A ambição universal dos homens é viver           
colhendo o que nunca plantaram.
(Adam Smith)                 


 


                                
                                A conta da vida 

Quando Levindo completou vinte e um anos, a mãezinha recebeu-lhes os amigos, festejou a data e solenizou o acontecimento com grande alegria. No íntimo, no entanto, a bondosa senhora estava triste, preocupada.

O filho, até à maioridade, não tolerava qualquer disciplina. 
Vivia ociosamente, desperdiçando o tempo e negando-se ao trabalho. Aprendera as primeiras letras, a preço de muita dedicação materna, e lutava contra todos os planos de ação digna.

Recusava bons conselhos e inclinava-se, francamente, para o desfiladeiro do vício. Nessa noite, todavia, a abnegada mãe orou, mais fervorosa, suplicando a Jesus o encaminhasse à elevação moral. Confiou-o ao Céu, com lágrimas, convencida de que o Mestre Divino lhe ampararia a vida jovem.

As orações da devotada criatura foram ouvidas, no Alto, porque Levindo, logo depois de arrebatado pelas asas do sono, sonhou que era procurado por um mensageiro espiritual, a exibir largo documento na mão.

Intrigado, o rapaz perguntou-lhe a que deveria a surpresa de semelhante visita. O emissário fitou nele os grandes olhos e respondeu:
- Meu amigo, venho trazer-te a conta dos seres sacrificados, até agora, em teu proveito.

Enquanto o moço arregalava os olhos de assombro, o mensageiro prosseguia:
- Até hoje, para sustentar-te a existência, morreram, aproximadamente, 2.000 aves, 10 bovinos, 50 suínos, 20 carneiros e 3.000 peixes diversos. Nada menos que 60.000 vidas do reino vegetal foram consumidas pela tua, relacionando-se as do arroz, do milho, do feijão, do trigo, das várias raízes e legumes. Em média calculada, bebeste 3.000 litros de leite, gastaste 7.000 ovos e comestes 10.000 frutas. Tens explorado fartamente as famílias de seres do ar e das águas, de galinheiros e estábulos, pocilgas e redis. O preço dos teus dias nas hortas e pomares vale por uma devastação. 

Além disto, não relacionamos aqui os sacrifícios maternos, os recursos e doações de teu pai, os obséquios dos amigos e as atenções dos vários benfeitores que te rodeiam. Em troca, que fizeste de útil? Não restituíste ainda à Natureza a mínima parcela do teu débito imenso. Acreditas, porventura, que o centro do mundo repousa em tuas necessidades individuais e que viverás sem conta nos domínios da Criação? Produze algo de bom, marcando a tua passagem pela terra. Lembra-te de que a própria erva se encontra em serviço divino. Não permitas que a ociosidade te paralise o coração e desfigure o espírito!...

O moço, espantado, passou a ver o desfile dos animais que havia devorado e, sob forte espanto acordou...

Amanhecera.

O Sol de ouro como que cantava em toda parte um hino glorioso ao trabalho pacífico. Levindo escapou da cama, correu até à genitora e exclamou:
- Mãezinha, arranje-me serviço! Arranje-me serviço!...
- Oh! Meu filho, disse a senhora num transporte de jubilo, que alegria! Como estou contente!... Que aconteceu?

E o rapaz preocupado, informou:
- Nesta noite passada, eu vi a conta da vida.
Daí em diante, converteu-se Levindo num homem honrado e útil.
 

Neio Lúcio / Francisco Cândido Xavier, no livro "Alvorada Cristã"

 

 
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