Gente, bichos, cores e costumes de Lumiar na arte do grafite

Renomado artista mineiro dá vida aos muros de um dos distritos mais charmosos da Serra
sexta-feira, 26 de junho de 2015
por Jornal A Voz da Serra
Andrea Brandani e personagens locais retratados com realismo num muro de um restaurante no centro de Lumiar (Cortesia de Andréa Rausch)
Andrea Brandani e personagens locais retratados com realismo num muro de um restaurante no centro de Lumiar (Cortesia de Andréa Rausch)

Quando acordaram certa manhã e saíram às ruas, moradores do distrito de Lumiar se surpreenderam com uma visão inusitada: um cachorro se destacava dormindo encolhido num dos muros mais visíveis da rua principal. À primeira vista dava a impressão de ser real. Mas logo os olhos denunciavam a ilusão e identificavam o grafite hiper-realista que retratava um conhecido vira-lata do local. Não havia assinatura e ninguém sabia quem o havia pintado. Na manhã seguinte nova surpresa, o vira-lata tinha companhia: outro famoso cão da localidade ganhara abrigo ao seu lado. Novamente não havia assinatura; ninguém tinha visto nada, ninguém sabia, mas começava-se a especular nas rodas de amigos quem seria o artista. Alguns dias depois, um homem apareceu pintado próximo ao seu próprio bar tocando saxofone, deitado no chão e com os pés apoiados num hidrante. Do outro lado da rua outros personagens também foram aos poucos sendo retratados: os clássicos “bebuns” do local, flagrados em animada fabulação; três jovens colegiais de aparência tranquila e mais alguns cães. Com o passar dos dias, no entanto, o nome do artista veio à tona. Andrea Brandani, no friozinho da noite, estaciona o seu jipe também grafitado em algum ponto do Centro de Lumiar, e sem fazer alarde dá início a mais um tema.

A grande aceitação e admiração manifestada pela população pelos desenhos do artista se destacam ainda pelo fato de ele retratar não apenas figuras que poderiam existir em qualquer lugar, mas indivíduos que fazem parte da realidade local. Qual morador não reconhece os cães que ao amanhecer e ao longo do dia o acompanham até em casa, rondam as mesas da padaria, dormem no meio da calçada? Quem não identifica os mais antigos vizinhos? E em que localidade pequena como Lumiar a maioria dos jovens não se reconhecem? Numa era em que a autoexposição da imagem e da própria vida privada das pessoas se intensifica, é previsível a reação positiva do público aos retratos feitos por Andrea, o que não invalida suas qualidades artísticas, que, aliás, já foram inúmeras vezes destacadas na imprensa brasileira e estrangeira, principalmente na Europa. Dedé, como também é conhecido, já viu seus trabalhos expostos na França — inclusive no Louvre —, Alemanha, Itália, Portugal e em vários outros países.

Nascido em Minas Gerais, Brandani vive atualmente entre o Rio de Janeiro, para onde se mudou em 1980, e o seu sítio em Rio Bonito, em Lumiar, e em viagens mundo afora. Mas foi em Ipanema, onde está localizado o seu ateliê, que ele começou a se tornar conhecido por suas intervenções nas ruas. Antes de focar sua arte no grafite, Dedé criou uma série de esculturas em tocos de árvores mortas do bairro. Houve quem gostasse e quem não gostasse, mas não houve quem não notasse. Por causa desse trabalho foi homenageado pela Academia de Artes, Ciências e Letras de Paris com a insígnia de Vermeil. Depois, embarcou na arte de “grafitar” muros, bancas de jornal e fachadas comerciais. Por aquelas ruas, desfilam seus elefantes — um dos temas preferidos do artista —, assim como as séries “flying flowers” e “Ipanema”, onde ele retrata as figuras lendárias do lugar. Ao lado dessas, um “turista” famoso: Wally, criado pelo artista Martin Handford na década de 80, e que, na versão de Andrea, ganhou o rosto de um homem que ele retratou numa feira em Portugal e que achou parecido com o original dos quadrinhos. De lá pra cá vem reproduzindo o personagem em cada cidade que tem acolhido seus grafites.

Atualmente, o seu Wally está em Lumiar, na porta de um bar. Sua próxima parada será o vizinho distrito de São Pedro da Serra. Em seguida parte para alguma cidade da Alemanha. E depois... só o que se sabe é que o mundo é cheio de cidades, de muros brancos, de fachadas de ferro e de temas inspiradores, além de pessoas que apreciam também a arte a céu aberto.

  • Brandani e seu autorretrato grafitado (Arquivo pessoal)

    Brandani e seu autorretrato grafitado (Arquivo pessoal)

  • As esculturas do artista em tocos de árvores mortas no bairro de Ipanema, no Rio, gerou grande repercussão local e mundial (Arquivo pessoal)

    As esculturas do artista em tocos de árvores mortas no bairro de Ipanema, no Rio, gerou grande repercussão local e mundial (Arquivo pessoal)

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