A Simplicidade das Coisas — Augusto Martini

dezembro 9, 2014

“Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa é adaptado para quadrinhos

A história de Riobaldo Tatarana, ex-jagunço que relembra lutas e a paixão reprimida por Diadorim, é traçada por uma travessia pelo sertão e pelas águas do rio São Francisco, retratada em Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa. O clássico da literatura brasileira ganhou adaptação em quadrinhos, com roteiro de Eloar Guazzelli e arte de Rodrigo Rosa.  A edição teve seu lançamento na Livraria Cultura, em São Paulo, no último dia 04/12.

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Ilustração de Rodrigo Rosa

Certamente é uma das maiores obras da literatura brasileira – “Grande Sertão: Veredas” – lançada em 1956 pelo escritor mineiro João Guimarães Rosa, foi adaptada em forma de quadrinhos. O roteiro foi escrito por Eloar Guazzelli e as ilustrações feitas por Rodrigo Rosa. A família do ilustre escritor deu aval ao projeto e acompanhou de perto todo o processo de criação. A adaptação, de 180 páginas, mantém o estilo em prosa poética utilizado por Guimarães Rosa para contar as histórias de lutas no sertão mineiro.

Os personagens principais também foram mantidos, Riobaldo e Diadorim, além de temas como: bem e mal, pacto com diabo, travessias e amores. Mesmo tendo que cortar bastante conteúdo do livro original, ainda assim, os autores conseguiram resgatar a essência da história, sobretudo, no conflito entre os personagens.
A linguagem da adaptação feita por Eloar Guazzelli é mais acessível do que a original, e devido a grande contribuição das imagens gráficas, poderá, com isso, atingir a um maior número de pessoas, principalmente, jovens fãs de quadrinhos, mangás, animes e séries de TV.
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Ilustração de Rodrigo Rosa

Esse processo de transposição para HQ (História em Quadrinhos) levou quase três anos para definir a aparência dos personagens, trechos e enquadramentos.

Ficha técnica:

Título: Grande Sertão: Veredas –  Graphic Novel

Autor: João Guimarães Rosa

Roteiro: Eloar Guazzelli

Arte: Rodrigo Rosa

Páginas: 180

Formato: 21 x 28 cm

Preço: R$ 199,90

ISBN: 978‐85‐250‐5775

Editora: Biblioteca Azul

Li o “Grande Sertão: veredas” há muitos anos e de vez em quando me pego relendo algumas páginas.  Fui instigado por uma professora que garantiu que eu gostaria. Emprestei-o então no Gabinete de Leitura de Rio Claro/SP, sem fazer ideia do que me esperava e logo nas primeiras linhas percebi que havia algo estranho, inusitado. A leitura linear habitualmente aplicada a outros livros, ali, não emprestava sentido às palavras, e o texto parecia que não se completava, pois era permeado de palavras em um dialeto que eu não conhecia. No entanto, a força do personagem se impôs antes que eu percebesse, e comecei a ler como Riobaldo falava. As frases passaram a fazer mais do que sentido, transformaram-se em um caminho que me conduziu por lugares e acontecimentos narrados, proporcionando-me uma fascinante viagem.  “Grande Sertão: Veredas” possui uma narrativa incrível, onde a experiência de vida e a experiência de texto se fundem.  Estas características muitas vezes fazem com que a leitura e a interpretação se tornem um desafio inesquecível. Abaixo, algumas frases do livro.

“O real não está no início nem no fim, ele se mostra pra gente é no meio da travessia…”
 
“O senhor ache e não ache. Tudo é e não é …”
“Passarinho que debruça – o voo já está pronto.”
“Sou só um sertanejo, nessas altas ideias navego mal. Sou muito pobre coitado. Inveja minha pura é de uns conforme o senhor, com toda leitura e suma doutoração.”
“Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa.”
“Deus é paciência. O contrário é o diabo.”
“O mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando.”
“A gente quer passar um rio a nado, e passa; mas vai dar na outra banda é num ponto muito mais embaixo, bem diverso do em que primeiro se pensou. Viver nem não é muito perigoso?”
“Quem-sabe, a gente criatura ainda tão ruim, tão, que Deus só pode às vezes manobrar com os homens é mandando por intermédio do diá?”
“O que não é Deus, é estado do demônio. Deus existe mesmo quando não há. Mas o demônio não precisa de existir para haver – a gente sabendo que ele não existe, aí é que ele toma conta de tudo.”
“Cavalo que ama o dono, até respira do mesmo jeito.”
“Quem desconfia fica sábio.”
“Passarinho cai de voar, mas bate suas asinhas no chão.”
“Ser ruim, sempre, às vezes é custoso, carece de perversos exercícios de experiência.”
“O espírito da gente é cavalo que escolhe estrada.”
“Medo, não, mas perdi a vontade de ter coragem.”
 
“Mas, na ocasião, me lembrei dum conselho de Zé Bebelo, na Nhanva, um dia me tinha dado. Que era: que a gente carece de fingir às vezes que raiva tem, mas raiva mesma nunca se deve de tolerar de ter. Porque, quando se curte raiva de alguém, é a mesma coisa que se autorizar que essa própria pessoa passe durante o tempo governando a ideia e o sentir da gente.”
 
“O jagunço Riobaldo. Fui eu? Fui e não fui. Não fui! – porque não sou, não quero ser.”
“Eu careço de que o bom seja bom e o rúim ruím, que dum lado esteja o preto e do outro o branco, que o feio fique bem apartado do bonito e a alegria longe da tristeza! (…) Este mundo é muito misturado …”
“A morte é para os que morrem.”
“A vida da gente vai em erros, como um relato sem pés nem cabeça, por falta de sisudez e alegria. Vida devia de ser como sala do teatro, cada um inteiro fazendo com forte gosto seu papel, desempenho.”
 
“Sertão é isto: o senhor empurra para trás, mas de repente ele volta a rodear o senhor dos lados. Sertão é quando menos se espera.”
 
“Preto é preto? branco é branco? Ou: quando é que a velhice começa, surgindo de dentro da mocidade.”
“No centro do sertão, o que é doideira às vezes pode ser a razão mais certa e de mais juízo!”
“O bom da vida é para cavalo, que vê capim e come.”
“E sei que em cada virada de campo, e debaixo de sombra de cada árvore, está dia e noite um diabo, que não dá movimento, tomando conta.”
“Tudo que é bonito é absurdo – Deus estável.”
“Liberdade – aposto – ainda é só alegria de um pobre caminhozinho, no dentro do ferro de grandes prisões.”
“Sertão é o sozinho.”
 
“Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura.”
 
“Sertão: é dentro da gente.”
“Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende.”
“Tudo que já foi, é o começo do que vai vir, toda a hora a gente está num cômpito.”
“Um sentir é do sentente, mas o outro é o do sentidor.”
“Para o prazer e para ser feliz, é que é preciso a gente saber tudo, formar alma, na consciência; para penar, não se carece.”
“Obedecer é mais fácil do que entender.”
‘Apertou em mim aquela tristeza, da pior de todas, que é a sem razão de motivo”…
 
“Vivendo, se aprende; mas o que se aprende, mais, é só fazer outras maiores perguntas.”
 
“Somente com a alegria é que a gente realiza bem – mesmo até as tristes ações.”
 
“O senhor sabe o que é silêncio é? É a gente mesmo, demais.”
” Se eu fosse filho de mais ação e menos ideia, isso sim, tinha escapulido, calado “
“Onde é que está a verdadeira lâmpada de Deus, a lisa e real verdade?”
“Tive medo não. Só que abaixaram meus excessos de coragem.”
 
“O senhor saiba: eu toda a minha vida pensei por mim, forro, sou nascido diferente. Eu sou é eu mesmo. Diverjo de todo o mundo… Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa. O senhor concedendo, eu digo: para pensar longe, sou cão mestre – o senhor solte em minha frente uma idéia ligeira, e eu rastreio essa por fundo de todos os matos. Amém!” 
 
“Como não ter Deus?! Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é possível, o mundo se resolve. Mas, se não tem Deus, há-de a gente perdidos no vai-vem, e a vida é burra. É oaberto perigo das grandes e pequenas horas, não se podendo facilitar – é todos contra os acasos. Tendo Deus, é menos grave se descuidar um pouquinho, pois no fim dá certo. (…) Deus existe mesmo quando não há. (…) Mas a gente quer Céu é porque quer um fim: mas um fim com depois dele a gente tudo vendo.” 
 
“O sertão é sem lugar.”
“Rir, antes da hora, engasga.”
“A gente vive repetido, o repetido, e, escorregável, num mim minuto, já está empurrado noutro galho. Acertasse eu com o que depois sabendo fiquei, para de lá de tantos assombros… Um está sempre no escuro, só no último derradeiro é que clareiam a sala. Digo: o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia.” 
“[U]m rio é sempre sem antiguidade.” 
“[U]m amigo… é que a gente seja, mas sem precisar de saber o por quê é que é.” 
“[E]u careço de que o bom seja bom e o rúim ruím, que dum lado esteja o preto e do outro o branco, que o feio fique bem apartado do bonito e a alegria longe da tristeza! Quero os todos pastos demarcados… Como é que posso com este mundo? A vida é ingrata no macio de si; mas transtraz a esperança mesmo do meio do fel do desespero. Ao que, este mundo é muito misturado…” 
“Tudo o que já foi, é o começo do que vai vir, toda a hora a gente está num cômpito. Eu penso é assim, na paridade… Um sentir é o do sentente, mas outro é o do sentidor. O que eu quero, é na palma da minha mão.” 
“Consegui o pensar direito: penso como um rio tanto anda: que as árvores das beiradas mal nem vejo… Quem me entende? O que eu queira. Os fatos passados obedecem à gente; os em vir, também. Só o poder do presente é que é furiável? Não. Esse obedece igual – e é o que é.” 
“O senhor não pode estabelecer em sua ideia a minha tristeza quinhoã. Até os pássaros, consoante os lugares, vão sendo muito diferentes. Ou são os tempos, travessia da gente?” 
“Natureza da gente não cabe em nenhuma certeza.”

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