Casas
Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história
Os arquitetos Marina Acayaba e Juan Pablo Rosenberg se aventuram com velhas técnicas e materiais para recompor esta casa em uma fazenda no interior paulista. Fizeram dela seu novo endereço, que carrega a marca da dupla no contraponto entre o colonial e o contemporâneo
2 min de leituraCom seu piso de tijolos artesanais, o pátio central funciona como uma ponte entre dois tempos. De um lado, está a casinha bicentenária de pau a pique, e, do outro, o pavilhão de alvenaria com laje plana, erguido entre 2018 e 2019. O projeto se insere no grande desejo da arquiteta Marina Acayaba de ter uma fazenda. “Este era o meu sonho número um”, revela. A busca por um pedaço de terra começou há oito anos, e, depois de se embrenhar pelo interior de São Paulo junto como marido, o arquiteto Juan Pablo Rosenberg, ela finalmente encontrou a propriedade que hoje ambos chamam de lar, localizada próxima a Catuçaba (distrito de São Luiz do Paraitinga, SP). É lá que os dois, sócios do escritório paulista no AR Arquitetos, passam a quarentena, acompanhados dos filhos Leon, 8, e Eva, 6. “Desde que terminamos a obra, eu nutria a vontade de mudar para cá.
"Solto da antiga estrutura de madeira, o novo forro de gesso acompanha o caimento do telhado colonial e sinaliza a intervenção na morada caipira"
De repente, veio a pandemia e pudemos pôr isso em prática”, conta Marina, feliz coma chance de estar no campo comas crianças, em um ambiente seguro que proporciona vivências tão especiais. “Elas andam a cavalo, plantam, fazem fogueira, comem pinhão... Além dessa experiência profunda com a natureza, é uma oportunidade de conviver com a cultura da roça.”
A intervenção ocorreu de forma muito sutil, sempre reverenciando a história da fazenda. “Sinto que me foi legado esse lugar, por isso, quero mantê-lo preservado para as próximas gerações”, reflete Marina.
"A base de pedra que nivelou o terreno resgata a presença de um muro visto em fotografias de época da casa original"
No bloco principal, de 90 m², duas paredes saíram de cena para conectar sala e cozinha, que ganhou uma ilha com fogão a lenha. Ali, o forro foi atualizado. “O desenho milimétrico dos painéis de gesso é a real marca contemporânea desta casa. Como ele fica solto da estrutura original de madeira, identifica-se facilmente a diferença entre ele e as imperfeitas paredes caiadas”, explica Marina. Apenas um exemplo de como os profissionais conseguiram colocar sua arquitetura minimalista, de detalhes precisos, em um projeto tão diferente de tudo o que já haviam feito, com materiais rústicos e fortes vestígios históricos.
Com a intenção de estabelecer um paralelismo entre a construção antiga e a nova, os arquitetos apostaram em materialidades parecidas. “Em fotos de época, descobrimos um muro de pedras que embasava a morada de pau a pique. Decidimos escavar e deixá-lo aparente”, lembra.
Para o anexo (onde há duas suítes), uma base, também de pedra, foi levantada a fim de nivelar o terreno – o granito veio do entulho da demolição de uma fazenda nos arredores. Apegada local também comparece na marcenaria de cedro-rosa, cujo esmero se faz presente em móveis, prateleiras, painéis e nas esquadrias das janelas pivotantes, que emolduram e valorizam o contorno das montanhas. Realização de uma oficina de São Luiz do Paraitinga, em um gesto coerente com o movimento de enaltecer a matéria-prima e a mão de obra locais.
O resultado, para Marina, é certeiro. “Não mexeria em nada. E acredito que um projeto desse, num lugar desse, precisa incorporar as marcas do tempo. Ele pode ser meio sujo, ter mais terra nas paredes”, filosofa a arquiteta, como a fazer um convite para os anos agirem sem pressa, coma garantia de que ela estará lá, ao lado da família, para observar e acolher cada mudança.
"As rochas vieram da demolição de uma fazenda vizinha, e os tijolos, de uma olaria próxima: o projeto valoriza materiais locais"