Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

A fachada da morada principal e o cachorro Tião (Fotos Ruy Teixeira)

Com seu piso de tijolos artesanais, o pátio central funciona como uma ponte entre dois tempos. De um lado, está a casinha bicentenária de pau a pique, e, do outro, o pavilhão de alvenaria com laje plana, erguido entre 2018 e 2019. O projeto se insere no grande desejo da arquiteta Marina Acayaba de ter uma fazenda. “Este era o meu sonho número um”, revela. A busca por um pedaço de terra começou há oito anos, e, depois de se embrenhar pelo interior de São Paulo junto como marido, o arquiteto Juan Pablo Rosenberg, ela finalmente encontrou a propriedade que hoje ambos chamam de lar, localizada próxima a Catuçaba (distrito de São Luiz do Paraitinga, SP). É lá que os dois, sócios do escritório paulista no AR Arquitetos, passam a quarentena, acompanhados dos filhos Leon, 8, e Eva, 6. “Desde que terminamos a obra, eu nutria a vontade de mudar para cá.

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

O pau a pique, tipo de estrutura com terra frequente no período colonial, resulta em superfícies imperfeitas, como se vê nesta foto – na parede caiada, aquarela de Gil Mello, e, no chão, bancos de Lina Bo Bardi e da Marcenaria Baraúna (Foto Ruy Teixeira)

"Solto da antiga estrutura de madeira, o novo forro de gesso acompanha o caimento do telhado colonial e sinaliza a intervenção na morada caipira"

 
Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

No hall que antecede os quartos, um cantinho de leitura foi montado com a poltrona de balanço Astúrias, design Carlos Motta, e mesa do AntiquárioCasarão, de Tiradentes, MG, que apoia peça de cerâmica de Richard Calhabéu e jarra Loops, de Brunno Jahara para a St. James – na parede, quadro de León Ferrari (Foto Ruy Teixeira)

De repente, veio a pandemia e pudemos pôr isso em prática”, conta Marina, feliz coma chance de estar no campo comas crianças, em um ambiente seguro que proporciona vivências tão especiais. “Elas andam a cavalo, plantam, fazem fogueira, comem pinhão... Além dessa experiência profunda com a natureza, é uma oportunidade de conviver com a cultura da roça.”

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

Eva, a caçula, na porta principal, foco de discussão entre o casal quanto ao posicionamento na planta: “A entrada atrapalhava um pouco a circulação. Mas as pessoas estão chegando por ela há 200 anos, não seria a gente que ia mudar isso”, conta Marina (Foto Ruy Teixeira)

A intervenção ocorreu de forma muito sutil, sempre reverenciando a história da fazenda. “Sinto que me foi legado esse lugar, por isso, quero mantê-lo preservado para as próximas gerações”, reflete Marina.

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

A ilha com fogão a lenha e a parede ao fundo levam revestimento da linha Casablanca, da Portobello, e a mesa desenhada pelos arquitetos exibe cerâmica da linha Degrau, da Dpot Objeto – ao redor dela, cadeiras da Thonart e banco Tripé, do Atelier Watson, na Dpot Objeto

"A base de pedra que nivelou o terreno resgata a presença de um muro visto em fotografias de época da casa original"

 
Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

A arquiteta com Pablo, ambos contornados pelo cinza-chumbo aplicado nas janelas, portas e esquadrias (Foto Ruy Teixeira)

No bloco principal, de 90 m², duas paredes saíram de cena para conectar sala e cozinha, que ganhou uma ilha com fogão a lenha. Ali, o forro foi atualizado. “O desenho milimétrico dos painéis de gesso é a real marca contemporânea desta casa. Como ele fica solto da estrutura original de madeira, identifica-se facilmente a diferença entre ele e as imperfeitas paredes caiadas”, explica Marina. Apenas um exemplo de como os profissionais conseguiram colocar sua arquitetura minimalista, de detalhes precisos, em um projeto tão diferente de tudo o que já haviam feito, com materiais rústicos e fortes vestígios históricos.

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

Detalhe mostra a janela do banheiro (Foto Ruy Teixeira)

Com a intenção de estabelecer um paralelismo entre a construção antiga e a nova, os arquitetos apostaram em materialidades parecidas. “Em fotos de época, descobrimos um muro de pedras que embasava a morada de pau a pique. Decidimos escavar e deixá-lo aparente”, lembra.

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

A sala tem sofá desenhado pelos moradores, cadeira de Lina Bo Bardi, na Etel, tapete da Clatt, luminária de Adriana Yazbek, na Dpot Objeto – na parede, quadro de Rebecca Sharp (à esq.), pratos de Stella Ferraz e obra de Juan José Cambre (Foto Ruy Teixeira)

Para o anexo (onde há duas suítes), uma base, também de pedra, foi levantada a fim de nivelar o terreno – o granito veio do entulho da demolição de uma fazenda nos arredores. Apegada local também comparece na marcenaria de cedro-rosa, cujo esmero se faz presente em móveis, prateleiras, painéis e nas esquadrias das janelas pivotantes, que emolduram e valorizam o contorno das montanhas. Realização de uma oficina de São Luiz do Paraitinga, em um gesto coerente com o movimento de enaltecer a matéria-prima e a mão de obra locais.

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

Detalhe da cozinha com vaso de cerâmica de Paty Degan, na Dpot Objeto (Foto Ruy Teixeira)

O resultado, para Marina, é certeiro. “Não mexeria em nada. E acredito que um projeto desse, num lugar desse, precisa incorporar as marcas do tempo. Ele pode ser meio sujo, ter mais terra nas paredes”, filosofa a arquiteta, como a fazer um convite para os anos agirem sem pressa, coma garantia de que ela estará lá, ao lado da família, para observar e acolher cada mudança.

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

As duas casas lado a lado, com destaque para o embasamento de granito do volume novo (Foto Ruy Teixeira)

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

A família reunida no pátio, principal espaço da casa, com bancos e mesa desenhados por Marina e Pablo: ali, eles fazem a maioria das refeições (Foto Ruy Teixeira)

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

Em um dos quartos de hóspedes, parte do novo pavilhão, a vista exuberante dos arredores se escancara diante da janela pivotante – a bancada de concreto ampara vaso da coleção Amorfos, da Alva Design, na Dpot Objeto (à esq.), e quadro de Gil Mello, enquanto a cadeira 39, da Jabuticasa, expõe manta de lã de alpaca da Casa Almeida (Foto Ruy Teixeira)

Restaurada, esta casa de pau a pique ganhou novos ares sem perder a história (Foto: Ruy Teixeira)

O pátio faz a ponte entre os séculos 19 e 21: “No fundo, este é um projeto que fala de dois tempos. Se, algum dia, isso virar uma ruína, será compreensível que há duas arquiteturas, de momentos diferentes”, pontua Marina (Foto Ruy Teixeira)

"As rochas vieram da demolição de uma fazenda vizinha, e os tijolos, de uma olaria próxima: o projeto valoriza materiais locais"