Os macacos reconhecem amigos que não veem há décadas. E talvez até sintam falta deles

CNN , Jack Guy
24 dez 2023, 15:00
Macacos no Jardim Zoológico de Edimburgo, na Escócia. Kate Grounds/Edinburgh Zoo

Os investigadores acreditam que a memória social dos macacos se pode estender para além dos 26 anos e pode mesmo ser comparável à dos humanos, que começam a esquecer as pessoas após 15 anos, mas podem lembrar-se delas durante 48 anos

Os macacos conseguem reconhecer velhos amigos que não veem há décadas, de acordo com uma nova investigação. Trata-se da memória social mais duradoura alguma vez documentada fora dos humanos.

Os investigadores descobriram que os chimpanzés e os bonobos eram capazes de reconhecer fotografias de antigos companheiros de grupo mais de 25 anos depois de os terem visto pela última vez ao vivo, sendo que as fotografias de velhos amigos suscitavam uma reação ainda mais positiva, de acordo com o estudo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences.

O autor principal do estudo, Christopher Krupenye, professor assistente da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, que estuda a cognição animal, contou à CNN que a investigação foi inspirada pela sua experiência de trabalho com macacos e por sentir que estes o reconheciam mesmo anos após a sua última interação.

Estudo revela que tanto os chimpanzés como os bonobos reconhecem velhos amigos, mesmo depois de décadas de separação. Kate Grounds/Edinburgh Zoo

Para testar este facto, Krupenye e a também autora principal Laura Lewis, antropóloga biológica e psicóloga comparativa da Universidade da Califórnia, em Berkeley, utilizaram fotografias de macacos que tinham morrido ou deixado grupos no Jardim Zoológico de Edimburgo, na Escócia, no Jardim Zoológico de Planckendael, na Bélgica, e no Santuário de Kumamoto, no Japão.

A equipa selecionou indivíduos que os macacos participantes não tinham visto durante períodos de tempo que variaram entre nove meses e 26 anos, que tinham imagens de alta qualidade disponíveis em arquivo e anotaram o tipo de relação que os participantes tinham tido com os indivíduos.

Os investigadores deixaram então duas fotografias - uma do macaco que tinham conhecido e outra de um estranho - acessíveis aos macacos e utilizaram um dispositivo não invasivo de rastreio ocular para medir para onde olhavam e durante quanto tempo.

Os resultados mostraram que os macacos olhavam "significativamente mais tempo" para aqueles que conheciam, independentemente do tempo decorrido desde a última vez que os tinham visto, e ainda mais tempo para aqueles com quem tinham sido amigos.

Krupenye compara a experiência com a de encontrar alguém do liceu na rua depois de não o ver há anos.

"É uma experiência muito familiar para os humanos também", disse à CNN.

Capacidade de sentir falta dos entes queridos?

Uma bonobo, Louise, não via a irmã Loretta nem o sobrinho Erin há 26 anos na altura do teste, mas "mostrou uma tendência de olhar surpreendentemente robusta para ambos ao longo de oito ensaios", de acordo com um comunicado de imprensa.

Os investigadores acreditam que a memória social dos macacos se pode estender para além dos 26 anos e pode mesmo ser comparável à dos humanos, que começam a esquecer as pessoas após 15 anos, mas podem lembrar-se delas durante 48 anos, acrescenta o comunicado.

"Isto parece estar a aproximar-se de uma espécie de memória para toda a vida para estes animais", considerou Krupenye.

Este é também um novo recorde para a duração da memória social em animais não-humanos, depois de pesquisas anteriores terem mostrado que os golfinhos se lembravam de indivíduos que não viam há 20 anos.

Os resultados mostram que a memória social é uma característica mais ampla dos macacos que partilhamos com os nossos parentes mais próximos, em vez de algo que evoluiu separadamente nos humanos, sublinhou Krupenye.

O estudo também levanta a possibilidade de os macacos serem capazes de sentir a falta dos seus entes queridos.

"A ideia de que eles se lembram dos outros e, portanto, podem sentir falta desses indivíduos é realmente um mecanismo cognitivo poderoso e algo que tem sido considerado exclusivamente humano", disse Lewis em comunicado.

"O nosso estudo não determina que isso está a acontecer, mas levanta questões sobre a possibilidade de eles terem a capacidade de o fazer".

Os autores esperam que o estudo aumente a consciencialização sobre a forma como a caça furtiva e a desflorestação podem afetar as comunidades de macacos, separando os companheiros de grupo, e impulsione os esforços de conservação.

"Esperamos que estes resultados proporcionem às pessoas uma maior empatia com os nossos primos vivos mais próximos", desejou Lewis, sublinhando que os bonobos podem extinguir-se durante a nossa vida.

A seguir, a equipa planeia investigar se os macacos conseguem reconhecer antigos amigos tal como são agora, em vez de quando deixaram o grupo, bem como se outros primatas, como os gorilas e os orangotangos, também possuem memórias sociais duradouras.

"Ficaria muito surpreendido se não observássemos efeitos semelhantes noutros macacos", afirmou Krupenye, que acrescentou que o seu método poderia ser utilizado para investigar a memória social noutros animais, como ovelhas e cães.

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