PEDRO MAURO | O faroeste italiano em quadrinhos no traço brasileiro

O desenhista Pedro Mauro tem uma vasta produção em revista de histórias em quadrinhos, storyboard e arte publicitária, em uma carreira iniciada nos anos 1970 e que continua até os dias de hoje.

De trabalhos de HQs independentes a editoras pequenas e mainstream, de obras autorais ao faroeste de quadrinhos mais famoso do mundo, o traço de Mauro é rápido e dinâmico em sua estrutura.

Entrega figuras realísticas em um sensacional preto e branco para criar contraste, e tudo tem uma vivacidade que só se encontra nos maiores clássicos da Nona Arte.

Sua arte preta e branca quadrada realística é das melhores não apenas no Brasil, mas do mundo.

Pedro Mauro
Pedro Mauro
Pedro Mauro
Uma arte pintada de Pedro Mauro

Pedro Mauro

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Pedro Mauro
O preto e branco da arte de Pedro Mauro. Grande domínio de figuras, anatomia, poses e cenários

Nascido na cidade de Nova Europa, interior de São Paulo, o primeiro trabalho de Pedro Mauro Moreno Dias nos quadrinhos foi na editora Taika, uma empresa da capital paulista, no começo dos anos 1970.

Suas revistas em quadrinhos vinham com capas com uma tarja verde e amarela com a frase “Totalmente escrita e desenhada no Brasil”.

Ela publicava quadrinhos de terror, faroeste, suspense. Usava personagens famosos como o Drácula. E a maioria vinha com o prefixo de “almanaque“.

Pedro Mauro

E a grande chance para Mauro aconteceu no seu gênero favorito, o faroeste, também conhecido como western no meio dos quadrinhos.

Pedro Mauro criou e desenhou Pancho, um personagem no melhor estilo dos pistoleiros criados pelo cineasta Sergio Leone, diretor de grandes clássicos do faroeste nos cinemas (dirigiu Era Uma Vez no Oeste, de 1968, o melhor do gênero).

O Pancho de Pedro Mauro era um anti-herói, em um cenário mais sujo e rude que os mocinhos cowboys padrão do mercado. Pancho era vingativo, não se importava em ser justo, odiava hipocrisia e fazia tudo que queria.

Pedro Mauro, Taika, Pancho, anos 1970

Pedro Mauro
Os primeiros trabalhos de Pedro Mauro nas HQs: Pancho, nos anos 1970

Pedro Mauro

Eu era muito fã do chamado spaghetti western, que era como a gente chamava o faroeste. Eu tinha 17 anos, nem podia entrar nos cinemas para assistir aos filmes permitidos apenas aos maiores de idade era permitida a entrada. Eu terminei o ensino médio e fui para a capital com 18 anos com portfólio embaixo do braço. Era assim que era naquela época, você saía da escola e tinha que arrumar trabalho. Era 1969. E em um primeiro momento, o trabalho na Taika consista em ser assistente, usando borracha para apagar traços e outros serviços menores. Mas consegui que me dessem uma chance de fazer algumas páginas, e quando elas foram publicadas em uma revista, ela se esgotou. Foi aí que começou a rolar mais trabalho de desenho“, relembra Pedro Mauro, ao Destrutor.

DO QUE PEDRO MAURO GOSTA NAS HQS: O artista gostava dos personagens Cavaleiro Negro, Flecha Ligeira, Durango Kid, seriados e filmes clássicos de western quando criança. No cinema, quem o fascinava era Clint Eastwood, Lee Van Cleef, Franco Nero, Montgomery Ford, Bud Spencer, John Garko, William Berger.

Na arte do desenho, é grande fã dos artistas Milton Canniff, Al Williamson e Alex Raymond. E se considera influenciado por Hugo Pratt, Esteban Maroto, Victor LaFuente, Milo Manara, Paolo Serpieri, Moebius, Will Eisnere muitos outros que com certeza estou esquecendo“.

Quando entrei na Taika, gostava muito dos desenhos de Victor de La Fue, que desenhava cavalos muito bem“, explica. Cavalos sempre são um bloqueio criativo duro de superar na arte de histórias em quadrinhos de faroeste, já que os animais são parte do lore do gênero.

Nunca foi um grande problema para Mauro, já que na infância, ele teve contato com os animais em ambiente rural, e sempre gostou de desenha-los. Victor de La Fue é autor de Sunday, uma das melhores séries de HQ de faroeste da indústria.

Gosto também de Gino D’Antonio“, explica Mauro. Gino ficou famoso por escrever e desenhar a conceituada série A História do Oeste (Storia del West, no original), conhecida no Brasil como Epopéia-Tri.

Pedro Mauro
Pedro desenhando (e pintando) cavalos

No mundo da publicidade

Depois de produzir mais de 300 páginas para a Taika em diversas outras revistas, e em um momento de aperto financeiro na empresa, ele se viu desempregado.

Mas algumas vezes essas situações vem acompanhadas de outras, bem diferente. Pedro Mauro e outros funcionários acabaram sendo entrevistados por jornalistas da Rede Bandeirantes, um canal de televisão, em uma matéria onde falavam sobre o fechamento da empresa.

Pedro estava com seus desenhos e isso apareceu na reportagem também. Um diretor de arte de uma agência de publicidade, por acaso, viu a matéria na TV. E em questão de dias, conseguiu o telefone de Pedro.

 Pedro Mauro
Arte promocional no traço de Pedro Mauro

Isso deu início a um novo passo profissional para o jovem Pedro, que mergulhou em trabalhos publicitários e no mercado de ilustração. Realizou trabalhos para grandes veículos do Brasil, onde revistas como Playboy, Quatro Rodas, Realidade, Editora 3, Sexy e diversas outras puderam ter a sua arte.

É de sua autoria, por exemplo, o cartaz do filme Keoma (1976), distribuído no país pela Paris Filmes.

O talento o levou para ainda mais longe, quando aceitou o convite de uma agência publicitária dos Estados Unidos.

Viveu em Nova York por 12 anos trabalhando com arte publicitária.

Pedro Mauro no ápice

Pedro Mauro assinando e fazendo uma sketch em um exemplar de Gatilho. Foto de André Pinto

Os anos de trabalho se acumularam, e a idade de Pedro também, que estava cansando do mercado, que exigia muitas horas e dias seus (de sua família).

Ele pisou no freio, e começou a considerar voltar aos quadrinhos. Retornou ao Brasil, começou a espalhar suas artes pela internet, e chamou a atenção de um figurão da indústria.

Em 2014, Pedro começou sua colaboração com a Sergio Bonelli Editore, uma das maiores editoras de quadrinhos da Itália e do mundo, casa de ninguém menos do que Tex, o maior personagem de western das HQs.

Ele desenhou dois episódios da Maxi Série Adam Wild: Lagos (#16, janeiro de 2016) e La suprema catastrofe (#17, fevereiro de 2016), escrito por Gianfranco Manfredi, cantor, compositor, escritor, ator e roteirista italiano.

Nascido em Senigallia, se formou em História da Filosofia. Estreou nos quadrinhos com Gordon Link (1991), pela editora Dardo. Começou a trabalhar com a Sergio Bonelli Editora em 1994, com Dylan Dog e Nick Raider. Manfredi criou Mágico Vento em 1997, e em 2005, estreou em Tex com o roteiro de La pista degli Agguati, publicada na Itália no Maxi Tex # 9 (outubro de 2005). Giancarlo Manfredi é uma lenda das HQs.

E desde então, Pedro Mauro se restabeleceu no mundo dos quadrinhos.

O QUE É PRECISO TER: O portfólio de Pedro quando tentou arrumar emprego na Taika era um caderno escolar comum cheio de desenhos.

Foi isso o primeiro passo para ter chance de desenhar as revistas do Drácula, Combate, Faroeste, Terror, Bang Bang. Sou muito agradecido por Ignácio Justo ter me ensinado tanto. Eu era seu assistente de arte, apagando lápis das artes finais e realizando todo tipo de ajuda. No começo, eu era todo durão, tentava copiar, fazer igual, mas creio que apenas no 4º ou 5º mês que ganhei um estilo próprio. O que quero dizer isso é que parte do segredo de ser desenhista, quando alguém me pergunta, é se dedicar totalmente ao trabalho, e ter na cabeça 24 horas isso. Não é para se matar de trabalhar, mas para sempre estar pensando nisso.”

O QUE CONHECER: “Indico para as pessoas conhecerem mais o artista Esteban Maroto. Sua forma diferente de desenhar fantasia e ficção é única. Dos artistas mais novos, o Luigi Cavenago é um italiano que desenhou Dylan Dog de forma digital, mas que tem uma simplicidade que acho fantástica.”

UMA DICA: “E aprenda inglês. Corte intermediários. Saber conversar em inglês ajuda a encurtar caminhos para conseguir boas chances lá fora“.

No Brasil, entre outros trabalhos, participou da antologia 321 Fast Comics (2015), Pátria Armada Visões de Guerra (2016), do artista Klebs Junior, e Chronicles of Few and Cursed (2018), ambos organizados pelo editor e escritor Felipe Cagno.

No mesmo ano, Pedro desenhou um álbum da série L’art du Crime, de Marc Omeyer e Olivier Berlion, para a dditora Glenat, na França.

Mugiko, de Giancarlo Manfredi e Pedro Mauro

Em 2017, Pedro fez um segundo projeto com Giancarlo Manfredi, na coleção Le Storie: uma história de espionagem, Mugiko, lançada no Brasil pela editora Trem Fantasma.

Durante os anos 2017, 2018 e 2019, ao lado do escritor Carlos Estefan, publicou de forma independente a sensacional trilogia de faroeste: Gatilho, Legado e Redenção, sobre um misterioso caçador de recompensas no Velho Oeste, um enorme sucesso de público e crítica no Brasil.

Carlos Estefan e Pedro Mauro
Gatilho. Arte de Pedro Mauro

Em 2020, o desenhista Pedro Mauro completou 50 anos de carreira. Para comemorar a data, lançou o especial Cowboy – Pedro Mauro – Primeiras histórias 1970-1971, um livro de quase 200 páginas, capa dura, produzido via Catarse.

Ele incluiu sketchs personalizados, arte originais, edições autografadas, bookplates autografados e pôsteres.

O lançamento reproduz em fac-símile todas as sete aventuras de faroeste que Pedro Mauro realizou na Taika. Também nesse ano, colaborou com sua arte para um projeto da DC Comics, Batman: The World.

Os primeiros trabalhos de Pedro Mauro já tinha uma excelência incrível nas composições de desenho

Em 2021, a trilogia Gatilho-Legado-Redenção foi lançada em cores pela Editora Pipoca e Nanquim em uma edição definitiva compilada. Carlos Estefan escreveu em seu perfil do Facebook: “(…) uma edição definitiva, colorida e com uma história extra feita especialmente pra esse novo volume, por mim e pelo Pedro Mauro.”

A publicação também trouxe uma história extra em preto e branco, com quase o mesmo número de páginas de Gatilho.

Pedro Mauro

Pedro Mauro
A grande trilogia Gatilho-Legado-Redenção agora em cores

Atualmente, Pedro Mauro está trabalhando de novo em outro projeto com Carlos Estefan. Confira o que o escritor escreveu em seu perfil do Instagram:

Pra quem tava pedindo por mais uma parceria minha com Pedro Mauro, tá aí: THE FEW AND CURSED: HEART-SHAPED AMBITION é o mais novo projeto que estamos trabalhando! Ambientada no universo fantástico criado pelo amigo Felipe Cagno, essa história se passa na Era de Ouro da Pirataria, e contará a origem de Bartholomew Eamus, o primeiro caçador de demônios de TFAC. Uma baita aventura, cheia de ação!“.

O projeto já está aberto pelo Kickstarter e nos próximos meses deve chegar ao Catarse.

Outro trabalho muito esperado de Pedro Mauro também foi anunciado neste ano: a obra chamada The Solicitor (L’ispettore, em italiano), um western de ninguém menos do que Gianfranco Manfredi nos roteiros, uma HQ que sairá pela editora Pipoca e Nanquim, com lançamento previsto para 2022, simultâneo em português (brasileiro)-italiano-inglês.

Mais detalhes ainda desse projeto não foram revelados pelos autores.

O desenhista Pedro Mauro pode ser encontrado junto com seus desenhos em seu perfil no Instagram e em sua página do Facebook. Muitas imagens usadas nesta matéria foram retiradas de lá.

/ 2019. A entrevista de Pedro Mauro foi concedida ao Destrutor no final de 2019, na Ilustra Comic Fest, uma feira independente dedicada aos quadrinhos e ilustração, idealizado pelos artistas Marcel Bartholo e Michell Ed. Ele faz parte da programação do Ilustradoria, que reúne a galera criativa das artes no espaço do SESC de Sorocaba-SP.

Não é só os quadrinhos, as diferentes formas de preparar a ilustração, desenho, concept art, diferentes formas de impactar os quadrinhos, temos artistas plásticos, de grafite, caricatura e roteiristas. Tentamos abranger todas as formas nesse encontro mensal. É um momento para troca de informações para quem nunca pensou em trabalhar na área. Dá noção para iniciantes no mercado“, explica Marcel.

A matéria original com o Pedro Mauro pode ser lida aqui: http://destrutor.blogspot.com/2019/11/o-caminho-da-arte-como-experiencia-e-as.html

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