Fractais tropicais

fractais tropicais

Nelson de Oliveira (organização)
Sesi-SP editora
496 páginas
Lançado em 2018

A antologia Fractais tropicais propõe ser um panorama representativo da aventura de produzir literatura de ficção científica no Brasil, a partir da seleção de seus principais contos na opinião do organizador, o também escritor Nelson de Oliveira. Conhecido como importante antologista das recentes gerações de escritores no Brasil, nos livros Geração 90 e Geração Zero Zero, assim como por seus próprios trabalhos, como os premiados O filho do crucificado e Poeira: demônios e maldições, entre outros, Oliveira também se tornou ele mesmo um autor de ficção científica, gênero que observa ser a alternativa mais favorável à crise de criatividade da literatura brasileira.

Do alto de suas 496 páginas, Fractais tropicais posta-se como pedra fundamental para um cânone da FC nacional, pois faz um levantamentos técnico, estilístico e histórico do gênero a partir das Ondas de autores vinculados ao movimento dos fãs (fandom), conceito consagrado entre os estudiosos de ficção científica. Dessa forma, o volume se divide em três partes, correspondendo a cada uma das ondas, apresentadas em ordem cronológica inversa, ou seja, iniciando pela terceira e voltando no tempo, como numa viagem ao passado, o que faz todo o sentido num livro de FC.

Dessa forma, o volume se inicia com a Terceira Onda, formada pelos autores que exercitam o gênero a partir do estabelecimento das redes sociais da internet na virada para o século 21, com textos de Cristina Lasaitis, Ana Cristina Rodrigues, Lady Sybilla, Cirilo Lemos, Alliah, Santiago Santos, Márcia Olivieri, Andréa del Fuego, Luiz Bras (persona literária do próprio organizador), Ademir Assunção, Tibor Moricz e Ronaldo Bressane.

Na Segunda Onda, também chamada de Geração dos Fanzines, aparecem os autores que produziram seus trabalhos ao longo dos anos 1980 e 2000 nas páginas das publicações independentes – período em que o gênero não tinha nenhum espaço no mercado formal –, dentre os quais Oliveira selecionou contos de Braulio Tavares, Ivanir Calado, Carlos Orsi, Lucio Manfredi, Fabio Fernandes, Ataíde Tartari, Finísia Fideli, Gerson Lodi-Ribeiro, Jorge Luiz Calife, Roberto de Sousa Causo, Ivan Carlos Regina, Octávio Aragão e Fausto Fawcett.

Finalmente chegamos na Primeira Onda, com uma seleta de autores clássicos publicados nos anos 1960 e 1970: André Carneiro, Dinah Silveira de Queiroz, Fausto Cunha, Jeronymo Monteiro e Rubens Teixeira Scavone. Poderia continuar rumando ainda mais ao passado, recuando à era pré-fandom, que tem exemplos importantes desde o século 19, mas isso por certo enfraqueceria os objetivos mais imediatos do volume.

Percebe-se que, ainda que o organizador tenha se empenhado em dar alguma representatividade aos gêneros, sempre, e ainda hoje, predomina a presença masculina entre os autores. Embora nos demais seguimentos da literatura fantástica, como a fantasia e o terror, haja uma presença feminina mais expressiva, e a Terceira Onda realmente mostre um aumento na variedade autoral, a FC continua sendo o Clube do Bolinha da literatura fantástica, e esse será um panorama difícil de mudar, pois os protocolos da ficção científica, estabelecidos nos anos 1940 e 1950 nas revistas pulp americanas, privilegiavam o público adolescente masculino.

Outras análises podem ser obtidas, mas é conveniente deixá-las para outra oportunidade. O importante agora é destacar que, com Fractais tropicais, a ficção científica dá um passo importante em direção ao estabelecimento de um campo respeitável na literatura nacional.

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Cesar Silva é pesquisador e um dos editores do Almanaque da Arte Fantástica Brasileira.

[ Resenha publicada originalmente no Almanaque da Arte Fantástica Brasileira. ]