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Por Adriano Leonardi — São Paulo

IStock Getty Images

As fraturas de stress, que outrora eram quase que exclusividade de atletas de alta “performance” e militares, tem se tornado lesões cada vez mais comuns entre esportistas. Modalidades como o triatlon, corrida de montanha, maratona, ultramaratona e demais esportes de endurance, fazem com que o atleta ultrapasse a resistência fisio-histológica do osso e também passe por esgotamento muscular, por esforço excessivo, com a falta de absorção de impactos acumulativos.

Invariavelmente, os músculos fadigados transferem a sobrecarga para o osso, ocorrendo a fratura por stress. Um estudo australiano recente mostrou que 21% dos fundistas de elite sofrem uma fratura de estresse ao menos uma vez na vida, com a maioria ocorrendo na tíbia. As mulheres tem duas a três vezes mais probabilidades de sofrer uma fratura de estresse tibial.

O quadro clínico clássico envolve início lento e gradual de dor no osso acometido que piora durante o treino e melhora no repouso, geralmente precedido por incremento súbito de volume e intensidade, de 4 a 5 semanas previas, em média. Ao insistir no treino, o atleta experimenta agravo dos sintomas com invariável queda de rendimento. O diagnóstico é feito pelo exame clínico e exames de imagem como as radiografias, cintilografia, tomografia e ressonância magnética. O período de reabilitação e repouso relativo (afastamento do esporte, mantendo-se atividades aeróbicas paralelas como a natação, ciclismo, spinning e hidroginástica) varia de 6 a 8 semanas.

Apesar do retorno ao esporte, muitas vezes ser feito de maneira gradual e progressiva, acompanhada por equipe multidisciplinar, a taxa de recidiva acaba sendo grande, principalmente entre mulheres, causando frustração em toda a equipe de saúde e, obviamente, no atleta.

Mulheres possuem maior taxa de reincidência da lesão — Foto: iStock

Por anos, acreditava-se que as fraturas de estresse ocorriam apenas por causas mecânicas, ou seja: por erros e exageros de treinamento, tipo de solo, calçado e falta de preparo físico. Inúmeros estudos foram feitos focando parâmetros como tipo do tênis, tipo de pisada, testes de equilíbrio muscular, simetria de membros inferiores, diâmetros de coxa e panturrilha, todos eles objetivando a prevenção destas lesões. O resultado da maioria deles foi inconclusiva. Alguns inclusive com resultados muito questionáveis, visando talvez a promoção de vendas de tênis, palmilha e órteses, já que o mercado dos esportes de endurece tem crescido e trazido generosas cifras à indústria ligada ao esporte.

Na ultima década, com a chegada de medicamentos que impedem a absorção óssea, classe conhecida como bifosfonados, o aumento das pesquisas dos efeitos fisiológicos da vitamina D e o atual lançamento das chamadas drogas osteoanabólicas (formadores de matriz óssea) indicados para a população idosa portadora de fragilidade óssea como a osteopenia, osteomalácia e osteoporose, chamou a atenção de alguns pesquisadores na aplicação nas fraturas de estresse, tanto na prevenção, quanto no tratamento.

Ao contrário do que se imagina, o tecido ósseo é metabolicamente muito ativo e responde a estímulos de pressão, com formação de mais matriz óssea e à tensão com processo de reabsorção e perda de massa óssea. A este processo, chamamos de remodelação. Além de fornecer suporte para o movimento, os ossos são também um grande reservatório de cálcio, eletrólito fundamental em diversas funções fisiológicos, dentre elas, a contração muscular.

Um estudo que particularmente considero um marco na prevenção da fratura de estresse estudou fraturas de estresse em recrutas da marinha americana do sexo feminino. As recrutas receberam suplementos vitamínicos com 200% da necessidade diária de vitamina D e cálcio e foram submetidas a 8 semanas de treinamento. Ao final do estudo 8,6% das recrutas que receberam placebo desenvolveram fratura de estresse contra os 6,8% das que receberam o suplemento vitamínico. A diferença entre os grupos foi de 21%.

Os resultados deste estudo vão de encontro com a teoria sustentada por diversos autores de que os valores considerados normais da concentração da vitamina D em nosso organismo são “ultrapassadas”, pois levam em conta indivíduos sedentários dosados no século passado. Segundo estes autores, os valores deveriam ser maiores em uma população ativa e que, 50% da população mundial teria deficiência crônica desta vitamina. A suplementação com a vitamina D preveniria a fratura de estresse em esportes de endurece?

Apesar de nunca terem sido utilizados no estudo de fraturas de estresse, uma nova classe de medicação análoga do paratormônio, denominada teriparatide tem chamado as atenções do meio cientifico esportivo pela excelência na formação óssea e redução do tempo de consolidação de fraturas traumáticas agudas. Estas drogas e anticorpos inibidores de sinalizadores celulares que induzem a reabsorção óssea compõem a nova classe denominada osteoanabólica. Alvo de pesquisas, esta nova classe de drogas tem uso restrito a pacientes com graus avançados de perda de massa ósseo e seu uso deve ser monitorado, pois estaria ligada ao desenvolvimento de tumores ósseos.

A suplementação da vitamina D e esta nova classe medicamentosa entrarão no rol do tratamento das fraturas de estresse em um futuro próximo? Pesquisas dos próximos anos nos trarão a resposta.

*As informações e opiniões emitidas neste texto são de inteira responsabilidade do autor, não correspondendo, necessariamente, ao ponto de vista do Globoesporte.com / EuAtleta.com.

Médico do esporte e ortopedista especialista em traumatologia do esporte e cirurgia do joelho. Membro da diretoria da Sociedade Paulista de Medicina Desportiva (SPAMDE) (Foto: EuAtleta)