Arte Londrina 6

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mergulho e salvamento, profundidade e superfĂ­cie


ORGANIZAÇÃO

DANILLO VILLA

LONDRINA, 2017


Catalogação elaborada pela Divisão de Processos Técnicos da Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina.

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

REITOR

Prof. Dr. Sérgio Carvalho VICE REITOR

Prof. Dr. Décio Sabbatini Barbosa A786 Arte Londrina 6 / organizador: Danillo Gimenes Villa; colaborador: Felipe Scovino. – Londrina : Midiograf,

DIRETORA DA CASA DE CULTURA

Maria Helena Ribeiro Bueno

2018. 170p. : il.

TÉCNICA ADMINISTRATIVA

Maristela Cestari Panza Barbosa ISBN 978-85-7846-498-1 MEDIADOR 1. Arte contemporânea. 2. Curadoria. 3. Exposição de

Gabriel Augusto de Paula Bonfim

arte. 4. Processos de criação artística. I. Villa, Danillo Gimenes. II. Scovino, Felipe.

PROJETO GRÁFICO CDU 7.036

Lasca Studio | Thayara Costa UEL.BR/CC/DAP


em busca da sentença definitiva

primeira exposição

das estruturas mínimas às não cores

DANILLO VILLA

o salão e o seu lugar na contemporaneidade

como uma ferida branca ELKE PEREIRA COELHO SANTANA

FELIPE SCOVINO

sumário

proposições meditativas

46

ALINE MORENO

50

ANDRÉ VECHI

54

FERCHO MARQUÉZ

58

GILSON RODRIGUES

62

GUILHERME MOREIRA

68

GUSTAVO GRAZZIANO

72

MARCELO BARROS

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SAMANTHA CANOVAS


segunda exposição

opções de fim de mundo

in-finitos derivados das opções de fim MANOELA MARIA VALÉRIO

sumário

proposições meditativas

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ADOLFO EMANUEL

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ANA TAKENAKA

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ANA VILELA

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ANDRÉ MASSENA

118

ANTÔNIO GONZAGA AMADOR

122

CHRISTINA ZORZETO

126

DANIELA PINHEIRO

132

FELIPE ALMEIDA

136

LETO WILLIAM

140

MIRELLA MARINO

144

SANTACOSTA

148

SIMONE FONTANA

152

VIVIANE VALLADES

currículos resumidos


em busca da sentença definitiva

Danillo Villa Professor Doutor em Poéticas Visuais pela Universidade Estadual de São Paulo Chefe Divisão de Artes Plásticas Idealizador e curador Arte Londrina

Inspira-nos que os sujeitos envolvidos nas exposições realizadas na Divisão de Artes Plásticas tenham a maior autonomia possível, que experimentem a elaboração de sentenças indicativas de conexão. Para além de uma possibilidade redutora que a palavra definitiva possa indicar, essa sentença surgiria do bom uso de tudo aquilo que se oferece disponível para a manutenção de um estado de movimento, não necessariamente geradora de ansiedade, mais implementando movimentos genuínos, criativos. A obra de arte é, assim, para a interação. No processo, aquilo que não se ajusta, que provoca o sujeito em suas pretensões habituais de equilíbrio, seria um não discurso sobre o que se sabe, que verbaliza, “palavreia” o outro, o não sabido do sujeito que se experimenta. Assim, nossa pretensão apaixonada é instrumentalizar o sujeito para que ele simplesmente viva a sua vida. A polarização entre as duas exposições resultantes da seleção compartilhada com Felipe Scovino, para o arte londr ina 6 , demonstra a disposição que o edital tem em realmente debruçar-se sobre os trabalhos enviados. Resumidamente, uma exposição trata das reduções e simplificações materiais • da s e stru tura s m ínima s à s não cor e s • favorecendo o entendimento dos silêncios nos processos perceptivos/criativos, enquanto a outra pensa as • opçõe s de fim de mundo • com um certo desencanto sobre o momento presente e as muitas possibilidades para o que pode vir a ser a vida/morte. Acolher o que os trabalhos nos oferecem é uma das nossas mais importantes prerrogativas. É sem dúvida um privilégio discutir os conceitos com o curador convidado, igualmente interessado e, durante o processo, estabelecer diálogos entre os trabalhos.

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Ao partilhar essa experiência nas exposições e mediações dizemos às pessoas: “você ouviu ou viu o que este sujeito disse que é possível?”. Assim, alimentamos o trabalho da DaP de muitas formas, estabelecendo novas respostas às questões que se tornam evidentes na interação como os trabalhos expostos. O edital atua como proposição de diálogo, distante um pouco espacialmente e conceitualmente de imposições de mercado e atento às reformulações das sensibilidades propostas pelos artistas que participam. Ao organizar um portfólio e, consequentemente, desejar fazer parte de uma exposição, conjuramos aos deuses (todos) a impossibilidade de se viver sem arte. Interessa-nos um tanto de teste, os artistas selecionados não constituíram seus trabalhos para estarem ao lado dos outros trabalhos que, na visão dos curadores, devem estar juntos. Aceitam (até certo ponto) as ideias de aproximação sugerida e então há uma troca de confianças e, principalmente, a crença de que o trabalho goza de uma certa autonomia, que os faz ir além dos projetos iniciais e individuais dos artistas. Apesar do tempo necessário para que cada obra apresente-se, há um teste para o próprio trabalho na interação com os outros trabalhos expostos. O esforço para manter uma exposição ativa, que atualize perguntas sobre sua pertinência como cultura como um acontecimento vivo, trata de possibilidades contemporâneas. Da observância da complexidade que se percebe na atualidade, na produção artística, especificamente, e nos fatos inegáveis percebidos nos comportamentos. Modos de viver são tratados a todo momento como matéria prima nos trabalhos de arte e

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tudo o que acontecer a partir da relação com eles será um evento para a atualização de um sujeito vivo, presente, pensante. Uma exposição de arte pretende um sujeito desejante. Temos para este catálogo a colaboração da professora de Artes e artista Elke Coelho e da pesquisadora e psicóloga Manoela Valerio. As perspectivas que desenvolveram em seus escritos tangenciam as exposições a partir do diálogo com a curadoria. O convite foi feito a partir da percepção de que, em suas pesquisas particulares, há aquilo que a curadoria detectou e indicou como estruturante para a organização das exposições. Assim sendo, o convite feito às pesquisadoras e a seleção dos artistas obedecem ao mesmo critério: um parentesco conceitual evidente. Mais que apontar possíveis funcionamentos para os trabalhos, constituem, junto com eles, um território um tanto quanto palpável a partir das reflexões que elaboramos sobre as afetações que nos acometem. A liberdade que gozamos na constituição das exposições fica documentada e expande-se no catálogo, abrindo caminhos para o futuro. Vivendo em um tempo de estranhas certezas, quando as instituições destinadas à cultura de uma maneira geral sofrem ataques e desmontam-se as universidades públicas, desqualificando-se o seu modelo de desenvolvimento de conhecimento, é muito importante que se mantenha algum registro de tudo o que está sob ameaça. As exposições do Arte Londrina sempre pretendem ser uma abertura de pensamento para os envolvidos. O número de exposições no ano depende das decisões e recortes curatoriais, assim como as abordagens e invenções nas mediações e os usos do catálogo dependem do empenho

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dos mediadores, professores e leitores. Ao multiplicar as vias de acesso às obras, o que pretendemos é, mesmo que isso irrite alguns, relativizar a posse (eu posso estar me repetindo, mas isso nunca é dito em quantidade suficiente de vezes) e afirmar que a obra de arte pertence a quem faz uso dela. Neste ano, conseguimos, selecionando os trabalhos junto com o curador convidado, organizar duas exposições:

das estruturas mínimas às não cores Sobre aquilo que, mesmo sendo residual, ainda imprime a percepção de uma estrutura e usa o silêncio como um caminho para uma possível substância, através de anulações e apagamentos. Dessa maneira, o espaço é impelido a dizer de si, a entregar seus encaixes e configurações na lentidão. Gavetas de pessoas que não estão mais aqui talvez tenham essas aparências. A memória de quem manipula os objetos dessas gavetas dá a eles sentidos novos, sobre sentidos inalcançáveis. Como um pouco de pó sobre tudo a nos esclarecer de onde tudo vem e para onde tudo vai. Início e fim coincidem, compactando o tempo e sua natureza essencial, a duração. É Possível dizer que o silêncio é a respiração dos objetos quando não estão em uso, mas eles se movem conceitualmente ao serem observados, ainda que mentalmente observados. Como quando olhamos um copo sobre uma mesa por um longo espaço de tempo, podemos ser induzidos a vê-lo lentamente mudando de cor, amarelecendo, tendo seu uso

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trocado, passando de copo a pote para lápis, para agulhas, para pequenas águas esquecidas, acumulando resíduos que se tornam manchas, quebrando-se, afiando-se, desgastando-se. Uma percepção induzida como essa ocupa preocupações centrais numa discussão sobre arte contemporânea, como sugestão de um contínuo de acontecimentos e trânsitos. Assim, qualquer objeto iguala-se a qualquer ser humano ou lhe serve de metáfora sobre o ser/estar no mundo. Observamos uma disponibilidade infinita de narrativas que podemos experimentar em busca de sentido e a partir de proposições abstratas, de configurações radicalmente antropomórficas. Ninguém mais duvida que a geometria de Lygia Clark e Hélio Oiticica versam sobre o humano. Ninguém duvida do tempo impresso nas escolhas matéricas e formais de Volpi ou no palavreado inútil e infinito a dar conta da imprecisão dos dias em Proust. Artistas participantes: Aline Moreno, André Vechi, Fercho Marquéz, Gilson Rodrigues, Guilherme Moreira, Gustavo Grazziano, Marcelo Barros, Samantha Canovas.

opções de fim de mundo Sabemos que todas as previsões de fim do mundo fracassaram. Ainda assim, também temos consciência que as coisas sempre estão acabando. E, de qualquer forma, as qualidades dos muitos microfins que experimentamos nos mostram possibilidades de afetação que não viveríamos de outra maneira. Então, há, na finitude, algo de nós que se

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dá a conhecer. A hipótese da curadoria é que haveria comportamentos que desenvolvemos nessas situações, uma dança especial, podendo ser ridícula, um apego e sua contrapartida: a decadência que se manifesta naquilo que pretendemos manter. É o desmoronamento da força da lógica sob um comportamento arbitrário, como uma experiência dadaísta. Interessante observar o que nos acontece quando um fim é anunciado. Mistificamos nossa relação com a vida, encaramos ou escancaramos nossas culpas, as individuais e as coletivas, imaginamos e experimentamos purezas tidas como iniciais, originais. Escolhemos atitudes para manter. Será sempre sofrimento? Chamamos a morte de fim porque nos é muito difícil imaginá-la boa, como o começo de algo novo, como a segunda feira é muito mais começo da semana do que o domingo. A variedade de soluções formais presentes na exposição seria como desdobramentos quase esquizofrênicos sobre as incertezas que rondam o fim, sobre as narrativas, os cenários e as circunstâncias que criamos diante da imprecisão que é a dissolução. Preceitos religiosos poderiam nos orientar, mas também sabemos que, historicamente, a religião comporta-se como produção ficcional. Ficção sempre foi uma saída legítima, a cultura é baseada nela. Nossa sensibilidade, em seus limites, não nos dá garantias sobre o que virá pós fim. Por ser algo além da materialidade palpável, esse não saber se apresenta como saber a ser experimentado. Estruturas com função inutilizada seriam metáforas do fim? Estruturas abandonadas encontrariam, elas mesmas, outras funções para si? Outros corpos? De qualquer maneira, parece claro que o fim está muito longe de

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estar próximo, e que as opções são sugestões para que pensemos no que estaremos fazendo quando ele chegar. Em última análise, como pretendemos viver. Artistas participantes: Adolfo Emanuel, Ana Takenaka, Ana Vilela Carmo, André Massena, Antonio Gonzaga Amador, Daniela Pinheiro, Christina Zorzeto, Felipe Ferreira de Almeida, Leto William, Mirella Marino, Santacosta, Simone Fontana Reis, Viviane Vallades. P.S. Este texto foi completamente concebido sob a afetação que os trabalhos dos artistas me causaram, sou profundamente agradecido a todos eles.

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o salão e o seu lugar na contemporaneidade

Felipe Scovino Critico de arte e curador. Doutor em Artes Visuais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor adjunto da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A categoria salão, usada ainda nos dias de hoje, pode provocar arrepios em alguns, mas o Arte Londrina, que chega à sua quinta edição, possui particularidades que provavelmente o farão rever o conceito (antiquado) de salão. Ele mantém a estrutura de realizar uma convocatória e, por conseguinte, receber os projetos dos artistas, efetuar a seleção de portfólios e realizar as exposições, sediadas na Divisão de Artes Plásticas da Casa da Cultura. O que difere o Arte Londrina de modelos mais tradicionais de salão é o seu olhar cuidadoso, o compartilhamento de informações e visões entre curadores convidados e, finalmente, as seleções temáticas que constituirão os recortes para as exposições. É importante frisar que acontece mais de uma exposição, e esse é um diferencial importante porque, do ponto de vista curatorial e também daquele que julga os portfólios (a visão crítica), é salutar que se possa conjugar um pensamento mais denso sobre as obras que estão ao dispor da comissão. Nesse caso, sempre levando em conta a complexidade que é criar recortes curatoriais a partir de um conjunto de obras, técnicas, olhares sobre o mundo e poéticas que chegam até à comissão. Perfazendo, portanto, um caminho às avessas, no sentido tradicional do que se é fazer curadoria, já que o curador, em grande parte, vai de encontro às obras e artistas. Eis um modelo interessante esse do Arte Londrina do ponto de vista curatorial, porque se coloca como um desafio para os curadores. Retira-os da sua zona de conforto e obriga-os a pensar com maior acuidade nos entrecruzamentos de um amplo painel de obras e/ou visões particulares do mundo. São características como essas que trazem um frescor e qualidade ao Arte Londrina. As duas mostras do Arte Londrina 5 foram pensadas a partir dos portfólios selecionados, enviados por artistas de todo o Bra-

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sil. É muito importante ressaltar esse caráter abrangente. Coloca a universidade pública como um lugar de produção e invenção de saberes, ao mesmo tempo em que a evidencia como um painel para a organização, exposição, investigação e cruzamento de fronteiras artísticas que compõem a vasta produção cultural contemporânea. A universidade abre as suas portas para pessoas, lugares e produções, que atravessam fronteiras nunca imaginadas. É o espaço público confluindo pensamentos e ações de um modo inventivo e potente. As exposições deste ano receberam os seguintes títulos: opçõe s de fim de mundo e das estruturas mínimas às não cores. Antes de comentar sobre elas, é importante dizer que o Arte Londrina, mesmo não tendo tantos anos de atividade, é uma fonte segura e valiosa para pesquisas no campo das Artes Visuais, funcionando como um arquivo, pois apresenta diferentes gerações de artistas, investigações de suportes e poéticas, além de lidar com o plano curatorial, já que as suas edições sempre permitiram que os curadores e críticos que atuaram ao longo desses anos pudessem articular exposições e, portanto, fundamentar temas pertinentes ao cenário artístico. Ter em atividade no país tal conjunção de fatores – possibilidade de exposição em uma universidade pública com destaque no cenário artístico nacional, trocas com pares, publicação em catálogo, ter sua obra de arte participando de programas de mediação, entre várias outras possibilidades de amadurecimento para artista, público e instituição –, levando em conta o atual cenário político e econômico, é algo bem raro. No momento em que galerias fecham, museus têm cada vez mais dificuldade em adquirir obras para o seu acervo e, em alguns casos, manter as atividades mínimas de

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operação, mostras são alvos de ataques midiáticos liderados por setores conservadores e levianos da sociedade porque supostamente exibem obras de arte que defendem e/ou expõem a pedofilia e a zoofilia, programas como o Arte Londrina merecem ser destacados. É a oportunidade democrática dos artistas exibirem suas pesquisas e o público local ter a chance de acessar e refletir sobre produções de todo o Brasil e, como foi o caso em outras edições, do exterior. Nesse sentido, o Arte Londrina já avançou e modificou em nossas mentes o antigo conceito de salão. Estamos diante não de um modelo fechado e ultrapassado, mas de um pensamento vibrante, consistente e autêntico sobre como a arte pode ser vista, refletida e ter um alcance maior do que os ateliês dos artistas ou galerias comerciais, que muitas vezes já possuem um perfil engessado. É essa relação de troca benéfica entre artista e instituição que rege o Arte Londrina. Partindo do pressuposto de que os espaços de arte, na medida em que o Arte Londrina já possui uma projeção não apenas local, são raros para artistas com até 5 anos de trajetória, esse modelo é também excepcional para a galeria da DAP, já que permite que uma programação com qualidade seja montada, tornando aparente, de forma gratuita, a vasta produção artística criada por diferentes gerações e lugares. É o caráter educacional da universidade colocando-se de forma preponderante. Como lugar de criação e reflexão, a universidade aglutina a união perfeita entre educação e cultura, as bases de qualquer sociedade moderna que persegue a justiça social para os cidadãos. A arte, portanto, é vista como um elemento fundador e essencial para a formação do sujeito. Estão ali, por exemplo, as diferenças sendo exibidas de forma alegórica para o espectador. Diferenças com as quais ele(a) terá que aprender

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a respeitar e dialogar. A arte é uma das ferramentas mais interessantes e, arriscaria dizer, eficazes para que esse processo de subjetivação e também de projeção de alteridades se façam. Eis o seu germe, a sua razão de existir e contribuir com o coletivo. E é dessa forma que o Arte Londrina compromete-se: ele pretende apresentar, difundir, multiplicar, explicar, refletir e permitir o diálogo entre produções artísticas, com alto grau de complexidade e entendimento sobre o mundo, e o público. É claro que, como ressaltei no início do texto, as exposições e edições desse projeto contam com artistas de diferentes tempos, locais, saberes, e intuições. São, portanto, investigações que nos ajudam a perceber a complexidade cultural, identitária, religiosa e política do nosso povo. Concluindo sobre o panorama atual das artes no Brasil e, em especial, os desafios da curadoria, gostaria de comentar que os meios de atuação do curador e sua própria formação estão aquém do que deveria existir. São poucos os livros que através de um largo intervalo de tempo e com um recorte denso e sério abordam a história da arte brasileira. Nossa historiografia da arte é constituída por ensaios, relatos, comunicações e artigos que, como um quebra-cabeças ou um mapa multifacetado e frágil, tentam construir uma rede de significações das práticas e teorias artísticas. É preciso louvar estratégias dentro do campo artístico que se voltam para uma atuação crítica e reflexiva pautada pela seriedade e compromisso com os agentes do circuito de arte. Vida longa ao Arte Londrina! O recorte da s e stru tura s m ínima s à s não cor e s congrega pesquisas artísticas que se valem de uma economia de elementos e linguagens para a criação de uma rede de significados e transbordamento de sentidos que apresentam, invariavelmente, a aparição das

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categorias silêncio e invisibilidade, transferindo à obra a marca da ambiguidade, fazendo com que a mesma não se entregue de uma só vez, e, por isso mesmo, seja avessa a tentativas de totalizações. A escala intimista e singela de obras como as de André Vechi e Gustavo Grazziano engendra proximidade, um compromisso mais atento do espectador em observar e perceber as sutilezas do branco. Eis a capacidade multiforme e ampla que o branco possui, criando camadas translúcidas sobre os objetos e tornando aparente as diferenças, rugosidades, tempos e histórias que as obras revelam. A força das obras desse núcleo também está na matéria, naquilo que as compõe, em como apresentam-se ao mundo. Percebam as obras de Marcelo Barros e Samantha Canovas e a maneira com que os materiais empregados pelos artistas constroem uma ampliação da percepção que tínhamos do tijolo e do pano de chão, respectivamente. Eles deslocam-se de uma função prática, aquela da indústria, do uso cotidiano e esperado da sua função, para colocarem-se como objetos frágeis. Na obra de Barros, o tijolo cria uma semelhança metafórica com a capa e o conteúdo de um livro ao estar “colado” às páginas de livros. Em Canovas, o pano de chão é a base e a matéria, assim como a lã entremeada sobre o pano para a revelação de uma “pintura” translúcida, que evoca de forma perspicaz uma certa tradição construtiva brasileira. Na série Horizontes sutis, fica clara a sua intenção, pois a obra direciona-se para um estudo sobre os monocromos e a pintura de paisagem, sempre reinventando essas posições e trazendo um pensamento original e próprio da artista. Encapsulando o chassi com o tecido de algodão, a artista expõe essa sutileza do branco, deixando à mostra a sua fragilidade e, ao mesmo tempo, a sua consistência.

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O longo tempo em exposição de um jarro preso dentro de uma estrutura de gelo até que, finalmente, o último derrete é o mote da obra de Gilson Rodrigues. Deixar o espectador como cúmplice dessa ação que, devido ao largo intervalo de tempo, parece nunca chegar ao fim. Está aí um exercício de paciência e obstinação. Em Textum, a estrutura de madeira de Guilherme Moreira que, assim como o pólen, espalha-se pelo espaço da galeria. A partir de uma estrutura mínima, barata e do cotidiano, como é a madeira, a obra projeta-se sobre o território da arte readequando suas fronteiras e demarcando espaços. A obra de Aline Moreno também investe sobre o material. O empilhamento de finíssimas tiras de madeira transmite a sensação de um monocromo, ambientado em uma atmosfera industrial, já que estão à mostra madeira, ferro, barra de metal e porca. Operar em novo sentido aquela paisagem ou materiais com os quais identificamos padrões bem definidos parece ser o pensamento que a persegue. A artista está interessada no particular, nas dobras e rugosidades, enfim, na capacidade sensível que o material industrial pode evocar. A instalação de Fercho Marquéz também explora, guardadas as devidas especificidades, as condições físicas de um lugar e o caráter de (im)permanência do material associados a um discurso sobre a Land Art e a arte conceitual nas práticas artísticas contemporâneas. Já em opçõe s de fim de mundo, deparamo-nos com um conjunto de manifestações artísticas que, a um só tempo, são signos do desengano de uma época pós-utópica, ao mesmo tempo em que há, nas mais diferentes obras e pesquisas desse núcleo, a indicação da abertura de novas possibilidades que esse mesmo tempo desenganado traz consigo. Essas novas possibilidades estariam na multiplicidade de narrativas,

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de pequenos e diversos mundos a serem construídos, ativados e potencializados por cada sujeito. É justamente dessa ideia de uma contemporaneidade ambígua, que acena, a um só tempo, crepuscular e esperançosa, que Opções de fim de mundo estabelece-se. Percebam o mundo errático, fraturado, permeado por uma atmosfera e sons ruidosos nas obras de Ana Takenaka e Santacosta. A sensação de incompreensão e rasura sobre o entendimento lógico aliado ao fato de deixar à deriva o espectador são situações que me parecem latentes em seus desenhos e objetos, respectivamente. Em Santacosta, tudo está prestes a ruir, virar falência e perda. Na pintura de Ana Vilela, o recorte inesperado da perspectiva que nos apresenta também é sintomático desse mundo em colapso. Situação análoga estão nos desenhos de André Massena: um lugar conturbado que suspeita das próprias ordens impostas pela lógica. As sobreposições de imagens nos despertam um sentimento de suspensão da suposta ordem em que vivemos. Embaralham as certezas do mundo. A morbidez encontra lugar nos desenhos de Adolfo Emanuel, ao retratar, segundo ele, miniaturas de futuras pessoas mortas. Mais um exemplo de como esse grupo de obras tem o zeitgeist do nosso tempo: falta de esperança, desordem, medo, um futuro que se coloca de forma duvidosa e trágica. A esse conjunto incluo o Autorretrato com chave de fenda, de Viviane Vallades, onde a artista coloca-se diante de espelhos e realiza, com a referida ferramenta, o seu autorretrato. A chave de fenda vira uma espécie de pincel ou lápis que percorre a superfície do espelho, “desenhando seu rosto” e criando uma zona de atrito ruidosa e áspera. Os lugares imaginários de Christina Zorzeto expõem as incongruências do cotidiano. São os diversos regimes imagéticos, divididos entre

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certo tom mágico, uma assertividade poucas vezes vista tão claramente sobre o mundo contemporâneo e a sua reunião de diferenças e (im) possibilidades, que fazem a sua obra tão rica. Paraíso de Jeová, de Felipe Ferreira, celebra em tom irônico e sarcástico a fratura dos sonhos. Não há happy end, mas o encontro da fantasia com a dureza do dia-a-dia, da utopia com a concretude (trágica, mas essencialmente real). A obra é uma espécie de síntese desse recorte ao evocar não o transcendental, mas o acidente diário das nossas vidas. Os animais não encontram o eldorado, mas a impossibilidade de continuarem adiante, tudo por via da comicidade. Os gráficos/desenhos de Antonio Gonzaga Amador tornam visível o imaterial. Gráfico da inspiração e expiração, gráfico da acuidade visual dos olhos e por aí vai. Também há um tom cômico nesse trabalho. Como podemos saber que a inspiração possui esse tipo de visualização gráfica? Imaginário, ficção e humor misturam-se em desenhos que expõem aquilo que não pode ser presentificado, mas apenas idealizado. Falar ao vazio, à total incompreensão de uma poesia sonora dedicada ao momento político controverso, conturbado, confuso e histérico. É o recital de Leto William. Dar conta já indicando a impossibilidade de um tempo excessivamente veloz, autoritário e inumano. Ecoando os dadaístas, mas expondo de maneira sintética as contradições do mundo contemporâneo, o artista realiza uma sinfonia com elementos do cotidiano, alertando-nos sobre o estado de incompreensão em que estamos. A cidade continua sendo o tema desse recorte por meio das Estruturas, de Mirella Marino. Explorando determinados espaços vazios da cidade, especialmente aqueles que ostentam cartazes ou banners de publicidade, a artista acaba criando, ou melhor, deixando visível um esquema gráfico

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que se revela quando os referidos espaços não são usados. Há algo de uma atmosfera de abandono e solidão que pode criar uma similitude com a performance de William. Já a instalação de Daniela Pinheiro, expõem o caráter híbrido que as artes visuais possuem e a forma delicada e suave do corpo ao dialogar com a cultura oriental, em especial com o Butô. Através do trabalho de Pinheiro, percebemos o quão plástico e notável é o exercício do corpo em conjunção com o espaço cênico. A interdisciplinaridade se faz presente na obra de Simone Fontana também. Em suas pinturas, ela aproxima tinta acrílica e solo antropogênico formando imagens orgânicas. São corpos híbridos que se oferecem, de maneira translúcida, ao olhar do espectador. Estranhos, mutantes, mas essencialmente mágicos, eles parecem sequestrar eles parecem sequestrar nosso olhar. Não deixamos de investigar todas as particularidades e características que nos oferecem. Natureza e cultura aproximando-se de forma surpreendente. Arte Londrina, portanto, consiste num painel amplo e multifacetado, compreendendo as diversas linguagens artísticas do contemporâneo. Seu lugar no meio das Artes Visuais brasileiras se faz importante por tornar pública diferentes gerações de artistas e suas pesquisas que, em muitos casos, têm dificuldade em participar do circuito oficial. Sem comprometimento com o mercado e voltado para pesquisas mais experimentais, Arte Londrina ocupa um espaço importante. Ademais, o envolvimento de curadores e a estrutura da universidade pública reforçam particularidades que acabam fazendo dele um evento de destaque no cenário nacional.

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das

mínimas às não cores E X P OS I ÇÃO

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como uma ferida branca

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Elke Pereira Coelho Santana Professora e artista. Doutora em Artes Visuais pela Escola de Comunicações e Arte da Universidade de São Paulo. Professora Adjunta do Departamento de Arte Visual da Universidade Estadual de Londrina.

Molda-se a argila para fazer vasos, mas é do vazio interno que depende o seu uso. Fernando Paixão


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Todos nós temos alguma memória, mesmo que remota, de uma ferida branca. Esta refere-se mais a um determinado estado do ferimento do que, particularmente, a uma tipologia capaz de classificar os modos como o corpo é marcado. A pele esfolada, instantes antes do sangue inundar os poros, mostra-se como uma ferida branca; constitui uma imagem fugaz que intermedeia dois estados: corpo ileso e corpo machucado, instante entre o salto e a queda, situação de espera e suspensão que carrega iminente tragicidade. O branco mostra-se, nessa circunstância, como um vazio latejante; e este vazio, por sua vez, como um tipo de acontecimento silencioso. Se há uma espécie de vazio que habita o corpo nesses breves instantes, há, no cotidiano, outras inumeráveis situações em que o vazio toma corpo. O mundo também é composto de faltas, de frestas, de ermos, de interstícios, de entres, de fendas: uma gaveta sem objetos; o vão entre uma porta fechada e o chão; uma paisagem vasta, com a linha do horizonte delimitando-a; sutis intervalos que separam os corpos, que propiciam ínfimas movimentações entre eles; dedos da mão juntos, justapostos, unidos, mas, ainda assim, há alguma coisa entre eles que não é massa corpórea; quando as coisas racham, abrem em duas, algo instala-se entre as partes; uma linha entre as tramas da folha de papel, circunscrevendo um espaço, rodeando uma área branca, tornando-a coisa, superfície, espaço, como em um desenho de Mira Schendel – são algumas possibilidades de vazios constitutivos, de cenas em devir, de feridas brancas. • Mira Schendel produziu mais de duas mil monotipias1. Em uma delas, a artista desenha, escrevendo a seguinte frase: “nel vuoto del mon-

do”2, no vazio do mundo. Não por acaso, o “nel” é inscrito em letra cursiva, com gesto contínuo e forte, resultando no grafismo mais intenso da página; “vuoto” é grafado com letra fina, bem pequena e de fôrma: as cinco letrinhas parecem flutuar no centro da folha de papel de arroz; o “del” é mais diminuto que “vuoto”, não apenas por ser composto por três letras, mas, também, por estas permanecerem muito próximas umas das outras e beirarem a extremidade direita do papel; “mondo”, por sua vez, ocupa quase metade do trabalho, é feito com letras finas, gesto contínuo e dois “o” bem redondos. O que percebo, e tento evidenciar por meio da descrição acima, é que há uma delicada e intrincada relação entre o gesto da artista e as possíveis significações das palavras inscritas no papel. Como se o “vuoto” de Mira, devido ao modo como foi desenhado, pudesse emanar “vazio” muito mais que os outros “vuotos” que já foram registrados por aí; como se o “mundo” expresso nessa monotipia fosse grande, múltiplo – pois há dois círculos – e, ao mesmo tempo, frágil. O que quero dizer, talvez, é que Mira Schendel me faz pensar que há um nexo, nada elementar ou ilustrativo, entre aquilo que um círculo pode expressar ao ser desenhado em uma folha de papel e aquilo que as pessoas sentem quando quase tudo as despovoa. O trabalho de Schendel, particularmente os desenhos, tem me ajudado a estabelecer pontes, oportunamente turvas e oblíquas, entre o grafismo e a sensação – sabendo do risco que corro ao empregar o termo “sensação”, palavra tão precisa quanto genérica, em um texto que apenas tateia e assenta parcos pensamentos. Por meio dessa pequena monotipia, Mira diz, pelo menos a mim, que vazio também se constrói.

Mira Schendel produziu, entre os anos de 1964 e 1966, “cerca de 2 mil desenhos, conhecidos hoje como a série das Monotipias, feitos com tinta a óleo em papel de arroz ultrafino. A técnica da monotipia consiste em estender o papel sobre uma superfície lisa coberta de tinta e marcá-lo pelo verso com algum instrumento”. EUVALDO, Célia. Cronologia. In: SALZSTEIN, Sônia (Org.). No vazio do mundo. São Paulo: Marca D’ Água, 1996. p. 88.

2 Mira Schendel. Sem título, 1964/65. Óleo sobre papel de arroz. 46 x 23 cm. A reproducão fotográfica desse trabalho foi publicada em: SALZSTEIN, Sônia (Org.). No vazio do mundo. São Paulo: Marca D’ Água, 1996. p. 15.

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• Apesar de ter grande apreço pelos desenhos, objetos e textos produzidos por Mira Schendel, procurei nos últimos anos, propositalmente, não construir um arcabouço enciclopédico de informações sobre sua trajetória e produção. Tento, de forma incipiente, mas não ingênua, deixar que o “vazio” pulse em minha mente quando penso em seus trabalhos; esfolo os pensamentos para que uma “ferida branca” se instaure e sabote as expectativas e pretensões que poderiam sobrepor-se à experiência – penso que, em contato com obras de arte, os desassossegos, as arrebentações e as inflexões são estados necessários. Como se as lacunas, os interstícios e os espaçamentos presentes na sensível cartografia que constituí a respeito dessa artista mantivessem-me inquieta e surpresa sobre aquilo que sei, sobre aquilo que não sei e, principalmente, sobre aquilo que desconfio sobre os seus trabalhos. Sei que Mira tinha muita estima pelo desenho, pelo grafismo enquanto gesto, enquanto rastro que denuncia a pulsão do corpo, enquanto registro de uma experiência indeterminada que culminava em traços, letras, rabiscos, vai e vem de linhas, contornos, setas e acumulações gráficas. A folha em branco, ou levemente amarelada do papel de arroz, comportava-se como um pequeno/grande vazio que a linha evidenciava, modelava, transformava em corpo sensível. Percebo que nos desenhos de Mira o suporte age como uma espécie de epiderme; o papel de arroz3, que ela tanto utilizou, é um corpo tátil, resistente e frágil ao mesmo tempo. Um gesto, nessa pele oriental, pode fazer com que a marca resultante tenha aspecto de arranhão, de lesão, de cicatriz, de ferida branca. Sei, também, que Mira Schendel constituía constelações gráficas4

a partir da repetição de curtos traços: superfícies repletas de pequenas letras próximas, justapostas, sobrepostas e/ou amontoadas. Página enquanto céu, letras comportando-se como astros, gestos tentando registrar instáveis existências, desenho enquanto instrumento possível de inscrever territórios intangíveis. Outra coisa que sei é que essa artista fez uma série de naturezas-mortas nomeadas como “mais ou menos frutas”5. Penso que o título é muito oportuno, não apenas por fazer com que o espectador atente para certa dinamicidade do gesto que constitui as sintéticas formas, mas, também, por estar em diálogo com uma pauta tão cara às vanguardas europeias, que discutem a relação entre o objeto observado e a imagem resultante desta relação perceptiva. A tentativa de representação de qualquer objeto, por mais fidedigna que possa aparentar, sempre evidenciará o objeto de forma “mais ou menos”. O “mais” talvez aponte para aquilo que aparece na realidade gráfica e que não consta na concretude do objeto; quiçá, fale da capacidade de transbordamento que o objeto possui pelo simples fato de estar imerso em uma complexa rede perceptiva que envolve experiência, análise e materialidade. E o “menos” aponta para o vazio, para o discurso de ausência presente em todas as representações – desenhar uma maçã, por exemplo, é falar que a maçã, de fato, não está mais aqui, está apenas seu referente, um duplo dotado de outro corpo material. Assim, seguindo a lição de Mira, ao desenhar um armário, este será um “mais ou menos armário”; se desenho uma formiga, esta será uma “mais ou menos formiga”; se registro uma mão, esta será uma “mais ou menos” mão. Há um dado libertador nesse grau de indeterminação, pois é no movimento pendular entre o “mais” e o “menos”, no estado de

Esse material também aparece em “Trenzinhos” (meados da década de 1960), suspenso em fio de nylon; e em “Droguinhas” (1966), com as folhas retorcidas e trançadas.

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Refiro-me, particularmente, aos “Objetos Gráficos”: trabalhos produzidos pela artista a partir da década de 1960, compostos por escritas e grafismos sobre papel; posteriormente, são supensos no espaço por meio de placas de acrílico transparente.

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Série produzida em 1983 que apresenta “figuras simplificadas de frutas, desenhadas sobre o papel branco, com uma ou duas linhas horizontais atravessando a folha quase de lado a lado, acima ou abaixo delas”. In: EUVALDO, Célia. Cronologia. SALZSTEIN, Sônia (Org.). No vazio do mundo. São Paulo: Marca D’ Água, 1996. p. 97.

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“ferida branca”, que o desenho pode falar do objeto e, ao mesmo tempo, versar sobre a “riqueza da vivência”, como diz a própria artista: Sei que se trata, no fundo, do seguinte problema: a vida imediata, aquela que sofro, e dentro da qual ajo, é minha, incomunicável, e portanto sem sentido e sem finalidade. O reino dos símbolos, que procuram captar essa vida (e que é o reino das linguagens), é, pelo contrário, anti-vida, no sentido de ser intersubjetivo, comum, esvaziado de emoções e sofrimentos. Se eu pudesse fazer coincidir esses dois reinos, teria articulado a riqueza da vivência na relativa imortalidade do símbolo6. Não dá para representar o mundo. As suas concretudes, talvez sim, mas o que interessa à Mira e a muitos outros artistas – e timidamente incluo-me neste rol – são as iminências, aquilo que lateja por baixo das visualidades objetivas, aquilo que no mundo usa as aparências concretas para evidenciar realidades submersas, latentes, vulcânicas. Na relação com o objeto, com o outro ou com a vida, há possibilidade de erupções, de acessar mundos cobertos por superfícies falsamente estáveis. No início da década de 1960, Mira Schendel produziu outra série de pinturas cujas superfícies traziam um grande teor tátil, corporeidade áspera, materialidade para ser sentida com os olhos. Nelas, há o emprego de têmpera sobre madeira ou sobre juta, criando um corpo material regular, mas não uniforme. Em um desses trabalhos7, o suporte de juta, em contato com a têmpera branca, transforma-se em uma espécie de pele porosa que abriga três formas geométricas, oriundas do retângulo. Aqui, o desenho é inscrição, é retirada de massa, é o respiro da juta, já que os poros do suporte tornam-se visíveis. A geometria, presente no próprio formato da obra e nos pequenos quadriláteros figurados, é precária: sus-

tenta uma forma, mas, ao mesmo tempo, denota que esta é frágil, que não está sendo imposta e, quem sabe, por isso, pode ruir a qualquer momento. O jogo entre estabilidade e instabilidade presente na obra pode ancorar sentidos no fato dos pequenos quadriláteros terem certo grau de similaridade com estruturas arquitetônicas, como se singelos prédios/ casas brancos - próximos ao grafismo infantil - habitassem o espaço, também branco, do suporte. • Grande parte da produção de Mira Schendel gera dúvidas que apontam para o “esqueleto” da linguagem, para aquilo que possa ser a raiz do desenho. O que é um gesto? Qual a dimensão de um gesto? Roland Barthes, ao abordar a produção do artista Cy Twombly, diz que o gesto “é a soma indeterminada e inesgotável das razões, das pulsões, das preguiças que envolvem o ato em uma atmosfera (no sentido astronômico do termo)”8. Mas, e quando o gesto transita entre deslimites e cálculos, insiste em gerar antinarrativas, retorna a movimentos aparentemente familiares, abandona-se em uma trama intrincada de rabiscos e persiste como ideia tão pueril quanto necessária? Quando olho, atentamente, para o trabalho dessa artista, sou tomada por dúvidas da mesma natureza, questões que, por serem elementares, acendem, inversamente, raciocínios complexos, já que procuram lidar com a gênese de alguma coisa, algo que eu também não sei exatamente o que é. Sei, apenas, que pensar sobre a origem do gesto motiva aproximações com a produção de Mira, desencadeia entendimentos outros sobre o desenho e faz-me perceber o que todas essas coisas – gesto, Mira Schendel, desenho, ferida branca, vazio e arte – têm em comum:

6 Fragmento de texto datilografado, não datado e não assinado encontrado entre os papeis da artista. In: SALZSTEIN, Sônia (Org.). No vazio do mundo. São Paulo: Marca D’ Água, 1996. p. 256.

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Mira Schendel. Sem título. Têmpera sobre juta, 1963. 60 x 51 cm. A reproducão fotográfica desse trabalho foi publicada em: SALZSTEIN, Sônia (Org.). No vazio do mundo. São Paulo: Marca D’ Água, 1996. p. 121.

8 BARTHES, Roland. Cy Twombly ou Non Multa Sed Multum. In: O óbvio e o obtuso: ensaios críticos III. Rio de Janeiro: Nova Fronteira: 1990. p. 146.

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redimensionam, quiçá expandem, o entendimento que temos a respeito do humano9.

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r efer ência s Alves, Cauê. Mira Schendel: avesso do avesso. São Paulo: Instituto de Arte Contemporânea; Bei Comunicação, 2011. BARTHES, Roland. Cy Twombly ou Non Multa Sed Multum. In: O óbvio e o obtuso: ensaios críticos III. Rio de Janeiro: Nova Fronteira: 1990. p. 143-160. DANZIGER, Leila. Diários públicos: jornais e esquecimento. In: Revista Z Cultural - Ano IV - Número 1 - Dezembro 2007/ Março 2008. Disponível em: http://revistazcultural. pacc.ufrj.br /diarios-publicos-jornais-e-esquecimento-de-leila-danziger-2/. Acesso em 15 de março de 2018. FILHO, Paulo Venancio. Mira Schendel – Sinais. São Paulo: Museu de Arte Moderna de São Paulo, 2018. GONÇALVES, Flávio. Observar, econder, mostrar. In: DIAS, Aline (Org.). Aqui desenho. Florianópolis: Corpo Editorial, 2012. p.12-13. JAFFE, Noemi. Sustos lentos – Houyhnhnms - Nuno Ramos. São Paulo: Pinacoteca do Estado, 2015. PAIXÃO, Fernando. Porcelana invisível. São Paulo: Cosac & Naify, 2015. SALZSTEIN, Sônia (Org.). No vazio do mundo. São Paulo: Marca D’ Água, 1996.

“A ideia de um sujeito que quer se dissipar no anonimato e ao mesmo tempo alcançar, por meio dessa evaporação (que também é uma onipresença), o mais elevado patamar de seu movimento de auto-compreensão é uma constante no trabalho de Mira Schendel”. SALZSTEIN, Sônia (Org.). No vazio do mundo. São Paulo: Marca D’ Água, 1996. p. 19.

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onde quer que esteja, nada escapa do fim.


onde quer que esteja, nada escapa do fim.


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SEM TĂ?TULO, 2017

ALINE MORENO

madeira, ferro e pedra. 100 x 50 x 5 cm cada.


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se m título, assim como parte da minha produção recente, está inserida na ampla discussão de paisagem e suas formas de interpretação, dialogando com a história da sua representação e, inevitavelmente, com a tradição da pintura. As características desse gênero pictórico, seja a proporção, horizontalidade, composição ou o chassi, são reinterpretadas através da sua materialidade, alheia à essa tradição, em torno da discussão do que é pintura e o que é paisagem.

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EMBRULHOS, 2017

fotografia, papel de arroz, papel de seda e plástico bolha. dimensões variáveis.


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Oito fotos: uma série. Uma série que não se constitui por imagens tiradas por um mesmo olhar com um mesmo fim. Mas sim, uma série recolhida por um mesmo olhar com um mesmo fim. Fragmentos. São fotos antigas, em preto e branco. Se olharmos com cuidado e com proximidade poderemos ver. São fotos de família, do arquivo de família. Isso se pode intuir. Contudo, completo dizendo que são fotos roubadas, extraviadas, raptadas, subtraídas dos álbuns encontrados nas casas de meus avós. São originais, todas. Podemos reconhecer um certo padrão. Todas são retratos femininos, crianças, jovens, adultas. Todas possuem aproximadamente o mesmo formato. Todas estão veladas. As fotos se encontram embrulhadas, protegidas por fino papel de arroz, ou plástico bolha. Elas estão conservadas, não só da ação do tempo, mas também do nosso próprio olhar, pois o embrulho nos impede de posse completa sobre elas. Entretanto, esse furtar à visão já estava dado. Trancadas em álbuns essas imagens já não eram vistas, já não estavam compartilhadas, já não serviam à rememoração. Elas apenas estavam latentes, como um fato esquecido dentro desse organismo memorialístico chamado álbum. A memória e a fotografia tem desses jogos, dar a ver a partir de um enquadramento, sendo sempre o resto de um acontecimento que tomou parte no mundo. A fotografia e a memória são sobras, restos e rastros que vão esmaecendo pouco a pouco. A tentativa de proteção delas se torna quase um recalque, um impedimento à rememoração. O cuidado excessivo com a imagem a impede de se circunscrever em outros circuitos de afetos e lembranças. A preservação se torna o seu próprio apagamento.

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FERCHO MARQUÉZ

A-1 IMAGEM DE I N S TA L A Ç Ã O C O M P L E TA ANEXO GOIABEIRA : C O VA S E M IDE NTIFIC AÇ ÃO. I N STA L AÇ ÃO , 2 0 1 7 .

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Cova sem identificação é uma área na propriedade do Instituto de Artes da UFRGS, sem nome, nem utilidade definida que foi esquecida pelo projetistas e arquitetos do prédio durante sua construção. A partir da percepção de especificidade do espaço, intervenho com placas finas de glicerina neste espaço para que, como um filtro, capturem os objetos que caem do alto em direção à superfície horizontal da área. As placas perdem sua referência ao molde, à medida em que vai tendo sua forma subvertida pelo intemperismo e pelas quedas de folhas e goiabas do alto. As placas se tornam esses filtros que capturam em sua própria presença, todo esse âmbito do sedimento. Após adicionar as placas ao espaço, subtraio-as de lá e disponho-as empilhadas sobre um suporte de madeira. Como experiência processual, apresento planta baixa do espaço que não informa especificamente nada em si, contextualização da ação interventiva, descrição do espaço, transcrição do áudio do momento de medida da área, lista imaginária de objetos/personagens do espaço, fotografias da adição, da subtração das placas de glicerina e consequentemente de seu rastro de presença, bem como, boato que narra a suposta origem do espaço. Há toda uma existência espacial própria que é respeitada: a intervenção é mínima, respeitando a própria dinâmica do espaço. O que se gera dessa experiência são fragmentos que não se tornam resultado findo, nem se reportam estritamente ao espaço propriamente dito. Distam frouxamente nem longe demais, nem perto demais, sendo mais um desvio, um resíduo. Respeita-se assim a fuga que a área propõe em relação aos endereçamentos de uso, de ocupação e de exploração

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espaciais. Proponho uma instalação que também seja um desvio ao próprio espaço, com fragmentos que ora pretendem se afastar da própria métrica do lugar, ora soçobram a forma das placas que perdem sua forma provinda do molde, como também, do boato que passou por tantas bocas que não há mais ligação nem próximo demais, nem distante demais do real acontecimento sobre o qual se é narrado. O espaço foi experienciado e o desvio dessa experiência vertida em blocos de textos, em placas de glicerina dispostas umas sobre as outras nas quais frouxamente desviam nossa experiência do espaço para o tato.

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B - 1 P L A N TA B A I X A ANEXO GOIABEIRA : C O VA S E M I D E N T I F I C AÇ ÃO ( D E TA L H E P L A N TA B A I X A ) , 2017.

Reprodução em caixa de madeira e vidro. 13 x 23 cm.


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JARRO REMEMBRAMENTO, 2016

vídeo digital 5’35’00”

A série r e m e m bra m en to é composta por pintura, vídeo e instalação. Trabalho com utilitários quebrados encontradas em diferentes lugares ou mesmo de minha coleção. No ateliê estes trabalhos começaram a surgir como uma tentativa de trazer a memória da forma de tais objetos, que inicialmente se apresentam como fragmentos (cacos) que em nada remetem a sua morfologia. Todo objeto possui a característica de evocar memórias. A série Remembramento é uma alusão ao esforço que fazemos para tentar lembrar de momentos, pessoas ou coisas e da impossibilidade de apreender tais memórias.


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A série matér ia-pr ima surge da investigação da madeira a partir de um processo de síntese e transfiguração, observando a relação que esse elemento estabelece com seu derivado mais conhecido, o papel. Essa série propõe uma espécie de genealogia material na qual um composto orgânico faz surgir um composto industrial numa dupla existência, em que um só é possível por meio do outro. Deste modo, a instalação Textum, inserida no contexto dessa série e projetada especialmente para o Arte Londrina 6, cria uma espécie de tecido vital pregnante e parasitário na estrutura arquitetônica do espaço expositivo. Um texto, assim como um tecido, é composto pelo entrelaçamento visual de linhas e contornos. Portanto, a esses elementos essenciais da tessitura visual, chamamos de desenho. Como, outrora, Vasari havia afirmado em suas Vite, “o desenho, pai de nossas três artes — arquitetura, escultura, pintura —, extrai de múltiplas elementos um juízo universal”1, pensamos, com Textum, em articular as antíteses da madeira, explorando suas possibilidades lineares e, por isso, bidimensionais, apesar de sua condição essencialmente tridimensional; investigando sua qualidade pictórica, a partir da tessitura das linhas; e relacionando toda essa estrutura com a forma arquitetônica do espaço.

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TEXTUM, 2017

madeira dimensões variadas

1. VASARI, Giorgio. A vida dos mais excelentes pintores, escultores e arquitetos In. LICHTENSTEIN, Jacqueline (org.). A pintura: textos essenciais — Vol.9: O desenho e a cor. São Paulo: Ed. 34, 2006. p. 20.

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D E C A N TA Ç Ã O 1 0 , 2 0 1 7

tinta acrílica, resina acrílica, gesso acrílico, nanquim, verniz e verniz stain sobre compensado. 24 x 30 cm.

D E C A N TA Ç Ã O 1 1 , 2 0 1 7

tinta acrílica, resina acrílica, gesso acrílico, nanquim, verniz e verniz stain sobre compensado. 24 x 30 cm.

D E C A N TA Ç Ã O 1 2 , 2 0 1 7

tinta acrílica, resina acrílica, gesso acrílico, nanquim, verniz e verniz stain sobre compensado. 24 x 30 cm.


G U STAVO

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A procura pela suspensão do tempo em meio a banalidade do cotidiano é um assunto recorrente em minha investigação. Encontro nesse contexto corriqueiro e de solidão uma dimensão espiritual. Nos trabalhos da série Decantação, busco vivenciar a dilatação do tempo durante a realização da pintura para que, ao final, o objeto carregue em sua superfície esse estado de espírito. A produção dos trabalhos parte de dois princípios intimamente conectados: 1) viver a reticência do tempo; 2) retomar uma visão da realidade, cotidianamente perdida, em que eu apenas olhe sem querer provar ou construir nada sobre o que vejo. Para isso, trabalho principalmente com gestos repetitivos e com o desenho de observação. A escolha de ambos tem como intenção inicialmente tomar o máximo de decisões prévias possíveis para que durante a pintura eu possa somente me concentrar na realização dela e nos acontecimentos vivenciados durante a execução. Decantação é uma série aberta de pinturas quase completamente brancas. Sobre suas superfícies, foram intercaladas finas camadas de tinta acrílica, resina acrílica e desenhos em nanquim. Em um percurso em espiral, a base branca de gesso acrílico gradativamente escurece com a sobreposição de finas camadas de marrom. Em seguida, finas camadas brancas retornam, pouco a pouco, ao branco inicial. A repetitiva pintura de camadas revela e vela o desenho das plantas e do grid (que se estende por toda a superfície). A pintura se assemelha com caminhar em meio à neblina. A alvura das telas pede a proximidade do espectador para, aos poucos, mostrar

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seus detalhes. Além disso, o silêncio de sua superfície potencializa cada poeira ou fragmento a ela aderido. Pelo mesmo motivo, as mudanças da luz ambiente da exposição variam o que pode ser visto em sua superfície. Nessa situação, presença e ausência se mostram um só. É na sútil existência dos opostos que as partes se potencializam.

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NÃO HÁ FLEXÃO QUE ENDUREÇA O VERBO POEMAS SÓLIDOS, 2016

MARCELO BARROS

páginas de livros recortadas e tijolo refratário. 12 x 22 x 10 cm. *foto por Ivan Padovani

sobre a pele das coisas Marcelo Barros cria irregularidades em superfícies continuas. Trabalha entre a impressão, o recorte, a textura gráfica, a fricção, o relevo. Traz ao tato o que antes era somente visual. Na interferência em imagens clássicas da pintura, o artista cobre e desconstrói retratos e paisagens. Já não importam os rostos e sim a materialidade da pele. Já não importa se é água, céu ou terra. Importa que a paisagem se

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tornou táctil. Toda imensidão se resume em consistência. Em cor, em papel, em cimento. As paisagens são cobertas para serem reveladas. Elas se tornam palpáveis. O papel já não é mais papel, é cobertura. Assim como o cimento. Assim como as palavras. Não há nada para ser dito. O nada é velado, e desta ação surge o discurso da pintura pura. Da cor, da forma, do quadro, das escolhas, da organização. As paisagens, assim como os retratos, tornam-se irrelevantes. Seu contexto, sua identidade e sua localização não importam. São apenas pessoas e lugares. Pessoas e lugares que se abstraem, que se transformam em pura casca. Porém, não nos intriga o que está por baixo. O que intriga é a ação, a transformação, o material, o tom, a minuciosidade, os ângulos formados, as bordas definidas. Assim, as superfícies ganham peso, pois é preciso tocar com os olhos. *Texto escrito pela artista visual Mari Nagem, para a exposição “Sobre a Pele”, o qual este trabalho e demais outros foram exibidos pela primeira vez. **Mari Nagem (Belo Horizonte, 1984) vive e trabalha em São Paulo. Artista multimídia desenvolve projetos em vídeo, instalação e fotografia. Site: marinagem.com.

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HORIZONTES SUTIS (1), 2017

pano de chão sobre chassi. 15 x 15 cm.

HORIZONTES SUTIS (2), 2017

tecido de algodão sobre chassi. 15 x 15 cm.

Os trabalhos apresentados na ocasião da exposição “Das estruturas mínimas às não cores”, nasceram de uma vontade de refletir acerca da pintura tendo como principal questão a materialidade principalmente em relação ao gesto e ao espaço. As transparências nos trabalhos são resultado da manipulação de diferentes tipos de tecido através de procedimentos repetidos à exaustão como o desfiar e o (re)costurar. Dessa forma a escolha de assumir o manual como característica fundamental ao trabalho está também contida nessa repetição.


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Os chassis largos e as dimensões diminutas das obras agem de forma a hibridizá-las, estabelecendo um diálogo direto entre objeto e pintura, evidenciando o suporte. Na série “Horizontes Sutis” as obras partem da criação de linhas de horizonte que cortam os tecidos ao meio. Em uma, as fibras do fino tecido são afastadas umas das outras, enquanto na outra, as linhas são retiradas cuidadosamente antes de esticar o tecido no chassi. Já nos trabalhos “Sem título (pra quem tinha medo de rosa)” e “Sem título”, a sutil inserção da cor busca refazer o trajeto da costura enfatizando também uma aproximação entre o têxtil e a pintura. O tecido tem memória: cada fio retirado modifica o estado do trabalho de forma gradual e lenta, mas também permanente. Toda a ação realizada, do movimento da mão ao desfiar, está contida no tecido.

SEM TÍTULO (2), 2017

pano de chão e lã sobre chassi. 15 x 20 cm.

SEM TÍTULO (4), 2017

lona e lã sobre chassi. 10 x 10 cm.

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ARTE LONDRINA 6

opções de

de mundo E X P OS I ÇÃO

I I


in-finitos derivados das opções de fim

Manoela Maria Valério Psicóloga Mestre e doutora pela UFF/RJ Co-fundadora da CIRCUS-Circuito de Interação de Redes Sociais Integrante do núcleo de cultura (produção e pesquisa em artes circenses)

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Dentro de minha barriga mora um pássaro, dentro do meu peito, um leão. Esse passeia pra lá e pra cá incessantemente. A ave grasna, esperneia e é sacrificada. O ovo continua a envolvê-la, como mortalha, mas já é o começo do outro pássaro que nasce imediatamente após a morte. Nem chega a haver intervalo. É o festim da vida e da morte entrelaçadas. Lygia Clark, 2008.


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. De ponta cabeça primeiro tem um ponto final. E então inicia-se por aquilo que, sabe-se lá, findou-se. Por esboçar a invenção de novos mundos ou pelo encerramento mesmo deste chão e daqueles que se foram? Por opções ou tragicidade? Por que aquilo que basta, num suspiro, transbordou? Será? A palavra escrita funda-se como despedida do turbilhão do pensamento. “Do caos à lama!”2e daí, então, nessa terra o caminho passa a fertilizar-se com visitas àquilo tudo que provoca as tantas e tais “opções de fim de mundo”. Um passeio solto e quase distraído pelas percepções diversas, transformadas em obras de uma exposição, dizem das memórias e do futuro, do espaço e dos lugares inventados, do instante, efêmero, da selvageria e das ancestralidades. Dizem ainda das pessoas, dos corpos, e dos objetos-isolantes-isolados, da cultura encoberta, do sangue, do gesto e fragmento dançante, da mulher, outra. A finitude é, pois, de algum modo uma das linhas recorrentes e na qual segue-se de carona. O finito do corpo. O finito de um modo de estar, de um lugar ou de um gesto. E, assim, com num rasgo que localiza a duração do presente, é o corpo, esse emaranhado de infinitas linhas finitas, que rege e tece o diagrama passageiro3. Mas que corpo é esse? Sugere-se que seja aquele que pinta, desenha, esculpe e inventa uma dança. Aquele que fala e silencia. Aquele que escuta, vê e percebe, que ouriça os sentidos para que mundos sejam opções e não pré-formatações. Para que a vida seja aliada da morte - um nome esgarçado para a finitude – como um jogo de intensa e necessária presença vital e não a morte fabricante de uma quase-vida. Para um cor1

Chico Science

Importante salientar que o presente texto é derivado da pesquisa de doutorado “Entre-tramas mambembes e as e(n)/(s)tranhas mortes: um circo” que, inevitavelmente, dialogou intensamente com o tema da exposição em questão “Opções de fim de mundo”. 2

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po em vias de estar outro, um depois do fim, depois dos fins, inventando opções de mundos. Um corpo que, num repente, pode. Atravessam, nesse sentido, questões que dizem de produções de subjetividades (enquanto produção de modos de vida), como o lançar-se às experiências limites - errante desamedrontado- nas quais o próximo passo pode ser tropeço, o próximo giro, náusea, o salto seguinte, mortal. Mas, então, tais fatalidades, esses riscos e essas mortes invertem seus sentidos, passando de tabu, de pretextos para os discursos preventivos e moralizadores a elemento alquímico. Ou ainda: um dado potencializador de um estilo, a afirmação, quem sabe, de uma vida bela. Mais um pouco ainda quando, apesar de todas as brutas aparências de uma vida precária, uma linha escapa e diz de certa tragicidade alegre de existir à margem da previsibilidade, de afirmar a invenção de saídas como, quem sabe, o fim de um mundo. Daí, então, como num flerte entre mundos pouco óbvios com outros já cansados, regidos e referenciados nas normas4, provocam-se, quicá, algumas saídas. Partidas de uma angústia que gangrena o corpo numa vida genérica, são dadas passagens a dores, inevitáveis e queridas, de “deixar ir” os mundos que já desabaram e receber mal estares que desestabilizem e contagiem o que pode, ainda, ser escape e sangue pulsante, vivo. É nesse ínterim que alguns sistemas de avaliações evidenciam aquilo que, no cotidiano, constituem-se e explicitam modos de existência que, supostamente, implicam valores imanentes, experiências de vida cuja moralidade se quebra e algumas de suas afiadas garras julgadoras perdem, por instantes, seus poderes. Suspender um pouco o juízo de valores e estar neste caldeirão, desmanchar um pouco a dura carne acusa3 “[...]à medida que o poder se torna mais anônimo e mais funcional, aqueles sobre os quais se exerce tendem a ser mais fortemente individualizados [...], por medidas que têm a norma como referência (FOUCAULT, 2004, p. 184). “A sociedade de normalização é uma sociedade em que se cruzam, conforme uma articulação ortogonal, a norma da disciplina e da regulamentação. [...]”(FOUCAULT, 1999, p.302)

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tória e botar um pouco de vinho, um pouco de relaxamento, um pouco de oxigênio no “possível pra não sufocar” e deixar a vida como a mais criteriosa avaliadora das avaliadoras. E, porque não, para buscar ou querer fazer passarem outros ares - outros mundos -, como em Artaud, que lembra que “viver é meio que arrancar da existência a vida, onde ela está aprisionada, equilibrada, estabilizada, submetida a uma forma majoritária, a uma gorda saúde dominante. Diante disso, a vida como palpitação, ardência a ser liberada.”5 Em certo sentido as relações entre corpo e morte (as finitudes) acabam por dialogar mais intimamente com alguns modos de viver, que dizem, pois, da produção de subjetividades cujo efeito oscila desde um jogo fadado à mortificação, à produção de norma, a uma saúde dominante e aos breves, mas não pouco intensos abalos sísmicos produzidos pelas linhas de fugas6. E sabe-se que tocar nesses processos é também pensar em como se imiscuem as produções de um corpo voltado às linhas duras, do poder e da morte enquanto mortificação, ‘aumento das gangrenas’ ou diminuição de potência de existir e um corpo em devir, inacabado, em aberturas a novas relações com a morte entendida. Nesse ponto, como afirmação da finitude para o ‘aumento da circulação sanguínea’, para diferentes relações com o riscos e perigos de radicalizar a relação com a vida. De um primeiro ponto, a questão pode ser relativamente breve: as subjetividades, do ponto de vista aqui tratado, que se alia a alguns pensadores, como Deleuze, por exemplo, associam-se em curta definição à produção de modos de vida. As subjetividades, ou melhor, os processos de subjetivação a partir desta perspectiva, dizem respeito aos modos, ao 4

PELBART, 2000, p.68

5 As linhas, veja, ou segmentos reais, para Deleuze e Guattari, são traçados cartográficos de vidas reais. Elas não se ‘tornam’ umas nas outras, antes podem estar presentes ao mesmo tempo e misturar-se. Elas são linhas distintas. Os autores apontam três linhas: segmentos duros, estratificados, nos quais vive a maioria: são circulares e centralizados; segmentos relativamente flexíveis que podem produzir transformações (passar de uma forma para outra); e linhas de fuga, segmentos de mutação (não de transformação), que podem produzir criações, invenções e abolições, destruições

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jeitos mesmo de viver em determinadas atualidades, criados incessantemente. Corpo, em outro ponto, sinteticamente, é produção. Isso posto, forçosamente, duas breves orientações entrecruzam-se e, portanto, implicam em relações também diversas com a compreensão de práticas no mundo, e a dança se faz entre as linhas que se constituem entre um corpo-forma/organismo e um corpo modo/dos afectos ou, em linguagem imagética: um corpo-gangrena e um corpo-sangue. Então, pede-se pensar que numa espécie de biologização da vida, ou na ditadura dos órgãos, ao corpo associa-se e restringe-se um organismo com tantas células, com funções tais ou quais, com heranças codificadas, permeado pelos sentidos e desejos devorados, estruturado nas interações sociais consigo e com os objetos do mundo. Seria preciso aqui lembrar que, enquanto objeto de curiosidades, essa coisa tão familiar, essa porção de massa que coloca o ser vivo no mundo foi e é, incessantemente, mutilada às vistas de ‘nobres’ intenções científicas. Na função de salvaguardar o indefinido, a Ciência apresenta a todo momento os melhores meios de cuidar de uma ‘coisa’ terceira, dessa casa de carnes, órgãos, ossos e almas, dessa coisa que parece nunca caber na vida que lhe cabe, na tentativa de, enfim, capturar um devir em uma forma. A Ciência, assim, tantas vezes objetivando esse sujeito, ou seja, tornando o homem objeto de si mesmo, promove o jogo mais perverso a ser adquirido: o de desaprender o que está aqui, o de criadora dos problemas de soluções, às vezes, já prontas no jogo de dizer que pode tapar a falta que sequer existia. Assim, o corpo -desconhecido de si- é tornado absolutamente morada das funções, instrumento, coisa biológica, forma física de descrição médica, ou, platonicamente, um corpo como prisão da alma, como o difie mortes. Todos os segmentos têm seus perigos, não são bons nem maus. Linhas de fuga seriam como uma variação que afeta um sistema impedindo-o de ser homogêneo”(p.5) “partir, se evadir, é traçar uma linha. [...] A linha de fuga é uma desterritorialização. [...] Fugir não é renunciar às ações, nada mais ativo que uma fuga. É o contrário do imaginário. É também fazer fugir, não necessariamente os outros, mas fazer alguma coisa, fugir, fazer um sistema vazar como se fura um cano. [...]Fugir é traçar uma linha, linhas, toda uma cartografia. Só se descobre mundos através de uma longa fuga quebrada (p.30). “E seria um erro acreditar que basta tomar, enfim, a linha de fuga ou de ruptura. Antes de tudo, é preciso traçá-la, saber onde e como traçá-la. E depois ela própria tem seu perigo, que talvez seja o pior. Não apenas as linhas de fuga, de maior declive, correm o risco de serem barradas, segmentarizadas, precipitadas

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cultante do acesso à verdade, à pureza, a essa alma mesmo, que, no limite, coloca-se em ato, com a única opção de seguir um leque predeterminado de opções de mundo, adestradamente. Ou, numa espécie de derivação dessa perspectiva que separa corpo x alma, o corpo, ou o formato desse corpo, passa a ser supervalorizado, tagarelado, hiperentendido, capturado em normas e, de certo modo, controlado por tais. Um corpo idealizado que nesse processo (de idealizações) diz de um sintoma bruto: o de perder a potência que produz realidades na existência e de entrar em severos processos de mortificações extremamente ligados a um vingar-se da vida, um eterno e infinito seguro, “com a fantasmagoria de uma outra vida, de uma vida melhor.”7 Os discursos médicos, psicológicos, pedagógicos, dietéticos, religiosos ou publicitários falam das gentes, para a gente toda, qual o melhor e mais adequado caminho para a salvação ou para o que lhes resta: estradas de acesso à pobre e ensebada felicidade de comercial de margarina (ou de novela ou de redes sociais e tais). Aqui, então, o corpo torna-se apenas um objeto de controle de alma ou mente, em modulações restritas de docilização. Subjetividades para além dos confinamentos, vigilâncias agora a céu aberto tomadas nos mínimos detalhes dos comportamentos. A maldição desse biopoder8 faz lembrar o adivinho em Zaratustra que: “estamos cansados demais para morrer e que agora continuamos acordados e vivendo em câmaras mortuárias.”9 Assim, também esse corpo pecador e depreciado ou ultra evidenciado segue na mesma direção de um processo homeopático de mortificação em vida. Nessa dicotômica visão, a existência oscila entre um lado que, ora promove a depreciação do corpo, colocando-o como o outro menor em buracos negros, mas elas têm um risco particular a mais: virar linhas de abolição, de destruição, dos outros e de si mesma. [...] E as linhas de fuga acabam mal não por serem imaginárias, mas justamente porque são reais e estão em sua realidade. Elas acabam mal, não apenas porque entram em curto-circuito com as duas outras linhas, mas em si mesmas, por causa de um perigo que elas secretam[...]”. DELEUZE, PARNET,1998/2016, p.4-5 e 30 6

NIETZSCHE, 2000, p.33.

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da alma, ora a supervalorização, colocando-o, a partir de discursos que investem nessa espécie de entidade dominadora chamada de consciência (ou, em outros nomes similares em sentido para a perspectiva em questão: mente, alma, desejo10 enquanto falta), que controla e regula as vontades para as políticas de produção de indivíduos. Um caminho que constrói esse desejo-agonia de um corpo utópico, mas, como diz Foucault, “é contra ele [justamente contra este corpo] e como que para apagá-lo, que nasceram todas as utopias.”11 Claro, não se poderia esquecer que nessa longa empreitada, essa alma, aqui sinônimo de verdade, é outra coisa que não se liga (ou se desliga) ao corpo ou, no outro lado da mesma moeda, ao corpo idealizado e, portanto, meio de negação da vida seria como que objetivado por uma alma-desejo. Assim, ‘a norma nossa de cada dia se faz hoje’ corpoXalma-desejo → mortificação. Mas a dicotomização da qual se tratava ali anteriormente, corpoXconsciência (alma/desejo), esquartejadora, que toma a vida em possuidoras forças (gangrenadas, adoecidas?) antagônicas, aponta, então, para lados que se opõem para não sair do lugar (ou caminhar em inércia), entre as paixões e anseios de uma verdade a ser cavada para um questionável e infinito lado de dentro.12 Mas será que esse ideal do corpo também não levaria, ironicamente, a certa banalização e uma espécie de embrutecimento da existência? Esse excesso de ‘sapiência sobre’ não seria sintoma de um vácuo de sentidos? Assim, é a alma-desejo, preferencialmente medíocre, que precisa de investimentos criteriosos, afinal ela/ele talvez sejam tomadas e acredita7 “O controle da sociedade sobre os indivíduos não se opera simplesmente pela consciência ou pela ideologia, mas começa no corpo, com o corpo. Foi no biológico, no somático, no corporal que, antes de tudo, investiu a sociedade capitalista. O corpo é uma realidade biopolítica” (FOUCAULT,1979, p.80). E mais, “a sociedade de normalização não é, pois, nessas condições, uma espécie de sociedade disciplinar generalizada cujas instituições disciplinares teriam se alastrado e finalmente recoberto todo o espaço [...] A sociedade de normalização é uma sociedade em que se cruzam, conforme uma articulação ortogonal, a norma da disciplina e da regulamentação. Dizer que o poder, no século XIX [...]incumbiu-se da vida é dizer que ele conseguiu cobrir toda a superfície que se estende do orgânico ao biológico, do corpo à população, mediante o jogo duplo das tecnologias de disciplina, de uma parte, e das tecnologias de regulamentação, de outras.” (FOUCAULT,1999, p. 302).

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das como as únicas vias de acesso à tal eternidade, ao além deste mundo e à eterna meta que busca satisfação e direciona, nesse sentido, quais são as opções de mundos neste mundo. De todo modo, a existência é posta neste lugar de um corpo pleno, possível, no dito saudável, bonito, útil e produtivo. Idealizado. Assim, raramente experimenta-se uma satisfação ou radical apropriação de ‘si’ em detrimento de um ‘eu’ entendido como ‘aquilo que vejo - e não vejo - no espelho’, que se estende à existência, ao corpo enquanto forma ou às imagens produzidas dos mesmos, ligando tal sensação a uma profunda inapropriação da vida num instante. Há sempre algo por se fazer: seja uma dieta, um peeling, uma malhação mais forte, seja um pouco mais ou um pouco menos de seio, de buço, de nariz, de testa, de barriga, ou de dinheiro, de felicidade, na rotineira insatisfação e na necessidade, cotidiana, de alterar alguns excessos de misérias e tantos miligramas das abissais insuportabilidades. O movimento dessa busca - exímio gerador de falta - produz-se numa impossibilidade em viver com o que é duração, instante, onde o estático das formas domina e sufoca o fluir mais oxigenado do tempo, a ocupar intensamente esse tempo na duração/pausa que produz vida.13 Dificuldade em viver o paradoxo que é o do próprio movimento, uma vez que, se o corpo (e a existência) é coisa viva, ele não cessa, sua forma não se apreende, seu desenho não se fixa. O corpo fica atrelado à ilusão de uma fotografia mórbida que pretende eternizar e formatar um instante (que é uma duração). Mas ele, o corpo, mesmo enquanto coisa orgânica, não se paralisa, o corpo - vivo - é movimento, o paradoxo de viver e morrer a cada instante.14 8

NIETZSCHE, 2009.

Importante salientar, para que não haja uma confusão no uso do conceito de desejo. Ele está sendo tratado em certos momentos do texto enquanto ‘aquilo que falta’. Na perspectiva da psicanálise, a falta direciona o desejo, diferentemente da perspectiva que Deleuze trabalha (e na qual mais nos afinamos), em que desejo é um conceito importante e não é algo que se almeja, que falta, nem busca um objeto, mas, pelo contrário, o desejo é sempre em ato porque só existe agenciado, ele não busca seu objeto, ele o fabrica. 9

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E se morre um pouco a cada dia, de uma morte que emerge da impotência, do cansaço de viver, do drama minúsculo, da fraqueza efeito de uma ausência ou de hábitos tomados como natureza do sujeito. Assassinando acontecimentos na tentativa de naturalizá-los em signos e valores ingeridos sem digestão possível. Assim, a esse corpo sintetizado, as opções e regimes de sensibilidades, já postos nas dicas de sucesso, milagres e receitas de felicidade, resta quase nada. A sobrevivência de uma vida fatigada, talvez. O corpo deste modo-poder passa a ser, inevitavelmente, o impotente, uma vez que a cada minuto, a cada gesto, a cada ação, anseia pelo reconhecimento do outro, não existe sem a esperança e as retribuições do jugo afiado do outro, que diz e que nele injeta mais estímulos: ‘você conseguiu, pessoa de sucesso!’, ‘x curtidas nas redes sociais on line’. E aqui talvez seja possível ler também o lado B: ‘perdemos algo neste triste cabaré.’ Do movimento do consumo ao consumo alucinado das formas desde o corpo-forma à forma de viver ou forma-homem- ideais, de que composições se faz a morbidez desta blindagem do tempo que corre (que não se apreende) à defensiva prerrogativa do não à vida? Que ruídos silenciosos são esses que pretendem calar as mais sutis possibilidades de encontros com o não familiar, ou seja, o ‘estrangeiro em nós’? Como buscar modos que facilitem o entendimento daquilo que sai do plano dos hábitos, já tomados como naturezas? Pois, “há de se quebrar nossos hábitos e aumentar nossa capacidade de pensar”15 quando, face ao obscurantismo incolor destes tempos, o olhar do outro sobre si, e de si sobre si, não é fonte de fissuras, de encontros desarranjadores e potentes com o 10

FOUCAULT, 2009, p.13.

O corpo enquanto morada das dores e dos erros que minam potências, das doenças, do pecado para a consciência (e alma platônica), uma entidade sublime, o meio de acesso à eternidade. A alma, pois, ou este tal desejo, ansiado como salvação. Alma supervalorizada em relação a este sujo pecador ou a este bobo apaixonado, o corpo. Dicotomizar para controlar. Esquartejar para zumbizar. Poderia aqui, também, de repente, se ouvir palavras de ordem: ‘esqueçamo-nos do corpo, ele deve apenas ser cuidado para abrigar bem essa nobre senhora, ele acaba, apodrecerá um dia, pode ser renegado a um segundo plano’.

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caos, de surpresas, mas de julgamentos. Resumidamente, o que agora coloca-se como antiga, mas atual questão é: pode-se avaliar as linhas de alguns encontros que se dão aqui e a todo momento para saber se existe potência e não a busca por um poder íntimo aliado do reconhecimento? A potência de um corpo, diria Spinoza, avalia-se enquanto possibilidades de afetar e ser afetado. Quando há o aumento da potência de agir e pensar, há o aumento da capacidade de manter-se em movimento, há aí alguma alegria, uma composição. Quando há a diminuição da capacidade de agir, nos encontros reativos, as possibilidades de afetar e ser afetado diminuem as possibilidades de pensar e agir; e dá-se aí uma paixão triste, uma decomposição. Ao pensar na diversidade dos modos de existência, há algo que se coloca ao questionamento das formas, a romper com elas e a avaliar, intermitentemente, que paixões são essas com as quais se lida? Daí parece que os lugares do ‘homem de sucesso’ já não cabem tanto. Mas o errante, exemplo supremo do fracassado (pois que fracassar neste mundo pode ser algum sinal de saúde), o desajeitado dos gestos e das palavras, o imperfeito e desordenado, o habitante do non sense, afina-se mais a esse gosto do descabido (como caber em tudo isso que, violentamente, aparece?), experimenta uma pequena liberdade que permite dizer o proibido, que autoriza o nojo, que duvida dos pecadilhos, que vê a feiura da norma e da moral reacionária e abre-se a novas passagens. Esse colocar-se num lugar onde seja preciso lamber o buraco e reconceituar a queda como num sopro de desconcerto e perdição oferecido às amarras duras, como quem dribla o ressentimento, a finitude e cria, talvez, alguns mundos neste mundo.

Essa experiência com a finitude aponta para aquilo que rompe com a norma quando afina-se com o caos. Nessa queda, quebra-se não limites físicos, mas talvez, morais. Com essa dilatação, é que expõem-se fragilidades que se escondem, do desconcerto, do fracasso e do erro, que só se produzem em um corpo imperfeito, inacabado e finito, enfim, onde habitam uma exposição e extravasamento do dito posto humano. Diferentemente, nota-se, quando sujeito, se está na normalidade moralizadora e moralizada, instauradora de limites convencionais pré-definidos, temeroso do erro, assustado com o fracasso, com podas e pequenas mortes cotidianas na busca pela segurança. Viver os riscos das imprevisibilidades, improvisar no previamente pensado, planejado e idealizado é degustar uma espécie de liberdade em que se mistura (enquanto radical relação com a vida) a morte de algo, que, quem sabe, seja um mundo. É preciso, parece, nesse sentido, não saber tanto assim, já que esse ressentimento travestido em saber passa a mais um fardo crônico do que um exercício de liberdade. Não saber para o sentido de saber e, aí sim, arrancar as marcas que ficam coladas na existência, para que novas aventuras tenham passagem. Neste indomável benquisto pelo errante, o desejo que se produz, em ato e de fato, é a reinvenção de modos de sentir, de pensar e agir, libertando-se dos regimes reativos de sensibilidade, de julgamento para um agir em devir. Assim, dos acontecimentos que colocam em xeque esta espécie de covardia pode ser que se esbocem instantes cuja moralização não finque suas afiadas garras tão profundamente e, ao se perder um pouco do chão, talvez evidenciem-se estranhamentos, um cheiro sutil de vida que pergunta: que gestos são esses? Que usos e apropriações dos corpos são

“Tudo o que existe na natureza age e reage. O homem é um ser esquartejado (uma parte sensória e outra motora). De um lado sensório = rosto que vê, sente, cheira = porta sensório. Do outro lado está a motricidade (poder de responder aos acontecimentos da vida). A função motora, portanto, reage. Percebemos um mundo e a reação àquilo que percebemos existe em uma pequena duração do tempo/espera. Este intervalo chama-se tempo. É neste pequeno intervalo que se dá o nascimento da vida.” (Hábito e Renovação, uma aula dadaísta- Claudio Ulpiano, 2016).

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O contemporâneo, neste processo, tornou ainda mais complexa a experiência disciplinar, pois não é mais o externo, mas a regra, o julgamento que está entranhado no sujeito, neste indivíduo que não é nada mais do que um corpo assujeitado. Produzidos, assim, nas mais diversas instâncias, na intimidade familiar, nas instituições de saúde, escolar ou religiosas, na publicidade e nas mais ínfimas relações sociais e consistindo-se, assim, na roda das frustrações.

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Hábito e Renovação, uma aula dadaísta- Claudio Ulpiano, 2016.

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esses? Que histórias podem ser inventadas, em que talvez se faça possível relações mais éticas, que não escolhem entre o bom e mau, segundo regras externas e se refugiam nas formas, mas, que nas mais diversas entranhas do contemporâneo e nas práticas cotidianas, questionem mesmo as obviedades dos mundos ofertados no mercado, nas naturalizações e perversões inventadas, nos medos, nas faltas. Deste corpo-gangrena, produzido em processos de mortificações, à expansão, aos encontros potentes da vida, aos acontecimentos que se efetuam na duração dos instantes, à presença num estado em que as opções de fim de mundo estejam, sim, múltiplas, entretanto, quem sabe, num radical exercício de tornar-se outro, ela, a opção - sempre finita - de mundo, seja única, como se já não houvesse opções, mas que, em cada universo particular-universal de uma existência, ela se faça de repente, inevitável, clara, trágica. ...

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r efer ência s DELEUZE,Gilles. Conversações. Tradução: Peter Pál Perlbart. Rio de Janeiro/RJ: Editora 34, 1992 Espinosa- Filosofia Prática. Trad. de Daniel Lins e Fabien Pascal Lins. São Paulo: Escuta, 2002. O Pensamento Nômade. Trad. de Sônia Salzstein Goldberg e Milton Nascimento In: MARTON, Scarlett (org.). Nietzsche Hoje? Colóquio de Cerisy. São Paulo: Brasiliense, 1985. FOUCAULT, Michel A verdade e as formas jurídicas. Tradução Roberto Cabral de Melo Machado e Eduardo Jardim Morais. Rio de Janeiro/RJ: Nau Editora, 1999. Em defesa da sociedade: curso no Collège de France (1975-1976). Trad. de Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 1999. Le corps utopique e Les hétérotopies (conferências de 1966). Paris: Nouvelles Éditions Lignes, 2009. Microfísica do Poder. Tradução: Roberto Machado. Rio de Janeiro/RJ: Editora Graal, 1979. NIETZSCHE, Friedrich. Assim falava Zaratustra. Um livro para todos e para ninguém. Petrópolis,Editora Vozes, 2009. PELBART, Peter Pál. A vertigem por um fio. políticas da subjetividade contemporânea. São Paulo. Iluminuras,2000. VALERIO, Manoela Maria. Entre-tramas mambembes e as e(n)/(s)tranhas mortes: um circo. Tese apresentada ao programa de pós graduação em Psicologia da Universidade Federal Fluminense, em 01 de Dezembro de 2016. Hábito e Renovação, uma aula dadaísta- Claudio Ulpiano.Disponível em: https://vimeo. com/41924300 - http://claudioulpiano.org.br/ Acesso em janeiro de 2016. LYGIA CLARK. Disponível em: http://www.lygiaclark.org.br/arquivoPT.asp. Acesso em abril de 2018.

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SEM TÍTULO M I N I AT U R A S D E F U T U R A S P E S S O A S M O RTA S , 2 0 1 7

ADOLFO EMANUEL

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ecoline sobre papel. 10,5 x 8,6 cm.

Para este edital do Arte Londrina foram propostos trabalhos que se inserem no campo do desenho e pertencem a uma mesma série, sendo estes de dimensões similares e constituídos com os mesmos materiais (ecoline sobre papel). Os trabalhos aqui apresentados pertencem à série Miniaturas de futuras pessoas mortas, série de desenhos formada por 42 retratos realizados entre o ano de 2016 e 2017, e que teve como referencial os artistas renascentistas alemães Hans Holbein, o jovem e Albrecht Dürer. Do mesmo modo que a produção dos dois artistas, os trabalhos da série são muito pautados na observação, meticulosidade e em certo dado naturalista. Todos os retratos possuem a medida de 10,5 x 8,6 cm. O tamanho pequeno foi pensado por apontar a certa esfera de intimidade e por relacionar-se às miniaturas realizadas durante o século XVI. Mas também, por evidenciar o controle como um imperativo e uma absorção intensa ao tema pesquisado (SMEE, 2008, p. 23). Os desenhos da série foram feitos tanto por observação direta quanto por fotografia. E a escolha dos modelos se deu por apresentarem certo estranhamento ou, em particular, por suas idiossincrasias volumétricas, como textura da pele, estrutura óssea, musculatura, bolsas de gordura, cicatrizes e outras marcas (SMEE, 2008, p. 24). Deste modo, na série, longe de querer fornecer imagens as quais se pode dar uma só interpretação, uma só leitura, uma só qualidade, procurou-se mostrar e atentar-se a irrrepetível condição existencial do sujeito (CASTELNUOVO, 2006, pgs. 62 e 63).

SMEE, Sebastian. Lucian Freud. Tradução: Isabel Falcão. Colonia: Editora Taschen, 2008. CALTELNUOVO, Enrico. Retrato e sociedade na arte italiana: ensaios de história social da arte. Tradução: Franklin de Mattos. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

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SEM TÍTULO M I N I AT U R A S D E F U T U R A S P E S S O A S M O RTA S , 2 0 1 7

ecoline sobre papel 10,5 x 8,6 cm

SEM TÍTULO M I N I AT U R A S D E F U T U R A S P E S S O A S M O RTA S , 2 0 1 7

ecoline sobre papel 10,5 x 8,6 cm


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ANA TAKENAKA

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Em “opçõe s de fim de mundo” apresento o primeiro desenho de minha trajetória artística “a implicação de um ‘não’”, no qual exploro as potências das linhas inspirada nas narrativas de Paul Klee sobre o ato de desenhar, e dois trabalhos da série “Deriva”. O desenho acontece como meio quase instantâneo de representar uma sensação vivida. A linha traçada carrega memória e atende a urgência de organizar um pensamento, transmitir uma sensação. Costumo posteriormente desenvolver o desenho na gravura em metal e suas derivações. Para a série Deriva, desenvolvida em gravura, utilizo diversas matrizes de trabalhos anteriores, criando novas relações entre os elementos gráficos e ressignificando seu conteúdo. Também reutilizo papéis seda usados na limpeza da placa, que retornam em forma de desenho e elemento pictórico. As escolhas gráficas obedecem ao fluxo do momento, sendo cada instante único, cada decisão tomada durante as etapas de gravação, entintagem e limpeza possui uma singularidade, desta forma, as imagens adquirem aspectos monotípicos. São trabalhadas e entituladas por séries de acordo com o tema pesquisado. O papel, que abarca o desenho, é também reconhecido por sua materialidade viva e integrado ao corpo do trabalho como elemento compositivo ativo e não somente como suporte.

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“A I M P L I C A Ç Ã O D E U M ‘ N Ã O ’ ”, 2013

Desenho Nanquim, aquarela, grafite e caneta hidrográfica sobre papel. 45 x 65 cm.

“ D E R I VA # 1 ” , 2 0 1 6

KLEE, Paul. Confissão criadora. In: Sobre a arte moderna e outros ensaios. Tradução Pedro Süs-sekind. Prefácio Günther Regel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. 126 p.

Gravura em metal Ponta-seca, chiné-collé e fita autoadesiva sobre matriz de polipropileno. Impressão sobre papel japonês. 97x120 cm.


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EU QUERIA MESMO É E S TA R S E N TA D A EM OUTRO LUGAR FAX INAS, 2017

ANA VILELA CARMO

acrílica e guache. 30 x 30 cm.

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O meu processo criativo tem por procedimento um olhar para a pintura (moderna e contemporânea) e depois disso um olhar para o mundo. Isso ocorre porque acredito que é a pintura que me faz enxergar o mundo, pensando suas relações de cores, organizações, espacialidades e atmosferas. A minha pintura procura ser uma resposta a conversa que tento estabelecer entre os pintores que me encorajam junto a minha visão de mundo. Ao mesmo tempo que uma “geometria volpiana” de fatura rala me provoca, o requinte cromático e estrutural de Paulo Pasta também. E para além da história da arte, a minha paleta de cor parte de uma influência da pintura religiosa tibetana (budista), em que as cores são quentes e climatizadas, ou seja, elas esquentam de uma maneira mais amena, não beirando a nossa tropicalidade, produzindo silêncios diferentes. E para completar meu procedimento, procuro selecionar o que acho mais encantador. Muita coisa passa a ser encantadora pra mim, coisas que estão dentro do cotidiano como cadeiras, piscinas, pisos e afins. Procuro trabalhar em várias séries diferentes, explorando as variações dentro das mesmas. Na série ‘faxinas’, procurei empurrar as figuras às beiras, numa composição metonímica, em que a forma/figura se faz inteira pela parte. E como existem marcas do fazer por toda a tela, os bancos também cumprem o papel de organizar esse espaço, que sem eles é demasiadamente imenso.

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ANDRÉ MASSENA

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SEM TÍTULO HIS M ASTER’S VOICE 2, 2017

nanquim sobre papel. 70 x 45 cm.


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A serie His Master´s voice adota como título a frase utilizada na logomarca da HMV, uma companhia discográfica do inicio do século 20. A logomarca apresentava acima da frase a pintura de “Nipper”, um cachorrinho ouvindo atentamente a um gramofone. Mais tarde a HMV seria adquirida pela RCA, que manteve o famoso design com Nipper até a década de 60, antes de ser dissolvida entre a Sony e a Tecnicolor. A utilização da frase que antes fora “linkada” ao cão Nipper, faz referência a um momento importante para a indústria midiática e cultural. Referencia a formação das indústrias que alavancaram a tecnologia e o mecanismo cultural que regeu por décadas boa parcela da estética e do consumo ocidental.A serie tem como objetivo a reflexão sobre os sistemas de manipulação apoiados na indústria cultural, responsáveis pelo direcionamento e cristalização ideológica que configuram o cenário econômico e social contemporâneo. Contexto no qual destacamos uma variedade e diversidade de ferramentas de controle sem igual. A cibercultura proporcionou aos mecanismos de controle novas formas de manutenção ou direcionamento ideológico. A comunicabilidade ganhou uma via paralela cujos limites são praticamente inexistentes, dando ao ambiente novas camadas de interação e manifestação. Publico e privado ganham novos aspectos e reconfiguram os questionamentos quanto aos limites de nossa realidade.A alegoria do fim de mundo se faz presente a cada instante, a cada dia de uma maneira diferente em meio a disputas efervescentes onde o espectador se torna mais um recurso. É interessante perceber que apesar de toda evolução no arsenal utilizado, o objetivo continua gerado pelos impulsos mais antiquados da natureza humana.

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GRÁFICO DA DENSIDADE DOS PELOS DOS MEUS ANTEBRAÇOS CUIDA DOS DE S I #2 (AU TO EXAMES), 2017

ANTONIO GONZAGA AMADOR

nanquim sobre papel. 21x29,7cm.

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Caro Antonio, É bom te reconhecer, desde já agradeço a oportunidade que me abriu para te observar melhor. Diante de teus gráficos me ponho a refletir sobre uma grande questão que tem provocado a todos nós atualmente, qual é a medida da partilha entre eu e o mundo? Me parece que o próprio corpo tem sido o nosso principal campo de investigações, dentro das nossas especificidades temos experimentado as distâncias e proximidades que nos conformam social, política e afetivamente. Sigo acreditando ainda que a arte pode reconfigurar esses lugares. Vejo na sua série Cuidados de si #2 (auto exames) seu desejo de compartilhamento de suas próprias descobertas e sua relação com as delicadezas que sua condição de saúde impõe à sua vida. O que te vejo devolver ao mundo é a experiência de alguém que se redescobriu e se modificou por meio de índices e números num laudo médico, e assim seguirá se acompanhando periodicamente, eu sei que isto não é uma escolha sua. Nosso corpo nos identifica ora por nossas decisões, ora pela forma como chegamos no mundo, também sem muita escolha, e seguimos nesta grande negociação de quem somos e quem queremos ser. Seus auto exames subvertem o que lhe é condicional ao propor essas novas medidas de acompanhamento e cuidado. Me sinto provocada a me conhecer melhor também, mais que isso, a pensar que tipo de parâmetro tenho empregado nesta difícil tarefa. Vejo em ti um gesto de tomada de controle de seu corpo e a oferta para o mundo de desenhos onde você inventa seus próprios contornos, tudo isso é você, é novo e é o de sempre. Me lembrei da série de fotos de Vera Chaves Barcelos, onde a artista ao fotografar se aproxima tanto da

GR ÁFICO DA ACUIDADE VISUAL DO OLHO E S Q U E R D O E D O O L H O D I R E I TO, CUIDA DOS DE S I #2 (AU TO E X A M ES), 2017

nanquim sobre papel 21x29,7 cm

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pele que cria um padrão de desenho abstrato. Aquelas linhas eram parte do corpo de alguém, e ao mesmo tempo eram o corpo de qualquer um. Antonio, quando você se oferece ao mundo nesta profunda intimidade, sinto que falamos deste tipo de proximidade. O corpo ganha uma forma abstrata, e agora é possível nos identificar de uma forma nova, com os padrões que escolhermos. Isso tudo é revolucionário nestes dias difíceis. Obrigada, Natália Nichols

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lugares imaginários

CHRISTINA ZORZETO

D E TA L H E

Essa série de desenhos é um mergulho em lugares imaginários, desde continentes, ilhas, cidades reinos, até árvores e casas. Lugares que refletem o misterioso e o sublime, que habita nosso arcabouço arquetípico e revelam a topografia de nossa intimidade. São lugares preciosos que abrigam nossa fantasia, pois somos o espaço que habitamos. Esses lugares admiráveis, alguns utópicos e outros distópicos, nunca teriam sido criados se não correspondessem a alguma necessidade profunda de expressá-los. A distopia está reinando na contemporaneidade, portanto crio o contraponto, ou seja, a utopia (lugar que não existe) para desafiar o caos. São desenhos que dialogam com pequenos poemas, como os hai kai japoneses e sonatas musicais. Uma reflexão simples a respeito do imaginário, com pontos, linhas, formas, texturas, papel, grafite e fogo, desvelando o “imponderável”. LUG ARES I M AGINÁRIOS, 2017

Papel vegetal, papel arroz, papel artesanal tecido, grafite e fogo. 100 x 25cm


C H R I ST I N A

ZO R Z ETO

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LUG ARES I M AGINĂ RIOS, 2017

Papel vegetal, papel arroz, papel artesanal tecido, grafite e fogo. 100 x 25cm.


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DANIELA PINHEIRO

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TA S O G A R E , 2 0 1 4

vidro. 2,5m de comprimento por 20cm de profundidade com 20cm de altura.


DA N I E L A

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vidro. 2,5m de comprimento por 20cm de profundidade com 20cm de altura.

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Quando iniciei o trabalho de Tasogare procurava outros diálogos com a fotografia, não somente o registro documental. Buscava uma poética visual voltada para o processo de criação por meio da experimentação. Foi entre um vidro e outro sendo materializado no processo dusting on, durante o processo criativo no laboratório fotográfico, junto das imagens clicadas por mim da dançarina de butô Emilie Sugai que surgiu a idéia de fazer um ziguezague com os vidros. Nos vidros, uma bifurcação de passagens onde se torna possível re-dançar a experiência do butô com as imagens do gesto da dançarina. Um ziguezague como um possível DNA. A dança do butô assume que carregamos o que nos antecede, que carregamos a nossa ancestralidade. Trabalhar com o dusting on é um processo que exige persistência e calma, o movimento precisa ser mínimo como no butô. A cada ida ao laboratório, uma nova preparação da emulsão, um novo olhar. Quando comecei o trabalho buscava a perfeição das imagens nos vidros, mas as primeiras imagens ficaram com as marcas de meus gestos, o que me causou um desconforto enorme. Ao longo do processo fui descobrindo que buscava para compor a minha poética justamente o contrário do que inicialmente havia me desestabilizado: transferir para a superfície do vidro, as marcas, um desfazer das camadas do corpo da dançarina de butô, e de certa forma, do meu também. A instalação Tasogare convida o público a interagir com as imagens através das lanternas que estão junto a instalação, fazendo assim o participante realizar suas próprias danças de sombras. Dessa forma, torna-se possível re-dançar experiências do gesto do butô, desencandeadas através da luz e da sombra.

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D E TA L H E

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TA S O G A R E , 2 0 1 4

TA S O G A R E , 2 0 1 4

vidro. 2,5m de comprimento por 20cm de profundidade com 20cm de altura.

vidro. 2,5m de comprimento por 20cm de profundidade com 20cm de altura.


FELIPE FERREIRA DE ALMEIDA 132 133


F E L I P E

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natureza, código e narrativa: notas sobre a produção de felipe ferreira de almeida As imagens de Felipe Ferreira de Almeida utilizam toda forma de representação de natureza que circula no mercado (brinquedos, miniaturas, impressões baratas, etc) organizadas em cenas que reproduzem esquemas de diversos campos de produção de imagem (cinema, documentário, arte, entre outros). Claro, a insistência nas representações de natureza são sintomáticas da impossibilidade de se chegar nela. Podemos dizer que os trabalhos de Felipe tratam de códigos de natureza, representações que se convencionaram na tentativa de acessá-la - a falta de foco nos personagens em primeiro plano no trabalho Sem título (Paraíso de Jeová), da série Cotidiano (a partir de Wilma Martins) reitera a suposta espontaneidade das imagens de documentários do tipo “vida selvagem”, por exemplo. Nesse trabalho, a narrativa mítico-religiosa dos animais que convivem em harmonia é rebaixada a seus códigos mais banais quando o artista organiza uma série de miniaturas de plástico diante de uma imagem idílica, “olhando” para ela. O próprio título reitera a importância das narrativas nessa produção, como se cada elemento progressivamente explicitasse os interesses do trabalho em uma narrativa aberta, religiosa (tomada com alguma distância), afetiva e da própria esfera da arte. A sobreposição desses diversos códigos tem algo de lúdico, ao sugerir que objetos “ganham vida” ou mesmo pela construção doméstica desses cenários, mais na escala da brincadeira de uma criança, que de uma produção hollywoodiana. Mas, se esses trabalhos internalizam uma

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excessiva codificação - da natureza, do espaço doméstico, das experiências subjetivas e sociais das quais, enfim, participam - o fazem com alguma malícia. Ao aceitar as convenções com que lidam, acabam indicando momentos de auto compreensão sobre os materiais em jogo - dos plásticos que compõem boa parte dos utensílios de nossas vidas, aos enquadramentos do cinema ou da publicidade. Nesse sentido, como qualquer trabalho de arte, o cerne das imagens de Felipe está em suas operações com a linguagem. Construir em pequena escala paisagens inteiras ou arranjar miniaturas “agindo” como seus referentes originais, não são tentativas de encontrar um real mais íntegro para além desses esquemas de representação, mas pela internalização desses códigos, deixar escapar contradições de suas narrativas e experiências materiais. Leandro Muniz Abril de 2018

S E M T Í T U L O ( PA R A Í S O D E J E O VÁ ) COT I DI A N O (A PA RT I R DE W I L M A M A RT I N S), 2017

Fotografia. 40 x 60 cm.

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O recital de placas de carros é uma ação de leitura-escritura, entendida enquanto escritura coletiva por entender a cidade – seus transeuntes, suas estruturas físicas e simbólicas – como ordenadora de um texto que surge ao ser captado-cooptado por um sujeito coletivo ou singular. Os motoristas dos carros que passam em frente ao leitor, participam involuntariamente da ação, fornecendo material suficiente para que o texto ossa ser constituído. Nesta ação surge algumas perguntas que movem meu pensamento e minha prática: Que leitura é essa sem escritor? O que se quebra nessa inversão, de um texto que só existe após sua leitura, que não foi escrito para ser recitado, mas só surge quando a voz o convoca? Que leitor é esse que também é escritor? Os outros não são apenas leitores, mas leitura, são leitores e leituras simultanemante. O recital é um trabalho que opera no campo da voz e da escrita, pois após a ação há um processo de tradução e de grafia da voz, que amplia e modifica este texto fornecido pela cidade. Para o arte londr ina 6, a ação foi realizada pelo artista Gabriel Bonfim.

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LETO WILLIAM

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R E C I TA L D E P L A C A S D E C A R R O S (PERFORMER : GABRIEL BONFIM,)2018

ação na cidade.

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L ETO

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W I L L I A M

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MIRELLA MARINO

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M I R E L L A

M A R I N O

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As imagens da série “Estrutura I” foram captadas durante percursos por cidades do Estado de São Paulo e fazem parte de uma pesquisa em que me interessa a apropriação e o processamento de elementos gráficos do contexto urbano. A partir do que se vê durante os trajetos realizados na cidade, nasce o desejo do registro como meio de reflexão, maneira de se apropriar e conhecer o mundo, detendo-se no que se observa numa apreensão mais ou menos demorada. Deste modo, revelam-se desenhos: elementos anonimamente projetados para atenderem uma função, estruturas de suporte outrora escondidas, objetos descartados, rastros. Aquilo que me chama a atenção é, em sua maioria, parte de um grupo de objetos padronizados, produzidos industrialmente e que ao longo do tempo de uso parecem ganhar um caráter próprio, individualizando-se. São estruturas geométricas presentes na cidade, mais ou menos evidentes, detectadas em sua especificidade embora possam parecer repetitivas.

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ESTRUTURAS I SÉRIE COM 4 IM AGENS, 2011/2017

Fotografia Colorida. 10x15cm cada.

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SANTACOSTA

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E S C U LT U R A D E PA I S A G E M , 2 0 1 7

blocos de areia e concreto, tinta acrĂ­lica, ferro. 120x60x21cm.


SA N TAC OSTA

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a construção da m at ér i a A fatura das obras de Santacosta ocorre através da articulação da matéria a partir de suas especificidades. O procedimento utilizado pelo artista se vale da junção de artefatos e materiais diversos, com o intuito de criar tensão pelo modo como se relacionam.O ponto de partida de sua pesquisa mais recente ocorreu por meio da união de aparatos que recebia através de doações ou que eram coletados na rua, e que o estimularam a expandir seu olhar para novos meios de criar, utilizando também itens novos e comprados. O resultado de suas ações têm graça e humor, e seus títulos sugerem uma narrativa cômica, desenvolvida através do arranjo e da história desses componentes, que são em sua maioria, próprios da construção civil.As estruturas se configuram em uma lógica entre a pintura e o objeto. O aspecto pictórico está principalmente no rastro do gesto, ao manipular da matéria, e na cor ácida das tintas; o caráter objetual é o que decorre da soma de elementos, rígidos ou informes, que são posicionados no chão ou na parede. Muitos deles são apresentados em sua forma crua, evidenciando suas propriedades como peso, forma e superfície. Sua volumetria ora é bruta e pesada, ora é leve e instável, o que evidencia a potência do trabalho que também se apresenta nesses apontamentos dicotômicos entre força e fragilidade.Os materiais apropriados, mesmo sendo facilmente identificáveis, perdem sua função inicial e passam a atuar como matéria-prima para essas operações que, de alguma forma, trazem proximidade e estranhamento. De um modo geral, há uma síntese de unidades, o que reforça sua presença corpórica. Roberta Tassinari, 2016 R E S G AT E U N I C Ó R N I O, 2 0 1 6

acrílica e óleo sobre tela, madeira, mdf e fita adesiva. 153x80cm.

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SIMONE FONTANA REIS

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M E TA N Ó I A A P Ó S A T E M P E S TA D E , 2017

acrílica sobre tela. 210 x 250 cm.


S I M O N E

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FO N TA N A

m etanóia após a te m pe stade quer dizer mudança radical no estilo de vida, caráter ou aparência. O trabalho sobre tela se iniciou com calmas linhas retas, como os grafismos que mulheres ameríndias costumam pintar sobre os corpos. O que parecia uma pintura banal, sofreu a força de jatos de água, transformando/a em algo maior, mudando o próprio pensamento, mudando o rumo do meu fazer artístico, expandindo-o em direção ao inexplorado. Essa mudança inesperada das linhas que antes eram retas, acabaram por abordar novos conceitos no meu próprio processo artístico e uma vez aberto este caminho, onde minha vontade controla a força da água, minha metodologia nunca mais será a mesma. O grafismo modificado pelo poder da água, abre uma nova percepção que está além do conhecido, produzindo novos caminhos para mim como artista e também para a vida, na dimensão do espectador. O resultado das linhas retas que após a tempestade se transformam numa aparição, é a materialização daquilo que foi gerado pela criatividade antes mesmo que as palavras a descrevessem. A mais forte das tempestades, o encontro entre Europeus e Ameríndios, transformaram para sempre os grafismos e as culturas deste continente. Sendo artista, eu tateio no escuro e tento melhor compreender o que estou procurando. engenhoca s u tópica s incorporam elementos que compõem meus trabalhos mais recentes, como os grafismos e a Terra Preta de Índio com elementos mais antigos de minha produção, como as orquídeas.

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Faço rios de Terra Preta de Índio com médium de aquarela sobre papel, que ao percorrerem linhas já molhadas, transbordam os grafismos e vão alimentar metaforicamente as plantas desenhadas, que emergem e crescem no fim da cadeia. Quase que evocando os ancestrais, as veias das plantas são preenchidas pelo solo milenar como numa ereção. As linhas antes transparentes dilatam-se com matéria fértil, num jogo de controle e acaso, erro e acerto. Esta engenharia utópica dá vazão a assuntos e reflexões de diversas áreas do conhecimento como ciência, política, antropologia, sociologia, história, ecologia, agricultura, economia e outros assuntos que me inquietam, como o problema da fome e da falta de água, o aquecimento global, o resgate da cultura ancestral, a sobrevivência da floresta e a sustentabilidade. ENGENHOCA S UTÓPICAS II, 2017

acrílica e solo antropogênico sobre tela. 100 x 63cm.

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Estas obras fazem parte da pesquisa que venho desenvolvendo na qual utilizo frequentemente meu corpo em ações performáticas orientadas para a câmera e as apresento em fotografias, vídeos, videoinstalações etc. Utilizo meu corpo para lidar com questões do corpo físico e dos aspectos psicológicos, comportamentais e sociais. Formas de ser e estar no mundo, reconstrução de si, metamorfoses do ser, relações sociais, interpessoais e comportamentos humanos são assuntos que me interessam e estão de certa forma refletidos em meus trabalhos.

S E M T Í T U LO, 2016 C A M E R A : R E G I N A VA L L A D E S , ILUMINAÇ ÃO: MERCEDES ESPÍRITO

vídeo, 02’00”.


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VA L L A D ES

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S E M T Í T U LO, 2016 C A M E R A : R E G I N A VA L L A D E S , ILUMINAÇ ÃO: MERCEDES ESPÍRITO

vídeo, 02’00”.

A U TO R E T R ATO C O M C H AV E D E F E N D A , 2 0 1 6 CAMERA : MERCEDES ESPÍRITO

vídeo, 03’00”.


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pesquisadores

C U R R Í C U LOS R E SU M I D OS

danillo gimenes villa, Professor, artista e pesquisador, é Doutor em Poéticas Visuais pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (2012), mestre em Artes pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas (2003). É professor do Departamento de Artes Visuais da Universidade Estadual de Londrina, nas disciplinas de Desenho e Pintura. Atua como chefe e curador da Divisão de Artes Plásticas da Casa de Cultura da UEL - desde 2011, onde organiza o Arte Londrina. Áreas de interesse: curadoria como partilha, objetos de arte como objetos de uso. felipe scovino, É professor da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Também atua como crítico e curador. Dentre as suas curadorias, destacam-se Lygia Clark: uma retrospectiva (Itaú Cultural, 2012), em parceria com Paulo Sergio Duarte, e a exposição itinerante Abraham Palatnik: a reinvenção da pintura. Publicou em revistas como Artforum, Art Review, Dardo, Arte & Ensaios, dentre outras. elke coelho, Pesquisadora, artista e professora no Departamento de Arte Visual da Universidade Estadual de Londrina. Possui graduação em Educação Artística pela Universidade Estadual de Londrina (2005); especialização em Literatura Brasileira, pela mesma instituição (2007), mestrado em Artes Visuais - Poéticas Visuais - pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2009) e doutorado em Artes Visuais – Poéticas

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Visuais – pela Escola de Comunicações e Artes da USP (2014). Participou de exposições coletivas e individuais, entre elas: 66º Salão Paranaense, MAC-PR/ Museu Oscar Niemeyer, Curitiba (2017); Persistência dos gestos, Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, Portugal (2017); Área de risco, MAC-USP, Universidade de São Paulo (2014); Quando os objetos se tornam abismos, Divisão de Artes Plásticas da Casa de Cultura da UEL (2013); Delicadezas incisivas, Galeria da Faculdade de Artes Visuais, Universidade Federal de Goiânia (2011); Ontem o dia estava assim e outras anotações gráficas, Museu Victor Meirelles, Florianópolis (2010); e Ocorrências Silenciosas, Sala Theodoro De Bona, Museu de Arte Contemporânea do Paraná (2010). Organizadora, juntamente com o artista e professor Danillo Villa, do livro Cartografias Cotidianas (2011), e autora da publicação Coisas de Iracema (2017). manoela maria valério, Formada, em 2003, em Psicologia, pela Universidade Estadual Paulista/Assis/SP, mestre e doutora em Psicologia-Estudos da Subjetividade pela Universidade Federal Fluminense/RJ com temática relacionada às produções de subjetividade no universo circense. Possui experiências em docência, clínica e artes cênicas, especialmente circo e teatro. É co-fundadora, em 2001, da Ong Circuito de Interação de Redes Sociais onde trabalha, especialmente, em ações e projetos culturais. Hoje clinica nas cidades de São Paulo e Campinas.

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das estruturas mínimas às não cores aline moreno, natural de Campinas, SP, vive e trabalha em São Paulo. Bacharel em Artes Visuais pela Escola de Comunicações e Artes. Participou das coletivas: 2º Bienal das artes Sesc -DF, 49º Salão de Arte Contemporânea de Piracicaba, 25º Programa Nascente, 16º Salão Nacional de Artes Jataí, 27º Mostra de Arte da Juventude Sesc Ribeirão Preto, 23º Salão de Arte de Praia Grande. Ganhou prêmio na 27ª Mostra de arte da Juventude do Sesc e menção honrosa no 23º Salão de Praia Grande. Contato: aline.moreno@gmail.com | (11) 95843 6456 andré vechi, queria ser escritor, tornou-se artista e pesquisador. bacharel em artes plásticas pela unb, mestre em linguagens visuais pelo ppgav-eba-ufrj, atualmente cursa doutorado em literatura, cultura e contemporaneidade na puc-rio. integrou e curou mostras no centro oeste, sudeste e sul. entre as principais estão: des tudo, prêmio funarte de arte contemporânea 2014, brasília; verbete #1, 2014, brasília; escrevo para me percorrer, 2018, rio de janeiro. Contato: cargocollective.com/andrevechi | vechi.andre@gmail.com fercho marquéz, (Guaraçaí, 1992, atualmente vive e trabalha em Porto Alegre, Brasil) é formado em licenciatura em Artes Visuais pela UEL-PR e atualmente bolsista CAPES no Mestrado em Poéticas Visuais PPGAV-IA-UFRGS, orientado pela Profa. Dra. Maria Ivone dos Santos, sob o Projeto de Pesquisa As extensões da memória: a experiência artís-

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tica e outros espaços. Participou da exposição individual À Imortalidade da Espera no Centro Histórico-Cultural Santa Casa de Porto Alegre (2017) e exposições coletivas como 1’ do seu silêncio (2018) e Abaixo (2017) ambas na Bibliotheca Pública Pelotense; Paragem (2017) na Pinacoteca Barão de Santo Ângelo do Instituto de Artes da UFRGS; Pertinaz: questão de espaço (2016) na Vila Cultural Grafatório, Londrina; Aviões Precisam de Vento (2017) e Potlach: Trocas desiguais (2014 e 2017) essas na DaP-UEL, Londrina; Corpo Dilatado (2013) na Galeria do CECA-UEL, Londrina. Em sua poética, empreende através de objetos tridimensionais, frequentemente em madeira e glicerina, como também em fotografia e outros meios, questões sobre criação e instauração de processos artísticos, espacialidade, territorialidade e morte, sua pesquisa também perpassa pelo dado da palavra e seus avizinhançamentos com o imaginário, com as interdições, os inacessos do mundo. Contato: feruchomaruquesu@gmail.com | (51) 98301 3275. gilson rodrigues, (Contagem/MG, 1987) vive e trabalha em São Paulo/SP. É Bacharel em Artes Visuais pela UFMG e licenciado pela UEMG. Se dedica a pintura e suas interseções com outras linguagens como o vídeo e a instalação. Em sua produção, além de uma intensa pesquisa sobre o próprio fazer pictórico é recorrente a investigação sobre questões ligadas ao tempo, a memória e a paisagem. O artista participou de exposições individuais e coletivas. Foi premiado no VIII Salão de Itabirito/2017 e na 26ª Mostra de arte da juventude/2016 no SESC de Ribeirão Preto/SP. Contato: www.gilsonrodrigues.art.br | gilsonrodrigs@gmail.com |

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(11) 94819 0967 guilherme moreira,Bacharel em Teoria, Crítica e História da Arte pela UnB, Guilherme Moreira iniciou sua pesquisa visual em 2014 com a série Sobre Madeira cujas esculturas fizeram parte do 21º Salão Anapolino, em 2015. Em 2016 realizou sua primeira exposição individual, Matéria e Derivado, na Galeria de Artes do Centro de Atividades do SESC Palmas, em Tocantins, e sua segunda exposição, homônima, no MARCO de Mato Grosso do Sul, em Campo Grande. Em junho de 2016 e julho de 2017 integrou o corpo de vinte artistas participantes do 15º e 16º Salão Nacional de Arte do MAC de Jataí, em Goiás. Contato: guilherme.tcha@gmail.com | (61) 99200 7525 Gustavo Grazziano, é mestre pela FAU USP, onde desenvolveu a pesquisa Códice: o tempo em suspensão. Atualmente, é pós-graduando em artes visuais na FAAP, onde participou da 49ª Anual de Artes. Foi residente na Residência São João – EAV Parque Lage (2016) e se graduou em programação visual na Universidade Presbiteriana Mackenzie (2012). Contato: ggrazziano.com.br | gustavo.grazziano@gmail.com | (11) 98166 9241 Marcelo Barros, 1977, vive e trabalha em São Paulo. É bacharel em Desenho Industrial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e técnico em Design Gráfico pela ABRA. Cursou O Processo Criativo, ministrado por Charles Watson, e frequenta o grupo de Acompanhamento de Projetos do Hermes Artes Visuais, ministrado pelos artistas Nino Cais,

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Marcelo Amorim e Carla Chaim. Principais exposições: 8º Salão dos Artistas Sem Galeria, nas galerias Patricia Costa, Potrich, Orlando Lemos, Sancovsky e Zipper. Brasil, 2017; Sobre a Pele, na Qualcasa, São Paulo, 2016; Contraprova – Vol.02, no Paço das Artes, São Paulo, 2015. Contato: marcelo@rockinstudio.com | (11) 99404 9289 | (11) 3596 8595 Samantha Canovas, Brasília, 1990. Bacharela artes visuais UnB, 2013, Mestranda em Poéticas Visuais ECA/USP, 2017. Exposição individual: Lembrar que a água circula por debaixo das ondas – Galeria Ponto, Brasilia/DF. Principais exposições coletivas: Praia: paisagem em processo, Biblioteca Brasiliana USP, São Paulo/SP; DEStudo – Funarte, Brasília/ DF; Contingente – FAV UFG, Goiânia/GO. Residência: School of visual artes, NYC. Contato: sscanovas@yahoo.com.br | (11) 99551 6879

opções de fim de de mundo Adolfo Emanuel, graduado em Educação Artística pela Universidade Estadual de Londrina (2010). Desde 2009, tem participado de exposições coletivas e individuais em Londrina e outras cidades, tais como Assis (SP), Ribeirão Preto (SP) e Florianópolis (SC). Contato: www.adolfoemanuel.wixsite.com/adolfoemanuel | adolfoemanuel@hotmail.com | (43) 3339 7259 | (43) 9964 90301

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Ana Takenaka, vive e atua em São Paulo. Formou-se bacharel em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo em 2013, desde então participa de exposições no Brasil e exterior. Está entre as dez finalistas do 92 ANNUAL INTERNATIONAL COMPETITON, The Print Center (EUA), participou da 11ª Biennal of Prints of Liège (Bélgica) como única representante da América Latina; dentre outras exposições e prêmios estão o 44º Salão de Arte Contemporânea Luiz Sacilotto (2016, Santo André, SP) na qual ganhou o Prêmio Aquisição e SP STAMPA (2015). Participou da 5ª Residência Artística Vale do Ribeira e recentemente fez estágio no Molí Paperer de Cappelades (Barcelona). Contato: www.anatakenaka.com | anatakenaka@gmail.com | (11) 97604 7940 Ana Vilela carmo, 21 anos, brasileira, atualmente vive estuda e trabalha em Pelotas - RS; Bacharel em Artes Visuais pela UFPel, aluna do curso de História da Arte com Rodrigo Naves e Vivian Villanova. Participou da Bienal Sesc do Distrito Federal, Novas Poéticas, edição Salvador e Mostra 20 x 20 na Fundação Chico Lisboa POA. www.anajuliavilela. tumblr.com; Contato: @sandaloemachado | anavilelacarmo@gmail.com; | (11) 96577-3036 André Massena, formou-se no bacharelado em pintura e especializou-se em história da arte, no ano de 2010, ambos pela EMBAP. Participou em exposições e salões por todo Brasil. Alguns deles como o 23º Salão de Artes de Praia Grande (SP), no qual recebeu prêmio aquisição; 16º Salão

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Nacional de Arte de Jataí (GO); Bienal das Artes do Sesc (DF); entre outros. O artista também participou de exposições no MAC e Museu Guido Viaro em Curitiba. Sua pesquisa pode ser conhecida através do site. Contato: cargocollective.com/andrevmassena | e-mailandrevmassena@ gmail.com | (041)98415 8404. Antonio Gonzaga Amador, é Mestrando em Estudos Contemporâneos das Artes PPGCA/UFF. Graduado em Pintura pela EBA/ UFRJ em 2013. Participei de cursos e oficinas na Escola de Artes Visuais do Parque Lage entre 2012 e 2014. Dentre as exposições destaca-se a 27° Mostra de Arte da Juventude (Ribeirão preto/SP), sendo um dos artistas premiados; o 35° salão Arte Pará - 2016 (Belém/ PA), premiado como ‘Amador e Jr. Segurança Patrimonial LTDA.’; Contato: www.antonio-amador.com | amador.pintura@gmail.com Christina Zorzeto, graduada em artes plásticas na FASM, especialista em Práxis e Discurso Fotográfico, Arte Educação e História e Teorias da Arte na UEL, mestre em Metodologias para o ensino de linguagens e suas tecnologias na UNOPAR. Ganhou Menção honrosa no Prêmio Brasil Contemporâneo de Artes Plásticas de São Paulo, prêmio aquisição na 15º Mostra Cascavelense de Artes Plásticas, participou do 53º salão paranaense de Curitiba, como também no XXI SARP de Ribeirão preto. Contato: mayarazor@hotmsil.com | (43) 3323 4428 Daniela Pinheiro, é natural de Pelotas/RS. Vive e trabalha em São Paulo/SP. Artista multimídia, jornalista e bacharel em fotografia (SE-

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NAC/SP). Atualmente é Mestranda em Artes Visuais pela UNICAMP. Entre os lugares que já expôs, destacam-se: Centre Flassaders/Espanha; Museu Gregório Álvarez Neuquén/Argentina; MIS - Museu da Imagem e do Som de São Paulo e 8ª Bienal do Mercosul de Porto Alegre/RS. Contato: www.danielapinheiro.com | danielapolaroid@gmail.com | (11) 98690-9106 Felipe ferreira de Almeida, (RJ, 1989) é mestre em Estudos Contemporâneos das Artes pelo PPGCA-UFF. Tem graduação em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal Fluminense. Cursou, em 2015, o Programa de Formação em Práticas Artísticas Contemporâneas (Nível II) na EAV Parque Lage. Tem participado de diversas exposições coletivas e salões: Novas Poéticas – Galeria Cañizares (Salvador, BA); ‘Depois do Futuro’ – Escola de Artes Visuais do Parque Lage (Rio de Janeiro, RJ) ‘No Tempo de Cada Um – Espaço Mangue (Porto Alegre, RS); ‘VI Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia’ – Casa das Onze Janelas (Belém, PA); ‘44º Salão de Artes Visuais Novíssimos’ – Galeria Ibeu (Rio de Janeiro, RJ). Contato: www.ffafelipe.com | ffa.arte@gmail.com | (21) 99781-9633 Leto William, é mestre em Artes Visuais pela Udesc e Licenciado em Artes Visuais pela UEL. Atualmente é professor substituto do Departamento de Artes Visuais da Udesc, ministrando as disciplinas de Artes Midiáticas e Instalação Multimídia. Participa de exposições coletivas e individuais desde 2012 e em 2018 foi residente na Citè International des Artes, em Paris.

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Contato: letouill@gmail.com | (48) 99842 6473 Mirella Marino, é artista visual com formação em Arquitetura e Urbanismos pela Universidade de São Paulo. Participou de exposições no Itaú Cultural e Centro Cultural São Paulo, recebeu o Prêmio Estímulo CPFL pelo trabalho realizado no Museu de Arte de Ribeirão Preto e em 2015 realizou o projeto Vou Voltar, em parceria com Mariana Vaz, contemplado pelo Proac de Artes Visuais 2014. Contato: mirellamarino.art.br | mirellamarino@gmail.com | (11) 99914 -2420 Santacosta, nasceu em 1983 em São Paulo, onde vive e trabalha. Bacharel em design de moda pela Universidade Anhembi Morumbi (2005), também cursou artes visuais na FAAP. Participou de cursos no MAM-SP, Escola Panamericana e na London University of the Arts e atualmente faz parte do grupo de acompanhamento Hermes Artes Visuais. Seu trabalho busca a interação entre pintura e objeto, e como essas mídias se entrelaçam e sobrepõem em suas obras. Partindo de uma colagem de diversos materiais, o artista cria uma colagem entre telas, madeira, blocos de concreto, diferentes tintas, entre outros objetos cotidianos que remetem a uma assemblage urbana, propondo assim uma ativação do espaço que o circunda. Contato: r.santacosta@gmail.com | (11) 98165 9025 | (11) 3892 1448 Simone fontana reis, nasceu em São Paulo em1965 é Mestre pela Central Saint Martins College of Art and Design Londres. Suas práticas

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incluem pinturas, esculturas e instalações. Pesquisa florestas e orquídeas e a comunidade indígena Kadiweu no Brasil Central, visitando-os regularmente. Pesquisa grafismos e a pintura corporal executada exclusivamente por mulheres sul americanas. Exposições: Londres, São Paulo, Nova Iorque e Suécia. Residências pelo Brasil. Em colaboração com cientistas na London School of Tropical Medicine, teve seu trabalho premiado. Foi nominada para New Sensation-2014 pela Saatchi Art e Hot-One-Hundred- Schwartz Gallery, em Londres. Foi selecionada no 66° Salão Paranaense, pelo Museu de Arte de Ribeirão Preto e realizou a instalação Nem tudo que reluz é ouro no Paiol da Cultura em Manaus. Em 2018, participará da exposição Os Novos Viajantes no MUBE-Museu Brasileiro de Escultura, uma colaboração entre cientistas e artistas sobre expedições na Amazônia. Contato: Sifontana1@hotmail.com | (11) 99886-9645 | (11)3022-3597 Viviane Vallades, vive e trabalha em SP. Atualmente é doutoranda em Poéticas Visuais na ECA USP. Realizou Residência Artística no LABMIS em 2016. Exposições recentes: 2017: Mostra LABMIS- no Museu da Imagem e do Som em SP, A nova arte política - Fundação Lauro Campos, 2014/2012: FILE- Festival Internacional de Linguagem Eletrônica em SP, XI Bienal do Recôncavo (BA) em 2012, dentre outros. Contato: vimeo.com/user12826472 | vivianevallades@gmail.com | (11) 98324-6145 (11) 99118-4900

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Este catálogo foi composto em Arno Pro, Graphik e Druk Wide para a capa. O miolo foi impresso em Pólen Bold 80 g/m2 e sua capa em Cartão 250 g/m2. Impressão e acabamento foram feitos em 2018 na Midiograf, Londrina.



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