Panorama Cultural de Roraima - Editora da UFRR

Page 1



Panorama Cultural de Roraima


UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA - UFRR REITOR Jefferson Fernandes do Nascimento VICE-REITOR Américo Alves de Lyra Júnior PRÓ-REITOR DE ASSUNTOS ESTUDANTIS E EXTENSÃO Vladimir de Souza Conselho Editorial da PRAE/UFRR Américo Alves de Lyra Júnior Flávio Corsini Lirio Geyza Alves Pimentel Maria das Graças dos Santos Dias Nilza Pereira de Araújo Parmênio Camurça Citó

Editora da UFRR Diretor da EDUFRR Cezário Paulino B. de Queiroz Conselho Editorial Alexander Sibajev Edlauva Oliveira dos Santos Cássio Sanguini Sérgio Guido Nunes Lopes Gustavo Vargas Cohen Lourival Novais Néto Luis Felipe Paes de Almeida Madalena V. M. do C. Borges Marisa Barbosa Araújo Rileuda de Sena Rebouças Silvana Túlio Fortes Teresa Cristina E. dos Anjos Wagner da Silva Dias

O livro Panorama Cultural de Roraima é uma síntese dos trabalhos escritos por grupos participantes do Projeto “Curso de Extensão em Gestão Cultural”, promovido pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), por meio da Fundação Ajuri, e com financiamento da Secretaria de Articulação Institucional (SAI) do Ministério da Cultura (MinC). Contato Universidade Federal de Roraima Coordenação de Cultura – Sala 417, bloco IV/UFRR, Campus do Paricarana E-mail: curso.gestaocultural@ufrr.br, cultura@ufrr.br Site: http://ufrr.br/gestaocultural/

Editora da Universidade Federal de Roraima Campus do Paricarana – Av. Cap. Ene Garcey, 2413, Aeroporto CEP: 69.304-000. Boa Vista –RR- Brasil. E-mail:editora@ufrr.br Fone: + 55 95 3621 3111 A Editora da UFRR é filiada à:


UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA

Panorama Cultural de Roraima Organização

Selmar de Souza Almeida Levino Flávio Corsini Lirio

EDUFRR Boa Vista/RR 2016


Copyright@2016 Editora da Universidade Federal de Roraima Todos os direitos reservados ao autor, na forma da Lei. A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação dos direitos autorais (Lei n.º 9.610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal.

Equipe Técnica Coordenação Geral SELMAR DE SOUZA ALMEIDA LEVINO Coordenação Pedagógica FLÁVIO CORSINI LIRIO Coordenação Técnica DANILO MARTINS DO NASCIMENTO Apoio Técnico da Coordenação EUNICE ALVES DE OLIVEIRA Coordenação Executiva ELISA HATSUE BRITO YOSHIHARA Supervisão de Conteúdo JOSIMAR OLAVO DANTAS Revisão Ortográfica ELIABE DOS SANTOS PROCÓPIO Revisão de Normas Técnicas LAYONIZE FÉLIX CORREIA DA SILVA Projeto Gráfico e Diagramação GREICE REJANE MORAES VAZ


Sumário

APRESENTAÇÃO

09

ALTO ALEGRE Alto Alegre/RR: desafios, especificidades e construções do sistema cultural

16

AMAJARI Levantamento sobre a cultura do município de Amajari

29

BOA VISTA Levantamento dos equipamentos culturais do município de Boa Vista

39

BONFIM O município de Bonfim/RR: cultura e seus desafios

51

CANTÁ Festa na comunidade: um olhar sobre a cultura do município do Cantá/RR

64

CARACARAÍ Breve diagnóstico da situação da cultura no município de Caracaraí/RR

74

CAROEBE Diagnóstico cultural do município de Caroebe

85

IRACEMA Diagnóstico cultural do município de Iracema

99

MUCAJAÍ A política cultural no município de Mucajaí/RR

111

NORMANDIA Normandia – (in)visibilidade das manifestações culturais no município: uma abordagem introdutória, situacional e contextual

127

PACARAIMA Política cultural de Pacaraima

141

RORAINÓPOLIS Diagnóstico situacional da cultura do município de Rorainópolis/RR

148

SÃO JOÃO DA BALIZA Diagnóstico dos atrativos culturais de São João da Baliza: apontamento das potencialidades turísticas

164

SÃO LUIZ O município de São Luiz e suas riquezas culturais: balanço e perspectivas

178

UIRAMUTÃ Diagnóstico situacional da cultura do município de Uiramutã/RR: abordagens e sistematizações iniciais

194

RORAIMA Diagnóstico da gestão cultural do Governo do Estado de Roraima

210



Apresentação

A política de cultura na última década tem sido debatida em todo o território nacional por meio de conferências e outras articulações conduzidas pelo poder público com o objetivo de construir o Sistema Nacional de Cultura (SNC). Dentro desse contexto, o Ministério da Cultura (MinC) também tem financiado diversos cursos de formação, dentre os quais uma plataforma voltada a gestores culturais, cuja finalidade é subsidiar o trabalho desses agentes na constituição de planos locais e na inserção dos municípios e estados no SNC. Este livro é uma síntese dos trabalhos produzidos pelo grupo de participantes do Curso de Extensão em Gestão Cultural promovido pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), executado pela Fundação Ajuri e financiado pela Secretaria de Articulação Institucional (SAI) do MinC. Trata-se de um apanhado geral sobre a política cultural dos municípios de Roraima e um capítulo referente ao estado. O primeiro capítulo se refere ao município de Alto Alegre, e apresenta uma visão panorâmica da gestão cultural do município. Trata-se de uma pesquisa qualitativa realizada por meio de análise documental e entrevistas semiestruturadas com representantes da área cultural do município. Realizouse levantamento sobre a construção do Sistema Municipal de Cultura: análise das atividades desenvolvidas pela Secretaria Municipal de Cultura, conferência municipal de cultural e das expressões culturais presentes na realidade local. Dentre os resultados, apresentam-se elementos relacionados ao “fazer cultural, suas fragilidades, os desafios, os obstáculos e as particularidades de Alto Alegre”. O segundo capítulo apresenta as particularidades culturais do município de Amajari. A pesquisa qualitativa utilizou como instrumentos a análise documental por meio de levantamento de dados junto aos órgãos públicos e sujeitos da área de cultura. Observa-se que, desde 2012, o poder público local não tem envidado esforços para discutir o Plano Municipal de Cultura (PMC) vinculado aos princípios estabelecidos pelo MinC na constituição Panorama Cultural de Roraima

|

9


do SNC. A reflexão espelha um levantamento sobre os passos dados para constituição do PMC e as etapas que ainda necessitam ser realizadas nesse propósito. Consideram-se o planejamento e o registro das atividades culturais como primordiais “para preservação da memória histórica e da publicação das ações, sejam elas em curso ou finalizadas”. O terceiro capítulo sobre o município de Boa Vista destaca um apanhado geral sobre o contexto histórico da capital de Roraima que concentra dois terços dos habitantes do estado. O estudo de cunho qualitativo se centrou no levantamento bibliográfico sobre o conceito de política cultural e informações com o objetivo de atualizar a análise sobre os equipamentos culturais presentes em Boa Vista (tipos, preservação e conservação). Os dados apresentam uma diversidade cultural por meio de diferentes manifestações. No que concerne ao debate sobre as políticas culturais com intuito de viabilizar a construção da política municipal de cultura, a capital se apresenta tímida nessa discussão. O quarto capítulo se debruça sobre a realidade cultural do município de Bonfim, localizado na divisa com a Guyana. A pesquisa qualitativa objetivou levantar dados sobre a política cultural local para subsidiar o diagnóstico da realidade situacional da cultura do município de Bonfim. Realizaram-se pesquisas bibliográficas, análises documentais no período entre 2003 e 2015. Também se coletaram dados de órgãos públicos federal, estadual e municipal, publicações impressas e virtuais. A finalidade foi “identificar, descrever e analisar as fragilidades, desafios e obstáculos que precisam ser superados para o desenvolvimento da cultura do município”. Em 2015, o município criou o departamento de cultura. Atualmente aguarda a concretização da adesão do município ao SNC, cuja documentação está sob diligência do MinC. O texto também apresenta dados que revelam uma realidade frágil sobre os equipamentos culturais do município. O quinto capítulo apresenta a contextualização cultural do município do Cantá. O trabalho aponta subsídios sobre a realidade cultural do município que poderão contribuir para o diagnóstico local. Utilizou-se referencial teórico sobre política cultural e pesquisa de campo – análise documental e entrevistas semiestruturadas. O levantamento das festas, grupos de danças, apresentações de coral e outras manifestações culturais dão ênfase para as comunidades indígenas. O Cantá conta com uma Secretaria Municipal de Cultura. No entanto, os demais instrumentos legais para composição do Sistema Municipal de Cultura não estão sendo viabilizados a partir da análise do grupo. O sexto capítulo é sobre o município de Caracaraí. O trabalho apresenta um levantamento da realidade da cultura municipal. A pesquisa de viés qualitativa utilizou a análise documental e entrevistas semiestruturada na captação dos dados. O objetivo foi identificar as manifestações, equipamentos e legislação pertinente à área de cultura. Também buscou mapear fragilidades, desafios e obstáculos a serem superados com a finalidade de pensar o sistema municipal de cultura. “Os resultados apontam que o município apresenta um grande potencial na área cultural. Porém, a realidade encontrada aponta para 10

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


uma série de dificuldades pela falta de incentivos e apoio à cultura por parte de empresas privadas” e do próprio poder público, por apresentar ações consideradas pontuais no campo da cultura. O sétimo capítulo trata do município de Caroebe, cujo acesso ocorre pelas rodovias BR-174 e BR-210. A pesquisa de cunho qualitativa (descritiva e exploratória) baseou-se em análise documental por meio de levantamento realizado nos órgãos públicos locais, pesquisa em meio eletrônico e entrevista semiestruturada junto à população e membros da área de cultura. Os dados apontam dificuldades de registros sobre a história de Caroebe. O município conta com o departamento de cultura, e a lei que cria a Secretaria Municipal de Cultura se encontra na Câmara de Vereadores: “Caroebe é um município que possui um grande potencial cultural, mas que necessita de uma atenção especial por parte dos governantes, para conseguir alavancar a cultura, valorizando e dando apoio aos agentes e/ou produtores culturais”. O oitavo capítulo é relacionado ao município de Iracema, o qual objetiva apresentar um diagnóstico cultural de Iracema. Os instrumentos de coleta de dados foram análise documental, pesquisa bibliográfica e aplicação de questionário, os quais apontam para uma valorização dos artistas locais com destaque para os bens culturais naturais, materiais e imateriais. O grupo identificou que “as políticas públicas de cultura começam a dar bons resultados”. O nono capítulo se refere ao município de Mucajaí. A pesquisa de cunho qualitativa utilizou a aplicação de questionário para compreender a percepção da população e dos membros da área da cultura sobre a situação da cultura local. O levantamento apresentou, por meio da literatura e da história oral, o registro sobre a raiz cultural do município por meio da presença de “povos silvícolas, Macuxis e Yanomamis”. Essas populações são as bases das manifestações culturais. Também apresenta dados concretos sobre os caminhos percorridos na constituição do Sistema Municipal de Cultura por meio da Secretaria Municipal de Cultura (SEMCET), criação do Conselho Municipal de Política Cultural (CMPC), realização da Conferência Municipal de Cultura, e as articulações de pactuação e deliberação para construção do Plano Municipal de Cultura (PMC) e o Sistema Municipal de Financiamento à Cultura (SMFC). O décimo capítulo se refere ao município de Normandia. Os autores investigaram o contexto cultural por meio do levantamento de registros da memória, trajetórias, eventos sociais e políticos. Nesse contexto, destacamse as “práticas culturais vivas, que são mantidas nas comunidades indígenas como parte da tradição milenar de seus detentores”. O levantamento do grupo apontou uma bibliografia restrita sobre a cultura local. Pois, os pesquisadores salientaram que tiveram dificuldades de acesso aos dados municipais. O undécimo capítulo é sobre o município de Rorainópolis. O trabalho apresenta um diagnóstico situacional da cultura de Rorainópolis. A pesquisa foi realizada por meio de análise documental, pesquisa bibliográfica e entrevistas semiestruturadas. O diagnóstico identificou uma diversidade cultural por

Panorama Cultural de Roraima

|

11


meio do levantamento de diferentes manifestações populares e expressões culturais (arte, saberes e fazeres). Outro dado significativo é sobre a fragilidade do poder público local na execução da política cultural. O duodécimo capítulo apresenta um balanço da política cultural de Pacaraima. A pesquisa é de natureza qualitativa e descritiva, e utilizou a análise documental e a aplicação de questionário junto à população de diferentes etnias que residem no município a mais de 10 anos. Desse modo, elaborou-se um breve inventário sobre a realidade local e as diferentes atividades culturais realizadas. Os dados sinalizam uma preocupação com a valorização cultural e o fortalecimento local do turismo como opção de geração de emprego e renda à população do município. Destaca-se a prevalência da cultura indígena, as peculiaridades das paisagens naturais e a condição fronteiriça com a Venezuela. Ainda assim, os autores salientam que é preciso mais comprometimento do poder público e dos sujeitos que fazem cultura do que um calendário de evento e algumas leis. O décimo terceiro capítulo trata do município de São João da Baliza, localizado ao sudeste do Estado, e interligado aos demais municípios pela BR210. A pesquisa qualitativa por meio de análise documental levantou dados com o objetivo de realizar um diagnóstico cultural do município. A identificação das festividades e dos pontos turísticos revelam a diversidade cultural que marca a identidade cultural de São João da Baliza. De acordo com a análise empreendida, “O turismo cultural ainda é pouco abordado, e o planejamento e a gestão dessa atividade estão ainda pouco amparados em São João da Baliza”. O décimo quarto capítulo se refere ao município de São Luiz do Anauá. A pesquisa de cunho qualitativa utilizou a entrevista e a análise documental como instrumentos de coleta de dados. Os entrevistados são membros da comunidade e sujeitos da área de cultura. Também se utilizaram fotos de paisagens e levantamento de manifestações culturais do município. O mapeamento e registros das manifestações e expressões culturais desse município indicam a diversidade cultural e a presença de tradições nordestinas, sulistas e de comunidades indígenas. Dessa maneira, constataram que “São Luiz tem um grande potencial cultural, possui vários segmentos culturais, tais como: música, dança, capoeira, teatro, artes plásticas, artesanato, audiovisual e artes visuais.” O décimo quinto capítulo é sobre o município de Uiramutã. Por meio de entrevistas com autoridades locais, artesões e pessoas antigas do município, realizaram-se relatos sobre a cultura local, análise documental e visitas a equipamentos culturais. O artigo apresenta uma breve descrição históricogeográfica que abarca características da economia local, de manifestações e registros culturais material e imaterial. Percebe-se que há “uma diversidade cultural e patrimonial do município, a gestão da cultura por parte do governo municipal ainda precisa se estruturar, principalmente do ponto de vista das políticas públicas”.

12

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


O décimo sexto capítulo aborda o estado de Roraima. O texto se baseia em uma pesquisa de abordagem qualitativa hermenêutica de caráter exploratório. Os instrumentos de coleta de dados foram: análise documental, utilização de fontes primárias e secundárias e entrevista semiestruturada. A definição de políticas públicas e as ideias de patrimônio cultural natural, material e imaterial embasam teoricamente o estudo em tela. O levantamento aponta uma diversidade cultural material e imaterial, com ênfase nas populações indígenas (danças, culinárias, artesanatos e música) e outras tradições como populações de origem nordestina. A gestão estadual de cultura tem se articulado no sentido de efetivar o Sistema Estadual de Cultura inserido ao SNC. O presente artigo caracteriza o cenário da gestão da política cultural em Roraima: “O entendimento é o de que a política estadual deve agir em sintonia com aquela desenvolvida pelo MinC, para todas as modalidades referente às setoriais. Neste sentido, surge um momento oportuno, em que diversas iniciativas de setores públicos e privados articulam esforços para construir um conjunto de indicadores confiáveis sobre a cultura no estado de Roraima”. A presente publicação é um marco para a gestão cultural de Roraima. O livro apresenta um mosaico que revela a diversidade cultural e os caminhos da gestão pública de cultura nos municípios e no estado e sua inserção na discussão do SNC. É um registro que consolida parte do processo de formação oferecido pela UFRR, financiado pela SAI/MinC. Prof. Dr. Flávio Corsini Lirio Coordenador Pedagógico

Fotografia: Acervo do Projeto

Panorama Cultural de Roraima

|

13


Fotografias: Acervo do Projeto

14

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Fotografia: Layrine Oliveira

Panorama Cultural de Roraima

|

15


ALTO ALEGRE/RR: desafios, especificidades e construções do sistema cultural Celijane Viana Nunesa, Chloé Virginie Marie Bourgy Noletob, Edgar Jesus Figueira Borgesc, Gerson Barreto de Oliveirad, Leila Adriana Baptagline

INTRODUÇÃO Este ensaio objetiva compreender a situação atual da cultura no município de Alto Alegre/RR com intuito de construir o Plano Municipal de Cultura. Como objetivos específicos tem as seguintes articulações: verificar a situação atual da cultura; identificar as fragilidades, desafios e obstáculos apresentados na parte cultural; identificar as particularidades culturais. Desta forma, nosso problema de investigação se articula para entender: qual a situação atual da cultura no município de Alto Alegre/RR. Para isso, utilizamos como metodologia de trabalho o estudo de caso, o qual se caracteriza por concentrar-se em casos particulares que podem ser representativos de casos semelhantes, fundamentando generalizações e autorizando inferências (SEVERINO, 2007). Inicialmente realizamos uma análise documental das legislações e documentações de Alto Alegre/RR. Análise documental, segundo Lakatos (2009), é uma metodologia caracterizada pela representação condensada das informações obtidas a partir de documentos. Para complementação dos dados, foram realizadas entrevistas com pessoas que participaram da ocupação da área que deu origem ao município de Alto Alegre. Após coleta de dados, foram feitas análises no intuito de compreender a atual situação da cultura no município. Estes dados serão de extrema relevância para a posterior construção do Plano de Cultura do Município de Alto Alegre/RR. No desenvolvimento do trabalho, observamos a seguinte estruturação: na parte 2, temos a Realidade Histórica, Social e Econômica do Município; na parte 3, temos o Diagnóstico Situacional da Cultura no Município e, na parte 4, temos a Situação da Política Cultural do Município. Após a apresentação geral dos dados, segue a análise a partir de categorias que delineiam a situação cultural de Alto Alegre/RR.

16

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Servidora da Prefeitura de Alto Alegre, Bacharel em Teologia, e-mail: celijanenunes@gmail.com a

Servidora do Instituto Boa Vista de Música - IBVM, Graduada em Mediação Cultural e Comunicação, e-mail: chloebourgy@gmail. com b

Servidor da Universidade Federal de RoraimaUFRR, Especialista em Comunicação Social: assessoria de comunicação e outras tecnologias, e-mail: edgarjfborges@gmail.com c

Servidor da Prefeitura de Alto Alegre, e-mail: gerso. barreto2011@gmail.com d

Orientadora do Trabalho de Conclusão do Curso de Extensão em Gestão Cultural - UFRR/MinC, professora da Universidade Federal de Roraima, Doutora em Educação, e-mail: leila. baptaglin@ufrr.br e


1 SITUAÇÃO CULTURAL DE ALTO ALEGRE/RR Este item busca trazer algumas reflexões sobre Alto Alegre/Roraima e a situação política da cultura. Para isso, a reflexão se baseia nos dados coletados e nas entrevistas realizadas no município. 1.1 CONTEXTUALIZANDO O MUNICÍPIO Figura 1 - Mapa de Alto Alegre

Fonte: RORAIMA (2012).

O município de Alto Alegre foi criado em 1982, a partir do desmembramento do município de Boa Vista. Limita ao norte com o município de Amajari; ao sul com os municípios de Mucajaí e de Iracema, além da República Bolivariana da Venezuela; ao leste com o município de Boa Vista e ao oeste, novamente, com a República Bolivariana da Venezuela. Possui extensão territorial de 25.567,014 km² e densidade demográfica de 0,64 hab/km². Sua sede está localizada a 87 km de Boa Vista, capital de Roraima. Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2015a), Alto Alegre é o quarto município mais habitado de Roraima, com população estimada de 16.176 pessoas. Entre os 15 municípios do Estado, Alto Alegre ocupa a 13ª colocação no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), de acordo com dados do Atlas Brasil 2013 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Em 2011, o Produto Interno Bruto (PIB) de Alto Alegre foi de R$ 173 milhões, o quinto maior de Roraima. O município conta com três vilas: Reislândia, São Silvestre e Taiano. Seu território abriga nove terras indígenas: Anta, Barata/Livramento, Boqueirão, Mangueira, Pium, Raimundão, Sucuba,

Panorama Cultural de Roraima

|

17


Truaru e Yanomami. Estas terras são ocupadas pelas etnias Wapichana, Makuxí e Yanomami. De acordo com o IBGE, Alto Alegre é o oitavo município da região Norte e o segundo de Roraima com a maior população indígena, sendo 7.544 dos residentes recenseados como pertencentes a alguma etnia. Isto equivale a 45,9% da população. 1.2 PERFIL HISTÓRICO Alto Alegre foi elevado à categoria de município pela Lei Federal n.º 7.009, de 01 de julho de 1982, quando foi desmembrado de Boa Vista. Tem a sua sede no atual distrito de Alto Alegre, anteriormente denominado Colônia de Alto Alegre. A sede do município é formada atualmente por sete bairros: Centro, Azul, Mutirão, Maria Benta Dias, Novo Horizonte, Imperatriz e Frederico Pinheiro Viana. As primeiras ocupações feitas por não-índios na região datam dos anos 1950, quando colonos japoneses foram incentivados a trabalhar com agricultura, formando a Colônia Agrícola Coronel Mota, atual vila do Taiano. A ocupação da área que viria a se constituir como a sede do município de Alegre começou somente em 1970, quando um grupo de 18 migrantes nordestinos, vindos do Maranhão e liderados pelo agricultor Pedro Costa, que viria a ser o primeiro prefeito do município, decidiu reunir-se para plantar arroz nas terras devolutas da região. A primeira área a ser trabalhada como lavoura ficava colada na fazenda Manga Brava, de propriedade do fazendeiro João Cenésio, paraibano que ocupava a área desde a década de 1960. Para ocupar o terreno, à época classificado como área devoluta1, Pedro Costa decidiu pedir permissão ao fazendeiro João Cenésio, evitando possíveis desentendimentos. O senhor João Cenésio, atualmente com 86 anos, conta que foi procurado por Costa e “autorizou” o plantio com a condição de que fizesse uma cerca para evitar que o gado da fazenda Manga Brava comesse as plantações dos novos vizinhos (informações verbais)2. Aí ele veio falar comigo. Disse “Seu João, eu queria falar com o senhor que lá no Maranhão já tá meio ruim pra gente desenvolver e quero ver se, depois de suas terras, o senhor dá o consentimento pra nós entrar pra trabalhar. Nós somos mais ou menos de 15 a 18 pessoas”. Aí eu digo: “Oia, Pedro, aqui a cerca é a mata. O meu gado pasta aqui mas não tenho cerca, não. Eles comem aqui nuns cantos que eu fechei mas pra lá é mata bruta, eles vai e volta. E aí, a cerca?”. Ele disse: “Não se incomode, que a cerca nós se ajunta tudo e faz pro gado não passar lá pra nossas roças, pro nosso trabalho”. Então eu aceitei (informações verbais)3.

O fazendeiro relembra ainda que o grupo enfrentou muitas dificuldades no começo, pois não tinha recursos financeiros para comprar equipamentos e para se alimentar: “Eles sem nada para poder trabalhar. Cumé que a pessoa vem pra uma mata dessas, 16, 18 homens sem nada? Sem feijão, sem farinha, nem carne, nem nada, nem dinheiro?”, conta o entrevistado (informações verbais)4. 18

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Terra pública que não integra patrimônio particular, mesmo que estejam irregularmente em posse de particulares. 1

Entrevista concedida por João Cenésio, em Alto AlegreRR, em maio de 2015. 2, 3, 4


Procurado por Pedro Costa, João Cenésio conta que foi avalista de 18 empréstimos feitos pelos agricultores no Banco do Brasil: “Tá mais ou menos com uns 40 anos. Nesse tempo era um conto e quinhentos para cada um. [...] Na base de hoje era como 300 mil reais. E eu assinei com esta mão. [...] Esses homens trabalharam e só teve um que não me pagou. Ainda hoje me deve”, destaca (informações verbais)5. Entre os parentes e conhecidos de Pedro Costa, todos vindos da cidade de Vitorino Freire (MA), estava João Mariano da Costa, seu pai. Foi ele, conforme relato de João Cenésio, quem deu nome de Alto Alegre à futura cidade, homenageando uma localidade do Maranhão. “Ele olhou e disse que era bonito como Alto Alegre. Eu perguntei se ele achava bonito esse nome. Disse que sim e eu falei: então, de hoje em diante, que Alto Alegre seja. Você botou o nome e eu batizo” (informações verbais)6. Para se deslocar até Boa Vista, o grupo gastava um dia inteiro. “Saíamos de casa 4 da manhã e chegávamos em Boa Vista sete da noite”, relembra o agricultor Raimundo Pinheiro Viana, que também integrou o grupo que inicialmente ocupou as terras (informações verbais)7. Por volta de 1973/1974, conforme Viana foi construída pelo governo municipal uma estrada ligando a região a Boa Vista. A obra foi determinada pelo prefeito Júlio Augusto Magalhães Martins, que decidiu ir visitá-los na lavoura após ter tomado conhecimento do grupo de agricultores que estava plantando arroz e hortaliças no meio da Mata Geral (informações verbais)8. Em um jipe, relembra Viana, que o prefeito e sua equipe: chegaram quando estava todo mundo junto. Viram a situação, o que tínhamos para vender e que não podíamos tirar. Não tinha como escoar, né? Ele prometeu que ia fazer uma raspagem, uma estrada pra nós poder tirar o legume. (...) Com dois dias a máquina chegou fazendo a raspagem. Fomos bater em Boa Vista já acompanhando no carro deles. Fretamos um caminhão e levamos 200 sacos de arroz. (...) Beneficiamos lá e enchemos Boa Vista de arroz pra todo canto. Trocamos em óleo, sabão, açúcar, em café e ficou um monte de arroz lá dentro do depósito do governo (informações verbais)9.

Entrevista concedida por João Cenésio, em Alto AlegreRR, em maio de 2015. 5, 6

Entrevista concedida por Raimundo Pinheiro Viana, em Alto Alegre-RR, em maio de 2015. 7, 8

Entrevista concedida por Raimundo Pinheiro Viana, em Alto Alegre-RR, em maio de 2015. 9

A vida de trabalho na roça não deixava muita margem para diversão. O lazer dos homens era jogar futebol aos domingos, conforme Valdemar Costa, que também integrou o grupo de 18 maranhenses que foi trabalhar na agricultura na Mata Geral, como era conhecida antes a região (informações verbais)10. Outra opção era ir dançar nas festas e comemorações realizadas nas fazendas e comunidades indígenas das redondezas (informações verbais)11. Com o passar do tempo, os agricultores decidiram fundar um clube para organizar ações de lazer e de solidariedade, ajudando-se entre si. O pioneiro clube 4S (Saúde, Saber e Sentir para melhor Servir), liderado por Raimundo Viana e Cananeu Reis, foi responsável por diversas atividades deste tipo (informações verbais)12.

Entrevista concedida por Valdemar Costa, em Alto Alegre-RR, em maio de 2015. 10,11,12

Panorama Cultural de Roraima

|

19


2 DIAGNÓSTICO MUNICÍPIO

SITUACIONAL

DA

CULTURA

NO

Ao tratarmos das questões relativas ao Patrimônio Cultural, temos que ter em conta que, foi a partir do Decreto Lei n.º 25, de 30 de novembro de 1937, que temos o início das normativas para a preservação do Patrimônio Histórico e Artístico. No entanto, a Constituição Federal de 1988 revitalizou e ampliou o conceito de patrimônio apresentando-o, embora ainda com divisões, como Patrimônio Cultural. Com base nestas considerações, no Município de Alto alegre, de acordo com as Metas do Plano Nacional de Cultura, considera o patrimônio cultural como um vetor econômico, com forte potencial para [...] gerar dividendos, produzir lucro, emprego e renda, assim como estimular a formação de cadeias produtivas que se relacionam às expressões culturais e à economia criativa. É por meio dessa dimensão que também se pode pensar o lugar da cultura no novo cenário de desenvolvimento econômico socialmente justo e sustentável (BRASIL, 2012, p.18).

Umas das primeiras ações da Secretaria Municipal de Cultura (SEMC/ AA) após a sua criação em 2013, foi promover um levantamento situacional da cultura no município. Um questionário aplicado em 12 comunidades indígenas (Sucuba, Ramundão I, Ramundão II, Arapúa, Livramento, Pium, Anta I, Anta II, Barata, Bouqueirão, Mangueira, Brasília), nas agrovilas Reislândia (antiga Paredão) e Taiano, além da sede do município, resultou no mapeamento de parte dos fazedores de cultura em Alto Alegre. A equipe da SEMC/AA percorreu, ao todo, 660 km apresentando o questionário em festejos e outros eventos. O trabalho começou a ser feito em agosto de 2013 e foi concluído em outubro do mesmo ano, ficando sem mapeamento apenas a vila São Silvestre, que não foi visitada por falta de transporte para levar os servidores da Secretaria até a localidade. Assim, temos que o mapeamento e o inventário cultural do município estão sendo elaborados. Por enquanto, foram identificados 45 representantes de diversos segmentos culturais: artesanato, dança, música (coral, bandas de rock, gospel e forró), manifestações de cultura popular (bumba meu boi e quadrilha junina), artes visuais, cultura indígena, produção audiovisual, teatro e cultura afro-brasileira. Cabe destacar que os artesãos catalogados são, em sua maioria, de origem indígena. Tanto eles como os artesãos residentes na área urbana desenvolvem seus trabalhos com diversas técnicas, predominando a pintura em pano, o entalhe em madeira e o uso de sementes, cipós e fibras diversas. Juntamente com esse levantamento, a equipe da SEMC/AA iniciou o trabalho de catalogação do patrimônio histórico do município. Neste sentido, destacamos que a ação começou a ser feita a partir de uma visita técnica à vila Taiano. Esta localidade, antigamente denominada colônia agrícola Coronel Mota, foi a sede das primeiras ocupações feitas por não-índios na região. Isto aconteceu nos anos 1950, quando colonos japoneses foram incentivados a trabalhar com agricultura no estado de Roraima, tendo recebido terras naquela parte do atual município. 20

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Na vila Taiano, foi constatada a existência de um conjunto de aproximadamente 25 casas construídas pelos primeiros habitantes da localidade. Algumas apresentam bom estado de conservação, outras sofreram leves modificações e outras foram totalmente modificadas pelos atuais moradores. Após o mapeamento das casas, foi encaminhado, ainda em 2013, um relatório da SEMC ao prefeito de Alto Alegre, no qual se destaca a importância da conservação do patrimônio histórico do município. Partindo deste documento, o prefeito determinou a elaboração de uma lei municipal de patrimônio. A referida legislação está sendo elaborada pela assessoria jurídica da Prefeitura. Quanto ao patrimônio imaterial, entendemos que são os ofícios e saberes artesanais, as maneiras de pescar, caçar, plantar, cultivar e colher, de utilizar plantas como alimentos e remédios, de construir moradias, as danças e as músicas, os modos de vestir e falar, os rituais e festas religiosas e populares, as relações sociais e familiares que revelam os múltiplos aspectos da cultura cotidiana de uma comunidade (INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL, 2012, p. 19).

Sendo assim, destacamos que, em Alto Alegre, há representantes das culturas ameríndias às afro-brasileiras, além de escritores e compositores como Didi do cordel, Maria Valdeires de Matos Paiva (compositora do hino do município) e Jacob Rufino de Souza, poeta e autor de mais de 10 livros que abordam temas como plantas medicinais e contos amazônicos. A cultura nordestina também está fortemente presente no cotidiano do município, seja na alimentação, nos termos usados rotineiramente nas conversas ou nos ritmos musicais mais ouvidos pelos munícipes, a exemplo do forró. A herança nordestina também está presente nas danças tradicionais, tendo o seu maior exemplo no grupo de bumba meu boi Douradinho, liderado pelo senhor Raimundo Carin. Neste sentido, ao tratarmos do patrimônio imaterial, há também os festejos locais que retratam a história da comunidade e sua vinculação com os migrantes e com a região. No calendário de festejos do município, temos diferentes eventos que retratam este patrimônio. Além destes patrimônios imateriais, temos os patrimônios naturais que, segundo Zanirato (2009, p. 138), “abrangem os valores científicos os que se encontram em áreas que contenham formações ou fenômenos naturais relevantes para o conhecimento da história natural do planeta”. Entre os patrimônios naturais de Alto Alegre, temos cachoeiras, igarapés e rios que são utilizados como balneários pela comunidade residente e por visitantes do município, demostrando grande potencial turístico e gerador de renda.

Panorama Cultural de Roraima

|

21


3 SITUAÇÃO DA POLÍTICA CULTURAL DO MUNICÍPIO ALTO ALEGRE No que concerne à Política Cultural do Município de Alto Alegre, temos que levar em consideração que esta vem regimentada pelo Plano Nacional de Cultura (PNC) e pelo Sistema Nacional de Cultural (SNC). Com base nestas políticas de incentivo ao desenvolvimento da cultura, percebemos que o Estado de Roraima e seus municípios vêm a passos lentos organizando seu sistema cultural. No município de Alto Alegre, podemos evidenciar algumas leis que regem a estrutura cultural do município, dentre elas: Lei Orgânica do município (que tem artigos que falam sobre cultura), Lei do Sistema Municipal de Cultura, Lei de criação da Secretaria Municipal de Cultura (SEMC), Lei de criação do SMC e Lei de criação da Biblioteca Pública Municipal. Com base nessas leis que regem o espaço cultural do município, temos que o órgão gestor de cultura é a SEMC do município de Alto Alegre e que as despesas culturais estão previstas no orçamento anual da prefeitura. Até o ano de 2014, essas despesas relacionadas às ações culturais eram incluídas no orçamento da Secretaria Municipal de Educação e Cultura. A partir de 2015, após a criação da SEMC, um orçamento próprio está voltado às despesas da Secretaria. Destacamos também que a equipe da SEMC do município de Alto Alegre estava composta por ocupantes de três cargos em setembro de 2015: o Secretário Municipal de Cultura, um Assessor em Arte e um Assessor de Eventos. Vale ressaltar que a Lei n° 280/2013 de criação da SEMC prevê um organograma totalmente diferente e estabelece a formação da equipe com seis cargos (1 Secretário Municipal de Cultura, 1 Secretário Adjunto de Cultura, 3 Assessores Técnicos, 2 Diretores Nível I, 2 Diretores Nível II, 2 Assistentes administrativos) ocupados por um total de 11 funcionários. Esta Secretaria já vem mobilizando algumas iniciativas no sentido de executar o SMC. Para isso houve duas Conferências Municipais de Cultura, uma no dia 6 de outubro de 2009 e outra em 6 de agosto de 2013. Desses eventos resultou a criação de 18 metas que vão complementar as 53 inicialmente previstas no Plano Nacional de Cultura. Não foi possível encontrar os relatórios que, a princípio, estão sendo arquivados na Secretaria Municipal de Educação. A Lei n.º 289/2014, de 14 de maio de 2014, rege a criação SMC do município de Alto Alegre. Até setembro de 2015, o mesmo não havia sido criado, assim como o Fórum de Cultura do município. A SEMC já se movimentou para incentivar a criação do Conselho Municipal de Políticas Culturais, mas no município encontra dificuldades para criar o CMC e até o Fórum, pois os possíveis membros já estão envolvidos em outros conselhos. Pode-se constatar que a SEMC tem um orçamento anual. No entanto, quando houve a definição do último planejamento anual de Alto Alegre, a secretaria ainda não existia. Como resultado, o setor cultural não foi inserido neste planejamento. O que há no momento é que a equipe responsável pela construção do PMC está na fase de construção do Plano de Trabalho, documento que 22

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


permite visualizar a implementação dos componentes constituintes do Sistema Municipal de Cultura, descrevendo o desenvolvimento das etapas previstas, contendo atividades, cronograma de execução e metas a serem atingidas em cada uma delas (BRASIL, 2015, p. 1).

No que tange ao sistema de financiamento da cultura, ainda há grandes problemas a serem sanados. O resultado da pesquisa aponta que não existe Lei de Incentivo Fiscal no município de Alto Alegre. A Secretaria não dispõe de pessoal capacitado para participar de editais de lei de incentivo fiscal do Estado ou da Lei Rouanet e, quanto aos produtores culturais locais, nenhum inscreveu um projeto a ser beneficiado pela Lei Estadual de Incentivo à Cultura para o ano de 2015. O Fundo Municipal de Cultura foi criado pela Lei n.º 289/2014, de 14 de maio de 2014, de criação SMC do município de Alto Alegre, mas ainda não está institucionalizado. A importância de se criar um Fundo Municipal de Cultura é que este seja o principal mecanismo do Sistema Municipal de Financiamento da Cultura, que disponibiliza os recursos destinados a apoiar programas, projetos e ações culturais implementados de forma descentralizada, em regime de colaboração e financiamento com a União e com o Governo do Estado. Com o Fundo Municipal de Cultura, o Município se tornou incentivador da ocorrência de iniciativas culturais locais e apoia o dinamismo dos atores culturais. Embora haja esta falta de estruturação do SMC, vemos que algumas iniciativas tem sido realizadas, tais como o mapeamento e o inventário cultural do município que estão sendo elaborados. Há também projeto de parceria com a Secretaria de Assistência Social no âmbito de resgatar dois projetos musicais sociais: a Banda “Tom Jobim” e o Coral “Canto do Curió”, instituídos durante o segundo mandato do Nertan Ribeiros Reis, entre 2001 e 2004. Em articulação com a Secretaria de Educação, há o Programa Mais Educação; em 2013, três escolas aderiram ao programa: a Escola Municipal Professora Maria das Dores Pereira de Matos (Vila São Silvestre), a Escola Municipal Vânio Pereira de Melo (na Vila Reislândia Paredão Novo) e a Escola Municipal Prof.ª Edneide Sales Campelo (bairro Centro). Os recursos do Ministério da Educação (MEC) foram disponibilizados porém por causa de pendências das Associações de Pais e Mestres das escolas, não foram aproveitados. Em 2014, foi iniciado um trabalho de regulamentação dessas Associações. No início de 2015, somente a Escola Municipal Profª. Edneide Sales Campelo estava apta a receber recursos, mas perdeu o prazo. Existe também um projeto de parceria com a Escola Estadual Desembargador Sadoc Pereira para retomar as atividades de sua fanfarra. Ao que concerne ao Acordo de Cooperação Federativa entre o Ministério da Cultura (MinC) e o município de Alto Alegre, verificamos que este foi assinado no dia 08 de agosto de 2014 e publicado no Diário Oficial da União, do dia 21 de agosto de 2014. O Plano de Trabalho está em fase de elaboração e ainda não foi mandado para o MinC.

Panorama Cultural de Roraima

|

23


De acordo com entrevista realizada com Wilson Roberto Moreira Amorim, Secretário de Cultura do Município de Alto Alegre, realizada no dia 10 de agosto de 2015, a Secretaria tinha um conjunto de metas a atingir até o final do ano de 2015. Trata-se da instalação do CMPC e do FMC da Secretaria. Mas essas metas, conforme o Secretário, não poderão ser atingidas. A SEMC vai tentar realizar a III Conferência Municipal de Cultura até o final do ano, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação. Ressaltando a importância da implementação do SMC, o Secretário de Cultura do Município de Alto Alegre alegou que, em conformidade com Sérgio Mamberti, Secretário de Políticas Culturais em 2012, destaca que: trata-se de um projeto que caminha para consolidação efetiva da cidadania cultural. Nela a cultura é um eixo do desenvolvimento e possibilita que os brasileiros (alto alegrenses) avancem cultural e economicamente – com justiça social, igualdade de oportunidades, consciência ambiental e convivência com a diversidade (BRASIL, 2012, p. 11).

O processo de implementação do SMC no município de Alto Alegre está apenas começando. Reconhecendo a cultura em suas três dimensões (simbólica, cidadã e econômica), o município de Alto Alegre se comprometeu em assumir a responsabilidade de estruturar a Secretaria e as suas dependências e se alinhar nas metas do PMC. É um caminho longo e sinuoso a ser percorrido.

4 ANÁLISE DO SISTEMA CULTURAL DE ALTO ALEGRE/RR A partir dos dados apresentados da cultura no município de Alto Alegre/ RR, temos três grandes categorias a serem analisadas: 1- o que existe de cultura; 2- fragilidades, desafios e obstáculos e 3 - particularidades culturais. Ao tratarmos do que existe em termos culturais em Alto Alegre/RR, podemos perceber que existe uma riqueza significativa em termos culturais relativos aos patrimônios históricos/materiais, patrimônios imateriais e patrimônios naturais. A diversidade cultural e o hibridismo potencializam este olhar para o desenvolvimento da cidade. Contudo, na área da gestão cultural, ainda há muito a ser feito tendo em vista a recente criação da cidade e o recente incentivo ao desenvolvimento cultural. Ao buscarmos trazer as fragilidades, desafios e obstáculos, deparamonos com uma realidade que é condizente com os demais municípios do Estado de Roraima: sua recente criação. Pelo fato de serem municípios com uma história bastante recente, muito há para ser feito em termos de regulamentação e registro dos bens culturais locais. Todavia, Alto Alegre, como pudemos observar, apresenta iniciativas significativas no âmbito da preservação de seus patrimônios culturais. No entanto, com base nos diferentes motivos apresentados (recursos humanos, estrutura física e financiamento) os quais envolvem questões políticas, administrativas e infraestruturais, a redação do Plano de Trabalho que deveria ser enviado ao MinC não foi finalizada pela SEMC.

24

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Apesar dessas dificuldades em termos de legislação, ações vinculadas à SEMC estão sendo realizadas no sentido de mapear e registrar a cultura local. Mas essa iniciativa se encontra suspensa atualmente por falta de recursos e meios de transporte para poder ir a todas as zonas do município e nas aldeias indígenas para cadastrar os fazedores de cultura de Alto Alegre. Quanto ao Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais (SNIIC), que poderia ajudar a esse levantamento, nenhum agente cultural de Alto Alegre estava registrado até setembro de 2015. Ao pensarmos nas peculiaridades culturais do município, temos claro que a política cultural se encontra num momento delicado. Esta situação ocorre por conta da falta de repasse do orçamento e da má distribuição de recursos para a cultura, como já foi ressaltado. Além desses fatores, percebemos que ainda há incompatibilidade nos dados que registram o repasse e aos gastos com a cultura, há equívocos em relação ao registro de nomes e dados históricos de locais (biblioteca), alguns documentos jurídicos não se encontram ou desapareceram e a falta de registro preciso das etnias e dos valores artísticos e culturais dos indígenas presentes na região.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao analisarmos o contexto cultural do Município de Alto Alegre, percebemos alguns elementos que nos auxiliam a compreender a situação atual da cultura no município de Alto Alegre/RR. A partir disso, esperamos poder contribuir com a construção do Plano Municipal de Cultura. Desta forma, destacamos que o processo de desenvolvimento e preservação cultural em Alto Alegre perpassa por um amadurecimento do entendimento da legislação e dos valores culturais locais, necessitando de toda uma infraestrutura de recursos humanos, financeiros e físicos para dar conta das demandas apresentadas. Infelizmente, o que percebemos é a não continuidade do trabalho e a desestruturação da SEMC no ano de 2015. Situação essa que merece atenção e cuidado da esfera administrativa do município para que não signifique um retrocesso na construção do sistema municipal de cultura.

Panorama Cultural de Roraima

|

25


REFERÊNCIAS BELO HORIZONTE (MG). Prefeitura. Fundação Municipal de Cultura: Patrimônio Cultural. Disponível em: <http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/ comunidade.do?evento= portlet&pIdPlc=ecpTaxonomiaMenuPortal&app=fu ndacaocultura&tax=23393&lang=pt_BR&pg=5520&taxp=0>. Acesso em: 26 set. 2014. BRASIL. Congresso. Câmara dos Deputados. Agência Câmara Notícias. Terras Devolutas. Disponível em: <http://www2.camara. leg.br/camaranoticias/ noticias/81573. html>. Acesso em: 31 ago. 2015. BRASIL. Lei n.º 12.343, de 2 de dezembro de 2010. Institui o Plano Nacional de Cultura - PNC, cria o Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais - SNIIC e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/_ato2007-2010/2010/ lei/l12343.htm>. Acesso em: 09 ago. 2015. BRASIL. Ministério da Cultura. As metas do Plano Nacional de Cultura. 2. ed. Brasília-DF: MinC, 2012. BRASIL. Ministério da Cultura. Conselho Nacional de Política Cultural, Secretaria de Articulação Institucional – SAI. Estruturação, Institucionalização e Implementação do Sistema Nacional de Cultura. Brasília-DF: MinC/SAI, 2011. BRASIL. Ministério da Cultura. Conselho Nacional de Política Cultural, Secretaria de Articulação Institucional – SAI. Guia de Orientações para os Municípios: Sistema Nacional de Cultura: Perguntas e Respostas. Brasília-DF: MinC/SAI, 2010. BRASIL. Ministério da Cultura. Perguntas Frequentes Relacionadas ao PNC. Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/plano-nacional-de-cultura-pnc>. Acesso em: 09 ago. 2015. BRASIL. Ministério da Cultura. Sistema Nacional de Cultura. Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/snc/>. Acesso em: 09 ago. 2015. BRASIL. Ministério da Cultura. Sistema Nacional de Cultura. Orientações para elaboração do Plano de trabalho do acordo de cooperação federativa do sistema nacional de cultura. Brasília-DF: MinC. Disponível em: <http://www. cultura.gov.br/documents/10907/ 963783/1382043354276Plano-de-TrabalhoMunic%C3%ADpio1.doc/212dbc57-930b-41c0-a5ff-d5a013602c76>. Acesso em: 09 ago. 2015. BRASIL. Ministério da Cultura. As metas do Plano Nacional de Cultura. 2. ed. Brasília-DF: MinC, 2012. BRASIL. Ministério da Educação. Programa Mais Educação: passo a passo. Brasília-DF: MinC, 2011.

26

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


FUNAI. Terras indígenas. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/index.php/ indios-no-brasil/terras-indigenas>. Acesso em: 30 ago. 2015. IBGE. Cidades – Alto Alegre. 2015a. Disponível em: <http://www.cidades.ibge. gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=140005&search=roraima|alto-alegre>. Acesso em: 14 jul. 2015. _______. Cidades - Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. Disponível em: <http://www.cidades.ibge.gov.br/comparamun/compara.php?lang=&c oduf=14&idtema=118&codv=v01&search=roraima|alto-alegre|sintese-dasinformacoes->. Acesso em: 30 jul. 2015. ________. Os indígenas no Censo Demográfico 2010. Disponível em: <http:// www.ibge. gov.br/indigenas/indigena_censo2010.pdf>. Acesso em: 25 ago. 2015. INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL (IPHAN). Educação Patrimonial: Programa Mais Educação / Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Brasília, DF: Iphan/DAF/Cogedip/Ceduc, 2012. LAKATOS, Eva Maria. Metodologia do trabalho científico: procedimentos básicos, pesquisa bibliográfica, projeto e relatório, publicações e trabalhos científicos. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009. PLANO NACIONAL DE CULTURA. Disponível em: <http://pnc.culturadigital. br>. Acesso em: 09 ago. 2015. RORAIMA. Secretaria de Estado do Planejamento e Desenvolvimento de Roraima. Informações Socioeconômicas do Município de Alto Alegre. Boa Vista/RR: Divisão de Estudos e Pesquisas, 2012. 58 p. SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Cortez, 2007. ZANIRATO, Silvia Helena. Usos sociais do patrimônio cultural e natural. Patrimônio e Memória, Assis-SP, v. 5, n. 1, p. 137-152, out. 2009. Disponível em: <http://pem.assis.unesp.br/index.php/pem/article/view/145/521>. Acesso em: 09 ago. 2015.

Panorama Cultural de Roraima

|

27


Fotografia: Jorge Pavani


LEVANTAMENTO SOBRE A CULTURA DO MUNICÍPIO DE AMAJARI Francisca das Chagas Soaresa, Jennifer Vieira Campelo Pimentelb, José Thomáz do Nascimento Júniorc, Maximiliano Corrêa Valente Netod

INTRODUÇÃO Uma política cultural democrática reconhece a existência de múltiplas manifestações culturais dentro de uma mesma sociedade. O que a torna multicultural é a presença dessa diversidade num mesmo espaço ou território. A troca entre essas diversas manifestações e a consequente interação são classificadas como interculturalidade. Para Santos (1994, p. 44), a cultura não é algo estável, pelo contrário é dinâmica, mutável e transformadora. A sociedade contemporânea reflete e expressa as influências e expressões culturais que a constituem, sendo a cidade um cenário propício a essa produção cultural contemporânea, é um espaço de liberdade e de encontro dos diferentes, buscando estimular a autonomia dos diferentes grupos culturais, facilitar os canais de comunicação com o poder público e, principalmente, promover um diálogo intercultural envolvendo todos os atores presentes na cena cultural da cidade; um diálogo que ultrapasse os limites territoriais do município e se estenda a outras cidades do país e do mundo.

Servidora da Prefeitura de Amajari, Bacharel em Geografia, e-mail: soareschaguinha@gmail.com a

Agente cultural, Bacharel em Serviço Social, e-mail: jennifercampelo@hotmail.com b

Diretor de Cultura da Prefeitura de Amajari, Especialista em Gestão e Educação Ambiental, e-mail: thomjun@hotmail.com c

Servidor da Universidade Federal de Roraima-UFRR, e-mail: max.karosso@ufrr.br d

Ao Estado cabe reconhecer, valorizar, dar visibilidade e apoiar as múltiplas expressões culturais, contemplando as diversas manifestações: eruditas e populares, profissionais e experimentais, consagradas e emergentes, reconhecendo as dinâmicas inovadoras, também aquelas gestadas nos diferentes movimentos sociais – comunitários, religiosos, étnicos, de gênero, entre outros elementos. Autores, como Wieviorka (2003, p. 19) e Taylor (1998, p. 82), desvendam o conceito de uma autêntica multiculturalidade associada à valorização da diversidade cultural e ao fortalecimento da democracia cultural. Desde 2012, Amajari busca implementar e desenvolver ações focadas numa política cultural democrática, oportunizando gestão, agentes e atores culturais por intermédio de saberes e conhecimentos dos princípios e políticas adotados pelo Ministério da Cultura (MinC).

Panorama Cultural de Roraima

|

29


O Sistema Municipal de Cultural (SMC) é o princípio de tudo, mas sem o Plano Municipal de Cultura (PMC) nada disso poderá se concretizar. Este trabalho propõe contribuir com subsídios para as etapas do planejamento e desenvolvimento do PMC do município de Amajari.

1 ASPECTOS INFORMATIVOS DO MUNICÍPIO DE AMAJARÍ O povoado que deu origem à cidade começou com um bar, em 1975, cujo proprietário é o morador e comerciante, conhecido como senhor Brasil. A partir daí surgiram as primeiras residências ao redor, cresceram em número e formaram uma vila, elevando-se a categoria de Vila Brasil, em homenagem ao fundador. A Lei n.º 097 de 17 de outubro de 1995, transformou em município com o nome de Amajarí, devido ao principal rio da região do Estado, o rio Amajarí, afluente do rio Uraricoera (RORAIMA, 2015a). Com a instalação do município em 1º de janeiro de 1997, tomou posse o primeiro prefeito, senhor Francisco Alberto Santiago, para os períodos de 1997 a 2000 e 2001 a 2004. No pleito 2005 a 2008, foi eleito o candidato Pereira da Silva Filho (PMDB). O último prefeito eleito para o exercício de 2009 a 2012 foi o senhor Rodrigo Cabral, eleito em 2008. O Poder Legislativo Municipal é composto por 09 vereadores. O presidente da Câmara Municipal eleito à época para o biênio de 2008 a 2010 foi a vereadora Iria de Matos Rodrigues. A população da região é composta de índios e nordestinos, que, pelos seus costumes, acabaram por transformar o lugar na “Capital do Forró”. A bacia hidrográfica é composta pelos rios Uraricoera, Parimé e Amajarí, e a cobertura vegetal é caracterizada por florestas densas e savanas. Esse município possui uma área demarcada como reserva indígena de 16.790,99 Km2, representando 58,71% em relação às terras do Município. Suas principais áreas são: Ananás, Aningal, Cajueiro, Ouro, Ponta da Serra, Santa Inês (Macuxi); Anaro (Wapixana); Araçá (Macuxi/Wapixana); Yanomami (RORAIMA, 2015b). Segundo o IBGE (2007), na contagem da população o município possui 7.586 habitantes e sua área territorial é de 28.472,310 Km2, com clima tropical quente e úmido, e temperatura média anual de 26°C. O gentílico do município é amajariense. O município de Amajarí, segundo dados do IBGE, está localizado no norte do Estado de Roraima, na mesorregião Norte, microrregião Boa Vista, situado nas coordenadas geográficas 61º 25’ 15” de longitude Oeste e 03º 39’ 19” de latitude Norte. Limita-se ao norte com a República Bolivariana da Venezuela, ao sul com o município de Alto Alegre e Boa Vista, ao leste com o município de Pacaraima e ao oeste com a República Bolivariana da Venezuela. De acordo com dados do Censo do IBGE (2010), o município de Amajari possui uma população de 9.330 habitantes, com uma densidade demográfica de 0,33 hab/km², o que indica como município de menor densidade de Roraima. Desse total, observamos que, no ano 2000, a população era composta de 55,53% de homens frente a 44,47% de mulheres. Em 2007, essa composição era de 54,26% de homens em relação a 45,74% de mulheres, e, em 2010, era de 53,52% de homens para 46,48% de mulheres. Em 2010, a taxa de urbanização do município de Amajarí foi de 13,07%, um dos menores índices do estado. A população residente de Amajarí está 30

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


concentrada na zona rural: 84,91% em 2000, 84,72% em 2007 e 86,93% em 2010. As pirâmides etárias do município de Amajarí, entre 2000 e 2010, tiveram como base os dados do Censo Demográfico de 2000 e 2010. Quanto à estrutura etária propriamente dita, verificamos que, em 2010, a população de Amajarí pode ser denominada “adulta”, pois uma parcela significativa dos habitantes do município é de população em idade ativa entre 15 e 64 anos (52,90%), seguida de “jovens” menores de 14 anos de idade (43,15%) e de idosos com idade superior a 65 anos (3,95%). A malha rodoviária de jurisdição municipal apresenta uma extensão de 201,2 km dos quais 100,2 km apresentam revestimento primário e 101 km em leito natural. O acesso ao município de Boa Vista é feito pela BR-174 e RR-203 com 155,1 km, completamente pavimentados. O sistema de telecomunicações do Município na área de telefonia fixa privada e pública está em leve expansão. O consumo de energia elétrica em Amajarí no período de 2008 a 2010 oscilou de 1.254 a 1.651 kWh, enquanto o número de consumidores passou de 729 para 949. De acordo com dados fornecidos pela Companhia de Águas e Esgotos de Roraima (CAER), no município de Amajarí, em 2009, 439 domicílios se encontravam ligados à rede geral de abastecimento de água. O município de Amajari não possui aterro sanitário. O Produto Interno Bruto (PIB) do município de Amajari ocupa o 11º lugar entre os municípios de Roraima. A participação da Administração Pública no PIB do município foi de 63,76% no ano de 2009, o que corresponde a aproximadamente R$ 71 milhões. O setor agropecuário do município de Amajari apresenta um importante componente da economia local, tendo como destaque a produção de arroz, mandioca, milho e banana. Na pecuária, o destaque vai para o rebanho de bovinos, aves, suínos, equinos e caprinos. Para os produtos de origem animal, destaca-se a produção de mel, leite e ovos. Também possui relevância os produtos do extrativismo vegetal, tais como madeira em tora, lenha e carvão vegetal. Apresenta bom potencial a produção de culturas permanentes, a exemplo do café, do cupuaçu, por exemplo. A pecuária é de corte, em caráter extensivo, com baixos rendimentos, com restrições de clima e solo. No entanto, há perspectivas favoráveis à pecuária de leite. O município dispõe de características positivas ao desenvolvimento da piscicultura em área de mata e do turismo. Aspectos econômicos, históricos, geográficos e políticos do município são fundamentais para compreender os elementos culturais que se estabeleceram nesse espaço. Também contribuem para pensar os avanços e as limitações para o desenvolvimento da diversidade cultural presentes no município de Amajari.

Panorama Cultural de Roraima

|

31


2 LEVANTAMENTO DA DIVERSIDADE CULTURAL DO MUNICÍPIO DE AMAJARI No início do segundo semestre de 2012, verificamos que o Departamento Municipal de Cultura iniciou um trabalho voltado ao fortalecimento da política cultural do município. Esta iniciativa se deu em virtude do município ter iniciado uma articulação visando a um futuro acordo de cooperação entre MinC, Secretaria Estadual de Cultura (Secult) e Secretaria Municipal de Educação e Cultura (Semecd). Após cinco meses iniciais de intenso trabalho, na busca de informações sobre as manifestações culturais local, tínhamos em mãos os primeiros dados legais comprobatórios dos personagens, atores, agentes ligados à cultura do município de Amajari. Em 2013, a nova gestão municipal assinou um acordo de cooperação entre o MinC e a Prefeitura Municipal de Amajari. A partir da assinatura, iniciaram-se os trabalhos por meio do desenvolvimento de ações para cumprimentos das metas constantes no acordo. A sequência de atividades para constituição do SMC foi: realização da II Conferência Municipal de Cultura, proposta do Projeto de Lei (PL) que contempla a criação do SMC, Fundação Amajari de Cultura, Esporte e Turismo (FACETur), PMC, Conselho Municipal de Políticas de Cultura (CMPC), Fundo Municipal de Cultura (FMC) e Conferência Municipal de Cultura (CMC). A realização dessas etapas selaram a seriedade quanto ao interesse por parte do município na continuidade do acordo de cooperação entre o MinC e Prefeitura de Amajari. O Projeto de Lei n.º 149/2013 que criava o Sistema Municipal de Cultura e sua estrutura funcional, foi aprovado por unanimidade na Câmara de Vereadores e sancionado pelo prefeito em exercício senhor Moacir José Bezerra Mota, em 23 de agosto de 2013. Com os primeiros dados legais em mãos sobre as manifestações culturais do município, iniciou-se a terceira etapa do plano de ação à formulação do “Calendário Municipal de Eventos Culturais”. De acordo com os dirigentes municipais de cultura, ao iniciar a constituição do calendário, as dificuldades foram muitas: alguns destes eventos já não aconteciam por diversos motivos, outros não tinham data fixa e somente quatro eram realizados, anualmente, a saber: Festa Junina, Jogos e Festejo da Comunidade Indígena Araçá, Festival do Tepequém e Festejo da Padroeira Santa Luzia. O processo de levantamento de dados nos revelou que uma parte da história do município de Amajari, bem como do estado de Roraima está se perdendo por falta de proteção legal, apesar do estado possuir a Lei n.o 718/2009 de proteção do patrimônio cultural do estado de Roraima. Na Serra do Tepequém, local que, na década de 30, foi o maior garimpo de diamante do estado, havia duas vilas (Cabo Sobral e Paiva) ocupadas por mais de cinco mil garimpeiros oriundos dos mais diversos cantos do Brasil e até mesmo do mundo. Atualmente, a história destes brasileiros e estrangeiros que por ali passaram permanece viva tão somente nos contos e causos relatados pelos então antigos garimpeiros que ainda residem na Serra.

32

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Em algumas comunidades indígenas, existem resquícios etnográficos de seus ancestrais, como da passagem do homem branco pela região, sendo um deles o mais famoso e de grande importância para a história do Brasil, o Marechal Rondon, que deixou vestígios manuscritos e retratos de sua passagem por essa parte do Brasil, muitas vezes esquecida. Os povos indígenas estão espalhados em várias comunidades, que juntas somam mais de 60% das terras municipais. As comunidades são: Ananás, Anaro, Araçá, Aningal, Cajueiro, Guariba, Leão de Ouro, Ponta da Serra, Mangueira, Santa Inês, Três Corações, Vida Nova e Yanomami. Os povos mais numerosos são: Makuxi, Yanomami, Wapixana e Taurepang. As tradições indígenas estão presentes em suas festas, jogos, organização, línguas e dialetos, construções, comportamento, escrita, culinária, bebidas, modo de vida, hábitos e costumes. As comunidades indígenas cultivam em suas lavouras: mandioca, milho, macaxeira, abacaxi, melancia, laranja, arroz, feijão, jerimum e abóbora; e criam animais para consumo: gado, carneiro, cabrito, porco, galinha e pato; e animais para trabalho: cavalos e jumentos. É muito comum a criação de pequenos animais da fauna local como animais domésticos, como: macacos, porco do mato, jiboia, papagaio, arara, tatu, capivara, dentre outros. Suas lendas são traços fortes da sua cultura viva dentro e fora das comunidades. Dentre os vários personagens da cultura indígena, destacamos o mais temido por todos eles, o Kanaime. Ele é uma espécie de ser que age em nome da ordem e bons costumes. De acordo com os indígenas, o Kanaime é um ser metade monstro, metade homem, e todas as comunidades o respeitam e o temem. A presença dessas diversidades culturais demonstra a disposição da sociedade na manutenção de suas tradições e memórias, pois o poder público, apesar dos avanços apontados na direção da efetiva constituição do Sistema Municipal de Cultura, carece de recursos para investir no desenvolvimento e na preservação da cultura local.

3 ELEMENTOS DO PANORAMA CULTURAL DE AMAJARI No que diz respeito às vocações e potencialidades do município de Amajari, podemos afirmar que o etnoturismo, ecoturismo e turismo rural são alternativas de desenvolvimento local. As possibilidades de estudos e pesquisas do potencial cultural e turístico em parceira com instituições de ensino e serviços, tais como: Universidade Federal de Roraima (UFRR), Instituto Federal de Roraima (IFRR), Universidade Estadual de Roraima (UERR), Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), Serviço Social do Comércio (SESC), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). São inúmeras as questões de proteção, preservação e conservação do patrimônio natural e cultural local, as áreas de fauna e flora, sítios arqueológicos, comunidades indígenas, fazendas centenárias dentre outros. Ressaltamos o fator importantíssimo, do resgate, valorização, fortalecimento e valoração da cultura indígena, garimpeira e rural, as quais marcam a pluralidade cultural do município de Amajari. Panorama Cultural de Roraima

|

33


Concordamos com a afirmação de Coelho: […] a política cultural apresenta-se assim como o conjunto de iniciativas, tomadas por esses agentes, visando promover a produção, distribuição e o uso da cultura, a preservação e a divulgação do patrimônio histórico e o ordenamento do aparelho burocrático por elas responsável (COELHO, 1997, p. 293).

A qualificação e melhoria dos produtos e serviços culturais e turísticos devem ser prioridade para a redução ou a minimização dos impactos destrutivos causados pela ação humana, e possibilitar aos moradores locais a geração de emprego e renda. Na questão ligada às fragilidades e aos obstáculos, a ausência de infraestrutura turística e cultural implica diretamente em ações de planejamento, organização, direcionamento, implantação, desenvolvimento e avaliação do etnoturismo, ecoturismo e turismo rural. No que se refere à cultura, implica na identificação, catalogação, estimulação, capacitação, produção, difusão, comercialização e acesso aos bens culturais materiais e imateriais. No município de Amajari a interação entre o turismo e a cultura é um ponto relevante, contribuindo muito com a divulgação dos eventos no município. As lendas locais é outro aspecto que também chama a atenção e desperta o interesse turístico em Amajari. Vivenciar significa sentir, captar a essência, e isso se concretiza em duas formas de relação do turista com a cultura ou algum aspecto cultural: a primeira refere-se às formas de interação para conhecer, interpretar, compreender e valorizar aquilo que é o objeto da visita; a segunda corresponde às atividades que propiciam experiências participativas, contemplativas e de entretenimento, que ocorrem em função do atrativo motivador da visita (BRASIL, 2010, p. 15)

Os desafios culturais são inúmeros, a começar pelo potencial cultural dentro das comunidades indígenas e do turismo rural, uma vez que possuímos fazendas centenárias na região. Neste sentido, poderemos analisar e pensar ações que venham contribuir no resgate e valorização da identidade, costumes, hábitos, tradições como fator determinante na identidade cultural do município de Amajari. A oportunidade da cultura se dá em virtude da implantação e implementação de políticas públicas de cultura e turismo, por intermédio do Projeto de Lei n.º 149/2013, constituído e alinhado ao SNC. Com a realização da II Conferência Municipal de Cultura de Amajari, foi possível identificar dentro da esfera administrativa (Análise SWOT dos pontos fortes, fracos, oportunidades e ameaças) os anseios e demandas oriundas do governo, da iniciativa privada, e da sociedade civil organizada no sentido de repensar a cultura enquanto fator de transformação, desenvolvimento e sustentabilidade local. Neste sentido, verificamos que o primeiro passo foi dado com a assinatura do Acordo de Cooperação entre Município e União. Já dos anseios demandados na II Conferência Municipal de Cultura de Amajari (CMCA), é que justificamos a escolha das estratégias descritas a seguir por apresentar clareza e objetividade, sem falar no posicionamento político e técnico para tornar o desenvolvimento de ações em prol da cultura, factíveis dentro de 34

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


uma ótica de futuro planejado para a solidificação do movimento cultural e da própria cultura como um todo. Cabe salientar que estes objetivos estão alinhados e inseridos entre as 53 metas estabelecidas no Plano Nacional de Cultura (PNC).

4 OBJETIVOS E ESTRATÉGIAS DO PNC 1º Objetivo: qualificar, profissionalizar e especializar equipe gestora e conselheiros municipais de cultura com base nos princípios norteadores do SNC e PMC. Estratégia: capacitar 100% dos gestores e conselheiros municipais de cultura por intermédio de cursos disponibilizados pelo Ministério da Cultura com base nos princípios norteadores e regentes do SNC e PMC. 2º Objetivo: implantar infraestrutura adequada à proteção e promoção do patrimônio cultural material e imaterial local. / Estratégia: buscar mecanismos legais de âmbito municipal, estadual e nacional para subsidiar a implantação e/ou implementação de infraestrutura adequada à proteção e promoção do patrimônio material e imaterial local. Verificamos que os dois objetivos do PNC têm sido perseguidos pelo município de Amajari. A disponibilização dos dirigentes municipais para participarem do Curso de Extensão em Gestão Cultural, faz parte do cumprimento do objetivo 1 e da meta 36 do PNC. Já o segundo objetivo tem sido trabalhado a partir da implementação do Departamento de Cultura e da aprovação da lei municipal de cultura. A realização das conferências municipais de cultura também sinaliza os esforços para constituição do PMC e sua integração ao PNC. São passos importantes à proteção e promoção do patrimônio material e imaterial local. O município de Amajari é um dos mais avançados na implementação do PMC e tem sido referência para os demais.

5 METAS E INDICADORES 1º Meta: criação de projeto de lei municipal que regulamente o SMC e seus instrumentos até o final do mês de agosto de 2013. Indicador: nível de institucionalização e implementação do Sistema Municipal de Cultura no Amajari. 2º Meta: constituição do órgão e equipe gestora municipal de cultura até o final do ano de 2013. Indicador: nível de importância do órgão gestor e equipe técnica de cultura do Amajari. 3º Meta: constituição do conselho municipal de política cultural até o 1º semestre de 2014. Indicador: nível de significância para o SMC e PMC na constituição do conselho municipal de política cultural do Amajari. 4º Meta: construção do Plano Municipal de Cultura até o 2º semestre de 2014. Indicador: nível de desenvolvimento e consolidação do Plano Municipal de Cultura para o Sistema Municipal de Cultura do Amajari. 5º Meta: Regularização do Fundo Municipal de Cultura até o 1º semestre de 2015. Indicador: nível de importância da legalização do FMC para captação e/ ou repasse de recursos para apoio e difusão da cultura do Amajari. Panorama Cultural de Roraima

|

35


É importante citar as metas e objetivos, haja vista que é grande a mobilização para seu alcance. O município é o maior interessado na expansão da visibilidade cultural existente no local, além de poder contar com políticas públicas e uma infraestrutura adequada a proteção e promoção do patrimônio cultural do município do Amajari. Verificamos que a primeira e segunda meta estão devidamente consolidadas. A terceira meta está em fase de implementação e as demais sendo encaminhadas. Isso significa que o município tem dado prioridade ao curso de implementação do SMC, não ficando apenas na assinatura do termo junto ao MinC.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao finalizarmos um trabalho tão importante como esse, refletimos sobre a importância do planejamento das ações desenvolvidas e a importância dos registros como fator primordial para preservação da memória histórica e da publicação das ações, sejam elas em curso ou finalizadas. Ressaltamos, por meio de exemplos, a relevância das informações culturais que nos possibilita contribuir para o desenvolvimento artístico municipal. Essa construção deve estar alicerçada por meio do estabelecimento de uma política pública voltada a essa finalidade. Dessa maneira se contribui com a articulação, promovendo intercâmbio cultural e trocando experiências de gestão cultural, comercialização de produtos, eventos, ações culturais, entre outros. Os resultados deste trabalho ressaltam a importância do assunto pesquisado associado a uma excelente oportunidade de visibilidade cultural do município de Amajari. Pois, conhecer a cultura do município ou da localidade é essencial para que possamos propor, elaborar, e realizar políticas, projetos e ações que estimulem a produção cultural local. Com esses elementos iniciais, é possível investir no diagnóstico cultural do município que demanda uma pesquisa mais profunda por meio de ferramentas que nos possibilitam um olhar diferenciado, em que conhecemos a realidade, as dificuldades, a diversidade e a riqueza do lugar. Ao observar, conhecemos a realidade de um lugar ou de uma situação. É possível realizar o levantamento de dados fundamentais por meio de metodologias de planejamento e diagnóstico, inspiradas numa vertente mais participativa, e que não precisam, necessariamente, de montanhas de recursos financeiros para a sua viabilização. Os elementos apresentados apontam que o município de Amajari tem caminhado de maneira singular na constituição do Sistema Municipal de Cultura, com vistas a se integrar ao Sistema Estadual e Nacional de Cultura. Verificamos que passos importantes já foram dados, mas que ainda há elementos essenciais que precisam ser desenvolvidos. O poder público e a sociedade em geral precisam compreender que a preservação e o desenvolvimento histórico e social perpassam pela valorização e o investimento na cultura que é um bem social e de grande relevância. Para tal, o SMC se apresenta como elemento fundamental. 36

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério do Turismo. Destinos Referência em Segmentos Turísticos. Goiânia: Instituto Casa Brasil de Cultura, 2010. COELHO, Teixeira. Dicionário crítico de política cultural. São Paulo: Iluminuras, 1997. IBGE. Contagem da população 2007. Rio de Janeiro, 2007. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/ populacao/contagem2007/ contagem.pdf>. Acesso em: 10 out. 2015. IBGE. Total da população: Roraima. Rio de Janeiro, 2010. Disponível em:<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/ populacao/censo2010/tabelas_ pdf/total_populacao_roraima.pdf>. Acesso em: 10 out. 2015. RORAIMA. Secretaria Estadual de Planejamento e Desenvolvimento – SEPLAN. Amajari. Boa Vista-RR, 2015. Disponível em:<http://www.portal.rr.gov.br/turismo/ site/ ?governoderoraima=amajari> Acesso em: 10 out. 2015. RORAIMA. Tribunal de Justiça de Roraima. Lei n.º 097 de 17 de outubro de 1995. Cria o Município de Amajarí e dá outras providências. Disponível em: <http://www.tjrr.jus.br/legislacao/phocadownload/leisOrdinarias/1995/Lei%20 Estadual%20097-1995.pdf>. Acesso em: 10 out. 2015. SANTOS, José Luiz dos. O que é Cultura. 14. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Coleção primeiros passos; 110) TAYLOR, Charles. Multiculturalismo: examinando a política de reconhecimento. Lisboa: Instituto Piaget, 1998. WIEVIORKA, Michel. Diferencias culturales, racismo y democracia. In: MATO, Daniel (Org.). Políticas de identidade y diferencias sociales em tiempos de globalizacion. Caracas: FACES – UCV, 2003. p. 17-32.

Panorama Cultural de Roraima

|

37


Fotografia: Irmânio Magalhães

38

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


LEVANTAMENTO DOS EQUIPAMENTOS CULTURAIS DO MUNICÍPIO DE BOA VISTA Irmânio Sarmento de Magalhãesa, João Capistrano da Silva Motab, Josiel Silva Matosc, Liege Maria Barros de Aquinod, Carolina Viana Albuquerquee, Marcio Akira Couceirof

INTRODUÇÃO

Servidor da Fundação de Educação Turismo Esporte e Cultura de Boa Vista, e-mail: artezanos.rr@gmail.com a

Servidor da Fundação de Educação Turismo Esporte e Cultura de Boa Vista, e-mail: joaocapistranorr@hotmail.com b

Servidor da Fundação de Educação Turismo Esporte e Cultura de Boa Vista, Licenciado em Letrasespanhol e literatura hispânica, e-mail: josielrr@hotmail.com c

Servidora da Fundação de Educação Turismo Esporte e Cultura de Boa Vista, e-mail: liegeaquino@gmail.com d

Pesquisadora do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN, Mestranda em Preservação do Patrimônio Cultural, e-mail: carol_vialbuq@yahoo.com.br e

Orientador do Trabalho de Conclusão do Curso de Extensão em Gestão CulturalUFRR/MinC, professor da Universidade Federal de Roraima, PhD em Ciências e Tecnologia, e-mail: marcio. akira@ufrr.br f

Visando atender a uma demanda legítima quanto à necessidade da consolidação e fortalecimento das políticas públicas voltadas para a cultura, o presente trabalho se propõe em realizar um levantamento dos equipamentos culturais do município de Boa Vista, capital do Estado de Roraima. Para a realização de tal pesquisa, primeiro foi realizada uma revisão bibliográfica que aborda o assunto e pesquisa na internet. Posteriormente, foi realizado o levantamento dos equipamentos culturais in loco, onde também foi feito o registro fotográfico dos equipamentos, bem como a coleta de informações. Com o presente levantamento, busca-se informar sobre a atual situação dos equipamentos culturais situados dentro do município de Boa Vista e sugerir possíveis ações de valorização e fomento de espaços públicos por meio da gestão municipal. O trabalho também faz uma abordagem no que tange ao Sistema Nacional de Cultura, o Plano Nacional de Cultura e suas cinquenta e três metas estabelecidas pelo Ministério da Cultura, com prazo para consolidar-se em 2020, bem como da oferta e demanda e condições da qual se encontram os equipamentos culturais de Boa Vista. Os resultados encontrados demonstram que o Município de Boa Vista apresenta relativa disponibilidade de equipamentos e espaços culturais com quantidade e qualidade. Os espaços se encontram, de forma geral, localizados nas áreas centrais e nobres da cidade devendo ter um olhar para sua maior disponibilização nas periferias. Entretanto, nota-se dificuldade na manutenção desses espaços assim como uma organização para o uso pelos artistas. Desta forma, entende-se que a melhoria desses serviços deve estar abrangida na implantação das políticas públicas municipais, das quais se destacam a criação do Conselho Municipal de Cultura, do Fundo Municipal de Cultura, da Secretaria Municipal de Cultura e, a regulamentação das leis referentes ao patrimônio cultural do Município de Boa Vista.

Panorama Cultural de Roraima

|

39


1 DESENVOLVIMENTO 1.1 HISTÓRIA Boa Vista é a capital do estado de Roraima, localizado na Região Norte do país, é a capital estadual mais setentrional do Brasil e a única localizada totalmente ao norte da linha do Equador, sendo a mais distante de Brasília, capital federal, e de São Paulo, principal metrópole do país. Concentrando cerca de dois terços dos habitantes do estado, situa-se na margem direita do Rio Branco. Em 2015, sua população, de acordo com estimativas Censo 2010 era de 320.714 habitantes (IBGE, 2010). Moderna, a cidade se destaca pelo traçado urbano organizado de forma radial, planejado no período entre 1944 e 1946 pelo engenheiro civil Darcy Aleixo Derenusson. A cidade vista de cima lembra um leque, em alusão às ruas de Paris, na França. O traçado foi construído no governo do capitão Ene Garcez, o primeiro governador do então Território Federal do Rio Branco. As principais avenidas do Centro da cidade convergem para a Praça do Centro Cívico Joaquim Nabuco, onde se concentram as sedes dos poderes executivo, legislativo e judiciário estaduais, além de pontos culturais (teatro e palácios), hotéis, bancos e a Catedral Diocesana. É interessante notar que, em um projeto feito na década de 1940, quando os automóveis ainda não eram um problema urbano, e em Boa Vista poucos existiam, o projeto da cidade já contava com ruas extremamente largas. As dimensões, aparentemente exageradas para a época, se mostraram de acordo com o progresso dos anos seguintes, fazendo com que Boa Vista conservasse a qualidade urbana ao longo dos anos. A diversidade cultural presente nos diferentes grupos que compõem a sociedade boa-vistense é fruto da sua história mais remota. No início, era a disputa por essas terras por parte dos estrangeiros, como espanhóis, holandeses e portugueses. Em meio às disputas, os portugueses saíram na frente e construíram um dos primeiros fortes na região amazônica, como estratégia de proteção. Com isso, podemos dizer que um dos grandes fatores que ocasionaram, posteriormente, a criação da cidade de Boa Vista, foi a construção do Forte São Joaquim do Rio Branco, na confluência dos Rios Uraricoera e Tacutu. A construção do Forte foi uma solicitação do Rei de Portugal, Dom José I, que emitiu uma Carta Régia, em 23 de outubro de 1752, ao Governador e Capitão Geral do Grão Pará, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, mandando que fosse construído um forte no Rio Branco (DIAS, 2012). Após a construção do Forte, foi dado início às políticas de aldeamento, como parte da estratégia de ocupação da região amazônica. Barbosa (1993) afirma que os aldeamentos tinham como objetivo concentrar os índios em povoamentos sob a influência religiosa, facilitando os ensinamentos e promovendo o desenvolvimento de uma economia agrícola e pesqueira baseada na força de trabalho indígena. O primeiro aldeamento foi no entorno do Forte, de onde iniciavam as expedições de tropas de resgate, inspecionavam as fronteiras e desciam os índios para as proximidades da fortaleza. Estas expedições tinham a finalidade

40

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


de ocupar a região que compreendia o Rio Branco (VIEIRA, 2014). Com o tempo, outros aldeamentos foram surgindo, porém a improdutividade que abatia a região, não deixava que os aldeamentos dessem certo. Outro fator que contribuiu para o fracasso dos aldeamentos foram as constantes revoltas que se abatiam entre brancos e índios (MORAES, 2009). Uma das fases de aldeamento que marca até hoje a economia da região, foi a que efetivou a entrada de gado por essas terras. O objetivo era de colonizar as áreas próximas ao Rio Branco, por meio de uma atividade econômica. Para isso, foram criadas as chamadas Fazendas do Rei, ou Fazendas Nacionais, nas quais o gado seria criado e comercializado. Barbosa (1993) relata que as terras foram divididas em três partes, sendo que: A oeste, entre o rio Uraricoera e o rio Branco, fundou-se a Fazenda do Rei, a primeira delas e que foi batizada como São Bento, em favor de Sua Majestade. Desta seguiu-se a formação da fazenda São José, instalada próximo a fortificação militar, na parte leste do vale. A última fazenda foi a de São Marcos, criada no setor norte, entre os rios Uraricoera e Tacutú, fundada no final do século (BARBOSA, 1993, p. 129).

O coronel Manoel da Gama Lobo D`Almada foi pioneiro na introdução de gado na região. O militar veio ao Rio Branco em uma expedição entre os anos de 1786-87 e em 1790, trouxe um rebanho do estado do Amazonas, da Vila de Ega, hoje município de Tefé (BARBOSA, 1993). Com o passar do tempo, outras fazendas foram aparecendo, dentre elas, a Fazenda Boa Vista, do antigo oficial do Forte, o Capitão Inácio Lopes de Magalhães, que fundou sua Fazenda em 1890, à margem direita do Rio Branco. Moraes (2009) relata que a Fazenda Boa Vista propiciou o desenvolvimento do porto fluvial na região do Rio Branco. Desta maneira, surgiram os marcos iniciais da cidade de Boa Vista, com a construção do edifício-sede da fazenda e da capela sob a invocação de Nossa Senhora do Carmo. Em torno desta propriedade rural, foram sendo instaladas outras propriedades, que deram origem a um pequeno arraial, composto de casas, igreja e o porto de carga e descarga de mercadorias (MORAES, 2009). Os primeiros bairros surgiram denominados de Olaria (Francisco Caetano Filho), Rói Couro (São Pedro e Centro), Praça da Bandeira e Caxangá (DIAS, 2012). Em 1858, por meio da Lei n.º 92 de 09 de novembro do mesmo ano, foi estabelecida a Freguesia de Nossa Senhora do Carmo, que teve como sede o local denominado Boa Vista, Fazenda Boa Vista. A Freguesia que fazia parte do então município de Moura, do Estado do Amazonas, foi desvinculada de lá em 1890, por meio do Decreto n.º 49, de 09 de julho do mesmo ano. Com isso foi estabelecido o Município de Boa Vista do Rio Branco, pelo governador do Amazonas, Augusto Ximenes de Villeroy que denominou que o capitão da Polícia Militar, Fábio Barreto Leite, o representasse na cerimônia de instalação (DIAS, 2012). Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 6.550, de 31 de maio de 1944, determinou que o nome de Boa Vista do Rio Branco passasse a ser apenas Boa Vista. Além da atividade pecuária, que se consolidou na região, tendo como seu principal mercado o estado do Amazonas, outras atividades econômicas despontaram, como a extração mineral, que, além de ser uma nova fonte de economia, marcou a história de Boa Vista, por conta do grande fluxo migratório

Panorama Cultural de Roraima

|

41


que despontou na região a partir de 1910 (BARBOSA, 1993). Em 1943, em meio a II Guerra Mundial, o presidente Getúlio Vargas ordenou que fossem criados cinco territórios federais: Guaporé, Amapá, Iguaçu, Ponta Porã e Rio Branco, para este se definiu que Boa Vista seria sua capital. O então Território teve como seu primeiro governador o capitão Ene Garcez dos Reis, nomeado pelo Decreto-Lei n.º 5.812, de 13 de setembro de 1943. Em 1962, o Território Federal do Rio Branco foi transformado em Território Federal de Roraima, e, finalmente, em 1988, passou a ser o Estado de Roraima (MORAES, 2009). Como relatado acima, Boa Vista teve no decorrer da sua história forte influência de imigrantes que chegaram a essas terras em busca de trabalho e melhores condições de vida. Percebe-se esta diversidade na cultura do município que, apesar de grande influência indígena, se caracteriza pela diversidade de estilos. As principais influências são as indígenas e nordestinas, que vão desde os gostos musicais até o artesanato. No entanto, existem núcleos culturais típicos das grandes metrópoles do país, espalhados pela cidade, como, por exemplo, um de MPB se encontra na Orla Taumanan, à noite. Outro núcleo é o de rock e heavy metal que se encontra na Praça do Centro Cívico. Outras bandas locais se reúnem no Serviço Social do Comércio (SESC/RR), o Espaço Rock SESC. 1.2 PLANO NACIONAL DE CULTURA E EQUIPAMENTOS CULTURAIS As políticas culturais estão sendo debatidas em todo país por meio de eventos, seminários, encontros, com a participação de movimentos sociais, sociedade civil organizada, e grupos de artistas. Neste atual cenário, é possível participar de forma ativa da construção das políticas públicas que fomentam e fomentarão o desenvolvimento da cultura em todo o Brasil. Desde 2003, o Ministério da Cultura (MinC) vem trabalhando na implementação do Sistema Nacional de Cultura (SNC), que representa um novo paradigma de gestão pública da cultura em nosso país (BRASIL, 2008). O SNC tem como um dos pilares fundamentais o fortalecimento dos órgãos responsáveis pela gestão cultural, dos conselhos e conferências de política cultural, dos sistemas de financiamento da cultura, e dos planos de cultura, nos três níveis da federação (BRASIL, 2008). O caderno do MinC que trata das Diretrizes Gerais do Plano Nacional de Cultura relata que “sem substituir iniciativas setoriais que o Brasil já desenvolveu ou venha a desenvolver”, como, por exemplo, o “Congresso Brasileiro de Cinema, o Plano Nacional de Museus e o Fórum Nacional de TV Pública”. O Plano Nacional de Cultura (PNC) é uma etapa essencial para a consolidação das políticas que efetivarão o Sistema Nacional de Cultura, “constituindo-se no passo mais consistente, em nível federal, para a sua estruturação e operacionalização” (BRASIL, 2008). O PNC se configura como: Um plano de estratégias e diretrizes para a execução de políticas públicas dedicadas à cultura. Toma como ponto de partida um abrangente diagnóstico sobre as condições em que ocorrem as manifestações e experiências culturais e propõe orientações para a atuação do Estado na próxima década. Sua elaboração está impregnada de responsabilidade

42

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


cívica e participação social e é consagrada ao bem-estar e desenvolvimento comunitário (BRASIL, 2008, p. 10).

O PNC é previsto no artigo 215 da Constituição Federal e foi criado pela Lei n.º 12.343, de 2 de dezembro de 2010, com o objetivo de orientar o desenvolvimento de programas, projetos e ações culturais que constituam a valorização, o reconhecimento, a promoção e a preservação da diversidade cultural existente no país (BRASIL, 2012). O Plano possui 53 metas com o prazo para o ano de 2020, para o alcance de seus objetivos. De acordo com o Caderno do MinC que trata das Metas do PNC, o Plano tem como estrutura três dimensões complementares, que são a cultura como expressão simbólica; como direito de cidadania; e como campo potencial para o desenvolvimento econômico com sustentabilidade. Essas dimensões, por sua vez, se desdobram nas metas, que dialogam com os temas da diversidade cultural; da criação e fruição; da circulação, da difusão e consumo; da educação; pesquisa e produção de conhecimento; espaços culturais; do patrimônio; da gestão pública e articulação federativa; da participação social; de desenvolvimento sustentável da cultura; e do fomento e financiamento (BRASIL, 2012, p. 9).

Atualmente Boa Vista não possui o Plano Municipal de Cultura, está em fase de construção por seus gestores e equipe técnica da cultura, pois a Prefeitura Municipal de Boa Vista (PMBV), já aderiu ao Sistema Nacional de Cultura. O Plano possibilitará a articulação da gestão municipal com os diferentes atores do segmento cultural, descrevendo as demandas das políticas, programas, projetos e ações culturais do Município. Para a elaboração do Plano, foram realizadas duas conferências, uma em 2010 e outra em 2013. Ademais, foram realizados fóruns com grupos culturais específicos para levantamento de demandas de acordo com a especificidade do grupo e de acordo com a realidade local.

2 METODOLOGIA Primeiro realizamos levantamento bibliográfico objetivando atualizar as informações e o suporte teórico ao trabalho. Em seguida, realizamos levantamento dos equipamentos culturais existentes dentro do município, com visitas in loco para verificar o estado de funcionamento, bem como, a partir do que constatamos, propor políticas públicas para a sua preservação e conservação. Nessas visitas, coletamos informações sobre os equipamentos, como, por exemplo, endereço, capacidade, histórico e acessibilidade, além de registro fotográfico. No decorrer do trabalho, optamos por uma análise descritiva dos equipamentos levantados.

Panorama Cultural de Roraima

|

43


3 RESULTADO E DISCUSSÃO 3.1 CONTEXTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DO MUNICÍPIO DE BOA VISTA A gestão cultural é fomentada em Boa Vista pela Fundação de Educação, Turismo, Esporte e Cultura (FETEC), autarquia ligada à Prefeitura Municipal, criada pela Lei n.º 106 de 24 de setembro de 1984. Dentro da FETEC, por meio da Superintendência de Cultura (SUPEC), são organizados e desenvolvidos os principais projetos e ações culturais da cidade, como, por exemplo, o Boa Vista Junina, o Festival das Araras e o Natal da Paz. Ademais a FETEC elabora os editais para Mostra Fotográfica, Audiovisual, Sistema de Credenciamento das Bandas e outros. As ações sempre buscam inovar, respeitando a diversidade cultural de Boa Vista e almejando o desenvolvimento econômico e sustentável para os diferentes atores envolvidos. Antes de prosseguirmos, é importante conceituarmos “equipamentos culturais”, os quais estão dentro dos chamados espaços culturais, que, conforme Coelho (1997), trata-se de uma categoria ampla, que abrange instituições e os equipamentos culturais, passando pelas práticas culturais, sejam essas permanentes ou passageiras. Essa prática faz com que um espaço impessoal, se torne referência para a cultura. Os chamados espaços culturais são tratados em 13 de 53 metas do PNC. Já o termo “equipamento cultural”, de acordo com Coelho (1997), é entendido tanto como edificações destinadas a práticas culturais (teatros, cinemas, bibliotecas, centros de cultura, filmotecas, museus), quanto grupo de produtores culturais abrigados ou não, fisicamente, numa edificação ou instituição (orquestras sinfônicas, corais, corpos de baile, companhias estáveis). Numa dimensão mais restrita, equipamentos culturais são todos os aparelhos ou objetos que tornam operacional um espaço cultural (refletores, projetores, molduras, livros, pinturas, filmes). 3.2 LEVANTAMENTO DOS EQUIPAMENTOS CULTURAIS DO MUNICÍPIO DE BOA VISTA Ao analisar o conceito apresentado por Coelho (1997), os equipamentos culturais abarcam as três dimensões complementares que estruturam o Plano de Cultura: expressão simbólica, direito de cidadania e desenvolvimento econômico com sustentabilidade. Os equipamentos culturais do município de Boa Vista foram elencados de acordo com a categoria apresentada no conceito de Coelho (1997): edificações destinadas a práticas culturais (teatros, cinemas, bibliotecas, centros de cultura, filmotecas, museus) e grupos de produtores culturais (orquestras sinfônicas, corais de baile, companhia estáveis), ainda destacando a acessibilidade ou não dos locais.

44

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Desta forma, o QUADRO 1 e FIGURAS 1 a 6 mostram os equipamentos culturais e grupos de produtores culturais de Boa Vista: Quadro 1 - Edificações destinadas a práticas culturais e grupos de produtores culturais de Boa Vista

Fonte: Irmânio Sarmento de Magalhães e Carolina Viana Albuquerque (2015).

Ao analisarmos, constatamos que Boa Vista apresenta relativa disponibilidade de equipamentos e espaços culturais com quantidade e qualidade, os quais se encontram, de forma geral, localizados nas áreas centrais e nobres da cidade devendo ter um olhar para sua maior disponibilização nas periferias. Entretanto, notamos dificuldade na organização de eventos culturais Panorama Cultural de Roraima

|

45


com a participação mais assídua dos artistas com melhor divulgação. No entanto, ressaltamos que, em sua maioria, os equipamentos culturais citados acima estão climatizados, tem fácil acesso e, acima de tudo, com acessibilidade. Figura 1- Espaço de Arte e Cultura União Operária/UFRR

Fonte: Irmânio Sarmento de Magalhães e Carolina Viana Albuquerque (2015).

Figura 2 - Palácio da Cultura Nenê Macaggi

Fonte: Irmânio Sarmento de Magalhães e Carolina Viana Albuquerque (2015).

Figura 3 - Centro Multicultural da Orla Taumanan

Fonte: Irmânio Sarmento de Magalhães e Carolina Viana Albuquerque (2015).

46

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Figura 4 - Praça do Mirandinha

Fonte: Irmânio Sarmento de Magalhães e Carolina Viana Albuquerque (2015).

Figura 5 - Praça da Cultura

Fonte: Irmânio Sarmento de Magalhães e Carolina Viana Albuquerque (2015).

Figura 6 - Centro de Artesanato Velia Coutinho

Fonte: Irmânio Sarmento de Magalhães e Carolina Viana Albuquerque (2015).

As fotos elencadas ilustram alguns dos equipamentos culturais visitados no decorrer da pesquisa, sobretudo na etapa de análise in loco dos equipamentos. Nas fotos, constatamos que estes equipamentos estão em excelente estado de conservação e funcionando diariamente, com horário de atendimento ao público diferenciado, inclusive com atendimento ao turista.

Panorama Cultural de Roraima

|

47


CONSIDERAÇÕES FINAIS Entendemos que a melhoria dos equipamentos culturais e de seus serviços oferecidos, deve estar atrelada às políticas públicas municipais, das quais se destacam a criação do Conselho Municipal de Cultura, do Fundo Municipal de Cultura e da Secretaria Municipal de Cultura. Ademais, é necessário regulamentar leis referentes ao patrimônio cultural de Boa Vista A implantação destas políticas dará as diretrizes básicas para a conservação do patrimônio artístico municipal, assim como auxiliará os artistas na sua promoção e sustentabilidade econômica. Os objetivos destas políticas devem estar atrelados ao Plano Municipal de Cultura, fruto de discussão com todos os segmentos artísticos. O Conselho Municipal deve ser responsável pela representatividade da diversidade cultural e servirá como interlocutor com a sociedade, e local de discussões, aprovações e encaminhamentos das demandas de cada segmento. O Conselho ainda terá uma importante função de fiscalização das instituições parceiras quanto ao cumprimento do Plano Municipal de Cultura. O Fundo Municipal de Cultura tem função principal de arrecadar e financiar as políticas públicas de cultura de Boa Vista. O Fundo deve estar vinculado à Secretaria Municipal de Cultura que será responsável pela elaboração dos editais para o financiamento dos programas, projetos e ações culturais. Importante ressaltar que os editais devem conter os critérios e parâmetros de avaliação, buscando atender a diversidade cultural. Muitas vezes o excesso de burocracia para concorrer ao edital, assim como na prestação de contas, acaba por inviabilizar que o recurso chegue aos agentes culturais. A gestão cultural é algo complexo e dinâmico, que deve ser apoiada por políticas públicas dinâmicas e de acordo com a realidade local. Desta forma, entendemos que a criação do Plano de Cultura Municipal junto a Políticas Municipais é imprescindível para a construção de um novo modelo de desenvolvimento de políticas públicas acerca da cultura. O desenvolvimento destas questões é crucial para a regulamentação e manutenção dos equipamentos culturais, assim como para a sustentabilidade artística de Boa Vista. Estas políticas darão segurança para realização de eventos culturais, sociais e econômicos colaborando com a divulgação do Município na Região Norte e no exterior. O desenvolvimento da cultura contribuirá ainda com a educação, inclusão social e desenvolvimento dos locais de vulnerabilidade econômica.

48

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


REFERÊNCIAS BARBOSA, Reinaldo Imbrózio. Ocupação Humana em Roraima. I. Do Histórico Colonial ao Início do Assentamento Dirigido. Bol. Mus. Par. Emílio Goeldi, BelémPA, v. 9, n. 1, p. 123-144, 1993. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA. Núcleo de Pesquisas de Roraima, 1993. Disponível em: <http://agroeco. inpa.gov.br/reinaldo/RIBarbosa_ProdCient_Usu_Visitantes/1993Ocup%20 Humana_I_BMPEG.pdf>. Acesso em: 13 nov. 2015. BRASIL. Ministério da Cultura. Diretrizes Gerais do Plano Nacional de Cultura. Brasília-DF: Secretaria de Políticas Culturais, 2008. BRASIL. Ministério da Cultura. As Metas do Plano Nacional de Cultura. Brasília-DF: Secretaria de Políticas Culturais, 2012. COELHO, Teixeira. Dicionário Crítico de Política Cultural: cultura e imaginário. São Paulo: Ilimunuras, 1997. DIAS, D. H. S. O Município de Boa Vista Aspectos Históricos. Boa Vista-RR: Ed. Boa Vista, 2012. IBGE. Roraima: Boa Vista: População de Boa Vista. Disponível em: <http:// cidades.ibge. gov.br/xtras/ perfil.php?codmun=140010>. Acesso em: 13 nov. 2015. MORAES, Carla Gisele Macedo Santos Martins; GOMES FILHO, Gregório Ferreira. Visadas sobre Boa Vista do Rio Branco: Razões e Inspirações da Capital de Roraima (1830-2008). Revista Tempos Históricos, Cascavel-PR, v. 13, n. 1, p. 137-166, jan./jun. 2009. Disponível em: <http://e-revista.unioeste. br/index.php/temposhistoricos/ article/view/3520>. Acesso em: 15 ago. 2015. VIEIRA, Jaci Guilherme. Missionários, Fazendeiros e Índios em Roraima: a disputa pela terra – 1777 a 1980. 2. ed. rev. e ampl. Boa Vista: EdUFRR, 2014.

Panorama Cultural de Roraima

|

49


Fotografia: RCCaleffi


O MUNICÍPIO DE BONFIM/RR: cultura e seus desafios Márlon da Cunha Leitãoa, Stevie Wonder Lima Lamazonb, Sumaira Veras Andradec, Antonio Vaz de Menesesd

INTRODUÇÃO Este trabalho apresenta informações e dados que permitiram gerar um diagnóstico da realidade situacional da cultura do município de Bonfim que integra o estado de Roraima. Tem como objetivos identificar, descrever e analisar as fragilidades, desafios e obstáculos que precisam ser superados para o desenvolvimento da cultura do município de Bonfim, relatando o quadro atual da cultura local por meio da identificação de suas características e potencialidades, para assim construir uma visão de gestão que contemple a cultura em sua diversidade. Além de ser um pré-requisito para conclusão do curso de extensão em gestão cultural, que objetiva a formação de gestores, conselheiros e agentes culturais, este trabalho tem também a finalidade de fornecer ao gestor público indicadores da situação cultural do município, assim contribuindo na orientação para formulação de políticas públicas culturais de qualidade e para a construção do plano municipal de cultura.

Agente Cultural e coreógrafo, Especialista em Gestão em Saúde, e-mail: marlonleitao@ oi.com.br a

Servidor da Prefeitura de Bonfim, Graduado em Geografia, e-mail: steviewonder2010@gmail.com b

Servidora da Prefeitura de Bonfim, Acadêmica em Comercio Exterior, e-mail: sumaira.andradebnf@hotmail. com c

O diagnóstico da realidade situacional da cultura do município de Bonfim que forneceu subsídios para este artigo foi realizado com o levantamento de indicadores e dados em relação à história sociocultural e conceitos relacionados à organização da cultura do município. Para o seu desenvolvimento, foram realizadas pesquisas bibliográficas e documentais, e coleta de dados em estudos originais, incluindo: artigos, teses, dissertações e trabalhos de conclusão de curso, publicados entre os anos de 2003 a 2015. Foram incluídos nesta pesquisa dados de órgãos e departamentos públicos em âmbito federal, estadual e municipal, por meio de publicações impressas, sites da internet e visita à Prefeitura Municipal de Bonfim, e realização de entrevistas aplicadas aos artistas locais por meio de questionários de respostas livres.

Orientador do Curso de Gestão Cultural - UFRR/MinC, professor da Universidade Federal de Roraima, Mestre em Sociedade e Fronteiras, e-mail: avdemeneses@gmail.com d

Panorama Cultural de Roraima

|

51


1 O MUNICÍPIO DE BONFIM O município de Bonfim surgiu no século XIX, como núcleo de comércio para atender a demanda regional da pecuária bovina, mantendo-se neste contexto econômico até o século XXI. A região do Alto Rio Branco, onde se localiza Bonfim, era habitada por diversos povos indígenas quando os colonizadores portugueses ali chegaram, no século XVIII, em expedições para captura de índios para ser vendidos como escravos (BAINES, 2004; SENHORAS, 2013). Com a criação das primeiras vilas e o crescimento da atividade agropecuária, no século XIX, toda a região passou a depender da mão de obra indígena, tanto no extrativismo como na criação de gado ou em outros serviços. Muitos povos nativos foram dizimados ou se incorporaram a outros. A composição étnica da população é formada por brancos, índios, caboclos, mulatos e negros, formando uma identidade cultural étnica diversificada (BARBOSA, 2015). A maioria hoje são wapichanas e macuxis. O primeiro morador, o baiano Manoel Luiz Silva, fixou-se próximo ao que hoje é a sede do município e deu nome à localidade em homenagem ao padroeiro de sua terra natal, o Senhor do Bonfim. Tem seus limites geográficos da seguinte forma: ao norte com o município de Normandia; ao sul com o município de Caracaraí; ao leste com a República Cooperativista da Guiana e ao oeste com Boa Vista e Cantá (NASCIMENTO, 2012). A cidade de Bonfim está localizada na margem esquerda do Rio Tacutu e na fronteira entre o Brasil e Guiana, sendo ligada a esse país pela ponte1 sobre o Rio Tacutu desde 2009, ocupando uma área de 8.095,420 km2 que corresponde a 3,61% do território de Roraima, com densidade demográfica de 1,35 hab./Km². Possui uma área de limite internacional com a Guiana de 964 Km² – faixa considerada de segurança nacional, e de posição estratégicas às relações internacionais. A população estimada é de 11.525 habitantes, o que representa 2,36% da população do Estado de Roraima (SUFRAMA, 2014). Bonfim se encontra a 125 km de Boa Vista capital do estado, o acesso é pela BR-401. Os municípios mais próximos a sua sede são: Normandia, 90 km, e Cantá, 130 km. A zona urbana é constituída pelos seguintes bairros: Getúlio Vargas, São Francisco, Cidade Nova, Primeiro de Julho, 13 de Maio e Centro (BAINES, 2004). Fala-se, além do português, o inglês em decorrência da forte presença de guianenses na cidade. A cidade possui plano diretor urbanístico com disposição de casas e ruas, fonte de eletricidade interligada ao Sistema de Interiorização da Energia de Guri (SIMÕES, 2013).

A ponte é parte do projeto estratégico do Arco Norte, que liga Roraima às capitais da Guiana, Suriname, Guiana Francesa ao estado brasileiro do Amapá, integrando o norte brasileiro ao Caribe. Foi custeada com recursos do governo brasileiro. 1

52

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Figura 1- Ponte Olavo Brasil liga Bonfim e Lethem

Fonte: HIRATA (2012).

2 CONTEXTO HISTÓRICO A expansão agrícola e pecuária determinou seu crescimento. O começo da produção agropecuária, com gado proveniente da fazenda São Marcos, se deu no princípio do século XX com a criação da primeira fazenda de gado de propriedade de um ex-militar que prestou serviços no Forte de São Joaquim, o pernambucano Antônio Vicente da Silva (SILVA, 2007). Mas foi a partir das décadas de 1930 a 1960, que o município apresentou uma taxa de crescimento demográfico bem significativo. Várias famílias chegaram e ali formaram uma pequena vila. As atividades com o garimpo surgido na região contribuíram para que houvesse um crescimento econômico e urbano bem expressivo. Outra contribuição veio com a implantação da rodovia BR-401, ligando Bonfim a Boa Vista. Após 1964, no período militar, houve por parte do governo federal preocupação com as fronteiras da região Amazônica com os países vizinhos. Com o argumento de uma segurança nacional, teve início a ocupação da Amazônia. Por outro lado, é importante salientar a relação entre Bonfim e Lethem, que segundo Silva (2007), destaca a importância do município como um ponto de defesa nacional do país. A interação entre essas cidades se reflete nas relações comerciais de bens de primeira necessidade. Bonfim foi um dos municípios que recebeu incentivo e preocupação por parte da federação nacional. Segundo Silva (2007), em 1965, ocorreu a instalação do 1º Pelotão Especial de Fronteira, que dinamizou com a presença das famílias dos militares o pequeno mercado local. Isso levou a construção de obras que contribuíram para o desenvolvimento, tais como a pista de pouso, o quartel do pelotão e uma vila militar.

Panorama Cultural de Roraima

|

53


Ainda por parte do governo federal, com o objetivo de priorizar o povoamento nas áreas de fronteiras, sobressaem-se as políticas de assentamentos com o objetivo de formação de grupos populacionais vindos da migração de outras regiões, principalmente do Nordeste. Isso veio contribuir para o crescimento da população, demonstrando um período de progresso relevante para o município. No entanto, somente em 1.º de julho de 1982, a vila passou à condição de município, por meio da Lei Federal n.º 7009. As duas cidades se encontram separadas apenas pelo Rio Tacutu, sobre o qual passa a ponte Brasil - Guiana, numa extensão da BR-401. São consideradas ainda como cidades gêmeas porque, segundo Becker (2009), as sedes municipais estão localizadas na faixa de fronteira e serem cidades vizinhas.

3 POLÍTICAS PÚBLICAS O planejamento de uma cidade depende de um conjunto de políticas públicas para construir um mecanismo de democratização. O plano diretor garante o funcionamento do município, para que todas as regras sejam aplicadas, porém Bonfim ainda não possui seu plano diretor, mais isso não impede que o planejamento seja feito com a participação dos cidadãos. Existe uma demanda por serviços de infraestrutura, saúde, educação, cultura e emprego, o que gera a necessidade de políticas públicas nessas áreas (BAINES, 2004). Por ser uma cidade gêmea e estar localizada na faixa de fronteira, apresenta problemas e carências de infraestrutura gerando um processo de complementaridade baseado na mobilidade populacional de seus moradores, que vão a Lethem da mesma forma que os moradores de Lethem vão a Bonfim para utilização de serviços na esfera municipal e estadual, criando problemas de políticas públicas. É necessário elaborar essas políticas públicas com diretrizes de ordenamento e desenvolvimento territorial, com contribuições para desenvolver a infraestrutura regional transfronteiriça (SENHORAS, 2013).

4 PLANO NACIONAL DE CULTURA (PNC) De acordo com Brasil (2013), o PNC é um conjunto de princípios, objetivos, diretrizes, estratégias e metas que devem orientar o poder público na formulação de políticas culturais. Previsto no artigo 215 da Constituição Federal, o Plano foi criado pela Lei n.° 12.343, de 2 de dezembro de 2010. Seu objetivo é orientar o desenvolvimento de programas, projetos e ações culturais que garantam a valorização, o reconhecimento, a promoção e a preservação da diversidade cultural existente no Brasil. O Ministério da Cultura (MinC) estabeleceu 53 metas, e a lei que estabelece o PNC prevê a criação de um comitê executivo para acompanhar a sua revisão de diretrizes, estratégias e ações. Esse comitê será composto de representantes, do poder Legislativo, dos estados e das cidades que aderirem ao Sistema Nacional de Cultura, do Conselho Nacional de Políticas Culturais e do MinC.

54

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


O Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais (SNIIC) tem um papel fundamental na realização do PNC, pois deve reunir os dados sobre as políticas culturais. A execução desse Plano depende da adesão dos estados e das cidades, o que será feito por meio do Sistema Nacional de Cultura (SNC). Os estados e as cidades que aderirem ao Sistema deverão elaborar planos de cultura e poderão contribuir para que se alcancem as metas do PNC. A adesão ao SNC é voluntária e poderá ser realizada por meio de um acordo de cooperação federativa. Ao aderir ao SNC, o estado ou o município deve elaborar um plano de cultura, um documento que reúne diretrizes, estratégias e metas para as políticas de cultura naquele território por um período de dez anos. Assim, pode receber recursos federais para o setor cultural e assistência técnica para a elaboração de planos, bem como ser incluído no SNIIC (BRASIL, 2013).

5 ESTRUTURA NECESSÁRIA PARA ELABORAÇÃO DO PMC Existe uma estrutura mínima de conteúdo para um Plano Municipal de Cultura (PMC). Destacamos cinco itens importantes de sua composição conforme a Secretaria de Cultura da Bahia (UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA, 2009): 1) Caracterização do município: são dados e informações referentes à contextualização do município, incluindo aspectos históricos, físicos, geográficos, demográficos, econômicos e sociais. Deve espelhar a realidade vivida pela comunidade, como suas dificuldades, potencialidades, oportunidades, vocações, limitações e sonhos. É uma caracterização geral do município, para melhor adequação dos programas culturais previstos no plano à realidade factual da comunidade. 2) Diagnóstico cultural do município: adquirido por meio de levantamentos e estudos para conhecer e compreender toda a dimensão da problemática existente na área cultural, em relação a questões como produção, difusão, equipamentos e agentes culturais, identificando-se os pontos fortes e fracos, ameaças e oportunidades nos contextos externos e internos da área cultural. Por este diagnóstico será analisada a cultura municipal na dimensão institucional, sobre a posição atual da prefeitura ao modelo de planejamento e gestão adotado, políticas formuladas, perfil, funcionamento dos órgãos de cultura em atuação, inventário de projetos culturais existentes e mecanismos de financiamento. 3) Desafios para o desenvolvimento da cultura municipal: a declaração e definição de desafios impostos ao Plano de Cultura emergem das dificuldades e obstáculos diagnosticados no estudo e compreensão da realidade atual e que exigem superação para se chegar a uma nova realidade necessária e desejada. Os desafios constituem a força motriz capaz de impulsionar e dinamizar a implantação do plano para se chegar aos programas estratégicos. Panorama Cultural de Roraima

|

55


4) Diretrizes: são linhas de orientação que servem como elementos balizadores dos programas e ações em busca de objetivos comuns. As diretrizes dão rumo e direção ao plano. 5) Programas estratégicos: compreendem os eixos temáticos centrais e prioritários que agrupam projetos e ações de curto, médio e longo prazo para implementação da política cultural do município, guardando sintonia e coerência com os desafios fixados. Um programa tem a seguinte composição: objetivo geral, ações, projetos, agentes envolvidos, metas e recursos financeiros necessários.

6 DIAGNÓSTICO DA MUNICÍPIO DE BONFIM

REALIDADE

CULTURAL

DO

Muitas foram as dificuldades para a elaboração do diagnóstico situacional cultural em Bonfim. Sabíamos que o diagnóstico deveria ser adquirido com levantamentos e estudos para conhecer e compreender toda a dimensão da problemática existente na área cultural, em relação a questões como produção, difusão, equipamentos e agentes culturais, identificando-se os pontos fortes e fracos, ameaças e oportunidades nos contextos externos e internos da área cultural. Deveríamos analisar a cultura municipal na dimensão institucional: posição atual da prefeitura ao modelo de planejamento e gestão adotado, políticas formuladas, perfil, funcionamento dos órgãos de cultura, inventário de projetos culturais existentes e mecanismos de financiamento, entre outros. Com a realização da pesquisa, constatamos que, até 2015, Bonfim não possuía uma secretaria exclusiva para a gestão da cultura.

7 CRIAÇÃO DA SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA O departamento de cultura foi criado com o objetivo de implantar projetos, como registra Lei n.° 221/2015, de 30 de abril de 2015, documento adquirido no Gabinete da Prefeitura do Município de Bonfim, estado de Roraima, que aqui transcrevemos um pequeno trecho, que dispõe sobre o desmembramento e a criação da Secretaria Municipal de Cultura para atuar no âmbito do município de Bonfim. A PREFEITURA MUNICIPAL DE BONFIM Faço saber que a câmara municipal de Bonfim, Roraima, aprovou e sancionou a seguinte lei: Art.1°. Fica criado na estrutura administrativa do Município de Bonfim, a SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA, órgão superior, subordinado diretamente ao Prefeito. São atribuições da Secretaria Municipal da Cultura: I – Formular e implementar, com a participação da sociedade civil, o plano municipal de cultura - PMC, executando as políticas e as ações culturais definidas; II – Implementar o sistema municipal de cultura - SMC, integrado aos sistemas Nacional e Estadual de Cultura, articulando os atores públicos e privados no âmbito

56

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


do Município, estruturando e integrando a rede de equipamentos culturais, descentralizando e democratizando a sua estrutura e atuação; III – Promover o planejamento e fomento das atividades culturais com uma visão ampla e integrada no território do município, considerando a cultura como uma área estratégica para o desenvolvimento local; IV - Valorizar todas as manifestações artísticas e culturais que expressam a diversidade étnica e social do município; V – preservar e valorizar o patrimônio cultural do município; VI – Pesquisar, registrar, classificar, organizar e expor ao público a documentação e os acervos artísticos, culturais e históricos de interesse do município; VII - Manter articulação com estes públicos e privados visando á cooperação em ações na área da cultura [...] (RORAIMA, 2015).

8 SITUAÇÃO DO MUNICÍPIO DIANTE DO PLANO NACIONAL DE CULTURA Após consulta ao MinC, obtivemos a confirmação de que Bonfim ainda aguarda a sua adesão ao SNC, estando ainda na fase de diligência documental. Tabela 1 - Informações sobre adesão ao Sistema Nacional de Cultura

Fonte: BRASIL (2015).

8.1 ESPAÇOS E EQUIPAMENTOS CULTURAIS EXISTENTES NO MUNICÍPIO Bonfim carece de equipamentos culturais. Segundo nossa pesquisa, o município conta com: uma biblioteca pública que possui espaço multiuso, um anfiteatro, um parque de exposições onde são realizadas exposição de animais e leilões; uma casa particular de festas e eventos, denominada Coqueiros. O que se tem de espaços públicos são geralmente praças e as quadras cobertas das escolas. Durante a pesquisa, foram citados como mais representativos os seguintes artistas locais: Izac Barros (poeta), Demétrio (poeta), José de Freitas (poeta), Geraldo (repentista), Stevie Wonder (músico compositor e cantor), Silvino (repentista), Rosenildo (coreógrafo) e Mário (músico compositor e cantor). Também registramos que a música mais presente no município, bem como na cidade fronteiriça de Lethem, é o forró brega, o forró eletrônico e o reggae.

Panorama Cultural de Roraima

|

57


9 ATIVIDADES E MANIFESTAÇÕES CULTURAIS LOCAIS PRESENTES NO CALENDÁRIO MUNICIPAL Conforme dados obtidos na Prefeitura de Bonfim, apresentamos o Calendário Municipal de atividades e manifestações culturais: Tabela 2 - Calendário de eventos do Município de Bonfim

Fonte: BRASIL (2015).

9.1 GRUPOS CULTURAIS Por não existir um mapeamento de seu patrimônio cultural, torna-se difícil a localização de grupos ou mesmos agentes culturais no município de Bonfim. Sabemos que existem, entretanto, não é possível levantar suas atividades atuais, como sobrevivem e o que pensam sobre a gestão da cultura. Mesmo assim identificamos uma banda de fanfarra na Escola Estadual Aldébaro José Alcântara, e um grupo cultural de capoeira denominado Raízes Brasileiras, dirigida pelo mestre Búfalo. A Fanfarra da Escola tem tido apoio da prefeitura e do estado por meio da Secretaria da Educação. Já o grupo de Capoeira, no período da pesquisa, se encontrava sem qualquer tipo de apoio. 58

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


10 AS ENTREVISTAS Foram entrevistados 12 artistas locais, dos quais 10 do sexo masculino e 2 do sexo feminino, com idades entre 21 e 65 anos de idade. Quanto à escolaridade, 2 deles possuem o ensino fundamental incompleto, 5 possuem o ensino médio completo, 1 tem o ensino superior incompleto e apenas 4 possuem curso de nível superior completo, com atuação nas seguintes áreas culturais: canto, composição; prosa e poesia; festa junina; artesanato; criação de cavalo; representação da cultura afro-brasileira (rezador); capoeira; dança; produção cultural; e regência de fanfarra. Foram aplicadas 8 perguntas, de respostas livres, abaixo descrevemos as perguntas e as respostas dos artistas entrevistados. 1) Qual o seu conceito de cultura? As respostas foram diversas, por meio delas percebemos aqueles que expressam sua essência com respostas assim, como quem nunca parou para estabelecer um conceito próprio da arte que pratica: “É a reunião de tudo produzido pela humanidade em todos os seguimentos”. Relatam a dificuldade de definir cultura por ser muito abrangente: “São várias manifestações que a sociedade utiliza para se expressar; São os conhecimentos passados de geração a geração; É o respeito pelas tradições deixadas pelos pioneiros do município de Bonfim; O reconhecimento do dom de Deus e tentar ajudar as pessoas; É o conhecimento adquirido na odisséia humana na Terra; É compartilhar e receber conhecimentos diversos; Abrange todas as produções humanas nos mais variados campos da arte e da cultura; É a produção genuína de um povo; Conhecimento adquirido através da simplicidade que a natureza transmite”. 2) Como está a representação do segmento cultural que você participa no município? Os entrevistados afirmaram que estão desarticulados por falta de apoio público e privado, e que o segmento cultural esta tímido e desorganizado juridicamente, embora aconteçam pequenos eventos. Também se referiram que, mesmo diante da falta de formalização, os artistas procuram trabalhar juntos. Os eventos, como a festa de exposição agropecuária que contempla o rodeio macuxi, a vaquejada, prova do tambor e as corridas de cavalos, embora sejam eventos que fazem parte da história da fundação do município, não são realizados há três anos. O que levou os artistas a organizarem a cavalgada do município de Bonfim na expectativa que seja colocada no calendário festivo da cidade. Em relação à cultura afro-brasileira, têm buscado contato com os indígenas que são profundos conhecedores espirituais. A cultura indígena tem sido consolidada por meio da festa da farinha, na qual se mostra o cultivo da mandioca, o processo de produção da farinha, sua gastronomia e artesanato. O segmento de capoeira tem estreita ligação com movimentos no município e estado. Os dançarinos reúnem voluntários e amantes da dança, no prédio cedido pela Secretaria de Promoção Social onde realizam ensaios. Quanto aos produtores culturais, estes realizam com apoio da prefeitura a festa anual do caju, na esperança de fixar o evento no calendário municipal. Panorama Cultural de Roraima

|

59


O evento Tacutú-Reggae Festival acontece no mês da consciência negra, e marca o traço de ligação cultural entre Brasil e a Guiana. Quanto às fanfarras, há destaque na esfera estadual para escolas e programações ligadas as atividades militares. 3) Existe alguma associação ou outro tipo de representação? As respostas foram praticamente unânimes: a maioria dos entrevistados disse não existir associação ou representação, e apenas 1 (uma) pessoa disse não conhecer e outra disse saber que está sendo providenciada uma. 4) Existe conselho municipal de políticas culturais no município? As respostas foram todas negativas, ou seja, que não existe Conselho Municipal de Políticas Culturais. 5) Existe no município espaços para apresentações culturais? Foi referido pelos entrevistados que muitas manifestações culturais acontecem em praças públicas, no ginásio poliesportivo, no estádio de futebol e nos pátios das escolas; que o espaço multiuso que existe no prédio da Biblioteca municipal possui um anfiteatro para 50 pessoas; e que também se utiliza o parque de exposições e que o auditório do fórum de justiça é utilizado para palestras e reuniões, assim como o Horto Municipal onde é realizada a festa do caju. Também citaram o Coqueiros Bar onde se realiza o Tacutú-Reggae Festival. Já as manifestações indígenas acontecem no malocão que existe nas comunidades, como é o caso da maloca do Manoá. 6) Você conhece as leis municipais voltadas para a cultura que o município possui? A maioria dos artistas apenas sabe da criação da Secretaria de Cultura, o que gera certa expectativa, para o avanço da cultura local e a elaboração do plano de cultura municipal. 7) Como você avalia o apoio do município aos artistas locais? As respostas foram diversas. Há os que afirmaram que o apoio varia de gestão para gestão; alguns dizem que o apoio financeiro que recebem para os eventos é insuficiente, fator que impede a melhoria da qualidade dos eventos. Os artistas relataram que, quando o solicitam, recebem um apoio razoável, assim como também alguns disseram que a ajuda é pouca, o que gera a necessidade de pleitear melhores parcerias e apoios no setor privado. Houve relatos sobre determinados momentos em que houve apoio e em outros que não houve, assim como parcerias bem estabelecidas, em que o apoio já está planejado no orçamento anual.

60

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante do exposto, pudemos identificar as características singulares que este local possui como sua identidade e diversidade cultural, sua multiplicidade étnica populacional, sua variedade linguística e tantas outras características derivadas de sua história e localização em faixa de fronteira. Sua cultura é formada de interação do cotidiano entre seus habitantes, gerando um conjunto de símbolos e significados que dão origem a novos padrões culturais. Este município é um local de trocas, de fragmentos culturais, de heterogeneidade cultural significativa que consolida uma cultura de fronteira, em um contexto de multiculturalismo que oferece uma forma de cultura alimentada por fluxos, como uma porta ou uma ponte de entrada e saída (MENESES; RODRIGUES, 2015). Os elementos aqui identificados e descritos colaboram para a coleta de indicadores das características e potencialidades do município de Bonfim, porém notamos que há necessidade de mais dados e informações não só a respeito da história que já aconteceu no município, mas também do que acontece atualmente e da potencialidade que o local possui. Ressaltamos a necessidade do desenvolvimento de pesquisas de campo para coleta de indicadores suficientes para fornecer à gestão pública cultural, dados relevantes para formulação e aplicação de políticas públicas culturais, para construir um plano municipal de cultura tão necessário para o município de Bonfim.

REFERÊNCIAS BAINES, Stephen G. A fronteira Brasil-Guiana e os povos indígenas. Revista de Estudos e Pesquisas-FUNAI, Brasília, v. 1, n. 1, p. 65-98, jul. 2004. BARBOSA, Tania Maria Sena; ROSA FILHO, Artur. As Pequenas Cidades da Amazônia Setentrional: um estudo sobre Bonfim – RR. ACTA Geográfica, Boa Vista, v. 9, n. 19, p. 36 - 61, jan./abr. 2015. BECKER, B. K. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. Rio de Janeiro: Garamond, 2009. BONFIM /RR. Prefeitura Municipal. Calendário de Eventos 2014. Bonfim-RR: gabinete da prefeitura, 2014. BRASIL. Ministério da Cultura. Plano Nacional de Cultura. 2013. Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/plano-nacional-de-cultura-pnc>. Acesso em: 31 ago. 2015. BRASIL. Ministério da Cultura. Sistema Nacional de Cultura. 2015. Disponível em:<http://snc.cultura.gov.br/adesao/detalhar/1448>. Acesso em: 31 ago. 2015. HIRATA, Marcel. Tensão na Guiana: governo ordena uso de força para reabrir acesso ao Brasil. 2012. Disponível em: <http://sempreguerra.blogspot.com. br/2012_07_01 _archive.html>. Acesso em: 11 dez. 2015. Panorama Cultural de Roraima

|

61


MENESES, A. V; RODRIGUES, F. S. A Construção de uma cultura de fronteira no espaço transfronteiriço do Brasil e a Guiana. Textos & Debates, Boa Vista, n. 27, v. 1, p. 53-66, jan./jun. 2015 NASCIMENTO, Francisleile Lima; GUTERRES, Luís Fernando dos Reis. Experiência e projetos desenvolvidos no município de Bonfim – RR: um trabalho de lição de vida e de cidadania proporcionado pelo projeto Rondon UERR. Examãpaku, Boa Vista – RR, v. 5, n. 2, p. 1-13, jul./dez. 2012. RORAIMA (Estado). Lei n.° 221/2015 de 30 de abril de 2015. Dispõe sobre o Desmembramento e a Criação da Secretaria Municipal de Cultura – SECULT para atuar no âmbito do município de Bonfim, e dá outras providencias. Bonfim-RR: Gabinete da Prefeitura, 2015. SENHORAS, Elói Martins. Dinâmica fronteiriça das cidades gêmeas entre Brasil e Guyana. Revista Geonorte, Manaus, v. 7, n. 1, p. 1077-1094, jun. 2013. Edição Especial - III Simpósio Nacional de Geografia Política. SILVA, P. R. de F. Dinâmica territorial urbana em Roraima - Brasil. 2007. 329 p. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007. SIMÕES, Sulamita Oliveira; VERAS, Nathália Santos. Migração pendular na panamazônia: pendularidade, comércio e trabalho na fronteira Guyana (Lethem) - Brasil (Bonfim-Roraima). In: CONGRESSO PORTUGUÊS DE SOCIOLOGIA 40 ANOS DE DEMOCRACIAS: progressos, contradições e prospectivas, 7., 2014, Manaus. Anais... Manaus, 2014. p. 1-13. SUFRAMA. Coordenação Geral de Estudos Econômicos e Empresariais. Áreas de Livre Comércio de Boa Vista e Bonfim: diagnóstico Sócio econômico e propostas para o desenvolvimento. Manaus: SUFRAMA, 2014. v. 6. UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA. Escola de Administração. Sistema Nacional de Cultura. Contrato SECULT: Universidade Federal da Bahia e Governo da Bahia, Salvador - Bahia, 2009.

62

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Fotografia: Vânia Coelho


FESTA NA COMUNIDADE: um olhar sobre a cultura do município do Cantá/RR Aubelúcia Ferreira de Sousaa, Paulo César de Andradeb, Beatriz Brooksc, Vânia Coelho de Sousad, Denison Rafael Pereira da Silvae

INTRODUÇÃO Ao longo de quase nove décadas em que se fala de cultura no país, além das várias crises pelas quais passou o setor, este tema ainda é visto em segundo plano. Somado a isto, tem-se as inúmeras mudanças que vêm ocorrendo, bem como a descontinuidade das ações, a carência de recursos, quando se passa a pensar no enxugamento da máquina pública. Assim, ao se cogitar em corte de verbas destinadas às políticas públicas, a cultura é a primeira da lista. Isso, sem contar as condições mínimas relegadas ao setor cultural. Temos a nítida certeza de que estamos sempre recomeçando. E pensar que no início de 2007 diversos intelectuais chamaram a atenção para a criação do Sistema Nacional de Cultura (SNC) como sendo uma das formas válidas e possíveis de poder garantir as parcerias necessárias para a construção de um Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais (SNIIC). Servidora da Prefeitura do Cantá, e-mail: aubelucia_ bella@hotmail.com a

O fato é que, no segundo trimestre do ano de 2012, a Câmara dos Deputados trouxe à tona o debate a respeito da cultura, inserindo-a na agenda política ao aprovar o Projeto conhecido como Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Cultura ou simplesmente PEC n.º 416/2005. Na verdade, essa mudança significativa na política cultural se tratou de um ato formal com o acréscimo do artigo 216-A da Constituição Federal, em que regulamenta o SNC. Apesar dos avanços conquistados nesse período para o campo cultural, ainda falta muito para termos de fato e de direito o que é preconizado na Constituição em seus artigos 215 e 216. Diante disso, pensamos em descrever as manifestações culturais existentes no município do Cantá, estado de Roraima, dando ênfase nas festas promovidas nas comunidades da região. O objetivo deste artigo é realizar o levantamento dos festejos do município, possibilitando subsidiar a posterior construção do diagnóstico

64

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Servidor da Prefeitura do Cantá, e-mail: pauloc@hotmail. com b

Presidente da Associação Cultural Locômbia Teatro de Andanças de Roraima, e-mail: locombiateatro@gmail.com c

Servidora do Governo do Estado de Roraima, Especialista em Comunicação Social, Assessoria de Comunicação e Novas Tecnologias, e-mail: vaniar27@ hotmail.com d

Orientador do Trabalho de Conclusão do Curso de Extensão em Gestão CulturalUFRR/MinC, servidor da Universidade Federal de Roraima, Mestre em Sociedade e Fronteiras, e-mail: denison. silva@ufrr.br e


situacional daquela localidade com elementos significativos, destacando sua importância no cenário da política cultural. Este artigo é resultado da pesquisa realizada para conclusão do Trabalho Final do Curso de Extensão em Gestão Cultural, ofertado pela Universidade Federal de Roraima em parceria com o Ministério da Cultura (MinC). A metodologia utilizada se norteou pela leitura de autores e obras pertinentes ao tema política cultural, bem como pela pesquisa de campo, tendo como técnica a realização de entrevistas do tipo aberta semiestruturada.

1 CONSTRUINDO CONCEITOS O termo cultura traz consigo diversos entendimentos e sentidos a depender, sobretudo, do tipo de ciência que se emprega ou da sua relação com o senso comum e o senso crítico. À luz do pensamento antropológico, por exemplo, este expressa tudo aquilo que um povo faz, o que veste, pensa, expressa e produz. São as ações, os hábitos e as vestimentas de determinado grupo social. Laraia (2001), informa que, do ponto de vista antropológico, Edward Tylor, em seu livro Primitive Culture (1871), procurou demonstrar que ao analisar a cultura esta poderia ser objeto de um estudo sistemático e objetivo, pois se tratava de um fenômeno natural e que, portanto, possui intrinsecamente causas e regularidades, permitindo o estudo por meio da natureza científica com análise capaz de postular leis sobre o processo tanto de ordem cultural quanto da própria evolução1. Em outras palavras, podemos dizer que tratar sobre o termo cultura é bastante amplo e nos levará para inúmeros caminhos, a depender, inclusive, da teoria a qual nos aportaremos. Assim, neste artigo, buscamos destacar em seu sentido mais amplo, que diz respeito às questões de direito. De acordo com a filósofa Marilena Chauí (1995), existem vários direitos que nós cidadãos temos em relação à cultura, tais como: Direito de acesso e de fruição dos bens culturais por meio dos serviços públicos de cultura, enfatizando o direito à informação, sem a qual não há vida democrática; Direito à criação cultural, nas quais indivíduos, grupos e classes sociais possam reconhecer-se como sujeitos de sua própria história e, portanto, como sujeitos culturais. Direito a reconhecerse como sujeito cultural, graças à ampliação do sentido da cultura, assegurando a autonomia dos sujeitos culturais, exposição de trabalhos ligados aos movimentos sociais e populares; Direito à participação nas decisões públicas sobre a cultura, por meio de conselhos e fóruns deliberativos para garantir uma política cultural distanciada dos padrões do clientelismo e da tutela (CHAUÍ, 1995, p. 82-83).

Trata-se, na verdade, mais de uma perspectiva de análise do pensamento evolucionista. 1

Os gestores precisam trabalhar melhor as políticas culturais e elaborar projetos do poder público para nortear as ações culturais com a participação efetiva dos entes públicos ou privados com intuito de garantir um direito de cidadania (SARAVIA, 2006).

Panorama Cultural de Roraima

|

65


A fim de tornar fácil a leitura, construímos e apresentamos os vários conceitos e suas implicações para a cultura. Isso por que o Estado de Roraima, especialmente o município do Cantá, possui um patrimônio cultural riquíssimo, tanto em ordem material quanto em ordem imaterial em suas várias formas. Assim, é importante compreender tais conceitos. De acordo com a UNESCO (1964), entendemos por bens culturais aqueles bens móveis e imóveis de grande valor/importância para o patrimônio cultural de cada país. A fim de esclarecer o leitor acerca disso, apresentamos como exemplos destes bens as obras de arte e arquitetura, os manuscritos, os livros e outros bens de interesse artístico, histórico e arqueológico, os documentos etnológicos, os espécimes de flora ou fauna, as coleções científicas e as coleções importantes de livros e arquivos, incluindo os musicais. Já acerca dos bens materiais imóveis, podemos dizer que estes são encontrados de diversas formas na sociedade, tais como: sítios de valor histórico, arqueológico, artístico, ecológico ou científico. Na verdade, são bens que não se podem mudar de lugar ou deslocá-los fisicamente de um espaço a outro. Na verdade, são bens que identificam um país, a sua cultura e a própria comunidade. Assim, entendemos que o patrimônio é a nossa herança do passado com que convivemos o hoje e passamos para as gerações futuras. Por este motivo que se faz necessária sua preservação, haja vista que o patrimônio público é direito de todos a usufruir e dever por zelar e preservar. Dando continuidade à conceituação, os bens materiais móveis, podemos dizer, são aqueles que podemos mover de um lugar para outro. Não há problemas ao serem transportados. Como exemplo, podemos citar as obras de artes, documentos, livros, equipamentos, instrumentos. De acordo com Silva (2009), a UNESCO traz à tona a definição de patrimônio cultural imaterial. Este pode ser definido como: as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas - junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados - que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural (SILVA, 2009, p. 03).

Assim, este pode ser transmitido de geração a geração e, constantemente, recriado pelas comunidades e grupos tanto em função de seu ambiente quanto em função de sua interação com a natureza, além de sua história. Geralmente está ligado a um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo, assim, para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana. Os bens culturais imateriais são as formas de expressão, sejam por meio da dança, da música, das festas e outros. Como o objeto desta pesquisa é o município do Cantá, nele realizamos o levantamento de suas festas. É interessante apresentar um histórico da região e sua comunidade em volta.

66

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


2 CANTÁ: localizando-se no espaço O Estado de Roraima é composto por 15 municípios, dentre os quais está o município do Cantá, localizado no centro-leste do Estado, integra a Região Metropolitana de Boa Vista, capital do estado, conforme a Lei Complementar Estadual n.º 130, de 21 de dezembro de 2007. O município se separa fisicamente do município de Boa Vista pelo principal rio da capital e o maior do estado: o Rio Branco. A ligação entre as duas cidades se dá por meio da Ponte dos Macuxis, que possui 1.200 metros de extensão, construída entre os anos de 1972 a 1975. O município do Cantá tem uma área de aproximadamente 7.691 km² e com uma população estimada, segundo o IBGE (2015), em 16.149 habitantes. Este município faz limite, ao norte, com Boa Vista e Bonfim e, ao sul, com município Caracaraí; ao leste apenas com Bonfim e ao oeste com Boa Vista, Mucajaí e Iracema, conforme a FIGURA 1: Figura 1 - Mapa do município de Cantá

Fonte: RORAIMA (2010).

Além disso, o município de Cantá ocupa o 6º lugar no Ranking do PIB dos municípios do Estado de Roraima. Destacamos ainda que a participação da Administração Pública no PIB municipal foi de 51,15%, no ano de 2008, o que correspondeu a aproximadamente R$ 118 milhões de reais.

Panorama Cultural de Roraima

|

67


Conforme QUADRO 1, podemos verificar a evolução do PIB do município no período que corresponde os anos entre 2003 a 2008: QUADRO 1- Evolução do PIB EVOLUÇÃO DO PIB 2003

2004

2005

2006

2007

2008

67.524

73.626

4.792

88.659

96.322

117.945

Fonte: RORAIMA (2010). Obs.: PIB a Preço de Mercado (1) do Município de Cantá - 2003 a 2008 (em R$ 1.000).

O município apresenta excelente potencial: para a pecuária, tanto de leite como de corte. O potencial produtivo está concentrado nas colônias agrícolas Confiança III e Serra Grande I e II. No que tange à produção agrícola destacam-se as culturas tradicionais (arroz, milho, mandioca, abacaxi e banana), bem como as culturas permanentes cupuaçu, coco, cítricos e outras (RORAIMA, 2010, p. 42).

3 CAÃNTA: um nascer esplêndido A planta que deu origem ao nome do município, que passou de vila Braz de Aguiar para Cantá, se chama caãnta2, planta pequena com folhas grandes. Os primeiros colonos usavam a caãnta, juntamente com a fibra de arumã, para forrar os peneiros feitos pelos indígenas para empaneirar farinha, milho, feijão e o que tivesse. Isto por que sacolas naquela época eram difíceis de encontrar nas residências. O Senhor Osvaldo Aureliano da Costa tem 77 anos, filho de José Aureliano da Costa e Maria Paula da Costa, cearenses que se fixaram na Braz de Aguiar, após vir para Roraima. Segundo ele nos informou que em virtude das sucessivas queimadas que ocorreram no município ao longo dos anos, bem como diversas outras ações antrópicas naquela região fizeram com que a planta fosse desaparecendo. Hoje, esta se encontra em poucas mudas, sobretudo, no igarapé Sucuriju e no pé das serras. O Senhor Osvaldo Aureliano da Costa relatou que, no início, para que as colônias Braz de Aguiar (Cantá), Fernando Costa (Mucajaí) e Coronel Mota (Alto Alegre) fossem povoadas, o governo federal ajudava os colonos com hospedagem na capital durante a adaptação, além da doação de trinta hectares de terra, ferramentas agrícolas, entre outros auxílios: Entraram na colônia 18 famílias. Na primeira remessa, chegaram à colônia oito pais de famílias. Foi assim que entramos para cá. Foram 16 dias abrindo picadas e fazendo barracão. Depois das aberturas feitas e barracões construídos foi que as famílias se mudaram. Nesse período o colono era obrigado a fazer oito linhas de roça. [Na época o transporte de mantimentos era feito a pé e] às vezes, quando se conseguia um cavalo, o rancho era carregado em uma cangalha puxada pelo cavalo, assim, era o transporte (informações verbais)3.

68

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Palavra indígena que significa planta da mata. O nome científico desta é demusaceae, conhecida como cantazinho. 2

Entrevista concedida por Osvaldo Aureliano da Costa, em Alto Alegre-RR. 3


As lembranças levaram o senhor Osvaldo ao seu passado de muito trabalho, das inúmeras dificuldades que enfrentara para se fixar na Colônia. Ele lembra que até a década de 1960, o transporte era feito em carro de boi e que o primeiro trator que chegou à colônia levou três dias. Os primeiros colonos foram: Francisco Sá, José Aureliano da Costa, Francisco Aureliano da Costa, Francisco Cesário da Costa, Laurentino, Josué Arqueiro, Davi, Josué, Miguel Lopes, Isaias, Lisandro, Baltazar, Francisco Baltazar, Anacleto e Manuel Correia Lima. A primeira escola da vila Braz de Aguiar foi construída no Grande Ajuri4, com os 24 colonos que moravam na vila. Era um barracão de 6mx8m coberto de palha, meia parede também de palha. A professora Aurelina Bezerra lecionava antes em sala de uma casa de taipa com chão batido.

4 CANTÁ E SUAS MANIFESTAÇÕES CULTURAIS No município do Cantá são realizadas muitas festas em diferentes localidades daquela região. Nas comunidades indígenas, por exemplo, as festas estão relacionadas ao dia a dia na comunidade. Existem grupos de danças, apresentações de coral, bem como diversas outras atividades que caracterizam o município por suas peculiaridades. Segundo o Tuxaua da comunidade da Taba Lascada, César da Silva (informações verbais)5, acontece naquela localidade, em abril de cada ano, a Semana dos Povos Indígenas, culminando com o Dia do Índio, no dia 19. O evento conta com palestras e seminários voltados para as questões indígenas. Quanto aos grupos de dança, podemos destacar a apresentação da dança do Parixara, que geralmente acontece no Centro Comunitário. Além da dança, também se apresenta o coral, realizam-se reuniões e apresentações das mais diversas. Outros eventos também são importantes naquela região tanto para o município quanto os seus moradores. Podemos destacar o festejo na comunidade de Santo Amaro, realizado em 15 de janeiro. Ainda existe a Festa do Beiju, que ocorre na primeira semana de dezembro. Durante o evento tem exposição de artesanatos feitos em sua maioria com sementes, fibra de buriti (saias), tipiti e peneiras. Na segunda quinzena de fevereiro, acontece na Vila Santa Rita sua tradicional vaguejada. A importância desse evento é tão visível que ele foi formalmente criado pela Lei Municipal n.º 238/2012. A vaquejada atrai público de vários municípios e os produtores rurais. É a prática tradicional dos povos da Amazônia, na qual grupos e pessoas se unem participando coletivamente dos trabalhos de uma comunidade ou família. 4

Entrevista concedida por Cesar da Silva, em Alto AlegreRR, em maio de 2015. 5

Raiz com a qual fazem a farinha e outros produtos. 6

Em 19 de março, a comunidade da Malacacheta realiza o Festejo de São José. Nos dias 21 e 22 de março, a festa acontece na Vila Fonte Nova. Na ocasião, os habitantes festejam um dos alimentos que é plantado e transformado em farinha e beiju, produtos muito consumidos pelos indígenas. É a tradicional Festa da Mandioca6. No segundo fim de semana de maio, ocorre na Vila União a Festa do Doce. Evento que também está regulamentado pela Lei Municipal n.º 229/2011.

Panorama Cultural de Roraima

|

69


No final de julho, o município realiza o Arraiá Cantaense, com apresentações de quadrilhas e show com bandas de forró do próprio município, e também da capital, Boa Vista. Em agosto, a movimentação cultural ocorre na Serra Grande I, com a realização da Festa do Milho, momento em que os produtores comemoram a grande safra. Vale ressaltar que, excepcionalmente, no ano de 2015, o evento ocorreu nos dias 18 e 19 de setembro por conta de logística para a realização da festa. O evento também é reconhecido pela Lei Municipal n.º 191/2008. Logo abaixo, podemos visualizar a foto das rainhas da festa referente a 2014 e 2015: Figura 2 - Rainhas 2014 e 2015

Fonte: Vânia Coelho (2015).

Na comunidade do Barro Vermelho, os moradores realizam a Feira da Produtividade com alimentos produzidos por eles como: abóbora, batata doce, milho, arroz, cana-de-açúcar, farinha, goma, beiju, carimã, pimenta, banana e macaxeira. A Feira da Produtividade ocorre no mês de agosto e reúne todos os moradores da comunidade. Figura 3 - Arranjo feito com arumã

Fonte: Vânia Coelho (2015).

70

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Na comunidade tem artesãos trançam a peneira de farinha e de beiju, o tipiti, vassoura e abanos feitos com fibra de arumã. O artesanato é vendido na própria comunidade e eles fazem também por encomenda. Dentre os artesãos, conhecemos a senhora Arilene Silva (wapixana), que trabalha com sementes e coquinhos encontradas na natureza. Em 17 de outubro, comemora-se o aniversário do município, geralmente com algumas atividades que se encerram com forró. Ainda em outubro, a comunidade do Canauani realiza o Encontro Intercultural, que reúne indígenas de várias comunidades para debater suas demandas e também momento em que acontecem apresentações culturais, como o coral indígena da comunidade, danças, venda de comidas típicas e de artesanato. Em novembro, ocorre a Festa da Damurida, comida típica dos indígenas, feita com peixe e bastantes pimentas de variadas espécies. A festa é regada com comidas típicas, danças, competições e outras apresentações culturais. O evento é uma realização do povo Wapichana, na comunidade da Malacacheta, com o objetivo de resgate cultural e a divulgação da cultura indígena daquela comunidade. O município do Cantá é conhecido como a capital do abacaxi, pela grande produção de fruto. Assim, nos dias 19 e 20 de dezembro, na Serra Grande II, é realizada a Festa do Abacaxi que culmina no período da safra. Esse festejo é reconhecido pela Lei Municipal n.º 192/2008 (RORAIMA, 2010). Mas no município não existe somente festas. São realizadas diversas outras atividades culturais tanto de iniciativa de gestores como de particulares. Há naquele município inclusive o turismo rural. O grande exemplo que se pode destacar é a Fazenda Castanhal, de propriedade da Senhora Gerusa Carvalho, que se localiza na Serra Grande I, e oferece lazer aos visitantes como caminhadas, passeio a cavalo, passeio de barco, trilhas, observação de pássaros, entre outros serviços. Vale destacar ainda que o município entrou no roteiro de turismo em áreas indígenas, a saber: as comunidades indígenas Taba Lascada e o Canauani. O anúncio foi feito durante a 43ª Feira Abav Expo Internacional de Turismo, realizada em São Paulo, no Anhembi. A empresa responsável pelos roteiros nessas áreas é a Roraima Adventure.

Panorama Cultural de Roraima

|

71


CONSIDERAÇÕES FINAIS O município do Cantá tem grande potencial artístico e cultural imaterial e material. As manifestações podem ser conferidas nas suas diferentes festas realizadas em diferentes comunidades indígenas. Vale ressaltar que no Cantá vivem as etnias Wapichana e Macuxi, nas comunidades Serra da Lua, Jacaminzinho Malacacheta, Canauani, Muriru, Barro Vermelho, Campinho, Taba Lascada, entre outras. Constatamos que, embora já existam no Cantá a Secretaria Municipal de Cultura e diversos eventos festivos, inclusive resguardados por lei, sem a boa vontade do poder público, bem como a presença de um gestor preocupado com as questões mais gerais do município e que seja sensível às questões culturais, dificilmente serão implementados todos os elementos que compõem o SMC. Este é o principal fator que contribui para o lento andamento da cultura.

REFERÊNCIAS CHAUI, Marilena. Cultura política e política cultural. Estudos avançados, São Paulo, v. 9, n. 23, jan./apr. 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ea/ v9n23/v9n23a06.pdf>. Acesso em: 06 out. 2015. DOURADO, Luiz Fernandes. Políticas e gestão da educação básica no Brasil: limites e perspectivas. Educ. Soc, Campinas, v. 28, n. 100, oct. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v28n100/a1428100.pdf>. Acesso em: 06 out. 2015. LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 14. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. RORAIMA. Secretaria de Estado do Planejamento e Desenvolvimento de Roraima. Informações socioeconômicas do município do Cantá – RR. Boa Vista: CGEES/SEPLAN, 2010. Disponível em: <http://www.seplan.rr.gov.br/ roraimaemnumeros/dados_municipios/ Canta.pdf>. Acesso em: 06 out. 2015. SARAIVA, Enrique. Introdução à teoria da política pública. In: SARAVIA, Enrique; FERRAREZI, Elisabete (Org.). Políticas públicas: coletânea: Brasília: ENAP, 2006. Disponível em: <http://antigo.enap.gov.br/index.php?option=com_ docman&task= doc_view&gid=2864>. Acesso em: 06 out. 2015. SILVA, Daisy Rafaela da. Patrimônio cultural imaterial: antecedentes e proteção jurídico ambiental. Âmbito jurídico, Rio Grande-RS, v. 12, n. 63, abr. 2009. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_ link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5931>. Acesso em: 06 out. 2015. UNESCO. Recomendação sobre medidas destinadas a proibir e impedir a exportação, a importação e a transferência de propriedades ilícitas de bens culturais. 1964. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br>. Acesso em: 06 out. 2015.

72

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Fotografia: acervo do Grupo Locômbia Teatro de Andanças


BREVE DIAGNÓSTICO DA SITUAÇÃO DA CULTURA NO MUNICÍPIO DE CARACARAÍ/RR Francilene Cardoso da Silvaa, Sebastião Lima Diniz Netob, Azenilson Hortêncio Monteiroc, Vilso Junior Santid

INTRODUÇÃO O presente trabalho tem o objetivo de apresentar um breve diagnóstico da situação da cultura no município de Caracaraí, no Estado de Roraima. Nele serão exibidos alguns aspectos sobre a realidade histórica, social e econômica do município com a finalidade de mostrar de maneira objetiva e concisa a estruturação e a disseminação da cultura ao longo da história, evidenciando seus potenciais e suas fragilidades. Em atendimento a um dos pré-requisitos exigidos para conclusão do Curso de Extensão em Gestão Cultural, realizado pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), elaboramos este breve diagnóstico situacional da realidade cultural do município de Caracaraí/RR, descrevendo histórico-geograficamente e apresentando características da economia, a cultura e um levantamento do patrimônio cultural material e imaterial do município. Também discutimos as potencialidades do município em geral, na economia, na produção agrícola e pecuária, e as leis voltadas para a cultura que criam eventos culturais e datas comemorativas. Descrevemos ainda as organizações e associações existentes no município de Caracaraí que, junto com a Secretaria Municipal de Educação, planejam e formulam projetos que beneficiam as famílias da região que participam das respectivas entidades. Evidenciamos também os registros de artistas, artesãos e organizações culturais, a partir do levantamento feito pelo Projeto “Colchas de Retalhos” da Universidade Estadual de Roraima (UERR); e ainda o registro do calendário de eventos, os pontos turísticos do município e as políticas públicas que objetivam financiar as atividades de incentivo à cultura do estado e, para finalizar, o Conselho Municipal de Cultura.

74

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Servidora da Universidade Federal de Roraima, Graduada em Ciências Contábeis, e-mail: francilene.cardoso@ufrr.br a

Servidor da Prefeitura Municipal de Boa Vista, Graduado em Psicologia, e-mail: dinizbv@hotmail.com b

Servidor da Prefeitura de Caracaraí, e-mail: monteirokity@hotmail.com c

Orientador do Curso de Extensão em Gestão CulturalUFRR/MinC, professor da Universidade Federal de Roraima, Doutor em Comunicação Social, e-mail: vilso.santi@ufrr.br d


1 HISTÓRICO DO MUNICÍPIO Caracaraí é conhecida como “Cidade-Porto” por ter o maior movimento fluvial do estado. Teve como primitivo habitantes da nação dos paravianas, na época, vulgarmente chamados de paravilhanas, os quais dominava as margens do Rio Branco. O distrito-sede de Caracaraí, outrora simples campo destinado ao embarque de bovinos, era propriedade particular do fazendeiro coronel Bento Ferreira Marques Brasil. Teve suas primeiras residências erguidas por volta de 1900, sendo seus habitantes empregados ou vaqueiros do referido cidadão. Caracaraí nasceu como um local de embarque de gado para Manaus, capital do Estado do Amazonas. Os bovinos desciam até a “Boca da estrada”, onde se iniciam as Corredeiras do Bem-Querer. Ali eram desembarcados e tangidos até um curral no Porto Municipal. Depois eram embarcados novamente e enviados de barco ao matadouro de Manaus. Mercadorias vindas de Manaus e com destino a Boa Vista faziam este caminho em sentido inverso. E isso foi o que desenvolveu o lugar. O nome dado pelos indígenas a um pequeno gavião comum na região deu origem ao nome do município, criado pela Lei Federal n.º 2.495, de 27 de maio de 1955 e, segundo dados do Censo 2010 (IBGE, 2010), tem aproximadamente 20.261 habitantes. 1.1 GEOGRAFIA Caracaraí está localizada na margem direta do Rio Branco e apresenta um clima quente e úmido. Seus limites são com os municípios de Iracema, Cantá e Bonfim ao Norte; Guiana ao Nordeste; Caroebe ao Sudeste; São João da Baliza, São Luiz do Anauá e Rorainópolis ao Sul, e o município amazonense de Barcelos ao Oeste. É o maior município roraimense em extensão territorial. As principais localidades de Caracaraí são: Sede, Vila Novo Paraíso, Vila Petrolina do Norte e Vila Vista Alegre. Figura 1 – Localização do Município de Caracaraí

Foto: RORAIMA (2010). Panorama Cultural de Roraima

|

75


O município é cortado pela rodovia federal BR-174 que interliga Boa Vista a Manaus e Venezuela. Caracaraí detém elevados percentuais de áreas protegidas e possui uma reserva indígena de 7.638,06 Km2, onde vivem as etnias wai-wai, wapixana e yanomami. 1.2 TRANSPORTE O Aeroporto de Caracaraí possui a quarta maior pista de pouso da Amazônia Ocidental, com 2.500m de extensão, concluída pela Comissão de Aeroportos da Amazônia (COMARA), em 2003. A navegabilidade de Caracaraí a Manaus, pelo baixo Rio Branco, é maior que em outros pontos ao Norte, embora grandes embarcações tenham dificuldades durante as fortes secas. As duas maiores e principais estradas federais de Roraima, BR-174 e BR-210/Perimetral Norte, cruzam-se no município, sendo que, no trecho de 130 Km, entre a sede municipal e a Vila de Novo Paraíso, as duas rodovias seguem sobrepostas. 1.3 SERVIÇOS URBANOS O município dispõe de agência bancárias e dos Correios, rede telefônica e estação de rádio difusão. Na saúde, existe um hospital público com 25 leitos e vários postos de atendimento no interior. Caracaraí conta ainda com um fórum de justiça e uma delegacia de polícia civil. Existem no município 24 escolas municipais, nove escolas estaduais, das quais uma é indígena; duas escolas técnicas e dois polos universitários.

2 POTENCIALIDADES A economia do município de Caracaraí apresenta perspectivas agrícolas positivas. No município estão assentadas cerca de 3.150 famílias de pequenos produtores. Além da atividade agrícola, existe uma intensa atividade comercial baseada em produtos de fabricação caseira. A aptidão agrícola do município, segundo as condições climáticas, possibilita o cultivo de inúmeras culturas. A caça e a pesca são as principais atividades das comunidades ribeirinhas e indígenas, sendo a pesca umas das principais atividades econômicas do município e o pescado de Caracaraí um produto de exportação. Na região de Caracaraí, a maioria dos produtores rurais tem título de posse do lote que ocupa. No município, existem 17 associações de produtores rurais, que junto à Secretaria Municipal de Agricultura e a Cooperativa de Produtores Rurais executam projetos que beneficiam os agricultores familiares da região. O crédito rural é um instrumento de política agrícola que objetiva financiar as atividades rurais. Existem três modalidades básicas do crédito: custeio, investimento e comercialização.

76

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


3 POLÍTICAS CULTURAIS O setor de cultura do município é gerido pelo Departamento de Cultura da Prefeitura, vinculado à Secretaria Municipal de Educação, e possui apenas um funcionário, o diretor de cultura. De acordo com a Lei n.º 573/2014, que estima as receitas e fixa as despesas municipais, para o exercício de 2015, destinou-se à cultura um percentual de 1,0129% do orçamento geral da Prefeitura. Este cenário passa a ser estruturado após a aprovação da lei que institui o Sistema Nacional de Cultural (SNC), sendo concluído com a “Ementa Constitucional n.º 236/2008, que insere a cultura no rol dos direitos sociais” (BRASIL, 2012, p. 40). Com a busca pela implementação do Sistema Municipal de Cultura (SMC), inicia-se todo um aparato de organizações para que o sistema seja consolidado, instituindo-se assim uma organização que reúne: [...] a sociedade civil e os entes federativos da República Brasileira – União, estados, municípios e Distrito Federal – com suas respectivas políticas e instituições culturais, incluindo os subsistemas setoriais já existentes e outros que poderão vir a ser criados: de museus, bibliotecas, arquivos, do patrimônio cultural, de informação e indicadores culturais, de financiamento da cultura, etc. (BRASIL, 2012, p. 41).

É com base nesta organização que se inicia um trabalho de mobilização dos Estados e Municípios na perspectiva de um trabalho conjunto e que venha a atender as demandas do setor cultural aproveitando os incentivos, os projetos e as organizações já existentes tendo em vista que o objetivo do SNC constitui-se em: Formular e implantar políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da federação e a sociedade civil, promovendo o desenvolvimento–humano, social e econômico–com pleno exercício dos direitos culturais e acesso aos bens e serviços culturais (BRASIL, 2012, p. 42).

Percebemos assim que, em Caracaraí, a Lei Estadual de Incentivo à Cultura também pode ser citada como uma política pública, do Governo do Estado, voltada às produções culturais de Roraima, que beneficia iniciativas em Caracaraí e que se insere neste cenário da implementação/organização do SNC. O Festival Folclórico de Caracaraí foi um dos projetos aprovados pela referida lei no último exercício. Verificamos ainda que as políticas públicas nessa área são poucas e restritas, é importante admitir que o seu funcionamento contribui na consolidação e disseminação da cultura do município, pois as ações dessa área estão interligadas às demais proporcionando alguns avanços. Em termos de organização social, o município apresenta uma diversidade e um grande potencial representado por meio das associações da área de cultura, que poderão possibilitar um impulso significativo na economia local, com o incentivo ao turismo e a venda de produtos relacionados aos fazeres da cultura de Caracaraí. Essa logística passa pelo fortalecimento e desenvolvimento do Sistema Municipal de Cultura.

Panorama Cultural de Roraima

|

77


3.1 LEGISLAÇÃO O município de Caracaraí também possui leis que instituem alguns eventos culturais, são eles: a Lei n.º 305/98, de 16 de Junho de 1998, que trata do Dia da Bíblia; a Lei n.º 447/07, que trata da realização do Festival Folclórico de Caracaraí; a Lei n.º 456/07 que trata do Arraial do Pescador, o qual faz parte do Calendário Municipal da Cidade e ainda, a Lei n.º 553/13, que trata da Semana da Cultura Gospel. Estas são algumas leis que podem se relacionar à cultura de Caracaraí. Há ainda a lei n.º 439/2007, que institui os feriados municipais oficiais. Na apresentação destas leis, percebemos que elas são limitadas em termos de aspectos culturais, pois estão relacionadas à promoção de eventos e a um determinado seguimento sem levar em consideração uma ação continua, de formação permanente e diversificada. Isso para que a cultura não se torne um elemento alienante. 3.2 O CONSELHO MUNICIPAL DE CULTURA DE CARACARAÍ O município de Caracaraí ainda não possui um Conselho Municipal de Cultura, mas já dispõe de uma minuta de lei que cria o Sistema Municipal de Cultura. No entanto, para sua implantação e funcionamento, há necessidade de cumprir outros protocolos e ritos, como, por exemplo, a elaboração do Plano Municipal de Cultura. Entendemos assim que a cultura deve ser trabalhada em sua tridimensionalidade: simbólica, econômica e cidadã (BRASIL, 2012). Por conta destes aparatos de valorização e organização do sistema cultural, os debates acerca da elaboração do Plano Municipal de Cultura são extremamente necessários, contudo constatamos que, em Caracaraí, as discussões sobre a temática ainda não se iniciaram. Tal fato se deve à falta de consciência da comunidade local e do poder público municipal para a importância estratégica que a cultura pode ter no desenvolvimento do município. Mesmo com a minuta que cria o SMC de Caracaraí, tramitando na Câmara de Vereadores do Município, há vários meses, parece não haver interesse político para que a lei venha a ser aprovada. Dessa maneira, o Sistema não é regulamentado e as ações culturais desenvolvidas continuam a ser pontuais e mal articuladas, produzindo com isso resultados questionáveis e limitados no mercado cultural local. Isso se deve a não existência de um SMC, mas sim de um Departamento de Cultura vinculado à Secretaria Municipal de Educação, o qual tenta suprir algumas demandas do setor cultural, contudo, ainda bastante desvinculadas das propostas existentes e da necessidade do setor. O trabalho que se tem realizado se limita à realização de ações pontuais, como o levantamento de artistas, artesões e organizações culturais, contudo, o trabalho de incentivo, apoio e valorização destes ainda não são viabilizados.

78

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


4 ARTISTAS, ARTESÕES E ORGANIZAÇÕES CULTURAIS Ao trabalharmos com o conceito de artistas, artesões e organizações culturais do município, entendemos que estes fazem parte do patrimônio da cultura local. Segundo a Constituição Federal, em seu artigo 216, Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira (BRASIL, 1988).

Neste sentido, o trabalho cultural no município de Caracaraí traz à tona os bens patrimoniais locais sejam eles materiais ou imateriais. Bens materiais, segundo o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, “[...] é composto por um conjunto de bens culturais classificados segundo sua natureza, conforme os quatro Livros do Tombo: arqueológico, paisagístico e etnográfico; histórico; belas artes; e das artes aplicadas” (INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL, 2015, p. 1). Já os bens imateriais, segundo o IPHAN, dizem respeito [...] àquelas práticas e domínios da vida social que se manifestam em saberes, ofícios e modos de fazer; celebrações; formas de expressão cênicas, plásticas, musicais ou lúdicas; e nos lugares (como mercados, feiras e santuários que abrigam práticas culturais coletivas) (INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL 2015, p. 1).

A partir desta compreensão acerca dos bens patrimoniais, apresentamos um levantamento dos elementos concretos da cultura de Caracaraí que são o registro e inventário dos artistas, artesãos e organizações culturais de Caracaraí. Esse levantamento contou com a colaboração decisiva do Projeto “Colcha de Retalhos” – uma ação de Extensão Universitária realizada por acadêmicos, docentes e egressos da UERR/Campus Caracaraí. Foram definidas cinco frentes de ação, quais sejam: 1. Mapeamento das organizações culturais: pessoas jurídicas; 2. Identificação dos sujeitos culturais–saberes: parteiras, raizeiras, benzedeiras, rezadeiras, casas de religião de matriz indígena ou africana; 3. Identificação dos sujeitos culturais–fazeres: artesãos, estilistas, desenhistas, grafiteiros, pintores, poetas, escritores, cordelistas, designers, cantores, compositores, músicos etc; 4. Mapeamento dos bens edificados; e 5. Identificação das famílias pioneiras. Parte dos resultados coletados pode ser verificada a seguir. Os depoimentos das famílias pioneiras foram prejudicados em sua coleta, assim não apresentaremos estes dados neste momento. Destacamos, contudo, a existência de pontos turísticos do município os quais fazem parte do cenário patrimonial de Caracaraí, perfazendo suas potencialidades.

Panorama Cultural de Roraima

|

79


4.1 ORGANIZAÇÕES CULTURAIS Conforme levantamento de campo, registramos três organizações culturais na sede do município, são elas: a) Associação Folclórica de Caracaraí Cobra Mariana; b) Associação Xorroxó de Caracaraí; e c) Grupo Folclórico de Caracaraí Gavião Caracará. Todos estes agrupamentos culturais possuem registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica e atuam na promoção de ações culturais no município de Caracaraí. 4.2 SUJEITOS CULTURAIS–SABERES A categoria denominada sujeitos culturais–saberes se preocupou em arrolar os sujeitos detentores e praticantes de saberes tradicionais, alguns deles já ameaçados de extinção. Os sujeitos culturais de saber com maior destaque na comunidade de Caracaraí são apresentados a seguir: Quadro 1- Sujeitos Culturais–Saberes Nome

Tipo de Saber ou Ofício

Sebastião Fonseca de Andrade Pega barriga, parto, garrafada e massagem Francisco Ferreira Lima

Reza

Sebastião José da Silva

Garrafada

Maria de Fátima Parente

Parto, reza, pega barriga, garrafada

Nestor Ferreira da Silva

Religião de Matriz Africana

Raimundo Farias de Souza

Reza, pega barriga, garrafada, benzimento

Fonte: Baseado em informações do Projeto Colcha de Retalhos (2015).

4.3 SUJEITOS CULTURAIS–FAZERES Na categoria denominada sujeitos culturais–fazeres, buscamos diagnosticar pessoas que atuavam diretamente na parte artística do município. Os resultados mais significativos desse encontro constam no QUADRO 2 disposto na sequência: Quadro 2 - Sujeitos Culturais – Fazeres Nome

Tipo de Atividade ou Ofício

José Roberto de Lima Correia

artesão, desenhista, pintor, Trabalhador manual e estilista

Cleveland Lima da Silva

músico, cantor

Jeremias Ferreira Gomes

músico, cantor e compositor produtor musical

Isaque Ferreira Gomes

poeta e compositor

Marina Rodrigues da Silva

artesã, pintora e trabalhadora manual

Genival Dias Castro

artesão (cestaria, esculturas, biojoias, entalhes em madeira) e designer

Fonte: Baseado em informações do Projeto Colcha de Retalhos (2015).

80

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


4.4 BENS EDIFICADOS Já os bens edificados de relevância encontrados na cidade estão listados conforme o QUADRO 3. Quadro 3 - Bens Edificados Nome Prefeitura Municipal de Caracaraí Prédio do INCRA (ocupado atualmente pela ADERR) Prédio do CRAS Corpo de Bombeiros (antiga Rodoviária) Escola Municipal Couto de Magalhães Monumento aos Pioneiros Orla Monumento dos Milagres Praça Padre Calleri Igreja Nossa Senhora do Livramento Ponte sobre o Rio Branco Fonte: Baseado em informações do Projeto Colcha de Retalhos (2015).

4.5 PONTOS TURÍSTICOS Conforme dados do Governo do Estado de Roraima, Caracaraí apresenta um atrativo de grande importância para a atividade do ecoturismo, dadas as inigualáveis oportunidades de observação da flora e fauna. Entre os pontos turísticos mais destacados do município estão: as Corredeiras do Bem-Querer, o Complexo Ecoturístico da Ilha de Jarú, e o Amazon Água Boa Lodge. Com base neste levantamento dos bens culturais do município, podemos perceber um leque bastante grande de patrimônios que adentram o material (organizações culturais, bens edificados e pontos turísticos) e o imaterial (sujeitos culturais-saberes e sujeitos culturais-fazeres). Contudo, o cenário de preservação e valorização destes bens ainda carece de atenção e entendimento pelos gestores culturais e pela comunidade como um todo. Os bens patrimoniais, não só em Caracaraí, carecem de cuidados na perspectiva de preservação da história e da perpetuação da cultura. O município de Caracaraí, por conta de um cenário ainda recente e desconexo da cultura, apresenta-se ainda com maiores dificuldades, carecendo de qualquer incentivo ao desenvolvimento destes espaços e destes sujeitos.

Panorama Cultural de Roraima

|

81


6 CALENDÁRIO DE EVENTOS Ao tratarmos do calendário de eventos, podemos destacar que alguns municípios de Roraima são referência em determinadas manifestações culturais, e Caracaraí é um deles. No primeiro trimestre de cada ano, realiza-se o Carafolia, considerado o melhor carnaval do estado de Roraima. Também ocorrem no município, o Festival Folclórico Gavião Caracará e Cobra Mariana, que tem como atração principal a disputa entre os dois grupos folclóricos da cidade (Cobra Mariana e Gavião Carcará), trazendo uma disputa semelhante ao Festival Folclórico de Parintins, realizado no Amazonas. Ambos são os dois maiores eventos que a cidade-porto realiza para celebrar a cultura. Merecem destaque também algumas datas festivas e históricas: o Aniversário do Município, o Festejo da Nossa Senhora do Livramento, o Dia Consagrado a Santa Luzia e o Campeonato Municipal de Futebol. Estes festejos, ao retratarem o cenário cultural de Caracaraí, demonstram sua riqueza e o potencial patrimonial. Atentar para as políticas de valorização, preservação, incentivo e desenvolvimento destas manifestações culturais é algo que pode ser alavancado com um Conselho Municipal Cultural, organizado e independente, com verbas e recursos humanos necessários.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste trabalho, observamos as peculiaridades de Caracaraí por meio da pesquisa bibliográfica e pesquisa empírica qualitativa realizada pelo grupo “Colcha de Retalhos”. Ao fazermos esse diagnóstico, enfrentamos a falta de registro e a dificuldade perante os órgãos públicos na obtenção de informações nos documentos oficiais dentro do município. Percebemos também que ainda há muito a ser feito para que a cultura de Caracaraí contemple suas especificidades. Verificamos ainda que os agentes públicos são fundamentais para que haja a concretização da proposta de formação do Conselho Municipal de Cultura e também para a formatação de um Plano de Desenvolvimento Cultural que contemple as potencialidades encontradas no município, elementos centrais que fazem parte da construção do Sistema Municipal de Cultura de Caracaraí. Nesse sentido, os dados apontam que Caracaraí possui um grande potencial cultural, imaterial e material. As manifestações culturais podem ser comprovadas por meio da realização dos festivais, nos quais se misturam raças, etnias, credo e religiosidade, expressando a diversidade que marca a cidade e atrai um grande número de visitantes, seja pela grande celebração que se promove, pela gastronomia, ou pelas belezas naturais da região. O diagnóstico apresentado nos mostra que existe a necessidade de investimentos e aplicabilidade de leis para o incentivo de grupos culturais que já vêm trabalhando e desenvolvendo suas atividades no município, junto com o Departamento de Cultura. Porém, ficou evidente a necessidade de se criar leis que possibilitem o acesso à cultura, de forma que atenda os anseios da sociedade local, leis 82

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


que consolidem políticas culturais, visando uma melhor utilização dos espaços físicos existentes e suprindo os anseios da comunidade. Diante das informações coletadas, sentimos a necessidade de um olhar diferenciado para potencializar a cultura local por meio de criação de leis que incentivem de fato o desenvolvimento da cultura local e possam contribuir significativamente para o seu fortalecimento. Ficou também evidente a necessidade de implantação de um sistema normativo que garanta o funcionamento das associações culturais já existentes, valorize os saberes e fazeres tradicionais já consolidados, e estimule a ocupação adequada de espaços físicos que ajudaram a marcar a identidade local; mas que igualmente estimule o desenvolvimento de novas práticas culturais e vanguardísticas.

REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição Federal 1988. Disponível em: <http://portal.iphan.gov. br/pagina/detalhes/276/>. Acesso em: 20 jan. 2016. BRASIL. Ministério da Cultura. Secretaria de Articulação Institucional. Sistema Nacional de Cultura: guia de orientações para os municípios: perguntas e respostas. Brasília-DF: MinC, 2012. 80 p. Disponível em: <http://www.cultura. gov.br/documents/10907/963783/cartilha_web.pdf/8cbf3dae-0baf-4a3088af-231bd3c5cd6e>. Acesso em: 20 jan. 2016. CARACARAÍ (RR). Prefeitura. Informações sobre Caracaraí. 2014. Disponível em: <http://www.caracarai.rr.gov.br/noticia.php?Id=13>. Acesso em: 22 nov. 2015. FREITAS, Aimberê. Estudos Sociais - RORAIMA: geografia e história. São Paulo: Corprint, 1998. IBGE. Censo 2010: resultados. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em: 22 nov. 2015. INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL (Brasil). Patrimônio Material. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/pagina/ detalhes/ 276>. Acesso em: 20 jan. 2016. INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL (Brasil). Patrimônio Imaterial. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/pagina/ detalhes/ 234>. Acesso em: 20 jan. 2016. RORAIMA. Governo do Estado. Turismo. Disponível em: <http://www.portal. rr.gov.br/turismo/site/?governoderoraima=caracarai>. Acesso em: 20 nov. 2015. RORAIMA. Secretaria de Estado do Planejamento e Desenvolvimento de Roraima. Informações Socioeconômicas do Município de Caracaraí – RR. Boa Vista: CGEES/SEPLAN – RR, 2010. 67 p.

Panorama Cultural de Roraima

|

83


Fotografia: Isaque Amorim


DIAGNÓSTICO CULTURAL DO MUNICÍPIO DE CAROEBE Carolina Viana Albuquerquea, Janeide Barbosa de Souzab, Paulo Santos Dias Filhoc, Regiane Aparecida da Silva Schumard, Altiva Barbosa da Silvae

INTRODUÇÃO Tendo em vista a necessidade de políticas públicas voltadas à valorização dos bens culturais do município de Caroebe, e vila Entre Rios, elaboramos um primeiro diagnóstico para resgatarmos um pouco da memória cultural deste município, partindo de dados disponíveis em livros e internet, levantamento de campo e entrevistas a alguns agentes sociais, direta ou indiretamente envolvidos nas atividades culturais de Caroebe; além de uma pesquisa direta aos agentes e órgãos encarregados da gestão cultural no município para compreender o estágio de implementação de suas políticas. Pesquisadora do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional- IPHAN, Mestranda em Preservação do Patrimônio Cultural, e-mail: carol_vialbuq@ yahoo.com.br a

Servidora da Prefeitura de Caroebe, Especialista em Psicopedagogia, e-mail: jb413582@gmail.com b

Diretor de Cultura da Prefeitura de Caroebe, Especialista em Gestão Escolar, e-mail: diasangonal@ bol.com.br c

Sabendo que os municípios em Roraima são novos e extremamente precários nos que diz respeito à existência de instituições que valorizem e preservem a cultura local, buscou-se apresentar alguns subsídios para os gestores, os artistas e a sociedade em geral, utilizando em muitos casos relatos de antigos moradores, uma vez que não existe uma documentação com dados organizados e disponíveis para consulta no município. A recente criação da Diretoria de Cultura ligada à Secretaria de Educação é um dos fatores centrais para se entender a incipiência e a precariedade das ações nesta área. Não há uma secretaria voltada exclusivamente ao setor cultural e nem recursos em todos os sentidos para uma gestão cultural que venha atender todas as necessidades deste setor no município.

Secretária Municipal de Educação e Cultura da Prefeitura de Caroebe, Especialista em Educação Ambiental, e-mail: schumar79@ hotmail.com

Realizamos assim um trabalho ainda muito inicial, partindo dos instrumentos e do pouco tempo que dispúnhamos para concluir este trabalho. Contribuiu muito o debate com os colegas, professores e coordenadores, sendo esta uma oportunidade ímpar para um verdadeiro trabalho em conjunto.

Orientadora do Trabalho de Conclusão do Curso de Extensão em Gestão Cultural - UFRR/MinC, professora da Universidade Federal de Roraima, Doutora em Geografia, e-mail: altiva. barbosa@ufrr.br

Apresentamos aqui a consolidação dos dados obtidos em campo e nas leituras, e alguns gráficos. Por fim, destacamos o mapeamento de expressões simbólicas e concretas da cultura local por meio das seguintes manifestações: Festival da Banana, Festa de Santo Isidoro, Festa junina; Capoeira, Karatê, Bicicross e outras atividades praticadas localmente.

d

e

Panorama Cultural de Roraima

|

85


Consideramos premente maior investimento e atenção para este setor que realmente pode modificar a vida das pessoas que residem no Caroebe. A pesquisa foi organizada na seguinte sequência: Introdução, Caroebe – um município dividido em dois, Estratégias da Pesquisa, Resultados e Discussões, e Considerações Finais.

1 CAROEBE – um município dividido em dois O município de Caroebe foi criado pela Lei Estadual n.º 082, de 04 de novembro de 1994, com terras desmembradas do município de São João da Baliza, e sua instalação se deu em 1997. De acordo com os dados do IBGE (2014), o município ocupa uma área de 12.066, 046 Km², o que equivale a 5, 36% do total de terras do estado de Roraima, sendo que destas, 6.376, 32 Km², são terras indígenas equivalentes a 53% do total do Município. Caroebe se localiza na microrregião do sudeste e mesorregião sul de Roraima. O acesso ao município se dá pela rodovia BR-174, pavimentada, e pela rodovia BR-210, parcialmente pavimentada; distante 338 km de Boa Vista. A população estimada do município de Caroebe é de 9.165 habitantes, com uma densidade demográfica de 0, 67 Km² e um IDH 0, 661, médio. O PIB é de 66, 934 e o IDI é 0, 57 (IBGE, 2014). Quanto aos limites do município, está localizado a sudeste do Estado, limita-se ao norte com o município de Caracaraí e a República Cooperativista da Guiana; ao sul com o estado do Amazonas; a leste com o Pará e a oeste com os municípios de São João da Baliza e Caracaraí (RORAIMA, 2010). No período de sua formação, o município tinha sua base econômica no setor primário da economia, sendo a produção agrícola direcionada para os cultivos de arroz, mandioca, banana, milho e laranja. Hoje o principal produto agrícola de Caroebe é a banana, comercializada nos mercados de Boa Vista e Manaus, capital do Estado do Amazonas. Em relação à pecuária, o potencial do município está voltado para o gado de leite e corte. Quanto ao extrativismo vegetal, está representado na região pela extração da castanha, maçaranduba e cupiúba. Na chamada vila Entre Rios a população estimada na área urbana é de 2.201 habitantes, havendo por volta de 4.000 habitantes na área rural, ou seja, um total aproximado de 6.000 habitantes. Desta maneira, muitos de seus habitantes a chamam de Vila até por agregar 60% da população do município de Caroebe (IBGE, 2014). Levando em consideração que a bibliografia sobre este município é bem escassa, damos destaque na nossa pesquisa à fala de alguns moradores, pois acabam sendo a memória viva do lugar. Segundo depoimento do Sr. Raimundo, um dos moradores mais antigo de Entre Rios: Antes de o Caroebe tornar-se município habitavam na região do Trombeta/ Mapuera somente indígenas de etnia Taurepangue. Com o passar dos anos indígenas da etnia Wai-Wai migraram para a mesma. Vieram das margens do Rio Anauá, ocupando a área Trombeta/ Mapuera e formando

86

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


suas comunidades que atualmente totalizam seis: Cobra, Sumaúma, Soma, Catual, Makará e Jatapuzinho, sendo a Jatapuzinho a principal delas, com 53 famílias chegando a aproximadamente 250 indígenas (informações verbais)1.

Atualmente existe nesta área uma pista de avião, um posto de saúde que é administrado pela Secretaria Estadual de Saúde (SESAU), uma escola com as três modalidades de ensino de responsabilidade do Estado, um motor de luz, uma bomba d´agua por meio da qual todos usam água encanada. As casas são todas de madeiras, existindo apenas uma maloca coberta com palha para as reuniões, onde também são realizados todos os eventos que ocorrem na aldeia. Os professores são indígenas, formados pelos cursos de formação superior indígena do Instituto Insikiran de Formação Indígena, da Universidade Federal de Roraima (UFRR), em áreas específicas, para que estes possam ministrar as aulas na aldeia conservando suas tradições e a língua materna. O tuxaua da comunidade é o Sr. Jaime, na liderança desta aldeia há oito anos, possuindo, portanto, uma boa relação com sua comunidade. Quanto às festas tradicionais destes grupos indígenas, são realizadas somente duas: a comemoração da Páscoa e do Natal, que têm duração de uma semana. Para tais eventos, convidam-se todas as aldeias vizinhas, e ainda vêm como convidados os indígenas do Estado do Pará e do Amazonas. São, portanto, comemorações mais restritas aos grupos indígenas, sem uma interação maior no município do Caroebe como um todo.

2 METODOLOGIA DE PESQUISA Primeiramente foi realizado um levantamento bibliográfico no próprio município de Caroebe, como, por exemplo, na Prefeitura, Secretaria de Educação e também no acervo da Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Roraima (IPHAN), biblioteca da Universidade Federal de Roraima (UFRR) e pesquisas no meio virtual. Pela dificuldade encontrada na busca por bibliografias que abordassem a história de Caroebe, podemos afirmar que se trata de uma pesquisa descritiva e exploratória, pois todas as informações colhidas se tornaram válidas para o desenvolvimento da pesquisa (GIL, 2007). A presente pesquisa também se baseia em uma análise qualitativa e analítica, de acordo com Ludke (1986, p. 45):

Entrevista concedida por Raimundo , em Caroebe-RR, em 23 de novembro de 2015. 1

A análise está presente em vários estágios da investigação, tornando-se mais sistemática e mais formal após o encerramento da coleta de dados. Desde o início do estudo, no entanto, nós faremos uso de procedimentos analíticos quando procuramos verificar a pertinência das questões selecionadas frentes as características específicas da situação estudada. Tomamos então várias decisões sobre áreas que necessitam de maior exploração, aspectos que devem ser enfatizados, outros que podem ser eliminados e novas direções a serem tomadas. Essas escolhas são feitas a partir de um confronto entre os princípios teóricos do estudo e o que vai sendo “aprendido” durante a pesquisa.

Panorama Cultural de Roraima

|

87


Ainda durante a pesquisa, foram realizadas visitas de campo, aplicação de um questionário na Escola Estadual Tereza Teodoro de Oliveira com vinte alunos; dez professores; vinte representantes da comunidade (empresários, gestores e produtores culturais).

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES 3.1 DIAGNÓSTICO No que diz respeito à cultura no município de Caroebe, podemos perceber a multiculturalidade em amplo sentido. Em primeiro lugar, por sua formação étnica de diferentes povos indígenas e, no século XX, recebeu migrantes de varias regiões do país, notadamente do Maranhão, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Paraná. O município de Caroebe precisa dar maior atenção no que se refere ao setor cultural. Pois o que existe hoje no Caroebe é apenas um acordo assinado pelo prefeito com o Ministério da Cultura (MinC), com a definição do responsável pelo setor cultural. O órgão gestor de cultura no município de Caroebe é a Diretoria de Cultura ligada à Secretaria Municipal de Educação. Possui apenas o calendário sociocultural dos eventos oficiais realizados no município. Contudo, a lei para criação da Secretaria Municipal de Cultura já se encontra na Câmara Municipal para sua aprovação. Entretanto, quanto aos marcos regulatórios, o município possui: a Lei Orgânica e a Lei Municipal n.º 048/03. A Lei Orgânica do município de Caroebe, na seção II no Art. 172 e 175 fala o seguinte: Os currículos escolares serão adequados às peculiaridades do Município e valorizarão sua cultura e seu patrimônio histórico, artístico, cultural e ambiental, levando em conta a aquisição de conhecimentos específicos aos alunos escolas rurais. O Município, no exercício de sua competência: I – apoiará as manifestações da sua cultura local; II – protegerá, por todos os meios ao seu alcance, obras, objetos, documentos e imóveis de valor histórico, artístico, cultural e paisagístico, localizados em seu território. (NR) (Emenda n.002, de 30 de abril de 2014); e III – criará a biblioteca pública Municipal, como meio de incentivar a cultura e a educação (CAROEBE, 2014).

O município possui também a Lei Municipal n.º 048/03 de criação da Comissão Municipal de Arte e Cultura (CMAC), sendo que o Poder Executivo de Caroebe não nomeou a referida comissão. Um fato importante foi a realização da I Conferencia Municipal de Cultura em Agosto de 2013, realizada por meio do Decreto n.º 094 de 11 de Julho de 2013, com o tema “Uma Política de estado para a Cultura: Desafios do Sistema Municipal de Cultura”. Está sendo feito o cadastro e o diagnóstico cultural do município, sendo o Curso de Extensão em Gestão Cultural um importante estímulo para iniciarmos este trabalho no Município. E, embora, este cadastro ainda não 88

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


tenha sido concluído, temos um resultado prévio dos produtores e agentes culturais, o qual pode ser observado na TABELA 1. Tabela 1 - Agentes e Produtores Culturais do Município de Caroebe

Fonte: CAROEBE-RR (2015).

No município de Caroebe, existem várias ações culturais em parceria com a educação, assistência social e pessoas físicas, tais como a capoeira, o karatê, o bicicross, a melhor idade e centro de convivência e fortalecimento de vínculo. A capoeira se iniciou no município em 27 de maio de 2002, com o professor Paulo Santos Dias Filho, mais conhecido por Dias; e se tornou um projeto de cunho social que atende cerca de 40 alunos entre crianças, adolescentes e jovens. Neste sentido, a população mudou sua visão desta arte ou deste jogo, como muitas a denominam. O karatê foi introduzido pela mesma pessoa em março de 2009, contava apenas com 10 alunos, sendo que uma destas foi campeã roraimense dos Jogos Escolares em 2013. O bicicross é um projeto social que deu início em 23 de novembro de 2012, com o nome de Pedalando com Você, sendo idealizado pelo senhor Silmar Pereira da Silva, para ser desenvolvido junto às crianças, adolescentes e jovens do município de Caroebe. Uma questão importante é que as pontuações dos participantes não serão somente aquelas adquiridas durante as provas, mais também o comportamento na rua, na escola, em casa, com as notas escolares e a frequência em sala de aula. O programa centro de convivência e fortalecimento de vínculo, proporciona várias atividades com crianças, adolescentes e idosos, com o intuito de melhorar a qualidade de vida dos participantes. Os eventos culturais do município são: o Festival da Banana, o Festejo de Santo Isidoro, a Festa Junina e o 7 de Setembro. O Festejo de Santo Isidoro é promovido pela Igreja Católica, no mês de maio, que se instalou no município. E por ele ser o santo protetor dos produtores, tornou-se o padroeiro da cidade. O evento “Revive Caroebe” deu origem ao Festival da Banana, no período em que a produção desta fruta, que leva o nome do evento, se expandiu por

Panorama Cultural de Roraima

|

89


todo município, tornando-se assim um dos maiores produtores de banana do Estado. Desde então, vem sendo promovida pela Prefeitura de Caroebe. O atual prefeito criou a Lei n.º 119 de 11 de Julho de 2011, que diz que o referido festival deve ser promovido na primeira semana do mês de setembro. Durante o evento, acontecem exposições de artesanatos e dos produtos produzidos pelos agricultores, várias atividades, como a cavalgada, prova do tambor, bicicross, competição do maior cacho de banana (quem come mais banana em menos tempo), escolha da rainha e do rei da festa dentre outras; trazendo, portanto, renda para o município, pois no decorrer do festival, muitos turistas tanto do estado quanto de outras regiões vêm para participar do evento. Já os arraiais também possuem uma tradição, destacando-se pela beleza das quadrilhas. A mais tradicional dela na época foi a do Giricão, criada por Valdiney Barbosa, que já não se apresenta nos eventos. Há 03 anos, os servidores municipais formaram uma que vem se apresentando nas festas juninas realizadas na cidade. Em relação aos equipamentos culturais que o município possui, podemos citar três: auditório municipal, quadra poliesportiva e biblioteca pública. Como ponto cultural, há duas praças: a Antônio Bauduíno e a Leonídio Nunes da Silva, que não são utilizadas com frequência para realização de atividades culturais, porém o professor de capoeira utiliza para realizar alguns de seus treinos e pelo menos uma apresentação no decorrer do ano. Também temos diversos pontos turísticos naturais, que se tornam a principal opção para a população nos finais de semana, como os banhos nos igarapés, as serras, entre outros. Caroebe, assim como os demais municípios do estado, está em fase inicial no processo da política cultural local, pois estão sendo providenciados os levantamentos documentais e o diagnóstico situacional do município, para a criação do Sistema Municipal de Cultura. O Acordo de Cooperação Federativa já foi assinado e publicado no Diário Oficial da União, já o plano de trabalho a ser enviado ao MinC ainda está em fase de construção. 3.2 ENTREVISTAS 3.2.1 História de Caroebe, segundo o “Seu Edmilson”(informações verbais)2 Segundo o seu Edmilson da Silva, que chegou a Caroebe em 1977, residiam apenas cinco famílias nesta localidade, assim este pequeno grupo de pessoas iniciaram a formação do município que ainda era vila de São João da Baliza, tornando-se munícipio somente alguns anos depois. A BR 210, na época, se encontrava em péssimas condições, o meio de transporte era só o animal ou a pé, outros meio de transporte praticamente não existiam. O município foi criado por meio de um plebiscito realizado em 1993, sua economia no período girava em torno da produção da castanha e da venda do couro do gato maracajá. Em seguida, veio a produção agrícola do arroz, milho, mandioca e batata doce. Toda produção era colhida e vendida na vila de Novo Paraiso, mais conhecida como 500, onde existia uma cooperativa. Com 90

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Entrevista concedida por Edmilson, em Caroebe-RR, em 23 de novembro de 2015. 2


o passar do tempo, todas essas produções se resumiram somente a uma, o cultivo da banana, a qual permanece até hoje. No que diz respeito às suas manifestações culturais, havia a festa “Revive Caroebe”, que se realizou durante três anos. Os precursores desta festa foram: Sr. Francisco Severo, Josué Pacheco, Charles da Rocha Brito, Mauro Minarine de Melo, Careca e Zelão. No ano de 2000, esta festa foi transformada em Festival da Banana, pois o fruto ficou em evidência e sua produção se expandiu por todo o município, tornando assim Caroebe e Entre Rios, dois dos maiores produtores de banana do Estado. 3.2.2 A História de Entre Rios, segundo “Seu Raimundo” ”(informações verbais)3 O Entre Rios é uma vila pertencente ao município de Caroebe e recebeu este nome por estar localizada entre os dois rios, o Rio Caroebe e o Rio Jatapú. A vila é adjacente à inconclusa Perimetral Norte que pretendia passar pelo Estado do Pará até chegar ao estado do Amapá. Nesta vila, a maioria dos imigrantes veio do Estado do Maranhão, assim como ocorre em Caroebe. No que diz respeito aos indígenas segundo o entrevistado, não existiam etnias indígenas na região. Para seu Raimundo, só existiam indígenas no Rio Novo e estes foram migrando de São Luiz do Anauá. Atualmente existem seis aldeais pertencente à etnia Wai-Wai. 3.2.3 Análise dos questionários Os resultados a seguir foram elaborados a partir de entrevista com um questionário de cinco questões aplicado a dez professores e vinte alunos, todos ligados ao ensino médio, e vinte pessoas da comunidade (empresários, gestores e produtores culturais). Como podemos perceber na FIGURA 1, quando perguntados sobre “O que você gosta de fazer nas horas livres (lazer)”, a maioria dos entrevistados prefere assistir TV nas suas horas livres. Acreditamos que isso aconteça por falta de opções culturais e de lazer no município. Só existe uma biblioteca que no fim de semana está fechada, restando os igarapés nem sempre acessíveis a todos, e algumas práticas de esportes.

Entrevista concedida por Raimundo, em Caroebe-RR, em 23 de novembro de 2015. 3

Panorama Cultural de Roraima

|

91


Figura 1 - O que você gosta de fazer nas horas livres (lazer)?

Fonte: Paulo S. Dias Filho (2015).

Observamos, de acordo com a FIGURA 2, que quando perguntados sobre “Que tipo de espaço de lazer você gostaria que tivesse no seu município”, as pessoas entrevistadas tiveram uma tendência maior para a área do esporte do que para o cinema e o teatro, talvez pelo fato de considerar muito distante ou irrealizável a curto e médio espaço de tempo, como observamos em conversas informais com os moradores do Caroebe. Figura 2 - Que tipo de espaço de lazer você gostaria que tivesse no seu município?

Fonte: Paulo S. Dias Filho (2015).

A FIGURA 3 mostra o gráfico referente à pergunta: “Qual evento cultural mais importante do município?”. Os entrevistados destacaram o Festival da Banana. De fato, este evento vem reunindo cada vez mais pessoas. Na última edição, segundo estatística da Policia Militar/RR, reuniu aproximadamente 92

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


5.000 mil pessoas. Este evento vem sendo organizado com mais atenção pelos gestores municipais e tem recebido bastante divulgação. Pessoas de várias localidades de Roraima e de outros estados também têm prestigiado o evento. Figura 3 - Qual evento cultural mais importante do município?

Fonte: Paulo S. Dias Filho (2015).

Quanto aos equipamentos culturais, a FIGURA 4, perguntamos “Quais os equipamentos culturais que você conhece do seu município?”. Os equipamentos mais conhecido são a Biblioteca Pública e o Poliesportivo, porém aquela é a menos utilizada. Acreditamos que isso se deva por que o referido espaço não tem internet e também não funciona nos fins de semana, como já foi citado anteriormente. Figura 4 - Quais os equipamentos culturais que você conhece no seu município?

Fonte: Paulo S. Dias Filho (2015).

Panorama Cultural de Roraima

|

93


Na FIGURA 5, o gráfico nos apresenta resposta à seguinte pergunta: “A gestão do município procura conhecer a diversidade cultural da população?”. A maioria entrevistada disse que a gestão do município não procura conhecer a diversidade cultural da população. Realmente isso não acontecia, pois não havia uma Secretaria de Cultura e a Diretoria de Cultura, que só passaram a existir em 2014, integrada à Secretaria de Educação. Foi a partir deste Curso de Extensão em Gestão Cultural que se começou a desenvolver um diagnostico situacional da cultura no município. Figura 5 - A gestão do município procura conhecer a diversidade cultural da população?

Fonte: Paulo S. Dias Filho (2015).

Podemos perceber que as respostas que apareceram por meio dos gráficos, oriundas das entrevistas com a comunidade local, vem ao encontro do que relatou-se no decorrer do presente trabalho.

CONSIDERAÇÕES FINAIS O município de Caroebe é multicultural, e é cada vez maior o número de imigrantes de várias regiões do país que para lá se direciona, especialmente, dos estados do Maranhão, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Paraná, destacandose os primeiros na formação cultural deste município. Apesar da existência e predominância dos povos indígenas, percebemos um vácuo cultural imenso no que diz respeito a manifestações culturais destes povos, fato originado pelo seu genocídio e etnocídio, promovidos pelos brancos que dominaram estas áreas. Fato que os levou ao isolamento atualmente. As únicas manifestações culturais existentes no município são o Festival da Banana, Festa de Santo Isidoro, Festa Junina, o Sete de Setembro e a Capoeira; e nas áreas indígenas, como evento fechado a estas comunidades, o Natal e a Páscoa.

94

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Há, entretanto, vários agentes culturais com habilidades para: artesanato, música, artes visuais, dança, folclore e literatura, sendo um verdadeiro desafio descobrir estes artistas que permanecem invisíveis, conhecidos apenas circunstancialmente. E quanto aos pontos culturais concretos, estes ainda estão para serem descobertos e incentivados em sua maioria, para que não sejam mais citados apenas o auditório municipal, o poliesportivo e a biblioteca pública. Até porque o município possui uma natureza exuberante com muitos lugares naturais belíssimos que são visitados nos fins de semana, principalmente no verão, que são os rios e igarapés, todos em áreas particulares. Concluímos, assim, que uma das maiores dificuldades para realizar este estudo, foi a ausência de documentos para embasar as informações, pois o município tem uma deficiência muito grande na parte documental, no que se refere ao seu histórico, já que as informações que constam em alguns livros e internet não condizem com àquela narrada pelos antigos moradores de Caroebe. Caroebe é um município que possui um grande potencial cultural, mas que necessita de uma atenção especial por parte dos governantes, para conseguir alavancar a cultura, valorizando e dando apoio aos agentes e/ou produtores culturais. Contudo, sabemos que primeiramente são necessários regulamentar seu sistema municipal de cultura e a continuidade das ações, que sempre são perdidas a cada nova gestão, inclusive a documentação também acaba sendo extraviada de alguma maneira.

REFERÊNCIAS CAROEBE-RR. Lei Orgânica do município de Careobe-RR. Alterada pela emenda n.º 002/2014, de 30 de Abril de 2014. 2014. Disponível em: <http:// www.caroebe.rr.leg.br/leis/lei-organica-municipal/lei-organica-do-municipio/ at_download/file>. Acesso em: 08 mar. 2016. _________. Lei Municipal n.º 048/03. Dispõe sobre a criação da Comissão Municipal de Arte e Cultura do município de Caroebe e dá outras providências. 2003. Disponível em: <http://www.caroebe.rr.leg.br/leis/legislacao-municipal/2003/leimunicipal-no-048_2003.pdf/at_download/file>. Acesso em: 08 mar. 2016. _________. Lei n.º 119 de 11 de julho de 2011. Emenda a lei municipal n. 35, de 30 de Agosto de 1999, que dispõe sobre a regulamentação do festival que menciona e dá outras providências. 2011. Disponível em: <http://www. caroebe.rr.leg.br/leis/legislacao-municipal/2011/lei-municipal-no-119-2011/ at_download/file>. Acesso em: 08 mar. 2016. CAROEBE. Diretoria Municipal de Cultura. Agentes e produtores culturais. Caroebe: [S.n.], 2015. GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007.

Panorama Cultural de Roraima

|

95


IBGE. Roraima. [Brasília-DF]: Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, 2014. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/estadosat/perfil. php? sigla=rr>. Acesso em: 22 ago. 2015. IBGE. Caroebe. [Brasília-DF]: Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, 2014. Disponível em: <http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil. php?codmun= 140023>. Acesso em: 22 ago. 2015. INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL (IPHAN). Bens Culturais Registrados. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/bcrE/ pages/con CategoriaE.jsf>. Acesso em: 22 ago. 2015. LUDKE, Menga. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. RORAIMA. Lei n.o 082 de 04 de novembro de 1994. Cria o Município de Caroebe e dá outras providências. 1994. 1994. Disponível em: <http://www.tjrr.jus.br/ legislacao/phocadownload/leisOrdinarias/1994/Lei%20Estadual%200821994.pdf>. Acesso em: 08 mar. 2016. RORAIMA. Secretaria de Planejamento. Informação Socioeconômicas do Município de Caroebe-RR 2010. 2010. Disponível em: <http://www.seplan. rr.gov.br/roraimaemnumeros/dados_municipios/ Caroebe.pdf>. Acesso em: 04 mar. 2016. UNESCO. Patrimônio Cultural Imaterial. Disponível em: <http://www.unesco. org/new/pt/brasilia/culture/world-heritage/intangible-heritage/>. Acesso em: 22 ago. 2015.

96

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


APÊNDICE A Questionário O presente questionário contribuirá significativamente para o trabalho que estamos a realizar, no âmbito da nossa pesquisa, para a conclusão do Curso de extensão, em Gestão Cultural, na Universidade Federal de Roraima, cujo o tema é sobre a Diagnóstico Cultural do Município de Caroebe-RR. Por isso agradeceríamos muito se pudesse colaborar conosco, respondendo com sinceridade todas as perguntas que compõe este questionário. Garantimos o anonimato e a confidencialidade das suas respostas. Identificação Pessoal A - Sexo: M (

)

F (

)

B - Idade: Escolaridade ou Cargo/Função: ________________________________ 1. O que você gosta de fazer nas horas livres (lazer)? 2. Que tipo de espaço de lazer você gostaria que tivesse no seu município? 3. Qual evento cultural mais importante do seu município? 4. Quais os equipamentos culturais que você conhece do seu município? 5. A gestão do município procura conhecer a diversidade cultural da população?

Panorama Cultural de Roraima

|

97


Fotografia: PatrĂ­cia Cardoso


DIAGNÓSTICO CULTURAL DO MUNICÍPIO DE IRACEMA Francisco das Chagas Almeida Silvaa, Mônica Regina Marques Padilhab, Patrícia Lima Cardosoc, Romeu D’ Ferreira Carvalhod, Fabricio Paiva Motae

INTRODUÇÃO Durante o Curso de Extensão em Gestão Cultural da Universidade Federal de Roraima, elaboramos este diagnóstico cultural do município de Iracema, cuja finalidade é apontar a situação da cultura, bem como verificar o seu atendimento, sua organização e disseminação dentro do município. Para tanto, discorremos sobre a cultura natural e patrimônio material e imaterial existente em Iracema.

Servidor da Prefeitura de Iracema, graduado em Letras, e-mail: franciscoabsoluto@ hotmail.com a

Superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN, Acadêmica de Comunicação Social, e-mail: monicabv. marques@hotmail.com b

Servidora da Prefeitura de Iracema, acadêmica do Curso de Licenciatura em Educação no Campo, e-mail: patricia. limacardoso@hotmail.com.br c

Secretário Municipal de Educação, Cultura e Desporto da Prefeitura de Iracema, Especialista em Informática e Comunicação na Educação, e-mail: romeuffcarvalho@gmail. com d

Orientador do Curso de Extensão em Gestão CulturalUFRR/MinC, professor da Universidade Federal de Roraima, Mestre em Letras, e-mail: fabricio.mota@ufrr.br e

Levantamos dados reais das necessidades na área da cultura, portanto, realizamos entrevistas, aplicação de questionário e pesquisas bibliográficas. Desse modo, pudemos diagnosticar que a cultura em Iracema, em especial as políticas públicas de cultura começam a dar bons resultados bem como a valorização dos artistas locais. Portanto, este diagnóstico servirá como base primordial de pesquisas e conhecimentos sobre a situação cultural do município. O trabalho objetiva diagnosticar a realidade cultural local e a gestão de políticas públicas de cultura em Iracema. Dessa forma, buscamos apresentar subsídios para gestores, artistas, sociedade em geral de Iracema, para melhor conhecer a realidade cultural do município, bem como as políticas de culturas que vêm sendo adotadas pelos gestores públicos da área cultural. Uma vez que dentre as ações culturais que mais vêm sendo discutidas em Iracema são as políticas culturais que compõem o Plano Municipal de Cultura (PMC), pois: É importante para sua cidade ter um plano municipal de cultura que estabeleça as relações de cultura para um período de dez anos. Isso significa gerar condições para desenvolver e preservar a diversidade das expressões culturais e promover o acesso a elas (BRASIL, 2013, p.12).

Assim, visando à implementação das políticas que compõem o Sistema Municipal de Cultura de Iracema, é que hora expomos um pouco da história cultural do município, bem como se deu o processo de criação de Iracema, os eventos culturais públicos ou privados e as políticas que vêm sendo adotadas

Panorama Cultural de Roraima

|

99


pela Secretária Municipal de Educação Cultura e Desporto de Iracema para a cultura em geral do município. Vale ainda ressaltar que este trabalho busca ofertar alternativas que visam à maior participação dos artistas e da sociedade nas ações culturais, que vêm surgindo cada vez mais dinâmicas e planejadas com a participação da juventude de Iracema. Dado que os jovens têm maior interesse nas políticas culturais do município, estes têm estado presentes com mais intensidade nas ações tomadas pelo poder executivo de Iracema para área cultural local.

1 BREVE HISTÓRICO DO MUNICÍPIO DE IRACEMA A origem do nome do município se refere a uma homenagem feita a esposa do primeiro morador e hospitaleiro, Militão Pereira da Costa, que chegou à região por volta de 1972. Quando Iracema ainda se chamava Colônia Balatal, recebeu o senhor Militão acompanhado de sua esposa Iracema Machado Costa e seu filho, Raimundo Machado Costa, na ocasião com dois anos de idade. Como a maioria dos antigos migrantes nordestinos, Militão e sua família vieram de barco pelo Rio Branco, pois, na época, Roraima não tinha ligação terrestre. Tinha como objetivo conseguir uma área de terra, onde pudesse trabalhar e dela tirar o sustento para seu filho. Outros pioneiros foram chegando ao município de Iracema, embora o destino fosse os garimpos venezuelanos. Muitos ficaram com Militão, e de garimpeiros se transformaram em agricultores, plantando milho, feijão, arroz e mandioca. Entre esses pioneiros, destacaram-se os maranhenses Chico Pimenta, Izidório Rodrigues, Agostinho Machado, José Francisco e Natanael Machado, este foi o primeiro enfermeiro de Iracema. Com tantos maranhenses, a localidade passou a ser chamada de Vila Maranhense e depois, com a chegada de migrantes do Piauí, Ceará e até do Japão, passou a ser conhecida como Vila Nova. Instalado, Militão, não querendo ficar só com a família, reservou uma pequena área de seu terreno para ceder a parentes e amigos que chegavam do Maranhão em busca de terra para trabalhar, numa tentativa de mudar de vida. O nome Iracema surgiu tempos depois quando começou a haver povoação no local, e foi em homenagem a dona Iracema, esposa de Militão, que faleceu num acidente de carro quando retornava de Manaus. Em 1983, a Câmara de Vereadores do Município de Mucajaí aprovou o projeto que concedia os fóruns de Vila à Antiga Colônia, agora com denominação oficial de Iracema. Com consulta popular, a Assembleia Legislativa do Estado aprovou e o governador Ottomar de Sousa Pinto, em 04 de novembro de 1994, sancionou a Lei n.º 083, que elevou Vila Iracema à categoria de município, instalado oficialmente com a eleição e posse de seu primeiro prefeito Joaquim Ruiz de Freitas. Localizado às margens da BR-174, na região centro-sul do estado de Roraima, sua sede dista 93 km da capital Boa Vista/RR. O município se encontra descrito no IBGE (2010) com o código 1400282, latitude 02º05’01’’ e longitude -61º02’27’’. Seus limites são: ao norte com os municípios de Mucajaí e Alto Alegre; ao sul, Caracaraí; ao leste, Cantá e ao oeste, com o estado do Amazonas. 100

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


O município possui uma área de 14.412,688 km², que corresponde a 6,42% do território de Roraima. Este município abriga parte da Reserva Indígena Ianomâmi, ocupando cerca de 80% do seu território. Conforme o censo demográfico do IBGE (2010), a população é de 8.696 habitantes, sendo 4.078 habitantes na área urbana (taxa de 46,9%) e 4.618 habitantes na área rural (taxa de 53,1%), com estimativa de 10.043 habitantes para o ano de 2014 (IBGE, 2010).

2 PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES MUNICÍPIO DE IRACEMA

CULTURAIS

DO

As primeiras manifestações culturais se fizeram por meio dos festejos religiosos, especificamente do festejo de Santa Luzia, padroeira do município, e das comemorações anuais do calendário escolar, bem como festa do dia das mães, desfile cívico de 7 de Setembro e arraias escolares. Eliesio Sales Lima (informações verbais)1, professor e técnico da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desporto, residente em Iracema, relatou que, há 35 anos, são as escolas responsáveis pelas principais manifestações culturais locais. Porém, disse ainda que estas estão promovendo uma cultura educacional e que, portanto, acaba ficando apenas dentro dos muros da escola. Destacamos as seguintes atividades culturais do calendário escolar: festas juninas, páscoa, dia das mães, dentre outros. Eliesio também disse que já não são mais programações unicamente desenvolvidas pelas escolas, afirmou que são as escolas o equipamento cultural mais forte em Iracema. Confirmando o posicionamento do senhor Eliesio, Amadeu Batista Filho, ex-prefeito de Iracema, morador e amante da cultura local, há 25 anos, disse estar concluindo um trabalho de pesquisa sobre o processo de fundação do município e que tem encontrado referências sobre as primeiras manifestações culturais em Iracema. Para ele, a cultura local sempre esteve subsidiada pelas escolas. Citou que as escolas do município, estadual ou municipal, têm sido os principais ambientes de cultura em Iracema. Salientou também que reconhece os esforços do poder público em dar suporte às organizações e ambientes culturais, para que o município se desenvolva e valorize ainda mais os fazedores de cultura local. Como pudemos ver, as escolas municipais foram e são, em sua maioria, os principais ambientes e equipamentos disseminadores da cultural de Iracema. No entanto, vale ressaltar outro equipamento forte na contribuição da cultura em Iracema, a Rádio Comunitária Iracema 87,9 FM. Com mais de 15 anos atuando no município, a rádio tem sido um meio de divulgação das opções culturais, além de promotora cultural. Com credibilidade e respeito, a Rádio Comunitária de Iracema tem desenvolvido um importante papel, na prestação de serviços de divulgação de notas, propagandas, avisos, convites e eventos públicos e particulares; sem deixar de levar o melhor da música a seus ouvintes. Nos últimos anos, a Rádio tem mantido uma programação que vem agradando todos os públicos, começando pela manhã e encerrando às 23h. Entrevista concedida por Eliesio Sales Lima, em Iracema-RR, exclusivamente para este trabalho. 1

Situada na Avenida Rio Branco, s/n.º, Centro, a Rádio Comunitária tem promovido diversas campanhas, das quais citamos: arrecadação de alimentos, roupas e brinquedos para doar a pessoas carentes; premiação de brindes e Panorama Cultural de Roraima

|

101


festa de passagem de ano da Rádio. A frente desses trabalhos, está Marcos Adriano, diretor-presidente da Rádio.

3 EVENTOS CULTURAIS DO MUNICÍPIO DE IRACEMA Os eventos culturais de Iracema são planejados majoritariamente pela Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desporto. É importante ressaltar que esses eventos compõem o calendário de ações culturais do munícipio e sua realização envolve a participação das escolas locais. É importante ainda salientar que tais eventos têm datas específicas para se realizar, facilitando o planejamento no momento de confecção do calendário cultural de Roraima. 3.1 CARNAVAL – ESQUENTA IRACEMA O carnaval em Iracema tem sido uma importante festa de entretenimento e diversão aos blocos carnavalescos e a comunidade em geral. Anualmente como previsto no calendário cultural do município, juntamente com as lideranças dos blocos carnavalesco, planeja-se antecipadamente micaretas de carnaval, denominadas “Esquenta Iracema”, que se realizam tanto pelo Município como pelos fazedores e promotores da cultura local. O carnaval fomenta a cultura, o turismo e o comércio local. Como dito antes, uma das potencialidades do carnaval de Iracema é a continuidade deste em datas fora de época como o “Iracema Folia” que arrasta públicos de diversos municípios de Roraima. Dessa forma, o Carnaval em Iracema é o principal evento para que os blocos possam investir em estrutura e organização. As micaretas ocorrem principalmente na sede do município, especificamente na Praça Central e Vila Olímpica, onde tudo começou. 3.2 ARRAIAL MUNICIPAL – ARRAIAL DE TODOS OS SANTOS O Arraial de Iracema iniciou na gestão do primeiro prefeito, Joaquim Ruiz, em 1995. Desde então, o Arraial passa por significativas transformações. Realizado sempre nos meses de junho ou julho, o evento contribui no processo de fomentação e dinamização da cultura caipira, uma vez que as escolas municipais e estaduais se organizam e elaboram seus próprios arraiais, cujo propósito é apresentar as atrações culturais no Arraial. Realizado pela Prefeitura e organizado pelo Departamento de Cultura do Município, o Arraial Municipal tem grande aceitação dos munícipes. Geralmente, realizado em duas noites, possibilita maior circulação e apresentação dos movimentos culturais. Grupos folclóricos, de danças, quadrilhas, shows musicais trazem para os dias do Arraial toda a comunidade de Iracema, além de visitantes e turistas dos municípios vizinhos, como, por exemplo, Mucajaí e Caracaraí. O momento mais esperado é o grande concurso de quadrilhas, aberto a todas as quadrilhas estaduais. Também acontece o concurso de Rei Matuto e de Rainha Caipira do Arraial Municipal. No Arraial, a prefeitura oferece a isenção de impostos a ambulantes e barraqueiros, garantido assim que estes possam ter maior rentabilidade. 102

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


3.3 FESTA DA BANANA A Festa da Banana, realizada anualmente na Vila de Campos Novos, interior do município de Iracema, originou-se no ano de 2004, a partir da realização de um curso voltado ao manuseio da fibra da banana. Este curso ajudou a vários agricultores a explorar os recursos que a banana pode gerar. O curso se direcionava a mulheres agricultoras para que pudessem aprender a fabricar vários artesanatos a partir da fibra de banana, destacando-se a fabricação de papel, bolsas, sandálias, semijóias e de peças decorativas. Também se ofertou curso voltado para gastronomia a partir do uso da banana, como bolos, tortas, pudins, aperitivos e petiscos. A partir de então, realiza-se uma festa para comemorar o sucesso do projeto, que aconteceu no Barracão da Associação dos Produtores Rurais de Campos Novos (PROCAM). Inicialmente, o evento envolveu crianças com brincadeiras coordenadas pela Igreja Católica e Assembleia de Deus, e culminou a noite com um baile dançante. No ano seguinte, a festa começou a ganhar melhor estrutura organizacional, sempre coordenada por um grupo de agricultores de Campos Novos, dos quais estavam Maria Mendonça. Posteriormente, a Festa começou a ser bastante divulgada e ganhar novos elementos em sua programação. 3.4 ANIVERSÁRIO DO MUNICÍPIO DE IRACEMA No aniversário do município de Iracema, há uma grande programação cultural e esportiva. O departamento de cultura do município por meio da prefeitura promove um dia de lazer culminando com baile dançante. Durante o dia ocorrem torneios de futsal, corrida pedestre, desfile cívico do dia 7 de setembro, este último, se repete em novembro. Assim, o munícipio comemora o dia 7 de setembro em novembro especificamente no dia 4 de novembro data do aniversário do município. À noite, acontecem o desfile da Miss Iracema e apresentações culturais danças, teatro e música. 3.5 FESTEJO DE SANTA LUZIA Santa Luzia é padroeira do município, sendo comemorada dia 13 de dezembro. As primeiras manifestações religiosas em homenagem a Santa Luzia foram feitas a partir da chegada de seus primeiros habitantes, quando até então Iracema ainda era vila de Mucajaí. Os padres e a comunidade celebravam uma missa sempre no dia de Santa Luzia, em uma capela feita de madeira. Com o passar dos anos, a comunidade se reuniu para dar início a construção de uma nova Igreja para Santa Luzia. Alguns moradores que até hoje residem no município, como Maria Eunice de Lima e Raimunda Ribeiro da Silva, testemunham que elas e mais outros líderes das comunidades se reuniram e produziram os tijolos que serviram para construção da atual Igreja de Santa Luzia. Também se obtiveram recursos oriundos da Alemanha. Com a elevação de Iracema a município, as homenagens a Santa Luzia receberam mais relevância. Deixou de ser apenas uma missa e passou a Festejo, com celebração de novenas e o tríduo de Santa Luzia, culminando Panorama Cultural de Roraima

|

103


com uma grande missa e com um arraial comunitário. Quando se iniciou o festejo de Santa Luzia, por volta de 1997, a comunidade católica preparava uma grande festa. Fieis de outros municípios apareciam para louvar, adorar e pagar promessas. A venda de bingos, de comidas típicas e brincadeiras para as crianças atraiam ainda mais a comunidade. Hoje o Festejo de Santa Luzia se realiza com mais organização, uma vez que há envolvimento de diversas pastorais, como: Pastoral da Criança, Catequese, Juventude, Legião de Maria, dízimo e liturgia, Infância e Adolescência Missionária (IAM), e ainda juntamente com as irmãs da congregação Filhas da Caridade e da paróquia São José Operário de Caracaraí em prol da festividade.

4 REALIDADE CULTURAL DO MUNICÍPIO DE IRACEMA O município de Iracema tem apenas 21 anos de emancipação. No entanto, dados mais precisos e de relevância significativa cultural para os seus munícipes, encontram-se dos últimos 12 anos. Em 2009, decretou-se a criação da Secretaria Municipal de Cultura e Desporto por meio do decreto n.º 165/2009, aprovado pela Câmara Municipal. Com a criação dessa Secretaria, diversas atividades culturais e desportivas do calendário de evento do município, passaram a ganhar maior expressividade e valorização, dos quais se destacam: Arraial Municipal, Campeonato Municipal de Futebol de Campo, Campeonato Municipal de Futsal, e Iracema Folia, micareta carnavalesca fora de época com a participação dos blocos da cidade usando abadá, além da participação da comunidade em geral, de turistas e visitantes de outros municípios. Este evento se realiza em alusão ao aniversário do município, dia 4 de novembro. Outras manifestações culturais de Iracema passaram a ter maior participação do poder público municipal, fazendo com que o calendário cultural do município fosse realizado de acordo com suas datas todos os anos. Assim a Secretaria de Cultura manteve o diálogo com os fazedores de cultura de Iracema para que estes pudessem ter o apoio do órgão na realização e organização de suas festividades. Em 2013, por meio da lei n.º 0318/2013, de 21 de fevereiro de 2013, a Secretaria Municipal de Cultura e Desporto se juntou à Secretaria Municipal de Educação, passando a se denominar Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desporto, cujas competências se relacionam à cultura e ao desporto, descritas nos incisos XXI a XLIII: XXI - o planejamento operacional, formulação e execução da política de cultura no Município; XXII - apoiar o desenvolvimento das atividades culturais em todas as suas manifestações; XXIII - difundir a cultura e o turismo em todas as suas manifestações; XXIV - preservar e aumentar o acervo da biblioteca pública municipal;

104

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


XXV - gerenciar a aplicação de recursos públicos e privados, para a instalação e manutenção de bibliotecas, museus, teatros e outras unidades culturais; XXVI - incentivar e difundir a cultura tradicional, as etnias, costumes e culturas populares; XXVII - apoiar a constituição de grupos voltados a todas as formas de manifestação cultural e artística; XXVIII - conservar e ampliar o patrimônio cultural; XXIX - preservar documentos, obras, monumentos e locais de valor histórico e artístico; XXX - instituir e manter um sistema de informação relativo aos planos, projetos e atividades relacionados à cultura; XXXI - desenvolver programas e atividades na área de cinema, teatro, dança, música, exposições de artes e outras atividades artísticas e culturais; XXXII - preservar o patrimônio histórico-cultural, bem como os costumes e os valores culturais importantes para a história da ocupação do Município; XXXIII - desenvolver programas e atividades de artes visuais, culturais; XXXIV - manter e preservar os espaços culturais; XXXV - promover a representatividade do Município em eventos desportivos estaduais, nacionais e internacionais; XXXVI - realizar e desenvolver eventos desportivos em suas diferentes modalidades; XXXVII - sediar eventos desportivos; XXXVIII - promover o lazer a toda sociedade; XXXIX - realizar atividades socioculturais de lazer e recreação, mediante a utilização dos espaços disponíveis; XL - Proporcionar a integração e o congraçamento, às diferentes faixas etárias, através de atividades desportivas e recreativas; XLI - incentivar através de ações, o esporte como pressuposto de saúde e vitalidade às diferentes faixas etárias; XLII - implantar projeto para avaliação e orientação de atletas amadores do Município e praticantes de atividades físicas nos programas desenvolvidos pela secretaria; e XLIII - conservar os espaços desportivos pertencentes ao Município (IRACEMA, 2013).

No período de realização do Curso de Extensão em Gestão Cultural, a Secretaria Municipal de Educação Cultura e Desporto, criou a Fundação de Cultura e Esporte de Iracema (FUNCEI), que surge da vontade do secretário municipal de educação Romeu D’Ferreira Carvalho, em apoiar e valorizar ainda mais as manifestações culturais e desportiva de Iracema. Hoje a FUNCEI é o principal órgão gestor específico da cultura, em Iracema. Criada e vinculada à Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desporto, o município de Iracema começa a apostar firmemente nas políticas culturais.

Panorama Cultural de Roraima

|

105


Há uma boa vontade por parte do poder público de Iracema em criar o Sistema Municipal de Cultura, os primeiros passos começam a se manifestar e são discutidos juntamente com os fazedores de cultura e com a comunidade em geral de Iracema. Segundo o Secretário Municipal de Educação, Cultura e Desporto, Romeu D’ Ferreira Carvalho, por meio da FUNCEI, já começou a ser elaborado o Plano Municipal de Cultura, já se realizaram reuniões para criação do Conselho Municipal de Cultura.

5 AMBIENTES CULTURAIS DO MUNICÍPIO DE IRACEMA Os equipamentos culturais de Iracema se encontram na sua maioria em perfeito funcionamento, são acessíveis aos munícipes e aos fazedores de cultura em geral. Estes equipamentos são de suma importância para valorização e criação de novas manifestações culturais e esportivas no município. A citar os principais ambientes culturais, há os seguintes: • Biblioteca Pública Municipal Lígia Bruna Bezerra; • Eco Parque Municipal; • Escola Estadual Dom Pedro II; • Praça Augustinho Machado – Praça Central; • Igreja Matriz de Santa Luzia; • Escola Municipal Iracema Aguiar Pereira; • Ginásio Esportivo Municipal; • Vila Olímpica de Iracema; e • Orla Beira do Rio Branco.

6 ADESÃO AO SISTEMA NACIONAL DE CULTURA De acordo com o que preconiza o principal objetivo do Sistema Nacional de Cultura: é fortalecer institucionalmente as políticas culturais da União, Estados e Municípios, com a participação da sociedade. As políticas para a cultura ainda ocupam posição periférica na agenda da maioria dos governos, além de serem conduzidas de forma pouco profissional. Parte desse problema está na indefinição a respeito do papel do poder público (Estado) na vida cultural (BRASIL, 2013).

Pode-se dizer que a gestão pública do município começou a adotar medidas para implementação das políticas culturais para a criação do Sistema Municipal de Cultura. Tais políticas se manifestam por meio do acordo de adesão ao Sistema Nacional de Cultura, criação do órgão gestor específico da Cultura do Município de Iracema. Assim, a partir da legalidade e aprovação do órgão gestor de cultura pelo legislativo municipal, há um comprometimento do poder executivo juntamente com os gestores públicos da cultura em criar um fundo municipal de cultura, o Plano Municipal de Cultura, II Conferencia Municipal de Cultura e o Conselho 106

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Municipal de Políticas Cultural até o fim do ano de 2016, e assim elaborar o Sistema Municipal de Cultura de Iracema.

CONSIDERAÇÕES FINAIS A Cultura no município de Iracema ainda se encontra muito na informalidade, ou seja, as manifestações e seguimentos culturais no município não constam em uma base administrativa legal, não há uma entidade cultural no município que seja pessoa jurídica e/ou que tenha uma equipe administrativa específica para determinada setor cultural. Ressaltamos que os funcionários nomeados pela Prefeitura para atuarem na administração da cultural do município, estão, na medida do possível, articulando-se para que as manifestações e os agentes culturais disponibilizem de subsídios para se tornarem grupos e associações legalizados. O contexto contemporâneo é o cenário no qual os gestores culturais atuam e buscam o seu reconhecimento profissional. Nele se encontra o material de análise para que se possa apreender o significado e as consequências dessa diversidade e pluralidade de sujeitos. Assim, podemos afirmar que esse processo de mudanças da sociedade contemporânea, associada à globalização, à politização da cultura, à ampliação do mercado de trabalho e ao aumento de consumo, é que fez surgir os novos profissionais que atuam no campo da gestão cultural (CUNHA, 2007, p. 14).

Assim podemos notar que os primeiros passos para que a cultura local seja encarada como prioridade na administração pública de Iracema, pois há um interesse muito pertinente por parte da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desporto em formalizar e profissionalizar os agentes culturais dos municípios, ofertando políticas culturais transformadoras, inovadoras e profissionalizantes.

Panorama Cultural de Roraima

|

107


REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Cultura. Como fazer um Plano de Cultura. São Paulo: Instituto Via Pública; Brasília: MinC, 2013. BRASIL. Ministério da Cultura. Conselho Nacional de Política Cultural. Secretaria de Articulação Institucional-SAI. Sistema Nacional de Cultura: Guia de Orientações para os Municípios: perguntas e respostas. Brasília-DF, 2011. Disponível em: <http://www.santoandre.sp.gov.br/pesquisa/ebooks/360431. pdf>. Acesso em: 22 nov. 2015. CUNHA, Maria Helena. Gestão Cultural: construindo uma identidade profissional. In: ENCONTRO DE ESTUDOS MULTIDISCIPLINARES EM CULTURA, 3., 2007, Salvador – BA. Anais... Salvador-BA: Faculdade de Comunicação/UFBA, 2007. Disponível em: <http://www.cult.ufba.br/enecult2007/MariaHelenaCunha .pdf>. Acesso em: 22 nov. 2015. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Cidades: Roraima. 2010. Disponível em: <http://cod.ibge.gov.br/J6E>. Acesso em: 22 nov. 15IRACEMA (RR). Plano Municipal de Educação de Iracema decênio 2015 a 2025. Iracema – RR: [s.n.], 2015. IRACEMA-RR. Prefeitura. Lei Municipal de n.º 0318/2013, de 21 de fevereiro de 2013. Dispõe sobre a alteração e reestruturação da lei n.º 165/09 e de quaisquer outras leis que trate do assunto, que cria a estrutura organizacional e administrativa e as funções diretamente subordinadas ao prefeito do Município de Iracema e dá outras providências. Iracema-RR, 21 fev. 2013. RORAIMA. Secretaria de Estado do Planejamento e Desenvolvimento. Divisão de Estudos e Pesquisas. Informações Socioeconômicas do Município de Iracema – RR 2010. Boa Vista: CGEES/SEPLAN, 2010. 58 p.

108

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


ANEXOS ANEXO A - Roteiro para coleta de informações culturais e turísticas do município de Iracema

ANEXO B - Roteiro para coleta de dados e/ou informações culturais sobre o município de Iracema, como fonte para elaboração do diagnóstico cultural do município de Iracema-RR Nome:_________________________________________________ Área de atuação:_________________________________________ Quantos anos reside no Município de Iracema:__________________ O Município de Iracema completará 21 anos de emancipação, dados mais precisos da cultura histórica do Município se fizeram por meio da cultura educacional, ou seja a Secretaria Municipal de Educação, Escolas Municipais e Estadual foram e são ainda os principais promovedores da cultura de Iracema. O que você sabe sobre a cultura promovida no município por estes meios/setores? _____________________________________________________________________ Na atualidade cultura do Município de Iracema, o que você sabe sobres os fazedores de cultura do Município? Quem são? Onde estão? O que fazem? A quanto tempo fazem? _____________________________________________________________________ Atualmente o órgão gestor específico da Cultura de Iracema esta ligado a Secretaria Municipal de Educação, que passou a denominar-se Secretaria Municipal de Educação Cultura e Desporto. Cite informações sobre a cultura. _____________________________________________________________________

Panorama Cultural de Roraima

|

109


Fotografia: Acervo da Secretaria Municipal de Cultura, Esporte e Turismo de MucajaĂ­ - SEMCET


A POLÍTICA CULTURAL NO MUNICÍPIO DE MUCAJAÍ/RR Ernandes Dantas e Silvaa, Francisco das Chagas Almeida Silvab, Gabriel Gomes de Oliveirac, Elisângela Gonçalves Lacerdad

INTRODUÇÃO Mucajaí é um dos 15 municípios que constituem o estado de Roraima. Sua história vem sendo criada tanto oral quanto literariamente desde o início do século XX, quando povos silvícolas, Macuxis e Yanomamis, percorriam a região em sua vida nômade, à procura de alimentos para subsistência. Essas caminhadas, às margens do rio hoje conhecido como Mucajaí, coletando pequenos cocos, deram-lhe origem ao nome. Não se sabe ao certo qual realmente era o coco que estes coletavam, se o Inajá ou o Tucumã. A divisão de produção da Administração do Território Federal do Rio Branco autorizou, na década de 1940, o senhor Raimundo Germiniano de Almeida a explorar uma área de 21.175 m². O objetivo era estimular a produção agrícola, de modo a abastecer a cidade de Boa Vista, capital do estado. A partir de então tem início o processo de colonização da região. Conselheiro Municipal de Cultura de Mucajaí, Especialista em Gestão, Supervisão e Orientação Educacional e Cultura Digital, e-mail: ernandesmucajai@ hotmail.com a

Servidor da Prefeitura de Iracema, graduado em Letras, e-mail: franciscoabsoluto@ hotmail.com b

Secretário-adjunto de Cultura, Esporte e Turismo da Prefeitura de Mucajaí, e-mail: ggomesdelospuerto@gmail. com c

Orientadora do Trabalho de Conclusão do Curso de Extensão em Gestão Cultural - UFRR/MinC, professora da Universidade Federal de Roraima, Doutoranda em Geografia, e-mail: elisangela. lacerda@ufrr.br. d

As políticas culturais demandam o resgate histórico e cultural do espaço no qual serão aplicadas, mas, sobretudo, faz-se necessário se repensar a forma de se fazer e gerir as questões ligadas à cultura. É mister se pensar a gestão cultural de forma visionária, de modo a se democratizar o acesso à mesma, ao esporte e ao turismo, preservando sua diversidade, uma vez que, são segmentos essenciais ao processo de formação e de desenvolvimento humano. É com essa postura que se elabora este diagnóstico cultural do município de Mucajaí. Tal documento é o resultado final do Curso de Extensão em Gestão Cultural, desenvolvido pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), em parceria com o Ministério da Cultura (MinC). O curso veio oportunizar um olhar mais crítico sobre o fazer cultural entre os profissionais que gerem a cultura nos municípios do estado de Roraima, ampliando a visão dos mesmos sobre as diversas manifestações culturais existentes em Mucajaí, sejam elas materiais ou imateriais. Os resultados foram obtidos a partir de pesquisa bibliográfica e de campo, realizada na sede e no interior do município, no período de maio a setembro de 2015. Foram aplicados 200 questionários, entre 140 munícipes, Panorama Cultural de Roraima

|

111


30 gestores e 30 artistas da localidade. Não é, de forma alguma, algo concluído e encerrado, mas, uma fonte inédita de informações, que visam auxiliar na construção das diretrizes da gestão cultural no município, além de subsidiar os pesquisadores da área.

1 O CONCEITO CONTEMPORÂNEO DE CULTURA É próprio do ser humano a necessidade de nomear as coisas, em um processo amplo por meio do qual buscamos apreender a realidade que nos abarca. Nossa evolução nos leva a estar em constante questionamento acerca dos conceitos que criamos. Neste contexto, o conceito de cultura nunca foi unânime, sendo sua relevância no escopo das ciências sociais crescente. Para Santos (2006b), cada realidade cultural tem sua lógica interna. Para que se possa compreender as práticas, costumes e concepções de uma determinada comunidade faz-se necessário conhecê-la. Dessa forma, o estudo da cultura contribui no combate a preconceitos, uma vez que, o conhecimento é capaz de incutir nos indivíduos o respeito e a dignidade, que devem prevalecer nas relações humanas. A bagagem cultural que um povo apresenta é reflexo de um dinâmico processo de construção, que se desenvolve de maneira interna e por meio do contato com outras culturas. Isso faz com que as características culturais sejam diversas, e que possuam critérios próprio de avaliação. Não obstante, é incorreto estabelecer uma classificação com julgamento de valor sobre as culturas, pois uma não é mais elevada ou mais importante que a outra. O desconhecimento da multiplicidade de manifestações, existentes dentro de uma mesma cultura, pode fazer com que as mesmas sejam tratadas como pertencentes à uma cultura que nos é estranha. Este equivoco é frequente quando se analisa grupos indígenas do território brasileiro, ou mesmo entre residentes de áreas rurais e urbanas do país. Por conseguinte, a compreensão da diversidade cultural interna é imprescindível para se compreender a cultura na qual estamos inseridos (SANTOS, 2006b). Os estudos acerca das questões relacionadas à cultura passaram a ser sistematizados no século XIX. Dentre as concepções sobre cultura, merecem destaque duas vertentes, uma relacionada aos aspectos de uma determinada realidade social e outra mais ligada ao conhecimento, às ideias e crenças de um povo. Conforme expõe Santos (2006b), cultura é uma palavra de origem latina, cujo significado original está ligado às atividades agrícolas. A origem da palavra está no verbo latino colere, que expressa a ação de cultivar. “Como cultivo, a cultura era concebida como uma ação que conduz à plena realização das potencialidades de alguma coisa ou de alguém; era fazer brotar, frutificar, florescer e cobrir de benefícios” (CHAUI, 2008, p. 55). O significado contemporâneo que se tem de cultura foi instituído pelos pensadores romanos, que passaram a utilizá-la para se referirem ao refinamento pessoal. No século XIX a palavra cultura passa a expressar as características e modos de vida de um povo em sua totalidade (SANTOS, 2006b). Porém, 112

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


não se pode perder de vista que, o seu uso historicamente está relacionado com as relações de poder e dominação. A crença de que a cultura dos povos colonizadores era superior à dos colonizados favoreceu a dominação e a exploração, deixando marcas até os dias atuais (CHAUI, 2008). A busca por um conceito de cultura fez com que o seu entendimento evoluísse. Assim, cultura passou a ser entendida como uma dimensão da realidade social, a dimensão não material, uma dimensão totalizadora, pois entrecorta os vários aspectos dessa realidade. Ou seja, em vez de se falar em cultura como a totalidade de características, fala-se agora em cultura como a totalidade de uma dimensão da sociedade (SANTOS, 2006b). Na concepção de Santos (2006b), cultura é o conhecimento que uma dada sociedade possui sobre si mesmo e suas ações, sendo, portanto, uma construção histórica inerente ao processo social. Dessa forma, seu constructo é coletivo, contínuo e dinâmico. Para se democratizar os conhecimentos e práticas relacionadas à cultura, reduzindo o seu uso enquanto instrumento de dominação, bem como o preconceito, é preciso se investir em ações que visem a sua promoção e difusão. A cultura é um aspecto de nossa realidade, analisar e compreender os seus aspectos contribuem para a sua expressão e reconhecimento. 1.1 A POLÍTICA NACIONAL DE CULTURA Todas as políticas, programas, projetos e ações desenvolvidas pelo MinC, a partir do ano de 2003, conforme os guias de orientações enviados aos estados e municípios têm sido norteados por uma concepção tridimensional: a simbólica, a cidadã e a econômica. As quais se baseiam nos direitos culturais e buscam responder aos novos desafios da cultura no mundo contemporâneo (BRASIL, 2011b). A dimensão simbólica foca-se na capacidade do ser humano em utilizar símbolos para se expressar, seja por meio da língua, do vestiário, etc. Como trata-se de modos de vida, essa dimensão tem um viés antropológico. Adotar a dimensão simbólica possibilita superar a tradicional separação entre políticas de fomento à cultura e de proteção do patrimônio cultural, uma vez que, ambas se referem à produção simbólica de cultura (BRASIL, 2010). No que diz respeito à dimensão cidadã, ressalta-se que os direitos culturais estão dentre os direitos humanos, portanto, devem servir como base para a proposição e implantação das políticas culturais (BRASIL, 2010). Dessa forma, essa dimensão está fundamentada na Constituição Brasileira (BRASIL, 2012). Já a dimensão econômica volta-se para o potencial que a cultura apresenta de gerar riquezas. Na nova economia de conhecimento a cultura é considerada como um instrumento estratégico, baseado na informação e na criatividade, os quais são fomentados a partir dos investimentos em cultura e educação (BRASIL, 2010). A lei que regulamenta o Sistema Nacional de Cultura determina que os municípios implantem seus Sistemas Municipais de Cultura com, no mínimo, cinco componentes: Secretaria de Cultura (ou órgão equivalente), Conselho Panorama Cultural de Roraima

|

113


Municipal de Política Cultural, Conferência Municipal de Cultura, Plano Municipal de Cultura e Sistema de Financiamento da Cultura (com Fundo Municipal de Cultura). O município de Mucajaí já tem seu órgão representante da Cultura e a lei do seu Sistema Municipal de Cultura (SMC) instituída. A partir deste diagnóstico, reformulará seu Plano Municipal de Cultura (PMC), completando assim as exigências mínimas estabelecidas pelo MinC, preconizadas pelo Acordo de Cooperação Federativa, ao qual o município aderiu em 2012. Quando o acordo foi assinado pelo município, automaticamente ele se comprometeu a integrar o Sistema Estadual de Cultura, quando este for constituído, o que ainda não ocorreu. No entanto, o município é ente autônomo e poderá firmar compromissos com a União independentemente do Estado. As atribuições de um órgão gestor de cultura podem ser divididas em quatro categorias: organização de atividades do calendário cultural da cidade, realização ou apoio a eventos e projetos da sociedade, desenvolvimento de ações culturais em conjunto com outras políticas públicas e prestação de serviços culturais permanentes (BRASIL, 2010, p. 19).

Os órgãos de cultura têm por atribuição elaborar o calendário cultural de atividades, podendo ser estas permanentes ou provisórias, tais como: festivais, festas populares, feiras, dentre outros. Além disso, é de sua responsabilidade a manutenção de espaços culturais, proteção e promoção da memória e do patrimônio cultural, apoio à produção, distribuição e consumo de bens culturais; incentivo ao livro e à leitura; intercâmbio cultural; formação de recursos humanos e programas socioculturais (BRASIL, 2010). Em um plano mais amplo, as políticas culturais são chamadas a colaborar com o planejamento urbano e com o desenvolvimento econômico local (BRASIL, 2011a). Em geral, os governantes costumam apreciar mais os eventos que trazem popularidade, e menosprezar as atividades permanentes, pois fortalecem a identidade e a diversidade cultural local, atuando na formação contínua dos cidadãos. Daí a importância da elaboração do Plano Municipal de Cultura, e sua aprovação como Lei Municipal, pois ele explicará as prioridades da cultura e quais programas, projetos e ações devem ter recursos assegurados na Lei Orçamentária Anual (LOA).

1.2 HISTÓRICO DOS EVENTOS E POLÍTICAS CULTURAIS DE MUCAJAÍ O primeiro prefeito eleito em Mucajaí foi Roldão Almeida (1984 a 1987). A partir desta gestão o segmento cultural passou a ser gerido de forma governamental. Sua equipe gestora, após a implantação da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desporto (SEMED), criou um calendário cultural para o município, instituindo as principais atividades que, em sua maioria, são realizadas até os dias atuais. Neste período o “Carnajaí”, carnaval de Mucajaí, era tradicionalmente realizado nos galpões por trás da máquina de arroz (área hoje da Praça da Juventude), e posteriormente no clube social do Time Atlético Progresso. Era uma festa tradicional com marchinhas carnavalescas dos bailes nacionais 114

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


do Rio de Janeiro. As famílias vestiam seus personagens, colocavam suas máscaras e se encontravam no clube. A encenação da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo, manifestação cultural mais expressiva do município, acontece há 33 anos, de acordo com o “Histórico da Paixão de Cristo”, elaborado pela Comissão Organizadora do evento. A dramatização teve início com a ideia do professor Venceslau Catossi (hoje falecido), de fazer alguma coisa diferente para movimentar Mucajaí durante a Semana Santa. Isso aconteceu em março de 1982. Na época, os professores Venceslau Catossi, Geraldo Pacheco, José Maria de Oliveira e Raimunda Plácida, se reuniram-se na residência desta última e discutiram o que e como fazer. A ideia era continuar com os moldes da Via-Sacra, porém com uma abordagem bem teatral e ainda levando uma cruz maior até a pedra. A partir desse pensamento, o grupo de professores conversou com o vigário da época, Pe. Luiz Palumbo. Este não aderiu, com a justificativa de que iria sair do contexto de fé, que era a Semana Santa (SANTOS, 2006a). Mesmo com a contestação do padre, realizaram a Via-Sacra encenada, inclusive com a participação de muitos fiéis da Igreja. O grupo era formado por aproximadamente 50 pessoas. A primeira encenação aconteceu no ano de 1982, na praça Valério Magalhães. Quando o espetáculo foi tomando maiores proporções (cultural, turística e comercial), houve distanciamento da Igreja que apoiou às primeiras realizações. “Havia muita emoção, choro na hora da flagelação, no enforcamento de Judas, na crucificação. Era como se estivéssemos vivendo aquilo de novo” (SANTOS, 2006a, p. 38). Nos últimos 10 anos, o espetáculo Paixão de Cristo foi transformado num evento maior durante a “Semana Santa” e recebe turistas da região Norte e dos países fronteiriços do estado: Venezuela e Guiana. Mucajaí é nacionalmente conhecida como a única cidade da região Norte a encenar a Paixão de Cristo, peça teatral exibida ao ar livre representada pelo trabalho voluntário de 150 artistas amadores, membros da própria comunidade (DI MANSO, 2004). A primeira banda formada em Mucajaí foi a “3ª Dimensão”, composta por três músicos: Daniel Martins Correia (guitarrista), Geraldo Pacheco (teclado e voz) e Josué Araújo (vocalista). Foi um dos primeiros trios de eletro ritmo do estado tocando nos clubes de Boa Vista. O repertório do trio seguia a tendência da época, que era principalmente as músicas da Jovem Guarda. Já a banda musical “Os Vikings” foi a segunda banda de baile criada no município, em meados da década de 1980, pelos músicos Naldo (guitarra), Edimilson (teclado), Josué Araújo, Francisco Pereira Lima, vulgo Alemão, (vocais) e Raimundo dos Reis, vulgo “Bolo frito” (baterista). Tocavam principalmente as músicas de bandas nacionais dos anos 60 e 70. Em meados da década de 1980, e na década seguinte, o Teatro Municipal Venceslau Catossi, era um centro cultural com shows de calouros, apresentados por Josué Araújo (Jerry Rossi), e peças teatrais encenadas pelos professores Venceslau Catossi, Geraldo Pacheco, Mara Santos e Ernandes Dantas. O “Arraial Popular de Mucajaí”, é outro evento que movimenta a cidade. Tradicionalmente realizado no mês de junho, em função do dia de São João, na Praça Valério Magalhães e, posteriormente, na Praça dos Estados (hoje se Panorama Cultural de Roraima

|

115


chama Praça Chaguinha Aguiar). Além das receitas com milho, também fazem parte do cardápio desta festa: broa de fubá, cocada, pé-de-moleque, vinho quente, batata doce e muito mais. As tradições fazem parte das comemorações. O mês de junho é marcado pelas fogueiras, que servem como centro para a famosa dança de quadrilhas. Com relação aos meios de comunicação existentes no município, devido a várias divergências políticas entre a direção do Jornal “O Roraima” e o então prefeito de Boa Vista, Silvio Leite, em julho de 1987 Mucajaí ganha um novo meio de comunicação, o jornal “A Tribuna de Mucajaí”. O jornal foi implantado com o apoio do então prefeito Roldão Almeida, que via nesse empreendimento a divulgação dos programas e projetos de sua gestão, bem como, as notícias da localidade. Outro meio de comunicação era a rádio “Voz do Vale”. Uma rádio em sistema de alto-falante, montada em 1986 no centro da cidade de Mucajaí, que durou mais de dois anos. Era coordenada pelo comunicador Raimundo Carvalho, conhecido popularmente como “Raimundinho da voz”. Esse veículo de comunicação popular fazia tanto sucesso que as pessoas, no final da tarde, sentavam em frente de suas casas para ouvir as músicas e os anúncios diários. Na gestão do prefeito Manoel de Souza Rufino, 1990 a 1992, a banda de baile “5ª Dimensão”, criada pelo contrabaixista J. Silva, animava os bailes de Mucajaí, tocando principalmente axé e forró nordestino. Realizava shows de calouros na cidade e o descobrimento de talentos. Dentre eles, Elton e Rubens, Eriscarlos Figueiredo, Evandro Inácio, Láercio Dantas e Ernandes Dantas, que por vários anos foi o vocalista da Banda, após participar de um dos shows de calouros. Nessa época, o clube da cidade mais frequentado era a sede do time Atlético Progresso. A gestão de Francisco Mendes da Silva, janeiro a junho de 1993, foi o período em que o município assumiu de fato e de direito o evento da encenação da Paixão de Cristo, pois, anteriormente, era realizado por uma comissão definida pelo Estado. A partir de 1993, o evento passa a ser organizado por uma comissão local, nomeada pela Prefeitura de Mucajaí. Na gestão de Antônio Nunes Cruz, julho de 1993 a 1996, ocorreram as edições I e II do Festival de Música de Mucajaí (FEMUM). O I Festival de Música de Mucajaí, foi realizado no ano de 1993, na sede do Atlético Progresso Clube, e contou com a participação de vários artistas amadores da cidade. Foi, na época, um dos principais eventos culturais do Município, coordenado pelo artista plástico Manoel Matias. A banda que acompanhou a final do festival foi a Banda Memory, a mais famosa do estado na época. A segunda edição aconteceu em 1994, no ginásio Municipal Francisco Arinaldo de Sousa Paiva (FASP) e contou com a participação dos artistas Eliakin Rufino, Vânia Coelho, Neuber Uchôa, Odelir Sampaio, Carlos Alberto Alves, Neto Araújo e Paulo Santos como julgadores. Os artistas que se destacaram no Festival foram: Félix, Evandro Inácio, Eronilde Mesquita e Eris Carlos. Manoel Matias se destacou ainda como gestor cultural, realizando a festa amadora das Artes, revelando as expressões artísticas da cidade nos anos de 1993 a 1994.

116

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Na gestão de Terezinha de Jesus Dal Correa, 1997 a 2000, ocorreu a reestruturação da Secretaria de Educação (SEMEDT) com criação dos Departamentos de Cultura, Esporte e Turismo. A equipe ficou melhor definida e cada departamento ganhou um técnico para organizá-lo. É nesse período que se organiza o Calendário Cultural e Turístico de Mucajaí e se realizam outros eventos tradicionais, como o Festival de Calouros de Mucajaí (FESCALJAÍ) e a Feira Municipal de Artesanato, com o auxílio técnico do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE/RR). A gestão de Aparecido Vieira Lopes, 2001 a 2004, foi marcada pelas maiores Semanas Santas de Mucajaí, com a participação de atores globais e bandas de renome nacional. É também o período em que a encenação ganha o prêmio de notoriedade cultural do estado, instituído pelo Conselho Estadual de Cultura. Na gestão de Ercildon de Souza Pinto, 2005 a 2007, houve a criação da Fundação Municipal de Cultura (FUMCET), por meio da Lei Municipal n.º 226/2005, no dia 12 de julho, com a finalidade de valorizar a cultura, o esporte e o turismo local, preservar o patrimônio cultural, esportivo e turístico da cidade de Mucajaí e valorizar as artes como forma de expressão da cultura, do esporte e do turismo. O carnaval fora de época, denominado “Precajaí”, foi um grande evento popular realizado no município de Mucajaí pela FUMCET, no período da gestão do prefeito Ercildon Pinto. Suas primeiras versões contaram com a participação de bandas nacionais como: Pimenta Nativa, Severina Brawn e Nagib, levando para o município uma média de público de 15.000 pessoas. A cidade se movimentava com os turistas frequentando os comércios locais e deixando assim uma boa renda. Além disso, havia concurso de blocos com uma premiação significativa, o que atraia a formação de grupos de jovens. Destacam-se nessa época os grupos “Fascinação”, “Kara de Bebê”, “Furacão” e “Tô Nem Aí”. Na administração de José Lima, Zé da Usina (2008), a FUMCET organizou uma “Semana Santa de Mucajaí” de expressão significativa, uma vez que, a mesma contou com uma vasta programação cultural, incluindo a contratação do ator Sidney Sampaio. O encerramento ocorreu no sábado de aleluia, com um show da dupla sertaneja nacional Rick e Renner. O evento contou com a participação de artistas plásticos contratados de Parintins e teve um orçamento final de aproximadamente R$ 400.000,00. A direção geral do evento foi do diretor-presidente Ernandes Dantas. Na década de 1980 havia sido criado o “Bloco das Virgens e Mukiranas”, pelo comerciante Chaguinha Bahia Aguiar. No período do carnaval, um grupo de 30 homens se transvestia de mulheres e percorria as principais ruas da cidade, concentrando-se na Praça dos Estados. Com a morte de Chaguinha, o grupo ficou sendo coordenado pelos irmãos: Assis Bahia e Joseane Vieira. Em 2008, foi criado também o bloco das Mukiranas, pelo gestor cultural Normando Rocha, para ampliar a participação popular no carnaval. Desde 2009, os dois blocos se fundiram e vêm sendo coordenado pelo professor Michael Almeida, que reuniu amigos e adeptos para brincar, mantendo a tradição popular.

Panorama Cultural de Roraima

|

117


No governo de Elton Vieira Lopes, 2009 a 2012, extinguiu-se a Fundação Municipal de Cultura, Esporte e Turismo de Mucajaí (FUMCET) foi extinta por meio da Lei Municipal n.º 0294 de 24 de dezembro de 2009. A justificativa apresentada pelo Executivo ao Legislativo Municipal foi que esta fundação não vinha apresentando satisfatoriamente suas prestações de contas junto aos órgãos governamentais, o que a tornou inadimplente e sem condições de executar os principais eventos culturais do município. A Câmara acatou e autorizou a extinção pelo então prefeito Elton Vieira Lopes. Com a extinção da FUMCET, foi criada a Secretaria Municipal de Cultura de Mucajaí (SEMCET), por meio da mesma lei (Lei n.o 0294 de 24 de dezembro de 2009), com o objetivo de elaborar, coordenar e executar as políticas municipais de cultura, esporte e turismo, garantindo o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura municipal, além de fomentar as práticas desportivas formais e não-formais, incumbindo-lhe, também, a acessibilidade gratuita a atividades de lazer. Teve como primeiro secretário o professor Daniel Pereira de Almeida. Foi um período de grandes eventos culturais e esportivos, mas de poucas políticas públicas municipais para a Cultura. Regulamentação da SEMCET - com a mudança de secretários de cultura em 2011, o novo gestor cultural, Ernandes Dantas e Silva, tratou de regulamentar a Secretaria, definindo seus objetivos, patrimônio, recursos financeiros e sua estrutura administrativa funcional. O Decreto de Regulamentação (n.º 0133) foi publicado em 11 de agosto de 2011 pelo executivo municipal. A regulamentação da Secretaria não trouxe de imediato o êxito esperado pela nova equipe gestora, pois o que se almejava com isso era alocar recursos para o município para atender aos anseios da classe artística, que não se sentia motivada a continuar no segmento. A criação do Sistema Municipal de Cultura de Mucajaí foi pela Lei Municipal n.º 0364 de 26 de junho de 2012, após extenso estudo da equipe gestora de cultura do município. Foi um marco para o segmento cultural local, pois houve ampla divulgação entre os artistas e estes participaram da elaboração e aprovação da Lei pelo legislativo municipal. Esta Lei constitui, no âmbito municipal, o principal articulador das políticas públicas de cultura, estabelecendo mecanismos de gestão compartilhada com os demais entes federados e sociedade civil. Integram o SMC de Mucajaí: a Secretaria Municipal de Cultura (SEMCET), como órgão de coordenação; o Conselho Municipal de Política Cultural (CMPC), a Conferência Municipal de Cultura (CMC), como instâncias de articulação, pactuação e deliberação; o Plano Municipal de Cultura (PMC) e o Sistema Municipal de Financiamento à Cultura (SMFC), como instrumentos de gestão. Na gestão de Josué Jesus Paneque, prefeito desde 2013, Gabriel Oliveira assumiu a pasta da Secretaria Municipal de Cultura, dando continuidade à política cultural que se implantara anteriormente. Participou de eventos em Brasília, representando o município de Mucajaí e implantou um projeto de cultura itinerante levando a música, o teatro e a dança às vilas do município. Foi na sua gestão que também se realizou o resgate do evento encenação da Paixão de Cristo com cunho mais religioso.

118

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Em maio de 2015 foi criada a “Fanfarra Municipal de Mucajaí” (FAMMUCA), composta por 45 crianças, regularmente matriculadas nas escolas municipais de ensino. A mesma tem como regente o professor Fernando Nogueira Leitão, vulgo Fernando Marley, que há 17 anos se dedica às fanfarras do município.

2 RESULTADOS OBTIDOS NA PESQUISA O questionário respondido por 30 artistas de Mucajaí foi aplicado entre os dias 28 de agosto e 02 de setembro de 2015 e corresponde a um olhar sobre os segmentos culturais existentes na localidade e as políticas públicas desenvolvidas pelo Executivo e Legislativo municipal. Quanto ao sexo dos entrevistados, 70% dos artistas são homens, o que demonstra a participação menor das mulheres nos segmentos culturais. Quanto à idade, os entrevistados têm em média 35 anos. 30% têm Ensino Médio, 35% Ensino Fundamental e 35% Ensino Superior na área de educação. Percebemos que apenas 10% dos artistas tem formação técnica na área cultural, demonstrando a necessidade de cursos de formação em arte visual, teatro, música, dança etc. Quanto à área de atuação, 35% são músicos, cantores, compositores, autodidatas sem trabalhos autorais registrados e com pouca atuação no cenário de forma profissional, uma vez que a maioria dos eventos de médio e grande porte realizados no município pouco privilegia os artistas locais. 35% são atores amadores que atuam na encenação da Paixão de Cristo, durante a Semana Santa; 20% do segmento dança e os demais 10% são fotógrafos, artesãos e costureiras. Com relação ao conceito que os entrevistados têm sobre cultura, as respostas, em sua maioria, demonstraram pouco embasamento teórico, mas estão relacionadas aos fazeres de um povo, suas manifestações sentimentais expressadas por meio da música, da dança, do teatro, ou da pintura de um quadro, de um produto artesanal, vestimenta, comida etc. Quanto à análise dos dados relacionados ao questionário aplicado à população de Mucajaí, 140 pessoas foram entrevistadas, no período de 18 de agosto a 14 de setembro de 2015. Destes, 70% foram do sexo feminino e 30% do sexo masculino, divididos nas seguintes faixas etárias: 14 a 20 anos, 20 a 40 anos e de 40 a 70 anos. Das 140 pessoas entrevistadas, 60% estão cursando o Ensino Médio e 40% cursando Nível Superior, sendo que 80% não souberam formalizar um conceito sobre cultura. Quanto às manifestações culturais de Mucajaí, 90% destes souberam citar os principais eventos culturais de Mucajaí; já 100% dos entrevistados disseram já ter participado de alguma forma, seja direta ou indiretamente, de alguma manifestação cultural de Mucajaí. Quanto à pergunta “você conhece os artistas de Mucajaí? ”, 80% citaram o nome dos artistas Ernandes Dantas e Franck Marques, 5% citaram os artistas Gabriel Oliveira e Josué Araújo, 5% responderam conhecer os artistas Francisco das Chagas e Harlesson Chystian, 3% outros artistas sem saber o nome e 7% disseram não conhecer nenhum artista local.

Panorama Cultural de Roraima

|

119


Para responder à questão; “quais equipamentos culturais você conhece em Mucajaí? ”, 90% dos entrevistados citaram a Praça Chaguinha Bahia e o cenário da Paixão de Cristo, 10% citaram os ginásios esportivos Francinaldo Conceição da Silva e Francisco Arinaldo de Souza Paiva (FASP), como um equipamento cultural. E 100% dos entrevistados disseram frequentar esses ambientes culturais. Um dado bem curioso foi relacionado à pergunta “você conhece alguma lei de apoio a cultural de Mucajaí? ”, 95% responderam não ter conhecimento de nenhuma lei voltada para este setor, mas 100% dos entrevistados responderam ser importante o investimento em Cultura. Quanto ao resultado do questionário aplicado aos 30 gestores públicos de Mucajaí, percebeu-se que 70% desconhecem as políticas públicas que são desenvolvidas no município e 90% também não conhecem o conteúdo das leis aprovadas para o seguimento cultural. Tanto o Executivo quanto o Legislativo não dispõem de um arquivo organizado com cópia das leis que foram criadas, o que é preocupante, uma vez que estas fazem parte do patrimônio cultural do município. Também o judiciário local desconhece por completo a legislação cultural existente no município.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Mucajaí foi o primeiro município do estado a constituir e regulamentar uma Secretaria Municipal de Cultura (SEMCET) e assinar o Acordo Federativo de implantação do Sistema Municipal de Cultura ganhando, assim, certa credibilidade no cenário cultural do estado. No entanto, sua implantação encontra-se inconclusa, pois, mesmo com o Plano Municipal de Cultura elaborado, o mesmo não foi enviado às representações estaduais e federal. O Plano de Cultura terá que ser reavaliado e enviado até o final do ano de 2015 para a Prefeitura e, então, ser encaminhado em formato de projeto de lei para ser aprovado pela Câmara Municipal. Muitas pessoas da Prefeitura, da Câmara Municipal e da sociedade civil estão envolvidas na construção do Plano Municipal. O resultado é compensador: um documento de planejamento que reúne os anseios da sociedade aos interesses e possibilidades do poder público, facilitando a execução das políticas públicas da cultura. Para tanto, é preciso ter uma base técnica para saber se o que se pretende alcançar pode ser de fato realizado. Ou seja, técnicos, gestores e sociedade devem trabalhar juntos nessa construção. Apesar das dificuldades econômicas enfrentadas em todo o país, percebemos como potencialidade no município o interesse do representante do executivo em manter a Secretaria e garantir políticas públicas para o segmento com a captação de recursos via emenda parlamentar ou por meio de projetos, programas via Ministérios da Cultura e do Turismo. Mesmo com todos esses esforços, a situação do segmento é bem preocupante no município. A maioria dos representantes dos poderes públicos de Mucajaí desconhecem a legislação de políticas culturais existentes no município, principalmente o judiciário. Ignoram as leis criadas e não se percebeu muito 120

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


interesse do legislativo e parte do executivo em participarem das decisões políticas voltadas para a cultura. Desconhecem o papel social do Conselho Municipal de Políticas Culturais (CMPC), que se encontra inativo. A comunidade também não se mostrou muito preocupada com a criação das leis culturais. Mesmo assim, reclama da falta de um calendário de atividades culturais mais significativo, que gere emprego e renda na cidade. Percebemos a necessidade da Secretaria Municipal de Cultura divulgar as ações que estão sendo desenvolvidas e as políticas culturais implantadas nos últimos anos, bem como reativar o conselho, pois os gestores culturais querem colaborar com o processo cultural, há interesse dos artistas em manifestarem sua arte e participarem dos eventos promovidos pelo município. A Secretaria de Cultura (SEMCET) vem tentando resgatar os eventos tradicionais do município e investindo em programas e projetos de formação, pois a maioria dos artistas é autodidata, mesmo assim vem sentido dificuldade na captação de recursos. Encontramos nas visitas realizadas pelo menos 5 segmentos culturais organizando-se e se constituindo juridicamente e aptos para serem Pontos de Cultura e a captarem recursos por meio de editais do poder público e privado. Quanto aos equipamentos culturais, o município tem uma estrutura boa, mas falta teatro, galeria de arte, dentre outros. A própria Secretaria ainda não tem um prédio próprio, funciona precariamente em um vestiário do Complexo Poliesportivo. Outros equipamentos culturais que estão sendo implantados, estão com obras atrasadas há mais de seis anos, passando de uma gestão para outra, o que causa descrença na população com relação às políticas culturais que vêm sendo implantadas. Além disso, precisa-se de uma legislação municipal para o uso racional desses espaços já criados e para os novos. Outro ponto observado é que a Secretaria Municipal de Educação (SEMED) está omissa à cultura e ao desporto escolar. É necessário se assumir esses dois segmentos, uma vez que a SEMCET deve trabalhar tanto com a comunidade jovem, como com os adultos, e não está atendendo as crianças e pré-adolescentes. Uma boa sugestão seria participar dos programas “Mais Educação” e “Mais Cultura nas Escolas’. A regulamentação do Fundo Municipal de Cultura, criado por meio da lei de implantação do Sistema Municipal de Cultura (SMC), é um excelente instrumento para a organização dos grupos e planejamento das ações culturais. A exemplo disso, podemos citar o estado da Bahia, que organizou todo o seu setor cultural e hoje é um dos estados brasileiros que mais produz e vende cultura, gerando emprego e renda para vários artistas e trabalhadores.

Panorama Cultural de Roraima

|

121


REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5 de Outubro de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988. Diário Oficial da União, Brasília, 30 de nov. 2012. BRASIL. Ministério da Cultura. Secretaria de Articulação Institucional – SAI. Coordenadoria Geral de Relações Federativas e Sociedade. Cartilha do sistema nacional de cultura para os municípios. Brasília-DF: MinC, 2010. BRASIL. Ministério da Cultura. Guia de como fazer um plano de cultura. Brasília-DF: MinC, 2013. ______. Guia de estruturação, institucionalização e implementação do sistema nacional de cultura. Brasília-DF: MinC, 2011a. ______. Guia de orientações para os municípios sobre SMC: perguntas e respostas sobre como implantar o Sistema Municipal de Cultura Brasília-DF: MinC, 2011a. CHAUI, Marilena. Cultura e democracia. Crítica y emancipación. Revista latinoamericana de Ciencias Sociales, Buenos Aires, v. 1, n. 1, pp. 53-76, jun. 2008. DI MANSO, Antonietta. A história, a lenda e os casos de Mucajaí, na versão de seus moradores mais antigos. 2004. 62 f. Monografia. (Graduação em Comunicação social com Habilitação em Jornalismo) - Centro de Comunicação Educação e Letras, Universidade Federal de Roraima, Boa Vista, 2004. SANTOS, Aline Siqueira da Silva. Encenação da paixão de cristo em Mucajaí / RR. 2006. 96 f. Monografia (Graduação em Ciências Sociais) - Centro de Ciências Sociais, Universidade Federal de Roraima, Boa Vista-RR, 2006a. SANTOS, Luiz dos Santos. O que é cultura. São Paulo: Brasiliense, 2006b. (Coleção Primeiros Passos).

122

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


APÊNDICES APÊNDICE A - Modelo de questionário utilizado com artistas UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA CURSO DE EXTENSÃO EM GESTÃO CULTURAL Prezado artista, Somos acadêmicos do Curso de Extensão em Gestão Cultural, realizado pelo Ministério da Cultura em parceria com a Universidade Federal de Roraima – UFRR, com a participação de representantes dos 15 municípios do estado de Roraima. Estamos realizando entrevista com os artistas mucajaienses para, a partir das informações coletadas, construir o diagnóstico cultural de Mucajaí. Este diagnóstico subsidiará a elaboração do Plano Municipal de Cultura. Para a efetivação deste trabalho de conclusão de curso solicitamos a colaboração de Vossa Senhoria no sentido de fornecer informações por meio deste questionário. O apoio e a contribuição serão de fundamental importância para a conclusão deste trabalho de pesquisa. Atenciosamente, Ernandes Dantas, Francisco das Chagas e Gabriel Oliveira.

Panorama Cultural de Roraima

|

123


APÊNDICE B - Modelo de questionário utilizado com gestores UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA CURSO DE EXTENSÃO EM GESTÃO CULTURAL Prezado gestor, Somos acadêmicos do Curso de Extensão em Gestão Cultural, realizado pelo Ministério da Cultura em parceria com a Universidade Federal de Roraima – UFRR, com a participação de representantes dos 15 municípios do estado de Roraima. Estamos realizando entrevista com os gestores mucajaienses para, a partir das informações coletadas, construir o diagnóstico cultural de Mucajaí. Este diagnóstico subsidiará a elaboração do Plano Municipal de Cultura. Para a efetivação deste trabalho de conclusão de curso solicitamos a colaboração de Vossa Senhoria no sentido de fornecer informações por meio deste questionário. O apoio e a contribuição serão de fundamental importância para a conclusão deste trabalho de pesquisa. Atenciosamente, Ernandes Dantas, Francisco das Chagas e Gabriel Oliveira.

124

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


APÊNDICE C - Modelo de questionário utilizado com a população UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA CURSO DE EXTENSÃO EM GESTÃO CULTURAL Prezado morador, Somos acadêmicos do Curso de Extensão em Gestão Cultural, realizado pelo Ministério da Cultura em parceria com a Universidade Federal de Roraima – UFRR, com a participação de representantes dos 15 municípios do estado de Roraima. Estamos realizando entrevistas com a população mucajaiense para, a partir das informações coletadas, construir o diagnóstico cultural de Mucajaí. Este diagnóstico subsidiará a elaboração do Plano Municipal de Cultura. Para a efetivação deste trabalho de conclusão de curso, solicitamos a colaboração de Vossa Senhoria no sentido de fornecer informações por meio deste questionário. O apoio e a contribuição serão de fundamental importância para a conclusão deste trabalho de pesquisa. Atenciosamente, Ernandes Dantas, Francisco das Chagas e Gabriel Oliveira.

Panorama Cultural de Roraima

|

125


Fotografia: Adilson Brilhante

126

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


NORMANDIA – (IN)VISIBILIDADE DAS MANIFESTAÇÕES CULTURAIS NO MUNICÍPIO: uma abordagem introdutória, situacional e contextual Jaider Esbella, Josimar Pereira dos Santosb, Lourival Novais Nétoc

INTRODUÇÃO Reunir a diversidade das manifestações culturais de um determinado lugar é passo fundamental no sentido de mostrar à sua própria comunidade, e ao outro, uma fotografia de sua cultura. Visível e invisível, aberto e fechado são termos-chave usados e serão melhor detalhados na metodologia. Um passeio na paisagem do lugar vale mais que somente levantar dados oficiais. Este artigo faz esse passeio no sentido de ordenar minimamente as manifestações culturais, em práticas “abertas” e “fechadas”, no município de Normandia. Não é objeto deste estudo apresentar uma radiografia conclusiva da situação da cultura do município. Este nível de detalhamento exige investimento técnico e estrutural, o que não é o caso. Para este ensaio é prudente pensar o município de Normandia como um espaço aberto de fluxos próprios, estando este mesmo sujeito a fluxos e dinâmicas alheias à sua força, sofrendo constante transformação. Para melhor compor o mapa trajetória, propomos ao leitor acompanhar o raciocínio lógico da formação da identidade cultural do município a partir de pontos específicos.

Artista indígena makuxi, Especialista em Gestão Ambiental e Desenvolvimento Sustentável, e-mail: es.b@ hotmail.com a

Servidor da Prefeitura de Normandia, Especialista em Supervisão Escolar, e-mail: josimarpereirasantos@hotmail. com b

Orientador do Curso de Extensão em Gestão CulturalUFRR/MinC, professor da Universidade Federal de Roraima, Doutor em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, e-mail: lourival. novais@ufrr.br c

Primeiro, podemos considerar a instalação das fazendas de criação de gado na região de forma violenta e indiscriminada. Esse foi o evento histórico que mais colaborou para a formação da paisagem social e cultural que temos hoje no município de Normandia e por extensão em boa parte da porção norte do território roraimense. As terras firmes do norte, com campos naturais, foram o grande foco da Coroa Portuguesa, que, operando seu contingente militar, deixava os rios das recentes estabelecidas fronteiras para fixar as fazendas reais e proceder aos sistemas de aldeamentos, neste caso, com a atuação da Igreja Católica. Cabe ressaltar que, embora as fazendas reais aparentemente não tenham impacto direto sobre o território do que conhecemos hoje como município de Normandia, defendemos que seus reflexos e sua política de alcance tenham, sim, efeitos diretos no resultado final qualquer que seja a realidade Panorama Cultural de Roraima

|

127


cultural do município nos dias atuais. Ao deixar as viagens exploratórias e de reconhecimento de limites fronteiriços para o estabelecimento de fazendas em adição ao sistema de aldeamento, temos neste período a maior e talvez a mais forte investida sobre a vida e a cultura dos povos indígenas originários, os garimpos e a introdução de bebidas alcoólicas industrializadas. Os conflitos diretos com os novos habitantes, leiam-se fazendeiros, exploradores aventureiros, caçadores, militares e missionários religiosos, causou a primeira grande interferência nas culturas originárias e os primeiros convívios forçados entre estes e os nativos. Configura no imaginário popular um termo-conceito que busca simplificar os processos e as relações sociais entre ocupantes invasores e seus serviçais nativos - convivência pacífica usado genericamente para descrever o modus operandi da relação fazendeiro, índio e vaqueiro, ou patroa, empregada e indígena. Fora do ideário de convivência pacífica, qual fosse o trabalho exaustivo não renumerado nas fazendas, os desdobramentos dos contatos, enfrentamentos e resistências de contato dos povos com o colonizador podem ser conhecidos em diversos documentos, cartas, relatos, fotos, livros e testemunhos vivos de antigos habitantes do município que vivenciaram e ainda vivenciam essas transformações. Cultura, arte, saberes, fazeres e outros termos-chave são recorrentes na construção dessa leitura. Uma abordagem introdutória desses conceitos exemplificados nas práticas possibilita melhor compreensão e construção de uma visão geral da cena cultural e suas complexidades. No contexto analisado, um arcabouço de práticas ou a sua falta na vida cotidiana das pessoas para além da memória coletiva, a cultura, podemos dizer, une e separa os povos. Cultura seria o mesmo que identidade, pois, algo vivo, identificável nas múltiplas manifestações coletivas e individuais. A arte pode nos auxiliar em exemplificações de cultura. Obras de arte seriam produtos de práticas de saberes, mas é prudente avisar ao leitor que este artigo não tem profundidade científica, portanto, não oferece maiores conclusões. Ao provocar a visibilidade de algumas práticas culturais “fechadas”, que não permitem participação ou influência de alheios, como rituais indígenas, mostramos o risco que há em compreender a cultura de um lugar apenas no que está plenamente visível, ou em prática cultural “aberta.” Esse apontamento cabe para abordar uma situação-problema, a tendência de se generalizar ou prevalecer o entendimento de que fazer cultura seja realizar eventos abertos de caráter público ou privados, portanto midiáticos. Este documento certifica a capacidade dos autores em imprimir um olhar abrangente sobre o termo cultura e seus desdobramentos práticos na realidade plural do município de Normandia.

128

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


1 GEOGRAFIA E HISTÓRIA Normandia foi criado em 15 de julho de 1982, por meio de Lei Federal n.º 7.009, tendo sofrido modificação em sua geografia no ano de 1995 (BRASIL, 1982). Parte do seu território foi desmembrado para a criação do município de Uiramutã. Está localizado no nordeste de Roraima. A história oficial conta, com certa carga de folclore, o caso de cidadãos franceses condenados naquele país e mandados para prisão de segurança máxima na Guiana Francesa, mais precisamente na Ilha do Diabo, como fundadores. O município recebeu nome do francês Maurice Habert, um de seus fundadores. Estamos falando do século XIX. A presença e a participação dos nativos da região é pouco notada, portanto, quase não aparece na história oficial. Livros, filmes e versões do imaginário popular dão tom de mito e contam que, então fugitivos, os franceses, entre eles Maurice Habert e Papillon, este o grande personagem, alcançaram o lugar. Maurice Habert se casou com uma nativa, constituiu família e ocupou um sítio. Em homenagem à sua região de origem, Normandie, na França, deu nome ao vilarejo, hoje cidade. Papillon adentra ainda mais a paisagem de lavrado e se sustentam os argumentos para uma sepultura sua em Surumu, hoje município de Uiramutã. Longe de um resumo simples, parte mínima da cultura do munícipio se define nessa empreitada. Atores diversos que versam diferentes argumentos para sustentar seus fatos. Em alguma dimensão, o enredo da fuga cinematográfica da prisão e passagem, em vida, dos personagens franceses pela região causou memórias, literatura e ainda inspira literatos. A participação dos nativos na construção dessa parte da identidade e memória oficial do lugar se restringe a personagens secundários, totalmente anônimos. Daqui, podemos tirar pistas valiosas para compreender a virada cultural que se desenha. Para ver a cultura do lugar, temos que olhar os tempos imemoriais, a história recente e a explosão de manifestações que ganha visibilidade nas mídias abertas. Normandia se limita ao norte com a República Cooperativista da Guiana e Uiramutã. Ao sul, com os municípios de Bomfim e Boa Vista, ao leste, com a República Cooperativista da Guiana e ao oeste com Boa Vista e Pacaraima. Normandia tem a BR-401, que a liga à capital Boa Vista, distante a 185 km (IBGE, 2016). O município tem elementos culturais diversos na constituição de sua identidade, mas prevalece a cultura indígena. Percentuais apontados pelo Censo 2010 (IBGE, 2010) contrastam visivelmente a realidade atual, in loco, em números (falta recenseamento atual). O Instituto indica população de 8.940 hab, dos quais, 2.311 habitam a sede do município. A área total do município é 6.967 km² e hoje tem 96% da sua área ocupada pela Reserva Raposa Serra do Sol. Eventos como a corrida para o garimpo e o consequente fechamento, o desmembramento de parte do território para o município de Uiramutã, o estabelecimento das fazendas de gado na região de lavrado e o recente decreto de homologação da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol marcam os aspectos da cultura do município à época da construção desse artigo. Normandia tem infraestrutura básica, conta com todos os serviços de

Panorama Cultural de Roraima

|

129


comunicação e, embora seja um município de fronteira, pouco se percebe uma relação bilateral com a Republica Cooperativista de Guiana, senão uma relação muito bilateral particular entre índios, à qual cabe pesquisa própria.

2 METODOLOGIA Os autores imprimem visão holística da situação atual da cultura no município de Normandia a partir de várias referências. Olhar com atenção os contextos de memória, trajetória, dias atuais e perspectivas futuras consta da metodologia. Fatores e eventos sociais ou políticos que influenciaram a realidade atual foram investigados. Devemos saber que, ao assumir o papel de escrever diagnósticos, perfis, descrever identidades culturais de lugares que, para todos os efeitos, sempre há uma ou mais versões não oficiais que não deixam, necessariamente, de ser verdade e de ter suas importâncias devidas, suas validades. Portanto, é premissa entender os fatores complicadores como parte fundamental da trajetória e sua função prática nos desdobramentos dos contatos interculturais. Muitas das vezes, estes detalhes não constam nos registros oficiais e como tal ficam alheios ao alcance das políticas públicas e também do conhecimento geral da sociedade. As considerações deste ensaio são expectativas amplas e buscam pôr um ponto central na construção e projeção da história remota e mais recente do município de Normandia. Não cabe aqui discorrer sobre a assertividade, ou leviandade, dos teóricos da cultura e das relações interculturais, cabe destacar a presença e a influência sofrida e causada nos contatos entre os povos indígenas e não indígenas ao longo do tempo e na dinâmica da construção do espaço habitado atual e suas tendências em relação ao futuro. Considerando a restrita bibliografia sobre o tema e a fim de evitar erros primários quando se investe no estudo de culturas, optamos por apresentar o artigo com a seguinte estrutura. O corpo do texto apresenta datas históricas e a geopolítica da formação do município, versa sobre festas e eventos culturais de amplo destaque, e listam algumas práticas culturais vivas, mantidas nas comunidades indígenas como parte da tradição milenar de seus detentores. Chamamos a atenção para a origem do nome e da constituição étnica, especialmente dos povos nativos à época, na formação da sede, voltando-se para um contexto histórico e político. Não serão apresentados dados oficiais quantitativos da Prefeitura de Normandia quanto ao atingimento da população no que se espera ser uma política pública. Os pesquisadores não obtiverem respostas às questões encaminhadas à área responsável. Mostramos a aparelhagem cultural, práticas mantidas pelo poder público e sua condição em relação às políticas públicas e em relação ao sistema e plano municipais de cultura. A metodologia é de pesquisa bibliográfica, com prestigio à memória viva dos personagens, considerando a vivência e o conhecimento empírico dos autores. O emprego dos termos de práticas culturais abertas e fechadas, defendem os autores, traz luz na organização das ideias e possibilita melhor apresentação das análises. Mais adiante, exemplificamos melhor o que seriam as práticas 130

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


abertas e fechadas e qual a relevância dessa observação nas conclusões apresentadas. Apresentamos breves considerações como conclusão, o que imprime nossa percepção sobre a fotografia mais visível ou menos visível da cultura do município de Normandia na primeira quinzena do século XXI.

3 EXEMPLOS DAS EXPRESSÕES CULTURAIS “ABERTAS” OU VISÍVEIS E “FECHADAS” OU INVISÍVEIS Consideramos expressões culturais abertas todos os eventos que envolvam a mobilização da estrutura pública, reúnam quantidade expressiva de locais, turistas e que tenham repercussão midiática, como, por exemplos: Festa da Melancia e Festejos de Nossa Senhora de Nazaré. Nestas duas festividades, é possível perceber os atores que compõem a diversidade cultural do município. A Festa ou o Festival da Melancia ocorre normalmente no mês de abril. É realizada no Parque de Exposição Valmir Gonçalves de Oliveira. Promove a fruta, destaca o potencial de mercado, socializa as pessoas e abre perspectiva de integração com outras práticas culturais abertas no município. As “famosas” melancias de Normandia abastecem o mercado local, regional e são exportadas para o mercado do Amazonas. O evento conta com a participação de produtores rurais da região e exposição de artesanato indígena. Comidas típicas, corridas de cavalo, forró, escolha da rainha da melancia, apresentações culturais e speedway também fazem parte da programação. A festa do Círio de Nazaré representa a religiosidade da comunidade católica no município. Anualmente, há mais de 40 anos, promove-se a tradicional procissão do Círio de Nazaré junto com os festejos, celebrada no mês de outubro, com forte atração turística, caracterizando o turismo religioso. É uma ocasião marcante para visitantes e devotos, considerado um momento para fortalecer a fé e a desenvolver a prática da solidariedade. A origem vem da influência de paraenses radicados no munícipio, visto que Belém/PA cultua a entidade como padroeira. Neste contexto, pode ser inserido como evento religioso. O período serve também para que os moradores que deixaram o município, por diversas razões, voltem para rever parentes e amigos. É considerada a festa mais tradicional do município de Normandia e vem, ao longo dos anos, vencendo obstáculos para que possa ser mantida e fortalecida. Por ser uma festa religiosa sempre teve como apoiadores diferentes classes sociais, com destaque os fazendeiros da região, que, com o advento da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, que teve como principal apoiador a Igreja Católica, perdeu parte substancial desse apoio. Ao que se procede a entrada da Prefeitura Municipal, do Governo do Estado, de comerciantes e devotos. Algumas festas nas comunidades indígenas sempre existiram como expressões culturais fechadas. Tornaram-se conhecidas e caminham para tradição aberta, com enfoque e destaque midiático. As festas contemporâneas mesclam originalidade, tradição milenar e culturas dos contatos com sociedades não indígenas. Parixara, areruia e rituais sagrados dividem palco com corridas de cavalo, campeonatos de futebol e forró.

Panorama Cultural de Roraima

|

131


As influências dos “brancos” mudaram radicalmente a vida dos indígenas e as festas e festividades se destacam atualmente pelo que se entende no senso comum como busca de um resgate cultural. Citamos como exemplo da Festa das Panelas de Barro da Comunidade Raposa I, em que é prioridade a cultura nativa e não são realizados o forró, tampouco a venda e consumo de bebidas alcóolicas industrializadas. Constitui grande desafio para as lideranças, os jovens e toda a comunidade a negação das influências danosas para a cultura, tais influências são os personagens cachaça, cerveja e drogas químicas ilícitas dentro da Reserva. Festa Tradicional Indígena de Napoleão (FETIN). A comunidade do Napoleão dista 64 km da sede do município. A população é composta por indígenas macuxi em sua maioria. Tem como ponto forte da economia pequenos comércios, pecuária e agricultura tradicional. A comunidade do Napoleão é cercada de serras, de matas fechadas e tem como principais localidades: Encrenca, Pau-Rainha, Muriru, Tucumã, Cruzeiro, Rato e Paraíso. A festa está no calendário anual, tem tradição e o formato é misto como a Festa do Caxiri na Raposa I. Os festejos de São Sebastião também são considerados uma festa de natureza religiosa e se realizam na comunidade do Xumina, que dista 58 km da sede do município. A festa possui tradição e recebe visitantes de todos os municípios roraimenses. Na programação, também constam o forró e as corridas de cavalo, bem como a exposição e venda de trabalhos artesanais realizados pela comunidade. A ‘Festa da Panela de barro - Ko’ Ko Non’ foi pensada e é realizada para preservar e valorizar a cultura tradicional do povo macuxi da região, os indígenas da comunidade Raposa I, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Durante a festividade, são realizados bingos, apresentações culturais e concursos. Durante a Festa ‘Ko` Ko Non’, que em macuxi quer dizer ‘Vovó Barro’, se reúnem visitantes de várias comunidades e turistas de diversos municípios interessados nas panelas de barro e na vida, saberes e fazeres da cultura tradicional macuxi. Segundo Gabriel Raposo, tuxaua da comunidade da Raposa I, a produção das panelas de barro é feita desde a época de fundação da comunidade, sendo uma pratica milenar que veio com o povo para esta localidade, o que teria ocorrido por volta de 1870. Yolanda da Silva, atual coordenadora da Casa de Cultura da Raposa I, destacou que o dinheiro arrecadado com a venda das panelas é entregue aos artesãos e também utilizado na construção de um novo centro (casa de cultura). A Festa do Caxiri, também realizada na Raposa I, é mais uma festa tradicional e segue os mesmos roteiros das festas nas comunidades indígenas citadas acima, com exceção da Festa das Panelas de Barro. A sua realização é sempre uma grande expectativa e acontece geralmente no mês de setembro.

132

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


4 EQUIPAMENTOS CULTURAIS E ESPAÇOS MULTIUSOS NA SEDE DO MUNICÍPIO A sede do município dispõe de uma biblioteca municipal, um centro de geração de renda, um parque de exposições agropecuária, um centro multiuso, um ginásio de poliesportivo, quatro praças públicas e um malocão. As comunidades indígenas estabelecem seus próprios locais de práticas culturais: malocões comunitários, centros de artesanato e casas da cultura, a exemplo da comunidade Raposa I. A própria comunidade e suas estruturas físicas, seus locais sagrados, cemitérios, os mitos, as lendas, a natureza, são pontos de vivências e práticas coletivas. Salientamos o intento do Ministério da Cultura (MinC) em lançar editais para cadastrar e “oficializar” do ponto de vista do Sistema Nacional de Cultura (SNC), comunidades indígenas interessadas em se tornarem Pontos de Cultura Indígena. Esta iniciativa embora tímida e permeada de limitações destaca a política pública criada com o objetivo de se valorizar a diversidade cultural brasileira, digamos, originária.

5 CALENDÁRIO MÊS A MÊS DE EVENTOS OFICIAIS Por não haver calendário institucional oficial, elencamos os ventos que fazem parte da tradição festiva e popular no município considerando a evidência de material de divulgação e conhecimento empírico dos pesquisadores: • Festa de São Sebastião / janeiro / Comunidade Xumina; • Festa Tradicional Indígena (FETIN) / abril / Comunidade Napoleão; • Festa da Melancia / abril / Sede do município; • Festa do Caxiri / setembro / Comunidade Raposa I; • Círio de Nazaré / outubro / Sede do Município; e • Festa da Panela de Barro Ko’ ko Non / novembro / Comunidade Raposa I. Mesmo existindo vários eventos culturais, a prefeitura municipal não realizou até então o cadastro de indicadores sociais e culturais. Como já citado, o município iniciou o processo de adesão ao SNC, porém não existe processo de implantação do plano municipal de cultura. Os eventos culturais são realizados pela Secretaria de Educação e pela Secretaria de Promoção Humana e Ação Social. Não há um órgão oficial responsável pela realização dos eventos e cadastramento dos atores culturais.

6 AÇÕES TRANSVERSAIS: cultura, educação e assistência social na sede do município Na sede do município, existem alguns eventos periódicos da prefeitura e de escolas. Os eventos são relevantes por apresentarem constância na realização e fazem parte da expectativa do povo, por sua repercussão. São eles: a Festa Cabelos de Prata (terceira idade) coral, balé e fanfarra e o The Voice Mariano. Este último é um projeto interdisciplinar e sociocultural da

Panorama Cultural de Roraima

|

133


Escola Estadual Mariano Vieira, na sua 4ª edição, visa despertar e intensificar o interesse pela música como instrumento de aprendizagem, valorização e recurso de socialização, divulgação de novas ideias, integrando comunidade escolar e sociedade.

7 AGENTES CULTURAIS DA SOCIEDADE CIVIL Os agentes culturais da sociedade civil dependem majoritariamente de eventos do município para ocuparem espaços e se apresentarem publicamente. A busca por recursos é uma constante e os agentes culturais se empenham em outras atividades para configurarem um trabalho assalariado, o que não é possível conseguir unicamente com suas áreas de atuação artística. Considerando o contexto acima, todos têm no forró a base e principal fundamento, como as banda Pipoquinha de Normandia, Paçoquinha de Normandia, Banda Lambe Sal, Banda Empurra Whisky Nela e Os Garotões do Forró. Ouve-se no seio popular que Normandia é um celeiro de talentos. Artistas se destacam em âmbito local, nacional e internacional, dentro de suas áreas de atuação, e elevam o nome do município, do estado de Roraima e do Brasil para dimensões mundiais. A seguir citamos alguns: Carmézia Emiliano, 49 anos, artista plástica autodidata, indígena da comunidade Japó, pertence à etnia macuxi. É a maior artista plástica naïf indígena brasileira viva. Suas obras são conhecidas e reconhecidas com vários prêmios na Bienal Sesc Naïf de Piracicaba, São Paulo/SP, o mais importante salão do gênero no Brasil. Vive na capital Boa Vista desde sua juventude e sua vasta trajetória compreende exposição nos Estados Unidos no ano de 2013. Diogo Lima, artista plástico e sanfoneiro de banda de forró, o jovem macuxi apresenta desempenho brilhante, com apenas 3 anos de carreira, é destaque entre os novos nome da arte indígena contemporânea roraimense e também participou da exposição nos Estados Unidos no ano de 2013. Jaider Esbell, artista plástico, produtor cultural, galerista, curador e escritor, foi premiado pela Fundação Nacional das Artes (FUNARTE), no ano de 2010, com o livro Terreiro de Makunaima – Mitos, Lendas e Estórias em Vivências. O artista pertence ao povo macuxi e viveu até aos 18 anos na sede do município de Normandia. Atualmente vive na capital Boa Vista, imprime trajetória e sua história reflete muito da vida e da dinâmica política, social e cultural do município e do estado de Roraima. Seu desempenho o levou a ser convidado a ministrar aulas de Arte e Antropologia no Pitzer College, universidade no estado da Califórnia, em 2013. Além de seu trabalho, Esbell realizou naquele país exposição coletiva com trabalho de mais 7 artistas indígenas, incluindo Carmézia Emiliano e Diogo Lima. Sua atuação envolve comunicação contextual com ênfase em arte indígena tradicional e contemporânea. O artista estabeleceu e mantém uma galeria de arte indígena coletiva em Boa Vista. Lídia Raposo, 42 anos, indígena macuxi da Comunidade Raposa I, é referência e destaque nacional pela prática das panelas de barro. Atribui-se a Lídia Raposo e Joana Fidelis, que foi sua mestra, o desenvolvimento de um estado da arte no exercício milenar de fazer as peças de cerâmica com 134

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


a introdução de tampas para as panelas, bem como novos modelos com apêndices diferenciados. É mestra reconhecida e colabora com várias oficinas, inclusive em comunidades indígenas, nas quais socializa suas práticas e conhecimentos. Vive e mantém um ateliê em Boa Vista, ponto de cultura viva do povo macuxi da Raposa I na capital Boa Vista. Cabe ressaltar a importância das mulheres macuxi que precedem Lídia Raposa, em especial vovó Damiana, anciã referência nesta arte e no saber e fazer tradicional. Zerbine Araújo, 45 anos, é cantor e compositor. A ele se atribui o destaque para o tecladista macuxi, Sipriano, indígena que foi destaque na década de noventa, época da primeira formação da Banda Pipoquinha de Normandia. Sipriano abandona a arte do teclado e volta a viver na comunidade Raposa I, onde constitui família e passa a viver como um dos seus. Dentre os feitos atribuídos ao destaque de Zerbine Araújo e ao sucesso vertiginoso da banda Pipoquinha de Normandia, estão uma apresentação estilo talk show em canal de televisão em âmbito nacional. Marcado por polêmicas, ao menos uma letra de música do compositor foi censurada pela justiça brasileira por apologia e estímulo ao conflito político e cultural entre índios e não índios, que à época ajuizaram política e judicial para a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Hoje, o artista continua com sua carreira e é importante ator no meio artístico musical do estilo forró.

8 PATRIMÔNIOS MATERIAIS E IMATERIAIS - DOIS EXEMPLOS O Morro do Cruzeiro é uma montanha, topo convexo e vertentes íngremes, recoberta por vegetação rasteira e ilhas de mata. No alto do morro, existe uma cruz instalada pela Igreja Católica em alusão ao cristianismo. Em homenagem à Nossa Senhora de Nazaré, foi erigido um complexo que envolve gruta com imagem da santa, passeio e um tapiri. Na data da elaboração deste documento, todas edificações se encontravam em estado crítico de conservação. O local se tornou cenário da maior manifestação religiosa do município, a Via Sacra na Semana Santa e procissão com a imagem da santa. Atualmente, estas práticas estão fragmentadas. Além do contexto religioso, é atrativo turístico devido à vista panorâmica que proporciona àqueles que escalam seus duzentos metros de elevação. O Lago do Caracaranã (doravante Lago) foi um dos destinos turísticos mais procurados do estado de Roraima. Com água morna e translúcida, praias de areia fina cercada por cajueiros nativos, tem em sua formação paisagística um atrativo além da própria balneabilidade. Dista 180 km da capital Boa Vista, com acesso pela BR-401. Com a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e a consequente reocupação da então fazenda, à qual o Lago pertencia, uma nova dinâmica é instituída para o usufruto deste recurso natural. Após homologação, o acesso e uso do Lago foram interrompidos para planejamento. Paulatinamente, ao Lago são atribuídas novas funções coletivas e comunitárias, vindo a dar lugar ao centro regional do Caracaranã. Antes dispunha de estrutura e explorava o turismo sem a devida técnica. Hoje não possui estrutura para pernoite de turistas, além de não possuir Panorama Cultural de Roraima

|

135


restaurante e bar. A sede de Normandia, que dista 18 km do Lago, dá suporte ao visitante. O uso profissional do Lago para o turismo receptivo consta no planejamento das comunidades indígenas da região. Como qualquer atividade em terras indígenas, a abertura para o turismo profissional ainda deve levar alguns anos. Destacamos a abertura em períodos que coincidam com o não uso do espaço pelas comunidades indígenas, que configura experiência entre as comunidades em gerenciar o uso do local, com respeito, como lugar sagrado e fonte de água pura, portanto, estratégico.

9 ALGO MAIS SOBRE EXPRESSÕES CULTURAIS “FECHADAS” OU INVISÍVEIS NO MUNICÍPIO Como destacado na apresentação, propomo-nos organizar minimamente o mosaico da diversidade. Para contrastar as práticas culturais e seus praticantes, precisamos nos deter com mais atenção sobre as práticas culturais dos povos indígenas, formados essencialmente por macuxi. A população indígena, nesse contexto, é a cultura que mais se expressa na “invisibilidade”. Adiantamos opção dos autores por classificarem as manifestações culturais em abertas e fechadas usando como critérios a repercussão midiática ou não, o emprego do aparelhamento público ou não e a diversidade de atores envolvidos. No caso das práticas culturais indígenas, classificamos como fechadas por serem manifestadas em convívios familiares e comunitários, não estarem expostas às mídias de massa ou demonstradas em público. Somente nesta perspectiva configuram invisibilidade. Sabemos serem relativos os valores que se aplicam aos estudos de culturas. Sabemos também que práticas e saberes tradicionais são a base, distinguem essas sociedades e, correm risco de se deixar de fora de “lista oficial” da cultura do lugar. Daí, o empenho em chamar a atenção para estes detalhes e por um ponto a mais na complexa formar de ver, compreender e propagar a cultura de um determinado lugar. Mostramos algumas expressões culturais indígenas desconhecidas do grande público, as quais representam o que muitos reivindicam sobre a identidade cultural de um lugar. É interessante lembrar que mesmo o termo identidade do lugar é permeado de interpretações dúbias e relativas. São elas: o modo de fazer a panela de barro; a prática de pinturas corporais e seus significados; a fala na língua materna (indígena); a colheita, o tratamento e a forma de consumir lagartas da maniva e lagarta do pau; práticas de xamanismo e uso de plantas de poder; a forma e o tempo de dançar as danças tradicionais do Parixara, Areruia, Tukui e Ximidim; a forma de preparar e consumir alimentos e bebidas derivados de frutas e raízes - o caxiri (bebida feita com mandioca), o aluá (feita com milho), o mocororó (feito com caju) e o pajuaru (beiju de mandioca); a forma de cultivo, de escolha de locais de roça, seleção das sementes e colheita das culturas de cada região; o manuseio da mandioca e a forma de explorar seus derivados; a forma de construir, a arquitetura tradicional; o saber tradicional sobre o tempo certo de tirar palhas para uso na cobertura de casa, dentre outras manifestações expressivas.

136

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Ao listar algumas das manifestações culturais dos povos indígenas da região de Normandia, percebemos com muita clareza como carece de atenção especializada. E, ao surpreender o leitor com tamanha lista, acreditamos estar ainda longe de uma plena compreensão sobre a diversidade cultural do município. Evidenciando ao menos uma lista incompleta cabe, e bem, empenharmo-nos na continuidade deste estudo com mais recursos técnicos e humanos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS O município de Normandia é muito recente, mas a ocupação humana precede toda a história moderna do continente americano. Os registros desta ocupação são inscrições rupestres, petróglifos, cemitérios e restos de artefatos de cerâmica. Dessa forma, por questões de coerência, todo e qualquer relato documental, e, especialmente em estudos que se proponham evidenciar, mapear ou mesmo investigar as práticas culturais e a sua presença na formação da identidade cultural do município, deve-se, obrigatoriamente, empenhar tempo e atenção às populações originárias, o processo de contato desses com os “desbravadores” e os desdobramentos políticos, sociais, econômicos e obviamente culturais desses contatos. Parte desse ponto nossa motivação em perguntar: o município de Normandia cabe em si mesmo? Sua população atual tem ligação ancestral com o lugar? De que cultura estamos tratando? Sob que aspectos e para quais valores a cultura dominante se apresenta. Após este estudo está claro qual é a identidade cultural do município? Como pesquisadores, nos alenta o benefício da dúvida, o estímulo a responder as questões supracitadas e longe ficamos de estabelecer qualquer marco, mas, aceitar que vivemos mesmo em um estado de permanente fluidez e que cultura é mesmo algo vivo e dinâmico e os eventos impactam e conferem mais teor em todas as questões analisadas. Na atualidade, Normandia e a sua “cultura” merecem estudos complementares, ou mesmo inéditos que considerem o fato da nova geografia, a nova geopolítica levando o município a mais uma jornada em busca de sua própria identidade, passando obrigatoriamente pelo seu tronco e raiz. Cabe ressaltar que a demarcação e homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, como área indígena contínua e que contorna praticamente todo o perímetro urbano da sede do município, confere-lhe diversas particularidades e novas dinâmicas e fluxos. O que podemos destacar em primeira análise é o aumento significativo da população indígena residindo na área urbana da sede de Normandia. Outro ponto destacável é a maior interação entre os povos indígenas da região e a grande sociedade em relação à socialização de seus saberes e fazeres em festividades abertas e coletivas. Destaca-se, por exemplo, o espaço conquistado nas festas da melancia, com exposição e venda de produtos alimentícios e artesanais. Outro lado deste fato é a permissividade que estes novos contatos podem trazer, cita-se, por exemplo, a Festa do Caxiri, que conforme relatos foge às vezes ao controle e ao propósito da comunidade, pois, esta festa trás políticos e bebidas alcoólicas para dentro da comunidade.

Panorama Cultural de Roraima

|

137


Não cabe juízo de valor ou mesmo envolver atores específicos, devemos portanto aceitar a necessidade de se olhar sob todos os ângulos a cultura, os contatos e os sistemas econômicos e políticos que prevalecem sob a égide da resistência, das contra forças e contra culturas que tanto se empenham em rebater a ideia livre de que fazer cultura seja somente fazer festa. A figura do indígena pecuarista também marca fortemente a passagem do tempo e a formação da nova paisagem. Ao passo que a festa da Semana Santa, os festivais de verão do Caracaranã e o carnaval praticamente desaparecem da cena na sede. Cabe destacar para efeito de entendimento que há um divisor de águas na relação dos povos indígenas com o gado bovino, com as fazendas e as grandes festas, também. Em resumo, a presença da Igreja Católica parece ter maior impacto na vida e na identidade do município ainda hoje e não a lenda cinematográfica das aventuras de Papillon e Maurice Habert, pois passeia permeando todas as fases, cenas e atores desde a remota chegada destes, até os dias atuais. Esperamos em tempo breve novos e mais profundos estudos. Alimentamos a expectativa que todos os atores sociais e classes da grande diversidade falem, escrevam, coloquem em documentos seus sentimentos, suas impressões, pois, se cultura é viva e dinâmica, não somos mesmo nós a determinar nada, mas, sim, ela existe e está viva no meio do povo. E quem é o povo? Esse trabalho vem demonstrar a grande deficiência e necessidade do município de Normandia em conhecer e reconhecer a si próprio sob vários aspectos: a adesão aos sistemas de cultura; o estabelecimento de um calendário oficial de atividades; a atenção aos seus artistas mais destacados e o incentivo aos novos e promissores talentos; a empreitada em ver a diversidade cultural como algo maior que projetos políticos partidários. Esperamos que esse trabalho venha colaborar com a grande dúvida, que incomode no sentido de ajudar a despertar para a máxima de que não se valoriza, por natureza, o que não se conhece. No campo prático, desejamos que este estudo ajude a estabelecer prioridades, como acreditamos ser a confecção do calendário municipal de cultura, a confecção de mapas e catálogos, o olhar dedicado para os fazedores de cultura. Que ajude a esclarecer a importância da instalação de uma política cultural mais ativa, com oportunidades pares, dando ferramentas, condições e, sobretudo, satisfação ao povo, mesmo que este pareça não querer ou precisar. Dedicamos este breve e frágil estudo a todos os normandienses, aos que se estabeleceram e escolheram viver sua cultura como fonte de sobrevivência e prazer. Aos nativos, por tudo.

138

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


REFERÊNCIAS BRASIL. Casa Civil. Lei n. 7.009, de 1º de julho de 1982. Autoriza a criação de municípios no Território Federal de Roraima, e dá outras providências. 1982. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1980-1988/L7009. htm>. Acesso em: 14 dez. 2015. CEVASCO, Elisa Maria. Dez lições sobre estudos culturais. São Paulo-SP: Boitempo, 2003. COSTA, Emily; OLIVEIRA, Valéria. Comunidade indígena de RR realiza a Festa da Panela de Barro Ko’ko Non. G1 RR, Boa Vista-RR, 07 abr. 2014. Disponível em: <http://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2014/04/comunidade-indigenade-rr-realiza-festa-da-panela-de-barro-ko-ko-non.html>. Acesso em: 12 dez. 2015. CUNHA, Manuela Carneiro; CESARINO, Pedro de Niemeyer (Org.). Políticas culturais e povos indígenas. São Paulo-SP: Cultura Acadêmica- Unesp, 2014. FESTIVAL da melancia movimenta município de Normandia, em Roraima. G1 RR, Boa Vista-RR, 27 mar. 14. Disponível em: <http://g1.globo.com/rr/roraima/ noticia/2014/03/festival-da-melancia-movimenta-municipio-de-normandiaem-roraima.html>. Acesso em: 10 dez. 2015. IBGE. Biblioteca. Normandia: Roraima /RR. Disponível em: <http://biblioteca. ibge.gov.br/visualizacao/dtbs/roraima/normandia.pdf>. Acesso em: 03 mar. 2016. IBGE. Cidades. Normandia – RR. 2010. Disponível em: <http://cidades.ibge. gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=140040&search=roraima|normandia|in fograficos:-informacoes-completas>. Acesso em: 03 mar. 2016. IBGE. População : Normandia /RR. 2010. Disponível em: <http://www.censo2010. ibge.gov.br/sinopse/webservice/frm_urb_rur.php?codigo=140040>. Acesso em: 03 mar. 2015. MONTEIRO, Geane Ribeiro Silva; ARAÚJO, Rayane; CUNHA, Luciana Doniz. Potencial do turismo educacional no ensino de geografia na sede do municipio de Normandia-RR: geografias e práticas educacionais. In: ENCONTRO RORAIMENSE DE FEOGRAFIA: o extremo norte em foco, 1., 2014, Boa Vista-RR. Anais... Boa Vista-RR: EdUFRR, 2014. 153 p. Disponível em: <http://ufrr.br/erg/ index.php/minicursos-e-oficinas/category/4-resumos?download=42:potencialdo-turismo-educacional-no-ensino-de-geografia-na-sede-do-munic-pio-denormandia&start=20>. Acesso em: 11 dez. 2015. NOGUEIRA, Damásio Douglas. Maurice Marcel Habert: o fundador de Normandia (RR) sua vida...sua Historia. Boa Vista/RR: Ed. Ioris, 2014.

Panorama Cultural de Roraima

|

139


Fotografia: RCCaleffi


POLÍTICA CULTURAL DE PACARAIMA Alshelldson de Jesus Araujo da Silvaa, Armandina Lopes dos Santosb, Déborah de B. A. P. Freitasc

INTRODUÇÃO Atualmente, em algumas regiões do nosso país, já estão sendo desenvolvidas políticas e atividades voltadas para a manutenção cultural a partir das características próprias de cada município. Sabemos que a cultura possui o mérito de atuar como um importante fator de indução que proporciona o crescimento local, regional e nacional, e que muitas localidades brasileiras não possuem alternativas de crescimento. Em conformidade com a necessidade de criar mecanismos de estimular o estabelecimento de uma identidade cultural do município de Pacaraima, despertamos o interesse de elaborar este diagnóstico para subsidiar políticas públicas que respeitem nossas particularidades, fomentando os produtos, produtores e agentes culturais, pois conforme nos orienta Saraiva (2008) o formato das políticas públicas dependerá, diretamente, das especificidades de cada sociedade.

1 MUNICÍPIO DE PACARAIMA

Servidor da Prefeitura de Pacaraima, Acadêmico de Turismo, e-mail: alshelldson@ gmail.com a

Servidora da Prefeitura de Pacaraima, e-mail: daya. lopes56@gmail.com b

Orientadora do Trabalho de Conclusão do Curso de Extensão em Gestão Cultural - UFRR/MinC, professora da Universidade Federal de Roraima, Doutora em Linguística Aplicada, e-mail: drahfreitas@yahoo.com.br c

De acordo com dados obtidos em Freitas (1998, 2001), Pacaraima, situada na região de fronteira conhecida pelo marco BV-8, dista 215 km da capital Boa Vista e sua área geográfica é de 8.028, 463km². Localiza-se na parte mais setentrional de Roraima, a 920m de altitude. É o município mais alto de toda a Região Norte. Limita-se ao norte com a Venezuela, cidade de Santa Elena do Uairén, no estado de Bolívar; ao sul com Boa Vista, ao oeste com o Amajarí, e a leste com os municípios de Normandia e Uiramutã. A população total, segundo dados do censo do IBGE (2015), é de 11.684 habitantes, sendo 4.514 residentes na zona urbana. A principal atividade econômica da cidade consiste no comércio e na administração pública.

Panorama Cultural de Roraima

|

141


Figura 1 - Mapa de localização de Pacaraima

Fonte: PACARAIMA (2016).

Com a demarcação da linha da fronteira e a implantação do 3º Pelotão Especial de Fronteira, surgiu a Vila do BV-8, a partir de uma população formada na sua maioria de nordestinos em busca do enriquecimento fácil. Desmembrou-se o Pacaraima da capital Boa Vista em 17 de outubro de 1995. O município se destaca por suas serras, rios, cachoeiras, corredeiras, florestas e savanas. Outro destaque se refere à cultura indígena, pois, atualmente, 98% do seu território equivale a Reservas Indígenas, a saber: São Marcos, Raposa e Serra do Sol, no total 63 comunidades. Pacaraima tem como marco identitário a cultura indígena, com uma vasta diversidade nas inúmeras formas de manifestações gerada pela miscigenação, como se comprovou durante a elaboração deste trabalho. Algumas comunidades indígenas possuem um trabalho de valorização cultural realizado por elas.

2 METODOLOGIA Na elaboração deste estudo, usou-se a metodologia qualitativa, buscando observar a participação direta de forma sistêmica e intensiva, para obter dados e fazer uso da técnica do questionário, por meio da qual o pesquisador manteve um comportamento informal com os sujeitos, procurando explicitar os objetivos da pesquisa sempre que solicitado. Realizou-se essa pesquisa em Pacaraima, em setembro de 2015. O estudo teve como sujeitos de pesquisa atores culturais (nordestinos, sulistas e estrangeiros) que residem em Pacaraima no mínimo há 10 anos e que têm conhecimento histórico-cultural do município por assumirem papéis (fazedores de cultura, moradores antigos, estudiosos, executores culturais e lideranças indígenas) ligados à questão cultural. Explicou-se para eles o objetivo do estudo, respeitando a voluntariedade de participação e esclarecendo a impossibilidade do anonimato, em consequência de ocuparem, muitas vezes, cargos públicos.

142

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Para a coleta desses dados, utilizou-se um questionário com perguntas fechadas e abertas, documentos e imagens, além da pesquisa bibliográfica com revisão da literatura existente para elaboração conceitual e definição do marco teórico, como uso de dados secundários: dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SEAPA) e Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA).

3 ANÁLISE O município de Pacaraima, mesmo já completando 20 anos de criação, ainda não apresenta um desenvolvimento cultural satisfatório, apenas alguns projetos que quase sempre não são executados com uma periodicidade regular. Atualmente o município conta com a seguinte estrutura cultural, muitos instituídos em leis e outros não: Uma fundação de cultura, esporte e turismo denominada de fronteira cidadã, criada pelo projeto de lei n.º 019/2013 com a finalidade de promover, desenvolver, consolidar e preservar as tradições por meio de parcerias. Criouse a instituição seguindo as orientações do Ministério da Cultura (MinC), que orienta os municípios a criarem um órgão gestor de cultura, em âmbito municipal, as secretarias municipais de cultura ou equivalente. A fundação nunca funcionou por conta da necessidade de correção na sua lei de criação e do registro em cartório da documentação. Por meio do projeto de lei n.º 154/2009, criou-se a Biblioteca Municipal Professora Norma Sueli Ribeiro Costa, com o objetivo de propor ações de incentivo à leitura, atividades conjuntas com as escolas, resguardo ao patrimônio histórico-cultural local, organização e execução de ações culturais, manutenção de espaço para divulgação de atividades artísticas e desenvolvimento de intercâmbios culturais. Atualmente a Biblioteca se encontra inativa por causa de erros técnicos na sua construção. O prédio foi projetado com uma grande parede de vidro no espaço destinado às estantes com os livros que, segundo informação da Secretária Municipal de Educação Edna Silva Souza, não é adequado, pois o sol incide toda a tarde. Outro problema está no telhado que tem muitas goteiras. De fato o funcionamento se torna muito difícil, pois quando não é o sol vespertino, é água das chuvas, fato muito marcante já que a sede de Pacaraima é uma cidade serrana. No primeiro final de semana do mês de janeiro, o SESI executa o Fronteira Cultural, evento musical que busca integra os três países e com isso realizar um grande intercâmbio cultural. No dia 4 de outubro, festeja-se o padroeiro de Pacaraima, São Francisco de Assis, feriado municipal de acordo com a Lei n.º 71/2004, na sede do município, mas nos últimos 6 anos só se tem cumprido o feriado, e não se realiza festa. Alguns eventos culturais não são instituídos por lei: Em março, realiza-se um dos mais antigos e tradicionais festejos de Roraima, os Festejos de São José, padroeiro da comunidade do Surumu Panorama Cultural de Roraima

|

143


e Barro. O evento se encontra em sua 87ª edição, não é reconhecido em lei e é realizado periodicamente todos os anos, com ou sem apoio dos gestores locais. Esse evento é motivo de briga entre as duas comunidades Surumu e Barro. Antes da demarcação da Reserva Raposa Serra do Sol, era uma só a Vila do Surumu. Após a demarcação, dividiu-se a antiga Vila ao meio, separada apenas pela BR-433. Ambas as comunidades pertencem a associações indígenas diferentes, em que uma permite a execução deste tipo de evento e a outra é mais conservadora, alega que essas festividades não fazem parte da cultura indígena. Em setembro, acontece o Festejo dos Produtores Rurais da Comunidade do Contão, organizado e executado pela cooperativa de agricultores indígenas. Este evento desde que foi criado vem acontecendo todos os anos. Em outubro ocorre o Torneio da Paz de Futebol, uma confraternização dos povos indígenas do município de Pacaraima, realizada na comunidade Taxi, região do Surumu. Este evento é organizado pela comunidade e conta com apoio da Prefeitura e de quase todas as lideranças indígenas da região. Os Jogos da Comunidade do Maruai é um evento de confraternização entre os povos indígenas, com várias modalidades esportivas baseadas na cultura indígena, como: arco e flecha, corrida com toras, cabo de guerra, queda de corpo, corrida de pedestres e corrida de cavalo. O futebol é atividade praticada que não é da base cultural indígena, mas se incorporou aos jogos. Este evento vem acontecendo sempre conforme rege no calendário e conta com apoio tanto do gestor municipal como estadual, do Programa São Marcos. Na 1ª quinzena de novembro, está programado no calendário turísticocultural do município o Yamix, um evento de educação, arte e cultura universitária, organizado e promovido pela Universidade de Estadual de Roraima. Ele acontece na sede do município e neste ano de 2015 completa 06 anos de existência. Por falta de apoio e patrocínio, ele vem enfraquecendo, arrisca ficar sem o que é para muitos: o maior evento artístico, cultural universitário do Estado de Roraima. Na 2ª quinzena do mês de novembro, acontece a apresentação principal do Projeto Orquestra Sinfônica de Pacaraima, evento intitulado Acorde e Raízes, para mostrar o que se desenvolveu no decorrer do ano. O evento é realizado no Ginásio Poliesportivo na sede de Pacaraima. O projeto é o único do executado pelo executivo municipal de incentivo à cultura de Pacaraima. A maestrina Bruna Bonatto é a tutora do projeto, no qual os participantes recebem aulas de música para instrumentos de corda, sopro, bateria, percussão e canto, e atende alunos da rede estadual e municipal de educação, com idade de 12 a 16 anos. No calendário, constam ainda datas comemorativas, como: dia do trabalho, dia das mães, arraial, dia dos pais, 7 de setembro, aniversário do estado de Roraima e do município, dias das crianças, padroeira do Brasil, dia do professor, dia do servidor público, proclamação da república, natal e ano novo. A população indígena de Pacaraima é formada pelas etnias: Makuxi, Maiongong, Wapichana e Taurepang. O trabalho de preservação destas 144

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


culturas é realizado por meio de políticas da Secretaria Estadual de Educação em algumas localidades onde se ensina a língua indígena. O Movimento Indígena das Mulheres do Alto São Marcos é um projeto que vem desenvolvendo uma série de atividades de preservação da cultura indígena na região. O projeto gerencia uma fazenda que tem a agropecuária como atividade principal e que doa recursos financeiros e parte da matéria-prima para que possam trabalhar a cultura indígena por meio de: artesanato de penas e sementes, fibra vegetal do croá e taboca; mitos e crenças, lendas e cantos; culinária - comidas e bebidas típicas; e cerâmica da serra - panelas, potes e jarros. O Movimento Indígena das Mulheres do Alto São Marcos está sob a coordenação de Avina Pereira Jonson. Segundo a secretária Aparecida da Silva Peixoto: (informações verbais)1 O que falta realmente é uma valorização da cultura Indígena por parte do poder publico, já que muitos projetos são elaborados mais não interligados e desta forma não fazem uma qualificação continuada com os projetos que já foram executados ou estão em execução e, desta forma, só quem perde é a cultura e a comunidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS O município de Pacaraima é riquíssimo em cultura e com um patrimônio histórico incrível formado por inúmeras comunidades indígenas e, na sua maioria, tem raízes no país vizinho, Venezuela. A sede do município, por sua vez, é uma verdadeira paleta cultural, formada por pessoas oriundas de todas as regiões do Brasil e de várias partes do mundo. Pacaraima ainda conta com o maior sítio arqueológico da Região Norte, onde está registrada a história de parte da humanidade, por meio de inúmeras artes, como as pinturas encontradas nos sítios arqueológicos da Pedra Pintada e Perdiz, e as gravuras rupestres encontradas na comunidade de Nova Esperança. Não há dúvida de que o município precisa de uma política que considere o envolvimento social tão importante quanto a cultura local, pois quando não se tem o envolvimento da comunidade, não se conhece a real necessidade da população e as pessoas continuarão a fazer ações isoladas em que os resultados serão mínimos e toda a riqueza cultural vai se perder ou ficar atrelada àquela singela iniciativa.

Entrevista concedida por Aparecida da Silva Peixoto, em Pacaraima-RR, em setembro de 2015. 1

É necessário que os atores que encabeçam o movimento cultural busquem um maior envolvimento social e que não se limitem a um simples comitê cultural, contudo que criem uma minuta de plano de trabalho anual, na qual não conste apenas o que fazer mais também como fazer, acompanhado de uma ferramenta de monitoração e com uma agenda de reuniões mensais nos municípios; que organizem e promovam encontros dos gestores, conselhos e atores para troca de experiências. Por fim, auxiliem na criação de políticas com ações de forma continuada, na qual prevaleça o desenvolvimento e a valorização cultural local e não os sonhos pessoais de um gestor.

Panorama Cultural de Roraima

|

145


REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Cultura. Secretaria de Políticas Públicas. Metas do Plano Nacional de Cultura. Brasília-DF: MinC, 2011. 98 p. Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/documents/10883/11294/METAS_PNC_final. pdf/>. Acesso em: 11 ago. 2016. BRASIL. Ministério da Cultura. Secretaria de Políticas Públicas. Como Fazer um Plano de Cultura. Brasília-DF: MinC, 2013. 96 p. Disponível em: <http:// www.cultura.pr.gov.br/arquivos/File/Como_fazer_um_plano_de_cultura.pdf>. Acesso em: 10 ago. 2016. BRASIL. Ministério da Cultura. Secretaria de Políticas Públicas. Guia de Orientações para os Municípios: perguntas e respostas. BrasíliaDF: MinC, 2012. 80 p. Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/ documents/10907/963783/cartilha_web.pdf/8cbf3dae-0baf-4a30-88af231bd3c5cd6e>. Acesso em: 09 ago. 2015. FREITAS, Aimberê. Estudos Sociais - Roraima: Geografia e História. São Paulo: Corprint, 1998. FREITAS, Aimberê. Geografia e História de Roraima. ed. rev. e ampl. Boa Vista /RR: DLM, 2001. IBGE Cidades. Roraima: Pacaraima. Disponível em: <http://cidades.ibge.gov. br/xtras/perfil.php?codmun=140045>. Acesso em: 12 ago. 2015. MAZUI, Guilherme. Encravada na reserva, Pacaraima corre risco de sumir do mapa. 2013. Disponível em: <http://nacaomestica.org/blog4/?p=9183>. Acesso em: 28 out. 2015. PACARAIMA. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Pacaraima>. Acesso em: 07 mar. 2016. SARAIVA E. A gestão e a cultura da gestão: a importância da capacitação de administradores culturais. In: ENCONTRO DE ESTUDO MULTIDISCIPLINAR EM CULTURA, 4., 2008. Salvador. Anais... Salvador, 2008. Disponível em: < http://www.cult.ufba.br/enecult2008/14323-02.pdf>. Acesso em: 29 out. 2015. SARAIVA, Enrique. O conceito de política pública. In: SARAIVA, Enrique; FERRAREZI, Elisabete (Org.). Políticas públicas: Coletânea. Brasília-DF, ENAP, 2006. p. 21-42. v. 1.

146

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Fotografia: Catarina Ribeiro


DIAGNÓSTICO SITUACIONAL DA CULTURA DO MUNICÍPIO DE RORAINÓPOLIS/RR Acassio Ribeiro da Silvaa, Aldenor da Silva Pimentelb, Claronilson Silva Souzac, Artur Rosa Filhod

INTRODUÇÃO Este relatório é o resultado do trabalho final do Curso de Extensão em Gestão Cultural, realizado pela Universidade Federal de Roraima (UFRR) e o Ministério da Cultura (MinC), por meio da Secretaria de Articulação Institucional (SAI). O objetivo do trabalho é realizar um diagnóstico situacional da cultura do município de Rorainópolis/RR. Para o levantamento das informações, foram realizadas pesquisa documental e bibliográfica e entrevistas semiestruturadas com gestores culturais e fazedores de cultura. Em um primeiro momento, para fins de contextualização, esta pesquisa faz um apanhado geral da história e da realidade socioeconômica do município. Em seguida, expõe-se a situação da política cultural do município, bem como as manifestações e organizações existentes em Rorainópolis.

1 RORAINÓPOLIS: contextualização histórica, social e econômica O município de Rorainópolis foi criado pela lei estadual n.º 100, de 17 de outubro de 1995, com o desmembramento de terras do município de São Luiz do Anauá (RORAIMA, 2005), e instalado em 1º de janeiro de 1997 (BRASIL, 2015c). Com uma área de 33.595,46 km² (IBGE, 2015b) e a 298 quilômetros da capital do Estado de Roraima, Boa Vista (RORAIMA, 2010), Rorainópolis se localiza no Sul do Estado (FIGURA 1), a 468 km de Manaus, capital do Amazonas (BRASIL, 2010).

Servidor da Prefeitura de Rorainópolis, e-mail: elpredador2009@hotmail a

Servidor da Universidade Federal de Roraima, Doutorando em Comunicação, e-mail: aldenor.pimentel@ufrr.br b

Servidor da Prefeitura de Rorainópolis, e-mail: sussuarana22@hotmail.com c

Orientador do Curso de Extensão em Gestão CulturalUFRR/MinC, professor da Universidade Federal de Roraima, Doutor em Geografia, e-mail: artur.filho@ufrr.br d

148

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Figura 1 - Mapa de localização de Rorainópolis

Fonte: Tácio José Natal Raposo (2014).

Rorainópolis se limita ao norte e a oeste com o município de Caracaraí; ao sul com o estado do Amazonas; a leste com os municípios de São Luiz do Anauá e São João da Baliza (RORAIMA, 2010). Silva (2013) destaca que os aglomerados ao longo da BR-174, denominados localmente de vilas, oficialmente não o são, uma vez que em Roraima não há divisão dos municípios por distritos. E, na ausência destes, por consequência, inexistem igualmente as sedes distritais: vilas (IBGE, 2015a). Rorainópolis se originou de uma vila de assentamento do Instituto de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Segundo Silva (2007), patrocinado pelo INCRA, Roraima deu início à fase dos Programas de Assentamento Humano Dirigido (PAHM), principalmente entre o final dos anos 70 e início dos 80. O PAHM Anauá foi criado pelo INCRA ao longo da BR-174, em 1979. Esse projeto, apesar de não prever a instalação de agrovilas, estimulou o surgimento de um pequeno aglomerado que passa a se chamar Vila do INCRA, pois havia uma base do instituto nesse lugar, que foi crescendo e mais tarde se transformou na cidade de Rorainópolis, para onde um intenso fluxo migratório ocorre no final da década de 1990, estabelecendo-se como uma das quinze cidades do estado (SILVA, 2007, p. 132).

Entretanto, Nascimento (2013) contrapõe que os primeiros moradores de Rorainópolis chegaram em 1976: “eram trabalhadores da empresa responsável por colocar os bueiros nos igarapés para [...] aterrar na [sic] local por onde iria passar a BR-174” (NASCIMENTO, 2013, p. 56).

Panorama Cultural de Roraima

|

149


Figura 2 - Vista aérea de Rorainópolis (“espinha de peixe”)

Fonte: Marmanillo (2012).

Figura 3 - Vista aérea de Rorainópolis

Fonte: Marmanillo (2012).

Para Marmanillo (2012), uma consequência dessa ocupação espacial por meio de assentamentos pode ser observada diretamente na forma de organização espacial da cidade, cuja expansão se iniciou da BR-174, por meio de estradas construídas perpendicularmente à rodovia, denominadas de vicinais. Estas teriam constituído as três principais avenidas da cidade, por sua vez, cortadas por ruas paralelas formando um aspecto de rede, forma de expansão, conhecida localmente como “espinha de peixe” (FIGURAS 2 e 3).

150

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Diferentemente das principais cidades mais próximas do litoral brasileiro, onde a igreja católica possui forte influência, sendo ponto de partida para o surgimento da própria cidade, o processo de expansão de Rorainópolis foi iniciado a partir dos terrenos próximos à prefeitura, órgão responsável pela legalidade da posse da terra, por meio dos títulos definitivos. “Talvez seja um dos poucos casos em que a igreja matriz não ocupe uma posição central na cidade e seja localizada em um lote de esquina, com medidas um pouco maiores que os lotes vizinhos” (MARMANILLO, 2012, p. 164). Marmanillo (2012, p. 164) destaca que a não centralidade geográfica da igreja católica pode ser interpretada no âmbito do poder de influência desta, uma vez que “por conta da característica de formação recente da cidade, tal instituição surgiu no mesmo período de algumas igrejas evangélicas, chegando duas a ter mais destaque arquitetônico que a católica”. Acrescenta-se que Rorainópolis é o segundo município em número absoluto de população residente de denominação religiosa evangélica e o quinto proporcionalmente (IBGE, 2014b, 2014d), enquanto, em relação à população residente católica, o município se mantém em segundo em números absolutos, mas cai para sétimo proporcionalmente (IBGE, 2014b, 2014c). Silva (2007) acrescenta que, a partir da década de 80, um forte processo migratório de um contingente populacional, advindo principalmente do Sul e do Nordeste do País, foi estimulado pelo Governo do Estado e pelo INCRA, com promessas de financiamento agrícola. O autor destaca que, com a finalização do asfaltamento da BR-174 entre Manaus e Pacaraima: [...] o deslocamento da população carente, proveniente principalmente do Maranhão, do Pará e do Amazonas, foi facilitado e deu-se (sic) o início da era rodoviária, com a chegada de grandes levas de migrantes, inclusive fazendo com que alguns núcleos urbanos, tal como Rorainópolis, obtivesse a maior taxa média geométrica de crescimento anual entre 1991 e 2000, com um percentual de 13,03%, pela sua localização, no extremo sul do estado, ao longo da rodovia (SILVA, 2007, p. 155-156).

Acrescenta-se que, de 1996 a 2000, a população do município saltou de 7.544 para 17.477 habitantes, um crescimento de 131,67%, “considerado em termos proporcionais o maior do país” (BRASIL, 2010). Veras et al. (2013) destacam que o crescimento urbano acelerado de Rorainópolis está ocorrendo sem um plano definido de urbanização, ocasionando ao município disparidades sociais, com precariedade de serviços públicos como estradas, saúde, segurança, saneamento básico, iluminação, qualidade da água. “Além disso, o deslocamento populacional favoreceu as ocupações irregulares, degradação do meio ambiental, bem como a emergência e proliferação do mercado informal, importante fonte de renda nos dias atuais” (VERAS et al., 2013, p. 6). Por ser o primeiro município de Roraima para quem chega ao Estado pela parte sul da BR-174, Rorainópolis teria uma “tendência natural de assentar os que vêm se aventurando sem um destino traçado, mesmo que posteriormente se destinem a outros lugares” (SILVA, 2007, p. 193). O município teve um aumento de sua população no decorrer da década de 1990 e no princípio do século XXI, Panorama Cultural de Roraima

|

151


devido ao grande número de imigrantes de baixa renda que para ali se dirigiram, formando no município grandes “bolsões de pobreza” (SILVA, 2007). Esse intenso fluxo migratório que envolve Rorainópolis é constante não só numa relação interestadual, mas também na relação intramunicipal, na dinâmica urbano-rural: No núcleo urbano de Rorainópolis, uma parcela significativa de famílias tem garantido nele uma casa para manter os filhos nos estudos. Mas a casa na sede não serve apenas como casa de apoio, mas também como moradia, pois, devido a pouca distância da propriedade, o trânsito de familiares entre o lote e a sede é constante (NASCIMENTO, 2013, p. 51).

Segundo município roraimense em número absoluto de habitantes e em extensão territorial (IBGE, 2014a, 2014b), Rorainópolis tem a segunda maior densidade demográfica do Estado, somente atrás da capital. A população do município estimada em 2014 é de 26.811 habitantes e a densidade demográfica é 0,72 hab/km² (IBGE, 2015b). A taxa de urbanização é de 47,5% (IBGE, 2010). Em Rorainópolis, estão situados 6.254,25 km² da Área Indígena WaimiriAtroari (RORAIMA, 2010) e os 2.594 km² da Floresta Nacional do Anauá (BRASIL, 2005), o equivalente a 18,62% e 7,72% do município, respectivamente. As principais fontes econômicas no município são o comércio, o setor público, o madeireiro, a piscicultura familiar, o agronegócio e a agricultura familiar (RORAINÓPOLIS, 2015). A agricultura do município tem como principais produtos para comercialização o arroz, a mandioca, a banana, o milho, a laranja e a cana (BRASIL, 2010). Conforme o Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável para o Sul de Roraima (BRASIL, 2010), a combinação de fatores físicos e econômicos proporciona uma agricultura baseada em cultivo de rápido retorno e em uma pecuária semiextensiva, comprometendo áreas de grande potencialidade voltadas para lavouras de maior valor comercial, como a soja, o cacau, a cana de açúcar e frutas. Cumpre ressaltar que o município de Rorainópolis, como em todo o território, a cadeia produtiva de ovinos tem-se destacado, devido [a] investimentos e custeios através dos governos da esfera municipal, estadual e Federal, onde está sendo possível consolidar a cadeia primária ovina (BRASIL, 2010, p. 40).

O grau de escolaridade dos proprietários das empresas entre o ensino fundamental incompleto e o completo corresponde a 72%. A média salarial paga aos funcionários das microempresas fica em torno de um salário mínimo. “As admissões são na maioria das vezes por convite pessoal e indicações de amigos dos proprietários, os mesmos (sic) não assinam carteira” (BRASIL, 2010, p. 40). Os empresários apontam como principais dificuldades na condução das atividades da área na seguinte ordem: o pouco capital de giro, a baixa demanda efetiva, o alto índice de inadimplência, a desorganização do setor e a forte concorrência no mercado local.

152

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


2 SITUAÇÃO DA POLÍTICA CULTURAL DO MUNICÍPIO Os direitos culturais são previstos pela Constituição Federal da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988). A Política Nacional de Cultura (BRASIL, 2012) considera a cultura, a partir de três dimensões: simbólica, cidadã e econômica. Para a perspectiva simbólica, ou antropológica, a cultura humana é o conjunto de modos de viver, expressos por meio de diversas línguas, valores, crenças e práticas. “A dimensão cidadã fundamenta-se no princípio de que os direitos culturais fazem parte dos direitos humanos e devem constituir-se como plataforma de sustentação das políticas culturais” (BRASIL, 2012, p. 21). A dimensão econômica compreende cultura como um dos segmentos mais dinâmicos das economias de todos os países, gerando trabalho e riqueza, e, portanto, elemento estratégico da economia baseada na informação e na criatividade, impulsionada pelos investimentos em educação e cultura. 2.1 ESTRUTURAÇÃO DA POLÍTICA CULTURAL DO MUNICÍPIO Quanto ao marco legal, somente dois dispositivos municipais fazem referência à cultura: a Lei Orgânica do Município e a Lei Municipal n.o 061/2001. A primeira em seu Capítulo IV, DA FAMÍLIA, DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA, DO DESPORTO E LAZER E DO TURISMO, dispõe de três artigos sobre o tema (RORAINÓPOLIS, 2001b). O primeiro artigo prevê que o poder público municipal garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional e estadual e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais, por meio de: I - articulações das ações do Governo Municipal no âmbito da cultura com as ações no campo da educação, do lazer, dos desportos e das comunicações; II - criação e manutenção de espaços devidamente equipados e de livre acesso à população para as diversas manifestações culturais; III - incentivo ao intercâmbio cultural com outros municípios roraimenses, com outros estados da federação e/ou com países estrangeiros; IV - promoção do aperfeiçoamento e valorização dos profissionais da cultura; V - proteção das expressões das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras e das de outros grupos integrantes do processo cultural roraimense e nacional, por meio de setores encarregado de executar as estratégicas dos órgão[s] culturais do município. VI - adoção de medidas adequadas a identificação, proteção, conservação, valorização e recuperação do patrimônio cultural de município e do estado. VII - estímulo para que as empresas privadas invistam na produção cultural no âmbito do município.

Panorama Cultural de Roraima

|

153


VIII - o município formulará através do órgão competente uma política de ação cultural para impedir a evasão, destruição e descaracterização de obras de artes e de outros bens de valor histórico, artístico, arquitetônico e cultural. IX - estímulo às associações culturais (RORAINÓPOLIS, 2001b, p. 45).

O segundo artigo prevê ainda a instituição do fundo municipal de cultura, constituído com recursos do fundo estadual, do orçamento municipal e de outras fontes (RORAINÓPOLIS, 2001b). Tais recursos devem, segundo a lei, ser aplicados em programas específicos administrados pela prefeitura e em apoio a entidades culturais regularmente constituídas, sendo vedada a aplicação em atividades de custeio. O terceiro artigo diz que, com a colaboração da comunidade, o município protegerá o patrimônio cultural, tendo como meios o inventário, o registro, a vigilância, o tombamento, a desapropriação e outras formas de acautelamento e preservação e, ainda, de repressão aos danos e ameaças a esse patrimônio (RORAINÓPOLIS, 2001b). Por sua vez, a Lei Municipal n.o 061/2001, que dispõe sobre a reestruturação organizacional da Prefeitura Municipal de Rorainópolis e dá outras providências, cita o Departamento de Desportos, Cultura e Turismo, vinculado ao Departamento de Ensino e Assuntos Pedagógicos, na estrutura da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desportos (RORAINÓPOLIS, 2001a). Não há registro de qualquer outra lei relacionada à cultura. A biblioteca municipal, por exemplo, funciona, mas não se tem conhecimento de qual dispositivo legal a criou. Não há perspectiva futura para que Rorainópolis tenha um órgão gestor de cultura específico, desvinculado da Secretaria de Educação. Ações de cultura organizadas pela Prefeitura compõem o calendário escolar e são desenvolvidas junto à Secretaria Municipal de Educação. As ações são executadas por meios de projetos. Em 2013, houve a Conferência Municipal de Cultura. Até o momento, Rorainópolis não dispõe de um conselho de cultura. Não existe um cadastro de mapeamento ou inventário cultural do município, tampouco se tem conhecimento de um fundo de cultura municipal ou lei de incentivo à cultura. Além disso, não há em Rorainópolis patrimônio cultural oficialmente reconhecido por nenhuma esfera governamental (municipal, estadual ou federal). Em relação à adesão ao Sistema Nacional de Cultura, Rorainópolis está em diligência documental (BRASIL, 2015b). 2.2 DIAGNÓSTICO SITUACIONAL DA CULTURA NO MUNICÍPIO Por ser um município formado por pessoas provenientes de várias regiões do País, com uma predominância da região Norte e Nordeste, Rorainópolis apresenta uma grande diversidade de culturas e costumes. A seguir, serão descritas manifestações e organizações culturais do município.

154

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


2.2.1 Festival de Música de Rorainópolis (FESTMURR) O Festival de Música de Rorainópolis (FESTMURR) é realizado anualmente em comemoração ao aniversário da cidade, em 17 de outubro. O festival é uma realização da Prefeitura de Rorainópolis, por meio da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desportos, e do Serviço Social do Comércio de Roraima (SESC), com apoio do Governo do Estado, da Secretaria de Estado da Cultura, das secretarias municipais de Rorainópolis, da Câmara Municipal e da iniciativa privada. Os objetivos do festival são: a) estimular a criação, a produção e a difusão musical no Estado de Roraima, em particular em Rorainópolis, respeitandose as especificidades culturais, estreitando-se o contato entre o compositor, o intérprete e o público; b) valorizar a cultura do Estado; c) estimular por meio da cultura as futuras gerações, priorizando a perpetuação da cultura do País; d) diminuir a exclusão social; e e) descobrir novos talentos. No FESTMUR são executadas músicas inéditas apresentadas ao vivo por intérpretes, de modo individual, em duplas, trios ou grupos. Em 2015, foi realizada a quinta edição do festival, durante três dias de programação no mês de outubro. 2.2.2 Festival de Música Gospel de Rorainópolis (FESTGOSPEL) O Festival de Música Gospel de Rorainópolis (FESTGOSPEL) tem os mesmos objetivos do Festival de Música de Rorainópolis, com foco no temática gospel. Expressamente, o festival pretende: a) estimular a criação, produção e difusão da música evangélica no Estado de Roraima, em particular no município de Rorainópolis, respeitando-se as especificidades culturais, estreitando-se o contato entre o compositor, o intérprete e o público; b) valorizar a cultura do Estado; c) estimular por meio da cultura as futuras gerações, priorizando a perpetuação da cultura do País; d) diminuir a exclusão social; e) e descobrir novos talentos. Em 2015, o FESTGOSPEL foi realizado nos dias 28 e 29 de agosto, como parte das comemorações municipais do Dia do Evangélico e premiou do primeiro ao terceiro colocado na categoria interpretação. Os inscritos puderam apresentar músicas próprias, bem como de outros artistas (RORAINÓPOLIS, 2015b). 2.2.3 Arraial de Rorainópolis (ARRAIANÓPOLIS) O Arraial de Rorainópolis é considerado pela prefeitura o principal evento cultural, de entretenimento e de fortalecimento da economia do município e tem como objetivo principal difundir o talento dos artistas da região, por meio da cultura e do entretenimento à população, incentivando o crescimento do comércio local. O Arraianópolis objetiva ainda: a) preservar a cultura do País; b) priorizar a perpetuação da cultura brasileira; c) diminuir a exclusão social; d) valorizar as diferenças culturais do Brasil; e) reconhecer a importância da Festa Junina nas diferentes regiões; f) promover a cultura local; g) desenvolver a cultura local; h) Panorama Cultural de Roraima

|

155


fomentar a economia municipal; i) aumentar a renda dos comerciantes locais; j) gerar empregos diretos e indiretos e l) mostrar a diversidade dos sabores das comidas típicas. Com a comercialização de comidas e bebidas típicas e a apresentações de bandas e quadrilhas juninas locais e regionais e a realização de concurso de rainha caipira, o arraial é realizado anualmente durante dois dias e recebe um público de cerca de três mil pessoas, entre moradores de Rorainópolis, de outros municípios de Roraima e de fora do Estado. Em 2015, o arraial foi realizado em julho (RORAINÓPOLIS, 2015a) e chegou à sétima edição. 2.2.4 Santo Reis De origem portuguesa, a comemoração de Santo Reis, também conhecida no Brasil como Folia de Reis, Reisado, Reisada e Boi de Reis, foi realizada pela primeira vez em Rorainópolis em 6 de janeiro de 1998, na vicinal 6, km 10, Lote 53, na residência de José Lima dos Santos, mais conhecido como Zé da Viola. Maranhense, de família de brincantes de Reisada, ele migrou para Roraima nos anos 90 e se estabeleceu no Assentamento Agrário Anauá, em Rorainópolis (BRASIL, 2015a). Zé da Viola e alguns moradores da mesma vicinal se reúnem anualmente a partir do dia 26 de dezembro e, entoando cantorias do folguedo, fazem visitas nas casas, com o objetivo de arrecadar doações para a realização do festejo (FIGURA 4). O ponto alto da programação chega a reunir, do dia 6 até o raiar do dia 7 de janeiro, em média, 100 pessoas, que se alimentam da comida arrecadada pelos representantes dos reis magos. Figura 4 - Santo Reis, da vicinal 6

Fonte: RIBEIRO (2015).

2.2.5 Outros eventos A prefeitura também realiza outros eventos de menores proporções, como a Vaquejada do município e as comemorações de aniversário do município e do Dia do Trabalhador.

156

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


2.2.5.1 Dança Folclórica Cangaço O Grupo de Dança Folclórica “Cangaceiros Vingadores do Vale”, inspirado no grupo de dança de Manaus “Cangaceiros do Vale Perdido”, foi montado em 2011 por Suzana Fernandes Fonseca e Emerson Santos Monteiro, com sede na Vila Martins Pereira, município de Rorainópolis. O grupo sobrevive com patrocínio e subvenções diversas e, segundo Suzana Fonseca, encontram muitas dificuldades para conseguir apoio e patrocínio, chegando a promover suas atividades com recursos próprios. O corpo folclórico, que realiza danças e peça teatral, já chegou a trabalhar com 60 integrantes, mas com as dificuldades financeiras enfrentadas pelo grupo, hoje brincam com 45 integrantes. São dois coordenadores, cinco pessoas de apoio e os demais, brincantes diretos. O grupo se apresentou nas edições de 2014 e 2015 do Arraianópolis (RORAINOPÓLIS, 2014, 2015a). 2.2.5.2 Artesanato1 Fundada em 3 de novembro de 2004, com o objetivo de apoiar os artesãos do município de Rorainópolis, a Associação dos Artesãos e Similares de Rorainópolis (ARTEFIBRAS) proporcionou vários cursos a seus associados, em parceria com o SEBRAE e o poder público local (FIGURA 5). Em assembleia geral, em outubro de 2013, mudou seu estatuto social, para atuar em todos os municípios do sul de Roraima, abranger os seguimentos da cultura de modo geral, esportes, música, artesanato etc., e passar a ter como razão social o nome Culturarte. Hoje a associação atua com a fabricação e a aprendizagem de vários estilos de artesanato (FIGURA 6) e treinamentos com instrumentos musicais. Tem sua própria banda musical, intitulada Banda Libesty, que, geralmente, se apresenta em eventos realizados pelo município. Figura 5 - Marca da associação Artefibras

Fonte: Arquivo Culturarte (2015).

Informações prestadas por presidente da associação, Juarez Ribeiro Costa. 1

Panorama Cultural de Roraima

|

157


Figura 6 - Artesã trabalhando

Fonte: Arquivo Culturarte (2015).

2.2.5.3 Aeco3 Brazil A Agência de Empreendimentos Cultural da Amazônia (Aeco3 Brazil) foi fundada em 11 de fevereiro de 2008 e tem como presidente Josué Rodrigues da Costa. Conta com 30 pessoas na Vila Martins Pereira, cinco pessoas em Nova Colina, 15 na Vila Equador e 12 na Vila do Jundiá. O segmento principal da agência é a literatura. Em 2010, a Aeco3 Brazil foi selecionada pelo Governo do Estado em edital para implantação da Rede dos Pontos de Cultura do Programa Mais Cultura, do Ministério da Cultura. O projeto selecionado foi o ‘Literart – Jornada Literária em Rorainópolis’, com o objetivo de promover oficinas, mostras e saraus literários no município (RORAIMA, 2010a; 2015). Em 2011, realizou a Jornada Literária, cuja segunda edição está prevista para dezembro de 2015. 2.2.5.4 A Bruxa Tá Solta Criado em 1992, o grupo de teatro A Bruxa Tá Solta foi transformado em ponto de cultura em 2006. Desde lá, atua nas vilas Martins Pereira, Nova Colina e Equador, com oficinas, montagem de espetáculos e realização de pesquisas de memória e fortalecimento de ações culturais comunitárias (BRASIL, 2014). Catarina Ribeiro, criadora do A Bruxa Tá Solta, relata: “A atuação sistemática em comunidades tão ricas culturalmente e tão distantes das informações e das possibilidades de trocas saudáveis, especialmente para os jovens, fez com que refletíssemos sobre o papel do fazer artístico” (BRASIL, 2014, p. 1). Ela acrescenta que a principal diretriz do grupo passou a ser a identificação das expressões de saberes e fazeres do assentamento e o apoio à circulação da produção local (FIGURA 7). Quatro mestres de saberes e fazeres populares trabalham em parceria com o ponto de cultura: Zé da Viola, especialista em Reisada, Dona Bié e Dona Lourdes, mestras de lindô (dança de origem quilombola) e de brincadeiras tradicionais, e Dona Maura, especialista nos saberes das ervas e plantas medicinais. 158

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Figura 7 - Catarina Ribeiro, do Ponto de Cultura A Bruxa Tá Solta

Fonte: RIBEIRO (2015).

A Bruxa Tá Solta trabalha ainda a memória de histórias da BR-174. “O principal espetáculo teatral criado pelo grupo é A Mitologia da BR-174, que reúne narrativas rurais do interior da Amazônia presentes na memória e no imaginário dos moradores do assentamento (BRASIL, 2014, p. 1). Em 2014, a peça foi apresentada na IV Mostra Nacional de Experiências em Atenção Básica/Saúde da Família, promovida pelo Ministério da Saúde, em Brasília.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho realizou um diagnóstico situacional da cultura do município de Rorainópolis/RR, a partir de pesquisa documental e bibliográfica e entrevistas semiestruturadas com gestores culturais e fazedores de cultura. Em um primeiro momento, fez-se um apanhado geral da história e da realidade socioeconômica do município. Em seguida, expôs-se a situação da política cultural do município, bem como as manifestações e organizações existentes em Rorainópolis. O levantamento apresentado demonstra uma diversidade de expressões culturais. No entanto, ressalta-se que há limitação na atuação do poder público na garantia de uma política pública de cultura que valorize e dê condições mais apropriadas para que elas possam ter mais visibilidade e melhor estrutura para o seu desenvolvimento. Observa-se no município grande potencialidade e diversidade cultural, atestadas pelas mais diferentes manifestações populares existentes em Rorainópolis e de distintas matrizes culturais, além do empenho dos moradores para manter as tradições do município, independentemente do incentivo governamental. Todavia, nota-se também o poder público local pouco aparelhado para responder a essa realidade, o que indica uma grande necessidade de estruturação da política pública municipal, ainda que se reconheçam as iniciativas pontuais e disposição dos profissionais dessa esfera governamental.

Panorama Cultural de Roraima

|

159


REFERÊNCIAS BRASIL. Confederação Nacional de Municípios. Rorainópolis/RR. Disponível em: <http://www.cnm.org.br/municipios/index/100114/100114012>. Acesso em: 14 jun. 2015c. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988. ______. Decreto de 18 de fevereiro de 2005. Cria a Floresta Nacional de Anauá, no Município de Rorainópolis, Estado de Roraima, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 21 fev. 2005. BRASIL. Ministério da Cultura. Guia de orientações para os municípios. Perguntas e Respostas. Brasília: Ministério da Cultura, 2012. BRASIL. Ministério da Cultura. A Bruxa tá solta em Roraima. MinC. O dia a dia da Cultura. 4 ago. 2014. Disponível em: <http://www.cultura. gov.br/o-dia-a-dia-da-cultura?p_p_auth=J7Aj9z2L&p_p_id=101&p_p_ lifecycle=0&p_p_state=maximized&p_p_col_id=column-&p_p_col_ count=1&_101_struts_action=%2Fasset_publisher% 2Fview_content&_101_ assetEntryId=1200570&_101_type=content&_101_groupId=10883&_101_ urlTitle=a-bruxa-ta-solta-em-roraima>. Acesso em: 9 set. 2015. BRASIL. Ministério da Cultura. Eleições 2015. Conselho Nacional de Cultura. Setorial de Culturas Populares de Roraima (RR). Candidatos. 2015a. Disponível em: <http://cultura.gov.br/votacultura/foruns/rr-culturas-populares>. Acesso em: 14 dez. 2015. BRASIL. Ministério da Cultura. Situação dos Municípios no SNC. 2015b. Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/documents/10907/1026307/4. +Situa%C3%A7%C3 %A3o+dos+Munic%C3%ADpios+no+SNC_2.4.pdf/ b0adabc1-83ec-46c4-969a-5679c 2f0776c>. Acesso em: 9 set. 2015. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Agrário. Plano territorial de desenvolvimento rural sustentável: propostas de políticas públicas para o território sul de Roraima. Rorainópolis/RR: MDA, 2010. Disponível em: <http:// sit.mda.gov.br/download/ptdrs/ptdrs_qua_territorio091.pdf>. Acesso em: 30 jun. 2015. IBGE. Noções Básicas de Cartografia. III – Elementos de representação. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/cartografia/manual_ nocoes/elementos_re presentacao.html>. Acesso em: 12 jul. 2015a. IBGE. Rorainópolis: informações completas. Disponível em: <http://cidades. ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=140047>. Acesso em: 30 jun. 2015b. IBGE. Sistema nacional de informação de gênero - uma análise dos resultados do censo demográfico 2010: Síntese das informações. Disponível em: <http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/temas.php?lang=&co dmun=140047&idtema=132&search=roraima%7Crorainopolis%7Csistema160

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


nacional-de-informacao-de-genero-uma-analise-dos-resultados-do-censo-demografico-2010>. Acesso em: 30 jun. 2015. IBGE. Síntese das informações: área da unidade territorial. comparação entre os municípios: Roraima. 2014a. Disponível em : <http://cidades.ibge.gov.br/ comparamun/compara.php?lang=&coduf=14&idtema=16&codv=v01&search =roraimarorainopolissintese-das-informacoes->. Acesso em: 12 jul. 2015. IBGE. Síntese das informações: população residente: comparação entre os municípios: Roraima. 2014b. Disponível em : <http://cidades.ibge.gov.br/ comparamun/compara.php?lang=&coduf=14&idtema=16&codv=v08&search =roraima|rorainopolis|sintese-das-informacoes->. Acesso em: 12 jul. 2015. IBGE. Síntese das informações: população residente, religião católica apostólica romana: comparação entre os municípios: Roraima. 2014c. Disponível em : <http://cidades.ibge.gov.br/comparamun/compara.php?lang =&coduf=14&idtema=16&codv=v13&search=roraima|rorainopolis|sintese-dasinformacoes->. Acesso em: 12 jul. 2015. IBGE. Síntese das informações: população residente, religião evangélicas: comparação entre os municípios: Roraima. 2014d. Disponível em: <http:// cidades.ibge.gov.br/comparamun/compara.php?lang=&coduf=14&idtema=16 &codv=v15&search=roraima|rorainopolis|sintese-das-informacoes->. Acesso em: 12 jul. 2015. MARMANILLO, Jesus. Lógicas imagéticas de uma sociedade interiorana: usos da fotografia e narrativa visual no Brasil setentrional. Iluminuras, Porto Alegre, v. 13, n. 31, p.157-176, jul./dez. 2012. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/ index.php/ iluminuras/article/view/37141/pdf>. Acesso em: 10 jul. 2015. NASCIMENTO, Antonio de Souza. Juventude rural na Amazônia: mobilidade de jovens rurais entre o lote e a sede de Rorainópolis/RR. Revista Cadernos de Ciências Sociais da UFRPE, Recife, v. 2, n. 3, p. 49-70, jul./dez. 2013. <http://www.journals.ufrpe.br/index.php/cadernosdecienciassociais/article/ view/348/27>. Acesso em: 12 jul. 2015. RAPOSO, Tacio José Natal et al. Percepção e Risco na Amazônia Setentrional: um estudo na cidade de Rorainópolis-Roraima. Revista Geográfica Acadêmica, Boa Vista-RR, v. 8, n. 2, p. 59-69, jul./dez. 2014. RIBEIRO, Catarina. Gestora cultural e aprendiz da tradição oral da Amazônia. Festejos de Santo Reis com Mestre Zé da Viola - Rorainópolis/ Roraima. [S. l.]: Cultura popular viva, 2015. RORAIMA. Lei n.o 100, de 17 de outubro de 1995. Cria o município de Rorainópolis e dá outras providências. Diário Oficial [do] Estado de Roraima, Boa Vista, RR, 7 out. 1995. Disponível em: <http://www.servidor.rr.gov.br/bancodeleis/index2. php?option=com_docman&task=doc_view&gid=797&Itemid=26>. Acesso em: 30 jun. 2015.

Panorama Cultural de Roraima

|

161


RORAIMA. Secretaria de Estado do Planejamento e Desenvolvimento de Roraima. Informações Socioeconômicas do Município de Rorainópolis – RR. Boa Vista: CGEES/SEPLAN /RR, 2010. RORAIMA. Secretaria de Estado da Educação, Cultura e Desporto. Portaria n.o 1093/10/SECD/GAB/RR. 8 jun. 2010a. Diário Oficial [do] Estado de Roraima, Boa Vista, RR, 11 jun. 2010. ______. Extrato. Espécie: convênio n.o 005/2015 celebrado entre o Estado de Roraima, através da Secretaria de Estado da Cultura e a Agência de Empreendimentos Culturais da Amazônia. 27 maio 2015. Diário Oficial [do] Estado de Roraima, Boa Vista, RR, 2 jun. 2015. Disponível em: <http://www. imprensaoficial.rr.gov.br/diarios/doe-20150602.pdf>. Disponível em: 14 dez. 2015. RORAINÓPOLIS (RR). Prefeitura. Projeto VII Arraial de Rorainópolis. 2015. Mimeo. ______. Lei n.o 061/2001. Dispõe sobre a reestruturação organizacional da Prefeitura Municipal de Rorainópolis e dá outras providências. 2001a. Mimeo. ______. Lei orgânica do município de Rorainópolis. 2001b. Mimeo. RORAINÓPOLIS (RR). Prefeitura. Tv Prefeitura. Arraianópolis foi um grande sucesso. 17 jul. 2014. Disponível em: <http://www.rorainopolis.rr.gov.br/ leNoticia.asp?materia=1100>. Acesso em: 14 dez. 2015. ______. Arraianópolis foi um sucesso. 17 jul. 2015a. Disponível em: <http:// www.rorainopolis.rr.gov.br/leNoticia.asp?materia=1203>. Acesso em: 14 dez. 2015. ______. Rorainópolis se prepara para comemorar o dia do evangélico. 2015b. Disponível em: <http://www.rorainopolis.rr.gov.br/leNoticia.asp?materia=1218>. Acesso em 12 dez. 2015. SILVA, Paulo Rogério de Freitas. Dinâmica territorial urbana em Roraima – Brasil. 2007. 329 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, 2007. ______. A emergência de novos lugares na Amazônia brasileira: a influência da rota BR-174 no estado de Roraima. Geonorte, Manaus, v. 7, n. 1, p. 898-909, ed. esp. 3, 2013. Disponível em: <http://www.revistageonorte.ufam.edu.br/ attachments/article/14/A%20EMERG%C3%8ANCIA%20DE%20NOVOS%20 LUGARES%20NA%20AMAZ%C3%94NIA%20BRASILEIRA%20A%20 INFLU%C3%8ANCIA%20DA%20ROTA%20BR-174%20NO%20ESTADO%20DE%20RORAIMA.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2015. VERAS, Antonio Tolrino de Rezende et al. Dinâmica socioespacial da cidade de Rorainópolis-RR. In: ENCONTRO NACIONAL DA ANPUR, 15., 2013, Recife. Anais... Recife: ANPUR, 2013, p. 1-14. Disponível em: <http://unuhospedagem. com.br/revista/rbeur/index.php/anais/article/viewFile/4597/4466>. Acesso em: 12 jul. 2015. 162

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Fotografia: Adelson Wendling


DIAGNÓSTICO DOS ATRATIVOS CULTURAIS DE SÃO JOÃO DA BALIZA: apontamento das potencialidades turísticas Altino Nogueira Bezerraa, Carla Roque de Oliveirab, Elizangela de Sousa Barbosac, Georgia Patrícia da Silva Ferkod

INTRODUÇÃO As discussões sobre cultura adquiriram maior notoriedade nos últimos anos, passando a constar na agenda política de diversos municípios. Com a criação do Ministério da Cultura, cresceu a discussão no campo acadêmico e mercadológico, principalmente quando se percebeu que a cultura, além de ser promotora de cidadania, é também um vetor de promoção de riqueza. Mas, por outro lado, sabe-se que a proliferação dos órgãos ligados à cultura ainda não foi capaz de criar políticas suficientes que incentivem e preservem todas as formas de manifestações culturais, e gerem desenvolvimento e riqueza para as comunidades. O Município de São João da Baliza, localizado ao sudeste do Estado, interligado aos demais municípios por meio da BR-210, é conhecido por suas festividades que acontecem durante o ano e pela natureza, que proporciona a prática de turismo em suas diversas modalidades. O turismo cultural ainda é pouco abordado, e o planejamento e a gestão dessa atividade estão ainda pouco amparados em São João da Baliza. O Ministério do Turismo entende que o turismo cultural compreende “as atividades turísticas relacionadas à vivência do conjunto de elementos significativos do patrimônio histórico e cultural e dos eventos culturais, valorizando e promovendo os bens materiais e imateriais da cultura” (BRASIL, 2006, p. 13) e […] engloba “as manifestações temporárias, enquadradas ou não na definição de patrimônio. Incluem-se nessa categoria os eventos religiosos, musicais, de dança, de teatro, de cinema, gastronômicos, exposições de arte, de artesanato e outros” (BRASIL, 2006, p.13). O objetivo deste trabalho é realizar um diagnóstico cultural do Município supracitado, para mapear as atuais práticas culturais, assim contribuindo para a futura implementação de políticas culturais pautadas no reconhecimento das expressões locais, promovendo o turismo e para a reflexão sobre a organização/ gestão da cultura neste município. Toma-se como base o conceito de Cuche (2002, p. 11), quando afirma que “a noção de cultura, compreendida em seu sentido vasto, remete aos modos de vida e de pensamento”. 164

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Servidor da Prefeitura de São João da Baliza, e-mail: tinoxhip55@hotmail.com a

Acadêmica do Curso de Artes Visuais, e-mail: carlaroquedeoliveira@hotmail. com b

Servidora da Prefeitura de São João da Baliza, Graduada em Pedagogia, e-mail: elizangela_sbarbosa@hotmail. com c

Orientadora do Trabalho de Conclusão do Curso de Extensão em Gestão Cultural - UFRR/MinC, professora da Universidade Federal de Roraima, Doutora em Políticas Públicas, e-mail: geoufpe@ yahoo.com.br d


O diagnóstico aqui pretendido pode ser entendido como o resultado da análise de certa realidade, o qual permite conhecer criticamente a situação da cultura em alguma localidade, indicando as suas fragilidades e potencialidades, sendo possível identificar o que é prioritário no desenvolvimento da política cultural (ROCHA, 2013). Tem-se o interesse de mapear os atrativos culturais desse município, pois, para a criação de políticas efetivas, faz-se necessário mapear os quadros atuais da cultura, promovidos pela esfera pública ou privada. Dessa forma, poder-se-á focar em projetos que promovam a democratização na distribuição dos recursos, transformando-os em linhas de ação que, efetivamente, façam surgir condições para a produção e o acesso à diversificada e rica produção cultural dos locais (FONSECA, 2010). Tal fato é especialmente relevante para que se analise também a proposta do turismo cultural, pois, de acordo com Burns (2002, p. 77), “é particularmente importante recordar quando os planejadores do turismo ou companhias de turismo (e até mesmo agências de apoio mal informadas) fazem tentativas de preservar a cultura”. Neste sentido, a relação proposta, nesta pesquisa, entre turismo e cultura, por sua vez, pode ser entendida “como uma totalidade complexa constituída por normas, por hábitos, por repertórios de ação e de representação, adquiridos pelo homem enquanto membro de uma sociedade (WARNIER, 2000, p. 16), a qual se constitui de práticas e crenças religiosas, educativas, alimentares, artísticas e lúdicas.

1 ASPECTOS GERAIS DO MUNICÍPIO SÃO JOÃO DA BALIZA Freitas (1998) relata que o nome do município São João da Baliza relaciona-se à construção da BR-210 (Perimetral Norte). O nome do município surgiu do seguinte incidente: um dos pioneiros, João Pereira da Silva, perdeu um instrumento de medição de limites nos serviços topográficos (baliza) em um igarapé onde hoje está a sede municipal. A junção do nome do santo escolhido para padroeiro do lugar ao nome do instrumento perdido resultou, então, em São João da Baliza. Outra versão do nome da cidade remete à quantidade de “Joãos” do vilarejo e baliza devida uma disputa entre topógrafos que estavam abrindo a BR-210 pela antiga empresa Paranapanema. João Pereira chegou ao município no ano de 1976, um ano depois dos primeiros pioneiros, que foram João de Deus (vulgo Didi), Raimundo Pereira Lima, Benedito Medeiros (vulgo Binuca) e Osmar Marques de Souza e suas respectivas famílias. São João da Baliza foi criado pela Lei Federal n.º 7.009, de 1982, com terras desmembradas do município de Caracaraí.

Panorama Cultural de Roraima

|

165


Figura 1 - Localização de São João da Baliza

Fonte: SILVA (2007).

São João da Baliza está localizado a sudeste do Estado, limita-se ao norte com Caracaraí, ao sul com o Estado do Amazonas; a leste com Caroebe e a oeste com São Luiz do Anauá e Rorainópolis. A distância rodoviária à sede de Boa Vista é 328,9 km (RORAIMA, 2010).

2 DIAGNÓSTICO SITUACIONAL DA CULTURA Mediante pesquisa, in loco, pode-se dizer que a área cultural de São João da Baliza começou a se estruturar em 1988, com a criação do Departamento de Educação, Cultura Esporte e Lazer, que tinha dentre suas atribuições a difusão da cultura. Mesmo depois de duas décadas, o município não dispõe de orçamento específico para a cultura. Ao longo dos anos, algumas despesas em cultura vêm sendo bancadas por projetos aprovados por meio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, por meio do Governo do Estado e/ou Prefeitura Municipal. O Plano Municipal de Cultura é um dos elementos do Sistema de Cultura, que está em vias de estruturação no município. Esse Plano visa a estabelecer estratégias, ações e metas que deverão ser executadas ao longo dos próximos 10 anos, já que o município ainda não possui um planejamento estratégico das políticas públicas de cultura, o que gera a execução de ações fragmentadas. Conforme fala de um dos entrevistados “para permitir o acesso à produção artística e cultural, o município precisa dispor de equipamentos públicos de cultura, qualificados, descentralizados e acessíveis”. Atualmente, os equipamentos disponíveis são, de maneira geral, tem estrutura razoável, localizando-se, todavia, somente na região central do município.

166

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Em termos de ações institucionalizadas, o município tem a presença de uma unidade do Serviço Social do Comércio (SESC), o Centro de Atividades José Serafim Muniz, inaugurado em julho de 2005, o qual oferece oficinas artísticas, exposições de arte, oficinas de teatro e outros, de forma gratuita na cidade. Os espaços culturais possuem programação diversificada gratuita ou a preços populares. Quanto à questão da proteção e valorização do patrimônio cultural edificado, São João da Baliza não tem bens tombados. No âmbito imaterial, a Rota da Imigração é considerada patrimônio cultural, por representar a identidade do Maranhão no município, por meio dos saberes e dos eventos culturais existentes. O município possui uma biblioteca pública, a Biblioteca Pública Municipal Antônio Augusto Martins, que possui um acervo de aproximadamente 1.500 (mil e quinhentos) volumes. A cidade também conta com bibliotecas estudantis, que se localizam no interior de escolas públicas, centro educacional e universidade, distribuídas da seguinte forma: 01 (uma) de estabelecimento particular, 01 (uma) universitária, 02 (duas) em instituições estaduais e 10 (dez) em escolas municipais. Tanto as bibliotecas de escolas particulares como as demais permitem o acesso da comunidade para pesquisa. A partir de conversas com pessoas da comunidade e entrevistas direcionadas, encontraram-se várias formas de expressões artísticas, festividades e eventos, a saber: 2.1 DOS ATRATIVOS CULTURAIS 2.1.1 Artesanato De acordo com um dos participantes da pesquisa, o artesanato, na cidade, em sua maioria, “ocorre como uma atividade repassada pela família, pois, além de ser uma alternativa de renda ao desemprego, também é visto como uma atividade artística”. A estimativa das receitas geradas pelo artesanato varia conforme a época, estimando-se de R$ 200,00 (duzentos reais) a R$ 500,00 (quinhentos reais) por mês. Em poucos casos, quando o artesão tem controle sobre suas entradas e saídas, ou dedica seu tempo em exclusividade à pratica artesanal, o valor aumenta mensalmente. Conforme o artesão João Damasceno Bezerra, “dezembro é considerado o melhor mês para as vendas”. Os itens artesanais comumente confeccionados são objetos decorativos e utilitários. As técnicas utilizadas são: fios e tecidos (crochê, bordado e costura), madeira (entalhe, pintura à mão livre). Para a cestaria, são utilizadas fibras naturais de cipó titica, timbó e ambé. Os artesãos produzem em casa, e quase metade deles com matéria-prima retirada do meio ambiente. O que precisa ser investido provém de recursos próprios ou de outras atividades.

Panorama Cultural de Roraima

|

167


2.1.2 Entalhe em madeira Conforme o entrevistado senhor Florentino Gomes (vulgo Flôr), o entalhe em madeira “é o trabalho artesanal com o propósito de dar vida a um determinado desenho, transformando-o em alto-relevo”. As madeiras mais usadas são as madeiras moles, de mais fácil manuseio, com ferramentas cortantes. Usa-se para confecção do trabalho ferramentas encontradas no mercado, mas muitas outras o artesão precisa fabricar conforme sua necessidade, comenta o profissional. Dentre as encontradas no mercado, estão os jogos de formões, compostos por 6 peças, 12 peças, e peças avulsas; são goivas, formões, ferra canto e outras peças. Ao contrário da xilogravura, feita em entalhe plano, isto é, baixo-relevo, o alto-relevo deve ser bem pronunciado, envelhecido com betume ou extrato de nogueira, para formar a pátina, dando assim maior plasticidade ao trabalho. Para o entrevistado do ramo, a comercialização e o acesso à matériaprima são os maiores problemas vividos pelos artesãos. O fator agravante é a falta de apoio na produção, e a baixa valorização do artesanato. 2.1.3 Artes, dança, teatro e música No que tange à promoção artística identifico-se que o SESC é o espaço de exposições mais importante de São João da Baliza, que desde 1999, vem incentivando as artes visuais, apresentando trajetórias artísticas, além de desenvolver mediações, oficinas e palestras. No campo da pintura, entrevistou-se Maurício Machado, o qual começou a pintar há 3 anos. O que era para ser apenas um hobby se transformou em uma paixão, fazendo com que as telas pintadas por ele começassem a ganhar uma perfeição impressionante e a chamar atenção de todos aqueles que tomam conhecimento de seu trabalho como artista plástico. O ateliê ainda tímido de Maurício está montado na sala de sua residência, localizada na Avenida São Paulo, em São João da Baliza. É de lá que saem os quadros com figuras que mostram a exuberância da fauna e flora da Amazônia. Maurício Machado afirmou “que já criou mais de 30 obras, vendidas para Curitiba e Manaus. As pinturas são feitas em tela com tecido em algodão, lona, entre outros. A madeira é utilizada nas bordas dos quadros”. No que diz respeito à música, pode-se dizer que a cidade é berço de diversos músicos, bandas e compositores em variados estilos musicais: samba, sertanejo, rock, rap e outros. Hoje, é uma prática da Secretaria Municipal de Educação e Cultura, bem como da Secretaria de Ação Social, subsidiar grupos musicais para apresentações nos eventos pela cidade, o que oferece a possibilidade da divulgação do trabalho. Na ótica do senhor Nazareno José da Silva, a cidade já exporta talentos da música devido a riqueza de ritmos e gêneros. “Contudo, apesar de se viver uma realidade de muito potencial na área da música, algumas dificuldades ainda persistem, para dar a visibilidade e o valor devido à música e, principalmente, para consolidar o seu mercado local”. A situação do segmento teatral na cidade também é precária, na fala do entrevistado, limitando-se a sua produção ao entusiasmo e dedicação 168

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


de alguns poucos criadores, que vão insistindo em sacrificar as suas vidas pessoais e profissionais, “em nome de projetos esporádicos, e de alguns grupos amadores, que de tanto insistir e praticar já alcançam a qualidade dramatúrgica encontrada em centros de excelência da área”. A cidade ganhou alguns espaços onde se pode desenvolver as atividades de teatro, mesmo não sendo esses espaços construídos para esse fim, pois lhes falta a estrutura técnica necessária. Porém, são espaços públicos onde se pode “formar públicos” para assistirem os talentos locais. Conforme um dos entrevistados, o município possui cursos livres e oficinas de teatro geralmente realizadas pelo Sistema S. A cidade de São Joao da Baliza conta com aproximadamente 21 (vinte e um) artistas, profissionais e amadores, atuantes na área teatral. Na cidade, há um grupo de teatro, cujo nome é Rever Bell. O nome adotado inicialmente era Reverbel, em homenagem a uma das primeiras atrizes a fazer teatro no Brasil, Olga Garcia Reverbel. De acordo com Rogério Martins, representante desse grupo, pelo fato de a banda musical não ter autorização para usar o sobrenome da atriz, adotou a nomenclatura Rever Bell, e um ano após a sua criação, foi mudada a escrita, porém a pronúncia continuou igual à que já era divulgada e conhecida em São João da Baliza e municípios vizinhos. Em 2015, o Rever Bell completou 10 anos de existência, com apresentação de peças adaptadas ou autorais, que somam mais de 50. Suas apresentações são baseadas na realidade ou ficção, e os temas abordados nos textos são críticas sociais que se enquadram nos gêneros drama, suspense e comédia, sendo este o mais destacável. O grupo se apresenta em escolas de Roraima, órgãos públicos e privados abertos à comunidade em geral. Além das peças, o grupo produz vídeos criativos com situações cotidianas, de forma cômica. É um grupo informal, e seus membros não são remunerados. Geralmente, os materiais utilizados vêm de doações dos próprios integrantes. Já fizeram parte do grupo mais de 40 (quarenta) componentes. Atualmente, o Rever Bell é composto de 10 (dez) integrantes. 2.1.4 Festas religiosas A Paixão de Cristo na Sexta-Feira Santa, espetáculo realizado pela Igreja Católica, tem sua encenação ao ar livre e conta com a participação dos artistas locais, grupo de teatro Rever Bell. Num espírito ecumênico, integra pela fé e comunidades católicas e evangélicas, retratando a vida, paixão, morte e ressurreição de Cristo. Tem também o festival gospel, evento de grande referencial em pregação do evangelho no município, e que, ao longo dos anos, vem ganhando credibilidade e conduzindo milhares de pessoas para a vida religiosa; conta com a presença de cantores e conferencistas renomados de várias regiões do Brasil, em um amplo espaço com área de alimentação, palco e estacionamento. Essa festa acontece no ginásio de esporte do estado, e suas datas podem variar. Sua realização é pela Igreja Evangélica Assembleia de Deus do Ministério de SIDADER, a qual envolve a comunidade local. Em São João da

Panorama Cultural de Roraima

|

169


Baliza há a Lei n.º 333/2014, que institui o dia do Evangelho como sendo o dia 30 de novembro. Para o entrevistado João Batista Marques de Moraes (vulgo João do Boi), a Folia de Reis, realizada em janeiro, atua na preservação dos festejos de folias de reis e suas tradições. É formado por membros e amigos da família de fundadores. A festa se inicia no dia 25 de dezembro, com a procissão nas residências, durante a qual acontecem as orações, recebem as doações e se deslocam para outras residências, no período noturno, a partir das 22h, acompanhado pelos três carretas, concretizando a festa no dia 06 de janeiro, no Barracão Cultural, que se localiza na Rua dos Soldados, s/n, bairro Mutirão, com visitação livre. A Folia de Reis é realizada e mantida por João Batista Marques de Moraes, conhecido como João do Boi, responsável por esse evento no município, desde 1995. No dia 24 de junho, a Igreja Católica de São João da Baliza celebra a solenidade litúrgica do nascimento de João Batista, “o maior dos profetas”, que foi enviado “para preparar os caminhos do Senhor”. A celebração de João Batista evoca a manifestação da graça e bondade de Deus. O lema dessa solenidade é a frase de Zacarias, seu pai, no evangelho: “Seu nome é João”. A frase é uma mensagem da gratuidade e bondade divinas que a ele é confiada. Para um dos entrevistados, João é testemunha da Luz, sobretudo por ter apontado Cristo no meio da humanidade. Além de encarnar a plenitude do Antigo Testamento e a preparação para o Evangelho, ele teve a graça de batizar o próprio Cristo, marcando o início da missão do divino Salvador. Em comemoração ao dia do padroeiro, a Igreja realiza leilões, almoço, bingo e um festejo junino, com apresentações de quadrilhas locais. As atividades da Comunidade Imaculada Conceição iniciaram em 1998, tendo como dirigente Maria Apolinária Pereira. Hoje, a Comunidade está localizada na Avenida São Cristóvão e tem como representante Orlete Rodrigues Araújo Salles e mais três dirigentes, que dividem as responsabilidades. O pároco é o Padre José Roberto. Todos os anos, no período de 5 a 7 de agosto, a Comunidade costuma realizar festejos de Nossa Senhora Imaculada Conceição, sendo uma festa social com almoço, churrasco, leilão e bingo. O evento é organizado no galpão da Igreja. União do Vegetal é uma sociedade religiosa cristã, implantada em nosso município, no ano de 1995. Não possui sede em São João da Baliza, porém há uma central de plantadores, onde ocorrem as sessões e os encontros, bem como os ensinamentos com o objetivo de promover a paz e trabalhar pela evolução do ser humano no sentido do seu desenvolvimento intelectual. A instituição conta hoje com mais de 17 sócios e 22 frequentadores, e se situa na Vicinal 27. Em suas sessões, os associados bebem o chá hoasca, ou ayahuasca, como também é conhecido, para efeito de concentração mental. No Brasil, o uso da hoasca em rituais religiosos foi regulamentado em 25 de janeiro de 2010, pelo Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (CONAD), do Governo Federal Brasileiro. Essa regulamentação estabelece normas legais para as instituições religiosas que fazem uso responsável do chá.

170

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Todo ano, no dia 22 de julho, acontece o festejo em comemoração ao Dia da Paz e a Conciliação e conta com a participação de inúmeras pessoas da região e de outros países. 2.1.5 Bumba-meu-boi O Bumba-meu-boi veio do Maranhão, representado por João Batista Marques de Moraes, conhecido por João do Boi, em São João da Baliza desde 1995. O ensaio de São João acontece no Sábado de Aleluia, No dia 13 de maio, faz-se a revelação, concretização de quem irá fazer ou doar o boi de São João. Um dos entrevistados comentou que o batizado do boi acontece no dia 24 de junho, dia de São João, no qual ocorre a festa no Barracão, envolvendo a comunidade e os brincantes, que são de 10 (dez) a 20 (vinte) pessoas. Elas brincam de junho a setembro e formalizam o curral ou arena, no qual o boi é morto no último sábado de setembro. Tradicionalmente, o Bumba-meu-boi é realizado na intenção de São João, a partir da crença de que agrada a esse santo organizar um Boi ou brincar num que já esteja organizado. Dentro desse contexto, identifica-se, na “brincadeira”, uma forte marca religiosa, em que o Boi funciona como elemento de ligação entre o santo e os devotos, inclusive para pagamento de “promessas”. 2.1.6 Dança da Mangaba A Mangaba é uma dança que se constitui, principalmente, num divertimento, num lazer, sendo dançada, com mais frequência, na época junina contagiante. Sua coreografia apresenta evoluções, formando, no entanto, um núcleo comum. Todos os passos são feitos em redor de uma formação em oito, tomada ao iniciar a brincadeira. Mesmo com toda a movimentação da dança, há a exigência de manter a forma do número oito no decorrer do espetáculo. Em São João da Baliza, o grupo é composto por brincantes de ambos os sexos e de variadas idades, embora haja predominância de adultos. As pessoas que praticam a Dança da Mangaba não constituem um grupo organizado, mas as que a conhecem e sabem dançá-la, incluindo aí os cantores e os músicos. O acompanhamento dessa dança é, principalmente, de percussão. A presença desse folguedo, herdado da cultura maranhense demonstra que ele tem conseguido se manter vivo através do tempo. 2.1.7 Festa junina e Carnaval Com o objetivo de fortalecer as manifestações culturais, o Governo do Estado, por meio da Secretaria Estadual de Cultural (Secult), apoia a Festa Junina em São João da Baliza. Em 2015, ocorreu sua 32ª edição, que começou no dia 4 e encerrou no dia 7 de junho. O arraial contou com a participação de bandas locais, como Remela de Gato, Forró do Patrão, Forró Pressão, e as atrações nacionais, Pedro Taveira (Goiás) e a banda Cavalo de Aço (Rio Grande do Norte).

Panorama Cultural de Roraima

|

171


Para um dos entrevistados o evento “é grandioso e importante na geração de emprego e renda, aquecendo assim a economia do município, além de revitalizar as raízes culturais, funcionando como um encontro da população”. Para a realização dos festejos juninos, é montada uma megaestrutura com toldos, visando a prevenir das chuvas desse período de inverno. Antigamente, faziam um barracão de palhas, e a festa acontecia durante 09 (nove) noites. Nas barracas encontram-se as comidas típicas, e as atividades esportivas são inseridas no decorrer do dia como atrações significativas à população. O evento vem se fortalecendo a cada ano, tornando a maior tradição cultural do município. Quanto ao carnaval, atração tradicional e destaque no município, é festejado em 03 (três) dias de folia com desfile de blocos carnavalescos, tem o baile público realizado na Praça de Alimentação. A animação ocorre pelas bandas regionais, com o desfile de blocos e a escolha da rainha e do rei momo. 2.1.8 Vaquejada A Vaquejada é uma atividade recreativo-competitiva, com características esportistas do Nordeste brasileiro: dois vaqueiros a cavalo têm de se alinhar ao boi até emparelhá-lo entre os cavalos e conduzi-lo ao objetivo (duas últimas faixas de cal do parque de vaquejada), onde o animal deve ser derrubado. A Vaquejada se tornou tradição em São João da Baliza. Esse evento acontece nos dias 08, 09 e 10 de novembro, na Pista de Vaquejada Di Valdo M. Rodrigues, sempre com premiações aos competidores, bem como diversas atrações regionais e de grupos locais. 2.1.9 Serras e Vicinais A BR-210, que passa por São João da Baliza, Caroebe e São Luiz do Anauá, é referência para se dirigir às paredes rochosas, havendo boas áreas nas estradas próximas a essas cidades. De acordo com um dos entrevistados, “as opções são diversas, pois, apesar de não haver camping específico, há condições para acampamento nos arredores das cidades, sendo a moto o veículo mais adequado para facilitar o deslocamento”. “A certeza que fica é que viajar por essa região vale muito pelas paisagens e pelas possibilidades de boas escaladas”. A Vicinal 28 se localiza na BR-210, a 05 km da sede do município. É uma vicinal bastante populosa, onde predomina a cultura da banana. Há também o plantio de melancia e a existência da pecuária. O trajeto é realizado em estrada de chão. A vicinal tem cerca de 30km, findando no Rio Caroebe, onde o morador Danilo Brandt aproveitou o espaço de seu lote, privilegiado pela localização, e criou um ambiente agradável com restaurante, bar, quiosques, som ao vivo, tirolesa, trampolim feito de forma artesanal. O espaço é bastante frequentado para banho, pesca e camping, atraindo moradores do município e áreas adjacentes, principalmente no período de verão. As Vicinais 30 e 32 estão localizadas na BR-210, aproximadamente 10 e 15 km da sede do município de São João da Baliza. Não são tão populosas, 172

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


e predomina em pequena escala a pecuária. As vicinais têm cerca de 20 km e findam no Rio Caroebe, onde há ambiente propício para banho, pesca e área selvagem para camping, atraindo assim moradores do município no período de verão. O trajeto é realizado em estrada de chão. Os moradores como forma de lazer para visitantes sugerem um percurso na Serra Acarí. O acesso é feito por uma estrada de terra e trilhas e não dispõe de infraestrutura, porém seu estado de conservação é bom. A serra é recoberta de floresta, com nascente d’água.

3 MATERIAL E MÉTODOS O presente trabalho é caracterizado como uma pesquisa exploratória, com abordagem qualitativa. De acordo com Chizzotti (1995, p.104), esse tipo de pesquisa objetiva, em geral, “provocar o esclarecimento de uma situação para a tomada de consciência”. A metodologia adotada se pautou na pesquisa qualitativa e técnica de coleta de pesquisa, entrevista formal não estruturada, a qual objetiva uma visão geral do problema pesquisado, quase uma conversa (GRESSLER, 2004). Neste caso, comumente recorreu-se a informantes-chave, especialistas no assunto, tais como: artistas, produtores locais e moradores. Dentre as pessoas consultadas, estão as das áreas do teatro, dança, artes visuais e música. Cabe assinalar que boa parte do conteúdo deste artigo se refere a tópicos relacionados à ação da comunidade na área da cultura, em função do objetivo da pesquisa. Sabendo da responsabilidade dos governos no fomento à cultura, procurou-se, mas nenhum representante da SECULT municipal se dispôs a fornecer informações, apesar de se ter buscado informações de várias formas. Contudo, mesmo assim, foi possível identificar um quadro de potencialidades nas ações e iniciativas de seus agentes culturais, que se traduzem nas vocações culturais e turísticas da região. Tentou-se realizar pesquisa documental junto aos órgãos do município, mas não foram encontrados, em termos tácitos, marcos regulatórios, como leis, projetos de lei ou minutas de lei, Lei Orgânica do Município (artigos que falam sobre a cultura), lei do sistema municipal de cultura, lei do órgão gestor de cultura, lei de criação da biblioteca pública, lei de patrimônio, lei de criação do conselho e portaria de nomeação dos conselheiros e suas respectivas representações etc. Tanto o representante da pasta quanto na Assembleia, alegaram que ninguém encontrava tais documentos. Como procedimento de análise, efetuou-se o mapeamento de quase todas as atividades culturais realizadas no município, e após o mapeamento, foram escolhidas algumas de interesse deste estudo, cujo resultado foi apresentado acima.

Panorama Cultural de Roraima

|

173


CONSIDERAÇÕES FINAIS Em termos gerais, pode-se afirmar que a estruturação da política cultural do município de São Joao da Baliza é insipiente. Há uma necessidade de o poder municipal criar mecanismos para o fortalecimento da cultura, esporte e lazer, bem como apoiar as manifestações culturais e atividades festivas. Quanto ao Plano de Cultura, viu-se que o órgão responsável pelo assunto não tem um plano anual. Hoje, há dois profissionais do município participando do curso de extensão promovido pela UFRR e MinC. A maioria dos financiamentos dessas atividades é obtida por editais da lei de incentivo fiscal. Aqui, tenta-se criar informações e indicadores culturais, ou seja, mapeamento ou inventário cultural do município. A partir do diagnóstico realizado, também foi possível identificar fragilidades, obstáculos e potencialidades do desenvolvimento cultural do município, sintetizados no QUADRO 1, abaixo: Quadro 1 - Fragilidades e obstáculos / Vocações e potencialidades

Fonte: Os autores (2015).

Diante disso, compreende-se que o município contempla a diversidade cultural de forma ampla, mas a cidade carece ainda de mais espaços que possam garantir aos cidadãos o acesso aos bens culturais de forma plena, embora sejam identificados espaços, programas, ações, projetos e eventos voltados para todas as áreas da expressão simbólica. É na dimensão econômica que os indicadores são ainda baixos, para não dizer inexpressivos, devendo ser dada grande atenção na formulação de políticas que possam impulsionar a cadeia produtiva. 174

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Sugere-se que se concretize um plano que abarque os objetivos e as diretrizes do segmento cultural do município, com participação da sociedade civil, independente dos grupos que estiverem no ofício de governar, com vistas ao desenvolvimento cultural do município. Conclui-se que a inexistência de políticas públicas tem dificultado a execução de ações que fomentem o desenvolvimento da cultura na região, em suas múltiplas dimensões. Espera-se que este diagnóstico, esforço inicial e necessário, torne-se um referencial para a formulação de propostas que venham contribuir efetivamente para a institucionalização do plano de cultura nesse município.

REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério do Turismo. Segmentação do turismo: marcos conceituais. Brasília, 2006. BURNS, Peter M. Turismo e antropologia: uma introdução. Tradução de Dayse Batista. São Paulo: Chronos, 2002. CHIZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez, 1995. CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. 2. ed. Tradução de Viviane Ribeiro. Bauru: EdUSC, 2002. FONSECA, M. A. M. Política Cultural: refletindo sobre princípios e diretrizes. Visões, Rio de Janeiro, v. 1, n. 8, p. 27-41, jan./jun. 2010. FREITAS, Aimberê. Estudos sociais: Roraima: Geografia História. São Paulo: CorPrint, 1998. GRESSLER, Lori Alice. Entrevista: introdução à pesquisa: projetos e relatórios. 2. ed. São Paulo: Loyola, 2004. p.164-169. ROCHA, Sophia. Planos de cultura. Salvador-BA: P55; Secretaria de Cultura, 2013. (Coleção política e gestão). RORAIMA. Secretaria de Planejamento. Informações socioeconômicas do município de São João da Baliza – RR 2010. Disponível em: <http://www. seplan.rr.gov.br/roraimaemnumeros/dados_municipios/baliza.pdf>. Acesso em: 30 jul. 2015. SILVA, P. R. F. Dinâmica territorial urbana em Roraima – Brasil. 2007. 327 f. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007. WARNIER, Jean Pierre. A mundialização da cultura. Tradução de Luís Felipe Sarmento. Lisboa: Notícias, 2000.

Panorama Cultural de Roraima

|

175


FONTES ORAIS (ENTREVISTA INFORMAL) Carlito Bernardino dos Santos, natural de Boa Vista /RR. Entrevista gravada no dia 29 de julho de 2015, no município de São João da Baliza – RR. Florentino Gomes, natural do estado do Maranhão. Entrevista gravada no dia 29 de julho de 2015, no município de São João da Baliza – RR. João Batista Marques de Moraes, natural do Maranhão. Entrevista gravada no dia 11 de setembro de 2015, no município de São João da Baliza – RR. João Damasco Bezerra, natural do estado do Maranhão. Entrevista gravada no dia 05 de abril de 2015, no município de São João da Baliza – RR. Maurício Machado Pinto, natural de São João da Baliza, estado de Roraima. Entrevista gravada no dia 29 de julho de 2012, no município de São João da Baliza – RR. Maria de Jesus Nogueira Bezerra, natural de Caxias, no estado do Maranhão. Entrevista gravada no dia 05 de outubro de 2015, no município de São João da Baliza – RR. Nazareno José da Silva, natural de Amajari /RR. Entrevista gravada no dia 15 de junho de 2015, no município de São João da Baliza– RR. Rogério Martins, natural do estado do Maranhão. Entrevista gravada no dia 05 de outubro de 2015, no município de São João da Baliza – RR.

176

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Fotografia: Edvânio Cavalcante


O MUNICÍPIO DE SÃO LUIZ E SUAS RIQUEZAS CULTURAIS: balanço e perspectivas Dina Oliveira da Silvaa, João da Cruz Pereira da Silvab, Ronaldo de Oliveira Santosc, Jaqueline Silva da Rosad

INTRODUÇÃO A identidade de um povo se traduz por suas crenças, suas manifestações e expressões artísticas. Na Constituição Federal de 1988, art. 216, há a indicação do que compõe o patrimônio cultural brasileiro como “modos de viver, fazer e criar dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira” (BRASIL, 1988). É necessário que a sociedade em parceria com o poder público tenham registros sobre a sua riqueza cultural, para que dessa forma possa se visualizar o legado de um povo, bem como a própria manutenção da sua cultura. Para tanto, esse trabalho tem como objetivo apresentar um diagnóstico cultural do município de São Luiz, no estado de Roraima. São Luiz é um dos municípios de Roraima, formado por um enorme contingente de nordestinos, em especial vindos do Maranhão, a fim de atender ao projeto de ocupação e integração da Amazônia Legal ao resto do país. Esse projeto foi implementado pelos governos militares por meio da expansão das fronteiras agrícolas nacionais, sendo criado em 1º de julho de 1982 por meio da Lei n.o 7.009 (BRASIL, 1982). O nome São Luiz é homenagem à capital do Maranhão, devido ao grande número de pessoas provenientes desse estado. Indicamos que grande parte da sociedade roraimense chama o município de São Luiz do Anauá, devido ao principal rio do município. O município se localiza na região sul de Roraima.

Servidora da Prefeitura de São Luiz, e-mail: dinavy123@ gmail.com a

Diretor de Cultura da Prefeitura de São Luiz, e-mail: joao_dosofa@hotmail.com b

Professor da Rede Estadual de Ensino, Graduado em Matemática, e-mail: ronaldo. rrbv@gmail.com c

Orientadora do Trabalho de Conclusão do Curso de Extensão em Gestão Cultural - UFRR/MinC, professora da Universidade Federal de Roraima, Mestre em Administração, e-mail: jaqueline.rosa@ufrr.br d

178

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Figura 1 - Localização do município de São Luiz

Fonte: RORAIMA (2014).

O município se destaca pela beleza paisagística, particularmente pela presença da serra dos Sonhos. São Luiz é muito próximo das cidades de São João da Baliza (16,0 km) e Caroebe (42,0 km), de modo a possibilitar a integração das três cidades, para que num futuro próximo, sejam desenvolvidos projetos turísticos de âmbito regional. Este trabalho, ao se propor mapear e registrar as manifestações e expressões culturais desse município, mostrará a sua diversidade, uma vez que há em sua comunidade pessoas de origem nordestina, assim como sulistas e ainda, indígenas, formando entre si, uma riqueza cultural muito grande que deve ser valorizada pela comunidade local.

1 REFERENCIAL TEÓRICO Bobbio (1977) faz a distinção entre política cultural e política da cultura, nesta os homens da cultura pertencentes à sociedade vão planejar e desenvolver a política da cultura com foco no acesso a todos, naquela, seu planejamento é realizado por políticos, com fins políticos. Fonseca (1997, p. 43) ponderou, na década de 1990, justamente as funções de cada segmento; ou seja, “[...] cabe à sociedade produzir cultura. Ao estado, cabe apenas garantir as condições para que esse direito possa ser exercido por todos os cidadãos”. A fim de desmistificar a discussão acerca da responsabilidade da produção, manutenção e proteção da cultura, a própria Constituição Federal apresenta, no art. 30, as responsabilidades dos municípios, os quais devem “promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual” (BRASIL, 1988). Portanto, vê-se que ao poder público implica identificação, promoção e proteção da cultura da sociedade, sejam por meio das políticas públicas ou outros mecanismos. Em 2003, criou-se o Sistema Nacional de Cultura (SNC), o qual “visa institucionalizar e fortalecer a gestão pública da cultura com base Panorama Cultural de Roraima

|

179


num modelo que reúne a sociedade civil e os entes federativos da República – União, municípios e Distrito federal [...]” (BRASIL, 2005, p.13). Além disso, o SNC ainda menciona que cada ente federativo deve estabelecer seus sistemas de cultura, organizados de forma autônoma, mas articulados de forma colaborativa. Pelo SNC, o Estado deve: a) Assegurar que a liberdade de criar não sofra impedimento; b) Garantir aos criadores as condições materiais para criar e usufruir dos benefícios resultantes das obras que produzem; c) Universalizar o acesso a todos os cidadãos aos bens da cultura; d) Proteger e promover as identidades e a diversidade cultural; e e) Estimular o intercâmbio cultural nacional e internacional. Percebe-se que todos os direitos a serem garantidos pelo Estado, abarcam aspectos: econômicos, simbólicos e cívicos. São as três dimensões da cultura que se encontram diluídas em todo o Sistema Nacional de Cultura. No que se refere à dimensão simbólica, esta é traduzida pelas ações humanas, socialmente construídas por meio de símbolos que se entrelaçam formando redes de significados que variam a cada contexto social e histórico (BRASIL, 2011). Quanto à dimensão cívica da cultura, por meio da Constituição Federal e SNC, e demais mecanismos, é assegurado aos cidadãos o direito à participação da sociedade na vida cultural. Ao assegurar esses direitos, tem-se o reforço da identidade cultural e da identidade dos indivíduos. No que concerne à dimensão econômica, essa se dá sob três aspectos (BRASIL, 2011): a) como sistema de produção, materializado em cadeias produtivas; b) como elemento estratégico da nova economia (ou economia do conhecimento); e c) como um conjunto de valores e práticas que tem como referência a identidade e a diversidade cultural dos povos, possibilitando modernização e desenvolvimento humano. Viu-se que o Estado institucionalizou mecanismos para que haja articulação entre sociedade civil e poder público a fim de assegurar os direitos à cultura; mas isso é apenas o início. A todos os entes federativos cabem executar os mecanismos para que a sociedade brasileira tenha a sua manutenção e proteção das suas riquezas culturais.

2 METODOLOGIA Tendo como objetivo geral apresentar um diagnóstico cultural do município de São Luiz/RR, classificou-se essa pesquisa como qualitativa e descritiva. Para tanto, utilizaram-se dados secundários no que se refere ao aspecto histórico cultural, como o levantamento feito pela Secretaria de Planejamento do Estado de Roraima (RORAIMA, 2010); Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2014); Câmara Municipal e Prefeitura de São Luiz, por meio de leis municipais. Além disso, fez-se coleta de dados primários, por meio de entrevista a moradores. Essas entrevistas foram guiadas por um roteiro de perguntas, e 180

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


realizadas em setembro, outubro e novembro do ano de 2015. Ao todo, foram entrevistadas 10 famílias antigas, as primeiras que chegaram ao município. Também se utilizaram fotos de paisagens e manifestações culturais do município.

3 RESULTADOS 3.1 A REALIDADE HISTÓRICA, SOCIAL E ECONÔMICA DO MUNICÍPIO DE SÃO LUIZ A criação do município ocorreu com a implantação do projeto de ocupação e integração da Amazônia Legal ao país, em 1º de julho de 1982 pela Lei n.º 7.009. O nome do município é em homenagem à capital do Maranhão (São Luiz), devido ao grande número de pessoas provenientes daquele estado e também em homenagem ao principal rio do município (Rio Anauá), que em tupi significa árvore florida, dando-lhe o nome de São Luiz do Anauá. Vale frisar que o registro se deu como São Luiz. Em abril de 1976, chegaram os primeiros habitantes nessa região em busca de melhores condições de vida, porém moravam isolados nos seus loteamentos. Figura 2 - Rio Anauá

Fonte: Os autores (2015).

No final do ano de 1977, moradores liderados por Firmino da Silva Pontes formaram uma equipe e fizeram o desmatamento de uma área, na qual se fixou a primeira comunidade de São Luiz, às margens da BR 210, onde atualmente se localizam praça municipal, igreja evangélica e casa lotérica do município. O primeiro administrador da comunidade foi Valdivino Ferreira de Sousa, nomeado pelo governador da época, Ottomar de Souza Pinto. O primeiro prefeito do município, Ari Lunardi, foi nomeado também pelo governador. O primeiro prefeito eleito por votação pública foi Gentil Barbosa Gomes, governou entre 1985-1988. O atual prefeito é Edson Pereira Leite, mandato de 2013 a 2016. Em 1990, São Luiz cedeu parte de seu território para a constituição do município de Rorainópolis, permanecendo somente com a Vila Moderna como núcleo populacional importante no seu interior. O gentilício é são-luizense. O município está localizado ao sul do estado, limitando-se ao norte com Caracaraí; ao sul e ao oeste com Rorainópolis; ao leste com São João da Baliza. Panorama Cultural de Roraima

|

181


A população de São Luiz é composta por pessoas vindas de várias partes do Brasil como: Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, São Paulo, e principalmente do Nordeste, especificamente do Maranhão trazendo consigo a cultura de sua região de origem. São Luiz possui uma área territorial de 1.526,89 Km2 que corresponde a 0,68 % do território de Roraima e possui uma área indígena de 23,94 km2, o que corresponde a 1,56% em relação à área total do município, onde se pode localizar parte da Reserva Indígena Wai-Wai, às margens do Rio Anauá. De acordo com os dados divulgados pelo IBGE (2014), o município de São Luiz possui uma população estimada de 7.309 habitantes e densidade demográfica de 4,42 h/km². Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de São Luiz é 0,649, em 2014. O que situa esse município na faixa de desenvolvimento humano médio (IDHM entre 0,600 e 0,699). A dimensão que mais contribui para o IDHM do município é longevidade, com índice de 0,788, seguida de renda, com índice de 0,605, e educação, com índice de 0,574. O município de São Luiz, como toda a região sul do Estado, tem aptidão agrícola e pecuária, que é semiextensiva associada às lavouras de maior valor comercial. O setor agropecuário do município de São Luiz apresenta um importante componente da economia local, tendo como destaque a produção de banana, mandioca e milho. Na pecuária, o destaque vai para a criação de aves, bovinos, caprinos e suínos, o que abastece o mercado local. Dentre os produtos de origem animal, destaca-se a produção de mel e leite. Também possui relevância no extrativismo vegetal, inclusive para exportação, a castanha-do-pará e a madeira. 3.2 DIAGNÓSTICO SITUACIONAL DA CULTURA NO MUNICÍPIO Cultura é um conjunto de ideias e modos de agir, costumes de um povo, é a forma pela qual as pessoas se adaptam às condições de existência transformando a sua realidade. É um processo que está em constante evolução, e pode ajudar no desenvolvimento de um grupo social, aprimorando seus valores espirituais e materiais como: línguas, costumes, rituais, culinária, vestuário, religiões, diferenças sexuais e étnicas, tudo isso constitui cultura e está em permanente processo de evolução. A cultura é importante para que haja a compreensão de diversos valores morais e éticos que regem a nossa conduta social, e auxilia a entender como estes valores foram assimilados e como eles guiam emoções, e orientam a julgar a dos outros. Ao avaliar a realidade da cultura, dentro dos vários segmentos culturais locais vê-se a falta de dados para que se possa revelar a força das manifestações culturais artísticas religiosas, e artesanais do município. O que se pode concluir é que todas as áreas apresentam um grande potencial, pois se presenciaram constantemente manifestações de grupos e indivíduos com apresentações culturais nas mais diversas áreas, por meio de eventos ou de forma isolada, mas por falta de apoio e incentivos o trabalho fica restringido. Não há informações para que se possa fazer uma análise preliminar do setor cultural, necessária para a implantação de políticas públicas voltadas 182

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


para a área da cultura local, mas, agora durante a realização deste trabalho, realizou-se cadastro de artistas e grupos locais para que possa servir de um banco de dados oficial. A cultura antes era mais espalhada dentro do município, mas atualmente a maioria das manifestações culturais se concentra dentro do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) de São Luiz, e possui alguns agentes e grupos culturais fazendo seu trabalho de forma isolada. 3.2.1 Patrimônio cultural e natural, material e imaterial do município de São Luiz: 3.2.1.1 Identificação dos elementos culturais que caracterizam o município São Luiz O município possui vários elementos que caracterizam sua pluralidade cultural, que vão desde patrimônios naturais, como: sítio arqueológico, serras e rios; patrimônios materiais: prédios, escolas e espaços para eventos; e patrimônio imaterial: crenças, modos, saberes, eventos culturais e a diversidade de manifestações culturais. a) Patrimônios culturais O patrimônio cultural do município é a herança das pessoas que vieram das regiões Sul e Nordeste e juntas construíram os costumes de hoje. É obrigação de todos preservar e transmitir todo esse legado às gerações futuras, que envolve vários aspectos culturais, que vêm deste a culinária, vestimentas, crenças, danças, músicas, festas tradicionais, originalizadas destas regiões, entre outras manifestações, dentre o patrimônio cultural de São Luiz, há imóveis, como escola, casa de moradores, sítio arqueológico, saberes, crença, rios e rochas. Esses locais são de expressivo valor para a comunidade local. b) Patrimônio cultural natural O município de São Luiz possui um sítio arqueológico chamado Pedra do Sol, no qual se pode conhecer o local onde os índios da etnia wai-wai fabricavam suas ferramentas. O sítio se localiza na vicinal-22, que está em bom estado de conservação e é aberto à visitação. Também, há a Serra dos Sonhos, composta por um conjunto de montanhas que divide os municípios de São Luiz e Rorainópolis, muito utilizado para prática de turismo de aventura e muito valorizado pela população que habitualmente faz trilhas ecológicas. Localiza-se na vicinal-10, na qual há mais um atrativo turístico: a pesca artesanal. Já a Serra do Anauá é composta por uma cadeia de montanhas que divide os municípios de São Luiz e Caracaraí, passando pela Vila Moderna. A cadeia de serras do Anauá foi dividida para a construção da BR-210 e, em uma delas foi instalada, no início da década de 1980, a primeira torre de transmissão da região. O Rio São Luiz, que deu origem ao nome da cidade, é ideal para prática da pesca artesanal. Localiza-se na entrada do município, com vista da ponte que Panorama Cultural de Roraima

|

183


corta o rio no início da povoação do município. Popularmente conhecido como São Luizão, é a continuidade do mesmo rio da entrada do município, cruza a vicinal 21, um dos relevos hidrográficos mais importantes de São Luiz, um ponto muito valorizado pela população, porém não tão conservado devido ao lixo que os visitantes acabam deixando por lá. c) Patrimônio cultural material O município possui um parque de exposições, o Raimundo Xavier Neto: construído em 1994 pelo Prefeito Emanuel Rodrigues, porém não há documento que regulamenta a criação da pista, só havendo um documento de doação do parque para a Associação dos Vaqueiros de São Luiz (Assovas) por um período de 8 anos, por meio de uma lei criada pelo até então prefeito João Nunes. Em 2005, pela Lei Municipal n.o 155/05, passou a denominar-se Centro de Entretenimento e Agronegócios e Pista de Vaquejada Raimundo Xavier Neto, onde se realiza a tradicional vaquejada de São Luiz e a Feira de Agronegócios que impulsionam a economia e o turismo na região. Em 31 de julho de 2015, realizou-se a reinauguração com ampliação do Parque, que se encontra em excelente estado de conservação. É o ponto mais valorizado pela população e está aberto à visitação. Figura 3 - Vaquejada em São Luiz

Fonte: Os autores (2015).

O município possui um estádio, o Cicatriz, fundado em 1992. O nome homenageia a um colaborador do futebol no município cujo nome era Antônio Gomes de Laia. O estádio está mal conservado. O último evento que teve foi em 2012. Atualmente a população não o utiliza para nenhum evento, e está fechado para visitação. A Escola João Rodrigues da Silva, fundada em 1979 com decreto de criação n.º 27/86, foi o primeiro órgão público a ser construído no município e os primeiros professores a lecionar foram: Teresinha de Jesus Paiva, Sebastião Freitas, Valdizete Freire de Lima, que também foram os primeiros professores do município de onde se originaram muitas manifestações ainda hoje existentes, como: festejo junino, dia cível com a fanfarra, referência por vários anos no estado na área esportiva. A escola passou por uma reforma que alterou sua estrutura original. 184

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


d) Patrimônio Imaterial Festa de Vaquejada: atualmente é o maior evento que o município possui, reúne vários segmentos culturais que vão desde culinária até apresentações de bandas locais. O festejo foi inaugurado em 1994 com objetivo de atender um grupo de vaqueiros que costumavam se reunir todo fim de tarde para brincar de vaquejada, depois de levar o gado para o abate no matadouro municipal. A ideia foi de um irmão do então prefeito Emanuel Rodrigues, que pensou em um espaço apropriado para a brincadeira. A princípio, foi só um espaço destinado para a brincadeira. No ano seguinte, foi criado um espaço mais apropriado e deu início a festa de vaquejada, o mais popular de todos os festejos. Houve a primeira ampliação. Desativaram o matadouro, criando um espaço mais amplo para animais, rodeio e shows regionais. Em 2005, com a Lei n.o 155/05 de autoria do vereador Lineu Hoslbach, denominou-se Centro de Entretenimento, Feira de Agronegócio e Pista de Vaquejada Raimundo Xavier Neto. Há três anos, agregou-se a essa festa o Festival do Mel. - A Semana Farroupilha é uma herança cultural que veio junto com os sulistas para o município. Se iniciou na década de 1990, implantado pelo sargento Leomar. A Semana Farroupilha é um evento festivo da cultura gaúcha, que se comemora de 14 a 20 de setembro, com a cavalgada em homenagem aos líderes da Revolução Farroupilha. O evento lembra a Semana Farroupilha, em que toda comunidade gaúcha das imediações do município de São Luiz se reúne para se confraternizar, tomando chimarrão, comendo churrasco tipicamente gaúcho, fazendo apresentações e se caracterizando de forma adequada: moças vestidas de prenda e homens de bombacha, lenço, guaiaca, chapéu, entre outros. - Festejo do Padroeiro do município: uma das primeiras manifestações culturais que ocorreu no município, porém no início a festa era feita para dois santos: Nossa Senhora de Aparecida e São Luiz, pois a santa tinha sido doada pelo prefeito da época, Ari Lunardi e a imagem de São Luiz pelo município. O objetivo da festa era arrecadação de doações para construção da primeira igreja católica. No entanto, acabou virando tradição e festejo, que depois passou a ser apenas para São Luiz. Em 2012, o prefeito James Moreira Batista decretou São Luiz como padroeiro do município, sendo feriado municipal a data de 25 de agosto. - Comunidade Indígena Wai-Wai: Os povos indígenas wai-wai residem às margens do Rio Anauá, sendo que a maior parte da comunidade fica dentro do município. Os povos indígenas habitam essa região há muitas décadas, bem antes dos primeiros moradores chegarem aqui na região onde hoje é o município de São Luiz, segundo informações do senhor Florentino, um dos pioneiros do município.

Panorama Cultural de Roraima

|

185


Porém, o tuxaua Luiz relatou que a primeira aldeia se localizava às margens do Rio Novo, afluente do Rio Anauá. No início da década de 1970, a maioria dos indígenas decidiu ir para o Amapá, mas não se adaptaram. Quando retornaram, decidiram se mudar para mais próximo da ‘civilização branca’, disse o tuxaua. Figura 4 - Comunidade Indígena Wai-Wai

Fonte: Os autores (2015).

Com a chegada dos primeiros moradores, houve a colonização da comunidade e os índios foram evangelizados por uma igreja cristã, a primeira religião existente no município de São Luiz. A Comunidade Wai-Wai, liderada pelo tuxaua Luiz de Souza, desde 2004, tem como principal renda a extração de castanha-do-pará, vendida a atravessadores e uma pequena parte vendida no comércio local. Conforme o tuxaua, essa extração ocorre entre os meses de maio e agosto. A principal fonte de alimentação é a farinha produzida por eles. Ao longo dos tempos, os índios foram perdendo sua cultura própria, como: crença, dança, rituais, vestimentas, e se adaptando à cultura dos evangelizadores. Hoje o que mais caracteriza o povo wai-wai é o artesanato produzido por sementes e cipós. Porém ele não tem nisso sua fonte de renda, segundo o Tuxaua “não existe um local apropriado para a exposição e pelo baixo valor pago nas peças”. Os festejos que existem dentro da Comunidade Wai-Wai são todos religiosos, um ocorre no mês de abril em alusão à Semana Santa e outro, em dezembro em relação ao nascimento de Cristo. O tuxaua disse “que nesse momento os mais antigos podem mostrar um pouco da sua cultura que está se perdendo para que os mais jovens não esqueçam a sua origem”. Crenças e Saberes - Dona Maria mora no município há 33 anos, veio do Mato Grosso acompanhando seu marido e se considera uma curandeira. Disse que, desde criança, ela gosta de plantas e Deus lhe deu o dom da cura por meio das plantas e que quando chegou, havia poucos médicos e as pessoas a procuravam para fazer garrafada de plantas e raízes dos mais variados tipos de tratamento, que tratam desde infertilidade a verminose. Devido a sua devoção pelas plantas, construiu uma igreja em sua propriedade, onde se reune com os demais membros da família para degustar 186

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


chás. Já Maria Ferreira, dona Zumira, quituteira, chegou ao município em 1982, junto com seu marido e filhos. 3.3 SITUAÇÕES DA POLÍTICA CULTURAL DE SÃO LUIZ DO ANAUÁ No município, não há políticas públicas voltadas para cultura. O órgão gestor só desenvolve atividades voltadas para eventos culturais municipais, contemplados no calendário cultural do município. Mesmo havendo várias atividades culturais desenvolvidas pelos cidadãos e associações, não há uma mobilização da sociedade civil para mudar o quadro atual. 3.3.1 Definição da política Cultural (PNC E SNC) Em dezembro de 2010, por meio da Lei n.o 12.343, estabeleceu-se o Plano Nacional de Cultura (PNC), cuja duração se estenderá até 2020 e que tem como objetivo orientar projetos e ações culturais de forma a garantir, valorizar e preservar a diversidade cultural existente no território Brasileiro. Sendo um Plano Nacional, visa congregar os Estados e os municípios em uma ação cooperativa, de forma a atingir seu objetivo. Com o intuito de sanar os principais desafios quanto à operacionalização de uma política pública cultural que primasse pela continuidade de suas ações, focando o maior envolvimento da Sociedade, bem como prover uma estrutura organizacional que subsidiasse recursos financeiros e humanos, na data de 30 de maio de 2012 na Câmara dos Deputados, regulamentou-se o Sistema Nacional de Cultura (SNC), por meio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 416-2005, conhecida como PEC da cultura. O SNC propõe a articulação entre União, Estado e Município, tendo como base em seus componentes, [...] órgãos gestores da cultura; constituição de conselhos de política cultural democráticos; realização de conferências com ampla participação de diversos segmentos culturais e sociais; elaboração de planos de cultura com participação da sociedade e já aprovados ou em processo de aprovação pelos legislativos; criação de sistemas de financiamento com fundos específicos para a cultura, de sistemas de informações e indicadores culturais; de programas de formação nos diversos campos da cultura e de sistemas setoriais, articulando várias áreas da gestão cultural (BRASIL, 2011, p. 14).

Os entes federativos devem firmar acordos de cooperação se comprometendo a trabalhar de forma conjunta para desenvolver os componentes que estruture o SNC. A meta de adesões ao SNC, até 2020, é de alcançar 60% dos municípios do país. 3.3.2 Estruturação da política cultural do município São Luiz A única ação em relação ao SNC, foi a assinatura de adesão ao sistema, feita pelo ex-prefeito James Moreira Batista (2012). Só recentemente foi autorizado pelo atual gestor a continuidade das ações para a implantação do Sistema Municipal de Cultura (SMC). Panorama Cultural de Roraima

|

187


a) Marcos regulatórios: Lei Orgânica do Município, na qual os artigos direcionados à cultura são os artigos 153, que diz que o município estimulará o desenvolvimento das ciências, artes, letras e culturas em geral. No inciso 4, do mesmo artigo, diz-se que ao município cabe proteger os documentos, obras e outros bens de valor históricos artístico cultural, monumentos, as passagens naturais notáveis, e os sítios arqueológicos. O artigo 163 diz que o município manterá no seu quadro de servidores um número de músicos necessários para a composição de uma banda musical; e o artigo 166 regula a composição, o funcionamento e as atribuições do Conselho Municipal de Cultura. Não existe lei do SMC, bem como lei de criação do órgão gestor de cultura. Nada foi encontrado nas leis municipais relacionado ao órgão gestor de cultura. Quanto à Lei de Criação da Biblioteca Pública, a Lei Municipal n.º 17/06, de autoria do vereador James Moreira Batista, autoriza criação da Biblioteca do Professor, visando à melhoria no aprendizado dos professores das redes municipais, estaduais e particulares do município de São Luiz. No entanto, segundo a secretária de educação municipal, professora Miriam Barbosa (informações verbais)1: [...] houve um erro na redação da lei, a biblioteca do professor já existe dentro das escolas e não se precisa de uma lei municipal para que seja criada e acredito que esse nome professor foi uma forma de homenagear a categoria dos professores, porém na hora de redigir a lei direcionaram para um público específico, mas que seria a biblioteca pública municipal. A lei pode ser modificada pela gestão atual, e que essa biblioteca começou a ser construída, porém como não estava dentro dos padrões de medidas do MEC, as obras foram paralisadas no final de 2012.

Porém, existe dentro do município um acervo bibliográfico que funciona atualmente no espaço que foi construído para Escola Municipal de Música. Quanto à Lei do Patrimônio, o município não possui uma lei específica nesse sentido. Do mesmo modo que não há lei de criação do conselho e portaria de nomeação dos conselheiros e suas respectivas representações. b) Órgão Gestor da Cultura A Secretaria de Educação é o órgão gestor municipal responsável pela cultura. Não existe no município ação para criação de um órgão gestor de cultura, o que há é uma negociação entre o gestor municipal e o diretor de cultura para dar andamento à implementação de uma secretaria de cultura. A equipe do órgão gestor hoje é formada por uma secretária de educação, um assistente administrativo, um auxiliar administrativo, coordenadores pedagógicos e um diretor de cultura. c) Institucionalização da participação social Em 2009, ocorreu a I Conferência de Cultura do município, na gestão do prefeito James Batista. Em 2013, houve a II Conferência na gestão do atual prefeito Edson Pereira Leite. Porém não há conselho de cultura no município e nem fórum de cultura, e até o momento não existe movimento dos segmentos culturais ou do órgão gestor da cultura no município para implantação. 188

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Entrevista concedida por Miriam Barbosa, em São LuizRR, em setembro de 2015. 1


d) Planos de Cultura As ações culturais presente no PPA do município são: realização do carnaval, eventos culturais, eventos cíveis e eventos tradicionais. Nem todas as ações estão sendo executadas. A prioridade são as ações tradicionais (vaquejada) e evento cultural (festa junina). O município fez somente a adesão e não deu continuidade até o momento ao Plano Municipal de Cultura. e) Sistema de Financiamento da Cultura O que existe dentro da lei orgânica voltada para a área da cultura são art.153, 166 e 163 dentro do município não existe lei de incentivo fiscal à cultura.

Devido à falta de conhecimentos, a maioria dos produtores culturais do município não participa da lei de incentivo fiscal do estado, ou da Lei Rouanet. O objetivo da criação do Fundo Municipal é incentivar à Cultura dentro do município e impulsionar as diversas atividades culturais que são realizadas na cidade, contemplando projetos de diversas áreas culturais.

f) Informações e indicadores culturais Não havia dados culturais arquivados nos órgãos públicos visitados durante o levantamento de dados para compor este trabalho. As informações e indicadores culturais foram encontrados em sites de buscas de informações na internet, mas com muita precariedade. O que dificulta bastante o acesso às informações culturais. Por isso, fezse um levantamento com cadastro dos artistas existentes nas diversas áreas culturais dentro do município de São Luiz. O mapeamento obteve as seguintes informações.

Fizemos ainda um levantamento de manifestações culturais dentro da unidade prisional de São Luiz, na qual ocorrem desde trabalhos artesanais, coral, grupo de teatro até curso profissionalizante.

Inaugurada em março de 1998, com capacidade para 24 reeducandos, sempre foi dirigida por diretores militares. Os detentos tinham pouco espaço para se expressarem, tendo somente o artesanato que era passado de um reeducando para outro, sem muito apoio. Em 2011, com a nomeação de novo diretor da cadeia pública, o advogado Alain Delon J.S. Correa, concursado no setor administrativo do governo de estado de Roraima, há 15 anos trabalha nas unidades prisionais, onde vivencia experiência positiva em relação à cultura dentro desse sistema.

Com o apoio de um reeducando chamado Mazon Ferreira Rodrigues, em 2012, deu início ao grupo de teatro e coral Shekinah. A primeira apresentação foi na Assembleia de Deus com a peça “O filho pródigo”, sendo a primeira vez que um grupo de detentos saiu de dentro da unidade prisional para fazer alguma manifestação cultural. Panorama Cultural de Roraima

|

189


Atualmente o grupo faz apresentações em várias localidades do município, como na vila Moderna, vicinais 26 e 22. Na sede do município, fizeram ações nas escolas estaduais, municipais abordando vários temas.

Dentro dos artesanatos produzidos na unidade prisional de São Luiz, estão: produção de redes, tarrafas, cestarias de papel, porta-retratos de palitos de picolé, areia colorida, cofres, com mesmo material, e bichinhos de sacolas plásticas.

No entanto, o diretor relatou a dificuldade de conseguir a matériaprima para fazer os artesanatos, pois não existe apoio do estado para os projetos realizados pelos reeducandos. Outro ponto é não ter um local adequado para exposição e vendas dos produtos feitos dentro da unidade.

Existe parceria com algumas instituições que fazem cursos profissionalizantes e já foram feitas horticultura, e de marceneiro. Com isso além de diminuir sua pena, o reeducando está realmente se ressocializando que é uma das funções do sistema prisional, acredita o diretor.

g) Ações culturais em parceria

A Secretaria de Assistência Social do município é a única parceira em relação à cultura, pois todas as atividades do CRAS trabalham com vários segmentos culturais dentro das oficinas desenvolvidas com os grupos de convivência. Dentre as escolas que trabalham a questão cultura, há a Escola Estadual Prof. Allan Kardec Dantas Haddad, que nesse ano iniciou um trabalho voltado para a área cultural, com introdução de aulas de músicas com instrumentos de cordas (violão).

O município de São Luiz tem um grande potencial cultural, possui vários segmentos culturais, tais como: música, dança, capoeira, teatro, artes plásticas, artesanato, audiovisual e artes visuais. Pontos de cultura: Associação Cultural de Difusão Comunitária de São Luiz (Projeto – Integração Cultural) e Grupo Folclórico Coração do Sertão (Projeto – Artes e Danças Folclóricas).

Manifestações culturais locais: vaquejada, festejo do padroeiro, semana farroupilha, festa junina e eventos evangélicos.

h) Acordo de Cooperação Federativa A adesão foi assinada e publicada no Diário da União, porém o município não enviou o plano de trabalho ao MinC até o momento. Foram abertas negociações com gestor municipal para que desse continuidade nesse processo de implantação do SNC.

190

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


i) Perspectivas da política cultural local

Apesar de várias manifestações emanadas da população, nota-se a dificuldade de se manter algumas ações. Além da falta de incentivo do poder público, existe a falta de conhecimento dos fazedores de cultura, e de como captar recursos por meio de editais, como também o mercado consumidor de produtos culturais é muito fraco, o que não traz subsídios para a subsistência de alguns artistas que necessitam comercializar seus produtos.

O que se tem, são os eventos municipais que se tornaram tradicionais e se realizam ações culturais, atraindo turistas e aquecendo a economia local.

Agora ao se concluir este trabalho de cadastro, com o mapeamento cultural, ter-se-á mais informações para se visualizar as facilidades, as dificuldades e o potencial que há no município. Esses dados serão entregues para o atual gestor, que já tomou a decisão de implantar o SMC, espera-se que com isso se possa formalizar políticas públicas que venham beneficiar o setor cultural. Assim mantêm-se os segmentos já existentes no município, de modo que possibilite o surgimento de novas manifestações, fortalecendo assim a cultura municipal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao fazer esse diagnóstico, perceberam-se a falta de registro e a dificuldade perante os órgãos públicos na obtenção de informações nos documentos oficiais dentro do município, e que muito se deve fazer para que a cultura no município de São Luiz contemple suas perspectivas cívicas, econômicas e também simbólicas. O poder público é um dos agentes fundamentais para que haja congregação da proposta de formação de um Conselho Municipal de Cultura, assim como para a articulação dos agentes culturais. Precisa-se agir e programar o que já está no papel, e registrar o que ainda não está. Para isso, é essencial haver parcerias, sejam com o estado, com a união e com a sociedade civil. Por meios das expressões artísticas, pode-se fazer transformações que libertem crianças e jovens da marginalidade. Por meio da cultura, pode-se resgatar idosos que muitas vezes se sentem improdutivos e ainda ressocializar aqueles que um dia cometeram atos contrários à lei, e também gerar renda e consolidar a identidade de um povo. Portanto, acredita-se que, por meio

Panorama Cultural de Roraima

|

191


desse trabalho, poder-se-á desenvolver mais ações que possam, no futuro, fomentar o setor de cultura no município, impulsionando e estimulando as pessoas e o poder público para um caminho inovador quanto à cultura.

REFERÊNCIAS BOBBIO, N. Política cultural. Torino: Einaurdi, 1977. BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ Constituicao/ Constituicao.htm>. Acesso em: 15 set. 2015. BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Lei n.º 7.009, de 1º de julho de 1982. Autoriza a criação de municípios no Território Federal de Roraima, e dá outras providências. Brasília-DF, 1982. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ ccivil_03/leis/1980-1988/L7009.htm>. Acesso em: 15 set. 2015. BRASIL. Ministério da Cultura. Conselho Nacional de Política Cultural. Secretaria de Articulação Institucional-SAI. Sistema Nacional de Cultura: Estruturação, Institucionalização e Implementação do Sistema Nacional de Cultura. Brasília-DF, 2011. Disponível em: <http://www.cultura.gov.br/ documents/10907/963783/livro11-602-para-aprovacao.pdf/d17c52f9-3a604196-af5c-a6655f028f3b>. Acesso em: 10 ago. 2015. FONSECA, M. C. L. O Patrimônio em processo: trajetória da política federal de preservação no Brasil. Rio de janeiro: UFRJ/Iphan, 1997. IBGE. Cidades: São Luiz. Brasília-DF, 2014. Disponível em: <http://www. cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=140060&search=rora ima|sao-luiz>. Acesso em: 15 set. 2015. RORAIMA. Secretaria de Estado do Planejamento e Desenvolvimento de Roraima - SEPLAN. Informações Socioeconômicas do Município de São Luiz do Anauá –RR 2010. Boa Vista-RR: CGEES, 2010. 64 p. Disponível em: <http://www.seplan.rr. gov.br/roraimaemnumeros/dados_municipios/SaoLuiz. pdf>. Acesso em: 10 ago. 2015. SÃO LUIZ (RR). Prefeitura Municipal. São Luiz. Disponível em: <http://www. saoluiz. rr.gov.br/prefeito.html>. Acesso em: 10 out. 2015.

192

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Fotografia: OmĂŠrio Lima


DIAGNÓSTICO SITUACIONAL DA CULTURA DO MUNICÍPIO DE UIRAMUTÃ/RR: abordagens e sistematizações iniciais Dayana Soares Araújoa, Lindinaia Pereira Melquiorb, Omério Cavalcante de Limac, Wagner da Silva Diasd

INTRODUÇÃO Por meio do Curso de Extensão em Gestão Cultural, realizado pela Universidade Federal de Roraima em parceria com o Ministério da Cultura (MinC), tivemos a oportunidade de realizar um diagnóstico inicial da cultura no município de Uiramutã. Neste artigo, apresentamos uma breve descrição histórico-geográfica, características da economia local, cultura e patrimônio histórico, natural, material e imaterial. Para tanto, realizamos entrevistas com autoridades locais, artesãos e pessoas que vivem há muito tempo na região, trazendo relatos importantes que contribuem para compreender a vida cotidiana no município. Além disso, consultamos documentos e visitamos diversos locais para compreendermos as potencialidades do município do ponto de vista da cultura e do patrimônio. Pudemos perceber que, apesar da diversidade cultural e patrimonial do município, a gestão da cultura por parte do governo municipal ainda precisa se estruturar, principalmente do ponto de vista das políticas públicas. Esperamos que este trabalho possa contribuir para a gestão cultural de Uiramutã, tendo em vista o que coletamos, observamos e percebemos. Apesar disso, reconhecemos que há um longo e gratificante caminho a percorrer para que as políticas públicas culturais do município aconteçam de forma a engrandecer a cultura local e sua população.

Professora da Universidade Federal de Roraima (UFRR), Mestranda em Sociedade e Fronteiras, e-mail: dayana. soares@ufrr.br a

Servidora da Prefeitura de Uiramutã, Licenciada em Pedagogia, e-mail: lindinaia@ hotmail.com b

1 BREVES APONTAMENTOS DA HISTÓRIA E DO PERFIL SOCIOECONÔMICO DO MUNICÍPIO O município de Uiramutã, antes denominado vila do Uiramutã, pertencia ao município de Normandia, sendo emancipado em 1995 (FREITAS, 2009). No mapa da divisão municipal de Roraima (FIGURA 1), localizamos o município no ponto mais setentrional do Brasil, nordeste do estado, local que compõe a tríplice fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana.

194

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Servidor da Prefeitura de Uiramutã, e-mail: omerio_ui@ hotmail.com c

Orientador do Curso de Extensão em Gestão CulturalUFRR/MinC, professor da Universidade Federal de Roraima, Mestre em Geografia, E-mail: wagner.dias@ufrr.br d


Boa Vista dista 330 km de Uiramutã, que possui 8.065,56 km2, dos quais aproximadamente 98% desta área pertencem à Terra Indígena Raposa-Serra do Sol (FIGURA 2). A porcentagem restante é formada pelo núcleo urbano uiramutense, “isolando-o” dentro da reserva. Figura 1 - Divisão municipal do estado de Roraima

Fonte: SILVA (2007, p. 166).

Figura 2 – Identificação das áreas indígenas do estado de Roraima

Fonte: SILVA (2007, p. 172).

Panorama Cultural de Roraima

|

195


Esta situação peculiar revela alguns dados interessantes quanto à demografia local, formada por 8.375 habitantes, segundo o IBGE (2011), sendo que a população urbana é de 1.138 habitantes e a rural é de 7.237 habitantes. Assim, considerando a elevada porcentagem da população rural e o contexto territorial marcado pela presença da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, não surpreende que 7.382 habitantes sejam identificados como indígenas (IBGE, 2011) aproximadamente 88% da população residente. A característica da população atual, sobretudo na classificação do IBGE por cor ou raça, nos remete à ocupação humana originária da região, muito antes da ocupação pelos europeus e da emancipação municipal. Uiramutã é considerado o município roraimense com a maior porcentagem de população indígena em relação ao total de habitantes. No município, esta população é subdividida em vários povos como Macuxi, Ingaricó, Patamona, Taurepang e Wapixana. Por volta de 1914, a Igreja Católica passou a realizar suas atividades religiosas com os povos. Desde então, percebemos a influência desses novos saberes e doutrinas presentes no local, visto que a maior parte da população professa esta religião. É justamente dos missionários católicos que temos os primeiros relatos que registram a população, as atividades econômicas e a chegada de outros imigrantes. As crônicas de viagens e os diários se tornaram fontes importantes para a compreensão do surgimento da vila, e depois município, em suas origens. Segundo Silva (2007), o garimpo é a primeira atividade econômica praticada por não indígenas a partir da década de 1920, com crescimento até o auge da atividade na localidade na década de 1940. O autor ressalva que “a atividade garimpeira não significa povoamento definitivo” (SILVA, 2007, p. 111), mas certamente temos os resquícios das primeiras aglomerações, como é exemplo a vila de Uiramutã, onde hoje é a sede do município. Após este impulso inicial, o estado de Roraima e seus municípios produtores de ouro, como é o caso de Uiramutã, passaram por mais dois períodos de intensa atividade garimpeira até o declínio final na década de 1990, quando diversos fatores convergem para desencorajar a prática em grande escala, como: maior fiscalização por parte da Polícia Federal e demarcação de terras indígenas. Outro fator de extrema relevância para o contexto histórico-social do município foi a chegada dos fazendeiros que se dedicaram à criação de gado bovino. Com isso, algumas famílias indígenas passaram a trabalhar para esses fazendeiros e, conforme o tempo foi passando, as terras indígenas foram sendo tomadas pelo gado. Houve épocas de grandes conflitos para que esses proprietários saíssem das terras e mais tarde deu-se início aos processos de demarcação das terras indígenas. Atualmente podemos observar que, mesmo com a saída dos fazendeiros do município, a população aprendeu a lidar com a criação de gado e hoje a carne bovina faz parte da culinária de Uiramutã. Um fato importante a ser exposto é o “memorial da aliança de amizade do marechal Cândido Rondon com os povos de Uiramutã”. Por volta de 1928, o marechal Rondon, que demarcava as fronteiras do Brasil com os países vizinhos, esteve em Uiramutã e deixou um sabre como memorial de aliança de amizade com o povo Macuxi. Atualmente este sabre está sobre a guarda de Dona Avelina Pereira, uma indígena macuxi nascida na Comunidade Maturuca, 196

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


mas residente na Comunidade Ticoça, fundada por seu esposo Lauro Melquior, em 1977. Durante uma entrevista aos autores, ela nos relatou algumas histórias que recorda de sua infância acerca do episódio (informações verbais)1. [...] Por volta de 1928, Tuxaua Amijor mandou o jovem Merequior ir com os padres pela Guiana para ir pra Manaus passar um ano pra aprender a cultura dos brancos. Aí os padres mandaram recado pra fazer pista grande pra pousar avião que ia trazer o exército e o chefe deles... Tuxaua Apá chamou os tuxauas e comunidades do Maracanã, Uiramutã, Pedra Branca e Lilás pra trabalhar e depois receber os brancos que iam chegar na comunidade. Em 1930, aí veio comitiva do marechal Cândido Rondon (dono da espada), os padres do Brasil e Merequior... os padres reuniram o povo cedo pra rezar missa, aí colocaram Merequior que tinha aprendido ser branco pra ser Tuxaua no lugar do tuxaua velho Apá Amijor. O Marechal falou pro povo e tirou sua roupa (farda), sapato e cinto e colocou no Merequior e deu a espada como símbolo de amizade com as comunidades indígenas da região. O Tuxaua vestia a farda nas reuniões e no domingo pra ir pra missa e visitar os parentes. O capataz Oscar vestia a roupa do Merequior na ausência dele. Já na velhice ele passou o cargo pro filho Lauro Melquior e pra simbolizar o ato repassou a espada do Marechal Rondon pra o mesmo e recomendou que este ato se repetisse toda vez que mudasse de tuxaua na comunidade. [...] o quartel já veio varias vezes aqui pra ver a espada e cantar hino do Brasil na comunidade. Daí vai ser repassada pro meu neto Milton Melquior, quando eu me for.

Devido à importância que é dada à espada guardada pela Dona Avelina, o Exército Brasileiro, por intermédio do 6º PEF/7º BIS2, realiza anualmente um evento cívico-militar, como cerimônia de repasse da espada, e parada militar. Finalizando esta seção, destacamos que as comunidades apresentam certa vocação para a pecuária bovina de corte, cuja criação é extensiva, prática herdada dos antigos fazendeiros. Além disso, as propriedades naturais e culturais do município podem vir a transformá-lo num expressivo polo turístico, representando sua principal potência econômica. Outra atividade que gera trabalho e renda é a produção e comercialização do artesanato, que será exposto adiante. O mercado local de Uiramutã é movimentado pelos recursos oriundos de benefícios sociais como o Programa Bolsa Família, Crédito Social, aposentados, pensionistas e salário maternidade rural, provento de salários de servidores federais, estaduais e municipais, e recursos oriundos da Guiana, pois toda a área de fronteira faz compra dos produtos da cesta básica em Uiramutã.

Entrevista concedida por Dona Avelina Pereira, no Uiramutã-RR, em setembro de 2015. 1

A agricultura sempre foi de subsistência, trabalhada de forma coletiva e familiar com o cultivo principalmente da mandioca, que é a base de alimentação, feijão, milho, cará, banana, batata e mamão. Além disso, diversos programas governamentais, ligados à produção e distribuição de alimentos impulsionam a produção local, gerando trabalho e renda para os moradores do município.

6º Pelotão Especial de Fronteira/7º Batalhão de Infantaria de Selva, instalado no município desde 2002. 2

Panorama Cultural de Roraima

|

197


2 METODOLOGIA O presente artigo se baseia em uma pesquisa qualitativa hermenêutica3 de caráter exploratório, que se utilizou de diferentes abordagens e técnicas, com análise documental de fontes primárias e secundárias, entrevistas semiestruturadas e estudo de campo, pois, de acordo com Flick (2004, p. 22), “a pesquisa qualitativa não se baseia em um conceito teórico e metodológico unificado”. Num primeiro momento, reconhecemos a importância de consultar os documentos oficiais, para a partir deles direcionar o nosso olhar. Aqui elencamos a legislação e outros documentos relevantes que tratam da cultura e das políticas culturais nas diversas esferas do poder público. Em seguida, vislumbramos a possibilidade de aprofundar certos conceitos por meio da bibliografia especializada. Interessou-nos particularmente definir as ideias de patrimônio cultural natural, material e imaterial e política pública de cultura. Além disso, procuramos entender questões específicas no âmbito da gestão, como a gestão cultural, o Sistema Nacional de Cultura (SNC) e os órgãos gestores da cultura. Num terceiro momento, planejamos dois estudos de campo ao município de Uiramutã. Neles, pudemos vivenciar minimamente o que é estar no município percorrendo e interagindo com a diversidade patrimonial. Entrevistamos moradores, visitamos locais considerados sagrados, avistamos construções e monumentos simbolicamente relevantes, comemos e bebemos da culinária local, entre outras vivências que tornaram possível compreender um pouco mais da importância deste artigo para pensarmos a gestão cultural do município. A fundamentação teórica deste artigo se encontra nas respectivas seções, de forma que poderemos dialogar os diversos assuntos abordados com os conceitos e categorias de análise nos locais adequados.

3 A CULTURA NO MUNICÍPIO Nesta sessão delinearemos a situação cultural do município no que toca a gestão e os órgãos de cultura. Além disso, apresentaremos os elementos culturais de acordo com o tipo de patrimônio que pudemos levantar em nossas entrevistas e atividades de pesquisa bibliográfica e estudos de campo. 3.1 ESTRUTURAÇÃO DA POLÍTICA CULTURAL NO MUNICÍPIO Hoje a gestão da cultura é feita pela Secretaria de Educação, Cultura e Desportos. O município ainda está na fase inicial da institucionalização e implementação do SMC. Não foram criadas as leis municipais, plano de trabalho e gestão específica de cultura, mas já estão em discussão projetos de lei para criação de todo o aparato dos órgãos municipais de cultura. Por enquanto, a cultura figura apenas na Lei Orgânica de Uiramutã, conforme o artigo 157 (UIRAMUTÃ, 1998, p. 34): DA CULTURA E DO PATRIMONIO HISTORICO E CULTURAL Art. 157 - O Município no exercício de sua competência:

198

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

“a perspectiva hermenêutica dá conta de que a experiência humana está atrelada ao contexto sociocultural e que é difícil conceber uma linguagem nas ciências sociais que exclua este contexto, quer seja pelos valores do pesquisador, quer pelos do grupo estudado” (GONDIM, 2002, p. 150). 3


I - apoiará as manifestações da cultura local; II - protegerá por todos os meios ao seu alcance obras, objetos, documentos e imóveis de valor histórico, artístico, cultural e paisagístico. Art. 158 - Ficam isentos do pagamento do imposto predial e territorial urbano os imóveis tombados pelo Município, em razão de suas características históricas, artística.

Como ações de cunho de valorização cultural baseadas em políticas públicas, podemos citar o ensino da língua materna dos povos indígenas locais na educação básica, tanto na rede municipal quanto na estadual. Além disso, são trabalhadas nas escolas as artes cênicas, artesanato e feiras culturais, que reivindicam as tradições dos povos originários da região. Para além da esfera governamental, as organizações indígenas trabalham e lutam em defesa da cultura local, a saber: a Organização dos Professores Indígenas de Roraima (OPIRR), que luta por uma educação diferenciada, respeitando valores locais (língua, arte, cultura, tradições, culinárias etc); o Conselho do Povo Indígena Ingaricó (COPING), que também defendem a mesma causa, contudo acrescentam os saberes, expressões e artesanatos, principalmente cestarias, como fonte de geração de renda; o Conselho Indígena de Roraima (CIRR), que é a maior organização dos direitos indígenas, e também vem incentivando e apoiando ações culturais no município; a Sociedade de Defesa dos Índios Unidos de Roraima (SODIURR), que também apoia ações culturais; a Associação do Fórum de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável de Uiramutã (AFDU), uma organização de interesse público que apoia ações voltadas para a educação, saúde, geração de renda, empreendedorismo, cultura e meio ambiente, cujo tema também é muito discutido no Fórum de Agricultura Familiar de Uiramutã. No município de Uiramutã, apesar da diversidade cultural, como a cultura nordestina e a trazida pela Igreja Católica, predominam as culturas indígenas, porém as políticas de incentivo ao desenvolvimento cultural ainda não estão efetivadas como políticas de governo municipal e a sociedade não tem o “valor cultural” como resgate de cidadania, inclusão social, fonte de renda e postos de trabalho. Por isso, apontamos a necessidade de paulatinamente sensibilizar, incentivar, criar, organizar e implementar as políticas da cultura. 3.2 IDENTIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS CULTURAIS QUE CARACTERIZAM O MUNICÍPIO4 Partimos da definição da Constituição Federal de 1988, no art. 216: “Constitui patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira [...]” (BRASIL, 1988). 4

Nossa pretensão nesta seção é expor o patrimônio de Uiramutã identificado em nosso estudo de campo. A identificação deste patrimônio deuse principalmente através do contato com os moradores e dos percursos que realizamos no município. O principal critério neste levantamento foi a percepção daquilo que a população identificava como parte de seu patrimônio. Este sentimento de pertencimento está presente nos diversos elementos culturais apontados abaixo e sem dúvida enriqueceu nosso trabalho, tornando-o mais fidedigno com o que se espera deste diagnóstico.

Panorama Cultural de Roraima

|

199


3.2.1 Patrimônio cultural natural Uiramutã está situado no extremo norte de Roraima, cujas paisagens da chamada terra de Macunaima possuem beleza cênica surpreendente. Esta singularidade cênica possui enorme potencial turístico, principalmente pelas serras e cachoeiras, com piscinas naturais possibilitando a prática de turismo ecológico. O município se localiza no planalto das Guianas, região de serras onde há muitos desníveis. Os rios e igarapés formam muitas cachoeiras e corredeiras. As mais acessíveis e visitadas são as cachoeiras do Banho do Paiuá, Sete Quedas, Urucá e Rebenque. As formações geomorfológicas que despertam mais interesse são: o Monte Caburaí, ponto mais setentrional do Brasil, localizado onde se encontra a nascente do rio Uailã; a Serra do Sol, com 2.370m de altura, e o Monte Roraima, com 2.875m. Todas ficam dentro do Parque Nacional do Monte Roraima, onde vive o povo Ingaricó. 3.2.2 Patrimônio cultural material Por patrimônio cultural material reconhecido pela população, temos a Biblioteca Pública Municipal, Ginásio Poliesportivo, Praça Pública, Igrejas e Malocas Indígenas. A biblioteca é mais frequentada pelos alunos e professores das escolas. Esta também é aberta para a população e possui espaços para pesquisas e realização de projetos. No momento, existe o projeto infantil denominado de “Cantinho da Leitura” e “Cantinho dos Números”. Como o futebol é muito praticado por toda comunidade, o ginásio é bastante frequentado e também utilizado para a realização dos eventos locais. Em outros momentos, a Praça Mariano Rufino foi mais frequentada, quando, por exemplo, havia a feira de produtos agrícolas, mas atualmente a feira não acontece mais. Apropriando-nos de Teixeira, Pozzi e Silva (2012, p. 17), “o patrimônio cultural de um povo é formado pelo conjunto de saberes fazeres, expressões, práticas e seus produtos, que remetem à história, a memória e a identidade desse povo”. Assim, todo patrimônio brasileiro faz parte da história da construção da sociedade e transmite para as gerações futuras o conhecimento do passado da humanidade, fortalecendo a identidade de um determinado grupo social através de simbologias de valor cultural. O catolicismo, como citamos acima, “foi introduzido em 1913 por missionários beneditinos”, conforme Freitas (2009, p. 120), o qual é predominante no município e na Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Destacamos a Igreja Sagrado Coração de Jesus na Comunidade Maturuca, como templo central de todas as Igrejas, mas também há em outros locais, como as localizadas em Willimon, Makuquem, Pedra Branca etc. Há também evangelização por parte das Igrejas Evangélicas Assembleia de Deus de Roraima, Assembleia de Deus de Madureira, Assembleia de Deus de Minas Gerais, Adventistas do Sétimo Dia, Testemunhas de Jeová, Mundial do Poder de Deus e Igreja Missionária Indígena. Construções indígenas também são consideradas patrimônios culturais, pois as paredes são feitas de madeira e cipó revestido com barro, e a cobertura 200

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


é de madeira com palha de Buriti, que ainda é muito comum o uso dessas moradias nas comunidades. Dentro da questão territorial indígena, há o Monumento do Memorial da Homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol5 na Comunidade Maturuca (FIGURA 3), feito pelos artistas plásticos Bartô e Máximus, em 2007. Segundo Dionito José de Souza6, 48 anos, residente em Maturuca desde sua infância, ex-coordenador geral do Conselho Indígena de Roraima (CIRR) no período de 2007 a março de 2011, o monumento “foi um presente para os tuxauas relembrarem a luta e o sofrimento das comunidades”. Figura 3 - Memorial da homologação da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol.

Fonte: Omério Lima (2015).

3.2.2.1 Sítios Arqueológicos em Uiramutã: urnas funerárias e sítios cerimoniais

Em 11 de dezembro de 1998, o Ministro da Justiça, Renan Calheiros, assina a Portaria 820/98, que declara a Terra Indígena Raposa Serra do Sol – TIRSS posse permanente dos povos indígenas, em área contínua. Em 18 de abril de 2005, foi revogada a Portaria 820/98 pela Portaria 534/05 em que o Presidente da Republica Luiz Inácio Lula da Silva assina e homologa a demarcação pelo Decreto de 15 de abril de 2005. 5

A expressão Rue’ penaron é conhecida na língua macuxi como lugar antigo e muito respeitado pelos detentores dos conhecimentos tradicionais onde são encontrados vestígios ancestrais. Vale ressaltar que esses lugares sagrados não são de livre acesso para qualquer pessoa da comunidade, pois eles podem ser também espaços que no passado aconteceram guerras entre povos diferentes, ou lugares de antigos aldeamentos, visto que se encontram vestígios humanos de interesse arqueológico e vestígios de cerâmicas, cestarias e utensílios de caça, elementos identitários de um determinado grupo que ocupou esse espaço. A importância do sítio arqueológico de urna funerária (FIGURA 4) para os indígenas não é apenas a quantidade de materiais que podem ser encontrados, nem o estado de conservação dos objetos identificados, mas o valor e significado que eles assumem para os grupos indígenas, como uma continuidade simbólica no processo de ocupação da terra (MARQUES, 2009).

Entrevista concedida aos autores no município de Uiramutã, em setembro de 2015. 6

Panorama Cultural de Roraima

|

201


Figura 4 - Urna funerária

Fonte: Dayana Soares (2015).

Adotando a definição de Martins (2008, p. 72), “sítio arqueológico é o local onde são encontrados os vestígios de ocupações antigas”. Sendo assim, o município é vasto em sítios arqueológicos de cemitérios indígenas, pinturas e desenhos rupestres. Destacamos as urnas funerárias indicando a forma de sepultamento pelos indígenas antes da chegada dos missionários beneditinos. Era escolhido um local, como caverna ou pedras inclinadas, e colocavam seus parentes dentro de urnas de cerâmica onde o sol nem a chuva pudessem deteriorar por completo os cadáveres. Existem várias pinturas e gravuras rupestres que, por vezes, podiam indicar um local de caça, localização de endereço etc. Há também lugares considerados sagrados pelos nativos, como Chefe do Rato, Chefe do Veado, Chefe do Catitu na serra do Pacará, Chefe da Cutia e outros locais que não podem ser visitados sem autorização, pois exige um ritual de purificação para chegar a esses locais. Encerramos esta parte do nosso trabalho, ao mesmo tempo em que foi o ponto de partida para nossas argumentações nesta seção, com as definições da Lei n.o 3.924/1961 (BRASIL, 1961): a) As jazidas de qualquer natureza, origem ou finalidade, que representem testemunho da cultura dos paleoameríndios do Brasil, tais como sambaquis, monte artificial ou tesos poços sepulcrais, jazigos, aterrados, estearias e quaisquer outras não especificadas aqui, mas de significados idênticos a juízo da autoridade competente. b) Os sítios nos quais se encontra vestígios positivos de ocupação pelos paleoameríndios tais como grutas, lapas e abrigo sob a rocha; c) Os sítios identificados como cemitérios sepulturas ou locais de pouso prolongados ou de aldeamento, ”estações” e “cerâmico”, nos quais se encontra vestígios humanos de interesse arqueológicos ou paleoetnográfico. d) As inscrições rupestres ou locais de suco de polimentos de utensílios e outros vestígios de atividades de paleoameríndios.

202

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Assim, ressaltamos que deve haver um grande esforço para identificar e catalogar estes sítios, para que eles sejam reconhecidos oficialmente como patrimônio e recebam a devida preocupação na preservação e respeito às comunidades locais. 3.2.3 Patrimônio cultural imaterial Dialogando com o texto oficial da Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial7, de 2003, concordamos que esta tipologia de patrimônio é a mais complexa em termos de reconhecimento e preservação, pois está em constante transformação e é recriado de geração em geração. No art. 2º do texto da Convenção supracitada, afirma-se que o patrimônio cultural imaterial se manifesta nos seguintes campos: a) tradições e expressões orais, incluindo o idioma como veículo do patrimônio cultural imaterial; b) expressões artísticas; c) práticas sociais, rituais e atos festivos; d) conhecimentos e práticas relacionados à natureza e ao universo; e) técnicas artesanais tradicionais (UNESCO, 2003).

Assim, os órgãos de gestão cultural e do patrimônio devem empenharse em várias estratégias de salvaguarda do patrimônio cultural imaterial a partir de seus respectivos contextos. Dentre as possibilidades de salvaguarda deste patrimônio, citamos: realização de inventários, elaboração de políticas de reconhecimento e preservação/conservação, fortalecimento de instituições voltadas ao tema, educação e conscientização, garantia da participação das comunidades, grupos e indivíduos. 3.2.3.1 Artesanato Com os recursos naturais da região, existe a produção do artesanato, que abrange uma variedade de artefatos e objetos (FIGURA 5). Como matériaprima tem a fibra da palha do buriti, cipós de arumã, titica e jacitara, utilizados para a confecção de cestarias, vestimentas, utensílios domésticos decorativos, biojoias, adereços para danças etc. Figura 5 - Artesanato dos povos indígenas de Uiramutã

Documento produzido a partir da 32ª Sessão da Conferência Geral das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), em 2003. 7

Fonte: Dayana Soares (2015). Panorama Cultural de Roraima

|

203


Existem também sementes usadas majoritariamente para fazer colares, pulseiras e brincos. A madeira serve para fazer utensílios de cozinha, como, por exemplo, colher de pau, remo, canoas, bandejas etc. A argila é usada para a fabricação de cerâmica, como panelas de barro, pratos, potes etc. Além disso, existem pinturas usadas nas cestarias, cerâmicas e no corpo. Cada povo tem sua forma de produção, contudo, devido ao contato entre os povos indígenas e não indígenas, muitos hábitos passaram por transformações tanto na estética visual, quanto na maneira de produzir. O povo ingaricó é formado por exímios artesãos, que possui no trançado um dos elementos mais expressivos de sua cultura. Belíssimos cestos de cipó titica e fibra de arumã, com uma variedade de trançados, são confeccionados pelos homens e têm múltiplas funções. Além das combinações de cores, formas e tamanhos valorizarem as peças, o material é enriquecido ainda mais quando lhes são agregados elementos de matizes iconográficos. Há também o primoroso chapéu de cipó, um tipo tradicional de sandália pïta pi’pï, colares mo’mo e bolsas pakara, taimé. Os dois últimos artefatos podem ser confeccionados pelas mulheres, mas sua produção costuma ser de peças de tamanho bem pequeno. Parece haver entre os ingaricó a noção de que os grandes artesãos são homens, e assim cabe às mulheres um papel secundário nessa atividade. 3.2.3.2 Tradições A medicina tradicional ainda é muito utilizada para tratamento de úlceras, sarnas, dores musculares, inflamações. Além destas, há pajés e curandeiros, que ainda seguem suas tradições e rituais, exemplificados mais adiante. As danças também estão presentes entre os povos, nas quais se destacam a parixara, tucui e ximidim. Na entrevista realizada com Quésia Pereira da Silva, da Maloca do Uiramutã, tivemos o relato de que esses três termos são usados para dançar e cantar durante eventos que ocorrem nas comunidades. Cada etnia tem seu cântico e sua dança e as melodias são diferentes. Durante as entrevistas, foi-nos explicado como ocorre entre o povo macuxi. O tucui é cantado e dançado para receber o parixara. Então, quando há uma comunidade que vai fazer festa, dança o tucui e usa vestimentas e adereços típicos dessa dança. Assim, o parixara também possui suas vestimentas e adereços, sendo que a fibra da palha do buriti é muito utilizada com adereços de semente e pena. No caso da parixara, a letra da melodia quer dizer “a minha bonita saia de palha balança, traz bebida pra eu beber”. O ximidim tradicionalmente era usado no Natal e em festividades religiosas dentro da comunidade, como no Sábado de Aleluia, por exemplo. Cada dança tem uma pintura corporal diferente. Quésia Silva, (informações verbais)8, relembra que na época em que era criança, todos da comunidade dançavam, principalmente os mais velhos e adultos. Com a entrada dos não índios em Uiramutã algumas falas, do tipo “essas danças de vocês é feia”, foram intimidando os índios e, aos poucos, apenas os mais antigos sabiam dançar e cantar. Percebendo que havia o risco de acabar com essa tradição Quesia, que também é professora, iniciou uma ação com toda comunidade para não deixar que isso ocorresse. Devido 204

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Entrevista concedida por Quesia Silva, que é professora e ministra aulas de língua Macuxi, em Uiramutã-RR, em setembro de 2015. 8


à inclusão da educação escolar indígena nas comunidades indígenas de Roraima, a inserção de atividades que trabalham as questões culturais dos povos tradicionais foi facilitada. Assim foi possível mobilizar professores e alunos para ensinar tucui, parixara e ximidim. Atualmente, a maioria dos jovens sabe participar dançando e cantando junto com os mais antigos nos eventos que acontecem na comunidade. Outro fator discutido foi a diferença entre o pajé e curandeiro. Quesia Silva nos disse que o pajé recebe um tipo de entidade e que essa entidade é capaz de detectar o problema do enfermo. Para isso o pajé faz uso de algumas plantas, fumo e rituais, realizando assim uma espécie de cirurgia espiritual. Nesse momento, Lindinaia Melquior, que também participava da roda de conversa, lembrou e relatou uma experiência que teve com um pajé da comunidade (informações verbais)9: [...] [meu filho] chorava demais e cresceu o umbigo, ficou grande né, maior que um botão mesmo, assim, ficou grande aí já tavam encaminhando ele pra fazer cirurgia em Boa vista, aí quando o Pajé passou lá em casa de tardezinha viu ele chorando demais, mas chorava muito, aí ele perguntou porque ele tava chorando, aí eu mostrei o umbigo, que ele tava chorando, tava sangrando, aí ele pegou e disse assim, minha filha é, minha filha, compra o cigarro quando for a noite eu vou vir aqui. Aí tudo bem. E nisso já tava sendo encaminhado pra ir pro médico em Boa Vista fazer cirurgia. Aí eu comprei. Eu pedi pro meu esposo comprar o cigarro, comprou e quando foi a noite ele foi lá. Aí eu presenciei né, ele fazendo todo o ritual dele né, incorporando outro espírito no corpo... quando ele fumou e entrou outro espírito né, aí era acho que tipo um venezuelano falando, aí ele falou, ele disse tipo ‘nossa né, você e seu filho quase morriam né’ e eu também, eu quase morria no parto, o meu filho também, aí ele disse, vou fazer cirurgia, aí ele pegou e vi ele fazendo assim com o dedinho né, fez, aí rapidinho ele pediu uma tesoura não sei de quem lá, por que eu não via mais ninguém lá né, só mesmo espírito né, aí ele pegou e disse assim, não vai ser mais preciso você levar seu filho pra Boa Vista, só não deixa ele chorar, não deixa. E uma semana né, em três dias vai tá bem melhor, mas durante uma semana, vai sumir, vai voltar ao normal o umbigo do seu filho. Tudo bem né, enquanto os médicos estavam preparando a remoção, a viagem, realmente, eu não deixei ele chorar, quando tava com três dias não sangrava mais e em uma semana sumiu [...].

Nesta roda de conversa, pudemos entender melhor como é feita uma pajelança, ilustrando alguns processos e rituais empregados, corroborando aquilo que nos explicava a entrevistada. Ainda conforme a entrevistada, o curandeiro atua de forma diferente. Este trabalha mais com as plantas medicinais, chás, rezas e banhos. Uma das plantas muito utilizadas é o pião roxo, em que o curandeiro vai fazendo a reza no enfermo e sacudindo o pião roxo. Depois disso, ele pode recomendar que um chá de uma determinada erva ou planta seja bebido para que o indivíduo melhore. Lindinaia Melquior, uma das autoras deste trabalho, concedeu este depoimento voluntariamente durante a entrevista com a professora Quesia Silva. 9

Panorama Cultural de Roraima

|

205


3.2.3.3 Culinária Muito da cultura dos povos indígenas do município se manifesta com muita força na culinária local. A damurida (caldo de carnes diversas, com folhas de caruru e pimenta) é o mais comum na culinária local, faz parte do cotidiano do povo indígena e pode ser consumida com beiju e farinha d´agua. A tanajura (formiga saúva fêmea) é também um aperitivo muito apreciado pelo povo local, tanto pelo sabor como pela as propriedades medicinais. Este pode ser consumido cru, assado, frito e também na damurida. Uma curiosidade é que, nos dias que as saúvas voam, todas as escolas no município liberam os alunos para pegar o inseto. Há um projeto de lei na Câmara dos Vereadores para instituir feriado municipal nos três dias em que os insetos aparecem.

Cono’repa (soldado de cupim) é consumido como fonte de alimentação, consumido cru com molho de pimenta. Por suas propriedades medicinais combate gripe, pneumonia, asma. Pode-se também fazer dele uma pasta e passar em úlceras e outras inflamações externas. Manivara (cupim fêmea) também é um aperitivo e, como a saúva, é consumida no início do período das chuvas. Muchiua (larva de besouro) é consumido assado e é encontrado em tronco da palmeira de buriti. A rã é consumida assada e na damurida. Lagartas de maniva e mutamba são consumidas assadas e na damurida. Todas essas iguarias fazem parte do cardápio local. Há também o tacacá, feito de peixe com amido de mandioca, e o beiju de mandioca, que não podem faltar nas refeições. Nesta seção ainda, é preciso destacar outro aspecto da cultura culinária local: as bebidas. O caxiri é uma bebida de mandioca brava, que depois de ralada é cozida e colocado em recipiente para fermentar (mandioca com batata, milho, cará, abobora, macaxeira). Pajuaru é outra bebida típica local, bastante consumida na região, também é feita de mandioca. Primeiro é feito o beiju que é “deitado” na folha de maniva ou banana para levedar. Ganha liga consistente, depois é misturado com água e colocado em recipiente para fermentar. Após esse processo, está pronto para o consumo. O sumo de pajuaru ou “whisky do indígena” é um licor concentrado que é aparentemente doce, mas possui um pouco de amargo. Ele tem a fama de deixar quem o consome com três dias de ressaca. Tanik (batata roxa com caldo e cana) e mocororó (caldo de caju) também são bebidas facilmente encontradas nas comunidades do município.

3.3 EVENTOS CULTURAIS NO MUNICÍPIO DE UIRAMUTÃ As festas e datas comemorativas demonstram o predomínio das tradições dos povos indígenas, porém há diversas comemorações inspiradas em outras culturas, como a festa junina, sobretudo trazidas por imigrantes, além das datas de certos feriados nacionais, como ocorre em 7 de Setembro. Na TABELA 1, apresentamos diversos eventos que compilamos, os quais fazem parte do calendário festivo da população.

206

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Tabela 1 - Compilação de datas comemorativas e festejos do município de Uiramutã

Fonte: Baseado em dados de UIRAMUTÃ (1998).

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Após investigarmos o município, podemos afirmar que há muito que considerar em termos culturais, porém também há muito que fazer na construção de uma gestão cultural no município. Esta constatação não pressupõe uma crítica à gestão como um todo, pois, durante a execução deste trabalho, pudemos perceber que diversas iniciativas têm sido tomadas para implantar os órgãos fundamentais da política de cultura municipal. Assim, o “muito que fazer” não indica a inoperância, mas sim o reconhecimento que, apesar das iniciativas atuais, o caminho para a plena cidadania cultural no município demandará tempo e trabalho árduo dos diversos atores envolvidos. Pudemos vivenciar a história desta população encravada na arquitetura, nos monumentos e nas histórias orais. Visitamos diversas localidades reconhecidas por todos como patrimônio cultural natural, cujas paisagens derivam de uma geomorfologia privilegiada que, ao longo das centenas e milhares de anos, pode ser estruturada e moldada para o resultado que temos hoje. Da mesma forma que o patrimônio natural envolve o município, o patrimônio cultural material e imaterial permeia todo o cotidiano dos povos

Panorama Cultural de Roraima

|

207


residentes ali. Tal fato não nos causa estranheza, tendo em vista a localização do município e sua configuração étnica e demográfica. Podemos concluir ressaltando as potencialidades culturais intrínsecas do local, moldadas ao longo da história. Não podemos afirmar que é necessário “valorizar” a cultura local, porque sabemos que a população se reconhece nas tradições, nos locais sagrados, nas paisagens. Então, julgamos que necessária é a valorização do ponto de vista dos incentivos e do fomento à cultura local, cuja realização por parte do poder público municipal é o que desejamos.

REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988 (com as emendas). BRASIL. Lei n.º 3.924, de 26 julho de 1961. Dispõe sobre monumentos arqueológicos e pré-históricos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/1950-1969/L3924.htm>. Acesso em: 4 jan. 2016. FLICK, U. Uma introdução à pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Bookman, 2004. FREITAS, A. Geografia e História de Roraima. Boa Vista: IAF, 2009. GONDIM, S. M. G. Grupos focais como técnica de investigação qualitativa: desafios metodológicos. Paidéia, Ribeirão Preto, v.12, n. 24, p.149-161, set./ dez. 2002. IBGE. Censo Demográfico 2010: Características da população e dos domicílios: resultados do universo. Rio de Janeiro: IBGE, 2011. MARQUES, A. C. N. Territórios de Memória e Territorialidades de Vitória dos Potiguara da Aldeia Três Rios. 2009. 217 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2009. MARTINS, D. C. Patrimônio Arqueológico. In: BARRETO, Euder et al. (Org.). Patrimônio Cultural e educação: artigos e resultados. Goiânia: Editora da UFG, 2008. SILVA, P. R. F. Dinâmica territorial urbana em Roraima – Brasil. 2007. 327 f. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007. TEIXEIRA, L.; POZZI, A.; SILVA, J. L. (Org.). Patrimônio arqueológico e paleontológico de Alagoas. Maceió: IPHAN-AL, 2012. UIRAMUTÃ(RR). Lei Orgânica do Município de Uiramutã. Uiramutã: Câmara de Vereadores, 1998. CONVENÇÃO PARA A SALVA GUARDA DO PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL, 2003, Paris. Anais...Paris: UNESCO, 2003. 17 p. Disponível em: <http:// unesdoc.unesco.org/images/0013/001325/132540por.pdf>. Acesso em: 2 mar. 2016. 208

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


Fotografia: Lucio Jesus


DIAGNÓSTICO DA GESTÃO CULTURAL DO GOVERNO DO ESTADO DE RORAIMA Jenniffer Santiago do Nascimentoa, Soraya Souza da Silvab, Claudia Helena Campos Nascimentoc

INTRODUÇÃO Roraima é um estado da Região Norte do Brasil, sua história está fortemente ligada ao Rio Branco, tendo seu ponto culminante o Monte Roraima e sendo cortado pela Linha do Equador. Boa Vista é a única capital brasileira ao norte da Linha do Equador, e nela se encontra a sede do Governo Estadual e vários outros órgãos estaduais, ainda herança do período em que o estado foi Território Federal (RORAIMA, 2014). A presença federal também se faz firme por sua condição de tríplice fronteira com a República Bolivariana da Venezuela e com República da Guiana (antiga Guiana Inglesa). Possui ainda fronteiras com os estados do Pará e Amazonas. A economia do estado de Roraima está diretamente ligada às atividades nos setores de prestação de serviços, mineração, indústria e agroindústria, pois sua base produtiva está na agricultura, pecuária e extrativismo animal, vegetal e mineral. Neste contexto econômico, Roraima possui o menor Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, sendo a unidade de federação que menos produz riquezas. Assim, como boa parte dos estados amazônicos, Roraima é formado por uma combinação dos três elementos que ajudaram a criar a identidade da região: o índio, o europeu e o mestiço de origem nordestina. Os índios são responsáveis por uma herança imaginária repleta de lendas e crenças, de artes, de danças, artesanatos, de rica cultura. A forte contribuição dos migrantes nordestinos também influencia no caldeirão cultural roraimense, a partir de práticas culinárias, sociabilidades e da música (NASCIMENTO; FREITAS; FARIAS, 2014). A influência europeia vem da contribuição histórica advinda dos primeiros colonizadores e, indiretamente, a partir das fronteiras, ampliando modos de viver. Sendo assim, a complexidade destas influências culturais culmina na necessidade de novas políticas públicas empregadas no âmbito cultural com o intuito de alcançarmos estratégias que viabilizem nosso avanço enquanto gestores, artistas, servidores, enfim, enquanto sociedade que promove e programa a gestão da cultura. Desta forma, o presente trabalho busca descrever 210

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

Servidora da Secretaria de Cultura do Estado de Roraima, Acadêmica do Curso de Administração, e-mail: jenniffersn@hotmail.com a

Servidora da Secretaria de Cultura do Estado de Roraima, Especialista em Ginástica Rítmica, e-mail:sorayrasouza50@gmail. com b

Orientadora do Trabalho de Conclusão do Curso de Extensão em Gestão Cultural - UFRR/MinC, professora da Universidade Federal de Roraima, Mestre em Arquitetura e Urbanismo, e-mail:claudia.nascimento@ ufrr.br c


os instrumentos legais de gestão cultural de Roraima, com ênfase no diagnóstico das ações culturais do Estado, equipamentos e ações. Essas informações irão servir de base para todos que pretendam atuar na área de gestão cultural ou desejem de fato conhecer legalmente como funciona um pouco dessa trajetória cultural até os dias atuais. O presente artigo data da transição dos anos 20152016, no qual podemos vislumbrar um cenário dinâmico na transição das políticas públicas, tanto na esfera estadual quanto federal. Além da complexidade de elementos da gênese desse contexto, há também uma multiplicidade de expressões de forte presença. A música roraimense cada vez mais diversificada, do erudito ao popular, numa mistura de ritmos, em que a composição dos artistas aflora conforme sua identidade cultural; a dança e o teatro são manifestações que vêm crescendo bastante em Roraima, assim como as manifestações folclóricas – folguedos amazônicos de inspiração indígena, grupos de dança do boi e quadrilhas de São João e Cangaceiros – marcam nossa trajetória histórico-artística, tendo na época de festas juninas mais de 20 (vinte) grupos de quadrilhas que disputam o prêmio de melhor festa e animação. Em oposição a esse quadro, existem segmentos culturais que compõem o conjunto de setoriais do Conselho Nacional de Políticas Culturais (CNPC) que não possuem mínima expressão ou espaço institucionalizado na política pública estadual, tais como arquivos ou arquitetura e urbanismo. Assim sendo, a contribuição desse trabalho visa apresentar o estado da arte na política cultural, como subsídio para seu desenvolvimento local. Assim sendo, o presente trabalho busca contribuir efetivamente para o fortalecimento da política pública de cultura, inserindo o estado de Roraima no conjunto de condicionantes que permitam a efetiva inserção no Sistema Nacional de Cultura (SNC), gerido pelo Ministério da Cultura (MinC). Para isso, este trabalho se divide sucintamente em diagnóstico dos instrumentos legais, das ações culturais do estado de Roraima, de seus espaços e agentes, condicionantes para o perfeito desenvolvimento e fruição das ações da política pública federal, que possui a estrutura estadual como agente fundamental na mediação entre o ente federativo e as municipalidades.

1 AVALIAÇÃO DOS INSTRUMENTOS LEGAIS DE GESTÃO CULTURAL A presente seção visa apresentar os instrumentos legais de gestão cultural dentro da estrutura do Governo do Estado de Roraima, no que tange à cultura. Para tal, foram levantados instrumentos jurídicos, a fim de compreender a gênese de sua criação, para que possamos entender e analisar os caminhos para uma estrutura de gestão cultural em sintonia com o MinC e com os entes municipais de Roraima. Portanto, além de apontar os instrumentos jurídicos, esse capítulo buscou conhecer das estruturas que possuem a missão de ações no campo da cultura, quer por sua competência, quer de forma associada, com o objetivo de caracterizar o cenário da gestão da política cultural no estado de Roraima, visando dar subsídios para a compreensão pelos demais agentes culturais, estruturas públicas e institucionais, que necessitem dessa vinculação. O Panorama Cultural de Roraima

|

211


entendimento é o de que a política estadual deve agir em sintonia com aquela desenvolvida pelo MinC, para todas as modalidades referente às setoriais. Neste sentido, surge um momento oportuno, em que diversas iniciativas de setores públicos e privados articulam esforços para construir um conjunto de indicadores confiáveis sobre a cultura no estado de Roraima. 1.1 DA ESTRUTURA ADMINISTRATIVA DA GESTÃO DE CULTURA A gestão cultural no estado de Roraima é atribuição exercida pela Secretaria de Estado de Cultura de Roraima (SECULT/RR), criada pela Lei n.º 890 de 23 de janeiro de 2013 (RORAIMA, 2013), contando com exígua estrutura funcional1 (RORAIMA, 2005). A estrutura organizacional básica anterior à criação da Secretaria de Cultura do Estado de Roraima era vinculada à Secretaria de Educação, Cultura e Desporto (SECD), e tinha por função planejar estrategicamente ações que contemplassem tanto a educação, quanto a cultura e o desporto. Verificou-se a pouca visibilidade do segmento cultural em campos de gestão, o que vêm para reorganizar a Estrutura do Estado, destacando e evidenciando o segmento da educação, nesse contexto. É claro que, não desmerecendo a importância da educação, o Estado passa a ansiar também por uma estrutura capaz de tratar de assuntos voltados para os interesses políticoculturais que se articulassem diretamente com o SNC, fortalecendo assim a evolução do processo de gestão e promoção da cultura no estado como um todo; aumentando a representatividade na Região Norte junto ao MinC; contribuindo consideravelmente com a execução de programas, projetos, metas culturais que fomentassem atividades artísticas e culturais em todas as modalidades; produzindo cultura e preservando a memória, o patrimônio pré-histórico e histórico, artístico e cultural, quer imaterial ou material, do Estado de Roraima. Neste ambiente, surge a SECULT/RR que, por ser uma Secretaria recente, com apenas dois anos de criação, e ainda em processo de adaptação à nova gestão governamental, vem se reorganizando internamente para melhor atender às demandas da sociedade civil e dos artistas. Assim sendo, analisando a sua estrutura organizacional, pode-se indicar: Secretaria de Estado da Cultura; Secretaria Adjunta de Estado da Cultura; Gabinete; Assessoria; Unidade Gestora de Atividades Meio (UGAM); Departamento de Promoção Cultural; Departamento de Biblioteca Pública; Departamento de Patrimônio Cultural; Conselho Estadual de Cultura e Grupo Técnico de Avaliação de Projetos. 1.2 DA ESTRUTURA JURÍDICA DA GESTÃO DE CULTURA O levantamento dos instrumentos jurídicos de gestão cultural do estado de Roraima permite a compreensão do contexto legal, a partir da Constituição Estadual e leis específicas que detalham a estrutura administrativa da SECULT/ RR e das estruturas públicas que aportam a gestão da política cultural. Quando se apresentou o estudo, julgou-se importante iniciar com a Lei n.º 890 de 23 de janeiro de 2013 que cria a SECULT/RR que, de acordo com o Art. 2º, diz: 212

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

No fim de 2015, período da pesquisa para esse artigo, foi computado um total de 153 funcionários, sendo 49 (quarenta e nove) efetivos, 62 (sessenta e dois) comissionados e 42 (quarenta e dois) servidores federais, segundo dados da própria SECULT/RR. 1


A Secretaria de Estado da Cultura tem como funções institucionais a promoção e desenvolvimento de políticas públicas e governamentais para a cultura do Estado de Roraima, fortalecendo a cadeia produtiva da cultura, valorizando a produção simbólica, a plena acessibilidade ao cidadão, transparência democrática, permitindo o acesso e a fruição aos bens culturais, como ação estratégica de desenvolvimento humano, social e econômico do Estado de Roraima, visando à promoção e bem estar da qualidade de vida e da cidadania (RORAIMA, 2013).

Por sua recente criação, a SECULT/RR ainda se encontra em fase de estruturação, tendo a nova gestão governamental buscado consolidar algumas práticas, que garantam uma gestão qualitativa e participativa dos mediadores de cultura de Roraima como, por exemplo, a Minuta de Projeto de Lei do Sistema Estadual de Cultura (SEC), que se encontra na Assembleia Legislativa para apreciação e votação dos deputados. Contudo, sabe-se da importância deste documento para os demais elementos constitutivos do SEC destinado para se articular e integrar ao SNC, resultando em uma gestão integrada de políticas públicas culturais que fomentarão e complementarão a gestão cultural do estado de Roraima. Entende-se que a SECULT/RR é um dos principais elementos constitutivos que irá efetivamente coordenar e implantar o SEC e, como instrumento para essa gestão, foi elaborado o Plano Estadual de Cultura pela SECULT/RR, o qual pode ser revisado conforme a realização de conferências estaduais de cultura, visto que este instrumento organiza, regula e norteia a execução da política estadual de cultura na perspectiva do SEC para será implementado por 10 anos, como previsto no Plano. 1.1.1 Da política de incentivo à cultura Um dos elementos primordiais para o desenvolvimento de uma política de cultura integradora com as premissas do MinC é o Fundo de Cultura, que, em conjunto com o Plano e o Conselho de Cultura, compõe o tripé básico para o desenvolvimento da gestão vertical da política cultural. O Fundo Estadual da Cultura (FUNCULTURA) é a ferramenta que tem por função viabilizar o financiamento das políticas públicas de cultura de Roraima. Vinculado à SECULT/RR, como fundo de natureza contábil e financeira, possui prazo indeterminado de duração, de acordo com as regras definidas nesta Lei n.º 983 de 26 de novembro de 2014. De acordo com o Art. 2º, o FUNCULTURA é: um mecanismo de financiamento das políticas públicas de cultura no Estado de Roraima, com recursos destinados a programas, projetos e ações culturais implementados de forma descentralizada, em regime de colaboração e cofinanciamento com a União e com os municípios do estado de Roraima, transferidos fundo a fundo, de acordo com critérios, valores e parâmetros pactuados e aprovados pelo Conselho Nacional de Política Cultural (CNPC) e pelo Conselho Estadual de Cultura de Roraima (CEC/RR) (RORAIMA, 2014).

Panorama Cultural de Roraima

|

213


É necessário mencionar a Lei de Incentivo à Cultura do Governo de Roraima que contempla realizações de projetos artístico-culturais com recursos oriundos da Lei n.º 318, de 31 de dezembro de 2001, regulamentada pelo Decreto n.º 5.024-E, de 21 de outubro de 2002, que, de acordo com o Art. 1º, instituiu o incentivo fiscal no âmbito estadual, para o apoio a projetos culturais a contribuintes (pessoas físicas e jurídicas) de Roraima (RORAIMA, 2001). Para tanto, a SECULT/RR dissemina informações e conhecimentos por meio do Grupo Técnico de Avaliação de Projetos (GTAP) para contribuir com a sociedade, em especial as classes artística e empresarial, podendo estes usufruir melhor desta importante política de estado, denominada Lei de Incentivo à Cultura. O funcionamento desta Lei se assemelha ao da Lei do Mecenato, Lei Federal n.º 8.313/1991, também conhecida como Lei Rouanet. Segundo a Constituição Federal de 1988, é dever do Estado garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais, o acesso a fontes de incentivo a valorização e a difusão das manifestações da cultura nacional (BRASIL, 1988). Portanto, um passo importante para viabilizar esses direitos foi a criação das leis de incentivo à cultura que já é uma realidade em praticamente todos estados brasileiros e em muitos municípios. Em Roraima, a Lei Estadual n.º 318/2001 foi o primeiro passo, visando exercer essa função na gestão cultural, incentivando a inserção do processo produtivo da cultura no desenvolvimento da economia local. Essa lei permite que 0,3% de todo o dinheiro arrecadado com o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) seja destinado à realização de projetos artísticos culturais. É importante destacar que esta lei deve ser tratada como instrumento complementar, que dinamiza e impulsiona o fazer cultural, ao envolver o incentivo econômico ao processo inerente ao conjunto da sociedade, das organizações não governamentais e à prática plena da cidadania. Neste formato, os projetos, além de serem avaliados pelo GTAP, também o são quanto ao mérito cultural do CEC/RR, e devem estar enquadrados corretamente em uma das áreas previstas na Lei de Incentivo à Cultura. Neste sentido, o GTAP é formado por nove membros titulares e nove suplentes que representam em igual proporção a SECULT/RR, a sociedade civil e o CEC. O GTAP desenvolve suas atividades mediante regimento próprio e é um órgão independente e autônomo que têm como competência maior analisar e aprovar (ou não) projetos culturais, conforme a Lei n.º 318/2001(RORAIMA, 2001). O CEC/RR, criado pela Constituição do Estado de Roraima no seu Art. 161, tendo sido regulamentado pela Lei n.º 55, de 9 de dezembro de 1993, é: um órgão colegiado de deliberação coletivo vinculado à Secretaria de Estado da Cultura. É um órgão superior de assessoramento a outras entidades de âmbito consultivo, normativo, fiscalizador e deliberativo na orientação das atividades culturais do Estado, composto de 11 (onze) membros efetivos para mandato de 04 (quatro) anos (RORAIMA, 1993).

Alguns enfoques específicos exigem legislação específica, como é o caso específico do patrimônio cultural, que se insere no escopo jurídico por intermédio da Lei n.º 718 de 6 de julho de 2009 que trata da preservação e proteção do patrimônio cultural do estado de Roraima. 214

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


O processo de gestão cultural do estado de Roraima tem sido dinâmico. Desta forma, há também a atenção quanto aos equipamentos culturais que, por sua vez, gerou a criação da Minuta de Projeto de Lei de Utilização de Bens Públicos Culturais administrados pela SECULT/RR, que encontra-se em fase de apreciação pelas instâncias devidas, visando ordenar as ações culturais, quanto à regulamentação de utilização de bens públicos estaduais, por particulares, para realização de eventos culturais, sociais, econômicos e desportivos, definindo assim regras para utilização desses espaços físicos e equipamentos. O Relatório de Gestão da SECULT/RR, de novembro de 2014 dá os subsídios do Marco Legal da Cultura em Roraima (SILVA, 2014): • Lei n.º 055, de 09 de dezembro de 1993 (Conselho Estadual de Cultura); • Lei Estadual n.º 318, de 31 de dezembro de 2001 (Incentivo à Cultura); • Decreto n.º 5.024, de 21 de outubro de 2002; • Lei n.º 890, de 23 de janeiro de 2013 (Criação da Secretaria de Estado da Cultura); • Lei n.º 718, de 6 de julho de 2009 (Preservação e Proteção do Patrimônio Cultural do Estado de Roraima), regulamentada em 22 de outubro de 2015; • Lei n.º 983, de 26 de novembro de 2014 (Fundo Estadual da Cultura – FUNCULTURA), regulamentada em 22 de outubro de 2015; e • Minuta de Projeto de Lei do Sistema Estadual de Cultura (em trâmite na Assembleia Legislativa). Desta forma, identificou-se que a exceção das legislações específicas para o patrimônio cultural e de incentivo, e os demais instrumentos visam instrumentalizar a política cultural roraimense de forma ampla e genérica.

2 DIAGNÓSTICO DAS AÇÕES CULTURAIS DO ESTADO DE RORAIMA Visando compreender o cenário de atuação das ações culturais do Governo do Estado de Roraima, foi necessário desenvolver um diagnóstico, a fim de apontar um prognóstico real e condizente com as condições orçamentárias do estado para apoio e incentivo da cultura. O Relatório de Atividades do GTAP, de 2014, foi elaborado a partir de várias fontes, como informações da Secretaria de Cultura do Estado de Roraima, do Ministério da Cultura, do Conselho Estadual de Cultura de Roraima, do Grupo Técnico de Elaboração e Projetos da SECULT/RR, as quais foram revisitadas para elaboração do atual diagnóstico. Entendendo que a gestão cultural passa por dois momentos – o primeiro sob a óptica do Mecenato e outro sob a égide do SNC – somente a partir da efetiva criação da SECULT/RR, em 2013, pela Lei n.º 890, que se iniciaram o desenvolvimento e a implantação das políticas públicas deste segmento, balizadas pelas diretrizes do SNC, o que permitiu a compreensão da necessidade de implementação de uma política pública para a cultura, efetivamente.

Panorama Cultural de Roraima

|

215


A SECULT/RR foi criada com o objetivo de promover e desenvolver a cultura, bem como o patrimônio cultural, e todas as manifestações culturais do estado, incentivando à pesquisa, à formação de grupos organizados, à captação de recursos, à qualificação, ao intercâmbio e à divulgação cultural. Essa complexa missão institucional, contudo, ainda é frágil. Conforme a metodologia e a diretriz do MinC, a SECULT/RR vem desenvolvendo ações para se alinhar em curto prazo de tempo ao SNC. Apresentam-se algumas informações e considerações sobre o contexto cultural roraimense, buscando caracterizar sua complexidade no que se refere à gestão estadual, apresentando referências da identidade cultural do povo de Roraima. 2.1 ELEMENTOS E PARTICULARIDADES DA CULTURA DE RORAIMA O estado de Roraima é formado por povos das mais diversas regiões, mas principalmente por tribos indígenas compostas por várias etnias. Grande extensão territorial é composta por terras indígenas, os quais também contribuíram em vários aspectos, com sua presença nas nossas cidades. A contribuição humana tem sido importante fator de integração, visto que o estado de Roraima é composto por vários perfis culturais, que contribuíram com o mosaico cultural que há nos dias atuais, e com a construção histórica local, sendo marcadores das várias etapas do desenvolvimento roraimense. Dentre as várias etnias, há os índios yanomami, os macuxi que são a maioria no estado, os taurepang, os ingarikó, os wai-wai, os patamona, os wapixana, os waimiri-atroari e os yekuana (mayongong). Destes, somente os Yekuana, vivem exclusivamente na terra indígena Yanomami. A população indígena do Estado de Roraima conta com cerca de 50.000 indivíduos (IBGE, 2012). A partir da década de 1940, o incremento da indústria do garimpo também veio contribuir fortemente para nossa cultura, especialmente de diamantes na Serra do Tepequém, atual município de Amajari. Provocou grande migração, especialmente da região Nordeste e do estado do Pará. Desta forma, a cultura em Roraima, que era composta por grande contribuição das tradições indígenas, com essa migração em grande escala de outros brasileiros de diversos pontos do país, especialmente nordestinos do Maranhão e, também, de outros povos de diversos países, especialmente os que fazem fronteira com o estado de Roraima, foi fortemente influenciada. As tradições e os costumes foram gradativamente sendo alterados, pela religião, pela culinária, pelas danças e músicas (NASCIMENTO; FREITAS; FARIAS, 2014). Com a chegada de nordestinos e outros brasileiros à região, a cultura roraimense foi se mesclando. A tradição menos modificada pela migração e miscigenação dos povos foi o artesanato indígena, que se tornou um traço de resistência. A cultura roraimense é, portanto, básica e predominantemente indígena e nordestina. No entanto, núcleos culturais diversificados podem ser identificados a partir de linguagens artísticas e espaços culturais, como a forte tradição gaúcha, a existência de eventos religiosos, como o Círio de Nazaré; 216

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


além de uma inserção de qualidade em algumas linguagens, como a Música Popular Brasileira (MPB), rock nacional, produções audiovisuais, entre outros. A maior concentração dessa diversidade está nas atividades relacionadas à música. Há também iniciativas individuais e coletivas, refletindo em outras linguagens, como, por exemplo, a dança. Nesse complexo de contribuições, a cultura de Roraima apresenta características bem peculiares, visto que foi formada pela migração de vários povos, em vários momentos, contribuindo de maneira pujante para crescimento populacional do estado. Atualmente o fortalecimento institucional de Roraima tem sido foco de atração que contribui com o processo. 2.2 CONFIGURAÇÃO DOS AGENTES CULTURAIS Conforme Relatório de Atividades do GTAP (SILVA, 2014), atualizando o censo realizado pelo SEBRAE/RR de 2009, no Estado de Roraima existem cerca de 530 indivíduos ligados à cultura, sendo esse contingente composto de 40% de artistas como músicos, compositores, artistas plásticos, ou seja, aqueles conhecidos como independentes. Existem também os membros de grupos que desenvolvem algumas atividades em coletivos de produção cultural e grupos, que representam 45%. Dentro dessa composição, há ainda os representantes e os responsáveis por entidades culturais e que, na sua maioria, correspondem aos próprios fundadores, dos citados grupos artísticos representando 15%. 2.3 ESPAÇOS PARA CULTURA EM RORAIMA Considerando que o Estado de Roraima é um estado jovem, 27 anos de criação, observou-se a existência de vários equipamentos culturais não administrados pela SECULT/RR, e se pode arriscar que não surpreende tal condição, visto que o estado está em crescente miscigenação populacional, com consequente reflexo cultural. Os equipamentos classificados como bom e ótimo são de propriedade privada ou de outro poder público que não o estadual. Esta condição impede o acesso amplo à cultura por diversas questões, quer sejam monetárias, quer sejam políticas. Isso indica que a vida cultural da população não é legitimada por aqueles que administram esses bens culturais. Quanto ao estado de conservação, alguns espaços apresentam boa estrutura para atendimento às demandas culturais, devido a intervenções recentes de reformas, como no Anfiteatro do Parque Anauá e no Palácio da Cultura Nenê Maccagi, com destaque aos espaços da biblioteca e videoteca. Quanto às ações culturais desenvolvidas, existe carência de ação no segmento de arquivos, artes visuais, museus (devido ao fechamento do Museu Integrado de Roraima/MIRR), além da interdição de vários espaços que se encontram ociosos, como o Teatro Carlos Gomes, além do desconhecimento das ações que são desenvolvidas atualmente em alguns pontos de cultura.

Panorama Cultural de Roraima

|

217


2.4 ESTRUTURAS FÍSICAS DA SECULT/RR A partir de dados coletados na SECULT/RR (RORAIMA, 2015) e de levantamento de campo, foi possível construir uma matriz de análise das estruturas físicas capazes de atender, mesmo que parcialmente, as demandas dos segmentos culturais, sob a égide do Estado. A principal estrutura é, sem dúvida, o Palácio de Cultura Nenê Maccagi, que foi inaugurado em agosto de 1998. É um centro cultural localizado no Centro Cívico de Boa Vista, que abriga a realização de shows musicais, teatro, dança e outras diversas manifestações artísticas. Em seu conjunto arquitetônico, há uma praça localizada no estacionamento do prédio onde existe um coreto utilizado para realização de sarau e afins, denominada Praça Dagmar Vieira Ramalho. No Palácio da Cultura, funcionam as dependências administrativas da SECULT/RR e do Conselho Estadual de Cultura, além da videoteca Francisco Aragão e da biblioteca Delta do Carmo Gouvêa Coelho, além do auditório José Celestino da Luz com 500 lugares. O projeto arquitetônico do prédio, de linhas contemporâneas, foi idealizado com a preocupação do domínio da luz solar, sendo utilizados vidros espelhados em sua fachada e uma grande pirâmide em vidro na cobertura. A Videoteca Francisco Aragão tem capacidade de 80 lugares. Lá também se realizam diversas manifestações culturais e é aberta também ao público para realização de encontros, conferências e reuniões. Atualmente, a Biblioteca Pública Delta do Carmo Gouvêa Coelho conta com um acervo de 32.440 livros e internet gratuita aos usuários. Há um trabalho de divulgação deste espaço junto às escolas da capital, para que todos os alunos da rede estadual e municipal possam usufruir deste acervo. Outro espaço importante para a estrutura cultural do estado de Roraima é o Parque Anauá, onde existem o Anfiteatro Luiz Celestino da Luz, a Galeria de Arte Luiz Canará, ambos revitalizados em 2015, a Escola de Música de Roraima e outras estruturas. O Anfiteatro Luiz Celestino da Luz estava em total abandono e, após esta revitalização, já se encontra em condições de utilização pela sociedade roraimense. A Galeria de Arte Luiz Canará, que funciona no térreo do Anfiteatro, teve sua infraestrutura recuperada recentemente para poder receber exposições de artistas regionais e nacionais das mais variadas áreas. O Auditório da Escola Música de Roraima tem capacidade de 200 lugares e, atualmente, é utilizado de forma precária para apresentações dos estudantes da própria escola. No centro comercial de Boa Vista, há o Teatro Carlos Gomes e a Casa da Cultura, ambos desativados e necessitando de obras. O Teatro Carlos Gomes, inaugurado em 1945, se encontra fechado ao público desde 2011 e possui projeto de reforma previsto para 2016 que permitirá à população poderá com mais esse espaço para atividades culturais. A Casa de Cultura Madre Leotávia Zoller foi construído em 1940 em estilo Art Decó e serviu como primeira residência oficial do governador do estado de Roraima, funcionando como sede do governo até a construção do Palácio Senador Hélio Campos. É tombado como patrimônio cultural do estado desde 1994 porém, há muitos anos, encontra-se em total abandono, sendo utilizado informalmente por usuários de drogas e moradores de rua. A SECULT/RR já iniciou o processo de reforma e restauração do prédio, com abertura de licitação a partir de projeto preliminar. Porém, somente em 2016, iniciar-se-á os trabalhos devido à legalidade e a transparência exigida. 218

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


3 ALINHAMENTO LEGAL AO SNC O MinC estabelece como meta que todos os estados e municípios se comprometam a desenvolver e construir espaços culturais, como também zelar pela manutenção desses locais. Os equipamentos culturais pertencentes à SECULT/RR, embora não sejam suficientes para dar suporte às demandas dos vários segmentos preconizados pela política cultural, têm sido objeto de atenção, pois estão em processo de ajustes, recuperação, reforma, ou manutenção. É o caso do Anfiteatro, da Galeria de Artes, do Auditório José Celestino da Luz nas dependências do Palácio de Cultura, da Casa de Cultura Madre Leotávia Zoller, e limpeza externa do Teatro Carlos Gomes. O Governo do Estado de Roraima possui equipamentos auxiliares que tendem a oferecer serviços culturais, mas não estão sob a gestão da SECULT/ RR. Em médio prazo, é necessário transferir esses equipamentos para a SECULT/RR para que possa ser formatado um planejamento de gestão, dando ênfase à cultura e aos segmentos culturais. A Diocese de Roraima, a Prefeitura de Boa Vista e a iniciativa privada são mantenedoras e possuidoras de estruturas culturais e com frequente utilização, oferecendo junto ao Governo do Estado de Roraima, o que o MinC preconiza. A legislação exigida do estado pelo MinC já se encontra em consonância em quase sua totalidade, restando apenas os trâmites finais da lei que regulamenta o SEC que se encontra tramitando na Assembleia Legislativa de Roraima. 3.1 AVALIAÇÃO DOS ESPAÇOS PARA A CULTURA PARA A GESTÃO ESTADUAL Conforme se pode aferir, os espaços que compõem a estrutura da SECULT/ RR se apresentam em condições regulares de funcionamento, destacando-se que alguns equipamentos já foram reformados ou revitalizados no ano de 2015, momento em que a atual gestão estadual encontrou um orçamento mínimo para o efetivo gerenciamento dos equipamentos culturais da estrutura estadual. O que impossibilitou o uso e a conservação frequente e suficiente para garantir o desenvolvimento das ações culturais no estado de Roraima. O MinC oferece parcerias com o estado contribuindo com os pontos de cultura, com o objetivo de ampliar o desempenho cultural. Esta parceria entre MinC, Estado e pontos de cultura, é positiva para aproximar a cultura do povo. A existência de outros espaços não pertencentes à estrutura da SECULT/ RR favorece ao desenvolvimento de atividades culturais da iniciativa privada, porém a grande massa populacional não consegue ter acesso. Assim sendo há necessidade de implementação de ações continuadas que vêm sendo oportunizadas a partir da criação da SECULT/RR. São elas: • Sensibilização e realização de oficinas para elaboração do Calendário Cultural nos 15 municípios de Roraima; • Oficina de sensibilização para elaboração dos planos municipais de cultura; Panorama Cultural de Roraima

|

219


• Curso para gestores municipais com a UFRR; • 60 cursos pactuados e realizados pelo PRONATEC; • Projetos avaliados pela Lei de Incentivo à Cultura; • Reforma e revitalização do Anfiteatro; • Reforma e revitalização da Galeria de Arte; • Reforma do Palácio da Cultura Nenê Macaggi: telhado e auditório; • Realização do Arraial Macuxi em 2015; • Realização do I Concurso de Sanfoneiros em 2015; e • Apoio à Encenação da Paixão de Cristo em Mucajaí em 2015.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Com a criação da Secretaria de Estado da Cultura, ampliaram-se as ações em prol da cultura no estado de Roraima. No entanto, para se promover, fomentar e implementar essas manifestações culturais, tornou-se necessário um investimento contínuo para não haver risco de não ser assumido compromisso com os mediadores e produtores culturais, mesmo em eventuais mudanças de governo. A nova gestão governamental apresenta hoje inúmeras iniciativas, como: repasse de verbas para os pontos de cultura do estado; sensibilização e realização de oficinas para elaboração do Calendário Cultural e elaboração de Projetos Culturais para a Lei de Incentivo à Cultura n.º 318/2001, sendo 55 projetos culturais inscritos neste ano de 2015,nos 15 municípios; curso para gestores municipais com a Universidade Federal de Roraima (UFRR); reforma e revitalização do Anfiteatro, da Galeria de Arte, do Palácio da Cultura Nenê Macaggi e de seu auditório e coreto; realização do Arraial Macuxi; repasse de verbas para as quadrilhas juninas de 2015; apoio à Encenação da Paixão de Cristo de 2015, em Mucajaí; apoio ao I Concurso de Sanfoneiros em 2015; dentre outras ações que vêm sendo desenvolvidas. Consequentemente, mesmo sendo uma nova equipe de trabalho, esta vem se organizando para supervisão e coordenação de atividades relativas à cultura. Daí o Governo do Estado, por meio da SECULT, assume concretizar tarefas técnico-políticas voltadas para discutir, definir e explicitar publicamente as instâncias legalmente constituídas no âmbito federal e estadual a respeito das políticas públicas aplicadas para fusão entre o desenvolvimento cultural, quantitativo e qualitativo. O objetivo é ampliar substancialmente o arcabouço cultural, intelectual e festivo do nosso Estado, no sentido de pertencimento e de capacidade de se aprimorar, produzir, criar e trocar experiências culturais, atendendo assim a demanda social por meio de ações transparentes, como direito à cultura e a cidadania. A necessidade de parâmetros para a tomada de decisões justifica uma reflexão neste sentido, pois, na medida em que os instrumentos criados por meio de leis, decretos, projetos, dentre outros planejamentos e metas para a Evolução Política e Econômica da Cultura Roraimense vêm assumindo, um caráter de revitalização não somente material, como também imaterial, cujos efeitos parecem ser percebidos pela população 220

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)


em geral, especialmente, os artistas e os empreendedores culturais, passando a usufruir de equipamentos culturais de uma gestão democrática que visa ao acesso a estes espaços para se dar continuidade ao exercício do fazer cultura com respeito, dignidade e liberdade de um povo. Este trabalho constitui um meio imprescindível e um ponto de partida como marco teórico necessário para ações constitutivas das políticas públicas e avanço da cultura do estado de Roraima.

REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5 de Outubro de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988. IBGE. Indígenas. 2012. Disponível em: <http://www.indigenas.ibge.gov.br>. Acesso em: 10 dez. 2015. NASCIMENTO, C. H. C. ; FREITAS, P. R. C. ; FARIAS, M. C. Traços culturais da paisagem de Boa Vista/RR: o bairro Asa Branca e a contribuição da migração nordestina da década de 1980. In: COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO: Desafios e Perspectivas, 3., 2014, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: IEDS, 2014. RORAIMA. Constituição do Estado de Roraima. Boa Vista/RR, Assembleia Legislativa do Estado de Roraima, 1991. Disponível em: <http://www.al.rr.leg. br/leis>. Acesso em: 15 maio 2015. RORAIMA. Lei n.º 055, de 09 de dezembro de 1993: Constitui o Conselho Estadual de Cultura de Roraima e dá outras providências. Boa Vista/RR, 1993. Disponível em: <http://www.al.rr.leg.br/leis>. Acesso em: 20 maio 2015. RORAIMA. Lei n.º 318, de 31 de dezembro de 2001: Disciplina sobre a concessão de incentivos fiscais de estímulo à realização de projetos culturais no Estado de Roraima. Boa Vista, 2001. Disponível em: <http://www.al.rr.leg. br/leis/>. Acesso em: 20 maio 2015. RORAIMA. Lei n.º 499, de 19 de julho de 2005: Dispõe sobre a reorganização administrativa do Estado de Roraima e dá outras providências. Boa Vista/RR, 2005. Disponível em: <http://www.al.rr.leg.br/leis/>. Acesso em: 11 maio 2015. RORAIMA. Lei n.º 718, de 6 de julho de 2009: Dispõe sobre a Preservação e Proteção do Patrimônio Cultural do Estado de Roraima. Boa Vista/RR, 2009. Disponível em: <http://www.al.rr.leg.br/leis>. Acesso em: 20 maio 2015. RORAIMA. Lei n.º 890, de 23 de janeiro de 2013: Dispõe sobre a criação da Secretaria de Estado da Cultura (SECULT); altera dispositivos da Lei n.º 055, de 09 de dezembro de 1993; altera dispositivo da Lei n.º 318, de 31 de dezembro de 2001; altera e acrescenta dispositivos na Lei n.º 499, de 19 de julho de 2005; altera dispositivo da Lei n.º 622, de 20 de dezembro de 2007, e dá outras providências. Boa Vista, 2013. Disponível em: <http://www.al.rr.leg.br/leis/>. Acesso em: 19 maio 2015. Panorama Cultural de Roraima

|

221


RORAIMA. Lei n.º 983, de 26 de novembro de 2014. Dispõe sobre a criação do Fundo Estadual da Cultura - FUNCULTURA, instrumento de financiamento das políticas públicas de cultura de Roraima, de natureza contábil especial e dá outras providências. Boa Vista-RR, 2014. Disponível em: <http://www.al.rr. leg.br/leis/>. Acesso em: 18 maio 2015. RORAIMA. Secretaria de Cultura. Relatório circunstanciado da estrutura física e dos bens permanentes da Secretaria de Cultura. Boa Vista, 2015. 121 f. Relatório digitalizado. RORAIMA. Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento. Divisão de Estudos e Pesquisas. Informações Socioeconômicas do Município de Boa Vista. Boa Vista, 2014. SILVA, Jonayna Rodrigues da. Relatório de atividades do GTAP/SECULT. Boa Vista/RR, 2014. 34 f. Digitalizado.

222

| UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)



Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.