Marciaszeliga

Page 1

MĂĄrcia SzĂŠliga arrossel dos sonhos

1


2


Márcia Széliga arrossel dos sonhos

Curitiba Espheris Edições 2014

1


D

edico este livro à minha grande família da árvore genealógica e à minha família espiritual, aos meus pais, aos meus filhos – fontes de inspiração –, aos meus amores, aos meus mestres e mestras dos muitos caminhos, aos meus colegas de todas as escolas, aos meus amigos do coração e também ao meu Amigo Invisível. Aos meus animais de estimação, às crianças do mundo inteiro, aos amantes de literatura infantil de todas as idades e aos meus companheiros de profissão – ilustradores, escritores e editores. Aos meus pupilos. Aos musos modelos vivos e aos músicos que me inspiram. A toda equipe de produção, em especial Monica Drummond, mensageira da cultura, Mauro Giller, com seu olhar por trás do melhor “click”, Guilherme Zamoner, mago cirurgião das imagens, Michele Mueller, doula de meu texto e Maxigráfica, em seu trabalho de parto. Aos que apoiaram o bater das asas desse pássaro-livro, acreditando em seu voo. Aos meus cuidadores, ao meu Anjo da Guarda, aos índios Kanamari, à Natureza e seus elementos sagrados, aos Elementais Divinos, aos Seres de Luz, aos Grandes Magos do Universo. E também a você que está lendo. Essa obra é para você. É para o mundo. Escrever é estar em oração; desenhar é estar em meditação. Márcia Széliga

2


MĂĄrcia SzĂŠliga arrossel dos sonhos

3


A

irreal realidade de Márcia Széliga

O que um sonho precisa É de alguém que lhe acredite E que nele deposite A fé que lhe concretiza Pois quem vestiu a camisa Do sonho que à noite deu Contra as trevas respondeu Com força e sabedoria; Quem no sonho não confia Faz da vergonha o apogeu. (...) Seu Ribeiro Poeta, músico, compositor, violonista e luthier, Belo Horizonte (MG) Maio de 2010

4


P

P

orque este livro fala de um Carrossel... Carrosséis giram numa melodia circular. Giram como giram os planetas no próprio eixo e em torno do Sol, e como as galáxias no Universo. Giram como uma criança dançando. E giram como os devaneios... Sim, aqueles que possuem o sabor mágico das coisas descobertas pela primeira vez, vistas através dos olhos e coração puro de uma criança e das coisas inexplicáveis que só a sabedoria de um espírito velho pode alcançar. É desse Carrossel que gira numa realidade irreal – ou ao contrário – que vou contar, em metáfora e poesia, sobre um jeito de nunca parar de brincar... E de sonhar. Quando brincamos num Carrossel, tudo gira como se caminhássemos em um velho disco vinil a 33,5 RPM que insistimos em colocar na mesma faixa, naquela velha vitrola valvulada, e dançamos um delicioso Sonho de Valsa. Somos o eixo orquestrando cada brinquedo de nós mesmos, vendo a vida acontecer em volta e de volta, em cada cena criada ou reinventada. Revisitar nossos Carrosséis do Passado não é tarefa das mais fáceis. É rever o filme de muitos anos numa sentada e como foi sendo conduzido, ao que muitas vezes pareceu, por uma Mão Invisível. Revirando baús escondidos, abrem-se portas que há muito foram encerradas. Assopramos então o pó acumulado de nossas mobílias interiores de meio século. Encontramos até o que nem lembrávamos mais ter sido feito algum dia. E vemos, quando possível, o rumo que cada registro tomou na vida, e o que ganhou em significado e valor na vida de outras pessoas. É quando a criação fala por si só e cria pernas que vão deixando pegadas por onde passa, abrindo novos caminhos, habitando outros lugares. Nesses novos ambientes que a criação passa a habitar, muitas pessoas são curiosas em saber o que levou o criador a expressar sua criação que tanto toca. Vou contar então sobre o chamado da Alma e os caminhos percorridos como um instrumento da Arte para dela ser mensageira em expressão e linguagem. Vamos agora passear nesse Carrossel e por ele se deixar conduzir na espiral da máquina do tempo. Muita atenção, passageiros! Tomem seus lugares, ocupem o brinquedo preferido, e desejo a todos uma feliz viagem pela irreal realidade! Ou ao mundo real da irrealidade – um espelho do outro. Tudo começou assim... 5


1°. Brinquedo: A Fada Bruxa

E

E

Na página oposta: Mapa astral

ra dia 8 de setembro de 1963, 10h10 da manhã de um domingo de sol. Nos céus do reino da Princesa dos Campos Gerais, um lugar não muito distante, o signo de Virgem entrou em alinhamento com a constelação de Escorpião, a Lua brilhava em Touro, no Meio do Céu rugia o Leão, quando uma criatura foi trazida de muito longe para este mundo – ou pela cegonha, ou de uma semente dançarina que encontrou um ovo solitário, ou de qualquer outra pergunta que ficou sem resposta. Dizem uns que ela teria vindo de uma galáxia distante; outros, de uma nuvem cor-de-rosa. Com o passar do tempo, alguns também desconfiavam que ela veio mesmo é do Mundo da Lua, devido ao seu comportamento aluado. Sendo a caçula temporã, sétima filha do casamento entre um Centauro descendente de polonês com uma Leoa de origem ucraniana, havia uma crendice de que, sendo sétima, era Bruxa categoricamente. – Vejam! Tem nariz bem arrebitado! É Bruxa mesmo! – diziam. Nasceram seus irmãos nessa ordem: o primogênito Tenente Escorpião, em segundo o Equilibrista da Balança (e que de tanto balançar com suas canções de amor, criou asas de Anjo e foi parar em outras dimensões), depois o Peixe Morangueiro, a Professora Carangueja, o Engenheiro Capricórnio e o Gênio Gêmeo. Anos mais tarde, depois da Bruxa, nasceria também, vinda só de seu pai, a Sereia do Aquário. 6


7


Minha famĂ­lia

8


Eram todos bichos estranhos. Só pareciam ter nascido da mesma mãe e mesmo pai se identificados pelo nariz e pelos olhos azuis – marca registrada da família por gerações. Mas a Bruxa, de todos, talvez por ter sido a raspa de tacho, saiu a mais diferente. Diziam ser a Ovelha Negra da família, embora mais parecesse ser uma Virgem Menina Branca. Todos ocupavam suas posições em volta de uma mesa farta. E era em volta dela que contavam suas histórias ou, em provocações, brincavam de Escravos de Jó com os pratos e talheres. Mas na maioria das vezes, era apenas no silêncio, em sinal de respeito, que devoravam famintos em minutos as delícias que Mamãe Leoa levara horas – às vezes até dias – preparando. A mãe, uma Leoa miúda e simples que vivia a plantar batatas pela roça, um dedo verde que só, batizou Bruxa chamando-a de Márcia. O pai fez questão de colocar no meio Eliza, homenagem à esposa de nome Elizabeth. Mas entre os íntimos foi apelidada de Tchutcha, que significa... Bem, deixa isso pra lá. Vamos dizer então que entre ser Fada metade do tempo e outra metade ser Bruxa, o equilíbrio seja o caminho do meio. Vamos chamá-la de Maga Tchutcha. De sobrenome Széliga, que é, pra muita gente, bem esquisito de pronunciar. É Xé: Xéliga. Mas já se ouviu algo como Zéliga, Slega, e Sss-xx-ce-zéliga, tudo bem. Mamãe Leoa dedicada ao lar e à família, quando a colocava no berço para dormir, ao mesmo tempo em que a embalava, ficava desenhando. Seu pai também era um bom desenhista e exímio calígrafo. As cartas de amor que escrevera para sua mãe em tempo de namoro eram pura poesia. Declarações como “o brilho de seu sorriso, oh! minha amada, exibe os mais belos dentes como um colar de pérolas” eram escritas em letras perfeitas, cheias de adornos e desenhos de flores em volta. Mamãe Leoa fazia de tudo para que seus filhos não fossem alvo de falatórios e que a família fosse sempre, no mínimo, perfeita. Ela se importava com o que os outros iam dizer e por isso todas as regras de bom comportamento eram logo cedo estabelecidas. Apesar de ser uma Leoa religiosa fervorosa e ainda sem entender como foi dar luz a uma criatura com rosto de Fada e com jeito de Bruxa depois de tantos bichos, tinha medo de mau-olhado e mandinga. Levava a sério as verdades dos ditos populares do tipo: aqui se faz aqui se paga; quem tudo quer tudo perde; o que se planta, colhe; e assim por diante... Para toda e qualquer situação se munia de suas armas poderosas: uma vela, um terço, um ramo bento e muita oração. Para Maga Tchutcha, todos esses badulaques eram sempre interessantes e contidos de magia, pois pareciam espalhar no ar uma misteriosa proteção contra os males. Até benzimento a Mamãe Leoa fazia, com clara de ovo em dois copos d’água. A forma que a clara tomava revelava o que apavorou, limpando assim do espírito e do corpo qualquer resíduo de pesadelo ou de susto.

Brazão Szeliga ród polski skłonny do miłostek (origem polonesa, significa “inclinado ao amor”)

9


2°. Brinquedo: O Sapo

E

E

10

ra em dias de sol que a criatura com olhos de Fada se enchia de encanto. Mas ao chegar a tempestade, qualquer um podia apostar que ela tinha aprontado alguma feitiçaria das feias para merecer tal castigo. Castigo esse que estragava os passeios nos finais de semana e os dias de sol para brincar em córregos e cachoeiras e saborear uvas frescas colhidas direto da videira, num lugar de abundante natureza. E vinha ribombando raios e trovões em nuvens carregadas de fúria, ventos uivantes violentos e uma aguaceira danada de atravessar telhados. Só podia ser coisa da Bruxa! Mas Tchutcha gostava mesmo era de ouvir o barulhinho da chuva, dos raios e trovões. Sabia que a aguaceira toda trazia mais sapos. E tudo virava uma orquestração da Natureza gostosa de ouvir: a chuva, a goteira e o coaxar. Tchutcha, desde os três anos de idade era dada a conversar com seres invisíveis aos olhos comuns. E também com sapos. Numa dessas conversas, seu amigo Sapo, de olhar calmo e penetrante, contou-lhe histórias do Planeta Encantado. De repente, num sobressalto, um de seus irmãos, o Peixe Morangueiro, pegou a conversa em flagrante e sumiu com o Sapo para nunca mais voltar. - Esse bicho há de cuspir veneno nos seus olhos e a deixar cega. E seu corpo irá se encher de verrugas! - gritou – E você vira bruxa!


E todos os dias, todos os dias mesmo, de domingo a domingo, ao badalar os sinos, Mamãe Leoa passou a levar Tchutcha à força, juntamente com o inseparável amigo da menina, o Urso Arquimedes, num Castelo Sagrado rumo ao caminho da devoção e obediência a um Ser Barbudo Benevolente e Punitivo, sentado num trono cercado de Seres Alados tocando trombetas, em uma abóboda celeste pintada com estrelas de cinco pontas. Quem sabe assim parasse de pensar em seres invisíveis e sapos e passasse a acreditar na coisa certa que consideravam ser o melhor para ela. Daí que Maga Tchutcha deu de pensar que o tal Ser fosse o Mago Branco durante os dias de sol e brincadeira e o Bruxo Negro nos dias de tempestade, aprontação e visita aos mortos no cemitério. Porém, nenhum Ser desses se parecia ou era tão grandioso quanto o Algo, mesmo sendo invisível aos olhos. Ela realmente sentia a presença de Algo, percebia-se preenchida por Algo e mergulhada no Algo. Sabia que o Algo estava dentro dela e também em todo lugar. Daí que resolveu nomeá-lo de Grande Mago do Universo, sem as contaminações do diz-que-me-diz do mundo de fora, mesmo que nomeando não O definisse, pois definindo já deixaria de sê-Lo, para virar qualquer outra coisa... Menos Algo. E quando sentia esse Algo a preencher, seu corpo aumentava e se esticava quase ao teto, ainda que aos olhos dos outros parecesse estar do mesmo tamanho. Ela queria contar para todos o quanto estava diferente e que podia olhar do alto de sua além-estatura, mas ninguém acreditava. Então seus irmãos pediram para que ela os chamasse da próxima vez que acontecesse. E quando aconteceu, a sensação foi tão maravilhosa que precisava repartir com sua família para que também pudessem fazer o mesmo, simplesmente entregando-se ao sentir, ao flutuar. A fileira de irmãos então se posicionou formando uma plateia e Maga Tchutcha dizia: - Vejam! Está acontecendo! Estou esticaaando! Um coro de risinhos estourando em gargalhadas ecoou pelos cômodos da casa. Eles, de repente, ficaram todos cegos. Maga Tchutcha foi desacreditada, percebendo que certas coisas não podiam ser divididas de qualquer jeito porque, além do risco de perder a força do fenômeno, poderia não mais voltar a acontecer. E ainda por cima seria chamada de louca. E cochichando entre si, todos girando o dedo indicador ao lado da cabeça, diziam: “Deve ter ficado louca. Acho que precisamos interná-la”. Com tristeza e frustrada por não a compreenderem, Maga Tchutcha calou-se e recolheu-se para o silêncio das horas em que podia ficar sozinha com suas práticas de esticaencolhe. Certa noite fresca de verão, quando aprendeu a contar estrelas, acreditava ser capaz de voar até elas só com a força do pensamento e apanhá-las para guardar em uma caixinha. E este Ser que ela sentia dizia isso a ela. Dizia também que seria capaz de pular de estrela em estrela até chegar à Lua. Mas sua mãe a pegou contando com o dedinho indicador e gritou: - Oh! Não faça isso! Hão de nascer verrugas em seus de-

dinhos! E verruga é coisa de bruxa! De bruxa que brinca com sapos! É o que dizem! A mãe se benzeu com um sinal da cruz e as mãos em oração, correndo pegar uma linha de costura para fazer simpatia de sumir com quebranto. E não deu outra! Em pouco tempo, as mãos de Tchutcha estavam repletas de verrugas de vários tamanhos. Nasceram tantas verrugas quantas estrelas brilhavam no céu. Parecia mesmo pele de sapo! Tchutcha roía todas pra sumir com elas, mas elas voltavam e apareciam ainda outras mais. E todos diziam rindo e zombando: - Bruxa! Bruxa! Bruxa Verruguenta! Sapa sapaienta!

11


3°. Brinquedo: A Curandeira

T

T

chutcha foi ficando triste e encolhida num canto, isolando-se e sentindo-se cada vez mais horrorosa. Queria se esconder, queria sumir por algum buraco que a levasse de volta para onde... Nem sabia qual era o lugar, mas aquele de onde veio. E o Ser que ela sentia tão presente foi se apagando, dando lugar ao Ser Barbudo Benevolente e Punitivo, aquele pintado na cúpula do Castelo Sagrado, e que à noite em seu quarto aparecia com seu Olho Que Tudo Vê para assombrar os sonhos de infância. Para piorar, o tal Homem Santo da roupa preta (que parecia de santo não ter nada, escondido naquela batina...), que sempre ficava de olho no Urso Arquimedes, chamou um dia Mamãe Leoa e Tchutcha ao confessionário – um caixotão de madeira escura que ficava no canto mais escuro do Castelo, com uma janelinha de treliças de madeira e cortininha cor de sangue. Disse para Tchutcha se ajoelhar, pedir perdão por seus pecados e não trazer mais seu urso companheiro. “Ursos também são católicos!”, argumentou na hora a garota. Suas noites de sono acabaram ficando cada vez mais perturbadas pelas imagens de pecado que os sonhos traziam, transformados em pesadelos. Era uma tarde rubra e ameaçadora de chuvas. Mamãe Leoa apelou à sua irmã curandeira para fazer todo tipo de benzimento e livrar a criança de toda maldição, para que tivesse um sono mais tranquilo. Além do Olho que Tudo

12


Vê, o que mais a aterrorizava era um cachorro de olhos esbugalhados e vidrados, chamado Orelhudo, que misteriosamente pulava para dentro de seu berço de balanço e ficava vigilante a noite inteira. A Tia Curandeira morava em uma pequena casinha de madeira, branca por fora, rodeada de margaridas e hortênsias, e com um pé de deliciosos maracujás doces na cerca. Na frente, um pinheiro que na época de Natal era enfeitado com sapatos abandonados recolhidos das ruas. Dentro, três pequenos cômodos: sala, cozinha e quarto. O banheiro, chamado de “casinha”, ficava no quintal antes da horta. A sala de paredes tom verde-hospital era enfeitada com imagens de santos emoldurados por papéis de bala e flores de plástico, com iluminação de lampiões. As labaredas estalavam em um fogão à lenha, sendo preparada uma chaleira para o chimarrão, outra panela para cozinhar os pierogies (pastéis cozidos poloneses). No fogão também era derretida cera de abelhas – uma de suas técnicas divinatórias –, ao mesmo tempo em que ela fazia rezas e benzia em cruz com um ramo de arruda mergulhado em água benta. Tratou logo de encher Maga de fitas vermelhas, crucifixo, figa e lágrimas-de-nossa-senhora para afastar olho grande e abençoar com o dedo polegar da mão direita, em pequenos sinais da cruz, a testa, o peito e os pequenos pés serelepes, garantindo que as assombrações e maus espíritos se afastariam do sono sossegado da criança. À medida que Maga Tchutcha (que nem sabia que era Maga de verdade) foi ganhando estatura, Mamãe Leoa cuidou de educá-la nas prendas domésticas: a arte de bordar, costurar e fazer biscoitos.

O olho que tudo vê

13


4°. Brinquedo: Os Seres Invisiveis

P

P

ara acalentá-la, Mamãe Leoa lia histórias antes de dormir. E era através delas que Maga Tchutcha encontrava um jeito de ir para o seu mundo encantado e fugir deste daqui. Bastava ouvir a voz doce e calma na leitura das palavras mágicas dos contos e poesias, que os livros do Mundo da Criança logo abriam portas e janelas por meio de suas páginas ilustradas. Dentro dos livros fez muitos amigos. Havia o Patinho Feio, tão rejeitado, como muitas vezes também se sentira, ou o Pinóquio, com o qual se identificava pelo nariz. Sua preocupação era se uma mentirinha pequenininha qualquer também faria o seu crescer – daí que teria que ir ao confessionário dar satisfações ao Homem Santo, sendo orientada a rezar três Pais-Nossos e três Ave-Marias. Adorava Dorothy e seus três amigos na terra encantada do Mágico de Oz e também Alice no País das Maravilhas, por ser ainda pequena demais para coisas que eram só de gente grande, ou grande demais para coisas que já haviam ficado bem pequenas. As histórias da Mamãe Gansa, a casa na bota que abrigava muitas crianças e outras personagens mais. Maga Patalógica, Madame Min e Professor Pardal então eram personagens que inspiravam a brincar de Poções & Invenções Malucas para Missões Impossíveis, nas brincadeiras com seu irmão Gênio Gêmeo, habilidoso na arte de transformar libélulas em helicópteros e sair com elas

14


voando e nas ligações de fios de rádio numa tentativa de se comunicar com espíritos do além. Mas foi com as Reinações de Narizinho e depois de muitas tardes assistindo à Pantera Cor-de-Rosa, Popeye e Pernalonga que ela despertou o desejo de fazer seu mundo imaginário criar vida própria. E Tchutcha, com tantos amigos assim, começou a desconfiar que também escondesse sua verdadeira identidade para poder viver no Planeta dos Normais. Só que ela não sabia como, afinal, vinha de um mundo no qual percebia as coisas de um jeito e foi parar em outro ao qual precisava se adaptar. E tudo isso foi ficando muito confuso. “Afinal! Sou de lá ou sou de cá? Por que vim, de onde vim e onde vou parar?”, pensava. Dia seguinte, e daí quase todos os dias, Tchutcha vestiu o avental que ganhara de presente e, dançando com ele, rodopiava até se sentir tonta. Gostava de ver tudo girar, mas, para não correr o risco de cair, aprimorou-se na técnica de rodopio, encostando a cabeça na parede e girando ao longo de todo o corredor da casa onde morava. Da parede, de pintura borrifada de cores, saltaram tantas formas que Maga começou a conversar com elas. Eram gnomos, fadas, monstros, bichinhos e bichões – tantas formas de vida habitando nas paredes, que passaram a povoar também seus sonhos. Para entrar nesse mundo e enxergar todas as criaturas invisíveis bastava apenas girar e girar. Uma canção de ciranda, uma palavra em repetição, uma tonteirinha e... Zuiiimmm! Silêncio: tudo roda que roda. E lá se ia Tchutcha, numa marchinha tontinha, tontinha, desenhar tudo o que via e imaginava. Na curiosidade e torpor de investigar esse universo imaginário, acordou certa manhã com a genial ideia de querer ver também o mundo girar, de poder mudar as coisas de lugar. Uma revelação luminosa aconteceu ao olhar a vida de ponta-cabeça! Primeiro no quarto, depois explorou outros cômodos até esgotar todas as possibilidades imaginárias. Enxergava as pessoas entrando pelas portas e caminhando pelo teto, que virara chão, os lustres eram móveis futuristas, enquanto os sofás e camas se tornavam exóticos lustres e objetos decorativos de teto. Depois foi a vez de explorar através das janelas do terceiro andar onde morava. Afinal, ver o mundo ao contrário era um jeito de ver mais longe – o céu sendo chão pra caminhar. Jeito divertido de ver diferente e sem limites de piso, cerca ou muros. Pensar que os carros corressem pelos tetos desafiando a lei da gravidade era tão fascinante quanto supor que os pés pudessem tocar as nuvens macias do céu e provar se eram feitas realmente de algodão-doce. E foi assim que, com a metade do corpo pendurado para fora da janela, contemplava o movimento real misturado com a imaginação, aguardando a noite chegar para poder ter aos seus pés um chão de estrelas e um teto iluminado pelas cores dos semáforos e postes das ruas. Corpo esse salvo em tempo pelas garras angelicais da Mãe Leoa zelosa. Mas também foi em um desses passeios pelos tetos que Maga Tchutcha conheceu seu Amigo Invisível, companheiro de todas as horas solitárias.

A Sereia do Aquário

15


5°. Brinquedo: O Caderno de Desenhos

C

C

onta Mamãe Leoa que Tchutcha chorava muito ao ver sua irmã, a Professora Carangueja, desenhar. Consolando ao pentear seus cabelos e fazer lindas tranças, ela dizia: “Marçoca Nariz de Pipoca... Não chora, não. Não chora. Você ainda é muito pequena e quando crescer vai desenhar bem melhor do que ela”. E Tchutcha sempre ficava atenta ao lado de sua irmã observando-a desenhar para aprender. Professora Carangueja, que fazia uso do quadriculado, traçava e pintava copiando com perfeição de outros desenhos. E Tchutcha pensava com seus botões: “Vou fazer melhor que isso. Não vou quadricular é nunca, nunquinha mesmo, isso sim!” Se perguntar qual foi o primeiro desenho de Tchutcha, verdade é que não ficou qualquer registro a não ser nas espumas do mar, pois foi nas areias de uma praia que desenhou um coração enorme. “Quando Márcia se deparou com a beleza das praias do litoral paranaense, é claro que ela se impressionou, principalmente por ser muito jovem. Mas ao olhar para a brancura da areia, com seu biquíni de flores miúdas, ajoelhou-se e, com um graveto, ousou desconsertar a simetria das areias desenhando um lindo coração. Mal sabia que, com este gesto, havia traçado o seu destino que a tornou imortal.” Maria Helena – a professora Carangueja –, irmã e mestra de muitas artes e tricôs.

16


Primeiro desenho

17


No aniversário de cinco anos, ganhou de Mamãe Leoa um presente mágico: um avental com bolsos cheinhos de lápis de cor, com borracha, apontador e régua. Já nessa idade, Maga fugiu da escola. Aconteceu quando estudava no Jardim das Marrecas Servas do Pombo Santo, onde ensaiavam uma homenagem ao Dia das Mães. Em jogral, cada aluna deveria recitar uma parte do poema. Mas ao chegar a vez de Tchutcha falar, fechou a boca, emudeceu. A Professorinha Marreca, vermelha de furiosa, deu a volta por trás de todo o semicírculo de patinhas alinhadas e, num ímpeto, puxou com força a orelha de Maga Tchutcha, que saiu correndo pelo teatro, indo se esconder no parquinho, atrás do gira-gira, num ponto de onde ninguém pudesse avistá-la. Lá ficou até o sinal bater e os portões se abrirem. Enquanto isso não acontecia, jurava (e esconjurava) algum tipo de bruxaria. No dia seguinte, bem arrumadinha, de uniforme e gravatinha – na gravatinha uma medalha de falsa prata com uma santinha – e cabelos bem penteados com laço de fita, Tchutcha terminou de almoçar e logo anunciou: “A partir de hoje não vou mais pra escola!” Mamãe Leoa arregalou os olhos e tentou segurá-la pelo braço. Tchutcha foi mais rápida, driblou e escapou. Mamãe Leoa correu atrás com os chinelinhos fazendo clap-claps nervosos no piso de cerâmica. Tchutcha voou para debaixo da cama. Mamãe Leoa começou a ficar irritada e se agachou para espiar Tchutcha. Tchutcha dava risadinhas da cara nervosa de Mamãe Leoa. Mamãe Leoa saiu do quarto furiosa. Tchutcha decidiu que dali não sairia até passar o horário de entrada no colégio. Mamãe Leoa voltou segurando uma vassoura. Ajoelhou-se e cutucou Tchutcha ameaçando que ia dar umas palmadas se não saísse logo. Tchutcha riu

18


perguntando como Mamãe Leoa ia dar palmadas se nem conseguia passar pelo espaço entre a cama e o piso. Mamãe Leoa ameaçou dizendo que o Olho que Tudo Vê castiga. Tchutcha revidou dando chutes no cabo da vassoura com suas botinhas ortopédicas. Mamãe Leoa tentou que tentou, até desistir. Então aconteceu: as badaladas do velho relógio de pêndulo ressoaram quando o ponteiro grande chegou às duas horas. Hora de sair! Tchutcha se arrastou para fora da cama, sacudiu a poeira do uniforme, e foi brincar. Só seu irmão Gênio Gêmeo ficou para cuidar. Mamãe Leoa não estava mais em casa. Na certa, foi ao colégio entender o que aconteceu. O assunto não voltou mais ao cenário familiar e por um ano teve aulas com seu talentoso irmão Gênio Gêmeo, companheiro de brincadeiras e inventor de armadilhas. Dele sempre recebia, ao final de cada aula, santinhos coloridos e um pedaço de chocolate branco como prêmio. Logo mais, a salinha de aula improvisada dentro de seu quarto com um pequeno quadro negro ganhava outros alunos, como o Urso Arquimedes, o Cãozinho Totó, a Boneca Suzi e outros coleguinhas miúdos. Aquele foi um ano inesquecível e no qual aprendeu muito mais do que ensinavam no colégio onde viveu seu jardim de infância. Ano seguinte, ela voltaria para o mesmo colégio com a promessa de dar um chute na malvada Marrequinha Serva do Pombo Santo. E foi mesmo a primeira a encontrar e assim o fez: colocou em prática sua bruxaria travessa e com sua botinha ortopédica fez estourar estrelinhas que cintilaram em volta da canela da indefesa Marrequinha. Esta fez cara de duas cores: de bochechas vermelhas e riso amarelo, num murmúrio do tipo “não foi nada”. Naquele dia não choveu nem foram ouvidos trovões ou qualquer sinal de raios...

19


6°. Brinquedo: O Diabo

Na página oposta: Detalhe História em quadrinhos 1972

A

A

os seis anos, Tchutcha sofreu algumas perseguições. Tinha uma ou outra rara amiga, pois não fazia o tipo bagunceira e a maioria se incomodava com a garotinha que se destacava na sala de aula por ser quieta e saber desenhar. Uma delas, que por ser nervosa e sardenta era conhecida como Pimentinha Enferrujada, chamou-a para brincar de brigar. Tchutcha, tão ingênua, entrou feliz na brincadeira porque pensava que assim seria aceita pelo grupo. E apanhou feio sem saber se defender. Era xingada de magricela, branquela, esquisita. Nessa época, Tchutcha começou a se dar conta do próprio corpo, olhando-se no espelho, imaginando como gostaria de ser quando crescesse. Em um desses momentos, Mamãe Leoa pegou a menina em flagrante e, sem qualquer delicadeza, assustou-a com a ideia de que descobrir a si mesma só podia ser um tipo de doença que a levaria ao inferno, e que não adiantava se esconder porque o Olho que Tudo Vê estava em todo lugar, em cada fresta, em cada canto. Vigiando todo ato e pensamento. Logo, quando a família recebia visita de médico ou de padre em casa, para Tchutcha era motivo de desespero. A qualquer sinal suspeito poderia ser mandada para o inferno, onde um diabinho já a esperava. O Diabo passou então a ser visto em cada veio de madeira, em cada mancha de azulejo, ou espreitando do lado de

A Menina desenho com canetinhas sylvapen 1970

20


21


Histรณria em quadrinhos 1972

Paisagem desenho com canetinhas sylvapen 1971

22


fora do confessionário, onde a obrigação de confessar os pecados já era uma tortura. E lá estava ele, o Capeta, com seu risinho sarcástico, de tridente na mão. Aos sete anos, já recheava de desenhos os cadernos do Colégio, claro que sempre incentivada a nunca escapar o tracejado para fora dos limites do contorno, o que a fez ser muito controlada na pintura do colorido para atingir a perfeição. No colégio, ninguém acreditava que ela desenhasse. As crianças chegavam a zombar dela, ou por ser muito magra, ou por ser muito branca, ou por ser muito quieta, ou por ser diferente das outras, ou por suspeitarem que mentisse ao mostrar seus cadernos cheios de desenhos feitos por ela. Então, numa tarde, acompanhada de Mamãe Leoa, entra na sala de aula com ar autoritário a Marreca Superiora. Sua presença parecia aumentá-la em estatura a um tamanho inalcançável. A Marrecona um dia havia batido com régua na mão de Tchutcha só porque ela pegava errado no lápis de escrever (apesar disso, dizem que Tchutcha não acertou até hoje o jeito torto de escrever e desenhar). Marreca Superiora parou diante da carteira de Tchutcha, dizendo com o dedo apontando em riste: - Sua filha diz que esses desenhos são dela! - Sim, são mesmo. – respondeu a mãe.

- Mas como, se ela é torta para escrever? Ela então que prove aqui na nossa frente agora. - Não era preciso me chamar só por isso. Bastava pedir para ela desenhar. – disse a mãe com um sorriso suave. Tchutcha, rodeada por outras colegas que também não acreditavam nela, desenhou uma menina, cuidando de cada pequeno detalhe e deixando todos admirados e algumas coleguinhas a morder os lábios. Naquele ano aconteceu um concurso do Dia da Ave, em que era preciso desenhar vários pássaros em uma cartolina. Maga Tchutcha, apesar de ter uns lápis de cor fajutos para desenhar, desenhou vários passarinhos (até hoje ela não entende por que certos adultos – inclusive professor de artes – acham que criança só merece material sem qualidade, com medo de que possa estragá-lo ou desperdiçá-lo). Forçando o quanto podia para a cor aparecer, era uma bronca toda vez que os lápis arranhavam o papel ou soltavam uns riscões escuros que se destacavam de um jeito sujo na textura lisinha que pintava. Mesmo assim, ganhou o primeiro lugar, recebendo um diploma assinado pelo Rei do Futebol: O Rei Pelé! Daí em diante não parou mais de desenhar. Seus irmãos ensinaram muitas coisas, compraram livros e materiais, e desenhar passou a ser seu passatempo preferido de horas.

23


7°. Brinquedo: A Coruja

Apresentação de mágica na escola canetinha e lápis de cor 1974

A

A

conteceu então de uma noite, já nos seus quase nove anos de idade, Tchutcha não conseguir dormir. Barulhos estranhos na casa. A porta do quarto ora abria, ora trancava-se sozinha. A Coruja que piava lá fora veio visitar trazendo uma mensagem difícil de compreender. Mamãe Leoa fez cara de preocupada. Tchutcha sentiu que algo muito sério estava para acontecer e que seus bruxedos começavam a ganhar involuntariamente vida própria, sem o seu comando nem controle. Imagens rodopiavam em volta dela no escuro do quarto, os seres saltavam alucinados das paredes e não pareciam mais tão amistosos. Coruja voava em círculos e seus grandes olhos eram assustadores. Tchutcha sentia as paredes sem precisar tocá-las. Antes lisas, elas agora eram ásperas, duras demais, devoradoras e assustadoras e, capturando uma dessas imagens, ela teve uma premonição, que não contou a ninguém. Teve medo do que visualizara. Teve medo de que novamente a chamassem de Bruxa. E aconteceu que a imagem saltou. E saltando, materializou-se no dia seguinte: seu irmão, o Tenente Escorpião, contou que Papai Centauro havia galopado pelos degraus de nuvens que levam ao céu e perdera o equilíbrio, despencando lá de cima para dormir um sono profundo e eterno numa cama de madeira escura com flores esculpidas, e que nada mais podia acordá-lo. Nem tempo teve de conhecer o caderno de desenhos de Tchutcha. 24


Menina no Penico canetinha e lรกpis de cor 1975

25


26


Os espelhos da casa estavam cobertos e as velas crepitavam. Odor de flores e de ramos de cedrinho no ar. Um pingo de vela caiu maculando o vestido vermelho de florezinhas brancas bordadas, o preferido de Tchutcha. O céu azul, que sustentava um sol forte e brilhante, virou rapidamente para um tom cinza de nuvens tenebrosas, bradando trovoadas e chorando uma chuva fininha e triste, que parecia espetar como agulhas, acompanhando o féretro. “Que foi que eu fiz? O céu chora de tristeza por minha bruxaria...”, pensou. E repetia num sussurro: “Sou bruxa, sou bruxa. Papai não vai me perdoar pelo que eu vi: a fórmula da poção do sono eterno.” Na escola, as crianças normais se afastaram dela. Outras cochichavam: “Vejam! É aquela esquisita ali! Não cheguem perto dela! Ela é órfã! Ela é órfã! Ela tem mesmo um jeito muito estranho. Também, branca do jeito que é, só podia dar nisso. Afastem-se dela. Não deixem entrar em nossa roda nem pisem por onde ela passar. Ela tem jeito de ser Bruxa!” E para Maga Tchutcha, que já se cansara de ser chateada com tantos adjetivos, mais esse era o fim! Era como estar mutilada ou com uma doença contagiosa. O único amigo com quem podia contar era com seu Amigo Invisível, companheiro de muitos anos que tinha um carro vermelho muito veloz, capaz de ir distante e voltar para trás num curto espaço de tempo – mais parecia se teletransportar. Com esse carro e seus cabelos ruivos ao vento, subia montanhas e até rodava pelas árvores, sem se ferir nem causar acidentes ou danos na natureza. Era um sujeito bem feliz e de bem com tudo na vida, especialmente no mundo invisível, onde vivia as aventuras que narrava, contando como era do lado de lá e trazendo sempre bons conselhos. Porém, cada vez mais isolada, Tchutcha acreditou que os pensamentos dela, e também o que previu naquela noite, eram capazes de se transformar em poção que fazia as coisas acontecerem. E passou a ter medo dos próprios pensamentos. Até seu Amigo Invisível de todas as horas a havia abandonado. E pediu aos Magos do Universo que não fosse verdade, porque afinal Eles protegem toda a família que ora. E pediu perdão ao Grande Mago do Universo pelo mau pensamento, pela visão antecipada. E pediu que reconsiderasse e fizesse tudo voltar no tempo pra consertar o pensamento. Pegou um relógio e moveu os ponteiros para trás, em vão. Enxergava o Ser Barbudo furioso com o mau pensamento de sua criatura. E resolveu deixar as coisas como estavam para Tchutcha merecer castigo. “Que triste! Não sei como alterar o efeito dessa poção maldita!” Tendo apenas seu caderno de desenho como apoio e seu avental mágico, fez de suas páginas companhia e mais uma vez um mundo à parte, sempre desenhando além do que era pedido nas aulas de Educação Artística do colégio. Sua infância foi chegando ao fim antes de completar onze anos, quando novamente a Coruja apareceu trazendo outra mensagem. E Tchutcha se despediu de um de seus irmãos, sentindo que não mais o veria... Era o querido irmão Equilibrista da Balança, aquele que criou asas de Anjo, voou para outras dimensões com seu canto, violão e a poesia.

Crianças de Feijões lápis de cor e canetinha 1975

Na página oposta: Dia do índio canetinha 1975

27


Cidade Fantasma grafite 1975

Primavera lรกpis de cor e canetinha 1974 Quintal em dia de sol canetinha e lรกpis de cor 1975 Festa Junina lรกpis de cor e canetinha 1974

28

Tiradentes grafite 1974


Meu papagaio lรกpis de cor e canetinha 1974

Peixe canetinha e casca de lรกpis 1975

Paisagem com palitos de fรณsforo lรกpis de cor 1975

29


30


Na página oposta: Moça no Baile grafite 1974

Cristo crucificado lápis de cor 1974

Novamente, Tchutcha pediu ao Grande Mago do Universo que isso não fosse verdade, que dessa vez os ponteiros do relógio pudessem voltar o tempo para trás, que a poção não causasse mais efeito. Tarde demais. O céu chorou pra valer e cada irmão seu, dentro de si, recolheu-se ao silêncio... E no silêncio, a única coisa que Tchutcha tinha para expressar era, ao vestir seu avental mágico, os lápis. E desenhava, desenhava e desenhava. Desenhava seu mundo interior mais colorido, alegre e possível. Como tudo de inesperado parece só escolher o horário noturno, outro episódio inusitado se deu após ter colocado sua cachorrinha Candy no canil para ir deitar: Tchutcha jurava ter visto luzes estranhas no céu. Duas luzes, uma vermelha e outra azul, pairavam bem diante de sua janela. Como estava com muito sono, achou que eram duas estrelas diferentes constelando no céu e adormeceu. De repente, um clarão iluminou o quarto e um vento estranho agitou as persianas. Tchutcha levantou-se sonolenta e caminhou por uma rampa metálica que se esticou através da janela. Acompanhada de Candy, Tchutcha subiu em direção a uma nave mãe que flutuava no ar, cor de prata com luzes em volta. Entrou e olhou para dentro da nave. Seres esguios luminosos operavam uma mesa de comando. No teto da nave, um mapa estelar com diversos pontos acesos, e ao centro da nave, uma mesa com um corpo deitado e coberto. Aproximou-se então outro ser, em um traje preto colado ao corpo, como uma malha brilhante ou de plástico. Seus olhos eram grandes e negros amendoados. Comunicandose telepaticamente, convidou-a a entrar, mas Tchutcha se negou. Então transmitiu um pensamento dizendo: “Volte e irá acordar acreditando que tudo foi apenas um sonho.” Tchutcha não se lembra de como voltou ao quarto, só do rastro de um clarão que se apagou velozmente e das duas luzes estranhas em movimentos rápidos que depois sumiram no céu escuro. Amanheceu e sua cachorrinha Candy acordou-a lambendo seu rosto. Estranhamente, Candy, que havia ficado fora no canil, apareceu na cama de Tchutcha, debaixo dos cobertores... A menina achou mesmo que seus irmãos tinham razão quando disseram que ela estava ficando louca.

Fruteira canetinha e lápis de cor 1975

31


8°. Brinquedo: O Vampiro Psicodélico

N

N

Na página oposta: Desenho em pontilhismo caneta nanquim 1979

aquelas paragens dos Campos Gerais, era sonho de toda menina da cidade chegar aos 15 anos para ser apresentada à sociedade no famoso Baile de Debutantes. O glamour da maquiagem e dos longos vestidos de gala para as fotos, o primeiro anel de brilhante conhecido como Solitário ou Chuveirinho, a valsa com os pais e os patinhos galantes, promissores bons partidos filhos de médicos... Nada disso interessava à Tchutcha. A adolescência foi marcada pelo solitário som da flauta doce e poesias que denunciavam a suspeita de uma promissora estrada como escritora. Páginas de caderno que acabaram sendo deitadas no fundo de uma gaveta qualquer, amareladas pelo tempo, linhas rasgadas pelo esquecimento que o ingresso na vida adulta traz. E no pequeno baú de lembranças, apenas doces recordações do sorriso iluminado da querida professora de língua portuguesa, com suas aulas que eram deliciosa brincadeira. “Ela foi uma daquelas poucas alunas que realmente marcaram a passagem pelos bancos escolares. A lembrança desse período é nítida, faz parte de minha memória afetiva. Passou pelas minhas aulas como um meteoro: rápido, mas inesquecível. Se todos os alunos fossem como ela, ou ao menos uns poucos mais, lecionar seria o paraíso.” Roselis Nápoli, professora de Língua Portuguesa da 8ª. Série no Colégio de Aplicação de Ponta Grossa – PR

32


33


O desenho beirava o psicodelismo em cenas deformadas de destruição e alucinações. Imagens que foram embora no tempo junto com as poesias, com as mudanças. Eram cenas em preto e branco com o uso de lápis grafite, de estradas que davam em olhos sangrentos, e, pelas beiradas, cogumelos venenosos gigantescos, seres macabros e os sinais de rebeldia se apresentavam num contraste com um arco-íris e com símbolos da morte. Tchutcha tinha mesmo uma vontade enorme de ir embora do mundo. Buscava em cada olhar de menino aquele que foi na infância um fiel companheiro, seu inseparável Amigo Invisível. Uns a achavam sem graça e magricela, outros diziam que era feia, branquela e dentuça. Daí Tchutcha não sabia mais pra quem se mostrar por dentro, quando o mundo só se importava em notar o que via por fora. E sendo branca e magricela daquele jeito, tão branca quanto a neve ou as penas de um pato, ganhou toda sorte de apelidos: Olívia Palito, Dez pras Duas (por causa de seus pés virados pra fora), Patinha Feia (quando a viam, gritavam esganiçados: quen quen! quen quen!), Brancura Rinso, Sabão Omo Total, Anêmica, Doida Varrida... Bruxa. Até que uma patota de patinhas ricas tentou afogá-la um dia num lago profundo, pois branca desse jeito tinha motivo de sobra para levar castigo: era errada, era feia, fora de esquadro, devia deixar de existir. “Branca é preta virada do avesso! Ô, Polaca encardida!”, diziam rindo. Mesmo branquela, descabelada, rebelde e vestida feito moleque, ela continuou procurando por amigos que a aceitassem naquele mundo comum e por alguém para amar, mesmo em tempos em que ouvia falar que amor era coisa fora de moda e careta. Um troço pra lá de cafona. Começou a sentir uma saudade antiga, a mesma que já sentia desde a infância, uma saudade de algo que nem sabia quem ou o que era ainda, só sentia existir em algum lugar. E cada vez que pensava estar acertando, acabava triste, falhando ao tentar entender de que ingrediente era feita essa saudade. E quanto mais doía nessa busca errante, mais ela se fechou por dentro com muitas chaves, só pra ela, pra mais ninguém. Como uma ostra ferida. Tchutcha foi ficando cada vez mais fechada, tão fechada que acabou entrando na própria sombra. E todos diziam de novo em todo lugar que passava: “Que Fada mais esquisita essa. Tem todo jeito de Bruxa! Só pode ser Louca.” Caminhando assim pela vida afora, foi de encontro a bruxos errantes, pois ser Louca ou Bruxa entre eles era ser Normal. Eles apresentaram a ela outras poções milagrosas. Eram poções de causar vertigem que Tchutcha chegou a pensar: “Ah! Achei de novo meu carrossel mágico!” Mas por esse caminho o Mundo Fantástico que girava ficou deformado, trazendo uma legião de seres medonhos dos olhos vermelhos, comandados pelo Vampiro Psicodélico, que sussurrara em seus ouvidos um canto de morte, clamando por sangue, pedindo que olhasse para seus braços como se fossem duas broas fatiadas que pudessem servir de alimento. Já sabia que muitos pensavam ou falavam dela, quando escutava por trás das portas: “Ficou Louca. É preciso interná-la!”.

Estudos de Anatomia grafite 1978

34


Estudo incompleto do Conde Drácula grafite 1978

Ela viu seus amigos se deixando levar por esses seres. Um a um, hipnotizados, foram sendo arrebatados. Descobriu que tomar da poção venenosa resultava em mais dor ainda. E que destruir fora era fácil pra quem já destruído por dentro está. Maga Tchutcha estava mesmo enlouquecendo, à beira de um abismo. Até que um de seus amigos de olhos doces e palavras divinas trocou o caminho torto e pantanoso por um caminho de luz e a puxou do penhasco só com um livro sagrado que sempre carregava em mãos. Aqui se deu o primeiro despertar de uma nova era. Acordou para a existência de um universo sutil no qual sempre acreditara, desde bem pequena, muito antes de ser contaminada pelas regras fechadas e estreitas. E assim, Maga Tchutcha mudou de cidade para ir morar na capital, deixando para trás a legião de anjos caídos. O desenho voltou a ganhar alegria e também cor em uma nova vida. Dos seus 15 anos, uma única imagem foi guardada, feita em pontilhismo. O paradoxo da técnica: um exercício de paciência pela repetição de movimento com a dinâmica de alcançar nuances de luz e sombra que se aproximam da perfeição. A Perfeição! Foi essa sua perseguição: tornar o impossível possível na imagem feita com Perfeição. 35


9°. Brinquedo: A Bolha de Sabão

A

A

Na página oposta: Mimetismo lápis de cor 1982

vida de Maga Tchutcha prosseguia normal. Dava até pra dizer que estava feliz. Fazia coisas belas das poções do Bem e a todos agradava. Percebia que era mais aceita, não ouvia mais a chamarem de Esquisita nem de Bruxa. Estava, enfim, lavada de toda poção errada. Assim, preferiu ser chamada de Maga Márcia, já deixando os trajes de pequena, fazendo para si mesma uma mágica de criar bolha de sabão gigante, povoada de bichinhos imaginários, e onde pudesse morar dentro com todas as cores necessárias para viver, dizendo: “Minha vida agora sim é um Conto de Fadas!”. Mesmo assim, Maga Márcia esqueceu-se de quem realmente era dentro da Bolha que criara. E, ainda com ares de infância, começou a sentir bem lá no fundo do seu coração que parte sua não havia crescido, enquanto outra parte queria crescer. Vivia criando receitas coloridas de poções agradáveis e mostrando-as para o mundo ver, sempre através da fina película furta-cor de sua Bolha. Certa vez, estava convencida de que se tornaria uma Grande Maga das Edificações. Desenhar castelos, arquitetar condados para os seres invisíveis e visíveis terem lugar para morar, projetar cidades e pontes, com fontes encantadas e emolduradas por plantas ornamentais. Enfeitar de cor, de flor e pequenos bichinhos sempre foi seu maior prazer. Mas o destino conduziu ao que ela no fundo sempre quis e nem 36


37


Sociedade de Consumo 1 grafite 1981

sabia que queria: um caminho mais livre de esquadros e linhas retas. De lembrança dessa época foi feito um retrato em gratidão aos incríveis e divertidos mestres que teve. Maga Márcia, mesmo que muito tímida, ingressaria numa Escola de Magia, que transformaria muitos materiais em imagens: a Linguagem da Alma! Nessa Escola havia um colega de classe, o Bicho Cabeludo Místicosz, com o qual compartilhava algumas de suas histórias fascinantes do mundo da imaginação. Certa noite, Maga Márcia, no exercício de seu dom de trocar de corpo, deixou seu corpo físico repousando, indo passear por aí apenas com seu corpo leve e transparente de neblina. Andou pelas ruas, atravessou paredes, flutuou pelos ares e foi parar na casa do Bicho Cabeludo Místicosz, que já dormia. Por conta de ter sido acordado ao receber a visita inesperada de Maga Márcia em seu estado mágico, dia seguinte Bicho Cabeludo Místicosz apresentou a ela um mapa secreto de caminhos ocultos. Esses caminhos levariam a encontrar um tesouro guardado, num antigo baú ornado de Rosa e Cruz, no centro de uma pirâmide. Um tesouro capaz de quebrar com crenças incertas, nas quais se apoiava com seu cajado frágil em meio ao forte nevoeiro, e ensinaria a voar mais longe nos mistérios de outros planos luminosos de esclarecimento. “Desde o tempo da faculdade, minha admiração era ver como a Márcia conseguia materializar seu vasto e fértil 38


Sociedade de Consumo 2 grafite 1981

imaginário com toque pessoal surpreendente, trazer o sonho para a realidade sem perder a qualidade do sonho, onde é desnecessário acreditar em magia. Ela acontece ali, explícita na técnica impecável e, ao mesmo tempo, camuflada, acessível apenas ao sensível, ao atemporal, jamais ao racional ou ao intelectual. Nosso convívio sempre esteve circulando o interesse pelo transcendente, o mágico, o místico, pontes para o inconsciente. Impossível seguir os mistérios envolvidos – podia ser uma viagem de luz ou um medo do escuro. Com certeza, as crianças podem entender melhor!” Antar Mikosz, artista plástico e professor da Escola de Música e Belas Artes do Paraná. Já no primeiro ano de Escola, criou muitos desenhos, encantada com a obra de artistas como Marcos Bento, pelo realismo ao qual o lápis grafite era capaz de chegar; e Heliana Grudzien, pelo aveludado e pela gama de cores do lápis de cor, com perfeccionismo fantástico. Essa artista – que anos mais tarde viria a conhecer, viajando juntas num Grande Pássaro Branco, atravessando oceanos para chegarem a terras longínquas e geladas, às raízes de suas famílias – tornou-se uma de suas melhores amigas, a ponto de se chamarem por irmãs. A sua primeira produção foi marcada por imagens em grafite e lápis de cor. O seu quarto ganhava luz naquelas noites, tendo sobre a prancheta muitos produtos da sociedade de consumo que seriam invadidos por diversos animaizinhos. E durante o silêncio e o sono da cidade adormecida, Maga 39


Terapia grafite 1981

Márcia desenhava ao longo das madrugadas que se esticavam até o primeiro canto dos passarinhos, quando só então ia dormir. Iam chegando sobre a prancheta ratos saindo de latas de cerveja, sapos banhando-se em frigideiras repletas de óleo e tantos outros animais interagindo com produtos do mercado. No ano seguinte, levaria ao povo daquele reinado de pinheirais sua primeira exposição, no Inter Americano – Centro Cultural Brasil Estados Unidos, em 1982. E em uma nota de jornal, a crítica de arte Adalice Araújo, disse:

Caricatura dos professores do Terceirão Positivo grafite 1980

“Com um desenho minucioso que se aproxima do realismo fotográfico, ela se apropria da superconhecida imagem de objetos de consumo diário – sobretudo embalagens – ironicamente manuseadas por animais que, longe de estarem sob o signo de fábula infantil, ou da simples brincadeira, submergem em um universo de símbolos através dos quais ironiza o momento social e seus falsos mitos.” Nessa exposição aconteceu um debate com o público. Foi algo tão chato que quase a fez desistir, quando alguém se manifestou perguntando em quem Maga Márcia se baseava para colocar valor em suas obras. Entre outras perguntas que não mereceram respostas, Maga Márcia ficou muda e acanhada, porque simplesmente acreditava que, por ser uma forma de comunicar, criada com prazer, não seria a Arte algo assim tão inútil nem supérfluo, nem decorativo ou apenas um hobby. Outro alguém rebateu em defesa, dizendo que um dia ela 40


devolveria vomitando todas as coisas chatas que acabara de engolir pelos ouvidos. Era um dos Mestres que mais a incentivou, comentando: “Márcia Széliga foi minha aluna. Esta afirmação eu a faço com grande prazer, pois me faz lembrar seus primeiros passos no âmbito do desenho, onde apresentava um trabalho mesclado de ingenuidade e malandrice, de sabor caricato e a busca do realismo gráfico. Os desenhos retratavam objetos de produção industrial, recebendo uma invasão de insetos, tripulando e brincando nas latas. Mais tarde, o nu e os animais em uma participação erótica. Tecnicamente, ela conseguiu um resultado refinado e carregado de detalhes. Por estes motivos é que me orgulho de ter sido seu professor.” Ivens Fontoura, designer e professor da Escola de Música e Belas Artes e da Universidade Tuiuti, atualmente professor da PUC.

Capa do LP Águas do Futuro de Tátara e Cabelo 1983

Ainda um grande amigo, o Anjo de Dois Sexos, um mago da Fantasia e virtuoso na arte de transformar sonhos em realidade, ofereceu a ela um de seus licores de coragem e por um ano sem nada mostrar, Maga Márcia preparou-se para uma nova virada. Nesse ano, Maga Márcia também conheceu Touro Maluco, bem afeiçoado, de uma família de artistas, pelo qual se enamorou durante um ano, antes dele ser abduzido pela nave mãe para um passeio no Hemisfério Norte do Planeta. No ano de 1983, fez a capa do LP Águas do Futuro, dos músicos paranaenses Tatára e Cabelo, em lápis grafite. Com produtos e bichos, introduziu também fadas e duendes que encontrou em um passeio pela Serra do Mar, onde acampou próximo a uma cachoeira enfeitada de Beijos da Serra. Era o acampamento de despedida de Touro Maluco. Seu irmão Gênio Gêmeo, sempre por perto, continuava sendo um grande observador a dar bons palpites nos desenhos de Maga Márcia. “Aos 7 anos de idade, ela disse: - Como que eu consigo? 8 anos: Debruçada sobre as folhas de papel, horas e horas, todos os dias... Ainda aos 8: - Veja esse desenho, critique!! 9 anos: Mãe, preciso de lápis decente, assim não dá! 10 anos: Alguém disse: - Não foi você que fez! Quem está fazendo isso por você? 11 anos: Esboços, preparos, estudos... 12 anos: Proporção, intensidade, luz, sombra, traço, detalhe... 13 anos: Mais horas e horas todos os dias. 14 anos: Todos os tons do cinza ao preto. 15 anos: Cores, profusão de ideias, técnica. 16 anos: Que show! 17 anos: Alguém no Teatro Guaíra disse: - Olhe só, a menina que fez estes desenhos tem só 17 anos! 17 anos: Preparo para o primeiro vernissage, bichinhos brincando como nunca. Ainda aos 18 anos, disseram: - Márcia! Como que você consegue?! “Depois dos 18, vocês já sabem.” Marcos Rogério Széliga, o irmão Gênio Gêmeo, seu Mestre. 41


10°. Brinquedo: O Duende da Serra

E

E

42

Na página oposta: Vibrando em Outra Dimensão retrato de Bernardo Mattos 1983

ra bem cedinho, uma suave e refrescante névoa cobria os matagais. Ao ir buscar água da cachoeira, Maga Márcia se desviou do caminho, perdendo-se por entre as árvores. A mata foi ficando cada vez mais fechada e emaranhada de cipós. O canto dos pássaros foi aos poucos desaparecendo, e a mata mergulhada num silencioso mistério. Olhou em volta e perdeu a direção. Andando em círculos, acabava sempre passando pelos mesmos lugares, não sabendo mais de onde havia vindo nem como retornar à barraca montada na clareira próxima à cachoeira. As árvores traziam em seus troncos líquens róseos e verdes. Pequenos insetos passeavam pelos galhos e folhas, uns se alimentando de frutos, outros carregando alimentos para seus ninhos. De repente, ouviu um “psiu!”. Olhou em volta, pensou que um de seus amigos já tivesse acordado e foi procurá-la, mas ninguém. “Psiu!”, de novo! Caminhou em direção ao alto da mata por onde acreditava ter vindo. No chão, entre troncos e musgos, numa mata onde os raios de sol mal penetravam, uma luz suave em meio às plantas nativas revelava um tipo de pedra com os mesmos líquens dos troncos. Duas mãos afastaram a vegetação e novamente o “psiu!” se pronunciou. Não era pedra nem tronco. Era o cocuruto de um ser de olhos brilhantes e sorriso maroto. Um ser iluminado, um


43


Existência de uma vibração lápis de cor, grafite e pastel seco 1983

O Eremita Contemplativo lápis de cor 1983

44


ser a espiar. Maga Márcia levou um susto tão grande que saiu correndo, tropeçando em cipós, arranhando-se nos galhos, coração disparado. Nem olhou para trás, e pensou: “Minha loucura de volta! Ah! Não!” Acabou numa trilha que deu no alto da cachoeira, cercada de um bambuzal repleto de Gigantes Borboletas Azuis e Libélulas Furta-cores. Nasceu assim a imagem Existência de uma Vibração, entre outras do mesmo gênero. Poucos dias após o acampamento, Touro Maluco foi embora para bem longe, levado pela nave mãe. Maga Márcia ficou triste como se nunca mais fosse reencontrá-lo. Achou um jeito então de imortalizá-lo para que ao menos sua imagem lhe fizesse companhia.

A Sopa da Bruxa aquarela 1983

45


11°. Brinquedo: A Lagartixa

N

N 46

Na página oposta: Néctar dos Deuses lápis de cor e grafite 1987

o início de 1984, Maga Márcia bem que tentou preencher o vazio que sentia conhecendo outros bichos – uns mais, outros menos marcantes. Mas seu pensamento estava mesmo é no Touro Maluco. Precisava preencher essa falta apaixonada que sentia e começou a desenhar seus primeiros nus desde que havia se encantado com as primeiras aulas de Modelo Vivo na Escola de Magia da Arte. Na maioria das vezes, os nus eram acompanhados em suas composições de uma Lagartixa, animal representante do mundo dos sonhos, símbolo de renovação e transformação. Descobrindo a maravilha da anatomia humana em sua cor, luz e forma, em gênero e sensualidade, ao mesmo tempo em que provocava a mentalidade hipócrita e doentia de uma sociedade que interpretava a nudez e o sexo como algo apenas pornográfico e objeto de desejo reprimido expressado em fetiches, explorava especialmente a naturalidade das formas e ângulos, a iluminação e riqueza de tonalidades e a expressividade. Vivia o grande desafio que é construir e dominar a arte de desenhar o corpo humano. Sabia que, dominando o desenho do corpo humano, seria capaz de desenhar de tudo. Ao ver-se, na época, com um “corpinho de meu deus do céu”, quando nem passava pela cabeça a corrosão galopante que deixa marcas, cicatrizes e rugas com a travessia dos anos, Maga Márcia, além de ter alguns amigos posan-


47


Vinho dos Elementais lรกpis de cor 1986

48


do de modelos para seus desenhos, também viu a possibilidade de se autorretratar, reconhecendo, em um devaneio misto de prazer e vaidade, de transgressão e rebeldia, a auto aceitação por ainda viver dentro de si o complexo camuflado da Patinha Feia. Fernando Calderari foi mais um dos Mestres que a incentivou na paixão pela anatomia humana, dizendo: “A linha precisa e convenientemente traçada estabelece formas e planos reais ou virtuais que deixam o espectador imaginar outros elementos além dos já configurados. A cor não segue as determinantes rígidas das teorias cromáticas, é utilizada de uma maneira muito pessoal, o que caracteriza a personalidade em seu desenho, ou seja, a cor modelando a forma e estabelecendo o claro-escuro. A perfeita harmonia e espontaneidade que até por vezes possa parecer uma simples habilidade inexiste diante da honestidade que o trabalho determina em seu resultado conclusivo. Finalmente, estamos diante de uma jovem artista e ao mesmo tempo é adulta que devemos nos acostumar a conviver e a observar com mais frequência.” Fernando Calderari, artista plástico, Curitiba, Agosto 1985 Antes que na vida se aprenda a ter um discernimento mais consciente e maduro entre o sagrado e o profano, entre a verdadeira moral e a hipocrisia, entre a real natureza humana e o que seja pecado de fato, vem a rebeldia, a contestação. Uma série provocativa de desenhos caricatos feitos com pastel seco satirizava o comportamento manifesto de alguns dos desejos ocultos mais íntimos do ser humano por trás da castidade, muitas vezes seguida na forma de imposições repressoras em oposição à soma de sentimentos reprimidos. A Ceia, O Brinde e O Fruto Proibido foram representantes dessa fase. Tais obras estiveram à beira de receber um prêmio da comissão julgadora em um salão de artes, entretanto um dos críticos havia segredado à Maga Márcia que, por receio dos demais em sofrer algum julgamento ou condenação sob uma possível ameaça de excomunhão, preferiram “deixar quieto”. Por fim, ficaram apenas expostas, sendo alvo de muitos comentários pelos cantos e um notável interesse da imprensa. E os nus prosseguiram interagindo com répteis e outros animais de grande porte, sendo camaleões e lagartos os mais evidenciados. No ano de 1987, Maga Márcia veio a conhecer sua irmã mais nova, a Sereia do Aquário, sem ainda imaginar que um dia, apesar de não terem convivido nas brincadeiras de infância, se tornariam tão unidas. Foi durante a exposição individual em sua terra natal, que também repercutiu num tal de “deu o que falar” desde a performance de abertura e durante os meses em que ficou aberto ao público. A mostra recebeu a visitação de mais de mil pessoas, entre elas uma Devota de Hábito, que fez questão de entrar para esconjurar a exposição, gritando: “Essa mulher é louca! É bruxa! Pecadora! Tem problemas sexuais!”. E quanto mais apontava seu dedo em riste blasfemando contra as obras, mais enrubescida ficava. De repente, o tempo virou em fúria, uma rajada de vento muito forte bateu, sacudindo um autorretrato em tamanho natural até que o fio de nylon rompesse, espatifan-

O Fruto Proibido pastel seco 1987 O Brinde pastel seco 1987 A Ceia pastel seco 1987

49


do aos pés da Devota que, apavorada, saiu gritando pelas ruas: “Isso foi obra do Capeta! Isso é Bruxaria! Prendam essa Louca!”. As pessoas que passavam nada entenderam e muitas entraram na sala de exposições para ver do que se tratava. Uns se riam, outros cochichavam e vários sorriram e agradeceram dizendo que voltariam mais vezes trazendo outras pessoas. Um senhor de 89 anos declarou que Maga Márcia, ainda tão nova, havia sido capaz de captar a atmosfera poética da beleza do corpo humano em cores além das reais, em perspectivas e escorços que eram um verdadeiro desafio. Até 1988, os nus femininos e masculinos com lagartos e outros bichos enroscados em plantas trepadeiras continuariam a chocar muitos e a ter admiração de poucos que entenderam que a importância dessas obras era, acima de tudo, aprimoramento técnico e domínio da forma e perspectiva, em beleza e poesia hedonista. E o lápis de cor proporcionando controle na textura do moiré trazia algo quase perto à perfeição que buscava – o olhar que realmente fita para quem contempla a obra, olhar que acompanha. A expressão do corpo despido de preconceito e resplandecente em beleza de luz e forma sempre foram seus mais nobres objetivos na conquista de construir a figura humana. Apesar de alguns tititis das más línguas, mais duas pessoas foram importantes e determinantes no apoio ao que fazia, com os seguintes depoimentos:

Constelação de Áries lápis de cor 1984

“O sexo (ainda) assusta muita gente. Pura hipocrisia. Aquilo que é repreendido na sala de jantar extravasa no motel. E o que a boca verbaliza como censura, fica estacionado na mente até o momento da liberação. Mas, felizmente, há sempre corajosos como Márcia Széliga. A ela fiz questão de oferecer minha Referência Especial. Na genitália está o princípio da Vida e que, ao contrário do que dizem todas as religiões (formas de repressão inventadas pelos homens), o prazer é uma dádiva de Deus para o equilíbrio do homem. Um dia, por hipocrisia, esconderam, nos fundos de um palácio do poder político, a escultura de Erbo Stenzel. E logo com o corpo (massacrado pelo homem) da mulher! Ah, Curitiba! Você, que é a cidade mais civilizada do Brasil, não poderia ter admitido isso com um artista. Os hipócritas têm medo de sexo. Márcia e eu, não.” Olney Kruse, crítico de arte, São Paulo, maio de 1986.

Bola de Chicletes lápis de cor 1985

“O desenho de Márcia, que minuciosamente percebe cada fresta em seus sonhos, causa impacto justamente pela limpeza e lucidez com que transpõe para o plano pálido do papel: elementos e espíritos que jogam de prazer com a luz. Bichos doidos entre olhos, orelhas - sexos tentam compreender (esclarecer?) o homem, este sim em extinção, condenado por só pensar e não viver: por que somos tão fúteis? Encanta-me o compromisso que ela tem com a crítica e essas línguas, safadas cobras que conseguem quentes sempre se intrometer... Sedução? Sim, sim, não há mais dúvida: estamos encurralados. Por pura sorte ou solução, os espíritos da Márcia muito mais invadem o planeta. Pode você também percebê-los?” Everly Giller, artista plástica, Curitiba, fevereiro de 1988.

Na página oposta: Sem título Litografia 1987

Samanamadamiga, como Maga Márcia a chama, amiga e 50


51


52


Na página oposta: Sem título lápis de cor e grafite 1987

Sax Sex lápis de cor 1987 Sem titulo óleo sobre tela 1987 Sem título lápis de cor 1984 Lizaluz lápis de cor 1985

Sem título lápis de cor 1985

53


Na página oposta: Procissão de Gnomos na Serra do Mar desenho a grafite sobre foto de Mauro Giller 1988 O Guardião Litografia 1987

Bichinho de Estimação Litografia 1987

54


55


56


musa inspiradora que posou de modelo em algumas de suas mais significativas obras dessa fase, também diz:

Capa do livro O Menino que contava estrelas de J.M.Perugini 1986

“Nos conhecemos em 1981, na EMBAP, quando começamos o curso Superior de Pintura, numa turma com cerca de 40 alunos. Não nos aproximamos de imediato. Fomos gradual e definitivamente consolidando uma amizade que, como árvores que se entrelaçam por serem semelhantes, vão se enraizando, dando mútuo suporte, se fortalecendo, crescendo e florescendo, pelas trocas de ideias, ideais, experiências e emoções dos momentos vividos juntas ou separadamente, mas assistidas uma pela outra, sempre que solicitadas. Márcia sempre fez do “jardim” ao seu redor a fonte de inspiração para expressar o seu mundo interior, rico e colorido, dando forma e vida aos seus pensamentos, emoções e experiências vividas com a linguagem poética de seus desenhos, pinturas e, mais recentemente, também com seus textos, poemas e histórias, com beleza e qualidade técnica. E tem, merecidamente, por ser constante e apaixonado, conquistado o reconhecimento do seu trabalho. Fomos colegas de classe no início, fui sua modelo inúmeras vezes (talvez a mais retratada por ela!), tornamo-nos colegas de classe no curso de arteterapia, mas mais que amigas somos irmãs de alma. Temos acompanhado a vida uma da outra, temos sido companheiras há tempos. E continuo redescobrindo em Márcia alguém que, como flor, desabrocha com mais beleza, força e vigor depois de cada poda, a cada nova estação.” Rosane Santos, artista plástica e professora

Na página oposta: Canção de Ninar para Rubens lápis de cor 1985 Auto-retrato tamanho natural para a exposição A Grande Pitonisa pastel seco 1985

57


12°. Brinquedo: O Índio

N

N

Tatau pelúcia 1988

58

Na página oposta: O som do fundo do rio lápis de cor 1988

o final de 1985, Touro Maluco retorna à pátria. Os nus ainda se estendem até 1988, quando passam a não fazer outro sentido que não o de estudos para aprimoramento técnico sem nada mais a dizer nem tocar. Tinham cumprido o ciclo e o propósito. Nesse ano, Maga Márcia havia criado um personagem, o Tatau, um tamanduá-bandeira detetive, exterminador de formigas. A ideia inicial havia sido de um colega de trabalho. Mas como ele dizia não saber desenhar, Maga Márcia criou toda a concepção do personagem principal e dos secundários – a gangue de formigas punks -, assim como os cenários, que posteriormente se transformariam em histórias em quadrinhos, pôsteres decorativos para quartos infantis e até bichos de pelúcia. Por conta própria e na ingenuidade de não conhecer muito bem seus direitos de autoria, Maga Márcia em sua casa gestou e gerou Tatau como se estivesse a cuidar de um filho. Comprou a ele um par de conguinhas vermelhas, confeccionou um óculos ray-ban bacana, uma jardineirazinha jeans, um sobretudo preto e um chapeuzinho de detetive. O boneco nasceu, porém, confiado a mãos erradas, acabou sendo sequestrado pelo ambicioso $enhor do$ $ifrõe$, e nunca mais se soube nem do seu destino muito menos de seu paradeiro. Para Maga Márcia, mais um luto sendo tristemente vivido. Soube-se que o $enhor do$ $ifrõe$, já em prejuízo por sua ganância, tentou outro desenhista que pudesse substituir


59


A lenda dos Homens Morcego lĂĄpis de cor 1988

O mundo subterrâneo låpis de cor 1989

60


a maternidade de Maga Márcia. Contudo, este disse que só quem cria é que conhece a Alma de seu personagem, pois contém ingredientes do próprio criador, um segredo difícil de ser acessado e revelado. Maga Márcia então tentou deixar o assunto triste pra lá, dizendo a si mesma que o dom de sua mão ninguém seria capaz de tirar. Quanto ao $enhor do$ $ifrõe$, logo encontrou sua derrota, afundando o navio do império que construíra, ficando à deriva sem rumo nem remador. Touro Maluco ajuda a preencher esse enorme buraco, estimulando Maga Márcia a se interessar por outros temas que trouxessem uma identidade de mais nacionalidade e encantamento, através da cultura indígena. Começa a pesquisar histórias que possam criar uma ponte com o universo imaginário, mantendo a marca fantasiosa de seu trabalho. As primeiras obras são de criação livre sobre os índios brasileiros. Um olhar romântico e bastante distanciado, não experienciado, com base apenas em algumas referências de elementos estéticos, como adornos e pinturas corporais. Mas o que significavam? Em 1989, as lendas indígenas são reveladas em livros escondidos e raros, e os desenhos, interpretações em lápis de cor, preenchem totalmente grandes folhas de papel em branco. Como ler apenas não bastava, Touro Maluco, grande companheiro, deu a ela outra brilhante ideia: a de conviver de perto com os Índios do Brasil. No mesmo ano, foi morar por alguns meses em uma aldeia indígena, com os índios Kanamari. Eram três dias de viagem de barco até chegar à aldeia mais próxima. Durante as noites, Maga Márcia abrigava-se em rede nas habitações de palafita dos povos ribeirinhos. Era impossível tomar banho ao entardecer. A nuvem de carapanãs cercava os banhistas como uma chuva de agulhas picando a pele. E era preciso resistir às coceiras, pois qualquer gota de sangue atraía mais mosquitos esfomeados que iam se alimentando a ponto de formar verdadeiras crateras de pus no corpo. Anoitecia e as luzes de lampiões e pequenas fogueiras contracenavam com uma imensa lua cheia. Do barco deslizando silencioso e lento no leito do rio, contemplava-se um cenário de silhuetas dos troncos retorcidos que se transformavam lentamente em entidades vegetais vivas movendo braços, torso e cabeças, numa suave coreografia que até parecia ter sido ensaiada para uma apresentação aos navegantes. Tudo durante a noite ganhava outro aspecto, outra vida. Ao amanhecer do terceiro dia, após um espetáculo de botos rosa e azuis saltando das águas com seus filhotes, jacarés se espraiando aos primeiros raios de sol, ainda por trás da névoa espalhada na paisagem, e uma anaconda dourada e gigantesca serpenteando pelas ondas do rio, o barco chegou à aldeia. Maga Márcia foi recepcionada por alguns membros da tribo, um povo de baixa estatura e, por serem remadores, mais entroncados. O caminho estava enfeitado de guirlandas trançadas com palha de buriti, e a mais velha da tribo ia à frente entoando um cântico de boas-vindas, enquanto se ouvia da tribo a resposta de outro nativo tocando algum instrumento de

Criança Kanamari aquarela 1989

A Lenda da Vitória Régia óleo sobre tela 1990

Sem titulo lápis de cor 1988

61


62


Na página oposta: Tsereko lápis de cor 1992

Sem título lápis de cor 1988

Detalhe

63


64


sopro, dando um belo efeito estéreo que propagava por entre as altas árvores da floresta amazônica. Ao chegar, logo lhe foi oferecida em uma cumbuca a caiçuma, bebida fermentada de mandioca mastigada. Maga Márcia foi para uma das ocas, pertencente à família dos Werê-Djapá, ou família dos Queixadas, e lá amarrou sua rede e mosquiteiro. Cada família representava um bicho e as características anatômicas da face já eram definidas a partir dos primeiros três meses de vida, em massagens que iam modelando o rosto do bebê, que ia assumindo, da forma mais próxima possível, as características do animal representativo da família. Maga Márcia foi batizada com o nome de Uahkodzi, que significa banho de rio. Provavelmente por ficar boa parte do tempo a se banhar nas águas dos igarapés, devido ao intenso calor. Uahkodzi desenhou apenas alguns croquis e aquarelas para registro, e anotou algumas observações. Investigou os mistérios da cultura indígena, procurando aproveitar ao máximo a natureza e a experiência com o convívio: as festas, as histórias contadas ao redor da fogueira, as danças, a colheita, os banhos nos igarapés, a rotina da tribo, as brincadeiras com as crianças. Em uma das noites, escura como o breu, a Mãe Natureza deu o ar de sua graça manifestando-se em fenômenos misteriosos. Durante a dança de celebração da boa colheita do dia, o pajé praticava cura em um índio enfermo, que estava com metade do corpo paralisada, fazendo ventosas com as próprias mãos e a boca para sucção. Em seguida, cuspia pequenas pedras, que eram a materialização dos maus espíritos sendo expurgados. As índias mais velhas iluminavam com tochas o terreiro. Cascas almiscaradas de uma árvore, enroladas nessas tochas, perfumando o ar. De repente, o céu ficou todo iluminado e uma bola de fogo com cauda brilhante atravessou, riscando o céu e desaparecendo tão rápido quanto surgiu. Uma coruja branca atravessou a aldeia num voo rasante e todos ficaram alvoroçados, correndo cada um para sua casa. Na vegetação densa da mata ao redor da aldeia, todos avistaram fachos azulados velozes a correr entre as árvores. Um bando de boitatás – cobras de fogo, soltavam labaredas, serpenteando e se enroscando pelos galhos. No dia seguinte, a ninguém foi permitido sair para caçar ou realizar qualquer outra atividade – nem tomar banho em igarapé. Só um indiozinho desobediente que apareceu chorando e gritava: “Bahi’ú! Bahi’ú!”. O menino havia fugido para a borda da mata. Assustado, repetia dizendo que havia visto Bahi’ú, o espírito da floresta, protetor dos animais. Mas segundo contam, Bahi’ú captura qualquer pessoa que se aventure pelas trilhas da selva densa, prendendo-a para sempre nos troncos das árvores, principalmente se estiver a caçar sem o intuito de comer ou se destruir a natureza. E lá se foi um grupo de homens fortes e corajosos, armados de arco e flecha, procurar Bahi’ú. Uahkodzi quis ir junto. Besuntou-se de urucum para pro-

A lenda da mandioca lápis de cor 1991

Na página oposta: O Boto cor-de-rosa lápis de cor 1991

65


teger a pele branca do sol forte e do ataque de carapanãs. Porém, os índios não a deixaram ir muito longe. Mesmo assim, Uahkodzi teimou e deu um jeito de acompanhar até a boca da mata onde pôde ver algo se mexer. Uma forma escura espreitava, camuflada na vegetação e se movendo agachada. O grupo acompanhou lentamente o movimento e com os arcos e flechas prontas para serem lançadas, penetraram mais adentro para descobrir o que ou quem estava lá. A criatura correu veloz por entre cipós e um emaranhado de galhos. Pássaros voaram estabanados, agitação na folhagem. Alguns índios ainda tentaram alcançar em vão, mas Bahi’ú avançou tão rápido mata adentro, que todos o perderam de vista. Era como se desmanchasse no ar qual fumaça. O grupo voltou à aldeia e nesse dia todos ficaram em silêncio nos seus afazeres. Uns catavam piolho nos cabelos das crianças, outros preparavam ponteiras de lanças e flechas. Já era hora de preparar os alimentos quando, numa grelha feita de gravetos, foi colocada uma cabeça de macaco, posta como um troféu da caçada do dia anterior. Os índios, enquanto preparavam a refeição, agradeceram ao espírito do macaco por servir de alimento. Cortaram-lhe as mãos e os pés para sua alma não perseguir as pessoas da tribo, assombrando e exigindo a vida de volta. Do gogó do Macaco Guariba foi feito um instrumento musical, de sopro, de duas notas só. O som nada mais era do que o grito do animal. Na refeição foram servidos cará, mandioca e carne de macaco. Depois, à tarde, Uahkodzi foi presenteada com um balaio de laranjas e bananas. Já haviam se passado três meses quando Uahkodzi começou a ter uns sonhos estranhos e premonitórios. O grupo deveria seguir viagem por mais três dias de caminhada por dentro da mata até a próxima aldeia. De barco, levaria pouco mais de um dia. Mas o barco resolveu misteriosamente enguiçar. Uahkodzi teve uma sequência de três sonhos, todos eles avisando que não prosseguisse viagem mata adentro, pois um Pássaro Gigante a aguardava para levá-la a terras distantes. Uahkodzi então, após três noites, avisou que deveria partir. O barco não pegava de jeito nenhum e os índios pediram aos espíritos de seus antepassados que viessem em auxílio. Ao final do último dia na aldeia, ao pôr do sol, o pajé posicionou três índios voltados ao sol nascente. Pediu de presente de Uahkodzi uma mecha de seu cabelo, que foi dividia entre os três e entoou cânticos de despedida e rezas de proteção para que os seres encantados da floresta a acompanhassem de volta para casa. Misteriosamente, o barco voltou a funcionar. Enquanto isso, no vilarejo onde o grupo se abrigava, a casa de passagem dos peregrinos da causa indígena, três dias antes – exatamente no dia em que o barco falhou – havia sofrido um atentado, tendo sido esburacada a balaços por armas de fogo daqueles que, por interesse de exploração das riquezas naturais, não gostam de quem defende as terras dos índios. Uahkodzi recebe uma mensagem assim que entra na casa baleada. O Pássaro Gigante que a levaria para terras dis-

Na página oposta: Uahkodzi lápis de cor 1992

Banho de Igarapé lápis de cor 1991 Índios acrílica 1988

66


67


Na página oposta: A lenda do Urutau lápis de cor 1992

Sem título lápis de cor 1988

Bahi’ú lápis de cor 1991

A lenda das araras vermelhas aquarela 1988 Mistérios da Celebração na aldeia lápis de cor 1992

68


69


70


tantes mandou um recado: tudo já estava pronto e à sua espera. Outro Pássaro Branco, menor, foi chamado no dia seguinte para levá-la embora dali. Enquanto sobrevoava a região, despedia-se dos índios que navegavam pelos rios e contemplava a paisagem, que mais parecia uma imensa horta de couve-flor e brócolis, entrecortada por diversas linhas sinuosas do caminho das águas. Uahkodzi levou na bagagem um grande aprendizado sobre valores verdadeiros do mundo material em conexão com o espiritual. O cheiro da mata e da pele dos índios, a sinfonia da sapaiada à noite, os borrifos de água com as crianças nos igarapés, as frutas colhidas do pé e as raízes arrancadas do chão, a natureza em abundância: tudo isso ela deixou bem gravado na memória e no coração. Um jeito simples e rico de viver. Uahkodzi teria mesmo ficado por lá, não fosse a bolsa de estudos em Desenho Animado que ganhou para estudar na Polônia – mais um dos seus sonhos e apelos da alma indo ao encontro da origem de seus antepassados.

Tatau aerografia 1988

Na página oposta: Mistérios da Celebração na aldeia lápis de cor 1992 Os sapos do tronco oco Lenda Kanamari nanquim 1990

71


13°. Brinquedo: O Dragão Polonês

U

U

Smok Wawelski O Dragão Polonês lápis de cor 1992

ahkodzi demorou um tempo até se acostumar com a ideia de que estava distante de casa. Dormia ainda tendo nos ouvidos o eco do vozerio dos índios, o coaxar dos sapos e outros sons da natureza. Estava num lugar onde não entendia uma só palavra do que diziam e procurava se comunicar por meio de gestos. Apesar de ter chegado durante a primavera, já havia a preocupação de obter trajes adequados para o inverno que se aproximava e prometia ser bastante frio, num país onde o comunismo ainda imperava, nem sempre havendo recursos – mesmo os mais básicos e necessários – disponíveis para viver. Embora Uahkodzi não fizesse disso seu maior problema porque, afinal, aprendera a sobreviver bem na selva com o mínimo necessário. Na Polônia, Uahkodzi passou a ser chamada pelo sobrenome. Morou primeiramente num lugar onde havia estudantes de diversos países. Depois foi viver num prédio onde só residiam estudantes de artes. Esse prédio havia sido sede da Gestapo durante o domínio nazista. Impossível falar do tempo de Polônia, logo depois de ter convivido com os índios em plena floresta amazônica, sem mencionar a excursão feita aos campos de concentração de Auschwitz, Birkenau e Treblinka. Isso fincou seus pés em outra realidade, dura, triste e mórbida demais. Ficou trancada durante uma semana em seu quarto, sem querer olhar a vida lá fora.

Taxi polonês grafite 1989 (publicado no livro A banda polaca, de Dante Mendonça, Ed. Novo Século, 2007)

72


73


74


Na pรกgina oposta: Pan Twardowski e o diabo de Cracรณvia lรกpis de cor 1992

Debaixo da Amexeira (O dia em que o Diabo entregou sua Alma ao Anjo por um caneco de cerveja) lรกpis de cor 1992 Menino Lobo lรกpis de cor 1989

75


Água que passarinho não bebe story-board 1990 Na página oposta: Porta em Cracóvia grafite 1989

Kelnerka, grafite 1989 Babka, grafite 1989 O cão e sua dona polonesa grafite 1989 (publicados no livro A banda polaca, de Dante Mendonça Ed. Novo Século, 2007) Criança Romena grafite 1989

76


77


Em seu quarto, para poder assimilar o contraste de culturas enquanto as aulas de línguas não começavam, desenhava as impressões de sua viagem à floresta. Trabalhava também no desenho de um ser que conheceu enquanto era preparada para ir à aldeia: o Menino Lobo. Com ele, cavalgou num Cavalo-Marinho que ganhou de presente e que os levou a navegar por um rio até chegar numa cachoeira, onde entre árvores e cascatas brincaram de escondeesconde e se balançavam em redes amarradas aos troncos, olhando as estrelas e aprendendo a pescar peixes. Mas chegou o dia, como já era sabido, de Uahkodzi dizer adeus e partir nas asas de um Pássaro Branco. Anos depois, um de seus melhores desenhos sofreu a ação devoradora de um dos quatro elementos, ficando apenas registrado em uma fotografia. A paisagem polonesa foi ganhando outras cores. Árvores pelas alamedas dos parques e heras agarradas às paredes dos castelos mudavam de verde para tons fortes que iam do vermelho ao amarelo, indicando mudança de estação. Os passeios pelo rio Vístula e redondezas davam vista para construções medievais soberanas. E à noite, o aroma do mistério se espalhava em névoa pelas ruas de paralelepípedos irregulares e pelos acessos em arco aos becos pouco iluminados que guardavam segredos. No recôndito profundo das muralhas do Castelo, o brilho de um olhar sinistro espreitava. Soltando baforadas das narinas pelo ar, o Dragão, com seus olhos vermelhos, colocou a cabeça para fora e depois avançou claudicante e lentamente com as patas de unhas retorcidas. Por fim, exibiu suas asas e corpo de escamas douradas. Ensaiou uns passos de dança folclórica e cumprimentou gentilmente, com reverência típica de um nobre, os visitantes que passavam. Nisso, apontou para uma luz no Castelo que acendeu devagar. Lá, os vultos de dois fantasmas, do Rei e da

Sequência de quadros para filme de animação nanquim 1990

Cenário Polonês aquarela 1992

78


Rainha, tomavam uma chávena de chá com limão antes de sair para assombrar em voos noturnos. O velho Dragão, cujo nome era Kochany Smok Wawelski, com seu olhar penetrante perguntou o nome de Uahkodzi, que a partir desse instante apresentou-se como Pani Széliga. Amistosamente, o Dragão convidou-a para subir em suas costas e fazer um passeio pelos ares. Sobrevoaram da antiga cidade até as montanhas, onde já nevava. Mostrou lugares escondidos, florestas, ruínas seculares, monumentos de guerra e até os campos de concentração. Os dias percorriam assim entre estudos e viagens, entre chás e deliciosas kremówkas. Pani Széliga e Kochany Smok Wawelski se tornaram grandes amigos. E quando a neve chegou, a princípio em flocos de cristais perfeitos e em seguida como nevasca, cobrindo de chantilly as ruas e telhados das casas, parecendo um imenso bolo de festa –, os dois saíram para brincar. Fizeram bonecos de neve, modelando bolas que atiravam um no outro, entre risos e muitos tombos. Em seu coração de Dragão ficou guardada uma memória sobre ela, descrita em dragonês: Cholera jazna... Tak szypko... Ai ai ai … a “Bruxa Márcia” … Seus olhos e seus segredos... To wielka tajemnica prosze Pani! Força, talento e sensibilidade sem iguais! Porto seguro acompanhado de herbata z cytronq i logicamente kremówka... Às margens do Wisła. Criatividade com “risquinhos” mágicos, fazendo surgir obras primas de tamanho encanto que as lágrimas surgem ao acaso... Talento inacreditável unido à afável artista. A vida faz sentido tendo uma amiga como você! Paulo Cesar Kochanny, secretário consular do Consulado Geral da República da Polônia

Polaca com gato caneta esferográfica 1989

79


14°. Brinquedo: O Boto Francês

N

N

Polaca em Paris grafite 1991 (publicado no livro A banda polaca, de Dante Mendonça, Ed. Novo Século, 2007)

80

Na página oposta: Lenda Sueca lápis de cor 1991

as férias, Pani Széliga entrou numa Centopeia-Fumaça Compriiiida e foi conhecer Paris. Com uma carta da embaixada brasileira, conseguiu entrar no Museu do Homem para realizar uma pesquisa, desenhando uma coleção de mais de cem peças indígenas que haviam sido trazidas por uma expedição francesa há cerca de 300 anos. No Brasil, elas haviam se perdido e muito pouco fora preservado da cultura ao longo dos anos de contato com a civilização, que dizimou muito dos costumes. Na oportunidade, conheceu também Maria Amazona e seu amigo, o Boto Corde-Rosa com nome de Anjo. Maria Amazona morava há muitos anos na França e escrevia sobre as lendas amazônicas. Sentia muita saudade de sua terra natal. Oferecendo sua morada para Pani Széliga descansar, toda noite antes de dormir contava uma ou mais histórias sobre botos, serpentes, vitória-régia, Iara, Curupira e Saci. E de manhã já deixava o lanche preparado à moda manauara: macaxeira cozida e manteiga derretida com um copão de leite quente. Em 1990, no retorno das férias e após ter encerrado o curso de línguas, Pani Széliga entra finalmente para a Academia de Belas Artes de Cracóvia, enquanto preparava as ilustrações para os livros de contos amazonenses de Maria Amazona. O primeiro desenho animado realizado a título de exer-


81


cício apresentava um sapo disfarçado de pedra que pacientemente aguardava o momento certo para capturar uma libélula que sobrevoava acima de sua cobertura de cogumelo. A segunda animação, em que quadro a quadro foi feito à mão com desenhos em nanquim, mostrava um índio massageando o próprio rosto até se transformar em um tucano que voava até o galho onde havia outro tucano aguardando. Alguns roteiros foram desenvolvidos com ênfase na mensagem que as imagens em movimento poderiam passar, já que eram todos filmes mudos. A alma de um filme de animação, muito além de apenas um começo, meio e fim, e de inserção de diálogos, impacta muito mais quando é capaz de falar por meio de imagens. Logo, a alma de todo filme está em seu roteiro. Foi com essa premissa que Pani Széliga passou a se referenciar em cada expressão de arte, desde uma obra de arte em papel ou tela até o desenho ganhar vida própria em um filme de animação. Em 1991, numa galeria de arte polonesa, realizou exposição individual de obras em lápis de cor e aquarela que, pelas cores e exotismo, impressionaram bastante o público num país onde predominavam o preto e os tons de cinza do inverno. Todos exclamavam: “Oh! Jak kolorowy!”. Sniadanie (Café da Manhã) foi o último filme de animação produzido em preto e branco na Academia. Fala do vício

O nascimento de Saci nanquim O Cobra Honorato nanquim

82


em bebida e em cigarro, com três minutos de duração. Outro roteiro a ser apresentado foi Woda której nie pie ptaszek (Água que passarinho não bebe), também de temática acerca do alcoolismo. E assim, seu professor, na conclusão do curso, escreveu em carta de recomendação: “Márcia Széliga estudou desenho animado com firme vontade e acreditando na possibilidade de conseguir muitas novas capacidades e experiências no caminho do desenvolvimento artístico. Seus resultados lhe deram a possibilidade de formação de uma interessante personalidade e de aparecer no campo artístico assim como no comercial. Não se esquecia das suas raízes e da sua educação no Brasil nem de sua origem polonesa. Com a sua atitude, trabalho e resultados, conquistou o respeito de outros estudantes e da comunidade da nossa escola.” Prof. Jerzy Kucia, Academia de Belas Artes de Cracóvia, Polônia, 1991 O romance do Cobra Grande nanquim

E assim, Pani Széliga, desvestindo-se de Pani, despediu-se da terra de seus antepassados. Touro Maluco chegou montado num Pássaro Branco para encontrá-la e juntos seguirem viagem para a ilha britânica. Lá, moraram em casas abandonadas e mal-assombradas e trabalharam com diversas atividades – desde lavar pratos, limpar casas e vender sorvetes de baunilha até cuidar de idosos e crianças.

O romance do sol e da lua e o nascimento do Rio Amazonas nanquim As ilustrações destas duas páginas fazem parte dos Contos da Amazônia, de Maria Creuza de Souza Edições Jatyba, Paris, França, 1991

83


84


Na página oposta: A lenda de Mara nanquim

A origem do sol e da lua nanquim A lenda de Jacy nanquim A lenda da árvore do tarumã, nanquim O nascimento de Iara nanquim As ilustrações destas duas páginas fazem parte dos Contos da Amazônia, de Maria Creuza de Souza Edições Jatyba, Paris, França, 1991

85


Na pรกgina oposta: Punk Londrino lรกpis de cor 1990

Maria Helena lรกpis de cor 1991

Lenda Sueca lรกpis de cor 1991

86


87


88


Na página oposta: Besançon, França aquarela 1991

Széliga, simplesmente como preferia ser chamada a partir de então, foi chamada de volta para a França. Com a ajuda de seus amigos Amazona Maria e Boto Corde-Rosa, –que viu em seus desenhos muita umidade, como dizia – aconteceu a exposição de suas obras na Maison Internationale de la Cité Universitaire. Boto Cor-de-Rosa disse, com olhos de saudade: “Seus desenhos são quentes e têm muita água.” E quis tornar-se irmão dos desenhos de Széliga, mergulhar nos traços coloridos que compunham as águas e vegetação, certamente por lembrar-se do habitat de sua natureza selvagem. Mas em poucos anos, Boto Cor-de-Rosa virou mesmo Anjo, fazendo jus ao nome que tinha, indo morar nas profundezas do firmamento. Széliga passou a procurá-lo no céu. E até hoje, sempre que encontra uma nuvem rosa com forma de boto, lá do alto vem um aceno. Amazona Maria, para contar da passagem de Széliga pela França, publicou em uma revista francesa: “Apesar do meu grande apego pelo Sul do meu país, foi preciso atravessar o Oceano Atlântico e me encontrar em terras distantes para que as condições se fizessem necessárias para encontrar a Fadinha das Águas do Sul. Seu universo estende-se sem nenhum impedimento. Seu trabalho impõe-se por ele próprio! Com uma varinha mágica na mão, por onde ela passa brota o Belo e a Harmonia.” Maria Creuza de Souza, escritora amazonense, Paris França, maio de 1991.

Jornaleiro em Londres grafite 1991 (publicado no livro A banda polaca, de Dante Mendonça, Ed. Novo Século, 2007)

89


15°. Brinquedo: O Pássaro-Livro

O

O

Na página oposta: As seis garrafas de ouro Álbum de litografias Lendas Curitibanas 1993

retorno ao Brasil trouxe mais estranheza do que o gosto de “lar doce lar”. Sabe-se lá se foi Széliga que mudou ou se foi o mundo que parou. Mas a verdade era que Széliga, mesmo com as asas que haviam nascido em suas costas, havia se transformado num pássaro fora do ninho. Todos continuavam os mesmos em suas rotinas, e, em poucos meses, Széliga estaria se readequando à realidade que havia deixado ao partir. Com sua produção feita na Europa, as boas-vindas da cidade abriram as portas de um espaço para realizar sua primeira exposição de retorno, em 1992. “As lendas da Amazônia são revestidas de um surrealismo que não tem nada a ver com sonhos e, ao contrário, tem detalhes da natureza vegetal e animal bem como elas são. O resultado dessa simbiose é belo e surpreendente. Belo porque é uma arte que tem como suporte um desenho sem titubeios, bem delineado e perfeito nas filigranas, tudo isso com uma cor cheia de vida, mas sem espalhafato. Surpreendente porque Márcia é muito criativa e, lembrando o surrealismo, coloca as lendas indígenas num ambiente livre e etéreo, com forte dose de realidade.” Aurélio Benitez, crítico de arte, Curitiba – PR.

Prazeres do Pê de Cecília Vasconcellos Editora Braga gouache 1995

Também um gravurista, Orlando da Silva, ao conhecer as 90


91


Visita de Parente distante O circo

A Casa da Vovó As ilustrações destas duas páginas fazem parte das Lições Curitibanas Secretaria Municipal de Educação 1994

92


A Lua Era uma casa muito engraรงada...

Caleidoscรณpio

93


94


obras de Széliga, disse a ela: “Agora quero ter a honra de conhecer a sua lenda pessoal”. Foi preciso passar um bom tempo até entender que ele quis que ela fizesse desse pedido uma determinação pelo caminho do autoconhecimento e redescoberta de si mesma. Em início de 1993, casou-se com Touro Maluco. E na metade do ano, mesmo sendo inverno, ela viu nascerem girassóis por todo lugar onde passava, nas frestas dos muros, nos cabelos das pessoas: Széliga esperava um bebê muito sonhado. Nesse ano ainda foi convidada a dar um curso de extensão em ilustração na Universidade. Um de seus alunos, funcionário de uma editora, convidou-a a conhecer um índio Guarani que havia escrito um livro e procurava alguém que pudesse ilustrar sua história. Abriu assim o portal do Universo Literário. A cidade de Curitiba preparava uma grande festa de seus 300 anos, em 1993, quando Széliga pesquisou as Lendas de Curitiba, que pouca gente ouvira falar, lançando um álbum ilustrado de litogravuras. No mesmo ano, foi contratada pela prefeitura para ilustrar livros que seriam espalhados por muitas escolas, bibliotecas e pelos Faróis do Saber – a coleção Lições Curitibanas, festivamente lançada na Ópera de Arame. Nessa época, depois de passar por um grupo de estudos espíritas, iniciou os estudos sobre si mesma por meio do Quarto Caminho. Diziam que Széliga a partir de então não iria mais conseguir desenhar por ter se tornado mãe. Mas o que aconteceu foi uma coisa maravilhosa: com tanta imagem para criar, uma transformação aconteceu em seus desenhos. Numa das reuniões com o grupo do Quarto Caminho, o bebê no ventre se mexeu muito e pediu para que Mamãe Széliga voltasse para casa.

Sete Quedas, Sete anões e um Dragão de Gloria Kirinus Editora Braga lápis de cor 1997

Capa do livro Histórias do Cotidiano Paranaense de Maria Auxiliadora Schmidt Governo do Estado do Paraná 1996 A lenda da lua Lições Curitibanas Secretaria Municipal de Educação 1994

Na página oposta: O Pirata Zulmiro Lições Curitibanas Secretaria Municipal de Educação 1994

95


Acima e abaixo: Bailado de uma lenda de Jussara Braga Editora Braga lรกpis de cor 1995

96


Sete Quedas, Sete anões e um Dragão de Gloria Kirinus Editora Braga lápis de cor 1997

97


Cenário da peça O pescador e o Peixe de Ouro Clips Histórias de Bolso 1997

Kyvy Mirim de Brígido Ibanhes produção independente lápis de cor 1994

98


Kyvy Mirim de Brígido Ibanhes produção independente lápis de cor 1994

99


Nesta página e na oposta: Espantalhos Lições Curitibanas Secretaria Municipal de Educação 1994

100


101


Quarto de menino

Castelo As ilustrações destas duas páginas fazem parte das Lições Curitibanas Secretaria Municipal de Educação 1994

102


O livro

103


O Anjo Rouco de Paulo Venturelli Editora Braga grafite 1994

Os “freak” de Lewis Carrol Jornal Nicolau nanquim 1993

O Anjo Rouco de Paulo Venturelli Editora Braga grafite 1994

104


Chegando em casa, um jorro de imagens lhe vieram à mente. Tão diferentes daquelas que vinha fazendo até então. Caleidoscópio, uma das ilustrações das Lições Curitibanas, marcaria definitivamente a mudança de seus desenhos, cada vez mais voltados à literatura infantil. Pouco depois, em 1994, o carneirinho Axel, de olhos azuis e nariz arrebitado, nasceu. E Mamãe Széliga passou a produzir muito mais do que antes. Enquanto com uma mão desenhava, com a outra segurava o bebê para amamentar. Outras obras foram surgindo, e assim a produção continuou por anos, entre livros didáticos, literatura infantil e juvenil, cenários para peças de teatro e até uma animação intitulada Como Peixe Fora D’água, para o Festival do Minuto. “É impossível ficar indiferente às ilustrações de Márcia Széliga. Lembro que o primeiro trabalho dela que vi – e me apaixonei – foi o livro Sete Quedas, Sete Anões e Um Dragão, de Gloria Kirinus. Estava em minha primeira Bienal do Livro, no Rio de Janeiro, como profissional do mercado. Fiquei encantado. A suavidade do lápis de cor, o contraste das cores, a força dos personagens, que pareciam que iam saltar das páginas e ganhar vida, tornaram-me, para sempre, um admirador e um de seus editores. Qualquer palavra utilizada para descrever a arte que ela desenvolve, aperfeiçoa, transforma, cria e recria não poderia exprimir perfeitamente o seu significado. Além do mais, é uma ilustradora talentosa, mulher e mãe corajosa, autora sensível, enfim, uma artista que dá gosto conviver e encomendar trabalhos porque tem sensibilidade suficiente para captar e transformar o texto em belas imagens.” Amir Piedade, paranaense e paulistano de trabalho e coração, é editor de literatura da Cortez Editora e tem um catálogo grande de trabalhos com Márcia Széliga.

Capas dos livros Kyvy Mirim de Brígido Ibanhes produção independente lápis de cor 1994 O Anjo Rouco de Paulo Venturelli Editora Braga grafite 1994 Pássaros Parados de Lúcio Bandeira Lei Municipal de Incentivo 1996 Sete Cavalos na Berlinda de Sidónio Muralha Editora Global, 1997

105


16°. Brinquedo: A Casinha de Madeira

I

I

O reino do rei tubarão gouache 2000

Na página oposta: Carlos Daitschman O Contador de Histórias aerografia 2002

nverno de 1998. Mamãe Széliga viajou para uma ilha coberta de mel. No mar, golfinhos exibiam um belo espetáculo de acrobacias, e nas areias, vários caranguejos brincavam de esconde-esconde, enquanto as corujas ficavam em tocas, observando. Foi nessa ilha cheia de encantos que o segundo menino de Mamãe Széliga foi concebido. Quando voltava de barco para casa, tinha certeza de que carregava mais uma sementinha no ventre. Durante o tempo de gestação, Mamãe Széliga tratou de ajeitar o ninho e foram todos morar numa casinha de madeira que seu irmão Gênio Gêmeo havia projetado. Ao fundo, um casal de Araucárias de braços sempre estendidos, prontos para dar muitos abraços. Mamãe Széliga sempre abraça seus troncos e fica por um prolongado tempo assim, sentindo a pulsação desses dois gigantes e velhos sábios do reino vegetal. Viver numa casinha assim colaborou bastante na inspiração. E, mais uma vez, entre construção de casa, gestação e nascimento do segundo carneirinho, o Kelvyn, Mamãe Széliga produziu mais algumas obras da literatura infantil e cenários para peças de teatro. Até, 2002 já havia ilustrado mais de 35 livros de vários autores. Mas foi em 2003, um ano em que não teve nenhum livro

106


107


108


109


Casal na Lua aerografia e gouache 1998

Nas duas páginas anteriores: O nome de todas as coisas: Anfíbios, Répteis e Insetos de Hardy Guedes HGF Produções computação gráfica 2002

Peixe Voador aerografia e gouache 1998

Espantalho aerografia e gouache 1998

110


para ilustrar, que uma série de presságios voltou a acontecer. Um ciclone azul chumbo gigantesco veio rodopiando pelas encostas até chegar ao centro do povoado, destruindo as casas de toda a região, lançando tudo pelos ares e arrancando árvores. Mamãe Széliga pendurava roupas brancas no varal e passarinhos pousaram nas pontas de cada roupa, segurando com as patinhas servindo de grampos. Transformada em Boneca de Pano, com seus braços abertos para um abraço, ela ficou de frente para receber o fenômeno em fúria. E como Boneca de Pano, com seu vestido de retalhos – cada retalho trazendo na estampa um símbolo ou cena representativos de sua vida – e cabelos em longas tranças de lã agitando-se na ventania, não sentiu medo. Só contemplou as cores da paisagem. Assim, ao passar por ela, o furacão foi só uma brisa que soprou em seu rosto e levou de seu vestido as cenas do passado, deixando-a apenas com um traje tão branco quanto as roupas limpas estendidas no varal. O ciclone não havia deixado qualquer sinal de devastação. Pelo contrário: uma linda paisagem de um campo verdejante servindo de palco mostrou pequenas flores campestres colorindo mais ainda o cenário. Boneca de Pano deu o nome ao acontecimento de Elemento Ar. O segundo elemento foi a Água, que se manifestou enquanto Boneca de Pano, voltando a ser Széliga, estava fazendo sua formação em Biopsicologia, onde descobriu Tempo de maturação óleo sobre tela 2002

Inverno lápis de cor 2000

Tempo de abundância óleo sobre tela 2002 Tempo de colheita óleo sobre tela 2002

111


Lua e Sol aerografia e gouache 1998 A turma do estojo aquarela 2000

Teatro do Piรก 1999

112


O nome de todas as coisas: Anfíbios, Répteis e Insetos de Hardy Guedes HGF Produções computação gráfica 2002

Jardim de Cataventos aerografia e gouache 1998

113

Libélulas aerografia e gouache 1998


Calendário ano 2000 Espantalho de Amir Piedade Editora Ave Maria 1999

os efeitos que as emoções causam nas moléculas de água e, consequentemente, no corpo. Széliga empinava a pipa em total concentração e silêncio profundo, próprio de quem medita, quando observou os sinais do céu, logo desconfiando que algo estava por acontecer. Ao longe, uma tromba d’água, tão gigante quanto o ciclone, se aproximava. Sem pensar duas vezes, Széliga, novamente com jeito de Boneca de Pano, construiu um barquinho de papel para navegar naquele mar que, de repente, surgiu pela frente. Apesar da agitação externa, as águas estavam bastante calmas e tão transparentes que era possível enxergar até as profundezas do vasto oceano. Uma suave agitação das ondas se deu quando um peixe abissal, de escamas multicoloridas incomuns e rara beleza, nadou por baixo do barco. Boneca de Pano lançou sua pipa como uma vara de pescar e alcançou a tromba d’água, apaziguando sua impetuosidade. Não demorou muito para que o terceiro elemento – e também o quarto e quinto – se manifestassem, no retorno para casa. Quando Boneca de Pano vestiu sua jardineira munida com uma pá e foi lidar no jardim e na horta, torrões começaram a se erguer à medida que cavava buracos e revirava a terra. Os buracos abriram crateras, revelando fósseis de animais e outros objetos, verdadeiros tesouros, há muito tempo enterrados. Em volta da Boneca de Pano, a terra girou em movimento espiralado para o alto, deixando no ar um cheiro de terra fresca e úmida, pronta para ser adubada e semeada. Por fim, à noite, enquanto Boneca preparava a fogueira, as labaredas cresceram, subindo junto com a fumaça em espiral e máscaras se formaram ao dançar. O céu sem estrelas abriu suas cortinas de nuvens espessas, revelando um escorpião imenso com coração brilhante de Antares. Suas garras faziam reverência ao eclipse lunar, e assim sendo, Boneca de Pano entrou em um tubo de energia invisível e sutil, revelando a quintessência da conexão entre o Planeta e o Universo. Então percebeu seu corpo formado de pequenas esferas ou partículas que se misturavam com o todo. Por um instante, deixara de ser matéria densa. E como estava sem expor havia muito, produziu a partir desses elementos a série de litogravuras Os Cinco Elementos. Reunindo com outras obras, realizou em 2003 duas exposições individuais. Três telas a óleo seriam o prenúncio de uma expressão mais despreocupada com a crítica, tecnicamente sem resultados perfeitos, mas que encontravam a forma expressiva e espontânea de sua criança interior – primeiro sinal de que mudanças estavam a caminho. Figuras como o Espantalho e Bobos da Corte estavam fortemente presentes, espalhando-se em livros, desenhos e pinturas. “Tive muito tempo para sonhar com uma ilustradora do calibre da Márcia. Na verdade, nunca pensei que fosse realmente encontrar a ilustradora sonhada em meu imaginário literário. E eis que o Universo me presenteia com a existência da Márcia, uma profissional extremamente competente, íntegra, poética e reunida em si mesma. Só 114


A cachola da bruxa lรกpis de cor 1998 Outono lรกpis de cor 2000

115


116


Na página oposta: O Fabuloso Circo de Fábulas do Prof. Jacques cartaz da peça teatral de Lena Horn e Roberto Bürgel 1998

Planeta Água de Yves Hublet Cultur Editoração lápis de cor 2002 Artes & Manhas do Mico-leão de Yves Hublet Cultur Editoração lápis de cor 2001

A Grande Guerra de Dona Baleia de Yves Hublet Cultur Editoração lápis de cor 2001

117


O reino do rei tubarรฃo aerografia e gouache 2000

Primavera lรกpis de cor 2000

Circo Vivo de Poesia de Hardy Guedes Filho Editora Mรณdulo 1998 Circo Vivo de Poesia de Hardy Guedes Filho Editora Mรณdulo 1998

Circo Vivo de Poesia de Hardy Guedes Filho Editora Mรณdulo 1998

118


119


Ouvidos Dourados estudo Editora Ave Maria 1999

120


sei que ser ilustrado pela Márcia Széliga significa receber um abraço da própria Criação.” Jonas Ribeiro, escritor - São Paulo - SP, maio de 2003 “Márcia Széliga não desenha. Faz poesia em traços e cores que pousa de leve na página e que nos transportam para o encanto dos sonhos ou da infância. Sua arte nos lembra em cada detalhe o quanto podemos ser livres por meio da imaginação e da sutileza.” Paulo Venturelli, escritor, Curitiba – PR, maio de 2003

Ouvidos Dourados capa do livro de Jonas Ribeiro Editora Ave Maria 1999

121


17°. Brinquedo: A Senhora Morte

M M

Do céu ao céu voltarás Editora Cortez lápis dermatográfico 2004

Na página oposta: Peixe Voador aerografia e gouache 1998

aga Márcia, como voltou a ser chamada, já estava por um bom tempo a se questionar sobre o sentido de existir. Sofria só de ver um mundo cinza do jeito direito, sem o colorido do contrário, mesmo com a quantidade de criações que inventara. Chegara ao ponto de achar que suas obras não diziam mais nada. Eram apenas um tracejado capaz de encantar por sua beleza e cores, porém esvaindo em conteúdo, não mais a tocando. Começou a perceber que criar somente para agradar ou para abrilhantar em fama já não trazia uma verdadeira e mais profunda razão do porquê de estar nesse mundo e de se fazer o que faz. Foi quando recebeu um convite de uma editora para pesquisar sobre contos da Vida e da Morte. Preferiu ir mais além: buscou compreender como a Morte é vista nas mais diversas culturas. Assim, poderia transpor para o livro a ideia da Passagem como algo a ser encarado de forma mais natural do que mórbida, sendo um jeito também de compreender os próprios lutos em vida que deixam cicatrizes. Poderia mostrar que a Morte não é separada da Vida, mas sim parte dela. Resolveu não só reunir contos que explicassem ou servissem de consolo, mas também levar em conta a oportunidade de se firmar como escritora. Em 2004, lançou o primeiro livro de sua autoria e ilustrações: Do Céu ao Céu Voltarás..., que poderia significar, sentia bem, tanto o fim como o início de uma nova jornada.

122


123


Ilustração para a Revista Construir lápis dermatográfico 2004 Do céu ao céu voltarás Editora Cortez lápis dermatográfico 2004

124


Do céu ao céu voltarás Editora Cortez lápis dermatográfico 2004 Caracol da Serra lápis dermatográfico 2003

125


O colecionador de tempos e passatempos lápis dermatográfico 2003 Gratidão às fragrâncias de graça lápis dermatográfico 2003

O colecionador de gatos e pássaros lápis dermatográfico 2003

126

Útero de Sereia lápis dermatográfico 2003


Elemento Ă GUA litogravura 2003

Elemento TERRA litogravura 2003

Elemento AR litogravura 2003

127

Elemento FOGO litogravura 2003


Na página oposta: O Quinto Elemento litogravura 2003

A Baleia e a Ovelha grafite 2005 Ácaro Ícaro grafite 2005

Volta da escola litogravura 2003

128


129


130


Del cielo al cielo autoria de Márcia Széliga Editora Cortez lápis dermatográfico 2004 Abaixo: Monstro grafite 2003

E, de fato, um ciclo se fechava para abrir espaço a outro. Em meio a esse novo despertar, outros autores surgiram para também ilustrar. E o sentimento de infância voltou a dar os seus sinais. Em algum lugar estaria aquele alguém que há muito tempo sentia existir e conhecer sem nunca ter visto. Só não sabia dizer se era seu Amigo Invisível ou se alguma parceria que fosse perfeita a ponto de dar sentido à sua missão como pessoa e profissional. Mas na verdade sentia mesmo era a presença de um Anjo. Um Anjo da Guarda. Associada desde 1999 a uma confraria de Grandes Alquimistas da Literatura Infantil, a Associação de Escritores e Ilustradores da Literatura Infantil e Juvenil – AEILIJ, da qual também foi representante regional, Maga Márcia foi de encontro ao inesperado que o destino conduz: a poesia dentro de si foi provocada e um colar de pérolas foi sendo tecido dos contatos preciosos que surgiam pouco a pouco. Mas uma de suas mais estimadas parceiras, a escritora Liana Leão, que Márcia ajudou apontando um caminho, surgiu por outra via e, por sua vez, foi uma das pessoas que mais abriu as portas de suas histórias para que a imaginação de Maga Márcia pudesse voar livremente, trazendo todas as cores e acordando outros seres especiais que, até então, mantinham-se em silêncio, apenas observando de algum ponto panorâmico a vida através delas se manifestar. “Trabalhar em parceria com a Márcia Széliga é, sempre, motivo de encantamento! Seu traço, sua imaginação, suas cores fazem os meus textos ganharem magia. A Márcia é a fada-madrinha dos meus livros! Eu gosto tanto de seus desenhos que às vezes acho que escrevo apenas como um pretexto para que ela ilustre. Seu desenho é vida, é cor, é movimento. Seu lápis de cor é suave, sutil, puro sentimento. Márcia é poeta da imagem.” Liana Leão, escritora de Literatura Infantil e professora de Literatura Inglesa na Universidade Federal do Paraná.

Na página oposta: Do céu ao céu voltarás Editora Cortez lápis dermatográfico 2004

131


18°. Brinquedo: O Anjo Guardião

E

E A caixinha de Narizes de Bibi e Liana Leão Cortez Editora 2006

m 2005 – um ano um tanto turbulento, com ventos e tempestades que afetavam o equilíbrio e harmonia da vida e com tristes ondas que se propagavam pelo ar, distribuindo mais sintomas ruins – Maga Márcia deu de desejar que viesse um terceiro filho. Primeiro pensou em adoção, depois achou melhor que, apesar da idade madura, pudesse ainda dar à luz uma menina, pois ultimamente vinha recebendo em sonho a visita de uma garotinha muito linda que segurava uma margarida na mão, brincando de Bem-me-Quer Mal-Me-Quer. De uma nuvem distante, mais distante do que o espaço que separa constelações, um Anjo Guardião observava Maga Márcia brincando em sua montanha-russa de emoções. Lá de cima, para criar um elo de comunicação, enviou um sinal, um tipo de barco onde pudessem navegar juntos. Maga Márcia, que acreditava estar em paz, por mais adormecida que estivesse em seu sono profundo, recebeu uma mensagem: a de viver sonhos lúcidos e acordados. O Anjo Guardião trazia nos bolsos palavras em forma de sementes e canção. E as palavras traziam as imagens mais belas. Imagens vindas do Mundo ao Contrário, em cores e em preto e branco. E que também serviam de alimento. As palavras musicais entravam pela nuca e pelas orelhas e Maga Márcia sentiu alegria e saiu dançar com os ventos, pois nunca havia sentido nada igual. A presença e o gosto de saudade tomaram conta dela.

132


“Pegue carona nessa... ler é bom à beça...” Cartaz premiado no programa Viva Leitura Governo Federal, SNEL Ministério da Cultura lápis de cor 2005

133


As ilustrações destas duas páginas fazem parte do livro No Trilho do Trem autoria e ilustrações de Márcia Széliga lápis dermatográfico 2007

134


135


136


As ilustrações destas duas páginas fazem parte do livro Dona Salete de Copacabana e seus amigos de estimação de Luiz Otávio e Liana Leão Editora Salesiana lápis de cor 2005

137


Ao lado e no pé da página: Maluquências de Gabriel Lacerda Editora Fundamento acrílica sobre papel artesanal 2005

Histórias de outrora histórias de agora Parte integrante do livro Projeto Pitanguá Português, Alfabetização Obra coletiva Editora Moderna 2006.

138


Mesmo não podendo enxergá-lo, o Anjo Guardião puxou a Bruxa Fada para o tempo de infância, trazendo à luz um fruto maduro, colhido do Pântano dos Pensamentos Escuros onde foi adubado, sendo ocultado por fantasmas que rondavam com outros monstros bizarros. Maga Márcia sentia a presença do Anjo ao ruflar de suas asas erguendoa no Ar, quando não sentia mais os pés no chão. Ela acabara de ganhar da Vida um presente: voltar a voar! Durante as noites, os olhos do Anjo Guardião eram identificados no brilho de duas estrelas gêmeas e, na Lua, seu sorriso. Anjo e Maga trocavam muitas receitas: doces, salgadas, bem temperadas, azedas e até as sem sabor, bem light. E também as de cores quentes, outras frias e todos os matizes do branco ao preto. A poesia volta a acontecer como forma de comunicação e correspondência com o plano sutil, onde moram o Anjo e outros seres da mesma Egrégora, viajantes ao Mundo da Imaginação. “Anjos olham por dentro” – concluiu – “Anjos carregam as chaves dos mundos invisíveis. Anjos conhecem a alma de uma Bruxa Fada”. E foi assim que, com o primeiro sopro poético do Anjo Guardião ao seu ouvido, Bruxa Fada Maga Márcia viu brilho por tudo novamente. E na alegria e amor por si mesma sendo reconquistados, ganhou o que desejava havia tanto tempo: uma linda menina que já sabia desde o ventre que seria uma Fada. Deu a ela o nome de Nicole, que significa “a que As ilustrações desta página fazem parte do livro A caixinha de Narizes de Bibi e Liana Leão Cortez Editora 2006

139


As ilustrações destas duas páginas fazem parte do livro João e Maria-de-Barro de Luiz Antonio Aguiar Editora Record 2005

140


141


Griselma de Marciano Vasques Editora Noovha America lรกpis dermatogrรกfico 2006

Diferentes de Liana Leรฃo Editora Elementar 2005

142


Griselma de Marciano Vasques Editora Noovha America lรกpis dermatogrรกfico 2006

Julieta de Bicicleta de Liana Leรฃo Cortez Editora lรกpis de cor 2005

143


O Pinguim de Geladeira de JoĂŁo Novais encarte A Folhinha da Folha de SĂŁo Paulo 2006

144


leva vitória ao povo”, embora também a chamasse de Mel. Touro Maluco que a princípio estava a andar de ré, com a chegada da menina que a tudo transformou, virou Touro Babão. Em 2006 chegou ao mundo, numa sexta-feira 13 de lua cheia, a terceira carneirinha, a Menina Fada, num tempo em que Maga Márcia tinha se transformado em Caramuja. O segundo livro de autoria e ilustração de Maga Márcia foi lançado em 2007: No Trilho do Trem. “Um livro é como um filho. A gente dá o melhor de si, tem orgulho, não tem objetividade para julgar. Depois que fica pronto é sempre lindo. A única diferença é que, para fazer um filho, é preciso um parceiro ou parceira e o livro a gente faz sozinho. Márcia tem uma vida interior enorme que merece ser contada. Nossa amizade começou quando, na minha condição de consultor jurídico da AEILIJ, ela me mandou um email sobre um problema de contrato com uma autora cujo livro havia ilustrado. Lembro que minha resposta era bem simples, não jurídica, mas algo de pura sensatez. Márcia ficou grata e me mandou um e-mail agradecendo efusivamente algo que nada me tinha custado. Pouco depois, em gratidão, me mandou um livro ilustrado por ela. O livro chegou exatamente quando eu estava procurando alguém para ilustrar o site que eu estava criando – o Contando História – literatura infanto-juvenil na Internet. Adorei seu traço, pedi o telefone, conversamos mais de uma hora, ficamos logo amigos e ela ilustrou o site. Temos outras identidades, loucuras parecidas, sensibilidades paralelas. Apesar da distância e da pouca frequência de contato, Márcia é percebida como uma grande amiga, uma parceira em duas obras, uma irmã na existência.” Gabriel Lacerda, Advogado e escritor de literatura infanto juvenil, Rio de Janeiro Diferentes de Liana Leão Editora Elementar 2005 Contando História ilustração em computação gráfica para o site de Gabriel Lacerda 2005 O Beijo de Luiz Antonio Aguiar encarte A Folhinha da Folha de São Paulo 2006 A caixinha de Narizes de Bibi e Liana Leão Cortez Editora 2006

145


19°. Brinquedo: O Pégaso

O

O

A Banda Polaca Sopa de chucrute de Dante Mendonça Editora Novo Século lápis de cor 2007

Segredos Compartilhados acrílica

s anos de 2007 e 2008 foram marcados por muitos conflitos internos vividos em silêncio, acumulados por anos. Maga Márcia se isolou do convívio com muitas pessoas, preferindo ficar só a maior parte do tempo. Entregou-se aos afazeres do dia a dia e ao trabalho. Diversão para ela parecia ser perda de tempo. Uma batalha entre o Ego e a Alma estava sendo travada: aquela que fazia de tudo para agradar e ser aceita em contraposição à que ressurgia, firmada no propósito de ser ela mesma a despeito de qualquer julgamento ou expectativa externa. Uma entrada em parafuso daquelas bravas se abateu sobre Maga Márcia, que mais de uma vez questionava, até de forma egoísta, o sentido de viver. Ninguém seria capaz de dizer, olhando para a bela vida que levava, que dentro dela havia algo que estaria prestes a desmontar seu castelo de areia ou a ponto de explodir sua Bolha de Sabão. Um amigo, sempre presente na vida de Maga Márcia, preocupado alertou que cuidasse de sua saúde. Maga Márcia deu-lhe as costas e saiu caminhar sozinha pela praia, levando alguns tombos, mas imediatamente erguendo-se e seguindo em frente. A cada tombo, desmoronavam-se dunas de areia e o mar se tornava mais revolto. Uma tempestade forte se aproximava com nuvens ameaçadoras chegando do horizonte do oceano. Banhistas

146


147


Banquete de capítulos fantásticos de Jonas Ribeiro lápis de cor Editora DCL

Ilustração para conto Compadres Doidos Comadres Varridas de Jonas Ribeiro lápis de cor

148


Ilustração para conto Mistério no Cemitério de Jonas Ribeiro lápis de cor

Ilustração para conto O Banquete de Jonas Ribeiro lápis de cor

Ilustração para conto A Fênix da Paz de Jonas Ribeiro lápis de cor

149


150


desesperados procuravam segurar-se em uma velha estrutura carcomida de maresia e com a base apoiada em areia movediça. Corpos caiam e eram engolidos por grandes ondas, enquanto a paisagem era modificada em toda sua geografia. Maga Márcia continuava caminhando e molhando seus pés na beira do mar. Naquele momento, importava presenciar cada instante e como sobreviver a ele. Então uma piscina de água cristalina com cerca de dois metros de diâmetros se formou em volta dela, permitindo que enxergasse a areia cintilando e peixes de todas as espécies que circulavam e acompanhavam o seu caminhar. Tubarões e Arraias eram amistosos e protetores. Nada ali a ameaçava, mesmo com as manifestações de mau tempo. Maga Márcia passou pela estrutura carcomida sem nada poder fazer e seguiu adiante em uma paisagem modificada, encontrando outros caminhantes, todos vestidos de branco, rumo às Montanhas Sagradas do Arco-Íris. Ao pôr-do-sol, Maga Márcia havia se transformado num Pégaso, galopando com suavidade pela praia, até abrir suas asas para sobrevoar os contornos do Universo. Pégaso mostrou a grande corrente que o prendia e até onde ela ia dar: numa caverna escura, onde passaria o fim de seus dias se ninguém o viesse libertar. A única chave que abriria o pesado cadeado seria feita com ingredientes de um amor incondicional. Mas para isso acontecer seria preciso passar por algumas provações: entrar ainda mais no escuro da caverna e enfrentar os monstros e demônios que a habitavam. Maga Márcia, vendo-se pelos olhos de Pégaso, sentiu toda espécie de temor, mas sabia que, se não se aventurasse nessa investigação, a vida continuaria sem fazer muito sentido e a destruição logo bateria à sua porta. Ainda com receio de abrir mão do porto seguro que era continuar fazendo o que fazia com os mágicos lápis de cor, algo dentro dela se angustiava e gritava mais forte, mesmo que em silêncio. E o silêncio pode ser muitas vezes ruidoso demais. Maga Márcia precisava atender ao chamado de Pégaso e enfrentar críticas, julgamentos e até os próprios medos que criara para si. Sua Alma sussurrava já entre a Vida e a Morte: “Pegue nos pincéis!” Maga Márcia se perguntava: “Será que eu posso?” E Anjo Guardião surgiu e soprou em compaixão, dizendo: “Confia e apenas permita-se!”, “Não desista de você! Não desista de seus sonhos!” Nessa época de isolamento, uma Fada Madura aproximou-se e Maga Márcia passou a chamá-la de Fada Madrinha, reconhecendo nela uma irmã querida, mais velha, uma irmã de muitas vidas. E com ela compartilhou muitos segredos, muitos receios e aflições e também algumas alegrias e sonhos. Com a Fada, aprendeu um pouco mais sobre as conexões espirituais e histórias de outras vidas e também sobre coisas simples e boas de viver. Aprendeu que não era tão louca quanto acreditava ser, mas que tinha sã loucura suficiente para ser mais feliz e acreditar na magia da vida. E entregou em confiança os tesouros de seu coração para repartir em bons momentos de alegria e muito chá com a companheira de todas as horas, faça chuva ou faça sol. Então, Fada Madrinha contou a ela algo que não sabia: 151

Dragão e Gnomo Ilustração para livro didático Série Conte Reconte Edições Jogo da Amarelinha lápis de cor

Na página oposta: Primeiras Reinações de André Aguiar Editora Planeta do Brasil lápis dermatográfico


Felinocídio Culposo Acrílica sobre tela ossada de gato 2007 Abaixo: Felinocídio Culposo estudo em esferográfica

Mais à esquerda e abaixo: O Pequeno Anjo estudo em esferográfica e lápis de cor O Pequeno Anjo Acrílica sobre tela penas 2007

152

Na página oposta: Entre nas águas acrílica sobre tela com cigarras 2008 No leito do rio, na mata Sob a gueixa deusa deitada Entre nenúfares úmidos, folhas molhadas, Vivem dois seres subaquáticos Entre feixes de luz, apaixonados. Entrelaçados se olham, se beijam enamorados, Dois peixes apeixonados. Abaixo: Entre nas águas, estudo


153


Olhai as ostras do Hipocampo jogai Pérolas aos Olhos Acrílica sobre tela conchas 2007

Mutismo Mutilante Acrílica sobre tela materiais diversos 2008 Do céu à terra num só segundo Acrilica sobre tela cabelo natural 2008

154


Ode ao Médio Ocre Por mão atroz da besta algoz o anjo jaz agora em paz Acrílica sobre tela e penas 2008

155


“Na década de 80, na Sala Bandeirantes de Cultura, fui montar minha primeira exposição individual quando vi saindo de lá uma garota de nariz arrebitado e cabelinho espetado. Ela estava tirando suas obras da exposição anterior. E a impressão que tive foi marcante: estava vendo os desenhos mais maravilhosos que jamais vira. E pensei que essa menina devia ser muito convencida do seu talento. Jamais poderia então imaginar que essa artista, cujo trabalho tanto admirei desde aquele momento, seria uma companheira durante tantos momentos das nossas jornadas. E assim, a Márcia veio praticar seu inglês comigo antes de viajar para a Polônia. Veio desenhar na pedra litográfica no Solar do Barão quando orientei o ateliê por lá. Estive por perto quando os filhos dela nasceram e ela viu os meus crescerem. Acompanhou-me na primeira Bienal do Livro que visitei e em varias outras, ajudando-me a entrar nesse mundo da ilustração. Compartilhamos belos momentos e outros difíceis também. A ajuda que recebi dela jamais poderei agradecer o suficiente. Por isso, passou a ter o apelido de Maninha. Espero poder estar sempre do seu lado, dando uma mão fraterna. Essa bruxa-fada agora tem umas asas tão grandiosas que alcançam todas as dimensões do Universo, e o retrata na sua obra. Eu testemunhei parte da transformação maravilhosa que a levou a esse voo e a admiro cada dia mais!” Michelle Behar, artista plástica gravurista e ceramista. E assim, cercando-se de novos antigos amigos que buscaram puxar Maga Márcia para cima, nasceu a exposição Trajestória: os trajes da história como artista e pessoa, O sino que queria voar de Luiz Antonio Aguiar Editora Record lápis dermatográfico

156


marcada pela carreira/trajetória nas artes plásticas e na literatura. As obras em acrílica sobre tela, sua mais recente produção, mesclavam materiais orgânicos e poesia e partiam da ideia de que a tela é como um bastidor de bordados. Maga Márcia foi de encontro, enfim, à sua Lenda Pessoal e, com toda coragem, contou em imagens a sua história, ao som do Círculo de Violões. A inspiração partiu de todo um trabalho de autoconhecimento, de representações de sonhos e fatos do cotidiano traduzidos em metáforas. Maravilhoso foi então ir em busca de elementos que pudessem representar essas metáforas. Nessa busca, encontrou esqueletos de animais, que considerou como presentes colocados em seu caminho pela Mãe Natureza para cumprir um destino artístico. Também visitou lojas de artigos de Umbanda e, sem preconceitos nem superstições, descobriu nessa ciência um pouco mais do misticismo e da alquimia das forças do universo, o que a fez rever o entendimento sobre religião, cultos e crenças. As portas da consciência se abriram para que ela lidasse com os empenhos do acaso e com as intenções depositadas nas formas-pensamento, amalgamadas com as formassentimentos. Assim, cada material passou a ter sentido simbólico e a expressar muito além do que mero elemento compositivo da obra. Com tudo isso, sua arte passou a falar por si mesma. Em seu olhar inusitado de interpretação da vida e do universo imaginário, a fantasia e a realidade se mesclam através do lúdico, trazendo o tema do ciclo vida-morterenascimento, aspectos humanos de Luz e de Sombra e O sino que queria voar de Luiz Antonio Aguiar Editora Record lápis dermatográfico

A Banda Polaca de Dante Mendonça Editora Novo Século lápis de cor 2007

157


Trajestórias

Trajestória acrílica sobre tela com passarinho empalhado 2008

Vista de fora. O brilho ofusca. Apaga a luz. Vestiu escuro. Vista de fora. Desejo dentro. Intocada. Vestiu negro. Vista de fora. Nudez da carne.

158

Pele branca. Vestiu preto. Vista de fora. Aparência. Oculta o perfume. Vestiu máscara. Vista de fora. Sem identidade. Servil camuflagem. Vestiu camaleão. Nunca vista. Esconde o dentro. Recolhe o próprio.

Vestiu morte. Nunca vista. Descoberta. Abre a gaveta. Vestiu pele. Vista por dentro. Nua do avesso. Sem esconderijo. Sem veste pra vestir. Vista por dentro. Encantamento. Sem canto pra fugir. Vestiu alma.


Teleósteos Poéticos obra inspirada em poema do escritor mineiro João Novais acrílica sobre tela escamas e espinha de peixe 2008

159


A Cadeira AcrĂ­lica sobre tela ossos de costela e de frango folhas secas 2008

160


reciclagem de materiais adaptados às obras. Além do universo onírico, ela trabalha o simbólico, dando a cada elemento um sentido. A influência da literatura está presente nos poemas, que levados às telas traduzem o significado do conjunto de cada obra. Geralmente, as imagens surgem a partir do poema, mas também se dá o inverso. Sendo palavra e figura um casamento entre duas linguagens, uma soma de objetos orgânicos, Maga Márcia denomina esse conjunto Obras Organopoemagéticas – termo inventado para explicar toda a experiência expressiva das obras de Trajestórias. Algumas obras são interativas, outras sensoriais, quebrando com o protocolo de que a obra não deve ser tocada, quando sabemos que o desejo de todo ser humano é o de sentir, não apenas com olhos, mas com as próprias mãos, e pelo toque aguçar as sensações e sentimentos que são evocados. A exposição, em parte mostrando a produção realizada para livros, outra parte a produção inédita de telas, surpreendeu em seus contrastes e paradoxos. A artista plástica e escritora Heliana Grudzien escreveu: “Ao recorrer a essa linguagem, a artista tudo questiona através do jogo poético, mergulhando fundo no universo da poesia, da qual retira consistentes signos, representados na simbiose pintura+objetos. Materiais variados e inusitados, cuidadosamente guardados, coletados, recriados, são colocados em cada tela, revelando-nos efeitos plásticos instigantes, através de uma sucessão de imagens ricamente elaboradas com a persistência da memória e a rapidez própria das recordações. Imagens carregadas de intensa matéria de vida, capazes de superar a condição lúdica e desnudar símbolos e ícones que sinalizam o seu mundo e que também representam arquétipos universais. A “trajestória” de Márcia Széliga mostra-nos a excepcional produção de ilustrações da artista, elaborada para livros infantis, ao mesmo tempo em que revela um relato plástico/poético que ultrapassa o visual, constituindo-se em registro existencial onde a memória, a reflexão e a celebração da morte, da vida e do amor são reinventadas através da arte.”

A Banda Polaca de Dante Mendonça Editora Novo Século lápis de cor 2007 O sino que queria voar de Luiz Antonio Aguiar Editora Record lápis dermatográfico

Doce Pecado acrílica sobre tela 2008 Com cuidado e com colher O apicultor colhe Do fundo do favo O mais doce mel Que em gotas escorre melado Entre os dedos E escolhe um jeito Do pecado dourado (a)tingir o céu... da boca Num instante eterno.

161


20°. Brinquedo: As Três Feiticeiras

A

A

brir-se para o mundo, revelar-se, ser ela mesma – um livro aberto de Arte e Poesia. Junto de tanta descoberta, Maga Márcia também realizava mais um sonho antigo: o belo e intenso caminho de formação em Arteterapia. Acreditava que a arte também era um bom remédio para curar as mazelas do mundo e uma escada para a espiritualidade, no contato com as profundezas do ser em sua total expressão. Por esse caminho conheceu Três Feiticeiras – Rozemar, Ana e Carol – que a conduziram pelo Universo Simbólico da Roda Xamânica e do Círculo Psico-orgânico. Uma delas conta: “Aluna, amiga ou parceira? Márcia me coloca esta questão quando me pede para escrever algumas poucas palavras sobre ela. Escrever poucas palavras se torna difícil dada à complexidade do que se passa numa relação que se coloca em muitas formas: formadora/aluna, amiga e parceira de trabalho. Quando conheci Márcia Széliga, sua intenção era de participar da Formação de Terapeutas do Incorporarte – Espaço Terapêutico Corpo Artes, do qual sou coordenadora. Deparei-me com uma mulher que trazia no olhar uma menina doce, tímida e travessa. Combinamos uma troca: ela faria a carga horária teórica vivencial do curso sem custos em troca da criação das ilustrações de um texto meu: Segredos do Coração. Obviamente, a

162


163


164


165


166


167


168


troca demarcou um espaço relacional que ultrapassa o formativo. Iniciou-se a formação. E ter uma ilustradora num espaço formativo que se inicia é muito rico para um grupo, mas muito difícil também. Em Arteterapia não temos uma proposta estética, mas simbólica. Por mais simples e descompromissadas que fossem as produções de Márcia, quando o canal das Artes Visuais era tocado, o que emergia do trabalho era de grande beleza. O grupo ora se encantava, ora se enciumava. Mas isso era algo com que aprenderam a lidar ao longo do tempo. Márcia se retirava para dentro de si. Sentia e fazia. Dava cor a si mesma e com isso acordava partes sombrias e iluminadas, com as quais podia dialogar. Ali ela criava e recriava a si própria. Apresentada ao seu contexto, sua família e casa, ficou ainda mais clara a sua marca na vida, que se reafirmava em seus trabalhos: a intensidade. Superfície não lhe é um espaço confortável. Mas mergulhar profundamente em si parece pouco para Márcia. Ela precisava ir aonde a luz não mais chega e, então, se perder no breu das águas e se deixar arrastar por suas correntes. O suficiente não lhe atrai. Ela sempre precisa ir mais e além na busca de sua essência. Como psicoterapeuta, compreendo o fascínio de afundar nas águas do inconsciente, mas sei do risco de querer ir mais e mais de forma totalmente destemida. Às vezes sentia a necessidade imensa de resgatá-la em algum lugar das águas sem fim para que ela não se afogasse e pudesse

169


170


171


172


olhar por onde nadara; de ver o que emergia da vastidão do oceano interno que nem sempre era a beleza de uma pérola ou a luz de uma estrela. Muitas vezes eram musgos, lodo, cracas de navios afundados. Mas ela os acolhia da mesma forma. Compreendido como algum conteúdo de si, reconhecido ou não, para o qual ela precisava olhar e destrinchar na busca de mais um aspecto de si mesma. Como amigas que nos tornamos, essa questão ainda me preocupa. Vejo Márcia sempre em movimento, com muitas realizações, mas com mil e uma buscas simultâneas que trazem uma enxurrada de conteúdos a se desvendar e, antes mesmo de olhar para o material que chegou movida por outra paixão, ela já começou outra busca e depois mais outras. Após a trajetória da Arteterapia, vejo uma Márcia mais consciente de si, criando um molejo entre mergulhar e permanecer no mundo. Talvez seu aprendizado nos últimos tempos tenha sido a construção da proteção necessária para poder mergulhar. Da troca que se instituiu neste primeiro momento, nasceu a parceria entre o texto e as ilustrações que originaram o livro infanto-juvenil Segredos do Coração, editado pela Espheris Edições, editora dela própria. O livro tornou-se referência na área de Saúde, principalmente em Oncologia Pediátrica, e na de Educação, chegando a ser premiado no XI Congresso de Psico-Oncologia e no IV Encontro Internacional de Cuidados Paliativos, no Rio de Janeiro, em 2010”. Ana Luiza Baptista, psicoterapeuta e orientadora do curso de formação em Arteterapia pelo Instituto Incorporarte, Rio de Janeiro.

173


21°. Brinquedo: A Ostra Louca

O

O

O Bebê Vampiro de Regina Drummond Cortez Editora 2010

ano de 2009 chegou com suspeitas que assombravam já de início para quem acabara de nascer Cisne, apaixonada pela vida, após um longo período de Patinha Feia, entre outros tantos adjetivos. Primeiro, um medo antes de entrar no quarto, pois o escuro poderia ser o corpo de um Grande Monstro. Mesmo assim, Maga Márcia entrou, levando um susto de algo indefinido que a princípio mostrou suas garras em pinças, depois exibiu sua enorme cabeça e patas. Um Caranguejo Gigante olhava para ela. Acreditando que nada estaria acontecendo (afinal, não estava sentindo nada, nem dor com os beliscões), continuou sua rotina diária dentro do quarto escuro com o Caranguejo que criou. Uma parada diante de um espelho colocava em dúvida se era o espelho que a deformava ou se a deformação estava mesmo acontecendo. “Talvez sejam já os primeiros sinais da idade”, pensou. Mas a miragem do Caranguejo voltava a aparecer para assustar. Virou-se então de bunda para o bichão e para o mundo, pra poder ficar encolhidinha bem quietinha, mergulhada no fundo do mar de seus pensamentos. Maga Márcia se transformara numa Ostra, bem fechada. A gente pensa que algumas coisas nunca, mas nunquinha mesmo, vão acontecer com a gente. A gente acha que é capaz de sair curando o mundo inteiro com arte e mal pensa que antes tem de curar a si mesmo.

174


A Tempestade de Liana LeĂŁo Editora Salesiana 2009

175


176


As imagens destas duas pĂĄginas sĂŁo desenhos e poesias do Sketchbook 2009

177


As imagens destas duas pĂĄginas sĂŁo desenhos e poesias do Sketchbook 2009

178


Aí cutucou a bolinha dentro de si. Não uma espinha interna nem pedaço de osso solto, muito menos verruga de bruxa, mas algo do tamanho de uma bolinha de gude. Se no lado esquerdo do peito guardava um enrosco, no peito direito contraíra um caroço. Uma pérola! Caranguejo Gigante esteve o tempo todo a mostrar isso para Maga Márcia. Alguns se perguntavam: “Bruxinhas não deviam ficar doentinhas... Será que faltou algum ingrediente da mata para o seu caldeirão?”. Um dia, ao passear de bicicleta pela ciclovia, pensava sobre a pérola que criara. Maga Márcia estava indo se encontrar com um grupo de Louquinhos, no Espaço de Saúde Mental Livre Mente, onde iniciara um estágio em Arteterapia. Na ciclovia tinha um poste. Um poste no meio da ciclovia. Que ideia colocar aquele poste bem no meio da ciclovia. Tem que ser um bom ciclista pra desviar do poste e passar na estreiteza da ciclovia bipartida. Tem que ter coragem pra passar pelo afunilamento da ciclovia. Uma bicicleta que vai, outra que vem. Lá em cima do poste tinha um ninho de passarinho. Um ninho abandonado, com um passarinho dentro. Caiu com o vento. Dentro, um esqueleto do filhotinho. E Maga Márcia se perguntou: “Qual mãe abandonaria seu passarinho no ninho?”. Sua cabeça girava feito um carrossel doido, também abandonado em um parque fechado. Girava tanto que parecia estar sendo engolida por um redemoinho. Tudo em sua volta flutuava num vácuo e ninguém entendia o que com ela se passava. Sentiu solidão, por mais que estivesse cercada de vida. Durante o estágio, confusa e sem saber o que fazer com o grupo de Louquinhos (que de louquinhos, para ela, não pareciam ter nada), Maga Márcia deu um pedaço de argila para que cada um representasse ali a sua casa. A proposta apresentada era de fazer Poesia e Arte, não apenas com uma casa material, mas com tudo o que inspirasse o sentido de morada, indo lá atrás no passado, na primeira morada, no útero materno até chegar à identidade que tinham de si atualmente. O próprio corpo como habitação do Ser. No princípio, todos os seis louquinhos presentes acharam que Maga Márcia estava de zoação, que tudo não passava de brincadeira de criança. Mas quando ela abriu sua mochila e tirou o ninho abandonado com um esqueletinho de passarinho dentro, todos exclamaram: “Ô, Loco! Você é mais louca que todos nós juntos!” Maga Márcia viu nisso um ar de boas-vindas ao grupo. Uma Louca possível para eles, que se achavam à parte desse mundo. Tão à parte quanto Maga Márcia se sentira muitas vezes, chegando a se perguntar: “Reunida com essas mentes brilhantes e criativas, seriam eles lúcidos como o que entendo por lucidez, ou seria eu louca tanto quanto eles e assim estamos diante de um caso de Lúcida Loucura? Vontade de dizer: Parem já com os medicamentos! Façam Arte!” Foi a tarde mais maravilhosa que teve. Um dos Loucos, um talentoso e inteligente poeta, um tanto indiferente e sem muito gosto pela vida, naquele dia sentiu algo especial. E afirmou: “Você me mostrou o quanto sou possível.” E ela, se despedindo num sorriso grato, pensou: “Talvez possa eu estar vivendo uma Loucura Lúcida? Ou o 179


Soldadinho de chumbo lápis de cor ilustração para livro didático Editora Moderna 2010

Na página oposta: Bicho Papão acrílica

Mundo dos Normais é que está tão louco que não nos adequamos?” Voltando de bicicleta para casa no lusco-fusco de uma tarde fria, observava a Lua como se fosse uma grande pérola. Vento na cara... Quase se esqueceu do caroço que carregava, preenchida que ficou da alegria daquela tarde, sentindo que enfim fazia algo pelo ser humano. Mas ele, o caroço, estava lá, sentia ao toque dos dedos. Guardado no peito direito... Contraponto? Espelho do que está guardado no lado esquerdo do peito? Depois daquele dia, Maga Márcia não encontrou mais seus amigos Louquinhos. Estaria sendo lançada a um novo desafio: olhar de frente para a Morte, Grande Conselheira, muito mais do que uma algoz ameaça. Claro que teve medo. Na ciclovia, o Caranguejo Gigante a esperava soltando um bafo e armando as pinças. “Tudo é bobagem! Qualquer um está aqui só de passagem e isso faz parte da vida”, pensava, consolando-se. Não. Da vida faz parte a celebração da vida. Justo agora, que começara a dar seus primeiros novos passos rumo ao desconhecido que um fino véu encobrira. Escureceu e teve de atravessar um trecho ao lado da estrada de ferro, de mata escura. Os monstros espiavam por entre a vegetação. O coração disparou, mas continuava pedalando, rezando para fazer uma boa travessia até chegar segura em casa. A escuridão ficou tão imensa, que só podia contar com os outros sentidos. Aprendera com um menino cego, certa vez, como era acordar os outros sentidos quando não se tem os olhos para enxergar. Os pelos da pele viram antenas, os ouvidos se esticam e as extremidades – os pés e as mãos – parecem acordar ainda mais. Quando se conhece o mapa dos caminhos, a escuridão pode estar um breu, que a mente, familiarizada com o espaço, orienta e reconhece cada obstáculo e perigo. Mas e quando não? O que conduz é a confiança que se tem em si mesmo, na sua atenção e cuidado. Fala

Abaixo: Colcha de Leituras de Jonas Ribeiro Editora Ave Maria Mundo Mirim 2009

180


181


182


então a voz da intuição e do instinto: “Coragem! E avante enfrentar seus vilões!” O som de um olho d’água se aproximou e Maga Márcia, tateando na escuridão, sensibilizando o olfato, tocou o pequeno jorro de água, lavando o rosto do suor frio. Maga Márcia carregava uma pérola maligna dentro de si. Perguntou-se por que e como foi parar lá. O que teria engolido? Veneno ou alguma mágoa lancinante? Agrotóxico ou algo indigno de perdão? Sapo ou caroço de azeitona? Anjo Guardião sempre a acompanhou lá do alto de sua nuvem, acima da Montanha Sagrada, soprando coragem e fé, por mais que Maga Márcia em tudo tivesse voltado a desacreditar. Foi um longo período vivendo o que pensava que seria resolvido da noite para o dia, mas não. Então seu caderno de borrões foi seu maior companheiro, na cama e nas esperas em cadeiras e leitos do Grande Céu de Cura, aonde anjos chegavam com sua bondade e compaixão para cuidar e ajudar a não perder a fé na vida, por mais que nela se depare com sofrimentos alheios e com os próprios, entre sorrisos amorosos distribuíam chá com biscoitos. Sua irmã, a Sereia do Aquário, também apareceu para com ela ficar. Foi uma semana encantadora de compartilharem momentos que não haviam vivido na infância, pela distância em que foram colocadas. Foram momentos preciosos que ajudaram Maga Márcia em sua recuperação. “Pulamos fases... Fases de brincar juntas quando crianças, de contar segredinhos de amor, mas nos encontramos depois. E agora, o que somos? Amigas, confidentes, simplesmente irmãs. Além de Márcia, seu nome para mim também é Proteção. Te amo!” Charlene Széliga, irmã mais caçula, a Sereia do Aquário.

O Bebê Vampiro de Regina Drummond Cortez Editora 2010

Para contar mais desse período, ninguém melhor do que seu Caderno de Borrões com alguns dos poemas guardados.

Frederico Godofredo estudo com esferográfica 2009 Capa do livro Frederico Godofredo de Liana Leão Editora Elementar 2009

183


22°. Brinquedo: O Erê Atlante

M M

Chapeuzinho Vermelho lápis dermatográfico 2011

Alice no País das Maravilhas lápis dermatográfico 2011

aga Márcia se recuperava aos poucos e recuperava a fonte do seu ser em essência, quando recebeu a visita de uma Entidade do fundo do oceano, cercada de corais e recifes. A Entidade apontou a ela uma parede repleta de livros de capa verde. Ao folhear um livro, reparou que suas páginas estavam todas em branco. E a Entidade emitiu telepaticamente uma mensagem de grande significado: “Foi entregue a você uma pérola, para você se dar conta de que não tem controle sobre sua vida tanto quanto pensa. É preciso que você compreenda o que faz com seu corpo físico, veículo da Alma e instrumento divino da Arte que por seu intermédio vem se manifestar. O corpo físico, escravizado por suas emoções negativas e pelas ordens de sua mente racional, impregnou de toxinas o seu sentimento e seu sangue. É preciso entender por que essa pérola nasceu em você para o fluir natural da vida acontecer e você cumprir o que veio fazer aqui. Se você puder olhar para ela com mais cuidado e atenção, verá que veio imbuída de um grande ensinamento. Esteja aberta às lições que a conduzirão ao caminho do autoconhecimento e de como tomar as rédeas de sua própria vida a partir de agora.” Maga Márcia respondeu então que sua vida só passaria a fazer mais sentido se o que veio fazer aqui tocasse os corações da humanidade, pois estava tendo a noção exata, diante da Morte, de que o corpo físico pereceria, deixando

184


185


Estudo para A Bruxinha que ficou doentinha caneta nanquim 2010

Estudo para tela em grafite O Anjo-Barco acrílica sobre tela 2010

Estudo para A Bruxinha que ficou doentinha caneta nanquim 2010 A Bruxinha que ficou doentinha de Luiz Antonio Aguiar lápis dermatográfico Editora Record 2013

Mais à esquerda: O Erê Atlante João acrílica sobre tela 2010

186


187


O Mรกgico de Oz lรกpis dermatogrรกfico 2011

188


apenas o resultado de seus atos, e levando consigo, tatuadas na memória da Alma, somente as lições em vida que colaborassem para a evolução do espírito. Nisso, a Entidade entregou-lhe um dos livros, dizendo que a partir dali Maga Márcia reescreveria sua história. Da estante, num festival de cores e magia, começaram a pular arlequins fazendo malabarismos; flores perfumadas espalharam-se pelo ar; uma revoada de colibris veio em sua direção e muitos serezinhos saltitavam em sua volta. A Entidade acenou feliz em despedida, indicando uma porta que dava acesso a uma sala de iluminação diáfana. Levitava em estado de meditação um ser azul, ancião de grande sabedoria, com os olhos semiabertos. Maga Márcia se aproximou e, ao olhar no fundo dos olhos do ancião, viu o universo em movimento com todas as suas galáxias e mundos paralelos. E o ancião lhe falou vagarosamente: “Falemos de coisas lícitas. A causa do tumor são as ilusões...” Maga Márcia foi então sugada para fora da sala e levada em uma cápsula de fina película furta-cor para fazer uma viagem pelo sistema solar. Tudo aquilo era muito fantástico! Maga Márcia realmente conseguiu voar! E, finalmente, realizou o sonho de infância de alcançar a Lua. Viu suas crateras e também seu lado escuro. E foi além da Lua, viajando entre as estrelas, passando por cometas, chuva de meteoritos e imensos asteroides. Atravessou os anéis de Saturno, observou as explosões solares e todos os outros planetas, até ser puxada ao longe por uma nebulosa em espiral, de intensa luz branca ao centro e azulada nas bordas. A Bruxinha que ficou doentinha de Luiz Antonio Aguiar Editora Record 2013 Estudo para díptico: Casal de Casas grafite

189


Quebra-cabeças obra inspirada em poema do escritor mineiro João Novais acrílica sobre tela e galo empalhado 2012

190


Voou até lá, não querendo mais voltar. Mas uma força invisível a impeliu e impulsionou-a de volta para casa, dizendo que ainda não era o momento de ir além, e que ainda precisava voltar para cumprir com o propósito de vida. Com humildade e alegria, Maga Márcia sentiu imensa Gratidão e de joelhos despediu-se da pérola que acabara de ser extraída. E novamente sendo chamada para um encontro de concentração de Entidades do Mundo Invisível, Maga Márcia realizou um ritual de passagem, onde recebeu bênçãos de cura. Um pequeno Ser, de pele azul e voz de criança, aproximou-se batendo sua cauda num nado. Metade humano, metade peixe, tocou suas mãos dizendo serem mãos de Fada. Observou que entre os dedos de Maga não havia membranas como nas mãos dele, um Erê Atlante que todos o chamavam por João. Suas mãos também emitiam uma luz do centro das palmas, luz de cura, mas mesmo assim enxergou que Maga Márcia pertencia ao mundo das águas por causa da coloração azulada que irradiava em volta. O Erê Atlante avisou que muitas coisas importantes iriam acontecer, mas que ele não tinha permissão de sua mãe, a Rainha das Águas Iemanjá, para contar. Maga Márcia então recebeu as últimas bênçãos entre sopros de neblina, cânticos e bailados, despedindo-se desse maravilhoso universo encantado. João e Maria lápis dermatográfico 2011

Desenho e poesia das páginas do Sketchbook, 2009

191


23°. Brinquedo: O Elefante Sagrado

Carrossel dos Sonhos acrílica fluorescente sobre tela versão sob luz negra 2013 quarta capa deste livro

A

A

A Rua Barulhenta autoria e ilustrações de Márcia Széliga Cortez Editora 2011

A primavera refloresceu, trazendo cabelos novos em cachos após a queda das mechas outonais e do período invernal em que a atmosfera havia sido de abandono e solidão. No ano de 2011 foi lançado o terceiro livro de sua autoria: A Rua Barulhenta. Um único livro artesanal, pequeno tesouro de segredos sagrados guardados em um baú musical, também veio sendo gerado em forma de Livro-Arte: O Livro dos Tios, com correspondências poéticas entre uma Tia, inspirada em sua tia curandeira, e o Tio imaginário do Mestre Mineiro da Palavra, com o qual criou laços mágicos de sintonia e parceria. Maga Márcia, com as lições que recebeu, foi em busca de um aprofundamento mais amplo nos mistérios da vida, que não só levariam à cura e à arte da escrita e da ilustração, mas ao contato com esferas mais elevadas que as alturas alcançadas por sua Bolha de Sabão. Em um humilde ritual de cura do qual participou, repleto de um amor tão imenso que ainda não conhecia, Maga Márcia compreendeu o sentido da existência e todos os níveis em que se desviou de si mesma. Sentiu a cor da música entrar em seus poros e cada nota se depositar como gotas medicinais em suas células e corrente sanguínea. Ao longe, e ao mesmo tempo bem dentro de si, assistiu ao desfile da Celebração da Vida numa festa de cores e abundância. Em sua direção caminhou

192


193


Ao Céu do Despertar

Na página oposta: A Árvore da Vida acrílica fluorescente sobre tela versão sob luz negra

Vórtice de Luz Amor Maduro acrílica 2012

Celebração da Vida acrílica sobre tela 2013

194


195


196


um Elefante Sagrado, todo enfeitado e pintado, com suas presas de marfim cravejadas com pedrarias preciosas e adornos de ouro. Macacos brancos distribuíam flores e frutos pelo ar, sendo uvas as preferidas. Homens e mulheres bailavam, vestidos com trajes requintados, divindades e seres alados tocavam seus instrumentos. Acima, numa abóboda celestial que não era apenas uma pintura, mas feita de matéria sutil e viva, um Castelo Sagrado de Prata se erigia atravessando as nuvens e muitos céus, tendo a cada céu os seres de luz abençoando o planeta. O Grande Mago do Universo, mesmo sem mostrar rosto ou ter forma, estava presente em cada partícula, em cada ser, em cada som. O Elefante Sagrado exibiu seu pano bordado de muitas gavetas, de onde saíam outros seres festivos e repletos de afetividade. Mais cores luminosas se formavam em padrões geométricos infinitos, explicando assim a origem e formação do Universo e de tudo o que nele existe, desde a primeira célula e estrutura molecular contidas em cada ser vivo e seu perfeito funcionamento. Mostrou que a Arte insiste em se manifestar através de seus seres instrumentos e por todas as culturas. O sentido sagrado da Arte aí está: as mensagens divinas a transmitir e transformar em um processo alquímico e evolutivo toda humanidade. Maga Márcia contemplou seu Anjo Guardião diluído nessa amorosidade por todo o Universo, voando livre na forma de passarinho que se libertou da gaiola e viu que, a partir da conexão, outras conexões mais adiante de infinitas possibilidades se multiplicavam em pontos de luz interligados numa rede luminosa, unindo todos os seres na Energia do Amor Universal – a chave dourada que abre o portal de um mundo melhor, brindado com o néctar da Alma, sabedoria guardada nas plantas ancestrais. Aconteceu então o que parecia impossível. Num abraço en-

197

Estudo de Miração para tela grafite 2012 Na página oposta: Lua Azul acrílica fluorescente sobre tela versão sob luz negra

O Gigante Egoísta de Oscar Wilde adaptação de Liana Leão Cortez Editora caneta nanquim sépia 2011


tre o Céu e a Terra, o invisível e o sonho, o ritmo sonoro de dois tambores batucando uma música ainda a ser cantada e dançada, uma nova história ainda a ser escrita, apontou o Caminho do Meio, que contemplava o brilho do sol em um belo horizonte. Sem fronteiras distanciando ou separando espaços, o Caminho unia o coração do Céu com o coração da Terra, cada qual sendo parte, fundindo-se no todo. Estudo para capa de O Gigante Egoísta acrílica 2011

Ouve-se dizer que até hoje Maga Márcia – a Bruxa Fada – está abençoada num lugar encantado entre sonho e realidade. E para quem acha que ela é Bruxa mesmo, ah! Daí que ela quer mais é se divertir! Maga Márcia sendo Bruxa de noite, Fada de dia, de tempos em tempos guarda com carinho as fantasias que veste em um antigo baú e sai celebrar em porções as poções da Vida, mexendo com sua colher de pau as ervas aromáticas e curativas, num grande caldeirão. Ou com sua varinha de condão e um sino, propaga o som das palavras mágicas pelas fumacinhas perfumadas que se espalham pelo ar. Dentro de si, em contato com as plantas sagradas e os reinos espirituais, Animais de Poder e Proteção se revelaram. Foi assim que Totem, seu primeiro livro de imagens, quarto livro de sua autoria, nasceu. E sob a luz do Amor e na ciranda da Alegria, Maga Márcia realizou enfim uma grande magia: despiu-se das fantasias de Bruxa e de Fada e transformou-se em uma Mulher com Coração de Criança, que dança em volta da fogueira, se banha na cachoeira, solta os cabelos longos ao vento e revira a terra para plantio comungando suas sagradas oferendas conforme os ciclos lunares, conforme as estações, que trazem o ritmo e a melodia do pão nosso de cada dia, enquanto toca os reinos espirituais da Alma pelas cores vivas das tintas. Suas obras vão criando as próprias pernas e asas por aí, tagarelando aos olhos atentos de todos, enquanto outras surpresas pela frente virão do “mundo de lá” da Fantasia para as telas do mundo de cá. Por isso, senta e aguarda que lá vêm muitas outras novas histórias! A Rua Barulhenta autoria e ilustrações de Márcia Széliga Cortez Editora 2011

198


O Gigante Pequenininho de Luiz Antonio Aguiar Editora Record lápis dermatográfico 2011

O Gigante Egoísta de Oscar Wilde adaptação de Liana Leão Cortez Editora acrílica 2011

199


“O que eu mais admiro, o que mais me surpreende nos desenhos que a Márcia faz é que ela conta uma história que não estava lá, mas acaba “estando”, de um jeito que depois que a gente lê junto, desenho e imagem, não dá mais para pensar em um sem o outro. Vi isso muito nitidamente em O Sino Que Queria Voar, onde enredos visuais se desenvolvem lindamente sobrepondo-se ao texto. Mas ela faz isso sempre, e cito com especial carinho a recriação/interpretação visual lindíssima e absurdamente criativa que ela fez em O Gigante Pequenininho. Além do mais, seus personagens não são realistas, são mágicos, mas cheios de expressividade “humana”, como em A Casa do João e da Maria de Barro. É outra peraltice/bruxaria dela...! E isso falando somente das nossas crias em comum.” Luiz Antonio Aguiar, escritor de Literatura Infantil “História em Quadrinho Escrever é fácil: Começa-se com uma letra maiúscula e termina-se com um ponto final. No meio, coloca-se ideias. (Pablo Neruda) Desenhar é fácil: Começa-se por um ponto e termina-se em outro. No meio, deixa o rabisco acontecer. Colocar ideias e deixar o rabisco acontecer são tarefas simples que qualquer criança faz, ou qualquer adulto. Todos nascemos sabendo. A diferença é que, ao longo de nossa trajetória, influenciados pelo meio em que vivemos e, como tudo muda a cada instante, é natural que o próprio exercício nos favoreça para o aprimoramento.

200


As ilustrações destas duas páginas fazem parte do livro O Pescador de Histórias de Eraldo Miranda Cortez Editora acrílica 2012

201


Na página oposta: Berinjelas Beligerantes lápis de cor e esferográfica 2011

Minha Tia que guarda papéis de bala e O Tio que colecionava dejetos grafite 2011

Nas Pregas do Pano lápis de cor e esferográfica 2011

202


203


204


Na página oposta: Lua Azul O olho que tudo vê Sopro do Universo Além do signo de Câncer Nesta página: Capa do livro Totem A Tecelã da Vida Espiral de Jardim Luz dos Olhos Despertai

205


O Sapo Moacyr lápis de cor 2011

Os Tios tampa do báu do livro-arte de João Novais e Márcia Széliga lápis dermatográfico 2011

206


Há, também, os que dedicam horas e horas de estudos, para que o resultado seja cada vez mais prazeroso e convidativo, tanto na caligrafia, como no desenho. Márcia Széliga é um exemplo disso. Artista plástica, ilustradora e escritora, há 40 anos, aproximadamente, dedica grande parte do seu tempo em benefício da arte. Com isso, imagino que seja inimaginável o número de corações e almas que seu trabalho já encantou. Para mim, é uma referência única nesse sentido, também por termos sido colegas de faculdade, nos anos 80 (isso é coisa de velho, mas agora já foi). Márcia Széliga é uma referência para todos os artistas do Brasil e muito provavelmente fora dele também, pois ao longo de quatro décadas ela decidiu ser missionária da paz e do amor através do seu trabalho exuberante, acolhedor e lúdico. Uma verdadeira poesia! Ela desenha sua caligrafia usando todas as cores do alfabeto e escreve seus desenhos com todas as cores do espectro. Assim, a cada trabalho realizado é mais um “quadrinho” para compor sua história de vida, que teve começo, tem o meio e não terá fim, porque sua obra vai permanecer no coração de todas as pessoas que se encantaram com ela. Se me permite aqui meu amigo José Bidóia (o poeta das estradas), cito um verso seu, se é que ainda me lembro: ‘Quanto mais caminho para o fim Sinto que meus versos Viverão além de mim’. Obrigado, Bidóia.” Xavier, artista plástico e publicitário 22/01/2013 Maringá PR

Leileca Come-come no pomar e na horta de Ione Adad Lapinha SPA computação gráfica ilustrações de Márcia Széliga e seu filho Axel Giller 2012 O Gigante Pequenininho de Luiz Antonio Aguiar Editora Record lápis dermatográfico 2011 Jasy Jatere estudo para capa de livro de Brígido Ibanhes computação gráfica

“Totens de Luz é mais leve, mais onírica, mais cósmica, mais do anseio perceptivo do divino. A outra é profundamente humana, aquele que cria está imbricado na Trajestória. Esse “desposicionamento” paradigmático marca as duas exposições. Trajestória é a manifestação humana sobre o divino, a recriação da realidade. Totens de Luz é o humano transcendido, expectador de uma outra realidade supostamente revelada. Tais variações não são no sentido de dominação, não competem entre si, são naturalmente complementares. Parece ser o que objetivou a necessidade criativa quando tomou as mãos da artista para realizar esses dois conjuntos de obras. Os dois grupos são lindos, tocam profundamente a alma. E esse toque pode ser sumarizado assim: se o humano assombra, o divino acalma.” João Novais, escritor e artista plástico - Belo Horizonte, 2013

A Rua Barulhenta autoria e ilustrações de Márcia Széliga Cortez Editora 2011

207


24°. Brinquedo: Os Três Carneirinhos

Pintura da Nicole aos 4 anos acrílica

Pintura da Nicole aos 4 anos acrílica Desenho da Nicole aos 5 anos lápis de cor

A

A

Princesinha da Lua Havia uma menina. Um dia, ela apareceu para mim. Era uma bela Princesinha da Lua. Chamo-a assim porque era clarinha e porque vem de um lugar para além de Nossa Senhora das Neves (é bem frio por lá)... Muito tempo atrás, em um belo parque, ela apareceu e me cativou como aquela raposa do Pequeno Príncipe, sabem? Ela me disse que estava sempre lá, mas eu não a via, tinha mágica no ar... E sei por que não a via: ela tem o dom de ficar invisível no momento em que quiser. Levei um tempo para perceber isso, mas um dia descobri o porquê. Ela vive aqui e lá, veio de um mundo diferente, busca incessantemente a verdade pelo seu imaginário, tem visões, vai para outros planos da realidade com facilidade... Levei um tempo para descobrir isso, e quando caiu a ficha vi que isso só podia significar uma coisa: ela realmente era uma Princesa feiticeira porque vive em outras dimensões, outras esferas, por assim dizer, e em suas viagens por esses mundos invisíveis ela traz de lá coisas surpreendentes e lindas. Isto para amenizar a “densidade” deste mundo, como ela mesma diz, para ver se umas pessoas acordam e para encantar criança também. É, é isso... E quanto a mim, um dia ela sussurrou umas coisas secretas no meu ouvido. Fazia isso enquanto eu dormia, então não lembro o que disse, só sei que depois subitamente comecei a ver coisas que realmente não estavam lá. Não que

208


209


Pintura do Kelvyn aos 5 anos acrĂ­lica Desenho do Kelvyn aos 7 anos pastel seco

Pintura do Kelvyn aos 5 anos acrĂ­lica

210


Desenho do Axel aos 15 anos grafite Desenho do Axel aos 5 anos pastel seco e oleoso

Desenho do Axel aos 3 anos pastel seco

211


Estudo de retrato da Nicole esferogrรกfica

Estudo de retrato do Axel e Kelvyn esferogrรกfica

212


não estivessem: eu é que não via. Apareceram de repente e com brilho de beleza. Lembram-se dos carneirinhos que o Pequeno Príncipe pedia para desenhar, né? (Aparentemente, a realeza cósmica gosta de carneirinhos). Pois é, a minha Princesinha da Lua desenhou, com um pouquinho de minha ajuda nuns detalhes, dois carneirinhos teimosinhos e felizes, e uma carneirinha muito fofinha e, claro, bruxinha também. Todos encadernados na mesma semana de Abril. Depois me digam se isso não é alta magia… Tudo graças a essa menina que me apareceu um belo dia e me cativou. Agora já sabem, sou o cara mais feliz do mundo. By Crazy Bull.” E agora com vocês as obras de arte feitas por nossas obras primas: Axel, Kelvyn e Nicole. Mauro Giller, o Touro Maluco, 2013 “Através do caleidoscópio vejo muitas mães. Minha mãe é assim, muitas em uma só. Tenho orgulho de dizer: minha mãe é Márcia Széliga.” Axel “Os desenhos de minha mãe são da hora! Mas na hora do almoço, vê se não me dá asas de frango. Não como asas porque elas carregam pedaços do céu.” Kelvyn “Quando acordei depois de ontem, olhei pra minha mãe e disse: ‘Você é minha melhor mãe mais preferida, a artista mais bonita e carinhosa e beijoqueira mais maluca. Seus desenhos são adoráveis. Gosto de você todos os dias pra sempre.” Nicole ORAÇÃO “Oh! Grande Maga de todas as Artes, Rainha Alada da Inspiração e das Espirais Ascensionadas, Estrela Guia que ilumina o Caminho Sagrado da Expressão. Faz de mim o instrumento de sua Mensagem A transmitir à humanidade Pela magia das imagens O amor universal de Sua Linguagem. Que manifeste em mim o Espírito de Criança Capaz de transformar Sonhos em Realidade Para que a Realidade seja sempre Um Sonho possível de realizar, Um Sopro bom de viver. Que do mergulho nas Sombras dos Pesadelos Sejam trazidas as Sementes Puras de Luz, Germinando em harmoniosa melodia O bailado do desabrochar das flores, E em sua abundante oferenda, Os frutos de todas as estações. E se a escuridão ainda habitar os corações Que possam os pincéis plenos de cores Contornar e preencher a beleza das formas E a Alma de cada ser em Brilho Divino de Amor transformar. Que Assim Seja!” Márcia Széliga, 2013 213


M

árcia Széliga é artista plástica, arteterapeuta, ilustradora e escritora de Livros infantis e Juvenis.

marciaszeliga.wix.com/arte-poesia

1981 Ingressa na Escola de Música e Belas Artes do Paraná; 3ª. Mostra do Desenho Brasileiro; 38°. Salão Paranaense; 1ª. Jovem Arte Sul América Brasil Sul, Curitiba, PR; 5°. Salão de Arte de Foz do Iguaçu 1982 4a. Mostra do Desenho Brasileiro; 1a. Mostra do Miniquadro; Free Art Cube, Paraná-Ohio Committee in Curitiba/USA; Individual no Centro Cultural Brasil-Estados Unidos de Curitiba; Menção Honrosa no 1o. Salão de Artes Plásticas do Círculo Militar do PR; 1ª Mostra do Miniquadro, Clube Santa Mônica 1983 Capa do LP “Águas do Futuro” de Tatára e Cabelo, Chantecler, SP; 5°. Encontro Artístico e Cultural da C.E.L.U., Curitiba, PR 1984 6ª. Mostra do Desenho Brasileiro; Coletiva na Sala Miguel Bakun; 1°. Lugar no Concurso para Capa do Guia de Endereços – Telepar; 2°. Salão de Arte do Círculo Militar, prêmio de melhor trabalho; Formatura em Artes Plásticas pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná 1985 42°. Salão Paranaense; 3ª Coletiva Guaíra; 37 pintores de Ponta Grossa, Galeria de Arte Poupança Banestado; “A Grande Pitonisa”, Teatro Guaíra, artista convidada; 3°. Salão de Arte do Círculo Militar do PR, prêmio medalha de ouro; “O corpo em movimento no esporte”, coletiva SESC da Esquina; “A Grande Pitonisa”, coletiva dos formandos 85 da EMBAP, artista convidada; Curso 40 dias com a gravura, Solar do Barão, FCC, Curitiba, PR 1986 7ª Mostra do Desenho Brasileiro; 43°. Salão Paranaense; Tradição Contradição, MAC; El Arte por La Paz, Teatro Guaíra; Curitiba Arte 2, prêmio menção especial; 4°. Salão de Arte do Círculo Militar do PR, prêmio de aquisição; 1°. concurso de fotos Ilha do Mel, UFPr; “Fotografe um Paraná Turístico”, FHOX-Paranatur; Os artistas em excursão no Trem Azul Bar, Curitiba, PR; Itinerante Emoções e Sensibilidades, Sesc da Esquina; Futebol Arte, Cary Galeria de Arte, Curitiba, PR; Trabalhou no SIR Laboratório de Som e Imagem como assistente de arte em Criação de cenários, Produção para TV, animação, ao lado de Daniel Marques; Ilustra a capa do livro “O menino que contava estrelas e o estranho caso da professora Quiméria”, de José Mário Perugini, produção independente; 1987 Individual na Galeria de Arte Poupança Banestado, Ponta Grossa; 5°. Salão de Arte do Círculo Militar do PR; Curitiba Arte 3, Salão Alcy Ramalho Filho; Coletiva Arte Curitiba 87, Solar do Barão Coletiva “Nú como Tema”, Museu Guido Viaro; Coletiva de Natal Galeria Arte Espaço Saint Germain de Prés, Curitiba; Coletiva na 28ª Jornada Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, Curitiba; Instrutora do Curso Básico e Avançado em Desenho Artístico, Curso Avançado de Desenho, SENAC, Serviço Nacional de Aprendizado Comercial; Curso de Litografia, com Michelle Behar, Solar do Barão, FCC, Curitiba, PR; 1988 Coletiva Histórias Extraordinárias, sala Miguel Bakun; Exposição EMBAP ano 40, Museu de Arte Contemporânea; Artes Plásticas Curitiba 88, Museu Guido Viaro; Projeto Última Forma, Galeria Cocaco; VIII Mostra da Gravura; Exposição coletiva Galeria Gilda Cunha, Ponta Grossa, PR; Trabalhou na Neomóvel, com ilustração de cartazes decorativos e cartazes infantis, onde criou o personagem Tatau, um tamanduá exterminador de formigas punks; 1989 Salão Arte Mulher, Teatro Guaíra, Curitiba, PR; Exibição comemorativa ao Dia Nacional da Polônia, Consulado da Polônia; Trabalho voluntário com os povos indígenas, OPAN, Operação Anchieta, Cuiabá, MT e Eirunepé, AM, morou com os índios Kanamari do Rio Purus, na bacia do Juruá; Representa o Paraná na Mostra Surrealismo no Brasil, por indicação e a convite de Ennio Marques, Pinacoteca de São Paulo, SP; Especialização em Desenho Animado, Academia de Belas Artes, Cracóvia, Polônia; 1991, Individual na Galeria Forum de Cracóvia, Polônia; Coletiva na Academia de Belas Artes de Cracóvia, Polônia; Apresentação das animações na Academia de Belas Artes de Cracóvia: Zaba (Sapo), 30 segundos, Transfiguração, 60 segundos e Sniadanie, 3 minutos; 1992 Com o apoio da Embaixada do Brasil na França, realizou pesquisa e reprodução em desenhos de coleções de peças indígenas dos grupos Kanamari, Katukina, Tikuna e Guarani trazidas pela primeira expedição francesa realizada ao Brasil há mais de 300 anos, pelo Padre Constant Tastevin, pertencentes ao Museu do Homem de Paris; Individual, Salle Ariel, Maison Internacional, Cité Universitaire, Paris; Coletiva Braspol, Galeria Wspólnota Polska, itinerante, Polônia; Volta ao Brasil. Individual APAP, Associação Paranaense de Artistas Plásticos, Contos em Lápis de Cor; 2ª Exposição do acervo do Centro Cultural Brasil Estados Unidos de Curitiba; 1993 Realiza Mostra conjunta dos desenhos realizados no Museu do Homem com fotos do grupo indígena Guarani da Ilha da Cotinga, do fotógrafo Mauro Giller, Museu Paranaense; Instrutora de cursos de extensão em ilustração de livro infantil e infanto-juvenil, Técnicas de Desenho e Pintura, UFPR, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR; Mostra da Gravura “Homenagem aos 300 Anos de Curitiba”, FCC; Mostra Moda Arte Ousadia Tribalist, Curitiba; Individual “Da Amazônia à Polônia em um Arco-Íris”, Gibiteca, FCC; Lançamento do álbum de litografia Lendas Curitibanas, Livraria Dario Vellozo, FCC; Ilustra Lições Curitibanas, livros didáticos, Prefeitura de Curitiba, até 1995; 1994 Mostra Geração Oitenta, Faculdade Tuiuti, Curitiba; Ilustra O Anjo Rouco, de Paulo Venturelli, Editora Braga; Kyvy Mirim, de Brígido Ibanhes, produção independente com apoio da editora Arco-Íris; Curso A Arte de Contar História, Fundação Sidónio Muralha, com Maria Angela Raio; 1995 Ilustra Prazeres do Pê, de Cecília Vasconcellos, Editora Braga; O Bailado de uma Lenda, de Jussara Braga, Editora Braga; Participação no 5o. Festival do Minuto, São Paulo, SP, com o desenho animado “Como Peixe For a D’Água”, em parceria com Mauro Giller; 1996 Mostra de Arte Contemporânea Paraná-Polônia, MAC, Curitiba; Cenário da peça “O Patinho Feio”, CLIPS Histórias de Bolso; Exposição coletiva na Sociedade União Juventus, Curitiba, PR; Pássaros Parados, de Lúcio Bandeira, ilustração de capa; Ilustrações de “Histórias do Cotidiano Paranaense”, de Maria Auxiliadora Schmidt, Governo do Estado do Paraná, Secretaria do Estado da Cultura; Ilustrações da Coleção Lendas Paranaenses, de Hardy Guedes; 1997 Cenário “O Pescador e o peixe de ouro”, CLIPS Histórias de bolso; 1ª mostra de ilustradores da APIQ, Associação Paranaense de Ilustradores e Quadrinistas, Gibiteca, Fundação Cultural de Curitiba; Participante e curadora da 1a. Mostra de Ilustração Paranaense, MAC; Mostra coletiva Gente Grande no Mundo da Criança, CEF; Coletiva de ilustradores, aniversário da Gibiteca, FCC; Ilustra “Um fio de linha contra o monstro do labirinto”, Mitologia Grega para Crianças, de Hardy Guedes, Lei de Incentivo à Cultura; Sete Cavalos na Berlinda, de Sidónio Muralha, Editora Global; Sete Quedas, Sete Anões e Um Dragão, de Gloria Kirinus, Ed. Braga; Cartaz da peça infantil “O Fabuloso Circo de Fábulas do Prof. Jacques”, de Lena Horn e Roberto Bürgel; Capa do CD “Ozônio”, da banda curitibana de jazz Sotak, de Paulo Branco e Marília Giller; 1998 Coleção de educação infantil “Idéias em Contexto”, Editora do Brasil; Circo vivo de poesia, de Hardy Guedes, Editora Módulo; El Niño, menino do mar, de Gloria Kirinus, Editora Ave Maria; Nicolau Grande e Nicolau Pequeno, Editora Kuarup; A mãe d’água, o diabo e o violeiro, de Hardy Guedes; Tição, o Saci camisa doze, de Hardy Guedes; Cartaz da peça infantil “O Fabuloso Circo de Fábulas do Prof. Jacques”, de Lena Horn e Roberto Bürgel; Participante e curadora da mostra coletiva Gente Grande no Mundo da Criança – Galeria da Caixa, Caixa Econômica Federal, Curitiba,PR 1999 Cria a ESPHERIS Edições Ltda.; Associa-se à AEI-LIJ, Associação de Escritores e Ilustradores do Livro Infantil e Juvenil, da qual foi coordenadora regional no Paraná;

Elaboração do projeto: Mônica Drummond Marketing Cultural: Cultural Office Edição e Organização: Márcia Széliga Fotos: Mauro Giller Texto: Márcia Széliga Revisão de texto; Michele Mueller Projeto Gráfico: Guilherme Zamoner Impressão: Maxigráfica Dados da Catalogação na Publicação Ficha Catalográfica elaborada pela Bibliotecária Jaqueline Jerônima Silva CRB-9/1368

S997c 2014

Széliga, Márcia Eliza Carrossel dos sonhos. / Márcia Eliza Széliga. Curitiba: Ed. do autor, 2014 216.: il. ; 31cm ISBN 978-85-63741-01-1 1. Artes Plásticas 2. Artistas - Paranaenses 3. Autobiografia I. Título CDU 73(816.2)

214


Cenários para “Casulo de Histórias”, CLIPS Histórias de bolso; Ilustra Ouvidos Dourados, a arte de ouvir histórias...para depois contá-las..., de Jonas Ribeiro, Editora Ave Maria; O ratinho da cidade e o ratinho do campo, de Hardy Guedes Alcoforado Filho, Lei de Incentivo à Cultura; Calendário ano 2000, Meu Anjo da Guarda, de Amir Piedade, Editora Ave Maria; 2000 Ilustra A turma do estojo, de Fernando Carraro, Editora Ave Maria; Minhas primeiras orações, de Suely Mendes Brazão, Editora Ave Maria; Deus fala aos pequeninos, de Tereza Albanez, Editora Ave Maria; Deu a louca no guarda-roupa, de Jonas Ribeiro, Edições Paulinas; De volta pra casa, de Jonas Ribeiro, Editora Esfera; O menino que fabricava beijos, de Rosângela Rauen; Capa do CD “Semente Bendita”, de Reinaldo Godinho; Ilustrações para o Cd-rom MITORAMA, Lendas do mundo todo para todo mundo, Tecnokena, de Paulo Munhoz; 2001 1ª Mostra de Ilustração, SESC Centro; Traçando Histórias, Mostra de ilustração de livros infanto-juvenis, 47a. Feira do Livro de Porto Alegre; Ilustra Artes & Manhas do Mico-leão, de Yves Hublet, Cultur Editoração; Teatrando, Aplicação do teatro na escola, de Alice Fagnani Simonati, Editora Elementar; Quero voltar para casa, de Diuni Rolim, Editora Braga; A Grande Guerra de Dona Baleia, de Yves Hublet, Cultur Editoração; Site Contando História, de Pedro Pessoa/Gabriel Lacerda; CD-Rom “Fábulas Fabulosas”, HORNBÜRGEL Produções; Contes et légendes d’Amazonie, de Maria Creuza de Souza, Jatyba Productions et Créations, Paris, França; Contes de Nuit, de Maria Creuza de Souza, Jatyba Productions et Créations, Paris, França; 2002 Formação em Biopsicologia pelo Instituto Visão Futuro, Porangaba, SP, com Susan Andrews; Teatrando, Aplicação do teatro na escola, de Alice Fagnani Simonati, Editora Elementar. Prêmio Altamente Recomendável Fundação Nacional do Livro Infanto Juvenil, 17ª Bienal do Livro de São Paulo; Ilustrações para: A saga de um povo que nasce, de Raquel Mestre, Ed. Paulinas; Colcha de Leituras, de Jonas Ribeiro, Ed. Elementar; O nome de todas as coisas: Anfíbios, Répteis, Insetos, Hardy Guedes; Planeta Água, de Yves Hublet, Cultur Editoração; Cartaz “O Contador de Histórias”, de Carlos Daitschman; 2003 Exposição Individual “Ciclos Férteis”, Jokers Pub-Café, Curitiba, PR; Exposição Individual Espaço Cultural do Poder Legislativo, Assembléia Legislativa, Curitiba, PR; 2004 Oficina de Educação Infantil, ASTRANET, Curitiba, PR; Do Céu ao Céu Voltarás, autoria e ilustração de Márcia Széliga, Cortez Editora; Maluquências, de Pedro Pessoa e Gabriel Lacerda, editora Fundamento; I Encontro Paranaense de Literatura Infanto-Juvenil, mesa redonda Literatura e Arte; Saberes, III Congresso Paranaense de Leitura, PUCPR, Mesa redonda A leitura projetando o futuro e a literatura infantil; 2005 Ilustrações para: Julieta de Bicicleta, de Liana Leão, Cortez Editora; As Duas Luas, de Márcia Novaes, Franco Editora; Diferentes, de Liana Leão, Editora Elementar; Cadeiras, de Jonas Ribeiro, Editora LGE; O Menino detrás das Nuvens, de Carlos A. Nazareth, Franco Editora; História de Mãe, de Eraldo Miranda, Franco Editora; Coleção Histórias de Tradição Oral, Editora Construir; João e Maria-de-Barro, de Luiz Antonio Aguiar, Editora Record; O Perfume do Mar, de Jonas Ribeiro, Editora Salesiana; Histórias mal-assombradas em volta do fogão de lenha, de Adriano Messias, Editora Biruta; Projeto Cidadão Mirim, coleção 1ª a 4ª série, Editora OPET, 2005 a 2007; Premiada com 3 cartazes na campanha VIVALEITURA, Ministério da Cultura, Ministério da Educação, Sindicato Nacional dos Editores de Livro; Participação na 20ª Bienal de Ilustrações de Bratislava, Tchekoslovaquia; 2006 2ª Mostra de Ilustração, SESC Centro; 1ª Mostra de Ilustração e Quadrinhos, FCC, Memorial de Curitiba; Ilustrações para: O menino e a colcha de retalhos, de Liana Leão, Editora Salesiana; A Caixinha de Narizes, de Liana e Bibi Leão, Editora Cortez; Curitiba, aqui muito pinhão, de Eduardo Fenianos, Editora Cortez; Griselma, de Marciano Vasques, Editora Noovha America; 2007 Oficina de ilustração e texto para crianças de 7 a 12 anos, na Semana Literária, Feira do Livro de Curitiba; Ingressa no curso de formação em Arteterapia, pelo Instituto Incorporarte do Rio de Janeiro; Ilustrações para: encarte Folhinha, da Folha de São Paulo. Contos de João Novais (Pinguim de Geladeira) e Luiz Antonio Aguiar (História de um Beijo); No Trilho do Trem, autoria e ilustrações de Márcia Széliga, Editora Salesiana; O Sino que queria voar, de Luiz Antonio Aguiar, Editora Record; Banquete de Capítulos Fantásticos, de Jonas Ribeiro, Editora DCL; Primeiras Reinações, de André Ricardo Aguiar, Editora Planeta; A Banda Polaca, de Dante Mendonça, Editora Novo Século; 2008 “Trajestórias”, exposição individual, Solar do Barão, FCC, Curitiba; Exposição Segredos do Coração, ilustrações do livro de Ana Luiza Baptista, no 1°. Simpósio de Arteterapia Arte e Corpo, Rio de Janeiro, RJ; Ministrante da oficina de Arteterapia A Poesia e a Arte Orgânica, no 1°. Simpósio de Arteterapia Arte e Corpo, Rio de Janeiro, RJ; Exposição da atividade com crianças “Soltando os Bichos” no 1°. Simpósio de Arteterapia Arte e Corpo, Rio de Janeiro, RJ; Oficina de ilustração e poesia na Semana de Estudos Pedagógicos, Colégio Municipal Omar Sabbag, Curitiba; Ilustrações para: Um Montão de Unicórnios, de Ana Maria Machado, Global Editora; Colcha de Leituras, de Jonas Ribeiro, reedição, Editora Ave Maria.; A Tempestade, adaptação de Liana Leão, da obra de Shakespeare, para crianças, Editora Salesiana 2009 Colcha de Leituras, nova edição, de Jonas Ribeiro, Editora Ave Maria; 2010 Ilustrações para: O Espelho, de Ieda de Oliveira, Editora Prumo; Frederico Godofredo, de Liana Leão, Editora Elementar; Duas Cadeiras e uma Amizade Verdadeira, de Jonas Ribeiro, Callis Editora; Segredos do Coração, de Ana Luisa Baptista, Espheris Edições; O Bebê Vampiro, de Regina Drummond, Cortez Editora 2011; Formação em Terapia Nexus: NEXUS THERAPY INSTITUT, São Paulo, com Rex Thomas; Ilustrações para: O Gigante Pequenininho, de Luiz Antonio Aguiar, Editora Record; O Gigante Egoísta, adaptação de Liana Leão, da obra de Oscar Wilde, Cortez Editora; Lançamento de A Rua Barulhenta, autoria e ilustrações, Cortez Editora, na 57ª. Feira do Livro de Porto Alegre, RS; Participação na exposição “Muitos desenhos de uma história”, Agência da Palavra, 57ª Feira do Livro de Porto Alegre, RS; Ilustrações do livro Cuicante, a família das cuícas cantantes, De Hélio Sant’Ana; Capa dos CDs Cuicante – a família das cuícas cantantes , e de Afro Brincantes, de Hélio Sant’Ana; Curadoria e participação da Mostra Primavera nos Museus, Sociedade Tadeusz Kosciuszko, Casa da Cultura Polônia Brasil; Lançamento de A Rua Barulhenta, autoria e ilustrações, na Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte, MG; Participação no III Congresso Latinoamericano de Arteterapia, IV Congresso do Mercosul de Arteterapia e I Congresso Lusobrasileiro de Arteterapia, Ouro Preto, MG; 2012 Vice-secretária e sócia fundadora da Casa da Cultura Polônia Brasil; Ministrante das oficinas de pintura “Projeto Fazendo Arte” para crianças internadas no Hospital Pequeno Príncipe, Curitiba, PR; Ilustrações para: O Pescador de Histórias, de Eraldo Miranda, Cortez Editora; Leileca Come-come no pomar e na horta, De Ione Maria Adad, Lapinha; 2013 Conclusão da formação em Arteterapia, Instituto Incorporarte, Rio de Janeiro; Ilustrações para: A Bruxinha que ficou doentinha, de Luiz Antonio Aguiar, Editora Record, lançamento no 15°. Salão FNLIJ de Livros para Crianças e Jovens, Rio de Janeiro; Totem, livro de imagens de Márcia Széliga, Cortez Editora; A Cantina de Dona Calabresa, de Liana Leão, Cortez Editora; Dona Revirada, de Luiz Antonio Aguiar, Editora Melhoramentos; Ilustrações para ônibus da Caravana da Poesia Vinicius de Moraes, Secretaria de Educação do Estado do Paraná; Totens de Luz, exposição individual, Villa Hauer Cultural; Carrossel dos Sonhos, livro autobiográfico, Lei Municipal de Incentivo à Cultura, Cultural Office; Exposição individual Círculos de Luz – Centro de Cultura da Cidade de Ponta Grossa.

Incentivo: Marketing cultural:

215


216


217


ISBN 978-85-63741-01-1

9 788563 741011

218


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.