CLB Guimarães Rosa

Page 1


ISSN 1413-652X

CADERNOS DE

LITERATURA B R A S I L E I R A


CADERNOS DE

LITERATURA B R A S I L E I R A

Diretor Editorial Editor Executivo Editor Editor Assistente Ensaio Fotográfico Edição de Arte Assistentes Editoriais Assistente de Produção Circulação

Antonio Fernando De Franceschi Bernardo Ajzenberg Manuel da Costa Pinto Michel Laub Edu Simões ˜ BEI Comunicação Diego Viana, Flávio Amaral, Hélio Ponciano Priscila Oliveira Odette Jerônimo Cabral Vieira

Consultoras da presente edição: Walnice Nogueira Galvão Ana Luiza Martins Costa Colaboradores: Ana Luiza Martins Costa, Benedito Nunes, Cleusa Rios Pinheiro Passos, Dora Ferreira da Silva, Francis Utéza, Germano Neto, João Correia Filho, José Mindlin, Rubens Ricupero, Sergio Guerini, Walnice Nogueira Galvão, Willi Bolle Foto da capa: Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

Edição especial, comemorativa dos 10 anos dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, números 20 e 21 – Dezembro de 2006


FOLHA DE ROSTO, 4 MEMÓRIA SELETIVA, 10 CONFLUÊNCIAS Dora Ferreira da Silva, 59 Manuelzão, 61 José Mindlin, 64 Rubens Ricupero, 66 GUIMARÃES ROSA POR ELE MESMO, 76 GEOGRAFIA PESSOAL, 94 MANUSCRITOS, 126 ENSAIOS “Rapsodo do sertão: da lexicogênese à mitopoese” – Walnice Nogueira Galvão, 144 “Via e viagens: a elaboração de Corpo de baile e GSV” – Ana Luiza Martins Costa, 187 “Guimarães Rosa quase de cor: rememorações filosóficas e literárias” – Benedito Nunes, 236 “O opus magnum oriental-ocidental” – Francis Utéza, 245 “No giro da memória: literatura e psicanálise em GSV” – Cleusa Rios Pinheiro Passos, 262 “GSV, romance de formação do Brasil” – Willi Bolle, 270 GUIA, 283


24/11/06 – 20h00

Acervo do Última Hora/Arquivo do Estado de São Paulo


F O L H A D E R O S TO

A hora e a vez de João Guimarães Rosa ESCRITA INTEGRALMENTE AO LONGO DO SÉCULO XX, A OBRA DO CRIADOR DE R IOBALDO E A UGUSTO M ATRAGA AMPLIFICA O LEGADO REGIONALISTA E AGREGA NOVAS PARAGENS, FAZENDO DO SERTÃO UMA METÁFORA DA LITERATURA DE NOSSO TEMPO

Esta 20ª edição comemorativa dos 10 anos dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA homenageia aquele que é considerado o maior escritor brasileiro do novecentos. Ponto culminante de uma tendência que atravessa nossa literatura – o regionalismo –, a obra de João Guimarães Rosa é ao mesmo tempo sua superação ao assimilar e amplificar as outras vertentes da invenção ficcional e poética que caracterizam o período mais fértil das letras do país. Contemporâneo de romancistas como Graciliano Ramos, José Lins do Rego e Clarice Lispector, e poetas como Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto, o autor de Sagarana (livro que este ano completa 60 anos) e Grande sertão: veredas (que há meio século transformou radicalmente nossa paisagem literária) pode ser considerado o resumo e o ápice de seu tempo. Já se disse sobre o continente rosiano que ele contém o local e o universal, o arcaico e o mítico, o documental e o metafísico, vazados numa linguagem que recria as palavras e desliza sobre uma geografia simbólica. O fato de continuarmos a dizê-lo sob diferentes ângulos apenas reitera o que todo leitor sente ao percorrer suas páginas: o sertão de Rosa, com seus jagunços e buritis, excede as condições históricas e o perfil social da região na qual parece tão profundamente enraizada. Antonio Candido – numa resenha feita no calor da hora, quando Sagarana começava a assombrar leitores e críticos – notou essa singularidade em relação aos demais regionalistas:

5

24/11/06 – 20h00


A província do sr. Guimarães Rosa, no caso Minas, é menos uma região do Brasil do que uma região da arte, com detalhes e locuções e vocabulário e geografia cosidos de maneira por vezes quase irreal, tamanha é a concentração com que trabalha o autor. (...) Sagarana não é um livro regional como os outros, porque não existe região igual à sua, criada livremente pelo autor com elementos caçados analiticamente e, depois, sintetizados na ecologia belíssima de suas histórias. Transcendendo o critério regional por meio de uma condensação do material observado (condensação mais forte do que qualquer outra em nossa literatura da “terra”), o sr. Guimarães Rosa como que iluminou, de repente, todo o caminho feito pelos seus antecessores. (“Notas de crítica literária – Sagarana”, Textos de intervenção. Desde então, e sob o impacto das obras publicados posteriormente – o ciclo novelesco Corpo de baile, Grande sertão: veredas e livros póstumos como Estas estórias e Ave, palavra –, a crítica vem enfatizando a idéia seminal de que o sertão de Guimarães Rosa é uma reconstrução alegórica do mundo e que suas narrativas, sejam contos mais breves ou seu único romance, perfazem o ambicioso projeto de fundar uma cosmologia literária da qual o escritor é uma espécie de demiurgo, criando os seres e os signos que os nomeiam. Leituras nem sempre convergentes, muitas vezes conflitantes, todas no entanto salientam o fato de que sua ficção aponta para um espaço imaginário, carregado de mistérios e símbolos que convidam à decifração, descolando-se assim do solo percorrido por seus viventes. Em “Céu, inferno”, Alfredo Bosi afirma: Em Guimarães Rosa, o que cinge à cultura popular é um fio unido de crenças: não só um conteúdo formado de imagens e afetos, mas, principalmente, um modo de ver os homens e o destino. (...) A sua narrativa, que parece a tantos ardidamente moderna e até mesmo experimental pela ousadia das soluções formais, realiza, com as artimanhas da linguagem, uma nova tradução do pensamento arcaico-popular. No ensaio “O mundo misturado”, Davi Arrigucci Jr. propõe que o entrecruzamento de elementos da cultura comunitária e de uma religiosidade tradicional com

6

24/11/06 – 20h00


questões próprias da sociedade e do indivíduo modernos faz do sertão rosiano um lugar onde se materializam ficcionalmente as forças contraditórias de nossa modernização periférica – figurada nessa mistura temporal e formal (épica, literatura oral, romance de formação) que coloca Grande sertão: veredas na trilha de uma totalidade buscada pelo grande romance moderno. Mistura essa que reaparece em O o, de João Adolfo Hansen, sob um viés radicalmente antimimético: descartando todas as leituras que perseguem correspondências entre o texto e um além do texto, entre a letra e sentidos pré-existentes a ela (padrões lingüísticos, mitologias, ideologemas etc.), Hansen vê no romance um deslocamento incessante de estórias que se cancelam reciprocamente, produzindo sobre a ilusão da referencialidade uma pura indeterminação, uma negatividade consubstanciada na expressão nonada: “uma cosmogonia no nada, como texto que a tudo pode incluir e deglutir em seu diabolismo”. Esses três exemplos são representativos de uma vastíssima fortuna crítica à qual a presente edição dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA vem acrescentar algumas contribuições fundamentais. A começar por um depoimento hoje tingido de forte conotação simbólica: o texto da poeta Dora Ferreira da Silva que abre a seção “Confluências” e acompanha as lembranças do embaixador Rubens Ricupero sobre a experiência de Guimarães Rosa como diplomata, as anotações do bibliófilo José Mindlin sobre seu encontro com o escritor, em Paris, e a transcrição de uma entrevista inédita de Manuelzão, vaqueiro que viajou com o escritor pelo interior de Minas, tornando-se personagem de “Uma estória de amor (Festa de Manuelzão)”, novela integrante de Corpo de baile. Escrito poucas semanas antes de sua morte, o último texto em prosa da autora de Hídrias traz o relato de um encontro entre ela e o criador de Riobaldo, cuja imagem se funde com a de Guimarães Rosa na memória da poeta, que recorda o dia em que acreditou vê-lo montado num cavalo à porta de sua casa em São Paulo. “João Guimarães Rosa, bardo do Brasil, inventor de mundos, a nossa paidéia, o nosso Homero”, escreve Dora na abertura de um texto que, à parte seu inestimável valor documental, coloca o escritor no rol dos clássicos da literatura universal e ecoa o célebre aforismo de Pessoa: “Deve haver, no mais pequeno poema de um poeta qualquer coisa por onde se note que existiu Homero”. Poeta da língua portuguesa, épico de um sertão arquetípico, Guimarães Rosa transformou a topografia em topos – o que faz dele um clássico naquela acepção inaugurada pelo autor da Odisséia. E se uma das características dos clássicos consiste justamente em se apropriar de tópicas tradicionais para metamorfoseá-las e projetá-las no futuro sob novas vestes,

7

24/11/06 – 20h00


a exemplo do que faz Goethe com o mito do doutor Fausto e com o Bildungsroman, essa será a tônica de Willi Bolle no ensaio que investiga o lugar ocupado por Grande sertão: veredas como “romance de formação do Brasil” – numa posição simétrica àquela de Os anos de aprendizagem de Wilhelm Meister na cultura de língua alemã. “O opus magnum oriental-ocidental”, de Francis Utéza, decodifica a “encruzilhada do tempo cósmico” construída por Guimarães Rosa em seu romance, desentranhando as referências herméticas e as “paragens mágicas ‘semicamufladas sob os buritis e o capim’”. Em “No giro da memória: convergências entre literatura e psicanálise em Grande sertão: veredas”, Cleusa Rios Pinheiro Passos percorre lapsos das personagens da narrativa, os atos discursivos que se oferecem como metonímias de seus fantasmas, numa análise que evita aplicações simplistas e mecânicas do repertório conceitual psicanalítico à matéria-prima verbal, preferindo desvelar as camadas de significação que vão se insinuando na cadeia simbólica da escrita rosiana. Esses três textos estão na seção “Ensaio”, que não enfoca apenas a obra máxima de Guimarães Rosa – embora esta, naturalmente, ocupe o centro da cena. Pois, se Grande sertão: veredas é um livro percorrido por um leitmotiv – a célebre frase “o demônio na rua, no meio do redemunho” –, o conjunto da produção de Rosa também gira em torno de algumas obsessões e motivos. Dentre eles, destaca-se a forma original com que o escritor se apodera da tradição filosófica, tornando recorrentes (embora nem sempre explícitas) as remissões que incluem Platão, Jesus, Plotino e Heidegger, passando por doutrinas orientais como bramanismo, budismo e taoísmo. Conforme diz Benedito Nunes, no ensaio que analisa essas figuras à espreita, em Rosa “o enredo é o pretexto episódico para a figuração de um ‘alto original’, de que cada novela, cada história, constitui uma versão parcial, fragmentária, enquadrada por moldura filosófica, ao mesmo tempo ‘módulo poético’ do conto crítico”. Em “Rapsodo do sertão: da lexicogênese à mitopoese”, que abre os “Ensaios”, Walnice Nogueira Galvão realiza a tarefa monumental de detectar todas as instâncias do processo de criação de Guimarães Rosa, o que inclui as “etapas de um labor incessante e em movimento perpétuo” com a palavra – tal como se pode constatar na pesquisa ecdótica rosiana – e a inesgotável capacidade fabulatória de seus enredos. O trabalho da autora de As forma do falso, todavia, ultrapassa o âmbito de sua reflexão ensaística: Walnice Nogueira Galvão foi uma fonte freqüente de consulta editorial e bibliográfica, avalizando a abrangência desta edição dos CADERNOS. A essa contribuição, soma-se a da pesquisadora Ana Luiza Martins Costa, cujo conhecimento profun-

8

24/11/06 – 20h00


do do espólio literário de Guimarães Rosa, dos documentos, cartas e variantes das edições de suas obras, redundou no ensaio “Via e viagens: a elaboração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas” – que procura entender o surto criativo que começa em 1946, com a publicação de Sagarana, e culmina nas obras de 1956, período ao qual podíamos aplicar a mesma expressão que Joseph Frank utilizou para definir o ápice da carreira de Dostoiévski (escritor com o qual o autor mineiro compartilha preocupações místico-religiosas): são os “anos miraculosos” de João Guimarães Rosa. Ana Luiza Martins Costa também é autora da “Memória seletiva”, cronologia que abre a edição e registra ano a ano a trajetória do criador de Tutaméia. Em função do pioneirismo e da importância documental do material coligido pela pesquisadora – que inclui uma iconografia gentilmente cedida ao Instituto Moreira Salles pela família Tess –, a seção difere ligeiramente do padrão adotado em outras edições dos CADERNOS. Além de incluir numerosas citações, traz ao final um aparato de notas bibliográficas (às quais o texto faz remissão) que constituem a partir de agora uma fonte rigorosa de consulta para leitores e pesquisadores. Todos os autores dos ensaios, é importante notar, estão presentes no “Guia” que fecha a edição – um levantamento bibliográfico cujas 60 páginas ampliam e atualizam o exaustivo levantamento feito por Plínio Doyle no ano seguinte à morte do escritor. O continente rosiano não estaria completo, porém, sem que nos aproximássemos das palavras com que o escritor se metamorfoseia em personagem – presente nos trechos selecionados em “Guimarães Rosa por ele mesmo” – e sem que percorrêssemos sua “Geografia pessoal” – aquelas veredas da paisagem mineira que, 40 anos após a morte do escritor, ainda reverberam o imaginário de seus livros e foram desvelados pela lente do fotógrafo Edu Simões. Completa esse quadro um encarte especial, que acompanha a edição comemorativa dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA: um inédito conjunto de registros sobre o período em que Guimarães Rosa viveu na Alemanha, onde foi vice-cônsul do Brasil em Hamburgo – fruto do trabalho das jornalistas Adriana Jacobsen e Soraia Vilela. Todo esse precioso material ensaístico, bibliográfico, testemunhal e iconográfico obviamente não esgota nosso conhecimento desse escritor ilimitado, mas ajuda a mitigar aquela irônica miragem de Guimarães Rosa deixada por Carlos Drummond de Andrade ao final do célebre poema em que dele se despede: “Ficamos sem saber o que era João/ e se João existiu/ de se pegar”.

9

24/11/06 – 20h00


M E M Ó R I A S E L E T I VA

Veredas de Viator Ana Luiza Martins Costa

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

1908 No dia 27 de junho, João Guimarães Rosa nasce em Cordisburgo, pequena cidade do interior de Minas Gerais, cercada de montanhas e fazendas de gado, no vale do rio das Velhas, entre Curvelo e Sete Lagoas, nas imediações da gruta do Maquiné. É o primeiro dos sete filhos de Francisca Guimarães Rosa (dona Chiquitinha) e Florduardo Pinto Rosa (seu Fulô): Maria Luiza (Iza), Maria José (Zezé), Maria Auxiliadora (Dora), José Luís, Oswaldo (Vavá) e Maria Izabel, que morre ainda criança, de difteria laríngea (crupe). A família mora em frente à estação de ferro e ao curral de embarque

João Guimarães Rosa com os pais Francisca e Florduardo

de gado, numa casa grande, de esquina, utilizada também como estabelecimento comercial: é a venda de seu Fulô. O quintal da casa é amplo e abriga animais de criação, um papagaio e alguns cachorros, como os perdigueiros de caça de Florduardo. Junto com eles mora a bisavó Chiquinha, que se orgulhava de haver feito o parto de sua neta Francisca, mãe de Joãozito. Hoje a casa onde o escritor João Guimarães Rosa nasceu e passou a infância é o Museu Casa Guimarães Rosa. 1908-17 O menino Joãozito cresce ouvindo estórias contadas pelos freqüentadores da venda de seu Fulô, convivendo com mascates, garimpeiros, praças da polícia, fazendeiros, caçadores e, principalmente, vaqueiros, que chegam com boiadas provenientes do alto sertão para embarque nos trens-de-ferro que dali partem rumo a Belo Horizonte e São Paulo. Juca Bananeira, futuro personagem de Sagarana, trabalha e dorme na venda, e costuma acompanhar os meninos em suas andanças e brincadeiras, como tomar banhos de córrego, capturar e soltar passarinhos. Joãozito aprende as primeiras letras com Mestre Candinho e desde cedo 10

mostra seu interesse e incrível dom para aprender línguas. Começa estudando francês e holandês com frei Canísio Zoetmulder, frade franciscano holandês, e logo depois se interessa por aprender alemão: Lá, em Minas Gerais, quando com 9 anos de idade, muito espantei os meus, ao comprar, por mim mesmo, uma gramática alemã, para estudá-la, sozinho, sentado à beira da calçada, nos intervalos de jogar, com outros meninos, football de rua. Só foi isso por inato amor às palavras recortadas de exatas consoantes: tais como kraft e sanft, welt e wald, e gnade, e pfad e haupt e schwung e schmiss. Do que, depois, querer estudar medicina também em livros alemães, aproximar-me de Schiller, Heine, Goethe, e namorar, de preferência, as louras moças de origem alemã.1

É um menino estudioso e apaixonado por Geografia e História Natural. Passa horas brincando com mapas, coleciona insetos e plantas em caixas de fósforo e de sapatos – paixão que cultivará também em Belo Horizonte, durante toda a adolescência. Acompanha o desenrolar da Primeira Guerra Mundial, discutindo estratégias militares com frei Canísio, de quem se torna amigo. Estendiam o mapa da Europa na mesa e, com alfinetes coloridos, “marcavam os avanços e recuos das tropas alemãs e dos aliados,


Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

de acordo com o noticiário dos jornais”. Também brincavam de “realizar estratégias próprias, por hipótese, promovendo sempre a vitória das forças aliadas”.2 Criado num ambiente muito religioso, Joãozito chega a brincar de oficiar missa em cima de um caixote: “Improvisava uns paramentos, ajeitava o altar e convocava os fiéis. Os fiéis eram os meninos das vizinhanças, todos muito contritos. Depois ele foi coroinha na igreja de São José [em Belo Horizonte]. E durante a vida inteira carregava um terço, rezava em todo lugar, na rua até...”.3 Segundo seus irmãos, em Cordisburgo “toda noite a gente rezava o terço, depois rezava uma porção de rezas, Ave Maria, Padre Nosso... E de manhã cedinho papai nos acordava, no domingo, para a missa na igreja de Lurdes. Ele até esperava abrir a igreja, ficava esperando abrir a porta da igreja para a gente entrar” (Zé Luís);4 “a gente tava brincando, mas a hora de rezar o terço era sagrada. Às vezes a gente cochilava...” (Dora).5 Na época do Natal, mamãe Chiquitinha e vovó Chiquinha costumam armar um enorme presépio num dos cômodos da casa, com plantas, montanhas e bichos, tal como retratado em “De stella et adventu magorum” (de Ave, palavra), e também na estória de Miguilim (“Campo geral”, do Corpo de baile), que reproduz muitos aspectos de sua infância. Joãozito é lembrado como um menino de memória prodigiosa, que estava sempre lendo, “sempre grudado num livro”: “Era magrinho, fraco, o médico man-

O jovem Guimarães Rosa (sentado, no centro) com a família reunida em Cordisburgo (1916)

dou cortar qualquer excesso. Os estudos demais da conta, as leituras. Mas o Joãozito não tinha jeito mesmo: lia atrás da porta, e de manhã eu achava livros debaixo do travesseiro. Quando era rapaz, lia até altas horas com os pés na bacia de água gelada, que era para não dormir.”6 Gostava de sentar no chão com as pernas cruzadas, inclinado sobre um livro aberto no colo, e ficava ritmando a leitura batendo sobre as páginas com dois pauzinhos (ou pedacinhos de papel enrolados como canudos), ora um, ora outro, compassadamente – um hábito de leitura ritmada que nunca abandonou:7 “Às vezes, ele estudando, a gente apanhava aquelas folhas de manga, ele tirava e ficava com aqueles pauzinhos batendo” (Dora); “ele estava estudando, e se a cadeira era de palhinha, ele tirava as palhinhas da cadeira, botava na boca, e ficava tamborilando no livro: tá-tá-tá-tá-tá... Quando não tinha palhinha, enrolava 11

papel, aquele canudinho ele botava na boca e ia batendo” (Zé Luís); “ele tinha sempre um pedacinho de pau e ia batendo. Batendo e lendo. Eu achava aquilo engraçado, achava estranho”.8 Entre oito e nove anos, o doutor José Lourenço, médico de Curvelo, descobre sua miopia – episódio que será recriado em “Campo geral”, na cena da descoberta da miopia de Miguilim. Em 1917, com nove anos, termina o curso primário no grupo escolar Afonso Pena, em Belo Horizonte, morando na casa de Luís Guimarães, seu avô materno e também padrinho. 1918-24 Após uma breve passagem pelo internato do colégio Santo Antônio, de São João del Rei, onde “não se acostumou com a comida e com uns colegas que lhe faziam medo”9, é matriculado no ginásio do colégio Arnaldo, em Belo Horizonte, de padres alemães, onde também estudaram Carlos Drummond


Acervo da família Tess

Entrada da estrada de ferro em Cordisburgo

de Andrade e Gustavo Capanema. Sua experiência de aluno interno no colégio Arnaldo irá inspirar o conto “Pirlimpsiquice” (Primeiras estórias, 1962), escrito muitos anos depois. Dos dez aos 16 anos, o jovem Joãozito continua se aperfeiçoando e aprendendo novas línguas, dedicando-se à leitura dos clássicos, sempre que possível no original: “Da mesada de dois mil-réis, comprava aos domingos empadinhas e garrafas de soda limonada e se refugiava na Biblioteca Pública, para devorar livros.” Também estuda música, depois que ganha do pai um violino, que mais tarde acaba vendendo só “para visitar uma namorada que se mudara para outra cidade”.10 1925 Ingressa na Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais (1925-30). Mora na pensão de seu tio, João Lima Guimarães, na rua Espírito Santo. Durante algum tempo, divide o quarto com José Luís, irmão dez anos mais moço, que acaba se acostumando a conviver com

suas coleções de insetos e alguns esqueletos: “Eu tinha sempre que dormir com aquelas caveiras, mãos, ossos, aquela mão dissecada em cima da mesa. Ele às vezes chegava tarde, às vezes nem ia dormir em casa, ficava no hospital estudando com os colegas.” Zé Luís nunca esqueceu a primeira vez que avistou o mar, levado pelo irmão, no Rio de Janeiro, alguns anos mais tarde: “Ele era uma pessoa totalmente ocupada, mas fez questão de me levar à praia para eu conhecer [...] Ele também me levou no Jardim Zoológico para ver os bichos, aqueles macacos grandes... Ele gostava demais também de bichos [...] Eu sempre pedia para ele desenhar para mim, e ele desenhava sempre a natureza, desenhava uma casa, por exemplo, assim com cerca, como se fosse um curral, com montanha no fundo e bicho na frente. Desenhava cavalo, boi...”. Na pensão de seu tio, Rosa conhece Pedro Moreira Barbosa, que também vai estudar medicina, e com quem trava uma longa amizade.11 1926 Também aluno da Faculdade de Medicina, em suas memórias (Beira-mar) Pedro Nava lembra das palavras do estudante “João Rosa” por ocasião da morte de um colega: “As pessoas não morrem, ficam encantadas” – frase que ficará bastante conhecida por encerrar seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, em 1967, saudando seu antecessor. Durante o curso de medicina, no hospital da Santa Casa de Belo Horizon12

te, Rosa fica amigo do futuro presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira, que entrara na faculdade três anos antes. 1928 Em outubro, o jornal Minas Gerais (Belo Horizonte, 05.10) publica sua tradução do alemão do artigo “A organização científica em Minas Gerais”, do professor O. Quelle, da Universidade de Bonn, Alemanha. Em dezembro, é nomeado para o cargo de agente itinerante da Diretoria do Serviço de Estatística Geral do Estado de Minas Gerais, da Secretaria de Agricultura. 1929 Em janeiro, toma posse no cargo de agente itinerante da Diretoria do Serviço de Estatística Geral do Estado de Minas Gerais, da Secretaria de Agricultura. Envia contos para um concurso literário promovido pela revista O Cruzeiro (Rio de Janeiro), motivado pelo prêmio em dinheiro e pela divulgação de seu trabalho. Desde menino, muito pequeno, eu brincava de imaginar intermináveis estórias, verdadeiros romances; quando comecei a estudar geografia – matéria de que sempre gostei – colocava as personagens e cenas nas mais variadas cidades e países; um faroleiro, na Grécia, que namorava uma moça no Japão, fugiam para a Noruega, depois iam passear no México... coisas desse jeito, quase surrealistas. Mas, escrever mesmo, só comecei foi em 1929, com alguns contos, que, naturalmente, não valem nada. Até essa ocasião, eu só me interessava, e intensamente, pelo estudo, da Medicina e da Biologia.12

Selecionado no concurso, o conto “O mistério de Highmore Hall” é publicado na revista O Cruzeiro


(n. 57, 07.12.1929), com ilustrações de C. Chambelland.

1918-30 Dos 10 a 22 anos, do colégio à faculdade, o jovem Guimarães Rosa vive em Belo Horizonte, num período marcado por histórias de jagunços e de violentas disputas políticas no interior de Minas Gerais, ouvindo falar de Antônio Dó e Andalécio (de São Francisco); Felão (delegado de capturas, de Curvelo); João Duque (de Carinhanha); coronel Hermógenes (de João Pinheiro); coronel Ricardo

Acervo da família Tess

1930 Em março, é designado para auxiliar apurador da Diretoria do Serviço de Estatística Geral de Minas Gerais, da Secretaria de Agricultura, em caráter de substituição. No dia do seu aniversário (27 de junho), casase com Lygia Cabral Penna, jovem de 18 anos, natural de Sete Lagoas, cidade próxima a Cordisburgo: “Era aluna da Escola Normal em Belo Horizonte. Papai sempre passava em frente à escola na hora da saída e dizia: Oi, Lili – Lili era o apelido dela – que coincidência! Era todo dia a mesma coisa. As colegas da minha mãe já sabiam e diziam para ela: Lili, a coincidência está te esperando lá na porta!”.13 Forma-se em medicina no dia 21 de dezembro: o “doutor João Rosa” é escolhido para ser o orador da turma. Seu discurso é publicado no jornal Minas Gerais (Belo

Horizonte, 22-23.12.1930). Ao longo desse ano, publica mais três contos: “Makiné” (no suplemento dominical de O Jornal, Rio de Janeiro, 09.02.1930); “Cronos kai Anagke (Tempo e destino) – a mais extraordinária história de xadrez já explicada aos adeptos e não-adeptos do tabuleiro” (O Cruzeiro, 21.06.1930. Ilustrações de C. Chambelland); e “Caçadores de camurças” (O Cruzeiro, 12.07.1930. Ilustrações de H. Cavalleiro).

A estação de trem da cidade natal do escritor, que fará os primeiros estudos em São João del Rei e Belo Horizonte 13

Gregório (de Curralinho, hoje Corinto), coronel Ornelas (de Goiás), Rotílio Manduca (dono da fazenda Baluarte); tenente Alcides do Amaral; capitão Mello Franco; etc. É nesse período que jornais da capital dão notícia dos batalhões enviados pelo Governo para “pacificar o sertão” e dos embates de Rotílio Manduca com a Coluna Prestes no norte de Minas (1925-1926), bem como sai na primeira página do Estado de Minas a notícia da morte do “famoso Antonio Dó: um astro no crime que desaparece” (1929). O jovem Rosa também tem acesso a essas histórias através de colegas do colégio Arnaldo (como o filho de Sancho Ribas, de São Francisco, inimigo político de Antônio Dó, que invadiu a cidade em 1913), e de amigos da faculdade (como Aurélio Caciquinho Ferreira, neto do barão de São Romão, de uma família de políticos de Januária, adversários de Antônio Dó),14 e ainda por intermédio de seu tio, doutor João Lima Guimarães, que havia sido advogado em Curvelo e adversário político do coronel Ricardo Gregório, fazendeiro de Curralinho (Corinto), casado com dona Hermogênea.15 Todos esses personagens históricos da Primeira República serão recriados no romance Grande sertão: veredas, escrito 30 anos depois. 1931-32 Em fevereiro de 1931, solicita expedição e registro do diploma de médico. Logo depois, inicia a carreira em Itaguara (município de Itaúna, Minas Gerais), pequeno povoado rural,


Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

ra o cargo de inspetor da Secretaria de Educação e Saúde Pública, no distrito de Itaguara. Durante a Revolução Constitucionalista, atua como médico voluntário da Força Pública, servindo no Setor do Túnel, onde reencontra JK.

Guimarães Rosa e Lygia Cabral Penna, com quem se casou em 1930

sem luz e com estradas de terra, onde passa a residir com dona Lygia. Torna-se pai aos 23 anos: Vilma, a primeira filha do casal, nasce em Itaguara, no dia 5 de julho de 1931. O jovem médico visita muitos pacientes a cavalo, cobrando suas consultas em função da distância percorrida. E aproveita suas conversas com moradores da roça, ciganos, doentes de malária e trabalhadores da estrada São Paulo-Belo Horizonte, para escrever alguns contos, que mais tarde serão retrabalhados e reunidos no volume Sezão (ou Contos, de 1937, a primeira versão de Sagarana). “Papai galopava, às vezes, a noite inteira, para atender os clientes. Seu grande desespero, contudo, era a impossibilidade de salvar alguns doentes. Ficava deprimido e profundamente angustiado.”16 Em abril de 1932 é nomeado pa-

1933-34 Em abril de 1933, através de concurso, ingressa na Força Pública de Minas como oficial-médico do 9º. Batalhão de Infantaria, sediado em Barbacena (MG), para onde se muda com a família. O imenso manicômio da cidade, que recebia pacientes transportados em vagões especiais de trem, estará presente no conto “Sorôco, sua mãe, sua filha”, publicado muitos anos depois (O Globo, 18.03.1961; incluído em Primeiras estórias, 1962). Pratica francês com amigos e parceiros de xadrez do Clube Comercial da cidade; treina alemão, estuda russo e japonês com moradores de Barbacena provenientes de tais países. Agnes (“Agnucha”), segunda filha de Rosa e Lygia, nasce em Barbacena, no dia 17 de janeiro de 1934. Em março de 1934, em carta a Pedro Barbosa (Barbacena, 01.03), revela que pretende “deslocar-se em breve para o Rio de Janeiro”. Dez dias depois (20.03), pedindo “absoluto sigilo”, revela ao amigo seu interesse pela carreira diplomática – “a mais nobre e distinta de todas, a mais selecionada, a de mais difícil acesso, talvez” –, explicando que o “gosto pelo estudo das línguas, amor pelas coisas internacionais, aflições cosmopolitas, alguma leitura, tudo isso me le14

va para esse rumo”. Declara-se “decepcionado com a realidade da medicina, sentindo até algum arrependimento por não ter estudado direito” – ainda que ande “navegando bem, apesar de em águas pouco profundas. Mas falta-me o amor da profissão, a adaptação às tarefas cotidianas”: “Não nasci para isso, penso [...] só posso agir satisfeito no terreno das teorias, dos textos, do raciocínio puro, dos subjetivismos. Sou um jogador de xadrez – nunca pude, por exemplo, com o bilhar ou com o futebol [...]”. Já se preparando para o concurso do Itamaraty, solicita ao amigo a coleção completa dos Pontos de direito internacional público, do professor Alberto Deodato, da UFMG. Estuda com afinco, acordando “de madrugada, na fria Barbacena”; “às vezes o corpo resistia. Sabem o que ele fazia? Enchia a banheira de água gelada e se atirava dentro, para receber a chicotada que desperta o espírito e predispõe ao trabalho.”17 É em Barbacena que Rosa conhece Geraldo França de Lima, futuro escritor e membro da Academia Brasileira de Letras, com quem trava uma amizade de longa data. Geraldo incentiva Rosa a entrar para o Itamaraty. Quando vai estudar direito no Rio de Janeiro, envia-lhe o programa do concurso: “Por conhecer sua aversão à Medicina, supus que o concurso seria interessante para ele porque ele conhecia línguas perfeitamente bem. Ele conhecia Goethe profundamente, e lia, falava, escrevia e discursava em alemão. Sabia


Além de médico, tenho estudos especializados de anthropologia e ethnographia [...] e de lingüística também [...] E por acaso, o homem veio interrogar-me justamente sobre os índios Ka-shi-nauás, a respeito dos quais fiz eu citações naqueles artigos que escrevi há muito tempo, acerca do ESPERANTO. Naturalmente, discorri com valentia a respeito delles. [sic]20

É nesse período que Rosa trabalha no Serviço de Proteção ao Índio (1933-35).

1934 No dia 11 de julho é nomeado cônsul de terceira classe, ingressando na carreira diplomática. Pede demissão do cargo de capitão-médico, e logo depois se muda com a família para o Rio de Janeiro, onde irá residir por quase quatro anos, trabalhando na Secretaria do Ministério das Relações Exteriores, Palácio do Itamaraty (14.07.1934 a 13.04.1938). Em agosto, escreve mais uma carta a Pedro Barbosa dizendo que terminou “o primeiro capítulo do segundo volume da minha vida”, e está “nomeado, empossado, trabalhando satisfeito”: “Penso que encontrei ainda a tempo a minha verdadeira vocação. Pretendo seguir o curso de direito, especializar-me em direito internacional e em línguas eslavas, escrever alguns livros de literatura e ver o mundo lá fora.”21 Anos mais tarde, em carta ao seu tradutor italiano, Rosa volta a falar dos motivos que o levaram a deixar a medicina: “o gosto de estudar línguas, e a ânsia de viajar mundo”.22 1936 Inscreve o volume de poesias Magma no Concurso Literário da Academia Brasileira de Letras, ganhando o primeiro lugar, entre 24 inscritos. Guilherme de Almeida, que assina o parecer da comissão julgadora (22.11), refere-se ao livro como um exemplar de “pura, esplêndida poesia. Descobre-se aí um poeta, um verdadeiro poeta: o poeta, talvez, de que o nosso instante precisava” (ver Em memória de JGR). 1937 Seu discurso de agradecimento pelo prêmio de poesia da 15

é publicado na Revista da ABL (Anais de 1937, Rio de Janeiro, 29 (53): 261-3). Em carta a Pedro Barbosa (Rio de Janeiro, 18.08), comenta que “o Magma ainda não foi editado (sel-o-á dentro em breve) e só por esse motivo é que você ainda não recebeu o exemplar a que tem direito”. Nove anos depois, na contracapa de Sagarana, que foi o primeiro livro publicado de Rosa (1946), Magma aparece como obra do autor, descrito nos seguintes termos: “Prêmio de Poesia da ABL, 1936 (A sair)”. No entanto, somente será publicado 60 anos depois, postumamente, em 1997. Animado com o sucesso de Magma, Rosa concorre ao Prêmio Humberto de Campos, da Livraria José Olympio Editora, com o volume Contos (com 12 estórias), a primeira versão de Sagarana, escrito “quase todo na cama, a lápis, em cadernos de 100 folhas – em sete meses; sete meses de exaltação, de deslumbramento”: ABL

Acervo da família Tess

muito bem também grego e latim, além do francês.”18 Em abril de 1934, Rosa solicita documento de reservista do serviço militar, visando prestar concurso para o Itamaraty. Em maio, é nomeado para o cargo de capitão-médico do Serviço de Saúde da Força Pública do Estado de Minas Gerais. Em julho, presta concurso para o Itamaraty, no Rio de Janeiro, sendo aprovado em 2º. lugar. Entre 57 concorrentes, só 9 são classificados. Rosa obtém as melhores notas nas cinco cadeiras de Direito (internacional público, internacional privado, constitucional brasileiro, comercial e administrativo). Na prova de francês, ao ser indagado sobre o que conhecia de literatura clássica francesa, Rosa surpreende a todos ao responder “Toda”: “E discorreu com brilhantismo sobre um determinado autor, reproduzindo passagens de cor, para o espanto de seu argüidor”.19 No exame de geografia, o ponto sorteado que lhe coube foi “Raças, línguas e religiões do globo”. Em carta a Lygia, relata como foi a sua resposta ao professor Raja Gabaglia:

Aracy Moebius de Carvalho, funcionária do Consulado do Brasil em Hamburgo


O título escolhido era Sezão; mas, para melhor resguardar o anonimato, pespeguei no cartapácio, à última hora, este rótulo simples: “Contos (título provisório, a ser substituído) por Viator.” Porque eu ia ter de começar longas viagens, logo após. 23

meado cônsul-adjunto em Hamburgo, para onde viaja sozinho. Permanece quatro anos na Alemanha, bem no período da eclosão da Segunda Guerra Mundial: em Hamburgo, de 05.05.1938 a 28.01.1942; em Baden-Baden, de 28.01 a 23.05 de 1942. Em Hamburgo, conhece dona Aracy Moebius de Carvalho, funcionária graduada do Consulado, que virá a ser sua segunda esposa. Tira carteira de motorista, compra um carro e faz algumas viagens pela Alemanha: “Em Weimar, visitei a casa de Goethe e a casa de Schiller, conservadas tal e qual eram por ocasião da vida dos dois; foi uma das minhas grandes emoções nesta terra, fazendo-me enorme bem”.25 Na Páscoa de 1939, atravessa a Alemanha de carro, de norte a sul, para visitar a Tchecoslováquia. Durante a guerra, vive dias muito difíceis em Hamburgo. A cidade é alvo de bombardeios e a

De fato, no ano seguinte Viator embarca para Hamburgo, onde permanece até 1942. O mistério de Graciliano só se resolverá em 1946, quando Rosa publica Sagarana, depois de reformular totalmente o volume “Contos” – trabalho que começa a fazer durante sua estadia na Alemanha. Em dezembro, é nomeado cônsul de segunda classe, por antiguidade. 1938-42 Em maio de 1938, com 30 anos, Guimarães Rosa é no-

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros –

[...] abri um cartapácio de 500 páginas grandes: uma dúzia de contos enormes, assinados por certo Viator, que ninguém presumia quem fosse [...] Certamente de um médico mineiro e lembrava a origem: montanhoso, subia muito e descia – e os pontos elevados eram magníficos, os vales me desapontavam [...] ficamos horas no gabinete de Prudente de Moraes, hesitando entre esse volume desigual e outro: Maria perigosa, que não se elevava nem caía muito. Optei pelo segundo – e, em conseqüência, Marques Rebelo quis matar-me, gritou, espumou, fez um número excessivo de piruetas ferozes [...] Peregrino Jr., transformado em fiel de balança, exigiu 48 horas para manifestar-se. Escolheu Maria perigosa [...] Viator desapareceu sem deixar vestígio [...] Às vezes assaltava-me vago remorso e perguntava a mim mesmo onde se teria escondido Viator.24

USP

É nesse concurso que Graciliano Ramos, membro do júri, vota contra o livro de Viator, que acaba tirando o segundo lugar:

tensão no Consulado é imensa, às voltas com inúmeras solicitações de vistos para o Brasil: “Somos acossados de pedidos, rogos, prantos, ameaças, o diabo! Tenho visto e ouvido coisas absurdas, impossíveis. E... nem sempre a gente pode atender”.26 Rosa mantém um diário durante a sua estadia em Hamburgo27, onde registra, ora em alemão ora em português, trechos de conversas, palavras e expressões; anota aonde foi (ver o Fausto no teatro, por exemplo: “maravilha!”); descreve a natureza (as variações do céu, árvores, flores, o Alster etc.); toma notas esparsas sobre seus estudos e leituras (Les fleurs du mal, Minha formação, Brás Cubas, Eça de Queirós etc.); esboça desenhos (como de um céu com holofotes); etc. Também documenta o trabalho de “correção” de algumas estórias de Contos (de 1937), entre o cair de bombas e o mugir de sirenes:

Carteira de motorista de Guimarães Rosa, emitida na Alemanha em 1943 e com carimbo Terceiro Reich 16


O diário transmite uma atmosfera pesada, com o registro de perseguições a judeus, racionamento e bombas caindo pela cidade: 23.II.940 – [...] em Budweiss, cidade do sul da Bohemia [...] os judeus só poderão andar de bonde nas plataformas. Primeira cidade a introduzir isso. 23.IV – [...] no dia 25 serão distribuídos 2 ovos por pessoa [...] 25-X-940 – O ataque de ôntem à noi-

Acervo da família Tess

7.IV.940 – [...] Fui vêr a segunda parte do Faust. Passaram tropas, durante horas, em frente da estação (Hauptbanhof ). Depois do theatro: os holofotes. Alguns subindo do Alster, pondo reflexos de luar longo na água. Outros, como si um jacto regasse as estrellas todas. Hoje (10-V) entreguei à srta. Mattos o nono conto (“Envultamento”). 11-V-940 – Dia friozinho [...] fui à tipografia, comprar cadernos para os meus próximos livros. 17.05.1940 – (sexta-feira) – (1 hora e dez minutos da noite.) Às 12 e 1/2 começou o tiroteio. Bombas? Eu estava trabalhando, corrigindo o conto “Uma historia de amor”.28 Flak [defesa antiaérea alemã]. 30 de maio (5ª. Feira) – 12 horas e 20. Estou trabalhando, corrigindo o último trecho do “O burrinho pedrês”. Mugiram as sirenes. Alarme! 10 minutos para 1 hora – (tres) quatro estampidos surdos, subterraneos. Bombas? Mais bombas, perto, sempre mais perto. [...] 1-VI-940 – 1 hora e 10 (da noite). Alarme – Mugem as sirenes. Este é o sexto alarme em Hamburgo. Estava na cama, lendo “Os 4 Cavalleiros do Apocalypse”. [...] 19-VI-940 – Estou escrevendo na cama, ao som dos estampidos da Flak. Alguns são tetricos: como sôcos retumbantes dados por punhos enormes no bojo elastico do ar alto. Outros ribimbam festivos. Uns tocam bombo ou tambor. [...] Às vezes, parece que uma pedra grande cahiu para cima, cahiu no céu sonoro, que é agua enorme, lagôa concava (e sonora). Escuto, baixo, nítido, sportivo, automobilístico, trepidante, o zumbido da Royal Air Force. [sic]

Funcionários do consulado: Rosa, segundo a partir da esquerda, está ao lado do cônsul-geral Souza Ribeiro; Aracy é a primeira à direita te foi o mais sério e terrível de quantos houve até hoje. Das 9 e 30 às 3,30, e depois das 4 e tanto até às 6 da manhã. Sempre com tiros e bombas tremendas. Parece que se inaugurou para nós uma nova fase da guerra aérea. Será que começou mesmo o fim do mundo?! [...] 15-III-941 (sábado) – De ôntem para hoje não houve alarme. Pude dormir e recuperar os nervos. Até às 12;30, dormi, vestido, no sofá, esperando as sirenes. [...] 20-IX-941 – Ontem começou a obrigação do destinctivo na roupa dos judeus [faz o desenho de duas estrelas-de-davi; numa delas, ao centro, está escrito “judeu”]. Hoje, à tarde, vi o primeiro [...] 22-X-941 – [...] judias chorando no Consulado, por terem recebido a ordem de evacuação de Hamburgo, para o dia 24. Horrível. [sic]

Em março de 1941, um bombardeio quebra a janela de sua casa; em maio, cai uma bomba no Consulado Brasileiro em Hamburgo (sem vítimas): “11V-941 (Domingo) – Hoje, às 7 da manhã, acordou-me o telefone. Era o Cônsul Geral – o Consulado havia sido atingido por 17

uma bomba. [...] Terrível, o estado do nosso pobre Consulado!...” No final de maio, vai a Lisboa em Missão Diplomática (Correio Diplomático da Embaixada do Brasil em Berlim), lá permanecendo por 15 dias. Freqüenta o zoológico de Hamburgo, o “Tierpark” dos Hagembecks, onde consegue encontrar algum refúgio, “principalmente nos dias das horríveis vitórias nazistas, fugindo dos aparelhos de rádio que bradavam, com fanfarra, as notícias”: Com coisas dos bichos de lá, para ficarem bem contadas, podia encher livro grande [...] nunca o escreverei, pois o povo podia ficar enfarado, enjoado com os detalhes de que tanto gosto. Depois, há o perigo de me rotularem de “animalista”, e eu detesto que me atribuam especializações...29

No entanto, cerca de 20 anos depois, Rosa irá publicar dois textos intitulados “Zôo (Hagembecks Tierpark, Hamburgo-Stellingen)”,


Acervo da família Tess

e a proibição de sair à rua: “A alimentação era péssima. O que nos alegrava o estômago era quando o embaixador de Portugal em Berlim trazia as malas, trazendo tudo [...]”.31 Também dona Aracy recorda muito bem daqueles tempos difíceis, “com os nazistas nos vigiando”:

Guimarães Rosa e o cônsul brasileiro em Hamburgo, cidade onde permaneceram até a ruptura das relações diplomáticas entre Brasil e Alemanha, em 1942

com descrições de animais por ele minuciosamente observados (O Globo, 11.03.1961; e Pulso, 29.04.1967). Suas visitas ao Aquário de Berlim também serão descritas em “Aquário (Berlim)” (Pulso, 18.02.1967) – todos os três republicados em Ave, palavra (1970). A partir de sua estadia na Alemanha, Rosa também escreve “O mau humor de Wotan” (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 29.02.1948), “A senhora dos segredos” (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 06.12. 1952; republicado em “Letras e Artes”, Rio de Janeiro, 22.03. 1953 e 18.05.1954), “Homem, intentada viagem” (O Globo, 18.02.1961) e “A velha” (O Globo, 03.06.1961) – todos republicados em Ave, palavra. Guimarães Rosa e dona Aracy ajudaram muitos judeus a fugirem da Alemanha durante a guerra – pelo que foram, mais tarde, homenageados.30

1942 Com a ruptura das relações diplomáticas entre o Brasil e os países do Eixo, o corpo diplomático e outros funcionários brasileiros e latino-americanos são internados num hotel em Baden-Baden: de Paris, o cônsul-geral Oscar Pires do Rio e sua equipe; de Copenhagem, o chefe da Comissão de Compras do Exército; de Viena, o cônsul-geral Mário Guimarães e sua equipe; de Berlim, o embaixador Cyro de Freitas Vale e sua equipe (João Emílio Ribeiro e Navarro da Costa, entre outros); de Hamburgo, o cônsul-geral e sua equipe (Guimarães Rosa e dona Aracy, entre outros); o embaixador do Uruguai em Paris e sua equipe; etc. Enquanto aguardam o resultado das negociações de sua troca, permanecem confinados num hotel com suas famílias e sofrem com o racionamento de comida 18

Ficamos num dos melhores hotéis e nos tratavam mais ou menos. Com a guerra, tinha pouca comida, e a gente também passou fome no hotel. Eu emagreci muito. Comia um prato de sopa, mais nada. Havia pessoas de todos os Consulados internadas. Foi um tempo duro. Quando chegamos em Portugal – ai que fome! Muita gente ficou doente de tanto comer. Em Portugal fomos trocados por diplomatas alemães que tinham vindo do Brasil.32

Durante a estadia em BadenBaden, Guimarães Rosa organiza campeonatos de xadrez entre os mais jovens, distribuindo, entre os vencedores, balas que havia trazido de Hamburgo. 33 Também participa de brincadeiras, como “daquele brinquedo de perguntas: uma flor (rosa!), uma cor etc.”34 É nessa ocasião que trava amizade com o pintor Cícero Dias, ambos da mesma idade (34 anos) e vizinhos de quarto num dos últimos andares do hotel (as famílias com crianças são alojadas nos primeiros andares). Passam o dia trabalhando numa saleta que separa os dois quartos – Cícero pintando e Rosa escrevendo –, onde também recebem visitas, como o embaixador Cyro de Freitas Vale.35 Cícero Dias lê as estórias de Contos (os originais de Sagarana) e incentiva o amigo a pu-


Fotos: acervo da família Tess

Diploma da homenagem recebida por Aracy em Jerusalém (1983) por ter ajudado judeus durante perseguição nazista

blicá-las.36 Guimarães Rosa e dona Aracy permanecem em Baden-Baden por cerca de quatro meses (de 28 de janeiro a 23 de maio de 1942). Saem de lá direto para Lisboa, onde ficam mais um mês, até conseguirem regressar ao Brasil, de navio, numa travessia bastante tensa, com o mar infestado de submarinos alemães. 1942-44 Após uma rápida passagem pelo Rio de Janeiro, Rosa é enviado para a embaixada do Brasil em Bogotá, como segundo secretário, onde permanece por cerca de 2 anos (03.09. 1942 a 27.07.1944). Viaja sozinho, porque dona Aracy, também funcionária do Itamaraty, não pode ir com ele. Ao chegar em Bogotá, situada a 2.660 metros de altitude, é “acometido pelo soroche, o mal das alturas, com incríveis dores de cabeça e náuseas”. Passa por

um longo período de adaptação, tendo que aprender a respirar numa atmosfera rarefeita: “Não desejo, sinceramente, a nenhum de vocês, a vinda a estas regiões tão próximas do céu, que são paragens apropriadas para anjos e não para criaturas humanas”. Sua experiência extremamente solitária em Bogotá, “na velha cidade colonial de Jimenes de Quesada, aninhada junto às nuvens, entre a cordilheira central e a cordilheira oriental; escutando os sinos das igrejas antigas, contemplando a savana melancólica”, será recriada em “Páramo”, novela que estava finalizando quando faleceu, em 1967 (publicada postumamente em Estas estórias, 1969). 37 No dia 05.04.1943 sai a averbação do desquite de Rosa e Lygia. 1944 Exonerado do cargo em Bogotá (27 de junho), vai para

Guimarães Rosa com seus gatos de estimação (1944)

a Secretaria de Estado, no Rio de Janeiro, onde permanece por quatro anos (31.07.1944 a 07.08.1948). 1945 Entre junho e outubro, “retrabalha” o volume Contos, “em cinco meses de reflexão e de lucidez”:38

O diplomata no aeroporto de Cali, na Colômbia; entre 1942 e 1944, Rosa trabalha na embaixada brasileira em Bogotá 19


Fotos: Hans Breuer/Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

Acima, vista de canal de Hamburgo, com a igreja de São Nicolau ao fundo, antes e depois de bombardeio em 1943; na pág. oposta, ruínas da cidade – imagens guardadas por Guimarães Rosa em seu arquivo pessoal Em todo o caso, consegui – a custa de horas de sono, do descanso dos domingos e de muito esforço – preparar, ou, melhor, reestruturar um livro de contos, para o qual achei imediatamente editor. Tenho muita esperança nesse livro, pois já provocou o mais exaltado entusiasmo (e sincero) da parte de 4 dos maiores escritores e intelectuais brasileiros, que lhe garantem tremendo sucesso. Vamos ver o que dá.39

Ao se transformar em Sagarana, Contos sofre muitas alterações. O texto é modificado, quatro contos são excluídos, e os demais são dispostos em outra ordem, alguns com novos nomes (“Sezão”, que também havia sido um dos títulos aventados para o volume, passa a se chamar “Sarapalha”). Em 1937, Graciliano Ramos ha-

via votado contra o livro de Viator, argumentando que o trabalho era “sério em demasia”, com “personagens magníficos que se conservam na memória do leitor”, mas muito desigual: “Alguns episódios desmereciam o conjunto”. Sua transformação em Sagarana deixou-o plenamente satisfeito: “Rosa concordou comigo... Havia suprimido os contos mais fracos. E emendara os restantes, vagaroso, alheio aos futuros leitores e à crítica”. O conto “A hora e vez de Augusto Matraga” fez Graciliano profetizar o destino de Viator: “Certamente ele fará um romance, romance que não lerei, pois, se for começado agora, estará pronto em 56, quando meus os20

sos começarem a esfarelar-se”. E, de fato, sua profecia se cumpriu. Em outubro, Rosa é aceito como sócio-titular da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro. Em novembro, escreve ao pai (Rio de Janeiro, 06.11) contando que acaba de entregar os originais de Sagarana à Editora Universal (Rio de Janeiro) e planeja ir a Minas para visitar a família e “retomar contato com a terra e a gente”, “reavivar lembranças” e “reabastecer-se de elementos para outros livros em preparo”. Ao confirmar a viagem, pede que o pai comece a “recordar e alinhar lembranças interessantes de coisas vistas e ouvidas na roça, que possam servir de elementos para outro livro” (Rio de Janeiro, 30.11).


Segundo Juca Bananeira, desde pequeno “Joãozito” adorava ficar ouvindo as estórias contadas pelo pai 40 – espécie de Selorico Mendes, que encheu a cabeça de Riobaldo com estórias de jagunços. Natural de Caeté (MG), onde foi juiz-de-paz, seu Fulô era um grande contador de estórias, sobretudo de suas caçadas na serra do Cabral, localizada nas imediações de Curvelo.41 É a partir de 1945, após o término de Sagarana e já planejando escrever outros livros, que Rosa começa a enviar ao pai suas cartas-questionário, pedindo detalhes sobre a natureza do sertão e o modo de vida do “povo sertanejo”, com seu “linguajar preciso” e estórias fabulosas.42 Ainda que também enviasse cartasquestionário a amigos (como Pedro Barbosa e Paulo Dantas) e outros familiares (como sua irmã Dora), Florduardo foi o seu principal colaborador e “reativador de memórias”. Escritas em tom coloquial, algumas muito engraçadas, suas cartas-resposta

são extremamente ricas em detalhes sobre a vida no sertão.43 No início de dezembro (de 03 a 13.12), conforme planejado, Rosa passa alguns dias na fazenda Pindaíbas (em Paraopeba), de Pedro Barbosa, e depois vai a Cordisburgo, onde revê os pais, visita a gruta do Maquiné e a fazenda Três Barras, que pertencera a seu bisavô, Francisco de Assis Guimarães. Alguns detalhes dessa viagem, como a “cavalgada de seis léguas até o Alto Grande” para ver o rio Paraopeba e o passeio até uma imensa vereda são revelados na entrevista que concede a Ascendino Leite, por ocasião do lançamento de Sagarana: [...] os buritis do imenso Brejão do Funil – estranhos, tamanhos, costeando os vinte alqueires do pântano, numa impressionante linha sinuosa, que marca a rota de vôo e os pousos dos gaviões – que o buriti é um caso de beleza e uma palmeira diferente, metafísica... Basta a gente olhar uma delas para acreditar que a arte e o céu são assuntos muito sérios, países de primeira necessidade.44

Em carta ao amigo Antônio Azeredo da Silveira (Rio de Janeiro, 20.12.1945), também diplomata, comenta o sucesso da viagem: “Queria rever a mãezinha terra, para preparar-me para outro livro, que já começo a precisar de escrever. [...] Colhi coisas maravilhosas, voltei contente como um garimpeiro que tivesse enchido a sacola”.45 Certamente Rosa fez esta viagem munido de suas inseparáveis cadernetas, onde costumava registrar o que via, ouvia e imaginava – material que depois incorporava em suas 21

estórias. Mas não temos notícia de tais cadernetas, apenas o documento “Notas da grande excursão a Minas”, que reúne muitas notas esparsas, copiadas das cadernetas originais.46 Ainda em dezembro, é nomeado primeiro secretário, por merecimento. 1946 Em fevereiro, é nomeado chefe de gabinete de João Neves da Fontoura, ministro do Exterior, de quem se torna amigo e a quem irá suceder na Academia Brasileira de Letras, em 1963. Permanece nesse cargo até agosto de 1948, quando é transferido para a Embaixada do Brasil em Paris, voltando a ocupá-lo em março de 1951, assim que regressa ao Rio de Janeiro. Em abril, publica Sagarana (344 p., com ressalvas no final; capa de Geraldo de Castro), seu primeiro livro, que é muito bem recebido pela crítica, ganhando o “Prêmio Felipe d’Oliveira”. A demanda por Sagarana é tão grande que a Editora Universal é obrigada a publicar uma segunda edição nesse mesmo ano, o que acaba provocando a sua “morte gloriosa”.47 Guimarães Rosa ajuda Paulo Rónai a trazer familiares da Hungria para o Brasil (194546), e os dois se tornam amigos depois que Paulo fica fascinado pela leitura dos originais de Sagarana e publica uma crítica elogiosa sobre o livro, logo após o seu lançamento.48 Este primeiro contato inicia uma amizade que irá durar a vida inteira. Além de compartilharem o interesse pela etimologia das palavras e colecionarem dicionários e gramáti-


Fui rancoroso e revolucionário permanente, então. Já era míope e, nem mesmo eu, ninguém sabia disso. Gostava de estudar sozinho e de brincar de geografia. Mas, tempo bom, de verdade, só começou com a conquista de algum isolamento, com a segurança de poder fechar-me num quarto e trancar a porta. Deitar no chão e imaginar estórias, poemas, romances, botando todo mundo conhecido como personagens,

misturando as melhores coisas vistas e ouvidas, numa combinação mais limpa e mais plausível, porque – como muita gente já compreendeu e já falou – a vida não passa de estórias mal arranjadas, de espetáculo fora de foco. A arte e o céu serão, pois, assunto mais sério, e também são países de primeira necessidade... [...] Um dia ainda hei de escrever um pequeno tratado de brinquedos para meninos quietos.

Em julho, viaja pelo Pantanal mato-grossense, percorrendo as cidades de Campo Grande, Aquidauana, Nioac, Bela Vista, Ponta Porã e, no Paraguai, Pedro Juan Caballero. Nas imediações de Corumbá, numa região conhecida como Nhecolândia (entre os rios Taquari, Paraguai e Negro), permanece cerca de uma semana na fazenda Firme, uma típica fazenda de gado pantaneiro, onde conhece o vaqueiro Mariano – futuro personagem de “Com o vaqueiro Mariano” (Estas estórias). Entusiasmado com a viagem, escreve uma longa carta a Azeredo da Silveira (Rio de Janeiro, 05.08) descrevendo sua recente aventura:

Ao longo do mês de julho, Rosa participa da Conferência de Paz em Paris, como secretário da Delegação Brasileira. É quando conhece José Mindlin, que está na cidade comprando livros raros, e juntos freqüentam livrarias 51 [ver a seção “Confluências”]. No final da Conferência, para tratar de assuntos de imigração, ao lado do ministro João Neves da Fontoura, Rosa percorre algumas cidades da Holanda, Bélgica e Alemanha (Berlim, Nuremberg e Munique), onde vê muitas ruínas e a miséria do pós-guerra. Em outubro, é aceito como sócio titular da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro. 1947 Em março, escreve ao pai (26.03), pedindo-lhe que envie, por escrito, “estórias e fatos sobre a vida no sertão” com as “palavras pronunciadas” pelas pessoas, porque está “escrevendo outros livros” e “imaginando” estórias ambientadas no sertão. Em abril, recebe um bilhete do pai (21.04) prometendo enviar suas “notas”. Ainda em abril, republica “São Marcos”, um dos contos de Sagarana (revista Vamos Ler!, Rio de Janeiro, 19.04), e publica “Histórias de fadas” (Correio da Manhã , Rio de Janeiro, 20.04).52 22

Rodei, pelo Pantanal, pelo planalto, pelo roteiro (às avessas) da Retirada da Laguna. Vi coisas espantosas. Andei de trem, de automóvel, de camionete, de caminhão, de “jardineira”, de avião teco-teco, de carro-de-bois, de vapor fluvial, de lancha, de canoa, de batelão, de prancha, de locomotiva, de pontão, de carreta, a pé, a cavalo em cavalo, em boi, em burro... Vestido de caqui, com polainas de lona, com mochila, cantil, Stefan Rosenbauer/Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

cas das línguas mais obscuras, Paulo Rónai estará sempre entre os primeiros leitores de cada novo livro de Rosa. Em maio, O Jornal publica uma entrevista de Ascendino Leite com o festejado autor de Sagarana49 – um dos raros momentos em que Rosa se permite falar em público de sua atividade literária:50 explicita o seu projeto de “recuperação da linguagem” (elaborar uma nova língua, “simples, formosa, exata em força e sutileza”), comenta sua paixão pelos animais (já evidenciada em Sagarana, o que levou Graciliano Ramos a qualificá-lo de “animalista notável”) e a imensa saudade que sente da terra natal – determinante na sua opção por escrever estórias ambientadas no sertão: “Quem lá nasceu tem de guardar, por toda a vida, uma concepção mágica do universo”. Mas é o relato de suas brincadeiras de infância e a confissão de que “ainda hei de escrever um pequeno tratado de brinquedos para meninos quietos” que ficam registrados em sua biografia, sobretudo quando se trata de identificar traços biográficos do autor no personagem Miguilim, de “Campo geral”, uma das novelas do Corpo de baile:

Guimarães Rosa e Aracy (no Rio de Janeiro, c. 1947)


Em novembro, em carta ao pai (Rio de Janeiro, 25.11), volta a falar da viagem pelo Pantanal inundado, com sua fauna exuberante, e menciona as conversas travadas com caçadores de onças: Gostaria de responder longamente, contando coisas de Mato Grosso, e especialmente do Pantanal (Nhecolândia) – que é um verdadeiro Paraíso Terrestre, um Éden, cheio de belezas, como nunca supus ali fosse encontrar. A vida animal, a fauna, é lá algo de espantoso. Jacarés, tamanduás (bandeira e mirim), onças pardas, pretas e pintadas, emas, jaburus, porcos-do-mato, capivaras, veados, uma infinidade de pássaros, enfim. O Pantanal é um mundo imenso, de terras baixas, que ficam submersas, no tempo das cheias, como um mar, só ficando de fora certos lugares, onde o gado se abriga. Nas enchentes maiores, as casas das fazendas, construídas nos “firmes”, se transformam em ilhas. E aquela imensidão não tem fim. Na época da vazante, tudo é pastos-invernadas e campos-decria. A paisagem é maravilhosa: a planície verde, as matas pequenas (capões compridos, que lá chamam de “cordilheiras”, e onde se abrigam as onças, e os bosques de palmeira carandá. No meio das campinas, há uns canais – os “corixos” – e lagoas, muitas lagoas, de dois tipos: as azuis, de água doce, que são as “baías”, e as verdes, de água fortemente salitrada, que são as “salinas”. Garças, socós, biguás, socós-bois, baguarís, biguatingas, jaburus, tabu-iaiás – são aos milhares, pousando voando, gritando e mergulhando, por toda a parte. As enormes emas, aos bandos, quase esbarram na gente. Vai-se pelo campo, de automóvel, e erguem-se do capim bandos de porcos bravos, que correm, tontos, e o automóvel quase atropela. Varas de 8, 9, 10, 15, caitetus. O tamanduá-bandeira, quase a

gente pode encostar-lhe a mão. Os papagaios e araras vêm pousar na cerca do curral, na hora de se tirar leite. Patos bravos, marrecos, maitacas etc., não tem conta. A qualquer momento, pode-se avistar uma onça. Se a gente quer caçar uma onça e dispõe de três dias, o sucesso é garantido. Conversei com diversos “zagaieiros” – caçadores bambas de onças, que manejam espetacularmente a longa azagaia. Um desses azagaieiros, o preto Marcão, já esteve até nos Estados Unidos. Ele era o auxiliar do grande caçador de onças Sascha Siemel, e uns americanos, que vieram ao Pantanal, ficaram gostando dele. Convidaram-no a acompanhálos aos Estados Unidos. Ele aceitou o convite, mas na hora, quando viu que a viagem era por avião, amedrontouse, e não queria mais ir. Mas os americanos fizeram-no beber whisky, e, a certa altura, ele mesmo, já meio esquentado, gritou que “queria ver como era mesmo, esse tal de avião!” Passou meses lá, gostou muito. Mas só sabe contar que fazia muito frio e que havia muita casa grande. E não aprendeu uma única palavra de inglês... Enfim, muitíssimas coisas eu teria que contar.

Assim como se perderam as cadernetas de 1945, também não se tem notícia das cadernetas desta viagem pelo Pantanal. Mas, através de um relato do próprio vaqueiro Mariano, sabemos que Rosa não perdeu a oportunidade de fazer mais uma de suas “colheitas”: “[o doutor] ficava puxando coisas e pondo lá num caderninho. Tudo queria saber: os nomes dos pássaros, dos pés de folha, o nome das vacas. Não largava o caderninho e escrevia”.53 No Arquivo Guimarães Rosa do IEB há apenas alguns desenhos (10 p.) e um mapa da região visitada em 1947 (Nhecolândia), os quais foram arquivados na Pasta E33 (1), que contém estu23

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

capacete de explorador. Falei com japoneses, colonos búlgaros, ervateiros, vaqueiros, índios Terena, chefes revoltosos e legalistas paraguaios, no Paraguai, e aqui chego, de volta.

Página dos cadernos de Rosa, com desenhos e anotações sobre a flora brasileira

dos e esboços de textos que vão integrar Ave, palavra (1970) – livro póstumo que reúne, entre outros, justamente os relatos dessa viagem pelo Pantanal, publicados originalmente em periódicos: “Sanga puytã” (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 17.08.1947), “Cipango” (Folha da Manhã, São Paulo, 17.02. 1953; republicado em “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, 12.04.1953), “Ao pantanal” (Diário de Minas, Belo Horizonte, 05.04.1953; republicado no Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 30.11.1957, e no Jornal de Letras, Rio de Janeiro, jan. 1958) e “Uns índios – sua fala” (“Letras e Artes”, Rio de Janeiro, 25.05.1954). As conversas com diversos “zagaieiros” – os intrépidos caçadores de onça – e o desenho detalhado que Rosa faz de uma azagaia, nomeando cada uma de suas partes, serão aproveitados na novela “Meu tio o Iauaretê”,


Fotos: acervo da família Tess

publicada 14 anos depois, na revista Senhor (Rio de Janeiro, 25.03.1961). Republicada no livro póstumo Estas estórias (1969), esta novela foi escrita depois da viagem ao Pantanal (1947) e antes de Corpo de baile e Grande sertão: veredas (livros de 1956): no original datilografado de “Meu tio o Iauaretê”, Paulo Rónai encontrou uma anotação manuscrita do autor, dizendo que “esta novela é anterior a Grande sertão: veredas”.54 Em agosto, assim que regressa da viagem ao Pantanal, publica “Sanga puytã”, onde relata sua recente aventura, “rodando, em senso inverso, as etapas da Retirada da Laguna”. Em outubro, publica a primeira das três partes de “Com o vaqueiro Mariano” (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 26.10.1947; as outras sairão no início do ano seguinte), onde descreve a fauna e a flora da fazenda Firme (com uma seção especialmente dedicada ao gado), e reproduz o que teria sido a sua conversa com

O autor de Tutaméia no Rio de Janeiro (1948)

Vilma Guimarães Rosa em fotografia que traz no verso dedicatória ao pai e a Aracy (1948)

Mariano sobre “a alma dos bois” – dando voz ao seu interlocutor. Em novembro, recebe carta de um fazendeiro de Curvelo (MG), Alexandre Barbosa (Rio de Janeiro, 15.11), que relata as façanhas do vaqueiro “Bôca-de-fogo”, inspirado pela recente leitura de “Com o vaqueiro Mariano”. A partir desta carta, Rosa começa a preparar um texto intitulado “Com o vaqueiro Bôca-de-fogo” (deixado inacabado), que tenta reproduzir o seu modo de falar, seguindo os moldes de “Com o vaqueiro Mariano” (Fundo JGR, Pasta 34 (1), Inéditos I, pp. 2-5).

em plena Alemanha nazista (Rio de Janeiro, 29.02); e as duas partes finais de “Com o vaqueiro Mariano” (22.02 e 07.03). Ainda no mês de março, acompanhando o ministro João Neves da Fontoura, viaja a Bogotá como secretário-geral da Delegação Brasileira à IX Conferência Panamericana. Nessa ocasião, ocorre um violento levante civil na cidade, provocado pelo assassinato do líder liberal Jorge E. Gaitán. Segundo Antônio Callado, que também estava em Bogotá como membro da Delegação Brasileira, Rosa “desapareceu” durante o levante:

1948 Logo no início do ano, no Correio da Manhã, publica “Cidade” – pequenos flashes da vida urbana: brincadeiras de crianças; um gato de rua; o bonde; baratas de verão (Rio de Janeiro, 15.02); “O mau humor de Wotan” – que evoca sua estadia em Hamburgo

Quando ele reapareceu, eu disse: “Puxa, Rosa! Onde é que você andou?” E ele me respondeu: “Estava todo o tempo na residência do embaixador”. A casa ficava no bairro mais chique de Bogotá, era enorme e tinha um parque imenso. “Mas você não viu o que aconteceu em Bogotá? Puxa, parecia a história de Augusto Matraga, de tanto que mataram gente... Isso aconteceu no

24


meio da rua, o tempo todo!” Foi então que ele me disse: “Ora, Callado, o que eu tenho que escrever já está tudo aqui na minha cabeça. Não preciso ver coisa alguma. Está tudo na minha cabeça... Já fiz um livro, estou fazendo outros”. – “Mas Rosa, olha, eu garanto que você ficaria impressionado! Foi um espetáculo terrível... O que você fez durante todos esses dias?” Ele disse: “Eu reli o Proust”. Vejam só! Ele havia descoberto Proust, numa edição francesa, na Embaixada Brasileira, num bairro de Bogotá, e simplesmente se sentou para reler Proust. Ignorou a cidade que pegava fogo porque já tinha todas as guerras de que precisava dentro da cabeça.55

Transferido para a Embaixada do Brasil em Paris, em agosto Rosa empreende sua mudança para a Europa.

Em 1948, Paris é uma cidade que se reestrutura no contexto do pós-guerra, às voltas com greves, racionamentos e cortes de luz. Guimarães Rosa encontra dificuldades para conseguir um apartamento e comprar coisas

necessárias à vida cotidiana. Em setembro, um mês após a sua chegada, viaja a Bordeaux para buscar dona Aracy e a jovem Vilma, agora com 17 anos de idade, que vai passar uma temporada com eles: “Estou ansioso para tornar a ter companhia da minha gente”.60 Assim que se estabelecem, Rosa encomenda um carro dos Estados Unidos, um Chevrolet, roubado alguns meses depois. Em carta a Pedro Barbosa (Paris, 16.11), o escritor incita o amigo a visitá-lo, enaltecendo a vida na cidade-luz: “A cultura é aqui coisa ponderável, real, e a gente a sorve, a todo instante. E há coisas belas. Anda por aqui o Álvaro Lins, do Correio da Manhã. Saímos sempre juntos, e ele temse deslumbrado.” No entanto, mesmo em Paris, não deixa de sonhar com uma viagem pelo sertão de Minas, planejando navegar pelo rio das Velhas numa canoa – provavelmente inspirado na aventura de Richard Burton, explorador e orientalista inglês que escreveu o relato de sua

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

1948-51 Guimarães Rosa mora em Paris durante dois anos e meio, de agosto de 1948 a março de 1951. Durante sua estadia, não publica nada de novo, apenas a 3a. edição de Sagarana (1951), agora pela Livraria José Olympio.56 Mas é desse período que datam alguns de seus documentos inéditos mais elaborados: o diário em Paris, inti-

tulado “Nautikon” (04.11.1948 a 18.02.1951) – lugar das “irremediáveis confidências” –, onde registra conversas com amigos, leituras, viagens, passeios e visitas a museus, jardins zoológicos e botânicos57; o caderno de leitura de clássicos, intitulado “Dante, Homero, La Fontaine”, que também inclui a seção “Artes”, dedicada à pintura, com descrições de telas contempladas em museus de Paris58; e as cadernetas de viagem pela Itália e França (1949 e 1950), onde registra suas visitas a vários locais turísticos, como castelos, igrejas, museus e aquários, anota palavras e expressões, descreve paisagens, pessoas, animais, quadros e peças de museus e faz alguns desenhos (como a fachada de uma igreja, um cavalo, objetos de museus e detalhes de quadros).59

Cadernetas da viagem à Itália contendo, à esq., anotações sobre o vulcão Vesúvio (Nápoles) e, à dir., desenho da catedral de Santa Maria Novella (Florença) 25


1949 Entre janeiro e fevereiro, junto com dona Aracy e Vilma, passa dez dias descansando nos Alpes, em Chamonix, estação de esportes de inverno, junto ao Mont Blanc, “a contemplar neves, picos de montanhas, florestas de abetos e pinheiros, esquiadores, patinadores e trenós”.61 No final de fevereiro, em carta ao pai (Paris, 23.02), menciona novamente sua intenção de viajar pelo sertão de Minas assim que regressar ao Brasil:

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

[...] apesar de estar nesta cidade, tão ambicionada e disputada, sonho com o dia em que voltarei ao Brasil, daqui a 4 anos, para então tirar o meu ano de licençaprêmio, e consagrá-lo a viajar pelo inte-

O casal à frente de uma ruína durante viagem pela Europa (c. 1949)

Acervo da família Tess

viagem pelo rio das Velhas e o São Francisco, em 1867 (livro muito apreciado por Rosa): “Por mim, quase cada dia eu penso no nosso vasto plano de descer o rio. Vai estudando, indagando. Pedrão, Pedrinho. Já colheu informações de bons canoeiros, de boas praias para o bivaque?”.

Guimarães Rosa e Aracy em parque de Paris (1949), onde o escritor permaneceria por dois anos e meio rior de Minas: descer o rio das Velhas em canoa, ir a Paracatu, e outras excursões.

Em abril, visita Nancy e Alesme. Em junho, vai morar num apartamento maior, e compra uma gata persa, a “Xizinha de Keran”, que se torna personagem constante de seu diário em Paris: 9-V-950. Levantei, sem despertador, só com a cortina aberta e o chamado de Ângela [que trabalha em sua casa], às 8hs. 30’. O tempo que fiquei na cama, foi quase que voluntariamente. Me alegra que esteja mais quente, um pouco, hoje. Xizinha não tinha querido comer. Fico bem um quarto de hora com ela no braço. Ronrona, ronrona. Ângela diz que ela teve saudades de mim, durante a noite. Levo-a à janela que dá para a rua: seu “cineminha”. Leve, quentinha, cheirosa, é como um meu coração externo, contra meu peito. Sua curiosidade infantil, para com os automóveis. Amorzinho. Felpudo. Sempre se interessa.

Depois de quase um ano em Paris, Vilma volta ao Brasil. Em julho, em carta a Pedro Barbosa (19.07), Rosa descreve a viagem que iria fazer pela África Equatorial – Nigéria Britânica e sul 26

do lago Tchad até a fronteira com o Congo Belga, para “tomar parte em caçadas de elefantes, leões, búfalos, gazelas e leopardos”, “saber o que é sol de verdade” e “olhar mais um pouco deste mundo, do lado do avesso”. Chega a comprar as passagens, mas acaba não embarcando, por conta de chuvas torrenciais que assolam a região. Nesta mesma carta, solicita detalhes sobre a vida de um morador da fazenda Pindaíbas, muito apreciada por Rosa: “Estou, afinal, pondo em papel a biografia romanceada do grande Mechéu” – um sujeito meio bocó, que cuidava dos porcos e da lenha, ajudava na cozinha e levava comida na roça para os trabalhadores da fazenda. No mês seguinte, recebe carta de Pedro (Rio de Janeiro, 15.8) contendo uma detalhada descrição de Mechéu, que será utilizada na redação de conto homônimo, publicado muitos anos depois.62 No final do ano, Rosa viaja pela Itália com dona Aracy (05.10


a 08.11). Visitam Como, Cernóbio, Veneza, Bolonha, Florença, Siena, Roma, Nápoles e Assis, passando inicialmente por Montreux (Suíça).63 Em carta aos pais (Paris, 03.09), descreve todo o percurso da viagem, mencionando cada um dos locais visitados, especialmente Florença, onde permaneceram por uma semana: É um tal mundo de maravilhas, que sua lembrança dá para encher uma vida. Seria preciso uma carta especial, só para indicar, por alto, o que lá visitei. Escolho, apenas, um detalhe: o Museu do Angélico, um velho convento, onde, em cada uma das pequenas celas, há um afresco de Fra Angélico, o frade e santo e artista inspirado, que pintava olhando para o céu, através da abertura da janelinha, e, diz-se, tinha por modelos os próprios anjos.64

Fotos: acervo da família Tess

Assim que volta da Itália, provavelmente estimulado pela visita a Florença, dedica-se a estudar a Divina comédia, como relata ao amigo Álvaro Lins:

Guimarães Rosa, Aracy e seu filho Eduardo Tess em Veneza (1950)

Tenho estudado Dante, no italiano; com as fartas notas de pé de página, não é difícil, experimente; e vale a pena, se vale!, ali tenho descoberto ou redescoberto muita coisa. Fora da Divina comédia, a última coisa que li foram dois romances de Graham Greene: The power and the glory e The heart of the matter. Gostei muito. Você já leu Evelyn Waugh? Só conheço dele Brideshead revisited. Gostei, mas muito menos. Não sei se estou certo ou não, mas penso ter encontrado em Gr. Greene influência forte dostoievskiana, e localizado várias ilhotas proustianas no livro de Ev. Waugh acima citado. Sem querer nem poder, será que estou fazendo crítica literária?65

Em seu diário, também menciona a leitura de L’évolution créatrice, de Bergson, e Le vagabond, de Frédéric Lefèvre (ambas em março), e registra suas visitas aos museus Jeu de Paume (onde vê os impressionistas) e Louvre (em abril). 1950 É promovido a conselheiro de embaixada. Na Páscoa (28.04 a 01.05), visita a Alsácia, Lorena e Borgonha (Dijon, Pérouge, Dôle, Rouen, Avalon, Jura). Durante o mês de maio, nos fins-de-semana, faz rápidas viagens a Rouen, Chantilly e Pierrefonds; em agosto, a Chelles e Chateau de Champs. Em julho, viaja a Londres com Pedro Barbosa, que está de férias na Europa, e juntos visitam a National Gallery. De volta à França, vão juntos a Fontainebleau e Barbizon. Ainda em maio, em carta a Azeredo da Silveira (Paris, 29.05), menciona seus passeios pelo interior da França e faz um relato entusiasmado da viagem de 1949 pela Itália – país que considera sua “paixão dos 40 anos” –, já planejando retornar nas próximas férias: 27

Pedro Barbosa, Eduardo Tess e Guimarães Rosa em Londres (1950) Sempre que podemos, que há um feriado pegado a domingo ou permitindo “ponte”, saímos a girar por esta França – Borgonha, Alsácia, Jura, Bretanha, Normandia – e tudo cintila e pulsa, em vinhos, museus e paisagens. Em outubro do ano passado, fizemos férias na Itália. Ah, Silveira, a Itália! A respeito dela, não acredite em opiniões, em informações, em leituras e descrições, mesmo nas mais exaltadamente elogiosas: a Itália ainda é mais bela, mais séria e maior do que eles cantam. Ela é a minha paixão dos 40 anos, por ela fiquei desvairado, perdido. Se Deus quiser, lá voltamos, nas férias deste ano, e nas férias dos próximos dez ou vinte anos, enquanto houver. Não vou mais a outra parte. Estive em Milano, Como, Stresa, Pallanza, Verona, Pádua, Vicenza, Veneza, Ferrara, Bolonha, FLORENÇA, Siena, Pisa, San Gimignano, Assis, Perúgia, Roma, Nápoles, Cápri, Sorrento, Amalfi, Ravello, Positano e Paestum. O que é mais belo? TUDO. Tudo é o mesmo fluido, cada uma tem suas riquezas e seus encantos. Desta vez, pretendíamos ir a Ravenna, Rimini, Lucca, Parma, Orvieto, Viterbo, e à Sicília; mas, como deixar de voltar a ver as cidades já vistas? Não tenho coragem de desprezar nenhuma, e aí é que é o tormento. A Vocês eu digo, meu gosto seria trocar Paris por Nápoles, agora que o posto vaga, e lá ani-


nhar-me, por quatro anos, pelo menos, no lugar incomparável que os colonos gregos, deslumbrados e confortados, denominaram Posílipo: ‘cessação da tristeza’...

Em setembro, já se preparando para a segunda viagem à Itália, escreve aos pais uma carta muito animada (Paris, 03.09), onde relata detalhes da viagem anterior e menciona seus novos estudos:

O contato sentimental com a velha Grécia de Minerva e Poseidon abriume tão dilatado apetite, que, mal cheguei aqui, precisei de atacar e reler Ilíada e Odisséia, mas linha a linha, anotando, e, principalmente, amando aqueles longos espaços encantados, ouvindo o chocar dos bronzes ou me perdendo a ver aquele mar dos mares, cor de vinho, do qual emergem deuses “como gaivotas sobre a asa”... 67

É quando regressa da segunda viagem à Itália, e ainda sob o im-

Fotos: acervo da família Tess

[...] de hoje a dois dias, parto de novo para a Itália, em férias. Ando na febre dos preparativos, pois um passeio destes é mais uma verdadeira expedição científica, ou melhor, artística. A fim de aproveitar bem tudo o que nos oferece “il bello Paese”, e não esperdiçar nenhuma migalha de tempo, é preciso um corajoso estudo prévio, ler e anotar muitos livros, localizar os quadros, as estátuas, os recantos de paisagem, tudo, enfim, a ser mais detidamente contemplado.

É assim que, nas férias de 05.09 a 16.10, junto com dona Aracy, visita Veneza, Ferrara, Ravena, Florença, Roma, Sienna, Orvieto, Nápoles, Terracina, Posílipo, Villanova; Paestum, Pompéia, Amalfi e Salerno.66 Se a primeira viagem à Itália leva Rosa a reler Dante, a segunda desperta seu apetite por Homero, seduzido pelas antigas colônias da Magna Grécia:

Guimarães Rosa e seu enteado, Eduardo Tess, passeiam de gôndola durante viagem a Veneza (1950) 28

Aracy e Guimarães Rosa em Florença, na região italiana da Toscana (1950)

pacto da beleza do mar Mediterrâneo e dos templos de Ceres e de Netuno, que Rosa mergulha numa leitura amorosa da Ilíada e da Odisséia, anotando “linha a linha” – como revela no “Nautikon”, em fins de outubro e início de novembro. É assim que surge o seu caderno de leitura de Homero, que contém a cópia de inúmeras passagens dos poemas e alguns breves comentários sobre o herói, a linguagem e a narrativa épica, sobretudo da Ilíada. Seis anos depois, morando no Rio de Janeiro, Rosa irá publicar o romance Grande sertão: veredas, que incorpora muitas das características da épica homérica registradas em seu caderno.68 Ao longo de 1950, em seu diário, menciona, de passagem, outros livros e autores, como Baudelaire, Thomas Mann, Proust, Kafka, Machado de Assis (“O espelho”) e Katherine Mansfield (seu diário).69 Também registra suas atividades culturais: assiste a uma apresentação do Cyrano de Bergerac (na Comédie Française, em julho); visita o zoológico de Vincen-


nes (maio e julho) e o Jardin des Plantes (julho e agosto), e os museus de L’Orangerie (abril e dezembro, quando vê uma exposição de paisagistas holandeses), Trocadéro (exposição sobre arte medieval iugoslava, em maio), Victor Hugo e Carnavalet (julho), Louvre (novembro) e National Gallery (durante a viagem a Londres com Pedro Barbosa, em julho). É ainda em 1950 que Rosa freqüenta o ateliê do pintor Cícero Dias, de quem se tornara amigo em Baden-Baden, em 1942. Suas conversas sobre cores estão registradas no diário (em setembro).70 Os dois amigos costumam se encontrar no café Le Flore. Assim como no ano anterior, Rosa continua a sonhar com o sertão, como revela, muito tempo depois, em Tutaméia (1967), no Prefácio “Sobre a escova e a dúvida” (item V):

em periódicos com “O lago do Itamaraty”, uma pequena crônica sobre os cisnes do palácio, que sai na contracapa das Seleções do Reader’s Digest. Em novembro, é aceito como sócio efetivo da Sociedade Brasileira de Geografia (antiga Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro). Seu discurso de posse será publicado na revista da sociedade, em 1953. A partir das notas de seu diário em Paris e das cadernetas de viagem da Europa (França e Itália), Rosa escreve alguns relatos, que serão publicados em periódicos do Rio de Janeiro, alguns anos depois: “Do diário em Paris”, “Zôo (Parc Zoologique du Bois de Vincennes)”, “Zôo (Jardin des Plantes)”, “Aquário (Nápoles)”, “O burro e o boi no presépio” e “Zôo (Whipsnade Park, Londres)”. 1952 Em março, em carta ao amigo Mário Calábria, cônsul do Brasil em Munique, Rosa menciona os preparativos de uma viagem pelo sertão de Minas:

1951 Em janeiro, menciona Goethe em seu diário, e registra mais uma conversa sobre cores com Cícero Dias. Em fevereiro, visita novamente o Louvre (duas vezes) e o Petit Palais. Em março, retorna ao Rio de Janeiro, novamente nomeado chefe de gabinete de João Neves da Fontoura, ministro das Relações Exteriores. Mora inicialmente num hotel na praia do Flamengo, e depois se muda para o edifício Perigot, na praia do Russel, na Glória. Em junho, é promovido a ministro de segunda classe, por merecimento. Em agosto, retoma suas publicações

A viagem “para conferir os mugidos dos bois e a copiosidade do orvalho nas moitas do meloso, entre aboios, estrelas e amenas peripécias”,72 é realizada no mês de maio, quando Rosa viaja até a fazenda Sirga, de Chico Moreira (criador de gado na beira do rio São Francisco), localizada cerca de 20 km abaixo da cidade de Três Marias (MG). Ao invés de descer o rio das Velhas de canoa, como havia planejado

Acervo da família Tess

[...] o tema de “O recado do morro” se formou aos poucos, em 1950, no estrangeiro, avançando somente quando a saudade me obrigava, e talvez também sob razoável ação do vinho ou do conhaque.

Você vai para Roma, minha branda inveja esvoaça. Quando ouço ou penso Itália, minhalma se prostra... Mas amo também outras regiões, mais ásperas. Prova? Estou-me preparando para, daqui a dias, ir acompanhar, rústica, árdua, autenticamente, uma boiada brava, em percurso de 40 léguas, lá do sertão sagarânico, da fazenda da Sirga – entre buritizais belíssimos e chapadões de matagal inviolado – até a fazenda São Francisco, de um meu primo, lá perto de Cordisburgo. Já ando nos preparativos, arrumando mochila, cantil, roupa cáqui, pois serão 15 dias no ermo, a carne seca com farinha-de-mandioca e café com rapadura, sob sol, poeira, lama e chuva. Odisseus.71

O casal com sua família de gatos no Rio de Janeiro (1951); a paixão por felinos aproximou Guimarães Rosa do escritor José J. Veiga 29


Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

nambuco, Paraíba e Piauí) e de quase todos os municípios baianos que se dedicam à pecuária:

Tropa de bois fotografada durante viagem de Rosa pelo sertão mineiro

com Pedro Moreira, à maneira de um viajante que apenas passa pelos lugares, o escritor prefere conviver intensamente com um grupo de vaqueiros, compartilhando seus afazeres, numa viagem “que era não de observação, mas de observância”: “Eu trabalhei de ajudante-de-vaqueiro. Trabalhava de vaqueiro e passava pelos lugares” (“A boiada”). Rosa viaja do Rio de Janeiro até Belo Horizonte, e pega um trem para Cordisburgo, onde visita os pais (dia 10); depois, segue de carro até Paraopeba, acompanhado de Pedro Barbosa (dia 12), e de lá seguem até a fazenda Sirga (dia 13), onde permanecem por seis dias (13 a 18). No dia 19 de manhã, Rosa parte com a comitiva de vaqueiros de Manuelzão, ao lado de Zito, o cozinheiro-de-boiada e batedor de berrante, e Bindóia, exímio tirador de versos, conduzindo uma boiada rumo à fazenda

Algodões, em Araçaí (entre Cordisburgo e Sete Lagoas). Ao longo de dez dias (19 a 28.05), percorreram cerca de 240 km pelos campos gerais, passando por Andrequicé, Morro da Garça e Cordisburgo, além de diversas fazendas e belas veredas. Em junho, sai na revista O Cruzeiro uma longa reportagem sobre a viagem com a boiada, ilustrada com fotos do escritor e dos vaqueiros.73 Animado com esta viagem, em junho, nas festas de São João, faz uma nova incursão rumo ao mundo dos vaqueiros, participando de uma grande vaquejada em Caldas do Cipó, no sertão da Bahia, em companhia de Assis Chateaubriand e do presidente Getúlio Vargas. Em carta ao pai (Rio de Janeiro, 15.07), comenta o “espetáculo inédito” que presenciou: a reunião de cerca de 600 vaqueiros “autênticos”, provenientes de vários estados do Nordeste (Per30

O passeio à Bahia, sim, esse foi notável. Em Caldas do Cipó, pude ver reunidos – espetáculo inédito, nos anais sertanejos e creio mesmo que em qualquer parte – cerca de 600 vaqueiros autênticos dos “encourados” [...] lá compareceram vaqueiros de vários Estados, e de quase todos os municípios baianos onde há criação de gado, do curraleiro (pé-duro) bravo das caatingas. Fui com Assis Chateaubriand, que é o rei dos entusiastas, e tive de vestir também o uniforme de couro e montar a cavalo (num esplêndido cavalo paraibano), formando na “guarda vaqueira” que foi ao campo de aviação receber o presidente Getúlio Vargas. A mim coube “comandar” os vaqueiros de Soure e de Cipó (!). Depois, o desfile, brilhante.

No final do ano, publica “Mensagem da ordem do vaqueiro: pé-duro, chapéu-de-couro” (O Jornal, Rio de Janeiro, 28.12; republicado, com alterações, em Ave, palavra) – uma espécie de tratado sobre o mundo dos vaqueiros, onde Rosa faz uma leitura de Os sertões, de Euclides da Cunha, à luz de suas próprias viagens a Minas (em maio) e à Bahia (em junho). No final do ano também sai em livro, numa tiragem de apenas 110 exemplares, a versão integral de Com o vaqueiro Mariano (de 1947-1948), com 52 páginas (ilustração de Darel Valença Lins. Niterói: Hipocampo, 1952; republicado em Estas estórias). Ainda que esquecido pela crítica, este é, na verdade, o segundo livro de Rosa, publicado entre Sagarana e os livros de 1956. Assim como se perderam as notas registradas durante a viagem pelo Pantanal (1947) e pelo interior


relatos serão reunidos, com algumas alterações, no item VII do prefácio “Sobre a escova e a dúvida”, de Tutaméia.76 Se “Mensagem da ordem do vaqueiro: pé-duro, chapéu-de-couro” é um texto mais ensaístico, que reflete sobre os “povos boieiros” (bukólos), os textos inacabados “A saída (01.05.52)” e “A boiada” (em suas duas versões), bem como “Sobre os planaltos” e “Caderno do Zito” (publicados anos depois) são escritos num tom de relato pessoal de viagem.77 Finalmente, ainda em dezembro, publica “A senhora dos segredos” – pequeno conto sobre uma visita à “cartomante de Hitler”, que o leva de volta à Alemanha nazista.78 No final de agosto, Guimarães Rosa e dona Aracy saem da Glória para um apartamento em Copacabana, na rua Francisco Otaviano, com vista para o mar do Arpoador, onde o escritor permanece até falecer, em seu escritório, no fi-

nal de 1967. Moram com alguns gatos e um papagaio, o “Louro”, que sabe “aboiar alto, late, canta, chora, e abre as madrugadas com um entusiasmo que faz gosto”, obtido no final da viagem com os vaqueiros do sertão de Minas.79 Muito “ciumento” dos gatos, o Louro “gosta de ouvir Wagner, detesta samba e delira de contentamento quando chove.” Costuma gritar “ministro, ministro!”, ao que Rosa responde: “é você!” E o papagaio logo retruca: “é você!”.80 É bastante conhecida a paixão de Rosa por animais, seu gosto por observá-los e descrevê-los, especialmente bois e gatos, “porque são os mais contemplativos”: “sempre gostei de bois e de gatos indistintamente. Mas os gatos são mais fáceis de se criar em casa...”81 É a paixão por gatos que aproxima Rosa e Aracy do casal José J. Veiga e Clélia: “não foi por intermédio da literatura que nos conhecemos, foi por intermédio de

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

de Minas (1945), também não se tem notícia das cadernetas da viagem ao sertão da Bahia. Mas o Fundo JGR possui as anotações de Rosa feitas durante a excursão com os vaqueiros de Minas, em maio deste ano: uma única caderneta original, manuscrita, que registra os dias 27 e 28.05; e uma cópia datilografada de todas as cadernetas desta viagem (de 12 a 28.05), ao que tudo indica, feita pelo próprio escritor.74 Rosa deixou ainda três relatos parciais da viagem, também datilografados e inéditos, nenhum deles datado: “A saída (01.05.52)” (2 p.) e “A boiada”, com três subtítulos – “Na Sirga”, “Entrada” e “Os camposgerais” (3 p.), ambos preservados no Fundo JGR (Pasta E26); e ainda um outro texto inédito também intitulado “A boiada”, mas com conteúdo diferente (13 p.). É nesse documento que revela ter concebido duas novelas do Corpo de baile durante a viagem: “Uma estória de amor (Festa de Manuelzão)” e “Dão-Lalalão”, que “cresceram com outro sentido, em ruminação posterior”.75 Quinze anos depois, em 1967, no jornal Pulso (Rio de Janeiro), Rosa publica dois relatos parciais da viagem com a boiada, que reproduzem passagens dos inéditos “A saída” e daqueles dois textos diferentes, intitulados “A boiada”: “Sobre os planaltos” (04.03.1967) e “Caderno do Zito” (18.03.1967). Neste último, reproduz alguns dos “versos da boiada”, escritos ao longo da viagem por Zito, o “vaqueiro-poeta” que “entendia dos remédios da beleza”. Esses dois

Guimarães Rosa em fazenda do interior mineiro, na célebre viagem que o escritor realizou na comitiva de vaqueiros de Manuelzão (1952) 31


Acervo da família Tess

do pelo escritor: “gostava de convidar alguns amigos e admiradores fiéis para ouvir a leitura de suas novas histórias. Lia muito bem – e depois modificava tudo, na sua obsessiva busca de perfeição. Uma tarde me convidou para ouvir ‘A terceira margem do rio’ [...]”.83

Do sertão para a cidade, Rosa mantém o hábito de fazer anotações sobre animais; acima, o escritor no zoológico do Rio de Janeiro (1952)

gatos, nós tínhamos gatos, gostávamos de gatos, e eles tinham também alguns gatos”. Quando a gata Xizinha adoece, eles indicam um veterinário e, a partir de então, tornam-se grandes amigos. Foi Rosa quem aconselhou José J. Veiga a publicar com o nome de J. J. Veiga, após alguns cálculos de numerologia: “– ‘Vai te dar muita sorte!’. Eu também não estava muito feliz com José Veiga, então eu adotei, e realmente parece que ele tinha razão, porque meu primeiro livro passou da 30ª. edição.” Os dois casais costumavam se encontrar com regularidade: [...] chegou uma época em que estabelecemos uma norma: num domingo eles almoçavam aqui, no outro nós almoçávamos lá, e com isso acompanhamos toda a escrita daquele livrão, o Corpo de baile. Quando íamos lá, ele lia para nós o capítulo que ele tinha escrito durante a semana, e quando vinha aqui, ele trazia para a gente também. [...] lia alto para a gente lá no escritório dele, ele gostava disso, tinha uma voz clara,

boa dicção, então, ninguém perdia nada [...] ele trabalhava muito aquilo, reescrevia, modificava, e quando lia, já estava mais ou menos na versão final.

J. J. Veiga não esquece da leitura que Rosa fez do episódio da descoberta da miopia de Miguilim: “Foi uma cena bastante comovente, nós lá perto, a Clélia, eu e Aracy chegamos a chorar com essa passagem.” Mas eles também riram bastante quando Rosa leu o julgamento de Zé Bebelo, do Grande sertão: veredas: “ele está sendo interrogado, e tem umas respostas engraçadas, humorísticas, para as perguntas que os captores dele estavam fazendo. Aquilo era muito divertido, ao invés de chorar, nós ríamos muito com essa estória, que é justamente o objetivo que ele queria, não é?”82 O hábito de ler em voz alta as estórias que estava finalizando – às vezes até mesmo por telefone – parece ter sido bastante cultiva32

1953 No primeiro semestre (de março a junho), em “Letras e Artes”, há oito publicações de Guimarães Rosa: “A senhora dos segredos” (republicação); “Cipango” – relato da sua visita a uma colônia de japoneses no Pantanal, em 1947 (“Letras e Artes”, 12.04.1953; também publicado na Folha da Manhã, São Paulo, 17.02.1953); “Teatrinho” – confronto de trechos do diário de dois escritores nos Estados Unidos: Érico Veríssimo e André Green (19.04.1953); “Do diário em Paris” – passagens do “Nautikon”, com algumas alterações (17.05.1953); “O homem de Santa-Helena” – uma conversa no Itamaraty com um brasileiro que mora na ilha de Napoleão (03.05.1953); “Terrae vis” – sobre os fluidos magnéticos da terra e sua influência sobre os homens (10.05.1953; também publicado no Diário de Minas, Belo Horizonte, 25.01.1953); “Fantasmas dos vivos” – sobre a aura negativa ou positiva das pessoas (24.05.1953); e “Os doces” – descrição de doces portugueses (07.06.1953), quase todos republicados em Ave, palavra. Em abril, no Diário de Minas, publica “Ao pantanal” (mais um relato de sua viagem de 1947; republicado no Correio da Manhã,


1954 No primeiro semestre (abril a junho), novamente em “Letras e Artes”, há sete publicações de Rosa (quase todas republicadas em Ave, palavra, com alterações): “A chegada de Subles” – estória kafkiana em torno de absurda conversa telefônica (06.04.1954); “Do diário em Paris” – outras passagens do “Nautikon”, com alterações (13.04.1954); “Aquário (Nápoles)” – descrições de animais marinhos (11.05.1954; republicado no Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 21.12.1957); “A senhora dos segredos” (republicação); “Uns índios – sua fala” – mais um relato da viagem ao Pantanal, em 1947, agora centrado na visita a uma aldeia de índios Terena (25.05.1954); “Os doces” (republicação); e “Risada e meia” – sobre a anedota e a estória (04.05.1954), que será republicado (com acréscimos e muitas alte-

rações), como o prefácio “Aletria e hermenêutica”, de Tutaméia. É curioso notar que o último livro publicado por Rosa (1967) abre com um prefácio cujo núcleo foi escrito 13 anos antes. Em maio, em carta a Mário Calábria (Rio de Janeiro, 07.05), Rosa menciona de novo o livro que está escrevendo e suas dificuldades de escrita. Em julho, mais uma vez solicita as notas do pai sobre o sertão (Rio de Janeiro, 12.07) e também menciona o trabalho imenso para escrever seu novo livro, que acaba de ser desdobrado em dois. Nesse mesmo mês, na seção “Livros” da revista Visão (23.07.1954), sai uma reportagem sobre a “Volta de Guimarães Rosa”, que anuncia duas obras para o início de 1955: “um conjunto de novelas, intitulado Corpo de baile” e, “de uma das novelas desse livro”, “quase contra” a sua “vontade”, “desenvolveu um romance: As veredas mortas”, que é a estória do “jagunço Riobaldo, cheia de violência e mortes. Desenrola-se no princípio do século, no Noroeste de Minas, perto do rio Urucuia”.84 Em outubro, em carta a Azeredo da Silveira, comenta o “trabalho febril” para terminar “um livro de novelas”. 1955 No segundo semestre, escreve a Azeredo da Silveira (Rio de Janeiro, 03.08) contando que a editora José Olympio já recebeu o Corpo de baile – um livro imenso, “cetáceo” – e menciona o trabalho hercúleo para terminar Grande sertão: veredas, “retocando” e “recopiando” o romance, “que vai ser um mastodonte”. 33

No início de dezembro, mais uma vez escreve ao pai (Rio de Janeiro, 09.12) solicitando suas notas sobre o sertão, e também menciona o “esforço imenso” para terminar e conseguir entregar à editora os dois livros, “completando, retocando e revendo” as provas. Na mesma ocasião, em carta a Azeredo da Silveira (Rio de Janeiro, 09.12) comenta que passou dois anos escrevendo sem parar, “num túnel, num subterrâneo”. Ao longo de 1955, Rosa tem vários encontros com Poty, contratado por José Olympio para fazer as capas e ilustrações da 4ª edição de Sagarana e de seus dois novos livros. Segundo Poty, Rosa dava as idéias, sugeria os temas, mas raramente desenhava: “Só quando havia um passarinho que eu não conhecia, ele tirava os óculos e fazia uma coisinha bem tosquinha mas exata, né?”. Só depois dessas conversas é que Poty desenhava: Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

Rio de Janeiro, 30.11.1957; no Jornal de Letras, Rio de Janeiro, jan. 1958; e em Ave, palavra); e na Revista da Sociedade Brasileira de Geografia sai o seu “Discurso de posse” (de 1951). Em outubro, é nomeado chefe da Divisão de Orçamento do Ministério das Relações Exteriores. Ainda em outubro, escreve novamente ao pai (Rio de Janeiro, 27.10), pedindo-lhe que continue a enviar material para seus livros. Em dezembro, em carta a Mário Calábria (Rio de Janeiro, 07.12), conta que está escrevendo um livro imenso, com “novelas labirínticas” – livro que será publicado em 1956, desdobrado em dois: Corpo de baile e Grande sertão: veredas.

Vaqueiro maranhense em foto recebida por Rosa em 1954


Poty ainda não havia lido o Grande sertão: veredas, e, para fazer sua capa, Rosa contou para ele toda a estória, sem parar, durante oito horas: “Foi me dando o maquinismo todo, contou as aventuras e desventuras do Riobaldo, Diadorim e coisa. Agora, no final, ele disse que ia ter um segredo que só o Zé Olympio sabia, e mais um ou dois leitores, e que eu saberia. E era sobre Diadorim...”. Os mapas das orelhas do romance, incluídos na 2ª edição (1958), também foram concebidos em parceria: Foram quatro versões do mapa. O mapa era sempre o mesmo, mas as figuras, ele mudava: “Essa pra cá. Tira mais um pouco. Acrescente esse diabo. Não, põe ali. Não, põe aqui”. Até que chegou no ponto que ele queria. O que ele pretendia, não sei, não. Ele me disse os elementos e eu compus: o diabo, a personagem feminina, a coruja... O símbolo do infinito era só o que ele queria como ilustração, no final, além do mapa. Eu presumo que o mapa é como se fosse um resumo do livro.86

1956 Em janeiro, publica Corpo de baile (7 novelas), em 2 volumes que somam 822 páginas, com capas de Poty. Nas orelhas do volume 1, transcrição do con-

Reprodução do livro Rosa no redemoinho/ Secretaria de Estado da Cultura de Minas Gerais

Ele descrevia, dizia o que queria e eu me virava para resolver o assunto [...] A capa do Corpo de baile – essa idéia foi dele também: fazer as figuras da capa, de frente, e da contracapa, de costas, como se fosse um palco, como se fossem vistas pela platéia e pelos bastidores. Num dos volumes havia duas mulheres conversando, uma em traje de montaria. No dia seguinte recebi um telegrama dizendo que a mulher em traje de montaria tinha que parecer desquitada. Então, escolhi uma senhora lá, que por acaso era desquitada, e desenhei a cara dela.85

Matriz de uma das gravuras de Poty para obras de Guimarães Rosa

to “Buriti”, de Afonso Arinos (Buriti perdido); no volume 2, nota da editora sobre Poty. No final de março, antes mesmo de lançar Grande sertão: veredas, Guimarães Rosa aparece como possível candidato à vaga de d. Aquino Correia (recém-falecido) na Academia Brasileira de Letras (Cadeira n. 34). Fomos informados de que o diplomata e escritor João Guimarães Rosa (Sagarana) havia desistido de sua candidatura à vaga de d. Aquino Corrêa, na Academia Brasileira de Letras. Segundo se fala, teria o escritor e diplomata mineiro desistido, ou melhor, deixado tudo para outra oportunidade, pois não desejava disputar a vaga, e sim ser apresentado como candidato de “todos os partidos”, sem luta. E o fez de comum acordo com o escritor Raymundo Magalhães Júnior, que teve assim melhoradas as suas possibilidades de ganhar a cadeira deixada vaga por d. Aquino, na nossa Academia. (Última Hora, Rio de Janeiro, 27.03.1956, p. 3)

Rosa não se candidata em 1956, e Raymundo Magalhães Júnior vence a eleição do dia 9 de agosto. Mas, no ano seguinte, irá dis34

putar a Cadeira n. 25, deixada vaga pelo acadêmico José Lins do Rego. Alguns meses depois de lançar Corpo de baile, em maio, publica Grande sertão: veredas com capa e ilustrações de Poty (alguns autores registram o “dia 17 de julho” como sua data efetiva de lançamento).87 Nas orelhas do livro, notas sobre a 4ª. edição de Sagarana e o lançamento de Corpo de baile (2 v.), escritas pelo próprio autor. Rosa também redige uma nota sobre o romance para ser publicada como orelha de um de seus livros, onde se lê seguinte advertência, que depois foi deixada de lado: “NOTA – Aos leitores, e aos que escreverem sobre este livro, pede-se não revelar a sequência de seu enredo, a fim de não privarem os demais do prazer da descoberta do Grande sertão: veredas”. Sai também a 4ª edição revista de Sagarana (versão definitiva), com capa de Poty. Nas orelhas, nota da editora com o título “Guimarães Rosa versus Sagarana”.


Em julho, Rosa escreve ao pai (Rio de Janeiro, 05.07) contando que está passando a limpo suas cartas, “para serem aproveitadas em futuros livros”, e solicita mais “notas” sobre o sertão. Rosa pergunta se o pai está gostando de Corpo de baile e comenta a sua participação no livro: “Como o senhor não deixará de ter notado, ele está cheio de coisas que o senhor me forneceu naquelas cartas e notas, extremamente valiosas para mim”. Também fala da “barulhada tremenda” provocada pelo lançamento de Grande sertão: veredas:

De fato, o romance provocou uma acirrada polêmica. Nos anos que se seguiram ao seu lançamento (1956-1958), foi elogiado por críticos e escritores, como Antonio Callado, Paulo Rónai, Afrânio Coutinho, Cavalcanti Proença, Oswaldino Marques, Tristão de Ataíde, Pedro Xisto, Euryalo Canabrava, Jaime Adour Câmara e Antonio Candido; e duramente criticado por Marques Rebelo, Adonias Filho, Ferreira Gullar, Ascendino Leite, Wilson Martins, Nelson Wer-

Fernando, estou lendo o livro de Guimarães Rosa, e não posso deixar de escrever a você. Nunca vi coisa assim! É a coisa mais linda dos últimos tempos. Não sei até onde vai o poder inventivo dele, ultrapassa o limite imaginável. Estou até tola. A linguagem dele, tão perfeita também de entonação, é diretamente entendida pela linguagem ín-

tima da gente – e nesse sentido ele mais que inventou, ele descobriu, ou melhor, inventou a verdade. Que mais se pode querer? Fico até aflita de tanto gostar. Agora entendo seu entusiasmo, Fernando. Já entendia por causa de Sagarana, mas este agora vai tão além que explica ainda mais o que ele queria com Sagarana. O livro está me dando uma reconciliação com tudo, me explicando coisas adivinhadas, enriquecendo tudo. Como tudo vale a pena! A menor tentativa vale a pena. Sei que estou meio confusa, mas vai assim mesmo, misturado. Acho a mesma coisa que você: genial. Que outro nome dar? Esse mesmo. Me escreva, diga coisas que você acha dele. Assim eu ainda leio melhor. Um abraço da amiga Clarice.89

Grande sertão: veredas acaba ganhando três prêmios: Machado de Assis (do INL); Carmen Dolores Barbosa (em São Paulo); e Paula Brito (da municipalidade do Rio de Janeiro). Logo após a publicação do romance, Rosa escreve “Pequena palavra” (27.08), que será publicado, no ano seguinte, como prefácio ao livro de contos húngaros traduzidos por

Acervo da família Tess

Vamos ver se tem sorte e obtém o mesmo sucesso dos outros, que, graças a Deus, estão retumbando e brilhando, provocando uma barulhada tremenda, aqui no Rio, em São Paulo, em Pernambuco, quase que por toda a parte. Inclusive, irritando os ressentidos e invejosos – o que constitui o melhor sinal e a melhor garantia de uma obra. O novo livro, o romance, é grosso, 594 páginas. É uma história de jagunços, do Norte de Minas, narrada pelo ex-jagunço Riobaldo, grande sujeito e brabo. Agora, já estou precisando de meter o peito noutras tarefas, pois: A vida é breve e a arte é longa...

neck Sodré, José Lins do Rego e Silveira Bueno, entre outros. O cerne da polêmica girava em torno de suas “inovações estilísticas e lingüísticas”, de suas “experimentações no plano da estética literária”: “criação de uma linguagem nova”; “excessos de hermetismo vocabular”; “língua codificada, diferente dos padrões tradicionais”; “manipulação arbitrária das palavras”; “língua estranha e sintaxe extravagante”; “excessos de virtuosismo, espécie de esnobismo literário”.88 Em dezembro de 1956, Clarice Lispector escreve uma carta a Fernando Sabino, dizendo-se completamente apaixonada pelo romance de Rosa:

A partir da esq., o editor José Olympio, Guimarães Rosa, e o casal Lygia Fagundes Telles e Goffredo da Silva Telles Jr. (Rio de Janeiro, anos 1950) 35


seu amigo Paulo Rónai (Antologia do conto húngaro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1967). É nesse texto que Rosa expõe aspectos fundamentais de sua própria arte, desenvolvendo idéias sobre tradução – a “fecundante corrupção” entre as línguas – que podem ser aproximadas do que Walter Benjamin propôs acerca da “tarefa” do tradutor. Autor que Rosa conhecia, como revela a Fernando Camacho:

Fotos: acervo da família Tess

[...] na mesma hora que eu leio, tenho de fato paixão por aquilo, gosto imenso, de maneira que entra, deve ter entrado muita coisa. Mas, ao mesmo tempo, pobre de mim, entra outra coisa, entra tanta coisa, ficando tudo misturado [...] Júlio Dantas, Fernando Camacho, Walter Benjamin, Goethe, Rubem Braga, Magalhães Junior, Machado de Assis, Eça de Queiroz... Nada é alto demais nem baixo demais. Tudo é aproveitável. Agora, qualquer coisa que eu leio, se eu gosto, eu começo a colaborar com o que leio, mentalmente, ou estou mudando, aproveitando, vivendo, imaginando...90

Rosa e um rinoceronte no zoológico carioca (1957)

O escritor no zoológico do Rio de Janeiro (1957) diante da jaula de uma onça, animal que aparece na novela “Meu tio o Iauaretê”

1957 Depois de eleito, o presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira costuma enviar um carro para buscar Guimarães Rosa no Itamaraty, para almoçarem juntos uma boa comida mineira. Em janeiro, Rosa viaja ao Planalto Central para “ver o chapadão formoso onde começam a fazer a nova capital”.91 Em carta a Pedro Barbosa (Rio de Janeiro, 16.02), revela que “dona Rosalina”, a personagem velhinha da novela “A estória de Lélio e Lina” (Corpo de baile), é “muito inspirada na pessoa de dona Joaquina”, mãe de Pedro, com quem costumava conversar em suas visitas à fazenda Pindaíbas. Anos depois, por ocasião de sua morte, Rosa comenta novamente com Pedro (Rio de Janeiro, 05.05.1964) que, se ele reler a novela, “verá como a luz de sua lembrança e presença me impregnou, e que pude revivê-la, um pouquinho, refletida em personagem, principalmente naquela descrição da horta, que era 36

a horta de lá, de sua casa.” Em março e abril, Manuel Bandeira escreve duas crônicas saudando o autor de Grande sertão: veredas. Em “Rotílio Manduca”, relata o seu insólito encontro com esse “personagem vivo” do romance, “famanado homem de cabras, terror dos gerais do Carinhanha”.92 Em setembro, Rosa vai a São Paulo receber o Prêmio Carmen Dolores Barbosa e conhece Edoardo Bizzarri, um dos membros júri, adido cultural do Consulado Geral da Itália e diretor do Istituto Italiano di Cultura de São Paulo – seu futuro tradutor italiano, com quem trocará inúmeras cartas sobre a tradução do Corpo de baile, em 1963. Em agosto, publica “Aí está Minas: a mineiridade” (Manchete, Rio de Janeiro, 24.08); em dezembro escreve “Simples passaporte”, prefácio do livro De 7 lagoas aos 7 mares, de seu amigo Vasconcellos Costa, deputado de Sete Lagoas, cidade vizinha de Cordisburgo (publicado em


Acervo de Vilma Guimarães Rosa

Bodas de ouro dos pais em 1957; a cerimônia acontece em Itaguara (MG), com a presença do escritor, das irmãs Maria Luiza, Maria José e Maria Auxiliadora, dos irmãos José Luiz e Oswaldo, dos cunhados Antônio Geraldo de Oliveira (prefeito da cidade e Gil Moreira de Abreu

1959 pela editora Itatiaia; republicado na Revista do Livro, Rio de Janeiro, n. 31, 1967). Em dezembro, pede ao pai que continue a lhe enviar suas “notas” (Rio de Janeiro, 17.12) e solicita informações sobre a fundação de Cordisburgo e também sobre João Pinheiro (1860-1908), político mineiro natural de Caeté, assim como seu Fulô. Ainda em 1957, entrega à Livraria José Olympio Editora o projeto de um novo livro, “Com os vaqueiros”, que reuniria seus escritos sobre os “povos boieiros” (bukólos) e suas incursões rumo ao mundo dos vaqueiros: “Com o vaqueiro Mariano” (19471948 e 1952) e “Pé-duro, chapéu-de-couro” (1952). A Biblioteca de José e Guita Mindlin (São Paulo), que possui todo o Acervo Guimarães Rosa da Livraria José Olympio Editora (originais datilografados)93, preserva tal projeto: uma pasta inti-

tulada “Com os vaqueiros”, datada de 1957. Dentro dela, há um exemplar do livro Com o vaqueiro Mariano (tal como publicado pela editora Hipocampo, em 1952) e um recorte de “Péduro, chapéu-de-couro” (tal como saiu em O Jornal, Rio de Janeiro, 1952), ambos com correções e emendas manuscritas. Esse livro nunca foi publicado, e seus dois textos acabaram separados para sempre, republicados em livros diferentes, respectivamente, em Estas estórias e Ave, palavra (obra póstuma).94 Talvez agora, em 2007, seja o momento de recuperarmos a leitura conjunta desses dois textos, tal como planejada por Rosa, editando “Com os vaqueiros” 50 anos depois... É a partir de 1957 que dona Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu), chefe do Serviço de Publicações do Itamaraty, começa a auxiliar Guimarães Rosa em seus 37

trabalhos, como secretária e colaboradora. Tornam-se grandes amigos. Convivem diariamente no Itamaraty e costumam almoçar juntos. Madu passa a freqüentar a sua casa e trava amizade também com dona Aracy. Paulo Rónai contará com a preciosa ajuda de Madu no preparo dos livros póstumos do escritor, na seleção, organização e revisão das peças que integram Estas estórias (1969) e Ave, palavra (1970). No segundo semestre morre José Lins do Rego (12.09.1957), que ocupava a Cadeira n. 25 da Academia Brasileira de Letras. Guimarães Rosa decide concorrer à sua vaga. Seu principal adversário é Afonso Arinos de Melo Franco, também mineiro: Conforme disse a você, candidateime. Repito: com desejo, angústia e respeito. E, imagine: a espera dura 4 meses! Quatro meses, numa berlinda terrível.95

Fumante inveterado, com vida sedentária, excesso de peso e de trabalhos, e ainda sob tensão, Rosa começa a apresentar problemas de saúde e se vê obrigado a parar de fumar (com várias recaídas posteriores), como revela ao amigo Paulo Dantas (Rio de Janeiro, 17.12): [...] também estive mesmo doente, com apertos de alergia nas vias respiratórias; daí, tive de deixar de fumar (coisa tenebrosa!) e, até hoje (cabo de 34 dias!), a falta de fumar me bota vazio, vago, incapaz de escrever cartas, só no inerte letargo árido dessas fases de desintoxicação. Oh coisa feroz. Enfim, hoje, por causa do Natal chegando e de mais mil-e-tantos motivos, aqui estou eu, heróico e pujante, desafiando a fome-e-sede tabágica das pobrezinhas das células cerebrais. Não repare.


Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

O escritor mineiro Mário Palmério, autor de Chapadão do bugre, com José Olympio (no centro) e Guimarães Rosa, no Rio de Janeiro (1958)

Um ano depois, com sérios problemas de hipertensão arterial, Rosa terá que emagrecer e se adequar a uma vida cheia de restrições. 1958 No dia 23 de janeiro sai o resultado da eleição na Academia Brasileira de Letras: Afonso Arinos de Melo Franco é eleito com 27 votos contra 10 para João Guimarães Rosa. Em carta a Paulo Dantas (Rio de Janeiro, 04.02), Rosa comenta o resultado: [...] voltei a Minas, fui só até Paraopeba, para me esconder dos jornalistas e repórteres, nos quentes dias da eleição para a Academia. O resultado, Você viu, foi o que foi: deu em água de barrela. Do “estouro”, salvei dez garrotes – isto é, os 10 votos bons, que deram para “salvar a face”. Não me aborreci, nada (você viu e sabia qual era o meu anterior estado de espírito). Sinto é uma caudalosa alegria, uma viva batida de libertação. Não ser candidato é uma pura delícia. E, depois de dar um arranjo nos livros e papéis, ando começando novo gosto de escrever, acho que

a qualquer momento recomeço; só não sei ainda é o que vai ser.

Em janeiro, recebe uma carta de Curt Meyer-Clason solicitandolhe autorização para traduzir Grande sertão: veredas para o alemão, no que é prontamente atendido. Mas as negociações com as editoras alemãs acabam levando mais de quatro anos, até o final de 1962. É só então que começa o trabalho efetivo de Meyer-Clason, e sua troca sistemática de cartas com Rosa, discutindo detalhes da tradução. Em maio, é promovido a ministro de primeira classe (embaixador), por merecimento. Recebe um telefonema do próprio presidente JK, que faz questão de lhe dar a notícia. Em janeiro, republica “Ao Pantanal” (Jornal de Letras, Rio de Janeiro; incluído em Ave, Palavra, 1970); em maio, publica “O ciclo do carro de boi no Brasil”, um comentário sobre o livro de Bernardino 38

José de Souza (Boletim Bibliográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, n. 4, v. 6, p. 224). Guimarães Rosa traduz do inglês o livro O último maçarico, de Fred Bodsworth, para a Biblioteca de Seleções do Reader’s Digest (Rio de Janeiro: Ypiranga, 1958, v. 6). Envia um exemplar a Manuel Bandeira, que lhe agradece (Rio de Janeiro, 30.8) com umas “lérias” e “duas sextilhas” bastante conhecidas, versando, de forma jocosa, sobre o recente episódio de sua eleição para a ABL: “Não permita Deus que eu morra/ Sem que ainda vote em você”. Acadêmico desde 1940, Bandeira havia acabado de receber Afonso Arinos em sua cerimônia de posse na ABL (no dia 19.07). Guimarães Rosa responde à brincadeira com outros versos, que terminam em “Louros e não rosas, noto,/ Vão bem a uma Academia”. No que Bandeira pontua: “Antes, porém, me prometa,/ pelo Senhor do Bonfim,/ Que à minha futura vaga/ Você se apresenta sim?”. Cinco anos depois, Rosa será eleito na ABL , por unanimidade, para ocupar a vaga de João Neves da Fontoura (1963). Manuel Bandeira não deixa de comentar o trabalho de Rosa como tradutor: “Era a história de um pássaro. Rosa mandou vir dos Estados Unidos o romance completo. Mandou vir também tratados de ornitologia. Fez a tradução, reescreveu-a cinco vezes. No fim saiu obra perfeita, coisa que não era no original.”96 O último maçarico deveria ser republicado para que os leitores de Rosa possam conhecer e apreciar


Acervo de Vilma Guimarães Rosa

No começo de junho, estive em BRASÍLIA, pela segunda vez, lá passei uns dias. O clima, na Nova Capital, é simplesmente delicioso, tanto no inverno quanto no verão. E os trabalhos de construção se adiantam, num ritmo e entusiasmo inacreditáveis: parece coisa de russos ou de norte-americanos. Desta vez, não vi mais tantos bichos e aves, como da outra, em janeiro do ano passado – quando as perdizes saíam assustadas, quase de debaixo dos pés da gente, e iam retas no ar, em vôo baixo, como bolas peludas, bulhentas, frementes, e viam-se os jacus fugindo no meio do mato, com estardalhaço; e também veados, seriemas, e tudo. Mas eu acordava cada manhã para assistir ao nascer do sol, e ver um enorme tucano, colorido, belíssimo, que vinha, pelo relógio, às 6 hs. 15’, comer frutinhas, durante dez minutos, na copa alta de uma árvore pegada à casa, uma “tucaneira”, como por lá dizem. As chegadas e saídas desse tucano foram

Com a neta mais velha, Laurinha, filha de Vilma (1958)

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

esta sua faceta de tradutor. Em junho, viaja de novo ao Planalto Central, de onde volta encantado com um tucano – episódio que será recriado no conto “Os cimos” (Primeiras estórias, 1962):

Guimarães Rosa em seu escritório no Rio de Janeiro, na década de 1950, período em que inicia intensa correspondência com seus tradutores uma das cenas mais bonitas e inesquecíveis de minha vida.97

Na mesma carta, envia aos pais uma foto de seus animais de estimação: os gatos persas Boyzinho e Xizinha (a “Lady”, comprada em Paris), e Sung, o cachorro pequinês, com o qual se diverte brincando de peteca. Entre maio e outubro, envia três cartas ao pai, solicitando suas “notas”, especialmente informações sobre o “jogo da bola” (Rio de Janeiro, 25.05), as caçadas do pai na serra do Cabral (Rio de Janeiro, 05.07) e estórias sobre a velha Caeté, sua cidade natal (Rio de Janeiro, 08.10). Em novembro, comenta com Paulo Dantas (Rio de Janeiro, 17.11) sua falta de ânimo e a necessidade de viajar novamente pelo sertão: Eu ando meio quejando – saúde e clima, certo marasmo. Agora, vou reagir. A vida exige pressa, exige tenência e 39

macheza curtida. E eu andei meio sem impulso, essas coisas. Acho que preciso de ir dar também uma boa espiada, Urucúia por lá, cheirar de novo o sertão, os currais de manhã, odor de bosta de vaca, pios de pássaros-pretos.

Mas Rosa acaba adoecendo gravemente. Sofre um enfarte no dia 30 de novembro, e se vê às voltas com médicos, exames e muitos cuidados. Saem pela Livraria José Olympio Editora a 2ª edição de Grande sertão: veredas (texto definitivo) e a 5ª edição de Sagarana, ambas com capa e ilustrações de Poty. Assim que sai a reedição de Sagarana, Rosa escreve a Paulo Dantas (Rio de Janeiro, 25.05) para saber o que o amigo paulista achou do livro “de roupa nova, das figuras. E das orelhas, também – dedicadas ao Corpo de baile. As ilustrações de Poty, glosantes”. E declara que esta 5ª. edição do livro “é a definitiva-para-sempre. No livro não mexerei mais”. Talvez o há-


bito de contemplar bois tenha levado o escritor a trabalhar com lentidão bovina98, ruminando Sagarana ao longo de 21 anos. O Sagarana que hoje encontramos nas livrarias não é exatamente igual ao de 1946, pois foi sucessivamente revisto até a sua 5ª edição, de 1958: Rever qualquer texto meu, já de si, é qualquer coisa de tremendo, porque o meu incontentamento é crescente, a ânsia da perfectibilidade, fico querendo reformar e reconstruir tudo, é uma verdadeira tortura. Por exemplo, dirlhe-ei que as 5 edições do Sagarana são todas diferentes, refeitas, remodeladas, remexidas. Por fim, para ver se eu conseguia deixar isso de lado, e me voltava para escrever outros e novos livros, o meu Editor, José Olympio, mandou matrizar ou estereotipar a composição, guardando-a nos chumbos, e impedindo-me assim, de permanecer na classe de Danaide ou Sísifo.99

1959 Em fevereiro, Rosa escreve a Pedro Barbosa (Rio de Janeiro, 26.02) contando de sua doença e de como anda a vida depois disso:

Fotos: Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

Imagine que, no fim do ano, precisamente no dia 30 de novembro, adoeci, sério. Parece que a coisa foi mesmo um

Jean-Jacques Villard, tradutor francês do autor de Sagarana

espasmo da coronária, por motivo de uma crise hipertensiva. Vi a vó por uma greta. Dispnéias, angústias, o diabo. Depois, médico, eletrocardiograma (bom, graças a Deus), repouso, exames completos de urina etc. (bons, também) e remédios e mais repouso. Com tudo isso, melhorei, bastante. Mas, como faço parte agora da grei dos hipertensos arteriais, tenho de viver mais sossegado, despreocupado, sóbrio. Consegui emagrecer 14 quilos, o que me restituiu a antiga e célebre elegância. O espírito vai bem. E as coisas, em geral. Boa animação. A literatura guimarãesroseana anda brilhando agora é no estrangeiro – França, Estados Unidos, Alemanha – a turma gostando exaltadamente, e as editoras se disputando os direitos de tradução. Chegam cartas, chegam telegramas, e seu parente aqui vai navegando com calma, estudando as propostas.

Logo no início do ano, Edoardo Bizzarri solicita autorização para traduzir o conto “Duelo”, de Sagarana, para o italiano. Publicado ainda em 1959, “Il duello” foi o primeiro texto traduzido de Rosa (saiu no periódico Il Progresso Italo-Brasiliano, n. 6-7, editado em São Paulo, sob a responsabilidade de Italo Bettarello). Aos poucos, Rosa vai retomando seu ritmo de trabalho, recebendo cada vez mais pedidos para a tradução de sua obra: “Um trabalho danado, com o serviço trivial, outras coisas; e a correspondência com as editoras estrangeiras, que andam querendo traduzir o Sertão nosso, despejando forte”.100 Mas a doença é uma preocupação constante, e Rosa tem que se adaptar a uma vida cheia de cuidados: Conheci-o já doente e sempre preocupado com a sua saúde. As pessoas que não lidavam com ele na intimidade mal se apercebiam disto porque ele era uma 40

A tradutora de Guimarães Rosa para o inglês, Harriet de Onís

pessoa viva e exuberante, com explosões de alegria quase infantil, com o seu riso de menino divertido. Ele tomava parte com energia e entusiasmo nos debates públicos, revelava-se cheio de vitalidade. Todavia, tudo isto parecia depois esgotá-lo. Guimarães Rosa alheava-se então do que se passava à sua volta e dava a impressão de querer poupar-se.101

1960-67 Depois dos livros de 1956, a atividade literária de Rosa vai se concentrar na confecção de estórias curtas, publicadas a partir de 1961, na sua maioria, em colunas literárias de periódicos do Rio de Janeiro (os jornais O Globo e Pulso; a revista Senhor), onde também colaboram escritores como Carlos Drummond de Andrade e Clarice Lispector. Consagrado com os livros Sagarana, Corpo de baile e Grande sertão: veredas, nos anos 60, Rosa começa a freqüentar encontros internacionais de escritores (na Alemanha, Itália, Estados Unidos e México), dedicando-se com afinco à tradução de seus livros e à sua divulgação no estrangeiro. A correspondência com os tradutores torna-se uma ocupação constante: “toda semana recebo e tenho de estudar


vida é dantas. Devagarinho, vou ultimando as novelas para entregar em livro. Recupero o gosto”. 103 Em outubro, comenta com Pedro Barbosa (Rio de Janeiro, 20.10) as dificuldades para se adaptar às restrições que sua doença exige: “eu é que não me animo a arredar pé daqui. Pressão alta, distúrbios do simpático, angústias. Só mesmo pegando com Deus e encurtando a rédea”. A Livraria José Olympio Editora publica a 2ª edição do Corpo de baile, agora num único volume de 516 páginas e capa de Poty.

consultas dos tradutores, e responder sem perda de tempo.”102 São extremamente minuciosas as respostas às inúmeras cartas que passa a receber periodicamente de Edoardo Bizzarri (tradutor italiano), Curt MeyerClason (alemão), J.-J. Villard (francês), Harriet de Onís (inglesa) e Angel Crespo (espanhol). A correspondência com os tradutores, recheada de discussões sobre a sua poética e de revelações sobre suas inovações lingüísticas, fará com que o escritor reflita de forma mais sistemática sobre a sua própria obra, o que terá conseqüências visíveis sobre o trabalho de linguagem efetuado em seus próximos livros, nos contos reunidos em Primeiras estórias (1962) e, sobretudo, em Tutaméia (1967), cujos prefácios versam sobre a sua poética.

Ora, uma semana não dá para Rosa caprichar nas suas invenções verbais (há sempre invenções verbais em tudo o que Rosa escreve). Daí a angústia. Rosa confidenciou-me: “– Começo a escrever, um mundo de coisas, idéias, imagens, reminiscências, me acodem. Escrevo cinco, dez, 15 páginas. É preciso reduzir a três. Começo a cortar, começo a corrigir. Aí tomo gosto. Nunca se acaba de corrigir. O meu desejo é então continuar a corrigir até o fim da minha vida. Mas há que entregar os originais. E no dia seguinte recomeçar coisa nova.”

E Bandeira profetiza: “Escrever para jornal é como escrever na areia. Rosa não escreve na areia: Rosa grava na pedra. Para a eternidade. Assim, o que Rosa está fazendo em O Globo é, capítulo a capítulo, mais um livro, digno de ficar junto de Sagarana, Corpo de baile e Grande sertão: veredas”.104

Acervo da família Tess

1960 A convite de Paulo Francis, editor da revista Senhor, Rosa começa a publicar estórias inéditas na “Seção de Literatura”, onde também colaboram Rubem Braga, Carlos Drummond de Andrade, Aníbal Machado, Fernando Sabino, Vinicius de Moraes, Jorge Amado, Paulo Mendes Campos e Clarice Lispector, entre outros. É assim que, no mês de abril, sai na revista Senhor (n. 22) sua primeira publicação depois do enfarte: “A simples e exata estória do burrinho do comandante” (republicado em Estas estórias, 1969). Em junho, revela a Paulo Dantas que anda “melhorando, de dentro para fora. O espírito já reage bem. Esta vida é mestra de sertanejos. Esta

1961 Em março, publica “Meu tio o Iauaretê” (Senhor, n. 25; incluído em Estas estórias). Escreve a Paulo Dantas (Rio de Janeiro, 08.05) anunciando a sua nova colaboração literária: “desde o dia 7 de janeiro último, estou com uma seçãozinha no O Globo, aos sábados, no 2º. caderno, na ‘Porta de Livraria’ do Antonio Olinto. Vocês aí não lêem O

Globo? Coisas variadas, às vezes dá até sertão. Vá lendo, quando for possível”. Manuel Bandeira fica surpreso com esta “obrigação hebdomadária” do escritor:

O casal Pedro e Miriam Bloch com Guimarães Rosa e Aracy em homenagem ao escritor na Embaixada do Brasil na Alemanha (1961) 41


Fotos: Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

O escritor no início dos anos 60, época em que recebe o Prêmio Machado de Assis

É assim que, entre janeiro e agosto de 1961, há 34 publicações de Rosa no jornal O Globo: – 12 delas serão posteriormente republicadas em Primeiras estórias (1962): “Sorôco, sua mãe, sua filha” (O Globo, 18.03); “O famigerado” (08.04); “A terceira margem do rio” (15.04); “Menina de lá” (06.05); “Seqüência” (13.05; republicado no Anuário da Literatura Brasileira, em 1962); “Os irmãos Dagobé” (10.06); “As margens da alegria” (01.07); “O cavalo que bebia cerveja” (08.07); “Um moço muito branco” (29.07); “A benfazeja” (05.08); “Tarantão, meu patrão” (12.08). – Três serão republicadas em Tutaméia (Terceiras estórias) (1967): “Hipotrélico” (O Globo, 14.01); “Nós, os temulentos” (28.01) e “Melim-meloso” (22.04). – Uma não será republicada: “O inverso afastamento” (O Globo, 15.07). – 19 serão republicadas em Ave, palavra (livro póstumo, de 1970): “De stella et adventu magorum” (O Globo, 07.01); “Além da amen-

doeira” (21.01); “Uns inhos engenheiros” (04.02); “O grande samba disperso” (11.02); “Homem, intentada viagem” (18.02); “Coisas de poesia” (25.02); “O riachinho Sirimin” (04.03); “Zôo (Hagembecks-Tierpark, HamburgoStellingen) (11.03; republicado no jornal Pulso, 29.04.1967); “Circo do miudinho” (25.03); “Outras coisas de poesia” (01.04); “Zôo (Parc Zoologique du Bois de Vincennes)” (29.04); “Novas coisas de poesia” (20.05); “Jardim fechado” (27.05); “A velha” (03.06); “A caça à lua” (17.06); “Zôo (Jardin des Plantes)” (24.06); “Sempre coisas de poesia” (22 ou 29.07); “Recados ao Sirimim” (19.08); “Evanira!” (26.08). Uma novidade nessas publicações em O Globo são os poemas anagramáticos do escritor (republicados em Ave, palavra com o acréscimo de vários inéditos): Soares Guiamar assina “Coisas de poesia” e “Outras coisas de poesia”; Meuriss Aragão, “Novas coisas de poesia” – ambos anagramas de Guimarães Rosa, descobertos por Manuel Bandeira; e Sá Araújo Ségrim – anagrama de J. Guimarães Rosa, descoberto por Plínio Doyle105 – escreve “Sempre coisas de poesia”. No dia 29 de junho, recebe o Prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto de sua obra. Seu discurso de agradecimento é publicado na Revista da Sociedade de Amigos de Machado de Assis (Rio de Janeiro, n. 7, 29.09). Em dezembro, publica “O burro e o boi no presépio” na revista Senhor (Rio de Janei42

ro, ano 3, n. 12, pp. 16-23); e “Alguns bichos” (exemplo de prosoema) em Brasil (n. 19, dez. 1961 a jan. 1962. Edição do Sepro da Embaixada do Brasil em Lisboa). A convite de João Condé (coordenador), Rosa aceita fazer o sétimo capítulo de O mistério dos MMM, romance policial escrito em colaboração com Viriato Correa (capítulo 1), Dinah Silveira de Queiroz (cap. 2), Lúcio Cardoso (cap. 3), Herberto Salles (cap. 4), Jorge Amado (cap. 5), José Conde (cap. 6), Antonio Callado (cap. 8), Orígenes Lessa (cap. 9) e Rachel de Queiroz (cap. 10). Os capítulos foram publicados na revista O Cruzeiro, entre outubro e dezembro de 1961, com ilustrações de Percy Deane. Rosa publica no exemplar de 16.12. Sagarana é editado em Portugal (Lisboa: ed. Livros do Brasil). Com o título Buriti, uma parte do Corpo de baile é publicada na França,

Manuscrito com a palavra “Pirlimpsiquice”, título de um de seus contos


1962 Em janeiro é nomeado chefe do Serviço de Demarcação de Fronteiras do Itamaraty, onde enfrentará casos difíceis como o do pico da Neblina (1965) e das Sete Quedas (1966). Em 1969 o pico culminante da cordilheira Curupira (2.150 m), na fronteira Brasil/Venezuela, recebe o seu nome, como uma homenagem do Itamaraty após a sua morte. Em setembro, viaja a Berlim para participar do Primeiro Colóquio de Escritores Latino-Americanos e Alemães (16 a 23.09), organizado pela revista Humboldt: “A primeira vez que faço uma viagem destas, convidado unicamente por ser escritor.”106 Conhece pessoalmente Curt Meyer-Clason, que diz ter sido Rosa “um dos participantes do Colóquio que mais se empolgou pela problemática da tradução, chegando até a propor a fundação de uma organização, talvez subvencionada pelo Estado”: “Não conheço escritor – e conheço alguns – que se tenha interessado tanto pelo problema da tradução, da transplantação”.107 Rosa passa 15 dias na Alemanha, aproveitando para visitar a Feira do Livro de Frankfurt, onde entra em contato com o dono da editora Kiepenheuer und Witsch, que compra os direitos de sua obra e contrata Curt Meyer-Clason para traduzi-la. É a partir desta data que começa a troca efetiva de cartas entre

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

com “Dão-Lalalão”, “Le message du morne” e “La fête à Manuelzão” – tradução de J.-J. Villard e prefácio de Javier Domingo (Paris: Seuil).

A partir da esq., Manuel Bandeira, Peregrino Jr., o tradutor alemão Curt MeyerClason, Guimarães Rosa, Geraldo Magela (atrás do escritor), Carlos Drummond de Andrade, Gabriel Athos (de perfil), Geraldo França de Lima e Fábio Penna da Veiga

Rosa e Meyer-Clason, primeiro sobre a tradução do romance (que sai na Alemanha em 1964), depois sobre Corpo de baile (editado em 1966) e Primeiras estórias (em 1968).108 Para auxiliá-lo em sua tarefa, o tradutor conta com a ajuda do diplomata Mário Calábria, cônsul do Brasil na Alemanha e amigo de longa data do escritor, que indica seu nome a Meyer-Clason assim que fecha contrato com a editora alemã: “Quanto àquelas pequenas dúvidas e dificuldades eventuais na tradução, cada vez mais me felicito de termos aí à mão, e com tão sincera boa vontade, o nosso comum e querido cônsul Mário Calábria”. 109 Quatro anos depois, quando MeyerClason já está às voltas com a tradução de Primeiras estórias, Rosa volta a recomendar o amigo (Rio de Janeiro, 27.09. 1966): “Pediria ainda que não deixasse de recorrer à afetuosa e forte ajuda do nosso cônsul amigo, Calábria-e-tanto, na 43

nova revisão, e ele estará sempre cordialmente disposto a dar-nos essa colaboração.” Entre março e agosto de 1962, saem quatro publicações de Rosa na revista Senhor: “A estória do homem do pinguelo” (n. 37, março; novela republicada em Estas estórias); “Substância” (n. 38, abril), “Partida do audaz navegante” (n. 39, maio) e “Nenhum, nenhuma” (n. 42, agosto), contos republicados em Primeiras estórias. Publica ainda “Pirlimpsiquice” (Comentário, Rio de Janeiro, n. 11) e republica “Seqüência” (O Globo, 13.05.1961) no Anuário da Literatura Brasileira (Rio de Janeiro, 1962-1963), os quais também integram Primeiras estórias. Em julho, Rosa escreve a Pedro Barbosa (Rio de Janeiro, 09.07) anunciando que vai a “botar na rua mais um livrinho (bonito) de contos: o Primeiras estórias”: “Vá preparando o apetite de ler, que nele se fala até no fabrico do polvilho, tomado como alto tema, conforme Você me ensinou, o das Pindas” – referência à con-


Tradução e nota de J.-J. Villard (Paris: Seuil, 1962). 1963 No dia 31 de março, morre João Neves da Fontoura, deixando vaga a Cadeira n. 2, que ocupava na Academia Brasileira de Letras (eleito em 1936). Em abril, Rosa decide concorrer à vaga de seu falecido amigo, para quem havia trabalhado como chefe de gabinete, no Itamaraty: Estou tendo de acabar uma novela, com compromisso de entrega até ao fim do mês; estou candidato à Academia, com as mexidas respectivas; estou às voltas com editoras estrangeiras e tradutores; enfim – estou, como se diz, “pulando num pé só”!111

Quatro meses depois, no dia 6 de agosto, é eleito por unanimidade para ocupar a Cadeira n. 2 (cujo patrono é Álvares de Azevedo; o fundador, Coelho Ne-

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

fecção de polvilho na fazenda Pindaíbas, de seu amigo. Primeiras estórias, seu novo livro de contos, sai pela Livraria José Olympio Editora (180 p.), com capa e desenho do índice feitos por Luís Jardim (reproduzido nas “orelhas”): “Ficou um livrinho lindo, é o amarelinho”.110 Depois dos dois livros imensos de 1956 (do romance e das sete longas novelas de Corpo de baile), lançados no mesmo ano, com poucos meses de diferença, Rosa leva seis anos para publicar um novo livro – e, desta vez, com estórias curtas. São 21 contos, 15 já publicados em periódicos (O Globo, 1961; Senhor, 1962; Comentário, 1962) e seis inéditos (“Fatalidade”, “O espelho”, “Nada e a nossa condição”, “Luasde-mel”, “Darandina” e “Os cimos”). Com o título Nuits du sertão, é publicada na França a segunda parte de Corpo de baile.

Rosa participa de cerimônia de condecoração no Serviço de Demarcação de Fronteiras do Itamaraty (1963), cuja chefia assumiu no ano anterior 44

to). Decide convidar Afonso Arinos de Mello Franco para recebê-lo na cerimônia de posse – justamente o acadêmico que o havia derrotado na eleição de 1958: “Escolhi-o. O presidente da Academia designa, mas o que vai entrar é quem escolhe.”112 Rosa adia sua posse por quatro anos, até novembro de 1967, vindo a falecer três dias depois. Ao longo do ano, publica “Maior meu sirimim” (Diário Carioca, Rio de Janeiro, 21.07; republicado em Ave, palavra, 1970); republica “Um moço muito branco” (Brasil, n. 22, edição do Serpro da Embaixada do Brasil em Lisboa); e uma de suas cartas a Angel Crespo e Pilar Gómez Bedate sai na Revista de Cultura Brasilena (Madri, n. 7, dez.). Primeiras estórias é premiado pelo Pen Club Brasileiro. Rosa passa o ano de 1963 muito envolvido com a tradução italiana das sete novelas do Corpo de baile, trocando cartas extremamente minuciosas com Edoardo Bizzarri (correspondência publicada em 1972). Também escreve a Haroldo de Campos (Rio de Janeiro, 26.04.1963) comentando o artigo que ele havia publicado sobre “A linguagem do Iauaretê” no final do ano anterior (O Estado de S.Paulo, 22.12. 1962).113 Segundo o poeta concretista, que se encontrou algumas vezes com o escritor: [...] depois que terminava o expediente, Guimarães Rosa mudava de personalidade, e passava a falar dele próprio na terceira pessoa. Mas não por vaidade, era uma espécie de respeito que ele tinha, uma objetivação que ele fazia da sua própria obra. Ele dizia: “O Rosa faz


Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

de Milão, lança Corpo di ballo, com tradução, notas e glossário de Edoardo Bizzarri. No Brasil, essa obra, publicada em dois volumes em 1956 e republicada num único volume em 1960, é agora, na sua 3ª edição, dividida em três volumes autônomos, figurando “Corpo de baile” como subtítulo. Na sua correspondência com Edoardo Bizarri, Rosa justifica a divisão do Corpo de baile por motivos editoriais (o que já havia ocorrido na França, onde foi editado em 2 volumes autônomos, em 1961 e 1962):

Amado, “The place of Guimarães Rosa in Brazilian Literature” (Ne w York: Alfred A. Knopf ). O livro também é lançado no Canadá pela Random House (Toronto).

isso, o Rosa faz aquilo”. Então, ele falava: “Dizem que o Rosa é regionalista” – e dava uma risadinha típica dele. “Ah! Eu me divirto muito com isso... Porque dizem que eu fiz uma paisagem, um crepúsculo mineiro, e não é nada de crepúsculo mineiro, é um crepúsculo que eu vi na Holanda, misturei com umas coisas que eu vi em Hamburgo, com coisas de Minas, misturei tudo aquilo e joguei lá – e as pessoas dizem que eu estou fazendo uma cena do interior de Minas, e eu estou fazendo um omelete ecumênico. O Rosa é como uma ostra: projeta o estômago para fora, pega tudo que havia pegado, de todas as fontes possíveis, e introjeta de novo no estômago, mastiga tudo aquilo e produz o texto.” Isso eu achei uma explicação fantástica, eu nunca vi isso em parte alguma, e é a melhor explicação que eu conheço do estilo roseano, que incorpora todas as coisas.

Com o título Il duello, uma parte Sagarana é publicada na Itália, com “Il duello” e “L’ora e il momento di Augusto Matraga” – tradução de Edoardo Bizzarri e P. A. Jannini, que assina a apresentação (Milão: Nuova Accademia). The devil to pay in the backlands, versão anglófona de Grande sertão: veredas, é publicada nos Estados Unidos, com tradução de James L. Taylor e Harriet de Onís e prefácio de Jorge

45

Sairá, agora, no decurso de 1964, uma nova edição do “Corpo de baile” – a 3ª. A novidade é que ele vai ficar sendo em 3 volumes. Três livros, autônomos. A idéia já me viera, há tempos. Comecei por “vendê-la” aos editores na França e em Portugal, que se convenceram depressa das vantagens, e concordaram. E, por fim, consegui, facilmente, aliás, que o José Olympio também a esposasse. De fato, o “Corpo de baile” vinha sendo prejudicado pelo “gigantismo” físico. A 1ª. edição, em 2 volumes, unidos, pesava, já. Arranjamos então a 2ª. num volume só, mas que teve de ser de tipo minúsculo demais, composição cerrada. E o preço caro, além de não ficar o livro convidativo. Agora, pois, ele se tri-faz.115 Acervo do Última Hora/Arquivo do Estado de São Paulo

Edoardo Bizzarri, tradutor italiano de Guimarães Rosa

1964 O “Suplemento Literário” do jornal O Estado de S.Paulo publica “Fita verde no cabelo” (08.02) e “As garças” (22.02; que também sai na revista Cavalo Azul, São Paulo, n. 1), ambos republicados em Ave, palavra (1970). A convite de Enio Silveira (editor), Rosa aceita escrever “Os chapéus transeuntes” (sobre a soberba), o primeiro capítulo do livro Os sete pecados capitais (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira), que conta também com a colaboração de Otto Lara Resende (avareza), Carlos Heitor Cony (luxúria), Mário Donato (ira), Guilherme Figueiredo (gula), José Condé (inveja) e Lygia Fagundes Telles (preguiça), com capa de Eugênio Hirsh. “Os chapéus transeuntes” será republicado em Estas estórias (1969). No final de setembro, viaja novamente à Alemanha, convidado para participar da Semana Cultural Latino-Americana, em Berlim: “A editora (Kiepenheuer & Witsch) oferece recepção em Colônia pelo aparecimento do Grande sertão: veredas em alemão, agorinha mesmo lançado. ‘O livro ficou uma maravilha!’.”114 A editora alemã Kiepenheuer & Witsch (Colônia/Berlim) publica Grande sertão, tradução de Curt Meyer-Clason do romance de Rosa. Na Itália, a Feltrinelli,

Rosa entre gatos e livros, em seu escritório no Rio de Janeiro


nas os personagens principais de uma e outra”.116. Os outros dois volumes saem em 1965: No Urubuquaquá, no Pinhém (capa de Poty, de cor azul clara), com “O recado do morro”, “Cara-debronze” e “A estória de Lélio e Lina”; e Noites do sertão (capa de Poty, de cor encarnada ou “escarlato”), com “Dão-Lalalão” e “Buriti”. Os leitores de hoje conhecem o Corpo de baile tripartido, e com a “ordem primitiva das novelas” alterada. O que não deixa de ter conseqüências sobre a sua leitura, sobretudo sobre a apreensão do fio que une as sete novelas que, de fato, compõem um corpo de baile – apesar de todas as precauções do autor. Recentemente, e muito bem-vinda, foi lançada uma edição comemorativa dos 50 anos do livro, em 2 volumes, reproduzindo sua 1ª. edição (Nova Fronteira, 2006). Ainda em 1964, Campo geral é editado pela Sociedade dos Cem Bibliófilos do Brasil (Rio de Janeiro), com desenhos em cores de

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

Nessa mesma carta, revela ainda sua preocupação em preservar a unidade original do livro, mediante algumas “manhas”: Corpo de baile é mantido como subtítulo, entre parênteses, de cada um dos volumes, os quais possuem a mesma capa, com desenhos de Poty, variando apenas a cor; cada livro contém uma relação das obras do autor, com a explicação de que “A partir da 3ª edição, desdobra-se em 3 livros autônomos, e segue-se a indicação dos mesmos”. As epígrafes de Plotino e Ruysbroeck também são distribuídas pelos três: “cada um fica com uma, de cada [...] Esta é outra maneira de preservar a unidade. O livro ficará sendo em três livros distintos e um só verdadeiro...”. Em abril de 1964 sai o 1º. volume: Manuelzão e Miguilim, com “Campo geral” e “Uma estória de amor” (capa de Poty, de cor “grená-arroxeado ou bordeaux”): “As duas novelas mantêm seus respectivos títulos, o título do livro apanhando e ajuntando ape-

Guimarães Rosa em sua escrivaninha de trabalho em 1964, ano no qual adota a divisão em três volumes para Corpo de baile 46

Djanira (gravados por Darel, em cobre e linóleo) e tiragem de 120 exemplares. Com o título de Miguilim e Manuelzão, uma parte do Corpo de baile é publicada em Portugal (ed. Livros do Brasil). Após algumas conversas com Guimarães Rosa, os irmãos Geraldo e Renato Santos Pereira (roteiro e direção) filmam o romance Grande sertão: veredas, em Patos de Minas (MG). O diretor de cinema Roberto Santos também se encontra algumas vezes com Guimarães Rosa, no Rio de Janeiro, para discutir sua adaptação de “A hora e vez de Augusto Matraga” (Sagarana). O filme será rodado no início de 1965, na região de Diamantina (MG). 1965 Em janeiro, participa do Congresso Internacional de Escritores Latino-Americanos, realizado em Gênova (Itália): “Essas reuniões dão trabalho enorme, exigem esforço e vigilância constantes. Mas, é preciso. A gente tem de cumprir.”117 É criada a Sociedade de Escritores LatinoAmericanos: Rosa e Astúrias são eleitos vice-presidentes. Ungaretti, Murilo Mendes e Antonio Candido participam dos debates. Durante o Congresso, Rosa aceita ser entrevistado por Günter Lorenz, que havia escrito uma apresentação à tradução alemã de Grande sertão: veredas, recém lançada na Alemanha (1964): Eu perguntei se poderíamos fazer uma entrevista, e ele me disse que normalmente não, mas eu teria que prometer que não seria uma entrevista, porque entrevistas são estúpidas, as perguntas são feitas já se sabendo as respostas. Mas se fizéssemos uma conversação, aí


A publicação no Brasil desta famosa entrevista (“Diálogo com Guimarães Rosa”) somente ocorrerá em 1973 (Diálogo com a América Latina. São Paulo: Pedagógica e Universitária), após a morte do escritor (1967). Mas já havia saído em Buenos Aires, em março de 1970 (Mundo Nuevo). Ainda em Gênova, junto com o evento literário, também ocorre um Congresso sobre o Cinema Novo brasileiro (no ano anterior, Deus e o diabo na terra do sol havia brilhado na Europa, exibido no festival de Cannes), que reúne cineastas como Glauber Rocha, Cacá Diegues e Paulo Cezar Sarraceni. A estética da fome, texto-manifesto recém escrito por Glauber, é apresentado no Congresso. Gênova é palco de muitos encontros e debates entre escritores e cineastas. O evangelho segundo São Mateus, de Pasolini, que acaba de sair nos cinemas, é tema de uma das conversas de Rosa com Glauber e seus colegas, na qual ele revela estar preparando uma novela com transposição do episódio de Pilates. Glauber e Rosa nutrem uma admiração mútua e se encontram algumas vezes no

Rio de Janeiro. Durante a filmagem de Terra em transe, Rosa chega a mandar um recado a Glauber, dizendo que “Deus está no detalhe”.119 Em maio, Rosa começa a publicar pequenos contos no jornal de médicos Pulso, do Rio de Janeiro (editado pelo Laboratório de Sydney Ross; dirigido pelo doutor Roberto de Souza Coelho), que circula entre médicos do Brasil inteiro, e onde Drummond também colabora.120 Os dois se revezam na mesma coluna: “Numa semana sai um artigo meu, na outra um de Carlos Drummond de Andrade. Acho o conto um excelente exercício de despojamento. Cada palavra tem de ser justa como num bordado delicado.”121 Durante cerca de dois anos, até julho de 1967, Rosa vai publicar 56 contos de página e meia no Pulso, 44 dos quais serão posteriormente reunidos para compor Tutaméia, lançado em 1967. Em 1965, entre maio e dezembro, envia 17 pequenos contos para o jornal Pulso: 14 deles serão posteriormente republicadas em Tutaméia (1967): “A escova e a dúvida” (Pulso, 15.05); “Desenredo” (29.05); “Orientação” (26.6); “Tapiiraiauara” (10.07); “Uai, eu?” (07.08); “João Porém, o criador de perus” (21.08); “Tresaventura” (04.09); “Azo de almirante” (18.09); “Hiato” (02.10); “O outro ou o outro” (16.10); “No prosseguir” (13.11); “Como ataca a sucuri” (27.11); “A vela ao diabo” (11.12); “Presepe” (25.12). Três serão republicadas em Ave, palavra (1970): “O porco e seu espírito” (Pulso, 12.06); 47

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

sim ele estaria disposto, pois o que eu havia escrito sobre seu livro [GSV] lhe pareceu muito bom e muito agradável. E como era um congresso organizado por italianos, tivemos tempo. Quando começou a palestra sobre opiniões políticas, e como ele não gostava do assunto, nos retiramos e fomos para um quarto e começamos a falar. Falamos por horas, algo em torno de 6 a 8 horas, e no final estávamos falando de metafísica, das estepes; ele citou toda a literatura mundial, quase sempre no idioma original. Foi fascinante.118

Rosa na década de 1960, em que proliferam adaptações e traduções de sua obra

“Sem tangência” (24.07); “Quemadmodum” (30.10). Ainda em 1965, Rosa escreve um breve comentário sobre o romance Serras azuis, de seu amigo Geraldo França de Lima, que é publicado na orelha do livro (Rio de Janeiro: Edições GRD). Em junho, o jornal Última Hora (20.06.1965) publica uma “Breve conversa sobre Guimarães Rosa”, onde dona Aracy revela alguns hábitos do escritor: Joãozinho quando escreve vive numa febre, numa exaltação, num deslumbramento. Quando termina um livro, sente-se aliviado, mas mal acaba de entregar os originais ao editor, já começa a pensar num próximo. Não pára nunca. Em casa está sempre lendo, escrevendo, estudando todo o tempo. [gosta de] comer bolo e tomar café frio, quando escreve. Andar em fazendas. Uma vez acompanhou uma boiada. Andar de ônibus, de olhos fechados, meditando durante o trajeto. Aos domingos, de ônibus, costuma ir para longe, Usina, Jacarepaguá. Gosta ainda de viajar pelo Brasil, que conhece muito bem, e de ficar em casa, deitado numa rede, olhando o mar do Ar-


Rosa tinha o costume de voltar de ônibus para casa, na linha Estrada-de-Ferro/Forte de Copacabana. Vez por outra, era acompanhado por Oswaldino Marques, e, durante o percurso, a conversa girava sobre os assuntos do dia, quase nunca sobre literatura. Nos trechos em que o tráfego ronceava um pouco e o barulho era ensurdecedor, ele às vezes tirava a caneta do bolso e, num retalho de papel, punha-se a combinar e a recombinar as letras que, invertidas, transcoavam do vidro do pára-brisa do veículo, onde estava escrito o itinerário. Quando lograva uma invenção original, curiosa, mostrava-ma e, os olhos esfuzilando por trás das lentes espessas, abria-se numa risada juvenil, como um colegial a jactar-se de suas habilidades.122

Acervo de Vilma Guimarães Rosa

Grande sertão: veredas é traduzido na França, sob o título Diadorim – Le diable dans la rue, au milieu du tourbillon, por J.-J. Villard (Paris: Albin Michel). Em junho, estréia no Rio de Ja-

Com Vilma e os netos Laura Beatriz e João Emílio no Iate Clube carioca (1966)

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

poador, daqui da varanda. [não gosta de] grã-finagem e vida social intensa, o que não quer dizer que não saiamos esporadicamente.

O escritor com os pais e a filha Vilma, em 1966, ano em que o filme A hora e a vez de Augusto Matraga representa o Brasil no Festival de Cannes

neiro o filme Grande sertão: veredas, dos irmãos Geraldo e Renato Santos Pereira. Filmado por Roberto Santos (direção e roteiro), com diálogos adicionais de Gianfrancesco Guarnieri e música de Geraldo Vandré, A hora e a vez de Augusto Matraga é exibido para Guimarães Rosa em sessão privada, num clima de tensão, porque o escritor não havia gostado do filme dos irmãos Santos – uma espécie de “western estereotipado”. No final da projeção, Rosa teria exclamado em voz alta: “Estamos vingados!” A adaptação do Matraga “foi aprovada com louvor e ele considerou que as mudanças introduzidas por Roberto, inclusive a alteração no final da história, estavam perfeitas, não alteravam o sentido e isso era o que contava [...] considerava, sim, a fidelidade ao clima da história, ao sentido básico do conto, aos sertões”.123 No mês de novem48

bro, em Brasília, ocorre a primeira exibição pública de Matraga, na Primeira Semana do Cinema Brasileiro (futuro Festival de Cinema de Brasília). O filme ganha 5 prêmios: melhor filme, roteiro, diálogo, música, intérprete masculino. 1966 No dia 10 de março, A hora e a vez de Augusto Matraga estréia em São Paulo. O filme é tão bem recebido pela crítica que é escolhido pelo Itamaraty para representar o Brasil no Festival de Cannes, em maio de 1966, onde recebe elogios mas não ganha nenhum prêmio. Em abril, em entrevista concedida a Fernando Camacho (Rio de Janeiro), Rosa discorre sobre o tema da saudade, que o leva sempre de volta ao sertão de sua infância, destacando sua vontade de “recuperar e preservar sob forma artística” esse mundo que lhe é tão familiar:


Sagarana foi concebido em uma época em que eu era mais extrovertido. Eu era mais moço, foi escrito em 1937. As Primeiras estórias foram escritas em 1960, 1961, 62... 24 anos depois. Já há aqui uma diferença, você compreendeu? Em Sagarana eu era moço, voltado para fora. Tinha vindo de Minas e tinha saudades de Minas, extrovertia-me e, paradoxalmente, minha obra era uma recuperação de um interior perdido lá de Minas. Quando eu morava nesse interior, não pensava em escrever, nem tomar notas. Eu queria ir para o estrangeiro, queria viajar. Depois fiz concurso, vim para o Itamaraty, e quando cheguei aqui, vi que estava segurada esta parte. Então a saudade de lá me puxou e escrevi Sagarana, que é um livro voltado para o ambiente dessa coisa de lá, de Minas, de saudade [...] para mostrar o cenário da minha infância, para recuperar e preservar esse mundo sob a forma artística [...] no fundo, Sagarana era para mostrar Minas às pessoas. Uma mistura: mostrar as Minas e mostrar também como eu via o mundo.124

[...] ele começou a dizer uma coisa que me espantou muito, porque as pessoas diziam que o Rosa era conservador, um embaixador do Itamaraty... Ele começou a me falar do fascismo: “– Você não sabe mas o fascismo é o Demo. Porque eu sei, eu estive lá e eu sei que

De volta ao Rio, Rosa escreve “Dezesseis vezes Minas Gerais” (21.09), que será publicado como prefácio do livro O segredo de sinhá Ernestina, de Eduardo Canabrava Barreiros (Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1967). Em outubro, responde por carta a um questionário feito por Lenice, sua jovem prima, estudante em Curvelo (MG), explicitando o leque de seu universo lingüístico:

Falo: português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano, esperanto, um pouco de russo; leio: sueco, holandês, latim e grego (mas com dicionário agarrado); entendo alguns dialetos alemães; estudei a gramática: do húngaro, do árabe, do sânscrito, do lituânio, do polonês, do tupi, do hebraico, do japonês, do tcheco, do finlandês, do dinamarquês; bisbilhotei um pouco a respeito de outras. MAS, TUDO MAL. Eu acho que estudar o espírito e o mecanismo das outras línguas ajuda muito a compreensão mais aprofundada do idioma nacional. Principalmente, porém, estudo-as por divertimento, gosto, distração.126

Segundo Otto Lara Resende, um pouco antes de morrer, “os olhos claros rindo quase fechados, Rosa me confidenciou que estava estudando o vietnamês arcaico, não por causa da guerra do Vietnã, mas para conhecer a rica literatura vietnamita antiga”.127 Ainda na carta a Lenice, o escritor revela qual o seu livro preferido: A gente sempre gosta mais de um livro futuro, que se pensa ainda escrever. De

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

Em junho, Rosa participa do 34º Congresso Internacional do Pen Club, em Nova York. Arthur Miller preside o Congresso, que conta também com a participação de vários escritores latino-americanos, como Carlos Fuentes, Mario Vargas Llosa125, Victoria Ocampo, Emir Rodriguez Monegal e Pablo Neruda, que estava proibido de entrar nos EUA por motivos políticos. Durante um encontro de confraternização, Haroldo de Campos, também presente no Congresso, conversa longamente com Guimarães Rosa:

é o Demo. Eu tive que lidar com alemães para proteger refugiados judeus... e não dou mais detalhes.” E eu fiquei espantado, porque não sabia daquela história toda, e depois eu vim a conhecer o fato real, de depoimentos, e, de fato, ele teve um papel de grande bravura pessoal e de grande bravura ética – eu acho que ele era cônsul do Brasil em Hamburgo –, dando respaldo a judeus que queriam fugir da Alemanha nazista. O que é muito bonito do ponto de vista ético e desmente aquela imagem de um Rosa ausente, protocolar, ligado mais àquelas pompas de embaixador. E, de fato, ele era um homem de grande vivência humana.

Rosa em seu escritório de Copacabana nos anos 1960, período em que produz várias narrativas curtas publicadas em periódicos cariocas 49


Acervo da família Tess

Sagarana. A cycle of stories, com tradução de Harriet de Onís e introdução de Franklin de Oliveira (“The epigraphs in Sagarana”), é publicado em Nova York pela Alfred A. Knopf. Desse volume há uma separata do conto “Augusto Matraga’s hour and turn”. O conto “A terceira margem do rio” (Primeiras estórias) é publicado na Tchecoslováquia, em tradução de Pavla Lidmilova (Praga: Svetová Literatura). Corpo de baile é integralmente publicado na Alemanha, sob o título Corps de Ballet, tradução de Curt Meyer-Clason, pela Kiepenheuer & Witsch – que também lança uma segunda edição de Grande sertão. Sagarana sai no Canadá pela Random House.

Guimarães Rosa no Rio de Janeiro em 1967, ano em que é encarregado da reformulação do serviço cultural do Itamaraty

Ainda que faça algumas revelações pessoais, Rosa aconselha Lenice e suas jovens colegas a se preocuparem mais com a obra do que com o autor: “Os livros, em si, é que são importantes. Os autores, não. O autor é uma sombra, a serviço de coisas mais altas, que às vezes ele nem entende”. Em cerimônia pública, recebe do governador Israel Pinheiro a Medalha da Inconfidência. No dia 2 de dezembro, recebe a Condecoração da Ordem de Rio Branco. Entre janeiro e dezembro de 1966, publica 26 pequenos contos no jornal Pulso (Rio de Janeiro): 24 deles serão posteriormen-

te republicados em Tutaméia (1967): “Antiperipléia” (Pulso, 22.01); “Arroio-das-Antas” (05.02); “Umas formas” (19.02); “Se eu seria personagem” (05.03); “Sota e Barla” (19.03); “Grande Gedeão” (02.04); “Reminisção” (16.04); “Intruje-se” (30.04); “Lá, nas campinas” (14.05); “Barra da vaca” (28.05); “Retrato de cavalo” (11.06); “Estoriinha” (25.06); “Curtamão” (09.07); “Rebimba, o bom” (23.07); “Quadrinho de estória” (06.08); “Ripuária” (20.08); “esses Lopes” (03.09; republicado na revista Manchete, Rio de Janeiro, 03.08. 1967); “Estória n. 3” (17.09); “Sinhá Secada” (01.10); “Os três homens e o boi dos três homens que inventaram um boi” (15.10); “Zingarêsca” (29.10); “Vida ensinada” (12.11); “Faraó e a água do rio” (26.11); “Droenha” (10.12). Dois serão republicados em Ave, palavra (1970): “Cartas na mesa” (Pulso, 08.01); “Nascimento” (24.12). 50

1967 Em janeiro, Rosa viaja a Manaus para participar de uma reunião de embaixadores. Passa uma semana no hotel Amazonas, “avistando do quarto o belíssimo rio Negro”: Acervo de Vilma Guimarães Rosa

qualquer modo, entretanto, posso dizer sinceramente que, de tudo o que escrevi, gosto mais é da estória do Miguilim (o título é “Campo geral”), do livro Corpo de baile. Por quê? Porque ela é mais forte que o autor, sempre me emociona; eu choro, cada vez que a releio, mesmo para rever as provas tipográficas. Mas, o porquê, mesmo, a gente não sabe, são mistérios do mundo afetivo.

As netas Maria Cristina e Maria de Lourdes, filhas de Agnes (1967)


Janeiro, n. 3, set. 1967); e, em outubro, como membro do Conselho Federal de Cultura, elabora pronunciamento sobre o novo acordo ortográfico.129 Integra a comissão julgadora do II Concurso Nacional de Romance Walmap, ao lado de Jorge Amado e Antônio Olinto (Capela dos homens, romance de Benito Barreto, ganha o primeiro lugar). Rosa aceita a sugestão de Edoardo Bizzarri de publicar as cartas que trocaram durante sua tradução do Corpo de baile, e planeja ir a São Paulo no mês de outubro para encontrá-lo, junto com o bibliófilo José Mindlin, e combinarem detalhes da edição do livro. Encontro que acaba não ocorrendo,

Em março, Rosa representa o Brasil no II Congresso LatinoAmericano de Escritores, realizado na Cidade do México, onde atua como vice-presidente. Diante das críticas feitas pelos delegados de Cuba e do Panamá ao governo dos Estados Unidos, assume sua posição de diplomata brasileiro e renuncia ao cargo. “Emoción del Brasil”, seu discurso como vice-presidente do Congresso, é publicado em El Despertar Americano (Boletim informativo do Congresso, México, v. 1, n. 2, maio 1967). Em maio, em carta a Pedro Barbosa (Rio de Janeiro, 30.05), comenta com o amigo que tem “trabalhado cada vez mais, dou um duro que Você nem imagina. Além das fronteiras, e da literatura, faço parte agora do Conselho Federal de Cultura, e presido a comissão encarregada de remodelar os serviços culturais do Itamaraty.” É assim que, em setembro, escreve um “Parecer sobre a unificação da ortografia portuguesa” (Revista Cultura, Rio de

mas sim a publicação da correspondência, em 1972, pelo Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro. Entre janeiro e julho de 1967, publica 13 pequenos contos no jornal Pulso (Rio de Janeiro): – seis deles serão posteriormente republicados em Ave, palavra (1970): “Zôo (Whipsnade Park, Londres)” (Pulso, 07.01); “Aquário” (18.02); “Zôo (Rio, Quinta da Boa Vista)” (01.04); “Zôo (Hagenbecks Tierpark, Hamburgo-Stellingen)” (29.04; já havia sido publicado em O Globo, 11.03.1961); “Os abismos e os astros” (27.05); “Reboldra” (10.06). – seis serão republicados em Tutaméia (1967): “Mecheú” (Pulso, 21.01); “Palhaço da boca verde”

Acervo da família Tess

Desci de lancha até ao encontro-daságuas, confluência do Negro com Solimões – os botos pulando fora d’água, aquela beleza toda, Você viu, daí subimos o Solimões [...] Outro dia, em lancha menor, entrei pelo “Paraná” [...] maravilha, macacos pulando nas árvores, as jaçanãs em quantidades, tudo. Vi a Ponte-Negra. O igarapé Tarumã, a estrada para Itacoatiara, o museuzinho das irmãs Salesianas que têm missões no Alto Rio Negro [...] o Tapajós é o mais belo rio amazônico. Comi tartaruga de todo jeito, e detestei; comi paca moqueada, pato ao tucupi, tacacá, pirarucu fresco, tucunaré, e mais porção de peixes, ótimos. Tomei assaí, pupunha, rala-rala de Taperebá, graviola, cupuassu (o creme ou mousse de cupuassu é delícia).128

O presidente Juscelino Kubitschek com Guimarães Rosa na cerimônia de posse do escritor na Academia Brasileira de Letras (1967) 51


Mas aos amigos comunico, principalmente, que os 24 meses de colaboração deram livro: Tutaméia/Terceiras estórias, em véspera de sair, pela Livraria José Olympio Editora, compreendendo 40 contos – dos quais um apenas não estampado prévio nesta coluna – mais 4 “Prefácios” do autor. Sem desmodéstia, declaro-me com ele satisfeito. Gostaria que o lessem: os já favoráveis e os ainda contrários; seja porque são médicos, e, pois, de minha natural estima; não faço aqui anuncio comercial. Tenho é sincera a confiança em que, muitos, com a moda minha de linguagem toquem de bem. Além de alguns retoques, mínimos mas utilíssimos a título de “facilitário”, já de si a coisa, em páginas, fica mais descomprimida e clara menos travada. Sempre é tempo para a boa-vontade de se reexperimentar. Digo, devo ao convite de Pulso a realização da obra. Para minha especial sorte: porquanto os temas de alguns dos contos andavam-me sem solução na

Acervo da família Tess

(04.02); “Sobre os planaltos” (04.03) e “Caderno do Zito” (18.03), ambos incorporados no item VII do prefácio “Sobre a escova e a dúvida”; “Inteireza/incessância” (15.04; incorporado no item II de “Sobre a escova e a dúvida”); “Trastempo” (22.04; incorporado no item III). – Um não foi republicado: “Rogo e aceno” (29.07) – uma “semidespedida” ao encerrar sua colaboração em Pulso, onde informa aos leitores que: “[...] um de nossos quinzenais continhos – ‘Nascimento’ (de 24.12.1966) – foi já traduzido, na Itália, para publicação em revista; e o ‘Estória n. 3’ (de 17.09.66) ora negocia-se, na Broadway, a fim de cabível adaptação em filme ou ‘musical’.” E anuncia a publicação de seu novo livro, Tutaméia, que reúne uma boa parte dos contos publicados no jornal:

Guimarães Rosa assina o livro de posse da ABL no dia 16 de novembro, quatro anos depois de eleito cabeça, uns há cerca de 20 anos; até que, só nesta forma curta, forçada pela limitação de espaço, encontraram como compor-se. [...] Fazendo outro pedido ainda: que é quanto ao título do livro, a palavra mesma “TUTAMÉIA”. Se bem os dicionários dêem apenas “tuta-e-meia”, sempre e desde menino em Minas ouvi só falar “tutaméia” – correndo por ninharia, no-nada, um quase-nada, bagatela. Mas, como vale a pena conhecer a ocorrência e forma do termo, nas diversas áreas do país, e os colegas e assinantes de Pulso situam-se felizmente em todos os pontos do território nacional, pergunto se quer alguém cordialmente a esse respeito informar-me. E: vivos votos. Tolerem-me a meia palavra desta semi-despedida. Obrigado. Guimarães Rosa

É assim que, em julho de 1967, cinco anos depois de Primeiras 52

estórias, publica Tutaméia (Terceiras estórias), seu último livro (Livraria José Olympio Editora, 194 pp. Capa de Luís Jardim), com dois índices diferentes, quatro inusitados prefácios e 40 contos (republicação de 44 pequenos contos que haviam saído no jornal Pulso, entre 1965-1967). Num encontro com Benedito Nunes, em seu escritório no Itamaraty, ao ser indagado acerca das “segundas” estórias, o escritor se mostra bastante evasivo e enigmático: Já tinham saído as Primeiras, então, eu perguntei: “– E as segundas? Essas são as terceiras!” E ele disse: “– Ah, isso é um mistério que eu não posso revelar!” E então ficou no domínio do segredo, do secreto, do oculto...130


Rio de Janeiro, 03.08.1967; incluído em Tutaméia). No dia 16 de novembro, quatro anos depois de eleito, toma posse na Academia Brasileira de Letras. É recebido pelo acadêmico Afonso Arinos de Melo Franco. Escrito, como de praxe, em homenagem a seu antecessor, “O verbo e o logos”, seu discurso de posse, não por acaso inicia e termina com a palavra “Cordisburgo” – referência explícita à sua cidade natal e também uma brincadeira com a forma carinhosa como João Neves o cha-

mava: “– Vamos ver o que diz Cordisburgo...”. O discurso se encerra com “– Ministro, está aqui CORDISBURGO”, a última frase pronunciada em público pelo escritor. No dia 19 de novembro, domingo, três dias depois da posse na ABL, Guimarães Rosa falece em sua residência em Copacabana, às 20h45, vítima de enfarte, com 59 anos de idade. À meianoite, seu corpo é levado para a ABL, para ser velado no Salão dos Poetas Românticos, no Petit Trianon. No dia seguinte, às

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

Ainda no mês de julho, Boi de carro, uma adaptação do conto “Conversa de bois” (Sagarana) feita pelo Teatro Chique-Chique, é apresentada durante o II Festival de Marionetes e Fantoches da Guanabara. Nos meses seguintes, Rosa publica uma “Nota sobre o autor” (na 1ª. orelha do livro Nordeste, de Gilberto Freyre. 4. ed. Livraria José Olympio Editora); e “Duas palavras de JGR”, sobre direitos autorais (O Globo, Rio de Janeiro, 20.09); e republica “Esses Lopes” (Pulso, 03.09.1966; Manchete,

Guimarães Rosa em seu escritório; o discurso proferido na ABL três dias antes de sua morte começa e acaba com a palavra “Cordisburgo” 53


Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

18h, é sepultado na urna número 13 do Mausoléu da ABL, no cemitério São João Batista (Rio de Janeiro).131 O escritor é enterrado com seus óculos de míope, como havia solicitado a familiares e amigos. Sua morte, três dias depois de tomar posse na Academia, causou grande impacto e até hoje provoca especulações acerca dos quatro anos que levou para efetivar sua eleição. Segundo Madu, no início de 1967, Guimarães Rosa anunciou que “esse ano vou só trabalhar e rezar”: “Foi o que ele fez o ano inteiro. Parece que estava se preparando, não sei, foi uma coisa estranha, ele teve uma premonição da morte.” “O Verbo e o logos” é publicado logo depois de sua morte, em jornais do Rio de Janeiro (Correio da Manhã, 25.11; Jornal do Commercio, 26.11; republicado no livro Em memória de JGR, ed. José Olympio, 1968). O que Rosa escreve sobre João Neves parece um anúncio de seu próprio destino: “A gente morre é para provar que viveu. Só o epitáfio é fórmula lapidar.” Um dia depois do enterro, em sua homenagem, Carlos Drummond de Andrade escreve o poema “Um chamado João”, que se encerra com “Ficamos sem saber o que era João/ e se João existiu/ de se pegar.” Após a sua morte, no final de 1967, “Os irmãos Dagobé”, de Primeiras estórias, é republicado no Suplemento Literário de Minas Gerais (Belo Horizonte, 25.11); “Remimento”, no Correio da Manhã (Rio de Janeiro,

25.11); a “Carta ao cônsul Cabral” (onde todas as palavras começam com a letra “c”), no Jornal da Tarde (São Paulo, 25.11); “Viver é muito perigoso...”, no Suplemento Literário de Minas Gerais (Belo Horizonte, 25.11); “Oração aos novos”, no Diário de Notícias (Rio de Janeiro, 26.11); “Poemas de Natal” (“Das pastorinhas” e “Quatro poemas sobre o burro e o boi no presépio”), na revista Realidade (São Paulo, dezembro; republicados em Relembramentos, 1983, pp. 267-268). Com o título de Gran sertón: veredas, o romance é publicado na Espanha, com tradução, notas e glossário de Angel Crespo (Barcelona: Seix Barral).

O BRA

PÓSTUMA

• Estas estórias, 1969, 236 p. Capa de Poty. “Nota introdutória” de Paulo Rónai (Rio de Janeiro, 14.11.1968). “Apenas saudade”, de Vilma Guimarães Rosa (Rio 54

de Janeiro, mar./1969). Nota crítica de Leo Gilson Ribeiro (nas orelhas do livro). As edições subseqüentes reproduzem esta. Em 1969, a Livraria José Olympio Editora lança Estas estórias, com oito “novelas ou contos longos” e uma “entrevista-retrato” (“Com o vaqueiro Mariano”, já publicada em 1947-1948 e 1952). Segundo Paulo Rónai, que preparou a edição com o auxílio de dona Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu), “nos papéis do escritor foram encontrados vários esboços dos índices deste volume”, e “foram também encontradas as oito novelas constantes de um desses índices” – quatro já publicadas (e retrabalhadas): “A simples e exata estória do burrinho do comandante” (1960), “Meu tio o Iauaretê” (1961) e “A estória do homem do Pinguelo” (1962), na revista Senhor; “Os chapéus transeuntes” (soberba), no livro Os sete pecados capitais (1964); quatro inéditas (datilografadas, “às quais só faltou uma última revisão do Autor”): “Páramo”, “Bicho mau”, “Retábulo de São Nunca” e “O dar das pedras brilhantes” (um fragmento desta última havia saído na revista Manchete, numa entrevista feita por Pedro Bloch). Nos vários índices deixados por Rosa, aparecem alguns títulos diferentes, “mas, das obras a que esses títulos se referem, só de uma, ‘Remimento’, foi encontrado um fragmento” (publicado no Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 25.11.1967, logo após a sua morte). • Ave, palavra, 1970, 274 pp. Ca-


pa de Gian. “Nota introdutória” de Paulo Rónai (Rio de Janeiro, 27.06.1970). Em 1970, a Livraria José Olympio Editora lança Ave, palavra. Segundo Paulo Rónai, que também preparou esta edição com o auxílio de dona Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu), o livro é uma “miscelânea”, que reúne 54 peças bastante variadas, muitas delas já publicadas em periódicos, entre 1957-1967: notas de viagem,

diários, poesias, contos, flagrantes, reportagens poéticas, meditações, poemas dramáticos e textos filosóficos. Uma boa parte das peças que compõem Ave, palavra foi produzida a partir das viagens do escritor e durante o período de elaboração dos livros de 1956. • Ave, palavra, 2ª edição (texto definitivo), 1978, 248 pp. Capa de Gian. “Nota da primeira edição” (Rio de Janeiro, 27.06.1970.) e

“Advertência da segunda edição” (Rio de Janeiro, 09.09.1976, 1 p.) de Paulo Rónai. As edições subseqüentes reproduzem esta, que inclui algumas correções (erros tipográficos), algumas variantes assinaladas pelo autor, mudança na disposição tipográfica de algumas peças e alterações na ordem de algumas delas, bem como a supressão das datas originais de publicação. • Magma. 1997. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.

Ana Luiza Martins Costa é autora de João Guimarães Rosa: viator, tese de doutorado em literatura comparada (Uerj, 2002), além de numerosos ensaios e alguns filmes sobre o escritor. Pesquisadora visitante da Fundação Casa de Rui Barbosa (RJ), com Bolsa RD/CNPq (2003-2005), atualmente é pesquisadora da Biblioteca Nacional (2006-2007).

NOTAS 1 “Carta de JGR a Curt Meyer-Clason”. Apud MEYER-CLASON, Curt. “Guimarães Rosa”. Conferência pronunciada no Goethe Institut de Belo Horizonte, 24.10.1968. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.11.1968, p. 7. 2 GUIMARÃES, Vicente. Joãozito: infância de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio/MEC, 1972. Vicente Guimarães era tio materno de JGR, apenas dois anos mais velho que ele, autor de livros infantis, conhecido como “Vovô Felício”. É em Joãozito que temos o relato mais detalhado da infância de JGR em Cordisburgo. 3 WERNECK, Humberto. “Dona Chiquita: as primeiras estórias de Guimarães Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.11.1968, p. 3. Entrevista com a mãe de JGR. 4 Entrevista com José Luís, irmão de JGR, para o documentário Os nomes do Rosa (direção de Pedro Bial; roteiro e pesquisa de Ana Luiza Martins Costa e Raul Soares. GNT, 1997), realizada em Belo Horizonte, em março de 1997. 5 Entrevista com Dora, irmã de JGR, para o documentário Os nomes do Rosa, realizada em Belo Horizonte, em março de 1997. 6 WERNECK, Humberto. Op. cit. 7 GUIMARÃES, Vicente. Op. cit. Na Biblioteca Pessoal de JGR, do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB/USP), encontrei um desses canudinhos de papel entre as páginas de um livro de Mário de Andrade. Agradeço a atenção de Maria Itália Causin, responsável pela Biblioteca do IEB. 8 Relato do doutor Pedro Moreira Barbosa, relembrando o tempo em que foram “colegas de pensão” em Belo Horizonte, na década de 1920. Entrevista para o documentário Os nomes do Rosa, realizada na fazenda Pindaíbas, em Paraopeba, Minas Gerais, de sua propriedade, em 09.10.1996. 9 WERNECK, Humberto. Op. cit. 10 GUIMARÃES ROSA, Vilma. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983, p. 51. 11 A correspondência JGR-Pedro Moreira Barbosa, que abrange o período de 1934-1967, foi consultada no Museu Casa Guimarães Rosa (Cordisburgo, MG). Agradeço a atenção do coordenador do museu, Ronaldo Alves de Oliveira, e também a José Osvaldo dos Santos (Brasinha). 12 “Carta de JGR a Lenice”, Rio de Janeiro, 19.10.1966. Apud GUIMARÃES, Vicente. Op. cit., p. 172. Estudante de um colégio em Curvelo (MG), Lenice é prima de JGR. 13 GUIMARÃES ROSA, Agnes. “Lembranças de ‘João Papai Beleza’” (entrevista). Revista do Livro da Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, n. 45, 2003, p. 11. 14 Como JGR confidencia a Paulo Dantas (Rio de Janeiro, 10.08.1957): “um filho de Sancho Ribas […] colega meu no colégio interno, foi um dos que me descreveram a invasão de São Francisco pelos jagunços; dois filhos do coronel Caciquinho, também. A vida é vária e comprida”. In: Sagarana emotiva: cartas de J. Guimarães Rosa. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1975, p. 71. 15 Relato de dona Eni Lima Guimarães, de Curvelo, filha do doutor João Lima Guimarães, tio materno de JGR, para o documentário Os nomes do Rosa, realizada em Morro da Garça (MG), em março de 1997. 16 GUIMARÃES ROSA, Vilma. Op. cit., p. 54. 17 RESENDE, Otto Lara. “Depoimento sobre JGR”. Revista D’, São Paulo, 24.11.1991. 18 LIMA, Geraldo França de. “Meu amigo Guimarães Rosa”. Revista do Livro. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, n. 45, 2003, p. 21. 19 Relato de seu tio Vicente, que assistiu aos exames orais. Ver GUIMARÃES, Vicente. Op. cit., p. 93. 20 “Carta de JGR a sua esposa Lygia”, Barbacena, 07.07.1934. Consultada no Arquivo Museu de Literatura Brasileira da Fundação Casa de Rui Barbosa. 21 “Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Rio de Janeiro, 13.08.1934. 22 “Carta de JGR a Edoardo Bizzarri”, Rio de Janeiro, 25.02.1964. In J. Guimarães Rosa: correspondência com o tradutor italiano (1962-1967). São Paulo: Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro, 1972.

55


23 “Carta de JGR a João Condé”. A Manhã, suplemento “Letras e Artes”, Rio de Janeiro, 21.07.1946. Republicada em GUIMARÃES ROSA, Vilma. Op. cit., pp. 333-334. 24 RAMOS, Graciliano. “Conversa de bastidores”. In: VÁRIOS AUTORES. Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, pp. 38-45. Depoimento publicado originalmente na revista A Casa (junho de 1946), logo após o lançamento de Sagarana (abril de 1946), e republicado em vários jornais da época. 25 “Carta de JGR a seu tio Vicente”, Hamburgo, 03.06.1939. In GUIMARÃES, Vicente. Op. cit., p. 159. 26 “Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Hamburgo, 20.05.1939. 27 “Diário em Hamburgo”. Fotocópia consultada no Acervo Henriqueta Lisboa do Acervo de Escritores Mineiros (Fale/BU/UFMG). A versão original do diário ainda não foi localizada. Agradeço a atenção de Eneida Maria de Souza, Wander Melo Miranda e Reinaldo Marques, responsáveis pelo AEM. 28 Esse conto será excluído de Sagarana. Ainda que possua título semelhante ao da novela “Uma estória de amor (Festa de Manuelzão)” (publicada em 1956, em Corpo de baile), o conteúdo não é o mesmo. 29 LEITE, Ascendino. “Arte e céu, países de primeira necessidade”. O Jornal, Rio de Janeiro, 26.05.1946. Entrevista com JGR republicada em LIMA, Sônia Maria van Dijck (org.). Ascendino Leite entrevista Guimarães Rosa. João Pessoa: UFPB, 1997. Foi Graciliano Ramos (Op. cit.) quem chamou o autor de Sagarana de “animalista notável”. 30 Cf. as seguintes entrevistas realizadas para o documentário Os nomes do Rosa: relato de dona Margarida Levy (São Paulo, 25.11.1996), que conseguiu fugir da Alemanha nazista graças à ajuda do casal; Franklin de Oliveira (Rio de Janeiro, nov. 1996); J. J. Veiga e sua esposa Clélia (Rio de Janeiro, 27.02.1997). Eva Rónai (Rio de Janeiro, nov. 1996) e Nora Rónai (Rio de Janeiro, nov. 1996) também descrevem episódios semelhantes. Em abril de 1985, JGR e dona Aracy foram homenageados em Israel “por sua atuação durante a Segunda Guerra em defesa do povo judeu”. 31 Entrevista com Cícero Dias para o documentário Os nomes do Rosa, realizada em Paris, em fevereiro de 1997. 32 Entrevista para o documentário Os nomes do Rosa, realizada em São Paulo, em novembro de 1996. 33 Ver GUIMARÃES, André. “100 dias em Baden-Baden”. ADB – Boletim da Associação dos Diplomatas Brasileiros. Brasília, setembro de 1993, pp. 3-4. 34 É o que JGR registra em seu “Diário em Paris” (1948-1951), consultado em seu Arquivo (Fundo João Guimarães Rosa), no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB/USP). Agradeço a atenção de Maria Neuma Cavalcanti, Maria Izilda Claro do Nascimento, Maria Cecília Ferraz de Castro Cardoso e Elizabeth Ziani, responsáveis pelo Arquivo JGR. 35 Entrevista com Cícero Dias para o documentário Os nomes do Rosa. Quando Cícero consegue sair de Baden-Baden, retorna clandestinamente à França, depois vai para Lisboa, voltando a viver em Paris somente após 1945. 36 CAVALCANTI, Gilberto. “Breve conversa sobre Guimarães Rosa” (Entrevista com dona Aracy Moebius de Carvalho)”. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 20.06.1965. 37 Segundo o organizador de Estas estórias, Rosa não chegou a dar a “última demão” em “Páramo”, apenas mandou datilografá-la junto com outras novelas do livro (RÓNAI, Paulo. “Nota introdutória”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969, p. XIV; p.160). 38 “Carta de JGR a João Condé”. In: GUIMARÃES ROSA, Vilma. Op. cit., p. 334. 39 Idem. “Carta de JGR ao pai”, Rio de Janeiro, 06.11.1945. Todas as cartas que JGR enviou a Florduardo, citadas nesta cronologia, foram publicadas no livro de Vilma Guimarães Rosa (Op. cit., pp. 143-197). As cartas originais de Rosa ao pai estão preservadas no Arquivo-Museu de Literatura Brasileira (AMLB), da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB/Rio de Janeiro). Agradeço a atenção de Eliane Vasconcellos, responsável pelo AMLB, e de Raquel Valença, diretora do Centro de Pesquisas. 40 Entrevista com Juca Bananeira, realizada por mim em Cordisburgo, MG, em fevereiro de 1993. 41 GUIMARÃES ROSA, Vilma. Op. cit., p. 143. 42 Das cartas enviadas entre 1945-1958, 13 solicitam informações sobre o sertão: 2 em 1945 (nov./dez.); 1 em 1947; 1 em 1953; 2 em 1954; 1 em 1955; 1 em 1956; 2 em 1957; 3 em 1958 (cerca de metade delas data do período de elaboração dos livros de 1956: Corpo de baile e Grande sertão: veredas). Em carta enviada logo após o lançamento do Corpo de baile, Rosa comenta com o pai que o livro “está cheio de coisas que o senhor me forneceu” (Rio de Janeiro, 05.07.1956). 43 Preservadas no Fundo JGR (IEB/USP), as cartas de Florduardo contêm inúmeros sublinhados e foram organizadas por Rosa a partir de um índice temático (por exemplo, “Carnaval em Cordisburgo, 1905”, “Os ciganos”, “Três contos do papagaio”, “O jogo da bola”, “A viúva e o gato que comeu os torresmos”). 44 LEITE, Ascendino. Op. cit. 45 A correspondência JGR-Azeredo da Silveira foi consultada no Arquivo Paulo Rónai (Nova Friburgo, RJ). Sou muito grata à dona Nora (sua viúva), Laura e Cora (suas filhas), que gentilmente me permitiram consultar todos os documentos referentes à obra de JGR. 46 Fundo JGR, Série “Estudos para a Obra”, Pasta E26 (20 p., dat.). Ainda que tais notas não acompanhem o percurso da viagem, foram copiadas das cadernetas originais, pois “a informação Notas tomadas a lombo de cavalo, e uma página quase inteira de caderneta com croqui e legenda, feitos a lápis, garantem a existência de registros anteriores” (LEONEL, Maria Célia de Moraes. “Guimarães Rosa: do arquivo à obra”. Scripta n. 3, Belo Horizonte, 1998, p. 237). As notas referentes à fazenda Três Barras, onde JGR encontra um vaqueiro que havia lutado na Segunda Guerra – “O pracinha, que esteve em Monte-Castelo, tirando leite” –, serão transformadas no relato “Dois soldadinhos mineiros” (publicado no Boletim da Biblioteca do Exército, abr. 1957; republicado em Ave, palavra, 1970). 47 “O livro vendeu tanto e tão depressa que o editor, depois que a segunda edição esgotou, se viu às voltas com uma crise de capital de giro, sendo obrigado a encerrar suas atividades com chave de ouro. Lançou Guimarães Rosa e não resistiu ao êxito...” (SEM AUTOR. “A descoberta de Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.11.1968, p. 4). Caio Pinheiro, dono da Editora Universal, era cunhado do diplomata Antônio Azeredo da Silveira, amigo de JGR, que havia lido os originais de Sagarana, sugerindo a sua publicação. 48 RÓNAI, Paulo. “A arte de contar em Sagarana”. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 14.07.1946. Também saudaram Sagarana com muito entusiasmo: LINS, Álvaro. “Uma grande estréia”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 12.04.1946; e CANDIDO, Antonio. “Sagarana”. O Jornal, Rio de Janeiro, 21.07.1946. 49 O sucesso de Sagarana é evidenciado na abertura desta entrevista: “[o livro] responsável pela súbita evidência literária do autor, hoje situado, por opinião unânime dos críticos, no plano em que se encontram os grandes escritores deste país” (LEITE, Ascendino. Op. cit.). 50 Foram poucas as entrevistas concedidas por JGR. A mais conhecida e interessante é aquela com Günter Lorenz, realizada em Gênova (jan. 1965), durante o Congresso de Escritores Latino-Americanos. A mais rara (e com problemas de transcrição), com Fernando Camacho (Rio de Janeiro, abr. 1966). Mas há também outros depoimentos esparsos do escritor (levantados por LARA, Cecília de. “Rosa por Rosa: memória e criação”. Revista do IEB. São Paulo, n. 41, 1996), e ainda uma entrevista feita pelo poeta e crítico português Arnaldo Saraiva, no gabinete de JGR no Itamaraty, em 1966. 51 MINDLIN, José. “Guimarães Rosa”. In Uma vida entre livros: reencontros com o tempo. São Paulo: Edusp/Companhia das Letras, 1997, pp. 103-107. 52 Republicada em Ave, palavra, “Histórias de fadas” – pequena “crônica-fantasia” sobre mosquitos e beija-flores que cruzam o Atlântico de avião – é analisada por JGR em carta enviada a seu tio Vicente Guimarães (Rio de Janeiro, 11.05.1947), que a reproduziu em Joãozito, (pp. 130-139). 53 VAQUEIRO MARIANO. “O personagem fala sobre o autor” (entrevista). Jornal Flan. Consultado no Fundo JGR (IEB/USP), Série “Recortes”, R2, s.d., p. 99. 54 RÓNAI, Paulo. “Nota introdutória”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969, p. XIII. 55 CALLLADO, Antonio. 3 Antônios e 1 Jobim. Depoimentos de Antonio Callado, Antonio Candido e Tom Jobim. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1995, pp. 81-82. 56 Em carta enviada a Braga Montenegro (Paris, jan. 1951), JGR comenta que apenas “retocou” o livro, “podando uma excrescência ou outra” (carta consultada no Arquivo Paulo Rónai). Sagarana será novamente revisto em 1956 (4. ed.) e 1958 (5. ed. retocada; forma definitiva). 57 Assim como o “Diário em Hamburgo”, a versão original do “Diário em Paris” nunca foi localizada. No Fundo JGR (IEB/USP) há apenas uma cópia datilografa-

56


58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75

76 77 78

79 80 81 82 83 84 85

86

87 88 89 90 91 92 93

94

95 96 97 98

da de várias passagens do “Nautikon”, com alguns dias em seqüência, outros não, preservada em duas pastas da Série “Estudos para a Obra”: Pasta E3 (1) – França-Paris (registra o período de 04.11.1948 a 18.04.1950, pp. 1-54), e Pasta E3 (2) – França (de 18.04.1950 a 18.02.1951, pp. 55-121). Fundo JGR (IEB/USP), Série “Estudos para a Obra”, Documento E17 – Dante, Homero, La Fontaine (75 p.). Fundo JGR (IEB/USP), Série “Estudos para a Obra”, Caderneta 1 (viagens pela França) e Cadernetas 2, 3, 4 e 5 (viagens pela Itália). São as cadernetas originais, manuscritas, das viagens realizadas em 1949 e 1950. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Paris, 24.09.1948. Idem. “Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Paris, 12.04.1949. “Mechéu” foi publicado originalmente no jornal Pulso (Rio de Janeiro, 21.01.1967). Republicado em Tutaméia (Terceiras estórias) (1967). Fundo JGR (IEB/USP), Série “Estudos para a Obra”, Caderneta 1 (França) e Cadernetas 2 e 3 (Itália). Esta carta (s.n.), que relata a viagem à Itália em 1949, foi enviada quase um ano depois, na véspera de sua nova excursão a “il bello Paese”. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Álvaro Lins”, Paris, dez. 1949. Folha de S.Paulo, “Mais!”, São Paulo, 04.06.1995, p. 6. Fundo JGR (IEB/USP), Série “Estudos para a Obra”, Caderneta 1 (França), Caderneta 4 (Itália) e Caderneta 5 (Itália). GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Álvaro Lins”, Paris, 16.11.1950, enviada um mês após o regresso da Itália. Folha de S.Paulo, “Mais!”, São Paulo, 04.06.1995, p. 7. Ver MARTINS COSTA, Ana Luiza. “Rosa, ledor de Homero”. Revista USP. São Paulo, n. 36, dez./fev. 1997-1998, pp. 46-73. Na Biblioteca Pessoal de JGR (IEB/USP), há vários diários de escritores, como Stendhal, Julien Green, Jules Renard, Barbey d’Aurevilly, Maurice Barrès e Katherine Mansfield. É provável que tenham sido adquiridos durante sua estadia em Paris. Essas conversas sobre cores serão publicadas em “Do diário em Paris” (A Manhã, Rio de Janeiro, 17.05.1953) e republicadas, com alterações, em Ave, palavra (1970). “Carta de JGR a Mário Calábria”, Rio de Janeiro, 31.03.1952. A correspondência JGR-Mario Calábria foi gentilmente cedida pelo próprio Calábria para a realização do documentário Os nomes do Rosa. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Mário Calábria”, Rio de Janeiro, 19.06.19[?]. SILVA, Álvares da. “Com o vaqueiro Guimarães Rosa: um escritor entre seus personagens”. Fotos de Eugênio Silva. O Cruzeiro. Rio de Janeiro, n. 35, 21.06.1952, pp. 42-46 e 50-52. Fundo JGR (IEB/USP), Caderneta 6 (30 p.), Pasta E28 – “A boiada 1” (cópia dos dias 12 a 18.05: viagem até a Sirga e estadia na fazenda, 80 p.) e Pasta E29 – “A boiada 2” (cópia dos dias 19 a 28.05: viagem com a boiada, 77 pp.). De fato, as cadernetas de 1952 documentam a festa organizada por Manuelzão para comemorar a inauguração de uma capelinha no cemitério da fazenda Sirga, construída em homenagem à sua falecida mãe (festa recriada na novela homônima). JGR também anota várias estórias contadas pelos vaqueiros sobre as famosas prostitutas de Montes Claros, “que se deitavam como cobras na areia quente” (tema abordado em “Dão-Lalalão” através da personagem Doralda, que havia sido prostituta naquela cidade). Ver VASCONCELOS, Sandra Guardini T. Baú de alfaias. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1984; e Puras misturas. São Paulo: Hucitec/Fapesp, 1997. Republicados em Tutaméia (1967), com alguns acréscimos: duas epígrafes, uma nota de pé de página, duas quadras de Zito cantando a viagem com o “doutor João Rosa”, e um parágrafo sobre “os epos das boiadas”. Para uma análise dos escritos de JGR produzidos a partir de suas incursões rumo ao mundo dos vaqueiros, ver MARTINS COSTA, Ana Luiza. João Guimarães Rosa, viator. Tese de doutorado em Literatura Comparada. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Rio de Janeiro, 2002, 270 pp. Publicado no Correio da Manhã (Rio de Janeiro, 06.12.1952) e republicado no jornal A Manhã, suplemento “Letras e Artes”, Rio de Janeiro, 22.03.1953 e 18.05.1954. Neste conto, Ara – apelido de dona Aracy, tal como registrado na dedicatória de Grande sertão: veredas – é também o nome da esposa do narrador da estória, que faz parte do grupo que vai consultar a cartomante de Hitler. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Rio de Janeiro, 18.08.1952. LAET, Carlos R. M. de. “Há títulos e brasões também no mundo dos bichanos”. Última Hora, Rio de Janeiro, 12.06.19[?]. Depoimento de JGR. Ibidem. J. J. Veiga, em entrevista para o documentário Os nomes do Rosa, realizada em seu apartamento na Glória, Rio de Janeiro, junto com dona Clélia, 27.02.1997. Relato de Fausto Cunha. In : RÓNAI, Paulo (seleção e prefácio). Rosiana – Uma coletânea de conceitos, máximas e brocardos de João Guimarães Rosa. Edição Comemorativa dos 75 anos de nascimento de JGR. Rio de Janeiro: Salamandra/MPM Propaganda, 1983. p. 88. Para uma análise das diferentes versões de Grande sertão: veredas, ver HAZIN, Elizabeth de Andrade Lima. No nada, o infinito: da gênese do Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991, p. 48. Cf. entrevista com Napoleon Potyguara Lazarotto, o Poty (1924-1998), realizada em Curitiba, em novembro de 1996, para o documentário Os nomes do Rosa). Seu nome sempre será lembrado ao lado de Guimarães Rosa: são dele as capas e ilustrações de Sagarana (a partir de sua 4a edição), dos livros de 1956, de Estas estórias (nas edições originais da José Olympio), e de Magma (Nova Fronteira, 1997). Poty também falou dos desenhos da 5ª edição de Sagarana (1958): “Para cada estória, ele queria uma vinheta dentro de um círculo: mão com dois cavaleiros; sapo no trapézio; boi lendo... Passávamos um tempão discutindo que desenhos seriam para os círculos [...] Em ‘A hora e vez de Augusto Matraga’, eu tinha feito a luta dos dois, tudo furado de faca, e ele vetou. Não quis mostrar a vingança deles na cara, assim, na brutalidade. Não quis, não”. Ver nota 64 do ensaio “Via e viagens: a elaboração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas”, publicado na presente edição, p. 223. Ver, por exemplo, VÁRIOS AUTORES. “O processo Guimarães Rosa”. Jornal de Letras, Rio de Janeiro, n. 87, setembro de 1956, p. 2; e “Escritores que não conseguem ler Grande sertão: veredas”. Leitura, Rio de Janeiro, n. 16, outubro de 1958, pp. 50-A e 58-A. Ambos com depoimentos a favor e contra o escritor. LISPECTOR, Clarice. “Carta de Clarice Lispector a Fernando Sabino (Washington, 11.12.1956)”. In: LISPECTOR, Clarice e SABINO, Fernando. Cartas perto do coração. 3. ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2001, p. 179. Entrevista concedida por JGR em seu gabinete, no antigo palácio do Itamaraty, Rio de Janeiro, abril de 1966. “Carta de JGR a Paulo Dantas”, Rio de Janeiro, 19.01.1957. In: Sagarana emotiva. Op. cit. “Grande sertão: veredas” (13.03.1957) e “Rotílio Manduca” (27.03.1957) saíram em Flauta de papel (1957). Em Mafuá do malungo (1949), há vários poemas escritos em homenagem a Guimarães Rosa. “Constam da biblioteca originais que serviram para a impressão de quase todas as obras de Guimarães Rosa, acompanhados das respectivas provas tipográficas, todos com numerosas correções manuscritas do próprio autor. De Corpo de baile, aliás, parece ser o único original conhecido.” (MINDLIN, José. Op. cit., p. 44). Em “As listas de palavras”, Walnice Galvão descreve todo o Acervo JGR da Biblioteca de José e Guita Mindlin (In Mitológica rosiana. 2. ed. São Paulo: Duas Cidades, no prelo) Para uma análise de “Com os vaqueiros”, ver MARTINS COSTA, Ana Luiza. Op. cit., 2002. Ver também da mesma autora João Rosa, viator. In: SÜSSEKIND, Flora e DIAS, Tânia (org.). A historiografia literária e as técnicas de escrita: do manuscrito ao hipertexto. Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa/Vieira & Lent, 2004, pp. 191-213. “Carta de JGR a Paulo Dantas”, Rio de Janeiro, 14.09.1957. In: Sagarana emotiva. Op. cit. BANDEIRA, Manuel. “Um encontro casual com Rosa”. In Andorinha, andorinha. Rio de Janeiro: José Olympio, 1966. “Carta de JGR aos pais”, Rio de Janeiro, 05.07.1958. É o que Graciliano Ramos (Op. cit., p. 45) observa a respeito da “longa e paciente depuração” do volume Contos (1937), versão original de Sagarana.

57


99 “Carta de JGR a Harriet de Onís”, 23.04.1959. Harriet traduziu para o inglês Sagarana e Grande sertão: veredas (este último com James L. Taylor). Fundo JGR (IEB/USP). 100“Carta de JGR a Paulo Dantas”, Rio de Janeiro, 11.06. In: Sagarana emotiva. Op. cit. 101Entrevista concedida a Fernando Camacho (Palácio do Itamaraty, Rio de Janeiro, abr. 1966). Cópia mimeografada. Consultada na casa de dona Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu). 21 p. [entrevista com problemas de transcrição]. Publicada na revista Humboldt. Munique, n. 37, 1987, pp. 42-53. 102“Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Rio de Janeiro, 19.01.1960. 103“Carta de JGR a Paulo Dantas”, Rio de Janeiro, 15.06. In: Sagarana emotiva. Op. cit. 104 BANDEIRA, Manuel. Op. cit. 105Sobre os poemas anagramáticos de JGR, ver levantamento feito por DOYLE, Plínio. “Contribuição à bibliografia de & sobre João Guimarães Rosa”. In Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, pp. 210-211. Ver também GALVÃO, Walnice Nogueira. “Heteronímia em Guimarães Rosa” e “Metáforas náuticas”. In Desconversa (ensaios críticos). Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1998. pp. 83-95 e 115-128. 106“Carta de JGR aos pais”, Rio de Janeiro, 13.09.1962. 107 MEYER-CLASON, Curt. Op. cit. 108Somente em 2003 foi publicada pelas editoras Nova Fronteira/ABL/UFMG a correspondência de JGR com seu tradutor alemão, que abrange o período de 19581967. Após a morte de Rosa, Meyer-Clason publica ainda a tradução de “Meu tio o Iauaretê” (1981), Sagarana (1982) e Tutaméia (1994). 109“Carta de JGR a Meyer-Clason”, Rio de Janeiro, 29.10.1962. 110“Carta de JGR aos pais”, Rio de Janeiro, 13.09.1962. 111“Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Rio de Janeiro, 04.04.1963. 112“Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Rio de Janeiro, 13.09.1963. 113A crítica de Haroldo de Campos (“A linguagem do Iauaretê”, “Suplemento Literário” de O Estado de S.Paulo, 22.12.1962) é publicada quase dois anos após o lançamento de “Meu tio o Iauaretê” (Senhor, março de 1961). Republicada em Metalinguagem e outras metas (4. ed. São Paulo: Perspectiva, 1992, pp. 57-63), incorpora algumas dicas de JGR. 114“Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Rio de Janeiro, 24.09.1964. 115“Carta de JGR a Bizzari”, Rio de Janeiro, 03.01.1964. In: J. Guimarães Rosa: correspondência com o tradutor italiano (1962-1967). Op. cit, pp. 91-93. 116Ibidem, loc. cit. 117“Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Rio de Janeiro, 06.01.1965. 118Entrevista de Günter Lorenz para o documentário Os nomes do Rosa, realizada em Achern, Alemanha, em fevereiro de 1997. 119Relato de NEVES, David E. “Guimarães Rosa e o cinema novo”. In Telégrafo visual. Rio de Janeiro: 34 Letras, 2004, pp. 318-321. Segundo ele, Joaquim Pedro de Andrade e Leon Hirszman cogitaram filmar a novela “Buriti” (de Corpo de baile), que finalmente foi levada às telas por Carlos Alberto Prates Correia, em 1984. 120Cf. levantamento feito por Plínio Doyle (Op. cit., pp. 212-213). 121Entrevista concedida por JGR a Maria da Graça Faria Coutinho, aluna do 1º ano clássico do colégio Brasileiro de Almeida (Rio de Janeiro, junho de 1965). 122 Relato de Oswaldino Marques. In: RÓNAI, Paulo (seleção e prefácio) Rosiana – Uma coletânea de conceitos, máximas e brocardos de João Guimarães Rosa. Op. cit., pp. 92-93. 123 SIMÕES, Inimá. Roberto Santos, a hora e vez de um cineasta. São Paulo: Estação Liberdade, 1977, p. 82. 124Entrevista concedida a Fernando Camacho. Rio de Janeiro, abril de 1966. 125O escritor peruano conhece JGR neste Congresso. Alguns anos depois, escreve “Epopée du sertão, tour de Babel ou manuel de satanisme?”, prefácio de Diadorim, nova tradução francesa de Grande sertão: veredas, feita por Maryvonne Lapouge-Pettorelli (Paris: Albin Michel, 1991). 126“Carta de JGR a Lenice”, Rio de Janeiro, 19.10.1966. Apud GUIMARÃES, Vicente. Op. cit., p. 173. 127 RESENDE, Otto Lara. “Língua legal”. O Globo, Rio de Janeiro, 02.08.1981, p. 8. 128“Carta de JGR a Pedro Barbosa”, Rio de Janeiro, 20.02.1967. 129 Sobre a intervenção de JGR no Conselho Federal de Cultura, ver comentários do poeta e crítico português Arnaldo Saraiva: “João”. Diário de Notícias, Lisboa, 30.11.1967, p. 17; e “Guimarães Rosa: espinhos – ou um inovador entre retardatários”. In Encontros dos encontros. Porto: Livraria Paisagem, 1973. pp. 239-250. 130Benedito Nunes, em entrevista para o documentário Os nomes do Rosa, realizada no palácio do Itamaraty, Rio de Janeiro, 24.11.1996. 131Dois anos depois da morte de Guimarães Rosa, será a vez de Mário Palmério ocupar a sua cadeira na ABL, saudando-o em seu discurso de posse, no dia 22 de novembro de 1969. Ver: PALMÉRIO, Mário. “Evocação de Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 30.11.1968, p. 5 (Republicado na revista Extensão. PUC-Minas, Belo Horizonte, v. 3, set. 1993, pp. 41-42).

58


CONFLUÊNCIAS

Às margens de Rosa O INVENTOR DE MUNDOS E O VIAJANTE DO SERTÃO, O HOMEM SENTIMENTAL E O DIPLOMATA ERUDITO SÃO AS PERSONAGENS QUE SURGEM DAS MEMÓRIAS DE DORA FERREIRA DA SILVA, JOSÉ MINDLIN, RUBENS RICUPERO E DO VAQUEIRO MANUELZÃO

Edu Simões/IMS

Nascida em Conchas, no interior de São Paulo, em 1918, a poeta e tradutora Dora Ferreira da Silva publicou em 1970 seu primeiro livro, Andanças, reunindo trabalhos escritos desde 1948. Seguem-se obras como Talhamar (1982), Retratos da origem (1988), Poemas da estrangeira (1995) – incluídos em Poesia reunida (Topbooks, 1999), que recebeu da Academia Brasileira de Letras o prêmio Machado de Assis. Tradutora dos poetas Rainer Maria Rilke, Friedrich Hölderlin e Saint-John Perse e do pensador suíço Carl Gustav Jung, foi casada com o filósofo Vicente Ferreira da Silva (1916-1963). Com ele, editava a revista Diálogo e promovia tertúlias literárias e grupos de estudos na casa da rua José Clemente, em São Paulo. Após a morte do marido, criaria a revista Cavalo Azul. Com Hídrias (Odysseus, 2004), ganhou pela terceira vez o prêmio Jabuti. Este depoimento sobre Guimarães Rosa foi escrito por Dora Ferreira da Silva poucos dias antes de sua morte, no dia 6 de abril de 2006.

João Guimarães Rosa, bardo do Brasil, inventor de mundos, a nossa paidéia, o nosso Homero. Di-

plomata, homem de cultura polimórfica, de finura inesquecível, foi no entanto como Riobaldo que apareceu sem aviso prévio na porta da rua José Clemente, 324, lá pelas 15 horas de 1957. Era uma tarde ensolarada não sei de que dia, Vicente não estava em casa, a empregada faltara. Sozinha e lenta, eu acabara de me vestir após o banho. A campainha tocou. Pus rapidamente um lenço como turbante para prender os cabelos molhados e fui olhar pela janela do meu quarto, que fica no segundo andar. O jardim é grande e de longe avistei (ou acreditei ver) um homem alto montado a cavalo à frente do meu portão. Curiosamente, ao mesmo tempo eu o conhecia e não conhecia. Um pensamento rápido aumentou aquela visão singular: ‘Deve ser alguém que acabou de descer de um disco voador’. 59

24/11/06 – 20h


Talvez nem um minuto tivesse passado quando ecoou uma clara voz: ‘Você é a Dora? Eu sou o Guimarães Rosa’. Desci correndo as escadas e fui abrir o portão, emocionadíssima, um pouco perturbada com o inesperado da situação. O Grande Sertão se fizera à minha porta, e Riobaldo lá estava num cavalo imaginário. Abraços de boas vindas, entramos na sala e Guimarães Rosa sentou-se sorrindo no sofá. Crivoume de perguntas. Ele soubera que preparávamos um número de Diálogo – o número 8 – inteiramente dedicado a ele. ‘O que tem em mãos?’, perguntou. Respondi que estávamos Sertão adentro, com os jagunços: Riobaldo, Diadorim, Hermógenes. Não revelei, porém, a estranha visão que eu tivera do Sertão à minha porta, e Riobaldo a cavalo. Guimarães Rosa me trouxera uma pequena cabeça de boi esculpida num osso, como presente de jagunço. Agradeci, maravilhada. Era um verdadeiro presente digno de Diadorim. E então ele pediu, exigiu, queria ouvir o que eu escrevera sobre o demoníaco em Grande sertão: veredas. Relutante, fui buscar as páginas ainda não datilografadas e as li com o coração batendo forte. Conversamos e reconversamos. O que retive na memória foi o itinerário interior daquele homem extraordinário. Grande sertão: veredas é de fato um romance teológico. O pitoresco de buritis e capim, o raso do Sussuarão, camuflam a ida infinita de Platão a Cristo, e a frase forte e impressionante daquele escritor consagrado ressoou na sala, no Mundo: ‘Sou só religião, alheio a qualquer associação ou organização religiosa’, e completou falando de sua tentativa de manter um diálogo sem mediações com o infinito. Numa carta posterior a Vicente Ferreira da Silva, Guimarães explicita certos pontos fundamentais de sua religio: Sei que haverá ‘novos’ Deuses, mas tudo que é discórdia, agressividade, destrutividade, tem de se transformar, desaparecer, antes. Cristo (o Cristo verdadeiro) cabe; tem seu ensino, indispensável. ‘Os mansos herdarão a terra.’ Seu ensino central, a meu ver (o do Reino do céu dentro de nós) é: 1 – o domínio da natureza, a começar pela natureza de cada um – pela fé, que é a forma mais alta e sutil de energia, à qual o universo é plástico; 2 – o amor, possibilitando a coexistência, sem o mínimo sinal de atrito, conflito, desarmonia, destruição ou desperdício. Sobre esta plataforma, o céu, as possibilidades infinitas de um sempre-evoluir, em plenitude, prazer, alegria ininterrupta; cada um invulnerável. Tudo em Guimarães Rosa soava com pureza, havia nele algo inconfundível, o gosto do que é amplo e verdadeiro. A minha visão do nosso grande bardo fundiu-se com aquela tarde quente e inesperada, e tornou-

se a alegria inesquecível de um encontro autêntico.

60

24/11/06 – 20h


O vaqueiro Manuel Nardy nasceu em 1904, na cidade de Dom Silvério (MG), e acompanhou Guimarães Rosa em viagem pelo sertão mineiro em maio de 1952. Tornou-se célebre como personagem de “Uma estória de amor (Festa de Manuelzão)”, novela incluída em Corpo de baile. Publicada em 1956, essa coletânea seria desmembrada posteriormente em três volumes. O primeiro passou a se chamar Manuelzão e Miguilim e traz aquela narrativa ao lado de “Campo Geral”. Os outros dois se intitulam No Urubuquaquá, no Pinhém e Noites do sertão. O depoimento publicado a seguir foi extraído do videodocumentário inédito O torto encanto de Manuelzão, realizado em 1993 (quatro anos antes da morte do vaqueiro) pelo jornalista João Correia Filho. Nele, Manuelzão fala da festa em homenagem a sua mãe, à qual Guimarães Rosa assistiu, do dia-a-dia da viagem e das personagens que migraram da realidade para a ficção.

Nós [Manuelzão e a mãe] fomos aqui na fazenda Sirga, onde morava um senhor que era meu ami-

go. Ele morreu e nós, no voltar de lá da sentinela dele, paremos aqui debaixo de um pau. E fiquemos aí, ela foi e disse: ‘É o lugar mais bonito que eu vejo aqui. É fazer uma capela e um cemitério, porque daqui se avista o rio [São Francisco]’. Ela não levou três dias e morreu. Eu mandei furar a sepultura dela no lugar que ela escolheu. (...) Eu morava aqui embaixo, daqui 600 metros. Achei uma imagem de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, que ela trouxe da minha terra ainda, e eu resolvi fazer aquela capelinha. Quando eu chamei o padre pra benzer a capelinha, diz ele que eu não podia benzer, que pra benzer a capela tem que dar um terreno pra patrimônio. Eu falei: ‘Eu não tenho pra mim morar, como é que eu vou dar pra patrimônio?’ Aí ficou muito tempo isso aqui sem benzer. Eu expliquei ao padre: ‘Pra mim toda terra é sagrada. O adobe que eu fiz os tijolos pra cercar a capelinha é sagrado, a madeira é sagrada, eu tô chamando vocês porque é uma coisa que a gente vê desde o princípio do tempo, mas tudo que Deus fez é sagrado’. (...) A festa era na capelinha, na igreja, até que eles falam ‘Festa de amor, de Manelão e Miguilinho’.1 Era todo ano que tinha ela naquele tempo certo. A capelinha ficou uns dois anos sem poder fazer festa nela, porque o padre não quis benzer a capela e disse que tinha que desmanchar, aquela confusão. Eu pus pé no toco que não deixava desmanchar ela. (...) Depois que o padre benzeu, dava certo que naquele dia que ele benzeu, benzeu o cemitério, eu continuei todo ano fazendo a festinha. Tinha missa, de tarde, tinha leilão, aquele trem todo. A despesa de comida, eu dava pra todo mundo. (...) E nós ia pra Sete Lagoas, mas ia esperar passar a festa, dos dias da festa, pra poder ir com a boiada pra Sete Lagoas. E ele [Guimarães Rosa] veio na véspera da festa e ele pôs ‘Festa de Manelão’, ‘Festa 61

24/11/06 – 20h


de amor, de Manelão e Miguilinho’. O Miguilinho já morava lá em casa comigo.2 Participou da festa, participou das viagens, tudo, contou história. O povo mais antigo, de primeiro, era um povo que sabia muita coisa. E era mais fácil da gente conviver com eles, não ficava fazendo luxo, você pedia pra tocar uma viola, cantar um lundu, fazer uma coisa antiga que existia, aquilo era pronto. Hoje que eles ficam naquela ren-renha, não sabe o que que faz, não quer fazer. Eu gostava daquilo. Aí, passou a festa, acabou de arrumar a bagagem, nós saímos um dia depois. (...) Ele via aquele pau, queria que você desse definição daquele pau. Via esse aqui, queria saber porque esse cipó subiu nele, porque que tinha esse cipozeiro nele, esse trem todo, ele queria saber. E tomando nota. João Rosa comia bem. Qualquer coisa que fizesse pra ele, pra ele tava bom. No primeiro dia sofreu, porque ele tinha costume de almoçar de tarde, almoçar uma hora, uma hora e meia era o almoço. No primeiro dia que nós andou a cavalo, de manhã cedo... Ele deitava tarde e levantava tarde. No primeiro dia levantou cedo. Nós tava juntando um gado pra poder levar pra Sete Lagoas. Ele queria ajudar. Nós comia uma feijoada de manhã cedo, bebia um gole de pinga. A patroa fez um café com leite de manhã cedo, ele bebeu, comeu uns dois biscoitinhos, e não quis comer mais. Ela foi e falou comigo: ‘Leva um requeijão, que às vezes você chega na beira de uma vereda, ele resolve é comer. Vocês vão chegar aqui é tarde pra ele almoçar e aquele biscoito com aquele copinho de leite não deu pra ele não’. Logo proibiu de chamar ele de dr. João: ‘Vocês me chamam de João Rosa. Nós somos é companheiros’. Aí todo mundo foi chamando ele de João Rosa. Eu disse, vamos beber um café, comer uma merenda. Ele disse: ‘Cê trouxe isso aí?’ Eu disse: ‘Eu trouxe uma garrafa de café, um requeijão’. Nós era cinco companheiro com ele. Eu mais três vaqueiros, mais eu e ele. Partimos o requeijão, bebemos café e ele achou bom aquele trem. (...) Nós já tinha almoçado, porque nós tinha costume de comer cedo, já sabia do que ia fazer e comia logo uma quantidade que ficava satisfeito. Quando foi de tarde nós íamos se embora, e quando ele foi almoçar era seis horas da tarde. Aí ele disse: ‘Amanhã nós vamos voltar pro campo e eu quero ir’. Eu fiz um cálculo... ele não volta, ele não vai agüentar isso. Aí ele deitou tarde. Ele queria gente que tocasse viola, violão, contador de história. E Deus me ajudou que lá tinha uma família muito amiga e tinha uns velhos que a gente combinou com eles de ir pra lá. Esse povo gostava daquilo, sô! A gente dava despesa, com fartura, eles almoçava, jantava, bebia até muito. A gente dava cachaça pra eles beber, o que eles queriam era aquilo. E contar história... Aquela Joana Xavier3 era uma contadeira de história na certa. Tinha mais velha, sem ser a Joana. Eu fui deitar logo porque ficava cansado e era o responsável por aquilo e tinha que por sentido naquilo. Eu fui deitar e fiz um cálculo: João Rosa não vai querer dormir bem cedo. Quando ele foi deitar era quase uma meia-noite. Eu falei: ele não levanta cedo amanhã pra nós ir, eu não vou chamar ele. Ele tem é que levantar, se ele levantar tá certo, mas se esperar chamar eu não vou chamar não. Quando foi de manhã cedinho ele levantou. Levantou primeiro do que a gente levantou. Logo ele falou: ‘Eu vou com vocês pro campo, mas hoje eu não vou comer o que eu comi ontem não, hoje eu quero beber uma pinguinha e comer uma feijoada junto com vocês, pra gente conseguir agüentar. Tem razão de vocês 62

24/11/06 – 20h


agüentarem um batente desse, que vocês comem de manhã cedo é um almoço, uma comida forte. Fica o dia todo e não queixa fome. Eu vou com vocês’. Nesse dia nós voltamos mais cedo. Eu resolvi voltar mais cedo pra ele poder almoçar. Almoçou e foi escutar gente contar história, cantar lundu... Ele fala de diversos desses fazendeiros aqui dessa região. Chico Barbosa4 que era um tocador de cavaquinho, rebeca. Tá tudo com o nome mudado, mas eu lendo o nome eu sei em qual é que ele colocou outro nome nele. Tem algum que tá vivo ainda. (...) O Chico Moreira5 tinha outro nome, o velho Tié tinha outro nome também. Joana, essa existiu, essa Joana era uma mulher solteira, já tava velha, ela gostava do Camilo6, mas eles já tinham morado juntos, mas nesse tempo eles já tinham separado e ela foi lá também pra contar história. Tem tanta história que ela contou pro Guimarães Rosa. Contou. Ela sabia um horror de bobagem. Essa Joana, ela morreu há muito tempo. (...) Tudo que ele me explicou que passou lá no estrangeiro com ele, lá no exterior, ele ensinou pra nós, e se eu tivesse tomado nota daquilo, igual ele fazia, hoje tinha muita coisa. Se eu contasse uma redação lá do exterior todo mundo achava que eu conhecia aquilo desde lá, mas eu nunca pensei em chegar na altura que chegou. Isso foi uma coisa que ninguém esperava por isso. E logo que saiu o primeiro livro que ele escreveu, ‘Festa de amor, Manelão e Miguilinho’, que ele terminou Sagarana 7, fez o Grandes sertões: vereda [sic], fala muito da minha pessoa naquele livro, Grandes sertões: vereda. Alguma coisa a gente ainda recorda. Naquele livro quase todo, o que ele escreveu, quase tudo foi eu que dei a dica pra ele. Ele escreveu, mas a maior parte daquilo... E nós chegava num lugar, parava, ele queria ver essa água, por que que essa água ali faz um barulho, ali embaixo fazia outro. Ela muda de diferença o som da água porque ali tá descendo mais, barulha mais. No outro lugar ela desce mais lento, tem essas coisas todas. (...) Alma nós tudo têm. O sangue estando correndo, eu acho que a alma tanto faz de um boi como de um cavalo, ou de uma galinha. É a mesma, alma é uma só, é o sangue. O sangue coalhou, acabou. A diferença que tem o cristão é porque ele foi batizado, mas a pessoa morreu, pra mim... Não tem céu, não tem inferno nem purgatório. Inferno que nós tá nele é esse. A pessoa quando tá bom de situação ele tá no céu, quando a pessoa tá mais ou menos, ele tá no purgatório e quando ele tá numa vida ruim mesmo ele tá é no inferno. Ele pensa a vida de um jeito e não dá certo, pensa de outro, não dá certo. (...) Assim é qualquer vivente. A única diferença que tem a nossa de um boi é que nós foi batizado e vai pra

igreja, mas não sendo, o sangue coalhô, acabou.

NOTAS 1 Referência à novela “Uma estória de amor (Festa de Manuelzão)”. 2 O vaqueiro se refere à personagem Miguilim, de “Campo geral” – novela que, ao lado de “Uma estória de amor (Festa de Manuelzão)”, compõe o volume Manuelzão e Miguilim. No entanto, não há relatos de que teria sido inspirado em alguém que viveu na região. 3 A personagem Joana Xaviel, de “Uma estória de amor (Festa de Manuelzão)”. 4 Chico Braaboz, outra personagem da mesma novela. 5 Francisco Moreira, primo do escritor e proprietário da fazenda de onde partiu a comitiva. 6 Referência ao personagem Camilo José dos Santos, ou velho Camilo. 7 Sagarana foi lançado em 1946.

63

24/11/06 – 20h


Sergio Guerini Imagem

Filho de imigrantes russos, o empresário e bibliófilo José Mindlin nasceu em São Paulo em 1914 e, ao longo das últimas décadas, constituiu a mais importante biblioteca privada do Brasil. Aos 15 anos, foi repórter de O Estado de S.Paulo. Formado em direito, trabalhou como advogado até se tornar sócio-fundador da Metal Leve – empresa do setor de autopeças da qual se desligaria em 1996. Paralelamente, montou um acervo com cerca de 40 mil obras, com raridades que incluem desde a primeira edição dos Sonetos de Petrarca (1488) e de Os lusíadas (1572), de Camões, até um dos datiloscritos originais de Grande sertão: veredas (ver pág. ##). Secretário da Cultura, Ciência e Tecnologia de São Paulo entre 1975 e 1976, autor de Uma vida entre livros – Reencontros com o tempo (Edusp/Companhia das Letras, 1997), Mindlin foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 2006.

Espero que não seja pecado – e, se for, que seja apenas venial – introduzir, em meio ao conjun-

to de artigos eruditos e ensaios críticos sobre a obra de Guimarães Rosa reunidos neste volume dos CADERNOS DE

LITERATURA BRASILEIRA, uma simples narrativa de como conheci o escritor. Pareceu-me que

valia a pena contá-la, pois esse conhecimento não foi feito de uma vez, mas em duas etapas, separadas por um intervalo de dez anos, e ainda numa terceira etapa, uns 40 anos depois. Vamos por partes. Encontrei Guimarães Rosa em Paris, em 1946, apresentado por recomendação de meu irmão Henrique e sua mulher Vera Bocayuva, que eram grandes amigos dele, e por indicação ainda de outro grande amigo em comum, Luís Camillo de Oliveira Netto. Rosa participava da Conferência da Paz, e eu estava atrás de livros para formar o estoque de uma livraria especializada em obras raras, que um amigo bibliófilo e eu tínhamos formado em sociedade com um capitalista (um caso curioso de dois bibliófilos que gostavam de comprar, mas não de vender livros, o que, evidentemente, não levou a livraria a ter sucesso, mas isso é uma outra história). Vamos, no entanto, aos fatos. Como o expediente da conferência só começava depois do meiodia, Rosa e eu tivemos freqüentes encontros pela manhã. Foram horas de bons papos, embora me lembre de que ele não era muito comunicativo ou talvez fosse tímido, mas mesmo assim fizemos boa camaradagem. Um exemplo disso é que ele chegou uma vez, num dos encontros, a me propor a compra de um conjunto de livros eróticos que ele tinha reunido, mas achava dificuldade de levar para o Brasil, pois tinha duas filhas meninas. A época era de preconceito ao erotismo e aos livros eróticos, chamados de livres du second rayon [livros da prateleira de trás], que não podiam aparecer na estante. Também eu recu64

24/11/06 – 20h


sei a oferta, pelo mesmo argumento das filhas meninas, mas hoje elas reclamam por eu não ter comprado. O curioso é que, falando com Vilma, e creio que também com Agnes Guimarães Rosa, tive a surpresa de ver que elas conheciam o episódio, relatado pelo pai. Mas voltemos ao encontro. Apesar das boas conversas e visitas a livrarias, de que também gostava, Rosa não me deu, naquela ocasião, a menor indicação de que fosse escritor. Com isso, vi dele apenas o ser social, sempre elegante, usando uma gravatinha borboleta, quase podendo ser o que naquela época se chamava de ‘almofadinha’. Isso, evidentemente, não tinha nada de censurável, mas a conseqüência foi grave: quando voltei ao Brasil, Sagarana tinha acabado de ser publicado, mas eu achei que não valia a pena ler! Com isso, encerrou-se a primeira fase de nosso conhecimento, e eu perdi dez anos de prazer, pois fui ler Sagarana somente junto com Corpo de baile e Grande sertão: veredas. Retrospectivamente, parece uma falha imperdoável de minha parte, mas o destino prega na gente peças desse calibre. Em todo caso, a leitura de Sagarana marca a segunda fase de meu conhecimento de Guimarães Rosa: eu, que em 1946 conheci o Rosa social, em 1956 tive a revelação de seu gênio e seus livros se tornaram meus grandes entusiasmos na vida, levando a muitas releituras. A terceira fase aconteceu uns 30 ou 40 anos depois, quando vi os cartões que Rosa mandou a Vera Tess e sua irmã Beatriz: pareceu-me em sua plenitude, o homem sentimental, amoroso com as crianças e despojado de toda a vaidade que seus grandes livros pudessem lhe ter posto sobre os ombros. Houve ainda outro episódio que gostaria de relembrar. Recebi, em meados de outubro de 1967, um telefonema de Edoardo Bizzarri, meu amigo e tradutor de Guimarães Rosa para o italiano, pedindo-me que perguntasse ao autor se concordaria em publicar a correspondência trocada entre eles durante a tradução. Preocupava Bizzarri que Rosa pudesse pensar que ele estaria querendo se promover com isso. Não encontrando o Rosa, pedi a meu irmão Henrique que o consultasse e recebi então a última mensagem de Guimarães Rosa por intermédio do Henrique: ‘Diga ao José que não só estou de pleno acordo, como gostando muito da idéia da publicação da correspondência. Como pretendo ir a São Paulo em princípio de novembro, lá podemos nos reunir os três e acertar todos os detalhes’. Infelizmente, esse encontro não aconteceu, pois Rosa morreu sem ter podido realizar a viagem. A publicação, no entanto, pôde ser feita, dada a anuência verbal, e é um dos grandes testemunhos da meticulosidade com que Rosa escrevia. Bizzarri fez inúmeras perguntas sobre o significado e a origem de muitas palavras, e as respostas de Rosa mostram que tudo era estudado e não improvisado. A idéia de que ele inventava palavras não corresponde, na realidade, ao seu estilo; procurava termos obscuros tirados certamente de suas cadernetas de notas, pois anotava qualquer peculiaridade que desconhecesse, fazia combinações pitorescas, mas a linguagem era preexistente ao escrito. Não vou, no entanto, entrar nesses detalhes, pois seria pretensão e água benta estar eu, de repente, começando a escrever um ensaio... Conhecê-lo, assim como ler e reler suas obras, foi um dos grandes privilégios de minha vida. Quem tem hábito de leitura e ainda não leu Guimarães Rosa não sabe o que está perdendo. 65

24/11/06 – 20h


Sergio Guerini Imagem

Rubens Ricupero nasceu em 1937, na cidade de São Paulo. Bacharel pela Faculdade de Direito da USP, ingressou no Instituto Rio Branco em 1958. Na carreira diplomática, foi chefe do Departamento das Américas do Itamaraty, embaixador em Genebra, Washington e Roma. Assessor internacional do presidente-eleito Tancredo Neves, subchefe da Casa Civil e assessor especial do presidente José Sarney (1985-87), exerceu o cargo de ministro do Meio Ambiente e da Amazônia (1993-94) e ministro da Fazenda (1994), na fase do lançamento do real. Desempenhou as funções de Secretário Geral da UNCTAD (Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento), em Genebra, durante dois mandatos consecutivos, de 1995 a 2004. É autor de livros, ensaios e artigos sobre relações internacionais e desenvolvimento. Atualmente é diretor da Faculdade de Economia e Relações Internacionais da Faap (Fundação Armando Álvares Penteado) e presidente do Conselho do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial.

Quando minha mãe morreu, meus irmãos encontraram entre seus papéis todas as cartas que eu

lhe havia escrito desde que deixei São Paulo para fazer o exame de ingresso no Itamaraty. Estavam cuidadosamente guardadas dentro de uma pasta de couro verde, presente de um de meus irmãos, na qual ela havia feito gravar em letras douradas: ‘Meu filho diplomata’. A primeira das cartas, que eu tinha esquecido totalmente, era datada do Rio de Janeiro, 9 de setembro de 1958. Nela, eu relatava a primeira prova eliminatória, de português, cujos resultados não eram conhecidos ainda, mas que dizimaria os candidatos, reduzindo-os de 116 a um punhado de pouco mais de 20. Na carta, eu também registrava, deslumbrado, minha descoberta do mundo fascinante do Itamaraty e da diplomacia. Com inexperientes 21 anos, crescido num dos cantos mais pobres do operário bairro do Brás dos anos 1930 e 1940, entre as ruas Caetano Pinto e Carneiro Leão, ao lado do Gasômetro, eu nunca havia sido exposto a um cenário tão majestoso e imponente. O exame havia sido num sábado, começando às dez horas da manhã, no salão nobre da biblioteca neoclássica, com todas as portas de vidro abertas ao lago onde deslizavam os cisnes. Ao fundo da aléia de palmeiras imperiais, os estudantes pensativos inspiravam-se na doçura em frente ao casarão corde-rosa do velho palácio dos condes de Itamaraty. A manhã era plácida, luminosa, mas não muito quente, pois soprava leve brisa. Esse cenário físico ideal lá fora era harmoniosamente completado pelos cuidados atenciosos de que éramos objeto no magnífico interior da biblioteca, mandada edificar ao tempo de Otávio Mangabeira. Acostumado à massificação, já naquele início da expansão da universidade pública, do vestibular à Fa66

24/11/06 – 20h


culdade de Direito de São Paulo, à impessoalidade e à distância burocrática dos contatos com o secretariado das Arcadas ou da Faculdade de Filosofia, na rua Maria Antonia, não esperava que os jovens diplomatas incumbidos de supervisionar as provas nos tratassem como quase colegas, de igual a igual, como se o exame não passasse de formalidade sem importância e estivéssemos já assegurados do ingresso. Meu encantamento chegou ao auge quando, em certo momento, contínuos de luvas e uniformes brancos com botões dourados nos serviram café em elegantes taças de bordas de ouro com as armas da República. Foi amor à primeira vista, jamais desmentido ao longo dos 36 anos que eu haveria de passar no aconchego do Itamaraty, que o chanceler Azeredo da Silveira dizia ser, na verdade, um orfanato, pelo carinho familiar com que tratava os funcionários. Se me demorei em evocar meu exame foi, primeiro, para introduzir o início de nervosa seqüência de provas ao longo de quase dois meses, que se encerrariam com nosso encontro com João Guimarães Rosa. Tive também para isso outro motivo. É que, ao ler o belo e sugestivo ensaio de meu colega Felipe Fortuna, ‘Guimarães Rosa, viajante’, publicado na coletânea O Itamaraty na cultura brasileira 1, fiquei impressionado com a semelhança da situação e das sensações que eu mesmo vivera com as de outro jovem que me precedera um quarto de século antes, um médico de 26 anos de idade, vindo como eu de outro Estado, aprovado em 1934 naquele concurso de ingresso (com a diferença de não existir, na época, o Instituto Rio Branco no qual estávamos entrando em 1958). Ao escrever à mãe, em carta de 7 de julho de 1934, que tirara o segundo e não o primeiro lugar por ter perdido a calma nas provas escritas iniciais, Guimarães Rosa explicava que ficara ‘estonteado com o ambiente barulhento do Rio de Janeiro, e com o luxo magnificente do Itamaraty’ [grifo meu]. Em carta datada de um dia antes, descrevia a dificuldade dos exames em termos muito parecidos aos que vim a encontrar em meus próprios relatos a meus pais: De 57 (candidatos), só dez foram habilitados (...). Desses dez, talvez seja eu o único que não esteve ainda na Europa; além disso, posso garantir que esse concurso é o mais difícil que se processa no Brasil (...). Assim, estou satisfeitíssimo, adquiri mais confiança em mim mesmo, e espanei os brasões... Comenta Felipe Fortuna que a atitude de Rosa não estaria isenta de uma ponta de ressentimento social (a comparação com os demais candidatos que já haviam estado na Europa, a referência a espanar os brasões). Há algo disso, mas caberia talvez interpretação mais indulgente: a da aquisição da autoconfiança, a justificável satisfação pela ascensão social. Ao menos, foi assim que me identifiquei ao sucesso do jovem mineiro, pois lembro minha reação similar ao ver, nos exames orais de línguas, que os concorrentes de impecável pronúncia tinham todos estudado em Londres e Paris, alguns, filhos de diplomatas, tendo sido mesmo educados nesses idiomas. Até o impacto estético e espiritualmente tranqüilizador do lago está presente nos escritos rosia67

24/11/06 – 20h


nos recolhidos em Ave palavra, conforme este trecho transcrito por Heloisa Vilhena de Araujo em Guimarães Rosa: diplomata: No seu dia a dia, porém, sem aparato (o lago do Itamaraty) rende o quadro certo e apropriado à Casa diplomática. Porque de sua face, como aos lagos é eternamente comum, vem indeteriorável placidez, que é reprovação a todo movimento desmesurado ou supérfluo. Também, uma vez, em 1935, e acaso associado à lembrança de outro lago, forneceu imagem imediata a um dos mais desvencilhados espíritos que jamais nos visitaram: Salvador de Madariaga. Que concluindo, ali, no auditório da biblioteca, memorável conferência sobre Genebra – id est a Sociedade das Nações ou qualquer organização que se proponha realizar alguma harmonia entre os povos – comparou que a mesma seria, na vida internacional, o que a água é na paisagem: mais luz, por reflexão, e o calmo equilíbrio da horizontalidade.2 O concurso de ingresso de Guimarães Rosa no Itamaraty vem narrado de forma saborosa no livro de seu tio Vicente Guimarães, Joãozito – A infância de João Guimarães Rosa, em boa hora reeditado.3 Tendo chegado ao Rio pelo trem noturno sem prevenir os parentes, o futuro diplomata metera-se num hotel de políticos mineiros, onde se trancou no quarto para estudar 20 horas seguidas. De manhã, queria descansar, mas o cérebro continuava à toda. Pede socorro ao tio, que corre ao hotel e, ao entrar no quarto, descreve cena memorável: ‘Encontrei meu sobrinho nu, deitado, coberto por um lençol, comendo ostras e na mão tendo um livro policial’. Testemunha ocular, Vicente relata do exame oral episódios que levaram o próprio candidato a confessar, na mesma carta à mãe acima citada: ‘Banquei um pouco o cabotino, para impressionar’.4 Em matéria de cabotinismo, veja-se, por exemplo, a prova de francês: ‘Que o senhor conhece da literatura clássica francesa?’ Resposta: ‘Toda’... ‘Desde quando o senhor lê francês?’ ‘Os clássicos, comecei a ler aos nove anos’. Indagado sobre o que havia de notável na principal obra de certo autor, o examinando ‘(e)xcedeu... (r)eproduziu de cor a página mais bonita do livro, aquela que o celebrizara’. No curioso estilo contagiado pelas inversões e inovações rosianas, o parente coruja salienta o entusiasmo dos examinadores: Chegaram a levantar-se de seus lugares e aproximar-se do examinando, perdendo nenhuma de suas respostas e exposições... Ao terminar a última prova, a platéia iniciou palmas, imediatamente interrompidas por psius, para não prejudicar o candidato com a invalidação do exame.5 O triunfo final ganha mais realce pelo contraste com o ponto de partida de Joãozito, ‘desconhecido, modesto, sem nenhum influimento político ou outro qualquer’. Felipe Fortuna destaca também a consagração antecipatória de Rosa por essa via da erudição ostentada no exame. Aos sentimentos que lhe desperta o sucesso, aplica adjetivos como orgulhoso, vencedor, en68

24/11/06 – 20h


vaidecido: ‘Sozinho no Rio de Janeiro, pressionado pelos examinadores, o êxito no concurso revelou uma face imodesta do filho de dona Chiquitinha e seu Florduardo’. Conclui que o aprovado encontrara profissão na qual as qualidades intelectuais, longe de constituírem estorvo, passavam a ajudar suas ambições.6 É interessante aproximar esse verdadeiro rito de passagem, pelo qual começa a manifestar-se ao mundo o talento escondido na província, de episódio similar vivido um século antes por um jovem exilado de 24 anos, o mais tarde presidente e ensaísta argentino Domingo Faustino Sarmiento, na época da história supervisor da mina de Copiapó, no Chile. Eis como o grande argentino evoca a situação, no estilo que lhe era característico e na ortografia então vigente no Chile: Una noche encontramos hospedado a un señor Codecido, pulcro i sibarita ciudadano que se quejaba de las incomodidades i privaciones de la jornada. Saludáronlo todos con atencion, toquéme yo el gorro con encojimiento, i fuí a colocarme en un rincon, por sustraerme a las miradas en aquel traje que me era habitual, dejándole ver, sin embargo, al pasar mi tirador alechugado, que es la pieza principal del equipo. Codecido no se fijó en mí, como era natural con un minero a quien sus patrones consentian que los acompañase, i a haber yo estado mas a mano, me habria suplicado que le trajese fuego, u otra cosa necesaria. La conversacion rodó sobre varios puntos, discreparon en una cosa de hecho que se referia a historia moderna europea, i a nombres jeográficos, e instintivamente Carril, Chenaut, y los demas, se volvieron hácia mí, para saber lo que habia de verdad. Provocado así a tomar parte en la conversacion de los caballeros, dije lo que habia en el caso, pero en términos tan dogmáticos, con tan minuciosos detalles, que Codecido abria a cada frase un palmo de boca, viendo salir las pájinas de un libro de los labios del que habia tomado por apir. Esplicáronle la causa del error en medio de la risa jeneral, i yo quedé desde entonces en sus buenas gracias.7 No livro onde colhi a significativa história, o autor comenta que as roupas e o conhecimento são elementos centrais em narrativa, na qual estaria dissimulado quase um conflito entre eles, no sentido de que, se as roupas sugerem qual é a posição hierárquica de cada um, o conhecimento é que indica quem deveria, na verdade, ocupar a posição dominante na escala social, no caso o autodidata Sarmiento. ‘(O) conhecimento transforma Sarmiento (…) de obscuro empregado, passa a ser alguém ilustre, um cavalheiro como os demais presentes na sala’.8 Para sociedades em transição do predomínio dos estamentos para o de classes, observa, o conhecimento não pode ser desinteressado e acaba por adquirir status de sinal, ao mesmo tempo, de prestígio e de mérito. Cita, a respeito, o texto mimeografado de Antonio Candido, apresentado em seminário sobre Richard Morse, em Washington, e intitulado ‘Literatura: espelho da América?’. Em países e continente nos quais a autonomia do campo intelectual era incipiente e subordinada ao político, os políticos eram quase sempre poetas, romancistas, ensaístas, historiadores, como boa parte das figuras centrais do romantismo no Brasil, na Argentina, no Chile. É o que afirmava Antonio Candido: 69

24/11/06 – 20h


Na América Latina, a literatura foi freqüentemente uma atividade devoradora. Quero dizer que durante a formação nacional dos nossos países quase tudo devia passar por ela, e por isso ela foi uma espécie de veículo que parecia dar legitimidade ao conhecimento da realidade local.9 Os literatos que não se sentiam, no Brasil, com vocação para a política, também ‘atividade devoradora’, tinham uma opção: o emprego público em geral, como Machado de Assis, Lima Barreto e legiões de outros, ou o Itamaraty em particular, mais atrativo para alguns, entre outras razões, pelo apelo da outra margem do mar, pela possibilidade de viajar, de viver em outras terras e de ser pago para isso. Era o caso de Rosa, que, lembra Fortuna, havia escolhido em concurso literário o pseudônimo de Viator, ‘o viajante, o que vai pelas vias e veredas, o andarilho’. O obscuro médico provinciano de Itaguara e Barbacena, cujas roupas certamente deveriam já distingui-lo dos demais candidatos viajados pela Europa e habituados ao cenário ‘estonteante’ do Rio de Janeiro, encontra no concurso o meio de revelar, pela superioridade da erudição e da cultura, que fazia jus ao mandarinato do Itamaraty. Na carreira, poderia dizer como o conselheiro Aires: ‘Não fiz tratados de comércio nem de limites, não celebrei alianças de guerra’. Os colegas diplomatas que lhe dedicaram estudos – o ensaio de interpretação psicológico-filosófica de Heloisa Vilhena de Araujo, a penetrante análise literária de Felipe Fortuna sobre a viagem como elemento do destino humano – esforçaram-se em valorizar, na medida justa e possível, a contribuição propriamente diplomática de Guimarães Rosa. É claro, contudo, que não se deve forçar essa nota além da conta. Magra, de fato, é a colheita de textos burocráticos que se destacam pelo valor estritamente profissional, não apenas pela vigorosa originalidade de estilo que rompe os cânones dos manuais de redação, tal como havia ocorrido antes com o célebre relatório de Graciliano Ramos sobre a prefeitura de Palmeira dos Índios. A rigor, o único grande texto diplomático rosiano é o minucioso estudo e a refutação das queixas limítrofes paraguaias, consubstanciados na ‘Nota n. 92’, de 25 de março de 1966, da Embaixada do Brasil em Assunção, copiosa e exaustiva nota-fleuve de 155 parágrafos, na qual o então chefe da Divisão de Fronteiras do Itamaraty demonstra sua competência como diplomata. Que ele, apesar de haver realizado a tarefa com impecável consciência de funcionário, a tenha, no fundo, considerado ‘maçada grande’, como diria o barão do Rio Branco, fica claro na carta ao seu tradutor italiano Edoardo Bizzarri, transcrita no trabalho de Heloisa Vilhena de Araujo: Pois, você sabe que sou aqui o chefe do Serviço de Demarcação de Fronteiras; e deve ter acompanhado nos jornais o palpitante caso de divergência com o Paraguai, o assunto de Sete Quedas. Imagine, pois, o que comigo sucedeu, de junho do ano passado, até julho deste. Foi uma absurda e terrível época, de trabalho sem parar, de discussões, de reuniões, de responsabilidades. Várias vezes, tive de trabalhar aqui no Itamaraty até as 5 horas da manhã... e comparecer no outro dia já às 9, para reuniões que duravam o dia inteiro. Tudo isso, sob a circunstância de ser, entre os 80 mi70

24/11/06 – 20h


lhões de brasileiros, o que é pago para cuidar do assunto, debaixo do peso dele. E com a saúde – como você sabe. E com o visceral medo de errar, a necessidade compulsiva de cuidar de todos os detalhes, a lentidão meticulosa do mineiro da roça, de terra onde os galos cantam de dia. Assim, fiquei fora e longe de tudo o mais, nem me lembrava que eu era Guimarães Rosa, não respondi às cartas das editoras estrangeiras, perdi dinheiro, sacrifiquei interessantes oportunidades, adoeci mais, soterrei-me.10 Não é segredo para ninguém no Itamaraty que a velha Divisão ou Serviço de Demarcação de Fronteiras era considerada, em circunstâncias normais, um remanso apropriado para quem tem coisas mais interessantes ou prementes para fazer. Tanto assim que chegou, em certos momentos, a desaparecer do organograma do ministério. Não que falte trabalho em fronteiras, mas o essencial do serviço era e é feito pelas duas Comissões Demarcadoras de Limites: a Primeira, sediada em Belém, responsável pela fronteira norte; e a Segunda, com sede no Rio de Janeiro, com jurisdição sobre a linha limítrofe da Bolívia ao Chuí. Ambas confiadas a coronéis reformados do Exército, especialistas em topografia, medições, aposição ou reposição de marcos etc. Sei do que falo porque fui um dos sucessores de Rosa, chefiando a divisão, interinamente, durante mais de um ano, quando meu principal trabalho era a direção da Divisão da América Meridional II (DAM-II) e o titular de Fronteiras encontrava-se em prolongado serviço provisório na Nicarágua. Por conseguinte, quem escolhia chefiar a divisão durante 11 anos, conforme aconteceu com o escritor, era como se abrisse mão de fazer carreira por ter algo muito mais importante a que dedicar o escasso e fugitivo tempo. Foi falta de sorte que, em meio a essa sossegada década, de repente rebentasse uma das raras, raríssimas, disputas limítrofes brasileiras desde que o barão deixou definidas, em negociações ou arbitragens, praticamente todas as fronteiras (aliás, a do Paraguai foi das poucas que estavam já resolvidas antes dele). A imensa maioria dos escritores que tiveram na diplomacia uma base garantida de segurança material, a partir da qual puderam construir obra literária, sabia da impossibilidade de devotar igual tempo e esforço ao serviço e à criação. João Cabral de Melo Neto, com quem convivi quando, após a renúncia de Jânio Quadros, ficou meses de 1961, em Brasília, aguardando que se criasse o prometido consulado em Sevilha (João havia sido chefe de gabinete de seu primo, o efêmero ministro da Agricultura de Jânio, Romero Cabral da Costa), disse-me isso de modo explícito. Perguntei-lhe um dia por que não se candidatava a alguma embaixada, em vez de esperar infindavelmente pela abertura do consulado. Respondeume que sempre preferia os consulados porque lhe permitiam desligar-se física e mentalmente do trabalho ao final do expediente, em geral curto. Do contrário, em funções diplomáticas mais exigentes e prestigiosas do ponto de vista da carreira, não teria tempo, material e espiritual, para a poesia. Os dois, Cabral e Rosa, escolheram certamente a melhor parte, que não lhes será tirada. Quem lembra ainda, por exemplo, os nomes dos ministros ou embaixadores que gozaram dos ‘quinze minutos de notoriedade’ dessa época? O caso do autor de Sagarana é até mais notável, posto que, por duas vezes, foi ele chefe de gabinete do ministro João Neves da Fontoura, lugar cobiçadíssimo pelos carreiristas por 71

24/11/06 – 20h


ser o caminho mais seguro para promoções rápidas e carreira curta. Logo após seu ingresso no concurso, ainda sob a ilusão da descoberta de sua definitiva vocação, havia confidenciado em carta ao pai: ‘Tenho esperança de fazer carreira breve, e para isso empregarei todos os meus esforços, pois penso que descobri minha verdadeira vocação’.11 Para os profissionais, carreira breve é chegar logo a embaixador a fim de poder chefiar no exterior embaixada prestigiosa que renda, ao mesmo tempo, fama, conforto e cabedais. Paradoxalmente, à medida que se aproxima dessa meta, Rosa perde interesse nela, não sai mais do Brasil após oito anos apenas de vida no estrangeiro e morrerá embaixador sem nunca ter tido embaixada. Da mesma forma que em relação à Academia Brasileira de Letras, na qual afinal toma posse para morrer em seguida. Seu destino parece o de Moisés: chegar à terra prometida mas só avistá-la do alto da montanha. A não ser que tenha vislumbrado outra e melhor Canaã mais longe. É o que se suspeita ao ler a entrevista que deu a Günter W. Lorenz: ‘Viajei pelo mundo, conheci muita coisa, aprendi idiomas, recebi tudo isso em mim; mas de escrever não me ocupava mais. Assim se passaram dez anos, até eu poder me dedicar novamente à literatura’.12 Foi a sorte da nossa turma de candidatos ao Itamaraty que ele tivesse tomado a decisão de permanecer na Divisão de Fronteiras, a partir de 1956 até sua morte em 1967. Um ou dois anos antes do nosso exame, que foi em 1958, a prova de cultura geral havia suscitado controvérsia na imprensa. Várias das questões pareciam perguntas de almanaque ou dessas ciladas que se armam contra candidatos a prêmios milionários na televisão. Uma delas era a famigerada indagação: para que lado, o direito ou o esquerdo, está virado o bico do pelicano que ornamenta a capa da edição princeps de Os lusíadas? Era prato cheio para as colunas dos jornais, que obviamente se esbaldaram. Diante do escândalo, o Instituto Rio Branco convidou João Guimarães Rosa a incumbir-se, junto com o folclorista e historiador Renato de Almeida, da prova de cultura geral, a última e não-eliminatória, apenas classificatória, da longa série, que durava quase dois meses. Não sabíamos àquela altura que, anos antes, em 1952, o autor de Grande sertão havia apresentado ao diretor do Instituto Rio Branco sugestões para o programa do concurso, com ênfase na parte relativa justamente à cultura geral. Nas notas que encaminhou ao diretor, reproduzidas no estudo de Heloisa Vilhena de Araujo, partia-se do objetivo da prova, que era o de apreciar... também os conhecimentos – científicos, artísticos, eruditos, ilustrativos etc. – adquiridos seja mediante aprofundamento extraordinário nas matérias dos cursos ginasial e colegial, seja em cursos outros, seja extracurricular e autodidaticamente, através de leituras e outros meios de informação e enriquecimento do espírito. Tais conhecimentos, especificava-se, deveriam ser ‘suplementares ou complementares, transcendentes da rotina escolar, bem assimilados e sedimentados’. O resultado esperado é que tivessem contri72

24/11/06 – 20h


buído para ‘a formação do candidato e (fossem) resultantes de curiosidade intelectual e capacidade mental, do gosto pela indagação objetiva ou especulativa, de vocação cultural e consciência humanística’. Insistia-se em que o objetivo do exame era a aferição do ‘saber gratuito e da cultura de informação, básica, variada e pragmaticamente utilizável’, evitando-se tudo que induzisse ao ‘estudo utilitário, para exame, as leituras apressadas, adrede feitas, a memorização artificial interessada’.13 Tendo assim fixado a teoria do exame de cultura geral, vejamos como se saiu o escritor-pedagogo ao ter de convertê-la em prática. Foi quase há meio século, mas recordo bem das circunstâncias. Estávamos exaustos após a seqüência infindável de provas escritas, dos dificílimos exames orais de língua, do nervosismo de esperar as notas, de apresentar pedidos de revisão das correções. Os que tínhamos sobrado das eliminações formávamos um grupinho rarefeito de 13 ou 14, já com incipiente solidariedade de grupo, nascida da ansiedade e do sofrimento em comum. À medida que avançava o ano, aumentava o calor, e nós, mergulhados em livros, mal podíamos acompanhar de relance nas manchetes dos jornais tudo o que nos oferecia de surpresas a história, o retorno ao poder de De Gaulle, o grande ‘salto para frente’ na China, já naqueles distantes dias o Iraque, onde o rei Faiçal e sua família haviam sido massacrados, no mesmo mês que assistira à intervenção militar norte-americana no Líbano. Nada de novo sobre a face da Terra... No Brasil, Juscelino, constantemente acossado por Carlos Lacerda, a ‘banda de música’ da UDN no Congresso, os brigadeiros e coronéis golpistas de Aragarças e Jacareacanga, chegava à metade triunfante dos ‘50 anos em cinco’, das metas, da construção de Brasília, da ruptura com o Fundo Monetário. Era a época de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, das colunas de Drummond e Bandeira no Jornal do Brasil ou no Correio da Manhã, das crônicas de Rubem Braga, da bossa nova de Jobim e Vinícius. Clarice Lispector preparava Laços de família e Maçã no escuro. Depois dos dez anos que se seguiram a Sagarana, Rosa publicara, em 1956, Corpo de baile e Grande sertão: veredas. Foi ele, aliás, já escritor consagrado, chefe de divisão com autoridade na Casa, que comandou nosso exame. Renato de Almeida estava presente, pequeno, roliço, sorridente, mas não me lembro de que tivesse tido algum papel. Guimarães Rosa apresentou-se como o vemos nas fotografias, de gravata borboleta de bolinhas, paletó bege, óculos de lentes grossas. Indicou-nos no quadro-negro os dois temas escolhidos. O primeiro eram os versos de Tomás Antônio Gonzaga: O sábio Galileu toma o compasso E sem voar ao céu, calcula, e mede, Das estrelas e sol, o imenso espaço. O segundo era uma frase do católico Gustavo Corção, de quem hoje ninguém mais fala, mas que escrevera na época livros notáveis, como Lições de abismo e A descoberta do outro: ‘Como explicar a desordem do mundo?’ 73

24/11/06 – 20h


Recusou dar explicações ou conselhos. O desafio de cultura consistia justamente na maneira de enfrentar e resolver o enigma dos dois textos. Só agora, ao preparar esta evocação daquela jornada, vim a tomar conhecimento, pelo livro de Heloisa Vilhena de Araujo, de que, nas notas de 1952 ao diretor do Instituto Rio Branco, se achava decifrada a chave do exame: O exame de cultura geral deverá permitir sejam levadas em conta as afirmações de erudição em quaisquer ramos do saber humano, prestando-se além disso a medir, de cada examinando, não só o cabedal de informações, mas também, tanto quanto possível, a coordenação das mesmas e sua dinâmica capacidade associativa. E, mais significativamente: Convém que as dissertações se dêem sobre temas de caráter geral, que permitam, pela variedade de seus aspectos, o máximo de ilações, associações e ilustrações, num tratamento revelador da pluralidade de conhecimento do candidato.14 Não sei mais o que escrevi, nem se essas provas sobrevivem ainda nos arquivos do Rio Branco. O exame, exclusivamente escrito, foi comprido. ‘A prova deverá ser de duração suficientemente longa, num mínimo de tempo de cinco horas’, rezavam as notas, porque ‘à cultura inerem as condições de meditação e calma’. Guardo lembrança vaga de que não esgotei o tempo, mas cheguei perto. Quando penso hoje no exame, o único de que conservo melhor memória de todas aquelas provas, vejo que a intenção do examinador provavelmente seria a de contrastar a ordem física do universo, na era em que existiam todavia as certezas da astronomia newtoniana, com a desordem do universo moral. Terei percebido o vínculo naquele momento? Quem sabe? Apenas lembro que meu texto respirava as influências católicas francesas que me formaram, Bernanos, Mauriac, Maritain, Teilhard de Chardin, os grandes mestres da espiritualidade beneditina; no Brasil, a marca preponderante de Alceu de Amoroso Lima. Diversas vezes citei Camões, as redondilhas ‘Sobre os rios que vão’, por exemplo: Não basta minha fraqueza Para me dar defensão, Se vós, santo Capitão, Nesta minha fortaleza Não puserdes guarnição. O que mais chamou a atenção do examinador foi o verso também de Camões com que terminei a dissertação: ‘Mas o melhor de tudo é crer em Cristo’. 74

24/11/06 – 20h


Não era das redondilhas citadas nem de poema conhecido. Tanto que Rosa veio falar comigo – ele havia tido tempo de olhar o começo e o fim da redação – para questionar onde havia eu pescado aquela pérola. Hoje, não saberia o que responder, mas, naquele momento, a erudição pronta e infalível de quem há meses queimava as pestanas no estudo ditou-me a resposta na ponta da língua. Terá ele lembrado do cabotinismo do seu próprio exame, da vaidade ingênua com que enfrentara os examinadores? Tenho boas razões para suspeitar de que fluiu entre nós corrente de simpatia e afinidade, seja pela recordação de outro provinciano deslocado no cenário de luxo da biblioteca, seja devido às referências religiosas e místicas de texto com algum apelo para quem vivia sempre em busca da ‘terceira margem do rio’. No Itamaraty, via-o às vezes de longe, ouvia as histórias que dele se contavam, o famoso caderninho onde anotava as palavras e expressões pouco usuais em meio à reunião dos países amazônicos em Manaus, o gosto de escrever de pé naquelas escrivaninhas inglesas dos contadores de antigamente. Os caminhos da carreira nos separaram; logo após a conclusão do curso do Rio Branco, voluntariei-me para trabalhar em Brasília. Servia no exterior, em Buenos Aires, quando ele morreu. De Rosa, o que me ficou foi aquele encontro fugaz de algumas horas, na Biblioteca do Itamaraty, o diálogo do examinador curioso por citação que não conhecia e o candidato que reproduzia, sem saber, a ponta de desafio do provinciano, médico obscuro de Barbacena, exilado capataz da mina de Copiapó, que parte à conquista do mundo armado apenas de leituras, erudição, conhecimento, esboço de cultura. Na procura da sempre-fugidia terceira margem do rio, o viajante descobriu, como lembra Felipe Fortuna, que viajar pelo sertão é a mesma coisa que viajar pelo mundo. Deixou-se ficar no país profundo do qual na verdade não tinha jamais saído. Descobriu também que fazer carreira breve valia pouco diante do mundo que podia criar com a palavra. E soube dar a resposta certa à pergunta do Evangelho: ‘De que vale ao homem ganhar o mundo inteiro se vier a perder sua alma?’

NOTAS 1 COSTA E SILVA, Alberto da (org.). Brasília: Instituto Rio Branco, 2001. 2 ARAUJO, Heloisa Vilhena de. Guimarães Rosa: diplomata. Rio de Janeiro/Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão/Ministério das Relações Exteriores, 1987. 3 GUIMARÃES, Vicente. São Paulo: Panda Books, 2006. 4 “Carta de 07 de julho de 1934”. In: GUIMARÃES ROSA, Vilma. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983. 5 GUIMARÃES, Vicente. Op. cit., 2006. 6 FORTUNA, Felipe. “Guimarães Rosa, viajante”. In: COSTA E SILVA, Alberto da (org.). Op. cit. 7 SARMIENTO, Domingo Faustino. Recuerdos de provincia. Apud RICUPERO, Bernardo. O romantismo e a idéia de nação no Brasil (1830-1870). São Paulo: Martins Fontes, 2004. 8 RICUPERO, Bernardo. Op. cit. 9 Remate de Males. Número especial sobre Antonio Candido. Campinas, 1999. 10 ARAUJO, Heloisa Vilhena de. Op. cit. Grifo meu. 11 “Carta de 21 de agosto de 1934”. In: GUIMARÃES ROSA, Vilma. Op. cit. 12 Apud FORTUNA, Felipe. Op. cit. 13 ARAUJO, Heloisa Vilhena de. Op. cit. 14 Ibidem.

75

24/11/06 – 20h


Acervo do Ăšltima Hora/Arquivo do Estado de SĂŁo Paulo


GUIMARÃES ROSA POR ELE MESMO

O escritor no meio do redemunho “Todos os meus livros são simples tentativas de rodear e devassar um pouquinho o mistério cósmico, esta coisa movente, impossível, perturbante, rebelde a qualquer lógica, que é a chamada ‘realidade’, que é a gente mesmo, o mundo, a vida.” A definição do autor de Sagarana e Grande sertão: veredas para seus próprios livros revela as ambições secretas de uma obra geralmente lida sob o signo do regionalismo. Recorrente nos depoimentos, entrevistas, artigos na imprensa e cartas nos quais Guimarães Rosa comenta sua literatura, a dimensão metafísica não cancela, antes amplifica, os limites geográficos de seu imaginário poético: “Sou regionalista porque o pequeno mundo do sertão (...), este mundo original e cheio de contrastes, é para mim o símbolo, diria mesmo o modelo de meu universo” – continua ele, numa série de variações sobre os temas que percorrem sua obra e que, reunidos nesta seção dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, mostram como, além de personagens e enredos, o escritor inventou também uma idéia de literatura em que inscreve suas veredas ficcionais. Tais declarações reiteram a imagem consagrada de Guimarães Rosa como um arqueólogo literário que, caderneta em punho, percorreu a imensidão sertaneja anotando histórias e palavras para compor seus afrescos (“Todos os meus personagens existem”), do poeta que reinventou a língua como um gesto de transcendência (“O idioma é a única porta para o infinito”) ou ainda do gnóstico que espreitava o absoluto em cada desvão, projetando sobre o papel suas inquietações (“Minha vida sempre e cedo se teceu de sutil gênero de fatos. Sonhos premonitórios, telepatia, intuições, séries encadeadas fortuitas, toda a sorte de avisos e pressentimentos... Sou um contemplativo fascinado pelo Grande Mistério”). Mas surge daqui também o retrato do escritor atento às observações de leitores e críticos – em quem enxerga a tarefa de “completar uma obra junto com o autor” – e como um laborioso artífice da palavra, em constante interlocução com seus tradutores – aos quais aponta a fronteira entre a linguagem arcaizante, enraizada na tradição lusófona, e as fusões idiomáticas realizadas pelo diplomata erudito e poliglota para, convertido em demiurgo, consumar sua Obra Total: “Quando escrevo um livro, vou fazendo como se o estivesse ‘traduzindo’, de algum alto original, existente alhures, no mundo astral ou no ‘plano das idéias’, dos arquétipos”. 77

24/11/06 – 20h


Primeiras estórias: infância

bio ou de São Francisco, ou de Sapakral-lal (velho nome inventado), com todas as curvas dos ditos, com as cidades marginais marcadas por grupos de pedrinhas, tudo isso sob o vôo matinal das maitacas de Nhô Augusto Matraga, no quintal.”

“É um tempo de coisas boas, mas sempre com pessoas grandes incomodando a gente, intervindo, estragando os prazeres. Recordando o tempo de criança, vejo por lá um excesso de adultos, todos eles, mesmo os mais queridos, ao modo de soldados e policiais do invasor, em pátria ocupada.”

(“O homem Guimarães Rosa segundo Renard Perez”. Jornal do Brasil, 19.11.1967)

(“Viagens imaginárias – O sertão e as veredas de Guimarães Rosa”. Manchete, 20.07.1991)

“Eu nunca me apaixonei por um autor. Poucos autores me influenciaram, muito poucos. O que mais me influencia é a vida, a rua, o sertão. E tudo pode contribuir para me influenciar: uma lata de lixo, uma lâmpada, uma farmácia, uma feijoada, uma trombada, tudo.”

“Gostava de armar alçapões para apanhar sanhaços – e depois tornar a soltá-los. Que maravilha! Puxar sabugos e espigas de milho feito boizinhos de carro, brinquedo saudoso: atrelar um sabugo branco com outro vermelho, e mais uma junta de bois pretos – sabugos enegrecidos ao fogo. Prender formiguinhas em ilhas, que eram pedras postas num tanque raso, e unidas por pauzinhos, pontes, para a formiguinha passar. Aproveitar um fiozinho de água, que vinha do posto das lavadeiras, e mudarlhe duas vezes por dia o curso, fazendo de DanúHamburgo (1938)/Acervo da família Tess

“Leio muito pouco, quase não tenho tempo. Os livros que leio são os que estão em moda, e, também, os escritos dos amigos. Gosto mesmo é de ouvir conversas. Com pessoas estranhas, de preferência. Ouvir a vida para poder transmiti-la. Se a gente lê muito, em demasia, acaba contando coisas que todo mundo já sabe. É preciso dar coisas novas, há milhares de coisas novas para dar. É descobri-las.” (“Guimarães Rosa fala aos jovens”. O Cruzeiro, 23.12.1967)

“Fui médico, rebelde, soldado. Foram etapas importantes de minha vida, e, a rigor, esta sucessão constitui um paradoxo. Como médico conheci o valor místico do sofrimento; como rebelde, o valor da consciência; como soldado, o valor da proximidade da morte... (...) É uma escala de valores (...). Estas três experiências formaram até agora meu mundo interior; e, para que isto não pareça demasiadamente simples, queria acrescentar que também configuram meu mundo a diplomacia, o trato com cavalos, vacas, religiões e idiomas.” “Nós, homens do sertão, somos fabulistas por natureza. (...) No sertão, o que pode uma pessoa fazer de seu tempo livre a não ser contar estórias? A única diferença é simplesmente que eu, em vez de contá-las, escrevia. (...) Eu trazia sempre os ouvidos atentos, escutava tudo o que podia e comecei a 78

24/11/06 – 20h


se formou aos poucos, em 1950, no estrangeiro, avançando somente quando a saudade me obrigava, talvez também sob razoável ação do vinho ou do conhaque. Quanto ao Grande sertão: veredas, forte coisa e comprida demais seria tentar fazer crer como foi ditado, sustentado e protegido – por forças ou corrente muito estranhas.”

transformar em lenda o ambiente que me rodeava, porque este, em sua essência, era e continua sendo uma lenda.” “Comecei a escrever no tempo certo, mas demasiado tarde. Apesar de ser verdade, isto também é um paradoxo. Não me posso permitir uma morte prematura, pois ainda trago dentro de mim muitas, muitíssimas estórias.”

(Prefácio “Sobre a escova e a dúvida”. In Tutaméia)

“Para mim, Cordisburgo sempre foi uma Europa em miniatura. Amamos a Europa como, por exemplo, se ama uma avó.”

“Sagarana é um cordel com que amarrei um livro. Sagarana é o primeiro. A chave que abriria a porta de meus triunfos.”

(“Diálogo com Guimarães Rosa”, Günter Lorenz. Congresso de Escritores Latino-Americanos, Gênova, janeiro de 1965. In Ficção completa, Volume I. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, pp. 31-61)

(sobre a história de Miguilim): “Nela acho tudo o que já escrevi até agora e talvez mesmo tudo o que venha a escrever na minha vida. Nessa história está o germe, a semente de tudo.” (sobre Riobaldo): “Modelei-o sem que pensasse em algum exemplo vivo. É como procedo sempre. Posso afirmar, até o ponto onde poderei saber, que sou um dos escritores menos autobiográficos. Minha isenção é a maior possível.”

Todas as estórias

“No plano da arte e criação – já de si em boa parte subliminar ou supraconsciente, entremeando-se nos bojos do mistério e equivalente às vezes quase à reza – decerto se propõem mais essas manifestações. Talvez seja correto eu confessar como tem sido que as estórias que apanho diferem entre si no modo de surgir. A ‘Buriti’ (Noites do sertão), por exemplo, quase inteira, ‘assisti’, em 1948, num sonho duas noites repetido. ‘Conversa de bois’ (Sagarana), recebi-a, em amanhecer de sábado, substituindo-se a penosa versão diversa, apenas também sobre viagem de carro-de-bois e que eu considerara como definitiva ao ir dormir na sexta. ‘A terceira margem do rio’ (Primeiras estórias) veiome, na rua, em inspiração pronta e brusca, tão ‘de fora’ que instintivamente levantei as mãos para ‘pegá-la’, como se fosse uma bola vindo ao gol e eu o goleiro. ‘Campo geral’ (Manuelzão e Miguilim) foi caindo já feita no papel, quando eu brincava com a máquina, por preguiça e receio de começar de fato um conto, para o qual só soubesse um menino morador à borda da mata e duas ou três caçadas de tamanduás e tatus; entretanto, logo me moveu e apertou, e, chegada ao fim, espantou-me a simetria e ligação de suas partes. O tema de ‘O recado do morro’ (No Urubuquaquá, no Pinhém)

“Todos os meus personagens existem. São criaturas de Minas: jagunços, vaqueiros, fazendeiros, pactários de Deus e do Diabo, meninos pobres, mulheres belas, moradores do Urucuia e redondezas.” (“Guimarães Rosa segundo terceiros”. Realidade, julho de 1967)

“Primeiras estórias é, ou pretende ser, um manual de metafísica e uma série de poemas modernos. Quase cada palavra, nele, assume pluralidade de direções e sentidos, tem uma dinâmica espiritual, filosófica, disfarçada. Tem de ser tomado de um ângulo poético, anti-racionalista e anti-realista (...). É um livro contra a lógica comum, e tudo nele parte disso. Só se apóia na lógica para transcendêla, para destruí-la.” (carta a J.-J. Villard, seu tradutor para o francês, 14.10.1963) 79

24/11/06 – 20h


“Não sou romancista; sou um contista de contos críticos. Meus romances e ciclos de romances são na realidade contos nos quais se unem a ficção poética e a realidade.”

“Voltando ao ‘Dão-Lalalão’, isto é, aos curtos trechos em que assinalei as ‘alusões’ dantescas, apocalípticas e cântico-dos-canticáveis (...). Como você vê, foi intencional tentativa de evocação daqueles clássicos textos formidáveis, verdadeiros acumuladores ou baterias, quanto aos temas eternos. Uma espécie do que é a inserção (...) da glosa de versículo de São João (Evangelho) no Crime e castigo de Dostoiévski. Com a diferença que, no nosso caso, ainda que tosca e ingenuamente, o efeito visado era o de inoculação, impregnação (ou simples ressonância) subconsciente, subliminal. Seriam espécie de sub-para-citações (?!?): isto é, só células temáticas, gotas da essência, esparzidas aqui e ali, como tempero, as ‘fórmulas’ ultra-sucintas.”

“A gente do sertão, os homens de meus livros (...) vivem sem consciência do pecado original; portanto, não sabem o que é o bem e o mal. Em sua inocência, cometem tudo o que nós chamamos ‘crimes’, mas que para eles não o são. Alguma coisa deste modo de pensar se conservou até mesmo na justiça de muitos países civilizados. Pense na distinção entre assassinato premeditado e homicídio irrefletido, ou no que os franceses chamam ‘crime passional’, o assassinato por ciúmes etc. Isto marca limites. No sertão, cada homem pode se encontrar ou se perder. As duas coisas são possíveis. Como critério, ele tem apenas sua inteligência e sua capacidade de adivinhar. Nada mais. E assim se explica também aquele provérbio sertanejo que à primeira vista parece outro paradoxo, mas que expressa uma verdade muito simples: o diabo não existe, por isso ele é tão forte.”

“(...) como eu, os meus livros, em essência, são ‘anti-intelectuais’ – defendem o altíssimo primado da intuição, da revelação, da inspiração sobre o bruxulear presunçoso da inteligência reflexiva, da razão, a megera cartesiana. Quero ficar com o Tao, com os Vedas e Upanixades, com os Evangelistas e São Paulo, com Platão, com Plotino, com Bergson, com Berdiaeff – com Cristo, principalmente. Por isto mesmo, como apreço de essência e acentuação, assim gostaria de considerá-los: a) cenário e realidade sertaneja: 1 ponto; b) enredo: 2 pontos; c) poesia: 3 pontos; d) valor metafísico-religioso: 4 pontos. Naturalmente, isto é subjetivo, traduz só a apreciação do autor, e do que o autor gostaria, hoje, que o livro fosse. Mas, em arte, não vale a intenção. Dei toda esta volta, só para reafirmar a você que os livros, o Corpo de baile principalmente, foram escritos, penso eu, neste espírito.”

“Riobaldo não é Fausto, e menos ainda um místico barroco. Riobaldo é o sertão feito homem e é meu irmão. (...) É mundano demais para ser místico, é místico demais para ser Fausto; o que chamam barroco é apenas a vida que toma forma na linguagem.” “Riobaldo é algo assim como Raskolnikov, mas um Raskolnikov sem culpa, e que entretanto deve expiá-la. Mas creio que Riobaldo também não é isso; melhor: é apenas o Brasil.” (Apud Günter Lorenz. Op. cit., pp. 35-60)

(João Guimarães Rosa – Correspondência com seu tradutor italiano Edoardo Bizzarri. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003, pp. 86-91)

“Eu carrego um sertão dentro de mim, e o mundo no qual eu vivo é também o sertão. As aventuras não têm tempo, não têm princípio nem fim. E meus livros são aventuras, para mim são a minha maior aventura. Escrevendo, descubro sempre um novo pedaço de infinito. Vivo no infinito, o momento não conta.”

“Todos os meus livros são simples tentativas de rodear e devassar um pouquinho o mistério cósmico, esta coisa movente, impossível, perturbante, rebelde a qualquer lógica, que é a chamada ‘realidade’, que é a gente mesmo, o mundo, a vida. Antes o obscuro que o óbvio, que o frouxo. Toda lógica contém inevitável dose de mistificação. To-

(“Viagens imaginárias – O sertão e as veredas de Guimarães Rosa”. Manchete, 20.07.1991) 80

24/11/06 – 20h


rado, como que ‘tomado’, em transe. Aquele livro me cansou fisicamente. Acabei extenuado. Deume, porém, um enorme prazer. Sensação igual só senti ao escrever ‘Miguilim’. Foi outro ‘clarão’ que recebi na vida.”

da mistificação contém boa dose de inevitável verdade. Precisamos também do obscuro.” (Guimarães Rosa – Correspondência com seu tradutor alemão Curt Meyer-Clason (1958-1967). Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003, p. 238)

(Sagarana emotiva: cartas de J. Guimarães Rosa a Paulo Dantas. São Paulo: Duas Cidades, 1975, pp. 25-29)

“Na literatura (...) há muito de penoso sacerdócio. É uma posição que se assume muito seriamente, importantemente perante o mundo. Persigo sempre as formas mais altas. Sou um homem de vida ascética. Naquela vitrola que você viu no meu apartamento toco muito disco de Luiz Gonzaga, de Tonico e Tinoco. Aprecio a autêntica música sertaneja; gosto de modas de viola. Usei algumas em meus livros, recriando-as, em forma de contracanções. O folclore existe para ser recriado. Receio demais os lugares-comuns, as descrições muito exatas, os crepúsculos certinhos, tipo cartões postais. Se abusa muito disso na ficção nacional.”

Ave, linguagem

“O idioma é a única porta para o infinito, mas infelizmente está oculto sob montanhas de cinza.” (“Viagens imaginárias – O sertão e as veredas de Guimarães Rosa”. Manchete, 20.07.1991)

“No Brasil a linguagem ainda não se libertou. Está virgem. Há um campo imenso para explorar, novas formas, maior flexibilidade, maior expressividade. Em suma: é preciso cultivar a expressividade da língua.”

Fundo João Guimarães Rosa – Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros – USP

(sobre Grande sertão: veredas): “Os caboclos ‘baixaram’ em mim... Só escrevo altamente inspi-

81

24/11/06 – 20h


“Eu não crio palavras. Elas todas estão nos clássicos, estão nos livros arcaicos portugueses. São expressões de muito valor que eu pretendo salvar. Em Sertão: veredas há palavras que nem em Portugal se falam mais. Mas existem. Para determinadas passagens, entretanto, não existem palavras. Então é preciso criá-las, ou redescobri-las através de sons que a correspondam.”

língua como meu elemento metafísico, o que sem dúvida tem suas conseqüências. Depois, existem as ilimitadas singularidades filológicas, digamos, de nossas variantes latino-americanas do português e do espanhol, nas quais também existem fundamentalmente muitos processos de origem metafísica, muitas coisas irracionais, muito que não se pode compreender com a razão pura.”

(“Guimarães Rosa fala aos jovens”. O Cruzeiro, 23.12.1967)

“Nosso português brasileiro é uma língua mais rica, inclusive metafisicamente, que o português falado na Europa. E, além de tudo, tem a vantagem de que seu desenvolvimento ainda não se deteve; ainda não está saturado.”

“A filosofia é a maldição do idioma. Mata a poesia, desde que não venha de Kierkegaard ou Unamuno, mas então é metafísica.”

“Há meu método que implica na utilização de cada palavra como se ela tivesse acabado de nascer, para limpá-la das impurezas da linguagem cotidiana e reduzi-la a seu sentido original. Por isso (...) eu incluo em minha dicção certas particularidades dialéticas de minha região, que são linguagem literária e ainda têm sua marca original, não estão desgastadas e quase sempre são de uma grande sabedoria lingüística. Além disso, como autor do século XX, devo me ocupar do idioma formado sob a influência das ciências modernas e que representa

“Pode-se conhecer facilmente o caráter de um homem pela relação que ele mantém com o idioma (...). Elegância demasiada é suspeita, porque encobre um vazio. (...) O brasileiro, até mesmo no sentido filosófico, fala com sinceridade. Ele ainda deve criar sua própria linguagem. Isso também o obriga a pensar com sinceridade.”

Hamburgo (1938)/Acervo da família Tess

“Há dois componentes de igual importância na minha relação com a língua. Primeiro: considero a

82

24/11/06 – 20h


uma espécie de dialeto. E também está à minha disposição esse magnífico idioma já quase esquecido: o antigo português dos sábios e poetas daquela época dos escolásticos da Idade Média, tal como se falava, por exemplo, em Coimbra. (...) Assim nasce então meu idioma que, quero deixar bem claro, está fundido com elementos que não são de minha propriedade particular, que são acessíveis igualmente para todos os outros.”

gado nas mãos de uns poucos ignorantes com vontade de fazer experiências. O que chamamos hoje de linguagem corrente é um monstro morto. A língua serve para expressar idéias, mas a linguagem corrente expressa apenas clichês e não idéias.” “Gostaria de ser considerado um reacionário da língua. Sou precisamente um escritor que cultiva a idéia antiga, porém sempre moderna, de que o som e o sentido de uma palavra pertencem um ao outro. Vão juntos. A música da língua deve expressar o que a lógica da língua obriga a crer.”

“A linguagem e a vida são uma coisa só. Quem não fizer do idioma o espelho de sua personalidade não vive; e como a vida é uma corrente contínua, a linguagem também deve evoluir constantemente. Isso significa que, como escritor, devo me prestar contas de cada palavra e considerar cada palavra o tempo necessário para ela ser novamente vida.”

“O melhor dos conteúdos de nada vale, se a língua não lhe faz justiça. O caso de Zola prova isso. E o conteúdo mais perigoso chega a ter uma função humana, se estiver expresso em uma linguagem poética, isto é, humana; Astúrias é a prova.”

“O bem-estar do homem decorre do descobrimento do soro contra a varíola e as picadas de cobras, mas também depende de que ele devolva à palavra seu sentido original. Meditando sobre a palavra, ele se descobre a si mesmo. Com isto repete o processo da criação. Disseram-me que isto era blasfemo, mas eu sustento o contrário. Sim!, a língua dá ao escritor a possibilidade de servir a Deus corrigindo-o, de servir ao homem e de vencer o diabo, inimigo de Deus e do homem.”

“Não se pode explicar a palavra ‘saudade’ em seu sentido lusitano, sem remontar à mentalidade lingüística portuguesa (...). Um português não precisa explicá-la; já nasce com ela, leva-a dentro de si. Conhece-a com o coração, não com a cabeça. Assim acontece com a ‘brasilidade’ (...). Existem elementos da língua que não são captados pela razão; para eles são necessárias outras antenas.” (Apud Günter Lorenz. Op. cit., pp. 33-55)

“Aprendi algumas línguas estrangeiras apenas para enriquecer a minha própria e porque há demasiadas coisas intraduzíveis, pensadas em sonhos, intuitivas, cujo verdadeiro significado só pode ser encontrado no som original. Quem quiser entender corretamente Kierkegaard tem de aprender dinamarquês; do contrário, nem a melhor tradução o ajudaria.”

“Quase sempre as dúvidas decorrem do ‘vício’ sintático, da servidão à sintaxe vulgar e rígida, doença de que todos sofremos. Duas coisas convém ter sempre presente: tudo vai para a poesia, o lugar-comum deve ter proibida a entrada, estamos é descobrindo novos territórios do sentir, do pensar e da expressividade; as palavras valem ‘sozinhas’. Cada uma por si, com sua carga própria, independentes, e às combinações delas permitem-se todas as variantes e variedades.”

“Antes, quando o mundo ainda era menor, parecia natural que toda pessoa instruída dominasse dois ou três idiomas. Hoje em dia, quando de repente o mundo é muito mais amplo, não pode ser suficiente um só idioma, que nem sequer é dominado com exatidão. Não tem sentido. E esta é a razão pela qual aprendi línguas.”

(Guimarães Rosa – Correspondência com seu tradutor alemão Curt Meyer-Clason (1958-1967), p. 314)

“Deus era a palavra e a palavra estava com Deus. Este é um problema demasiado sério para ser lar-

“Quase todas as expressões empregadas no Primeiras estórias não são tiradas da linguagem co83

24/11/06 – 20h


estava reconhecendo. Junto de uma palmeira descobri: eu havia descrito a estrada em Sagarana, veja só. Também um dia passei todo o tempo observando uma cobra cascavel – o que ela fazia, o que ela pensava fazer. Sempre se descobre alguma coisa nova se se olha com atenção. Quem olha estudiosamente fotografa o momento e o revela na retina.”

mum, mas sim criadas por mim (...), de modo que, também para o leitor brasileiro, elas soam novas, estranhas, completamente inéditas.” (Carta a J.-J. Villard, 23.12.1964)

As margens do ofício

“Quando escrevo não penso no estilo, na obra, no compromisso. Esqueço tudo e só penso no assunto. Porque quando eu digo ‘a lua está assim’ é porque ela está ‘assim’. Já passei muitas noites acordado – noites inteiras – para ver como é a lua, como é a escuridão. Sem vê-la demoradamente é impossível descrevê-la. É preciso vê-la passar, ver as suas mudanças de cores, sentir seu ar (é um ar todo especial), seu jeito.”

“Eu, quando escrevo um livro, vou fazendo como se o estivesse ‘traduzindo’, de algum alto original, existente alhures, no mundo astral ou no ‘plano das idéias’, dos arquétipos, por exemplo. Nunca sei se estou acertando ou falhando, nessa ‘tradução’. Assim, quando me ‘re’-traduzem para outro idioma, nunca sei, também, em casos de divergência, se não foi o tradutor quem, de fato, acertou, restabelecendo a verdade do ‘original ideal’, que eu desvirtuara...”

“Uma noite eu vinha com uma boiada pela estrada. Caiu o sol e os animais começaram a dormir. E eu comecei a observá-los. Vi-os dormir. Descobri muita coisa com eles. Anotei tudo.”

(João Guimarães Rosa – Correspondência com seu tradutor italiano Edoardo Bizzarri, p. 99)

“Gosto de me comparar com um cozinheiro – estou na cozinha fazendo a comida que vocês comerão. Não sei o que se passa no restaurante, quer dizer, nas correntes literárias.”

“Eu procuro captar o fato, o momento – como no cinema! –, para colocar o leitor dentro da trama. O leitor precisa conviver com os personagens. Mas, para captar este momento é preciso que o autor esteja no momento. Por isso eu tenho meus caderninhos que me acompanham em todas minhas viagens. Eu amarro um lápis com duas pontas e, no sertão, até em cima do cavalo eu escrevo. É o momento. Um passarinho faz um movimento – eu capto o movimento. Na hora, e o escrevo como o vejo. Mas só naquele momento eu poderia registrá-lo. Jamais poderia guardá-lo na cabeça para dali a algumas horas ir me inspirar nele para compor. Não. Não teria valor.”

“Começando a escrever eu me desligo. Dedico-me apenas a meus personagens, à minha inspiração. Muita gente diz que é difícil ler minhas obras. Não é difícil. E não precisa ler em voz alta, como muita gente que conheço, para assimilar. Basta ler, ler com atenção. Você pensa que não está entendendo mas mentalmente está.” “Quando se está escrevendo tudo é um ímã. As palavras se atraem, os assuntos também. E vai-se escrevendo, sem parar (importante não parar). Se eu paro para olhar meu estilo, como vai indo, eu começo a me copiar (...). O segredo é pensar na coisa (impossível definir essa coisa), você entende? Como no cinema. A coisa está ali, na tela, vai-se desenvolvendo. Nos meus romances muitas vezes eu fecho os olhos e deixo a ação se desenrolar. Por exemplo, em Sagarana. Eu gosto de lê-lo com os olhos fechados (engraçado isso, né?). Vendo. Sentindo o cheiro.”

“Sentado numa mesa ninguém é genial. Tem-se de estar perto. Cair em pensamento é voltar a reminiscências, e isso fatalmente é o fim. A coisa tem de ser capturada viva, na hora. Por esta razão algumas frases minhas são duras, ásperas, rudes. Mas são palpitantes, acho. Elas correspondem a uma verdade que realmente aconteceu.” “Uma vez eu passava por uma estrada no interior e reconheci o caminho. Não sabia de onde, mas o 84

24/11/06 – 20h


“Quando acabo um livro já estou com outro na cabeça. Esta nova idéia tem preferência sobre as demais, eu penso sempre que o novo escrito vai ser melhor que todos os demais. É a busca do diferente, todos nós devemos cultivá-la. Quando o artista começa a copiar a si mesmo está fracassando, em plena decadência.”

não deve se transformar em um computador. Não deve abandonar as zonas do irracional, ou então deixa de produzir literatura e só produz papel.” (Apud Günter Lorenz. Op. cit., pp. 34-57)

“Todos os meus livros foram escritos em sete meses. Levei mais quatro meses para retocá-los, cada um.”

(“Guimarães Rosa fala aos jovens”. O Cruzeiro, 23.12.1967)

“Meus cadernos cheiram a suor de cavalo, de boi. Estão impregnados dos cheiros do sertão.” “A poesia profissional, tal como se deve manejá-la na elaboração de poemas, pode ser a morte da poesia verdadeira. Por isso retornei à ‘saga’, à lenda, ao conto simples, pois quem escreve estes assuntos é a vida e não a lei das regras chamadas poéticas. Então comecei a escrever Sagarana.”

(“Guimarães Rosa segundo terceiros”. Realidade, julho de 1967)

“Em geral, quase toda frase minha tem de ser meditada. Quase todas, mesmo as aparentemente curtas, simplórias, comezinhas, trazem em si algo de meditação ou de aventura. Às vezes, juntas, as duas coisas: aventura e meditação. Uma pequena dialética religiosa, uma utilização, às vezes, do paradoxo; mas sempre na mesma linha constante, que, felizmente, o Amigo já conhece, pois; mais felizmente ainda, somos um pouco parentes, nos planos, que sempre se interseccionam, da poesia e da metafísica.”

“Não costumo conversar se antes não posso pensar tranqüilamente e ir até o final. (...) E também choco meus livros. Uma palavra, uma única palavra ou frase podem me manter ocupado durante horas ou dias. Para isso, não preciso forçosamente de um escritório. Gosto de pensar cavalgando, na fazenda, no sertão.” “Os livros nascem quando a pessoa pensa; o ato de escrever já é a técnica e a alegria do jogo com as palavras.”

(Guimarães Rosa – Correspondência com seu tradutor alemão Curt Meyer-Clason (1958-1967), pp. 238 e 239)

“O escritor deve ser um alquimista. Naturalmente, pode explodir no ar. A alquimia do escrever precisa de sangue do coração. Não estão certos quando me comparam com Joyce. Ele era um homem cerebral, não um alquimista. Para poder ser feiticeiro da palavra, para estudar a alquimia do sangue do coração humano é preciso provir do sertão.”

Literatura: rumos e veredas

“Não pretendo ler mais Machado de Assis, a não ser seus afamados contos. Talvez também o começo de Dom Casmurro, do qual já li crítica que me despertou a curiosidade. (...) Por vários motivos: acho-o antipático de estilo, cheio de atitudes para ‘embasbacar o indígena’; lança mão de artifícios baratos, querendo forçar a nota da originalidade; anda sempre no mesmo trote pernóstico, o que torna tediosa a leitura. Quanto às idéias, nada mais do que uma desoladora dissecação do egoísmo e, o que é pior, da mais desprezível forma do egoísmo: o egoísmo dos introvertidos inteligentes.”

“A personalidade do escritor, ao escrever, é sempre o seu maior obstáculo, já que deve trabalhar como um cientista e segundo as leis da ciência; ela o faz perder seu equilíbrio, torna-o subjetivo quando deveria buscar a objetividade.” “Inteligência, prudência, tal como eu as interpreto, cultura elevada, tudo isso está bem, pois o escritor atual deve possuir todas estas qualidades. Mas 85

24/11/06 – 20h


(Os cadernos do cônsul Guimarães Rosa, trecho dos diários do escritor citado em Valor Econômico, 14.01.2002)

mente não se deve supor que quase toda a literatura brasileira esteja orientada para o ‘regionalismo’, ou seja, para o sertão ou para a Bahia. Portanto, estou plenamente de acordo, quando você me situa como representante da literatura regionalista; e aqui começa o que eu já havia dito antes: é impossível separar minha biografia de minha obra. Veja, sou regionalista porque o pequeno mundo do sertão (...), este mundo original e cheio de contrastes, é para mim o símbolo, diria mesmo o modelo de meu universo.”

“Não sei que rumos toma a literatura brasileira. Há várias correntes. Há os que são influenciados diretamente pelo nouveau roman francês, outros cultivam o regionalismo em suas formas mais regionais. Outros seguem Jorge Amado. E a mim mesmo. Hoje em dia não se pode definir escolas literárias como antigamente. Tudo é um caldeirão.”

“Não é necessário se aproximar da literatura incondicionalmente pelo lado intelectual. Isso vem por si só, com o tempo, quando o homem chega à sua maturidade, quando tudo nele se amalgama em uma personalidade própria.”

(“Guimarães Rosa fala aos jovens”. O Cruzeiro, 23.12.1967)

“(...) entre nós o ‘regionalismo’ tem um significado diferente do europeu (...). Naturalmente, não gostaria que na Alemanha me considerassem um Heimatschriftsteller. Seria horrível, uma vez que é para você o que corresponderia ao conceito de ‘regionalista’. Ah, a dualidade das palavras! NaturalAcervo da família Tess

“Conheço bastante bem a literatura alemã. Por exemplo, o Simplizissimus (primeiro romance em língua alemã, de Grimmelshausen, publicado em 1663) é para mim muito importante. Amo Goethe, admiro e venero Thomas Mann, Robert Musil, Franz Kafka, a musicalidade de pensamen-

86

24/11/06 – 20h


Imprensa e crítica: opinião, opiniães

to de Rilke, a importância monstruosa, espantosa de Freud. Todos esses autores me impressionaram e me influenciaram muito intensamente, sem dúvida. Entretanto, não sei o que fazer com autores mais jovens, como Brecht. Todos eles perderam o sentido da metafísica da língua, todos eles se tornaram pregoeiros e deixaram de lado a alma, considerando-a fora de moda, em desacordo com a época (...).”

“Não gosto do sentido bisbilhoteiro da imprensa. Ela deforma tudo. Irrita-me. (...) Perco a naturalidade. Todas as vezes em que dei entrevistas, fiquei profundamente desgostoso com o que disse e com o que disseram de mim.” “Os livros saíram-se necessariamente desabusados, ‘no peito e na raça’, e involuntariamente polêmicos. A respeito deles, tenho tido motivos de alegria, e não de queixa. Tiveram sorte. Encontraram editor inteligente, corajoso. Foram reeditados. Estão sendo traduzidos e publicados no estrangeiro, de onde chegam boas notícias. Motivaram quantidade de artigos, estudos, alguns deles já entrados definitivamente na nossa melhor bibliografia crítica. (Bem, às vezes, também, acho que eles são um pouquinho ilegíveis ou incompreensíveis, isto é verdade. Fico com pena. Ou qualificam, livros e autor, de ‘discutidos’; e serão, mesmo, de fato?). De qualquer modo, porém, trata-se de uma obra... – como diremos? – crespa, rumorosa, incômoda.”

“No ano 2000 a literatura mundial estará orientada para a América Latina; o papel que um dia desempenharam Berlim, Paris, Madri ou Roma, também Petersburgo ou Viena, será desempenhado pelo Rio, Bahia, Buenos Aires e México. O século do colonialismo terminou definitivamente.” (Apud Günter Lorenz. Op. cit., pp. 31-61)

O papel do escritor

“Embora eu veja o escritor como um homem que assume grande responsabilidade, creio entretanto que não deveria se ocupar de política; não desta forma de política. Sua missão é muito mais importante: é o próprio homem. Por isso a política nos toma um tempo valioso. Quando os escritores levam a sério o seu compromisso, a política se torna supérflua.”

(“Guimarães Rosa segundo terceiros”. Realidade, julho de 1967)

“As entrevistas são trocas de palavras em que um formula ao outro perguntas cujas respostas já conhece de antemão.” “Um crítico que não tem o desejo nem a capacidade de completar uma obra junto com o autor de um determinado livro, que não quer ser intérprete ou intermediário, que não pode ser, porque lhe faltam condições, deveria se abster da crítica. Infelizmente a maior parte deles não faz isso, e por isso acontece que tão poucos deles, geralmente, têm algo a ver com a literatura. O que tal crítico pretende, em resumo, é vingar-se da literatura, ou sabe Deus que motivos o impulsionam. Talvez como passatempo. É um palhaço, ou um assassino.”

“Cada homem tem seu lugar no mundo e no tempo que lhe é concedido. Sua tarefa nunca é maior que sua capacidade para poder cumpri-la. Ela consiste em preencher seu lugar, em servir à verdade e aos homens. Conheço meu lugar e minha tarefa; muitos homens não conhecem, ou chegam a fazêlo quando é demasiado tarde. Por isso, tudo é muito simples para mim, e só espero fazer justiça a esse lugar e a essa tarefa.” “A vida deve fazer justiça à obra, e a obra à vida. Um escritor que não se atém a esta regra não vale nada, nem como homem, nem como escritor. Ele está face a face com o infinito e é responsável perante o homem e perante si mesmo.”

“Uma crítica bem entendida é muito importante para o escritor; ela o auxilia a enfrentar sua solidão. (...) Uma crítica tal como eu a desejo (...) deve ser um diálogo entre o intérprete e o autor, uma conversa entre iguais que apenas se servem de meios

(Apud Günter Lorenz. Op. cit., pp. 27-38) 87

24/11/06 – 20h


Política, diplomacia, nacionalidade

diferentes. (...) Em essência, deve ser produtiva e co-produtiva, mesmo no ataque e até no aniquilamento se fosse necessário.”

“Ao mestre achei de pedir conselho, ao embaixador Leão Velloso, o ministro que deixava a pasta. – ‘Que fazer para ser um chefe de gabinete?’ Ele, coloidalmente bondoso e dono de curtida sabedoria, não à toa vivera anos na China. Ainda assim primeiro se pasmou, um átimo. Acudiu-me porém com um fino sorriso adequado: – ‘Sempre trate de não chegar depois dos outros. E de mais não precisa, quem é capaz de fazer essa pergunta...’.”

(Apud Günter Lorenz. Op. cit., pp. 29-40)

“Naturalmente, alguns riscos teremos de correr com o público europeu – talvez hoje excessivamente materialista, racionalista, político, positivo, intelectualizante ou plebeizante, afastado do puro mágico, perdida sempre mais a sensibilidade e receptividade para o ‘beatífico’. (...) Na França, porém, o saldo tem sido nitidamente a favor.”

(Sobre João Neves da Fontoura): “Arremetia grandes olhos a qualquer problema, não enjeitando a farinha por grossa nem o angu por duro, jamais avaro de si. Nunca o vi bocejar; se estremunhava era como despertado gato. Seguro de modos trastanto exercitado autodomínio. Inimigo de ênfases, dramaticidade ou imponência, nem com ensombrar meio rosto se traía, ou só em quebrado de segundo, no semicerrar o cenho; quando indicado, ensurdecia-se um pouquinho mais, polidamente. Temi, vez, que, devido a razão descoincidir de índoles e vistas, estivesse-o menos socorrendo que estorvando e o interpelei: – ‘Ministro, como é que o sr. me suporta?’ (Nessa manhã, de seguida, empalhara eu alguns de seus projetos, tendo-me como isolador ou maucondutor contra as descargas de bateria poderosa.) Retrucou-me: – ‘Porque nós nos completamos... Você é a minha consciência mineira...’”

“Inimigos e irritados (...) meus livros sempre terão de ter (basta ver o que mesmo aqui no Brasil acontece). Digo dos que se sentem, acaso, subconscientemente perturbados, incomodados; não me refiro ao direito de gostarem ou não, natural e legítimo, tanto mais com relação a livros tão pouco harmoniosos e cheios de ingenuidades e defeitos.”

Florença (1950)/Acervo da família Tess

(João Guimarães Rosa – Correspondência com seu tradutor italiano Edoardo Bizzarri, p. 125)

(Discurso de posse na Academia Brasileira de Letras. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 26.11.1967) (Sobre a ABL): “Se tomar posse, eu morro (...). Que pena não ser como num jogo de futebol. Quando acaba, os jogadores estão a salvo, entram no buraco e somem.” (“Viagens imaginárias – O sertão e as veredas de Guimarães Rosa”. Manchete, 20.07.1991)

“A política é desumana porque dá ao homem o mesmo valor que uma vírgula em uma conta. Eu não sou um homem político, justamente porque amo o homem. Deveríamos abolir a política.” 88

24/11/06 – 20h


“Um diplomata é um sonhador e por isso pude exercer bem essa profissão. O diplomata acredita que pode remediar o que os políticos arruinaram.”

agir’. Sente que a vida é feita de encoberto e imprevisto, por isso aceita o paradoxo; é um idealista prático, otimista através do pessimismo.”

“Nós, os brasileiros, estamos firmemente persuadidos (...) de que sobreviveremos ao fim do mundo que acontecerá um dia. Fundaremos então um reino de justiça, pois somos o único povo da terra que pratica diariamente a lógica do ilógico, como prova nossa política. Esta maneira de pensar é conseqüência da ‘brasilidade’.”

“(O mineiro) não entra caninamente em disputas. Melhor, mesmo – não disputa. Atencioso, sua filosofia é a da cordialidade universal, sincera; mas em termos. Gregário, mas necessitando de seu tanto de solidão, e de uma área de surdina, nos contatos verdadeiramente importantes. Desconhece castas. Não tolera tiranias, sabe deslizar para fora delas. Se precisar, briga.”

“Para compreender a ‘brasilidade’ é importante antes de tudo aprender a reconhecer que a sabedoria é algo distinto da lógica. A sabedoria é saber e prudência que nascem do coração. Minhas personagens, que são sempre um pouco de mim mesmo, um pouco muito, não devem ser, não podem ser intelectuais, pois isso diminuiria sua humanidade.”

“(O mineiro) tem a memória longa. Não tem audácias visíveis. Ele escorrega para cima. Só quer o essencial, não as cascas. Sempre freqüentado pelo enigma, pica o enigma em pedacinhos, como quando pica seu fumo de rolo, e faz contabilidade da metafísica; gente muito apta ao reino do céu.” “(O mineiro) não acredita que coisa alguma se resolva por um gesto ou um ato, mas aprendeu que as coisas voltam, que a vida dá muitas voltas, que tudo pode tornar a voltar. Até sem saber que o faz, o mineiro está sempre pegando com Deus.”

“Olhe o futuro da Europa e de toda a humanidade: é como uma equação com várias incógnitas. A Europa é pequena, mas seus habitantes são ativos e, além disso, têm a seu favor uma grande tradição. E entretanto os europeus não têm qualquer influência sobre essas incógnitas que determinam o futuro de seu continente. O ‘x’ e o ‘y’ desta questão decidirão o amanhã, tanto é assim que quase já se pode dizer hoje. A América Latina talvez não seja a incógnita principal, o ‘x’, mas provavelmente será o ‘y’, uma incógnita secundária muito importante.”

(“Aí está Minas: a mineiridade”. Manchete, 24.08.1957)

“As vacas e cavalos são seres maravilhosos. Minha casa é um museu de quadros de vacas e cavalos. Quem lida com eles aprende muito para a sua vida e a vida dos outros. (...) Quando alguém me narra algum acontecimento trágico, digo-lhe apenas isto: ‘Se olhares nos olhos de um cavalo, verás muito da tristeza do mundo’. Eu queria que o mundo fosse habitado apenas por vaqueiros. Então tudo andaria melhor.”

(Apud Günter Lorenz. Op. cit., pp. 41-61)

Minas e o sertão

“O mineiro é muito espectador. O mineiro é velhíssimo, é um ser reflexivo, com segundos propósitos e enrolada natureza. É uma gente imaginosa, pois que muito resistente à monotonia. E boa – porque considera este mundo como uma faisqueira, onde todos têm lugar para garimpar. Mas nunca é inocente.”

(Apud Günter Lorenz. Op. cit., p. 32)

“Quem interpreta como um nacionalismo mesquinho o fato de eu partilhar a maneira de pensar e viver do sertão é um tolo.”

“O mineiro traz mais individualidade que personalidade. Acha que o importante é ser, e não parecer, não aceitando cavaleiro por argueiro nem cobrindo os fatos com aparatos. Sabe que ‘agitar-se não é

(Ibidem, p. 50) 89

24/11/06 – 20h


Travessia: traduções e tradutores

“A frase ‘viver é muito perigoso...’ tem de ser repetida, quantas vezes conste no texto. O caráter épico, religioso, existencial e confessional do livro tem de ser cuidadosamente preservado.”

“Para o Primeiras estórias, estive pensando, agora, numa outra maneira de facilitar o seu trabalho. Seria, em vez de ir traduzindo as estórias pela ordem em que estão no volume, começar por dividi-las em grupos, das que tenham o mesmo ‘tom’ ou aparentado, e atacar primeiro um grupo, e, depois, sucessivamente, os outros. Facilmente o amigo obteria essa prévia classificação. Por exemplo: 1º grupo – ‘Famigerado’, ‘Os irmãos Dagobé’, ‘Fatalidade’, ‘O cavalo que bebia cerveja’; 2º grupo – ‘A menina de lá’, ‘Partida do audaz navegante’, ‘As margens da alegria’, ‘Os cimos’, ‘Sorôco, sua mãe, sua filha’; 3º grupo – ‘Nenhum, nenhuma’, ‘Nada e a nossa condição’, ‘A terceira margem do rio’, ‘A benfazeja’, ‘O espelho’; 4º grupo – ‘Seqüência’ e ‘Substância’; 5º grupo – ‘Pirlimpsiquice’ e ‘Darandina’; 6º grupo – ‘Luas de mel’ e ‘Tarantão, meu patrão’; e ‘Um moço muito branco’, esqueci-me, entraria no grupo 4 (mas com linguagem especial, calma e arcaica, pelo menos arcaizante). Além disso, traduzindo os grupos nessa ordem (...), verá que a transição se faz mais amena, sem tanta dificuldade na ‘readaptação’.”

“A respeito do Grande sertão: veredas, estou de acordo que se façam as coupures [cortes] parciais que o amigo julgar necessárias ou vantajosas, eliminando, aqui e ali, algumas linhas. Não vi a tradução americana, nem sei se fizeram também assim. Acho, porém, que a poda de algumas coisas, das não funcionais, valorizará a edição francesa, tornando o livro mais enxuto.”

“Meyer-Clason me convenceu de que uma passagem do meu romance (Grande sertão: veredas) – na realidade se tratava de uma metáfora – era mais convincente na tradução alemã que em meu original. É claro que aceito isso, e em uma nova edição brasileira pretendo adaptar essa passagem à versão que Meyer-Clason encontrou em alemão. A isto eu chamo cooperação, co-pensamento.” (Apud Günter Lorenz. Op. cit., p. 60)

“A respeito das traduções, francesa e inglesa, creio que não me teria explicado bem, o que agora faço. Achei, apenas, que, em si, o idioma inglês, como o alemão, se presta mais plasticamente à versão de Acervo da família Tess

(Carta a J.-J. Villard, 23.12.1964)

(Carta a J.-J. Villard, 21.11.1962)

“Decerto não poderíamos cortar: passagens em que se define, menciona ou caracteriza o ‘sertão’, ou a ele se alude; idem com relação ao ‘demônio’; idem quanto aos demais leitmotiv do livro. Também devem permanecer as exclamativas, cujas repetições relembram sempre o estado de espírito exaltado e atormentado do Narrador, que narra sempre a quente, em ritmo crispado, nervoso, preocupado com seu tremendo problema, de ordem metafísica.” 90

24/11/06 – 20h


parágrafo seguinte já começa: ‘Daí, sendo a noite, aos pardos gatos.’ Com essa brusquidão, proposital, só com o intervalo de parágrafo-a-parágrafo, retrata-se a rapidez do anoitecer tropical, violento, fulminante, sem crepúsculo. Ora, os tradutores, não sabendo nem sentindo isso, acharam de englobar tudo, mortalmente, no parágrafo seguinte: ‘The night came down, black as a cat.’ E não viram, também, que o que o original diz é justamente o contrário. O ‘aos pardos gatos’ alude ao provérbio universal ‘De noite, todos os gatos são pardos’ (... ‘alle Katzen sind grau...’). E esse provérbio (v., em italiano: ‘In sera, tutti gatti sono biggi...’) se refere, evidentemente, opticamente, à NOITINHA, ao ainda começo da noite. Está vendo?”

uma linguagem viva e concreta, com suas inovações e rebeldias. Acontece, porém, que nada vi, ainda, da tradução inglesa do Grande sertão: veredas, e não sei, portanto, como ficou. Assim, não posso comparar seu valor de justeza e beleza com as traduções francesas de J.-J. Villard, em geral boas. O que penso, porém, é que a língua alemã permitirá, seguramente, versão mais bela e completa, cingindo muito mais estreitamente o texto original, e assim não duvido de que suas traduções vão ser as primeiras, as mais vivas.” “Naturalmente, eu mesmo reconheço que muitas das ‘ousadias’ expressionais têm de ser perdidas, em qualquer tradução. O mais importante, no livro, o verdadeiramente essencial, é o conteúdo. A tentativa de reproduzir tudo, tudo, tom a tom, faísca a faísca, golpe a golpe, o monólogo sertanejo exacerbado, seria empreendimento gigantesco e chinesamente minuciosíssimo, obra de árdua recriação, custosa, temerária e aleatória. Sei que nem o editor, nem o tradutor, nem o autor podemos correr tamanho risco. E pensando assim, reconheço também que temos de fazer sacrifícios. Mas não tanto quanto os que se verificaram na tradução americana.”

(Guimarães Rosa – Correspondência com seu tradutor alemão Curt Meyer-Clason (1958-1967), pp. 95-114)

“Talvez a estória (e mesmo em português, no original, assim hoje a considero) seja muito sobrecarregada, correndo o risco de langeweilen [n.e.: tédio]. Que acha? Agora que a tradução já dominou o ‘espaço’, dou-lhe liberdade de aligeirá-la, onde achar bem. Porque muitas coisas perdem o vigor, ou mesmo a razão de ser, quando passadas para outro idioma. De qualquer modo, confio plenamente no seu gosto e competências. Vejo que, tanto nesta quanto nas outras, já realizou façanhas notáveis. Gratuliere.”

“À página 163, o 2o parágrafo termina assim: ‘... I came to love him the most.’ Mas, no original (p. 194 [210], 2a [28a / 29a] linha, na 1a edição; p. 185, linha 21, na 2a edição), segue-se àquela esta curta frasezinha, finalizando: “O sol entrado”. Eles acharam isso sem importância, e omitiramno. Não viram: 1) que aquela anotação, ali, pontuava, objetiva, energicamente, o trecho, numa brusca mudança ou alternância, relevante para o ‘ritmo emocional’ do monólogo; 2) que essa brusca mudança guarda analogia com as ‘pontuações’ da música moderna. (E o Grande sertão: veredas, como muito bem viu o maior crítico literário brasileiro, Antonio Candido, obedece, em sua estrutura, a um rigor de desenvolvimento musical...) Não viram, principalmente, que o livro é tanto um romance quanto um poema grande, também. É poesia (ou pretende ser, pelo menos). Há outra coisa, porém. No original, a menção do entardecer e anoitecer é dada, de propósito, em duas anotações. O parágrafo termina assim: ‘O sol entrado.’ Isto é: o sol se pôs. E o

“Para traduzir ‘um certo cansaço do ser’, não podemos usar ‘ermüdeten’. Tem de haver uma certa ambigüidade. Sugiro: ‘einen unbestimmt nicht verwunderten Aussehen’. Melhor ainda: ‘einen unbistimmt, beinahe nicht verwunderlich Aussehen’.” (Ibidem, pp. 322-348)

Infinito e eternidade: Deus esteja

“Tenho de segredar que – embora por formação ou índole oponha escrúpulo crítico a fenômenos paranormais e em princípio rechace a experimentação 91

24/11/06 – 20h


metapsíquica – minha vida sempre e cedo se teceu de sutil gênero de fatos. Sonhos premonitórios, telepatia, intuições, séries encadeadas fortuitas, toda a sorte de avisos e pressentimentos. Dadas vezes, a chance de topar, sem busca, pessoas, coisas e informações urgentemente necessárias.”

“No sertão, o homem é o eu que ainda não encontrou o tu: por isso ali os anjos ou o diabo ainda manuseiam a língua. O sertanejo, você mesmo escreveu isso, ‘perdeu a inocência no dia da criação e não conheceu ainda a força que produz o pecado original’. Ele está ainda além do céu e do inferno.”

“Acredito que Krishnamurti seja a segunda encarnação de Cristo. Estudo muito as doutrinas. A sabedoria oriental me fascina. Não foi à toa aquelas epígrafes de Plotino ou de Ruysbroeck, o Admirável para o meu Corpo de baile. São um complemento de minha obra. Sou um contemplativo fascinado pelo Grande Mistério, pelo O anel ou a pedra brilhante.”

“Segundo nossa interpretação brasileira, não muito cristã, mas muito crédula, o diabo é uma realidade no mundo. Está oculto na essência das coisas e faz ali suas brincadeiras. A ciência existe para expulsar o diabo. O homem sofre sempre o desespero metafísico, pois conhece a existência do diabo e pode assim liquidá-lo, superando-o até conseguir uma humanidade sem falsidades.”

(Sagarana emotiva: cartas de J. Guimarães Rosa a Paulo Dantas, pp. 25-29)

“Um gênio é um homem que não sabe pensar com lógica, mas apenas com a prudência. A lógica é a prudência convertida em ciência; por isso não serve para nada. Deixa de lado componentes importantes, pois, quer se queira quer não, o homem não é composto apenas de cérebro. Eu diria mesmo que, para a maioria das pessoas, e não me excetuo, o cérebro tem pouca importância no decorrer da vida. O contrário seria terrível: a vida ficaria limitada a uma única operação matemática, que não necessitaria da aventura do desconhecido e inconsciente, nem do irracional. Mas cada conta, segundo as regras da matemática, tem seu resultado. Estas regras não valem para o homem, a não ser que não se creia na sua ressurreição e no infinito. Eu creio firmemente. Por isso também espero uma literatura tão ilógica como a minha, que transforme o cosmo num sertão no qual a única realidade seja o inacreditável.”

“Escrevendo, descubro sempre um novo pedaço de infinito. Vivo no infinito; o momento não conta.” “O crocodilo vem ao mundo como um magister da metafísica, pois para ele cada rio é um oceano, um mar da sabedoria (...). Gostaria de ser um crocodilo, porque amo os grandes rios, pois são profundos como a alma do homem. Na superfície são muito vivazes e claros, mas nas profundezas são tranqüilos e escuros como os sofrimentos dos homens. Amo ainda mais uma coisa dos nossos grandes rios: sua eternidade.” “Apenas na solidão pode-se descobrir que o diabo não existe. E isto significa o infinito da felicidade. Esta é a minha mística.”

(Apud Günter Lorenz. Op. cit., pp. 37-57)

“Sou místico, pelo menos acho que sou.”

“(...) sou profundamente, essencialmente religioso, ainda que fora do rótulo estrito e das fileiras de qualquer confissão ou seita; antes, talvez, como o Riobaldo do G.S.:V., pertença eu a todas. E especulativo, demais. Daí todas as minhas constantes preocupações religiosas, metafísicas, embeberem os meus livros. Talvez meio existencialista-cristão (alguns me classificam assim), meio neo-platônico (outros me carimbam disto) e sempre impregnado de hinduísmo (conforme terceiros). Os livros são como eu sou.”

“Goethe nasceu no sertão, assim como Dostoiévski, Tolstoi, Flaubert, Balzac; ele era, como os outros que eu admiro, um moralista, um homem que vivia com a língua e pensava no infinito. Acho que Goethe foi, em resumo, o único grande poeta da literatura mundial que não escrevia para o dia, mas para o infinito. Era um sertanejo. Zola, para tomar arbitrariamente um exemplo contrário, provinha apenas de São Paulo.” 92

24/11/06 – 20h


“As pessoas não morrem, ficam encantadas.”

(João Guimarães Rosa – Correspondência com seu tradutor italiano Edoardo Bizzarri, p. 90)

(Discurso de posse na Academia Brasileira de Letras) “Desde cedo, apenas, também eu aprendera que ‘o sábio fia-se menos da solércia e ciência humanas que das operações do Tao’.”

“Se quer seguir-me, narro-lhe; não uma aventura, mas experiência, a que me induziram, alternadamente, séries de raciocínios e intuições. Tomou-me tempo, desânimos, esforços. Dela me prezo, sem vangloriar-me. Surpreendo-me, porém, um tanto à parte de todos, penetrando conhecimento que os outros ainda ignoram. O senhor, por exemplo, que sabe e estuda, suponho nem tenha idéia do que seja na verdade – um espelho? Demais, decerto, das noções da física, com que se familiarizou, as leis da óptica. Reporto-me ao transcendente. Tudo, aliás, é a ponta de um mistério. Inclusive os fatos. Ou a ausência deles. Duvida? Quando nada acontece, há um milagre que não estamos vendo.”

“Imortal é o que é do sofrido e espírito; tudo, abaixo daí, é póstumo.” “Não que a fé seja inimiga da vida. Mas o que o homem é, depois de tudo, é a soma das vezes em que pôde dominar, em si mesmo, a natureza. Sobre o incompleto feitio que a existência lhe impôs, a forma que ele tentou dar ao próprio e dorido rascunho.” “‘Choras os que não devias chorar. O homem desperto nem pelos mortos nem pelos vivos se enluta’ – Krishna instrui Arjuna, no Bhágavad Gita. A gente morre é para provar que viveu. Só o epitáfio é fórmula lapidar.”

Hamburgo (1938)/Acervo da família Tess

(“O espelho”. In Primeiras estórias. José Olympio, 1969, p. 71)

93

24/11/06 – 20h


G E O G R A F I A P E S S OA L

Minas Gerais


96

97


98

99


101


103


104

105


106

107


108

109


110

111



115


116

117


118

119


120

121



124

125


M A N U S C R I TO S

Na filosofia da composição de Guimarães Rosa convergem pesquisa e metamorfose, registro documental e invenção poética. Esse traço singular pode ser verificado em praticamente todas as suas obras, nas quais o leitor encontra um repertório de costumes e falas enraizados na cultura popular – e que, submetido ao labor de uma prosa irredutível à cor local (“O sertão é metafísico”), adquire autonomia, compondo um mundo à parte: o linguajar arcaizante que o escritor anota em suas cadernetas de trabalho plasma-se numa prosódia indissociável de suas personagens; as tradições coletivas passam a compor uma mitologia pessoal. Esse processo aparece em estado de floração em dois datiloscritos guardados no Fundo Guimarães Rosa do Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros da USP: os textos inacabados de A fazedora de velas e O imperador. Não há informação confirmada das datas em que o autor escreveu essas duas narrativas. Sobre esta última, não existem nem sequer indicações; com relação à primeira, Elisabeth Hazin – na tese No nada, o infinito: da gênese do Grande sertão: veredas (1991) – supõe ser A fazedora de velas o romance que Guimarães Rosa estaria escrevendo por volta de 1951, conforme recorte de jornal pertencente a seu espólio (ver o ensaio de Ana Luiza Martins Costa publicado nesta edição dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA). Entretanto, o prefácio “Sobre a escova e a dúvida”, de Tutaméia, sugere que ele teria começado a redigir e abandonado esse inédito em 1957. Nessa reflexão sobre o caráter “subliminar ou supraconsciente” de sua criação, depois de afirmar que Grande sertão: veredas foi “ditado, sustentado e protegido – por forças ou corrente muito estranhas” (ver a p. ## de “Guimarães Rosa por ele mesmo”), o escritor continua: Aqui, porém, o caso é um romance, que faz anos comecei e interrompi. (Seu título: A fazedora de velas.) Decorreria, em fins do século passado, em antiga cidade de Minas Gerais, e para ele fora já ajuntada e meditada à massa de elementos. O teor curtido na idéia, riscado o enredo em gráfico. Ia ter, principalmente, cenário interno, num sobrado, do qual – inventado fazendo realida-

126

24/11/06 – 18h00


de – cheguei a conhecer todo canto e palmo. Contava-se na primeira pessoa, por um solitário, sofrido, vivido, ensinado. Mas foi acontecendo que a exposição se aprofundasse, triste, contra meu entusiasmo. A personagem, ainda enferma, falava de sua doença grave. Inconjurável, quase cósmica, ia-se essa tristeza passando para mim, me permeava. Tirei-me, de sério medo. Larguei essa ficção de lado. O que do livro havia, e o que a ele se referia, trouxe-se em gaveta. Mas as coisas impalpáveis andavam já em movimento. Daí a meses, ano-e-meio, ano – adoeci; e a doença imitava, ponto por ponto, a do Narrador! Então? Más coincidências destas calam-se com cuidado, em claro não se comentam. Outro tempo após, tive de ir, por acaso, a uma casa – onde a sala seria, sem toque ou retoque, a do romanceado sobrado, que da imaginação eu tirara e decorara, visualizado freqüentando-o por ofício. Sei quais foram, céus, meu choque e susto. Tudo isto é verdade. Dobremos de silêncio.

Em A fazedora de velas, a localização e a data (uma cidade mineira de fins do século XIX) servem de plataforma para o que ele mesmo descreve como uma revelação “inconjurável, quase cósmica” – que assombra o criador e transcende o cenário do qual retira suas criaturas. O fato de o escritor adoecer à maneira de sua personagem e de, tempos depois, encontrar uma casa tal e qual aquela inventada no texto reitera esse trânsito incessante entre ficção e realidade, fazendo da obra de Rosa um microcosmo que interpreta o mundo no qual está encravado. No caso de O imperador, o lastro das raízes populares se faz mais explícito, sem prejuízo da recriação poética. O pano de fundo é a Festa do Imperador, que por sua vez se insere no contexto das festas do Divino, de origem portuguesa, que celebram o Espírito Santo e nas quais uma criança é coroada Imperador do Divino, adquirindo poderes majestáticos e presidindo as folias que percorrem a região do folguedo. Guimarães Rosa retoma essa tradição do ponto de vista de um menino ensimesmado e “desjeitoso”, retraído como um bicho no terreiro do quintal, para quem “a realidade lhe parecia o contrário do Céu” – e que ouve, incrédulo, o chamamento da mãe e das mulheres da vila, anunciando ser ele o Imperador. Esta seção dos CADERNOS traz fac-símiles inéditos dessas narrativas. Nas duas páginas seguintes, encontram-se um desenho do “frontispício” que Guimarães Rosa criou para A fazedora de velas e uma tabela na qual discrimina os diferentes episódios e personagens de O imperador. Seguem-se reproduções dos datiloscritos propriamente ditos, acompanhados de uma transcrição que incorpora todas as intervenções feitas a lápis ou caneta pelo escritor. Palavras de transcrição duvidosa estão entre colchetes; em alguns casos, as intervenções de Guimarães Rosa não constituem correções, mas alternativas, variantes; nesses casos, estão indicadas em itálico, também entre colchetes.

127

24/11/06 – 18h00


Restam poucas páginas datiloscritas de A fazedora de velas (ver pp. ## a ## da presente edição). Além disso, os cadernos de Guimarães Rosa conservados no IEB-USP trazem alguns trechos manuscritos sem unidade entre si. No entanto, a julgar pelos planos de trabalho existentes em seu espólio, o escritor parecia ter uma idéia global das diferentes partes da narrativa. A página reproduzida acima é uma espécie de frontispício do futuro livro e índice das partes que deveriam compô-lo. Em seus cadernos, o escritor abriu uma página para cada capítulo que integraria essas partes – mas são folhas em branco, contendo apenas um cabeçalho, como se ele quisesse visualizar a seqüência desses episódios jamais escritos.

128

24/11/06 – 18h00


O esquema de O imperador (acima) é uma página dupla retirada de um fichário. Contém colunas verticais referentes a uma seqüência de dias (supostamente o tempo de duração da Festa do Imperador do Divino) e colunas horizontais relacionando personagens; na interseção dessas colunas, as anotações parecem se referir à reação do protagonista diante de cada personagem – algo que pode ser confirmado pela passagem inicial do datiloscrito (ver pp. ## a ##), que descreve uma rivalidade com os primos indicada de modo sucinto nesse diagrama.

129

24/11/06 – 18h00


130

24/11/06 – 18h00


A FAZEDORA DE VELAS Levanto-me do sono, id est [isto é], saio do que se não sabe. Senão que em antecipado acordei, entre o restar da noite, acaso primeiro que qualquer um, do que outro vivente no casario da cidade. Até agora os sinos nem tocaram. Tornado a sentir-me, entanto, no principiar dos momentos eu faço por esquecer [não ter] memória. Mediante o me embeber [Antes, o absorver-me] na mente, sob estrita e branda aplicação, esforço sem esforço, diligencio antes tatear o rumo fundo existente para ser o meu, superno a toda história visível, e acertar dizerme dentro no coração um resumo de constância, haver [reaver/resguardo/rebate/um retomar] de firmeza contra os efeitos de cada dia: porquanto o escorregar do tempo é o rio de sobressaltos sucedendo-se [seguindo-se] em gravidade. Da parte de fora, tirante a corrubiana nos morros e o cerrar da nevoaça que sobe do rio pelos becos e tortas ladeiras, e vem a embaçar na rua a pouca luz dos lampiões, a escuridão semelhar-se-á com esta, que faz no quarto. Aqui é mais frio que em outros lugares. Meu costume foi sempre o de dormir com bem fechadas as janelas, por conta do carregar do relento, à volta das madrugadas; amiúde, contudo, a friagem [o progredir] da umidade me apreme, amanheço tomando menos que um [parco] fio de ar na [por] respiração, e o corpo a renovar cansaços. Se der de mirar espelho, então [entrementes], avisto [vejo/enxergo] a descor do meu rosto, o nariz feito de cera, pontudo definhado. Sendo, porém, que uso de não olhar quase mais nunca em lume de espelho, drede por [para] não afirmar imagem da velhice, à mão de suas marcas. É preciso a gente se dispor para [A gente precisa/carece dispor-se a] morrer em estado de maior mocidade. Da supradita circunstância do bafio malino das noites, antigamente, uns achaques de asma se me causavam; soí assaz temer [acostumei-me a] aquele despertar ansiado na afrontação, que me carecia de assentar na cama e pitar cigarrilhas de estramônio. A qual moléstia, entretanto, dos anos para cá, poupou de agoniar a minha natureza, tenho que por alguma espécie de milagre; também nem sofro mais [deixei de sofrer] o sono atravessado de pesadelos. Do que, embora, e com humildade maior, colijo certeza: a de que essas pobres melhoras do corpo, no presente, procedem de aumento dos circuitos do querer meu e de Deus, se arrancando do mundo das dificuldades. Posto que, sem embargo, me encontro ciente do prestes vir do meu trânsito: o que o doutor já confirmou, a mim, apartadamente [à parte], em rogado aviso. Eu estou enfermo de morte. A ocasião da morte, a inteligência da morte, são estudos mais egrégios e de mister que o vulgar da vida.

131

24/11/06 – 18h00


132

24/11/06 – 18h00


O amativo na morte... O que, porém, de mim [Aquilo, entretanto, sobre mim], os outros, os estranhos e os próximos, seja para interinamente não saberem, tão certo haveriam [porquanto haviam] perturbar a minha entrepresa. Sobretudo, à minha mulher não colha o anúncio [não chegue/venha a notícia] de tal sentença, por que verdadeiramente e falsamente lhe não amargue; minha mulher pensa que tem ódio de mim, por isso pensa que não tem. Digo-o, em proposição que versa [versando] do singular ao confuso, se bem [porém] pela qual, e de quanto mais longo excogito, muito infiro, reputo e concebo. E é a voz comum de todos, doutrarte, que ela [demonstra] por mim é desprezo. Eu, servo do que hei e creio, o contencioso humano não acanha a minha esperança abalançada. Com pouco, os sinos vão tocar. Agora paramos no silêncio de antes deles [antecedentemente a eles]. Daqui a prazo, em distância, repentino, um incoa: outro repica, em de mais longe, retarda; outros repetem, vários logo são, e ulteriores. Respondem-se, prosseguem, de acolá a acolá, ao cabo de tantas casas, e muros e quintais [tantos muros, e quintais e casas]. Aqui, enfim, toam juntos, perto demais, renhidamente, estupendos metais enormes; horas. Definem que esta cidade é antiga, tristonha no venerar e viver, possuindo bastantes igrejas, e se jazendo num entremontes – os espaços dela se transpassam do solene [sagrado] tinimento, que tresmuda os suspensos mistérios, por esses ares. Andando de ser hoje a Festa de Todos os Santos, que soarão, em este 1 de novembro do Ano da Graça de MCCMLXXXIX, e data que outrossim se praz de assinalar o natalício do Senhor Bispo, azo de alvorada. Já os sineiros hão de estar subindo às torres, pelo que têm de dar à campana antecedentemente ao romper [antes ao nascer] do sol. Adiantado a qualquer acerto que o velho João Gil ora aguardará, lá no alto, com seus crioulos ajudantes, entrados à torre sineira da Assunção, que é o templo da minha Santa Irmandade, desta [da] qual, segundo a um confrade estudado e abastado de posses pertence, me cometo de Irmão remido e Escrivão, eu, Domingos Jonas Minervino Renães Arluque, que assim me assino. Vantagens mundanas, porém, de que me não abono [que com reflexão rejeito], por não procurarem ponto de motivo à perseverante exatidão [ordem] que persigo, senão só às malemendadas [sempre] serpentes que são a soberba, para traição na existência. João Gil, pobre aceito e agradado a Cristo, e quase caduco, pela dele meu mui finado pai [avô] devia de regular a idade; nem sei por que guisa atura sobreviver, qual fosse para servir como testemunho das épocas, eis que ancião e centenário. Todavia, assim ainda, não cede do oficio, conquanto as escassas forças não lhe mais outorguem vibrar por si, com o próprio suor, a sinaria da Assunção: aos três, uma corda em cada mão e outra num pé – conforme outrora

133

24/11/06 – 18h00


134

24/11/06 – 18h00


praticava. Sem outra ação que mediante gestos, meneios e acenos de cabeça, agora regala ver como gere os ajudadores, que, de tal arte pela vontade do mestre espiritados, tudo cumprem; e comanda as cadências capazes de satisfazer os ouvidos, sabe levantar o estilo: inventa que executem as dificultosas tarantanas. Em ocasiões, eu julgo discernir o vulto do assunto que por meio dos bronzes ele propala. Ersília, minha mulher, não tolera o João Gil, de quem detrai; Ersília me reprova de entreter a feição somente a adoidados e perversos. Porém, entendo por mim, quando aquele velho badaleja e tange, por certo haverá de estar-se lembrando do neto, amigo meu companheiro de infância, nos amenos anos da juventude assassinado, e cujo eu apenas neste mundo sei quem o matador tenha sido, réu desgraçado de medonho crime, de que assim faço menção. Recito, de pé, o Credo, a fim de adversar essas recordações funestas, exultando no poder de verdades sem bordas... Deum de Deo, lumen de lumine... Et incarnatus est de Spiritu Sancto... Et homo factus est. Et ascendit in caelum... Somente a respeito do Céu era que se devia pensar e falar... ...cujus regni non erit finis. ...porque todo tremer e temor são para se fazer e vir a ser a alegria palpável na beleza... Et expectu ressurrectionem mortuorum... ...na Ressurreição da Carne gloriosa!... Et vitam venturi saeculi... Na esperança dessa alegria sem termo, lavo-me de ainda humano – erros e ânsias do imperfeito...

135

24/11/06 – 18h00


136

24/11/06 – 18h00


O IMPERADOR Capítulo I Foi um dia um menino, ele estava no quintal de sua casa, que era sombroso de espaços e de árvores e sem fundo, isto é, que tinha um pessegal no fundo, depois dos limoeiros e das mangueiras à orla do rego corrente serpeante. Ele se achava ainda à inteira conta distraído do [mínimo] movimento de acontecer todas as coisas, sozinho de si, debaixo do um pessegueiro falto todavia de flores ou frutos, senão se os de mentira. De repente, chamaram-no, com vários brados. Foi no dia 31 de maio de 1906. Era de manhã, os primos deviam chegar para brincarem juntos, e o menino, que, às vezes, [confusamente] tentava atinar com a maneira mais sábia de aguardar-lhes a vinda, de nenhum jeito até então a conseguira acertar. Havia, por exemplo, na mangueira maior, um balouço, em que lhe valeria permanecer já sentado, na ocasião, a se oscilar no alto, afetando de tranqüilo; ou cavalgar a forquilha de outra mangueira, a meio, onde tinham pendurado um badalável sinozinho, com sua corda de puxar; ou, mais simples, ficaria de costas, entretido com as biroscas ou o pião, todo desinteressado de companhia. De qualquer modo, porém, aqueles a cada entrada se faziam de lhe não ver a antecedência, impunham logo em balbúrdia algum brinquedo diferente, enchiam o quintal, mudavam o ar de tudo. Eles eram assim – os bruscos, os três, seus primos coirmãos. E agora seguramente por isso o menino experimentara retrair-se até ao ponto extremo do terreiro [terreno], aonde teriam de andar caminho a fim de o encontrar. Podia ali, entrequanto, ir apanhar água do rego, para a entornar, em pouco e pouco, nos orifícios redondos no chão, olhos de moradia dos besouros, via de forçá-los a surgir do denso [de debaixo] da terra, escuros e já desdobrados e zumbintes; ou perseguir das folhas secas as tantas macias lagartixas; ou tapar minúsculos currais, construções de gravetos, círculos de catadas pedras pontudas; ou inimaginar outras artes, fáceis no atender-lhe à mais urgente necessidade da condição de infante: à de incessantemente [não cessar de] descobrir novos fatos objetos e sem esforço esquivar-se ao peso [pego] de presença das pessoas. Mas, para tudo, e ainda mais quando solitário, sem companheiros, ele quase sempre se sentia desjeitoso, tomava aumentada noção do próprio corpo, das atitudes, dos atos, receava sujar-se; ah, detestava ter de sujar a roupa. Não que temesse daí ralhos ou castigos,

137

24/11/06 – 18h00


138

24/11/06 – 18h00


mas porque, em si e por si, aquilo lhe repugnava. A cisma de um inevitável salteara-o, de algum tempo: o de que, apenas se vestia uma roupa, embora nova, ou a mais bonita, lavada e passada a ferro com capricho, e já, desde no primeiro momento, ela começava devagarinho a se sujar, já a poeira nela pousava, e fiapos, suor, e o ar, o que fosse, e logo estariam reveladas uma, outra, muitas manchas, nem a gente sabia como; – a realidade lhe parecia o contrário do Céu. – Os anjos têm roupa? Eles não sujam a roupa?... E a pergunta, não respondida, ele precisaria de a repetir. Só que não tinha persistência de lembrança, nem o poder de guardar além de instantes suas tentativas de especulação: não passava de um menino entrado nos sete anos, a percepção em extraordinários giros, sucessivamente entregue a qualquer [quanto] que maravilhoso – o ser verde da relva e erva, o intacto em-pé dos troncos, a dosagem dos sons do rego, o revezar das sombras, o saltitar ritmista do pássaro, o revôo pênsil do pássaro, o piscar do canto do pássaro, a lenta e espiralada descida no ar da penugem do pássaro, o ignoto ninho do pássaro, o agudo aparecer de uma vespa, a possível ferroada da vespa na bochecha de um dos primos, a provável irrupção, dentro de minutos, dos mesmos primos... – ele somente presentâneo, ali, em atualidade levíssima, sob sua árvore. E também já ficava esmorecido, enfastiado de todo e nenhum brinquedo, os primos não vinham nunca, não conseguia mais pôr-se em espera, só no estar por estar, já era pois a hora de que o rodeasse alguma maior modificação, de que se desse um acontecer. Por isso foi que as vozes de chamada da mãe ou das mulheres, 1á de beira da casa, soaram-lhe a ponto: posto que ouvidas assim de súbito, não lhe cortavam a atenção de coisa nenhuma notável. Pelo que, portanto, aqueles gritos eram um fato histórico. Também não denotassem talvez chamamento comum – a que a gente podia tardar de obedecer, bastando acudir com resposta e seguir brincando onde se estivesse, transido tão só a outro estado, em efeito de alerta, por se tratar apenas de como um primeiro aviso, a ser reiterado, vezes, até se afirmar a final, peremptório –: o menino, parando-se ainda mais, por um segundo, palpitava nisso, calculava com o corpo todo, à feição dos bichos. De pronto, acorrera-lhe às orelhas uma baforada extra de sangue, o abrir das ventas dobrava-lhe a respiração, o queixo se erguia, o coração apurava o dar. Sentia-o agora, por entendimento reto e imediato. Aquela era não-natural, outra qualidade de convocação, expressa. Os brados não

139

24/11/06 – 18h00


140

24/11/06 – 18h00


iam consentir-lhe suspensão, não se calariam um tempo. As mulheres apareceriam a buscá-lo. Então, achava de antecipar-se, encaminhando-se para elas, isto é, não refletira na ação, unicamente já se estava deixando do lugar, avançando as pernas, curtas demasiado, desiguais, talvez tortas. Apesar bem de querer vir, demoravase, não de pleno propósito, executava uma contradição nos passos. Ainda que o chamado tivesse coincidido com seu azo de desejabilidade, quando, enfarado de se descobrir sozinho, ele pedia um acontecimento, agora alguma coisa nele reclamava [se saía a reclamar] contra as pessoas que o demandavam, acaso a pressentir que em verdade as ocorrências da vida deveriam dever suceder-se de outra maneira, ainda mais exata, em tudo agradadora, já iniciadora de vantagens e de asseguradas consistências. Ele não sabia disso, nem tampouco que estava a surdo precisando de opor-se de meio modo à mãe, às mulheres, às vontades delas, a fim de poder crescer-se propriamente mais de si, de em-seu-rumo. Caminhava um tanto curvado; ele era mesmo sempre assim – com a cabeça encolhida para os ombros, e um tanto curvado. De não pensado, de sem plano, adiantando-se até se defrontar com elas, largara-se porém conduzido ao realizar de um resultado de astúcia – o encontro dando-se justo no sítio que àquela hora porcerto melhor se lhe aquerenciava à natureza, feito sua área de oportunidade: no mangueiral, ao pé da mangueira onde havia pendurado o sininho com badalo e corda, às margens plácidas do rego, que era um pequeno arroio serpenteante. Ao estacar ao depará-las, encarava a mãe e não as mulheres, no que bem podia ser expressasse um rigor de desejo de que essas ali não estivessem, a necessidade de excluí-las do muito vivo pequeno mundo que ora era o seu. Ao mesmo tempo interrogara rápido a mãe com o olhar, desde as aparências conhecendo que ela queria dar-lhe alguma coisa. Mas não se precipitou para ela. Assumiu o ar meio comediado, involuntário, de tanto que um subir de pejo o travava de espontâneo sorrir, o todo de desabotoado desaperto a par com [mais] a confusão de fisionomia, com que se mostrava quando, após qualquer queda que o enxovalhasse de vez, se apressava em comparecer perante os mais velhos, que então teriam de cuidar dele, banhálo e o rearrumar a limpo. Demais, as mulheres – a madrinha, as tias, a avó – simultâneas, falavam-lhe alto, em forma meio encoberta, o que desse jeito proferiam ele não conseguia captar, nem disso fazia questão, fixava-se

141

24/11/06 – 18h00


142

24/11/06 – 18h00


apenas na mãe; seja que, de fato, espiasse para o chão, porém à mínima palavra ou gesto dela estaria enleadamente atento. E a mãe demorou a proclamar aquilo, ou que procurasse em alma o devido dizer, ou estivesse simples adensada de maior emoção: – Meu filho! você vai ser o Imperador... O menino tirou-se, num desembrulho e espanto, o coração visível. Por pouco não resistiria ao começo de choro. Enfim pôde a pergunta: – Eu... tenho de ir-me embora?!... Eu vou morrer?... Todas já o tranqüilizavam, atrapalhadas com aquele reagir, e entravam com explicar-se, a mãe também. O que ele ia ser, era mesmo Imperador, mas o Imperador do Divino, na Festa, que ali na Vila se celebrava. Belo, belo, que para isso fora escolhido, por forma que todos levavam muito em gosto, o encargo consistindo em alteza de bençãos, honras [glórias] e graças. A Festa se marcava para em breve, isto é, nesse ano realizar-se-ia só no mês de julho, e, de larga execução, durava cerimonial de nove dias, com presepéia e pompéia, as sérias, grandiosas solenidades, das quais ele ocuparia o centro, representava de rei imperial. Assim se resumia o falar delas, o enunciado. Mas a mãe se curvara para afagar o menino, e as outras redobraram de chufas meigas, chocarrice com que quem-sabe tivessem por onde atenuar em si mesmas a inconfessável porém natural antipatia sempre animalmente provocada pelos mimos que se dão entre mãe e cria. Mas, também, qual se tomasse por primeira vez envergonhada consciência disso, ele próprio, já agora o menino se voltava para as outras mulheres, e como se se acordasse, súbito, de que fazia falta a declarada confirmação, justamente das pessoas mais afastadas, para aquele assunto que desbordava do doméstico e se ampliava até à pública geral competência. Em tanto que, por entre exclamações de Imperador! Imperador!, elas o urgiam com perguntas, exigindo-lhe que se manifestasse. Pois nem se entusiasmava de satisfação, com a importante [esplêndida] notícia? Pelo que o menino parara sem átimo, arregalou em par os olhos, o momento mal tragado, a gente o via sob prema do que lentamente escutasse, a lance com a beleza abrupta e astuta dos absurdos. Seu pensamentozinho estava ainda na fase hieroglífica. Aliás, também, aquilo era uma coisa impensável. As mulheres assim de sobrevento vinham botar-lhe os ovos de ouro. Até que, apenas, repentino, ele mesmo falou, para ninguém, só afirmativo, a voz encalcada: – Eu vou ser o Imperador... [...]

143

24/11/06 – 18h00


ENSAIOS

Rapsodo do sertão: da lexicogênese à mitopoese Walnice Nogueira Galvão

Guimarães Rosa, o rapsodo do sertão, ocupa lugar privilegiado na literatura brasileira. Seu território de eleição, o interior de Minas Gerais, é cenário onde decorre toda a sua obra. O escritor destaca-se pela combinação muito particular que engendrou entre a fala sertaneja e sua erudição de poliglota, recuperando arcaísmos e regionalismos, cunhando neologismos e adaptando estrangeirismos. Outro ponto alto que o distingue é a capacidade quase ilimitada de fabulação, que lhe permite arquitetar uma multiplicidade de enredos. Partindo da posição central que Grande sertão: veredas ocupa em sua obra, Guimarães Rosa descortina um território que, embora integrado e indissolúvel, pode, para efeitos de análise, ser percebido segundo três pontos de vista diversos: o geográfico propriamente dito, o mítico e o metafísico. O ponto de vista geográfico fornece ao leitor a paisagem, variegada, dessa região de Minas Gerais. O sertão do Nordeste, mais explorado na literatura e no cinema, associa-se a noções de secura e de caatinga – com sua vegetação tacanha, eriçada de espinhos e garranchos. Já o sertão mineiro é dominado pelos campos gerais, com suas pastagens boas para o gado e suas “veredas”, onde as águas alimentam o vicejar dos renques de buritis, alternando-se com matas e florestas. O ponto de vista mítico confere às conflagrações locais entre bandos de jagunços a serviço dos coronéis visos de novela de cavalaria, como se fossem histórias de Carlos Magno e os doze pares de França, ou então do rei Artur e a Demanda do Santo Graal. A perspectiva metafísica transfigura o sertão em arena abstrata onde o mal grassa, onde se joga o destino de homens e mulheres, onde Deus e o Dia-

144

24/11/06 – 18h


bo travam uma batalha cósmica que tem por trunfo a salvação ou a danação da alma dos viventes. Sendo a literatura espaço privilegiado da utopia, é esse mesmo sertão múltiplo que realça o tratamento riquíssimo que Guimarães Rosa dá à alteridade. Em primeiro lugar, salta aos olhos a alteridade de gênero: ocupa a linha de frente em Grande sertão: veredas a personagem de Diadorim. Desde o momento em que entra em cena, reconhece-se uma donzela-guerreira saída da grande tradição épica, descendente das baladas dos rimances velhos ibéricos, em que uma filha vestida de homem e destra em armas assume como missão vingar a morte do pai abatido em luta. Ao apaixonar-se por ela, sem duvidar de seu disfarce, Riobaldo torna-se presa de elucubrações sobre as ambigüidades entre a diferença e a semelhança. Em segundo lugar, mas não de menor relevância, vem a alteridade de classe, que mostra os jagunços como soldados rasos versus os comandantes latifundiários, ou, em outros termos, a plebe versus a oligarquia. Desenrola-se uma reflexão sobre o sistema de dominação que rege esse arranjo, através do recurso de fazer de Riobaldo alguém que transita entre as duas classes. Pois, filho bastardo de fazendeiro, depois de ascender de peão a chefe de bando, herdará fazendas, desprendendo-se da camada subalterna. Mas há uma outra, menos perceptível: enquanto aquelas duas predominam, ocupando toda a extensão do romance, surge ainda a alteridade de origem nacional, e aliás de uma maneira bem curiosa. Em Curralinho, convivem o Alemão Vupes e seo Assis Wababa, pai de Rosa’uarda, primeira namorada de Riobaldo. Constata-se ali o contraste entre duas formas de civilização encarnadas nesses dois expatriados, a saber, o nomadismo do alemão, caixeiro-viajante a disseminar novidades tecnológicas, e o sedentarismo do árabe, dono da casa de comércio O Primeiro Barateiro da Primavera de São José. São grandes amigos e dão exemplo de afabilidade entre dessemelhantes. Ao falar deles, Riobaldo avança a observação: “Toda vida gostei demais de estrangeiro...” A registrar, a inversão do clichê, que dá os alemães como sedentários e os árabes como nômades. Mas não foi só nesse romance que nosso escritor se interessou em criar situações para forasteiros. Em Tutaméia – Terceiras estórias, alguns contos envolvem ciganos, como “Faraó e a água do rio”, “O outro ou o outro” e “Zingaresca”. Sabe-se que o escritor fez anotações sobre as roupas, os hábitos e o lingua-

145

24/11/06 – 18h


jar dos ciganos, até os hospedando certa vez no porão de sua casa em Itaguara, onde residiu antes de entrar para a carreira diplomática. Há um italiano em “O cavalo que bebia cerveja”, de Primeiras estórias, conto que é também uma parábola sobre a intolerância, que alimenta o preconceito contra o exótico. Em “Cipango”, de Ave, palavra, surgem os japoneses hortelãos, nas chácaras do interior. Percebe-se que Guimarães Rosa se compraz na diferença, o que se evidencia no cuidado com que procura recriá-la. O desastre do matrimônio que une o chinês Quim e a sertaneja Rita, no conto “Orientação”, de Tutaméia (Terceiras estórias), constitui um extremo. Aqui, a oposição, e até mesmo a antítese, ocupa todos os níveis da linguagem, indo desde as descrições exteriores de ambos até os fonemas e os sinais gráficos dos termos que os contrapõem: “til no i, pingo no a”. Eles eram “parecidos como uma rapadura e uma escada”. É só depois de desmanchar-se o casamento que a dialética entre o mesmo e o outro se completa. Rita, após a partida de Quim Chim, sentindo a falta dele, começa a adquirir características asiáticas, a pele recobrindo-se de tons de marfim e açafrão, imitando o marido ao andar com um pé bem na frente do outro. Guimarães Rosa experimentou a mão em outros conflitos de timbre similar. O mais extraordinário é “Meu tio o Iauaretê”, de Estas estórias, onde a recusa do reconhecimento do direito à diversidade, expresso em rejeição, implica na metamorfose de um índio em onça, transpondo de volta a linha que separa a cultura do estado de natureza. Se sua alteridade não é legitimada pelo olhar alheio, o outro deixa de ser gente, passa a ser bicho. Como o escritor mostra a concretude desse processo, sem designar explicitamente o genocídio e o etnocídio? Construindo o arcabouço do conto em três línguas: português, tupi e uma espécie de “idioma animal” composto por onomatopéias de rugidos e rosnados. Aqui, nosso escritor foi o mais longe possível em sua percepção da tragédia que pode ser o entrechoque dos diferentes, abalando – mais do que o questionamento de gênero, classe e nacionalidade – os próprios alicerces da civilização. As galas da linguagem Guimarães Rosa é um autor para quem tem o sestro de compulsar enciclopédias nas horas vagas. Ou gosta de trava-línguas, charadas, parlendas e ou-

146

24/11/06 – 18h


tros jogos verbais. Ou coleciona velhos dicionários, ao lado de outros extravagantes, que vão desde os de termos chulos até os de astequismos, argot ou lunfardo. Ou referenda nosso autor quando fala do prazer de “palavrizar” e Fernando Pessoa quando confessa: “Gosto de palavrar”. No que diz respeito à linguagem, figura, em primeiro lugar, pelo papel crucial em esclarecer as questões, a correspondência do autor com seus tradutores. Antes já se conheciam, como contribuição maior nesse setor, as cartas e fragmentos publicados por familiares, como o tio Vicente Guimarães1 e a filha Vilma Guimarães Rosa2, em volumes de reminiscências. Mas, se esse tipo de carta pode ser importante para a recomposição de uma biografia, para os estudos literários nada se compara à epistolografia dirigida aos tradutores. Guimarães Rosa descia a minúcias nas explicações para ajudar o estrangeiro a encontrar o mais perfeito correlato. Um primeiro conjunto encontra-se publicado há tempos, graças aos bons ofícios do destinatário e tradutor para o italiano Edoardo Bizzarri.3 Por sorte, Guimarães Rosa ainda era vivo e autorizou a publicação. De importância ímpar são dois outros acervos, o primeiro dirigido à tradutora para o inglês4 – que, versão pioneira, propiciou a abertura internacional –; o segundo, ao tradutor para o alemão.5 Este último recentemente veio à luz, mas o outro ainda não. A todos eles o leitor poderia ter acesso se os entraves para publicação, em que se empenham os autores das teses, fossem eliminados. A elas podemos acrescentar outras teses universitárias que garimpam materiais do mesmo arquivo, como prototextos, cadernos de anotações e listas de palavras. Já se acumula uma dezena delas, todas inéditas e de importância inestimável, aguardando que os herdeiros de nosso escritor liberem os direitos autorais, permitindo a publicação. Afora essas teses que lidam com material de arquivo, são úteis os ensaios críticos que enveredam pelo léxico e pela sintaxe. O primordial, e o mais pertinente, ainda é o de Cavalcanti Proença, Trilhas no grande sertão.6 Foi ele quem deslindou as linhas mestras da criação verbal de Guimarães Rosa. É bem verdade que, como já se observou, mostra o pendor bastante usual a magnificar o componente erudito, sobreestimando o poliglotismo do escritor. A este devemos acrescentar os até há pouco escassos vocabulários rosianos. Afora os trabalhos sobre nomes próprios7, que são um caso à parte, já lá vão 30 anos surgiu o de Nei Leandro de Castro sobre o Grande sertão: veredas.8 E em 1994 Jacqueline Penjon obteve doctorat d’état na Sorbonne com um léxi-

147

24/11/06 – 18h


co dos termos de flora e fauna nesse romance, complementado por alguns outros escritores e por um estudo específico.9 Na tese em três volumes, o maior número de páginas foi mesmo para Guimarães Rosa, o que é compreensível. A partir dessa base, a autora preparou o “Glossário de flora e fauna” para a edição crítica do romance, que coordenei para a Archives.10 A edição crítica permanece inédita.11 Data de 2001 a publicação do monumental O léxico de Guimarães Rosa, de Nilce Sant’Anna Martins.12 Com seus 8.000 verbetes, cobre toda a obra do escritor, enfrentando todos os seus vocábulos, não se esquivando a nenhum neologismo. Desde então, os estudiosos dispõem de um inestimável instrumento de trabalho, da maior seriedade. O escritor a quem a língua portuguesa deve seu maior índice de criação vocabular encontrou aqui uma estudiosa à altura. De qualquer modo, o Léxico faz justiça a um autor único na literatura brasileira: foi em seu estro que nossa língua literária alcançou seu mais alto patamar. Nunca antes e sobretudo nunca mais depois a língua foi desenvolvida em todas as suas virtualidades. A tal ponto que, na formulação de Cavalcanti Proença, um dos primeiros críticos a saudar sua estréia, o escritor chega a se confundir com a língua, colocando-se em seu ponto inaugural e, a exemplo dela, criando incessantemente. Assim, Guimarães Rosa toma a liberdade de trocar um sufixo por outro; ou então deriva um verbo, até então inexistente, de um substantivo ou adjetivo; ou, ao contrário, deriva um substantivo ou adjetivo de um verbo. Ou então, como é seu hábito, opera um deslocamento de sentido, atribuindo um de sua criação ou escolhendo dentre vários o mais inusitado e raro, que pode ser um regionalismo ou arcaísmo, enquanto mantém o significante. Quando, por exemplo, emprega “monarquia” como um coletivo, sinônimo de grande quantidade: “Os muitos! Uma monarquia deles...” Reitera-se entretanto o viés de enfatizar a erudição, e que se origina no próprio Cavalcanti Proença. Este ia antes sondar o babilônio (“O sol chamacha”, do deus solar mesopotâmico Shamash), o sânscrito, o grego e o latim, esquecendo-se do que se passa aqui ao pé – a chama. Entre outras, o Léxico acolhe sua interpretação para “perequitar”, derivando-a do verbo latino perequitare – perambular a cavalo – sem se lembrar de seu homófono e quase homógrafo “periquitar”, brasileirismo que descreve o andar em vaivém do periquito. A ave forneceu ainda outro brasileirismo de notável expressividade, “emperiquitar”,

148

24/11/06 – 18h


sinônimo de enfeitar-se com exagero. De qualquer modo, trata-se de uma contribuição que não tem preço para a compreensão do texto de nosso autor. Um olhar sobre a maneira de operar de nosso escritor é facultado pela freqüentação do Arquivo Guimarães Rosa, sob a guarda do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo. Há ali abundância de materiais, tais como correspondência ativa e passiva ainda inédita, recortes, cardápios, fotos e postais, diplomas e certificados, documentos, papéis relativos à carreira profissional, mementos de todo tipo. Mas sobressai uma notável coleção de sete cadernetas e 25 cadernos, que serviram a diferentes propósitos. Podem conter impressões de boiadeiro, das ocasiões em que o escritor tangeu boiadas pelo sertão mineiro, quando, em configuração que se tornou legendária, necessitando das mãos livres para subjugar a montaria, levava o caderno atado ao pescoço por um barbante. Uma viagem e seu respectivo caderno às vezes servem de base para muitos trabalhos.13 Podem conter apontamentos de leitura, qual seja a de Homero, a que o escritor andou se dedicando entre os anos de 1948 e 1951.14 Ou então funcionam como uma espécie de registro do cotidiano, como aquele conhecido por “Diário de Paris”.15 Ou estiveram a serviço de determinado objetivo específico, como o conjunto de cinco “cadernetas de viagem”, fiéis companheiras de giros pela Europa.16 Ou, caso raro, preservam uma unidade temática, patente por exemplo no caderno dedicado aos costumes e linguajar dos ciganos.17 Ou ainda se adequaram a uma miscelânea de destinações, conforme vários trabalhos já comprovaram.18 E assim por diante. São informações a que temos acesso graças à diligência de pesquisadores que estagiaram no verdadeiro tesouro que o arquivo constitui.19 Afora tudo isso, as folhas avulsas constituem os materiais mais numerosos, bem como os mais peculiares, constantes do arquivo. Manuscritas ou datilografadas, às vezes duplamente inscritas, contêm listas de palavras e de locuções de várias espécies, elencos de possíveis títulos, notas de leitura, lembretes, observações feitas em pesquisa de campo. Ressalta a ausência de rascunhos propriamente ditos, raramente havendo versões ou originais. Estes viriam à tona em outros acervos.20 Raro é o elemento claramente diegético no arquivo. Lá estão os apontamentos, mas não há nem notas de regência (planos, resumos, esboços de enredo) nem roteiros. Tudo se passa como se houvesse uma fratura entre os prototextos e paratextos, de um lado, e as obras prontas, de outro, ignorando-se como

149

24/11/06 – 18h


os primeiros conseguiram transformar-se nas segundas. Pelo menos é o que parecia, levando-se em conta que os originais datiloscritos de Grande sertão: veredas tinham seu paradeiro conhecido entre os herdeiros, sendo possível examiná-los e até copiá-los. Devia-se pensar que as etapas intermediárias (manes de Flaubert e Joyce!) se perderam, ou, ao contrário, que o método de trabalho do escritor não as incluía? Que dos fragmentários prototextos ao primeiro jato de escrita executava um salto? Só bem mais tarde, como se verá, algumas lacunas seriam preenchidas. Guimarães Rosa mesmo foi de pouca ajuda para a compreensão de seus métodos de trabalho. Avesso a entrevistas, entre as poucas que deu, a mais completa nesse tópico é aquela concedida a Günter Lorenz (1965)21, e assim mesmo porque se destinava de início exclusivamente à publicação na Alemanha. Segundo o testemunho dos que com ele conviveram, fazia declarações que cercavam de mistério sua escrita e a atribuíam à inspiração. Todavia, nessa entrevista fala de muita labuta e suor. As melhores pistas, como vimos, encontram-se nas cartas em que respondeu a consultas de seus numerosos tradutores, enriquecidas por seu talento de poliglota que se deleitava no potencial praticamente inesgotável demonstrado pela espécie humana para a diversidade lingüística. Entretanto, essas cartas, se soerguem o véu de um mistério cultivado, têm o inconveniente de terem sido escritas a posteriori: os livros já estavam publicados e a reflexão do escritor ia mostrando influência da recepção crítica, à medida que esta se desenrolava. Ainda assim, devemos a elas esclarecimentos preciosos, como o da formação do nome da personagem Moimeichego, em “Cara de Bronze”, de Corpo de baile.22 Conforme adiantou a Edoardo Bizzarri, seu tradutor para o italiano, trata-se de um somatório de pronomes de primeira pessoa em francês, inglês, alemão e latim/grego (moi + me + ich + ego), os quais, telescopados, com os grafemas respeitados nas línguas de origem mas os fonemas desfigurados pela prosódia brasileira, ficam irreconhecíveis. A propósito, não parece inteiramente alheia a essa composição o Mamalujo – da primeira sílaba dos nomes dos quatro evangelistas: Mateus, Marcos, Lucas e João – do Finnegans wake de Joyce. Devemos à mesma fonte luzes sobre o neologismo “abocabaque” em “Uma estória de amor”, do mesmo livro, advérbio de modo inexistente em nosso idioma, criado pelo escritor mediante a naturalização da frase feita latina ab

150

24/11/06 – 18h


hoc ab hac, utilizado para caracterizar uma personagem que falava “disto e daquilo”, ou a torto e a direito, em versos rimados. Depois de formulado, o neologismo guarda ainda paronomásia com os vocábulos portugueses boca e basbaque, transformando-se dessa maneira numa palatra portmanteau. Embora imprescindíveis para elucidação em vários níveis, como vimos, as cartas aos tradutores, desde que fique claro seu caráter de pós-texto, servem a indagações genéticas mais específicas, sendo prudente combiná-las com materiais que formam propriamente prototextos e paratextos. Quanto às folhas avulsas, não levam datas e, quando numeradas, o são sem seqüência. Procedem a uma série de operações e dão origem a outras tantas, para a compreensão das quais é preciso abrir mão do eixo estemático. Tais folhas interrogam o pesquisador, ao não estipularem – com raras exceções, como veremos –, no seu conjunto ou separadamente, alguma relação com um futuro texto. Até mesmo sua natureza de prototexto pode tornar-se discutível: apenas parte delas tem relação direta com futuros textos, enquanto outras se omitem. Por isso, a pluralidade dos materiais e sua virtual utilização exigem uma genética não estemática. Ora, as que podem ser rastreadas até textos definitivos colocam-se tardiamente na cronologia da obra: aparentemente não há folhas avulsas relacionadas aos primeiros e mais volumosos livros, inclusive o único romance. Devese atribuir esse fato ao nascimento de uma consciência da importância dos prototextos e paratextos, devido à fama, que levaria o escritor a preservar tardiamente tais folhas, ou deve-se pensar que o escritor sofreu uma evolução em seus métodos de trabalho? As folhas avulsas que passo a examinar derivam de uma amostragem colhida dentre os abundantes materiais, não constituindo exceções, mas bem ao contrário, sendo típicas. Foram selecionadas por sua representatividade, obedecendo ao duplo critério de suporte (manuscrito, datiloscrito, formato do papel, distribuição na página) e nível de elaboração. A intenção é que essa amostragem seja representativa dos diferentes patamares de criação do texto. Para fins de exposição, começo pelas mais simples e vou apresentando as demais sucessivamente, conforme se adensa seu grau de complexidade. Começo por uma lista de palavras em ordem alfabética, de “Aba” a “Acicate”, com explicações de seu significado e uso, após o hífen à direita da palavra. A disposição na página bem como a seqüência seguida, embora lacunosa e

151

24/11/06 – 18h


interrompida, sugere que se trata de verbetes de dicionário. O cotejo a que procedemos aponta como provável fonte dessa lista o Pequeno dicionário brasileiro da língua portuguesa, de Aurélio Buarque de Holanda, precursor do Aurélio e, à época, o mais usual de nossos dicionários. Deve-se notar que são incluídas apenas as palavras mais raras, sendo selecionados e resumidos os significados mais complicados, deixando-se de lado os outros que estão nesse dicionário. Essa já é uma primeira gestão do escritor no código lingüístico, ou seja, na língua “em estado de dicionário”.23 Uma segunda gestão insere o signo pessoal “m%”, indicando apropriação da palavra ou locução para uso do escritor, signo que se apresenta com alta freqüência nas folhas avulsas. O signo “m%” é multívoco, e nem sempre indica que o autor tenha inventado aquele torneio verbal, embora isso possa ocorrer. Dou como exemplo a incidência do signo nesse exemplar, onde está: “Abalonado – que tem forma de balão (m%: nuvem)”. Ora, o vocábulo “abalonado” não é corrente em português, mas a palavra “nuvem” é a mais corriqueira possível. O signo pessoal “m%” aqui indica que a combinatória no eixo sintagmático, esta sim, embora virtual no código lingüístico, é um achado do escritor (nuvem abalonada). Um outro caso mostra procedimento diverso. A ordem alfabética é subvertida pela intromissão de “m% – a fel-pesar”, entre os verbetes “abater-se” e “abelheira”, de onde, portanto, infere-se a ausência de “a bel-prazer”. Ora, “a fel-pesar” é um neologismo do autor, criando um antônimo para a locução “a bel-prazer”, que, esta sim, poderia estar no lugar certo conforme a ordem alfabética. Uma simples regra de três nos diz que “fel” está para “bel” assim como “pesar” está para “prazer”, numa equação em que a locução de modo “a fel-pesar” – invenção de Guimarães Rosa – vem a ser o antônimo de “a bel-prazer”. Ainda mais, à simetria gráfica e fonética do significante corresponde a antítese do significado. Nesse caso, temos uma percepção ainda mais clara da gênese da escrita rosiana, pois nos vemos em presença de um autêntico neologismo do autor tanto quanto dos mecanismos de sua composição. Uma terceira gestão, dessa vez manuscrita, inscreve à direita de uma lista datiloscrita o título de um conto de Tutaméia (Terceiras estórias), “Ripuária”. Verifica-se que justamente nesse conto aparece uma dentre as muitas acepções possíveis constantes da lista para a palavra “abas” – no caso, a pouco conhecida que designa as margens de um rio.

152

24/11/06 – 18h


Em princípio, um rol de verbetes de dicionário deveria ser considerado um paratexto. Todavia, aqui interferem quatro tipos de gestões do escritor: 1) seleção no eixo paradigmático, privilegiando apenas as palavras mais raras; 2) intervenção no eixo sintagmático, por meio de resumos dos verbetes; 3) diferentes ocorrências de “m%”, indicando ampla gama de modos de apropriação; 4) criação. Essas gestões transpõem a lista para um estatuto ambíguo entre o prototexto e o paratexto. Mais uma lista traz igualmente verbetes, só que agora de locuções e não mais de palavras. À direita da locução persiste o hífen, após o qual vem o verbete propriamente dito, ou a acepção, ou, por assim dizer, sua versão em metalinguagem. Algumas locuções dispensam a explicação à direita. A ordem alfabética não é respeitada e o número 62 aparece manuscrito no canto superior direito, sugerindo um bloco de que a folha teria sido destacada. As locuções, que também obedecem ao princípio da raridade, incidem sobre expressões idiomáticas do português do Brasil, e são em geral pouco empregadas. Por exemplo, “sacudir o sono – acordar” ou então, sem verbete, “vagar a qualquer atividade”. Numa gestão já conhecida, títulos de contos surgem manuscritos, um à esquerda (“Luas-de-mel?”), três à direita (“H. Pinguelo” duas vezes, uma delas com ponto de interrogação, e “Substância”). Observa-se que uma mesma locução pode ser aproveitada em dois contos diferentes: “descer em cena – avançar para o proscênio, vir para o 1º plano” está referida a dois títulos de conto (“Luas-de-mel?” à esquerda e “H. Pinguelo” à direita), ocorrendo de fato em ambos. A seguinte, linhas abaixo, remete a locução “estar nos ares ou ficar nos ares”, com o significado de “ficar sobressaltado, alvoroçado de esperanças e alegria ou de receios e susto”, em inscrição à direita, para o conto “Homem do pinguelo”, onde se encontra. Uma última gestão nesse exemplar remete para o conto “Substância”, onde se acha incluída a locução “dar volta a uma coisa – resolvê-la”. As locuções escolhidas têm sinais parciais de cercadura, enquanto só a última está cercada e hachurada, não havendo, portanto, uma total uniformidade de sinalização. O signo pessoal de apropriação “m%” está ausente. Outra lista de locuções já não traz um verbete à direita após o hífen. Tudo indica que se trata de notas de leitura, pois muitas estão entre aspas como se fossem citações. Há autores ou títulos indicados (Ruy, Bilac e até o Código

153

24/11/06 – 18h


Civil), duas são em espanhol e uma em alemão. Algumas trazem o signo pessoal “m%” à frente. Afora a parte datilografada, essa lista apresenta uma ocupação do espaço deixado em branco pela datilografia no canto superior direito, por nove outras locuções manuscritas, o que pressupõe duas etapas sucessivas, ou seja, que primeiro a folha foi datilografada e a anotação manuscrita feita posteriormente. Tanto as datilografadas como as manuscritas privilegiam torneios engenhosos de frases, sobretudo concordâncias heterodoxas ou pouco correntes na língua, por exemplo “para vingar a uma conclusão séria” ou “à maneira que”. Novamente surgem aqui, manuscritas, algumas chamadas de títulos de escritos de Guimarães Rosa. Há duas remissões a “Aletria” na margem esquerda da página, seguidas de ponto de interrogação. A primeira, que aparta para uso “Veja-se Platão, que...”, figura num dos prefácios de Tutaméia (“Aletria e hermenêutica”), mas a segunda, que se refere a “o antessuposto”, não será ali empregada, embora ambas venham precedidas do signo “m%”. À direita da locução “terá o jus do”, vê-se entre parênteses o título do conto “Fatalidade”, onde ela de fato figura. Entretanto, é possível encontrar um conjunto de quatro folhas avulsas formando uma seqüência numerada a mão, composta por duas páginas manuscritas (numeradas 38 e 39) e duas páginas datilografadas (40 e 41), sendo as demais inexistentes. O conjunto apresenta as características expostas em seguida. A transcrição do manuscrito para o datiloscrito, que é sua cópia, se faz “imediatamente”, em numeração seguida. Há poucos trechos que figuram no manuscrito sem se acharem no datiloscrito e vice-versa. Afora essas lacunas e interpolações, o restante é ipsis litteris. Não se trata aqui de uma lista de palavras ou locuções, como nos casos anteriormente examinados, mas de um assunto: a descrição minuciosa da fabricação artesanal de polvilho. Essas páginas, embora não contenham qualquer referência a títulos, vão constituir o cenário do conto “Substância”, acrescentando-se ao assunto um enredo e personagens, isto é, os elementos diegéticos. Interessa aqui examinar como se faz o aproveitamento desse material no conto: no geral, pelo cenário completo, e no particular, por palavras ou pequenos sintagmas, com deslocamentos. É aproveitada quase sem alterações justa-

154

24/11/06 – 18h


mente a frase de abertura do conto, em que datiloscrito e manuscrito coincidem: “Na roça = o polvilho é das coisas mais alvas. (Nem algodão, nem nada)”. No conto “Substância”, a frase surge desenvolvida: “Sim, na roça o polvilho se faz a coisa mais alva: mais que o algodão, a garça, a roupa na corda”. No caso desse conjunto de quatro folhas avulsas, pode-se dizer que, embora mantenha o caráter de paratexto, já se mostra um prototexto mais complexo e tendendo à narrativa em que afinal se tornará. Ainda uma outra lista datiloscrita apresenta um alto grau de elaboração, se atentarmos para sua constituição por sintagmas desenvolvidos, alguns deles frases completas que vão da inicial maiúscula ao ponto final. A cada linha, quase sem exceção, corresponde o signo pessoal “m%”. Trata-se de um grupo de orações já inventadas e trabalhadas, prontas para entrarem nas narrativas. Das cinco frases cercadas, e uma delas ainda hachurada, quatro entram no conto de cujo título se faz remissão à direita, “Desenredo”. A cada uma destas quatro corresponde a inscrição manuscrita “Pulso?”, à esquerda, referindose ao título do jornalzinho de médicos onde os contos de Tutaméia (Terceiras estórias) estrearam. A alusão a “Sem tangência”, manuscrita à direita da segunda das quatro frases hachuradas, aparta a frase para emprego naquele texto, para onde de fato foi. Deve-se notar que todos os sintagmas são compatíveis com os contos em que só alguns vão figurar, mesmo aqueles que não foram aproveitados, o que decorre da insistência em termos abstratos, retirados do vocabulário da filosofia. Um par de páginas manuscritas de tamanho médio, a primeira encimada pelo brasão e timbre do Ministério das Relações Exteriores, onde o escritor trabalhava, também apresenta sintagmas antecedidos do signo pessoal “m%”, já elaborados para entrarem numa narrativa. Mas com uma diferença importante: nenhum deles entrou no conto a que o Incipit se refere – “Nada e a nossa condição”, de Primeiras estórias – e no qual Tio Man’Antônio passou de título a protagonista. É provável que a inscrição OUT seja a palavra inglesa para “fora”, autorizando-nos a inferir que esses sintagmas, apesar do “m%”, sobraram do conto, já que faltam remissões associando-os a qualquer título. À vista dessa amostragem de listas, pode-se avançar a seguinte hipótese. O escritor apresentaria como método básico de trabalho a criação de pequenas unidades frásicas, palavras isoladas ou sintagmas, às vezes mementos para si próprio,

155

24/11/06 – 18h


em grande quantidade e não para uso imediato, que ficam em latência nas listas, aguardando sua utilização. Pode-se inferir que era a essa atividade perene que se referia quando fez esta declaração numa entrevista: “Eu estou sempre trabalhando, acumulando, cogitando. De repente cristaliza a idéia de fazer um livro. Então junto coisas que cresceram separadas, mas que agora se completam”.24 Entre anotações de mesmo teor na epistolografia da época, também confidenciou ao pai, em carta, que iria ordenar num caderno as informações que este lhe enviara. Constituem essas listas um estoque permanente, do qual são retirados os sintagmas para uso e para o qual voltam se “sobram” de uma determinada narrativa; e no estoque ficam aguardando um possível futuro aproveitamento. Proponho a delimitação de três etapas de um labor incessante e em movimento perpétuo. Na primeira, ou de contato, o autor dirige-se ao código lingüístico, seja através de dicionário, de leituras variadas, ou de viagens pelo sertão, operando uma seleção no eixo paradigmático. Na segunda, ou de intervenção, o autor procede à combinação no eixo sintagmático, quando a inscrição do signo pessoal “m%” indica uma apropriação ou criação sua. Na terceira, abrem-se duas possibilidades: ou a integração do sintagma assinalado “m%” numa narrativa qualquer ou a volta do sintagma que “sobrou” para o estoque permanente, este sem cessar decrescendo por uso e crescendo por invenção. As operações são comandadas por uma rede de deslocamentos, num movimento ao mesmo tempo centrífugo e centrípeto que se bifurca em duas direções, ou para a narrativa ou para o estoque. Na primeira etapa, ao sintagma do código vai corresponder um verbete. Na segunda, o signo pessoal de apropriação, “m%”, é anteposto ao sintagma assim criado ou apropriado. Na terceira, o sintagma criado ou apropriado submete-se a um desses dois destinos: ou é enxertado numa narrativa ou volta para o estoque. • Como se pode verificar, a pesquisa ecdótica rosiana sofreu uma guinada crucial, com o aparecimento de tal fartura de materiais, constituída pelos originais que passaram a integrar a Coleção Guita e José Mindlin. Faço votos de que inúmeras outras achegas sejam postas a nosso alcance não só pela edição crítica de Grande sertão: veredas por mim coordenada, pronta há vários anos e

156

24/11/06 – 18h


aguardando impressão, mas igualmente pela futura edição crítica de toda a obra rosiana. Tarefa que pode muito bem caber à mesma equipe que nesta instância tive a honra de reunir e coordenar, a qual, após o tirocínio adquirido, acha-se apta a debruçar-se sobre o restante por si própria, com autonomia. A construção do imaginário e a proliferação dos enredos Na obra rosiana, enquanto espaço e linguagem permanecem constantes, os enredos mostram-se variadíssimos. Esquadrinhando as fontes mais remotas de seu imaginário e recuando a suas origens mineiras, com base em textos não ficcionais de sua autoria, veremos como Guimarães Rosa era apegado a essas origens. Um pequeno e curioso texto seu versa sobre Minas e seus nativos.25 Em elucubração lírico-devocional, vai alinhavando paradoxos e mais esconde que revela, compondo de certa maneira o estereótipo do “mineiro sonso”. Em resumo, formam o texto “nove expressões imagéticas (...), 26 topônimos escolhidos por suas ressonâncias estranhas ou poéticas (...), sete nomes de rios, 65 traços de caráter, 207 qualificativos coroando tudo!”26 Predomina a figura da acumulação, em negaceio de que o leitor não sai mais esclarecido sobre Minas e os mineiros, porém convencido do amor de Guimarães Rosa por ela e por eles. Procedia do coração de Minas Gerais, até pelo topônimo de sua cidade, Cordisburgo. Em consonância, embora lamentasse a perda do nome anterior de Vista Alegre e sua substituição pelo mais pretensioso de Cordisburgo, este lhe deu oportunidade para tecer volutas lingüísticas em torno do “burgo do coração”, como fez no discurso de posse na Academia Brasileira de Letras.27 Entre as muitas faceirices do discurso, ressalte-se que começa e termina com o topônimo, enquanto o orador conta que no meio diplomático era freqüentemente chamado pelo nome de sua cidade. Ali se pode apreciar, ainda hoje, a venda de seu pai reconstituída arquetipicamente naquilo que de fato foi a casa em que morou na infância, hoje tombada pelo Patrimônio Histórico. Fica em localização ideal para tal gênero de comércio, numa esquina, com portas abrindo para ruas que se cortam em ângulo reto. Com um pouco de fantasia, visualiza-se por ali um menino cismarento e de óculos – tal como aparece numa das raras fotos da época –, ouvindo sem que ninguém lhe preste atenção os “causos”, muitos deles certamen-

157

24/11/06 – 18h


te inconvenientes para uma escuta infantil, que constituem a conversa fiada sem fim dos adultos na venda (como testemunha seu tio Vicente, companheiro de folguedos, apenas dois anos mais velho apesar de tio).28 A venda: esse misto de foco da sociabilidade masculina, central de informações e banco de dados da história oral. Depois de homem feito e já morando longe, ainda escreveria com freqüência ao pai solicitando novas estórias portentosas, bem como confirmação ou pormenorização de antigas, dando como referência a venda.29 O pedido de contribuições referentes a coisas e pessoas locais é insistente, e datam do início da reescrita de Sagarana para publicação, quando o assunto em pauta é o livro. E convida o pai para uma viagem ao sertão: “Que irei fazer de cadernos abertos e lápis em punho, para anotar tudo o que possa valer, como fornecimento de cor local, pitoresco e exatidão documental, que são coisas muito importantes na literatura moderna”.30 A observação mostra como o escritor estava imbuído da melhor doutrina regionalista da época, com relação à qual, no entanto, sempre faria questão de marcar suas distâncias. A anuência do pai é festejada em outra carta: Fiquei muito contente com a ida do Papai, que já deve ir recordando e alinhando lembranças interessantes de coisas vistas e ouvidas na roça – caçadas etc. – que possam servir de elementos para outro livro, que vou preparar.31 Publicado Sagarana em 1946, depois de muitas indagações e respostas do pai, as solicitações doravante ultrapassariam as meras notícias sobre coisas e traços pitorescos, avançando para enredos mirabolantes, os quais, embora não faltassem no livro do momento, inçariam toda a sua obra subseqüente. E isso logo no ano seguinte, 1947, tendo-se em mente que a elaboração de Corpo de baile e de Grande sertão: veredas tomaria perto de dez anos. Muitas e muitas cartas acusam recebimento de outras do pai trazendo novas anedotas e causos, que o escritor comenta deliciado, dizendo que vai incorporar a seus escritos. Faz lembrar, como vimos, um outro pai contador de estórias, Selorico Mendes, “padrinho” de Riobaldo. Afora a escuta na venda e os relatos do pai, mais uma nada desprezível contribuição deste ao estilo do futuro autor é seu próprio onomástico. Enquan-

158

24/11/06 – 18h


to o autor saíra da pia batismal como um corriqueiro João, sendo em criança chamado de Joãozito e Zito, seu pai, bem à maneira brasileira dos miríficos prenomes inéditos no registro civil, portava o extraordinário nome de Florduardo Rosa. Qualquer um – não é mesmo? – juraria que um nome como esse só pode ser invenção do grande criador vocabular Guimarães Rosa. Pois não é. Tão germânico em sua vetusta origem quanto Eduardo, Hermengarda, Luitgarde etc., apresenta uma corruptela de Flodoardo (frod + hard = prudente e forte), santo conhecido que também resultou nos sobrenomes franceses Frouard e Froard. Mas a homenagem maior ficaria por conta de “Recado do morro”, em Corpo de baile, ao batizar um dos dois padres missionários, pertencentes à ordem franciscana e conhecidos como capuchinhos, desses que andam aos pares em missões de reavivamento pelo sertão, como no episódio de Maria Mutema, no romance. Ao que tudo indica, eram alemães ou provindos dos estados do sul do país, onde predominavam, já que, reza o texto, eram louros, fortes, corados, falando com sotaque e entendendo a língua do dinamarquês seu Olquiste. O que, se não combina com o biótipo sertanejo, é coerente com o que testemunham familiares de Florduardo Rosa e com a cepa germânica do onomástico. Devemos muito do que se sabe sobre um período tão crucial quanto a infância de nosso escritor a Vicente Guimarães, seu tio paterno, ele próprio o conhecido Vovô Felício, autor de literatura infantil, que evoca particularmente os primeiros anos de Guimarães Rosa, bem como a sua filha Vilma Guimarães Rosa, que viemos citando.32 Ainda outros dados constam da documentação depositada no acervo do Instituto de Estudos Brasileiros da USP e na Casa de Rui Barbosa, no Rio. • A capacidade de fabulação de nosso autor parece infinita: os enredos que cria, e não repete, são numerosíssimos. Essa riqueza já se faz notar em Grande sertão: veredas, em que, paralelamente à trama central, aparecem incontáveis estorinhas, pontuais e circunscritas, quase sempre sob a forma de causos. Inícios tateantes constaram de quatro contos publicados em revistas, três deles mostrando preferência por entrechos desenvolvidos em países estrangei-

159

24/11/06 – 18h


ros, e um livro de poesia (Magma) que, apesar de premiado pela Academia Brasileira de Letras, nunca permitiu que viesse à luz, o que só ocorreu décadas após sua morte. Como opção estética, nada tinham a ver com o que no futuro seria sua obra. Entrementes, candidatou-se a outro concurso literário, o prêmio Humberto de Campos da Editora José Olympio, de 1938, com um volume modestamente intitulado Contos, tendo o júri agraciado outro concorrente. Não se sabe se foi a derrota que o desanimou, ou os percalços inerentes a uma mudança para fora do país, como exigia sua nova profissão, a de diplomata. O certo é que levou perto de dez anos preparando o livro para publicação. E com certeza foi nessa lida insana que aprendeu seu ofício. Entregou-se a podar os escritos sem piedade: o volume foi reduzido quase à metade, passando de perto de quinhentas páginas para cerca de trezentas. Além disso, três dos contos foram sumariamente eliminados. Sagarana Após quase uma década de incessante reescrita, Sagarana finalmente ficou pronto e saiu em 1946. Trazia nove contos, indo de vinte (“Sarapalha”) a 65 páginas (“O burrinho pedrês”). Se uma evolução pode ser notada na trajetória da obra, no entanto alguma coisa de definitivo já se afirma nesse primeiro livro.33 A matéria do sertão lá está, bem como a linguagem baseada na oralidade, com aproveitamento de regionalismos e de arcaísmos ali preservados, mas já também adaptando estrangeirismos e criando neologismos. Sua marca registrada estava estabelecida nesse livro. Cerca de metade dos contos traz histórias de prodígios. “O burrinho pedrês” trata de um cataclismo, no qual uma boiada e os vaqueiros que a conduzem são tragados por um córrego avolumado pelas chuvas, só se salvando um que cavalgava o burrinho do título, e outro que se agarrou a sua cauda. Em “Duelo”, dois homens perseguem-se mutuamente com intuitos assassinos, sem conseguir se encontrar, ao azar do destino. Em “São Marcos”, uma importante discussão sobre o canto e a plumagem das palavras alterna-se com um tenebroso caso de feitiçaria que leva o protagonista à cegueira. Em “Conversa de bois”,

160

24/11/06 – 18h


os animais justiceiros que puxam o carro entabulam diálogo, como nos tempos primordiais, numa viagem que começa com o transporte de um defunto e termina com dois. Depois de “Sarapalha”, em que dois primos tiritam de malária enquanto ajustam velhas contas, e “Corpo fechado”, em que valentões se sucedem no arraial e um cômico episódio de fechamento de corpo dá bom resultado, sãonos oferecidos episódios dos fastos da oligarquia. “A volta do marido pródigo” é um picaresco relato de conchavos eleitorais, introduzindo as estripulias de um grande protagonista, Lalino Salãthiel, que vende a mulher e depois a recupera de graça. Em “Minha gente”, um rapaz e uma moça passam férias na fazenda da família, férias que têm para eles a valia de uma aula sobre as politicagens dos “coronéis”. E em “A hora e vez de Augusto Matraga” vamos nos deter um pouco. Primeiro, por se tratar do mais importante e elaborado conto do livro, tendo uma recepção de alcance muito maior que os restantes. Essa recepção estendeu-se até a filmagem de um longa-metragem por Roberto Santos (1966), obra-prima também, fazendo jus ao texto em que se baseou, e que se tornaria a melhor transposição de uma obra de nosso autor para a tela. E segundo, porque, conforme declarações de Guimarães Rosa, foi ao criá-lo que atinou com o que queria fazer. Narra o percurso de um “coronel”, que começa mandão e prepotente, mas, ao perder tudo de repente, ao ser vítima de um atentado, é dado por morto e jogado de um barranco. Recolhido por um casal de pretos velhos que moram num rancho e por eles recuperado, volta à vida e converte-se, para fazer penitência em arrependimento pelos pecados anteriores. Chegará às raias do martírio, ao utilizar novamente a violência que renegara, porém imolandose em lugar de uma pessoa indefesa. É assim que Matraga vai ao encontro daquilo por que tanto ansiava, sua hora e vez, na morte. O título da coletânea é bastante sugestivo. Em lugar do termo anódino de Contos que inicialmente o rotulou, nos quase dez anos de reelaboração acabou encontrando outro, que faria história, e que revela um escritor já dono de seus instrumentos e neles confiante, sem temor de inventar um neologismo e uma sonora palavra cheia de aa. Ao somar o germânico “saga” (conjunto ou série de estórias, aliás orais, derivada do verbo “dizer”, portanto índice épico) ao sufixo tupi “–rana” (à maneira de, o que parece), Guimarães Rosa exibe sua mestria e seu crescente apetrechamento para enfrentar o que virá.

161

24/11/06 – 18h


Corpo de baile Após dez anos sem livro, Guimarães Rosa assombrará a cena literária ao publicar no mesmo ano de 1956 as quase 2.000 páginas de Corpo de baile e Grande sertão: veredas, constituindo em seu conjunto três grossos volumes. Ambos os livros abeberam-se na “matéria do sertão”, especialmente nessa mina do anedótico que é a região do rio São Francisco. Quando comparadas aos contos de Sagarana, as “novelas” de Corpo de 34 baile – conforme o subtítulo dado pelo autor, que todavia as denomina “poemas” no índice – revelam-se bem mais complexas e densas. Apenas seu tamanho já é uma indicação, pois vão desde 68 (“Cara-de-bronze”) até 138 páginas (“A estória de Lélio e Lina”). Repartidas em dois volumes na primeira edição, foram reunidas num só na segunda, e desde então aparecem em três, cada qual com título próprio. A classificação das “novelas”/”poemas” também ficará sujeita a variações. De sua complexidade, uma rápida notícia pode dar idéia. “Campo geral”, a primeira novela, tornou-se um dos mais populares entre os escritos rosianos, devido ao encanto do protagonista, o menino Miguilim. Seu nome foi mesmo posteriormente escolhido para batizar os contadores de estórias de Cordisburgo, Os Miguilins, que declamam textos de nosso autor. No auge de uma intriga familiar e das agruras de ser criança, dão óculos ao menino, que não se sabia míope, e ele de repente descobre as belezas do mundo. Em “Uma estória de amor”, Manuelzão comanda a festa de consagração da capela que mandou erigir em sua fazenda, ponto culminante de uma vida de trabalhos, no percurso da qual perdeu alguma coisa de espontâneo, o que o torna ciumento e cismado. Ambas passaram a compor o volume Manuelzão e Miguilim. O segundo volume, No Urubuquaquá, no Pinhém, reúne três novelas, todas de uma delicadeza e de sondagens de linguagem quase metafísicas. Em “O recado do morro” assistimos à tortuosa retransmissão de uma suposta mensagem, prevenindo e salvando a vida de uma personagem, enquanto paralelamente se expõe a gênese de uma canção. Em “Cara-de-bronze”, o fazendeiro fica sentado em casa e manda o vaqueiro Grivo pesquisar o que existe no mundo para vir-lhe contar de volta, interessado que está em conhecer “o quem das coisas”. “A estória de Lélio e Lina” toca fundo numa tópica imemorial da grande

162

24/11/06 – 18h


tradição da Antigüidade clássica, ao fazer de seu fulcro a amizade amorosa entre um jovem vaqueiro e uma velha-moça.35 As duas primeiras novelas figuram entre as meditações de maior alcance que o autor escreveu sobre os nexos entre o inconsciente da linguagem e a criação artística. Finalmente, o terceiro volume, Noites do sertão, traz, como o primeiro, duas novelas, “Lão-Dalalão (Dão-Lalalão)” e “Buriti”, que primam pelo erotismo. Na primeira, o protagonista inferniza seu feliz casamento devido aos ciúmes que abriga com relação ao passado da esposa, que antes do casamento era prostituta de bordel, e a quem criva de perguntas indiscretas. Em “Buriti”, enquanto o chefe Zaquiel passa a vigília de sua insônia a auscultar as vozes da noite, o poderoso fazendeiro domina a pequena comunidade, bem como o mundo natural, e uma sexualidade infusa se propaga por toda a comparsaria. Grande sertão: veredas As sagas do sertão são aproveitadas nesse romance tanto como narrativas orais, que passam de geração em geração, quanto como tradição escrita, seja na literatura de cordel, seja em alguns livros básicos de circulação por aqueles ermos, como a História de Carlos Magno e dos pares de França. Mas muitos outros elementos derivam dessas fontes. Era costume, por exemplo, que os jagunços de um bando assumissem coletivamente, como substantivo comum, o nome de seu chefe. Tal ocorreu com os feitosas, os brilhantes, os antunes, tal como no romance com os ramiros, os zébebelos, os hermógenes, os riobaldos. Do mesmo modo, o jagunço assumia um nome de guerra, e mesmo os mais célebres, como Antonio Silvino ou Lampião, estavam nesse caso. Antonio Silvino trocou seu verdadeiro nome de Manuel Batista de Morais como homenagem a seu padrinho Silvino Aires. Virgulino Ferreira recebeu a alcunha de Lampião porque atirava com tal rapidez que tudo clareava em volta. Seu irmão adotou o nome de Ponto Fino porque seus tiros costuravam cerrado, o que vai de encontro, como matriz, ao primeiro apelido de Riobaldo, o Cerzidor. Ganhará mais um apelido, o de Tatarana, “lagarta de fogo”, antes de atingir a culminância da chefia e de um cognome ilustre como o chefe Urutú-Branco, serpente das mais venenosas. Três vezes renominado, persiste a alusão à excelência do tiro: no segundo a um bicho que queima e no terceiro à precisão do bote letal. As provas sus-

163

24/11/06 – 18h


tentadas pelo bando no Liso do Sussuarão, definido como “o raso pior havente”, tomam por modelo o Raso da Catarina, no sertão da Bahia, com suas características físicas de extrema agrura, deserto onde Lampião sumia com seu bando para escapar ao assédio das volantes. Mesmo a utilização do zurro eqüestre e do apito como sinal convencionado para ordens de batalha está registrada nas crônicas do cangaço. São pormenores anedóticos que fazem a verossimilhança se relacionar com a veracidade. Mas mesmo o esteio da narrativa, e não um pormenor, que é a legenda do pacto com o Diabo e do corpo fechado, é uma das mais caras tradições do sertão e se aplicou a todos os jagunços famosos. Assim, a “matéria do sertão” fornece ao romance o substrato que sustenta a fabulação. O depoimento, ficcional é claro, de um velho jagunço chamado Riobaldo, agora retirado das lides guerreiras e, por artes que aos poucos se esclarecem, transformado em próspero fazendeiro, fornece o fio da narrativa. Ele se dispõe a contar a história de sua vida a um interlocutor letrado e urbano, que – como se fosse um jornalista, um psicanalista ou um antropólogo – vai anotando suas palavras. “– Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja.” Por essa célebre frase se abre a narrativa, ou seja, por um travessão, que é signo de fala, e de uma fala que só se encerra 500 páginas adiante, no ponto final, sem divisão de capítulos. Esse travessão instaura um monólogo ininterrupto, que é um dos lados de um suposto diálogo, já que em nenhum momento o monólogo cede a palavra ao interlocutor. Mas este é postulado desde a primeira frase, pelo travessão e pelo tratamento respeitoso de “o senhor”, que se reitera até o fim. O interlocutor é interpelado, sempre dentro da fala do narrador, por “respostas” que o narrador dá a suas presumíveis perguntas, em geral sugerindo pedidos de esclarecimento. E também por alusões a suas características – como o uso de óculos e de uma caderneta de notas – ou a seus gestos, como o escrever e desenhar continuamente ao anotar o que ouve. Os elogios, até cômicos de tão exagerados, que o narrador faz ao interlocutor incluem alusões a sua “carta de doutor”, ao fato de vir da cidade grande, a sua instrução, e até a sua “suma doutoração”. A ocasião de atender à solicitação do interlocutor, que conhece a reputação do antigo chefe de jagunços, transforma-se numa verdadeira oportunida-

164

24/11/06 – 18h


de, aliás bem aproveitada, de passar a vida a limpo. Ou seja, construindo, com o auxílio do interlocutor, um texto de autobiografia que o ajude a compreender sua vida, que foi, segundo ele mesmo, caótica, desconexa, desnorteante. O monólogo funda a opção por um discurso “oral” que se expressa mediante interjeições, torneios expeditivos, frases exclamativas e interrogativas, períodos truncados e entrecortados. A opção pela fala é um feliz achado, pois confere ao romance unidade estilística, abolindo a multiplicação de recursos que obrigaria forçosamente a variação dos pontos de vista ou focos narrativos. Pela boca de Riobaldo, são todas as personagens do romance que falam. Entretanto, trata-se de um discurso “oral” escrito. Não se pode esquecer de que é a partir do modelo oral da fala sertaneja que Guimarães Rosa criou uma linguagem especial, nutrida de arcaísmos e de elementos eruditos, fundando a verossimilhança de um jagunço ser capaz de utilizar tal linguagem a fim de conferir-lhe um passado de letrado, do qual ele se vangloria, embora não tenha ultrapassado as primeiras letras. E foi ao se tornar professor, primeiro, e depois secretário de Zé Bebelo, que Riobaldo acabaria por entrar no ofício da jagunçagem. Até o fim, Zé Bebelo o chamará de “Professor”. Dando a palavra a um jagunço, o romance ganha outra vantagem, a de eliminar o contraste canhestro, tão praticado pela prosa regionalista, entre uma linguagem pitoresca e folclórica que é a do sujeito analfabeto e outra que é apanágio da classe a que pertence o escritor, que assim usualmente, mas não nesse romance, exibe ao leitor o exotismo do cangaço. Atravessa o romance de ponta a ponta uma grande história de amor, aquela entre Riobaldo e Diadorim, seu companheiro de jagunçagem, e causa de perturbação constante para o narrador. Além de ficar remoendo sua experiência passada de guerreiro, tentando encontrar alguma lógica na vida que vivera, tão rica de peripécias que não lhe facilitara tempo para pensar nem para tomar decisões meditadas, também esse amor é fonte de rememoração, remorsos e frustrações. Primeiras estórias Entram em cena, a seguir, as “estórias”, termo que Guimarães Rosa cunhou e pôs em circulação, opondo-o, como em inglês, a “história”. O livro Primeiras estórias36, publicado em 1962, consta de 21 contos, que vão de qua-

165

24/11/06 – 18h


tro (“Soroco, sua mãe, sua filha”) a 14 páginas (“Darandina”): depois dos volumosos livros imediatamente anteriores, os contos encurtam, mas seu número se multiplica. Duas estórias a respeito de um mesmo menino visitando os tios numa cidade em construção37, em meio a um sofrimento difuso, mas submetido a epifanias graças à visão de duas aves, um peru no primeiro conto (“As margens da alegria”) e um tucano no último (“Os cimos”), inauguram e encerram o livro. A destacar, a predominância, só aparentemente fortuita, de crianças. Além dessas duas estórias, também surgirão em outras. Em “A menina de lá”, Nhinhinha, que não chega a ter quatro anos, inventa palavras e profetiza, antes de morrer e virar santa. Em “Pirlimpsiquice”, os meninos do colégio interno criam um teatrinho, em que procedem a uma encenação, com espantosas conseqüências. Em “Nenhum, nenhuma”, os olhos de um menino, sozinho numa fazenda misteriosa onde há um moço, uma moça, uma velhinha e um homem alto, tentam entender o que se passa. Em “Partida do audaz navegante”, crianças brincam, inventando enredos de imaginação desatada. Algumas estórias são protagonizadas por valentões. “Famigerado” é uma estória cômica de rufiões sertanejos às voltas com vocábulos complicados que temem ser insultos a eles dirigidos. Em “Os irmãos Dagobé”, todos de nome começado por “D” – Damastor, Doricão, Dismundo e Derval –, os façanhudos do lugarejo fazem o velório por Damastor, a quem vão sepultar. “Fatalidade”, na qual um pobre-diabo é vítima do brutamontes Herculinão, mostra com ironia a fatalidade como obra dos homens, que, se bem manipulada, pode proteger os fracos. Outras efetuam sondagens existenciais. Em “A terceira margem do rio”, um dia um homem, enigmaticamente, entra numa canoa e vai viver no meio do rio, resistindo aos apelos de sua família para que volte. Em “O espelho”, alguém contempla seu rosto e abisma-se com o que vê. Em “Nada e a nossa condição”, outro homem faz o balanço de sua vida, morre e sua fazenda incendeia-se. Há também romances de amor. Em “Seqüência”, é uma vaquinha que serve de guia numa estória de amor. Em “Luas-de-mel”, um casamento por rapto, costume sertanejo, põe em polvorosa a fazenda onde se abriga o casal e provoca mudanças nos circunstantes. Em “Substância”, o deslumbramento da alvura na fabricação de polvilho é o cenário para um enamoramento.

166

24/11/06 – 18h


Criaturas diferentes são temas de algumas estórias. Em “Um moço muito branco”, um misterioso ser, vindo não se sabe de onde, talvez do espaço sideral, cria situações que raiam o milagre. Em “Darandina”, um homem sobe ao alto de uma palmeira, numa praça, quase provocando um motim na cidadezinha. Em “– Tarantão, meu patrão...”, uma cavalgada maluca reúne todos os desviantes e não-conformistas da fazenda e dos arredores. Outras, ainda, lidam com a opinião da comunidade. De “Soroco, sua mãe, sua filha”, “A benfazeja”, “O cavalo que bebia cerveja” e “Fatalidade”, trataremos detidamente mais abaixo. Em “Soroco, sua mãe, sua filha”, o protagonista está em vias de embarcar sua mãe e sua filha no trem que as levará para o hospício em Barbacena. Em “O cavalo que bebia cerveja”, o espanto que um estrangeiro provoca no arraial vai da hostilidade à aceitação. Em “A benfazeja”, uma mendiga assusta um povoado – antes com o marido, que já morrera, e agora em companhia do enteado – e, por medo, ninguém a ajuda. Em “Fatalidade”, um pobre homem, acossado por um bandido que o persegue de povoado em povoado, procura socorro para escapar à sina. Os volumes de contos costumam buscar coerência e coesão interna, obtendo-as de várias maneiras, seja em personagens que se repetem, seja no mesmo espaço ou na mesma época etc. No caso de Primeiras estórias, o espaço e o tempo se mantêm, além da linguagem – como sempre em nosso autor. Do ponto de vista estrutural, temos mais um fator, que também não é raro: a circularidade que o autor lhe deu, compondo um livro que se torna cíclico devido ao primeiro e ao último conto. No meio do livro, há outro, o conto “O espelho”, o décimo primeiro dos 21: sem lugar geográfico definido, numa voz que fala a partir de um ponto incógnito, e que, por constituir uma ampla interrogação sobre identidade, tornouse predileto dos psicanalistas. A cidade em construção do primeiro e do último conto deve ser Brasília – mas não se pode descartar a possibilidade de convergirem para ela reminiscências de Belo Horizonte, também primeiro planejada no papel e depois executada, outra cidade “artificial” que Guimarães Rosa viu crescer. Todas as demais estórias transcorrem no espaço rural – sítio, fazenda, chácara – ou em pequenas cidades dentro do espaço rural, umas maiores, como em “Darandina”, que tem hospício, bombeiros, polícia, carros, mas quase todas lugarejos. Em dois casos, os contos são de percurso: “Seqüência”, de fazenda para fazenda, e “– Tarantão, meu patrão...”, de fazenda para cidadezinha.

167

24/11/06 – 18h


Mas há ainda outro elemento, nada desprezível, que dá coerência interna ao livro: é o perfil das personagens. A maioria delas é constituída por excêntricos38, no sentido etimológico, ou seja, pessoas que estão fora da centralidade. Poderiam ser chamados também de desajustados ou excepcionais: aqueles que só inadequadamente poderiam ser considerados normais. E que por causa dessa condição têm acesso a níveis de realidade a que o comum dos mortais não tem. Vejamos agora em quem se encarna essa excentricidade. Esses limítrofes incluem a criança, o muito velho, o apaixonado, o insano, o insensato, o inconformista, o marginal e até mesmo um extraterreste... mudo.39 Todos aqueles que poderíamos chamar de iluminados, de fora-das-convenções, de seres de exceção. Não convém dizer que são loucos, a não ser impropriamente, porque Guimarães Rosa já decretava nesse mesmo livro: “Ninguém é louco. Ou então, todos” (“A terceira margem do rio”). Essas figuras fora de esquadro reúnem-se e concentram-se no extraordinário catálogo que delas faz “– Tarantão, meu patrão...”, para instaurar uma cavalgada em missão, a cavalgada dos insensatos – a exemplo da Nau dos Insensatos, a Stultifera navis, de que fala Foucault, na qual as autoridades confinavam os loucos e os deixavam à deriva. Aqui, o protagonista arrasta empós si até 14 deles em conta redonda, que inclui, conforme suas palavras, ele próprio mais o narrador e Deus: o ajudante de criminoso Sem-Medo, Felpudo, Curucutu, Cheira-Céu, Jiló, o cigano Pé-de-Moleque, Gouveia “Barriga-Cheia”, o vagabundo Corta-Pau, Bobo, João-Paulino, Rapa-pé, um “por nome anônimo” e o preto Gorro-Pintado. Os contos de Primeiras estórias apresentam similaridades, não nos enredos – na variação dos quais nosso autor capricha, como sempre –, mas na estrutura deles. Ou seja, todos têm acentuado suspense, e esse suspense às vezes é climático e às vezes anticlimático. Em alguns casos, e muito interessantes, o clímax é um anticlímax, com a construção intensificante do suspense sendo desmanchada, porque o que se aguardava não sobrevém; ao contrário, falha e frustra a expectativa do leitor. O que é muito apropriado para a veia cômica que sustenta algumas das estórias, como “Famigerado”, “Os irmãos Dagobé”, “Fatalidade”, “Um moço muito branco”, “Partida do audaz navegante”, “Darandina”, “– Tarantão, meu patrão...”. Em “Luas-de-mel”, a situação, tão comum no sertão, de casamento por rapto, vai progressivamente erotizando os circunstantes, bem como a linguagem do conto, de modo que a tragédia que se aguarda-

168

24/11/06 – 18h


va não ocorre. Mas pode aparecer também em veia trágica, como em “Soroco, sua mãe, sua filha”, “A benfazeja”, “O cavalo que bebia cerveja”, nos quais o que se julgava saber é desmentido no último momento. Várias das estórias exploram o universo infantil: afora a primeira e a última, ainda “A menina de lá”, “Nenhum, nenhuma”, “Partida do audaz navegante”, com as devidas implicações metalingüísticas. Do lado do metalingüístico, acrescentam-se outras ou algumas das mesmas estórias, cujo desenrolar depende de discussão de linguagem, e até de verbiagem, como “Famigerado”, “A menina de lá”, “Os irmãos Dagobé”, “Pirlimpsiquice”, “Partida do audaz navegante”, “A benfazeja” e “Darandina”. Os nós que o enredo vai atando podem ser desatados no desenlace, este por sua vez ou climático ou anticlimático. É no foco narrativo que reside um dos pontos altos, um dos mais admiráveis feitos estilísticos de nosso autor. Entre outras proezas, é ele o autor da extraordinária primeira pessoa de Grande sertão: veredas e em “Meu tio o Iauaretê”, assumindo a fala do outro. Entretanto, já viera ensaiando desde antes uma espécie de voz popular, coletiva, que falava por todos, às vezes com pertinência insuspeitada, como em “A hora e vez de Augusto Matraga”. Mas nesse livro leva o experimento avante e acerta a mão. Seu grande acerto aqui é a utilização de um narrador coletivo, comportando gradações e matizes. A maioria dos contos é narrada por alguém que fala em nome da comunidade e não se distingue do coletivo. Em “A terceira margem do rio” há um eu que narra, e a primeira pessoa singular se alterna com a plural, pois, embora diga com freqüência “eu”, diz também nosso, nossa, nossos, nossas – referindo-se à família. Em outros, como em “Soroco, sua mãe, sua filha”, utiliza o coletivo “a gente”, para indicar a primeira pessoa plural. Esse indivíduo que fala pela comunidade testemunhou em geral o caso que está narrando; às vezes pode estar contando uma estória que “ouviu”, mas com mais freqüência está contando eventos que “viu” acontecer. Por isso talvez fosse adequado tomar emprestado um termo à antropologia e mostrar sua semelhança com o “observador participante”. Ele não está fora da estória, ele estava presente e viu acontecer, mas não é personagem, é narrador. O foco narrativo de Primeiras estórias elege um sujeito plural, e não mais do singular como no romance ou em “Meu tio o Iauaretê”. Todavia, Guimarães Rosa faz sua concordância verbal no singular, embora no coloquial seja co-

169

24/11/06 – 18h


mum o verbo no plural, concordando não com o significante mas com o significado. Esse narrador de Guimarães Rosa é a voz da saga, ou a voz do épico. Um narrador que se sente parte da comunidade e transmite o que ela pensa não deixa de lembrar o “refletor” de Henry James, que não só o empregou inúmeras vezes como sobre ele teorizou.40 No entanto, o refletor faz parte do entrecho, é personagem individualizada e não se dissolve na comunidade: sabemos seu nome e algo de sua biografia. Ademais, o refletor é em terceira pessoa, alguém que desvia o foco narrativo e por seus olhos a intriga é propriamente vista, o que não é aqui o caso. Se imaginarmos um continuum, poderíamos dizer que esse narrador de Guimarães Rosa situa-se entre o refletor de Henry James e o corifeu do coro da tragédia grega, aqui transferido do trágico (onde é supérfluo dizer “a gente”, é a gente que está comentando a ação, ali presentificada aos olhos de todos) para o épico. A distância desse narrador rosiano pode aumentar ou diminuir com relação ao narrado. E a combinação desse narrador coletivo com a estrutura básica do enredo nesse livro (suspense que se resolve ou em clímax ou em anticlímax) traz as conseqüências mais extraordinárias – no modo como essa combinação é portadora do que é menos dito, e mais cheio de implicações. Examinaremos a seguir alguns exemplos dos casos mais notáveis desse narrador coletivo – “a gente” –, em que se trata de confrontar a opinião alimentada pelos preconceitos da comunidade – a doxa –, para fazer prevalecer valores mais altos. Em “Soroco, sua mãe, sua filha”, a turba reunida na estação vê a cerimônia do adeus inicialmente como um espetáculo, o que é corroborado pelo primado do visual na construção literária, que enfatiza a técnica da descrição. A situação tem até um quê de festivo. À medida que o drama se adensa, a narração interioriza-se, o pessoal vai percebendo que a situação é grave, e o “alívio” de Soroco em ficar livre das duas mulheres – “o que a gente se dizia” – era insuficiente para dar conta das emoções envolvidas. É a partir de então que o auditivo vai expulsando o visual. Notavelmente expresso num símbolo sonoro, a cantiga sem sentido que as duas mulheres entoavam, a transformação ampliase quando Soroco passa a entoá-la também. E, no momento máximo de identificação, toda “a gente” engrossa o coro. Conclusão: “a gente” expressa a opinião comum, sem profundidade, banal, o clichê das aparências e da etiqueta social. Mas ela ganha intuição e se torna compaixão verdadeira.

170

24/11/06 – 18h


Em “A benfazeja”, temos a pungente estória de uma pobre-coitada, guia de cego, mendiga e louca, figura habitual vagando pelas ruas do lugarejo, a respeito da qual correm boatos terríveis: teria matado o marido, viveria maritalmente com o filho, e assim por diante. Por isso, todos a temiam. Nessa estória há um narrador individual, que interpela “a gente” por sua falta de caridade. O prosseguimento do caso vai desmentindo os boatos, através do aumento da compreensão, revelando um acervo de carência e desgraça. Em “O cavalo que bebia cerveja”, um estrangeiro é temido no arraial, e em torno dele se tece um véu de lendas desabonadoras: os habitantes pensavam mal dele e o temiam. Mas ao cabo descobre-se que era uma boa pessoa, um refugiado de guerra, sobrevivente do fascismo, que além do mais deixa sua chácara em testamento ao narrador. As tramóias de “Fatalidade” mostram que esta não existe e que é obra dos homens revertê-la. A opinião comum, a ser desfeita, consiste em acreditar na fatalidade, assim curvando-se a ela, que não passa de um artifício humano. Tutaméia (Terceiras estórias) O enredo esgarça-se consideravelmente nesse livro41, como anteriormente talvez só em “Cara-de-bronze”, de Corpo de baile. A instilação da atmosfera e a construção enigmática tendem a ser mais fortes que a trama, que se baseia em iluminações e adivinhações. Por isso, por serem pouco mais que parábolas, é bom assinalar que é nesse livro que a multiplicação dos enredos aparece com maior pujança, justamente onde eles quase desaparecem. À medida que a extensão diminui, o número se multiplica, resultando em 44 textos: entre 40 estórias distribuem-se quatro prefácios. A maioria das estórias conta entre três ou quatro páginas, uma ou outra mal chegando a cinco. Os prefácios variam entre as dez páginas do primeiro, “Aletria e hermenêutica”, e as 21 páginas do último, “Sobre a escova e a dúvida”. Os quatro prefácios – entre esses dois ficam ainda “Hipotrélico” e “Nós, os temulentos” – dedicam-se a especulações sobre a linguagem e sobre o ato de narrar. Já as estórias tratam de assuntos variados, como se verá a seguir. Algumas são estórias de amor, mas nada banais. “A vela ao diabo”: um rapaz hesita entre duas moças, a noiva distante e a amiga presente. “Desenre-

171

24/11/06 – 18h


do”: uma mulher com a constância da infidelidade trai vários homens, mas a fidelidade de um deles acaba por prendê-la. “Estória n° 3”: um valentão atrapalha o humilde idílio entre uma viúva e um homem medroso. “Estoriinha”: dois irmãos amam a mesma mulher, esposa de um e amante de outro, que a rejeita por lealdade fraternal. “Se eu seria personagem”: o amor por uma mesma mulher se interpõe, passando por várias mutações, entre dois amigos. “Orientação”: o matrimônio entre um chinês e uma sertaneja, fadado ao fracasso, é esmiuçado num questionamento da diferença. “Reminisção”: o sapateiro ama sua mulher, a qual, feia e má, além de estéril, foge com outro. Abandonada, volta ao marido, que ainda a ama. “Retrato de cavalo”: dois apaixonados, um por uma moça e o outro por seu próprio cavalo, desentendem-se a propósito de uma fotografia em que ela e o animal figuram, provocando os ciúmes do dono do cavalo. Mas a moça abandona o apaixonado e o cavalo morre. Outras se referem a ciganos. Em “Faraó e a água do rio”, membros desse povo acampam numa fazenda para consertar tachos, mas são acossados pela gente da terra, que os teme. Em “O outro ou o outro”, eles são envolvidos em roubos e devolução dos objetos subtraídos. Em “Zingaresca”, estão acampados justamente onde arrancha a boiada da estória imediatamente anterior, acrescidos de um cego carregando uma cruz, seu guia anão e um padre. Há também as que envolvem bois e boiadeiros. “Hiato”: os vaqueiros assustam-se ante a súbita aparição de um enorme touro. “Intruje-se”: 11 vaqueiros tangem uma boiada; num amanhecer, um dos homens é encontrado morto, esfaqueado, no meio do sertão; cabe ao líder do grupo descobrir o assassino. “Os três homens e o boi dos três homens que inventaram um boi”: três vaqueiros, no ermo do sertão, a partir de enunciados fragmentários acabam por construir uma estória. “Sota e barla”: vaqueiros rivais conduzem duas boiadas e têm que enfrentar um trecho sem água, que lhes causa dificuldades e exaspera os ânimos (atenção: é só um; o outro não aparece). “Vida ensinada”: os problemas de um vaqueiro, habituado a conduzir boiadas de um lado para outro; como se casara com a viúva de um companheiro que ele mesmo matara inadvertidamente; seus pequenos desejos e desgostos, suas mínimas ambições. Podem tratar de caçadas. “Como ataca a sucuri”: um caçador corre risco ao ser ameaçado por seu mal-encarado hospedeiro. “No prosseguir”: um veterano caçador de onças conversa com outro mais moço sobre seu ofício, mas

172

24/11/06 – 18h


também sobre vários assuntos. “Tapiiraiauara”: numa caçada de anta, o narrador faz o possível para impedir que o animal, com filhote, seja abatido. Ou tratar do valor da fantasia, ou da imaginação, apta a engendrar a realidade. “Barra da vaca”: um suposto valentão, embora pacato, faz um povoado inteiro tramar sua expulsão pacífica. “Curtamão”: o mestre-de-obras edifica uma casa tão original como nunca se vira por aquelas bandas, por encomenda de um noivo. “João Porém, o criador de perus”: enganam o protagonista dizendo que uma moça imaginária gostava dele, fazendo-o apaixonar-se de volta e insistir em encontrá-la; ressabiados, declaram que ela morreu e arranjam-lhe outra de carne e osso, mas ele não se interessa. “Grande Gedeão”: um pobre sitiante, ao ouvir o sermão de um padre missionário, resolve que não mais trabalhará; expulso pela esposa e filhos, logo encontra quem o contrate e pague bem, achando que se parou de trabalhar é porque devia ter fortuna escondida. “Lá, nas campinas”: um homem busca sem cessar campinas de que ouviu falar enquanto sua vida passa. “Mechéu”: o protagonista, pobre de fato e de espírito, trabalha numa fazenda, onde é apreciado por suas excentricidades – até que descobre a morte. “Melim-Meloso”: o narrador fala de um ente lendário, que responde por esse nome e é caracterizado por sua mansa esperteza e tino para passar a perna nos outros. “Rebimba, o bom”: um ser imaginário, assim chamado, dá forças ao protagonista quando as coisas ficam difíceis; após descobrir que não existe, topa com seu enterro numa viagem. “Ripuária”: o que o protagonista – ribeirinho – mais desejava era conhecer o outro lado do rio, e até fantasiava encontrar lá a moça com que haveria de se casar. “Tresaventura”: uma menininha deseja intensamente ver de perto o arrozal que se avista da casa da fazenda, o que acaba realizando em meio a mil peripécias. “– Uai, eu?”: o fiel empregado de um médico, a quem muito admirava e com quem procurava aprender, obedece tão ao pé da letra a seu modelo que acaba na cadeia. Ou de casos de crimes, verdadeira ou falsamente atribuídos. “Antiperipléia”: fala um guia de cego, acusado de assassinar seu patrão. “Droenha”: o assassino esconde-se no alto da serra, confessa o crime aos ventos, e acaba sabendo que a vítima não morrera. “Esses Lopes”: uma mulher conta como desde garota passou de mão em mão de um Lopes para outro, e como se defendeu, eliminando-os sucessivamente. “Quadrinho de estória”: a meditação de um pri-

173

24/11/06 – 18h


sioneiro que, ao que parece, matou uma mulher e não compreende muito bem quais são as conseqüências. Ou de metamorfose e redenção. “Arroio-das-antas”: uma mocinha viúva vai morar num povoado só de velhinhas. “Azo de almirante”: um canoeiro que vive de comerciar com os ribeirinhos socorre vítimas da enchente, enquanto esta vitima sua família. “Palhaço da boca verde”: antigos membros de um circo, num vilarejo, investigam o passado e se encontram no presente. “Presepe”: um velho arma um curioso presépio ao vivo, no curral, com um burro e um boi, e mais um inesperado Menino Jesus, cometendo uma travessura, também chamada de presepada. “Sinhá Secada”: por ordem do marido, tomam o filho pequeno de uma mulher que procedera mal; ela foge e vai viver em outro lugar, numa vida de penitência e de serviço ao próximo, transformando-se. “Umas formas”: a igreja local, mal-assombrada, era freqüentada por fantasmas e aparições; o padre, o sacristão e um paroquiano maçom concorrem para a elucidação do mistério. A algumas faceirices não se furta o mais minimalista dos livros de Guimarães Rosa. Traz dois índices, um inicial para leitura e um final para releitura. Ambos são ordenados por ordem alfabética, e em ambos o “G” e um dos contos cujo título começa com “R” estão fora da ordem, logo em seguida ao “J”, formando as iniciais do autor. Ademais, o primeiro comanda que os prefácios sejam lidos misturados aos contos, na ordem em que aparecerem. Já o segundo comanda que os prefácios sejam lidos antes e os contos depois. Estas estórias, Ave, palavra e Magma Três livros de Guimarães Rosa saíram desde sua morte em 1967: Estas estórias (1969), Ave, palavra (1970) e Magma (1997). Embora os dois primeiros tenham sido preparados para publicação pelo próprio autor, são entretanto conseqüência do êxito editorial que o guindou à posição de mais importante escritor brasileiro enquanto viveu. Por isso, ficam aquém da obsessão com qualidade e rigor que os demais ostentam. O primeiro reúne contos, inclusive sobras de Sagarana.42 Mas é nesse livro, resgatando-o, que figura uma das obras-primas do escritor, “Meu tio o Iauaretê”, em que o narrador é um caçador de onças, mestiço de índio, que acaba regredindo ao nível delas e odiando os homens. É extraordinariamente escrito numa mis-

174

24/11/06 – 18h


tura de português, tupi e onomatopéias animais. O segundo é uma miscelânea de recortes de jornal, incluindo crônicas, poemas, fragmentos, anotações, trechos de diário etc. E o terceiro, de poesia, Magma (1997)43, seria publicado 30 anos após sua morte. Com ele, o autor ganhara o prêmio da Academia Brasileira de Letras em 1937, mas nunca quisera publicá-lo, e de fato encontraria sua verdadeira vocação na prosa, como qualquer leitor pode constatar. À guisa de arremate Se alinharmos os cinco séculos de literatura brasileira ao correspondente período na literatura portuguesa, logo salta aos olhos um contraste temático nada desprezível. De um lado, os portugueses preocupam-se obsessivamente com o mar, desde Os lusíadas, de Camões, até a obra de Fernando Pessoa, sem esquecer a Peregrinação, de Fernão Mendes Pinto, entre outros clássicos das aventuras das navegações. Por seu lado, nossas letras, focalizando seu interesse no interior, desenrolam-se como se não emanassem de um país com 8.000 quilômetros de litoral. Tudo se passa como se os portugueses voltassem as costas de sua imaginação literária ao continente enquanto se lançam aos mares, e os brasileiros voltassem as costas aos mares, enquanto direcionam suas indagações para o interior. Nem parece, afinal, que se trata de duas literaturas de uma só língua e de ambas as margens de um mesmo oceano, o Atlântico. Dessa maneira, desde o início o fascínio do sertão se faz presente em nossas letras, e a atração pelas entranhas do território seria responsável pela perpetuação de uma linhagem literária a que se deu o nome de regionalismo.44 Fincando raízes nas descrições da nova terra, desde o início dos escritos sobre o Brasil detecta-se uma irresistível inclinação, muito compreensível, a intentar descrevê-lo pondo ênfase em suas características de exuberância e opulência, para efeito de propaganda. Daí uma predominância do pitoresco, que se revela não só nas hipérboles da natureza, como também nas enumerações de animais e frutas estranhos, com nomes similarmente estranhos, nos textos de cronistas e viajantes, bem como nas manifestações nativistas. Tais traços iriam se tornar mais acentuados com o advento do romantismo, o qual, coincidindo com a independência política, impregna-se de nacio-

175

24/11/06 – 18h


nalismo. Proposta pelo romantismo europeu, a valorização do folclore pesquisado nos contos e cantos do povo vinha a calhar para os escritores nacionais, que procederam à apropriação da cultura popular no país. A principal personagem do novo movimento seria o índio, escolhido como emblema da nacionalidade para marcar a diferença com relação ao colonizador português. É o que se pode verificar tanto nos romances de José de Alencar, como O guarani (1857), Iracema (1865) e Ubirajara (1874), quanto na poesia de Gonçalves Dias, sobretudo em “I-Juca-Pirama” (de Últimos cantos, 1851) e Os timbiras (c. 1857), deixado inconcluso. As dimensões continentais de nosso país instigariam manifestações localistas, em protesto contra a hegemonia das letras da corte, posição que o Rio de Janeiro ocupou durante dois séculos como sede da capital do país. Tais reações, havidas tanto ao Norte quanto ao Sul, decidiriam que o Brasil autêntico fica no interior e não no litoral deslumbrado pela Europa. E reivindicariam uma expressão própria e autônoma de sua peculiaridade. Na esteira do romantismo, nasceu aquilo que se conhece como o primeiro regionalismo. É também denominado de sertanismo, porque trouxe o sertão para uma longa vida dentro da ficção. É assim que entram para a literatura as paisagens de diferentes partes do país e os homens que nelas vivem. Entre as vozes a se fazerem ouvir no primeiro regionalismo, estão alguns pioneiros de certa importância. Bernardo Guimarães põe em cena o Brasil Central, em O ermitão de Muquém (1864), O garimpeiro (1872) e A escrava Isaura (1875), o mais famoso de seus romances. Alfredo d’Escragnolle Taunay, a região Centro-Leste, em Inocência (1872). O cearense Franklin Távora – teorizador e militante do regionalismo –, o Nordeste, em O cabeleira (1876), O matuto (1878) e Lourenço (1881). José de Alencar, uma espécie de pai fundador de nossa prosa de ficção, visava a dar um quadro o mais completo possível do país, no tempo e no espaço. E veio a escrever vários romances propriamente regionalistas, a exemplo de O gaúcho (1870), Til (1872) e O sertanejo (1875). Os tipos humanos das diferentes regiões e províncias, a cor local, a notação pitoresca, envoltos em enredos sentimentais, concentravam a prosa desses autores. Sob o influxo do naturalismo surgiria depois um segundo regionalismo, em reação ao romantismo, rejeitando vários de seus achados e propondo outras

176

24/11/06 – 18h


sondagens. Alguns autores destacam-se. Inglês de Sousa, autor de O missionário (1888) e Contos amazônicos (1893), sediando seus livros no extremo Norte. Manuel de Oliveira Paiva, autor de Dona Guidinha do Poço – publicado incompleto na Revista Brasileira em 1897 e como livro só em 1952 –, ambientandose no sertão cearense. Rodolfo Teófilo, com A fome (1890), Os brilhantes (1895), O paroara (1899), romances que tratam do Nordeste. Afonso Arinos escolheria o interior mais agreste, nos contos de Pelo sertão (1898) e no romance Os jagunços, do mesmo ano, sobre a Guerra de Canudos. Domingos Olímpio selecionaria para cenário o interior do Ceará, onde se passa Luzia-Homem (1903). Os traços comuns de descrição desapaixonada dos fatos, preocupação com os determinismos e com a ciência, pessimismo e fatalismo – tudo isto decorre da reação contra o romantismo precedente. Essa generalização pode ser entretanto injusta para com alguns livros que, ao alcançar um nível mais alto de elaboração literária, fogem ao bitolamento naturalista, como Dona Guidinha do Poço e Pelo sertão. Mais tarde, porém ainda aparentados a esse segundo regionalismo de recorte naturalista, surgiriam alguns pré-modernistas, sobretudo paulistas, focalizando a cultura caipira. Dois dentre eles adquiririam maior porte. Um é Monteiro Lobato, sobretudo com os contos de Urupês (1918), Cidades mortas (1919) e Negrinha (1920). O outro é Waldomiro Silveira, autor de Os caboclos (1920), cujos escritos já apareciam em periódicos desde a virada de século. E seria publicado postumamente seu livro mais conhecido, contendo as estórias matutas de Leréias, em 1945. Destaca-se pelo cuidado com que mimetizou tanto o “dialeto caipira” quanto o espírito dos causos portentosos. E efetuou um achado, ao pôr em cena um narrador falando na primeira pessoa, assim canalizando a identificação com o leitor e conferindo naturalidade às cadências do discurso “dialetal” ou “rústico” do perímetro do “R” retroflexo. A obra de Monteiro Lobato, evidentemente, transborda dessa única dimensão, pois é de alcance multifacetado, indo da literatura infantil ao ensaio e ao romance. Entrementes, também no extremo Sul o regionalismo iria se manifestar, na obra de um gaúcho apegado às estórias e às figuras de seus pagos. Simões Lopes Neto escreveu Contos gauchescos (1912), Lendas do Sul (1913) e o póstumo Casos do Romualdo (1952). A relevância de sua reduzida obra, embora com resultado diverso, é algo que partilha com Waldomiro Silveira, e reside priori-

177

24/11/06 – 18h


tariamente na criação de uma fala própria em primeira pessoa e em sua atenção à mimese da oralidade gaúcha. Foi assim que o caipira, o bandido, o jagunço, o caboclo, o cangaceiro, o vaqueiro, o beato, o tropeiro, o capanga, o garimpeiro e o retirante entraram para a literatura. Dessa tarefa encarregaram-se com empenho e escrúpulo pelo menos duas ou três gerações de escritores, os do primeiro e os do segundo regionalismo, executando tanto o mapeamento da paisagem e das condições sociais, quanto o inventário dos tipos humanos que se espalhavam pela ignota vastidão do país. O impacto da publicação de Os sertões, de Euclides da Cunha, em 1902, pesaria sobre o regionalismo. Esse livro, certamente filiado aos padrões estéticos do naturalismo, embora matizado de parnasianismo e até de romantismo, exerceu uma influência incalculável, que excedeu de muito a seu tempo. Embora, após ter sido bem aceito no pré-modernismo, atravessasse um interregno de ostracismo decretado pelos modernistas, cujo programa era avesso a sua retórica altissonante, vai deixar marca visível na produção da década de 1930. E isso, tanto no romance, quanto no pensamento social que produz as grandes interpretações do Brasil publicadas no período. Entre muitas outras – que já vinham de antes com perspectivas tão divergentes, indo desde Manuel Bonfim até Oliveira Viana –, surgiam agora com índole renovadora: Casa grande & senzala (1933), de Gilberto Freyre, Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda, e Formação do Brasil contemporâneo (1942), de Caio Prado Jr. Os sertões sistematizou a concepção de um abismo a separar o país litorâneo e civilizado de um interior atrasado e primitivo, denunciando que a relação entre ambos só se dava quando o primeiro chacinava o segundo. E interrogavase sobre as razões de tal disparidade. Mas sua influência não ficou só aí. Ainda iria imprimir seu ferrete nas nascentes ciências sociais brasileiras na década de 1940, ao repertoriar os temas que iriam entretê-las pelos decênios a vir, pois já se ocupara do negro, do mestiço, do índio, dos movimentos sociais, da desigualdade, da disputa pela terra, das insurreições dos pobres, da cultura popular, do messianismo e do milenarismo, do subdesenvolvimento e da dependência. Quem estivesse postado nos anos 1920, por certo pensaria que o modernismo tinha enterrado em definitivo qualquer espécie de regionalismo. No entanto, o filão mostrava-se tão rico que ainda não se esgotara e voltaria com forças renovadas. O modernismo, naturalmente, no seu afã de desprovincianizar-se

178

24/11/06 – 18h


e alçar-se ao patamar das vanguardas européias, apesar de todo o seu nacionalismo renegara o regionalismo e o decretara de má qualidade estética, bem como inteiramente equivocado quanto aos propósitos de dar a conhecer o Brasil. O melhor exemplo é Macunaíma (1928), de Mário de Andrade, teórico e principal artista da escola, que traça o panorama do Brasil em sua totalidade, mas deliberadamente confunde as diferentes regiões e aquilo que as caracteriza, praticando aquilo que chamava de “desgeograficação”. Assim procedendo, contestava o localismo e o particularismo, bandeiras dos autores regionalistas. • A década de 1930 passaria à história como um período de intensa polarização política. No lapso entre guerras, intelectuais e artistas viram-se solicitados por crises sociais sem precedentes. Ainda estavam lidando com o rescaldo daquela que foi a primeira guerra não circunscrita, mas envolvendo o mundo todo numa globalização armada até então inédita, com sua farândola de horrores e atrocidades, que fez esboroar-se a visão que a Europa tinha de si mesma como sede da civilização. Depois, viram-se às voltas com uma escalada de conflitos que prenunciava a próxima, e muito mais cruel, guerra mundial, que seria a segunda. No mundo todo, bem como no Brasil, trataram eles de arregimentar-se ou à direita ou à esquerda. E, de preferência, à esquerda. Assistia-se à ascensão dos totalitarismos por toda parte. Fascismo na Itália, Espanha e Portugal; nazismo na Alemanha. Primeiros sinais do peronismo, que dominaria a Argentina entre os anos 1940 e 1950. Ditadura e Estado Novo de Getúlio Vargas no Brasil, para não falar no integralismo de Plínio Salgado. Tudo isso só podia mesmo conclamar os intelectuais a uma maior participação na luta contra os regimes de exceção. Tal arregimentação deixou marcas nas artes e na literatura, um pouco por toda parte. Uma das mais invulgares realizações dela, e à esquerda, foi o romance social norte-americano, cuja silhueta avulta como uma sombra sobre o terceiro regionalismo, o de nosso romance de 1930. Surge com vigor no entre guerras uma novidade literária em ficção, constituindo uma espécie de neonaturalismo em seu empenho de denunciar a injustiça, a iniqüidade, a opressão sob todas as suas formas – de classe, de raça etc.

179

24/11/06 – 18h


Em sua preocupação social, o mestre é Émile Zola. Com berço nos Estados Unidos, teve como pano de fundo a Grande Depressão, cujo auge foi o craque da Bolsa de Valores de Nova York em 1929. A crise só viria a ser estancada pelo programa de reformas econômicas e sociais (New Deal) encetado pelo presidente Franklin Roosevelt em seus dois mandatos consecutivos, sob a inspiração do economista inglês John Maynard Keynes, ao fim dos quais a prosperidade trazida pelos investimentos industriais, principalmente de armamentos e outros equipamentos bélicos, já preparava a nova guerra. Os principais nomes da tendência, na qual predominam profissionais da imprensa de convicções socialistas, são, começando pelos mais velhos, que já estavam em atividade anteriormente: Theodore Dreiser, Upton Sinclair, Sherwood Anderson, Erskine Caldwell, John Steinbeck, Sinclair Lewis e John Dos Passos. E podemos incluir pelo menos o jovem Hemingway dos inícios, também ele jornalista, também de esquerda, também crítico da sociedade americana. John Dos Passos, o mais experimentalista, teve maior presença na Europa, onde foi objeto de relevantes estudos teóricos, inclusive de Jean-Paul Sartre. Seus recursos expressivos foram largamente absorvidos, um pouco por toda parte, e mesmo tardiamente, como por exemplo pelo neo-realismo italiano – mais em Moravia, Vitaliano Brancati, Elio Vittorini, Vasco Pratolini, Carlo Levi, Cesare Pavese etc., menos em Giorgio Bassani, e contornando Gadda –, e ficaram trivializados. Dos Passos costuma ser considerado membro da mesma “geração perdida” a que pertenceram Hemingway e Scott Fitzgerald. Hoje em dia, mal dá para imaginar a influência que esses norte-americanos exerceram, tanto na Europa como entre nós, e por toda a América Hispânica – onde frutifica uma notável prosa romanesca de denúncia social, dominante por várias décadas, só abrindo brecha para uma novidade com o boom do realismo mágico já nos anos 1960. E, principalmente, a escala em que eram lidos, pois se tornaram best-sellers em seu próprio país e pelo mundo afora. No Brasil, foram divulgados por várias casas, destacando-se entre elas a Globo, de Porto Alegre, que os editou a todos, fossem de língua inglesa ou espanhola. Na América Hispânica, esse romance também era de esquerda, anticolonialista e antiimperialista, dedicado à defesa dos oprimidos. Sobressaem algumas novidades da maior importância: o indigenismo, o ciclo da revolução mexicana, a ficção sobre os ditadores e o debate sobre civilização versus barbárie.

180

24/11/06 – 18h


Os principais focos do indigenismo foram o andino, o mexicano e o mesoamericano. As altas concentrações de populações autóctones nesses locais, o nível de sua exploração pelo colonizador branco e a degradação decorrente inspiraram seu aproveitamento como matéria literária. No México, destacou-se Juan Rulfo; nos países andinos, Ciro Alegría, Jorge Icaza, Manuel Scorza e José María Arguedas; na Mesoamérica, surgiu a reelaboração da riquíssima mitologia maia por Miguel Ángel Astúrias, da Guatemala. A revolução mexicana tornaria-se matéria épica na pena de, entre outros, Mariano Azuela, continuado mais tarde por Carlos Fuentes. O ciclo dos ditadores começara bem antes com o espanhol Valle-Inclán e persistiria com Miguel Ángel Astúrias e Augusto Roa Bastos. O debate sobre civilização versus barbárie fascinou longamente os escritores latino-americanos, entre eles o venezuelano Rómulo Gallegos e o cubano Alejo Carpentier. Em suma, os autores do romance social no Novo Mundo, dos anos 1930 em diante, escrevendo em inglês ou em espanhol, são de esquerda e praticantes de uma literatura empenhada. Tiveram enorme divulgação e repercussão ao tempo, em seus países e além fronteiras, inclusive na exigente Europa. Produziam uma literatura mais fácil de ler do que a das vanguardas (aquela de Joyce, por exemplo), nisso já pressagiando a cultura de massas, ou a indústria cultural. Esta optaria sempre em favor do mais fácil e do simplificado, relegando a alta literatura, cuja forma é esteticamente informativa, a um pequeno círculo de leitores sofisticadíssimos cada vez mais exíguo. Sintonizavam-se com pelo menos parte do público à época, na tomada de consciência quanto à miséria e à injustiça. Reivindicavam reformas que minorassem os sofrimentos dos pobres e oprimidos, acusando os ricos e poderosos das condições iníquas da sociedade. Enfim, pode-se dizer, sopesando-se esses vários traços, que se mostravam mais despreocupados com a forma e mais atentos aos conteúdos. A reter que, para nós, foi a primeira vez na história que a cultura norteamericana suplantou a européia em nosso país. E nunca mais a Europa retomaria sua ascendência perdida. Quanto aos nossos, é quase dispensável apresentá-los, tal a hegemonia exercida durante longo tempo pelo terceiro regionalismo, o do romance de 1930, desde que se tornou dominante na prosa brasileira. Encontrou seu editor de eleição em José Olympio, e entre seus ilustradores e capistas, sobretudo

181

24/11/06 – 18h


Santa Rosa, afora vários outros como Luís Jardim e até Portinari, todos afinados pela opção por uma arte empenhada. O afã ao mesmo tempo cosmopolita e nacionalista do modernismo, que afinal se encenara todo no eixo São Paulo-Rio, no centro-sul do país, somado a sua altíssima qualidade estética, fora incapaz de refrear um novo surto regionalista. Ao contrário do modernismo, que privilegiara a poesia, a voga em ascensão investe tudo no romance, gênero certamente mais legível, mais impermeável a vanguardismos e menos requintado. Com instrumentos mais aguçados que os regionalismos anteriores, tinha todo o ar, devido a sua simultaneidade, impressionante volume e ineditismo, de ser propriamente uma escola, e vinda dos estados do Nordeste.45 Historiadores e críticos são concordes em considerar como marco inaugural A bagaceira (1928), de José Américo de Almeida, da Paraíba. Ali já se notam certas coordenadas que se farão recorrentes, desde o entrecho que expõe um drama humano local até a presença de coronéis, de cangaceiros, de retirantes, da seca, da paisagem de caatinga e da ênfase nas relações sociais. Em rápida seqüência, estrearão e dominarão a cena literária por vários decênios, com apogeu nos anos 1930 e 1940, Rachel de Queiroz, do Ceará, Amando Fontes, de Sergipe – embora nascido em Santos (SP) –, José Lins do Rego, da Paraíba, Graciliano Ramos, de Alagoas, Herberto Sales e Jorge Amado, da Bahia – e estes, para só falar dos principais. Outro importante regionalista, Erico Verissimo, surge no Rio Grande do Sul. O fato é que essa safra de ficção ao rés do chão e aspirando ao documentário impôs um cânone que tem seus epígonos até hoje e que dominou a literatura brasileira, impedindo por longo tempo que houvesse percepção estética de autores que não atuassem dentro dessas normas. E porque coincidiu com a formação de um mercado editorial e de um público leitor, também lança luz sobre a persistência das ramificações do naturalismo como principal programa estético-literário entre nós. • Entretanto, nem tudo era regionalismo no panorama literário brasileiro. Uma outra linha46, certamente recessiva e abafada pelo estrondoso sucesso, in-

182

24/11/06 – 18h


clusive de vendas, dos regionalistas, tenazmente prosseguia e produzia, mesmo que com menos estardalhaço. E viria, a seu tempo, a gestar pelo menos um escritor extraordinário na pessoa de Clarice Lispector, embora essa gestação implicasse num salto mortal e numa espécie de superação da negligência tanto com o burilamento formal quanto com a complexidade do foco narrativo. Nessa linha, nada de documental nem de engajamento, tampouco. Esses autores, evidentemente cada um à sua maneira, pelo menos naquilo que escrevem voltam as costas ao social e à militância, para embrenhar-se nas entranhas da subjetividade. Muito interessante é que suas afinidades eletivas provenham de outras paragens que não aquelas para as quais se voltava o romance regionalista: da França, sobretudo. A grande sombra fecundante que paira sobre a ficção introspectiva é o romance católico francês de entre guerras, prolongando-se pelos anos 1940 e 1950. Os discípulos brasileiros, além de reivindicarem com ênfase uma espiritualidade que supunham perdida ou pelo menos extraviada no panorama artístico nacional, apregoavam o “Mistério”, assim com letra maiúscula. Suspensos entre o pecado e a graça, escrevendo à borda do inefável, sustentando que os problemas materiais – miséria, injustiça, opressão – nada significam quando comparados à redenção ou perdição da alma, esses escritores e seus escritos operam por dentro de uma introspecção levada ao extremo limite. Tudo se passa como se quisessem perquirir uma imensa problemática espiritual, encenandose no íntimo de cada um, enquanto recuperavam a dimensão da subjetividade – mas uma subjetividade muito singular, vivendo o drama cristão, os embates entre o Bem e o Mal, a obsessão com a transcendência. Seja como for, certamente encarnam com vigor uma reação contra a particularização do regionalismo: esse romance é universalizante. Por isso, manifestam horror à cor local, ao pitoresco, à exuberância dos trópicos, ao típico, à imanência de um mundo sem Deus. Nisso, dessolidarizam-se dos regionalistas de 1930 no que estes têm de ateus ou agnósticos, abstendo-se estes de tocar em assunto religioso, a não ser para zombar abertamente do tartufismo do clero e da beatice dos fiéis, denunciando a cumplicidade da hierarquia da Igreja com os opressores. Entre os principais autores de prosa de ficção que sobressaem nesse núcleo, figuram Lúcio Cardoso, Octávio de Faria e Adonias Filho. Em doses di-

183

24/11/06 – 18h


versas, e variando conforme a personalidade artística de cada um, percebem-se todavia elementos comuns na obra de todos eles. Uma certa vivência exasperada da derrocada, verrumação da subjetividade, preocupação com a fatalidade, religiosidade assumida ou negada que eclode em obsessão com o pecado, busca da transcendência e até do sobrenatural na ficção. A reação espiritualista no romance, a exemplo do regionalismo, tampouco se desprende de todo do naturalismo, no fatalismo com que abre espaço às forças atávicas e hereditárias. Contribuem para esse efeito a escavação introspectiva e o aprofundamento de certas técnicas literárias típicas do século XX, como o monólogo interior, o fluxo da consciência, e tudo o que desagregasse o discurso, que assim pretendia ser fiel e colado ao que se postulava como o verdadeiro funcionamento da psique. • Em Guimarães Rosa, a matéria do sertão é fecundada pelos achados formais, sobretudo lingüísticos, das vanguardas do século XX. Ao retomar o veio cosmopolita e experimental, nosso autor ultrapassa o particularismo e o neonaturalismo do romance de 1930. E, reatando com a alta tradição da prosa modernista – aquela de Macunaíma, Serafim Ponte Grande e Memórias sentimentais de João Miramar –, permite-nos vislumbrar seu ar de parentesco, difícil de precisar, com Clarice Lispector, William Faulkner e Jorge Luis Borges. Situando-se a cavaleiro das duas mais importantes tendências da época, vai partir delas para construir seu discurso tão peculiar. Do lado do regionalismo, lá estão a matéria do sertão, as personagens plebéias, a oralidade etc. Do lado da reação espiritualista, acham-se a preocupação com a subjetividade e com a transcendência, a perquirição da religiosidade, o sopro metafísico, a sondagem do sobrenatural. Por isso se pode dizer que sua obra a um só tempo incorpora e supera conquistas precedentes.

184

24/11/06 – 18h


Walnice Nogueira Galvão é professora titular de teoria literária e literatura comparada na USP. Coordenou a edição crítica de Grande sertão: veredas para a Coleção Archivos (Unesco), a sair. Tem 26 livros publicados, entre os quais os seguintes, relacionados a Guimarães Rosa: As formas do falso – Um estudo sobre a ambigüidade no Grande sertão: veredas (São Paulo: Perspectiva, 1972), Saco de gatos (São Paulo: Duas Cidades, 1976), Mitológica rosiana (São Paulo: Ática, 1978), Gatos de outro saco (São Paulo: Brasiliense, 1981), A donzela guerreira (São Paulo: Senac, 1998), Desconversa (Rio de Janeiro: UFRJ, 1998), Guimarães Rosa (São Paulo: Publifolha, 2000) e Mínima mímica (São Paulo: Duas Cidades, no prelo).

NOTAS 1 GUIMARÃES, Vicente de Paulo. Joãozito: infância de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972. 2 GUIMARÃES ROSA, Vilma. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983; NASCIMENTO, Edna Maria Fernandes dos Santos e COVIZZI, Lenira Marques. João Guimarães Rosa: homem plural, escritor singular. São Paulo: Atual, 1988. 3 GUIMARÃES ROSA, João. Correspondência com o tradutor italiano (Edoardo Bizzarri). São Paulo: Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro, 1972. 4 VERLANGIERI, Iná Valéria Rodriges. J. Guimarães Rosa – Correspondência inédita com a tradutora norte-americana Harriet de Onislna. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 1993. 5 Felizmente publicado seis anos depois que a dissertação de mestrado foi defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP): GUIMARÃES ROSA, João. Correspondência com seu tradutor alemão Curt Meyer-Clason (1958-1967). Edição e organização de Maria Apparecida Faria Marcondes Bussolotti. Belo Horizonte/Rio de Janeiro: UFMG/Nova Fronteira/ABL, 2003. 6 PROENÇA, Manoel Cavalcanti. Trilhas do grande sertão. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação do MEC, 1958. 7 MACHADO, Ana Maria. Recado do nome – Leitura de Guimarães Rosa à luz do nome de seus personagens. Rio de Janeiro: Imago, 1976. 8 CASTRO, Nei Leandro de. Universo e vocabulário do Grande sertão. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970. 9 PENJON, Jacqueline. Nature et culture dans le roman brésilien contemporain: léxique de la flore et de la faune. 3 volumes. Paris: Sorbonne, 1994. 10 Nilce Sant’Anna Martins, Maria Célia de Moraes Leonel e Edna Maria Fernandes dos Santos Nascimento responsabilizaram-se pelo “Glossário geral”, que completou aquele preparado por Jacqueline Penjon. 11 No preparo do texto trabalharam Lenira Marques Covizzi, Kátia Bueno Romanelli, Maria Lúcia Fernandes Guelfi e Maria Neuma Barreto Cavalcanti, sob a supervisão de Cecília de Lara; notas de Consuelo Albergaria. Colaboraram com ensaios para o volume Cecília de Lara, Davi Arrigucci Jr., Ettore Finazzi-Aggrò, Flávio Aguiar, Francis Utéza, K. David Jackson, Paul Teyssier e Willi Bolle. Apresentação de Antonio Candido. 12 MARTINS, Nilce Sant’Anna. O léxico de Guimarães Rosa. São Paulo: Edusp, 2001. 13 LEONEL, Maria Célia de Moraes. Guimarães Rosa alquimista: processos de criação do texto. Tese de doutorado em Letras. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1985. 14 COSTA, Ana Luiza Martins. “Rosa, ledor de Homero”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998; e João Guimarães Rosa: viator. Tese de doutorado em Letras. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), 2002. 15 LARA, Cecília de. “João Guimarães Rosa na França: anotações do ‘Diário de Paris’”. Travessia. Florianópolis, n. 16, 1988-1989. 16 CAVALCANTE, Maria Neuma Barreto. “Cadernetas de viagem: os caminhos da poesia”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996; e “Bicho mau”: a gênese de um conto. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991. 17 ROMANELLI, Kátia Bueno. A “Álgebra mágica” na construção dos textos de Tutaméia, de João Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995; e “Faraó e a água do rio”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996. 18 HAZIN, Elisabeth de Andrade Lima. No nada, o infinito: da gênese do Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991. 19 Afora os supracitados: VASCONCELOS, Sandra Guardini Teixeira. Baú de alfaias. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1984; e Puras misturas: o imaginário das histórias em uma estória de amor de João Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991; LEONEL, Maria Célia de Moraes. Guimarães Rosa alquimista: processos de criação do texto. Tese de doutorado em Letras. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1985; e Guimarães Rosa: magma e gênese da obra. São Paulo: Unesp, 2000; NASCIMENTO, Edna Maria Fernandes dos Santos. Estudo da metalinguagem natural na obra de Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Lingüística. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1987.

185

24/11/06 – 18h


20 Na Coleção Guita e José Mindlin encontram-se hoje praticamente todos os originais das obras de Guimarães Rosa. 21 LORENZ, Günter W. “João Guimarães Rosa”. In Dialog mit Lateinamerika: Panorama einer Literatur der Zukunft. Tübingen: Erdmann, 1970. Traduzido como: Diálogo com a América Latina. São Paulo: E.P.U., 1973. 22 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., 1972, p. 71. 23 A expressão é de Carlos Drummond de Andrade, no poema “Procura da poesia”, de A rosa do povo. 24 HAZIN, Elisabeth de Andrade Lima. Op. cit., p. 22. 25 GUIMARÃES ROSA, João. “Aí está Minas: a mineiridade”. Manchete. Rio de Janeiro, 24.08.1957. Texto posteriormente publicado em Ave, palavra, com o título “Minas Gerais”. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970. 26 WITKOWSKI, Ariane. “L’identité mineira en question”. In: OLIVIERI-GODET, Rita (org.). Figurations identitaires dans les littératures portugaise, brésilienne et africaines de langue portugaise. Paris: Université de Paris 8, 2002. 27 GUIMARÃES ROSA, João. “Discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, em sessão de 16 de novembro de 1967 – O verbo e o logos”. In: VÁRIOS AUTORES. Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968. 28 GUIMARÃES, Vicente de Paulo. Op. cit., p. 117. 29 GUIMARÃES ROSA, Vilma. Op. cit., p. 174. 30 “Ao pai: Rio, 6.11.1945”. In Ibidem, pp. 159-160. 31 “Ao pai: Rio, 30.11.1945”. In Ibidem, p. 160. 32 Ver PEREZ, Renard. “Perfil de João Guimarães Rosa”. In Op. cit. – indispensável pela anterioridade e por se basear em presumíveis informações do autor; e NASCIMENTO, Edna Maria Fernandes dos Santos e COVIZZI, Lenira Marques. Op. cit. 33 LINS, Álvaro. “Uma grande estréia”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 12.04.1946. Republicado em: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983; CANDIDO, Antonio. “Sagarana”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Op. cit.; MARQUES, Oswaldino. “Canto e plumagem das palavras”. In A seta e o alvo. Rio de Janeiro: MEC/INL, 1957. Republicado em Ensaios escolhidos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968. 34 NUNES, Benedito. “O amor na obra de Guimarães Rosa” e “A viagem do Grivo”. In O dorso do tigre. São Paulo: Perspectiva, 1969; MARTINS, Nilce Sant’anna. “Rosalina, a fada do Pinhém”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996; VASCONCELOS, Sandra Guardini Teixeira. Op. cit., 1991; GARBUGLIO, José Carlos. Rosa em dois tempos. São Paulo: Nankin Editorial, 2005. 35 NUNES, Benedito. “O amor na obra de Guimarães Rosa”. In Op. cit. 36 Ibidem. 37 “...Eu acordava cada manhã para assistir ao nascer do sol, e ver um enorme tucano, colorido, belíssimo, que vinha, pelo relógio, às 6h15, comer frutinhas, durante dez minutos, na copa alta de uma árvore pegada à casa, uma ‘tucaneira’, como por lá dizem. As chegadas e saídas desse tucano foram uma das cenas mais bonitas e inesquecíveis de minha vida.” “Carta ao pai, Rio, 5.7.1958”. ROSA, Vilma Guimarães. Op. cit., p. 187. 38 Uso o termo no sentido instaurado pelo manual do tema, o delicioso The english eccentrics, de Edith Sitwell (Londres: Faber & Faber, 1933). Essa rica dama da aristocracia (1887-1964) não só pesquisava como também praticava ativamente a excentricidade, do alto de sua avantajada estatura, feições angulares e nariz comprido. Enfarpelava-se em toaletes rebuscadas, coroadas por chapéus e toucados extravagantes. Apresentava-se ladeada por seus irmãos Osbert e Sacheverell, ambos escritores, que partilhavam suas convicções. Poetisa, amiga de Virginia Woolf e Gertrude Stein, pontificou na cena literária de seu país. Os caminhos que trilhou tangenciaram o grupo de Bloomsbury e por isso seus retratos, bem como sua verve polêmica, podem ser apreciados nas biografias e estudos panorâmicos escritos sobre o grupo. 39 SANTIAGO, Silviano. “Transtornado incerto”. In Ora (direis) puxar conversa! Belo Horizonte: UFMG, 2006. 40 JAMES, Henry. A arte do romance. Organização, tradução e notas de Marcelo Pen. São Paulo: Globo, 2003. 41 RÓNAI, Paulo. “Os prefácios de Tutaméia” e “As estórias de Tutaméia”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Tutaméia. 3. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969; NUNES, Benedito. “Tutaméia”. In. Op. cit.; ROMANELLI, Kátia Bueno. Op. cit., 1995 e Op. cit., 1996; PERRONE-MOISÉS, Leyla. “Nenhures 2: lá, nas campinas” e “Orientalismo e orientação em Guimarães Rosa”. In Inútil poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2000; BOLLE, Willi. Fórmula e fábula: teste de uma gramática narrativa, aplicada aos contos de Guimarães Rosa. São Paulo: Perspectiva, 1973; e NOVIS, Vera. Tutaméia: engenho e arte. São Paulo: Perspectiva/Edusp, 1989. 42 CAVALCANTE, Maria Neuma Barreto. Op. cit., 1991. 43 LEONEL, Maria Célia de Moraes. Op. cit., 2000. 44 CANDIDO, Antonio. “Pitoresco e nativismo”, “Os três Alencares”, “O contador de casos Bernardo Guimarães” e “A corte e a província”. In Formação da literatura brasileira. São Paulo: Martins, 1959; CASTELLO, José Aderaldo. A literatura brasileira. São Paulo: Edusp, 1999. 45 MICELI, Sérgio, Intelectuais à brasileira. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. 46 LIMA, Alceu Amoroso. “A reação espiritualista”. In: COUTINHO, Afrânio (org.). A literatura no Brasil. 3. ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro: José Olympio, 1985, v. IV.

186

24/11/06 – 18h


Via e viagens: a elaboração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas Ana Luiza Martins Costa

O que João Guimarães Rosa escreveu ao longo dos dez anos que separam Sagarana (1946) de Corpo de baile e Grande sertão: veredas, lançados juntos em 1956? Como se deu o processo de elaboração desses dois livros? Na ampla bibliografia sobre a vida e obra do escritor não há nenhum trabalho que se detenha, especificamente, nesse período. O que parece estranho, pois sabemos que Guimarães Rosa publicou cerca de 23 escritos em periódicos do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte, entre 1947-1954, e até mesmo um pequeno livro, Com o vaqueiro Mariano, em 1952.1 A maior parte desses escritos – pequenos contos, relatos de viagens, notas de um diário, descrições de animais etc. – somente foi republicada, e com algumas alterações, nos livros póstumos Estas estórias (1969) e Ave, palavra (1970). No entanto, tais publicações nunca foram analisadas em conjunto e à luz da época em que foram concebidas. O mesmo pode ser dito em relação ao grande número de documentos inéditos do escritor, produzidos entre 1948-52. Esse é um período-chave para o Arquivo Guimarães Rosa do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB/USP), onde se concentram alguns de seus documentos inéditos mais bem elaborados, como o diário de sua estadia em Paris (1948-51), as cadernetas de viagem pela França e Itália (1949-50) e pelo sertão de Minas Gerais (1952); o caderno de leitura de Homero, Dante e La Fontaine (1949-50)2, o caderno “Artes”, que reúne descrições de quadros contemplados em museus de Paris (1948-51)3, e os cadernos com notas de leitura de relatos de viajantes naturalistas que percorreram o interior do Brasil no século XIX, como Spix e Martius e Saint-Hilaire.4

187


O período de elaboração dos livros de 1956 concentra tais documentos inéditos e inúmeros exercícios narrativos concebidos a partir deles: textos inacabados, deixados de lado ou publicados em periódicos, entre 1947-54. É por meio desse conjunto que podemos acompanhar os desdobramentos do projeto de “recuperação da linguagem literária” de Guimarães Rosa, que começa a ser formulado durante o trabalho de escrita de Sagarana e se realiza mais plenamente nos livros de 1956.5 O projeto literário de Guimarães Rosa Em maio de 1947, cerca de um ano após o lançamento bem-sucedido de Sagarana, Rosa envia uma carta a seu tio Vicente, também escritor, onde procura explicitar os critérios que presidem seu trabalho de linguagem, criticando “o longo e infeliz período de relaxamento da língua”, de “desprestígio do estilo” e de “primitivismo fácil e de mau gosto”: A língua portuguesa, aqui no Brasil, está uma vergonha e uma miséria. Está descalça e despenteada; mesmo para andar ao lado da espanhola, “ela não tem roupa”. Empobrecimento de vocabulário, rigidez de fórmulas e formas, estratificação de lugares-comuns, como caroços num angu ralo, vulgaridade, falta de sentido de beleza, deficiência representativa. É preciso distendê-la, destorcê-la, obrigá-la a fazer ginástica, desenvolver-lhe músculos. Dar-lhe precisão, exatidão, agudeza, plasticidade, calado, motores. E é preciso refundi-la no tacho, mexendo muitas horas. Derretê-la, e trabalhá-la, em estado líquido e gasoso. (Releia, tendo isso em vista, a pequenina e incerta tentativa, que é a nossa “Histórias de fadas”).6 Na bibliografia sobre Guimarães Rosa, muitos trabalhos analisam suas diferenças com a prosa regionalista e com o trabalho de estilização modernizante.7 São bem conhecidas as freqüentes críticas de Rosa aos “excessos” de uma proposta modernista que coleciona lugares-comuns e problemas gramaticais da língua falada, prejudicando a “virilidade enérgica de certas dicções”.8 São essas críticas que parecem dar o tom de um “recado” enviado pelo escritor logo após o lançamento de Sagarana:

188


Sejamos modestos, porém. Os que gostam de “língua brasileira” deveriam querê-la pelo menos como filha sensata e prática, que, quando sai da casa materna, traz consigo o maior número de jóias da família que pode obter. E a língua portuguesa é mãe tão desprendida...9 É sintomático que o primeiro texto publicado por Rosa depois de Sagarana seja justamente um de seus contos, “São Marcos”, reimpresso na revista Vamos ler!, em abril de 1947. Considerado pela crítica como a sua “primeira teorização a respeito da linguagem”, é nesse conto que lemos uma passagem sobre o “canto e plumagem das palavras”, bastante difundida: “Sim, que à parte o sentido prisco, valia o ileso gume do vocábulo pouco visto e menos ainda ouvido, raramente usado, melhor fora se jamais usado”. Essa busca pelo “ileso gume do vocábulo” está na base de seu processo de “revitalização da linguagem literária”, como observa Eduardo Coutinho.10 O louvor às “palavras raras, estranhas, ressonantes, sem significado aparente”11 é o contraponto de seu “forte horror ao lugar-comum, de toda espécie, como sintoma de inércia mental, rotina desfiguradora, viciado automatismo”.12 Avesso a qualquer tipo de improviso e entusiasta do “estudo prévio” e do “planejamento”, para Rosa o trabalho de “construção” literária requer uma “elaboração cuidada e dolorosa”, com “aprofundamento” e “domínio dos temas”, “observação direta” e coleta de “termos precisos”. Só assim é possível dar à língua a “precisão, exatidão, agudeza e plasticidade” almejadas. Em busca do “embelezamento” e “enriquecimento” do idioma materno, o escritor se coloca contra a rigidez e o lugar-comum, e critica a vulgaridade da sintaxe e de formas narrativas desgastadas pelo uso. Ele ambiciona uma língua que seja capaz de misturar formas de expressão inauditas com o sentido original de cada palavra: Mas a recuperação da linguagem literária me preocupa, e muito. O bom seria reunir, depressa, tudo, todas as palavras – de Portugal, do Sertão, dos tupis, dos clássicos, galicismos, gírias, termos novos arrancados dos desvãos do latim, tecnicismos, cinemismos, neologismos premiados em concursos – e depois confiar a uma comissão de artistas a alta tarefa de selecionar as necessárias, as “boas”, para a elaboração da nova língua – que seria simples, formosa, exata em força e subtileza. É preci-

189


so uma montanha de minério, para poder-se extrair grama de metal raro. Se a gente pudesse ensinar às crianças o idioma falado no céu, este mundo melhorava tanto, que era um espanto.13 Inconformado com o próprio meio de expressão, Rosa procura “recuperar a linguagem literária”, ora mergulhando nas fontes mais puras do vernáculo ora incorporando outras línguas e modos de falar, sobretudo do falar regional do sertão do Brasil, que elege como “matriz de seu estilo”.14 Como o próprio escritor observa: O capiau está mais certo: com o vocabulário involuntariamente escasso de que dispõe, gosta da ostentação, de opulência, de beleza, de inventar nomes. Para os defeitos de seus cavalos e as cores dos seus bois, dá-se a um luxo incrível de termos exatos, marcando as mínimas gradações. Gente esperta!15 As cadernetas da viagem de Guimarães Rosa pelo sertão de Minas Gerais, realizada em maio de 1952, conduzindo uma boiada pelos campos gerais, contêm um verdadeiro inventário do “linguajar vaqueiro”, dos “termos exatos” com que nomeiam as coisas da natureza, com todas as nuances de cores e sons, e da maneira precisa como falam e relatam suas estórias: Dizem que eu sou aristocrata e que invento palavras. Não as invento totalmente. Para escrever Grande sertão: veredas, passei um mês inteiro no mato, em lombo de mula, catalogando num caderninho o linguajar do povo sertanejo. Há palavras que, na cidade, nem são conhecidas e que têm, contudo, raízes puras no latim autêntico. Aristocrata não sou. Guardei o caderninho no bolso. Ele ficou sujo de suor, de mato e de terra, até de dejeções de burro. Mas não o joguei fora.16 Ainda que o sertão do Brasil, sobretudo o interior de Minas Gerais, seja o seu grande foco de atenção, Rosa está sempre ávido por oportunidades, recorrendo a muitas outras fontes. As cadernetas de suas viagens pela França e Itália (1949-50) estão repletas de palavras e expressões “catadas vivas”, e seu diário

190


em Paris (1948-51) registra inúmeras conversas sobre cores e tonalidades com o pintor Cícero Dias, só para citar alguns exemplos. Na verdade, a pesquisa e documentação da língua escrita e falada fazem parte do cotidiano do escritor, de suas viagens ou meras andanças pela rua, de conversas ou leituras, e abrange os mais variados discursos e seus modos diversos de nomear e entender o mundo, das ciências naturais (botânica, zoologia, geografia, geologia...) às humanidades (filosofia, religião, música, pintura, história, línguas, literatura...).17 Um trabalho contínuo e persistente que se torna visível nos inúmeros documentos de seu Arquivo e se realiza plenamente na “linguagem misturada” de Grande sertão: veredas, como observou Arrigucci Jr.18: O fato é que encontramos, na base da linguagem, o falar regional do Norte de Minas, certamente muito estilizado, de combinação com latinismos; arcaísmos tomados ao português medieval [...]; indianismos; neologismos; termos aproveitados e adaptados de múltiplos idiomas (do inglês, do alemão, do francês, do árabe etc.); vocábulos cultos e raros, bebidos nos clássicos portugueses; elementos da linguagem das ciências, e sabe-se lá de que fontes mais. Enfim, as virtualidades da língua atualizadas e manipuladas na direção de uma mescla única, difícil de definir e de entender num primeiro momento, que estranha e surpreende e vai, entretanto, se apoderando do leitor, à medida que se entrega ao fluxo rítmico da narrativa também misturada. Cerca de dez anos depois dos livros de 1956, por ocasião do lançamento da tradução alemã de Grande sertão: veredas, Rosa vai descrever sua relação com a língua como “um casal de amantes que juntos procriam apaixonadamente”, explicitando alguns de seus preceitos básicos: buscar o sentido original de cada palavra, limpando-as das impurezas da linguagem cotidiana; evitar a servidão à sintaxe vulgar e rígida; fecundar e corromper o idioma materno com elementos de outras línguas. O escritor acaba formulando o seu “método tradutivo” de escrita: Escrevo, e creio que este é o meu aparelho de controle: o idioma português, tal como o usamos no Brasil; entretanto, no fundo, enquan-

191


to vou escrevendo, eu traduzo, extraio de muitos outros idiomas. Disso resultam meus livros, escritos em um idioma próprio, meu, e pode-se deduzir daí que não me submeto à tirania da gramática e dos dicionários dos outros. A gramática e a chamada filologia, ciência lingüística, foram inventadas pelos inimigos da poesia.19 Muitas análises apontam para as diversas línguas que se interpenetram nas construções textuais de Guimarães Rosa. Sua escrita é lugar de várias línguas em ação, que produzem constantemente tradução e interferência. A “fecundante corrupção” entre as línguas está na base de suas inovações lingüísticas.20 Ansiedades da escrita É em seu diário em Paris, intitulado “Nautikon”, o “livro da sinceridade” ou “sozinho a bordo”, que o escritor revela as ambições e tormentos de sua grande viagem na linguagem.21 Além de registrar seu cotidiano em Paris, entre novembro de 1948 e fevereiro de 1951, Guimarães Rosa reflete sobre as dificuldades da escrita e a “incessante tempestade de sua vida interior” – “porque todo homem tem a parte térrea e a parte oceânica. Nessa é que (Nautikon) ele está sempre sozinho. Sozinho? E... Deus? Com Deus coexistem os deuses”. 22 Visto como o “lugar das irremediáveis confidências”, é no diário que Rosa tematiza sua “ânsia de onisciência”: O canto dos pardais, repentinamente múltiplo, gaiato e concertado, faz-me sentir que a minha angústia básica é a ânsia de onisciência... (Por que cantam assim os pardais? Quais são os seus hábitos? Como vivem? Quem pode estudar os pardalitos?) (E as observações sobre eles resultam de acaso, de tempos outros, de bribes reunidas, várias contribuições...). Assim tudo o mais. De modo que a coisa mais simples, álacre, natureza e espontaneidade ? provoca-me em vez de um gozo gratuito um tormento acaparador, de ambicioso, de insaciável...23 Mas este não é o único tipo de angústia presente no diário. Nele, Rosa também procura refletir sobre a sua verdadeira mania de andar sempre toman-

192


do notas, “arrecadando” ou “colhendo” paisagens, palavras e expressões para “levá-las consigo, para casa”: sua “ânsia de fixar no papel” impressões, temas, conversas etc. Registrando incessantemente o mundo à sua volta, ele procura “fixar o tempo, o vivido”, ao mesmo tempo em que se pergunta se “correr para o papel e anotar logo qualquer brotar de pensamento ou sensação não seria um mal?” Não estaria ele se privando de “gozar do próprio espetáculo?” Como revela no próprio diário, o “Nautikon” oscila entre dois tons: a “auto-reflexão” e o “puro fixar momentos, idéias, reações, emoções”. É a busca pela “captação de instantâneos” – as “intuições fulgurantes”, os “lampejos de beleza”, as “interpelações poéticas das coisas” – que move sua “tarefa” de “diarista” ou “memorialista do presente”, levando-o a andar sempre com cadernos ou cadernetas, tomando nota de tudo que vê, ouve ou imagina em suas andanças. A “ânsia” de tudo registrar é evidenciada não apenas por seu produto – o volume espantoso de documentos de seu Arquivo –, mas também pelos relatos de seus amigos mais próximos: “O Rosa vivia com um lápis e papel tomando nota de conversa” (Cícero Dias); “Qualquer expressão que ele ouvisse, que fosse estranha ao conhecimento dele, ele anotava” (José Saturnino, fazendeiro de Cordisburgo); “Ele viajava anotando as palavras para não perder” (Paulo Dantas); “Às vezes na rua, conversando, ele parava, tirava um pedaço de papel e anotava qualquer coisa, qualquer idéia ele tomava nota. Ele me dizia assim: – Às vezes você tem uma idéia muito bonita mas ela não se repete” (Geraldo França de Lima).24 Também Augusto Frederico Schmidt retrata Guimarães Rosa como “um anotador, um homem que se documenta” constantemente, inclusive em suas viagens pela Europa, e constrói sua literatura em “bases sólidas”: Encontrei traços de Rosa em muitos lugares por onde andei, principalmente pela Itália. – “Quem passou por esta cidade foi Guimarães Rosa, discreto, secreto, deslizando, e sempre a tomar notas” – era o que me informavam inalteravelmente em Bolonha, em Parma, em Luca, em Florença. Com seu ar enganadoramente cordial e aberto, pois é um ser que na verdade se esconde e prefere observar, compreender, a exibir-se ou representar, Guimarães Rosa é um anotador, um homem que se documenta, que constrói a sua literatura solidamente, com a consciência de que não basta brilhar, ou escrever belo, mas que é preciso saber exa-

193


tamente o que se quer dizer, e tratar o assunto com todos os elementos da verdade e não apenas com o colorido mudável, provisório e variável.25 Já o poeta Manoel de Barros descreve a “curiosidade sem fim” do escritor, “que se aplica nas palavras com o fundo indagar”: “– E árvore, Manoel, o nome de algumas, você me dará?” [...] Quer saber qual o nome que tal árvore tem aqui. Quer saber o nome daquele passarinho que pula no brejo, cor de café, e como é que ele canta. [...] Nossa conversa era desse feitio. Ele inventava coisas de Cordisburgo. Eu inventava coisas do Pantanal. [...] Não tinha fim a sua curiosidade. Dava ares de um rei, às vezes. Mas o rosto merecia anjo. Eu tinha informações de seu gosto por línguas, idiomas. Traçava até línguas arrevezadas: tcheco, grego, aramaico, sei lá. Queria saber guarani. Foi no caderno, virou, virou, me perguntou: “– Manuel, que quer dizer não tem nhamonguetá nem buguerê?” Tentei traduzir. Quer dizer: não tem conversa nem vira de lado. Isso é guaranês, falei de orelhada. Mas Rosa quer saber a origem, quer saber a explicação de tudo. Rosa se aplica nas palavras com o fundo indagar. Fica imaginando. Recorre a outras línguas de origem tupi. Faz desenhos de letras no caderno. Excogita. [...] Rosa tomou nota. Gravou na caderneta.26 Sua verdadeira paixão pelo registro, sempre em busca de palavras e frases, também é descrita por Mário Calábria: A experiência lingüística era permanente nele [...] Ele carregava um caderninho de notas e um lápis, que ele aconselhava a todos os amigos que carregassem sempre, como parte da roupa, da indumentária, para não deixar nunca que pudesse escapar uma frase boa, uma palavra nova... Ele, Rosa, foi um mestre nesta arte de levar jóias, não só da casa materna, mas de onde encontrava.27 Ainda segundo Calábria, Rosa também o aconselhava a andar sempre tomando notas:

194


“– Anote tudo, carregue sempre no bolso um caderninho de notas, e escreva no mesmo dia o que interessa, faça como eu, um dia você aproveitará uma história, uma frase, palavras e até a maneira de contar. Sagarana não teria sido escrito sem meus caderninhos de notas...”28 Além da “ânsia de onisciência” e da “ânsia de fixar no papel”, Guimarães Rosa também tem de lidar com sua “ânsia da perfectibilidade”: Rever qualquer texto meu, já de si, é qualquer coisa de tremendo, porque o meu incontentamento é crescente, a ânsia da perfectibilidade, fico querendo reformar e reconstruir tudo, é uma verdadeira tortura. Por exemplo, dir-lhe-ei que as 5 edições do Sagarana são todas diferentes, refeitas, remodeladas, remexidas. Por fim, para ver se eu conseguia deixar isso de lado, e me voltava para escrever outros e novos livros, o meu Editor, José Olympio, mandou matrizar ou estereotipar a composição, guardando-a nos chumbos, e impedindo-me assim, de permanecer na classe de Danaide ou Sísifo.29 O escritor passava horas retocando seus escritos, revendo-os incessantemente, até mesmo depois de publicados. Segundo Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu), que acompanhou todo o processo de escrita dos contos de Primeiras estórias (1962) e de Tutaméia (1967), em dez anos de convivência com o escritor no Itamaraty (1957-67), como sua secretária e colaboradora: [...] a escrita para ele era uma gestação e um parto, era um esforço violento. Ele tinha que parar muitas vezes e deixar guardado, na gaveta, uma folha que ele tinha começado. E, às vezes, ele tirava, tentava recomeçar a trabalhar, não conseguia, guardava de novo. Então tem coisas dele, tem folhas começadas assim, que nunca foram acabadas, porque era difícil, porque ele procurava a palavra exata para aquilo que ele queria dizer. Ele falava: “– Quando eu não encontro a palavra, eu crio”. E como ele criava as palavras! [...] porque ele criava coisas, palavras que não existiam, não é? E ele usava muito dos arcaísmos também, e gostava muito do dicionário, ficava horas, às vezes, olhando o dicionário, procurando palavras, não uma exatamente, mas olhando, lendo o dicionário.30

195


Não é de se espantar, num escritor famoso por seu requintado trabalho de linguagem e seu gosto por ler dicionários e gramáticas, que as inúmeras listas de palavras e sintagmas presentes nos documentos de seu Arquivo revelem justamente o seu imenso interesse pelo nome das coisas – testemunho inequívoco de que, para ele, “o conhecimento só tem sentido se acompanhado da denominação do objeto, da maneira ou maneiras de exprimi-lo”.31 É o que o próprio Rosa observa acerca de suas cadernetas do sertão: Você conhece meus cadernos. Quando saio montado num cavalo, pela minha Minas Gerais, vou tomando nota das coisas. O caderno fica impregnado de sangue de boi, suor de cavalo, folha machucada. Cada pássaro que voa, cada espécie, tem um vôo diferente. Quero descobrir o que caracteriza o vôo de cada pássaro, a cada momento. Eu não escrevo difícil. EU SEI O NOME DAS COISAS.32 É ao longo do processo de elaboração dos livros de 1956 que Guimarães Rosa desenvolve o seu projeto bem mais amplo de “reescrever a própria língua”.33 O que começa, em 1946, como um projeto de “recuperação da linguagem literária”, vai aos poucos se transformando numa grande viagem em busca do nome das coisas e de formas que expressem aquilo que não tem voz nem contornos definidos. Sempre brincando com a linha tênue e arbitrária que distingue as coisas do mundo, a escrita de Rosa quer captar o que é ambíguo e escorregadio, ignoto ou difícil de ser apreendido – a própria “matéria vertente” das coisas, tantas vezes tematizada em Grande sertão: veredas. É este o projeto que conforma o sertão de Riobaldo e a inusitada metamorfose de “Meu tio o Iauaretê”, “operada de dentro da linguagem”34, e se faz presente no olhar do menino Miguilim e de todos os “bobos” e “alucinados” que povoam seu Corpo de baile – seres que falam línguas estranhas, de conteúdos enigmáticos, freqüentemente atribuindo outros nomes para as coisas e novos significados para os nomes, ou simplesmente criando nomes motivados por inusitadas sinestesias. É através desta nova linguagem literária que Rosa procura fazer ver o que normalmente não se vê, e dá voz ao que não fala ou não deveria estar falando como sujeito, àquilo que a cultura classifica como seres de

196


exceção, irrepresentáveis ou sem competência para falar, como bem observou João Adolfo Hansen (2000). Não só o doido, mas também a criança, o louco, o sertanejo, o índio, e até mesmo a própria natureza, sobretudo os animais, como o boi e a onça. A redação dos livros de 1956 Guimarães Rosa diz ter escrito Corpo de baile em 1953-1955, e Grande sertão: veredas, em 1954-55.35 Sua fase de trabalho intenso se concentra justamente nesses dois últimos anos, quando ele se viu “num túnel, num subterrâneo, só escrevendo, só escrevendo, só escrevendo eternamente”.36 Se a redação efetiva dos livros de 1956 ocorreu a partir de 1953, no entanto, foi bem mais longo o seu processo de elaboração. Na verdade, assim que termina Sagarana e entrega os originais à editora Universal, no início de novembro de 1945, Rosa já sonha escrever outros livros: Já penso em escrever um romance; já estou engenhando –, cranialmente. Depois, muita coisa: contos, novelas, o diabo. No começo, ainda é duro. Como uma Potência média, que começa a construir uma esquadra. Mas, logo que consiga lançar um ou dois dreadnoughts, poderei, penso, repousar na minha essência, encaranguejar-me ainda mais. Viver sem pressa, um pouco “intemporalmente”. Se preciso e se possível, trocarei então o Itamaraty por um emprego de fiscal de imposto do consumo, ou coisa parecida. Nada melhor do que uma casa nos subúrbios, e um emprego rotineiro, deslustrado, obtuso, sem agitações, sem remoções, sem viajações.37 Em dezembro de 1945, enquanto a editora prepara as provas tipográficas de Sagarana, o escritor viaja pelo interior de Minas Gerais, “retomando contato com a terra e a gente”, “reavivando lembranças” e “reabastecendo-se de elementos para outros livros em preparo”38: “Colhi coisas maravilhosas, voltei contente como um garimpeiro que tivesse enchido a sacola”.39 Um ano depois, animado com o sucesso de Sagarana, Rosa comenta com um amigo a sua necessidade de escrever:

197


Eu ando febril, repleto, com três livros prontos na cabeça, um enxame de personagens a pedirem pouso em papel. Estou apontando os lápis, para começar a tarefa. É coisa dura, e já me assusto, antes de por o pé no caminho penoso, que já conheço. Mas, que fazer? Depois de certo ponto, um livro tem de ser escrito, ou fica coagulado na gente, como um trombo numa veia, pior que um “complexo”. Tenho esperança de poder criar coisa nova e diferente, de superar o nosso Sagarana, com histórias e romances mais humanos, mas ao mesmo tempo, mais meta-humanos, mais super-humanos; que sei!?!... O bom seria fazer-se um livro só, de 5.000 páginas, que seria escrito e reescrito, durante a vida inteira. Ou – que beleza! – três gerações de romancista (pai, filho, neto), trabalhando um roman-fleuve, catedralesco, pétreo, tri-generacional...40 Em março de 1947, Rosa conta ao pai que está “escrevendo outros livros” e “imaginando estórias ambientadas no sertão”41, e comenta com Azeredo da Silveira que tem trabalhado “mas, até agora, numa cabotagenzinha, esperando ajuntar carga suficiente, para fazer-se ao largo oceano”.42 Em agosto de 1948, o diplomata João Guimarães Rosa é transferido para a embaixada do Brasil em Paris, onde permanece até março de 1951. No final de 1949, ele comenta com um amigo que começou a “escrever alguma coisa devagar, não sei bem se dará o que preste”, e planeja “parar com as leituras que me estavam tomando muito tempo”.43 No entanto, em maio de 1950, ainda em Paris, continua totalmente envolvido com seus estudos: Literariamente, tenho trabalhado pouco, e estudado muito. Agora, pretendo começar rijo, depois que me esforcei no sentido de resolver um pouco a dificuldade que mais me atrapalhava: a vulnerabilidade maior, quando a gente se põe de “sensibilidade aberta”, para escrever, e se está em lugar freqüentado e agitado como é este aqui.44 Guimarães Rosa ainda não entrou naquele ritmo intenso de trabalho que a redação de um livro requer, pois além dos estudos, que lhe “tomam muito tempo”, sente-se “vulnerável” e “atrapalhado” pelas demandas da efervescente

198


vida cultural de Paris. Mas ainda que não consiga escrever como deseja, movido pela saudade, planeja estórias ambientadas no sertão do Brasil, e sonha em viajar pelo rio das Velhas de canoa, à maneira de um viajante naturalista. Ao que tudo indica, Rosa só começa a construção efetiva de sua nova obra quando regressa ao Brasil, em 1951, depois de se instalar na paz de sua casa no Rio de Janeiro, diante do mar do Arpoador. É ali que ele consegue finalmente se colocar “de sensibilidade aberta para escrever” e trilhar o “penoso caminho” da escrita.45 É em dezembro de 1953, quase três anos após o seu regresso de Paris, que Guimarães Rosa menciona claramente o livro enorme que está escrevendo: E, por falar, estou escrevendo um livro, um livrão, um livralhão. São novelas labirínticas, nelas me perco, por elas quero me salvar. Vão ser 9, e já comecei a 6ª. Prepare-se para gostar, e brigar em defesa de, com os que não gostarem. Logo depois começo outro. Já estou resolvido: daqui por diante, é escrever, sem parar. O destino do homem é o moto-contínuo. Agora, cesso. Já escrevi longo demais, o que me assusta. Quando a gente está no meio de um livro, as cartas saem sem vitaminas. O epistolar não é gênero de meu forte. E Nietzsche era contra. Recupero-me no afeto. Isto, sim. E no forte abraço do seu Guimarães Rosa.46 A informação contida nesta carta é preciosa, pois revela que Rosa está escrevendo “um livrão”, no qual pretende reunir nada menos que “nove novelas labirínticas”, cinco das quais já escritas. A sexta novela começa a ser redigida no início de dezembro de 1953. No entanto, depois de cinco meses de intenso trabalho, em maio de 1954, o “livralhão” de “nove novelas” parece já ter sido dividido, pois Rosa escreve a Calábria (Rio de Janeiro, 07.05) dizendo que “os livros vão indo; mas a matéria resiste muito, e o Artista (ou artista, mesmo) sofre muito, porque as palavras escorregam e as idéias passam voando muito alto demais.” De fato, em julho de 1954, Rosa escreve ao pai (Rio de Janeiro, 12.07) contando que o “livrão” se desdobrou em dois: “estou trabalhando burramente, dia e noite, para terminar os livros que estou escrevendo – pois, em vez de um, como comecei, a coisa logo virou dois...”.

199


Ainda em julho de 1954, sai na revista Visão uma matéria sobre a “volta” do escritor, que declara estar escrevendo um romance chamado As veredas mortas: Depois de um silêncio de oito anos, Guimarães Rosa anuncia para princípios de 1955 mais duas obras. A primeira delas é um conjunto de sete novelas, intitulado Corpo de baile [...] De uma das novelas desse livro, Guimarães – “quase contra a minha vontade”, diz ele – desenvolveu um romance: As veredas mortas, que é a história do jagunço Riobaldo, cheia de violência e mortes. Desenrola-se no princípio do século, no Noroeste de Minas, perto do rio Urucuia [...].47 No Arquivo Guimarães Rosa (AGR/IEB/USP), não há nenhum plano, resumo ou esboço de enredo dos livros de 1956: “Tudo se passa como se houvesse uma falha entre as anotações e as obras prontas, não se sabendo como as anotações passaram a livros. Deve-se pensar que as etapas intermediárias [...] foram perdidas, ou, ao contrário, que o método de trabalho do escritor não as incluía? Que dos fragmentários prototextos ao primeiro jato de escrita ele dava um salto?”48 Segundo dona Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu), Chefe do Serviço de Publicações do Itamaraty, secretária e colaboradora de Rosa (19571967), “pode talvez ter havido notas manuscritas, projetos, páginas que Guimarães Rosa às vezes rabiscava, atirando-as ao cesto depois de datilografadas. Tudo leva assim a crer – diz ela – que o primeiro rascunho representa a primeira versão organizada do Grande sertão: veredas”.49 Consultado na casa de dona Aracy (SP), viúva de Guimarães Rosa, e a quem o romance é dedicado, o Primeiro Rascunho (R1) de Grande sertão: veredas é um volume datilografado, repleto de rasuras, correções e adendos. Na primeira página, há um primeiro título, O DIABO NA RUA, NO MEIO DO REDEMOINHO, datilografado e riscado a lápis pelo autor. Acima dele, há um outro título escrito à mão (ao que tudo indica, o segundo), Veredas Mortas, que também foi riscado a lápis. Mais abaixo, o primeiro título aparece como subtítulo, reescrito à mão e colocado entre parênteses: (O diabo na rua, no meio do redemoinho...). Na última página do Primeiro Rascunho (R1), depois do – FIM – (datilografado), Rosa escreveu:

200


Em 31 de julho de 1954, Às 11 hs.30 da noite (23 hs. 30’) ! —————— (A “batalha do Tamanduá-tão”: foi a 21-VII (julho) - 1954.) Os dados contidos no Primeiro Rascunho (R1) reforçam aquela informação veiculada pela revista Visão (ambos datados de julho de 1954): em meados de 1954, Guimarães Rosa está escrevendo um “romance” intitulado As veredas mortas. O título definitivo, GRANDE SERTÃO : VEREDAS (O DIABO NA RUA, NO MEIO DO REDEMOINHO...), consta apenas do Segundo Rascunho (R2), também preservado por dona Aracy. Na primeira página do Segundo Rascunho (R2), acima do título Grande sertão: veredas (o diabo na rua, no meio do redemoinho), datilografado, Rosa escreveu uma dedicatória: À Aracy, minha mulher, Ara, pertence também este segundo rascunho. Com amor, com um beijo, o Joãozinho. Rio, 1955. E na última página, depois do – FIM – (datilografado), escreveu: (Em 22 de novembro de 1955, Às 12 hs. 32 da noite, Digo: 0 hs. 32’, de 23-XI-55).50 Depois que termina o Primeiro Rascunho (31.07.1954), Rosa volta a trabalhar no livro de novelas, deixando o romance repousar um pouco. É o que se depreende da carta que envia a Azeredo da Silveira, em outubro de 1954: “Estou trabalhando, febrilmente, no acabar o livro de novelas. Febrilmente – é a palavra. Caí na torrente, nem durmo direito, a coisa borbulha em grande calor terrível.” Dez meses depois, em agosto de 1955, Rosa já entregou ao editor os originais de Corpo de baile, um “verdadeiro cetáceo”, com sete novelas, e está trabalhando em Grande sertão: veredas, que será um “mastodonte”: E a vida tem sido endiabrada e vultosa, para mim, nestes meses. [...] Mais que tudo, porém, sobrecarregam-me os meus livros. Meti-me a fazer coisa grande demais (no tamanho). Já entreguei ao José Olympio o Corpo de baile – que é um verdadeiro cetáceo, nas dimensões: sairá em dois volumes, de cerca de 400 páginas, cada um. E são apenas sete novelas, imagine. Uma verdadeira penca de romances. Agora, porém, retoco e recopio o romance, o Grande sertão: veredas, e ando apenas pela me-

201


tade. Sendo que vai ser um mastodonte, com perto de 600 páginas. Trabalho enterrado naquilo, chego a perder a noção das coisas externas. Por isto mesmo, em posto não penso ainda, não posso. Só depois de pôr os dois cartapaccios na rua. Também, é melhor.51 Em agosto de 1955, Rosa está “retocando” e “recopiando” o Primeiro Rascunho (R1) do romance. Ainda “pela metade”, a confecção do Segundo Rascunho (R2) se estende por mais quatro meses, até 22.11.1955. Se Rosa escreveu Corpo de baile entre 1953-1955, e Grande sertão: veredas, entre 1954-1955, como revelou a Mary L. Daniel52, foi alternando períodos em que se dedicava mais a um ou outro livro (o que não excluía, evidentemente, algumas visitas esporádicas aos textos em repouso). Ao que tudo indica, o Primeiro Rascunho (R1) foi elaborado entre janeiro e agosto de 1954, o Segundo, entre julho e novembro de 1955. É este Segundo Rascunho (R2) que o escritor entrega à editora.53 Em carta ao pai, ele comenta: [...] a luta para terminar e entregar ao Editor os originais dos meus livros, que ficaram enormes: um, em dois volumes, com 820 páginas; o outro com 467 páginas datilografadas, que deverão dar, impressas, umas 600! Completar, retocar, rever as provas de tudo isso, ainda está sendo um esforço imenso. O importante é ver se a coisa “pega”, depois, se valeu a pena. No mais, vai tudo bem.54 No início de dezembro de 1955, os originais dos dois “livrões”, Corpo de baile e Grande sertão: veredas, já estão nas mãos de José Olympio. Movido por sua “ânsia da perfectibilidade”, Guimarães Rosa continuou trabalhando no romance mesmo depois de entregá-lo à editora. Como nos revela Hazin55, o autor fez a revisão das duas provas tipográficas do romance, aproveitando para “completar”, “retocar” e “rever” o texto.56 Depois disso, ainda reviu a 1ª edição, lançando a 2ª edição (texto definitivo) em 1958. Ou seja: entre o Primeiro Rascunho (1954) e o texto definitivo (1958), há seis etapas conhecidas do romance. Em fevereiro de 1956, Guimarães Rosa revela a um amigo como foi estranha a experiência de finalizar o romance – “só lucidez e angústia” –, e a sensação de “renascimento” que lhe veio depois de fechar a primeira edição:

202


[...] na fase final, e nas providências e cooperações da mecânica editorial, os dois livros me maltrataram tanto, que foi até demais. Conto a Você que, na última semana, antes de entregar ao José Olympio o Grande sertão, passei três dias e duas noites trabalhando sem interrupção, sem dormir, sem tirar a roupa, sem ver cama: foi uma verdadeira experiência trans-psíquica, estranha, sei lá, eu me sentia um espírito sem corpo, pairante, levitando, desencarnado – só lucidez e angústia. Daí, entregues os originais, foi uma brusca sensação de renascimento, de completa e incômoda liberação, de rejuvenescimento: eu ia voar, como uma folha seca. Imagine, eu passei dois anos num túnel, um subterrâneo, só escrevendo, só escrevendo, só escrevendo eternamente...57 Segundo relatos de familiares e amigos, ao escrever, Guimarães Rosa entrava num ritmo “febril”, como se estivesse sendo arrastado por uma torrente: Joãozinho quando escreve vive numa febre, numa exaltação, num deslumbramento. Quando termina um livro, sente-se aliviado, mas mal acaba de entregar os originais ao editor, já começa a pensar num próximo. Não pára nunca. Em casa está sempre lendo, escrevendo, estudando todo o tempo.58 Dona Aracy conta que a redação do romance deixou seu marido “exaurido”: “Levantava-se noite alta para escrever, e assim se esquecia, sozinho, até o dia clarear”. E Franklin de Oliveira, amigo de longa data do escritor, declara que “Rosa parecia um louco, não pensava em outra coisa. Dizia que aquilo era maior que ele.”59 Não por acaso, o escritor se refere a Grande sertão: veredas como um “livro terrível”: Note bem, não é só pela extensão “territorial” do trabalho, mas principalmente pela carga de excitação que deflagra, a ansiedade febril que em mim provoca uma tarefa dessas, com seu stress qualitativo, afetivo. Como a amiga já viu, o romance de Riobaldo é uma espécie descomedida de cetáceo, com seu toucinho todo querendo ser de poesia e metafísica. É um livro terrível; não é à toa que o Diabo é seu personagem.

203


Chego a pensar que foi de escrevê-lo e, mais tarde, rever-lhe as provas, que adoeci: eu, que sempre tive pressão baixa, e que agora passei a tê-la verticalíssima.60 A escrita para Rosa era uma experiência tão avassaladora que ele chegou a declarar: “Quando eu escrevo, me dá uma coisa. Fico atuado. É como se fosse um transe”.61 A redação do romance foi de fato uma experiência muito intensa, como revelou a Benedito Nunes, durante um encontro em seu escritório, no Palácio do Itamaraty: Ele disse que havia escrito penosamente o Grande sertão: veredas, mas com uma grande flama. O Grande sertão o levava, quando estava escrevendo, até mesmo a gritar, a dançar, em movimento contínuo pela sala... Ele me disse que Grande sertão: veredas foi a salvação da vida dele, que sem Grande sertão ele teria morrido, mais expressamente, ele teria se matado se não escrevesse o livro.62 Paulo Dantas também lembra de ter ouvido de Rosa um relato semelhante acerca do romance: – Os caboclos “baixaram” em mim... Só escrevo altamente inspirado, como que “tomado”, em transe. Aquele livro me cansou fisicamente. Acabei extenuado. Deu-me, porém, um enorme prazer. Sensação igual só senti ao escrever Miguilim. Foi outro “clarão” que recebi na vida.63 Corpo de baile é publicado em janeiro de 1956, com sete novelas, divididas em dois volumes, num total de 822 páginas: no primeiro, “Campo geral”, “Uma estória de Amor” e “A estória de Lélio e Lina”; no segundo, “O recado do morro”, “Lão-Dalalão (Dão-Lalalão)”, “Cara-de-Bronze” e “Buriti”. Alguns meses depois, em julho de 1956, é lançado o romance Grande sertão: veredas, com 594 páginas.64 O que começou, em 1946-1947, como “três livros prontos na cabeça”, no final de 1953 virou um “livralhão” que teria “nove novelas”, para finalmente ser dividido em dois, em 1954: o “livro de novelas” (Corpo de Bai-

204


le) e o romance Veredas Mortas, inicialmente intitulado O diabo na rua, no meio do redemoinho. Segundo Madu, o romance, inicialmente, seria “a última novela do Corpo de Baile”, a qual “cresceu tanto e com tanta força” que acabou virando um livro independente: O Grande sertão era uma novela que faria parte do Corpo de baile, mas – isso ele me contou – quando começou a escrever o Grande sertão: veredas – que seria a última novela do Corpo de baile –, ele disse que sentiu aquilo crescer tanto, tanto dentro dele, e ele escreveu quase noite e dia sem parar, num estado de transe. E a editora telefonava para ele: “Olha nós estamos esperando a última novela...” – que seria a última novela do Corpo de baile e que, inclusive, era um número cabalístico [...] Seria a oitava, mas cresceu tanto e com tanta força, e quando ele lia estava tão grande que não podia mais fazer parte. Então foi a independência do Grande sertão, que explodiu de tal maneira que suplantou o Corpo de baile. A editora publicou o livro logo depois, e Corpo de baile ficou um pouco esquecido, porque Grande sertão apareceu assim. O Corpo de baile é realmente importantíssimo na obra dele, e ele ficou até um pouco, assim, triste, porque o Corpo de baile desapareceu quase com a inclusão do Grande sertão.65 É assim que, das “nove novelas labirínticas” do “livrão” de 1953, apenas uma permanece desconhecida. É possível supor que seja “Meu tio o Iauaretê”, como veremos mais adiante, a partir do levantamento dos inúmeros exercícios narrativos produzidos por Guimarães Rosa durante o processo de elaboração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas. A viagem nos periódicos Em 1934, ao ingressar na carreira diplomática, o médico João Guimarães Rosa (1908-1967) sai de Minas Gerais para residir no Rio de Janeiro (19341938; 1944-1948 e após 1951), Hamburgo (1938-1942), Bogotá (1942-1944) e Paris (1948-1951). Suas publicações em periódicos entre Sagarana (1946) e

205


os livros de 1956 estão concentradas nos anos de 1947-1948 e 1951-1954. O escritor não publicou nenhum texto inédito durante sua estadia em Paris – período consagrado a leituras, estudos, viagens e escritos pessoais –, nem após maio de 1954 e durante todo o ano de 1955, dedicados integramente à redação e finalização de Corpo de baile e Grande sertão: veredas.66 Durante o período de elaboração dos livros de 1956, Guimarães Rosa fez várias viagens de documentação, recolhendo elementos para suas estórias. A famosa aventura de maio de 1952, conduzindo uma boiada com um grupo de vaqueiros, foi apenas uma entre, pelo menos, seis viagens registradas em cadernetas: em Minas Gerais (dezembro de 1945); no Pantanal mato-grossense (julho de 1947); pela França e Itália (1949 e 1950); no sertão da Bahia (junho de 1952). Além de tomar notas in loco e depois copiá-las e recopiá-las diversas vezes, datilografando-as integralmente ou apenas algumas de suas passagens, Rosa também produziu vários escritos – relatos de viagem, pequenos contos, diários e outras peças de difícil classificação –, não só a partir das cadernetas mas também de seus diários. Se alguns foram deixados inacabados (como “Com o vaqueiro Bôca-de-fogo”67, “A saída” e “A boiada”68), ou ficaram “descansando” por um tempo (como “Mechéu”69 e “Meu tio o Iauaretê”70), a maioria foi publicada em periódicos, entre abril de 1947 e junho de 1954: 1947 1. “São Marcos” 2. “Histórias de Fadas” 3. “Sanga Puytã” 1947-48 4. “Com o vaqueiro Mariano” 1948 5. “Cidade” 6. “O mau humor de Wotan”

206


1951 7. “O lago do Itamaraty” 1952 8. “A senhora dos segredos” 9. “Pé-duro, chapéu-de-couro” 1953 10. “Terrae Vis” 11. “Cipango” 12. “Ao pantanal” 13. “Teatrinho” 14. “O homem de Santa-Helena” 15. “Do diário em Paris” 16. “Fantasmas dos vivos” 17. “Os doces” 18. “Discurso de Posse na Sociedade Brasileira de Geografia” 1954 19. “A chegada de Subles” 20. “Do diário em Paris” 21. “Risada e meia” 22. “Aquário (Nápoles)” 23. “Uns índios – sua fala”

Foram nada menos que 23 escritos em periódicos do Rio de Janeiro e Belo Horizonte, entre 1947 e 1954,71 sendo que a metade (os 11 em destaque) remete diretamente às viagens de Rosa e aos documentos inéditos produzidos a partir delas, entre 1938-1952:

207


Sertão da Bahia e de Minas Gerais (1952): “Pé-duro, chapéu-de-couro”: relato de suas duas incursões rumo ao mundo dos vaqueiros. Pantanal (1947): “Sanga puytã”, “Com o vaqueiro Mariano”, “Cipango”, “Uns índios – sua fala” e “Ao pantanal”: relatos de sua estadia na Fazenda Firme (onde trabalhava o vaqueiro Mariano), de uma viagem pelo Pantanal inundado, da visita a uma aldeia de índios Terena e também a uma colônia de japoneses; Itália (1949-1950): “Aquário (Nápoles)”: descrições de animais marinhos observados no aquário desta cidade. São “fotos verbais dos animais, tentando defini-los por aproximações antropomórficas, croquis de palavras contadas e iluminadores”. 72 Paris: “Do diário em Paris” (setembro/outubro de 1949) e “Do diário em Paris” (agosto de 1949): passagens do “Nautikon” (com algumas alterações), entre as quais uma conversa sobre cores com o pintor Cícero Dias, e alguns ensaios de definição do próprio diário. Hamburgo: “O mau humor de Wotan” (1938-1940) e “A senhora dos segredos”: “reminiscências que evocam numa contenção extrema seu horror ante à barbárie de que lhe coube ser testemunha ocular na Alemanha de Hitler”.73 Dessas onze publicações entre 1947-1954, dez foram integradas ao livro

208


póstumo Ave, palavra (1970). Nove remetem às viagens realizadas entre 19471952; duas, aos anos em que Rosa viveu na Alemanha nazista (1938-1942). Ave, palavra Das 23 publicações de Rosa que datam de 1947-1954, a grande maioria (18 delas) foi reunida em Ave, palavra. As exceções são: “Com o vaqueiro Mariano” (Estas estórias); “São Marcos” (conto de Sagarana); “Os doces” e “Discurso de posse na Sociedade Brasileira de Geografia” (não foram republicados); e “Risada e meia”, que foi reescrito, ampliado, e ganhou um novo título, “Aletria e hermenêutica”, para se transformar no primeiro prefácio de Tutaméia (1967). O que já provoca uma curiosa inversão na bibliografia do autor, pois seu último livro começa com um “Prefácio” que foi originalmente concebido em 1954 – além de integrar também o conto “Mechéu”, cujos dados foram “colhidos” em Paris, por meio de carta enviada a Pedro Barbosa, em 1949. A mesma inversão pode ser feita em Ave, palavra, que possui um bloco significativo de peças (18) que foram publicadas antes de 1956, dez das quais diretamente relacionadas com as viagens, cadernetas e diários do escritor. Ave, palavra possui duas partes. A primeira, com 49 peças74, constitui o livro propriamente dito (pp. 3 a 250). A segunda, intitulada “Jardins e riachinhos”, com 5 peças (pp. 253-274), é na verdade um anexo, pois o autor pretendia publicá-las num livro à parte.75 No entanto, Paulo Rónai, organizador do livro, acabou optando por incluí-las na coletânea, “embora não tivessem sido a ela destinadas pelo Autor”: Incluíram-se no volume cinco peças que iam ser o núcleo de outro livro, Jardins e riachinhos, de extensão insuficiente para dar outro volume, de cor, sabor e forma aparentados aos deste. Memórias da simbiose de Rosa menino com a natureza e os bichos são deveras exercícios de saudade e iridescente ternura.76 Assim, excluindo-se a seção “Jardins e riachinhos”, das 49 peças que compõem Ave, palavra, um bloco significativo remete às viagens e documentos inéditos de Rosa que datam de 1938-195277: dez peças publicadas entre 1947-1954

209


(listadas mais acima)78, e outras dez que também foram publicadas em periódicos, entre 1956-196779: Hamburgo Além de “O mau humor de Wotan” e “A senhora dos segredos”, temos: 1 – “Homem, intentada viagem” (datado de 1938-1939; O Globo, 18.02.1961); 2 – “A velha” (O Globo, 03.06.1961). Visitas a aquários e zoológicos na Europa e no Rio de Janeiro Além de “Aquário (Nápoles)”, temos: 3 – “Zôo (Hagembecks Tierpark, Hamburgo-Stellingen)” (O Globo, 11.03.1961; e Pulso, Rio de Janeiro, 29.04.1967; 4 – “Zôo (Parc Zoologique du Bois de Vincennes)” (O Globo, 29.04.1961); 5 – “Zôo (Jardin des Plantes)” (O Globo, 24.06.1961); 6 – “Zôo (Whipsnade Park, Londres)” (Pulso, 07.01.1967); 7 – “Aquário (Berlim)” (Pulso, 18.02.1967); 8 – “Zôo (Rio, Quinta da Boa Vista)” (Pulso, 01.04.1967). Visitas a museus na Europa 9 – “O burro e o boi no presépio” (revista Senhor, dez. 1961).80 Viagem pelo interior de Minas, em 1945 10 – “Dois soldadinhos mineiros” (Boletim da Biblioteca do Exército, abril de 1957). Dessas 20 peças que integram Ave, palavra, quatro remetem a Hamburgo (1938-1942), e 16 às viagens realizadas entre 1945-1952. Ao agrupar dessa forma peças que estão dispersas ao longo do livro (nas

210


atuais edições nem estão datadas), estou propondo uma leitura de Ave, palavra que considere a data de publicação dos textos e sua relação com as viagens e documentos inéditos de Rosa produzidos no período de elaboração dos livros de 1956. Critério que não foi adotado pelo organizador da coletânea, seguindo indícios da vontade do autor:81 Na ordenação das peças – guardadas na pasta dos originais em ordem casual, na medida em que iam sendo datilografadas – procurou o organizador aplicar o critério que seria o usado por Guimarães Rosa na composição dos seus demais livros. Segundo a informação de D. Maria Augusta de Camargos Rocha – secretária e amiga do escritor, a cuja preciosa ajuda se devem os dados indispensáveis à organização do presente volume – ele alternaria poesia e prosa, narrativas e cenas dramáticas, procurando realizar assim um conjunto harmonioso para, fugindo ao monótono, manter alerta e prisioneiro o leitor.82 Segundo Paulo Rónai, Guimarães Rosa estava preparando a publicação do livro quando faleceu: já havia escolhido o título, selecionado as peças, revisto algumas, e pretendia terminar Ave, palavra com uma “explicação”, denominada “Porteira de fim de estrada”, que não chegou a ser escrita. Jamais saberemos se tal explicação daria um novo sentido à sua opção de alternar diferentes tipos de peças: “poesia e prosa, narrativas e cenas dramáticas”. Mas até se decidir por Ave, palavra, Rosa teria hesitado bastante entre diversos títulos bastante sugestivos: Azulejos amarelos, Conversas com tempo, Sortidos e retalhos, Reportagens, Desconexões, Via e viagens, Contravazios, Moxinifada83, Almanaque, Poemas do esporádico, Exercícios de saudade, Meias-estórias, Oficina aberta.84 Conforme observou Rónai, “todos tinham o inconveniente de se referir, cada um, apenas a um ou a alguns grupos dos trabalhos enfeixados”. Para ele, o título finalmente escolhido – e “roseanamente ambíguo” – resolvia a dificuldade: [...] não se referindo a nenhum e a todos, mas saudando com exaltação o poder criador da palavra que transparecia radioso em todos eles, ou

211


contemplando o seu vôo para regiões extraterrenas, ou ainda, talvez, apontando numa síntese lapidar, o oscilar dos assuntos entre dois pólos, o mundo animal representado na ave e o humano, compendiado em seu atributo diferenciador.85 Na Pasta de Estudos para Ave, palavra (AGR), localizei um texto datilografado pelo escritor, que fornece novas pistas para o entendimento do título escolhido: Ave, palavra Saio de sinuosíssima experiência: traduzi. Tirei do inglês para o português um livro, inteiro, se bem que de si se tratasse de obra condensada, de 34 páginas, um livrinho. E, entretanto, notável. Comovedor, a um grau profundo demais. Sei pouco de outras obras que por tantos e tão emocionantes meios até hoje me hajam pegado. E é a estória de um pássaro. Por ora não direi seu título verdadeiro; confidencio apenas um dos que pensei em emprestar-lhe: O pássaro perdido.86 A experiência a que Rosa se refere é a tradução de O último maçarico, livro escrito pelo norte-americano Fred Bodsworth, que relata as peripécias da viagem migratória de um pássaro, o maçarico, da América do Norte rumo à América do Sul.87 Além da saudação e reverência ao poder da palavra, que é o sentido mais evidente do título, ou ainda, como bem observa Rónai, da palavra como diferença entre o homem e o animal – ambos tão agudamente observados e descritos em suas estórias –, para Guimarães Rosa o título Ave, palavra também se relaciona com uma experiência extremamente “sinuosa”: a tradução, ou seja, “tirar” do inglês para o português, transpor de uma língua para outra. Mas se quisermos entender a relação entre a tarefa do tradutor, o título do livro e as diferentes peças que o compõem, é necessário pensar também em termos da tradução de uma linguagem ou de uma cultura para outra (o que se evidencia em seu mergulho no mundo dos vaqueiros), e até mesmo da tradução de uma experiência em palavras (problema presente no “Nautikon”). De qualquer forma, o que Rosa observou a respeito de suas cadernetas ainda parece ser o melhor comentário

212


ao título do livro: “Cada pássaro que voa, cada espécie, tem um vôo diferente. Quero descobrir o que caracteriza o vôo de cada pássaro, a cada momento. Eu não escrevo difícil. EU SEI O NOME DAS COISAS”.88 “Via e viagens” Ave, palavra é um livro que tem se mantido, equivocadamente, à margem dos estudos críticos sobre a obra de Rosa.89 Segundo Vincent Jons, os vários textos que o compõem “podem ser agrupados de várias maneiras, mas é duvidoso que isso possa ajudar a iluminá-lo de alguma forma”.90 É certo que as várias peças de Ave, palavra podem ser agrupadas de várias maneiras, como “Jardins e riachinhos” (já colocados à parte), as estórias ambientadas na Segunda Guerra (“O mau humor de Wotan”, “A velha”, “A senhora dos segredos”) ou no Pantanal mato-grossense (“Sanga puytã”, “Uns índios – sua fala”, “Cipango”, “Ao pantanal”), e os poemas dos cinco poetas anagramáticos (Soares Guiamar, Meuriss Aragão, Sá Araújo Ségrim e Romaguari Sães).91 As descrições de animais contemplados em inúmeras visitas a zoológicos e aquários bem poderiam ser publicadas num livrinho à parte, como “Jardins e riachinhos”, sob o título de “Animalogia ou bestiário amoroso”, como o próprio autor chegou a pensar, em 195392: “Tenho idéia de escrever um bestiário amoroso, aproveitando todas as minhas notas e impressões de jardins zoológicos”. O que faria jus à sua carreira de “animalista notável”, como bem notou Graciliano Ramos a propósito de Sagarana: “fervilham bichos no livro, não convenções de apólogo, mas irracionais diretos, exibidos com peladuras, esparavões e os necessários movimentos de orelhas e de rabos”.93 Walnice Galvão também destaca o incrível poder de observação de Guimarães Rosa, capaz de descrever não apenas pessoas mas também animais em seu ínfimos detalhes, como nos “cinco textos sobre jardins zoológicos que figuram no Ave, palavra. Ali, dispensando a mediação da ficção, o autor estende sensibilíssimas antenas e fica tentando apreender cada bicho e construir um equivalente em palavras”.94 A dificuldade de Rosa em escolher um título para o livro, considerado por ele mesmo uma “miscelânea”, reflete bem a diversidade das peças que o compõem: notas de viagem, trechos de um diário, poesias, pequenos contos, flagrantes do cotidiano, reportagens poéticas, meditações metafísicas, poemas

213


dramáticos e textos filosóficos – um livro que “passa da reportagem à poesia, da reminiscência à vinheta, do comentário de notícias ao relatório de viagem, do grave depoimento ao exercício lúdico”.95 No entanto, ao contrário do que pensa Vincent Jons, a datação dos textos é uma chave de leitura do livro. Entre os vários títulos aventados por Rosa, “Via e viagens” parece perfeito para denominar o conjunto significativo de peças que remetem às viagens e documentos inéditos do escritor que datam do período anterior aos livros de 1956. Ou seja: quase a metade de Ave, palavra é composta de peças que fazem parte do processo de elaboração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas. Levando a fundo essa proposta de agrupar os textos a partir da época em que foram concebidos, mais três outros textos, ainda que publicados em Estas estórias, poderiam integrar “Via e viagens”: “Com o vaqueiro Mariano”, “A simples e exata estória do burrinho do comandante” e “Meu tio o Iauaretê”. “Com o vaqueiro Mariano” (de 1947-1948) e “Pé-Duro, chapéu-de-couro” (1952) são duas incursões do escritor rumo ao mundo dos vaqueiros, buscando apreender sua linguagem e visão de mundo. Denominado “reportagem poética” por Rosa, “Pé-duro, chapéu-de-couro”96 é centrado no relato da viagem ao sertão da Bahia, mas inclui passagens sobre a viagem com a boiada, ambas realizadas em 1952: em maio desse ano, Rosa conviveu com um grupo de vaqueiros mineiros; no mês seguinte, participou de uma “vaquejada” em Caldas do Cipó (Bahia), onde pôde comparar as diferenças entre vaqueiros de diversas regiões do sertão. Como resultado dessas viagens, no final do ano (dezembro) publica “Pé-duro”, que é central para compreendermos o notável interesse do escritor pelo gado e a cultura vaqueira, evidenciado na leitura de suas cadernetas. Este texto retoma algumas questões levantadas cinco anos antes em “Com o vaqueiro Mariano”, que relata sua estadia numa fazenda de gado no Pantanal, em 1947. Publicado originalmente em três partes (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 1947-1948), foi republicado como um livro, justamente, em 1952 (hoje, uma raridade de bibliófilos). Rosa não descobriu o mundo dos vaqueiros em “Pé-duro, chapéu-decouro”, mas foi nele que formulou a sua concepção da cultura boieira. Em Sagarana (1946), vários contos abordam a relação do vaqueiro com o gado, e esse tema já está presente na “entrevista” com o vaqueiro Mariano (1947),

214


orientando os rumos de sua viagem “para dentro do país do boi”. “Pé-duro” é uma espécie de tratado sobre os vaqueiros do sertão, seu modo de vida e de pensar. É uma leitura de Euclides da Cunha à luz de suas cadernetas de viagem, procurando penetrar na própria visão de mundo dos vaqueiros, em sua filosofia de vida. Euclides fornece o solo de suas descrições, é a referência constante que está presente nas entrelinhas, nas perguntas que adivinhamos terem sido feitas por Rosa. Ao longo do texto, em flagrante diálogo com Os sertões, o escritor percorre, mas não na mesma ordem, cada um dos itens abordados por Euclides para caracterizar o “tipo sertanejo”: descreve o aboio; a postura dos vaqueiros; seus trajes de couro, cavalos e selas; formas de pagamento; vaquejadas; estouros de boiada etc. O que nos leva a supor que datem justamente de 1952 as muitas marcas de leitura feitas por Rosa em seu exemplar de Os sertões (sublinhados e notas à margem), especialmente no capítulo II, “O homem”.97 Quase todos esses itens também estão presentes nas cadernetas de 1952, como se Rosa estivesse refazendo, em campo, os mesmos temas abordados por Euclides. “Pé-duro, chapéu-de-couro” e “Com o vaqueiro Mariano” possuem tantas afinidades que Rosa pretendia publicá-los juntos, chegando a entregar o projeto deste livro – intitulado Com os vaqueiros – à editora José Olympio, em 1957.98 Seria, portanto, bastante razoável que fossem editados juntos, e sob tal denominação, como uma subdivisão de “Via e viagens”. No entanto, nos papéis deixados por Rosa, Paulo Rónai encontrou vários esboços de índices para o livro Estas estórias, que deveria abranger oito novelas longas e também a “entrevista-retrato” com Mariano.99 O que significa que, em 1967, Rosa já havia abandonado totalmente a idéia de publicá-la junto com “Pé-duro, chapéu-de-couro”. O projeto de editar Com os vaqueiros data de 1957, logo depois dos livros de 1956 e do prefácio “Pequena palavra” (de 27.08.1956)100, que também trata dos “povos boieiros” (bukólos): o livro é concebido num momento em que ainda são candentes as questões que levaram Rosa a refletir sobre o mundo dos vaqueiros. Dez anos mais tarde, depois de publicar Primeiras estórias e Tutaméia, o preparo dos livros Estas estórias e Ave, palavra, que deixou inacabados, já envolve outros textos e outras questões. “Meu tio o Iauaretê” e “A simples e exata estória do burrinho do comandante” – “mencionados em todos os índices de Estas estórias esboçados por Rosa” – foram publicados, respectivamente, em abril de 1960 e março de 1961,

215


na revista Senhor. No entanto, como nos informa Paulo Rónai, ambos foram escritos alguns anos antes dos livros de 1956: As datas de publicação desses escritos nem de longe coincidem com as da composição. A respeito de “A simples e exata estória do burrinho do comandante” e “Meu tio o Iauaretê”, informam D. Aracy, viúva do escritor, e Franklin de Oliveira, seu grande amigo, que já estavam escritas havia uns dez anos quando foram entregues à revista Senhor. Teriam sido escritos durante sua estadia em Paris, entre agosto de 1948 e março de 1951? É possível. Em suas cartas a amigos, Rosa menciona alguma atividade literária, quando revela estar escrevendo a “biografia romanceada” de Mechéu (em julho de 1949), ou produzindo “alguma coisa devagar” (em dezembro de 1949). É em Paris que prepara a terceira edição (revista) de Sagarana, publicada em 1951, pela Livraria José Olympio, sua nova editora. Mas Rosa também ressalta sua dedicação aos estudos nesse período (como a leitura cuidadosa de Homero, Dante, La Fontaine, em 1949-1950), que o impedem de trabalhar mais “literariamente”. É igualmente possível que “Meu tio o Iauaretê” e “A simples e exata estória do burrinho do comandante” tenham sido elaborados (ou esboçados) logo depois da viagem do escritor pelo Pantanal mato-grossense (julho de 1947). Nesse caso, seriam coetâneos de “Com o vaqueiro Mariano”. É o que sugerem os desenhos feitos por Rosa durante essa viagem. Primeiro, porque foram arquivados na mesma pasta que contém estudos e esboços de textos destinados a integrar Ave, palavra – livro que reúne um conjunto de peças relativas ao Pantanal: “Sanga puytã”, “Cipango”, “Uns índios – sua fala” e “Ao pantanal”. Segundo, porque os desenhos parecem ter sido arrancados das cadernetas que o escritor levava consigo durante a viagem. São feitos a lápis, em folhas lisas, pautadas ou quadriculadas, que foram recortadas e coladas em folhas de papel ofício (frente e verso). Ainda que não estejam datados101, quase todos possuem legendas que atestam sua relação com a viagem pelo Pantanal. Alguns mencionam a fazenda Firme (onde Rosa passou alguns dias e conheceu o vaqueiro Mariano, personagem da “entrevista-retrato”, escrita logo após a viagem), como o desenho de um perfil de montanhas, com uma árvore

216


em primeiro plano, intitulado “Vista do poente: (Do pátio, i.e., da frente da fazenda Firme)”. Também há dois mapas da Nhecolândia (um deles com a localização da fazenda Firme), algumas vistas panorâmicas (com indicação de cores: montanhas azuis, céu rosa etc.) e vários pequenos desenhos: um casebre, uma fazenda, uma árvore com pássaros, dois touros brigando, uma carreta paraguaia, uma cerca, um curral tipo “australiano” (detalhado), garças nas árvores (vistas de longe) e uma grande lista dos sinais e marcas (desenhados) de várias fazendas da região (Firme, Paraíso, Cáceres, Santa Filomena, do Lelengo etc.). Rosa também fez o desenho detalhado de uma azagaia, com o nome de cada uma de suas partes – resultado provável de uma de suas conversas com caçadores de onças do Pantanal, conforme relatou em carta ao pai: A qualquer momento, pode-se avistar uma onça. Se a gente quer caçar uma onça e dispõe de três dias, o sucesso é garantido. Conversei com diversos “zagaieiros” – caçadores bambas de onças, que manejam espetacularmente a longa azagaia. Um desses azagaieiros, o preto Marcão, já esteve até nos Estados Unidos. Ele era o auxiliar do grande caçador de onças Sascha Siemel [...].102 Os últimos desenhos da série (nas duas últimas páginas) não retratam o Pantanal, mas nos remetem a um ambiente marinho. Numa página, há navios, baleias e gaivotas; noutra, dois desenhos minuciosos de um burrinho: sentado em frente a um homem, cada um em sua cadeira, como se estivessem conversando; içado por um pau-de-carga. Tais desenhos são esboços pictóricos de “A simples e exata estória do burrinho do comandante”, onde um burro, “saído do mar”, é içado para dentro de um navio. Ao contrário de “Com o vaqueiro Mariano” e “Meu tio o Iauaretê”, não é possível afirmar que esta novela tenha uma relação direta com a viagem pelo Pantanal. Mas também não se pode excluir a possibilidade de Rosa ter imaginado a estória do burrinho durante a viagem, ou mesmo que tenha ouvido algum relato inspirador sobre o comandante de um navio... Estaria lendo Joseph Conrad? Arquivados juntos, tais desenhos sugerem que “Meu tio o Iauaretê”, “Com o vaqueiro Mariano” e “A simples e exata estória do burrinho do coman-

217


dante” foram concebidos na mesma época, e evidenciam um traço comum entre eles: o esboço pictórico como um momento de seu processo de elaboração. No caso do burrinho, seriam os desenhos o ponto de partida da estória, ou só foram elaborados depois? Vinte anos mais tarde, Rosa decidiu reunir essas três peças no livro que estava preparando quando faleceu, em 1967: Estas estórias. Deixou vários esboços de índices com sugestões para o ilustrador, entre elas o desenho de um burrinho conversando com o comandante... De qualquer forma, não temos (ainda) evidências concretas para datar as duas novelas. Apenas podemos dizer que foram escritas entre julho de 1947 (viagem ao Pantanal) e 1951 (considerando-se a informação de que “já estavam escritas havia uns dez anos” quando foram publicadas, em 1960-61). O que não exclui a possibilidade (provável) de terem sido retrabalhadas ou retocadas ao longo dos dez anos em que permaneceram em repouso, especialmente na véspera de serem publicadas na revista Senhor. Paulo Rónai também nos fornece uma informação curiosa a respeito de “Meu tio o Iauaretê”. Guimarães Rosa fez questão de sublinhar que ela antecede o romance de 1956: “Segundo anotação manuscrita do Autor, constante do original datilografado, esta novela é anterior ao Grande sertão: veredas.”103 A relação entre a forma narrativa do romance, da novela e da “entrevista-retrato” parece ser a chave para entendermos sua preocupação em estabelecer, não uma data, mas a precedência da novela. É na entrevista com Mariano (1947-1948) que Rosa começa a trabalhar o lugar de um interlocutor que nunca fala mas se faz presente, inserido na fala do narrador por meio de interpelações e respostas a hipotéticas perguntas. É o que se vê ao longo do relato de Mariano: – Medo? Se tive. [...] Eu? Então eu vi que o cavalo tinha escapado sem-vergonha. [...] Gado só? O senhor acredite, lá na baía já tinham amanhecido outros bichos. [...] – ... E, ia esquecendo de contar, a nossa situação ainda era pior do que o senhor está pensando. [...] – ...Um estava no inferno, nas profundas, por relancear que se ti-

218


nha de fazer outra vez a travessia daquela campina inteira, vendo o fogo pular corda. [...] A força de Riobaldo é tão grande que, depois de Grande sertão: veredas, encontramos sua presença na fala de Mariano ou do sobrinho da onça. Ao que tudo indica, o achado narrativo de “Meu tio o Iauaretê” (escrito entre 19471951) e Grande sertão: veredas (entre 1954-1955) é um desdobramento da forma narrativa de “Com o vaqueiro Mariano” (de 1947). Mas é na novela e no romance que se realiza plenamente a posição insólita de um narrador que se dirige a um interlocutor silente.104 É bem possível que “Meu tio o Iauaretê” seja a novela desconhecida que faria parte daquele “livrão” com “nove novelas labirínticas”, tal como planejado por Guimarães Rosa, em 1953. Sua exclusão do “livro de novelas”, e seu repouso até 1961, quando finalmente é entregue ao público, poderiam ser explicados por seus traços comuns com o romance. Como já foi aventado por Walnice Galvão, é provável que Rosa não quisesse repetir o grande achado narrativo de Grande sertão: veredas, o que diminuiria a sua força e impacto.105 “Oficina aberta” Se Corpo de baile e Grande sertão: veredas foram escritos entre 1953-1955, no entanto seu período de elaboração é muito maior e compreende as publicações em periódicos e os documentos inéditos que lhes serviram de base, como o diário de Rosa em Paris, suas cadernetas de viagem, cadernos de estudos, anotações de leitura e de visitas a museus, zoológicos e aquários. Sob o título de “Via e viagens” procurei reunir as publicações de Guimarães Rosa que possuem uma relação direta com suas viagens e escritos produzidos entre 1946-1956. A dificuldade de classificá-las evidencia seu caráter de exercícios narrativos que experimentam dicções heterogêneas, alternando prosa e poesia, lírico e discursivo, romanesco e ensaístico. Neles, acompanhamos as incursões do escritor rumo ao mundo dos vaqueiros e dos animais, e suas recorrentes tentativas de deslocar a perspectiva, ensaiando ver o mundo a partir de outros pontos de vista, humanos e não-humanos106, bem como seu empenho em captar a matéria vertente das coisas e seus ambíguos contornos, como nu-

219


vens, tonalidades ou pássaros em vôo. Tais escritos são fundamentais para se compreender a configuração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas – e são uma via de mão dupla para tais livros. O recenseamento de dados biobibliográficos precisos, de citações, detalhes e notas seguiram um rigoroso critério seletivo, visando acumular evidências, muitas delas inéditas, fundamentais para a reconstituição do processo de elaboração dos livros de 1956. Sobretudo para sustentar a hipótese de que as sete novelas do Corpo de baile, o romance Grande sertão: veredas e a novela “Meu tio o Iauaretê” integravam um mesmo projeto de escrita, e deveriam ser repensados sob esta perspectiva.

220


NOTAS 1 Ver DOYLE, Plínio. “Contribuição à bibliografia de e sobre João Guimarães Rosa”. In: VÁRIOS AUTORES. Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, pp. 193-255. 2 No IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Série Estudos para a Obra, o “Documento E17” (75 páginas, dat.), intitulado Dante, Homero, La Fontaine, também inclui a seção “Artes”. A maior parte do caderno é dedicada à leitura da Ilíada, com 33 páginas (Odisséia, 2 páginas; Divina Comédia, 20 páginas; Fábulas, 7 páginas; “Artes”, 12 páginas). 3 No caderno “Artes”, JGR registra seis visitas a museus: duas ao Louvre (pp. 63-64); duas ao Jeu de Paume (pp. 65 e 75); uma ao Trocadéro (Exposição sobre “Arte Medieval Iugoslava”; pp. 66-67); uma ao Museu de l’Orangerie (Exposição sobre “Paisagistas Holandeses”; pp. 68-70). 4 Apenas estes últimos foram consultados no Arquivo-Museu de Literatura Brasileira (AMLB), da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB/RJ), e no Acervo Henriqueta Lisboa do Acervo de Escritores Mineiros (Fale/BU/UFMG). 5 Este ensaio é uma versão do capítulo I da minha tese de doutorado: MARTINS COSTA, Ana Luiza. João Guimarães Rosa: viator. Tese de doutorado em Literatura Comparada. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), 2002. 6 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a seu tio Vicente”. Rio de Janeiro, 11.05.1947. In: GUIMARÃES, Vicente. Joãozito: infância de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio/MEC, 1972. Rosa escreve ao tio (autor de livros infantis) rebatendo as críticas que ele havia feito a “Histórias de fadas”, sua primeira publicação (inédita) após Sagarana (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20.04.1947. Republicada em GUIMARÃES ROSA, João. Ave, palavra. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970). 7 Ver, por exemplo ARRIGUCCI JR., Davi. “O mundo misturado – Romance e experiência em Guimarães Rosa”. Novos Estudos Cebrap. São Paulo, n. 40, nov. 1994. Especialmente no item “As formas da mistura. Linguagem”. 8 É o que Riedel observa , a propósito da prosa experimental modernista. RIEDEL, Dirce Cortes. “O modernismo na ficção. II. Experimentalismo.” In: COUTINHO, Afrânio (dir.). A literatura no Brasil. Rio de Janeiro: Global, 1999, v. 5, pp. 289-329. 9 LEITE, Ascendino. “Arte e céu, países de primeira necessidade...”. Entrevista com João Guimarães Rosa. O Jornal, Rio de Janeiro, 26.05.1946. Republicada em LIMA, Sônia M. van Dijck (org.). Ascendino Leite entrevista Guimarães Rosa. João Pessoa: UFPB, 1997. Mas é somente em 1964, depois dos livros de 1956 e de Primeiras estórias, e em diálogo com as análises críticas de sua obra, que JGR se permite falar abertamente dos escritores modernistas, especialmente de Mário de Andrade (GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Mary Lou Daniel”. Rio de Janeiro, 03.11.1964): “polêmico, ligado a um Movimento, [Mário] partiu de um desejo de ‘abrasileirar’ a todo custo a língua, de acordo com postulados que sempre achei mutiladores, plebeizantes e empobrecedores da língua, além de querer enfeiá-la, denotando irremediável mau gosto. Faltava-lhe, a meu ver, finura, sensibilidade estética. Apoiava-se na sintaxe popular – filha da ignorância, da indigência, e que leva a frouxos alongamentos, a uma moleza sem contenção (ao contrário, procuro a condensação, a força, as cordas tensas). Mário de Andrade foi capaz de perpetrar um ‘milhor’ (por melhor) – que eu só seria capaz de usar com referência a ‘milho’. (Em todo o caso, adorei ler o ‘MACUNAÍMA’, que, na ocasião, me entusiasmou. Será que há influências sutis, que a gente mesmo é incapaz de descobrir em si?).” Com certeza. Leitor atento de Mário, Rosa chega a fazer algumas correções a lápis em contos de seu exemplar de Contos novos (consultado na Biblioteca Pessoal de JGR, IEB/USP). 10 COUTINHO, Eduardo. “Guimarães Rosa e o processo de revitalização da linguagem”. In Guimarães Rosa. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1991, p. 228. 11 NUNES, Benedito. “De Sagarana a Grande sertão: veredas”. In Crivo de papel. 2. ed. São Paulo: Ática, 1998, pp. 249-250. 12 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Mary Lou Daniel”. Rio de Janeiro, 03.11.1964. 13 LEITE, Ascendino. Op. cit. 14 ARRIGUCCI JR., Davi. Op. cit., pp. 7-29. 15 LEITE, Ascendino. Op. cit. 16 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Maurício Caminha de Lacerda”, s/d. 17 Rosa chega a dizer que aprendeu algumas línguas estrangeiras “apenas para enriquecer a minha própria e porque há demasiadas coisas intraduzíveis, pensadas em sonhos, intuitivas, cujo verdadeiro significado só pode ser encontrado no som original” (LORENZ, Günter. “Diálogo com Guimarães Rosa”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983, p. 87). 18 ARRIGUCCI JR., Davi. Op. cit., p. 13. 19 LORENZ, Günter. Op. cit, p. 87. 20 Ver GUIMARÃES ROSA, João. “Pequena palavra” (Prefácio). In: RÓNAI, Paulo (seleção, tradução, introdução e notas). Antologia do conto húngaro. 3. ed. Rio de Janeiro: Artenova, 1975, pp. XI-XXVIII. Escrito logo após a publicação dos livros de 1956, é neste texto que Rosa discute a tarefa do tradutor e expõe alguns aspectos fundamentais de sua poética. 21 “Nautikon”, termo grego relativo à navegação ou aos navegadores, náutico, naval (adjetivo neutro). No IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa possui apenas uma cópia datilografada de várias passagens do “Nautikon”, com alguns dias em seqüência, outros não, preservada em duas pastas da Série “Estudos para a Obra”: Pasta E3 (1) – França-Paris (registra o período de 04.11.1948 a 18.04.1950, pp. 1-54) e Pasta E3 (2) – França (dia 18.04.1950 a 18.02.1951, pp. 55-121). Assim como o “Diário em Paris”, os originais do “Diário em Hamburgo” (1938-1942) nunca foram localizados, apenas uma cópia xerográfica, preservada no Acervo Henriqueta Lisboa, do Acervo de Escritores Mineiros (Fale/BU/UFMG). 22 Para uma análise do “Nautikon”, ver LARA, Cecília de. “João Guimarães Rosa na França: anotações do ‘Diário de Paris’”. Travessia. Florianópolis, n. 16, 1988-1989, pp. 221-233. 23 GUIMARÃES ROSA, João. “Diário em Paris”. 11.02.1951. IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Pasta E3 (2) – França, p. 119. 24 Entrevistas realizadas em 1996-1997 para o documentário Os nomes do Rosa. Direção de Pedro Bial. Roteiro e pesquisa de Ana Luiza Martins Costa e Raul Soares. GNT, 1997. 25 SCHMIDT, Augusto Frederico. “A saga de Rosa”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 18.01.1952. 26 BARROS, Manoel de. “Pedras aprendem silêncio nele” (Entrevista). In Gramática expositiva do chão (Poesia quase toda). 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992, pp. 323-343.

221


27 Entrevista para o documentário Os nomes do Rosa, realizada em Berlim, fevereiro de 1997. 28 CALÁBRIA, Mário. Memórias: de Corumbá a Berlim. Rio de Janeiro: Record, 2003, p. 364. 29 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Harriet de Onís”. 23.04.1959. Harriet traduziu para o inglês Sagarana e também Grande serão: veredas (este último com James L. Taylor). Sagarana foi revisto ao longo de 12 anos, entre 1946 (1. ed.) e 1958 (5. ed., retocada. Forma definitiva). A “versão primitiva” do livro, o volume “Contos”, data de 1937. JGR retrabalhou o livro durante 21 anos, numa “longa e paciente depuração” – a expressão é de Graciliano Ramos, referindo-se apenas à transformação de “Contos” em Sagarana, que levou cerca de 8 anos (RAMOS, Graciliano. “Conversa de bastidores”. In VÁRIOS AUTORES. Op. cit., p. 45). 30 Entrevista com dona Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu) para o documentário Os nomes do Rosa (Rio de Janeiro, novembro de 1996). 31 LEONEL, Maria Célia de Moraes. “Guimarães Rosa: do arquivo à obra”. Scripta. Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998, p. 236. As inúmeras listas de palavras e sintagmas que povoam o Arquivo de JGR, via de regra, não tinham um destino imediato, mas abasteciam o escritor sempre que necessário, como um estoque permanente, constantemente ampliado, trabalhado e retrabalhado (cf. GALVÃO, Walnice Nogueira. “As listas de Guimarães Rosa”. In II encontro de edição crítica e crítica genética: eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH/USP, 1990, pp. 135-150). 32 Depoimento de JGR a Pedro Bloch. RÓNAI, Paulo. “João Guimarães Rosa, uma unanimidade” (Depoimentos de amigos). In: GUIMARÃES ROSA, João. Rosiana – Uma coletânea de conceitos, máximas e brocados de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Salamandra/MPM Propaganda, 1983, pp. 91-92. 33 Cf. ROCHA, Marília Librandi, “Grande sertão, de Rosa” (Entrevista com João Adolfo Hansen). O Estado de S.Paulo, 07.05.2000. Hansen traça paralelos entre o trabalho de linguagem de “dois grandes experimentadores”: “Rosa quer reescrever a língua e fazer falar algo que nunca falou ou vai falar. Clarice Lispector tem esse dispositivo que chama a Coisa, um neutro radical, um indizível que nela é um inconformismo muito grande com os papéis imaginários ou com a unidade imaginária da pessoa, e ela tenta dissolver, fazendo falar o que seria uma outra vida etc. Esse indizível é o que a literatura moderna persegue: dizer o entre, o interstício, o que não tem forma nem voz nem discurso autônomo. Daí Clarice também confinar com a bestice, o nonsense, como em A hora da estrela [...] São autores inconformados com o próprio meio de expressão. Eles não acreditam que o meio é suficiente, então sempre vão escrevendo uma estória dupla, uma estória sobre um assunto qualquer, mas é uma estória sobre a linguagem que estão usando – linguagem levada por eles para aquém do que ela nomeia e para além do que ela significa. [...] Foram capazes de levar adiante essa experiência de radicalizar o próprio meio de trabalhar a língua [...] É não aceitar os meios oferecidos e não achar que eles são naturais. É desnaturalizar. É como aquela idéia de Kafka, que dizia que é preciso escrever como um cachorro escreve.” 34 Uma metamorfose “vista por dentro, de um ponto de vista lingüístico, intrínseco”. CAMPOS, Haroldo de. “A linguagem do iauaretê”. In Metalinguagem & outras metas. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 1992, p. 63. Para Luiz Costa Lima, esse é um exemplo de “mímesis da produção”, que “supõe a extrema dificuldade da comunicação do texto ficcional”, na medida em que é capaz de “engendrar, passo a passo com sua criação, um real apenas minimamente ancorado em um dado referencial”. COSTA LIMA, Luiz. Mímesis e modernidade: formas das sombras. Rio de Janeiro: Graal, 1980, p. 222. 35 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Mary Lou Daniel”. 11.07.1964 36 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 09.02.1956. 37 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 27.10.1945. 38 Idem. “Carta de JGR ao pai”. Rio de Janeiro, 06.11.1945. 39 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 20.12.1945. 40 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 08.01.1947. 41 Idem. “Carta de JGR ao pai”. Rio de Janeiro, 26.03.1947. 42 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 27.03.1947. 43 Idem. “Carta de JGR a Álvaro Lins”. Paris, dez. 1949. Publicada no jornal Folha de S.Paulo (04.06.1995). No IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Seção “Recortes” (R2, p. 71), há uma “nota solta de jornal” (s/n) sobre “Flagrantes de escritores”, anunciando, em janeiro de 1949, que JGR estaria “trabalhando num romance” (cf. HAZIN, Elizabeth. No nada, o infinito:da gênese do Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991, p. 49). Mas essa é uma notícia publicada no Brasil, que não parece muito afinada com o momento vivido por JGR em Paris, mais estudando que escrevendo. 44 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Paris, 29.05.1950. 45 No IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Seção “Recortes” (R2, p. 83), HAZIN (Op. cit., 1991, p. 49) encontra outra nota solta de jornal, “sem referência alguma”, publicada “certamente por volta de 1951”: “Anuncia-se ainda que Guimarães Rosa está escrevendo um romance”. Hazin acha “bem provável que a referência diga respeito a A fazedora de velas, romance abandonado pelo escritor, segundo motivos expostos em um de seus prefácios a Tutaméia”. No entanto, de acordo com tal prefácio (“Sobre a escova e a dúvida”, item VI), o autor que ali se apresenta teria começado a escrever (e abandonado) A fazedora de velas por volta de 1957. 46 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Mário Calábria”. Rio de Janeiro, 07.12.1953. 47 SEM ASSINATURA. “Volta de Guimarães Rosa”. Visão. Rio de Janeiro, 23.07.1954, seção “Livros”. Apud HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 1991, p. 48. Na verdade, o “silêncio” do escritor não foi tão grande assim, pois ele publicou um pequeno livro em 1952, numa tiragem de apenas 110 exemplares: Com o vaqueiro Mariano (que já havia saído no Correio da Manhã, Rio de Janeiro, dividido em 3 partes, em 1947-1948), com 52 páginas, ilustração de Darel Valença Lins (Niterói: Hipocampo; republicado em Estas estórias). Ainda que esquecido pela crítica, este é, na verdade, o segundo livro de JGR, publicado entre Sagarana e os livros de 1956. 48 GALVÃO, Walnice Nogueira. Op. cit., 1990, pp. 136. 49 Apud HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 1991, p. 59. A autora também entrevistou Franklin de Oliveira (Rio de Janeiro, jan. 1986): “[ele] reforça tal hipótese, ao afirmar ‘com certeza absoluta’ que o original em mãos de Aracy, viúva do autor, é mesmo a primeira versão do livro. Amigo íntimo de Guimarães Rosa, seu comensal todos os sábados, acompanhou passo a passo o desenvolvimento do primeiro rascunho do Grande sertão: veredas.” 50 Segundo Cecília de Lara, que assina a “Introdução” da edição crítico-genética do romance (ainda inédita), “o primeiro título da obra,

222


51 52 53

54 55 56 57 58 59 60

61 62 63 64

65

66 67

68

69

70 71

datilografado e rasurado, foi a expressão que se tornaria subtítulo: o diabo na rua, no meio do redemoinho, seguida de um segundo título, manuscrito e rasurado: Veredas mortas. O definitivo, tal como o conhecemos, só aparece [...] na página de rosto do Segundo rascunho (R2).” (LARA, Cecília de. “Grande sertão: veredas, processos de criação”. Scripta. Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998, p. 42). Ver ainda os trabalhos de NASCIMENTO, Edna Maria Fernandes dos Santos “Descrições das duas primeiras edições e do ‘Segundo rascunho’ de Grande sertão: veredas”. In II encontro de edição crítica e crítica genética: eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH/USP, 1990, pp. 151-155; LEONEL, Maria Célia de Moraes. “O ‘Primeiro rascunho’ de Grande sertão: veredas”. In II encontro de edição crítica e crítica genética: eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH/USP, 1990, pp. 123-128; e HAZIN, Elizabeth. “No nada, o infinito: da gênese do Grande sertão: veredas. João Guimarães Rosa”. Il Che delle cose”. In: LANCIANI, Giulia (org.) Roma: Bulzoni, 2000, pp. 135-176. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 03.08.1955. DANIEL, Mary Lou. João Guimarães Rosa: travessia literária. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968. Segundo HAZIN, Elizabeth (Op. cit., 2000, pp.148-153), R2 tem cerca de 100 páginas a mais que R1, e foi datilografado em máquina diferente. R2 é uma cópia em papel carbono, cujo original foi entregue à editora, para fins de publicação: “o que se denomina terceiro rascunho (R3) do romance não é mais do que o original da cópia carbono” (“idêntico, de início, a R2, mas apresentando alterações posteriores”). GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR ao pai”. Rio de Janeiro, 09.12.1955. HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 2000, pp. 135-176. Além de rever as provas, JGR fez inúmeras correções e alterações, como a substituição da palavra “FIM” pelo símbolo do infinito que ocorreu na Segunda Prova Tipográfica do romance (cf. HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 2000, p. 155). GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 09.02.1956. Relato de dona Aracy Moebius de Carvalho, publicado em CAVALCANTI, Gilberto. “Breve conversa sobre Guimarães Rosa”. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 20.06.1965. Apud HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 1991, p. 59. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Harriet de Onís”. 23.04.1959. Rosa adoeceu gravemente no final de 1958: teve um enfarte e foi obrigado a cuidar da saúde, emagrecer e parar de fumar (não sem recaídas), o que talvez explique sua decisão de não mais mexer no romance, a partir da segunda edição (texto definitivo), que data, justamente, de 1958. A quinta edição retocada (forma definitiva) de Sagarana também data de 1958. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Maurício Caminha de Lacerda”. S.d. No que diz respeito a Sagarana, Rosa revela ter escrito o livro “em sete meses de exaltação, de deslumbramento” (GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a João Condé”. 21.07.1946). Entrevista com Benedito Nunes para o documentário Os nomes do Rosa, realizada no Palácio do Itamaraty (RJ), em novembro de 1996. DANTAS, Paulo. Sagarana emotiva. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1975, p. 28. Segundo alguns levantamentos sobre a obra de JGR, o romance foi publicado em “maio” de 1956: PEREZ, Renard. “Perfil de João Guimarães Rosa”. In VÁRIOS AUTORES. Op. cit., p. 33; LIMA, Sonia van Dijck. “João Guimarães Rosa: cronologia de vida e obra”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996, p. 252. Mas outros trabalhos registram o “dia 17 de julho de 1956” como sua data efetiva de lançamento: HAZIN, Elizabeth, Op. cit., 1991, p. 47; COVIZZI, Lenira Marques. “Grande sertão: veredas, no Brasil, em dias de época”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa II. Segundo seminário internacional Guimarães Rosa (2001). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2003, pp. 402-405. Entrevista realizada por mim para o documentário Os nomes do Rosa (Rio de Janeiro, novembro de 1996). A mesma informação está presente num artigo de Mauritônio Meira, publicado no dia 17.07.1956, “data de lançamento do romance”: “Este livro tem uma história. Guimarães Rosa estava escrevendo Corpo de baile [...] um dos contos começou a crescer, crescer [...] Transformou-se em novela. A novela, por sua vez, foi tomando corpo [...] resultado: a novela se transformou em romance.” (IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Série “Recortes”, Pasta R4(9), p. 1, apud HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 1991, pp. 47-48). Para um levantamento detalhado das viagens, estudos e escritos de JGR, realizados entre 1945-1956, consultar, nesta revista, o texto “Veredas de Viator”. Em novembro de 1947, Rosa recebe uma carta de Alexandre Barbosa (Rio de Janeiro, 15.11.1947), fazendeiro de Curvelo (MG), que relata as façanhas de um dos vaqueiros de sua fazenda, o “Bôca-de-fogo”, inspirado pela leitura de “Com o vaqueiro Mariano”, recémpublicado (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 26.10.1947). A partir dessa carta, Rosa começa a preparar um texto intitulado “Com o vaqueiro Bôca-de-fogo” (IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Pasta 34 (1), “Inéditos I”, pp. 2-5), tentando reproduzir o seu modo de falar, seguindo os moldes de “Com o vaqueiro Mariano”. Rosa deixou três relatos parciais da viagem de 1952 (datilografados e sem data): “A saída (01.05.1952)” (2 páginas) e “A boiada”, com três subtítulos: “Na Sirga”, “Entrada” e “Os campos-gerais” (3 páginas), ambos preservados no IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa (Pasta E26); e um outro texto também intitulado “A boiada”, mas com conteúdo diferente (13 páginas), preservado por dona Aracy. 15 anos depois, em 1967, no jornal Pulso (Rio de Janeiro), Rosa publica dois relatos parciais da viagem de 1952, que reproduzem passagens dos inéditos “A saída” e daqueles dois textos diferentes, intitulados “A boiada”: “Sobre os planaltos” (04.03.1967) e “Caderno do Zito” (18.03.1967), posteriomente reunidos, com algumas alterações, no item VII do prefácio “Sobre a escova e a dúvida”, de Tutaméia. Em julho de 1949, em carta a Pedro Barbosa (Paris, 19.07.1949), dono da Fazenda Pindaíbas (MG), JGR diz que está escrevendo a “biografia romanceada” de um de seus empregados, o Mechéu, sujeito meio “bocó”, que ajudava na cozinha, cuidava dos porcos e da lenha. A carta-resposta de Pedro (Rio de Janeiro, 15.08.1949) contém uma detalhada descrição de Mechéu, que será utilizada na redação de conto homônimo, publicado muitos anos depois, no jornal Pulso (Rio de Janeiro, 21.01.1967; republicado em GUIMARÃES ROSA, João. Tutaméia. Rio de Janeiro: José Olympio, 1967). Como veremos, esta novela foi engendrada a partir da viagem de JGR pelo Pantanal, em 1947. Escrita antes do romance, foi publicada na revista Senhor (Rio de Janeiro, 25.03.1961; republicada em GUIMARÃES ROSA, João. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969). Vide a relação completa das publicações no Anexo I. Nessas 23, estou contando apenas uma vez as republicações de “A senhora dos segredos” (em 1953 e 1954) e “Os doces” (em 1954), bem como as três partes de “Com o vaqueiro Mariano”. O número pode cair

223


72 73 74 75 76

77 78 79 80

81

82 83

84 85 86 87 88 89

90 91

92 93

para 22, excluindo-se “São Marcos” (republicação de um conto de Sagarana). RÓNAI, Paulo. “Em véspera do livro Ave, palavra, de JGR”. 4 páginas mimeografadas, s./d. Consultado no Arquivo Paulo Rónai (Sítio Pois É, Nova Friburgo-RJ). Ibidem. Ver os Anexos II e III. Dessas 49 peças, 3 eram inéditas, 29 foram publicadas entre 1957 e 1967, 18 entre 1947 e 1954 (na verdade, 17, porque as duas publicações “Do diário em Paris” foram reunidas numa só). Este livro acabou sendo editado por Geraldo Jordão (filho de José Olympio), em 1983 (Rio de Janeiro: Salamandra/Ipiranga). Edição comemorativa dos 75 anos do autor, fora do comércio e dificílima de ser encontrada (é uma raridade de bibliófilos). RÓNAI, Paulo. Op. cit., s.d. Ainda segundo Rónai (“Nota Introdutória”. In GUIMARÃES ROSA, João. Ave palavra. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970): “Em adendo 5 crônicas, das quais 4 já publicadas em jornais, foram acrescentadas a este volume, embora não tivessem sido a ele destinadas pelo Autor. Faziam parte, ou melhor, eram o indez, segundo expressão mesma de GR, de um ‘livrinho’ que se chamaria Jardins e riachinhos: ‘Jardim fechado’, ‘O riachuelo Sirimim’, ‘Recados do Sirimim’, ‘Mais meu Sirimim’ (inédito), e ‘As garças’.” Se ainda excluirmos, das 49 peças, os 5 poemas anagramáticos de JGR, que formam outro bloco à parte (3 publicados originalmente em 1961, no jornal O Globo; e 2 inéditos), teríamos um número ainda mais significativo: 20 em 44. Vide Anexo II: relação das 18 publicações de 1947-1954 que integram Ave, palavra, dez das quais remetem às viagens e documentos inéditos de 1938-1952. Vide Anexo III: relação das 29 publicações de 1957-1967 que integram Ave, palavra, dez das quais remetem às viagens e documentos inéditos de 1938-1952. Republicado em Ave, palavra, “O burro e o boi no presépio” foi lançado em livro, em 1983 (Rio de Janeiro: Salamandra), numa edição bilíngüe (inglês/português), com ilustrações coloridas (reproduções dos quadros descritos por JGR nos poemas). Nota de Geraldo Jordão Pereira (editor). Prefácio de Geraldo França de Lima. (Edição especial e fora do comércio). Como organizador de Ave, palavra, Paulo Rónai escreveu três artigos que explicitam os critérios de organização do livro e comentam algumas de suas peças: “Em véspera do livro Ave, palavra, de JGR” (Op. cit., s.d.); “Nota introdutória” (Op. cit., 1970); e “Uma mensagem para cada leitor” ((artigo de jornal, s.n., 27.06.1971). Consultados no Arquivo Paulo Rónai (APR), no Sítio Pois É (Nova Friburgo-RJ). Material que me foi gentilmente cedido para consulta por dona Nora Rónai, sua viúva, Cora e Nora, suas filhas, a quem muito agradeço. Cf. RÓNAI, Paulo. Op. cit., 1970. “Moxinifada” (subst. fem.): mistura de comidas, bebidas, ingredientes etc.; qualquer mistura de coisas; miscelânea, mixórdia; qualquer tipo de confusão. Ver também “mexerufada” (subst. fem.): lavagem, comida de suíno; mistura confusa, desordenada, de seres ou coisas; confusão, misturada (HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001). Essa relação de títulos foi encontrada por Paulo Rónai na pasta com os manuscritos do livro, deixado inacabado pelo autor. RÓNAI, Paulo. Op. cit., s./d. IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Pasta E 33 (2), p. 4. GUIMARÃES ROSA, João. O último dos maçaricos. Tradução do livro Last of the curlews, de Fred Bodsworth. Versão condensada do texto. In Biblioteca de Seleções. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Ypiranga/Seleções do Reader’s Digest, v. 6, 1958. pp. 433-470. Depoimento de JGR a Pedro Bloch. Op. cit., p. 92. Na extensa fortuna crítica de JGR, há poucos estudos dedicados a Ave, palavra. Algumas análises tratam de um grupo de peças temáticas, como: BENAVIDES, Washington. “Los ‘Zoos’ de Guimarães Rosa.” Travessia, Florianópolis, n. 8, 1987, pp. 125-151; GALVÃO, Walnice Nogueira. “Heteronímia em Guimarães Rosa.” In Desconversa (ensaios críticos). Rio de Janeiro: UFRJ, 1998, pp. 83-95; SILVA, Francis da. “Poesia e alteridade em Ave, palavra.” In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa. Seminário Internacional Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2000, pp. 251-256; SOETHE, Paulo. “A imagem da Alemanha em Guimarães Rosa como retrato auto-irônico.” Scripta. Belo Horizonte, v. 9, n. 17, 2005, pp. 287-301. A maioria, no entanto, refere-se a peças isoladas, como: LARA, Cecília de. Op. cit.; ALMEIDA, Tereza Virginia de. “O inumano nas cartas de tarô: uma leitura de ‘Cartas na mesa’”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Op. cit., 2003, pp. 806-811. Há muitos estudos sobre “Fita verde no cabelo”, publicados em DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Op. cit., 2000: COUTINHO, Fernanda. “‘Fita verde no cabelo’ a perenidade do era uma vez.” (pp. 246-250); CARVALHO, Tida. “‘Fita verde no cabelo’, nova velha estória: entre a dor e o conhecimento – o prazer” (pp. 681-685); ANDRADE, Maria das Graças. “Tudo er(r)a uma vez” (pp. 428-433); LOPES, Vera. “‘Fita verde no cabelo’: uma rede de leituras” (pp. 686689). Ver também SOUZA, Enivalda. “Dom Quixote e ‘Fita verde’: uma viagem, duas travessias”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Op. cit., 2003, pp. 213-217. JONS, Vicent. João Guimarães Rosa. Boston: G.K. Hall & Co., 1978. O autor analisa todos os livros de JGR. Ave, palavra, que considera “um livro menor”, é tema do último capítulo (“Ave, palavra: the word itself ”). Este bloco de poesia é composto por (1) “Às coisas de poesia” (25.02 e 01.04.1961), de Soares Guiamar (segundo o autor, um poeta “despercebido, impresso, inédito, fora-de-moda – que queria livro, o Anagramas, e disse palpites: Ser poeta é já estar em experimentada sorte de velhice. Toda poesia é também uma espécie de pedido de perdão”); (2) “Novas coisas de poesia” (20.05.1961), de Meuriss Aragão (“Jovem, sem jeito, em sua primeira fase, provavelmente extinta”); (3) “Sempre coisas de poesia” (29.07.1961), de Sá Araújo Ségrim (“poeta comprido – é outro dos anagramáticos, de que hoje disponho. Se bem talvez um tanto discípulo de Soares Guiamar, sob leves aspectos, sofre só e sozinho verseja. Sei que pensa em breve publicar livro: o Segredeiro, e do supracitado é, às vezes, o que prefiro. Será que conosco concordam?”); (4) “Quando coisas de poesia” (inédito), de Sá Araújo Ségrim (que agradou e voltou); e (5) “Ainda coisas de poesia” (inédito), de Romaguari Sães (“o embevecido, escondedor de poemas”). Para uma análise da “Heteronímia em Guimarães Rosa”, ver GALVÃO, Walnice Nogueira. Op. cit., 1998, pp. 83-95. Ver também DOYLE, Plínio. Op. cit., pp. 210-211. Sob este título, o autor lista ainda os seguintes subtítulos: “Animal e palavra. Jardim zoológico. Zodião. Terioscopia. Filmagens. Estudos e exercícios”. IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Série “Manuscritos”. RAMOS, Graciliano. Op. cit., p. 45.

224


94

GALVÃO,

Walnice Nogueira. “O impossível retorno”. In Mitológica rosiana. São Paulo: Ática, 1978, p. 33. Ao analisar a metamorfose do onceiro em onça na novela “Meu tio o Iauaretê”, Galvão também destaca a capacidade do autor de fazer seu personagem “comungar com a natureza, com as plantas, com as onças, com cada pequeno ruído ou sinal”. Ainda sobre Ave, palavra, observa que vários textos “lidam muito diretamente com animais, como ‘Quemadmodum’, ‘As garças’, um e outro ‘Aquário’, ‘Ao pantanal’. Outros são do mesmo modo dedicados aos homens de sua terra, seja os vaqueiros de ‘Pé-duro, chapéu-de-couro’, seja os japoneses hortelãos de ‘Cipango’, seja, especialmente, ‘Uns índios (sua fala)’.” 95 RÓNAI, Paulo. “Uma mensagem para cada leitor”. Artigo de jornal, s.n., 27.06.1971. 96 GUIMARÃES ROSA, João. O Jornal, Rio de Janeiro, 28.12.1952. Republicado, com algumas alterações, em GUIMARÃES ROSA, João. Ave, palavra. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970. 97 Consultado na Biblioteca Pessoal de JGR (IEB/USP). Ver a análise das marcas de leitura de JGR em seu exemplar de Os sertões (BOLLE, Willi. “Guimarães Rosa leitor de Euclides da Cunha.” Revista de Literatura Brasileira. Porto Alegre, n. 20, pp. 9-41, 1998). 98 Ainda que não tenha sido publicado, sua capa, feita à mão pelo próprio Rosa, pode ser consultada na Biblioteca de José e Guita Mindlin (São Paulo), que adquiriram da Livraria José Olympio Editora todos os originais da obra de JGR. 99 Entre os papéis de JGR, Paulo Rónai (organizador do livro) encontrou, além da entrevista com Mariano, as oito novelas constantes de um dos índices: quatro já publicadas (na revista Senhor: “A simples e exata estória do burrinho do comandante”, abr. 1960; “Meu tio o Iauaretê”, mar. 1961; “A estória do homem do Pinguelo”, mar. 1962; e no livro Os sete pecados capitais, no capítulo de JGR sobre a soberba: “Os chapéus transeuntes”, de 1964); quatro inéditas: “Páramo”, “Bicho mau”, “Retábulo de são Nunca”, “O dar das pedras brilhantes” (cf. RÓNAI, Paulo. “Nota introdutória”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969, p. XIII-XIV). 100 GUIMARÃES ROSA, João. “Pequena palavra” (Prefácio). In: RÓNAI, Paulo (seleção, tradução, introdução e notas). Op. cit., 1975, pp. XIXXVIII. 101Apenas um desenho (o primeiro da série) está datado e assinado pelo escritor: 7 de março de 1947. Ou seja, este é anterior à viagem pelo Pantanal, realizada em julho, mas é do mesmo ano. 102 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR ao pai”. Rio de Janeiro, 25.11.1947. 103 RÓNAI, Paulo. “Nota introdutória”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969, p. XIII. 104O “monólogo em situação dialógica” ou “diálogo visto por uma face” (cf. SCHWARZ, Roberto. “Grande sertão: a fala” e “Grande sertão e Dr. Faustus”. A sereia e o desconfiado: ensaios críticos. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981, pp. 37-41). 105“Seria a exploração de um mesmo achado formal a explicação para o engavetamento? O brilhante feito de conseguir por uma fala que flui ininterruptamente da boca de um narrador, que é o outro? De fato, tanto o conto como o longo romance saem em forma de fala emitida por um narrador-protagonista. Em ambos os casos, o narrador-protagonista tem sua alteridade marcada com relação ao interlocutor que é homem da cidade e portador dos signos da urbanidade, nem sertanejo, num caso, nem meio-índio no outro. Evitando o contraste de discursos, o interlocutor nunca fala, mas é colocado na fala do outro por meio de interpelações e respostas a hipotéticas perguntas. Assim, a fala só indiretamente se dirige ao leitor, apesar de, em ambos os casos, ser um monólogo direto iniciado por um travessão: seu alvo é o interlocutor presente na situação criada, e só dali ela inflete na direção do leitor. Este, evidentemente, está colocado para cá do interlocutor, e recebe pela mediação deste monólogo a ele destinado. [...] Teriam estas coincidências sido observadas pelo autor, que não queria repetir-se?” (GALVÃO, Walnice Nogueira. Op. cit., 1978, p. 34). 106É o que observa Viveiros de Castro a respeito de “Meu tio o Iauaretê”: “Talvez seja a única descrição na literatura brasileira, o único caso em que você vê uma pessoa virando um bicho – o que não é de espantar, porque Guimarães sempre teve uma sensibilidade particular para o ponto de vista dos bichos. Ele tem vários textos assim, sobretudo no Ave, palavra. Ele ia para o Jardim Zoológico e para outros lugares, e ficava tentando ver as coisas como se fosse, ele mesmo, um bicho” (Entrevista para o documentário Os nomes do Rosa, realizada no Rio de Janeiro, novembro de 1996).

225


Anexo I PUBLICAÇÕES EM PERIÓDICOS E UM PEQUENO LIVRO ENTRE SAGARANA (1946) E OS LIVROS DE 1956 1947 “São Marcos”. Revista Vamos Ler!, Rio de Janeiro, n. 559, Ano 9, sábado, 19.04.1947, pp. 26-31 e 60-63 (conclusão). Ilustração de Jeronymo Ribeiro. Republicação de um conto de Sagarana (1946). Consultado na Fundação Casa de Rui Barbosa. “Histórias de Fadas”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.091, Ano 46, domingo, 20.04.1947, 2ª Seção, p. 1. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional. “Sanga Puytã”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.192, Ano 47, domingo, 17.08.1947, 2ª Seção, pp. 1 e 2. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional.

1947-1948 “Com o vaqueiro Mariano” (parte 1). Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.252, Ano 47, domingo, 2ª Seção, 26.10.1947, pp. 1 e 3 (conclusão). “Com o vaqueiro Mariano” (parte 2). Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.350, Ano 47, domingo, 2ª Seção, 22.02.48, pp. 1 e 3 (conclusão). “Com o vaqueiro Mariano III” (parte 3). Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.362, Ano 47, domingo, 2ª Seção, 07.03.1948, pp. 1 e 3 (conclusão). As três partes foram reunidas e publicadas em Estas estórias (1969), com o título “Entremeio: com o vaqueiro Mariano”, com algumas alterações (de or-

226


tografia e pontuação) e a supressão de um pequeno trecho da 1ª parte. Consultados na Biblioteca Nacional.

1948 “Cidade”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.344, Ano 47, domingo, 15.02.1948, 2ª Seção, pp. 1 e 3. Incluído em Ave, palavra (1970), com o título “Em-cidade”, com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional. “O mau humor de Wotan”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.356, Ano 47, domingo, 29.02.1948, 2ª Seção, pp. 1 e 3 (conclusão). Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional.

1951 “O lago do Itamaraty”. Seleções do Reader’s Digest, Rio de Janeiro, agosto. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Fundação Casa de Rui Barbosa.

1952 “A senhora dos segredos”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 18.317, Ano 52, sábado, 06.12.1952, 1º Caderno, p. 7. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional. “Pé-duro, chapéu-de-couro”. O Jornal, Rio de Janeiro, domingo, n. 10.018, Ano 33, 28.12.1952, Revista, p. 1. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações e a supressão de um trecho. Consultado na Biblioteca Nacional.

227


Com o vaqueiro Mariano. Niterói: Hipocampo, 52 pp. Ilustração de Darel Valença Lins. Geir Campos e Thiago de Mello (editores). Tiragem de 110 exemplares. Incluído em Estas estórias (1969). Consultado na casa de dona Maria Augusto de Camargos Rocha (Madu).

1953 “Terrae Vis”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 25.01.1953. Consultado na Biblioteca Nacional. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 289, Ano 7, domingo, 10.05.1953, p. 2. “Cipango”, Folha da Manhã, São Paulo, 17.02.1953. Consultado na Biblioteca Nacional. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 286, Ano 7, domingo, 12.04.1953, pp. 6 e 7 (conclusão). “A senhora dos segredos”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 284, Ano 7, domingo, 22.03.1953, p. 9. “Ao pantanal”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 05.04.1953. Consultado na Hemeroteca Histórica de Belo horizonte (Superintendência de Blibliotecas Públicas de Minas Gerais). Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 19.842, Ano 57, sábado, 1º Caderno (seção “Literatura”), 30.11.1957, p. 9. Consultado na Biblioteca Nacional. Jornal de Letras, Rio de Janeiro, n. 101-2, Ano 10, janeiro de 1958, p. 8. Consultado na Fundação Casa de Rui Barbosa. “Teatrinho”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 287, Ano 7, domingo, 19.04.1953, p. 9. “O homem de Santa-Helena”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 288, Ano 7, domingo, 03.05.1953, p. 9.

228


“Do diário em Paris”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 290, Ano 8, domingo, 17.05.1953, p. 2. “Fantasmas dos vivos”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 291, Ano 8, domingo, 24.05.1953, p. 2. “Os doces”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 292, Ano 8, domingo, 07.06.1953, p. 4. “Discurso de Posse na Sociedade Brasileira de Geografia”. Revista da Sociedade Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro. Os periódicos foram consultados na Fundação Casa de Rui Barbosa (A Manhã e Jornal de Letras) e na Biblioteca Nacional (Correio da Manhã, Folha da Manhã e Diário de Minas) e Hemeroteca Histórica de Belo horizonte (Diário de Minas). Com exceção de “Os doces”, que não foi republicado em livro, todas as demais publicações de 1953 integram Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Com exceção de “Ao pantanal”, os demais (8) foram publicados no suplemento “Letras e Artes” do jornal A Manhã, do Rio de Janeiro, de março a junho de 1953. Até o momento, não localizei o volume original da Revista da Sociedade Brasileira de Geografia (mas o “Discurso de Posse” está arquivado no IEB/USP, Fundo JGR, série “Recortes”).

1954 “A chegada de Subles”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 293, Ano 8, terça-feira, 06.04.1954, p. 9. “Do diário em Paris”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 294, Ano 8, terça-feira, 13.4.1954, p. 10. “Risada e meia”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 297, Ano 8, terça-feira, 04.05.1954, p. 8.

229


“Aquário (Nápoles)”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 298, Ano 8, 3ª feira, 11.05.1954, p. 5. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 19.869, Ano 57, sábado, 1º Caderno, 21.12.1957, p. 11 (seção “Literatura”). Consultado na Biblioteca Nacional. “A senhora dos segredos”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 299, Ano 8, terça-feira, 18.05.1954, p. 9. “Uns índios – sua fala”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 300, Ano 8, terça-feira, 25.05.1954, p. 9. “Os doces”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 301, Ano 9, terça-feira, 01.06.1954, p. 9. Todos (7) foram publicados no suplemento “Letras e Artes” do jornal A Manhã, entre abril e junho de 1954 (consultados na Fundação Casa de Rui Barbosa). “A senhora dos segredos” e “Os doces” já haviam sido publicados no jornal A Manhã, em 1953. Com exceção de “Os doces” e “Risada e meia”, os demais foram republicados em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. O título de “A chegada de Subles” foi alterado para “Subles”; o de “Uns índios – sua fala” para “Uns índios (sua fala)”. “Risada e meia” foi republicado em Tutaméia (1967) com alterações, acréscimos e com outro título: o prefácio “Aletria e hermenêutica”.

Anexo II PUBLICAÇÕES DE 1947-1954 QUE INTEGRAM AVE, PALAVRA, 1970 (com alterações)

1947 1 – “Histórias de fadas”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20.04.1947. 2 – “Sanga puytã”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 17.08.1947.

230


1948 3 – “Cidade”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 15.02.1948 (incluído com o título “Em-Cidade”, com pequenas alterações). 4 – “O mau humor de Wotan”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 29.02.1948.

1951 5 – “O lago do Itamaraty”. Seleções do Reader’s Digest, Rio de Janeiro, agosto.

1952 6 – “A senhora dos segredos”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 06.12.1952. 7 – “Pé-duro, chapéu-de-couro”. O Jornal, Rio de Janeiro, 28.12.1952 (incluído com pequenas alterações e a supressão de um trecho).

1953 8 – “Terrae vis”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 25.01.1953; A Manhã, Rio de Janeiro, 10.05.1953. 9 – “Cipango”. Folha da Manhã, 17.02.1953. 10 – “Ao pantanal”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 05.04.1953. 11 – “Teatrinho”. A Manhã, Rio de Janeiro, 19.04.1953. 12 – “O homem de Santa-Helena”. A Manhã, Rio de Janeiro, 03.05.1953. 13* – “Do diário em Paris”. A Manhã, Rio de Janeiro, 17.05.1953. 14 – “Fantasmas dos vivos”. A Manhã, Rio de Janeiro, 24.05.1953.

1954 15 – “A chegada de Subles”. A Manhã, Rio de Janeiro, 06.04.1954.

231


16* – “Do diário em Paris”. A Manhã, Rio de Janeiro, 13.04.1954. 17 – “Aquário (Nápoles)”. A Manhã, Rio de Janeiro, 11.05.1954. 18 – “Uns índios – sua fala”. A Manhã, Rio de Janeiro, 25.05.1954. Em negrito: dez publicações que remetem às viagens e documentos inéditos de Guimarães Rosa que datam de 1938-1952. * As duas publicações “Do diário em Paris” (1953 e 1954) foram reunidas numa só, em Ave, palavra.

Anexo III DEMAIS PUBLICAÇÕES (1957-1967) E INÉDITOS QUE INTEGRAM AVE, PALAVRA 1957 1 – “Dois soldadinhos mineiros”. Boletim da Biblioteca do Exército, abril de 1957. 2 – “Minas Gerais”. Manchete, 24.08.1957.

1961 3 – “De stella et adventu magorum”. O Globo, Rio de Janeiro, 07.01.1961. 4 – “Além da amendoeira”. O Globo, Rio de Janeiro, 21.01.1961. 5 – “Uns inhos engenheiros”. O Globo, Rio de Janeiro, 04.02.1961. 6 – “O grande samba disperso”. O Globo, Rio de Janeiro, 11.02.1961. 7 – “Homem, intentada viagem”. O Globo, Rio de Janeiro, 18.02.1961. 8 – “Coisas de poesia”. O Globo, Rio de Janeiro, 25.02.1961 e 01.04.1961 (republicado como “Às coisas de poesia”). 9* – “Zôo (Hagembecks-Tierpark, Hamburgo-Stellingen)”. O Globo, Rio de Janeiro, 11.03.1961; e Pulso, Rio de Janeiro, 29.04.1967. 10 – “Circo do miudinho”. O Globo, Rio de Janeiro, 25.03.1961.

232


11 – “Zôo (Rio, Quinta da Boa Vista)”. Pulso, Rio de Janeiro, 01.04.1967. 12 – “Zôo (Parc Zoologique du Bois de Vincennes)”. O Globo, Rio de Janeiro, 29.04.1961. 13 – “Novas coisas de poesia”. O Globo, Rio de Janeiro, 20.05.1961. 14 – “A velha”. O Globo, Rio de Janeiro, 03.06.1961. 15 – “A caça à lua”. O Globo, Rio de Janeiro, 17.06.1961. 16 – “Zôo (Jardin des Plantes)”. O Globo, Rio de Janeiro, 24.06.1961. 17 – “Sempre coisas de poesia”. O Globo, Rio de Janeiro, 22 [ou 29].07.1961. 18 – “Evanira”. O Globo, Rio de Janeiro, 26.08.1961 (republicado como “Evanira!”). 19 – “O burro e o boi no presépio”. Senhor, Rio de Janeiro, dezembro de 1961.

1964 20 – “Fita verde no cabelo (Nova velha estória)”. O Estado de S.Paulo, São Paulo, 08.02.1964.

1965 21 – “O porco e seu espírito”. Pulso, Rio de Janeiro, 12.06.1965. 22 – “Sem tangência”. Pulso, Rio de Janeiro, 24.07.1965. 23 – “Quemadmodum”. Pulso, Rio de Janeiro, 30.10.1965 [ou 1967].

1966 24 – “Cartas na mesa”. Pulso, Rio de Janeiro, 08.01.1966. 25 – “Nascimento”. Pulso, Rio de Janeiro, 24.12.1966.

1967 26 – “Aquário”. Pulso, Rio de Janeiro, 18.02.1967 [republicado como “Aquário (Berlim)”].

233


27 – “Zôo (Whipsnade Park, Londres)”. Pulso, Rio de Janeiro, 07.01.1967. * “Zôo (Hagembecks-Tierpark, Hamburgo-Stellingen)”. Pulso, Rio de Janeiro, 29.04.1967 (já publicado em O Globo, 11.03.1961). 28 – “Os abismos e os astros”. Pulso, Rio de Janeiro, 27.05.1967. 29 – “Reboldra”. Pulso, Rio de Janeiro, 10.06.1967.

Inéditos 30 – “Grande louvação pastoril à linda Lygia Maria” 31 – “Quando coisas de poesia” 32 – “Ainda coisas de poesia” Em negrito: dez publicações que remetem às viagens e documentos inéditos de Guimarães Rosa que datam de 1938-1952.

Inéditos de João Guimarães Rosa Contos (Sezão), mimeo, 1937. AGR/IEB/USP. “Diário em Hamburgo”. Cópia xerográfica. Acervo Henriqueta Lisboa, do Acervo de Escritores Mineiros (Fale/BU/UFMG). Pastas E3 (1) – “França-Paris” (pp. 1-54). AGR. Contém cópia de passagens do diário de JGR em Paris. Pastas E3 (2) – “França” (pp. 55-121). AGR. Contém cópia de passagens do diário de JGR em Paris. Pastas E1 (1) – “Europa” (57 pp.), dat. AGR. Pastas E1 (2) – “Europa” (112 pp.), dat. AGR.

234


Pastas E1 (3) – “Europa” (163 pp.), dat. AGR. Pasta E26 – “Notas da grande excursão a Minas” (20 pp.), “A saída” (2 pp.), “A boiada” (3 pp.). AGR. Pastas E 27 (1) (2) – “Boiada”. AGR. Pasta E28 – “A boiada 1”, dat., 80 pp. AGR. Pasta E29 – “A boiada 2”, dat., 77 pp. AGR. “Caderneta do sertão” (6), manuscrita, 31 pp. AGR. “A boiada”, dat., 13 pp. Consultado na casa de dona Aracy (SP). “Cadernetas da Europa” (1) (2) (3) (4) (5), manuscritas. AGR. Pastas E33 (1) (2) – Ave, palavra. AGR. Pasta 34 (1) – “Inéditos I”. AGR. Primeiro Rascunho (R1) de Grande sertão: veredas. Consultado na casa de dona Aracy Moebius de Carvalho, São Paulo (SP). Volume datilografado e encadernado. Segundo Rascunho (R1) de Grande sertão: veredas. Consultado na casa de dona Aracy Moebius de Carvalho, São Paulo (SP). Volume datilografado e encadernado.

235


Via e viagens: a elaboração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas Ana Luiza Martins Costa

O que João Guimarães Rosa escreveu ao longo dos dez anos que separam Sagarana (1946) de Corpo de baile e Grande sertão: veredas, lançados juntos em 1956? Como se deu o processo de elaboração desses dois livros? Na ampla bibliografia sobre a vida e obra do escritor não há nenhum trabalho que se detenha, especificamente, nesse período. O que parece estranho, pois sabemos que Guimarães Rosa publicou cerca de 23 escritos em periódicos do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte, entre 1947-1954, e até mesmo um pequeno livro, Com o vaqueiro Mariano, em 1952.1 A maior parte desses escritos – pequenos contos, relatos de viagens, notas de um diário, descrições de animais etc. – somente foi republicada, e com algumas alterações, nos livros póstumos Estas estórias (1969) e Ave, palavra (1970). No entanto, tais publicações nunca foram analisadas em conjunto e à luz da época em que foram concebidas. O mesmo pode ser dito em relação ao grande número de documentos inéditos do escritor, produzidos entre 1948-52. Esse é um período-chave para o Arquivo Guimarães Rosa do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB/USP), onde se concentram alguns de seus documentos inéditos mais bem elaborados, como o diário de sua estadia em Paris (1948-51), as cadernetas de viagem pela França e Itália (1949-50) e pelo sertão de Minas Gerais (1952); o caderno de leitura de Homero, Dante e La Fontaine (1949-50)2, o caderno “Artes”, que reúne descrições de quadros contemplados em museus de Paris (1948-51)3, e os cadernos com notas de leitura de relatos de viajantes naturalistas que percorreram o interior do Brasil no século XIX, como Spix e Martius e Saint-Hilaire.4

187


O período de elaboração dos livros de 1956 concentra tais documentos inéditos e inúmeros exercícios narrativos concebidos a partir deles: textos inacabados, deixados de lado ou publicados em periódicos, entre 1947-54. É por meio desse conjunto que podemos acompanhar os desdobramentos do projeto de “recuperação da linguagem literária” de Guimarães Rosa, que começa a ser formulado durante o trabalho de escrita de Sagarana e se realiza mais plenamente nos livros de 1956.5 O projeto literário de Guimarães Rosa Em maio de 1947, cerca de um ano após o lançamento bem-sucedido de Sagarana, Rosa envia uma carta a seu tio Vicente, também escritor, onde procura explicitar os critérios que presidem seu trabalho de linguagem, criticando “o longo e infeliz período de relaxamento da língua”, de “desprestígio do estilo” e de “primitivismo fácil e de mau gosto”: A língua portuguesa, aqui no Brasil, está uma vergonha e uma miséria. Está descalça e despenteada; mesmo para andar ao lado da espanhola, “ela não tem roupa”. Empobrecimento de vocabulário, rigidez de fórmulas e formas, estratificação de lugares-comuns, como caroços num angu ralo, vulgaridade, falta de sentido de beleza, deficiência representativa. É preciso distendê-la, destorcê-la, obrigá-la a fazer ginástica, desenvolver-lhe músculos. Dar-lhe precisão, exatidão, agudeza, plasticidade, calado, motores. E é preciso refundi-la no tacho, mexendo muitas horas. Derretê-la, e trabalhá-la, em estado líquido e gasoso. (Releia, tendo isso em vista, a pequenina e incerta tentativa, que é a nossa “Histórias de fadas”).6 Na bibliografia sobre Guimarães Rosa, muitos trabalhos analisam suas diferenças com a prosa regionalista e com o trabalho de estilização modernizante.7 São bem conhecidas as freqüentes críticas de Rosa aos “excessos” de uma proposta modernista que coleciona lugares-comuns e problemas gramaticais da língua falada, prejudicando a “virilidade enérgica de certas dicções”.8 São essas críticas que parecem dar o tom de um “recado” enviado pelo escritor logo após o lançamento de Sagarana:

188


Sejamos modestos, porém. Os que gostam de “língua brasileira” deveriam querê-la pelo menos como filha sensata e prática, que, quando sai da casa materna, traz consigo o maior número de jóias da família que pode obter. E a língua portuguesa é mãe tão desprendida...9 É sintomático que o primeiro texto publicado por Rosa depois de Sagarana seja justamente um de seus contos, “São Marcos”, reimpresso na revista Vamos ler!, em abril de 1947. Considerado pela crítica como a sua “primeira teorização a respeito da linguagem”, é nesse conto que lemos uma passagem sobre o “canto e plumagem das palavras”, bastante difundida: “Sim, que à parte o sentido prisco, valia o ileso gume do vocábulo pouco visto e menos ainda ouvido, raramente usado, melhor fora se jamais usado”. Essa busca pelo “ileso gume do vocábulo” está na base de seu processo de “revitalização da linguagem literária”, como observa Eduardo Coutinho.10 O louvor às “palavras raras, estranhas, ressonantes, sem significado aparente”11 é o contraponto de seu “forte horror ao lugar-comum, de toda espécie, como sintoma de inércia mental, rotina desfiguradora, viciado automatismo”.12 Avesso a qualquer tipo de improviso e entusiasta do “estudo prévio” e do “planejamento”, para Rosa o trabalho de “construção” literária requer uma “elaboração cuidada e dolorosa”, com “aprofundamento” e “domínio dos temas”, “observação direta” e coleta de “termos precisos”. Só assim é possível dar à língua a “precisão, exatidão, agudeza e plasticidade” almejadas. Em busca do “embelezamento” e “enriquecimento” do idioma materno, o escritor se coloca contra a rigidez e o lugar-comum, e critica a vulgaridade da sintaxe e de formas narrativas desgastadas pelo uso. Ele ambiciona uma língua que seja capaz de misturar formas de expressão inauditas com o sentido original de cada palavra: Mas a recuperação da linguagem literária me preocupa, e muito. O bom seria reunir, depressa, tudo, todas as palavras – de Portugal, do Sertão, dos tupis, dos clássicos, galicismos, gírias, termos novos arrancados dos desvãos do latim, tecnicismos, cinemismos, neologismos premiados em concursos – e depois confiar a uma comissão de artistas a alta tarefa de selecionar as necessárias, as “boas”, para a elaboração da nova língua – que seria simples, formosa, exata em força e subtileza. É preci-

189


so uma montanha de minério, para poder-se extrair grama de metal raro. Se a gente pudesse ensinar às crianças o idioma falado no céu, este mundo melhorava tanto, que era um espanto.13 Inconformado com o próprio meio de expressão, Rosa procura “recuperar a linguagem literária”, ora mergulhando nas fontes mais puras do vernáculo ora incorporando outras línguas e modos de falar, sobretudo do falar regional do sertão do Brasil, que elege como “matriz de seu estilo”.14 Como o próprio escritor observa: O capiau está mais certo: com o vocabulário involuntariamente escasso de que dispõe, gosta da ostentação, de opulência, de beleza, de inventar nomes. Para os defeitos de seus cavalos e as cores dos seus bois, dá-se a um luxo incrível de termos exatos, marcando as mínimas gradações. Gente esperta!15 As cadernetas da viagem de Guimarães Rosa pelo sertão de Minas Gerais, realizada em maio de 1952, conduzindo uma boiada pelos campos gerais, contêm um verdadeiro inventário do “linguajar vaqueiro”, dos “termos exatos” com que nomeiam as coisas da natureza, com todas as nuances de cores e sons, e da maneira precisa como falam e relatam suas estórias: Dizem que eu sou aristocrata e que invento palavras. Não as invento totalmente. Para escrever Grande sertão: veredas, passei um mês inteiro no mato, em lombo de mula, catalogando num caderninho o linguajar do povo sertanejo. Há palavras que, na cidade, nem são conhecidas e que têm, contudo, raízes puras no latim autêntico. Aristocrata não sou. Guardei o caderninho no bolso. Ele ficou sujo de suor, de mato e de terra, até de dejeções de burro. Mas não o joguei fora.16 Ainda que o sertão do Brasil, sobretudo o interior de Minas Gerais, seja o seu grande foco de atenção, Rosa está sempre ávido por oportunidades, recorrendo a muitas outras fontes. As cadernetas de suas viagens pela França e Itália (1949-50) estão repletas de palavras e expressões “catadas vivas”, e seu diário

190


em Paris (1948-51) registra inúmeras conversas sobre cores e tonalidades com o pintor Cícero Dias, só para citar alguns exemplos. Na verdade, a pesquisa e documentação da língua escrita e falada fazem parte do cotidiano do escritor, de suas viagens ou meras andanças pela rua, de conversas ou leituras, e abrange os mais variados discursos e seus modos diversos de nomear e entender o mundo, das ciências naturais (botânica, zoologia, geografia, geologia...) às humanidades (filosofia, religião, música, pintura, história, línguas, literatura...).17 Um trabalho contínuo e persistente que se torna visível nos inúmeros documentos de seu Arquivo e se realiza plenamente na “linguagem misturada” de Grande sertão: veredas, como observou Arrigucci Jr.18: O fato é que encontramos, na base da linguagem, o falar regional do Norte de Minas, certamente muito estilizado, de combinação com latinismos; arcaísmos tomados ao português medieval [...]; indianismos; neologismos; termos aproveitados e adaptados de múltiplos idiomas (do inglês, do alemão, do francês, do árabe etc.); vocábulos cultos e raros, bebidos nos clássicos portugueses; elementos da linguagem das ciências, e sabe-se lá de que fontes mais. Enfim, as virtualidades da língua atualizadas e manipuladas na direção de uma mescla única, difícil de definir e de entender num primeiro momento, que estranha e surpreende e vai, entretanto, se apoderando do leitor, à medida que se entrega ao fluxo rítmico da narrativa também misturada. Cerca de dez anos depois dos livros de 1956, por ocasião do lançamento da tradução alemã de Grande sertão: veredas, Rosa vai descrever sua relação com a língua como “um casal de amantes que juntos procriam apaixonadamente”, explicitando alguns de seus preceitos básicos: buscar o sentido original de cada palavra, limpando-as das impurezas da linguagem cotidiana; evitar a servidão à sintaxe vulgar e rígida; fecundar e corromper o idioma materno com elementos de outras línguas. O escritor acaba formulando o seu “método tradutivo” de escrita: Escrevo, e creio que este é o meu aparelho de controle: o idioma português, tal como o usamos no Brasil; entretanto, no fundo, enquan-

191


to vou escrevendo, eu traduzo, extraio de muitos outros idiomas. Disso resultam meus livros, escritos em um idioma próprio, meu, e pode-se deduzir daí que não me submeto à tirania da gramática e dos dicionários dos outros. A gramática e a chamada filologia, ciência lingüística, foram inventadas pelos inimigos da poesia.19 Muitas análises apontam para as diversas línguas que se interpenetram nas construções textuais de Guimarães Rosa. Sua escrita é lugar de várias línguas em ação, que produzem constantemente tradução e interferência. A “fecundante corrupção” entre as línguas está na base de suas inovações lingüísticas.20 Ansiedades da escrita É em seu diário em Paris, intitulado “Nautikon”, o “livro da sinceridade” ou “sozinho a bordo”, que o escritor revela as ambições e tormentos de sua grande viagem na linguagem.21 Além de registrar seu cotidiano em Paris, entre novembro de 1948 e fevereiro de 1951, Guimarães Rosa reflete sobre as dificuldades da escrita e a “incessante tempestade de sua vida interior” – “porque todo homem tem a parte térrea e a parte oceânica. Nessa é que (Nautikon) ele está sempre sozinho. Sozinho? E... Deus? Com Deus coexistem os deuses”. 22 Visto como o “lugar das irremediáveis confidências”, é no diário que Rosa tematiza sua “ânsia de onisciência”: O canto dos pardais, repentinamente múltiplo, gaiato e concertado, faz-me sentir que a minha angústia básica é a ânsia de onisciência... (Por que cantam assim os pardais? Quais são os seus hábitos? Como vivem? Quem pode estudar os pardalitos?) (E as observações sobre eles resultam de acaso, de tempos outros, de bribes reunidas, várias contribuições...). Assim tudo o mais. De modo que a coisa mais simples, álacre, natureza e espontaneidade ? provoca-me em vez de um gozo gratuito um tormento acaparador, de ambicioso, de insaciável...23 Mas este não é o único tipo de angústia presente no diário. Nele, Rosa também procura refletir sobre a sua verdadeira mania de andar sempre toman-

192


do notas, “arrecadando” ou “colhendo” paisagens, palavras e expressões para “levá-las consigo, para casa”: sua “ânsia de fixar no papel” impressões, temas, conversas etc. Registrando incessantemente o mundo à sua volta, ele procura “fixar o tempo, o vivido”, ao mesmo tempo em que se pergunta se “correr para o papel e anotar logo qualquer brotar de pensamento ou sensação não seria um mal?” Não estaria ele se privando de “gozar do próprio espetáculo?” Como revela no próprio diário, o “Nautikon” oscila entre dois tons: a “auto-reflexão” e o “puro fixar momentos, idéias, reações, emoções”. É a busca pela “captação de instantâneos” – as “intuições fulgurantes”, os “lampejos de beleza”, as “interpelações poéticas das coisas” – que move sua “tarefa” de “diarista” ou “memorialista do presente”, levando-o a andar sempre com cadernos ou cadernetas, tomando nota de tudo que vê, ouve ou imagina em suas andanças. A “ânsia” de tudo registrar é evidenciada não apenas por seu produto – o volume espantoso de documentos de seu Arquivo –, mas também pelos relatos de seus amigos mais próximos: “O Rosa vivia com um lápis e papel tomando nota de conversa” (Cícero Dias); “Qualquer expressão que ele ouvisse, que fosse estranha ao conhecimento dele, ele anotava” (José Saturnino, fazendeiro de Cordisburgo); “Ele viajava anotando as palavras para não perder” (Paulo Dantas); “Às vezes na rua, conversando, ele parava, tirava um pedaço de papel e anotava qualquer coisa, qualquer idéia ele tomava nota. Ele me dizia assim: – Às vezes você tem uma idéia muito bonita mas ela não se repete” (Geraldo França de Lima).24 Também Augusto Frederico Schmidt retrata Guimarães Rosa como “um anotador, um homem que se documenta” constantemente, inclusive em suas viagens pela Europa, e constrói sua literatura em “bases sólidas”: Encontrei traços de Rosa em muitos lugares por onde andei, principalmente pela Itália. – “Quem passou por esta cidade foi Guimarães Rosa, discreto, secreto, deslizando, e sempre a tomar notas” – era o que me informavam inalteravelmente em Bolonha, em Parma, em Luca, em Florença. Com seu ar enganadoramente cordial e aberto, pois é um ser que na verdade se esconde e prefere observar, compreender, a exibir-se ou representar, Guimarães Rosa é um anotador, um homem que se documenta, que constrói a sua literatura solidamente, com a consciência de que não basta brilhar, ou escrever belo, mas que é preciso saber exa-

193


tamente o que se quer dizer, e tratar o assunto com todos os elementos da verdade e não apenas com o colorido mudável, provisório e variável.25 Já o poeta Manoel de Barros descreve a “curiosidade sem fim” do escritor, “que se aplica nas palavras com o fundo indagar”: “– E árvore, Manoel, o nome de algumas, você me dará?” [...] Quer saber qual o nome que tal árvore tem aqui. Quer saber o nome daquele passarinho que pula no brejo, cor de café, e como é que ele canta. [...] Nossa conversa era desse feitio. Ele inventava coisas de Cordisburgo. Eu inventava coisas do Pantanal. [...] Não tinha fim a sua curiosidade. Dava ares de um rei, às vezes. Mas o rosto merecia anjo. Eu tinha informações de seu gosto por línguas, idiomas. Traçava até línguas arrevezadas: tcheco, grego, aramaico, sei lá. Queria saber guarani. Foi no caderno, virou, virou, me perguntou: “– Manuel, que quer dizer não tem nhamonguetá nem buguerê?” Tentei traduzir. Quer dizer: não tem conversa nem vira de lado. Isso é guaranês, falei de orelhada. Mas Rosa quer saber a origem, quer saber a explicação de tudo. Rosa se aplica nas palavras com o fundo indagar. Fica imaginando. Recorre a outras línguas de origem tupi. Faz desenhos de letras no caderno. Excogita. [...] Rosa tomou nota. Gravou na caderneta.26 Sua verdadeira paixão pelo registro, sempre em busca de palavras e frases, também é descrita por Mário Calábria: A experiência lingüística era permanente nele [...] Ele carregava um caderninho de notas e um lápis, que ele aconselhava a todos os amigos que carregassem sempre, como parte da roupa, da indumentária, para não deixar nunca que pudesse escapar uma frase boa, uma palavra nova... Ele, Rosa, foi um mestre nesta arte de levar jóias, não só da casa materna, mas de onde encontrava.27 Ainda segundo Calábria, Rosa também o aconselhava a andar sempre tomando notas:

194


“– Anote tudo, carregue sempre no bolso um caderninho de notas, e escreva no mesmo dia o que interessa, faça como eu, um dia você aproveitará uma história, uma frase, palavras e até a maneira de contar. Sagarana não teria sido escrito sem meus caderninhos de notas...”28 Além da “ânsia de onisciência” e da “ânsia de fixar no papel”, Guimarães Rosa também tem de lidar com sua “ânsia da perfectibilidade”: Rever qualquer texto meu, já de si, é qualquer coisa de tremendo, porque o meu incontentamento é crescente, a ânsia da perfectibilidade, fico querendo reformar e reconstruir tudo, é uma verdadeira tortura. Por exemplo, dir-lhe-ei que as 5 edições do Sagarana são todas diferentes, refeitas, remodeladas, remexidas. Por fim, para ver se eu conseguia deixar isso de lado, e me voltava para escrever outros e novos livros, o meu Editor, José Olympio, mandou matrizar ou estereotipar a composição, guardando-a nos chumbos, e impedindo-me assim, de permanecer na classe de Danaide ou Sísifo.29 O escritor passava horas retocando seus escritos, revendo-os incessantemente, até mesmo depois de publicados. Segundo Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu), que acompanhou todo o processo de escrita dos contos de Primeiras estórias (1962) e de Tutaméia (1967), em dez anos de convivência com o escritor no Itamaraty (1957-67), como sua secretária e colaboradora: [...] a escrita para ele era uma gestação e um parto, era um esforço violento. Ele tinha que parar muitas vezes e deixar guardado, na gaveta, uma folha que ele tinha começado. E, às vezes, ele tirava, tentava recomeçar a trabalhar, não conseguia, guardava de novo. Então tem coisas dele, tem folhas começadas assim, que nunca foram acabadas, porque era difícil, porque ele procurava a palavra exata para aquilo que ele queria dizer. Ele falava: “– Quando eu não encontro a palavra, eu crio”. E como ele criava as palavras! [...] porque ele criava coisas, palavras que não existiam, não é? E ele usava muito dos arcaísmos também, e gostava muito do dicionário, ficava horas, às vezes, olhando o dicionário, procurando palavras, não uma exatamente, mas olhando, lendo o dicionário.30

195


Não é de se espantar, num escritor famoso por seu requintado trabalho de linguagem e seu gosto por ler dicionários e gramáticas, que as inúmeras listas de palavras e sintagmas presentes nos documentos de seu Arquivo revelem justamente o seu imenso interesse pelo nome das coisas – testemunho inequívoco de que, para ele, “o conhecimento só tem sentido se acompanhado da denominação do objeto, da maneira ou maneiras de exprimi-lo”.31 É o que o próprio Rosa observa acerca de suas cadernetas do sertão: Você conhece meus cadernos. Quando saio montado num cavalo, pela minha Minas Gerais, vou tomando nota das coisas. O caderno fica impregnado de sangue de boi, suor de cavalo, folha machucada. Cada pássaro que voa, cada espécie, tem um vôo diferente. Quero descobrir o que caracteriza o vôo de cada pássaro, a cada momento. Eu não escrevo difícil. EU SEI O NOME DAS COISAS.32 É ao longo do processo de elaboração dos livros de 1956 que Guimarães Rosa desenvolve o seu projeto bem mais amplo de “reescrever a própria língua”.33 O que começa, em 1946, como um projeto de “recuperação da linguagem literária”, vai aos poucos se transformando numa grande viagem em busca do nome das coisas e de formas que expressem aquilo que não tem voz nem contornos definidos. Sempre brincando com a linha tênue e arbitrária que distingue as coisas do mundo, a escrita de Rosa quer captar o que é ambíguo e escorregadio, ignoto ou difícil de ser apreendido – a própria “matéria vertente” das coisas, tantas vezes tematizada em Grande sertão: veredas. É este o projeto que conforma o sertão de Riobaldo e a inusitada metamorfose de “Meu tio o Iauaretê”, “operada de dentro da linguagem”34, e se faz presente no olhar do menino Miguilim e de todos os “bobos” e “alucinados” que povoam seu Corpo de baile – seres que falam línguas estranhas, de conteúdos enigmáticos, freqüentemente atribuindo outros nomes para as coisas e novos significados para os nomes, ou simplesmente criando nomes motivados por inusitadas sinestesias. É através desta nova linguagem literária que Rosa procura fazer ver o que normalmente não se vê, e dá voz ao que não fala ou não deveria estar falando como sujeito, àquilo que a cultura classifica como seres de

196


exceção, irrepresentáveis ou sem competência para falar, como bem observou João Adolfo Hansen (2000). Não só o doido, mas também a criança, o louco, o sertanejo, o índio, e até mesmo a própria natureza, sobretudo os animais, como o boi e a onça. A redação dos livros de 1956 Guimarães Rosa diz ter escrito Corpo de baile em 1953-1955, e Grande sertão: veredas, em 1954-55.35 Sua fase de trabalho intenso se concentra justamente nesses dois últimos anos, quando ele se viu “num túnel, num subterrâneo, só escrevendo, só escrevendo, só escrevendo eternamente”.36 Se a redação efetiva dos livros de 1956 ocorreu a partir de 1953, no entanto, foi bem mais longo o seu processo de elaboração. Na verdade, assim que termina Sagarana e entrega os originais à editora Universal, no início de novembro de 1945, Rosa já sonha escrever outros livros: Já penso em escrever um romance; já estou engenhando –, cranialmente. Depois, muita coisa: contos, novelas, o diabo. No começo, ainda é duro. Como uma Potência média, que começa a construir uma esquadra. Mas, logo que consiga lançar um ou dois dreadnoughts, poderei, penso, repousar na minha essência, encaranguejar-me ainda mais. Viver sem pressa, um pouco “intemporalmente”. Se preciso e se possível, trocarei então o Itamaraty por um emprego de fiscal de imposto do consumo, ou coisa parecida. Nada melhor do que uma casa nos subúrbios, e um emprego rotineiro, deslustrado, obtuso, sem agitações, sem remoções, sem viajações.37 Em dezembro de 1945, enquanto a editora prepara as provas tipográficas de Sagarana, o escritor viaja pelo interior de Minas Gerais, “retomando contato com a terra e a gente”, “reavivando lembranças” e “reabastecendo-se de elementos para outros livros em preparo”38: “Colhi coisas maravilhosas, voltei contente como um garimpeiro que tivesse enchido a sacola”.39 Um ano depois, animado com o sucesso de Sagarana, Rosa comenta com um amigo a sua necessidade de escrever:

197


Eu ando febril, repleto, com três livros prontos na cabeça, um enxame de personagens a pedirem pouso em papel. Estou apontando os lápis, para começar a tarefa. É coisa dura, e já me assusto, antes de por o pé no caminho penoso, que já conheço. Mas, que fazer? Depois de certo ponto, um livro tem de ser escrito, ou fica coagulado na gente, como um trombo numa veia, pior que um “complexo”. Tenho esperança de poder criar coisa nova e diferente, de superar o nosso Sagarana, com histórias e romances mais humanos, mas ao mesmo tempo, mais meta-humanos, mais super-humanos; que sei!?!... O bom seria fazer-se um livro só, de 5.000 páginas, que seria escrito e reescrito, durante a vida inteira. Ou – que beleza! – três gerações de romancista (pai, filho, neto), trabalhando um roman-fleuve, catedralesco, pétreo, tri-generacional...40 Em março de 1947, Rosa conta ao pai que está “escrevendo outros livros” e “imaginando estórias ambientadas no sertão”41, e comenta com Azeredo da Silveira que tem trabalhado “mas, até agora, numa cabotagenzinha, esperando ajuntar carga suficiente, para fazer-se ao largo oceano”.42 Em agosto de 1948, o diplomata João Guimarães Rosa é transferido para a embaixada do Brasil em Paris, onde permanece até março de 1951. No final de 1949, ele comenta com um amigo que começou a “escrever alguma coisa devagar, não sei bem se dará o que preste”, e planeja “parar com as leituras que me estavam tomando muito tempo”.43 No entanto, em maio de 1950, ainda em Paris, continua totalmente envolvido com seus estudos: Literariamente, tenho trabalhado pouco, e estudado muito. Agora, pretendo começar rijo, depois que me esforcei no sentido de resolver um pouco a dificuldade que mais me atrapalhava: a vulnerabilidade maior, quando a gente se põe de “sensibilidade aberta”, para escrever, e se está em lugar freqüentado e agitado como é este aqui.44 Guimarães Rosa ainda não entrou naquele ritmo intenso de trabalho que a redação de um livro requer, pois além dos estudos, que lhe “tomam muito tempo”, sente-se “vulnerável” e “atrapalhado” pelas demandas da efervescente

198


vida cultural de Paris. Mas ainda que não consiga escrever como deseja, movido pela saudade, planeja estórias ambientadas no sertão do Brasil, e sonha em viajar pelo rio das Velhas de canoa, à maneira de um viajante naturalista. Ao que tudo indica, Rosa só começa a construção efetiva de sua nova obra quando regressa ao Brasil, em 1951, depois de se instalar na paz de sua casa no Rio de Janeiro, diante do mar do Arpoador. É ali que ele consegue finalmente se colocar “de sensibilidade aberta para escrever” e trilhar o “penoso caminho” da escrita.45 É em dezembro de 1953, quase três anos após o seu regresso de Paris, que Guimarães Rosa menciona claramente o livro enorme que está escrevendo: E, por falar, estou escrevendo um livro, um livrão, um livralhão. São novelas labirínticas, nelas me perco, por elas quero me salvar. Vão ser 9, e já comecei a 6ª. Prepare-se para gostar, e brigar em defesa de, com os que não gostarem. Logo depois começo outro. Já estou resolvido: daqui por diante, é escrever, sem parar. O destino do homem é o moto-contínuo. Agora, cesso. Já escrevi longo demais, o que me assusta. Quando a gente está no meio de um livro, as cartas saem sem vitaminas. O epistolar não é gênero de meu forte. E Nietzsche era contra. Recupero-me no afeto. Isto, sim. E no forte abraço do seu Guimarães Rosa.46 A informação contida nesta carta é preciosa, pois revela que Rosa está escrevendo “um livrão”, no qual pretende reunir nada menos que “nove novelas labirínticas”, cinco das quais já escritas. A sexta novela começa a ser redigida no início de dezembro de 1953. No entanto, depois de cinco meses de intenso trabalho, em maio de 1954, o “livralhão” de “nove novelas” parece já ter sido dividido, pois Rosa escreve a Calábria (Rio de Janeiro, 07.05) dizendo que “os livros vão indo; mas a matéria resiste muito, e o Artista (ou artista, mesmo) sofre muito, porque as palavras escorregam e as idéias passam voando muito alto demais.” De fato, em julho de 1954, Rosa escreve ao pai (Rio de Janeiro, 12.07) contando que o “livrão” se desdobrou em dois: “estou trabalhando burramente, dia e noite, para terminar os livros que estou escrevendo – pois, em vez de um, como comecei, a coisa logo virou dois...”.

199


Ainda em julho de 1954, sai na revista Visão uma matéria sobre a “volta” do escritor, que declara estar escrevendo um romance chamado As veredas mortas: Depois de um silêncio de oito anos, Guimarães Rosa anuncia para princípios de 1955 mais duas obras. A primeira delas é um conjunto de sete novelas, intitulado Corpo de baile [...] De uma das novelas desse livro, Guimarães – “quase contra a minha vontade”, diz ele – desenvolveu um romance: As veredas mortas, que é a história do jagunço Riobaldo, cheia de violência e mortes. Desenrola-se no princípio do século, no Noroeste de Minas, perto do rio Urucuia [...].47 No Arquivo Guimarães Rosa (AGR/IEB/USP), não há nenhum plano, resumo ou esboço de enredo dos livros de 1956: “Tudo se passa como se houvesse uma falha entre as anotações e as obras prontas, não se sabendo como as anotações passaram a livros. Deve-se pensar que as etapas intermediárias [...] foram perdidas, ou, ao contrário, que o método de trabalho do escritor não as incluía? Que dos fragmentários prototextos ao primeiro jato de escrita ele dava um salto?”48 Segundo dona Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu), Chefe do Serviço de Publicações do Itamaraty, secretária e colaboradora de Rosa (19571967), “pode talvez ter havido notas manuscritas, projetos, páginas que Guimarães Rosa às vezes rabiscava, atirando-as ao cesto depois de datilografadas. Tudo leva assim a crer – diz ela – que o primeiro rascunho representa a primeira versão organizada do Grande sertão: veredas”.49 Consultado na casa de dona Aracy (SP), viúva de Guimarães Rosa, e a quem o romance é dedicado, o Primeiro Rascunho (R1) de Grande sertão: veredas é um volume datilografado, repleto de rasuras, correções e adendos. Na primeira página, há um primeiro título, O DIABO NA RUA, NO MEIO DO REDEMOINHO, datilografado e riscado a lápis pelo autor. Acima dele, há um outro título escrito à mão (ao que tudo indica, o segundo), Veredas Mortas, que também foi riscado a lápis. Mais abaixo, o primeiro título aparece como subtítulo, reescrito à mão e colocado entre parênteses: (O diabo na rua, no meio do redemoinho...). Na última página do Primeiro Rascunho (R1), depois do – FIM – (datilografado), Rosa escreveu:

200


Em 31 de julho de 1954, Às 11 hs.30 da noite (23 hs. 30’) ! —————— (A “batalha do Tamanduá-tão”: foi a 21-VII (julho) - 1954.) Os dados contidos no Primeiro Rascunho (R1) reforçam aquela informação veiculada pela revista Visão (ambos datados de julho de 1954): em meados de 1954, Guimarães Rosa está escrevendo um “romance” intitulado As veredas mortas. O título definitivo, GRANDE SERTÃO : VEREDAS (O DIABO NA RUA, NO MEIO DO REDEMOINHO...), consta apenas do Segundo Rascunho (R2), também preservado por dona Aracy. Na primeira página do Segundo Rascunho (R2), acima do título Grande sertão: veredas (o diabo na rua, no meio do redemoinho), datilografado, Rosa escreveu uma dedicatória: À Aracy, minha mulher, Ara, pertence também este segundo rascunho. Com amor, com um beijo, o Joãozinho. Rio, 1955. E na última página, depois do – FIM – (datilografado), escreveu: (Em 22 de novembro de 1955, Às 12 hs. 32 da noite, Digo: 0 hs. 32’, de 23-XI-55).50 Depois que termina o Primeiro Rascunho (31.07.1954), Rosa volta a trabalhar no livro de novelas, deixando o romance repousar um pouco. É o que se depreende da carta que envia a Azeredo da Silveira, em outubro de 1954: “Estou trabalhando, febrilmente, no acabar o livro de novelas. Febrilmente – é a palavra. Caí na torrente, nem durmo direito, a coisa borbulha em grande calor terrível.” Dez meses depois, em agosto de 1955, Rosa já entregou ao editor os originais de Corpo de baile, um “verdadeiro cetáceo”, com sete novelas, e está trabalhando em Grande sertão: veredas, que será um “mastodonte”: E a vida tem sido endiabrada e vultosa, para mim, nestes meses. [...] Mais que tudo, porém, sobrecarregam-me os meus livros. Meti-me a fazer coisa grande demais (no tamanho). Já entreguei ao José Olympio o Corpo de baile – que é um verdadeiro cetáceo, nas dimensões: sairá em dois volumes, de cerca de 400 páginas, cada um. E são apenas sete novelas, imagine. Uma verdadeira penca de romances. Agora, porém, retoco e recopio o romance, o Grande sertão: veredas, e ando apenas pela me-

201


tade. Sendo que vai ser um mastodonte, com perto de 600 páginas. Trabalho enterrado naquilo, chego a perder a noção das coisas externas. Por isto mesmo, em posto não penso ainda, não posso. Só depois de pôr os dois cartapaccios na rua. Também, é melhor.51 Em agosto de 1955, Rosa está “retocando” e “recopiando” o Primeiro Rascunho (R1) do romance. Ainda “pela metade”, a confecção do Segundo Rascunho (R2) se estende por mais quatro meses, até 22.11.1955. Se Rosa escreveu Corpo de baile entre 1953-1955, e Grande sertão: veredas, entre 1954-1955, como revelou a Mary L. Daniel52, foi alternando períodos em que se dedicava mais a um ou outro livro (o que não excluía, evidentemente, algumas visitas esporádicas aos textos em repouso). Ao que tudo indica, o Primeiro Rascunho (R1) foi elaborado entre janeiro e agosto de 1954, o Segundo, entre julho e novembro de 1955. É este Segundo Rascunho (R2) que o escritor entrega à editora.53 Em carta ao pai, ele comenta: [...] a luta para terminar e entregar ao Editor os originais dos meus livros, que ficaram enormes: um, em dois volumes, com 820 páginas; o outro com 467 páginas datilografadas, que deverão dar, impressas, umas 600! Completar, retocar, rever as provas de tudo isso, ainda está sendo um esforço imenso. O importante é ver se a coisa “pega”, depois, se valeu a pena. No mais, vai tudo bem.54 No início de dezembro de 1955, os originais dos dois “livrões”, Corpo de baile e Grande sertão: veredas, já estão nas mãos de José Olympio. Movido por sua “ânsia da perfectibilidade”, Guimarães Rosa continuou trabalhando no romance mesmo depois de entregá-lo à editora. Como nos revela Hazin55, o autor fez a revisão das duas provas tipográficas do romance, aproveitando para “completar”, “retocar” e “rever” o texto.56 Depois disso, ainda reviu a 1ª edição, lançando a 2ª edição (texto definitivo) em 1958. Ou seja: entre o Primeiro Rascunho (1954) e o texto definitivo (1958), há seis etapas conhecidas do romance. Em fevereiro de 1956, Guimarães Rosa revela a um amigo como foi estranha a experiência de finalizar o romance – “só lucidez e angústia” –, e a sensação de “renascimento” que lhe veio depois de fechar a primeira edição:

202


[...] na fase final, e nas providências e cooperações da mecânica editorial, os dois livros me maltrataram tanto, que foi até demais. Conto a Você que, na última semana, antes de entregar ao José Olympio o Grande sertão, passei três dias e duas noites trabalhando sem interrupção, sem dormir, sem tirar a roupa, sem ver cama: foi uma verdadeira experiência trans-psíquica, estranha, sei lá, eu me sentia um espírito sem corpo, pairante, levitando, desencarnado – só lucidez e angústia. Daí, entregues os originais, foi uma brusca sensação de renascimento, de completa e incômoda liberação, de rejuvenescimento: eu ia voar, como uma folha seca. Imagine, eu passei dois anos num túnel, um subterrâneo, só escrevendo, só escrevendo, só escrevendo eternamente...57 Segundo relatos de familiares e amigos, ao escrever, Guimarães Rosa entrava num ritmo “febril”, como se estivesse sendo arrastado por uma torrente: Joãozinho quando escreve vive numa febre, numa exaltação, num deslumbramento. Quando termina um livro, sente-se aliviado, mas mal acaba de entregar os originais ao editor, já começa a pensar num próximo. Não pára nunca. Em casa está sempre lendo, escrevendo, estudando todo o tempo.58 Dona Aracy conta que a redação do romance deixou seu marido “exaurido”: “Levantava-se noite alta para escrever, e assim se esquecia, sozinho, até o dia clarear”. E Franklin de Oliveira, amigo de longa data do escritor, declara que “Rosa parecia um louco, não pensava em outra coisa. Dizia que aquilo era maior que ele.”59 Não por acaso, o escritor se refere a Grande sertão: veredas como um “livro terrível”: Note bem, não é só pela extensão “territorial” do trabalho, mas principalmente pela carga de excitação que deflagra, a ansiedade febril que em mim provoca uma tarefa dessas, com seu stress qualitativo, afetivo. Como a amiga já viu, o romance de Riobaldo é uma espécie descomedida de cetáceo, com seu toucinho todo querendo ser de poesia e metafísica. É um livro terrível; não é à toa que o Diabo é seu personagem.

203


Chego a pensar que foi de escrevê-lo e, mais tarde, rever-lhe as provas, que adoeci: eu, que sempre tive pressão baixa, e que agora passei a tê-la verticalíssima.60 A escrita para Rosa era uma experiência tão avassaladora que ele chegou a declarar: “Quando eu escrevo, me dá uma coisa. Fico atuado. É como se fosse um transe”.61 A redação do romance foi de fato uma experiência muito intensa, como revelou a Benedito Nunes, durante um encontro em seu escritório, no Palácio do Itamaraty: Ele disse que havia escrito penosamente o Grande sertão: veredas, mas com uma grande flama. O Grande sertão o levava, quando estava escrevendo, até mesmo a gritar, a dançar, em movimento contínuo pela sala... Ele me disse que Grande sertão: veredas foi a salvação da vida dele, que sem Grande sertão ele teria morrido, mais expressamente, ele teria se matado se não escrevesse o livro.62 Paulo Dantas também lembra de ter ouvido de Rosa um relato semelhante acerca do romance: – Os caboclos “baixaram” em mim... Só escrevo altamente inspirado, como que “tomado”, em transe. Aquele livro me cansou fisicamente. Acabei extenuado. Deu-me, porém, um enorme prazer. Sensação igual só senti ao escrever Miguilim. Foi outro “clarão” que recebi na vida.63 Corpo de baile é publicado em janeiro de 1956, com sete novelas, divididas em dois volumes, num total de 822 páginas: no primeiro, “Campo geral”, “Uma estória de Amor” e “A estória de Lélio e Lina”; no segundo, “O recado do morro”, “Lão-Dalalão (Dão-Lalalão)”, “Cara-de-Bronze” e “Buriti”. Alguns meses depois, em julho de 1956, é lançado o romance Grande sertão: veredas, com 594 páginas.64 O que começou, em 1946-1947, como “três livros prontos na cabeça”, no final de 1953 virou um “livralhão” que teria “nove novelas”, para finalmente ser dividido em dois, em 1954: o “livro de novelas” (Corpo de Bai-

204


le) e o romance Veredas Mortas, inicialmente intitulado O diabo na rua, no meio do redemoinho. Segundo Madu, o romance, inicialmente, seria “a última novela do Corpo de Baile”, a qual “cresceu tanto e com tanta força” que acabou virando um livro independente: O Grande sertão era uma novela que faria parte do Corpo de baile, mas – isso ele me contou – quando começou a escrever o Grande sertão: veredas – que seria a última novela do Corpo de baile –, ele disse que sentiu aquilo crescer tanto, tanto dentro dele, e ele escreveu quase noite e dia sem parar, num estado de transe. E a editora telefonava para ele: “Olha nós estamos esperando a última novela...” – que seria a última novela do Corpo de baile e que, inclusive, era um número cabalístico [...] Seria a oitava, mas cresceu tanto e com tanta força, e quando ele lia estava tão grande que não podia mais fazer parte. Então foi a independência do Grande sertão, que explodiu de tal maneira que suplantou o Corpo de baile. A editora publicou o livro logo depois, e Corpo de baile ficou um pouco esquecido, porque Grande sertão apareceu assim. O Corpo de baile é realmente importantíssimo na obra dele, e ele ficou até um pouco, assim, triste, porque o Corpo de baile desapareceu quase com a inclusão do Grande sertão.65 É assim que, das “nove novelas labirínticas” do “livrão” de 1953, apenas uma permanece desconhecida. É possível supor que seja “Meu tio o Iauaretê”, como veremos mais adiante, a partir do levantamento dos inúmeros exercícios narrativos produzidos por Guimarães Rosa durante o processo de elaboração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas. A viagem nos periódicos Em 1934, ao ingressar na carreira diplomática, o médico João Guimarães Rosa (1908-1967) sai de Minas Gerais para residir no Rio de Janeiro (19341938; 1944-1948 e após 1951), Hamburgo (1938-1942), Bogotá (1942-1944) e Paris (1948-1951). Suas publicações em periódicos entre Sagarana (1946) e

205


os livros de 1956 estão concentradas nos anos de 1947-1948 e 1951-1954. O escritor não publicou nenhum texto inédito durante sua estadia em Paris – período consagrado a leituras, estudos, viagens e escritos pessoais –, nem após maio de 1954 e durante todo o ano de 1955, dedicados integramente à redação e finalização de Corpo de baile e Grande sertão: veredas.66 Durante o período de elaboração dos livros de 1956, Guimarães Rosa fez várias viagens de documentação, recolhendo elementos para suas estórias. A famosa aventura de maio de 1952, conduzindo uma boiada com um grupo de vaqueiros, foi apenas uma entre, pelo menos, seis viagens registradas em cadernetas: em Minas Gerais (dezembro de 1945); no Pantanal mato-grossense (julho de 1947); pela França e Itália (1949 e 1950); no sertão da Bahia (junho de 1952). Além de tomar notas in loco e depois copiá-las e recopiá-las diversas vezes, datilografando-as integralmente ou apenas algumas de suas passagens, Rosa também produziu vários escritos – relatos de viagem, pequenos contos, diários e outras peças de difícil classificação –, não só a partir das cadernetas mas também de seus diários. Se alguns foram deixados inacabados (como “Com o vaqueiro Bôca-de-fogo”67, “A saída” e “A boiada”68), ou ficaram “descansando” por um tempo (como “Mechéu”69 e “Meu tio o Iauaretê”70), a maioria foi publicada em periódicos, entre abril de 1947 e junho de 1954: 1947 1. “São Marcos” 2. “Histórias de Fadas” 3. “Sanga Puytã” 1947-48 4. “Com o vaqueiro Mariano” 1948 5. “Cidade” 6. “O mau humor de Wotan”

206


1951 7. “O lago do Itamaraty” 1952 8. “A senhora dos segredos” 9. “Pé-duro, chapéu-de-couro” 1953 10. “Terrae Vis” 11. “Cipango” 12. “Ao pantanal” 13. “Teatrinho” 14. “O homem de Santa-Helena” 15. “Do diário em Paris” 16. “Fantasmas dos vivos” 17. “Os doces” 18. “Discurso de Posse na Sociedade Brasileira de Geografia” 1954 19. “A chegada de Subles” 20. “Do diário em Paris” 21. “Risada e meia” 22. “Aquário (Nápoles)” 23. “Uns índios – sua fala”

Foram nada menos que 23 escritos em periódicos do Rio de Janeiro e Belo Horizonte, entre 1947 e 1954,71 sendo que a metade (os 11 em destaque) remete diretamente às viagens de Rosa e aos documentos inéditos produzidos a partir delas, entre 1938-1952:

207


Sertão da Bahia e de Minas Gerais (1952): “Pé-duro, chapéu-de-couro”: relato de suas duas incursões rumo ao mundo dos vaqueiros. Pantanal (1947): “Sanga puytã”, “Com o vaqueiro Mariano”, “Cipango”, “Uns índios – sua fala” e “Ao pantanal”: relatos de sua estadia na Fazenda Firme (onde trabalhava o vaqueiro Mariano), de uma viagem pelo Pantanal inundado, da visita a uma aldeia de índios Terena e também a uma colônia de japoneses; Itália (1949-1950): “Aquário (Nápoles)”: descrições de animais marinhos observados no aquário desta cidade. São “fotos verbais dos animais, tentando defini-los por aproximações antropomórficas, croquis de palavras contadas e iluminadores”. 72 Paris: “Do diário em Paris” (setembro/outubro de 1949) e “Do diário em Paris” (agosto de 1949): passagens do “Nautikon” (com algumas alterações), entre as quais uma conversa sobre cores com o pintor Cícero Dias, e alguns ensaios de definição do próprio diário. Hamburgo: “O mau humor de Wotan” (1938-1940) e “A senhora dos segredos”: “reminiscências que evocam numa contenção extrema seu horror ante à barbárie de que lhe coube ser testemunha ocular na Alemanha de Hitler”.73 Dessas onze publicações entre 1947-1954, dez foram integradas ao livro

208


póstumo Ave, palavra (1970). Nove remetem às viagens realizadas entre 19471952; duas, aos anos em que Rosa viveu na Alemanha nazista (1938-1942). Ave, palavra Das 23 publicações de Rosa que datam de 1947-1954, a grande maioria (18 delas) foi reunida em Ave, palavra. As exceções são: “Com o vaqueiro Mariano” (Estas estórias); “São Marcos” (conto de Sagarana); “Os doces” e “Discurso de posse na Sociedade Brasileira de Geografia” (não foram republicados); e “Risada e meia”, que foi reescrito, ampliado, e ganhou um novo título, “Aletria e hermenêutica”, para se transformar no primeiro prefácio de Tutaméia (1967). O que já provoca uma curiosa inversão na bibliografia do autor, pois seu último livro começa com um “Prefácio” que foi originalmente concebido em 1954 – além de integrar também o conto “Mechéu”, cujos dados foram “colhidos” em Paris, por meio de carta enviada a Pedro Barbosa, em 1949. A mesma inversão pode ser feita em Ave, palavra, que possui um bloco significativo de peças (18) que foram publicadas antes de 1956, dez das quais diretamente relacionadas com as viagens, cadernetas e diários do escritor. Ave, palavra possui duas partes. A primeira, com 49 peças74, constitui o livro propriamente dito (pp. 3 a 250). A segunda, intitulada “Jardins e riachinhos”, com 5 peças (pp. 253-274), é na verdade um anexo, pois o autor pretendia publicá-las num livro à parte.75 No entanto, Paulo Rónai, organizador do livro, acabou optando por incluí-las na coletânea, “embora não tivessem sido a ela destinadas pelo Autor”: Incluíram-se no volume cinco peças que iam ser o núcleo de outro livro, Jardins e riachinhos, de extensão insuficiente para dar outro volume, de cor, sabor e forma aparentados aos deste. Memórias da simbiose de Rosa menino com a natureza e os bichos são deveras exercícios de saudade e iridescente ternura.76 Assim, excluindo-se a seção “Jardins e riachinhos”, das 49 peças que compõem Ave, palavra, um bloco significativo remete às viagens e documentos inéditos de Rosa que datam de 1938-195277: dez peças publicadas entre 1947-1954

209


(listadas mais acima)78, e outras dez que também foram publicadas em periódicos, entre 1956-196779: Hamburgo Além de “O mau humor de Wotan” e “A senhora dos segredos”, temos: 1 – “Homem, intentada viagem” (datado de 1938-1939; O Globo, 18.02.1961); 2 – “A velha” (O Globo, 03.06.1961). Visitas a aquários e zoológicos na Europa e no Rio de Janeiro Além de “Aquário (Nápoles)”, temos: 3 – “Zôo (Hagembecks Tierpark, Hamburgo-Stellingen)” (O Globo, 11.03.1961; e Pulso, Rio de Janeiro, 29.04.1967; 4 – “Zôo (Parc Zoologique du Bois de Vincennes)” (O Globo, 29.04.1961); 5 – “Zôo (Jardin des Plantes)” (O Globo, 24.06.1961); 6 – “Zôo (Whipsnade Park, Londres)” (Pulso, 07.01.1967); 7 – “Aquário (Berlim)” (Pulso, 18.02.1967); 8 – “Zôo (Rio, Quinta da Boa Vista)” (Pulso, 01.04.1967). Visitas a museus na Europa 9 – “O burro e o boi no presépio” (revista Senhor, dez. 1961).80 Viagem pelo interior de Minas, em 1945 10 – “Dois soldadinhos mineiros” (Boletim da Biblioteca do Exército, abril de 1957). Dessas 20 peças que integram Ave, palavra, quatro remetem a Hamburgo (1938-1942), e 16 às viagens realizadas entre 1945-1952. Ao agrupar dessa forma peças que estão dispersas ao longo do livro (nas

210


atuais edições nem estão datadas), estou propondo uma leitura de Ave, palavra que considere a data de publicação dos textos e sua relação com as viagens e documentos inéditos de Rosa produzidos no período de elaboração dos livros de 1956. Critério que não foi adotado pelo organizador da coletânea, seguindo indícios da vontade do autor:81 Na ordenação das peças – guardadas na pasta dos originais em ordem casual, na medida em que iam sendo datilografadas – procurou o organizador aplicar o critério que seria o usado por Guimarães Rosa na composição dos seus demais livros. Segundo a informação de D. Maria Augusta de Camargos Rocha – secretária e amiga do escritor, a cuja preciosa ajuda se devem os dados indispensáveis à organização do presente volume – ele alternaria poesia e prosa, narrativas e cenas dramáticas, procurando realizar assim um conjunto harmonioso para, fugindo ao monótono, manter alerta e prisioneiro o leitor.82 Segundo Paulo Rónai, Guimarães Rosa estava preparando a publicação do livro quando faleceu: já havia escolhido o título, selecionado as peças, revisto algumas, e pretendia terminar Ave, palavra com uma “explicação”, denominada “Porteira de fim de estrada”, que não chegou a ser escrita. Jamais saberemos se tal explicação daria um novo sentido à sua opção de alternar diferentes tipos de peças: “poesia e prosa, narrativas e cenas dramáticas”. Mas até se decidir por Ave, palavra, Rosa teria hesitado bastante entre diversos títulos bastante sugestivos: Azulejos amarelos, Conversas com tempo, Sortidos e retalhos, Reportagens, Desconexões, Via e viagens, Contravazios, Moxinifada83, Almanaque, Poemas do esporádico, Exercícios de saudade, Meias-estórias, Oficina aberta.84 Conforme observou Rónai, “todos tinham o inconveniente de se referir, cada um, apenas a um ou a alguns grupos dos trabalhos enfeixados”. Para ele, o título finalmente escolhido – e “roseanamente ambíguo” – resolvia a dificuldade: [...] não se referindo a nenhum e a todos, mas saudando com exaltação o poder criador da palavra que transparecia radioso em todos eles, ou

211


contemplando o seu vôo para regiões extraterrenas, ou ainda, talvez, apontando numa síntese lapidar, o oscilar dos assuntos entre dois pólos, o mundo animal representado na ave e o humano, compendiado em seu atributo diferenciador.85 Na Pasta de Estudos para Ave, palavra (AGR), localizei um texto datilografado pelo escritor, que fornece novas pistas para o entendimento do título escolhido: Ave, palavra Saio de sinuosíssima experiência: traduzi. Tirei do inglês para o português um livro, inteiro, se bem que de si se tratasse de obra condensada, de 34 páginas, um livrinho. E, entretanto, notável. Comovedor, a um grau profundo demais. Sei pouco de outras obras que por tantos e tão emocionantes meios até hoje me hajam pegado. E é a estória de um pássaro. Por ora não direi seu título verdadeiro; confidencio apenas um dos que pensei em emprestar-lhe: O pássaro perdido.86 A experiência a que Rosa se refere é a tradução de O último maçarico, livro escrito pelo norte-americano Fred Bodsworth, que relata as peripécias da viagem migratória de um pássaro, o maçarico, da América do Norte rumo à América do Sul.87 Além da saudação e reverência ao poder da palavra, que é o sentido mais evidente do título, ou ainda, como bem observa Rónai, da palavra como diferença entre o homem e o animal – ambos tão agudamente observados e descritos em suas estórias –, para Guimarães Rosa o título Ave, palavra também se relaciona com uma experiência extremamente “sinuosa”: a tradução, ou seja, “tirar” do inglês para o português, transpor de uma língua para outra. Mas se quisermos entender a relação entre a tarefa do tradutor, o título do livro e as diferentes peças que o compõem, é necessário pensar também em termos da tradução de uma linguagem ou de uma cultura para outra (o que se evidencia em seu mergulho no mundo dos vaqueiros), e até mesmo da tradução de uma experiência em palavras (problema presente no “Nautikon”). De qualquer forma, o que Rosa observou a respeito de suas cadernetas ainda parece ser o melhor comentário

212


ao título do livro: “Cada pássaro que voa, cada espécie, tem um vôo diferente. Quero descobrir o que caracteriza o vôo de cada pássaro, a cada momento. Eu não escrevo difícil. EU SEI O NOME DAS COISAS”.88 “Via e viagens” Ave, palavra é um livro que tem se mantido, equivocadamente, à margem dos estudos críticos sobre a obra de Rosa.89 Segundo Vincent Jons, os vários textos que o compõem “podem ser agrupados de várias maneiras, mas é duvidoso que isso possa ajudar a iluminá-lo de alguma forma”.90 É certo que as várias peças de Ave, palavra podem ser agrupadas de várias maneiras, como “Jardins e riachinhos” (já colocados à parte), as estórias ambientadas na Segunda Guerra (“O mau humor de Wotan”, “A velha”, “A senhora dos segredos”) ou no Pantanal mato-grossense (“Sanga puytã”, “Uns índios – sua fala”, “Cipango”, “Ao pantanal”), e os poemas dos cinco poetas anagramáticos (Soares Guiamar, Meuriss Aragão, Sá Araújo Ségrim e Romaguari Sães).91 As descrições de animais contemplados em inúmeras visitas a zoológicos e aquários bem poderiam ser publicadas num livrinho à parte, como “Jardins e riachinhos”, sob o título de “Animalogia ou bestiário amoroso”, como o próprio autor chegou a pensar, em 195392: “Tenho idéia de escrever um bestiário amoroso, aproveitando todas as minhas notas e impressões de jardins zoológicos”. O que faria jus à sua carreira de “animalista notável”, como bem notou Graciliano Ramos a propósito de Sagarana: “fervilham bichos no livro, não convenções de apólogo, mas irracionais diretos, exibidos com peladuras, esparavões e os necessários movimentos de orelhas e de rabos”.93 Walnice Galvão também destaca o incrível poder de observação de Guimarães Rosa, capaz de descrever não apenas pessoas mas também animais em seu ínfimos detalhes, como nos “cinco textos sobre jardins zoológicos que figuram no Ave, palavra. Ali, dispensando a mediação da ficção, o autor estende sensibilíssimas antenas e fica tentando apreender cada bicho e construir um equivalente em palavras”.94 A dificuldade de Rosa em escolher um título para o livro, considerado por ele mesmo uma “miscelânea”, reflete bem a diversidade das peças que o compõem: notas de viagem, trechos de um diário, poesias, pequenos contos, flagrantes do cotidiano, reportagens poéticas, meditações metafísicas, poemas

213


dramáticos e textos filosóficos – um livro que “passa da reportagem à poesia, da reminiscência à vinheta, do comentário de notícias ao relatório de viagem, do grave depoimento ao exercício lúdico”.95 No entanto, ao contrário do que pensa Vincent Jons, a datação dos textos é uma chave de leitura do livro. Entre os vários títulos aventados por Rosa, “Via e viagens” parece perfeito para denominar o conjunto significativo de peças que remetem às viagens e documentos inéditos do escritor que datam do período anterior aos livros de 1956. Ou seja: quase a metade de Ave, palavra é composta de peças que fazem parte do processo de elaboração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas. Levando a fundo essa proposta de agrupar os textos a partir da época em que foram concebidos, mais três outros textos, ainda que publicados em Estas estórias, poderiam integrar “Via e viagens”: “Com o vaqueiro Mariano”, “A simples e exata estória do burrinho do comandante” e “Meu tio o Iauaretê”. “Com o vaqueiro Mariano” (de 1947-1948) e “Pé-Duro, chapéu-de-couro” (1952) são duas incursões do escritor rumo ao mundo dos vaqueiros, buscando apreender sua linguagem e visão de mundo. Denominado “reportagem poética” por Rosa, “Pé-duro, chapéu-de-couro”96 é centrado no relato da viagem ao sertão da Bahia, mas inclui passagens sobre a viagem com a boiada, ambas realizadas em 1952: em maio desse ano, Rosa conviveu com um grupo de vaqueiros mineiros; no mês seguinte, participou de uma “vaquejada” em Caldas do Cipó (Bahia), onde pôde comparar as diferenças entre vaqueiros de diversas regiões do sertão. Como resultado dessas viagens, no final do ano (dezembro) publica “Pé-duro”, que é central para compreendermos o notável interesse do escritor pelo gado e a cultura vaqueira, evidenciado na leitura de suas cadernetas. Este texto retoma algumas questões levantadas cinco anos antes em “Com o vaqueiro Mariano”, que relata sua estadia numa fazenda de gado no Pantanal, em 1947. Publicado originalmente em três partes (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 1947-1948), foi republicado como um livro, justamente, em 1952 (hoje, uma raridade de bibliófilos). Rosa não descobriu o mundo dos vaqueiros em “Pé-duro, chapéu-decouro”, mas foi nele que formulou a sua concepção da cultura boieira. Em Sagarana (1946), vários contos abordam a relação do vaqueiro com o gado, e esse tema já está presente na “entrevista” com o vaqueiro Mariano (1947),

214


orientando os rumos de sua viagem “para dentro do país do boi”. “Pé-duro” é uma espécie de tratado sobre os vaqueiros do sertão, seu modo de vida e de pensar. É uma leitura de Euclides da Cunha à luz de suas cadernetas de viagem, procurando penetrar na própria visão de mundo dos vaqueiros, em sua filosofia de vida. Euclides fornece o solo de suas descrições, é a referência constante que está presente nas entrelinhas, nas perguntas que adivinhamos terem sido feitas por Rosa. Ao longo do texto, em flagrante diálogo com Os sertões, o escritor percorre, mas não na mesma ordem, cada um dos itens abordados por Euclides para caracterizar o “tipo sertanejo”: descreve o aboio; a postura dos vaqueiros; seus trajes de couro, cavalos e selas; formas de pagamento; vaquejadas; estouros de boiada etc. O que nos leva a supor que datem justamente de 1952 as muitas marcas de leitura feitas por Rosa em seu exemplar de Os sertões (sublinhados e notas à margem), especialmente no capítulo II, “O homem”.97 Quase todos esses itens também estão presentes nas cadernetas de 1952, como se Rosa estivesse refazendo, em campo, os mesmos temas abordados por Euclides. “Pé-duro, chapéu-de-couro” e “Com o vaqueiro Mariano” possuem tantas afinidades que Rosa pretendia publicá-los juntos, chegando a entregar o projeto deste livro – intitulado Com os vaqueiros – à editora José Olympio, em 1957.98 Seria, portanto, bastante razoável que fossem editados juntos, e sob tal denominação, como uma subdivisão de “Via e viagens”. No entanto, nos papéis deixados por Rosa, Paulo Rónai encontrou vários esboços de índices para o livro Estas estórias, que deveria abranger oito novelas longas e também a “entrevista-retrato” com Mariano.99 O que significa que, em 1967, Rosa já havia abandonado totalmente a idéia de publicá-la junto com “Pé-duro, chapéu-de-couro”. O projeto de editar Com os vaqueiros data de 1957, logo depois dos livros de 1956 e do prefácio “Pequena palavra” (de 27.08.1956)100, que também trata dos “povos boieiros” (bukólos): o livro é concebido num momento em que ainda são candentes as questões que levaram Rosa a refletir sobre o mundo dos vaqueiros. Dez anos mais tarde, depois de publicar Primeiras estórias e Tutaméia, o preparo dos livros Estas estórias e Ave, palavra, que deixou inacabados, já envolve outros textos e outras questões. “Meu tio o Iauaretê” e “A simples e exata estória do burrinho do comandante” – “mencionados em todos os índices de Estas estórias esboçados por Rosa” – foram publicados, respectivamente, em abril de 1960 e março de 1961, na

215


revista Senhor. No entanto, como nos informa Paulo Rónai em “Rosa não parou (sobre Estas estórias)”, ambos foram escritos alguns anos antes dos livros de 1956: As datas de publicação desses escritos nem de longe coincidem com as da composição. A respeito de “A simples e exata estória do burrinho do comandante” e “Meu tio o Iauaretê”, informam D. Aracy, viúva do escritor, e Franklin de Oliveira, seu grande amigo, que já estavam escritas havia uns dez anos quando foram entregues à revista Senhor. Teriam sido escritos durante sua estadia em Paris, entre agosto de 1948 e março de 1951? É possível. Em suas cartas a amigos, Rosa menciona alguma atividade literária, quando revela estar escrevendo a “biografia romanceada” de Mechéu (em julho de 1949), ou produzindo “alguma coisa devagar” (em dezembro de 1949). É em Paris que prepara a terceira edição (revista) de Sagarana, publicada em 1951, pela Livraria José Olympio, sua nova editora. Mas Rosa também ressalta sua dedicação aos estudos nesse período (como a leitura cuidadosa de Homero, Dante, La Fontaine, em 1949-1950), que o impedem de trabalhar mais “literariamente”. É igualmente possível que “Meu tio o Iauaretê” e “A simples e exata estória do burrinho do comandante” tenham sido elaborados (ou esboçados) logo depois da viagem do escritor pelo Pantanal mato-grossense (julho de 1947). Nesse caso, seriam coetâneos de “Com o vaqueiro Mariano”. É o que sugerem os desenhos feitos por Rosa durante essa viagem. Primeiro, porque foram arquivados na mesma pasta que contém estudos e esboços de textos destinados a integrar Ave, palavra – livro que reúne um conjunto de peças relativas ao Pantanal: “Sanga puytã”, “Cipango”, “Uns índios – sua fala” e “Ao pantanal”. Segundo, porque os desenhos parecem ter sido arrancados das cadernetas que o escritor levava consigo durante a viagem. São feitos a lápis, em folhas lisas, pautadas ou quadriculadas, que foram recortadas e coladas em folhas de papel ofício (frente e verso). Ainda que não estejam datados101, quase todos possuem legendas que atestam sua relação com a viagem pelo Pantanal. Alguns mencionam a fazenda Firme (onde Rosa passou alguns dias e conheceu o vaqueiro Mariano, personagem da “entrevista-retrato”, escrita logo após a viagem), como o desenho de um perfil de montanhas, com uma árvore

216


em primeiro plano, intitulado “Vista do poente: (Do pátio, i.e., da frente da fazenda Firme)”. Também há dois mapas da Nhecolândia (um deles com a localização da fazenda Firme), algumas vistas panorâmicas (com indicação de cores: montanhas azuis, céu rosa etc.) e vários pequenos desenhos: um casebre, uma fazenda, uma árvore com pássaros, dois touros brigando, uma carreta paraguaia, uma cerca, um curral tipo “australiano” (detalhado), garças nas árvores (vistas de longe) e uma grande lista dos sinais e marcas (desenhados) de várias fazendas da região (Firme, Paraíso, Cáceres, Santa Filomena, do Lelengo etc.). Rosa também fez o desenho detalhado de uma azagaia, com o nome de cada uma de suas partes – resultado provável de uma de suas conversas com caçadores de onças do Pantanal, conforme relatou em carta ao pai: A qualquer momento, pode-se avistar uma onça. Se a gente quer caçar uma onça e dispõe de três dias, o sucesso é garantido. Conversei com diversos “zagaieiros” – caçadores bambas de onças, que manejam espetacularmente a longa azagaia. Um desses azagaieiros, o preto Marcão, já esteve até nos Estados Unidos. Ele era o auxiliar do grande caçador de onças Sascha Siemel [...].102 Os últimos desenhos da série (nas duas últimas páginas) não retratam o Pantanal, mas nos remetem a um ambiente marinho. Numa página, há navios, baleias e gaivotas; noutra, dois desenhos minuciosos de um burrinho: sentado em frente a um homem, cada um em sua cadeira, como se estivessem conversando; içado por um pau-de-carga. Tais desenhos são esboços pictóricos de “A simples e exata estória do burrinho do comandante”, onde um burro, “saído do mar”, é içado para dentro de um navio. Ao contrário de “Com o vaqueiro Mariano” e “Meu tio o Iauaretê”, não é possível afirmar que esta novela tenha uma relação direta com a viagem pelo Pantanal. Mas também não se pode excluir a possibilidade de Rosa ter imaginado a estória do burrinho durante a viagem, ou mesmo que tenha ouvido algum relato inspirador sobre o comandante de um navio... Estaria lendo Joseph Conrad? Arquivados juntos, tais desenhos sugerem que “Meu tio o Iauaretê”, “Com o vaqueiro Mariano” e “A simples e exata estória do burrinho do coman-

217


dante” foram concebidos na mesma época, e evidenciam um traço comum entre eles: o esboço pictórico como um momento de seu processo de elaboração. No caso do burrinho, seriam os desenhos o ponto de partida da estória, ou só foram elaborados depois? Vinte anos mais tarde, Rosa decidiu reunir essas três peças no livro que estava preparando quando faleceu, em 1967: Estas estórias. Deixou vários esboços de índices com sugestões para o ilustrador, entre elas o desenho de um burrinho conversando com o comandante... De qualquer forma, não temos (ainda) evidências concretas para datar as duas novelas. Apenas podemos dizer que foram escritas entre julho de 1947 (viagem ao Pantanal) e 1951 (considerando-se a informação de que “já estavam escritas havia uns dez anos” quando foram publicadas, em 1960-61). O que não exclui a possibilidade (provável) de terem sido retrabalhadas ou retocadas ao longo dos dez anos em que permaneceram em repouso, especialmente na véspera de serem publicadas na revista Senhor. Paulo Rónai também nos fornece uma informação curiosa a respeito de “Meu tio o Iauaretê”. Guimarães Rosa fez questão de sublinhar que ela antecede o romance de 1956: “Segundo anotação manuscrita do Autor, constante do original datilografado, esta novela é anterior ao Grande sertão: veredas.”103 A relação entre a forma narrativa do romance, da novela e da “entrevista-retrato” parece ser a chave para entendermos sua preocupação em estabelecer, não uma data, mas a precedência da novela. É na entrevista com Mariano (1947-1948) que Rosa começa a trabalhar o lugar de um interlocutor que nunca fala mas se faz presente, inserido na fala do narrador por meio de interpelações e respostas a hipotéticas perguntas. É o que se vê ao longo do relato de Mariano: – Medo? Se tive. [...] Eu? Então eu vi que o cavalo tinha escapado sem-vergonha. [...] Gado só? O senhor acredite, lá na baía já tinham amanhecido outros bichos. [...] – ... E, ia esquecendo de contar, a nossa situação ainda era pior do que o senhor está pensando. [...] – ...Um estava no inferno, nas profundas, por relancear que se ti-

218


nha de fazer outra vez a travessia daquela campina inteira, vendo o fogo pular corda. [...] A força de Riobaldo é tão grande que, depois de Grande sertão: veredas, encontramos sua presença na fala de Mariano ou do sobrinho da onça. Ao que tudo indica, o achado narrativo de “Meu tio o Iauaretê” (escrito entre 19471951) e Grande sertão: veredas (entre 1954-1955) é um desdobramento da forma narrativa de “Com o vaqueiro Mariano” (de 1947). Mas é na novela e no romance que se realiza plenamente a posição insólita de um narrador que se dirige a um interlocutor silente.104 É bem possível que “Meu tio o Iauaretê” seja a novela desconhecida que faria parte daquele “livrão” com “nove novelas labirínticas”, tal como planejado por Guimarães Rosa, em 1953. Sua exclusão do “livro de novelas”, e seu repouso até 1961, quando finalmente é entregue ao público, poderiam ser explicados por seus traços comuns com o romance. Como já foi aventado por Walnice Galvão, é provável que Rosa não quisesse repetir o grande achado narrativo de Grande sertão: veredas, o que diminuiria a sua força e impacto.105 “Oficina aberta” Se Corpo de baile e Grande sertão: veredas foram escritos entre 1953-1955, no entanto seu período de elaboração é muito maior e compreende as publicações em periódicos e os documentos inéditos que lhes serviram de base, como o diário de Rosa em Paris, suas cadernetas de viagem, cadernos de estudos, anotações de leitura e de visitas a museus, zoológicos e aquários. Sob o título de “Via e viagens” procurei reunir as publicações de Guimarães Rosa que possuem uma relação direta com suas viagens e escritos produzidos entre 1946-1956. A dificuldade de classificá-las evidencia seu caráter de exercícios narrativos que experimentam dicções heterogêneas, alternando prosa e poesia, lírico e discursivo, romanesco e ensaístico. Neles, acompanhamos as incursões do escritor rumo ao mundo dos vaqueiros e dos animais, e suas recorrentes tentativas de deslocar a perspectiva, ensaiando ver o mundo a partir de outros pontos de vista, humanos e não-humanos106, bem como seu empenho em captar a matéria vertente das coisas e seus ambíguos contornos, como nu-

219


vens, tonalidades ou pássaros em vôo. Tais escritos são fundamentais para se compreender a configuração de Corpo de baile e Grande sertão: veredas – e são uma via de mão dupla para tais livros. O recenseamento de dados biobibliográficos precisos, de citações, detalhes e notas seguiram um rigoroso critério seletivo, visando acumular evidências, muitas delas inéditas, fundamentais para a reconstituição do processo de elaboração dos livros de 1956. Sobretudo para sustentar a hipótese de que as sete novelas do Corpo de baile, o romance Grande sertão: veredas e a novela “Meu tio o Iauaretê” integravam um mesmo projeto de escrita, e deveriam ser repensados sob esta perspectiva.

220


NOTAS 1 Ver DOYLE, Plínio. “Contribuição à bibliografia de e sobre João Guimarães Rosa”. In: VÁRIOS AUTORES. Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, pp. 193-255. 2 No IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Série “Estudos para a Obra”, o “Documento E17” (75 páginas, dat.), intitulado Dante, Homero, La Fontaine, também inclui a seção “Artes”. A maior parte do caderno é dedicada à leitura da Ilíada, com 33 páginas (Odisséia, 2 páginas; Divina comédia, 20 páginas; Fábulas, 7 páginas; “Artes”, 12 páginas). 3 No caderno “Artes”, JGR registra seis visitas a museus: duas ao Louvre (pp. 63-64); duas ao Jeu de Paume (pp. 65 e 75); uma ao Trocadéro (Exposição sobre “Arte Medieval Iugoslava”; pp. 66-67); uma ao Museu de l’Orangerie (Exposição sobre “Paisagistas Holandeses”; pp. 68-70). 4 Apenas estes últimos foram consultados no Arquivo-Museu de Literatura Brasileira (AMLB), da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB/RJ), e no Acervo Henriqueta Lisboa do Acervo de Escritores Mineiros (Fale/BU/UFMG). 5 Este ensaio é uma versão do capítulo I da minha tese de doutorado: MARTINS COSTA, Ana Luiza. João Guimarães Rosa: viator. Tese de doutorado em Literatura Comparada. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), 2002. 6 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a seu tio Vicente”. Rio de Janeiro, 11.05.1947. In: GUIMARÃES, Vicente. Joãozito: infância de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio/MEC, 1972. Rosa escreve ao tio (autor de livros infantis) rebatendo as críticas que ele havia feito a “Histórias de fadas”, sua primeira publicação (inédita) após Sagarana (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20.04.1947. Republicada em GUIMARÃES ROSA, João. Ave, palavra. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970). 7 Ver, por exemplo ARRIGUCCI JR., Davi. “O mundo misturado – Romance e experiência em Guimarães Rosa”. Novos Estudos Cebrap. São Paulo, n. 40, nov. 1994. Especialmente no item “As formas da mistura. Linguagem”. 8 É o que Riedel observa a propósito da prosa experimental modernista. RIEDEL, Dirce Cortes. “O modernismo na ficção. II. Experimentalismo”. In: COUTINHO, Afrânio (dir.). A literatura no Brasil. Rio de Janeiro: Global, 1999, v. 5, pp. 289-329. 9 LEITE, Ascendino. “Arte e céu, países de primeira necessidade...”. Entrevista com João Guimarães Rosa. O Jornal, Rio de Janeiro, 26.05.1946. Republicada em LIMA, Sônia M. van Dijck (org.). Ascendino Leite entrevista Guimarães Rosa. João Pessoa: UFPB, 1997. Mas é somente em 1964, depois dos livros de 1956 e de Primeiras estórias, e em diálogo com as análises críticas de sua obra, que JGR se permite falar abertamente dos escritores modernistas, especialmente de Mário de Andrade (GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Mary Lou Daniel”. Rio de Janeiro, 03.11.1964): “polêmico, ligado a um Movimento, [Mário] partiu de um desejo de ‘abrasileirar’ a todo custo a língua, de acordo com postulados que sempre achei mutiladores, plebeizantes e empobrecedores da língua, além de querer enfeiá-la, denotando irremediável mau gosto. Faltava-lhe, a meu ver, finura, sensibilidade estética. Apoiava-se na sintaxe popular – filha da ignorância, da indigência, e que leva a frouxos alongamentos, a uma moleza sem contenção (ao contrário, procuro a condensação, a força, as cordas tensas). Mário de Andrade foi capaz de perpetrar um ‘milhor’ (por melhor) – que eu só seria capaz de usar com referência a ‘milho’. (Em todo o caso, adorei ler o ‘MACUNAÍMA’, que, na ocasião, me entusiasmou. Será que há influências sutis, que a gente mesmo é incapaz de descobrir em si?).” Com certeza. Leitor atento de Mário, Rosa chega a fazer algumas correções a lápis em contos de seu exemplar de Contos novos (consultado na Biblioteca Pessoal de JGR, IEB/USP). 10 COUTINHO, Eduardo. “Guimarães Rosa e o processo de revitalização da linguagem”. In Guimarães Rosa. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1991, p. 228. 11 NUNES, Benedito. “De Sagarana a Grande sertão: veredas”. In Crivo de papel. 2. ed. São Paulo: Ática, 1998, pp. 249-250. 12 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Mary Lou Daniel”. Rio de Janeiro, 03.11.1964. 13 LEITE, Ascendino. Op. cit. 14 ARRIGUCCI JR., Davi. Op. cit., pp. 7-29. 15 LEITE, Ascendino. Op. cit. 16 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Maurício Caminha de Lacerda”, s/d. 17 Rosa chega a dizer que aprendeu algumas línguas estrangeiras “apenas para enriquecer a minha própria e porque há demasiadas coisas intraduzíveis, pensadas em sonhos, intuitivas, cujo verdadeiro significado só pode ser encontrado no som original” (LORENZ, Günter. “Diálogo com Guimarães Rosa”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983, p. 87). 18 ARRIGUCCI JR., Davi. Op. cit., p. 13. 19 LORENZ, Günter. Op. cit, p. 87. 20 Ver GUIMARÃES ROSA, João. “Pequena palavra” (Prefácio). In: RÓNAI, Paulo (seleção, tradução, introdução e notas). Antologia do conto húngaro. 3. ed. Rio de Janeiro: Artenova, 1975, pp. XI-XXVIII. Escrito logo após a publicação dos livros de 1956, é neste texto que Rosa discute a tarefa do tradutor e expõe alguns aspectos fundamentais de sua poética. 21 “Nautikon”, termo grego relativo à navegação ou aos navegadores, náutico, naval (adjetivo neutro). No IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, há apenas uma cópia datilografada de várias passagens do “Nautikon”, com alguns dias em seqüência, outros não, preservada em duas pastas da Série “Estudos para a Obra”: Pasta E3 (1) – França-Paris (registra o período de 04.11.1948 a 18.04.1950, pp. 1-54) e Pasta E3 (2) – França (dia 18.04.1950 a 18.02.1951, pp. 55-121). Assim como o “Diário em Paris”, os originais do “Diário em Hamburgo” (1938-1942) nunca foram localizados, apenas uma cópia xerográfica, preservada no Acervo Henriqueta Lisboa, do Acervo de Escritores Mineiros (Fale/BU/UFMG). 22 Para uma análise do “Nautikon”, ver LARA, Cecília de. “João Guimarães Rosa na França: anotações do ‘Diário de Paris’”. Travessia. Florianópolis, n. 16, 1988-1989, pp. 221-233. 23 GUIMARÃES ROSA, João. “Diário em Paris”. 11.02.1951. IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Pasta E3 (2) – França, p. 119. 24 Entrevistas realizadas em 1996-1997 para o documentário Os nomes do Rosa. Direção de Pedro Bial. Roteiro e pesquisa de Ana Luiza Martins Costa e Raul Soares. GNT, 1997. 25 SCHMIDT, Augusto Frederico. “A saga de Rosa”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 18.01.1952. 26 BARROS, Manoel de. “Pedras aprendem silêncio nele” (Entrevista). In Gramática expositiva do chão (Poesia quase toda). 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992, pp. 323-343.

221


27 Entrevista para o documentário Os nomes do Rosa, realizada em Berlim, fevereiro de 1997. 28 CALÁBRIA, Mário. Memórias: de Corumbá a Berlim. Rio de Janeiro: Record, 2003, p. 364. 29 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Harriet de Onís”. 23.04.1959. Harriet traduziu para o inglês Sagarana e também Grande serão: veredas (este último com James L. Taylor). Sagarana foi revisto ao longo de 12 anos, entre 1946 (1. ed.) e 1958 (5. ed., retocada. Forma definitiva). A “versão primitiva” do livro, o volume “Contos”, data de 1937. JGR retrabalhou o livro durante 21 anos, numa “longa e paciente depuração” – a expressão é de Graciliano Ramos, referindo-se apenas à transformação de “Contos” em Sagarana, que levou cerca de 8 anos (RAMOS, Graciliano. “Conversa de bastidores”. In VÁRIOS AUTORES. Op. cit., p. 45). 30 Entrevista com dona Maria Augusta de Camargos Rocha (Madu) para o documentário Os nomes do Rosa (Rio de Janeiro, novembro de 1996). 31 LEONEL, Maria Célia de Moraes. “Guimarães Rosa: do arquivo à obra”. Scripta. Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998, p. 236. As inúmeras listas de palavras e sintagmas que povoam o Arquivo de JGR, via de regra, não tinham um destino imediato, mas abasteciam o escritor sempre que necessário, como um estoque permanente, constantemente ampliado, trabalhado e retrabalhado (cf. GALVÃO, Walnice Nogueira. “As listas de Guimarães Rosa”. In II Encontro de edição crítica e crítica genética: eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH/USP, 1990, pp. 135-150). 32 Depoimento de JGR a Pedro Bloch. RÓNAI, Paulo. “João Guimarães Rosa, uma unanimidade” (Depoimentos de amigos). In: GUIMARÃES ROSA, João. Rosiana – Uma coletânea de conceitos, máximas e brocardos de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Salamandra/MPM Propaganda, 1983, pp. 91-92. 33 Cf. ROCHA, Marília Librandi, “Grande sertão, de Rosa” (Entrevista com João Adolfo Hansen). O Estado de S.Paulo, 07.05.2000. Hansen traça paralelos entre o trabalho de linguagem de “dois grandes experimentadores”: “Rosa quer reescrever a língua e fazer falar algo que nunca falou ou vai falar. Clarice Lispector tem esse dispositivo que chama a Coisa, um neutro radical, um indizível que nela é um inconformismo muito grande com os papéis imaginários ou com a unidade imaginária da pessoa, e ela tenta dissolver, fazendo falar o que seria uma outra vida etc. Esse indizível é o que a literatura moderna persegue: dizer o entre, o interstício, o que não tem forma nem voz nem discurso autônomo. Daí Clarice também confinar com a bestice, o nonsense, como em A hora da estrela [...] São autores inconformados com o próprio meio de expressão. Eles não acreditam que o meio é suficiente, então sempre vão escrevendo uma estória dupla, uma estória sobre um assunto qualquer, mas é uma estória sobre a linguagem que estão usando – linguagem levada por eles para aquém do que ela nomeia e para além do que ela significa. [...] Foram capazes de levar adiante essa experiência de radicalizar o próprio meio de trabalhar a língua [...] É não aceitar os meios oferecidos e não achar que eles são naturais. É desnaturalizar. É como aquela idéia de Kafka, que dizia que é preciso escrever como um cachorro escreve.” 34 Uma metamorfose “vista por dentro, de um ponto de vista lingüístico, intrínseco”. CAMPOS, Haroldo de. “A linguagem do Iauaretê”. In Metalinguagem & outras metas. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 1992, p. 63. Para Luiz Costa Lima, esse é um exemplo de “mímesis da produção”, que “supõe a extrema dificuldade da comunicação do texto ficcional”, na medida em que é capaz de “engendrar, passo a passo com sua criação, um real apenas minimamente ancorado em um dado referencial”. COSTA LIMA, Luiz. Mímesis e modernidade: formas das sombras. Rio de Janeiro: Graal, 1980, p. 222. 35 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Mary Lou Daniel”. 11.07.1964 36 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 09.02.1956. 37 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 27.10.1945. 38 Idem. “Carta de JGR ao pai”. Rio de Janeiro, 06.11.1945. 39 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 20.12.1945. 40 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 08.01.1947. 41 Idem. “Carta de JGR ao pai”. Rio de Janeiro, 26.03.1947. 42 Idem. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 27.03.1947. 43 Idem. “Carta de JGR a Álvaro Lins”. Paris, dez. 1949. Publicada no jornal Folha de S.Paulo (04.06.1995). No IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Seção “Recortes” (R2, p. 71), há uma “nota solta de jornal” (s/n) sobre “Flagrantes de escritores”, anunciando, em janeiro de 1949, que JGR estaria “trabalhando num romance” (cf. HAZIN, Elizabeth. No nada, o infinito: da gênese do Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991, p. 49). Mas essa é uma notícia publicada no Brasil, que não parece muito afinada com o momento vivido por JGR em Paris, mais estudando que escrevendo. 44 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Paris, 29.05.1950. 45 No IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Seção “Recortes” (R2, p. 83), HAZIN (Op. cit., 1991, p. 49) encontra outra nota solta de jornal, “sem referência alguma”, publicada “certamente por volta de 1951”: “Anuncia-se ainda que Guimarães Rosa está escrevendo um romance”. Hazin acha “bem provável que a referência diga respeito a A fazedora de velas, romance abandonado pelo escritor, segundo motivos expostos em um de seus prefácios a Tutaméia”. No entanto, de acordo com tal prefácio (“Sobre a escova e a dúvida”, item VI), o autor que ali se apresenta teria começado a escrever (e abandonado) A fazedora de velas por volta de 1957. 46 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Mário Calábria”. Rio de Janeiro, 07.12.1953. 47 SEM ASSINATURA. “Volta de Guimarães Rosa”. Visão. Rio de Janeiro, 23.07.1954, seção “Livros”. Apud HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 1991, p. 48. Na verdade, o “silêncio” do escritor não foi tão grande assim, pois ele publicou um pequeno livro em 1952, numa tiragem de apenas 110 exemplares: Com o vaqueiro Mariano (que já havia saído no Correio da Manhã, Rio de Janeiro, dividido em 3 partes, em 1947-1948), com 52 páginas, ilustração de Darel Valença Lins (Niterói: Hipocampo; republicado em Estas estórias). Ainda que esquecido pela crítica, este é, na verdade, o segundo livro de JGR, publicado entre Sagarana e os livros de 1956. 48 GALVÃO, Walnice Nogueira. Op. cit., 1990, pp. 136. 49 Apud HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 1991, p. 59. A autora também entrevistou Franklin de Oliveira (Rio de Janeiro, jan. 1986): “[ele] reforça tal hipótese, ao afirmar ‘com certeza absoluta’ que o original em mãos de Aracy, viúva do autor, é mesmo a primeira versão do livro. Amigo íntimo de Guimarães Rosa, seu comensal todos os sábados, acompanhou passo a passo o desenvolvimento do primeiro rascunho do Grande sertão: veredas.” 50 Segundo Cecília de Lara, que assina a “Introdução” da edição crítico-genética do romance (ainda inédita), “o primeiro título da obra,

222


51 52 53

54 55 56 57 58 59 60

61 62 63 64

65

66 67

68

69

70 71

datilografado e rasurado, foi a expressão que se tornaria subtítulo: o diabo na rua, no meio do redemoinho, seguida de um segundo título, manuscrito e rasurado: Veredas mortas. O definitivo, tal como o conhecemos, só aparece [...] na página de rosto do Segundo rascunho (R2).” (LARA, Cecília de. “Grande sertão: veredas, processos de criação”. Scripta. Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998, p. 42). Ver ainda os trabalhos de NASCIMENTO, Edna Maria Fernandes dos Santos. “Descrições das duas primeiras edições e do ‘Segundo rascunho’ de Grande sertão: veredas”. In II Encontro de edição crítica e crítica genética: eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH/USP, 1990, pp. 151-155; LEONEL, Maria Célia de Moraes. “O ‘Primeiro rascunho’ de Grande sertão: veredas”. In II Encontro de edição crítica e crítica genética: eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH/USP, 1990, pp. 123-128; e HAZIN, Elizabeth. “No nada, o infinito: da gênese do Grande sertão: veredas”. In: LANCIANI, Giulia (org.). João Guimarães Rosa: il che delle cose. Roma: Bulzoni, 2000, pp. 135-176. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 03.08.1955. DANIEL, Mary Lou. João Guimarães Rosa: travessia literária. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968. Segundo HAZIN, Elizabeth (Op. cit., 2000, pp.148-153), R2 tem cerca de 100 páginas a mais que R1, e foi datilografado em máquina diferente. R2 é uma cópia em papel carbono, cujo original foi entregue à editora, para fins de publicação: “O que se denomina terceiro rascunho (R3) do romance não é mais do que o original da cópia carbono” (“idêntico, de início, a R2, mas apresentando alterações posteriores”). GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR ao pai”. Rio de Janeiro, 09.12.1955. HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 2000, pp. 135-176. Além de rever as provas, JGR fez inúmeras correções e alterações, como a substituição da palavra “FIM” pelo símbolo do infinito, na Segunda Prova Tipográfica do romance (cf. HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 2000, p. 155). GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Azeredo da Silveira”. Rio de Janeiro, 09.02.1956. Relato de dona Aracy Moebius de Carvalho, publicado em CAVALCANTI, Gilberto. “Breve conversa sobre Guimarães Rosa”. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 20.06.1965. Apud HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 1991, p. 59. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Harriet de Onís”. 23.04.1959. Rosa adoeceu gravemente no final de 1958: teve um enfarte e foi obrigado a cuidar da saúde, emagrecer e parar de fumar (não sem recaídas), o que talvez explique sua decisão de não mais mexer no romance, a partir da segunda edição (texto definitivo), que data, justamente, de 1958. A quinta edição retocada (forma definitiva) de Sagarana também data de 1958. GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a Maurício Caminha de Lacerda”. S.d. No que diz respeito a Sagarana, Rosa revela ter escrito o livro “em sete meses de exaltação, de deslumbramento” (GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR a João Condé”. 21.07.1946). Entrevista com Benedito Nunes para o documentário Os nomes do Rosa, realizada no Palácio do Itamaraty (RJ), em novembro de 1996. DANTAS, Paulo. Sagarana emotiva. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1975, p. 28. Segundo alguns levantamentos sobre a obra de JGR, o romance foi publicado em “maio” de 1956: PEREZ, Renard. “Perfil de João Guimarães Rosa”. In VÁRIOS AUTORES. Op. cit., p. 33; LIMA, Sonia van Dijck. “João Guimarães Rosa: cronologia de vida e obra”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996, p. 252. Mas outros trabalhos registram o “dia 17 de julho de 1956” como sua data efetiva de lançamento: HAZIN, Elizabeth, Op. cit., 1991, p. 47; COVIZZI, Lenira Marques. “Grande sertão: veredas, no Brasil, em dias de época”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa II. Segundo seminário internacional Guimarães Rosa (2001). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2003, pp. 402-405. Entrevista realizada por mim para o documentário Os nomes do Rosa (Rio de Janeiro, novembro de 1996). A mesma informação está presente num artigo de Mauritônio Meira, publicado no dia 17.07.1956, “data de lançamento do romance”: “Este livro tem uma história. Guimarães Rosa estava escrevendo Corpo de baile [...] um dos contos começou a crescer, crescer [...] Transformou-se em novela. A novela, por sua vez, foi tomando corpo [...] resultado: a novela se transformou em romance.” (IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Série “Recortes”, Pasta R4(9), p. 1, apud HAZIN, Elizabeth. Op. cit., 1991, pp. 47-48). Para um levantamento detalhado das viagens, estudos e escritos de JGR, realizados entre 1945-1956, consultar, nesta revista, o texto “Veredas de Viator”. Em novembro de 1947, Rosa recebe uma carta de Alexandre Barbosa (Rio de Janeiro, 15.11.1947), fazendeiro de Curvelo (MG), que relata as façanhas de um dos vaqueiros de sua fazenda, o “Bôca-de-fogo”, inspirado pela leitura de “Com o vaqueiro Mariano”, recémpublicado (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 26.10.1947). A partir dessa carta, Rosa começa a preparar um texto intitulado “Com o vaqueiro Bôca-de-fogo” (IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Pasta 34 (1), “Inéditos I”, pp. 2-5), tentando reproduzir o seu modo de falar, seguindo os moldes de “Com o vaqueiro Mariano”. Rosa deixou três relatos parciais da viagem de 1952 (datilografados e sem data): “A saída (01.05.1952)” (2 páginas) e “A boiada”, com três subtítulos: “Na Sirga”, “Entrada” e “Os campos-gerais” (3 páginas), ambos preservados no IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa (Pasta E26); e um outro texto também intitulado “A boiada”, mas com conteúdo diferente (13 páginas), preservado por dona Aracy. Quinze anos depois, em 1967, no jornal Pulso (Rio de Janeiro), Rosa publica dois relatos parciais da viagem de 1952, que reproduzem passagens dos inéditos “A saída” e daqueles dois textos diferentes, intitulados “A boiada”: “Sobre os planaltos” (04.03.1967) e “Caderno do Zito” (18.03.1967), posteriomente reunidos, com algumas alterações, no item VII do prefácio “Sobre a escova e a dúvida”, de Tutaméia. Em julho de 1949, em carta a Pedro Barbosa (Paris, 19.07.1949), dono da Fazenda Pindaíbas (MG), JGR diz que está escrevendo a “biografia romanceada” de um de seus empregados, o Mechéu, sujeito meio “bocó”, que ajudava na cozinha, cuidava dos porcos e da lenha. A carta-resposta de Pedro (Rio de Janeiro, 15.08.1949) contém uma detalhada descrição de Mechéu, que será utilizada na redação de conto homônimo, publicado muitos anos depois, no jornal Pulso (Rio de Janeiro, 21.01.1967; republicado em GUIMARÃES ROSA, João. Tutaméia. Rio de Janeiro: José Olympio, 1967). Como veremos, esta novela foi engendrada a partir da viagem de JGR pelo Pantanal, em 1947. Escrita antes do romance, foi publicada na revista Senhor (Rio de Janeiro, 25.03.1961; republicada em GUIMARÃES ROSA, João. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969). Vide a relação completa das publicações no Anexo I. Nessas 23, estou contando apenas uma vez as republicações de “A senhora dos segredos” (em 1953 e 1954) e “Os doces” (em 1954), bem como as três partes de “Com o vaqueiro Mariano”. O número pode cair

223


72 73 74 75 76

77 78 79 80

81

82 83

84 85 86 87 88 89

90 91

92 93

para 22, excluindo-se “São Marcos” (republicação de um conto de Sagarana). RÓNAI, Paulo. “Em véspera do livro Ave, palavra, de JGR”. 4 páginas mimeografadas, s./d. Consultado no Arquivo Paulo Rónai (Sítio Pois É, Nova Friburgo-RJ). Ibidem. Ver os Anexos II e III. Dessas 49 peças, 3 eram inéditas, 29 foram publicadas entre 1957 e 1967, 18 entre 1947 e 1954 (na verdade, 17, porque as duas publicações “Do diário em Paris” foram reunidas numa só). Este livro acabou sendo editado por Geraldo Jordão (filho de José Olympio), em 1983 (Rio de Janeiro: Salamandra/Ipiranga). Edição comemorativa dos 75 anos do autor, fora do comércio e dificílima de ser encontrada (é uma raridade de bibliófilos). RÓNAI, Paulo. Op. cit., s.d. Ainda segundo Rónai (“Nota Introdutória”. In GUIMARÃES ROSA, João. Ave palavra. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970): “Em adendo 5 crônicas, das quais 4 já publicadas em jornais, foram acrescentadas a este volume, embora não tivessem sido a ele destinadas pelo Autor. Faziam parte, ou melhor, eram o indez, segundo expressão mesma de GR, de um ‘livrinho’ que se chamaria Jardins e riachinhos: ‘Jardim fechado’, ‘O riachuelo Sirimim’, ‘Recados do Sirimim’, ‘Mais meu Sirimim’ (inédito), e ‘As garças’.” Se ainda excluirmos, das 49 peças, os 5 poemas anagramáticos de JGR, que formam outro bloco à parte (3 publicados originalmente em 1961, no jornal O Globo; e 2 inéditos), teríamos um número ainda mais significativo: 20 em 44. Vide Anexo II: relação das 18 publicações de 1947-1954 que integram Ave, palavra, dez das quais remetem às viagens e documentos inéditos de 1938-1952. Vide Anexo III: relação das 29 publicações de 1957-1967 que integram Ave, palavra, dez das quais remetem às viagens e documentos inéditos de 1938-1952. Republicado em Ave, palavra, “O burro e o boi no presépio” foi lançado em livro, em 1983 (Rio de Janeiro: Salamandra), numa edição bilíngüe (inglês/português), com ilustrações coloridas (reproduções dos quadros descritos por JGR nos poemas). Nota de Geraldo Jordão Pereira (editor). Prefácio de Geraldo França de Lima. (Edição especial e fora do comércio). Como organizador de Ave, palavra, Paulo Rónai escreveu três artigos que explicitam os critérios de organização do livro e comentam algumas de suas peças: “Em véspera do livro Ave, palavra, de JGR” (Op. cit., s.d.); “Nota introdutória” (Op. cit., 1970); e “Uma mensagem para cada leitor” ((artigo de jornal, s.n., 27.06.1971). Consultados no Arquivo Paulo Rónai (APR), no Sítio Pois É (Nova Friburgo-RJ). Material que me foi gentilmente cedido para consulta por dona Nora Rónai, sua viúva, Cora e Nora, suas filhas, a quem muito agradeço. Cf. RÓNAI, Paulo. Op. cit., 1970. “Moxinifada” (subst. fem.): mistura de comidas, bebidas, ingredientes etc.; qualquer mistura de coisas; miscelânea, mixórdia; qualquer tipo de confusão. Ver também “mexerufada” (subst. fem.): lavagem, comida de suíno; mistura confusa, desordenada, de seres ou coisas; confusão, misturada (HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001). Essa relação de títulos foi encontrada por Paulo Rónai na pasta com os manuscritos do livro, deixado inacabado pelo autor. RÓNAI, Paulo. Op. cit., s./d. IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Pasta E 33 (2), p. 4. GUIMARÃES ROSA, João. O último dos maçaricos. Tradução do livro Last of the curlews, de Fred Bodsworth. Versão condensada do texto. In Biblioteca de Seleções. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Ypiranga/Seleções do Reader’s Digest, v. 6, 1958. pp. 433-470. Depoimento de JGR a Pedro Bloch. Op. cit., p. 92. Na extensa fortuna crítica de JGR, há poucos estudos dedicados a Ave, palavra. Algumas análises tratam de um grupo de peças temáticas, como: BENAVIDES, Washington. “Los ‘Zoos’ de Guimarães Rosa.” Travessia, Florianópolis, n. 8, 1987, pp. 125-151; GALVÃO, Walnice Nogueira. “Heteronímia em Guimarães Rosa.” In Desconversa (ensaios críticos). Rio de Janeiro: UFRJ, 1998, pp. 83-95; SILVA, Francis da. “Poesia e alteridade em Ave, palavra.” In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa. Seminário Internacional Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2000, pp. 251-256; SOETHE, Paulo. “A imagem da Alemanha em Guimarães Rosa como retrato auto-irônico.” Scripta. Belo Horizonte, v. 9, n. 17, 2005, pp. 287-301. A maioria, no entanto, refere-se a peças isoladas, como: LARA, Cecília de. Op. cit.; ALMEIDA, Tereza Virginia de. “O inumano nas cartas de tarô: uma leitura de ‘Cartas na mesa’”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Op. cit., 2003, pp. 806-811. Há muitos estudos sobre “Fita verde no cabelo”, publicados em DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Op. cit., 2000: COUTINHO, Fernanda. “‘Fita verde no cabelo’: a perenidade do era uma vez” (pp. 246-250); CARVALHO, Tida. “‘Fita verde no cabelo’, nova velha estória: entre a dor e o conhecimento – o prazer” (pp. 681-685); ANDRADE, Maria das Graças. “Tudo er(r)a uma vez” (pp. 428-433); LOPES, Vera. “‘Fita verde no cabelo’: uma rede de leituras” (pp. 686689). Ver também SOUZA, Enivalda. “Dom Quixote e ‘Fita verde’: uma viagem, duas travessias”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Op. cit., 2003, pp. 213-217. JONS, Vicent. João Guimarães Rosa. Boston: G.K. Hall & Co., 1978. O autor analisa todos os livros de JGR. Ave, palavra, que considera “um livro menor”, é tema do último capítulo (“Ave, palavra: the word itself ”). Este bloco de poesia é composto por (1) “Às coisas de poesia” (25.02 e 01.04.1961), de Soares Guiamar (segundo o autor, um poeta “despercebido, impresso, inédito, fora-de-moda – que queria livro, o Anagramas, e disse palpites: Ser poeta é já estar em experimentada sorte de velhice. Toda poesia é também uma espécie de pedido de perdão”); (2) “Novas coisas de poesia” (20.05.1961), de Meuriss Aragão (“Jovem, sem jeito, em sua primeira fase, provavelmente extinta”); (3) “Sempre coisas de poesia” (29.07.1961), de Sá Araújo Ségrim (“poeta comprido – é outro dos anagramáticos, de que hoje disponho. Se bem talvez um tanto discípulo de Soares Guiamar, sob leves aspectos, sofre só e sozinho verseja. Sei que pensa em breve publicar livro: o Segredeiro, e do supracitado é, às vezes, o que prefiro. Será que conosco concordam?”); (4) “Quando coisas de poesia” (inédito), de Sá Araújo Ségrim (que agradou e voltou); e (5) “Ainda coisas de poesia” (inédito), de Romaguari Sães (“o embevecido, escondedor de poemas”). Para uma análise da “Heteronímia em Guimarães Rosa”, ver GALVÃO, Walnice Nogueira. Op. cit., 1998, pp. 83-95. Ver também DOYLE, Plínio. Op. cit., pp. 210-211. Sob este título, o autor lista ainda os seguintes subtítulos: “Animal e palavra. Jardim zoológico. Zodião. Terioscopia. Filmagens. Estudos e exercícios”. IEB/USP, Fundo João Guimarães Rosa, Série “Manuscritos”. RAMOS, Graciliano. Op. cit., p. 45.

224


94

GALVÃO,

Walnice Nogueira. “O impossível retorno”. In Mitológica rosiana. São Paulo: Ática, 1978, p. 33. Ao analisar a metamorfose do onceiro em onça na novela “Meu tio o Iauaretê”, Galvão também destaca a capacidade do autor de fazer seu personagem “comungar com a natureza, com as plantas, com as onças, com cada pequeno ruído ou sinal”. Ainda sobre Ave, palavra, observa que vários textos “lidam muito diretamente com animais, como ‘Quemadmodum’, ‘As garças’, um e outro ‘Aquário’, ‘Ao pantanal’. Outros são do mesmo modo dedicados aos homens de sua terra, seja os vaqueiros de ‘Pé-duro, chapéu-de-couro’, seja os japoneses hortelãos de ‘Cipango’, seja, especialmente, ‘Uns índios (sua fala)’.” 95 RÓNAI, Paulo. “Uma mensagem para cada leitor”. Artigo de jornal, s.n., 27.06.1971. 96 GUIMARÃES ROSA, João. O Jornal, Rio de Janeiro, 28.12.1952. Republicado, com algumas alterações, em GUIMARÃES ROSA, João. Ave, palavra. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970. 97 Consultado na Biblioteca Pessoal de JGR (IEB/USP). Ver a análise das marcas de leitura de JGR em seu exemplar de Os sertões (BOLLE, Willi. “Guimarães Rosa: leitor de Euclides da Cunha.” Revista de Literatura Brasileira. Porto Alegre, n. 20, 1998, pp. 9-41). 98 Ainda que não tenha sido publicado, sua capa, feita à mão pelo próprio Rosa, pode ser consultada na Biblioteca de José e Guita Mindlin (São Paulo), que adquiriram da Livraria José Olympio Editora todos os originais da obra de JGR. 99 Entre os papéis de JGR, Paulo Rónai (organizador do livro) encontrou, além da entrevista com Mariano, as oito novelas constantes de um dos índices: quatro já publicadas (na revista Senhor: “A simples e exata estória do burrinho do comandante”, abr. 1960; “Meu tio o Iauaretê”, mar. 1961; “A estória do homem do Pinguelo”, mar. 1962; e no livro Os sete pecados capitais, no capítulo de JGR sobre a soberba: “Os chapéus transeuntes”, de 1964); quatro inéditas: “Páramo”, “Bicho mau”, “Retábulo de são Nunca”, “O dar das pedras brilhantes” (cf. RÓNAI, Paulo. “Nota introdutória”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969, pp. XIII-XIV). 100 GUIMARÃES ROSA, João. “Pequena palavra” (Prefácio). In: RÓNAI, Paulo (seleção, tradução, introdução e notas). Op. cit., 1975, pp. XI-XXVIII. 101 Apenas um desenho (o primeiro da série) está datado e assinado pelo escritor: 7 de março de 1947. Ou seja, este é anterior à viagem pelo Pantanal, realizada em julho, mas é do mesmo ano. 102 GUIMARÃES ROSA, João. “Carta de JGR ao pai”. Rio de Janeiro, 25.11.1947. 103 RÓNAI, Paulo. “Nota introdutória”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969, p. XIII. 104 O “monólogo em situação dialógica” ou “diálogo visto por uma face” (cf. SCHWARZ, Roberto. “Grande sertão: a fala” e “Grande sertão e Dr. Faustus”. A sereia e o desconfiado: ensaios críticos. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981, pp. 37-41). 105 “Seria a exploração de um mesmo achado formal a explicação para o engavetamento? O brilhante feito de conseguir por uma fala que flui ininterruptamente da boca de um narrador, que é o outro? De fato, tanto o conto como o longo romance saem em forma de fala emitida por um narrador-protagonista. Em ambos os casos, o narrador-protagonista tem sua alteridade marcada com relação ao interlocutor que é homem da cidade e portador dos signos da urbanidade, nem sertanejo, num caso, nem meio-índio no outro. Evitando o contraste de discursos, o interlocutor nunca fala, mas é colocado na fala do outro por meio de interpelações e respostas a hipotéticas perguntas. Assim, a fala só indiretamente se dirige ao leitor, apesar de, em ambos os casos, ser um monólogo direto iniciado por um travessão: seu alvo é o interlocutor presente na situação criada, e só dali ela inflete na direção do leitor. Este, evidentemente, está colocado para cá do interlocutor, e recebe pela mediação deste monólogo a ele destinado. [...] Teriam estas coincidências sido observadas pelo autor, que não queria repetir-se?” (GALVÃO, Walnice Nogueira. Op. cit., 1978, p. 34). 106 É o que observa Viveiros de Castro a respeito de “Meu tio o Iauaretê”: “Talvez seja a única descrição na literatura brasileira, o único caso em que você vê uma pessoa virando um bicho – o que não é de espantar, porque Guimarães sempre teve uma sensibilidade particular para o ponto de vista dos bichos. Ele tem vários textos assim, sobretudo no Ave, palavra. Ele ia para o Jardim Zoológico e para outros lugares, e ficava tentando ver as coisas como se fosse, ele mesmo, um bicho” (Entrevista para o documentário Os nomes do Rosa, realizada no Rio de Janeiro, novembro de 1996).

225


Anexo I PUBLICAÇÕES EM PERIÓDICOS E UM PEQUENO LIVRO ENTRE SAGARANA (1946) E OS LIVROS DE 1956 1947 “São Marcos”. Revista Vamos Ler!, Rio de Janeiro, n. 559, Ano 9, sábado, 19.04.1947, pp. 26-31 e 60-63 (conclusão). Ilustração de Jeronymo Ribeiro. Republicação de um conto de Sagarana (1946). Consultado na Fundação Casa de Rui Barbosa. “Histórias de Fadas”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.091, Ano 46, domingo, 20.04.1947, 2ª Seção, p. 1. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional. “Sanga Puytã”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.192, Ano 47, domingo, 17.08.1947, 2ª Seção, pp. 1 e 2. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional.

1947-1948 “Com o vaqueiro Mariano” (parte 1). Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.252, Ano 47, domingo, 2ª Seção, 26.10.1947, pp. 1 e 3 (conclusão). “Com o vaqueiro Mariano” (parte 2). Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.350, Ano 47, domingo, 2ª Seção, 22.02.48, pp. 1 e 3 (conclusão). “Com o vaqueiro Mariano III” (parte 3). Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.362, Ano 47, domingo, 2ª Seção, 07.03.1948, pp. 1 e 3 (conclusão). As três partes foram reunidas e publicadas em Estas estórias (1969), com o título “Entremeio: com o vaqueiro Mariano”, com algumas alterações (de or-

226


tografia e pontuação) e a supressão de um pequeno trecho da 1ª parte. Consultados na Biblioteca Nacional.

1948 “Cidade”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.344, Ano 47, domingo, 15.02.1948, 2ª Seção, pp. 1 e 3. Incluído em Ave, palavra (1970), com o título “Em-cidade”, com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional. “O mau humor de Wotan”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 16.356, Ano 47, domingo, 29.02.1948, 2ª Seção, pp. 1 e 3 (conclusão). Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional.

1951 “O lago do Itamaraty”. Seleções do Reader’s Digest, Rio de Janeiro, agosto. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Fundação Casa de Rui Barbosa.

1952 “A senhora dos segredos”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 18.317, Ano 52, sábado, 06.12.1952, 1º Caderno, p. 7. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Consultado na Biblioteca Nacional. “Pé-duro, chapéu-de-couro”. O Jornal, Rio de Janeiro, domingo, n. 10.018, Ano 33, 28.12.1952, Revista, p. 1. Incluído em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações e a supressão de um trecho. Consultado na Biblioteca Nacional.

227


Com o vaqueiro Mariano. Niterói: Hipocampo, 52 pp. Ilustração de Darel Valença Lins. Geir Campos e Thiago de Mello (editores). Tiragem de 110 exemplares. Incluído em Estas estórias (1969). Consultado na casa de dona Maria Augusto de Camargos Rocha (Madu).

1953 “Terrae Vis”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 25.01.1953. Consultado na Biblioteca Nacional. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 289, Ano 7, domingo, 10.05.1953, p. 2. “Cipango”, Folha da Manhã, São Paulo, 17.02.1953. Consultado na Biblioteca Nacional. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 286, Ano 7, domingo, 12.04.1953, pp. 6 e 7 (conclusão). “A senhora dos segredos”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 284, Ano 7, domingo, 22.03.1953, p. 9. “Ao pantanal”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 05.04.1953. Consultado na Hemeroteca Histórica de Belo Horizonte (Superintendência de Bibliotecas Públicas de Minas Gerais). Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 19.842, Ano 57, sábado, 1º Caderno (seção “Literatura”), 30.11.1957, p. 9. Consultado na Biblioteca Nacional. Jornal de Letras, Rio de Janeiro, n. 101-2, Ano 10, janeiro de 1958, p. 8. Consultado na Fundação Casa de Rui Barbosa. “Teatrinho”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 287, Ano 7, domingo, 19.04.1953, p. 9. “O homem de Santa-Helena”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 288, Ano 7, domingo, 03.05.1953, p. 9.

228


“Do diário em Paris”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 290, Ano 8, domingo, 17.05.1953, p. 2. “Fantasmas dos vivos”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 291, Ano 8, domingo, 24.05.1953, p. 2. “Os doces”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 292, Ano 8, domingo, 07.06.1953, p. 4. “Discurso de Posse na Sociedade Brasileira de Geografia”. Revista da Sociedade Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro. Os periódicos foram consultados na Fundação Casa de Rui Barbosa (A Manhã e Jornal de Letras), na Biblioteca Nacional (Correio da Manhã, Folha da Manhã e Diário de Minas) e na Hemeroteca Histórica de Belo Horizonte (Diário de Minas). Com exceção de “Os doces”, que não foi republicado em livro, todas as demais publicações de 1953 integram Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. Com exceção de “Ao pantanal”, os demais (8) foram publicados no suplemento “Letras e Artes” do jornal A Manhã, do Rio de Janeiro, de março a junho de 1953. Até o momento, não localizei o volume original da Revista da Sociedade Brasileira de Geografia (mas o “Discurso de Posse” está arquivado no IEB/USP, Fundo JGR, série “Recortes”).

1954 “A chegada de Subles”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 293, Ano 8, terça-feira, 06.04.1954, p. 9. “Do diário em Paris”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 294, Ano 8, terça-feira, 13.4.1954, p. 10. “Risada e meia”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 297, Ano 8, terça-feira, 04.05.1954, p. 8.

229


“Aquário (Nápoles)”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 298, Ano 8, 3ª feira, 11.05.1954, p. 5. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, n. 19.869, Ano 57, sábado, 1º Caderno, 21.12.1957, p. 11 (seção “Literatura”). Consultado na Biblioteca Nacional. “A senhora dos segredos”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 299, Ano 8, terça-feira, 18.05.1954, p. 9. “Uns índios – sua fala”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 300, Ano 8, terça-feira, 25.05.1954, p. 9. “Os doces”. “Letras e Artes”, suplemento de A Manhã, Rio de Janeiro, n. 301, Ano 9, terça-feira, 01.06.1954, p. 9. Todos (7) foram publicados no suplemento “Letras e Artes” do jornal A Manhã, entre abril e junho de 1954 (consultados na Fundação Casa de Rui Barbosa). “A senhora dos segredos” e “Os doces” já haviam sido publicados no jornal A Manhã, em 1953. Com exceção de “Os doces” e “Risada e meia”, os demais foram republicados em Ave, palavra (1970), com pequenas alterações. O título de “A chegada de Subles” foi alterado para “Subles”; o de “Uns índios – sua fala” para “Uns índios (sua fala)”. “Risada e meia” foi republicado em Tutaméia (1967) com alterações, acréscimos e com outro título: o prefácio “Aletria e hermenêutica”.

Anexo II PUBLICAÇÕES DE 1947-1954 QUE INTEGRAM AVE, PALAVRA, 1970 (com alterações)

1947 1 – “Histórias de fadas”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20.04.1947. 2 – “Sanga puytã”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 17.08.1947.

230


1948 3 – “Cidade”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 15.02.1948 (incluído com o título “Em-Cidade”, com pequenas alterações). 4 – “O mau humor de Wotan”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 29.02.1948.

1951 5 – “O lago do Itamaraty”. Seleções do Reader’s Digest, Rio de Janeiro, agosto.

1952 6 – “A senhora dos segredos”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 06.12.1952. 7 – “Pé-duro, chapéu-de-couro”. O Jornal, Rio de Janeiro, 28.12.1952 (incluído com pequenas alterações e a supressão de um trecho).

1953 8 – “Terrae vis”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 25.01.1953; A Manhã, Rio de Janeiro, 10.05.1953. 9 – “Cipango”. Folha da Manhã, 17.02.1953. 10 – “Ao pantanal”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 05.04.1953. 11 – “Teatrinho”. A Manhã, Rio de Janeiro, 19.04.1953. 12 – “O homem de Santa-Helena”. A Manhã, Rio de Janeiro, 03.05.1953. 13* – “Do diário em Paris”. A Manhã, Rio de Janeiro, 17.05.1953. 14 – “Fantasmas dos vivos”. A Manhã, Rio de Janeiro, 24.05.1953.

1954 15 – “A chegada de Subles”. A Manhã, Rio de Janeiro, 06.04.1954.

231


16* – “Do diário em Paris”. A Manhã, Rio de Janeiro, 13.04.1954. 17 – “Aquário (Nápoles)”. A Manhã, Rio de Janeiro, 11.05.1954. 18 – “Uns índios – sua fala”. A Manhã, Rio de Janeiro, 25.05.1954. Em negrito: dez publicações que remetem às viagens e documentos inéditos de Guimarães Rosa que datam de 1938-1952. * As duas publicações “Do diário em Paris” (1953 e 1954) foram reunidas numa só, em Ave, palavra.

Anexo III DEMAIS PUBLICAÇÕES (1957-1967) E INÉDITOS QUE INTEGRAM AVE, PALAVRA 1957 1 – “Dois soldadinhos mineiros”. Boletim da Biblioteca do Exército, abril de 1957. 2 – “Minas Gerais”. Manchete, 24.08.1957.

1961 3 – “De stella et adventu magorum”. O Globo, Rio de Janeiro, 07.01.1961. 4 – “Além da amendoeira”. O Globo, Rio de Janeiro, 21.01.1961. 5 – “Uns inhos engenheiros”. O Globo, Rio de Janeiro, 04.02.1961. 6 – “O grande samba disperso”. O Globo, Rio de Janeiro, 11.02.1961. 7 – “Homem, intentada viagem”. O Globo, Rio de Janeiro, 18.02.1961. 8 – “Coisas de poesia”. O Globo, Rio de Janeiro, 25.02.1961 e 01.04.1961 (republicado como “Às coisas de poesia”). 9* – “Zôo (Hagembecks-Tierpark, Hamburgo-Stellingen)”. O Globo, Rio de Janeiro, 11.03.1961; e Pulso, Rio de Janeiro, 29.04.1967. 10 – “Circo do miudinho”. O Globo, Rio de Janeiro, 25.03.1961.

232


11 – “Zôo (Rio, Quinta da Boa Vista)”. Pulso, Rio de Janeiro, 01.04.1967. 12 – “Zôo (Parc Zoologique du Bois de Vincennes)”. O Globo, Rio de Janeiro, 29.04.1961. 13 – “Novas coisas de poesia”. O Globo, Rio de Janeiro, 20.05.1961. 14 – “A velha”. O Globo, Rio de Janeiro, 03.06.1961. 15 – “A caça à lua”. O Globo, Rio de Janeiro, 17.06.1961. 16 – “Zôo (Jardin des Plantes)”. O Globo, Rio de Janeiro, 24.06.1961. 17 – “Sempre coisas de poesia”. O Globo, Rio de Janeiro, 22 [ou 29].07.1961. 18 – “Evanira”. O Globo, Rio de Janeiro, 26.08.1961 (republicado como “Evanira!”). 19 – “O burro e o boi no presépio”. Senhor, Rio de Janeiro, dezembro de 1961.

1964 20 – “Fita verde no cabelo (Nova velha estória)”. O Estado de S.Paulo, São Paulo, 08.02.1964.

1965 21 – “O porco e seu espírito”. Pulso, Rio de Janeiro, 12.06.1965. 22 – “Sem tangência”. Pulso, Rio de Janeiro, 24.07.1965. 23 – “Quemadmodum”. Pulso, Rio de Janeiro, 30.10.1965 [ou 1967].

1966 24 – “Cartas na mesa”. Pulso, Rio de Janeiro, 08.01.1966. 25 – “Nascimento”. Pulso, Rio de Janeiro, 24.12.1966.

1967 26 – “Aquário”. Pulso, Rio de Janeiro, 18.02.1967 [republicado como “Aquário (Berlim)”].

233


27 – “Zôo (Whipsnade Park, Londres)”. Pulso, Rio de Janeiro, 07.01.1967. * “Zôo (Hagembecks-Tierpark, Hamburgo-Stellingen)”. Pulso, Rio de Janeiro, 29.04.1967 (já publicado em O Globo, 11.03.1961). 28 – “Os abismos e os astros”. Pulso, Rio de Janeiro, 27.05.1967. 29 – “Reboldra”. Pulso, Rio de Janeiro, 10.06.1967.

Inéditos 30 – “Grande louvação pastoril à linda Lygia Maria” 31 – “Quando coisas de poesia” 32 – “Ainda coisas de poesia” Em negrito: dez publicações que remetem às viagens e documentos inéditos de Guimarães Rosa que datam de 1938-1952.

Inéditos de João Guimarães Rosa Contos (Sezão), mimeo, 1937. AGR/IEB/USP. “Diário em Hamburgo”. Cópia xerográfica. Acervo Henriqueta Lisboa, do Acervo de Escritores Mineiros (Fale/BU/UFMG). Pastas E3 (1) – “França-Paris” (pp. 1-54). AGR. Contém cópia de passagens do diário de JGR em Paris. Pastas E3 (2) – “França” (pp. 55-121). AGR. Contém cópia de passagens do diário de JGR em Paris. Pastas E1 (1) – “Europa” (57 pp.), dat. AGR. Pastas E1 (2) – “Europa” (112 pp.), dat. AGR.

234


Pastas E1 (3) – “Europa” (163 pp.), dat. AGR. Pasta E26 – “Notas da grande excursão a Minas” (20 pp.), “A saída” (2 pp.), “A boiada” (3 pp.). AGR. Pastas E 27 (1) (2) – “Boiada”. AGR. Pasta E28 – “A boiada 1”, dat., 80 pp. AGR. Pasta E29 – “A boiada 2”, dat., 77 pp. AGR. “Caderneta do sertão” (6), manuscrita, 31 pp. AGR. “A boiada”, dat., 13 pp. Consultado na casa de dona Aracy (SP). “Cadernetas da Europa” (1) (2) (3) (4) (5), manuscritas. AGR. Pastas E33 (1) (2) – Ave, palavra. AGR. Pasta 34 (1) – “Inéditos I”. AGR. Primeiro Rascunho (R1) de Grande sertão: veredas. Consultado na casa de dona Aracy Moebius de Carvalho, São Paulo (SP). Volume datilografado e encadernado. Segundo Rascunho (R1) de Grande sertão: veredas. Consultado na casa de dona Aracy Moebius de Carvalho, São Paulo (SP). Volume datilografado e encadernado.

235


No giro da memória: literatura e psicanálise em Grande sertão: veredas Cleusa Rios Pinheiro Passos

A gente vive repetido, o repetido, e, escorregável, num mim minuto, já está empurrado noutro galho.1

No ano em que as obras Grande sertão: veredas e Corpo de baile de Guimarães Rosa comemoram 50 anos de publicação (sem esquecer os 60 de Sagarana), impressiona a vasta bibliografia sobre elas, abrangendo diferentes conhecimentos. Da análise textual à histórica, da crítica genética à tradição literária, as abordagens interpretativas complementam-se e interagem, comprovando, cada vez mais, a importância do autor e seu amplo diálogo com a cultura – um dos fatos responsáveis pela universalidade de traços que vão muito além do regional. Em meio a essa fortuna crítica, é possível recobrar vínculos entre alguns de seus escritos e a teoria psicanalítica, no intento de revisitar efeitos de sentido aí gerados. Leitor perspicaz, ao elencar a Günter Lorenz autores da “literatura alemã” que o “impressionaram e influenciaram intensamente”, Guimarães ressalta a “importância monstruosa de Freud”.2 Por outro lado, admitir a influência do pensamento psicanalítico em suas produções, embora ela ocorra veladamente, dá ao leitor certa garantia da familiaridade com processos inventivos que transitam tanto na psicanálise quanto na literatura. Retomando depoimentos de Rosa, cabe lembrar que, numa entrevista, o crítico Emir Monegal aponta-lhe um dos famosos “lapsos” verbais de Grande sertão, obtendo como resposta: “Temos que trabalhar a favor das limitações”.3

262

24/11/06 – 18h


Ora, suas composições mostram o contrário: ele trabalha a favor das ampliações, seja pela linguagem transgressiva, seja pelos diálogos com campos culturais diversos, seja pela presença analógica do inconsciente e suas formações – um dos focos a serem aqui abordados. E, ainda, como entender a réplica a Monegal, diante da renomada preocupação do autor com o pormenor no ato criativo? Ou, talvez, a réplica não desviasse o olhar de mais um recurso de sua criação? Por isso, a passagem do “lapso” merece resgate, pois é portadora de um expressivo sentido no conjunto narrativo de que faz parte. Em linhas gerais, o referido “lapso” diz respeito ao oferecimento de uma pedra preciosa (índice de um afeto não declarado) por Riobaldo – narrador e ex-jagunço – a Diadorim, donzela travestida para combater ao lado do pai, chefe de um bando guerreiro em pleno sertão. Rechaçada pela moça em razão do próprio travestimento, a pedra é nomeada topázio, safira e ametista, conforme o momento, tornando-se, por fim, um presente do narrador para a esposa Otacília, num discurso ambíguo referente a sua posse, discurso em que o objeto tanto parece pertencer à companheira oficial, como ganhar dimensão própria: “(...) E hoje ela se possui é em mão de minha mulher!”4 Entre tantos enganos do romance, a escolha recai, particularmente, sobre esse lapso, não apenas porque preservado por Rosa, mas também porque, em ponto menor, lança luz sobre a composição de cadeias significantes amplas. Uma delas, a da fala e escuta, constitui importante fio da trama a ser perseguido. Quanto à pedra, textualmente, sua transformação consiste em algo interno; uma peça de “ornamento” passa a identificar-se, a partir da recusa de Diadorim, à demanda (e rejeição) amorosa e, por conseguinte, não pode mais ser designada da mesma forma, pois o objeto endereçado a uma acaba ofertado a outra, alterando-se a relação do sujeito Riobaldo com o Simbólico, um dos registros da tópica lacaniana, apoiado na linguagem.5 Mais especificamente, a relação com a linguagem modifica-se em relação aos nomes da pedra, que, metáfora do amor, perde a primeira designação (sem se saber qual teria sido ela de fato), comportando um aspecto básico: é uma espécie de invólucro que esconde e revela, paradoxalmente, um bem precioso, o proibido amor por Diadorim.6 Aceitá-la seria um sinal; adiar o recebimento para o término da luta seria outro. Todavia, o ex-jagunço não percebe a segunda possibilidade e, submisso à linguagem, aflora como “sujeito suspenso” ao lon-

263

24/11/06 – 18h


go do romance; isto é, a cadeia significante em que a pedra se insere, insinuando uma espécie de compromisso e sustentação amorosa, rompe-se. Um elo desconecta-se, instaurando uma ciranda distinta, introdutora de novo deslocamento: a mudança de nome, implicando a desfiguração do objeto e o traço de uma irrevogável negação do (e pelo) Outro. Elemento circunstancial, a pedra termina por constituir uma metonímia do fantasma fundamental de Riobaldo, que parece fixar-se na palavra “não dita”, deslizante e igualmente “suspensa” no discurso. Topázio, safira, ametista... os significantes, metonimicamente, deslocam-se e, com eles, o ex-jagunço, que viverá sempre hesitante e à procura da compreensão do passado, marcado por duas passagens cruciais, o amor ilícito e o suposto pacto com o demo. Em primeira instância, esse “ajuste diabólico” é feito para vencer o inimigo, entretanto, suportar as emoções despertadas por Diadorim também exige uma força demoníaca. A inquietude do ex-jagunço conforma-se, insistentemente, pela fala e escuta – vertente bastante sublinhada pela crítica e básica para que tenha lugar a busca de “individualidade” de Riobaldo, além de o próprio lapso do qual tratamos. De forma análoga, a troca de nomes atinge o próprio narrador, chamado “Cerzidor”, “Tatarana” ou “Urutú-Branco”, segundo o papel exercido na jagunçagem, e, mais, aí se delineia um dos traços especulares com a amada, graças à corrente significante que a designa: Reinaldo para o grupo, Diadorim para ele e, na origem, Maria Deodorina – nome de batismo ironicamente desvendado só após sua morte. A substituição das palavras deixa entrever algo do cerne da obra, já que põe em jogo as obsessões de Riobaldo, seu desejo e o de seu par, ora pelo engano assinalado, ora por elaborações verbais determinantes da reconfiguração de cada um. Nessa direção, a inatingível meta do narrador – sabendo-o ou não – é evitar o deslizamento infinito das palavras que o enredam, no intento de ir além de se constituir “sujeito de sua fala” para culminar como sujeito no (e do) desejo, o que resultaria alcançar a “individualidade”7 que lhe escapa. A procura surge desde as confissões a Otacília sobre o amor pela guerreira até o apoio de amigos e de Quelemém, “compadre” religioso e ouvinte, que aquieta seu constante “temer de consciência”, resultado do contrato demoníaco e da afeição por um igual – de certo modo, também pactário, pois don-

264

24/11/06 – 18h


zela dissimulada sob trajes, parentesco e nomes (masculino e neutro), gradativamente revelados a Riobaldo. No entanto, essas vias não o satisfazem, uma vez que suas confissões vêm permeadas por afetos e recriminações que – se atenuam a angústia e pagam o preço do desejo inapreensível – não bastam nem criam o distanciamento necessário de uma escuta, a um tempo alheia e próxima a sua caracterização. Riobaldo é letrado como o doutor, viajou pelo sertão, escutando causos e recontando-os no presente. Poderia ele próprio assumir a escrita, à maneira dos romances de memória em primeira pessoa. Porém, Grande sertão abre-se com um travessão e sua voz, fechando-se com a sugestão de que ao viajante cabe “enche(r) uma caderneta”8, numa palavra, escrever. À primeira vista, o ex-jagunço, frente à morte e ao (não) saber sobre a feminilidade da amada, recusa o peso da verbalização: “Não escrevo, não falo! – para assim não ser: não foi, não é, não fica sendo! Diadorim...”.9 Contudo, volta atrás e dá curso à oralidade que, sintomaticamente, domina o pacto ficcional; aliás, oralidade mediada pela escrita, sem que se explicite o papel de tal jogo. Ora, o trabalho criativo de Rosa leva à hipótese de que não estaria na escrita a ajuda que almeja Riobaldo, pois, se ela permite reconstruções do vivido, não oferece a escuta “flutuante” de um terceiro, impedindo os afetos da “transferência”10, suporte para que retornem as experiências anteriores e, pontuadas, propiciem (re)descobertas e reflexões inusitadas. No princípio, recordar vincula-se a tudo rever e refazer, com o intuito de “receber outra vez o que não tinha tido, repor Diadorim em vida?”11 Na confissão, desejo, logro e descrença contaminam-se. O sinal interrogativo evidencia um saber concernente ao impossível retorno temporal, destacando a função do ouvinte: desencadeador da “fala” e da repetição. Aliás, a identificação projetiva entre Riobaldo e o doutor enseja a confiança, responsável pelo questionamento de opiniões, reavaliação dos fatos e, por vezes, sua reelaboração. Essa idéia é observada em sua demanda narrativa: “(...) Ao doido, doideiras digo. Mas o senhor é homem sobrevindo, sensato, fiel como papel, o senhor me ouve, pensa e repensa, e rediz, então me ajuda.”12 “Fiel como papel”, o viajante detém a escuta e o “redizer”, condicionado ao filtro do “falante”. Muito próximo das relações no divã, o ex-jagunço confere ao Outro, por meio de perguntas (“Agora, que o senhor ouviu, perguntas

265

24/11/06 – 18h


faço”)13, um “suposto saber”14 paradoxalmente negado ao longo do narrar (“O senhor não me responda”)15. O mesmo saber é atribuído a Quelemém e aos chefes maiores, versados no viver: “Zé Bebelo um tanto sabia disso, mas sabia sem saber, e saber não queria; como Medeiro Vaz, como Joca Ramiro; como compadre meu Quelemém, que viaja diverso caminhar”.16 A citação reforça as incertezas de Riobaldo que, arguto, reconhece as limitações do saber humano, bem como o imperativo de sua solidão: “Sozinho sou, sendo, de sozinho careço, sempre nas estreitas horas – isso procuro”.17 Todavia, persiste a inquietação do leitor: por que contar, se é impossível vencer o desamparo, a cegueira pretérita e a morte? A psicanálise permite entrever caminhos: para além do “repensar”, “remexendo(r) o vivido”18, implicaria reatualizálo como uma espécie de ato só possível pela “fala”, uma vez que o desaparecimento de Diadorim é irreversível. O contador estaria sempre retornando ao momento da perda, ao desejo de apagá-la e de recobrar – embora imaginariamente – a figura “viva” da amada. Se o ex-jagunço narra para “organizar a experiência”, conforme parte da 19 crítica , sublinho aqui outra face de sua fala, a do luto. Verbalizado como “nojo e emenda”, na passagem em que Otacília vem reencontrá-lo, dando-lhe tempo para recompor-se20, ficam as questões: em seu narrar, a perda teria sido superada? Nele, a força maior é a da reelaboração ou a da repetição? O luto de Riobaldo teria mesmo se realizado? A meu ver, não inteiramente. Basta reler a passagem em que, ao recordar a morte da guerreira, o lamento ainda o domina: “Ah, Diadorim... E tantos anos já se passaram”.21 E, ainda, luto por quem? Maria Deodorina, a donzela morta e passível de amor, ou Diadorim, o parceiro amado, apesar dos interditos? Por outro lado, difícil argumentar que ele se entregue à melancolia. Sua trajetória mostra a incessante tentativa de fugir dela. Casar, rever amigos, retomar o lugar do pai nas fazendas, seguir os conselhos de Zé Bebelo e Quelemém o impelem a prosseguir, a “não adiar”. Irônica e conscientemente “fugidor” 22, dessa vez Riobaldo permanece, embora não consiga esquivar-se do “giro da memória” e, nela, não ocorra a renúncia ao objeto perdido, pois a presença de Diadorim continua um forte núcleo de cristalização da dor que – de novo, o paradoxo – o paralisa e o impulsiona a contar... É preciso não esquecer que, ao liberar seu hóspede da escuta, Riobaldo formula uma inquietante conclusão: “Sei de mim? Cumpro”,

266

24/11/06 – 18h


aliado ao retorno do primeiro termo do texto – “Nonada” – e à frase final do romance: “O diabo não há! É o que eu digo, se for... Existe é homem humano. Travessia”. Não haveria nas hesitações e na sugestão de “atravessar” algo cíclico, como se também o antigo e obsedante enamoramento persistisse? Tal situação justificaria o fato de Riobaldo jamais abdicar efetivamente do verbo, já que a “falência” do discurso permitiria sua entrada na órbita da pulsão de morte.23 Enquanto perdurar a palavra, dirigida ao Outro (seja ele quem for), o ex-jagunço, mesmo duvidando sobre o “saber de si”, “cumprirá” o curso da existência. A duras penas! Assim, o lapso da pedra configura não um engano que Rosa prefere manter, mas um acerto diferenciado, entre outros deslizes de Grande sertão – esses, sim, pontuados textualmente pelo narrador. À guisa de exemplo, veja-se o episódio acerca do ciúme de Diadorim por Nhorinhá, “prostitutriz” e “cravável lembrança” do parceiro. Perturbada pelo oferecimento da pedra, a guerreira altera o nome do lugarejo da rival, sem o notar: “– ... Ou quem sabe você resolve melhor mandar de dádiva para aquela mulherzinha especial, a da Rama-deOuro, filha da feiticeira”. “Não era na Rama-de-Ouro – era na Aroeirinha”24, corrige o ex-jagunço. Resta ao leitor interpretar a troca. Nhorinhá representa o que Diadorim precisa negar: a feminilidade e o prazer da sexualidade. O arbusto inserido no nome do espaço de Nhorinhá se preserva como “rama”, mas ganha a qualidade “áurea”, índice do desejo reprimido ou da transação “negociável” do corpo. A hipótese se confirma com a evocação da etimologia de “rameira” (ramo + eira) e o costume português do século XV, segundo o qual as “freqüentadoras das tabernas, para assinalarem sua presença, ostentavam na porta ramos de árvores”.25 Ora, enquanto a meretriz se anuncia, a donzela se oculta. Aí, igualmente, o lapso não é ato verbal fracassado, mas “bem-sucedido”, para além da “derrapagem”, é invenção poética.26 Matreiro, Rosa ignora a ressalva de Monegal, já que reconhece o valor do logro na fala de cada um. Diferentemente dos demais equívocos, o narrador não retifica o lapso relativo à pedra; cabe ao crítico/leitor pontuá-lo. O fato resguarda a substituição nominal do objeto precioso seja como criação, seja como uma marca – em ponto menor, insisto – da complexa elaboração do romance: a presença da palavra sempre deslizan-

267

24/11/06 – 18h


te, sinuosa e insubordinada. O autor mimetiza, variada e adequadamente, dados psíquicos concernentes à memória e à “fala”, valendo-se, como poucos, da ambigüidade verbal – expressivo recurso de suas produções literárias. Tais aspectos insinuam a persistência de Riobaldo em revisitar sua história, graças a associações, analogicamente livres e contínuas, lacunares, plenas de idas e voltas. Não por acaso, as primeiras edições do romance terminam com o sinal de infinito, reforçando a idéia segundo a qual – para o ex-jagunço – contar parece não se esgotar nunca, pois é a ponte entre o luto e a melancolia a evitar o domínio da segunda e, conseqüentemente, exposto a lacunas, deslocamentos e enganos. Contar impede ainda que a perda o preencha, o amor antigo oponha-se ao desejo e a busca de “individualidade” se esgote, ganhando espaço a pulsão de morte. Enfim, se o conjunto de Grande sertão: veredas comporta inúmeras áreas do conhecimento, traz também noções psicanalíticas, expressivas tanto para a trilha desejante de seu narrador, quanto para o leitor que se queira constituir sujeito do/no próprio desejo. A meu ver, nesse aspecto, Rosa alcança uma feliz confluência entre literatura e psicanálise, não separando saberes, mas os integrando culturalmente por meio de uma transfiguração literária singular que, na contramão de sua entrevista, trabalha a favor das ampliações...

Cleusa Rios Pinheiro Passos é professora titular do Departamento de Teoria Literária e Literatura Comparada da USP, autora de Guimarães Rosa: do feminino e suas estórias (Hucitec/ Fapesp, 2000) e Confluências: crítica literária e psicanálise (Edusp/Nova Alexandria, 1995).

268

24/11/06 – 18h


NOTAS 1 GUIMARÃES ROSA, João. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969, p. 52. 2 COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983, p. 88. 3 Ibidem, p. 52. 4 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 49. 5 O termo é empregado no sentido lacaniano. Em linhas bem gerais, como uma das três instâncias ligadas ao inconsciente, o Simbólico vincula-se à linguagem, às interdições e às leis, presentificando o sistema cultural a que pertencemos. Cf. LACAN, Jacques. Le séminaire, livre XI. Les quatre concepts fondamentaux de la psychanalyse. Paris: Seuil, 1973, p. 88. 6 Segundo a teoria freudiana, os “lapsos” não consistem em equívocos verbais sem importância, mas “atos psíquicos completos”, “possuidores de um sentido e de uma intenção”, resultantes de “duas intenções diferentes”, em que uma delas deve ter sofrido, antes do discurso, “certa repressão” para ter possibilidade de “manifestar-se pela perturbação da outra”. Freqüentemente, o sujeito ignora seu engano, contudo a repressão em “dizer alguma coisa” constitui condição indispensável para que o equívoco se configure. Por analogia, esse seria o caso de Riobaldo no que se refere à pedra. Quanto a Rosa, nada nos permite discutir seu deslize, não só porque caberia a ele associar, bem como conhecer seus “motivos” em nada contribuiria para a interpretação do romance. Cf. FREUD, Sigmund. “Actos fallidos”. In Obras completas, v. 2. Madri: Editorial Biblioteca Nueva, 1948, pp. 65-95. 7 Para Lacan, a “individualidade” não constitui a unidade de cada um como corpo, mas consiste, textualmente, “dans le rapport privilégié où culminons comme sujet dans le désir” (na relação privilegiada em que culminamos como sujeito no desejo). Cf. LACAN, Jacques. Op. cit., p. 203. 8 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 451. 9 Ibidem, p. 453. 10 Na esteira freudiana, Lacan discute a questão da “transferência”, em diferentes passagens. Da perspectiva analógica, interessam aqui as reflexões que a consideram “um fenômeno essencial, ligado ao desejo como fenômeno nodal do ser humano, descoberto antes de Freud e articulado, rigorosamente, no debate sobre o amor, em O banquete, de Platão”. A isso, acresce-se uma afirmação básica para a trajetória deste artigo: “Se houver, em algum lugar, ‘sujeito suposto a saber’, ocorre a ‘transferência’”. LACAN, Jacques. Op. cit., p. 210. 11 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 455. 12 Ibidem, p. 79. 13 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 86. 14 Em 1895, Freud já se refere a esse “estado singular em que o sujeito sabe tudo sem o saber (...)”, afirmando que tal fato só se torna compreensível se nos encontramos em estado semelhante, aproximando-o, entre outros exemplos, à “cegueira dos não-cegos que nos espanta constatar nas mães quando se trata de suas filhas” ou aos “soberanos a respeito de seus favoritos”. Cf. FREUD, Sigmund e BREUER, Joseph. Études sur l’hystérie. Paris: P.U.F., 1956, pp. 91-92. Mais tarde, Lacan retorna à noção de “sujeito suposto saber” relacionandoa à idéia de “saber absoluto” e à situação transferencial na análise. Por analogia, Riobaldo estaria nessa posição em relação a seu ouvinte. Cf. LACAN, Jacques. Op. cit., pp. 209-220. 15 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 86. 16 Ibidem, pp. 86-87. 17 Ibidem, p. 119. 18 Ibidem, p. 135. 19 Ver, entre vários ensaios: ARRIGUCCI JR., Davi. “O mundo misturado – Romance e experiência em Guimarães Rosa”. Novos Estudos. São Paulo, 1994, n. 40, Cebrap, pp. 7-30; e MENESES, Adélia Bezerra. “Grande sertão: veredas e a psicanálise”. Scripta. Belo Horizonte, v. 5, n. 10, 2002, pp. 21-36. 20 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 457. 21 Ibidem, p. 147. 22 Ibidem, p. 142. 23 Cf. FREUD, Sigmund. “La afliccion y la melancolia”. Op. cit., pp. 1087-1095; e LACAN, Jacques. Op. cit., pp. 456-460. 24 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 285. 25 HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss de língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. 26 Sobre o assunto, Cf. LACAN, Jacques. Op. cit., pp. 28-29.

269

24/11/06 – 18h


O autor quase de cor: rememorações filosóficas e literárias Benedito Nunes

Esta reflexão sobre a obra de Guimarães Rosa acompanha o decurso de uma conversa que com ele tive em fevereiro de 1967, num gabinete do antigo Itamaraty, no Rio de Janeiro. Surpreendeu-me sua avantajada estatura, porte sólido e saudável, ombros largos de boiadeiro, em contraste com a mansidão da voz. Mal me sentara ao lado da mesa que meu interlocutor ocupava, posta sobre um estrado, numa cadeira de onde o divisava sempre de baixo para cima, levantou-se, abriu a gaveta superior de um arquivo burocrático e entregou-me grosso volume encadernado e datilografado que dela retirou. Era o original de Tutaméia. Surpreso diante do estranho subtítulo daquele seu último livro ainda inédito – Terceiras estórias –, perguntei-lhe de imediato onde estariam as Segundas: “Ah! – exclamou – isso é um mistério que não posso revelar ainda. Escrevi quatro prefácios diferentes para as 40 estórias aqui reunidas. Leia o primeiro, ‘Aletria e hermenêutica’, e dê-me sua opinião”. Então, como para me pôr à vontade enquanto eu lia o prefácio, abriu o Herzog, de Saul Bellow, em tradução portuguesa. Mas ambos estávamos desatentos. Olhávamo-nos de soslaio. Eram movimentos de mútua inspeção interrompendo cá e lá nossas leituras imparalelas. Cheguei exausto ao fim da minha, incomodado com a presença dele e premido pela necessidade de responder-lhe a indagação antes proposta. Não estaria eu recebendo o privilégio de surpreender a novidade de seu livro ainda inédito? Como sabia que o autor muito próximo se achasse da tradição ocultista, julguei que a incumbência dele recebida era uma espécie de ato iniciático disfarçado. Confirmou-o gesto ritualístico de Rosa naquele momento ao dividir comigo, exatamente pela metade, uma bolacha Maria que juntos comemos em comunhão.

236

24/12/06 – 18h


Correu o cafezinho. Ele pitou o seu primeiro cigarro. Segurava-o de maneira imponente, num gesto largo e meditado, entre o polegar e o indicador (segundo vim a saber, é assim que se fuma no interior de Minas). Aproveitei a pausa para revigorar o ânimo. E pude então dizer-lhe, tirando vantagem do meu prévio conhecimento de muitas histórias de seu novo livro, já por mim lidas em Pulso, jornal médico onde foram estampadas, que “Aletria e hermenêutica” defendia original convergência entre o imaginário e o reflexivo, o teórico e o poético. E como os prefácios não podem ser separados das estórias que preludiam, Tutaméia conseguira realizar, ao juntá-los, um empreendimento tanto literário quanto filosófico. Não usei, infelizmente, na tensão da hora, destas mesmas palavras que agora emprego. Mas deu-se Guimarães Rosa ao trabalho de desenvolver minha canhestra observação, estendendo-se longamente a propósito das passagens de Sexto Empírico empregadas como epígrafes num dos prefácios de Tutaméia, sobre a incorporação da filosofia em sua literatura, a respeito da qual nos deteremos adiante. • A primeira questão com a qual deparamos é a legitimidade, como método, da aplicação da filosofia, de um modo geral, à leitura de textos literários, mormente os de ficção, e em particular o romance, as novelas e os contos curtos (estórias) de Guimarães Rosa. Perguntemos, porém, antes de tudo, em que consiste o exame filosófico de uma obra literária. Há, pelo menos, quatro modos de efetuá-lo. O mais corrente é o modo tópico, que se atém aos conceitos repertoriados pela história da filosofia, limitando-se a assinalar as suas incidências na expressão dos personagens ou na voz do narrador, sejam diretas, sejam indiretas, alusivas, retrabalhadas segundo a forma particular do discurso narrativo, como as que prevalecem em Guimarães Rosa. Do tecido poético de sua prosa afloram diferentes conceitos filosóficos ou parafilosóficos, sempre pertencentes a troncos do pensamento metafísico e de ramificações religiosas. Para não irmos tão longe quanto foi Hygia Terezinha Calmon Ferreira1 – arrolando dos escritos disponíveis do ficcionista, inclusive cartas, as numerosas fontes da filosofia, da religião e da mística a que ele recorreu –, basta lembrarmos a freqüência profusa,

237

24/12/06 – 18h


que estonteia o intérprete, de alusões a Platão e a Plotino, quando não a fragmentos de Heráclito e a passagens do saber hermético-alquímico, parafraseados e parodiados no torrencial monólogo de Grande sertão: veredas. Seja dito, porém, que os abundantes elementos das tradições filosófica, mística e religiosa nele incorporados direta ou indiretamente, em surpreendentes combinações, pesam, em qualquer caso, no desenvolvimento da narrativa. Já o segundo modo, que chamaríamos de instrumental, utiliza-se, abstraindo a história da filosofia, de conceitos exponenciais para elucidar as situações e os conflitos dos personagens. Assim procedeu Sônia Maria Viegas em A vereda trágica do Grande sertão: veredas2, ao empregar, para o aclaramento de uma das peripécias desse romance, o pacto com o Demônio, o par dialético do senhor e do escravo em Hegel, que daria a medida do agônico processo de auto-reconhecimento de Riobaldo, caracterizando, dessa maneira, seu embate com o Destino, complemento trágico ao épico das lutas e façanhas do narrador-jagunço. Nem instrumental nem histórico-filosófico, o terceiro modo visa a reconstituir a filosofia inerente, própria ao texto ficcional, aquela que esse mesmo texto carrega consigo, como um produto endógeno seu. É uma “filosofia literária”, conforme a denomina Pierre Macherey3, exemplar único para cada obra, não sistematizável, composta de idéias fluidas, entre a abstração dos conceitos e a concretude das imagens, porque gerada e produzida mediante as formas literárias de que nasce e das quais não se pode separar. “Assim, através de tudo o que os escritores dizem e escrevem, é a literatura como tal que especula, instalando-se no elemento filosófico preexistente a todas as filosofias particulares”.4 Para Héctor Olea, essa literatura que especula, e que poética se faz, é o primeiro móvel da escrita de Guimarães Rosa. Mas o que motiva o ânimo especulativo desse escritor sempre vem de fora, dos já mencionados conceitos de tradição, que formam o acumulado acervo das coisas lidas e relidas pelo romancista, verdadeiro bricoleur de “restos de filosofia e cacos poéticos”5, dos quais retira o enquadramento metafísico-religioso da invenção racional: “o conto crítico”. Desse ponto de vista, o enredo é o pretexto episódico para a figuração de um “alto original”, de que cada novela, cada história, constitui uma versão

238

24/12/06 – 18h


parcial, fragmentária, enquadrada por moldura filosófica, ao mesmo tempo “módulo poético” do conto crítico. Por conseguinte, jamais poderia ser completa a “filosofia literária” de Guimarães Rosa a quem, com felicidade, Olea compara a Unamuno. Tal como o filósofo espanhol, Guimarães Rosa identificou a literatura à poesia, a poesia à religião e a religião à filosofia como metafísica. Um híbrido, a filosofia do poeta de Grande sertão: veredas é uma metafísica fragmentária concentrada nos vários e dispersos “módulos poéticos” das narrativas – módulos esses que contêm as verdades que elas traduzem e os veículos de sua composição numa forma figural, alegórica. Em posição contrária, JGR: metafísica do Grande sertão, de Francis Uté6 za , une as verdades disseminadas no romance de Riobaldo num único friso de sabedoria ocultista, que interliga a tradição hermético-alquímica ao taoísmo. A “filosofia literária” inerente a esse romance, e que preexiste “a todas as filosofias particulares”, é completa. Trata-se porém de uma metafísica da iniciação; as peripécias dos personagens são operações alquímicas (obra em negro, em branco, em rubro) de sua alma. Encontros, embates, circunstâncias de tempo e de lugar, têm significados recônditos, decifráveis segundo as chaves do ocultismo. Como os anteriores modos de leitura, o terceiro, ora apresentado em dois exemplares diferentes – Olea e Utéza –, também mostra, a par da importância dos conceitos filosóficos na economia ficcional de Guimarães Rosa, o fato de que aí ingressam, exportados das várias tradições de pensamento, incluindo o orientalista, realçada nas doutrinas esotéricas. Quando Maria Heloísa Noronha Barros leu duas das novelas de Rosa, Campo geral e Uma estória de amor, aplicando-lhes a particular filosofia de Heidegger, praticou um quarto método, entrecruzando essas novelas do ficcionista brasileiro com os escritos do filósofo alemão.7 Interpretando-as, transportou o pensamento filosófico, abstrato, sobre unidades textuais narrativas, como modelo conceptual de seus mundos próprios, das idéias e valores nela concretizados. Além de assimétrica, essa relação interpretativa seria unidirecional. Ela vai da filosofia para a literatura; no entanto, “o demônio da filosofia não teria o que fazer com o texto”.8 Mas o daimon, que incutiu em Platão a desconfiança à escrita, também levando-o a escrever os Diálogos para contorná-la, fez a filosofia passar da alma ao texto. Já a “ordem das razões” estrutura o pensamento como obra de lingua-

239

24/12/06 – 18h


gem e necessita da literatura – o meio arquitetônico de que fala Guéroult – individualizando os escritos filosóficos com uma retórica distintiva, como a do estilo hiperbólico, de simulação e fingimento, da dúvida em Descartes, num estilo narrativo em primeira pessoa, comum ao Discours de la méthode e às Meditationes de prima philosophiae. Confrontando as duas espécies de textos, os literários de Rosa e os filosóficos de Heidegger, ela desempenha o papel de leitora “ambidextra”. Só pode caminhar de uns para outros, em alternância, num movimento de lançadeira, a fim de entrecruzar as constantes temáticas das novelas (a viagem, a procura de si mesmo, o Sertão como universo mítico) aos conceitos heideggerianos correspondentes (a itinerância do homem como Dasein, o poder-ser da existência, a physis dos pré-socráticos). Mas esse procedimento torna a relação interpretativa, nesse quarto modo filosófico de compreender a literatura, bilateral – e não unilateral. Ao compreender a obra literária, a filosofia também se deixa compreender por ela. Podemos concluir agora que determinadas linhas do pensamento filosófico grego da Antigüidade, como as platônica e neoplatônica – amplificadas às doutrinas orientais (bramânica, budista, taoísta) – e de acento místico ou transcendente, juntamente com a singular filosofia heideggeriana, de manifesto pendor poético, configuradas nos quatro modos de leitura filosófica antes analisados, aplicam-se apropriadamente à ficção de Rosa. • A respeito desse assunto, não percamos de vista o seguinte dado que as considerações anteriores permitem firmar: para Guimarães Rosa, filosofia e religião vivem em constante intertroca na trama poética do texto ficcional. E o poético, inerente à ficção, é o que segura, expande e transmite ao leitor a junção entre poesia, religião e filosofia, como demonstra o tema da viagem, que atravessa a obra de Rosa, de Sagarana a Grande sertão: veredas e de Corpo de baile a Tutaméia. Viajam os personagens rosianos de várias maneiras. Viajam quando pastoreiam, quando plantam, quando guerreiam, quando festejam. A condição deles é andeja. De um pasto a outro, de uma fazenda a outra, conduzem boiadas ou gente. Adotam trabalhos temporários, sazonais. Às vezes são guias de viajan-

240

24/12/06 – 18h


tes, não raro andarilhos, vagamundos quase sempre. Mas quase sempre escalando o Sertão-mundo de que não saem. Por isso, nos textos de Rosa, o cômico e o trágico, o reles e o sublime, passam-se a céu aberto. Daí, como síntese dos acontecimentos narrados, a alternância do ir e do vir, do caminho e do descaminho, da chegada e da partida, que constitui a dialética da viagem. Outro dado a considerar é o aproveitamento lúdico da filosofia do escritor. Guimarães Rosa parecia divertir-se com essa utilização. Constatei-o com a resposta que me deu ao perguntar-lhe a que diálogo de Platão pertenciam as palavras “prazeres fáceis e ligeiros”, transcritos em grego nas notas da novela “Cara-de-bronze”, em Corpo de baile: Não seria capaz de lhe dizer agora. Vou lendo os filósofos e transcrevendo nos meus cadernos o que deles me interessa, e que poderá fazer parte de uma história, como a que recolho da boca das pessoas. Nada tenho de um erudito. Não cito, mas absorvo. Aquelas palavras que você referiu – continuou Rosa – são mesmo do filósofo grego, tal como registro em minha novela. No entanto, posso contrafazer um texto ou um trecho de Platão. Nem os especialistas em história da filosofia poderiam distingui-los sem hesitação dos verdadeiros. Outro expediente lúdico, mais aparentado a um jogo cabalístico, era cifrar, nesta ou naquela expressão, a chave verbal do sentido de uma narrativa, como o fez em “Cara-de-bronze”. O sentido literal da viagem do Grivo nessa novela é a busca da Noiva para o Cara-de-bronze, em que se repete a alegoria religiosa da Demanda do Graal, e que por tudo quanto o peregrino entrega ao mandante – palavras de consolo e vida – exprime simbolicamente a busca da poesia, do logos poético. Guimarães Rosa concordou com essa interpretação. Mas havia deixado no texto uma chave verbal oculta, aí figurando como um contra-signo cabalístico no corpo da expressão. Lida ao contrário, de trás para diante, “Ai, Zé, opa?” significa “a Poesia”. Assim, o conhecimento que Guimarães Rosa tinha de Sexto Empírico, que lhe chamou a atenção pela justeza do raciocínio e por ser médico, e de tantos outros pensadores, como Platão, Plotino e também dos místicos como Ruysbroek,9 Böhme,10 Eckhart,11 era um conhecimento por convivência, com eles

241

24/12/06 – 18h


compartilhado mediante simpatia ou afinidade eletiva. Desse modo, os pensamentos ou idéias pertenciam tanto a si próprio como ao pensador a quem espiritualmente se unia. No entanto, se havia filósofos contemporâneos que o guiavam, como o russo Nicolau Berdiaeff, de têmpera mística, punha Jesus Cristo acima de todos os luminares. Quem é Cristo? – perguntou. – O Amor e o Reino. Mas o amor de Cristo não foi aquele de dar dinheiro e fundar instituições. Ele não organizou nada. O que ele fez foi como se jogasse dinheiro a esmo, para esbanjar. Por isso seu Reino é e não é desse mundo. É desse Mundo porque se abre para outras religiões. O Caminho de Cristo, a sua verdade, intercomunica-se como Tao. O universalismo religioso que Rosa defendia podia admitir essa intercomunicação, que será a mesma proporcionada pela literatura. Mas pelo que dele ouvi, a literatura, como ato de escrita e a escrita como oração e sacrifício, purifica o homem completando-o e salvando-o: Escrevi Grande sertão como um ato de minha vida, para aprender a viver. Era como se fosse o meu testamento. As minhas preocupações, os meus conflitos, ali se refletem e se resolvem. Até os 14 anos eu não sabia viver. Um dia deitei-me na cama com a intenção de não me levantar mais. Até que fui me encontrando nas coisas, nas leituras. A antropologia rosiana é religiosa. O homem é um ser inacabado, como se ainda fosse uma espécie inferior às outras. Mas pelo sexo já se liga à vida. Precisamos criar outras correntes de ligação e de elevação, como o apuro da sensibilidade contra a abstração das idéias, que pode levar à crueldade, ao inumano. A inteligência pode pouco; a rigor, nada demonstra. É impotente contra o mal; os possíveis a embaraçam. Guimarães Rosa, simpático a Bergson, valoriza a intuição e o alcance depurador e liberador do sofrimento. Daí proclamar também a superioridade dos valores éticos, em nome dos quais admitiria – e nele apareceu aqui o fantasma inquisitorial – que se queimassem livros quando incitam à baixeza e à crueldade, como os de Sade e de Jean Genet.

242

24/12/06 – 18h


A escrita seria para ele a grande viagem, a travessia por excelência, que pode começar continuando texto já existente: Quando li o “Livro de Job” (um dos mais belos da Bíblia ao lado do “Cântico dos cânticos”), veio-me a idéia de transportá-lo, de retraduzi-lo para o sertão. Naquele o Senhor pergunta a Satanás se terá visto na Terra o seu servo Jó. Vi em imaginação, como num filme, uma casa-grande, o dono no alpendre e um vaqueiro a quem ele diz: “Andaste por toda a Terra, e lá terá visto etc. etc.” Nele, a composição literária era, de qualquer modo, despertada por uma visão e sustentada por um movimento: Ando muito, canto, rolo no chão. Depois escrevo e repasso tudo até oito, nove vezes. Se consigo descobrir coisas novas no escrito, nele já deparo com as situações antes não pensadas, então começa a segunda fase do trabalho. A estória terá se produzido como se outro a houvesse escrito. Daí por diante posso trabalhar noutras direções. Agora uma solicitação. Queira o leitor-ouvinte tomar as “aspas” [as citações de falas de Guimarães Rosa], sempre que empregadas, como assinalamento da interferência da memória-lembrança, falível até pelo auxílio reminiscente que recebeu da leitura de notas escritas, logo após minha conversa com Guimarães Rosa, e sem prejuízo da complementar ajuda da imaginação de quem o entrevistou ao tentar, como fizemos ao longo destas notas, preencher as lacunas da fala do nosso romancista com torneios reflexivos.

Benedito Nunes formou-se em direito pela Universidade Federal do Pará, de onde foi professor e fundador do curso de filosofia. É autor de Passagem para o poético – Filosofia e poesia em Heidegger (São Paulo: Ática, 1986), O drama da linguagem? Uma leitura de Clarice Lispector (São Paulo: Ática, 1989), Crivo de papel (São Paulo: Ática, 1998) e Hermenêutica e poesia – O pensamento poético (Belo Horizonte: Editora UFMG, 1999).

243

24/12/06 – 18h


NOTAS 1 FERREIRA, Hygia Terezinha Calmon. As sete sereias ao longe. Tese de doutorado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), São José do Rio Preto, 1991. 2 ANDRADE, Sônia Maria Viegas. A vereda trágica do Grande sertão: veredas. São Paulo: Edições Loyola, 1975. 3 MACHEREY, Pierre. À quoi pense la littérature? Paris: Presses Universitaires de France, 1990. 4 Ibidem, p. 199. 5 OLEA, Héctor. Enigma no nó da imagem: os módulos poéticos no “conto crítico” roseano (inédito). 6 UTÉZA, Francis. JGR: metafísica do Grande sertão. São Paulo: Edusp, 1994. 7 BARROS, Maria Heloísa Noronha. Miguilim e Manuelzão – viagem para o ser (um estudo de duas novelas de Guimarães Rosa). Belo Horizonte: Edição da autora, 1996. 8 GUÉROULT, Martial. Descartes selon l’ordre des raisons. Vol. 1. Paris: Aubier, 1968, p. 10. 9 O místico holandês Jan van Ruysbroek (1293-1381). 10 Jakob Böhme, filósofo e místico alemão que viveu entre 1575 e 1624. 11 Representante da “mística renana” conhecido como Mestre Eckhart (1260-1328).

244

24/12/06 – 18h


O opus magnum oriental-ocidental Francis Utéza

O idioma é a única porta para o infinito, mas infelizmente está oculto sob uma montanha de cinzas. (…) Escrever é um processo químico; o escritor deve ser um alquimista declaração a Günter Lorenz – Gênova, janeiro de 1965.

A cada vez que se exprimiu a respeito de sua obra, João Guimarães apontou o que ele qualificava de “valor metafísico-religioso” como chave essencial, convidando o leitor a desentranhar na sua literatura aquelas paragens mágicas “semicamufladas sob os buritis e o capim” do regionalismo imediato.1 Respondendo ao convite do escritor, vamos acompanhar as andanças de Riobaldo pelas “terras altas” do Grande Sertão, analisando os três momentos decisivos de sua travessia: o “pacto” das Veredas-Mortas, a “apoteose” do Tamanduá-tão e a “catástrofe” do Paredão. I – Veredas-mortas: Nigredo Queria entender do medo e da coragem, e da gã que empurra a gente para fazer tantos atos, dar corpo ao suceder.2 Quem quiser ajudar Riobaldo a entender da gã que o empurrou para dar corpo ao pacto das Veredas-Mortas já terá avançado bastante ao identificar a data do evento com base na informação dada por uma voz anônima na chegada

245

24/11/06 – 20h


dos jagunços à fazenda Barbaranha: “De uns três dias foi o São João, então amanhã é o São Pedro”.3 Reconstituindo a caminhada do bando a partir da saída do Valado, uma vez recrutados os catrumanos do Pubo4, o pesquisador cuidadoso poderá conferir que o “pacto” se deu na noite de São João – isto é, no solstício de inverno do hemisfério sul. Naquele momento fronteira, em que o auge das trevas coincide com o reinício da caminhada do sol invicto, abre-se uma fresta no tempo cronológico linear, fresta essa por onde se torna possível o mergulho na Fonte Primordial do Presente Eterno. Naquela noite, encruzilhada do tempo cósmico, movido pela intuição irracional – “se não é que fosse naquela noite, nunca mais eu ia receber coragem de decisão. Senti esse intimado”5 –, Riobaldo se dirige serra acima procurando um lugar supostamente adequado para o diabo se manifestar: de fato, as características que o relato define equivalem a delimitar um espaço geometricamente central, isto é, separado do mundo profano em que impera a dualidade. Ali, na “concruz” de caminhos terrestres, o tronco de “uma árvore mal vestida” materializa na vertical a ligação da Terra com o Céu, sob a luz estelar do Cruzeiro. Naquele espaçotempo crucial, surge na consciência do herói o anelo extraordinário de concentração: “Eu era eu – mais mil vezes – que estava ali, querendo, próprio para afrontar relance tão desmarcado. Destes meus olhos esbarrarem num rôr de nada”.6 Concretiza-se assim cá embaixo o pólo do Ser – “era eu mais mil vezes” – antagônico ao do Não-Ser – “um rôr de nada” –, radicalizando-se a polarização conforme se aproxima a meia-noite: “E, o que era que eu queria? Ah, acho que não queria mesmo nada, de tanto que eu queria só tudo. Uma coisa, a coisa, esta coisa: eu somente queria era – ficar sendo!”7 A tensão da vontade apela para a pessoa circunstancial do jagunço servir de suporte ao essencial: “ficar sendo” significa permanecer no Ser absoluto, fazer que se materialize, na carne contingente do indivíduo, a parte do Verbo que tem dentro de si. Em outras palavras, atingir pela força da vontade mais profunda a plenitude do Ser, ultrapassando as limitações da condição humana, da existência, do Estar. Assim, diante do pólo carregado com a universalidade das energias centrípetas, surgiria o seu contrário, portador da globalidade das energias centrífugas: “Ao que não vinha – a lufa de um vendaval grande, com Ele em trono, contravisto, sentado de estadela bem no centro”. Nessas condições, no imaginário do protagonista, a representação do “redemunho” animado pelo Diabo plas-

246

24/11/06 – 20h


ma como resposta à sua própria fixação na permanência da Essência. E embora o herói, inquinado pela cultura dualista ocidental, assuma implicitamente o Bem deixando o Mal para o Outro, o confronto tende a convergir para a unidade: A já que eu estava ali, eu queria, eu podia, eu ali ficava. Feito Ele. Nós dois, e tornopio do pé-de-vento – o ró-ró girado mundo a fora, no dobar, funil de final, desses redemoinhos: ...o Diabo na rua, no meio do redemunho... O conflito com o outro aponta portanto para a sua solução – eu “feito Ele. Nós dois” – isto é, para a Coincidência dos opostos, motor do movimento do Cosmos – “o ró-ró girado mundo a fora” – que o folclore diabólico ilustraria apenas como referência cultural herdada do contexto judaico-cristão e significativa da obsessão do protagonista. Exaspera-se aí o anseio por meio de um arrocho que o narrador identifica aparentemente como manifestação de sua própria “coragem”: Ah – eu, eu, eu! “Deus ou o Demo – para o jagunço Riobaldo!” A pé firmado. Eu esperava, eh! De dentro do resumo, e do mundo em maior, aquela crista eu repuxei, toda, aquela firmeza me revestiu: fôlego de fôlego de fôlego – da mais-força, de maior-coragem. A que vem, tirada a mando, de setenta e setentas distâncias do profundo mesmo da gente.8 Tal esforço no nível individual do microcosmo – “de dentro do resumo [grifo nosso]” – está em correlação com o que acontece no “mundo em maior [grifo nosso]” – no macrocosmo, quando o universo está operando a conversão do estado noturno da maior retração para a abertura à luz da regeneração. A energia arquetípica – “mais-força, maior-coragem” –, também legível na simbólica do número 70 elevado do singular ao plural, age tanto de dentro para fora (“aquela crista eu repuxei”) como de cima para baixo (“aquela firmeza me revestiu”), sendo o sujeito, ao mesmo tempo, ativo (eu) e passivo (me). E quando finalmente chama o Inimigo, embora persuadido de desafiá-lo, o jagunço está de fato clamando para a conjunção da luz de cima presente na etimologia do nome do outro – “Lúcifer!” – com as trevas de baixo – “Satanaz dos meus

247

24/11/06 – 20h


infernos!” –, numa síntese do primeiro aforismo da Tabula smaradigna, texto fundamental do hermetismo ocidental: “O que está em cima é como o que está embaixo, e o que está embaixo é como o que está em cima”. Logo se dissolve o clímax vertical numa sensação aérea que libera o espírito invadido em seguida por uma imagem aquática horizontal: “Fechou o arrocho do assunto. Ao que eu recebi de volta um adêjo, um gozo de agarro, daí umas tranqüilidades – de pancada. Lembrei dum rio que viesse adentro a casa de meu pai”. Prolonga-se a expansão numa autêntica experiência mística em que, explodindo para o alto – “arquei o puxo do poder meu” –, a consciência do jagunço funde-se com o “brilho” da noite, na luz paradoxal do sagrado: Vi as asas, arquei o puxo do poder meu, naquele átimo. Aí podia ser mais? (...) As coisas assim a gente mesmo não pega nem abarca. Cabem é no brilho da noite. Aragem do sagrado. Absolutas estrelas!9 Embora sem materialização diabólica, o Não-Ser, difuso no Caos noturno, respondera às vibrações que emanavam do Ser concentrado na encruzilhada do céu e da terra. Realizava-se a fusão no seio da noite solsticial com a desmaterialização daquele que agora flutua, germe latente, fora do tempo e do espaço, na Eternidade do Presente: Porque a noite tinha de fazer para mim um corpo de mãe – que mais não fala, pronto de parir, ou, quando o que fala, a gente não entende? Despresenciei. Aquilo foi um buracão de tempo.10 Regenerado no útero da Noite primordial, o espírito de Riobaldo regressa à matéria, cá embaixo – “Desci de retorno” –, com a garoa da madrugada e os primeiros fulgores da aurora. Reintegra assim um corpo mineral cujas sensações paradoxais sublinham a carência de substância aquática – “Eu tinha tanto friúme, assim mesmo me requeimava forte sede”. O léxico escolhido evoca o grau extremo de coagulação próprio dos cadáveres – “Meu corpo era que sentia um

248

24/11/06 – 20h


frio, de si, friôr de dentro e de fora, no me rigir” –, sendo necessário recorrer a neologismos para evocar o desconhecido – “Nunca em minha vida eu não tinha sentido a solidão duma friagem assim”.11 Ao lado de “friúme, frior e friagem”, o substantivo “solidão” remonta ao adjetivo “sólido” de que se torna o aumentativo, exprimindo a rigidez por excelência, tanto física como psíquica. No húmus em fermentação, enriquecido pelos excrementos de uma anta, rente às raízes de uma árvore que se alimenta nas águas pantanosas, e cujo nome também significa a união dos contrários – “um pé de breu-branco” –, a semente humana beneficia de ótimas condições para retornar à vida. Após a desagregação, inicia-se a fase positiva da Nigredo alquímica, sob a luz da estrelad’alva, enquanto está orvalhando cá embaixo. Com o mel da abelha araticum, substância energética por excelência, escorrendo pelo tronco da árvore a que se agarrou o jagunço, e que curiosamente mudou de nome passando a ser um “paude-vaca”12, o lugar torna-se terra de Promissão onde manam o mel e o leite. Quando regressa ao acampamento, o jagunço não é um doente que reclama um cobertor, mas um recém-nascido, surgido dos despojos do homem antigo regenerado pelas energias cósmicas, e que necessita de um prazo para se recuperar das provações sofridas ao longo daquela iniciação. Portanto, na noite das Veredas-Mortas/Altas, como nos antigos mistérios da Grécia, Riobaldo recebia a investidura do Universo, capacitando-se para empreender a renovação da velha ordem esclerosada. Sob os auspícios de São João Batista, no instante em que o sol invictus reiniciava a sua carreira celeste, na meia-noite natalícia do hemisfério sul, Satã serviu de álibi para a Obra em Negro, prelúdio de toda reencarnação. Tinha chegado a hora e a vez do Urutú-Branco, a cobra voadeira, assumir a chefia e cumprir a promessa do nome, procurando conciliar os opostos na sua travessia do Grande Sertão. II – Tamanduá-tão: Wu-Wei Nos campos do Tamanduá-tão. Foi grande batalha.13 Caminhando de Goiás para Minas, em direção ao sol nascente, a tropa do Urutú-Branco chega à divisa, no início do veranico – a estiada que, no Bra-

249

24/11/06 – 20h


sil Central, começa nos últimos dias de dezembro e se prolonga em janeiro.14 Este dado, glosado de forma indireta por meio de notações referentes a chuvas e trovões, “rios andando sujos, e umbuzeiros dando flor”15, até o bando chegar aos campos do Tamanduá-tão, situa a vitória de Riobaldo sobre os hermógenes, em torno de Natal, isto é, do solstício de verão do hemisfério sul.16 Trata-se portanto do clímax do ciclo solar, acrescido naquela altura com as energias concomitantes do ciclo lunar: “Era na força da lua”.17 Antes de evocar o combate, Riobaldo faz questão de descrever o espaço identificado por um topônimo que colocaria o evento sob a invocação do “tamanduá”, o pacífico formicívoro brasileiro cujo nome recebe um apêndice, “tão”, de sentido aparentemente aumentativo. Num primeiro momento, o narrador procura o termo geográfico adequado para aquela imensa extensão na fronteira entre Goiás e Minas: assim “os campos”, plural masculino, é corrigido logo em “varjaz” e “baixadão”, dois neologismos elaborados a partir de raízes femininas – “vargem” e “baixada”. Com os sufixos aumentativos que lhes conferem o gênero masculino, esses neologismos acabam sintetizados numa única expressão vernacular, dessa vez feminina: “a enorme vargem”. E essa unidade é logo analisada como composição de dois elementos: “Ao muito escuro, duma banda, existia um travessão de mato. Outro braço de mata, da outra banda”. A presença do homem, visível nas roças cultivadas, é também detectada nas ruínas da “casa-de-fazenda”, as quais lembram, no montículo de terra duma extremidade, o já desaparecido conjunto de “sanzalas” mais “engenho-depau-em-pé” (um feminino plural e um masculino singular dotado de conotação sexual óbvia). E completa-se o quadro com a Vereda em cujas beiras os “buritis altos” patenteiam o intercâmbio entre os níveis cósmicos, desde as profundezas da terra em que mergulham as raízes até as do céu, por onde se projetam as suas palmas. Assim, sob a etiqueta de “Tamanduá-tão”, e sem que nunca se veja por ali qualquer caçador de formigas, conjugam-se terra e água, vertical e horizontal, masculino e feminino, singular e plural, grande e pequeno, alto e baixo. O topônimo serve portanto de suporte ao conceito de complementaridade das categorias dualistas constitutivas do tudo, do “tão”, com til: “Para tudo quanto havia, o nome era aquele só – que Mata-Grande do Tamanduá-tão, e Mata-Pequena do Tamanduá-tão, e tudo”.

250

24/11/06 – 20h


No segundo momento da sua descrição, o narrador propõe um desenho: “O senhor forme uma cruz, traceje. Que tenha os quatro braços, e a ponta de cada braço: cada uma é uma”.18 “Cada uma”, isto é, cada ponta, “é uma”, uma cruz. Traçar assim o que se chama em heráldica uma cruz “recruzetada”19 equivale a orientar o espaço pela materialização de um Centro repercutido em cada ponto cardeal: tal emblema simboliza o universo girando em torno do eixo figurado pelo ponto de encontro dos braços da cruz principal. Aliás, a idéia da rotação concretiza-se também na paisagem, com os “barrancos cinzentos, divulgando uns rebolos e relombos” a sugerir a erosão circular da serra em torno da vargem. Além disso, essa segunda descrição vem precisar a posição simétrica da Mata-Grande e da Mata-Pequena (oeste/leste), bem como da casa desmantelada e da roça cultivada (sudoeste/nordeste), em relação ao percurso transversal da Vereda “em curtas curvas, como no sucinto caminhar qualquer cobra faz”.20 Assim, em filigrana completando a simbólica da cruz ocidental, esboça-se o círculo Yin/Yang do Tai-Ki, que significa na tradição oriental o Uno manifestado nas infinitas combinações da dualidade – o Tao, sem til.21 Desde o alto da serra, no instante em que descobre o inimigo, Riobaldo reage sem “receio, nem estupor, nem arrocho”.22 Tal vacuidade – “o que eu senti foi nada, (...) coisa-nenhuma em branco” – corresponde ao ideal taoísta. Assim, livre dos obstáculos que o ego suscitaria, uma vez na planície, no meio do capim alto que o esconde do inimigo, o chefe organiza as vagas de assalto. Primeiro libera os cavaleiros de Fafafa, no instante que a intuição decide: “Fechei os olhos, e contei. Até dez, agüentei não, que me deu um deciso já em sete”.23 De olhos fechados, aguardava portanto o sinal que viria de dentro. Mas decidir contar até dez era um procedimento racional; “o deciso já em sete” implica, além da carga simbólica do número sete, a negação do processo intelectual. Erguendo-se logo – “me alteei (...) quase trepei de todo na sela” – o protagonista acompanha essa elevação com o sinal da cruz. Embora comentado pelo narrador como prova de que se colocava do lado do Bem e rejeitava ipso facto o Hermógenes sob a bandeira do Mal, o gesto ultrapassa a referência superficial ao cristianismo; significa o chamado para a unidade transcendental, o que aliás se manifesta no desencadear do movimento seguinte:

251

24/11/06 – 20h


Foi o instante de tempo que era o momento. Só chamei João Concliz: – “Agora é agora...” E joguei a rumo. – “Lá vai obra!” (...) Todos atrás de mim, no arranque; e era o mundo mesmo. Gritei de sussús: – “Vale seis! – e toma nove!...” – nas grimpas da voz... E eles meus, gritando tão feroz, que semelhavam sobre-vindos sobre o ar. Menos vi. Mas todo o todo do Tamanduá-tão se alastrou em fogo de guerra. À frente dos cavaleiros, o chefe carrega “o mundo mesmo”. Recalcando no aviso dado in vivo a João Concliz, o jogo verbal entre “instante” (de in stare: estar em cima) e “momento” (etimologicamente, o impulso ínfimo que basta para o prato da balança inclinar-se) assinala uma fronteira temporal por onde as energias do alto – “sobre-vindos sobre o ar” –, liberadas pelo verbo de um demiurgo, se propagam em volta – por “todo o todo do Tamanduá-tão”. Diferenciado no texto pelo itálico, o grito de guerra proferido naquela altura remete ao truco, o jogo que antes o chefe proibia por ser “endiabrado”.24 Numa partida de truco, “vale seis! toma nove! ” seriam gritos sucessivos de dois adversários, rematando o segundo em cima da aposta do primeiro; aqui, num brado único, sugerem a complementaridade do número “seis” (par, primeiro múltiplo de três) e do número “nove” (ímpar, quadrado do mesmo símbolo da trindade) – dois números cujos algarismos se desenham numa rigorosa simetria em relação a um ponto central virtual. Assim, tanto podem fundir-se na sugestão de uma espiral quanto evocarem o círculo do Tai-Ki representativo da globalidade do Tao – sendo aliás o seis o número do Yin, e o nove, do Yang.25 Num contexto épico tradicional, tendo lançado a última vaga, continuaria o chefe à frente, desfechando estocadas a torto e a direito. No Tamanduátão não acontece nada disso. Antes pelo contrário, o Urutú-Branco imobilizase, apartando-se dos guerreiros: “Suspenso – ouviu? – escapei, à de banda, com meu bom cavalo, repuxei as rédeas. Só assim permaneci, eu estava debaixo de uma árvore muito galhosa; canjoão. Que pensei”. Sob aquele “canjoão”, depois identificado como “angico” – substituindo-se assim ao eco do nome de São João a referência à acácia brasileira em que se vislumbra, para além da palavra “anjo”, a simbologia maçônica do mito de Hiram –, o protagonista, “com friezas, escorrido de todo medo”, alheio à “ira”

252

24/11/06 – 20h


bem como à “raiva”, vira uma estátua eqüestre. De braços “cruzados”, embora empunhando uma arma apenas carregada com a etimologia da palavra que a designa (“revolver”: mover em torno de um eixo), o chefe pretende controlar a giração do mundo: O que eu tinha, que era a minha parte, era isso: eu comandar. Talmente eu podia lá ir, com todos me misturar, enviar por? Não! Só comandei. Comandei o mundo, que desmanchando todo estavam. Que comandar é só assim: ficar quieto e ter mais coragem. A certeza de que se pode “comandar o mundo” mantendo-se alheio à batalha corresponde ao conceito taoísta de Wu-Wei, que, no discurso de posse na Academia Brasileira, o próprio Rosa definiria com precisão de ourives – “não interferência, a norma de fecunda inação e repassado não-esforço de intuição, passivo agente a servir-se das excessivas forças em torno e delas recebendo tudo pois, ‘por acréscimo’”. Naquela tensão vertical, repete-se a vontade que se afirmara no clímax das Veredas-Mortas: Um nome só eu falava, fortemente falado baixo, e que pensado com mais força ainda. E que era: – Urutú-Branco!... Urutú-Branco!... Urutú-Branco!... Cujo era eu mesmo. Eu sabia, eu queria.26 No entanto, trata-se de manifestar, aqui e agora, não uma individualidade como na noite do pacto – “Eu queria ser mais do que eu”27 –, mas a Chefia portadora de todas as energias da egrégora28 jagunça. Em cima do cavalo, sob a árvore “muito galhosa” que capta as forças do céu e da terra, o protagonista, único elemento estável da batalha, encarna o olho do furacão. Tranqüilo e unificado, deixou de pertencer ao espaço-tempo contingente que as balas recortam em torno dele sem o atingirem. Ali conhece a embriaguez mística – “cachaças que em minha alegria”29 – sem contudo se dissolver no êxtase: Morresse – tive preguiça de pensar – mas, morresse, então morria três-em-pê, de valente: como o homem maior valente no mundo to-

253

24/11/06 – 20h


do, e na hora mais alta de sua maior valentia! A fé, que foi. Dei em lagoa, de tão filho tranqüilo. A horizontalidade da lagoa, imagem aquática parecida àquela que também dilui a tensão no clímax das Veredas-Mortas, vem equilibrar a concentração vertical do chefe que continua plenamente consciente. Vemo-lo dar de beber a um inimigo, superando assim em nome da humanidade os antagonismos da contenda em curso – e finalmente assumir a total harmonia de Wu-Wei: Rústico fechei os olhos, para não me abrandar com pena das desgraças. Nem não escutei; que ouvido também se fecha. No cavalo, eu estava levantado. Campo que me competia comandar, dito. Tudo em mim, minha coragem: minha pessoa, a sombra de meu corpo no chão, meu vulto. O que eu pensei forte, as mil vezes: que eu queria que se vencesse; e queria quieto: feito uma árvore de toda altura!30 Vazio de toda a emoção interior, fechado a qualquer solicitação exterior, o Chefe é apenas espírito que se assimila à árvore portadora da hierogamia entre o Céu e a Terra. Senhor absoluto das forças ctonianas aqui representadas pelo cavalo em que está erguido, e plenamente consciente da sua capacidade de ordenar a giração do macrocosmo, o Chefe atinge ali o ênstase.31 Portanto, no Centro do Tamanduá-tão, sob os auspícios conjugados do Tao e da Cruz, em plena luz solar combinada com a força do plenilúnio, erguia-se a impossível serpente branca, sublimando no eixo do universo a contradição urano-ctoniana. Assim cumpria o Urutú-Branco a promessa do nome com que Zé Bebelo crismara aquele que ia assumir a Chefia na manhã do domingo das Veredas-Mortas. Porém, mal terminado o relato daquela apoteose, o narrador adverte: “Se soalerte o senhor, que estamos descambando: o senhor mesmo se prepare; que para fim terrível, terrivelmente”.32 III – Paredão: Arcano XVI O senhor sobrenasceu lá? O senhor mordeu aquilo? 33

254

24/11/06 – 20h


O Paredão – cujo topônimo é localizável no noroeste de Minas – caracteriza-se pela sua topografia: plantado no meio da horizontal materializada pela única rua do arraial, ergue-se a verticalidade do edifício central onde o UrutúBranco mandou encerrar a mulher do Hermógenes. Passando a primeira noite fora desse sobrado, numa casa qualquer da periferia, o chefe já não assume o lugar que lhe corresponde. E quando, no dia seguinte, no momento do ataque, ele se encontra prestes a tomar banho no rio do Sono – equivalente mineiro do Letes grego, o rio infernal do esquecimento –, a marginalização atinge o máximo. Conseguindo apenas juntar-se a um grupo numa trincheira à entrada da rua, dali, reduzido à condição de simples jagunço, ele capta um chamado: Com anseio, olhei, para muito ver, o sobrado rico, da banda da mão direita da rua, com suas portas e janelas pintadas de azul, tão bem esquadriadas. Aquela era a residência alta do Paredão, soberana das outras.34 Apoiado pela sugestão de Diadorim, o chamado atinge a consciência do protagonista, que identifica o significado simbólico daquela organização do espaço: “Aquele sobrado era a torre. Assumido superior nas alturas dele, é que era para um chefe comandar – reger o todo cantão de guerra!”35 Na palavra “sobrado” encontramos a raiz “super”, de “superior”, que ecoa também no adjetivo “soberana”, constituindo-se aquela “residência alta” em arquétipo da verticalidade – “a torre”. Dali, carregado com as energias de cima (“assumido superior”), o chefe ordenaria o caos inerente à guerra movida cá embaixo na periferia (“cantão”, de “canthus”: o aro da roda). Das alturas do sobrado poderia repetir o milagre do Tamanduá-tão, ao “comandar” a giração do macrocosmo. No entanto, a analogia não é completa. De fato, o Axis mundi do Tamanduá-tão ganhou a categoria de Centro do universo pela atuação do Chefe Yang ordenando um espaço Yin caótico. O interior da torre do Paredão, “meio sombrio”, com ar de ser “antigo dia-de-domingo”, já tem a qualidade de Centro antes de Riobaldo lá chegar. É um templo, separado do universo profano circundante pela presença oculta da Mulher (com maiúscula) “sobreguardada, (...) de custódia”.36 Presença feminina oculta ocupando o Santo dos Santos do edifício que se ergue no meio da rua como imagem visível do Masculino, aque-

255

24/11/06 – 20h


la Mulher corresponde, na perspectiva ocidental da liturgia cristã, à luzinha lunar da hóstia que irradia no centro do resplendor solar da “custódia”.37 Já na perspectiva oriental, ela representa o ponto Yin escuro no interior luminoso do Yang. Ao imaginar que recuperaria a chefia do alto da torre, Riobaldo enganava-se: a apoteose Yang não teria cabimento num espaço que era a vez do Yin comandar.38 Vejamos de que modo. A progressão do jagunço, da periferia para o centro, é dificultosa: começa rastejando pelo chão sob uma saraivada de balas e só recupera a verticalidade ao penetrar no sobrado pelos fundos depois de abandonar o Jiribibe morto. Lá dentro, ele sobe com certa dificuldade e, uma vez em cima, maltrata o cego Borromeu recusando a chave “de todo-tamanho” que o outro lhe estende, a Chave por excelência, com a qual teria acesso ao quarto da Mulher “de custódia” – ao tabernáculo. Assim, em vez de se interessar pelo interior – pelo sagrado –, o chefe vira-se para o exterior, para o tumulto profano de fora. Instalado na janela e misturando suas balas com os tiros dos companheiros, embora iludido pela eficiência de sua pontaria, Riobaldo não passa de jagunço entre outros jagunços, apenas operando num lugar mais adequado para defender o acesso ao Centro. Pior ainda, vai perdendo suas “agarras” numa crise que, no momento crucial, o deixa paralisado. Manifesta-se o primeiro sintoma dessa crise quando o chefe empreende a subida pela escada-de-redor (em “redor” lê-se “dor”, além da simbólica representada nas iniciações por esse tipo de escada)39 – “arfava um pouco e estava com uma sede”. Paulatinamente, multiplicam-se as anotações relativas a lesões nervosas que primeiro afetam os membros superiores, logo os inferiores, ganhando a cara.40 E quando ao pé da torre começa o duelo a faca entre os dois bandos, no alto do sobrado só se encontra um fantoche desarticulado que não pode nem se mexer nem sequer rezar, embora conserve a capacidade visual – em duas páginas, constam 12 ocorrências dos verbos “ver”, “olhar” e “mirar”. Crucificado lá em cima, o protagonista assiste ao corpo-a-corpo Diadorim–Hermógenes; ao mesmo tempo, dentro dele, está acontecendo outra luta de que a narração dá conta, sugerindo que as manifestações tanto físicas como psíquicas evidenciariam a possessão diabólica. Assim, enquanto a crise se concretiza fisicamente num vômito, vai surgindo na mente a imagem maléfica:

256

24/11/06 – 20h


Boca se encheu de cuspes. Babei... Mas eles vinham, se avinham, num pé-de-vento (...) Ao que – fechou o fim e se fizeram. E eu arrevessei, na ânsia por um livramento... Quando quis rezar – e só um pensamento como raio e raio, que em mim. Que o senhor sabe? Qual:... o diabo na rua no meio do redemunho.41 Cristalizada no leitmotiv subtítulo do livro, a obsessão escande três vezes a narração do duelo entre Hermógenes e Diadorim, sempre separada no texto por reticências e itálicos, na sugestão do raio fulminando o cume da “torre”. Petrificado, com o último relâmpago, cai desmaiado o herói no interior do sobrado, do lado do sagrado – numa situação simétrica à dos personagens que aparecem suspensos no ar e aparentemente precipitados para fora da “Torre”, o arcano XVI do Tarô.42 Para se fazer uma idéia objetiva do que se passou no alto do sobrado, dispomos do testemunho de Guirigó e Borromeu. Com efeito, uma vez o combate terminado, os comentários de ambos confirmam que o chefe “tinha estado sem acordo, dado ataque, mas que não tivesse espumado nem babado”.43 Não se teriam, pois, manifestado os sinais pelos quais a crença popular identifica os possessos, apesar de o narrador ter afirmado que as ânsias do vômito se tinham acompanhado de baba. Tampouco ocorreu a nenhum jagunço a idéia de que o chefe precisasse de algum exorcista. De fato, aquelas perturbações psicomotoras evoluem logo para um estado de letargia, o que motiva um diagnóstico preciso: “que foi febre-tifo, se diz, mas trelada com sezão, mas sezão forte especial – nas altíssimas!”44 Mas o narrador não escolhe apenas uma explicação pela patologia: com a redução progressiva da atividade física e mental do herói, cada vez mais impedido de se relacionar com o meio ambiente, a paralisia corporal converge com a mental, terminando no delíquio em que se verifica a dicotomia essencial: “alma que perdeu o corpo. (...) Até que trespassei de horror, precipício branco”.45 O que Hermes Trismegisto e a alquimia explicam: o excesso de “coagula” acarreta a desintegração da matéria – “solve”. Sem a alma (fluida) a fazer a ligação com o corpo (fixo), o espírito flutua no vazio, no “precipício branco”. E é naquele preciso instante que ao pé da torre se inicia uma nova operação que passamos agora a analisar. Fixados em dois pólos em cada extremidade da rua horizontal, Hermógenes e Diadorim logo se projetam para aquele ponto central onde a torre ins-

257

24/11/06 – 20h


taura a verticalidade. Ali, preludiando a conjunção, o anjo aéreo dança perante o dragão informe: “Hermógenes desumano, dronho – nos cabelões da barba... Diadorim foi nele... Negaceou, com uma quebra de corpo, gambetou”. E o corpo-a-corpo resulta num amálgama criador de uma nova entidade: “E eles sanharam e baralharam, terçaram. (...) Trecheio, aquilo rodou, encarniçados, roldão de tal, dobravam para fora e para dentro, com braços e pernas rodejando”.46 Naquela unidade indissociável47 – “trecheio”: três cheio – e circular – “rodou”, “roldar”, “rodejar” –, cada componente sela o destino terrestre do outro: “mirei e vi – o claro claramente: aí Diadorim cravar e sangrar o Hermógenes... “Ah, cravou – no vão – e ressurtiu o alto esguicho de sangue” [grifos nossos]. Sob a punhalada de Diadorim (de cima para baixo) jorra (de baixo para cima) o sangue do inimigo. Cravado (na construção escolhida o objeto do verbo é o próprio Hermógenes, e não a arma de Diadorim), o ser informe é imobilizado numa forma terrestre, dando-se a fixação definitiva a partir do foco da sua vacuidade – “no vão”, anotado sem o complemento de praxe, “do pescoço”. O monstro, sangrado, perde sua virtude volátil aquática, ficando apenas no chão um invólucro mineral solidificado. Quanto ao antagonista, este sofre uma metamorfose simétrica: “Como de repente, não vi mais Diadorim! No céu, um pano de nuvens”. Uma leitura realista diria que aquele pano de nuvens significa a perturbação das vistas do espectador Riobaldo. Numa leitura alquímica diremos que Diadorim, ente de ar e fogo, explode no contato com seu contrário de terra e água. Ao liberar a parte fluida do Hermógenes, a componente masculina ígnea do Andrógino se torna vapor – “nuvem”. Esvaziando com uma facada a diformidade do inimigo, Diadorim lhe confere a humanidade de um corpo masculino, recebendo em troca a aparência feminina definitiva que caberá à Mulher revelar na hora de limpar o cadáver. Confrontado à conjunção dos contrários que ocorre ao pé do sobrado e projeta para cima as energias decorrentes, o protagonista-espectador atinge naquele instante o clímax do combate interior. Procurando na reza uma compensação à incapacidade de agir48, consegue um mínimo, substituir à frase obsessiva do “redemunho” diabólico uma alucinação que no seu sistema tem sentido positivo: Soluço que não pude, mar que eu queria um socorro de rezar uma palavra que fosse, bradada ou em muda; e secou: e só orvalhou em mim,

258

24/11/06 – 20h


por prestígios do arrebatado no momento, foi poder imaginar a minha Nossa-Senhora assentada no meio da igreja [grifos nossos]. O princípio feminino, na sua representação religiosa ocidental, impõese numa visão estática apolínea – “Nossa-Senhora assentada”. Na alucinação salvadora, a estabilidade da matriz subverte o dinamismo dionisíaco do diabo. Na consciência do protagonista, o reflexo do interior pacífico do sobrado com a “Mulher de custódia” no Santo dos Santos substitui-se ao espetáculo de violência do exterior, num deslumbramento evocado com o léxico dos místicos: “prestígios”, de praestringere oculos – o efeito da luz que cega e enleva no êxtase marcado pelo adjetivo “arrebatado”. Paralelamente, o esforço para converter o bloqueamento maléfico do espírito em libertação benéfica, é traduzido mediante uma metáfora de óbvia conotação alquímica. Contra a coagulação máxima (“secou”) procurava-se uma “solução” que, por mínima que fosse (“soluço”), operaria como um “mar” irrompendo por dentro (“socorro”, de “sub currere”, correr por baixo). A petrificação do espírito é finalmente superada pelo “orvalho” (agente alquímico do “solve”) da imagem religiosa, imediatamente absorvido: “Gole de consolo... (...) Que enguli vivo”. E enquanto aquele “orvalho” coincide com o espirrar do “alto esguicho de sangue” do Hermógenes, a mordida que Riobaldo consegue infligir-se opera no instante da vaporização de Diadorim. O resultado daquilo tudo é uma ascensão: “Subi os abismos... De mais longe, agora davam uns tiros, esses tiros vinham de profundas profundezas. Trespassei” [grifos nossos].49 O Paredão – “precipício”, e não aumentativo de “parede”50 – abre-se pois para cima, invertendo a eventual negatividade inscrita no topônimo. Aliás, mordendo-se a própria mão, o protagonista inscreve em si mesmo o símbolo hermético da serpente Uroboro, o hieróglifo do Conhecimento. O homem que “volta a si” reanimado pela água espargida em seu rosto é um ser transmutado pela provação sofrida. A espada flamejante que lançou o raio no cume da torre aniquilou a antiga encarnação do chefe jagunço que ali encontrou seu caminho de Damasco, despertando para o nível superior. A transmutação resultava das bodas alquímicas de Diadorim e Hermógenes, realizadas no centro da mandala onde se esposam os contrários. Sob o signo do raio, nesse duplo holocausto em que cada um é ao mesmo tempo vítima e imolador, so-

259

24/11/06 – 20h


brenascia “o terceiro corpo herdeiro da energia vital e das qualidades misturadas dos seus pais defuntos”.51 E como todo recém-nascido, o neófito do Paredão necessita recuperar-se fisicamente. A larva humana encontrará o melhor acolhimento em casa de Josafá Jumiro Ornelas, o Mestre da Barbaranha, aquele hierofante oculto que na véspera do São Pedro recebera na sua residência do Pé-da-Pedra um chefe de jagunços que se iniciava na via, vangloriando-se de um sobrenome ainda sem sentido nem conteúdo. Hoje em dia, estabilizado na terra herdada de seu pai Selorico Mendes, o barranqueiro do São Francisco tornou-se parecido a Josafá, a “especular idéias” na procura das chaves que ainda faltam para entender sua aventura. O discurso, destinado tanto ao hóspede anônimo quanto a ele próprio, constitui uma nova etapa do percurso – da travessia, dessa vez interior, que, por tabela, poderá repercutir no ensinamento de outros beócios à procura da luz: “E me cerro, aqui, mire e veja. Isto não é o de um relatar passagens de sua vida, em toda admiração. Conto o que fui e vi, no levantar do dia. Auroras”.52 Mas com uma condição: que estes cegos “mire(m) e veja(m)”, voltandose em direção ao “levantar do dia”, nas horas de ouro da alquimia – aurea horas: “Auroras”. Assim também eles terão condições de realizar o Opus Magnum Oriental-Ocidental trilhando as Veredas do Grande Sertão.

Francis Utéza é professor de literatura e diretor do Departamento de Português da Universidade Paul Valéry – Montpellier III (França), autor de JGR: metafísica do Grande sertão (Edusp, 1994).

NOTAS 1 Por exemplo, ao enviar um exemplar de Corpo de baile a um casal amigo (Dora e Vicente Ferreira da Silva), Rosa declarava: “Valeria a pena reler também o Grande sertão: veredas – que por bizarra que V. ache a afirmativa, é menos literatura pura do que um sumário de idéias e crenças do autor com buritis e capim devidamente semicamufladas” (Cavalo azul, n. 3, São Paulo, s/d – presumivelmente de 1967). 2 GUIMARÃES ROSA, João. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1980, p. 79. 3 Ibidem, p. 341. 4 UTÉZA, Francis. JGR: metafísica do Grande sertão. São Paulo: Edusp, 1994, pp. 198-200. 5 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit. p. 316. 6 Ibidem, p. 317. 7 Ibidem, p. 318. 8 Ibidem, p. 319. 9 Ibidem, p. 319. 10 Ibidem, p. 320. 11 Ibidem, p. 320.

260

24/11/06 – 20h


12 “Esta árvore preciosa que cresce entre rochedos áridos dá um leite muito nutritivo e foi, após a árvore do pão, a que talvez provocou mais admiração em Humboldt por causa da pujança e fecundidade da natureza tropical” (DENIS. Tableau historique et analytique des sciences occultes. Paris: Bachelier, 1830, p. 237). 13 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit. p. 413. 14 “Veranico é um verão pequeno, miniverão, que, no comum dos climas, vem em dezembro, em janeiro” (ORTÊNCIO, W. Bariani. Dicionário do Brasil Central. São Paulo: Ática, 1983). 15 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit. p. 410. 16 A caminhada para o Tamanduá-tão dá-se depois de novo mergulho no “umbigo” do mundo, no Verde-Alecrim onde se regenerava o Urutú-Branco junto das portadoras das energias lunares (a “Ageala Hortênsia”) e solares (“Maria-da-Luz”). 17 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit. p. 413. 18 Ibidem, p. 414. 19 MONTEIRO, L. Stubbs Saldanha. Vocabulário heráldico. Lisboa: Mame Sume, 1985, p. 93b. 20 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 414. 21 Em carta de 07.04.1964, Rosa anunciava: “Grande sertão: veredas sairá este ano na França com o título de Diadorim. E também este ano, na Alemanha, com o título de (!): GRANDE SERTAO (sem til) (GUIMARÃES ROSA, João. Correspondência com seu tradutor italiano. São Paulo: T. A. Queiroz Editor, 1981, p. 100). O escritor assinalava assim o que acarretava a supressão do til. De fato, não foi assim, publicou-se com til mesmo. 22 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 415. 23 Ibidem, p. 417. 24 Ibidem, p. 406. 25 “Para decifrar os símbolos (os adivinhos) designavam com o número nove as linhas Yang das diversas figuras e, com o seis, as linhas Yin. Isso se explica pelo fato de a relação do Yin ao Yang representar a da Terra ao Céu e, daí, do Quadrado ao Redondo” (GRANET, M. La pensée chinoise. Paris: Albin Michel, 1986, p. 158). 26 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 419. 27 Ibidem, p. 318. 28 “Entidade espiritual coletiva, receptora difusora de influências benéficas, e, ao mesmo tempo, escudo protetor e fonte de energias para aqueles que dela tomam parte” (BOUCHER, J. La symbolique maçonnique. Paris: Dervy-Livres, 1984, p. 336). 29 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 420. 30 Ibidem, p. 420. 31 Neologismo criado por Mircea Eliade para traduzir o conceito indiano de samadhi, o “ênstase” supera o estado de “êxtase” na medida em que corresponde à recuperação da não-dualidade primordial enriquecida pelas dimensões de liberdade e de transconsciência (ELIADE, M. Le yoga. Paris: Payot, 1983, p. 108). 32 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 422. 33 Ibidem, p. 449. 34 Ibidem, p. 441. 35 Ibidem, p. 442. 36 Ibidem, p. 441. 37 Aliás, no centro da custódia que representa o “Sol”, a parte em que se guarda a hóstia se chama “lúnula”. 38 O mesmo poder oculto foi atribuído pelo narrador a Otacília, na sua residência da Santa Catarina em cujo topônimo ecoa Kether, a mais alta Sefira da árvore hebraica, e o grego Katharos, apontando para a pureza do sagrário – “guardada macia e fina em sua casa-grande, sorrindo santinha no alto da alpendrada” (p. 149). 39 A subida pela escada em caracol indica ao iniciado que é nele próprio, dando uma volta inteira em direção ao alto, que poderá atingir o objetivo da excelência (BOUCHER, J. Op. cit., p. 132.) 40 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., pp. 446-448. 41 Ibidem, p. 451. 42 Cf. abrindo e fechando a narração do episódio, o primeiro aviso, “choque que levei – foi feito um trovão” (p. 438), e o último: “Eu despertei de todo – como no instante em que o trovão não acabou de rolar até ao fundo, e se sabe que caiu o raio {grifos nossos}” (p. 451). A referência é perceptível inclusive nas “janelas pintadas de azul, tão bem esquadriadas”, detalhe que caracteriza esta lâmina XVI no Tarô dito “de Marselha”. 43 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 451. 44 Ibidem p. 455. Num outro contexto, o médico Guimarães Rosa poderia ter feito constar, em jargão de patologia clínica, que o quadro do paciente apresentava todos os sintomas da febre tifóide com complicações neuromeníngicas – náuseas, cefaléias, sede, dores abdominais difusas, astenia física, vômitos, perturbações psíquicas acompanhadas de agitação, delírio, convulsões localizadas, deficiência motora dos nervos cranianos e dos membros (PILLY, E. Maladies infectieuses. Paris: Crouan, 1971, pp. 103-108; CAMBIER-MASSON. Abrégé de neurologie. Paris: Masson, 1972, pp. 421-423). 45 Ibidem p. 450. 46 Ibidem p. 450. 47 Também não deixa de ficar patente a sugestão do Tai-Ki Yin/Yang, naquela unidade girando em torno dos dois pólos antagônicos. 48 Rezar teria sido movimentar o espírito (veja-se a etimologia: dentro do latim recitare encontra-se a raiz grega Kine, movimento). 49 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 451. 50 Cf. a referência às beiras do São Francisco em tempo de estiagem: “E chamou minha atenção para o mato da beira, em pé, paredão, feito à régua regulado” (p. 82). 51 Cf. FULCANELLI. Les demeures philosophales. Paris: Pauvert, 1985, tomo 2, p. 95. 52 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., p. 460.

261

24/11/06 – 20h


Um romance de formação do Brasil Willi Bolle

“Vou lhe falar. Lhe falo do sertão. Do que não sei. Um grande sertão! Não sei. Ninguém ainda não sabe. Só umas raríssimas pessoas – e só essas poucas veredas”.1 Essa passagem do romance de Guimarães Rosa é uma espécie de mediação entre o título e o volumoso corpo da narrativa com suas mais de 500 páginas. Existem, sem dúvida, maneiras muito diversas de se interpretar o Grande sertão – como sugere, para começar, a parte em contraponto: Veredas –, mas nenhuma delas dispensa o leitor da tarefa hermenêutica de decifrar. Grande sertão: veredas é a história de vida do jagunço Riobaldo e de sua paixão por Diadorim, que motiva o seu relato. Com esse brevíssimo resumo já está esboçado o primeiro passo para ler a obra como um romance de formação, no duplo sentido: formação da alma de um indivíduo e retrato de um país. Relembremos inicialmente o protótipo do gênero, Os anos de aprendizagem de Wilhelm Meister, publicado por Goethe em 1795-1796 e seguido em 1828-1829 por uma continuação, Os anos de andanças de Wilhelm Meister. Os anos de aprendizagem são a história de um jovem, Wilhelm, que opta por uma vida alternativa àquela que lhe prescreve sua condição de filho de comerciante burguês. Em vez do traçado previsível de uma tranqüila existência prosaica, com todas as etapas já demarcadas e garantidas, do nascimento até o casamento proveitoso, do ganhar dinheiro até as diversões regradas, da geração de herdeiros e acumulação de um sólido patrimônio até o leito da morte – em vez de tudo isso: o amor proibido por uma atriz encantadoramente vestida de amazona; a paixão pelas letras e pela arte; o envolvimento com uma trupe de atores viajantes, com festas, brincadeiras, alegria; a curiosidade e o gosto de co-

270

24/11/06 – 18h


nhecer culturas diferentes do seu meio de origem; o encontro com a classe superior, com seu mascaramento congênito, seu desprezo pelos de baixo e suas damas belas e elegantes; a atração, por outro lado, pela vida natural da gente simples do campo, embora pelo preço de um ou outro assalto; o constante trânsito entre o desejo de “formar-se a si mesmo”, de aperfeiçoar-se e de buscar as qualidades de um “homem público” e, por outro lado, o choque com o comportamento mediano e interesseiro das pessoas, inclusive no meio artístico; o projeto de um teatro voltado para a formação das pessoas e, em última instância, da nação inteira; e o defrontar-se com empresários teatrais zombando desse ideal e visando ao lucro. Após a travessia do fazer teatral em todas suas dimensões, há uma recaída na realidade prosaica e rotineira burguesa da qual se pretendia escapar – eis, em síntese, a experiência de vida do jovem herói de Goethe, magistralmente relatada por um narrador que conhece profundamente tanto o establishment burguês quanto as utopias do artista, e que percebe que o único meio autêntico, talvez, de transmitir o perfil desses desenganos da modernidade é a ironia. E há ainda, no meio do caminho, o encontro com um personagem denominado o Desconhecido. Como menor unidade constitutiva da literatura comparada podemos considerar a afinidade eletiva entre as obras. Sem forçar paralelos ou fazer derivações, o leitor terá percebido que, assim como no Wilhelm Meister, também no romance-irmão brasileiro existe a fuga da casa do pai, o gosto pela viagem e a existência itinerante, a atração pelo amor proibido – por uma figura “virilmente feminina” –, a imersão em um ambiente social diferente, desafiador e perigoso, os conflitos, as lutas, os desenganos e os momentos de beleza gratuita, lado a lado com a utilização do homem pelo homem, o cálculo político e financeiro, mas também o incontabilizável e o desconhecido. O contato de Riobaldo com o Desconhecido se dá na personagem de Diadorim. O primeiro encontro, ainda na adolescência, é assim comentado: “Por que foi que eu precisei de encontrar aquele Menino?”2 Não existe explicação causal para essa pergunta; trata-se de um problema constitutivo do romance de formação. Uma das lições que Wilhelm Meister aprende com o personagem do Desconhecido é a de se perguntar, a cada encontro com uma pessoa, se se trata de mero acaso ou de necessidade. E, no segundo caso, como se deve dar

271

24/11/06 – 18h


continuidade a esse conhecimento e como aprofundá-lo. É Diadorim que inicia Riobaldo no meio dos jagunços, naquele ambiente do Brasil Central onde se misturam pobreza e poder, miséria e crime, e onde se jogam alegoricamente os destinos do país. Antes de abrir a perspectiva em grande-angular, detenhamo-nos na micro-história, como recomenda o narrador rosiano quando questiona a primazia dada a “guerras e batalhas”, em nome da importância dos “sentimentos”. “Diadorim: sabendo deste, o senhor sabe minha vida”.3 Foi o encontro com Diadorim, que aguçou a sensibilidade do protagonista de Grande sertão: veredas e proporcionou-lhe uma verdadeira educação sentimental, que é consolidada pela rememoração do convívio com a pessoa amada. Trata-se de uma aprendizagem dos grandes sentimentos que fazem a vida valer a pena: o amor e a coragem, ou dito de outra maneira, a luta contra o medo; é isso, em síntese, que o narrador procura compreender. A iniciação a essa tríade de sentimentos começa durante o episódio da travessia do rio São Francisco com o Menino. Riobaldo lembra do prazer que lhe deu o contato com a mão da pessoa com quem viajava na canoa, mas essa sensação o deixou “vergonhoso” e “perturbado”. Ele manifesta o seu “medo”, seu estar “ansiado” e sua “vergonha”. Diadorim, então, na figura do Menino, lhe ensina a pesquisar os seus sentimentos: “– Que é que a gente sente, quando se tem medo?”4 A partir desse momento, Riobaldo pesquisará esse sentimento em constante auto-análise e observação do comportamento das pessoas ao seu redor. Para uma tarefa desse tipo, o romance é, aliás, um meio de pesquisa incomparável. “Tenho medo?” – eis uma dúvida que sempre volta e que o protagonista se coloca nos momentos cruciais de sua vida e de sua narração. Ele mesmo responde: “Não. Estou dando batalha”.5 Já vimos que “guerras e batalhas” são apenas a parte superficial da história narrada em Grande sertão: veredas; “o que vale, são outras coisas”: o “signo e sentimento” de cada um. A maior das batalhas de Riobaldo é, sem dúvida, a luta contra o seu medo diante do Hermógenes e a luta contra o medo de amar Diadorim. Ambas as lutas são inter-relacionadas, e, desgraçadamente, o nosso herói não-heróico sai duplamente derrotado. Aí talvez o motivo, se isso pode servir de consolo, porque a história é narrada. Vejamos.

272

24/11/06 – 18h


O medo do Hermógenes, com o qual esse homem domina todos os jagunços ao seu redor, que vêem nele o “pactário”, senão o demônio em pessoa, esse misto de tremor-e-admiração é sentido também por Riobaldo e o deixa como hipnotizado: “Do Hermógenes, então, me atormentou sempre aquele meu receio [...]. Eu não queria ter de pensar naquele Hermógenes, e o pensamento nele sempre me vinha, ele figurando, eu cativo. [...] Aquilo me corria só os calafrios de horror”.6 Desse medo, apesar de todos seus estratagemas, Riobaldo não consegue livrar-se nunca. Mas não seria o seu pacto com o Diabo a grande e corajosa preparação para a luta contra o pactário Hermógenes? É uma convenção estabelecida pela crítica, mas ela é falaciosa. Pois o que haveria de especialmente corajoso em fechar à meia-noite numa encruzilhada um pacto com “o-que-não-existe”? Trata-se apenas de uma batalha virtual, um sucedâneo da luta contra o Hermógenes que não ocorre, um ritual para Riobaldo exorcizar o seu medo. Em vez de enfrentar o Hermógenes, que é o seu inimigo real, ele – num ato de falsa coragem – se confronta com uma figura de substituição, imaginária: o Diabo. Em nenhum momento, Riobaldo cria coragem para enfrentar o Hermógenes em pessoa – quem luta com o Hermógenes de igual para igual, quem o mata e é morto por ele é Diadorim. Vejamos também algumas das emoções que Riobaldo experimenta com relação a Diadorim. “Era um delém que me tirava para ele [...]. Eu não tinha coragem de mudar para mais perto”.7 “Diadorim pôs mão em meu braço. Do que me estremeci, de dentro, mas repeli esses alvoroços de doçura”.8 “Eu gostava dele, dia mais dia, mais gostava. [...] Como um feitiço? Isso. Feito coisa-feita. [...] Em mim a vontade de chegar todo próximo, quase uma ânsia de sentir o cheiro do corpo dele”.9 Nota-se que a palavra “ânsia” tem a mesma raiz que “angústia”. Ambas as palavras são derivadas do latim angustus (estreito, apertado), que vem do grego ango, anxi (apertar a garganta ou o coração). Assim se explica a passagem semântica do “aperto” pelo “ímpeto” ao “desejo”. Em outras palavras, existe uma fluidez e metamorfose dos sentimentos. Para falar de suas reações diante do amor por Diadorim, Riobaldo – que tem medo de amar – chega a usar os mesmos termos com os quais descreve suas lutas contra o medo representado por perigos e inimigos externos. A “valentia enorme” de encarar a pessoa amada, de declarar-se a ela e de tocar o seu corpo, Riobaldo não chega a tê-la em momento nenhum durante

273

24/11/06 – 18h


todo o seu convívio com Diadorim. A narração de sua história, enquanto trabalho de luto sem fim, é pura melancolia. O que resta da tentativa de Riobaldo de “repor Diadorim em vida” são os lugares, onde “alguma coisa, ainda [se] encontra”: os “vazios”. À medida que se desenrola a história desse sofrimento individual, aprendemos a conhecer algo da história da gente sertaneja e do país. Com isso, passamos para a outra faceta do romance de formação: sua dimensão de história social. Ao entrar nesse terreno, convém esclarecer que o romance de formação goethiano, como história do desenvolvimento de um “herói individual”, costumava ser oposto pela crítica ao romance social – desde Karl Morgenstern, que cunhou o termo Bildungsroman, em 1820, até Wilhelm Dilthey, Georg Lukács e mesmo Walter Benjamin. A crítica mais recente, com pesquisadores como Wilhelm Vosskamp, passou a revisar o conceito de Bildungsroman e resgatar no texto fundador de Goethe a dimensão de romance social que foi soterrada. Na verdade, Os anos de aprendizagem de Wilhelm Meister, longe de focalizarem apenas a trajetória de formação do herói, são baseados numa profunda reflexão sobre a sociedade, sacudida pela Revolução de 1789. O diagnóstico de Friedrich Schlegel, contemporâneo de Goethe, segundo o qual o Wilhelm Meister expressava uma das três “maiores tendências de [sua] época”, juntamente com a doutrina-da-ciência de Fichte e a Revolução Francesa, foi descartado por Morgenstern, crítico típico da época Biedermeier, como “exagero”. A partir dele, predominou, durante o século XIX e o século XX adentro, uma valorização da formação do indivíduo em detrimento da formação social, de acordo com a atitude de alienação da burguesia alemã diante das questões da vida pública e da cidadania. Tendência reforçada pelo romance oitocentista alemão, que não chegou a dar o salto qualitativo de combinar o romance de formação individual com o romance social. A própria feitura de Grande sertão: veredas, sua afinidade eletiva com certas estruturas de Wilhelm Meister, ajuda a perceber melhor o projeto de formação concebido por Goethe. Tanto no romance de Goethe quanto no de Guimarães Rosa, a idéia de que a pessoa se forma num campo de energias sociais e políticas é sustentada estrategicamente pela figura do narrador, que realiza um complexo trabalho de mediação entre os diferentes discursos sociais. Procurando uma alternativa à Revolução, a meta de Goethe não foi a luta de classes, mas o diálogo entre as classes em conflito. Com razão, Vosskamp, em seu comentá-

274

24/11/06 – 18h


rio, sublinha a “dialogicidade dos Anos de aprendizagem”.10 Convém lembrar, nesse contexto, que a idéia de formação, intensamente discutida no meio intelectual e artístico alemão por volta de 1789-1795, não se limitava à dimensão do indivíduo, mas estendia-se explicitamente ao “povo” e à “humanidade” como um todo (Herder), com desdobramentos numa teoria da linguagem e uma literatura de abertura universal (Wilhelm von Humboldt, Goethe). O romance de Guimarães Rosa, como se fosse uma ilustração da idéia goethiana de Weltliteratur, contribui para resgatar o sentido original do Bildungsroman. Trata-se, sem dúvida, também de um romance da formação do indivíduo, mas dentro de um projeto mais arrojado: a construção de uma cultura coletiva, incorporando as dimensões políticas da esfera pública, da cidadania e dos conflitos sociais. Além de se inspirar no paradigma do Bildungsroman alemão, o romance de Guimarães Rosa proporciona, por sua vez, uma reflexão sobre o conceito de “formação” a partir da tradição da literatura brasileira. Isso se torna mais visível, se analisamos o Grande sertão: veredas no contexto dos ensaios de formação do Brasil. A palavra “formação”, utilizada já em Os sertões por Euclides da Cunha e, como título de obra, pela primeira vez por João Pandiá Calógeras, em Formação histórica do Brasil (1930), tornou-se a partir de então um verdadeiro eixo conceitual entre os retratistas do país. É bastante difícil, no entanto, encontrar em seus textos uma definição explícita do termo. Uma pesquisa conceitual sobre o “sentido da formação” foi realizada apenas recentemente por Paulo Arantes em uma análise da Formação da literatura brasileira (1959), de Antonio Candido.11 Como explica Arantes, trata-se de uma “aspiração coletiva de construção nacional”, um processo de “acumulação da experiência intelectual nas condições [...] da dependência”; mais concretamente: a retomada por um autor brasileiro de determinados problemas estratégicos de outro autor conterrâneo identificado então como “precursor”. Constituiu-se assim uma tradição própria no campo da crítica: ao diagnosticar a “formação de um sistema literário”, a existência de uma “causalidade interna”, Antonio Candido pôde reportar-se a uma idéia de Sílvio Romero, que contrapropôs “um certo espírito de coesão” à “falta de ‘seriação nas idéias’”. Outro campo literário abriu-se nos domínios do romance, com a aprendizagem e o aperfeiçoamento de Machado de Assis com relação a José de Alencar – como mostrou Roberto Schwarz –, e analogamente poderíamos demonstrar que Guimarães Rosa “reescreveu” criti-

275

24/11/06 – 18h


camente o livro fundador de Euclides da Cunha. Ou seja, ao longo da elaboração do sistema literário brasileiro, ocorreu, como explica Paulo Arantes, a “consolidação de uma causalidade interna”, a invenção de um sentido autônomo para a palavra “formação”, em que certos ensaios sociológicos e historiográficos e esse romance de formação do Brasil que é Grande sertão: veredas constituem expressões da “formação na periferia”. Para ilustrar o funcionamento desse retrato poético do Brasil que é o Grande sertão: veredas, vamos nos valer de um dos textos menos conhecidos do escritor, o prefácio à Antologia do conto húngaro, organizada por Paulo Rónai em 1956, em que Guimarães Rosa fala, indiretamente, da forma de construção do romance que acabara de publicar: [...] é uma língua in opere, fabulosamente em movimento [...] toda possibilidades, como se estivesse sempre em estado nascente [...] como um prestante e moderno mecanismo, [...] aceita quaisquer aperfeiçoamentos estruturais e instrumentais [...]. Por sua própria natureza original, permite todas as caprichosas e ousadas manipulações da gênese inventiva [...] como [...] um painel de mesa telefônica, para os engates ad libitum.12 A metáfora tecnológica usada aqui pelo próprio Guimarães Rosa só incomodará aqueles que acham um disparate querer analisar o grande autor “metafísico” à luz de uma terminologia própria da era eletrônica. Ocorre que o romancista, contemporâneo do surgimento dos primeiros computadores, defendeu explicitamente, na entrevista a Günter W. Lorenz em 1970, o princípio de “trabalhar como um cientista e segundo as leis da ciência”. A metáfora tecnológica é exata e muito apropriada para ajudar o leitor a organizar um percurso de leitura nessa obra labiríntica. As referências à história do Brasil são estrategicamente espalhadas por mais de 500 páginas, e o leitor tem de se dar ao trabalho de juntar esses fragmentos esparsos para remontar a partir deles uma nova leitura do país. “Organizar” a leitura, como solicita o próprio narrador, significa escolher, nesse painel de mesa telefônica que é o Grande sertão, uma série de “engates” ou citações que nos levem a conhecer melhor algumas veredas, notadamente as conexões entre o romance de formação da “alma” do indivíduo e a dimensão histórica do país. Isso implica também em estabelecer co-

276

24/11/06 – 18h


nexões com alguns ensaios de formação. A título de ilustração, proponho aqui três “engates” de leitura que nos levem da experiência de formação dos sentimentos de Riobaldo, aguçada pelo seu relacionamento com Diadorim, à dimensão mais ampla do retrato do país. Ao longo de seu convívio com Diadorim, falta a Riobaldo a coragem de assumir esse amor proibido e perigoso, assim como lhe falta a coragem de se afastar dele de vez. Quando, no meio de muitas travessias, ele reitera a proposta que ambos abandonem a jagunçagem – com o sensato argumento de que muita gente já morreu e foi morta “para documento do fim de Joca Ramiro” – a réplica se dá em forma de um desafio, ao mesmo tempo viril e feminino. Diadorim acusa o amigo de falta de coragem: “– Riobaldo, você teme?” Além disso, ele põe às claras o motivo que Riobaldo não tem coragem de assumir diante dele: casar-se com a “filha do dono daquela grande fazenda, nos gerais da Serra, na Santa Catarina”.13 Com isso, toca-se no motivo nunca confessado pelo protagonista-narrador. Riobaldo renega sua paixão por Diadorim não apenas por pressão de uma sociedade machista ou por causa do amor a Otacília, mas também e talvez sobretudo por uma questão de interesse material: sua ascensão de raso jagunço a integrante da classe dos fazendeiros. São basicamente três os estratagemas usados por Riobaldo – filho bastardo de uma pobre moradora do sertão, a Bigri, com o latifundiário Selorico Mendes – para passar da “casinha pobre” para a “grande fazenda”. Primeiro, a preparação cuidadosa do casamento com Otacília, “dona de tantos territórios agrícolas e adadas pastagens”. Segundo, a campanha contra o Hermógenes, também proprietário de “gados e fazendas [...] nos gerais da Bahia”; empreendimento para o qual Riobaldo recruta toda a mão-deobra disponível, “rebanhal”, entre os sem-posse e os miseráveis. Em terceiro lugar, as alianças com figuras da oligarquia local, como seô Habão e seo Ornelas. Com tudo isso, e mais o patrimônio recebido de Selorico Mendes, Riobaldo acaba se integrando à classe dominante. O que nos faz perceber melhor a importância das fazendas no romance é a leitura de Grande sertão: veredas pelo prisma do estudo de Gilberto Freyre, Casa-grande & senzala (1933). O diálogo entre os dois textos surge com maior visibilidade no episódio da fazenda dos Tucanos, descrita detalhadamente como uma “casa-grande” com suas “senzalas”. É lá que vem à tona o tema da es-

277

24/11/06 – 18h


cravidão, por meio de papéis velhos descobertos por Riobaldo, ainda do tempo do imperador, entre os quais “a fatura de negócios com escravos, compra, os recibos”. Discretamente, o escritor insere no relato oral do seu narrador alguns escritos-chave da história do Brasil. E não só antigamente negociava-se o ser humano naquela fazenda, mas no exato momento da história de Riobaldo os “pobres jagunços”, inclusive ele, correm o risco de se tornarem objeto de uma negociata entre seu chefe Zé Bebelo e as forças do governo. Nessa fazenda, Riobaldo também aprende com Zé Bebelo os moldes da traição. A ameaça de Riobaldo e seus companheiros tornarem-se material humano a ser usado pelos donos do poder paira novamente sobre eles nos domínios do “fazendeiro-mór”, seô Habão, “sujeito da terra definitivo”, ao lado do qual jagunço “não passa de ser homem muito provisório”: “Seô Habão [...] cobiçava a gente para escravos!”14 Depois de sentir essa ameaça na carne, o quase-escravo Riobaldo prepara-se para o pacto com o Demônio, que lhe traz o status de “senhor”: “Quem era que ordenava, se prazia e mandava? Eu, senhor, eu: por meu renome, o Urutú-Branco...”.15 Uma vez empossado como chefe, Riobaldo age segundo os mesmos moldes que ele criticou em seô Habão: recruta a mãode-obra camponesa para sua empresa particular de derrotar o Hermógenes, a fim de se apresentar publicamente como aquele que limpou “estes Gerais da jagunçagem”, seguindo o modelo do candidato a deputado Zé Bebelo. Voltemos mais uma vez da esfera social do romance para a história individual da paixão do protagonista. No meio da batalha final do Paredão, Riobaldo imagina um diálogo que ele poderia ter tido com Diadorim na véspera: “– [...] Quando isto tudo findar, Diá, Di, então, quando eu casar, tu deve de vir viver em companhia com a gente, numa fazenda, em boa beira do Urucúia...”16 Ou seja: o senhor Riobaldo, casado com dona Otacília, imagina Diadorim vivendo na sua fazenda! O status social que ele atribui nesse momento à pessoa pela qual se diz apaixonado é o de um agregado. Essa passagem nos chama a atenção para o fato de Diadorim ser um personagem social e economicamente indefinido – em contraste com todos os demais. Apesar de Maria Deodorina da Fé Bettancourt Marins ser filha de Joca Ramiro, dono da fazenda São João do Paraíso, nada desse patrimônio passa para ela como herança depois da morte do pai. Quer dizer: o lugar social de Diadorim não deve ser procurado, como o de Otacília, no mapa das fazendas, mas

278

24/11/06 – 18h


no mapa da mão-de-obra subjacente ao romance. Lembremos que foi Diadorim que iniciou Riobaldo nesse ambiente, que proporciona a este um profundo conhecimento da vida cotidiana do povo brasileiro. Nesse ponto, operamos um segundo engate de comparação de Grande sertão: veredas com os ensaios de formação do Brasil. A mão-de-obra jagunça que povoa o romance de Guimarães Rosa é recrutada entre os “desclassificados, inúteis e inadaptados”, esse amplo contingente da população brasileira, trazido para o primeiro plano por Caio Prado Jr. em Formação do Brasil contemporâneo (1942). Posto “no entremeio deles”, o protagonista-narrador rosiano nos dá o testemunho de uma observação participante, que tem traços em comum com o trabalho de campo do sociólogo ou antropólogo, mas difere deles pelo seu engajamento existencial. Acompanhando o jagunço Riobaldo, o leitor mergulha no meio da sociedade sertaneja, com seus usos e costumes, suas falas e sua mentalidade, especialmente as condições de vida e a ideologia dos “homens livres”. A forma dispersa como o romance representa o povo e a mão-de-obra corresponde a um quadro real: é “uma massa de população totalmente desarticulada, trabalhando com baixíssima produtividade numa agricultura de subsistência”. Assim, Celso Furtado, em Formação econômica do Brasil (1958), caracteriza a situação em Minas Gerais, em fins do século XVIII. Cada uma das empreitadas dos chefes, de Medeiro Vaz a Zé Bebelo, e também a de Riobaldo, é um micromodelo da macroempresa Brasil. Na interpretação de Caio Prado Jr., o sentido da colonização do Brasil foi o de uma vasta empresa comercial – um ângulo de abordagem retomado por Celso Furtado e Darcy Ribeiro. As cenas de Grande sertão: veredas relembram a história do país, desde a colonização: a “empresa Brasil”, como moinho ou máquina de gastar gente. Qual é o balanço final dessa empreitada da jagunçagem? Afora os sobreviventes que Riobaldo afirma ter reposto em seus lugares, a última versão do mapa da mão-de-obra em Grande sertão: veredas é um mapa de mortos. “– Mortos, muitos?”, pergunta o chefe Riobaldo depois da batalha do Paredão; como resposta ele recebe um lacônico e triste “– Demais...”. Há uma morte, no meio de tantas, que pesa especialmente para Riobaldo: “Diadorim tinha morrido – mil-vezes-mente – para sempre de mim”.17 O trabalho de luto e a tentativa de “repor Diadorim em vida” inicia-se ali no Paredão, prolonga-se em buscas por

279

24/11/06 – 18h


testemunhos da existência dele e finalmente se torna o motivo que desencadeia a narração. “Agora, no que eu tive culpa e errei, o senhor vai me ouvir”18, declara Riobaldo no meio da narrativa. Na primeira parte predominavam as explicações sobre o seu “jeito condenado” de gostar de Diadorim; na segunda parte ele falará sobretudo do pacto concluído com o Demônio e do caminho de sua ascensão social. Na verdade, a culpa é uma só: o peso de consciência de ter usado seus ex-companheiros, antigamente seus iguais, inclusive a vida de muitos deles, como meio para ele, Riobaldo, obter vantagens materiais; uma culpa que se aguça pelo fato de no meio das vítimas encontrar-se também a pessoa amada: Diadorim. A expiação da culpa de Riobaldo é a narração de sua história. Narração como trabalho de luto por Diadorim e, ao mesmo tempo, história cotidiana do povo sertanejo. Diadorim foi para Riobaldo a figura iniciática que o trouxe para o meio dos jagunços. Na segunda parte do relato, Diadorim confunde-se cada vez mais com esse meio, ao passo que Riobaldo, à medida que avança na carreira do poder, vai se afastando do povo. Em termos de método de narrar, o escritor procura dar conta da dupla condição social de Riobaldo construindo o seu protagonista-narrador como um jagunço letrado. Aqui operamos um terceiro e último engate entre o romance e os ensaios de formação. “O senhor conhece meu pai, fazendeiro Senhor Coronel [...]?!” – pergunta Riobaldo a seô Habão, logo depois de ter sentido o olhar do latifundiário cobiçando “eu [Riobaldo], Diadorim, e todos os companheiros” como “braços, para capinar e roçar”, “jornaleiros” e, em última instância, “escravos”.19 Em vez de se revoltar junto com os companheiros, Riobaldo pratica um ato de traição: distancia-se de seus iguais e os renega, declarando-se filho de coronel. O último ato dessa traição consiste em assistir, passivamente, instalado como chefe, no alto do “sobrado” no Paredão, à luta em que Diadorim enfrenta o Hermógenes, mata o arquiinimigo e é morto por ele. O sobrado é um lugar emblemático na cultura brasileira, e também essa passagem do romance dialoga com um dos retratos do Brasil. Em Sobrados e mucambos (1936), Gilberto Freyre descreve uma mudança social e cultural da sociedade brasileira, ocorrida entre o final do século XVIII e meados do século XIX: a opção dos filhos dos senhores de engenho pela formação e pela carreira de bacharéis. É um capítulo

280

24/11/06 – 18h


significativo da história do letrado brasileiro, como realça Antonio Candido em Formação da literatura brasileira, uma adaptação e colaboração das “elites tradicionais” com “as novas camadas em ascensão”. Raymundo Faoro, em Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro (1958) traz um amplo histórico do “estamento” dos letrados na história brasileira, e de sua coligação com o establishment patrimonial. A obra inspiradora desses retratos é Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda, que investiga a persistência do arcaico no processo da modernização no Brasil e encontra essa “herança rural” nos “novos tempos” emblematizada pela figura do bacharel. Ambos, o historiador Sérgio Buarque e o romancista Guimarães Rosa, têm como objetivo comum “exorcizar” o elemento arcaico dentro do bacharelismo, mas seus procedimentos são diferentes. Enquanto o historiador apresenta o problema da “sociedade [...] mal formada nesta terra” em termos de uma temporalidade causal (os bacharéis como descendentes dos senhores rurais), diagnosticando a sobrevivência das velhas estruturas no presente, o romancista constrói um quadro dialógico – uma “conversa” entre um narrador sertanejo e um ouvinte urbano –, em que as estruturas presentes são escavadas até revelarem seus fundamentos remotos. E enquanto Sérgio Buarque vê o caminho de “expiar os erros” em uma “liquidação [...] de nossa velha herança rural e colonial”20, um “aniquilamento das raízes ibéricas de nossa cultura”21, e um “extirpar [...] das sobrevivências arcaicas”22, Guimarães Rosa opta por uma estratégia diametralmente oposta. Esse romance de formação do Brasil que é Grande sertão: veredas é apresentado por um narrador que tem como lema: “No que eu tive culpa e errei, o senhor vai me ouvir”. Ou seja, trata-se de rastrear uma história culposa e escondida, tanto do indivíduo Riobaldo, quanto do seu país, em que os erros e os crimes, em vez de serem liquidados, aniquilados, extirpados – e, com isso, recalcados –, são trazidos à luz do dia, num trabalho paciente e sofrido de memória, com a expectativa de uma redenção. “Agora, o mundo quer ficar sem sertão”23 e “Mas só se sai do sertão é tomando conta dele a dentro”24, declara o romancista por intermédio de seus personagens. Ou seja, é preciso trazer à tona o que a historiografia oficial oculta no espaço simbolizado pelo Grande sertão: o que não se sabe, o que “ninguém ainda não sabe”. “Só umas raríssimas pessoas – e só essas poucas veredas”.25 Para dar uma amostra de como podem

281

24/11/06 – 18h


ser rastreados nesse labiríntico romance os elementos ocultos da formação, recorremos ao auxílio da metáfora do painel da mesa eletrônica, utilizada pelo romancista para falar da construção de sua obra – e sugerindo com isso também um método para sua desconstrução hermenêutica.

Willi Bolle é professor de literatura alemã na USP, autor de Fórmula e fábula: teste de uma gramática narrativa, aplicada aos contos de Guimarães Rosa (São Paulo: Perspectiva, 1973), Fisiognomia da metrópole moderna: representação da história em Walter Benjamin (São Paulo: Edusp, 1994) e grandesertão.br – O romance de formação do Brasil (São Paulo: Duas Cidades/Editora 34, 2004).

NOTAS 1 GUIMARÃES ROSA, João. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p. 100. 2 Ibidem, p. 109. 3 Ibidem, p. 318. 4 Ibidem, p. 106. 5 Ibidem, p. 313. 6 Ibidem, p. 232. 7 Ibidem, p. 29 (grifos meus). 8 Ibidem, p. 38 (grifo meu). 9 Ibidem, pp. 146-147 (grifo meu). 10 Apud GOETHE, Johann Wolfgang von. Wilhelm Meisters Lehrjahre. Organização de Wilhelm Vosskamp. Frankfurt: Deutscher Klassiker Verlag, 1992, p. 1246. 11 ARANTES, Paulo Eduardo. “Providências de um crítico literário na periferia do capitalismo”. In: ARANTES, Otília Beatriz Fiori e ARANTES, Paulo Eduardo. Sentido da formação: três estudos sobre Antonio Candido, Gilda de Mello e Souza e Lúcio Costa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. 12 GUIMARÃES ROSA, João. “Pequena palavra”. In: RÓNAI, Paulo (org.). Antologia do conto húngaro. Rio de Janeiro: Artenova, 1956. 13 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., 2006, pp. 374-376. 14 Ibidem, pp. 423-415. 15 Ibidem, p. 443. 16 Ibidem, p. 588. 17 Ibidem, pp. 596-597. 18 Ibidem, p. 313. 19 Ibidem, p. 415. 20 BUARQUE DE HOLANDA, Sérgio. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 74 (grifo meu). 21 Ibidem, p. 172 (grifo meu). 22 Ibidem, p. 180 (grifo meu). 23 GUIMARÃES ROSA, João. Op. cit., 2006, p. 289. 24 Ibidem, p. 279. 25 Ibidem, p. 100.

282

24/11/06 – 18h


GUIA

Ave, palavras OBRAS DO AUTOR

1. Romance

Com o vaqueiro Mariano. Niterói: Hipocampo, 1952. Posteriormente incluído em Estas estórias.

Manuelzão e Miguilim. Rio de Janeiro: José Olympio, 1964; 11. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.

Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1956; 19. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001; edição comemorativa – 50 anos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

2. Novelas e contos Sagarana. Rio de Janeiro: Editora Universal, 1946; 63. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001; edição comemorativa – 60 anos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

Campo geral. Rio de Janeiro: Sociedade dos Cem Bibliófilos do Brasil, 1964.

Corpo de baile. Rio de Janeiro: José Olympio, 1956. Posteriormente dividido em três volumes: Manuelzão e Miguilim, No Urubuquaquá, no Pinhém e Noites do sertão. Reunidos em edição comemorativa – 50 anos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

No Urubuquaquá, no Pinhém. Rio de Janeiro: José Olympio, 1965; 9. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.

Primeiras estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1962; 15. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.

Noites do sertão. Rio de Janeiro: José Olympio, 1965; 9. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.

283

24/11/06 – 20h


Tutaméia (Terceiras estórias). Rio de Janeiro: José Olympio, 1967; 8. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969; 5. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. Ave, palavra. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970; 5. ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. Jardins e riachinhos. Edição especial com prefácio de Geraldo França de Lima e perfil do autor de Renard Perez. Rio de Janeiro/São Paulo: Salamandra/Grupo Ipiranga, 1983. Distribuída como brinde de final de ano.

de nascimento de João Guimarães Rosa.

Rio de Janeiro: Edições O Cruzeiro, 1962.

A hora e vez de Augusto Matraga. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1987. Conto originalmente publicado em Sagarana.

“Os chapéus transeuntes”. In Os sete pecados capitais. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964; 2. ed., Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000. Posteriormente incluído em Estas estórias.

Fita verde no cabelo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1992. Conto originalmente publicado em Ave, palavra. O burrinho pedrês. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1996. Conto originalmente publicado em Sagarana.

3. Poemas Magma. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. Escrito em 1936.

6. Textos incluído em coletâneas “O burrinho pedrês”. In: ANDRADE, Carlos Drummond de (org.). 10 histórias de bichos. Rio de Janeiro: Edições Condé, 1947. “A hora e vez de Augusto Matraga”. In Contos e novelas, v. 2. Seleção de Graciliano Ramos. Rio de Janeiro: Casa do estudante do Brasil, 1957. “A hora e vez de Augusto Matraga”. In Obras-primas da novela brasileira. Seleção de Raimundo de Menezes e Fernando de Barros Martins. São Paulo: Martins, 1957.

O burro e o boi no presépio / The ass and the ox in the nativity scene. Edição bilíngüe inglês/português. Prefácio de Geraldo França de Lima. Rio de Janeiro: Salamandra, 1983. Distribuída como brinde de final de ano.

4. Compilação Guimarães Rosa: ficção completa. Organizado por Eduardo de Faria Coutinho. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.

5. Obras coletivas Rosiana – Uma coletânea de conceitos, máximas e brocardos de João Guimarães Rosa. Seleção e prefácio de Paulo Rónai. Rio de Janeiro: Salamandra/ MPM Propaganda, 1983. Edição comemorativa dos 75 anos

O mistério dos MMM. Capítulo 7. Romance coletivo. Coordenação de João Condé. Publicado em O Cruzeiro. Rio de Janeiro, 16.12.1961. Lançado em livro com o mesmo título. 284

“O duelo”. In Panorama do conto brasileiro – O conto mineiro. Seleção de Edgard Cavalheiro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1959. “A hora e vez de Augusto Matraga”. In Panorama do conto brasileiro – O conto trágico. Seleção de Jerônimo Monteiro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964. “Seis poemas de Soares Guia24/11/06 – 20h


mar”. [Pseudônimo de Guimarães Rosa] In: BANDEIRA, Manuel (org.). Antologia dos poetas bissextos contemporâneos. 2. ed. revista e aumentada. Rio de Janeiro: Organizações Simões, 1964. “A terceira margem do rio”. In: COUTINHO, Afrânio. Antologia brasileira de literatura. Rio de Janeiro: Distribuidora de Livros Escolares, 1965. “A hora e vez de Augusto Matraga”. In Seleção de contos brasileiros. Selecionados por Graciliano Ramos. Rio de Janeiro: Edições de Ouro/Tecnoprint, 1966. “As margens da alegria”. In Textos de autores brasileiros. Selecionados pela Faculdade de Filosofia da Universidade Federal da Bahia. Rio de Janeiro: Distribuidora de Livros Escolares, 1967. “São Marcos”. In O besouro e a rosa, São Marcos e a mulher que chegava às seis. São Paulo: Paz e Terra, 1997.

7. Prefácios e orelhas “Pequena palavra”. In: RÓNAI, Paulo (org.). Antologia do conto húngaro. Rio de Janeiro: Artenova, 1956.

“Simples passaporte”. In: COSVasconcellos. De 7 lagoas aos 7 mares. Belo Horizonte: Itatiaia, 1960.

TA,

“Orelha”. In: LIMA, Geraldo França de. Serras azuis. Rio de Janeiro: Edições GRD, 1965. “Dezesseis vezes Minas Gerais”. In: BARREIROS, Eduardo Canabrava. O segredo de Sinhá Ernestina. Rio de Janeiro: José Olympio, 1967. “Orelha”. In: BARREIROS, Eduardo Canabrava. O segredo de Sinhá Ernestina. Rio de Janeiro, José Olympio, 1967. “Orelha”. In: FREYRE, Gilberto. Nordeste. Rio de Janeiro: José Olympio, 1967.

8. Correspondências “Carta a João Condé (como e por que foi escrito Sagarana)”. A Manhã, Rio de Janeiro, 2128.07.1946. “Carta a Cyro dos Anjos”. A manhã. Rio de Janeiro, n. 96, 22.08.1948. “Carta à redação de Letras e Artes”. A manhã. Rio de Janeiro, n. 156, 05.03.1950. “Carta a Angel Crespo e Pilar Gómez Bedate”. Revista de Cultura Brasileña. Madri, n. 7, dez. 1963. “Carta a Bernardo Élis”. Goiás Agora, Goiânia, jun. 1965. “Carta ao embaixador Antônio C. Câmara Canto”. Revista de Cultura Brasileña. Madri, n. 21, jun. 1967. 285

“Carta a Waldemar Reis”. Correio do Sul, Bagé, 23.11.1967. “Carta a Paulo Dantas”. O Estado de S. Paulo, 25.11.1967. “Carta ao cônsul Cabral”. Jornal da Tarde, São Paulo, 25.11.1967. “Três cartas”. Minas Gerais, Belo Horizonte, 25.11.1967. “Carta a Paulo Hecker Filho”. Cultura Contemporânea. Porto Alegre, n. 1, 1968. “Carta a Vilma”. In: VÁRIOS Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968.

AUTORES.

Sagarana emotiva. Cartas de J. Guimarães Rosa (1957-1965). Organização de Paulo Dantas. São Paulo: Duas Cidades, 1975. “Carta a Pedro Moreira Barbosa, Paris, 19/7/1949”. In: PALMÉRIO, Mário. “Discurso de posse na ABL (22/11/1968)”. Extensão. Número Especial “Guimarães Rosa”. Belo Horizonte, v. 3, set 1993, pp. 41-42. “Carta a Álvaro Lins”. Folha de S. Paulo, 04.06.1995. “O texto, um animal bravo e vivo...” Trechos de cartas enviadas à tradutora Harriet de Onís. Jornal da Tarde, São Paulo, 18.05.1996. “Carta a Harriet de Onís 23/4/1959”. Folha de S. Paulo, 30.06.1996. “Carta de 14 de outubro a 24/11/06 – 20h


Jean-Jacques Villard”. Folha de S. Paulo, 30.07.1996. J. Guimarães Rosa: correspondência com o tradutor italiano (1962-1967). São Paulo: Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro, 1972. Reeditado como: Correspondência com seu tradutor italiano Edoardo Bizzarri. 2. ed. São Paulo: T. A. Queiroz/Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro, 1981; e João Guimarães Rosa: correspondência com seu tradutor italiano Edoardo Bizzarri. 3. ed. Belo Horizonte/Rio de Janeiro: UFMG/Nova Fronteira, 2003.

Cartas a William Agel de Mello. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003.

“São Marcos”. Vamos Ler!. Rio de Janeiro, ano 9, n. 559, 19.04.1947. (Republicação de um conto de Sagarana). “Histórias de fadas”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20.04.1947. (Republicado com alterações em Ave, palavra)

Ooó do vovô: correspondência de João Guimarães Rosa, vovô Joãozinho, com Vera e Beatriz Helena Tess. São Paulo: Edusp/Imprensa Oficial, 2003.

“Sanga puytã”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 17.08.1947. (Republicado com alterações em Ave, palavra) “Com o vaqueiro Mariano”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 26.10.1947, 22.02.1948 e 07.03.1948. (Textos reunidos e incluídos em Estas estórias) “Cidade”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 15.02.1948. (Incluído em Ave, palavra, com o título “Em-cidade”)

Correspondência com seu tradutor alemão Curt Meyer-Clason (1958-1967). Edição e organização de Maria Apparecida Faria Marcondes Bussolotti. Belo Horizonte/Rio de Janeiro: UFMG /Nova Fronteira/ ABL , 2003.

9. Textos de Guimarães Rosa publicados em jornais, revistas e periódicos “O mistério de Highmore Hall”. O Cruzeiro. Rio de Janeiro, 07.12.1929. “Makiné”. O Jornal, Rio de Janeiro, 09.02.1930.

“O mau humor de Wotan”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 29.02.1948. (Republicado com alterações em Ave, palavra) “O lago do Itamaraty”. Seleções do Reader’s Digest. Rio de Janeiro, ago. 1951. (Texto incluído em Ave, palavra)

“Caçadores de camurças”. O Cruzeiro. Rio de Janeiro, 12.07.1930.

“A senhora dos segredos”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 06.12.1952. (Republicado com alterações em Ave, palavra)

“Chronos kai anagke”. O Cruzeiro. Rio de Janeiro, 21.06.1930.

“Pé-duro, chapéu-de-couro”. O Jornal, Rio de Janeiro,

286

24/11/06 – 20h


28.12.1952. (Texto incluído em Ave, palavra) “Terrae vis”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 25.01.1953. (Texto incluído em Ave, palavra) “Cipango”. Folha da Manhã, São Paulo, 17.02.1953. (Texto incluído em Ave, palavra) “Ao pantanal”. Diário de Minas, Belo Horizonte, 05.04.1953. (Texto incluído em Ave, palavra) “Teatrinho”. A Manhã, Rio de Janeiro, 19.04.1953. (Texto incluído em Ave, palavra) “O homem de Santa-Helena”. A Manhã, Rio de Janeiro, 03.05.1953. (Texto incluído em Ave, palavra) “Do diário em Paris”. A Manhã, Rio de Janeiro, 17.05.1953 e 13.04.1954. (Textos reunidos e publicados em Ave, palavra) “Fantasmas dos vivos”. A Manhã, Rio de Janeiro, 24.05.1953. (Texto incluído em Ave, palavra) “Os doces”. A Manhã, Rio de Janeiro, 07.06.1953. “A chegada de Subles”. A Manhã, Rio de Janeiro, 06.04.1954. (Texto incluído em Ave, palavra)

“Uns índios - sua fala”. A Manhã, Rio de Janeiro, 25.05.1954. (Texto incluído em Ave, palavra)

e incluídos em Ave, palavra com o título “Às coisas de poesia”)

“Aí está Minas: a mineiridade”. Manchete. Rio de Janeiro, 24.08.1957. (Republicado em Ave, palavra com o título “Minas Gerais”)

“Zoo (Hagembecks Tierpark, Hamburgo-Stellingen)”. O Globo, Rio de Janeiro, 11.03. 1961. (Texto incluído em Ave, palavra)

“O ciclo do carro de boi no Brasil”. Boletim Bibliográfico Brasileiro. Rio de Janeiro, maio 1958.

“Circo do miudinho”. O Globo, Rio de Janeiro, 25.03. 1961. (Texto incluído em Ave, palavra)

“A simples e exata estória do burrinho do comandante”. Senhor. Rio de Janeiro, abr. 1960.

“Meu tio o Iauaretê”. Senhor. Rio de Janeiro, mar. 1961. (Texto incluído em Estas estórias)

“De stella et adventu magorum”. O Globo, Rio de Janeiro, 07.01.1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “Além da amendoeira”. O Globo, Rio de Janeiro, 21.01.1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “Uns inhos engenheiros”. O Globo, Rio de Janeiro, 04.02.1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “O grande samba disperso”. O Globo, Rio de Janeiro, 11.02.1961. (Texto incluído em Ave, palavra)

“Risada e meia”. A Manhã, Rio de Janeiro, 04.05.1954.

“Homem, intentada viagem”. O Globo, Rio de Janeiro, 18.02.1961. (Texto incluído em Ave, palavra)

“Aquário (Nápoles)”. A Manhã, Rio de Janeiro, 11.05.1954. (Texto incluído em Ave, palavra)

“Coisas de poesia”. O Globo, Rio de Janeiro, 25.02.1961 e 01.04.1961. (Textos reunidos 287

“Zoo (Parc Zoologique du Bois de Vincennes)”. O Globo, Rio de Janeiro, 29.04.1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “Novas coisas de poesia”. O Globo, Rio de Janeiro, 20.05.1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “A velha”. O Globo, Rio de Janeiro, 03.06.1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “A caça à lua”. O Globo, Rio de Janeiro, 17.06.1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “Zoo (Jardin des Plantes)”. O Globo, Rio de Janeiro, 24.06.1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “Sempre coisas de poesia”. O Globo, Rio de Janeiro, 22.07. 1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “Evanira”. O Globo, Rio de Ja24/11/06 – 20h


neiro, 26.08.1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “O burro e o boi no presépio”. Senhor. Rio de Janeiro, dez. 1961. (Texto incluído em Ave, palavra) “Alguns bichos”. Brasil. Lisboa, n. 19, dez 1961-jan. 1962. “A estória do Homem do Pinguelo”. Senhor. Rio de Janeiro, mar. 1962. “Substância”. Senhor. Rio de Janeiro, abr. 1962. (Texto incluído em Primeiras estórias) “Nenhum, nenhuma”. Senhor. Rio de Janeiro, ago. 1962. (Texto incluído em Primeiras estórias) “Partida do audaz navegante”. Senhor. Rio de Janeiro, maio 1962. (Texto incluído em Primeiras estórias)

“Fita verde no cabelo”. O Estado de S. Paulo, 08.02.1964. (Texto incluído em Ave, palavra) “As garças”. O Estado de S. Paulo, 22.02.1964. (Texto incluído em Ave, palavra) “O porco e seu espírito”. Pulso, Rio de Janeiro, 12.06.1965. (Texto incluído em Ave, palavra) “Sem tangência”. Pulso, Rio de Janeiro, 24.07.1965. (Texto incluído em Ave, palavra) “Quemadmodum”. Pulso, Rio de Janeiro, 30.10.1965. (Texto incluído em Ave, palavra) “Cartas na mesa”. Pulso, Rio de Janeiro, 08.01.1966. (Texto incluído em Ave, palavra) “Nascimento”. Pulso, Rio de Janeiro, 24.12.1966. (Texto incluído em Ave, palavra)

(Texto incluído em Ave, palavra) “Reboldra”. Pulso, Rio de Janeiro, 10.06.1967. (Texto incluído em Ave, palavra) “Esses Lopes”. Manchete. Rio de Janeiro, 05.08.1967. (Texto incluído em Tutaméia) “Parecer sobre a ‘Unificação da ortografia brasileira’”. Revista Cultura. Rio de Janeiro, v. 1, n. 3, set 1967. “Duas palavras de João Guimarães Rosa (sobre direitos autorais)”. O Globo, Rio de Janeiro, 20.09.1967. “Remimento”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 25.11.1967. “Poemas de Natal”. Realidade. São Paulo, dezembro de 1967. “Simples passaporte”. Diário de S. Paulo. 04.01.1968 “Saudade”. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 01.12.1968.

“Pirlimpsiquice”. Comentário. Rio de Janeiro, n. 11, 1962. (Texto incluído em Primeiras estórias)

“Zoo (Whipsnade Park, Londres)”. Pulso, Rio de Janeiro, 07.01.1967. (Texto incluído em Ave, palavra)

“Seqüência”. Anuário da Literatura Brasileira. Rio de Janeiro, 1962/1963. (Texto incluído em Primeiras estórias)

“Aquário”. Pulso, Rio de Janeiro, 18.02.1967. (Texto incluído em Ave, palavra com o título “Aquário (Berlim)”)

“Maior meu sirimim”. Diário Carioca, Rio de Janeiro, 21.07.1963. (Texto incluído em Ave, palavra)

“Zoo (Rio, Quinta da Boa Vista)”. Pulso, Rio de Janeiro, 01.04.1967. (Texto incluído em Ave, palavra)

“Poemas inéditos de Rosa”. Folha de S.Paulo, 20.11.1987.

“Um moço muito branco”. Brasil. Lisboa, n. 22, 1963.

“Os abismos e os astros”. Pulso, Rio de Janeiro, 27.05.1967.

“Discurso como orador da turma de médicos de 1930, da Fa-

288

“‘Bicho mau’, um inédito de Guimarães Rosa”. Veja. São Paulo, 05.03.1969. “Melim-meloso”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.11.1968.

10. Discursos

24/11/06 – 20h


culdade de medicina de Belo Horizonte”. Minas Gerais, Belo Horizonte, 22-23.12.1930. “Discurso de agradecimento na Academia Brasileira de Letras, quando da distribuição dos prêmios literários de 1936, pelo livro Magma”. Revista da Academia Brasileira de Letras. Rio de Janeiro, v. 29, n. 53, 1937. “Discurso de posse na Sociedade Brasileira de Geografia”. Revista da Sociedade Brasileira de Geografia. Rio de Janeiro, n. 53, 1946. “Discurso de agradecimento na Academia Brasileira de Letras, em sessão de 29 de junho de 1961, pelo prêmio Machado de Assis, para conjunto da obra”. Revista da Sociedade de Amigos de Machado de Assis. Rio de Janeiro, n. 7, 1961. “Emoción del Brasil”. Discurso como vice-presidente do II Congresso Latino-Americano de Escritores (Cidade do México, mar./1967). El Despertador Americano. Cidade do México, v. 1, n. 2, maio 1967. “Oração aos novos”. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 26.11.1967. “O verbo e o logos”. Discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, em sessão de 16 de novembro de 1967. In: VÁRIOS AUTORES. Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968.

11. Tradução “A organização científica em Minas Gerais”. Artigo de O. Quelle. Minas Gerais, Belo Horizonte, 05.10.1928. O último dos maçaricos. Texto de Fred Bosworth. Publicado em Biblioteca de Seleções do Reader’s Digest. Rio de Janeiro, v. 6, 1958.

12. Ensaio Apreciação não datada sobre o livro Serras azuis, de Geraldo França Lima. Rio de Janeiro: Edições GRD, 1965.

NO EXTERIOR

Alemão Grande Sertão: Roman [Grande sertão: veredas]. Tradução de Curt Meyer-Clason. Colônia: Kiepenheuer & Witsch, 1964. Republicado em Munique: DTV, 1994. Corps de Ballet [Corpo de baile]. Tradução de Curt Meyer-Clason. Colônia: Kiepenheuer & Witsch, 1966. Das dritte Ufer des Flusses [“A terceira margem do rio”]. Tradução de Curt Meyer-Clason. Colônia: Kiepenheuer & Witsch, 1968. Nach langer Sehnsucht und langer Zeit [“Buriti”, extraído de Corpo de baile]. Tradução de 289

Curt Meyer-Clason. Munique: DTV, 1969. Miguilims Kindheit [“Miguilim”, extraído de Corpo de baile]. Tradução de Curt MeyerClason. Munique: DTV, 1970. Mein Onkel der Jaguar [“Meu tio o Iauaretê”]. Tradução de Curt Meyer-Clason. Colônia: Kiepenheuer & Witsch, 1981. Doralda, die weiße Lilie [“Dãodalalão”, extraído de Corpo de baile]. Tradução de Curt Meyer-Clason. Frankfurt: Suhrkamp, 1982. Sagarana [Sagarana]. Tradução de Curt Meyer-Clason. Colônia: Kiepenheuer & Witsch, 1982. Reeditado em Berlim: Aufbau, 1984. Die Geschichte von Lélio und Lina [“A estória de Lélio e Lina”, extraído de Corpo de baile]. Tradução de Curt MeyerClason. Munique: Piper, 1991. Tutameia. Dritte Erzählungen [Tutaméia (Terceiras estórias)]. Tradução de Curt Meyer-Clason. Colônia: Kiepenheuer & Witsch, 1994.

Dinamarquês Djævelen på vejen [Grande sertão: veredas]. Tradução de Peter Poulsen. Copenhague: Samlerens Bogklub, 1997.

Eslovaco Velká pustatina [Grande sertão: 24/11/06 – 20h


veredas]. Tradução de Ladislav Franek. Bratislava: Vavrín, 1980.

Espanhol La oportunidad de Augusto Matraga [“A hora e vez de Augusto Matraga”]. Tradução de Juan Carlos Ghiano e Néstor Krayy. Buenos Aires: Galerna, 1970. Gran sertón: veredas [Grande sertão: veredas]. Tradução de Ángel Crespo. Barcelona: Seix Barral, 1975. Reeditado em Barcelona: Alianza Editorial, 1999. Menudencia [Tutaméia]. Tradução de Santiago Kovacloff. Buenos Aires: Calicanto, 1979.

ques Villard. Paris: Seuil, 1961. Les nuits du sertão [Noites do sertão]. Tradução de Jean-Jacques Villard. Paris: Seuil, 1962.

Het uur en ogenblik van Augusto Matraga [“A hora e vez de Augusto Matraga”]. Tradução de August Willemsen. Amsterdã: Meulenhoff, 1992.

Hautes plaines [extraído de Corpo de baile]. Tradução de Jean-Jacques Villard. Paris: Seuil, 1969.

Diepe wildernis: de wegen [Grande sertão: veredas]. Tradução de August Willemsen. Amsterdã: Meulenhoff, 1993.

Premières histoires [Primeiras estórias]. Tradução Inès OsekiDepré. Paris: Métailié, 1982.

Inglês

Primeras historias [Primeiras estórias]. Tradução de Virgina Fagnani Wey. Barcelona: Seix Barral, 1982. Urubuquaquá: cuerpo de baile [Corpo de baile]. Tradução de Estela dos Santos. Barcelona: Seix Barral, 1982.

Diadorim [Grande sertão: veredas]. Tradução de Maryvonne Lapouge-Petorelli. Paris: Albin Michel, 1991.

Francês

Toutaméia [Tutaméia]. Tradução de Jacques Thiériot. Paris: Seuil, 1994.

Buriti [“Buriti”, de Noites do sertão]. Tradução de Jean-Jac-

De derde oever van de rivier [“A terceira margem do rio”]. Tradução de August Willemsen. Amsterdã: Meulenhoff, 1984.

Diadorim [Grande sertão: veredas]. Tradução de Jean-Jacques Villard. Paris: Albin Michel, 1965.

“La troisième rive de fleuve” [“A terceira margem do rio”]. Tradução de Inés Oseki-Depré. In Historires étranges et fantastiques d’Amérique latine. Paris: Métailié, 1989.

“L’heure et la chance d’Augusto Madraga” [“A hora e vez de Augusto Matraga”]. Tradução de Antonio e Georgette Tavares Bastos. In Les vingt meilleures nouvelles de l’Amérique latine. Paris: Seghers, 1958.

Holandês

Sagarana [Sagarana]. Tradução de Jacques Thiériot. Paris: Albin Michel, 1997.

The devil to pay in the backlands [Grande sertão: veredas]. Tradução de James L. Taylor e Harriet de Onís. Nova York: Knopf, 1963. Sagarana [Sagarana]. Tradução de Harriet de Onís. Nova York: Knopf, 1966. The third bank of the river and other stories [Primeiras estórias]. Tradução de Barbara Shelby. Nova York: Knopf, 1968. The jaguar and other stories [“Meu tio o Iauaretê”]. Tradução de David Treece. Oxford: Boulevard, 2001.

Italiano Mon oncle le jaguard [“Meu tio o Iauaretê”]. Tradução de Jacques Thiériot. Paris: Albin Michel, 1998. 290

Corpo di ballo [Corpo de baile]. Tradução de Edoardo Bizzarri. Milão: Feltrinelli, 1964. 24/11/06 – 20h


Grande sertao [Grande sertão: veredas]. Tradução de Edoardo Bizzarri. Milão: Feltrinelli, 1970.

FORTUNA CRÍTICA

Miguilim [“Miguilim”, extraído de Corpo de baile]. Tradução de Edoardo Bizzarri. Milão: Feltrinelli, 1984. Buriti [“Buriti”, de Noites do sertão]. Tradução de Edoardo Bizzarri. Milão: Feltrinelli, 1985. Sagarana [Sagarana]. Tradução de Silvia la Regina. Milão: Feltrinelli, 1994. Una storia d’amore [“Uma estória de amor”, extraído de Corpo de baile]. Tradução de Edoardo Bizzarri. Milão: Feltrinelli, 1994. Mio zio il giaguaro [“Meu tio o Iauaretê”]. Tradução de Roberto Mulinacci. Parma: Guanda, 1999.

Norueguês Sagarana [Sagarana]. Tradução de Bård Kranstad. Oslo: Gyldendal, 1998. Den store Sertão [Grande sertão: veredas]. Tradução de Bård Kranstad. Oslo: Gyldendal, 2004.

Tcheco Velká divoˇcina: cesty [Grande sertão: veredas]. Tradução de Pavla Lidmilová. Praga: Mladá Fronta, 2003.

ALBERT,

Andréia Dutra. Dons, dádivas e trocas em Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Vitória, 2003. ALEIXO,

1. Dissertações, teses e artigos avulsos ABREU,

Áurea Sousa Oliveira de. A simbologia da passagem iniciática nas estórias de João Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Letras. Universidade Federal do Rio Grande do Sul ( UFRGS ), Porto Alegre, 2002. ABRIATA, Vera Lúcia Rodella. A

configuração do universo mitopoético em “A menina de lá” de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 1993. ABRIATA,

Vera Lúcia Rodella. Histórias primeiras em Primeiras estórias de João Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Lingüística e Língua Portuguesa. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 2001.

AFONSO, Fernanda Maria Cardoso de Oliveira. Estórias primeiras: o mito de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal Fluminense ( UFF ), Niterói, 1997.

291

Isabel Cristina Pereira. Estórias primeiras. Dissertação de mestrado em Letras. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio de Janeiro, 1995. ALMEIDA ,

Ana Luiza Penna Buarque de. Rosa e a rapsódia silenciosa; um estudo sobre a recepção crítica de Tutaméia entre 1967 e 1990. Tese de doutorado em Letras. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Rio de Janeiro, 2004. ALMEIDA,

Aristides Teixeira de. As sagas de Sagarana. Dissertação de mestrado em Letras Vernáculas. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 1989. ALMEIDA,

Leonardo Vieira de. O pacto fáustico em Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Literatura Brasileira. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), 2005. AMORIM, Rodrigo. Os neologismos de Sagarana e a sua tradução para a língua inglesa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Assis, 2003. ANDRADE,

Ana Maria Bernardes de. A velhacaria nos para24/11/06 – 20h


textos de Tutaméia – Terceiras estórias. Dissertação de mestrado em Teoria e História Literária. Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2004. ANDRADE,

Paulo Fonseca. Retira a quem escreve sua caneta – Guimarães Rosa e a subtração da escrita. Dissertação de mestrado em Estudos Literários. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2001. ARAUJO,

Heloisa Vilhena de. The metamorphoses of João Guimarães Rosa. Tese de doutorado. King’s College, Londres, 1977. Rosemary. Jorge Luis Borges’ labyrinths and João Guimarães Rosa’s sertão: images of reality as Text. Baltimore, 1985.

Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, 1998. BALBINO,

Márcio dos Santos. A linguagem poético-religiosa dos contos “O recado do morro” e “Cara-de-bronze” de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Ciência da Religião. Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Juiz de Fora, 2002.

Nildo Máximo. As múltiplas faces de “A hora e vez de Augusto Matraga” e suas duas traduções italianas. Dissertação de mestrado em Língua e Literatura Italiana. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2003.

BARREIRA,

BENTO,

Vânia Bernadete. A margem da terceira margem do rio: uma leitura bilíngüe de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Lingüística e Língua Portuguesa. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 1994.

ARROJO,

ASSIRATI,

Catarina Meloni. As mulheres e o mundo do sertão na obra de Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2001. AZEVEDO,

Cristiane Sampaio de. Alegria – A descoberta do mundo em Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras Vernáculas. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 2003.

BARROS,

Eliane da Silva. A palavra multifacetada da personagem narradora no romance Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras e Lingüística. Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Maceió, 2002.

BARROS,

Liliane Batista. O sertão e o musseque: um estudo comparativo entre Sagarana e Luuanda. Dissertação de mestrado em Estudos Comparados de Literatura em Língua Portuguesa. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2002.

BASTIANETTO, BACKES,

Marcelo Juarez. Riobaldo e seus fumos de Fausto: um pacto no diabo do Sertão. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do

Lingüísticos. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 1998.

Patrizia G. E. Collina. A tradução dos neologismos rosianos na versão italiana de Grande sertão: veredas de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Estudos 292

BENEDETTI,

Lúcia Aparecida. Alteridade em contos de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual de Londrina (UEL), Londrina, 2003. BONATTI,

Nicia Adan. Entre o amor da língua e o desejo: a tarefa sem fim do tradutor. Tese de doutorado em Lingüística. Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 1999. BORYSOW ,

Vitor da Costa. Zoos: um livro-montagem de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Jornalismo. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2005.

BRANCO ,

Maurício Menezes Ribeiro. Um Jesus Cristo “extraterrestre”, Maquiavel e Weber no sertão das Minas no século XIX: messianismo, milenarismo, culturas políticas e desencantamento do mundo em “Um moço muito branco” de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em História. Universidade Federal de Mi24/11/06 – 20h


nas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2003. Maria Aparecida Faria Marcondes. Proposta de edição da correspondência inédita entre João Guimarães Rosa e seu tradutor alemão, Curt Meyer-Clason (23 de janeiro de 1958 a 27 de agosto de 1967). Dissertação de mestrado em Filologia e Língua Portuguesa. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1997.

Lingüística. Universidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza, 2000.

BUSSOLOTTI,

CALOBREZI,

Edna Tarabori. O mito poiesis rosiana em Primeiras estórias. Dissertação de mestrado em Comunicação e Semiótica. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, 1990. CALZOLARI, Tereza

Paula Alves. Nas pegadas de Manuelzão – A trajetória do protagonista de “Uma estória de amor”, de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras Vernáculas. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 2004. CAMARGO,

José Márcio. Verdade e nomadismo: leitura de quatro contos de Tutaméia, de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Juiz de Fora, 2002. CAMPELO ,

Kilpatrick Müller Bernardo. Criações lexicais prefixais em Manuelzão e Miguilim, Noites do sertão e Primeiras estórias de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em

CAMPOS,

Aguinaldo Aparecido. Passagens bíblicas em Sagarana de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2000. CAMPOS,

André Luís de. A travessia crítica de Sagarana. Dissertação de mestrado em Teoria e História Literária. Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2001.

CANELAS,

Fernanda Schettino. A língua do diabo em Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal de Minas Gerais ( U F M G ), Belo Horizonte, 1995.

CARDOSO,

Afonso Ligório. A história e as histórias na “Festa do Manuelzão”. Dissertação de mestrado em Estudos Literários. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 2000.

CARELLI, Fabiana Buitor. Ruína

e construção: oralidade e escritura em João Guimarães Rosa e José Luandino Vieira. Tese de doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2003. CARMELLO,

Patrícia da Silva. 293

Paisagens subjetivas em Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Ciências da Literatura. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 2004. CARVALHO,

Cleuza Martins de. As fazedoras de velas: o outro lado da moeda (a gênese do romance em João Guimarães Rosa). Dissertação de mestrado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1996. CARVALHO, Lúcia Helena de O. Vianna. Mulher em cena (cenas de amor e morte na ficção brasileira). Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991. CARVALHO, Marcio Cezar. Tutaméia, a projeção do conceito através da poética – João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Estudos da Linguagem. Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Natal, 1996. CASTAÑEDA,

Irene Zanette de. “Meu tio o Iauaretê”: a revolução da consciência e o reequilíbrio cósmico. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 1987.

CASTRO,

Antonio Carlos Drumond Monteiro de. O trem do sertão – As primeiras estórias e a sabedoria chinesa. Dissertação de mestrado em Teoria e His24/11/06 – 20h


tória Literária. Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 1999. CAVALCANTE , Maria Neuma Barreto. “Bicho mau”: a gênese de um conto. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991. CHAGAS,

Silvania Nubia. Um canto primeiro, um eco: um estudo sobre “A benfazeja” de Guimarães Rosa e as formas simples da tradição oral. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 2001.

CONCEIÇÃO, José Henrique da.

A hermenêutica na narrativa em Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Brasileira. Universidade de Brasília (UnB), Brasília, 1996. CORGOSINHO,

Rosângela Ramos. O narrador Riobaldo – Passar pelo escrito: a transmissão de experiência em Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Estudos Literários. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2003. COSTA, Ana Valéria Beserra. O mito em “A hora e vez de Augusto Matraga” de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2006.

COSTA ,

Luciano Bernardino da. Pequena viagem ao grande sertão: fotografia e palavra. Dissertação de mestrado em Educação. Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2001. CRISPIM, Regina Marta de Sou-

sa. Retratos do sertão – Imagens do Brasil: realidade e representação em Os sertões e Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Letras e Lingüística. Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, 2003. CRUZ,

Antonia Marly Moura da Silva. Sob o signo do amor: uma leitura de seis contos de Tutaméia. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 1996. CRUZ, Antonia Marly Moura da Silva. A transferência metafórica nos nomes de personagens de Tutaméia de João Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2001. CUSTÓDIO,

André. Interferência da linguagem local em Sagarana e em Luuanda. Dissertação de mestrado em Estudos Comparados de Literaturas de Línguas Portuguesas. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2005. DAMACENO,

Maria Aparecida. Miguilim: trajetória e metamorfose. Dissertação de mestrado 294

em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), São José do Rio Preto, 1998. DIALECTAQUIZ,

Maria do Socorro Burity. Uma incursão lingüística em Primeiras estórias de Guimarães Rosa: aspectos lexicos-semânticos. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, 2003. DRUMOND, Josina Nunes. As dobras do sertão: palavra e imagem. Tese de doutorado em Comunicação e Semiótica. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, 2004. FARGONI,

Ana Maria Souza Lima. Magia-escrita: Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 2000. FARIA, Elisabete Brockelmann de. A narrativa lírico-poética de Campo geral. Dissertação de mestrado em Estudos Literários. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 2003. FARIA, Maria Celeste Lima de Barros. Circuito pulsional em Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Vitória, 2004.

24/11/06 – 20h


FARIA,

Maria Lúcia Guimarães de. A estética concreta de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Brasileira. Universidade de Brasília (UnB), Brasília, 1988. FEDERICO,

Rosa Cristina. Hércules do sertão – Uma tradução intersemiótica de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Artes. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), São Paulo, 2003. FELÍCIO,

Ros’elles Magalhães. A criação neológica em Primeiras estórias de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Lingüística. Universidade Federal de Uberlândia ( UFU ), Uberlândia, 2003. FERREIRA,

Claudia Andrea Prata. Riobaldo: o indivíduo à procura da compreensão do seu ser. Dissertação de mestrado em Ciências da Literatura. Universidade Federal do Rio de Janeiro ( UFRJ ), Rio de Janeiro, 1995. FERREIRA,

Hygia Therezinha Calmon. As sete sereias ao longe. Tese de doutorado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), São José do Rio Preto, 1991.

FERREIRA,

Solange T. de Lima. A concepção geográfica da paisagem dos gerais no Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Geografia. Uni-

versidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Rio Claro, 1990. FERRI, Débora. Textualidade e intertextualidade em contos de Sagarana. Dissertação de mestrado em Estudos Literários. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 2002. FITE,

Tereza C. As articulações do lúdico em “O recado do morro”, de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio de Janeiro, 1973.

FLORA,

Fábio. Segundas estórias: uma leitura sobre Joãozito Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Literatura Brasileira. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), 2005.

FONSÊCA, Cláudia Lorena Vou-

to da. Os bichos de muita antigüidade: anticonvenções do contar em Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, 2004. FONTES, Maria Helena Sansão. A mulher na obra de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras Vernáculas. Universidade Federal do Rio de Janeiro ( UFRJ ), Rio de Janeiro, 1990. GALERY,

Ivana Versiani. Os prefixos intensivos em Grande ser295

tão: veredas. Tese de doutorado em Letras. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 1969. GÁLVEZ , Sofia Elaine Cerni Baú Ortega. “Cara-de-bronze”: a viagem pela poesia, pelo tempo e pelos gêneros. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 1999. GINZBURG, Jaime. A desordem e o limite – A propósito da violência em Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1993. GONÇALVES,

Martha Augusta Corrêa e Castro. Travessia semiótica – Guimarães Rosa e o prazer de ler: uma proposta para o 2° grau. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Assis, 1996.

GONZALES,

Lucilene dos Santos. A imanente concepção de “loucura” em contos de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Assis, 1993. GUILBAUD ,

Paulo Frederico Telles Ferreira. O épico em Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Letras. Pontifícia Universidade Cató24/11/06 – 20h


lica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio de Janeiro, 2003. HARANAKA,

Paulo Jorge. Leituras de João Guimarães Rosa, poeta. Dissertação de mestrado. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1981. HAZIN,

Elisabeth de Andrade Lima. No nada, o infinito: da gênese do Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991.

HERNANDEZ,

Neusa Maria Alveno. Intertextualização e mito em “A hora e vez de Augusto Matraga”. Dissertação de mestrado em Língua Portuguesa. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, 2000. HOLANDA,

Sílvio Augusto de Oliveira. A aragem dos acasos: sobre alguns temas trágicos em Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2000. HOLANDA,

Sílvio Augusto de Oliveira. Rapsódia sertaneja: leituras de Sagarana. Dissertação de mestrado em Letras, Lingüística e Teoria Literária. Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, 1994. JUNQUEIRA , Leandro Gama. Conversões mitopoéticas em Primeiras estórias. Dissertação de

mestrado em Letras Vernáculas. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 2004. LEITE, Isabela Fernandes Soares. A travessia do leitor no Grande sertão. Dissertação de mestrado em Letras. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio de Janeiro, 1989. LEONEL,

Maria Célia de Moraes. Guimarães Rosa alquimista: processos de criação do texto. Tese de doutorado em Letras. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1985.

LEROY,

Sílvia de Menezes. Le bestiaire dans l’oeuvre de J. G. Rosa. Comunicação datilografada. Colloque de Littérature Brésilienne, Potiers, fev. 1985.

LEROY,

Sílvia de Menezes. Recherches sur le passage du régionalisme à l’universelo dans GSV. Tese de doutorado. Université de Rennes, 1981. LIMA,

Deise Dantas. No Mutúm, na Samarra, no Pinhém: encenações do Brasil rural em Corpo de Baile, de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, 1999. LINO,

Joselita Bezerra da Silva. A alegoria no Iauaretê. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, 1996. 296

LIPPOLD,

Eva. Die Oralität als Illusion im Roman: João Guimarães Rosa: Grande sertão: veredas. Mündliche Erzähltradition in der Brasilianischen Literatur. Colônia, 2006. LOPES,

Paulo César Carneiro. Dialética da iluminação – A revelação como capacidade de escuta do outro – Leitura de “Campo geral”, de João Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2000. LOYOLLA, Dirlenvalder do Nas-

cimento. Aprender o mundo: a poética da reflexão no Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Estudos Literários. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2004. LUCCHESE , Lenise Maria de Souza. Vertentes do amor em Guimarães Rosa: uma leitura de “Substância”, “Dão-dalalão” e “Luas-de-mel”. Dissertação de mestrado em Letras Vernáculas. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 2003. LUCENA,

Gilberto de Souza. Da cultura popular e das falas do narrador em Sagarana: uma leitura dos contos “Sarapalha”, “Duelo”, e “Conversa de bois”. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, 1997. MACHADO ,

Neuza Maria de 24/11/06 – 20h


Sousa. O narrador toma a vez: sobre o narrador de “A hora e vez de Augusto Matraga”. Dissertação de mestrado em Ciências da Literatura. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 1990. MACHADO JÚNIOR,

Odilon. Algumas veredas na construção da legitimação do condomínio da violência no Grande sertão. Dissertação de mestrado em História. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Franca, 2003.

MADEIRA FILHO, Wilson. O dis-

curso do demônio – Leitura comparada dos romances Doktor Faustus, de Thomas Mann, e Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Letras. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio de Janeiro, 1998. MARCHEZAN, Luiz Gonzaga. O espaço no conto regionalista brasileiro. Tese de doutorado em Lingüística. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1994.

Maria do Socorro Morais. Infância e Miguilim: os fios da memória e a câmera do olhar. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, 2000.

tura Comparada. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), 2002. MASCARENHAS,

Robson Fontenelle. De Primeiras a outras estórias: o texto rosiano, da letra à imagem. Dissertação de mestrado em Letras. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), Belo Horizonte, 2004.

MELLO,

Cléa Corrêa de. A ficcionalização da oralidade em Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Ciências da Literatura. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 2003.

MELLO, Cléa Corrêa de. Guimarães Rosa, um intérprete do Brasil. Dissertação de mestrado em Ciências da Literatura. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 2000. MELLO FILHO, Hélio de. Caso e romance: gêneros e sociedade em Grande sertão: veredas (Veredas). Dissertação de mestrado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2005.

MARTINS,

Ana Luiza. João Guimarães Rosa: viator. Tese de doutorado em Litera-

MENDES,

Eliana Amarante de Mendonça. Tradução dos neologismos de Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Lingüística. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1991.

MARTINS COSTA,

MEYER, Mônica Angela de Aze-

vedo. Ser - tão natureza – A na297

tureza de Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Ciências Sociais. Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 1998. MIRANDA,

Hélio Rosa de. O sertão no universo poético de João Guimarães Rosa: o recado cifrado da canção. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1999.

MORAES,

Márcia Marques de. Travessias do sujeito: as representações da subjetividade em Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1999.

MORAIS, Osvando José de. Imagens em Grande sertão: veredas: da palavra impressa no romance à imagem eletrônica televisiva – Semiótica da imagem. Tese de doutorado em Ciências da Comunicação. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002. MORAIS,

Rosane. A lei do pai: leitura de Grande sertão: veredas a partir da função paterna em psicanálise. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Vitória, 2004. MOURA, Sueli Cavendish. O ja-

gunço e o fidalgo: considerações em torno de romances de Guimarães Rosa e William Faulkner. Tese de doutorado em Letras. Universidade do Estado 24/11/06 – 20h


do Rio de Janeiro (Uerj), Rio de Janeiro, 1999. MOYSES,

Darcília. Diadorim e Ahmed ou a vida travestida. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Vitória, 2001.

gem aos textos “O recado do morro”, “Pirlimpsiquice” e “A terceira margem do rio”). Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife, 1994.

Edna Maria Fernandes dos Santos. Contribuição para o estudo do léxico de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1979.

Elza de Sá. Descrever as veredas ou narrar o Grande sertão – A tarefa de Arlindo Daibert ao traduzir o romance em imagens. Tese de doutorado em Letras. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio de Janeiro, 2004.

NASCIMENTO,

NOGUEIRA,

NASCIMENTO,

Edna Maria Fernandes dos Santos. Estudo da metalinguagem natural na obra de Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Lingüística. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1987. Sheila Grecco de Oliveira. Brasis-Brasília, o vôo parado da modernidade: leituras de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2001.

NOGUEIRA,

Elza de Sá. Metáfora como conceito e experiência poética nas Primeiras estórias de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio de Janeiro, 2000.

NEVES,

NEVES,

Sheila Grecco de Oliveira. Dois, diversos: alegorias do Brasil em Guimarães Rosa e Glauber Rocha. Tese de doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2005.

NÓBREGA ,

Maria Marta dos Santos Silva. Sujeição x perversão na escritura rosiana (aborda-

NOGUEIRA,

Erich Soares. Percepção e experiência poética: estudo para uma análise de Campo Geral, de J. Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Teoria e História Literária. Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2004.

NOGUEIRA,

Maria Carolina de Godoy. A construção literária da magia em Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 2002.

de Rosa: reconstrução do processo de composição empregado por Guimarães Rosa pela interpretação de um texto (Paramo, estas estórias). Dissertação de mestrado em Teoria e História Literária. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1987. OLIVEIRA,

Joaquim Benedicto de. A hierofania no episódio do pacto de Riobaldo com o Demo. Dissertação de mestrado em Ciências da Religião. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo ( PUC - SP ), São Paulo, 1994. OLIVEIRA, Luiz Cláudio Vieira de. O percurso dos sentidos. Tese de doutorado em Letras. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 1991. OLIVEIRA, Paulo César Silva de. Poética da distensão – Entre a transcrição da paisagem e a escritura do caminho: crítica e desconstrução no Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Ciências da Literatura. Universidade Federal do Rio de Janeiro ( UFRJ ), Rio de Janeiro, 2001. OLIVEIRA, Paulo Sampaio Xavier de. A televisão como “tradutora”: veredas do Grande sertão na rede Globo. Tese de doutorado em Lingüística Aplicada. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1999. OLIVEIRA,

OLEA,

Héctor Raul. Intertexto 298

Silvana. O terceiro Estado em Guimarães Rosa: a 24/11/06 – 20h


aventura do devir. Tese de doutorado em Teoria e História Literária. Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, 2003. PACCA,

Maria Beatriz. Orientando-se pela constelação do Cruzeiro do Sul – Uma análise da tradução francesa do conto “Orientação” de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual de Londrina (UEL), Londrina, 1997.

PACHECO,

Ana Paula Sá e Souza. Mito e processo social em Primeiras estórias. Tese de doutorado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2002.

PAIVA, Jair Miranda de. Os tem-

pos impossíveis: perigo e palavra no sertão. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Vitória, 2000. PAULINO,

Ana Maria Aparecida. Permanecer ou partir: o dilema no sertão rosiano. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2002.

PERUZZO,

Lisângela Daniele. Veredas desanoitecidas: um estudo comparado das relações de poder e submissão em Sagarana e Vozes anoitecidas. Dissertação de mestrado em Estudos Comparados de Literatura em Língua Portuguesa. Universidade

de São Paulo (USP), São Paulo, 2002. PINTO,

Anna Luiza Miranda. Alguns aspectos védicos na ficção de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, 2003.

QUINTÃO,

Renata Soares. O mundo à revelia e a visão da terra em Grande sertão: veredas e Os flagelados do vento leste. Dissertação de mestrado em Estudos Comparados de Literaturas em Língua Portuguesa. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2005. RAMOS,

Jacqueline. A representação feminina em Sagarana. Dissertação de mestrado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1997. REINALDO,

Gabriela Frota. A mitopoiesis na canção de Siruiz de Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Comunicação e Semiótica. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, 1998. RIANI,

Arilda. Construções neológica em João Guimarães Rosa – Veredas! Uma abordagem semântico-estilística para ler em suas tortas linhas. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Rio de Janeiro, 1999.

RIEDEL,

Dirce Cortes. Aspectos 299

da imagística de Guimarães Rosa. Tese para concurso à cátedra de Literatura Brasileira. Universidade do Estado da Guanabara, Rio de Janeiro, 1962. RIEDEL,

Dirce Cortes. O mundo sonoro de Guimarães Rosa. Tese para concurso à cátedra de Português e Literatura. Instituto de Educação no Estado da Guanabara, Rio de Janeiro, 1962. ROCHA,

Luiz Carlos de Assis. Teoria sufixal do léxico português aplicada às formações nominais de Guimarães Rosa. Tese de doutorado em Letras Vernáculas. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 1992.

ROCHA,

Marília Librandi. As espantosas palavras – Uma análise de Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1997. RODRIGUES,

Elyane. O conflito e a criação do drama nas narrativas de Guimarães Rosa: uma leitura para ultrapassar os limites do relato. Dissertação de mestrado em Língua Portuguesa. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, 2003. ROMANELLI,

Kátia Bueno. A “Álgebra mágica” na construção dos textos de Tutaméia, de João Guimarães Rosa. Tese de dou24/11/06 – 20h


torado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995. RONCARI,

Luiz Dagobert de Aguirra. O Brasil de Rosa: mito e história no universo rosiano. Tese de livre docência. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002.

RUNHO, Rosiane Cristina. A memória e o olhar em contos de Primeiras Estórias. Tese de doutorado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 2001. RUNHO,

Rosiane Cristina. O processo narratológico em contos de Primeiras Estórias. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 1996.

SANTANA,

Ana Lúcia. A terceira margem do tempo: narrar e lembrar em Primeiras estórias, de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2004.

SANTIAGO SOBRINHO,

João Batista. Imagens da água no romance Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Estudos Literários. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2003. SANTOS,

Adilson dos. Rastros do trágico em “A hora e vez de

Augusto Matraga”, de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual de Londrina (UEL), Londrina, 2004.

Estudos Literários. Universidade Federal de Minas Gerais ( U F M G ), Belo Horizonte, 2000. SCHEIBLE,

SANTOS,

Beny Ribeiro dos. O canto da narrativa: fronteiras entre Mancha e sertão. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Vitória, 2003. Cássia de Fátima Matos dos. As margens da alegria – A esperança nos personagens infantis de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Estudos da Linguagem. Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Natal, 2002.

Ingeborg. A mudança de registro como desvio estilístico na tradução para a língua alemã de Sagarana de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Estudos Lingüísticos. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 1998.

SANTOS,

SCHIAVO, Sylvia França. Do ter-

ritório da lenda à lenda do território na travessia do Grande Sertão. Tese de doutorado em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Seropédica, 2002.

SANTOS,

Maria Lúcia Nobre dos. A recriação do sertão no verso e na prosa – A harmonia da arte popular e erudita: uma incursão na tradição cultural brasileira na contística de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras e Lingüística. Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Maceió, 1999.

SILVA, Ana Cláudia da. A infância da palavra: um estudo comparado das personagens infantis em Mia Couto e Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2000.

SASSO,

SILVA,

Wilson da Silva Rodrigues. “A hora e vez de Augusto Matraga”: da literatura ao cinema. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, 2004. Marli de Oliveira Fantini. Fronteiras em falso – A poética migrante de Guimarães Rosa. Tese de doutorado em

Irma Maria Viana da. O entre-lugar na nação nos discursos de Glauber Rocha e Guimarães Rosa sobre o sertão. Dissertação de mestrado em Letras e Lingüística. Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, 2003.

SCARPELLI,

300

SILVA,

Marden da. Uma abordagem intertextual em Sagarana: a paráfrase. Dissertação de 24/11/06 – 20h


mestrado em Lingüística. Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Uberlândia, 2000.

Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, 2003. SILVA ,

SILVA,

Margarete Alves da. Vozes em Grande sertão: veredas – Abordagem backhtiniana ao romance de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife, 1997. SILVA,

Maria Luiza de Castro da. O fio de Rosa no carretel de idéias do cinema. Tese de doutorado em Letras. Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, 1999. SILVA,

Maria Luiza de Castro da. Quantas mangas perfaz uma mangueira enquanto vive? Os escritos roseanos no circuito da intertextualidade. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Rio de Janeiro, 1994. SILVA, Percy da. A incrível histó-

ria do homem que ouviu a música que o outro não tocou. Dissertação de mestrado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2005. SILVA,

Rogério Mosimann da. A “sabedoria poética” rosiana: uma leitura de Guimarães Rosa à luz do pensamento de Giambattista Vico. Dissertação de mestrado em Estudos Literários. Universidade Federal de

Viviane Elizabete da. Vertentes do viver: a estrutura trágica de Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, 2002.

SILVEIRA, Regina da Costa da. O herói nos contos de Tutaméia. Tese de doutorado em Letras. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, 1997. SOARES,

Cláudia Campos. Movimento e ordem nos gerais rosianos: a família e a formação do herói em “Campo geral”. Tese de doutorado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002. SOETHE,

Paulo Astor. Ethos, corpo e entorno: sentido ético da conformação do espaço em Der Zauberberg e Grande sertão: veredas. Tese de doutorado em Literatura Alemã. Universidade de São Paulo, São Paulo, São Paulo, 1999. STESSUK,

Silvio José. Introdução ao rosário magmático de Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Assis, 2002. TEIXEIRA,

Eduardo de Araújo. A reabilitação do sagrado nas es301

tórias de João Guimarães Rosa e Mia Couto. Tese de doutorado em Estudos Comparados de Literaturas de Línguas Portuguesas. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005. TERRON FILHO,

Emílio Carlos Herrera. O sertão maior que o mundo. Dissertação de mestrado em Filosofia. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo ( PUC - SP ), São Paulo, 2002. VALLADARES, Nelly Gonçalves. Eros amordaçado: intertextualidade e erotismo na poética de Grande sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Ciências da Literatura. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 1996. VASCONCELOS,

Sandra Guardini Teixeira. Baú de alfaias. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo, São Paulo, 1984.

VERLANGIERI,

Iná Valéria Rodrigues. J. Guimarães Rosa – Correspondência inédita com a tradutora norte-americana Harriet de Onís. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Araraquara, 1993. VICENTE,

Eleonora Magalhães Cunha. Falas desencontradas – Reflexões contingentes sobre pressupostos em leituras de Grande 24/11/06 – 20h


sertão: veredas. Dissertação de mestrado em Letras. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio de Janeiro, 1997.

ANDRADE,

Sônia Maria Viegas. O universo épico-trágico do Grande sertão: veredas. Belo Horizonte: UFMG, 1982. ANDRADE,

Ana Cristina Coutinho. Primeiras veredas no grande sertão: a crítica dos anos 50. Dissertação de mestrado em Letras. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Rio de Janeiro, 1992.

Sônia Maria Viegas. A vereda trágica do Grande sertão: veredas. São Paulo: Edições Loyola, 1975.

VIEGAS,

VILAR,

Socorro de Fátima Pacífico. Primeiras leituras e outras histórias: a representação do oprimido em Primeiras estórias. Dissertação de mestrado em Letras. Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, 1990.

2. Livros ABEL,

Carlos Alberto dos Santos. Rosa autor Riobaldo narrador: veredas da vida e da obra de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Relume Dumará/Faperj, 2003. e LOPES, Oscar (org.). Guimarães Rosa. Lisboa: Instituto Luso-Brasileiro, 1969.

ADONIAS FILHO

ZIANI,

Elizabeth Maria. Remimento: raízes de uma narrativa inacabada. Dissertação de mestrado em Literatura Brasileira. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 1996.

ARAUJO,

Heloisa Vilhena de. Guimarães Rosa: diplomata. Brasília: Ministério das Relações Exteriores, Fundação Alexandre de Gusmão, 1987. Heloisa Vilhena de. Palavra e tempo: ensaio sobre Dante, Carroll e Guimarães Rosa. São Paulo: Mandarim, 2001.

Francisco Ernesto Zaragoza. La crítica de la modernidad en Grande sertão: veredas y los pasos perdidos. Tese de doutorado em Letras Modernas. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2005. José Alaercio. Os narradores de “causos” em “O burrinho pedrês”: Sagarana, João Guimarães Rosa. Dissertação de mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada. Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, 2004.

Heloisa Vilhena de. O espelho: contribuição ao estudo de Guimarães Rosa. São Paulo: Mandarim, 1996.

ARAUJO,

ZALDÍVAR,

ZAMUNER,

ARAUJO,

ARAUJO,

Heloisa Vilhena de. A raiz da alma: Corpo de baile. São Paulo: Edusp, 1992. ALBERGARIA, Consuelo. Bruxo da linguagem no grande sertão: leitura dos elementos esotéricos presentes na obra de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1977. ALBISTUR,

Jorge. J. Guimarães Rosa: análisis de cuatro cuentos breves. Montevidéu: Banda Oriental, 1978. ALMEIDA ,

Ana Luiza Penna Buarque de. Um abreviado de tudo: anedotas de Tutaméia. Belo Horizonte: UMA, 2001. 302

ARAUJO, Heloisa Vilhena de. O roteiro de Deus: dois estudos sobre Guimarães Rosa. São Paulo: Mandarim, 1996. ARAUJO, Heloisa Vilhena de. As

três graças: nova contribuição ao estudo de Guimarães Rosa. São Paulo: Mandarim, 2001. ARROYO,

Leonardo. A cultura popular em Grande sertão: veredas (filiações e sobrevivências tradicionais, algumas vezes eruditas). Rio de Janeiro/Brasília: José Olympio/INL, 1984. 24/11/06 – 20h


BALBUENA,

Monique. Poe e Rosa à luz da Cabala. Rio de Janeiro: Imago, 1994.

BOLLE,

Willi. Grandesertão.br: o romance de formação do Brasil. São Paulo: Editora 34/Duas Cidades, 2004.

CAMPOS,

Vera Mascarenhas de. Borges e Guimarães. Na esquina rosada do grande sertão. São Paulo: Perspectiva, 1988.

CASTRO,

Manuel Antônio. O homem provisório no grande sertão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1976. CASTRO,

BARBOSA,

Alaor. Epopéia brasileira ou para ler Guimarães Rosa. Goiânia: Imery, 1981.

BERRINI,

Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004.

BRAIT,

Beth (org.). Guimarães Rosa. São Paulo: Abril Educação, 1982. BRANDÃO ,

Carlos Rodrigues. Memória sertão: cenários, cenas, pessoas e gestos nos sertões de João Guimarães Rosa e de Manuelzão. São Paulo/Uberaba: Cone Sul/Universidade de Uberaba, 1998.

BRASIL, Francisco de Almeida Assis. Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Organização Simões, 1969.

Nei Leandro de. Universo e vocabulário do grande sertão. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970.

CESAR ,

Guilhermino (org.). João Guimarães Rosa. Porto Alegre: Editora da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1969.

COELHO,

Nelly Novaes e VERSIANI, Ivana. Guimarães Rosa: dois estudos. Coleção Escritores de Hoje. São Paulo/Brasília: Quíron/INC, 1975.

CÁLAMO.

Desnorte: leituras poéticas em torno à obra de João Guimarães Rosa. São Paulo: Nankin Editorial, 1997.

BISILLIAT,

Maureen. Fim de rumo, terras altas, Urucúia: ensaio fotográfico de Maureen Bisilliat, com fragmentos extraídos de Grande sertão: veredas. São Paulo: Gráficos Brunner, 1969.

CALOBREZI ,

Edna Tarabori. Morte e alteridade em Estas estórias. Ensaios de cultura n. 20. São Paulo: Edusp, 2001.

COSTA,

Dalila Pereira da. Duas epopéias das Américas: Moby Dick e Grande sertão: veredas. Porto: Lello e Irmãos, 1974.

BOLLE, Willi. Fórmula e fábula: teste de uma gramática narrativa, aplicada aos contos de Guimarães Rosa. São Paulo: Perspectiva, 1973.

COUTINHO ,

Eduardo F. Em busca da terceira margem: en-

303

24/11/06 – 20h


saios sobre o Grande sertão: veredas. Salvador: Fundação Casa de Jorge Amado, 1993. Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Coleção Fortuna Crítica, v. 6. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983. Reedição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1991.

DIXON ,

Paul. Reversible readings: ambiguity in four modern Latin American novels. University of Alabama Press, 1985.

COUTINHO,

COUTINHO,

Eduardo F. The process of revitalization of the language and narrative structure in the fiction of João Guimarães Rosa and Julio Cortázar. Valência: Albatrós Ediciones, 1980.

Eduardo F. The “synthesis” novel in Latin America: a study on João Guimarães Rosa’s Grande sertão: veredas. Chapel Hill: University of North Caroline Studies, 1991.

DUARTE,

D’ANGELO,

Biagio (ed.). Verdades y veredas de Rosa: ensayos sobre la narrativa de João Guimarães Rosa. Belo Horizonte/Lima: PUC-MG/Fondo Editorial de la Universidad Católica Sedes Sapientiae, s.d.

DUARTE,

Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa II. Segundo seminário internacional Guimarães Rosa (2001). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2003.

COUTINHO,

COVIZZI,

Lenira Marques. O insólito em Guimarães Rosa e Borges. São Paulo: Ática, 1978.

Paulo. Euclides da Cunha e Guimarães Rosa, através dos sertões – Os livros, os autores. São Paulo: Massao Ohno, 1996.

CRUZ,

DEFINA,

Nelson. No longe dos gerais. São Paulo: Cosac Naify, 2004. DAIBERT,

Arlindo. Imagens do grande sertão. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1998.

DANIEL,

Mary Lou. João Guimarães Rosa: travessia literária. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969.

Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa. Seminário internacional Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2000.

DANTAS NETO,

Gilberto. Teoria e prática de análise literária: síntese de princípios de análise literária (aplicados ao romance Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa). São Paulo: Pioneira, 1975.

DIAS, Magno Machado. Rosa, rosae: leitura das Primeiras estórias de Guimarães Rosa. 3. ed. Rio de Janeiro: Aoutra, 1985.

304

DUARTE,

Lélia Parreira e ALVES, Maria Theresa Abelha (org.). Outras margens: estudos da obra de Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Autêntica/PUC, 2001.

DURÃES,

Fani Schiffer. Riobaldo und Faust: Untersuchung zum Faust-Mythos bei João Guimarães Rosa. Bonn: Romanis24/11/06 – 20h


tischer, 1996. Traduzido como: O mito de Fausto em Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: ABL, 1999. FACÓ,

Aglaêda. Guimarães Rosa: do ícone ao símbolo. Rio de Janeiro: José Olympio, 1982.

FANTINI,

Marli. Guimarães Rosa: fronteiras, margens, passagens. São Paulo: Senac São Paulo/Ateliê Editorial, 2004.

marães. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.

de sertão: veredas. São Paulo: Scripta, 1996.

GALVÃO,

GUIMARÃES,

Walnice Nogueira. A donzela guerreira: um estudo de gênero. São Paulo: Senac, 1998. GALVÃO ,

Walnice Nogueira (coord.). Edição crítica de Grande sertão: veredas. Paris: Collection Archives, no prelo.

Vicente de Paulo. Joãozito: infância de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972.

GALVÃO,

Walnice Nogueira. As formas do falso: um estudo sobre a ambigüidade no Grande sertão: veredas. São Paulo: Perspectiva, 1972. GUIMARÃES ROSA,

Vilma. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983.

FERNANDES, Rinaldo de. Quar-

tas histórias: contos baseados em narrativas de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Garamond, 2006. FERREIRA,

Hygia Therezinha Calmon. A sagrada “escritura” de João Guimarães Rosa. São José do Rio Preto: UNESP, 1983. FIALHO,

GALVÃO ,

Walnice Nogueira. Guimarães Rosa. Coleção Folha Explica. São Paulo: Publifolha, 2000.

GALVÃO ,

Walnice Nogueira. Mitológica rosiana. São Paulo: Ática, 1978.

Sylvio Abreu. O mundo dos olhos: de Machado de Assis a Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1975.

GARBUGLIO ,

FINAZZI-AGRÒ,

GARBUGLIO,

Ettore. Um lugar do tamanho do mundo: tempos e espaços da ficção em João Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001. FONSECA,

Aleilton. Nhô Gui-

José Carlos. O mundo movente de Guimarães Rosa. São Paulo: Ática, 1972.

HANSEN,

João Adolfo. O o: a ficção da literatura em Grande sertão: veredas. São Paulo: Hedra, 2000.

José Carlos. Rosa em dois tempos. São Paulo: Nankin Editorial, 2005.

GRANATO,

Fernando e FIRMO, Walter. Nas trilhas do rosa: uma viagem pelos caminhos do Gran305

24/11/06 – 20h


KUTZENBERGER,

Stefan. Europa in Grande sertão: veredas. Amsterdã: Rodopi, 2005.

Sagarana. São Paulo: Navegar, 2003. LISBOA,

LAGES,

Susana Kampff. João Guimarães Rosa e a saudade. São Paulo: Ateliê Editorial/Fapesp, 2002.

Henriqueta e WILTON, Cardoso (org.). Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Imprensa da Universidade Federal de Minas Gerais, 1966.

sertão: vertigens de um enigma. Campo Grande: UCDB/Letra Livre, 2001. MARTINS,

Heitor. Do barroco a Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Itatiaia, 1983. MARTINS, José Maria. Guimarães Rosa: o alquimista do coração. Petrópolis: Vozes, 1994. MARTINS,

Nilce Sant’Anna. O léxico de Guimarães Rosa. São Paulo: Edusp, 2001.

LEONEL, Maria Célia. Guimarães Rosa: magma e gênese da obra. São Paulo: Unesp, 2000.

LLERAS ,

Gabriela HofmannOrtega. Die produktive Rezeption von Thomas Manns Doktor Faustus: Einzeltextanalysen zu João Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Michel Tournier und Danièle Sallenave. Heidelberg: C. Winter, 1995. LOPES,

LIMA, Deise Dantas. Encenações

do Brasil rural em Guimarães Rosa. Niterói: Editora da UFF, 2001. Sônia Maria van Dijck (org). Ascendino Leite entrevista Guimarães Rosa. João Pessoa: UFPB, 1997. Publicada originalmente em O Jornal, Rio de Janeiro, 26.05.1946.

Paulo César Carneiro. Utopia cristã no sertão mineiro: uma leitura de “A hora e vez de Augusto Matraga” de João Guimarães Rosa. Petrópolis: Vozes, 1997.

MELLO,

Melilo Moreira de. As pessoas não morrem: ficam encantadas. Rio de Janeiro: Academia Carioca de Letras, 1977.

Tânia. Guimarães Rosa. São Paulo: Ática, 1988.

Lauro Belchior e OLIVEIRA, Luis Claudio Vieira de. A astúcia das palavras – Ensaios sobre Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Editora UFMG , 1998.

MACHADO,

MIKETEN,

MARINHO ,

MORAIS, Márcia Marques de. A travessia dos fantasmas: literatura e psicanálise em Grande ser-

MACEDO ,

MENDES,

LIMA,

Sônia Maria van Dijck. Guimarães Rosa: escritura de

Ana Maria. Recado do nome – Leitura de Guimarães Rosa à luz do nome de seus personagens. Rio de Janeiro: Imago, 1976. Reedição: Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003.

LIMA,

Marcelo. Grande 306

Antônio Roberval. Travessia de Grande sertão: veredas. Brasília: Thesaurus, 1982.

24/11/06 – 20h


tão: veredas. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

das do Grande sertão. Belo Horizonte: Editora C/Arte, 2006.

MORAIS ,

NOVIS,

Osvando José de. Grande sertão: veredas: o romance transformado: o processo e a técnica de Walter George Durst na construção do roteiro televisivo. São Paulo: Edusp, 2000.

NASCIMENTO,

Edna Maria Fernandes dos Santos e COVIZZI, Lenira Marques. João Guimarães Rosa: homem plural, escritor singular. São Paulo: Atual, 1988.

Vera. Tutaméia: engenho e arte. São Paulo: Perspectiva/Edusp, 1989.

REINALDO, OLIVEIRA,

Luiz Claudio Vieira de. Crítica e semiótica: Guimarães Rosa no Suplemento – A recepção crítica da obra de Guimarães Rosa no Suplemento Literário de Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG, 2002. pacheco, Ana Paula. Narrativa e processo social nas Primeiras estórias de Guimarães Rosa. São Paulo: Nankin, 2006

Gabriela. Cantiga de fechar os olhos - Mito e música de Guimarães Rosa. São Paulo: Annablume, 2005.

RIEDEL, Dirce Côrtes. Meiasverdades no romance. Rio de Janeiro: Achiamé, 1980. RIVERA,

Tania. Guimarães Rosa e a psicanálise: ensaios sobre imagem e escrita. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.

PASSOS, Cleusa Rios Pinheiro. Guimarães Rosa: do feminino e suas estórias. São Paulo: Hucitec/Fapesp, 2000.

NASCIMENTO , Zaeth Aguiar do. Diadorim: uma estranha revelação – O feminino no Grande sertão: veredas. João Pessoa: Idéia, 2000.

Paulo Roberto Albieri. Relatos de viagem e construção da pessoa em Guimarães Rosa: o deslocamento como valor. Brasília: Departamento de Antropologia da UnB, 2003.

B. Uma concordância do romance Grande sertão: veredas de João Guimarães Rosa. Chapel Hill: University of North Carolina, 1989.

ROCHA,

Glauber. Riverão Sussuarana. Rio de Janeiro: Record, 1978.

NERY,

NOBRE,

Lúcia. A arte Rosa do popular ao erudito: uma incursão na tradição cultural na contística de Guimarães Rosa. Maceió: Ufal, 2000.

ROCHA,

PAZ-ANDRADE,

Valentín. A galeguidade na obra de Guimarães Rosa. Tradução e prefácio de Paulo Rónai. São Paulo: Difel, 1983.

PROENÇA,

Manoel Cavalcanti. Trilhas do grande sertão. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação do MEC, 1958.

NOGUEIRA, Elza de Sá. Daibert,

tradutor de Rosa – Outras vere-

RAMSEY, Myriam e DIXON, Paul

307

Karina Bersan. Veredas do amor no grande sertão. Nova Friburgo: Imagem Virtual, 2001. ROCHA,

Luiz Otávio Savassi. João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio/ I N L , 1972. ROCHA,

Roseli Gimenes Alves da. A menina de Lacan: um conto Rosa – Uma leitura do conto “A menina de lá” de Gui24/11/06 – 20h


marães Rosa. São Paulo: Hacker/Cespuc, 1993. Olavo. Manuelzão, o último tropeiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.

SANTOS,

Wendel. A construção do romance em Guimarães Rosa. São Paulo: Ática, 1996.

ROMANO,

RONCARI,

Luiz. O Brasil de Rosa: o amor e o poder. São Paulo: Unesp, 2004.

Júlia Conceição Fonseca. Nomes de personagens em Guimarães Rosa. Rio de Janeiro, INL/MEC, 1971.

SANTOS, Paulo de Tarso. O diá-

SANTOS,

Wendel. A construção do romance em Guimarães Rosa. São Paulo: Ática, 1978.

SERRA ,

ROSENFIELD, Kathrin Holzermayr. Desenveredando Rosa: a obra de J. G. Rosa e outros estudos rosianos. Rio de Janeiro: Topbooks, 2006.

Suzi Frankl. Guimarães Rosa: signo e sentimento. Coleção Ensaios, 90. São Paulo: Ática, 1982.

SANTOS,

logo no Grande sertão: veredas: Guimarães Rosa e Riobaldo. São Paulo: Hucitec, 1978.

ROSENFIELD, Kathrin Holzermayr. Os (des)caminhos do Demo: tradição e ruptura em Grande sertão: veredas. Rio de Ja n e i r o / S ã o Pa u l o : Im a go/Edusp, 1993.

SPERBER,

Tania Rebelo Costa. Riobaldo Rosa – A verdade junguiana do grande sertão. Brasília: Thesaurus, 1990.

SIMÕES, Irene Jeanete Gilberto.

Guimarães Rosa: as paragens mágicas. Coleção Debates, 216. São Paulo: Perspectiva, 1988. SOUZA,

Ronaldes de Melo e. Ficção e realidade: diálogo e catarse em Grande sertão: veredas. Brasília: Clube de Poesia, 1978. SPERA,

Jeane Mari Sant’ana. As ousadias verbais em Tutaméia. Coleção Universidade Aberta, 10. São Paulo: Arte e Cultura, 1995.

STARLING, Heloisa. Lembranças

do Brasil: teoria política, história e ficção em Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Revan/UCAM/IUPERJ, 1997. TARSO, Paulo de. O diálogo no Grande sertão: veredas – Guimarães Rosa e Riobaldo. São Paulo: Hucitec, 1978. THEOBALDO,

Carlos. O tempo em Grande sertão: veredas (um estudo entre luz e sombras). Rio de Janeiro: Ágora da Ilha, 2000. TOLEDO, Marcelo de Almeida. Grande sertão: veredas – As trilhas de amor e guerra de Riobaldo Tatarana. São Paulo: Massao Ohno/M. L. Pires e Albuquerque Editores, 1982. TURRER,

Daisy Leite. O livro e a ausência de livro em Tutaméia, de Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Autêntica, 2002. UTÉZA,

Francis. João Guimarães Rosa: metafísica do grande sertão. Tradução de José Carlos Garbuglio. São Paulo: Edusp, 1994.

SPERBER, ROSENFIELD,

Kathrin Holzermayr. Grande sertão: veredas: roteiro de leitura. São Paulo: Ática, 1992.

Suzi Frankl. Caos e cosmos – Leituras de Guimarães Rosa. São Paulo: Duas Cidades/Secretaria de Cultura, Ciência e Tecnologia, 1976. 308

24/11/06 – 20h


VALADARES,

Napoleão. Os personagens de Grande sertão: veredas. Brasília: André Quicé, 1982.

redas. São Paulo/Brasília: Duas Cidades/INL – Fundação PróMemória, 1984. XISTO,

VÁRIOS AUTORES.

Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968.

Pedro, CAMPOS, Augusto de e CAMPOS, Haroldo de. Guimarães Rosa em três dimensões. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1970.

ALBERGARIA ,

Consuelo. “O sentido do trágico em ‘A terceira margem do Rio’”. In: COUTINHO, Eduardo. Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira/INL, 1983. ALMEIDA ,

Ana Maria. “’Pirlimpsiquice’: o palco psíquico”. In O Eixo e a roda. Belo Horizonte: UFMG, 1983.

ALMEIDA,

VASCONCELOS,

Sandra Guardini Teixeira. Puras misturas: estórias em Guimarães Rosa. Coleção Linguagem e Cultura, 27. São Paulo: Hucitec/Fapesp, 1997.

VEJMELKA,

Marcel. Kreuzwege: Querungen – João Guimarães Rosas Grande sertão: veredas und Thomas Manns Doktor Faustus im interkulturellen Vergleich. Berlim: Tranvia, 2005. VIGGIANO ,

Alan. DiadorimDeodorina: Hermes versus Afrodite em Grande sertão: veredas. Brasília: André Quicé, 1987.

VIGGIANO,

Alan. Itinerário de Riobaldo Tatarana. Belo Horizonte/Brasília: Comunicação/INL, 1974.

3. Estudos, referências e ensaios publicados em livros ABRAMO,

Maria Augusta Bernardes Fonseca Weber. “Entranhas de um conto”. In: BOSI, Viviana, CAMPOS, Claudia Arruda, HOSSNE, Andréa Saad e RABELLO, Ivone Darel (org.). Ficções: leitores e leituras. Cotia: Ateliê Editorial, 2001. AGUIAR, Flávio. “Grande sertão

em linha reta”. In: DUARTE, Lélia Parreira e ALVES, Maria Theresa Abelha (org.). Outras margens: estudos da obra de Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. AGUIAR , Flávio. “O oco do mundo”. In: B R A I T , Beth (org.). O sertão e os sertões. São Paulo: Arte & Ciência, 1998. AGUIAR,

VINCENT, Jon. João Guimarães Rosa. Boston: Twayne, 1978. WARD,

Teresinha Souto. O discurso oral em Grande sertão: ve-

Flávio. “Um pouco além do inferno. Contribuição à análise de ‘Meu tio o Iauaretê’ de Guimarães Rosa”. In Canticum Ibericum. Frankfurt: Vervuert, 1991. 309

Tereza Virgínia de. “O inumano nas cartas de tarô: uma leitura de ‘Cartas na mesa’”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa II. Segundo seminário internacional Guimarães Rosa (2001). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2003. ANDRADE,

Maria das Graças. “Tudo er(r)a uma vez”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa. Seminário internacional Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2000. ANDRADE,

Vera. “Conceituação de jagunço e jagunçagem em Grande sertão: veredas”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983. ARRIGUCCI JR.,

David. “Guimarães Rosa e Góngora: metáforas”. In Achados e perdidos (ensaios de crítica). São Paulo: Polis, 1979.

ARROJO ,

Rosemary. “Maria Mutema, o poder autoral e a resistência à interpretação”. In Tradução, desconstrução e psica24/11/06 – 20h


nálise. Rio de Janeiro: Imago, 1993.

ca literária e ideologia. São Paulo: Ática, 1988.

dos avessos”. In Tese e antítese. São Paulo, Nacional, 1971.

ARRUDA,

BOSI ,

Alfredo. “Tendências contemporâneas”. In História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, s.d.

CANDIDO,

BRANCO,

CANDIDO,

Maria Luiza de. “O medo e o sertão: a travessia da vida e o encontro com o desconhecido”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004.

BANDEIRA,

Manuel. “Grande sertão: veredas”. Carta a Guimarães Rosa de 13.03.1957. In Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1957.

BASTOS,

Rita de Cássia. “Diadorim: a tragédia e o trágico em Grande sertão: veredas”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004. BOLLE,

Willi. “Diadorim – A paixão como medium-de-reflexão”. In: DUARTE, Lélia Parreira e ALVES, Maria Theresa Abelha (org.). Outras margens: estudos da obra de Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. BOLLE, Willi. “Grandesertão.br

ou: a invenção do Brasil”. In: LANCIANI, Giulia (org.). João Guimarães Rosa: il che delle cose. Roma: Bulzoni, 2000. Publicado também em: MADEIRA, Angélica e VELOSO , Mariza (org.). Descobertas do Brasil. Brasília: Editora UnB, 2001. Alfredo. “Céu, inferno”. In Céu, inferno: ensaios de críti-

Marise. “Riobaldo e seus provérbios”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004. BRANDÃO, Antonia Marisa Rodrigues. “O liso do sussuarão: espaço de provação”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUCSP, 2004. BRUYAS,

Jean-Paul. “Estruturas e visão em Grande sertão: veredas”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Simões Editora, 1969.

Antonio. “Jagunços mineiros de Claudio a Guimarães Rosa”. In Vários escritos. São Paulo: Duas Cidades, 1970.

Antonio. “O mundo provérbio”. In O discurso e a cidade. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1993. CANDIDO,

Antonio. “Sagarana”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1993. CANNABRAVA,

Euryalo. “Compreensão de Guimarães Rosa”. In Estética da crítica. Rio de Janeiro: MEC, 1963. CANNABRAVA, Euryalo. “Guimarães Rosa e a linguagem literária”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Ficção completa. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 1. CARDOSO ,

CAMPOS, Augusto de. “Um lan-

ce de ‘dês’ no grande sertão”. In Guimarães Rosa em três dimensões. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1970. CAMPOS,

Haroldo de. “A linguagem do Iauaretê”. In Guimarães Rosa em três dimensões. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1970. Republicado em Metalinguagem e outras metas. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 1992.

Marília Rothier. “Uma aprendizagem transcultural nos cadernos de Guimarães Rosa”. In: OLINTO, Heidrun Krieger e SCOLLHAMMER, Karl Eric (org.). Literatura e cultura. Rio de Janeiro/São Paulo: PUC-RJ/Loyola, 2003. CASTRO,

Nei Leandro de. “A epifania da linguagem ou o ‘corpo fechado’”. In Travessia poética. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1977.

CARVALHO,

BOSI,

CANDIDO, Antonio. “O homem

310

Tida. “‘Fita verde no cabelo’, nova velha estória: 24/11/06 – 20h


entre a dor e o conhecimento – o prazer”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa II. Segundo seminário internacional Guimarães Rosa (2001). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2003. CHAVES, Flávio Loureiro. “Gui-

marães Rosa e a chave do jogo”. In O brinquedo absurdo. São Paulo: Polis, 1978. CHAVES, Flávio Loureiro. “Perfil

de Riobaldo”. In Ficção Latinoamericana. Porto Alegre: UFRGS, 1973. COELHO ,

Nelly. “Guimarães Rosa e o Homo ludens”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983. COELHO ,

Nelly. “Guimarães Rosa, um novo demiurgo”. In Guimarães Rosa. Brasília: Quíron,1975. COSTA LIMA,

Luiz. “O buriti entre os homens ou o exílio da utopia”. In A metamorfose do silêncio. Rio de Janeiro: Eldorado, 1974.

COSTA LIMA, Luiz. “Mito e pro-

vérbio em Guimarães Rosa”. In A metamorfose do silêncio. Rio de Janeiro: Eldorado, 1974. COSTA LIMA,

Luiz. O mundo em perspectiva: Guimarães Rosa. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL,1983.

COSTA LIMA,

Luiz. “O sertão e o mundo”. In Por que literatura?. Petrópolis: Vozes, 1969. COUTINHO,

Eduardo. Diadorim e a desconstrução do olhar dicotômico em Grande sertão: veredas. In: DUARTE, Lélia Parreira e ALVES, Maria Theresa Abelha (org.). Outras margens: estudos da obra de Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. COUTINHO,

reto. “Critérios para o estabelecimento do texto de Grande sertão: veredas”. In: WILLE MART, Philippe (org.). II encontro de edição crítica e crítica genética: eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH-USP, 1990. CUNHA,

Maria de Lourdes da Conceição. “Diadonzela Guerreirim”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/ Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004.

Eduardo F. (org.). “Guimarães Rosa: um alquimista da palavra”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Ficção completa. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 1.

DACANAL, José Hildebrando. “A epopéia de Riobaldo”. In Nova narrativa épica no Brasil. Porto Alegre: Sulina, 1973.

COUTINHO,

DAIBERT,

Eduardo F. “Rosa e o processo de revitalização da linguagem”. In: COUTINHO , Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983.

COUTINHO, Fernanda. “‘Fita verde no cabelo’: a perenidade do era uma vez.” In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa. Seminário internacional Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2000. COVIZZI, Lenira Maria. “Grande sertão: veredas, no Brasil, em dias de época”. In DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa II. Segundo seminário internacional Guimarães Rosa (2001). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2003. COVIZZI,

Lenira Marques e CAVALCANTE, Maria Neuma Bar311

Arlindo. “Grande sertão: veredas”. In Caderno de escritos. Rio de Janeiro: 7 Letras, 1995.

DAMATTA, Roberto. “Augusto Matraga e a hora da renúncia”. In Carnavais, malandros e heróis. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1978. DIAS,

Fernando Correia. “Aspectos sociológicos de Grande sertão: veredas”. In: LISBOA , Henriqueta e WILTON, Cardoso (org.). Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Imprensa da Universidade Federal de Minas Gerais, 1966. DJANIRA. “Estudos para ilustração de Campo geral, de Guimarães Rosa”. In A arte sob o olhar de Djanira. Coleção Museu Nacional de Belas Artes. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul Design e Editora, 2005.

24/11/06 – 20h


DOURADO,

W. Autran. “Guimarães Rosa, barroco e colonial”. In Poética de romance: matéria de carpintaria. São Paulo: Difel, 1976.

DOYLE, Plínio. “Contribuição à

bibliografia de & sobre Guimarães Rosa”. Separata do livro Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968.

zão à emoção II. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1971. FREIXEIRO, Fábio. “O problema do gênero em Sagarana”. In Da razão à emoção II. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1971. FREYRE,

Gilberto. “Presença de Guimarães Rosa e outras presenças”. In Vida, forma e cor. Rio de Janeiro: José Olympio, 1962.

DOYLE,

Plínio. “Dedicatórias: de João Guimarães Rosa”. In Uma vida: Plínio Doyle. Rio de Janeiro: Casa da Palavra/Fundação Casa de Rui Barbosa, 1999.

Nogueira. “O certo no incerto: o pactário”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Ficção completa. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 1.

FARIA,

GALVÃO ,

Otávio de. “Discurso de homenagem póstuma”. In: VÁRIOS AUTORES. Em memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968. FORTUNA,

Felipe. “Guimarães Rosa, viajante”. In: COSTA E SILVA, Alberto (org.). O Itamaraty na cultura brasileira. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 2002. FRANZBACH ,

Martin. “João Guimarães Rosa”. In: EITEL, Wolfgang. Lateinamerikanische Literatur der Gegenwart. Stuttgart, Kröner, 1978. FREIXEIRO,

Fábio. “De Sagarana a ‘Uma história de amor’”. In Da razão à emoção II. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1971. Fábio. “Guimarães Rosa em face de conceitos lingüísticos modernos”. In Da ra-

GALVÃO, Walnice

Walnice Nogueira. “Ciclo da donzela guerreira”. In Gatos de outro saco. São Paulo: Brasiliense, 1993.

GALVÃO ,

Walnice Nogueira. “Distinguindo”. In A donzela guerreira: um estudo de gênero. São Paulo: Senac, 1998.

GALVÃO ,

Walnice Nogueira. “Forasteiros”. In Desconversa (ensaios críticos). Rio de Janeiro: UFRJ, 1998.

GALVÃO ,

Walnice Nogueira. “As listas de Guimarães Rosa”. In: SALLES, Cecília Almeida (org.). Eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH-USP, 1998. GALVÃO ,

Walnice Nogueira. “Metáforas náuticas”. In Desconversa (ensaios críticos). Rio de Janeiro: UFRJ, 1998.

FREIXEIRO,

Bernardo. “Veredas no grande sertão”. In: GUIMA-

RÃES ROSA, João. Ficção comple-

ta. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 1. GUIEIRO, Cilene Aparecida Palma Soares. “A presença do rio em Grande sertão: veredas”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004. GUIEIRO, Noé Amós. “O conceito de vida em Grande sertão: veredas”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/ Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004. HARSS, Luís. “João Guimarães Rosa, o la otra orilla”. In Los nuestros. Buenos Aires: Sudamericana, 1966. LARA, Cecília de. “A edição crítico-genética de Grande sertão: veredas de Guimarães Rosa”. In: Willemart, Philippe (org.). Gênese e Memória. IV encontro internacional de pesquisadores do manuscrito e de edições. São Paulo: Annablume, 1995. LEÃO, Ângela Vaz. “O ritmo em

‘O burrinho pedrês’”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Ficção completa. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 1. LEITE, Dante Moreira. “Análise psicológica do texto ‘Campo geral’: retratos e espelho”. In Psicologia e literatura. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1965.

GERSEN ,

312

LEITE,

Dante Moreira. “Gran24/11/06 – 20h


de sertão: veredas: a ficção de Guimarães Rosa”. In O amor romântico e outros temas. 2. ed. São Paulo: Ed. Nacional/ Edusp, 1979/ LEONEL,

Maria Célia. “O ‘primeiro rascunho’ de Grande sertão: veredas”. In: WILLEMART, Philippe (org.). II encontro de edição crítica e crítica genética: eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH-USP, 1990. LINS,

Álvaro. “Sagas de Minas Gerais”. In Sagas literárias e teatro moderno do Brasil: Erico Verissimo, Jorge Amado, Guimarães Rosa, Nelson Rodrigues. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1967.

LISBOA,

Henriqueta. “O motivo infantil na obra de Guimarães Rosa”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Ficção completa. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. v. 1. LLOSA,

Mario Vargas. “Épopée du sertão, tour de Babel ou manuel du satanisme”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Diadorim. Paris: Albin Michel, 1991. LOBO, Luiza. “Humor da palavra e sentido de lugar em Guimarães Rosa”. In Crítica sem juízo. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1993. LOPES, Óscar. “Cosmorana de Guimarães Rosa”. In Ler e depois – Crítica e interpretação literária. Porto: Editorial Inova, 1970.

Óscar. “Novos mundos”. In: GUIMARÃES ROSA ,

João. Sagarana. 16. ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1973. LOPES, Vera. “‘Fita verde no cabelo’: uma rede de leituras”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa. Seminário internacional Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2000.

pertório verbal”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983. MARQUES, Oswaldino. “A revo-

lução Guimarães Rosa”. In A seta e o alvo. Rio de Janeiro: MEC/INL, 1957.

LORENZ, Günter. “João Guima-

MARTINS,

rães Rosa”. In Dialog mit Lateinamerika: Panorama einer Literatur der Zukunft. Tübingen: Erdmann, 1970. Traduzido como: Diálogo com a América Latina. São Paulo: E.P.U., 1973.

MARTINS, Heitor. “Nonada”. In

LOURENÇO,

Eduardo. “Da literatura brasileira como rasura do trágico”. In A nau de Ícaro e imagem e miragem da lusofonia. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. LOURENÇO, Eduardo. “Guimarães Rosa ou o terceiro sertão”. A nau de Ícaro e Imagem e miragem da lusofonia. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. MALARD,

Letícia. “Minas Gerais em Guimarães Rosa”. In: GROSSMANN, Judith (org.). O espaço geográfico no romance brasileiro. Salvador: Fundação Casa de Jorge Amado, 1993.

Heitor. “No Urubuquaquá, em Colônia”. In Do Barroco a Guimarães Rosa. Belo Horizonte/Brasília: Itatiaia/INL, 1983.

Do Barroco a Guimarães Rosa. Belo Horizonte/Brasília: Itatiaia/INL, 1983. MARTINS,

Wilson. “Structural perspectivism in Guimarães Rosa”. In: MARTINS , Heitor (ed.). The brazilian novel. Bloomington, Indiana University Press, 1976. MARTINS COSTA,

Ana Luiza. “Diadorim belo feroz”. In: SÜSSEKIND, Flora, DIAS, Tânia e AZEVEDO, Carlito (org.). Vozes femininas – Gênero, mediações e práticas de escrita. Rio de Janeiro: 7 Letras/Casa de Rui Barbosa, 2002. MARTINS COSTA, Ana Luiza. “João

MARQUES,

Oswaldino. “Canto e plumagem das palavras”. In: A seta e o alvo. Rio de Janeiro: MEC/INL, 1957. Republicado em Ensaios escolhidos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.

Rosa, viator”. In: SÜSSEKIND, Flora e DIAS, Tânia (org.). A historiografia literária e as técnicas de escrita: do manuscrito ao hipertexto. Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa/Vieira & Lent, 2004.

MARQUES,

MARTINS COSTA,

LOPES,

Oswaldino. “O re313

Ana Luiza.

24/11/06 – 20h


“Rosa, ledor de relatos de viagem”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa. Seminário internacional Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2000. MAZZARI ,

Marcus Vinicius. “Meyer-Clason: a Guimarães Rosa”. In: GALVÃO, Walnice Nogueira e GOTLIB, Nádia Battela. Prezado senhor, prezada senhora. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. MEDINA ,

Fabiana Grazioli. “Diadorim: um amor em suspenso”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004. MEYER - CLASON , Curt. “Der Sertão des João Guimarães Rosa”. In: STRAUSFELD, M. (org.). Brasilianische Literatur. Frankfurt: Suhrkamp, 1984.

tempos. São Paulo: Unesp, 1996. MOISÉS , Giovana de Fátima Rontal Fausto. “Riobaldo e a ascensão a Deus”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004. MONEGAL ,

Emir Rodríguez. “Em busca de Guimarães Rosa”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira, 1991. MONTEIRO ,

Adolfo Casais. “Guimarães Rosa: uma revolução no romance brasileiro”. In O romance: teoria e crítica. Rio de Janeiro: José Olympio, 1964. MONTENEGRO, Braga. “Guima-

rães Rosa, novelista”. In:

GUI-

MARÃES ROSA, João. Ficção com-

pleta. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 1.

MEYER - CLASON ,

Curt. “João Guimarães Rosa und der Sertão”. In: STRAUSFELD, M. (org.). Die Menschen sterben nicht, sie werden verzaubert. Munique: Piper, 1990.

MOTTA, Leda Tenório da. “As margens do sentido em Guimarães Rosa”. In Catedral em obras: ensaios de literatura. São Paulo: Iluminuras, 1995.

MIYAZAKI,

MOURÃO,

Tieko Yamaguchi. “A antecipação e a sua significação simbólica em ‘São Marcos’ de Guimarães Rosa”. In: D’ONOFRIO, Salvatore. Conto brasileiro: quatro leituras. Petrópolis: Vozes, 1979.

Cleonice Paes Barreto. “Diadorim: o corpo nu da narração”. In: DUARTE, Lélia Parreira (org.). Veredas de Rosa. Seminário internacional Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC-MG, 2000.

João. Ficção completa. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 1. MULINACCI,

Roberto. “La voce del silenzio”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Mio zio il Giaguaro. Parma: Ugo Guanda, 1999. NASCIMENTO,

Edna Maria Fernandes dos Santos. “Descrição das duas primeiras edições e do ‘segundo rascunho’ de Grande sertão: veredas”. In: WILLEMART, Philippe (org.). II encontro de edição crítica e crítica genética: eclosão do manuscrito. São Paulo: FFLCH-USP, 1990.

NEVES,

David E. “Guimarães Rosa e o cinema novo”. In Telégrafo visual. Rio de Janeiro: 34 Letras, 2004.

NUNES,

Benedito. “O amor na obra de Guimarães Rosa”. In O dorso do tigre. São Paulo: Perspectiva, 1969. NUNES,

Benedito. “De Sagarana a Grande sertão: veredas”. In Crivo de papel. 2. ed. São Paulo: Ática, 1998. NUNES, Benedito. “Guimarães Rosa”. In O dorso do tigre. São Paulo: Perspectiva, 1969. NUNES,

Benedito. “Guimarães Rosa e a tradução”. In O dorso do tigre. São Paulo: Perspectiva, 1969. NUNES,

MIYAZAKI,

Tieko Yamaguchi. “Nas veredas: uma estória de amor”. In Um tema em três

MOURÃO, Rui. “Processo da linguagem, processo do homem”. In: GUIMARÃES ROSA,

314

Benedito. “Literatura e filosofia: Grande sertão: veredas”. In Teoria da literatura em suas fontes. 2. ed. Seleção, in24/11/06 – 20h


trodução e revisão técnica de Luiz Costa Lima. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1983.

Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira, 1991. PERRONE-MOISÉS,

NUNES,

Benedito. “A matéria vertente”. In: CONSELHO ESTADUAL DE CULTURA DE MINAS

Seminário de ficção mineira III – De Guimarães Rosa a nossos dias. Belo Horizonte, 1983.

Leyla. “Nenhures 2: lá, nas campinas”. In Inútil poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

GERAIS.

NUNES,

Benedito. “Reflexões sobre o moderno romance brasileiro”. In Ensaios da Bienal Nestlé de Literatura. São Paulo: LR, 1983. NUNES,

Benedito. “Tutaméia”. In O dorso do tigre. São Paulo: Perspectiva, 1969. Benedito. “A viagem”. In O dorso do tigre. São Paulo: Perspectiva, 1969.

PERRONE-MOISÉS,

Leyla. “Orientalismo e orientação em Guimarães Rosa”. In Inútil poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

PIRAN,

Carolina Monteiro de Barros. “Contradições e conciliações em Grande sertão: veredas”. In: BERRINI, Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004.

NUNES,

NUNES,

Benedito. “A viagem do Grivo”. In O dorso do tigre. São Paulo: Perspectiva, 1969.

OLIVEIRA, Franklin. “Guimarães Rosa”. In Viola d’amore. Rio de Janeiro: Edições do Val, 1965.

PONTES,

Joel. “O geralista Riobaldo”. In O aprendiz de crítico. Rio de Janeiro, MEC/INL, 1960.

PORTELLA,

Eduardo. “Um romance e sua dialética”. In Dimensões I. Rio de Janeiro: José olympio, 1958. PROENÇA,

OLIVEIRA,

Franklin. “Guimarães Rosa”. In: COUTINHO, A. (org.). A literatura no Brasil. Rio de Janeiro: Editorial Sulamericana, v. 5, 1970. Renard. “Guimarães Rosa”. In Escritores brasileiros contemporâneos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1960. Republicado em COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães

Manoel Cavalcanti. “Dom Riobaldo do Urucuia, cavaleiro dos campos gerais”. In: COUTINHO, Eduardo F. Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983.

PEREZ ,

Manuel Cavalcanti. “Trilhas no grande sertão”. In Augusto dos Anjos e outros ensaios. Rio de Janeiro: José Olympio, 1959.

PY,

Fernando. “Estas estórias”. In: COUTINHO , Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização brasileira/INL, 1983.

RAMOS,

Graciliano. “Um livro inédito”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Ficção completa. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 1.

RAMOS,

Maria Luiza. “Análise estrutural de Primeiras estórias”. In: COUTINHO, Educardo F. Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília; Civilização Brasileira/INL, 1987.

RAMOS,

Maria Luiza. “O elemento poético em Grande sertão: veredas”. In: Fenomenologia da obra literária. Rio de Janeiro: Forense, 1969.

RIBEIRO,

Gilvan P. “O alegórico em Guimarães Rosa”. In Realismo e anti-realismo na literatura brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974. RIEDEL,

Dirce Côrtes. “Ainda é... já não é”. In Meias-verdades no romance. Rio de Janeiro: Achiamé, 1980.

RÓNAI,

Paulo. “Advertência da segunda edição”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Ave, palavra. 2. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1978.

PROENÇA,

315

RÓNAI,

Paulo. “Apêndice – Os prefácios de Tutaméia – As estórias de Tutaméia”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Tutaméia 24/11/06 – 20h


(Terceiras estórias). Rio de Janeiro: José Olympio, 1967. RÓNAI, Paulo. “A arte de contar

em Sagarana”. In Encontros com o Brasil. Rio de Janeiro: MEC/INL, 1958. RÓNAI,

Paulo. “As falácias da tradução”. In A tradução vivida. Rio de Janeiro: Educom, 1976.

RÓNAI, Paulo. “A fecunda babel

de Guimarães Rosa”. In Pois é: ensaios. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. RÓNAI,

Paulo. “Interesse geral de uma correspondência particular (com o tradutor italiano)”. In Pois é: ensaios. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. RÓNAI,

Paulo. “Nota introdutória”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Ave, palavra. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970. RÓNAI,

Paulo. “Nota introdutória”. In: GUIMARÃES ROSA, João. Estas estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969. RÓNAI,

Paulo. “Organização, estudo e notas”. In Seleta de João Guimarães Rosa. 2. ed. revista. Rio de Janeiro: José Olympio, 1978.

RÓNAI,

Paulo. “Orientação de pesquisa”. In Seleta de João Guimarães Rosa. 2. ed. revista. Rio de Janeiro: José Olympio, 1978.

RÓNAI,

Paulo. “Palavras apenas mágicas”. In Pois é: ensaios. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.

RÓNAI,

Paulo. “Perfil de João Guimarães Rosa”. In Seleta de João Guimarães Rosa. 2. ed. revista. Rio de Janeiro: José Olympio, 1978.

RÓNAI,

Paulo. “Rondando os segredos de Guimarães Rosa”. In Encontros com o Brasil. Rio de Janeiro: MEC/INL, 1958.

RÓNAI, Paulo. “Rosa não parou

(sobre Estas estórias)”. In Pois é: ensaios. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. RÓNAI,

Paulo. “Rosiana (Especulações sobre Tutaméia (os prefácios; as estórias)”. In Pois é: ensaios. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.

RÓNAI,

Paulo. “Trajetória de uma obra”. In Seleta de João Guimarães Rosa. 2. ed. revista. Rio de Janeiro: José Olympio, 1978. RÓNAI,

Paulo. “Três motivos em Grande sertão: veredas”. In Encontros com o Brasil. Rio de Janeiro: MEC/INL, 1958. RÓNAI,

Paulo. “Tutaméia”. In: João. Ficção completa. 2 volumes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 1.

GUIMARÃES ROSA,

RÓNAI,

Paulo. “Os vastos espaços”. In: GUIMARÃES ROSA , João. Primeiras estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969. RONCARI,

Luiz Dagobert de Aguirra. “O engasgo de Rosa e a confirmação milagrosa”. In: DUARTE, Lélia Parreira e ALVES, Maria Theresa Abelha (org.). 316

Outras margens: estudos da obra de Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. ROSENFIELD,

Kathrin Holzenmayr. “Grande sertão: veredas and João Guimarães Rosa’s quest of universality”. In: MENDES, Victor e ROCHA, João Cézar de Castro (org.). Brazil 2001, a revisionary history of Brazilian litterature and culture. Dartmouth: Center for Portuguese Studies and Culture University of Massachusetts, 2000. ROSENFIELD, Kathrin Holzenmayr. “Idealização e realidade na obra de João Guimarães Rosa”. In: ABDALA JÚNIOR, Scarpelli (org.). Portos flutuantes: trânsitos ibero-afro-americanos. São Paulo: Ateliê, 2004. ROSENFIELD, Kathrin Holzenmayr. “João Guimarães Rosa em busca da universalidade”. In: ROCHA, João Cezar de Castro. Nenhum Brasil existe. Rio de Janeiro: Topbooks, 2003. ROSENFIELD,

Kathrin Holzenmayr. “O maléfico e o obscuro em Goethe e Guimarães Rosa: ruptura com a conciliação épica”. In A linguagem liberada: estética, literatura, psicanálise. São Paulo: Perspectiva, 1989. ROSENFIELD,

Kathrin Holzenmayr. “A secreta presença de Gilberto Freyre no imaginário de Guimarães Rosa”. In: SCARPELLI, Marli Fantini e OLIVEIRA, Paulo Motta (org.). Os centenários: Eça, Freyre, Nobre. Belo Horizonte: Fale/UFMG, 2001. 24/11/06 – 20h


ROSENTHAL,

Erwin T. “Deformação lingüística como elemento de representação da realidade flutuante”. In O universo fragmentário. São Paulo: Edusp, 1975.

SANTOS,

Livia Ferreira. “A desconstrução em Tutaméia”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.) Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983. SARAIVA,

Arnaldo. “Guimarães Rosa: espinhos – Ou um inovador entre retardatários”. In Encontros dos encontros. Porto: Livraria Paisagem, 1973.

SCHÜLER,

Donaldo. “O épico em Grande sertão: veredas”. In J. G. Rosa. Porto Alegre: UFRGS, 1969. SCHÜLER, Donaldo. “Grande sertão: veredas: estudos”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983. SCHWARZ, Roberto. “Grande sertão: a fala”. In A sereia e o desconfiado: ensaios críticos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. SCHWARZ,

Roberto. “Grande sertão e dr. Faustus”. In A sereia e o desconfiado: ensaios críticos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. SILVA,

Francis Paulina Lopes da. “Poesia e alteridade em Ave, palavra”. In: DUARTE , Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa. Seminário internacional

Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC Minas/ Cespuc, 2000.

méia – Troisièmes histoires. Paris: Seuil, 1985. VASCONCELOS,

SILVA,

Vitor Manuel de Aguiar e. “Visão do mundo e estilo em Grande sertão: veredas”. In: ADONIAS FILHO e LOPES, Oscar (org.). Guimarães Rosa. Lisboa: Instituto Luso-Brasileiro, 1969. SOUZA, Alduísio M. de. “Grande sertão: veredas”. In Os impasses do amor. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. SOUZA, Enivalda. “Dom Quixo-

te e ‘Fita verde’: uma viagem, duas travessias”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa II. Segundo seminário internacional Guimarães Rosa (2001). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2003. STEGAGNO-PICCHIO,

Sandra Guardini Teixeira. “Guardados da memória: as cadernetas de campo de Guimarães Rosa”. In: DUARTE, Lélia Parreira Alves (org.). Veredas de Rosa. Seminário internacional Guimarães Rosa (1998-2000). Belo Horizonte: PUC Minas/Cespuc, 2000. VERSIANI,

Ivana. “Para a sintaxe de Grande sertão: veredas – Valores do subjuntivo”. In Guimarães Rosa. Brasília: Quíron, 1975.

4. Artigos em Jornais

Luciana. “João Guimarães Rosa: le sponde dell’allegria”. In: MORINO, Angelo (org.). Terra America. Saggi sulla narrativa latinoamericana. Turim: La Rosa, 1979.

“Corpo de baile: um equívoco literário”. Jornal de Letras, Rio de Janeiro, n. 84, jun. 1956.

STEIN,

Ernildo. “A conversão mitopoética, chave hermenêutica de Grande sertão: veredas”. In Instauração do sentido. Porto Alegre: Movimento, 1977.

AFONSO, Wilson.

“Carta inédita de Guimarães Rosa a Waldemar Reis”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 05.06.1976.

TOLGYESI ,

AGUIAR, Flavio. “Riobaldo e Dia-

Aparecida Mércia Cavana. “O poder da palavra”. In: BERRINI , Beatriz (org.). Convivendo com Guimarães Rosa. São Paulo: Educ/Programa de Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, 2004. Francis. “Glossário”. In GUIMARÃES ROSA, João. Touta-

ADONIAS FILHO.

dorim, os filhos da neblina”. O Estado de S.Paulo, 12.06.1994. ALAMBERT,

Francisco. “Autor realizou a ambição de todo modernista”. O Estado de S.Paulo, 12.06.1994.

UTÉZA,

317

ALBERGARIA ,

Consuelo. “O

24/11/06 – 20h


evangelho de Rosa”. Folha de S.Paulo, 20.11.1987. Ana Maria. “Nós perdizes”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 21.05.1977.

ção”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 22.12.1973.

ALMEIDA ,

Carlos. “Ipoméia na idéia”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

BARCELLOS, ATAÍDE,

Tristão de. “O transcendentalismo de Guimarães Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 30.08.1963.

ALVES ,

AMADO,

Gilberto. “Notas sobre Sagarana”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 05-12.07.1958.

AMADOR, Paulo. “Mergulho na in-

timidade do gênio”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 01.08.1998. ANDRADE,

Carlos Drummond de. “Um chamado João”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006. ANDRADE,

Carlos Drummond de. “Rosa Cordisburgo”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.03.1974.

AUGUSTO ,

Sérgio. “O fluxo desconcertante de Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 13.11.1985.

ÁVILA, Affonso. “A autenticidade em Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 12.01.1957. Republicado em: Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006. BAGNO ,

Marcos. “A terceira margem do Danúbio”. Jornal da Tarde, São Paulo, 20.03.1993.

BANDEIRA,

Manuel. “Grande sertão: veredas”. Folha de S.Paulo, 01.12.2001.

ANDRADE, Euclides M. “Como G. Rosa criou Mecheu”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 08.07.1978.

Danusia. “De ‘equívoco literário’ a clássico da literatura moderna em 25 anos”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 06.06.1981.

ANDRADE ,

Fábio de Souza. “Retrato do Brasil: ficamos bem de Rosa?”. Folha de S.Paulo, 12.03.2005.

BARBOSA, Alaor. “Guimarães Ro-

ASSUNÇÃO,

BARBOSA,

Moacir. “Cordisburgo: ‘tão de repente bonita’”. O Estado de S.Paulo, 25.04.2006.

Tristão de. “Macunaíma e Sagarana: ruptura e tradi-

genética literária”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

BARBARA,

sa, um escritor-repórter”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 01.07.1978. D. Marcos. “Guimarães Rosa, um religioso”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 29.11.1967.

ATAÍDE,

BARCELLOS, Paula. “A aventura da

318

Paula. “A farra dos caderninhos”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

BARCELLOS,

Paula. “Hipertexto de Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 23.10.2004. BARCELLOS,

Paula. “No penúltimo móvel”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

BARCELLOS,

Paula. “A recriação do monstro”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

BARRETO,

Plinio. “Casa onde nasceu Guimarães Rosa vai ser museu”. Estado de Minas, Belo Horizonte, 05.01.1972.

BARROS, André Luiz. “De: João Guimarães Rosa – ‘Tens de ter certeza de que o meu amor por ti é coisa profunda, grande, definitiva, acima de brigas, de caprichos, de idades, de literatura.’ Para: Aracy Moebius de Carvalho”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 20.12.1995. BARROS, André Luiz. “A ‘fortidão’ de Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 14.08.1994. BARROS, Manoel de. “Brincação com palavras”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 19.11.1997. BARTUCCI, Giovanna. “Tramas e desenredos”. Folha de S.Paulo, 21.01.2001. BEZERRA, Elvia. “Ex corde”. O Povo, Fortaleza, 21.07.2006.

24/11/06 – 20h


BIZARRI,

Edoardo. “Guimarães Rosa e Vico: notas sobre uma poética rosiana”. O Estado de S.Paulo, 19.11.1972.

CAMBARÁ,

Isa. “Vilma Guimarães Rosa conta pequenas histórias do pai”. Folha de S.Paulo, 10.12.1983.

CASTRO ,

BORGES,

CAMPOS ,

CAVALCANTE ,

Robinson. “Os cadernos do cônsul Guimarães Rosa”. Valor, São Paulo, 14.01.2002. BORGES, Rogério. “As veredas do mestre Rosa”. O Popular, Goiânia, 11.03.2006. BRAGA ,

C. dos Reis Baeta. “Formação de palavras em G. Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 15.11.1980. BRAGON,

Milton de Godoy. “Guimarães Rosa – Mestre ocultista”. O Estado de S.Paulo, 06.01.1974. Antonio. “Grande sertão: veredas”. Suplemento Literário do Estado de São Paulo, 06.10.1956.

CAVALCANTI, Cláudia. “O fabuloso Manuelzão”. Folha de S.Paulo, 23.07.1992.

CARVALHO,

CAVALCANTI,

Alana Dias. “Uma viagem pelo sertão mineiro”. Folha de S.Paulo, 22.05.2004.

CARVALHO, David de. “Compadre meu Quelemém”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 14.09.1976.

BUENO,

CARVALHO, David de. “O fora e o dentro das coisas em Guimarães Rosa (ou O objetivo e o subjetivo em ‘Sarapalha’)”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 18.10.1975.

Silveira. “O Grande sertão: veredas”. A Gazeta, São Paulo, 07.06.1957.

BUENO,

CAETANO,

Maria do Rosário. “Balada para Rosa”. Correio Braziliense, Brasília, 17.11.1985.

Maria Neuma Barreto. “As idéias estéticas, a poética, os estudos de linguagem”. Jornal da Tarde, São Paulo, 06,01.1996.

CANDIDO,

Ranier. “Guimarães Rosa inspira ‘ópera-teatro’ em Minas”. Folha de S.Paulo, 23.04.2001.

A. Sérgio. “A narrativa como Cosmos: o medo e o amor em Grande sertão: veredas”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 14.02.1976.

Rui. “Rosa 2: em torno a Tutaméia”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 10.11.1968.

Maria Angélica. “Os dez anos da morte de Guimarães Rosa – Do fundo de Minas, a vaga lembrança de seu escritor maior”. O Globo, Rio de Janeiro, 19.11.1977.

Gilberto. “Breve conversa sobre Guimarães Rosa (Entrevista com dona Aracy Moebius de Carvalho)”. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 20.06.1965. CESAR ,

Guilhermino. “No mundo moral de Riobaldo”. Suplemento Literário de Minas Ge ra i s , B e l o Ho r i z o n t e , 21.06.1975. CHAMIE ,

Mário. “Citrodia, Blau e Riobaldo”. Suplemento Literário do Estado de São Paulo, 17.10.1964.

CARVALHO ,

CHIARELLI,

Stefania. “A saudade na obra de Guimarães Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 03.01.2004. COELHO,

CALLADO,

Antonio. “Versos de Guimarães Rosa aguardam resgate”. Folha de S.Paulo, 25.07.1992.

CALMON FILHO,

Milton. “Imperador dos sertões”. O Globo, Rio de Janeiro, 05.01.1996.

José. “Traduzir, verbo intransitivo”. Valor, São Paulo, 16.05.2003.

Nelly Novaes. “A arte narrativa e o espírito lúdico de Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 14.04.1974.

CASTRO,

COLEMAN,

CASTELLO,

Rui. “Rosa 1: garimpando as primeiras estórias”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 10.11.1968. 319

Alexander. “Magnets inside”. The New York Times Review of Books, Nova York, 29.09.1968. 24/11/06 – 20h


COLI,

Jorge e SEEL, Antoine. “Le Brésil de Guimarães Rosa”. Le Monde, Paris, 17.12.1982.

COSTA E SILVA,

COLOMBO,

COSTA LIMA, Luiz. “Rosa: o mal

Lélia Parreira. “Guimarães Rosa na PUC Minas”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006.

é ‘matéria vertente’”. O Estado de S.Paulo, 24.07.1993.

DURÁN,

Sylvia. “Ciclo investiga rastros de Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 15.05.2006.

Alvaro. “Biscoitos e catedrais”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

COURI, CONY,

Carlos Heitor. “Apontamentos para Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 25.02.2005.

CONY,

Carlos Heitor. “Da arte de falar mal”. Folha de S.Paulo, 09.09.2005. CONY,

Carlos Heitor. “Rosa e Machado”. Folha de S.Paulo, 20.05.2006. CORRÊA,

Assis e SABINO, Waldemar. “Juca Bananeira – A memória viva de Guimarães Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 27.11.1971.

CORREA,

Marcos Sá. “Grande sertão do parque é bem menor que o do livro”. O Estado de S.Paulo, 01.06.2006. CORRÊA,

Nereu. “Guimarães Rosa – O homem e o artista”. O Estado de S.Paulo, 31.03.1974. COSTA,

Cristiane. “‘Tudo se finge primeiro: germina autêntico é depois’”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 20.04.1996.

Norma. “Um pouco da cor de Rosa”. Folha de S.Paulo, 03.11.1984.

cova à dúvida: a obra indagadora de Guimarães Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006. COUTO, José Geraldo. “Falta de

acordo atrasa publicação de poemas reunidos em Magma”. Folha de S.Paulo, 15.11.1992. Lenira Marques. “Prefácios travestidos”. O Estado de S.Paulo, 14.06.1969.

Luiz Fernando. “Um museu didático”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 23.03.1974.

FELL, Claude. “João Guimarães

Rosa et l’univers des ‘Hautes plaines’”. Le Monde, Paris, 26.04.1969. FERREIRA ,

Ewaldo Dantas. “Ruínas onde Rosa nasceu”. O Estado de S.Paulo, 22.11.1967.

COVIZZI ,

José Hildebrando. “Grande sertão: veredas ou a apologia do imanente”. Correio do Povo, Porto Alegre, 06.12.1969.

FERREIRA,

Lívia. “Recriação da infância em Miguilim”. O Estado de S.Paulo, 29.06.1968.

DACANAL,

DAMASCENO,

Darcy. “A audaz bandeirante e o grande sertão”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20.10.1968.

tratégia do jogo”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006. COSTA,

DANTAS ,

Francisco. “Guimarães Rosa, o diplomata”. Folha de S.Paulo, 30.08.1987.

Cristina R. “Obra de Guimarães Rosa ganha revival e popularidade”. Jornal da Tarde, São Paulo, 22.10.1996.

EMEDIATO , COUTINHO, Eduardo F. “Da es-

Mary Lou. “Esses Guimarães e sua bicharada mineira”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 14.11.1981.

COSTA, Flávio Moreira da. “A es-

DUARTE,

DANIEL ,

Paulo. “Sagarana emotiva”. O Estado de S.Paulo, 29.06.1968. 320

FINAZZI-AGRÒ, Ettore. “A perfeita imperfeição: transição e permanência em Grande sertão: veredas”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006. FISCHER, Luís Augusto. “Rotei-

ro para Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 19.04.2004 FISCHER, Luís Augusto. “O ser-

tão vai à praia”. Folha de S.Paulo, 05.07.2004. FISCHER, Luís Augusto. “Volume de contos inicia jovens leitores na língua de Guima-

24/11/06 – 20h


rães Rosa”. Folha de S.Paulo, 10.02.2003. FLUSSER, Vilém. “O ‘iapa’ de Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 14.12.1963. FLUSSER, Vilém. “João Guimarães Rosa – O autor e a imortalidade”. O Estado de S.Paulo, 25.11.1967. FONSECA,

Aleilton. “Nhô Guimarães”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

FONSECA,

Aleilton. “Para além do já sabido e registrado”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

FREIXIEIRO ,

Fábio. “Guimarães Rosa em face de conceitos lingüísticos modernos”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 09.11.1968.

GALVÃO,

Walnice Nogueira. “Um dicionário exclusivo para Guimarães Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 04.08.2001.

GALVÃO ,

Walnice Nogueira. “Mínima mímica”. Folha de S.Paulo, 01.10.2000.

GALVÃO ,

Walnice Nogueira. “Os patamares da fabulação“. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006.

GARCIA, Frederick. “Romaria às origens em ‘O Mistério dos MMM’”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 09.07.1975.

GONÇALVES,

Adelto. “Um diálogo entre criador e recriador”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 17.01.2004.

HAAG,

Carlos. “Sagarana traz magia da palavra há 50 anos”. O Estado de S.Paulo, 02.11.1996.

HANSEN, João Adolfo. “Em busGRAIEB,

Carlos. “Livro retoma as veredas do Grande sertão”. O Estado de S.Paulo, 01.02.1996.

ca da língua pré-babélica”. O Estado de S.Paulo, 12.06.1994. HANSEN,

GRAIEB,

Carlos. “Obra-prima é revista por críticos”. O Estado de S.Paulo, 12.06.1994.

GRECCO ,

Sheila. “Alemanha tem cartas inéditas de Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 02.09.2001.

GRECCO, Sheila. “‘Temos de es-

crever para os próximos 600 anos’”. O Estado de S.Paulo, 02.09.2001. GRÜNEWALD,

José Lino. “Rosa da prosa”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 21.11.1967. GUIMARÃES ROSA, Vilma. “O lu-

gar do coração”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 23.03.1976. GUIMARÃES ROSA, Vilma. “A per-

manência eterna”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 19.11.1974. GUIMARÃES ROSA,

Vilma. “Relembramentos de uma antiga vivência”. O Estado de S.Paulo, 20.05.1984. HAAG, Carlos. “Poesia inédita de

Guimarães Rosa vem à luz”. O Estado de S.Paulo, 02.11.1996. HAAG,

Carlos. “Poesias de Guimarães Rosa enfim editadas”. O Estado de S.Paulo, 10.08.1997. 321

João Adolfo. “O sertão de Rosa: uma ficção da linguagem“. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006.

HANSEN,

João Adolfo. “Terceira margem”. Folha de S.Paulo, 20.11.1987.

HIRSZMAN, Maria. “Um olhar contemporâneo sobre Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 21.08.2000. HUAMANY,

Walter. “Manoelzão, 92, personagem de Rosa”. O Globo, Rio de Janeiro, 06.05.1997.

JABOR,

Arnaldo. “Rosa protege a história com suas estórias”. Folha de S.Paulo, 24.11.1992.

JACQUES,

Eunice. “Guimarães Rosa e Curt Meyer-Clason – A fala do grande sertão vertida para o idioma de Goethe”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 06.05.1977. JAFFE, Noemi. “Grande sertão: veredas nunca termina”. Folha de S.Paulo, 15.05.2006. JAFFE, Noemi. “Obra desvenda mistérios do ‘rosês’”. Folha de S.Paulo, 07.07.2001. JAFFE,

Noemi. “Vida e morte 24/11/06 – 20h


em Grande sertão”. Folha de S.Paulo, 19.03.2006. JOSEF, Bella. “Guimarães Rosa e a literatura hispano-americana”. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 03-10.12.1967. JOSEF,

Bella. “Nos 15 anos de sua morte, o fenômeno Guimarães Rosa”. O Globo, Rio de Janeiro, 18.11.1982.

“Guimarães Rosa”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 06.01.1968.

MACIEL, Pedro. “‘As veredas estão

LINS,

MADEIRA FILHO,

Álvaro. “Uma grande estréia”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 12.04.1946. Republicado em COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983. LLOSA, Mario Vargas. “Epopéia

JOSEF,

Bella. “Vilma Guimarães Rosa – Relembramentos de uma antiga vivência”. O Estado de S.Paulo, 20.05.1984.

do sertão, torre de babel ou manual de satanismo?”. Folha de S.Paulo, 30.03.1991. LORENZ,

KAPLAN, Sheila. “Vilma Guimarães Rosa lança ensaio biográfico sobre o João-papai”. O Globo, Rio de Janeiro, 15.12.1983. LAET, Carlos R. M de. “Há títu-

los e brasões também no mundo dos bichanos”. Última Hora. Rio de Janeiro, 12.06.19[?]. LAMEGO, Valéria. “À margem, de Guimarães Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 12.05.2000. LAURIA, Márcio José. “A respei-

to de ‘Um moço muito branco’”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 12.02.1977. Pierre. “L’épopée de João Guimarães Rosa”. Le Monde, Paris, 08.02.1991.

Günter. “Literatura deve ser vida”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.03.1974.

LOURENÇO, Eduardo. “Os sertões de Portugal”. Folha de S.Paulo, 30.06.1996. MACHADO, Ana Maria. “Guimarães Rosa? Muito prazer”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, sd. MACHADO ,

Cassiano Elek. “Evento homenageia Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 08.07.2004.

MACHADO ,

Cassiano Elek. “Primeiríssimas estórias”. Folha de S.Paulo, 10.07.2004.

LEPAGE,

LIBERATI,

Bruno. “As chaves do matagal indevassável”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 19.11.1997.

LIMA ,

Everaldo Dayrell de.

MACHADO,

Cassiano Elek. “Sai livro de cartas de Rosa a seu tradutor”. Folha de S.Paulo, 22.11.2003.

desaparecendo’”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.1995. Wilson. “Um romance polêmico desde o seu lançamento, em 1956”. O Globo, Rio de Janeiro, 28.11.1996.

MARTINS,

Alexandre. “História do vovô contando estórias”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 17.01.2004.

MARTINS,

Alexandre. “Na pele de Miguilim”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 24.02.2004.

MARTINS,

Heitor. “As chaves de G. Rosa”. Suplemento Literário do Estado de S. Paulo, 30.12.1973. MARTINS,

Heitor. “No Urubuquaquá, em Colônia”. O Estado de S.Paulo, 06.06.1968.

MARTINS ,

Heitor. “Nonada”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 25.09.1976. MARTINS ,

Nilce Sant’Anna. “Ave, beleza”. Jornal da Tarde, São Paulo, 20.01.1996.

MARTINS ,

Nilce Sant’Anna. “Difícil, mas fascinante”. Correio Braziliense, Brasília, 14.03.2001. MARTINS, Wilson.

“A caminhada do Viator”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

MACIEL, Luiz Carlos “Guimarães

Rosa: a realidade fugidia”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 30.08.1975. 322

MARTINS,

Wilson. “Gênio e talento”. O Estado de S.Paulo, 21.02.1970. 24/11/06 – 20h


MARTINS,

Wilson. “Literaturnost”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 13.01.1968.

MEDEIROS,

Paula. “No tempo dos Gerais”. Folha de S.Paulo, 27.03.2004.

MONTELEONE,

Joana. “Guimarães Rosa, do fruto à semente”. Gazeta Mercantil, São Paulo, 08.08.1997.

MEGALE, Heitor. “Francês vê taMARTINS,

Wilson. “Releituras rosianas”. O Estado de S.Paulo, 27.05.2006.

rô no Grande sertão: veredas”. O Estado de S.Paulo, 11.03.1995. MELLO,

MARTINS COSTA,

Ana Luiza. “As cadernetas do viajante João Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, nov. 1996.

MARTINS COSTA,

Ana Luiza. “Poty, parceiro de Rosa”. Livros, Porto Alegre, n. 7, outdez. 1998.

MARTINS COSTA,

Ana Luiza. “Sagarana”. Livros, Porto Alegre, n. 4, 1996. MATTOS,

Carlos Alberto de. “Um encontro comovente”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 09.02.1994.

MAUAD,

Isabel Cristina. “Nova Fronteira reedita obras de Guimarães Rosa”. O Globo, Rio de Janeiro, 05.09.1992. Isabel Cristina. “O velho debate dos contos inéditos”. O Globo, Rio de Janeiro, 19.11.1992.

Alessandra. “O diário misterioso”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 13.03.2001. MELO,

Oswaldo A. de. “O aspecto fônico em orientação de G. Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 27.06.1974.

MENEZES ,

Cynara. “Suor e imagens de Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 14.06.2099.

MEYER-CLASON,

Curt. “Guimarães Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.11.1968.

MILLIET,

Sérgio. “Sagarana”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 22.12.1951. MIRANDA,

Wander Melo. “O sertão em forma de hipertexto”. Folha de S.Paulo, 03.10.2004.

MAUAD,

MEDEIROS, Alexandre. “Cartas a um contista da província”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 19.11.1997.

Jotabê. “Loucos por Rosa refazem imagem do sertão”. O Estado de S.Paulo, 14.12.1995.

MOISÉS , Massaud. “Grande sertão: veredas, o enigma do título”. O Estado de S.Paulo, 12.12.1987.

Joana. “O ano Guimarães Rosa – A magia com as palavras”. Jornal da Tarde, São Paulo, 06.01.1996.

MONTELEONE, Joana. “Lição de

idiomas, nas margens de uma correspondência”. Jornal da Tarde, São Paulo, 18.05.1996. MONTELLO,

Josué. “Tendências atuais da prosa brasileira”. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 06.12.1962.

MORAIS,

Márcia Marques de. “Traições e ‘traição’: reticências no Grande sertão: veredas”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006. MORENO,

Leila Kiyomura. “O avô Joãozinho era assim. Afetuoso e criativo”. Jornal da USP, São Paulo, 15-21.12.2003. MORENO ,

Leila Kiyomura. “Uma nova trilha para encontrar João”. Jornal da USP, São Paulo, 12-18.05.2003. MOTTA,

Dantas. “Guimarães Rosa, o diabo e o sertão”. O Estado de S.Paulo, 29.06.1968.

MOURÃO, Gerardo Mello. “Dez

anos de Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 19.11.1977.

MONTELEONE,

MEDEIROS ,

Joana. “Diários do mundo antigo”. Jornal da Tarde, São Paulo, 20.04.1996.

MOUTINHO,

Nogueira. “João Guimarães Rosa: travessia literária”. Folha de S.Paulo, 08.12.1968.

MONTELEONE,

323

MUSSA,

Alberto. “1956: o ano da literatura brasileira”. Jornal 24/11/06 – 20h


do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006. NAME, Daniela. “O Globo revela inéditos de Magma, livro de Guimarães Rosa lançado 61 anos depois”. O Globo, Rio de Janeiro, 13.07.1997. NASCIMENTO,

Evando. “Travessia por redes de sentido”. Folha de S.Paulo, 20.06.2004.

NICOLAU,

Roselena. “Manuelzão em suas próprias veredas”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 03.09.2001.

OLIVEIRA,

Aderson Graciano de. “O modernismo do autor de Grande sertão: veredas”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.11.1968. OLIVEIRA,

Franklin de. “Corpo de baile, de João Guimarães Rosa”. Jornal de Letras, Rio de Janeiro, n. 83, maio 1956. OLIVEIRA,

Franklin de. “O sertão, o menino e as canções”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 17.11.1968.

terário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006. PEN, Marcelo. “Cartas são exege-

se da obra de Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 24.05.2003. PEN,

Marcelo. “Faceta doméstica e perfil psicológico são revelados em cartas de Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 05.04.2003. PEREIRA,

Adilson. “Na trilha de Guimarães Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 13.12.2000.

André. “Pesquisa revê diário de Guimarães Rosa no 3º Reich”. Jornal da Tarde, São Paulo, 13.03.2001.

OLIVEIRA, Roberta. “Mineiros discutem o mundo masculino a partir de texto de Guimarães Rosa”. O Globo, Rio de Janeiro, 23.03.1999.

Renata. “A vida ‘raiando numa verdade extraordinária’”. Jornal do Commercio, Recife, 30.07.2005.

NOVIS,

ORICCHIO,

PINHEIRO,

NIGRI,

Vera. “Depositário de revelações”. Folha de S.Paulo, 20.08.1988. Vera. “Iniciação a Tutaméia”. Folha de S.Paulo, 20.11.1987.

Luiz Zanin. “‘Matraga’ é a melhor adaptação para o cinema”. O Estado de S.Paulo, 12.06.1994.

NOVIS,

NUNES, Benedito. “A Rosa o que é de Rosa”. O Estado de S.Paulo, 22.03.1969. NUNES,

Benedito. “Ensaio revela lado esotérico de Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 03.09.1994. NUNES,

Benedito. “Guimarães Rosa em novembro”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.11.1968.

NUNES,

Benedito. “Interpretação de Tutaméia”. O Estado de S.Paulo, 02.09.1967.

PIMENTEL ,

Amilton. “Retorno ao universo de Guimarães”. Valor, São Paulo, 28.05.2004. PIZA ,

OTTE,

Georg. “O ‘Diário de guerra’ de João Guimarães Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006. Fernando. “Anotações de Rosa são estudadas”. O Estado de S.Paulo, 27.02.1995.

Daniel. “A língua do Rosa”. O Estado de S.Paulo, 09.05.2004.

PÓLVORA , Hélio. “Duas ‘estórias’ de Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 07.01.1970.

PACHI,

Mário. “Evocação de Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 30.11.1968. Republicado na revista Extensão. Belo Horizonte, v. 3, set. 1993.

PÓLVORA,

Hélio. “Infância de Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 03.05.1972.

PALMÉRIO,

PASSOS, Cleusa Rios Pinheiro. “As voltas do contar Grande sertão: veredas”. Suplemento Li-

324

PÓLVORA,

Hélio. “Sagarana, a criação total de um alquimista”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 07.09.1974. PONTES,

Hugo. “A simbologia da iniciação maçônica em ‘O recado do morro’”. Suplemento 24/11/06 – 20h


Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 02.05.1987. PORTUGAL,

Henrique Furtado. “‘Um equívoco de Guimarães Rosa’”. O Estado de S.Paulo, 09.06.1982. RAMOS,

Graciliano. “Conversa de bastidores”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 20.04.1996.

RAMOS, Maria Luiza. “O mundo

mítico do sertão de Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 09.10.1971. RANGEL, Vivian. “‘Quase lugar,

e de repente tão bonito’”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006. RANGEL,

Vivian. “Reedições e inéditos na comemoração”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

RESENDE ,

Otto Lara. “Depoimento sobre João Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 24.11.1991. RESENDE,

Otto Lara. “Levava pela mão um balão de criança”. Folha de S.Paulo, 24.11.1991.

RIBEIRO,

Leo Gilson. “Guimarães Rosa – Novas luzes sobre um fascinante enigma”. Jornal da Tarde, São Paulo, 06.10.1984.

RÓNAI, Paulo. “Guimarães Rosa

RIBEIRO,

não parou”. O Estado de S.Paulo, 03.01.1970.

Leo Gilson. “Tradução italiana é a melhor”. O Estado de S.Paulo, 12.06.1994. RICCA , Regina. “Guimarães Rosa, redescoberto. Em cartas e anotações”. Jornal da Tarde, São Paulo, 27.09.1985. RIEDEL, Dirce Côrtes. “De cha-

péu e de bengala”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 21.12.1974. RIEDEL, Dirce Côrtes. “A verda-

de poética e a essência do pecado”. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 02-03.05.1964. ROCHA,

João Cezar de Castro. “No redemoinho da narrativa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

mento Literário do Estado de São Paulo, 10.10.1971.

RÓNAI,

Paulo. “Uma mensagem para cada leitor”. Suplemento Literário do Estado de São Paulo, 27.06.1971. RÓNAI, Paulo. “Presença de Gui-

marães Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 16.11.1968. RÓNAI,

Paulo. “O segredo de João Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 10.06.1956.

RONCARI, Luiz. “Lugar do sertão”.

Folha de S.Paulo, 16.12.1984. ROSENFIELD,

Kathrin Holzenmayr. “Grande sertão: veredas, Magma e matéria vertente”. Folha de S.Paulo, 16.12.1989.

Gabriela. “Recados do vovô Joãozinho”. Folha de S.Paulo, 06.12.2003.

Kathrin Holzenmayr. “O lugar de Grande sertão: veredas na literatura brasileira”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006.

ROMEU, Gabriela e RIBEIRO, Al-

ROSENFIELD,

ROMEU,

Gabriela. “Palavras no ar”. Folha de S.Paulo, 22.04.2006.

ROMEU,

ROSENFIELD,

RESENDE,

Otto Lara. “Língua legal”. O Globo, Rio de Janeiro, 02.08.1981.

da. “Viaje na pena de Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 25.06.2001.

Kathrin Holzenmayr. “Todos são errantes no Grande sertão”. O Estado de S.Paulo, 12.06.1994.

RESENDE,

RÓNAI,

ROSSI, Alcina de Melo. “A mor-

Otto Lara. “Médico, na verdade escritor”. Folha de S.Paulo, 18.10.1992. RIBEIRO, Débora. “Grande sertão: veredas terá edição crítica”. O Estado de S.Paulo, 12.07.1990.

Paulo. “Duas traduções de Grande sertão: veredas (francesa e alemã)”. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 19.09.1965. Paulo. “Guimarães Rosa e seus tradutores”. Suple-

fologia dos contos ‘Sarapalha’, ‘Conversa de bois’ e ‘A hora e vez de Augusto Matraga’”. O Popular, Goiânia, 05.09.1976.

RÓNAI,

325

RUFFATO,

Luiz. “As veredas de 24/11/06 – 20h


Sagarana”. Jornal da USP, São Paulo, 04-10.08.2003.

SCHMIDT,

Augusto Frederico. “Sagarana”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 04.05.1961.

dias: 22 mil exemplares”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 02.07.1983.

SCHWARTZ,

SEM ASSINATURA.

SABÓIA, Napoleão. “Grande ser-

tão: veredas está de volta a Paris”. Jornal da Tarde, São Paulo, 02.03.1991.

Adriano. “Veredas de Deus”. Folha de S.Paulo, 30.06.1996.

SANT ’ANNA, Affonso Romano de. “Guimarães Rosa, escritor em construção”. O Globo, Rio de Janeiro, 25.09.1994.

SECCO, Carmen. “Nietzsche e o processo do conhecimento em GSV”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 05.01.1980.

SANTOS,

Joaquim Ferreira dos. “Guimarães Rosa segundo os ‘relembramentos’ da filha Vilma”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 05.12.1983.

SEM ASSINATURA. “Caminhos do

sertão grande”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006. SEM ASSINATURA.

SANTOS,

Livia Ferreira. “De Mário de Andrade a G. Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 19.05.1979.

SANTOS,

Valmir. “Guimarães Rosa recebe nova adaptação”. Folha de S.Paulo, 02.02.2002.

“As cartas de um escritor com pressa de ficar rico”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 28.12.1977. SEM ASSINATURA.

“Colaboração com tradutor quase chegava à parceria”. O Estado de S.Paulo, 02.09.2001. SEM ASSINATURA.

SARAIVA, Arnaldo. “João”. Diário

de Notícias, Lisboa, 30.11.1967. SCARPELLI, Marli Fantini. “Apre-

sentação”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006. Léo. “As veredas de Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 03.09.1994.

“Curt Meyer-Clason, tradutor sem traição”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.11.1968.

SEM ASSINATURA.

“O diabo nas veredas do sertão”. Folha de S.Paulo, 24.02.1970.

saga de Rosa”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 18.01.1952. Republicada em: Diálogo. São Paulo, n. 8, nov. 1957.

SEM ASSINATURA.

“Guimarães Rosa estréia hoje no teatro”. Folha de S.Paulo, 05.09.1969. SEM ASSINATURA.

“Guimarães Rosa faleceu domingo”. O Estado de S.Paulo, 21.11.1967. SEM ASSINATURA.

“Guimarães Rosa ganha a edição que merece”. Jornal da Tarde, São Paulo, 03.09.1994. SEM ASSINATURA.

“O homem João Guimarães Rosa segundo Renard Perez”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 19.11.1967.

SEM ASSINATURA.

“Inéditos de um Guimarães Rosa aprendiz”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 15.11.1992. SEM ASSINATURA.

“João Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 19.11.1969. SEM ASSINATURA.

SCHLAFMAN,

SCHMIDT, Augusto Frederico. “A

“Guimarães Rosa, brinde indispensável da LPM”. Correio Braziliense, Brasília, 18.12.1983.

SEM ASSINATURA.

“O fascínio do mestre entre as veredas de Rosa”. Folha de S.Paulo, 05.09.1987. SEM ASSINATURA. “Grande Sertão em 27 anos: 90 mil exemplares. Grande Sertão em 20

326

“Lembranças de Guimarães Rosa em novo pouso”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 07.02.1984.

SEM ASSINATURA. “Mesa-redonda – A obra de João Guimarães Rosa”. Folha da Noite, São Paulo, 14.09.1956.

24/11/06 – 20h


SEM ASSINATURA.

“As múltiplas facetas na academia”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

SEM ASSINATURA.

“Museu reúne tudo da vida e da obra de Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 31.03.1974.

SEM ASSINATURA.

“Notícias do Gran sertón”. Folha de S.Paulo, 05.04.2003.

SEM ASSINATURA.

“Um ‘novo’ livro de Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 30.12.1983.

SEM ASSINATURA.

“Pesquisadores revisitam sertão de Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 08.08.1989. SEM ASSINATURA .

“Poeta do Rio G. do Norte preparou um glossário do dialeto de Guimarães Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 19.11.1967 SEM ASSINATURA.

“Um retrato de João Guimarães Rosa”. Correio do Livro, São Paulo, jul. 1968. “Sepultado Guimarães Rosa no mausoléu da Academia”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 21.11.1967.

SEM ASSINATURA. “Veredas de Ro-

sa”. Folha de S.Paulo, 15.11.1992. SEM ASSINATURA.

“+ Personagem”. Folha de S.Paulo, 16.09. 2001. SILVA,

E. da. E. “Foi assim que vi nascer o Grande sertão: veredas”. Estado de Minas, Belo Horizonte, nov. 1967. SILVA,

Fernando de Barros e. “Romance recria a tradição oral do sertão”. Folha de S.Paulo, 08.08.1989.

ficção em João Guimarães Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006. STRAUCH, Eliezer. “Israel homenageia hoje com nome de bosque casal Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 29.04.1985. SUASSUNA,

Ariano. “O Grande sertão e o romanceiro”. Folha de S.Paulo, 15.01.2001. SUASSUNA, Ariano. “O Grande sertão e sua demanda”. Folha de S.Paulo, 08.01.2001.

SILVA, Gutemberg da Mota e. “Grande sertão: veredas, 25 anos depois”. O Estado de S.Paulo, 24.05.1981.

Ariano. “João Guimarães Rosa e Homero”. Folha de S.Paulo, 01.01.2001.

SILVA,

SUASSUNA, Ariano. “Rosa e a li-

Gutemberg da Mota e. “Guimarães Rosa – ‘Meu alcorão é o dinheiro’”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 28.12.1977.

SUASSUNA,

teratura brasileira”. Folha de S.Paulo, 12.02.2001. SUKMAN, Hugo. “Um ‘trem’ as-

SILVEIRA, Alcantara. “Pai e filha de mãos dadas”. Jornal da Tarde, São Paulo, 08.12.1968.

sim”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 07.01.1994. SZKLO, Gilda Salem. “GSV, o li-

SIMÕES,

Eduardo. “Grande sertão tem edição de luxo”. Folha de S.Paulo, 16.02.2006.

vro da saudade”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 06.01.1979.

SPERBER,

TABUCCHI,

SEM ASSINATURA.

Suzi Frankl. “O lírico na narrativa de João Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 31.12.1988.

SEM ASSINATURA. “O super-realismo de Guimarães Rosa”. Jornal da USP, São Paulo, 1521.05.2006.

STARLING, Heloisa Maria Murgel. “Caminho torto”. Folha de S.Paulo, 14.04.2001.

SEM ASSINATURA. “Veredas...” O

STARLING,

Estado de S.Paulo, 20.11.1967.

Heloisa Maria Murgel. “Travessias: sobre história e 327

Antonio. “O olhar insondável”. Folha de S.Paulo, 30.06.1996. TASSINI, Raul. “Rosa – O imortal Guimarães”. Estado de Minas, Belo Horizonte, 03.12.1967. TEIXEIRA, Ivan. “A arte de reelaborar a tradição”. Jornal da Tarde, São Paulo, 03.09.1994.

24/11/06 – 20h


TEIXEIRA, Ivan. “Astros e índices

em João Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 23.12.1995.

VÁRIOS AUTORES.

“O processo Guimarães Rosa”. Jornal de Letras, Rio de Janeiro, n. 87, set. 1956.

TEIXEIRA, Ivan. “O enigma das

Primeiras estórias rosianas”. Jornal da Tarde, São Paulo, 03.09.1994. Ivan. “Grande sertão impõe teoria do mundo pela ficção”. O Estado de S.Paulo, 04.06.2000.

Minas, onde o sertão acaba”. Estado de Minas, Belo Horizonte, 09.01.1985. WALTY,

VARTUCK, Pola. “Uma divertida incursão no mundo de Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 28.06.1975.

Ivete. “O estudo da ambigüidade em quatro contos de G. Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 11.08.1979.

VASCONCELOS,

WERNECK,

TEIXEIRA,

TEIXEIRA ,

Ivan. “Guimarães Rosa – Análise pioneira das primeiríssimas histórias de cem mil réis”. O Estado de S.Paulo, 26.09.1992.

TEIXEIRA, Ivan. “Para melhor entender Rosa”. O Estado de S.Paulo, 18.06.2006. TORERO, José Roberto. “Grande final: veredas”. Folha de S.Paulo, 14.01.2003.

Sandra Guardini Teixeira. “Rosa a contrapelo“. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, maio 2006.

WERNECK, Antônio. “Nas vereVERLANGIERI, Iná Valéria Rodrigues. “A desmontagem literária de Rosa”. Jornal da Tarde, São Paulo, 18.05.1996. VERSIANI,

Ivana. “Derivados regressivos em GSV”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 0916.10.1971.

VERSIANI, VAL, Maria da Graça. “Antiperipléia, uma estória habitual no diferente”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 09.08.1975. VALE,

Israel do. “Bial mostra o sertão de Guimarães Rosa”. O Estado de S.Paulo, 30.11.1997.

VALERIANO,

Jane Alves. “‘O recado do morro’, uma perspectiva mítica”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 16.04.1988. VAQUEIRO MARIANO.

“O personagem fala sobre o autor (entrevista)”. Flan, Rio de Janeiro, s.d.

Alexandre. “A câmera e o demoramento”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18.02.2006.

Ivana. “Eu Militão, ele guerreiro”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 15.01.1972.

VERSIANI,

Ivana. “Itinerário de Riobaldo Tatarana”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 17.07.1976.

VIANNA, Luiz Fernando. “Abertura da Flip destaca sonoridade de Guimarães Rosa”. Folha de S.Paulo, 07.07.2004. VIANNA,

Luiz Fernando. “Vilma Guimarães Rosa relança seus Relembramentos”. O Globo, Rio de Janeiro, 27.08.1994.

VIGGIANO,

Alan. “Paredão de 328

das deste sertão”. O Globo, Rio de Janeiro, 28.11.1996. WERNECK,

Humberto. “Dona Chiquita: as primeiras estórias de Guimarães Rosa”. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, 23.11.1968.

WERNECK,

Humberto. “Os tesouros de Guimarães Rosa”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26.06.1990.

ZAMITH,

Fernando. “Riobaldo Tatarana: veredas”. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 05.03.1983.

5. Textos em revistas ADRIANO, Carlos. “A angústia das inadaptações”. Cult. São Paulo, n. 4, 2001. AGUIAR,

Flávio. “Veredas comuns”. Bravo!. São Paulo, jun. 2001. 24/11/06 – 20h


AMÂNCIO,

Moacir. “O desafio de Guimarães Rosa”. Cult. São Paulo, maio 2006.

xos do assombro”. Veja. São Paulo, 14.05.1986. CORREIA FILHO ,

ARRIGUCCI JR.,

Davi. “Guimarães Rosa”. Leia Livros. São Paulo, v. 10, n. 109, nov. 1987.

João. “Remembranças de seu Zito”. Cult. São Paulo, n. 4, 2001. ELIAS ,

BARROS,

André Luiz. “Memória de um ativista”. República. São Paulo, set. 1997. BRAGA ,

Rubem. “Guimarães Rosa, vaqueiro”. Manchete. Rio de Janeiro, 14.11.1953.

BUTCHER,

Pedro. “Guimarães Rosa segundo um amador”. Bravo!. São Paulo, jun. 1999.

CALDEIRA,

Jorge. “Veredas vocais”. Bravo!. São Paulo, dez. 1997.

CALLADO,

Antonio. “Guimarães Rosa, o épico do grande sertão”. Visão. Rio de Janeiro, n. 2, 1966.

CARNEIRO,

Glauco. “A hora e a vez dos Guimarães Rosa”. O Cruzeiro. Rio de Janeiro, 25.11.1967.

CASTELLO,

José. “As aldeias resistentes”. Bravo!. São Paulo, jun. 2001.

CASTRO,

Vander de. “Guimarães Rosa fala aos jovens”. O Cruzeiro. Rio de Janeiro, 23.12.1967. Claudio. “Travessia sertaneja”. Globo Rural. São Paulo, dez 2000.

Maria Cristina. “Os não-lugares de Rosa”. Cult, São Paulo, n. 4, 2001. FORTES, Luiz Roberto Salinas. “E o sertão ficou ainda maior”. Veja. São Paulo, 22.04.1981. FORTUNA,

Felipe. “Armadilha de Rosa”. Época. São Paulo, 26.11.2004. GONÇALVES FILHO,

Antonio. “Rosa na lista dos 100”. Época. São Paulo, 13.05.2002.

LEITE,

Ascendino. “A seta e o alvo”. Leitura. Rio de Janeiro, ano 16, n. 7, jan. 1958.

Mario Sergio. “Refle-

marães Rosa segundo terceiros”. Realidade. São Paulo, jul. 1967. PORZIO,

Domenico. “Fuga con nostalgia”. Panorama. Roma, 03.09.1984. PRADO,

Ricardo. “O escritor e o vaqueiro”. Nova Escola. São Paulo, n. 145, set 2001. RIBEIRO ,

Leo Gilson. “Rosa analisado”. Veja. São Paulo, 22.11.1972.

RIBEIRO ,

Leo Gilson. “Rosa traduzido”. Veja. São Paulo, 22.11.1972.

RIEDEL ,

Dirce Côrtes. “As meias-verdades em Guimarães Rosa”. Cultura. Brasília, n. 17, 1975. RODRIGUES,

LUCAS,

Fábio. “Rosa imortal”. Veja. São Paulo, 23.11.1977. MARTINS,

Wilson. “Poeta morto jovem”. República. São Paulo, set. 1997. MOURA, Flávio. “Nonada e outras invenções”. Veja. São Paulo, 06.06.2001. PACHECO,

Ana Paula. “História, psique e metalinguagem em Guimarães Rosa”. Cult. São Paulo, n. 4, 2001.

CERRI,

CONTI,

PEREIRA, Otoniel Santos. “Gui-

Cleusa Rios Pinheiro. “Desenredos em Guimarães Rosa”. Cult. São Paulo, n. 4, 2001.

Ricardo. “Viagens imaginárias – O sertão e as veredas de Guimarães Rosa”. Manchete. Rio de Janeiro, 20.07.1991. SEM ASSINATURA. “As cores do grande sertão”. Veja. São Paulo, 05.11.1969. SEM ASSINATURA.

“Entrevista: Riobaldo Tatarana”. Veja. São Paulo, 24.05.2000. SEM ASSINATURA. “Guimarães Rosa final”. Veja. São Paulo, 24.12.1969.

PASSOS,

329

SEM ASSINATURA.

“An immortal’s parting reverie”. Time. Nova York, 04.10.1968. 24/11/06 – 20h


da filha: sexualidade, identidade e o ato de narrar em Grande sertão: veredas”. Luso-brazilian Review. Madison, v. 42, n. 2, 2005.

SEM ASSINATURA. “Inuticências”.

Veja. São Paulo, 03.05.1972. SEM ASSINATURA.

“O mundo, seu campo geral”. Veja. São Paulo, 05.03.1969.

SEM ASSINATURA. “Na selva de Ro-

sa”. Veja. São Paulo, 25.03.1970. SEM ASSINATURA.

“Rosa, imagens do sertão”. Veja. São Paulo, 25.06.1969. SEM ASSINATURA .

“Sagarana: 25 anos”. Veja. São Paulo, 13.10.1971.

SEM ASSINATURA.

“Vaqueiro de Roma”. Veja. São Paulo, 17.02.1971.

SILVA,

Álvares da. “Com o vaqueiro Guimarães Rosa: um escritor entre seus personagens”. O Cruzeiro. Rio de Janeiro, n. 35, 21.06.1952.

ARAÚJO,

6. Textos em periódicos acadêmicos e revistas literárias AGUIAR, Flávio. “As imagens fe-

mininas na visão de Riobaldo”. Scripta. Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998. AGUIAR,

Flávio. “O pacto e o pacto letrado”. Organon. Porto Alegre, v. 6, n. 19, 1992.

ALMEIDA, Ana Maria. “As bordaturas do texto”. Quadrant. Revista do Centre de Recherche en Littérature de Langue Portugaise da Université PaulValéry. Montpellier, n. 5, 1988. AMODEO,

STERZI,

Eduardo. “Reinvenção da língua e do destino”. Superinteressante. São Paulo, set. 2001.

TOLEDO,

Roberto Pompeu de. “O grande livro faz 50 anos”. Veja. São Paulo, 20.12.1995. VÁRIOS AUTORES. “Escritores que não conseguem ler Grande sertão: veredas”. Leitura. Rio de Janeiro, ano 17, n. 16, out. 1958 VITRAL,

Luiz Fernando. “Guimarães Rosa”. Revista Fapesp. São Paulo, n. 69, out. 2001.

Paulo Roberto Monteiro de. “Guimarães Rosa: o feminino ocultado”. Todas as Letras. São Paulo, ano 7, n. 7, 2005.

Maria Tereza. “O jagunço na leitura televisiva de Grande sertão: veredas”. Letras de Hoje. Porto Alegre, v. 37, n. 2, 2002.

ANDRADE,

Álvaro Martins. “O espelho de Guimarães Rosa”. Revista de Letras. Assis, n. 14, 1972. ANDRADE ,

Ana Luíza Britto Cesar de. “The carnivalization of the holy sinner: Thomas Mann and Guimarães Rosa”. Latin American Literary Review. Pittsburgh, v. 14, n. 27, jan-jun. 1986.

ARMSTRONG,

Piers. “Guimarães Rosa in translation: scrittore, editore, traduttore, traditore”. Luso-Brazilian Review. Madison, v. 38, n. 1, 2001.

ARRIGUCCI JR.,

Davi. “O mundo misturado – Romance e experiência em Guimarães Rosa”. Novos Estudos. São Paulo, n. 40, nov. 1994.

AVELAR,

Idelber. “Os paradoxos do vazio e da ausência em Grande sertão: veredas”. Brasil/Brazil: Revista de Literatura Brasileira. Porto Alegre, v. 11, n. 7, 1994. BAGGIO,

Marco Aurélio. “Apego e loucura em João Guimarães Rosa”. Revista Extensão. Belo Horizonte, v. 3, set. 1993.

BAGGIO,

Ma r c o Au r é l i o. “Constituição da identidade de Riobaldo”. Revista Extensão. Belo Horizonte, v. 6, n. 2, ago. 1996. BAGGIO,

Marco Aurélio. “Dãodalalão”. Revista Reverso. Belo Horizonte, n. 27, dez. 1987.

BALTAR,

ANITAGRACE,

Joyce. “O nome 330

Alda. “Analyse des lettres échangées entre G. Rosa et 24/11/06 – 20h


son traducteur sur la traduction française de Grande sertão: veredas”. Elos. Rio de Janeiro, n. 1, 1979. BARROS,

Diana Luz Pessoa de. “O dizer-verdadeiro”. Ilha do Desterro. Florianópolis, n. 18, 1987. Washington. “Los ‘zoos’ de Guimarães Rosa”. Travessia. Florianópolis, n. 8, 1985.

BOLOGNESI,

Mario Fernando. “Vida e teatro em G. Rosa: Grande sertão: veredas e ‘Pirlimpsiquice’”. Transformação: Revista de Filosofia. Assis, v. 8, 1985.

BRAIT,

Beth. “Scripta – Guimarães Rosa”. Revista da Anpoll. São Paulo, v. 8, n. 1, 2000.

BENAVIDES,

BIANCHI,

Soledad. “Grande sertão: veredas, en Chile: recepción, grado cero (una crónica)”. Acta Literaria. Concepción, n. 30, 2005. BOLLE, Willi. “Grande sertão: cidades”. Revista USP. São Paulo, n. 24, dez. 1994-fev. 1995. BOLLE,

Willi. “Guimarães Rosa: leitor de Euclides da Cunha”. Brasil/Brazil: Revista de Literatura Brasileira. Porto Alegre, v. 11, n. 20, 1998. BOLLE ,

Willi. “O pacto no Grande sertão – Esoterismo ou lei fundadora?” Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998. BOLLE,

Willi. “O sertão como forma de pensamento”. Scripta. Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998. Willi. “Zur Vermittlung von Stadt- und SertãoKultur im Werk von Guimarães Rosa”. Wissenschaftliche Zeitschrift der Humboldt. Berlim, v. 39, n. 5, 1990.

BUENO, Raquel Illescas. “Urutú-branco e o leproso: corpo e culpa em uma vereda do Grande sertão”. Revista Letras. Curitiba, n. 49, 1998. BURIANOVÁ, Zuzana. “Do tem-

po na narrativa ao tempo em Primeiras estórias”. Philologica. Praga, n. 74, 1999. CAMACHO,

Fernando. “Entrevista com Guimarães Rosa”. Humboldt. Munique, v. 18, n. 37, 1978.

CAMPOS, Augusto de. “Um lan-

ce de ‘dês’ do Grande sertão”. Revista do Livro. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, ano IV, n. 16, 1959. CAMPOS,

Maria do Carmo Alves de. “A festa da nomeação em Grande sertão: veredas”. Taira. Grenoble, n. 1, 1989.

CANDIDO,

Antonio. “O sertão e o mundo”. Diálogo. São Paulo, n. 8, 1957.

BOLLE ,

Maurício. “‘O recado do morro’, de João Guimarães Rosa”. Revista do Livro. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, n. 25, 1964.

CASTRO ,

E. M. de Melo e. “Poesia/transpoesia/repoesia”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998.

CAVALCANTE , Maria Neuma Barreto. “Cadernetas de viagem: os caminhos da poesia”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996. CEZAR ,

Adelaide Caramuru. “Quando o familiar se torna estranho: uma leitura de ‘A terceira margem do rio’, de João Guimarães Rosa”. Boletim – Centro de Letras e Ciências Humanas. Londrina, n. 44, 2003.

CEZAR,

Adelaide Caramuru e Paula. “Rememoração em ‘Uai, eu?’, de João Guimarães Rosa”. Boletim – Centro de Letras e Ciências Humanas. Londrina, n. 47, 2004. PASSARELLI,

CHIAPPINI,

Lígia. “Grande sertão: veredas – A metanarrativa como necessidade diferenciada”. Scripta. Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998.

CIRURGIÃO, Antônio. “Seqüência de Guimarães Rosa, ou o jogo do amor e do azar”. LusoBrazilian Review. Madison, v. 23, n. 1, 1986. CIRURGIÃO, Antônio. “Simbolismo religioso em ‘Dãodalalão’”. Ocidente. Lisboa, v. 84, n. 422, 1973.

CAPOVILLA,

331

CIRURGIÃO, Antônio. “Um tex-

to sem decifração”. Arquivos do Centro Cultural Português. Paris, ano 21, 1985. 24/11/06 – 20h


COELHO, Marco Antônio Tava-

res. “As diversas vidas de Zé Bebelo”. Estudos Avançados. São Paulo, v. 17, n. 49, 2003. Irlemar Chiampi. “Narración y metalenguaje en Grande sertão: veredas”. Revista Ibero-Americana. Pittsburgh, n. 43, 1977.

DANIEL,

Mary Lou. “Berdyaev and G. Rosa: the paradox of necessity and freedom”. LusoBrazilian Review. Madison, n. 18, 1981.

CORTEZ ,

COSTA,

Horacio. “Alencar, Simões Lopes Neto, Guimarães Rosa: tres escritores y la región”. Latinoamérica – Anuario de Estudios Latinoamericanos. Cidade do México, n. 18, 1985.

DANIEL, Mary Lou. “The failed

fortune tellers: Machado de Assis’ ‘Cartomante’ and Guimarães Rosa’ Mme de Syais”. Luso-Brazilian Review. Madison, n. 13, 1986. DANIEL,

Mary Lou. “Redemptive analogy in the fiction of J. G. Rosa”. Romance Notes. Chapell Hill, inverno 1986. DANIEL,

COSTA,

Marta M. da. “Claráguas ou a simbologia do elemento aquático em Grande sertão: veredas”. Estudos brasileiros. Curitiba, n. 21, 1977.

Mary Lou. “Through the looking glass: mirror play in two works of J. G. Rosa and Osman Lins”. Luso-Brazilian Review. Madison, n. 13, 1976.

DANIEL, Mary Lou. “Word forCOSTA LIMA, Luiz. “A expressão

orgânica de um escritor moderno”. Diálogo. São Paulo, n. 8, nov. 1957.

mation and deformation in Grande sertão: veredas”. LusoBrazilian Review. Madison, n. 1, 1965.

COUTINHO,

DANTAS,

Eduardo F. “The commited character of Guimarães Rosa’s aesthetic revolution”. Ideologies and Literature. Minneapolis, v. 3, n. 2, 1988.

Paulo. “Variações sobre o tema: Guimarães Rosa”. Diálogo. São Paulo, n. 8, nov. 1957. DAVIS,

COUTINHO ,

Eduardo F. “O Grande sertão: veredas e a linguagem literária”. Perspectivas. Rio de Janeiro, n. 2, 1985.

COVIZZI ,

Lenira Marques e VERLANGIERI, Iná Valéria Rodrigues. “Pequena bibliografia de João Guimarães Rosa”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996.

William Myron. “Indoiranian mythology in Grande sertão: veredas”. Luso-Brazilian Review. Madison, n. 17, 1980. DAVIS, William Myron. “Japanese elements in Grande sertão: veredas”. Romance Philology. Berkeley, n. 19, 1976.

Javier. “João Guimarães Rosa y la alegría”. Revista do Livro. Fundação Bibliote-

ca Nacional, Rio de Janeiro, v. 5, n. 17, mar. 1960. FANTINATI ,

Carlos Erivany. “Um Riobaldo, três amores”. Revista de Letras. Assis, n. 7, 1965.

FERREIRA,

Lívia. “Darandina: construção da surpresa por transformações do conhecimento”. Revista de Letras. Assis, n. 16, 1974.

FERREIRA,

Lívia. “Homência e hominização em Matraga”. Revista de Letras. Assis, n. 13, 1973.

FIGUEIREDO,

Luiz Antonio de. “Orientação: sina e signo”. Através. São Paulo, n. 1, 1977.

FIGUEIREDO,

Maria do Carmo Lanna. “Os pertences de Riobaldo, símbolo da ambigüidade em Grande sertão: veredas”. Luso-Brazilian Review. Madison, v. 20, n. 1, 1983.

FONSECA,

Maria Angélica Nogueira Pimentel. “Os códigos lingüísticos em ‘Sinhá Secada’”. Alfa. Marília, v. 28, 1984.

FRIZZI,

Adria. “The demonic texture: deferral and plurality in Grande sertão: veredas”. Revista de Literatura Latinoamericana. Provo, maio 1988. GALANO,

Ana Maria. “Particulares de ‘Campo geral’, novela de Guimarães Rosa”. Novos Estudos. São Paulo, março de 1994.

DOMINGO,

332

GALVÃO ,

Walnice Nogueira. “Freqüentação da donzela24/11/06 – 20h


guerreira”. Almanaque, Cadernos de Literatura e Ensaio. São Paulo, Brasiliense, 1979. Walnice Nogueira. “Heteronímia em Guimarães Rosa”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998. Republicado em Desconversa (ensaios críticos). Rio de Janeiro: UFRJ, 1998.

GONÇALVES,

Aguinaldo. “O legado de João Guimarães Rosa”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998.

GALVÃO ,

GALVÃO ,

Walnice Nogueira. “Metamorfoses do sertão”. Estudos Avançados. São Paulo, v. 18, n. 52, 2004.

GARBUGLIO, José Carlos. “O fato épico e outros fatos”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 3, 1968. GARBUGLIO, José Carlos. “Guimarães Rosa: a gênese de uma obra”. Revista Ibero-americana. Pittsburgh, 1977. GARBUGLIO,

José Carlos. “Guimarães Rosa, o pactário da língua”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 22, 1982. GARBUGLIO, José Carlos. “Regresso do mito ou mito do regresso”. Études Portugaises et Brésiliennes. Rennes, 1977. GARBUGLIO,

José Carlos. “Um salto no oco do sertão”. Almanaque, Cadernos de Literatura e Ensaio. São Paulo, Brasiliense, 1978. GARCIA,

Wladimir. “Quem é o narrador de Grande sertão: veredas?” Travessia. Florianópolis, 1987.

G U I M A R Ã E S RO S A ,

Agnes. “Lembranças do ‘João Papai Beleza’”. Revista do Livro. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, n. 45, 2003.

GUIMARÃES,

André. “100 dias em Baden-Baden”. ADB – Boletim da Associação dos Diplomatas Brasileiros. Brasília, set. 1993. GULLAR,

Ferreira. “Testemunho”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998.

Riobaldo”. Colóquio Letras. Lisboa, n. 76, 1983. KREUTZ, Odilio. “Riobaldo, um herói problemático: a travessia para o ser”. Letras de Hoje. Porto Alegre, v. 36, n. 1, 2001. KUJAWSKI,

Gilberto de Mello. “Consciência e perigo na épica”. Cavalo Azul. São Paulo, n. 5, 1970. LAGES,

S. K. “As asas da interpretação: notas sobre anjos em Walter Benjamin e Guimarães Rosa”. Revista da USP. São Paulo, v. 39, 1998. LARA, Cecília de. “Arquivo João

GUTIERREZ,

Guimarães Rosa do IEB”. Travessia. Florianópolis, n. 15, 1987.

HANSEN,

LARA, Cecília de. “Classer, éditer et interpréter les manuscrits de Grande sertão: veredas de Guimarães Rosa”. Génésis. Paris, n. 3, 1993.

M. Antônio. “Pelas veredas do sertão do logos”. Cadernos de Lingüística. Belo Horizonte, 1985. João Adolfo. “A imaginação do paradoxo”. Arte em Revista. São Paulo, v. 1, n. 2, jul.-ago. 1979.

LARA,

HARLAND, Michael. “Plotino e Jung na obra de Guimarães Rosa”. Colóquio Letras. Lisboa, n. 46, nov. 1978.

Cecília de. “Grande sertão: veredas – Processos de criação”. Scripta. Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998.

Michael. “Plotino e Jung na obra de Guimarães Rosa II”. Colóquio Letras. Lisboa, n. 47, mar. 1979.

LARA, Cecília de. “João Guimarães Rosa na França: anotações do ‘Diário de Paris’”. Travessia. Florianópolis, n. 16, 19881989.

HILBERT ,

LARA,

HARLAND,

Telma M. Remor. “Grande sertão: veredas: a defesa”. Travessia. Florianópolis, n. 15, 1987.

Maria Amália. “A paixão de Diadorim segundo

Cecília de. “Rosa por Rosa: memória e criação”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996.

JOHNSON,

333

LEITE,

Ilka Boaventura. “Reca24/11/06 – 20h


do de João para João”. Travessia. Florianópolis, n. 15, 1987. LEITE,

Mario Cezar Silva. “Encenações do Brasil rural em Guimarães Rosa”. Luso-Brazilian Review. Madison, EUA, v. 41, n. 2, 2005. LEONEL,

Maria Célia Moraes de. “O discurso citado na festa de Manuelzão”. Alfa. Marília, v. 34, 1990. LEONEL, Maria Célia Moraes de. “Faca e armas brancas: um campo lexical em Grande sertão: veredas”. Alfa. Marília, v. 44, 2000. LEONEL,

Maria Célia Moraes de. “Grande sertão: veredas: alguns neologismos semânticos”. Alfa. Marília, v. 41, 1997. LEONEL,

Maria Célia Moraes de. “Guimarães Rosa: do arquivo à obra”. Scripta. Belo Horizonte, n. 3, 1998. LEONEL,

Maria Célia Moraes de. “A palavra em Guimarães Rosa”. Revista de Letras. Assis, v. 35, 1995. LEONEL,

Maria Célia Moraes de e VASCONCELOS , Sandra Guardini. “Arquivo Guimarães Rosa”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 24, 1982. Sílvia de Menezes. “The animal world in the works of João Guimarães Rosa”. Portuguese Studies. Londres, n. 5, 1989.

LEROY ,

Sílvia de Menezes. “Grande sertão: veredas, un jeu de construction”. Études Portugaises et Brésiliennes. Rennes, ano 15, 1980.

MARTINS COSTA,

Ana Luiza. “Diadorim, delicado e terrível”. Scripta. Belo Horizonte, v. 5, n. 10, 2002.

LEROY,

MARTINS COSTA ,

Ana Luiza. “Homero no Grande sertão”. Kléos. Rio de Janeiro, n. 5, 2004.

LIMA ,

MARTINS COSTA, Ana Luiza. “O mundo escutado”. Scripta. Belo Horizonte, v. 9, n. 17, 2005.

Sílvia de Menezes. “Le pacte de l’écriture”. Interferences. Rennes, n. 8, 1978.

Geraldo França de. “Meu amigo Guimarães Rosa”. Revista do Livro. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, n. 45, 2003.

LIMA,

Sônia Maria van Dijck. “João Guimarães Rosa: cronologia de vida e obra”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996.

LISBOA,

Henriqueta. “A poesia de Grande sertão: veredas”. Revista do Livro. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, dez. 1958.

MARTINS COSTA,

Ana Luiza. “Rosa, ledor de Homero”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998.

MELLO, Silva. “A morte de Guimarães Rosa”. Ocidente. Lisboa, v. 75, 1968. MENESES, Adélia Bezerra de. “Grande sertão: veredas e a psicanálise”. Scripta. Belo Horizonte, v. 5, n. 10, 2002. MENESES,

LOPES, Ruth S. B. “Antiperipléia: um jogo de enganos”. O Eixo e a Roda. Belo Horizonte, n. 1, 1983. LOWE, Elizabeth. “Os diálogos de Grande sertão: veredas”. Revista de Letras. Curitiba, n. 25, 1976.

Nilce Sant’anna. “Rosalina, a fada do Pinhém”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996.

Adélia Bezerra de. “Matéria vertente: Grande sertão: veredas de Guimarães Rosa e o rio São Francisco”. Remate de Males. Campinas, n. 22, 2002. MERQUIOR ,

José Guilherme. “O significado do pós-modernismo”. Colóquio Letras. Lisboa, n. 52, 1979.

MARTINS ,

LEROY ,

MARTINS,

Wilson. “Um novo regionalismo: Guimarães Rosa”. Humboldt. Munique, n. 18, 1978. 334

MERRIM ,

Stephanie. “Desire and the art of dehumanization: Macedônio Fernandez, Julio Cortázar and João G. Rosa”, Latin American Literary Review. Pittsburgh, jan-jun. 1988. MERRIM ,

Stephanie. “In the wake of the word: translating 24/11/06 – 20h


G. Rosa in the art and science of translation”. Dispositivo, Revista Hispánica de Semiótica. Ann Arbor, n. 7, 1982.

bre a tradução francesa de um conto de Guimarães Rosa”. Revista Letras. Curitiba, n. 49, 1998.

MERRIM, Stephanie. “Sagarana:

NASCIMENTO,

a story system”. Hispania. Cincinatti, v. 26, n. 4, 1983. MEYER-CLASON,

Curt. “A tradução ou o encontro procurado”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 1, 1966.

MINAES,

Ivone P. “A linguagem malandra em G. Rosa”. Revista de Letras. Assis, n. 25, 1985.

MIYAZAKI,

Tieko Yamaguchi. “Os recados do morro”. Mimesis. São Paulo, n. 2, 1976.

MIYAZAKI,

Tieko Yamaguchi. “Um tema em três tempos (G. Rosa, J. C. de Carvalho, João Ubaldo Ribeiro)”. Revista de Letras. Assis, n. 28, 1988.

MOREIRA,

Maria N. “Algumas considerações sobre a associação semântica na narrativa de G. Rosa”. Littera. Rio de Janeiro, n. 7, 1973. MOREIRA,

Maria N. “Les expressions figurées dans la langue de G. Rosa”. Caravelle. Toulouse, n. 23, 1974. Sérgio Vicente. “Guimarães Rosa/Joan Miró: um diálogo intra e entre artes”. Revista de Letras. Assis, v. 36, 1996.

Edna Maria Fernandes dos Santos. “A correspondência inédita de G. Rosa e a desconstrução de formas estereotipadas”. Travessia. Florianópolis, n. 15, 1987.

NASCIMENTO,

Edna Maria Fernandes dos Santos. “O texto rosiano – Documentação e criação”. Scripta. Belo Horizonte, n. 3, 1998.

NAZARIO,

Julian Francis. “Os contornos da demanda em Grande sertão: veredas de Guimarães Rosa”. Revista de Letras. Assis, v. 36, 1996.

OBEID, Ana Lia Torre. “Guima-

rães Rosa e ‘O discurso da saudade’”. Estudos Lingüísticos e Literários. Salvador, n. 6, dez. 1987. OLIVIERI, Rita. “Reelaboração do mito da androginia em Grande sertão: veredas”. Lusorama. Frankfurt, n. 29, 1996. PALLOTINI ,

Renata. “Sarapalha”. Diálogo. São Paulo, n. 8, nov. 1957.

PÉCORA, Antônio A. B. “Aspec-

tos da revelação em Grande sertão: veredas”. Remate de Males. Campinas, n. 7, 1987. PERRONE ,

NEVES,

Nuno Teixeira. “O onceiro que virou onça ou a recusa do indianismo”. Revista Letras & Letras. Porto, n. 14, fev. 1989.

NOVIS,

Vera. “De Jó a Jó: popa a proa”. Polímica. São Paulo, n. 4, 1982. NUNES, Benedito. “O amor na obra de Guimarães Rosa”. Revista do Livro. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, ano 7, n. 26, 1964.

MOTTA,

Adalberto. “A tradução como trans-formação: so-

Grande sertão: veredas”. Scripta. Belo Horizonte, n. 3, 1998.

NUNES,

Benedito. “Grande sertão: veredas – uma abordagem filosófica”. Bulletin des Études Portugais et Brésiliens. Paris, n. 44-45, 1985.

MÜLLER,

NUNES,

Benedito. “O mito em 335

Charles. “Lyrical passage(s): verse, song and sense in Grande sertão: veredas”. Luso-Brazilian Review. Madison, n. 27, 1990.

PERRONE-MOISÉS, Leyla. “Nenhures: considerações psicanalíticas à margem de um conto de Guimarães Rosa”. Colóquio: Letras. Lisboa, 1978. Reeditado em: Flores da escrivaninha. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. PICCHIO,

Luciana S. “Guimarães Rosa: le sponde dell’allegria”. Strumenti critici. Torino, n. 4, 1970. PIGNATARI,

Décio. “Metáfora: barroco, surrealismo, Rosa”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998. 24/11/06 – 20h


PIRES,

Alves. “Aproximação a G. Rosa”. Brotéria. Lisboa, abr. 1988. PIVA,

Mairim Linck. “Uma travessia sem margens”. Letras de Hoje. Porto Alegre, v. 36, n. 1, 2001.

de Psicanálise. São Paulo, v. 7, n. 12, 2003. RODRIGUES, Antonio Medina. “Reflexões sobre a escrita no Brasil”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998.

Bento. “O destino decifrado – Linguagem e existência em Guimarães Rosa”. Cavalo Azul. São Paulo, v. 3, 1968. Republicado em PRADO JR., Bento. O destino decifrado – Linguagem e existência em Guimarães Rosa: alguns ensaios. São Paulo: Max Limonade, 1985. PROENÇA,

Manoel Cavalcanti. “Alguns aspectos formais de Grande sertão: veredas”. Revista do Livro. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, ano 2, n. 5, 1957.

RABASSA,

Gregory. “João Guimarães Rosa: the third bank of the river”. Books Abroad. Norman, v. 44, n. 1, 1970. Roberto. “A viagem para o pleno”. Letras de Hoje. Porto Alegre, n. 35, 1979.

ROSENFIELD, Kathrin Holzermayr. “João Guimarães Rosa: o contista de Sagarana”. Brasil/Brazil. Porto Alegre, v. 15, n. 9, 1996.

ROMANO,

James Vig. “Structure and mysticism in the ‘Third bank of the river’”. Luso-Brazilian Review. Madison, v. 20, n. 1, 1983.

ROSENFIELD,

Kathrin Holzermayr. “João Guimarães Rosa: o mestre do amálgama líriconarrativo”. Revista Nonada. Porto Alegre, v. 1, 1997.

RÓNAI,

ROSENFIELD,

Paulo. “Guimarães Rosa contista”. Revista Galega. Vigo, n. 59, 1978.

RÓNAI, Paulo. “Notas para faci-

litar a leitura de ‘Campo geral’ de J. Guimarães Rosa”. Matraga. Rio de Janeiro, ano 9, n. 14, jan./dez. 2002. Paulo. “L’oeuvre de J. Guimarães Rosa”. Caravelle. Toulouse, 1965.

Dirce Côrtes. “Grande sertão: veredas, choques e interação de culturas”. Travessia. Florianópolis, n. 15, 1987. RISSO , Mercedes S. “Padrão contextual e efeito estilístico”. Alfa. Marília, 1985.

ROSENFIELD, Kathrin Holzermayr. “A alegria: tema rosiano ou princípio estético”. Scripta. Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998. ROSENFIELD, Kathrin Holzermayr. “Les brouillards de Diadorim”. Revue Esprit. Paris, v. 6, 1991. ROSENFIELD,

RIVERA,

Tânia. “O outro ou o outro: Guimarães Rosa e a transferência”. Psychê: Revista

Kathrin Holzermayr. “João Guimarães Rosa: Primeiras estórias”. Études de Littérature Portugaise et Brésilienne. Paris, v. 3, 1996. ROSENFIELD,

Kathrin Holzermayr. “A modernidade barroca de Grande sertão: veredas”. Letras Hoje. Porto Alegre, 1993.

RÓNAI,

REIS,

RIEDEL,

Kathrin Holzermayr. “Guimarães Rosa no espelho de Machado, Flaubert e cia.” Revista do Centro de Estudos Portugueses. Belo Horizonte, v. 22, n. 30, 2001.

Kátia Bueno. “Faraó e a água do rio”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996.

ROMANELLI,

PRADO JR.,

ROSENFIELD,

Kathrin Holzermayr. “Grande sertão: veredas: o caos ordenado”. Brasil/Brazil. Porto Alegre, n. 7, 1992. 336

ROSENFIELD,

Kathrin Holzermayr. “A poética das estórias roseanas”. Letras de Hoje. Porto Alegre, v. 32, n. 3, 1997. ROSSI FILHO, Aléssio. “Ver e re(vi)ver ‘A benfazeja’, de Guimarães Rosa”. Revista de Letras. Assis, v. 28, 1988. SÁ,

Lúcia de. “O índio muda de voz: ‘Gaspar Ilóm’ e ‘Meu tio o Iauaretê’”. Romance-Languages-Annual. West Lafayette, n. 4, 1992. SANTOS,

Alckmar dos. “Duas questões acerca do simbolismo 24/11/06 – 20h


literário”. Ciência e cultura. São Paulo, n. 41, abr. 1989. SANTOS,

Livia Ferreira. “‘Esses Lopes’, uma percepção durável”. Revista de Letras. Assis, v. 25, 1985.

SANTOS,

Livia Ferreira. “Ressonâncias da ficção anterior no texto de G. Rosa”. Revista de Letras. Assis, n. 25, 1985.

SANTOS,

Livia Ferreira. “Sagarana, um livro de dois mundos”. Revista de Letras. Assis, n. 28, 1988.

SILVA,

Maria Cristina da. “Traversée poétique de G. Rosa: une poétique de la folie dans Primeiras estórias”. Europe. Paris, n. 640-641, ago.-set. 1982.

STERZI,

SILVA,

TARDITO,

Tania Boff. “A linguagem de Clarice Lispector e a de Guimarães Rosa”. Cadernos Fapa. Porto Alegre, n. 1, 2005. SOETHE,

Paulo Astor. “A imagem da Alemanha em Guimarães Rosa como retrato autoirônico”. Scripta. Belo Horizonte, v. 9, n. 17, 2005.

SOUZA,

SCHÜLLER, Donaldo. “Significante e significado em Grande sertão: veredas”. Organon. Porto Alegre, n. 12, 1966.

Eneida Maria de. “Rosa entre duas margens”. Margens – Revista de Cultura. Belo Horizonte, n. 1, jul. 2002. SPAREMBERG,

SCHÜLLER,

Donaldo. “O texto liberto”. Travessia. Floranópolis, n. 15, 1987.

Alfeu. “Uma invenção misturada – O processo compositivo de Grande sertão: veredas”. Travessia. Florianópolis, n. 15, 1987.

SCHWADERER, Richard. “Tradi-

tion und innovation in João Guimarães Rosas roman Grande sertão: veredas”. Iberomania. Tübingen, n. 12, 1980.

SPERBER, Suzi Frankl. “A resistência possível – Ou, quem espera está vivendo”. Remate de Males, Campinas, n. 7, 1987.

SEAY DEAN , J. “Upon these banks and Shoab of time: Hermann Melville’s whale, J. G. Rosa’s crocodile”. Luso-Brazilian Review. Madison, v. 20, n. 2, 1983.

SPERBER, Suzi Frankl. “A virtude do jaguar: mitologia grega e indígena no sertão roseano”. Remate de Males. Campinas, n. 12, 1992.

R. C. “A ‘viagem’ de Riobaldo Tatarana”. Lusorama. Frankfurt, n. 29, 1996.

STEIN,

Ernildo. “Grande sertão: veredas, uma teodicéia épica”. Cavalo Azul. São Paulo, n. 5, 1970.

SILVA ,

STEIN,

SERRA, Tânia

Francisco Borba da. “Matrizes morfológicas em Guimarães Rosa”. Alfa. Marília, v. 20, 1974-1975.

Ernildo. “Grande sertão: veredas – Verdade e método”. Che vuoi?. Porto Alegre, v. 1, n. 1, 1986. 337

Eduardo. “Desleitura: aletria. ‘A terceira margem do rio’ e a dialética da tradição”. Letras de Hoje. Porto Alegre, v. 34, n. 4, 1999.

Márcia. “‘Com o vaqueiro Mariano como antecedente de Grande sertão: veredas”. Selecta Journal of Pacific Northwest Council on ForeignLanguages. Corvallis, n. 2, 1981.

TEGHME, Lidia. “Teoría narrativa y metafísica en Grande sertão: veredas”. Revista Chilena de Literatura. Santiago, abr. 1983. TEIXEIRA,

Ivan. “Rosa e depois: o curso da agudeza na literatura contemporânea (esboço de roteiro)”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998. TEYSSIER,

Paul. “Le Brésil primitif et magique de G. Rosa”. Amérique Latine. Paris, n. 24, 1985. THEREZO,

Graciema Pires. “O desvio da norma e a beleza literária em ‘Cara-de-bronze’ de Guimarães Rosa”. Letras. Campinas, v. 18, n. 1-2, 1999.

TODESCHINI,

Maria Thereza. “Aragem do sagrado”. Travessia. Florianópolis, n. 15, 1987.

TOLEDO,

Marleine Paula Marcondes e Ferreira de. “‘A hora e vez de Augusto Matraga’: do humano ao mítico”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 29, 1988. 24/11/06 – 20h


TOSTA,

Antonio Luciano de Andrade. “O ‘sublime’ sertão em O sertanejo, Os sertões e Grande sertão: veredas”. Letras de Hoje. Porto Alegre, v. 36, n. 1, 2001.

VASCONCELOS,

Sandra Guardini Teixeira. “A festa de Manuelzão”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. São Paulo, n. 41, 1996.

VASCONCELOS, TRENCH , Belkis. “Relato de viagem aos não-lugares”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 19971998.

Sandra Guardini Teixeira. “Guimarães Rosa’s poeticas and the sertão”. ABEI Journal. São Paulo, n. 6, 2004.

Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, n. 21-22, 1961. Republicado em COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL,1983.

VASCONCELOS, TROGO,

Sebastião. “A travessia da dor no Grande sertão: veredas”. Travessia. Florianópolis, n. 15, 1987. Francis. “Grande sertão: la voie du Tao”. Quadrant. Montpellier, 1986.

Sandra Guardini Teixeira. “Homens provisórios: coronelismo e jagunçagem em Grande sertão: veredas”. Scripta. Belo Horizonte, v. 5, n. 10, 2002.

ZALAZAR,

Oscar. “La oposición civilizatión y barbarie en el Gran sertón: veredas de João Guimarães Rosa”. Káñina. San Jose, v. 20, n. 2, 1996.

UTÉZA,

UTÉZA, Francis. “Grande sertão:

veredas: de l’irrationel au sacré”. Quadrant. Montpellier, 1985. UTÉZA, Francis. “Grande sertão:

veredas: l’apocalypse de João”. Quadrant. Montpellier, 1987.

VASCONCELOS,

Sandra Guardini Teixeira. “The magic of words: Guimarães Rosa and the backlands”. Portuguese Studies. Londres, v. 12, 1996.

VASCONCELOS,

Sandra Guardini Teixeira. “Os mundos de Rosa”. Revista USP. São Paulo, n. 36, 1997-1998. VERISSIMO ,

UTÉZA,

Francis. “J. G. Rosa, paladin oriental-occidental”. Quadrant. Montpellier, 1989.

Luis Fernando. “Isolado”. Revista USP . São Paulo, n. 36, 1997-1998.

VERSIANI, VALENTE, Luiz F. “Affective res-

ponse in Grande sertão: veredas”. Luso-Brazilian Review. Madison, verão 1986.

Ivana. “Uma novela em devenir: a volta do marido pródigo”. Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro, n. 51, 1977.

VINCENT,

VALENTE,

Luiz F. “Fiction and the reader: the prefaces of Tutaméia”. Hispanic Review. Filadélfia, verão 1988. VALENTE,

Luiz F. “Mediação e afectividade: o leitor em Grande sertão: veredas”. Travessia. Florianópolis, n. 15, 1987.

Jon. “Corpo de baile”. Luso-Brazilian Review. Madison, v. 14, 1977.

7. Textos em revistas e publicações eletrônicas AGUIAR,

Raquel. “Despetalando Rosa”. Ciência Hoje. Revista eletrônica. Link: http://cienciahoje.uol.com.br/controlPanel/materia/view/2958, 2001.

CONTI,

Mario Sergio. “Grande sertão: cinqüenta”. No Mínimo. Revista eletrônica. Link: http://nominimo.ibest.com. br/notitia/servlet/newstorm. notitia.presentation.NavigationServlet?publicationCode=1&pageCode=22&textCode=22518, 2006.

José Miguel. “Recado da viagem”. Scripta. Belo Horizonte, n. 3, 1998.

Carlos Alberto. “A terceira margem de Guimarães Rosa”. Trópico. Revista eletrônica. Link: http://p.php.uol. com.br/tropico/html/textos/ 2526,1.shl, 2005.

XISTO,

PIRES,

WISNIK,

Pedro. “A busca da poesia”. Revista do Livro. Fundação 338

DÓRIA,

Paulo Roberto. “Ooó de vovô”. No Mínimo. Revista ele24/11/06 – 20h


trônica. Link: http://nominimo. ibest.com.br/notitia/servlet/ newstorm.notitia.presentation. NavigationServlet?publication Code=1&pageCode=9&text Code=10106&currentDate= 1073703660000, 2004.

– Exposição fotográfica. Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, 1997.

São Paulo, 30.11.1968. (Suplemento literário especial sobre Guimarães Rosa) RANGE REDE. Rio de Janeiro, n. 2, 1996. (Dossiê Guimarães Rosa)

POMPE ,

Carlos. “Veredas de Guimarães”. Vermelho. Revista eletrônica. Link: http://www. vermelho.org.br/base.asp? texto=2773, 2006.

9. Publicações especiais dedicadas a Guimarães Rosa

SILVA,

CULT.

Marcelo Henrique da. “A cena do pensamento e da literatura contemporânea na trama de ‘Desenredo’, de Guimarães Rosa”. Revista Eletrônica. São João del Rei, n. 5, 2003. Disponível em: http://www. ufsj.edu.br/Pagina/metanoia5/ Arquivos/marcelo.pdf.

O ESTADO DE S. PAULO.

REMATE DE MALES.

São Paulo, n. 43, 2001. (Dossiê Guimarães Rosa)

DIÁLOGO.

São Paulo, n. 8, nov. 1957. (Número especial sobre Guimarães Rosa) – REVISTA DE LETRAS E Viçosa, ano 1, n. 1, jul./dez. 1996. (Ensaios sobre Guimarães Rosa)

GLÁUKS ARTES.

JORNAL DE LETRAS.

Rio de Janeiro, n. 19, nov./dez. 1967. (Edição especial sobre Guimarães Rosa)

Campinas, n. 7, 1987. (Edição dedicada a Guimarães Rosa)

REVISTA DE CULTURA BRASILEÑA.

Madri, v. 6, n. 21, 1967. (Edição especial sobre Guimarães Rosa)

REVISTA DO INSTITUTO DE ESTUDOS BRASILEIROS. São Paulo,

n. 41, 1996. (Número especial sobre Guimarães Rosa) REVISTA USP.

São Paulo, n. 36, 1997-1998. (Dossiê 30 anos sem Guimarães Rosa)

SCRIPTA.

Belo Horizonte, v. 2, n. 3, 1998. (Número especial Guimarães Rosa)

8. Catálogos de exposição LUSOBRASILICA.

LARA, Cecília de (coord.). João Guimarães Rosa – Confluências: trilhas de vida e de criação. Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro, 1984. MUSEU CASA GUIMARÃES ROSA.

João Guimarães Rosa (19081967) – Cronologia vida e obra. Cordisburgo, dez. 1984. ZIANI,

Elizabeth e SCHIESARI, Maria Helena P. (org.). Instituto de Estudos Brasileiros da USP – Arquivo João Guimarães Rosa

Roma, n. 3, 2000. (Número especial aos cuidados de Giulia Lanciani: João Guimarães Rosa. Il che delle cose) MINAS GERAIS. Belo Horizonte, 25.11.1967. (Suplemento literário especial sobre Guimarães Rosa) NONADA: Letras em Revista. Porto Alegre, n. 1, 1997. (Revista da Faculdade de Educação, Ciências e Letras Ritter dos Reis)

339

TRAVESSIA . Florianópolis, n. 15, 1987. (Dedicada a João Guimarães Rosa) VISÃO.

Rio de Janeiro, 02.12. 1966. (Edição especial sobre Guimarães Rosa) 24/11/06 – 20h


10. Entrevistas José César. “Histórias de Itaguara e Cordisburgo”. Correio da Manhã. Rio de Janeiro, 19.05.1946.

Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 03.06.1971.

inspirou a personagem Manuelzão. Curta.

SARAIVA,

Arnaldo. “Guimarães Rosa”. In Conversas com escritores brasileiros. Porto: Edição do Congresso Portugal-Brasil Ano 2000, 2000.

Aboio (2005), de Marília Rocha. Sobre o mundo dos vaqueiros no sertão de minas, inspirado pelo universo de Guimarães Rosa.

DOCUMENTÁRIO

TELEVISÃO

A João Guimarães Rosa (1968), de Roberto Santos e Marcelo Tassara. Curta.

Do sertão ao beco da Lapa (e o mundo de Oswald) (1973). Direção de Maurice Capovilla e Rudá de Andrade. Programa da série Globo Shell Especial. Um bloco do programa é dedicado a Guimarães Rosa. Documentário.

BORBA,

CAMACHO,

Fernando. “Entrevista com Guimarães Rosa”. Humboldt. Munique, n. 37, 1987. CASTRO,

Vander de. “Guimarães Rosa fala aos jovens”. O Cruzeiro. Rio de Janeiro, 23.12.1967.

COUTINHO,

Maria da Graça Faria. “Trabalho de português para o Colégio Brasileiro de Almeida”. Rio de Janeiro, jun. 1965.

LEITE,

Ascendino. “Arte e céu, países de primeira necessidade”. O Jornal, Rio de Janeiro, 26.05.1946. Republicada em LIMA, Sônia Maria van Dijck (org.). Ascendino Leite entrevista Guimarães Rosa. João Pessoa: UFPB, 1997. LORENZ ,

Günter. “Diálogo com Guimarães Rosa”. In: COUTINHO, Eduardo F. (org.). Guimarães Rosa. Rio de Janeiro/Brasília: Civilização Brasileira/INL, 1983. LORENZ,

Günter. “Uma entrevista com Guimarães Rosa”.

A criação literária de João Guimarães Rosa (1970), de Paulo Thiago. Curta. João Guimarães Rosa – Veredas de Minas (1975), de David Neves e Fernando Sabino. João Rosa (1980), de Helvécio Ratton. Curta. Uma leitura de Guimarães Rosa (1993), de Arlindo Daibert. Curta. Buriti: uma conversa com o vaqueiro Zito (2001), de Estevão Ciavatta. Curta. Cordisburgo roseana: a cidade recriada (2001), de Vitor Borysow. Curta.

Globo Ecologia (1996). Programa especial sobre Grande sertão: veredas. Rede Globo. Os nomes do Rosa (1998). Documentário de Pedro Bial. Série. GNT. Guimarães Rosa – O mágico do reino das palavras (2001). Produzido pela TV PUC para a série Mestres da Literatura, do programa TV Escola, do MEC.

ADAPTAÇÕES

Diário do sertão (2003), de Laura Erber. Curta. A alma do osso (2004), de Cao Guimarães. Inspirado no universo de Guimarães Rosa.

1. Para o cinema e vídeo

Livro para Manuelzão (2004), de Angélica del Nery. Sobre o vaqueiro Manoel Nardy, que

O grande sertão (1965), de Geraldo e Renato Santos Pereira. Adaptação do romence.

340

24/11/06 – 20h


A hora e a vez de Augusto Matraga (1965), de Roberto Santos. Adaptação do conto do livro Sagarana.

gobé”, “Nada e a nossa condição”, “Substância” e “Sorôco, sua mãe, sua filha”, do livro Primeiras estórias.

Sagarana, o duelo (1973), de Paulo Thiago. Adaptação do conto “Duelo”, do livro Sagarana.

Campo geral (2001), de Laura Erber. Inspirado na estória de Miguilim, filmado com meninos de uma favela do Rio de Janeiro. Curta.

Cabaret mineiro (1980), de Carlos Alberto Prates Correia. Seqüência final é transposição de “Sorôco, sua mãe, sua filha”. Eu carrego um sertão dentro de mim (1980), de Geraldo Sarno. Curta. Noites do sertão (1984), de Carlos Alberto Prates Correia. Adaptação da novela “Buriti”, do livro Noites do sertão.

Um conto contado (2005), de Gustavo Rosa de Moura. Registro da contadora de histórias Dôra Guimarães narrando o conto “A terceira margem do rio”, do livro Primeiras estórias. Mutum (em produção), de Sandra Kogut. Roteiro de Sandra Kogut e Ana Luiza Martins Costa. Adaptação de “Campo geral”.

Famigerado (1991), de Aluizio Salles Jr. Adaptação do conto do livro Primeiras estórias. Rio de Janeiro, Minas (1993), de Marily da Cunha Bezerra. Apresenta o episódio do encontro de Riobaldo e Diadorim às margens do rio de Janeiro, do romance Grande sertão: veredas. Curta.

ge Durst, direção de Walter Avancini. Rede Globo.

2. Para a

TV

Teatro 2 (1975). Adaptação dos contos “Corpo Fechado” e “Sorôco, Sua Mãe, Sua Filha”. TV Cultura, São Paulo.

A terceira margem do rio (1994), de Nelson Pereira dos Santos. Adaptação dos contos “A terceira margem do rio”, “A menina de lá”, “Os irmãos Dagobé”, “Fatalidade” e “Seqüência”, do livro Primeiras estórias.

Caso especial (1975). Adaptação do conto “Sarapalha”, direção de Roberto Santos. Rede Globo.

Outras estórias (1999), de Pedro Bial. Adaptação dos contos “Famigerado”, “Os irmãos Da-

Grande sertão: veredas (1985). Minissérie baseada no romance, adaptação de Walter Geor341

3. Para o teatro e dança A volta do marido pródigo (1960). Adaptação e direção de Léo Gilson Ribeiro. Montagem do Grupo Experimental de Teatro do Instituto Italiano de Cultura. Boi de carro (1967). Adaptação do conto “Conversa de bois” pelo Teatro Chique-Chique, no Rio de Janeiro. João Guimarães: veredas (1969). Adaptação de textos de Guimarães Rosa por Renata Pallottini. Direção de Terezinha Aguiar. Estréia no Teatro Anchieta, São Paulo. A hora e vez de Augusto Matraga (1986). Adaptação e direção de Antunes Filho. Estréia no teatro Sesc Vila Nova, em São Paulo. 24/11/06 – 20h


Vau de sarapalha (1992). Adaptação do conto “Sarapalha” por Luiz Carlos Vasconcellos. Com o Grupo Piollin. João Pessoa. Grande sertão: veredas (1994). Adaptação do romance, direção de Regina Bertola, grupo Ponto de Partida, no Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro. Sertão, sertão (1998). Espetáculo escrito por Lima Duarte, José Garbuglio e David José de Moura Mattos sobre a obra de Guimarães Rosa. Com Lima Duarte, Papete e Saulo Laranjeira. O fuso – História de homens (1999). Adaptação do conto “A terceira margem do rio”, direção de Regina Bertola, grupo Ponto de Partida. Estréia no 8° Festival de Teatro de Curitiba. Sertão, sertões (2001). Cantata cênica de Carlos Rocha, com músicas de Rufo Herrera. Direção de Carlos Rocha e Carmem Paternostro. Estréia no Palácio das Artes, Belo Horizonte. A terceira margem do rio (2002). Adaptação e direção de Henrique Rodovalho. Estréia no Sesc Belenzinho, São Paulo. Derde oever (Terceira margem)

(2004). Adaptação do conto “A terceira margem do rio”, realizada pela companhia de bonecos Teatro Munganga, de Amsterdã, Holanda. Encenação no Sesc Pompéia, São Paulo. A benfazeja (2005). Adaptação da obra de Guimarães Rosa com bonecos e máscaras. Grupo O Casulo. Romanço do boi bonito (2006). Dança butô inspirada no conto “Uma estória de amor”, do livro Manuelzão e Miguilim. Leituras de Guimarães Rosa pelo grupo Os Miguilins, de Cordisburgo – MG. Espetáculos musicais do grupo Nhambuzim, com músicas inspiradas em Guimarães Rosa e narração de trechos de suas obras.

EXPOSIÇÕES Homenagem de artistas plásticos a Guimarães Rosa (1969). Exposição de quadros inspirados no universo de Guimarães Rosa no Instituto Ítalo-brasileiro de São Paulo. Rosas Rosa – Emblemas e movimentos (2000). Revisões de artistas e videomakers sobre a lite-

342

ratura de Guimarães Rosa. Casa das Rosas, São Paulo. Grande sertão: veredas (2006). Exposição comemorativa dos 50 anos da obra de Guimarães Rosa com mostra feita de palavras que recriam o ambiente do sertão. Criação de Bia Lessa. Museu da Língua Portuguesa, São Paulo.

MÚSICA E LEITURAS A terceira margem do rio (1994). Música composta por Milton Nascimento e Caetano Veloso. Rio abaixo (1995). CD de Paulo Freire, com músicas inspiradas no universo de Grande sertão: veredas. Tratore. Sete episódios de Grande sertão: veredas (1997).CD com leituras de José Mindlin, Davi Arrigucci Jr. e Antonio Cândido. Encarte com textos de Maria Neuma Barreto Cavalcante. Coleção Ler e Ouvir 1. LogOn. Récits du sertão (2000). Álbum com narração de Frédéric Pagès de trechos de João Guimarães Rosa, com música de Xavier Desandre-Navarre. Ministério da Cultura/Fundação Biblioteca Nacional/Departamento Nacional do Livro.

24/11/06 – 20h


AG R A D E C I M E N TO S

Dora Ferreira da Silva, in memoriam (São Paulo) Agnes Guimarães Rosa do Amaral, Ana Luiza Martins Costa, Carlos Augusto Lacerda, Carlos Barbosa, Cora Rónai, Isabel Diegues, Laís Rodrigues, Laura Rónai, Marisa Rothier Cardoso, Nana Vaz de Castro, Pedro Bial, Vilma Guimarães Rosa (Rio de Janeiro) Ana Lúcia Duarte Lanna, Cíntia Medina de Souza, Eduardo Tess, Eduardo Tess Filho, Maria Izilda C. N. Fonseca Leitão, Marili Bezerra, Mônica A. Guilherme da Silva, Taís Borja Gasparian e Walnice Nogueira Galvão (São Paulo) José Osvaldo dos Santos (Cordisburgo) Instituto de Estudos Brasileiros – USP (São Paulo), Editora Nova Fronteira, Fundação Casa de Rui Barbosa (Rio de Janeiro), Museu Casa Guimarães Rosa (Cordisburgo) Adriana Jacobsen (Berlim), Ray-Güde Mertin, Renata Martins (Hamburgo), Soraia Vilela (Colônia)

343


Guimarães Rosa, à dir., na viagem de 1952 pelo sertão mineiro

344

Fundo João Guimarães Rosa – Instituto de Estudos Brasileiros – USP



INSTITUTO MOREIRA SALLES

Walther Moreira Salles (1912-2001) Fundador Diretoria Executiva

Conselho Consultivo

Fernando Roberto Moreira Salles Presidente

João Moreira Salles Presidente

João Moreira Salles Roberto Konder Bornhausen Vice-Presidentes

Augusto Carlos da Silva Telles Lúcia Regina Moreira Salles Lygia Fagundes Telles Pérsio Arida Conselheiros

Mauro Agonilha Diretor Tesoureiro Gabriel Jorge Ferreira Diretor Executivo

Casa da Cultura de Poços de Caldas Conselho Consultivo

Conselho de Administração

João Moreira Salles Presidente Fernando Roberto Moreira Salles Vice-Presidente

João Moreira Salles Presidente Antonio Candido de Mello e Souza Resk Frayha Conselheiros

Gabriel Jorge Ferreira Pedro Moreira Salles Roberto Konder Bornhausen Walther Moreira Salles Junior Conselheiros

Administração

Antonio Fernando De Franceschi Superintendente Executivo Bernardo Ajzenberg Edson Micael Souza Santos Maria do Carmo Martins Iász Coordenadores Executivos José Luiz Herencia Coordenador da área de música Liliana Giusti Serra Coordenadora de bibliotecas

Michel Laub Coordenador da área de publicações e cursos

Sergio Burgi Coordenador da área de fotografia

Manuel da Costa Pinto Coordenador editorial

Cristiane Loff Elizabeth Pessoa Teixeira Odette Jerônimo Cabral Vieira Roselene Pinto Machado Vera Regina Magalhães Castellano Coordenadores de centros culturais

Odette Jerônimo Cabral Vieira Coordenadora de vendas e marketing Paula Papis Coordenadora de produção, comunicação e tecnologia


INSTITUTO MOREIRA SALLES

Sede Av. Paulista, 1.294, 14º. andar, Bela Vista CEP: 01310-915 São Paulo-SP Tel.: (0 XX 11) 3371-4455 Fax: (0 XX 11) 3371-4497 E-mail: ims@ims.com.br

Centros culturais

Galerias IMS

Rio de Janeiro Rua Marquês de São Vicente, 476 Gávea CEP: 22451-040 Tel.: (0 XX 21) 3284-7400 Fax: (0 XX 21) 2239-5559

Rio de Janeiro Unibanco Arteplex Praia de Botafogo, 316, lojas D e E Tel.: (0 xx 21) 2559-8750

São Paulo Rua Piauí, 844, 1o andar Higienópolis CEP: 01241-000 Tel.: (0 XX 11) 3825-2560 Fax: (0 XX 11) 3661-0984

São Paulo Unibanco Arteplex – Frei Caneca Shopping & Convention Center Rua Frei Caneca, 569, 3o piso Tel.: (0 xx 11) 3255-8816

Belo Horizonte Av. Afonso Pena, 737 Centro CEP: 30130-002 Tel.: (0 XX 31) 3213-7900 Fax: (0 XX 31) 3213-7906 Poços de Caldas Rua Teresópolis, 90 Jardim dos Estados CEP: 37701-058 Tel./fax: (0 XX 35) 3722-2776

Porto Alegre Unibanco Arteplex – Shopping Bourbon Country Av. Túlio de Rose, 80, 2o piso Tel.: (0 xx 51) 3341-9685 Curitiba Unibanco Arteplex – Crystal Plaza Shopping Rua Comendador Araújo, 731 Tel.: (0 xx 41) 3223-2527

Reserva técnica fotográfica e Reserva técnica musical Rua Marquês de São Vicente, 476, Gávea CEP: 22451-040 Tel.: (0 XX 21) 3284-7400

Rio de Janeiro-RJ

Internet/Rádio IMS http://www.ims.com.br

CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA À venda nas principais livrarias do país, nos espaços culturais e no site do Instituto Moreira Salles e em Portugal Número 1 – João Cabral de Melo Neto (mar. 96) Número 2 – Raduan Nassar (set. 96) Número 3 – Jorge Amado (mar. 97) Número 4 – Rachel de Queiroz (set. 97) Número 5 – Lygia Fagundes Telles (mar. 98) Número 6 – Ferreira Gullar (set. 98) Número 7 – João Ubaldo Ribeiro (mar. 99) Número 8 – Hilda Hilst (out. 99) Número 9 – Adélia Prado (jun. 00)

Número 10 – Ariano Suassuna (nov. 00) Número 11 – Ignácio de Loyola Brandão (jun. 01) Número 12 – Carlos Heitor Cony (dez. 01) Números 13 e 14 – Euclides da Cunha (dez. 02) Número 15 – Millôr Fernandes (jul. 03) Número 16 – Erico Verissimo (nov. 03) Números 17 e 18 – Clarice Lispector (dez. 04) Número 19 – Márcio Souza (dez. 05) Números 20 e 21 – João Guimarães Rosa (dez. 06)

Jornalista responsável: Antonio Fernando De Franceschi (MTb: 9.093).


ESTA OBRA FOI COMPOSTA PELA BEI˜ • COMUNICAÇÃO EM GARAMOND E GILL SANS COM FOTOLITOS E IMPRESSÃO NA IPSIS GRÁFICA E EDITORA PARA O INSTITUTO MOREIRA SALLES EM NOVEMBRO DE 2006.


AG R A D E C I M E N TO S

Dora Ferreira da Silva, in memoriam (São Paulo) Agnes Guimarães Rosa do Amaral, Ana Luiza Martins Costa, Carlos Augusto Lacerda, Carlos Barbosa, Cora Rónai, Isabel Diegues, Laís Rodrigues, Laura Rónai, Marisa Rothier Cardoso, Nana Vaz de Castro, Pedro Bial, Vilma Guimarães Rosa (Rio de Janeiro) Ana Lúcia Duarte Lanna, Cíntia Medina de Souza, Eduardo Tess, Eduardo Tess Filho, Maria Izilda C. N. Fonseca Leitão, Marili Bezerra, Mônica A. Guilherme da Silva, Taís Borja Gasparian e Walnice Nogueira Galvão (São Paulo) José Osvaldo dos Santos (Cordisburgo) Instituto de Estudos Brasileiros – USP (São Paulo), Editora Nova Fronteira, Fundação Casa de Rui Barbosa (Rio de Janeiro), Museu Casa Guimarães Rosa (Cordisburgo) Adriana Jacobsen (Berlim), Ray –Güide Mertin (Bad Homburg), Renata Martins (Frankfurt), Soraia Vilela (Colônia)

343


Guimarães Rosa, à dir., na viagem de 1952 pelo sertão mineiro

344

Fundo João Guimarães Rosa – Instituto de Estudos Brasileiros – USP



INSTITUTO MOREIRA SALLES

Walther Moreira Salles (1912-2001) Fundador Diretoria Executiva

Conselho Consultivo

Fernando Roberto Moreira Salles Presidente

João Moreira Salles Presidente

João Moreira Salles Roberto Konder Bornhausen Vice-Presidentes

Augusto Carlos da Silva Telles Lúcia Regina Moreira Salles Lygia Fagundes Telles Pérsio Arida Conselheiros

Mauro Agonilha Diretor Tesoureiro Gabriel Jorge Ferreira Diretor Executivo

Casa da Cultura de Poços de Caldas Conselho Consultivo

Conselho de Administração

João Moreira Salles Presidente Fernando Roberto Moreira Salles Vice-Presidente

João Moreira Salles Presidente Antonio Candido de Mello e Souza Resk Frayha Conselheiros

Gabriel Jorge Ferreira Pedro Moreira Salles Roberto Konder Bornhausen Walther Moreira Salles Junior Conselheiros

Administração

Antonio Fernando De Franceschi Superintendente Executivo Bernardo Ajzenberg Edson Micael Souza Santos Maria do Carmo Martins Iász Coordenadores Executivos José Luiz Herencia Coordenador da área de música Liliana Giusti Serra Coordenadora de bibliotecas

Michel Laub Coordenador da área de publicações e cursos

Sergio Burgi Coordenador da área de fotografia

Manuel da Costa Pinto Coordenador editorial

Elizabeth Pessoa Teixeira Odette Jerônimo Cabral Vieira Roselene Pinto Machado Vera Regina Magalhães Castellano Coordenadores de centros culturais

Odette Jerônimo Cabral Vieira Coordenadora de vendas e marketing Paula Papis Coordenadora de produção, comunicação e tecnologia


INSTITUTO MOREIRA SALLES

Sede Av. Paulista, 1.294, 14º. andar, Bela Vista CEP: 01310-915 São Paulo-SP Tel.: (0 XX 11) 3371-4455 Fax: (0 XX 11) 3371-4497 E-mail: ims@ims.com.br

Centros culturais

Galerias IMS

Rio de Janeiro Rua Marquês de São Vicente, 476 Gávea CEP: 22451-040 Tel.: (0 XX 21) 3284-7400 Fax: (0 XX 21) 2239-5559

Rio de Janeiro Unibanco Arteplex Praia de Botafogo, 316, lojas D e E Tel.: (0 xx 21) 2559-8750

São Paulo Rua Piauí, 844, 1o andar Higienópolis CEP: 01241-000 Tel.: (0 XX 11) 3825-2560 Fax: (0 XX 11) 3661-0984

São Paulo Unibanco Arteplex – Frei Caneca Shopping & Convention Center Rua Frei Caneca, 569, 3o piso Tel.: (0 xx 11) 3255-8816

Belo Horizonte Av. Afonso Pena, 737 Centro CEP: 30130-002 Tel.: (0 XX 31) 3213-7900 Fax: (0 XX 31) 3213-7906 Poços de Caldas Rua Teresópolis, 90 Jardim dos Estados CEP: 37701-058 Tel./fax: (0 XX 35) 3722-2776

Porto Alegre Unibanco Arteplex – Shopping Bourbon Country Av. Túlio de Rose, 80, 2o piso Tel.: (0 xx 51) 3341-9685 Curitiba Unibanco Arteplex – Crystal Plaza Shopping Rua Comendador Araújo, 731 Tel.: (0 xx 41) 3223-2527

Reserva técnica fotográfica e Reserva técnica musical Rua Marquês de São Vicente, 476, Gávea CEP: 22451-040 Tel.: (0 XX 21) 3284-7400

Rio de Janeiro-RJ

Internet/Rádio IMS http://www.ims.com.br

CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA À venda nas principais livrarias do país, nos espaços culturais e no site do Instituto Moreira Salles e em Portugal Número 1 – João Cabral de Melo Neto (mar. 96) Número 2 – Raduan Nassar (set. 96) Número 3 – Jorge Amado (mar. 97) Número 4 – Rachel de Queiroz (set. 97) Número 5 – Lygia Fagundes Telles (mar. 98) Número 6 – Ferreira Gullar (set. 98) Número 7 – João Ubaldo Ribeiro (mar. 99) Número 8 – Hilda Hilst (out. 99) Número 9 – Adélia Prado (jun. 00)

Número 10 – Ariano Suassuna (nov. 00) Número 11 – Ignácio de Loyola Brandão (jun. 01) Número 12 – Carlos Heitor Cony (dez. 01) Números 13 e 14 – Euclides da Cunha (dez. 02) Número 15 – Millôr Fernandes (jul. 03) Número 16 – Erico Verissimo (nov. 03) Números 17 e 18 – Clarice Lispector (dez. 04) Número 19 – Márcio Souza (dez. 05) Números 20 e 21 – João Guimarães Rosa (dez. 06)

Jornalista responsável: Antonio Fernando De Franceschi (MTb: 9.093).


ESTA OBRA FOI COMPOSTA PELA BEI˜ • COMUNICAÇÃO EM GARAMOND E GILL SANS COM FOTOLITOS E IMPRESSÃO NA IPSIS GRÁFICA E EDITORA PARA O INSTITUTO MOREIRA SALLES EM NOVEMBRO DE 2006.


Guimar達es Rosa na Alemanha



Acervo da família Tess

Guimarães Rosa com seu automóvel em Hamburgo, onde foi vice-cônsul do Brasil

Guimarães Rosa viveu na Alemanha durante os momentos dramáticos que antecederam e marcaram a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Trabalhava como vice-cônsul em Hamburgo quando ocorreu, em novembro de 1938, a Noite dos Cristais, prenúncio do Holocausto. E, em 1942, quando o Brasil rompe relações diplomáticas com o governo de Hitler, ele dá início à viagem de volta a seu país natal. Essa experiência é tema de documentário realizado por duas jornalistas brasileiras residentes na Alemanha, que investigaram a atuação do diplomata no momento em que o consulado brasileiro emitiu vistos a centenas de judeus, possibilitando a estes escapar das perseguições nazistas. A atmosfera opressiva do Terceiro Reich deixaria marcas na literatura de Guimarães Rosa, como se pode ler em “O mau humor de Wotan”, texto incluído em Ave, palavra. Mas também permanece viva na memória de pessoas que conviveram com o escritor e cujas histórias foram resgatadas pelas pesquisadoras – conforme relato, com informações inéditas, sobre o documentário Outro sertão incluído neste encarte dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA.


Outro sertão Adriana Jacobsen e Soraia Vilela

Com lançamento previsto para 2008, o documentário Outro sertão reconstrói um período pouco conhecido da biografia de Guimarães Rosa: os anos vividos em Hamburgo, onde o escritor trabalhou como vice-cônsul entre 1938 e 1942. O longa-metragem revela aspectos até hoje desconhecidos dessa fase da vida do diplomata. Avesso a falar publicamente sobre si próprio, Guimarães Rosa fez pouca menção pública aos anos passados na Alemanha. Outro sertão procura, por meio de entrevistas com testemunhas que o conheceram na época, anotações, diários, cartas, imagens e documentos inéditos, relembrar aspectos esquecidos de sua estadia em Hamburgo. A reconstrução histórica audiovisual detalhada de seu cotidiano na Alemanha é feita com material original do período e imagens atuais dos locais por onde Guimarães Rosa passou. O ponto de partida é a travessia do Atlântico e sua chegada ao país, em 1938. O ciclo é fechado com o confinamento de diplomatas sul-americanos em Baden-Baden, quando o Brasil rompe relações com a Alemanha (janeiro de 1942), e o conseqüente retorno de Guimarães Rosa ao Brasil, meses mais tarde. O documentário lembra, dessa forma, um período de fundamental importância na vida do escritor, sua experiência como estrangeiro na Alemanha sob o regime nazista e a importância desses anos para a constituição de sua obra posterior.

Sob a ira de Wotan Em abril de 1938, Guimarães Rosa deixa o Brasil, faz uma viagem em “águas calmas” e chega ao porto de Bremerhaven, no dia 4 de maio. De lá segue para Hamburgo, onde assume suas funções um dia depois, ao lado de seu superior, o cônsul-ge2


Hans-Helmut Heubel e Marion Madsen, casal de amigos alemães cuja história Guimarães Rosa relata em Ave, palavra

ral Joaquim Antonio Souza Ribeiro. Com base em pesquisa realizada no decorrer dos últimos três anos, durante a qual foram coletados documentos, imagens inéditas e depoimentos, o documentário refaz os caminhos percorridos por Guimarães Rosa, mostrando seus lugares prediletos na cidade, como o zoológico Hagenbeck e as margens do Alster. No verão europeu desse mesmo ano, Guimarães Rosa conhece Marion Madsen, cuja história é relatada em “O mau humor de Wotan”, publicado no volume Ave, palavra. Nele, o escritor reproduz a atmosfera sufocante da Alemanha nazista e relata o triste acaso que levou à morte de Hans-Helmut (marido de Marion e seu grande amigo), na Segunda Guerra. Outro sertão documenta os rastros dessa família, redescobre na Alemanha uma Marion idosa, que ignora por completo o fato de que detalhes de sua vida estão registrados e publicados no outro lado do Atlântico, num idioma que ela não compreende. Nas lembranças de Marion, Guimarães Rosa permanece sendo “o cônsul” da Hamburgo dos anos 1930. O documentário comprova, dessa forma, o caráter autobiográfico de “O mau humor de Wotan” e a fidelidade das descrições de Rosa à realidade da época.

Impressões e decepções A ingenuidade inicial do deslumbramento com o país deixaria lugar, pouco mais tarde, no outono-inverno de 1938-1939, a uma insatisfação com a “fascinaçao bélica”, a “comida detestável” e a “pouca originalidade” dos alemães, como se lê nas cartas enviadas a seu tio Vicente. 3


Acervo da família Tess

Edifício no qual Guimarães Rosa morou em Hamburgo entre 1938 e meados de 1940

Guimarães Rosa vive os prenúncios da Segunda Guerra Mundial, presencia a terrível Noite dos Cristais (9-10 de novembro de 1938) e os discursos inflamados de Hitler. Pouco depois, sua insatisfação no país era clara, como se lê em carta ao tio Vicente, datada de 19 de novembro de 1939: “Este povo é pobre, conservador e quase que só se interessa por carros blindados e aviões de bombardeio”.1 No consulado de Hamburgo, Guimarães Rosa é confrontado com a correspondência de teor anti-semita trocada por membros do corpo diplomático brasileiro na Alemanha e com as chamadas “circulares secretas”, enviadas pelo Itamaraty aos diplomatas no exterior. Diariamente o consulado era procurado por aqueles que buscavam uma possibilidade de fuga do regime nazista. Entre 1938 e 1939, o consulado brasileiro em Hamburgo emite vistos para centenas de pessoas. A cidade, aonde em fins do século XVI chegaram os primeiros judeus vindos da Península Ibérica, tinha em 1933 mais de cem instituições culturais e sociais judaicas. Marcada até a ascensão do nazismo pela tradição liberal portuária, era a principal saída procurada pelos que tentavam escapar das perseguições. Em Hamburgo, Guimarães Rosa viria a conhecer Aracy Moebius de Carvalho, funcionária contratada do consulado, com quem passaria a viver mais tarde, após o retorno ao Brasil. O cargo ocupado por Aracy não permitia que ela assinasse documentos oficiais de concessão de visto. Guimarães Rosa, na função de vice-cônsul, tampouco tinha autonomia para expedir tal documentação, exceto durante a ausência do cônsul-geral. O documentário procura detectar o papel exercido por Guimarães Rosa no consulado através de uma análise detalhada da correspondência diplomática do período, do relato de historiadores e da comparação com dados de outras representações diplomáti4


cas brasileiras na Alemanha. E, acima de tudo, através dos testemunhos de sobreviventes ou de seus descendentes. Nas lembranças e no cotidiano dessas pessoas, o filme encontra não apenas indícios sobre a vida de Guimarães Rosa, mas também revelações simbólicas sobre a história da emigração para o Brasil naquele momento.

Ontem e hoje Mesmo falando sobre acontecimentos que se passaram há quase sete décadas, alguns sobreviventes, hoje com mais de 85 anos de idade, narram a fuga da Alemanha para o Brasil. O documentário traz à tona a angústia, o horror da perseguição, o amargor pela perda de parentes no Holocausto e as dificuldades e alegrias do recomeço no Brasil. O longa-metragem passa a refletir, neste momento, sobre a memória e suas lacunas. Na busca por respostas exatas para questões relacionadas ao período, o filme explicita as dificuldades de se reconstruir de forma nítida um passado que muitos levaram uma vida tentando esquecer. Uma sobrevivente, hoje aos 92 anos, narra:

Acervo da família Tess

Meu marido e eu nos casamos um mês antes da Noite dos Cristais. Tentamos tudo, perguntávamos a todos como poderíamos sair da Alemanha o mais rápido possível. De repente, ouvimos que poderíamos ir para o Brasil. Fomos de Essen até o consulado em Hamburgo. Lá, encontramos uma sala de espera cheia de gente, não sei se eram todos judeus. Assim conseguimos um visto de turista. Só sabíamos que o Brasil ficava na América do Sul. [...] Ainda nos vejo aquele dia no consulado.

Interior do Consulado Geral do Brasil em Hamburgo

5


Arquivo Histórico do Itamaraty/Documentário Outro sertão

Telegrama do cônsul geral, Joaquim Antônio Souza Ribeiro, relatando a destruição do consulado brasileiro na cidade portuária e os esforços para salvar documentos

6


O trauma comum entre todos os testemunhos é a lembrança dolorosa da Noite dos Cristais, um pogrom que se estendeu por toda a Alemanha na noite do 9 para o 10 de novembro de 1938, com apreensões, assassinatos e a depredação de sinagogas e estabelecimentos judeus – para muitos, o anúncio irrevogável de que a barbárie nazista não poderia mais ser freada e de que a saída do país, a qualquer preço, seria a única possibilidade de sobrevivência. Em setembro de 1939, a Alemanha invade a Polônia. Começa a Segunda Guerra Mundial. Documentos ainda inéditos revelam que Guimarães Rosa, em 1940, mostrava-se avesso ao governo alemão, criticava e ridicularizava líderes do Terceiro Reich, além de ter demonstrado desejo de abandonar o país naquele momento – um comportamento que chegou a lhe render represálias. Apesar da tensão da guerra, Guimarães Rosa mantinha intensa correspondência com as filhas pequenas, Vilma e Agnes, que haviam ficado no Brasil, como mostra carta datada de 13 de março de 1940: “Depois, mais tarde, você [Vilma] virá passear à Europa. [...] Na travessia do Equador (penso que você já sabe muita geografia), a Agnucha [Agnes] será batizada na piscina de bordo...”.2 O mesmo batismo na piscina pelo qual ele próprio havia passado poucos anos antes.

Início do fim

Documentário Outro sertão

1941: O cerco se fecha cada vez mais. Os bombardeios à volta de Guimarães Rosa tornam-se mais intensos e os alarmes passam a fazer parte do dia-a-dia dos diplomatas em Hamburgo. Em janeiro de 1942, o Brasil declara guerra aos países do Eixo. Guimarães Rosa parte para Berlim, ao lado de outros membros do corpo diplomático e de funcioná-

Prédio de Hamburgo no qual Guimarães Rosa morou a partir de 1940

7


rios do consulado. De lá, segue para um campo de internamento em Baden-Baden, destinado a diplomatas sul-americanos. O documentário revive esses dias passados em Baden-Baden, marcados pela tensão, apesar do conforto relativo das instalações onde os diplomatas são mantidos. Segundo testemunhas, para acalmar os ânimos das diversas crianças também ali confinadas, Guimarães Rosa organizou um “campeonato de xadrez” infantil, premiando os vencedores com caramelos e ensinando aos entediados filhos de diplomatas o uso de palavrões até então desconhecidos por eles. Em Baden-Baden, Guimarães Rosa permanece 100 dias, até o momento em que os cidadãos brasileiros são trocados por alemães, então detidos no Brasil. No dia 24 de maio, o corpo diplomático brasileiro deixa Baden-Baden de trem, atravessa a França e a Espanha com destino a Portugal. De Lisboa, partem a bordo do navio Bagé, em maio de 1942 – um percurso tenso até a chegada no Rio de Janeiro. Acima de tudo, o documentário mostra os paradoxos inevitáveis que persistem quando se volta o olhar para o passado. Depoimentos contraditórios de historiadores, lembranças às vezes controversas de sobreviventes, registros em documentos oficiais, lendas criadas em torno das circunstâncias e a subjetividade do próprio Guimarães Rosa nas referências que deixou escritas sobre o período tentam revelar esse “outro sertão” raramente lembrado quando se pensa sobre a obra do escritor. Adriana Guimarães Jacobsen é formada em letras pela Universidade Federal do Espírito Santo. Graduada e mestre em ciências da comunicação pela Universidade Livre de Berlim, vive e trabalha como editora de imagens em Berlim. Soraia Vilela formou-se em comunicação social pela PUC-MG. Graduada e mestre em ciência da cultura pela Universidade Humboldt de Berlim, vive e trabalha como jornalista em Colônia.

Outro sertão. Roteiro e direção de Adriana Jacobsen e Soraia Vilela. Produção: Galpão Produções (Vitória, ES). Projeto aprovado no edital Petrobras Cultural 2005/2006. Formato: longametragem, com suporte final em 35 mm e exibição prevista para cinema e televisão. Previsão de lançamento: 2008.

NOTAS 1 Apud GUIMARÃES, Vicente. Joãozito: infância de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972, p. 157. 2 Apud GUIMARÃES ROSA, Vilma. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira 1999, p. 250.

8



Encarte da edição especial, números 20 e 21, comemorativa dos 10 anos dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, que tem por tema João Guimarães Rosa.


Guimar達es Rosa na Alemanha



Acervo da família Tess

Guimarães Rosa com seu automóvel em Hamburgo, onde foi vice-cônsul do Brasil

Guimarães Rosa viveu na Alemanha durante os momentos dramáticos que antecederam e marcaram a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Trabalhava como vice-cônsul em Hamburgo quando ocorreu, em novembro de 1938, a Noite dos Cristais, prenúncio do Holocausto. E, em 1942, quando o Brasil rompe relações diplomáticas com o governo de Hitler, ele dá início à viagem de volta a seu país natal. Essa experiência é tema de documentário realizado por duas jornalistas brasileiras residentes na Alemanha, que investigaram a atuação do diplomata no momento em que o consulado brasileiro emitiu vistos a centenas de judeus, possibilitando a estes escapar das perseguições nazistas. A atmosfera opressiva do Terceiro Reich deixaria marcas na literatura de Guimarães Rosa, como se pode ler em “O mau humor de Wotan”, texto incluído em Ave, palavra. Mas também permanece viva na memória de pessoas que conviveram com o escritor e cujas histórias foram resgatadas pelas pesquisadoras – conforme relato, com informações inéditas, sobre o documentário Outro sertão incluído neste encarte dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA.


Outro sertão Adriana Jacobsen e Soraia Vilela

Com lançamento previsto para 2008, o documentário Outro sertão reconstrói um período pouco conhecido da biografia de Guimarães Rosa: os anos vividos em Hamburgo, onde o escritor trabalhou como vice-cônsul entre 1938 e 1942. O longa-metragem revela aspectos até hoje desconhecidos dessa fase da vida do diplomata. Avesso a falar publicamente sobre si próprio, Guimarães Rosa fez pouca menção pública aos anos passados na Alemanha. Outro sertão procura, por meio de entrevistas com testemunhas que o conheceram na época, anotações, diários, cartas, imagens e documentos inéditos, relembrar aspectos esquecidos de sua estadia em Hamburgo. A reconstrução histórica audiovisual detalhada de seu cotidiano na Alemanha é feita com material original do período e imagens atuais dos locais por onde Guimarães Rosa passou. O ponto de partida é a travessia do Atlântico e sua chegada ao país, em 1938. O ciclo é fechado com o confinamento de diplomatas sul-americanos em Baden-Baden, quando o Brasil rompe relações com a Alemanha (janeiro de 1942), e o conseqüente retorno de Guimarães Rosa ao Brasil, meses mais tarde. O documentário lembra, dessa forma, um período de fundamental importância na vida do escritor, sua experiência como estrangeiro na Alemanha sob o regime nazista e a importância desses anos para a constituição de sua obra posterior.

Sob a ira de Wotan Em abril de 1938, Guimarães Rosa deixa o Brasil, faz uma viagem em “águas calmas” e chega ao porto de Bremerhaven, no dia 4 de maio. De lá segue para Hamburgo, onde assume suas funções um dia depois, ao lado de seu superior, o cônsul-ge2


ral Joaquim Antônio Souza Ribeiro. Com base em pesquisa realizada no decorrer dos últimos três anos, durante a qual foram coletados documentos, imagens inéditas e depoimentos, o documentário refaz os caminhos percorridos por Guimarães Rosa, mostrando seus lugares prediletos na cidade, como o zoológico Hagenbeck e as margens do Alster. No verão europeu desse mesmo ano, Guimarães Rosa conhece Marion Madsen, cuja história é relatada em “O mau humor de Wotan”, publicado no volume Ave, palavra. Nele, o escritor reproduz a atmosfera sufocante da Alemanha nazista e relata o triste acaso que levou à morte de Hans-Helmut (marido de Marion e seu grande amigo), na Segunda Guerra. Outro sertão documenta os rastros dessa família, redescobre na Alemanha uma Marion idosa, que ignora por completo o fato de que detalhes de sua vida estão registrados e publicados no outro lado do Atlântico, num idioma que ela não compreende. Nas lembranças de Marion, Guimarães Rosa permanece sendo “o cônsul” da Hamburgo dos anos 1930. O documentário comprova, dessa forma, o caráter autobiográfico de “O mau humor de Wotan” e a fidelidade das descrições de Rosa à realidade da época.

Impressões e decepções

Acervo da família Tess

A ingenuidade inicial do deslumbramento com o país deixaria lugar, pouco mais tarde, no outono-inverno de 1938-1939, a uma insatisfação com a “fascinaçao bélica”, a “comida detestável” e a “pouca originalidade” dos alemaes, como se lê nas cartas enviadas a seu tio Vicente.

Edifício no qual Guimarães Rosa morou em Hamburgo entre 1938 e meados de 1940

3


Guimarães Rosa vive os prenúncios da Segunda Guerra Mundial, presencia a terrível Noite dos Cristais (9-10 de novembro de 1938) e os discursos inflamados de Hitler. Pouco depois, sua insatisfação no país era clara, como se lê em carta ao tio Vicente, datada de 19 de novembro de 1939: “Este povo é pobre, conservador e quase que só se interessa por carros blindados e aviões de bombardeio”.1 No consulado de Hamburgo, Guimarães Rosa é confrontado com a correspondência de teor anti-semita trocada por membros do corpo diplomático brasileiro na Alemanha e com as chamadas “circulares secretas”, enviadas pelo Itamaraty aos diplomatas no exterior. Diariamente o consulado era procurado por aqueles que buscavam uma possibilidade de fuga do regime nazista. Entre 1938 e 1939, o consulado brasileiro em Hamburgo emite vistos para centenas de pessoas. A cidade, onde em fins do século XVI chegaram os primeiros judeus vindos da Península Ibérica, tinha em 1933 mais de cem instituições culturais e sociais judaicas. Marcada até a ascensão do nazismo pela tradição liberal portuária, era a principal porta de saída procurada pelos que tentavam escapar das perseguições. Em Hamburgo, Guimarães Rosa viria a conhecer Aracy Moebius de Carvalho, funcionária contratada do consulado, com quem passaria a viver mais tarde, após o retorno ao Brasil. O cargo ocupado por Aracy não permitia que ela assinasse documentos oficiais de concessão de visto. Guimarães Rosa, na função de vice-cônsul, tampouco tinha autonomia para expedir tal documentação, exceto durante a ausência do cônsul-geral. O documentário procura detectar o papel exercido por Guimarães Rosa no consulado através de uma análise detalhada da correspondência diplomática do período, do relato de historiadores e da comparação com dados de outras representações diplomáticas brasileiras na Alemanha. E, acima de tudo, através dos testemunhos de sobreviventes ou de seus descendentes. Nas lembranças e no cotidiano dessas pessoas, o filme encontra não apenas indícios sobre a vida de Guimarães Rosa, mas revelações simbólicas sobre a história da emigração para o Brasil naquele momento.

Ontem e hoje Mesmo falando sobre acontecimentos que se passaram há quase sete décadas, alguns sobreviventes, hoje com mais de 85 anos de idade, narram a fuga da Alemanha para o Brasil. O documentário traz à tona a angústia, o horror da perseguição, o amargor pela perda de parentes no Holocausto e as dificuldades e alegrias do recomeço no Brasil. O longa-metragem passa a refletir, neste momento, sobre a memória e suas lacunas. Na busca por respostas exatas para questões relacionadas ao período, o filme explicita as dificuldades de se reconstruir de forma nítida um passado que muitos passaram uma vida tentando esquecer. Uma sobrevivente, hoje aos 92 anos, narra: 4


Meu marido e eu nos casamos um mês antes da Noite dos Cristais. Tentamos tudo, perguntávamos a todos como poderíamos sair da Alemanha o mais rápido possível. De repente, ouvimos que poderíamos ir para o Brasil. Fomos de Essen até o consulado em Hamburgo. Lá, encontramos uma sala de espera cheia de gente, não sei se eram todos judeus. Assim conseguimos um visto de turista. Só sabíamos que o Brasil ficava na América do Sul. [...] Ainda nos vejo aquele dia no consulado.

Acervo da família Tess

O trauma comum entre todos os testemunhos é a lembrança dolorosa da Noite dos Cristais, um pogrom que se estendeu por toda a Alemanha na noite do 9 para o 10 de novembro de 1938, com apreensões, assassinatos e a depredação de sinagogas e estabelecimentos judeus – para muitos, o anúncio irrevogável de que a barbárie nazista não poderia mais ser freada e de que a saída do país, a qualquer preço, seria a única possibilidade de sobrevivência. Em setembro de 1939, a Alemanha invade a Polônia. Começa a Segunda Guerra Mundial. Documentos ainda inéditos revelam que Guimarães Rosa, em 1940, mostrava-se avesso ao governo alemão, criticava e ridicularizava líderes do Terceiro Reich, além de ter demonstrado desejo de abandonar o país naquele momento – um comportamento que chegou a lhe render represálias. Apesar da tensão da guerra, Guimarães Rosa mantinha intensa correspondência com as filhas pequenas, Vilma e Agnes, que haviam ficado no Brasil, como mostra carta datada de 13 de março de 1940: “Depois, mais tarde, você [Vilma] virá passear à Europa. [...] Na travessia do Equador (penso que você já sabe muita geografia), a Agnucha [Agnes] será batizada na piscina de bordo...”.2 O mesmo batismo na piscina pelo qual ele próprio havia passado poucos anos antes.

Interior do Consulado Geral do Brasil em Hamburgo

5


Arquivo Histórico do Itamaraty/Documentário Outro sertão

Telegrama do cônsul geral, Joaquim Antônio Souza Ribeiro, relatando a destruição do consulado brasileiro na cidade portuária e os esforços para salvar documentos

6


Início do fim

Documentário Outro sertão

1941: O cerco se fecha cada vez mais. Os bombardeios à volta de Guimarães Rosa tornam-se mais intensos e os alarmes passam a fazer parte do dia-a-dia dos diplomatas em Hamburgo. Em janeiro de 1942, o Brasil declara guerra aos países do Eixo. Guimarães Rosa parte para Berlim, ao lado de outros membros do corpo diplomático e de funcionários do consulado. De lá, segue para um campo de internamento em Baden-Baden, destinado a diplomatas sul-americanos. O documentário revive os dias passados em Baden-Baden, marcados pela tensão, apesar do conforto relativo das instalações onde os diplomatas são mantidos. Segundo testemunhas, para acalmar os ânimos das diversas crianças também ali confinadas, Guimarães Rosa organizou um “campeonato de xadrez” infantil, premiando os vencedores com caramelos e ensinando aos entediados filhos de diplomatas o uso de palavrões até então desconhecidos por eles. Em Baden-Baden, Guimarães Rosa permanece 100 dias, até o momento em que os cidadãos brasileiros são trocados por alemães, então detidos no Brasil. No dia 24 de maio, o corpo diplomático brasileiro deixa Baden-Baden de trem, atravessa a França e a Espanha com destino a Portugal. De Lisboa, partem a bordo do navio Bagé, em maio de 1942 – um percurso tenso até a chegada no Rio de Janeiro. Acima de tudo, o documentário mostra os paradoxos inevitáveis que persistem quando se volta o olhar para o passado. Depoimentos contraditórios de historiadores, lembranças às vezes controversas de sobreviventes, registros em documentos oficiais, lendas criadas em torno das circunstâncias e a subjetividade do próprio Guimarães Rosa nas referências que deixou escritas sobre o período tentam revelar esse “outro sertão” raramente lembrado quando se pensa sobre a obra do escritor.

Prédio de Hamburgo no qual Guimarães Rosa morou a partir de 1940

7


Adriana Guimarães Jacobsen é formada em letras pela Universidade Federal do Espírito Santo. Graduada e mestre em ciências da comunicação pela Universidade Livre de Berlim, vive e trabalha como editora de imagens em Berlim. Soraia Vilela formou-se em comunicação social pela PUC-MG. Graduada e mestre em ciência da cultura pela Universidade Humboldt de Berlim, vive e trabalha como jornalista em Colônia.

Outro sertão. Roteiro e direção de Adriana Jacobsen e Soraia Vilela. Produção: Galpão Produções (Vitória, ES). Projeto aprovado no edital Petrobras Cultural 2005/2006. Formato: longametragem, com suporte final em 35 mm e exibição prevista para cinema e televisão. Previsão de lançamento: 2008.

NOTAS 1 Apud GUIMARÃES, Vicente. Joãozito: infância de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972, p. 157. 2 Apud GUIMARÃES ROSA, Vilma. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira 1999, p. 250.

8



Encarte da edição especial, números 20 e 21, comemorativa dos 10 anos dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, que tem por tema João Guimarães Rosa.


Guimar達es Rosa na Alemanha



Acervo da família Tess

Guimarães Rosa com seu automóvel em Hamburgo, onde foi cônsul-adjunto do Brasil

Guimarães Rosa viveu na Alemanha durante os momentos dramáticos que antecederam e marcaram a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Trabalhava como cônsul-adjunto em Hamburgo quando ocorreu, em novembro de 1938, a Noite dos Cristais, prenúncio do Holocausto. E, em 1942, quando o Brasil rompe relações diplomáticas com o governo de Hitler, ele dá início à viagem de volta a seu país natal. Essa experiência é tema de documentário realizado por duas jornalistas brasileiras residentes na Alemanha, que investigaram a atuação do diplomata no momento em que o consulado brasileiro emitiu vistos a centenas de judeus, possibilitando a estes escapar das perseguições nazistas. A atmosfera opressiva do Terceiro Reich deixaria marcas na literatura de Guimarães Rosa, como se pode ler em “O mau humor de Wotan”, texto incluído em Ave, palavra. Mas também permanece viva na memória de pessoas que conviveram com o escritor e cujas histórias foram resgatadas pelas pesquisadoras – conforme relato, com informações inéditas, sobre o documentário Outro sertão incluído neste encarte dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA.


Outro sertão Adriana Jacobsen e Soraia Vilela

Com lançamento previsto para 2008, o documentário Outro sertão reconstrói um período pouco conhecido da biografia de Guimarães Rosa: os anos vividos em Hamburgo, onde o escritor trabalhou como cônsul-adjunto entre 1938 e 1942. O longa-metragem revela aspectos até hoje desconhecidos dessa fase da vida do diplomata. Avesso a falar publicamente sobre si próprio, Guimarães Rosa fez pouca menção pública aos anos passados na Alemanha. Outro sertão procura, por meio de entrevistas com testemunhas que o conheceram na época, anotações, diários, cartas, imagens e documentos inéditos, relembrar aspectos esquecidos de sua estadia em Hamburgo. A reconstrução histórica audiovisual detalhada de seu cotidiano na Alemanha é feita com material original do período e imagens atuais dos locais por onde Guimarães Rosa passou. O ponto de partida é a travessia do Atlântico e sua chegada ao país, em 1938. O ciclo é fechado com o confinamento de diplomatas sul-americanos em Baden-Baden, quando o Brasil rompe relações com a Alemanha (janeiro de 1942), e o conseqüente retorno de Guimarães Rosa ao Brasil, meses mais tarde. O documentário lembra, dessa forma, um período de fundamental importância na vida do escritor, sua experiência como estrangeiro na Alemanha sob o regime nazista e a importância desses anos para a constituição de sua obra posterior.

Sob a ira de Wotan Em abril de 1938, Guimarães Rosa deixa o Brasil, faz uma viagem em “águas calmas” e chega ao porto de Bremerhaven, no dia 4 de maio. De lá segue para Hamburgo, onde assume suas funções um dia depois, ao lado de seu superior, o cônsul-ge2


Fotos: acervo da família Heubel

Marion e Hans-Helmut Heubel, casal de amigos alemães cuja história Guimarães Rosa relata em Ave, palavra

ral Joaquim Antonio de Souza Ribeiro. Com base em pesquisa realizada no decorrer dos últimos três anos, durante a qual foram coletados documentos, imagens inéditas e depoimentos, o documentário refaz os caminhos percorridos por Guimarães Rosa, mostrando seus lugares prediletos na cidade, como o zoológico Hagenbeck e as margens do Alster. No verão europeu desse mesmo ano, Guimarães Rosa conhece Marion Madsen, cuja história é relatada em “O mau humor de Wotan”, publicado no volume Ave, palavra. Nele, o escritor reproduz a atmosfera sufocante da Alemanha nazista e relata o triste acaso que levou à morte de Hans-Helmut (marido de Marion e seu grande amigo), na Segunda Guerra. Outro sertão documenta os rastros dessa família, redescobre na Alemanha uma Marion idosa, que ignora por completo o fato de que detalhes de sua vida estão registrados e publicados no outro lado do Atlântico, num idioma que ela não compreende. Nas lembranças de Marion, Guimarães Rosa permanece sendo “o cônsul” da Hamburgo dos anos 1930. O documentário comprova, dessa forma, o caráter autobiográfico de “O mau humor de Wotan” e a fidelidade das descrições de Rosa à realidade da época.

Impressões e decepções A ingenuidade inicial do deslumbramento com o país deixaria lugar, pouco mais tarde, no outono-inverno de 1938-1939, a uma insatisfação com a “fascinaçao bélica”, a “comida detestável” e a “pouca originalidade” dos alemães, como se lê nas cartas enviadas a seu tio Vicente. 3


Acervo da família Tess

Edifício no qual Guimarães Rosa morou em Hamburgo entre 1938 e outubro de 1940

Guimarães Rosa vive os prenúncios da Segunda Guerra Mundial, presencia a terrível Noite dos Cristais (9-10 de novembro de 1938) e os discursos inflamados de Hitler. Pouco depois, sua insatisfação no país era clara, como se lê em carta ao tio Vicente, datada de 19 de novembro de 1939: “Este povo é pobre, conservador e quase que só se interessa por carros blindados e aviões de bombardeio”.1 No consulado de Hamburgo, Guimarães Rosa é confrontado com a correspondência de teor anti-semita trocada por membros do corpo diplomático brasileiro na Alemanha e com as chamadas “circulares secretas”, enviadas pelo Itamaraty aos diplomatas no exterior. Diariamente o consulado era procurado por aqueles que buscavam uma possibilidade de fuga do regime nazista. Entre 1938 e 1939, o consulado brasileiro em Hamburgo emite vistos para centenas de pessoas. A cidade, aonde em fins do século XVI chegaram os primeiros judeus vindos da Península Ibérica, tinha em 1933 mais de cem instituições culturais e sociais judaicas. Marcada até a ascensão do nazismo pela tradição liberal portuária, era a principal saída procurada pelos que tentavam escapar das perseguições. Em Hamburgo, Guimarães Rosa viria a conhecer Aracy Moebius de Carvalho, funcionária contratada do consulado, com quem passaria a viver mais tarde, após o retorno ao Brasil. O cargo ocupado por Aracy não permitia que ela assinasse documentos oficiais de concessão de visto. Guimarães Rosa, na função de cônsul-adjunto, tampouco tinha autonomia para expedir tal documentação, exceto durante a ausência do cônsul-geral. O documentário procura detectar o papel exercido por Guimarães Rosa no consulado através de uma análise detalhada da correspondência diplomática do período, do relato de historiadores e da comparação com dados de outras representações diplomáti4


cas brasileiras na Alemanha. E, acima de tudo, através dos testemunhos de sobreviventes ou de seus descendentes. Nas lembranças e no cotidiano dessas pessoas, o filme encontra não apenas indícios sobre a vida de Guimarães Rosa, mas também revelações simbólicas sobre a história da emigração para o Brasil naquele momento.

Ontem e hoje Mesmo falando sobre acontecimentos que se passaram há quase sete décadas, alguns sobreviventes, hoje com mais de 85 anos de idade, narram a fuga da Alemanha para o Brasil. O documentário traz à tona a angústia, o horror da perseguição, o amargor pela perda de parentes no Holocausto e as dificuldades e alegrias do recomeço no Brasil. O longa-metragem passa a refletir, neste momento, sobre a memória e suas lacunas. Na busca por respostas exatas para questões relacionadas ao período, o filme explicita as dificuldades de se reconstruir de forma nítida um passado que muitos levaram uma vida tentando esquecer. Uma sobrevivente, hoje aos 92 anos, narra:

Acervo da família Tess

Meu marido e eu nos casamos um mês antes da Noite dos Cristais. Tentamos tudo, perguntávamos a todos como poderíamos sair da Alemanha o mais rápido possível. De repente, ouvimos que poderíamos ir para o Brasil. Fomos de Essen até o consulado em Hamburgo. Lá, encontramos uma sala de espera cheia de gente, não sei se eram todos judeus. Assim conseguimos um visto de turista. Só sabíamos que o Brasil ficava na América do Sul. [...] Ainda nos vejo aquele dia no consulado.

Interior do Consulado-Geral do Brasil em Hamburgo

5


Arquivo Histórico do Itamaraty/Documentário Outro sertão

Telegrama do cônsul-geral, Joaquim Antonio de Souza Ribeiro, relatando a destruição do consulado brasileiro na cidade portuária e os esforços para salvar documentos

6


O trauma comum entre todos os testemunhos é a lembrança dolorosa da Noite dos Cristais, um pogrom que se estendeu por toda a Alemanha na noite do 9 para o 10 de novembro de 1938, com apreensões, assassinatos e a depredação de sinagogas e estabelecimentos judeus – para muitos, o anúncio irrevogável de que a barbárie nazista não poderia mais ser freada e de que a saída do país, a qualquer preço, seria a única possibilidade de sobrevivência. Em setembro de 1939, a Alemanha invade a Polônia. Começa a Segunda Guerra Mundial. Documentos ainda inéditos revelam que Guimarães Rosa, em 1940, mostrava-se avesso ao governo alemão, criticava e ridicularizava líderes do Terceiro Reich, além de ter demonstrado desejo de abandonar o país naquele momento – um comportamento que chegou a lhe render represálias. Apesar da tensão da guerra, Guimarães Rosa mantinha intensa correspondência com as filhas pequenas, Vilma e Agnes, que haviam ficado no Brasil, como mostra carta datada de 13 de março de 1940: “Depois, mais tarde, você [Vilma] virá passear à Europa. [...] Na travessia do Equador (penso que você já sabe muita geografia), a Agnucha [Agnes] será batizada na piscina de bordo...”.2 O mesmo batismo na piscina pelo qual ele próprio havia passado poucos anos antes.

Início do fim

Documentário Outro sertão

1941: O cerco se fecha cada vez mais. Os bombardeios à volta de Guimarães Rosa tornam-se mais intensos e os alarmes passam a fazer parte do dia-a-dia dos diplomatas em Hamburgo. Em janeiro de 1942, o Brasil declara guerra aos países do Eixo. Guimarães Rosa parte para Berlim, ao lado de outros membros do corpo diplomático e de funcioná-

Prédio de Hamburgo no qual Guimarães Rosa morou a partir de 1940

7


rios do consulado. De lá, segue para um campo de internamento em Baden-Baden, destinado a diplomatas sul-americanos. O documentário revive esses dias passados em Baden-Baden, marcados pela tensão, apesar do conforto relativo das instalações onde os diplomatas são mantidos. Segundo testemunhas, para acalmar os ânimos das diversas crianças também ali confinadas, Guimarães Rosa organizou um “campeonato de xadrez” infantil, premiando os vencedores com caramelos e ensinando aos entediados filhos de diplomatas o uso de palavrões até então desconhecidos por eles. Em Baden-Baden, Guimarães Rosa permanece 100 dias, até o momento em que os cidadãos brasileiros são trocados por alemães, então detidos no Brasil. No dia 24 de maio, o corpo diplomático brasileiro deixa Baden-Baden de trem, atravessa a França e a Espanha com destino a Portugal. De Lisboa, partem a bordo do navio Bagé, em maio de 1942 – um percurso tenso até a chegada no Rio de Janeiro. Acima de tudo, o documentário mostra os paradoxos inevitáveis que persistem quando se volta o olhar para o passado. Depoimentos contraditórios de historiadores, lembranças às vezes controversas de sobreviventes, registros em documentos oficiais, lendas criadas em torno das circunstâncias e a subjetividade do próprio Guimarães Rosa nas referências que deixou escritas sobre o período tentam revelar esse “outro sertão” raramente lembrado quando se pensa sobre a obra do escritor.

Adriana Guimarães Jacobsen é formada em letras pela Universidade Federal do Espírito Santo. Graduada e mestre em ciências da comunicação pela Universidade Livre de Berlim, vive e trabalha como editora de imagens em Berlim. Soraia Vilela formou-se em comunicação social pela PUC-MG. Graduada e mestre em ciência da cultura pela Universidade Humboldt de Berlim, vive e trabalha como jornalista em Colônia.

Outro sertão. Roteiro e direção de Adriana Jacobsen e Soraia Vilela. Produção: Galpão Produções (Vitória, ES). Projeto aprovado no edital Petrobras Cultural 2005/2006. Formato: longametragem, com suporte final em 35 mm e exibição prevista para cinema e televisão. Previsão de lançamento: 2008.

NOTAS 1 Apud GUIMARÃES, Vicente. Joãozito: infância de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972, p. 157. 2 Apud GUIMARÃES ROSA, Vilma. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira 1999, p. 250.

O IMS e as autoras agradecem Detlev Heubel, que gentilmente cedeu as fotos de Marion e Hans-Helmut Heubel.

8



Encarte da edição especial, números 20 e 21, comemorativa dos 10 anos dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, que tem por tema João Guimarães Rosa.


Guimar達es Rosa na Alemanha



Acervo da família Tess

Guimarães Rosa com seu automóvel em Hamburgo, onde foi cônsul-adjunto do Brasil

Guimarães Rosa viveu na Alemanha durante os momentos dramáticos que antecederam e marcaram a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Trabalhava como cônsul-adjunto em Hamburgo quando ocorreu, em novembro de 1938, a Noite dos Cristais, prenúncio do Holocausto. E, em 1942, quando o Brasil rompe relações diplomáticas com o governo de Hitler, ele dá início à viagem de volta a seu país natal. Essa experiência é tema de documentário realizado por duas jornalistas brasileiras residentes na Alemanha, que investigaram a atuação do diplomata no momento em que o consulado brasileiro emitiu vistos a centenas de judeus, possibilitando a estes escapar das perseguições nazistas. A atmosfera opressiva do Terceiro Reich deixaria marcas na literatura de Guimarães Rosa, como se pode ler em “O mau humor de Wotan”, texto incluído em Ave, palavra. Mas também permanece viva na memória de pessoas que conviveram com o escritor e cujas histórias foram resgatadas pelas pesquisadoras – conforme relato, com informações inéditas, sobre o documentário Outro sertão incluído neste encarte dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA.


Outro sertão Adriana Jacobsen e Soraia Vilela

Com lançamento previsto para 2008, o documentário Outro sertão reconstrói um período pouco conhecido da biografia de Guimarães Rosa: os anos vividos em Hamburgo, onde o escritor trabalhou como cônsul-adjunto entre 1938 e 1942. O longa-metragem revela aspectos até hoje desconhecidos dessa fase da vida do diplomata. Avesso a falar publicamente sobre si próprio, Guimarães Rosa fez pouca menção pública aos anos passados na Alemanha. Outro sertão procura, por meio de entrevistas com testemunhas que o conheceram na época, anotações, diários, cartas, imagens e documentos inéditos, relembrar aspectos esquecidos de sua estadia em Hamburgo. A reconstrução histórica audiovisual detalhada de seu cotidiano na Alemanha é feita com material original do período e imagens atuais dos locais por onde Guimarães Rosa passou. O ponto de partida é a travessia do Atlântico e sua chegada ao país, em 1938. O ciclo é fechado com o confinamento de diplomatas sul-americanos em Baden-Baden, quando o Brasil rompe relações com a Alemanha (janeiro de 1942), e o conseqüente retorno de Guimarães Rosa ao Brasil, meses mais tarde. O documentário lembra, dessa forma, um período de fundamental importância na vida do escritor, sua experiência como estrangeiro na Alemanha sob o regime nazista e a importância desses anos para a constituição de sua obra posterior.

Sob a ira de Wotan Em abril de 1938, Guimarães Rosa deixa o Brasil, faz uma viagem em “águas calmas” e chega ao porto de Bremerhaven, no dia 4 de maio. De lá segue para Hamburgo, onde assume suas funções um dia depois, ao lado de seu superior, o cônsul-ge2


Fotos: acervo da família Heubel

Marion e Hans-Helmut Heubel, casal de amigos alemães cuja história Guimarães Rosa relata em Ave, palavra

ral Joaquim Antonio de Souza Ribeiro. Com base em pesquisa realizada no decorrer dos últimos três anos, durante a qual foram coletados documentos, imagens inéditas e depoimentos, o documentário refaz os caminhos percorridos por Guimarães Rosa, mostrando seus lugares prediletos na cidade, como o zoológico Hagenbeck e as margens do Alster. No verão europeu desse mesmo ano, Guimarães Rosa conhece Marion Madsen, cuja história é relatada em “O mau humor de Wotan”, publicado no volume Ave, palavra. Nele, o escritor reproduz a atmosfera sufocante da Alemanha nazista e relata o triste acaso que levou à morte de Hans-Helmut (marido de Marion e seu grande amigo), na Segunda Guerra. Outro sertão documenta os rastros dessa família, redescobre na Alemanha uma Marion idosa, que ignora por completo o fato de que detalhes de sua vida estão registrados e publicados no outro lado do Atlântico, num idioma que ela não compreende. Nas lembranças de Marion, Guimarães Rosa permanece sendo “o cônsul” da Hamburgo dos anos 1930. O documentário comprova, dessa forma, o caráter autobiográfico de “O mau humor de Wotan” e a fidelidade das descrições de Rosa à realidade da época.

Impressões e decepções A ingenuidade inicial do deslumbramento com o país deixaria lugar, pouco mais tarde, no outono-inverno de 1938-1939, a uma insatisfação com a “fascinaçao bélica”, a “comida detestável” e a “pouca originalidade” dos alemães, como se lê nas cartas enviadas a seu tio Vicente. 3


Acervo da família Tess

Edifício no qual Guimarães Rosa morou em Hamburgo entre 1938 e 1940

Guimarães Rosa vive os prenúncios da Segunda Guerra Mundial, presencia a terrível Noite dos Cristais (9-10 de novembro de 1938) e os discursos inflamados de Hitler. Pouco depois, sua insatisfação no país era clara, como se lê em carta ao tio Vicente, datada de 19 de novembro de 1939: “Este povo é pobre, conservador e quase que só se interessa por carros blindados e aviões de bombardeio”.1 No consulado de Hamburgo, Guimarães Rosa é confrontado com a correspondência de teor anti-semita trocada por membros do corpo diplomático brasileiro na Alemanha e com as chamadas “circulares secretas”, enviadas pelo Itamaraty aos diplomatas no exterior. Diariamente o consulado era procurado por aqueles que buscavam uma possibilidade de fuga do regime nazista. Entre 1938 e 1939, o consulado brasileiro em Hamburgo emite vistos para centenas de pessoas. A cidade, aonde em fins do século XVI chegaram os primeiros judeus vindos da Península Ibérica, tinha em 1933 mais de cem instituições culturais e sociais judaicas. Marcada até a ascensão do nazismo pela tradição liberal portuária, era a principal saída procurada pelos que tentavam escapar das perseguições. Em Hamburgo, Guimarães Rosa viria a conhecer Aracy Moebius de Carvalho, funcionária contratada do consulado, com quem passaria a viver mais tarde, após o retorno ao Brasil. Embora o cargo ocupado por Aracy não permitisse que assinasse documentos oficiais de concessão de visto, ela era responsável pelo contato com os requerentes. Na década de 1980, a Fundação Yad Vashem, de Israel, prestou homenagem a ela, incluindo seu nome na lista dos “Justos entre as Nações” pelo auxílio prestado a judeus na Alemanha nazista. Guimarães Rosa, na função de cônsul-adjunto, tampouco tinha, via de regra, autonomia para assinar os vistos expedidos pelo consulado. O documentário procura detectar o papel exercido por ele nesse contexto através de uma análise detalhada da correspon4


dência diplomática do período, do relato de historiadores e da comparação com dados de outras representações diplomáticas brasileiras na Alemanha. E, acima de tudo, através dos testemunhos de sobreviventes ou de seus descendentes. Nas lembranças e no cotidiano destas pessoas, o filme encontra não apenas indícios sobre a vida de Guimarães Rosa, mas revelações simbólicas sobre a história da emigração para o Brasil naquele momento.

Ontem e hoje Mesmo falando sobre acontecimentos que se passaram há quase sete décadas, alguns sobreviventes, hoje com mais de 85 anos de idade, narram a fuga da Alemanha para o Brasil. O documentário traz à tona a angústia, o horror da perseguição, o amargor pela perda de parentes no Holocausto e as dificuldades e alegrias do recomeço no Brasil. O longa-metragem passa a refletir, neste momento, sobre a memória e suas lacunas. Na busca por respostas exatas para questões relacionadas ao período, o filme explicita as dificuldades de se reconstruir de forma nítida um passado que muitos levaram uma vida tentando esquecer. Uma sobrevivente, hoje aos 92 anos, narra:

Acervo da família Tess

Meu marido e eu nos casamos um mês antes da Noite dos Cristais. Tentamos tudo, perguntávamos a todos como poderíamos sair da Alemanha o mais rápido possível. De repente, ouvimos que poderíamos ir para o Brasil. Fomos de Essen até o consulado em Hamburgo. Lá, encontramos uma sala de espera cheia de gente, não sei se eram todos judeus. Assim conseguimos um visto de turista. Só sabíamos que o Brasil ficava na América do Sul. [...] Ainda nos vejo aquele dia no consulado.

Interior do Consulado-Geral do Brasil em Hamburgo

5


Arquivo Histórico do Itamaraty

Telegrama do cônsul-geral Joaquim Antonio de Souza Ribeiro relatando a destruição do consulado brasileiro na cidade portuária e os esforços para salvar documentos

6


O trauma comum entre todos os testemunhos é a lembrança dolorosa da Noite dos Cristais, um pogrom que se estendeu por toda a Alemanha na noite do 9 para o 10 de novembro de 1938, com apreensões, assassinatos e a depredação de sinagogas e estabelecimentos judeus – para muitos, o anúncio irrevogável de que a barbárie nazista não poderia mais ser freada e de que a saída do país, a qualquer preço, seria a única possibilidade de sobrevivência. Em setembro de 1939, a Alemanha invade a Polônia. Começa a Segunda Guerra Mundial. Documentos ainda inéditos revelam que Guimarães Rosa, em 1940, mostrava-se avesso ao governo alemão, criticava e ridicularizava líderes do Terceiro Reich, além de ter demonstrado desejo de abandonar o país naquele momento – um comportamento que chegou a lhe render represálias. Apesar da tensão da guerra, Guimarães Rosa mantinha intensa correspondência com as filhas pequenas, Vilma e Agnes, que haviam ficado no Brasil, como mostra carta datada de 13 de março de 1940: “Depois, mais tarde, você [Vilma] virá passear à Europa. [...] Na travessia do Equador (penso que você já sabe muita geografia), a Agnucha [Agnes] será batizada na piscina de bordo...”.2 O mesmo batismo na piscina pelo qual ele próprio havia passado poucos anos antes.

Início do fim

Documentário Outro sertão

1941: O cerco se fecha cada vez mais. Os bombardeios à volta de Guimarães Rosa tornam-se mais intensos e os alarmes passam a fazer parte do dia-a-dia dos diplomatas em Hamburgo. Em janeiro de 1942, o Brasil declara guerra aos países do Eixo. Guimarães Rosa parte para Berlim, ao lado de outros membros do corpo diplomático e de funcioná-

Prédio de Hamburgo no qual Guimarães Rosa morou a partir de outubro de 1940

7


rios do consulado. De lá, segue para um campo de internamento em Baden-Baden, destinado a diplomatas sul-americanos. O documentário revive esses dias passados em Baden-Baden, marcados pela tensão, apesar do conforto relativo das instalações onde os diplomatas são mantidos. Segundo testemunhas, para acalmar os ânimos das diversas crianças também ali confinadas, Guimarães Rosa organizou um “campeonato de xadrez” infantil, premiando os vencedores com caramelos e ensinando aos entediados filhos de diplomatas o uso de palavrões até então desconhecidos por eles. Em Baden-Baden, Guimarães Rosa permanece 100 dias, até o momento em que os cidadãos brasileiros são trocados por alemães, então detidos no Brasil. No dia 24 de maio, o corpo diplomático brasileiro deixa Baden-Baden de trem, atravessa a França e a Espanha com destino a Portugal. De Lisboa, partem a bordo do navio Bagé, em maio de 1942 – um percurso tenso até a chegada no Rio de Janeiro. Acima de tudo, o documentário mostra os paradoxos inevitáveis que persistem quando se volta o olhar para o passado. Depoimentos contraditórios de historiadores, lembranças às vezes controversas de sobreviventes, registros em documentos oficiais, lendas criadas em torno das circunstâncias e a subjetividade do próprio Guimarães Rosa nas referências que deixou escritas sobre o período tentam revelar esse “outro sertão” raramente lembrado quando se pensa sobre a obra do escritor.

Adriana Guimarães Jacobsen é formada em letras pela Universidade Federal do Espírito Santo. Graduada e mestre em ciências da comunicação pela Universidade Livre de Berlim, vive e trabalha como editora de imagens em Berlim. Soraia B. M. Vilela formou-se em comunicação social pela PUC-MG. Graduada e mestre em ciência da cultura pela Universidade Humboldt de Berlim, vive e trabalha como jornalista em Colônia.

Outro sertão. Roteiro e direção de Adriana Jacobsen e Soraia Vilela. Produção: Galpão Produções (Vitória, ES). Projeto aprovado no edital Petrobras Cultural 2005/2006. Formato: longametragem, com suporte final em 35 mm e exibição prevista para cinema e televisão. Previsão de lançamento: 2008.

NOTAS 1 Apud GUIMARÃES, Vicente. Joãozito: infância de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972, p. 157. 2 Apud GUIMARÃES ROSA, Vilma. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira 1999, p. 250.

8



Encarte da edição especial, números 20 e 21, comemorativa dos 10 anos dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, que tem por tema João Guimarães Rosa.


Guimar達es Rosa na Alemanha



Acervo da família Tess

Guimarães Rosa com seu automóvel em Hamburgo, onde foi cônsul-adjunto do Brasil

Guimarães Rosa viveu na Alemanha durante os momentos dramáticos que antecederam e marcaram a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Trabalhava como cônsul-adjunto em Hamburgo quando ocorreu, em novembro de 1938, a Noite dos Cristais, prenúncio do Holocausto. E, em 1942, quando o Brasil rompe relações diplomáticas com o governo de Hitler, ele dá início à viagem de volta a seu país natal. Essa experiência é tema de documentário realizado por duas jornalistas brasileiras residentes na Alemanha, que investigaram a atuação do diplomata no momento em que o consulado brasileiro emitiu vistos a centenas de judeus, possibilitando a estes escapar das perseguições nazistas. A atmosfera opressiva do Terceiro Reich deixaria marcas na literatura de Guimarães Rosa, como se pode ler em “O mau humor de Wotan”, texto incluído em Ave, palavra. Mas também permanece viva na memória de pessoas que conviveram com o escritor e cujas histórias foram resgatadas pelas pesquisadoras – conforme relato, com informações inéditas, sobre o documentário Outro sertão incluído neste encarte dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA.


Outro sertão Adriana Jacobsen e Soraia Vilela

Com lançamento previsto para 2008, o documentário Outro sertão reconstrói um período pouco conhecido da biografia de Guimarães Rosa: os anos vividos em Hamburgo, onde o escritor trabalhou como cônsul-adjunto entre 1938 e 1942. O longa-metragem revela aspectos até hoje desconhecidos dessa fase da vida do diplomata. Avesso a falar publicamente sobre si próprio, Guimarães Rosa fez pouca menção pública aos anos passados na Alemanha. Outro sertão procura, por meio de entrevistas com testemunhas que o conheceram na época, anotações, diários, cartas, imagens e documentos inéditos, relembrar aspectos esquecidos de sua estadia em Hamburgo. A reconstrução histórica audiovisual detalhada de seu cotidiano na Alemanha é feita com material original do período e imagens atuais dos locais por onde Guimarães Rosa passou. O ponto de partida é a travessia do Atlântico e sua chegada ao país, em 1938. O ciclo é fechado com o confinamento de diplomatas sul-americanos em Baden-Baden, quando o Brasil rompe relações com a Alemanha (janeiro de 1942), e o conseqüente retorno de Guimarães Rosa ao Brasil, meses mais tarde. O documentário lembra, dessa forma, um período de fundamental importância na vida do escritor, sua experiência como estrangeiro na Alemanha sob o regime nazista e a importância desses anos para a constituição de sua obra posterior.

Sob a ira de Wotan Em abril de 1938, Guimarães Rosa deixa o Brasil, faz uma viagem em “águas calmas” e chega ao porto de Bremerhaven, no dia 4 de maio. De lá segue para Hamburgo, onde assume suas funções um dia depois, ao lado de seu superior, o cônsul-ge2


Fotos: acervo da família Heubel

Marion e Hans-Helmut Heubel, casal de amigos alemães cuja história Guimarães Rosa relata em Ave, palavra

ral Joaquim Antonio de Souza Ribeiro. Com base em pesquisa realizada no decorrer dos últimos três anos, durante a qual foram coletados documentos, imagens inéditas e depoimentos, o documentário refaz os caminhos percorridos por Guimarães Rosa, mostrando seus lugares prediletos na cidade, como o zoológico Hagenbeck e as margens do Alster. No verão europeu desse mesmo ano, Guimarães Rosa conhece Marion Madsen, cuja história é relatada em “O mau humor de Wotan”, publicado no volume Ave, palavra. Nele, o escritor reproduz a atmosfera sufocante da Alemanha nazista e relata o triste acaso que levou à morte de Hans-Helmut (marido de Marion e seu grande amigo), na Segunda Guerra. Outro sertão documenta os rastros dessa família, redescobre na Alemanha uma Marion idosa, que ignora por completo o fato de que detalhes de sua vida estão registrados e publicados no outro lado do Atlântico, num idioma que ela não compreende. Nas lembranças de Marion, Guimarães Rosa permanece sendo “o cônsul” da Hamburgo dos anos 1930. O documentário comprova, dessa forma, o caráter autobiográfico de “O mau humor de Wotan” e a fidelidade das descrições de Rosa à realidade da época.

Impressões e decepções A ingenuidade inicial do deslumbramento com o país deixaria lugar, pouco mais tarde, no outono-inverno de 1938-1939, a uma insatisfação com a “fascinaçao bélica”, a “comida detestável” e a “pouca originalidade” dos alemães, como se lê nas cartas enviadas a seu tio Vicente. 3


Acervo da família Tess

Edifício no qual Guimarães Rosa morou em Hamburgo entre 1938 e outubro de 1940

Guimarães Rosa vive os prenúncios da Segunda Guerra Mundial, presencia a terrível Noite dos Cristais (9-10 de novembro de 1938) e os discursos inflamados de Hitler. Pouco depois, sua insatisfação no país era clara, como se lê em carta ao tio Vicente, datada de 19 de novembro de 1939: “Este povo é pobre, conservador e quase que só se interessa por carros blindados e aviões de bombardeio”.1 No consulado de Hamburgo, Guimarães Rosa é confrontado com a correspondência de teor anti-semita trocada por membros do corpo diplomático brasileiro na Alemanha e com as chamadas “circulares secretas”, enviadas pelo Itamaraty aos diplomatas no exterior. Diariamente o consulado era procurado por aqueles que buscavam uma possibilidade de fuga do regime nazista. Entre 1938 e 1939, o consulado brasileiro em Hamburgo emite vistos para centenas de pessoas. A cidade, aonde em fins do século XVI chegaram os primeiros judeus vindos da Península Ibérica, tinha em 1933 mais de cem instituições culturais e sociais judaicas. Marcada até a ascensão do nazismo pela tradição liberal portuária, era a principal saída procurada pelos que tentavam escapar das perseguições. Em Hamburgo, Guimarães Rosa viria a conhecer Aracy Moebius de Carvalho, funcionária contratada do consulado, com quem passaria a viver mais tarde, após o retorno ao Brasil. O cargo ocupado por Aracy não permitia que ela assinasse documentos oficiais de concessão de visto. Guimarães Rosa, na função de cônsul-adjunto, tampouco tinha autonomia para expedir tal documentação, exceto durante a ausência do cônsul-geral. O documentário procura detectar o papel exercido por Guimarães Rosa no consulado através de uma análise detalhada da correspondência diplomática do período, do relato de historiadores e da comparação com dados de outras representações diplomáti4


cas brasileiras na Alemanha. E, acima de tudo, através dos testemunhos de sobreviventes ou de seus descendentes. Nas lembranças e no cotidiano dessas pessoas, o filme encontra não apenas indícios sobre a vida de Guimarães Rosa, mas também revelações simbólicas sobre a história da emigração para o Brasil naquele momento.

Ontem e hoje Mesmo falando sobre acontecimentos que se passaram há quase sete décadas, alguns sobreviventes, hoje com mais de 85 anos de idade, narram a fuga da Alemanha para o Brasil. O documentário traz à tona a angústia, o horror da perseguição, o amargor pela perda de parentes no Holocausto e as dificuldades e alegrias do recomeço no Brasil. O longa-metragem passa a refletir, neste momento, sobre a memória e suas lacunas. Na busca por respostas exatas para questões relacionadas ao período, o filme explicita as dificuldades de se reconstruir de forma nítida um passado que muitos levaram uma vida tentando esquecer. Uma sobrevivente, hoje aos 92 anos, narra:

Acervo da família Tess

Meu marido e eu nos casamos um mês antes da Noite dos Cristais. Tentamos tudo, perguntávamos a todos como poderíamos sair da Alemanha o mais rápido possível. De repente, ouvimos que poderíamos ir para o Brasil. Fomos de Essen até o consulado em Hamburgo. Lá, encontramos uma sala de espera cheia de gente, não sei se eram todos judeus. Assim conseguimos um visto de turista. Só sabíamos que o Brasil ficava na América do Sul. [...] Ainda nos vejo aquele dia no consulado.

Interior do Consulado-Geral do Brasil em Hamburgo

5


O trauma comum entre todos os testemunhos é a lembrança dolorosa da Noite dos Cristais, um pogrom que se estendeu por toda a Alemanha na noite do 9 para o 10 de novembro de 1938, com apreensões, assassinatos e a depredação de sinagogas e estabelecimentos judeus – para muitos, o anúncio irrevogável de que a barbárie nazista não poderia mais ser freada e de que a saída do país, a qualquer preço, seria a única possibilidade de sobrevivência. Em setembro de 1939, a Alemanha invade a Polônia. Começa a Segunda Guerra Mundial. Documentos ainda inéditos revelam que Guimarães Rosa, em 1940, mostrava-se avesso ao governo alemão, criticava e ridicularizava líderes do Terceiro Reich, além de ter demonstrado desejo de abandonar o país naquele momento – um comportamento que chegou a lhe render represálias. Apesar da tensão da guerra, Guimarães Rosa mantinha intensa correspondência com as filhas pequenas, Vilma e Agnes, que haviam ficado no Brasil, como mostra carta datada de 13 de março de 1940: “Depois, mais tarde, você [Vilma] virá passear à Europa. [...] Na travessia do Equador (penso que você já sabe muita geografia), a Agnucha [Agnes] será batizada na piscina de bordo...”.2 O mesmo batismo na piscina pelo qual ele próprio havia passado poucos anos antes.

Início do fim 1941: O cerco se fecha cada vez mais. Os bombardeios à volta de Guimarães Rosa tornam-se mais intensos e os alarmes passam a fazer parte do dia-a-dia dos diplomatas em Hamburgo – como mostra o telegrama enviado pelo cônsul Souza Ribeiro à Secretaria de Estado das Relações Exteriores em 11 de maio (e transcrito a seguir com base em cópia do documento guardado no Arquivo Histórico do Itamaraty): Esta madrugada, com o segundo ataque aéreo de uma nova série, mais intensa e destruidora, inaugurada há dois dias pela aviação britânica, quatro bombas de alto poder caíram nas proximidades imediatas do edifício da sede deste Consulado Geral. Uma dessas bombas, explodindo a cinco metros do prédio, nele produziu enormes estragos, tendo quase que destruído as três salas da frente, ocupadas por esta repetição. Avisado às sete horas da manhã, dirigi-me com o cônsul-adjunto Guimarães Rosa e demais auxiliares do Consulado ao local, onde penetramos com dificuldade, devido ao cordão de isolamento estabelecido pela polícia. Verificando a extensão do sucedido e prevenido pelas autoridades da presença, a 100 m de distância, de duas bombas de retardamento, imediatamente, usando o meu automóvel particular, por falta de outro meio de transporte, 6


fiz remover a parte principal do arquivo e os valores para a minha residência, onde instalei provisoriamente a chancelaria do Consulado.

Documentário Outro sertão

Em janeiro de 1942, o Brasil declara guerra aos países do Eixo. Guimarães Rosa parte para Berlim, ao lado de outros membros do corpo diplomático e de funcionários do consulado. De lá, segue para um campo de internamento em Baden-Baden, destinado a diplomatas sul-americanos. O documentário revive esses dias passados em Baden-Baden, marcados pela tensão, apesar do conforto relativo das instalações onde os diplomatas são mantidos. Segundo testemunhas, para acalmar os ânimos das diversas crianças também ali confinadas, Guimarães Rosa organizou um “campeonato de xadrez” infantil, premiando os vencedores com caramelos e ensinando aos entediados filhos de diplomatas o uso de palavrões até então desconhecidos por eles. Em Baden-Baden, Guimarães Rosa permanece 100 dias, até o momento em que os cidadãos brasileiros são trocados por alemães, então detidos no Brasil. No dia 24 de maio, o corpo diplomático brasileiro deixa Baden-Baden de trem, atravessa a França e a Espanha com destino a Portugal. De Lisboa, partem a bordo do navio Bagé, em maio de 1942 – um percurso tenso até a chegada no Rio de Janeiro. Acima de tudo, o documentário mostra os paradoxos inevitáveis que persistem quando se volta o olhar para o passado. Depoimentos contraditórios de historiadores, lembranças às vezes controversas de sobreviventes, registros em documentos oficiais, lendas criadas em torno das circunstâncias e a subjetividade do próprio Guimarães Rosa nas referências que deixou escritas sobre o período tentam revelar esse “outro sertão” raramente lembrado quando se pensa sobre a obra do escritor.

Prédio de Hamburgo no qual Guimarães Rosa morou a partir de 1940

7


Adriana Guimarães Jacobsen é formada em letras pela Universidade Federal do Espírito Santo. Graduada e mestre em ciências da comunicação pela Universidade Livre de Berlim, vive e trabalha como editora de imagens em Berlim. Soraia Vilela formou-se em comunicação social pela PUC-MG. Graduada e mestre em ciência da cultura pela Universidade Humboldt de Berlim, vive e trabalha como jornalista em Colônia.

Outro sertão. Roteiro e direção de Adriana Jacobsen e Soraia Vilela. Produção: Galpão Produções (Vitória, ES). Projeto aprovado no edital Petrobras Cultural 2005/2006. Formato: longametragem, com suporte final em 35 mm e exibição prevista para cinema e televisão. Previsão de lançamento: 2008.

NOTAS 1 Apud GUIMARÃES, Vicente. Joãozito: infância de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972, p. 157. 2 Apud GUIMARÃES ROSA, Vilma. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira 1999, p. 250.

O IMS e as autoras agradecem Detlev Heubel, que gentilmente cedeu as fotos de Marion e Hans-Helmut Heubel.

8



Encarte da edição especial, números 20 e 21, comemorativa dos 10 anos dos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, que tem por tema João Guimarães Rosa.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.