Ocupação Laura Cardoso

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Ocupação Laura Cardoso

Laura Cardoso

Conheça a história da atriz que marcou o rádio, a TV, o teatro e o cinema brasileiros Relembre os papéis vividos por Laura Cardoso

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Laura Cardoso Laura Cardoso, prestes a completar 90 anos, investe toda energia na criação de personagens. São mais de 70 anos de profissão, dando corpo e alma às muitas mulheres que criou. Força, vitalidade e persistência são características primordiais para descrever sua personalidade e sua carreira – iniciada no rádio, aos 15 anos. Primeira mostra do ano, a 33ª edição do programa Ocupação homenageia Laura e dá início a uma série de exposições que valorizam a energia, o poder de ação e o vigor criativo de mulheres cujos trabalhos são essenciais para a arte e para a cultura brasileiras. A evocação do feminino faz parte das comemorações do aniversário do Itaú Cultural, que celebra 30 anos. Nascida no bairro da Bela Vista, em São Paulo, Laura Cardoso dedicou-se como uma operária a praticamente todas as linguagens e expressões artísticas. A atriz transita por diferentes palcos – circo, rádio, teatro, televisão e cinema. A Ocupação Laura Cardoso convida o público para conhecer o processo criativo da atriz, os registros de sua trajetória e a memória de seus papéis em um percurso não linear que se preten-

coordenação editorial Carlos Costa edição Maria Clara Matos conselho editorial Ana de Fátima Sousa, Bruna Ferreira, Camila Nader, Carlos Gomes, Fernando Galante, Galiana Brasil, Glaucy Tudda, Regina Medeiros e Tânia Rodrigues coordenação de design Jader Rosa projeto gráfico e diagramação Megalo Design (terceirizada) produção editorial Bruna Guerreiro produção gráfica Lilia Góes supervisão de revisão Polyana Lima revisão Ciça Corrêa e Rachel Reis (terceirizadas) colaboradores Flávio Luiz Porto e Silva, Livia Deodato, Paulo Hebmüller, Sabina Anzuategui e Welington Andrade foto da capa: André Seiti

de múltiplo a exemplo de sua atuação. O tempo de Laura é o hoje, o agora. Esta publicação tem como foco se aprofundar nos trabalhos realizados por Laura Cardoso e analisar o contexto em que foram desenvolvidos. Aborda a marca de sua interpretação, seu poder de adaptação e os obstáculos que teve de superar por ser mulher. Outros conteúdos sobre Laura Cardoso podem ser conferidos no site da Ocupação (itaucultural.org.br/ocupacao) e na Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras (enciclopediaitaucultural.org.br).

Itaú Cultural


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Ela governa as coxias, o palco e a plateia por Livia Deodato

22 Aprendizado em Mão Dupla por Paulo Hebmüller

32 Mulheres: Profissionais e Personagens na TV Brasileira por Sabina Anzuategui

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Camaleônica Laura Cardoso por Flávio Luiz Porto e Silva

56 Tragicômica à Moderna

por Welington Andrade


fotos: AndrĂŠ Seiti

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Laura Cardoso: vida e obra por Flávio Luiz Porto e Silva e Maria Clara Matos

1922

7 de setembro

Ocorre a primeira demonstração oficial de rádio no Brasil, durante as comemorações do centenário da Independência do país, com a transmissão do discurso do presidente Epitácio Pessoa.


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LINHA DO TEMPO Com o propósito de contextualizar e situar o leitor, esta linha do tempo se estende por toda a publicação. Ela funciona de forma autônoma, sem relacionar-se diretamente aos textos que aparecem na mesma página. Entre marcos importantes da história do Brasil e do desenvolvimento dos meios de comunicação no país, pontuamos fatos relevantes da vida e principalmente da carreira de Laura Cardoso.

9 de julho

Nasce Laurinda de Jesus Cardoso, que adotaria anos depois o nome artístico de Laura Cardoso.

1931

13 de setembro

No primeiro governo de Getúlio Vargas, o Poder Público passa a regulamentar a atividade de radiodifusão.

1932

1927

Laura Cardoso (com sua filha Fátima no colo) e família em piquenique no bairro de Interlagos, em São Paulo | foto: acervo de família

Estoura a Revolução Constitucionalista em São Paulo. O rádio paulista apoia o movimento e tem destacada atuação.


foto: Ludovic Carème


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Ela governa as coxias, o palco e a plateia Laura Cardoso é admirada e aplaudida há mais de 70 anos por Livia Deodato

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Filha de imigrantes portugueses, Laurinda de Jesus Cardoso nasceu e cresceu no tradicional bairro da Bela Vista, em São Paulo. Nascida em 13 de setembro de 1927, sempre quis ser atriz. E precisou de muita coragem e perseverança para enfrentar os pais e a vizinhança quando se deu conta de que não seria feliz se não vivesse para as artes cênicas. Àquela época, toda mulher que escolhesse essa carreira era vista como meretriz. “As mulheres que faziam arte eram discriminadas. Naquele tempo, se não fosse operária ou do lar, a gente era vista como puta”, conta Laura em entrevista à equipe do Itaú Cultural para a Ocupação Laura Cardoso. Em 1942, aos 15 anos, sem a aprovação da família, Laurinda participou de um teste na Rádio Cosmos (atual Rádio América) e foi aprovada. Seu nome de batismo, no entanto, não soou muito bem aos ouvidos da direção artística da rádio. Sugeriram simplificar para Laura Cardoso, que virou a alcunha de uma das maiores artistas vivas do Brasil. A atriz, hoje com 89 anos, dedicou a vida aos estúdios das rádios, aos palcos de teatro e aos sets de novelas e de cinema, contabilizando mais de 110 trabalhos e dezenas de prêmios. Mesmo com toda essa experiência, não houve sequer um dia em que ela não tenha sentido a adrenalina pulsar ao encarnar uma personagem. Costuma dizer que, a cada novo papel, ela se sente “começando no escuro”.

A atriz e escritora Vida Alves – falecida no início de 2017, aos 88 anos – foi categórica ao afirmar que Laura virou uma grande estrela em pouco tempo. “Ela sempre foi muito boa. Aqueles olhos curiosos, sempre atentos... Uma sede de aprender, aprender! Ela ficava atrás de todos em busca de novos desafios”, relembra. Enquanto emprestava sua voz a diversos personagens no rádio, Laura flertava com a possibilidade de trabalhar na TV. E quem deu a primeira oportunidade a Laura foi a própria Vida Alves, que a escalou para participar do programa de sua autoria Tribunal do Coração, ao ar na TV Tupi em 1952. Vida explica: “Era um pequeno tribunal com causas reais debatidas por um júri. Laura foi personagem desse programa e interpretava os casos. Foi um grande sucesso na época. E ela já se mostrava brilhante na televisão”. Pelos corredores da TV Tupi circulavam outros jovens e talentosos profissionais; um deles em especial chamou atenção de Laura: o ator, roteirista, diretor e produtor Fernando Balleroni. Os dois casaram-se pouco tempo depois e tiveram três filhos, Fátima, José e Fernanda. Fernando Balleroni faleceu aos 58 anos, em 1980 – ano também em que a TV Tupi foi fechada.

Multifacetada Laura Cardoso foi fanática religiosa, mãe amargurada de gêmeas, imigrante, matriarca de famílias caipira, indiana. O olhar atento para a


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- É inaugurada a Sociedade Rádio Cosmos. - Fundação da Rádio Cultura e inauguração da Rádio Excelsior.

1936

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Laura Cardoso aos 19 anos nos estúdios da Rádio Cosmos | foto: acervo de família/Estúdio Ritz

Entra no ar a Rádio Nacional do Rio de Janeiro.


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Entra no ar a Rádio Tupi de São Paulo, pertencente ao grupo dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand.

1939

Getúlio Vargas, então na Presidência da República, instaura o Estado Novo, por meio de um golpe de estado.

1938

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Espetáculo Vem Buscar-Me que Ainda Sou Teu (1990) | foto: Lenise Pinheiro

Início da Segunda Guerra Mundial.


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vida sempre foi seu maior laboratório. A feira livre, por exemplo, é um de seus lugares favoritos para estudar figuras e se inspirar para a criação de personagens. Laura estreou no teatro em 1959, com a peça Plantão 21, sob a direção de Antunes Filho. Ambos trabalharam juntos novamente em 1993, em Vereda da Salvação, que rendeu à atriz seu segundo Prêmio Shell – o primeiro foi pelo trabalho Vem Buscar-Me que Ainda Sou Teu, com direção de Gabriel Villela e texto de Carlos Alberto Soffredini, em 1990. “Antunes é considerado um dos cinco melhores diretores do mundo. É muito bom trabalhar com ele, eu aprendi muito. Nos ensaios chegávamos a ficar 24 horas no teatro estudando o texto”, diz Laura. “Ela sempre foi líder do grupo com toda aquela sabedoria. Trazia

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suas próprias experiências para o espetáculo que estávamos criando”, conta Claudio Fontana, que estreou no palco ao lado de Laura em Vem Buscar-Me que Ainda Sou Teu. “Foi por meio da convivência com ela que entendi que o teatro tinha uma generosidade e uma magia muito forte. Deixei um cargo executivo em uma indústria química para me dedicar às artes cênicas por causa da Laura”, completa o ator. Além do rádio, da TV e do teatro, a atriz passou pelo circo, de onde não tinha coragem de tirar o seu sustento. “O dinheiro que entrava era tão pouco que eu não tirava da bilheteria”, conta. Fez dublagem de filmes, séries e desenhos – uma das personagens mais famosas para a qual emprestou a voz foi a Betty Rubble, de Os Flintstones. “Tenho uma saudade gostosa dessa época e do entusiasmo que vivencia-

Radioteatro Representação teatral transmitida pelo rádio ou radiofonização de uma peça de teatro, obra literária, biografia, fato histórico ou contemporâneo. Verdadeira escola para autores, atores, diretores, sonoplastas e contrarregras, o radioteatro nos anos 1940 e em parte da década de 1950 chegou a ser considerado “a essência da arte radiofônica”.

1941

Radionovela Originária do romance-folhetim, a radionovela pertence à família do radioteatro. Enquanto o primeiro é unitário – a cada transmissão uma nova história –, a radionovela é levada ao ar em capítulos.

A Rádio Nacional cria o Repórter Esso durante a Segunda Guerra Mundial. No mesmo ano lança a primeira radionovela transmitida no Brasil – Em Busca da Felicidade, de Leandro Blanco.


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ele desse o mesmo sentido à narrativa. Voltava ao texto original para estudar mais e tentar entender o que a levou a “errar”. Ao fim de cada espetáculo, atendia a todos que desejavam falar, abraçar, elogiar. Parece haver consenso entre público e colegas de trabalho de que Laura Cardoso possui um magnetismo único. Até mesmo quando está em cena, mas não abre a boca. “Essa é uma capacidade que só as grandes estrelas têm. A concentração e a imersão na personagem são tão grandes, assim como a sabedoria de se colocar em cena, que automaticamente ela se transforma em um ímã. Laura não desperdiça uma vírgula, mantém sempre o sentimento e a razão adequados”, diz Wagner. Gabriel Villela, que tinha apenas 30 anos quando a dirigiu, engrossa o coro e a define como “uma grande máquina teatral”. “Laura é uma mulher inteligentíssima, muito estudiosa, ética e engraçada”, diz. “Nunca vi uma atriz que governa o palco, a plateia e as coxias, tudo ao mesmo tempo. É de um olhar, de uma totali-

Sumidade

Aos 15 anos, Laura ingressa na Rádio Cosmos, na qual inicia sua carreira como radioatriz.

1944

1942

O talento, a dedicação, o perfeccionismo e o comprometimento aliados à graça e à simplicidade de Laura Cardoso conquistaram, ao longo das décadas, aqueles que cruzaram o seu caminho. O ator, dramaturgo e diretor Odilon Wagner, com quem trabalhou no espetáculo A Última Sessão, em 2014, diz que a disposição de Laura sempre deixou todos boquiabertos. “Ela era sempre a primeira a chegar e a última a sair do teatro. Quando eu perguntava por que ela era sempre a última a sair, ela dizia: ‘Porque sempre dá para ficar melhor’.” Não se conformava quando trocava, sem querer, uma palavra do texto por um sinônimo, mesmo que

Na Rádio Tupi (SP), a atriz integra o elenco da radionovela A Toutinegra do Moinho, baseada no conhecido romancefolhetim de Émile Richebourg.

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va ao dublar a Betty, a moreninha dos Flintstones. Foi um trabalho delicioso com Helena Samara, Rogério Márcio e Marthus Mathias emprestando suas vozes a seus personagens Wilma, Barney e Fred, respectivamente”, destaca Laura na entrevista que a autora Julia Laks realizou para a edição da Coleção Aplauso sobre a atriz.

Termina a Segunda Guerra Mundial.


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Laura Cardoso casa-se com Fernando Balleroni.

1950

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Laura Cardoso em seu casamento, em 1949 | foto: acervo de família

- Numa iniciativa de Assis Chateaubriand, entra no ar a Tupi-Difusora de São Paulo. O Brasil torna-se o pioneiro em transmissão televisiva na América Latina.

- A TV Tupi apresenta A Vida por um Fio, de Lucille Fletcher. Adaptado e dirigido por Cassiano Gabus Mendes, é considerado o marco inicial do gênero teleteatro na televisão brasileira.


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dade... Ela tem a consciência da mecânica que rege todo o espetáculo e sabe verificar se tudo está a postos.” O conhecimento autodidata que Laura acumulou ao longo das décadas impressiona todos que têm mais contato com ela. E, por saber do seu valor, a atriz não pensa duas vezes antes de enfrentar a chefia do meio artístico – no caso, os diretores das novelas, das peças e dos filmes. Já brigou com diretora que quis recomeçar uma cena porque não tinha enquadrado a atriz bonitinha e já pediu para ser dispensada de um trabalho ao ver o seu papel diminuir e ganhar

cada vez menos falas na trama (depois disso, sua personagem cresceu). Laura Cardoso contribuiu para a formação do caráter das artes cênicas no Brasil. Atualmente, na ativa, persevera na construção de seu legado, que está longe de chegar ao fim.  Livia Deodato é jornalista. Trabalhou em veículos como o Caderno 2, do jornal O Estado de S. Paulo, nas revistas Época e Marie Claire e no canal de TV Arte 1. Atualmente produz conteúdo para diversas publicações e agências.

Teleteatro

- Entra no ar o Grande Teatro das Segundas-Feiras, mais tarde Grande Teatro Monções e depois Grande Teatro Tupi. Dele participavam companhias teatrais especialmente convidadas para o programa, como as de Madalena Nicol, Procópio Ferreira e Maria Della Costa. As peças eram encenadas nos estúdios da emissora, ao vivo.

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Além de peças de teatro, adaptadas ou não, inclui a encenação de obras literárias (romance, novela e conto), biografias, episódios históricos, fatos passados ou contemporâneos adaptados dramaturgicamente para a televisão. Os episódios são únicos, diferentemente da telenovela e da minissérie, que são exibidas em capítulos. Além da difusão cultural, a grande importância desse gênero de programa foi o laboratório a que ele submeteu os profissionais do rádio, da televisão e do teatro, em todos os níveis, tanto na área artística quanto no setor técnico.

- Estreia Sua Vida Me Pertence, de Walter Forster, primeira telenovela da televisão brasileira. Fazem parte do elenco o próprio autor, Vida Alves, Lia de Aguiar, Lima Duarte e outros nomes. Com apenas 15 capítulos, dois por semana, com cerca de 20 minutos cada um, ao vivo. Protagonizada por Walter Forster e Vida Alves, nela ocorreu o primeiro beijo na boca da telenovela brasileira.


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Lima Duarte e Laura Cardoso, em 1969, na TV Tupi | foto: acervo de família/J.B. de Campos Filho

Telenovela

- Entra no ar a TV Paulista (SP). se dos profissionais em sua maioria vindos do rádio e era - Estreia o TV de Vanguarda, transmitido quinzenalmente, considerado o mais importante aos domingos. Ao longo dos programa de teleteatro da anos, a TV de Vanguarda televisão brasileira. Idealizado exibiu alguns dos maiores por Dermival Costa Lima e textos da dramaturgia e Cassiano Gabus Mendes, valia- da literatura mundiais.

1952

Com raízes no romance-folhetim e na radionovela, a telenovela é a história em capítulos. Pode ser um original escrito especialmente para a televisão ou resultar da adaptação de obras literárias, principalmente romances. Sempre presente o gancho para o próximo capítulo, assim como acontecia no romance-folhetim e na radionovela.



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Eu só pensava no preconceito arraigado dos anos 1940 em torno dos artistas e em como as mocinhas que faziam tal opção eram malvistas.” (Trecho retirado do livro Laura Cardoso: Contadora de Histórias, 2010, escrito por Julia Laks. Coleção Aplauso Perfil. Imprensa Oficial)


foto: AndrĂŠ Seiti

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Aprendizado em mão dupla Na década de 1950, com a chegada da TV ao Brasil, os profissionais da área foram desafiados a criar uma nova linguagem artística por Paulo Hebmüller

O programa Almoço com as Estrelas ia ao ar todos os sábados na hora do almoço pela TV Tupi. Na imagem, Laura Cardoso recebe do jornalista Roberto de Almeida Rodrigues a caricatura do Hall da Fama – 7 Dias na TV, em 1958 | foto: acervo Museu Pró-TV


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Não havia modelo, não havia padrão, não havia “manual”: para as primeiras gerações de atores e atrizes a atuar na nascente televisão brasileira do início da década de 1950, o desafio era inventar uma linguagem de dramaturgia para o novo veículo. Esses passos foram dados especialmente com a experiência do teleteatro, que transportava para a televisão peças em cartaz nos palcos. “Era um desafio fantástico, cumprido de maneira brilhante por aquelas gerações, que souberam colocar na tela o brasileiro que estava na rua”, define o ator e diretor Celso Frateschi. “Tratava-se de criar uma linguagem, e não apenas de fazer uma transposição de um meio a outro. Aí é que se caracteriza o grande trabalho.” Frateschi teve oportunidade de trabalhar ao longo da carreira com alguns desses nomes. Nessas ocasiões, confirmou a impressão que guardava dos seus primeiros tempos de espectador, na infância e na adolescência, durante a década de 1960: a representação era prazerosa para quem fazia e para quem assistia. Para colocar no ar produções exibidas em programas como Grande Teatro Tupi e TV de Vanguarda, a TV Tupi – primeira emissora do Brasil, criada em 1950 por Assis Chateaubriand – recrutava elencos das grandes companhias teatrais em atividade. “Foram para a televisão os atores e as atrizes das melhores companhias, primeiro de São Paulo e depois do Rio de Janeiro”, conta o pesquisador de teatro brasileiro Warde Marx. Entre os nomes pioneiros no novo meio estavam Procópio Ferrei-

ra, Sérgio Britto, Cacilda Becker e Maria Della Costa. Se esses talentos tiveram de se “encontrar” na nova experiência, considera Warde Marx, também é verdade que a televisão absorveu muito do que eles traziam dos palcos. Afinal, o veículo precisava de atores e atrizes para criar os programas e, portanto, as adaptações ocorriam em mão dupla. Também não se pode esquecer que nos primeiros anos as produções televisivas eram apresentadas ao vivo, e os elencos com experiência no teatro possuíam mais recursos para enfrentar eventuais imprevistos ou problemas técnicos. Antes da chegada da televisão, eram as radionovelas que atraíam as atenções e a audiência. Porém, foi relativamente pequeno o número de atores e atrizes que conseguiram es-

Neyde Pavani e Laura Cardoso, em 1959, na peça Não Sairás Esta Noite | foto: acervo Museu Pró-TV

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tender ao novo meio a carreira já consolidada no rádio. Nesse grupo está Laura Cardoso, que começou nas radionovelas ainda na adolescência, em meados da década de 1940. Para o crítico José Cetra Filho, autor do livro O Teatro Paulistano de 1964 a 2014: Memórias de um Espectador, a versatilidade era uma característica importante para os artistas que fizeram essa migração. No rádio, um ator ou uma atriz jovem podiam utilizar recursos de voz para representar um personagem bem mais velho. Na televisão, essa caracterização exigia talentos adicionais. Para os homens, por exemplo, uma voz linda e aveludada podia garantir papéis de galã no rádio – “mas, se eles não tinham a estampa de galã que a televisão exigia, não continuavam nela”, diz o crítico. A importância da versatilidade e do talento aparece num exemplo

que José Cetra Filho, com sua memória privilegiada, puxa da década de 1960 – uma produção do TV de Comédia, também da TV Tupi. Na trama, a jovem Laura Cardoso caracterizou-se para interpretar uma personagem de mais de 60 anos que era sogra da personagem vivida pela ainda mais jovem Susana Vieira. “Lembro do trabalho da Laura desde essa época como uma coisa maravilhosa”, diz ele.

A consolidação da linguagem televisiva A partir do final dos anos 1950 e do início da década seguinte, as experimentações e os aprendizados fortaleceram uma linguagem televisiva. A qualidade técnica dos equipamentos melhorava continuamente e a projeção da voz, por exemplo, tinha de ser reduzida para que o áudio não

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Nos primeiros tempos da televisão no Brasil, o número de telespectadores era pequeno, devido ao preço alto dos aparelhos televisores. A televisão permanecia poucas horas no ar e o rádio continuava imbatível. Mas o progressivo desenvolvimento da TV ao longo da década de 1950 e o surgimento de novas emissoras terminaram por abalar a estrutura e a programação radiofônicas. Além de absorver alguns dos seus principais profissionais e recursos, a televisão conquistava cada vez mais as verbas publicitárias, levando o rádio a uma crise. As grandes produções transferiram-se para a televisão e a programação radiofônica empobreceu.

Inauguração da TV Record (SP).


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Cena de Rolando Boldrin e Laura Cardoso em A Severa, exibida da década de 1960 pela TV Tupi | foto: acervo Museu Pró-TV

“estourasse” nos microfones. Como a dimensão reduzida da tela maximiza os movimentos, atores e atrizes tiveram de aprender a conter gestos e expressões. “A rubrica ‘Fulano caminha decididamente em direção à porta’ é encenada de formas completamente diferentes na televisão e no teatro”, aponta Warde Marx. Neste, pode significar atravessar todo o palco; naquela, dar uns poucos passos. Em qualquer dos casos, o talento é decisivo. “Nos poucos trabalhos de televisão que fez, o Paulo Autran exibia um domínio técnico invejá-

vel. Como muitos outros, ele soube levar a formação do teatro para a televisão”, salienta Celso Frateschi. O trânsito e os aprendizados em mão dupla tiveram sequência com nomes de gerações posteriores, como Glória Pires e Tony Ramos, que surgiram e cresceram na televisão para depois expandirem seu trabalho em produções de teatro e cinema. Esse trânsito, é claro, não está isento de risco. José Cetra Filho chama atenção para a possibilidade de “acomodação” do intérprete a um estilo que concentra toda a expressividade


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1954

Laura Cardoso estreia na televisão em um dos programas da série Tribunal do Coração (TV Tupi), criada por Teófilo de Barros Filho e produzida por Vida Alves. Daí em diante, torna-se frequente a sua participação em teleteatros e telenovelas em geral.

zidos para TV, para cinema e para smartphone são muito diferentes entre si, tanto para quem cria quanto para quem usufrui”, completa Celso Frateschi. Paulo Hebmüller é jornalista formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pós-graduado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Já colaborou como freelancer para as revistas Brasileiros, Caros Amigos e Carta Capital, e os jornais Correio Popular e Valor Econômico, além de sites e outras publicações.

1957-59

no rosto, muitas vezes apresentado em close na tela. No palco, porém, o corpo todo fala – e no teatro, lembra o crítico, é o espectador que escolhe para onde quer dirigir sua atenção e o que quer ver. Na televisão e no cinema, é o olhar de editores e diretores que decide os enquadramentos. Hoje, a procura de linguagens próprias é um desafio para o material voltado para a internet. Nas produções para a rede, é necessário refrear ainda mais os gestos e as expressões, lembra Warde Marx, porque boa parte do público assistirá ao trabalho nas pequenas telas dos smartphones. Além disso, é preciso ser muito mais rápido e sintético naquilo que se quer dizer. “Filmes produ-

- A atriz estreia no programa TV de Comédia, que se alternava aos domingos, com o TV de Vanguarda. • Treze à Mesa, de Marc-Gilbert Sauvajon (TV de Comédia) • Ralé, de Maximo Gorki (TV de Vanguarda) • Vende-se um Passado, de Geraldo Vietri (TV de Comédia)

• Eram Todos Meus Filhos, de Arthur Miller (TV de Vanguarda) - Laura Cardoso estreia no teatro, em 1959, com a peça Plantão 21. A montagem projetou o grupo Pequeno Teatro de Comédia e seu diretor, Antunes Filho.


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Cena de A Severa, exibida na década de 1960 pela TV Tupi | foto: acervo Museu Pró-TV

Introduzido em 1960, o videotape inicia uma nova etapa na história da televisão brasileira. Com a gravação de som e imagem ao mesmo tempo e posterior reprodução, o VT revolucionou a técnica e permitiu o desenvolvimento de uma linguagem mais elaborada, incluindo a correção de erros. Favoreceu a centralização da produção televisiva no eixo São PauloRio de Janeiro e a circulação dos programas por todo o país.

1960-62

Cartaz da peça de estreia de Laura Cardoso no teatro, em 1959, Plantão 21  | acervo José Cetra Filho

Duas novas emissoras são • Há Sempre o Amanhã, inauguradas na capital paulista: telenovela de Vida Alves TV Cultura e TV Excelsior. • A Casa de Bernarda Alba, • Hamlet, de William de Garcia Lorca (Grande Shakespeare Teatro Tupi) (TV de Vanguarda) • A Severa, de Júlio Dantas (Grande Teatro Tupi)



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Eu gosto de ficar meio no escuro estudando o texto. Aos poucos eu vejo meu personagem nascer.” (Entrevista com a atriz cedida em 3 de janeiro de 2017 à equipe do Itaú Cultural)


foto: Richner Allan

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Pão, Pão, Beijo, Beijo, novela exibida em 1983 pela Rede Globo | foto: acervo de família/Rede Globo

Mulheres: profissionais e personagens na TV brasileira Como os meios de comunicação lidavam com a figura feminina na primeira metade do século XX por Sabina Anzuategui


Ocupação Laura Cardoso

No início dos anos 1940, quando a jovem Helena Silveira, com dificuldades financeiras depois de um divórcio, foi pedir emprego no jornal Folha da Manhã, ela esperava ser contratada para escrever crônicas e resenhas de livros. Mas o jornalista Rubens do Amaral, amigo de seu pai, lhe ofereceu a função de cronista social: “Esqueça tudo que aprendeu. Você terá de escrever coisas tolas, fúteis, sem nada de literário. Tem de ir a festas, descrever os chapéus das mulheres”. Helena Silveira, irmã da escritora Dinah Silveira de Queiroz, tinha um livro de contos publicado. Depois de quase três décadas escrevendo colunas sociais, ela se tornaria uma das críticas de TV mais importantes da imprensa brasileira. Nessa época, nas cidades brasileiras, principalmente nas maiores, como São Paulo e Rio de Janeiro, a mulher escolarizada era uma figura possível, embora as escolas visassem a uma educação “prática”, ou seja, à preparação da mulher para a “educação dos filhos, a orientação do esposo, o governo do lar”. As mulheres que estudavam faziam cursos

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de magistério, artes e “artes domésticas”. Algumas estudavam datilografia, serviços de saúde, assistência social, comércio. No trabalho, os “cargos menos importantes e menos exigentes” eram “mais apropriados para o sexo feminino”: vendedoras, secretárias, enfermeiras, professoras. O emprego das mulheres era aceito para complementar a renda das famílias e promover o crescimento do país, desde que não alterasse a feminilidade nem interferisse no cumprimento dos deveres domésticos. Quando uma jovem se casava, esperava-se que deixasse de trabalhar. No mundo das artes (a pintura, a música, as letras), a participação feminina era um pouco mais aceitável. As artistas e as escritoras podiam trabalhar em casa, com horário flexível e pouca remuneração. Era a continuação natural do costume de moças educadas que tocavam piano. Eram elogiadas pela sensibilidade e pela elegância. Por causa da “ternura feminina”, eram consideradas naturalmente qualificadas para escrever para outras mulheres e crianças.

1963

Em fins de 1962 e início • Entre Quatro Paredes, de 1963, a TV Excelsior de Jean Paul Sartre reformulou-se totalmente. (TV de Vanguarda) Técnicos, produtores e artistas • Longa Jornada Noite Adentro, em geral foram convidados de Eugene O’Neill para trabalhar na emissora com (Grande Teatro Tupi) ofertas salariais superiores ao •O Anjo de Pedra, de Tennessee que recebiam habitualmente. Williams (Grande Teatro Tupi) Entre as novidades, a TV Excelsior lançou a telenovela diária, que logo conquistou o público.


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Laura Cardoso e Henrique Martins em cena do filme Um Lugar ao Sol (1959) | foto: acervo Uh/Folhapress

1964

- O presidente da República, Calderón adaptada por Walter João Goulart, é deposto e inicia- George Durst se a ditadura militar. - Laura Cardoso estreia no • Um Bonde Chamado Desejo, cinema em Imitando o Sol, de Tennessee Williams de Geraldo Vietri (TV de Vanguarda) • Os Fuzis da Sra. Carrar, de Bertold Brecht (TV de Vanguarda) • Gutierritos, o Drama dos Humildes, novela de Stella

1967

Os Miseráveis, novela exibida em 1967 pela TV Bandeirantes | foto: acervo de família/TV Bandeirantes

- Entra no ar a TV Bandeirantes (SP). Neste mesmo ano a atriz atua como a personagem Fantine em Os Miseráveis, adaptação do romance de Victor Hugo, sob a direção de Walther Negrão. - Laura Cardoso volta a trabalhar na TV Tupi e integra o elenco de Os Rebeldes, telenovela de Geraldo Vietri.


Ocupação Laura Cardoso

- Morre Assis Chateaubriand. - Laura Cardoso integra o elenco da peça As Criadas, de Jean Genet. - A atriz muda de emissora e passa a trabalhar na TV Record, na qual participou de várias telenovelas, como As Pupilas do Senhor Reitor, baseada no

cam esses sonhos. Dulce Santucci, nascida no interior de Minas Gerais em 1921, gostava de ler e escrevia contos sem publicar. Aos 26 anos, casada, escreveu um romance e o enviou à Rádio São Paulo. Foi convidada para transformar seu romance numa radionovela. Ivani Ribeiro nasceu em 1920 e fez o normal (magistério) em Santos, onde nasceu. Mudou-se para São Paulo pensando em cursar faculdade de filosofia e começou a escrever para o rádio. Lúcia Lambertini, nascida em 1926, tinha amigos no Teatro Escola de São Paulo (Tesp). Começou a atuar em programas televisivos e peças infantis como Emília, a boneca do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Tornou-se redatora, produtora e diretora de TV.

romance de Júlio Diniz (1970); Os Deuses Estão Mortos (1971), de Lauro César Muniz, e Vidas Marcadas (1973), de Amaral Gurgel

1969

1968

A indústria cultural espelhou esse panorama e as transformações que aconteceram nas décadas seguintes. No mercado do entretenimento, desde o início do cinema, da música popular e do rádio, a imagem e a voz feminina são elementos de atração. A chanchada, gênero cinematográfico brasileiro mais popular dos anos 1930 aos 1950, tinha suas estrelas – atrizes, comediantes e cantoras: Dercy Gonçalves, Zezé Macedo, Eliana Macedo, Adelaide Chiozzo. Na indústria audiovisual, as mulheres serão atrizes e roteiristas. Às vezes figurinistas e cenógrafas. Mas raramente diretoras, cinegrafistas ou sonoplastas. O rádio, entretenimento mais acessível e popular, canalizava o sonho de muitas moças. Algumas autoras de radionovelas exemplifi-

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Em 1º de setembro de 1969, o Jornal Nacional, da Rede Globo, é transmitido em rede para diversos pontos do país. Inicia-se assim uma nova era na televisão brasileira.


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1972

A radionovela, e posteriormente a telenovela, se dedicava ao público feminino. O primeiro sucesso estrondoso da telenovela brasileira – O Direito de Nascer, de 1964, adaptada de um original cubano – falava de maternidade e aborto (como ameaça, não como opção). Os títulos das novelas dessa época mostram o foco em personagens femininas: As Solteiras, A Moça que Veio de Longe, A Gata, Mãe, O Segredo de Laura, A Outra Face de Anita, Pecado de Mulher. Mas títulos com nomes femininos poucas vezes significavam mulheres emancipadas. Eram geralmente histórias de amor, melodramas em que a figura feminina está enredada nas armadilhas do coração, em disputas familiares, ciúmes e inveja. Nesse quadro, destaca-se um título de 1965, escrito por Lúcia Lambertini: As Professorinhas. Era a história de um grupo de professoras que vão lecionar no interior. Produzido primei-

Chegada oficial da televisão em cores ao Brasil.

ro na TV Cultura, com recursos modestos, foi regravado três anos depois pela TV Record. Era a memória marcante do grande papel profissional da mulher no Brasil: “a professorinha que me ensinou o bê-á-bá”, como cantou o sambista Ataulfo Alves em 1956. Outro sucesso da década de 1960 foi Éramos Seis, adaptação do romance de Maria José Dupré que contava o cotidiano e as dificuldades familiares de dona Lola, seu marido e seus filhos. A obra foi adaptada pela primeira vez pela TV Record em 1958. Em 1967, dona Lola foi interpretada por Cleyde Yáconis na TV Tupi. O romance ainda teve duas outras adaptações, em 1977, com Nicette Bruno, e, em 1994, com Irene Ravache. Publicada pela primeira vez em 1943, a obra narra as transformações de uma família: a dificuldade para comprar a casa, o crescimento dos filhos, a viuvez, a velhice. Maria José Dupré, escritora criativa e bem-sucedida, ini-

O aprimoramento técnico, a formação de redes via satélite e as transmissões em cores trouxeram mudanças na programação das emissoras, propiciando uma linguagem mais dinâmica, um visual mais atraente e o imediatismo da notícia. A censura, contudo, impunha limites ao jornalismo e à ficção. No final da década, com o abrandamento da censura, a temática brasileira na telenovela e na ficção em geral vai, pouco a pouco, se afirmando. O rádio, por sua vez, se renova. Embora apoiado numa programação musical, passa a enfatizar a informação imediata e a prestação de serviços. Os “comunicadores” ganham espaço, o esporte cresce na programação e o jornalismo é incentivado apesar da censura.


Ocupação Laura Cardoso

Com direção de Antunes Filho, Laura Cardoso encena no teatro a peça Venha Ver o Sol na Estrada.

liar e econômico depois da morte de uma figura masculina (o pai, o marido). Laura Cardoso foi atriz em várias obras marcantes de Vietri, como Os Rebeldes, de 1967, e Os Apóstolos de Judas, de 1976. No final da década de 1970, personagens mulheres tornam-se centrais no novo gênero de novelas cômicas, como Locomotivas (1977), de Cassiano Gabus Mendes, e Pecado Rasgado (1978), de Sílvio de Abreu. A possibilidade de não se casar é tema da comédia romântica A Barba Azul, sucesso de Ivani Ribeiro, com a personagem Jô Penteado, que ficou noiva sete vezes e não se casou. A obra foi regravada em 1985 na Rede Globo, como A Gata Comeu. Em sua autobiografia, Laura Cardoso destaca suas amigas de muitos anos, atrizes como ela desde o início da TV brasileira: Marly Bueno, Vida Alves, Lia de Aguiar e Lea Camargo. Nos resumos biográficos de todas, descobrimos marcas do constrangimento social imposto às mulheres. Marly Bueno, “após o casamento, não abandonou totalmente a vida artísti-

- De volta à Tupi, a atriz destaca-se em telenovelas como Os Apóstolos de Judas (1976) e Gaivotas (1979). - No cinema: Já Não se Faz Amor como Antigamente, com direção de Anselmo Duarte e John Herbert.

1976

1973

cialmente assinava seus livros como Sra. Leandro Dupré, sem mencionar seu nome próprio. Nas mudanças de costumes assinalados pelas telenovelas brasileiras, vale ainda registrar algumas personagens mulheres, fortes e independentes, escritas por autores homens, nas obras de Lauro César Muniz (Ninguém Crê em Mim, 1966; Os Gigantes, 1979), Mario Lago (Presídio de Mulheres, radionovela nos anos 1950 e telenovela em 1967), Jorge Andrade (O Grito, 1975; Ninho da Serpente, 1982), Gilberto Braga (A Corrida do Ouro, 1974; Dona Xepa, 1977), além da obra marcante de Walter George Durst, Nina, de 1977, que recupera a figura da professora emancipada e é ambientada em São Paulo na década de 1920. Outro profissional que merece destaque por criar personagens fortes para mulheres é Geraldo Vietri, autor e diretor de longa carreira na TV Tupi e no cinema. A Fábrica, de 1971, e Vitória Bonelli, de 1972, mostram mulheres que precisam reconstruir um ambiente fami-

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ca, mantendo-se no ar para apresentar o concurso Miss Brasil de 1965 a 1979”. Vida Alves, que protagonizou o primeiro beijo na TV brasileira, em 1951 – e o primeiro beijo gay em 1960 –, conta que o diretor e ator Walter Forster “explicou ao seu marido” como a cena seria gravada com respeito. Lia de Aguiar deixou a carreira para se casar em 1958 e voltou, 11 anos depois, em papéis menores. Lea Camargo fez Escola de Arte Dramática e sempre trabalhou como atriz, mas os convites dimi nuíram depois da falência da TV Tupi. A memória de suas décadas de trabalho está registrada no excelente arquivo do Museu da TV, liderado por Vida Alves. Até os dias de hoje, as mulheres profissionais da área audiovisual batalham pela representatividade. As atrizes reivindicam papéis melhores e menos estereotipados. As pro-

fissionais de áreas técnicas reivindicam mais participação. Se, em 2014, entre 18 diretores de núcleo da Rede Globo (cargos mais altos de direção artística na teledramaturgia) somente duas eram mulheres, significa que ainda falta muito para a igualdade. Sabina Anzuategui é escritora e roteirista. Autora dos romances Calcinha no Varal (Companhia das Letras, 2005) e O Afeto ou Caderno sobre a Mesa (7 Letras, 2011), também roteirizou os filmes Ausência (2014) e A Casa de Alice (2007), ambos de Chico Teixeira, Jogo das Decapitações, de Sérgio Bianchi, e Desmundo (2003), de Alain Fresnot, entre outros.


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foto: Bob Sousa

Ocupação Laura Cardoso



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Um ator deve estar atento a seu tempo. Há uma evolução na representação; é preciso acompanhar essa caminhada.” (Entrevista com a atriz cedida em 3 de janeiro de 2017 à equipe do Itaú Cultural)


fotos: AndrĂŠ Seiti

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Camaleônica Laura Cardoso Rádio, televisão, teatro, cinema. A atriz paulistana desenvolveu uma identidade artística particular, que possibilitou a ela transitar nos diversos meios de comunicação por Flávio Luiz Porto e Silva

Benjamin Cattan, ator, diretor e produtor, costumava dizer que para ele não existia o ator específico de teatro, de televisão ou de circo. Existia o ator que, num momento, poderia estar no palco de um teatro, no estúdio de uma emissora de televisão ou no picadeiro de um circo. Circunstancialmente é que ele poderia estar num local diferente. Suas palavras podem ser estendidas ao rádio e ao cinema. Laura Cardoso, que com ele trabalhou, é um exemplo. Na década de 1940 e até meados dos anos 1950, o rádio no Brasil vivia sua fase áurea. Fonte de informação e entretenimento, a programação tinha atrações variadas, entre as quais se destacavam as radionovelas e os programas de auditório. Para os que almejavam a carreira artística, o rádio

significava uma das portas de entrada. Em São Paulo, ainda adolescente, Laura alimentava o sonho de tornarse atriz. O universo do radioteatro, que incluía a radionovela, a seduzia e, em 1942, após um teste na Rádio Cosmos, ela foi aprovada e ingressou naquele mundo fascinante. Meses depois, transferindo-se para a Rádio Tupi, passou a integrar o elenco de radioteatro. Seguiram-se passagens pela Rádio Bandeirantes e pela Rádio Cultura, nesta permanecendo até 1953, quando então retornou à Tupi, pertencente ao grupo dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand. A experiência nos programas de radioteatro e radionovela foi importante para sua formação. Inteligente, observadora e perspicaz, Laura assimilou as técnicas radiofônicas e as


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Cena da peça A Casa de Bonecas, transmitida em 1959 pela TV Tupi | foto: acervo Museu Pró-TV

O Anjo de Pedra, teleteatro exibido em 1956 pela TV Tupi  | foto: acervo Museu Pró-TV

necessárias inflexões e nuances vocais de modo a expressar as emoções e o interior das personagens. Para isso, era preciso “saber ler” o texto, apreendê-lo em todas as suas implicações e dar às palavras e frases seu sentido exato. Com a inauguração e a entrada no ar da TV Tupi-Difusora de São Paulo, graças ao empenho de Assis Chateaubriand, a televisão começava sua trajetória no Brasil. Os primeiros tempos foram de aprendizagem, tanto para os profissionais da área técnica quanto para os do setor artístico, a maioria


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vinda do rádio. Para estes, o início não foi fácil. Acostumados a usar a voz em seu trabalho, precisavam aprender como atuar no estúdio, movimentando-se em relação às câmeras segundo as marcações preestabelecidas. Além disso, habituados a ler e a interpretar diante dos microfones, tinham agora de memorizar o texto que lhes cabia, uma vez que as transmissões eram ao vivo, sem possibilidade de erros, pois tudo a câmera captava. Herdeiro do radioteatro, o teleteatro – a transmissão de peças teatrais e a adaptação de obras literárias – era um dos fortes atrativos na programação. Levar ao público essas obras valendo-se da imagem e do som, e não apenas desse último, aproximava a televisão do cinema, sonho de muitos daqueles profissionais do rádio. E assim foram surgindo o Grande Teatro das Segundas-Feiras (1951), depois Grande Teatro Tupi, e o TV de Vanguarda (1952), o primeiro com a participação de companhias teatrais e o segundo valendo-se dos profissionais oriundos do próprio rádio.

Laura Cardoso interpreta a personagem Canina na peça Volpone, de Ben Johnson, sob a direção de Antônio Abujamra.

- A TV Tupi sai do ar. - A atriz encena a peça A Nonna, com texto de Roberto Cossa e direção de Flávio Rangel. - No cinema: Ariella, adaptação do livro A Paranoica, de Cassandra Rios, com direção de John Herbert.

1980

1977

Programa da peça Volpone (1977) | acervo José Cetra Filho


Ocupação Laura Cardoso

Laura Cardoso e Tarcísio Meira encenam Se a Noite Falasse, em 1961, na TV Tupi | foto: acervo Museu Pró-TV

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Luís Melo e Laura Cardoso no espetáculo Vereda da Salvação (1993) | foto: Emidio Luisi

1981

- Laura Cardoso é convidada para trabalhar na Rede Globo. A partir de então atua em várias telenovelas, como Brilhante (1981), Mulheres de Areia (1993), A Viagem (1994), Explode Coração (1995), Salsa e Merengue (1997), Esperança (2002), Caminho das Índias (2009) e Araguaia (2010).

- A atriz integra o elenco do espetáculo Órfãos de Jânio, de Millor Fernandes, sob a direção de Antônio Abujamra.


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1982-83

Seguiram-se muitos outros, como O Contador de Histórias (1956) e TV de Comédia (1957). De todos eles Laura viria a participar. Interpretar algumas das personagens mais famosas da dramaturgia e da literatura atraía Laura Cardoso. Ela desejava ampliar seu campo de atuação. Em 1952 estreou finalmente na TV Tupi, e a participação nos programas de teleteatro tornouse uma constante. Espelhando-se no cinema, logo dominou a interpretação em frente das câmeras, a expressão e o gesto adequados, a voz bem colocada, consciente dos microfones no estúdio. Para muitos críticos e telespectadores, esses programas significavam o que havia de melhor na programação. Para Laura e outros atores, era a oportunidade de viver as mais diversas personagens, um laboratório não só de interpretação para eles, mas também de experimentação para diretores e demais envolvidos no processo de realização. A televisão descobria sua própria linguagem.

- A TVS (Sistema Brasileiro de Televisão) inicia suas atividades em São Paulo. - Na TV Bandeirantes, Laura Cardoso encena duas novelas marcantes com textos de Jorge Andrade e Geraldo Vietri: Ninho da Serpente e Renúncia, respectivamente. Um ano depois, em 1983, atua ao lado

de Nair Belo e Gianfrancesco Guarnieri em Casa de Irene, na mesma emissora. - No cinema: Uma Casala de Três (1982), sob a direção de Adriano Stuart.

Introduzido em 1960, o videotape marcou o início de uma nova etapa na história da televisão. Com a gravação da imagem e do som simultaneamente e a reprodução posterior, o VT possibilitou uma linguagem mais elaborada e a correção de erros, pois bastava interromper a gravação e refazer a cena. Para alguns atores, no entanto, faltava o calor da transmissão ao vivo, o élan do espetáculo teatral diante dos espectadores, aqui substituídos pelo “olho” da câmera. Gravar cenas isoladas, algumas em externas, e editá-las posteriormente aproximava mais ainda a televisão do cinema e do processo de montagem. Laura soube adaptar-se à nova tecnologia. Rádio e televisão não eram suficientes. Ela queria novos desafios, e o teatro – velho sonho de criança – abriu-lhe espaço. Embora com posturas e linguagens diferentes, a experiência nos teleteatros ao vivo contribuíra para a atuação contínua no palco. A voz modulada nas sutis inflexões no rádio e na televisão am-


Ocupação Laura Cardoso

1984-89

Da esquerda para a direita: Rolando Boldrin, Laura Cardoso e Fernando Balleroni em A Fabulosa História do Néca do Pato, espetáculo transmitido em 1960 pela TV Tupi | foto: acervo Museu Pró-TV

- Em texto de Walther Negrão, a atriz vive a personagem Carolina na novela Livre para Voar (1984), sob a direção de Wolf Maya e Fred Confalonieri. Em 1988, ainda na Rede Globo e com texto do mesmo autor, atua em Fera Radical. - No cinema: Quincas Borba (1987), sob a direção de Roberto Santos.

- No teatro: Cerimônia do Adeus (1989), com texto de Mauro Rasi e direção de Ulysses Cruz.

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Cena de O Profundo Mar Azul, com Altair Lima e Laura Cardoso, exibido pela TV Tupi em 1963 | foto: acervo Museu Prรณ-TV


Ocupação Laura Cardoso

pliou-se na impostação e na sonoridade para fazer-se ouvir pelos espectadores, e os gestos, antes precisos e econômicos respeitando o limite das câmeras, expandiram-se no espaço cênico. E o cinema não tarda a convidá-la. Agora são os sets de filmagem. Habituada às câmeras, Laura sabe, a cada tomada, o que deve fazer. À orientação do diretor acrescenta sua própria visão da personagem, moldando em seu rosto a expressão necessária. Num depoimento para a série Grandes Damas (GNT, 2013), a atriz explica que, a cada nova personagem, é como se lhe dessem um punhado de barro a que, pouco a pouco, vai dando forma, buscando entender seus sentimentos, suas razões e suas motivações. Concluída a construção, dá-lhe vida. Embora conscientes de que se trata de uma atriz a interpretar um papel com total domínio, ao vê-la atuar não se percebe o distanciamento. É a personagem viva diante dos olhos dos espectadores, numa interpretação visceral. Seja nas antigas radionovelas e nos teleteatros, seja nas telenovelas, no teatro ou no cinema, essa é uma das suas marcas, aliada ao magnetis-

mo da sua presença e ao seu impecável profissionalismo. Protagonista ou coadjuvante, como numa frase atribuída a Bette Davis, não há papéis menores para grandes atrizes. No entanto, apesar de toda a sua experiência, Laura confessou naquele depoimento que, antes de entrar em cena, ainda tem medo de errar. Mas esse medo, na verdade, a desafia e impulsiona. E quando entra na arena é para vencer: – Ser atriz é minha vida!, diz Laura Cardoso. Flávio Luiz Porto e Silva é graduado em comunicação social pela Universidade de São Paulo (USP) e possui especialização em rádio e televisão e mestrado em letras pela mesma universidade. Trabalhou no Centro Cultural São Paulo (CCSP), dedicando-se à pesquisa da memória do rádio e da televisão no Brasil. Publicou, entre outros trabalhos, a obra O Teleteatro Paulista nas Décadas de 50 e 60. Atualmente é professor titular da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap).

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fotos: AndrĂŠ Seiti

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Por incrível que pareça, fica tudo dentro da gente. É uma bagagem. É como se você fosse armazenando malas, um monte de malas cheias de lembranças. Você não esquece nunca.” (Trecho retirado do livro Laura Cardoso: Contadora de Histórias, 2010, escrito por Julia Laks. Coleção Aplauso Perfil. Imprensa Oficial)


Tragicômica à moderna Naturalidade, força, ousadia. Que características marcam a atuação de Laura Cardoso?

foto: André Seiti

por Welington Andrade


Ocupação Laura Cardoso

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“Para analisarmos o estilo do ator, então, será útil procurar, mais do que uma abstrata coerência estética, os caminhos pelos quais a sua maneira de ser como indivíduo acha uma consistente e constante tradução no palco, ainda que adaptada às exigências específicas de cada papel que lhe cabe interpretar.” (Yan Michalski)

Laura Cardoso nasceu no mesmo ano – 1927 – em que o diretor que mais tarde viria a aprová-la na Rádio São Paulo em seu primeiro teste, Oduvaldo Vianna, criava a Companhia de Prosódia Brasileira, por meio da qual ele pretendia promover uma alteração significativa no modo de os atores se expressarem, já que a língua portuguesa falada nos palcos de teatro então obedecia ao sotaque lusitano. Entretanto, apesar dos esforços modernizadores de Vianna e de outros homens de teatro, como Álvaro Moreyra, Renato Vianna e Flávio de Carvalho, a arte teatral praticada nas décadas de 1920 e 1930 ainda girava em torno de formas fixas e ultrapassadas, caso da velha tipologia dramática reinante desde o século XIX, bem ao gosto do estrelismo dos primeiros atores, normalmente donos de suas próprias companhias. Outra coincidência histórica que marca a trajetória da atriz reside no

fato de ela ter começado sua carreira na Rádio Cosmos (a rigor, sua primeira experiência profissional, já que, com medo da reprovação familiar, Laura desistira de trabalhar com Oduvaldo Vianna) no mesmo ano – 1942 – em que Alfredo Mesquita fundou o Grupo de Teatro Experimental (GTE), cuja direção ele deixou, em maio de 1948, aos cuidados de Abílio Pereira de Almeida para criar a Escola de Arte Dramática de São Paulo (EAD), uma das iniciativas que melhor contribuíram para a renovação do trabalho de interpretação dos atores


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“A minha formação foi baseada num estudo muitas vezes solitário, em erros e acertos.”

brasileiros. Observe-se o período de grande efervescência teatral no qual Laura Cardoso dá seus primeiros passos como atriz: em 1943, Os Comediantes encenam no Rio de Janeiro uma antológica montagem de Vestido de Noiva; no mesmo ano, Décio de Almeida Prado cria em São Paulo o Grupo Universitário de Teatro (GUT); em 1948, o Teatro do Estudante do Brasil (TEB) apresenta uma memorável encenação de Hamlet, com Sergio Cardoso no papel-título; no mesmo ano, o empresário Franco Zampari cria na capital paulista o Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). A partir desse caldo de cultura é que se lançam as bases para o grande vento modernizador que irá soprar sobre a arte do ator na década de 1950, do qual Laura Cardoso, mais por intuição do que propriamente por formação teórica, será uma autêntica tributária, não somente em seu trabalho pioneiro na televisão (sua estreia no veículo se deu na TV Tupi, em 1952, no programa Tribunal do Coração, apresentado em parceria com Vida Alves), como também em sua bem-sucedida, embora bissexta, atuação no teatro, em que ela estreou em 1959 em Plantão 21, dirigida por Antunes Filho. Num depoimento dado a Julia Laks, transformado no livro Laura Cardoso, Contadora de Histórias, a intérprete se lembra do autodidatismo dos anos iniciais: “No meu tempo, pelo menos que eu saiba, não existiam vários cursos de interpretação. Atuávamos porque víamos


Ocupação Laura Cardoso

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os colegas no teatro, no cinema e tentávamos repetir o que faziam. [...] A minha formação foi baseada num estudo muitas vezes solitário, em erros e acertos. Nunca tive um mentor. Julgava as situações que se apresentavam e tomava as decisões”. Cumpre notar que a atriz – como sói acontecer a muitos artistas brasileiros, divididos dialeticamente entre a tradição e a modernidade – sempre soube aliar muitíssimo bem a “naturalidade trabalhada” que marca seu estilo de atuação à máscara facial de grande impacto, quase sempre tangendo os limites do trágico, muito embora dessa mesma face também

DÉCADA DE 1990

Laura Cardoso e Luís Melo em Vereda da Salvação (1993) | foto: Emidio Luisi

Em 1990, Laura recebe seu primeiro Prêmio Shell de Melhor Atriz pela atuação na peça Vem Buscar-Me que Ainda Sou Teu (1990), com texto de Carlos Alberto Soffredini e Gabriel Villela. A segunda condecoração do mesmo prêmio veio três anos depois, pelo trabalho que desenvolveu com Antunes Filho no espetáculo Vereda da Salvação (1993), de Jorge Andrade.

Durante essa década, outros tantos personagens se destacaram na carreira da atriz, como a dona Lila de Mundo da Lua – seriado exibido pela TV Cultura entre 1991 e 1992 – e Isaura, mãe das gêmeas Ruth e Raquel em Mulheres de Areia (1993). São desse período também as novelas A Viagem (1994), Explode Coração (1995), Irmãos Coragem (1995) e Salsa e

Cartaz de Vereda da Salvação (1993) | acervo José Cetra Filho

Merengue (1996). Na tela dos cinemas, atuou em Terra Estrangeira (1995), sob a direção de Walter Salles e Daniela Thomas.


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Cartaz de A Última Sessão (2015) | acervo de família

DÉCADA DE 2000

Laura Cardoso em seu mais recente trabalho no teatro, a peça A Última Sessão (2015) | foto: João Caldas

Os anos 2000 se iniciam com projetos marcantes: o filme Através da Janela (2000), dirigido por Tata Amaral, e a novela da TV Record Vidas Cruzadas (2000), de Attílio Riccó. O primeiro deles rendeu a Laura Cardoso o Prêmio Lente de Cristal de Melhor Atriz no Festival de Cinema Brasileiro de Miami. Ela volta à Rede Globo em 2001, sob o comando de Roberto

Talma, em A Padroeira, e se dedica a papéis em novelas como Esperança (2002), Chocolate com Pimenta (2003), Hoje É Dia de Maria (2005) e Caminho das Índias (2009). As participações no cinema assinalam a década, como Copacabana (2001), de Carla Camurati, Fica Comigo Esta Noite (2006), de João Falcão, Muito Gelo e Dois Dedos D’Água (2006), de Daniel Filho,

e A Casa da Mãe Joana (2008), de Hugo Carvana. Os curtasmetragens também entram para o currículo da atriz: Morte, de José Roberto Torero, e No Bar, de Paulo Tarso Mendonça e Tom Stringhini, ambos de 2002. No teatro, destaca-se a parceria com Miguel Falabella em Veneza (2004) e com Eduardo Tolentino em Outono e Inverno (2006).


Ocupação Laura Cardoso

DÉCADA DE 2010

se possa esperar as emanações do patético ou mesmo do cômico. Laura se dedicou mais à televisão do que ao teatro, mas sua energia criativa e sua imaginação artística competem de igual para igual com o talento de Cacilda Becker, Beatriz Segall, Ruth de Souza, Nathalia Timberg, Maria Della Costa, Cleyde Yáconis e Fernanda Montenegro, para ficarmos com os exemplos femininos de sua própria geração ou próximos a ela. Embora a modernidade encarnada por Laura e seus pares, que abandonaram os maneirismos antiquados e aderiram à introspecção subjetiva de base stanislavskiana, tenha sido ultrapassada pelas experiências mais radicais dos anos 1960 – o Teatro de Arena e o Teatro Oficina –, é inegável que o estilo de interpretação da atriz, sólido, denso, robusto, resistiu a toda sorte de vanguardismos, fazendo parte, hoje, da memória cultural do país. Impossível não ter sido arrebatado pela Dolor de Vereda da Salvação, de Jorge Andrade, com direção de Antunes Filho; ou pela Isaura da telenovela Mulheres de Areia; ou ainda pela Selma de Através da Janela, filme de Tata Amaral. E

Nessa época, por serem mais recentes, os papéis de Laura Cardoso tornam-se mais claros na memória. É desse período a novela Araguaia (2010), em que a atriz interpretou brilhantemente a personagem Mariquita, que sofria de mal

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o que dizer de sua participação em um dos episódios do seriado Os Normais, em que ela interpreta uma impagável “mãe de aluguel” do personagem de Luiz Fernando Guimarães. Aqui, mais do que nunca, a edição ágil, o texto “esperto” e a metalinguagem mais desabrida se vergam, fascinados, a um tipo de talento ancestral, que faz do anacronismo a marca de seu rigor e de sua inventividade. Welington Andrade é doutor em literatura brasileira pela Universidade de São Paulo (USP), na área de dramaturgia, e crítico de teatro e editor da revista Cult.

de Alzheimer. Dois anos depois viveu Doroteia, uma vilã amada pelo público, na segunda versão de Gabriela (2012). Nos anos seguintes Laura marcou presença em Flor do Caribe (2013), Boogie Oogie (2014) e Império (2014).

Seu último trabalho, iniciado em 2016 e ainda não finalizado, é Sol Nascente, em que interpreta mais uma vilã, Sinhá.


Laura Cardoso Concepção e realização Itaú Cultural Curadoria Itaú Cultural e Fátima Carolina Balleroni Leite Projeto expográfico Kleber Montanheiro Pesquisa Equipe Itaú Cultural, Mateus Araújo e Reinaldo Braga (terceirizados) Consultoria em acessibilidade Mais Diferenças (empresa parceira) ITAÚ CULTURAL Presidente Milú Villela Diretor-superintendente Eduardo Saron Superintendente administrativo Sérgio M. Miyazaki NÚCLEO DE ARTES CÊNICAS Gerência Galiana Brasil Coordenação Carlos Gomes Produção-executiva Natália Souza e Regina Medeiros NÚCLEO DE ENCICLOPÉDIA Gerência Tânia Rodrigues Coordenação Glaucy Tudda Produção-executiva Bruna Ferreira e Camila Nader NÚCLEO DE AUDIOVISUAL E LITERATURA Gerência Claudiney Ferreira Coordenação audiovisual Kety Fernandes Nassar Produção audiovisual Jahitza Balaniuk Captação de imagens André Seiti, Karina Fogaça e Richner Allan Roteiro e edição de imagens Karina Fogaça NÚCLEO DE PRODUÇÃO DE EVENTOS Gerência Henrique Idoeta Soares Coordenação Edvaldo Inácio Silva e Vinícius Ramos Produção Carmen Fajardo, Cecília Ungaretti (terceirizada), Daniel Suares (terceirizado), Érica Pedrosa, Maria Zelada (terceirizada), Renan Ortega (estagiário) e Wanderley Bispo NÚCLEO DE EDUCAÇÃO E RELACIONAMENTO Gerência Valéria Toloi Equipe Amanda Freitas, Caroline Faro, Danilo Fox, Thays Heleno, Victor Soriano e Vinicius Magnun Estagiários Alan Ximendes de Lima, Aline Rocha, Bruna Caroline Ferreira, Danielle de Oliveira, Edson Bismark, Gabriela Lima, Guilherme Wichert, Juliane Lima, Kaliane Miranda, Letícia Sato, Luan Lima Silva, Lucas Balioes, Marcus Ecclissi, Maria Luiza Kazi, Mario Rezende, Paloma

Xavier, Pamela Camargo, Pamela Mezadi, Patricya Maciel, Sidnei Santos, Silas de Almeida, Thais Gonçalves, Vinicius Escócia, Vitor Augusto da Cruz, Wellington Rodrigues e William Miranda Coordenação de programas de formação Samara Ferreira Educadores Carla Léllis, Claudia Malaco, Edinho Santos, Josiane Cavalcanti, Lucas Takahaschi, Luisa Saavedra, Malu Ramirez, Raphael Giannini, Thiago Borazanian e Viny Rodrigues NÚCLEO DE COMUNICAÇÃO E RELACIONAMENTO Gerência Ana de Fátima Sousa Coordenação de conteúdo Carlos Costa Produção e edição de conteúdo Amanda Rigamonti, Maria Clara Matos e Victória Pimentel (estagiária) Edição do site Amanda Rigamonti, Maria Clara Matos e Victória Pimentel (estagiária) Redes sociais Renato Corch Supervisão de revisão Polyana Lima Revisão de texto Ciça Corrêa e Rachel Reis (terceirizadas) Coordenação de design Jader Rosa Comunicação visual Yoshiharu Arakaki Produção editorial Bruna Guerreiro Produção gráfica Lilia Góes Edição de fotografia André Seiti Coordenação de eventos e comunicação estratégica Melissa Contessoto Produção e relacionamento Simoni Barbiellini e Vanessa Golau CENTRO DE MEMÓRIA DO ITAÚ CULTURAL Gerência Fernando Araujo Coordenação Eneida Labaki Produção-executiva Fernando Galante Digitalização de fotos e documentos Laerte Fernandes AGRADECIMENTOS Adriana Balleroni Faria, Carla Camuratti, Elmo Francfort, Etty Fraser, Fernando Balleroni Faria, Flávio Luiz Porto e Silva, José Cetra Filho, Lima Duarte, Luciano Amaral, Luís Melo, Miguel Falabella, Miriam Mehler, Odete Assumpção, Odilon Wagner, Orias Elias, Pró-TV, Rodrigo Figueiredo, Sérgio Seabra, Serviço Social do Comércio – Sesc São Paulo, Thereza Jessouroun e Vida Alves


Ocupação Laura Cardoso quarta 22 de fevereiro a domingo 30 de abril de 2017 visitação terça a sexta 9h às 20h [permanência até as 20h30] sábado, domingo e feriado 11h às 20h espaço expositivo (piso 1)


Centro de Memória, Documentação e Referência Itaú Cultural cupação Laura Cardoso / organização Itaú Cultural. - São Paulo : O Itaú Cultural, 2017. 64 p. : il. ; 18 x 24 cm. ISBN 978-85-7979-093-5 1. Cardoso, Laura. 2. Artes cênicas. 3. Teatro. 4. Dramaturgia. 5. Televisão. 6. Exposição de arte – catálogo I. Instituto Itaú Cultural. II. Deodato, Livia. III. Hebmüller, Paulo. IV. Anzuategui, Sabina. V. Porto e Silva, Flávio Luiz. VI. Andrade, Welington. VII. Título. CDD 792.02892


Ocupação Laura Cardoso

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O Itaú Cultural completa 30 anos festejando no feminino:

Zuleika Ivone Hilda Laura Aracy Regina Maria Nise Conceição Ignez Vejam, leiam, ouçam e pensem as mulheres.

itaucultural.org.br


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