hhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh

Page 1

Biografia Candido Portinari (Brodósqui SP 1903 - Rio de Janeiro RJ 1962). Pintor, gravador, ilustrador e professor. Inicia-se na pintura em meados da década de 1910, auxiliando na decoração da Igreja Matriz de Brodósqui. Em 1918, muda-se para o Rio de Janeiro e, no ano seguinte, ingressa no Liceu de Artes e Ofícios e na Escola Nacional de Belas Artes -Enba, na qual cursa desenho figurativo com Lucílio de Albuquerque (1877 - 1939) e pintura com Rodolfo Amoedo (1857 - 1941), Baptista da Costa (1865 - 1926) e Rodolfo Chambelland (1879 - 1967). Em 1929, viaja para a Europa com o prêmio de viagem ao exterior, e percorre vários países durante dois anos. Em 1935, recebe prêmio do Carnegie Institute de Pittsburgh pela pintura Café, tornandose o primeiro modernista brasileiro premiado no exterior. No mesmo ano, é convidado a lecionar pintura mural e de cavalete no Instituto de Arte da Universidade do Distrito Federal, quando tem como alunos Burle Marx (1909 - 1994) e Edith Behring (1916 - 1996), entre outros. Em 1936, realiza seu primeiro mural, que integra o Monumento Rodoviário da Estrada Rio-São Paulo. Em seguida, convidado pelo ministro Gustavo Capanema (1902 - 1998) pinta vários painéis para o novo prédio do Ministério da Educação e Cultura - MEC (1936-1938), com temas dos ciclos econômicos do Brasil, propostos pelo ministro. Em 1940, após exposição itinerante pelos Estados Unidos, a Universidade de Chicago publica o primeiro livro a seu respeito, Portinari: His Life and Art, com introdução de Rockwell Kent. Em 1941, pinta os painéis para a Biblioteca do Congresso em Washington D.C. com temas da história do Bra-

sil, Descobrimento, Desbravamento da mata, Catequese e Descoberta do ouro. Filiado ao Partido Comunista Brasileiro, PCB, candidata-se a deputado, em 1945, e a senador, em 1947, mas não se elege. Em 1946, recebe a Legião de Honra do governo francês. Em 1956, com a inauguração dos painéis Guerra e Paz na sede da ONU, em Nova York, recebe o prêmio Guggenheim. Ilustra vários livros, como Memórias Póstumas de Brás Cubas e O Alienista, de Machado de Assis (1839 - 1908), entre outros. Em 1958, inicia um livro de poemas - editado por José Olympio em 1964 -, com textos introdutórios de Antonio Callado (1917 1997) e Manuel Bandeira (1886 - 1968). Em 1979, seu filho João Candido Portinari implanta o Projeto Portinari que reúne um vasto acervo documental sobre a obra, a vida e a época do artista, no campus da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC/RJ. Comentário Crítico

Candido Portinari

Candido Portinari (1903 - 1962)

Candido Portinari inicia sua formação artística na Escola Nacional de Belas Artes - Enba, em 1919, onde estuda com Lucílio de Albuquerque (1877 - 1939), Rodolfo Amoedo (1857 - 1941), Baptista da Costa (1865 - 1926) e Rodolfo Chambelland (1879 - 1967). Obtém o prêmio de viagem ao exterior em 1928 e segue para a Europa no ano seguinte. Conhece as obras dos mestres italianos Giotto

O Café


Candido Portinari

(ca.1266 - 1337) e Piero della Francesca (ca.1415 - 1492) e da cena européia: Henri Matisse (1869 - 1954), Amedeo Modigliani (1884 - 1920), Giorgio de Chirico (1888 - 1978) e Pablo Picasso (1881 - 1973). Retorna ao Brasil no início de 1931. Trabalha com intensidade, pintando principalmente retratos, sua maior fonte de renda. O artista, em sintonia com a tendência do Retorno à Ordem na pintura internacional, explora poéticas diversas na retratística. Retrato de Maria (1932), em sua linearidade, indica uma aproximação com a obra de Modigliani e dos maneiristas. Já o Retrato de Sofia Cantalupe (1933) revela a influência do imaginário metafísico, em um clima mágico que também é encontrado, por exemplo, no Retrato de Mário de Andrade (1935). A produção de Portinari é variada em seus temas e em algumas telas apresenta lembranças de Brodósqui, jogos infantis e cenas de circo. As figuras são diminutas, sem rostos, contrastando com a imensidão da paisagem, na qual predominam os tons de marrom, como em Futebol (1935). Revela forte preocupação social, procurando captar tipos populares e enfatizar o papel dos trabalhadores. Como relata o historiador Tadeu Chiarelli, Portinari, no início da carreira, declara a intenção de criar uma pintura caracteristicamente nacional, baseada em tipos brasileiros, manifestando admiração pela obra do pintor ituano Almeida Júnior (1850 - 1899). O ideal de Portinari encontra apoio nas idéias do escritor e crítico Mário de Andrade (1893 - 1945), que defende a necessidade da criação no Brasil de uma arte nacional e moderna. Como nota Chiarelli, para Mário de Andrade, em grande parte de suas pinturas, Portinari não está preocupado em retratar um brasileiro determinado (como faz Almeida Júnior no fim do século XIX), mas o brasileiro. Ao superar a pintura region-

alista de Almeida Júnior, que antecede o modernismo, Portinari produz uma obra que possui esse caráter nacional e moderno, não apenas pelos temas tratados mas também por suas grandes qualidades plásticas. Nos quadros O Mestiço e Lavrador de Café (ambos de 1934) os personagens são pintados em composições monumentais e predominam os tons de marrom da paisagem, na qual se destacam os campos cultivados ao fundo. Também em Café (1934), a figura humana adquire formas escultóricas robustas, com o agigantamento das mãos e pés, recurso que reforça a ligação dos personagens com o mundo do trabalho e da terra. Portinari realiza um conjunto de afrescos para o Ministério da Educação e Cultura - MEC (1936-1938), com tema ligado aos ciclos econômicos do país. Neles utiliza recursos derivados da poética do Renascimento italiano. Sua admiração pela obra de Piero della Francesca pode ser observada nos gestos imobilizados dos personagens e no desdobramento da figura em vários momentos do trabalho. Portinari revela, desde o início da carreira, admiração pela obra de Picasso, que é renovada na década de 1940, após a visão de Guernica. Seu trabalho passa a apresentar mais dramaticidade, expressando a tragédia e o sofrimento humano e adquire caráter de denúncia em relação a questões sociais brasileiras, reveladas em obras como as da Série Bíblica e Os Retirantes. Na Série Bíblica, em telas como O Último Baluarte (1942) e O Massacre dos Inocentes (1943), a presença de Picasso pode ser percebida no uso dos tons de cinza, na teatralidade dos gestos, na criação de um espaço abstrato, na deformação pronunciada e no choque constante entre figura e fundo. Já na Série Retirantes apresenta um tema recorrente em sua produção, utiliza elementos expressionistas, derivados também da Sé-


Críticas

Candido Portinari

rie Bíblica, embora com uma dramaticidade mais controlada. As telas são construídas com pinceladas largas e em composições piramidais, apresentando uma paleta dominada por tons terMestiço - 1934 rosos e cinza, que realçam o caráter da representação. O artista expressa a tragédia dos retirantes por meio dos gestos crispados das mãos e das lágrimas de pedra. Há uma desarticulação das figuras, realizadas em um ritmo definido pelas linhas negras, com um fundo que tende à abstração em algumas obras. Pinta, em 1941, os painéis para a Libary of Congress [Biblioteca do Congresso] em Washington D.C. (Estados Unidos), com temas da história do Brasil. Realizados em têmpera, com grande luminosidade, os painéis têm como protagonistas, mais uma vez, os trabalhadores, como em Descobrimento. Na década de 1950, as cores voltam à paleta de Portinari, que se torna mais clara. Os temas permanecem - as lembranças da infância, o drama do homem do povo e as paisagens. O artista pinta telas nas quais dialoga com a abstração geométrica, nem sempre de maneira positiva. Entre 1953 e 1956, realiza os murais Guerra e Paz (1953-1956) para a sede da ONU, em Nova York, obras de grandes dimensões, em que trabalha com uma sobreposição de planos. Esses murais apresentam um resumo da trajetória do artista, em termos de iconografia: neles estão presentes a mãe com o filho morto, os retirantes e os meninos de Brodósqui. Portinari falece consagrado como o artista brasileiro mais importante, posição que deixará de ser unânime nas décadas seguintes.

“A partir de Café, o humano, compreendido em termos sociais e históricos, torna-se a tônica da arte de Portinari, voltada para a captação da realidade natural e psicológica, para uma expressividade, ora serena e grave, ora desesperada e excessiva. A nova problemática encaminha-o, a exemplo dos mexicanos, para o muralismo, em que procura magnificar sua busca duma imagística nacional, alicerçada no trabalho e em suas raízes rurais. (...) Após 1947, a arte de Portinari conhece uma nova modificação. São postas de lado, ao mesmo tempo, a dramaticidade expressiva e a preocupação social. (...) Os novos temas de Portinari são sobretudo históricos - A Primeira Missa no Brasil, Tiradentes (...). A viagem a Israel parece conferir uma nova dimensão à arte de Portinari. (...) Ao mesmo tempo em que se deixa seduzir pela cor, Portinari começa a fazer experiências com a abstração geométrica, influenciado pelo cubismo cristalino do francês Jacques Villon, pintor que admirava há algum tempo. (...) A busca dum rigor geométrico aliado a uma paleta clara e sonora não mascara, entretanto, o esvaziamento que a pintura de Portinari vem sofrendo nos últimos anos de sua atividade artística”. Annateresa Fabris FABRIS, Annateresa. Portinari, pintor social. 1977. 230 f. Dissertação (Mestrado em Artes Plásticas) - Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo - ECA/USP, São Paulo, 1977. p.78., p.95, p.101, p.103. “(...) Quando começou a abordar esta temática (retirantes) não havia ainda preocupações sociais marcantes na obra de Portinari. Aparecem apenas famílias acampadas nos arredores de seu povoado. (...) Também não tinham a des-


Candido Portinari

ignação de retirantes. Algumas dessas composições possuem inegável beleza plástica (...) Começaram a ser produzidos a partir de 1935. (...) Somente mais tarde a série dos retirantes assumiria uma feição acentuadamente social na carreira do mestre brasileiro. Não apenas em virtude da Grande Guerra iniciada em 1939, como em face do apelo aos recursos de expressão que caracterizariam em seguida a parte mais notável de sua obra. Esta fase social culmina com a grande tela Retirantes e com a composição O Morto na Rede, pertencentes ao acervo do Masp. (...) Os retirantes pintados nos últimos anos da vida do artista já não eram apenas quadros sociais. Tornaram-se igualmente soluções de problemas formais. (...) De qualquer modo, em suas três fases distintas, Os Retirantes de Portinari permanecerão como alguns dos trabalhos mais significativos e pungentes da arte brasileira de todos os tempos”. Antônio Bento BENTO, Antonio. Portinari. Rio de Janeiro: Leo Christiano, 1980. p.169.

“O mundo de Portinari: à medida que, atraídos por ele, nós nos movemos nele através do pensamento, cheios de assombro - de medo talvez - mas aceitando seus elementos macabros com a mesma naturalidade com que nosso inconsciente acolhe os mais fantásticos sonhos que nos perturbam na hora do sono, vamos chegando, aos poucos, à percepção de que não estamos diante de um mundo apenas imaginário e sim diante da recriação intensificada e fantástica do mundo que Portinari conhece, o de sua terra natal, o Brasil. Disto seus quadros são a prova. Neles vemos a paisagem, pisamos o chão; vemos seus trabalhadores e sua pobreza - não descritos com aflição, descritos. E descritos com amor. Não amor pela miséria e o trabalho incessante e sim

amor por mulher, homem, criança - que, ricos ou pobres, são para ele objeto de amor. Ele os pinta com plena aceitação. ‘Bem-aventurados os humildes’ é o que parece dizer, do fundo do coração. E sem as condições em que vivem em sua terra brasileira nada tem, pelo que vemos, de invejável herança, a vida que levam, pela bondade que deles se exala, vale a pena ser vivida. Trabalham; casam-se e sustentam família; seus filhos brincam. E não existem, no tesouro das artes, quadros mais eloqüentes do que esses, que pintam a felicidade de crianças que brincam”. Rockwell Kent CALLADO, Antonio. Candido Portinari. In: CANDIDO Portinari. São Paulo: Finambrás, 1997. P. 11-19.

“(...) Não se pode dizer, no entanto, que tenha havido uma estética oficial, se compreendermos por tal um estilo que o Poder adota como seu e o impõe. Não se pode, portanto, afirmar que Portinari tenha sido um pintor oficial (...). Houve foi uma recuperação por parte do Poder da tática adotada pelo movimento modernista, onde o governo utilizará o apoio a Portinari como exemplo do seu mecenato. Mas se não houve uma arte oficial, não significa que o estilo de Portinari não pudesse também ser assimilado pela ideologia do Poder. No que se refere ao aspecto temático, se a orientação de Portinari não correspondia a um patriotismo evidente e épico, como talvez fosse o desejo do governo, não significa que não pudesse ser recuperado. A dignidade que o artista confere ao trabalhador, o destaque que dá ao personagem popular, enfim, todos aqueles assuntos que ele abordou não podiam ser negados por um poder para quem a questão social (mesmo que dentro de uma ótica populista) constituía uma das bases de


Carlos Zilio ZILIO, Carlos. A querela do Brasil: a questão da identidade da arte brasileira: a obra de Tarsila, Di Cavalcanti e Portinari/1922-1945. 2. ed. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1997. p.112. “Candido Portinari começa a ganhar ressonância na cena artística carioca entre 1928 e 1931, período que sucede a eclosão mais violenta do modernismo no Brasil, período que começa a perceber as vanguardas históricas como parte do legado da história da arte ocidental, e não mais como paradigma absoluto para os novos artistas. Iniciada após o refluxo das vanguardas, a obra de Portinari dialogou com inúmeras tradições visuais da arte européia, desde aquelas do Primeiro Renascimento, até a obra de seu contemporâneo Pablo Picasso. Através de sua espantosa capacidade em absorver as mais diversas maneiras, Portinari trafegou com indisfarçável facilidade por esquemas formais criados por Botticelli, Picasso, Pisanello, De Chirico, Holbein, Paul Delvaux... Portinari produziu suas obras experimentando procedimentos pictóricos de artistas antigos e contemporâneos, sempre acrescentando a cada um desses ‘experimentos’ soluções de forte cunho pessoal, que ainda aguardam um entendimento mais profundo. (...) De volta ao Brasil, já sem os traços acadêmicos, mas também sem o radicalismo dos artistas vanguardistas, Portinari acabou sendo eleito pelos protagonistas do movimento modernista local (Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade e outros);

Candido Portinari

sua política. Mas se a pintura de Portinari pôde ser recuperada, foi principalmente porque a sua concepção formal era conciliável com a estratificação simbólica de uma ideologia conservadora. (...)”

Retirantes, Série Retirantes

como principal motor para a constituição de uma arte moderna no Brasil: uma arte que tentava distanciar-se das convenções da Academia, mas atenta para não se ‘perder’ na abstração ou em outros ‘excessos’ vanguardistas”. Tadeu Chiarelli CHIARELLI, Tadeu. Sobre os retratos de Candido Portinari. In: ______. Arte internacional brasileira. São Paulo: Lemos, 1999. p. 175-181. Depoimentos

“Arte brasileira só haverá quando os nossos artistas abandonarem completamente as tradições inúteis e se entregarem com toda alma, à interpretação sincera do nosso meio” Candido Portinari - [Entrevista publicada originalmente no jornal A Manhã em junho de 1926] PORTINARI, Candido. Rumo a Paris. In BALBI, Marilia. Portinari: o pintor do Brasil. São Paulo: Boitempo, 2003. p. 26.


Candido Portinari

“Não pretendo entender de política. Minhas convicções, que são fundas, cheguei a elas por força da minha infância pobre, de minha vida de trabalho e luta, e porque sou um artista. Tenho pena dos que sofrem, e gostaria de ajudar a remediar a injustiça social existente. Qualquer artista consciente sente o mesmo”.

Candido Portinari - [Depoimento feito ao Poeta Vinícius de Moraes e publicado postumamente, em março de 1962]

PORTINARI, Candido. Guerra e Paz. In BALBI, Marilia. Portinari: o pintor do Brasil. São Paulo: Boitempo, 2003. p.12. “Vim conhecer aqui o Palaninho, depois de ter visitado tantos museus, tantos castelos e tanta gente civilizada. Aí no Brasil, eu nunca pensei no Palaninho. Daqui fiquei vendo melhor a minha terra - fiquei vendo Brodósqui como ela é. Aqui não tenho vontade de fazer nada. Vou pintar o Palaninho, vou pintar aquela gente com aquela roupa e com aquela cor. Quando voltar vou ver se consigo fazer a minha terra. Eu uso sapato de verniz, calça larga e colarinho, mas no fundo eu ando vestido como o Palaninho”. Candido Portinari - [Trecho de carta enviada de sua viagem a Paris para Rosalita Candido Mendes] PORTINARI, Candido. Repensando o Brasil. In BALBI, Marilia. Portinari: o pintor do Brasil. São Paulo: Boitempo, 2003. p. 28.

PORTINARI, Candido. Itaú Cultural: http://www.itaucultural.org.br/ aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=artistas_biografia&cd_ verbete=121&cd_item=1&cd_idioma=28555 Acess em 16 de dez. 2008. Diagramação: Juliana Gomes de Souza Dias - julianagsouza@gmail.com


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.