O Nome da Cor - Caderno Educativo

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CADERNO EDUCATIVO



CORES E NOMES Dentre inúmeros significados, pode-se definir cor como a percepção visual de uma faixa das ondas eletromagnéticas que estão presentes no espaço. A capacidade que permite essa percepção é fruto de um desenvolvimento biológico de longa data, orientado pela interação dos animais com as coisas. Sua percepção, portanto, é um dos elementos que permite a diferenciação das coisas do mundo. Existe uma relação entre a cor e os objetos, mas a atribuição de significados às cores guarda sempre um grau de arbitrariedade. Os conteúdos culturais atribuídos são ferramentas potentes de organização e transmissão de informações. Através das cores, são criados signos que nos orientam, nos identificam, nos remetem a valores e sentimentos. O que demonstra a importância de questionarmos os sentidos daquilo que vemos. A exposição O Nome da Cor busca sensibilizar e provocar as pessoas sobre a complexidade que envolve esse fenômeno aparentemente simples. A experiência do visitante no Sesc Santana vai ser guiada pela ideia essencial de que a cor possui um caráter relativo e mantém uma íntima relação com a subjetividade. Trata-se de um convite à descoberta conjunta de um tema fascinante. Para o Sesc, trazer à tona questões que fazem parte de nosso cotidiano, como o caso da visão e das cores, é imprescindível para a criação e/ou manutenção de um pensamento lúcido e, por isso, crítico; é também uma forma de conduzir as pessoas à reflexão constante sobre a vida, e suas peculiaridades, para que nela possa atuar de modo efetivo em suas transformações em prol do desenvolvimento da cidadania.

Sesc São Paulo


EDUCATIVO COR A exposição O Nome da Cor nos leva a uma imersão no amplo universo com o qual estamos em contato no dia a dia, mas nem sempre percebemos. A cor presente no mundo está presente de modo ampliado na exposição Como propor experiências que possam desobstruir canais de percepção, para despertar nos visitantes sensações que os façam pensar em sua relação com seu próprio corpo e na forma como elas afetam diversas dimensões de sua vida? O Educativo Cor olha para a exposição como um acontecimento em que todos podem se expor, potencializando as relações com o público, através de ações que têm como intenção propiciar experiências em diferentes campos e de várias naturezas, que envolvem o fazer e o pensar: do corporal ao conceitual, na arte e na ciência, na história e no cotidiano. Em um mundo em que as ações objetivas e o automatismo se impõem, o Educativo Cor quer abrir espaço para a subjetividade e para a pausa, por meio de ações de caráter contemplativo, reflexivo e prático, que estabeleçam diálogos com o público através de visitas, oficinas e conversas, articulando as diversas áreas do conhecimento e as linguagens visual, corporal, musical e verbal. Considerando que a cor é um elemento presente em tudo, dentro e fora, no cheio e no vazio, na luz e no pigmento, entre o céu e a terra, na física e na química, O Nome da Cor torna-se um lugar para a invenção de alternativas e criação poética. O material educativo é um caderno, um instrumento aberto para construção de conhecimento. Nele o educador vai encontrar diversas propostas para a sala de aula e também estímulo para a criação de outras tantas. Ele apresenta, de maneira informal, assuntos ligados à óptica, fisiologia, cultura, arte, antropologia e dá espaço para agregar inúmeras abordagens.

Carlos Barmak e Marisa Szpigel


SUMÁRIO EXPERIMENTOS COM A COR..........................................1 E A COR? O QUE É?......................................................10 O OLHAR SENSÍVEL: CARACTERÍSTICAS SENSÍVEIS DA VISÃO.....................................................16 MUTÁVEL, INSTÁVEL E RELATIVA — A COR......................18 A COR NA ARTE..........................................................24 CULTURA VISUAL........................................................37 BIBLIOGRAFIA..............................................................46

Legenda referências experimentos registros


EXPERIMENTOS COM A COR Nosso contato com a cor é intenso, estamos o tempo todo em relação com ela: nas ruas, em casa, na escola ou no trabalho. Seja por meio dos alimentos, das roupas, dos objetos ou das pessoas que nos cercam. Ao acordar, nossos olhos recém-abertos são inundados de cores, que se transformam na presença de mais ou menos luz. À medida que nos movimentamos, quando acendemos a luz ou abrimos uma janela, quando caminhamos ou deslocamos os objetos, as mais diversas cores se mostram. A cor está em tudo e em todo lugar e, às vezes, é difícil perceber o que está sempre presente, tocando-nos e interferindo em nosso cotidiano. Experimentos com a cor nos permitem olhar para esse fenômeno novamente, de outro modo, a partir de experiências diretas. Essas situações possibilitarão que entremos em contato com a cor como se estivéssemos usando diversos óculos: os óculos da antropologia, da arte, da física, da química, da história, da biologia, da literatura, da cultura.

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Os participantes receberão taças de plástico estilo coquetel. A ideia é criar drinques exóticos explorando combinações de líquidos coloridos.

Por exemplo, uma bebida amarela pode ficar verde com algumas gotinhas de anilina azul comestível.

Uma jarra de água e potinhos de corante nas cores azul, amarelo e magenta (rosa) serão suficientes para você elaborar inúmeros coquetéis.

Se quiser dar um toque especial, adicione um pouco de detergente e sopre com um canudo. Tim-tim!

Será que a cor-pigmento e a cor-luz, quando misturadas, se comportam do mesmo modo?

Caixa-cabeça

experimento 2

experimento 1

Coquetéis

A ideia é criar, a partir de uma caixa de papelão quadrada não muito grande, uma “caixa-cabeça”.

Escolha um lado da caixa e faça um desenho a lápis de como você imaginaria uma abertura na altura dos olhos.

Recorte esse desenho com uma tesoura e, pelo lado de dentro da

caixa, coloque uma ou mais cores de papel celofane sobre o espaço vazado com fita adesiva.

Coloque a caixa na cabeça e saia para um passeio com seus amigos percebendo e se relacionando com as coisas que o cercam de uma maneira completamente diferente.

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Escolha, em uma loja de materiais de construção, uma lona plástica colorida, do tipo que usamos para proteger os móveis durante uma

reforma. Coloque duas partes iguais deste plástico sobrepostas, uma sobre a outra (quanto maior for o tamanho do plástico, mais pessoas poderão explorar seu interior). Com um grampeador “costure” todo o contorno dos plásticos, unindo as duas partes.

Escolha a parte que ficará embaixo e faça nela, com uma tesoura, uma grande abertura. Agora os participantes podem balançar o plástico

de forma que o ar entre em seu interior, inflando o objeto. Entre neste grande ambiente colorido pela abertura e experimente mergulhar na

cor. Para visualizar: http://muriquinhos.blogspot.com.br/2009/03/oca-

experimento 4

oca.html

Como fazer para que a cor ganhe corpo? Pesquise sobre o artista venezuelano Cruz-Diez.

E quando o nosso próprio corpo é a cor? Hélio Oiticica, artista brasileiro, fez esta proposição.

Envelope para gente Nessa proposta, cada pessoa vai criar um envelope para vestir. O envelope funcionará como um filtro colorido para observação do entorno. Para fazer o envelope, utilize duas folhas de papel

celofane colorido (é importante que o envelope fique bem folgado para garantir a mobilidade do corpo). Junte as duas folhas, uma sobre a outra e cole fita-crepe ou durex transparente em três lados,

de modo a juntar as duas folhas de três lados. Um dos lados fica aberto para que o envelope seja vestido.

É interessante fazer os envelopes nas cores magenta (rosa), amarelo e azul, pois eles podem ser sobrepostos e as misturas de cor observadas.

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experimento 3

Por dentro da cor


A quantidade de matizes e tonalidades de cor é muito grande, pode ser infinita. Que tal criar um dicionário de cores com o título da

exposição O Nome da Cor? Em pequenos potinhos, coloque tinta guache nas cores primárias – magenta, azul e amarelo – para

Dicion

clarear e escurecer.

A quan

confeccionar matizes; use o branco e o preto para fazer tonalidades –

tas. Qu

Entregue aos participantes pequenas filipetas de papel branco para

da cor

que façam com o pincel registros das cores que misturaram e da cor

magen

criada. Para finalizar, sugira que inventem um nome para patentear a

fazer t

cor: verde-dor-de-barriga, azul-céu, roxo-repolho, rosa-bala.

Entreg

com o

lizar, s

azul cé

Por que damos nomes às cores?

A cor do nome De onde se originam os nomes dados às cores? Qual será o nome mais antigo atribuído a uma cor? Quem a batizou?

Inventar nomes para as cores pode ser muito divertido. Em duplas,

pense em nomes estranhos, impossíveis de serem encontrados, por

exemplo, a cor da “Quinta” de Beethoven, do barulho do avião, de um bocejo. Essa mesma proposta pode ser feita com todos os sentidos.

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experimento 5

Dicionário da cor


Uma imensa ilha emergiu do fundo do mar no oceano Atlântico.

Pessoas do mundo inteiro resolveram mudar radicalmente de vida e

ir morar lá. Porém muitas coisas precisam ser inventadas nesse novo país.

Como ele se chamaria? Quais seriam as cores da bandeira?

De que cor seriam os vestidos das noivas? De que cor seria o uniforme da seleção de futebol? Que cor teriam os táxis? Como se vestiriam os carteiros, os bombeiros, os padres e os padeiros?

A partir dessas perguntas crie novas relações

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das cores com a cultura desse novo país.

Quando a cor das coisas é um fenômeno da natureza e quando é um dado cultural?

E se... Se as cores das coisas fossem trocadas, quais seriam as

consequências? Levantar hipóteses e encontrar argumentos é o foco dessa questão. Assim:

Se um marciano passasse o dia na Praia de Copacabana sem protetor solar, de que cor ficaria?

Se o céu fosse verde, as cores das coisas seriam outras? Quais? Se a maçã fosse azul, seu sabor seria diferente?

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País inventado


Nosso olho é muito sensível e busca sempre o equilíbrio.

Recolha uma boa quantidade de retalhos de papel de cores

variadas para criar um enorme tapete a partir da sobreposição das cores. Nada precisa ser colado, para que possa ser feito

e desfeito inúmeras vezes. Nessa proposta, o mais interessante é

passear pelo tapete e observar como as cores se comportam uma ao lado da outra.

Você já parou para observar como as imagens são construídas em

peças gráficas como HQs, jornais, embalagens, outdoors? Ilusão de óptica?

Ponto a ponto Experimente realizar uma pintura apenas com pontos. Para isso, escolha duas cores entre as primárias, por exemplo, o ciano e o

amarelo. Procure preencher boa parte do espaço, variando a distância entre os pontos e alternando as duas cores. Observe o que acontece.

Numa próxima proposta, o magenta pode ser acrescentado.

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Tapete efêmero


O retroprojetor é um equipamento antigo, mas ainda presente nas

escolas. Ele pode nos proporcionar experiências muito enriquecedoras. Por exemplo: faça vários desenhos em um papel tipo cartolina e

recorte com uma tesoura. Coloque os desenhos sobre o retroprojetor criando uma narrativa que será projetada e ampliada na parede.

Para dar mais dramaticidade, recorte folhas de papel celofane de

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cores, tamanhos e formas diferentes e misture-as a seus desenhos.

Será que as cores são as mesmas quando estão em lugares diferentes? Quais as relações entre a cor e a luz?

Luz na cor Foi Leonardo da Vinci quem comprovou, pela primeira vez, a

composição da luz branca. Para ver o que ele viu, você só precisa

de um corpo opaco, a luz amarelada de uma vela, a luz azulada do dia e um papel com um círculo vazado. Alinhe a vela e o objeto em uma

reta, de forma que a luz da chama da vela passe pelo orifício e reflita sobre o objeto. Observe o que acontece com a cor do objeto quando

iluminado pela luz da vela. Converse em grupo sobre o que cada um observa.

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Luz e cor


Agora é a sua vez de criar experimentos. Procure identificar a área de conhecimento e o conteúdo que deseja enfocar.

A proposta pode surgir a partir de outros experimentos realizados anteriormente.

A ideia é que haja apropriação de conhecimentos e que eles possam ser

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trabalhados em graus cada vez mais profundos.

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E A COR? O QUE É? Se pensamos no azul, pensamos na cor do céu, de uma piscina, uma camisa favorita, uma garrafa. E, se for no amarelo, logo vem o sol, um vestido, a capa de um livro guardado há muito na prateleira. No verde, sem nem piscar, vêm as árvores, gramados, ou talvez um sapo ou papagaio. E quem não pensa em sangue, corações ou carros de bombeiro quando pensa no vermelho? O mundo é cheio de cores. Mas o que elas são?

No dia a dia, chamamos de cor tanto a sensação cromática quanto a luz direta ou o pigmento que a reflete. No entanto, cor mesmo é a sensação, e a luz e o pigmento que a refletem são o que se chama de matiz. Pode ser que esses matizes não sejam puros, pois podem se apresentar mais claros, mais escuros. Essa é a razão de termos tantas cores no ambiente. São os matizes que causam as sensações cromáticas. E como isso acontece?

Epicuro, um filósofo grego que morreu em 270 a.C., já dizia que “a cor guarda íntima relação com a luz, uma vez que, quando falta luz, não há cor”. Para ele, os corpos não têm cor em si mesmos. Dizia que a cor depende da luz que os ilumina.

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Israel Pedrosa define matiz: “Variedade do comprimento de onda da luz direta ou refletida, percebida como vermelho, azul, amarelo e demais resultantes das misturas dessas cores.”


Cores-luz Você já observou as cores que aparecem nas bolhinhas de sabão? É o fenômeno de refração que faz com que isso aconteça. As moléculas no espaço funcionam como refratores, decompondo a luz branca em raios coloridos. Que tal conversar sobre o fenômeno e lembrar outras situações em que isso ocorre?

Foi o matemático e astrônomo inglês Isaac Newton que comprovou que as cores não eram propriedade dos corpos, mas da luz: ao incidir sobre objetos, pessoas ou qualquer matéria, a luz reflete uma cor. As cores-luz vêm de uma fonte luminosa direta, como o sol, uma lâmpada ou um raio, e suas primárias são as mesmas que o olhar capta na retina: cores que se aproximam do vermelho, do verde e do azul. Delas todas as outras cores se originam e, na síntese aditiva das três, ou seja, das três juntas, se forma o branco. As superfícies brancas refletem todos os raios luminosos que recebem, enviando toda luz que incide sobre elas para os olhos.

Cores-luz primárias: vermelho, verde e azul.

As cores-luz primárias não podem ser decompostas.

Goethe chama as cores-luz de cores absolutas: para ele, elas são desvinculadas de sujeito, assunto ou tema.

Leonardo da Vinci, em seu Tratado da Pintura, foi o primeiro a demonstrar a composição da luz branca. Da Vinci escreveu: “O branco não é uma cor, mas sim a potência receptiva de toda cor.”

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Cores-pigmento Imagine um céu escuro, sem nenhuma estrela, O magenta, o amarelo e o ciano são as cores-pigmento primárias. ou um buraco tão fundo que parece infinito. Essas cores se encontram em matérias e são resultado de sua Olhe como Anish propriedade de absorção, reflexão ou refração dos raios luminosos Kapoor, artista incidentes. Em sua síntese subtrativa, as cores-pigmento geram uma cor indiano que vive na que se aproxima do preto. Isso acontece porque todos os raios luminosos Inglaterra, pensa a cor: ela é corpo, ganha são absorvidos pela superfície preta, que, por sua vez, não envia forma, imagem, matéria. nenhuma luz para nossos olhos.

Cores-pigmento primárias: magenta, amarelo e ciano.

Cores secundárias se formam da mistura de duas cores primárias.

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RGB e CMYK são termos universais da cor. R: vermelho (red) G: verde (green) B: azul (blue) C: ciano M: magenta Y: amarelo (yellow) K: preto A mistura das três cores não gera o preto, pois os pigmentos sempre apresentam alguma imperfeição.

RGB

CMYK

É curioso saber que o amarelo, enquanto cor-luz, é cor secundária, derivando da mistura do vermelho com o verde, e, quando cor-pigmento, é cor primária, o que significa que não pode ser decomposta. As cores magenta e ciano também derivam de outras e, desse ponto de vista, são secundárias quando cor-luz. Ambas são produzidas da mistura da cor azul com outras cores primárias: o ciano nasce da combinação de azul e verde, e o magenta, do azul com o vermelho.

Índigo blue é o nome que se dá a uma variação do azul violetado, que se aproxima do azul RGB. Blue é azul em inglês e é o termo usado para calças jeans. Veja o que a artista visual Helen Mirra criou a patir de calças jeans: http://www.artnet.com/Magazine/features/erickson/erickson8-18-9.asp

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O ver científico — ­ a percepção física da cor

As cores não são matéria, ou seja, não têm presença no mundo a não ser

Tanto Newton quanto como uma sensação, a qual é resultado da ação da luz sobre o olho. A luz Leonardo da Vinci fizeram experiências penetra os olhos, atingindo os cones e bastonetes. Os cones captam a luz envolvendo a cor-luz. Faça também em três diferentes comprimentos de ondas, que não correspondem experimentos: você exatamente a três cores específicas. Essas cores se aproximam do precisa de dois prismas vermelho, verde e azul, as cores-luz primárias. Sozinhas ou em suas mais e um raio de luz. Posicione um dos variadas possibilidades de combinação, essas cores geram a sensação prismas de modo que cromática após serem processadas pelo cérebro. o raio de luz passe por ele e reflita sobre uma superfície branca. Observe e registre o que aconteceu. Depois coloque o segundo prisma invertido em linha com o primeiro, de modo que o espectro de luz passe por ele. O que aconteceu?

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De olho na cor A íris funciona como um diafragma, filtrando os raios luminosos que entram no olho para atingir a retina. A retina conta com a fóvea retiniana, que é composta de fibrilas nervosas (os cones) que nos permitem ver em cores: visão tricromática. Como vimos, há três grupos de cones: o L, o M e o C, que captam comprimentos de onda longa, média e curta. Ao redor da fóvea, encontram-se os bastonetes. São esses que nos permitem ver o preto e o branco. Bem no meio da retina, está o nervo óptico. É ele que transmite ao cérebro as sensações que os cones e bastonetes captam.

camada de fibra nervosa membrana de limitação bastonetes interna cones

Dependendo da luz a que os objetos estão expostos, suas cores podem ser alteradas. As lâmpadas comuns têm mais rosa, enquanto as fluorescentes têm mais azul e a luz a vapor de sódio (aquelas que se usam nos postes de rua) tem mais amarelo. Experimente levar os objetos para locais iluminados por diferentes fontes de luz e observe as cores deles.

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O OLHAR SENSíVEL: CARACTERíSTICAS SENSíVEIS DA VISÃO Johann Wolfgang von Goethe, um dos mais importantes escritores alemães, foi um pensador que se interessou por muitas áreas do conhecimento e tinha um interesse especial pela cor. Goethe decidiu questionar a teoria de Newton e mergulhou em estudos do fenômeno cromático. Essa pesquisa, que iniciou quando tinha 41 anos, o acompanhou até o fim de sua vida. Sua Doutrina das Cores influenciou muito o pensamento de artistas e a compreensão da cor como um fenômeno que ultrapassava os limites da física e penetrava diversas áreas, colocando o foco na percepção visual e nos processos criativos. Mas enfrentou também a desconfiança de um mundo que se valia fielmente das teorias newtonianas.

... o olho se forma na luz e para a luz, a fim de que a luz externa venha ao encontro da luz interna.

Embora Goethe não aceitasse o fato de que luzes coloridas compunham a luz branca, como comprovou Newton, sua contribuição para a compreensão das cores foi fundamental. Foi ele que nos permitiu ver que a cor não se restringe a um fenômeno físico, mas também fisiológico e psíquico. Enquanto Newton queria descobrir a origem da cor, a natureza da luz, Goethe tentou entendê-la, investigando-a profundamente e entendendo-a como um fenômeno que o homem não apenas percebe, mas também sente. A sombra ganha grande importância em sua teoria, sendo considerada um complemento da luz. Assim, contribuiu muito para a arte, pois a pintura tem como matéria-prima a tinta, o pigmento, que se origina da mistura subtrativa das cores. Sem contar que se faz, primordialmente, de luzes e sombras. Enquanto para Newton a sombra é apenas a ausência de luz, para Goethe a sombra tem a mesma importância da luz: a cor é metade luz, metade sombra. As cores são ações e paixões da luz,

escreveu, explicando que os mistérios aí envolvidos estão no homem e em seu entorno. Com isso, desenvolve uma teoria em que o significado das cores para os homens é fundamental ao conectar a percepção, a cor e a emoção. 16


Durante o dia, devido aos tons amarelados, as sombras tendem a tornarem-se violeta... Ao pôr do sol, quando seus raios difusos são do mais bonito vermelho, a cor da sombra torna-se verde.

Como a cor aparece na natureza? Como o olho percebe a cor? Essas são as perguntas que conduzem o pensamento de Goethe, que sabe bem que o homem faz parte da natureza, não podendo portanto observá-la sem interferir nela. Aparência e observador contribuem para o mesmo processo e

Construímos o mundo visível a partir do claro, do escuro e da luz.

...cada cor produz um efeito específico sobre o homem ao revelar sua essência tanto para o olho quanto para o espírito. Conclui-se daí que as cores podem ser utilizadas para certos fins sensíveis, morais e estéticos.

A luz e a sombra estão sempre juntas, ainda que, às vezes, esta última não possa ser vista. Não há sombra na escuridão total: a sombra aparece quase como uma marca da diminuição da luminosidade, mas nunca na ausência de luz. Pode ser tão suave que mal se vê ou pode estar escondida pelo corpo que faz com que exista.

Assim falou Goethe. 17


MUTÁVEL, INSTÁVEL E RELATIVA — A COR Há quem diga que a essência da beleza está no contraste entre luz e sombra, entre o claro e o escuro. Leonardo da Vinci foi a primeira pessoa a levantar essa questão. A beleza aumenta ou diminui de acordo com a mudança de contraste. Algumas pessoas acham que é por isso que a beleza da cor é relativa, mas talvez relativa seja qualquer coisa que envolva a percepção humana: será que uma cor vista por duas pessoas diferentes é percebida da mesma forma? Será que o verde-piscina que uma pessoa descreve é o mesmo que vê seu interlocutor?

E o vermelho-sangue, o azul do céu, a cor do mar? Você tem uma cor preferida? Como você caracterizaria essa preferência? Será que ela tem relação com experiências vividas? Como isso determina a percepção das cores? Talvez não haja uma resposta para essas perguntas, as razões variam: pode ser por uma memória, por um afeto, por nenhum motivo, por inúmeros.

Será que as experiências que cada um tem com a cor alteram a percepção? Que tal propor aos alunos fazer uma investigação? Peça que entrevistem amigos e conhecidos para que relatem fatos e histórias que influenciam suas relações com as cores.

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Qual é a cor?

As cores mudam e não é só por conta da quantidade ou tipo de luz e sombra que incide sobre elas. Mudam também devido à proximidade de outras cores. O branco ao lado do negro se intensifica. O verde parece mais vibrante ao lado do vermelho, ou o azul mais intenso se próximo do alaranjado.

As obras do holandês Piet Mondrian podem nos ajudar a ver isso. Observe em livros de arte ou na internet. Veja o branco no limite com cada uma das cores. Como ele se mostra? É sempre igual? Discuta suas impressões com seu grupo e pensem em exemplos da relatividade da cor na vida cotidiana. Foi trabalhando em uma fábrica de tapetes que Eugène Chevreul, químico francês, reparou na alteração dos tons de azul devido à proximidade de outras cores, o que fez com que dedicasse sua pesquisa à lei do contraste simultâneo das cores.

diagrama de cores complementares 19


As ideias de Chevreul influenciaram muitos artistas, como o pintor holandês Vincent Van Gogh e o americano Joseph Albers.

Você conhece os quadrados de Josef Albers? Observe a imagem em livros ou na internet: http://dailymodalisboa. blogspot.com.br/2012/05/gulbenkianrecebe-primeiraexposicao-em.html Investigue como uma cor influencia a outra na obra.

Você conhece a cadeira de Van Gogh? Observe a imagem em livros ou na internet: http://www.nationalgallery.org.uk/paintings/ vincent-van-gogh-vanAo olhar demorada e fixamente para uma certa cor e desviar rapidamente goghs-chair Investigue como uma o olhar para uma superfície branca, vemos sua cor complementar. Se a cor influencia a outra cor for vermelha, o branco se mostrará esverdeado. Se for azul, na obra. alaranjado. Esse fenômeno se deve à lei do contraste simultâneo: as cores complementares invadem os olhos, como uma compensação para um esforço cromático muito intenso. Essa ilusão colorida também é chamada de cor consecutiva.

E como aparecem as pós-imagens negativas? Quando os fotorreceptores, principalmente as células cones, sofrem uma superestimulação e perdem sensibilidade, as pós-imagens negativas aparecem. O olho faz movimentos quase imperceptíveis para resolver isso, mas, às vezes, a imagem cromática é tão grande que esses pequenos movimentos não conseguem mudar a cor na retina. Os cones acabam por se cansar demais ou se adaptam à imagem e deixam de responder. Até os bastonetes podem ser afetados! Ao repousar em um espaço branco, os fotorreceptores mandam um sinal tão fraco que as cores se calam. Só que os cones, que ainda não foram ativados pela tal cor, animados e dispostos, enviam sinais fortes, fazendo com que o cérebro entenda que o olho viu a cor oposta. 20


Qual é a cor da sombra? Se uma luz vermelha incidir sobre um objeto, sua sombra em uma parede branca será escura, como qualquer outra sombra, indicando a diminuição da luz. Porém, se uma fonte de luz verde iluminar o mesmo objeto, veremos uma sombra amarelada, a cor secundária formada pela combinação das duas primárias. A combinação das luzes vermelha e azul gera uma sombra magenta, assim como a da luz azul com a verde nos faz ver o ciano. Se, no entanto, um objeto opaco for iluminado pelas três cores, de ângulos diferentes, três sombras serão geradas: onde a luz vermelha encontra a verde, vê-se a sombra amarela; onde a azul e a verde se encontram, vemos o ciano; e o magenta surge na intersecção da azul com a vermelha. Ao bloquear uma das luzes, por exemplo, o vermelho, veremos apenas uma sombra: ela será ciano, a cor secundária gerada da mistura da luz verde com a azul.

Israel Pedrosa disse: “(...) Chama-se sombra colorida a sombra de coloração complementar à cor do fundo onde ela surge. Percebendo que nem sempre a cor da sombra corresponde à do corpo onde ela aparece, Da Vinci deu o primeiro passo para a explicação do fenômeno das sombras coloridas ao demonstrar que as sombras cuja cor não corresponda ao escurecimento do corpo opaco onde surja são sombras produzidas pela conjugação de luzes de colorações diferentes.”

Para continuar as investigações sobre as sombras coloridas pense: se a luz azul for apagada, a sombra ciano ficará de que cor? E a sombra magenta?

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Para Leonardo da Vinci, a sombra colorida surge de um objeto cuja luz incidente é de cor complementar à cor da sombra produzida. O artista Os impressionistas costumavam pintar sombras ao perceber que a cor da sombra nem sempre correspondia à uma mesma cena em do corpo que a produzia. Com a experiência da luz de uma vela e um raio diferentes horas do dia. Para eles, as sombras de luz diurna, explicou o fenômeno das sombras coloridas. Ele acreditava eram coloridas e a cor que a sombra contribui para a cor do objeto, dependendo do grau de do mundo variava de acordo com a luminosidade dele e da distância entre os dois. É por isso que uma passagem das horas mesma cor exposta à luz ou na sombra não parece ser a mesma. do dia, com a incidência da luz. Experimente fotografar um mesmo local em diferentes horas do dia. O que você observa nas sombras? desenvolveu a lanterna mágica com o objetivo de projetar imagens e

Goethe observou que a cor da sombra resultante da incidência do sol sobre um corpo dependida do horário em que ela era produzida e da tonalidade do céu naquele momento. A sombra ganha a cor complementar à da superfície onde é projetada. Os impressionistas se valiam desse fenômeno ao pintar paisagens ao ar livre.

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Experimente olhar uma obra de Monet ou Sisley de perto. O que você vê? E ao afastar-se lentamente, sempre com os olhos na pintura, o que você percebe?

Os pós-impressionistas se utilizaram imensamente da síntese partitiva. Os franceses Georges Seurat (1859-1891) e Paul Signac (1863-1935), importantes nomes do Pontilhismo, partem do estudo científico da decomposição da luz para criar suas imagens: agrupamentos de pequenos pontos ou pinceladas de cor pura vistos a certa distância reproduzem a unidade de tons que chega na retina. Eles deixavam que o olho participasse da composição da obra: um pouco de amarelo perto de um agrupamento azul e a retina compunha o verde, e assim por diante, criando um mundo de cores luminosas.

Georges Seurat

Paul Signac

A cor inexistente A cor inexistente é também conhecida como cor de contraste. Considerada uma cor subjetiva, ou seja, que é percebida pelo observador em uma situação específica em que uma cor, ao refletir em uma superfície vizinha, seja percebida como sua complementar e não como a cor se apresenta fisicamente. Essa explicação parece um pouco complicada. Na verdade, a cor inexistente é sempre uma cor complementar que aparece nas superfícies brancas ou de cor neutra quando a quantidade de uma Goethe: “... Em dias de sol radiante, a luz solar, dando tom à cor das flores, permite-lhes emitir a cor complementar com tal intensidade que, mesmo sob a luz mais viva, torna-se perceptível.”

cor primária é tão grande que acaba gerando um embate entre suas variedades e chega a seu ponto mais alto devido à presença do contraste.

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A COR NA ARTE Os artistas são os maiores investigadores da cor desde o início dos tempos. Seja em seus desenhos rupestres, diários de um tempo que se mostraram importantes estudos de linhas e sombras, seja na produção dos grandes mestres da pintura, em suas pesquisas e criações. Ao longo da história da arte, os artistas criaram diferentes relações com a cor e isso continua acontecendo até hoje. Suas paletas foram se modificando de acordo com a busca e a disponibilidade de materiais, convenções sociais ou do mundo da arte, algumas vezes, por influência de estilo, pesquisas e estudos científicos, sem contar o desenvolvimento tecnológico, e talvez por uma necessidade de expressão ou de transgressão. Os artistas pensam a cor através da materialidade, ou seja, por seu caráter expressivo.

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o preto O preto muitas vezes é considerado não cor, por estar associado à ideia de privação ou à ausência de luz. Sua mais conhecida propriedade física é absorver os raios luminosos que incidem sobre ele, refletindo-os minimamente. Com esforço, é possível perceber alguma tendência à coloração até nos pretos mais intensos: tendem ao azul, ao verde ou aos tons terrosos. É ao lado do branco que esse tom encontra sua maior intensidade. Embora teoricamente o preto represente a soma das cores-pigmento primárias, essa mistura gera, na verdade, um cinza escuro, em função da imperfeição da cor dos pigmentos.

o preto de Manet Édouard Manet (1832-1883) dizia querer pintar o que se vê, aproximando-se de seu próprio tempo. Seus pretos vivos eram compostos de outras cores brilhantes: preto-marfim se fundia à laca vermelha, azul-cobalto e laranja para encontrar o tom único que buscava. Em suas pinturas, em que a cor apresenta o mundo aos olhos e a luz se identifica com a qualidade das cores, o preto não é somente cor, mas luz. Observe suas pinturas: como você percebe o uso do preto?

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o branco Na física, o branco é a soma das cores: síntese aditiva das luzes coloridas, o que se obtém da mistura de todos os matizes do espectro de luz é o branco. A soma de uma cor-luz com sua complementar também é igual a branco. Enquanto pigmento, o branco é a superfície que reflete o maior número de raios luminosos que compõem a cor branca. Na psicologia e na língua, o branco é a ausência. É a cor que reflete da lua, a cor das estrelas. Na pintura, se sobressaem os brancos dos minérios de prata, zinco, titânio e barita.

O branco de Manzoni Piero Manzoni (1933-1963) chamou suas pinturas brancas de Acromas: superfícies brancas que não são nada além de superfícies brancas, como ele afirmou O artista procurava tornar as telas neutras, sem cor, completamente brancas, isentas de qualquer elemento alheio a elas. Um branco que não é neve, luar ou paz. Despida de significado, a cor da superfície não é material nem possui significado, não é nada além dela mesma. As intervenções do artista conceitual italiano procuram disfarçar a presença do artista com redução de sua atividade e eliminação de qualquer tipo de técnica formal.

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o azul Como as outras seis cores do espectro de luz, o azul é cor fundamental ou primitiva. É a mais escura das cores primárias e, portanto, a cor que mais se aproxima do preto. Seja enquanto cor-luz ou cor-pigmento, não pode ser decomposta e tem no laranja sua cor complementar. Na pintura, é utilizado para criar sombras em suas diversas tonalidades.

O azul de Klein Em suas primeiras exposições, Yves Klein (1928-1962), artista francês, exibiu uma variedade de monocromos até que, em 1957, apresentou o IKB (sigla para Azul Klein Internacional em inglês), pigmento fabricado especialmente para ele, sob encomenda, e que leva seu nome. Klein acreditava que a intensidade dos quadros deveria sensibilizar o espectador. Mas como fazer isso? Em 1955, Klein descobriu um novo produto que funciona como fixador, o Rhodopas, que não prejudicava a luminosidade das cores. Com ele, conseguia uma superfície mate, que reproduzia a perspectiva do observador, porém logo notou que o público não percebia seus quadros como gostaria e entendeu que deveria aprofundar sua pesquisa.

Na Antiguidade, acreditava-se que o azul resultava da mistura do branco e do negro. Da Vinci escreveu: “O azul é composto de luz e trevas, de um preto perfeito e de um branco muito puro como o ar.” Já Goethe dizia que o azul é o preto clareado.

Foi então que decidiu concentrar seus esforços em uma única cor: o azul. Para ele, essa cor tinha a missão de diluir a linha do horizonte e unificar o céu e a terra. Durante um ano, trabalhou em colaboração com o químico francês Edouard Adam para encontrar “a mais perfeita expressão do azul”, em suas palavras. A cor impregna o espectador, que tem a sensação de mergulhar no azul klein. A profundidade do azul o deixa quase etéreo, permitindo ao espectador uma relação intensa e única com a cor. Klein dizia que as cores são seres vivos e que se assemelham aos homens. Cada uma tem suas diferentes tonalidades, que possuem suas próprias vidas, sua personalidade. Em seus trabalhos a cor é matéria, com peso, volume e, portanto, presença, que permite que o fruidor viva a cor em toda a sua intensidade. 27


o vermelho Também o vermelho é cor primitiva ou fundamental, além de ser primária e, assim, indecomponível tanto como cor-pigmento quanto como cor-luz. A mais saturada das cores, chama sempre mais atenção que as demais. Uma característica curiosa é o fato de não poder ser clareada sem perder suas particularidades. O ciano é seu complementar em cor-luz e o verde, em cor-pigmento. Também é curioso pensar que o vermelho é a mais contraditória das cores, devido a sua origem e processo de saturação. O que mais se pinta de vermelho?

O vermelho do Cildo Imagine um lugar onde tudo é vermelho. Brilhante, opaco ou fosco, qualquer vermelho cabe ali. Desvio para o Vermelho, obra do artista carioca Cildo Meireles (1948), é uma experiência cromática que faz com que mergulhemos em um mundo particular.

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Cildo diz que a obra surge de uma ideia de alguém que, por qualquer E quais são os sentidos do vermelho? Procure listar tudo o que associa com essa cor e discutir com um grupo. Procure elencar, em seguida, significados que atribui a outras cores também. Compare com seus colegas. Será que as cores remetem todo mundo aos mesmos lugares?

razão, acumula, em um mesmo local, objetos vermelhos, das mais diferentes tonalidades da cor, junto à ideia para duas outras obras, que apareceram muito tempo depois: uma pequena garrafa da qual vazava um volume enorme e uma pia inclinada com uma torneira aberta. Desvio para o Vermelho é, portanto, dividida em três partes: Impregnação, uma sala de paredes brancas em que todos os objetos e móveis são vermelhos, um acúmulo de coisas de casa, seja para decoração ou uso; Entorno, uma segunda sala, escura, em que vemos uma pequena garrafa de onde vaza uma grande quantidade de tinta vermelha e de onde podemos ouvir o som de uma torneira aberta; ao caminhar na escuridão total, guiados pelo som da água correndo, nos deparamos com o Desvio, uma pia inclinada, com a torneira derramando um líquido vermelho. Talvez seja essa a tinta que colore Impregnação ou transborda a garrafa de Entorno. Segundo o artista, Impregnação não traz nenhum sentido metafórico. É uma coleção, resultado de escolhas. Entrar na sala é, de fato, se impregnar de vermelho, descobrir detalhes dos objetos em um ambiente onírico e embriagante. Já as outras duas salas apresentam possibilidades de leituras simbólicas. No entanto, o artista afirma querer acreditar que o vermelho seja talvez a cor que carrega mais significados, que possibilita a maior variedade de direções. Ele conta que muitas pessoas atribuíram um sentido político à obra, que ele reconhece, embora sempre a tenha pensado da perspectiva física e poética.

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o amarelo Em sua escala tonal, o amarelo é a cor que mais se aproxima do branco e a mais clara de todas. Você já notou que paredes, tecidos e louças brancas, com o passar do tempo, podem se tornar amarelos? Goethe acreditava que todo branco escurecido se torna amarelo. Também cor-pigmento primária, o amarelo tem no violeta sua cor complementar. Cor-luz secundária, ele se forma da combinação do vermelho com o verde, tendo aqui o azul como cor complementar.

O amarelo de Van Gogh Van Gogh (1853-1890) tinha os olhos como que banhados de amarelo e, assim, criou seu mundo quase que todo pintado dessa cor. Há algumas teorias a respeito de seu olhar amarelado sobre o mundo. Há quem diga que sofresse de xantopsia, que faz com que as pessoas enxerguem os objetos banhados dessa cor. Mas outras ideias, como um efeito colateral do tratamento de epilepsia ou mesmo o daltonismo, também são consideradas. O fato é que as pinturas de Van Gogh, que usa da cor para construir e modelar a realidade a sua volta, ao longo do tempo passam a ter grande presença da cor amarela.

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Conhecedor da lei do contraste simultâneo, o pintor se utilizou da teoria para criar seus ambientes, de forma que eles suscitassem as emoções que despertavam no artista. Seu Quarto em Arles, de 1889, é das Observe a pintura Quarto em Arles, de Van Gogh, e veja se você consegue “descansar o cérebro ou, antes, a imaginação”, como propôs o artista na mesma carta a seu irmão. Como você o descreveria? O artista o descreveu (carta 554): “As paredes são violeta-claro. O chão tem ladrilhos vermelhos. A madeira da cama e das cadeiras é amarela, o amarelo da manteiga fresca, os lençóis e travesseiros, amarelo-pálidos com um tom esverdeado. A colcha é escarlate. A janela, verde. O toucador laranja, a bacia, azul. As portas lilás.” http://www.musee-orsay.fr/fr/collections/ catalogue-des-oeuvres/resultat-collection. html?no_cache=1

primeiras obras que pintou pensando em pares complementares. Em carta a seu irmão Theo, Van Gogh diz: “A cor deve fazer tudo (…), nesse caso, sugerir descanso e sono em geral.”

Vincent Van Gogh dizia que queria representar a luz interior: “Eu quero a luz que vem de dentro, quero que as cores apresentem emoções.” Que sentimentos seus quadros despertam em você? E a cor amarela, de modo geral?

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Linha do tempo Os primeiros pigmentos datam de 15000 a.C. e eram os castanhos, o vermelho, o ocre e o preto. Os pigmentos derivavam de elementos da natureza, como minérios, ossos, terra, cal e eram misturados com água e gordura animal para os desenhos rupestres. A paleta dos egípcios (1320-1200 a.C.) já era bem mais variada: branco, preto, turquesa, vermelho, verde, azul ultramarino e amarelo ocre. Derivavam de minerais naturais, que não desbotam ou se alteram ao longo do tempo. No século I d.C., na Roma Antiga, surge o vermelhão, fruto do cinabre e herança da combinada genialidade grega e egípcia. Exposto à luz, tornava-se preto, pedindo então a proteção de uma camada de óleo ou cera.

Para os egípcios as cores se apresentavam em duas categorias, aquelas que serviam a pinturas de cenas cotidianas ou da natureza (o artista podia misturar as cores à vontade) e as que se dedicavam a fins religiosos, artefatos médicos ou fúnebres (restritas a seis cores, nunca misturadas, mas justapostas). Foram os egípcios que inventaram os primeiros pigmentos sintéticos. A primeira cor foi o azul alexandrino. Foram eles também os primeiros a produzir tintas para tingimento.

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Na Idade Média, os pigmentos vinham de animais, vegetais ou minerais. Por volta do século X, os vitrais medievais registram uma série de fases em que se percebe os estudos de cor e luz dos artistas da época: Acredita-se que a razão para isso é criar uma atmosfera escura, porém que permita a penetração da luz, como uma analogia à proximidade com Deus, que, embora não se possa conhecer, segundo os religiosos, traz luz. Com a maior predominância de Deus na teologia ocidental, os vitrais vão se tornando mais claros no final da Idade Média, ganhando uma maior presença do amarelo.

do fundo branco e contraste intenso do verde e do vermelho, seguidos, de uma predominância do azul, a cor que mais se aproxima da escuridão do preto.

Os afrescos renascentistas exigiam muito cuidado e técnicas especiais para a proteção das cores, que podem sofrer alterações facilmente devido às reações entre a cal e os pigmentos. As cores eram, por isso limitadas ao branco e às cores da terra: vermelho, marrons, laranjas, amarelo e verde (séc. XII).

A pintura em têmpera a ovo é, provavelmente, a razão pela qual as pinturas em painéis do século XIII ao XV são tão bem conservadas. As pinceladas devem ser delicadas, criando camadas finas de cor com uma aparência aveludada. Para a cor da pele se usava o cinabre e o sinopla, somando ainda mais cores à paleta.

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O sfumato, técnica criada por Leonardo da Vinci para diminuir o contraste entre figura e fundo, dissolvendo contornos e suavizando as cores, permite a fusão das formas, como se uma saísse da outra. A técnica vela a forma, como se omitisse informações na tela, estimulando o espectador a projetar suas referências de mundo para completá-la. O chiaroscuro (claro-escuro, literalmente, na pintura, se refere à luz e à sombra) é uma técnica que permite a evidência das diferenças tonais e a criação de volume e definição do objeto da tela. Leonardo da Vinci usava a técnica para dar uma sensação de tridimensionalidade, enquanto Caravaggio (1571-1610) com ela criava a luz dramática e teatral de suas pinturas. O betume marrom passa a ser muito utilizado.

Leonardo aproveita as descobertas da utilização de tinta a óleo feitas nos Países Baixos e estuda as variações da cor na construção de perspectiva: os tons mais pálidos indicam maior distância, enquanto os mais fortes dão a impressão de proximidade. O século XV traz muitos avanços para as tintas a óleo, inaugurando uma grande gama de cores. A base oleosa permite a secagem lenta da tinta, facilitando a mistura das cores e a sobreposição de camadas. Com três ou quatro pigmentos era possível criar mais de 20 tonalidades de vermelho. Para obter sua luz tão particular, o holandês Rembrant Harmenszoon van Rijn (1606-1669) primeiro pinta o painel com um tom marrom quente (ou seja, com boa quantidade de amarelo).

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Leonardo disse que em um dia de chuva, quando cai a tarde, o rosto das pessoas ganha uma suavidade especial, devido ao jogo de luz e sombra.


O branco e o cinza sugerem luz e textura aos tons de amarelo e ocre que compõem a figura. Sombras surgem do jogo de cores quentes e frias. As cores azul e amarela ganham destaque na segunda metade do século XVII, com o aparecimento de novas ideias sobre as cores-luz. Nas pinturas de Jan Vermeer (1632-1675), as duas cores, consideradas fundamentais por Hooke e Huyghens, cientistas pesquisadores da cor, são ponto de partida. Vermeer estava muito interessado na luz e em como ela modificava as cores. O pintor Delacroix (1798-1863) foi o maior colorista francês do Romantismo e teve papel fundamental no desenvolvimento de técnicas e do processo artístico. Estudioso de Chevreul, influenciou jovens artistas na pesquisa das cores complementares. É nesse período também que a arte passa a falar de seu próprio tempo, com o presente tomando o lugar do passado. Turner (1775-1851) foi o primeiro artista a fazer a distinção entre o material da arte (pigmentos) e o material da física (a luz). A mistura das cores primárias do artista resultavam em um cinza lamacento, enquanto a mistura das cores prismáticas primárias eram responsáveis pela produção da luz branca.

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As tintas a óleo ganham nova presença nas obras impressionistas (início em 1860-70). As novas invenções tecnológicas trazem outras possibilidades à cor. O cromo metálico e o cádmio permitem a fabricação de cores novas e brilhantes. A paleta impressionista é dominada pelas cores primárias, verdes e o branco.

O pintor fovista francês Henri Matisse (1869-1954) traz novo significado à cor: sua aplicação deixa de ser literal, descritiva e passa a ser regida pelo sentimento suscitado na observação, em sua experiência. Suas cores, expressão de emoção, eram intensas e vivas, assim como a dos expressionistas. A Arte Contemporânea explora uma diversidade de materiais e meios. A pintura começa a ganhar a presença de esmaltes e emulsões de uso doméstico, alumínio e tintas acrílicas. A Pop Art traz métodos do mundo da impressão comercial, como o silkscreen e as retículas, para o mundo da arte. A Minimal Art dispensa a manualidade do artista e as obras são realizadas por meio de processos e tintas industriais. Além disso, na producão artística contemporânea, a cor, que até então, durante a história da arte, foi trabalhada principalmente como pigmento em superfícies bidimensionais, passa a ser pensada em suas possibilidades espaciais. O artista venezuelano Cruz-Diez, realizou investigações cromáticas que envolvem as relações entre arte e espectador: a cor ganha tridimensionalidade a partir de projeções de luz sobre objetos para disparar reflexões a respeito da maneira como a luz e a cor são processadas pelo olho humano. As pesquisas acerca da cor na contemporaneidade obtiveram desdobramentos bastante radicais na poética do artista brasileiro Hélio Oiticica que, em várias de suas proposições, dá corpo à cor, como em seus Parangolés, capas, bandeiras e estandartes coloridos que podem ser vestidos. Nesse momento, o espectador participante não apenas a contempla, mas passa a ser a cor. 36

Os tubos de estanho que substituíram a bexiga de porco fazem com que fiquem mais fáceis de transportar, permitindo aos artistas a saída do estúdio em busca da luz natural


CULTURA VISUAL Aby Warburg foi o primeiro historiador a fazer uso de imagens em suas aulas e palestras. A imagem, no entanto, não é algo que ilustra o pensamento, mas ela mesma se constitui em pensamento. Warburg pode ser considerado o primeiro pesquisador a elaborar uma história visual da arte.

Como nosso olhar se constrói? Como entendemos o mundo? Será que vemos o que não conhecemos? Como o modo de olhar no passado se atualiza no presente? Como esse modo de olhar atualizado modifica o entendimento que se tem do passado? Nos dias de hoje, em que a experiência é fundamental, ver vale muito mais do que crer. A cultura visual não é parte de nosso dia a dia, mas sim nosso próprio cotidiano. É um campo do conhecimento que permite a reflexão sobre os objetos em diferentes épocas e culturas a fim de possibilitar uma compreensão da riqueza da experiência visual da contemporaneidade. Mas, o que será isso, essa coisa tão influente que acaba por afetar a vida de todo mundo, muitas vezes, sem nem mesmo percebermos? Os elementos de uma imagem, sua construção e sua recepção cultural são essenciais para nos aproximarmos do conceito de cultura visual. A cor, por exemplo, do ponto de vista cultural, não é pensada isoladamente, mas a partir do sentido que se cria em sua relação com as coisas. Os significados que ganha são influenciados por sua presença na natureza e acabam por determinar seu papel na cultura. Esse papel é variado, uma vez que é também suscetível à experiência pessoal de cada um dentro de uma determinada cultura.

Exposição Para refletir sobre a cor na cultura, os quatro painéis denominados exposição presentes nas páginas seguintes propõem possíveis relações entre a cor e situações cotidianas, obras de arte, objetos e pessoas. Inspiradas nas constelações de Aby Warburg, que contam a história da arte de modo atemporal a partir de relações estabelecidas entre as obras e os elementos que as compõem, seja por analogia ou distinção, as pranchas apresentam relações a partir das quais você pode criar as suas obras. Recorte as fichas e mãos à obra. É sua vez de montar uma exposição!

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proximidade e o distanciamento como ferramentas para que as relações que fizer fiquem claras. Aby Warburg se valia tanto da distância entre as imagens quanto de suas dimensões para explicitar as relações que fazia em suas constelações. Será que uma pessoa que vive na cidade grande, uma que vive na floresta e uma que vive no sertão entendem as imagens abaixo da mesma maneira? Encontre pelo menos cinco palavras que se relacionem com todas as imagens desta página.

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exposição 1

Observe a disposição das figuras: ao montar sua exposição, considere a


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Como a luz está presente nelas? Encontre pelo menos cinco palavras que se relacionem com todas elas. Procure em jornais e revistas outras que se relacionem com sua exposição.

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exposição 2

Como você se sente ao observar as imagens desta página?


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Outra organização das imagens na página mudaria o sentido do conjunto? Procure o fio (ou os fios) condutores que as conectam. O que elas contam? De que elas falam?

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exposição 3

A que temperatura estas imagens o remetem?


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Você já experimentou olhar as imagens impressas nos jornais e revistas bem de pertinho? O que você vê? Como o olho constrói as imagens?

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exposição 4

Com quantos pontos se faz uma imagem gráfica?


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BIBLIOGRAFIA A Cor na Arte John Gage

Editora Martins Fontes, São Paulo, 2012 A Cor no Processo Criativo — Um estudo sobre a Bauhaus e a teoria de Goethe Lilian Ried Miller Barros

Editora Senac, São Paulo, 2006 Catadores da Cultura Visual — Proposta para uma nova narrativa educacional Fernando Hernández

Editora Mediação, Porto Alegre, 2007 Curso da Bauhaus Wassily Kandinsky

Editora Martins Fontes, São Paulo, 2003 A Interação da Cor Josef Albers

Editora Martins Fontes Leitura de Imagens Lucia Santaella

Editora Melhoramentos, 2012 O Universo da Cor Israel Pedrosa

Editora Senac Nacional Pedagogia Profana — Danças, piruetas e mascaradas Jorge Larossa

Editora Autêntica, Belo Horizonte, 2006 Visual Culture: the reader

Edited by Jessica Evans and Stuart Hall Sage publications, 1999

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Sites e vídeos de referência Bartolomeo Gelpi

http://arte1.band.uol.com.br/dialogo-de-geracoes/ Cildo Meireles

http://www.inhotim.org.br/arte/texto/de_parede/170/cildo_meireles_desvio_para_o_vermelho Claude Manet

http://www.metmuseum.org/toah/hd/cmon/hd_cmon.htm Lúcia Koch

http://www.luciakoch.com Piero Manzoni

http://www.tate.org.uk/art/artworks/manzoni-achrome-t01871 Tom Sachs

http://www.youtube.com/watch?v=eBM_9W_e_D4 Van Gogh

http://www.youtube.com/watch?v=3OTj5Qv153U Yves Klein

http://www.youtube.com/watch?v=x0mYZbYdIpU

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SESC — SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO Administração Regional no Estado de São Paulo Presidente do Conselho Regional Abram Szajman Diretor Regional Danilo Santos de Miranda Superintendências Técnico-Social Joel Naimayer Padula Comunicação Social Ivan Giannini Administração Luiz Deoclécio Massaro Galina Assessoria Técnica e de Planejamento Sérgio José Battistelli Gerências Ação Cultural Rosana Paulo da Cunha / Adjunta: Flávia Carvalho / Assistentes: Juliana Braga e Nilva Luz Estudos e Desenvolvimento Marta Colabone / Adjunta: Andréa Nogueira Artes Gráficas Hélcio Magalhães / Adjunta: Karina Musumeci Santana Lilia Marcia Barra / Adjunto: Mario Fernandes da Silva

O NOME DA COR Equipe Sesc Santana: Fernando Marineli (coordenação geral), Talita Rebizzi (produção) Coordenadores: Suzana Garcia, Rovena Verona C. Pigari, Silvan Oliveira da Silva, Marcus Vinícius Rocha, Alcione Pereira Müzel Teixeira Concepção e Coordenação Expográfica: Renato Theobaldo Projeto Expositivo: Beto Rolnik Projeto Executivo: Eduardo Orellana e Juliana Neves Interações Cinéticas: Christian Marcondes Finalização Gráfica: Fernanda Mascarenhas Assessoria de Conteúdo e Textos: Paula Csillag Iluminação: Fábio Retti Interações Eletrônicas: Videotek Sistemas Eletrônicos Vídeos: Renata Rico Produção Executiva: Escamilla Soluções Culturais Projeto Educativo: Carlos Barmak (coordenação geral), Marisa Szpigel (coordenação pedagógica), Daniela Gutfreund (pesquisa), André Sztutman, Elana Gomes e Thais Szabzon (supervisores), Maria Andrade (design gráfico) Montagem Equipamentos Interativos Externos: BR2 Cenotecnia: Aprumo Eventos Equipamentos Informáticos e Audiovisuais: Equipa Equipamentos de Iluminação: Piaf Impressões Gráficas: Neoband

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