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Serra do Mar

As cores da urbanidade

Lorette Coen Projeto Com Com

São Paulo, 2017


Foto aérea do Núcleo Itutinga-Pilões, 2009


O Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica, iniciativa do governo do estado de São Paulo em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), envolvendo as Secretarias de Habitação e Meio Ambiente, é um projeto inovador de recuperação e conservação ambiental, inclusão social e prevenção de tragédias. A maior área de Mata Atlântica preservada do Brasil está no estado de São Paulo, nos territórios do Parque Estadual da Serra do Mar e em seus três mosaicos: Paranapiacaba, Jureia-Itatins e Jacupiranga. São 332 mil hectares, em 24 municípios paulistas, que contribuem para a regulação do clima, promovem a qualidade das águas de abastecimento e dão abrigo a mamíferos, anfíbios, répteis e a metade das espécies de aves do bioma. O programa teve início em 2007, e sua parceria com o BID foi firmada em 2010. Desde então, as ações desenvolvidas ganham cada vez mais relevância. A Mata Atlântica é uma das regiões do planeta mais ricas em biodiversidade e também uma das mais ameaçadas, pois apenas 7% de sua vegetação encontra-se bem conservada. A efetiva proteção da biodiversidade do Parque Estadual da Serra do Mar e de seu entorno representa ganhos expressivos na manutenção de um patrimônio ambiental de importância mundial. Além disso, a preservação de seus mananciais incide diretamente sobre a capacidade e a qualidade do abastecimento de grande parte das regiões metropolitanas de São Paulo, da Baixada Santista, do Vale do Paraíba e Litoral Norte, onde reside cerca de 57% da população de todo o estado de São Paulo.

O programa contou com quatro principais objetivos: a redução do impacto das populações residentes nas áreas de preservação, bem como a melhoria das suas condições de vida, a proteção das unidades de conservação e o fortalecimento da fiscalização dessas áreas. Neste momento, cerca de 5 mil famílias que viviam em áreas de risco ou de preservação ambiental já foram atendidas com moradias e obras de urbanização, com toda a infraestrutura e oportunidades reais de progresso para todos os seus integrantes. Vivendo em novas comunidades estruturadas, as famílias também passam a se beneficiar de programas de capacitação profissional. Ao todo, em duas fases, o programa prevê atender, com remoção e reassentamento ou obras de urbanização, aproximadamente 14 mil famílias. Esta é uma das grandes conquistas deste que é o maior programa de recuperação socioambiental já realizado por iniciativa do governo do estado de São Paulo.

Geraldo Alckmin Governador do Estado de São Paulo


Início da construção da rodovia Anchieta, no trecho Serra-Baixada Santista, s/d


A Mata Atlântica brasileira é considerada uma das áreas mais ricas em diversidade do planeta e é também um dos biomas mais ameaçados, com apenas 7% de mata nativa restante no país. Seu ecossistema é vital para a região, seja para o abastecimento de água potável ou como proteção contra deslizamentos nas encostas da Serra do Mar. Na região de Cubatão, o histórico de ocupação em áreas de preservação por mais de 10 mil famílias nas últimas décadas comprometeu as condições de preservação ambiental da região e também a qualidade de vida desses moradores. Considerando essas dificuldades e adversidades não só em termos ambientais, mas também sociais, fez-se necessária uma abordagem que envolvesse diferentes setores, contando com a participação ativa tanto do poder público quanto da sociedade civil. Essa integração entre o Estado e a comunidade se refletiu ao longo do desenvolvimento de uma metodologia de trabalho social que, ancorada nas dinâmicas sociocomunitárias, possibilitou o melhor desenho da intervenção físico-urbanística, com a oferta de 15 tipologias diversificadas de moradia, entre casas e apartamentos. Esse processo resultou na transferência voluntária de 4.085 famílias para novas habitações, e outras 1.898 permaneceram em áreas em processo de consolidação e regularização. Um dos principais desafios do Programa foi o de lidar com as características e a complexidade do território, considerando o histórico das famílias na região, suas diferentes necessidades e anseios tanto em relação às novas áreas a serem urbanizadas, quanto sobre os bairros de destino. Nessa perspectiva, foram desenvolvidos projetos e ações de fomento à organização social, de valorização da comunidade e, consequentemente, de cidadania. O programa ofereceu cursos de formação para dezenas de agentes comunitários que se tornaram promotores da recuperação socioambiental da Serra do Mar, além do acompanhamento às famílias antes, durante e depois da mudança, adequando as opções de reassentamento a cada perfil. No âmbito das ações de fortalecimento dos laços comunitários, foram promovidos inúmeros projetos sociais, de forma integrada e contínua ao longo da intervenção, tais como o Ateliê Arte nas Cotas, de práticas culturais para apropriação do novo espaço, especialmente

em intervenções de arte urbana nos espaços públicos e fachadas das casas para uma nova identidade estética do bairro; o Núcleo de Economia Solidária e Desenvolvimento Local, uma cooperativa que visa a formação de grupos produtivos locais por meio de capacitação técnica; o Projeto Com Com, que criou programas de rádio e televisão com conteúdos produzidos pela própria comunidade e, posteriormente, o Projeto Cota-Viva, voltado à conservação e recuperação de ecossistemas por meio da formação de agentes ambientais, ações de sensibilização ambiental e oportunidades de trabalho e renda. Além disso, com o apoio de ações de fortalecimento da gestão ambiental e da Polícia Militar Ambiental, órgão responsável pela fiscalização das áreas desocupadas, já é possível observar que a mata nativa retoma seu espaço, evidenciando a importância da integração de projetos de áreas distintas por meio de um planejamento único desenvolvido por equipes multissetoriais. Com o sucesso obtido no projeto, as atividades já ultrapassam os limites de Cubatão e estão sendo implantadas ao longo da área de influência da Mata Atlântica paulista, estendendo-se por todo o Parque Estadual da Serra do Mar, de norte a sul do estado, chamando-se, a partir de então, Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica. Ao analisar o projeto e seus resultados, fica evidente a importância de uma abordagem multissetorial para obtenção de resultados satisfatórios. É necessário ir além da seara ambiental e envolver diversos setores e colaboração entre múltiplas entidades governamentais e comunidades locais. Essa colaboração e a disposição para inovação dos gestores, funcionários e comunidades devem ser constantes, porque só assim será possível garantir no longo prazo um atendimento integral às famílias e às áreas protegidas pelo programa.

Hugo Flórez Timorán Representante do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no Brasil


Ortofoto do município de Cubatão, 2010


Secretaria da Habitação

A inovação e a dedicação para superar desafios foram as marcas do trabalho desenvolvido para levar à frente o Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar do Governo do Estado de São Paulo por intermédio das Secretarias de Habitação (SH) e do Meio Ambiente (SMA). Apenas assim foi possível concretizar essa iniciativa que teve metas muito audaciosas desde o seu início: dar condições dignas de moradia para 22 mil pessoas que ocupavam áreas de assentamento irregulares, incluindo áreas de risco, e proteger 1.240 hectares da Mata Atlântica. Não por acaso, essa é a maior ação do tipo já financiada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). A instituição financeira emprestou 162 milhões de dólares – que representam 35% do investimento total – para uma contrapartida do governo do estado e demais parceiros, como o governo federal, de 308 milhões de dólares – equivalentes a 65% do custo do projeto. Para que o trabalho fosse bem-sucedido, estabeleceu-se uma metodologia de atuação em que a linha dorsal foi o compartilhamento das decisões com a comunidade afetada pelo Programa. As famílias moradoras dessas áreas foram identificadas – de acordo com sua localização, características socioeconômicas etc. – como subsídio ao plano de intervenção na região. Além disso, houve forte investimento no estabelecimento de laços de confiança, essencial para o sucesso do Programa. Foram debatidos e esclarecidos os critérios gerais, os projetos de urbanização, o desenvolvimento das obras e os critérios de remoção.

Esse processo fortaleceu os vínculos entre as pessoas da comunidade e fomentou a participação popular e o desenvolvimento econômico, com a formação de agentes comunitários de urbanização, curso de capacitação profissional e Projetos Sociais como: Ateliê Arte nas Cotas, Projeto Com Com, Núcleo de Economia Solidária e Desenvolvimento Local (NESDEL) e o Cota Viva de educação ambiental. A integração entre todos os envolvidos permitiu a realização de ações exemplares de reflorestamento e de proteção de nascentes. Todas as intervenções criaram condições para o desenvolvimento sustentável na região, pois o cuidado e a proteção ao restante de Mata Atlântica no estado de São Paulo são essenciais para o legado que deixaremos para as próximas gerações. Dessa forma, foram suprimidas ocupações irregulares em áreas suscetíveis a graves acidentes, como escorregamentos de terra, e muitas vidas foram salvas. O resultado desse trabalho é um case de política habitacional em que se conciliou o atendimento habitacional de qualidade com prevenção a riscos de catástrofes ambientais e recuperação de áreas de proteção ambiental.

Rodrigo Garcia Secretário de Estado da Habitação de São Paulo


Foto aérea da Cota 200, 2012


O Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar nos deu a oportunidade de desenvolver projetos ambiciosos de urbanização e de mitigação de risco ambiental. A situação que encontramos foi de moradias em meio à Mata Atlântica, em locais com alto risco de escorregamentos.

Os locais em que as famílias puderam permanecer estão sendo urbanizados e recebem muros de contenção, redes de água, saneamento – com implantação de estação de tratamento – e drenagem. Estão sendo abertas novas ruas, além da recuperação e implantação de vielas e escadarias.

O plano de ação do governo do estado foi definido a partir de laudos elaborados pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), que identificou e classificou as áreas de risco. Considerando também os limites do Parque Estadual da Serra do Mar (PESM) foram definidas as áreas passíveis de permanência das famílias, as obras necessárias, os locais onde eram imprescindíveis as remoções e as ações de preservação ambiental.

Outro destaque do Programa diz respeito ao Trabalho Técnico Social realizado. A equipe da CDHU trouxe para o Programa a expertise desenvolvida em outros projetos.

Para atender os moradores que saíram das áreas do PESM e de locais com riscos geológicos, foram construídos novos bairros, dos quais o Residencial Rubens Lara, em Cubatão, é o melhor exemplo. Esse foi o primeiro bairro de interesse social totalmente projetado com base em princípios da construção sustentável e com inovação do traçado do desenho urbano. Com 1.840 imóveis, o projeto incluiu a implantação de equipamentos coletivos de qualidade e espaços para comércios. Um dos destaques do programa refere-se ao projeto das moradias construídas para reassentamento, que conta com inovações significativas. As residências foram produzidas com materiais e processos reconhecidos pelo Programa Qualihab da CDHU, com pé-direito alto – de 2,6 metros – e preparadas para a circulação de pessoas com deficiência, com aquecimento solar para a água do chuveiro, medição individualizada de água em condomínios verticais, iluminação e circulação de ar naturais e azulejos até o teto na cozinha e no banheiro.

A forte parceria com a comunidade teve papel central junto ao empenho do governo do estado de São Paulo, dedicado a reverter a grave situação na Serra do Mar e dar condições dignas de moradias para a população envolvida, gerando também um ambiente favorável para o desenvolvimento sustentável da região.

Marcos Penido Diretor presidente da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU)


Foto aérea da Água Fria, 2013


Serra do Mar

As cores da urbanidade Lorette Coen Projeto Com Com Apoio

Realização

Consórcio Secretaria da Habitação


Foto aérea do bairro Pinheiro do Miranda, 2013


Sumário Prefácio Viviane Frost

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A autora e o Livro Agradecimentos O que é a CDHU Siglas utilizadas

Serra do Mar As cores da urbanidade Lorette Coen

Onde o Estado e vidas se cruzam

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¬ Poema «Serra do Mar» Álvaro Rodrigues dos Santos

Qual é o projeto?

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A inteligência coletiva ¬

A história de Viviane Viviane Frost

Morro vivo

¬

Poema «Terceira idade» Noêmia Bispo de Souza A história de Jera Jeronimo Vilhena

¬

Filhos da estrada ¬

145

165

81

A história de Álvaro Álvaro Rodrigues dos Santos

A vila toda de cores

185

A história de Fefa e Inês Fernanda Saguas Tresas e Inês Prado

¬

Cubatão, terra prometida

101

A história de Walkyria Walkyria Marques de Paula ¬ A história de Adelina e Luci Adelina Mikolajaw e Lucineide Pereira de Souza Nascimento ¬

O social como ferramenta Poema «Remoção» Carlos Guilherme Campos Costa ¬ A história de Bel Isabel Frontana Caldas ¬

As esperanças pipocam

125

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¬ ¬

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Hino «Cota 200» Régio Alves

Anexos O Programa «Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica» Referências Créditos Institucionais e Técnicos

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Foto aérea da rodovia dos Imigrantes com Cota 200 ao fundo, 2013

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Prefácio

Viviane Frost

Arquiteta - CDHU Superintendente de Ações de Recuperação Urbana

A publicação deste livro tem um significado singular. Num país de muitas favelas, onde a questão urbana promove debates acalorados, pouco se discute sobre o trabalho social de habitação – e também, pouco se propõe. Nos encontros técnicos e nos espaços de discussão e pesquisa sobre o tema, esse aspecto das intervenções públicas é visto com reticências no tocante aos resultados e conteúdos, apesar dos reconhecidos esforços empenhados, especialmente na lida em campo. Ora, tomando emprestado o vocabulário do fazer arquitetônico, questionamos permanentemente qual o Projeto do trabalho social de habitação, no sentido de desenho, desejo, desígnio, afirmação e construção de futuro. Qual é de fato o nosso objeto de trabalho, a principal tarefa?

Equipe técnica e multiplicadores no dia da visita do príncipe Harry, 2014

Antes, é preciso enfrentar uma discussão central, mas de difícil trato: o perfil do trabalhador social da habitação. Temos buscado agregar técnicos de diferentes formações (sociólogos, geógrafos, assistentes sociais, historiadores, arquitetos, psicólogos, gestores ambientais, arte-educadores e comunicadores sociais, entre outros), alinhados em torno do conceito de profissionais da cidade, do CNPq, o qual tem o mérito de resumir a complexa integração demandada por esse tipo de intervenção. Sem prejuízo da complementaridade dos saberes, mas de modo a atender a abordagem que pretendemos e que será descrita ao longo deste livro, é necessário não só ao técnico social – mas também a ele – o protagonismo no debate da questão urbana, do direito à cidade e da política habitacional. Do ponto de vista mais imediato, é fundamental que o técnico social reúna uma visão do conjunto das ações e, ainda que de modo desigual e a depender das afinidades de cada profissional, compreenda as interfaces ambiental, legal, fundiária, urbanística e arquitetônica da intervenção. Somente de posse dessas ferramentas o trabalhador social poderá adquirir a percepção das diferentes dimensões do território (física, econômica, simbólica e sociopolítica). O território vulnerável, constituído como tecido urbano sobre o qual se conforma também um tecido social, é visto aqui como ponto de partida, tanto pela sua relação intrínseca com pertencimento e participação, memória e identidade, carências manifestas e também histórico de conquistas – como pela condição de cenário onde as políticas públicas multissetoriais devem se concretizar e se integrar.

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Entrega de certificado do curso de manuseio de roçadeira, parceria entre CDHU e Ecovias, 2015

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Na realidade, a experiência aqui apresentada consiste justamente na valorização e investimento do trabalho social nos territórios de origem como forma de oferecer a possibilidade de consolidação de territórios sustentáveis no âmbito da intervenção como um todo, incluídos os empreendimentos destinados ao reassentamento. Vale dizer, para o êxito da intervenção é necessário o conhecimento das reais condições de vida, das redes de relações socioterritoriais, das referências de memória. Em nossa percepção, a formação de uma nova identidade comunitária só será bem-sucedida se tiver por base a identidade existente, ainda que a transformação se dê a partir de sinergias com o Estado. Um dos aspectos mais importantes dessa abordagem talvez seja a construção de expectativas coletivas para o novo bairro (seja a favela urbanizada ou o novo empreendimento habitacional) em contraposição a uma abordagem individualizante do “beneficiário”. A desvalorização do histórico comunitário e os sentimentos de perda de identidade levam à ausência de referências para valorização da nova moradia e do novo bairro, e dão margem a que os interesses particulares se sobreponham às questões de interesse comum. A metodologia adotada, centrada na concretização de espaços de fortalecimento da cidadania e no desenvolvimento sustentável do território, se dá por meio de estratégias transversais e princípios socioeducativos que permeiam todas as ações do trabalho técnico social, desde a pactuação com a comunidade sobre os projetos de urbanização e critérios de remoção e reassentamento, até os projetos sociais de fomento à organização sociocomunitária e ao desenvolvimento local. Os diversos eixos e ações do trabalho social estão intrinsecamente ligados, não só pelo fato de serem desenvolvidos em tempos paralelos, mas principalmente porque são interdependentes e se complementam. Dessa forma, no Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar a eleição de representação ampliada e setorizada, que recebeu o nome de Agentes Comunitários de Urbanização, com 211 novos representantes eleitos, ocorreu durante o processo de apresentação e debate do projeto de intervenção em 41 reuniões realizadas quadra a quadra, e contou com a participação de 1.800 pessoas. O curso de formação desses agentes, realizado ao longo de 4 meses e conduzido para ser o espaço privilegiado de pactuação em torno do desenvolvimento local, foi organizado em módulos que abordaram: Urbanização e protagonismo comunitário; Memória, cidadania e comunicação social; Democracia e cidadania; Transformação socioambiental e Desenvolvimento local sustentável e autonomia comunitária. Esse processo de intensa interação entre os moradores dos diferentes núcleos, e destes com as equipes técnicas e convidados, resultou na formação do Núcleo Operacional de Urbanização e dos núcleos embrionários de intervenção artística urbana, comunicação comunitária, economia solidária e educação ambiental.

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Estava criada assim uma rede de atores locais com legítima e efetiva representação de sua vizinhança, permitindo maior “capilaridade” da organização comunitária e potencializando seus desdobramentos, o que convencionamos chamar de Geografia da Representação. O processo de organização comunitária ancorada no grupo de Agentes Comunitários de Urbanização teve papel fundamental para que a comunidade ocupasse o lugar de sujeito da intervenção, e não de objeto do trabalho social. É importante registrar que, se por um lado o projeto de intervenção urbana transforma o tecido urbano e social do território, por outro, a efetiva e constante participação da comunidade em debates junto a toda a equipe técnica – do Social, de Projetos e de Obras – qualifica e enriquece o projeto, resultando em espaços urbanos de fato ressignificados. O Núcleo Operacional de Urbanização (NOU) ocupou um espaço central nesse processo, e não por acaso foram realizadas, até julho de 2016, 532 atividades, entre reuniões e vistorias coletivas. Para apoio a essa dinâmica, adotamos como parte das ferramentas do trabalho social uma forte presença em campo, diária e contínua, por meio de Escritórios de Apoio Técnico (EATs) em cada um dos bairros e oficinas e ateliês de projetos sociais, resultando em 11 espaços institucionalizados de trabalho social. Acreditamos que, além de oferecer permanente acolhimento ao diálogo entre Estado e comunidade, a existência de espaços institucionais em campo contribui para estruturar o Projeto, dar credibilidade e percepção de permanência e continuidade das ações, além de integrar as equipes e propiciar melhores condições de trabalho. A figura da pactuação, central nessa concepção, implica reconhecer a existência do conflito entre as partes como fato irrefutável, ao menos no início da intervenção. Ou seja, não se parte do consenso, ao contrário, se reconhece claramente a diferença entre os atores – comunidade e Estado –, seus interesses e suas posturas. O Estado se apresenta com sua atribuição legal de recuperação das áreas de Parque e remoção das áreas de risco; os moradores veem sua moradia, seu patrimônio e seu modo de vida ameaçados. Moradores e seus representantes citam inúmeras promessas não cumpridas, longo histórico de abandono e fracassos das iniciativas públicas. O Estado, por sua vez, se vê diante de desafios gigantescos e contraditórios. O que se pactua, de fato, é a realização da intervenção passo a passo, mediante o compromisso de transparência, consulta permanente e corresponsabilidade. Ou seja, a parceria entre comunidade e Estado é uma obra em contínua construção, demandando engajamento permanente de ambas as partes, inovação por parte da equipe técnica e respaldo da administração pública. Esse cenário, de credibilidade e relações de respeito mútuo entre moradores e técnicos, adotado persistentemente, é que permitiu enfrentar inércias, obstáculos e resistências e contrariar interesses; acolher expectativas frustradas e sentimentos de perda e luto, sempre trabalhando no sentido de conciliar as escalas do indivíduo, dos grupos e

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da comunidade. Cabe aqui o reconhecimento ao trabalho ininterrupto da equipe social de campo, cuja competência e resiliência permitiram realizar aproximadamente assombrosas 5 mil remoções e reassentamentos, sem percalços. Percebe-se que um dos principais desafios superados foi o de referenciar a solução dos conflitos nas decisões conjuntas, alçando as ações do Programa à condição de conquista coletiva resultante da participação e do exercício democrático. Esse êxito se deve, em grande medida, ao engajamento da comunidade. Além da nítida vocação dessa valorosa comunidade para a organização comunitária, acreditamos que os resultados foram potencializados pela proposta de participação em diferentes formatos e escalas. Dessa forma, tanto o atendimento individual a cada família quanto as reuniões com o grupo ampliado de Agentes Comunitários de Urbanização são vistos como faces do mesmo projeto social de fomento à participação e organização comunitária. Do mesmo modo, é interessante ressaltar que os projetos sociais são incorporados à condição de protagonistas também das estruturas de organização social do Programa, entendidos como formas alternativas de participação. A coexistência de diferentes escalas de participação favorece a organicidade, contempla diferentes perfis de moradores, atende uma gama maior de necessidades e promove mudanças nas relações de poder – nesse sentido, fomentar a organização sociocomunitária não significa necessariamente construir relações de liderança-liderado, reproduzindo a verticalização das estruturas sociais tradicionais, mas sim, favorecer o surgimento de uma cultura da participação sistemática e, especialmente, um formato mais solidário de organização e convivência.

Por fim, o recente projeto de Turismo de Base Comunitária fortalece os vínculos das comunidades com o espaço transformado e anuncia uma perspectiva concreta de sustentabilidade da intervenção – depois de nossa saída de campo. Esse sim, um verdadeiro desafio. Agradeço imensamente à Lorette Coen, cuja capacidade de reflexão e encantamento é temperada com extrema perspicácia e permeabilidade, como mostra o texto fluido a seguir. Esse encontro fez deste livro um projeto inestimável. O número de pessoas que apoiaram, trabalharam ombro a ombro e se solidarizaram – e a quem devemos o sucesso do trabalho social do Programa – é de tal ordem que não seria possível nomear todos sem cometer deslizes. Entretanto, não posso deixar de agradecer o empenho e engajamento de toda a equipe social de campo, incluídos aí todos os projetos sociais. Na pessoa do engenheiro Humberto Schmidt, já quase um “engenheiro social”, Superintendente das Obras do Programa e Coordenador da Unidade Executora do Programa (UEP), e do engenheiro Marcos Arruda, agradeço a toda a equipe técnica de Projetos e Obras.

Os projetos sociais de Comunicação Comunitária – Com Com e Arte nas Cotas – Ateliê, são testemunhos inequívocos quanto às possibilidades de cultura e arte serem veículos de mitigação da segregação social, e também agentes de urbanização.

Não poderia deixar de agradecer à equipe BID – Helena L. Piaggesi e Annette Kilmer, especialistas de recursos naturais –, e a John Renshaw, especialista social, não só pelo apoio ininterrupto ao longo de todo o trajeto, mas especialmente, pela visão compartilhada.

O projeto de Educação Ambiental – Cota Viva assumiu a liderança da preservação de praças executadas pelas obras de urbanização e promoveu o surgimento da consciência da preservação e o cuidado ativo desses espaços pelos moradores vizinhos.

O trabalho realizado nos bairros-cota faz parte de uma longa trajetória de toda a equipe da Superintendência, que tenho o privilégio de conduzir em sólida parceria, já de vários anos, com Walkyria Marques de Paula e Valéria Sanches. Não poderia perder a oportunidade de celebrar e agradecer abertamente cada dia vivido ao lado das mais valiosas companheiras de trabalho que se pode ter.

No que se refere às possibilidades de geração de trabalho e renda, o Núcleo de Economia Solidária e Desenvolvimento Local – Nesdel, criado no seio da formação em economia solidária e negócio justo oferecida pelo PJ Mais – projeto educativo da Secretaria do Meio Ambiente e parceiro de primeira hora – tem caminhado firmemente para a autonomia. Aqui, é importante esclarecer que o foco do Trabalho Técnico Social de habitação, na sua dimensão de desenvolvimento local, é o fortalecimento da organização comunitária como meio de instrumentalizar a população para conquista das políticas setoriais, inclusive aquelas pertinentes ao mundo

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do trabalho. Seria pretensioso e descabido depositar nessas iniciativas a expectativa do real combate à pobreza. Ainda assim, buscamos atuar no sentido de arejar as membranas da segregação socioespacial, na medida da possibilidade de integração física dos assentamentos e da conexão de moradores a redes – estruturas de oportunidades, informações e recursos materiais e imateriais.

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A autora e o livro

Lorette Coen, formada em letras e filosofia nas Universidades de Lausanne (Suíça) e Paris VIII, trabalha como ensaísta, jornalista, curadora de exposições e diretora de projetos culturais. Publicou vários estudos e livros sobre arquitetura, urbanismo, arquitetura da paisagem, arte e design. Participa de diversos júris internacionais. O livro As cores da urbanidade nasceu de seu encontro com Viviane Frost e da visita aos bairros-cota de Cubatão em plena mutação. Ali descobriu o trabalho sistemático e ambicioso de uma equipe de agentes do Estado junto a moradores vivendo em condições precárias, em áreas de risco, em plena Mata Atlântica da Serra do Mar. Nesse micromundo, inventavam-se os métodos de um urbanismo aberto aos anseios profundos das pessoas, que se preocupa com educação , desenvolvimento local e geração de renda, que aposta na criatividade e na cultura. Um urbanismo que tira sua eficácia e legitimidade de um trabalho social atento, paciente. Respeitoso. Os bairros-cota situam-se no antigo caminho do desbravamento do território, hoje rota das exportações, a principal riqueza da economia do país. Confluem ali os problemas gritantes que agitam o Brasil contemporâneo: a preservação ambiental, o deficit habitacional, a desindustrialização, o desemprego, a profunda desigualdade social. Ora, quem passa ao largo dos bairros-cota de Cubatão enxerga de noite uma pequena luz...

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Foto noturna da Cota 200, 2015

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Agradecimentos

A autora expressa sua gratidão às numerosas pessoas que deram apoio e contribuíram para enriquecer sua pesquisa, a começar pela amiga Viviane Frost, urbanista por paixão, que pilota com energia um projeto inovador e corajoso. Agradece ao irmão Gerry Coen, sempre ao seu lado, cuja clareza de língua e de visão foram uma ajuda preciosa. Meu particular reconhecimento a Álvaro Rodrigues dos Santos, de amplos conhecimentos e visão generosa; a Adriana Levisky e a Eduardo Trani pelos esclarecimentos e análises perspicazes, e também a Davis Gruber Sansolo, Renato Daud e Fernando Chucre pelas entrevistas instrutivas. Fortes agradecimentos à equipe da CDHU-SARU em São Paulo e Cubatão: Walkyria Marques de Paula, Lucinede Pereira de Souza Nascimento, Isabel Frontana Caldas, Adelina Mikolajaw, Deborah Motta, Marystela Pinheiro de Oliveira, Reinaldo Andrade da Costa, Fernanda Saguas Tresas, Inês Prado, Natalia Girasol e Moema Torres. Muito obrigada também à equipe do Projeto Com Com: Jeronimo Vilhena, Agner Simões Rebouças, André Gustavo de Castro Matos, Alex Sandro da Silva, Antônio Trovão, Carlos Guilherme Campos Costa, Celina Silva, Cristiane Novaes, Damião Nogueira, Duda Matias Brito, Expedito Silva, Jeferson Nascimento, Josevaldo Barbosa e Juliana Finamore. A autora agradece calorosamente às pessoas que aceitaram ser entrevistadas – Noêmia Bispo de Souza, Maria José de Araujo Silva e Antonio Pedro Ferreira de Araujo – e às equipes que as receberam tão gentilmente no ateliê Artes nas Cotas e no NESDEL.

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Cachoeira na estrada de manutenção da rodovia dos Imigrantes, 2016

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O que é a CDHU?

A Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU), empresa do governo estadual, vinculada à Secretaria da Habitação, é o maior agente promotor de moradia popular no Brasil. Tem por finalidade executar programas habitacionais em todo o território do estado, voltados para o atendimento exclusivo da população de baixa renda – atende famílias com renda na faixa de 1 a 10 salários mínimos. Além de produzir moradias, a CDHU também intervém no desenvolvimento urbano das cidades, de acordo com as diretrizes da Secretaria da Habitação. A empresa hoje conhecida como CDHU foi fundada em 1949 e já teve vários nomes: CECAP, CODESPAULO e CDH. Recebeu sua atual denominação em 1989. A história da intervenção do governo do estado de São Paulo na habitação popular começou efetivamente em 1967, quando a Companhia Estadual de Casas Populares (CECAP) iniciou a produção de habitações para a população de baixa renda. De lá para cá, foram comercializadas milhares de unidades habitacionais em quase todas as cidades do estado, um número que cresce a cada mês.

Siglas utilizadas BID CDHU IPT NESDEL NOU PRRU SARU SEBRAE UNESP USP

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Foto aérea do Conjunto Habitacional Rubens Lara, 2012

Banco Interamericano de Desenvolvimento Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano Instituto de Pesquisas Tecnológicas Núcleo de Economia Solidária e Desenvolvimento Local Núcleo Operacional de Urbanização Plano de Reassentamento e Recuperação urbana Superintendência de Ações de Recuperação urbana Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Universidade de São Paulo

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Foto aérea da Cota 200, 2013

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Onde Estado e vidas se cruzam

Realiza-se aqui uma urbanidade que fala a língua dos habitantes.

São numerosos os invisíveis que vivem e trabalham ao lado. Quem repara neles? Quem se dá ao trabalho de prestar atenção ao mundo paralelo dos bairros periféricos, das favelas? De vez em quando, um repórter de boa vontade ou um antropólogo se debruça sobre certos povoados, certos casos. Para o resto da população, trata-se de pessoas assistidas ou ignoradas. De repente, eis que pobres aparecem na forte luz do dia. Nos bairros-cota de Cubatão, carentes e desfavorecidos mostram vitalidade e força criativa enfeitando suas moradias, participando da transformação de suas favelas em vilas. E mais, encarregam-se da própria informação sobre os assuntos que os interessam. Ao invés de ser desenhada nos escritórios especializados, revela-se e realiza-se aqui uma urbanidade que fala a língua dos habitantes. Na longa e frequentemente penosa história das remoções e reassentamentos, da qual esse fato notável faz parte, isso é novidade; isso merece documentação. Essa afirmação, essa nova visibilidade dos moradores não surgiu do nada. Decorre de uma atuação do estado de São Paulo em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) que, por sua excepcionalidade, merece destaque. Não que seja perfeita em todos seus aspectos. Inscreve-se num processo longo, com seus sucessos e seus fracassos. Resulta sobretudo de múltiplos fatores: equipes engajadas, indivíduos inventivos e colaborativos, capacidade de abrir espaço a um pequeno laboratório sócio-urbano dentro de uma administração pública de grande dimensão, cuja vocação é construir a cidade. Chegou o momento de tirar todo o proveito da experiência – para uso de arquitetos, urbanistas e trabalhadores sociais, mas sobretudo para uso de todos – examinando-a de modo crítico em todas as suas dimensões. Colocando o foco nas pessoas, principal ferramenta da produção urbana e da recuperação ambiental, recolhendo testemunhos, apresentando retratos de protagonistas de cada lado: aqueles que intervieram em nome do Estado, aqueles que souberam ouvir e dialogar, aqueles que deram um passo à frente na conquista de uma cidadania autêntica. É justamente esta a ambição do livro.

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Um projeto discretamente experimental Pode parecer estranho, neste Brasil atormentado pela questão habitacional, celebrar as cores da urbanidade. Trata-se de um conto de fada? De promoção turística? De propaganda política? Ou disso tudo ao mesmo tempo? Não será um tanto irônico ou provocativo se deter num projeto estadual – mesmo bem-sucedido – de tamanho exíguo quando comparado às extensas periferias ou “aglomerados subnormais” em crescimento constante, para não dizer geométrico? Ao considerar o Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar, o microcosmo dos bairros-cota de Cubatão, as unidades residenciais construídas para os moradores das casas em zonas de risco, não estamos sucumbindo a um otimismo exagerado. Descrevendo o projeto de urbanização ali implantado, não nos iludimos nem tentamos iludir para valorizar feitos a favor, por exemplo, de certas políticas, de certos políticos. Sem disfarçar os limites, nem exagerar o impacto deste projeto, nos interessa evidenciar seu caráter discretamente experimental. Da invenção contínua de respostas coletivas adequadas a situações difíceis, duras, talvez esteja nascendo um método de urbanização que importa identificar. Nossa ambição: tentar revelá-lo. Ou, mais modestamente, descrever uma atitude eficaz frente à questão urbana, no que ela tem de específico, de inovador e, eventualmente, de transponível.

Discussão de Projeto entre equipe técnica e moradores, 2013

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Sobre o desenvolvimento urbano brasileiro existem pesquisas e publicações numerosas e valiosas, de tipo acadêmico, apoiadas em números, em estatísticas, que vão do caso minuciosamente examinado até a visão larga, abrangente. Estudos técnicos também muito úteis propondo análises com finalidade prática. Nossa proposta é diferente. Assume um ponto de vista particular. Estamos num ponto delicado: a interseção entre a intervenção do Estado e as vidas, as necessidades, as aspirações das pessoas. De um lado: planos, números, metas, orçamentos e cronogramas. Do outro: uma substância viva, indivíduos, famílias e destinos. Avança-se num solo frágil, no sentido próprio como no figurado, aquele do empírico, do intuitivo, do não formulado... Aqui impera o imprevisível, o irredutível. Portanto o sensível, o narrativo é o nosso chão. Contamos aqui histórias do passado e do presente. Damos voz a protagonistas, traçamos perfis de pessoas, de comunidades. Ouvimos agentes estaduais no desempenho de suas missões, movidos também por emoções e convicções. E o importante: explicamos como, nos bairros-cota de Cubatão, eles encontram interlocutores e espaço para desenvolver experiências e assim forjar, pouco a pouco, uma metodologia. Falamos da implementação dos projetos e das iniciativas surgidas ali, das quais nascem as cores da urbanidade.

Oficina de Intervenção artística-urbana, 2010

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Um resumo de Brasil O curioso, o interessante, é a escolha de uma especialista em urbanismo, arquitetura e paisagem, pesquisando habitualmente em regiões desenvolvidas, para descrever e comentar o trabalho realizado pelo Estado no município de Cubatão, em parceria com o BID. Atraída pelo caráter experimental da intervenção, por sua dimensão humana e até filosófica, essa jornalista e ensaísta tem a convicção de que de laboratórios pequenos podem surgir mudanças decisivas. Pensa que os terrenos apartados favorecem o brotar de tempos futuros, e que é preciso estar atentos. Talvez, num Brasil sempre tentado pela insularidade, um certo recuo, um olhar e um falar diferentes tenham suas utilidades. Talvez a escolha dessa escritora queira significar que, apesar das especificidades, a questão urbana reveste um caráter mundial. E que o local pode contribuir ao global e vice-versa. Mas tocar hoje na urbanização dos bairros periféricos, das favelas, é como manipular um barril de pólvora; qualquer erro no manejo provoca a explosão. Na verdade, o estouro já aconteceu e continua na forma de movimentos sociais sempre mais frequentes, sempre mais organizados, quase habituais. Ouvem-se detonações a cada dia. Isso comprova a necessidade de divulgar a experiência do projeto de urbanização nos bairros-cota de Cubatão. Pois trata-se de um resumo de Brasil, um revelador de seus grandes bens e seus grandes males. Sobretudo, num quadro sombrio, abre perspectivas alentadoras.

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Grupo de alunos em visita aos bairros Cota, 2013

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Foto aérea da rodovia dos Imigrantes sobre o núcleo Itutinga-Pilões, 2013

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Foto aérea do bairro Água Fria, 2013

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Foto panorâmica da Cota 95/100, 2011

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Foto aérea da Usina Henry Borden, 2013

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Serra do mar

Álvaro Rodrigues dos Santos

fevereiro de 2004

Publicado no livro A grande barreira da Serra do Mar: da trilha dos Tupiniquins à Rodovia dos Imigrantes. São Paulo: O Nome da Rosa Ed., 2004.

Imponente e deslumbrante escarpa De duras rochas maciça És mistério, és esfinge És uma Deusa impondo Temor, pasmo e cobiça. Com teus flancos me espantas Com tuas águas me convidas Com teu verde me fascinas Com teus barros me intimidas. Teu colo sensual Tua pele aveludada São-me acenos de amante Ou engodos de cilada? Talvez seja esse o teu capricho, Por temer a humana orgia Nega-te como pouso de chegada Já transformando em odisséia U’a mera travessia.

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Cachoeira Lagoa Azul no rio das Pedras, próxima à Cota 95/100, 2013

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Rio Cubatão, 2013

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Foto panorâmica da Serra do Mar, 2011

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Qual é o projeto?

O desenvolvimento ambiental e o desenvolvimento humano são interdependentes e condição um do outro.

Com o Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica, o estado de São Paulo lançou uma obra de importância nacional, a maior desse tipo no Brasil, cujo custo ultrapassa um bilhão de reais. Ironicamente, ela nasceu do descumprimento da Lei ambiental pelo estado e pela prefeitura de Cubatão. Em setembro de 2009 o governo paulista foi condenado, por decisão judicial, a preservar e recuperar os ecossistemas do Parque Estadual da Serra do Mar, criado em 1977, retirando todas as moradias irregulares mas até então toleradas, localizadas nas áreas do parque. Já o Plano de Risco realizado em 2007 pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) havia apontado os terrenos sujeitos a deslizamentos, onde remoções tinham de ser efetuadas para garantir a segurança dos moradores. Estes dois documentos – o Programa de Recuperação Socioambiental e o Plano de Risco – formam os fundamentos do empreendimento. Bastava sobrevoar a área na altura de Cubatão para entender a extrema fragilidade da Mata Atlântica, reduzida a uma estreita faixa. Uma vez a continuidade interrompida, a hora da morte da floresta soaria. Ora, mais de 7.500 famílias viviam ali, formando núcleos na encosta ao longo da Via Anchieta – Cota 95/100, Cota 200, Cota 400 e Cota 500 – e no sopé da serra ao longo do rio Cubatão – Pinheiro do Miranda, Água Fria e Pilões –, aos quais acrescenta-se o pequeno Sítio dos Queirozes. Com o número de moradias irregulares em rápido aumento, esses núcleos acabariam fatalmente por se interligar, formando assim uma favela de grandes proporções. Era preciso frear essa evolução. A Secretaria da Habitação e a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU), comandadas naquela época pela mesma pessoa, Lair Krähenbühl, avaliaram a urgência da situação. Impelidas a proteger a Mata Atlântica, tiveram de enfrentar esta evidência: a interdependência entre o desenvolvimento ambiental e o desenvolvimento humano, condição um do outro. As consequências decorrentes impunham várias medidas, a serem conduzidas todas com a máxima velocidade, a começar pela construção de grande número de novas unidades habitacionais para as famílias removidas. Mas também: a requalificação e a urbanização das zonas

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Entrega de certificado da Oficina de Fotografia do Projeto Com Com, 2016

Cota 200, 2011

degradadas situadas fora das áreas de risco, a implantação de infraestruturas e o fornecimento de serviços públicos às comunidades cuja vida iria mudar radicalmente. Pela dimensão geográfica, ambiental e social, pelo número de habitações necessárias e de remoções a serem efetuadas simultaneamente, o Programa tornou-se uma operação de alta complexidade. Era preciso navegar entre a urgência constantemente exigida e o longo prazo obrigatório imposto pela amplitude, encontrando imprevistos abundantes e dificuldades numerosas pelo caminho.

bem-sucedida, adquiriu uma importância desconhecida em projetos similares. Mobilizou inúmeras pessoas, acumulou experiências, inventou práticas e dinâmicas, criou canais de comunicação e de participação, convidou novos e inesperados atores no terreno da recuperação urbana.

Nessa escala e apesar de cuidados especiais, a intervenção do Estado iria inevitavelmente gerar embates. A originalidade aqui é que eles se tornaram parte consciente e assumida do projeto. O fator conflito foi considerado, estudado e integrado na aplicação do Programa e no atendimento às pessoas envolvidas. Na implantação dos programas habitacionais e de desenvolvimento urbano, os agentes do Estado – funcionários da CDHU – foram sensibilizados e treinados para agir nas fases de pré e pós-ocupação. Foram preparados para o trabalho de prevenção e de resolução pacífica de crises. Mais, tiveram de se adaptar a atuações coletivas e a atividades dentro de grupos. Isso exigiu deles um investimento pessoal considerável.

Inventou-se aqui um método que, em certa medida, deu certo. 64

Por ser imprescindível, o projeto social embutido no Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar assim cresceu e tomou corpo a ponto de se tornar a ferramenta principal. As equipes da CDHU, e não somente os responsáveis pelas ações de recuperação urbana, passaram a desenvolver um trabalho social ou, pelo menos, incluíram sistematicamente a dimensão psicossocial nas suas reflexões. Ao lado da urbanização e da recuperação ambiental, a ação junto às comunidades, condição prévia para qualquer intervenção

Instalou-se nos bairros-cota de Cubatão um pequeno laboratório social e urbano cujas experiências – sucessos, fracassos e aprendizagem – valem ser contadas e analisadas. Inventou-se ali um método que, em certa medida, deu certo. Pergunta-se: será este um caso único, favorecido pelas circunstâncias? Situações de pobreza e de risco encontram-se aos milhares em todo o nosso país. Poderia esse método ser generalizado, ou seja, transposto a outros lugares? O fato é que a ação desenvolvida nos bairros-cota e seus resultados chamam a refletir além do caso: no fundo, o que é urbanizar? Tratando-se de uma favela, o que é mais interessante: extingui-la ou transformá-la? Apagar até sua lembrança ou reconhecer o valor social e cultural dessa elaboração humana? Neste caso, não merece recuperação e valorização tanto quanto o meio ambiente do qual faz parte? Em outras palavras: qual é o projeto levado adiante? Para quem, em nome de que sociedade e de que valores?

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Edificação na Cota 95/100, 2013

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A ação junto às comunidades é a condição prévia para qualquer intervenção bem-sucedida.

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Edificação na Cota 95/100, 2013

Edificações desconstruídas no bairro Água Fria, 2013

Crianças no bairro Pinheiro do Miranda, 2014

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Esgoto lançado diretamente em córrego no bairro Fabril, 2013

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Edificação no bairro Água Fria, 2013

Alagamento no bairro Água Fria, 2013

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Grotão no bairro Pinheiro do Miranda, 2011

Edificação na Cota 200, 2012

Foto do bairro Pinheiro do Miranda, 2007

Edificação na Cota 200, 2009

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Edificação na Cota 400, 2013

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Edificação desconstruída, 2013

Edificação atingida pela enchente do rio Cubatão, 2013

Edificação desconstruída, 2013

Edificação atingida pela enchente do rio Cubatão, 2013

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Arquiteta Stella Maris Bilemjian em reunião de discussão de Projeto, 2012

Engenheiro Humberto Schmidt em reunião do Núcleo Operacional de Urbanização – NOU, 2015

Reunião dos Agentes Comunitários de Urbanização, 2013

Reunião do Núcleo Operacional de Urbanização – NOU, 2012

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Filhos da estrada

Apesar dos desmatamentos provocados pelas construções rodoviárias e pelas ocupações informais, apesar dos frequentes escorregamentos de encostas sempre instáveis, apesar do descaso e do descuido ambiental predominantes, o vigor florestal da Serra do Mar é tal que, à primeira vista, dá a impressão de uma natureza intocada. Para as crianças que fomos, representou o paradigma da mata virgem. Ora, ao contrário do que parece indicar a densa cobertura vegetal, a montanha que separa a estreita planície litorânea do planalto paulista sempre esteve ocupada, desde antes do período colonial.

Moradores, comunidades, bairros-cota No século passado, formaram-se ali núcleos habitacionais, os chamados bairros-cota do município de Cubatão: Cota 500, Cota 400, Cota 200, Cota 95/100. Essas medidas topográficas, que indicam a altitude em relação ao nível do mar, passaram a designar os acampamentos dos trabalhadores que foram alocados nessas áreas pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER), na década de 1940, para construir a Via Anchieta. Depois da abertura da estrada em 1953, muitos permaneceram para realizar sua manutenção ou se empregar em outras obras do sistema rodoviário. Fundaram famílias, formaram comunidades às quais estão fortemente ligados e às quais se identificam por meio dessas denominações que nunca trocariam por outras.

Tratando-se de uma favela, o que é mais interessante: extingui-la ou transformá-la? 80

Aos trabalhadores migrantes, de origem nordestina em maior parte, vieram se agregar, em quantidade crescente, operários atraídos pelo polo industrial de Cubatão em pleno desenvolvimento e pelas importantes obras subterrâneas da usina hidrelétrica Henry Borden, cujas tubulações externas marcam de modo espetacular a paisagem da serra. Por fim, chegou outra grande leva de trabalhadores chamados para construir a rodovia dos Imigrantes. Com salários pouco compatíveis com o preço da terra e dos aluguéis de Cubatão, foram assentar suas moradias nos bairros-cota ou nas margens dos rios Cubatão e Pilões, em áreas de mangue. Ali formaram os bairros Pinheiro do Miranda, Água Fria, Pilões e Sítio dos Queirozes.

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Estradas A vida dos bairros-cota tinha começado com a estrada, considerada na época da construção como um avanço supremo do desenvolvimento paulista, para o qual os mais velhos se orgulhavam de ter contribuído. Agora, outra forma de avanço os despejava. Os progressos no conhecimento e a abordagem multidisciplinar, de praxe nos dias de hoje, permitiram chegar a leis ambientais e a uma política de preservação bastante eficiente, da qual faz parte o Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar. Este se comprometeu a superar o paradoxo que opõe bem-estar humano e proteção da natureza. Levanta a enorme questão habitacional que, além dos bairros-cota, permeia a atualidade brasileira de cima a baixo: fazer o quê – e como – com os assentamentos precários dos pobres? Como com eles produzir cidades?

Benedito Calixto [Itanhaém, SP, 1853 – São Paulo, SP, 1927] Paisagem (da série Mata), 1910-1920. Óleo sobre tela, 45,5 x 70,5 cm Coleção Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand

A Via Anchieta, em cartão-postal da época de sua construção: devastação na serra, s/d

Implantados em zonas periféricas da cidade de Cubatão, desprovidas de infraestruturas e dos mais elementares serviços públicos, marginalizados pela falta de meios de transporte coletivos, os moradores dos bairros-cota, por serem pobres, ganharam o rótulo de favelados. Ali, porém, se sentiram em casa, apesar das condições precárias. Criaram seus filhos, desenvolveram suas comunidades e seus modos de viver próprios por três e até quatro gerações.

Fazer o quê – e como – com os assentamentos precários dos pobres? Como, com eles, produzir cidades? 82

Durante aproximadamente 12 mil anos, foi percorrida por homens que caçavam e colhiam, abrindo inúmeras trilhas. No decorrer do milênio que precedeu a chegada dos portugueses, eles passaram a praticar a lavoura itinerante. No primeiro século e meio de conquista e povoamento, quilômetros dessas trilhas, mantidas pelos moradores das aldeias nativas para seus intercâmbios, foram utilizados para o transporte a pé e serviram a todo tipo de tráfego, incluído aquele de escravos indígenas. Algumas delas correspondem provavelmente ao traçado das rodovias atuais.

Até 2007, quando, após estudos preliminares, foi anunciado o Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar. De um dia para o outro, as ocupações, provocadas pelo DER ou pelas empreiteiras e toleradas por mais de 60 anos, se tornaram irregulares. Os trabalhadores de ontem e seus filhos passaram então a ser considerados invasores de terras. De fato, desde 1977, quando foi criado o Parque Estadual da Serra do Mar, uma reserva da Mata Atlântica, as comunidades encontravam-se em áreas de preservação. Muitos moradores ocupavam edificações de baixo padrão, penduradas nas encostas da serra, em zonas de risco, vulneráveis em graus diversos aos frequentes deslizamentos do terreno. A primeira medida tomada foi o “congelamento” do espaço todo: nenhuma construção, nenhum morador novo admitido; foram somente permitidos alguns consertos indispensáveis – de telhado, por exemplo. Para grande quantidade de habitantes, sobretudo entre os primeiros moradores e seus descendentes, essa primeira intervenção foi percebida e vivenciada como um terremoto.

Desde o mirante da Cota 200, o principal bairro-cota em processo de urbanização de Cubatão, observa-se o cruzar elegante dos viadutos ascendente e descendente da rodovia dos Imigrantes, o mais imponente dos eixos que interligam São Paulo à Baixada Santista através da Serra do Mar. Não longe, a Via Anchieta, outra proeza, se bem que mais antiga, da engenharia civil brasileira, sobe e desce, abraçando as encostas, descrevendo arabescos apurados. Essas obras monumentais somam-se à grandeza florestal do entorno para compor uma paisagem de beleza impressionante.

Trecho da Serra, na Via Anchieta, por volta de 1960

Desses antigos caminhos, os mais conhecidos são a Trilha dos Tupiniquins – uma simples picada de terra batida – substituída a partir de 1560 pelo Caminho do Padre José, obra dos recém-chegados, um pouco mais largo porém instável, aberto para servir ao tráfego crescente entre o litoral e o Planalto, entre o estuário onde será edificado o porto de Santos e São Paulo do Piratininga. O Novo Caminho de Cubatão, percorrido por homens e mulas entre 1770 e 1790, foi trocado pela primeira via pavimentada, a Calçada do Lorena. Esta representou um progresso pois, traçada pelos engenheiros portugueses como as trilhas antigas, ao longo da crista de um espigão, evitou grandes interferências nas encostas, preservando

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assim o terreno de maiores deslizamentos. Bastante duradoura, desempenhou papel econômico importante facilitando o transporte do açúcar por tropas de mulas durante a primeira metade do século XIX. Existem vestígios desses percursos estudados pelos arqueólogos e historiadores, alguns visitáveis, como trechos da Calçada do Lorena. Tempos depois, enquanto as carroças seguiam uma pouco segura Estrada da Maioridade, São Paulo abriu-se ao trem que, a partir de 1867, pôs radicalmente fim ao imenso obstáculo ao desenvolvimento representado pelos 800 metros de declive abrupto da Serra do Mar. Se a vida da estrada de ferro foi longa e decisiva para a economia paulista, permitindo o escoamento do café, por fim, o trem foi derrotado pelo automóvel. Para este foi construído o Caminho do Mar, conhecido também como a Estrada Velha de Santos, lembrança ainda viva, com seus ziguezagues, na memória contemporânea. Intensivamente utilizado até a abertura das rodovias, em declínio depois, foi fechado entre 1992 e 2004 para, após reforma, ser aberto ao ecoturismo. A ele sucedeu a Via Anchieta (1953), cujo traçado corta profundamente as vertentes da montanha. Esta, assim como a pista ascendente da rodovia dos Imigrantes (1976), executada de modo inadequado nesse trecho da serra, provocaram consequências ambientais nefastas.

Organismo vivo Fala o geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos a propósito do desafio lançado pela Serra do Mar aos construtores e aos engenheiros que, desde os primeiros tempos da colonização até os dias de hoje, tentaram sucessivamente transpô-la: “É preciso saber no que estamos mexendo, o que estamos cutucando. A Serra deve ser considerada como um organismo vivo que tem história e regras. Os deslizamentos fazem parte da vida da Serra do Mar, do seu jeito de ser, de evoluir, de se fazer”. Num livro esclarecedor, A grande barreira da Serra do Mar, o cientista explica detalhadamente o fenômeno dos escorregamentos ligados às características próprias a essa montanha, à natureza dos solos, à água, ao clima e à vegetação, e mostra como as interações determinam movimentos de massa. A geologia de engenharia ensina que qualquer ação humana interfere em matéria em movimento, ou seja, em processos geológicos. Importa saber como esses ocorrem para preveni-los. Qualquer interferência efetuada sem a indispensável compreensão de interações complexas só pode romper equilíbrios delicados, longamente elaborados ao curso do tempo, produzindo frequentemente catástrofes de grandes proporções. Ao contrário dos nativos que possuíam uma experiência íntima e profunda da serra, os ocupantes portugueses tiveram um comportamento de conquista, conta Álvaro Rodrigues dos Santos, o que a história dos caminhos através da Serra do Mar ilustra perfeitamente. Com a notável exceção da Calçada do Lorena, as sucessivas intervenções viárias, do século XVI para cá, romperam o frágil equilíbrio das encostas, determinando escorregamentos contínuos. Lançando inúmeros viadutos, abrindo túneis, os engenheiros do século XX agrediram a montanha de mil maneiras. Fizeram da construção das ferrovias e das estradas uma perigosa epopeia. Custou um preço altíssimo em vidas destruídas e obras constantemente reparadas. A serra beneficiou-se com melhores cuidados só quando foi realizada a pista descendente da Imigrantes (2002), com resultados positivos em termos de estabilidade e de impacto ambiental. Desenha-se agora o projeto de uma Nova Imigrantes...

Trabalhadores na época da construção da rodovia Anchieta, s/d

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Hoje o Sistema Anchieta-Imigrantes, intensamente percorrido por milhares de carros e de caminhões de mercadorias, exerce uma função de importância vital para a economia brasileira. Liga São Paulo, área de maior concentração populacional e industrial, a Santos, mais importante complexo portuário da América do Sul. Passa por ele, portanto, uma grande parcela da produção do país, em direção aos mercados internacionais. Em 2013, o total das mercadorias que transitaram pelo porto atingiu o patamar de 122,5 bilhões de dólares,

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Calçada do Lorena, 2007

o que corresponde a 25,4% da corrente comercial brasileira. O desempenho da economia regional – as empresas do polo petroquímico e siderúrgico de Cubatão e as atividades turísticas e de veraneio da Baixada Santista – depende inteiramente das estradas. Os moradores da Serra do Mar – cerca de 7.500 famílias em 2009 – e os viajantes que circulam a todo vapor nas rodovias vivem em mundos que se ignoram. Às vezes se encontram por acaso. Aproveitando um congestionamento, surgem meninas vendendo cocadas ou biscoitos de polvilho, meninos oferecendo siris pendurados a um pau, milho verde, refrigerantes: filhos dos bairros-cota. A eles, o Estado promete segurança e melhores perspectivas, reassentando 70% dessas famílias nas unidades habitacionais construídas para esse fim em Cubatão, urbanizando e requalificando parte de seus bairros para as demais. Mas os obstáculos não são poucos. Enfrentá-los e superá-los exige das equipes engajadas nesta árdua tarefa uma sensibilidade psicológica e social fora do comum e, acima de tudo, flexibilidade e imaginação.

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Vista aérea do Caminho do Mar, s/d

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Acampamento dos operários do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) que trabalharam na construção da Via Anchieta, s/d

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A história de Álvaro

Álvaro Rodrigues dos Santos Geólogo

Professor Álvaro Rodrigues dos Santos, 2011

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Professor Álvaro Rodrigues dos Santos, 2010

Ninguém conhece tão profundamente a Serra do Mar como Álvaro Rodrigues dos Santos, que dedicou boa parte de sua vida profissional à Grande Barreira. “Ela se apresentou a mim e eu me apresentei a ela”, conta o geólogo. Diplomado pela Universidade de São Paulo, contratado logo depois pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), efetuou estudos preliminares às obras da rodovia dos Imigrantes e coordenou também a primeira Carta Geotécnica dos morros de Santos e São Vicente. Desde então, nunca parou de aprofundar sua compreensão dessa montanha que considera como um organismo vivo. Desenvolveu uma íntima convivência com a Serra do Mar e também com os homens que a habitam. Erudito sensível tanto quanto geólogo de engenharia, publicou vários livros e inúmeros artigos sobre esse território instável e complexo. Chamado como consultor pela CDHU, atuou no mapeamento dos riscos e participou da elaboração do plano de prioridades das obras do Plano de Reassentamento e Requalificação Urbana (PRRU). Soube convencer uma população bastante desconfiada da realidade dos riscos de deslizes e ajudou na resolução de conflitos. Favorável ao método aplicado pela Superintendência de Ações de Recuperação Urbana (SARU) – intervenções modestas e sempre com a participação da população –, observou como se conseguiu ganhar assim, paulatinamente, o apoio dos moradores. Denunciou o choque frequente entre os diversos interesses e a filosofia do projeto. Acabou afastando-se, mas considera que os programas sociais continuam sendo o ponto forte do projeto: “Quando a CDHU se retirar, a população dos bairros-cota será o melhor guardião da perenidade das conquistas sociais”.

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Foto aérea da Cota 200, 2012

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Obra de Urbanização na Cota 200, s/d

Obra de contenção no bairro Pinheiro do Miranda, 2013

Obra de contenção no bairro Pinheiro do Miranda, 2013

Obra de Urbanização na Cota 200, 2012

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Rodovia dos Imigrantes, 2012

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Foto aérea da rodovia Anchieta, 2013

Rodovia dos Imigrantes, 2013

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Rodovia Anchieta, 2013

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Cubatão, terra prometida

Os deslizamentos fazem parte da vida da Serra do Mar, do seu jeito de ser, de evoluir, de se fazer.

Benedito Calixto [Itanhaém, SP, 1853 – São Paulo, SP, 1927] Evangelho nas selvas, 1893 Óleo sobre tela, 59 x 70,4 cm Acervo Pinacoteca do Estado de São Paulo, Brasil Compra do Governo do Estado de São Paulo, 1954

Rodar serra abaixo, em direção à cidade de Cubatão, entre o mar e a muralha rochosa, densamente coberta de vegetação. Após voltas e mais voltas, a curiosa sensação de não ter chegado em lugar nenhum. Ora, aqui elevam-se prédios altos, de cinco pavimentos ou mais, erguidos sobre pilotis, alinhados numa disposição rigorosamente ortogonal. Construções de aparência sólida, com fachadas recobertas de pastilhas agradavelmente coloridas, em tons pastéis – azuis, verdes, rosa e cinza claro –, revelando um cuidado particular. Nota-se também, pelas placas fotovoltaicas encaixilhadas nos telhados, uma nítida preocupação com a sustentabilidade. Esses imóveis, realizados entre 2009 e 2012, formam o conjunto habitacional Rubens Lara, que ocupa uma área de 197.500 m2 desapropriada pelo governo estadual num terreno próximo à interligação entre as vias Anchieta e Imigrantes. Trata-se de um bairro de Cubatão? Ainda não. Observam-se, sim, moradores nos apartamentos e carros estacionados nos espaços entre os pilotis, mas ao pé dos edifícios a atividade coletiva parece reduzida e a vida de rua escassa. Estão por vir os serviços, as lojas, os espaços públicos arrumados, enfim, aquilo que dá alma e movimento. O governo de São Paulo entregou o mais urgente: apartamentos em prédios, casas assobradadas e casas sobrepostas para abrigar famílias, cumprindo assim uma das metas do Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica, seu grande projeto. Estão alojadas nesses edifícios pessoas originárias de áreas de risco e de proteção ambiental, removidas dos bairros-cota da Serra do Mar e transferidas progressivamente para unidades construídas no Jardim Casqueiro pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU). Outras estão instaladas nos antigos Bolsão 7 e Bolsão 9, agora rebatizados de Vila Harmonia e Parque dos Sonhos... Entre as antigas moradias situadas nos bairros-cota e as novas, a viagem não foi muito longa: pouco mais de 5 quilômetros em linha reta – cerca de 10 quilômetros pela estrada – separam a Cota 200 e o residencial Rubens Lara, mas a mudança apresenta um caráter radical. De vilas precárias dependuradas nas encostas, os moradores passaram a loteamentos geométricos, com ruas asfaltadas, conquistados sobre o manguezal. Entre esses dois mundos, o de antes e o de agora, a estrada passa e separa.

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Um crescimento incerto A escarpa da Serra e as extensas áreas de mangue, assim como o uso industrial do solo explicam o urbanismo incerto da cidade de Cubatão e a dificuldade de abrir novos bairros. Construída entre o pé da serra e a baía de Santos, sobre um terreno pantanoso percorrido por inúmeros rios e canais, o primeiro vilarejo formou-se historicamente a partir dos pontos de transbordo de homens e cargas vindos do litoral, antes da subida em direção ao planalto ou descendo rumo ao mar. Somente no século XIX o Porto Geral transformou-se num núcleo urbano, depois da conclusão, em 1827, do aterrado de Cubatão, um empreendimento colossal de 13 quilômetros de aterro e quatro pontes. As dificuldades foram imensas. Num ensaio erudito sobre “A incrível odisseia da construção do Aterrado de Cubatão”, o geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos descreve os enormes obstáculos técnicos e financeiros enfrentados, “uma vez que o aterro, sob a tecnologia da época, implicava cestos de terra e pedra transportados na cabeça de escravos sob as mais perigosas e insalubres condições físicas e ambientais dos mangues da Baixada”. Essa construção viária sobre solo mole marcou um avanço para a engenharia brasileira da época, mas ao mesmo tempo provocou um retrocesso econômico, já que Cubatão perdeu assim suas funções portuárias e alfandegárias. Declínio ainda acentuado pela implantação da estrada de ferro Santos-Jundiaí, em 1867. O cultivo da banana se tornou o principal recurso ao qual se acrescenta, numa medida menor, a extração de pedras e de areia. O desenvolvimento deslanchou no século XX com a progressiva instalação de indústrias, a começar pela Usina Hidrelétrica Henry Borden, cuja primeira unidade foi inaugurada em 1927. Entre as décadas de 1920 e 1950, instalaram-se indústrias de grande porte – curtidoras, fábricas de produtos químicos –, a mais importante das quais foi a Companhia Santista de Papel, que começou a produzir em 1932. Conhecida como a Companhia Fabril de Cubatão, criou uma vila operária a seu lado e teve papel determinante na atração de trabalhadores e no desenvolvimento do núcleo urbano de Cubatão.

Entre o mundo de antes e o de agora, a estrada passa e separa.

a Union Carbide do Brasil ou a Petrobras Química (Petroquisa). O processo se acentuou em 1963, quando a Companhia Siderúrgica Paulista (Cosipa) começou a operar, e continuou até os anos 1970. Cubatão tornou-se assim um dos maiores polos industriais da América Latina, contabilizando 23 indústrias em janeiro de 2015. Esse desenvolvimento acelerado, acompanhado pela construção das estradas, determinou um forte crescimento da população atraída pelas oportunidades de emprego. Condiciona até hoje a natureza dos assentamentos humanos.

O afluxo dos migrantes Quem são, de onde vêm os moradores da cidade de Cubatão? Em 1940, os dados demográficos mostram 4.683 habitantes rurais, vindos da Baixada Santista e das regiões vizinhas, contra 1.887 urbanos. A primeira imigração de trabalhadores, em boa parte nordestinos, corresponde aos princípios da industrialização, com a construção da usina hidrelétrica e da Via Anchieta, inaugurada em 1947.

Benedito Calixto [Itanhaém, SP, 1853 – São Paulo, SP, 1927] Vista de Cubatão, 1826, 1922 Óleo sobre tela, 81 x 120 cm Acervo Museu Paulista da USP

Impulsionadas pelos esforços de industrialização dos governos Vargas e Kubitschek e com a atração de investimentos estrangeiros, outras usinas sugiram num movimento que se acelerou nos anos 1950 e 1960. Com a criação da Petrobras em 1953, nasceu a refinaria Presidente Bernardes de Cubatão (1955), ligada por oleodutos a um terminal marítimo em São Sebastião, ao porto de Santos e à Grande São Paulo através as encostas da Serra do Mar. A presença da refinaria estimulou o aparecimento de várias indústrias de derivados como a Companhia Brasileira de Estireno,

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Logo após, Cubatão conquista por plebiscito sua separação política da cidade de Santos e torna-se município oficialmente emancipado a partir de 1949.

Propostas de caráter técnico e melhoramentos materiais não bastam. Existem outros imperativos.

Início do tráfego na Via Anchieta, no trecho Serra-Baixada Santista, s/d

Sua população começa a crescer de modo expressivo em meados dos anos 1950 com a construção da refinaria Presidente Bernardes, das usinas químicas e petroquímicas, da siderúrgica Cosipa, das usinas de fertilizantes. Entre 1950 e 1980, conhece um afluxo explosivo de migrantes à procura de trabalho nas suas obras e usinas; calcula-se em 54 mil pessoas oriundas de regiões de grande pobreza, o Nordeste em maior parte e, também, em medida menor, Minas Gerais. Boa parte delas sem nenhuma formação escolar nem profissional. A esses migrantes deve-se o crescimento urbano de Cubatão, que hoje conta mais de 126 mil habitantes. Cidade pouco estruturada, desenvolveu-se sem planejamento da ocupação do solo, sobretudo nos bairros periféricos muito espalhados por falta de terrenos apropriados. Inúmeras ocupações irregulares ocorreram em terrenos pouco valorizados ou públicos; estabeleceram-se favelas nas margens de rodovias e de ferrovias, nas escarpas e sobre os manguezais. Esse movimento começou no início de século XX às margens da rodovia Piaçaguera, e continuou com as obras de construção e manutenção da Via Anchieta. Entre 1938 e 1947, formaram-se colônias de trabalhadores da construção civil que, durante os anos 1970 e 1980, espalharam-se em torno da estrada nas encostas da Serra do Mar, frequentemente em zonas de risco, formando os bairros-cota: Cota 95/100, Cota 200, Cota 400 e Cota 500. Outros núcleos urbanos foram construídos perto das usinas e também sobre o mangue, em palafitas. Todos com infraestrutura precária ou ausente e sem saneamento básico. Isso não deixou de influir sobre a saúde da população carente e desprotegida que vivia ali. Fenômeno agravado pelas condições ambientais às quais essas pessoas foram submetidas em razão do entrelaçamento entre as áreas habitacionais, as zonas industriais e as estradas de trânsito intenso, com fortes emissões de gases tóxicos. As catástrofes se sucederam; uma das mais graves foi o incêndio da favela Vila Socó, em 1984, que provocou um número de mortes nunca esclarecido e teve repercussão no mundo inteiro. Revelado pouco depois, o desastre da Vila Parisi – doenças e mortes de neonatos por anencefalia ligada à miséria e à poluição – provocou clamor internacional. As autoridades tiveram de agir. Num esforço conjunto de governo estadual, município e indústrias, Cubatão chegou a controlar 98% do nível de poluentes no ar e recebeu da Organização das Nações Unidas (ONU) o título de “Cidade-símbolo da Recuperação Ambiental” em 1992, ano da Cúpula da Terra sobre o meio ambiente e o desenvolvimento, no Rio de Janeiro (Eco-92). Ainda hoje, porém, mal consegue corrigir sua antiga fama.

Início do tráfego na Via Anchieta, no trecho Serra-Baixada Santista, s/d

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Acesso à propriedade Foi a premência do perigo ambiental que obrigou o governo estadual a lançar o Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica, mas a escolha dos bairros-cota de Cubatão como foco de sua ação representou para as cerca de 22 mil pessoas envolvidas a oportunidade de sair da precariedade habitacional. De fato, o governo estadual desenvolveu um enérgico projeto de moradia popular como nunca antes nesse município. Cerca de 5.000 casas situadas em zonas de proteção ambiental ou em áreas de risco geológico foram removidas, e seus moradores reassentados em outros locais. Além disso, 1.898 construções em terrenos aptos à moradia receberam os equipamentos básicos necessários, esses setores estão sendo urbanizados e as situações fundiárias regularizadas. Assim foram construídos o residencial Rubens Lara e os Bolsões 7 e 9, sob responsabilidade da CDHU. Para completar esses empreendimentos foram edificadas também unidades habitacionais em outros municípios, e unidades foram adquiridas pela CDHU na Baixada Santista, em cidades do Litoral, na região metropolitana de São Paulo e até em Cotia. Enfim, vários dispositivos foram aplicados, como a garantia de crédito para a compra de casa a prazo e o sistema de troca entre famílias sujeitas a remoção, mas que desejavam ficar nos bairros-cota. O mais importante foram os mecanismos de acesso à propriedade, permitindo às famílias carentes dos bairros-cota realizar o sonho da casa própria antes inacessível.

Portanto, trocar a precariedade à qual foram, pela força do destino, acostumados, por outra forma de insegurança – a dependência de decisões governamentais – representou para muitos uma perspectiva angustiante. A resistência às remoções – obrigatórias por decisão de justiça – se mostrou à altura da desconfiança na autoridade e proporcional ao medo de substituir o conhecido pelo desconhecido, a sociedade de origem por um mundo anônimo. Mais profundamente, abandonar a antiga casa – mesmo que fosse um barraco insalubre – equivalia a apagar a própria memória, a cancelar sua história, com o risco final de se desfazer de si mesmo. Arautos do Estado, encarregados de executar uma imposição, os colaboradores da CDHU que atuaram nos bairros-cota e nos novos conjuntos habitacionais tiveram de encarar problemáticas de caráter antropológico, psicológico e até filosófico frente às quais propostas de caráter técnico e melhoramentos materiais não bastavam. Existiam outros imperativos, exigências que não constam nos livros de urbanismo.

Desconfiança e resistência Pensado como resposta à necessidade de alojar um grande número de pessoas, o projeto governamental teve, porém, de se confrontar à realidade sociocultural, a exigências simplesmente humanas que planos urbanísticos, por mais cuidadosos que sejam, são incapazes de atender. Elaborados com números e volumes, materializados com máquinas, tijolos e concreto, não consideram necessidades primordiais de natureza não quantitativa. Ora, qual é o bem mais vital de antigos migrantes, de famílias marginalizadas que, há três gerações, vivem no isolamento dos bairros-cota ilhados no meio da Serra do Mar? A solidariedade entre famílias e vizinhos e a vida comunitária representam a condição de sobrevivência essencial para quem até lá nunca recebeu o mínimo amparo de órgão público qualquer.

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Trabalhadores na época da construção da rodovia Anchieta, s/d

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A história de Walkyria

Walkyria Marques de Paula Assistente Social

Formada em serviço social, Walkyria Marques de Paula atua em projetos com comunidade de favela desde 1990. Quando criança, observou a vida dos moradores de perto porque a escola que frequentava ficava ao lado de uma delas, a Vila da Paz, perto do autódromo. Ainda muito jovem, participou de um projeto de empresa voltado a melhorar a vida de uma comunidade carente. Alcançou um conhecimento profundo, íntimo, desse mundo, o que lhe permite ao mesmo tempo compreensão e lucidez. Dessa vivência, tira a inspiração para escrever crônicas, poesias de cordel e os stand-ups que apresenta. “A favela é nordestina. Sou paulista. Mas não tem jeito: ali, sempre me reconhecem como um deles por causa da aparência.” Quando funcionária da prefeitura, teve de assistir a operações “sem dó nem piedade”, remoções para fins de obras realizadas sob ameaça, sem compensação nenhuma, com reassentamentos em lugares longínquos, desprovidos de quaisquer serviços. Conheceu pessoas em condição de extrema pobreza, lidou com traficantes, enfrentou violência, passou por frustrações fortes. Seus 3 anos no Projeto Cingapura1 foram um período de extremo estresse. Na CDHU, Walkyria participou do Projeto Pantanal, “um celeiro de aprendizado”. Mas foi na Serra do Mar que ela encontrou o projeto mais estimulante. Como gerente das Ações de Recuperação Urbana, exige de si mesma e da equipe um compromisso total. “Passamos do reassentamento forçado e excludente a um processo que respeita o morador e leva em conta a realidade das famílias. Atuamos com transparência, definimos critérios. Não nos limitamos a oferecer habitação e urbanização mas pedimos participação; formamos agentes comunitários, trouxemos oficinas, cursos; lançamos a comunicação comunitária, organizamos atividades festivas, passeios formativos; promovemos a criação de renda. Despertamos a responsabilidade e a criatividade da comunidade. Foi uma revolução.”

1 Programa habitacional implementado pela Prefeitura do Município de São Paulo, a partir de 1993, que previa a construção de edifícios para parte das famílias que moravam em favelas.

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Walkyria Marques de Paula, 2015

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A história de Adelina e Luci

Adelina Mikolajaw Assistente Social

Lucineide Pereira de Souza Nascimento Assistente Social

Adelina Mikolajaw, 2015

Graduadas em serviço social e já bastante experientes, Lucinede Pereira de Souza Nascimento e Adelina Mikolajaw participaram do Programa de recuperação socioambiental da Serra do Mar desde os seus primórdios. Na dura missão de remoção e reassentamento de moradores, as duas coordenadoras de campo se formaram em práticas diferentes, como o trabalho em equipe multidisciplinar, e em métodos novos que contribuíram para definir e consolidar. Hoje, ambas afirmam: “Este projeto nos transformou”. “Me mudou como profissional e como pessoa”, diz Luci. Ela relata: “Encontrei aqui uma população específica, famílias de trabalhadores implantadas nos bairros-cota de Cubatão desde a construção das estradas e com forte consciência de pertencimento às suas comunidades. O diálogo com os moradores foi difícil e crítico, sobretudo no início. Pouco a pouco, e graças aos agentes comunitários que formamos, conseguimos uma participação efetiva que se tornou sempre mais interessante. Foi assim que, juntos, construímos uma metodologia”. Quando ingressou no projeto em 2010, Adelina já tinha certa experiência em habitação que repassou para a equipe. Encarregou-se do planejamento de campo: “A pressão foi forte pelo grande número de famílias a serem atendidas e pela resistência daquelas que não queriam sair de suas moradias ainda que fossem precárias. Nos períodos de grandes chuvas, vivemos situações angustiantes, de alto risco para os moradores de certas áreas. Mas o trabalho foi evoluindo e se aperfeiçoando. Fomos aprendendo com as equipes e com a população”. O processo exigiu paciência e neutralidade, mas também sensibilidade. Foi rico e gratificante. Agora Luci e Adelina sentem orgulho de ter participado de um projeto de grande alcance social. Não só pelo lado ambiental, mas também pelo benefício que trouxe à população dos bairros-cota. Um projeto exemplar e multiplicador cuja reprodução – afirmam elas – pode ser ampla.

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Lucineide Pereira de Souza Nascimento, 2016

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Bairros Cotas, 2013

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Polo Petroquímico de Cubatão, 2011

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Polo Petroquímico de Cubatão, 2016

Polo Petroquímico de Cubatão, 2011

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Foto aérea do Conjunto Bolsão IX, 2013

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Foto aérea do Conjunto Rubens Lara, 2013

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Área de lazer do Conjunto Rubens Lara, 2013

Entrega do Conjunto Rubens Lara, 2011

Conjunto Rubens Lara, 2011

Conjunto Habitacional Bolsão IX, 2011

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Conjunto Habitacional Bolsão VII, 2011

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O social como ferramenta

O anúncio aos moradores – uma população vulnerável, fragilizada pela pobreza e pela precariedade – das medidas decididas pelo estado na execução do Programa Serra do Mar suscitou de imediato um clima de tensão. Áreas inteiras seriam esvaziadas e casas demolidas em razão do risco de deslizamento e para fins de preservação ambiental. Grande parte das famílias, muitas instaladas há mais de 60 anos nos chamados bairros-cota, seriam removidas. Um dos primeiros passos do poder público foi pronunciar o “congelamento” das invasões da Serra do Mar. Instalou-se uma base da Polícia Militar Ambiental para evitar a entrada de materiais de construção na área, a não ser aqueles necessários à manutenção obrigatória das casas. Muitos viveram essas providências como um trauma.

Terreno de confronto As ações do estado foram recebidas com desconfiança. Donos de um longo histórico de expectativas e de promessas não cumpridas, os filhos e netos daqueles que construíram a rodovia Anchieta costumam receber a palavra da autoridade com suspeita bem enraizada. Operários com contrato fixo no polo industrial, trabalhadores temporários aqui ou lá e “peões de obras”, todos sujeitos às oscilações conjunturais ou sazonais e à instabilidade do emprego, têm uma forte tradição de lutas reivindicatórias. Portanto, a primeira reação foi de resistência. A inquietação assim criada aguçou as divergências entre estado e autoridades municipais filiadas a partidos adversos. A prefeitura não deixou de lamentar “a falta de transparência e as informações desencontradas”, criticando a atuação do estado nos bairros-cota que “têm deixado os moradores muito preocupados quanto ao seu futuro”. Isso alimentou a hostilidade ora explícita ora latente que permeava as relações entre responsáveis locais e estatais. De resto, o governo tinha sua responsabilidade no crescimento populacional dos bairros-cota já que os tolerou por tão longo tempo. E os

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políticos locais também. Afinal, muitas vezes incentivaram as ocupações doando material de construção em troca de votos, aumentando assim o número de seus eleitores. Na aplicação do programa de remoções e reassentamentos, as comunidades converteram-se em terreno de confronto entre lógicas contraditórias: poderes públicos, peritos, moradores, empreiteiras e partidos, todos movidos por interesses próprios e opostos.

Obras e trabalho social Era preciso lidar com todas essas enrascadas para prevenir travas na aplicação do Plano de Reassentamento e Requalificação Urbana (PRRU). O amplo processo de comunicação e de participação comunitária previsto no plano tornou-se medida de suma importância. O documento mostrava a total imbricação entre fatores sociais e ambientais. A necessidade de tratá-los em conjunto constava como condição imprescindível da ação do governo. O plano salientava também a relevância de promover de modo integrado a sustentabilidade ambiental, social, urbanística e cultural. Estava detalhadamente exposto o método participativo escolhido com seus mecanismos de gestão e de resolução de conflitos. O trabalho social foi reconhecido como principal ferramenta da proteção ambiental e da requalificação urbana nos bairros-cota e nos novos residenciais de Cubatão.

Trata-se de promover de modo integrado a sustentabilidade ambiental, social, urbanística e cultural. 126

Esses princípios e os processos definidos pesaram sem dúvida na decisão do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) de financiar o programa numa proporção excepcionalmente alta – 35% do orçamento total do projeto –, a parte do governo sendo investida quase inteiramente em habitação. O PRRU formou a base do acordo de cooperação entre o BID e as Secretarias de Habitação e de Meio Ambiente. O trabalho social ganhou novo estatuto, não mais submetido às obras em curso, mas indissociável delas. Antes subordinado à Superintendência de Projetos Especiais da CDHU, passou à responsabilidade da Superintendência de Ações de Recuperação Urbana (SARU) dirigida pela arquiteta Viviane Frost. A superintendente e seus técnicos possuíam forte experiência em recuperação urbana adquirida na Grande São Paulo – no Bairro de Pimentas em Guarulhos, no Jardim Santo André e no imenso Projeto Pantanal (em União da Vila Nova, zona Leste), entre outros. Preparados para situações críticas, não subestimaram a dificuldade da tarefa nem sua complexidade e amplitude. Apostaram no respeito às pessoas, no tempo – agir sem precipitação – e no método.

Método participativo Inúmeras foram as explicações, as discussões, as negociações, as oficinas e as assembleias. Era preciso informar e orientar as famílias, tentar aliviar o transtorno, encontrar soluções adequadas para cada um. Foram estabelecidos canais de diálogo com a população. Foram abertos espaços de atendimento: um Escritório central e vários Escritórios Técnicos de Apoio onde as famílias pudessem buscar esclarecimentos, reivindicar, reclamar ou recorrer. Os técnicos mantiveram contatos permanentes com os moradores por via de mobilizações na área, de consultas em casa e por telefone, de visitas domiciliares. Efetuaram reuniões para a escolha das unidades habitacionais, para a preparação das mudanças, para o acompanhamento das remoções. Entre dezembro de 2009 e agosto de 2016 foram realizados 89.740 atendimentos sociais às famílias e mobilizações em campo, buscando auxiliar as famílias das áreas de remoção que precisassem de reassentamento. Foi também necessário tratar das trocas de moradia para as famílias que tinham de ser removidas, mas queriam ficar nos bairros-cota, operação que exigiu em torno de 480 vistorias. Surgiram numerosíssimos casos complexos que requereram tratamento particular. Por exemplo: famílias que se separaram ou que se estabeleceram fora da área durante o processo em curso, mudanças de titularidade, transformações da moradia ou modificação de seu uso. Sobretudo, ponto-chave do método concebido pela SARU, 41 reuniões de apresentação do programa foram organizadas para eleger representantes territoriais da comunidade com o objetivo de garantir a representação equilibrada de todos os trechos das áreas a serem urbanizadas. Qualquer residente podia se candidatar. Essas reuniões ocorreram de dezembro de 2009 a fevereiro de 2010, durante as quais foram indicados 211 agentes comunitários que se tornaram elos entre a população e a CDHU.

Construir a cidadania A esses agentes foi oferecido um curso de formação elaborado pela SARU, administrado de abril a dezembro de 2010 e concluído com uma solenidade de formatura. As oficinas e módulos trataram de temas como cidade, memória, cidadania, meio ambiente e preservação, resolução pacífica de conflitos, comunidade, combate à violência, construção coletiva, desenvolvimento local sustentável e outros tópicos também importantes. Assim, ao lado

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das lideranças já presentes nas diferentes áreas e sem intenção nenhuma de substituí-las, formou-se uma rede de multiplicadores e de corresponsáveis incumbidos de informar e de envolver a comunidade no processo decisório. Esse trabalho não se limitou a propiciar conhecimentos e a conscientizar os agentes comunitários; tinha por intuito levar a atividades concretas, orientadas no sentido de consolidar a autonomia das coletividades pela gestão própria da informação e da comunicação, pela capacitação profissional, pela geração de renda, pelo fortalecimento da economia local. Sem dúvida, tratava-se de conquistar a aceitação da população para o projeto. Mas não somente. O agente comunitário, pivô e vetor da estratégia de ação da SARU, devia ser também capaz de lhe trazer os desejos e as propostas de sua gente a fim de passarem a agir em conjunto, traduzindo assim em ato a ideia essencial que conduz a ação da CDHU nas áreas de recuperação urbana: a construção da urbanidade passa pela inclusão social. E para isso é também preciso preparar e produzir a cidadania.

A cara do Estado

Formação dos Agentes Comunitários, 2010

“O Estado deve mostrar sua cara”, afirma Viviane Frost, resumindo com força a originalidade da metodologia de trabalho social criada pela CDHU no que se refere à habitação. Enquanto os assistentes sociais, de outras instituições, dão plantão, lidando com hierarquias e tratando cada caso individualmente, os técnicos sociais da CDHU atendem diariamente dentro da comunidade, num diálogo constante com ela, sem nunca substituí-la. Esses profissionais da cidade fazem parte de equipes pluridisciplinares que atuam em função de programas e, quando possível, de modo integrado com as equipes de projeto propriamente urbanístico. Estão presentes, empenhados na construção da urbanidade, assim como os operários na obra de urbanização.

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Reunião do Núcleo Operacional de Urbanização, 2015

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Remoção

Carlos Guilherme Campos Costa Publicado no Morro vivo! Viva o Morro!, n°1, 2011

Eu sou daqui. Aqui nasci, aqui me criei. Aqui fiz infância, fiz escola, enfim, fiz família. De repente alguém muito forte quer me tirar, me tirar do meu lugar, da minha gente, Gente que fez a minha história, gente que participa dos meus sonhos. Gente que divide a minha dor, comemora o meu amor e bebe da minha vitória. Querem me tirar. Falam em remoção, na verdade não ouvem o meu coração. Não quero morar em apartamento. Quero morar em liberdade, a mesma liberdade que sinto tolhida. Quero ver o mato, os pássaros, a serra. Não quero o luxo, prédios, o asfalto, só quero ficar no meu cantinho, ouvir os passarinhos, os cães a latir e ao acordar na manhã levantar, ir trabalhar, rezando pra hora de voltar. Meu barraco é tão pequeno, tão grande minha esperança e neste corpo quase preto, moreno, vive um velho que só acredita em criança.

Carlos Guilherme Campos Costa, 67 anos, aposentado, foi eleito agente comunitário. Empenhou-se na defesa dos moradores, acompanhou todo o processo das remoções, ajudou a resolver conflitos e a encontrar soluções. Explica: “Usei a poesia para falar de nossos problemas”. Radialista no passado, tornou-se um dos fundadores e idealizadores do projeto Com Com. Participou de todos os projetos sociais. Aceitou a própria remoção “por opção pessoal” e hoje vive satisfeito no residencial Rubens Lara.

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Edificação desconstruída, 2013

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Entrega de Unidade Habitacional, 2010

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Formação dos Agentes Comunitários, 2010

Atendimento Individual Programado, 2012

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A história de Bel

Isabel Frontana Caldas Historiadora

O título de sua dissertação de mestrado, Crianças e adolescentes nas ruas de São Paulo (publicada em livro pelas edições Loyola, em 1999), defendida na Universidade de São Paulo, indica a orientação e as opções de Isabel Frontana Caldas. Essa militante por essência conheceu muito jovem o mundo das favelas, atuou em projetos de apoio a mutirões para construção de casas e ajudou na elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente. Ingressou na CDHU uma primeira vez, tentou desenvolver um projeto social numa favela de alto risco, mas sua sensação foi de impotência e a experiência fracassou. Aperfeiçoou-se depois em orçamento participativo. Voltou para a CDHU chamada pela superintendente de Ações de Recuperação Urbana, Viviane Frost. Ali encontrou espaço para sua proposta de urbanismo participativo. Testou o método no Jardim Pantanal, onde a equipe da CDHU formou representantes populares apesar da resistência às vezes violenta das lideranças autoinstituídas.

Isabel Frontana em oficina de curso de formação em economia solidária, 2011

“Demos um salto de qualidade na Serra do Mar. Foi nosso pulo do gato.” Conta Bel: “Chegamos ali depois de 2 anos de conflitos contínuos. Os moradores rejeitavam o projeto de remoções e reassentamentos percebido como impositivo. As 41 reuniões de apresentação do programa se desenrolaram num clima tenso e sob proteção da polícia. Conseguimos fazer eleger representantes da população, os agentes comunitários. Oferecemos formação. Os técnicos de projetos tiveram de colaborar com os agentes comunitários no Núcleo Operacional de Urbanização. Elaborou-se assim um método de adesão às remoções. Trouxemos a experiência da artista Mônica Nador no Ateliê Arte nas Cotas. Convidamos a comunidade a produzir sua própria informação, o que deu à luz o projeto Com Com. O mais difícil foi montar o Núcleo de Economia Solidária e Desenvolvimento Local, que exigiu um processo de formação enorme. Criamos uma cultura da participação para qualificar o debate e fortalecer os moradores no diálogo com seus interlocutores públicos a começar pela CDHU.”

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Isabel Frontana em reunião com os Agentes Comunitários, 2011

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Desconstrução na Cota 400, 2013

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Moradores em reunião do Núcleo Operacional de Urbanização, 2012

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Moradores em reunião do Núcleo Operacional de Urbanização, 2015

Moradores em reunião do Núcleo Operacional de Urbanização, 2015

Moradores em reunião do Núcleo Operacional de Urbanização, 2016

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Curso de formação em Turismo de Base Comunitária, 2015

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Reunião do Núcleo Operacional de Urbanização, 2012

Formação dos Agentes Comunitários de Urbanização, 2010

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Moradores da Cota 400, 2011

Mudança na Cota 200, 2012

Mudança na Cota 400, 2011

Visita a Empreendimento do Conjunto Rubens Lara, 2009

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A inteligência coletiva Em setembro de 2015, a Secretaria do Meio Ambiente do estado de São Paulo afirmou: “atualmente, mais de 5 mil famílias que viviam em áreas de risco ou de preservação ambiental, nas encostas, após efetivados os projetos de urbanização da Serra do Mar, já foram atendidas”. Acrescentou: “Estão em execução, entre outras ações, a recuperação ambiental de 45 hectares nas áreas desocupadas”. Entre eliminar todo e qualquer tipo de instalação humana dentro do Parque Estadual da Serra do Mar e tolerar as ocupações desenfreadas, perigosas tanto para as pessoas quanto para o ecossistema, o governo escolheu a solução moderada, razoável: urbanização quando possível, remoção negociada, com reassentamento, quando imprescindível.

Núcleos removidos

Quanto maior a variedade das abordagens, melhores as chances de tecer e costurar uma coletividade sólida. 144

Assim, na Cota 200 e em Pinheiro do Miranda o governo se esforçou para manter famílias, mas em outras áreas de alto risco geotécnico e geológico foi necessário proceder a um árduo processo de desocupação. A Cota 500, de difícil acesso, localizada no km 45 da pista ascendente da Via Anchieta, contava pouquíssimos moradores que se encarregavam da manutenção da caixa d’água que abastecia parte da população das cotas inferiores. Já na Cota 400, no km 47/48 entre as pistas ascendente e descendente da mesma via, foram contabilizadas em torno de 230 edificações. Essas áreas apresentavam altíssimos riscos tanto de trânsito, relacionados à estrada próxima, quanto geológicos e ambientais. Seus moradores foram retirados e reassentados após forte resistência. Ainda hoje, a lembrança do momento muito simbólico da demolição da escola desperta em alguns tristeza e ira. Agora a floresta cresce ali, encobrindo progressivamente ruínas que não puderam ser arrancadas, tamanha é a instabilidade do solo. A Cota 95/100, no km 52/53 da pista ascendente da Anchieta, a 3 quilômetros do centro de Cubatão, contava mais de mil edificações à margem da rodovia. Sua urbanização foi considerada e estudada, mas abandonada em seguida, pois a zona foi avaliada pelos peritos como extremamente vulnerável. Assim, foi também incluída nos núcleos a serem erradicados. Quanto ao bairro Água Fria, na borda direita do rio Pilões, onde cerca de 1.500 famílias viviam precariamente,

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enfrentando constantes enchentes em períodos de chuva, ele daria lugar futuramente ao Jardim Botânico de Cubatão, exclusivamente plantado com espécies de Mata Atlântica. Enfim, uma ocupação menor, de aproximadamente 170 edificações, o Sítio dos Queirozes, às margens da rodovia Padre Manoel da Nóbrega, fez parte do programa de preservação ambiental. Insalubre e desprovido de qualquer equipamento, devia ser extinto também.

Urbanizações em curso Na Cota 200, bairro de Cubatão estabelecido no km 50 da pista ascendente da Via Anchieta, o governo de São Paulo agiu com eficiência. Tinha determinado que cerca de 1.400 edificações localizadas em terrenos sujeitos a escorregamentos, apontados no Plano de Risco realizado pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), fossem desocupadas e seus habitantes removidos. Hoje, sobram ali cerca de 750 famílias, um terço da população existente antes da implementação do programa. Para estas, o governo promoveu uma urbanização sistemática. Os moradores, antes ilhados pela mata, receberam todos os serviços básicos.

O governo escolheu a solução moderada, razoável: urbanização quando possível, remoção negociada, com reassentamento, quando imprescindível. 146

Sob o comando da CDHU, empreiteiras escolhidas por licitação consolidaram áreas de possível fragilidade geológica e implantaram muros de contenção. A rede viária foi profundamente modificada, as escadas foram alargadas e as vielas transformadas em ruas asfaltadas, permitindo o trânsito de veículos. Os esgotos a céu aberto foram substituídos por estruturas de saneamento e drenagem. O abastecimento em luz e água, antes irregular e precário, foi normalizado. Para melhor garantir a proteção ambiental foi construída uma rua perimetral além da qual é rigorosamente proibida qualquer edificação. Essa perimetral delimita a zona de preservação do Parque Estadual da Serra do Mar. Enfim, criaram-se espaços públicos, em particular o mirante Cota 200, que se tornou ponto de atração turística. Dali, admira-se o vasto panorama da Baixada e o belo contraste entre natureza e obras humanas: no fundo, os morros, o espelho d’água dos manguezais; no centro, os enormes pilares dos viadutos da Imigrantes e o balé das autopistas se cruzando numa ampla curva, por cima do vale do rio Pilões. Os melhoramentos progridem pouco a pouco em Pinheiro do Miranda, localizado entre os quilômetros 52 e 53 da pista descendente da Via Anchieta, perto do bairro da Fabril, a cerca de 3 quilômetros do centro de Cubatão. Para esse núcleo foi traçado um plano de urbanização

ambicioso, apresentado à comunidade e amplamente debatido. As obras foram lançadas e o mais urgente foi feito: a erradicação das edificações em áreas de risco – 1.100 sobre um total de 2.400 –, em particular aquelas instaladas nos declives acentuados das vertentes do Grotão.

Laboratório urbano Para as equipes da CDHU que intervieram no duplo processo das remoções e dos reassentamentos, os bairros-cota revelaram-se um vasto laboratório urbano. A pergunta fundamental colocada era: “como passar de favela para cidade?”. Existem referências? Existem modelos? Quais aplicar e por quê? Muitas vezes avançaram no escuro, sem caminho traçado; no entanto, recolheram ampla matéria para refletir sobre o que faz ‘comunidade’ e o que faz ‘cidade’. Para cumprir essa tarefa, não se mobilizaram exércitos de técnicos. Ao contrário, os recursos foram sempre limitados; compensou o investimento irrestrito de profissionais empenhados. A SARU contou com seus próprios funcionários e com assessores terceirizados que, juntos, formaram equipes fortemente integradas e comprometidas. Estas, por sua vez, buscaram força na capacidade multiplicadora dos agentes comunitários. Atuaram no projeto a um título ou outro, em momentos ou fases diferentes, engenheiros e ambientalistas, arquitetos e urbanistas, geólogos e geógrafos, historiadores e cientistas sociais, assistentes sociais e educadores, junto a outros especialistas. Cineasta, artistas visuais e de expressões diversas tiveram papel importante também. Experimentou-se assim o mérito das equipes e da ação pluridisciplinar. Pois no trabalho técnico-social concebido como suporte e fomento à emancipação e não como assistência, o profissional da cidade apresentava um perfil plural. Verificou-se que, quanto maior a variedade das abordagens, melhores as chances de tecer e costurar uma coletividade sólida. Ou seja, capaz de entender e defender seus direitos e, eventualmente, de definir seu futuro. Pois foi essa a responsabilidade assumida pelos técnicos sociais da CDHU. O quadro social encontrado nos bairros-cota exigia criatividade e iniciativa. Ali viviam pessoas empurradas pela grande pobreza a morar em áreas de risco, sujeitas a desemprego endêmico, isoladas pelas dificuldades de acesso e pela insuficiência ou ausência de transportes públicos. Moradores doentes, porém carentes de atendimento. Ou dependentes de drogas, subordinados ao tráfico que representa, às vezes, a única fonte próxima de renda e que oferece proteção social e segurança.

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Ora, de repente, o poder público se apresenta, promete melhor qualidade de vida – infraestruturas ou moradias novas num outro lugar. Mas no imediato inflige feridas e traumas tais como a divisão das famílias e a separação entre vizinhos, aqueles que teriam de se mudar e aqueles que iriam ficar. A aflição foi profunda. O sentimento de injustiça também, já que os habitantes, instalados em grande parte nos bairros-cota por três gerações, não se sentiam invasores de jeito nenhum. Tratava-se de dar apoio à reorganização familial e social. E, sobretudo, oferecer perspectivas. O trabalho sociocultural integrado ao plano de requalificação urbana que acompanhou a intervenção estadual visou agregar e fortalecer essas comunidades frágeis no momento em que estavam prestes a se desfazer, partindo do postulado repetido por Viviane Frost, segundo o qual “a inteligência é coletiva”.

Edificações antes da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

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Edificação depois da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2012

Edificações depois da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

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A história de Viviane

Viviane Frost Arquiteta

Como estudante e desde o início de sua vida profissional, Viviane Frost sempre se interessou pela habitação popular e pela dimensão social do urbanismo. Ingressou na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP) no tempo da reabertura política, quando os professores anistiados voltaram a ensinar. Foi também quando se retomou a pensar a questão urbana. “Entendi cedo que se não se constrói a cidade, não se chega a nada.” Trabalhar na solução do problema das favelas se contrapunha aos modelos que destituem o habitante de sua identidade. Pouco a pouco, percebeu que era preciso levar em conta a realidade, isto é, o contexto. Reposicionou-se, levantando estas perguntas: como o exercício técnico pode ser generoso? Como construir espaços com identidade? E sobretudo: como introduzir o trabalho social na questão habitacional? Faltavam referências. Entre os profissionais da cidade não existiam técnicos sociais voltados às comunidades. Tornava-se necessário inventar esse novo perfil. Batalhou para impor essa ideia, acedeu à Superintendência de Ações de Recuperação Urbana (SARU) da CDHU e conseguiu montar a Equipe Técnica Social. Agora enfrenta com ela os desafios e trabalha em grandes projetos de recuperação urbana em longo prazo na Grande São Paulo, na Serra do Mar e no Litoral Paulista.

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Viviane Frost no 1º Workshop de Turismo de Base Comunitária, 2015

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Edificação antes da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

Edificações antes da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

Edificação depois da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

Edificações depois da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

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Edificação antes da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

Edificação antes da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

Edificação depois da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

Edificação depois da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

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Muro antes da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2012

Praça do mirante na cota 200 antes da intervenção urbanística, 2011

Muro depois da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

Praça do mirante na cota 200 depois da intervenção urbanística, 2016

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Praça das Crianças no bairro Pinheiro do Miranda depois da intervenção urbanística e artística, 2015

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Edificação depois da intervenção artística e urbanística na Cota 200, 2015

Muro depois da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2013

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Muro depois da intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas na Cota 200, 2015

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Morro vivo Não existe urbanização sustentável sem a participação popular e sem desenvolvimento local.

Se nos bairros-cota os urbanistas do social passaram a trabalhar ao lado de urbanistas de projeto, vale lembrar que isso não resultou de um consenso. Aconteceu após longo processo no qual não faltaram conflitos e lutas. A prática se fortaleceu gradualmente e se sistematizou. “Não existe urbanização sustentável sem a participação popular e sem desenvolvimento local”, coloca a historiadora Isabel Frontana Caldas, que foi coordenadora do Núcleo de Apoio aos Projetos Sociais da CDHU. Mas como abrir um espaço de diálogo em áreas onde o Estado sempre foi ausente e onde dominam lideranças constituídas – muitas vezes apoiadas na religião (sobretudo evangélica) ou no crime (principalmente de tráfico)? A coordenadora, dona de uma larga experiência participativa, responde: pela qualificação e pela formação. Ora, esse processo funciona só se for de mão dupla. Ao passo que o técnico social aprende conhecendo a vida e a cultura dos moradores – nordestinos, em sua maior parte –, estes se constroem como interlocutores conscientes do poder público.

A comunidade protagonista Portanto, a proposta da equipe da SARU foi investir em cultura como veículo de organização e de urbanização. Os cursos ministrados aos agentes comunitários sobre temas escolhidos por eles foram levados muito a sério. Verificou-se que existia nos bairros-cota uma real demanda por formação. Durante a fase de cursos, instaurou-se um diálogo entre professores, técnicos sociais e moradores do qual nasceram, de modo bem pragmático, os projetos sociais realizados junto à população. O trabalho sobre a memória desenvolvido num dos módulos dos cursos teve grande sucesso e foi importante para fortalecer o sentimento de pertencimento. Com teatro, fotografias, filmes e documentos, foram lembradas a trajetória dos migrantes desde o sertão nordestino, a transformação de Cubatão, a construção das estradas e a formação dos bairros-cota. Os moradores, filmados nas “cabines da memória”, relataram histórias de suas famílias e de suas próprias vidas. Da oficina sobre participação comunitária no processo de urbanização, nasceu o Núcleo Operacional de Urbanização (NOU). Os agentes comunitários que integraram o NOU se juntaram aos técnicos de obras e aos técnicos sociais para acompanhar passo a passo os trabalhos de

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Restabelecer as condições de uso dos espaços públicos, abrir novos, é servir a urbanidade.

urbanização. Colaboraram no estabelecimento de critérios de remoção e de reassentamento. Discutiram o próprio projeto de urbanização detalhadamente, com todos os profissionais envolvidos. Trouxeram as críticas e reivindicações dos moradores, apresentaram sugestões e propostas de intervenções e ajudaram, assim, a construir o projeto executivo. Foi de utilidade significativa, por exemplo, o estudo de campo sobre espaços públicos realizado pelos agentes comunitários com os moradores. Observa Walkyria Marques de Paula, gerente de Ações de Recuperação Urbana na CDHU e testemunha atenta da vida nos bairros-cota: “Tais espaços – locais de encontro, de sociabilidade e de lazer – fazem enorme falta quando abandonados pelos habitantes por terem sido tomados pelo tráfico. Restabelecer as condições de uso dos espaços públicos, abrir novos, é servir a urbanidade”. Completa a coordenadora Isabel Frontana Caldas: “A sustentabilidade do bairro urbanizado só se realiza na medida em que se garantam espaços participativos e educativos, nos quais se estabeleça o diálogo permanente entre a população, as áreas técnicas e os demais representantes do poder público. A comunidade passa então a ser a protagonista desse processo, a participar das propostas e definições sobre a intervenção e a produzir informação e arte”.

Projeto Com Com A ideia do Com Com – de Núcleo de Comunicação Comunitária – projeto entre os mais férteis e ativos realizado pela CDHU nos bairros-cota, germinou durante o curso sobre informação. Esse curso despertou intenso interesse entre os agentes comunitários. O entusiasmo aumentou ainda mais quando entreviram a possibilidade de se converterem em produtores de matérias jornalísticas, programas de rádio e vídeos sobre assuntos relativos a suas próprias vidas e à urbanização dos bairros-cota. Aprenderam a alimentar blogs e redes sociais na internet. Com o apoio da CDHU e a ajuda do BID, montaram então oficinas de textos, de fotografia, de videorreportagens, de edição. Com isso, encontraram a forma de reger a comunicação local e de interagir com todas as comunidades da Serra do Mar. O Com Com despontou assim e se tornou rapidamente essencial como proposta educativa e profissionalizante, como polo de informação e de criação, como elo entre os agentes comunitários e com os demais núcleos e, sobretudo, como catalisador social. O projeto Com Com instalou-se num prédio pequeno e modesto de uma rua recém-urbanizada de Pinheiro do Miranda. No térreo, sala,

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atendimento, cozinha; sobe-se aos andares por degraus irregulares; ali encontram-se os estúdios: sala para gravar programas de rádio, sala de filmagem, sala para fotografia, sala para entrevistas e trabalhos jornalísticos de todo tipo. Computadores, equipamentos de som, de vídeo... Tudo muito simples, mas o indispensável para qualquer tipo de trabalho jornalístico e para animação de redes. Pessoas de todas as idades trabalhando concentradas, lado a lado. Adolescentes querendo se formar nas várias disciplinas, e adultos, às vezes já aposentados, que aqui adquirem competência na comunicação social. O Projeto Com Com é aberto a todos. Únicas condições: empenho, constância, eficiência. O amadorismo é proscrito. O sucesso do projeto deve-se, sem dúvida, ao entusiasmo e ao esforço de toda a equipe gestora e educativa. Mas corresponde em primeiro lugar à generosidade imaginativa e à perseverança incansável de Jeronimo Vilhena, o coordenador geral, técnico e executivo do Com Com, indissociável da equipe que se formou em torno dele. Formaram moradores que, depois, se juntaram a eles para desenvolver o projeto. Proposta e mote do Com Com: “Fazer mídia alternativa é preciso! E aqui no Projeto Com Com é possível! Você tem espaço para falar da comunidade e abordar temas que são deixados de lado pela grande mídia”.

Mestre Expedito Importante papel foi aquele do morador e agente comunitário Expedito Silva, 68 anos em 2016, um dos idealizadores e fundadores do Com Com: “Quando o Jerão me convidou para participar do Com Com, eu não sabia nada, não entendia nada. Tive medo de não me adaptar”. Expedito é do campo, não é da aula: “Vim do Rio Grande do Norte na idade de 23 anos, moro em Cubatão há mais de 40 anos e sempre trabalhei na indústria. Sofri poluição, inundações; conto nos dedos de uma mão só os colegas ainda vivos. Segui os três cursos do Projeto Com Com (rádio, TV e jornal). Pouco a pouco assumi responsabilidades, conversando com os companheiros, incentivando os alunos, organizando o local. Ajudei na rádio Visão, colaborei nos programas da TV Comunidade em Ação, produzidos para a TV Unisantos e a TV Polo. Sempre trabalhei pesado, tinha-me tornado uma pessoa recalcada. O Com Com mudou muito minha vida”. Respeitado e com título de “mestre”, Expedito Silva é hoje responsável no Espaço Com Com e monitor dos Repórteres Mirins. Avalia assim a utilidade do projeto: “A comunidade precisava saber o que estava ocorrendo aqui, e como. Com programas sobre o bairro na TV, no rádio e no jornal, conseguimos acompanhar os acontecimentos

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Um sopro de contemporaneidade Moradores, antes periféricos e isolados, tornam-se cidadãos informados, com possibilidade de expressão pessoal e de intervenção social. Jovens não mais condenados a serem pedreiros ou desempregados se mostram capazes de aceder a profissões como radialistas, cinegrafistas, jornalistas, locutores, técnicos de informática ou fotógrafos. Para apoiar esse ensino, a Superintendência de Ações de Recuperação Urbana (SARU) firmou parcerias com ONGs da Economia Solidária. Foi contratado o Instituto Voz (iVoz), cujos integrantes são produtores artísticos e culturais e educadores independentes organizados coletivamente. O iVoz foi encarregado de elaborar uma metodologia e de aplicá-la. Quem são Jeronimo Vilhena e seus companheiros? Jovens oriundos do movimento hip hop e da arte de periferia, frequentadores dos saraus de poesia, autores de filmes “feijão com arroz”, grafiteiros, DJs ou beat boxers. E ao mesmo tempo: cientistas sociais, comunicadores, familiarizados com a internet, as redes de contato e os novos modos de dizer e de fazer. Trouxeram aos bairros-cota abertura e liberdade junto a um sopro de contemporaneidade. Apostando nesse espírito, Viviane Frost e a equipe de Ações de Recuperação Urbana obedeceram a uma intuição boa e, por isso mesmo, acertaram. Sr. Expedito da Silva, integrante do Projeto Com Com, morador da Fabril, 2012

e até seguir os trabalhos da Câmara municipal. Isso nos deu mais confiança. Nos facilitou a cobrança daquilo que não tínhamos. O espaço comunitário e a pracinha foram conquistas dos moradores. Reivindicamos horta, aparelhos de ginástica. Pudemos informar sobre o andamento das obras, sobre as mudanças no bairro, sobre os projetos. Graças às nossas mídias e redes, anunciamos os eventos sociais, educativos, proporcionamos plataformas para atividades e intercâmbios entre pessoas. Abrimos assim nossas portas ao mundo”. Para o coordenador Jeronimo Vilhena, “seu Expedito é nosso barômetro. Ajuda a medir a temperatura dos moradores em relação às empreiteiras que realizam as obras, em relação à CDHU ou entre eles”. Com o decorrer do tempo, os papéis respectivos evoluíram. “Agora – diz Jeronimo Vilhena – as pessoas que formamos ensinam os novos participantes. E cobram por isso, o que é justo.” O mérito do Com Com não é só de abrir perspectivas para as pessoas, qualquer que seja seu nível e idade, mas estimular a capacitação voltada às profissões do futuro.

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Moradores, antes periféricos e isolados, tornam-se cidadãos informados, com possibilidade de expressão pessoal e de intervenção social.

É só olhar o muito colorido jornal dos bairros-cota, o Morro Vivo! Viva o Morro!, na sua versão impressa ou virtual para sentir a enorme e comunicativa vitalidade e alegria dos moradores produzindo a própria informação. O jornal se autodescreve assim: “É produzido pela e para a comunidade. Aborda pautas de interesse dos bairros-cota e mais especificamente, sobre o Processo de Reurbanização e Recuperação Sócio Ambiental da Serra do mar. Recupera a memória do bairro, registrando histórias de vida dos moradores e acontecimentos históricos. Toda a produção é feita pela comunidade e a sua distribuição também. Tornando-os assim, jornalistas e jornaleiros! ”. Os animadores do Com Com – boa mistura de competências em arte e educação, comunicação e jornalismo, design gráfico e música – escolhem as matérias com os moradores que são também os articulistas. No Morro Vivo! Viva o Morro! encontra-se todo tipo de notícias: preparativos e letra do samba escrito para o Carnaval do ano; aulas de música do Projeto Tocando em Frente no residencial Rubens Lara; histórias do passado; legislação ambiental; datas e locais de vacinação, conselhos de prevenção de doenças tipo dengue ou lepra; alertas sanitários sobre desratização; informações sobre regularização fundiária; criação de uma moeda local, emitida pelo banco do Mangue e ligada à reciclagem; curso de ecoturismo; desenhos, brincadeiras, receitas de cozinha. E muitos, muitos retratos de moradores. E muita, muita poesia.

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Terceira idade

Noêmia Bispo de Souza Poema difundido pela Rádio Voz do Morro em 6 de janeiro de 2014

Dona Noêmia em gravação do programa Comunidade em ação, 2012

O jovem nasceu, criou descalço, pisando em espinhos. Hoje, muito idoso hoje vive sofrendo no mundo sem amor e sem carinho. Muitos deles nasceu em berço de ouro, que hoje vive na chalaça, de tanto sofrer no mundo que se entregou na cachaça. A terceira idade precisa todos se reunir para esquecer o passado, para voltar a sorrir. A morte está próxima. Vamos cantar, sorrir e ser reais. A vida do passado é coisa que não volta mais. Estou na terceira idade, vou sorrir, cantar, comer e encher a pança, esquecer tudo na vida, menos da vida de criança. As flores, nasceu, cresceu, criou raiz. Estou passando por tudo, colhendo tudo que fiz. O resto da minha vida quero viver sem chorar, sorrir, cantar, falar com todo mundo até a morte me chamar. A terceira idade é fogo...[risos] a terceira idade é fogo... Obrigado.

Noêmia Bispo de Souza, cordelista, veio da Bahia e morou no bairro Pinheiro do Miranda. Hoje com 67 anos, sonha conhecer São Paulo mas, diz ela, “o custo da condução é muito grande”. Teve 18 filhos, dos quais 12 ainda estão vivos. Muitos são casados e vivem no Bolsão 9. O primeiro marido morreu na passarela da estrada. Noêmia casou de novo há 7 anos. Conta sua filosofia de vida nas poesias que recita no rádio do Projeto Com Com.

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Dona Noêmia, moradora do Bolsão IX, 2012

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A história de Jera

Jeronimo Vilhena Cineasta, cientista social e produtor cultural

Jeronimo em Oficina de Fotografia, 2016

Como diretor de fotografia e câmera, Jeronimo Vilhena foi – e continua sendo – protagonista ativo da exuberante cena artística que floresceu na periferia paulista a partir dos anos 2000. Começou no Jabaquara onde, do hip hop de rua, passou a formar redes de contato, a montar oficinas de animação, articulando pessoas e projetos. Inspira-se nas novas formas de dizer e fazer experimentadas na internet e no Facebook. Acompanha os saraus de poesia da Cooperifa e também os movimentos de democratização da informação como Fora do Eixo, CasaDigital e outros. Interessou-se pela metodologia desenvolvida pelo educador Tião Rocha. Com Agner Simões Rebouças monta o coletivo de expressão artística Graffiti com Pipoca, oferecendo gratuitamente oficinas para a comunidade. Lança com André Gustavo de Castro Matos a produtora Jeronimo Filmes para desenvolver projetos pessoais ou coletivos. Participa do Jardim Miriam Arte Clube – o JAMAC, fundado por Mônica Nador –, e colabora pela primeira vez com a CDHU em 2008, filmando o documentário sobre Paredes Pinturas, o trabalho da artista com moradores no Jardim Santo André. Continua quando a CDHU leva a mesma experiência para os muros de uma cooperativa de catadores no Jardim Pantanal, na Zona Leste. Graças a essa “nuvem de experiências” adquiriu uma competência particular, compartilhada com seus colegas e sócios, que resume na expressão “juntar gente” e que aplicou trabalhando no Instituto Voz. Foi chamado a dar aulas de comunicação aos agentes comunitários dos bairros-cota. Do intento de integrar os vários projetos sociais lançados pela CDHU e da vontade de criar laços dentro da comunidade nasceu o Projeto Com Com, cuja equipe de comunicadores formou educadores populares que, por sua vez, estão formando a próxima leva. Adicionando alfabetização digital e comunicação com arte e redes sociais, criou no Com Com uma nova metodologia social, intuitiva, flexível, diferenciada, que leva gradativamente à emancipação.

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Formatura dos cursos do Projeto Com Com, 2013

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Gravação do programa Voz do Morro, 2012

Crianças após exibição de filme 3D, 2015

Crianças captando imagem para oficina de vídeo, 2013

Equipe Com Com entrevistando o especialista em educação comunitária Sérgio Gomes, 2013

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Distribuição do jornal Morro Vivo! Viva o Morro!, 2012

Oficina de produção de jornal, 2013

Moradores lendo o jornal Morro Vivo! Viva o Morro! no bairro Pinheiro do Miranda, 2011

Oficina de produção de jornal, 2013

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Morro Vivo! OR INF

M AT I V O

COMUNITÁRIO

DOS

MOR

ADO

Viva o Morro!

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DA S ERR

G A DO L/A MAR - JU - ANO 2 - N º 4 - C U B AT Ã O

Cordel de lá pra cá “A literatura de cordel está em todos os lugares do país e como não poderia faltar, também está aqui nos bairros Cota, nas mãos de uma pessoa muito especial cujo sonho é mostrar seu trabalho que estava guardado em sua gaveta” Antigamente os livretos de cordéis ficavam pendurados em barbantes ou cordas, isso da origem ao nome Cordel.

Cartaz da 5ª Feira Cultural, Turística e Gastronômica dos Bairros Cotas, 2016

Cartaz das Oficinas Com Com, 2014

Dentro desses livretos eram impressos poemas rimados que poderiam ser declamados e até cantados. Nesses poemas eram abordados os mais variados temas, podemos destacar: política, religião, amor, lendas, coisas do cotidiano etc. Em sua capa xilogravuras (técnica artística de esculpir desenho em madeira e imprimir em papel, como um carimbo) impressas na maioria das vezes em preto e branco. Por ser escrito por pessoas humildes e de pouco estudo, o cordel passou por diversos preconceitos até, ser considerado parte da literatura brasileira. Sua influência hoje é tão grande em nossa sociedade que existem espalhados pelo Brasil, associações,

comunidades, bibliotecas, centro de estudos, todos especializados em cordel. João Cabral de Melo Neto, um dos maiores poetas do Brasil foi fortemente influenciado por essa literatura e com sua obra prima “Morte e Vida Severina”, mostrou a riqueza cultural e literária que o cordel carrega, abrindo as portas para o mundo dos cordéis.

O

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O amor nasce na vida Na vida o amor cresce Na Bahia eu trabalhava hoje tenho saudade que dá dor no coração aqui eu não sou feliz,

Quando amanhece o dia chega o romper da aurora

O amor nasce na vida Porque a vida merece.

com todo sofrimento, mas não tem luta sem vitória.

feliz eu quero ser voltar para minha terra,

Noêmia Bispo de Souza

para feliz eu viver.

Uma baiana da Chapada da Diamantina – BA, que vive no bairro Fabril, Noêmia Bispo de Souza, 64 anos, aprendeu ainda menina a escrever cordéis, seguindo o exemplo de seu pai declamando e cantando suas próprias composições. Viúva, mãe de dezoito filhos, tem a arte como parte fundamental da sua vida e companheira inseparável do diaa-dia. Tem agora a oportunidade de dar uma mostra de seus trabalhos que são tantos, aqui no jornal Morro Vivo! Viva o Morro!

“ VOZ

PROGRAMA

“COMUNIDADE PROGRAMA

VISÃO FM :

EM AÇÃO

92.5MHZ

PROJETO COM COM

COMUNIDADES DOS BAIRROS COTA A PALAVRA É SUA! DE TERÇA A QUINTA DAS 15:00 ÀS 16:00h PARTICIPE: PROJETOCOMCOM@GMAIL.COM (13) 33771570

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Convite para Coffee Break Sustentável produzido pela equipe Com Com, 2016

Verso do convite para Coffee Break Sustentável, 2016

DO MORRO PROJETO COM COM

Jornal Morro Vivo! Viva o Morro!, 2012

ASSISTA AS REPORTAGENS FEITAS PELOS MORADORES DOS BAIRROS COTA NA TV POLO. SINTONIA: NET CANAL 18 – DE DOMINGO A QUARTA ÀS 17H DE QUINTA A SÁBADO ÀS 8H. OU PELA INTERNET PROJETOCOMCOM.WORPRESS.COM

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Cartaz da 2ª Feira Cultural, Turística e Gastronômica dos Bairros Cotas, 2012

Cartaz da Oficina de Videorreportagem, 2012

Cartaz da 3ª Feira Cultural, Turística e Gastronômica dos Bairros Cotas, 2013

Cartaz para o Arraial na Cota 200, 2012

Cartaz Curso de Fotografia e Meio Ambiente, 2016

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Trabalhadoras da obra de urbanização lendo o jornal Morro Vivo! Viva o Morro!, 2012

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A vila toda de cores

Esta é a Cota 200, onde cada moradia se exibe, vistosamente adornada pelos próprios habitantes.

O carro adentra a serra dando voltas e mais voltas. A via sinuosa corta uma mata tão densa que, apesar da pouca distância de São Paulo, tem-se a sensação de retornar às origens do mundo. Surgem na memória as inúmeras histórias de excursionistas que nunca souberam regressar e se perderam para sempre nas profundezas da floresta. Aparência enganosa. Nesta área de preservação ambiental continuam a viver muitas pessoas. Passado um contorno, interrompe-se o verde. Desvela-se à beira do caminho um conjunto de casas simples, porém revestidas de tonalidades exuberantes brilhando ao sol. É forte o contraste com o triste uniforme dos casebres precários perigosamente construídos nas vertentes íngremes da Serra do Mar. A surpresa também. Impõe-se subitamente a visão extraordinária de uma vila toda de cores. Esta é a Cota 200, onde cada moradia se exibe, vistosamente adornada pelos próprios habitantes. Nada de estranho se aqui, onde residem alguns dos mais carentes do município, param visitantes em número crescente, atraídos pelo brilho insólito de um povoado considerado até há pouco como uma favela no meio da Serra do Mar. Ora, de favela perdeu praticamente os traços, se bem que a comunidade continue pobre e não conte menos desempregados, ao contrário. Entre 2010 e hoje, aconteceu uma metamorfose. A Cota 200 perdeu dois terços de seus moradores – aqueles cujas casas, construídas em terrenos instáveis, corriam risco de escorregamento. Mas foi urbanizada. Os que puderam ficar receberam equipamentos básicos, ganharam em salubridade e conforto; suas casas foram consolidadas. Mas isso não bastava. Já se verificou em numerosas intervenções similares que, uma vez as necessidades essenciais atendidas, nem por isso a favela se transforma em comunidade. As pessoas também necessitam restauro; o tecido social precisa se transformar. Como? A superintendente Viviane Frost, arquiteta e urbanista, levanta estas perguntas, procedentes não da teoria mas do trabalho de campo: Qual é a cara de uma favela urbanizada no Brasil? O que está sendo realizado pelos arquitetos e pelos técnicos? Que projeto de cidade estão defendendo assim? E esta outra: Se o Estado pode apoiar de muitas maneiras as pessoas para se reerguerem, qual será nesse processo o papel da comunidade em sua própria construção?

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A outra intuição boa de Viviane Frost e sua equipe – junto a uma comunicação comunitária de espírito muito contemporâneo – foi de buscar respostas práticas a essas perguntas fazendo dos bairros-cota um laboratório de habitação.

Paredes precisando de cor Vivane lançou na Cota 200 uma experiência já tentada em outros lugares, só que aqui numa escala maior e com firme intenção de continuidade. O Ateliê Arte nas Cotas inspira-se em Mônica Nador, artista plástica reconhecida internacionalmente, que faz de sua obra uma forma de ativismo social. No Jardim Miriam, o bairro periférico da Zona Sul paulistana onde ela mora, criou o Jardim Miriam Arte Clube (JAMAC), onde realiza oficinas. Ensina a moradores várias técnicas, como criar estampas em tecidos, como executar pintura seriada servindo-se de máscaras de papel com motivos simples escolhidos por eles próprios, demonstrando o potencial criativo de qualquer um.

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muita tinta dentro de museu enquanto tinha muita parede precisando de cor por aí”, disse ela uma vez. Essa brincadeira, na verdade muito séria, resume perfeitamente o propósito do Ateliê Arte nas Cotas, aberto há cerca de 5 anos num vasto local da rua do Alojamento no bairro da Fabril, em Cubatão. As cerca de 750 casas equipadas com água, luz e saneamento que ficarão definitivamente na Cota 200 precisavam também de cor e ofereciam suas paredes. Boa parte delas já foram pintadas, e o objetivo é que, nos próximos anos, todas estejam coloridas, assim como os comércios.

Ateliê Arte nas Cotas

Alimentados pelo imaginário dos participantes, os trabalhos inscrevem-se no cotidiano da comunidade e se convertem numa obra coletiva em progresso. Pela alegria, vitalidade e sinceridade, ressaltam o poder transformador da arte como modo de conquista da autoestima e da dignidade e como ferramenta de transformação social.

O Ateliê serve de espaço de ensino e de trabalho, de sala de exposição e, também, de ponto de venda das obras e objetos confeccionados. É usado com frequência para reuniões e para apresentações aos visitantes sempre mais numerosos. Organizam-se ali as festas dos bairros-cota. Instaurado como parte do Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar, foi imediatamente aceito pela comunidade. Sua função é definida assim: “Promover através da CDHU intercâmbio entre práticas e conhecimentos artísticos com a população dos bairros-cota de Cubatão. Gerar vivências e debates sobre as artes; ressignificar o uso dos espaços públicos; contribuir para a melhoria da qualidade de vida nas comunidades e instigar o olhar crítico à produção artística através da noção de pertencimento comunitário para a população em geral”.

Mônica Nador estimulou a formação de vários artistas membros do JAMAC, propagando assim essa forma de ação. “Eu percebi que se gastava

As coordenadoras escolhidas, Fernanda Saguas Tresas, artista e arte-educadora que trabalhou com Mônica Nador, e Inês Prado, designer

Ateliê Arte nas Cotas, 2014

Produtos do Ateliê Arte nas Cotas, 2015

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especialista em mosaicos, cerâmica, estamparia e desenvolvimento de produtos, receberam a missão de levar progressivamente os moradores a se associarem para transformar seus lares e bairros.

Capacitação e criação de renda

As duas artistas ensinam a pintura de parede pelo método do estêncil – tinta aplicada com rolos ou com sprays para preencher papel com desenho vazado – e a técnica dos mosaicos que virão enfeitar os espaços públicos. São as coordenadoras que escolhem as casas a serem pintadas e pedem o consentimento dos moradores e suas preferências. Todos os alunos participam do processo, desde a fase do desenho até a execução da pintura com cores vivas e chamativas nas casas e praças da comunidade. Confeccionam também peças com motivos inspirados na flora da mata: camisetas, almofadas, panos de prato, chinelos e bloquinhos de anotações. Os produtos são depois vendidos no local ou em feiras de artesanato, em Cubatão e São Paulo. A renda é revertida ao projeto. No ateliê, sempre aberto aos moradores, instaurou-se uma vida social contínua e ativa. Maria José de Araujo Silva passa muito tempo ali, quando não trabalha na Escola Zenon Cleantes de Moura, que fica na mesma rua. Nasceu neste bairro. O essencial de sua vida decorreu entre a Imigrantes e a Anchieta, dentro do perímetro Pinheiro do Miranda, Fabril e Agua Fria. Quando jovem, sobreviveu em certos períodos graças às bananeiras abundantes na região; sofreu também as terríveis inundações do rio Pilões. Casada e tendo sua filha já criada, foi olhar o que acontecia no Artes nas Cotas. “A arte-educadora Moema me formou e agora pinto. Já enfeitei grandes espaços dentro da escola.” Maria José atua como multiplicadora, encarrega-se da venda dos produtos na lojinha do ateliê, recebe os visitantes. Buscou melhorar sua vida seguindo vários cursos de capacitação oferecidos pela CDHU.

Alunos multiplicadores do Projeto Arte nas Cotas, 2012

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Se o Estado pode apoiar de muitas maneiras o reerguimento social, qual será neste processo o papel da comunidade em sua própria construção?

A recuperação urbana e socioambiental passa também pelo fortalecimento da economia local e pela geração de trabalho e renda. Um grupo foi formado para pensar e mapear as potencialidades dos bairros-cota. A equipe de Ações de Recuperação Urbana estabeleceu uma parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) para propiciar formações rápidas nas profissões de soldador, pedreiro revestidor e outras, da área da construção civil, onde podia existir procura de trabalhadores para as obras em curso nos bairros-cota. Caminhando pelas ladeiras recém-asfaltadas da Cota 200, depara-se com um local onde trabalham em turnos senhoras de avental, usando toucas para prender seus cabelos. Essas foram as cocadeiras que viviam precariamente de suas vendas nas esquinas de Cubatão e na beira das estradas. Hoje produzem doces preparados e acondicionados nas regras da arte. Dependendo da demanda, fornecem também almoços prontos para os operários das obras ao lado. Tornaram-se cozinheiras formadas graças aos cursos do Instituto Consulado da Mulher da Whirlpool Latin America. Uma parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas empresas (SEBRAE) ajudou a montar e a equipar a cozinha-laboratório. A implementação desse projeto foi complexa e trabalhosa, pois as candidatas tiveram de não só aprender culinária profissional e industrial, mas também adquirir noções de organização e de participação comunitária. O Núcleo de Economia Solidária e Desenvolvimento Local (NESDEL) mobiliza agora 21 mulheres que

Integrantes do Nesdel produzindo na cozinha experimental, 2013

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se dividem em dois grupos: as Empreendedoras da Serra do Mar que atuam na cozinha experimental fornecendo eventos e feiras (recepções, coffee-break, brunch, almoços etc.) e as Fabricoteiras, capacitadas em artesanato. Quarenta e cinco mulheres receberam seus certificados de formação em Economia Solidária. Atuando no âmbito do NESDEL, do Com Com, do Ateliê Artes nas Cotas ou no Cota Viva – o mais recente dos projetos sociais –, cada aluno dos cursos financiados pela CDHU recebe seu certificado de participação numa cerimônia que se tornou importante e muito gratificadora para quem pouco ou nunca frequentou escola.

Cota viva Os povos nativos, estabelecidos na Serra do Mar há mais de 5 mil anos, possuíam um conhecimento íntimo da natureza da qual se sentiam participar e com a qual, como caçadores e colhedores, sabiam coabitar – diferentemente dos habitantes dos bairros-cota que vivem alheios a seu entorno, não tiram nenhum proveito da floresta e tampouco sabem preservá-la. Descendentes em boa parte de migrantes nordestinos, procedentes de outro ecossistema, não herdaram nem receberam nenhuma educação ambiental. O Projeto Cota Viva foi lançado em 2013, pela CDHU, justamente para suprir essa lacuna e propalar uma competência ambiental entre aos moradores, a começar pelas crianças e os adolescentes. Tem como objetivo ensinar valores de sustentabilidade e prepará-los para ajudar na recuperação e na conservação da Serra do Mar e dos ecossistemas envolvidos. Visa reflorestar áreas degradadas, promover ações práticas e educativas de meio ambiente e atuar na revegetação da Mata Atlântica. Inclui também uma dimensão profissionalizante. Um viveiro-escola, a ser construído na Cota 200, sediará um conjunto de ações voltadas a formar agentes comunitários ambientais. Após 4 meses de curso teórico e prático, os participantes inscritos no projeto receberão certificado e estarão aptos a trabalhar, por exemplo, no próprio reflorestamento previsto pelo Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica, uma vez liberados os 80 hectares de áreas degradadas pelas ocupações. Devevrão estar também envolvidos na implantação do futuro Jardim Botânico de Cubatão, no bairro da Água Fria.

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Turismo sustentável Graças ao Projeto Com Com, os vários programas sociais foram acompanhados passo a passo e sistematicamente documentados. Mas foram sobretudo as casas coloridas da Cota 200 que contribuíram para dar visibilidade e notoriedade ao trabalho realizado nos bairros-cota. Reportagens televisivas mostraram a favela que virou bairro pitoresco onde nunca se esperava – num município que, pouco anos atrás, arcava com péssima fama em matéria ambiental. Explicaram as soluções encontradas frente às ocupações em áreas de risco e a originalidade do método ali aplicado; ressaltaram a amplitude do projeto desenvolvido dentro do Parque Estadual da Serra do Mar. Tiveram repercussão. Visitantes começaram a afluir, sempre mais numerosos. Urbanistas, arquitetos e profissionais da cidade vieram primeiro. A Cota 200 se tornou a modesta vitrine da experimentação urbana promovida pela CDHU. O cúmulo do sucesso foi alcançado com a visita de um príncipe da coroa inglesa. O muito mediático príncipe Harry, neto da rainha Elizabeth, plantou árvores, provou um prato confeccionado com bananas pelas cozinheiras do NESDEL e conheceu o Ateliê Arte nas Cortas. Tão nobre hóspede deixou a população totalmente eufórica. O passeio de sua alteza, abundantemente relatado pelos jornais britânicos, tornou a Cota 200 famosa em todo o Reino Unido. Turistas de vários tipos apareceram. Amadores de passeios organizados na Serra do Mar puseram a Cota 200 na rota de suas excursões. Entre 2015 e 2016, cerca de 900 alunos de escolas públicas e privadas visitaram o bairro; esses alunos foram sensibilizados para a importância de uma região carregada de história. A equipe social não só incitou e favoreceu esse interesse, como percebeu quanto poderia beneficiar o desenvolvimento local. A posição geográfica singular dos bairros-cota, a rica história do território e a singular experiência em curso chamaram a atenção do professor Davis Gruber Sansolo, do Instituto de Biociências, Campus do Litoral Paulista (IB/CLP) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), em São Vicente. Encontrava-se em Cubatão um caso exemplar para suas pesquisas voltadas ao turismo de base comunitária usado como alavanca do desenvolvimento social. As práticas da equipe de Ações de Recuperação Urbana correspondiam às suas reflexões sobre os paralelismos entre as políticas de proteção da natureza e de desenvolvimento turístico. Numa iniciativa conjunta da Equipe Técnica Social da CDHU e dos especialistas da UNESP, lançou-se um trabalho social de pós-urbanização com foco no turismo comunitário, baseado em três eixos: ecológico, histórico e socioambiental, beneficiando os moradores dessas áreas e o Parque Estadual da Serra do Mar (Núcleo Itutinga-Pilões). Mais um passo para a consolidação dos empreendimentos originados nos bairros-cota.

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Formatura da Equipe Nesdel Curso de Pães, 2016

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Equipe Cota Viva em visita à sede do Parque Estadual da Serra do Mar em Caraguatatuba, 2015

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A história de Fefa e Inês

Fernanda Saguas Tresas Artista e arte-educadora

Inês Prado

Artista, designer e arte-educadora

Fernanda Saguas, 2015

Ambas formadas em artes visuais pela Faculdade de Artes Plásticas da FAAP, Fernanda Saguas Tresas sempre se interessou por arte-educação e trabalho com comunidades, e Inês Prado sempre se dedicou à economia solidária e criativa. Razão pela qual responderam ao pedido da CDHU para realizar uma intervenção artística nos bairros-cota, levando a população a participar da transformação de seu próprio povoado. Primeiro, montaram pequenas oficinas esporádicas na rua, depois convidaram os moradores a visitarem um pequeno galpão, sempre trabalhando para demonstração. Finalmente chamaram para visita ao ateliê e ofereceram cursos aos agentes comunitários. Com isso ganharam pouco a pouco a confiança dos moradores. Ampliaram o funcionamento do ateliê de modo progressivo, querendo torná-lo um espaço sempre aberto a quem se interessa pelo trabalho em arte. Passou por ali um grande número de pessoas. “Conseguimos tirar resultado de todo mundo”, comentam, satisfeitas, Fefa e Inês. Formou-se um grupo de participantes assíduos, e o Ateliê Artes nas Cotas passou a desenvolver uma atividade profissionalizante, oferecendo serviços remunerados – uma parte do dinheiro cobrindo as despesas, a outra sendo repartida. São as duas artistas que escolhem as casas da Cota 200 a serem pintadas, obedecendo a critérios de visibilidade e priorizando os espaços públicos, após discussão com os mestres de obras e com os agentes comunitários do Núcleo Operacional de Urbanização. O entusiasmo dos moradores cresce à medida que o número de casas pintadas aumenta. Para Fernanda e Inês, esse trabalho de urbanização onde arte e moradores são incluídos ganha uma importância incomparável pelo papel social, a consolidação do grupo agora considerado como o Grupo de Arte nas Cotas. E mais além, “porque pintar paredes e casas não serve somente para embelezar, é para ser oferecido a todo mundo”.

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Inês Prado, 2012

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Mudas de palmito juçara produzidas pelo Projeto Cota Viva, 2015

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Agentes ambientais em dia de visita do Turismo de Base Comunitária, 2015

Agente Ambiental fazendo manutenção de canteiro, 2015

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Cozinha experimental do Nesdel, 2015

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Integrantes do Nesdel em evento, 2012

Integrantes do Nesdel na Feira Cultural, 2012

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Ernani Pilla, Janine Ferretti e Annette Kilmer – equipe do BID em visita aos bairros Cota, 2012

Professor Davis Gruber Sansolo no 1º Workshop de Turismo de Base Comunitária, 2015

Jonathan Renshaw, Especialista Social do BID, em visita aos bairros Cota, 2011

Príncipe Harry da Inglaterra em visita aos bairros Cota, 2014

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As esperanças pipocam

Cedo ou tarde, esbarra-se com a política da cidade tal como é praticada no Brasil, país onde se constrói com pouco ou nenhum urbanismo.

O trabalho desenvolvido pela Equipe Técnica Social da CDHU na Cota 200 e no Pinheiro do Miranda visa consolidar núcleos urbanos existentes, no sentido próprio e figurado: o solo instável, as pessoas frágeis. Outra equipe oferece um apoio equivalente aos residentes dos novos conjuntos habitacionais, o residencial Rubens Lara, os Bolsões 7 e 9 e os outros sítios espalhados na Baixada Santista onde se instalaram progressivamente os moradores removidos dos bairros-cota. O esforço principal e também o mais árduo foi conquistar a adesão de famílias. Todos os relatos dos reassentados contam histórias de trauma, de perda, de resistência. Enfrentar as situações conflitivas, superar a desconfiança em relação ao poder público, explicar, convencer, resolver com equilíbrio os casos individuais, esse é o dia a dia de Walkyria Marques de Paula. Nisso, ajuda sua longa prática profissional do mundo das favelas. A gerente de Ações de Recuperação Urbana se lembra, porém, “dos dias de forte chuva e das angústias passadas pensando no risco de desabamento das casas e das pessoas ali no morro”. Antigo morador da Cota 200, o aposentado Carlos Guilherme Campos Costa admite: “tínhamos consciência do risco, mas não nos parecia tão forte”. Como agente comunitário, agora residente no Rubens Lara, ele se dedica a informar e a intermediar o diálogo entre técnicos de projetos, técnicos sociais e moradores. “Lutamos, conseguimos mudar certas coisas e obter outras. Foi uma grande experiência de conhecimento humano.” Para expor os problemas da comunidade, divulga suas poesias através do Com Com. Hoje, no Rubens Lara, quase todos se sentem satisfeitos, julga ele. Certa calma voltou, tanto nos bairros-cota como nos novos conjuntos. Se a mudança representou uma alteração dos hábitos, dos relacionamentos sociais, um real avanço foi conquistado em termos de segurança, de conforto, de regularização, de acesso à casa própria – e de urbanização nos núcleos subsistentes. Abriram-se novas perspectivas.

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As duas maneiras de produzir a cidade A pergunta de Viviane Frost – com que cara fica a favela urbanizada? – encontra aqui respostas que correspondem a duas maneiras de produzir a cidade. Uma partindo do existente, outra edificando o novo. Na Cota 200 a escolha foi de conservar o local tal como o fez a história, sem congelá-lo no seu passado mas aumentando sua qualidade. Reforça-se o tecido social para que a comunidade consiga sua emancipação e passe a se transformar em seguida pela dinâmica própria. Ilustrativo dessa opção é o projeto Arte nas Cotas, fonte de orgulho, de autoestima coletiva e de prazer visual. Os conjuntos habitacionais quase sempre respondem a uma lógica diferente – racional e quantitativa – que se generalizou na Europa do pós-guerra devido à urgência da reconstrução e à necessidade de alojar rapidamente as numerosíssimas famílias pobres e uma grande massa de imigrantes. Para absorver essas populações, foram construídos em série conjuntos habitacionais de grande porte, obedecendo a plantas de bairros rigorosamente ortogonais. Nesses prédios para pobres, implantados nas periferias das cidades, vivem pessoas desfavorecidas em termos de transportes, de serviços e de cultura. A provisão habitacional foi equacionada em boa parte, mas a integração urbana e a integração social foram esquecidas. As insuficiências desse tipo de urbanismo, nocivo tanto para o desenvolvimento das cidades quanto para a cidadania, já foram descritas em inúmeros estudos críticos, mas ele continua a ser aplicado em grande escala no Brasil.

Duas maneiras de produzir a cidade: uma partindo do existente, outra edificando o novo. 206

Intervenção artística do Ateliê Arte nas Cotas, 2012

O residencial Rubens Lara, localizado no bairro Jardim Casqueiro e cujas 1.840 unidades habitacionais estão totalmente ocupadas, responde a outro padrão e é um bom exemplo de tentativa de superação desse modelo. A qualidade desse conjunto, cuidadosamente pensado e realizado pela arquiteta paulistana Adriana Levisky, foi reconhecida internacionalmente: foi agraciado com o Greenvana Greenbest 2012 e o Sustainable Social Housing Initiative (Sushi), do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, por produzir habitações saudáveis de interesse social para população de baixa renda. Satisfeita em participar com esse conjunto no vasto Programa de Recuperação da Serra do Mar, a arquiteta associa-se plenamente à metodologia elaborada pela equipe da CDHU – vincular urbanismo e trabalho social – e considera muito adequadas as soluções adotadas. “É raríssimo – diz ela – encontrar uma tal ambição em projetos desta amplitude. Sinto orgulho: apostei numa solução de projeto a favor da cidadania. O diálogo que mantenho com os moradores confirma que acertei.”

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Adriana Levisky explica como se esforçou para integrar conceitos de urbanismo no projeto, imaginar a diversidade do bairro, introduzir variedade nas fachadas e nas cores, criar surpresas, estabelecer vínculos entre prédios e espaços públicos, inserir diferenciais e interações, trabalhar o traçado viário, pensar também a acessibilidade e as travessias. Nem tudo foi realizado. “Tinha projetado prédios com uso misto. A Secretaria não aceitou, alegando motivos jurídicos e de gestão. A parte da arquiteta foi executada, mas em termos de urbanismo e de equipamentos públicos, resta muito a fazer.”

Interrogações É assim que, cedo ou tarde, esbarra-se com a política da cidade tal como é praticada no Brasil, país onde se constrói com pouco ou nenhum urbanismo. Onde o imediatismo encontra sua desculpa na realidade da urgência social. Onde prevalece o interesse das empreiteiras e dos políticos, onde os projetos lançados carecem de continuidade por falta de verba ou de estabilidade no comando.

Os programas sociais apoiam-se um no outro para tecer a trama de um tecido social suscetível de se consolidar aos poucos – mas que pode se rasgar, segundo as circunstâncias. 208

* Como os vulcões transbordam e deixam aparecer as entranhas da terra, o Brasil vive hoje profundos tumultos, reveladores de muitos de seus males antigos, nunca seriamente considerados e tratados. O primeiro entre eles, que acirra a insatisfação de milhões, é a falta de moradia para os pobres. A doença é crônica, os remédios sempre tardios e insuficientes. Nesse quadro tão perturbado, por que contar a história de pequenos grupos humanos ilhados há várias gerações, em plena mata atlântica, na Serra do Mar? Será o caso deles exemplar? Transponível a outras situações análogas? A avaliação parece ainda difícil. Mas o Brasil é também o país dos mil e um experimentos. De inúmeras tentativas imaginativas e corajosas nos campos da política, do social, da economia, da arte, do meio ambiente. As esperanças pipocam por todo o território, muitas vezes sem se encontrar. Porém, pouco a pouco, forma-se uma riquíssima cultura alternativa da qual – quem sabe? – os tempos futuros poderão se aproveitar. O ensinamento dos bairros-cota de Cubatão vem aumentar esse abundante patrimônio de conhecimentos práticos. Por ser humilde e concreto se multiplicará.

“Como começar uma cidade?” Esta pergunta, formulada por Jeronimo Vilhena, principal comunicador do projeto Com Com, foi o título do filme que realizou em 2014, sobre o trabalho da Superintendência de Ações de Recuperação Urbana (SARU) da CDHU. Mostra os projetos sociais da empresa, apoiando-se um no outro para oferecer aos moradores dos bairros-cota uma proposta de vida renovada, a trama de um tecido social suscetível de se consolidar aos poucos – mas que pode se rasgar, segundo as circunstâncias. Isso dependerá em primeiro lugar da melhora ou da piora da situação do emprego e da economia para as famílias, do dinamismo das iniciativas locais e do apoio que o Estado continuará a prestar, quando se retirar deste território. Restam abertas algumas interrogações. A primeira é relativa à preservação ambiental, aos últimos 7% de mata Atlântica ainda intactos que o Programa de Recuperação da Serra do Mar tenta resgatar. Quem se ocupará da transição entre zona urbana e zona de preservação? A consciência ambiental, ambição última, depende da recuperação da própria população, meta do trabalho social. Será possível manter e assegurar uma evolução positiva em tempos de poderes públicos e de economia enfraquecidos? Num entorno conturbado pela crise do polo petroquímico e pela multiplicação das demissões, como evitar o refavelamento? Ou, ao contrário, serão os bairros-cota esvaziados, apesar dos esforços, por uma população em busca de empregos em outros cantos do país? Formatura do Ateliê Arte nas Cotas na 1ª Feira Cultural, Artística e Gastronômica dos Bairros Cotas, 2011

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Hino Cota 200

Régio Alves

Compositor Música arranjada pelo Maestro Alexandre Felipe Gomes, 2004

Vejo as estrelas refletindo lá no céu e a lua cheia clareando a imensidão. O nosso sonho era morar em um lugar de muita paz, caridade e devoção. Daqui se ver o sol nascer no verde mar e a paisagem criou nova inspiração. Cota 200 querida tu és minha vida, meu berço de amor. Ei de te amar para sempre, es a estrela cadente, meu céu, meu calor. Linhas aéreas, ferrovias e rodovias de norte a sul cruzando a Serra do Mar, Os passarinhos enfeitando a natureza, quanta beleza temos para contempla! O ar é puro e o clima é relevante; não é distante a cachoeira murmurar. Cota 200 querida tu és minha vida, meu berço de amor. Ei de te amar para sempre,és a estrela cadente, meu céu, meu calor. Salve as encostas e os vales verdejantes, é importante sempre a preservação. A chuva caí e o vento sopra forte, a nossa sorte é a fé e oração. Se por ventura a vida terminar aqui, pra onde for levarei a minha gratidão. [2 x] Cota 200 querida, tu és minha vida, meu berço de amor. Ei de te amar para sempre, és a estrela cadente, meu céu, meu calor.

https://www.youtube.com/watch?v=IGlzOlR5-U4

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Régio Alves, compositor e músico morador da Cota 200, 2015

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Estudantes em visita ao bairro Água Fria, 2013

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Estudantes em visita à Cota 200, 2013

Estudantes em visita à Cota 400, 2013

Moradores recebendo estudantes em visita à Cota 400, 2013

Moradores recebendo estudantes em visita no anfiteatro da Cota 200, 2013

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Grupo de turistas do SESC em visita aos bairros Cota, 2013

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Crianças em atividade de plantio no Projeto Cota Viva, 2014

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Integrantes do Projeto Com Com, 2013

Muda do Projeto Cota Viva, 2016

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Exibição de filme na Cota 200, 2012

Equipe Projeto Arte nas Cotas realizando intervenção, 2012

Exibição de filme no bairro Água Fria, 2011

Grupos Zabelê em apresentação na 1ª Feira Cultural, Artística e Gastronômica dos Bairros Cotas, 2011

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Crianças moradoras dos bairros Cotas no Ateliê Arte nas Cotas, 2013

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Anexos O Programa «Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica»

Objetivo Promover a conservação, o uso sustentável e a recuperação socioambiental de importantes unidades de conservação do bioma Mata Atlântica no Estado de São Paulo, além de gerar benefícios sociais e ecológicos tais como a proteção de mananciais da Baixada Santista e a proteção da biodiversidade.

Abrangência / Área de atuação Só o Parque Estadual da Serra do Mar (PESM) possui 332 mil hectares, em 24 municípios paulistas, que contribuem para regulação do clima, promovem a qualidade das águas de abastecimento e dão abrigo a mamíferos, anfíbios e répteis e metade das espécies de aves do bioma. E ainda abrange o Mosaico da Jureia-Itatins que possui 110,8 mil hectares, compreendendo dois maciços preservados de Mata Atlântica e uma ampla planície litorânea. Na área marítima, o Programa atua no Mosaico de Ilhas e Áreas Marinhas Protegidas do Litoral Paulista, com área total de 1,2 milhão de hectares, em 15 municípios, composto por três APAs – Áreas de Proteção Ambiental Marinhas, cinco Parques Estaduais e duas Áreas de Relevante Interesse Ecológico.

Implantação do Programa O Programa está dividido em três componentes: 1. Proteção de Unidades de Conservação; 2. Investimentos Sociais no Parque Estadual da Serra do Mar (PESM); 3. Fiscalização das Unidades de Conservação. A Fundação Florestal atua como executora dos componentes 1 e 3 e a CDHU atua como executora do componente 2. A Fundação Florestal já executou 11 obras de infraestrutura no PESM e 3 obras no Mosaico de Ilhas e Áreas Marinhas Protegidas, entregou 10 embarcações, 81 veículos, 3 tratores, 2 motos e 1 aeronave para uso das Unidades de Conservação atendidas, bem como da Polícia

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Militar Ambiental. Destaque-se, ainda, a realização do Curso de Capacitação para Gestores de Unidades de Conservação, o Projeto Sistema de Trilhas e Atrativos do PESM, o Sistema de Monitoramento da Qualidade Ambiental do PESM, o Manual de Gestão de Unidades de Conservação, os Projetos Executivos, com Certificado AQUA para as obras da Polícia Militar Ambiental, compreendendo as Sedes do 1º e 3º Batalhões de Polícia Ambiental e o Centro de Treinamento do Comando de Policiamento Ambiental, entre outros. Estão em execução o Plano de Manejo Florestal para erradicação de exóticas do PESM, a recuperação ambiental de 45 hectares nas áreas desocupadas, o Plano de Manejo da APA Ilha Comprida, 5 obras no Mosaico Jureia-Itatins, gerenciamento e Obra da Sede do 1º Batalhão de Polícia Ambiental, do Centro de Treinamento da Polícia Militar Ambiental, ambos no Município de São Paulo, do PESM/ Núcleo Caraguatatuba na Estrada da Intermediária, a desconstrução de edificações e pisos nos bairros-cota e Água Fria no PESM/Núcleo Itutinga-Pilões, a obra de adequação e perenização da Estrada do Despraiado no Mosaico Jureia-Itatins, a contratação da conclusão do Plano de Manejo do Mosaico Jureia-Itatins, a conclusão da elaboração dos Planos de Manejo das 3 APAs Marinhas e 2 ARIEs do Mosaico de Ilhas e Áreas Marinhas Protegidas, contratação de projetos executivos para obras nas RDS do Despraiado e Barra do Una, para a sede da E. Ec. Jureia-Itatins, bem como de base para o P. E. Prelado, abastecimento para a aeronave e das obras de reforma do PIER do P. E. Ilha Anchieta, além de diversos outros contratos relativos a operacionalização das Unidades de Conservação e da Polícia Militar Ambiental.

a Caixa Econômica Federal realizada em 7 de julho de 2014. Está em processo de formulação do Edital a contratação de 668 UHs em Cubatão (K) e 216 UHs em Cubatão (B). Estão em execução o diagnóstico de projetos multidisciplinares para implantação de empreendimentos habitacionais e urbanização de assentamentos precários e contratos do trabalho técnico social e de monitoramento social do Programa.

Valor contratado O valor do empréstimo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) é de 162,4 milhões de dólares, sendo sendo 100,5 milhões para Habitação e 61,9 milhões para Meio Ambiente. O valor compromissado de contrapartida do estado de São Paulo é de 307,7 milhões de dólares, representando 65,4% do total do valor do Programa de 470,1 milhões de dólares.

A CDHU até dezembro de 2016 já removeu 4.727 famílias e entregou 4.085 UHs, sendo 3.594 UHs construídas em Cubatão, 464 UHs construídas em outros municípios e 27 cartas de crédito; 635 famílias estão com auxílio moradia provisório e 1.898 famílias serão beneficiadas com obras de urbanização nos bairros Cota 200 e Pinheiro do Miranda. Nos setores Norte e Sul foram iniciadas as obras para construção de 166 UHs em São Sebastião, 116 UHs em Pedro de Toledo, 376 UHs em Ubatuba e 360 UHs em São Vicente. Assinatura dos contratos de 500 UHs em São Vicente dos Condomínios Penedo e Primavera com

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Referências

Documento básico PROGRAMA de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica. Plano de Reassentamento e Requalificação Urbana para os Núcleos de Ocupação Irregular do Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar em Cubatão (PRRU). São Paulo: Governo do Estado de São Paulo, Secretarias de Estado do Meio Ambiente e da Habitação, 2009.

Livros e documentos consultados A CIDADE informal no século 21. (Catálogo). Coordenação: Elisabete França e Marisa Barda. São Paulo: Prefeitura do Município de São Paulo, SEHAB, Superintendência de Habitação Popular, 2010. ASSENTAMENTOS precários no Brasil urbano. Coordenação: Eduardo Marques; autores: Sandra Gomes, Renata Gonçalves, Demétrio Toledo, Encarnación Moya, Donizete Cazzolato e Maria Paula Ferreira. Brasília: Ministério das Cidades e do Centro de Estudos da Metrópole; Cebrap, Projeto PNUD BRA/00/019 – Apoio à implementação do Programa Habitar Brasil-BID, 2007. BIOMAS brasileiros: retratos de um país plural. Textos: Fabio Rubio Scarano, Isabela Santos, Ana Cecilia Impellizieri Martins, José Maria Cardoso da Silva, André Guimarães e Russen A. Mittermeier. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2012. DAVIS, Mike. Planeta favela. Posfácio: Erminia Maricato; ensaio fotográfico: André Cypriano; tradução: Beatriz Medina. São Paulo: Boitempo, 2006. DEAN, Warren. A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. Tradução: Cid Knipel Moreira. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. (Título original: With broadax and firebrand). GUTBERLET, Jutta. Cubatão: desenvolvimento, exclusão social e degradação ambiental. Tradução: Kaye-Uwe Gutberlet. São Paulo: Edusp; Fapesp, 1996. (Título original: Industrieproduktion und Umweltzerstörung im Wirtschaftsraum). JAMAC – Jardim Miriam Arte Clube. Organização: Thais Rivitti; textos: Thais Assunção, Célio Turino, Rafael Vogt Maia Rosa. São Paulo: Pinacoteca do Estado; Luciana Brito Galeria, 2012. KRÄHENBÜHL, Lair. Trajetória de um profissional da habitação. São Paulo: Pini, 2011. MARICATO, Erminia. O impasse da política urbana no Brasil. 2.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012. MÔNICA NADOR. Textos: Thais Rivitti; cronologia Isabella Rjeille. São Paulo: Pinacoteca do Estado; Luciana Brito Galeria, 2012. OFICINA de ideias: urbanização de favela = Informal toolbox: Slum Lab Paraisópolis. São Paulo: Prefeitura do Município de São Paulo, Secretaria Municipal de Habitação – SEHAB, 2008. OLHARES possíveis: memórias e identidades do bairro Cota 400. Textos: Luciane Scarambone Brandão, Caio Henrique Caprioli, Lívia Souza Gonzalez, Mayara Tabone, Paula Venâncio; prefácio: Ricardo Kotscho; orientação: Mônica Pegurer Caprino. Trabalho de

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conclusão de curso (Comunicação social com habilitação em jornalismo) – Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS). São Caetano do Sul, 2009. OVANDO, Adilana Goulart Silva. Dimensão social da participação comunitária no processo de urbanização nos bairros cota da Serra do Mar em Cubatão. Dissertação (Mestrado) – Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2014. Disponível em: www.teses.usp.br/teses/disponiveis/100/100134/ tde-15102014-072132/pt-br.php ROLNIK, Raquel. Guerra dos lugares: a colonização da terra e da moradia na era das finanças. São Paulo: Boitempo, 2015. SANTOS, Álvaro Rodrigues dos. A grande barreira da Serra do Mar: da trilha dos Tupiniquins à Rodovia dos Imigrantes. São Paulo: O Nome da Rosa Ed., 2004. SANTOS, Álvaro Rodrigues dos. Diálogos geológicos: é preciso conversar mais com a Terra. São Paulo: O Nome da Rosa Ed., 2008. TURISMO de base comunitária: diversidade de olhares e experiências brasileiras. Organizadores: Roberto Bartholo, Davis Gruber Sansolo e Ivan Bursztyn. Rio de Janeiro: Letra e Imagem, 2009. VIVENDO nos bairros-cota. Redação: Sergio Pompeu e Maria de Lourdes Zuquim; ilustrações: A. C. Nicolielo; fotos: João Primo Carloni. São Paulo: Secretaria Executiva de Habitação, Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Estado de São Paulo (CDH); Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), 1983. URBANIZAÇÃO de favelas: a experiência de São Paulo. Vários colaboradores. Edição bilíngue: português e inglês. São Paulo: Boldarini Arquitetura e Urbanismo; Prefeitura do Município de São Paulo, Secretaria Municipal de Habitação – SEHAB, 2008. URBANIZAÇÃO de favelas: lições aprendidas no Brasil. Editores: Fernanda Magalhães e Francesco Di Villarosa. Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), 2012.

Documentários, reportagens, vídeos ATELIÊ Arte nas Cotas. Santos: TV Tribuna, 2012. http://www.youtube.com/watch?v=ti XgotXBv0Y&feature=youtu.be. GABEIRA, Fernando. Áreas de risco. Programa Capital Natural # 34 – Canal BandNews TV, 2014. www.capitalnatural.aiue.com.br; http://capitalnatural.aiue.com.br/ video/66930013. PROJETO COM COM. O trabalho social na Serra do Mar. São Paulo: Secretarias de Estado da Habitação e do Meio Ambiente, CDHU, BID. Nova versão. 2015. https://www. youtube.com/watch?v=Cu-NsCmbhTQ (legendas em espanhol). PROJETO COM COM. Serra do Mar e Mosaicos da Mata Atlântica. 17min11s. BID; CDHU; Secretarias de Estado da Habitação, de Planejamento e Desenvolvimento Regional, Governo do Estado de São Paulo. São Paulo, 2014. https://www.youtube. com/watch?v=_CPcyevQevM (legendas em inglês, 10min); https://www.youtube.com/ watch?v=Ddq3SmnGkYs (legendas em francês).

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VILHENA, Jeronimo. Como começar uma cidade? Recuperação Sócio Ambiental da Serra do Mar – Viviane Frost. São Paulo: Governo do Estado de São Paulo; BID; CDHU; Secretarias de Estado do Meio Ambiente e da Habitação, 2014. https://vimeo. com/78299310. VILHENA, Jeronimo. Paredes Pinturas no Jardim Santo André. São Paulo: JAMAC – Jardim Miriam Arte Clube; Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), 2008. http://curtadoc.tv/curta/artes/paredes-pinturas-no-jardim-santo-andre/.

Jornais eletrônicos MORRO VIVO! VIVA O MORRO!, Bairros-cota, Cubatão. https://projetocomcom.wordpress.com. NOVO MILÊNIO, Santos e Baixada Santista. http://www.novomilenio.inf.br.

Sites consultados www.cdhu.sp.gov.br www.habitacao.sp.gov.br www.ambiente.sp.gov.br www.facebook.com/nesdel.serradomar https://projetocomcom.wordpress.com www.graffiticompipoca.com.br www.leviskyarquitetos.com.br

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Vista aérea da área do Grotão no bairro Pinheiro do Miranda antes da intervenção, 2009. Imagem © 2016 Digital Globe

Vista aérea da Cota 200 antes da intervenção, 2009. Imagem © 2016 Digital Globe

Vista aérea da área do Grotão no bairro Pinheiro do Miranda depois da remoção, 2016. Imagem © 2016 Digital Globe

Vista aérea da Cota 200 em processo de intervenção, 2016. Imagem © 2016 Digital Globe

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Governo do Estado de São Paulo Geraldo Alckmin Governador do Estado Secretaria de Habitação Rodrigo Garcia Secretário de Habitação Nelson Baeta Neves Filho Secretário-Adjunto Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano – CDHU Marcos Rodrigues Penido Diretor Presidente Diretoria de Atendimento Habitacional Ernesto Mascellani Neto Diretor Superintendência de Ações de Recuperação Urbana Viviane Frost Superintendente Gerência de Ações de Recuperação Urbana I Walkyria Marques de Paula Gerente Equipe Técnica Social (2010-2016)

Banco Interamericano de Desenvolvimento Pâmela Garrido Patrícia Ribeiro da Cruz Ledo Paulo Cesar Pereira Botacine Priscila Ohira Priscila Seixas Silva Martins Reinaldo Andrade da Costa Renato dos Santos Mirra Ronivaldo Floriano Silva Rosemeire de Sá Camboa Solange de Cássia Ferreira Sueli Ferreira Santos Tais Moretti Sabio Terezinha José dos Santos Verônica Letícia Cezario Equipe Projeto Arte nas Cotas Fernanda Saguas Presas Inês Prado Marcel Marques Moema Torres Natália Gabriela Girassol Bartolani Ricardo Luiz Valério Pereira Equipe Projeto Com Com Jeronimo Vilhena de Toledo André Gustavo de Castro Mattos Agner Simões Rebouças Alex Sandro da Silva Arcelina Francisca da Silva Eduardo Maia (Toroká) Fábio Cruz Humberto Luiz Bonni Jefferson Nascimento (Borracha) Márcio Vidal Rodrigo EBA! Thais Scabio

Lucinede Pereira de Souza Nascimento Adelina Mikolajaw Adilana Goulart S. Ovando Adriana Almeida Alessandra Regina dos Santos Moreira Amanda Maria Mesquita Antonio Quintino da Silva Junior Camila Santana Rodrigues Cássia Regina Calazans Cristiana Góes do Nascimento Equipe Nesdel Eloá Ramos Susana Alves dos Santos Emilly Matias dos Santos Viviane Feitosa Araújo Evandro Matthiesen Leister Fabiana Soares Bazan Fernanda Machado Reis Equipe Cota Viva Fernando Barbosa Rocha Nini Luferly Castilho Soto Fernando Lopes Gabriela Rahal Gisele de Freitas Gomes Clivanir Mendes Cardoso Isabel Cristina Ribeiro da Cunha Frontana Caldas Ivone Crispim Rocha Jéssika Danielle Vieira Equipe Turismo Comunitário José Geraldo Ferreira da Silva Deborah Estri Motta Juliana Pereira Nascimento Alex dos Santos Larissa Oliveira Gonçalves de Araújo Gabriela Puntel Carrasco Lia de Oliveira Viana Luciana Gonçalves Luiz Fernandes Serra Jr Marcelo Zarzuela Coelho Maria Angélica Sanches Maria Betânia Paulo de Araújo Maria Dolores Santos Maria Isabel Costa dos Santos Mariana Costa Silveira Mariana Lima Paz Mariane Gama de Oliveira Marisa Marques Ferreira Marystela Pinheiro de Oliveira Natasha Vieira Lopez Osmar Ralph de Lima Friedrich

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Annette B. C. Killmer Especialista Líder de Recursos Naturais Helena Landazuri de Piaggesi Especialista Líder de Recursos Naturais Janine Ferretti Chefe da Unidade de Salvaguardas Ambientais (VPS/ESG) Jonathan Renshaw Especialista Social Ernani Pilla Especialista Ambiental

As Cores da Urbanidade Coordenação Editorial Viviane Frost e Lorette Coen Assistente Editorial Marystela Pinheiro de Oliveira Seleção de Imagens Viviane Frost Walkyria Marques de Paula Jeronimo Vilhena de Toledo André Gustavo de Castro Mattos Agner Simões Rebouças Alex Sandro da Silva Marystela Pinheiro de Oliveira Edição de imagens Claudio Filus Projeto e produção gráfica Claudio Filus Revisão e padronização Armando Olivetti Fotografias Todas as fotografias foram feitas pela equipe do Projeto Com Com, exceto: Adriana Matoso – p.2 e 3. Clóvis Deangelo – p.120 inf. Reinaldo Andrade da Costa – p.70 inf., 76 sup. e inf. e 77 sup. e inf. Acervo Fundação Energia e Saneamento – p.86 Acervo do professor e pesquisador Francisco Vázquez Carballa – p. 83 sup. e inf. Arquivo Histórico de Cubatão – p. 6, 7,84, 87, 88, 89, 104 sup. e inf. e 107. Arquivo pessoal de Álvaro Rodrigues dos Santos – p. 90 sup. e inf. Ateliê Arte nas Cotas – p. 152 sup., 153 sup., 155 sup. e 156 sup. Equipe Técnica Social: p.72 inf. Emplasa – Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano – Cortesia, todos os direitos reservados – p.10 e 11. Etemp – p.92 e 93. Google Earth – p.232 sup e inf. e 233 sup. e inf. MASP – João Musa – p.82. Museu Paulista – Hélio Nobre/José Rosael – p.103. Pinacoteca do Estado de São Paulo – p.101. As fotografias aqui publicadas foram feitas para registrar as ações do Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar e Sistema de Mosaicos da Mata Atlântica, e têm, portanto, apenas objetivo documental. Solicitamos a compreensão do leitor se nem sempre apresentarem a qualidade desejada. Apesar de nossos esforços para creditar acuradamente os fotógrafos e os detentores de direitos autorais das imagens, pedimos desculpas, caso tenham ocorrido eventuais falhas ou omissões na identificação. Processamento gráfico, impressão e acabamento Ipsis Gráfica e Editora

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Este livro foi composto usando a tipologia da família Apex Sans. Para impressão do miolo foi utilizado papel couché fosco 170 gr/m2. Para a capa, papel duo-design 350 gr/m2.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Coen, Lorette As cores da urbanidade / Lorette Coen / Colaborador Projeto Com Com. -São Paulo : IPSIS Gráfica e Editora, 2017. ISBN: 978-85-9550-000-6 1. Mar, Serra do 2. Mata Atlântica (Brasil) 3. Meio ambiente 4. Parque Estadual da Serra do Mar (SP) 5. Planejamento urbano I. Título. 17-01748

CDD-350 Índices para catálogo sistemático:

1. Serra do Mar : Mata Atlântica : Recuperação socioambiental : Administração pública 350

http://www.cdhu.sp.gov.br/serra-do-mar/programa-serra-do-mar.asp

Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo Rua Boa Vista, 170 - Centro CEP 01014-930 - São Paulo, SP, Brasil Telefone (PABX): 55 11 2505-2000 www.cdhu.sp.gov.br


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