de Dentro e de Fora | Coletiva de Artistas de Cabo Verde

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de DENTRO e FORA Coletiva de Artistas de Cabo Verde




EXPOSIÇÃO de DENTRO e FORA Coletiva de Artistas de Cabo Verde

FICHA TÉCNICA CATÁLOGO

FICHA TÉCNICA EXPOSIÇÃO

CURADORIA Ricardo Barbosa Vicente - CCCV

DIREÇÃO Vítor Ramalho, Secretário-Geral da UCCLA COORDENAÇÃO GERAL Rui Lourido COORDENAÇÃO

Filomena Nascimento Ricardo Barbosa Vicente

CURADORIA Ricardo Barbosa Vicente - CCCV

DIREÇÃO

Vítor Ramalho, Secretário-Geral da UCCLA Embaixada de Cabo Verde em Portugal COORDENAÇÃO GERAL Rui Lourido, Coordenador Cultural da UCCLA APOIO À COORDENAÇÃO

Ricardo Barbosa Vicente - CCCV Filomena Nascimento

EDITORA Maria do Rosário Rosinha DESIGN GRÁFICO E PAGINAÇÃO Catarina Amaro da Costa CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS

Bruno Lopes Chris Costa Dörte Felsing Filipe Louro Mendes José Matos Alves Kitmin Less | Cortesia Alter Ego Kuny Mendes Laura Castro Caldas e Paulo Cintra Lauro João Martins Dias de Barros Luisa Péres Maeds museu Vadu Tavares

PRODUÇÃO Raquel Carvalho ARQUITETURA DE EXPOSIÇÃO Ricardo Barbosa Vicente DESIGN GRÁFICO Catarina Amaro da Costa COMUNICAÇÃO Anabela Carvalho, Raquel Carvalho PARCERIA INSTITUCIONAL

Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde Embaixada de Cabo Verde em Portugal Centro Cultural de Cabo Verde

IMPRESSÃO Imprensa Municipal | CM Lisboa ISBN: 978-989-54881-2-4

ORGANIZAÇÃO

Lisboa, novembro 2021

APOIO INSTITUCIONAL

APOIO

MEDIA PARTNER


índice

pág. 7 | Textos de introdução Vítor Ramalho Secretário­‑Geral da UCCLA

Eurico Correia Monteiro Embaixador de Cabo Verde em Portugal

Abraão Vicente Ministro da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde AGRADECIMENTOS:

Câmara Municipal de Lisboa, Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde, Embaixada de Cabo Verde em Portugal, Caixa Geral de Depósitos, 3+1 Arte Contemporânea, Arnaud, EPAL, Garantia seguros, Innovarisk, seguros de arte.

Rui Lourido Coordenador Cultural da UCCLA

Leão Lopes Reitor do M_EIA

Ricardo Barbosa Vicente Curador

pág. 35 | de Dentro e Fora - Coletiva de Artistas de Cabo Verde pág. 158 | Artistas (biografias)



É com muito gosto que a UCCLA promove a exposição de Dentro e Fora – Coletiva de Artistas de Cabo Verde, que resulta de uma parceria com a Embaixada de Cabo Verde em Portugal, sendo de elementar justiça sublinhar a total colaboração e disponibilidade do Senhor Embaixador, Dr. Eurico Monteiro, e dos funcionários da Embaixada, bem como do Centro Cultural de Cabo Verde, em particular do curador da exposição, Ricardo Barbosa Vicente. Nestas circunstâncias, surge como natural que a exposição apresente trabalhos de conceituados artistas de Cabo Verde em simultâneo no auditório da Casa das Galeotas, sede da UCCLA, e na sede do Centro Cultural de Cabo Verde (CCCV). No auditório da Casa das Galeotas serão exibidas 66 obras de 35 artistas e, no Centro Cultural de Cabo Verde, 16 obras de 3 artistas. As obras refletem a criatividade dos artistas das onze ilhas de Cabo Verde, se considerarmos também como uma ilha a forte diáspora cabo­ ‑verdiana que se espraia por todos os continentes e que em Portugal tem uma importante dimensão, que muito contribui para o aprofundamento do encontro secular de culturas entre os nossos povos e que a ambos aproveita.

Houve a preocupação, por isso mesmo, de o catálogo referente à exposição, com o sugestivo título de Dentro e Fora, contar com um texto de investigação do Senhor Professor Doutor Leão Lopes, que muito nos honra, para além da introdução do Senhor Ministro da República de Cabo Verde, Abraão Vicente, também ele uma respeitada e incontornável personalidade da cultura. Como sempre sucedeu nos anteriores catálogos de exposições da UCCLA, o Senhor Dr. Rui Lourido, a quem muito se deve a conceção e a determinação em apresentar exposições de reconhecido mérito, não poderia deixar de registar num escrito forjado na experiência e no saber, uma marca que é de todos os colaboradores da UCCLA, a quem também muito agradeço. Desde a primeira hora houve a preocupação de as exposições de artistas de países de língua oficial portuguesa seguirem a ordem alfabética dos respetivos países. A presente exposição segue-se, por isso, à de Angola e do Brasil, não sem que se houvesse entretanto apresentado outras duas exposições.

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Uma delas teve a ver com a passagem dos 40 anos do estabelecimento das relações diplomáticas entre Portugal e a China e dos 20 anos da criação da Região Administrativa Especial de Macau. A segunda, denominada “Urbanismos de influência portuguesa”, refletiu o contributo da conceção urbanística portuguesa para várias cidades de países de língua oficial portuguesa. O facto de a exposição de Dentro e Fora se iniciar em 2021, ano em que, no final do primeiro semestre, terminou o mandato de Cabo Verde como país Presidente da CPLP, tem um significado especial que importa ser também sublinhado. 8

É que foi sob a Presidência de Cabo Verde que foi aprovada, na Cimeira de Chefes de Estado e de Governo, realizada em Luanda, a lei­ ‑quadro sobre a mobilidade dos cidadãos de língua oficial portuguesa, primeiro passo para o aprofundamento da mobilidade mais extensa dos cidadãos lusófonos entre os nossos países. O direito de pertença a este vasto espaço de afetos e de interesses, que é o dos países de língua oficial portuguesa, é uma exigência que tem e deve ser concretizada sem desfalecimentos. De alguma maneira, a exposição de Dentro e Fora é também um contributo para o reforço da sensibilização para essa mobilidade face ao património comum, resultante do encontro secular de culturas dos nossos países.

Vítor Ramalho Secretário­‑Geral da UCCLA


A exposição de Dentro e Fora simboliza de forma perfeita o que é Cabo Verde. Cabo Verde “não tem” propriamente uma grande diáspora, Cabo Verde é produto e produtor da sua Diáspora! Cabo Verde é, em imensa medida, a sua diáspora, de séculos. A emigração para os Estados Unidos da América começou no século XVIII com a pesca da baleia no Atlântico, como ocorreu também com os açorianos. A língua materna cabo­‑verdiana foi uma das primeiras línguas estrangeiras a ser ensinada naquele país. Mais tarde os cabo­ ‑verdianos fizeram­‑se ao mar, abusando de todos os pontos cardeais, designadamente Europa, África e América do Sul. E levaram com eles a tradição, os costumes, a religião, a música, a língua, o seu modo de ser e estar, enfim, a cultura! Integrando­‑se nos países de acolhimento, sem deixarem de ser cabo­‑verdianos! Nunca viram nisso alguma contradição! E, por isso mesmo, a história de Cabo Verde também se fez e faz­‑se na emigração! E a cultura cabo­‑verdiana acontece e se enriquece quotidianamente na emigração.

Hoje, quando olhamos para a ciência, o desporto e a cultura, impossível se mostra minimizar o papel da emigração! E a sua ligação intensa e íntima com a terra-mãe! Por isso, o que somos “Dentro” é muito do que somos e fazemos “Fora”! “Fora” teve sempre muito de “Dentro”, levando-o em cada passo, em cada esquina ou jornada, mas o que tem sido “Dentro”, de há largos anos a esta parte, tem imenso de “Fora”. Afinal, somos todos um! Na natural perceção diferenciada do mundo dada pela condição de indivíduos, os artistas acabam por se juntar fatalmente nas suas raízes e nesse amor sempre presente – e quase sempre muito exigente – a Cabo Verde! Os autores, estando fisicamente dentro ou fora, respiram Cabo Verde e isso transpira inelutavelmente das suas obras, subtil ou ostensivamente!

Eurico Correia Monteiro Embaixador de Cabo Verde em Portugal

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Somos Dentro e Fora... na reinvenção das ilhas pela arte! Somos dentro e fora. Como ilhas, mar e diáspora. Criamos onde estivermos. O chão físico, a pátria onde vivemos as nossas vidas carnais nunca re­ tira das nossas existências a pátria espiritual de onde viemos: Cabo Verde. As ilhas vivem em nós como dragoeiros1 vigilantes nas encostas de São Nicolau. Somos os “Chiquinhos” que ficaram e os “Chiquinhos” que partiram. Se, na música, Cabo Verde se transforma num país continental, nas artes plásticas e visuais ain­ da caminhamos nas costas da criatividade de alguns poucos. No pós­‑independência, Manuel Figueira, Bela Duarte, a filha adotiva mas cabo­ ‑verdiana nas artes, Luísa Queirós, Leão Lopes, Mito Elias, Kiki Lima, José Maria Barreto, Tchalê Figueira, Nelson Lobo, Leopoldina Barreto, Antó­ nio Firmino, Djosa Gomes, David e Abraham Levy Lima como nomes sonantes dos anos 70, 80 e 90. Alex Silva e Bento Oliveira no despertar dos anos 2000. Mais recentemente, toda uma nova geração que de certa forma, não abandonou as “tradições” narrativas e pictóricas dos anos ini­

O dragoeiro é uma árvore endémica dos arquipélagos da Madeira, Canárias e Cabo Verde (Macaronésia). Nome científico: Dracaena Draco.

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ciais pós­‑independência: o quotidiano, a mística do arquipélago, o retrato da alma das ilhas, das gentes, o imaginário “claridoso”, a ideologia revo­ lucionária do pós­‑colonialismo, enfim, os rituais de exorcismo da nossa condição de ilhéus agar­ rados a um tempo­‑espaço marcadamente mistifi­ cado, exagerado nas lembranças e nos significa­ dos. Um tempo­‑espaço mais romantizado do que real, pois temos um país em mutação permanen­ te e acelerada. Com presença nesta mostra, Tutu Sousa, Luís Levy Lima, Kuny Mendes, Jacira da Conceição, Eduardo Bentub, Sue Vicente, Yuran Henrique, Hélder Cardoso, Aires Melo e, Oleandro Pires Garcia e Adílio Felsing. Podia acrescentar Severo Delgado na pintura, Albertino Silva e Artur Marçal na escultura, César Scofield Cardoso na experi­ mentação vídeo e fotografia, Queila Fernandes numa fotografia autoral com base no "storytel­ ling" da novíssima geração. Acrescentam­‑se a esses nomes os filhos da diáspora que podemos legitimamente resgatar como nossos: Carlos No­ ronha Feio, Francisco Vidal,Ricardo Piedade, Fi­ del Évora. Muitas serão com certeza as perguntas, na visão dos mais ortodoxos, sobre como definir e consa­

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grar determinadas práticas manuais como sendo arte com relevância técnica e conceptual para merecer ser catalogada de interesse nacional ou com valor criativo para se enquadrar na galeria das artes de Cabo Verde. Pessoalmente, nada ortodoxo ou académico, penso que estamos no tempo das sementeiras. Da necessidade de se aprofundar o ensino artístico, de se multiplicarem as bolsas de estudo e de investigação para as ar­ tes, da construção das infraestruturas de apoio às artes no País. Estamos em tempo de luta por um aumento do financiamento público para fomen­ to das artes. Estamos em época “di azáguas”2, em que devemos acolher as obras e a criação emergente com empatia, sem necessariamente ocultar o espírito critico positivo necessário ao crescimento. Cabo Verde precisa de tempo, mais estudos, mais conhecimento. Cabo Verde preci­ sa de ousadia, rebeldia e transgressão nas artes. O certo é que o país vive um momento de tran­ sição nas artes plásticas e visuais. Transição e não substituição geracional. Transição onde cabe a concomitância de diálogos, de expressões de tempos históricos e de vivências. É preciso que os criadores nacionais dialoguem e se conheçam mais para que possamos romper definitivamente com o isolacionismo típico de ilhéus, que se re­ flete no carácter e na qualidade da nossa própria produção artística global.

a considerar com atenção um grande leque de novos artistas, de obras em construção, de novas experiências, quer académicas, quer puramente críticas e criativas. Muitos poderão não sobrevi­ ver ao funil do tempo, mas não tenho dúvidas que o futuro das artes plásticas e visuais em Cabo Verde caminha para um momento disruptivo de inovação em que uma nova geração dialogará sem complexos com o passado e alargará a sua intervenção para além dos mitos nacionais e das reflexões identitárias que ainda hoje prevalecem nas nossas artes, para um campo mais contem­ porâneo, melhor conceptualizado, atual, que in­ tervenha e interaja directamente com a realidade das ilhas, da diáspora e do mundo. A exposição de Dentro e Fora ­ ‑ Colectiva de Artistas de Cabo Verde é um contributo assinalável para se aprofundar a reflexão sobre as artes plásticas nacionais e situar Cabo Verde na contemporaneidade e no contexto não só da Lusofonia mas também do continente africano e do mundo. Somos dentro e fora, somos um, caminhamos em vários sentidos porque como povo somos feitos de muitos povos. Os de dentro são os mesmos, tão iguais aos de fora, por isso a nossa arte contemporânea tem em si mesma as sementes de uma revolução que ainda está por vir. Dentro e fora é um presságio bom do futuro que está por vir.

Se um olhar sobre o passado nos remete para um território parco em produção artística relevante, hoje, na segunda década do século XXI, temos Abraão Vicente 2

“em época de chuvas”

Ministro da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde


Mar + Cabo Verde = Criatividade Artística A presente exposição, intitulada de Dentro e Fora, Coletiva de Artistas de Cabo Verde, enquadra­ ‑se no atual programa UCCLA de exposições coletivas de artes plásticas contemporâneas dos países de Língua Portuguesa. Com esta mostra a UCCLA dá continuidade ao seu programa cultu­ ral com iniciativas internacionais, em várias áreas estratégicas, que pretendem contribuir para a afirmação e o conhecimento e interação recípro­ cas das diferentes culturas de expressão oficial em Língua Portuguesa. Na promoção da língua portuguesa podemos destacar a Coordenação da Comissão Temática de Promoção e Difusão da Língua Portuguesa dos Observadores Con­ sultivos da CPLP, para a qual a UCCLA foi eleita para o Biénio 2021­‑22. No âmbito desta Comis­ são, apoiámos a reabertura do Museu da Língua Portuguesa de São Paulo, no Brasil, em julho de 2021. Coorganizámos, com a Academia Galega de Língua Portuguesa, a Conferência “Português, Multilinguismo e Ensino à Distância”, no passa­ do mês de outubro, na Universidade de Santiago de Compostela. Por outro lado, a UCCLA realiza anualmente os “Encontros de Escritores de Lín­ gua Portuguesa” (EELP), com nove encontros já

realizados em diferentes países e continentes, no Brasil, em Angola, em Cabo Verde e em Macau/ China. Realizamos igualmente, de forma anual, o Prémio de Revelação Literária UCCLA – CMLis­ boa, Novos Talentos, Novas Obras em Língua Portuguesa que, nas suas seis edições, se con­ solidou como o mais amplo prémio de revelação de todo o espaço da Língua Portuguesa a nível de candidaturas (recebemos cerca de 600 a 800 obras); em 2021 recebemos candidaturas de mais 21 países em todos os continentes. Quanto às exposições, realizamos dois tipos de exposições coletivas: as temáticas, que pro­ movem o conjunto dos países de Língua Portu­ guesa (nomeadamente Conexões Afro­‑Ibero­ ‑Americanas, com curadoria de Carlos Cabral Nunes, da Galeria Perve, realizada em 2017; Frente. Verso. Inverso, em 2018, com curadoria de Adelaide Ginga, curadora do Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado; e Urbanismos de influência Portuguesa, organizada em parceria com a Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa, com a curadoria dos arquitetos Pro­ fessores Doutores Manuela da Fonte e Sérgio

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Padrão, em 2020; e as exposições organizadas sobre cada um dos Países de Língua Portugue­ sa, seguindo uma ordem alfabética, que iniciá­ mos com Angola – Artes Mirabilis (com curadoria de Lino Damião, no primeiro trimestre de 2018), seguindo­‑se o Brasil, com a exposição Do que permanece, Arte contemporânea Brasil – Portu­ gal; sobre a China­‑Macau – O Fio invisível, arte contemporânea Portugal – Macau/China (curado­ ra Carolina Quintela e coordenação curatorial de Adelaide Ginga, em 2019).

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De sublinhar que, para além do elevado nível artís­ tico dos artistas representados, estas exposições contribuíram igualmente para o aprofundamento do relacionamento entre os países representa­ dos, tendo algumas delas sido inauguradas pelo Presidente da República de Portugal e por alguns ministros de governos lusófonos. Todas as expo­ sições referidas tiveram um assinalável impacto entre as comunidades dos países representados residentes em Portugal. De Dentro e Fora, Coletiva de Artistas de Cabo Verde apresenta­‑nos 82 obras, da autoria de 36 artistas de, ou com antepassados em Cabo Verde1. Tendo em conta que selecionámos Cabo Verde como país a homenagear, fizemos uma parceria com a Embaixada, com o seu Centro Cultural (CCCV) e selecionámos o seu curador, Ricardo Barbosa Vicente, para a curadoria des­ ta nova exposição. Pela primeira vez, a UCCLA envolve numa exposição, para além da sua gale­

ria, onde apresentamos 66 obras de 35 artistas, um outro espaço físico – o do Centro Cultural de Cabo Verde, onde apresentamos 3 outros artistas com 16 obras expostas. As obras são proprieda­ de de vários colecionadores e de artistas, a quem muito agradecemos a gentileza da cedência das suas peças2. A primeira constatação que podemos realizar sobre as obras em exposição é que elas são o resultado da impressionante criatividade dos ar­ tistas das 11 ilhas do arquipélago cabo­‑verdiano3, refletidas numa multiplicidade de 12 técnicas di­ ferentes (da pintura à fotografia, da escultura ao vídeo, da serigrafia à instalação). Na galeria da UCCLA as obras dispõem­‑se segundo diálogos temáticos integradores das diferentes perceções da identidade de Cabo Verde: o Mar, a Música, a Literatura, a Mulher, a Memória, a Natureza e o Têxtil. A literatura está representada por poe­ mas que aludem e servem de introdução a cada tema da exposição. As obras refletem diferentes mundos oníricos e diferentes sensibilidades ar­ tísticas, de complexa e dialética relação entre a individual perceção e afirmação identitária, bem como a memória coletiva/individual. Entre a UC­ CLA e o CCCV estão representadas diferentes gerações de artistas, com obras que expressam, evocam, as complexas conexões entre o espaço e o tempo e as respetivas tradições artísticas, no­

Ver a lista com o nome dos colecionadores e artistas identificados neste catálogo. 3 A décima primeira ilha é corporizada pela imensa diáspora de Cabo­‑verdianos. 2

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Ver a lista com o nome dos 22 artistas identificados neste catálogo.


meadamente a ancestralidade africana, as misci­ genações de raiz europeia ou as ruturas contem­ porâneas. As memórias de múltiplas vivências contribuem para a reflexão sobre o papel do ser humano neste mundo global, cada vez mais em mudança acelerada. Algumas das questões de cidadania, levantadas por algumas das obras presentes nesta exposição, chamam a atenção para questões muito atuais e prementes, como seja o tema fulcral das altera­ ções climáticas (a poluição, a desflorestação que propicia maior contacto com animais selvagens e maior probabilidade de expansão de Coronavírus aos humanos – como no caso da pandemia da Covid­‑19) –, que agravam a carência de água, da utilização sustentável dos recursos naturais pelas sociedades contemporâneas, fazendo­‑nos refletir sobre a relação imanente entre a arte, a socie­ dade e as respetivas práticas políticas4. Algumas obras assinalam diferentes perceções dos con­ flitos do passado colonial. Queremos contribuir para a reflexão crítica desse passado e destacar as potencialidades da construção conjunta de um futuro partilhado. A UCCLA reafirma o respeito pela diversidade, quer da sensibilidade dos artistas, quer das di­ ferentes expressões culturais, como uma mais­ ‑valia no presente e no futuro, considerando­‑as uma grande riqueza dos nossos Povos e impor­ tantes elementos na criação de laços culturais e

Refletido em várias peças da exposição e explicitamente no texto legenda da peça “A Última Fronteira,” de autoria conjunta do artista Abraão BarbosaVicente e do curador Ricardo Barbosa Vicente.

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do nosso futuro conjunto em Harmonia. Gostaria ainda de destacar dois textos extrema­ mente interessantes e complementares para a compreensão da evolução das Artes Contempo­ râneas em Cabo Verde, elaborados especifica­ mente, o que para nós é um privilégio, para serem publicados neste catálogo de Dentro e Fora. São eles o texto de investigação do Professor Doutor Leão Lopes e o texto de introdução do Ministro Abraão Vicente. As obras refletem a pulsão individual dos artistas, influenciando a renovação da criação artística e o lançamento de múltiplas propostas, por vezes de contraditórias perceções, mas sempre proje­ tando no Futuro novas linhas de desenvolvimen­ to artístico. Obras que questionam o observador, algumas pela utilização de materiais não nobres ou clássicos que, retirados do seu uso quotidiano através do processo criativo, dão origem a novas obras de arte. De Dentro e Fora pretende contribuir para, por um lado, o melhor conhecimento das culturas e do património material e imaterial de Cabo Verde e, por outro lado, para aprofundar o diálogo inter­ cultural que divulgue novos artistas do presente que projetam tendências inovadoras para o futuro de problematização de caminhos na criação de pontes entre identidades partilhadas e reinventa­ das, num mundo mais sustentável e justo. Sabe­ mos que sem conhecimento do passado e res­ peito pela memória será difícil alicerçar um futuro harmonioso e sustentável.

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Por fim, o agradecimento profundo a todos par­ ceiros, em especial ao Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde, na pessoa do Senhor Ministro Abraão Vicente, e à Embaixada de Cabo Verde em Portugal, na pessoa do Senhor Embaixador Eurico Monteiro, ao curador, Senhor Arquiteto Ricardo Barbosa Vicente, bem como, na pessoa da Senhora Drª. Filomena Nascimen­ to, agradeço a todos os colegas que colaboraram na produção desta exposição e do seu catálogo. Rui Lourido, Coordenador Cultural da UCCLA

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Arte contemporânea em Cabo Verde Questionamentos para a sua compreensão e eventual sistematização O impacto da Segunda Guerra Mundial em Cabo Verde refletiu o drama que ia pelo mundo ociden­ tal acrescido de especificidades que resultavam da condição em que Portugal, politicamente neu­ tro no conflito, viveu essa guerra enquanto potên­ cia colonizadora. Uma estratégia que salvaguar­ daria seus interesses nas colónias, mas que ao mesmo tempo o enfraqueceria na administração das mesmas, forçando-o de alguma forma a en­ trar na guerra, sem nela tomar parte, para pro­ teger as suas possessões que, pela sua posição estratégica, em especial no Atlântico, eram alvo do interesse alemão e igualmente consideradas muito importantes na estratégia dos Aliados. Ao impacto militar e político dessa guerra no ar­ quipélago veio juntar-se uma grande crise climá­ tica que resultaria numa calamidade: uma grande fome, que dizimou grande parte de sua população. Cabo Verde entra assim na história contempo­ rânea com uma população arrasada pela seca e pelo abandono do poder em Lisboa, a braços com um sistema político instalado a partir de 1926 e inspirado pelas correntes ideológicas vi­ gentes na Alemanha nazi e na Itália fascista. Os estatutos das colónias viriam a ser adequados ao novo regime e, após a II Guerra Mundial, Portugal

veio dar mais atenção às suas colónias, sobretu­ do no plano económico e ideológico. De colónia, Cabo Verde, bem como as demais, passou a pro­ víncia ultramarina. Portugal estendia-se então do Minho a Timor. O cenário mundial pós-guerra, no que respeitava às potências coloniais, impunha processos que levariam à descolonização na Ásia e na África, dando início a um período que veio a ser caracte­ rizado por grandes convulsões internas nos terri­ tórios colonizados que reivindicavam a sua inde­ pendência. Após a independência da Índia, em 1948, e com os resultados da Conferência de Bandung1, em 1955, o desenho da administração política das colónias portuguesas em África não seria mais o mesmo. A insurreição de 1961 em Angola e a rendição militar na Índia, em Goa, Damão e Diu, no mesmo ano, marcariam definitivamente esse período histórico em que Cabo Verde se inclui.

Realizada em Bandung, na Indonésia, foi nesta conferência, que reuniu países da Ásia, Oriente Médio e África, que nasceu o conceito de Terceiro Mundo, o qual viria a abrir o caminho para a autodeterminação dos países colonizados pelas potências europeias na África e na Ásia.

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É nessa conferência, de 55, que se reconhece o direito dos povos à autodeterminação e ao repúdio a todas as formas de colonialismo. Mo­ mento histórico charneira que está na génese dos movimentos de independência nacional na Guiné, Angola e Moçambique, colónias portu­ guesas no continente africano. Portanto, o que se entende como história contemporânea no contexto destes futuros países independentes teria como marco esse importante evento polí­ tico, mundial.

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Esta introdução pretende aclarar e fornecer pis­ tas, no caso de Cabo Verde, para um melhor co­ nhecimento desse período contemporâneo no plano cultural e social onde uma eventual abor­ dagem no campo da arte poderá encaixar-se. Um puzzle em processo de montagem a partir de uma base histórica minimamente articulada e inteligível. Cabo Verde, como é por demais sabido e estu­ dado, constitui um caso específico na história da colonização portuguesa. Tornado independente em 1975, a sua história, a sua cultura e a sua economia não seriam de um momento para ou­ tro (como acreditou e se empenhou a geração da independência) redesenhados para responder a propósitos ideológicos estranhos que o seu povo dificilmente sustentaria. Se, nos primeiros anos, o sistema de partido único de cariz totalitário foi tolerado devido ao estado catastrófico em que encontrou o país, o povo, sempre em linha com o que se passa no mundo — muito por conta da contribuição de sua diáspora —, começou a reivindicar, de novo, “um poema diferente para

o povo das ilhas”2. Libertado desse período, em 1991, a contemporaneidade histórica em Cabo Verde inaugura um novo capítulo com a instaura­ ção da democracia no país. Como é que tudo isso se refletiu na cultura das ilhas e mais especificamente na arte? Aqui está a dificuldade que se me põe nesta tentativa de en­ saio sobre esse campo, dúbio, ainda por estudar atentamente. Onde é muito fácil perdermo-nos em análises sobre esses assuntos, especialmen­ te quando somos levados a catalogá-los à vista dos nossos cânones marcadamente europeus, negligenciando por desconhecimento e falta de interesse político e académico a herança e o que se passa na nossa região africana, subsariana, como parte intrínseca de nossa identidade cultu­ ral e histórica. É verdade que o conceito e práticas de arte con­ temporânea nestes países também são herdeiros do que aprendemos, estudamos e importamos, em especial da Europa. O seu resultado endó­ geno: na sociedade, na política, na educação e na cultura em geral, a forma como nos apropria­ mos da contribuição do resto do mundo é o que importa. Afinal, somos irremediavelmente parte dele, fruto das mesmas circunstâncias históricas, globais, irmanados no mesmo devir planetário. Nesta perspetiva, e no debate à volta da arte, es­ pera-se dos artistas que não só nele participem, mas também questionem, critiquem e produzam

Poema de Onésimo Silveira que se popularizou no período que antecedeu a independência.

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obra que seja reflexão do seu tempo e da sua so­ ciedade. Não nos é fácil enquadrar esses propósitos, diria, universais, na contemporaneidade cabo-verdia­ na, onde tudo, no campo da arte e da cultura, está ainda por discutir, liberto de mazelas ideoló­ gicas e regionalizadas que ainda persistem como herança de distúrbios vigentes até hoje e que subsistem dos primeiros tempos da independên­ cia do país. Pretender (o que não é o caso) estabelecer bali­ zas para uma história, mesmo que ainda difusa, da arte em Cabo Verde é, no mínimo, aceitar urdir um pano de terra3 com os parcos liços4 e retalhos que vamos cerzindo através de escassos teste­ munhos (de que também somos parte), aparen­ temente desgarrados e aleatórios. De outra forma não será possível trazer os mesmos à inteligibili­ dade e salvá-los da areia do esquecimento. Li recentemente um trecho de um texto relativo à ilha do Fogo no século XIX onde se refere que, na altura, não se registava nenhum testemunho artísti­ co, no domínio da pintura, por exemplo, devido ao desinteresse da classe abastada, com forte poder

Pano de terra, ou “pánu di téra”, é uma faixa de tecido de algodão longa e estreita, feita de forma artesanal em tear manual. O pano de terra tradicional utiliza só as cores preta e branca. Nota da editora RR. 4 Liço – Cada um dos fios entre duas travessas, através dos quais passa a urdidura do tear, e que, elevando-se ou abaixando a cada passagem da lançadeira, determinam o tecido com o fio que sai desta. (Do lat. licium). In https://www.lexico.pt/lico/. Nota da editora RR. 3

político, administrativo e económico na ilha, por essa expressão artística, mesmo tratando-se do retrato, muito em voga na Europa de então, que os mais ricos mimetizavam. Que não viam na arte qualquer utilidade prática numa ilha que, apesar dessa classe de privilegiados, era ainda escraviza­ da e carente dos recursos os mais primários para a sobrevivência de grande parte da população. Portanto, entenda-se que, para aquela classe de privilegiados, as expressões artísticas seriam su­ pérfluas, sem qualquer sentido ou utilidade em contexto de tanta penúria, material como espiritual. Sequer a igreja promoveu, por via de sua tradição, práticas de representação artística para decorar as paredes de seus pobres templos. Este testemunho, inserto num trabalho de investigação,5 poderia ex­ trapolar os limites da ilha para todo o arquipélago de Cabo Verde. Panorama que, embora possa não ser explicado de forma quase lapidar com os argu­ mentos acima, subsiste de certa maneira em Cabo Verde, apesar dos 500 anos de sua história, apesar de hoje contar com uma população de 564 mil ha­ bitantes e de um significativo avanço em diversos setores. Basta sairmos dos centros urbanos mais desenvolvidos para se constatar o quanto pesa a frugalidade no campo das expressões plásticas, por exemplo. O que se passa então com tão difusa cultura artística no país? Porque é que mesmo no campo da música — a mais expressiva manifesta­ ção da criação e génio do cabo-verdiano, somos tão parcos em políticas públicas de educação ar­

CALDAS, Maria de Lurdes, Os Medina e Vasconcelos, História de uma Família, 2019, Escritório Editora.

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tística e tão pobres em programas formais ou infor­ mais de estímulo vocacional para jovens? Será isso descaso ou fatalidade? Será isso uma característi­ ca das políticas do país a considerar outros setores do seu desenvolvimento mais prementes e urgen­ tes, deixando esse importante campo da educação a subsistir (em grande parte) na informalidade? Não serão apenas a economia, a religião, a expli­ car esses factos. A política também explica.

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Há alguns anos uma curadoria canarina esteve em Cabo Verde a investigar o que representaria a arte contemporânea do arquipélago com vista a uma exposição em Las Palmas. A exposição veio a realizar-se restringindo-se a apenas quatro autores: com pintura, instalação, cinema, fotogra­ fia e vídeo. Todavia, haviam tentando compreen­ der no terreno o que se passava em Cabo Verde que, na sua perspetiva, pudesse ser enquadrado como arte contemporânea a ser lida e entendida enquanto tal nas ilhas Canárias. A minha questão na altura foi porque é que os curadores não alar­ garam o espectro de sua avaliação crítica, que acabou por resultar numa exposição tão conden­ sada. Compreendi, pós dialogar com os mesmos, que o que procuravam restringia-se a esses qua­ tro autores, que produziam uma obra pensada, crítica, que comunicava com o seu território de elaboração e para fora dele. Esses curadores dis­ pensaram todas as demais expressões das artes plásticas ou visuais cabo-verdianas por reporta­ rem a uma estranha e tardia identificação com movimentos — em especial na pintura — há mui­ to esgotados, mas que ainda teimam em resistir em Cabo Verde.

Esta exposição promovida pela UCCLA sublinha e traz à tona algumas evidências interessantes sobre a “arte de hoje” em Cabo Verde. Uma pa­ norâmica quase exaustiva do que se tem produ­ zido no país, especialmente pós a independência nacional (1975). Um mosaico de tendências, a maior parte pintura de cavalete, juntando os mais diversos autores: autodidatas, alguns muito co­ nhecidos e outros menos; naifes, poucos, mas, interessantes. Também autores (poucos) com percurso académico que exploram outras áreas para além da pintura, como a tapeçaria, a foto­ grafia, o vídeo; outras materialidades, outros su­ portes e novas práticas oficinais. Se num passado recente o modernismo cabo­ -verdiano esteve sintonizado com o mundo, le­ gando uma obra reconhecida e bastante consis­ tente nos domínios da literatura, da música, da fotografia, da antropologia sociocultural, hoje o país parece estar à procura de um novo norte, em especial no campo das artes plásticas ou visuais, que vão sobrevivendo timidamente tentando en­ contrar o seu espaço e um mercado que as sus­ tente nos limites dos dois centros urbanos mais expressivos do arquipélago. O importante evento histórico da independência do país (1975) abriu caminhos e libertou os espí­ ritos para novos questionamentos e novas expe­ rimentações que acabariam por dar mote e apon­ tar rumos de criação contemporânea, os quais, todavia, não tiveram vida suficiente para permitir formular e sedimentar pensamentos e consubs­ tanciar correntes que hoje poderiam ainda estar a ser debatidos e criticados. Porém, estimularam


práticas que refletiram outras maneiras de fazer e entender a arte, outras formas de relacionamento com o público, outras oportunidades educativas e culturais para os mais jovens. Embora não te­ nham sido acompanhadas de uma crítica endó­ gena suficiente e disponível para as questionar — porque tão prementes, urgentes e esmagado­ res eram os desafios de então no campo políti­ co, social e económico —, deixaram marcas que esta exposição testemunha. É nesse período que se registam as experimentações mais consentâ­ neas com os movimentos da arte contemporânea ocidental. No teatro, nas artes visuais, por exem­ plo. Também na música e na literatura. É ainda neste período, que estimamos de dez anos, entre 1975 e 1985, que se tenta esclarecer os contor­ nos conceptuais da arte popular, ou artesanato, e estabelecer fronteiras (nem sempre estanques) com a arte. Pela primeira vez na história do país surgiram artistas e professores com formação académica adequada, habilitados para o ensino artístico nas escolas públicas, assumidamente engajados com esse tempo de renovação e de novas experimentações criativas. Poucos, é ver­ dade, não chegavam ao número dos dedos de uma mão. Estes artistas e professores, respon­ sáveis por abrir caminhos de conhecimento e de pensamento crítico à volta da arte no país, pu­ seram o seu esforço maior no plano educativo e de formação de artesãos em detrimento de uma obra artística pessoal que, apesar de outras prio­ ridades, não deixaram de lado. Puderam conci­ liar a urgência da demanda política que o país reclamava com o pensar e o experimentar a arte noutros termos. Uma atitude, uma postura ideo­

lógica perfeitamente enquadrada no seu tempo. A influência do pensamento marxista, o regime de partido único de génese numa guerra de liber­ tação armada, explicam de certa forma o posi­ cionamento desses artistas que chegaram a criar para si mesmos um estatuto formal de “profes­ sor artesão”, uma figura de mestre e quadro da administração pública, responsável por desenhar e conduzir programas de formação profissional de artesãos: a sua prioridade ideológica e inte­ lectual com o propósito de resgatar a tradição e suas práticas no campo do artesanato, deixado ao acaso até à sua quase extinção no tempo co­ lonial. À margem desse quadro institucional expe­ rimentavam novos territórios no campo da arte, motivados pelo que também ocorria no Ocidente, em especial na Europa, onde alguns deles ini­ ciaram suas atividades profissionais. De regres­ so ao país recém-independente, “quase” tudo estava aberto e virgem para atuarem com uma certa liberdade que, todavia, deveria ser sempre entendida e enquadrada pelo regime de partido único. O partido, ao mesmo tempo que estimula­ va, também condicionava os limites da liberdade individual face ao instituído, o que se expressava por via da organização e controlo da sociedade através de organizações de massa: milícias; or­ ganizações de mulheres, jovens e de crianças; sindicato; cooperativa. Um quase paradoxo num partido que então se proclamava “luz e guia do povo”, onde o indivíduo, a arte, não poderiam escapar a uma conduta e orientação ideológica que, embora pouco explícita, era, contudo, tácita. Promover o artesanato numa perspetiva cultural e económica; estimular a criação artística dentro de

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alguns limites do que percecionavam como arte; representar e enaltecer valores tradicionais; ino­ var, mas dentro das fronteiras do que seria “arte para o povo”, ou “arte popular”… Isto sim, era enaltecido e projetado em ocasiões festivas, ofi­ ciais e em representações externas. Voltemos um pouco atrás para apanhar o fio à meada…

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Não é possível contornar a contribuição do mo­ dernismo ao período que enforma o contemporâ­ neo em Cabo Verde à luz do convencionado, que localizaríamos no início dos anos 60. Protagoni­ zada numa primeira fase pela geração educada e intelectualmente preparada pelos modernistas, alguns deles seus professores no então Liceu Gil Eanes, cadinho de gestação da protoconsciên­ cia nacionalista. Os modernistas de 36 do século passado assentaram seus propósitos programá­ ticos no estudo, na observação, na vivência fac­ tual com os problemas do povo para compreen­ der e sistematizar uma ideia de cultura regional, autóctone, no contexto colonial português, sinto­ nizando Cabo Verde com o mundo. Atentos ao que então se constituía como ciência no domínio da antropologia, atentos à nova poesia e à nova literatura de língua portuguesa, francesa e inglesa que então se produzia, e acompanhando o que no campo da política internacional se desenrola­ va — a crise do pós primeira guerra mundial; a emergência do nazismo e do fascismo; a guerra de Espanha; a anexação de Abissínia pela Itália —, criaram um movimento que teve expressão, para além dos domínios do ensaio, da literatura e da consciencialização política, também na mú­

sica (a nova morna de B. Leza) e noutras áreas, como a fotografia e o cinema. Curiosamente, são parcos os testemunhos registados no domínio das artes plásticas; estranhamente, não tiveram mais visibilidade que a tentativa de introdução da gravura (linóleo) mais com o propósito de servir de ilustrações para a revista do grupo (Claridade) que como expressão plástica autónoma. O teatro também parece ter-lhes passado ao lado. A emigração forçada da geração de 60, tanto para a Europa como para São Tomé — estes os menos privilegiados por condições sociais — represen­ tou uma hemorragia cultural e humana no tecido social cabo-verdiano tal que ainda hoje é sentida. Aqueles que tiveram condições para o ingresso nas universidades portuguesas e noutros países europeus viriam a representar a outra parte dias­ porizada, a qual acabou por ter um papel impor­ tante no processo da consciencialização política que levaria à independência do país. É também da contribuição dessa geração que a contemporaneidade cabo-verdiana ainda se ex­ pressa. Os estudantes universitários em Portugal e noutros países da Europa, nos quais a cons­ ciencialização política pós-Bandung teve um efei­ to catalisador, alicerçaram o que se pode consi­ derar parte importante de um eventual movimento contemporâneo cabo-verdiano. Expressaram-se essencialmente no campo da ideologia política e do ideal da independência nacional que marcaria esse período. Também na poesia. De contestação e luta. Se fixarmos esse momento e considerar­ mos o período contemporâneo em Cabo Verde, a partir de 60, estaremos a concluir que, também


nesse momento da história, a geração de então esteve sintonizada com o mundo. Não tanto pela via das artes plásticas, visuais ou outras, mas pela atitude, consciência cultural e ação política. Tal como os modernistas que os antecederam. Estes ancoraram suas inquietações na antropo­ logia cultural, no ensaio, na poesia e na literatura (apesar da censura institucional): abriram novos caminhos na música, na fotografia, no cinema, sem descurar os problemas políticos e ideológi­ cos do seu tempo; aqueles, na conscientização e mobilização cívica que levaria à rutura política e administrativa com o colonialismo, inspirados pelos movimentos que, noutras colónias africa­ nas, os antecederam na luta pela independência nacional. O período de quinze anos (1960-1975) pode ser uma outra baliza cronológica que interessa aqui reter. Este período, se, por um lado, não produziu matéria que se espera ser considerada no âmbito da arte contemporânea em Cabo Verde — artes plásticas ou visuais —, por outro estimulou um pensamento e outras formas de marco histórico que não se pode ignorar, mesmo tratando-se, como neste caso, de uma aproximação de en­ saio sobre arte contemporânea cabo-verdiana. É durante esse período que se produz e se edita, inclusive em disco, a nova poesia “de protesto e luta” que, por sinal, não exclui a dos modernis­ tas de 36; é nesse mesmo período que, de dentro do país e, sempre sintonizado com a sua diás­ pora, os mais jovens tomam contacto com a luta de libertação em curso na Guiné. Importante pe­ ríodo de transição que viria encontrar (em 1975) as ilhas, cansadas, extenuadas, desanimadas. O

que se lhe segue, já abordamos em parte, pode­ rá ser cronologicamente datado, apenas como exercício ou ensaio, em dez anos, 1975-1985. Este é o período em que, regressados ao país, os novos protagonistas ideologicamente engaja­ dos inauguram e promovem ações e dinâmicas criativas na linha de movimentos de arte contem­ porânea na América ou na Europa. Tendentes ao que se poderia considerar o que eu designaria de “protomovimento” (que não chegaria a tanto), pois não houve sequer a preocupação de susten­ tar teoricamente o que era realizado em tempo de urgências, em que viver intensamente as novas experiências e os novos desafios criativos era tão absorvente que não deixou espaço para práticas de tradição académica. Isso não quer dizer que não tenha havido pensamento formal em proces­ so, estudo e investigação. Que poderá ainda che­ gar à luz do dia. Referindo-nos ainda a esse período (1975-1985), é possível resgatar os testemunhos da contribui­ ção dessa geração para a abertura de algumas janelas que poderiam, a exemplo dos modernis­ tas de 36 do século passado, sintonizar Cabo Verde com o mundo. Mas não. Porque é que isso não aconteceu, ainda não temos resposta con­ cludente. O facto é que esse período, se por um lado espoletou no espírito desses poucos artis­ tas regressados ao país a determinação engajada no processo da afirmação identitária, endógena, inovando e experimentando novas linguagens ar­ tísticas, por outro lado levou-os a fecharem-se, desconfiados (nem todos), à contribuição que por vezes se oferecia de fora. Característica dos tem­ pos de então, marcados pela ideologia vigente,

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contra o imperialismo e o colonialismo e ainda sarando feridas abertas pelo regime fascista do Estado Novo, uma experiência castradora e re­ pressiva vivida durante 48 anos, até abril de 1974.

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Não eram ignorados pelo sistema político que, ao contrário, apoiava-os em determinadas iniciativas. Tinham público e estímulo da população, que per­ cebia neles alguma rebeldia ou contra corrente ao sistema. Afinal, esses poucos criadores não esta­ vam completamente à margem do sistema formal. Tratando-se de uma geração que formou cons­ ciência cívica e política com os movimentos de 60, que pugnou pela independência do país, es­ tavam de certa forma comprometidos com o regi­ me e com uma “arte popular” revitalizada, renova­ da. Queriam trazer para dentro de suas práticas e questionamentos artísticos a experiência adquiri­ da antes de regressar à terra, sem negar em abso­ luto o legado da cultura tradicional de seu país de origem. Afinal, também, estavam indagando para compreender as suas raízes identitárias a uma ne­ cessária consolidação da afirmação nacionalista que então se impunha. Uma nova cabo-verdiani­ dade: sem rutura com o passado, sem a orienta­ ção ideológica vigente mas divergente e libertária. Tal propósito, difícil de conciliar, acabou por acan­ tonar ou mesmo condenar a possibilidade de sis­ tematizar, a ponto de sedimentar, um movimento assente em bases ou argumentos suficientemente pensados, aprofundados, traduzidos e esgotados em práticas consistentes. Talvez o que verdadei­ ramente caracteriza esse período e o papel de alguns elementos desse grupo muito restrito seja exatamente o que se passou com os modernistas, que não tiveram o propósito explícito de criar mo­

vimento, nem a determinação de realizar um pro­ jeto programático previamente estabelecido. No caso dos contemporâneos, o resultado traduz-se em obra, alguma consolidada, outra fragmentada e ainda em efemeridades tão fugazes que dificul­ tam ou não esclarecem o estudo desse período de criação artística em Cabo Verde que, na verdade, se confinou apenas aos dois maiores centros ur­ banos, no Mindelo e na Praia. Em cada um deles, como se desconhecessem mutuamente as suas manifestações e experimentações autóctones. Sem diálogo, sem intercâmbio, ao contrário do que acontecia com as iniciativas suportadas pelas organizações de massa, que se faziam represen­ tar por todo o país. Isso, nos primeiros dez anos da vigência do partido único, que duraria quinze. Muito tempo, quase uma geração, moldada por uma ideologia e completamente capturada por uma nova elite política saída do movimento de li­ bertação nacional com uma guerra pelo meio. Que contestou o papel e o legado dos modernistas e não entendeu em tempo o vazio, o hiato que se processou na alma do povo que recebeu a inde­ pendência em festa, mas que alguns anos depois se sentiu frustrado com o regime. O mesmo cuja semente começou a dar frutos desde o início de 60, que intentou uma rutura antinatura, impossível com os modernistas de 36, mas que acabou por compreender que a história não se faz com hia­ tos ou páginas rasgadas de si mesma. Reconci­ liando-se momentaneamente com o seu passado, com a mesma geração que hostilizaram, a mácula, a ferida do tempo ainda persiste. A geração que manteve a chama da cabo-verdianidade acesa e que, tal como numa equipa de corrida de estafeta,


entregou à nova geração o bastão e o legado de sua gesta, que ajudou a construir uma ideia de na­ ção, não desanimou. Seus protagonistas haviam sido considerados “evasionistas” perante os de­ safios que a contemporaneidade suscitava. A sua poesia contestada, os seus ensaios ignorados. A geração “da luta”, como então se designava a de 60, gritou, berrou, “não vou para Pasárgada”.6 Atitude contestatária própria do tempo, mas mal recebida pelo povo, que respeitava esses homens do passado com quem ainda se cruzava nas ruas. Dos “novos”, vindos da guerra e da diáspora para assumir as rédeas do destino político do país in­ dependente, a incompreensão. E, por isso, nega­ ram no primeiro momento receber das mãos des­ ses pioneiros da consciência nacional o bastão de estafeta sem o qual a corrida não teria rumo nem sentido. A geração de 36, todavia, continuou na frente das novas batalhas. Estiveram próximos e sempre disponíveis para apoiar as iniciativas dos mais jovens pós 75, aqueles que se propunham a agir para criar e inovar de forma autónoma no seio da sua comunidade. Participando ainda vivamente no novo momento histórico e político, estavam os de 36, ainda ativos, mais próximos dos “rebeldes” com quem, de certa maneira, se identificavam no seu tempo de também rebeldia.

Alusão ao poema “Vou-me embora pra Pasárgada”, de Manuel Bandeira. O poeta cabo-verdiano Ovídio Martins, importante referência dessa geração a que aqui se convencionou designar de 60, contrapôs com “Não vou para Pasárgada”. Prometeu gritar, berrar, matar, prender nas mãos convulsas ervas e pedras de sangue, mas não iria para Pasárgada.

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Podemos considerar que esse foi o momento crucial (1975-1985) que marcou e abriu novos horizontes na recente história pós-independência das ilhas: na arte, na cultura contemporânea das ilhas, na educação, na política. Inconsequente? Não há inconsequência na histó­ ria. Nem na vida. Muito menos na arte. Vejamos o que então marcou esses dez primeiros anos da independência das ilhas. A música popular veio para a rua fazer dançar o povo em festa; – a morna, mantendo a sua linha melódica, ga­ nhou nova lírica e novos intérpretes que, com os “incontornáveis”, de novo resgatados para a ribalta, refletiam o novo tempo de euforia cultu­ ral e de esperança num futuro melhor; – novos géneros musicais emergiram, entre eles a música de intervenção e de mobilização popu­ lar, como a morna-balada e a morna-rock; – géneros musicais adormecidos pelo tempo (fu­ naná, batuque, colá, talaia baxo, mazurca, pol­ ca…) renasceram, alguns renovados; a contra­ dança, os cantos tradicionais e a tradição oral resgatados em contexto educativo e popular; também pela literatura; novas formas culturais e artísticas começaram a ser experimentadas com base nelas…. – o jazz surge a ocupar também seu espaço ex­ perimental, bem como a dança contemporânea a dar os primeiros passos; – o cinema começa a ousar criar o seu espaço; – os festivais de música abertos às massas são inaugurados;

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– o audiovisual: diaporama, vídeo; a fotografia, emissões televisivas experimentais (privadas antes da oficial) fazem o seu aparecimento; – uma nova literatura e nova poesia vêm a públi­ co; – um novo teatro (experimental) a ganhar consis­ tência; – a moda a balbuciar; – a performance a interagir com a música e com o teatro; o “stand up comedy” mobiliza grande público pela pertinência da crítica social e cultu­ ral que produz; – publicações periódicas de interesse cultural e absolutamente independentes circulam; – o carnaval renasce envolvendo também os ar­ tistas regressados que, com os populares, in­ troduzem outros enredos e outras linguagens técnicas e plásticas na manifestação; – a cerâmica contemporânea, bem como outras tecnologias, como a serigrafia, fizeram o seu surgimento; – a panaria dos séculos XV a XVII é bem estuda­ da, suas técnicas e saberes tradicionais resga­ tados a ponto de gerar uma tapeçaria numa lin­ guagem inédita e original; a tinturaria renasce, o batik também; – o design enquanto recurso técnico e criativo instala-se em processos de produção artesanal e industrial.

quer esforço de inovação ou de apetência para a experimentação que os novos tempos susci­ tavam. Os pintores populares mais interessantes seriam os ligados ao carnaval, genuínos, com forte sentido da arte e da pintura em particular, alguns muito populares. Pintavam sobre qualquer suporte: paredes, placas de madeira prensada, cartões, chapas de “bidon”, andores de carna­ val… Com tintas de construção civil, o que viesse à mão. Enquanto outros apregoavam a dificul­ dade em produzir pintura porque lhes faltava no mercado: telas, óleos, pincéis adequados…

Contudo, a arte, como era então entendida pela elite política e a nova burguesia que a confundia com o artesanato e outras manualidades, ficou timidamente confinada à pintura de cavalete, re­ petindo os mesmos procedimentos, as mesmas práticas oficinais, os mesmos cânones, sem qual­

Tudo isto resume as contribuições dos dois cen­ tros urbanos de referência no país e em pleno re­ gime de partido único. Uma verdadeira agitação cultural e social que trazia na sua esteira não uma rutura radical com o legado modernista e a con­ temporaneidade política, mas sobretudo a ansie­

Esse período de “agitação criativa” e de empol­ gamento experimental foi também o momento em que a poesia de “protesto e luta” (antes censura­ da) veio para a rua e para os palcos; em que se discutiu o papel da chamada “arte social”; em que se deram os primeiros passos na “arte urbana”. O muralismo é ensaiado em grandes superfícies públicas; momento em que escultores (efémeros) populares emergiram com o novo carnaval. No plano social, estudantes liceais celebram John Lennon pelas ruas da cidade do Mindelo cantando “Imagine”. Reagem com este evento às manifesta­ ções oficiais da organização juvenil partidária com quem não se identificam. São brutalmente sova­ dos pela polícia e alguns deles presos.


dade e a necessidade de exprimir em liberdade, discutindo e experimentando, sem peias, novas formas de afirmação identitária, pós-colonial, mas autónoma dos cânones ideólogos que então se instalavam na sociedade cabo-verdiana. Um con­ junto de experimentações e ensaios na linha do que se convencionou designar, no ocidente, como arte contemporânea. Tardios em relação ao que se passava, por exemplo, em Portugal ou no Sene­ gal? Sim, pode-se aceitar esta constatação nos domínios das artes plásticas e visuais, mas não se pode negligenciar ou minimizar a expressão do tempo cabo-verdiano no seu contexto histórico e ideológico. Só nessa medida se poderá compreen­ der o que se vive, o que se produz e se experimen­ ta, hoje, nos diversos planos em que se realiza a sociedade cabo-verdiana, inclusive na arte. A primeira galeria que acolheu esse laboratório de insularidade múltipla da criação contemporânea no país teve vida curta mas cumpriu o seu pa­ pel de agitador de águas, que poderiam ter sido mais paradas e turvas do que são, não fosse ela a dar conta do que então se pensava e se produ­ zia nesse território de experimentações. Sem ga­ lerias nem museus públicos (até os dias de hoje) que pudessem albergar, sistematizar, preservar a produção e o pensamento cultural desse tempo, perde-se a amplitude desse fulgurante momento, quase efémero, da arte, balbuciantemente con­ temporânea, que hoje vive mais nos interstícios da memória e de parcas manifestações que lem­ bram esse período. Na história da criação artística em Cabo Verde há vazios que importa serem aprofundados. A expo­

sição que aqui nos traz e suscitou esta reflexão é um bom ponto de partida. Não só para ajudar a compreender o período de 1975 a 1985, mas também o que se lhe antecedeu e o que se lhe segue até o presente. O vasto leque de autores e de uma ampla diversidade de práticas e de ex­ pressões aqui reunidas atesta, sem sombra de dúvidas, a importância e a urgência do estudo e sistematização da arte cabo-verdiana. A presen­ ça de obras de autores que fizeram o seu per­ curso na diáspora desde finais da década de 60 — incontornáveis numa exposição desta ampli­ tude — oferece-nos uma visão mais abrangente do que aquela que normalmente se perceciona a partir de Cabo Verde. Chegados aqui, e para compreender a arte na contemporaneidade cabo-verdiana, é fundamen­ tal ter em conta que seu rizoma funda-se num processo histórico sui generis que pode não re­ produzir a visão e a cronologia que retemos de nossa aprendizagem, sempre ameaçada de um discurso exógeno, dogmático, fechado, que con­ tamina e fragiliza um pensamento crítico endó­ geno. O que reclama, sobretudo no plano aca­ démico, um esforço particular para abrir novos caminhos de conhecimento no campo da arte em Cabo Verde, mesmo com as nebulosas, vazios e incongruências com que se apresenta. Também para perceber onde e como se estabelecem fron­ teiras conceptuais entre o que será “arte” — no caso presente: artes plásticas e visuais — e o que se lhe escapa enquanto conhecimento e domí­ nio específico da criação humana em contextos sociológicos e culturais específicos, como é este caso. Como se exprime enquanto obra irrepetível,

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única, que questiona e interpela, a um tempo, as inquietações intrínsecas do criador e a sociedade donde emana, que a perceciona e consome.

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Não se pode evocar as históricas vulnerabilida­ des endémicas – climáticas, políticas, económi­ cas, sociais –, que ainda persistem nas ilhas, para justificar a pobreza de estudos e a ineficácia de políticas públicas no campo das artes visuais. Os modernistas, que encontraram um terreno deser­ to, árido, diríamos, dramático sob o ponto de vista social e económico, produziram pensamento, pro­ puseram uma estética como seu suporte e, ainda, deixaram obra. O que é que explica, por exemplo, que tenha sido apenas nos anos 60 que um alu­ no cabo-verdiano — Manuel Figueira — ingressa numa escola superior de arte, no caso, Escola Su­ perior de Belas-Artes de Lisboa para estudar pin­ tura? Que viria a ser o primeiro dessa geração com formação académica superior em arte a regressar às ilhas logo após a independência. Sabe-se que a educação artística formal como eventual profissão era castrada na sociedade e no contexto escolar. Manuel Figueira, graças à in­ tervenção de seu professor Baltasar Lopes (um dos modernistas mais destacados da geração de 36) junto do pai, terá sido o primeiro estudante depois de Simplício de Sá (finais do século XVIII) que partiu das ilhas com o objetivo claro de estu­ dar arte. Apesar de nessa altura, no início de 60, no mesmo contexto escolar de Manuel Figuei­ ra, no Liceu Gil Eanes, terem sido identificados vários jovens com aptidão e vocação para essa área de estudo e que foram encaminhados para outras (com mais status e garantia de realização

profissional) contra a sua tendência, opção e ex­ pectativa. O que ainda hoje acontece, de certa maneira. Parece vir da tradição que arte não ca­ rece de investimento sequer na educação. Razão porque não há notícias nem testemunhos docu­ mentais de que o Seminário-Liceu de S. Nicolau (1866-1917), instituição pioneira e importante na história da educação em Cabo Verde, tenha dado atenção à educação artística para além da músi­ ca. O Liceu Gil Eanes (1917) e a Escola Técnica (1956) se despertaram no espírito dos jovens o in­ teresse, pelas artes, não os encaminhavam nessa direção, não era sua missão educativa. Restou o povo, a informalidade, as iniciativas sociais e cul­ turais, a cumprir essa missão de educar a alma e deixá-la fruir. É importante compreender o que os artistas ca­ bo-verdianos pensam, como se integram critica­ mente na sua sociedade, como a questionam nas várias “nuances” em que se expressa na atualida­ de. Para melhor perceber o impacto desse apa­ rente hiato entre a modernidade e a contempora­ neidade, que pode ser também explicado pelas circunstâncias impostas por uma realidade adver­ sa resultante do contexto colonial e da não me­ nos determinante condição telúrica e ambiental de um arquipélago sem alternativas económicas no pós II Guerra Mundial. Mas há que ter cuidado com o peso desses elementos na leitura holísti­ ca que o assunto requer. Há, aparentemente, um importante vazio de criação ou produção artística (salvaguardando sempre a literatura e a música) entre a vigência do modernismo no seu auge (o movimento ainda persiste no contemporâneo) e o momento da independência nacional.


Na história não existem vazios, mas sim espaços nebulosos e pouco estudados que urge colmatar para que um texto como este pudesse ter outra contextura ou compleição. Voltando à história e, em especial a das artes e ofícios em Cabo Verde, o seu primeiro marco an­ cora no século XV, prosseguindo pelo XVI e XVII — é fundamental para esta leitura a integração de um pano de terra7 nesta exposição — conquanto a panaria de influência hispano-mourisca8, produ­ zida nas ilhas e exportada essencialmente para o continente africano que marca esse tempo histó­ rico, não possa ser estudada nos limites de um artesanato estritamente utilitário. Com o que per­ deríamos a possibilidade de compreender o seu papel na formação de uma consciência estética e simbólica, já nesse tempo. A panaria tinha finalidade económica (é certo) e era importante na economia escravocrata de en­ tão. Mas essa finalidade não se esgotava em si. O pano-de-obra9, o expoente de elaboração téc­ nica e criativa, e que chegou a ser muito desen­ volvida nas ilhas, leva a questionar porque é que em Cabo Verde não se desenvolveu a esse nível

Ver a Nota de Rodapé nº 3 Carreira, A. (1983). Panaria Cabo-Verdiana-Guineense. Praia: Instituto Cabo-verdiano do Livro. 9 O pano d’obra ou pano obrado é a designação dada na panaria cabo-verdiana a uma peça em algodão formada por bandas com cerca de 15 centímetros, chamadas teadas, tecidas em pequenos teares manuais rudimentares, com padronagem formando motivos geométricos geralmente de duas cores, branco e azul anil, que do século XVI até aos finais do século XIX se produziu em Cabo Verde. http://www.caboverde-info.com/Identidade/Cultura/Pano-d-Obra 7 8

outras “artes”, como as que se desenvolveram, por exemplo, no continente africano (região sub­ sariana) ou na Índia. Nessas regiões, o interesse pelo objeto de arte, sua produção e comércio, re­ sultaram em “contaminações” europeias sobre a arte nativa dos povos em diálogo, hoje importan­ te fonte de conhecimento sobre as relações inter­ continentais nos séculos XV e XVI. Esses mesmos mercadores portugueses que encomendavam e comerciavam objetos de marfim, de prata ou de bronze por toda a Europa, tiveram o mesmo pa­ pel em Cabo Verde, mas restritos ao campo da panaria enquanto objeto de troca no comércio de escravos. Não tanto como objeto simbólico em si, mas como valor de moeda. Porém, nessa linha de produção, cujas tecnologias vieram com os escravos, pode-se juntar a cerâmica e a cestaria, estas sem a pujante expressão que no continente africano se impunham, restringindo-se nas ilhas a puros objetos de uso doméstico quotidiano sem qualquer preocupação simbólica ou decorativa. Embora na panaria tenham sido introduzidas ino­ vações ao nível do tear e de recursos técnicos que revolucionaram o pano trazido pelos escra­ vos, a cerâmica, por exemplo, não avançou mais que os limites do neolítico, permanecendo neles até os anos 50, quando foram introduzidos nas ilhas a roda de oleiro e o forno. Na panaria ainda é de registar o grande avanço ao nível da com­ posição e dos elementos que participam no seu desenho, alguns introduzidos pelos mercadores portugueses — como a Cruz de Cristo das ve­ las das caravelas que aportavam à Cidade Velha — outros resgatados da tradição africana, em es­ pecial da Guiné. O mesmo expediente foi usado

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pelos mesmos encomendadores, na Serra Leoa, por exemplo, para a produção de peças de mar­ fim ou de bronze reproduzindo cenas de gravura ou elementos simbólicos europeus. Em Cabo Verde, é a própria história de ilhas en­ contradas desabitadas, sem qualquer testemu­ nho civilizacional e cultural com o qual se poderia agir em diálogo, a dar-nos parte das respostas que procuramos. Comparando-a com a história e práticas que os navegadores encontraram na costa ocidental africana, habitada e com fortes expressões culturais nos territórios onde instala­ ram seus postos comerciais. 30

Nas ilhas, o chamado comércio triangular, escra­ vocrata, era emergente e de trocas imediatas. A insularidade, as condições ecológicas pouco fa­ voráveis a um povoamento regular e estável; a pirataria e a investida de grandes corsários ingle­ ses e franceses dificultaram sobremaneira a pro­ gressão do arquipélago, ainda hoje bem sentida. Na Cidade Velha, a primeira cidade europeia nes­ tas bandas, embora tenham sido erigidas igrejas e catedral, não temos registos da preocupação de nelas albergarem a tradição pictórica ou es­ cultórica europeia de produção local ou trazidas do exterior para a educação da fé e ornamenta­ ção dos seus interiores. Ou isso terá acontecido e sido objeto de saque? A cantaria importada di­ retamente de Portugal, despojada de ornamentos significativos, parece não ter tido qualquer impac­ to no espírito local donde se pudesse imaginar a génese de uma classe de canteiros ou de escul­ tores, assim como na mesma época aconteceu nalgumas cidades do Brasil. Podemos questio­

nar: falta de materiais mais apelativos para essas artes? Pedra calcária ou outras pedras brandas? Ou mesmo madeira? Não será por aí. Há pois es­ tes e outros aspetos de estudo que merecem ser aprofundados para se compreender hoje o que se passa no domínio da criação artística em Cabo Verde, especialmente em algumas das suas ex­ pressões. Sem descurar outros ofícios e práticas do artesanato. Por isso há ainda um trabalho de arqueologia da história a fazer que este texto apenas reclama. Um trabalho que ajude a urdir e tecer um pano mesmo que, por agora, pareça pouco consisten­ te, sobre a história da arte em Cabo Verde, em es­ pecial das artes plásticas ou visuais. Um trabalho que sistematizasse o de António Carreira sobre a história da panaria, mas agora numa perspetiva de arte, até, pelo menos, o período pós-indepen­ dência, 1975-1985. A seguir, escavar o período de um século (século XVII a XVIII) para descobrir o que esconde, até o momento em que o Bispo, Frei Cristóvão de S. Boaventura, tem a iniciativa de enviar alguns meninos de S. Nicolau para se­ rem preparados em artes e ofícios na Casa Pia de Lisboa em finais do século XVIII. Momento em que vamos descobrir um deles, o primeiro cabo­ -verdiano estudante formal de arte, Simplício Ro­ drigues de Sá10 que, enviado com dez anos para

Nascido em S. Nicolau, Cabo Verde, em 1785, e falecido no Rio de Janeiro em 1839, foi discípulo de Jean-Baptiste Debret, francês. Participou ativamente na formação da Academia Imperial de Belas Artes de Rio de Janeiro, foi um dos poucos artistas que contribuiu ativamente na Missão Artística Francesa no Brasil e deixou obra significativa – retratos muito famosos.

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Portugal, veio a ser pintor da corte de D. João VI, no Brasil, e autor de retratos famosos do rei e do príncipe D. Pedro I, mais tarde D. Pedro II,impe­ rador do Brasil. A partir daí nada se sabe até um outro momento possível de documentar como marco histórico e que será o que regista a presença e estadia de An­ tónio Pedro, pintor surrealista e dramaturgo por­ tuguês nascido na ilha de Santiago que, durante o curto tempo que viveu na Praia, incentivou Jai­ me de Figueiredo, ensaísta, crítico, dramaturgo e artista plástico, a produzir um conjunto de dese­ nhos e algumas pinturas que seriam mais tarde (1930) expostos no Salão dos Independentes, em Lisboa, na linha dos modernistas portugueses aos quais estava, de certa maneira, ligado.

Os demais capítulos dessa história inclusive, os vazios de testemunhos que fomos tendo ao lon­ go deste texto, desafiam-nos para que sejam tra­ zidos à luz do conhecimento, aprofundados, es­ tudados e divulgados, por quem há de vir. Posto isto, aqui estão algumas peças de um pu­ zzle que podem ajudar na leitura e fruição desta exposição de arte contemporânea cabo-verdiana que a UCCLA, em boa hora, nos dá a apreciar. Para, sobretudo, podermos refletir sobre nós ca­ bo-verdianos, e sobre os caminhos que se nos abrem daqui para a frente. Os artistas aqui repre­ sentados oferecem generosamente matéria de contemplação e de reflexão para tanto. 31

Leão Lopes Reitor do M_EIA Mindelo, 27 de setembro de 2021



de Dentro e Fora – Coletiva de Artistas de Cabo Verde

A exposição de Dentro e Fora – Coletiva de Artistas de Cabo Verde, surge do desafio da UCCLA (União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa) à Embaixada de Cabo Verde em Portugal, como representação oficial da Repú­ blica de Cabo Verde, para a realização de uma mostra de obras de arte –, dando continuidade à programação de exposições dedicadas aos Paí­ ses de Língua Oficial Portuguesa. A mostra pretende convidar o visitante a refletir sobre a condição transnacional dos artistas de Cabo Verde, um país onde a diáspora tem uma marcante e assinalável dimensão, com repercus­ são inequívoca nas artes plásticas. Os autores, na sua produção artística, influenciam e são in­ fluenciados não apenas pelas suas raízes, mas também por todo o contexto dos novos países onde vivem ou viveram, pelos quais viajaram e onde produziram as suas obras. Apresentamos artistas nascidos em Cabo Verde (CV) e que sem­ pre ali viveram, artistas que nasceram em CV e vivem fora do país, e artistas que nasceram fora e foram viver para CV, assim como descenden­ tes de cabo­‑verdianos de 1ª ou 2ª geração que nasceram fora e vivem fora, e que têm, apesar disso, um forte sentido de identidade e pertença a Cabo Verde.

A abordagem curatorial surge da vontade de expor obras e autores incontornáveis da cultu­ ra cabo­‑verdiana e da constatação da predomi­ nância de temas conotados com Cabo Verde, independentemente da condição do chão / lugar ou de geração. Esta mostra acontece em duas partes, simulta­ neamente, na UCCLA e no Centro Cultural de Cabo Verde (CCCV), uma dependência da Em­ baixada de Cabo Verde em Lisboa. Na UCCLA, a exposição é materializada ao longo de um trilho marcado por blocos vulcânicos frag­ mentados, trazidos do vulcão da Ilha do Fogo, que representam a dispersão da Terra­‑Mãe em Ilhas e condicionam o percurso dos visitantes, como que apelando ou sugerindo diálogos en­ tre as obras com a alusiva companhia de poe­ sia cabo­‑verdiana. Estão representados 36 artistas, com 66 obras agrupadas em 7 diálogos improváveis, aparentes ou possíveis, realizados por diferentes interve­ nientes com abordagens plásticas distintas so­ bre os mesmos temas. No CCCV, a exposição é composta por 3 artis­ tas em 3 salas, três miniexposições individuais que formam uma só, três ilhas a juntar às muitas

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representadas no espaço da UCCLA, dando ên­ fase aos tempos e espaços do universo artístico cabo­‑verdiano, valorizando a sua condição de ar­ quipélago de muitas gentes sob múltiplas repre­ sentações.

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Neste sentido, para as salas do CCCV foram con­ vidados 3 artistas, com 16 obras expostas. Mi­ guel Levy Lima, um consolidado artista, experi­ mentalista, que nasceu em Cabo Verde e viveu sempre fora; Oleandro Pires Garcia, um artista emergente, nasceu em Cabo Verde e ali vive per­ manentemente, criando a partir dos seus diversos cotidianos; e Carlos Noronha Feio, um artista do longínquo pós-memória, descendente de uma fa­ mília cabo-verdiana, nascido em Portugal e com intensas vivências noutros países fora, com sen­ tido de múltipla pertença plenamente reveladora e presente nas suas obras. 7 diálogos + 3 ilhas = 10 ilhas, uma Ilha é com­ posta sempre pelos diálogos da sua gente.

Ricardo Barbosa Vicente



Mar azul

Oh... oh… mar, detá quitinho

B. Léza

Bô dixa´m bai, Bô dixa´m bai spiá nha terra, Bô dixam bai salvá nha Mâi

mar


... Oh mar… Mar azul… subi mansinho… Lua cheia, luminá´m caminho… Pa´m bà nha terra di meu São Vicente pequinino, Pa´m bà braçá nha cretcheu...

Oh... oh…mar, anô passá tempo corrê Sol raiá, lua saí A mim ausente na terra longe... Oh Mar…Oh Mar…

(Apontamentos extraídos do Capítulo 15, 1ºvolume, intitulado “Nova Maré de Composições e Gilberto Freyre” da trilogia biográfica, dedicada à vida, família e obra deste compositor das mornas mais icónicas de Cabo Verde)


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Carlos Noronha Feio

Uma construção é feita de mais do que das memórias dos antepassados, o local onde nascemos, os predicados que vivemos Audio, Ano: 2021 Créditos Gravação:Carlos Noronha Feio, Caxias,Oeiras, Portugal. Lauro João Martins Dias de Barros, Mosteiros, Ilha do Fogo, Cabo Verde. Coleção do Artista


38°41'51.4"N 9°16'29.7"W

15°02'01.6"N 24°19'23.4"W


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David Levy Lima

Nôs Mar Ano: 2015 140X100 cm, Óleo sobre Tela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção da Embaixada de Cabo Verde em Portugal


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Tutu Sousa

Lobo do Mar Ano: 2019 60X50 cm, Acrílico Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Luís Levy Lima

Mundo Nobu, Cidade Velha Ano: 2020 100X150cm, Acrílico sobreTela Créditos Fotográficos: Filipe Louro Mendes Coleção Garantia -Seguros de Cabo Verde



Chuva em Cabo Verde Ovídio Martins

Choveu Festa na terra Festa nas Ilhas Soluçam os violinos choram os violões nos dedos rápidos dos tocadores «Dança morena dança mulata menininha sabe como vocês não tem» E elas sabinhas dão co’as cadeiras dão co’as cadeiras

musica


a

Choveu

Choveu

Festa na terra Festa nas Ilhas Já tem milho pa cachupa Já tem milho pa cuscus Nas ruas nos terreiros por toda banda as mornas unem os pares nos bailes nacionais Mornas e sambas mornas e marchas mornas mornadas

Festa na terra Festa nas Ilhas que cantam e dançam e riem e choram de contentamento Soluçam os violinos choram os violões nos dedos rápidos dos tocadores «Dança morena dança mulata menininha sabe como vocês não tem» E elas sabinhas dão co’as cadeiras dão co’as cadeiras dão co’as cadeiras

(in “Caminhada”, Casa dos Estudantes do Império, 1963)




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Kiki Lima

Bói Popular Ano: 2021 100X195 cm, Acrílico sobreTela Créditos Fotográficos: Kiki Lima Coleção do Artista

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Kiki Lima

Sem som Video Ano:2021 Captação: Kiki Lima | Edição e montagem - Luisa Péres



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Aniceto Gomes

Sem título Ano: 2019 37X8X6 cm, Madeira Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção da Embaixada de Cabo Verde em Portugal



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Luís Levy Lima

Konxa Sra da Luz Ano: 2018 80X120 cm, Acrílico sobreTela Créditos Fotográficos: Filipe Louro Mendes Coleção da Embaixada de Cabo Verde em Portugal



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António Firmino

Serenata Nossa Senhora da Luz Ano: 2019 70X90 cm, Acrílico sobreTela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção Privada



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António Firmino

Serenata Inauguração CCCV Ano: 2021 76X102 cm, Acrílico sobreTela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



ODI MARÍTIMU Excerto do poema “Ode Marítima”, de Fernando Pessoa

(…) Ah, tudu kais é un sodadi di pedra! I ora ki naviu ta sai di kais I dirapenti ta odjadu ma abri un spasu Entri kais ku naviu Un angústia risenti, n ka sabe pamodi, ta toma na mi, Un nébua di sintimentus di tristeza Ki na sol di nhas angústia relvadu ta brilia Sima purmeru janela undi madrugada ta konko, I ta envolve-m sima rakordason dotu algen Ki, misteriozamenti, é propi mi.

literario


Ah, kenha ki sabe, kenha ki sabe, Si n ka parti un bes, antis di mi, Dun kais; si n ka dexa, naviu baxu sol Gengedu di madrugada, Un otu spésia di portu? Kenha ki sabe si n ka dexa, antis d’ora Di mundu fora di mi sima n ta odja-l Ta raia pa mi, Un grandi kais intxidu di poku algen, Dun grandi sidadi meiu-kordadu, Dun inormi sidadi di nogósiu, krisidu, fogadu, Tantu kuantu kel li pode ser fora di spasu ku tenpu.

o

Sin, dun kais, dun kais material dalgun manera, Rial, ki ta odjadu sima kais, kais rialmenti, Kel kais abusulutu, ki através di si mudelu imitadu Inkonsientimenti, Invokadu sen sensibilidadi, Nos omi nu ta konstrui Nos kais na nos portus, Nos kais di pedra atual riba d’agu dimé-divera, Ki dipos di dja es sta fetu di rapenti es ta parse Ku kusas-rial, spritu-kusas, entidadis di pedra-almas Na sertus mumentu di nos di sintimentu-raís Ora ki na mundu-fora sima ki un porta ta abri I, sen nada muda, Tudu ta bira ta odjadu dun manera diferenti. (…)

(Tradução de José Luiz Tavares, "Odi Marítimu", Abysmo, 2021)


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Francisco Vidal

"Odi Maritimu" Ano: 2021 42X59 cm (9 desenhos), Acrílico sobrePapel Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Abraham Levy Lima

Arsenal da Marinha de Lisboa – anos 20 Ano: 2020/21 100X150 cm, Óleo sobre Tela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



MULHERES Carlota de Barros

(Homenagem à mulher cabo-verdiana)

Eis as mulheres…podemos vê-las em toda a parte nas manhãs…tardes e noites de todos os dias… vêm de longe as mulheres…somos nós filhas da escravazinha negra ainda menina cobiçada…perseguida…ultrajada em perfumadas alcovas do senhor branco na estribaria…nas plantações… nos campos de milho…chorando… desejando seu amado desesperado preso ao tronco vergastado…escarrado…humilhado… desprezado… mil vezes desonrado

mulher africana…mulher cabo-verdiana …negra…mestiça…de alva tez… tão bela!…Cor de chocolate… baunilha…canela…cravinho da Índia mulher de corpo bem feito seios rijos…ancas roliças dançantes… cabelo negro…crespo… encaracolado…encarapinhado… ondulado ou escorrido Eis as mulheres somos nós meninas…moças…com passos de espuma…mães…tias…avós… esposas…amantes…amadas…mal amadas…violentadas…queridas… escravizadas… idolatradas… alienadas …vendidas…poetizadas… abandonadas…endeusadas… prostituídas tanta vez por um prato de cachupa para o filho…a mãe doente…corpo fraco…esquecido…sem vida… sem brilho…cabeça baixa…mãos abandonadas no ventre vazio

mulher


Eis as mulheres…estão aí todas somos nós…altivas…orgulhosas… frementes de amor…tão confiantes… sorriso nos olhos se amadas…respeitadas…livres… libertadas… aí estão resistentes…firmes…empenhadas… lutadoras a batucadeira…a deputada…a emigrante…a camponesa…a a juíza…a artista…a empregada doméstica…a peixeira…a poetisa ... a cabeleireira a operária…a doméstica…a companheira…a doutora…a rabidante ... a professora…a enfermeira…a costureira…a ministra ... a estudante

res Ei-las…estão todas aí somos nós mulheres mulheres cabo-verdianas mulheres africanas…

mulher simples…lenha à cabeça… lenço amarrado…xaile colorido… roupa de chinês…sempre vaidosa… respirando beleza…rebolando a kadera…numa dança sensual… provocando…insinuante…sabendo bem o que faz…sabendo bem que o faz Mulher chique…perfumada… exibindo seu corpo bonito…bem cuidado…elegante…sapatos de salto alto…roupa de estilo Como são belas! Orvalho…aurora…luar de Agosto… Primavera precoce …Verão ardente… suave Outono…enérgicas como o Inverno Mulheres! Somos todas nós da escrava ainda menina à mulher hoje… Belas sim… divinas criaturas somos nós todas… Mulheres…

(Carlota de Barros, Na Pedra do Tempo, 2017)


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Kuny Mendes

Fonti Lima Ano: 2018 100X70 cm, Papel fotográfico em dibond Créditos Fotográficos: Kuny Mendes Coleção do Artista



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Jacira da Conceição

O meu interior Ano: 2021 120X52 cm, Cerâmica Créditos Fotográficos: Maeds museu Coleção da Artista



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Leomar

Badia Ano: 2020 90X90 cm, Acrílico sobre Tela Créditos Fotográficos: Luisa Péres

Coleção Embaixada de Cabo Verde em Portugal



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Tchalé Figueira

Sem título 1,04X0,86 cm, Acrílico sobreTela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção Privada



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Adílio Felsing

Sem título Ano: 2020 50X40 cm, Técnica mista (acrílico,pastel s papel) Créditos Fotográficos: Dörte Felsing Coleção do Artista



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Maria Alice Fernandes

Mudjêris di Fonti Lima – Santakatrina Ano: 2020 120X80 cm, Acrílico sobreTela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção da Artista



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Eduardo Bentub

Em sintonia Ano: 202198 X 9 cm, Acrílico. sobre Tela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Sue Vicente

Mira Ano : 2020 100X70 cm, Acrílico sobre Papel Créditos Fotográficos: Vadu Tavares Coleção da Artista



ROÇA INOMINADA (Poema de Erasmo Cabral de Almada)*

À Veninha, com fraterna ternura À São Lima, poetisa de todas as cumplicidades

Sob os teus pés exaurindo descalços todo o compacto silêncio dos cieiros e das colinas circundantes do Birianda ouve-se o frenesim da dor pétrea percutindo em saudade da roça que lateja longe e penumbrosa tal útero da casa erodida porém desejada Foi-se o afago materno levado pelo sueste inundado pelo verde corrosivo das ilhas do Equador enterrado até à exaustão do espanto nas águas do Golfo e do atroz dilúvio que soterram as réstias da alma e o caminho do regresso

memór


E legou-te a obstinação suplicante a voz suspensa e estes trilhos inclementes aturdidos sob os teus pés cansados e a negrura da servidão luzindo no pardo suor do rosto e da pele triste e os cascos fraternos dos asnos e das bestas de carga e do seu o redondo e impoluto que incendeiam as pedras e contigo partilham a lonjura dos caminhos o odor agridoce dos frutos recentes a albarda e a veemência da ingratidão

ria

E legou-te este verde agreste que resplandece nos frutos e em outras iguarias de Jaracunda e na roça inominada a que te sujeita o teu mudo perfil e a sua profusão surda e sombria pelo doméstico estendal do pátio e pelo fumegar da cozinha em vil imagem sonhando com a alforria

* Nome literário José Luís Hopffer Almada (José Luís Hopffer Almada, Sonhos Caminhantes, Pedro Cardoso Livraria, 2017)


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Blac Dwelle

Oryx Ano: 2019 270X230 cm, Madeiras, Spray, Verniz Créditos Fotográficos: Chris Costa



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Oleandro Pires Garcia

The Capital Ano: 2020 93X98 cm, Metal tecido com fio de cobre, Óleo sobre Metal Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Oleandro Pires Garcia

"The Partition of Africa” ou "A Partilha de África" Ano 2021 100X100 cm, Metal com fio de cobre fixo_Metal como tela / escultura / gravura. Créditos Fotográficos: Oleandro Pires Garcia Coleção do Artista



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Fidel Évora

Fake Self I Ano: 2018 189X165 cm, Serigrafia e Acrílico sobre tela Créditos Fotográficos: Kitmin Less | Cortesia Alter Ego Coleção do Artista



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Fidel Évora

Fake Self II Ano: 2018 189X165 cm, Serigrafia e Acrílico sobre tela Créditos Fotográficos: Kitmin Less | Cortesia Alter Ego Coleção do Artista



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Mito Elias

Um chaveta kita sirbiu Ano : 2006 130X120 cm, Técnica mista sobre Tela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção Embaixada de Cabo Verde em Portugal



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Mito Elias

sirbi pa spantadju (being a scarecrow) Ano: 2006 120X130 cm, Técnica mista sobre Tela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção Embaixada de Cabo Verde em Portugal



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Alex da Silva (1974 - 2019)

Desperate Ano: 2000 Díptico 170X140 cm, total 170 X 280 cm, Acrílico sobre tela Créditos Fotográficos: Laura Castro Caldas e Paulo Cintra Coleção da Caixa Geral de Depósitos



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Abraão Vicente

Identidade em construção I Ano: 2004 a 2009 41,5X28,5 cm, 10 unidades emolduradas peça a fazer um conjunto Colagem, pastel de óleo, acrílico e carvão sobre papel Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Abraão Vicente

Identidade em construção II 210X178 cm Técnica Mista sobre Papel ( Colagem, pastel, óleo, acrílico, carvão) Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista




Abraão Vicente Ricardo Barbosa Vicente

Última Fronteira Ano: 2021 1000X200 cm


BOCA DO FOGO Regina Correia A David Andrade

A boca do mundo é um cone de fogo escancarado ao céu da manhã negra sobre músculo matreiro sulfuroso fincado na montanha enraivecida. Cada explosão funesta armadilha de rocha e cinza nas franjas do tempo laçado por grito tamanho que a terra cospe de seu ventre desabrida.

naturez


Amarrotado queixume na mão insubmissa do vento e do mar carrega gota a gota ferina, turva nuvem de exílio sem eco contra pedra porosa em brasa.

za

E nas espáduas do silêncio fragmentos de azul repousam tremendo como se a poeira ondulante e inerte fosse nossa mortalha em forma de asa.

(Regina Correia, Conjugação de Mapas, Editorial Novembro, 2020)


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Yuran Henrique

Sem título Ano: 2020 112X100 cm Técnica Mista sobre Papel Créditos Fotográficos: José Matos Alves Coleção do Artista



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Hélder Cardoso

Lua engana galo Ano: 2021 120X100 cm, Acrílico sobreTela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Aires Melo

Blimundo Ano: 2020 90X90 cm, Acrílico sobreTela Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção Privada



NHO XINHO

(Poema de Nzé de Sant´y Ago)* À memória de Nho Xinho, tecelão de Pombal

As mãos enrugadas tecem a vagarosa e calada amargura que do rosto sulcado de velhice em fímbrias vegetais se transmuta para os dias utilitários das mulheres dos cortadores de cana-de-açúcar e ilumina a castanha resplandecência do milho e de outros frutos de Pombal Padece a alma - escalvada escalavrada ribeira alagada de pétrea mágoa e do último suspiro das águas e da agonia do verde – onde o rústico coração floresce e em silêncio amadurece

textil


Fenece a alma e absorta assombra o espectro do sobrado ensombrando o basalto nu e negro e o humilde colmo do casebre ajaezado e circular refúgio em funco 1 estigmatizado sob a penumbra das montanhas e do finar da esperança quando o preto-fino do rumor irredutível do djato 2 e do ébano esplendor da valentia e da pele rebelde da já antiga altivez dos cabelos crespos da mocidade se perdem no preto-negro da serena e já anciã servidão das mãos tranquilas e do corpo sentado sobre os restos e as cicatrizes do poilão

Descai o rosto réstia apenas da ribeira crucificada no altar do riso cúpido do morgadio e do pelourinho da repentina violência das cheias de Agosto sobre a ferida da plenitude rubra do tempo despojado de rancor indiferente às mãos de Nho Xinho tecendo calosas a memória da melancolia e o fulgor da acrimónia escorrendo da sombra cerimoniosa do casebre…

Cabana tradicional, de base circular, com tecto de palha em forma de cone (Cabo Verde). 2 brado (José Luís Hopffer Almada, Rememoração do Tempo e da Humidade (Poema de N’zé de Sant’y Ago), INCM, 2015) * Nome literário José Luís Hopffer Almada 1




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Pano di terra, ou pano d'obra tradicional Ano: não identificado 160X72 cm Créditos Fotográficos: Luisa Péres

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Marcelino Santos

Sem título Ano: não identificado 150X120 cm Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção Embaixada de Cabo Verde em Portugal



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Manuel Figueira

sem título Ano: não identificado 213X158 cm, Batik Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção Embaixada de Cabo Verde em Portugal



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Maria Alice Fernandes DA ESQUERDA PARA A DIREITA

Nha mudjeres Ano: 2004 33X17 cm Técnica mista

Rabidanti Kabu Verdi Ano: 2008 34X13 Técnica mista

Rabidanti Kabu Verdi Ano: 2006 33X15 cm Técnica mista Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção Embaixada de Cabo Verde em Portugal




de DENTRO e FORA Coletiva de Artistas de Cabo Verde

Centro Cultural de Cabo Verde Rua de São Bento, 640 - Lisboa


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Miguel Levy

For all those born with wings Ano: 2019 Instalação/ tríptico175x300cm Créditos Fotográficos: Miguel Levy Coleção do Artista



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Miguel Levy

Miles ahead Ano: 2021 195x135 cm, Acrílico sobre Cartão Créditos Fotográficos: Miguel Levy Coleção do Artista



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Miguel Levy

Colorfield playground Ano: 2017 120x200cm Acrílico sobre Tela Créditos Fotográficos: Miguel Levy Coleção do Artista



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Miguel Levy

Some way Out Ano: 2018 150x200 cm, Acrílico sobre Cartão Créditos Fotográficos: Miguel Levy Coleção do Artista



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Miguel Levy

Em busca do vento Ano: 2017 117.8x150 cm Fotografia sobre Tela Créditos Fotográficos: Miguel Levy Coleção do Artista



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Oleandro Pires Garcia

M' Bem Di Fora ___Traditional Woman Ano: 2020 100X100 cm, Acrílico sobre Cartão) Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Oleandro Pires Garcia

Criola ___Creole Ano: 2020 100X100 cm, Acrílico sobre Cartão Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



142

Oleandro Pires Garcia

Bacchus, Venus and Wine Ano: 2020 100X100 cm, Acrílico sobre Cartão Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Oleandro Pires Garcia

Coronavirus Pandemic __Animals with money Ano: 2020 100X100 cm, Acrílico sobre Cartão Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Oleandro Pires Garcia

Big Eyes I Ano: 2020 48x33 cm, Acrílico sobre Cartão Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Oleandro Pires Garcia

Big Eyes II Ano: 2020 48x33 cm, Acrílico sobre Cartão Créditos Fotográficos: Luisa Péres Coleção do Artista



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Carlos Noronha Feio

O descanso antes da elevação em ‘S’, 2021 Ano: 2021 34x85x50 cm, Luz néon (argónio) Créditos Fotográficos: Bruno Lopes Coleção 3+1 Arte Contemporânea



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Carlos Noronha Feio

Um vento entre arquipélagos Ano: 2021 40x23x25 cm, néon (argon), transformer, wiring, metal string Créditos Fotográficos: Carlos Noronha Feio

Coleção 3+1 Arte Contemporânea



38°41'51.4"N 9°16'29.7"W

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Carlos Noronha Feio

Uma construção é feita de mais do que das memórias dos antepassados, o local onde nascemos, os predicados que vivemos 38°41'51.4"N 9°16’29.7"W Ano: 2021 40X30 cm, Impressão sobre Papel Créditos Fotográficos: Carlos Noronha Feio Coleção do Artista



15°02'01.6"N 24°19'23.4"W

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Carlos Noronha Feio

Uma construção é feita de mais do que das memórias dos antepassados, o local onde nascemos, os predicados que vivemos 15°02'01.6"N 24°19'23.4"W Ano: 2021 40X30 cm, Impressão sobre Papel Créditos Fotográficos: Lauro João, Martins Dias Barros Coleção do Artista



os artistas


ABRAÃO VICENTE Abraão Vicente, natural de Assomada, Santa Catarina, Ilha de Santiago, Cabo Verde, é licenciado em Sociologia pela Universidade Nova de Lisboa, Portugal. Encontrou-se como pintor e escritor em Lisboa, e verificou que, mesmo numa capital que é um caldo de lusofonia, fora do lugar onde nasceu estava destinado a ser estrangeiro. Na literatura e na arte desenha-se o vínculo a uma questão identitária da qual acredita não ser possível fugir. Na estadia em Portugal, onde germina o seu percurso como artista plástico e escritor, interioriza a ligação inviolável ao lugar de pertença: “Os africanos, os Erasmus, todos os que estavam em Lisboa diziam que somos cidadãos do mundo. Com o tempo percebemos que somos cada vez mais de onde somos. Percebi que sou muito cabo-verdiano, não renegando as outras raízes, as outras misturas que tenho”. Um regresso à matriz que atravessa a sua produção literária e artística: “A minha literatura, a minha arte toda, tem a ver com essa questão identitária. E nós não podemos fugir de nós, apesar de alguns de nós conseguirmos driblar a nossa identidade; a maior causa é fazer com que o lugar de onde somos seja um sítio melhor”, diz Abraão Vicente. Abraão Barbosa Vicente é deputado à Assembleia Nacional de Cabo Verde pelo MpD (Movimento para Democracia) desde 2011, foi jornalista, editor e cronista do jornal a “A Nação” entre 2008 e 2010, e criou e apresentou na Televisão Nacional (TCV) os programas “Casa da Cultura” – 2006/2008, “180 graus” – 2008/2009, “Nha Terra Nha Cretcheu” e “Intimidades” (ACI) / TCV 2008/2010. Na atualidade, é Ministro da Cultura e das Indústrias Criativas do Governo de Cabo Verde (X Legislatura).

ABRAHAM LEVY LIMA Abraham Levy Lima é um pintor português nascido na Ilha de Santo Antão, Cabo Verde, em 1948, descendente de uma família judaica estabelecida no arquipélago no início do século XIX. Filho de pai ilustrador e aguarelista, Abraham herdou do pai a paixão pela arte e cultura dos grandes mestres. Completou os seus estudos secundários no Mindelo, Ilha de São Vicente. Na década de 1960, com 18 anos, partiu para Lisboa a fim de prosseguir os estudos em Engenharia mas, influenciado pelo seu irmão David e pela herança genética que lhe foi transmitida, optou pela pintura. Dedicado às artes plásticas portuguesas e influenciado pelas escolas Flamenga, Americana e Russa, Abraham desenvolveu um estilo muito próprio apoiado num trabalho de pesquisa profunda da História, da arte de velejar e das narrativas épicas de batalhas navais. Assim, o seu foco artístico passa pelas embarcações históricas, pela natureza paisagística e morta, pela náutica e pelos registos Lisboetas. Considerado pela crítica como um paisagista urbano hiper-realista, pintor realista e naturalista, Abraham identifica-se acima de tudo como um criador autodidata, de formação também autodidata, que utiliza a técnica de pintura figurativa/documental na sua atividade profissional artística. Abraham Levy Lima está representado em vários museus e coleções particulares. Em 2000, recebeu o 2º Prémio da Academia da Marinha e em 2017 foi-lhe atribuída a Medalha de Mérito Cultural do 1º grau em Cabo Verde. (texto retirado de: http://www.caboverde-info.com/ Identidade/Personalidades/Abraham-Levy-Lima)

ADÍLIO FELSING Adílio Felsing (Adílio Lopes Robalo), nasceu e cresceu na cidade da Praia, Ilha de Santiago, Cabo Verde. Formado em desenho técnico, Adílio Felsing começou a pintar ainda jovem e continua a pintar, para além de trabalhar com arquitetos. Como autodidata, participou em workshops, e continuou a sua formação recorrendo a livros e ilustrações. Em 2011 mudou-se para a Alemanha, onde teve aulas com vários grandes pintores, como Hans Scheibner e Jürgen Weber, entre outros. Em dois cursos intensivos em Berlim, com os Professores Sailer e Andrei Krioukov, desenvolveu a sua técnica e, ao mesmo tempo, descobriu como queria expressar-se na pintura na sua própria linguagem. Em 2016 fez a sua primeira exposição na Alemanha. Em 2017 regressou a Cabo Verde e, na tranquilidade do Tarrafal, encontrou a concentração necessária para o seu trabalho. Em abril de 2018 expôs pela primeira vez, com a sua mulher, na cidade da Praia, no Palácio da Cultura Ildo Lobo e, posteriormente, no Hotel VIP Praia, em outubro do mesmo ano. Adílio Felsing participou ainda na exposição coletiva “Palácio Fora de Portas”, no Hotel Pérola, em 2018. Em 2019 regressou à Alemanha e reside em Hamburgo. ALEX DA SILVA Alex da Silva nasceu em 1974, em Angola. Filho de pais cabo-verdianos, ainda criança foi viver para Cabo Verde, São Vicente. Alex da Silva é um artista plástico, curador, empreendedor criativo (e agitador cultural) do Mindelo, em Cabo Verde, e de Roterdão, Holanda. Partiu para Holanda após os estudos liceais em Mindelo, e formou-se com distinção na Academia Willem de Kooning de Arte e Arquitetura,

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em Roterdão, em 1999, e foi estudante Erasmus do programa de intercâmbio Socrates na Faculdade de Belas Artes “Alonso Cano”, de Granada, Espanha, em 1997/1998. Em 2000 fez a pós-graduação e o mestrado em Belas Artes na Academia Minerva, em Groningen, Holanda. O seu trabalho foi tema de mais de 20 exposições individuais e participou em mais de 30 coletivas na Europa e nos quatro cantos do mundo. Exibido em Itália, Espanha, Portugal, Holanda, Noruega, França, Bélgica, Luxemburgo, Curaçau (Antilhas Holandesas), Alemanha, Rússia, Emirados Árabes Unidos, China, Senegal e Cabo Verde, a sua obra pode ser encontrada em coleções privadas e públicas, em museus e coleções particulares. Em 2012, Alex da Silva foi designado para criar, junto ao grande Porto de Roterdão, um monumento alusivo aos 150 anos sobre a abolição do comércio de escravos. A peça, intitulada CLAVE faz parte do circuito de Arte Pública, constituído pelas obras de vários artistas internacionais, ao longo dos locais simbólicos da cidade. Assumido pelos promotores e pela cidade durante a sua inauguração, CLAVE é um Memorial, para que ninguém possa dizer que nunca soube da existência da escravatura, as suas mazelas e cicatrizes, do êxodo forçado dos africanos para fora do seu continente, entre o século XV e o século XIX. Alex é fundador da ZeroPointART, e curador/ diretor de exposições da ZeroPointART Gallery, localizada no centro da cidade de Mindelo, Cabo Verde.

AIRES MELO Aires Melo nasceu na Ilha da Boa Vista, em Cabo Verde, e vive e trabalha em Castelo Branco, Portugal. Autodidata, Aires Melo dedi-

cou-se às artes plásticas e à ilustração, sendo também criador de banda desenhada. Há mais de 15 anos que o artista vive da sua arte. Desde criança se interessou pelo desenho e nessa altura já sabia o que queria ser quando crescesse. Ao longo dos anos de aprendizagem, foi experimentando várias técnicas, mas são as técnicas com carvão, grafite e tinta da china que mais tem aperfeiçoado e aquelas com que se sente mais à vontade para criar. A partir do estúdio onde trabalha, realiza diversos trabalhos para vários cantos do globo, como Singapura, França, Lesoto, Suíça, Bélgica, Alemanha, Nova Zelândia, Estados Unidos, Canadá, Índia, entre outros. O registo de obras e ilustrações encomendadas desses e de outros países já ultrapassa as cinco centenas ao longo de mais de uma década e meia de experiência. Verifica-se que cada vez existe maior procura para o seu trabalho e estilo artístico, o que não o surpreende, porque sempre se dedicou e preparou para tornar a sua arte cada vez mais apurada e, consequentemente, satisfazer os apreciadores. Na opinião do artista, poder viver da sua arte e realizar trabalhos que agradam ao público é uma bênção.

ANICETO GOMES Aniceto Gomes nasceu em 1966 em São Tomé e Príncipe, filho de mãe cabo-verdiana. Foi a sua fé e determinação que fizeram de Aniceto Gomes Coutinho o grande construtor de instrumentos musicais de cordas que é hoje. Chegou a Cabo Verde em 1970, quando tinha apenas 4 anos, na companhia dos pais. Aos 15 anos, tendo abandonado os estudos, a sua paixão era tornar-se carpinteiro e, em Mindelo, São Vicente, encontrou o Mestre Baptista om quem viria a aprender a construir

instrumentos musicais. Aniceto aprendeu as técnicas de construção de instrumentos musicais de corda e, hoje, os instrumentos que constrói, são utilizados por músicos e grupos de renome internacional, como os Gipsy Kings. Após a morte de Mestre Baptista, em 1997, Aniceto abriu a sua própria oficina, onde foi aperfeiçoando o que aprendera com o seu mentor, tornando-se ele próprio, mais tarde, um Mestre, ensinando e empregando jovens no seu atelier em Monte Sossego, São Vicente. Aniceto constrói vários instrumentos, incluindo o violão de 6 e 7 cordas, a viola de 10 e 12 cordas, viola baixo acústico, e mesmo uma guitarra portuguesa. A sua especialidade, porém, é o cavaquinho, instrumento considerado por muitos como a “alma da Morna”. O cavaquinho de Aniceto Gomes é hoje o modelo do “cavaquinho cabo-verdiano”, encontrado em todas as ilhas de Cabo Verde, e é utilizado por quase todos os músicos cabo-verdianos de renome, destacando-se entre eles Bau, Kim Alves, Toy Vieira, Palin Vieira, Zé António, Tó Alves e Zé Rui de Pina. Com a sua arte e engenho, Aniceto Gomes já participou em várias feiras e exposições de arte, artesanato e design, tanto a nível nacional como internacional.

ANTÓNIO FIRMINO António Firmino nasceu na cidade do Mindelo, na ilha de São Vicente, Cabo Verde, cujas gentes, vivências e folclore servem de tema para as suas telas, a óleo ou em acrílico. É licenciado em Línguas e Literaturas Modernas pela Universidade Nova de Lisboa e em Estudos Franceses pela Universidade de Toulouse, França. Possui um mestrado em Comunicação Educacional multimédia, e duas


pós-graduações na área educacional, obtidas em Inglaterra. Desde 2009 ministra no Centro InterculturaCidade o curso de crioulo cabo-verdiano – Introdução à língua e cultura. Pintor por vocação, há mais de quatro décadas que se assume como um artista autodidata que “inventa a sua própria técnica a cada pincelada”. A sua pintura foi desde cedo muito marcada por uma forte relação com a terra e com o imaginário de Cabo Verde. Pode dizer-se que a obra de António Firmino é um facto consumado de quadros com vida própria. A pobreza, a seca, a natureza das ilhas, as festas tradicionais, os atos religiosos, as paisagens marinhas, algumas cenas históricas de naufrágios, retratos, entre outros, são aspetos frequentes da sua temática. António Firmino está há alguns anos radicado em Portugal, onde tem efetuado diversas exposições e participado em inúmeras atividades culturais relacionadas com o universo das comunidades cabo-verdianas e lusófonas em geral. Profundo apreciador da música tradicional da sua terra natal, presença assídua – quando não mesmo impulsionador – das sempre recordadas noites de serenata no Mindelo dos anos 70, enfeitiçado pela criatividade musical natural do ilhéu, passou ele próprio a compor e a tocar violão, de onde surgiu o mote para a pintura a que chamaria mais tarde “Serenata Mágica”. Está representado em várias coleções privadas em Cabo Verde, Portugal e diversos outros países. FONTES: https://www.artmajeur.com/pt/antonio-firmino/presentation https://www.largoresidencias.com/pessoas/antonio-firmino

B.LÉZA Francisco Xavier da Cruz (Ambrósio), mais conhecido pelo seu imaginativo nome artístico, B.Léza, foi um importante músico de Cabo Verde. Nasceu no Mindelo, em 1905, no dia 3 de dezembro, hoje dia Nacional da Morna, merecido reconhecimento de um dos maiores valores culturais de Cabo Verde. Artista multifacetado, poeta, músico contista e pedagogo, compôs dezenas de mornas, entre as quais se destacam “Eclipse”, “Miss Perfumado”, “Resposta de Segredo Cu Mar” e “Lua Nha Testemunha”, que, diz-se, foi composta no leito do hospital, dias antes da sua morte. B.Léza faleceu em 1958 e deixou uma riquíssima herança musical, entre as mornas, que ele inovou com o “meio-tom brasileiro”, as coladeiras, marchas carnavalescas, mazurcas, valsas, fados, compondo ao violão, clarinete e piano. Também deixou obra escrita: Uma Partícula da Lira Cabo-Verdiana (1933); Flores Murchas (1938), poesia; Fragmentos – Retalhos de um poema perdido no naufrágio da vida (1948), poesia; Razão da amizade cabo-verdiana pela Inglaterra (1950), textos para crianças e jovens, novelas, poesia, ensaios, um diário escrito em Lisboa, depois da Exposição do Mundo Português de 1940, em que participou integrado num grupo musical, e uma breve história sobre a dança, interpretação e roteiro de composições e autores da morna. No final de 2021, em dezembro, por ocasião do segundo aniversário da classificação da morna como Património Imaterial da Humanidade, será lançado um livro-disco com um conjunto de acetatos gravados em São Vicente entre finais dos anos 1940 e princípios

dos 1950. Será a primeira vez que se poderá ouvir a voz de B.Léza a cantar em disco.1

CARLOS NORONHA FEIO Carlos Noronha Feio (Lisboa,1981) consome, justapõe e realiza a media como pesquisa de identidade cultural, local e global, adotando imagens, locais e símbolos culturalmente significativos, como forma de interferência criativa, demonstrando a natureza quase arbitrária na qual o significado cultural é interpretado. Sobre a sua arte e significados, Noronha Feio faz frequentemente palestras e conferências. É doutorado em Filosofia (Belas Artes) pelo Royal College of Art em Londres. Expõe internacionalmente, e os seus projetos artísticos recentes incluem “The Fabric of Felicity” no Garage Museum of Contemporary Art, em Moscovo, 2018, “Nada Miami Beach 2019”, Sculpture Park, em Miami, nos Estados Unidos, “even if at heart we are uncertain of the will to connect, there is a common future ahead”, na narrative projects, em Londres, em 2018, “no fim de tudo está o começo, a negociação!”, na Galeria 3+1 Arte Contemporânea, em Lisboa, em 2021, “Matter of Trust”, no Nottingham Contemporary, Nottingham, Reino Unido, “Oikonomia: a Matter of Trust”, no Museu Nacional de Arte Contemporânea – Museu do Chiado em Lisboa, “You Are Now Entering_________”, no Center for Contemporary Art de Londonderry/Derry, na Irlanda do Norte, “Image Wars”, no Abrons Art Center

1 https://expressodasilhas.cv/topico/bleza https://www.publico.pt/2021/02/24/culturaipsilon/ noticia/voz-bleza-cantar-vai-ouvirse-primeira-disco-1951947

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em Nova Iorque, “The Flag: Instruction Manual #2” no Sazmanab Platform for Contemporary Art, Teerão, e “Da outra margem do Atlântico: alguns exemplos da videoarte e da fotografia portuguesa”, no Centro Cultural Helio Oiticica, no Rio de Janeiro, em 2010. O seu trabalho está incluído nas publicações “The Art of Not Making: The New Artist/Artisan Relationship” assim como “Nature Morte: Contemporary Artists Reinvigorate the Still Life Tradition”, editadas pela Thames & Hudson. Está presente em várias coleções incluindo o MAAT– Fundação EDP, em Lisboa, Saatchi Collection, em Londres, MAR – Museu de Arte do Rio no Rio de Janeiro, MNAC – Museu do Chiado em Lisboa.

recente livro em prosa, Sol de Infância – Memórias das macias manhãs solares. Carlota de Barros participou em várias coletâneas e antologias de poesia e em várias revistas literárias: “Jornal Artiletra”, “Revista Novas Letras”, “Revista da Universidade de Aveiro – Letras”, e “Revista Cultural Licungo”. Colaborou ainda com a revista “Pré-Textos”, dirigida pelo poeta Daniel Spínola. Em 2017, por ocasião do Dia da Mulher Cabo-verdiana (27 de março), a Embaixada de República de Cabo Verde em Portugal prestou “homenagem simbólica a Carlota de Barros, em reconhecimento do papel que desempenha em prol da afirmação da mulher cabo-verdiana e da divulgação da cultura cabo-verdiana”.

CARLOTA DE BARROS Carlota de Barros Fermino Areal Alves nasceu na Ilha do Fogo, Cabo Verde. Viveu em Cabo Verde, Moçambique e Lisboa, onde vive atualmente. É licenciada em Filologia Germânica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Foi professora do Ensino Secundário em Cabo Verde e em Portugal. É membro da Academia Cabo-verdiana de Letras, da Sociedade Portuguesa de Autores, da Sociedade Cabo-verdiana de Autores e do Círculo de Escritores Moçambicanos na Diáspora. Carlota de Barros é uma escritora com vários livros publicados: em poesia, A Ternura da Água, A Minha Alma Corre em Silêncio, Sonho Sonhado, e Sonho Sonhado, versão em português, crioulo e inglês, editado em Cabo Verde, em 2008, Na Pedra do Tempo, em 2017. Em prosa editou o romance Luna, a noite de todos os dias e o livro de contos Os Lírios da Memória, pela Fénix Editora. Em 2020, a Rosa de Porcelana Editora deu à estampa o seu mais

DAVID LEVY LIMA David Levy Lima nasceu em Santo Antão, Cabo Verde, em 1945. Vive e trabalha em S. Pedro do Estoril, Portugal. Foi distinguido em 1997 com o Prémio “Jaime de Figueiredo”, concedido pelo Ministério da Educação e Cultura de Portugal, e com uma Menção Honrosa na Galeria de Arte do Casino Estoril, na Exposição “Paisagem Portuguesa/ Terras e Regiões”. Pintor autodidata, David Levy Lima atribui o seu gosto e talento para as artes plásticas aos genes herdados de seu Pai, ilustrador e aguarelista. Veio para Portugal com uma bolsa para estudar eletrotecnia, mas acabou por enveredar pelas artes quando ficou sem recursos. Pintor impressionista de reconhecido sucesso, David Levy Lima é hoje uma referência na arte contemporânea cabo-verdiana e também no mundo artístico português. Aliando o seu talento à uma técnica apurada e expressividade depurada, David Levy tem já uma obra

importante sobre a realidade e a cultura cabo-verdianas e também sobre o espaço urbano de Portugal. Tem realizado inúmeras exposições individuais e coletivas, em Portugal, Cabo Verde e no estrangeiro. Está representado em diversos museus, coleções particulares e organismos oficiais, tais como: Sede da ONU, Nova Iorque; Ministério da Cultura da República Popular da China, Pequim; Comando Geral da GNR, Galeria de Retratos dos Bastonários da Ordem dos Advogados Portugueses e Museu da Marinha (Lisboa); Câmaras Municipais de Arganil e Santarém; Instituto Nacional de Seguros, Praia, Cabo Verde; ENAPOR, Empresa Nacional dos Portos de Cabo Verde; Presidência da República de Cabo Verde e Palácio do Governo, Praia, Cabo Verde; Yan-Huang Art Museum, Pequim, China; Sede da Portugal Telecom, Lisboa; Sede dos TACV (Transportes Aéreos de Cabo Verde), Praia, Cabo Verde; Sede do Montepio Geral, Lisboa. David Levy Lima é ainda o autor dos retratos de numerosas personalidades, entre elas três Presidentes da República e dois Presidentes da Assembleia Nacional de Cabo Verde, o antigo Presidente chinês, Yang Zemin, e o antigo Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos.

EDUARDO BENTUB Eduardo Bentub nasceu em 1979, na ilha de Santo Antão, em Cabo Verde. Desde a infância demonstrou interesse pela arte e a sua criatividade já se manifestava; no entanto, a paixão pela arte, pela pintura, surgiu enquanto trabalhava no atelier com o seu tio, o pintor cabo-verdiano David Levy Lima. Apresentou o seu trabalho em Portugal, onde residiu vários anos, e realizou várias exposi-


ções. Hoje, trabalha e vive na Eslovénia. As suas obras já foram apresentadas em inúmeras exposições em Portugal, Cabo Verde, Eslovénia, Áustria, Itália e em 50 cidades mediterrânicas e Brasil pertencentes ao projeto Sete Sóis Sete Luas, de Itália. Nas suas obras, apresenta as paisagens cabo-verdianas, os hábitos e a cultura, os seus músicos famosos, como Cesária Évora, Mayra Andrade, e outros artistas, como David Levy Lima. Com as suas pinturas, feitas principalmente em acrílico, incluindo técnicas mistas ou colagem, e utilizando cores expressivas e vivas, acompanhadas de desenhos de figuras e textos que descrevem o quotidiano cabo-verdiano, Eduardo Bentub levou a cultura cabo-verdiana para fora da área da Lusofonia. Entre mais de duas dezenas de exposições individuais e coletivas, recebeu a menção honrosa de Maribor, Capital Europeia da Cultura 2013, e de melhor artista internacional no Simpósio de Arte Contemporânea na Eslovénia, em 2020; participou em mostras individuais com o grupo Sete Sóis Sete Luas, em Itália e Portugal, tendo feito parte das exposições itinerantes Don Quixote e Saramago Mediterrâneo. Em 2021 esteve presente em Macau, no ciclo de exposições “Policromias Lusófonas”, com a Exposição “10 Grãozinhos de Terra, Independentes, no Meio do Atlântico”, no âmbito da 13ª Semana Cultural da China e dos Países Lusófonos.

FIDEL ÉVORA Fidel Évora nasceu na cidade da Praia, Ilha de Santiago, Cabo Verde, em 1984, mas cresceu no Barreiro, em Portugal. Em 2004 completou o curso técnico de imagem e comunicação na ETIC e em 2008 fez um mestrado em Motion

Graphics na BAU Escola Superior de Disseny (Diseño), em Barcelona. Entre 2004 e 2010 trabalhou como designer gráfico em agências de comunicação, mas optou por seguir uma carreira como artista plástico. Évora procura aprofundar o seu gosto pela pesquisa e preservação de artefactos antigos, recuperando memórias importantes para a identidade coletiva e pessoal; dividido entre essas fronteiras, cria composições entre o real e o fictício trilhando o seu próprio caminho, criando diálogos esquecidos propositada ou involuntariamente. Participou no documentário “The Dolls of Lisbon”, de Ethan H. Minsker, em 2011 e, no mesmo ano, integrou pela primeira vez a exposição coletiva “After the Utopia – A view on the Portuguese Freedom Day”, com a obra conceptual “Freedom’s Exhumation”, na Acquire Arts Gallery, Londres, com curadoria de Plasticina; em 2016, participou na coletiva “Glocal Wozen” Lisboa; em 2018, na exposição coletiva “Alter Ego” Macau, integrada na iniciativa Macau – Festival de Artes e Cultura, entre a China e os Países Lusófonos; em 2020, integrou, com uma pianista e um cantor, uma performance ao vivo da “Viagem de Inverno”, de Schubert, primeiro evento do ciclo Boca do Lobo, com curadoria do maestro Martim Sousa Tavares; em 2020, na coletiva “A FOmE”, n’A Gráfica – Centro de Criação Artística, em Setúbal; em 2021, na exposição coletiva “Ephemeral / Ethernal” – NFT group show, promovida por Underdogs, uma plataforma cultural baseada em Lisboa. Fidel Évora integra desde 2008 o coletivo “Antagonist Movement" sediado em Nova Iorque (que incluiu, até à sua morte, Arturo Vega, diretor criativo do grupo Ramones).

FRANCISCO VIDAL Francisco Vidal nasceu em Lisboa, em 1978. É português, angolano e cabo-verdiano e vive entre Luanda, Angola e Lisboa, Portugal. Licenciado em Artes Plásticas pela Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha, fez um curso avançado em Artes Visuais na Escola de Artes Visuais Maumaus, em Lisboa. Viveu durante algum tempo nos Estados Unidos, obtendo o mestrado na Escola de Artes da Universidade de Colúmbia, em Nova Iorque. Começou a expor com regularidade a partir de 2005. Em 2014 apresentou o projeto de pintura “Utopia Luanda Machine” na 56.ª Bienal de Veneza, no Pavilhão de Angola, com a curadoria de António Ole, e na Expo Milão, com a curadoria de Suzana Sousa. Em 2016 apresentou em Luanda e, em 2017, em São Tomé e Príncipe, o projeto “ESCOLA DE PAPEL, Kiekelela”. Em 2018 integrou a exposição “Artes Mirabilis – Coletiva de Artistas Plásticos Angolanos”, na UCCLA, em Lisboa. A prática de Francisco Vidal realça ideias em torno do trabalho e mobilidade internacional. É reconhecido pelas suas grandes instalações de pintura, traçando poderosas linhas caligráficas sobre telas de serigrafia, retratando flores de algodão em cores vivas e variados esquemas cromáticos. Tem obras suas em coleções nacionais, como as da Fundação EDP, Fundação Calouste Gulbenkian, Fundação Cachola, e internacionais. HÉLDER CARDOSO Helder Cardoso, conhecido pelo nome artístico HJC, nasceu em 1990, na ilha de Santiago, Cabo Verde. Desde criança, o fascínio e a aptidão para a arte estiveram sempre presentes. Em 2008 ingressou em Engenharia Civil. Con-

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tudo, no final do curso, decidiu dedicar-se exclusivamente às artes plásticas. Começou por fazer retratos de colegas, recorrendo a lápis de grafite, depois passou a fazer pinturas personalizadas em t-shirts. Em 2017 foi convidado pelo artista Tutu Sousa para participar no projeto “Rua D’Arte”. Teve a oportunidade de trabalhar com artistas como Kiki Lima, Tchalé Figueira e Nela Barbosa. As suas primeiras obras em tela esgotaram num evento anual realizado entre Cabo Verde e a Guiné-Bissau que o lançou como “artista plástico no panorama nacional”. Para além de Cabo Verde, Hélder Cardoso já realizou trabalhos em diversos países, entre os quais Portugal, República Checa e Espanha (Ilhas Canárias). Em 2018 fez a primeira exposição individual no Palácio Ildo Lobo, na cidade da Praia e, em 2019, na Galeria Tutu Sousa no bairro da Terra Branca, também na Praia. Já participou em diversas exposições coletivas realizadas pelo Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde. Hélder Cardoso vai ao encontro da comunidade através da chamada “pintura urbana”, ou Street Art, e, há cerca de dois anos, realiza a Semana “Stª Cruz Art Week”, um projeto que pretende incentivar e “mudar” as mentalidades em relação à arte e conseguir maior projeção em relação à intervenção artística. Através das suas representações de expressões do rosto humano, seja através de olhares, seja através de movimentos, quer provocar sensações que levem as pessoas a identificar-se nas suas pinturas. Atualmente, o artista vive na cidade da Praia, onde inaugurou recentemente o seu estúdio. (https://viventeandante.com/hjc-e-helder-cardoso-conheca-o-artista-plastico-de-cabo-verde/)

JACIRA DA CONCEIÇÃO Jacira de Jesus Lopes Fernandes da Conceição nasceu há 30 anos na localidade de Chão Bom, Ilha de Santiago, Cabo Verde. Viveu uma infância feliz, numa casa simples, sem água canalizada nem luz elétrica. Aprendeu a nadar muito cedo, talvez porque passava muito tempo na praia, perto das ondas e com o olhar sempre focado no azul do mar. Por esse tempo, começou a praticar “capoeira” do Brasil com um grupo do Tarrafal de Santiago ao qual se juntou. Nessa altura, conheceu Pedro da Conceição, realizador de cinema, ceramista, escultor e poeta, com quem viria a casar. Pedro da Conceição foi um dos fundadores do CAO – Centro de Artes e Ofícios de Trás di Munti, no Tarrafal de Santiago, um lugar fundamental na cultura material da Ilha de Santiago e de Cabo Verde. Foi neste lugar e noutros pertencentes à comunidade de Trás di Munti que Jacira da Conceição aprendeu olaria com outras oleiras de Trás di Munti. Com elas aprendeu a amassar o barro, a modelar, todos os trabalhos da olaria tradicional do interior da Ilha de Santiago. Durante uma estadia no estado do Maranhão, no Brasil, viveu numa comunidade Quilombola, formada por descendentes de escravos africanos, e a observação das oleiras da comunidade foi mais uma contribuição para a sua arte. Em 2020, com Pedro da Conceição, Jacira realizou a exposição “Da Saudade do Sal da Terra” no Centro Cultural de Cabo Verde, em Lisboa. Em março de 2021, Jacira inaugurou a sua exposição, “Badia”, no Museu de Arqueologia e Etnografia do distrito de Setúbal, em Portugal. JOSÉ LUÍS HOPFFER ALMADA José Luís Hopffer Almada, poeta, jurista, ensaísta, analista e comentador político, nasceu na

ilha de Santiago, Cabo Verde, em 1960. É licenciado em Direito pela Universidade Karl Marx, de Leipzig, e pós-graduado em Ciências Jurídicas, em Ciências Políticas e Internacionais e em Ciências Jurídico-Urbanísticas pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Foi Diretor da revista Fragmentos, cofundador da Spleen-Edições e dirigente da Associação de Escritores Cabo-verdianos. Foi membro da Comissão Nacional para a Apreciação do Acordo Ortográfico do Rio de Janeiro sobre a Língua Portuguesa (1986), da Comissão Nacional da Língua Cabo-verdiana (1990) e do Grupo para a Padronização do Alfabeto Unificado para a Escrita do Cabo-verdiano (1994). Foi Vice-Presidente da Direção da Associação Cabo-verdeana de Lisboa. Colabora em vários jornais e revistas culturais e jurídicas, está representado em inúmeras antologias poéticas nacionais e estrangeiras. Publicou: À Sombra do Sol, Volume I e Volume II (1990); Assomada Nocturna (1993), Assomada Nocturna (Poema de NZé di Sant’ y Águ) (2005); Praianas (Revisitações do Tempo e da Cidade) (2009), Rememoração do Tempo e da Humidade (2015/2016), Germinações e Outras Restituições de Março (2019). Tem utilizado os seguintes nomes literários: Zé di Sant´y Águ, Nzé di Sant’ y Águ (agora grafado Nzé de Sant´y Ago), Ezeami di Sant´y Águ, Alma Dofer, Alma Dofer Catarino e Erasmo Cabral de Almada (na poesia), Dionísio de Deus y Fonteana (prosa literária em português e em crioulo), e Tuna Furtado (em artigos e ensaios de intervenção cultural). Foi condecorado com a Medalha de Mérito Cultural de Primeira Classe, do Governo de Cabo Verde, e com a Medalha da Ordem do Vulcão, outorgada pelo Presidente da República de Cabo Verde.


JOSÉ LUIZ TAVARES José Luiz Tavares nasceu em 1967, no lugar de Chão Bom, concelho do Tarrafal, ilha de Santiago, Cabo Verde. Estudou literatura e filosofia em Portugal, onde vive. Tem colaboração em jornais e revistas de Cabo Verde, Portugal e Brasil. Pelo seu primeiro livro publicado, Paraíso Apagado por um Trovão, recebeu o Prémio Mário António de Poesia em 2004, atribuído pela Fundação Calouste Gulbenkian à melhor obra de um autor africano de língua portuguesa ou de Timor-Leste, publicada no triénio 2001-2003. Entre 2003 e 2020 publicou catorze livros, espalhados por Portugal, Brasil, Cabo Verde, Moçambique e Colômbia e foi o vencedor de vários prémios em Cabo Verde, Brasil, Portugal e Espanha, mas não aceitou nenhuma comenda ou medalha, até agora. José Luiz Tavares traduziu Camões e Pessoa para a língua cabo-verdiana e a sua obra está traduzido para inúmeras línguas. Nesta Coletiva de Cabo Verde, a voz de José Luiz Tavares ouvir-se-á no espaço da exposição. KIKI LIMA Kiki Lima (Euclides Eustáquio Lima) nasceu em Ponta do Sol, Ilha de Santo Antão, Cabo Verde, em 1953. Licenciado em Design de Comunicação pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, frequentou os cursos de Desenho e Pintura do CEC e o curso de Escultura do Centro de Arte e Comunicação Visual, ambos em Lisboa. Kiki Lima vive e trabalha em Cabo Verde. Pintor, escultor, designer e músico, compositor e intérprete, Kiki Lima iniciou o seu percurso nas artes plásticas em 1969, com mais de 200 exposições individuais e mais de 160 coletivas. O seu trabalho pictórico caracteriza-se pelo uso de cores vibrantes e pincelada gestual para

retratar figuras em movimento e espaços da cultura cabo-verdiana onde a música é elemento central. As suas telas, luminosas, pintam a alegria popular em conversas de rua, mercados, recantos e danças. Kiki Lima assume-se como profissional das artes plásticas, impressionista e expressionista, com variações nas técnicas tradicionais: uma mesa em vez de paleta, de preferência pincéis largos e, frequentemente, cores alegres, laranja e azul cyan. Recebeu diversos prémios e distinções, entre os quais, o 1º Grau da Medalha de Mérito Cultural do Governo de Cabo Verde (2017), a 1ª Classe da Medalha do Vulcão, no 25º Aniversário da Independência de Cabo Verde, pelo Presidente da República de Cabo Verde; o Prémio Selo Morabeza (2015); “Personalidade 2002“ em Artes Plásticas, pelo Núcleo de Estudantes Universitários Africanos em Portugal; “Prémio Prestígio AI-UÉ” – Pintura (1992). Está representado no painel de pintores cabo-verdianos na Assembleia Nacional de Cabo Verde. Entre várias obras relevantes de arte pública destacam-se o frontispício do Pavilhão de Cabo Verde na EXPO’98 e a “Receção de Emigrantes” no Aeroporto Amílcar Cabral, na ilha do Sal. Está representado em diversas coleções nacionais e internacionais, particulares, públicas e institucionais, em Portugal, e noutros países. Tem obras suas nas coleções particulares de vários estadistas, como Mário Soares, Jorge Sampaio, Cavaco Silva; Rei de Espanha; Presidentes da África do Sul, de Timor Leste, da China; Hillary Clinton e Barack Obama dos EUA. Como escultor, produziu várias obras, nomeadamente em bronze, bustos, troféus e medalhas comemorativas.

Em 2019, Kiki Lima comemorou 50 anos de carreira com a exposição “50 anos de musicalidade pictórica”, no Palácio da Cultura Ildo Lobo.

KUNY MENDES Nilson Mendes, que usa o nome artístico Kuny Mendes, cabo-verdiano, natural de Santa Cruz, reside atualmente em Assomada, na Ilha de Santiago. É um ativista pelas boas causas socioculturais e ambientais, particularmente o voluntariado e o desenvolvimento desportivo. Aos dezasseis anos começou a dar os primeiros passos na arte da fotografia. Com 23 anos teve a sua primeira experiência profissional enquanto estagiário no antigo jornal “Horizonte”. Aos 26 anos emigrou para Europa, tendo vivido em Portugal onde, como autodidata, desenvolveu e aperfeiçoou as técnicas da arte fotográfica, através do contacto e do trabalho com fotógrafos de renome, em workshops e formação intensiva em cursos de pequena duração. Em 2009, foi distinguido com o 1º prémio no concurso fotográfico sobre a importância da música na vida, em Leiria, Portugal. Em 2016, em Assomada organizou a sua primeira exposição individual, intitulada “Guentis di Santa Katrina”. Em 2017, na cidade da Praia, realizou a sua segunda exposição, “Juntos pela primeira infância”, enquadrada na Semana do Bebé, em parceria com o grupo Cimpor-Intercement, e a Câmara Municipal da Praia. Em 2018, no Palácio da Cultura Ildo Lobo, na cidade da Praia, inaugurou a 1ª exposição com o tema “Rostús Y Identidadi”, enquadrado no Ciclo Novos Talentos. Esta exposição foi mostrada no Museu da Resistência, no antigo campo de concentração do Tarrafal, no âmbito das Comemorações do Dia da Cultura e das

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Comunidades, em Assomada, em Santa Cruz e, posteriormente, em 2019, em Portugal, na Biblioteca Municipal de Moita - Barreiro, e no Centro Cultural de Cabo Verde, em Lisboa.

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LEÃO LOPES Leão Lopes (Santo Antão, Cabo Verde, 1948), é licenciado em Pintura pela Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa e doutorado pela Universidade de Rennes II, França, com uma tese sobre o escritor cabo-verdiano Baltazar Lopes. É membro fundador do Instituto Universitário de Arte, Tecnologia e Cultura (M_EIA), no Mindelo, onde desempenha as funções de reitor e professor. É consultor do projeto “UNESCO’s Global Report on Culture and Sustainable Urban Development regional survey for Portuguese speaking countries”, coordenado por Walter Rossa e financiado pela UNESCO. Tem desenvolvido ao longo dos anos intensa atividade nos domínios da criação artística – literatura, com várias obras publicadas, artes plásticas, design e cinema –, assim como na docência e investigação aplicada a ações de desenvolvimento de comunidades rurais e urbanas em Cabo Verde. É autor e realizador de inúmeros documentários e da primeira longa-metragem cabo-verdiana, o filme "Ilhéu de Contenda". Foi ainda cofundador e editor da revista “Ponto & Vírgula” (19831987). No domínio cívico e político, fundou a ONG AtelierMar (1979), foi Deputado Nacional eleito pelo MpD, Ministro da Cultura e da Comunicação e Membro do Conselho da Presidência da República de Cabo Verde. FONTE – http://doutoramento.patrimonios.pt/leao-lopes/

LEOMAR Leomar (Leontina Ribeiro), nasceu na ilha do Sal, mas desde criança reside na cidade da Praia, em Cabo Verde. Engenheira civil de profissão e artista plástica autodidata, Leomar convive permanentemente com o mundo da arte a nível nacional e internacional, assim alargando os seus horizontes. Artista de cores explosivas, pinceladas e espatuladas rápidas que lhe conferem um estilo próprio e o realismo resultante de uma conjugação de cores vibrantes, Leomar dá aos seus trabalhos luz, movimento e colorido. A artista inspira-se na Mulher, no Mar e na Música para criar as suas obras, os seus três M’s que, em conjunto, sintetizam o mundo crioulo cuja riqueza só a arte pode alcançar. Destaca-se a sua participação em várias exposições nacionais e internacionais, entre os quais o certame de artes plásticas, Art Basel Miami, um evento de arte a nível mundial, realizado em dezembro de 2017, em South Beach, Miami, Estados Unidos. Mais recentemente, Leomar expôs no Palácio da Cultura Ildo Lobo, e no Palácio da Assembleia Nacional nas comemorações do dia da Liberdade e da Democracia, e no Cabo Verde Investiment Forum, na Ilha do Sal. As suas obras fazem parte de acervos institucionais e particulares, em Cabo Verde, Portugal, Itália, Holanda, EUA, Canárias (Espanha), Angola, Timor-Leste e Dakar (Senegal), entre outros. A artista foi reconhecida como Embaixadora Urbana pela ONU-Habitat pelo seu projeto social “Colorir as Ilhas”, destinado incentivar a criatividade e combater a exclusão social através da educação artística de crianças, jovens e mulheres na área da pintura, em parceria com ONG, Câmaras Municipais, escolas e comunidades. Atualmente, a artista Leomar criou

o projeto “Cores Que Falam”, que consiste em pintar as maiores riquezas de Cabo Verde: Mulher, Mar e Música, em diversos suportes e espaços.

LUÍS LEVY LIMA Luís Levy Lima nasceu em 1986, em Lisboa, cidade onde vive e trabalha. Cresceu numa família de artistas cabo-verdianos, mas formou-se em design de comunicação na Faculdade de Belas-Artes de Lisboa. Desde pequeno que o que mais gostava de fazer era desenhar e “mexer nas tintas”, mas curiosamente não queria ser pintor. Pintava porque se sentia confortável a expressar-se daquela forma e não por pensar que tinha jeito ou futuro na área. Durante anos pintou “às escondidas”, aos fins de semana, e ofereceu os seus trabalhos a amigos e familiares enquanto trabalhava em design e publicidade para marcas e empresas internacionais. Mas sempre soube que a pintura era a sua paixão. Está representado no Museu do Oriente, na Embaixada da República de Cabo Verde em Lisboa, no Clube Robinson Cabo Verde, na Ilha do Sal, no Hotel Pestana Trópico na Praia e no Centro Cultural de Cabo Verde em Portugal. Já expôs em várias galerias e instituições em Portugal e no estrangeiro. Retratou também diversas figuras famosas e tem obras em coleções privadas como as Madonna e Luís Represas. O pintor quer transmitir a emoção, seja no olhar de uma criança, na paixão de um músico quando toca ou no amor com que um animal protege a sua cria. “A sensibilidade é rainha. Sentir é tudo. A arte pode ser tudo menos indiferente.” A sua temática é variada e vai do mundo animal ao universo das crianças, da música à tradição oral e


da cultura humana à banda desenhada. As suas obras surgem em cores fortes e vibrantes, pinceladas rasgadas, sobreposições de camadas e transparências. Para além das exposições desenvolve atividades artísticas com fins solidários e sobretudo com crianças, às quais, acredita, deveríamos dedicar mais tempo e atenção, pois elas são o futuro.

MANUEL FIGUEIRA Manuel Figueira é natural da ilha de São Vicente, Cabo Verde, e viveu em Portugal entre 1960 e 1974, onde frequentou o Curso Complementar de Pintura da Escola Superior de Belas Artes de Lisboa. Regressou a Cabo Verde em 1975 para colaborar na revitalização da cultura popular. Com algumas colegas professoras, em 1976 fundou a Cooperativa Resistência com o objetivo de manter viva a arte de tecelagem tradicional cabo-verdiana. De janeiro de 1978 a março de 1989 foi Diretor do Centro Nacional de Artesanato, onde orientou artisticamente o projeto e concebeu e executou obras suas recorrendo às técnicas de tecelagem tradicional, tapeçaria e tingidura. Foi agraciado com importantes distinções: Prémio Jaime Figueiredo (do Ministério da Cultura e Desportos de Cabo Verde), em 1988, e com a Medalha do Vulcão, em 2000, por ocasião dos 25 Anos da Independência, pelo seu contributo e pela sua importância nas Artes Plásticas e na cultura de Cabo Verde. Manuel Figueira está representado em diferentes coleções, nomeadamente no Museu de Ovar, Banco de Fomento, Coleção de Serralves, Culturgest (Portugal); na ONU, em Nova Iorque; no Banco Totta e Açores, em São Vicente; no Palácio da Cultura e na Fundação

Pró-Justitae, na cidade da Praia, e em diversas coleções particulares. Em 2005, a Galeria Perve, sediada em Lisboa, apresentou a primeira retrospetiva de Manuel Figueira realizada em Portugal. Nesta exposição, “Visões do Infinito”, foram apresentadas 126 obras do período compreendido entre 1963 (anterior à sua viagem para Portugal) e obras datadas de 2004.

MARCELINO SANTOS Marcelino Andrade dos Santos, nasceu em 1957, na ilha de Santo Antão, em Cabo Verde. É Mestre Artesão em Tecelagem e Tapeçaria. Em 1977, ano em que ingressou na Cooperativa Resistência, no Mindelo, onde se iniciou como aprendiz, teve o seu primeiro contacto com as práticas artesanais ligadas ao têxtil, e aí adquiriu experiência em todo o processo, desde a fiação, passando pela cardagem, até ao desenvolvimento de tapeçaria e do Tradicional Pano de Terra. No Centro Nacional de Artesanato lecionou diversas formações promovidas e/ou financiadas por entidades públicas a nível nacional. De entre as várias atividades educativas promovidas em Cabo Verde, vale a pena referir uma das mais recentes, em 2020, intitulada Oficina do Ciclo do Algodão, Cardar e Fiar, da responsabilidade do projeto Neve Insular, que teve Marcelino dos Santos como formador. Durante nove dias, os 8 formandos aprenderam com o Mestre Artesão todo o processo de produção e transformação da fibra do algodão. O objetivo deste projeto é dar nova vida à produção de algodão em Cabo Verde, que praticamente se extinguiu, sendo que a planta se desenvolve com muita facilidade neste país, particularmente na ilha de Santiago.

O percurso de Marcelino dos Santos, que até hoje mantém a sua atividade como Mestre Artesão e desenvolve o seu trabalho nesta categoria específica, conta com participações em feiras e fóruns nacionais e internacionais.

MARIA ALICE FERNANDES Maria Alice Fernandes, autodidata, pintora naïf, é natural da Ilha de Santiago, Cabo Verde, onde nasceu em 1939, e aí iniciou a sua carreira artística, em 1975, elegendo a temática “vida da mulher rural cabo-verdiana”, como base dos seus traços. Reside em Portugal desde 1977. Participou em inúmeras exposições individuais e coletivas, nomeadamente nos salões anuais, nacionais e internacionais de pintura naïf no Casino de Estoril. Tem obras em museus, como o de Jaen (Espanha) e Guimarães (Portugal). Ilustrou o livro bilingue (português / italiano), intitulado Recordai, de Maria de Lourdes Jesus, jornalista cabo-verdiana da RAI (RádioTelevisão Italiana), o conto cabo-verdiano no audiolivro Contos Tradicionais da CPLP, em 2015, e um outro de que é a autora, Tchapa-tchapa, Retalhos de uma cultura, editado pela Câmara Municipal de Oeiras. Defensora da cultura cabo-verdiana, partilhou-a durante anos com crianças e adolescentes de origem cabo-verdiana e não só em Paço de Arcos, Portugal. Foi agraciada com a Medalha de 1ª classe do Vulcão, em julho de 2008, pelo Presidente da República de Cabo Verde, Comandante Pedro Pires, em reconhecimento ao seu trabalho em prol da promoção da Cultura cabo-verdiana na diáspora. Para além da pintura, Maria Alice Fernandes, recicla diversos materiais (tecido, cerâmica, sisal, entre outros), convertendo-os em peças de artesanato, tendo sido distinguida com uma

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menção honrosa pela Sociedade de Artesãos de Lisboa. Tem trabalhos (presépios em cerâmica) na coleção privada da ex-Primeira Dama portuguesa, Dra. Maria Cavaco Silva. Participou na exposição “Mudjer di terra”, no Centro Cultural de Cabo Verde em Lisboa, a propósito do Dia da Mulher Cabo-verdiana, em 2020. Maria Alice Fernandes vive há 44 anos em Paço de Arcos, Oeiras, terra que adotou e a adotou, uma ligação visível em algumas das suas obras.

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MIGUEL LEVY Miguel Levy nasceu na Ilha de Santo Antão, Cabo Verde, em 1957. Mudou-se com a sua família para Lisboa, Portugal, quando era criança, e ainda hoje reside em Lisboa. A família de Miguel Levy conta com vários artistas muito talentosos, e não surpreende que, ainda muito jovem, Miguel exibisse a sua vocação para o desenho e a pintura. A intensidade manifesta do talento, do impulso, da energia e da inspiração para o desenho e para a pintura levaram naturalmente Miguel Levy a tornar-se um artista profissional. Hoje é um conhecido artista autodidata, com trabalhos em acrílico, técnicas mistas e aguarelas. A expressão artística de Miguel Levy tem passado por diferentes fases. Mais recentemente, explorou o acrílico sobre tela com colagens e cartão. O seu estilo pode ser considerado uma fusão de abstracionismo, impressionismo e expressionismo. O artista já realizou inúmeras exposições individuais e participou em mais de 40 exposições coletivas, em Cabo Verde, Portugal e outros países europeus, e na China. Fez várias residências em Cabo Verde (2012, 2016 e 2017) e, em 2019, integrou com o projeto Playground a iniciativa Cidadela Art District, Cascais,

em Portugal. A sua obra está representada em diversas coleções privadas e institucionais.

MITO ELIAS Mito Elias (Fernando Hamilton Barbosa Elias) nasceu na cidade da Praia, em Santiago, Cabo Verde, em 1965. Estudou na AR.CO. em Lisboa entre 1989 e 1992. Vive e trabalha na diáspora desde 1989. É um poeta e artista plástico e tem desenvolvido uma linguagem plástica original que consiste na pesquisa da oralidade e do fabulário crioulo, num estilo simbiótico entre aguada, escrita e multimédia que apelidou de Mare Calamus. Expõe regularmente, desde 1983, o seu trabalho desenhado, pintado, escrito ou videografado, e tem viajado por diversos cantos do globo, como Angola, Brasil, Cabo Verde, Canárias, China, EUA, Espanha, França, Holanda, Itália e Portugal. Está representado em várias coleções espalhadas pelo mundo, das quais se destacam: Banco Mundial, EUA; BNU, Macau; Museu Afro Brasil, São Paulo, Brasil; Embaixada de Cabo Verde, Lisboa, e Ethnic Communities Council of Victoria, Austrália. Mito Elias vive em Melbourne, na Austrália, desde 2013, onde trabalha como artista independente e tutor de artes visuais, dirigindo workshops de arte através do seu Fandata Studio, um conceito “low cost art workshop”. Mito Elias foi distinguido com a Medalha do Vulcão, 1.ª classe, atribuída pela Presidência da República de Cabo Verde.

sor, ilustrador, designer gráfico, Garcia é apaixonado pelas artes plásticas e define-se como artista intervencionista. A sua arte, de traço nitidamente contemporâneo, está intimamente e de forma constante ligada à realidade social através da frequente participação solidária. Oleandro Pires Garcia participou em exposições conjuntas, como “Cabo Verde Contemporâneo” – 2016; “Um corpo dos kurson” – 2017; “Exposição Coletiva na Cimeira da CPLP” e no “Projeto de Arte urbana” em Achada Grande Frente, na cidade da Praia, em Cabo Verde. Em 2018, inaugurou a exposição de pintura “Utopia in Versus”, com 40 quadros, enquadrada na rubrica “Talentos Consagrados”, no Palácio da Cultura Ildo Lobo, na cidade da Praia. Nesta mostra, de 40 quadros, o pintor aborda temas como o das crianças-soldados, retrata músicos, como o americano Charlie Parker, e poetas e escritores, como o cabo-verdiano Eugénio Tavares. Em 2019 foi convidado, com outros artistas, a participar na exposição coletiva temporária “Estórias Dentro de Casa”, incluída nos eventos que assinalaram a inauguração do Centro Cultural de Cabo Verde, em Lisboa. Em 2021, participou na Exposição Coletiva de Arte na Lusofonia, promovida pela CPLP para comemorar o dia 5 de Maio, Dia Mundial da Língua Portuguesa e da Cultura. FONTE:http://www.trasdemar.com/home/actualidad/oleandro-pires-garcia

(Texto retirado de https://miguelevy.com/)

OLEANDRO PIRES GARCIA Oleandro Pires Garcia nasceu na cidade da Praia, Ilha de Santiago, Cabo Verde, em 1982. Profes-

OVÍDIO MARTINS Ovídio Martins nasceu em 1928 no Mindelo (Ilha de São Vicente). Depois de acabar o liceu, seguiu para Lisboa, em 1947, e matriculou-se


na Faculdade de Direito. Por razões de saúde principalmente (perda quase completa da audição), não chegou terminar o curso. No entanto, desenvolve uma importante atividade cultural e política, e a sua militância antifascista valeu-lhe ser duramente perseguido e preso. Refugiou-se em Amesterdão, e só regressou a Cabo Verde depois da independência. A sua participação na vida cultural e política cabo-verdiana começou cedo. Foi um dos fundadores do “Suplemento Cultural” (1958), grupo que pretendia romper com os arquétipos europeus e orientar a atividade criadora dos escritores para os temas de raiz cabo-verdiana, num tom mais veemente e mais contestatário. Em 1962 são publicadas duas obras de Ovídio Martins: Caminhada (poemas), em Lisboa e Tchutchinha (contos), em Angola. Por esses anos, publica dois poemas fundamentais, “Os Flagelados do Vento Leste” e "Anti-Evasão” (Não vou para Pasárgada), mais tarde incluídos no livro Gritarei, berrarei, matarei, não vou para Pasárgada, editado em Roterdão, em 1973. A partir de 1977, Ovídio Martins colabora na revista “Raízes”, publicada na capital cabo-verdiana, dirigida por Arnaldo França, em que participam também poetas e romancistas de prestígio, como António Aurélio Gonçalves, Baltasar Lopes, Corsino Fortes e Arménio Vieira. O poeta também colaborou nas publicações: “Claridade”, “Cabo Verde”, “Vértice”, Suplemento literário do “Jornal de Notícias”, “Notícias do Imbondeiro” e “Le Journal des Poètes” (Bélgica).

REGINA CORREIA Maria Regina Fernandes Correia nasceu em 1951, em Viseu, viveu em Angola desde os oito meses e tem nacionalidade angolana e por-

tuguesa. Concluiu a Licenciatura em Filologia Germânica, pela Faculdade de Letras de Lisboa. Foi professora do ensino secundário em Angola e em Portugal e docente de Língua e Cultura Portuguesas em Estugarda e em Hamburgo, onde desenvolveu projetos na área da literatura e da cultura em língua portuguesa. Tem coordenado e participado em eventos poéticos e culturais, sobretudo junto de instituições cabo-verdianas. Autora de prefácios e recensões públicas de livros, integra antologias poéticas e de ficção, em Portugal e no Brasil. Venceu os prémios Clarice Lispector Melhor Poeta do Ano de 2018 e Melhor Livro de Poesia 2021, com o livro Conjugação de Mapas, pela Editora ZL Books (Rio de Janeiro) onde publicou as micronarrativas Sírio (2014) e Conga (2015). É autora de três livros publicados pela Universitária Editora: Uma Borboleta na Cidade (2000); Noite Andarilha (1999); Os Enteados de Deus (1990) (Prémio Revelação de Ficção da Cidade do Montijo/APE). Publicou ainda os livros de poesia Sou Mercúrio, Já Fui Água, com reedição de Noite Andarilha – Alphabetum Editora (2012) e Conjugação de Mapas – Editorial Novembro (2020). É membro da Associação Portuguesa de Escritores (APE).

RICARDO PIEDADE Ricardo Piedade, também conhecido como Black Dwelle, nasceu em 1993, no Barreiro, em Portugal, filho de pais cabo-verdianos, possuindo dupla nacionalidade, portuguesa e cabo-verdiana. As suas opções no mundo das artes são a escultura, a pintura e o desenho. Começou desde muito pequeno a fazer desenhos nos cadernos de escola, e ficava a ver o trabalho do seu irmão mais velho, Paulo Piedade, também ele artista e ilustrador, tentando seguir-lhe as pisadas, em particular na

chamada “arte urbana”, utilizando como telas as paredes do Vale da Amoreira, a “cidade invisível”2. Com o tempo, o seu interesse fixou-se principalmente em temas africanos, com especial destaque para as máscaras, que considera simbolizarem uma ocultação da real identidade de cada pessoa. Com formação profissional em design gráfico, Ricardo Piedade tem explorado esta área principalmente na pintura, no desenho e nas formas esculturais em madeira. A um tempo figurativa e abstrata, a sua linguagem visual revela o seu gosto pela exploração de cores e formas, padrões e elementos. Imbuídas de uma relevante, mas subtil, carga simbólica, as suas obras colhem inspiração em referentes de culturas tradicionais e indígenas, de civilizações antigas, da arquitetura vernacular ou das artes e culturas de África, onde tem as suas raízes.

SUE VICENTE Suely Vicente, mais conhecida como Sue Vicente, nasceu na cidade de Assomada, Santa Catarina, na Ilha de Santiago, em Cabo Verde. Artista plástica, tem feito vários trabalhos relacionados com o mundo das artes, nomeadamente nas áreas de pintura, design e arquitetura de interiores, escultura e instalações de iluminação artística. A sua primeira exposição, “Nha corpo, Nha estribilim”, inaugurou em agosto de 2020, numa parceria com a Wink Kriola, organização sem fins lucrativos que promove os direitos humanos, a igualdade de género e a formação de

2 https://www.rtp.pt/play/p6377/e550503/cidade-invisivel

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jovens, e presta auxílio às mulheres cabo-verdianas nos seus problemas do dia a dia. Em “Nha corpo, Nha estribilim”, o corpo feminino ganha novas perspetivas que transcendem a sua forma e maneira de estar e sublinham a conexão mind, body & soul. A “Alma Kriol [A | O]”, segunda exposição de Sue Vicente, foi inaugurada em março de 2021 no Palácio Cultural Ildo Lobo, na cidade da Praia. Esta mostra, que tem como principal inspiração a Natureza e o processo de transformação, apresenta retratos “vistos de um ângulo espiritual dos traços cabo-verdianos”. “Melanina Quântica”, tema da terceira exposição, patente na Biblioteca Nacional de Cabo Verde, uma fusão entre a melanina e a energia da natureza. Esta exposição acontece a propósito do lançamento do livro Melanina Quântica, de Vanilce Veiga, ilustrado por Sue Vicente. Sue Vicente é a fundadora do projeto “Post Card”, postais pintados que podem ser enviados a todos e para qualquer parte do mundo, cujo principal objetivo é aproximar a arte à pessoas e aos seus momentos importantes.

TCHALÉ FIGUEIRA Tchalé Figueira, como é conhecido Carlos Alberto Figueira, nasceu em 1953, na cidade de Mindelo, São Vicente, Cabo Verde. Viveu e trabalhou em Basileia, na Suíça, de 1974 a 1985, e estudou artes na Kunstgewerbeshulle (Escola de Design) de Basileia. Regressou a Cabo Verde em 1985 e reside entre a cidade da Praia, onde possui um atelier, e a cidade de Mindelo, onde abriu em dezembro de 2014 a galeria “Ponta D’Praia”. Tchalé Figueira é um artista plástico com obra exibida em Portugal, França, Suíça, Espanha, Cabo Verde, Angola, Moçambique, Brasil, Itá-

lia, Senegal, Cuba, Holanda, Alemanha, Áustria e Estados Unidos. Possui uma vasta obra pictórica, reconhecida em muitos destes países, fruto das diversas exposições concretizadas ao longo do seu percurso artístico. Tchalé é um homem de muitos talentos, pois além de pintor, é poeta e romancista, com uma considerável obra literária em poesia e prosa, de que se destacam: Todos os Naufrágios do Mundo (1992); O Azul e a Luz (2002); Solitário (2005); Ptolomeu e sua Viagem de Circum-Navegação (2005); Contos de Basileia (2011); A Viagem (2013); A Índia que todos procuramos (2014); Solitude Blues, Uma pequena Odisseia Mindelense e Moro nesta ilha há mais de cinquenta anos e Outros contos (2016); Curtos 7 Contos (2017), e Txon Vendido (2021). Em 2008, Tchalé Figueira foi premiado pela Prix Fondation Blanchère na Bienal de Dakar, no Senegal. Em 2019 inaugurou na cidade da Praia a exposição de pintura “O Silêncio Musical das Cores”, inspirado na Suite para Piano “Quadros de uma Exposição”, do compositor russo Modest Mussorgsky.

TUTU SOUSA Tutu Sousa nasceu em Cabo Verde, e vive na cidade da Praia. O pintor explica: “[…] nasci para ser artista. Praticamente desde criança desenho, pinto e hoje estou nessa área com sonhos por realizar.” As suas obras exprimem valores, sentimentos e características do povo cabo-verdiano, um povo crioulo, rico de influências culturais africanas e europeias, sempre com o mar à volta, onde a música tem um lugar de eleição. A sua arte insere-se no surrealismo, embora críticos o classifiquem como “tutuísta”.

Já realizou várias exposições individuais e coletivas em Cabo Verde e em alguns países da Europa, Estados Unidos e China, e dezenas de pinturas de murais decorativos, como nos Aeroportos Nelson Mandela, na Cidade da Praia, e Amílcar Cabral, na ilha do Sal. Em 2015 recebeu do município da Praia uma medalha de reconhecimento pelo seu trabalho de embelezamento da capital com as suas pinturas de Street Art, e foi nomeado Artista do Ano na Gala Marca de Confiança dos Cabo-verdianos. Em 2018, venceu o prémio Homem do Ano, na IV edição do Somos Cabo Verde. Em 2016, ao comemorar 25 anos de carreira, deu início a um projeto pessoal, “Rua d’Arte”, uma galeria a céu aberto no bairro de Terra Branca, cidade da Praia, com o objetivo de promover a arte, a cultura e a união entre artistas. No início de 2019, Tutu inaugurou uma exposição individual, “Solfejo”, na sua galeria de arte. Cada quadro representa um estilo musical de Cabo Verde, como a morna, a serenata, a tabanca. Ainda em 2019, Tutu Sousa apresentou a exposição “Meus ACORdes”, em Itália, no âmbito do Festival Sete Sóis Sete Luas, realizando diversas oficinas com estudantes italianos e franceses de escolas de arte locais. No mesmo ano, Tutu Sousa representou Cabo Verde no Festival Street Art Viseu em Portugal. FONTES: https://www.governo.cv/cabo-verde-representado-no-festival-de-arte-urbana-em-portugal-pelo-artista-plastico-tutu-sousa/ https://expressodasilhas.cv/cultura/2019/02/09/ tutu-sousa-nasci-para-ser-artista/62259 /www.festival7sois.eu/news/a-arte-de-tutu-sousa-seduz-o-povo-italiano


YURAN HENRIQUE Yuran Henrique nasceu na Ilha de São Vicente, Cabo Verde, em 1993. Desde muito cedo mostrou o seu interesse pela pintura, ilustração e artes urbanas, interesse que se estendeu mais tarde à dramaturgia. Na cidade de Mindelo frequentou os ambientes de convívio cultural, e o bairro de Bela Vista, de onde a sua família procede, sendo influenciado pelas demonstrações artísticas e quotidianas de um bairro característico da cidade. Em 2014 mudou-se para a cidade da Praia, na Ilha de Santiago, onde começou ativamente o seu percurso. Em 2016 fez parte do coletivo de artistas plásticos que participaram na mostra de “Artes visuais – Cabo Verde Contemporâneo 2016”. Nesse mesmo ano realizou a sua primeira exposição individual, “Artérias do tempo”, com a Câmara Municipal da Praia. Em julho de 2017 inaugurou a exposição “Reversos”, no Palácio da Cultura Ildo Lobo e, no mesmo ano, participou na reconhecida Bienal de Cerveira, em Portugal, para Jovens Criadores da CPLP. Em 2017 realizou uma nova amostra de pintura intitulada “Mitográfias” durante o festival de teatro Mindelact. Posteriormente foi convidado pela Embaixada de Espanha para uma residência artística no Centro Atlántico de Arte Moderno (CAAM), do Cabildo de Gran Canaria (Espanha), de que resultam 11 novas telas, reunidas na exibição “Calendarios”, expostas no mesmo museu em 2018. Em 2019 inaugurou a exposição “Dentu Sol”, no Palácio da Cultura Ildo Lobo, e, em 2020, uma nova exposição, “Ácido & Fluido”, no mesmo local. Desde 2015, colabora semanalmente como cartoonista no jornal “Expresso das Ilhas”, mostrando a sua faceta crítica e o seu humor mordaz.

O jovem artista apresenta a sua realidade numa perspetiva expressionista e contemporânea, afastando-se do realismo e descrevendo a identidade africana e cabo-verdiana num questionamento identitário e estético do universo em que está imerso.




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