Quando eu era editor da revista The Catholic Answer, nesta época do ano, com a aproximação do Halloween, sempre recebíamos a mesma pergunta dos leitores: e os fantasmas? Eles têm lugar na fé católica?

Alguns podem zombar da ideia como fantasiosa ou supersticiosa. Mas a crença em fantasmas parece ser universal nas culturas humanas desde o início da história e é baseada, ao menos em parte, em inúmeros relatos de encontros reais com eles. Devido ao significado especial que “fenômenos fantasmagóricos” genuínos têm para a teologia, os católicos não deveriam ignorar tão facilmente a possibilidade.

Os fantasmas existem?

Nossa primeira tarefa é abordar a questão fundamental aqui: os fantasmas existem de fato? Para responder a essa pergunta, devemos definir “fantasma”.

De acordo com o dicionário Webster’s, a palavra significa “a alma de uma pessoa morta, um espírito desencarnado” [1]. Parece que isso se encaixa melhor no uso popular do termo, então vamos aceitá-lo como uma definição de trabalho. Por conseguinte, devemos ter em mente que, na presente discussão, “fantasma” não se refere a um anjo ou demônio, a um “poltergeist” ou mesmo a um extraterrestre. “Fantasma” é a parte de um ser humano que não é corporal (física) e foi separada do corpo pela morte.

Com essa definição, os católicos devem afirmar prontamente que os fantasmas de fato existem. Afinal, é uma parte fundamental da crença católica que o ser humano é um composto de alma e corpo; que, na morte, a alma se separa do corpo; e que, após a morte, embora o corpo de regra se corrompa, a alma sobrevive, aguardando o Juízo Final, quando o corpo, finalmente ressuscitado, se unirá a ela.

Da perspectiva católica, portanto, não apenas as almas do inferno e do purgatório, mas também as dos santos do céu podem ser chamadas de “fantasmas” (com exceção de Nossa Senhora, que não é um espírito desencarnado, porque seu corpo foi assunto ao céu). A questão para os católicos, então, não é se os fantasmas realmente existem. Eles existem. A questão mais premente é se as almas humanas separadas, no tempo presente antes do Juízo Final, são capazes de se manifestar aos que ainda estão vivos na Terra.

Evidência das Escrituras

Os mortos podem aparecer para os vivos? As Escrituras mostram que sim. O exemplo bíblico mais claro da aparição de um “fantasma” é o relato evangélico da Transfiguração de Nosso Senhor na montanha, quando Moisés (morto séculos antes) apareceu a conversar com Jesus a três de seus Apóstolos (cf. Mt 17, 1ss). Não incluímos Elias nesta passagem como um “fantasma”, porque as Escrituras parecem indicar que ele não morreu, mas que foi levado da Terra (cf. 2Rs 2, 11s).

“A sombra de Samuel invocada por Saul”, de Salvator Rosa.

No Antigo Testamento, um exemplo em debate de uma visita fantasmagórica é o do falecido profeta Samuel, que apareceu ao rei Saul (cf. 1Sm 28, 3-20). Alguns autores pensam que a aparição era, na verdade, uma falsificação diabólica, uma vez que ocorreu por ordem de um necromante (o que hoje seria chamado de médium), prática proibida por Deus. No entanto, já que o próprio texto das Escrituras se refere repetidamente ao “fantasma” como Samuel, S. Agostinho e outros intérpretes competentes insistem em que se tratava, realmente, de um “fantasma”, e não de um demônio.

Se considerarmos também visitas de fantasmas em sonhos ou visões, podemos citar a história bíblica de Judas Macabeu. Ele teve uma visão de Onias, um sumo sacerdote falecido, orando pelos judeus. (Este é, a propósito, também um exemplo bíblico da intercessão dos santos pelos vivos). A Onias seguiu-se o falecido profeta Jeremias, que falou com Judas e lhe deu uma espada de ouro (cf. 2Mc 15, 11-16).

Evidência da Tradição

Além dos exemplos nas Escrituras, há numerosos relatos de aparições de fantasmas que chegaram até nós pela Tradição católica desde os tempos bíblicos. O Papa S. Gregório Magno, do séc. VI, por exemplo, contou vários exemplos em seus famosos Diálogos. Para Gregório, assim como para S. Agostinho e outros Doutores da Igreja, as aparições de fantasmas certamente têm seu lugar em uma visão católica de mundo

Segundo esses relatos, às vezes a figura aparecida era um santo conhecido. Outras vezes, a aparição era de um santo, homem ou mulher, recentemente falecido que veio ajudar os vivos. Em outros relatos, uma alma perturbada, presumivelmente no purgatório, veio pedir ajuda aos que ainda estavam na Terra.

Sem dúvida, muitas dessas histórias podem ser vistas como “lendas” ou “superstições” piedosas, brincadeiras ou alucinações. Mas algumas delas são difíceis de descartar. Os relatos mais convincentes chegaram até nós através de várias testemunhas de bom juízo e caráter impecável, e geralmente datam de tempos bastante recentes. São relatos de primeira mão, sem possibilidade de acréscimos lendários. Entre essas, estariam algumas das aparições post mortem bem conhecidas de S. Pio de Pietrelcina (1887-1968).

Uma história bem conhecida vem de S. João Bosco (1815-1888). Como seminarista, recordou S. João que, certa vez, havia concordado com um colega chamado Comollo que, se algum deles morresse primeiro, daria ao outro alguma indicação sobre o estado de sua própria alma. Comollo morreu em 2 de abril de 1839 e, na noite seguinte ao funeral, veio a “indicação”.

Junto com outros vinte estudantes de teologia reunidos na mesma sala, João de repente ouviu um rugido poderoso e contínuo que sacudiu o prédio. Então, eles viram a porta se abrir violentamente por vontade própria. Uma luz fraca apareceu e se ouviu com clareza uma voz, dizendo: “Bosco, Bosco, eu estou salvo…”. 

“Por muito tempo”, concluiu São João, recordando o sucedido, “não se falou de outra coisa no seminário”.

Por que eles aparecem?

No final do séc. XIX e início do séc. XX, vários estudiosos católicos respeitados coletaram diversos relatos confiáveis de “fenômenos fantasmagóricos”, colhidos de testemunhas oculares contemporâneas, documentos oficiais da polícia e médicos.

Eles tentaram explicar esses relatos, juntamente com relatos de outros “fenômenos ocultos”, dentro de uma estrutura da teologia católica tradicional (geralmente tomista) e das descobertas da psicologia e parapsicologia modernas. Talvez os mais conhecidos desses pesquisadores teólogos tenham sido os padres jesuítas Herbert Thurston e F. X. Schouppe, além do abade trapista Alois Wiesinger [2].

Um padrão já observado se repete em muitos dos relatos reunidos por estudiosos: quando os falecidos aparecem, eles geralmente vêm para ajudar ou pedir ajuda aos vivos. Eles podem pedir, por exemplo, que orações e Missas lhes sejam oferecidas ou que certos papéis de natureza confidencial sejam destruídos. Às vezes, um parente falecido de uma pessoa necessitada dos sacramentos vem informar um padre da situação e mostrar-lhe onde encontrar o necessitado.

Histórias como essas sugerem uma resposta aos desafios comumente levantados pelos cristãos mais céticos quanto à possibilidade de “visitas fantasmagóricas” se encaixarem em uma perspectiva de fé. Como — costumam perguntar — os mortos conseguiriam o poder de visitar os vivos? S. Agostinho respondeu simplesmente: “Por uma disposição secreta de Deus”. Isso acontece com a permissão divina e graças ao poder divino.

E por que Deus permitiria a visita de “fantasmas”? Ao que tudo indica, para realizar alguma missão espiritual.

É por isso que, se você topar com algum tipo de “aparição”, a melhor coisa a fazer é orar pela alma e pedir que se rezem Missas pelo descanso eterno dela.

Um aviso final

Por fim, devemos enfatizar que a Igreja sempre proibiu qualquer tentativa de estabelecer comunicação com os mortos por meios “mediúnicos”, sessões espíritas ou tabuleiros de Ouija. A razão é clara: tais tentativas de “evocação dos mortos […] escondem uma vontade de poder […], ao mesmo tempo que um desejo de ganhar para si os poderes ocultos” (Catecismo da Igreja Católica, §2116).

Os perigos são abundantes: os demônios podem se apresentar como espíritos dos mortos e tirar proveito dessas práticas ocultas para manipular e oprimir as pessoas. Por isso, devemos tratar com muita cautela e discernimento quaisquer encontros que possamos ter com fenômenos inexplicáveis ou relatos ouvidos de outras pessoas. Aparições fantasmagóricas genuínas, não procuradas pelos vivos e permitidas pela graça de Deus, parecem ser extremamente raras.

Esse deveria ser um pensamento reconfortante da próxima vez que você estiver sozinho no escuro…

Notas

  1. Não se confunda um “espírito desencarnado”, em sentido católico, com a “desencarnação espírita”, noção estranha ao pensamento cristão e baseada numa concepção quase-material (“fluídica”, como diziam os espíritas franceses do séc. XIX) de alma e na tese de que a união entre ela e o corpo é extrínseca e acidental, além de ser mediada por um suposto “perispírito”. Embora fosse bom evitar a expressão, muito associada no Brasil ao espiritismo kardecista, um católico pode sem escrúpulos falar de “espírito desencarnado” no sentido de “alma separada” (de seu correspondente corpo).
  2. Do Pe. François Xavier Schouppe, a propósito, já publicamos aqui numerosos textos, extraídos todos de seu excelente livro Purgatory: Explained by the Lives and Legends of the Saints, Londres: Burns & Oates, 1893.

O que achou desse conteúdo?

0
0
Mais recentes
Mais antigos