Publicação de Toninho Lima

O EU E O ESTERIÓTIPO DO EU. Eu estava trabalhando quando recebi uma mensagem no whatsapp. Era a minha querida amiga Nádia Rebouças, que está vivendo um momento merecido e especial como uma das protagonistas da série Betinho, No Fio da Navalha, na Globoplay. Era para me avisar que no episódio daquela noite seria mostrado um comercial que fiz para a Ação da Cidadania. “Vai ser mostrado na íntegra”, ela me escreveu. Por conta dessa informação, fui me sentar ao lado da Drika, minha mulher, para assistir àquele episódio, interessado em rever o filme que criei há mais de 30 anos. Levei um baita susto quando a Drika soltou um grito: “É você! Toninho Lima! É você!” Olhei para a tela embasbacado. Precisamos voltar alguns frames para rever a cena. O sujeito de blazer branco, óculos e brinco na orelha que era recebido pela Andrea Horta, a atriz que interpreta a Nádia, com uma fala mais ou menos assim: “Toninho Lima, quem diria!” Aquele publicitário, absolutamente estereotipado na tela, era eu. Em seguida, como a Nádia tinha me assegurado, passava o filme “Cebolas” realmente do começo ao fim. Rever o meu filme me devolveu um pouco a emoção e o envolvimento com a trama. Lembro bem de como foi impactante assistir ao noticiário que falava sobre o lixão nos arredores de um hospital em Recife, onde famílias catavam objetos que lhes tivessem serventia e até restos de alimentos. E de como aquilo me inspirou a criar um filme e oferecer à Nádia para que ela usasse numa campanha, se quisesse. Ela não só aceitou o filme como o Betinho, segundo ela me contou e a série da Globoplay confirma, ficou encantado com a ideia. Mas o que me deixou bem incomodado ao assistir ao episódio foi o perfil do publicitário mostrado. Deveria ser eu, mas aquele ar de prepotência e aquele blazer engomadinho me deixaram com a sensação de que nossa categoria ficou para sempre estigmatizada. Somos uns almofadinhas arrogantes, representantes legítimos do capitalismo voraz. Somos? Fomos? Eu fiquei muito chocado e não resisti ao impulso de mandar uma mensagem à minha amiga. Ela explicou que, no livro, não era assim que as coisas ocorriam. Mas, sabe como é, né? Roteiristas da Globo sempre colocam uns detalhes e criam livremente em cima dos personagens. De qualquer modo, sinto-me extremamente honrado em ter vivido aqueles episódios, de ser retratado na série que conta a saga desse grande brasileiro que foi o Betinho e com muito destaque para a minha amiga iluminada, com todo merecimento. Fica apenas o meu registro de que o verdadeiro Toninho Lima andava de calças jeans e camisetas, com o um verdadeiro publicitário dos anos 1990. Peço desculpas ao ator que me interpretou por ficar reclamando de como fui retratado. Com certeza não foi ele quem escolheu o figurino.