Você está na página 1de 37

Ivan

Saidenberg

A História dos Quadrinhos


no Brasil
Resgate das colunas publicadas
entre 17 de agosto e 26 de outubro de 1980
no Jornal de Hoje de Campinas
Sumário

Introdução

Parte I – 17/8/1980
Palavra e Traço Através dos Tempos
A palavra e Traço no Brasil
História em Quadrinhos
A Primeira História em Quadrinhos

Parte II – 24/8/1980
Palavra e Traço no Século das Luzes
A Sátira Política sob a Forma de Charge
O Humor no Final do Século XIX

Parte III – 31/8/1980


O Século das Luzes… E das Trevas
Evolução na História em Quadrinhos
A “Época de Ouro” dos Quadrinhos no Brasil

Parte IV – 7/9/1980
Os Novos “Vehicullos” de Comunicação
A Caricatura Política
Os Quadrinhos Brilhavam
Os Quadrinhos e a 2ª Guerra Mundial

Parte V – 14/9/1980
O Estado Novo
Jayme Cortez e os Quadrinhos Nacionais
A Renovação das Histórias em Quadrinhos

Parte VI – 21/9/1980
Bota o Retrato do Velhinho no Mesmo Lugar
Entre Golpes e Contragolpes, Surgem “JK”… e “JQ”
A Segunda “Época de Ouro” dos Quadrinhos
Os Grandes Desenhistas Começam a Brilhar

Parte VII – 28/9/1980


O Período de Goulart e o Brasil Agitado
O Golpe Militar de 1964
O Fim da Segunda “Época de Ouro” dos Quadrinhos
Os Artistas de um Período Conturbado
O Regime Militar e os Cartunistas
Mas, Aconteceu o Pior…

Parte VIII – 05/10/1980


E SURGE “O PASQUIM”
E o “Pasca” Deita e Rola
Os Quadrinhos sob o AI-5

Parte IX – 12/10/1980
A Renovação do Humor
O Salão Internacional de Humor
CRÁS! – A Explosão dos Quadrinhos
Os pulos do “Pererê”
As palhaçadas de “Sacarrolha”

Parte X – 19/10/1980
Figueiredo e a “abertura”
Os Quadrinhos Atingem a Maturidade
Quadrinhos Experimentais e de Vanguarda

Parte final – 26/10/1980


Caminhos do Humor
O Humor Brasileiro Vai Bem, Obrigado
E os Quadrinhos?
Só Mesmo Sendo “Pancada”…
Os Novos Heróis
Os Quadrinhos Eróticos
O Futuro dos Quadrinhos Brasileiros
Introdução
(Lucila Simões Saidenberg)

Esta série de colunas foi originalmente publicada no extinto Jornal de Hoje, de Campinas, de
17 de agosto a 26 de outubro de 1980. Nelas, meu pai descreve de modo bastante conciso a
história do humor político e de costumes feita de tinta e papel, e das histórias em quadrinhos,
desde seus primórdios no final do século XIX até os anos 1980 do século XX.
Reproduzo-as aqui do modo mais fielmente possível, e espero que o texto a seguir seja do
interesse dos leitores destas linhas.
Parte I – 17/8/1980

Palavra e Traço Através dos Tempos


A imagem foi a primeira forma de comunicação a ser utilizada pelo ser humano, desde
tempos imemoriáveis. Antigas pinturas nas cavernas pré-históricas já retratavam cenas de
caçadas, homens e animais em luta, às vezes em sequência, narrando uma história. A imagem
deu origem à escrita, pois as primeiras formas de escrita humana (na China e no Egito) eram
esquematizações de figuras humanas, animais, casas, etc. Assim surgiram os hieróglifos
egípcios, que Champolion decifrou, revelando toda a história de um povo.
O primeiro desenho de humor que se conhece é egípcio e está no Museu de Turim, e
representa animais assumindo papéis humanos e se comportando como se fossem gente. Existe
até um burro tocando harpa! Todavia, só na Europa medieval é que a arte da ilustração iria
renascer com a xilogravura e a pintura religiosa. É conhecidíssima a sequência da Paixão de
Cristo, onde Jesus é mostrado desde sua prisão até sua ressurreição, passando pela
crucificação, tudo isso numa sequência de quadros que encontramos até hoje, na maioria das
igrejas católicas. No século XVIII surgem as técnicas do pontilhado e da aquatinta, bem como a
litografia, possibilitando o aparecimento dos primeiros jornais ilustrados. O talho doce e a água
forte precedem um novo processo de xilogravura que veio permitir a junção da imagem com o
texto, no ano de 1817, na Inglaterra. Pela vez primeira, a palavra e o traço se uniam.

A palavra e Traço no Brasil


“A Campainha e o Cujo” foi o título da primeira caricatura brasileira que unia a palavra ao
traço. O texto é atribuído a Manuel de Araújo Porto Alegre e a estampa da litografia é de Victor
Larée. Foi executada a 14/12/1837 e publicada no Jornal do Commércio, do Rio de Janeiro.
Essa primeira “charge” pertence hoje à Biblioteca Nacional e mostra um fidalgo com uma
campainha nas mãos, entregando um saco de dinheiro a uma personagem vestida como um
arauto de rua, que se ajoelha para receber a dádiva do primeiro. Essa segunda figura, o “Cujo”
da sátira, tem as características do jornalista Justiniano José da Rocha. Ao fundo, numa parede,
há uma inscrição: “Com honra e probidade – 3:600$000 – Viva a sinecura!!!” –; a seguir, uma
palavra da gíria, “gimbo”, que significa dinheiro, e ainda: “Viva a Pátria” e “Chronica das
Parvoíces”. Mais ao fundo, um grupo foge na direção de uma parede onde se lê: “Campainha
venha a nós” e, numa placa, “Cemitério dos Desmazelos”. Como se não bastasse, há versos ao
pé da ilustração:
“A Campainha – Quem quer; quem quer redigir/ O Correio Oficial!/ Paga-se bem. Todos
fogem?/ Nunca se viu coisa igual.
“O Cujo – com três contos e seiscentos,/ Eu aqui’stou, meu Senhor;/ Honra tenho e
probidade/ Que mais quer d’um redator?”
Assim surgia a charge (do francês: ataque) em nosso país.

História em Quadrinhos
Paralelamente à arte da charge ou cartum (do inglês, cartoon: desenho, caricatura) surgia
também no século XIX a História em Quadrinhos. A 25 de fevereiro de 1894, o jornal NY World
publicou uma “história em imagens” que mostrava um bêbado usando uma máscara de teatro
chinês para assustar a todos, num bar, e assim poder esvaziar a prateleira.
Todavia, a primeira história em quadrinhos oficialmente reconhecida como tal é de autoria
de Richard Felton Outcault, com seu “The Yellow Kid” (O Menino Amarelo), também publicada
no NY World, a 16 de fevereiro de 1896.
“The Yellow Kid” ainda não é uma obra dentro dos padrões atuais, mas é uma predecessora
imediata do gênero. Foi somente em 12 de dezembro de 1897 que o New York Journal
apresentou uma série de desenhos em quadrinhos, feita por um principiante, Rudolph Dirks:
“Os Sobrinhos do Capitão”, mostrando as traquinagens de dois garotos terríveis, Hans e Fritz,
que são publicadas até hoje!

A Primeira História em Quadrinhos


No mesmo ano de 1897, a revista O Malho publicava “As Aventuras de Zé Caipora”, de
Ângelo Agostini, a primeira obra em quadrinhos no Brasil.
A personagem principal, inspirada em lendas indígenas, vivia aventuras nos sertões do nosso
país. Mas foi só no século XX que surgiu a primeira revista especializada no gênero, O Tico-Tico.
O Tico-Tico seria um marco histórico. Seu primeiro número foi lançado a 11 de outubro de
1905 e seus primeiros colaboradores foram: Vasco Lima (Histórias Avulsas), Cícero Valadares
(Histórias Avulsas) e Alfredo Storni (Histórias Avulsas). Logo em 1906 surgia J. Carlos, com a
personagem “Trapisongas”, também publicada em O Malho.
J. Carlos seria considerado o maior desenhista de quadrinhos e cartunista de sua geração.
Mas foi O Tico-Tico que continuou a divulgar novos autores: Mas Yantok (Kaximboun, 1908)
Alfredo Storni (Zé Macaco, Faustina e Baratinha, 1910), e Luis Loureiro (Chiquinho, 1914). Foi
esse personagem, Chiquinho, que mais se destacou na época. Era inspirado em “Buster Brown”,
de Richard Oucault, o mesmo que criou o “Yellow Kid”. Todavia, tinha como companheiro o
negrinho Benjamim, introduzido pelo Luis Loureiro.
Outros artistas nacionais criariam e desenhariam o garoto Chiquinho: Rocha, Alfredo Storni,
Paulo Affonso, Osvaldo Storni, Miguel Hochman, etc.
Ainda nessa primeira fase do quadrinho brasileiro, destacaram-se: Benedito Bastos Barreto
(Belmonte), criador de Juca Pato, publicado na Folha da Manhã, em 1928, e ainda J. Carlos,
novamente, com a personagem Lamparina, criada em 1930 e publicada também em O Tico-Tico.
Foi uma fase ingênua, onde todas as histórias eram cômicas e destinadas exclusivamente ao
público infantil. Somente no período de 1934 a 1940 é que surgiu a chamada “Época de Ouro”.
Parte II – 24/8/1980

Palavra e Traço no Século das Luzes


A charge ou cartum surgiu no Brasil em 1837, mas a história em quadrinhos levou 60 anos
para aparecer na nossa imprensa. Todavia, essas duas artes gráficas, que unem a palavra ao
traço, passaram a coexistir no nosso século, de vez que muitos cartunistas foram argumentistas
ou desenhistas de quadrinhos e vice-versa. Como a charge é mais antiga, os primeiros autores
brasileiros eram somente cartunistas e, no período de 1837 a 1897, destacamos alguns dos mais
importantes chargistas nacionais, a saber:

Depois dos pioneiros Manuel Araújo Porto Alegre e Victor Larée, surgiram ilustradores que,
na maioria das vezes, não assinavam seus trabalhos, ficando anônimos, ou só assinavam um
sobrenome ou pseudônimo. No catálogo da exposição de 1881, promovida pelo Comendador
José Tomas de Oliveira Barbosa, no Rio de Janeiro, há uma série de 13 estampas litografadas
por Lopes e de autor anônimo (talvez o próprio Lopes).
Mas o grande litógrafo da época foi Frederico Guilherme Briggs, que se instalou no Rio de
janeiro em 1837. Suas obras são anônimas, de um modo geral, mas há uma, de 1840, que é
atribuída a Rafael Mendes de Carvalho, denominada “O Sapateiro Eleitor”. Briggs não era autor
das charges que litografava, já que era uma prática comum o trabalho em dupla: um redator ou
jornalista criava a charge e um litógrafo apenas a executava graficamente.

A Sátira Política sob a Forma de Charge


A charge (ou cartum) já nasceu voltada para a política, como seu próprio nome indica (carga
ou ataque, em francês). Em 1844, surgiria a “Lanterna Mágica”, espécie de pioneira da
imprensa alternativa, sob a direção de Manuel Araújo Porto Alegre. Essa publicação exibia
sempre ilustrações humorísticas e satíricas, com desenhos de Rafael Mendes de Carvalho. A
seguir, surgiria a “Marmota Fluminense”, cujo primeiro número saiu a 7 de setembro de 1849,
sob o título de “Marmota da Corte” e sob a direção de Próspero Ribeiro Dinis e Francisco de
Paula Brito. A 2 de julho de 1857, iria denominar-se apenas “Marmota”.
Outras publicações se seguiram trazendo charges: “Brasil Ilustrado” (1855/56), a “Semana
Ilustrada” (1860/76) e a “Revista Ilustrada” de Ângelo Agostini, o mesmo que iria criar a
primeira personagem de quadrinhos do Brasil, o “Zé Caipora”. Essa revista começou a circular
em 1876. Em 1859, surgiria o “Charivari”, logo substituído pelo “Charivari Nacional”, surgido
em 1862. Já era um tipo de jornal alternativo, que ironizava os desmandos do Imperador D.
Pedro II, como se vê na charge de 4 de maio de 1862, de autor anônimo, one uma estátua do
Imperador segurando um exemplar da “Confederação dos Tamoios” numa das mãos e um cacho
de bananas na outra, equilibrada sobre um jumento e uma pirâmide de tijolos colocada sobre o
“Pão de Açúcar”, é contemplada pelo próprio Imperador e seus ministros, com a seguinte
legenda: “D. Pedro II – Safa!… Ao menos não se dirá que nunca escrevi para a imprensa; sou
sábio, e sou também jornalista! É minha opinião geral que minha análise à ‘Confederação dos
Tamoios’ foi um verdadeiro chef d’oeuvre… até me saí bem no grego… decididamente, vou
chegar ao Capitólio…”

O Humor no Final do Século XIX

Em fins do século XIX, surge a publicação: “Bazar Volante” (1863/67), com a colaboração de
Henrique Aranha, A. Seelinger, Flúmen Junius e Pinheiro Guimarães. A 28 de abril de 1867,
passou a se chamar “O Arlequim”, com charges de Flúmen Junius, J. Mill, V. Mola e outros.
Em1868, no dia 7 de janeiro, surgia “Vida Fluminense”, em substituição ao “Arlequim”, onde
colaboram Ângelo Agostini, Candido Aragonês de Faria, Pinheiro Guimarães, e o italiano Luigi
Borgomainerio, autor da famosa charge “Empréstimo Inglês – A Transfusão de Sangue”
(20/2/1875).
Em 19 de setembro de 1869, iria aparecer “O Mosquito – Jornal Caricato e Crítico”. Esse
antecessor de “O Pasquim” estendeu-se até 1877 e teve como colaboradores Cândido Faria,
Flúmen Junius, Pinheiro Guimarães e Antônio Augusto do Vale, cujo periódico “O Lobisomem”
se fundiu com “O Mosquito” em 14 de abril de 1871. Ângelo Agostini e Rafael Bordalo Pinheiro
passam a integrar o corpo de colaboradores e “O Mosquito” engloba outras publicações, tais
como: “A Comédia Social” (1870/71) e “O Mefistófeles” (1874/75). O primeiro era desenhado
por Pedro Américo, Aurélio de Figueiredo e Décio Vilares. Foi o fabuloso Pedro Américo o autor
de uma charge famosa: “O Que Deveria Fazer a Humanidade” (“A Comédia Social” – 29/9/1870)
– caricatura profética, pois mostra, enforcados, o Imperador da Alemanha, Bismark, e Napoleão
III, responsáveis pela Guerra Franco-Prussiana de 1870. Antecipa, assim, o Julgamento de
Nuremberg, de quase um século depois.
Ainda no Rio, surgiu o famoso “Ba-ta-clan” (1867/71), curiosíssimo periódico redigido em
Francês! Seu diretor era Charles Berry e trazia charges de cartunistas franceses importados
pelo periódico e aqui residentes. Alf. Michon foi o grande cartunista dessa revista curiosa.
Em 1875, surgiu “O Mequetrefe”, que duraria até 1893, com trabalhos de Cândido Faria,
Antônio Alves do Vale, Pereira Neto, Joseph Mill e Aluízio Azevedo, nele estreando Bambino
(Artur Lucas) em 1891. Nesse período ainda tivemos as revistas “Psitt” (1877), “O Besouro”
(1873), “O Ganganelli (1876) e a “Zigue-Zague” (1878). Depois vieram “O Binóculo” (1881) e
“Rataplan” (1886).
Ao apagar das luzes do século, surgiria “Dom Quixote” (1895) e ainda se destacariam os
artistas Julião machado, Hilarião Teixeira, Bento Barbosa e Antonio do Vale, encerrando um
ciclo da antiga caricatura brasileira e iniciando um novo, após a proclamação da República.
Parte III – 31/8/1980

Em fins do século XIX já era grande o número de publicações que traziam charges e textos
de humor, em sua maioria do tipo que hoje seria chamado de jornais alternativos. Talvez os mais
expressivos fossem “O Mosquito”, “O Mequetrefe”, a “Revista da Semana” e o “Dom Quixote”.
Vigorava, principalmente, a caricatura política e social, tal como nos tempos atuais.
Durante o período da Regência, desde 1823 até a maioridade de D. Pedro II, a imprensa se
viu sujeita a intensa censura, o que iria determinar uma ampla reação em fins do século XIX,
quando os artistas e jornalistas acabaram por conseguir ampla liberdade de imprensa. Com a
proclamação da República, essa liberdade chegou a ser quase completa, dando surgimento a
novos artistas de valor inquestionável. Mudava o século e mudavam as mentalidades
retrógradas, a imprensa se aperfeiçoava e renovam-se as esperanças.

O Século das Luzes… E das Trevas


Se o século passado foi considerado como sendo o SÉCULO DAS LUZES, o nosso pode ser
chamado de O SÉCULO DAS LUZES… E DAS TREVAS. Depois de um glorioso início, onde a
Liberdade parecia imperar, vieram períodos sucessivos de violenta censura e nova liberalização.
O grande marco do início do século XX foi O Malho, lançado independente da “Revista
Ilustrada”, a 20 de setembro de 1902, com o subtítulo de “Semanário Humorístico, Artístico e
Litterário”.
Os métodos fotoquímicos surgem e assoberbam as artes gráficas. Já em 1900, uma nova
“Revista da Semana” fundada por Álvaro de Teffé, usaria esse novo e revolucionário método de
imprensa.
Já se destacam os cartunistas Julião Machado, Raul Pederneiras, Calixto Cordeiro (K. Lixto) e
J. Carlos. As charges explodem em O Malho, O Jornal do Brasil, O País, o Correio da Manhã, e a
Gazeta de Notícias, alguns já diários. Surgem ainda “O Kosmos” (1904), o “Fon-Fon” (1907), a
“Careta” (1908), o “Degas” (1908), “O Avança” (1908), “O Albor” (1911), “O Gato” (1911),
“Caricatura” (1913), etc.
O clichê a cores iria surgir em 7 de julho de 1907, na Gazeta de Notícias, em papel
acetinado, em máquinas rotativas, constituindo-se numa total inovação em matéria de imprensa
diária sul-americana. Todavia, a inspiração dos cartunistas era francesa, de modo geral, já que a
França se destacava como líder no gênero, impondo até mesmo o nome de charge (carga,
ataque), ao cartum da época.
Mas foi o semanário O Malho que lançou os maiores nomes do início de nosso século, até a
década de 30; três gerações de artistas do lápis nele trabalharam: além de K. Lixto, Raul e J.
Carlos, tivemos J. Ramos Lobão, Crispim do Amaral, Leônidas Freire, Gil (Carlos Lenoir),
Alfredo Storni, Alfredo Cândido, Vasco Lima, Seth, Augusto Rocha, Yantok, Loureiro, Luís
Peixoto, Nássara, Theo, Enrique Figueroa, Del Pino, Di Cavalcanti e Andrés Guevara.

Evolução na História em Quadrinhos


Com O Malho surgiria também a primeira história em quadrinhos brasileira, como já vimos:
“As Aventuras de Zé Caipora”, de Ângelo Agostini, criada em 1897 e republicada em 1902.
Outros artistas desse semanário e da revista O Tico-Tico dariam prosseguimento ao trabalho
pioneiro de Ângelo Agostini (italiano, aqui radicado), com histórias cômicas e, até certo ponto,
um tanto ingênuas, num período que se estenderia até 1934.

A “Época de Ouro” dos Quadrinhos no Brasil


É em 1934 que se ergue o “Suplemento Juvenil” dirigido por Adolfo Aizen que, após retornar
dos USA, começou a editar um suplemento para o jornal A Nação, do Rio, cujo primeiro nome
foi “Suplemento Infantil”. O sucesso foi tão grande que, um mês após o lançamento, tornou-se
mais popular que o próprio jornal.
Após seu 14º número separou-se de A Nação e, como “Suplemento Juvenil” daria início à
“Época de Ouro” dos quadrinhos nacionais.
Nesse suplemento trabalharam muitos artistas de renome: Alpho e Berto (“Sherlock”, 1934 –
Mirim), Augusto Barreiros (“O Castigo a Cavalo”, 1936), Berto (agora só com “Bituca”, 1935, e
“Biboca”, 1936), Carlos A. Thiré (A. Ericson, por pseudônimo, com “O Galvão Riff”, 1936,
“Raffles”, 1936, e “Ricardo Relâmpago”, 1940), Fernando Dias da Silva (“O Enigma das Pedras
Vermelhas”, 1938), José Constâncio Filho (“Uma Viagem Encrencada”, 1934), Monteiro Filho
(“Roberto Sorocaba”, 1934), Queiroz (“Macarrão e Talharim”, 1934), Renato Silva (“Nick Carter
Versus Fantasma”, 1937), Rodolpho Ische (“Aventuras de Jack e Ralph”, 1937, “No País das
Amazonas”, 1939, e “Os Conquistadores do Novo Mundo”, 1940), Sólon Botelho (“Mil Milhas
por Hora”, 1937) e muitos outros.
Em outras publicações do gênero, tivemos: Abílio Correa (“As aventuras de Guy”, 1935 –
Suplemento Infantil do Diário da Noite), Ayres Borges (“A Vingança dos Micos”, 1935 – Correio
Universal), Carlos A. Thiré (o mesmo A. Ericson), com “Bob Lloyd, Repórter”, 1937 – Mirim, e
“Legionários da Sorte”, 1941 – O Tico-Tico), Décio Delphino (“Bibinha, Manecão e Zé Bolacha”,
1938 – O Diário de Belo Horizonte, e “A Invenção do Capitão Luren”, 1940 – Era Uma Vez),
Elísio Martins (“O Ás da Legião”, 1939 – Mirim), Francisco Acquarone (“História de Aladim”,
1936, “João Tymbira”, 1937, e “O Guarany” – Correio Universal), Hélio Queiroz (“Aventuras de
Roberto Galvão”, 1937, Mirim), Hélio Soveral (“O Mistério da Casa de Campo”, 1935 – Correio
Universal), Hugo Winkelma (“Buri”, 1939 – Mirim), José Geraldo (“Fred Williens”, 1935 – O
Tico-Tico, e “Zanzio”, 1939 – Diários Associados), Luis Sá (“Reco-Reco”, “Bolão e Azeitona”,
1931 – O Tico-Tico) e Renato Silva (“Garra Cinzenta”, 1937 – A Gazetinha).
Parte IV – 7/9/1980
Depois que O Malho – Semanário Humorístico, Artístico e Litterário foi lançado no Rio, em
1902, uma nova geração de cartunistas se formou. Os valores iam surgindo quase que
espontaneamente, pois jovens idealistas começavam a desenhar seus cartuns e logo eram
publicados pelas várias revistas e pelos jornais que passaram a se utilizar da charge com
frequência para a crítica política e de costumes.

Os Novos “Vehicullos” de Comunicação

A Careta, fundada a 6 de junho de 1908, iria dar novo impulso ao humor brasileiro. J. Carlos
fez a capa do número I, caricaturando Afonso Penna. Logo, grandes nomes da literatura, como
Olavo Bilac, se uniam a grandes nomes da ilustração e cartum. Em a Careta trabalharam:
Martins Fontes, Olegário Mariano, Aníbal Teófilo, Alberto de Oliveira, J. M. Goulart de Andrade,
Emílio Meneses, Bastos Tigre, Luis Edmundo e muitos poetas parnasianos. J. Carlos foi o grande
ilustrador dos trabalhos desses imortais da literatura.
Em 1907 já surge a revista FON-FON!, logo seguida pelas revistas Illustração Brasileira e
Para Todos Nessas publicações trabalharam: K. Lixto, Raul e J. Carlos, além de Nair de Teffé, a
primeira cartunista mulher do Brasil e talvez do mundo, mais conhecida pelo pseudônimo Rian,
a “portrait-chargista”. Já era o feminismo em marcha, no início do século XX.

A Caricatura Política
No período de 1910 a 1930, a charge brasileira passa a ser mais de crítica política do que de
costumes. Surge Nássara, um capítulo à parte na história do nosso humor, pois, além de
cartunista, era compositor e marchinhas de carnaval de grande sucesso, como Alá-lá-ô.
Nássara, testemunha ocular da história, ainda está vivo, no momento em que redigimos estas
mal traçadas linhas. Nássara ainda ilustrava suas composições, sendo que a última delas, de
grande sucesso, foi “Mulher Só Depois dos 30”.
K. Lixto nos brindou, já em 1909, com uma grande charge política, criticando as eleições da
época, na revista FON-FON!. Numa charge que continua muito atual, ele mostrava o povo e
uma caveira lado a lado com o seguinte subtítulo: “ELEICÕES – Os dois mais legítimos
representantes da moderna Soberania Nacional, os únicos, talvez, a quem será permitido hoje o
exercício do sagrado Direito de Voto”.
Em 1912, o cartunista Seth apresentava outra charge política de grande força, na revista O
Garoto, mostrando um túmulo com a seguinte inscrição: “Aqui jaz a Verdade Eleitoral –
assassinada a golpes de Penna Mallat. Orae por Ella”. Ao lado do túmulo, um carneiro
representando “o povo soberano” (5) p. 189.
Eram já os sintomas da insatisfação contra o sistema eleitoral sem o voto secreto, que
resultaria na Revolução de 1930.

Os Quadrinhos Brilhavam
E foi de 1930 a 1940 que os quadrinhos brasileiros atingiram sua primeira “Época de Ouro”.
Novos nomes surgiram, tais como Luis Teixeira da Silva (“Gregório vai à lua”, 1939 – Mirim),
Luna e Martins (“Os Ciclones de Inferno”, 1938 – Mirim, “O Volante Milionário”, 1939 – Mirim,
e “Rodolfo Matias em Indianápolis”, 1940 – Suplemento Juvenil), Mario Pacheco (“Grandes
Figuras do Brasil”, 1937 – Suplemento Juvenil, e “Descobrimento do Brasil”, 1937 – Suplemento
Juvenil), Mario Jaci (“O Tesouro de Ricardo”, 1938 – O Tico-Tico), Max Yantok (“Barão de
Rapapé”, 1935 – O Tico-Tico, “Pandareco, Parachoque e Viralata”, 1939 – O Tico-Tico), Messias
de Mello (“Pão-Duro”, 1935 – Gazetinha, “Sherlock Holmes”, 1936 – Gazetinha, “Audaz, o
Demolidor”, 1938 – A Gazetinha, e Os Três Mosqueteiros, 1938 – Gazetinha), Nino Borges
(“Jonjoca e Rabicó”, 1934 – O Tico-Tico, e “Bolinha e Bolonha”, 1939 – O Tico-Tico), Olavo
Pereira (“Edy, o Repórter”, 1938 – A Gazetinha) Oscar Brener (“O Tesouro Perdido”, 1939 –
Mirim), Paulo Affonso (“Azarias”, 1940 – O Tico-Tico, e “Chiquinho”, 1940 – O Tico-Tico), Renato
Silva (“O Garra Cinzenta”, 1937 – A Gazetinha, e “Nick Carter X Fantasma”, 1937 – Suplemento
Juvenil), Sigismundo Walpeteris (“Tom Corrigan”, 1939 – A Gazetinha, “O Cado Mamming”,
1939 – A Gazetinha, e “Dick Peter”, 1940 – Álbum Café Jardim), Theo (“Chico Farofa”, 1934 – O
Tico-Tico, e “Tinoco, Caçador de Feras”, 1938 – O Tico-Tico). Destaca-se ainda, nesse período, a
forte influência dos quadrinhos norte-americanos que, além de já tomarem parte do mercado de
trabalho de nossos artistas, levavam-nos a imitá-los, consciente ou inconscientemente.

Os Quadrinhos e a 2ª Guerra Mundial


Foi durante o segundo grande conflito mundial que os artistas brasileiros puderam dar
expressão a toda sua criatividade: ocupados com a guerra, os norte-americanos produziram
menos e deram mais espaços para os desenhistas e argumentistas “tupiniquins”. No período de
1940 a 1950 surgem: Alceu Penna (“O Mágico de Oz”, 1941 – O Globo Juvenil), Antonio Rocha
(“Almirante”, 1943 – Diário de Belo Horizonte, e “Sapo Sapeca”, 1947 – Era Uma Vez), A. Latini
Filho (“Caramuru”, 1941 – Mirim), André Le Blanc (“Morena Flor”, 1949 – Apla, “O Guarani”,
1950 – Edição Maravilhosa, e “Capitão Atlas”, 1951), Arcindo Madeira (“Os Lusíadas”, 1942 –
“Guri e História da Independência”, 1941 – Suplemento Juvenil), Archibaldo Ribeiro (“Os 3
Fujões”, 1942, e “Zé Cuíca”, 1942 – Mirim), Belfort (“No Reino do Silêncio”, 1940, e “A Serra do
Roncador”, 1943 – Suplemento Juvenil), Celso Barroso (“Episódios da História do Brasil”, 1941 –
Mirim), Fernando Dias da Silva (“O Vingador”, 1943 – Palmolive, “Capitão Atlas e as Minas de
Salomão”, 1951 – Diário Ilustrado), Fabio Horta (“José Vitaminas”, 1940 – Era Uma Vez, “O
Diamante Azul”, 1948 – Era Uma Vez), Guilherme Walpetris (“Totó Detetive”, 1940, e “O
Tesouro Enfeitiçado”, 1943 – Suplemento Juvenil), Heitor Cardoso (“Zabelinha”, 1940, e
“Caxumba”, 1941 – O Tico-Tico), Humberto Barreiros (“O Tesouro da Ilha dos Cocos”, 1947 –
Sesinho), Ivan Washt Rodrigues (“Aventuras de Tacomi”, 1948, e “As Ideias de Nadinho”, 1948 –
Sesinho), J. Nelson (“Compadre Coelho”, 1945 – Era Uma Vez) e Jaime Cortez, capítulo à parte
nas HQ brasileiras.
Parte V – 14/9/1980
Na década de 1920, o humor brasileiro tornava-se cada vez mais político. Novos cartunistas
surgiram, sempre ironizando os sucessivos governos da Primeira República. Vasco Lima e
Guevara eram dois deles, sendo que este último já denunciava a velhice precoce da república,
numa charge publicada no jornal Manhã (1927), na qual a velha república dizia: “Meu Pai!” – e
o velho Deodoro respondia: “Você? Minha Filha? Com 38 anos e neste estado?…”. Já o excessivo
autoritarismo de Washington Luis, o último presidente da Primeira República, era mostrado por
J. Carlos, em O Malho (1926), numa charge intitulada “Os Pensadores” (A propósito do
ministério de W. Luis): W. Luis: “O que é que vocês estão fazendo?” – Os ministros: “Nós
estamos pensando.” – W. Luis: “Não é preciso. Deixem isso comigo. Eu penso”.
Os acontecimentos que precederam a Revolução de 1930 foram muito bem retratados por J.
Carlos, Luis, Guevara, Figueroa, Storni e Theo. Mas a velha república estava caindo de podre e,
a 3 de outubro de 1930, Getúlio Vargas, ex-ministro de Washington Luis, sentiu-se prejudicado
na eleição daquele ano para a Presidência da República, onde a fraude eleitoral apontou Júlio
Prestes como vencedor, comanda a Aliança Liberal e toma o poder. Enquanto W. Luis deixa o
Brasil, rumo ao exílio, inicia-se uma nova era.

Também o cartum passa por uma renovação, pois agora a moda era satirizar Vargas. Foi Gip
(Luis) quem retratou melhor o homem que iria governar o País por 15 anos, sendo considerado
herói, tirano, líder popular, salafrário, inimigo dos paulistas, fascista, etc. Numa grande charge,
publicada no Suplemento de Bom Humor (1934), Gip mostra Vargas sobre um elefante, com um
cartaz nas mãos onde se lê: “Brevemente, programa novo!” – e, sob o desenho, em versos, o
seguinte texto: “A GRANDE ESTREIA – Vinde ver que eu, sem barulho,/ Consegui com os meus
engodos/ Amansar tigres, panteras,/ Que eu sou de circo e me orgulho/ De ser o maior de todos/
Os domadores de feras./ Em mim ninguém dá rasteira/ Nem há quem me engane/ Quem é bom
já nasce feito…/ Comigo não tem bandeira./ Junto de mim, Sarrasani,/ Tu és criança de peito…”
(Obs: Sarrasani era o dono do maior circo da época – I.S.).

O Estado Novo
Na Europa, Hitler e Mussolini pregam e executam abertamente o nazifascismo. Vargas, a
princípio titubeante, marca eleições, mas prepara um golpe de Estado. Dias antes do golpe, J.
Carlos em a Careta (1937), nos mostra, como numa bola de cristal, quem será o futuro
presidente. A charge se intitula “NO MEIO, A VIRTUDE”. Os nomes dos candidatos formam,
num acróstico, ao centro, o nome de Getúlio, que diz: “Sim, haverá ‘sucessão’, isto é, sucesso
grande! O vencedor está entre esses nomes!” – Não deu outra…

Jayme Cortez e os Quadrinhos Nacionais


E foi durante a ditadura de Getúlio que eclodiu o segundo conflito mundial (1939-1945).
Ocupados com a guerra, os estrangeiros cediam espaço aos desenhistas de quadrinhos
nacionais. Mas foi um português de nascimento, aqui radicado, o maior nome desse período
conturbado que se estendeu até 1950: Jayme Cortez Martins. Ele começou desenhando para o
Diário da Noite (“O Guarani”, 1947) e para A Gazetinha (“O Rajá de Penjab”, 1949).
A guerra já terminara, mas os brasileiros tinham logrado seu lugar ao sol. Em 1950, Jayme
Cortez, Álvaro Moya, José Lanzellotti, Nico Rosso, Reinaldo de Oliveira e outros fazem a
primeira exposição de histórias em quadrinhos do mundo, realizada em São Paulo.
Outros desenhistas e argumentistas trabalharam muito nesse período, tais como Mário e
Renato Lima (“A Serra da Prata”, 1940 – Suplemento Juvenil), Messias de Mello (“Dick Peter”,
1947, e “Perdidos no Igapó”, 1948 – A Gazetinha), Nico Rosso (“Submarino Fantasma”, 1948 –
Jornalzinho), Osvaldo Storni (“Aventuras de um Jovem Brasileiro”, 1941 – O Tico-Tico), Péricles
(“Oliveira, o Trapalhão”, 1942 – O Cruzeiro), Rubens Fradik (“Super Gato”, 1946 – Era Uma
Vez), Sálvio Corrêa Lima (“A Retirada da Laguna”, 1941 – Suplemento Juvenil), e Walmir Ramos
(“Páginas Históricas”, 1942 – Suplemento Juvenil).
Mas Jayme Cortez, inegavelmente, teria um papel maior, pois sua influência e seu traço iriam
formar toda uma nova plêiade de desenhistas e argumentistas de histórias em quadrinhos nos
33 anos seguintes do início de sua carreira no Brasil. Cortez trabalha em quadrinhos até hoje,
como diretor de arte da equipe de Mauricio de Souza, Criador de “Mônica” e “Cebolinha”. A
obra máxima desse artista, com certeza, foi “O Retrato do Mal”, que iria influenciar a onda de
Histórias de Terror que tomaria conta do Brasil de 1950 a 1970, um período de renovação e de
várias tendências, onde surgiriam os maiores desenhistas e argumentistas da atualidade.

A Renovação das Histórias em Quadrinhos

“O Retrato do Mal” foi publicado pela primeira vez em 1960, pela Editora Outubro, pequena
firma que, juntamente com a Editora Continental e a Editora La Selva, publicaria histórias em
quadrinhos desde o gênero infantil até o juvenil e adulto, principalmente as Histórias de Terror.
Por volta de 1950, esse gênero foi proibido nos USA, por ser considerado “nocivo” à formação
da juventude. As revistas como Terror Negro, Contos de Terror e outras, que publicavam
material importado, foram forçadas a contratar artistas nacionais para dar continuidade às suas
publicações. Dentre esses muitos, o autor destas linhas foi um deles, trabalhando na parte de
argumentos, ao lado de Luis Saidenberg (meu irmão), Júlio Shimamoto, Getúlio Delphim,
Mauricio de Souza, Edmundo Rodrigues, Flávio Colin, João Batista Queiroz e outros, que
renovaram os quadrinhos brasileiros.
Parte VI – 21/9/1980
Com o final da Segunda Grande Guerra, terminou também a ditadura de Getúlio Vargas,
assumindo o poder o general Eurico Gaspar Dutra, governante canhestro que causou deflação e
desemprego no Brasil. Praticamente ignorado pelos chargistas, de Dutra podemos destacar
apenas uma charge, denominada “Enfim, Pai!”, publicada no Diário da Noite, em 1950. A
charge critica o tardio lançamento da candidatura de Cristiano Machado, pelo PSD, tendo Dutra
como “pai da criança”. Esse cartum é de autoria de Augusto Rodrigues.

Bota o Retrato do Velhinho no Mesmo Lugar


Não podia dar outra: Getúlio voltou ao poder, nos braços do povo, pelo voto livre e direto.
Esperança dos trabalhadores e das camadas mais sofridas da população, ele voltou ao Palácio
do Catete, num governo nacionalista e tumultuado que terminaria tragicamente em 1954. Quem
melhor retratou o novo governo de Vargas foi o famoso J. Carlos, em a Careta (1950), numa
charge intitulada “Quando as Circunstâncias Permitem”. Getúlio é o condutor do bonde do
Catete e uma velha pergunta: “Moço, este bonde passa na Rua da Constituição?” – Ao que
Getúlio responde: “Às vezes!”.

Getúlio criou a Petrobras, tornando-se amado pelos estudantes, intelectuais e todas as


camadas da população, praticamente. Todavia, um tiro misterioso, disparado na madrugada de
24 de agosto de 1954, poria fim à sua vida.

Entre Golpes e Contragolpes, Surgem “JK”… e “JQ”


Após o suposto suicídio de Vargas, o País entrou numa crise terrível, com os militares
direitistas tentando derrubar do poder o vice-presidente João Café Filho que assumira o posto
no lugar de Getúlio. Depois de um confuso golpe, em novembro de 1955, o marechal Teixeira
Lott garante as eleições de 1956, quando é vencedor o dr. Juscelino Kubistchek de Oliveira,
mais conhecido como “JK”. É uma nova era, com a construção de Brasília, com um programa de
“50 anos de progresso em 5”, com as multinacionais entrando firmes no Brasil através da
indústria automobilística. O tempo parece passar muito depressa, a inflação começa a estourar
e o povo, descontente, vota em massa numa nova figura controvertida e carismática, em 1960:
Jânio da Silva Quadros, o “JQ”. A carreira eleitoral de Jânio é um sucesso absoluto, como se
pode notar através de uma caricatura de Theo, em a Careta (1955), onde se vê o general Juarez
Távora transformado em aprendiz de feiticeiro e sr. Jânio em vassoura (símbolo de sua
campanha). Juarez, atônito, pensa: “E agora, como vou parar esta vassoura?!…” – E não
conseguiu parar mesmo. Com mais de seis milhões de votos, Jânio é eleito presidente da
república, sendo uma nova esperança para o povo brasileiro. O povo julga ter encontrado um
novo líder, o nacionalismo campeia, fala-se num Brasil novo, onde os corruptos e os venais serão
para sempre varridos do cenário político nacional.

A Segunda “Época de Ouro” dos Quadrinhos


A euforia toma conta dos desenhistas de histórias em quadrinhos, pois acredita-se que,
afinal, haverá uma nacionalização dessa arte. Um grupo é formado para ir a Brasília e conseguir
de Jânio Quadros uma lei que ampare as HQs brasileiras, composto por Maurício de Souza, Ely
Barbosa, Júlio Shimamoto, Luiz Saidenberg, Ivan Saidenberg (o autor destas linhas), Waldir
Igayara, Izomar Guilherme, Lyrio Aragão, Almir Bertolassi, Aylton Thomaz, Gedeone Malagola,
João Batista Queiroz, Nico Rosso, Otoni Gali Rosa, Zezzo, Dag Lemos e outros. Jânio Quadros
parece apoiar totalmente os desenhistas.

Os Grandes Desenhistas Começam a Brilhar

Ziraldo Alves Pinto desponta, no Rio de Janeiro, como o grande desenhista de humor da
época. Seu personagem, o “Pererê”, com temas altamente nacionais, é um sucesso absoluto. É a
“Primavera do Brasil”. Em São Paulo, é Mauricio de Souza quem desponta, com “Bidu e
Franjinha” e, logo depois, “Mônica e Cebolinha”. No gênero adulto, proliferam as histórias de
terror e mistério, quando Luiz Saidenberg nos brinda com uma obra prima, “O Gato Preto”,
adaptação de conto de Edgar Allan Poe. Nesse período, que seria brutalmente truncado pelo
golpe de 1º de abril de 1964, brilham ainda inúmeros valores, como Acácio Alves Pinto
(“Eugênio, o Gênio”, 1959 – Capitão Z), Antonio Vaz (“Mirinho”, 1964 – Anjinho) Álvaro Moya
(“Zumbi”, 1955 – Ed. Maravilhosa, e “MacBeth”, 1959 – Ed. Outubro), Ari Moreira (“O Soldado
Tambor”, 1963 – Anjinho), Carlos Estevão (“Dr. Macarra”, 1962 – O Cruzeiro), Diamantino Silva
(“Simão Brasil”, 1952 – Última Hora, e “Flávio, o Corsário”, 1953 – Ed. Júpiter), Edmundo
Rodrigues (“Jerônimo”, 1959 – Rio Gráfica), Flávio Colin (“O Anjo”, 1961 – Rio Gráfica, “Sepé
Tiaraiu”, 1963 – Coop. Porto Alegre, “O Vigilante Rodoviário”, 1963 – Ed. Outubro), Getúlio
Delphin (“Capitão 7”, 1959 – Ed. Outubro, “Jet Jackson”, 1960 – Ed. Outubro, e “Aba Larga”,
1963 – Coop. Porto Alegre), Gil Brandão (“Raça e Coragem”, 1960 – Sesinho), Gil Coimbra, (“O
Tigre da Abolição”, 1957 – Ed. Maravilhosa), Gutemberg Monteiro (“O Sonho das Esmeraldas”,
1955 – Ed. Maravilhosa, e a Retirada da Laguna, 1956 – Ed. Maravilhosa), Henrique Souza
Filho/Henfil (“Os 2 Fradinhos”, 1964 – Alterosa), Ivan Wasth Rodrigues (“Histórias do Brasil”,
1962 – Ebal, Ivan Saidenberg (“Histórias Macabras”, 1960/64 – Ed. Outubro e La Selva), Jarbas
(“Cão e Gato”, 1958 – Sesinho), Jayme Fonseca (“Espadinha”, 1963 – Anjinho, “Pingo, o
Repórter”, 1963 – Anjinho, e “Lamparina” – Anjinho), Jayme Cortez (“Dick Peter”, 1952 –
Bentivegna, “Sérgio Amazonas”, 1953 – Idem, e “Contos de Terror”, 1960 – Ed. Outubro), José
Del Bó (“Gatinha Paulista”, 1963 – Última Hora, e “Colorado”, 1963 – Ed. Outubro), José
Geraldo (“Charlie Chan”, 1952 – O Cruzeiro, e “Os Meus Balões”, 1955 – Ed. Maravilhosa), José
Lanzellotti (“Raimundo, o Cangaceiro” – 1953 – Bentivegna). Joselito (“Martim Pescador”, 1958
– Sesinho), Juarez Odilon (“Cavaleiro Negro”, 1963 – Rio Gráfica), Luiz Saidenberg (“O
Bandeirante”, 1963 – B. Lessa Produções, e “Histórias de Terror”, 1960/63 – Ed. Outubro),
Manoel Victor Filho (“Capitão Tarumã”, 1963 – B. Lessa Produções) e outros.
Parte VII – 28/9/1980

Num clima de euforia, os artistas brasileiros criaram histórias nacionais com muito humor no
período em que Jânio Quadros governou. Para os cartunistas, o “homem da vassoura” era um
prato cheio e sua figura exótica prestava-se a todo tipo de charges. Súbito, sem explicações
Jânio renunciou à Presidência da República, a 25 de agosto de 1961, deixando o Brasil inteiro
perplexo. Militares direitistas, uma vez mais, tentam tomar o poder e impedir a posse de João
Goulart, vice-presidente de Jânio, que estava em visita à China. Surge a “Campanha da
Legalidade”, no Rio Grande do Sul, liderada por Leonel Brizola, cunhado de Goulart, e o vice
toma posse sob o regime do parlamentarismo.

O Período de Goulart e o Brasil Agitado


Quem melhor retratou o período do parlamentarismo, no qual o presidente governava mas
não mandava, foi Augusto Bandeira, numa charge publicada no Correio da Manhã (10/7/1962)
prevendo o fim desse regime. João Belchior Marques Goulart (Jango) aparece vestido à gaúcha
e fazendo um churrasco com o parlamentarismo. Um plebiscito pôs fim a esse regime, seis
meses depois. Assumindo plenos poderes presidenciais, Jango levou a Nação a um de seus
períodos mais agitados: falava-se na nacionalização de empresas estrangeiras, surge uma lei
contra a remessa de lucros para o exterior e um movimento pela legalização do PCB (Partido
Comunista Brasileiro).

O Golpe Militar de 1964


O marechal Castelo Branco assume o poder e há uma reação temerosa na imprensa
brasileira. O Ato Institucional nº 1 é decretado e o País fica em suspense, vendo seus líderes
civis sendo todos cassados. Os cartunistas, nesse período, preferem retratar figuras como
Carlos Lacerda, governador do então estado da Guanabara, Aliomar Baleeiro, Ademar de
Barros, governador de São Paulo, etc., como é o caso Appe (O Cruzeiro – 1964).
A situação se agrava em 1968, quando há uma grande reação civil ao golpe já durante o
governo do marechal Arthur da Costa e Silva. Os atos institucionais se sucedem, culminando
com o Ato Institucional nº 5, o famigerado “AI-5” que lançaria o Brasil numa noite de dez anos.

O Fim da Segunda “Época de Ouro” dos Quadrinhos


Jamais os desenhistas e argumentistas de quadrinhos brasileiros poderiam sonhar com a
renúncia de Jânio Quadros, que lhes dava todo o apoio: foi um rude golpe, mas os artistas
continuaram lutando bravamente até a queda de Jango, em 1964. O golpe militar desse ano
decretou, também, o fim da segunda “Época de Ouro” dos quadrinhos brasileiros.
Mas não nos podemos esquecer dos artistas que lutaram pela nacionalização e que a
conseguiram, em 1963, através de um decreto-lei de João Goulart, que pretendia um mínimo de
20% de HQs nacionais em revistas e jornais, numa escala percentual crescente que atingiria os
100% em 1970.

Os Artistas de um Período Conturbado


Tentando fazer renascer o trabalhismo e o populismo dos tempos de Getúlio, Jango põe tudo
a perder: após decretar uma lei contra a remessa de lucros das empresas multinacionais ao
exterior, é derrubado do poder, subitamente, na fria madrugada de 1º de abril de 1964.
Tropas de Minas Gerais avançam sobre o Rio de Janeiro, onde o presidente se encontrava.
Jango tenta ir para Brasília, depois para o Rio Grande do Sul e, por fim, deixa o País, indo se
exilar no Uruguai. A Nação, entre surpresa e temerosa, vê surgir um novo regime.

O Regime Militar e os Cartunistas


Muitos foram os artistas que continuaram na luta: Aylton Thomaz (“Oscarito e Grande Otelo”
e “Histórias de Terror”, 1960/64 – Ed. La Selva), Edmundo Rodrigues, Flávio Collin, Ivan
Saidenberg, Izomar Guilherme (“Joãozinho Nada-Teme”, 1960/64 – Ed. La Selva), Jayme Cortez,
José Geraldo (fundador da CETPA – Coop. Editora de Trabalho de Porto Alegre), Luiz
Saidenberg, Mauricio de Souza (“Mônica”, 1964 – M.S. Produções), Lyrio Aragão, Nico Rosso
(“Histórias de Terror”, 1960/64 – Ed. Outubro), Orlando Pizzi (“Duduca e Jambolão”, 1960 – Ed.
La Selva), Otoni Gali Rosa (“Contos de Terror”, 1960/64 – Ed. Outubro), Paulo Hamasaki
(“Último Assalto”, 1960, e “Polícia Fantasma”, 1964 – G.E.P.) Pedro Segui (“Tim, o
Camundongo”, 1960, e “Pelé e Pelado”, 1961 – Ed. La Selva), Renato Canini (“Zé Candango”,
1961 – CETPA), Rodolfo Zalla (“Jacaré Mendonça”, 1963 – B. Lessa Produções), Rubens
Cordeiro (“2ª Guerra Mundial”, 1964 – Diário da Noite), Rujos (José Horta) - (“O Universo”,
1962 – Jornais de BH, e “João Bruzundunga” – Idem), Sérgio Lima (“Histórias de Terror”, 1960 –
Ed. Outubro), Sérgio Militelli (“Tupinho”, 1964 – Ed. La Selva), Shimamoto (“Fidêncio, o
Gaúcho”, 1963 – B. Lessa Prod.), Waldir Igayara (“Peninha, o índio”, 1960 – Zás-Trás, e “Zeca e
Peteca” – Idem), Zezzo (“O Tubarão Voador”, 1962 – Jornal Juvenil) e Ziraldo (“Pererê”, 1960/64
– O Cruzeiro).

Mas, Aconteceu o Pior…


Depois do Golpe Militar de 1964, veio o de 1968, com o AI-5, e tudo pareceu desabar sobre a
cabeça dos desenhistas nacionais. Muitas editoras pequenas fecharam, muitos artistas foram
despedidos sob a acusação de serem “comunistas”, por desejarem nacionalizar os quadrinhos;
Shimamoto foi preso e torturado, entre outros, sem ao menos saber por quê.
Os jornais e revistas brasileiros passaram a publicar quase somente material importado dos
EUA, pouco restando àqueles que desejavam continuar na luta, apesar de todos os pesares.
Mas, em 1969, quando tudo parecia perdido, surge um jornal nanico que iria, em plena época
de repressão e ditadura, mostrar a sua força: O Pasquim, capítulo à parte no Humor
Parte VIII – 05/10/1980

Desde os tempos da ditadura de Getúlio Vargas (1930/45), o humor brasileiro tornou-se


muito político. Todavia, havia alguns humoristas, apolíticos ou voltados para outras formas de
humor, que criticavam mais os costumes e a sociedade do que os governantes, propriamente
ditos. O mais importante desses elementos, surgido profissionalmente na década de 1940, foi,
sem dúvida, Millôr Fernandes, que escrevia em O Cruzeiro e também desenhava, usando o
pseudônimo de Emmanuel Vão Gogo. Millôr foi (e ainda é) o grande mestre que iria influenciar
todas as gerações de humoristas e cartunistas vindas depois dele. Sua obra era tão importante
que, ao ser despedido de O Cruzeiro somente porque criticara a criação do mundo segundo a
Bíblia em suas páginas humorísticas, criou uma lacuna tão grande que a revista, iniciada no
começo do século, fechou logo depois.
Outro que se lançou através de O Cruzeiro foi Carlos Estevão, criador de tipos os mais
variados que criticavam as nossas falhas sociais e morais. Também através dessa revista
apareceu Péricles Maranhão, criador do famoso “Amigo da Onça”, personagem que se divertia
em prejudicar os outros e que, todavia, era muito simpático. Depois, na década de 1951 a 1960,
surgiria outro cartunista, este na revista Manchete: Borjalo (Mauro Borges Lopes), que também
teria grande influência sobre as novas gerações.
Outro grande precursor do humor atual foi Sérgio Porto, mais conhecido pelo pseudônimo de
Stanislaw Ponte Preta, que escrevia textos de humor mas não desenhava. Criador de
personagens famosas, como “Tia Zulmira”, “Primo Altamirando”, Stanislaw fez escola, dando
ensejo ao nascimento de outro cartunista que se tornaria famoso: Sérgio Jaguaribe, o Jaguar.
Jaguaribe iria ilustrar as obras de Ponte Preta e, posteriormente, criar o rato mais famoso do
Brasil: “Sigmund”, mais conhecido pelo diminutivo de “Sig, o rato que ruge”. Sérgio Porto
faleceu em 1964, após criar o “Febeapá – Festival de Besteiras que Assola o País”. Jaguar, anos
mais tarde, falando sobre ele, diria: “O criador do ‘Febeapá’, ao morrer, não poderia imaginar o
quanto foi profético. Como sempre acontece, a realidade, ao copiar a caricatura, consegue no
máximo chegar ao grotesco”.

E SURGE “O PASQUIM”
No Rio de Janeiro, Jaguar, Millôr, Ziraldo e outros cartunistas e humoristas, sentindo o
mercado de trabalho trancado pelo Golpe Militar de 1964 (e depois pelo AI-5, em 1968),
tentaram lançar revistas próprias, como o Urubu, Pif-Paf e outras, que não conseguiram manter-
se por longo período. Mas, em 1969, uniram-se a Sérgio Cabral, Henfil (Henrique de Souza
Filho), Paulo Francis, Tarso de Castro, Ivan Lessa e outros grandes nomes do humor. A 26 de
junho daquele ano, surgia o semanário O Pasquim.

Esse jornal iria renovar o conceito de humor em nosso país, atingindo a incrível tiragem de
200 mil exemplares por semana, em 1970! Sendo um semanário humorístico de fundo político,
não poderia deixar de criar problemas com a censura então existente, logo de início. Poucos
meses depois de lançado o número 1, dez dos 12 elementos que faziam O Pasquim (Só
escaparam Millôr e Henfil, por não serem localizados) foram presos arbitrariamente, ficando
retidos num quartel durante meses, até que foram impronunciados por um promotor público,
que leu toda a coleção do jornal e declarou nada ter encontrado de atentatório à moral e aos
bons costumes, à Segurança Nacional, etc., mas sim ter quase morrido de tanto rir…

E o “Pasca” Deita e Rola


O Pasquim virou “Pasca” na gíria popular. A turma que o fazia virou “patota” e logo surgiram
as musas que inspiravam os cartunistas: primeiro Odette Lara, depois a inesquecível Leila Diniz
(tragicamente falecida num desastre aéreo, em 1972). Embora sofrendo limitações da censura,
O Pasquim conseguiu reunir em suas páginas a nata do humor e dos quadrinhos nacionais.
Entre outros, trabalharam nesse semanário: Luís Carlos Maciel, Martha Alencar, Claudius,
Fortuna, Haroldo Zager, Nelma Quadros, Edélsio Tavares (pseudônimo de Ivan Lessa), Lúcio
Rangel, Hélio Fernandes, Nássara, Tristão de Athayde, Dodóis (pseudônimo do autor Ivan
Saidenberg), Armindo Blanco, Carlos Drummond de Andrade, Ferdy Carneiro, Fausto Wolff,
Carlos Lyra, etc.

Os Quadrinhos sob o AI-5


No campo dos quadrinhos, também O Pasquim foi o responsável pela continuidade do
trabalho de inúmeros artistas, entre eles Henfil, criador do “Fradim”, “Zeferino”, “Orelhão”,
“Graúna”, “Bode Orellana”, “Urubu”, “Ubaldo, o Paranoico”, “Xabu, o Provocador”, etc. Henfil
(Henrique de Souza Filho) é hoje um dos mais completos artistas brasileiros, sendo tanto
humorista quanto quadrinista, fazendo o argumento, o desenho e a arte final (inclusive letras)
de suas historietas, tudo ao mesmo tempo.
Também Ziraldo (Ziraldo Alves Pinto) publicou quadrinhos em O Pasquim, ainda que
esporadicamente, assim como Dodois (com argumento de Ivan Saidenberg e desenhos de Luiz
Saidenberg), Nani, Luscar, Claudius, Paulo Caruso, Reinaldo, Nilson, Guidacci, Agner, Cláudio
Paiva, Duayer, Coentro, Ivan Lessa (argumentos), Redi, Jaguar (Sérgio Jaguaribe) e muitos
outros.
Mauricio de Souza, em São Paulo, criou uma produtora e distribuidora de quadrinhos, dando
continuidade a “Bidu e Franjinha”, “Mônica e Cebolinha”, além de criar novas personagens,
como “Pelezinho”, “Rolo” e outros. Também Ely Barbosa conseguiria se impor com “Cacá e sua
Turma”. Na Editora Abril, um grupo se formava, criando no Brasil os argumentos dos estúdios
de Walt Disney, tentando também criar histórias nacionais, lançando a revista Crás! e
movimentando os quadrinhos brasileiros. A luta continuava, com AI-5 e tudo.
Parte IX – 12/10/1980
Os anos 1970 foram pródigos em Humor && Quadrinhos, apesar da censura, apesar dos
duros governos militares, apesar do AI-5. Os artistas nacionais jamais entregaram os pontos,
satirizando direta ou indiretamente os governos militares e os políticos. Todavia, o general
Médici conseguiu ser o único dirigente brasileiro a nunca ser caricaturado, o que não deixa de
ser um recorde significativo…

A Renovação do Humor

Com o surgimento de O Pasquim e outros jornais chamados de “alternativos”, representantes


da imprensa independente, o humor se renovou. Contribuíram para isso, principalmente, os
jornais Movimento, Opinião, O Repórter, Hora do Povo, Em Tempo, Tribuna da Luta Operária e
muitos outros. Também alguns jornais diários, representantes da grande imprensa, deram
ênfase aos cartuns e tiradas humorísticas, além de publicar quadrinhos nacionais. Destacou-se a
Folha de S.Paulo, além de Última Hora, Jornal da Tarde, etc., em São Paulo, e O Dia, Tribuna de
Imprensa e Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro.
Os humoristas mais marcantes da época continuaram sendo Ziraldo, Jaguar, Henfil, Fortuna,
Zélio, Claudius, Millôr e outros, mas muitos artistas novos surgiram. Em 1974, surgia o Salão de
Humor, em Piracicaba (SP).

O Salão Internacional de Humor


Dentre as várias mostras de Humor && Cartuns, foi o salão de Piracicaba que mais se
destacou, tornando-se internacional em 1976. A cada ano, mais e mais humoristas surgiam, em
sua maioria jovens, através dessa mostra. Os premiados foram se sucedendo e, entre eles,
destacamos: Laerte Coutinho, Marcos Benjamin, Chico Caruso, Lailson Cavalcanti, Luiz Solda,
Glauco Villas Boas, César Villas Boas, Hermínio Castelo Branco, Ivan Saidenberg (o autor).
Fausto Longo, Jorge Nagao, Carlos Hering, Yosimaro Sakita, Estevão Niemeyer, Francisco Juska
Filho, Ivan Fernandes, Massao Hotoschi, Oscar Grillo, Neltrair Abreu (Santiago), Josanildo
Lacerda, Fernando Rivaben, Abelardo Libório, etc.

CRÁS! – A Explosão dos Quadrinhos


Crás! foi o nome escolhido para uma das mais importantes publicações nacionais de histórias
em quadrinhos. Essa revista foi lançada pela Editora Abril, a 6 de fevereiro de 1974, não
chegando a completar 1 ano de existência, mas revelando novos autores brasileiros e novas
personagens, além de republicar obras de notável valor artístico de autoria de Jayme Cortez.
Fizeram a revista, entre outros, os seguintes artistas: Renato Canini (Kactus Kid), José
Lanzellotti (Lendas Brasileiras), Carlos Alberto de Oliveira, o “Xalberto” (Olimpo), César
Sandoval e Odair Bernabé (Aragão), Ivan Saidenberg e Carlos Herrero (Vavavum), Waldir
Ygayara (Nina), Michele Iacoca, Ruy Perotti (Satanésio), Jayme Cortez (Zodíaco), Júlio de
Andrade Filho e Izomar Guilherme (Zing, Zong, Crunch), Eduardo Octaviano
Walmir Amaral (Alex e Cris), Primaggio Mantovi (Cafuné && Acácio), Ivan Saidenberg e Ivan
Washt Rodrigues (A Guerra Que Não Houve – Episódio baseado na História do Brasil), etc.

Os pulos do “Pererê”
Também através da Abril, seria relançado o excelente personagem “Pererê”, de Ziraldo, com
histórias criadas em equipe, sob orientação do autor, que revisava cada história pessoalmente.
De julho de 1975 a abril de 1976, a revista foi publicada, também não atingindo um ano de vida.
Todavia, foi mais um passo importante no lançamento de novos valores, que trabalharam junto
com Ziraldo. Destacamos os seguintes: Brasílio M. da Luz, Paulo José da Silva, Thereza
Saidenberg, Ivan Saidenberg (o autor), Júlio Andrade Filho, Ruy Perotti, criando argumentos,
além de Napoleão Figueiredo, Primaggio Mantovi, Roberto Fukue, Eli Leon, Renato Campello,
nos desenhos, e Euclides de Andrade, Sideral M. Luz, Micchio Yamashita, Ricardo Correa da
Silva, Selma Bertolino, Luiz Podavin e outros, na arte final.

As palhaçadas de “Sacarrolha”

Primaggio Mantovi, jovem italiano radicado no Brasil, lançou o palhaço “Sacarrolha”, em


1973, através da Rio Gráfica e Editora. Essa excelente personagem seria publicada pela Abril,
em 1975, com a mesma equipe de “Pererê”. Também essa revista não teve grande duração,
mas, entre os pulos do “Pererê” e as brincadeiras de “Sacarrolha”, surgiram ainda “Satanésio”,
de Ruy Perotti, em revista própria, além de “Cacá e sua Turma”, de Ely Barbosa. Além disso, a
partir de 1970, a Abril passou a publicar “Mônica”, depois “Cebolinha” e finalmente
“Pelezinho”, de Mauricio de Souza. Apesar de tudo, ninguém segurava os quadrinhos
brasileiros.
Parte X – 19/10/1980
Depois do período mais obscurantista do nosso Humor & Quadrinhos, sob o governo Médici,
no qual apenas O Pasquim conseguiu sobreviver, iniciou-se uma época mais aberta (1974/79),
sob o governo Geisel. No entanto, continuava a existir uma censura férrea, tanto prévia como
posterior (apreensão de revistas e jornais nas bancas). Sem entregar os pontos, os cartunistas
ousaram retratar o general-presidente em várias oportunidades. Jaguar, diretor e editor de O
Pasquim, conseguiu ser enquadrado na Lei de Segurança Nacional, ao retratar Simonsen,
Golbery, Ueki, Delfim e Maluf num “mar de lama”.

Figueiredo e a “abertura”
A partir de 1979, com a posse do general Figueiredo na presidência e com a chamada
“abertura”, o humor tornou-se mais livre e, naturalmente, o próprio presidente militar se
tornaria o alvo mais visado pelos cartunistas. No Salão Internacional do Humor, de Piracicaba,
naquele ano, o prêmio “Júri Popular” seria ganho pelo autor destas linhas, juntamente com o
cartunista Pierre Trabbold, aqui do Jornal de Hoje, através de uma charge onde Figueiredo
aparecia em seu retrato oficial, todo sorridente, enquanto um menino pobre, magrinho e roto
perguntava à sua genitora, esta cheia de filhos e nas mesmas condições do garoto: “Manhê, di
que qui o homi tá rindo?”

Os Quadrinhos Atingem a Maturidade


No fim dos anos 1970, os quadrinhos evoluíram a ponto de atingir a sua plena maturidade
em nosso país. Surgiram os quadrinhos destinados aos adolescentes e adultos, em maior
número, com temas ousados e realistas. A chamada “abertura” propiciou maior liberdade de se
tratar de temas envolvendo sexo e violência.
Alguns pioneiros do gênero “adulto” foram: Cláudio Seto, Edgar Souza, Eduardo Barão,
Eugênio Colonesse, Fernando Ikoma, Floriano de Almeida, Fernando Lisboa, Lucilio Zawadzki,
Luscar, Luís Saidenberg, Luis Sátiro, Lisenfeld, Moacir Rodrigues, Nico Rosso, Paulo Fukue,
Pedro Mauro Moreno, Sérgio Militello, Shimamoto e outros.

Quadrinhos Experimentais e de Vanguarda

Alunos da Faculdade de Comunicações da USP (Cadeira de História em Quadrinhos do Curso


de Editoração) publicaram uma revista experimental, a Quadreca, com quadrinhos, charges e
fotonovelas. Em Porto Alegre (RS), Oscar Kern, depois de escrever argumentos para a Editora
Abril, tornou-se editor numa nova firma destinada a criar quadrinhos de vanguarda.
Assim surgiu a Geo-Gráfica e Editora Oliveira, apresentando trabalhos muito bons de artistas
nacionais, entre eles o próprio Kern, A. Elias, Renato Canini, A. Cocolete, Hartur e toda uma
nova safra de quadrinistas.
Parte final – 26/10/1980
No início dos anos 1980, o humor tornou-se mais livre, em consequência do fim da censura
prévia, o que não impediu que alguns jornais alternativos fossem apreendidos em banca, a
posteriori, sem maiores explicações ou quaisquer indenizações. O governo Figueiredo foi
intensamente caricaturado e chargeado por inúmeros humoristas. No entanto, é provável que a
figura mais atingida pelas charges e cartuns tenha sido a do governador de São Paulo na época,
o sr. Paulo Maluf. Na coluna “Palavra e Traço”, aqui do JH, temos mostrado esse político de
várias maneiras diferentes, além de ministros e do próprio presidente, o general Figueiredo.

Caminhos do Humor
Ao lado do humor político, a “abertura” tem proporcionado maior liberdade para o humor
erótico, dando oportunidade ao surgimento de novos cartunistas que têm publicado seus
trabalhos nas revistas especializadas no ramo, como Playboy, Status, Ele Ela, Homem, Exclusive
e outras. Alguns dos nomes dessa nova safra de humoristas são: R. Cardozo, Fausto, Geandré, J.
Caesar, Érico Santos, Arnaldo, ao lado de Ziraldo e outros nomes consagrados.

O Humor Brasileiro Vai Bem, Obrigado


O povo brasileiro é, certamente, o mais irreverente do mundo. O humor brasileiro caminha, a
passos largos, para um grande futuro, que somente será truncado no caso de um novo
“fechamento” político, no qual não acreditamos por confiar no espírito liberal e democrático da
nossa gente. O nível do humor nacional não fica nada a dever ao melhor humor estrangeiro,
posto que não conhecemos nenhum país do mundo que conte com elementos do nível de
Ziraldo, Millôr, Henfil, Jaguar, Chico Caruso, Zélio, Aldir Blanc, Ivan Lessa e outros, todos ao
mesmo tempo. Apesar de já se notar certo recrudescimento da censura, com juízes de menores
apreendendo revistas e/ou exigindo que elas sejam vendidas em sacos plásticos opacos, cremos
que os nossos artistas, unidos e conscientes, conseguirão impor o seu trabalho, em virtude de
seu alto padrão de qualidade. Nota 10 para o humor brasileiro.

E os Quadrinhos?
Embora sempre sofrendo a concorrência desleal dos quadrinhos estrangeiros, os brasileiros
muito têm lutado, conseguindo proezas incríveis. O Projeto Tiras, da Editora Abril, é um
exemplo desse trabalho, pois deu oportunidade para muitos artistas brasileiros se expressarem
e publicarem suas obras em jornais de todo o País. Entre outros, trabalharam nesse projeto os
seguintes artistas: Primaggio Mantovi, Waldir Igayara, Jorge Kato, Paulo Paiva, Paulo José,
Carlos Avalone, Napoleão Figueiredo, Henrique Farias, José Claudino Gomes e outros. O mesmo
grupo foi o responsável pela excelente revista Pancada, que, durante quase três anos, divulgou
nossos quadrinhos.

Só Mesmo Sendo “Pancada”…


Essa revista deu uma amostra do que pode o humor brasileiro, com excelentes paródias de
filmes e novelas, criadas por Cláudio Marra, Cláudio Cunha, Geandré, Ivan Saidenberg, Renato
Canini, Rivaldo, Rogério de Almeida e outros, e desenhadas por Carlos Chagas, Edson Cabral,
Geandré, Henrique Farias, Renato Canini, Rivaldo, etc.

Os Novos Heróis
Diversas tentativas têm sido feitas para o lançamento de novos heróis de histórias em
quadrinhos. Entre eles, “Falcon”, escrito por Thereza Saidenberg e Antonino Homobono, e
desenhado posteriormente por Michio Yamashita. Outro é o “Capitão Valente”, criação do autor
destas linhas, com desenhos de Claudson Ribeiro e José Claudino Gomes. Um grupo de São
Paulo, chefiado por Paulo Paiva, tem também criado heróis para tiras de jornais, entre eles o
cangaceiro “Carcará”. Fausto e Laerte criam quadrinhos sindicais, expondo reivindicações dos
trabalhadores brasileiros.

Os Quadrinhos Eróticos
Como não poderia deixar de ser, também os quadrinhos entraram na onda do erotismo,
especialmente os criados no Paraná, pelo grupo da Grafipar – Gráfica Editora Ltda., composto
por Eros, Maichrowiz, Mozart Couto, Rodval Matias, Watson Portela, Itamar Gonçalves, Gustavo
Machado, Fernando Bonini, Roberto Kussumoto, Fernando Ikoma, Nelson Padrella, Jorge
Fischer, Ataíde Braz, etc., ao lado de artistas consagrados como Shimamoto, Flávio Colin,
Sakita, Luiz Saidenberg, Wilde, Vilachá, Watson Portela, Itamar Gonçalves, Noriyuki, Seabra,
Zenival, Jan Boguslawski e outros.

O Futuro dos Quadrinhos Brasileiros


Enfrentando dificuldades maiores do que os humoristas, os quadrinistas nacionais têm
enfrentado o massacre das multinacionais das historietas, mas têm conseguido vencer. Desde
1950, quando da primeira exposição brasileira (e mundial) de quadrinhos, a luta prossegue. O
Brasil precisa de uma lei de proteção para os quadrinhos ou de taxação do material importado
como sendo “supérfluo”. Como sabemos, essa lei já foi criada em 1963, pelo ex-presidente João
Goulart, mas nunca foi regulamentada.
Urge reunir as forças mais vivas da Nação para defender essa expressão maravilhosa que
são os nossos quadrinhos. Políticos combativos têm se colocado ao lado dos artistas, lutando por
uma lei de proteção. Entre eles, o deputado federal João Paulo e o senador Orestes Quércia.
Acreditamos que, unidos, humoristas e quadrinistas vencerão mais essa batalha, levando bem
alto o humor e os quadrinhos brasileiros.
FIM
Título da Obra
A HISTÓRIA DOS QUADRINHOS NO BRASIL

Autor
IVAN SAIDENBERG

© 1980 Ivan Saidenberg


© 2013 Marsupial Editora Ltda.

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer meio
(escrito ou eletrônico) sem a prévia autorização por escrito da editora.

Design de Capa
Design Company (design-company@uol.com.br)

Revisão
Leandra Trindade

Produção do arquivo ePub


Rejane Megale

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
___________________________________________________________

Saidenberg, Ivan

A história dos quadrinhos no Brasil / Ivan Saidenberg. – Nova Iguaçu, RJ: Marsupial Editora, 2013.

ISBN 978-85-66293-04-3

1. Histórias em quadrinhos - Brasil - História. 2. Histórias em quadrinhos – História e crítica. I. Título.

13-11826 CDD-741.50981

___________________________________________________________

MARSUPIAL EDITORA LTDA.


Caixa Postal 77100
Nova Iguaçu - RJ
CEP 26210-970
www.marsupialeditora.com.br

Você também pode gostar