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APRESENTAÇÃO

Ocupar espaços, agenciar neles linhas de fuga e encontros desejantes que


desestabilizam as forças reativas que tentam frear nossa potência inventiva. Afirmar
a vida em sua diferença, multiplicidade, intensidade e no que nela se insinua como
inominável. Estas são as vias que movem a construção desse encontro de trocas
afetivas que é a V Semana de Artes Visuais da UEM. Nossa proposta é resistir e
criar fissuras em meio às forças de poder e camadas de saber que segregam a vida
e nos capturam por todos os lados, um convite ético, estético e político para pensar
nossos modos de existência e criar outras relações com o mundo. Peter Pál Pelbart,
afirma que vivemos na atualidade "um estrangulamento biopolítico que pede
brechas, por minúsculas que sejam, para reativar nossa imaginação política, teórica,
afetiva, corporal, territorial, existencial". É acreditando na força inventiva e de
resistência que produz brechas que convidamos a todxs a produzir conosco, na V
Semana de Artes Visuais, esse espaço de criação e resistência micropolítica. Diante
dos ataques reacionários que a arte tem sofrido. Diante das forças conservadoras
que tem impresso no mundo suas marcas violentas. Diante de um desejo imenso de
construir um futuro que se desenhe em solo mais justo, livre e inventivo.
Convidamos a todas e todos a pensar e explorar potências micropolíticas da arte.
Entendemos que a arte pode ser um dispositivo importante para agenciar no mundo
outros olhares, modos de subjetivação inventivos e sensíveis ao outro, linhas de
sentido capazes de abalar verdades que nos vendem como prontas e acabadas. A
arte, portanto, pode se configurar como uma potente ferramenta para resignificar o
mundo a partir de lentes mais problematizadoras e sensíveis. Um caminho possível
para extrairmos do presente forças para criarmos um outro agora.

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PROGRAMAÇÃO GERAL

04.DEZ.2017 – SEGUNDA-FEIRA

HORÁRIO/
PROGRAMAÇÃO
LOCAL

Apresentações do VI Seminário de Projetos de Artes Visuais


Coord: Dra. Renata Marcelle Lara
8h 30min
Auditório I12
Palestra “ Corpo, Sexualidade e Ciência?”
Palestrante: Prof. Dr. Edson Carlos Romualdo

11h Credenciamento
Auditório I12 Coord: Ma. Fabiane Sartoretto Pavin e Dra. Eloiza Amália Bergo Sestito

Palestra “Expressão Midiática e a Dimensão Social da Arte:


13h 30min Fruição estética e afirmação da vida”
Auditório I12 Palestrante: Luiz Hermenegildo Fabiano
Coord: Dra. Roberta Stubs Parpinelli

15h Apresentação de Trabalhos de Conclusão de Curso em Artes Visuais


Auditório I12 Coord: Ma. Kiyomi Hirose

Oficinas
18h
Coord: Dra. Annelise Nani da Fonseca e Ma. Damaris Morgenstern Pacheco

05.DEZ.2017 – TERÇA-FEIRA

HORÁRIO/
PROGRAMAÇÃO
LOCAL

8h 30min Apresentações do VI Seminário de Projetos de Artes Visuais


Auditório I12 Coord: Dra. Renata Marcelle Lara

Abertura do Evento - Cerimonial


Coord: Ma. Kyiomi Hirose
13h 30min
Auditório I12
Palestra Ricardo Basbaum
Coord: Dra. Sheilla Patrícia Dias de Souza

Primeiras Ações Artísticas


17h 30min
Coord: Dra. Roberta Stubs Parpinelli e Ma. Franciele Garlet

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06.DEZ.2017 – QUARTA-FEIRA

HORÁRIO/
PROGRAMAÇÃO
LOCAL

8h 30min Mesa Redonda: arte e dissidências


Auditório Ney Ms. João Paulo Baslicei e Prof. Maddox Cleber
Marques – D03 Coord: Dra. Roberta Stubs Parpinelli

13h Apresentação de Trabalhos de Conclusão de Curso em Artes Visuais


Auditório I12 Coord: Ma. Kiyomi Hirose

Oficinas
18h
Coord: Dra. Annelise Nani da Fonseca e Ma. Damaris Morgenstern Pacheco

07.DEZ.2017 – QUINTA-FEIRA

HORÁRIO/
PROGRAMAÇÃO
LOCAL

Sessões de Comunicação Oral


8h 30min
Coord: Dra. Eloisa Amalia Bergo Sestito e Ma. Fabiane Sartoretto Pavin

13h Apresentação de Trabalhos de Conclusão de Curso em Artes Visuais


Auditório I12 Coord: Ma. Kiyomi Hirose

Oficinas
18h
Coord: Dra. Sheilla Patrícia Dias de Souza e Ma. Luane Maciel Freire

07.DEZ.2017 – SEXTA FEIRA

HORÁRIO/
PROGRAMAÇÃO
LOCAL

8h 30min Sessões de Narrativas Visuais e Performances


M40 Coord: Ma. Franciele Garlet e Ma. Rosiane Cristina de Souza

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13h Apresentação de Trabalhos de Conclusão de Curso em Artes Visuais
Auditório I12 Coord: Ma. Kiyomi Hirose

Encerramento da Semana de Artes

16:30
Palco Livre – 16:30
Coord: Dra. Roberta Stubs e Ma. Franciele Garlet

Ação – Lágrimas de Linhas Bordadas em Névoa-Nuvem – 17:30


17:30
Coord: Dra. Roberta Stubs e Ma. Franciele Garlet

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SUMÁRIO

VI SEMINÁRIOS DE PROJETOS EM ARTES VISUAIS

A MULHER PROTAGONISTA DA HQ SAGA E SUA REPRESENTAÇÃO


10
ESTÉTICO-CORPORAL

APARIÇÕES VISUAIS DE UM ETERNO-RETORNO VISIONÁRIO 16

ARTE E PESSOALIDADES NO TRABALHO COM ARGILA DO ARTISTA-


21
PESQUISADOR

DIÁLOGOS ENTRE ARTE INTERATIVA E O JOGO JUST DANCE 27

ENTRE BECOS E VIELAS, A VIDA COTIDIANA DOS DEUSES


32
CLÁSSICOS NAS OBRAS (MONTAGENS) DE ALEXEY KONDAKOV

O CORPO COMO TELA NAS PRODUÇÕES DO ARTISTA CRAIG TRACY 38

O DESENVOLVIMENTO POÉTICO SOBRE PEÇAS DE VESTUÁRIO 44

O JOGO ERÓTICO-NATUREZA-FEMININO DO CORPO (DA MULHER)


49
DISCURSIVISADO NAS OBRAS DE SABRINA GEVAERD

O PODER ANIMADO EM KOE NO KATACHI 55

O SUJEITO-ARTISTA EM CISNE NEGRO 61

PRÁTICA PROBLEMATIZADORA DE IMAGENS PUBLICITÁRIAS NO


66
ENSINO DE ARTE

SANGUE MENSTRUAL COMO ELEMENTO ARTÍSTICO DE


72
RESISTÊNCIA EM UM CONTEXTO DE CORPOS DOCILIZADOS

COMUNICAÇÕES ORAIS

A ESCRITA DE SI NA PINTURA MENSTRUAL DE JULIARO 79

A EXPERIÊNCIA DO ESTÁGIO, POR MEIO DOS DIÁRIOSEM NOSSA


85
FORMAÇÃO COMO ALUNAS-PROFESSORAS-ARTISTAS

6
ARTE MESTIÇA NO BRASIL COLONIAL 90

ARTE RUPESTRE NO ENSINO DA ARTE: PLANO DE AULA REALIZADO


96
NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

AS ARTISTAS DO INFANTIL 5 101

AS CONTRIBUIÇÕES DA LINGUAGEM AUDIOVISUAL PARA O


106
CONHECIMENTO DA SÍNDROME DE DOWN

(AUTO)DESTRUIÇÃO: RELAÇÕES DE TERROR(ISMO) ENTRE O EU E O


112
OUTRO

CLEBINHO(A) NÃO TEM GÊNERO, PODE SER QUEM QUISER 117

CULTURA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL: UMA ANÁLISE DO


123
DOCUMENTÁRIO BABIES

EDUCAÇÃO ESPECIAL: ENSINO DE ARTE PARA PESSOAS INVISUAIS 128

ESTÁGIO SUPERVISIONADO II: PESQUISA E IDENTIDADE CULTURAL


133
DOCENTE

FOTOCUMENTÁRIO CONTEPORÂNEO. TINTA: DA PELE AO MURO 139

LA BÊTE E A CENSURA DA/NA ARTE DO/NO CORPO 145

LEITURA VISUAL MUSICAL: UMA EXPERÊNCIA INTERDISCIPLINAR NO


151
ESTÁGIO SUPERVISIONADO

LUMIA: A LUZ COMO MATÉRIA 157

MÁSCARAS AFRICANAS: HISTÓRIA DA ARTE TRIBAL E SUAS


162
INFLUENCIAS NO MODERNISMO

METODOLOGIA DE PESQUISA NAS ARTES VISUAIS 167

O “ALGO” QUE ESCAPA PELA FISSURA: UM DIÁLOGO ENTRE


173
NIETZSCHE E ROSA PARA LEITURA DO CONTO “O ESPELHO”

O CORPO COMO POSSIBILIDADE DE EXPERIÊNCIA NO ENSINO DE


178
ARTE

O DEVIR-CRIANÇA E A AMPLIAÇÃO DO SENTIDO DA EXPERIÊNCIA


184
EM UMA OFICINA DE LAMBE LAMBE

O SAMBA E O ARTISTA HEITOR DOS PRAZERES: ESTÁGIO


190
SUPERVISIONADO EM ARTES VISUAIS II

7
O SILÊNCIO DO TROTE EM PALOMO 197

O USO DA TECNOLOGIA NA PROMOÇÃO DA EDUCAÇÃO 202

PISTAS IDENTITÁRIAS 208

POÉTICAS DO CORPO 214

QUEM FAZ PARTE DA SUA FAMÍLIA?: ESTÁGIO SUPERVISIONADO EM


220
ARTES VISUAIS I

REAL E IRREAL: UMA RELAÇÃO ENTRE ÉTICA E ESTÉTICA EM


225
SARTRE

RECORTES E IMPRESSÕES: MATERIAIS DIDÁTICOS NO ENSINO


231
INFANTIL

RELAÇÕES (TRANS)FORMATIVAS ENTRE OBRA, ESPAÇO E


237
INSTITUIÇÃO

RELATO DE EXPERIÊNCIA: DOIS ESTAGIÁRIOS NA EDUCAÇÃO


243
INFANTIL

ENSAIOS VISUAIS

ALGUMAS MANEIRAS DE SER 249

“AMA$ÔNIA” 251

CRIAÇÃO DE GAMES: ALGO ALÉM DE UMA FERRAMENTA 254

FRAGMENTANDO-SE-R 256

MEMÓRIAS IMPRESSAS 260

MIMIMI: UMA FISSURA LITERÁRIA NOS MUROS DA UNIVERSIDADE 266

NARRATIVA DE UM CORPO CÍCLICO 268

SENSAÇÕES QUE PERPASSAM O CORPO EM AFETOS-TINTA 269

SUA MORAL É MINHA INEXISTÊNCIA 274

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VI SEMINÁRIO DE PROJETOS DE ARTES
VISUAIS

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A MULHER PROTAGONISTA DA HQ SAGA E SUA REPRESENTAÇÃO
ESTÉTICO-CORPORAL

Beatriz Marques Nolli (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
bia_nolli@hotmail.com
Resumo
O Projeto de iniciação científica (PIBIC/CNPq-FA-UEM), que se encontra em
andamento, começou a ser esboçado, ainda no formato de pré-projeto, durante a
disciplina de Metodologia de Pesquisa em Artes Visuais I, cursada no primeiro ano
da Graduação em Artes Visuais na Universidade Estadual de Maringá (UEM), em
2016, e ganhou contornos mais delimitados dentro do referencial teórico e
metodológico da Análise de Discurso francesa, abordagem de Michel Pêcheux,
seguido pela orientadora da pesquisa. Tendo como foco temático a representação
estético-corporal da protagonista Alana na História em Quadrinhos (HQ) Saga,
objetiva-se analisar tal representação estético-corporal em relação a um possível
padrão estético de corpo feminino em HQs protagonizadas por personagens
mulheres. Tal percurso analítico está norteado pela pergunta discursiva que indaga
se a protagonista feminina da HQ Saga se afasta e como de um possível padrão
estético apresentado nos quadrinhos em que há mulheres protagonistas ou se o
reproduz.

Palavras-chave: Análise de Discurso. Arte. História em quadrinho. Corpo. Mulher.

Introdução

O tema do meu projeto de iniciação científica acerca da representação


estético-corporal da mulher protagonista da História em Quadrinhos (HQ) Saga
resultou de questionamentos pessoais que surgiram de observações de imagens
presentes em meu cotidiano, mais especificamente de histórias em quadrinhos. Por
meio de tais observações como leitora e apreciadora de HQs, notei que muitos
quadrinhos, como X Men, Liga da Justiça e até mesmo os que tinham como
protagonista uma personagem do sexo feminino, como Mulher Gato e Mulher
Maravilha, apresentam a mulher com certo padrão: roupas provocantes, corpos
cheios de curvas e poses sensuais. Tal padrão, denominado por mim, a princípio, de
“padrão estético-corporal” – sendo que o estético aqui demarca a

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representação/significação visual desse corpo da mulher – pode causar certo
incômodo em leitoras do gênero feminino, pois muitas vezes mostra a mulher sendo
objetificada, também no sentido de que a personagem passa a ser usada na história
como um meio de chamar a atenção do público masculino para o quadrinho.
A partir desse “padrão”, e o incômodo que ele causava em mim, comecei
uma busca por HQs que fugissem deste padrão estético, procurando protagonistas
com corpos e características diversas. Nessa busca, deparei-me com a protagonista
Alana, da HQ Saga. HQ que é contada do ponto de vista de Hazel, filha de Marko e
Alana, soldados de planetas inimigos, que se apaixonam e precisam fugir.

Figura 1: Personagem Alana. Capitulo 2, Volume 1

Fonte: Acervo pessoal


Figura 2: Personagem Alana. Capítulo 5, Volume 1

Fonte: Acervo pessoal

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Foi mediante tal contato que passei a me interrogar sobre a presença ou não
de tal padrão estético-corporal, anteriormente mencionado, nesta protagonista.
Respaldada nos fundamentos e procedimentos da Análise do Discurso francesa
materialista, amparada em referências centrais Michel Pêcheux e de Eni Orlandi,
com contribuições de Maria Cristina Leandro Ferreira e Nádia Neckel, cheguei à
formulação da pergunta analítica que indaga se a protagonista feminina da HQ Saga
se afasta e como de um possível padrão estético apresentado nos quadrinhos em
que há mulheres protagonistas ou se o reproduz, dá continuidade a ele ou o
reconfigura.
Ao buscar uma resposta para tal interrogação, parti do objetivo de analisar a
representação estético-corporal da mulher protagonista da História em Quadrinhos
Saga em relação a um possível padrão estético de corpo feminino em HQs
protagonizadas por personagens mulheres. Portanto, esta é uma pesquisa que se
organiza em duas partes, bibliográfica e analítica, que busca abordar os objetivos de
apresentar, sinteticamente, o surgimento das primeiras personagens mulheres das
histórias em quadrinhos e discorrer sobre a recorrência de protagonistas mulheres
em HQs desde então; levantar, descrever e discutir características possivelmente
recorrentes de representação estética do corpo da mulher protagonistas em HQs
dos anos 2012 e 2013, capazes de apontar para a construção e sustentação de um
padrão estético-corporal de tais personagens; descrever a HQ Saga, considerando
especificidades de autoria e de editora e compreender o corpo como discurso;
finalmente, observar traços representativos da/na estética corporal da personagem-
protagonista Alana, da HQ Saga, na relação com um possível padrão estético-
corporal identificado em outras HQs protagonizadas por mulheres ou mesmo na
relação com especificidades outras identificadas nestas protagonistas.
Tal projeto, que surgiu, inicialmente, da disciplina de Metodologia de
Pesquisa em Artes Visuais I, no Curso de Graduação em Artes Visuais da
Universidade Estadual de Maringá (UEM), é desenvolvido vinculado ao Projeto de
Pesquisa Docente “Imagens-Visuais e Projeções Imaginárias de Sujeitos em
Materiais Artísticos e Midiáticos” (2016-2019), sob coordenação da orientadora

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Profa. Dra. Renata Marcelle Lara, e também integrado ao GPDISCMÍDIACNPq/UEM
– Grupo de Pesquisa em Discursividades, Cultura, Mídia e Arte, do qual faço parte.

Desenvolvimento

Sheilla Jeffreys, uma feminista australiana, aponta que a moda e as práticas


de beleza feminina, difundidas pela publicidade, são direcionadas ao corpo feminino
para satisfazer a desejos e necessidades sexuais dos homens. Como prova disso,
no universo dos quadrinhos, o desenhista Greg Capullo desenvolveu uma série de
cursos de desenho para a revista Wizard, especializada em histórias em quadrinhos.
Nessa série, o quadrinista dá várias dicas sobre como desenhar o corpo feminino,
tratando do tamanho ideal do quadril, seios, nádegas, largura dos ombros, das
curvas e sempre com um apelo sexual (CUNHA, 2016). A partir de um dos trechos
desse curso, fica visível o intuito de Cappulo de usar o corpo da personagem como
objeto de contemplação masculina, de maneira desrespeitosa e objetificadora,
usando até mesmo a expressão “de dar água na boca” para se referir à mulher
(CUNHA, 2016).
A partir de leituras de quadrinhos, sempre observei esse “padrão” proposto
no curso de Cappulo, algo que sempre me incomodou, pois não me via representada
nessas personagens. Além disso, as personagens femininas eram sempre as
culpadas por algo de errado que acontecia na história e sempre precisavam ser
salvas. Ao buscar quadrinhos que iam para além dos heróis, encontrei os quadrinhos
alternativos, publicado por editoras alternativas como a Vertigo – editora que
publicou o primeiro HQ alternativo que li, Sweet Tooth – e a Image Comics, dos
Estados Unidos, que publicou The Wicked + The Divine e Saga, que posteriormente
veio para o Brasil na editora Devir.
Saga é uma história em quadrinho de ficção científica da editora Image
Comics, lançada em 2012 e finalizada no começo de 2017. A trama é dividida em 42
capítulos que compõem 7 volumes, sendo apenas os 4 primeiros traduzidos e
lançados no Brasil pela Devir. Foi escrita por Brian K. Vaughan e desenhada pela
ilustradora Fiona Staples.

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Quando tive contato com Saga pela primeira vez, fiquei encantada com as
ilustrações de Fiona Staples e a personagem que ela ilustrou. Alana é magra, tem
cabelo curto e colorido, em contraste com as mulheres com muitas curvas e longos
cabelos com as quais estava acostumada, além de ter humor ácido, usar um vestido
e capa largos, normalmente com um pano enrolado ao corpo, onde carrega Hazel,
sua filha. Com medo de estagnar o pensamento no senso comum, aproveitei minha
dúvida e a oportunidade de fazer, como já disse, um pré-projeto que, posteriormente,
resultou no meu PIBIC, com recursos da Fundação Araucária, por uma abordagem
discursiva, desestabilizadora de sentidos tidos como “evidentes”.

Considerações finais

No momento em que a pesquisa se encontra, estudando a história dos


quadrinhos e um possível padrão estético-corporal, vejo que as representações das
mulheres sempre condizem com a situação histórica da mulher, como por exemplo,
a volta dela ao lar após a segunda guerra mundial, e, ao mesmo tempo, a produção
das Family Stripes. Assim, os tateamentos teórico-analíticos apontam que a
protagonista Alana se afasta do padrão estético-corporal observado nos quadrinhos
e formulado com base dos ensinamentos de ilustração de Cappulo, mas se identifica
com padrões estéticos-corporais socialmente aceitos atualmente, no caso, a mulher
alta e esguia, com roupas e cabelo modernos.

Referências

CUNHA, Jaqueline dos Santos. A representação feminina em Mulher Pantera e


Mulher Maravilha. 152 f. Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem) –
Universidade Federal de Goiás, Catalão, 2016.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. Discurso, arte e sujeito e a a tessitura da


linguagem. In: INDURSKY, Freda; FERREIRA, Maria Cristina Leandro; MITTMANN,
Solange (Orgs.). O acontecimento do discurso no Brasil. Campinas: Mercado de
Letras, 2013. p. 127-139.

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NECKEL, Nadia Regia Maffi. Análise do Discurso e o Discurso Artístico. In:
SEMINÁRIO DE ESTUDOS EM ANÁLISE DO DISCURSO. 2., Porto Alegre. Anais
eletrônicos...

Porto Alegre: UFRG, 2005. Disponível em:


http://www.ufrgs.br/analisedodiscurso/anaisdosead/2SEAD/SIMPOSIOS/NadiaRegin
aM affiNeckel.pdf. Acesso em: 19 nov. 2015.

ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 10. ed.


Campinas: Pontes, 2012.

PÊCHEUX, Michel. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio.


Campinas: Edunicamp, 1997.

VAUGHAN. Brian K. Saga. São Paulo: Devir, n. 1, 2014.

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APARIÇÕES VISUAIS DE UM ETERNO-RETORNO VISIONÁRIO

André Matheus dos Santos Franke (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
ra83830@uem.br

Resumo
Este trabalho tem como objetivo operar a arte visionária entrecruzada à noção de
eterno-retorno. A referida modalidade artística está relacionada com o que
chamaremos de Estados Não-Ordinários de Consciência (ENOC). Lewis-Williams
(2005), entre outros, afirma que a própria arte, como representação simbólica inicial,
apareceu após o contato do homem “primitivo” com estes estados de consciência.
Com base nesses pressupostos, a pesquisa busca pensar a noção de eterno-retorno
apresentada por Pelbart (2007) a partir de obras ou representações visuais de
períodos artísticos diferentes, de modo a investigar essa aparição visual deste
conceito, a partir das relações espiraladas do tempo e de imagens produzidas a
partir da experimentação de Estados não Ordinários de Consciência.

Palavras-chave: Arte visionária. Estados Não-Ordinários de Consciência (ENOC).


Eterno-retorno.

Introdução

Inicialmente, a ideia desta pesquisa era a de estudar e analisar a arte


visionária sem nenhuma espécie de barreira ou fronteira. Havia apenas uma
curiosidade em torno da psicodelia. Por meio do contato com leituras a respeito
desta arte, pouco desenvolvida nos livros de história da arte, a atenção foi
direcionada para elementos presentes nas imagens visionárias. Tais elementos são
apresentados por Mikosz (2009) em sua tese “A Arte Visionária e a Ayahuasca:
Representações Visuais de Espirais e Vórtices Inspiradas nos Estados Não
Ordinários de Consciência (ENOC) ”. De acordo com o desenvolvimento da pesquisa
de Mikosz (2009), são elementos visuais que surgem em meio ao processo de
experimentação deste Estado Não-Ordinário de Consciência (ENOC), um estado de

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consciência alucinatório, fora do “comum” e capaz de produzir na visão do indivíduo
estas espirais e vórtices que são vivenciadas por ele, que se afasta de sua sanidade,
propositalmente ou não.
As espirais e vórtices trabalhados por Mikosz (2009) são apresentadas como
elementos que se repetem tanto nas imagens quanto na experiência, pois, afinal, as
imagens da arte visionária são estritamente ligadas a este processo de
experimentação, como veremos no caso da artista visionária Maura Holden. Além de
produzir imagens a partir desta experimentação, ela também descreveu seu
processo no texto The Cosmic Mountain (2007), para o site Visionary Revue, onde
comenta um pouco o processo e contexto de algumas de suas obras.
A partir de leituras de cunho filosófico, baseadas em Pelbart (2007) e Gilles
Deleuze (1988), foi possível estabelecer uma relação produtiva em relação a esta
repetição dos elementos visionários na arte, entendo esses elementos, aqui, como
imagens em eterno-retorno, pois, por serem frequentes no processo da
experimentação visionária, como apresenta Mikosz (2009) ao escrever seu capítulo
“Lewis Williams e os 3 Estágios dos ENOC”, acabam se proliferando de forma
diferente. Esta é uma ideia apresentada por Pelbart (2007), vista em alguns textos
de Deleuze (1988), como em Diferença e Repetição, a respeito do eterno-retorno,
sendo que o que retorna dificilmente será o mesmo, mas transmuta para poder
retornar, perde-se ou se ganha conteúdo, em contextos diferentes. A arte visionária
se mostra, então, como materialidade da pesquisa, com a qual operaremos esse
conceito.

Desenvolvimento
Para apresentar esta relação entre eterno-retorno e arte visionária, foram
selecionadas duas obras de artistas visionários(as), a obra Travellers Moon (s.d.), de
Maura Holden (1967 -?) e The Lovers Whirlwind (1824), de William Blake (1757 -
1827). São obras distintas em termos de contexto, mas possuem conteúdos e
formas semelhantes. Em seu texto, Maura Holden deixa clara a influência de
enteógenos em seu processo criativo:

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O lado visionário do meu trabalho vem das terras estranhas e das dimensões
mentais que experimentei, em grande parte, através dos enteógenos. Parte do meu
objetivo na pintura é sintetizar alguns de meus interesses mais persistentes –
geometria, mitologia, arquitetura e várias obsessões ópticas (HOLDEN, 2007,
online).

Figura 1 (direita): Travellers Moon, sem data, Maura Holden.

Figura 2 (esquerda): The Lovers Whirlwind, 1824-1827, aquarela, 374 x 530 cm.
Disponível em: wikiart.org. Acesso em: 8 nov. 2017.

Não encontrei muitos registros sobre o processo criativo de William Blake,


mas devido ao caráter fantástico de suas produções, ele é considerado um artista
visionário por Caruana (2001), por evocar um imaginário pessoal em suas obras ao
ser capaz de criar sua própria visualidade religiosa para seu período histórico. Ele é
apresentado por Laurence Caruana (2001, p.9) em seu livro The first Manifesto of
Visionary Art, como um “artista visionário verdadeiro”, dentre inúmeros outros. Eis
então os motivos pelos quais estes artistas se fazem presentes nesta pesquisa.
Distante de uma proposta analítica para destrinchar os elementos destas
obras, operaremos a partir delas o conceito de eterno-retorno, com a intenção de
pensar este movimento artístico que se envolve com algumas partes da consciência
humana até então apagadas. Podemos nos atentar estritamente aos elementos já
trabalhados por Mikosz (2009), as espirais e vórtices, que se fazem presentes em
ambas as obras. Retomando o que dizíamos, vemos que estes elementos aparecem

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na visão do indivíduo em transe como parte do processo “revelador” dos enteógenos
e alguns psicodélicos.
A ideia de que o eterno-retorno é “verdadeiro” ainda permanece inalcançável
no que diz respeito à arte, e não se pode provar empiricamente o eterno-retorno por
si só. A percepção apresentada por Perbalt (2007) de que sempre há alterações no
que diz respeito a este conceito, é estudado também por Deleuze (1988) em
Diferença e Repetição, obra em que faz uma leitura e interpretação do pensamento
de Nietzsche e potencializa a ideia de que o retorno evocado por esta temporalidade
em que vivemos é sempre um retorno da diferença, ou seja, nada retornará da
mesma forma que foi, nem mesmo estas espirais, que podem ser vistas, talvez, da
mesma forma durante diversas experimentações, mas que sempre produzirão outros
sentidos diante de um repertório único de cada ser em contato com esta
experimentação, como é o caso de Maura Holden e William Blake citados acima.
Cada imagem possui uma forma de representar o movimento que é a espiral. No
caso da obra de Maura Holden, a espiral ocupa um lugar separado, é iluminada e,
de certa forma, evoca uma transcendencia do ser. Como inúmeras experimentações
podem sugerir e, no caso da obra de William Blake, a espiral é encontrada quase
como um nó, evoca um movimento. Mas, neste caso, um movimento “real” indica um
caminho maçante e repleto de outros seres que seguem esta espiral sem nenhuma
oportunidade de se livrarem dela, a não ser aos pés de uma figura entendida como
divina.
Frente ao exposto, formulo como objetivos específicos desta pesquisa:
compreender a maneira que as espirais e vórtices (presentes nas imagens
visionárias) se manifestam em diferentes obras e períodos a história da arte;
explorar e observar filosoficamente estes elementos visionários atemporais
recorrentes nas obras de Maura Holden e William Blake.

Considerações finais

Como dito anteriormente, não há uma intenção de destrinchar elementos ou


técnicas presentes nestas obras; apenas a necessidade de pensar e visualizar uma

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potência do que é entendido como eterno-retorno. Se houvesse aqui uma
preocupação em entender algo, seria a consciência humana e sua capacidade de
interpretar e ressignificar e reproduzir elementos que, nestes casos apresentados,
adviram de forma possivelmente inconsciente, pois, a partir dos textos de Maura
Holden fica clara sua proximidade com o mundo dos enteógenos e seu contato
“racional” com este estado não ordinário de consciência. Pela falta de registros
existe uma dificuldade em afirmar que William Blake também consumia enteógenos
ou tinha contato com alguma técnica de alteração de consciência. Ambas as
imagens, além de representarem os mundos de seus criadores, são preenchidas
com estes elementos visionários que insistem em retornar nas experimentações e no
inconsciente desses artistas, mas que são sempre apresentadas de maneiras
diferentes, revelando um pouco de quem as pintou.

Referências

CARUANA, Lawrence. First draft of a manifesto of visionary art. Paris: Recluse


Pub, 2001.

DELEUZE, Gilles. Diferença e repetição. Trad. Luiz Orlandi e Roberto Machado.


Rio de Janeiro: Graal, 1988.

HOLDEN, Maura. The cosmic mountain. Visionary Revue, 2007. Disponível em: <
http://visionaryrevue.com/webtext4/holden.html> Acesso em: 12 out. 2017.

LEWIS-WILLIAMS, J. D. La mente en la caverna: la consciencia e las orígenes


del arte. Madrid: Akal Editor, 2005.

MIKOSZ, José Eliézer. A arte visionária e a Ayahuasca: representações visuais de


esperais e vórtices inspiradas nos Estados Não Ordinários de Consciência (ENOC).
2009. 291 f. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) – Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, 2009.

PELBART, Peter Pál. O tempo não reconciliado: imagens de tempo em Deleuze.


São Paulo: Perspectiva, 2007.

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ARTE E PESSOALIDADES NO TRABALHO COM ARGILA DO ARTISTA-
PESQUISADOR

Aléxia Amanda Doro (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
lekadoro@hotmail.com

Resumo
Levando em consideração que a argila é um material utilizado desde os primórdios
da humanidade até hoje e que diversos artistas encontram nela as propriedades
necessárias para realizar seus trabalhos, interroga-se: como observar o inconsciente
no processo de produção artística envolvendo argila do artista-pesquisador? Para
responder este questionamento, recorre-se aos conceitos de poética pensados a
partir de Rey (2002) e de inconsciente (no caso freudiano) trazido por Bozza (2015).
O método, desenvolvido por Bozza (2015), será adaptado para melhor atender aos
requisitos da pesquisa em que busco investigar os aspectos da poética que podem
vir a aparecer na expressão do inconsciente pelo trabalho artístico com a argila na
pesquisa em arte, no caso analisando o próprio processo de criação do pesquisador.

Palavras-chave: Pesquisa em arte. Poética. Inconsciente. Argila.

Introdução

Expressar-se artisticamente é um ato que tem como possibilidade para a


execução o uso de diversos materiais e técnicas como pintura, gravura, desenho,
fotografia, poesia, entre outras alternativas. Elementos da natureza podem ser
utilizados também, de acordo com os interesses do artista, e a argila é um deles. Ela
é um dos materiais mais antigos utilizados pela humanidade (independentemente de
intenções artísticas) e até hoje artistas encontram nela as características
necessárias para a realização de suas produções. Peças esculpidas neste material
(como a Vênus de Willendorf) já foram encontradas e datadas com uma margem de
milhares de anos, a exemplo da Vênus anteriormente citada, cuja produção, de
acordo com Proença (2005), foi realizada no período Paleolítico Superior.

21
Outro exemplo, segundo a mesma autora, data do período Neolítico e
consiste em cerâmicas, nas quais se revela uma preocupação com a beleza para
além do utilitário. O Vaso escandinavo em terracota e a Ânfora da Dinamarca feita
com o mesmo material são dois exemplos que Proença (2005) traz, embora neste
período a utilização do metal pelos seres humanos tenha começado a dar seus
primeiros passos.
As mãos de nossos antepassados criaram cerâmicas que eram feitas “com
finalidades objetivas e simples, sendo de uso cotidiano (recipientes utilizados para
alimentar o corpo) ou ritualístico (recipientes utilizados para alimentar a alma) ”
(ALMEIDA, 2010, p. 26).
Dessa forma, podemos perceber a relevância da argila desde os períodos
mais antigos até os dias atuais. Ela é um material de fácil acesso, podendo ser
obtida diretamente da natureza (como no fundo de rios e vales), em papelaria e até
mesmo em sites de venda, além de variar em cor e qualidade para a modelagem. É
também um produto flexível, maleável e macio, que suporta a queima, mas que pode
ser seca com o ambiente, como explicita Bozza (2015).
Bozza (2015) também destaca que o psiquismo (de acordo com os estudos
freudianos) “é concebido como um aparelho que se estrutura via meio exterior e
meio interno. Os estímulos externos que chegam até o psiquismo o fazem pela
excitação dos órgãos dos sentidos” (BOZZA, 2015, p. 78).
Ainda em concordância com Bozza (2015), sua propriedade regressiva capaz
de levar à satisfação alucinatória pode auxiliar que o indivíduo descarregue sua
tensão interna. Dessa forma, “poderíamos pensar no material argila em contato com
as mãos como estímulo externo que excitará o psiquismo, imprimindo um
direcionamento na ação da modelagem e que teve seu nascimento no inconsciente”
(BOZZA, 2015, p. 79).
Diante de tal possibilidade, questionamos: Como observar o inconsciente no
processo de produção artística com argila do artista-pesquisador? Dessa forma, o
foco de tal investigação é para a poética do artista e sua relação com o inconsciente
na produção com a argila, e requererá, no desenvolvimento do projeto, três seções.

22
Primeiramente será levantado e discutido o conceito de poética, relacionando
com a arte, e, mais especificamente, com a argila. Para dar conta desta discussão,
recorrerei aos estudos de Rey (2002) para maior compreensão, como já explicitado,
do conceito de poética. Além deles, e pensando na necessidade de relacionar este
conceito com a arte, mais especificamente com a argila, utilizarei o livro Mulheres
recipientes de Almeida (2010).
A segunda seção também diz respeito a uma pesquisa bibliográfica, porém
apresentarei o conceito de inconsciente e compreenderei a maneira como ele se
expõe pela expressão da argila. Construirei esta seção do projeto com base nos
estudos a respeito do inconsciente freudiano a partir de Bozza (2015), além de sua
relação com a argila.
Bozza (2015) desenvolve, também, um método que será aplicado, porém com
adaptações, na terceira seção, pois o considero relevante para analisar o meu
processo artístico com argila. Dessa forma, para esta seção, refletirei acerca da
expressão poética na relação com o inconsciente que se materializa em meu
processo artístico com a argila e terei como base para análise os já mencionados
estudos da primeira e segunda seções.

Desenvolvimento

O trabalho com a argila vem sendo desenvolvido por mim desde criança, mas
só passou a ter uma relação com a arte depois que entrei na universidade e, mais
especificamente, quando tive meus primeiros contatos com o conceito de poética
ainda nas aulas de Desenho l, ministradas, no primeiro ano da graduação em Artes
Visuais da UEM, pela professora Sheilla de Souza,
Concomitantemente ao desenrolar dos primeiros marcos de pessoalidade em
meus trabalhos, uma inquietação com relação ao conceito de poética fez-se
presente. Rey (2002) considera que a obra de arte é como um iceberg. Isso significa
que, para além do que podemos visualizar, a obra de arte carrega uma parte

23
“oculta”, “invisível”, como a camada mais densa do referido iceberg
que não pode ser visualizada, mas que sustenta aquilo que somos
capazes de ver. Essa camada subaquática diz respeito à dimensão teórica,
às ideias e pensamentos que foram empregados durante o processo de
criação e é isso “o que a diferencia como obra de arte dos demais objetos
produzidos por uma sociedade” (REY, 2002, p. 125).

Dessa forma, junto a estes primeiros vislumbres conceituais, comecei a me


perguntar se aquilo que carregamos em nossas mentes, ou seja, o que está
armazenado em nossos inconscientes, poderia de alguma forma interferir no
processo de criação do artista.
O inconsciente, no caso freudiano, que mencionamos com base em Bozza
(2015), diz respeito aos “processos mentais dos quase não temos consciência,
portanto, inconscientes” (BOZZA, 2015, p. 73). A autora chega a criar um método
próprio intitulado “Argila: Espelho da Auto-Expressão”, o qual eu proponho adaptar
para atender aos meus interesses a respeito da possível relação entre a poética do
artista e a expressão que se dá por intermédio do inconsciente. Para tal proposta,
pretendo utilizar a argila em um trabalho próprio em que observo como se dá meu
processo artístico.
O método de Bozza (2015) pode ser aplicado de três maneiras, embora eu vá,
como já mencionado, adaptar. As três formas de aplicação citadas, segundo ela,
são:
a) sujeito e terapeuta modelam segundo tema livre ou tema dirigido –
apresentando os seguintes procedimentos: secagem das peças,
quebraduras, colagem, pintura, exposição das peças, destino das
esculturas e novas elaborações; b) tema escolhido pelo sujeito a partir das
esculturas previamente confeccionadas; c) escultura escolhida pelo
terapeuta como tema. Assim se torna um modelo de trabalho novo com um
material muito primitivo. Respeita a individualidade, pode ser aplicado
conforme a necessidade e o momento, levando à transformação da
dinâmica enraizada e petrificada daquele que busca auxílio (BOZZA, 2015,
p. 4)

Para este projeto, eu farei uso da segunda maneira de aplicação, todavia, ao


invés de esculturas terapêuticas, pretendo selecionar um tema a partir de esculturas

24
feitas por mim mesma, porém confeccionadas durante o segundo ano de graduação
na disciplina de Escultura I, ministrada pela professora Sheilla de Souza.
Para melhor visualização do que acontece, filmarei por quatro ângulos
diferentes meu próprio processo de criação e, para obter ainda mais dados,
escreverei meus pensamentos, ideias, sentimentos, entre outros possíveis
elementos que possam vir a fazer parte de meu processo em um caderno.
A análise dos dados coletados será feita após a conclusão do trabalho, tendo
como base os estudos freudianos a respeito do inconsciente, trazidos por Bozza
(2015), concomitantemente a alguns instrumentos de análise que Rey (2002)
sugere.

Considerações finais

Considerando tudo que foi dito, o projeto proposto trabalhará com a poética
do artista pesquisador, ou seja, será uma pesquisa em arte pensando na relação
entre a expressão e o inconsciente. Dessa forma, considera-se que o referido projeto
possa vir a ser relevante para artistas pensarem suas poéticas, além de possibilitar
que mais pessoas mergulhem nas diversas alternativas de experimentação artística
por ser uma pesquisa que envolve todo um universo que considera o processo de
produção e não apenas o objeto finalizado.
Além disso, por englobar toda uma fundamentação para além da prática, o
projeto poderá trazer contribuições para o curso de Artes Visuais, tanto teoricamente
quanto com relação às práticas.

Referências
ALMEIDA, Flávia Leme de. Mulheres recipientes: recortes poéticos do universo
feminino nas artes Visuais. São Paulo: UNESP, 2010.

BOZZA, Maria da Glória Gracco. Argila: espelho da auto-expressão. Curitiba: Ed. do


Autor, 2015.

PROENÇA, Graça. História da Arte. São Paulo: Afiliada, 2005.

25
REY, Sandra. Por uma abordagem metodológica da pesquisa em artes visuais. In
BRITES, Blanca; TESSLER, Elida (Orgs.) O meio como ponto zero: metodologia
da pesquisa em artes plásticas. Porto Alegre: UFRGS, 2002. p.123-140.

26
DIÁLOGOS ENTRE ARTE INTERATIVA E O JOGO JUST DANCE

Beatriz Naomi Ichiba (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
Beatriz.naomi.ichiba@gamil.com

Resumo
A presente proposta de projeto de pesquisa que tem como tema “Just Dance e a arte
digital interativa” objetiva investigar o jogo Just Dance como possibilidade de arte
interativa. Para tanto, os objetivos específicos levam, de início, a uma apresentação
do conceito de arte digital interativa e de jogos interativos; sequencialmente, a uma
descrição do jogo Just Dance; por fim, à análise do jogo, pela estrutura e
funcionamento, de traços que ressignifiquem e/ou sinalizem interatividade. Tudo isso
partindo dos pesquisadores Santos (2005), Melo e Silveira (2016), Gobira e Mozelli
(2017), entre outros. O problema de pesquisa centra-se, justamente, no incômodo
em saber de que forma o jogo em questão pode ser considerado arte interativa.

Palavras-chave: Arte. Jogo. Interatividade.

Introdução

Toda pesquisa precisa de um incômodo, de uma dúvida, uma incerteza sobre


algo, assim como interroga Lancri (2012) sobre como fazer uma pesquisa, de onde
devemos partir.
A dúvida que me fez fomentar esta proposta foi de que forma o jogo Just
Dance pode ser considerado uma forma de arte interativa, ainda mais que tanto a
arte interativa quando os jogos interativos utilizam equipamentos eletrônicos e
ambos necessitam de uma “ação recíproca, ação reação [...], pois sem ela não
existe como a indistinção do público” (SANTOS, 2004, p.101-102).
Por meio desta proposta, verei se é possível o diálogo entre a arte interativa e
o jogo Just Dance. É nesse sentido que o objetivo geral do projeto é investigar o jogo
mencionado como possibilidade de arte interativa.

27
Desenvolvimento

A pesquisa bibliográfico-analítica aqui proposta pretende ser desenvolvida,


futuramente, como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Também foi elaborada
como uma forma de me ajudar a pensar mais sobre jogos e arte e adquirir
conhecimento mais específico sobre a relação jogos e arte interativa.
Eu ainda estou em processo de pesquisa de referências, tendo em vista a
dificuldade em encontrar material específico sobre a temática. Pelo que consegui
levantar até o momento, parece haver poucas pesquisas sobre essa relação entre
arte e jogos interativos, mas encontrei algumas que discutem sobre jogos, arte
digital, interfaces visuais, arte e interatividade, entre outras que vão me ajudar a
amenizar essa dificuldade.
Até agora, encontrei textos como o de Moran (2013), que aborda sobre os
desafios que as tecnologias digitais nos trazem; Poltronieri (2010), sobre “Possíveis
relações entre a arte e os jogos eletrônicos: uma introdução ao conceito de estética
aplicada as possibilidades do jogar digital”; e os textos de Santos (2005), que
abordam sobre a arte interativa. Inicialmente, o referencial teórico que irei utilizar é
baseado nos pesquisadores Santos (2004; 2005), Melo e Silveira (2016), Gobira e
Mozelli (2017).
A parte bibliográfica do projeto, assim como a analítica, está voltada a
responder de que maneira o jogo Just Dance pode ser considerado uma forma de
arte interativa. Como este incômodo, na forma de problema de pesquisa, ainda é
muito recente na área das Artes, tal como foi esclarecido, ainda continuo realizando
levantamento de material sobre isso.
No desenvolvimento da pesquisa, pretendo elaborar três secções
investigativas para tentar responder ao problema da investigação, partindo do
objetivo geral que é investigar o jogo Just Dance como possibilidade de Arte
interativa.
A primeira seção, bibliográfica, que será elaborada, busca apresentar o
conceito de arte digital interativa e jogos interativos, abordando, assim, o que é arte
digital e o que é jogo interativo, inicialmente partindo dos textos como de Gobira e

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Mozelli (2017), Santos (2005) e Melo e Silveira (2016), para explicar sobre o
conceito de arte interativa e sobre os jogos interativos. Posteriormente, descreverei o
jogo interativo Just Dance, partindo do próprio site oficial da empresa que lançou o
jogo, a Ubisofit, como de sites afins, que falam sobre ele e suas edições de
lançamentos, planejamentos, criação, entre outras coisas sobre o jogo em si. E, por
fim, analisarei o jogo Just Dance, buscando observar na sua estrutura e
funcionamento traços que resinifiquem e/ou sinalizem interatividade, com o intuito
de, assim, estabelecer um diálogo entre eles. O material de análise será obtido em
meio virtual, como também empréstimo do material de uma amiga minha que possui
uma das versões do jogo. Todo o material está disponível para compra em qualquer
loja de jogos, mas precisa de um equipamento para jogar, podendo ser Nitendo Wii,
Xbox One, Wii, Playstation, entre outros. Para aqueles que apenas querem observar
como funciona o jogo interativo, há diversos vídeos no Youtube que mostram
pessoas jogando, basta apenas digitar “Just Dance” que você terá acesso ao próprio
canal do jogo.
Quanto ao método de análise, este ainda não foi definido, tendo em vista a
dificuldade inicial em levantar textos teórico-metodológicos sobre a temática ou
outros que permitam o diálogo com o meu tema. Isso será estabelecido,
posteriormente, com o auxílio da futura orientadora do TCC.
Como ainda tem muito caminho a ser percorrido e pesquisado, mesmo que
essa pesquisa seja concluída, ela sempre vai fomentar algo, e mostrar novas visões,
caminhos e conhecimentos.

Considerações finais

Com essa proposta de projeto de pesquisa eu espero compreender melhor se


existe essa possibilidade de relação entra os jogos interativos e a arte interativa.
Além disso, o tema a ser investigado também tem a ver com o meu interesse
pessoal e profissional, pois pretendo seguir minha carreira profissional na área
tecnológica. Realizar esta pesquisa seria uma forma de adquirir conhecimento na
área.

29
Essa dúvida se jogos podem ser uma forma de arte surgiu na disciplina “Arte
e Tecnologia”, no curso de Graduação em Artes Visuais da Universidade Estadual
de Maringá (UEM), ao ter contato com textos sobre arte interativa, como um artigo
de revista do Centro de Arte e Letras, escrito por Nara Cristina Santos, em 2005,
com o título como “Arte e Tecnologia: considerações sobre o percurso histórico”.
Nele, Santos descreve a relação da arte e a tecnologia no decorrer do tempo. Na
página 35, subsecção “Tecnologia no tempo da arte: a experiência da presença”,
Santos (2005) aborda sobre a fotografia e seu surgimento, como também sua
relação com a arte.
No início, a fotografia não era considerada uma forma de arte. Havia críticos,
estudiosos, pesquisadores que questionavam isso. Atualmente ainda existem
pesquisas sobre essa dúvida, como pode ser visto nos textos de Kossoy
“Fundamentos Teóricos. Fotografia e História” e “Processos de criação na
fotografia”, mas boa parte dos pesquisadores considera a fotografia uma forma de
arte, até porque “a fotografia, por ser um meio de expressão individual, sempre se
apresentou a incursões puramente estéticas; [...] não pode ser entendia apenas
como registro da realidade factual” (KOSSOY, 2001, p.49) como também “a
fotografia transforma o mundo da arte a ponto de modificar totalmente a recepção de
uma obra de arte e de metamorfosear uma arte menor em arte maior” (SOULAGES,
p.152).
Se o jogo interativo for de fato uma possibilidade de arte interativa, e caso
futuramente venha a ser considerado uma forma de arte, seria de suma importância
estudar sobre, já que atualmente, na UEM, temos disciplinas envolvendo tecnologia
e arte, foto e vídeo, arte e tecnologia, presentes na grade do Curso de Artes visuais.

Referências

GOIBIRA, Pablo; MOZELLI, Antônio. As interfaces de realidade virtual no século


XXI. Revista Z Cultural, Minas Gerais, n.1, p.1-9, mar./mai.2016.

KOSSOY, Boris. Fotografia e história: fundamentos teóricos. São Paulo: Ateliê


Editorial, 2001. p.35-54.

30
LANCRI, Jean. Colóquio sobre a metodologia da pesquisa em artes plásticas na
universidade. In: BRITES, Blanca; TESSLER, Elida (Orgs.). O meio como ponto
zero: metodologia da pesquisa em Artes Plásticas. Porto Alegre: EdUFRGS, 2002.
p. 15-33.

MELO, Venise Paschoal De; SILVEIRA, Luciana Martha. A Obra de Arte aberta e os
processos de interatividade. Art Sensorium, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 51-61, jun. 2017.

MORAN; BEHRENS, Masetto E. Novas tecnologias e mediação pedagógica:


Desafios que as tecnologias digitais nos trazem. 21 ed. Campinas: Papirus, 2013. p.
30-35.

SANTOS, Nara Cristina. Arte e Tecnologia: considerações sobre o percurso


histórico. Expressão, Santa Maria, v. 1, p. 34-42, jan./jun. 2005.

SANTOS, Nara Cristina. Projetos brasileiros: Diana Domingues e a instalação


interativa. Expressão, Santa Maria, v. 2, p. 41-47, jul./dez. 2015.

SOULAGES, François. Reflexões: A ficção Fotográfica. [S.L.: s.n.], 2006. p.149-155.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA. O jogo virtual e o ensino de arte.


Disponível em:
<
http://www.nupea.fafcs.ufu.br/pdf/9eraea/relatos_pesquisa/comunicacao_rp_av_ma
rilia.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2017.

UBISOFT. Just Dance. < https://www.ubisoft.com/pt-br/game/just-dance-2018/>.


Data de acesso: 8 de nov.2017

31
ENTRE BECOS E VIELAS, A VIDA COTIDIANA DOS DEUSES CLÁSSICOS NAS
OBRAS (MONTAGENS) DE ALEXEY KONDAKOV

Isabella Dinardi (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
isa.b.ella@hotmail.com

Resumo
O projeto de pesquisa proposto reúne como material de análise a série “A vida
cotidiana dos deuses”, do artista Alexey Kondakov, que trabalha com o Photoshop,
criando montagens nas quais ele insere pinturas do período clássico em cenas
urbanas de sua cidade natal Kiev, na Ucrânia. O artista manipula obras clássicas de
diversas épocas, principalmente o Renascimento e o Barroco. Objetiva-se investigar
o procedimento de Alexey Kondakov no resgate dos personagens da arte clássica,
mais precisamente, do Renascimento e do Barroco, inserindo-os em contextos
cotidianos e contemporâneos, a fim de possibilitar olhares outros para a arte
clássica. Frente a isso, interroga-se como o artista resgata a arte clássica, por meio
de personagens clássicos na arte digital. Para tanto, trilha-se um percurso pela
Cultura Visual, tendo como um dos autores de referência Raimundo Martins.

Palavras-chave: Cultura Visual. Arte digital. Arte clássica. Fotografia.

Introdução

Os deuses do período clássico vieram visitar o século XXI, escolhendo um


destino nada comum: Ucrânia. Entre becos, metrôs, ruas desertas, eles se espalham
e se adaptam à realidade moderna. Por meio do artista Alexey Kondakov, atribuir
uma ressignificação para esses personagens clássicos tornou-se um meio de
mesclar a arte digital com a arte clássica. O artista produz, por meio do Photoshop,
colagens em que figuras de pinturas clássicas são inseridas em cenários urbanos.
Logo, o cenário é sua própria cidade natal, Kiev, na Ucrânia.
Tratando-se da arte acerca da própria cultura do artista, de seu país e cidade,
a proposta de pesquisa fundamenta-se na perspectiva da Cultura Visual. Escolheuse
tal perspectiva porque, segundo Martins (2006), a arte designa mais do que uma
categoria; ela inclui espaços, valores. O artista busca cenários em sua própria
cidade e isso inclui sua própria cultura e o olhar artístico para cenários urbanos que

32
podem significar um resgate de uma época passada, agora de volta para o contexto
atual.
[...] como nenhuma configuração histórica isola-se das demais, mas muitas
são convocadas simultaneamente neste ou naquele discurso, as “formas
de olhar” misturam-se e sobrepõem-se umas às outras nos modos de se
perceber, conhecer e habitar o mundo (BECCARI; PORTUGAL, 2013, p.2).

A partir da série “A vida cotidiana dos deuses”, objetiva-se investigar o


procedimento do artista Alexey Kondakov no resgate dos personagens da arte
clássica, mais precisamente, do Renascimento e do Barroco, inserindo-os em
contextos cotidianos e contemporâneos, a fim de possibilitar olhares outros para a
arte clássica. Como é explorado em uma de suas montagens da série, na figura 1 é
possível notar as duas etapas que o artista realiza: a fotografia e a inserção dos
personagens nesta. Uma das formas de explicar essa mescla do clássico com o
digital é o discurso acerca da imagem da realidade para a realidade da imagem:

Figura 1: Le chant des anges (O canto dos anjos), 1881, de Bouguereau. Colagem: Alexey
Kondakov, 2015.

Fonte: site Art and facts, 2015.


Disponível em: < https://www.mdig.com.br/index.php?itemid=36058>. Acesso em: 4
out. 2017.

33
Essa forma de encarar a relação entre fantasia e realidade nos faz perceber
também o engodo que é a promessa tecnocientífica de nos fazer penetrar em uma
realidade mais real – ou, de todo modo, mais adequada a nossos desejos – que
aquela acessível pelos sentidos (BACCARI; PORTUGAL, 2013, p.8).
Por fim, o problema de pesquisa interroga: Como o artista Alexey Kondakov
resgata a arte clássica, por meio da inserção de personagens clássicos na arte
digital? O que é suposto é como o artista olha para esses deuses clássicos, o que
eles despertam no cenário contemporâneo, a fim de ressignificar lugares comuns,
mesclando arte com a realidade.

Desenvolvimento

Alexey Kondakov, em uma entrevista concedida ao site Forbes (2017),


menciona que, quando criança, ao ser levado por seus pais ao museu, estava
aborrecido. Ele acrescenta que não possuía um olhar para as artes plásticas, e que,
posteriormente, começou a convidar e imaginar esses personagens clássicos para a
sua realidade, imaginando a vivência desses deuses em Kiev. De acordo com o site,
Kondakov nasceu em 1984, em Donetsk, no leste da Ucrânia. Começou a se
interessar por arte quando estava no ensino médio. Na graduação cursou Arte e
Design Gráfico, posteriormente, Mestrado em Design.
Partindo da perspectiva da Cultura Visual, na linha de Raimundo Martins
(2010), pesquisador da área, é significativo reconhecer que poucos artistas
conseguiram autoridade para abalar o sistema, como ele coloca, para diminuir a
distância entre arte e vida, arte e cotidiano. Kondakov surge como um artista
contemporâneo que consegue trazer para seu trabalho essa aproximação
comentada pelo pesquisador. Martins (2010) também evidencia que a ideia de que
as imagens têm vida cultural e exercem poder psicológico e social sobre os
indivíduos é o bordão que ampara a cultura visual (MARTINS, 2010, p. 73). Logo, as
montagens do ucraniano carregam uma vida cultural muito abrangente, de modo
que, em uma montagem, notam-se elementos da arte clássica, da fotografia

34
contemporânea, da interferência na plataforma digital. As montagens incluem e
unificam diversas questões culturais que levam a questionar o que cada cultura está
influenciando na outra.
O Photoshop, editor usado pelo artista, possibilitou que ele mesclasse a foto
urbana, tirada por ele mesmo, com a imagem da pintura clássica, retirada da
internet. Além da mescla, possibilitou o recorte dos personagens, assim como a
edição dos tons das duas imagens, do brilho, contraste, fatores que influenciam no
contexto e definem um trabalho mais detalhado.
Alexey Kondakov declarou na mesma entrevista concedida ao site Forbes
(2017) anteriormente mencionada, que na graduação virou um grande fã do pintor
clássico Bouguereau (1825-1905), tendo suas obras utilizadas com frequência nas
montagens do ucraniano. Na série “A vida cotidiana dos deuses”, Kondakov usa a
imagem de deuses como: Apolo, Vênus, Adonis, entre outros. Além de ninfas e
anjos, ele também explora as figuras bíblicas, como a virgem Maria, Davi e Golias.
Kondakov resgata muitos deuses da mitologia. Ele argumenta, durante a entrevista,
que esses personagens acabam servindo de lição na história da arte, para nós que
somos meros mortais, como afirma. Mesmo que tirados de seus contextos originais,
acabam extrapolando os livros e museus.

Considerações finais

Diante do trabalho desenvolvido por Alexey Kondakov, nota-se que a arte


digital tem trazido à realidade contemporânea as figuras da arte clássica.
Ressignificar esses personagens é buscar olhares outros para um contexto que já foi
muito significado ao longo da história da arte e ainda é. A série: “a vida cotidiana dos
deuses” busca mostrar que o cotidiano também possui sua beleza e isso muitas
vezes passa despercebido. A arte resgatou não só personagens, mas pintores da
época que não tiveram seus nomes tão destacados. A beleza da mescla entre o
digital e o clássico é fazer difundir não só o visual, mas o conceito que existe para
além da realidade que nos cerca, podendo nos fazer imaginar que a arte está

35
diariamente em nosso cotidiano, e como artistas, poder ressignificar e produzir a
partir de um cenário dentro de nossa própria cultura.

Referências

ARTES VISUAIS. Arte digital. Disponível em:


<http://www.artesvisuais.net/artedigital.php/>. Acesso em: 7 nov. 2017.

BALISCEI, João Paulo; STEIN, Vinicius. Como olhamos e somos olhados pelas
imagens? Estudos críticos dos artefatos da cultura visual. Revista Reflexão e Ação,
Santa Cruz do Sul, v. 23, n .1, jan./jun. 2015.

BECCARI, Marcos; PORTUGAL, Daniel B. Da imagem do real para o real da


imagem: por um elogio das aparências. In: PPGCOM ESPM – COMUNICON, 2013,
São Paulo. 3º Encontro de GTs – Comunicon. São Paulo: ESPM, 2013. p. 1-13.

FABER, Marcos. O Renascimento – história ilustrada da arte. [S.l.: s.n.].

GOMBRICH, Ernst Hans Josef. A História da Arte. 16. ed. Rio de Janeiro, LTC,
1999.

JONES, Jonathan. A second coat: why painting is the come back art of the 21st
century. Disponível em:
<https://www.theguardian.com/artanddesign/jonathanjonesblog/2016/dec/01/painting
-comeback-painters-painters-saatchi-gallery-london>. Acesso em: 10 set. 1
MDIG. A vida cotidiana dos deuses: imagens extraídas de pinturas e reinseridas
em momentos do mundo moderno. Disponível em:
< https://www.mdig.com.br/index.php?itemid=36058>. Acesso em: 10 set. 2017.

REIS, Osmar Gonçalves. Reconfigurações do olhar: o háptico na cultura visual


contemporânea. Visualidades, FAV/UFG, Goiânia, v.10, n.2, jul-dez 2012.

SOUZA, Evandro da Silva; SANTOS, Wesley Rocha. O barroco na Europa. Revista


eletrônica, FJAV, Sergipe. Disponível em:
<http://linux.alfamaweb.com.br/sgw/downloads/142_104453_OBarroconaEuropa.pdf
>. Acesso em: 10 set. 2017.

TRAVISANI, Tatiana Giovannone. Imagem em movimento na arte: o digital como


processo criativo. In: Neamp – Programa de Estudos Pós-graduados em Ciências
Sociais. São Paulo: PUC, 2010. 1

UM olhar sobre a arte. A Arte da Antiguidade Clássica - Arte Romana . Disponível


em: <http://umolharsobreaarte.blogs.sapo.pt/8801.html>. Acesso em: 07 nov. 2017.

36
ZAFRA, Remedios. I like your image. Políticas da afetividade e da cultura de arquivo
na rede. Visualidades, FAV/UFG, Goiânia, v.14 n.1, jan-jun 2016. p. 1-20.

37
O CORPO COMO TELA NAS PRODUÇÕES DO ARTISTA CRAIG TRACY

Bárbara Boer Rodrigues (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
barbara_boer_rodrigues@hotmail.com

Resumo
A proposta temática do projeto de pesquisa que se busca desenvolver tem como
enfoque o corpo nas produções do artista Craig Tracy. Pensando sobre os
processos de desenvolvimento de uma obra com base no artista, interroga-se
analiticamente: Como a pintura corporal se apresenta na relação com o cenário
artístico em obras de Craig Tracy? Ao formular tal problemática e procurar
compreender tal processo, busca-se o desenvolvimento de uma série de pinturas
corporais, inspiradas no artista citado acima. Como suporte teórico, utiliza-se a
Cultura Visual de acordo com Odailson Berté e Irene Tourinho (2014), além de
conceitos de Mestiçagem e Hibridismo apresentados, respectivamente, por Paulo
César Ribeiro Gomes e Stevão Cleando Tombini (2013), e também referências
sobre pintura corporal no meio artístico.

Palavras-chave: Arte Contemporânea. Cultura Visual. Pintura Corporal.

Introdução

A partir da pergunta mobilizadora desta proposta de pesquisa, ou seja, “Como


a pintura corporal se apresenta na relação com o cenário artístico produzido por
Craig Tracy?”, busca-se entender os processos de fusão presentes nas obras
criadas pelo artista, pois este elabora pinturas corporais, as quais se fundem com o
cenário, também produzido por ele. Como citado anteriormente, o artista faz um
estudo sobre a junção do corpo com o cenário, onde o primeiro é colocado à frente
do último. Para isso, são utilizadas tintas corporais e máquinas de Air brush1 para
misturar as texturas e elementos do cenário, trazendo estes ao corpo. Ao final dessa
pintura, o artista fotografa e compartilha em sua galeria virtual, pois é um dos meios
de se ter acesso à sua obra, e foi a via pela qual tive acesso a ela.
1
Air brush é um instrumento utilizado para elaborar pinturas por meio da pulverização de
uma fonte de ar comprimido, cuja tinta é expelida pela pressão da fonte de ar. Age
controlando a força de ar, e quando projetado no lugar desejado, tende a ter um aspecto
natural, sendo utilizado em maquiagens artísticas e sociais. O equipamento precisa de uma
tinta adequada, sendo ela fluída ou diluída.

38
Além disso, a análise parte da fundamentação teórica a partir da Cultura
Visual e dos conceitos de Mestiçagem propostos por Irene Tourinho, Odailson Berté
(2014) e Paulo César Ribeiro Gomes (2013). Frente ao exposto, formula-se como
temática desta pesquisa “O corpo como tela nas produções do artista Craig Tracy”.
O maquiador citado anteriormente, de acordo com a galeria online Craig Tracy’s
Fine-art Bodypainting Gallery, nasceu em New Orleans, Los Angeles e participa de
um programa de televisão como jurado, cujo o nome é Skin Wars, transmitido pela
emissora GSN.
Sobre o corpo como tela, Viviane Matesco (2011) compreende-o como sendo
um suporte pictórico, ou seja, um objeto que o artista pinta. Dessa forma, o artista
citado acima realiza pinturas corporais, fazendo a utilização de um corpo,
transformando-o em uma obra de arte. Para Tania Rivera (2013), o corpo que
participa de uma obra se torna um objeto. E é o que vejo no trabalho artístico de
Craig Tracy, que produz suas obras em corpos/objetos magros e femininos, os quais
se encontram dentro de padrões de beleza socialmente produzidos e aceitos.
Mesmo as suas obras contendo diversos tipos de corpos, a grande maioria é
representada pelo magro. Além do mais, por se considerar um artista
contemporâneo, de acordo com sua galeria virtual Craig Tracy´s Fine-Art
Bodypainting Gallery (2017), ele transforma corpos em obras de arte, saindo do
padrão artístico de antes dos anos 1960, e é nesse momento historiográfico,
segundo Matesco (2011), que surge a Body art2, permitindo uma dissolução de
ramificações, como a Body Painting3, sendo ela pouco reconhecida.
Com a abordagem sobre a pintura corporal na contemporaneidade, o objetivo
é buscar investigar sobre esta arte nesse período citado, dando enfoque ao
maquiador Craig Tracy, sendo que este, de acordo com a sua galeria virtual (2017),
se considera um artista contemporâneo. Dessa forma, observa-se de que maneira a
arte contemporânea interfere nas obras Tracy, uma vez que ele é um maquiador que

2
Body art é uma arte realizada no corpo, sendo assim, o corpo se torna suporte pictórico. 3
Body painting significa pintura corporal, ou seja, o corpo é pintado por determinado artista,
como, por exemplo, Craig Tracy que realiza pinturas nos corpos femininos.

39
realiza pinturas corporais, desenvolvendo imagens cativantes. Portanto, de acordo
com Michael Archer (2013) na contemporaneidade,

[...] não parece haver mais nenhum material particular que desfrute do
privilégio de ser imediatamente reconhecido como material da arte: arte
recente tem utilizado não apenas tinta, metal e pedra, mas também ar, luz,
som, palavras, pessoas, comidas e muitas outras coisas. (ARCHER, 2013,
IX)

Desse modo, Craig Tracy aproxima-se da definição mencionada acima, uma


vez que utiliza corpos, fotografias, tintas, dentre outros elementos para compor sua
arte.

Desenvolvimento

Como um dos objetivos específicos, o projeto busca compreender a presença


e os sentidos de pintura corporal nas artes, tendo em vista que a maioria das
produções teóricas acadêmicas sobre pintura corporal possue um enfoque
relacionado à pintura corporal indígena em suas relações culturais e ritualísticas.
Ao introduzir sobre esse tipo de arte, objetiva-se, também, levantar
problematizações em relação ao corpo nas obras do Craig Tracy, a partir das teorias
da Cultura Visual sobre imagem e corpo. Sendo a contemporaneidade marcada pela
dissolução dos padrões estéticos impostos historicamente pela sociedade, várias
renovações no meio artístico tornam-se necessárias para acompanhar o
pensamento da sociedade, sendo este período, de acordo com Gomes e Tombini
(2013), norteadas pela criação, originalidade e exaltação do artista criador. Tais
renovações englobam a utilização de temáticas inclusivas, bem como a introdução
de uma perspectiva de grupos considerados como minorias, por exemplo, negros,
autistas, pessoas de massa corpórea mais elevada, deficientes físicos e mentais.
O objetivo específico sequencial é analisar o processo artístico da pintura
corporal, na relação com o cenário criado pelo artista Craig Tracy, pois, como citado
anteriormente, ele consegue criar uma relação de mistura e fusão entre o corpo e o
cenário também produzido por ele. Além do mais, esta ligação entre os dois será

40
observada com base nos conceitos de Mestiçagem e Hibridismo, pois segundo
Gomes e Tombini (2013), o primeiro é a relação de mistura de elementos díspares
como, por exemplo, profundidade/superfície, figuração/abstração, dentre outros. Já
no Hibridismo há uma relação homogênea, porque visa fundir todos os elementos
em um único.
Portanto, após a realização da parte teórica e analítica do projeto, será
desenvolvida uma parte artística, que resultará em uma série de pinturas corporais
inspiradas no artista Craig Tracy. A elaboração de tal série, buscará pensar corpos
que se distanciam dos padrões disseminados pela sociedade, e dos corpos magros
e curvilíneos das colaboradoras das obras de Craig Tracy. Contudo, apesar da
divergência sobre a ideia de que corpos são passíveis de serem utilizados na pintura
corporal, o cenário artístico produzido pelo artista foi um dos aspectos que me
cativou e me instigou a pesquisá-lo.

Figura 1 - Monarch, de Craig Tracy

Fonte: Craig Tracy’s Fine-art Bodypainting Gallery, 2017.

Sendo assim, a fusão entre o cenário e a pintura corporal também será


explorada na série. A proposta de pesquisa sobre “O corpo como tela nas
produções do artista Craig Tracy”, desencadeará uma série de pinturas corporais,
que priorizarão corpos fora dos padrões implantados pela sociedade, ou seja, será
feito um trabalho em pessoas excluídas socialmente. Será necessário para o

41
desenvolvimento dessa poética, a percepção e análise crítica dos corpos utilizados
por Craig Tracy, os quais se enquadram em modelos socialmente aceitos, magros,
diferentemente do que será proposto. Convergindo também com o trabalho de Craig
Tracy, as pinturas que serão realizadas no projeto estarão disponíveis na internet
por meio de uma página no Facebook e Instagram.
Para Monica Ferreira Magalhães (2011), tanto a maquiagem quanto a pintura
corporal são linguagens usadas em texto, os quais, por sua vez, são dotados de
significação, e, sendo um enunciado em ato, acontece a partir de uma presença
efetiva, mesmo que o suporte corporal esteja virtualmente afastado. (MAGALHÃES,
2011, p. 54)

Considerações finais

A temática proposta para investigação possibilitará desenvolver uma visão


crítica acerca dos padrões utilizados até mesmo na arte contemporânea, levando a
uma prática de criatividade, uma vez que, para isso, é presente uma desconstrução
dos cânones de beleza contemporâneos. Além da proposta de criação de uma
poética diferenciada, as obras de Craig Tracy apresentam também uma relação com
o cenário artístico. Para isso é necessário que a pintura corporal instigue a
criatividade, sendo a fusão entre os dois o que cativa e traz reflexões, além de
problematizações acerca deles.

Referências

ARCHER, Michael. Arte contemporânea: uma história concisa. Tradução de


Alexandre Krug, Valter Lellis Siqueira. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.

CRAIG Tracy´s Fine-Art Bodypainting Gallery. Disponível em:


<http://craigtracy.com/>. Acesso em: 10 nov. 2017.

GOMES, Paulo César Ribeiro; TOMBINI, Stevão Cleandro. Mestiçagens e


hibridismos: permeando o processo de construção do espaço pictórico. In:
ENCONTRO NACIONAL DA ANPAP, 22., 2013, Pará. Anais eletrônicos... Pará:
UFPA, 2013. p. 1357-1368. Disponível em:

42
<http://www.anpap.org.br/anais/2013/ANAIS/comites/pa/Cleandro%20
S.%20Tombini .pdf>. Acesso em: 30 out. 2017.

MAGALHÃES, Monica Ferreira. As articulações entre o corpo e a maquiagem


corporal de Craig Tracy. Estudos Semióticos, São Paulo, v. 7, n. 1, p. 48-55, jun.
2011 Disponível em: <http://fflch.usp.br/dl/semiotica/es>. Acesso em: 30 out. 2017.

BERTÉ, Odailson; TOURINHO, Irene. Entre madonas virgens e eróticas: corpo,


imagem e afetos como investimentos das pedagogias culturais. In: MARTINS,
Raimundo; TOURINHO, Irene. Pedagogias culturais. Santa Maria: UFSM, 2014,
p.73-99.

MATESCO, Viviane. Corpo-Objeto. In: ENCONTRO NACIONAL DA ANPAP, 20.,


2011, Rio de Janeiro. Anais eletrônicos... Rio de Janeiro: UFF, 2011. p. 2981-2995.
Disponível em: <
http://www.anpap.org.br/anais/2011/pdf/chtca/viviane_furtado_matesco.pdf>. Acesso
em: 30 out. 2017.

RIVERA, Tania. O retorno do sujeito: sobre performance e corpo. In: ______. O


avesso do imaginário. São Paulo: Cosac Naify, 2013, p. 19-45.

43
O DESENVOLVIMENTO POÉTICO SOBRE PEÇAS DE VESTUÁRIO

Ana Julia Preza de Campos (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
anajulia_prezacampos@hotmail.com

Resumo
A proposta investigativa visa averiguar as especificidades do ato poético em pintura
e gravura na produção de blusas para vestuário, partindo da modalidade de
pesquisa em artes visuais. O presente resumo aborda minimamente sobre a
particularidade da pesquisa em artes visuais. O lugar teórico adotado é a perspectiva
psicanalítica de Jung, tendo em vista as contribuições que suas visões da
psicanálise podem ter para a investigação do processo de criação deste trabalho.
Uma vez que o tema do projeto é “A especificidade do desenvolvimento poético na
produção artística sobre suporte de vestuário utilizando pintura e gravura”, a
pergunta problema leva a interrogar o que muda quando a produção artística com
pintura e gravura é sobre uma peça de vestuário.

Palavras-chave: Processo poético. Vestuário. Inconsciente. Gravura. Pintura.

Introdução

Quando observamos a engenharia de uma casa pronta, conseguimos notar


todas as paredes já levantadas formando o todo. Andamos por ela, enxergamos os
cantos escuros, as ranhuras nas paredes, as rachaduras; conseguimos caminhar por
dentro de cada cômodo e observar a fundo todos os detalhes que somos capazes a
olho nu. Esse exercício demanda tempo, dedicação e uma atenção aguçada. No
entanto, por mais que observemos todas essas minúcias, só chegamos lá quando a
casa já estava pronta, tivemos o trabalho de entrar e nos acomodar.
Ao passarmos pelo processo de observar a casa em construção, descobrimos
que nem tudo que estava planejado saiu como o esperado. Esse é o desafio que me
proponho nesta pesquisa: observar meu próprio processo de construção da obra,
mas uma obra artística, tendo como objetivo investigar as especificidades do ato
poético em pintura e gravura na produção de blusas para vestuário. Como dito por
Cecilia Salles (1998, p. 25), “o artefato que chega às prateleiras das livrarias, às

44
exposições ou aos palcos surge como resultado de um longo percurso de dúvidas,
ajustes, certezas, acertos e aproximações”, ou seja, o processo de criação carrega
uma bagagem tão grande, ou até maior, do que a obra final propriamente dita.
Pensando na investigação do processo de produção poética, direciono-me
para uma maneira específica de produção, fazendo um recorte que seja possível de
ser abraçado pela pesquisa. Esse recorte é sobre “A especificidade do
desenvolvimento poético na produção artística sobre suporte de vestuário utilizando
pintura e gravura”, tema do meu projeto, partindo do seguinte problema: O que muda
quando a produção artística com pintura e gravura é sobre uma peça de vestuário?
O ponto chave aqui é justamente o fato de serem peças com fins utilitários, e não
somente expositivos, ou seja, essas peças serão usadas normalmente após a
pesquisa e não ficarão restritas somente a exposições. Tornar-se-ão obras de arte
“ambulantes”, que saem pelas ruas e permitem o acesso a qualquer pessoa, uma
vez que o público para o qual será destinado essas peças, posteriormente, não é o
foco da pesquisa, e sim a interferência que a condição de utilitário impõe sobre o
processo, ou seja, se o caráter de peça de vestuário do suporte sobre o qual se
desenvolverá a obra artística pode guiar o processo poético para caminhos
específicos.
Para nortear a pesquisa, parto do lugar da Psicanálise, mais especificamente
da Psicanálise de Jung, utilizando como principal obra O homem e seus símbolos
(s.d.), além de trazer para a caminhada autoras centrais da discussão de pesquisa
em artes visuais, sendo elas: Sandra Rey (2002), O meio como ponto zero, e Cecilia
Salles (1998; s.d.), Gesto inacabado: processos de criação artística; Redes de
criação: construção da obra de arte.

Construção da casa

Ele pode ver, ouvir, tocar e provar. Mas a que distância pode ver, quão
acuradamente consegue ouvir, o quanto lhe significa aquilo em que toca e o que
prova, tudo isto depende do número e da capacidade dos seus sentidos. (JUNG,
s.d., p.21)

45
A explicação do campo do inconsciente acontece por várias entradas
diferentes, tão subjetivas quanto o próprio material de análise. Jung (s.d.) define os
sonhos como sendo o lugar do inconsciente, no qual os símbolos humanos são mais
fortes e evidentes. Para os junguinianos nada explica melhor o ser humano em sua
essência do que os seus sonhos. É lá que encontramos a carne viva, crua e
exposta, as veias pulsantes e cada célula corpórea desse quase outro ser que habita
dentro de cada um: o inconsciente e toda sua subjetividade. O surgimento dos
símbolos, em Jung (s.d.), acontece quando existe algo que não chega à
compreensão humana a partir de descrições detalhadas; o autor exemplifica com a
criação de símbolos para figuras divinas: a explicação do que consiste a figura divina
foge do entendimento humano, então lhe são atribuídos símbolos que a
representem.

A pesquisa em artes visuais visa justamente entender quais são


esses símbolos que carregamos na bagagem e que influenciam na
construção da obra artística. Ela pressupõe que os conceitos extraídos dos
procedimentos práticos são investigados pelo viés da teoria e novamente
testados em experimentações práticas, da mesma forma que passamos,
sem cessar, do exterior para o interior, e vice-versa, ao deslizarmos a
superfície de uma fita de moebius. (REY, 2002, p. 125-126)

Levantando parede por parede, prestando atenção em cada movimento,


questionando-se sobre os passos tomados, afastando-se de si para olhar para si. A
investigação desse momento em que fervilham as ideias ocorre quando a atenção
se torna ao mesmo tempo concentrada e distraída, preparada para qualquer clique,
para perseguir qualquer ideia que atravesse correndo o caminho, mesmo que para
isso tenha que despender mais tempo do que o planejado, ou melhor, despender o
tempo necessário para que o processo diga olhando em nossos olhos “acho que
agora é a hora de parar e deixar a obra caminhar com suas próprias pernas”. Sim,
ela caminha sozinha, caminha em direção ao público antes mesmo de virem até ela.
Caminha pelas mentes de cada um que deposita uma porção de tempo sobre ela.
Transforma, interfere, mexe um elemento de lugar dentro do inconsciente de cada
pessoa que passar correndo ou demorando-se em sua frente. É uma prática
alinhavada diretamente com os símbolos “escondidos” em nosso inconsciente, já

46
que “a criação artística é marcada por sua dinamicidade que nos põe, portanto, em
contato com um ambiente que se caracteriza pela flexibilidade, não fixidez,
mobilidade e plasticidade” (SALLES, s.d., p. 12), plasticidade essa que se origina
das ideias que mergulham e emergem constantemente durante a produção, como se
fossem borbulhas vindas do fervilhante inconsciente.
A proposta de observação e investigação desse momento em que o artista
mergulha dentro de si, numa viagem demorada e escura, requer luzes para iluminar
pelo menos parte da imensidão do mar subjetivo que nos envolve, e trazer
minimamente o conhecimento sobre esses símbolos vivos que moram nesse habitat.
A modalidade de pesquisa em artes vem como uma potente fonte luminosa para
ajudar a entender a vastidão do que é nosso próprio universo inexplorado. Como dito
por Jung (s.d.), a própria realidade consciente é desconhecida por inteiro. Mesmo
nos apropriando de aparelhos que intensificam a capacidade de visão, auditiva ou
tátil, sempre chegará um limite. Não mais será possível haver a compreensão dentro
do estado de consciência humana. Sempre haverá algo mais distante do que os
aparelhos conseguem alcançar, ou algo menor que os mesmos aparelhos não
conseguem distinguir, quem dirá, então, essa recente descoberta desse outro que
habita dentro de mim, que habita nas águas profundas da psique humana.
Pensar todas essas questões exige um estímulo. Esse estímulo vem em
formas de objetivos a seguir dentro da pesquisa. Tratando-se de uma investigação
poética a respeito dos processos de criação de estampas para peças de vestuário,
mais especificamente camisetas, escolhendo as técnicas de gravura e pintura para a
produção dessas estampas, parto da parte bibliográfica e, após essa, a efetivação
da parte analítica, seguindo os seguintes objetivos específicos: contextualizar
historicamente as ligações da linguagem artística com a linguagem da moda (uma
vez que, como dito anteriormente, as peças terão finalidades utilitárias, portanto
abrem espaço para a ligação com linguagem da moda); averiguar sobre os
processos de imbricamento entre pintura, xilogravura e estamparia a partir da
segunda metade do séc. XX para, então, analisar o processo de construção de
matrizes de xilogravuras para construir as estampas de camisetas. Por fim, observar

47
e discutir os processos poéticos da pesquisa em arte durante o desenvolvimento das
estampas e depois de finalizadas as produções.

Considerações finais

Debruçar-se analiticamente sobre si mesmo durante o momento mais


sensível da produção requer atenção e todo o cuidado para não tornar a pesquisa
uma barreira na fluidez artística. Precisa ser um movimento em que

o sensível deve ser constantemente balizado pelo racional, de


forma que o trabalho não se perca na subjetividade, e o racional deve ser
permeado constantemente pelo sensível de modo a não cercear a obra
com normas e condutas exteriores a ela. (REY, 2002, p. 135)

Desvendar os alicerces da obra, pensar sensitivamente, trazer conceitos que


pareciam longe e afastar os que pareciam perto. Essa considerável luz que traz a
pesquisa em arte, juntamente com a perspectiva psicanalítica de Jung, poderá
iluminar os cantos da casa escura e acalmar, por enquanto, a inquietude que
provoca a saber mais sobre a particularidade que essa condição de peça utilitária
reverbera nas produções.

Referências

JUNG, C.G. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, s.d.

REY, Sandra. Por uma abordagem metodológica da pesquisa em artes visuais. In:
BRITES, Blaca; TESSLER, Elida (Orgs.). O meio como ponto zero: metodologia da
pesquisa em Artes Plásticas. Porto alegre: Editora da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, 2002. p. 123-140.

SALLES, Cecilia Almeida. Gesto inacabado: processo de criação artística. São


Paulo: Fapesp/Annablume, 1998.

_________. Redes da criação: construção da obra de arte. s.d. Disponível em <


http://sciarts.org.br/curso/textos/redes_criacao_final_grifado.pdf >. Acesso em: 7 nov.
2017.

48
O JOGO ERÓTICO-NATUREZA-FEMININO DO CORPO (DA
MULHER) DISCURSIVISADO NAS OBRAS DE SABRINA GEVAERD

Beatriz Marques Nolli (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
bia_nolli@hotmail.com

Resumo
A temática do projeto de pesquisa foca no discurso acerca do corpo feminino nas
ilustrações de Sabrina Gevaerd, tendo como pergunta norteadora: Como no jogo
erótico-natureza-feminino o corpo (da mulher) é discursivisado nas ilustrações de
Sabrina Gevaerd, que busca ilustrar o prazer, a satisfação do toque e o contato com
a natureza? Para contemplar a pergunta problema, há o objetivo de analisar pelo
jogo erótico-natureza-feminino as discursividades do corpo feminino nas ilustrações
da artista. O percurso metodológico da pesquisa se dará em duas partes,
bibliográfica e analítica, e terá como subsídio teórico e analítico a Análise de
Discurso francesa, proposta por Michel Pêcheux e representada no Brasil por Eni
Orlandi.

Palavras-chave: Corpo discursivo. Erótico. Natureza. Feminino.

Introdução

O projeto proposto tem fundamento teórico na Análise de Discurso de vertente


francesa materialista, principalmente nos estudos de Michel Pêcheux e de Eni
Orlandi (2013). Entre os autores desta vertente, também subsidiam esta proposta as
pesquisadoras Nadia Neckel (2015; 2004; 2010), com o conceito de Discurso
Artístico, e Maria Cristina Leandro Ferreira (2013 a; 2013 b), com suas discussões
sobre corpo discursivo. Tal proposta foi elaborada na disciplina de Metodologia de
Pesquisa em Artes Visuais III e foca no discurso acerca do corpo feminino em
ilustrações de Sabrina Gevaerd.
A ideia para o projeto surgiu de uma pesquisa por referências artísticas para
minhas próprias produções artísticas, para as aulas de Produções Artísticas:
Gravura I, do Curso de Graduação em Artes Visuais da Universidade Estadual de

49
Maringá (UEM), em que me deparei com diversas artistas que trabalham com a
relação entre o feminino e a natureza, como Henn Kinn, Layse Almada, Alexandra
Levasseur, Brunella Simoes, Brunna Mancuso e Sabrina Gevaerd. Mas mesmo com
todas trabalhando a mesma temática em diferentes técnicas e estilos, Gevaerd se
destacou, para mim, por incluir o erotismo em suas obras, e por trabalhar com a
ideia de emoções opostas que se anulam e completam, como o prazer e o
desconforto, o velado e o escancarado – o que me lembrou do conceito de
contradição3 na Análise de Discurso, referencial teórico com o qual já venho
produzindo um percurso por meio de uma iniciação científica.
Para nortear essa pesquisa, tenho como pergunta problema: Como no jogo
erótico-natureza-feminino o corpo (da mulher) é discursivisado nas ilustrações de
Sabrina Gevaerd? Nesse sentido, objetivo analisar pelo jogo erótico-
naturezafeminino as discursividades do corpo feminino nas ilustrações da artista. De
forma específica, objetivo: discutir o corpo como discurso – uma discussão que já
movimento em minha Iniciação cientifica; entender ilustrações como forma de
produção artística nas Artes Visuais; descrever o trabalho artístico de Sabrina
Gevaerd e problematizar o jogo erótico-natureza-feminino como discurso artístico; e
observar, discursivamente, nas ilustrações da artista, o jogo erótico-
naturezafeminino.
A pesquisa será metodologicamente organizada em duas partes em diálogo,
bibliográfica e analítica. A parte analítica consistirá em analisar três ilustrações da
artista, que não fazem parte de uma série e nem todas possuem nomes, mas que
apresentam elementos semelhantes, como as cores, cobras e plantas específicas, e
também que foram produzidas em um mesmo período de tempo.

Figura 1: Sem nome, de Sabrina Gevaerd. Risografia.

3
A contradição, em Análise de Discurso, diz respeito sentidos tidos logicamente como
opostos, que convivem no mesmo espaço, ao mesmo tempo.

50
Disponível em: <https://sabrinagevaerd.tumblr.com> Acesso em: 7 nov. 2017.

Figura 2: Canta primavera, pá, de Sabrina Gevaerd. Risografia.

Disponível em: <https://sabrinagevaerd.tumblr.com> Acesso em: 7 nov. 2017

Figura 3: Benquerença, de Sabrina Gevaerd. Risografia

51
Disponível em: <https://sabrinagevaerd.tumblr.com> Acesso em: 7 nov. 2017.

Desenvolvimento

Sabrina Gevaerd Montibeller é uma artista brasileira de 26 anos. Nasceu em


Brusque, Santa Catarina, e se formou em Design de Moda em 2013, e no mesmo
ano se mudou para Curitiba, onde ficou por dois anos e trabalhou como diretora de
arte de uma agência de publicidade, com uma carreira paralela de pichadora de
músicas de axé e pagode pelas ruas da capital paranaense. Ao perceber que se
distanciava de um trabalho que a desse prazer, largou o emprego na agência, voltou
para Brusque por um tempo e acabou se instalando na cidade, definitivamente, por
problemas familiares. Filha de uma professora de artes, cresceu entre caixas de
lápis de cores e sempre teve prazer ao desenhar. Atualmente, pinta murais pelo
Paraná e Santa Catarina. Teve sua primeira publicação, uma zine 2. – livreto básico e
independente – batizada de “Nem todo mundo gosta de viver”, em que são
apresentadas ilustrações de mulheres nuas em posições que causam estranheza e
constantemente relacionadas à natureza, tema que se assemelha a suas outras
obras (FACEBOOK SABRINA, 2017).
Em suas obras, Gevaerd busca apresentar a riqueza da vegetação tropical
que dialoga com o erotismo, encontrando um ponto em comum entre o prazer, a
satisfação do toque e o contato com a natureza, produzindo obras em que o corpo
feminino é ilustrado em um momento de prazer, com elementos da natureza e
animais à sua volta. Como já mencionado na Introdução, o que me chamou a
atenção para o trabalho de Sabrina Gevaerd foi o fato de que ela busca representar
a ideia de emoções opostas que se anulam e completam, como o prazer e o
desconforto, o velado e o escancarado, que podem ser analiticamente trabalhados
pelo conceito de contradição discursiva.
Optei pela Análise de Discurso por ser um referencial teórico com o qual já
estou desenvolvendo uma iniciação científica, e que subsidia a análise que realizo,
em tal pesquisa, do corpo como discurso.

52
Considerações finais

A proposta de projeto apresentado tem possibilidade se tornar, futuramente,


uma nova iniciação científica, aproveitando minha pesquisa atual sobre corpo, ou,
posteriormente, se tornar uma pesquisa em arte, por abordar um tema semelhante à
minha poética pessoal. Espero, ainda, que ele possa dar um aporte teórico para
mulheres artistas que estão surgindo com essa mesma poética de feminino e
natureza, mostrando também esse tema na área da Análise de Discurso.
2 “Zine é uma publicação impressa independente, de pequena escala,
geralmente produzida por um só autor(a) ou pequeno grupo de pessoas. Expressão,
que pode vir em forma de texto, de imagem e de uma combinação de ambos.”
Disponível em: <http://revistapolen.com/zines/> Acesso em: 14 nov. 2017.

Referências

CAVALCANTE, Mariana. Polen. (Fan) Zines: um jeito de se comunicar. Disponível


em: <http://revistapolen.com/zines/>. Acesso em: 14 nov. 2017.

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. Discurso, arte e sujeito e a tessitura da


linguagem. In: INDURSKY, Freda; FERREIRA, Maria Cristina Leandro; MITTMANN,
Solange (Orgs.). O acontecimento do discurso no Brasil. Campinas: Mercado de
Letras, 2013 a. p. 127-139.

______. O corpo como materialidade discursiva. Redisco, Vitória da Conquista, v.2,


n.1, p 77-82, 2013 b.

GEVAERD. Sabrina. Facebook. Sobre. Disponível em:


<https://www.facebook.com/asabrinagevaerd/>. Acesso em: 8 nov. 2017.

NECKEL, Nadia Regia Maffi. Análise do Discurso e o Discurso Artístico. In:


SEMINÁRIO DE ESTUDOS EM ANÁLISE DO DISCURSO. 2., Porto Alegre. Anais
eletrônicos... Porto Alegre: UFRG, 2005. Disponível em:
http://www.ufrgs.br/analisedodiscurso/anaisdosead/2SEAD/SIMPOSIOS/NadiaRegin
aMaffiNeckel.pdf. Acesso em: 19 nov. 2015.

______. Do discurso artístico à percepção de diferentes processor discursivos.


Orientadora: Solange Leda Gallo. Dissertação (Mestrado em Ciências da
Linguagem) – Universidade do Sul de Santa Catarina, Florianópolis, 2004. 121p.

53
______. Tessitura e tecedura: movimentos de compreensão do artístico no
audiovisual. Orientadora: Suzy Lagazzi. Tese (Doutorado em Linguística) – Instituto
de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2010.
239p.

ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 10. ed.


Campinas: Pontes, 2012.

PÊCHEUX, Michel. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio.


Campinas: Edunicamp, 1997.

54
O PODER ANIMADO EM KOE NO KATACHI

Marcio Soares Pili (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
marciopili@hotmail.com

Resumo
Busca-se compreender as relações de poder entres os personagens Ishida Shouya
e Shouko Nishimiya apresentadas pelo anime Koe no Katachi (2016), traduzido para
o português brasileiro como A Forma da Voz. Parte-se da ideia de poder na
perspectiva de Michel Foucault, de modo a interrogar como ocorrem tais relações de
poder no anime. Tomaz Tadeu da Silva também traz contribuições à pesquisa por
seus estudos sobre identidade e diferença numa perspectiva cultural. Entre os
objetivos específicos estão: descrever as características de animação e na
animação; observar o cenário de educação no Japão atual e como ocorre a inclusão
de pessoas com necessidades especiais em suas escolas. Espera-se que este
trabalho seja capaz de contribuir para o entendimento das relações de poder
presente no filme e em nossa sociedade.

Palavras-chave: Michel Foucault. Anime. Relações de Poder.

Introdução

O anime Koe no Katachi é dirigido por Naoko Yamada, com roteiro escrito por
Reiko Yoshida, design de personagens de Futoshi Nishiya e música de Kensuke
Ushio. Baseado na série de sete mangás de mesmo nome, escrito e ilustrado por
Yoshitoki Oima, o filme foi lançado no Japão em 17 de setembro de 2016. O ponto
de partida para a formulação do meu projeto foi a maneira como Koe no Katachi
(2016) apresentou a relação entre os personagens e o desenvolvimento de ambos
no decorrer do filme.
Nesse sentido, o objetivo principal da pesquisa que pretendo realizar é
compreender a maneira que o poder se manifesta no relacionamento dos
personagens Ishida Shouya e Shouko Nishimiya em Koe no Katachi. Para tanto, a
pesquisa será fundamentada em estudos de Michel Foucault (1997, 2003), com foco
na ideia de poder, e Tomaz Tadeu da Silva (2000), com contribuições sobre

55
identidade e diferença. Os estudos de ambos os autores darão suporte para a
compreensão dessas relações de poder de maneira que o foco não seja apenas nas
relações, mas como elas ocorrem, observando não somente as ações isoladas de
um personagem, mas sim o que ele acaba fazendo por conta de estar ingressado
em uma sociedade na qual o padrão é o “normal” e o “diferente” é estranho,
causando um sentimento de repúdio e isolamento daqueles que não se encaixam
por conta de ser quem são e de não possuírem medo de deixar isso claro aos
outros.

Desenvolvimento
Koe no Katachi desenvolve-se no contexto de educação atual, mais
precisamente no Japão, onde observarei o cenário de educação e a inclusão de
pessoas com necessidades especiais em suas escolas confrontadamente à
representação feita no anime. Sua ambientação retrata o período de ensino
fundamental até o ensino médio dos personagens, e diferencia-se das outras
animações cinematográficas por apresentar a história focada em Ishida, o garoto
que pratica bullying com Shouko, tendo ele como ponto de vista de tudo o que
acontece com ele e com ela.

Figura 1: Cartaz do filme.

56
Disponível em: http://images6.fanpop.com/image/photos/39900000/Koe-no-Katachi-
koe-nokatachi-39916070-509-700.jpg. Acesso em: 12 nov. 2017.

Ishida é um jovem garoto que desde pequeno é muito travesso, conseguindo


passar dos seus limites por causa de alguém chamada Shouko Nishimiya. Shouko é
a garota transferida de outra escola que acaba por frequentar a mesma sala, e que
mesmo parecendo ser alguém “normal”, um fator a diferenciava da maioria: sua
surdez. Ele, então, começou a odiá-la por inúmeros fatores, mas o principal é por
não terem vencido no concurso de coral, devido a Shouko não saber falar as
palavras direito e, muito menos, cantar. Até que Ishida começa a fazer bullying com
ela de quase todas as formas, como retirar a força seus aparelhos auditivos,
brincadeiras de mau gosto, pegadinhas, riscar sua mesa com palavras que a
ridicularizavam. Shouko, porém, era gentil, não se importando muito com isso,
tentado até ser amiga de Ishida, mas o garoto simplesmente se recusava a aceitar o
pedido de amizade da garota.
O diretor da escola acaba descobrindo o que estava acontecendo com
Shouko e veio conversar com os alunos da sala, já que, durante apenas cinco

57
meses, mais de oito pares de aparelhos auditivos foram quebrados. Portanto, se o
culpado que fez isso se entregasse, não haveria mais problemas e tudo seria
resolvido. Ishida levantou sua mão e disse que não havia feito tudo isso sozinho, que
algumas crianças da sala o ajudaram e fizeram o mesmo com ela, porém com medo
das consequências, ninguém admitiu ser cúmplice do garoto. No final de tudo,
Shouko se mudou de escola e quem começou a sofrer bullying foi o próprio
protagonista, inclusive pelos seus antigos amigos e cúmplices das brincadeiras de
mau gosto. Sua mesa era escrita com palavras o ridicularizando, roubavam os seus
sapatos, ou seja, praticamente o mesmo tratamento que era dado à garotinha.
Depois desses acontecimentos, Ishida se tornou isolado por todos,
começando a odiar e evitar o contato com qualquer pessoa, vendo um "X" nas faces
de quem não gosta e não conhece. Ele tem o desejo de querer morrer o mais rápido
possível quando termina o ensino fundamental. Então pensou em possíveis métodos
de suicídio, já que sua vida estava arruinada por tudo que havia feito em sua
infância, e acabou por ser assombrado e se tornando culpado por suas atitudes.

Figura 2: Os “X” que Ishida Vê nas Pessoas.

Disponível em: http://www.rotoscopers.com/wp-content/uploads/2017/07/silentvoice7.jpg.


Acesso em: 12 nov. 2017.

Enquanto andava pelos corredores da escola depois de uma tentativa falha de


suicídio, conseguiu reconhecer o rosto que, por acaso, acabou com sua vida,
Shouko Nishimiya. Após tê-la visto, começou a tentar contatá-la, e quando

58
finalmente a alcançou, entregou-lhe o seu antigo caderno de comunicação, que
usava para poder falar com os outros de sua turma. Ela o leu e começou a chorar
devido às coisas que estavam escritas nele, lembrando daquilo que havia acontecido
no fundamental. Em seguida, Ishida a perguntou em linguagem de sinais (libras) se
os dois poderiam se tornar amigos. Shouko ficou corada e surpresa devido à
pergunta do garoto, já que havia feito essa mesma quando crianças e ele havia
recusado na época por sua dificuldade de nascença.
Como já exposto, a escolha por trabalhar com esse longa, em especial, deuse
por essa relação entre os dois personagens principais. Foi isso que me levou à
minha pergunta de análise: Como ocorrem essas relações de poder entre os
personagens Ishida Shouya e Shouko Nishimiya? Por Shouko possuir uma
dificuldade de nascença (surdez) e por não conseguir ouvir, não sabia se comunicar
“normalmente” como Ishida. Devido a isso, ele a abomina e não quer ter relações
positivas com ela quando criança, sem saber das consequências e do impacto que
isso teria a longo prazo em sua vida, o que nos instiga a pensar sobre nossas ações
e, no meu caso, me levou a pensar nos meus arrependimentos quando mais jovem.
A proposta de projeto que focaliza as relações de poder entre os personagens
Ishida Shouya e Shouko Nishimiya no anime Koe no Katachi surgiu como atividade
da disciplina de Metodologia de Pesquisa em Artes Visuais III, do Curso de Artes
Visuais da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Trata-se de uma proposta de
pesquisa analítica, fundamentada nos autores Michel Foucault (1997; 2003) e
Tomaz Tadeu da Silva (2000), por meio dos quais busco apresentar as relações de
poder presentes no anime e confrontá-las com o cotidiano retratado no próprio filme
e discutir as consequências das relações de poder na vida de ambos os
personagens Ishida Shouya e Shouko Nishimiya. A escolha por esses autores se
deu pela maneira com que Foucault trabalha essa relação de poder em seus
trabalhos e como Tomaz Tadeu da Silva trabalha a identidade e diferença numa
perspectiva cultural.

Considerações finais

59
O projeto que pretendo desenvolver é uma proposta teórica e analítica em
torno do filme Koe no Katachi para compreender o funcionamento das relações de
poder retratadas nesta produção, considerando as características do cinema de
animação e desta animação em específico.
Espero que o trajeto que busco desenhar possa trazer contribuições tanto aos
estudos sobre anime, desenvolvidos em pesquisas sobre arte quanto em arte,
ampliando as formas de significar esse objeto de pesquisa e, acima de tudo,
apreciado pela sociedade.

Referências

FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. 8. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1997.

FOUCAULT, Michel. A vida dos homens infames. In: MOTTA, Manoel Barros da.
(Org.) Estratégia, poder-saber. 2. ed. Tradução de Vera Lúcia Avelar Ribeiro. Rio
de Janeiro: Forense Universitária, 2006. p. 203-222 (Ditos e escritos; IV).

SILVA, Tomaz Tadeu da. A produção social da identidade e diferença. In: Tomaz
Tadeu da Silva (org.) Stuart Hall, Kathryn Woodward. Identidade e diferença: a
perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000. p. 73-101.

60
O SUJEITO-ARTISTA EM CISNE NEGRO

Bianca Luiza Marçal Melchior (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
Biancalmm09@gmail.com

Resumo
Por meio da teoria e do método de Análise de Discurso pecheutiana, o projeto de
iniciação científica, em andamento, propõe-se a investigar a representação
imaginária do sujeito-artista em Cisne Negro, do roteiro ao filme, pela análise
discursiva da personagem-protagonista bailarina. Dirigida por Darren Aronofsky e
escrita por Andres Heinz em colaboração com John McLaughlin e Mark Heyman, o
percurso desta pesquisa transita do roteiro ao filme para composição do corpus de
análise. Interroga-se, portanto, de que maneira a personagem artista é construída e
representada discursivamente, por meio de projeção imaginária, do roteiro ao filme
Cisne negro. O trajeto inicial de investigação aponta para uma representação da
dualidade entre o Eu e o outro/Outro. As cores preta e branca, que jogam a todo o
momento no filme, representam a artista protagonista dividida entre o Eu e seu
duplo, entre o desejo e a repulsa.
Palavras-chave: Cinema. Análise de discurso. Imaginário. Artista.

Introdução

A temática “Do roteiro ao filme, a representação imaginária de artista em


Cisne negro” norteia discussões sobre a representação do sujeito-artista na
discursividade da obra fílmica Cisne negro, assim como em seu roteiro de mesmo
nome. Este projeto está vinculado ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica (PIBIC/CNPq-Fa-UEM), tendo sido iniciado como uma proposta de
pesquisa da disciplina de Metodologia de Pesquisa em Artes Visuais I no Curso de
Graduação em Artes Visuais da Universidade Estadual de Maringá (UEM), em 2016.
Dirigida por Darren Aronofsky e escrita por Andres Heinz em parceria com
John McLaughlin e Mark Heyman, Cisne negro (2010) é uma obra fílmica que retrata
a vida da jovem Nina, uma bailarina que deseja se tornar a mais nova protagonista

61
da companhia de balé em que trabalha, para atuar na peça O lago dos cisnes. A
peça trabalha com o dualismo entre os dois personagens principais, Odette e Odile,
respectivamente cisne branco e cisne negro, e a bailarina principal tem a tarefa de
representar ambas as personagens. Após ganhar o papel, Nina vê-se em uma
tensão ao não conseguir se desprender do seu mundo e personalidade já
estabilizados para conseguir representar o papel de cisne negro, apresentado desde
o início como o oposto da personagem. Ao mesmo tempo, Nina é mostrada como
uma representação moderna de Odette. Desta tensão surge o encontro com o seu
duplo, que é visualizado como uma versão idêntica, porém oposta a si.
É perante a passagem destas tensões do roteiro para o filme, e como a
personagem protagonista é significada nesses momentos individuais e em conjunto,
que nossa pesquisa se norteia.
Como aporte teórico-metodológico são utilizados estudos de autores que
trabalham na área de Análise de Discurso, vertente francesa na perspectiva de
Michel Pêcheux, tais como Eni Orlandi (2012) e Bethania Mariani (2003), com
contribuições, também, de Maria Cristina Leandro Ferreira (2013) e Tania Riveira
(2013) sobre corpo, sujeito e artista, tendo em vista que “[...] corpo é tanto uma
linguagem, como uma forma de subjetivação e, por isso mesmo, tem relação estreita
com o discurso” (FERREIRA, 2013, p. 77).
Para fundamentar aspectos da vida da protagonista serão utilizados artigos
de autores que já realizaram pesquisas em cima deste mesmo material de análise, e
que utilizaram da psicanálise para constituir seus argumentos, sendo alguns deles
Malvine Zalcberg (2011), Amadeu de Oliveira Weinmann (2015) e Michelle Carreirão
Gonçalves (2011). O corpus de análise está sendo construído por meio de recortes
do roteiro fílmico e do filme, que serão utilizados para investigar as projeções
imaginárias que se constituem na passagem de roteiro ao filme.

Desenvolvimento

Tendo em vista que o projeto PIBIC foi iniciado em agosto deste ano, alguns
dos objetivos específicos já começaram a ser trabalhados, utilizando de nossos

62
levantamentos bibliográficos. Objetivou-se apresentar os conceitos de
imaginário/formações imaginárias em Análise de Discurso, utilizando de materiais
como Análise de discurso: princípios e procedimentos, de Eni Orlandi, precursora da
teoria e metodologia do filósofo Michel Pêcheux no Brasil. Também está em
desenvolvimento a compreensão e a concepção de artista na perspectiva
psicanalítica de Freud e Lacan, assim como a descrição das condições de produção
do roteiro e do filme, buscando observar marcas discursivas que sinalizam
regularidades e desvios entre eles, como as características de dualidade entre a
personagem Nina e seu duplo, tema recorrente dentro do filme. Por último, está
sendo estabelecida uma relação discursiva entre o roteiro fílmico e o filme, com foco
na representação do sujeito-artista, pela protagonista, de modo a observar as
imagens projetadas no/pelo roteiro e sua inscrição ou ausência na produção fílmica.
Ao pensar sobre o funcionamento discursivo de Cisne negro, foi necessário também
conhecer a peça de balé O lago dos cisnes, que serve de influência direta para a
trama fílmica. Escrita pelo compositor russo Piotr Ilitch Tchaikovsky, a peça é um
drama dividido em quatro atos que conta a história da jovem Odette, transformada
em um cisne pelo mago Rothbart, o qual só conseguirá retornar à sua forma humana
após encontrar seu amor verdadeiro. Ao fim da história, Odette morre de tristeza
após perder seu grande amor, o príncipe Siegfried, cujo mago Rothbart o enfeitiçou.
Em nosso trajeto já é possível identificar regularidades entre a peça e o filme,
e também entre o roteiro fílmico e sua obra final em audiovisual. A introdução da
personagem Nina se dá, na obra fílmica e no roteiro fílmico, ao mesmo tempo em
que é introduzida a projeção imagética da personagem Odette, colocando ambas as
personagens em foco, como se fossem uma, reforçando a ideia de que Nina é a
materialização do cisne branco. Isso se torna relevante uma vez que o filme se
propõe a trabalhar com o percurso de Nina ao ter de interpretar tanto o cisne branco
quanto o cisne negro, estes repetidamente colocados no filme como uma dualidade
impossível de se materializar, ao mesmo tempo, no mesmo sujeito-artista. Ao
introduzir Nina como uma das personagens da peça (cisne branco),
automaticamente se exclui dela tudo o que a outra personagem representa (cisne
negro), e é neste embate que se põem em jogo as projeções imaginárias de Nina em

63
relação a si e ao outro/Outro e a quebra de sua realidade pré-estabilizada ao se
encontrar com seu duplo, o cisne negro.
É importante ressaltar que as conceitualizações de projeção/formação
imaginária vêm da metodologia de Análise de Discurso, sendo ela assim descrita:

Resta acrescentar que todos esses mecanismos de funcionamento


do discurso repousam no que chamamos formações imaginárias.
Assim não são os sujeitos físicos nem os seus lugares empíricos
como tal, isto é, como estão inscritos na sociedade, e que poderiam ser
sociologicamente descritos, que funcionam no discurso, mas suas imagens
que resultam de projeções. São essas projeçoes que permitem passar das
situações empíricas – os lugares dos sujeitos – para as posições dos
sujeitos no discurso. (ORLANDI, 2012, p.40)

Cisne negro trabalha muito com a dicotomia. Em seu roteiro apresenta


narrações e falas diretas de personagens adjetivando Nina de maneira que a projeta
como cisne branco e a distancia do cisne negro, no entanto, estas maneiras de
representá-la, muitas vezes, não podem ser transpostas para a obra audiovisual, e é
aí, então, que o filme utiliza de fotografia, cenário e figurino para destacar Nina dos
demais personagens. A obra reforça visualmente que Nina se estabiliza como cisne
branco no fato de sempre estar utilizando de roupas claras, diferentemente do
ambiente à sua volta e dos personagens que interagem com ela.
Frente ao exposto é que utilizamos da Análise de Discurso de vertente
francesa para tentar analisar essas regularidades de roteiro e filme que a obra
materializa ao apresentar este sujeito-artista que vive tensões cotidianas,
procurando responder à pergunta discursiva que indaga de que maneira esta
personagem artista é construída discursivamente no roteiro fílmico e como ela é
representada, por meio de projeção imaginária, no filme Cisne Negro?

Considerações finais

Pelo aporte teórico-metodológico da Análise de Discurso está sendo


construída uma investigação pelas regularidades e ausências do roteiro para o filme,
quanto ao funcionamento das projeções imaginárias que põem em foco Nina,

64
protagonista que está no centro não só do filme, mas também desta pesquisa.
Considera-se, assim, que o propósito de partir do roteiro fílmico para observar como
as imagens (projeções imaginárias) acerca do sujeito-artista, neste roteiro, se
materializam na produção fílmica Cisne negro (2011), tece possíveis contribuições à
ciência que põe em integração áreas do conhecimento, como Arte, Cinema,
Multimeios, pela visibilização dessa passagem roteiro-filme na investigação do
objeto discursivo.
A nossa pesquisa de iniciação científica, que está vinculada a estudos do
grupo GPDISCMÍDIA (CNPq-UEM) – Grupo de Pesquisa em Discursividades,
Cultura, Mídia e Arte, se situa nesse entremeio de áreas, tendo em vista, também, o
próprio grupo já se constituir no/pelo intercâmbio de áreas do conhecimento e de
pesquisadores advindos destas áreas.

Referências

FERREIRA, Maria Cristina Leandro. O corpo como materialidade discursiva.


Redisco, v. 2, p. 77-82, 2013. Disponível em:
<http://periodicos.uesb.br/index.php/redisco/article/viewFile/1996/1723>. Acesso em:
27 dez. 2017

FIELD, Syd. Manual do roteiro. Rio de Janeiro: Objetiva, 1982.

MARIANI, Bethania. Subjetividade e Imaginário linguístico. Linguagem em


(Dis)curso, v. 3, p 55-72, 2003. Disponível em:
<http://linguagem.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/linguagem-
emdiscurso/0303/030304.pdf>. Acesso em: 27 dez. 2017

ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 10. ed.


Campinas: Pontes, 2012.

RIVERA, Tania. O avesso do imaginário: arte contemporânea e Psicanálise. São


Paulo: Cosac Naify, 2013.

65
PRÁTICA PROBLEMATIZADORA DE IMAGENS PUBLICITÁRIAS NO
ENSINO DE ARTE

Fernanda Ayumi Sakuma (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
fayumisakuma@gmail.com

Resumo
O objetivo do projeto de pesquisa que se pretende desenvolver é levantar e discutir,
por meio da Cultura Visual, formas de o ensino de arte ser empregado como prática
problematizadora de imagens publicitárias no cotidiano do aluno. Para isso, será
necessário compreender o ensino de arte na perspectiva da Cultura Visual,
identificar quais imagens publicitárias estão presentes no cotidiano e discutir a
Cultura Visual como forma de produção de sentido. Logo, a pergunta que se busca
responder é: Como o emprego da Cultura Visual no ensino de arte possibilita
práticas problematizadoras junto às imagens publicitárias no cotidiano do aluno?
Esperam-se resultados pelos quais se possa visualizar nas produções indícios de
processo de singularização, que permita uma relação de expressão e criação e
reapropriação de uma subjetividade, provocando desvios e novas indagações.

Palavras-chave: Cultura visual. Arte-educação. Imagens publicitárias.

Introdução

As imagens publicitárias em nosso cotidiano são constantes, intensas e


volumosas. Elas podem articular informações, significados e valores que influenciam
e orientam as pessoas a se posicionar, formar opiniões sobre problemas e
situações. É importante, então, pensarmos formas de o ensino ser empregado como
prática problematizadora de imagens publicitárias no cotidiano do aluno. E é nisso
que se constitui nosso objetivo geral. Consideramos ser possível investigar “O
ensino de arte como prática problematizadora de imagens publicitárias” – tema de
nosso projeto –, por meio da Cultura Visual, pois, segundo Duncum (2011), ela é
inclusiva, incorpora às belas-artes uma extensa gama de imagens midiáticas,

66
imagética eletrônica e toda história da imagética produzida e utilizada pelas culturas
humanas.
Além de abordar as imagens publicitárias pela Cultura Visual, o projeto
contém uma discussão em torno da subjetividade e sobre produção de
singularidade, termos trazidos por Felix Guattari e Suely Rolnik (2013) no livro
Micropolíticas cartografias do desejo, que discute a produção de subjetividade a
partir do sistema econômico em que vivemos, uma subjetividade capitalística que
estabelece conexões diretas entre as grandes máquinas produtivas, as grandes
máquinas de controle social e as instâncias psíquicas.

Desenvolvimento

O ensino de arte na perspectiva da Cultura Visual nos permite uma


aproximação do cotidiano do aluno com o ensino, pois, como vivemos hoje
eletronicamente conectados a tudo, estamos sempre em contato com as mídias,
pelas quais são veiculadas as imagens publicitárias. Dessa maneira, é importante
pensar formas de o ensino ser empregado como prática problematizadora de
imagens publicitárias no cotidiano do aluno. Além disso, o sistema econômico em
que estamos inseridos, o capitalismo, age não somente como um regime visual, que
segundo Martins e Tourinho (2011), “[...] são formas peculiares de visualidade que
exercem influência e algum tipo de controle sobre o modo como vemos e, sobretudo,
sobre nossa expectativa de ver (o que ver)”, mas também como um produtor de
subjetividade, na qual pode se estabelecer dois tipos de relação:

[...] uma relação de alienação e opressão, na qual o indivíduo se submete


a subjetividade tal como a recebe, ou uma relação de expressão e de
criação, na qual o indivíduo se reapropria dos componentes da
subjetividade produzindo um processo que eu chamaria de singularização.
(GUATTARI; ROLNIK, 2013, p.42)

Para compreendermos o ensino de arte na perspectiva da Cultura Visual,


partirei de Hernandez em seu texto “A cultura visual como um convite à
deslocalização do olhar e ao reposicionamento do sujeito”, em que o autor comenta

67
três posições pelas quais a Cultura Visual transita na educação: primeiramente, a
Cultura Visual como um campo de estudo transdisciplinar ou adisciplinar que indaga
sobre as práticas culturais do olhar e os efeitos desse olhar sobre quem vê; um
guarda-chuva debaixo do qual se incluem imagens e artefatos do passado e do
presente que dão conta de como vemos e somos vistos por esses objetos; e uma
condição cultural que, especialmente na época atual, está marcada por nossa
relação comas tecnologias da aprendizagem e comunicação que afeta como vemos
a nós mesmos e ao mundo. E também, nas palavras de Miranda (2013), é
fundamental enriquecer as práticas educativas que incluam as imagens como
possibilidades de representação, imaginação e produção de sentido, concebendo
oportunidades criativas que aconteçam metáforas, relações conceituais e
compromissos sensíveis. Portanto, “os estudos da cultura visual [...] nos permite
analisar e repesar a visualidade que nos cerca relacionando-a com a construção de
nossa identidade” (BALDISSARELI, 2014, p.2). Assim, de acordo com Barbosa
(2011, p.459):

[...] a escola tem trabalhado para a formação do sujeito receptivo e ativo,


ou seja, não cabe ao aluno somente receber conteúdo ensinado na escola,
deve também estar preparado para intervir na sociedade com base no que
abstrai dentro e fora da escola [...] A publicidade leva o aluno a pensar que
somente fara parte da sociedade se ele comprar determinados produtos,
será alegre, aceito e é levado a acreditar e concordar com conceitos e
valores que muitas vezes nem são os seus [...]

Diante disso, nota-se a relevância do processo de singularização discutido


por Guattari e Rolnik (2013). Como atualmente passamos a maior parte do tempo na
frente de uma televisão, computador ou celular, meios em que imagens publicitárias
são constantes, é necessário que elas saibam se reapropriar dessas imagens, que
essa relação não vire uma relação de alienação e opressão, e sim de expressão e
criação. É relevante dizer que a subjetividade capitalística exerce uma função de
infantilização, que, segundo Guattari e Rolnik (2013, p.50), pensam por nós,
organizam-se por nós a produção e a vida social.
Considerando o que foi exposto, o projeto apresenta os seguintes objetivos
específicos: compreender o ensino de arte na perspectiva da Cultura Visual;

68
identificar quais imagens publicitarias estão presentes no cotidiano do aluno; discutir
a Cultura Visual como forma de produção de sentido e problematização de imagens
publicitárias e colocar as diferentes narrativas feitas pelos alunos a partir das
imagens publicitárias levadas por eles para conversar e buscar novas indagações e
caminhos possíveis para o ensino de arte. Desse modo, a pesquisa conta com uma
inserção em campo durante o Estágio Supervisionado em Artes Visuais II, no curso
de Graduação em Artes Visuais da Universidade Estadual de Maringá (UEM), que
ocorrerá no 6º semestre do curso, em 2018. A inserção em campo contempla uma
prática problematizadora a um grupo de estudantes na faixa etária dos 13 a 14 anos,
9º ano/ 8º série em uma escola pública da cidade de Maringá. Para a prática, os
alunos buscarão imagens publicitárias presentes em seu cotidiano, pensando como
essas imagens os produzem subjetivamente e que sentidos são produzidos por eles
por meio das imagens. Entre as perguntas que seriam feitas aos alunos, estão: O
que é possível produzir/pensar com as imagens publicitarias? Como essa imagem
me representa? Significa-me? Quais indagações são possíveis de se fazer? Que
aproximações e distanciamentos posso estabelecer entre minha vida e essas
imagens? Eu compraria a mercadoria que a imagem está me propondo a comprar?
A proposta também inclui análise de suas narrativas ou produções visuais de modo
a observar como se deu a relação entre eles e as imagens, buscando, então,
responder ao problema de pesquisa que interroga como o emprego da Cultura
Visual no ensino de arte pode possibilitar um trabalho de práticas problematizadoras
junto às imagens publicitárias presentes no cotidiano do aluno. Dessa maneira, os
alunos se reapropriariam das imagens publicitárias, criando algo novo, algo que vem
deles, que os signifiquem, que os singularizem.

Considerações finais

Em síntese, a presente proposta de projeto de pesquisa elaborada para a


disciplina de Metodologia de Pesquisa em Artes Visuais IIII, no Curso de Artes
Visuais da UEM, tem como objetivo geral levantar e discutir por meio da Cultura

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Visual formas de o ensino de arte ser empregado como prática problematizadora de
imagens publicitárias inseridas no cotidiano do aluno. Para isso, será necessário
compreender o ensino de arte na perspectiva da Cultura Visual; identificar quais
imagens publicitarias estão presentes no cotidiano do aluno; discutir a Cultura Visual
como forma de produção de sentido e problematização de imagens publicitárias;
colocar as diferentes narrativas produzidas pelos alunos a partir das imagens
publicitarias levadas por eles para conversar e buscar novas indagações e caminhos
possíveis para o ensinod e arte. Este último objetivo pode favorecer a produção de
situações de discrepâncias e dissenso, trabalhando a partir do reconhecimento da
heterogeneidade, pois um grupo de uma sala de aula é um conjunto de pessoas com
experiências, possibilidades, interesses e histórias diversas, além de beneficiar a
imaginação e multiplicação de possibilidades de narração e metáfora (MIRANDA,
2013).

Referências

BALDISSARELLI, Alessandra. Cultura visual e cultura digital: mídia e identidade


em arte educação. 2014. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização) –
Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria.

BARBOSA, B. C. A imagem em sala de aula: cultura visual e a formação de


consumidores. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS DA IMAGEM, 3, 2011,
Londrina. Anais... Londrina: UEL, 2011.

DUNCUM, Paul. Por que a arte-educação precisa mudar e o que podemos fazer. In:
MARTINS, Raimundo; TOURINHO, Irene (org.). Educação da Cultura Visual:
conceitos e contextos. Santa Maria: EdUFSM, 2011. p. 15-30.

GUATARRI, Felix; ROLNIK, Suely. Micropolítica. Cartografia do Desejo. Petrópolis:


Vozes, 2013.

HERNÁNDEZ, Fernando. A cultura visual como um convite à deslocalização do olhar


e ao reposicionamento do sujeito. In: MARTINS, Raimundo; TOURINHO, Irene
(Org.). Educação da Cultura Visual: conceitos e contextos. Santa Maria: Editora
UFSM, 2011, p. 31 - 49.

MIRANDA, Fernando. Imagens da arte, da ciência e da tecnologia: pesquisar a partir


da cultura visual. In: MARTINS, Raimundo; TOURINHO, Irene (Orgs.). Processos e

70
práticas de pesquisa em cultura visual e educação. Santa Maria: Editora UFSM,
2013. p. 321-344.

TOURINHO, Irene; MARTINS, Raimundo. Circunstâncias e ingerências da cultura


visual. In: MARTINS, Raimundo; TOURINHO, Irene (Org.). Educação da Cultura
Visual: conceitos e contextos. Santa Maria: Editora UFSM, 2011, p. 51 – 68.

71
SANGUE MENSTRUAL COMO ELEMENTO ARTÍSTICO DE RESISTÊNCIA EM
UM CONTEXTO DE CORPOS DOCILIZADOS

Jacqueline Amadio de Abreu (UEM)


Renata Marcelle Lara (Orientadora-UEM)
Jacqueline-amadio@hotmail.com

Resumo
Este resumo expandido tem como tema o uso da menstruação na arte como prática
de liberdade em um contexto de docilização de corpos e tem como objeto de
investigação mulheres artistas que usam a menstruação como elemento artístico
para compor suas produções como meio de resistência. Diante disso, objetiva-se
observar o uso da menstruação na arte de artistas mulheres como resistência à
docilização de corpos, buscando compreender os sentidos de resistência e
docilização desses corpos; abordar o uso do corpo como prática política por artistas
mulheres; analisar obras de artistas mulheres que fazem arte com menstruação
como meio de resistência micropolítica. Tendo como metodologia a PBA (Pesquisa
Baseada em Arte) com o método da a/r/tografia e autores como Braidotti, Laurentiis,
Stubs, Tvardovskas e Macarena, cabe responder de que modo o uso da
menstruação na arte pode tensionar o modelo de docilização de corpos, apontando
para novas figuras de subjetividade.

Palavras-chave: Pesquisa Baseada em Arte. Mulher artista. Menstruação. Prática


de Liberdade.

Introdução

Esta é uma proposta de projeto a ser desenvolvida em nível de iniciação


científica e tem como tema O uso da menstruação na arte como prática de liberdade
em um contexto de docilização de corpos. A investigação aborda o uso da
menstruação por artistas mulheres e busca entender o uso desse sangue menstrual
como elemento artístico para praticar resistência e afirmação de si, considerando o
enredo de silenciamento em que os corpos femininos estão inseridos. Dessa forma,
o uso do sangue faz com que a mulher transgrida os tabus e tome consciência de
seu corpo, criando novas figuras de subjetividade.

72
Portanto, como problemática, busca-se responder de que modo o uso da
menstruação na arte pode tensionar o modelo de docilização de corpos, apontando
para novas figuras de subjetividade. Para tanto, objetiva-se observar o uso da
menstruação na arte de artistas mulheres como resistência à docilização de corpos.
Para alcançar tal proposta, cabe compreender os sentidos de resistência e
docilização de corpos, abordar o uso do corpo como prática política por artistas
mulheres e analisar obras de artistas mulheres que fazem arte com menstruação
como meio de resistência micropolítica. Para fundamentar essa discussão, o aporte
teórico utilizado são as autoras Stubs (2015), Laurentiis (2013), Tvardovskas (2013),
Lessa (2007), Braidotti (2002) e Macarena (2015), que contribuem teoricamente ao
tratarem de arte e feminismo, uso do sangue menstrual na arte e termos centrais
como prática de liberdade e docilização.

Desenvolvimento

Artistas mulheres têm usado seus fluidos corporais para compor obras
artísticas, como o sangue menstrual, que é parte constitutiva do objeto desta
pesquisa. Ao usar a menstruação como elemento artístico, as artistas contrapõem os
tabus do sangue menstrual, do corpo feminino e praticam a resistência, transgridem
e afirmam o seu ser mulher na sociedade.
São essas as mulheres que escolhem, então, não se submeter aos tabus
impostos aos seus corpos, às condutas pré-estabelecidas, às medicalizações, aos
silenciamentos dos seus próprios corpos, e escolhem transgredir, assumir o que é
seu, se autogovernar.
A esses corpos que descrevi – com imposições que fazem sobre ele, as
condutas pré-estabelecidas, as medicalizações e os silenciamentos –, chamo aqui
de corpos docilizados. Esse termo “docilização de corpos” é um termo trazido por
Stubs (2015), que foi cunhado por Foucault.
Quanto à atitude das mulheres artistas diante disso – de transgredir, não mais
se submeter, ressignificar seus corpos por meio da arte, se autogovernar –, chamo

73
aqui de prática de liberdade, em que as mulheres praticam a libertação de seus
corpos. “Prática de Liberdade” é outro termo trazido por Stubs (2015), também
cunhado por Foucault.
Portanto, nesta pesquisa, o sangue é tido como potência para desestabilizar
padrões impostos e é capaz de tensionar as imposições estabelecidas, os modelos
prontos, abrindo fissuras nas condutas já dadas e espaço para questionamento,
denúncia e reflexão. Isso resulta em novas relações com o corpo feminino, em novas
figuras de subjetividade.
Braidotti (2000, p.28), citada por Stubs (2015, p. 25), diz que a criação de
novas figurações para a subjetividade é um “[...] comprometimento radical com a
tarefa de subverter as representações e perspectivas convencionais acerca da
subjetividade humana”. Portanto, as novas figuras de subjetividade aqui tratadas são
consequência do rompimento com os corpos docilizados causado pela prática de
liberdade ao fazer uso do sangue na arte e, assim, criar uma nova relação com o
corpo – esta ressignificada pela mulher.
As artistas levantadas para essa pesquisa têm em comum serem artistas
mulheres (essencialmente mulheres) e que trabalham com o sangue menstrual com
um caráter de resistência, que usam a arte como ferramenta para ressignificação de
si, espaço de crítica e tomada de consciência de seu corpo. As artistas que
correspondem a esses critérios são: Juliaro, da Argentina; Carina úbeda, do Chile;
Ana Mendieta, de Cuba; Gina Pane, da França; as norte-americanas Vanessa Tiegs,
Christen Clifford e Portia Munson; Zanele Muholi, sul-africana. Porém, as escolhidas
para análise são Juliaro, Zanele Muholi e Chisten Clifford, que se unem pelo fio
condutor do sangue menstrual, mas se diferenciam pela linguagem artística e pela
visualidade que têm.

74
Figura 1: Tempo para mim Figura 2: Ummeli Figura 3: I want your blody

4
Fonte: JuliaroArte Fonte: Natural Flow Fonte: Dazed

Essa seleção vem para mostrar como o sangue pode ser usado por mulheres
de diferentes lugares, por diferentes motivos, causando diferentes impactos,
contendo diferentes visualidades e modos de utilizá-lo para o trabalho artístico.
Dessa forma, é possível analisar as obras a fim de mostrar essas inúmeras
possibilidades de trabalhar com o sangue, as diversas visualidades desses trabalhos
e os diferentes processos de criação, mas que se unem no condutor central que é a
mulher artista praticando resistência, ressignificando o sangue menstrual e
reiventando figuras de subjetividade para si. É por esse motivo que elegi artistas que
se diferenciam, para abrir o leque de possibilidades dentro da arte em torno de um
mesmo tema, relevante para essa pesquisa.
A metodologia que será usada é a PBA (Pesquisa Baseada em Arte), uma
metodologia que busca “[...] deslocar intencionalmente modos estabelecidos de se
fazer pesquisa e conhecimentos em arte, ao aceitar e ressaltar categorias como
incerteza, imaginação, ilusão, introspecção, visualização e dinamismo” (DIAS, 2013,
P. 23). Uma metodologia que surge para pensar outras possibilidades de redação de

4
Disponível em: https://www.facebook.com/juliaroartes/. Acesso em: 9 nov. 2017.
Disponível em: https://www.facebook.com/naturalflowus/. Acesso em: 9 nov. 2017.
Disponível em: http://www.dazeddigital.com. Acesso em: 9 nov. 2017.

75
publicação técnico-científico-artístico, o que me dá base para realizar uma pesquisa
sobre arte.
A PBA oferece uma variedade de métodos. O que será usado aqui é o
método da a/r/tografia. A/R/T é uma metáfora para Artist (artista), Researcher
(pesquisador), Teacher (professor) e grafh (grafia: escrita/ representação). Este
permite o uso de texto e imagem e é um campo em que conhecer, fazer e produzir
são unidos, havendo uma integração entre intelecto, sentimento e prática.

Considerações finais

As artistas apresentam uma nova forma de ver o seu sangue, seu corpo e o
seu eu. Atuam no campo da arte para uma prática de liberdade, rompendo com os
corpos docilizados. O sangue carregado de carga negativa se torna potente para
tensionar modelos estabelecidos sobre os corpos femininos e abre fissuras para
novas figuras de subjetividade.
A relevância em ter como objeto de investigação mulheres no campo das
artes é também um ato de resistência e atende aos assuntos urgentes da sociedade,
como o papel da mulher, seus corpos e seus atos. A figura da mulher fragilizada é
deixada de lado e seus corpos silenciados ganham voz. Novas figuras de
subjetividade tomam forma, resultante da decisão mulher em sua prática de
liberdade; mulheres fortes, empoderadas e autogovernadas.
Pela análise das obras das artistas selecionadas é possível visualizar as
inúmeras formas em que isso pode se realizar, e como cada mulher pode encontrar
sua forma de praticar a resistência, de ressignificar a si mesma e convidar outras
mulheres a fazer o mesmo ato.

Referências

BRAIDOTTI, Rosi. Diferença, diversidade e subjetividade nômade. Revista Labrys,


estudos feministas. Brasília: Montreal: Paris, n. 1-2, p.1-15, 2002.

DIAS, Belidson. A/r/tografia como metodologia e pedagogia em artes: uma


introdução. In: DIAS, Belidson; IRWIN, L. Rita (Orgs.). Pesquisa educacional
baseada em arte: A/r/tografia. Santa Maria: Ed. da UFSM, 2013. p. 21-26.

76
LAURENTIIS, Gabriela de. Fazer e desfazer formas: as imagens do feminino na arte
de Louise Bourgeois. In: RAGO, Margareth; MURGEL, Ana Carolina Arruda de
Toledo (Orgs). Paisagens e tramas: o gênero entre a história e a arte. São Paulo:
Intermeios, 2013. p. 24-36.

LESSA, Patricia. Lesbianas em movimento: a criação de subjetividades


(Brasil1979-2006). Orientadora: Tânia Navarro-Swain. Tese (Doutorado) –
Universidade de Brasília. Programa de Pós graduação em História na Área de
Concentração em Estudos Feministas e de Gênero – Brasília. 2007. 261p.

MACARENA, Tatiana Perez. Arte menstrual: el uso y la exposición de la


menstruación en el arte en la actualidad. Orientadora: Cañada Lucia. 2015. 35p.

STUBS, Roberta Parpinelli. A/r/tografia de um corpo-experiência: arte


contemporânea, feminismos e produção de subjetividade. Orientador: Fernando
Silva Teixeira Filho. Tese (Doutorado em Psicologia) – Universidade Estadual
Paulista. Faculdade de Ciências e Letras de Assis – Assis. 2015. 277p.

TVARDOVSKAS, Luana Saturnino. Fabulações de si na arte contemporânea: Ana


Miguel, Rosana Paulino e Cristina Salgado. In: RAGO, Margareth; MURGEL, Ana
Carolina Arruda de Toledo (Orgs). Paisagens e tramas: o gênero entre a história e a
arte. São Paulo: Intermeios, 2013. p. 175-193.

77
COMUNICAÇÕES ORAIS

78
A ESCRITA DE SI NA PINTURA MENSTRUAL DE JULIARO

Jacqueline Amadio de Abreu (UEM)


Patrícia Lessa (Orientadora - DFE)
jacqueline-amadio@hotmail.com

Resumo
Em um contexto de tabus ao redor do sangue menstrual, Julia Larotonda (Juliaro),
artista plástica, usa o sangue como instrumento artivista. A artista rompe as barreiras
impostas entre si e seu corpo usando o sangue menstrual como se fosse aquarela
para experienciar seus ciclos, seu corpo, seu útero e a natureza. Este trabalho se
propõe contextualizar o sangue menstrual, considerar seu processo criativo e
abordar o artivismo de Juliaro. O procedimento metodológico da pesquisa é
bibliográfico e feminista tendo como referencial teórico Gray (1999), Laurentis
(2013), Macarena (2015), Tvardovskas (2013) e Owen (1994). As mulheres artistas
que usam seu corpo para praticar o artivismo e reivindicar o feminismo na/pela arte é
o nosso foco nas obras estudadas.

Palavras-chave:
Artivismo. Feminismo. Menstruação. Processo criativo.

Introdução

A escrita de si na arte menstrual de Juliaro tem como objeto de investigação a


menstruação como material criativo nas pinturas de Julia Larotonda (Juliaro).
Sabendo que o sangue é visto como tabu, observamos a atitude da artista em se
sobrepor a esse tabu, rompendo com as ideias prontas e negativas sobre esse
sangue e provocando rupturas nas barreiras que impõem ao corpo feminino e nas
vivências de seus próprios ciclos.
Nosso aporte teórico metodológico são as autoras Gray (1999) e Owen
(1994), que trabalham com a perspectiva do sangue menstrual como despertar de
energias e valoração do feminino; Laurentis (2013) e Tvardovskas (2013) que
trabalham com arte e feminismo e Macarena (2015) que trata sobre uso de
menstruação na arte. Dessa forma, temos como objetivo contextualizar o sangue
menstrual, considerar o processo criativo da artista e abordar o artivismo a fim de
observar a pintura menstrual de Juliaro como escrita de si.

79
Desenvolvimento

Juliaro é argentina de Buenos Aires (1979) e atualmente vive no Brasil, em


São Paulo. Aqui, ela trabalha como ilustradora, pintora, escritora e designer
freelance, também realiza workshops de autoconhecimento feminino e círculo de
mulheres, é membro da Coordenação da Benção do Útero Brasil de Miranda Gray e
Moon Mother avançada. Suas obras têm ênfase no sagrado feminino, nas mulheres
míticas, nas deusas, na mãe terra, em todos os elementos da natureza. Dentre seus
trabalhos, o que abordamos é sua “pintura menstrual”, são as pinturas feitas com
sua própria menstruação, em que ela usa seu sangue como se fosse aquarela.
Para que se possa entender a relevância da obra da artista ao fazer uso de
seu sangue, se faz necessário contextualizar esse sangue. Owen (1994) traça um
percurso longo sobre a história da menstruação. A autora inicia esse percurso na
época em que as mulheres eram veneradas e vistas como férteis, quase sagradas,
tanto é que temos várias estatuetas de mulheres férteis e criativas, as deusas da
fertilidade, datadas arqueologicamente cerca de 5.000 a.c. por sociedades antigas.
Porém isso muda, é com ascensão do cristianismo que o patriarcado se firma e com
ele a carga negativa do sangue menstrual, a vergonha do corpo, o sangue como
sujo. No século XIX a visão do útero muda e o status da mulher também, se inicia as
medicalizações, os hormônios, os tampões, a supermulher é a que disfarçava seu
sangue e fazia uso de todos esses instrumentos para disfarçar sua menstruação, é o
que Owen (1994) chama de “tecnologia da desconsideração”. Ainda de acordo com
a autora essa situação só começa a mudar com os movimentos de espiritualidade
feminina, em que o sangue para de ser ignorado e começa a se tornar significativo.
De acordo com Gray (1999), as sociedades antigas sabiam do poder da
menstruação, de sua fonte de energia criativa e que as mulheres vivenciavam essa
energia em seus ciclos, mas com as primeiras sociedades patriarcais esse sangue
era visto como perigoso, e o processo natural dos corpos femininos se tornam então
um sangue contaminado. Aqui retomo o que Owen (1994) diz que na
contemporaneidade o sangue passa a ser novamente significativo com os

80
movimentos de espiritualidade feminina. Para a autora vivemos um momento que é
possível falar desse sangue, e a partir dele se ressignificar, transgredir.
Esse ato, então, da artista em pintar com seu sangue menstrual pode ser
encarado como um artivismo, já que este é um meio de produção de conhecimento e
meio de reinvindicação. Juliaro, em uma entrevista para o site Entremujeres (2016),
diz que o intuito de suas pinturas menstruais é o reconexão consigo mesma e com
seus ciclos, que ao ter contato com o sangue se encara vários temores e se rompe
com os tabus impostos pela sociedade. Ao usar o sangue menstrual como material
artístico, ela rompe com as ideias prontas e impostas e inicia um percurso de
autoconhecimento, passando a ver o sangue em sua própria ótica e não pela do
patriarcado.
Para Tvardovskas (2013, p. 175) as práticas artísticas contemporâneas de
mulheres se apresentam como um espaço de resistência e de reinvenção ética e
subjetiva e “[...] propõem novas possibilidades de constituição de si, na medida em
que deslocam sentidos estabelecidos com os corpos, os desejos e com a própria
criatividade”. É nas práticas do cotidiano e nas vivências de si que a artista cria
resistência e ressignificações de si. O trabalho de Juliaro demonstra a representação
da mulher que busca seus ciclos novamente, o enfrentamento que a mulher
contemporânea encara ao retomar a ancestralidade da visão de um sangue
sacralizado, a mulher que vai contra as barreiras impostas entre si e seu próprio
corpo e isso expresso em pinturas realizadas com a fonte de todo esse poder
feminino que a sociedade tenta esconder: o sangue menstrual.
E para essa expressão de reconexão, são retratadas figuras relacionadas à
Grande Mãe, a natureza, a lua, justamente por essa busca de um lugar em que a
representação da mulher não é feita pelo patriarcado, buscando nas religiões antigas
da Deusa e nos conhecimentos ancestrais, como o Sagrado Feminino, um lugar
único da mulher e uma representação de si.
Laurentis (2013, p.30) fala sobre essas artistas que

Operam uma desnaturalização dos discursos históricos que silenciam as


mulheres e as representam como frágeis mães e esposas. As artistas
aproveitam-se, portanto, de uma história feminista em suas obras, que

81
vibram para a desconstrução das imagens estabelecidas do feminino. Ao
transfigurarem seus corpos recorrendo a Grande Deusa, imaginam outras
formas de si mesmas, que têm um efeito crítico ás concepções históricas
de um feminino fragilizado e pacificado dentro do lar, ou confinado em
espaços disciplinarmente destinados a elas. [...] Contrapondo-se às
imagens tradicionais do feminino.

Figura 1: “Sono com fada” Figura 2: “Moon Mother” Figura 3: “Bruxa”

Fonte: página oficial da autora (JULIARO-ARTE, 2017)

Juliaro transforma sua vida e seu corpo usando seu sangue como material
criativo em uma busca pessoal, mas de embate social, se contrapondo as imagens e
comportamentos tradicionais do feminino imposto pelo patriarcado.

Na dimensão da arte, as práticas autobiográficas das feministas ironizam


os discursos patriarcais. Elas fazem de sua experiência como mulher-
motor para a criação, recorrendo ás figuras nas quais fundam a identidade
feminina e, consequentemente, as suas próprias (LAURENTIS, 2013, p.
33).

Pelo trabalho de Juliaro vemos que a arte emerge como um ato de liberdade,
de transformação e criação de vida. Segundo Laurentis (2013, p. 34) “ela (a arte)
surge contra o que somos, podendo levar à falência modos de vida controlada e
conformada em lógicas identitárias despotencializadoras da existência, que fazem
incapazes as invenções de outros de nós”. Para ela, a arte, seja como prática ou
como objeto, pode operar deslocamentos subjetivos e produzir novos mapas de
existência. O processo de criação da artista e suas experiências constituem seu
sujeito, produz novos modos de viver, resiste aos assujeitamentos. Nas palavras de
Macarena (2015, p.14, tradução nossa) “A arte se transformou em um meio de

82
ativismo, um ativismo feroz que arrasa com tudo, que não teme nada e que busca
chamar a atenção de todos os povos para conhecer a história dessas mulheres.”
Juliaro, enfim, com suas obras, “[...] quer que a mulher se reconheça e se
aceite, que tome o poder de seu corpo, seu ciclo e suas fases. Busca conscientizar
as mulheres para que se tirem dos tabus que se tem estabelecido ao redor da
menstruação ao longo da história” (MACARENA, 2015, p.20-21, tradução nossa).
Dessa forma, partindo de transformações de si, busca uma resistência coletiva,
escapa de formas de vida regulamentadas e controladas, assume seu corpo e faz
dele território de poder, experiência e resistência.

Considerações finais

Artistas e suas obras podem ser percebidas em relação artivista com o


sangue, pois elas se contrapõem ao tabu e escolhem romper com as barreiras
erguidas entre si mesma, seu corpo e seus ciclos. Aqui essa mulher é Juliaro, que
faz uso de seu sangue para fazer arte. A arte então é campo de resistência, de
questionamentos, de possibilidade de ressignificação e, é, portanto, um artivismo.
A relevância das mulheres nas artes praticando o artivismo é essa
reivindicação de seu lugar na arte e falando sobre o lugar do feminino no mundo. A
artista que usa um material específico, o sangue menstrual, para renovar a figura do
corpo feminino. Por meio da arte ela possibilita um reconexão consigo mesma e se
transforma, se ressignifica, e convida outras mulheres a fazerem o mesmo.

Referências

GRAY, Miranda. Luna roja. Tradução Nora Steinbrun. Móstoles: Gaia Edciociones,
1999.

JULIARO-arte. Disponível em: <http://www.juliaro.com/>. Acesso em: 18 out. 2017.

LAURENTIIS, Gabriela de. Fazer e desfazer formas: as imagens do feminino na arte


de Louise Bourgeois. In: RAGO, Margareth; MURGEL, Ana Carolina Arruda de
Toledo (Orgs). Paisagens e tramas: o gênero entre a história e a arte. São Paulo:
Intermeios, 2013. p. 24-36.

83
MACARENA, Tatiana Perez. Arte menstrual: el uso y la exposición de la
menstruación en el arte en la actualidad. Orientadora: Cañada Lucia. 2015. 35p.

OWEN, Lara. Seu sangue é ouro. Tradução Magda Lopes. Rio de Janeiro: Rosa
dos Tempos, 1994.

TVARDOVSKAS, Luana Saturnino. Fabulações de si na arte contemporânea: Ana


Miguel, Rosana Paulino e Cristina Salgado. In: RAGO, Margareth; MURGEL, Ana
Carolina Arruda de Toledo (Orgs). Paisagens e tramas: o gênero entre a história e a
arte. São Paulo: Intermeios, 2013. p. 175-193.

84
A EXPERIÊNCIA DO ESTÁGIO, POR MEIO DOS DIÁRIOSEM NOSSA
FORMAÇÃO COMO ALUNAS-PROFESSORAS-ARTISTAS


Josiele Cardoso da Silva (UEM) 
Larissa Silvério Figueiredo (UEM)  
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Roberta Stubs (UEM) 
 larisasilverio@hotmail.com 

Resumo  
Neste trabalho, apresentamos nossas experiências decorrentes das ações no
Estágio Supervisionado em Artes Visuais II, do Curso de Licenciatura em Artes
Visuais da Universidade Estadual de Maringá - UEM.   Para tanto, tivemos como
ponto de partida, a experiência do estágio, por meio dos diários, em nossa formação
como alunos-professoras-artistas. Sendo embasadas para tal, por
Jorge Larrosa Bondía e Marilda Oliveira de Oliveira, os quais respectivamente
trabalham os conceitos de experiência, docência e diários. A partir disso, buscamos
por meio deste trabalho compreender o diário e o Estágio Supervisionado como um
campo que produz experiências, saberes, nos perpassando, deixando marcas,
vestígios e nos constituindo como arte educadoras. 

Palavras-chave: Estágio. Experiência. Diário. 


Introdução  
A partir da disciplina de Estágio Supervisionado em Artes Visuais II nós,
acadêmicas do terceiro ano do curso de Licenciatura em Artes Visuais da
Universidade Estadual de Maringá, realizamos um estudo partindo das experiências
vividas ao longo do estágio, enquanto alunas/professoras/artistas.
 Portanto, iniciamos os estudos partindo do conceito de experiência, docência e
diários,  fundamentadas respectivamente por Jorge Larrosa Bondía e Marilda Oliveira
de Oliveira.   
O estágio supervisionado é um requisito parcial para o cumprimento da nossa
formação docente.  Entretendo o estágio não é apenas algo burocrático, conforme
Oliveira (2005), “o estágio curricular é a disciplina que permite aos alunos de
licenciatura a apropriação de instrumentos teórico-metodológicos para atuação no
ambiente escolar”, (OLIVEIRA, 2005, p. 60). Desse modo,  cabe aos estagiários,
 buscar entender que a “[...] atividade na escola tem por finalidade
buscar mudanças [...]" (OLIVEIRA, 2005, p. 61), mas, além disso,

85
 experienciar nossos processos enquanto alunas-professoras-artistas,  tendo
como materialização artística,  os nossos percursos, os diários de estágio.  

Desenvolvimento  
Tal pesquisa tem como temática "A Experiência do estágio, por meio
dos diários, em nossa formação como alunas-professoras-artistas". Os
diários surgem como um recurso que nos ajuda a pensar para além da dicotomia
teórico-prático, pois nos induz a refletir e pesquisar sobre nós, sobre nossos próprios
processos, sobre as experiências exteriores, que nos tocam como pessoas
e enquanto futuras arte educadoras.  
  Desse modo, esse estudo questiona, de que maneira o diário de estágio
supervisionado pode auxiliar na nossa formação como estagiarias-professoras-
artistas.Para isto, damos início pensando o Estágio Supervisionado, por meio
de Oliveira,  como algo essencial na formação da identidade docente dos alunos de
licenciatura,  sendo "[...] fundamental pelo fato de propiciar ao aluno um momento
específico de aprendizagem, de reflexão com sua prática profissional" (LAMPERT,
OLIVEIRA, 2010, p. 84).  
O estágio é o início de um caminho na nossa formação de professores,
entretendo ao adentramos nesse percurso encontramos um campo repleto de
incertezas, de encontros felizes ou não, do qual não passamos imunes.
Algo de alguma maneira irá nos afetar e nos marcar, pois somos constituídos pelas
experiências com os outros e é nesse percurso que o diário se configura, como uma
via de acompanhar e registrar os processos desse percurso. O diário não se refere
a um objeto pronto e acabado, ou a um simples registro repleto de anotações vagas,
ao contrário ele faz parte do nosso processo de formação, ele é a materialização
desse princípio de transformação, tal como aponta Oliveira:

Os diários são formados por componentes fragmentados, com


acabamentos provisórios. Todo diário conta uma história, histórias não
lineares, ao contrário, histórias sinuosas, de idas e vindas, enviesadas. Um
diário se alimenta de várias fontes: de imagens coladas, de conceitos
entrecruzados, de camadas de cola, de desenhos, de rasuras, de escritas
nas margens (OLIVEIRA, 2011, p.999).

86
No diário de estágio se encontram algumas de nossas angustias,  tristezas,
alegrias, também as nossas experiências por meio de pistas,  fragmentos de histórias
não lineares,  que estão guardadas em nossas memórias.  Os diários não são iguais,
pois nossa subjetividade é singular, e cada uma de nós pôde ser marcada de
formas diferentes, passando pelo mesmo caminho. A figura 1 e 2 ilustra o modo
como cada uma de nós se significou de modo diferente, com base
nas mesmas vivências. Posto que a experiência e o sentido da
experiência são únicos e exclusivos a cada um.

Figura 1: Diário em Construção A, 2017.

Figura 2: Diário em construção B, 2017.

Cada pessoa se significa de modo diferente e materializa isso por meio da


sua própria linguagem, seja ela artística ou não; frases; desenhos; sensações;
pequenos detalhes que lhe tocaram mais. Sendo o diário constituído por pedacinhos
dessas memórias; lembranças queridas, ou não. Fazendo com que assim pensemos
sobre o nosso próprio processo como professoras e artistas; que tenhamos

87
opiniões acerca à conduta dos outros e da nossa, pois capturamos os modos de agir
e se portar de acordo com cada ambiente. Temos consciência, e vivemos na pele,
que no estágio nem tudo são flores, entretanto todos esses momentos que
partilhamos no estágio são importantes para nossa experiência enquanto futuras
professoras-artistas.
De acordo com Bondía (2002,  2011) cada experiência é única, assim como o
afeto é algo singular, não podendo ser medido ou quantificado, mas mesmo assim,
não há uma experiência que aconteça sozinha,  necessitamos dos outros para
que haja experiência. Precisamos desses encontros de corpos, dos nossos corpos
com os dos outros, desses corpos coletivos que em sua própria unicidade
ainda são múltiplos, pois somos constituídos por essas relações com os outros,
somos um campo de passagem dos outros, mas também sujeitos da experiência,
pois mesmo que a experiência ocorra em nossos corpos e peles, ela somente ocorre
numa relação de troca e afeto com essa exterioridade.
O sujeito da experiência "[...] é como um território de passagem, como uma
superfície de sensibilidade em que algo passa e que 'isso que me passa', ao passar
por mim ou em mim, deixa um vestígio, uma marca, um rastro, uma ferida"
(BONDÍA,  2011, p. 8). Sendo assim, ao nos assujeitarmos e estarmos passíveis
às experiências, ao nos abrirmos para ela, somos modificados e essas modificações
não passam despercebidas, elas deixam marcas visíveis e
invisíveis. São justamente essas marcas e afetos que se encontram materializadas
em nossos diários, nossas impressões e nossas marcas em relação à vivência no
estágio.  
Desse modo, entendemos o estágio como um campo que nos
possibilita experienciar em diversos momentos.  Ambiente este no qual podemos
exercitar o contato, a observação, o estudo, etc. Como explica Bondía (2011, p.
7) "[...] na experiência, o sujeito faz a experiência de algo, mas, sobretudo, faz a
experiência de sua própria transformação”. Assim não passamos pela experiência de
forma ilesa, ela nos modifica no percurso, e o diário serve de auxílio para
a nossa construção de uma identidade enquanto pessoas individuais e como futuras
docentes. 

88
Considerações finais  
Contudo, assim como Jorge Larrosa Bondía nos apresenta; o sujeito
da experiência acabanos "[...] mostrando algo como um território de passagem, algo
como uma superfície sensível que aquilo que acontece afeta de algum modo, produz
alguns afetos, inscreve algumas marcas, deixa alguns vestígios, alguns efeitos”
(2002, p. 24), que são refletidos na nossa forma de se posicionar no mundo, na
nossa forma de materialização desses fragmentos, em diários.  
No diário não captamos todos os momentos vividos durante o estágio, pois
conscientemente ou inconscientemente elencamos pequenos detalhes que mais nos
atinge. Desse modo, o mais importa é o processo, como um campo que
produzexperiências, saberes, nos perpassando, deixando marcas e vestígios
como arte educadoras.   O diário se torna a materialização desse princípio de
transformação.

Referências  

BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência.


Rev. Bras. Educ. [online]. 2002, n.19, p. 20-28. Disponível
em:< http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n19/n19a02.pdf>. Acesso em: 14 nov. 2017 

___ Experiência e alteridade em educação. Revista Reflexão e Ação, Santa Cruz


do Sul, v.19, n2, p.04-27, jul./dez.
2011. Disponivel em: < https://online.unisc.br/seer/index.php/reflex/article/view/2444/1
898>. Acesso em: 14 nov. 2017 

OLIVEIRA, Marilda Oliveira de. A perspectiva da cultura visual, o endereçamento e


os diários de aula como elementos para pensar a formação inicial em artes visuais. 
In: ENCONTRO NACIONAL SUBJETIVIDADES, UTOPIAS E FABULAÇÕES,
20., 2011, Rio de Janeiro. Anais... [Recurso eletrônico]. Rio de Janeiro: ANPAP,
2011, p. 988 – 1000. 

OLIVEIRA, Marilda Oliveira de; LAMPERT, Jociele. Artes Visuais e o Campo de


Estágio Curricular. Revista Nupeart, Santa Catarina, v.8. 2010. Disponível
em:< http://www.revistas.udesc.br/index.php/nupeart/article/view/3072/2268>.Acesso
em: 16 nov. 2017

89
ARTE MESTIÇA NO BRASIL COLONIAL
Lucas Men Benatti (UEM)
Milena Beatriz da Silva (UEM)
Odonias Santos de Souza Junior (UEM)
Rafael Carvalho de Almeida (UEM)
lucas-benatti@outlook.com

Resumo
Este estudo aborda a temática da arte mestiça no Brasil tendo como principal
referência os estudos de Oliveira (2011), que considera a constituição, entre o final
do século XVI e início do século XIX, de duas “tradições” artísticas estilísticas que
beberam de uma mesma fonte ibérica, mas que se redirecionaram em seu percurso
de instauração no/pelo meio social/cultural de modos distintos, caracterizando o que
comumente é designado como Barroco Mineiro e Barroco Litorâneo. Como
resultado, compreende-se que falar sobre mestiçagens na arte, nos deslizamentos
das formas de representação canônica é abrir espaço para discursos de rupturas de
normas sociais e demonstrar a visualidade e a representatividade de sujeitos negros
que passaram por um apagamento histórico.

Palavras-chave: Arte mestiça. Barroco mineiro. Barroco Litorâneo.

Introdução

Abordar a temática da arte mestiça no Brasil implica, como sublinha Oliveira


(2011), considerarmos que se construíram entre o final do século XVI e início do
século XIX duas “tradições” artísticas estilísticas que beberam de uma mesma fonte
ibérica, mas que se redirecionaram em seu percurso de instauração no/pelo meio
social/cultural da época de modos distintos, caracterizando o que comumente é
designado como Barroco Mineiro e Barroco Litorâneo.
Ambas as expressões, devemos ressaltar, estavam atreladas a Igreja
Romana, aos modelos europeus e suas produções giravam em torno da
imagem/imaginário e das representações religiosas que regiam a vida social na
colônia. O Barroco Mineiro, que desenvolveu-se no interior do Brasil, mais
especificamente na Capitania das Minas, em cidades como Ouro Preto, Ouro Branco
e Mariana, configura-se de modo distinto ao Barroco Litorâneo. Em síntese, como
ressalta Oliveira (2011), as representações do Barroco Mineiro se direcionaram mais

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a devoção e a crença, e suas obras estavam atreladas principalmente as
irmandades leigas. Isso se deve ao fato de que por determinação da Coroa
portuguesa, foi proibia expressamente a instalação das congregações missionárias
na Capitania de Minas, visto que não era prioridade da administração colonial a
conversão dos mineradores, mas sim, a garantia da extração e o seu beneficiamento
com a circulação do ouro e pedras preciosas. Situação inversa ao contexto do
Barroco Litorâneo, que desenvolveu-se essencialmente no litoral do atual Nordeste,
por meio do qual, diversas irmandades religiosas como jesuítas, franciscanos,
beneditinos e carmelitas, produziram visualidades discursivas, desde os primeiros
momentos da colonização, para a catequese dos nativos, dos africanos e dos
colonos europeus.
Se pensarmos na historicidade cultural que acompanhava cada um dos
sujeitos que habitavam a colônia, coexistindo em um mesmo tempo-espaço e a
diversidade que faz advir suas origens, temos, por exemplo, a presença de nativos
de diversas tribos, diferentes grupos africanos, europeus de nacionalidades distintas
em uma mesma cidade colonial. Sujeitos que possuíam línguas, costumes, crenças,
modos de organização social, etc. distintos. Apesar de um (pre)domínio da Igreja
Católica (associada a Coroa portuguesa) nas relações de poder, por meio, até
mesmo de tratados e regulações a respeito do uso das imagens religiosas, não é
difícil constatar, como aponta Oliveira (2011), que de fato, não era possível haver um
total controle sobre as representações artísticas produzidas.
Apesar da temática análoga entre a produção barroca no Brasil e na Europa e
dos esforços em igualar a produção que se dava na colônia com a de Portugal, a
Igreja Católica no Brasil não tinha a sua disposição artistas e/ou artífices, por
exemplo, que seguissem estritamente o cânone europeu, uma vez que, não havia
formação profissional que os possibilitasse a cópia. Os materiais e suportes também
eram distintos, as igrejas eram menos “pomposas” que as construídas na Europa e
muitos trabalhos eram feitos em madeira, ao invés do comumente usado, ouro. Mas
para além das (re)interpretações estéticas, dos cruzamentos de linguagens, técnicas
e suportes, a mestiçagem na arte colonial brasileira aponta diretamente para uma
representação da mestiçagem social da colônia. Em muitas pinturas, tanto do

91
Barroco Mineiro, quanto do Barroco Litorâneo, percebemos traços que tencionam a
(falsa) hegemonia tanto social, quanto artística canônica e que dá visualidade a
heterogeneidade que caracteriza esses cruzamentos e imbricamentos da
mestiçagem e do hibridismo.
Veremos a seguir exemplos de representações iconográficas que decoram
igrejas tanto do Barroco Mineiro, quanto do Barroco Litorâneo, onde estão presentes
diversos personagens negros e mestiços. Olharmos para essas representações, nos
auxilia a compreender esse processo de hibridização, por meio do qual não há o
assujeitamento passivo a determinações dominantes, mas sim, resistências e
reconfigurações culturais das culturas.

Representações negras e mestiças no Barroco Mineiro

Dentre as obras de Arte Mestiça, destacamos o Papa Negro. Essa obra está
na Igreja da Santa Efigênia, em Ouro Preto, no estado de Minas Gerais. Conforme
Oliveira (2011), essa obra foi construída pela Irmandade de Nossa Senhora do
Rosário dos Pretos da Freguesia de Antônio Dias, que antes se abrigava em outra
igreja. As irmandades eram instituições religiosas que objetivavam colaborar com a
comunidade e os seus membros. Essas instituições apareceram no Brasil por volta
do século XVII, principalmente em Minas Gerais, mas já existiam na Europa desde a
Idade Média. O público das irmandades era heterogêneo. Existiam instituições para
ricos, para pobres, para brancos e para negros, e as funções colaborativas dessas
irmandades iam da realização de procissões, construção de igrejas e capelas, ações
da assistência (ajuda médica, financeira), realização de funerais, até, no caso das
pessoas escravizadas, auxílio para conseguir a carta de alforria.

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Fig.01 - Anônimo. Papa negro, anônimo, último quartel do século XVIII. Têmpera
sobre madeira, detalhe do forro da capela-mor, Igreja de Santa Efigênia, Ouro
Preto, Minas Gerais.

Observamos nessa obra, a inserção de um mestiço em uma posição de


destaque. As populações mestiça e negra encontravam suas formas de serem e/ou
sentirem-se representadas. Ainda que a prática fosse mínima em comparação com a
quantidade de representações brancas e de padrão europeu, era necessário para a
construção da identidade cultural na época. Entretanto, até em tempos mais atuais,
ainda é preciso alcançar uma representatividade maior dos/as negros/as, até
porque, o primeiro cardeal negro foi nomeado apenas em 1960. Laurean
Rugambwa, com 37 anos, nascido em Bukongo, na Tanzânia (na época, África
Oriental Alemã), foi nomeado pelo Papa João 23.

Barroco Litorâneo e as representações negras e mestiças

Apesar do maior controle, por parte da igreja, dos modelos de representação


pictórico no Barroco Litorâneopelas congregações missionárias que exerciam
atividade no litoral nordestino, como aponta Oliveira (2011), não são poucas as
demonstrações em Recife, na Paraíba e até mesmo em Salvador, a principal sede
administrativa do poder colonial, que burlam esse controle.

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Fig. 02 – Respectivamente: João de Deus e Sepúlveda. Nossa Senhora da Conceição,
c. 1777. Têmpera sobremadeira, medalhão central, forro da nave, Igrejade Nossa
Senhora da Conceição dos Militares,Recife, Pernambuco. João de Deus e Sepúlveda.
Nossa Senhora e o Bendito Fruto, c. 1777. Têmperasobre madeira, medalhão
secundário, forro danave, Igreja de Nossa Senhora da Conceiçãodos Militares, Recife,
Pernambuco.

Um exemplo da inserção mestiça no cânone barroco europeu se dá na Igreja


de Nossa Senhora da Conceição dos Militares do Recife, onde os medalhões
pintados no forro pelo artífice pardo João de Deus e Sepúlveda por volta de 1777,
traz segundo Oliveira (2011), ao menos um anjinho de pele mais escura entre vários
outros anjinhos que rodeiam a imagem de Nossa Senhora da Conceição. Nessa
mesma igreja, em um outro medalhão secundário, um outro anjo mulato aparece ao
redor da Virgem trazendo o emblema dos jesuítas. Um detalhe que a autora chama
a atenção é ao fato de que em ambas as pinturas os traços faciais de Maria
aproximam-se do fenótipo mestiço, com cabelos ondulados e lábios carnudos, como
é demonstrado nas duas imagens a seguir.

Considerações Finais

Durante este percurso, podemos nos ater as construções imagéticas e as


relações de força por elas mantidas e representadas por meio das produções

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barrocas no Brasil. Como sublinha Oliveira (2011), a vida colonial era marcada pelo
delineamento das posições sociais a partir da intrínseca relação entre religiosidade e
vida cotidiana. Falar sobre mestiçagens na arte, nos deslizamentos das formas de
representação canônica é abrir espaço para discursos de rupturas das normas
sociais da colônia. Sujeitos à margem da vida colonial dão-se a visualidade e a
representatividade por meio de produções artísticas, brechas que construíam, em
negação ao apagamento hierárquico pelo qual eram submetidos, que deixavam
entrever a autoafirmação de negros e de mestiços por meio do reconhecimento de
sua fisionomia, sua história e cultura.

Referências

APPELTAUER, Gerhard. 1960: Vaticano nomeia primeiro cardeal negro. Deutsche


Welle. São Paulo, p. 0-156. 03 mar. 2010. Disponível em:
<http://www.dw.com/pt/1960-vaticano-nomeia-primeiro-cardeal-negro/a-
302040?maca=bra-abril-all-1642-rdf>. Acesso em: 21 jun. 2016.

OLIVEIRA, Carly S. Mary de. Arte colonial e mestiçagens no Brasil setecentista:


Irmandades, artífices, anonimato, e modelos europeus na capitania de Minas Gerais
e do norte do Estado Brasil. In: PAIVA, Eduardo França.; AMANTINO, Marcia; Ivo,
ISNARA Pereira (Orgs). Escravidão, mestiçagens, ambientes, paisagens e
espaços. São Paulo: Annablume, 2011.

95
ARTE RUPESTRE NO ENSINO DA ARTE: PLANO DE AULA
REALIZADO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Anna Carilina Leal Santos (UEM)
Flávia Heloísa Bulla de Carvalho(UEM)
Karina Aiko Nakata(UEM)
Prof.ª Me. Fabiane Sartoretto Pavin (UEM)
lealanna.s@gmail.com

Resumo
Este plano de aula trabalha o conteúdo da Arte Rupestre de modo a enfatizar o
período enquanto conjunto das primeiras evidências humanas de concepção,
comunicação, registro e produção artística. Cabe ressaltar que a Arte Rupestre falha
em atender a alguns critérios de valor de arte ocidental, o que faz com que algumas
teorias e disciplinas amiúde a considere por um aspecto não-artístico, isto é, por um
caráter meramente utilitário. No que tange o ornamento primitivo, verificaremos que
o entendimento dos indivíduos desse período sobre o ritmo físico do padrão
empregado em seus artefatos é na verdade, excepcionalmente aguçado, o que
explica o fascínio sobre essa arte que persiste até os dias de hoje. Em se tratando
de uma arte que antecede a escrita (pré-histórica), interessa-nos indagar sobre as
possibilidades de motivação, temática, funcionalidade, insumos e soluções
expressivas que os artistas encontraram na sua época.

Palavras-chave:Ensino da Arte.Arte Rupestre. Grafite. Arte Contemporânea.

Introdução

Para se discutir as reverberações em práticas atuais da Arte Rupestre, expõe-


se um trabalho do artista de rua britânico, codinome Banksy (1974--, Bristol, Reino
Unido), que se vê pendurar na galeria 49 do Museu Britânico ilicitamente. Simulando
os motivos das pinturas de caverna, Banksy projeta num suporte rochoso uma figura
animal e uma humana, esta última que se move junto a um carrinho de compras.
Perpassado o conteúdo da Arte Rupestre do período do Paleolítico Superior
(aproximadamente 40.000-25.000 a.n.e.), debate-se as motivações da produção de
Banksy. Isso com o objetivo de elucidar a Arte Rupestre nas particularidades de uma
das primeiras manifestações humanas de/em arte e relativizá-la à prática
contemporânea do artista de rua Banksy (1974--, Bristol, Reino Unido).
Julga-se pertinente abordar maximamente todas e quaisquer atividades
artísticas registradas em algum período pelo globo. Em relação ao conhecimento

96
que não menospreza o que não é convencionado, a arte-educadoraBarbosa (1998)
julga ser importante conhecer os valores dominantes para que se compreenda o
processo defixação pelas relações de estrutura e poder. Ademais, defende-se que o
alargamento do repertório iconográfico é capaz de alterar o modo como os
indivíduos se relacionam e percebem não só o mundo, mas os outros, os espaços
que os circundam e que estes experienciam, e o próprio patrimônio da humanidade.
Adentrar o universo dos conteúdos compartilhados culturalmente pode fazer com
que o indivíduo se reconheça como participante, agente ou como um “outro” nesse
processo assimilativo.

Desenvolvimento

Durante a regência deste estágio voltado a educação de jovens e adultos, a


partir do plano de aula apresentado anteriormente, é realizada por um grupo de
alunas do curso de Artes Visuais do quarto ano da Universidade Estadual de
Maringá, a intervenção para as turmas do Ensino Médio e Ensino Fundamental do
CEEBJA no módulo individual.
As três aulas do primeiro horário são destinadas ao Ensino Médio, é abordado
o conteúdo teórico e visual por meio da metodologia com a projeção estática na TV-
pendrive, disponíveis na sala de aula, dois livros do artista contemporâneo Banksy e
uma revista de graffiti, apresentando desta forma, o conteúdo do plano de aula da
arte rupestre que discorre sobre os períodos da idade da pedra na Europa, África e
América Latina. Desta forma, para contextualizar este período da idade da pedra é
abordado brevemente questões antropológicas, biológicas, geográficas, sociológica,
cultural e simbólica por meio de mapas, registros mortuários, objetos utilitários e
adornos, registros pictóricos e esculturas, bem como, é apresentado referências de
artistas pesquisadores contemporâneos que utilizam a pré-história como objeto de
estudo produzindo arte e reconstrução das pessoas e costumes.
É analisado as esculturas das “Vênus de Willendorf” do período Paleolítico
Superior datada em 23.000 a.C, e a “Vênus de Laussel” datada aproximadamente
entre 27.000 a.C-20.000 a.C, interpretadas como “as mais primitivas representações
do mesmo princípio: mãe terra, fonte de vida, símbolo de fertilidade” (ANAWALT,

97
2011, p. 109). Sendo assim, tais imagens femininas não representam uma mulher
universal mas uma antiga deusa da fertilidade retratada sem rosto definido. Na
primeira Vênus apresentada, atenta-se para a base rígida e estável com os pés
firmes no chão em posição frontal, um corpo com formas voluptuosas dando
destaque para os seios fartos e quadris largos, simbolizando a fertilidade. Já na
segunda Vênus apresentada, atenta-se para o corpo em posição frontal e a cabeça
de perfil, mostrando a deusa mãe segurando um corno de bisão com a mão direita,
enquanto a esquerda está próxima ao ventre, explicando que acredita-se entre os
pesquisadores que o chifre em forma de lua crescente é relacionado ao ciclo
lunarcom o ciclo menstrual e a mão sobre o ventre indicaria a gravidez, evidenciando
um dos primeiros registros da interação dos povos pré históricos com os ciclos
universais e humanos.
Para contextualizar com a atualidade, relaciona-se os registros pictóricos pré
históricos às práticas contemporâneas do graffiti, a partir de uma intervenção do
artista Banksy, que consiste em um desenho sobre uma pedra de uma pessoa
empurrando um carrinho de mercado e, ao fundo da cena, a representação de um
bisão remetendo aos registros pré históricos.Esta obra foi deixada em um museu
sem que a instituição percebesse, caracterizando esta ação como uma intervenção
artística. Enquanto os(as) alunos(as) observam os livros do artista e discutem sobre
o tema é proposta a atividade prática, apresentada no plano de aula anteriormente,
que consiste em realizar uma produção artística de acordo com a temática da aula a
partir do material didático distribuído em sala, lixa de parede no tamanho A5 para dar
impressão de um material poroso e giz de cera colorido, eem seguida, os trabalhos
realizados são expostos no quadro-negro.
Nas duas aulas do último período a intervenção é voltada para o Ensino
Fundamental no módulo individual, porém, com menos tempo para concluir a
discussão e atividade prática, utiliza-se como estratégia focar nas produções pré
históricas como, roupas, adornos, pinturas, esculturas e objetos utilitários, assim
como, questões sociais para fundamentar a simbologia acerca das produções e
relacionar com as implicações geográficas e antropológicas. Para a atividade prática
é utilizado o mesmo material didático, os livros do artista Banksy, a revista de graffiti

98
como referência imagética, lixa no tamanho A5 e giz de cera colorido. Ao final da
intervenção, é perceptível que os(as) alunos(as) do Ensino Fundamental se valem
dos mesmos elementos apresentados na obra do Banksy decorrendo em uma
releitura como resultado final da produção.

Considerações finais

Ao final da intervenção, recebemos um elogio de um aluno pelo caráter


inter/transdisciplinar da aula. Ele parece espantado pelo desconhecimento da
possibilidade de a disciplina de arte dialogar com outras áreas como a Arqueologia,
História, Física e Química. A sua fala acaba por indicar um quadro geral do ensino
da arte, que tende a prezar ou compreender a arte unicamente pelo aspecto visual.
Pela especificidade da organização do CEEBJA, os planos de aula
necessitam ter uma conclusão no mesmo dia em que são iniciados. Em termos do
ensino e aprendizagem de/em arte, isso é encarado como uma complicação pelo
fato de um conteúdo ter de ser conformado em 45 minutos ou tempo menor e a
atividade, em práticas em papel avulso e lápis de cor. Quanto à atividade,
observamos que os alunos carecem de maiores direcionamentos e referências na
hora da produção. As professoras também se orientam por uma noção de
criatividade divergente da nossa, que entende a busca por referências como
composição de um repertório iconográfico e não necessariamente uma tática de
ausência de originalidade ou autenticidade.

Referências

ANAWALT, P. R. AHistória mundial da roupa. Tradução de Anthony Cleaver e


Julie Malzoni. São Paulo: Senac São Paulo, 2011.

CLOTTES, J. What is paleolithic art?: cave paintings and the dawn of human
creativity. Traduzido por Martin Y. Oliver e Robert D. Martin. Chicago: The University
of Chicago Press, 2016. Disponível em:
<https://books.google.com.br/books?id=eoebCwAAQBAJ&amp;pg=PA1&amp;hl=ptB
R&amp;source=gbs_toc_r&amp;cad=2#v=onepage&amp;q&amp;f=false&gt;>Acesso
em 1 mai. 2017.

GOMBRICH, E. H. A história da arte. Rio de Janeiro: LTC, 2013. Versão de bolso.

99
HOEBEL, E. A.: EVERETT, L. F. Antropologia cultural e social. Tradução de
Euclides Carneiro da Silva. São Paulo: Cultrix, 2006.

KHAN ACADEMY. An Introduction to Paleolithic Art. Domínio virtual educativo.

OWEN, J. A gramática do ornamento. São Paulo: Senac São Paulo, 2010.

STRICKLAND, C.; BOSWELL, J. Arte comentada: da pré-história ao pós-moderno.


S.l.: Nova Fronteira, 2002.

SHOVE, G. POTTER, P. CRUCHTLEY, L. (orgs). Banksy: you are an aceptable


level of threat. Carpet Bombing Culture, Reino Unido, 2012. Disponível em:
<www.carpetbombingculture.co.uk>

The Random House Group. Banksy: wall and piece. Reino Unido, 2005. Disponível
em: <www.randomhouse.co.uk/offices.htm>

100
AS ARTISTAS DO INFANTIL 5
Ana Gabriela Portelinha Hainosz (UEM)
Emanuelle Batista Camacho (UEM)
Jenifer Carolina Silva (UEM)
ana.hainosz@gmail.com

Resumo
Este trabalho expõe a experiência e as reflexões decorrentes da ação no Estágio
Supervisionado em Artes Visuais I, do Curso de Licenciatura em Artes Visuais da
Universidade Estadual de Maringá - UEM, realizada pelas acadêmicas do 3º ano
junto ao CEMEI Recanto Vila Esperança na turma do Infantil 5. O CEMEI é uma
instituição municipal que também é financiada pelo Rotary Club de Maringá, e
atende crianças de 0 aos 5 anos de idade. A temática nuclear que orientou os planos
de aula e as intervenções realizadas é As artistas do infantil 5, título dado ao álbum
de figurinhas a ser completado – sendo a ideia de aproximação entre arte e vida o
norte teórico, com foco na realização de leitura de imagem.

Palavras-chave: Estágio. Leitura de imagem. Prática docente. Mulheres artistas.

Introdução

O presente trabalho é um relato de nossa experiência do primeiro estágio em


Artes Visuais. O espaço formal destinado à realização do Estágio Supervisionado
em Artes Visuais l, que se volta à educação infantil (crianças de 0 aos 5 anos de
idade) foi o CEMEI Recanto Vila Esperança. Atuamos na turma do infantil 5, que
abarca crianças entre os 4 e os 5 anos de idade. Apresentaremos neste resumo uma
retomada da nossa proposta, bem como a importância da sua configuração, o relato
da leitura de imagem realizada pelas crianças e um pouco da relação que estas
demonstraram ter com as imagens.

Nossa Experiência
O estágio não é apenas uma atividade prática, mas um campo de
conhecimento o qual tem a pesquisa como cerne, dando um norte para possibilitar
sua realização (OLIVEIRA, 2005). Sendo assim, na realização do estágio o aluno-

101
estagiário passa, a partir de todo o aporte teórico estudado até então, para a
atuação no campo escolar. Nós, enquanto estagiárias, precisávamos (neste
contexto) lidar com as mais diferentes crianças em uma fase de desenvolvimento
primeira. Tentamos trabalhar a figura da mulher na arte, um assunto importante,
encaixada ao ritmo da idade e às suas realidades.
Richter (1999) explica que a criança inventa, não se conformando apenas em
reproduzir o que conhece. Compreendemos que ela inventa outros modos de fazer,
uma ação em que transforma tanto a realidade quanto a si mesma. O jogo lúdico/faz
de conta é necessário pois a compreensão da ação no plano da realidade passa, em
seu aparato psíquico, pela compreensão da representação (no faz de conta). Por
isto, configuramos nossa proposta passando por pontos de atividades em que
continham jogos e fizemos a apresentação teórica como um contar de histórias.
Embasamos o fazer com o infantil 5 pensando a potência modificadora da
arte. Enquanto mulheres e acadêmicas de Artes, escolhemos abordar a
representatividade artística feminina: a mulher não apenas enquanto uma figura a
ser retratada, mas também como um sujeito produtor de sentidos e significações,
ativo, que se expressa em e sobre o mundo no qual vive.
Partindo de uma caça ao tesouro pelo CEMEI, dividimo-nos por diferentes
locais para buscar imagens de produções artísticas – as quais se davam enquanto
pinturas, esculturas, bordados, entre outros. Todas foram realizadas por artistas
brasileiras: Rosana Paulino, Mudinha (parte do Coletivo do Parque do Parnaíba),
Evelyn Queiroz (conhecida por Negahamburguer), Cristina Agostinho, Madalena
Reinbolt, Lygia Clark. As crianças descobririam, então, que aquelas obras na
verdade fariam parte de um grande álbum de figurinhas intitulado As mulheres do
Infantil 5.
No primeiro dia, junto a cada um dos alunos, deu-se uma leitura das imagens
que haviam encontrado. Partimos de questões que chamamos questões
disparadoras: ‘o que vocês vêem na imagem?’, ‘como será que foi feito?’, ‘o que
será que a artista utilizou?’, etc; e conduzimos as discussões de acordo com as
respostas dadas pelas crianças. Tivemos, é claro, contra-tempos: a utilização do
refeitório por outra turma durante a realização da caça ao tesouro e o ritmo ligeiro

102
com que eles a executaram, por exemplo, fez com que a proposta acabasse antes
do previsto.
Na aula seguinte, mais preparadas, trabalhamos a disposição em sala para
ter uma conversa e exposição de conteúdos mais eficientes. Utilizando instantes
iniciais, propusemos atividades físicas em que chacoalhava-se todo o corpo, que
foram imprescindíveis para o desenrolar da aula: a ideia de começar com elas foi
trabalhar seu foco, preparando-os para a concentração do momento da conversa e
diminuir um pouco a euforia.
Então, sentados no chão, falamos um pouco sobre as artistas e montamos
nosso álbum. Os alunos se mostraram animados quanto à utilização feita pelas
artistas de diferentes materiais na criação das obras, como a tinta e argila. A
configuração em que os deixamos para explicarmos sobre as artistas – no chão em
meia lua ao fundo da sala – funcionou melhor do que deixá-los sentados às mesas,
pois tivemos uma vista panorâmica da turma. Durante a conversa, estiveram atentos
às coisas que os colegas mencionavam: relacionaram suas interpretações entre si,
corrigindo uns aos outros e/ou acrescentando detalhes à descrição no momento de
suas falas. Nossa temática dá foco para as produções das mulheres e reflete a
necessidade de uma representatividade feminina que se dê além dos espaços já
determinados e de imposta permanência. As crianças, atentas e interessadas nas
produções das artistas, se empolgaram ao discutir as obras trazidas e também ao
falar das artistas que convivem com elas – mulheres de suas famílias que produzem
arte em seus mais diversos formatos, trazendo suas experiências pessoais e
enriquecendo a prática.

As leituras das crianças

Na faixa etária entre os 4 e os 5 a criança apresenta a chamada relação


imagem-mundo tipo 2: sendo as imagens representações literais da realidade, ainda
que não considere transferências de sentimentos do artista para a obra, ela aceita
que há intencionalidade no que está sendo retratado, e para ela a boa arte é aquela

103
que está alinhada ao moralmente aceitável. Aos 6, no entanto, inicia-se a relação
tipo 3, em que sentimentos entram no patamar de coisas transferidas da artista para
a obra (ROSSI, 2011). Trabalhar com crianças do Infantil 5 significou aceitar a
possibilidade de que, dentre elas, havia aquelas que apresentariam relações
imagem-mundo tipo 3, encaminhando-se a um pensamento menos concreto.
Estas relações puderam ser percebidas nas interpretações em classe, com
alunos dizendo que “a personagem está muito triste e por isso as lágrimas a
amarravam na cadeira”, “era para mostrar que ela não gosta de se maquiar”, “ela
furou os próprios olhos de tristeza”, “as pessoas estão felizes e tocando, por isso o
artista fez eles tocando”. Sobre uma obra em formato de lambe da Negahamburguer,
que continha apenas uma mulher deitada com o braço erguido, a colocação de dois
alunos foi a de que “a menina queria mostrar seu sovaco”, que “ela estava na piscina
e precisava de um banho”. Outra dupla, quando questionada do porquê da obra,
falou que a artista a colou no poste porque queria deixá-lo bonito. Já, por exemplo,
as figuras encontradas pela aluna Y na obra Mão segurando trança (Cristina
Agostinho) foram totalmente diferentes da comumente encontrada, que é uma mão:
ela mencionou na imagem uma pedra com tranças, um nariz e um olho.
Raramente algum deles entrava no assunto do artista transferindo uma
opinião ou sentimento produzindo a obra, e quando ocorria era sempre para
endossar que era na verdade uma representação literal de alguém, um terceiro;
considerando as personagens como duplos de pessoas reais. Isto, no entanto, não
torna suas interpretações menos importantes ou menores. Muito pelo contrário:
demonstra que seu desenvolvimento cognitivo acompanha os níveis de leitura de
imagem esperados de sua idade, conseguindo relacionar repertório próprio e
produção artística em uma análise complexa e rica.

Considerações finais

A partir da intervenção, entendemos que a atividade com crianças tem que


ser exercida a ponto de envolvê-las, e que a forma para atingir isto é pela ludicidade,
como jogos e utilizando o faz de conta; uma vez que é a partir deles que elas

104
compreendem a realidade. A discussão teórica, com crianças, tem que ser feita de
maneira lúdica sem que se perca o foco. Ao tomá-la como se fosse uma história
infantil, esta aproxima-se de sua linguagem e consegue acompanhar seu
desenvolvimento: modificar a abordagem não significa retirar a complexidade da
temática. A última coisa desejada por nós, em uma atividade artística, é que o todo
torne-se uma ação vazia de significado.
Mesmo quando não soa tão conceitual quanto as discussões de adolescentes
ou adultos, a necessidade de exercer com crianças pequenas a leitura de imagens e
instigá-las a refletir o universo imagético é grande. Mecanismos para desenvolver
uma alfabetização visual existem, e esta precisa ser praticada.

Referências

BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da arte: anos oitenta e novos tempos.
São Paulo: Perspectiva, 2008. p. 27-43.
RITCHER, Sandra. Infância e imaginação: o papel da arte na educação infantil. In:
PILAR, Analice Dutra (org.). A educação do olhar no ensino das artes. Porto
Alegre: Mediação, 1999.

ROSSI, Maria Helena Wagner. A compreensão do desenvolvimento estético. In:


PILAR, Analice Dutra. A educação do olhar no ensino das artes. Porto Alegre:
Mediação, 1999.
______, Imagens que falam: leitura da arte na escola. 5 ed. Porto Alegre:
Mediação. 2011.
OLIVEIRA, Marilda Oliveira de. A formação do professor e o ensino das artes
visuais: estágio curricular como campo de conhecimento. In: HERNANDEZ,
Fernando; OLIVEIRA, Marilda Oliveira de. (Org.). A formação do professor e o
ensino das artes visuais. 1ªed. Santa Maria: Editora UFSM, 2005, p. 57-72.

105
AS CONTRIBUIÇÕES DA LINGUAGEM AUDIOVISUAL PARA O
CONHECIMENTO DA SÍNDROME DE DOWN
Luana Graziela da Cunha (UEM)
Yasmin Castro (UEM)
Flávia Augusta Ramon (UEM)
Lucas Men Benatti (UEM)
luanagrasiela_tdb@htomail.com

Resumo
Este trabalho tem por objetivo abordar possíveis contribuições da linguagem artística
audiovisual imbricada os saberes pedagógicos, potencializando, assim, nosso
recorte temático que versa sobre a Síndrome de Down. A pesquisa foi desenvolvida
durante o curso de Introdução aos saberes teóricos e práticos do cinema e vídeo,
que aconteceu na Universidade Estadual de Maringá, Campus Regional de Cianorte,
tendo como referência temática e visual o documentário “Do Luto à Luta” de Evaldo
Mocarzel. Como resultado, visualiza-se a relevância interdisciplinar ao correlacionar
a área da educação das pesquisadoras com os novos saberes ligados a tecnologia e
a arte, bem como, a possibilidade de uma reflexão sobre as condições sociais e
culturais que envolvem as pessoas com Síndrome de Down.

Palavras-chave: Audiovisual. Educação. Síndrome de Down.

Introdução

Com o desenvolvimento dos saberes científicos, na contemporaneidade,


observa-se um número cada vez mais crescente de catalogações, diagnósticos
sobre os diversos tipos de peculiaridades que caracterizam os sujeitos, em nosso
foco temático, as crianças, em relação aos problemas, dificuldades de
aprendizagem. Para a área da educação, torna-se importante discutir e expor sobre
todas essas peculiaridades, neste caso,nos debruçamos sobre uma dentre tantas
síndromes que existem: a Síndrome de Down.
Durante o curso de Introdução aos saberes teóricos e práticos do cinema e
vídeo5, foi proposto a escolha de um tema que se relacionasse com uma produção
audiovisual, um vídeo, um clipe, uma curta-metragem entre outros. O tema escolhido
foi a Síndrome de Down e a obra foi o documentário do “Luto à Luta” produzido em

5
Curso de extensão promovido pelo projeto “Desenvolvimento Cultural por meio da Arte”,
financiado pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Paraná.

106
2005 por Evaldo Mocarzel. Considerando os saberes apreendidos sobre a arte em
sua configuração audiovisual e a reflexão que o documentário propõe, que é de
pensar como é o processo ao receber um filho com Síndrome de Down, uma vez
que na maioria das vezes, a família não se sente preparada para tal
responsabilidade,a proposta deste trabalho é refletir sobre a realidade dessas
crianças com Síndrome de Down realizando uma própria produção audiovisual em
torno do tema.

Síndrome de Down

Por sermos estudantes de pedagogia e já atuarmos na área, o tema escolhido


justifica-se por uma proximidade de estudo e vivência. A Síndrome Down é presente
dentro do âmbito educacional e todo conhecimento sobre a mesma ainda é pouco
em relação ao rico universo das pessoas com a Síndrome.
Os primeiros estudos sobre Síndrome de Down iniciam com o médico inglês
John Lagdon Down. John buscou descrever semelhanças nos sinais físicos de um
grupo de pessoas, assim instituindo oque denominou de mongolismo, por conta das
pessoas desse grupo apresentarem olhos amendoados semelhantes aos da raça
mongólica. John afirmou que esses indivíduos eram incapazes e improdutivos para o
convívio social, ainda que considerados amigáveis e amorosos.
Mesmo tendo iniciado os estudos, John não descobriu a causa da Síndrome,
a mesma só foi descoberta com o cientista Francês Jerome Lejeun, que estudou os
cromossomos de nove pessoas com Síndrome de Down e conclui que eles tinham
47 cromossomos, um a mais no par de 21, sendo que o “normal” seria ter 46
agrupados em 23 pares. Foi assim surgiu o nome Síndrome de Down ou
Trissomiado cromossomo 21.
Não se sabe ao certo porque isso acontece, existem algumas pesquisas, mas
nenhumafoi confirmada totalmente, algumas afirmam que pode ter ocorrido
distúrbios hormonais nas mães, exposição asubstâncias químicas ou agentes
infecciosos.

107
Por ano, nascem cerca de 8 mil bebês com Síndrome de Down, algumas
pesquisas concluíram que os maiores números de crianças com Síndrome de Down
nasceram de mães com idade a partir de 35 anos, mas isso não é uma regra, pois
qualquer casal pode gerar um filho com a Síndrome.
Dentre as características das pessoas com essa Síndrome estão: a
musculatura geral mais flácida; a cabeça geralmente menor e pouco achatada; a
moleira demora um pouco mais para fechar e pode ser maior; muitas vezes a boca
se mantém aberta com a língua para fora, entre outros.
Com o passar do tempo desde da descoberta da síndrome, foram realizadas
diversas pesquisas, principalmente no âmbito educacional em relação ao
desenvolvimento psíquico desses indivíduos. Hoje se tem produções teóricas que
demonstram que esses indivíduos têm condições de se desenvolverem
psiquicamente, de aprender conteúdos sistematizados e realizarem atividades e
ações complexas, assim como os demais seres humanos ditos normais. A Síndrome
adentra os portões da escola com a inclusão, para atuar com essas pessoas. assim
como com os demais alunos, é necessário estudo, embasamento teórico, formação
adequada e nunca deixar de pesquisar.

Breve análise sobre o documentário do Luto à Luta

A obra cinematográfica que fundamentou nossa produção teórica e prática foi


o documentário do “Luto à Luta”. A escolha se fez porque somos alunas de
Pedagogia, e por meio da inclusão, recebemos diversos alunos com diferentes
peculiaridades na escola, dentre elas, a Síndrome Down. Outro fator importante para
a escolha desse tema é a nossa intenção em despertar, principalmente aos
acadêmicos de cursos de licenciatura a importância de voltar sua atenção à essa
discussão tão polêmica e tão presente em nosso meio.
O documentário discute sobre como é o processo de aceitar o filho com
Síndrome de Down, considerando que todos passam por um momento de luto, que
pode durar um minuto, um dia, um ano ou até mais, superando, passam ao
momento de luta, de buscar vencer junto com a criança, de pesquisar sobre a

108
Síndrome. Como lidar? Como cuidar? O que fazer e o que não fazer? Como vivem
outras crianças nessa mesma condição? Como é o acesso e permanência dessas
pessoas no âmbito escolar?
O que levou o cineasta Evaldo Mocarzela produzir o documentário foi ter uma
filha com Síndrome de Down, sua filha foi a personagem Clara na novela “Páginas
da vida” (2004). É interessante refletir sobre o que o autor fez, com o que a princípio
era uma razão para luto; após vencer o choque e a negação inicial que geralmente
acompanham a notícia de se ter um filho com a Síndrome, ele reuniu esforços para
divulgar esse assunto, e mostrar a nível nacional o que os familiares e os portadores
sofrem; porém não se restringe a isso, mas retrata também as potencialidades e
todas as possibilidades que essas pessoas possuem a medida que aceitam as
limitações que a Síndrome de Down traz como qualquer outra limitação que um
indivíduo considerado “normal” possa ter, saem do comodismo e de um estágio de
autocomiseração e se arriscam em uma jornada de lutas e conquistas.
Logicamente o autor não pode deixar de ilustrar que além das lutas normais
que todos os sujeitos inseridos em sociedade (estudar, se formar, se estabelecer no
mercado de trabalho, enfrentar as situações do cotidiano), os portadores da
Síndrome de Down, enfrentam simultaneamente o preconceito e em muitas vezes as
lutas judiciaispara assegurar seus direitos como cidadãos capazes e autônomos
para gerir suas vidas. Ao longo do documentário, o cineasta retrata diversas
habilidades que essas pessoas são completamente capazes de desenvolver, como
interpretação, música, esportes, também retrata a capacidade de se relacionar,
constituir família, trabalhar, ser independente como qualquer indivíduo.
Todo professor passa pelo momento de luto também, ao receber um aluno
especial em sua sala, mesmo tendo em sua formação estudos sobre a educação
especial, emergem diversas questões, o que vou fazer? Como vou lidar? Serei
capaz de ensinar esse aluno e fazer com que ele evolua? Buscando responder
essas perguntas o professor evolui para o momento de luta, de pesquisar mais, de
estudar mais, de dar o seu melhor, de lutar junto ao aluno e a família, a fim de,
desenvolver as potencialidades deste.

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Produção prática audiovisual
O vídeo realizado como atividade do curso, se estrutura de forma
relativamente simples, retratando algumas pessoas que possuem visões errôneas a
esse respeito da Síndrome de Down. Logo no início, uma simulamos uma
personagem entrevistada, com falas de uma mãe preconceituosa sobre a Síndrome,
que tenta até mesmo afastar seus filhos, que trataa deficiência como um problema.
Em outras falas expostas no vídeo, buscamos retratar situações, visões enganosas
da nossa sociedade ao achar e suplantar uma imagem que esses downianos são
pessoas sempre limitadas e dependentes. Optamos por um retrato pessoal e
profissional, já que somos atuantes na área da educação, destacamos que as
pessoas com Down possuem algumas dificuldades sim, porém, desde que sejam
estimuladas, são capazes de desenvolver suas máximas potencialidades.
Mesmo que eventualmente restrito de maneira brusca a um sistema
econômico e social, esse vídeo é uma obra simples, contudo auspiciosa e
esperançosa, com a propriedade de quem não se oculta por trás do ser imparcial. E
que a convivência com pessoas downianas, nos revela um novo universo, essas
pessoas trazem imensas alegrias para eles próprios, e para familiares e amigos.

Considerações finais

É visível que já ouve um grande avanço no que diz respeito à informação e


aceitação das pessoas com a Síndrome e é chocante ver com o documentário, como
pais recebiam a notícia há alguns anos atrás; mas não podemos estagnar no que diz
respeito a aceitar e incluir essas pessoas em todas as esferas da sociedade. Refletir,
estudar sobre a síndrome é necessário para que as pessoas compreendam quão
ricos são esses indivíduos.
É possível concluir que muitas obras cinematográficas tocam o afetivo de
quem as assiste, o documentário em questão, nos tocou pela forma como alguns
pais tiveram dificuldades para aceitar, e mesmo depois de aceitar as dificuldades
que enfrentaram, como por exemplo, o preconceito que impõe rótulos falsos,

110
discrimina. Mas,tem que se considerar, que mesmo com os desafios, existe muita
luta, muita persistência por essas pessoas, essas vem conseguindo resultados, cada
vez mais a Síndrome de Down ganha espaço dentro da sociedade e buscamos
ressaltar isso em nossas considerações práticas e teóricas.

Referências

MOREIRA, Lília MA. HANI, Charbel N El-b. GUSMÃO,Fábio AF; A síndrome de


Down e sua patogênese: considerações sobre o determinismo genético.Revista
Brasileira de Psiquiatria, vol.22, n.2, pp.96-99, 2000.Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1516-
44462000000200011&script=sci_abstract&tlng=pt> acesso em: 19 set. 2017

NASCIMENTO, Marcia Leody Corrêa. Síndrome de Down. Brasília. Disponível


em:<http://marcia.nascimento.eng.br/02_down.pdf> acesso em: 19 set. 2017

111
(AUTO)DESTRUIÇÃO: RELAÇÕES DE TERROR(ISMO) ENTRE O EU E O
OUTRO

Juliana Camargo Castro de Oliveira (Uninter)


Nayara Bueno Sóta
Lucas Men Benatti (UEM)
juulianaa@icloud.com

Resumo
O presente resumo é resultado de investigações materiais e conceituais referentes a
relação autodestrutiva humana, tanto como espécie em nível macro, quanto
como sujeito, em nível micro. A pesquisa foi desenvolvida durante o curso
Introdução aos saberes teóricos e práticos do cinema e vídeo, vinculado ao projeto
Desenvolvimento Cultural por meio da Arte/SETI, na Universidade Estadual de
Maringá, Campus Regional de Cianorte. Trata-se de uma pesquisa em arte,
que estende sob a fisicalidade as pulsões simbólicas e que se desenvolve
durante o próprio fazer. O produto final resultou em pequenos ensaios, aqui
apresentados na composição deste estudo, e em uma produção audiovisual que
reflete sobre o potencial de destruição de si dos humanos.

Palavras-chave: Pesquisa em arte. (Auto)destruição. Terrorismo. Vídeo.

O início da guerra ao terror

A Lei brasileira Nº13.260 de 16 de março de 2016 diz:

Art. 2° O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos


previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou
preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a
finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo
pessoa, patrimônio, a paz pública ou incolumidade pública.

Sendo essa uma forma de nomear o atentado que ocorreu em Nova Iorque no
dia 11 de setembro de 2001. Contrários as tentativas de alterar costumes do Oriente
Médio (principalmente por parte dos Estados Unidos, que possuíam interesses
petrolíferos na região) Osama bin Laden, juntamente com o grupo terrorista intitulado
Al Qaeda, sequestraram dois aviões e os jogaram contra o World Trade Center, um
dos maiores centros financeiros do mundo na época.
Porém, há suposições de que tal ato foi um acordo entre George W. Bush,
então presidente dos Estados Unidos e Osama bin Laden, a partir de evidências de

112
contatos prévios entre os mesmos. Essa ligação foi relatada no documentário
“Fahrenheit 09/11” de Michael Moore, produzido em 2004, em que Bush negligencia
os ataques no momento em que é informado por seus acompanhantes, durante uma
visita a uma escola infantil na Flórida, justificando que não interromperia a leitura das
crianças para não assustá-las.
Como consequências do ataque, foram relatados 2996 óbitos, sendo 19
sequestradores e 2977 civis e aproximadamente 6300 feridos.
Foi transmitido no Brasil, pelo programa Fantástico um noticiário árabe que
informou a descoberta de uma fita, junto de arquivos cujo conteúdo era a explicação
de Bin Laden ao 11 de setembro. Dentre eles estão:

 Barbárie da Aliança entre EUA e Israel para atacar palestinos e libaneses;


 Invasão israelense no Líbano em 1992;
 Carta Branca dos Estados Unidos a Israel com ajuda da 6ª Frota Americana.

Bin Laden relatou também que obteve seu tempo planejado de 20 minutos
triplicado por conta da reação de George Bush, também citada no documentário
Fahrenheit 09/11.
Após Barack Obama ser eleito presidente, tomaram-se medidas
antiterroristas, onde o principal objetivo era capturar ou matar o líder terrorista
Osama bin Laden. Em 2 de maio de 2011, agentes americanos adentraram em uma
residência suspeita no Paquistão. Lá encontraram Osama e alguns homens de suas
tropas. Nesta operação morreram alguns desses homens, o seu filho, uma mulher
que foi usada como escudo, além dele, com um tiro na cabeça. Sua morte foi
festejada por milhares de norte-americanos, principalmente nova-iorquinos, que
viram como um ato para o fim do terrorismo no país. O corpo de Osama foi recusado
por diversos países, no entanto conforme as tradições islâmicas o enterro deveria
ocorrer dentro de 24 horas, então foi desovado no mar.

113
Arte e Terrorismo

O autor Arthur C. Danto, citou no artigo “A arte e o 11 de setembro” uma


instalação no Davis Museum, na Wellesly College, intitulada “Obituary”, que ocorreu
no mesmo dia do atentado e representavam lápides, com nomes e imagens das
mesmas capas do The New York Times, que continham como matéria principal, a
morte de muitas pessoas. Foram usadas aproximadamente 300 primeiras páginas
do jornal.

Com isso, o autor da instalação Joseph Bartscherer quis mostrar que eram
casos raríssimos a imagem de pessoas desconhecidas na primeira página, assim
como a maneira que nos são apresentas as mortes de pessoas influentes. Essa
instalação originou o livro “Obituary: Davis Museum and Cultural Center, Wellesley
College, Wellesley, Massachusetts, September 4-December 30, 2001”. No dia
seguinte ao atentado, como esperado por Bartscherer e pelos que compactuam de
tais ideias, não foram para as capas do The New York Times a imagem de pessoas
comuns.
Além disso, Richard Schechner, por meio de Stockhausen vê o atentado
como uma performance vanguardista, explicando dessa forma o episódio:

a maior obra de arte imaginável para todo o cosmos. Mentes alcançando


algo em um ato que sequer poderíamos sonhar na música, pessoas
ensaiando feito loucas durante 10 anos, preparando-se fanaticamente para
um concerto e, então, morrendo, basta imaginar o que aconteceu lá. Você
tem pessoas que estão focadas em uma performance e então 5.000
pessoas são mandadas para o além, num só momento. Eu não poderia
fazer isso. Em comparação, nós, compositores, não somos nada. Artistas,
também, não raro tentam ir para além dos limites do que é possível e
concebível, e assim nós despertamos, assim nos abrimos para outro
mundo […]. É um crime porque os envolvidos não deram seu
consentimento. Eles não vieram para o concerto. Isso é óbvio. E ninguém
os avisou que a vida deles correria riscos. O que aconteceu, em termos
espirituais, foi um salto para fora do seguro, para fora do que é tomado por
certo, para fora da vida, que às vezes acontece em pequena escala
também na arte, caso contrário, arte não é nada (STOCKHAUSEN,
2009, s/p. apud SCHECHNER, 2011, p. 405).

114
Outra expressão artística relacionada com o dia, considerada pelo site WNYC
a fotografia mais famosa que ninguém viu é a foto chamada “The Falling Man”, que
retrata um homem caindo do edifício durante o atentado, feita por Richard Drew. Um
marco na história do 11 de setembro, principalmente pelo modo que o fotógrafo
relatou a queda do homem, deixando explícita a vulnerabilidade do corpo humano
quando fora qualquer controle.
A vulnerabilidade não é capaz de atingir apenas o corpo humano, mas
também sua mente, de modo que haja atrocidades como o atentado no World Trade
Center em 2001.

Da violência com o Outro à violência de si

Diante dos fatos anteriormente apresentados, a produção audiovisual


realizada com base nos mesmos tem o intuito de mostrar que o ser humano além de
realizar grandes projetos acerca da destruição externa é capaz de fazer a sua
própria destruição através de pequenos atos que executa em suas rotinas
exaustivas.

Figura 1: Conjunto de recortes que compõe o vídeo, acervo dos autores.

115
Como uma fuga a elas, a pessoa pode desenvolver vícios em diversos
químicos manipulados, legalizados ou não, como a nicotina, o álcool, o crack e a
cocaína.
A criação desse vídeo teve a intenção de mostrar o potencial humano a se
autodestruir, tanto por questões psicológicas, políticas e religiosas, além de diversas
outras que não foram abrangidas pela temática.

Rerências

BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Lei nº 13.260, de 16 de março de


2016. Diário Oficial da União (Edição Extra). Brasília, DF, 17 mar. 2016. Seção 1,
p.1.

SCHECHNER, Richard. 11 de Setembro, Arte de Vanguarda?. Revista Brasileira


de Estudos da Presença, [S.l.], v. 1, n. 2, out. 2011. ISSN 2237-2660. Disponível
em: <http://seer.ufrgs.br/presenca/article/view/20986>. Acesso em: 21 set. 2017.

DANTO, Arthur C. Art and 9/11. 12 nov. 2001. In: . Unnatural wonders:
essays from the gap between art & life. New York: Columbia University Press, 2005,
p.125-131.

MAYER, Laura. Photographer Richard Drew remembers “The Falling Man”. New
York Public Radio. Set, 2011. Disponível em <http://wnyc.org/story/156882-
falling-man> Acesso em 20 set. 2017.

116
CLEBINHO(A) NÃO TEM GÊNERO, PODE SER QUEM QUISER
Eliane Cristina da Silva (UEM)
Willyan Henrique Batosti da Silva(UEM)
Roberta Stubs(UEM)
avelianesilva@gmail.com

Resumo

O presente estudo refere-se às experiências e reflexões sobre o personagem


Clebinho(a),originado a partir de uma oficina de lambe-lambe aplicada no CAP por
meio do Estágio Supervisionado em Artes Visuais. Pretende-se discutir o corpo
múltiplo, pautado no gênero e na construção pós-identitária, a fim de proporcionar
reflexões para pensar o corpo de Clebinho(a) dentre as suas diferentes formas, o
qual não possui atributos físicos que demarquem o masculino e o feminino
facilmente localizáveis Parte da análise fundamenta-se nos relatos dos alunos
durante o ato criador, pois representaram sujeitos que estão presentes em nossa
sociedade, mas não necessariamente se identificam inseridos totalmente nela por
diversos motivos. Como resultado, busca-se uma compreensão pós-identitária a
partir da teoria queer para entendermos a multiplicidade de corpos, não só de
personagens, mas de sujeitos reais que estão presentes em nosso meio.

Palavras-chave:
Clebinho(a). Gênero. Corpo múltiplo. Pós-identidade.

Introdução

Ao falarmos do(a) personagem Clebinho(a) enquanto sujeito de corpo


múltiplo, sem gênero localizável e sua evidente postura contra o preconceito ao qual
sofreria por não estar inserido totalmente em um padrão de normalidade,
questionamos sobre a pluralidade de corpos pautados no gênero e na construção
pós-identitária que contrapõe o binarismo de homem/mulher,
masculinidade/feminilidade, hétero/homossexual, e estabelece fronteiras que estão
em constantes transformações e instabilidades. .
A exclusão de formas múltiplas é desencadeada pela ausência de
representações de certos modos de ser no discurso dominante. Em oposição a essa
ausência, e por meio de uma educação menor (SCHNEIDER, 2014), é possível
pensar o ensino da arte como forma de possibilitar novas formas de ver o mundo,

117
em sua multiplicidade e pluralidade. De acordo com Schneider (2014), é uma
educação menor por interessar à micropolítica, aquela que perpassa as pequenas
ações, dizeres, mas que comporta a multiplicidade, transformando-as em pequenas
possibilidades de transformações e olhares.
Pela educação menor, temos uma postura micropolítica que entende que os
gestos cotidianos e as ações diárias são uma potente ferramenta transformativa e de
resistência. A partir dessa perspectiva, levamos aos alunos e alunas do Colégio de
Aplicação Pedagógica (CAP) debates acerca do corpo enquanto manifestação
política, identitária, social e diversificada, priorizando sua pluralidade de formas,
cores e representações, passando assim, pelo fio da sensibilidade, da
experimentação e da singularidade.

O corpo de Clebinho(a) em sua multiplicidade a partir de uma construção pós-


identitária.
Considerar o conceito de identidade no contexto da pós-modernidade é
pensar as diferentes possibilidades de identificar e designar sujeitos que se
constituem sob bases cada vez mais efêmeras e instáveis, possibilitando a
fragmentação de identidades fixas e a construção de novas e outras identidades.
Esse processo de fragmentação, decorrido de uma mudança estrutural das
sociedades modernas do século XX, faz com que aconteça um deslocamento da
noção de identidade e nos leva a questionar a centralidade dessa noção para além
de um corpo fixo pautado na normatividade e em concepções essencialistas de
sujeito e subjetividade.
Segundo, Hall (2006, p. 13) “à medida em que os sistemas de significação e
representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade
desconcertante e cambiante de identidades possíveis com cada uma das quais
poderíamos nos identificar”. No entanto, por não ter o “eu” coerente, pautado no
sujeito do Iluminismo, mas um “eu” que se fragmenta, desloca, “descentra”, as
identidades múltiplas e cambiantes acabam sendo entendidas como minorias que
muitas vezes não são retratadas nas representações identitárias hegemônicas por
serem consideradas desviantes do normal

118
Para além do dualismo identitário que classifica e generaliza os sujeitos em
masculino e feminino, ao analisar criticamente a produção de Clebinho(a), fica
evidente que há um desnorteamento do binário, seja em sua forma física quanto em
seu nome, pois nas palavras dos próprios alunos, o(a) personagem não seria nem
masculino nem feminino. Sendo assim, Clebinho(a) sugere pensar em suas
possibilidades representativas, ir além dos pressupostos aparentes em seu corpo.
Acompanhado do enunciado “não ao preconceito”, escrito pelos alunos, reforça que
ele surge dessa necessidade de ir contra a normalidade, de reivindicar não somente
a sua identidade, pois como bem esclarece Louro (2001, p. 9) “a afirmação da
identidade implica sempre a demarcação e negociação do seu oposto, que é
constituído como sua diferença”.
Ao reivindicar a diferença pela representação plural e fluída de Clebinho(a), o
personagem nos leva a explorar o território da teoria queer, estudo este que desafia
as normas regulatórias da sociedade e questiona os sistemas que determinam o
que é “normal” . Desse modo, o queer questiona “a identidade como um fator
limitante dos processos múltiplos dos sujeitos, uma vez que a identidade estabelece
o ser e exclui o não ser, o plural, o diverso, o diferente.” (SILVA, 2015, p.149 ). A
partir dessa crise de identidade no sujeito moderno, que não comporta mais uma
unicidade, mas que se revela como um membro atribuído de fragmentos e
descentralizado, surge o conceito de pós-identidade: uma proposta teórica de
compreender criticamente as estruturas heteronormativas que estão no centro do
poder de organizações, sistemas, conhecimentos e relacionamentos entre sujeitos
na sociedade (LOURO,2001).
A análise do personagem Clebinho(a), se faz a partir de uma construção pós-
identitária, pois carrega, para além de suas formas estranhas, o sentimento de não
reconhecimento. O corpo em sua construção social e cultural, de acordo com Silva
(2015, p.152) “são assinalados pela linguagem e por isso são atravessados por
relações de poder que definem o que é ‘normal’ para esses corpos”.
Se refletirmos sobre a idealização social na qual a configuração biológica do
sexo/gênero dos sujeitos se apresenta como corpos que se enquadram no feminino
e masculino, Clebinho(a) não está em concordância com aquilo que é designado na

119
cultura como ideal para cada sexo/gênero, já que, segundo os alunos o(a)
personagem não poderia ter elementos que indicassem o sexo/gênero. É justamente
essa ausência de determinações identitárias rígidas que possibilita a Clebinho(a) ser
quem quiser.
Figura 1: Clebinho(a), 2017.

Fonte: registros pessoais.

Considerações finais

O objetivo geral deste trabalho foi elaborado pensando em Clebinho(a) como


eixo norteador de debates e reflexões a respeito de corpos múltiplos estruturados na
concepção de pós-identidade. Além disso, foram surgindo outros conceitos que
identificamos como relevantes para o desdobramento da pesquisa. O primeiro foi a
concepção de micropolítica e pedagogia menor, e o segundo, a experiência. Por
micropolítica e pedagogia menor, compreendemos que ela acontece todos os dias,
contrapondo a instrução, ou seja, aquilo que já está previamente guiado. Sendo

120
assim, a educação menor acontece na experiência, no fruir e na experimentação
propriamente dita. Quando falamos sobre experiência, segundo Larrosa (2002),
falamos de como ela nos afeta, nos passa e nos acontece como sujeitos ativos e
receptores de mudanças. A experiência não pede licença para se manifestar, nós é
que nos permitimos sermos parte dessa interrupção que exige parar. Ela se delimita
quando não paramos. Foi enquanto uma pedagogia menor que essa oficina ganhou
corpo. Uma experiência micropolítica que gerou marcas e afetos nos estudantes e
que reverberaram na construção de Clebinho(a), esta construção coletiva não tem
gênero, que não pode ser reduzido a categorias identitárias e que pode sim ser
quem quiser.
Clebinho(a) nos permitiu deslocarmos de uma identidade fixa, não o(a)
dividindo em posição binária. E quando retornamos ao enunciado que carrega com
os dizeres “não ao preconceito”, ganhamos força para desatar os pré-conceitos
institucionalizados, de reafirmar a vida do(a) outro(a) diferente de nós enquanto valor
igual. Afinal Clebinho(a) não tem gênero, não é passível de ser rotulado, não se
encaixa em padrões, posto que, celebra a diversidade de cores e formas e
possibilidades de identitárias. Clebinho(a) pode ser quem quiser.

Referências

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A,


2006.

LARROSA, Jorge Bondía. Notas sobre a experiência e o saber de experiência.


Revista brasileira de educação, n. 19, 2002. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n19/n19a02.pdf>. Acesso em: 08 nov. 2017

LOURO, Guarcira Lopes. Teoria queer - uma política pós-identitária para a


educação. Estudos feminista, v. 9 n. 2, 2001. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ref/v9n2/8639>. Acesso em: 08 nov. 2017.

SILVA, Caio Ramos. Identidade e pós-identidade, uma perspectiva queer. Revista


Contraponto, UFRGS, v.2, n.1, 2015. Disponível
em:<http://seer.ufrgs.br/index.php/contraponto/article/view/54394>. Acesso em: 08
nov. 2017.

SCHNEIDER, Daniela da Cruz. Micropolítica e pedagogia menor: desdobramentos

121
conceituais para se pensar a educação pelas vias da experimentação. Revista
Travessias, v. 8, n. 2, 2014. Disponível em:
<http://erevista.unioeste.br/index.php/travessias/article/view/8653/781>. Acesso em:
11 nov. 2017.

122
CULTURA E DESENVOLVIMENTO INFANTIL: UMA ANÁLISE DO
DOCUMENTÁRIO BABIES
Lucas Men Benatti (UEM)
Luana Graziela da Cunha (UEM)
lucas-benatti@outlook.com

Resumo
O presente estudo busca versar sobre o processo de desenvolvimento infantil a
partir da análise do documentário Babies (2010), ancorado sob a perspectiva
histórico-cultural, que compreende o sujeito, como evidência Leontiev (19--), como
um ser de natureza social, cuja humanidade nele provida, advém de sua vida em
sociedade, inserida em dada cultura e criada pela humanidade. Como resultado,
visualiza-se uma melhor compreensão da relação formação-sujeito/aquisições-
históricas. O desenvolvimento humano é alcançado por meio da aprendizagem
desde a infância, de modo que, o sujeito só se constitui como tal, por meio da
apropriação da cultura que o rodeia, dos artefatos e instrumentos já produzidos,
variando de sociedade para sociedade, relação bem explicitada por meio das
personagens do documentário Babies, cujas particularidades, de modo de ser e ver
o mundo, reflete uma historicidade particular de cada nacionalidade.

Palavras-chave: Histórico-cultural. Desenvolvimento infantil. Documentário Babies.

Introdução

O presente estudo busca versar sobre o processo de desenvolvimento infantil


a partir da análise do documentário Babies (2010), ancorado sob a perspectiva
histórico-cultural, que compreende o sujeito, como evidência Leontiev (19--), como
um ser de natureza social, cuja humanidade nele provida, advém de sua vida em
sociedade, inserida em dada cultura e criada pela humanidade.
Babies segundo Carneiro (2014), foi produzido em 2010, na França, sob
direção de Thomas Balmès e coescrito por Alain Chabat. Trata-se de um filme-
documentário que retrata o crescimento de quatro bebês de nacionalidades distintas
desde sua gestação até completarem um ano de vida. Com duração de
aproximadamente 80 minutos Babies é um documentário não narrado, cujas
personagens verídicas são filmadas, como sublinha a autora, de modo oculto,
buscando não causar nenhuma interferência no dia a dia das famílias registradas.

123
O documentário nos apresenta as experiências de Bayarjargal (cujo apelido é
Bayar), Ponijao, Hattie e Mari, que vivem, respectivamente em Bayanchandmani, na
Mongólia, Opuwo, na Namíbia, São Francisco, nos Estados Unidos e em Shibuya no
Japão. Para a construção do nosso corpus de análise, tomamos as teorizações de
Carneiro (2014), que divide as personagens do documentário em dois grupos,
levando em consideração a localidade em que se situam os bebês: espaços de
evidência da cultura urbana e espaços de existência de características rurais. A
partir destas considerações, procuramos tecer uma rede comparativa de
desenvolvimento entre os bebês de cada grupo, levando em conta que “cada
geração começa [...] a sua vida num mundo de objetos e de fenômenos criados
pelas gerações precedentes” (LEONTIEV, 19--, p. 284).

Infância e cultura: Analisando Babies

Segundo Mello e Farias (2010) todos os sujeitos são produtos do momento


histórico e da cultura que participam. São as experiências vividas que impulsionamo
desenvolvimento do sujeito por meio da aprendizagem. Nessa perspectiva, como
evidencia as autoras, se a aprendizagem é o que impulsiona o desenvolvimento, a
criança desde que nasce aprende e atribui sentido ao que vive. Como destaca Mello
e Farias (2010, p. 55) “[...] desde o início de sua vida, a criança é inserida no
conjunto da herança cultual da humanidade que é partilhada pelo grupo social do
qual ela participa e que se faz presente no momento da história em que vive”.
As crianças apresentadas pelo documentário nasceram em um contexto já
determinado e construído historicamente. O modo com o qual elas aprendem a se
significar sobre o espaço, a interpretar o ambiente é construído a partir de uma série
de redes de interações entre o sujeito e o meio. Apesar do documentário já ser uma
visão a respeito das etnias e nacionalidades que aborda, já construir discursos e
direcionar nosso olhar para cada um dos complexos de personagens, fica evidente a
diferença de realidade principalmente entre os bebês da Mongólia e Namíbia cujo
contexto se insere em uma perspectiva de espaço cultural rural e os bebês dos
Estados Unidos e do Japão, que apesar de distantes geograficamente e distintos em

124
muitos aspectos, apresentam diversas regularidades ao se inserir em um contexto
de cultura urbana.
O modo como é tratada a maternidade e a infância nesses dois grupos é
muito diferente. Para citar apenas alguns aspectos que os constituem e os definem
em cada cultura, Bayar o menino da Mongólia, por exemplo, costuma ficar amarrado
dentro de casa, pela mão ou pelo tronco, a relação com animais de grande porte,
como vacas e bodes é naturalizada; esses animais o rondam em diversas situações,
inclusive enquanto toma banho. Ponijao o bebê da Namíbia bebe água de um
pequeno córrego, come areia, lambe animais, brinca e engatinha sobre pedras. Já
as bebês do outro grupo, estão a todo momento em um ambiente aparentemente
higienizado, longe do que consideramos em nossa cultura, como artefatos que
trazem algum perigo a criança. Hattie, a garota estadunidense, fica em uma
cadeirinha enquanto o pai cozinha, tem a leitura incentivada pela mãe, seu parto
ocorreu em um hospital, com acompanhamento médico etc. Mari, a bebê japonesa,
vive em situação parecida pelo que é retrato no documentário, recebendo os
mesmos cuidados médicos na hora do parto, fazendo uso de brinquedos e objetos
semelhante, frequentando locais específicos para o cuidado de crianças.
A questão aqui não é criar um juízo de valor para quais ações, modos de
viver, são mais corretos ou mais equivocados, mas sim, compreendermos que não
se nasce humano, torna-se humano, a medida que existe uma predeterminação pela
experiência cultural, inscrita na história, que o define. Apesar de cada criança estar
inserida em um contexto cultural diferente, todas se apropriam dos instrumentos da
sociedade, para assim, desenvolver, como demonstra Leontiev (19--), as aptidões
especificamente humanas.

Podemos dizer que cada indivíduo aprende a ser homem. O que a


natureza lhe dá quando nasce não lhe basta para viver em sociedade. É
preciso adquirir o que foi alcançado no decurso do desenvolvimento
histórico da sociedade humana (Leontiev, 19--, p.285).

Cada criança aprende como ser e como agira partir da interação com o
adulto, desta forma, mesmo que as culturas e sociedades estejam em constante

125
transformação, cujo caráter de transitoriedade também lhe é constituinte, é
assegurado e perpassado costumes e tradições que constroem a identidade de
determinada nação, determinada etnia. Por hipótese, a mãe de Ponijao também
nasceu em uma sociedade, que para parâmetros ocidentais, negligenciam cuidados
que, supostamente, seriam essenciais a sobrevivência do bebê, dessa forma, ela
tem atitudes semelhantes com seu filho pelas experiências vividas, observadas por
ela.
É importante compreender que, para Vigotski o desenvolvimento infantil não é
natural ninguém nasce pronto, ninguém nasce humanizado, o desenvolvimento não
depende de fatores biológicos. Desse modo, a humanização acontece por meio do
processo de mediação, o adulto media o conhecimento elaborado pelas gerações
precedentes à criança, por exemplo, ao dar um copo para a criança e não ensinar
sua função social, a criança não aprenderá sozinha. O copo será apenas um objeto
físico e somente a partir do momento que for realizada a mediação, que passará a
ter função social.
Para um último destaque, assim como sublinha Carneiro (2014), apesar de
cada bebê desenvolver sua identidade e personalidade conforme o mundo exterior
ao qual se relacionam e se inserem, há uma regularidade presente nos modos de
identificação e significação das crianças, trata-se de identidades culturais infantis,
que segundo Sarmento (2004, p. 11 apud CARNEIRO, 2014, p. 320) “[...] exprimem
a cultura societal em que se inserem, mas fazem-no de modo distinto das culturas
adultas, ao mesmo tempo em que veiculam formas especificamente infantis de
inteligibilidade, representação e simbolização do mundo”. Nesse sentido, segundo o
autor, haveria uma “universalidade” das culturas infantis que ultrapassaria limites da
inserção cultural local, isso se deveria ao fato das crianças criarem “ordens sociais
instituintes” que regeria as relações de conflito e cooperação. Traços dessas marcas
podem ser visualizadas, por exemplo, no choro de Bayar para chamar a atenção da
sua mãe quando o irmão o incomoda, ou quando Mari, enquanto tenta caminhar cai
e chora diversas vezes. Em nenhum dos casos o choro tem uma relação com o
biológico (dor, sofrimento), são modos que se utilizam para comunicar, uma
linguagem que antecede a língua mais elaborada.

126
Considerações finais

O percurso trilhado no desenvolvimento deste estudo nos permite constatar


que os sujeitos não nascem dotados de aquisições históricas inatas. Todo seu
desenvolvimento, alcançado por meio da aprendizagem desde a infância, é
resultado da incorporação do desenvolvimento humano ao longo da história.
Somente por meio da mediação que acontecea apropriação da cultura que o rodeia,
dos artefatos e instrumentos já produzidos que os sujeitos irão adquirir propriedades
e faculdades que o caracteriza enquanto humano. Vale destacar que os modos de
significação e interpretação são móveis, construídos em um duplo jogo entre o
subjetivo e o exterior que o cerca. Essa mobilidade fica explícita se pensarmos a
análise das personagens retratas pelo documentário Babies, cujas particularidades,
de modo de ser e ver o mundo, reflete uma historicidade particular de cada
nacionalidade.

Referências
LEONTIEV, Alexis. O desenvolvimento do psiquismo. 1.ed. São Paulo: Moraes,
19--.

MELLO, Suely Amaral; FARIAS, Maria Auxiliadora. A escola como lugar da cultura
mais elaborada. Revista Educação. Santa Maria, v.35, n.1, 2010. Disponível em: <
http://periodicos.ufsm.br/reveducacao/article/view/1603 >. Acesso em: 04 ago. 2016.

CARNEIRO, Ana Carolina Rocha. Infância e diversidade cultural: uma reflexão sobre
o filme “Babies”. Zero-a-seis. Florianópolis, v. 16, n.30, 2014. Disponível em: <
https://periodicos.ufsc.br/index.php/zeroseis/article/view/1980-
4512.2014n30p116/27696 >. Acesso em: 04 ago. 2016.

127
EDUCAÇÃO ESPECIAL: ENSINO DE ARTE PARA PESSOAS
INVISUAIS

Lucas Men Benatti (UEM)


lucas-benatti@outlook.com

Resumo
Esta pesquisa demonstra resultados do decorrer da disciplina de Espaços de Arte
Aprendizagem IV, do curso de Artes Visuais, da Universidade Estadual de Maringá.
Tem por excelência, o foco de abordar e refletir a respeito do ensino de arte, em
suas construções práticas e teóricas sobre a educação especial, debruçando-se
sobre o processo de pesquisa e investigação a partir da pesquisa bibliográfica e de
experiência. Em um primeiro momento, fazemos uma retomada histórica sobre a
educação especial, posteriormente abordamos algumas experiências de ensino de
arte para pessoas invisuais, para enfim, concluirmos com uma proposta pedagogia
para se trabalhar o ensino de arte para deficientes visuais.

Palavras-chave: Ensino de Arte. Educação especial. Deficientes visuais.

História da deficiência

Para podermos compreender mais a fundo a dinâmica de ensino para a


pessoa com deficiência, nos convém refletir sobre a historicidade que envolve esse
grupo de pessoas e o tratamento social e educacional que lhes é dado. De acordo
com Miranda (2003), alguns estudiosos, analisando a história da educação especial
em países da Europa e da América do Norte, apontam a existência de quatro
fases/estágios no processo evolutivo de atendimento as pessoas com deficiência. A
primeira fase, segundo a autora, seria marcada pela negligencia, a ausência total de
atendimento que se desdobrou na era pré-cristã, podendo haver variações,
posteriormente, já na era cristã, onde as ações das pessoas estavam condicionadas
em suas concepções de caridade ou castigo.
O segundo estágio se dá em meados do século XVII e XIX, fase chamada de
institucionalização, pois as pessoas que apresentavam algum tipo de deficiência
eram segregadas e protegidas em instituições residenciais. O terceiro estágio tem
início já no final do século XIX e meados do século XX e é marcado pelo

128
desenvolvimento de escolas e/ou classes especiais que ofereciam a pessoa com
deficiência uma educação a parte dos outros sujeitos. O quarto estágio se dá por
volta da década de 1970, onde é possível observar um movimento de integração
social dos indivíduos que apresentavam deficiência em ambientes escolares, o mais
próximo possível daqueles oferecidos à pessoa sem deficiência.
Nesse processo de tirar a pessoa com deficiência de uma clara marginalidade
social, destacamos aqui, assim como Miranda (2003) faz em seus estudos, o
trabalho de pesquisadores pioneiros nessa área, como é o caso de Jean Marc Itard
(1774-1838), que desenvolveu as primeiras tentativas de educar uma criança de
doze anos de idade a partir de um método sistematizado de ensino para deficientes.
Dando prosseguimento aos estudos de Itard, Edward Seguin (1812-1880) é
responsável pela criação do método fisiológico de treinamento, que consiste em
estimular o cérebro por meio de atividades físicas e sensoriais. Por fim, Maria
Montessori (1870-1956), outra importante educadora, cujos estudos foram
experimentados em diversos países da Europa e da Ásia, baseou suas pesquisas no
uso sistemático e na manipulação de objetos concretos, desenvolvendo um
programa de treinamento para crianças deficientes mentais, contribuindo para a
evolução de pesquisas sobre o ensino para pessoas com deficiência.
No Brasil, de acordo com Miranda (2003), apenas na década de 1970 ocorre
a institucionalização da Educação Especial, isso ainda em termos de planejamento
de políticas públicas. Apenas em 1988, a Constituição Federal em seu artigo 208,
iria estabelecer a integração escolar enquanto preceito constitucional, preconizando
o atendimento as pessoas com deficiência preferencialmente na rede regular de
ensino. Somente em 1996, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
93.94/96 que haveria um reforço a obrigação do país em promover a educação
especial.

O Ensino de Arte para pessoas invisuais

Enquanto professores de artes visuais nos cabe considerar uma problemática


que se coloca para o ensino desta disciplina, que trabalha tão intrinsicamente com a

129
visão e o visual, no contexto da educação especial: Como trabalhar a aprendizagem
de conteúdos visuais com pessoas invisuais? Na busca de elucidarmos essa
questão, nos colocamos em um processo de estudo teórico-prático durante a
disciplina, procurando compreender e aplicar na prática, as particularidades do
ensino de arte para pessoas sem a visão, mas especificamente, como trabalhar com
o ensino de desenho, da representação pictórica com esses sujeitos. Para tanto, nos
deparamos com os estudos de Duarte (2010), sobre o desenho infantil e o desenho
de crianças cegas.
A autora aponta, que segundo alguns pesquisadores, o desenho infantil
apresenta determinadas regularidades quanto a sua forma representacional e gráfica
mesmo em culturas diferentes. Isso se deve, segundo Duarte (2010), ao fato de que
esses desenhos, além de produtos do cultural, são sínteses de um processo mental,
cognitivo, de representação na construção visual e plana desses desenhos.
Duarte considera que o ensino do desenho de esquemas gráficos às pessoas
invisuais é fator de relevância como recurso para minimizar a distância entre a
percepção de mundo visuo-espacial das pessoas visuais, da percepção sequencial-
temporal das pessoas invisuais. O ato de desenhar, para a autora, é imitativo e
cultural como a fala, a escrita e os demais comportamentos dos sujeitos em
sociedade.
Entre os desenhos analisados no teste aplicado pela autora, ela distingue um
tipo de produção específica de pessoas, principalmente invisuais, que se encaixam
no conceito de “multimodal. Duarte (2010) utiliza o termo para conceituar um tipo de
desenho que não prioriza a modalidade visual, sendo oriundo da percepção
adquirida a partir de outros sentidos, de conhecimentos e saberes já adquiridos. O
desenho desse menino apresentava um forte trabalho cognitivo de assimilação dos
objetos, entretanto não exercia plenamente a função comunicacional. A apreensão
de seus significados por outros sujeitos, uma vez que a grafia de seus signos
escapam do grafismo culturalmente estabelecido, não se dava de forma automática,
sendo necessário, para uma total compreensão, uma descrição verbal do autor, que
sinalizava suas intenções e objetivos. É possível que o desenho de uma pessoa
invisual reúna “[...] percepções de diferentes modalidades sensoriais. [...] [grafando]

130
no desenho indistintamente o ‘dentro’ (invisível) e o ‘fora’ (visível)” (DUARTE, 2010,
p. 11).

Proposta pedagógica: Caixas que mostram telas

A relevância de se trabalhar e produzir esquemas gráficos táteis deve ser


encarado como uma realidade da prática docente, uma vez que possibilita uma
maior interação entre crianças invisuais com o ambiente visual e de comunicação da
atualidade. Visando a prática educativa do ensino de arte para crianças invisuais,
após as reflexões apontadas por Duarte (2010), executamos uma proposta
pedagógica tendo em mente o ensino de desenho. Para tanto, construímos nosso
próprio material didático para trabalhar com pessoas invisuais, por meio do qual,
desenvolvemos “caixas que mostram telas”, referenciando a proposta pedagógica
desenvolvida pela professora e doutora Marta Gustave Coubert Bellini. “Caixas que
mostram telas” consiste na reprodução em miniatura 3D de alguma obra de arte, de
modo que, está se adapte a uma caixa. Em nosso trabalho utilizamos a obra
Harmonia em Vermelho do artista moderno Henri Matisse, e o material final é
ilustrado pela figura 01 abaixo.

Figura 01: Obra-tátil - reprodução de Harmonia em Vermelho de Henri


Matisse, arquivo do autor, 2015.

131
Nosso plano de aula tinha por objetivo, ao trabalhar com a obra de Matisse e
a utilização de linhas e formas, exercitar a prática do desenho de memória curta e
longa, a partir da experiência tátil com a obra Harmonia em Vermelho e de
lembranças pessoais em ambientes internos da própria casa. Para tanto, a proposta
pedagógica perpassaria os momentos de apresentação oral da vida e obra de
Matisse, com destaque para a criação da tela Harmonia em Vermelho; divisão da
turma em grupos para a experienciação da obra-tátil, havendo a mediação do
professor com os grupos; proposta aos alunos de criação de um desenho da figura
humana presente na obra, feito com barbante sobre papel adesivo e um desenho na
mesma superfície, com os mesmos materiais, que retrata-se o interior de algum
cômodo/espaço da casa do aluno, exercitando desta forma a memória de curto e
longo prazo. A atividade teria fim com a apresentação oral dos alunos sobre suas
obras e a avaliação do professor quanto à execução do que foi proposto.

Referências

BRASIL. Senado Federal. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: nº


9394/96. Brasília: 1996. Disponível em:<
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/leis/L9394.htm >. Acesso em: 16 out. 2015.

DUARTE, Maria Lúcia Batezat.A Possibilidade de Produção e Leitura de Desenhos


Tátil-visuais por Crianças e Adolescentes Cegos. Revista Brasileira de Tradução
Visual, PE, vol. 5, n. 5, 2010. Disponível em: <
http://www.rbtv.associadosdainclusao.com.br/index.php/principal/article/viewArticle/6
2 >. Acesso em: 03 nov. 2015.

MIRANDA, Arlete Aparecida Bertoldo. História, deficiência e educação especial.


Histedbr, 2003. Disponível em:<
http://www.histedbr.fe.unicamp.br/revista/revis/revis15/art1_15.pdf >. Acesso em: 25
fev. 2016.

132
ESTÁGIO SUPERVISIONADO II: PESQUISA E IDENTIDADE CULTURAL
DOCENTE

Anne Beatriz Baliscke de Morais (UEM)


Mariana Aparecida Pereira da Silva (UEM)
Eloiza Amalia Silva (UEM)
annebaliscke@gmail.com

Resumo
Este trabalho tem como objetivo relatar as experiências vivenciadas no estágio
formal no decorrer da disciplina de Estágio Supervisionado Obrigatório Fundamental
II. Tem-se o intuito de relatar experiências vivenciadas pela dupla de acadêmicas de
Artes Visuais – licenciatura. O estágio ocorreu no Colégio Gastão Vidigal com duas
turmas de 9º ano, onde foi oportunizado conhecer o contexto escolar e organizar o
trabalho docente. O Movimento Paranista foi o tema selecionado para a intervenção
pedagógica, abordado a partir do estudo das obras de quatro artistas, por meio da
leitura de imagens. Tais vivências possibilitaram o conhecimento e a pesquisa
quanto ao ensino e aprendizagem da Arte, nos âmbitos da Educação Ensino
Fundamental.

Palavras-chave: Ensino Fundamental. Estágio. Ensino de arte. Movimento


paranista.

Introdução

O presente resumo tem como objetivo relatar e refletir ainda que brevemente,
as atividades desenvolvidas na disciplina de Estágio Supervisionado
Obrigatório II em Artes Visuais que compreende estudos teóricos e práticos. O
Estágio percorre os dois últimos anos da graduação sendo eles realizados
semestralmente I, II e III, IV. O enfoque corresponde ao Estágio
Supervisionado II, referente ao segundo semestre do terceiro ano, que abrange
o campo de atuação docente em ambiente escolar da Educação Básica. O estágio
escolar é uma exigência da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº
9.394/96 que o art. 82 define “Os sistemas de ensino estabelecerão as normas
de realização de estágio em sua jurisdição, observada a lei federal sobre a
matéria”. Sendo assim realizado pelos acadêmicos do curso de graduação em
Licenciatura de Artes Visuais.

133
O estágio formal foi realizado em dupla pelas acadêmicas: Anne e Mariana do 3º
ano do curso de Artes Visuais – Licenciatura, que vivenciaram o
acompanhamento das atividades docente com a professora de Arte em sala de aula
do 9º ano no estágio formal. A partir de nossas pesquisas e reflexões sobre
as experiências vivenciadas no decorrer do estágio, o qual abrange a teoria e a
prática docente, constatamos que as duas categorias ocorrem juntas. Concordamos
com a afirmação de Paulo Freire (2002, p.25) “quem ensina aprende ao
ensinar e quem aprende ensina ao aprender”, uma vez que os conhecimentos
e práticas foram compartilhados entre professor e aluno, bem como, com todos que
fazem parte da instituição escolar.
O contato com a cultura tanto dos alunos, professores de sala e professora
supervisora do estágio, possibilitaram que nos aproximassem da realidade de
ser professoras. A troca de saberes e conhecimento entre todos por
meio da participação em situações de trabalho, permitiram aperfeiçoar nossas
escolhas nas ações como futuros professores de Artes Visuais.

Desenvolvimento

Ao início do estágio formal foi realizado durante o terceiro trimestre no Colégio


Gastão Vidigal e teve a supervisão da professora de estágio Eloiza Amália
em conjunto com a professora responsável pela sala para a realização das
observações e regências. Iniciamos com a observação de duas turmas do 9º
ano, observando dois conteúdos aplicados em sala, o Op art e Pop art, sempre nos
atentando para o modo como a professora conduzia suas explicações aos alunos, e
também, o modo que estes alunos reagiam ao conteúdo.
Já em nossa regência a professora da sala nos orientou sobre o
conteúdo que deveríamos trabalhar, que foi o movimento Paranista (1920-
1940). Buscamos relacionar com quatro artistas do período que foram: Lange
de Morretes, Guido Viaro, Poty Lazarotto, Alfredo Andersen. Optamos por abordar
tais artistas, uma vez que através de suas obras retrataram o povo paranaense,
sua cultura e seus símbolos de diversas formas. Utilizamos dois livros para

134
compor nosso material didático sobre o tema escolhido: “Arte - Ensino médio”
e “O professor PDE e os desafios da escola pública paranaense: produção
didático-pedagógica”. Os recursos didáticos utilizados para a regência foram:
apostila sobre o Movimento Paranista, análise da obra “Tela nos detalhes” e a
elaboração de um simulado de artes com questões de somatória e gabarito.
Em nosso primeiro dia de regência nos apresentamos aos alunos como
estagiarias de artes visuais e fizemos a chamada, logo em seguida informamos aos
alunos o tema que trabalharíamos com eles “O Movimento Paranista” por meio de
slides. Após a exposição teórica fizemos várias perguntas como: Alguém sabe o que
foi o movimento paranista? O que é paranaense e paranista? Passamos
sobre a história e os artistas como: Lange de Morretes, Guido Viaro, Poty Lazarotto,
Alfredo Andersen, um pouco da história de cada um deles e uma ou duas obras de
cada artista que também será utilizado na atividade de análise de obras no terceiro
dia de regência. Explicamos também a distinção entre os termos paranistas e
paranaenses. No segundo momento da aula fizemos a retomada do conteúdo,
perguntando aos alunos sobre os artistas se eram paranistas ou paranaense,
pudemos perceber que a maior parte dos alunos entendeu bem o conteúdo
apresentado em nossa aula.
No segundo dia de regência entregamos as apostilas “Paranismo um resgate
da história das artes visuais do Paraná ” para que os alunos pudessem pesquisar
afim de realizar as demais atividades e ter em mãos o material que
havíamos passado em slides. Lemos e grifamos com os alunos a apostila em
sala e os orientamos que seria utilizada no dia de nossa próxima regência,
os alunos participaram da aula oralmente.
Ao terceiro dia aplicamos apresentamos a proposta de análise de
imagens, utilizando a “Tela dos Detalhes”, reproduzimos as obras dos artistas
selecionados em papel transparente, colamos em uma folha preta de alta gramatura
por baixo e montamos uma lupa por meio de um círculo com papel branco,
grande e outro pequeno colados em uma fita de papel preto.
No papel sulfite elaboramos dez questões sobre as obras. Já em sala
realizamos a chamada e pedimos para que os alunos se organizassem em grupos

135
de cinco alunos, resultando então em 6 grupos, posteriormente, distribuímos
uma obra e uma folha de perguntas para cada grupo. Os alunos tiveram muitas
dúvidas sobre os planos de perspectiva da obra, não sabiam distinguir o que
estava em primeiro, segundo e terceiro plano. Exemplificamos no quadro os planos
por meio de desenhos, assim os alunos conseguiram desenvolver a atividade
sem problemas, orientamos também, para que utilizassem a apostila entregue
no segundo dia de regência para o auxílio de algumas perguntas. Ficamos de
prontidão andando pela sala para podermos ajuda-los em suas duvidas durante a
atividade e ao final da aula colocamos no quadro o dia da prova e para estudarem a
partir do material entregue a eles.
No quarto dia de regência aplicamos o “Simulado de artes” com dez questões
somatórias e gabarito simulando. Pedimos para que todos os alunos
guardassem seus materiais na mochila e só deixassem sobre a carteira lápis,
borracha e caneta preta ou azul. Muitos deles não sabiam interpretar alguns
enunciados e preencher o gabarito, logo esclarecemos a todos no quadro.
Ao final da aula passamos recolhendo, depois em nossas casas dividimos as
atividades que cada uma iria ficar responsável e devolvemos a professora
corrigido para dar retorno aos alunos. Podemos ver que os alunos aprenderam
muito bem sobre o conteúdo apresentado, assim como aprendemos com eles
nesses dias e assim finalizamos a nossa regência na instituição de ensino.
Nossas experiências no campo de estágio, podemos observar que os alunos se
dedicaram muito bem sobre o conteúdo apresentado, assim como também
aprendemos com eles nesses dias de regência. As vivências em sala de aula, nós
possibilitou uma série de saberes entre professores e alunos, refletir sobres nossos
erros, vivenciar os desafios que enfrentamos no nosso percurso e de como foi dito
durando os anos de estudos do curso, foi um amadurecimento e uma contribuição,
para a nossa formação, segundo Pimenta Gonçalves cita que

não se resume à aplicação imediata, mecânica e instrumental de


técnicas, rituais, princípios e normas aprendidas na teoria. A prática não se
restringe ao fazer, ela se constitui numa atividade de reflexão que
enriquece a teoria que lhe deu suporte. O estágio é um processo criador,

136
de investigação, explicação, interpretação e intervenção na realidade
(PIMENTA, 1995, p.74)

Concluímos essa etapa do estágio, foi um momento de grande aprendizado


em que todas as dificuldades foram sanadas com de pesquisa e muito esforço de
todos os envolvidos nesse percurso.

Considerações finais

Ao término do estágio formal da disciplina Estagio Supervisionado


II, entendemos este período de prática docente, como parte fundamental para
nosso crescimento profissional e acadêmico, nos oportunizou articular o
conhecimento acadêmico com a prática docente enquanto futuras educadoras
da disciplina de artes visuais. Agradecemos a direção da instituição escolar, que
nos recebeu muito bem, neste período de preparação para a nossa
formação acadêmica, aos profissionais da área de artes que nos forneceram toda
ajuda possível com as suas experiências docentes e também à nossa
supervisora de estágio que nos acompanhou e orientou nesta jornada.

Referências

BRASIL. Decreto n. 9.394, de 20 de dez. de 1996. Estabelece diretrizes e bases da


educação nacional, Brasília, DF, dez. 1996.

BUENO, Luciana Estevam Barone. O Paranismo e as Artes Visuais. Dissertação de


Mestrado em Artes Visuais – Universidade Estadual de Santa Catarina.
Florianópolis, SC, 2009.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa-


21ª Edição- São Paulo. Editora Paz e Terra, 2002.
PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência de Educação. O
professor PDE e os desafios da escola pública paranaense: produção didático-
pedagógica. Curitiba, SEED/PR., v.2, 2009. Disponível em:
<http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/cadernospde/pdebusca/producoes_p
de/2009_fap_arte_md_luciana_estevam_barone.pdf >. Acesso em: 04 out. 2017.

137
PIMENTA, S. G. O estágio na formação de professores: unidade, teoria, pratica. 2ª
edição. São Paulo: Cortez,1995

SECRETARIA de Estado da educação. Arte-Ensino Médio. 2ª ed. Curitiba, SEED-


PR, 2006. Disponível em:
<http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/livro_didatico/arte.pdf/>
Acesso em: 04 out. 2017.

138
FOTOCUMENTÁRIO CONTEPORÂNEO. TINTA: DA PELE AO MURO

Gabriel Brunini (Unicesumar)


Fábio Dias Souza (Unicesumar)
bruninigabriel@gmail.com

Resumo
O trabalho apresentado trata-se de um fotodocumentário contemporâneo escolhido
por possibilitar maior flexibilidade que o fotodocumentário convencional e permitir
certa expressão artística e externalização de uma ideia/sentimento nele
representado pela arte manifesta em diferentes espaços. Este artigo, resultante do
trabalho de conclusão de curso em Comunicação Social - Jornalismo, objetivou
evidenciar diálogos entre o grafite e a tatuagem e sua convergência nas questões
subjetivas. O trabalho foi dividido em três partes, uma primeira dedicada a
explanação sobre o grafite, a segunda abordou as características da tatuagem e no
terceiro subtítulo apresentou-se a convergência entre as duas artes, expondo a sua
complementariedade, mesmo porque, ambas, representam através da tinta, o
movimento subjetivo de cada ação, do público para o privado, do acadêmico para a
vida de todas as pessoas envolvidas nesta tentativa de, por meio da fotografia, ler,
reler e sentir a vivência coletiva da tinta em corpos e muros.

Palavras-chave
Fotodocumentário. Grafite. Tatuagem.

Introdução

As cidades, se vistas de longe, não tendem a apresentar muitas diferenças.


Podem ser interpretadas como um mesmo organismo. Vários prédios, muito
concreto e seres que circulam por suas “veias”, trazendo vida. Vistas com atenção,
por dentro do sistema, podemos constatar que são únicas; cada cidade possui uma
tradição, preconceitos, manias, elas dormem, acordam, possuem crises e,
inevitavelmente, morrem.
Esses territórios materiais também se apresentam como espaços sensoriais,
quando paladar, audição, olfato, tato e visão tornam-se dispositivos disparadores de
sensações singulares interpretadas por cada corpo em sua subjetividade.
Dos sons de sirenes e construções, futuras moradias de integrantes desse
conglomerado, que cotidianamente produzem barulhos ao andarem pelas ruas, seus
passos, falas, gritos e súplicas, ao som do motor do carro e o cheiro da fumaça que

139
exala do escapamento mesclando-se com aroma de cada prato do boteco do
subúrbio ao cheiro do pão recém assado na panificadora do centro.
A urina no beco e o incenso usado pelas comunidades religiosas junto ao som
dos cultos a um deus, atravessados pela música alta no carro de som. A textura de
cada caminho de terra, areia, pedras, cimento e piche visualizadas pelos olhos do
sujeito com a barba por fazer, da menina arrumando o cabelo bagunçado pelo vento
forte que atinge o rosto de cada trabalhador na rua presente. E por onde todos esses
olhos passam? Que corpos não enxergam? E quais mensagens ignoram?
Na tentativa de responder estas questões, em um movimento onde sujeito,
cidade e pesquisador se atravessam e se transmutam, foi proposto o produto desta
pesquisa que narra, por meio de um fotodocumentário contemporâneo, as
peculiaridades que fazem com que o ser, ora a cidade, ora as pessoas, sejam únicos
por meio de sua arte corporal, seja na pele ou no muro.
O trabalho em questão possui influências do desenhista americano Will
Eisner, no que se refere à sua leitura urbana, que propõe a cidade como um
personagem, “O verdadeiro retrato está nas frestas do chão e em torno dos menores
pedaços de arquitetura, onde se faz a vida do dia-a-dia” (EISNER, 2006). Por mais
que cada cidade tenha uma identidade particular, todas elas são constituídas de um
aglomerado de pessoas. A cidade é um organismo vivo e nós, seres humanos,
somos células presentes neste organismo, produtoras de arte expressa no corpo
urbano, biológico e material. Tais movimentos artísticos apresentam sentimentos,
pensamentos, opiniões e histórias que podem ser lidas nos muros de cada cidade e
nos corpos de cada sujeito.
A escrita e imagens que seguem são um convite à contemplação da
dimensão artística no universo público de toda cidade, expressões culturais, sócio
históricas e fotográficas do pesquisador que se fez inserido no momento da
produção das fotografias por meio de seus sentimentos e subjetivado em seus
ensaios de futuro profissional do jornalismo, expressando a obrigatoriedade técnica
de olhares atentos ao todo e aos detalhes e de certa atitude ética em relação à
leitura de todos os corpos e ambientes múltiplos e que transitam e transitaram pelo
jornalista em sua função de fotógrafo.

140
Desenvolvimento

Ao historiar sobre cada elemento de arte da tatuagem e grafite trabalhados


em seus espectros, fica evidente que ambos possuem alguns pontos de
convergência, nos quais os diálogos expressos tanto pelo grafite tanto pela tatuagem
coincidem em vários momentos.
Primeiramente pode-se considerar que ambas as artes milenares, tendo como
início do grafite as pinturas rupestres que “aprisionavam” as almas da caça e
também ensinavam sobre os pontos fracos das presas, e a tatuagem, que possuem
registros no antigo Egito há mais de 2100 A.C, como marcações em pontos
encontradas no corpo de uma múmia do sexo feminino com o intuito de
embelezamento.
Já nas múmias egípcias foram encontrados vestígios de uma cultura em
que as práticas de marcação corporal eram intensas, sendo que o registro
mais antigo refere-se a tatuagens em formas de pontos e linhas, que foram
preservadas em múmias do sexo feminino que datam do ano 2.160 a.C. É
deste período também o primeiro vestígio de uma escarificação (VILHENA;
ROSA; NOVAES, 2015, p. 134).

As duas artes tiveram grande importância nas décadas de 60 e 70, onde


foram amplamente utilizadas como método de manifestação. O grafite como já
debatido teve presença forte nas revoluções estudantis de maio de 1968 na França.
No fim da mesma década a tatuagem era vista como expressão de protesto
particular, fortemente presente nos corpos dos adeptos de vários movimentos
sociais que têm como seu estopim essa época, caso dos hippies e punks.

Slogans e pichações dos muros. As universidades e as ruas,


especialmente nos locais de manifestações, foram cobertas de pichações
Slogans e pichações dos muros. As universidades e as ruas,
especialmente nos locais de manifestações, foram cobertas de pichações
(THIOLLENT,1998, p.75).

A subjetividade é um dos, se não o quesito mais fortemente presente no


grafite e na tatuagem, tendo em vista que essas artes levam em consideração os

141
sentidos que constituem o sujeito, que cria, tanto quanto, no que consome o
resultado final na obra.
Toda as experiências, opiniões, culturas e vivências influenciam diretamente
na construção e leitura, fazendo com que cada obra seja diferente para cada um que
a consome, por mais que fisicamente trate-se do mesmo objeto. A tatuagem que
pinta o corpo do hippie pode ter como intenção o protesto contra a violência e
densidade da sociedade, ou até mesmo uma relação de conexão com o estado
natural, enquanto para um observador que não faz parte do grupo social pode ver
apenas como um ornamento que busca embelezar aquele que carrega a arte.
A pessoa que carrega uma tatuagem ou pinta um muro leva consigo a
necessidade de expressão, de se mostrar diferente. Hoje em dia com a
popularização das cidades cada vez menos o homem está só, ele sempre se
encontra cercado de vizinhos, passa por pedestres, colegas de trabalho, se vista de
cima (a cidade) não podemos reconhecer as formas humanas pequenas que
circulam em meio aos colossais blocos de concreto, todos são iguais, todos são
vizinhos, logo a vontade de expressão torna-se existente.
Pessoas tatuam histórias, experiências e gostos para se mostraram diferentes
na amálgama urbana. Outros grafitam os muros e exibem suas assinaturas, porém
com a mesma intenção, passar uma mensagem, se mostrar diferente, se destacar
em meio a cidade, gigante e impiedosa.

É necessário produzir modos de resistência à lógica onipresente do


capitalismo global, a qual se dá através de um movimento sem território,
sem rosto ou sem corpo e que se parece com uma onipotência que não
pode ser identificada. Por este motivo, o lugar abandonado ou o lugar da
velocidade se desvitaliza e se descaracteriza, se tornando “não-lugares” ou
espaços não habitados, somente usados como locais de passagem. Muitas
vezes somente os grafites são capazes de produzir um aspecto particular e
uma estética específica para aquele lugar (RINK, 2010, p.77).

Quando observamos a cidade atuais estamos ao mesmo tempo reconstruindo


o seu passado, sua história e moldando o seu futuro. Em uma sociedade cada vez
mais individualista as pessoas presam por gritarem e se exporem para todos. O culto

142
ao corpo é cada vez mais forte logo cada vez mais comum se expressar por meio
dele, ou apenas torna-se diferente, embelezá-lo.
Mais um ponto que vale a pena destacar é na beleza pela beleza. Nas duas
artes vemos fases ou sujeitos que criam apenas por criar, por achar bonito, por
querer tem aquela arte em sua pele ou expressa no muro. Mesmo esse tipo de arte
apresenta sua subjetividade, seja ela no traço da arte ou no local da tatuagem,
porém neste cenário a geração de conteúdo ou de um discurso não é o foco
principal da arte.
A partir disso é possível sentir a polissemia das artes, até mesmo da
fotografia, que de sua própria maneira, neste trabalho muito explicita, se conecta
com o grafite e a tatuagem em uma arte subjetiva, que teve como base as
experiências do fotógrafo na hora de capturar os momentos aqui registrados.

Considerações finais

A partir do desenvolvimento do artigo torna-se claro os diversos pontos de


convergência no que se refere as artes visuais: grafite e tatuagem, principalmente
quando colocamos lado a lado a importância histórica de ambos os movimentos e a
produção de subjetividade.
O trabalho foi referenciado por diversos artistas, principalmente por Claudio
Edinger, e seu livro “Cityscapes” que retratou, de forma inspiradora, a ação em
ambiente urbano. Outros autores como Robert Capa, Karen Knorr e Mário Cravo
Neto, estimularam a produção deste fotodocumentário devido ao olhar tanto humano
quanto abstrato tão presentes em cada escolha dos locais visitados, dos corpos
autorizados e dos ângulos captados para o registro de cada imagem capturada em
forma de fotografia.

Referências

VILHENA, Junia; ROSA, Carlos Mendes; NOVAES, Joana de Vilhena. Narrando as


dores. A tatuagem como narrativa, 2015. Disponível em:

143
<http://cprj.com.br/imagenscadernos/caderno33_pdf/07_Narrando%20dores.pdf > Acessado
em: 19 de maio de 2017.

THIOLLENT, Michel. Maio de 1968 em Paris: testemunho de um estudante.


Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
20701998000200006 > acessado em: 09 de setembro, 2017.

RINK, Anita. Grafitagem: Resistência e criação. Revista Tamoios, 2010. Disponível


em: <http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/tamoios/article/viewFile/1171/3034>
Acessado em 15 de junho de 2017.

144
LA BÊTE E A CENSURA DA/NA ARTE DO/NO CORPO

Bruno Arnold Pesch (UEM)


Rafaella Barqueiro Domingues (UEM)
brunopesch@hotmail.com

Resumo
A manifestação artística performance, traz para o campo da Arte mudanças
significativas na concepção de artista, espectador, obra e até mesmo de arte. Abarca
uma (re)estruturação, não apenas na estrutura e fazer artístico, mas em conceitos
até mesmo do corpo posto à visibilidade, tornado obra. Corpo artístico que traz em si
metáforas de censura, ideologias e materializações de práticas sociais e culturais.
Tendo como material de análise dois textos provenientes dos sites do Jornal Folha
de São Paulo e G1, este trabalho interroga-se, assim, de que maneira se configura a
metáfora da censura da/na arte do/no corpo performático em La Bête. Em uma
perspectiva teórica da Análise Crítica do Discurso (ACD), busca-se compreender a
metáfora da censura enquanto instrumento de materialização de ideologias a partir
da investigação do evento comunicativo acerca da performance La Bête, do
coreógrafo Wagner Schwartz.
Palavras-chave: Análise Crítica do Discurso. Arte. Performance. Corpo. Metáfora da
censura.

Introdução

Focalizando centralmente o discurso enquanto prática social e cultural, e nos


sujeitos desse discurso enquanto atores sociais, buscamos refletir sobre o evento
que denominamos, com base em Bourdieu (1998), de metáfora censura da arte
do/no corpo na performance La Bête, apresentada no 35º Panorama da Arte
Brasileira em São Paulo. Para tanto, interrogamo-nos de que maneira se configura
a metáfora da censura da/na arte do/no corpo performático em La Bête. Objetiva-se
compreender a metáfora da censura enquanto instrumento de materialização de
ideologias e, mais especificamente, analisar discursos na/da mídia acerca do evento
comunicativo; entender a manifestação artística performance enquanto um discurso
que materializa práticas sociais e culturais; e por fim, identificar a intertextualidade
presente entre La Bête e a série Bichos.

La Bête: sobre corpo, performance e censura

145
A performance, enquanto manifestação artística, traz mudanças significativas
na concepção de artista, espectador, obra e até mesmo de arte. Ela abarca uma
reestruturação não apenas na estrutura e fazer artísticos, mas em conceitos até
mesmo do corpo posto à visibilidade, tornado obra. Segundo Nascimento (2011, p.
28), passa-se a uma “proximidade perceptiva e experimental” do espectador com a
obra. A partir da década de 1960, desvela-se o corpo como possibilidade de
engajamento político, lugar de encontro entre público e privado, onde o social é
negociado, produzido e dotado de sentidos (NASCIMENTO, 2011). Havendo uma
intensificação da presença desse corpo nas práticas artísticas, bem como uma
emergência, que tem início nas Vanguardas, de uma dimensão e preocupação social
na arte, “o corpo do artista torna-se, assim, espaço de discussão e confronto entre
desejos e imposições, fluxos pessoais e coletivos, numa espécie de campo de
batalha [...]” (NASCIMENTO, 2011, p. 35).
Com o advento da body art e dos happenings, o corpo passa, assim, a ser
objeto de arte, e também campo de experimentação de novas manifestações
artísticas. Exemplo disso é performance do coreógrafo Wagner Schwartz, intitulada
La Bête, termo de origem francesa e que pode ser traduzido por A Besta,
recentemente apresentada no 35º Panorama6 da Arte Brasileira, que acontece de 26
de setembro a 17 de dezembro de 2017 em São Paulo.
Dentro da proposta de Antropofagia, La Bête faz uma interpretação da obra
Bichos da artista Lygia Clark. No lugar de dobradiças e placas manipuláveis,
encontrava-se o próprio corpo nu do artista pronto a ser manipulado pelo público. A
proposta da artista Lygia Clark apresenta placas de alumínio interligadas por
dobradiças que podem ser manipuladas pelo espectador, com a proposição da
experiência do espaço tridimensional e da maleabilidade e manipulação de materiais
duros.

6
ATRAVES. Panorama da Arte Brasileira. Disponível em: <
http://atraves.tv/projects/colab10/>. Acesso em: 08 out. 2017.

146
O que gerou incômodo social, até posteriormente ao pronunciamento oficial7
do Museu, foi a repercussão de um vídeo gravado durante a performance e
veiculado na mídia no dia 26 de setembro de 2017. No registro, uma criança
aparecia tocando o corpo nu do artista e, após a divulgação, acompanhou-se na
mídia a ocorrência de inúmeros atos de censura à performance, desde agressão a
frequentadores do MAM, segundo a manchete da página online do G1 Notícias –
“Protesto contra performance com homem nu tem agressão física; MAM e
manifestantes registram caso na polícia” – até mobilizações nas redes sociais
afirmando que no ato performático havia se configurado crime de pedofilia, segundo
manchete publicada pelo Jornal Folha de São Paulo (online), que trazia “Museu em
SP é acusado de pedofilia após performance com nudez”, e ainda, “Em vídeo, João
Doria condena mostra ‘Queermuseu’ e performance no MAM”.

Em cena La Bête

Para falar do evento comunicativo causado pelo registro da performance La


Bête, pela perspectiva crítica da ACD, apresentamos os conceitos de prática
discursiva e ideologia tal como concebe este aporte teórico.
A prática discursiva, em conformidade com Fairclough (2001), contribui tanto
para reproduzir a sociedade (identidades sociais, sistema de crenças e
conhecimentos, relações sociais), como para transformá-la. Tal prática, segundo o
autor, envolve os processos de produção, distribuição e consumo textual. A natureza
desses processos mudam conforme os diferentes tipos de discurso, de fatores
sociais.
Assim, segundo Silva (2012), baseada em Fairclough (2001), a Análise do
Discurso Crítica foca na língua como prática social, tal como o texto – seja ele verbal
ou não-verbal – como um evento comunicativo. Nesse sentido, entendemos os
enunciados publicados no site da Folha de São Paulo e no G1, sobre e acerca da

7
A nota oficial foi publicada no site do Museu de Arte Moderna (MAM) no dia 29 de
setembro de 2017. Disponível em: <http://mam.org.br/2017/09/29/nota-de-esclarecimento/>
Acesso em: 10 out. 2017.

147
performance La Bête como um evento comunicativo, do qual traços ideológicos do
que seja considerado arte (não-arte), ou adequado a determinadas faixas etárias são
constitutivos.
Embutidas nas práticas discursivas, as ideologias, em conformidade com
Fairclough (2011), soam muito eficazes quando se naturalizam e atingem o status de
“senso comum”, contudo, “essa propriedade estável e estabelecida das ideologias
não deve ser muito enfatizada, porque sua referência a ‘transformação’ aponta a luta
ideológica como dimensão da prática discursiva, na luta para remoldar as práticas
discursivas e as ideologias” construídas a partir delas no contexto “da reestruturação
ou da transformação das relações de dominação” (FAIRCLOUGH, 2001, p. 117).
A metáfora da censura é pensada por nós enquanto um exercício de poder.
Como ensina Bourdieu (1998, p. 132), “é a própria estrutura do campo que rege a
expressão ao reger o acesso à expressão e à sua forma, e não a transgressão de
um tipo de código lingüístico”. A censura estrutural se exerce por meio de “sanções
do campo que operam como um mercado onde os preços das diferentes
modalidades da expressão” (BOURDIEU, 1998, p. 132). Essa estrutura se impõe “a
todo produtor de bens simbólicos, inclusive o porta-voz autorizado cuja fala de
autoridade está, mais do que qualquer outra, submetida às normas do decoro oficial,
condenando os ocupantes das posições dominadas às alternativas do silêncio ou do
palavreado escandaloso” (BOURDIEU, 1998, p. 132). O maior grau de perfeição e
invisibilidade da censura é atingido “quando cada agente não tem mais nada a dizer
além daquilo que está objetivamente autorizado a dizer [...]” (BOURDIEU, 1998, p.
132).
Em um texto publicado no site da Folha de São Paulo, é relatado o
posicionamento do MAM, frente ao protesto realizado, fazendo menção à nota
oficial8 emitida pelo Museu. A instituição MAM de seu lugar legítimo, ou seja,
instituído e legitimado como um espaço ritual e ritualizante de (das) práticas
artísticas – consonante com Bourdieu (1998) –, se pronuncia publicamente acerca
de La Bête, frisando sobre a nudez enquanto “trabalho de conteúdo não erótico”. O
ato de dizer publicamente sobre a obra, como também a dos manifestantes de se

8
Conferir nota de rodapé anterior.

148
opor a esta performance, na qual o corpo nu do coreógrafo se significa e é
significado como obra, e que pela trama da intertextualidade se relaciona
(in)diretamente com a série Bichos da artista fundadora do Grupo Neoconcreto Lygia
Clark são práticas ideológicas, pelas quais cada um dos lados/cada grupo buscam
mudança, o transcender da ideologia dominante. Como afirma Fairclough (2001, p.
123), “as ideologias surgem nas sociedades caracterizadas por relações de
dominação com base na classe, no gênero social, no grupo cultural, e assim por
diante, e, na medida em que os seres humanos são capazes de transcender tais
sociedades, são capazes de transcender a ideologia”.
Mediante ao exposto no decorrer desta breve análise, observamos que a
metáfora da censura da/na arte, do/no corpo são constituídas no/pelo poder. A
maneira pela qual as produções simbólicas participam diretamente das condições
sociais de sua produção, também é um instrumento que exerce seu efeito social
mais particular (BOURDIEU, 1998).

Considerações Finais

No e pelo movimento analítico pudemos observar a forma como o poder está


presente na metáfora da censura da/na arte e do/no corpo na performance La Bête.
Metáfora esta atravessada por ideologia(s), que em consonância com os
pressupostos teóricos da ACD, produzem significações/construções acerca do
artístico, sustentando diversos efeitos de sentidos das/nas e sobre as práticas
artísticas, contribuindo para (re)produção e busca por transformação que entrelaçam
discursivamente arte-corpo-social-cultural em uma performance realizada num
espaço instituído e legitimado da arte, o MAM.

Referências

BARROS, D. E. C. In: I Jornada Internacional de Estudos do Discurso, 2008,


Maringá. Anais... Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 2008. p. 200-211.

149
BOURDIEU, P. A economia das trocas lingüísticas: o que falar quer dizer. 2.ed.
São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1998.

FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Brasília: Editora da Universidade de


Brasília, 2001.

NASCIMENTO, A. R. Performance. Corpo. Contexto: trajetos entre arte e desejo.


2011. 147 p. Dissertação (Mestrado em Arte) – Programa de Pós-graduação em
Artes da Universidade Federal de Uberlândia, Universidade Federal de Uberlândia,
Uberlândia, 2011. p. 1-147.

SILVA, D. E. G. Estudos do discurso no contexto brasileiro (por uma rede de


transdisciplinaridade). In.: EUTOMIA: Revista de Literatura e Linguística, Vol. 2, p.
224-243. Recife: UFPE, 2012.

150
LEITURA VISUAL MUSICAL: UMA EXPERÊNCIA INTERDISCIPLINAR NO
ESTÁGIO SUPERVISIONADO

Maria de Oliveira Wilhans (UEM)


mawilhans@gmail.com

Resumo: Este trabalho apresenta uma atividade interdisciplinar entre as linguagens


arte visual e música, desenvolvida durante a prática do Estágio Supervisionado,
cumprindo as exigências desta disciplina, no curso de Artes Visuais- Parfor/UEM.
Buscou-se atender a solicitação do professor regente de Arte, com fundamentação
em autores como Araldi e Chiqueto (2008), Barbosa (2005), Schlichta (2011), Rosa
Barbosa (2010), Kandisnky (1996), para a realização de um trabalho que envolvesse
a construção simultânea de conhecimentos sobre música e artes visuais. O artista
plástico Alexander Calder, foi o fomentador da ideia de construir junto com os alunos
envolvidos, um móbile musical. O resultado deste trabalho foi a realização de uma
atividade já almejada, que tornou-se interessante e enriquecedora para a construção
de conhecimentos e o processo criativo de todos os envolvidos.

Palavras-chave: Interdisciplinaridade. Arte. Música. Conhecimento.

A prática da formação

A Disciplina de Estágio Supervisionado está presente em muitos cursos de


graduação e outros, por permitir ao futuro profissional experienciar, praticar ou
mesmo relacionar os conhecimentos construídos durante a trajetória acadêmica
com sua prática profissional. Como parte do curso de Artes Visuais Parfor/UEM
(Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica /Universidade
Estadual de Maringá.), cumprindo a exigência desta disciplina na educação
fundamental, buscou-se atender a solicitação do professor regente na disciplina de
Arte, para que se realizasse um trabalho com os conteúdos de música, devido a sua
pouca experiência na área e por conhecer os trabalhos que já realizamos como
professora egressa do curso de Música Parfor/Uem.
Partindo dos estudos realizados, dos conhecimentos assimilados na disciplina
de Escultura e dos conteúdos relacionados aos conhecimentos musicais previstos a
serem trabalhados com as turmas, somados a nossa prática docente, propôs-se o
desenvolvimento deste projeto de estágio, buscando realizar um trabalho
interdisciplinar entre Arte visual e música, através da confecção de móbiles

151
musicais, de leitura visual e vivência prático-musical; tomando-se como base os
móbiles com arame, do artista plástico norte-americano Alexander Calder.
Para melhor compreensão dos alunos a cerca do trabalho a ser realizado
foram apresentados estudos sobre o artista e imagens de algumas de suas obras.
Após os estudos para fundamentação, foram planejadas as atividades de
intervenção/regência com os objetivos de: Compreender o que é som; Conhecer os
parâmetros do som; Identificar as figuras musicais e os “valores/tempos” musicais
que representam; Compreender que cores e formas também podem representar
características do som; Confeccionar as figuras musicais para montagem dos
móbiles musicais; Realizar a leitura visual do móbile e praticar a vivência musical ,
com instrumentos.
As cores escolhidas para representar as figuras musicais relativas aos
parâmetros de altura e duração do som (grave, médio e agudo) , abordados, com
maior ênfase, na atividade desenvolvida, foram fundamentadas a partir das
contribuições de Kandinsky (1996), que nos traz relações entre as alturas do som e
a cores quentes e frias, contribuindo ainda mais para nossa busca pela
interdisciplinaridade dos conteúdos na disciplina de arte.
Os estudos relacionados ao conteúdo de música, abordaram os parâmetros
do som: altura, densidade, duração, intensidade e timbre. A construção do móbile
musical esteve ligada ao parâmetro da duração, por ser representada de forma
convencional em partituras musicais pelas figuras e pausas.

http://maiseducacaomusical.blogspot.com.br/p/6-ano.html

152
De acordo com as colocações de Araldi e Chiqueto (2008), as práticas
musicais com elementos diversificados proporcionam aos alunos ampliar suas
capacidades de expressão corporal, a audição, a atenção e a produção de ideias
próprias, levando-os a desenvolver diferentes modos de fazer música e
compreender sua função social nos diferentes contextos.
Após as leituras, estudos e explicações, os alunos, em pequenos grupos,
confeccionara as partes ou figuras musicais com: papel crepom,, palito de sorvete e
arame, para montagem dos móbiles. Com o primeiro móbile pronto e exposto,
deixamos a conclusão dos demais, para outro momento e partimos para a prática
musical, ou seja, a leitura visual e musical da nossa construção artística, utilizando
os instrumentos disponíveis na escola: chocalhos, clavas e tamborzinhos.
Desta forma, o desenvolvimento do trabalho aconteceu de maneira
interdisciplinar, demonstrando aos alunos diferentes abordagens e representações
do mesmo conteúdo, promovendo a interação entre os mesmos como nos esclarece
SILVA (2013).

Fundamentando a prática

A Arte é uma forma de expressão do ser humano, por isso já foi reconhecida
socialmente como uma das disciplinas necessárias a ser desenvolvida no âmbito
escolar como prevê a lei 9394/96, compreendendo os conteúdos de música, dança,
teatro e artes visuais.” (Fortunato, et al, 2013, p. 4).
A lei 11.769/ 08, traz a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas, em
todas os níveis, mas foi incluída juntamente com a arte, devendo ser trabalhada
pelo mesmo professor, cabendo a este buscar meios para desenvolver seu trabalho
de modo a envolver os alunos e levá-los á compreensão dos conteúdos trabalhados
e à descoberta do prazer de fazer e aprender arte.
Segundo Paulo Freire, citado por Rosa Barbosa, 2006, p. 06: “[...] a leitura do
mundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta implica a continuidade

153
da leitura daquele.”
Analice Pillar (1999, p.14), fazemos leituras do mundo em que vivemos e,
dependendo do contexto, temos sentimentos variados. Mas a leitura que fazemos de
uma obra de arte é diferente, pois envolvem uma gama de conhecimentos
exclusivos do saber/fazer artístico.
Barbosa (1991, p.34) afirma que é preciso haver uma “alfabetização para a
leitura visual” e que “o fazer artístico é insubstituível para aprendizagem da Arte”.
Schlichta (2011, p.372), nos demonstra ideias sobra a percepção artística
como uma característica que se aprimora com conhecimentos práticos de
familiaridade com a linguagem artística, que leva a compreender que a Arte é um
trabalho e, ao mesmo tempo, uma invenção.
Então, cabe ao professor de arte, especificamente, possibilitar ao aluno os
conhecimentos teórico-práticos sobre as representações artísticas, fazendo sempre
um exercício sistemático de leitura e interpretações para compreensão das técnicas
artísticas como meios de representações. (Rosa Barbosa, 2010, p.373)
Teresa Otranto, traz em seu trabalho uma interligação entre as linguagens
artísticas: ”... negar uma relação entre a pintura, a poesia e a música é negar as
potencialidades da comunicação plástica, verbal e sonora... (2008, p. 37)
No texto sobre a: “Interdisciplinaridade nas Escolas de Educação Básica: da
retórica à efetiva ação pedagógica”, as autoras, após pesquisas bibliográficas nos
PCN’s, RCN’s e Projetos Político Pedagógicos de algumas escolas, afirmam sobre a
interdisciplinaridade: “O termo é dito mais que praticado.” (Fortunato, et al, 2013, p.
4).
Diante das contribuições, reafirmando que a prática pedagógica
interdisciplinar promove a aprendizagem significativa dos alunos, reiteramos a
responsabilidade dos professores em efetivar esta prática pedagógoca.

Considerações finais:

A experiência vivenciada nas atividades da Disciplina de Estágio


Supervisionado permite ao futuro profissional, além de conhecer seu espaço de

154
atuação, a troca de experiência com docentes atuantes e a realização de estudos
planejados, como foi o “móbile musical”. A leitura visual precedia a musical, no
entanto esta já se manifestava também na compreensão dos alunos envolvidos,
demonstrando a aprendizagem dos alunos nesta atividade interdisciplinar.
Imagens das atividades realizadas

Figura 1 – criação Figura 2- exposição Figura 3- execução

Referências:

ARALDI, Juciane. CHIQUETO, Márcia Rosane. Música na Escola: Sons


Alternativos na Educação Musica Escolar: Proposta Pedagógica para o Ensino
Fundamental e Médio.PDE -Programa de Desenvolvimento Educacional Núcleo
Regional de Educação de Campo Mourão, 2008.

BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da arte: anos oitenta e novos tempos.
6.ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.

KANDINSKY, Vassily. Do Espiritual na Arte: e na pintura em particular. São Paulo,


Martins Fontes : 1996.

ROSA BARBOSA, Maria Helena. Leitura de Imagem e o ensino da arte:


Considerações em educação. Em Museu não formal de Arte Santa Catarina – MASC
- III Seminário Leitura de Imagens para a Educação: múltiplas mídias
Florianópolis, 14 de abril de 2010.

OTRANTO, Teresa. “Trem da Estação da luz”: um diálogo de linguagens e de


Culturas”. XI Congresso Internacional da ABRALIC Tessituras, Interações,
Convergências, 13 a 17 de julho de 2008, USP – São Paulo, Brasil.

SCHLICHTA, Consuelo Alcioni B. D. A Leitura da Imagem no Ensino da Arte e a


Persistência da Releitura – UFP.

155
www.anpap.org.br/anais/2011/pdf/.../consuelo_alcioni_borba_duarte_schlichta.pdf
(acessado em 25/04/2017). http://maiseducacaomusical.blogspot.com.br/p/6-ano.html
(acessado em 25/04/17)

156
LUMIA: A LUZ COMO MATÉRIA
Leonardo Augusto Alves Inacio (UEM / UNICAMP)
Dr. José Eduardo Ribeiro de Paiva (UNICAMP)
leonardoalvesld@gmail.com

Resumo
Este trabalho tem como objetivo refletir sobre o lugar da luz nas artes, não
simplesmente como elemento de composição, mas como matéria e assunto da
criação artística. Para tanto, apresentamos o trabalho de Thomas Wilfred com seu
Clavilux, na primeira metade do século XX. Através desse aparelho tecnológico,
Wilfred estabelece uma estética artística de projeções e alternâncias de luz, a qual
dá o nome de Lumia. Este trabalho tem como método a crítica histórica, onde
procurou-se investigar os processos e métodos do passado, para verificar sua
influência nos fazeres artístico atual. A partir desse trabalho é possível entender
como Wilfred influenciou diversos artistas, principalmente a partir da década de
1960.

Palavras-chave: Lumia. Wilfred. luz. light art.

Introdução

Para a filosofia, a luz é metáfora para conhecimento; já na ciência, é


componente fundamental da matéria e para o sentido da visão; nas artes, pode ser
um elemento de exploração do sensível. A luz é usada e pensada pelos artistas
desde o próprio surgimento das artes. Podemos citar alguns exemplos na História,
desde o teatro grego, que se utilizava do posicionamento Sol como parte do cenário
de suas peças, até o trabalho de iluminação teatral proposto por Josef Svoboda ou
Robert Wilson; também nas artes visuais, diversos pintores, das mais diferentes
épocas, como Caravaggio, Edward Hopper, os pintores impressionistas, tiveram a
luz como elemento fundamental da construção de suas obras.
No entanto, por muitos séculos, a maioria das obras utilizou a luz de forma
representativa, como elemento dramático da obra, limitando-a a ser somente um
iluminante da obra. "A luz é vista inicialmente como um elemento de representação,
tendo fundamentalmente um papel de apoio à percepção do artista na concepção
das suas formas de expressão". (PARANHOS, 2012, p. 05).

157
Na obra O Êxtase de Santa Teresa, de Gian Lorenzo Bernini (1598-1680), é
possível perceber a simbiose entre arquitetura, escultura e luz, proporcionando
plasticidade e simbolismo. "Os jogos de luz fazem exacerbar a ilusão de que a
escultura esteja em movimento." (KUESTER, 2013, p. 2951). Bernini pensou em
como a luz natural incidiria sobre a escultura, em determinado horário, atravessando
os elementos arquitetônicos da igreja onde se encontra. A luz que incide sobre a
obra proporciona "um tom mais divino aos raios que descem sobre as personagens
representadas, como provocando os efeitos de iluminação direcionada." (COSTA
FILHO; DA SILVA; SILVA, 2010, p. 05).
Durante centenas de anos os pintores procuraram ser mais sensíveis aos
efeitos da luz – tanto à sua incidência quanto à sua reflexão. "No entanto, nos
séculos XVIII e XIX a música, não a pintura, foi a base teórica para a maioria das
composições empregando luz emitida." (BURNHAM, 1982, p. 286, tradução nossa).
O uso da luz artificial como material para a criação artística foi executado por Louis-
Bertrand Castel (1688-1757) no século XVIII. Ele testou o Clavecin Oculaire – cravo
ocular – colocando velas atrás de fitas coloridas transparentes, procurando criar
combinações de cores por meio de engrenagens que correspondessem ao fluxo da
música e controlados por uma pessoa tocando as teclas desse "cravo preparado".
(BACH, 1989, p. 324; BURNHAM, 1982, p. 286).
Apesar de todas as experimentações, é somente na arte moderna que a luz
torna-se mais que um elemento, adquirindo status de matéria – muito em função do
desenvolvimento tecnológico das fontes de iluminação artificial. (PARANHOS, 2012,
p. 07).

Lumia

Com a incorporação da luz elétrica em diversos setores da sociedade, no final


do século XIX e início do século XX, as artes também vão em busca de entender e
se apropriar desse novo material. Surgem propostas de inovações na iluminação
teatral no início do século XX, principalmente por Appia e Craig. Somando-se à
invenção do cinema, isso inspira novos pensamentos sobre a luz, sobre a

158
plasticidade do movimento e a projeção de luz. (BACH, 1989, p. 324). A luz elétrica é
logo adotada para a iluminação fotográfica e para a projeção de cinema, mas nas
artes visuais foi mais explorada a partir da década de 1950. (MALINA, 1987, p. 109).

Figura 1: Lumia, 1960, Thomas Wilfred.

Fonte: Manuscripts & Archives, Yale University.

Uma figura de grande importância para a história da light art é o inventor


dinamarquês Thomas Wilfred (1889-1968). Em 1919, ele constrói o primeiro modelo
de seu Clavilux, um órgão "composto por 6 projetores regulados por um teclado
ligado a um banco de slides" (CAMPOS, 2009, p. 11-12). À produção de forma, cor e
movimento de luz gerada pelos projetores Clavilux, Wilfred dá o nome de Lumia
(BURNHAM, 1982, p. 287).
O Clavilux é uma série de projetores que "usa um espelho reflexivo e peças
dobradas de metal para moldar a luz lançada por uma série de lâmpadas e lentes."
(PETRIC, 2013, p. 20, tradução nossa). Esses mecanismos são escondidos em uma
caixa de madeira, e o tocador do Clavilux consegue controlar os matizes e formas
com um teclado, produzindo as mudanças de forma e cores. Apesar da apropriação
das teclas do piano, não se trata de um instrumento musical, mas de uma estrutura
de controle randômico para as projeções, Wilfred acreditava que o Lumia deveria se

159
desenvolver como uma forma de arte independente da música. (BURNHAM, 1982,
p. 288).
Lumia, por sua vez, são pedaços, como músicas criadas pelos artistas.
Alguns são essencialmente de composição na sua estrutura, outros
incluem elementos improvisados. Lumia é o resultado, em parte, do
fascínio do artista visual com o impacto da música. Lumia são pedaços
dinâmicos, baseados essencialmente em ilimitadas combinações de
elementos simples, são capazes de manifestar uma ampla gama de
emoções humanas e experiências, e podem ser criados em tempo-real.
Com Lumia, os artistas começaram a construir pinturas a moverem-se
como a música, e inclusive ligá-las com a música. (CAMPOS, 2009, p. 12-
13).

Ao longo dos anos, Wilfred construiu muitas versões de Lumia, aperfeiçoando


suas técnicas de criação para ampliar as possibilidades de cores e formas.
(BURNHAM, 1982, p. 288). Para ele, forma, cor e movimento em um espaço escuro
eram os componentes básicos dessa arte – sendo forma e movimento os elementos
mais importantes. (STEIN, 1971, p. 03).

Considerações finais

Wilfred é o primeiro artista a usar a luz como um meio de expressão e a


construir instrumentos luminosos para realizar suas ideias. (STEIN, 1971, p. 03;
BURNHAM, 1982, p. 288). Apesar de ter recebido pouco prestígio em sua época, faz
parte de um movimento pioneiro de artistas que desenvolveram métodos de
produção de imagens em movimento, além de construir obras incorporando luz
elétrica para contemplação. (MALINA, 1987, p. 109). A partir da década de 1960,
quando começam a ser expostos trabalhos com luz elétrica em museus e galerias,
observou-se a importância de Wilfred e deu-se ênfase no resgate de seu trabalho.

Referências

BACH, Penny Balkin. To Light up Philadelphia: Lighting, Public Art, and Public
Space. Art Journal, Vol. 48, No. 4, Critical Issues in Public Art (Winter, 1989), p.
324-330. Disponível em: <http://www.jstor.org/stable/777017> Acesso em: 10 mar.
2016.

BURNHAM, Jack. Beyond Modern Sculpture: The Effects of Science and


Technology on the Sculpture of this Century. New York: George Braziller, 1982.

160
CAMPOS, Patrícia Isabel Machado. Vídeo Jockeying. Estudo sobre a cultura visual/
Patrícia Isabel Machado Campos. Orientador: Dr. Heitor Alvelos. Dissertação
(Mestrado em Multimédia) – Universidade do Porto. Faculdade de Engenharia.
Programa de Pós-Graduação em Multimédia – Porto, 2009. 153 f.

COSTA FILHO, José Almir Valente; DA SILVA, Francisco Gleydson Lima; SILVA,
Lucas Viana. O êxtase da Santa Teresa: entre o sagrado e o profano. Pindorama,
Eunápolis. v. 01, n. 01, p. 01-19, 2010.

KUESTER, Sandra. A Exuberância do Barroco: O Latente Êxtase de Santa Teresa.


In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS DA IMAGEM, 4, 2013, Londrina. Anais
do IV Encontro Nacional de Estudos da Imagem. Londrina: Universidade Estadual
de Londrina, 2013. p. 2947-2955.

MALINA, Frank J. Electric Light as a Medium in the Visual Fine Arts: A Memoir.
Leonardo, Vol. 8, No. 2 (Spring, 1975), pp. 109-119. Disponível em:
<http://www.jstor.org/stable/1572952> Acesso em: 10 mar. 2016.

PARANHOS, Márcio Daniel Campos. Logos Project. Instalação de luz interativa/


Márcio Daniel Campos Paranhos. Orientadores: Dr. Pedro Sérgio Oliveira Branco;
Dr. Nelson Troca Zagalo. Dissertação (Mestrado em Tecnologia e Arte Digital) –
Universidade do Minho. Escola de Engenharia. Programa de Pós-Graduação em
Tecnologia e Arte Digital – Braga, 2012. 94 f.

PETRIC, Maja. Transforming the Poetic Experience of Space Through Light/


Maja Petric. Orientador: Dr. Juan Pampin. Thesis (Ph.D. in Digital Arts and
Experimental Media) – University of Washington. Art History Department. Digital Arts
and Experimental Media Program – Washington, 2013. 79 f.

STEIN, Donna M. Press Preview: Thomas Wilfred: Lumia. The Museum of Modern
Art – MoMA. 1971. Disponível em:
<https://www.moma.org/d/c/press_releases/W1siZiIsIjMyNjc2MCJdXQ.pdf?sha=e388
15bab435c4e0> Acesso em: 04 fev. 2017.

161
MÁSCARAS AFRICANAS: HISTÓRIA DA ARTE TRIBAL E SUAS
INFLUENCIAS NO MODERNISMO.
Ana Carolina Ribeiro Teixeira (Universidade Estadual de Maringá/UEM)
Natália Tiemi Borghetti Ito (Universidade Estadual de Maringá/UEM)
Eloíza Amalia Silva (Universidade Estadual de Maringá/UEM)
carolina_ana10@outlook.com

Resumo
Este resumo expandido apresenta as experiências realizadas na disciplina de
Estagio Supervisionado em Arte Visuais II, do curso de graduação de Artes Visuais,
tendo com ênfase as intervenções realizadas durante o 6º semestre. Com o objetivo
de relatar a grande importância da cultura Africana, aos alunos do Colégio Santa
Maria Goretti do 9º ano em duas aulas semanais. Em primeiro instante, foi
apresentado para os alunos o tema, bem como, a maneira que o mesmo foi
introduzido nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Foi abordada a história da
utilização de máscaras tribais e suas influencias para a arte moderna. Ao fim da
parte teórica utilizada, foi proposto um trabalho prático de produção de máscaras.

Palavras-chave:
Estágio Supervisionado. Cultura Africana. Parâmetros Curriculares.

Introdução

O curso de Artes Visuais da Universidade Estadual de Maringá habilita os


acadêmicos à pesquisa, licenciatura e exercícios na área. A partir da disciplina de
Estágio Supervisionado em Artes Visuais II, temos acesso à experiência de ministrar
aulas no Ensino Fundamental I e II. Além de termos a maioria das disciplinas
voltadas para a educação formal com teorias e práticas para uma boa atuação nos
espaços escolares. As aulas destinadas ao estágio docente foram ministradas na
sala do nono ano do Colégio Estadual Santa Maria Goretti, que comportam alunos
entre quatorze e quinze anos. Durante as observações indiretas e diretas, tivemos o
grande prazer acompanhar uma professora com uma formação de qualidade e
também com um tempo de experiência, o que contribuiu significativamente para
nossa atuação, nos ajudando e nos deixando a vontade para nossa intervenção. A
temática utilizada para a intervenção foi pensada principalmente a partir das
discussões recentes sobre o racismo, e pela Lei 11.645/08, que torna obrigatório o

162
ensino da história e cultura afro-brasileira e africana em todas as escolas, públicas e
particulares, do ensino fundamental ao ensino médio. Além do interesse particular da
professora, devido à chegada do dia da consciência negra que relembra a todos a
importância de viver em um mundo repleto de diversidade.
Nós estagiarias tivemos como principal intuito enfatizar a grande importância
da participação dos povos africanos para a formação da nossa cultura brasileira e
também europeia, e também ressaltar em sala a cultura afro como constituinte e
formadora da sociedade brasileira, na qual os negros são considerados como
sujeitos históricos, valorizando-se, portanto, o pensamento e as idéias de
importantes intelectuais negros brasileiros, a constituição multicultural de nossa
cultura. Em seguida apresentamos a utilização de máscaras com especificidades
nas etnias da África central e ocidental, e por fim, concluímos a importância e
inspiração que a produção artística africana teve para os grandes artistas até os dias
atuais.

Desenvolvimento

Nossa primeira atitude ao dar inicio ao estágio supervisionado II, foi buscar
com a professora responsável pela turma, informações sobre os conteúdos que
seriam abordados ao longo do trimestre. A professora nos disponibilizou o plano de
trabalho docente que havia feito para a turma e se colocou aberta a sugestões e
propostas de atividades. No decorrer da convivência em sala de aula durante o
período de observação, notamos que os alunos eram muito participativos e criativos,
procuramos então, desenvolver um plano de aula que tivesse um conteúdo teórico
específico, mas que contemplasse também uma pratica bastante dinâmica. A
professora responsável pela sala comentou conosco, sobre a semana de
interculturalidade e nos pediu para que, em nossa regência, desenvolvêssemos com
os alunos, algum trabalho para ser exposto na semana.
Diante da condição que nos foi dada, buscamos construir uma proposta de
intervenção pedagógica que atendesse ao tema orientado e que simultaneamente,
proporcionasse o desenvolvimento cultural e visual dos alunos.

163
Durante duas semanas, estudamos temas que poderiam ser abordados na
intervenção. Percebemos que a história da arte africana é pouco abordada nas
escolas e sempre de uma forma rasa e geral. Pensando nisso, optamos por
trabalhar com as mascaras africanas tribais, e suas importâncias culturais, sociais e
politicas na região Central e Ocidental. Além disso, buscamos apresentar, as
influencias que estas máscaras trouxeram para o movimento modernista da Arte.
A ação foi desenvolvida em duas etapas. Nossa metodologia para o primeiro
dia se baseava na apresentação teórica sobre a presença dos estudos africanos nos
Parâmetros Curriculares Nacionais, a história e características das mascaras tribais,
e também, as influencias das mesmas na arte moderna; para isso, utilizamos os
artistas Pablo Picasso, Henri Matisse e Amadeo Modigliani. Durante a apresentação
teórica, os alunos foram bastante participativos e enriqueceram a aula com
discussões importantes. Com o tempo restante, organizamos os alunos em duplas
para que um auxiliasse o outro na confecção das máscaras, distribuímos uma
atadura gessada por dupla, bem como, um pote com água, para que fossem
diluídas. Explicamos como deveria ser feito o manuseio do material, assim como, os
respectivos cuidados que deveriam ser tomados. Formamos uma fila para passar
vaselina no rosto dos alunos, de forma que a atadura pudesse ser retirada de forma
mais fácil. Após as instruções e preparações, demos inicio à produção das
máscaras, usando o rosto dos próprios alunos como molde.
No segundo dia, demos continuidade à produção das máscaras, ao longo das
duas aulas, auxiliamos os alunos nas confecções. As ataduras eram cortadas em
quadrados pequenos, molhávamos parte por parte, para depois fixar no rosto do
colega. A fim de obter um resultado melhor, fizemos varias camadas, criando desta
forma, uma superfície mais rígida e resistente. Depois de finalizada as produções, os
alunos deram acabamento nas máscaras com massa corrida, de modo que ficassem
mais niveladas. Alguns alunos criaram relevos e vincos em suas produções, para
que se assemelhassem com as obras tribais. No nosso planejamento, a intenção era
que os alunos pintassem as mascaras na segunda aula do dia, no entanto, eles
precisaram de um tempo maior para o acabamento. Como estávamos no ultimo dia

164
do Estagio Supervisionado, a atividade foi finalizada pela professora responsável
pela turma.
Observamos no decorrer da intervenção, que a proposta foi muito bem aceita,
os alunos se engajaram de forma efetiva nas produções e acreditamos que isso
aconteceu graças à abordagem teórica que foi feita anteriormente.

Considerações finais

Com esse propósito de estudo elaborado por nós estagiarias, que busca
apresentar a diversidade é que a educação constitui-se um dos principais
mecanismos de transformação na vida aluno, e por meio da escola tem a obrigação
e comprometimento com a promoção do ser humano e de sua integralidade,
estimulando a formação de valores, hábitos e comportamentos que respeitem as
diferenças dos vários grupos sociais existentes em nossa sociedade. Por meio de
nossas experiências com os alunos do nono ano do ensino fundamental ll durante o
estágio formal, destacamos o grande interesse de participação dos alunos, durante a
regência ocorreram algumas perguntas que tiveram respostas surpreendentes como:
Porque estudar a cultura africana nas escolas? Esperávamos uma resposta breve,
no entanto, a discussão em torno da questão levantada foi extremamente rica.
Enxergamos a experiência de regência como parte fundamental da formação
docente, sendo marcada pelo desejo de aprendizagem e trabalho em equipe, com
as produções de máscaras com ataduras gessadas, e desejamos que por meio
deste trabalho consigamos realizar uma exposição com as esculturas dos alunos.

Referências

BARROS. José D’Assunção. As influencias na arte moderna. Disponível em:


file:///C:/Users/Fernando/Downloads/21236-72113-1-SM.pdf. Acesso em: Out. 2017

CARVALHO. Leandro. Brasil escola. Lei 10.639/03 e o ensino da história e


cultura afro-brasileira e africana. Disponível em:
http://educador.brasilescola.uol.com.br/estrategias-ensino/lei-10639-03-ensino-
historia-cultura-afro-brasileira-africana.htm. Acesso em: Out. 2017

165
UEM. Regulamento do componente estágio curricular supervisionado do curso de
Artes Visuais – licenciatura modalidade presencial. In: UEM. Resolução 061/2010-
CI/CCH – Aprova o projeto pedagógico do Curso de Graduação em Artes Visuais.
Maringá, 2010. Disponível em: http://www.cch.uem.br/resolucoes_10/061_10.pdf.

Parâmetros Curriculares Nacional. Introdução aos parâmetros curriculares


nacional. Disponível em:
file:///C:/Users/Fernando/Downloads/resumos%20expandidos%20com%20expereinci
as%20do%20est%C3%A1gio%202016-
%20semana%20de%20artes%20visuais.pdf>. Acesso em: Out. 2017

166
METODOLOGIA DE PESQUISA NAS ARTES VISUAIS
Lucas Men Benatti (UEM)
Lucas-benatti@outlook.com

Resumo
O presente desenvolvimento teórico exprime em sua temática, os termos conceituais
da metodologia de pesquisa e sua presença e funcionamento nas artes visuais,
buscando auxiliar artistas e estudantes de artes, dentro da pesquisa em seu campo
de atuação. A primeira seção procura explanar a respeito de conceitos da
metodologia de pesquisa científica em parâmetro gerais e em sua segunda seção,
discorrer a respeito das particularidades da pesquisa no campo das artes visuais,
dando maior destaque as especificidades da pesquisa em arte. Para tanto apresenta
como base norteadora os estudos de Hélio R. Silva Brantes, Maria C. de Souza
Minayo, Sandra Rey e Silvio Zamboni.

Palavras-chave: Metodologia. Pesquisa. Artes visuais.

Introdução
Diante da singularidade da arte contemporânea de extrapolar o belo, o
comum e os paradigmas sociais, as obras pós-modernas se instauram em um
ambiente de profunda complexidade, dado seu nível técnico e teórico. É impensável
a arte contemporânea sem reflexão, sem conceitualização da obra. Concebemos o
trabalho teórico do artista como a luz ao que não é claro na obra de arte, aquilo que
não é ou fica visível ou a ideia que nem sempre é perceptível aos olhos. Sabendo
das dificuldades perante a formulação teórica de ideias nas obras de arte, buscamos
a partir dos termos conceituais da metodologia de pesquisa inserida nas artes
visuais, principiar o artista e/ou estudante de artes dentro da pesquisa no seu campo
de atuação. Tendo como base estruturante os estudos de Hélio R. Silva Brantes,
Maria C. de Souza Minayo, Sandra Rey e Silvio Zamboni dentro da metodologia de
pesquisa científica e da metodologia de pesquisa em artes visuais, em nossa
primeira seção, delimitamos alguns conceitos pertinentes à metodologia de pesquisa
científica e que acreditamos ser essenciais ao conhecimento do futuro artista-
pesquisador. Em nossa segunda seção, intencionamos, sem o intuito de exaurir a

167
temática, estabelecer algumas características a respeito da metodologia de pesquisa
notadamente dentro das artes visuais, intuindo o auxílio ao artista-pesquisador.

Metodologia e pesquisa científica

Dentro de um aparato geral, a ciência pode ser entendida como resultante da


busca do homem para compreender o mundo e a si mesmo através da
sistematização, da racionalidade, da experimentação etc. sempre visando alcançar
respostas as suas perguntas. Podemos inferir que a pesquisa é um meio utilizado
pela ciência na busca de alcançar tal objetivo, e, portanto, uma “[...] busca
sistemática de soluções, com o fim de descobrir ou estabelecer fatos ou princípios
relativos a qualquer área do conhecimento humano” (ZAMBONI, 2006, p. 51).
A pesquisa científica sempre visa uma finalidade através de um caminho
racional determinado. Zamboni (2006) aponta alguns passos essenciais a serem
seguidos dentro da metodologia de pesquisa científica. Para o autor, seria
fundamental, após o amadurecimento de ideias, explicitar na pesquisa, a
metodologia utilizada - ou seja, o percurso que o pensamento faz para a produção
de conhecimento. Outro aspecto a ser destacado é o método (conhecido como o
fazer da teoria, modo de fazer seguindo princípios determinados), de acordo com a
proposta da pesquisa e que melhor se adeque ao paradigma9 em que está atuando.
É imprescindível que o paradigma esteja diretamente ligado à teoria (um modo de
ver as realidades fundamentada em princípios, um “como ver”) e, se necessário,
também devem estar presentes na pesquisa, as técnicas, - isto é, umconjunto de
processos que colocam em prática o método – como, por exemplo, os testes,
questionários, formulários etc.
Dentro do contexto da pesquisa cientifica, destacamos aqui, alguns aspectos
das pesquisas abrangendo as ciências sociais – o que inclui as pesquisas nas artes
visuais. Minayo (2000) afirma que o objeto das Ciências Sociais é essencialmente
qualitativo, ou seja, ele lida com as realidades sociais, com sujeitos, culturas etc. e
os significados que se expandem nessas e a partir destas relações. A pesquisa

9
Normas, regras orientadoras, modelo seguido em determinada situação.

168
qualitativa se refere a cultura, os costumes, crenças e “difere, em princípio, do
quantitativo à medida que não emprega um instrumental estatístico como base do
processo de análise de um problema” (BRANTES, 2013, p. 603). Dentro da
pluralidade de perspectivas de estudos científicos, Zamboni (2006), aponta que, de
um modo geral, é comum adotar-se, nas pesquisas científicas, a seguinte estrutura:
definição do objeto; colocação de um problema; introdução do problema em um
campo teórico; levantamento de hipóteses; observação; processo de trabalho;
interpretação e resultados e/ou conclusões. Isso, porém, não deve ser considerado
como uma estrutura fixa e única. Temos, como exemplo, a pesquisa em artes,
perspectiva que traça caminhos particulares do proposto e sobre a qual discorremos
a seguir.

Pesquisa e metodologia no campo das artes visuais

A princípio, podemos distinguir dois tipos de pesquisa no campo das artes


visuais, a pesquisa sobre arte e a pesquisa em arte. Quanto à primeira, entendemos
como a pesquisa elaborada a partir da obra de arte pronta, já acabada, pautada, por
exemplo, em análises históricas e críticas do produto final, seguindo as mesmas
metodologias das ciências humanas. Já a pesquisa em arte, é aquela que se faz
durante o fazer da obra, ou seja, aquela que se dá durante o processo de
instauração da obra feita pelo artista-pesquisador, perspectiva de pesquisa sobre a
qual nos aprofundaremos.
O processo metodológico da pesquisa em arte, apresenta algumas
particularidades dentro da pesquisa científica. Zamboni (2006) salienta, por exemplo,
que o problema na pesquisa em arte apresenta um nível de abstração e um grau de
complexidade muito maior que os colocados pela pesquisa em ciência. Os
problemas em arte fogem do senso comum e “suas soluções não preenchem
necessidades imediatas de ordem material” (ZAMBONI, 2006, p. 60). Os problemas
em arte muitas vezes encontram dificuldades em serem verbalizados e exigem um
grau intuitivo maior em seu tratamento.

169
Seguindo o pensamento de Zamboni (2006), no que concerne o referencial
teórico, a maior distinção entre a demais pesquisas em ciência e a pesquisa em arte,
está no fato de que, em arte não é tão relevante a formulação escrita do objeto de
pesquisa, ao contrário do que ocorre em outras ciências, onde o objeto de pesquisa
é expresso verbalmente dentro das implicações teóricas. A hipótese para o artista-
pesquisador “não assume forma tão rigorosa, sendo mais um desejo e uma
expectativa do que poderá ocorrer em termos de resultado final” (ZAMBONI, 2006, p
63).
Segundo Rey (2002), dentro da metodologia de pesquisa em artes visuais,
não é aplicável um método a priori, uma vez que o artista pesquisador constrói seu
objeto de estudo ao mesmo tempo que desenvolve sua pesquisa. O modo de ver do
artista-pesquisador na pesquisa em arte, de acordo com Zamboni (2006), é muito
mais amplo, uma vez que compreende o objeto em suas relações com os símbolos
que lhe conferem significados. O paradigma do artista-pesquisador também se
relaciona com sua maneira de ver o objeto, assim como sua vivência influência o
modo como esse o colocará em discussão.
O processo de trabalho em artes não se apresenta de forma linear como no
processo de pesquisa em ciência. A intuição e a racionalidade estão em jogo e se
relacionam constantemente durante todo o processo. O caminho é permeado pelo
racional e o intuitivo, pela razão e pela sensibilidade, em uma constância de ajustes
entre os dois polos. A apresentação dos resultados geralmente não se dá de forma
verbalizada, mas pela própria finalização da obra. A conclusão é subjetiva e varia
com o espectador, sendo as conclusões do autor apenas mais uma entre tantas
verdades.
A pesquisa em artes visuais, na perspectiva de Rey (2002), pressupõe a
competência do artista-pesquisador, em um primeiro nível, para transformar seus
pensamentos, ainda que nebulosos, em ideias, em rascunhos colocados no papel,
para, em uma segunda dimensão, o artista-pesquisador dar corpo às suas ideias
através de procedimentos práticos e técnicos e, em seu último estágio, conseguir
articular conceitos à sua obra em seu processo de criação.

170
Rey (2002) ainda aponta os caminhos que podem elucidar o processo da
pesquisa em artes. Segundo a autora, é importante, durante o processo, verbalizar
aquilo que se faz para as pessoas, mesmo que esta seja uma tarefa difícil a muitos
artistas, ela é essencial para a construção de um pensamento mais claro e coeso.
Existem, ainda, estratégias que auxiliam o desenvolvimento da pesquisa como, por
exemplo, manter um diário de artista que contenha todos os pensamentos, ideias e
percursos do artista-pesquisador. Também é fundamental estar atento às
ambiguidades que podem se apresentar, por exemplo, na interpretação entre os
escritos de um artista e escritos de terceiros sobre sua obra, para não cair no risco
de análises equivocadas como o endeusamento de certas coisas “banais” e vice-
versa. Rey (2006) também recomenda coletar os dados teóricos de fontes originais
para a pesquisa, evitando ocasionais erros de interpretação. Acentua a
imprescindibilidade de conceitualizar o trabalho munido de ferramentas teóricas que
são, muitas vezes interdisciplinares, assim como, de fazer análises comparativas, ou
seja, aproximar o que parece diferente e diferenciar o que se assemelha, exercitar a
redação, buscar sempre a clareza na apresentação das ideias, expressar-se com
propriedade e por fim, apresentar os resultados de forma criativa.

Considerações Finais

Dada a importância da metodologia de pesquisa nas artes visuais para a


produção artística, em especial, a metodologia que se insere na dimensão da
pesquisa em arte, visto que ainda é um caminho enevoado dentro de muitos cursos
de licenciatura em artes visuais “onde muitas vezes pelo fato dos professores não
terem formação na área de artes visuais, não vislumbram especificidades da
pesquisa no universo das artes visuais [...]” (BRANTES, 2013, p. 603), o artista, de
forma recorrente, não possui o conhecimento dos caminhos ou vias para a produção
teórica de sua obra e se vê sem alternativas perante o nosso atual contexto
histórico-cultural, onde críticos, artistas-pesquisadores, entendedores de artes de
modo geral, compreendem que, apenas técnicas bem desenvolvidas em uma obra,
não são suficientes para o enquadramento dentro de determinadas galarias,

171
exposições, centros culturais etc. não estabelecendo “prestígio”, a esse tipo de
trabalho artístico.

Referências

BRANTES, Hélio Renato Silva. Por uma metodologia de pesquisa em poéticas


visuais. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE PESQUISA EM ARTE E CULTURA VISUAL,
6., 2013, Goiânia. Anais... Goiânia: UFG-FAV, 2013. p. 602-611. Disponível em:
http://www.fav.ufg.br/seminariodeculturavisual/Arquivos/2013/077-eixo2.pdf. Acesso
em: 14 jul. 2014.

MINAYO, Maria Cecília de Souza. Ciência, técnica e arte: o desafio da pesquisa


social. In: ______ (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 16. ed.
Petrópolis: Vozes, 2000. p. 9-28.

REY, Sandra. Por uma abordagem metodológica da pesquisa em artes. In: BRITES,
Blanca; TESSLER, Elida (Org.). O meio como ponto zero: metodologia da pesquisa
em artes plásticas. Porto Alegre: UFRGS, 2002. p. 123-140.

ZAMBONI, Silvio. Metodologia da pesquisa em artes visuais. In: ______. A


pesquisa em arte: um paralelo entre arte e ciência. 3. ed. Campinas: Autores
Associados, 2006. p. 51-71.

172
O “ALGO” QUE ESCAPA PELA FISSURA: UM DIÁLOGO ENTRE NIETZSCHE E
ROSA PARA LEITURA DO CONTO “O ESPELHO”

Rafael Andrade Moreira (PG-UEM/Gpleiadi)


Roselene de Fátima Coito(UEM/Gpleiadi)
r.andrademoreira@gmail.com.

Resumo
O poeta Manoel de Barros chama nossa atenção para um fator instigante na sua
obra intitulada Livro sobre nada. Nesse livro há um poema que um dos versos é o
seguinte: “A ciência pode classificar e nomear os órgãos de um sabiá, mas não pode
medir o seu encanto” (BARROS, 1996, p. 53). Por mais rigorosa que seja toda a
classificação dessa espécie por parte da ciência (educação?), com sua linguagem
extremamente técnica, ela jamais conseguirá abarcar todas as “possibilidade” do
objeto em questão. Haverá algo que sempre insistirá em sair por fissuras inevitáveis
dentro do “lógico-estabilizado”. O presente artigo discute a problemática desafiadora
que é a posição do indivíduo e sua perspectiva diante dos fatos/objetos no mundo. O
apoio para tal empresa, principalmente, se dará num diálogo entre Nietzsche (2005),
(2012) e Guimarães Rosa (2001), filosofia e literatura (arte). Para compor o corpus
de análise para este trabalho, selecionamos o conto O espelho, de Guimarães Rosa,
presente no livro Primeiras Estórias, publicado em 1962. Neste conto, observamos a
luta do narrador para provar a falta de “sentido” do mundo. Trata-se de um livro em
que o autor mineiro trabalha com pequenas “estórias”, permeadas por diversos tons:
jocoso, erudito, lírico, sarcástico, místico e, principalmente, popular.

Palavras-chave: Linguagem. Perspectiva. Espelho. Estórias.

Introdução

No nosso entender a literatura (e a arte de forma geral) sempre foi subversiva.


Seu papel, entre outros, é mostrar aos homens seus anseios e limitações. E uma
dessas limitações é a perspectiva do indivíduo diante do objeto no mundo. Jamais
seu “olhar” conseguirá abarcar todas as “fatias” do objeto. Sempre escapará algo de
seus falsos domínios.
O poeta Manoel de Barros chama nossa atenção para tal fato na sua obra
intitulada Livro sobre nada. Nesse livro há um poema que um dos versos é o
seguinte: “A ciência pode classificar e nomear os órgãos de um sabiá, mas não pode

173
medir o seu encanto”10 (BARROS, 1996, p. 53). Por mais rigorosa que seja toda a
classificação dessa espécie por parte da ciência, com sua linguagem extremamente
técnica, ela jamais conseguirá abarcar todas as “possibilidade” do objeto em
questão. Sempre haverá algo que lhe escapará, como no caso todo o “encanto” do
pássaro. Ideia que o filósofo alemão Friedrich Nietzsche sempre suspeitou e
resumiu, de certa forma, no aforismo (§ 108) do seu livro Além de bem e mal: “Não
existem fenômenos morais, apenas uma interpretação moral dos fenômenos”
(JGB/BM § 108)11.
Dessa forma, podemos compreender que essa ciência afirmada no poema,
apoiada numa linguagem técnica, só terá acesso a uma fatia da realidade do objeto-
pássaro. Ou seja, por mais rigorosa que ela seja, seus resultados serão frutos de
uma interpretação permitida por uma determinada perspectiva. “A linguagem não
pode revelar o ser das coisas, não somente porque é um acúmulo de metáforas
mortas, mas porque não há ser nem coisas, senão na linguagem” (MOSÉ, 2014, p.
53). Nada melhor do que a arte para nos alertar disso!

Desenvolvimento

O intuito da presente comunicação é desenvolver uma reflexão sobre a


problemática desafiadora que é a posição do indivíduo diante dos fatos/objetos
do/no mundo. Buscaremos apoio para tal empresa num diálogo entre Nietzsche e
Guimarães Rosa, filosofia e literatura.
No aforismo (§ 22) de Além do bem e do mal, do capítulo intitulado “dos
preconceitos dos filósofos”, Nietzsche faz uma reflexão sobre fatos e interpretações.

Perdoem este velho filólogo, que não resiste à maldade de pôr o dedo
sobre artes de interpretação ruins; mas essas “leis da natureza”, de que

10
“A ciência pode classificar e nomear os órgãos de um sabiá / mas não pode medir seus encantos /
A ciência não pode calcular quantos cavalos de força existem nos encantos de um sabiá / Quem
acumula muita informação perde o condão de adivinhar: divinare / Os sabiás divinam” (BARROS,
1996, p. 53)
11Em relação às obras de Nietzsche adotamos a convenção de citação adotada pelos Cadernos
Nietzsche. Cf. “Nota de esclarecimento” no livro Nietzsche: filosofia e educação (2008) de Vânia Dutra
de Azeredo.

174
vocês, físicos, falam tão orgulhosamente, como se – existem apenas
graças à sua interpretação e péssima “filologia” – não são uma realidade
de fato, um “texto”, mas apenas uma arrumação e distorção de sentido
ingenuamente humanitária, com a qual vocês fazem boa concessão aos
instintos democráticos da alma moderna! (JGB/BM § 22)

Como uma maquinaria de guerra, o filósofo alemão aponta toda sua


perspicácia para o que sempre se chamou de verdade. As “leis da natureza” que a
ciência, na citação representada pela física, sempre se propôs a procurar e explicar
de algum modo, não passaria de interpretações e perspectivas. Ao invés de ser algo
estabilizado, um “texto”, para Nietzsche essas leis seriam como distorções de
sentidos erigidos por perspectivas que se quer fazer como verdades absolutas. “Ni
Dieu ni maître [Nem Deus, nem senhor] – assim querem vocês também: por isso
‘viva a lei natural!’” (JGB/BM § 22). Ainda no mesmo aforismo, Nietzsche vai explicar
que isso é apenas interpretação e que essa “tirania” estaria ligada a uma “vontade
de poder” das ciências e que cada poder tiraria suas últimas consequências a cada
instante.
É daí que podemos entender, por exemplo, o que Mosé (2014) afirma ao dizer
que o afastamento do corpo, o esquecimento das sensações e do devir, foi permitida
pela crença cega na correspondência entre as palavras e as coisas. “Utilizar os
códigos da linguagem é, de alguma forma, negar o mundo, como tempo, como devir”
(MOSÉ, 2014, p. 74). Porém, como o próprio filósofo chama a atenção no aforismo
(§112) de A Gaia Ciência, essa verdade absoluta da ciência é uma mera ilusão, pois
os indivíduos percebem somente uma “fatia” da realidade. Por mais que tentamos
abarcar, aparar todas as arestas dos objetos a nossa frente, sempre há algo que nos
escapa.

“Explicação”, dizemos; mas é “descrição” o que nos distingue de estágios


anteriores do conhecimento e da ciência. Nós descrevemos melhor – e
explicamos tão pouco quanto aqueles que nos precederam. Descobrimos
múltiplas sucessões, ali onde o homem e pesquisador ingênuo de culturas
anteriores via apenas duas coisas, “causa” e “efeito”, como se diz;
aperfeiçoamos a imagem do devir, mas não fomos além dessa imagem,
não vimos o que há por trás dela. Em cada caso, a série de “causas” se
apresenta muito mais completa diante de nós, e podemos inferir: tal e tal
coisa têm de suceder antes, para que venha essa outra – mas nada
compreendemos com isso. (FW/GC § 112 )

175
Assim, para compor o corpus de análise para este trabalho e propor um
diálogo com tal “maquinaria de guerra” pensada pelo filósofo alemão, selecionamos
o conto O espelho, de Guimarães Rosa, presente no livro Primeiras Estórias,
publicado em 1962. Neste conto, observamos a luta do narrador para provar a falta
de “sentido” do mundo. Se observando diariamente diante de um espelho, acaba
suspeitando, com o passar do tempo, de que a aparência humana é uma grande
ilusão. Por meio dessa abordagem, refletiremos sobre uma possível e incômoda
experiência do indivíduo diante do devir, da pluralidade que é encoberta por um falso
aparente.

Considerações finais

O conto evidencia com um movimento por parte do narrador. Anos mais tarde,
diante de sua experiência e novos confrontos com o espelho, “ao fim de uma
ocasião de sofrimentos grandes, de novo me defrontei – não rosto a rosto. O
espelho mostrou-me” (ROSA, 2001, p. 127). Isso passa a ser permitido pelo
“despojamento” de tudo que impedia o crescer de sua alma. Ou seja, para o
protagonista a vida consiste em uma experiência extrema e séria. E que tal
movimento permitirá novas visões: “Sim, vi, a mim mesmo, de novo, meu rosto, um
rosto; não este, que o senhor razoavelmente me atribui. Mas emergindo, qual uma
flor pelágica, de nascimento abissal... E era não mais que: rostinho de menino, de
menos-que-menino, só. Só” (ROSA, 2001, p. 127).
É na tentativa de “apalpar o evidente” que termina essa reflexão. O que
tentamos propor nesta comunicação, como reflexão, foi a capacidade (ou não) que o
indivíduo tem para apreender o objeto, mesmo diante do incomodo de saber que
somente pode abarcar uma “fatia”. E que este movimento de estabilização acaba
apagando outras possibilidades de sentidos. Nessa leitura, o que foi possível
enxergar é que esse narrador rosiano consegue perceber que antes dos conceitos e
objetividades propostos pelas ciências, devemos valorizar também nossas
experiências de estar-no-mundo.

176
Referências

BARROS, Manoel de. Livro sobre nada. 3ª ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Record,
1996.

MOSÉ, Viviane. Nietzsche e a grande política da linguagem. 4ª ed. Rio de


Janeiro: Civilização Brasileira, 2014.

NIETZSCHE, Friedrich. Além do bem e do mal: prelúdio a uma filosofia do


futuro. Tradução, notas e posfácio Paulo César de Souza. 1ª ed. São Paulo:
Companhias das Letras, 2005.

____________. A Gaia Ciência. Tradução: Paulo César de Souza. 1ª ed. São


Paulo: Companhia das Letras, 2012.

ROSA, João Guimarães. Primeiras estórias. 15ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2001.

177
O CORPO COMO POSSIBILIDADE DE EXPERIÊNCIA NO ENSINO
DE ARTE
Carina Seron da Fonseca UEM
Renata Hannay Vidal UEM
Roberta Stubs UEM
carinaseronf@hotmail.com

Resumo
O presente resumo expandido aborda o corpo como possibilidade de experiência no
ensino de arte, por meio do processo de estágio, desenvolvido na disciplina de
Estágio Supervisionado em Artes Visuais II, sob orientação da professora Roberta
Stubs, no curso de Artes Visuais da Universidade Estadual de Maringá. Pautado no
referencial teórico de Bondia (2002), Farina (2007) e Stubs (2015) nosso objetivo é
analisar a relação estabelecida entre os alunos do C.A.P. participantes de nossas
regências, e o processo de estágio como possibilidade de experiência, tendo o corpo
como peça fundamental e a arte como dispositivo.

Palavras-chave
Arte. Experiência. Corpo. Estágio.

Introdução

Diante de uma intensa profusão de informações e imagens acerca de uma


infinidade de acontecimentos, a experiência torna-se algo raro. Para Bondía (2002),
a palavra experiência em espanhol, é “o que nos passa”, enquanto que em
português, “é o que nos acontece”. Segundo o autor:

A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não
o que se passa, não o que acontece, ou o que toca. A cada dia se passam
muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece. Dir-se-
ia que tudo o que se passa está organizado para que nada nos aconteça.
(BONDÍA, 2002, p. 21).

O excesso de informação, marca da globalização e da sociedade


contemporânea, faz surgir o que o autor chama de “sujeito da informação”, alguém
que busca constantemente estar informado, obsecado pelo saber, “(mas saber não
no sentido de “sabedoria”, mas no sentido de “estar informado”), o que consegue é
que nada lhe aconteça”. (2002, p.22).

178
De acordo com Bondía (2002) é importante que saibamos separar a
experiência da informação, nesse sentido ele nos traz o saber da experiência, e diz
“que é necessário separá-lo de saber coisas, tal como se sabe quando se tem
informação sobre as coisas, quando se está informado” (p. 22). Desse modo, os
sujeitos da informação, os sujeitos modernos, não são capazes de viver a
experiência por estarem munidos de opiniões pessoais embasadas em excessos de
informações, além da pressão constante de terem sempre opinião para tudo e da
falta de tempo, principalmente quando imersos em grandes redes de acesso a
informação, como é o caso da internet. Para o autor essa aceleração, e o fato de
não poder parar, priva o sujeito da experiência, em suas palavras, para que a
experiência aconteça

requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos


tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para
escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar;
parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender
a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o
automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os
ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos
outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se
tempo e espaço. (BONDÍA, 2002, p. 24).

Partindo de textos e discussões abordados em sala de aula nas disciplinas de


Estágio Supervisionado II e Tópicos Epistemológicos e Metodologia do Ensino de
Arte, compreendendo o contexto do sujeito moderno, e buscando, enquanto
estudantes de artes visuais, formar sujeitos da experiência, nos questionamos: De
que forma a arte como dispositivo pode possibilitar o saber da experiência? Para
responder a essa pergunta, nosso objetivo é analisar a relação estabelecida entre os
alunos do C.A.P. participantes de nossas regências, e o processo de estágio como
possibilidade de experiência, tendo o corpo como peça fundamental e a arte como
dispositivo de experimentação.

179
Desenvolvimento

Para Farina (2007, p. 770) “A crise da modernidade fez com que a arte do
século XX olhasse a experiência do sujeito com outros olhos. A condição física do
seu estar no mundo assumia uma nova evidência que requeria ser interrogada.”.
Nesse sentido, segundo a autora, inevitavelmente a filosofia e a arte assumiram
esse papel de questionar a experiência do sujeito, não só pela consciência, mas pelo
corpo em sua totalidade.
Pensando o corpo como possibilidade de reflexão e experiência estética por
meio da arte, desenvolvemos com a nossa turma de graduação, as propostas de
regências do nosso estágio. As observações, bem como as regências do estágio,
aconteceram no Colégio de Aplicação Pedagógica (C.A.P.), situado na cidade de
Maringá/PR. Trabalhamos com o ensino fundamental II, que contempla do 5º ao 9º
ano (crianças e adolescentes de 11 a 14 anos). Após as observações em diferentes
turmas, a sala desenvolveu duas regências, sendo uma com crianças de 11 anos e
outra com adolescentes de 14 anos.
Desenvolvemos as regências por meio de oficinas coletivas com a temática
de corpos múltiplos, e, pensando no conceito de corpo local de identidades plurais e
de empoderamento, a oficina foi intitulada de “Frankenstein de nós mesmos: de
corpos em corpos”. A linguagem a ser abordada na oficina foi o Lambe-Lambe,
técnica de colagem muito utilizada na arte de rua, devido a sua praticidade, baixo
custo e boa duração. Ambas as oficinas foram divididas em dois momentos, sendo o
primeiro, um debate sobre o Corpo tendo como dispositivo um GIF – um compilado
de imagens que se movimentam como um vídeo – com obras de diversos artistas,
nacionais e internacionais, homens e mulheres, com o tema Corpo em comum e nas
linguagens de colagem e lambe-lambe.
Alguns dos artistas por nós levantados foram Fernanda Magalhães, Travis
Bedel, Neghamburger, Hudnilson Jr, Rosana Paulino, Hanna Hock, e outros. Para o
debate, elencamos algumas questões disparadoras, que eram feitas sempre que
parávamos o GIF em uma obra aleatória, tais como: “O que esse corpo diz para
você?”, “Todo corpo é igual?”, “O que é ser igual?”, “Qual a forma desse corpo?”,

180
“Qual a cor desse corpo?”, “O que este corpo está sentindo?”, “Como o corpo é
representado nessa obra?”, “Como o corpo é representado na sociedade?”, etc.
Em um segundo momento, desenvolvemos com os alunos, em grupos, a
montagem dos corpos Frankenstein. Partindo das discussões realizadas, os alunos
desenharam partes de seus corpos, misturando-as com partes de corpos de animais
e outras figuras imaginárias. Em seguida, recortaram e esquematizaram as partes de
modo a formar um único corpo, um Frankenstein deles mesmos. Estes corpos
construídos pelos grupos foram colados nas caixas d’água da escola, por meio da
técnica de Lambe-Lambe, reforçando a ideia de aceitação das diferenças,
pertencimento e coletividade, temas estes, abordados nas discussões feitas no
momento de apresentação do GIF.
Segundo com Farina (2007, p. 775) “Pensar sobre as imagens através das
quais nos entendemos como sujeitos da atualidade pode ajudar-nos a ver os modos
de funcionamento de nossa formação.” Segundo a autora, através dessas imagens,
surgem novas maneiras de pensar e originam-se novas sensibilidades.
Nesse sentido, ao considerarmos a faixa etária das crianças e adolescentes
envolvidos, assim como o contexto escolar e as crescentes discussões acerca do
corpo na contemporaneidade, torna-se fundamental questionar, por meio da arte, as
diferentes representações desses sujeitos na sociedade, assim como possibilitar a
eles a oportunidade da experiência. Segundo Stubs (2015)

A cada experiência estética nasce também um outro “sujeito” da


experiência.” Há um trabalho tanto por parte do artista, que cria sua obra
numa relação sensível e estética com a experiência que poderá
proporcionar ao "receptor", quanto por parte daquele que recebe a obra e
abre seu corpo e suas percepções para criar e imergir numa experiência
singular. (p, 195).

Desse modo, para além de um encontro de subjetividades entre artistas e


receptores, a regência possibilitou um encontro de experiências singulares por parte
de todos os participantes. Segundo Stubs (2015), a arte, ainda que complexa e por
vezes, difícil de ser entendida, “consegue criar uma via expressiva e um canal de
comunicação desobstruído e descampado de representações. Esse fato possibilita a

181
criação de um espaço-tempo único e propício para o compartilhamento e produção
de experiências singulares” (p.195).
Outro ponto observado por nós foi a relevância do tema escolhido pela turma:
o Corpo. Ainda de acordo com Stubs (2015):

Questionar regras, normas e modelos tradicionais e ideais de corpo, bem


como buscar novas formas de liberdade, são atos que carregam uma
concepção de corpo como território político, como suporte para resistir,
subverter e criar outras artes de viver. (STUBS, 2015, p. 199).

Ao questionarmos o corpo e suas representações na arte, o que chamou


nossa atenção, em especial no caso das crianças menores, muitas vezes
subestimadas, foi observar que os alunos estavam muito conectados com os
assuntos como racismo e gordofobia. As crianças estavam inteiradas sobre o
respeito com o outro, em especial o bullyng. Em suas falas, ao observarem
elementos das obras apresentadas por nós, deixavam claro que todos somos
diferentes e devemos ser respeitados.

Considerações finais

Conforme Farina (2007, p. 775) “A experiência estética permite-nos fazer


imagens de nós mesmos e da realidade: faz-nos ver e entender as coisas de
maneira concreta.”. Ao finalizar nossas regências do estágio, no qual o objetivo era
problematizar o corpo por meio de uma aprendizagem inventiva, bem como refletir
suas representações na arte e na sociedade, foi possível proporcionar aos alunos,
por meio da arte, uma experiência estética, assim como uma troca de experiências
singulares, por meio da criação de um corpo plural. Esse processo evidenciou-se
nas produções artísticas, que possibilitaram a nós, alunas de arte, ver o processo de
estágio como possibilidade de experiência para nós e para os alunos, tendo o corpo
como peça fundamental e a arte como dispositivo para pensarmos outros modos de
compreender, identificar e vivenciar o corpo.

182
Referências

BONDIA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de


experiência. Rev. Bras. Educ. 2002.

FARINA, Cynthia. Arte, Corpo e Subjetividade: Experiência Estética e Pedagogia.


Revista Digital Art&. Ano IV, 2007, No. 05. Disponível em:
<http://www.anpap.org.br/anais/2007/2007/artigos/078.pdf> Acesso em mai. 2017.

STUBS, Roberta. A/r/tografia de um corpo-experiência: arte contemporânea,


feminismos e produção de subjetividade. 2015. 276 f. Tese (doutorado) -
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências e
Letras de Assis, 2015. Disponível em:
<https://repositorio.unesp.br/handle/11449/136107> Acesso em nov. 2017.

183
O DEVIR-CRIANÇA E A AMPLIAÇÃO DO SENTIDO DA
EXPERIÊNCIA EM UMA OFICINA DE LAMBE LAMBE
Thaís Joana Tito Gonçalves (UEM)
Monalisa Romanesi Santos (UEM)
Roberta Stubs (UEM)
thaisartesvisuais2015@gmail.com

Resumo
O presente resumo expandido focaliza como tema “O devir-criança e a ampliação do
sentido da experiência em uma oficina de Lambe Lambe”, com objetivo geral de
promover uma abertura no campo da experiência e a produção de linhas de
subjetivação inventivas, por meio de uma pedagogia inventiva (KASTRUP, 2005) e
da pedagogia menor(SCHNEIDER, 2014). Para respondermos a problemática
proposta, como romper as construções recognitivas, fixas e endurecidas, que
impedem os encontros e os agenciamentos do devir-criança, a metodologia de
pesquisa será bibliográfica e pautada em nossa própria experiência de estágio. A
princípio, abordaremos os conceitos fundamentais para nossa discussão, com foco
no devir e no devir-criança (DELEUZE & GUATTARI, 1977), posteriormente
trataremos da Micropolítica, da Pedagogia Inventiva e da Recognição, discorrendo
sobre a experienciação da oficina de Lambe Lambe, bem como as justificativas que
embasam a problemática, no decorrer da análise.

Palavras-chave: Devir-criança. Recognição. Pedagogia menor. Experiência. Corpo.

O Devir, a livre experimentação e a produção de subjetividade

A análise proposta neste artigo relata as experiências vivenciadas na oficina


de Lambe Lambe “Frankenstein de nós mesmos: de corpos em corpos”, realizada
com inspiração na ideia de uma pedagogia inventiva de Virgínia Kastrup (2005) e da
Pedagogia Menor, pensada por Daniela da Cruz Schneider (2014) a partir do Livro
Kafka: por uma Literatura Menor, de Gilles Deleuze & Félix Guattari (1977). A partir
disso, objetivamos promover uma abertura no campo de experiência e a produção
de linhas de subjetivação inventivas.
Dessa forma, apresentaremos uma problematização pautada em conceitos
formulados pelo filósofo Gilles Deleuze e o psicanalista Félix Guattari, com foco no

184
devir e no devir-criança, partindo da percepção da necessidade em provocar nas
crianças uma ruptura nas construções recognitivas fixas e endurecidas perante o
corpo. Tais construções, expressam imbricações valorativas que perpetuam os
estereótipos, reforçam o preconceito e impõem valores morais, contribuindo para a
adultização da criança e para um fechamento progressivo que impede a disposição
a novas e outras experiências e consequentemente, a uma experiência plena.
Ao utilizarmoso termo devir formulado por Deleuze e Guattaripercebemos que
os devires estão relacionados com os termos:desterritorialização, subjetividade,
agenciamentos, afetos e experiência.
Nesse sentido, a partir do livro O Vocabulário de Deleuze (2004), de François
Zourabichvili, os agenciamentos majoritários e os agenciamentos minoritários são
considerados fatores relevantes que compõem os imbricamentos que permeam o
devir, pois “[...] o indivíduo por sua vez não é uma forma originária evoluindo no
mundo [...] ele só se constitui ao se agenciar, ele só existe tomado de imediato em
agenciamentos” (ZOURABICHVILI, 2004, p. 9).
Desse modo, enquanto um agenciamento que emerge de acontecimentos,
todo devir pode ser considerado minoritário (molecular), que direciona a novas e
outras experiências, desestruturando as potências molares, que são os padrões
molares (família, profissão, conjugalidade) (DELEUZE & GUATTARI, 1997, p. 21).
Sendo assim, entendemos os sujeitos, assim como seus campos de experiência,
como sendoconstituídospor agenciamentos coletivos de enunciação, ou seja por um
vir a ser da ordem do inacabado. Enquanto devir, os sujeitos rompem com formas e
pensamentos preconcebidos e passam a experienciar uma espécie de potência
pensante e sensitiva (ZOURABICHVILI, 2005), a potência de um vir a ser capaz de
romper com as forças que cristalizam a subjetividade.
Nesse movimento, a constituição do devir-molecular instaura agenciamentos
e também a circulação de afectos gerando uma movimentação alternativa tornando
possível a desterritorialização (DELEUZE & GUATTARI, 1997). Consequentemente,
os agenciamentos possibilitam um movimento de fuga de um território por meio da
mobilidade de fluxos em prol de um desenraizamento e da movimentação de
afectos. O afecto, por sua vez “[...] não é um sentimento pessoal, tampouco uma

185
característica, ele é a afetuação de uma potência [...] que subleva e faz vacilar o eu”
(DELEUZE, 1997, p.18). Nesse sentido, pensar o devir, é pensar a relação sensível
que os sujeitos estabelecem consigo e com o mundo, é pensar um sujeito que se
faz, desfaz e refaz a partir dos afetos e marcas sensíveis que os constituem. É
enquanto disposição sensível de afetar e ser afetado que utilizamos a ideia de devir
criança, entendido aqui como uma disposição para experimentar o mundo sem a
interferência os juízos morais que alicerçam a sociedade.
A partir dos apontamentos de Gilles Deleuze e Félix Guattari, Virgínia
Kastrup(2005) estabeleceu a Pedagogia Inventiva como forma de ultrapassar a ideia
derecognição que prevalece em nosso contexto educativo. De acordo com Kastrup,
por meio da recognição, “[...] as informações chegam de um mundo preexistente e o
sistema cognitivo opera com regras e representações, chegando a resultados
previsíveis” (2005, p. 1275). Em oposição à recognição que a autora pensa em
termos de uma Pedagogia Inventiva, na qual o novo e a inventividade se tornam
centrais para pensar pratica educativa. É pensando nessa inventividade que
invocamos aquia potencialidade do devir-criança que é movido por um desejo de
experimentação, uma força desejante que aciona no corpo essa abertura à
experiência.
Alinhada a proposta da Pedagogia Inventiva, utilizamos também a ideia de
Pedagogia Menor, pensada porDaniela da Cruz Schneider a partir do Livro Kafka:
por uma Literatura Menor, de Gilles Deleuze & Félix Guattari (1977). Conforme
Schneider (2014), Pedagogia Menor pode ser entendida como um agenciamento
minoritário no cotidiano da educação, gerando uma resistência aos meios de
padronização, engendrando a desterritorialização que possibilita o encontro de
experiências singulares e a abertura para novos caminhos na relação ensino e
aprendizagem. Tais considerações são essenciais para fundamentar a realização da
oficina proposta e posteriormente discorrermos sobre a mesma.

“O melhor dia de aula de Artes de todos!” - A experienciação na oficina de


Lambe Lambe

186
Considerando o exposto acerca da Pedagogia menor e da Pedagogia
Inventiva, podemos dizer que nossa oficina de Lambe Lambe foi pensada enquanto
uma possibilidade de problematização de estereótipos acerca do corpo a partir da
produção de uma experiência singular por meio delinhas de subjetivação inventivas.
Dessa forma, constatamos que, em um primeiro contato de observação antecedendo
a oficina, sentimos uma frequência de formas cognitivas engessadas perante o
corpo, as quais implicam em um modo de representação por meio da recognição.
Por conta disso, os agenciamentos constatados nos processos de ensino e
aprendizagem estabelecem uma relação valorativa que direcionam, por exemplo, o
corpo nu, como sendo um corpo exclusivamente sexualizado, o corpo gordo, como
sendo o fora do padrão de beleza. Portanto, ao considerarmos as crianças, diante de
uma sociedade que se acostumou a adultilizá-las, percebemos uma legitimação de
um fator regulador da experiência que caracteriza uma predefinição social atual.
Nesse contexto, a realização da oficina contou com dois momentos, o primeiro
foi direcionado por meio de obras de artes de artistas que problematizam o corpo e a
partir de perguntas norteadoras levantamos novos questionamentos afim de
provocar inquietações e desestruturar os preconceitos que se instauram, por
exemplo, diante do corpo que é tido como fora dos padrões estabelecidos e
perpetuados pela sociedade. Em um segundo momento, a partir de tal reflexão,
ocorreua prática, para a construção de um corpo múltiplo com o uso da técnica de
Lambe Lambe. O corpo múltiplo foi construído a partir de partes do corpo dos
próprios alunos, que culminou em um corpo plural, multicolorido e não
necessariamente humano. Nesse momento as discussões sobre as quebras de
estereótipo reapareceram na construção de um corpo nem um pouco padronizado.
Inicialmente, os alunos demonstravam uma dificuldade em quebrar alguns
padrões da representação do corpo, mesmo com os direcionamentos de corpos
múltiplos e diferenciados. Sendo assim, durante a oficina, nos deparamos com
reações de deboche perante a representação do corpo gordo - sendo essa uma
reação do cotidiano escolar -feminino e nu presente no trabalho Gorda 9 (1995) da
artista paranaense Fernanda Magalhães (1962). A artista usaem seus trabalhos a

187
relação com o próprio corpo, bem como corpo do outro, conduzindo uma ação de
micropolítica perante os estereótipos de beleza.
A partir de algumas falas dos alunos durante a ação, como por exemplo, “eu
gostei da obra da mulher gorda” percebemos que mesmo mencionando “mulher
gorda” esta fala já não possuía um caráter de deboche, ou de aversão. Também
constatamos este novo olhar diante da fala “eu ria de gordo”. Constitui-se então, um
momento propenso a pensar nas ações para além da sala de aula, e o quanto tais
ações são necessárias no sentido de promover este novo olhar, bem como também
de oportunizar aos alunos esta prática artística do uso da técnica de Lambe Lambe.

Considerações finais

A oficina de Lambe Lambe foi uma experiência que potencializou o encontro e


construção de subjetividades ecorpos singulares. Sendo assim, finalizamos com
uma frase que ecoou por entre nossos ouvidos e que nos fez sair com a sensação
de dever cumprido, “é o melhor dia de aula de Artes de todos!”. A problematização
de obras de artes, resultou em um campopossível de experiências, sendo esse um
agenciamento de afetos no qual “[...] a invenção de novas possibilidades de vida
supõe, portanto, uma nova maneira de ser afetado” (ZOURABICHVILI, 2000, p.15).
A ação que se consolidou por meio de uma pedagogia menor e inventiva, suscitou
por meio dos trabalhos artísticos, questões familiares sob uma ótica política e ética.
Notamos que trazer a arte como meio de resistência no campo educacional, implica
em construir questionamentos para além de experiências recognitivas, conduzindo o
devir-criançapor meio de um olhar sem preconceitos, revelando uma cognição
bifurcante e inventiva, com uma abertura para a livre experimentação e produção de
novas sensibilidades.

Referências

DELEUZE, Guilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: Capitalismo e Esquizofrenia, v.4.


São Paulo: Editora 34, 1997.

188
KASTRUP, Virgínia. Políticas cognitivas na formação do professor e o problema do
devir-mestre. Educ. Soc. [online].v. 26, n.93, p.1273-1288, 2005.

SCHNEIDER, D. C .Micropolítica e pedagogia menor: desdobramentos


conceituais para se pensar a educação pelas vias da experimentação.
Travessias (UNIOESTE.Online) , v.08, p. 24-41, 2014.

ZOURABICHVILI, François. 2000. Deleuze e o possível (sobre o involuntarismo


na política). In: ALLIEZ, Éric (org.). Giles Deleuze: uma vida filosófica. São Paulo:
Editora 34, p. 333-356.

_______. O Vocabulário de Deleuze. Rio de Janeiro: RelumeDumara, 2004.

________.Deleuze e a questão da literalidade. Educ. Soc. Campinas, v.26, n.93.


2005.

189
O SAMBA E O ARTISTA HEITOR DOS PRAZERES: ESTÁGIO
SUPERVISIONADO EM ARTES VISUAIS II

Vanessa Arnaut Pereira (UEM)


Prof. Dr. Eloiza Amalia Bergo Sestito(UEM)
eloizaamalia@hotmailcom

Resumo: O presente resumo é resultado da regência realizada na disciplina


de Estágio Supervisionado em Artes Visuais II, do curso de graduação de Artes
Visuais, da Universidade Estadual de Maringá, realizado no Colégio Estadual
Dr. Gastão Vidigal na cidade de Maringá, Paraná. Tem como objetivo relatar a
intervenção, docente com a temática cultura afro-brasileira a partir do gênero
musical samba e as obras do artista Heitor dos Prazeres, desenvolveu-se
produções artísticas com gravura em matriz no isopor e produção em pintura no
papel cartão. Com o objetivo dos alunos compreender a cultura popular e sua
dimensão artística e cultural.

Palavras-chave: Cultura popular. Pintura. Gravura.

Introdução
A partir da disciplina de Estágio Supervisionado em Artes Visuais
II, acadêmica do terceiro ano do curso de Licenciatura em Artes Visuais
da Universidade Estadual de Maringá, tive a experiência de ministrar aulas no
Colégio Estadual Dr. Gastão Vidigal no município de Maringá-PR, na sétima série do
Ensino Fundamental. Espaço no qual desenvolvi observações e regências para
turmas A e D.
A disciplina de Arte é uma área de conhecimento que contribui para formação
humana do aluno, para ajudá-la a entender de forma crítica a sociedade que o
rodeia e a cultura. Portanto, não pode ser tratado como forma meramente de
entreter, ou ser visto como uma área menos importante que as demais. Sua
existência no currículo contribui para uma formação integral do aluno, lembrando
que é muito importante a formação global, não se reduzindo o processo educacional
somente por áreas mais tradicionais como é o caso da língua portuguesa,
matemática e ciências. Nesse sentido, o conhecimento na área de Arte faz parte do

190
todo na formação do aluno e não permitir o acesso a essa área de conhecimento é
negar um direito que o cabe para ser formado como cidadão crítico e consciente.
As intervenções pedagógicas que ora apresento neste resumo,
foram planejadas de acordo com o conteúdo que a professora da sala
estava desenvolvendo com os alunos, segundo seu planejamento. Trata-se dos
conteúdos ligados à música. Desta forma optei por realizar o plano de ação
docente com o objetivo de desenvolver a temática da cultura afro-brasileira a
fim de destacar a cultura popular, por meio do gênero musical o samba.
Fundamentei-me na proposta triangular de Barbosa (2009) a qual propõem que
os conteúdos curriculares e práticas sejam orientados a partir das três ações – ler,
fazer e contextualizar. Desse modo, para abordar a temática em Artes Visuais,
busquei relacionar com a vida e as obras do artista, cantor e compositor
Heitor dos Prazeres, apresentando os elementos que estruturam e organizam
as artes e sua relação com movimentos e períodos, a cultura popular e sua
expressão no movimento modernista. E assim relacionar os elementos formais
e a composição das obras do artista Heitor dos Prazeres e a expressão visual
com a música. A partir da proposta da temática os alunos desenvolveram
produções artísticas como a gravura a matriz no isopor e a pintura no papel cartão.

Desenvolvimento

A intervenção pedagógica aconteceu com duas turmas do 7º ano do Ensino


Fundamental. Com base nas observações e pesquisa, defini que o conteúdo a ser
trabalhado em sala de aula seria o samba e o modernismo brasileiro com o enfoque
no artista Heitor dos Prazeres e a obra Carnaval nos Arcos da Lapa. Devido que a
professora estava trabalhando com eles sobre música, durante as observações
e chegando a semana da Consciência Negra optei em fazer a regência na temática
a cultura afro-brasileira.
Abordei brevemente a biografia de Heitor dos Prazeres, sua história na
música e nas artes plásticas, por meio de slides e algumas de suas obras.

191
Além disso apresentei aos alunos algumas matrizes de gravura, para melhor
exemplificar as impressões para que conhecessem a técnica e o resultado,
eles adoraram a gravura muitos questionaram sobre as técnicas das matrizes
apresentadas.
Em um primeiro momento distribui um texto para os alunos sobre a origem do
samba e a vida e obra do artista Heitor dos Prazeres. Antes de propor o exercício da
produção artística. Pedi aos alunos que levassem os materiais tais como: bandeja de
isopor, rolinho, tintas diversas cores e papeis A4 colorido ou branco.
Já na primeira aula os alunos trouxeram os materiais para desenvolvermos a
proposta prática. No início apresentei as obras do artista por meio de slides e pedi
para que eles fossem falando o que representava cada obra, as cores e os
elementos formais. Dessa forma realizamos uma análise das obras, em
seguida expliquei a atividade a ser desenvolvida. Orientei os alunos como fazer o
desenho na bandeja, alguns alunos com mais facilidade na execução da matriz e
outros com dificuldades, assim fui orientando cada um individual para melhor a
compreensão da atividade. Expliquei também como fazer a impressão dando
exemplo ali na hora, para que todos possam compreender melhor.
Figura 1: Gravura Impressões Figura 2: Gravura Impressões

Fonte: acervo próprio 2017.

192
Figura 3: Gravura Impressões

Fonte: acervo prórpio,2017.

Na segunda aula de regência foi dada a teoria por slide mostrei várias obras
do artista. E depois seguimos com a continuação da prática a gravura, os
alunos levaram os materiais novamente e se mostraram bem interessados a aula.
Procurei sempre orientar os alunos a todo o momento em sala de aula. As duas
turmas do 7º A e D ano desenvolveram as mesmas atividades.
Após a finalização da gravura realizei outra atividade prática com as
duas turmas do 7º ano, entreguei para os alunos uma folha A4 papel cartão branco
para cada aluno para que desenvolvesse um desenho com a proposta estudada,
pedi aos alunos novamente que levassem os seguintes materiais: pincéis, tinta
diversas cores, vasilha plástica, pano velho e o desenho desenvolvido de
acordo com a temática estudada em sala de aula. Após os desenhos finalizados
iriam colorir com a tinta. Para que os alunos pudessem desenvolver a técnica da
pintura.
Orientei os alunos individualmente nessa atividade explicando as técnicas de
pintura, mas eles tinham muita dificuldade na pintura por ser a primeira vez

193
que estavam executando um trabalho com tinta, mas não desistiram se
mostraram interessados em aprender.

Figura 4: Pintura Figura 5: Pintura

Fonte: acervo próprio, 2017.

Durante as aulas percebi que tanto no exercício com a gravura quanto com a
pintura os alunos têm dificuldades para desenvolver suas criações. Ainda
estão presos à cópia, alguns alunos justificaram que a professora não passa
atividades práticas, mas se restringe apenas na leitura de textos por isso tem
dificuldade para a criação dos desenhos.
No início alguns alunos não se interessaram pela aula devido à temática, por
não gostarem do gênero musical o samba, eles não se motivaram a fazer atividade,
mas no decorrer das aulas esses alunos acabaram interagindo e fazendo as
atividades práticas e foram o que mais se destacaram das produções artísticas fiquei
surpresa com essa reação deles, mas alguns alunos já acharam interessante
de início a proposta estudada novos conhecimentos quanto da prática e a temática.

Considerações Finais
No decorrer do processo através da observação, na regência busquei
levar aos alunos conteúdo diferente que eles ainda não tinham conhecimento,
através das atividades práticas de gravura e pintura. O resultado do trabalho

194
desenvolvido contribuiu para ampliar o repertório dos alunos e conhecimento da arte,
através do gênero musical samba.
No final da produção da gravura e pintura os alunos agradeceram pelas aulas
por ter ensinado uma técnica que eles não conheciam e por ter dado aulas
diferentes, por ter levado eles para sala de artes que não tinham ido ainda durante o
ano, fiquei muito feliz por ter ensinado e ao mesmo tempo aprendizado
também, teve uma aluna em especial que disse que a pintura fez ela relaxar
devido que estava com estresse muito alterado, e agradeceu muito pelas aulas.
É neste momento como estagiária, podendo vincular os conteúdos estudados
no curso de Artes Visuais, começo a perceber como futura professora, que
desenvolvi características própria para evitar a comodidade na forma de
ensinar, através desse estágio eu pude fazer esse relato. O estágio proporciona
esse contato com a espaço escolar, podendo ampliar mais experiência e além de
fazer refletir a respeito de metodologia de ensino, buscando adaptar os conteúdos
trabalhados no curso com o auxílio da professora orientadora.

Referências
BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da Arte: anos 80 e novos
tempos. 7ªed. ver. São Paulo: Perspectiva, 2009. Disponível em:
<http://www.heitordosprazeres.com.br/hp/pinturas/index.asp>. Acesso em: 11 de
Nov.
2017.

DUARTE JR, João Francisco. Por que Arte-Educação? 20ª Edição. Papirus
Editora. Campinas, São Paulo, 2009.

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS (PCN). Introdução aos parâmetros


curriculares nacionais (1997) Disponível em: <
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf> Acesso em: 11 de Nov. 2017.

RODA de Samba. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.


São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Disponível em:
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra4654/roda-de-samba>. Acesso em: 11 de
Nov. 2017. Verbete da Enciclopédia.

195
UEM. Regulamento do componente estágio curricular supervisionado do curso de
Artes Visuais-licenciatura modalidade presencial. In.UEM. Resolução 061/2010-
CI/CCH- Aprova o projeto pedagógico do Curso de Graduação de Artes Visuais.
Maringá, 2010. Disponível em: <<http://www.cch.uem.br/resolucoes_10/061_10.pdf.

196
O SILÊNCIO DO TROTE EM PALOMO

Bruna Augusta Marques (Universidade Estadual de Maringá)


Patrícia Lessa, Orientadora (Universidade Estadual de Maringá)
Bruna-Augusta_@hotmail.com

Resumo
As discussões que serão delineadas ao longo dessa pesquisa, têm como foco
abordar a performance Palomo, da artista brasileira Berna Reale, que na construção
de sua obra tem a intenção de levantar questões ligadas ao abuso de poder
institucional. Nesta performance a artista anda pelas ruas da cidade de Belém,
montada em um cavalo, todo pintado de vermelho sangue, usando uma focinheira
em sua boca, trajada com roupas pretas, fazendo referência a força militar. Dessa
forma temos como objetivo central, analisar a performance na perspectiva da
discussão sobre a violência e sobre as relações de poder entendendo-a como um
Artivismo. Consideramos que, o trabalho da artista como perita criminal na polícia
implica em uma dualidade pois ao mesmo tempo que a ela questiona observamos
que também é parte integrante dessa intuição de poder.

Palavras-chave: Berna Reale. Artivismo. Palomo.

Introdução

O Brasil, é um pais que teoricamente diante da constituição coloca-se como


pais democrático, mas em pratica algumas de suas instituições de poder ainda são
enraizadas em uma base de autoritarismo, como a questão da força policial, Força
esta que utiliza do manto da segurança pública para “proteger” os cidadão utilizando
de violência e truculência na maior parte de suas ações de “segurança”, o controle
da polícia suscita debate sobre o caráter militar de uma fração dessa instituição no
Brasil ( OLIVEIRA, 2005), ou seja uma instituição que se caracteriza por promover a
segurança pública dentro de um pais democrático, comporta-se de forma autoritária,
tanto na sua construção como órgão de contenção da sociedade, quanto nas suas
ações de intervenção nesta.
Diante desse cenário a questão da brutalidade, no ambiente urbano se faz
constate tanto pela questão da criminalidade, quanto pela ação policial, com suas
medidas de contenção. Em muitas situações a violência adota características
mambembes, um palco armado em qualquer esquina, espetáculo gratuito, razão de

197
distração e pilhéria cujo atores são ao mesmo tempo vilão e vítima (MARRA, 2008),
dentro desses conflitos sociais as entidades se distorcem, quem deveria ser
protegido acaba como vítima e aquele que deveria proteger acaba como agressor,
devido ao uso desmedido da força autoritária. Esse é um cenário urbano, que se
encaixa em muitas realidades brasileiras como o da cidade de Belém, que se
caracteriza por estar inserida no contexto de uma região de muitos conflitos, por
ocupação, ambientais, étnicos e territoriais entre outros (MARRA, 2008), é dentro
desse cenário marcado por diversas relações poder, que nasce a artista Berna
Reale.
Berna Reale, é uma artista brasileira que tem um trabalho crítico, voltado para
o desenvolvimento de obras de caráter social, que tem como função denunciar a
“violência calada”, cometida em frágeis setores do tecido social (ROCHA, 2014).
Como foco dessa pesquisa vamos abordar a performance Palomo, que com sua
imponência e autoridade cria uma atmosfera quase que palpável de poder e medo
nas ruas do centro de Belém.

Desenvolvimento

Reale é uma artista que teve sua formação na Universidade Federal do Pará
(Belém, PA), desde então vem desenvolvendo vários trabalhos na área da fotografia
e performance, utilizando também do vídeo, como uma ferramenta de registro que
possibilita um outro olhar para sua obra. Seu trabalho ganha repercussão devido a
construção sensível de suas performances, que a partir de 2011, foram registradas
principalmente em vídeo, em contraposição aos trabalhos anteriores, cuja memória
chega a nós pela fotografia (CARRION 2015), exemplo dessa transformação no seu
modo de registrar os seus trabalhos de performance se dá na obra Palomo, que foi
registrada em forma de vídeo e exposta junto com diversos outros trabalhos da
artista em uma exposição chamada , “Vazio de nós”, Museu de Arte do Rio de
Janeiro (2013), com a proposta de trazer uma reflexão sobre a vulnerabilidade
humana na sociedade (ROCHA, 2014), levantado questionamentos sobre forma que
vemos e tratamos uns aos outros .

198
Dentro dessas discussões sobre vulnerabilidade relações de poder, temos
como foco a performance Palomo, que acontece no centro das ruas de Belém, esse
trabalho foi Filmado durante o amanhecer, “Palomo”, mostra um centro da cidade
quase deserto, com os seus estabelecimentos comerciais fechados e com a maioria
dos habitantes ainda dentro de suas casas (ROCHA, 2014), é sob essa atmosfera
que a artista trajada com roupas pretas, semelhantes a de agentes da força policial,
percorre a cidade, montada em um cavalo todo pintado de vermelho, em repleto
silêncio, a não ser pelos trotes do cavalo. Silêncio esse que pode ser significado de
muitas maneiras como o silêncio do medo aquele, que se faz presente diante da
violência da opressão e principalmente nesse caso do abuso de poder das
autoridades que a princípio deveriam agir com instituição que zela pela segurança e
não como mão que corrige a sociedade, por meio da agressão regida pela força
bruta.
Figura 1: Palomo, 2012, registro fotográfico de vídeo performance, 100X150 cm.

Fonte: Premio Pipa, 2014.

Palomo, também pode ser caracterizada como uma obra artivista, devido seu
caráter político e social, sua construção age de forma a criticar (autocriticando-se) e
é bifurcada em duas trajetórias (VIEIRA, 2007), ao mesmo tempo que cria um
universo próprio para suas representações se desligando da realidade, ela
representa em si mesmo o reflexo desta crítica, agindo como resistência nesse meio
social que suscitou a sua criação. De acordo com Jacques Rancière, no texto de
(VIEIRA, 2007), a resistência da obra não é o socorro que a arte presta à política.

199
Ela não é a imitação ou antecipação da política pela arte, mas propriamente a
identidade de ambas, ou seja Palomo, se inscreve nesse contexto como o grito
silencioso e sufocante da realidade, que mesmo em silêncio consegue disseminar o
sentimento de temer e ser temido de ter medo e não poder gritar, de sentir-se preso
em sua própria casa sendo cercado por todos os lados, devido a uma atmosfera de
poder que se cria com a utilização da força por uma figura que se constrói como
símbolo e poder de autoridade
Dentro desse contexto a artista brasileira Berna Reale, também age como
símbolo de resistência, ao mesmo tempo que trabalha e atua na força policial do
estado de Belém, como perita criminal (ROCHA, 2014), ela também constrói seus
trabalhos como crítica e reflexo de sua realidade social, não cabendo apenas à
cidade de Belém, mas há vários lugares do mundo, pois a violência e o abuso de
poder, não são ações que acontecem em escalas localizadas, mas sim globais.

Considerações finais

As relações de poder advindas da coerção, construídas em nossa sociedade


por meio da força e uso de autoridade desmedida, configuram-se como forma de
abuso tanto da integridade física do indivíduo social quanto mental. Elas agem de
modo a acuar e prender o ser humano em uma teia invisível de medo e obediência
desmedida.
A partir disso podemos interpretar as obras de Berna Reale, como um
disparador que no excita a questionar modelos, comportamentos e símbolos
instaurados em nossa sociedade, problematizando-os e resistindo trazendo novos
olhares e formas de pensar.

Referências

CARRION, Caroline. Irrupção pela disrupção: sobre o modo de trabalho de Berna


Reale. Disponível em: https://bernareale.wordpress.com/ Acesso em: out de 2017

ROCHA, Susana N. V. T. Berna Reale: a importância do choque e do silêncio na


performance. Disponível em:
<http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/11089/2/ULFBA_PER_EST%C3%9ADIO_9_

200
S USANA%20DE%20NORONHA%20DA%20ROCHA.pdf> Acesso em: 04 de out.
2016.

MARRA, Maria. Violência e transgressão na periferia de Belém: sociabilidade e os


arranjos criminosos no espaço de ocupação Riacho Doce. Disponível em: <
file:///C:/Users/Usuario/Desktop/semana%20de%20Arte/Dissertacao_ViolenciaTrans
gressaoPeriferia.pdf >. Acesso em: out de 2017.

OLIVEIRA, Antônio. Uma polícia militar em uma sociedade democrática. Disponível


em:< http://www.redalyc.org/html/3476/347632167011/> Acesso em: out de 2017.

VIEIRA, Teresa. Artivismo: Estratégias artísticas contemporâneas de resistência


cultural. Disponível em: <
file:///C:/Users/Usuario/Desktop/PDF/Artivismo%20%20Teresa%20Vieira.pdf >
Acesso em: out de 2017.

201
O USO DA TECNOLOGIA NA PROMOÇÃO DA EDUCAÇÃO
Polyanna Astrath Costa (Universidade Estadual de Maringá)
Fabio Luiz Grassi (Universidade Estadual de Maringá)
Vagner Basqueroto Martins (Universidade Estadual de Maringá)
polyastrath@gmail.com

Resumo
As mídias sociais apresentam um papel importante na vida do brasileiro tornando
quem está fora delas inexistente, visto isso, o seguinte trabalho busca explorar as
maneiras que as tecnologias da web 2.0 podem se aliar com as instituições de
ensino superior, especificamente para promover o curso de graduação de Design da
Universidade Estadual de Maringá e suas produções acadêmicas e cientificas para a
comunidade interna e externa utilizando um website na plataforma Wordpress e uma
página na rede social Facebook. Aqui é apresentada a metodologia utilizada para o
uso das mídias e os resultados obtidos no último ano de realização do projeto.

Palavras-chave: Mídias sociais. Wordpress. Promoção. Graduação.

Introdução

O convívio em sociedade e o agrupamento de indivíduos com mesmos


interesses é algo intrínseco ao ser humano e a forma na qual essas relações
acontecem pode ser variada, principalmente nos dias atuais com o advento da
internet e das mídias digitais e sociais (CIRIBELI e PAIVA, 2011). Segundo Richard
Miskolci (2011) as mídias digitais referem-se ao conjunto das conexões com a
internet e aos equipamentos materiais que dão suporte à essa conexão, podendo
ser computadores de mesa ou portáteis, celulares ou tablets. Já as mídias sociais
fazem parte da web 2.0, que dita a segunda fase da internet, na qual a geração de
conteúdo e o rápido compartilhamento dos mesmos pelos usuários da rede são o
fator mais importante.
Fazem parte das mídias sociais os blogs, wikis (páginas que podem ser
facilmente editadas por qualquer pessoas que tenha acesso a rede, sendo a

202
Wikipedia o melhor exemplo para tal) e as redes sociais (páginas que permitem a
criação de um perfil pessoal ou coorporativo para os usuários) (ANDERSON, 2007).
Segundo o Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da
Sociedade da Informação (Cetic.br), em pesquisa sobre o “Uso das Tecnologias de
Informação e Comunicação nos domicílios brasileiros - TIC Domicílios 2016”, 68% da
população brasileira utiliza a internet, sendo que 86% deles utilizam a internet todos
os dias. A pesquisa também indica que 23% dos brasileiros usuários de internet
pesquisados buscou informações a respeito de cursos de graduação, pós-graduação
e extensão na internet e que 84% dos pesquisados já utilizou a internet para fins
educacionais.

Desenvolvimento

Charles Wankel (2009) explica que nos últimos anos, professores perceberam
que seu alunos são nativos da era digital e que a nomenclatura "millennial students"
foi adotada para se referir aos estudantes que desde a infância tem contato com a
internet, assim o uso das tecnologias da web 2.0 se tornou um aliado para o ensino,
pois a troca de conteúdos geradas pelas mídias sociais é maior que o
compartilhamento de informações tradicional, o que potencializa a aprendizagem.
Esse compartilhamento de conteúdo pode ser feito via Facebook, por meio de
grupos de disciplinas ou páginas das instituições de ensino; blogs, para uma
geração de conteúdo mais profunda; e outras redes sociais.
Partindo do pressuposto acima citado, para Junior, Sarquis, et al (2014), o uso
das mídias sociais também pode ser um aliado na promoção e divulgação de
instituições de ensino e de sua produção, pois o púbico alvo são os “millennial
students” e toda sua rede de conexões nas redes sociais. Deste modo, as
instituições podem utilizar destas mídias para promoção do conhecimento e das
ofertas existentes, trazendo benefícios para a comunidade externa e acadêmica.
Diante desse cenário o projeto foi criado, implementado e está em
desenvolvimento contínuo, tendo em vista as constantes mudanças tecnológicas que
vem acontecendo nos últimos anos, que tem como objetivo reformular as mídias

203
vinculadas ao curso para obter maior sucesso na divulgação de informações para os
atuais alunos, egressos, comunidade externa e interessados em cursar Design.
Para a realização do projeto utilizamos um site na plataforma Wordpress e
uma página no Facebook, no site ficam contidas notícias a respeito da comunidade
acadêmica e conteúdos relevantes para a mesma, bem como informações gerais
sobre o curso de Design da UEM. A página do Facebook, foca-se na postagens de
links compartilháveis relacionados ao design, vídeos, fotos e promoção de eventos.
O Wordpress é uma plataforma de gestão de conteúdo web que foi lançada
em 27/05/2003, com características como URLs12 fáceis de serem encontrados em
provedores de busca, possibilidade de criação de múltiplos menus, moderação de
comentários, utilização e atualização gratuitas, tornando-se popular entre as
plataformas de gerenciamento de blogs existentes no mercado (SANTOS, 20015).
Esses fatores aliados a fácil programação gráfica, que possibilita a edição
sem conhecimentos avançados em programação, e a fácil navegação dos sites
construídos na plataforma foram determinantes para a escolha da plataforma para o
projeto. Já a escolha do Facebook aconteceu devido ao grande número de usuários
que tem um perfil nesta rede social.
Após uma análise de usabilidade e estética, listando todos os pontos de
melhoria que poderiam ser efetuados, vem sendo desenvolvido um novo projeto
para o site, levando em conta a facilidade de navegação e o apelo visual. A seguir,
podemos ver um comparativo entre o site atual e a nova porposta com a aplicação
das informações obtidas na análise, onde as informações foram organizadas por
relevância, alémda aplicação de um novo padrão de cores.

Figura 1 – Página Inicial (parte I)

12
Do inglês Uniform Resource Locator, traduzido para português como "Localizador
Uniforme de Recurso"

204
Fonte: Autoria própria (2017)

Figura 2 – Página Inicial (parte II)

Fonte: Autoria própria (2017)

Figura 3 – Mockup (parte I)

Fonte: Autoria própria (2017)

205
Figura 4 – Mockup (parte II)

Fonte: Autoria própria (2017)

Considerações finais

Em um período de uma ano de desenvolvimento do projeto, algumas métricas


que obtivemos foram o número de curtidas na página do Facebook, que
aumentaram em 74% nesse período e também a concorrência no vestibular para o
curso de Design na UEM, que cresceu de 3,1 para 3,913 de 2016 para 2017,
cumprindo com o objetivo de promover o curso e as atividades realizadas pelas
comunidade acadêmica. O projeto continua em andamento com perspectivas de
conseguir métricas melhores e de implementar o novo layout no site.

Referências

ANDERSON, Paul. What is Web 2.0? Ideas, technologies and implications for
Education. JISC Technology and Standards Watch, Fevereiro, 2007.

Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação


(Cetic.br), Pesquisa sobre o Uso das Tecnologias de Informação e
Comunicação nos domicílios brasileiros - TIC Domicílios 2016.

CIRIBELI, João Paulo; PAIVA, Victor Hugo Pereira. Redes e mídias sociais na
internet: realidades e perspectivas de um mundo conectado. Mediação, Belo
Horizonte, v. 13, n. 12, p. 57-74, 2011.

13
Fonte: CVU - UEM

206
JÚNIOR, Valdemiro da Rocha; SARQUIS, Aléssio Bessa; SEHEM, Simone; DIASA,
Taíssa; SCHARF, Edson Roberto. Uso de mídias sociais no setor de ensino
superior. Revista Brasileira de Gestão e Inovação, v. 1, n. 2, p. 13-38, 2014.

MISKOLCI, Richard. Novas conexões: notas teórico-metodológicas para pesquisas


sobre o uso de mídias digitais. Cronos: Revista da Pós-Graduação em Ciências
Sociais. UFRN, Natal, v. 12, n.2, p. 09-22, 2011.

SANTOS, Alexandre Miguel Leitão dos. Benefícios e desafios do Wordpress no


desenvolvimento de sítios web. Orientador: Francisco Rui Cádima. Relatório de
Estágio de Mestrado em Novos Media e Práticas Web. Universidade de Nova de
Lisboa - Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Lisboa, 2015. 34p.

WANKEL, C. Management education using social media. Organization


Management Journal, v. 6, n. 4, p. 251-262, 2009.

207
PISTAS IDENTITÁRIAS

Odonias Santos de Souza Junior (UEM)


Dra. Roberta Stubs Parpinelli (UEM)
odoniasjunior@gmail.com

Resumo
O seguinte texto apresenta partedo percurso teórico de uma pesquisa em artes
visuais, que teve como resultado o trabalho intitulado Pistas Identitárias. A produção
busca levantar questões acerca de uma concepção de identidade fragmentada, que
pode assumir diferentes posições em diferentes contextos, contrapondo-se à
concepção de identidade estática e imutável. As imagens foram produzidas por meio
da técnica da fotomontagem digital, utilizando-se de softwares de edição de
imagens.

Palavras-chave: Pesquisa em arte. Fotomontagem. Identidade.

Introdução

Pistas Identitárias foi realizado durante o desenvolvimento de uma das


disciplinas do sétimo semestre da graduação em Artes Visuais, da Universidade
Estadual de Maringá.O trabalhoutilizou-se da metodologia da pesquisa em artes
visuais, fundamentando-se nos estudos de Rey (2002).
Durante a pesquisa, buscou-se trabalhar com o conceito de identidade por
meio de autores como Hall (2006). De acordo com este autor, no período do
Iluminismo desenvolveu-se uma concepção de indivíduo centrado, consciente e
objetivo, estando sua identidade relacionada diretamente à sua essência. Segundo
tal concepção, se uma pessoa nascesse “boa”, se fosse “boa” em sua essência,
independente das condições materiais e simbólicas que permeasse sua vida, ela
sempre continuaria a ser “boa” e sua identidade seria a de uma “boa pessoa”.
Essa concepção que Hall (2006) se refere como sendo cartesiana – e
dicotômica – passou a ser desestabilizada durante a chamada pós-modernidade, no
séc. XX. O autor pontua cinco eventos principais que proporcionaram essa
desestabilização e mesmo uma ruptura com essa concepção. Esses eventos são: 1.
o marxismo, com o pensamento de que as pessoas são constituídas de acordo com

208
as condições materiais e históricas que lhe são impostas; 2. a descoberta da
presença do inconsciente por parte de Freud e dos estudos psicanalíticos; 3. os
estudos linguísticos de Saussure; 4. os estudos de Foucault acerca das instituições
de poder, que regulam e “disciplinam” os sujeitos; 5. o desenvolvimento do
feminismo, que contestava a concepção de indivíduo centrado exclusivamente
masculina, que ignorava ou mesmo apagava a presença das mulheres, assim como
a história da humanidade enquanto história dos “homens”, o que tornava a
identidade feminina uma construção feita por homens, a partir de uma identidade
masculina.
Hall (2006) aponta que na pós-modernidade não se fala mais em “identidade”
(no singular), mas em “identidades” (no plural), uma vez que em nosso cotidiano nós
possuímos várias identidades (por vezes contraditórias), uma vez que ocupamos
várias posições-sujeito (eu enquanto homem, enquanto heterossexual, enquanto
graduando de um curso de artes visuais, enquanto filho, enquanto eleitor etc.).
Nesse sentido a identidade não seria algo fixo e imutável, mas algo que está sendo
construído continuamente a partir da maneira como nos relacionamos com as
condições históricas e sociais (materiais e simbólicas) que se apresentam para nós,
com aquilo que já existia antes de nós e aquilo que continuará a existir depois.
Uma vez que nossa identidade é constituída de elementos distintos, um único
aspecto de nossa identidade não seria suficiente para nos definir, uma vez que nós
não temos total controle sobre o que nos afeta, nem total consciência de como
refletimos os aspectos de nossa identidade nos objetos que utilizamos.

A fotomontagem

A técnica da fotomontagem passou a ser desenvolvida no início do séc. XX,


em grande parte, pelos/as artistas do movimento Dadaísta, a partir do estudo de
técnicas do cubismo, da fotografia e do cinema. Tal técnica, de acordo com autores
como Fabris (2002) e Carvalho (1999) foi explorada e aprimorada em diferentes
aspectos, tanto por artistas do próprio Dadaísmo (Hanna Höch, John Heartfield),

209
como também por artistas do Surrealismo (Max Ernst) e do Pop (Richard Hamilton),
entre outros.
A técnica teria sido desenvolvida pelos/as dadaístas como uma maneira de
contrapor os valores e os métodos tradicionais da arte, utilizando-se de
procedimentos mecânicos, de modo que pudessem produzidos e veiculados na
mesma velocidade em que a sociedade se desenvolvia. A fotomontagem passaria,
contudo, a ser vista também como um instrumento de uso (e crítica) político, no
trabalho de artistas como John Heartfield, e também como veículo de propaganda,
na produção de artistas do Construtivismo Russo, como Rodchenko.
Fabris (2002, p. 11) pontua que, para autores como Georg Lucáks, a
fotomontagem era vista como um espaço que apresenta uma “justaposição de
fragmentos da realidade heterogêneos, desconexos, arrancados do próprio
contexto”. Tais fragmentos apresentariam imagens que perderam seu sentido de
presença, de modo que a integridade aparente do real é negada. Nesse sentido, a
realidade não é apresentada, na fotomontagem, de maneira simultânea, mas de
forma fragmentada e sequencial.
Contudo, a técnica fotomontagem, assim como as demais técnicas artísticas,
desenvolve-se de acordo com os processos de produção de seu contexto histórico.
Carvalho (1999) aponta que a revolução da informática e o desenvolvimento do meio
digital possibilitaram outras formas de se pensar e de se produzir as imagens. Desta
forma, a fotomontagem também viria a passar por algumas mudanças. Nas palavras
do autor: “a fotomontagem além de refirmar a sua tendência a negação de uma
realidade única, pré-estabelecida e imutável, transmuta-se em uma nova estrutura
capaz de incorporar os aspectos transitórios e dinâmicos do próprio meio”
(CARVALHO, 1999, p. 36). Nesse sentido, ainda segundo este autor, a
fotomontagem distancia-se conceitualmente da colagem, uma vez que esta última
relaciona-se à fixação e aderência, enquanto a primeira está mais voltada à
convivência do híbrido e das combinações momentâneas.

Pistas Identitárias

210
As fotomontagens buscam apresentar possibilidades de identidades a partir
da combinação de elementos tidos como distintos, ou até mesmo opostos, que não
seriam concebíveis segundo argumentos de um mundo logicamente estabilizado (é
sim ou não, é x ou y, eu gosto ou não gosto, etc.) (PÊCHEUX, 2008), ou segundo o
modelo cartesiano. A composição das fotomontagens é desenvolvida a partir da
noção de contradição discursiva formulada por Pêcheux (2008), que concebe a
possibilidade de elementos distintos (que podem ser opostos ou não) funcionando
ao mesmo tempo, e das noções de identidade delineadas por Hall (2006) e
Woodward (2014), que apontam para identidades que estão sempre se constituindo
de forma heterogênea.
Na primeira imagem tem-se um braço, que não sabemos ao certo se pertence
a uma mulher ou a um homem, que está com o bíceps contraído, músculo esse que
é um dos mais valorizados entre as pessoas que praticam atividades físicas de força
intensa. Todavia, o músculo é sobreposto com a imagem de um cérebro que,
socialmente, acredita-se, no âmbito do senso comum, que seja pouco valorizado
pelas pessoas que praticam tais atividades. Dito de modo mais simples, tais
elementos são comumente tidos socialmente como opostos, associados a
identidades distintas, sendo, portanto, dificilmente associados à uma mesma pessoa,
ou a uma mesma identidade.
As três outras imagens funcionam de forma semelhante. Em uma das
imagenstem-se a figura de um homem que pode ser facilmente encontrada em uma
busca rápida por “homem viril” no site de buscas Google. Ao pensar sobre o que
seria um “homem viril”, é pouco provável que se pense também em elementos como
flores, borboletas, corujas ou o planeta Vênus, que são elementos comumente
associados ao feminino. Ao se pensar numa identidade feminina, poucas pessoas
atribuiriam a tal identidade animais como cavalo, urso e águia, que geralmente são
associados à identidade masculina, tomados por vezes como elementos
incompatíveis. A última imagem refere-se a uma quase inexistente possibilidade, ao
menos em nível de senso comum, de se conceber uma pessoa negra oriunda da

211
periferia se graduar em um dos cursos mais concorridos em grande parte das
universidades do país e possuir gosto, ou interesse, pela arte.
Por fim, as figuras não possuem rosto pelo motivo de que a proposta é
apresentar possibilidades de construção de identidades, sem associá-las a outras
personalidades, de modo que tais identidades possam pertencer a qualquer pessoa.

Figura 01: Pistas Identitárias, #1, #2, #3 e #4, respectivamente. Fotomontagem digital, 2017. Acervo pessoal.

Referências

BASTOS, Maria Teresa Ferreira. Uma investigação na intimidade do


portraitfotográfico. 2007. 244 p. Tese (doutorado). Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2007.

BOTTON, Fernando Bagiotto. As masculinidades em questão: uma perspectiva de


construção teórica. Vernáculo. Curitiba, n. 19 e 20, 2007.

CARVALHO, Hélio Jorge Pereira de. Da fotomontagem às poéticas digitais. 1999.


Dissertação (mestrado). Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Instituto de
Artes, 1999.

FABRIS, Annateresa. O artista como produtor: John Heartfield e a fotomontagem. In:


BRITES, Blanca e KERN, Maria Lúcia. Anais do XXII Colóquio do Comitê
Brasileiro de História da Arte – CBHA. Porto Alegre: PPGH/CPIS/PUCRS, 2002.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução: Tomaz Tadeu
da Silva, Guaracira Lopes Louro. 11. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

PÊCHEUX, M. O Discurso: estrutura ou acontecimento. Tradução: Eni P. Orlandi. 5


ed. Campinas: Pontes Editores, 2008.

REY, Sandra. Por uma abordagem metodológica da pesquisa em artes visuais. In:
BRITES, Blanca; TESSLER, Élida. (Org.). Metodologia da Pesquisa em Artes
Visuais. Porto Alegre: UFRGS, 2002, p. 123-140.

212
WOODWARD, Kathryn. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual.
In: SILVA, Tomaz Tadeu da (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos
estudos culturais. 15. ed. Petrópolis: Vozes, 2014.

213
POÉTICAS DO CORPO
Lucas Men Benatti (UEM)
lucas-benatti@outlook.com

Resumo
O presente estudo é fruto de reflexões teóricas acerca do meu próprio processo
criativo e busca debruçar-se justamente sobre o processo de instauração poética
nas três séries de produções: XXXMEN; O Corpo do Fim do Mundo e Corpo-plasma:
percursos sobre o espaço, reconhecendo nelas, caminhos, regularidades,
associações simbólicas e conceituais entremeadas pela presença do corpo em suas
configurações pós-modernas. Tendo como base teórica e metodológica as
particularidades da pesquisa em arte, este trabalho tece seu escopo a partir dos
estudos de Rey (2002) sobre processo criativo, bem como, se utiliza de demais
autores que apresentam abordagens convergentes com os conceitos apresentados
em cada produção.

Palavras-chave: Processo criativo. Pós-modernismo. Corpo. Realidade.


Virtualidade.

Introdução

Diante da singularidade da arte contemporânea de extrapolar o belo, o


comum e os paradigmas sociais/culturais, as obras pós-modernas se instauram em
um ambiente de profunda complexidade, dado seu nível técnico e teórico. A arte
contemporânea, como salienta Rey (2002, p. 125), “[...] levanta a questão da
ausência de parâmetros rigidamente estabelecidos” e nesse aspecto, requisita ao
artista, ao seu processo, a responsabilidade de criar sua própria forma de fazê-la. O
artista contemporâneo, frente a esse campo aberto, de possibilidades de caminhos
tão diversificados, “[...] passa a constituir a arte como um campo facundo para a
pesquisa e a investigação” (REY, 2002, p. 125).
É a partir das singularidades metodológicas da pesquisa em arte, isto é, de
uma investigação que se constitui durante o fazer artístico, que se sustenta o
presente estudo. Vivências, reflexões subjetivas se imbricam ao conhecimento
teórico, científico e filosófico na construção consciente, investigativa do próprio
processo criativo. Das correspondências, semelhanças que são evocadas, que se

214
instaura esse estudo sobre a construção poética das séries XXXMEN (2015),O
Corpo do Fim do Mundo (2017) e Corpo-plasma:percursos sobre o espaço (2017).
Analisando a posterior a construção dessas minhas obras, tornou-se evidente as
relações estabelecidas por elas, na construção de uma poética direcionada ao
corpo, a imagem do corpo, ao corpo virtualizado, representações que remetam as
minhas experiências cotidianas, as minhas bagagens e memórias subjetivas.
Tratam-se, pois, de obras, como veremos a seguir, que possuem em seu núcleo,
essa materialização que discursiviza o sujeito comum pós-moderno, apontando
questões que se relacionam com a identidade, consumo, corpo, espaço, real e
virtual.

XXXMEN
Essa é uma série que se desdobrou em um número incontável de obras e
estudos experienciais, com técnicas, materialidades, dimensões diferentes,
perpassando o traçar da linha no papel branco, ao giz pastel, a pintura, a gravura, o
stencil, etc. O que mais me interessa aqui é a pulsão criadora que me proporcionou
o ato. Esse trabalho partiu de uma reflexão sobre a circulação da imagem do corpo
masculino nunas redes sociais virtuais. Trata-se de uma criação que se dá sobre a
visão de um Outro desconhecido, como a o autor da selfie. A minha visão já é pega
pelo recorte de mundo, tempo, espaço de um outro sujeito. Minhas obras vão
convocar a presença e a idealização de um número inimaginável de sujeitos Outros,
dissolvendo totalmente quaisquer vínculos com o contexto inicial de captura da
imagem pela câmera.
Ao me apropriar dessas imagens em circulação pela internet, por meio da
qual, origem e destinatário estão apagados, imersos em um domínio coletivo, apaga-
se totalmente as condições de produções originais da imagem. Eu estou de frente a
uma imagem que me diz que existiu em algum espaço-tempo, um sujeito que se
fotografou com o seu órgão genital ereto, em frente a um espelho e apenas isso, o
sujeito perdeu sua identidade, sua subjetividade ao se tornar uma imagem abstrata
do mundo real.

215
Autores pós-modernos, afirmam que os sujeitos passaram a viver literalmente
sobre aparências, por meio de uma leitura de mundo fixada em representações
imagéticas. O sexo, por exemplo, passa a ser experenciado através de registros
moldados e mediado por uma tela. A possibilidade de fantasia do real, e a facilidade
da manipulação dos instrumentos técnicos de registro e circulação de imagens
fizeram os meios virtuais serem tomados por uma infinidade de registros do
cotidiano, um registro que busca o maior alcance de visualidade em seu meio. As
“tendências exibicionistas e performáticas alimentam a procura de um efeito: o
reconhecimento nos olhos alheios e, sobretudo, o cobiçado troféu de ser visto. Cada
vez mais, é preciso aparecer para ser” (SIBILIA, 2008, p. 112, grifo da autora; apud
OLIVEIRA, 2015, p. 91).
Essas, entre outras reflexões,construíram à série XXXMEN (2015). A escolha
do nome faz uma dupla referência à temática que permeou sua elaboração. O uso
dos três “Xs” tem relação com o termo de pesquisa na web muito comum para
acesso a pornografia, e “MEN” trata-se do meu primeiro sobrenome, em uma alusão
ao narcisismo, mas também ao termo em inglês para “homens”, recorte de minhas
representações.

O Corpo do Fim do Mundo

As referências sígnicas de O Copo do Fim do Mundo (2017), partilham em


muitos aspectos dos conceitos impulsionadores e criadores de XXXMEN, porém,
focam-se mais na representação do corpo, do que na leitura da imagem desse
corpo. São seis pinturas em acrílica aguada, que trazem a representação de um
corpo transmutado, antropozoomórfico, que toma para si os afetos dos filtros que se
espalham pelas redes sociais e mesclam a feição humana com de outros animais.
O corpo do fim do mundo é um corpo desejante, está subordinado a padrões,
estéticas e estereótipos e ele busca a todo instante alcançar essa imagem, A
imagem. Ao mesmo tempo é um corpo que não se deseja, justamente porque a
imagem que busca, vai sempre estar distante do corpo real. É um corpo reprodutivo
e reproduzido, apesar de se colocar egoicamente como o ínicio, como precursor de
um ideal e nesse processo torna-se vítima de si mesmo em sua humanização e

216
experiências reais. Trata-se de um corpo propriamente virtual, sem matéria, suas
configurações físicas só são possíveis na realidade virtual. É um corpo-(s)cem-corpo
que sobrevive de ideias.

Corpo-plasma: percursos sobre o espaço

É do corpo, a princípio enquanto organismo, e sua interação com as


materialidades urbanas, que se instaura minha pulsão criativa na elaboração dessa
série. A cidade é percebida pelo corpo em seu conjunto de condições sensíveis a
realidade, e por hipótese, toda essa experiência urbana se inscreve em diversos e
diferentes graus no corpo de quem a experiencia. São marcas cartográficas
instauradas no corpo e resultantes da experiência espaço-temporal. Tudo está
presente: objetos, outros sujeitos, naturezas, etc. e o conjunto de toda essa
ambiência, presentifica não apenas espaços/lugares físicos, mas todo um campo de
processos simbólicos instaurados pela própria ação dos sujeitos integrantes e
interativos daquele ambiente.
Para instauração artística dessa pulsão, tomei meu corpo como suporte para
essas marcas cartográficas. Dentro do contexto urbano de Maringá, me coloquei a
experimentar os espaços mais comuns (em grau coletivo) dos habitantes da cidade.
Partindo do princípio de que a imagem como potência experiencia e da ideia que
meu corpo é parte integrante de toda imagem, fiz registros fotográficos dessa minha
ação de estar no espaço. De caminhar e tomar consciência do meu corpo no
espaço. Apenas os registros, porém, não davam conta da potência artística que
pretendia.
O corpo que me prendia, ainda era o corpo orgânico. Estava trabalhando com
o registro desse corpo, sua virtualização por meio da técnica. Mas meu objetivo era
a construção de uma imagem/corpo onde o mais profundo se torna superfície, um
corpo simbólico tocado justamente pelos processos simbólicos dos espaços. Um
corpo que da visualidade a invisibilidade dessas presenças. Criei o que chamei
então, de corpo-plasma, uma vez que o plasma não possui forma ou volumes
definidos, a não ser quando contido em um recipiente, no caso, nosso corpo
material.

217
A primeira representação desse corpo se deu a partir da intervenção por meio
da colagem, em fotografia impressa. A presença do meu corpo no espaço foi
substituída e transformada apenas em forma (contida pelos limites de meu corpo
físico), mas isenta da visualidade real/objeto. Esse apagamento buscava justamente
dar visualidade as presenças invisuais ali contidas. A presença do olhar do
espectador também é significativa nesse momento, com as suas construções
simbólicas com aquele espaço real ou com a imagem/representação daquele
espaço. Por meio dessas lacunas deixadas a partir desse apagamento da
representação corpo/real, que eu visualizava uma construção poética possível para
pensar o simbólico advindo a superfície da materialidade.
Na segunda criação, busquei avanços na forma de construção técnica. Ir além
do que costumo me prender ou produzir em questão de linguagem. Desafiei-me a
trabalhar apenas com a imagem virtual. Produzir movimento a partir do registro que
congela. Criei uma imagem a partir de 30 outras imagens. Em disparo contínuo
registrei meu estar no espaço, sequencias que capturavam e congelavam cada ação
minha naquele ambiente. Editei cada uma das imagens, em movimento semelhante
a da primeira edição, porém agora a partir da manipulação digital. Com a soma de
todas essas imagens consegui criar uma imagem em movimento, o corpo-plasma
pode fluir e habitar o espaço em transformação, não-estático. Corpo e espaço são
móveis, se interseccionando, ramificando, coexistindo.

Considerações finais

Ao fim dessas considerações, que se pretendem mais manter a abertura e o


caráter polissêmico da obra de arte e sua leitura/análise, do que restringir-se em um
ponto específico, conseguimos visualizar poeticamente os entremeios estabelecidos
entre experiência e produção artística. A todo o momento, minhas vivências,
enquanto sujeito pós-moderno, são potencializadas ao resignificar o existir ordinário,
permeado pelas questões e conflitos da virtualidade, das relações sociais, das
construções subjetivas e identitárias, da fragmentação dos sujeitos. Faz-se
necessário estranhar nossa rotina, e a arte estabelece essa ponte, nos questionando
e trazendo respostas, fazendo nosso olhar se voltar para nós e para nosso entorno,

218
mas de um modo reflexivo, crítico ou ao menos distinto do que tínhamos
antes.Passar a olhar com olhos que estranham é algo urgente.

Referências
OLIVEIRA, Michel de. Reflexos de Narciso: traços do arquétipo mítico-psicanalítico
nos selfies. Ciberlegenda, Niterói, RJ, n. 32, p. 83-94, fev. 2015. Disponível em: <
http://www.uff.br/ciberlegenda/ojs/index.php/revista/article/view/766 >. Acesso em: 05
de ago. 2015.

OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. Petrópolis: Vozes,


2001.

REY, Sandra. Por uma abordagem metodológica da pesquisa em artes. In: BRITES,
Blanca; TESSLER, Elida (Org.). O meio como ponto zero: metodologia da pesquisa
em artes plásticas. Porto Alegre: UFRGS, 2002. p. 123-140.

219
QUEM FAZ PARTE DA SUA FAMÍLIA?: ESTÁGIO SUPERVISIONADO EM ARTES
VISUAIS I

Ana Carolina de Souza (UEM)


Larissa Monique Saldanha da Silva (UEM)
Eloiza Amália Bergo Sestito (UEM)
anaz.msouza@gmail.com

Resumo
O presente resumo trata sobre a experiência e as experimentações realizadas
durante a intervençõe desenvolvidas para a disciplina de Estágio Supervisionado em
Artes Visuais I, do curso de graduação de Artes Visuais, da Universidade Estadual
de Maringá - UEM. Tem como o objetivo relatar sobre uma das intervenções
aplicadas à turma do Infantil 4-A, no CMEI Recanto Menor Alvorada, localizado na
cidade de Maringá/PR. A partir da temática família, desenvolvemos uma atividade
com base na técnica de pintura rupestre, na qual propusemos para as crianças, que
realizassem suas produções representando os membros de suas famílias com as
particularidades da técnica. Por fim relatamos nossas experiências dos resultados
obtidos e destacamos a importância do estágio supervisionado para a formação
docente.

Palavras-chave:
Estágio supervisionado. Experimentações. Pintura rupestre. Gravura. Carimbos.

Introdução

Este resumo objetiva refletir sobre as pesquisas desenvolvidas na disciplina


de Estágio Supervisionado em Artes Visuais I, em particular sobre o estágio no
ensino formal (educação infantil 0 a 4 anos). Tratamos aqui, sobre a investigação da
realidade educacional no que se refere ao espaço escolar como microcosmo sócio-
cultural, considerando as especificidades da legislação que norteiam a disciplina e
relacionando teoria e prática educacional.
O espaço formal que experienciamos a prática docente em Artes Visuais,foi o
CMEI Recanto Menor Alvorada, localizado na Av. Dona Sophia Rasgulaeff, no
Jardim Alvorada, na cidade de Maringá – PR, que atende alunos de 2 a 5 anos de
idade. Onde foram feitas observações em sala, execução do planejamento de aula e
intervenção, conforme previsto em documento do regulamento de estágio
supervisionado.

220
Desenvolvimento

Em nossas observações do estágio, percebemos que os momentos dispostos


para as crianças praticarem experimentações artísticas, eram muitas vezes
pensados somente na praticidade da atividade e não nos resultados de aprendizado
que essas crianças teriam em arte. Os alunos recebiam desenhos prontos para
pintarem ou preencherem com recortes de papel e E.V.A; ainda, na maioria das
vezes apresentando figuras estereotipadas. Moreira (2008) critica amplamente o
atual sistema de ensino brasileiro, onde o ensino da Arte é inferiorizado e
negligenciado, listando vários fatores que provam esses fatos. A autora destaca a
necessidade de se redescobrir o desenho nos adultos, principalmente nos
professores da educação infantil, com o intuito de mudar a educação escolar.
A partir disso nos propusemos a proporcionar experiências que os alunos
pudessem experimentar novas práticas artísticas que saíssem da rotina de colorir
desenhos prontos e colar papéis como forma de preenchimento, além de promover
reflexões a conversas sobre o conteúdo apresentado. Oliveira e Lampert (2010)
salientam a importância da Arte como meio de construção da identidade do
indivíduo:

A Arte, enquanto disciplina, precisa ser pensada, exercitada/ desenvolvida


no seu âmbito mais amplo, como um processo sócio- -histórico. Precisa ser
trabalhada de forma que atue na construção da identidade do indivíduo, de
maneira que provoque reflexões intensas e constantes. Isso tem um
significado muito mais abrangente do que possa parecer. Denota repensar
conceitualmente a Arte, mas não só na educação, na vida de cada um de
nós, seres humanos e implicados nesse processo docente. (LAMPERT,
2010, p. 87)

A partir desta necessidade, inicialmente estudada durante a nossa graduação


de licenciatura em Artes Visuais, presenciamos no campo de estágio as reais
dificuldades de trabalhar com o ensino de arte na educação infantil.
Nosso ponto de partida se deu a partir de um tema pré-estabelecido pela
Secretaria de Educação do Município, esta, organiza os conteúdos de toda rede
infantil anualmente, sendo assim, em cada bimestre há um tema a ser trabalhado.

221
Durante nossa presença na escola, o tema abordado era “Família”, durante todas as
atividades propostas o tema norteador foi este. Ao desenvolvermos nosso plano de
trabalho docente, necessitamos buscar um meio de trabalhar a relação da Arte e a
temática proposta no bimestre.
Holm (2007) apresenta em seu livro “Baby-Art: os primeiros passos com a
arte”, teorias e práticas do ensino para alunos/crianças de 0 a 5 anos de idade. Nos
fundamentamos em uma prática apresentada neste material chamada “Pintura de
Cavernas Arte Rupestre”; ao pensar nesta prática, buscamos na história da arte a
relação que poderia ser estabelecida, a partir de elementos de uma possível família
representada. Encontramos imagens de pinturas rupestres que mostravam grupos
de pessoas em atividades cotidianas, desse modo pode-se fazer a relação entre a
figuração de família na história da arte pré-histórica com o conteúdo solicitado.
Organizamos nossa proposta para ser trabalhada conforme a abordagem
triangular proposta por Ana Mae Barbosa (1998), apresentamos inicialmente
imagens de pinturas rupestres para os alunos, de forma a propiciar a leitura e
contextualização deste material visual. Expomos imagens de pinturas de grupos e
falamos da possibilidade de serem representações dos grupos familiares daqueles
povos. Em seguida explicamos o que eram as pinturas rupestres, dizendo que não
eram feitas com pincéis ou outros materiais parecidos, e sim com as mãos.
Após esta explicação e contextualização, apresentamos a proposta para os
alunos, eles teriam que pintar as suas famílias, assim como os povos pré-históricos.
Para isso disponibilizamos um papel kraft de 3m de comprimento, que foi amassado
a fim de obter textura de rocha e ser depois colado na parede. Disponibilizamos
também tinta vermelha para os alunos pintarem utilizando as mãos, e carvão, por ser
um material incomum no cotidiano escolar, que possui efeito muito semelhante aos
materiais que os povos pré-históricos utilizavam para as pinturas.
Por fim conversamos com os alunos sobre a produção feita por eles,
questionando se eles gostaram, como foi, quem eles pintaram, de forma a avaliar a
compreensão dos alunos sobre o tema (pintura rupestre).
Acreditamos que a proposta teve um resultado positivo, pois obtivemos
retorno dos alunos ao demonstraram bastante interesse quanto as imagens

222
apresentadas, ao questionarem as pinturas, ao falarem sobre a técnica que os povos
pré-históricos utilizavam e ao proporem significações para as figuras presentes nas
pinturas rupestres apresentadas. Quanto a produção das pinturas na “nossa
caverna”, houve grande interesse das crianças, pois foi uma atividade diferente do
que elas costumavam trabalhar (por exemplo utilizarem as mãos para pintar), o que
se tornou motivo de as crianças pedirem para pintar por mais tempo, utilizando a
tinta que foi disponibilizada em potinhos até acabar.
Nossa experiência de regência em arte, para a educação infantil nos trouxe
vários conhecimentos que foram muito importantes, sendo a primeira vez que
estivemos como professoras em uma sala de aula, ao pensar nosso processo
docente, pesquisamos, preparamos materiais didáticos, buscamos materiais visuais,
com o objetivo de organizar o material de forma que ele funcionasse com a turma.
Na prática observamos que os caminhos podem se desdobrar a partir de pequenas
interferências, modificando nossos planejamentos na medida em que as aulas
acontecem.

Considerações finais

A experiência vivida na disciplina de Estágio Supervisionado I, difere-se muito


da realidade apresentada e estudada durante nossas aulas de graduação. Quando
entramos em sala para observação estamos com a ideia rígida de que tudo que foi
visto pode ser aplicado e que funcionará de maneira bem simples com os alunos e
também professores/educadores, não levamos em conta a situação da instituição ou
a realidade vivenciada por cada membro constituinte, e claro, os próprios alunos.
O que gostaríamos de ressaltar é exatamente o entendimento que tivemos
sobre o funcionamento do ensino em uma instituição, e assim, poder estabelecer
conexões, nos apropriar da vivência das pessoas que formam esse meio de
educação para então estabelecer caminhos que se cruzem com os aprendidos
dentro de uma sala do curso de graduação superior.
Salientamos que a disciplina teve grande importância para nossa formação
como arte educadoras, pois ao nos depararmos com a realidade acima citada,
aprendemos que devemos sempre analisar os possíveis acontecimentos e caminhos

223
para se conduzir o desenvolvimento de uma aula.
Pensando em foco no ensino infantil, momento de grande importância para o
desenvolvimento humano, devemos nos apropriar das experiências até aqui
conquistadas, para no futuro, trabalharmos de forma diferente do que observamos
durante este estágio, de forma a promover cada vez mais o aprendizado destas
crianças, para que nos anos seguintes de sua educação, possam continuar a
desenvolver seus conhecimentos, em especial a criatividade e o saber artístico.

Referências

BARBOSA, Ana Mae. Tópicos Utópicos. Belo Horizonte: C/Arte, 1998.


HOLM, A. M. Baby - Art: os primeiros passos com a arte. São Paulo: Museu de Arte
Moderna de São Paulo, 2007.

MOREIRA, Ana Angélica Albana. O espaço do desenho: a educação dos educadores. São
Paulo: Edição Loyola, 2008.
OLIVEIRA, Marilda Oliveira de; LAMPERT, Jocieli. Artes Visuais e o Campo de
Estágio Curricular. Revista Nupeart, v. 8, p. 79-93, 2010.

224
REAL E IRREAL: UMA RELAÇÃO ENTRE ÉTICA E ESTÉTICA EM
SARTRE
Lucas Rodrigues da Fonseca Lopes (Universidade Estadual de Maringá)
Prof. Dr. Cristiano Perius (Universidade Estadual de Maringá)
lucas_rodrigues_lopess@yahoo.com.br

Resumo
Jean-Paul Sartre em sua obra O Imaginário (1940) apresenta a ideia de que o objeto
estético da obra de arte é irreal, estando para além do que é revelado pela
percepção. Na qual apenas a consciência imaginante através de um ato de
nadificação da realidade permite a apreensão do objeto estético. Entretanto, diante
dessas condições colocadas por Sartre referente à apreensão obra de arte, como
podemos pensar uma relação entre ética e estética? Visto que, a moral do homem
implica em um ser-no-mundo, e a estética um recuo desse mundo. Uma das formas
de estabelecermos essa relação é por meio de um estudo da consciência perceptiva
e da consciência imaginante. Logo, partindo da construção do objeto estético
buscamos apresentar a relação entre esses modos de consciências e
consequentemente à relação entre ética e estética, real e irreal.

Palavras-chave: Estética. Ética. Sartre. Analogon. Irreal.

Introdução

De acordo com Sartre, quando nos deparamos com uma obra de arte, um quadro,
por exemplo, se olharmos este quadro apenas pela percepção não conseguimos
apreender o seu objeto estético. Pois o que é revelado pela percepção é somente a
materialidade da obra, no caso, a tela e as tintas. Isso acontece porque segundo o
autor, a obra de arte tem seu estatuto ontológico dado como irreal (SARTRE, 1996, p.
245). Consequentemente ela não é captada pela percepção, mas sim pela
imaginação na qual realiza um recuo da realidade, um ato de nadificação que coloca
tudo aquilo que não é intencionado pela consciência em um plano de não-ser. E que
por meio de um analogon torna visível o objeto estético. Por conseguinte, para
pensarmos uma relação entre ética e estética devemos que compreender primeiro
como ocorre o processo de apreensão do objeto estético, como a consciência se
posiciona perante tal para compreendermos a sua relação e o engajamento da arte.

225
Desenvolvimento

Para Sartre, a imagem é uma relação da consciência com o objeto, é o modo


como os objetos aparecerem à consciência ou um modo como a consciência
apreende um objeto (SARTRE, 1996, p. 19), dado que, consciência é sempre
consciência de algo. Assim, ao posicionar uma imagem, é a consciência que se
organiza como imaginante, e ao perceber, a consciência agora se organiza como
percipiente (ALVES, 2015, p. 486).
Quando se posiciona um objeto na percepção, sua concepção se realiza de
forma mais lenta, sendo preciso que seja de diversas formas, o objeto aparece como
uma série de projeções, no qual, cada vez que se dirige a ele, um de seus lados
acaba sendo invisível. Só se conhece um cubo, por exemplo, a partir do momento
em que são aprendidas suas seis faces. Diferentemente de quando se pensa em
algum objeto através de um conceito. Pensar em um cubo através de seu conceito é
pensar nos seus seis lados e oito ângulos ao mesmo tempo. Pensa-se em algo e ele
já se apresenta como uma totalidade. Num ato de consciência posso restabelecer
aparências, porém, sem nenhuma aprendizagem. Enquanto que, na percepção o
saber é construído lentamente, na imagem o saber é imediato. Se na percepção
ocorre um conhecimento a cada revelação de suas projeções, na imagem encontra-
se apenas aquilo que se colocou (SARTRE, 1996, p. 21).
Constituir a consciência como imagem é constituí-la como uma consciência
imaginante. E diferentemente da consciência perceptiva que coloca seu objeto como
existente, a consciência imaginante coloca seu objeto em um ato de crença
posicional que pode ser inexistente, ausente, existente em outra parte ou neutro
(Idem, p. 26). Estes atos posicionais são constitutivos da imagem como aponta
Sartre: “A imagem deve conter em sua própria estrutura uma tese nadificadora.
Constitui-se como imagem designando seu objeto como existente em outro lugar ou
não existente.” (SARTRE, 2005, p. 69). O autor nos possibilita a entender que, a
estrutura fundamental da imagem é uma negatividade. Pois, a imagem é dada por
uma existência irreal, uma ausência, e essa possibilidade de colocar um objeto como

226
irreal é sustentado pelo modo do Para-si, sendo uma negação realizada pela
consciência, processo chamado de nadificação. Sartre usa um exemplo na qual
busca encontrar seu amigo Pedro num bar. Quando ele entra no bar em busca de
Pedro, o bar, as cadeiras, as mesas e as pessoas que estão lá, todos estes
elementos formam uma totalidade num plano de fundo, na qual não estão
intencionadas pela consciência. Eles são colocados em um segundo plano. Isto
acontece porque a consciência tem como objeto intencionado Pedro (Idem, p. 50).
Compreender este caráter negativo da imaginação nos possibilita entender para
além das imagens, mas também a natureza do objeto estético.
Deste modo, conhecendo algumas das características da imagem e da
consciência imaginante é necessário verificar como que a imagem se realiza, neste
ponto temos acesso ao conceito de analogon, conceito que possibilita o surgimento
da figura estética. Quando realizamos um esforço para produzirmos a consciência
imaginante de algo, como tentar reproduzir mentalmente o rosto de alguém, o
objetivo é alcançado de um modo imperfeito, faltando detalhes, tornando vaga a
imagem. Entretanto, ao observarmos uma fotografia dessa mesma pessoa, é
possível ver todos os detalhes de seu rosto. Em todos estes casos citados
encontrarmos uma “intenção” que visa um mesmo objeto, sendo que este objeto não
é nem a representação, nem a foto, mas um objeto estético. Nas palavras de Sartre:
É no terreno da percepção que eu quero fazer aparecer o rosto de Pierre, que quero ‘torná-
lo’ presente. E, como não posso fazer surgir sua percepção diretamente, sirvo-me de uma
certa matéria que serve como analogon, como um equivalente da percepção (SARTRE,
1996, p. 34).
O analogon é o suporte material equivalente da percepção, uma vez que
esses objetos das imagens não podem surgir da percepção diretamente. Através do
analogon a consciência imaginante ultrapassa o que é visto, ultrapassando o real,
colocando ele em um plano de não-ser por meio da nadificação e abstraindo a sua
imagem. O analogon atua como um suporte que vai para além da percepção
atingindo o que é irreal.
Assim, a obra de arte também está para além daquilo que podemos perceber,
ela possui um sentido que não é captado pela percepção, mas sim pela imaginação.

227
O objeto estético só é apreendido quando se tem um distanciamento do real. “O
objeto estético é por natureza não perceptível, irreal; ele não é o suporte, mas aquilo
que é representado. Por exemplo, uma pintura não será apreciada pela tela, mas,
unicamente pelo objeto que representa.” (DUDOGNON, 2014, p. 07). Eu não julgo o
quadro pela moldura. O objeto estético somente é produzido através de uma
atuação imaginante, no qual se realiza uma passagem da realidade para irrealidade,
sendo que o objeto estético seja ele qual for ele não se oferece apenas pela
percepção, mas sim pela imaginação.
O imaginário realiza uma negação do real, no entanto essa negação não
exclui aquilo que é negado. A nadificação coloca aquilo que não é intencionado
como um pano de fundo. E através disto que podemos compreender a relação entre
estética e ética. Recuperando o exemplo da fotografia e seu analogon, mas agora
em outra perspectiva, conseguimos observar essa ação de preservação da
nadificação. Quando olhamos uma foto não para observar suas qualidades, mas
para lembrarmo-nos de algo ou alguém, negamos esta fotografia e a ultrapassamos
para atingirmos nosso objetivo (SOUZA, 2010, p. 92). Porém o que não deve deixar
de ser notado é que apesar desse movimento de negação, ainda conservamos a
fotografia como analogon, ela permite que o conteúdo ausente pelo qual a minha
intenção dirige se manifeste. Contudo, não olhamos a foto apenas uma vez,
retornamos a ela diversas vezes para lembrarmos seja de outros aspectos ou
situações. A fotografia serviu como um analogon para a imaginação, que se voltou
para uma construção irreal, mas que precisou voltar constantemente à realidade
para se enriquecer, dado que uma imagem mental nada ensina (SARTRE, 1996, p.
21). Se afirmarmos que a arte é uma negação do real, ela só e possível enquanto
mantém o real como pano de fundo, pois toda negação é negação de algo.
Entretanto, esta estética do “irreal” de Sartre não coloca o homem em um
estado de pura alienação desprendido totalmente do real. Uma vez que a realidade
atua como um analogon que precisa ser sempre redescoberto para que a construção
irreal obtenha cada vez mais detalhes. Portanto, a arte não gera um abandono total
do mundo real, o que ela faz é uma negação da realidade construindo uma
“irrealidade”, e possibilitando uma manutenção e um olhar atento para o que

228
negamos (SOUZA, 2010, p. 92). Se a arte se afasta da realidade, é para realizar
uma melhor compreensão daquilo que vivemos.
Segue-se que, a relação entre ética e estética é de interdependência (Idem, p.
94). Uma consciência completa a outra. “Todo imaginário aparece “sobre o fundo do
mundo”, mas, reciprocamente, toda apreensão do real como mundo implica uma
ultrapassagem velada em direção ao imaginário” (SARTRE, 1996, p. 245).

Considerações finais

Logo, o imaginário realiza um afastamento do real, mas é um afastamento


que implica numa volta para o mundo real, que consequentemente carrega consigo
uma crítica e uma compreensão melhor deste mundo. O engajamento da arte não
esta relacionado estritamente com a política, ele não implica uma submissão da arte
perante a moral. O que acontece é que um se liga com o outro, e um complementa o
outro, mas não se confundem. Assim, conseguimos compreender melhor o que
Sartre diz na conclusão do O Imaginário: “Essas observações nos levam a concluir
que o real nunca é belo. A beleza é um valor que só poderia ser aplicado ao
imaginário e que comporta a nadificação do mundo em sua estrutura essencial. Dai
a estupidez em confundir moral e estética” (SARTRE, 1996, p. 251). A obra de arte
tem seu caráter ético, e isso acontece devido ao seu movimento de nadificação,
negação mundo, permitindo uma melhor compreensão da realidade humana. Porém,
estética e ética são duas coisas que não se dão ao mesmo tempo e não devem ser
confundidas, mas também não podem ser pensadas sem estar em relação uma com
a outra.

Referências

ALVES, Igor Silva. Consciência Imaginante e analogon: O lugar do objeto estético na


obra de Sartre. Sapere Aude, v. 6 – n. 12, p. 484-497, Jul./Dez. 2015.

DUDOGNON, Aurélia, O Imaginário ou a nadificação do mundo por Jean-Paul


Sartre. Perfomatus Ano 2, Nº 8, Jan 2014. Tradução: Jaqueline Siano.

229
SARTRE, Jean-Paul. O Imaginário - Psicologia fenomenológica da imaginação.
Editora Ática, 1996.

SARTRE, Jean-Paul. O Ser e o Nada – Ensaio de Ontologia Fenomenológica.


Editora Vozes, Petrópolis. 5ª Edição, 1997.

SOUZA, Thana Mara. Ética e estética no pensamento de Sartre. Estudos


Filosóficos nº 4. p. 84-96, 2010.

230
RECORTES E IMPRESSÕES: MATERIAIS DIDÁTICOS NO ENSINO INFANTIL

Yan Kimura (Universidade Estadual de Maringá/UEM)


Gregório Balielo (Universidade Estadual de Maringá/UEM)
Eloiza Amália BergoSestito (Universidade Estadual de Maringá/UEM)
yankimura@hotmail.com

Resumo
Este trabalho apresenta algumas impressões alcançadas pela nossa dupla durante o
Estágio Curricular Supervisionado I, obrigatório na graduação em Artes Visuais da
Universidade Estadual de Maringá, sendo resultante das observações e
intervenções feitas em duas instituições do município de Maringá: no Centro
Municipal de Educação Infantil Recanto do Menor (CMEI do Jd. Alvorada) e na
Creche Pertinho da Mamãe (UEM), pertencente à universidade onde está localizada.
Sendo a prática em espaços formais e não-formais um critério para a conclusão do
estágio, este trabalho constitui um conjunto de observações feitas em instituições
dos dois tipos, uma formal e a outra não-formal.

Palavras-chave:
Estágio supervisionado. Ensino Infantil. Recurso Didático.

Introdução
Conforme o Regulamento do Estágio Supervisionado, a carga horária dos
componentes do Estágio Curricular Supervisionado I é de 136 horas/aula
(totalizando o número de 544 h/a nos Estágios Curriculares Supervisionados I, II, III
e IV juntos), e a atuação pedagógica do estágio em Artes Visuais, realizada nas
intervenções planejadas para o ambiente escolar (Educação Infantil), é de, no
mínimo, 34 horas/aula. As observações do estágio feitas nas instituições foram
realizadas em dupla, e contamos com a orientação da professora Doutora Eloiza
Amália BergoSestito, que supervisionou todo o processo de planejamento e
execução das intervenções, assim como das professoras e servidores envolvidos
nas atividades em ambas as instituições, que também contribuíram na formulação e
na realização de nossas intervenções.
Debruçados nos textos de Ana Mae Barbosa (2008) e Maria Helena Wagner
Rossi (1999; 2010), e em suas considerações sobre as possíveis formas do ensino
de arte, conduzimos nossas observações em sala de aula e análises do estágio nas

231
instituições, nos baseando nos conceitos abordados pelas autoras, principalmente
sobre o uso da imagem no ensino de arte, que serão mencionados neste resumo.

Primeiras observações
Sendo a primeira experiência em Estágio de alguns de nossa turma do curso,
essas observações também foram as nossas primeiras enquanto professores
atuantes em sala de aula. Em cada instituição, pudemos vivenciar uma experiência
única, em que compreendemos que cada instituição é única, pois são regidas por
profissionais únicos, e preenchidas com a convivência de crianças únicas.
Pudemos observar na rotina de cada instituição, como a convivência em cada
lugar reflete seus recursos e a forma como recebem seus amparos. As condições de
estrutura do local, a quantidade de professoras e servidores contratados, a
disponibilidade de materiais e recursos didáticos, até mesmo nos alimentos
ofertados nas refeições servidas às crianças pudemos ver como é diferente o
investimento em cada instituição.
As particularidades de cada instituição também precisaram ser levadas em
conta nos planejamentos da dupla, uma vez que cada lugar propiciou possibilidades
diferentes em nossas ações. Como exemplo, citamos o uso de pedaços de esponjas
rasgadas como pincéis no Estágio Supervisionado I em Espaço Formal, usados na
confecção de um cartaz com a temática “família”, trabalhado pela professora com os
alunos. Embora tenha sido uma atividade reprodutivista de cópia da obra de Tarsila
do Amaral (1925), o uso das esponjas foram uma novidade na prática como técnica
de pintura, e também conseguimos aproveitar em seu desenvolvimento a
abordagem de outros conhecimentos, como a mistura das tintas guaches disponíveis
para atingirem novas cores, o manuseio de outros materiais da confecção, e o
próprio compartilhamento desses materiais entre os integrantes das turmas.
Um outro exemplo que citamos é da atividade de intervenção do Estágio
Supervisionado I em Espaço Não-Formal, em que a disponibilidade de alguns
materiais específicos, como rolinhos de tinta e um furadores de papel, facilitaram as
ações das intervenções, além do uso de materiais orgânicos acessíveis no pátio e

232
arredores da creche, como as folhas de várias espécies de árvores, usadas como
matrizes nas impressões em folhas sulfites, que foram usadas na confecção de uma
catálogo feito pelos alunos.
Figura 1: Registro de atividade de reprodução de realizado pela professora com alunos,
observado no Estágio Supervisionado I em Espaço Formal

Fonte: Acervo Pessoal, 2017.


Figura 2: Registros do procedimento de impressão com folhas, realizado durante a
regência do Estágio Supervisionado I em Espaço Não-fomal

Fonte: Acervo Pessoal, 2017.


Acreditamos que mesmo numa atividade de reprodução de imagem “todo
aluno deve ter a oportunidade de interpretar os símbolos da arte, pois a dimensão
estética é constitutiva do potencial humano.” (ROSSI, 2011, p. 9), e são durante
estes momentos que leitura de imagem pode ser realizada em forma de atividades
artísticas.

Recortes e Impressões

233
Partindo do princípio de que “não existe pensamento genuíno sem
imaginação” e “a imaginação é indissociável da atividade artística”(BARBOSA, 2008,
p. 30), pensamos em atividades que envolvessem didaticamente a imaginação, e
planejamos nossas intervenções com o uso dos recursos disponíveis.
Fizemos o uso do recorte e colagem de revistas na intervenção no Espaço
Formal principalmente pela facilidade de obtenção do material e da praticidade de
seu uso. A disponibilidade de revistas, material abundante para esse tipo de
atividade, foi um “prato cheio” para a realização da intervenção com imagens,
principalmente pela presença de anúncios nas revistas, uma vez que “na publicidade
contemporânea, a imagem é presença obrigatória” (ROSSI, 2011, p. 9):

Figura 3: Recurso didático com recortes de revistasusado na intervenção no Estágio


Supervisionado I em Espaço Não-Formal

Fonte: Acervo Pessoal, 2017.


Em seu texto “A compreensão do desenvolvimento estético”, Rossi descreve
como os estudos de Abigail Housen (1983) estabeleceram a existência de cinco
tipos de leitores de imagem, conforme seu estágio de desenvolvimento estético:
narrativo (estágio I), construtivo (estágio II), classificativo (estágio III), interpretativo
(estágio IV) e recreativo (estágio V) (ROSSI, 1999, p. 25-35).
Alguns aspectos dessa classificação tornaram-se visíveis após as primeiras
experiências do estágio, com as primeiras interações com os alunos durante nossas

234
intervenções. O teor dos comentários e apontamentos feitos pelos alunos sobre o
conteúdo exposto em sala, apresentaram uma leitura egocêntrica em alguns
momentos, apresentando uma hierarquização dos elementos. Como por
exemplo,nas colocações feitas pelos alunos sobre as composições de rostos feitas
com colagens no Estágio Supervisionado em Espaço Formal.

Considerações finais

Apontamos que o investimento que cada instituição recebe, reflete


diretamente no amparo dos recursos disponíveis, na disponibilidade de materiais e
na estrutura de cada uma das instituições, consequentemente, atingindo a
disponibilidade de recursos para o Ensino de Artes. Durante nosso período nos
estágios, nos foi possível compreender e observar diretamente as diferenças entre
duas instituições de ensino infantis diferentes. Afinal, “aprende-se a palavra
visualizando” (BARBOSA, 2008, p. 28), e as experiências do nosso Estágio nas duas
instituições foram assim.
A diferença de investimentos que a Creche Pertinho da Mamãe da UEM
apresenta em relação ao CMEI Recanto do Menor Alvorada, mostrou que a
quantidade de crianças matriculadas (consideravelmente maior no CMEI), contribuiu
com uma dinâmica completamente diferente em cada instituição. Enquanto na
creche temos 12 alunos para três professoras, no CMEI temos uma média de 25
alunos para uma única professora. Mas esse fator não demonstrou ser uma
desvantagem nas ações em cada instituição, uma vez que no quesito de formação
dos profissionais, os servidores do CMEI são concursados e possuem ensino
superior. A creche da UEM conta com educadoras com anos de experiência, porém
não possuem ensino superior, e não possuem uma pedagoga na instituição, por
conta de falta de financiamento do estado.

235
Referências

BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da arte: anos oitenta e novos tempos.
São Paulo: Perspectiva, 2008. p. 27-43.

ROSSI, Maria Helena Wagner. A compreensão do desenvolvimento estético. In:


PILLAR, Analice Dutra. A educação do olhar no ensino das artes. Porto Alegre:
Mediação, 1999. p. 25-35.

______, Imagens que falam: leitura da arte na escola. 5 ed. Porto Alegre:
Mediação, 2011.

236
RELAÇÕES (TRANS)FORMATIVAS ENTRE OBRA, ESPAÇO E
INSTITUIÇÃO
Lucas Men Benatti (UEM)
Karina Aiko Nakata(UEM)
Milena Beatriz da Silva (UEM)
Gustavo Barrionuevo (UEM)
Odonias Santos de Souza Junior (UEM)
lucas-benatti@outlook.com

Resumo
O presente resumo é resultado de investigações materiais e conceituais referentes
as obras de arte e seus espaços de fruição dentro de instituições especializadas.
Este trabalho parte do tema relações (trans)formativas entre obra, espaço e
instituição tendo como alicerce três bases de desenvolvimento teórico: Em obra e
espaço apresentamos o pensamento de O’Doherty (2002), no que diz respeito a
relação da produção artística com seus espaços expositivos e de fruição;
eminstituição: MoMAtrazemos informações históricas e organizacionais a respeito do
Museu de Arte Moderna de Nova Iorque; para então, em posse desses saberes,
estruturarmos uma síntese em obra, espaço e instituição visando a compreensão
dessa relação obra-espaço proposta por O’Doherty em um museu de arte moderna.

Palavras-chave: Obra de arte. Espaços expositivos. Instituições artísticas

Introdução

Este trabalho parte do tema relações (trans)formativas entre obra, espaço e


instituição tendo como alicerce três bases de desenvolvimento teórico, aqui
compreendidas em subseções que confluem para uma síntese conclusiva de nossa
proposta de estudo. Em obra e espaço apresentamos o pensamento de O’Doherty
(2002), no que diz respeito a relação da produção artística com seus espaços
expositivos e de fruição. O autor nos auxilia compreender a fantasia do real
proporcionada pela tendência da perspectiva clássica renascentista, corroborada
pela moldura e pelos meios de exposição dessas obras. Apesar do rompimento
vanguardista com essa tendência, de expansão da pintura para além da moldura e
dos cavaletes, os espaços expositivos ainda são carregados de um simbolismo
asséptico que isola a obra de seu espaço e de seu fruidor.

237
Em instituição: MoMA apresentamos informações históricas e organizacionais
a respeito do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, recorte investigativo nessa
pesquisa. Em posse desses saberes, estruturamos uma síntese em obra, espaço e
instituição visando a compreensão dessa relação obra-espaço proposta por
O’Doherty em um museu de arte moderna.

Obra e espaço

Os estudos de O’Doherty (2002) nos auxiliam a pensar, dentro de nossos


objetivos, as relações entre a produção artística e seus espaços expositivos e de
fruição. Como salienta o autor, desde que a noção de instituição artística se
materializou na história humana, parece haver um certo distanciamento da produção
artística em relação aos sujeitos no tempo histórico-social. Uma realidade que viria a
se alterar apenas com a produção vanguardista e a crítica a tradição e seu caráter
excludente, movendo os eixos da verticalidade que caracterizava a relação distante
obra-espectador, para a horizontalidade.
Porém, como demonstra O’Doherty (2002), esses velhos paradigmas apenas
foram substituídos por novos, que mantem a mesma raiz estrutural vertical da
fantasia da obra e da exclusão. A galeria e também por extensão o espaço de
exposição do museu na modernidade, se apresentarão como espaços
transcendentais, onde a realidade exterior parece não habitar. O espaço expositivo
toma a frente da produção artística. É isolado, asséptico, nulo, branco ideal que
busca todos os meios para afirmar seus objetos como arte. A obra é distanciada de
tudo que pode prejudicar sua apreciação, habitando uma aura espiritual sobre os
espaços de galerias. Como sublinha o autor, as paredes são pintadas de branco,
luzes cobrem o teto, o piso é polido, quase não há a presença de mobílias, “[...] o
recinto é consagrado à tecnologia da estética. Montam-se, penduram-se, espalham-
se obras de arte para estudo. Suas superfícies imaculadas são intocadas pelo tempo
[...]” (O’DOHERTY, 2002, p. 4).
O despontamento da ruptura com a moldura, enquanto instrumento de
afirmação da fantasia da pintura de perspectiva, terá início apenas com o advento
vanguardista de alguns artistas, como Monet e Matisse, que rompem com a

238
composição formal das obras. Porém, como salienta O’Doherty (2002), ainda que as
pinturas tenham sido radicais, o modo como eram dispostas (penduradas e
emolduradas) geralmente conservavam as caraterísticas tradicionais anteriores.
O mesmo conservadorismo expositivo é apontado pelo autor nas pinturas do
fim do modernismo (Color Field), que continuaram como pinturas de Salões,
exigindo espaços amplos na parede de galerias e grandes colecionadores para
mover o mercado.
O’Doherty notabiliza, que partir dos anos de 1950 e 1960, com o
desdobramento da produção de Matisse, Miró e alguns abstracionistas, a existência
da codificação de uma nova configuração expositiva. Questiona-se: quanto espaço
deve ter uma obra de arte para respirar? O que deve se aproximar? O que deve se
retrair? Toda essa movimentação, como salienta o autor, vai transformar a parede
em uma zona nem um pouco neutra. Ela agora é participante da obra, não é mais
apenas um suporte passivo, passando a ser pensada em sua relação com a obra.

Instituição: MoMA

Fundado em 1929, a princípio como uma instituição educacional, o Museu de


Arte Moderna de Nova Iorque, dedica-se atualmente a preservação e fomento à
produção artística moderna e contemporânea. No fim dos anos de 1920, Abby
Aldrich Rockefeller e as duas amigas Lillie P. Bliss e Mary Quinn Sullivan
perceberam a necessidade de desafiar as políticas conservadoras dos museus
tradicionais, criando uma instituição exclusivamente voltada a arte moderna. Alfred
H. Barr Jr., diretor fundador do museu, pensava a criação de uma instituição que se
dedicasse a ajudar as pessoas a compreender e apreciar as artes visuais do nosso
tempo. A resposta entusiasmada do público, favoreceu ao desenvolvimento do
museu, que nos próximos dez anos, mudou-se três vezes, até em 1939, finalmente
abrir suas portas no edifício que ainda ocupa no centro de Manhattan.
Com o compromisso de ser o principal museu de arte moderna do mundo,
promove exposições e programas educacionais de importância ímpar, constituindo-
se como um centro de referência internacional a pesquisa no campo da arte

239
moderna. A coleção do Museu, constitui uma das mais variadas no seguimento
institucional voltado a arte moderna. De um acervo inicial de oito cópias e um
desenho, atualmente o Museu conta com um acervo de mais de 200 mil obras, entre
pinturas, esculturas, desenhos, gravuras, fotografias, mídias, modelos
arquitetônicos, filmes, objetos de design etc. Sua biblioteca concentra o mais rico
material de pesquisa sobre arte moderna do mundo e cada um dos departamentos
curatoriais mantem um centro de estudos disponíveis para estudantes e
pesquisadores.
Sua missão é promover a fruição e uma compressão cada vez mais profunda
sobre a arte moderna e contemporânea, em suas diversas frentes de atuação. Para
o Museu, as artes modernas e contemporâneas transcendem fronteiras nacionais,
envolvem todas as formas de expressão visual, tanto as já consolidadas no campo
artístico como a pintura, escultura, gravura, etc., quanto as novas formas que ainda
estão a ser desenvolvidas e compreendidas, enquanto reflexo e expressão próprias
de sua época. O compromisso do Museu com a arte contemporânea, reflete em seu
escopo, uma compreensão transformativa das tradições da arte, entendo que, para
se manter na vanguarda de seu campo, o MoMA precisa reavaliar constante sua
visão de atuação, incentivando a abertura a novas ideias, criando diálogos entre o já
estabelecido e o experimental, o passado e o presente, de modo, cada vez mais
acessível a todos os públicos.
O Museu também dedica-se ao papel de instituição de ensino, oferecendo
programas completos de atividades, tanto para artistas e pesquisadores da área,
quanto para o público em geral, buscando aproximar a comunidade com o mundo da
arte moderna e contemporânea. Além de palestras, cursos e simpósios, o museu
oferece atividades especiais para pais, professores, estudantes, crianças, contanto
com visitas orientadas bilíngues e para pessoas com necessidades especiais.

Obra, espaço e instituição

Bausbam (2012) atesta a inauguração do museu moderno de Nova Iorque


enquanto consolidação da ideia de um ‘cubo branco’ que pretendia atender às

240
demandas das transformações históricas. Dedicado num primeiro momento à
exposição de arte moderna europeia, o acervo do museu se viu concentrar na arte
do século XIX tardio e nas novas tradições artísticas ensaiadas pelo impulso
contemporâneo. Disposto a transcender os limites da arte nacional, o MoMA passou
a envolver formas de expressões visuais que incluem a pintura e escultura,
desenhos, impressões, livros ilustrados, fotografia, arquitetura e design, filme e
vídeo, além de formas novas que ainda estão para se desenvolver e compreender.
Já nesse processo de englobamento, confere-se o desejo da instituição para a
flexibilização do perfil de seu domínio. Basbaum (2012) argumenta que essa
especificidade do museu em responder a essas transformações diz respeito ao
entendimento do mesmo quanto às mudanças conceituais e discursivas informadas
pelas obras de arte que por sua vez, indicam as mudanças e os problemas
encarados pelo quadro geral da arte. Coincidindo com a aparência asséptica,
“neutra” e de justificações eretas da qual nos informa O’Doherty (2002), o espaço
interno do museu encontra garantias para a incorporação do heterogêneo. Vale
lembrar com Bulhões (1991), que essa incorporação desmedida também está
relacionada com as relações mercantilizadas e com o que autora define como
‘Sistema das Artes Plásticas’.
O’Doherty (2002) verifica que à medida em que o modernismo envelhece, o
contexto espacial do museu fez se tornar conteúdo. Dadas as vicissitudes, o
Espectador inclinou-se a mirar em primeira instância o espaço do museu para depois
o fazê-lo com as obras de arte. A despeito da atenção localizada dos artistas e suas
obras aos espaços, Basbaum (2012) retoma o conceito de ‘site specificity’ da
curadora coreana-americana Miwon Kwon que preconiza tratar a ação não só de
uma ligação física com o espaço, mas também discursiva, em que o local tem a
singularidade determinada a partir das narrativas e conceitos que dinamizam uma
intertextualidade. Basbaum (2012) argumenta que parte dessa flexibilização
apresentada tanto por parte das instituições e dos artistas tem a ver com a
linguagem do capitalismo avançado, ligeiro e fluxo em que os agentes anseiam por
ver o capital virtual materializado.

241
Referências

BASBAUM, Ricado. Perspectivas para o museu no século XXI. Periódico


Permanente, São Paulo, v. 1, n. 1, 2012.

BULHÕES, M. A. Considerações sobre o Sistema das Artes Plásticas. Porto Alegre,


Porto Alegre, v. 2, n. 3, 1991.

MOMA.The Museum of Modern Art history. Disponível em:


<https://www.moma.org/about/who-we-are/moma-history>. Acesso em: 08 out. 2017.

______.The Museum of Modern Art. Disponível em:


<https://www.moma.org/about/who-we-are/moma>. Acesso em: 08 out. 2017.

O’DOHERTY, Brian. No interior do cubo branco: a ideologia do espaço da arte.


Tradução de Carlos S. Mendes Rosa. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

242
RELATO DE EXPERIÊNCIA: DOIS ESTAGIÁRIOS NA EDUCAÇÃO
INFANTIL
Odonias Santos de Souza Junior (UEM)
Lucas Men Benatti (UEM)
odoniasjunior@gmail.com

Resumo
No campo do desenvolvimento de pesquisas durante o estágio, a qual se insere
essa pesquisa, uma das abordagens possíveis é a dos registros, dos escritos em
diários de aula. Trata-se de uma perspectiva que olha a narrativa enquanto
pesquisa, capaz de organizar a experiência por meio de pautas de reflexão e como
um meio possível de se desenvolver uma investigação científica. Este trabalho,
demonstra parte dos diários realizados pelos autores, enquanto estagiários de arte
na educação infantil, seguindo uma narrativa contínua a partir do trabalho direto com
a memória, o retorno mental da experiência, dessa forma, a própria vivência dos
pesquisadoresfoi utilizada para elucidar o contexto de atravessamento entre
realidade social e docência.

Palavras-chave: Diários de aula. Arte. Docência. Pesquisa.

Narrativas de experiência

De acordo com o Componente Curricular Estágio Supervisionado (UEM,


2010), o objetivo das disciplinas que envolvem o Estágio Curricular é capacitar os
acadêmicos/estagiários a exercerem, de forma reflexiva, a prática pedagógica-visual
nos diferentes campos de atuação, através da vivência nas escolas e demais
espaços que dialoguem com o conhecimento e ensino de arte.
Entretanto, nosso Componente Curricular, não especifica a área de atuação
nesta primeira etapa do estágio. Por esta razão, ficou decidido entre o
professor/orientador, acadêmicos, juntamente com o coordenador de estágio, por
desenvolvermos a disciplina de Estágio Supervisionado em Artes Visuais I com as
séries iniciais da Educação Básica, ou seja, com crianças da Educação Infantil. A
Educação Infantil atende crianças até os cincos anos de idade, e não é requerido o
trabalho com elas nas outras etapas do Estágio Curricular. Para nós, decidir por
desenvolver o Estágio com as séries iniciais da Educação Básica é uma ação de

243
grande ganho, visto que, nos oportuniza a vivência em todos os níveis da educação
escolar e também possibilita às crianças, um contato com a Arte e com as imagens
orientadas por professores e acadêmicos com/em formação na área.
Por meio do Estágio Supervisionado nós pudemos experienciar, mesmo que
por um breve período de tempo, a prática da docência em Arte. Identificamos no
Estágio um caráter potencialmente duplo, à medida que este contribuiu para o
desenvolvimento inicial da nossa identidade docente e também para nossa iniciação
a pesquisa. Para além disso, proporcionou-nos um desenvolvimento mesmo
enquanto seres humanos, através das relações interpessoais estabelecidas na
escola.
A prática do Estágio retira-nos da nossa zona de conforto, do nosso local
comum de estudantes de uma universidade, ao mesmo tempo em que, desafia-nos
a sermos capazes de articular todos os saberes conquistados durante a graduação e
nossas experiências pessoais com esse novo espaço de pesquisa e atuação que é
escola. Nossa pesquisa foi desenvolvida com a utilização dos registros em diários de
aula, abordados por Oliveira (2011) ao discorrer sobre a prática docente. Nosso
primeiro contato com a escola foi de estranhamento, tanto por conta de sua estrutura
– que se distancia da universidade – quanto, e principalmente, por conta da nossa
mudança de posição – de acadêmicos do curso de Licenciatura em Artes Visuais
para a de professores estagiários.
Logo nas primeiras observações tivemos a oportunidade de refletir sobre
como viria a ser a nossa postura enquanto docentes, relacionando também a
postura da professora da turma e nossas próprias experiências enquanto alunos da
educação básica. Relembrando a fala de Loponte (2007, p.236), pudemos constatar
que a prática docente constitui-se por erros, acertos, frustrações, dúvidas,
conquistas e sucessos. Nossa turma, um infantil 5, possuía 26 alunos/as
matriculados/as, entretanto, em nenhuma de nossas observações, e também em
nossas intervenções, conseguimos contemplar a presença de todas as crianças. De
modo geral, as crianças mostraram-se compreensivas e respeitosas para com a
figura da professora e, por conseguinte, da nossa figura enquanto professores
estagiários.

244
A primeira dificuldade observada diz respeito ao comportamento das crianças,
que se dispersam com muita facilidade – inclusive, durante as primeiras
observações, nossa presença foi o motivo de dispersão da atenção delas. A
dificuldade delas de manter a concentração em uma atividade de maior duração de
tempo é evidente. No caso do aluno portador de Síndrome de Down, a dificuldade de
concentração é ainda mais acentuada. Outra questão observada foi a falta de
destreza para a realização de algumas atividades manuais, como desenhar, recortar
e colar. Algumas inclusive mal sabem escrever o próprio nome, como é o caso de
uma menina que havia ingressado na escola há poucos meses. Ao falarmos desta
aluna que havia sido matriculada na escola há poucos meses, estando já com 5
anos, podemos mencionar a falta de participação por parte de
pais/mães/responsáveis na vida escolar das crianças. Logo na primeira visita, com a
fala da professora supervisora, e posteriormente com a fala das próprias crianças,
tivemos conhecimento de que muitos alunos e alunas são filhos/as de pais
divorciados e moram com tios e/ou avós. Inclusive para a realização da nossa
segunda intervenção, necessitaríamos da colaboração dos responsáveis para a
realização de uma atividade, que consistia na comparação do desenho da família
realizado pela criança, com uma fotografia enviada pelos responsáveis. Nós
entregamos para a professora 26 comunicados para os responsáveis, entretanto
apenas uma das crianças apresentou a fotografia.
Como nossos planos de aula foram desenvolvidos durante as observações,
no momento de execução dos mesmos algumas mudanças precisaram ser feitas.
Isso ocorreu, pois na última observação percebemos questões que não havíamos
constatado antes e que consequentemente não consideramos durante a elaboração
dos planos de aula. Retornando aos registros em diários de aula como metodologia
para pesquisa, essas alterações realizadas nos auxiliaram a refletir sobre nossa
intervenção e repensá-la a partir de diálogos em grupo com nossa turma e nosso
orientador. Todavia, os registros dão margem para outras pesquisas, como foco em
outras abordagens e também para o desenvolvimento de planos de aula mais
estruturados para esta faixa etária.

245
Uma questão que gerou-nos inquietações foi a respeito da ludicidade. Desde
a primeira observação em sala de aula, após a finalização da atividade proposta pela
professora, as auxiliares apresentavam-se as crianças com brinquedos diversos.
Assim como os demais elementos presentes na escola, os brinquedos também são
recursos pedagógicos, entretanto, da maneira pela qual eram apresentados e
distribuídos às crianças não pôde ser verificada nenhuma intencionalidade por parte
da professora ou das auxiliares. As crianças apenas brincavam livremente. Porém,
até mesmo nesse brincar livremente, podemos desenvolver pesquisas sobre o
comportamento das crianças, mais especificamente a respeito das representações
que estas fazem. Os meninos geralmente representavam super-heróis como
Homem-Aranha, Superman e Batman, associando os brinquedos também a armas
(como espada) ou carros e aviões. Já as meninas representavam-se como princesas
ou como mães, geralmente uma cuidando da outra (como mãe e filha) ou brincando
de maquiar. Essas representações materializaram-se nos desenhos solicitados por
nós como atividade do plano de aula.
Buscamos por meio da nossa experiência, contribuir para que as crianças
pudessem ter um contato maior com a Arte e mostra-las que elas também são
capazes de produzir arte se assim desejarem. Apresentar a artista Sofonisba
Anguissola e obras de arte de artistas como Frida Khalo e Henri Matisse de maneira
lúdica mostrou-se uma ação exitosa para nós e para as crianças também, pois como
apontam Jordão, Martini e Salomão (2007) as crianças interiorizam seu
conhecimento de mundo com mais facilidade através da ludicidade.
Por fim, concordando com a fala de Oliveira (2005), esta primeira experiência
positiva com a licenciatura foi fundamental para nós enquanto professores em
formação, concedendo-nos novos conhecimentos e experiências para prosseguir
nas próximas etapas do Estágio Supervisionado.

Referências

JORDÃO, A.P.M.; MARTINI, M.; SALOMÃO, H.A.S. A importância do lúdico na


educação infantil: enfocando a brincadeira e as situações de ensino não
direcionado. In. PSICOLOGIA.PT O PORTAL DOS PSICÓLOGOS. [S.I.]: 2007

246
LOPONTE, Luciana Gruppelli. Arte da docência em Arte: desafios contemporâneos.
In. OLIVEIRA, Marilda Oliveira de (org.). Arte, educação e cultura. Santa Maria, Ed.
UFSM, 2007. Pg. 231-249.

OLIVEIRA, Marilda Oliveira de. Por uma abordagem narrativa e autobiográfica: os


diários de aula como foco de investigação. In: MARTINS, Raimundo; TOURINHO,
Irene (orgs.). Educação da Cultura Visual: conceitos e contextos. Santa Maria,
Ed. UFSM, 2011. Pg. 175-190.

______. O estágio curricular como campo de conhecimento e suas especificidades.


In: OLIVEIRA, Marilda Oliveira de; HERNÁNDEZ, Fernando (orgs.). A formação do
professor e o ensino de Artes Visuais. Santa Maria, Ed. UFSM, 2005. p. 59-72.

UEM. Regulamento do componente estágio curricular supervisionado do curso de


Artes Visuais – licenciatura modalidade presencial. In. UEM. Resolução 061/2010-
CI/CCH – Aprova o projeto pedagógico do Curso de Graduação em Artes Visuais.
Maringá, 2010. Disponível em: < http://cch.uem.br/resolucoes_10/061_10.pdf >.
Acesso em: 04 mai 2016.

247
ENSAIOS VISUAIS

248
ALGUMAS MANEIRAS DE SER
Willyan Henrique Batosti da Silva (UEM)
willyanbatosti@gmail.com

Resumo
O presente trabalho intitulado de Algumas maneiras de ser tem como base a
natureza como norteadora de pesquisa em poética individual e seus
desdobramentos. Aqui, os galhos postos em linha horizontal, busca estabelecer
reflexões a partir do tempo, formas e relações entre sí oriundas das
representações naturais. O trabalho incentiva ir além do olhar. Segmenta sobre
as ramificações das relações entre corpo-matéria individual enquanto subjetivo
e identitário não excludente de uma coletividade que abrange uma diversidade.
Tendo como referência artistas como herman de vries 14, Henrique Oliveira,
Frans Krajcberg, Karl Blossfeldt, Giuseppe Penone, Kishio Suga, Shan Hur,
entre outros, a representação da obra também abrange a possibilidade de
pensar a natureza não como algo distante ou diferente de nós, humanos, mas
envoltos um ao outro. Pensar que desmatamentos, queimadas, e não ser
consciente sobre a preservação do meio ambiente, resulta em catástrofes
mundiais para todos nós. E isso pode ser observado na fragilidade dos galhos
caso tenha um ato de força, mas resistentes perantes a mudanças, espaços e
intervenções. A proposta surge também com a possibilidade de estruturar
diálogos em que os observadores possam se identificar e identificar os outros
ao seu redor. Reconhecerem os espaços ao qual que estão, são, e possam se
sentir como parte de um pertecimento, mas prudentes que sua ações os
afetam e nos afetam. Que as maneiras de ser possam expandir raízes.

Palavras-chave: Relações, Natureza, Singularidades.

14
O artista grafia seu nome em letras minúsculas.

249
Fotografia: willyan batosti
Titulo: Algumas maneiras de ser
Modalidade artística: objeto-arte
Fonte da imagem: acervo pessoal
Materiais: galhos, fita adesiva.
Ano: 2017

250
“AMA$ÔNIA”
Geovani Valarini Inhesta - UEM
Francieli Regina Garlet – UEM
Damaris Morgernstern Pacheco - UEM

geovani.valarini@hotmail.com

Resumo
O cronista, novelista e romancista Orlando Carneiro, me despertou
inquietações por meio de um trecho de seus escritos: “Amazônia, se depende
de ti o oxigênio do mundo, que as futuras gerações aprendam a respirar
oxigênio em lata” (CARNEIRO, 1945)15.
Esse escrito do autor somado a absurda notícia sobre a extinção de uma
reserva ambiental na Amazônia próxima ao Pará16, que foi autorizada pelo
atual presidente da República Federativa do Brasil, Michel Temer, para a
exploração de minérios no local, bem como das demais atrocidades ambientais
produzidas pela ação do homem ocorridas durante todo o século XX e XXI,
movimento algumas problematizações na obra denominada ‘Ama$ônia’, na
qual busco retratar essa violência cometida contra a natureza visando o
dinheiro. Tal agressão além de destruir nossa maior riqueza natural, produz
também impactos que podem afetar as gerações futuras e nos afetam no
presente. O alimento do homem se compra com dinheiro, mas se produz
como? Talvez o homem tenha se esquecido.

Palavras-chave: Arte Feminista. Violência. Natureza. Feminino. Poéticas


Dissidentes.

15
Disponível em: https://www.pensador.com/frase/MjQ3NTc/
16
Informações disponíveis em:
http://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2017/08/1912465-temer-extingue-reserva-na-
amazonia-para-ampliar-exploracao-mineral.shtml

251
Figura 1 – Geovani Valarini Inhesta, Ama$ônia, Pintura, dimensões 100X60 cm, 2017.
Fonte: acervo pessoal.

A obra acima, por trazer uma imagem feminina, também nos leva a
pensar sobre outra situação que tem nos preocupado em nosso cotidiano: o
grande número de assédios e casos de violência contra a mulher. A mão que
enforca a natureza-mulher, se mostra como as forças reativas da sociedade
contemporânea que buscam refrear, em suas ações cotidianas, as potências
de vida da mulher, e as potências de existência da natureza. As poéticas
dissentes estão em ascendência nas poéticas de estudantes de arte, como
forma de resistência em meio ao que temos vivenciado nesse país, como forma
de lançar provocações que operem fissuras no que damos por naturalizado.
Talvez esse trabalho possa produzir ainda outros diálogos e conexões

252
dispersando seus sentidos em outras vias, para além do que havia imaginado
enquanto o produzia.

253
CRIAÇÃO DE GAMES: ALGO ALÉM DE UMA FERRAMENTA
Débora Cristina Mendes da Silva (UEM)
Damaris Morgenstern Pacheco (UEM)
decris100@gmail.com
damarismail@yahoo.com.br

Resumo

Este trabalho refere-se a uma atividade desenvolvida na disciplina de


introdução ao desenho, no curso de artes visuais da Universidade Estadual de
Maringá em 2017. A minha paixão por games como Professor Layton e Zelda
me inspirou a fazer meu portfólio nesse formato. Para McLuhan (2003, p.148)
“Os jogos são artes populares, reações coletivas e sociais às principais
tendências e ações de qualquer cultura.” Sendo assim o formato de jogo reflete
minha poética da mesma forma que os jogos refletem uma sociedade.
A game engine (motor de jogo) usado foi o RPG Maker VX Ace,
acompanhado dos programas para desenho Paint Tool SAI e MediBang Studio.
A figura 1 mostra o mapa do jogo, que é livremente inspirado na logo do
Windows, da Microsoft. O primeiro conceito do jogo pretende uma grande
galeria onde tivesse vários quadros e suas respectivas descrições. Mudando
para uma passagem de mapas linear e prática.

Figura 1: Mapa do portfólio e logo da Microsoft

Cada parte desses mapas tem suas respectivas significações. A parte


verde, onde se inicia o jogo, ficam os textos e desenhos expostos, produzidos

254
na primeira parte do semestre. A segunda parte (Amarela) foram desenhos
produzidos em aula, um clima desértico ao mapa, pensando na relação do local
das aulas (M40), que é distante e deserto.
Na terceira parte (azul) estão os desenhos de criação a partir de
manchas no papel que trouxe a várias obras uma estética aquática. Já a última
parte (vermelha) simula uma casa de campo, que passa um ar de tranquilidade
ao relembrar o passado dos artistas que afetaram minha poética até então.

Palavras-chave Gameart. Arte e tecnologia. Zelda.

Referências

MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do


homem. Tradução de Décio Pignatari. São Paulo: Cultrix, 2003.

255
FRAGMENTANDO-SE-R
Bruna Augusta Marques (Universidade Estadual de Maringá)
Annelise Nani da Fonseca, Orientadora (Universidade Estadual de Maringá)
Bruna-Augusta_@hotmail.com

Resumo
Fragmentado-se-r, foram gravuras que desenvolvi em coletivo no curso de
Artes Visuais, sob a temática da Perda, tendo como foco a perda do corpo e a
perda de si. Fragmentado-se-r, se constrói por meio de uma narrativa de
corpos femininos, fragmentados pela violência, não uma violência física, mas
sim mental que é tão mortal quanto, adoecendo o ser de dentro para fora,
dilacerando a mente e o induzindo a uma tortura do corpo. Essas discussões
se constroem pautadas nas idealizações que são construídas em cima do
corpo feminino em sociedade, gerando ideais estéticos irreais que resultam no
adoecimento mental e físico do corpo da mulher.

Palavras-chave: Fragmentando-se-r. Violência. Corpo.

Ser que é diluído uma mente enclausurada

Diante dos diversos padrões estéticos que são impostos ao corpo


feminino em sociedade me proponho a discutir alguns sentimentos que são
gerados devido a essas diferentes preções que o meio exerce sobre esse ser.
Objetificando e o instrumentalizando-o, o corpo da mulher sofre diversas
coerções sócias do meio em que se encontra desde de sempre, as construções
de um imaginário voltado ao ideal de um de corpo feminino não começaram no
século XXI, mas sim à muito séculos atrás no começo da nossa história através
de diversos tipos de repressão.
Fragmentado-se-r, foi uma obra que teve sua construção delineada por
caminhos que se propusessem a discutir o corpo da mulher, mais do que como
uma mera figura ilustrativa ou objeto de figuração, mas sim mostrando seus
transtornos e adoecimentos internos provocados por uma mídia cruel, que usa
corpos e deturpa imagens utilizando-as como ferramentas para a produção de
capital, gerando um ciclo vicioso de seres que se perdem si mesmo, em busca

256
de um ideal estético, um padrão plástico e frívolo que constrói cascas trincadas
de cernes enfermos.
Um corpo que se cria em meio a dor, indo em busca de um padrão
inalcançável, seres alterados e modificados pela indústria da beleza por meio
de programas e edição, com o intuito de correções esteticamente mais
agradáveis ao olhar, mas que correções agradáveis são essas que criam seres
irreais, vendendo imagens de um corpo falso, gerando uma ideia distorcida de
beleza que reduz e dilui a essência de um ser, que se perde em si, em busca
de algo que não lhe agrega mas sim o subtrai, podando seus desejos
reprimindo os seus anseios fragmentando corpo e mente .

Figura1: Fragmentado-se-r, 2017, registro fotográfico.

Fonte: Bruna Augusta Marques, Gravura em gesso, impressão sobre papel


branco, 2017.

257
Submersão de si, emersão do irreal

A gravura mostra uma mulher, emergindo de outro corpo quebrado e


submerso por muitas linhas e trincados, nos disparando a pensar em um
primeiro momento em uma casca que se quebra para o surgimento de um novo
ser, em parte poderíamos considerar isso verdade, mas é algo que surge
paltado na irrealidade sob um ideal de um ser que não existe, que ganha sua
forma e contornos por meio da dilaceração da realidade da deterioração do real
sobre idealização do mórbido inexistente.
Figura 2: Fragmentado-se-r, 2017, registro fotográfico.

Fonte: Bruna Augusta Marques, Gravura em gesso, impressão sobre papel


branco, 2017.

Essa produção me leva refletir sobre todas a coerções que um corpo


feminino sofre, mas também me dispara a pensar nesse corpo sendo mais que
apenas um vitima que sofre calado, mas sim como símbolo de resistência e
luta que deve perseverar e não se submeter a padrões imposto, dialogando

258
também com obras como Limite Zero, da artista brasileira Berna Reale,
(ROCHA, 2014). O corpo deve servir de escrita e ferramenta para
reinvindicações e enfrentamentos, questionando formas de agir e símbolos
instaurados em nossa sociedade, problematizando-os e resistindo trazendo
novos olhares e formas de pensar.

Considerações finais

Questionando moldes e quebrando valores pré-existente em busca de


uma multiplicidade do olhar, penso que meu trabalho dialoga com a V Semana
de Artes Visuais, nas questões de Micropolítica e poéticas dissidentes, porque
me instiga a pensar na quebra de padrões, no enxergar entre linhas que nem
sempre se mostram lineares a compressão, é uma constate luta por enxergar
outro despindo a si mesmo de preconceitos e julgamentos considerando o
corpo como potência e não privação.

Referência

ROCHA, Susana N. V. T. Berna Reale: a importância do choque e do silêncio


na performance. Disponível em:
<http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/11089/2/ULFBA_PER_EST%C3%9ADI
O_9_S USANA%20DE%20NORONHA%20DA%20ROCHA.pdf> Acesso em:
04 de out. 2016.

259
MEMÓRIAS IMPRESSAS
Ana Julia Preza de Campos (UEM)
Dra. Roberta Stubs (Orientadora – UEM)
anajulia_prezacampos@hotmail.com

Resumo:
Este ensaio visual é referente ao trabalho desenvolvido dentro da disciplina de
Arte e Mídia I – Fotografia e vídeo, ministrada pela professora Dra. Roberta
Stubs, na qual construímos uma câmera fotográfica de caixa de fósforo: a
Pinhole. As fotos usadas aqui foram tiradas a partir da experimentação da
câmera, sendo o resultado final um completo efeito do acaso. No entanto, as
fotografias carregam um considerável potencial poético e político que será
explicitado no decorrer do texto. O ensaio leva o título de “Memórias
Impressas” e visa retratar questões recorrentes aos problemas de infraestrutura
dentro da universidade, mais precisamente sobre os blocos cujas construções
estão abandonadas.

Palavras-chave: Fotografia. Resistência. Efemeridade. Esquecimento.

Introdução
No momento que comecei a tomar conhecimento sobre a construção da
máquina, vendo os vídeos de referência, adquirindo os materiais, etc., já
comecei a ficar empolgada com a experiência, e logicamente, ansiosa. Quando
finalmente chegou o dia, lá estava eu, prontinha para me achar a maior
revolucionaria da arte contemporânea com minha fabulosa maquina feita a
mão. Nunca tinha tido experiências com a maquininha de caixa de fósforo,
apresar de sempre ter ouvido falar.
Quando saímos para fotografar, senti que precisava aproveitar ao máximo
aquelas 36 poses que tinha em minhas mãos. Tentei procurar lugares
inusitados, ângulos diferentes, e de tanto esforço saíram ideias ótimas, mas,
um pequeno detalhe importantíssimo para se lembrado foi esquecido, girar o
filme! Tirei umas 3 fotos uma em cima da outra, tripla exposição, e não me
contentei em esquecer só uma vez, esqueci várias vezes durante o percurso,
tanto é que as primeiras fotos saíram todas queimadas no filme, e depois de
tanto esquecer, acabei girando mais do que devia, porque esqueci que já tinha
girado.

260
Durante o percurso, ficava pensando em quais possibilidades eu poderia
investir com aquela câmera mágica. Fomos até um dos muitos blocos
abandonados no meio da construção para explorar nosso experimento. A
princípio a intenção era apenas achar cenários interessantes para tirar as fotos,
a significação que atribuí a elas depois de reveladas não estava sendo
idealizada naquele momento. O que torna interessante pensar como o próprio
trabalho fala por si, mesmo quando nos recusamos a ouvir, ele continua
gritando até que lhe seja dado a devida atenção. Como dito por Kossoy (2002,
p.26) “A fotografia resulta de uma sucessão de fatos fotográficos que têm seu
desenrolar no interior daquele contexto”, ou seja, ela parte dali para algum
lugar, que nesse caso, não tinha ideia de onde seria.
Passar pelo desconhecimento do processo foi um tanto angustiante. A
ansiedade para ver o que estava escondido dentro daquele rolinho fotográfico
me corroeu por alguns dias até que tivesse essas fotos em minhas mãos.
Depois de olhar para elas com muito carinho, a ideia começou a se formar
devagar, e sofreu várias mudanças até chegar no ponto atual, o que não
significa que não possa mudar daqui para frente, já que tratamos“[...] de uma
expressão peculiar que, por possibilitar inúmeras
representações/interpretações, realimenta o imaginário num processo
sucessivo e interminável de construção e criação de novas realidades.”
(KOSSOY, 2002, p.48).De qualquer maneira, esse estágio de experimentações
não é passageiro, então sempre haverá caminhos inexplorados dos dois lados
da história. O que é passageiro é o desconhecimento da capacidade do
equipamento. Devemos “[...]conhecer em profundidade a bula dos fabricantes –
da máquina, do filme, dos químicos, dos softwares, etc – para poder atravessar
os limites do aparelho e intervir nas suas funções.” (FERNANDES, 2006, p. 14)

Desenvolvimento
Percebi que as fotos tiveram quase sempre a presença de uma figura
humana, e em quase todas que foram reveladas essa humana era eu. Talvez
isso tenha relação com minhas produções em outras técnicas, já que sempre

261
trabalho bastante com a inserção do corpo na obra. Penso que uma presença
corpórea traz uma carga de sentimentos para a produção, traz calor, tato,
expressões, deposita um pedacinho de toda a grandeza e complexidade que é
viver na pele de um desses seres, e isso agrega um peso gigante para mim.
Além disso, há um cenário em
comum: as imensas construções
inacabadas e abandonadas pela
UEM. A junção da simbologia do
corpo com o problema real dos
blocos (ou o que deveriam ser
blocos) passam então a constituir a
Figura 1 Fotografia Pinhole, 2017, essência desse ensaio fotográfico.
10x15 cm, acervo pessoal
Ensaio esse que agrega todas as possibilidades da segunda realidade
fotográfica, contextualizada por Kossoy (2002) como sendo a dimensão que se
abre a partir do clique, e a foto registrada passa a compor esse universo, no
qual é possível intervir sem compromisso nenhum com a primeira realidade (o
cenário físico). Portanto, posso me apropriar dos efeitos conseguidos por meio
de experimentações para fazer uma crítica, pois “a fotografia possibilita não a
captura da realidade, mas o acesso à contrarrealidade que, como
contrachoque, critica a realidade do mundo: a ficção talvez seja o melhor meio
para compreender a realidade.” (SOULAGES, p.154)
A ficção do trabalho se concretiza quando as figuras humanas deixam
de estar completamente nítidas no espaço. Mas elas estão lá, e eu sei que elas
estavam quando bati a foto. Elas não terem aparecido trazem a sensação de
sonho, talvez um vagar entre as memórias, onde nada é como era no momento
que o corpo estava presente. É tudo meio borrado, tremido, escuro,
fantasmagórico, como quem tirasse fotos de lembranças e não do presente, do
instante já como diria Clarice Lispector. Nessas lembranças existem alguém.
Existe algo que grita e, sem que eu esperasse, denuncia.

262
Figura 2 Fotografia Pinhole, 2017, 10x15cm, acervo pessoal.

Sou eu esse alguém, feito um fantasma num banheiro inacabado, apagada


pelo tempo assim como aquele lugar, esquecida até mesmo das próprias memórias.
Apenas de passagem, uma passagem tão breve que não se arriscadar-se
importância alguma. O cenário continua acompanhando meu desaparecimento, não
se restringe apenas ao momento e efeito fotográfico, porque sua ficção é ganhar na
segunda realidade a nitidez que não lhe é dada na primeira. O problema do
desaparecimento no mundo real migra da personagem para o cenário e se
concretiza.Está acontecendo ao vivo todos os dias para quem quiser assistir. A cada
dia que passa ele fica mais perto da não existência completa, se tornando apenas
um ruído daquilo que deveria ser.Um grande elefante branco sumindo
vagarosamente da universidade, e, com ele levando todas as possibilidades jogadas
a sorte.
É a Jacqueline parada dentro da sala escura em que só aparece um vulto que
provavelmente é ela, mas não concretamente é ela, apenas provável. A sala escura
que, tanto quanto Jacqueline, continua se comportando como apenas um vulto. É a
Jordana que saiu correndo pela escada e passou tão rápido pela foto que sua luz se
negou a entrar pelo buraquinho minúsculo da câmera para registra-se naquele filme.
A velocidade dos passos dela se equipara a velocidade da significação daquele

263
lugar, o que um dia ele foi e o que ele viria a ser. Agora, rapidamente, ele se
transforma em abrigo para plantas rebeldes, mas já nessa nova condição, se
demora, mais do que possamos calcular.

Figura 3 e 4 Fotografia Pinhole, 2017, 10x15cm, acervo pessoa

Somos eu e Samantha triplicadas, registradas no aconchego do cheiro da


outra, com uma ternura três vezes maior do que já seria. Para essa foto tenho uma
palavra: lusco-fusco, aquele momento do dia que não é mais dia e também não é
noite, quando o sol começa a se pôr e banha toda a cidade de amarelo, vermelho e
laranja. Minha hora preferida do dia ironicamente dura pouco e quase não se
registra na grandeza das 24 longas horas. Talvez por representar justamente essa
efemeridade das coisas que gosto tanto dela. Um efêmero que volta todos os dias
com novos tons de quentura e novas nuvens no céu.
Essa efemeridade se equipara a importância daquelas paredes levantadas...
já se foi. Esvaziou-se de sentidos, ou talvez se preencheu de resistência. Nós
resistimos ali. Atribuímos nossa significação a esses lugares, mostramos que
existimos tanto quanto eles. Um curso esquecido abrigado em um teatro esquecido:
ocupar e resistir. Parece guerra, o que na verdade apenas por pouco não é.
Deixamos nossas marcas nessas paredes e damos-lhes vida, para continuarmos
lutando juntos.

Considerações finais
Este trabalho possui sua essência ligada a significação dos elementos
visuais, e não propriamente a estética ou perfeição da foto, já que, segundo
Soulages (s.d.) “[...] na fotografia não se reproduz nada, produz-se como em uma

264
fábrica.” Trata-se de uma série de borrões, uma série de memórias capturadas a
partir da realidade. Memórias que resistem a serem perdidas, assim como os blocos
abandonados há tanto tempo que se tivessem a chance de falar, nem lembrariam
mais quem são. A denúncia sobre a árdua batalha contra a precarização da
universidade não acabou e está longe do fim.
Tento por meio dessa escrita bagunçada, assim como meus pensamentos, e
dessas fotos borradas e completamente experimentais, trazer um pouco do que
estamos perdendo com aquelas paredes esquecidas no tempo. Não são apenas
mais alguns tijolos, são questões tão mais profundas que não cabe a mim, em 5
breves páginas, explicar. Espero que pelo menos possa trazer algo a mais para
prestarmos atenção, e que de alguma forma esses esqueletos de concreto deixem
de ser esquecidos por nós, assim como estão sendo por quem mais deveria lembrar
deles.

Referência

FERNANDES. Rubens Junior. Processos de Criação na Fotografia: apontamentos


para o entendimento dos vetores e das variáveis da produção fotográfica. FACOM.
São Paulo, nº 16, 2º semestre de 2006. Disponível em
<http://www.faap.br/revista_faap/revista_facom/facom_16/rubens.pdf>. Acesso em:
13 set 2017.

KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica. São Paulo: Ateliê


Editorial, 2002.

SOULAGES, François. A ficção fotográfica: antropologia e estética. In:


CHIODETTO, E; MONTEROSSO, J. A invenção de um mundo. Coleção
da Maison Européenne de La Photographie/Paris. São Paulo: Itaú Cultural, 2009

265
MIMIMI: UMA FISSURA LITERÁRIA NOS MUROS DA
UNIVERSIDADE

Autora: Soraya Ayumi Tory (UEM)


Co-autoras: Natalia Dias Pedroza (UEM)
Ana Bárbara de Carvalho Santi (UEM)
Fernanda Ramos Finco (UEM)
Fernanda Sayuri Ito (UEM)
Orientadora: Rosiane Cristina de Souza (UEM)
sorayatory@gmail.com

Resumo

Mimimi propõe uma ação sobre os espaços de transito dentro da UEM,


agenciando nestes locais quadrinhos que problematizam questões sociais, afetivas e
existenciais. A ocupação é feita através de lambe-lambes distribuídos pelo campus,
gerando rotas de fuga e promovendo a multiplicidade. Assim, nosso projeto dialoga
com a proposta da 5ª Semana de Artes Visuais, identificando-se como uma ação de
micropolítica.
Em conceito, de maneira simples, Mimimi se uma define como uma
expressão informal para imitar, com humor e ironia, alguém que reclama, sendo
amplamente utilizada para satirizar e deslegitimar discursos. Desta forma, decidimos
tomar o termo como nome, reconstruindo-o, instaurando assim um tensionamento,
uma vez que buscamos a validação de modos dissidentes de ser.
A proposta ganha forma por meio de tirinhas de autoria e ilustração realizadas
por um grupo de estudantes do primeiro ano do curso de Artes Visuais. O fio
condutor destas histórias se dá pela temática que se desenvolve em narrativas
críticas abordando problemas silenciados pela normatividade. As personagens
tratam de maneira cômica e sarcástica a violência que se afirma na naturalização de
comportamentos repressivos.
Veiculamos tais narrativas em lambes com o intuito de dar potência e voz aos
gritos políticos, promovendo a discussão e a desconstrução no ambiente acadêmico;
de modo que o espaço universitário fosse ocupado por meio da arte, dando vazão a
subjetividade e a sensibilidade.

266
A intervenção busca desestabilizar as duras paredes do preconceito e da
discriminação ao criar fissuras literárias que nos convidam a repensar nossa relação
para com o outro, para com o diferente de mim. Mimimi é um convite para que
direcionemos nossa visão a lugares onde muitos olhos não veem, ou se fecham ao
olhar.

Palavras-chave: Micropolíticas. Quadrinhos. Lambe-lambe.

267
NARRATIVA DE UM CORPO CÍCLICO

Jacqueline Amadio de Abreu (UEM)


Jacqueline-amadio@hotmail.com

Resumo
Narrativa de um corpo cíclico vem como experimentação de si e emerge do meu
encontro com autoras como Kaufer e Osmer-Newhouse, que primeiro despertaram
em mim um novo olhar sobre a mulher; Gray, criadora de um movimento espiritual
feminino sobre despertar das energias e valores femininos; Owen, pioneira no
artivismo menstrual; Laurentiis e Tvardovskas, autoras que trabalham com arte e
feminismo. E tenho como maior inspiração a artista argentina Juliaro que trabalha a
relação mulher e natureza e uma nova forma de se relacionar com o corpo feminino.
Essas mulheres, pesquisadoras e artistas, movem os temas do universo feminino e
dos feminismos, temas que desenvolvo em meu trabalho visual. Este objeto-arte é
composto de gravuras e costuras. As gravuras dizem respeito à natureza cíclica das
mulheres, conectadas ao céu e a terra, segundo os saberes ancestrais do feminino.
Dessa forma, busco trazer a mulher dissidente em novo enredo, quebrando com a
repetição do que é dito sobre os ciclos femininos – esses geralmente carregados de
carga negativa – e trago esse outro olhar, reflexo de tradições antigas que valorizam
a mulher e a vê sob outra ótica. De forma poética é que realizo essa micropolítica,
minha ação para movimentar outros pensamentos e ideias acerca do corpo
feminino. Retornar ao que é específico da mulher, seu útero, com outro olhar e abrir
fissuras para novas experiências de um autoconhecimento caminhando por outra
narrativa.

Palavras-chave: Objeto-arte. Gravura. Feminino. Ciclos.

268
SENSAÇÕES QUE PERPASSAM O CORPO EM AFETOS-TINTA

Gabriel Silva Batista (Universidade Estadual de Maringá)


Francieli Regina Garlet (Universidade Estadual de Maringá)
gabriel.sbatista09@gmail.com

Resumo

A performance que proponho nesse trabalho, parte de uma produção


elaborada originalmente dentro da disciplina de Produções Artísticas: Pintura I, sob a
temática ‘efemeridade e permanência’. A ideia que norteou essa produção foi
retratar uma relação de proximidade entre duas emoções humanas: a alegria e a
tristeza, e também a relação de efemeridade de tais emoções no ser humano.
Os planos eram apenas estes, mas, como sempre, a arte nunca se limita a
seus planos iniciais. A arte se redescobre, se reinventa, se reinterpreta a todo
momento. Ela toma novos rumos, mesmo sem avisar. Os caminhos pelos quais a
produção da obra se enveredou – a minha própria participação na obra, o fato de a
produção e a autoria terem sido compartilhadas com minha amiga e parceira de arte
Hevelin, as reações extasiadas dela ao meu lado e os grandes laços afetivos que
temos um com o outro, a condição do tempo chuvoso no dia da produção, entre
outros fatores – me levaram a pensar outras significações para a obra. Tentei,
portanto, não somente retratar tristeza e alegria lado a lado compartilhando um
espaço, mas fazê-las interagirem, de modo que produzissem interferências uma na
outra, mostrando, assim, como as emoções do ser humano são de certo modo
confusas, e como elas se embaralham ao longo deste caminho entre uma e outra. A
água (que no momento da produção foi a própria água da chuva), usada para borrar
a tinta que cobria nossos rostos e misturar as cores, reforçava a ideia de fluidez das
emoções. As cores das tintas usadas também procuravam compartilhar dessa
relação: o vermelho para a alegria, por ser uma cor quente, que chama a atenção
para si, e o azul para a tristeza, por todo o histórico cultural e semântico em torno da
cor azul.

269
Figura 01: Registro da performance realizada por Gabriel Batista e Hevelin Briga Pereira. Fotografia por Francieli
Briga. Fonte: Acervo pessoal.

A relação traçada entre as emoções se fazem a todo momento em nós. O que


é ser triste? O que é ser feliz? O verbo “ser” utilizado nesta situação se mostra para
mim um tanto quanto estranho. O verbo ‘estar’ talvez se aproximaria mais de tais
sensações. Emoções são estados momentâneos. ‘Ser feliz’ e ‘ser triste’, nesse
sentido, são afirmações que parecem impossíveis. ‘Estar feliz’, ‘estar triste’ são
retratos, efeitos das vivências. Nossas emoções estão de passagem por nós, e,
porventura, no meio do caminho, acontece de se encontrarem, se abraçarem, e
nocautearem violentamente uma a outra. Nosso corpo é um ringue, o lugar onde as
emoções se confrontam e se misturam.
Sobre estas relações entre corpo e emoção Espinosa diz que:

O ser humano se potencializa no momento em que produz experimentações e


relações com os outros e com o mundo. [...] A potência é o que define o corpo,
este é constantemente afetado e estes afetos aumentam a potência, alegria, ou a
diminuem, tristeza. [...] Tristes, estamos separados de nossa essência, somos o
que não somos; alegres tornamo-nos o que somos e adquirimos a capacidade de
transmutação (ESPINOSA, 1677, apud TRINDADE, 2013, on-line).

270
A proposta para a performance na 5ª Semana de Artes Visuais segue a
mesma ideia do trabalho produzido na disciplina de Produções Artísticas: Pintura I,
mas com alguns pontos diferentes. As interferências, os borrões, as interações entre
nós dois que, em um primeiro momento, aconteceram apenas após estarmos
devidamente maquiados, acontecerá já no momento da produção da maquiagem.
Sentados um de frente ao outro, reproduziremos a ideia da interação, pintando-nos
com as cores pré-estabelecidas para cada sensação (alegria/vermelho e
tristeza/azul). Uma vez pronta a pintura, traremos de volta a ideia de fluidez, e
usando água, produziremos borrões e misturas um na maquiagem do outro.
A ideia de apresentar algo performático na 5ª Semana de Artes Visuais busca
contemplar todo este processo de produção que foi tão importante para as
ramificações e desdobramentos da obra a partir da ideia inicial. Sem os entremeios
do processo, dificilmente a obra teria tomado rumos tão interessantes para mim. A
performance The Artist is Present (2010) da artista sérvia Marina Abramovic,
disparou-me a pensar o modo com que a minha performance acontecerá na 5ª
Semana de Artes Visuais. O fato de Marina estar presente em sua obra, utilizando-
se de seu próprio corpo, de seu olhar, e, principalmente, das emoções que brotam
da interação dela com o público, tudo isso me inspira a pensar quais emoções eu
conseguiria fazer brotar no público presente com minha performance. Procuro que
as relações de alegria e tristeza consigam extravazar nossos corpos e, por meio da
interação entre Hevelin e eu, o público possa sentir o conflito entre suas próprias
emoções.

271
Figura 02: Marina Abramović – The Artist is Present. MOMA, 2010.
Fonte: https://www.mdig.com.br/index.php?itemid=31060.

O trabalho de Marina me remete à a presença da arte enquanto potência no


ser humano . Potências que para se efetuarem, exigem esforço, experimentação de
pensamento e uma lida com meios materiais e imateriais. A arte não brota do nada,
somos nós que a semeamos. Conseguiríamos nós semear no público alguns
questionamentos sobre seus conflitos internos e incitá-los a pensar sobre suas
próprias experiências emocionais? Para provocar essa reflexão sobre os atos mais
corriqueiros, penso que uma performance seria a forma mais apropriada. Através
dela, seria possível apresentar tudo o que pensei com a obra, considerando todos os
seus reinventos. Pensar, a partir de uma apresentação performática, a pluralidade
de possibilidades de duas emoções encarnadas. Afinal, a arte para mim é isso: a
pura encarnação das sensações e emoções humanas.
Também convido o público a pensar algumas questões, desconstruindo a
noção do ‘ser triste’ e do ‘ser feliz’, escapando, desse modo, de padrões
normatizados sobre as emoções do ser humano. Como podemos driblar as pressões
sociais que encaixam nossos sentimentos em gavetas separadas e não permitem
perceber as nuances deles (algo tão indispensável para a modulação de nossa
subjetividade)? Será que precisamos domar essa subjetividade, delimitando-a em

272
um ‘ser’, ou podemos manifestar as misturas de sentimentos bagunçados que nos
compõe a cada vez?
Como convivemos com as misturas emocionais dos outros? Até que ponto os
encontros com a tristeza e a alegria e entre tristeza e alegria produzem potências
em nós? E até que ponto nossas potências de agir afetam o nosso emocional? O
que constrói nossas emoções? O que as dinamita? O que transpassa as duas e
como as duas nos transpassam? O que fica de pé depois de um confronto entre as
emoções e nós mesmos?

Palavras-chave: Sensações. Emoções. Corpo. Performance.

Referências:

TRINDADE, Rafael. Espinosa – O que pode o corpo? 2013. Disponível em:


https://razaoinadequada.com/2013/08/25/espinosa-o-que-pode-o-corpo/. Acesso em
29 nov. 2017.

273
SUA MORAL É MINHA INEXISTÊNCIA

Ana Gabriela Portelinha Hainosz (UEM)


Roberta Stubs (orientadora-UEM)
ana.hainosz@gmail.com

Resumo
O contato com a arte é muito forte para nos possibilitar mudanças. Frente a ela é
possível pensar as emergências da atualidade como as questões ligadas ao corpo,
às violências, entre outros. Justamente por mobilizar questões por vezes polêmicas,
mas certamente urgentes, algumas vozes reacionárias querem o fim da arte, querem
o fim do que já não é o mesmo, querem o fim das coisas que se manifestam em
busca de afirmação de existência. Esse desejo de reprimir a arte reflete um modo de
pensar e agir presos em um momento que não faz mais sentido por não
acompanhar as mudanças de nosso tempo. Porém, das bordas traçadas pela moral
própria de uma sociedade reacionária, vazamos além de tudo aquilo que não
querem que sejamos. Nesse percurso de luta micropolítica, a arte é nossa aliada
para a resistência. É dessa força de resistência que a presente produção se trata.

Palavras-chave: Arte. Resistência. Micropolítica.

O porquê dessa manifestação visual

O presente trabalho visual intitulado Sua moral é minha inexistência, aborda a


moralidade atual que condena existências tidas como dissidentes e minoratárias e
suas formas de resistências. A nudez, por exemplo é proibida, a sociedade
normativa não quer a manifestação de uma nudez, a não ser que seja do seu jeito:
ilegal, violenta, bonita/padronizada e feminina, fora destas cabe a denúncia. A
principal base para a construção deste trabalho foram os textos de Suely Rolnik
sobre a subjetividade e os taxicomanos de identidade. Em relação à subjetividade
cabe entendê-la segundo a metáfora de uma folha esticada que, recebendo
estímulos e amassos de forças externas, acaba ficando cheia de marcas (mesmo
quando desamassada). Como um campo de experiências carregados por marcas
podemos entender nossa subjetividade, que, em relação com as experiências
externas cria novas dobras, novas existências e maneiras de existir. Nesse sentido,
estamos sempre nos metamorfoseado. Assim, entendo que a arte e a nudez nela

274
expressa são forças que fazem nossa folha da subjetividade ser amassada, uma vez
que é um campo para provocar questionamentos e reflexões.
Ao entendermos a arte como uma linguagem, ela é capaz de nos provocar e
nos dizer coisas da ordem da sensibilidade através de signos visuais, plásticos,
performáticos, entre outros. Podemos então dizer que a arte nos provoca no campo
do sensível, gerando marcas em nossa subjetividade também dessa ordem. No
entanto, quando pensamos nos toxicômanos de identidade, um modo de
subjetivação endurecido e repleto de moralidade, pensamos em pessoas cujas
dobras e desdobras da folha da subjetividade cessam e estacionam. Viciados em
identidade são aqueles que preferem se fixar em padrões morais do que seguirem
os fluxos intensivos da vida, esse campo sensível no qual a arte habita e com o qual
trabalha. Este vício em uma identidade não aceita as mudanças, não aceita que
elas interfiram em sua identidade vista como concreta e imutável, assim elas
recorrem ao passado e à receitas morais que passam a ilusão de estabilidade e
felicidade, a fim de garantir seu lugar de privilégio.
Viciados em identidade e portadores de uma moral que mata, esse modo de
viver advoga para garantir seus próprios privilégios. Esta é a bala que nos acerta e
que, recentemente, vem acertando a arte por todos os lados. Ao acertar a arte mata
uma linguagem, mata a liberdade de expressão, liquida uma forma de existir e
resistir, e, principalmente mata uma potência transformadora de subjetividade.

O porquê dos elementos visuais

Na produção as manchas vermelhas representam nosso sangue que corre nas


ruas, que pinga a cada passo e escorre a cada ataque. Resquício de ataques que
não nos matam, mas nos transformam, nos compõem, as linhas bordadas afirma
nossa existência levada em manchas pelo sangue de todas. Se só com linhas
podemos mexer (trançar, bordar, tricotar, etc), com linhas vamos nos reinventar.
Linhas que formam desenhos e palavras, desenhos e palavras que formam
denúncia, denúncia que é feita pela arte, para a arte e pela vida em sua potência
múltipla.

275
Pensando por aberturas, não queremos uma linha que se encerra, se fecha e
dá algo pronto, preferimos alinha inacabada, que permite que algo novo se atrele à
ela. De coisas dadas já não queremos mais, se uma produção bidimensional me
permite deixar algo em aberto para ser completado aos olhos de quem se depara
com ela assim preferimos, pois, não se fecham as possibilidades de elementos
representados para serem interpretados à maneira e em resposta às dores de cada
um/uma que se permite pensar sobre ela. É enquanto linha aberta a outro e novos
sentidos, que pensamos essa produção enquanto uma forma de afetar e disparar
construções coletivas e plurais. Abertas ao outro, essas linhas costuram a dor do
mundo, do eu e do outro.
O guardanapo utilizado como suporte são dos restaurantes fast food, duas
palavras que quando utilizadas juntas não parecem combinar muito bem para as
nossas saúdes: comida e rápido. Rápido, tudo tem de ser rápido. Na rapidez os
detalhes, os sabores, a arte e a reflexão que ela pode trazer escapam. Ao não nos
atentarmos aos detalhes, ao que a arte se propõe a dizer, aos momentos, perdemos
a experiência, perdemos a posição de sujeitos passíveis a serem tocados, assim, as
coisas parecem perder o sentido, pois, parecem só vir para nos sobrecarregar na
correria da vida. É o caso da rejeição da arte, neste momento não em um sentido
moral, mas da necessidade de parar a nossa velocidade dos afazeres que nos
exigem para se atentar apenas em uma coisa.
Nesse sentido, essa produção intitulada A sua moral é minha Inexistência, é
uma resposta frente a tudo que as existências dissidentes tem passado, aos ataques
que tem se tornado cada vez mais fortes, fato que, de certa maneira, reitera e
reforça nossa a necessidade de lutar e resistir. Nesse contexto a arte vira arma
política, se torna máquina de guerra. O presente ensaio visual se vale da arte para
discorrer sobre a vida que urge e transborda. Pela vida, a arte é um meio de sobre-
viver.

276
Analua. Sua moral é minha inexistência. Desenho, 2017. Acervo pessoal.

Analua. Sua moral é minha inexistência. Desenho, 2017. Acervo pessoal.

277
Analua. Sua moral é minha inexistência. Desenho, 2017. Acervo pessoal.

Analua. Sua moral é minha inexistência. Desenho, 2017. Acervo pessoal.


Referências

BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber da experiência.


Revista Brasileira de Educação, Campinas, n. 19, 2002.

278
ROLNIK, Suely. Uma Insólita Viagem à Subjetividade: fronteiras com a Ética e a
Cultura. In: LINS, Daniel (Org.). Cultura e Subjetividade: saberes nômades.
Campinas: Papirus, 1997. P. 25-34.

______. Toxicômanos de identidade. Subjetividade em tempo de globalização. In


LINS, Daniel (org.). Cultura e subjetividade: saberes Nômades. Campinas:
Papirus. 1997. pp.19-24

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