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Organizador
Rodrigo Barchi
Diagramação: Marcelo A. S. Alves
Capa: Lucas Margoni
Arte de Capa: Luis Felipe Loyola
Diálogos com a música extrema [recurso eletrônico] / Rodrigo Barchi (Org.) -- Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2021.
290 p.
ISBN - 978-65-5917-167-5
DOI - 10.22350/9786559171675
CDD: 780
Índices para catálogo sistemático:
1. Música 780
Dedicado ao Alex Bucho e às demais queridas
pessoas que perdemos no desastre da pandemia
In memorian
Sumário
Prefácio 11
Marcos Reigota
Apresentação 19
Rodrigo Barchi
1 29
Do noisecore ao noise : a tradução do precário em The Hermeneutics of Fear of God
Cristiano dos Passos
2 67
“Do it ourselves, together, as working class: thrash metal e luta de classes”
Fábio Alexandre Tardelli Filho
3 96
O Death Metal e a desnaturalização do demoníaco sob a perspectiva do ethos
discursivo
Lucas Martins Gama Khalil
4 121
Anarchopunk e tecnologias sociais de resistência: antirracismo e subversão da
branquitude na música do grupo Aus Rotten
Moacir Oliveira de Alcântara
5 153
O antipátria: ensaio de uma transvaloração dos valores no Black Metal
Roberto Scienza
6 221
O que a Música Extrema tem a dizer às ecologias?
Rodrigo Barchi
7 247
O que acontece no palco é pretexto: Ecologia da Comunicação e capilaridades
comunicacionais visitam o submundo musical
Tadeu Rodrigues Iuama
8 264
(ENTRE) Educações: crust punk, arte de viver e e e...
Wescley Dinali
Marcos Reigota 1
1
Professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Sorocaba, pesquisador
do CNPQ, e autor de diversos livros no campo da Educação Ambiental e da Ecologia Política, como “O que é Educação
Ambiental”, “Meio Ambiente e Representação Social”, “A Floresta e a Escola: por uma educação ambiental pós-mo-
derna” e “Ecologistas” entre outros.
2
Título de uma música da banda Corubo, gravado no EP de 2001 “Nem a Morte Cala a Voz do Guerreiro”, que conheci
graças a um dos artigos desse livro.
12 | Diálogos com a Música Extrema
3
Referência à música “O Sonho Acabou” de Gilberto Gil, gravada em 1972, no álbum “Expresso 2222”.
4
CRUSP- Centro Residencial da Universidade de São Paulo.
5
Música do grupo “Inocentes”, gravada no disco ‘Grito Suburbano “de 1982.
14 | Diálogos com a Música Extrema
1964 ou que eram crianças quando o golpe foi dado) não queriam seguir
regras e cartilhas de partido nenhum. Eu era um deles.
Se abordo aqui alguns desses acontecimentos é porque eles estão pre-
sentes nos artigos que compõem essa coletânea que nos convida ao
diálogo. Esse convite nos traz um pouco de oxigênio e nos provoca a rever
nossas origens e trajetórias política, cultural e educacional.
No conjunto de artigos desse livro encontramos ousadia e pertenci-
mento. Os autores escrevem sobre temas e universos que conhecem muito
bem, que participam como sujeitos ativos, que estudam e deglutem as
mais diversas informações, autores e conceitos cristalizados e nos devol-
vem questionamentos com coragem pouco vista em livros e artigos “Made
in Brazil”6. Tem sido cansativo e com pouco ou nenhum impacto político
a produção acadêmica nas Humanidades no Brasil, mais voltadas para
obedecer a critérios de produtividade e de pertencimento institucional e a
grupos de prestígio. Isso é visível e facilmente localizado mesmo entre
aquelas e aqueles colegas que se querem e autoproclamam como “rebel-
des”, mas que não fazem mais que repetir nos trópicos o que consideram
ser de bom tom, e de ilusória acolhida nas instituições culturais e educaci-
onais, colonizadas e colonizadoras.
Ao longo desse livro se encontra, de forma explicita ou implícita, os
processos de desnaturalização/desconstrução de conceitos e argumentos
caros às Humanidades, como, por exemplo, os de “aura da arte”, de “mú-
sica”, de “cultura” e de “indústria cultural”. O processo desconstrucionista
está pautado em autores clássicos de diferentes epistemologias e intima-
mente relacionado com os impactos políticos que provoca e possibilita.
Entre os autores clássicos encontram-se autores brasileiros contemporâ-
neos cuja trajetória de lida&luta está longe de ter sido esgotada. Entre eles
6
Para não nos esquecermos dessa banda, “que só quer tocar rock and roll”.
Marcos Reigota | 15
7
Noção extraída do livro “Viver nas ruínas: paisagens multiespécies no Antropoceno” de Anna Lowenhaupt Tsing.
Brasília: IEB, 2019.
8
Para nos lembrarmos do Racionais MC’s.
Foto MR- Fitas gravadas pelo Rodrigo Barchi, com as devidas explicações manuscritas,
que ele me presenteou em 2001.
Apresentação
Rodrigo Barchi
1
Sobre os fascismos contemporâneos, vero prefácio da edição estadunidense de “O Anti-Édipo: capitalismo e esqui-
zofrenia”, de Deleuze e Guattari, publicado no Brasil em: FOUCAULT, Michel. Estratégia Poder-Saber. MOTTA,
Rodrigo Barchi | 21
Manoel Barros da (Org.). Tradução de Vera Lucia Avellar Ribeiro. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2012.
(Ditos e Escritos: IV).
22 | Diálogos com a Música Extrema
Do noisecore ao noise:
a tradução do precário em The Hermeneutics of Fear of God
Introdução
1
Como não é objetivo aqui desenvolver um extenso debate acerca da precisão terminológica, optamos por usar o
termo de Rodel até para facilitar a compreensão de eventuais leitores leigos quanto ao universo da música extrema.
Assim, quando se estiver fazendo referência ao som de origem punk, o termo usado será “hardcore extremo”, ao
passo que o termo “noise” servirá para identificar as formas mais eletrônicas e experimentais de som. Em alguns
momentos, entretanto, me permitirei usar o termo “antimúsica” para o primeiro grupo, pois este é amplamente
utilizado pela cena para se referir à sua própria arte (ou antiarte?) sonora.
36 | Diálogos com a Música Extrema
2
Tradução do autor para: "Musical proficiency was generally an afterthought to the bands; velocity and urgency
colored with a righteous anger were what mattered. Ultimately, this form of aggressive music was the only manner
in which these adolescents could properly express themselves." (p. 26)
38 | Diálogos com a Música Extrema
3
O termo usado pela autora é “badness”, mas como o livro não tem tradução para o português, preferi usar o termo
“ruindade”, que pode ser visto como um correlato do termo “inépcia” usado por Hegarty (2007).
4
LAING, Dave. One-chord wonders: power and meaning in punk rock. Open University Press, 1985.
Cristiano dos Passos | 39
5
Boa parte desse material é que sera aproveitado posteriormente por Dave Phillips em The Hermeneutics of Fear of
God.
Cristiano dos Passos | 41
6
Em trabalho pioneiro sobre a importância da troca de fitas para o desenvolvimento da música extrema, Jones (2016)
comenta a ideia de Netherton (2007) a respeito de como as fitas contribuíram não apenas para espalhar a música
mundo afora, mas também influenciaram o som extremo. Em virtude da baixa qualidade das gravações, que se
tornavam ainda mais precárias à medida que eram regravadas, a própria cena incorporou a sonoridade crua à sua
estética.
42 | Diálogos com a Música Extrema
mercadoria, tornando o suporte por meio do qual essas obras são apre-
sentadas em algo descartável, que não se presta à coleção e muito menos
à contemplação, além de ter um custo de produção e difusão baixíssimo, o
que torna esse tipo de material bastante acessível.
Curioso notar, porém, que atualmente diversos selos pequenos têm
se dedicado a resgatar boa parte desse material e lançá-lo em um formato
mais nobre, o disco de vinil, o qual, embora seja mais luxuoso e tenha um
custo mais alto, não deixa de aproveitar os detritos e sobras de baixa qua-
lidade. Assim, os discos se tornam compilações de materiais que seriam
desprezados pela indústria fonográfica e também pelo público acostumado
à alta qualidade das gravações profissionais. São registros de gravações ao
vivo em que nem todos os instrumentos estão perfeitamente audíveis, re-
gistros de ensaios sem edição alguma, muitas vezes captados apenas por
um gravador situado no meio do local de ensaio, que geralmente não é um
estúdio, mas uma garagem ou um quarto de fundos da casa de um dos
integrantes da banda. Juntem-se a isso diversos materiais gráficos artesa-
nais coletados de antigas publicações independentes (os fanzines) ou do
arquivo pessoal dos integrantes ou amigos dos grupos, como capas de
demo-tapes, flyers, velhas entrevistas e resenhas dos registros sonoros,
cartazes de shows, entre outros. É importante perceber que a baixa quali-
dade desses materiais não diminui o valor desses produtos, posto que a
precariedade estética é considerada uma espécie de virtude na cena do
hardcore extremo, pois contribui para manter intacta a sua autonomia,
posição que ao mesmo tempo também é precária, considerando a ameaça
latente de que um grupo possa abraçar a indústria musical e “se vender”,
conforme aponta Rodel (2004).
Nesse sentido, cabe aqui introduzir o conceito de precariedade, bas-
tante discutido na arte contemporânea e que parece guardar uma forte
relação com o hardcore extremo, ainda que esta seja muito mais uma
Cristiano dos Passos | 43
São blocos de som, organizados por fatores de timbre e duração, que, despidos
da investidura léxica, traçam uma espécie de pré-história do auditivo, reve-
lando a infraestrutura fonética adormecida sob as cunhagens gastas tanto do
idioma da comunicação utilitária, como do de convenção “belartística”; possi-
bilitam um retorno às matrizes do material poético, um puro júbilo do objeto
Cristiano dos Passos | 45
Cerca de 15 anos após o fim do grupo, seu antigo baixista, Dave Phil-
lips, artista performático dedicado a explorar os limites do som por meio
Cristiano dos Passos | 51
7
O disco original, em LP, é de 2003, foi lançado pelo selo alemão Tochnit Aleph e continha 33 faixas de curtíssima
duração. Interessante registrar que a versão em CD foi feita em formato CDr. A versão que vamos analisar aqui,
contudo, é a versão brasileira, lançada em CD pela Absurd Records em 2008, que conta com diversos materiais
extras, totalizando 62 faixas (61 sons e um vídeo extra, o único que traz um título – I shot myself). Consideramos
que, apesar das diferenças, é válido estender a leitura original para a versão que ora se apresenta, pois ideia básica
de todas as faixas é reaproveitar os restos/fragmentos da obra do Fear of God como material para (re/de)composição.
52 | Diálogos com a Música Extrema
É Hegarty (2007) quem vai traçar uma linha histórica no uso do ru-
ído como forma de composição, que inicia com Luigi Russolo, autor do
manifesto The Art of Noises, publicado em 1913, na esteira das inovações
estéticas produzidas pelos futuristas, e que proclama a necessidade de uma
“Arte dos Ruídos” baseada no som das máquinas e das cidades barulhentas
do período pós-Revolução Industrial. Na visão de Russolo, antes da inven-
ção das máquinas, o mundo era um lugar silencioso:
A vida antiga foi só silêncio. No século XIX com a invenção das máquinas, nasce
o Ruído. Hoje, o ruído triunfa e reina soberano sobre a sensibilidade dos ho-
mens. Por muitos séculos a vida fluiu em silêncio, ou, quando muito, em
surdina. Os ruídos mais fortes que quebravam esse silêncio não eram nem
intensos, nem prolongados, nem variados. De fato, tirando os excepcionais
movimentos telúricos, os furacões, as tempestades, as avalanches e as cacho-
eiras, a natureza é silenciosa.
8
DAVE PHILLIPS, after the initial split up of our band FEAR OF GOD in 1988, had found his own way of dealing
with the inevitable void such a break up leaves behind, yet following the path we had set foot on. Whereas I pretty
much kept stranded on the HC and political nonsense thing for many years to follow, he got himself involved with
the electronic avantgarde. He has since produced a vast amount of releases, collaborating with the who’s-who of
avantgarde noise, performing worldwidely and constantly. (KELLER, 2006)
Cristiano dos Passos | 57
antigo parceiro de banda, Erich Keller (2006), mas pode ser intolerável
para um ouvinte de música popular ou erudita tradicional9.
Outro aspecto em que a tradução do material diverge do hardcore
extremo é que, no disco de Dave Phillips, nenhuma faixa tem nome, mas
apenas um número, o que também cria uma unidade entre elas e torna
difícil discriminar esta ou aquela faixa. Não há canções independentes,
mas uma só massa sonora que agride o ouvinte e compromete o estado
contemplativo, como também dizia Benjamin (1987) ao falar sobre a dife-
rença entre a tela do cinema e um quadro.
No disco de Dave, é possível reconhecer diversos trechos das antigas
faixas do Fear of God, os quais são sampleados e transformados em uma
massa sonora muito mais impenetrável do que em suas versões originais.
De algumas faixas clássicas da banda, são recortados riffs e vozes conheci-
das, os quais são repetidos ad nauseam, têm sua rotação alterada ou são
tocados de trás pra frente. Dave aproveita também sobras sonoras que
normalmente não seriam utilizados no produto final de uma gravação mu-
sical popular, fazendo dos detritos seu material de composição. A faixa nº
10, por exemplo, traz apenas o toque das baquetas, comumente usado em
apresentações ao vivo para avisar aos outros membros da banda o início
exato da música, que é repetido diversas vezes até os 45 segundos, até que
a "música" propriamente dita comece e leve menos de dez segundos para
ser resolvida de forma caótica.
Assim como em uma obra de Schwitters, todo o lixo que a indústria
da música rejeita é reciclado e recomposto em uma colagem do material
precário do Fear of God. Porém, nessa nova composição, busca-se
9
Earlier this very year, a friend of mine from Germany, a philosopher and educationalist, paid me a visit during which
he wanted me to play FEAR OF GOD to him finally. I did so by choosing the remastered debut EP on Mini-CD and
this[referring to THOFOG]. After 10 minutes, he asked me to stop this 12″. He looked at me, saying he didn’t want
me to be mad at him, but he felt this music would alienate me from him or vice versa maybe. “It’s inhumane”, he said.
(KELLER, 2006)
60 | Diálogos com a Música Extrema
10
Tradução livre de: "What he did was cut the stuff up and into pieces and reassemble it, following the focus of FEAR
OF GOD that was: To disturb instead of to entertain. So what Dave achieved is, at least to me, the endpoint of such
an endeavor.”
Cristiano dos Passos | 63
Considerações finais
Referências
CAMPOS, Haroldo de. A arte no horizonte do provável e outros ensaios. São Paulo:
Perspectiva, 1969.
FEAR OF GOD.As statues fell. Switzerland: Off the Disk Records, 1988. 1 Lp (17min42s).
Cristiano dos Passos | 65
IOMMI, Tony. Iron Man: My Journey through Heaven and Hell with Black Sabbath. Boston,
MA: Da Capo Press, 2012.
KAHN, Douglas. Noise, water, meat: a history of sound in arts. MIT Press:
Cambridge/Massachussets, 1999.
KELLER, Erich. Dave Phillips – The Hermeneutics of Fear Of God 12"Ep (Tochnit Aleph,
Germany, 2003). Disponível em: http://www.goodbadmusic.com/2006/11/10/
dave-phillips-the-hermeneutics-of-fear-of-god-12ep-tochnit-aleph-germany-2003/.
Acesso em: 25.2.2019.
KELLER, Erich. Dave Phillips – The Hermeneutics of Fear Of God LP (Absurd Records,
Brasil, 2008). Disponível em: http://www.goodbadmusic.com/2008/04/21/dave-
phillips-the-hermeneutics-of-fear-of-god-lp-absurd-records-brazil-2008/. Acesso
em: 24.2.2019.
LAING, Dave. One-chord wonders: power and meaning in punk rock. Open University
Press, 1985.
MUDRIAN, Albert. Choosing death: the improbable history of death metal & grindcore. Los
Angeles: Feral House, 2004.
NOVAK, David. Japanoise: music at the edge of circulation. Durham: Duke University Press,
2013.
PASSOS, Cristiano. Entrevista com Dave Phillips, conduzida por e-mail em dezembro de
2018.
66 | Diálogos com a Música Extrema
RODEL, Angela. Extreme Noise Terror - Punk rock and the aesthetics of badness. In:
DERNO, Maiken; WASHBURNE, Christopher (orgs.).Bad music: the music we love
to hate. New York & London: Routledge, 2004.
RUSSOLO, Luigi. A arte dos ruídos (1913). Tradução: Daniel Belquer e José Henrique
Padovani. Disponível em: https://www.academia.edu/8891205/_A_arte_dos_
ru%C3%ADdos_Luigi_Russolo_tradu%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 19.5.2019.
RUSSOLO, Luigi. The art of noises. Tradução: Barclay Brown. Monographs in Musicology.
Nova York: Pendragon Press. 1986.
WILSON, Steven. The radical music of John Zorn, Diamanda Galás, and Merzbow: a
hermeneutic approach to expressive noise. Dissertation (Doutorado em Filosofia em
Musicologia).Graduate College of the University of Illinois at Urbana-Champaign,
2014.
WISNIK, José Miguel. O som e o sentido: uma outra história das músicas. 3. ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 2017
2
Ficaremos organizados
Porque viver não é um benefício
Sua pretensão de controle
Encontrou um fim iminente
Deve respeitar a existência
Ou esperar resistência
Não cheguei à toa na fonte primária que é a web zine Resíduos Tóxi-
cos2 muito pelo contrário, pois em 2011 fundei junto a uma amiga3 essa
1
Tradução “Façamos por nós mesmos, juntos, como na luta de classes”. Essa frase é uma adaptação do célebre lema
punk “Do it yourself” que significa “faça por você mesmo”, parto da referência da entrevista e colaborador do Resí-
duos Tóxicos: o camarada Felipe Nizuma, que citou essa frase em sua entrevista em 2013 ao zine Resíduos Tóxicos.
2
Para efeitos de abreviaturas usávamos também RxTx, e para demais efeitos de menção usaremos em diversas
ocasiões nesse texto.
3
A historiadora Keyla Rosado.
68 | Diálogos com a Música Extrema
web zine e, até hoje, volta e meia penso em retomar esse projeto4. A histó-
ria do nome passava por duas referências que tínhamos na época, a
primeira eram as bandas de thrash metal como Violator, Toxic Holocaust,
Anthrax e Municipal Waste e todo um conjunto de grupos que traziam essa
temática de guerra biológicas (ou nucleares) e despejos de produtos quí-
micos no meio ambiente (e todo aquela distopia envolvida) e a segunda
referência eram alguns intelectuais que gostávamos de estudar e que ava-
liávamos terem análises sociais “ácidas” entre eles o historiador Eric
Hobsbawm e o antropólogo Massimo Canevacci5, que viriam a ser a base
do meu tcc sobre heavy metal em Sorocaba6.
O zine foi crescendo em torno de publicações de notas sobre shows,
indicação de bandas e documentários, algumas menções sobre fatos da
Educação (já que ambos cursávamos História e estávamos nas caminhadas
iniciais da docência) e até algumas coisas compartilhadas de outros zines.
Até que, no final de 2011, começamos a entrevistar bandas, e posso dizer
que era a forma era risível. Eu mandava uma mensagem em alguma rede
social da banda perguntando se queriam responder uma média de sete
perguntas para o nosso zine e, em geral, aceitavam, logo em seguida bo-
lava as perguntas e mandava num documento de word que tinham umas
orientações e aguardava. Acontecia que não raro tinha que estudar e caçar
informações das bandas que, não conhecia nada além de um som ou outro,
que chegavam aos meus ouvidos por indicação de amigos ou algo visto na
web, e decidia tentar a entrevista quase de forma aleatória. Assim conheci
muitas bandas que mal tinha parado para ouvir na vida.
4
A última publicação foi em 30 de outubro de 2016.
5
Inclusive chegamos à entrevista o Massimo Canevacci em 2013 no Resíduos Tóxicos.
6
Heavy metal em Sorocaba: de 1995 a 2000, tcc apresentado em 2011 na UNISO. O objetivo fora estudar o que para
muitos havia sido o ápice da cena sorocabana e trazer contribuições marxistas para pensar o heavy metal a partir da
totalidade concreta.
Fábio Alexandre Tardelli Filho | 69
Outro fator era que nós não entendíamos nada de teoria musical, e
eu particularmente ainda não entendo, esse é meu lado punk (no mais ho-
nesto e positivo sentido que isso pode ter), então não perguntava sobre
nada de ordem instrumental. E foi disso que ligamos nosso interesse polí-
tico-social com as entrevistas, afinal uma coisa era entrevistar uma banda
que conhecia e curtia, mas as bandas que não conhecia? Não tinha como
enrolar.
Das sete perguntas, dedicava duas para questões políticas da época e
uma para despedida. A coisa no começo era desorganizada chegando a pu-
blicar duas entrevistas no mesmo dia e dez em uma semana. Enfim, em
2011 podíamos dizer que fazíamos a coisa no clássico estilo underground;
desbravando. Inclusive posso dizer que a maestria com a qual a Keyla Ro-
sado conduziu a organização do layout do blogspot foi fora de série,
recordo-me de um músico que trabalhava com páginas ter perguntando
quando pagamos para ter a página daquele jeito.
Com o passar do tempo amigos e amigas da cena foram integrando
nossa equipe, alguns convidados (que podiam ser bem aleatórios) como
Eduarda Yumi (minha ex-aluna) ou (mais ligados ao metal) Guilherme de
Assis o “Volstag”, e nossos “editores”/ “colaboradores” como Augusto Mi-
randa (um desenhista profissional formidável, que inclusive fez a arte
símbolo do RxTx para nós, Augusto tocava na época na banda Mito da Ca-
verna um crust/ doom perturbador e maravilhoso), o Leonardo “Apollo”
(o Léo estava terminando o ensino médio na escola na qual eu era tutor do
Grêmio no qual ele fazia parte, sempre curtiu metal e rap e hoje segue
carreira de rapper), o “Bolaxa” (o Matheus tinha uma rádio virtual desde
adolescente e nos conhecemos por isso, já no ensino superior ajudei ele
apoiando alguns shows que organizou na UFSCar São Carlos como o Con-
quest For Death dos Estados Unidos) e o Felipe Nizuma (o Felipe vi tocando
no Metal For All de Salto com o BrainDeath e ficamos amigos, escrevia
70 | Diálogos com a Música Extrema
textos para nós e nos apoiava bastante com envio de alguns materiais para
distribuir aos envolvidos no projeto e meus alunos e os da Keyla, esses
materiais foram livros do Lenin e Florestan). Entre outros diversos nomes,
eram esses que colaboraram com maior frequência cada um à sua forma.
Fonte apresentada, hora de falar das bandas.
Assault, Exodus, Voivod, Vio-Lence. Mas o que seria esse subgênero? Ian
Christe em Heavy metal: a história completa (2010) cunhou a seguinte sín-
tese:
Em 1985, o power metal já não era rápido o suficiente para conter o ritmo do
underground. Uma nova geração de bandas de thrash metal passou a fazer
riffs no estilo Metallica, aparentemente da noite para o dia. Enquanto o power
metal era uma espécie de heavy metal com esteroides, o thrash metal repetia
as notas palpitantes sustentadas sem esforço, num fluxo contínuo. A música
estava em constante movimento, um intricado corpo de sonoridade grandiosa.
Os looks no palco e outras armadilhas do mundo comercial foram abandona-
das, à medida em que bangers se debruçaram sobre sua música e se
concentraram em fazer letras mais sérias. Outros também o chamavam de
speed metal; puristas apontavam que o thrash metal contava mais com pausas
rítmicas longas e violentas, enquanto o speed metal, como era tocado por
Agent Steel e Destruction, era uma subcategoria mais limpa e musicalmente
complexa, ainda fiel às melodias conflitantes do thrash metal clássico.
(Christe, 2010, p.179)
7
Uma referência ao Warfare Noise I de 1986, nas palavras de Casito do Witchhammer: “A coletânea abriu os olhos
do Brasil para o cenário de Minas.” (RODIE CREW, 60 Grandes álbuns do metal brasileiro, 2013, p. 20). Essa coletâ-
nea, lançada pelo Cogumelo Records, continha quatro bandas do metal mineiro: Chakal, Sarcófago, Mutilator e
Holocausto.
8
Esse é o título do álbum de 1987 do Chakal considerado por muitos, seu maior clássico.
Fábio Alexandre Tardelli Filho | 73
Sou ainda fissurado com essa ideia do universalismo. Mundo sem fronteiras e
essas coisas. Estávamos saindo de um regime ditatorial e para mim foi natural
gritar com liberdade o que eu pensava. Pouca coisa mudou mas hoje tento
74 | Diálogos com a Música Extrema
contrários aos direitos dos trabalhadores. E foi justamente após essas dé-
cadas de crise e espezinhamento de direitos sociais que houve uma
ascensão de governos de linha liberal-progressista no país, com a chega de
Lula e Dilma (ambos do Partido dos Trabalhadores, o PT) à presidência da
República. Mas, independentemente de reconhecer algumas questões de
avanço nos campos econômicos e sociais, se trataram de gestões longe de
estarem em diálogo franco com a classe trabalhadora, não à toa sua polí-
tica de conciliação de classes veio acompanhada de supressão pesada aos
movimentos sociais populares. E foi exatamente nesse contexto que o
thrash metal voltou com força total.
9
Uma referência ao apêndice De Toussaint L'Ouverture a Fidel Castro do livro Os jacobinos negros. Toussaint L'Ou-
verture e a revolução de São Domingos (2010) de C.L.R. James.
10
No livro Balas de Washington (2020), o indiano Vijay Prashad cita uma menção de Fidel Castro ao senador esta-
dunidense George McGovern em 1975 que foram VINTE E QUATRO tentativas de depô-lo, entre assassinatos e golpes
(PRASHAD, 2020, p. 57).
11
VEJA. São Paulo: outubro, ano 40, n. 43, 31 Out. 2007.
12
Na própria página do Partido dos Trabalhadores há esse material: https://pt.org.br/ha-16-anos-lula-lancava-a-
carta-ao-povo-brasileiro/. Apesar de na carta abordar direitos sociais e garantias aos trabalhadores o que se aplicou
de fato foi “[...] esforço conjugado de exportar mais e de criar um amplo mercado interno de consumo de massas”
(CARTA AO POVO BRASILEIRO, 22 de junho 2002). Vale lembrar que Lula realizou uma “Contrarreforma Previden-
ciária” (Marques; Mendes, 2004, p. 3-15) bastante agressiva e Dilma assentou menos famílias que Fernando Henrique
Cardoso (FHC) (http://g1.globo.com/politica/noticia/2015/03/dilma-assentou-menos-familias-que-lula-e-fhc-
meta-e-120-mil-ate-2018.html).
13
E Foi justamente entre maio e junho de 2020 que o então presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tentou tipificar
o movimento antifascista como grupo terrorista para enquadrar nessa lei. Já diria Marx, parafraseando e comple-
tando Hegel, “[...] todos os grandes fatos e todos os grandes personagens da história mundial são encenados por
assim dizer, duas vezes. (...) a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa” (MARX, 2011, p. 25).
Fábio Alexandre Tardelli Filho | 77
Não seria por acaso que o subgênero mais ácido do heavy metal vol-
taria a todo vapor, e para explicar essas razões haviam muitas hipóteses
levantadas por bandas, revistas especializadas e fãs. Em geral avaliavam
como um desgaste do power metal, metal melódico e as bandas do gothic
metal, ou por razões de saturamento de ouvidos, brigas e rupturas nas
principais bandas desses estilos e a qualidade das novas bandas de thrash.
Particularmente vejo a conjunção desses três fatores com mais um: o acir-
ramento da luta de classes em oposição ao pacto de classes em decorrência
da ascensão de governos progressistas e liberais que estavam consolidados
ou ascendendo ao poder pela primeira vez em muitos países após ditadu-
ras civis-militares impostas com apoio dos Estados Unidos ao longo da
Guerra Fria e do macarthismo14.
É justamente nessa direção que encontramos um caminho para nossa
hipótese: a entrevista de Felipe Nizuma do BrainDeath, quando indagado
em entrevista ao Resíduos a respeito das manifestações de junho de 2013
que ainda estavam começando e não haviam descarrilhado da forma como
foi:
Penso que tem uma insatisfação geral sobre o transporte público, mas ela ge-
ralmente se dá no plano individual. Sozinho se faz o que? É muito caro, sempre
lotado, aqui em São Paulo é um inferno. 2 ou 3 horas no trânsito só pra ir,
mais 9 horas de trampo, depois a volta, quando você vê, são 13 ou 14 horas na
rua... Sempre que tem aumento o MPL e outras organizações chamam o ato.
Dessa vez talvez esteja sendo diferente porque a insatisfação individual se tor-
nou coletiva. O Sindicato dos Metroviários, um dos mais combativos hoje por
aqui, já estava em campanha contra o aumento das passagens algumas sema-
nas antes - o abaixo assinado oficial foi divulgado por eles e replicado pelo MPL
-, então o que se tira disso é que a politização não é espontânea, mas sim fruto
14
Foi um controverso movimento político estadunidense que para combater o comunismo iniciou uma verdadeira
caça aos movimentos de esquerda. Inclusive com muita propaganda falsa e acusações graves e sem fundamentos
sobre países alinhados com a União Soviética (URSS).
78 | Diálogos com a Música Extrema
Sobre "nasceram nesse mundo", só quer dizer, que na arte, às vezes as pessoas
(inclusive intelectuais) tendem a achar que é um mundo separado. O que de-
termina a arte são os meios materiais para a produção da arte. Então
relativamente, o The Force do Paraguai é qualitativamente muito mais bem
elaborado do que o Bonded By Blood dos EUA, porque a falta de condição ma-
terial-financeira latino-americana para se produzir música impõe que se
elabore muito mais o que está se fazendo do que quem tem um estúdio enorme
e uma gravadora bancando. (RESÍDUOS TÓXICOS, Entrevista com Felipe
Nizuma (Urutu, BrainDeath e Six & Rebels), 15 de junho de 2013)
Acho que bandas como Violator, D.E.R. e Defy têm ajudado a elevar o grau de
consciência sobre as coisas. Pode notar que as três atingem os objetivos de
cada "estilo" muito bem. A galera sabe o que tá fazendo. Não acham que são
diferentes porque tocam thrash-grind-crust. São diferentes porque sabem que
não é roupa, nem cabelo que vai fazer a pessoa ser diferente. Creio que ajuda
sim a criar um setor de resistência. Ainda que bem pequeno, porque não são
músicas que atingem as "massas", mas ajudam a organizar um setor jovem,
moraliza bastante sobretudo, a juventude. Mas ainda acho que o embate po-
deria ser maior, e aí que entraria o papel de auto organizar em fóruns pelo
menos - porque as denúncias dentro do "underground" ainda têm caráter
muito grande de insatisfação individual, e tendem a achar que denúncias de
nazismo, fascismo, machismo, homofobia, dividem o underground. Inclusive
com discursinho de direita, que sempre vai dizer que é "patrulha ideológica"
como ouvi certa vez de um "colega" que dizia coisas racistas/machistas/ho-
mofóbicas em fóruns do antigo orkut. Tá vendo como faz falta a auto-
organização? (RESÍDUOS TÓXICOS, Entrevista com Felipe Nizuma (Urutu,
BrainDeath e Six & Rebels), 15 de junho de 2013)
80 | Diálogos com a Música Extrema
O som fala sobre luta de classes de maneira bem simples, porém o conceito
está ali. Parto do seguinte pensamento “Luta de Classes tem todo dia”. Sendo
nosso país capitalista temos, portanto, luta de classes. É verdade que as coisas
estão um tanto diferentes que na época de Marx, porém o conflito entre “Pa-
trão e Peão” continua dado. Temos ainda uma série de mecanismos que já no
século XIX Marx havia visto como a mais valia, os monopólios, Estado burguês
e coisas do tipo. Portando a luta de classes continua viva, Burgueses e Proletá-
rios continuam em conflito. (RESÍDUOS TÓXICOS, Entrevista com a banda
Critical Fear thrash metal!, 19 de março de 2012)
15
Uma referência à música Revolution’s Necessary do álbum Conflicts (2011).
16
Em tradução nossa a letra fica assim: “Gloria à União Soviética/ Terra do imortal Lenin/ Nascida pela Revolução
de Outubro, foi a vontade de todas as pessoas/ A burguesia desapareceu/ As pessoas são livres/ Por constituição
apenas uma classe/ Vitória dos trabalhadores”.
Fábio Alexandre Tardelli Filho | 81
17
Essa categoria aparece justamente nos dois textos de Marx que trabalhamos até aqui. No Manifesto do Partido
Comunista (2004) Marx afirma: “[...] essa putrefação passiva dos estratos mais baixos da velha sociedade, pode, aqui
e ali, ser arrastado ao movimento por uma revolução proletária; no entanto, suas condições da existência o predispõe
bem mais a se deixar comprar por tramas reacionárias” (MARX, 2004, p. 55). Já no 18 de brumário essa definição
aparece da seguinte forma: “Roués ´[rufiões] decadentes com meios de subsistência duvidosos e de origem duvidosa,
rebentos arruinados e aventurescos da burguesia eram ladeados por vagabundos, soldados exonerados, ex-presidiá-
rios, escravos fugidos pelas galeras, gatunos, trapaceiros, lazzaroni [lazarones], batedores de carteira,
prestidigitadores, jogadores, maquereaux [cafetões], donos de bordel, carregadores, literatos, tocadores de realejo,
trapadeiros, amoladores de tesoura, funileiros, mendigos, em suma, toda essa massa indefinida, desestruturada e
jogada de um lado para outro, que os franceses denominam la bohème [a boemia] [...]” (MARX, 2011, p. 91). Ainda
que nesse caso esteja abordando um contexto, a França, e um momento específico, a formação por Luís Bonaparte
da Sociedade 10 de dezembro, nos serve justamente para pensar a respeito dessas figuras dos aventureiros e boêmios
que se jogam a depender para aonde a História pesa, inclusive servindo sem pestanejar aos interesses das classes
dominantes e contra as lutas dos trabalhadores.
82 | Diálogos com a Música Extrema
Culture é uma das duas ou três palavras mais complicadas da língua inglesa.
Isso ocorre em parte por causa de seu intrincado desenvolvimento histórico
em diversas línguas europeias, mas principalmente porque passou a ser usada
para referir-se a conceitos importantes em diversas disciplinas intelectuais
distintas e em diversos sistemas de pensamento distintos e incompatíveis
(WILLIANS, 2007, p. 117).
O termo art é usado no inglês desde o séc. 13, da p.i. art, do francês antigo, e
da p. r. latina artem, habilidade. Teve ampla aplicação, sem especialização pre-
dominante, até finais do séc. 17, em assuntos tão diversos quanto matemática,
medicina e pesca com vara. Nos currículos das universidades medievais, as
artes (“as sete artes” e, mais tarde, “as artes LIBERAIS” [v.]) eram a gramática,
a lógica, a retórica, a aritmética, a geometria, a música e a astronomia; e
84 | Diálogos com a Música Extrema
artista, a partir do séc. 16, foi primeiro usado nesse contexto, embora com
desenvolvimentos quase contemporâneos para descrever qualquer pessoa ha-
bilidosa (como tal, o termo é substancialmente idêntico a artesão até finais do
séc. 16) ou praticamente de uma das artes correspondentes ao grupo presidido
pelas sete musas: história, poesia, comédia, tragédia, música, dança e astrono-
mia. Adiante, a partir do final do séc. 17, tornou-se cada vez mais comum uma
aplicação especializada a um conjunto de habilidades até então não represen-
tadas formalmente: pintura, desenho, gravura e escultura. O uso hoje
dominante de arte e artista para referir-se a essa habilidade ainda não estava
estabelecido plenamente até o final do séc. 19 [...]” (WILLIANS, 2007, p. 60).
Mas nem acho que seja obrigação de artistas fazerem isso18, a diversão e a
distração tem que sim fazer parte de uma nova sociedade, porque a "aliena-
ção" cultural de hoje tem mais a ver com quem domina a difusão cultural,
então temos que tomar as rédeas. Não queremos uma sociedade em preto-e-
branco com fábricas cinzas ao fundo, creio que o que tem que emergir em
termos de "cultura" seja todas as frentes de arte e cultura nas mãos da classe
trabalhadora, para retratarem o mundo da forma como achar melhor. Não é
que o artista tenha que ter a obrigação de retratar a "realidade" de denunciar,
tem que ser livre pra denunciar ou não, mas a obrigação talvez, seja a de tomar
a direção de quem comanda a "cultura". (RESÍDUOS TÓXICOS, Entrevista
com Felipe Nizuma (Urutu, BrainDeath e Six & Rebels), 15 de junho de 2013)
18
Músicas políticas e trazerem assuntos sociais em suas letras. Essa resposta é um trecho para a seguinte pergunta:
“RxTx - Indo para o lado das bandas das quais você faz parte. Vocês têm alguma letra ou algum material preparado,
que aborde esse momento histórico, especificamente? Ou não pretendem nada nessa direção, pelo menos nesse mo-
mento?” (RESÍDUOS TÓXICOS, Entrevista com Felipe Nizuma (Urutu, BrainDeath e Six & Rebels), 15 de junho de
2013).
86 | Diálogos com a Música Extrema
19
É muito comum fãs de heavy metal alegarem, por exemplo, que odeiam o funk porque é uma modinha e mero
consumismo. Oras e o que foi o metal nos anos 80? Foi justamente se opondo a isso que, entre outros estilos e
inclusive dentro do próprio metal, que vieram subgêneros como grunge (e que ironicamente virou outra “modinha”).
Por outro lado, há também aqueles que tentam significar o funk em uma pauta identitarista, acima de espaço e
tempo, como ele estivesse por si enfrentando a supracultura expressa nos gêneros de rock e outras subculturas.
Fábio Alexandre Tardelli Filho | 87
20
Abordei esse debate com maior profundidade em minha defesa de mestrado na qual discuti diversas questões a
respeito da categoria de classe social, entre elas heterogeneidade com base no historiador britânico Eric Hobsbawm.
90 | Diálogos com a Música Extrema
21
No thrash metal quem bem exprime esse caso é o Slayer. Com músicas bastante contestadoras, mas na posição
política de Tom Araya, o vocalista chileno, assume um papel extremamente conservador que em nada combina com
álbuns como Hell Awaits (1985) e God Hates us All (2001). Outro exemplo famoso é Alice Cooper, base para bandas
como Anthrax, Rage Against The Machine e até mesmo sendo referência para uma moça transsexual na qual Gilberto
Gil se baseou para escrever Edyth Cooper, mas o próprio Vicent Damon (o nome verdadeiro de Alice Cooper) já deu
inúmeras entrevistas de que não liga para questões político-sociais e que política deve passar longe da música, ainda
que ele mesmo seja considerado um músico politizado com algumas de suas músicas.
22
Uma banda que me surpreendeu, positivamente, nesse sentido foi o Asomvel da Inglaterra. Com seu heavy metal
bastante despretensioso musicalmente, ou como definem sem nenhum assunto específico em suas letras, os ingleses
se engajaram bastante na pauta do Black Lives Matter se assumindo antirracistas e antifascistas.
Fábio Alexandre Tardelli Filho | 91
Suponho que ninguém possa pensar, por tudo isso, que eu corrobore a ideia
de a formação da classe ser independente de determinações objetivas, nem
que eu sustente que classe possa ser definida como simples fenômeno cultural,
ou coisa semelhante. [...] A classe se delineia segundo o modo como homens e
mulheres vivem suas relações de produção e segundo a experiência de suas
situações determinadas, no interior do “conjunto de suas relações sociais”,
com a cultura e as expectativas a eles transmitidas e com base no modo pelo
qual se valeram dessas experiências em nível cultural. De tal sorte que, afinal,
nenhum modelo pode dar-nos aquilo que deveria ser a “verdadeira” formação
de classe em um certo “estágio” do processo. (THOMPSON, 2012, p. 277)
Referências
CHRISTE, Ian. Heavy metal: a história completa. Trad. Milena Durante e Augusto Zantoz.
São Paulo: Arx, Saraiva, 2010.
EAGLETON, Terry. A ideia de cultura. Trad. Sandra Castello Branco; ver. tec. Cezar
Mortari. 2ª ed. São Paulo: Editora Unesp, 2011.
MARX, Karl. Manifesto do partido comunista. Trad. Pietro Nassetti. São Paulo: Editora
Martin Claret, 2004.
MATTOS, Marcelo Badaró. A classe trabalhadora: de Marx ao nosso tempo. 1ª ed. São
Paulo: Boitempo, 2019.
PRASHAD, Vijay. Balas de Washington: Uma história da CIA, golpes e assassinatos. 1ª ed.
São Paulo: Editora Expressão Popular, 2020.
94 | Diálogos com a Música Extrema
__________. A peculiaridade dos ingleses e outros artigos. Org. Antonio Luigi Negro e
Sergio Silva. 2ª Ed. Campinhas-SP: Editora da Unicamp, 2012.
__________. Cultura e Materialismo. Trad. Adré Glaser. São Paulo: Editora Unesp, 2011.
Leis
Sites e entrevistas
Dilma assentou menos famílias que Lula e FHC; meta é 120mil até 2018, G1 <
http://g1.globo.com/politica/noticia/2015/03/dilma-assentou-menos-familias-que-
lula-e-fhc-meta-e-120-mil-ate-2018.html > Acessado em: 19 de maio de 2020.
Entrevista com a banda Chakal, lenda do Death metal brasileiro, Resíduos Tóxicos <
http://residuotoxico.blogspot.com/2011/12/entrevista-com-banda-chakal-lenda-
do.html > Acessado em: 21 de maio de 2020.
Entrevista com Felipe Nizuma (Urutu, Brain Death e Six & Rebels), Resíduos Tóxicos <
http://residuotoxico.blogspot.com/2013/06/entrevista-com-felipe-nizuma-
urutu.html > Acessado em: 23 de maio de 2020.
Fábio Alexandre Tardelli Filho | 95
Entrevista com a banda Critical Fear thrash metal!, Resíduos Tóxicos <
http://residuotoxico.blogspot.com/2012/03/entrevista-com-banda-critical-
fear.html > Acessado em: 23 de maio de 2020.
Revista
RODIE CREW, 60 grandes álbuns do metal brasileiro, ano 16, n° 172. Maio de 2013.
Letras de músicas
Da língua ao discurso
exterioridade à língua, não como mero pano de fundo, mas uma exterio-
ridade sócio-histórica constitutiva de toda produção enunciativa.
A Análise do Discurso é uma área bastante ampla e, atualmente, abor-
dagens teóricas diversas identificam-se a essa denominação disciplinar.
Assim, o que fizemos nos parágrafos acima foi uma apresentação bastante
sintética, sem pretender ser completa. Como, em minha pesquisa de dou-
torado, fundamentei-me especificamente em um teórico chamado
Dominique Maingueneau, dedico a parte final desta seção para apresentar,
também brevemente, alguns desenvolvimentos teóricos que constituem os
estudos desse autor e que foram importantes para que eu pudesse analisar
o discurso do death metal.
Maingueneau é um analista de discurso com uma extensa, e ainda
ativa, produção na área. Em uma de suas principais obras, Gênese dos Dis-
cursos (2008 [1984]), ele apresenta sete hipóteses que direcionam
metodologicamente suas pesquisas. Em outras obras, algumas delas mais
recentes, o autor tem tratado de variados temas e questões: o discurso li-
terário, a hipergenericidade, o ethos discursivo, as cenas de enunciação, o
discurso pornográfico, a enunciação aforizante etc.
Dentre as sete hipóteses referidas no parágrafo anterior, abordarei
brevemente apenas duas delas, devido à limitação espacial, tendo em vista
que são as mais pertinentes para que a exposição propriamente dita da
análise que fiz sobre o death metal torne-se mais palpável. São elas a pri-
meira e a terceira hipóteses propostas em Gênese dos Discursos. Conforme
a primeira, o interdiscurso tem precedência sobre o discurso. Em outras
palavras, esse primado do interdiscurso faz com que a unidade pertinente
de análise não seja um discurso em suas relações internas, mas um espaço
de trocas entre discursos de um mesmo campo (e tal espaço só se constitui
a partir de uma problemática de pesquisa levantada pelo analista). É a re-
lação interdiscursiva, sendo assim, que estrutura a identidade semântica
Lucas Martins Gama Khalil | 103
1
Faz-se alusão, respectivamente, a canções das bandas Cannibal Corpse (Hammer Smashed Face e I Cum Blood) e
Obituary (Infected).
2
Tradução nossa: Hipertrofia sangrenta das papilas vomitando uretrite como urticária/ Septicemia preenche a
derme queimada pela noctúria úrica ácida// Uretra verrucosa/ Condiloma glutinoso// Ureterocele excretando pên-
figos quentes, apodrecidos e císticos/ Corroendo na carne com rançoso desejo uraturial.
Lucas Martins Gama Khalil | 111
3
“Um Completo Foda-se a todas as pessoas que nos rotulam como rockstars ou dizem que nos vendemos” (encarte
do álbum Harmony Corruption, da banda Napalm Death).
4
“Não é algo que eu faça pela imagem, pelo dinheiro ou por promoção, é tudo pessoal” (David Vincent, vocalista e
baixista da banda Morbid Angel, no documentário 666 at Calling Death)
5
“Aquilo foi uma parte de seu charme: seu espírito rebelde, um dedo do meio na cara do mainstream” (Karl Sanders,
da banda Nile, sobre a aparição da banda Cannibal Corpse no filme Ace Ventura). Retirado de Purcell (2003, p. 27).
116 | Diálogos com a Música Extrema
Referências
AMOSSY, Ruth. O ethos na intersecção das disciplinas: retórica, pragmática, sociologia dos
campos. In: ______ (org.). Imagens de si no discurso. 2. ed. São Paulo: Contexto,
2013.
BLANCHARD, John. Rock in… Igreja!? 5. ed. São José dos Campos: Editora Fiel da Missão
Evangélica Literária, 1993.
CANNIBAL CORPSE. Eaten Back to Life. Estados Unidos: Metal Blade, 1990.
ECKERS, Cornelia; HUTZ, Diana; KOB, Malte; MURPHY, Peter; HOUBEN, Diana;
LEHNERT, Bernhard. Voice production in death metal singers. International
Conference on Acoustics. Rotterdam, 2009.
GICK, Brian; WILSON, Ian; DERRICK, Donald. Articulatory phonetics. New Jersey: Wiley-
Blackwell, 2013.
120 | Diálogos com a Música Extrema
KHALIL, Lucas. A voz demoníaca encenada: uma análise do discurso do death metal.
Jundiaí: Paco Editorial, 2018.
LAVER, John. The phonetic description of voice quality. Cambridge: Cambridge University
Press, 1980.
MAINGUENEAU, Dominique. Gênese dos discursos. Tradução Sírio Possenti. São Paulo:
Parábola Editorial, 2008.
PURCELL, Natalie. Death Metal music: the passion and politics of a subculture. Jefferson –
Carolina do Norte: McFarland, 2003.
SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Linguística Geral. Organizado por Charles Bally e
Albert Sechehaye. 4ª ed. São Paulo: Cultrix, 1972.
Introdução
1
Mestre em História pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade de Brasília (PPGHIS/UnB). E-
mail: <moa7782@gmail.com>.
122 | Diálogos com a Música Extrema
2
O’Hara faz a seguinte definição para a ideia de “cena punk”: “a cena é a comunidade punk e a palavra que os
punks usam para descrevê-la. Há cenas locais, cenas nacionais e cenas mundiais” (2005, p.22).
3
Repertórios interpretativos podem ser compreendidos como “dispositivos linguísticos que utilizamos para cons-
truir versões das ações, eventos e outros fenômenos que estão a nossa volta” (POTTER; WETHERELL Apud SPINK,
2013, p. 28).
124 | Diálogos com a Música Extrema
4
Navarro-Swain (2011) ensina que são “tecnologias” ou ‘pedagogias’ sociais a educação formal, as mídias, a internet
e tudo aquilo que, de alguma forma, participa da construção e mediação do conhecimento socialmente partilhado,
criando “verdades, estruturas mentais, instituições, normas, modelos, comportamento [...]. As pedagogias sociais
encarregam-se de sua divulgação em termos de tradição, evidências, valores [...], reiterando imagens naturalizadas
[...]. As representações sociais atravessam assim todo ensinamento e aprendizado, tornando evidente aquilo que é
construído social e politicamente”. Falamos aqui de “pedagogias sociais de resistência” no intento de delinear alter-
nativas libertárias que se opõem às estruturas de poder dominantes que operam disciplinamento e opressão de
condutas.
5
A dissertação “Violentos, selvagens e baderneiros: representações e modos de subjetivação do punk no jornal Cor-
reio Braziliense (1990-2014)”, resultante de minha pesquisa de mestrado no Programa de Pós-Graduação em História
da Universidade de Brasília (PPGHIS/UnB).
126 | Diálogos com a Música Extrema
6
Nesse sentido, me apoio na perspectiva pós-estruturalista butleriana acerca das identidades. Ao questionar a uni-
versalidade da categoria “mulher” no pensamento feminista, Judith Butler irá afirmar que o gênero não é uma
categoria totalizante sob a qual alguém é definido enquanto mulher. Segundo a teórica, “o gênero estabelece inter-
seções com modalidades raciais, classistas, étnicas, sexuais e regionais de identidades discursivamente constituídas”
(BUTLER, 2003, p. 20). De modo semelhante, não é possível compreender questões que envolvem sexualidade, classe
e raça sem levar em conta os entrecruzamentos ou intersecções que essas categorias mantêm em relação aos con-
textos políticos, históricos e culturais nos quais são produzidas. Nessa mesma toada, ensina-nos Stuart Hall, a
identidade não corresponde a modelos estáticos, mas se processa como “‘celebração móvel’, formada e transformada
continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que
nos rodeiam” (HALL, 2006, p. 13), ou seja, falar de identidade é falar de algo submetido às contingências, algo fugidio
e em constante transformação. Assim, a raça, o racismo e as identidades raciais, como construtos culturais e históri-
cos, são passíveis de problematização e podem ser desconstruídos/desnaturalizados.
Moacir Oliveira de Alcântara | 129
[...] uma posição em que sujeitos que ocupam esta posição foram sistematica-
mente privilegiados no que diz respeito ao acesso a recursos materiais e
simbólicos, gerados inicialmente pelo colonialismo e pelo imperialismo, e que
se mantêm e são preservados na contemporaneidade (SCHUCMAN Apud
ALMEIDA, 2019, p. 75).
7
Cardoso faz distinção entre formas de discriminação “justas” e “injustas”. Para tanto, o autor se utiliza das ações
afirmativas para fins de exemplificação do tipo justo de discriminação racial, ou seja, aquela que se emprega na
promoção da igualdade racial. No sentido inverso, a discriminação racial “injusta” seria coincidente com o próprio
racismo e os seus efeitos na criação das desigualdades e subalternizações entre diferentes raças.
132 | Diálogos com a Música Extrema
8
Misanthropic Division é um grupo neonazista originário da Ucrânia com células espalhadas em diversas partes do
mundo, incluindo o Brasil. Segundo o site Ponte.org, em abril de 2020 a Polícia Civil do Estado de São Paulo recebeu
denúncias e passou a investigar pessoas ligadas ao grupo por apologia ao nazismo e ataques virtuais a minorias,
especialmente judeus. Disponível em: < https://ponte.org/policia-civil-de-sp-investiga-grupo-por-apologia-ao-na-
zismo/ >. Acesso em 31 jul. 2020.
134 | Diálogos com a Música Extrema
9
A tradução literal da expressão seria “alfabetização racial”. No entanto, Schucman (2012) a traduz como “letramento
racial”, ideia que remete de maneira mais imediata à desnaturalização/desconstrução de formas de agir e pensar
orientadas por privilégios de raça. Em outro sentido, a ideia de letramento racial também remete à construção de
narrativas positivas acerca da população negra, possibilitando a superação de sua condição histórica de subalterni-
dade.
136 | Diálogos com a Música Extrema
10
Segundo informações do site da Anti-Defamation League, organização judaica com sede em Nova York, a Aryan
Nations é um dos mais longevos grupos neonazistas estadunidenses. A organização, enfraquecida após a morte do
seu líder fundador Richard Butler em 2004, teve o seu auge entre as décadas de 1980 e 1990 e se destaca pelo extre-
mismo na defesa de suas posições racistas e xenófobas (ARYAN..., 2020).
11
Há que se distinguir as noções de branquitude e brancura. Se a primeira, como já exposto, diz respeito “a um lugar
de poder, de vantagem sistêmica nas sociedades estruturadas pela dominação racial”, a segunda é definida pelas
“características fenotípicas que se referem à cor da pele clara, traços finos e cabelos lisos de sujeitos que, na maioria
dos casos, são europeus ou euro-descendentes” (SCHUCMAN, 2012, p. 102).
12
“Fuck your racist stereotypes/ Fuck the Aryan Nation!/ Fuck your anti-semitism/ Fuck the Aryan Nation!/ Fuck
your homofobia/ Fuck the Aryan Nation!/ Fuck your xenofobia/ Fuck the Aryan Nation!” (ABSENT..., 2001).
Moacir Oliveira de Alcântara | 137
antirracista anarchopunk que perpassa Absent Minded. Ainda que não tra-
gam manifestamente representações do grupo neonazista opositor, esses
versos devem ser avaliados em sua relação de intertextualidade com enun-
ciados antirracistas disseminados em zines, informativos, na arte, nas
iconografias, performances e outras práticas culturais do punk, já que si-
nalizam relações entre identidades e subjetividades anarchopunks e
práticas antirracistas.
No trecho destacado, a expressão “fuck” aparece repetidas vezes
sendo direcionada às crenças defendidas pelo grupo racista Aryan Nations.
Tida como uma das mais chulas e ofensivas expressões do idioma inglês,
“fuck it” equivale à expressão “foda-se” em português, utilizada quando se
tem a intenção de repelir, rechaçar ou opor-se a algo ou a alguém de ma-
neira grosseira, manifestando irritação ou indignação. O instrumental da
parte introdutória da canção é composto sobre uma única nota que ressoa
por quatro vezes sobre uma sequência de viradas de bateria. Esse recurso
erige uma atmosfera de tensão na introdução da canção, reforçando os
efeitos de afirmação e agressividade que emolduram a mensagem antirra-
cista. A mensagem se processa tanto na dimensão da letra quanto do
instrumental da música, criando um efeito enfático. Aquilo que se atribui
ao grupo neonazista representado em Absent Minded – antissemitismo,
homofobia, xenofobia e ideário baseado em estereótipos racistas – é ex-
presso enquanto atributos do “Outro”, ou seja, implicitamente classificado
como pertencente à esfera da branquitude acrítica (CARDOSO, 2010). A
estratégia discursiva empregada no excerto destacado demarca traços sub-
jetivos e identitários de anarchopunks que se posicionam radicalmente
enquanto antirracistas.
Nesse sentido, os versos que abrem Absent Minded apontam para
uma noção crucial à delimitação de uma branquitude antirracista no anar-
chopunk, ou seja, que não apenas desaprova publicamente o racismo, mas
138 | Diálogos com a Música Extrema
Uma vez que a identidade muda de acordo com a forma como o sujeito é in-
terpelado ou representado, a identificação não é automática, mas pode ser
ganhada ou perdida. Ela tornou-se politizada. Esse processo é, às vezes, des-
crito como constituindo uma mudança de uma política de identidade (de
classe) para uma política de diferença (HALL, 2006, p. 21).
Moacir Oliveira de Alcântara | 139
13
“Lacking understanding and longing for consistency/ Small-minded bigots cowering in the face of diversity/ Scape-
goating the minorities for all of society's flaws/ Projecting false statistics to legitimize their cause/ The amassing of
recruits has been rendered by deceit/ Spewing racist stereotypes to influence beliefs/ Brainwashed by the rhetoric
that reaffirms their fears/ Oblivious to the reality that prejudice never hears” (ABSENT..., 2001).
Moacir Oliveira de Alcântara | 141
Assim, as imagens que a banda Aus Rotten difunde acerca dos segui-
dores da Aryan Nations em Absent Minded, para além de revelarem
práticas, discursos, concepções e modos de ser de supremacistas brancos,
trazem, segundo a perspectiva anarchopunk, representações que questio-
nam o tipo de branquitude que caracteriza o referido grupo de extrema-
direita. Ao descrever e questionar os atributos do grupo neonazista, subor-
dinado a discursos que atestam o temor racista em relação à perda de
privilégios e alienado pelos preconceitos que cultiva, a canção acarreta pro-
cessos de subjetivação de sujeitos anarchopunks que constituem
resistência ao racismo a partir da identificação de princípios que regem as
condutas do grupo Aryan Nations, ao qual rechaça. Quando sujeitos anar-
chopunks brancos conscientemente criam seus modos de representar
racistas/neonazistas – covardes, intolerantes, obtusos e crédulos em afir-
mações inverídicas e estereotipadas acerca de grupos raciais não brancos
– esses sujeitos articulam as suas identidades a partir da interrupção dos
parâmetros discursivos sobre a raça branca correntes na cultura estadu-
nidense. Rompendo o silêncio sobre a raça e o racismo com base na crítica
a um grupo racista, os anarchopunks estão a confrontar a própria “fragili-
dade branca” sobre a qual DiAngelo (2018) discorre. Desse modo, Absent
Minded evidencia a opção do sujeito anarchopunk por avançar da mera
desaprovação pública em relação ao racismo (branquitude crítica) para
efetivas práticas antirracistas.
O andamento hardcore/crust de Absent Minded tem continuidade no
refrão e nas estrofes seguintes. No entanto, o riff empregado no refrão,
que se inscreve em uma construção musical baseada em um fraseado de
cromatismo, ressalta ainda mais a atmosfera de tensão presente em toda
Moacir Oliveira de Alcântara | 143
14
“It's pathetic that their loudest proudest characteristic is the color of their skin” (ABSENT..., 2001).
15
"Believing in their superiority while functioning as pawns/ To manipulative politicians who plant submissive
seeds" (ABSENT..., 2001).
144 | Diálogos com a Música Extrema
16
Segundo Alexander (2017), os argumentos que sustentam a chamada “Guerra às drogas”, iniciada pelo governo
norte-americano nos anos 1970, são adjacentes à disseminação de estereótipos de usuários de drogas através da
mídia. A autora assinala que o governo Reagan, por exemplo, foi responsável por iniciar uma campanha midiática
em torno da alavancada do crack nos guetos dos Estados Unidos. “Praticamente da noite para o dia, a mídia estava
saturada de imagens de “putas do crack”, “traficantes do crack” e “bebês do crack” – imagens que pareciam confirmar
os piores estereótipos raciais a respeito dos moradores das regiões empobrecidas dos centros das cidades”
(ALEXANDER, 2017, p. 40).
17
“I'm tired of the intimidation and manipulation that they use/ I'm tired of hearing about another racially motivated
attack/ That's why it's so important that we never turn our backs/ Our inaction and indifference provide the strength
they get/ When we keep our silence we invite this racist threat/ Let's make these bigots as non existent as their
minds/ They don't deserve any sympathy that they can hide behind” (ABSENT..., 2001).
Moacir Oliveira de Alcântara | 145
Considerações finais
Referências
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identidades. Textos de História, Brasília, v.15, n. 1/2, p. 209-223, 2007. Disponível
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O’HARA, Craig. A filosofia do punk: mais do que barulho. 1. ed. São Paulo: Radical Livros,
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RIBEIRO, Djamila. O que é lugar de fala? 1. ed. Belo Horizonte: Letramento, 2017.
SPINK. Mary Jane P.; MEDRADO, Benedito. Produção de Sentido no Cotidiano: Uma
abordagem teórico-metodológica para análise das práticas discursivas. In:
SPINK, Mary Jane P (org.). Práticas discursivas e produção de sentidos no cotidiano.
Edição virtual. Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2013. p. 22-41.
THE ART OF REVOLUTION – an ABC No Rio Benefit – Part Twelve, 1997. 1 vídeo (120min).
Publicado pelo canal Point Of Interest Zine. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=jziOkjZgd0I. Acesso em: 28 jul. 2020.
150 | Diálogos com a Música Extrema
Referências Fonográficas
ABSENT minded. Intérprete: Aus Rotten. Compositor: Aus Rotten. In: THE ROTTEN
Agenda. Intérprete: Aus Rotten. Pittsburgh: Rotten Propaganda Records, 2001. 1
disco vinil, lado B, faixa 4 (2 min 10 seg).
Autor: Márcio Destito
5
O antipátria:
ensaio de uma transvaloração dos valores no Black Metal
Roberto Scienza
Introdução
1 Black Metal ist Krieg (Black Metal é Guerra) é o nome do terceiro álbum da banda norueguesa Nargaroth, lançado
em 2001. Seu título é uma das frases mais repetidas na cena de Black Metal no mundo todo.
154 | Diálogos com a Música Extrema
filósofo alemão tem sobre essa vertente extrema do metal, sendo referên-
cia direta na obra de centenas bandas. Algumas notórias referências às
ideias de Nietzsche estão presentes na música do BATHORY, Gorgoroth,
Judas Iscariot, Anaal Nathrakh, Hate Forest, entre outros. No Black Metal,
Nietzsche foi utilizado para afirmar o anticristianismo, glorificar povos pa-
gãos, defender o elitismo e individualismo, críticar a moral e transvalorar
valores. No entanto, assim como fizeram os nazistas, black metallers ra-
cistas se utilizaram de Nietzsche para sustentar valores eugênicos e
supremacistas e propagar políticas de extrema-direita.
Com a finalidade de entender como isso ocorreu, desenvolve-se a re-
lação entre o anticristianismo deste começo da cena do Black Metal e o
anticristianismo de Nietzsche, principalmente por meio da banda sueca
BATHORY. Observa-se que o anticristianismo satânico-nietzschiano no
Black Metal passa a afirmar religiões pagãs e um nacionalismo romântico
ainda com o BATHORY, especialmente quando a banda começa a abordar
histórias sobre os Vikings. Este discurso se desenvolve de maneira bas-
tante expressiva na cena norueguesa, com destaque para o Burzum,
fortalecendo discursos de extrema-direita e de supremacia racial nesses
países, que se estenderam para a cena de National-Socialist Black Metal
(NSBM ou Black Metal Nacional-Socialista) na Europa e no mundo. Afir-
mamos que a influência dos escandinavos não se restringe à música, mas
também à cultura e ideologia do Black Metal ao redor do mundo. Leva-se
em consideração o nacionalismo e a xenofobia presentes na Escandinávia,
uma vez que as bandas que mais influenciaram a cultura black metaller
são dessa região da Europa. Toma-se o BATHORY e a cena norueguesa
(nas personagens de Euronymous e Varg Vikernes) como objetos de aná-
lise. Denuncia-se o conteúdo político e religioso em seus discursos
expresso por meio das bandas BATHORY, Mayhem e Burzum e entrevistas
e declarações públicas de Quorthon, Euronymous e Varg.
Roberto Scienza | 155
Da Encruzilhada ao Inferno
O Rock N' Roll tem uma longa história com Satanás, seja na figura do
pecado e da libertinagem, na do oculto ou ainda na do adversário, aquele
que questiona os valores cristãos. Desde suas raízes no Blues, o diabo era
uma figura bastante abordada por artistas como Robert Johnson, Skip Ja-
mes e Son House. Robert Johnson, aliás, ficou famoso por suas canções
que tinham o diabo como tema, como Crossroads e Me and The Devil
Blues. No metal, as coisas só ficaram mais aparentes. Do Black Sabbath ao
Iron Maiden, Satanás já era trabalhado de maneira explícita.
Os escritos de Anton LaVey (1969) são particularmente populares
entre headbangers. LaVey foi o autor da bíblia satânica e fundador da
Igreja de Satã. O satanismo moderno de LaVey, surgido do contexto con-
tracultural dos Estados Unidos em meados dos anos 1960, criou sua
primeira igreja em 1966, na cidade de São Franciso. Na bíblia satânica,
Satã é tomado como símbolo de soberania e vontade individual. LaVey
(1969) pregava a exaltação do ser humano e a destruição de paradigmas.
Um pensamento bastante progressista. A Igreja de Satã chegou a patroci-
nar bandas de rock psicodélico que estavam emergindo na cena de São
Francisco no final dos anos 1960, como Coven, banda americana que tinha
letras ligadas a magia negra e satanismo (OLSON, 2008). Os satanistas
ligados à LaVey nunca simpatizaram com discursos conservadores, homo-
fóbicos e totalitários, pois viam nisso uma volta a valores cristãos. Não há
adoração a Satanás, sacríficios humanos, nem nada do tipo, mas rituais
teatrais e orgias regadas a drogas, nas quais muitos músicos da época par-
ticiparam.
Roberto Scienza | 157
A banda que cunhou o termo Black Metal foi a inglesa Venom, por
meio de seu segundo álbum, Black Metal, de 1982. Este álbum, inclusive,
já trazia também uma estética que seria amplamente copiada no subgê-
nero: a monocromia e o uso da fonte Old English. E o som? Bem, o Venom
era certamente mais pesado que as outras bandas da New Wave of British
Heavy Metal (NWOBHM), bastante influenciada pela cena punk e com
uma abordagem lírica e imagética explicitamente satânica. Antes de seu
álbum de 1982, o seu primeiro álbum, Welcome to Hell (1981), já causava
um tremendo desconforto na comunidade cristã.
tinha, além de LaVey, uma forte relação com a filosofia nietzschiana, pois
Nietzsche fez inúmeras e notórias críticas ao cristianismo e via no diabo
um símbolo de emancipação. “O Diabo: o mais velho amigo do conheci-
mento” (NIETZSCHE, BM, §129). Nietzsche é o imoralista (EH), o
destruidor par excellence (EH), o anticristo (AC), o anunciador da morte
de deus (ZA). E assim querem ser os black metallers. O alemão era filho e
neto de pastores luteranos e teve uma educação bastante rígida e encami-
nhada para a teologia. Sua crítica ao cristianismo começou a ser moldada
na adolescência. O filósofo via no cristianismo a fonte da pobreza de espí-
rito, que controla seus crentes por meio da culpa e da promessa de um
além-mundo e ideais ascéticos (AC). Em sua obra, Genealogia da Moral,
Nietzsche (GM) denuncia as origens filológicas do Bem e do Mal. Para o
alemão, “necessitamos de uma crítica dos valores morais, o próprio valor
desses valores deverá ser colocado em questão — para isto é necessário um
conhecimento das condições e circunstâncias nas quais nasceram, sob as
quais se desenvolveram e se modificaram” (NIETZSCHE, GM, Prólogo VI).
De que modo inventou o homem estas apreciações de valor “Bem” e
“Mal”? E que valor elas têm em si mesmas? Foram ou não favoráveis ao
desenvolvimento da humanidade? São um sintoma funesto do empobre-
cimento vital, de degeneração? Ou indicam, pelo contrário, plenitude,
força e vontade de viver, coragem, confiança no futuro da vida?
(NIETZSCHE, GM, prólogo III). Para o alemão, a questão do valor dos va-
lores morais é de primeira ordem porque a moral estabelece as condições
em que o futuro da humanidade se desenvolve (NIETZSCHE, EH). Nietzs-
che (ZA, prefácio 9), portanto, advoga pela destruição das tábuas de
valores existentes. Para o alemão, só assim poderemos criar novos valores,
pois o infrator é também o criador.
Cronos, vocalista e baixista da banda Venom, já expressou visões in-
fluenciadas pela filosofia nietzschiana. Em uma entrevista cedida por
Roberto Scienza | 159
É nesses termos que nós usamos o satanismo, ou seja, pensando no lado posi-
tivo de todas as coisas. Se você é um desses católicos, cristãos ou sei lá o quê,
está sempre preso aos seus medos. Ao invés de tentar ser perdoado por seus
pecados, por que não assumí-los? Ninguém é responsável por eles, a não ser
você mesmo. Por outro lado, se você fez algo incrivelmente bom, deve receber
o crédito também. Se dê um tapinhas nas costas ao invés de dizer "obrigado,
Deus" e aceite as coisas ruins e as coisas boas (CRONOS, 2006, p. 57).
que já trazia um som mais extremo que bandas como Venom e Hellham-
mer, com vocais bem sujos, uma produção bruta e lowfi e uma capa
monocromática com fonte Old English (já influenciada pela capa do álbum
de 1982 do Venom), todos traços que seriam amplamente usados no gê-
nero a partir deste álbum. A influência de bandas como GBH, Motorhead,
Slayer e, é claro, Venom, sobre este primeiro álbum do BATHORY é evi-
dente. Numa mistura pesada de heavy metal veloz e punk rock sujo aliados
a uma temática satânica explícita, o primeiro do BATHORY é um marco
na história do Black Metal e do metal extremo como um todo. Os três pri-
meiros álbuns da banda, BATHORY (1984), The Return... Of Darkness and
Evil (1985) e Under the Sign of the Black Mark (1987), são conhecidos como
a trilogia de Black Metal e foram extremamente influentes na cena.
2 "Blood could be the blood of one’s forefathers, the myth of race and holy blood, and not just the blood of one’s
enemies. Fire could be the cleansing fire of sacrifice, the fire of purification or the fire that follows rape and pillage.
162 | Diálogos com a Música Extrema
Death might be one’s own death fighting against the impure enemies of Odin, the foreigners and Christians or it could
be their deaths" (SPRACKLEN, 2020, p. 94).
3 "Promise me my son to always/Cherish what is home to you/What is the truth and to/Defend all of your race”.
4 "Nationalism and racism (and hegemonic masculinity) at the heart of this Viking theme, the song continues to tell
the son to not bring dishonour to “his flag”. Sons who are true follow their fathers in fighting for the nation, for blood
and for race” (SPRACKLEN, 2020, p. 98).
Roberto Scienza | 163
5 This man’s appearance is mocked: the new religion brings with it challenges to what it means to be a man. They are
cutting off their beards and becoming women. Quorthon says there is now a “foreign God” worshipped, and ends by
warning us that it has “only just begun”. The entire album, then, dwells on the negative changes brought by outsiders
and those not of the race or nation. Quorthon is unhappy that the warrior masculinity and the code of honour of the
Vikings was replaced by the foreign, southern, feminine religion of peace (SPRACKLEN, 2020, p. 99).
164 | Diálogos com a Música Extrema
Sem dúvida: com isso o "reino de Deus" ficou maior. Antes ele tinha apenas
seu povo, seu "povo eleito". Nesse meio-tempo, tal como seu povo mesmo, ele
partiu em andança para o exterior, não mais se deteve em nenhum lugar: até
Roberto Scienza | 165
enfim estar em casa em toda parte, o grande cosmopolita - até ter do seu lado
"o grande número" e metade da Terra. Apesar disso, o deus do "grande nú-
mero", o democrata entre os deuses, não se tornou um orgulhoso deus pagão:
continuou judeu, continuou o deus dos pequenos cantos, o deus das esquinas
e paragens sombrias, dos locais insalubres de todo o mundo!... Seu reino do
mundo é sempre um reino do submundo, um hospital, um reino subterrâneo,
um reino-gueto... E ele próprio, tão pálido, tão fraco, tão décadent...
(NIETZSCHE, AC, §17).
6 Richard Wagner foi um maestro e compositor alemão especialmente conhecido por suas óperas. A relação de Ni-
etzsche e Wagner é bastante controversa. Nietzsche foi muito influenciado por Wagner nos seus primeiros anos de
produção intelectual até finalmente romper com o músico, quando passou a critica-lo fortemente.
7 "Is, by its nature, evangelical and attempst to engage the listener in an integrated, if not especially profound, reli-
gious, philosophical and sometimes political outlook. In doing so it resembles far more the nationalist, racist and
romantic appropriation of the Viking” (TRAFFORD, PLUSKOWSKI, 2007, p. 71).
168 | Diálogos com a Música Extrema
8 SRA é a sigla para Satanic Ritual Abuse (Abuso de ritual satânico), que foi um pânico moral que se iniciou nos
Estados Unidos na década de 1980 e se espalhou para o mundo. Havia alegações de abusos em supostos rituais
satânicos, relatos de abuso físico e sexual, sacrifícios humanos, pornografia, prostituição e diversas teorias conspira-
tórias.
Roberto Scienza | 169
na Noruega que hoje faz parte do turismo do país, atraindo fãs deste con-
troverso subgênero do metal aos lugares que fazem parte da história do
True Norwegian Black Metal.
Euronymous, em entrevista à zine Kill Yourself, afirmava acreditar
em uma criatura física: “Eu acredito em um diabo com chifres, um Satanás
personificado. Na minha opinião todas as outras formas de Satanismo são
besteira”9 (AARSETH apud PATTERSON, 2013, p. 121, tradução nossa).
Um Satanismo teísta este expressado por Euronymous, no qual Satanás é
entendido como uma entidade que existe, de maneira física ou espiritual,
no mundo. Embora esse caminho, mais ligado a um Satanismo teísta
(como o Luciferianismo, o Caminho da Mão Esquerda, a Ordem dos Nove
Ângulos) tenha sido seguido por muitas outras bandas, como é o caso do
Watain e do Dissection (Ordem Misantrópica Luciferiana), o Satanismo
teísta de Euronymous parecia ser pura estratégia de choque. Euronymous
gostava de provocar pânico midiático e afirmava que o satanismo não de-
veria ser individualista, mas totalitário, opressor. Em entrevista à Isa
Lahdenperä, no ano de 1993, Euronymous declara: “Eu sou uma pessoa
religiosa e vou lutar contra aqueles que usam mal o Seu nome. As pessoas
não devem acreditar em si mesmas e ser individualistas. Eles deveriam
OBEDECER, ser os ESCRAVOS da religião”10 (AARSETH apud OSBORN,
2015, p. 13, tradução nossa). Para Euronymous, todos são apenas servos
de Satanás, inclusive ele.
Os garotos (pois todos eram muito novos) da cena norueguesa acha-
vam o satanismo de LaVey muito humanista e hedonista. Acreditavam que
o Black Metal devia ser opressor e elitista, pois as pessoas normais deviam
9 “I believe in a horned devil, a personified Satan. In my opinion all the other forms of Satanism are bullshit”
(AARSETH apud PATTERSON, 2013, p. 121).
10 "I'm a religious person and I will fight those who misuse His name. People are not supposed to believe in them-
selves and be individualists. They are supposed to OBEY, to be the SLAVES of religion" (AARSETH apud OSBORN,
2015, p. 13).
170 | Diálogos com a Música Extrema
sentir medo do Black Metal. Muitas bandas da cena norueguesa não eram
de fato satanistas, mas utilizavam Satã como um emblema de resistência
pagã, o que fez com que a evolução da cena se voltasse para religiões nór-
dicas pagãs. As bandas se utilizavam da mitologia nórdica, do
conhecimento das runas, poesia germânica e glorificavam a antiga natu-
reza como forma de afirmar o seu passado e herança cultural. A imagem
cartunesca do satanismo de bandas como Venom foi deixada para trás e o
Black Metal se tornou uma ideologia contra a modernidade e pela volta
dos deuses antigos. Shnirelman (2002, p. 204, tradução nossa) afirma isto
ser uma coisa comum entre neopagãos: “Os neopagãos estão profunda-
mente e insaciavelmente apaixonados com o passado pré-cristão, como se
nesse tempo, as pessoas vivessem em pureza virgem, não estavam cor-
rompidas por influências externas”11.
Segundo Granholm (2011), o ressurgimento de religiões pagãs é uma
tendência recorrente na história. Na chamada era do esclarecimento (ou
iluminismo) houve um grande desenvolvimento do neopaganismo na Eu-
ropa. A valorização da razão fez com que a influência da igreja cristã se
exercesse menos sobre a população, o que fez com que as pessoas pudes-
sem, pela primeira vez, praticar outras religiões abertamente.
Euronymous também flertou com a mitologia pagã, com a identidade
nórdica e com o nacionalismo norueguês. Há músicas dessa época do Ma-
yhem com Euronymous, como Pagan Fears, presente no álbum de 1994
De Mysteriis Dom Sathanas que, embora a letra tenha sido escrita pelo ex-
vocalista Per “Dead” Ohlin (1969-1991), demonstram que Euronymous
não tinha qualquer problema com a temática pagã e atavista. Na letra, ele
diz: “A história sangrenta do passado/Humanos falecidos agora
11 “Neo-Pagans are deeply and insatiably in love with the pre-Christian past, as if at that time, peoples lived in virgin
purity, were not corrupted by external influences” (SHNIRELMAN, 2002, p. 204).
Roberto Scienza | 171
12 “The bloody history from the past/Deceased humans now forgotten/An age of legends and fear/A time now so
distant”.
13 “Pagan fears/The past is alive”.
14 “Woeful people with pale faces/Staring obsessed at the moon/Some memories will never go away/And they will
forever be here”.
172 | Diálogos com a Música Extrema
Suécia como Noruega, assim como todos os países nórdicos, foram brutal-
mente convertidos ao cristianismo (louco que um deus “fraco” tenha feito
isso, não?). Basta ver suas bandeiras. A cruz “nórdica” é símbolo da sujei-
ção destes países ao cristianismo. “O cristianismo era pouco familiar e
indesejado, a consolidação de seu poder necessitava de violência, o que
pode ser evidenciado pelo estabelecimento de igrejas cristãs sobre lugares
de importância pagã”15 (BUESNEL, 2020, p. 4, tradução nossa).
A faixa Lost Wisdom do Burzum, presente no álbum Det som engang
var (1993) que, traduzido do norueguês, significa “O que uma vez foi”,
serve de exemplo para que se entenda o discurso de Vikernes. Na faixa, o
norueguês expressa um forte sentimento de negação em relação ao cristi-
anismo, responsabilizando o Deus cristão pela destruição do verdadeiro
conhecimento, a cultura pagã e nórdica. “Negado pela igreja cega/Porque
não são palavras de Deus/O mesmo Deus que queimou o saber”16 (DET,
2020, tradução nossa).
É por este motivo que o posicionamento anticristão nos países nórdi-
cos se deu dessa forma, tomando um caráter pagão e nacionalista, de
resgatar tradições nativas e culturas que foram dizimadas. A cena de Black
Metal norueguesa promovia mitos e arquétipos nórdicos, culto à força, à
guerra, ao totalitarismo, à misantropia e ao elitismo e, frequentemente,
tomava posições machistas e supremacistas (TAYLOR, 2010). “Esses mú-
sicos abraçaram e rejeitaram o satanismo do gênero, sua ideologia
anticristã a favor de um nacionalismo mitificado”17 (LUCAS; DEEKS,
SPRACKLEN, 2011, p. 287, tradução nossa). Em vez de Satã, Odim foi elen-
cado como o herói da resistência pagã em oposição ao cristianismo.
15 “Christianity was both unfamiliar and undesired, its consolidation of power required violence, which can be evi-
denced in the establishment of Christian Churches on sites of Pagan significance” (BUESNEL, 2020, p. 4).
16 “Denied by the blind church/'Cause these are not the words of God/The same God that burnt the knowing”.
17 “These musicians have embraced and rejected the genre’s satanic, anti-Christian ideology in favour of mythologised
nationalism”. (LUCAS; DEEKS, SPRACKLEN, 2011, p. 287).
Roberto Scienza | 173
Segundo Pinkler (2001, p. 135), "a noção de paganismo só pode ser defi-
nida a partir de sua oposição ao cristianismo, uma vez em que a palavra
pagani foi utilizada pelos praticantes de tal religião não apenas para dar
significado ao “não cristão”, mas, também, ao “não judeu”".
O apoio que esses discursos têm em Nietzsche são evidentes. Há in-
terpretações de que "a doença moral do próprio Nietzsche advém da luta
interna entre o cristianismo da alma e um atavismo pagão" (CARPEAUX,
2016, p. 75). Em O Anticristo, Nietzsche ressalta a natureza afirmativa dos
pagãos: “pagãos são todos os que dizem Sim à vida, para os quais "Deus"
é a palavra para o grande Sim a todas as coisas” (NIETZSCHE, AC, §55).
Ora, os pagãos tinham amor fati, diferente dos cristãos que são ressenti-
dos. Mas não seriam estes novos pagãos ressentidos com a sujeição que
seus nobres antepassados tiveram em relação ao cristianismo? Não são
eles ressentidos com o fato de que sua cultura nórdica foi esmagada pelos
cristãos?
As afirmações nietzschianas sobre os judeus também são controver-
sas. Um dos pontos mais discutidos por Nietzsche em relação ao povo
judeu é que estes são mestres na arte da mentira. "No cristianismo, como
a arte de mentir santamente, o judaísmo inteiro, uma milenar técnica e
preparação judaica da maior seriedade, atinge sua derradeira maestria”
(NIETZSCHE, AC, §44). Nietzsche chama atenção para a ideia de que a
falsidade do judeu é genial. "Essa falsificação de palavras e gestos como
arte, não é acidente de algum dom individual, alguma natureza de exceção.
Isso requer raça" (NIETZSCHE, AC, §44). Portanto, a falsidade do judeu
destacada por Nietzsche não tem a ver com talento nem mesmo com a
cultura judaica, é algo inerente à “raça”.
Nietzsche, entretanto, fez duras críticas ao antissemitismo. Em sua
obra Nietzsche contra Wagner, o alemão escreve que se despediu interior-
mente de Wagner no verão de 1876. O motivo disso: ”eu não tolero nada
174 | Diálogos com a Música Extrema
18 Há uma lista de supostas motivações para Vikernes ter cometido o crime: briga por dinheiro que Euronymous e
seu selo deviam a Varg, ameaças de morte e as visíveis tensões entre os dois no que diz respeito a liderança do Inner
Circle e a cena norueguesa, mas este não é o foco do presente ensaio.
Roberto Scienza | 175
19 “Most Pagans identify an ethnic group with a nation, and, thus, for some of them Paganism means nationalism or,
more precisely, ethnic nationalism” (SHNIRELMAN, 2002, p. 199).
20 “Which at one point through its web pages called for “euthanasia” of homosexuals and the physically impaired"
(ASPREM, 2008, p. 59).
176 | Diálogos com a Música Extrema
21 “Its is a CHTONIAN religion: a cult of the EARTH and a return to it, therefore a nationalism; a cult of what is
BELOW the earth: Hell - the adjective "chthonian" applies to the Infernal gods as well” (FAMINE apud BENJAMIN,
2010, p. 111).
Roberto Scienza | 177
22 “‘Raceless’ racist discourses, focusing on culture or ethnicity, circulate Norway and other nations that conceive of
themselves as homogeneously white” (TAYLOR, 2010, p. 166).
178 | Diálogos com a Música Extrema
23 Embora haja, por exemplo, a Pagan Front, organização chave na promoção de propaganda de extrema-direita no
Black Metal, que se opõe a utilização do satanismo dentro do NSBM.
Roberto Scienza | 179
24 “The most perfect synthesis of the Luciferian will-to power, and neo-heathen principles and symbolism” (MÖBUS
apud SEMENYAKA, 2013).
180 | Diálogos com a Música Extrema
(NIETZSCHE, BM, §36). Que uma vida superior é uma vida pautada na
superação de si e na elevação da potência. Em um de seus Fragmentos
Póstumos, Nietzsche (FP, Outono de 1885 – Outono de 1886, §190) ques-
tiona: “qual é o valor de nossas estimativas de valor e nossas próprias
tábuas de valores? O que resulta do seu domínio? Para quem? A respeito
de quê? - Resposta: para a vida”25. A crítica nietzschiana se posiciona para
além de qualquer fundamento moral, pois avalia os valores morais a partir
da vida como vontade de potência. Portanto, um tipo de vida ascendente
ou decadente serviria de critério para sua promoção ou obstrução
(AZEREDO, 2000).
Na Alemanha do Terceiro Reich, este conceito foi bastante corrom-
pido para servir aos ideólogos nazistas, que viam na vontade de potência
um motor político para a história, a vitória sobre aqueles que se opunham
ao Nazismo, a vontade de potência como expansão imperialista. Na con-
cepção dos nazistas a vontade de potência sugere uma agressão, uma
política de expansão perfeitamente ilustrada pela ascensão de Hitler ao po-
der (BRINTON, 1940). “E é aí que repousa inteiramente a organização
nacional-socialista. É na submissão do rebanho à “vontade de poder” do
chefe” (REGO, 2016, p. 89). O documentário Triumph des Willens, ou o
Triunfo da Vontade, dirigido por Leni Riefenstahl26, é um dos filmes de
propaganda política mais conhecidos da história e tinha como conceito o
triunfo dessa vontade de potência torpe, mostrando a grandiosidade do
governo alemão e de seu ideal eugênico.
A associação que se faz entre Nietzsche e o nazismo é recorrente,
principalmente entre não estudiosos do alemão. Isso se dá por uma série
de fatores. A primeira delas é que o destino do Nietzsche-Archiv em
25 “¿Qué valor tienen nuestras estimaciones de valor y nuestras tablas de bienes mismas? ¿Qué resulta de su domi-
nio? ¿Para quién? ¿Respecto de qué? — Respuesta: para la vida".
26 Cineasta alemã e figura importante para a construção imagética nazista e propaganda de seus ideais.
Roberto Scienza | 181
27 "Vontade de Poder" e "Vontade de Potência" são duas traduções distintas para o conceito nietzschiano de Wille
zur Macht. O autor deste ensaio prefere Vontade de potência devido à interpretação deleuzeana de poder e potência,
mas há várias motivos para se usar "Vontade de Poder" ou "Vontade de Potência" e uma vasta discussão sobre, que
não me cabe neste ensaio.
182 | Diálogos com a Música Extrema
28 “The primary difference for NSBM is the polarization of the them/us dichotomy into strictly racial and national
categories” (OLSON, 2008, p. 99).
Roberto Scienza | 183
29 “Undoubtedly, the most striking personality in Europe was Adolf Hitler. What he tried to build deserves the great-
est respect” (DARKEN, 2002, apud BUESNEL, 2020, p. 3).
184 | Diálogos com a Música Extrema
30 “The Nazis realized the value of a pure Aryan Europe. Hitler embodied the idea of an empire of white people. He
discovered and realized the true destiny hidden in the blood of white people” (DARKEN, 2002, apud BUESNEL, 2020,
p. 3).
31 "Their request for mercy was nothing for us/They had no respect for our ancestors/Today is not a day for mercy".
32 “Churches burn. In Poland, new neo-fascism powers are rising. Its theories are near to our ideology, so we support
it. War is the first duty of all who live for Darkness or Paganism” (DARKEN apud OLSON, 2008, p. 117)
Roberto Scienza | 185
33 Graveland was born from hate dreaming in our lands. We take revenge for our dying ancestors who protected
our pagan lands from our foes who wanted to destroy the harmony of nature. Christianity brought false goodness…
Graveland knew this. Our souls burn with fire of hate and retribution! Aryan race wake up! The new era of paganism
and darkness is coming. Graveland will show you the way. Start the holocaust again, kill Jews and Christians. Destroy
the false god of Jesus Christ! I, Darken, the Black Druid of Darkness, Karcharoth of Infernum and Capricornus are
the spirits of war. We come from the land of everlasting funerals; from the unholy winter. We are three angels of
retribution. War! (DARKEN apud OLSON, 2008, p.116).
186 | Diálogos com a Música Extrema
34 In Europe, neofascism is re-born and Europe must re-emerge in a new spirit. It will lead to big changes in the
future. We have to take power from old, true traditions of these lands. We chose the way of war, because we have to
wage war against the sub-human races from Turkey, Africa and Rumania. Destroy Negroes and other sub-men!
They destroy our traditions and culture. Europe must be cleansed from this fucking shit! Europe only for white Aryan
race! (DARKEN apud OLSON, 2008, p. 117).
Roberto Scienza | 187
O cristianismo foi, até hoje, a mais funesta das presunções. Homens sem du-
reza e elevação suficientes para poder, como artistas, dar forma ao homem;
homens sem longividência e força suficientes para, com uma sublime vitória
sobre si, deixar de valer a lei primordial das mil formas de malogro e pereci-
mento; homens sem nobreza suficiente para perceber o hiato e a hierarquia
188 | Diálogos com a Música Extrema
Mas não seria a moral defendida pelo NSBM uma moral que coloca a
si mesma como pré-existente (antes do cristianismo) e absoluta? Os tipos
Roberto Scienza | 189
35 "A society harsh and heroic, a new Sparta of Supermen" (BRINTON, 1940, p. 135).
190 | Diálogos com a Música Extrema
36 “Without being necessarily N[ational] S[ocialist], real Black Metal is always extreme right-wing music - be it from
Asia or Latin America as extreme-right politics are not the appanage of the white race" (FAMINE apud BENJAMIN,
2010, p. 108)
Roberto Scienza | 191
37 ”People cannot deal with it. It's actually one of those few things. In which the evilness still shows its face to the
people. Things that people are afraid of and startled by.” (SATANIC WARMASTER, 2011).
192 | Diálogos com a Música Extrema
pessoas terem medo. “É por isso que nunca devemos desistir desses tipos
de símbolos no Black Metal. Devemos usá-los mais, porque as pessoas te-
mem esses símbolos. Isso sublinha e cultiva novamente aquilo que ainda
deveria ser a força que faz do Black Metal alguma coisa”38 (Satanic Tyrant
Werwolf In: LOPUTON, 2011, tradução nossa).
38 “That's why we should never give up on those kind of symbols in black metal. We should use them more, because
people fear those symbols. That underlines and cultivates again the thing that sould still be the strength that makes
black metal something.” (SATANIC WARMASTER, 2011).
39 “In some cases this is all NSBM is; one more transgressive signifier among many others. For others, notions of
ultra-nationalism and militant racism take on deeply meaningful connotations when placed within a black metal
context. Black metal, in all of its forms, glorifies the distant past and seeks to annihilate the mundane present. Neo-
Nazism makes this assertion very simple by imposing notions of otherness onto virtually everyone unlike oneself and
elevating the angry, megalomaniacal back metaler to the status of a God among sheep. Notions of modernity and
civilization seem vague and intellectual to many black metalers; race, nation and tradition are less so.” (OLSON, 2008,
p. 99).
Roberto Scienza | 193
40 “Black Metal at a glance is the very embodiment of an active-nihilistic phase in a metaphysical process of trans-
valuation of all values heralded by Friedrich Nietzsche.” (SEMENYAKA, 2013).
194 | Diálogos com a Música Extrema
41 “The greatest European nihilist was simultaneously the greatest elitist, aristocratic individualist and traditionalist
who looked forward to the beginning of the new golden age.” (SEMENYAKA, 2019).
Roberto Scienza | 195
42 “Cuanto mayor es el impulso hacia la unidad, tanto más se puede concluir la debilidad; cuanto más el ímpetu hacia
la variedad, la diferencia, la interna disgregación, tanto más fuerza hay.”
198 | Diálogos com a Música Extrema
Moral é hoje, na Europa, moral de animal de rebanho: - logo, tal como enten-
demos as coisas, apenas uma espécie de moral humana, ao lado da qual, antes
da qual, depois da qual muitas outras morais, sobretudo mais elevadas, são ou
deveriam ser possíveis. Contra tal "possibilidade", contra tal "deveriam" essa
moral se defende com todas as forças, porém: ela diz, obstinada e inexorável:
"Eu sou a moral mesma, e nada além é moral!" (NIETZSCHE, BM, §202).
43 “Every subordinate leader despises his own underlings, and each of them despises his inferiors. This reinforces
the sense of mass elitism.” (ECO, 1995, p. 7).
44 Nietzsche fez duras críticas aos anarquistas e comunistas de sua época, pois afirmava que os grupos baseavam
suas ideias em uma moral cristã humanista e igualitária.
200 | Diálogos com a Música Extrema
47 Damos nuestra muerte en el cumplimiento por la profecía de la sangrienta y satánica revolución socialista, que
concluya e implante una república obrera, basada en organismos de democracia directa de la clase obrera y de los
pobres urbanos y del campo, incluyéndonos como marginales dementes, combatiendo por expandir la revolución
socialista en todo el mundo.
48 “Es por eso que la única estrategia realista es le guerra de clase contra el enemigo luchamos por la independencia
de la clase obrera de toda variante patronal y del estado evangelista burgués”.
49 "No habrá estado, Habremos matado a Dios”.
204 | Diálogos com a Música Extrema
o Estado — olhai para ali, meus irmãos! Não vedes o arco-íris e as pontes
do super-homem?” (ZA, Do novo ídolo). O Übermensch não é de uma raça
ariana, é um espírito livre e bárbaro, que cria linhas de fuga, linhas resis-
tentes à moral, ao Estado, à religião, ao capitalismo. Uma força afirmadora
e múltipla contra a vontade de verdade, de dogmatismo e unicidade.
E assim é o Black Metal da Uprising. A one man band alemã, na ativa
desde 2014, explicita, por meio de uma perspectiva anarco-satânica, diver-
sos traços da filosofia nietzschiana, aliados à luta contra a opressão em seu
primeiro álbum Uprising, de 2016. Na faixa Uprise, W. (pseudônimo utili-
zado pela pessoa por trás do projeto), convoca todos para a revolta até que
todos os reis e deuses estejam mortos. W. diz: “Revolte-se – não siga
mais/Revolte-se – até que todos reis e deuses estejam mortos/Revolte-se
– você nasceu com o direito de lutar/Revolte-se – voe para ser seu próprio
deus”50 (UPRISING, 2016). A moral de senhores nietzschiana, daquele que
não segue ninguém, que afirma somente a si mesmo, é aliada à revolta
contra aqueles que oprimem a liberdade e à ideia satanista de autodeifica-
ção, presente em escritos como os de LaVey (1969) e de Ford (2009). Em
Ford (2009), o único Deus existente é o humano, pois todos os deuses e
espíritos a serem canalizados se manifestam por meio dele. “Anjo do Sol,
Estrela da Manhã! Dê-me o Fogo de sua Divindade. Deixe os raios do sol
me preencherem! Eu sou meu Próprio Deus ao recebê-lo [Lúcifer] dentro
de mim51” (FORD, 2009, p. 290, tradução nossa).
A faixa seguinte, Thrones to Overthrow, inicia com um diálogo sobre
a morte. Sobre a diferença entre um homem livre e um escravo quando
morrem: se “o homem livre morre ele perde o prazer da vida, o escravo
50 "Uprise – do no longer follow/ Uprise – until all kings and gods are dead/ Uprise – you were born with the right
to fight/ Uprise – soar to be your own god”.
51 “Angel of the Sun, Morning Star! Give unto me the Fire of your Divinity. Let the rays of the sun fill me! I am my
Own God as I welcome you within!” (FORD, 2009, p. 290).
Roberto Scienza | 207
52 “A freeman dies he loses the pleasure of life, the slave loses his pain”.
53 “In the absence of truth, Empires were created”.
54 “Thrones to overthrow - Rise free spirits/Thrones to overthrow - Bring down what devours your soul”.
55 "Let hearts burn with will/Let the fire devour their thrones/Claim back what was taken from you”.
208 | Diálogos com a Música Extrema
56 “L'Etat donne à la pensée une forme d'intériorité, mais la pensée donne à cette intériorité une forme d'universalité”
(DELEUZE; GUATTARI, 1980, p. 465).
57 Mais la forme d'extériorité de la pensée - la force toujours extérieure à soi ou la dernière force, la nieme puissance
- n'est pas du tout une autre image qui s'opposerait à l'image inspirée de l'appareil d'Etat. C'est au contraire la force
qui détruit l'image et ses copies, le modèle et ses reproductions, tou te possibilité de subordonner la pensée à un
modèle du V rai, du Juste ou du Droit ( le vrai cartésien, le juste kantien, le droit hégélien, etc. ). Une « méthode » est
l'espace strié de la cogitatio universalis, et trace un chemin qui doit être suivi d'un point à un autre. !vlais la forme
d'extériorité met la pensée dans un espace lisse qu 'elle doit occuper sans pouvoir le compter, et pour lequel il n'y a
pas de méthode possible, pas de reproduction concevable, mais seulement des relais, des intermezzi, des relances
(DELEUZE; GUATTARI, 1980, p. 467-8).
Roberto Scienza | 209
Muito mais punk que skin. Muito mais RABM que NSBM. Seu papel é tra-
çar linhas de fuga criadoras, compor o espaço liso. O Estado é uno, a
máquina de guerra é múltipla. O Estado é do ser, a máquina de guerra é
do devir. O Estado é moralista, a máquina de guerra é amoral.
Como nos dizem Deleuze e Guattarii (1980), o Estado, quando aliado
à religião, anseia pelo absolutismo, e é a religião que converte o absoluto.
“A religião, nesse sentido, é uma peça do aparelho de Estado (e isto, sob as
duas formas, do "liame" e do "pacto ou da aliança"), mesmo se ela tem a
potência própria de elevar esse modelo ao universal ou de constituir um
Imperium absoluto”58 (DELEUZE; GUATTARI, 1980, p. 475, tradução
nossa). Como aponta Nietzsche (BM), a religião é nada mais que uma in-
terpretação da vida e do mundo, de moralidade ensinada, antinatural e
inimiga dos instintos vitais. No entanto, é uma instituição dogmática, que
se posiciona de maneira categórica. “A fórmula geral que serve de base a
toda religião e a toda moral pode ser expressada assim: "Faça isto, e mais
isto, não faça aquilo e mais aquilo — e então serás feliz, do contrário...”
(NIETZSCHE, CI, Os quatro grandes erros, §2). Tais valores moralistas,
quando aliados ao Estado, são extreamamente perniciosos para a demo-
cracia, para a autonomia e liberdade da população.
O teórico anarquista Michel Onfray (2011, p. 198) declara que “o que
define os regimes totalitários hoje corresponde ponto a ponto ao Estado
cristão conforme foi construído pelos sucessores de Constantino”59. Suas
ferramentas reguladoras, destruição de bibliotecas e lugares simbólicos,
poder absoluto ao líder, extermínio de oponentes, monopólio dos meios de
comunicação e o aniquilamento da diferença. Num país como o Brasil,
58 “La religion en ce sens est une pièce de l'appareil d'Etat (et cela, sous les deux formes du « lien », et du « pacte ou
de l'alliance »), même si elle a la puissance propre de porter ce modèle à l'universel ou de constituer un Imperium
absolu” (DELEUZE; GUATTARI, 1980, p. 475).
59 “What defines totalitarian regimes today corresponds point by point with the Christian state as it was constructed
by Constantine's successors” (ONFRAY, 2011, p. 198).
210 | Diálogos com a Música Extrema
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Anexo 1
A - Aurora (M – Morgenröte)
EH - Ecce homo
VM - Sobre verdade e mentira no sentido extramoral (WL - Über Wahrheit und Lüge im
aussermoralischen Sinn)
Rodrigo Barchi
ricos da Europa Ocidental, seja como uma perspectiva socialista mais new
age – hoje, declara-se uma guerra praticamente aberta contra os grupos e
pessoas que lutam em prol da defesa da vida selvagem e das áreas ainda
preservadas. Além dos discursos abundantes da presidência da República
do Brasil contra as Organizações Não-Governamentais ambientalistas, al-
gumas calúnias e difamações são constantemente realizadas, como as
acusações de que elas são as responsáveis pela destruição, com o intuito
somente de atacar o governo e manchar a imagem do Brasil perante o
mercado internacional.
Apesar da estupidez e irresponsabilidade desse discurso, há uma
enorme aceitação dessa fala por parte de defensores da governança, e até
por quem não conhece o trabalho sério e comprometido de centenas de
instituições espalhadas Brasil afora. Para que instituições sérias, que há
décadas vem trabalhando com monitoramento, observação, reprodução e
proteção de uma série de onças-pintadas, lobos-guarás, araras azuis, ta-
manduás-bandeira, e uma série de outras espécies severamente
ameaçadas de extinção, iriam colocar fogo nos habitats, e destruir todo o
esforço, que envolve, inclusive, capital de empresas, fundos de pesquisas
públicos e privados, além do apoio de muitos setores da sociedade civil?
O discurso anti-ecologista que se espalha – mas que ainda não é he-
gemônico – ocorre antes mesmo que as reivindicações ecologistas
tivessem se tornado conquistas efetivas perante toda a sociedade civil e o
próprio estado brasileiro. Isso, apesar de uma boa quantidade de políticas
públicas já terem sido promulgadas e, inclusive, terem garantido a criação
de órgãos devidamente sistematizados e estruturados para dar conta das
demandas requeridas pelos movimentos ecológicos1, parece que
1
Como o Orgão Gestor da Educação Ambiental brasileira, vinculado aos Ministérios da Educação e do Meio Ambiente,
e que foi extinto no segundo dia de mandato de Jair Bolsonaro, ainda no início de 2019.
Rodrigo Barchi | 225
Por isso, que a pergunta título, sobre o que a Música Extrema tem a
dizer – ou melhor, urrar, berrar, gritar, vociferar - às ecologias políticas e
às educações ambientais, se faz pertinente, não somente perante a pro-
posta dessa coletânea, mas face ao terror que se impõe e que não tem
perspectiva de que acabe tão já.
Mas do que se trata essa Música Extrema? E, apesar do que ela grita,
enuncia e denúncia, será que as ecologias políticas e as educações ambien-
tais estão dispostas e/ou se interessam pelo que elas têm a dizer e urrar?
Para essa conversa é necessário que eu faça dois esclarecimentos.
Em primeiro, e invertendo a ordem da questão, é sobre o que estou
sugerindo como ecologias políticas e educações ambientais. No plural e em
minúsculo. Sabendo que as(os) leitoras(os) desse livro não serão somente
aquelas(es) que tem familiaridade sobre o debate ao redor das ecologias
(GODOY, 2008), educações (GALLO, 2002) e educações ambientais maio-
res, menores (HENNING; MUTZ; VIEIRA, 2018) e outras (SAMPAIO,
2019), mas interessados naquilo que os pesquisadores aqui presentes têm
a dizer sobre a música extrema e suas áreas de formação, atuação e pes-
quisa, acredito que seja impositiva essa breve explanação.
226 | Diálogos com a Música Extrema
Os irascíveis!
É evidente que toda essa fúria possa gerar uma série de riscos, devido
tanto as ameaças por parte dos poderes hegemônicos contra os discursos
anticapital, anti Estado e anticristãos. As abordagens policiais contra
punks e cabeludos nos anos 80 e 90, além da já citada ação da PMRC nos
EUA, assim como uma série de outras ameaças e violências menores – o
caso do Krisiun no aeroporto da Indonésia, por exemplo – e cotidianas, são
mostras do quanto um discurso antiestablishment pode causar danos a
quem arrisca se colocar contra. Ética, estética e politicamente.
Por mais que as manifestações dos grupos de música extrema não
sejam capazes de ameaçar bélica e economicamente a estrutura contem-
porânea, há sempre um temor, por parte de quem exerce o poder, de que
a fala – aqui a partir de letras, sonoridades, imagens e vestimentas – desses
grupos e seus admiradores, possa representar alguma ameaça. E o medo
se dá, principalmente, por que há algo de parresiástico na música extrema.
Uma das questões centrais com que temos de lidar é a promoção de posturas
rebeldes em posturas revolucionárias que nos engajam no processo radical de
transformação do mundo. A rebeldia é ponto de partida indispensável, é de-
flagração da justa ira, mas não é suficiente. A rebeldia enquanto denúncia
precisa se alongar até uma posição mais radical e crítica, a revolucionária, fun-
damentalmente anunciadora. A mudança do mundo implica a dialetização
entre a denúncia da situação desumanizante e o anúncio de sua superação, no
fundo, o nosso sonho. (FREIRE, 2000a, p. 88)
Radicalidade
2
A minuciosa análise realizada por Ana Maria Araújo Freire das citações da obra de Paulo Freire mostra que essa
obra não é citada, assim como no dicionário Paulo Freire (STRECK; REDIN; ZITKOSKI, 2019), no verbete
238 | Diálogos com a Música Extrema
Não teme enfrentar, não teme ouvir, não teme o desvelamento do mundo. Não
teme o encontro com o povo. Não teme o diálogo com ele, de que resulta o
crescente saber de ambos. Não se sente dono do tempo, nem dono dos ho-
mens, nem libertador dos oprimidos. Com eles se compromete, dentro do
tempo, para com eles lutar. (FREIRE, 1983, p. 24)
RADICALIDADE, escrito por Jenifer Crawford e Peter Mclaren, não há nenhuma referência direta a essa obra do
pensador alemão.
Rodrigo Barchi | 239
Sou radical não porque tema cair no pensamento crítico de vitrine. Sou radical
porque procuro ir às raízes das coisas, das ideias, dos fatos, porque não me é
possível sonhar sem enraizer-me, porque não me é possível simplesmente es-
tar sendo no mundo sem ter amanhã e não é viável lidar com ele, o amanhã,
sem sonhar. Por isso também sou esperançoso e não por pura teimosia como
antes afirmei e poderia parecer. (FREIRE, 2014, p. 243-244)
Não que o movimento ecológico não tenha sido permeado pela ira,
pela rebeldia e pela radicalidade em sua história. De forma alguma pode-
mos dizer que “Primavera Silenciosa” de Rachel Carson não tenha se
pautado pela indignação em relação à matança de insetos e aves devido ao
uso indiscriminado de agrotóxicos, de venenos. Assim como não podemos
deixar de citar a insurgência e rebelião dos povos da floresta, ao verem,
como Chico Mendes, a floresta dizimada e sua possibilidade de subsistên-
cia ser destruída. Como afirmar que não há raiva, rebelião e radicalidade
nas ações políticas e alertas feitos por Ailton Krenak (2019) e Davi Kape-
nawa (2015)? Ou ainda na ação incansável de Paul Watson e pelos
membros da Sea Shepherd, na defesa dos animais marinhos e dos oceanos,
e que são constantemente apoiados, entre outros, por bandas da música
extrema como Napalm Death?
A ecologia é permeada de insubmissão e revolta. A ecologia que as
bandas de música extrema constantemente trazem à tona está cheia de
242 | Diálogos com a Música Extrema
Referências
BARCHI, Rodrigo. O ruído infame das ecologias menores: o grindcore e as relações entre
meio ambiente e educação. Revista do Lhiste, Porto Alegre, num.6, vol.4, jan/dez.
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Rodrigo Barchi | 245
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GALLO, Sílvio. Por uma Educação Menor. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 27 n. 2,
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GODOY, Ana. A menor das ecologias. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
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presente. Curitiba: Appris, 2018.
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RUBIO, Salva. Metal Extremo: 30 años de oscuridad (1981-2011). 5ª ed. Lleida: Editorial
Milenio, 2016.
Intro
Capilaridade presencial
1
Embora o trabalho em questão não seja sobre o metal extremo, a dinâmica social é similar ao que foi observado nos
processos folkcomunicacionais no âmbito do blues e do hip hop (POSTALI, 2011).
Tadeu Rodrigues Iuama | 251
Capilaridade alfabética
Capilaridade elétrica
Por vezes, amplificar a emissão de sinal não parece ser suficiente. Por
isso, os seres humanos criaram toda uma estrutura de comunicação que
extrapola completamente as limitações espaço-temporais. A eletricidade é
quem possibilita isso: por meio de um aparato, meu sinal é codificado e
emitido como impulsos elétricos e, em qualquer lugar em qualquer época,
Tadeu Rodrigues Iuama | 255
Capilaridade eólica
2
Uma discussão para outro momento seria a relevância de, em pleno século XXI, querer restringir o acesso a essas
gravações. As pessoas interessadas pela materialidade nunca deixaram de comprar os álbuns físicos. Aquelas inte-
ressadas no conteúdo imaterial, por sua vez, irão conseguir, de um jeito ou de outro, acesso. Melhor nesse caso, penso
eu, é contribuir para a divulgação, característica principal de uma gravação.
Tadeu Rodrigues Iuama | 257
alcançar lugares que jamais imaginava que existiam na época em que era
limitado a trocar correspondências pela saudosa carta social.
Ecossistema subterrâneo
extremo dos polos apontados por Romano e Flusser. São igualmente de-
sequilibrados. O que fascina, contudo, é que as pessoas que frequentam
esse meio geralmente percebem um equilíbrio comunicacional de segunda
ordem: vivendo num mundo pautado pelos discursos de função informa-
tiva emitidos pelas telecomunicações, e participando também dessas
rupturas do cotidiano delineadas pelos diálogos presenciais de função so-
cial, parece haver uma espécie de harmonia. Como num trítono, é o diabo
quem toca essa terceira nota, que harmoniza as duas outras, dissonantes.
Nesse sentido, as capilaridades comunicacionais são, tal qual uma
música, uma composição entre diferentes instrumentos. A capilaridade
presencial, tal qual o contrabaixo, dá corpo. A capilaridade alfabética, tal
qual a bateria, impõe um ritmo. A capilaridade elétrica, tal qual o teclado,
propaga uma melodia. E a capilaridade eólica, tal qual a guitarra, rasga os
céus.
Pode parecer que alguns dos elementos elencados são supérfluos.
Erro. Algo que aparentemente não tem relação mais consolidada, como o
exemplo dos pastéis cuidadosamente preparados pela Adalini e pelo Juli-
ano, fazem toda a diferença para que eventos como esse aconteçam.
Explico. Quando você, enquanto musicista, deve se transportar de uma ci-
dade para outra, chegar no lugar e preparar os equipamentos, ajustar o
som, tocar na sua vez e prestigiar os colegas, arrumar os equipamentos e
pegar estrada de volta para casa, alimentação passa a ser fundamental. A
critério de exemplo, basta imaginar uma viagem de mais ou menos sete
horas, ou pouco mais de 500 km, rumo a uma cidade para tocar. Depois
dessas sete horas numa van, você se encontra com as outras seis bandas
que irão tocar no festival, cada uma com uma apresentação de mais ou
menos uma hora. No camarim, uma caixa com algumas bananas, mexeri-
cas e maçãs é toda a refeição da qual todos vocês dispõem. Após o festival,
você sabe que também irá passar pelo longo caminho de volta para casa.
Tadeu Rodrigues Iuama | 261
Outro
Referências
BAITELLO JUNIOR, N.. A serpente, a maçã e o holograma: esboços para uma teoria da
mídia. São Paulo: Paulus, 2010.
POSTALI, Thífani. Blues e Hip Hop: Uma perspectiva folkcomunicacional. Jundiaí: Paco
Editorial, 2011.
Wescley Dinali
A conquest of butchers,
The bodies pillied high.
So the victor can raise his sword to the sky.
Ao som de:
Appalachian Terror Unit – Endless Bloodshed
Do album It's Far From Fucking Over (2009)
https://www.youtube.com/watch?v=rFOC-UoqGsU
Introdução
1
Cf. DINALI, Wescley. Pesquisar em educação: um passeio estéticoanarcoesquizonoisepunk. Tese (Doutorado em
Educação) – Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2020.
Wescley Dinali | 265
2
É importante destacar que não é o objetivo deste texto, fazer uma análise profunda do movimento punk, dado a
sua ampla diversidade.
266 | Diálogos com a Música Extrema
uma luta entre os homens”. Morte essa, entendida como aquela que des-
potencializa a vida como processo de luta, a morte fascista3.
É importante destacar também que Foucault nos incita a problema-
tizar as redes de subjetivação como processos educativos mais amplos,
uma vez que elas acontecem no interior de uma cultura e sociedade
(FERRARI; ALMEIDA, DINALI, 2010).
3
Para mais questões cf. DELEUZE. Gilles. Anti-édipo e outras reflexões – AULA de Gilles Deleuze [1980] (legendado
em PT/BR). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=wtbLZaOpmDQ>. Acesso em: 30 jan. 2019.
Wescley Dinali | 267
4
Algumas bandas que se enquadram nesse período são: Pink Floyd, Led Zeppelin, Yes, Beatles (Sgt. Pepper's), Ge-
nesis, Jethro Tull, The Rolling Stones entre outras.
268 | Diálogos com a Música Extrema
5
Para a autora o aparecimento do punk foi de fato um dos mais importantes movimentos juvenis nas décadas de
1970 e 1980.
Wescley Dinali | 269
6
Bivar (2007, p. 89) vai chamar essa sedição dentro do próprio movimento como retomada do punk, ou, nas suas
palavras: “segundo levante punk”.
7
Filipetas cuja função é divulgar shows, eventos e bandas, entre outros.
8
Fanzine é a junção das palavras fan com magazine. É uma espécie de revista feita pelo fã e para o fã, como nos conta
Bivar (2007). São publicações geralmente feitas em xerox, com pequenas tiragens. Seu conteúdo varia bastante, mas
geralmente busca-se a divulgação de bandas, shows, cultura punk e política entre outras questões. O fanzine procura
socializar ideias, propostas, experiências, estabelecer contatos; enfim, é um tipo de imprensa alternativa no interior
do movimento punk (OLIVEIRA, 2006).
270 | Diálogos com a Música Extrema
9
Fala é de um anarco-punk integrante da banda boliviana Escatofagia entrevistado no fanzine Abdução Extrema.
10
Os fanzines foram de suma importância para o desenvolvimento de tais práticas, uma vez que, como defende
Oliveira (2006), eles foram fundamentais para a divulgação e discussão das ideias anarquistas no interior do movi-
mento.
11
Não é a proposta desse texto discutir sobre o ideal filosófico anarquista. Para questões sobre a filosofia anarquista
Cf. Luizzetto (1987).
Wescley Dinali | 271
12
Squats são casas ou prédios abandonados, deteriorados, de propriedade pública ou mesmo privada, onde pessoas,
os chamados ocupas, buscam reabilitar esses imóveis para (re)construção de um novo espaço dedicado tanto à mo-
radia quanto à construção de um local alternativo para educação, cultura e lazer (GALLO, 2008; LIMA, 2009). De
caráter quase exclusivamente urbano, “apresentam-se como formas de ressocialização possível em substituição às
formas de convivência impostas pelo capitalismo” (GALLO, 2008, p. 757). Segundo Rudy (2010), o squat é um local
de possibilidade de vivência prática de teorias libertárias a que esses grupos aderem, da autogestão, da solidariedade
e da recusa aos valores do mundo capitalista, como os da propriedade privada, da massificação da cultura, da indús-
tria alimentícia, das relações heteronormativas e da moda.
13
Trata-se de um estilo de vida cujos praticantes buscam aproveitar a comida do lixo ou os restos de feiras para se
alimentarem. A tradução livre seria literalmente mergulhar na lixeira.
Wescley Dinali | 273
14
Essas informações foram baseadas em entrevistas e textos presentes em fanzines, revistas e sites de membros de
bandas crusts. Serviram de referência o site https://revoluta.com/2008/10/16/crust-as-origens/; o site
www.vice.com/pt_br/article/9k3a83/martine-blue-entrevista; o fanzine Necrofeelings # 4, 1999; a revista Meta-
lhead, fanzine Náusea # 1, 2010 e o fanzine Insanity Crusties # 1, 2011; # 2, 2012; # 3, 2013.
Wescley Dinali | 275
Foucault reserva seu mais selvagem desrespeito às pessoas que imaginam ser
possível a liberdade para a moderna humanidade [...] nós estamos apenas
sendo movidos pelas ‘modernas tecnologias do poder que tomam a vida como
objeto’ [...] não há liberdade no mundo de Foucault porque sua linguagem
compõe uma teia inconsútil, um cárcere mais constrangedor do que tudo o
que Weber sonhou, no qual nenhum sopro de vida pode penetrar (BERMAN,
1986, p. 33: aspas do autor).
Referências
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DELEUZE, G.; GATTARI, F. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia, vol. 4. Rio de janeiro:
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Wescley Dinali | 283
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Sobre os autores (por eles mesmos)
4. Fabio Alexandre Tardelli Filho - Professor de História da rede pública estadual, mes-
tre em Educação pela UFSCar, militante e delegado da APEOESP, membro fundador do
podcast Prolecast e fundador da web zine Resíduos Tóxicos. Membro do grupo de pesquisa
do HISTEDBR da UFSCar Sorocaba. Desenvolve pesquisas nas áreas de Educação, História
da Educação, História do Brasil, Haiti e África, Imprensa Operária, uso de jogos, cinema e
literatura nas pedagogias críticas e Educação Popular. E-mail: f.a.tardelli@gmail.com
Lattes: http://lattes.cnpq.br/0345122645229407
Uberlândia – UFU, tendo realizado pesquisas que articularam o estudo do discurso a obje-
tos do âmbito da música, em especial, ao rock e ao metal extremo. Em Uberlândia-MG, foi
guitarrista (2008-2015) da banda de hardcore No Defeat. E-mail: lucas.khalil@unir.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5480323509113727
10. Wescley Dinali - Doutor em Educação pela Universidade Federal de Juiz de Fora
(UFJF). Mestre em Educação pela UFJF. Graduado em Pedagogia pela Universidade Federal
de São João del-Rei (UFSJ). Pesquisador associado ao Travessia Grupo de Pesquisa
NEC/PPGE/UFJF, certificado pelo CNPq. Agitador (contra) cultural e zineiro de carteirinha.
Autor do blog “Ocupa Guerrilha Noise Zine. Atuou nos projetos undergrounds: Genital Tu-
mour (splatternoisegrinder) e Anarco Vomit Noise (harsh noise caos). Atualmente mantém
vivo o micro selo Depressive Noise Records e as bandas: Alice Psicodélica (HNW) e Wit-
ching Crusties (black crust) juntamente com seu filho. E-mail:
wescleydinali@yahoo.com.br.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5131927257149426
Sobre os ilustradores (por eles mesmos)
Diego Anderson Sebold – natural da cidade de Florianópolis (SC), tem em sua trajetória
várias participações artísticas dentro da cena underground da região. Admirador da Natu-
reza e da Arte contestadora, segue o rumo do seu destino como um peregrino impaciente,
colhendo sua inspiração pelo misterioso caminho da vida e da morte
Luis Felipe Loyola - “LF Voideath” é o pseudônimo de Luís Felipe Loyola, formado em
Artes Visuais pela Universidade Federal de Uberlândia, no momento concluindo mestrado
em História, também pela Universidade Federal de Uberlândia. Na música, atualmente en-
contra em processo de gravação de um EP com a Deadtrack, banda de Crust/Death Metal
de Uberlândia que fundou em 2014. Também fez parte de bandas de metal e hardcore na
cidade, bem como a realização de alguns eventos de metal e punk ao longo dos anos. Como
Ilustrador, faz trabalhos como capas de discos, merch e cartazes para algumas bandas e
marcas da cena de Uberlândia e também de outras localidades.
Márcio Destito – Ilustrador, ex-punk e coeditor do fanzine “Alice’s Dirty Head”. Autor de
capas para álbuns de bandas (Execradores e Pós-Guerra), flyers (Discarga Violenta, Distúr-
bio Mental, Lisa Cane, Rotten Flies), cartazes de festivais (Wisconsin Old Barn Punk Fest
’98) e fanzines (Profane Existence, Outspoken, Ato Punk) durante a década de 1990.
Sobre o revisor
Davi Fernandes Costa - atua como psicanalista e como professor titular de Língua Portu-
guesa do Governo do Estado de São Paulo. Possui graduação em Pedagogia pela
Universidade Nove de Julho (2019), graduação em Letras - Português / Inglês (2008), Gra-
duação em Letras - Espanhol (2013) e Especialização em Literatura Contemporânea (2014)
pela Universidade Camilo Castelo Branco. É mestrando em Educação pela Universidade
Ibirapuera, além de já ter atuado como professor em cursos de formação docente na Uni-
versidade Brasil e nas Faculdades Metropolitanas Unidas.
Autor: Marcio Destito
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parceria das mais diversas instituições de ensino superior no Brasil. Conheça
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