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Maceió
2010
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Maceió
2010
2
Catalogação na fonte
Universidade Federal de Alagoas
Biblioteca Central
Divisão de Tratamento Técnico
Bibliotecária Helena Cristina Pimentel do Vale
S237p Santos, Janayna Paula Lima de Souza.
“POFE” “arrarara”: formas de representações onomatopeicas em manuscritos
escolares de histórias em quadrinhos produzidas por alunos do 2º ano do Ensino
Fundamental / Janayna Paula Lima de Souza Santos, 2010.
134 f.: il.
Bibliografia: f. [110]-115.
Anexos: f. [116]-134.
CDU: 371.38
3
4
Para
Iracema,
Osvaldo e
Pedro.
Pela presença constante.
5
AGRADECIMENTOS
Aos professores Paulo Ramos, Cristina Felipeto e Adna Lopes pela leitura
minuciosa dedicada ao trabalho e a inestimável direção teórica apontada por cada um.
A querida professora Maria Alba Correia por apoiar cada passo dado.
Naumin Aizen
7
RESUMO
ABSTRACT
Resources verbal and nonverbal featuring the comic for children are considered actually
factors which facilitate the entry of the child in writing and may contribute to the literacy
process. Based on this assumption, discussed in this work, the functioning of linguistic and
discourse of these features: the onomatopoeia. Thus, we take as its object “creation” of
students from a 2nd year of elementary school and describe the different approaches aimed at
her by some linguists, grammarians and lexicographers. Taking as its starting point this
discussion, we analyze how these students represent onomatopoeia when they invent the text
to a sequence of images of Mônica’s Gang comics. The manuscripts collected HQ
schoolchildren are the products of 12 proposals for production of text made from the didactic
project “Comics in the room”, developed in the 2nd half of 2008 in a public school in Maceió.
The results show that the set of 144 manuscripts emerge onomatopoeia 291, classified by the
sense invoked in four categories: 1) expressive onomatopoeia; 2) onomatopoeia
action/motion; 3) indeterminate onomatopoeia; and, 4) onomatopoeia of animal sounds.
Among them, point out five characteristics emerge with intensity: The first concerns the use
of onomatopoeia of linguistic structure, namely, the reduplication of significant ways; the
second refers to the relationship established between the image represented by comic and the
onomatopoeia, this relationship is not always calm; the third related the similarities between
the students productions and onomatopoeia in comics stabilized Mônica’s Gang; and the
fourth is related to those forms “strange” that appear in some manuscripts; and the fifth
feature points to the influence of orality in writing that represented some onomatopoeia
provide large-print volume and intensity to it, as can be exemplified in the onomatopoeia
“POFE” the title of this work. Along these lines, the research showed that onomatopoeia
produced in the school situation maintain close relations with the graphic-visual aspects of
their own gender and interrogate the concept of arbitrariness of the Saussurean sign proposed
in the discussion. We hope with this study, the comic being a genus considered “suitable for
work with written language” (BRAZIL, 2001, p. 111), contribute to the intensification of
scientific research put into relief the processes of creation and writing of manuscripts school.
LISTA DE FIGURAS
Figura 21: QUÁ! QUÁ! QUÁ!: onomatopeia que representa o som de gargalhadas...... 93
10
LISTA DE TABELAS
SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS................................................................................... 15
CAPÍTULO 1: HQ NA EDUCAÇÃO......................................................................... 19
1.1 Educação e HQ: um breve panorama histórico................................................... 20
1.2 Mauricio de Sousa e a Turma da Mônica: da origem à consolidação............... 21
1.3 HQ e a escola........................................................................................................... 24
1.4 Breve comentário sobre a entrada de HQ na sala de aula.................................. 26
1.5 HQ em alguns LDP........................................................................................... 26
CAPÍTULO 6: METODOLOGIA.............................................................................. 80
6.1 Coleta de dados....................................................................................................... 81
6.2 Procedimentos de análise....................................................................................... 86
REFERÊNCIAS............................................................................................................ 111
ANEXOS........................................................................................................................ 116
A – Sobre a escola......................................................................................................... 116
B – Exemplares da Gibiteca 01.................................................................................... 120
C – Exemplares da Gibiteca 02................................................................................... 121
D – Manuscritos escolares de HQ............................................................................... 123
15
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
“(...)
Bramam os tigres, as onças,
Pia, pia o pintainho,
Cucurica e canta o galo,
Late e gane o cachorrinho.
A vitelinha dá berros,
O cordeirinho balidos,
O macaquinho dá guinchos,
A criancinha vagidos.
Pedro Dinis1.
1
Vozes de animais, encontrado no livro “Estudo sobre as onomatopeias” de Rodrigo Nogueira.
16
Na tentativa de contribuir com alguns desses estudos, este trabalho procura discutir o
processo de criação textual em um gênero discursivo3 específico, as histórias em quadrinhos
(doravante, HQ), por alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental4.
Acreditamos que as HQ, através da interação entre dois sistemas semióticos distintos –
verbal e o não-verbal, constituem um gênero com características bastante específicas. Nele, a
particularidade dessa interação promove uma necessária articulação entre inúmeros aspectos,
tais como: as cores predominantes, as formas dos traçados, as composições gráfico-visuais, os
tamanhos e tipos de letras, os tipos de personagens, a presença ou não de enunciados escritos,
usos do discurso reportado, o sequenciamento narrativo e a relação entre as imagens e cenas,
formas e representações de onomatopeias etc. São, precisamente, esses últimos aspectos que
tomaremos como objeto de estudo em nossa investigação, pois as onomatopeias aparecem
como um dos mais importantes e intensos desses recursos. Elas são usadas não somente para
indicar sons ou ruídos de objetos e vozes, mas também para produzir efeitos visuais através de
um conjunto de formas gráficas e cores que cumprem uma função bastante particular, tanto
em relação ao estilo das HQ, quanto no que se refere ao impacto que pode produzir na
ilustração de uma determinada cena (CARVALHO, 2006, p. 44).
Podemos dizer também que em diferentes HQ, elas não são iguais. Observe as
representações a seguir:
2
E demais pesquisadores que compõem o grupo de pesquisa Escritura, Texto & Criação (ET&C) coordenado
pelo professor Dr. Eduardo Calil, tais como: Cristina Felipeto, Adna Lopes, Hozanete Lima, Claudemir
Belintane, Catherine Boré, que comungam da mesma perspectiva teórica de Calil (2004, 2008a).
3
Acentuamos, no entanto, que a calorosa discussão acerca da noção de “gênero” não faz parte do escopo deste
trabalho. Apontamos para o leitor interessado a leitura do texto de Bakhtin (2003) e demais pesquisadores da
área como Marcuschi (2008), Micheletti (2008), Andrade (2008).
4
Este estudo, financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), encontra-
se inserido em um projeto de pesquisa mais amplo intitulado “Alteridade e Singularidade em Processos de
Escritura e Manuscritos de alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental” (ASPEMA), elaborado e
coordenado pelo professor e pesquisador Eduardo Calil, no qual um de seus objetivos é investigar o movimento
de autoria, em manuscritos escolares, de alunos do 2º ano ao inventarem uma HQ. Nesse projeto, há mais dois
estudos, além deste, que estão sendo gestados concomitantemente. São eles: 1) Imagem e texto em manuscritos
escolares de HQ, realizado pela mestranda Aline da Silva Ferreira; e 2) O discurso direto em HQ: relações entre
o que é e o que falam personagens da Turma da Mônica, realizado pela mestranda Lidiane Evangelista Lira.
17
5
Extrato retirado da HQ Super-Homem: Eternamente. São Paulo: Abril, julho, 1999.
6
Extrato retirado da história “Donald: o último dos patocanos” da Revista Pato Donald, nº 2.099. São Paulo:
Abril, novembro, 1996.
7
Extrato retirado da história “Cebolinha e Cascão em: Mau humor?” da Revista Cebolinha, nº 02. São Paulo:
Panini Comics, fevereiro, 2007.
8
Observamos que “PIFA” indica um “tapinha”, enquanto “KNOKK” um “murro”.
18
últimos estudos, diferentemente dos demais trabalhos sobre o gênero, apresentam análises
sobre onomatopeias criadas por duas crianças de seis anos de idade quando escrevem histórias
inventadas. Foi por essa razão que elegemos a onomatopeia como objeto de estudo,
procurando cernir suas formas de representação em manuscritos escolares de HQ.
HQ E EDUCAÇÃO
Fernando Gonsales
A inegável popularidade dos quadrinhos talvez tenha sido responsável por uma
espécie de “desconfiança” quanto aos efeitos que elas poderiam provocar em seus leitores
(VERGUEIRO, 2007, p. 8). Muitos pais, educadores e até psicólogos acreditavam que a
leitura das HQ pudesse afastar crianças e jovens de leituras “mais eruditas”, desviando-os,
portanto, de um amadurecimento “sadio e responsável”. Com o tempo, as restrições foram
amenizadas e até extintas. Para compreender esse processo detalhadamente, é necessário rever
os acontecimentos e, principalmente, refletir sobre as contribuições que esse gênero pode
oferecer ao trabalho pedagógico em sala de aula.
Mauricio de Sousa nasceu no Brasil, numa pequena cidade do estado de São Paulo,
chamada Santa Isabel em outubro de 1935. Seu pai, Antônio Mauricio de Sousa, foi o poeta e
barbeiro. A mãe, Petronilha Araújo de Sousa, poetisa. Além de Mauricio, o casal teve mais
três filhos: Mariza (já falecida), Maura e Marcio.
Nos anos seguintes, Mauricio criaria outras tiras de jornal: “Cebolinha”, “Piteco”,
“Chico Bento”, “Penadinho” e páginas tipo tabloide para publicação semanal: “Horácio”,
“Raposão”, e “Astronauta” que invadiram dezenas de publicações durante dez anos. Para a
distribuição desse material, Maurício criou um serviço de redistribuição que atingiu mais de
200 jornais ao fim de uma década.
Suas primeiras histórias foram publicadas pela Editora Continental, que lançava
histórias de terror e havia decidido trabalhar unicamente com material brasileiro. Daí chegou
o tempo das revistas de banca. Foi em 1970, quando a “Mônica” foi lançada já com tiragem
de 200 mil exemplares lançados pela Editora Abril. Foi seguida, dois anos depois, pela revista
“Cebolinha” e nos anos seguintes pelas publicações do “Chico Bento”, “Cascão”, “Magali”,
“Pelezinho” e outras9.
Tentando resolver o problema abriu um estúdio de animação, a Black & White, com
mais de setenta artistas realizando oito longas-metragens. Estava se preparando para a volta
9
Informações colhidas no sítio eletrônico oficial da Turma da Mônica, a saber,
<http://www.monica.com.br/index.htm>. Acesso em: 28/01/2010.
23
aos mercados perdidos, mas não contava com as dificuldades políticas e econômicas do país.
A inflação impedia projetos a longo prazo (como têm que ser as produções de filmes
sofisticados como as animações), a bilheteria sem controle dos cinemas que fazia evaporar
quase 100% da receita, e o pior: a lei de reserva de mercado da informática, que o impedia o
acesso à tecnologia de ponta necessária para a animação moderna. Mauricio, então, deteve o
desenho animado e concentrou-se somente nas HQ e seu merchandising, até que a situação se
normalizasse.
Depois de passar pelas editoras Abril e Globo, Mauricio assinou contrato com a
multinacional italiana Panini Comics, que publica suas revistas desde 2007. O autor já
alcançou o número de um bilhão de revistas publicadas. Mais de 100 empresas nacionais e
internacionais são licenciadas para produzir quase 3.000 itens com os personagens de
Mauricio de Sousa. Suas criações já chegaram a mais de 120 países, em 50 idiomas.
Em 2007, num feito inédito, o UNICEF – Fundo das Nações Unidas para Criança e
Adolescência – nomeou como embaixadora a personagem Mônica, criação de Maurício
inspirada em sua segunda filha. Nesta ocasião, Mauricio de Sousa foi nomeado Escritor para
Crianças do UNICEF. Suas mais recentes criações são Tikara e Keika, personagens
especialmente criados para as comemorações do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil
que já fazem parte das histórias da Turma da Mônica. Seu recente lançamento, Turma da
Mônica Jovem, que mostra os personagens de Mauricio de Sousa adolescentes e vivendo
aventuras incríveis, na qual o personagem Cascão toma banho (mas não sempre), Mônica fez
um regime e emagreceu e Cebolinha, agora chamado de Cebola, recorreu a Fonaudiologia e
só troca a pronúncia dos “R”s pelos “L”s quando está nervoso, em 2008, é considerado o
24
maior sucesso na área de quadrinhos dos últimos 30 anos – só as quatro primeiras edições
venderam, juntas, mais de 1,5 milhão de exemplares10.
Em relação aos quadrinhos voltados para um público adulto destacamos Angeli, com
os Skrotinhos, Rê Bordosa e Bibelô; Laerte, com Piratas do Tietê; Glauco, com Neuras,
Geraldão e Dona Marta, e muitos outros autores que também fazem parte desse elenco de
escritores de quadrinhos: Neil Gaiman, Alain Voss, Miguel Paiva, Sergio Macedo, Paulo
Caruzo, Quino...
1.3. HQ e a escola
Muitas pesquisas realizadas comprovam o potencial pedagógico das HQ. Uma delas,
citada por Carvalho (2006), e realizada em 2001 pela Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação (CNTE) em dez estados brasileiros, comprovou que alunos que
10
Informações colhidas no sítio eletrônico
<http://www.meujornal.com.br/cbm/jornal/materias/integra.aspx?id=986838>. Acesso em: 28/01/2010.
11
Advertimos ao leitor que essas considerações não foram comprovadas num trabalho investigativo, trata-se
apenas de ideias concebidas pelo autor.
25
leem gibis têm melhor desempenho escolar do que aqueles que usam apenas o livro didático.
O relatório do CNTE ressalta ainda que as HQ aumentam significativamente o desempenho
do aluno: entre os que acompanham quadrinhos, o percentual das melhores notas nas provas
aplicadas foi de 17,1%, contra 9,9% entre os que não leem. Os professores que leem revistas
em quadrinhos obtêm melhor rendimento dos alunos, pois conhecem melhor o universo dos
estudantes e se aproximam deles usando exemplos desse universo como paradigma para as
aulas. A pesquisa mostra, dentre outras coisas, que, entre os alunos da 4ª série da rede pública
cujos professores leem HQ, a proficiência em leitura é mais alta do que entre aqueles cujos
professores não tem o hábito de ler gibis. Na rede pública 36% dos alunos leitores de gibis
têm proficiência média-alta e alta, contra 31,5% dos não-leitores, “o que mostra a importância
de haver tempo livre para apreensão de conhecimento e de vivência de outras fontes para a
qualidade da educação” (CARVALHO, 2006, p. 39)
intenção os autores de LDP exploram as onomatopeias? Seria meramente por ser um recurso
encontrado abundantemente nesse gênero?
Todavia, reconhecemos que sua presença nos livros didáticos é um efeito das políticas
públicas efetivadas pelo Ministério da Educação, em particular, dos critérios e das orientações
apresentadas pelo Guia de Livro Didático (BRASIL, 2006).
29
ONOMATOPEIA E A LINGUÍSTICA
12
Excerto encontrado no livro Shazam! de Álvaro de Moya, publicado em 1970, em que traz uma valiosa
compilação de estudos acerca das HQ e, em especial, sobre onomatopeias.
30
13
Extrato retirado da história “Papa-Capim em: a maraca mágica”, publicada na Revista Almanaque da Magali.
nº 06. São Paulo: Panini Comics, 2007.
14
Extrato retirado da história “Tio Patinhas e a musa dos negócios”, publicada na Revista Tio Patinhas. nº 388.
São Paulo: Abril, 1997.
15
Extrato retirado da Revista X-Men: O filme – Quadrinização Oficial. São Paulo: Abril, 2000.
31
16
Na conjuntura linguística tanto as aulas quanto os escritos de Saussure suscita inúmeras reflexões. Para o
aprofundamento nos estudos do mestre genebrino sugerimos a leitura do texto Introdução à leitura de
Saussure de Simon Bouquet (1997), que traz valiosas contribuições à Linguística sobre a o pensamento
saussuriano.
32
17
Elas variam de país a país, na medida em que diferentes culturas representam os sons de acordo com o idioma
utilizado para sua comunicação (VERGUEIRO, 2007, p. 62).
18
Exemplo visto nas considerações iniciais deste trabalho.
33
Dessas, a seção evidentemente que nos interessa, refere-se às funções dos morfemas.
A primeira consideração que retomamos do autor é a sua posição quanto à arbitrariedade do
signo, em que afirma “os morfemas são inteiramente arbitrários em relação às significações
gramaticais que representam” (MATTOSO CAMARA, 1959, p. 131) comprovando sua
filiação aos estudos de Saussure. Nessa seção, apresenta os conceitos de afixos
compreendendo a noção de prefixo, sufixo, reduplicação e alternâncias consonânticas e
vocálicas. Nosso olhar incidirá nessas duas últimas.
A reduplicação, para esse autor, é o tipo de morfema que consiste em antepor à raiz
(ou corpo fonético do semantema) uma parte ou a totalidade desse próprio segmento de
fonemas. A reduplicação é, definida aparentemente, como um morfema segmental como é o
afixo; e sua natureza linguística é muito mais sutil e abstrata, pois não é uma fração fônica
que o constitui, senão o fato dela repetir-se. A reduplicação é um fenômeno intimamente
ligado às exigências da linguagem enfática e assenta no valor intensivo da repetição. Segundo
Mattoso Camara (1959), esse fenômeno está presente, nas diversas línguas, tanto na
linguagem infantil como sendo desenvolvido sob normalização e sistematizada para a
expressão de determinadas categorias.
19
Morfema é a menor unidade linguística que possui significado, abarcando raízes e afixos, formas livres (por
exemplo: mar) e formas presas (por exemplo: sapat-, -o-, -s) e vocábulos gramaticais (preposições, conjunções).
(HOUAISS, 2001).
34
Mas, apesar dessa abordagem conter esses princípios tão próximos das onomatopeias,
pois são os processos formadores desse recurso linguístico, o autor não tece explicitamente
qualquer comentário acerca desse recurso linguístico.
20
Referimo-nos aqui ao livro “Lingua (gem) e Linguística” do autor, em que desenvolve uma introdução geral
ao estudo da linguagem.
35
O linguista diz que, “há em todas as línguas casos esporádicos do que tradicionalmente
se chama de onomatopeia” e exemplifica com a conexão não-arbitrária entre forma e
significado dos vocábulos ingleses: cuckoo (cuco), peewit (pio), crash (estrondo) e acrescenta
que, “a grande maioria de palavras em todas as línguas é não-onomatopaica: a conexão entre
sua forma e significado é arbitrária visto que, dada a forma, é impossível prever o significado,
e dado o significado, é impossível prever a forma” (LYONS, 1987, p. 31).
Direcionando seu olhar para os estudos de Saussure, Ullman (1964, p. 168), diz que
“entre os linguistas modernos, Saussure foi quem mais relevo deu àquilo que chamou “o
arbitrário do signo”, o caráter convencional das nossas palavras, no qual ele viu um dos
princípios básicos da língua.” E continua enunciando, “compreendeu que havia algumas
exceções a este princípio, mas desprezou-as por serem pouco importantes. Linguistas de
21
Doutorado em Letras pela Universidade de Budapeste, Doutorado em Literatura pela Universidade de
Glasgow.
36
No que tange a primeira questão, o autor diz que se houvesse uma conexão necessária
entre o nome e o sentido, esperar-se-ia que os mesmos sons significassem a mesma coisa, e,
inversamente, a mesma coisa deveria ser sempre designada pelos mesmos sons, como, por
exemplo, a palavra meat que tem vários homônimos com significados totalmente diferentes: o
verbo to meet (encontrar), o adjetivo arcaico meet (apto, conveniente), o substantivo mete
(fronteira) e o verbo to mete (out) (distribuir), entretanto, esta palavra possui quase um
sinônimo no termo flesh (carne de animais vivos). As duas palavras estão muito próximas ao
significado, mas não têm um único som. Na segunda questão, o autor, baseado em Bloomfield
diz, se o elo entre o nome e o sentido fosse necessário, esperaríamos que ambos os elementos
permanecessem inalterados. No entanto, não foi isso o que aconteceu. A forma da palavra no
antigo inglês era mete e significava comida em geral. E, na terceira questão, Ullman afirma
que as diversas línguas têm palavras inteiramente diferentes para o mesmo objeto. Ao inglês
meat corresponde viande em francês. Inversamente – os mesmo sons ou aproximadamente –
representam coisas diferentes noutras línguas: o alemão miet (alugar), o francês mite (bicho
do queijo).
Ullman (1964, p. 171), dando continuidade a essa discussão, afirma que muitas
palavras são inteiramente convencionais e outras motivadas de muitas maneiras, podendo ser
motivadas nos sons, residindo na estrutura morfológica da palavra, e no seu fundo semântico.
Cada uma destas possibilidades origina problemas diferentes, devendo, por isso, ser
consideradas separadamente. O linguista subdivide em três tipos de motivação: a motivação
22
O aprofundamento nessas questões, segundo o autor, podem ser vistas no seu livro “Princípios da Semântica”,
publicado em 1963.
37
A onomatopeia, segundo Ullman (1964, p. 174), pode ser usada tanto como artifício
“estilístico”, quanto como recurso “semântico”. Em relação ao seu aspecto estilístico, o efeito
baseia-se não tanto nas palavras individuais, mas em uma judiciosa combinação e modulação
de valores sonoros que podem ser reforçados pela aliteração, pelo ritmo, pela assonância e
pela rima. Já o semântico baseia-se na qualidade onomatopaica das palavras. Nesse campo, o
autor faz uma distinção entre a onomatopeia primária e a onomatopeia secundária. A
onomatopeia primária é a imitação do “som pelo som”, é o verdadeiro “eco do sentido”, em
que o próprio referente é uma experiência acústica, imitada pela estrutura fonética da palavra.
As palavras buzz (zumbir), crack (rachar), growl (rosnar), hum (murmurar), pertencem a essa
categoria. Algumas dessas palavras inglesas deram origem, nas HQ brasileiras, às
onomatopeias: ZZZZ, GRR!! e HUM!.
Diante dessa discussão tecida por Ullman e na tentativa de evitar possíveis equívocos,
é necessário definir a emergência de alguns conceitos subjacentes à formação das
onomatopeias, tais como a alternância (vocálica e/ou consonântica), a reduplicação e a
repetição. A alternância, segundo Mattoso Camara (2002, p. 47), é o tipo de morfema que
38
consiste na substituição de um fonema dentro do semantema, donde uma oposição entre duas
ou mais formas de um mesmo semantema. Trazemos como exemplo, além das onomatopeias
supracitadas: zigue-zague; pingue-pongue. Ainda tomando como base os conceitos delineados
por esse importante linguista, “a reduplicação é a repetição da sílaba radical de um vocábulo,
a qual em muitas línguas corresponde a um tipo de morfema dito reduplicativo” (MATTOSO
CAMARA, 2002, p. 206).
impossível classificar a onomatopeia, pois sua formação conta com a subjetividade de quem a
produz.
O primeiro livro, “Estudos sobre as onomatopeias”, está constituído por três artigos24
que se complementam, intitulados, respectivamente: 1) Subsídios para o estudo das
onomatopeias em português; 2) Contribuição para o estudo das onomatopeias; e, 3) Nova
contribuição para o estudo das onomatopeias.
23
Foi professor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Dentre seus estudos incluem-se: Curso de
Filologia Portuguesa (1932); O problema da sílaba (1942); Dicionário de verbos portugueses conjugados (1945)
e outros.
24
“Independentes uns dos outros, porque em épocas diferentes foram concebidos e elaborados, mas que se
completam uns aos outros, pois que, de certo modo, o 2º é uma continuação do 1º, e o 3º é outra do 2º [...] a
concepção e a redação dos três não foram seguidas: entre o 2º e o 1º medeiam doze anos, e entre o 3º e o 2º, um
ano” (NOGUEIRA, 1950a, p. 5).
25
Publicado, inicialmente, no Boletim de Filologia, IV, Lisboa, 1936.
26
Do original, lê-se: “Les onomatopées sont des mots imitatifs, c’est-à-dire des mots qui prétendent imiter par
les phonèmes dont ils se composent certains bruits tels que le cri ou le chant des animaux, le son des instruments
40
Há, segundo o autor, uma classificação dos caracteres dos sons da natureza, a saber, o
timbre, o tom, a entonação, a quantidade, a sonoridade, a ressonância, a brusquidão, a
intensidade, a continuidade, a repetição, a rapidez da repetição e a suspensão, e são,
justamente, estas classificações que tornam os sons com a capacidade de aproximação dos
sons naturais.
de musique, le vacarme des machines, le bruit qui accompagne les phénomènes de la nature, etc. L’onomatopée
est toujours une approximation, jamais une reproduction exacte”.
41
duração da emissão das vogais, e pelo emprego, em certos casos, das consoantes fricativas27; a
sonoridade, pela vibração ou não vibração das cordas vocais, isto é, pelo emprego dos sons
vozeados (sonoros) e dos sibilados (surdos); a ressonância, pela nasalidade; a brusquidão,
pelas consoantes oclusivas28; a intensidade, pela maior ou menor força com que se expulsa o
ar e pelo emprego adequado das consoantes oclusivas; a continuidade, pelo emprego das
vogais longas, das consoantes fricativas e das vibrantes; a repetição, pela repetição dos
fonemas ou das sílabas; a rapidez da repetição, pelas consoantes vibrantes; a suspensão, pela
suspensão (reticências).
Nogueira, ainda nesse primeiro artigo, propõe uma hipótese em relação à ortografia
das onomatopeias empregando o traço de união entre os elementos componentes das
onomatopeias, principalmente se são constituídas pela repetição de um monossílabo. Para ele,
a representação gráfica das onomatopeias deve ser considerada sob dois prismas: o das
onomatopeias vocabulizadas e o das onomatopeias não vocabulizadas. As primeiras devem
ser moldadas a partir das regras gerais da ortografia da língua, e as segundas, na sua
representação gráfica, procuram manter as qualidades fonéticas, ou seja, a sua ortografia tem
de ser expressiva.
Este conceito de Nyrop é, que eu saiba, de uma maneira geral, o de quantos se têm
ocupado dos estudos das onomatopeias. Quer dizer: são quase todos unânimes em
considerar que as onomatopeias “são palavras imitativas de sons da natureza”. Eu
próprio segui esse critério no meu supracitado trabalho.
Será esse critério justo e definitivo? Não poderemos classificar de onomatopeias
certas palavras designativas de coisas e de ações produtoras de sons, ou de aspectos,
digamos assim, comparáveis aos sons? (NOGUEIRA, 1950a, p. 127-128).
Nesse sentido, advoga Nogueira (1950a), visto que os fonemas são sons, o que é
natural é que eles se utilizem na estrutura fonética das palavras como tradutores de sons, isto
é, de fenômenos perceptíveis pelo ouvido, e não de particularidades perceptíveis pela vista,
27
Segundo Bechara (2005) as consoantes fricativas são: /f/, /v/,/s/, /z/, /x/ e /j/.
28
Segundo Bechara (2005) as consoantes oclusivas são: /p/, /b/, /t/, /d/, /k/ e /g/.
29
Esse artigo foi publicado, inicialmente, no Boletim da Filologia, IX, Lisboa, 1948.
30
De acordo com Houaiss (2001), a Filologia refere-se ao estudo científico do desenvolvimento de uma língua
ou de famílias de línguas, em especial a pesquisa de sua história morfológica e fonológica baseada em
documentos escritos e na crítica dos textos redigidos nessas línguas.
42
pelo tato, etc. Contudo, não é impossível ao espírito humano, por um processo metafórico,
digamos assim, estabelecer paralelos, conexões, comparações, etc.
a) sendo mais que certo que grande número das palavras das várias línguas do Globo
são de origem onomatopeica (...) aos que pretendem fazer investigações
etimológicas é absolutamente indispensável que conheçam com suficiência a
natureza e a extensão do fenômeno onomatopeico;
b) é bem conhecida a teoria da origem onomatopeica da linguagem. (...) Tanto para
defender como para combater tal teoria, é indispensável, antes de mais nada que
conheçamos com suficiência a natureza e a extensão do fenômeno onomatopeico;
c) não sendo mera fantasia o onomatopeísmo e sendo real o fundamento real da
expressividade das palavras, o conhecimento suficiente da natureza e da extensão
do fenômeno onomatopeico é da máxima conveniência para aqueles que pretendem
31
Aprofundaremos essa questão no quinto capítulo.
43
Em continuidade com este trabalho publica no mesmo ano o que considera como o
segundo volume do livro acima supracitado e o intitula “As onomatopeias e o problema da
origem da linguagem”. Neste, Nogueira (1950b), em oito capítulos, discute os meandros da
44
32
Alertamos ao leitor, que não empreenderemos aqui uma descrição exaustiva da referida obra, tentaremos, pois,
sintetizar num quadro geral alguns pontos fundamentais do problema.
33
Cabe ressaltar que a expressão “homem primitivo”, neste trabalho, não se refere aos antropoides que
“injustificadamente se diz que Darwin atribui a nossa ascendência, o gorila, o orangotango, o chimpanzé, de
inteligência e de linguagem rudimentaríssimas, incapaz (?) de sentimentos de moral e de religião (...). O tipo
humano, a que me refiro (...) se referem em geral os que têm tratado do problema da origem da linguagem”
(NOGUEIRA, 1950b, p. 10).
34
Segundo Nogueira (1950b) o termo monogenista refere-se aos partidários que defendem a origem de uma
única língua que originou as várias línguas hoje conhecidas.
35
Segundo Nogueira (1950b) o termo poligenista refere-se aos partidários que defendem a origem de duas ou
mais línguas, independentemente umas das outras, e que deram origem a duas ou mais línguas em diferentes
pontos do planeta.
36
A saber: 1) Teoria de Deus criador; 2) teoria da Natureza criadora. 3) teoria da invenção tardia; 4) teoria das
raízes; 5) teoria das onomatopeias; 6) teoria das interjeições; 7) teoria dos gritos naturais; 8) teoria dos gestos; 9)
teoria da elaboração progressiva da linguagem natural e, 10) teoria negativa.
45
37
Convém esclarecer ao leitor que o linguista não especifica nenhum teórico.
46
Kehdi (1990), não apresenta uma definição específica para a onomatopeia. Para ele, a
reduplicação de morfemas compreende essa noção, que está presente na linguagem infantil e
nos hipocorísticos: papai, mamãe, vovô, Zezé, Fifi; ocorre, também, em alguns compostos:
pingue-pongue, reco-reco, tique-taque. No entanto, esses exemplos não se revestem de valor
morfológico: ilustram, na verdade, o chamado redobro expressivo.
38
Semelhante processo ocorre com “bem-te-vi”, que indica o canto e o nome da ave.
39
Professor da Universidade Federal do Ceará e da Universidade Estadual do Ceará.
40
De acordo com Houaiss (2001) acrossemia é a redução dos vocábulos ou expressões a seus elementos (letras
ou sílabas) iniciais.
47
Definição x x x x - - x
Formação - - x x x x x
quanto nas HQ e sua formação conta com a subjetividade de quem a produz, ou seja, a
onomatopeia está a meio caminho entre os recursos da língua, a subjetividade, e as formas de
representações convencionalizadas.
ONOMATOPEIA E AS GRAMÁTICAS
“(...)
Mas o que ela não entendia mesmo era o “pá, pá, pá”.
– Qual o significado exato de “pá, pá, pá”?
– Como é?
– “Pá, pá, pá”.
– “Pá” é pá. “Shovel”. Aquele negócio que a gente pega assim...
– “Pá” eu sei o que é. Mas “pá” três vezes?
– Onde foi que você ouviu isso?
– É a coisa que mais ouço. Quando brasileiro começa
a contar história, sempre entra o “pá, pá, pá”.
(...)
– Funciona como reticências – sugeri eu. – Significa, na
verdade, três pontinhos. “Ponto, ponto, ponto”.
– Mas por que “pá” e não “pó”? Ou “pi” ou “pu”? Ou etcétera?
Ela continuou:
– E por que tem que ser três vezes?
– Por causa do ritmo. “Pá, pá, pá”. Só “pá, pá” não dá.
– E por que “pá”?
– Porque sei lá – disse, didaticamente.”
Nada melhor do que iniciar esse capítulo com um fragmento do texto “Pá, Pá, Pá”, de
Luis Fernando Veríssimo, cujo escopo é a produção de onomatopeia. No texto vemos seu
41
Um dos grandes nomes da literatura brasileira. O texto completo pode ser encontrado no livro “Comédias para
se ler na escola – Edição especial para crianças”. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005, p. 41-43.
50
funcionamento na interação oral, encontrada tanto no discurso cotidiano informal, quanto nas
HQ.
42
Pertencia à Academia das Ciências de Lisboa, à Academia Mineira de Letras, à Academia Brasileira de
Filologia, ao Círculo Linguístico do Rio de Janeiro, à Sociedade de Linguística de Paris.
43
Pertenceu à Academia Espanhola de História, à Academia de Buenas Letras de Barcelona, à Academia
Portuguesa de História e à Academia das Ciências de Lisboa.
51
derivação imprópria. Sob a ótica do processo de composição a define em três tipos: quanto à
forma, abordando a composição por justaposição e composição por aglutinação; quanto ao
sentido, diferenciando os termos determinantes e determinados da palavra; e, quanto à classe
gramatical dos elementos que compõem a palavra. Há, ainda, os compostos eruditos,
abarcando os radicais latinos e gregos; o processo de recomposição, apresentando os
pseudoprefixos, o hibridismo, a onomatopeia, a abreviação vocabular e as siglas.
44
Professor Titular e Emérito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade Federal
Fluminense (UFF), membro da Academia Brasileira de Letras, da Academia das Ciências de Lisboa e da
Academia Brasileira de Filologia.
52
Acreditamos que esse processo também seja responsável pelo ritmo da palavra, pois é
a partir da quantidade dos segmentos que se repetem que o efeito rítmico é atingido. Como
exemplo, retornamos ao conto de Veríssimo em que “pá, pá, pá” tem seu sentido garantido na
repetição do segmento “pá” três vezes.
Seguindo a linha teórica dos demais estudos gramaticais evidenciados nesse trabalho
por Cunha e Cintra (2007) e Bechara (2005), Luft (2002) faz descrições linguísticas do
português subdividindo sua gramática em quatro pontos: sintaxe, morfologia, fonologia e
ortografia. No que tange ao processo de formação de palavras, o gramático define três
processos, a saber: a derivação, a composição e o hibridismo. Situa os dois primeiros como
fundamentais para a ampliação interna do vocabulário e, o último, como constituída,
integralmente, por elementos de línguas diversas. Mas em nenhum desses segmentos, o
gramático fez alusão à onomatopeia.
45
Já discutida no capítulo anterior na seção referente ao linguista Stephen Ullman.
46
Gramático e filólogo, foi professor titular de língua portuguesa na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
54
47
Doutora em Letras pela USP e professora de língua portuguesa na Escola de Comunicação e Artes da USP.
48
Bacharel em Direito e pós-graduando em Comunicação Social.
55
que comumente constituem as HQ. Esta é formada por um verbo que, de acordo com Houaiss
(2001) significa a ação de “selecionar (número telefônico), pressionando o teclado”, e não
uma representação aproximada de um som, como é definida entre os linguistas e gramáticos.
Observe outra incidência desse tipo de onomatopeia.
(...) Vestiu o colete e foi abotoá-lo diante de uma janela que dava para os fundos (...)
Felizmente, começou a cantar uma cigarra, com tal propriedade e significação que o
nosso amigo parou no quarto botão do colete.
Sôôôô... fia, fia, fia, fia, fia... Sôôôô...fia, fia, fia, fia, fia...
(ASSIS apud CAMPEDELLI; SOUZA, 2002, p. 450)
49
Onomatopeia retirada da história “Magali em: A bruxa da lua” da Revista Turma da Mônica Extra. São Paulo:
Panini Comics, 2008, p. 06.
50
Discutiremos esse tipo de onomatopeia no capítulo cinco, cujo foco será a descrição das onomatopeias
representadas nas HQ da Turma da Mônica de Mauricio de Sousa.
56
A explicação que se segue diz: o fragmento ganha em significação se lido em voz alta.
Aí, sim, é possível perceber a obsessão de Rubião pela amada Sofia. A exploração dos sons
ocorre pela silabação escandida do nome, pela repetição das vogais da primeira sílaba
(“Sôôôô”) e a repetição cadenciada da segunda (“fia, fia, fia, fia, fia”).
Diante dessa intensa explanação da onomatopeia nesse trabalho, destacamos que esses
autores são os primeiros que explicam a representação específica da onomatopeia nas HQ,
evidenciando o seu processo de formação, quando consideram relevante o fenômeno da
repetição que a constitui. É importante ressaltar também que, além de exemplificar em tiras,
demarcando o tipo de letras, o sentido do som evocado e a criação nas diferentes línguas, os
autores a exemplificam com a presença na literatura brasileira consagrada, num texto de
Machado de Assis. Com isso, consideramos essa abordagem bastante significativa no que
tange a definição desse recurso linguístico, em que extrapola os outros conceitos dados nas
demais gramáticas.
51
Autores de diversas obras da área de língua portuguesa.
57
52
Licenciada e pós-graduada em Língua Portuguesa, pela Universidade Federal de Minas Gerais.
58
Essa autora se difere dos demais e se aproxima de Campedelli e Souza, ao passo que
concebe a onomatopeia num ambiente comumente encontrada, mas não comenta sobre os
principais processos formadores da onomatopeia.
53
Mestra em Teoria Literária, doutora em Educação pela Unicamp e professora de Ensino Médio e de cursos
pré-vestibulares.
54
Não há na gramática a referência do texto original de Guimarães Rosa.
59
Nas quatro gramáticas de textos que descrevemos, a definição é elaborada por todos,
inclusive é levada em consideração, em Campedelli e Souza (2002), Sarmento (2005) e
Amaral (2003), a incidência de exemplos advindos das HQ, contemplando algumas formas
peculiares, nesse gênero, como a utilização do tipo e tamanho da letra e a diversidade na sua
representação de acordo com cada língua.
ONOMATOPEIA E OS DICIONÁRIOS
A maioria das onomatopeias não estão nos dicionários, inclusive esta, utilizada por
Guimarães Rosa. Sendo utilizadas principalmente por poetas e criadores de HQ, é um recurso
linguístico dotado de expressividade que provoca grandes efeitos visuais. Dando continuidade
às discussões dos capítulos anteriores, discutiremos as definições das onomatopeias dadas em
55
Fragmento retirado do livro “Sagarana”.
61
alguns dicionários. Trazemos a luz os conceitos elaborados por dois tipos de dicionários: os
comuns, Aurélio Buarque de Holanda e Antonio Houaiss; e os técnicos, João Mattoso Camara
Junior e R. L. Trask.
Nos preceitos da gramática, o dicionarista faz duas distinções no que diz respeito ao
aspecto motivado da língua. São considerados os signos motivados que tem relação objetiva -
56
Pertencia à Academia Brasileira de Letras, Academia Brasileira de Filologia, à Academia de Ciências de
Lisboa e da Hispanic Society of America.
57
Foi presidente da Academia Brasileira de Letras, ministro de Estado da Cultura, relator da IV Comissão da
Assembléia Geral das Nações Unidas.
62
e não apenas arbitrária - com aquilo que significam (por evocação), e dentro do campo dos
signos considerados motivados. No primeiro aspecto a onomatopeia é subdividida nas
onomatopeias linguísticas e não-linguísticas, nas onomatopeias brutas e gramaticalizadas. No
que diz respeito ao segundo aspecto, as onomatopeias são divididas entre as onomatopeias
propriamente ditas e as chamadas palavras expressivas.
58
Os estudos de Mattoso Camara Junior ressurgem neste capítulo e, complementando seu trabalho na linguística,
visto no segundo capítulo deste trabalho, define e caracteriza a onomatopeia.
64
No que diz respeito à iconicidade, toda palavra onomatopaica denota um som, e tem
uma forma que procura imitar especificamente esse som, permitindo, em alguma medida, que
ele seja identificado. Os exemplos em português do Brasil incluem verbos como tinir, miar,
ronronar, rosnar, zumbir, silvar, farfalhar e substantivos como bangue-bangue, algaravia,
estrondo, grasnido e soluço, para não falar de um certo número de pássaros cujo nome procura
59
imitar o grito correspondente, por exemplo: “o-fogo-apagou”, “bem-te-vi” e outros. Mas
mesmo as palavras onomatopaicas não deixam de ter um bom tanto de arbitrariedade: o ruído
de um disparo é representado em português e em inglês como bang, mas em espanhol é pum,
em alemão peng e em basco dzast. Como já tínhamos apontado nos estudos de Saussure,
Ullman e outros.
59
Nestes exemplos, podemos conceber as definições do dicionarista Houaiss (2001) e classificá-las como
onomatopeias gramaticalizadas.
65
Definição x x x x
Formação - x x -
No que diz respeito ao processo formador da palavra, apenas dois desses dicionaristas
abordam a reduplicação e a alternância. Portanto, sustentados nas especificidades de cada
área, os estudiosos do assunto tecem suas definições, exemplificam, mas poucos contemplam
o processo de formação. No próximo capítulo, veremos como as onomatopeias se constituem
em algumas HQ.
66
ONOMATOPEIA NAS HQ
Stephen Ullman
60
A discussão teórica pautada acerca da onomatopeia por esse teórico da linguagem foi efetuada no segundo
capítulo.
67
linguagens espontâneas, não artificiosas e expressivas tais como nas falas das crianças, na
linguagem coloquial e popular, no calão e na gíria. E, acrescentamos nesse conjunto, nas HQ.
As HQ, através da interação entre dois sistemas semióticos distintos – verbal e o não-
verbal, constituem um gênero com características bastante específicas. Ao fundar uma
linguagem que utiliza elementos gráfico-visuais e textuais, promove uma necessária
articulação entre inúmeros aspectos: cores predominantes, formas dos traçados,
enquadramentos, tamanhos e tipos de letras, tipos de personagens, presença ou não de
enunciados escritos, usos do discurso reportado, sequenciamento narrativo e relação entre
imagens e cenas, formas e representações de onomatopeias etc., pois já dizia Eisner (1995), as
regências da arte (por exemplo, perspectiva, simetria, pincelada) e as regências da literatura
(por exemplo, gramática, enredo, sintaxe) superpõem-se mutuamente. A leitura da revista em
quadrinhos é um ato de percepção estética e de esforço intelectual.
Já ao surgir as HQ, segundo Aizen (1970, p. 289), a “trilha sonora” não tinha grande
importância, pois o que mais interessava era o texto – texto abaixo do desenho – que tudo
dizia, tudo explicava, tudo descrevia, misturando descrições com diálogos, ao contrário das
HQ modernas: em que as legendas estabelecem a sequência da ação, interligando cenas e
acontecimentos, completando-se com os balões, onde se localizam os diálogos.
Não se tem notícia da primeira onomatopeia utilizada nos quadrinhos, mas já se sabe
que ela intensificou-se com o advento do cinema falado em 1927. Cirne (1977, p. 31) afirma
que os ruídos mais antigos, encontrados por ele, são “ZZZZ”, “UH”, “UMPH” e “BOOM” na
história de Winsor McCay, em oito de dezembro de 1907 no Little Nemo in Slumberland.
Segundo Bibe-Luyten (1985), algumas onomatopeias surgiram de verbos da língua inglesa e
foram utilizados pelos quadrinhos norte-americanos e hoje são usadas em todo o mundo.
É que esta língua, por ser híbrida (houve mais de dez idiomas na formação do inglês
atual, sobretudo o antigo holandês e o francês normando), favoreceu melhor a
escolha definitiva de palavras para determinar as coisas. Além disso, a fase de
consolidação dos quadrinhos teve como local os Estados Unidos e daí partiu sua
influência pelo mundo. (BIBE-LUYTEN, 1985, p. 14)
Logo, certas onomatopeias têm seu sentido na tradução linguística semelhante ao ruído
expresso, como as citadas abaixo:
As HQ, certamente, estão carregadas desse recurso, pois eles cumprem o papel de uma
espécie de “trilha sonora” (AIZEN, 1970, p. 289): representações linguísticas de sons e ruídos
que, associadas ao sistema semiótico não-verbal, constitui, hoje, uma forte característica de
muitas HQ. É o elemento que favorece a construção de uma movimentação, expressividade e
sonoridade das imagens e que nem sempre se encaixavam dentro dos diálogos: o bater da
porta, o tiro da arma de fogo, o soco do personagem, etc. Ainda, segundo o autor, a
onomatopeia, é uma variante do código sonoro, que confere às HQ o caráter de mensagens
audiovisuais, porque permitem uma comunicação mais densa, mais direta.
Vale destacar, ainda, que nas HQ a onomatopeia não é um recurso linguístico isolado.
Ela mantém uma relação intrínseca com a imagem e com as metáforas visuais, em que os
sentidos são produzidos e intensificados.
61
No entanto, destacamos que essa é uma questão delicada, pois a representação linguística do som varia de
acordo com a escuta de cada sujeito.
70
Para o leitor desse gênero, as metáforas visuais que envolvem a onomatopeia, como,
por exemplo, as fumacinhas e as estrelinhas; os traços cinéticos que acompanham o balão; as
cores escolhidas para o seu fundo amarelo, que contrasta com o roxo das letras64, assim como
o tamanho das letras, que ocupam quase todo o quadro; e sua sombra são elementos inter-
relacionados. Do mesmo modo que a onomatopeia “buá”, tais recursos ajudam na produção
62
Imagem retirada de uma história sem título, disponível no sítio eletrônico oficial da Turma da Mônica
<http://www.monica.com.br/index.htm>. Acesso em: 12/03/2010. Destacamos ao leitor que estamos usando
onomatopeias que fazem parte das HQ a que os alunos tiveram acesso. Porém, como descreveremos adiante,
efetivamos um tratamento nas imagens dessas HQ, apagando toda referência linguística.
63
Imagem retirada da história “Mônica”, encontrada na Revista Almanaque historinhas de uma página: Turma
da Mônica, n. 2. São Paulo: Panini Comics, 2008, p. 44.
64
Infelizmente, essas características não podem ser observadas neste suporte impresso.
71
de sentido e na própria caracterização da onomatopeia, fazendo com que ela represente não
somente o som, mas também sua intensidade, seu volume e ainda dê um caráter lúdico à
história.
65
Contudo, essa onomatopeia pode representar o barulho de uma porta batendo ou o som de alguém dando um
susto em outra pessoa.
72
66
Quadrinhos retirados da história “Limite assustador” do mangá Bleach, v. 16. São Paulo: Panini Comics, 2007,
p. 29.
73
Além dessa intensa presença e forte característica das onomatopeias nas HQ, tanto nos
gibis Ocidentais quanto nos Orientais, surge um personagem, nas HQ de super-herois
estadunidenses, no mínimo curioso. É o misterioso “Onomatopeia”, um assassino com um
estranho fascínio por efeitos sonoros, que invade os gibis do Batman com um objetivo bem
claro: acabar com a vida do maior protetor de Gotham City! Sua fala peculiar imita os sons
que emanam do seu entorno. Observe uma de suas falas representadas na imagem abaixo:
Figura 11: “BLAM BLAM BLAM” 67: Onomatopeias de tiro reproduzidas na fala do personagem
“Onomatopeia”
67
Quadrinho retirado da Revista Batman Cacofonia. São Paulo: Panini Comics, 2009, p. 12.
68
Resumidamente, nesta história Batman enfrenta o vilão Onomatopeia, natural de Star City, lar do Arqueiro
Verde, que tem como única motivação caçar e assassinar super-herois sem poderes. Para conseguir tal façanha,
elabora um plano para matar Batman envolvendo o Coringa e o Maxi Zeus. Ao fim da história, o Coringa toma
uma facada no coração do Onomatopeia e o Maxi Zeus é preso pelos federais.
74
69
A Turma da Mônica é a “turma” mais conhecida das publicações assinadas por Maurício de Sousa.
Direcionada para o público infantojuvenil, com uma linguagem coloquial, direta e uma intensa representação de
onomatopeias. Essa “turma” tem como personagens principais a Mônica, o Cebolinha, o Cascão e a Magali.
70
Em Santos; Braga; Calil (2008) mostramos que nas HQ da Turma da Mônica esse recurso está em quase todas
as páginas. Sua forte manifestação compõe um dos elementos que constitui esse tipo de gibi, a ponto de
podermos afirmar que sua ausência poderia descaracterizá-lo como gênero discursivo.
71
Extrato retirado da Revista Almanaque do Chico Bento, nº 60. São Paulo: Globo, 2000.
72
Extrato retirado da Revista Almanaque da Magali, nº 51. São Paulo: Globo, 2005.
75
73
Ver em Calil (2009).
74
Extrato retirado da Revista Almanaque da Magali, nº 37. São Paulo: Globo, 2003.
75
Remetemos, nesse momento, para a representação onomatopeica “SALTITA SALTITA SALTITA” de Angeli
comentada no terceiro capítulo.
76
76
Infelizmente, não foi possível recuperar a referência deste quadrinho.
77
Extrato retirado do sítio oficial da Turma da Mônica <www.monica.com.br/paginasemanal327>. Acesso em:
22 de setembro de 2008.
77
Segundo Calil (2004, p. 18) resumidamente, esta história narra a aventura de “três
Todinhos” que têm diferentes sabores: chocolate, morango e creme. Esses personagens
falavam e cantavam o tempo todo, deixando a mãe (“Dona Sabor”) muito triste. De repente
surgiu um/a feiticeiro/fada que fez uma mágica e, ao dar “um toquinho a mais”, emudece-os.
Depois o feiticeiro volta e conserta o seu erro. É no “toquinho a mais” que emudece os “treis
Todinhos” que os autores apontam para algo dessa história fazendo-a “absolutamente singular
78
Extrato retirado da Revista Almanaque do Cascão, nº 55. São Paulo: Globo, 2000.
79
No mês dessa produção Nara estava com seis anos e cinco meses e Isabel com sete anos e um mês. Segundo
Calil e Del Re (2009, p. 28) elas estudavam em uma importante escola particular paulistana e estavam inseridas
fortemente na cultura letrada valorizada na época.
78
mantém um forte valor linguístico. Valor que significa a ausência, a falta de voz dos
Todinhos ou o modo como eles “falam”, “respondem” à pergunta “Tudo bem?”.
Marca gráfico-visual que representa o “som” da fala dos personagens ao ficarem
sem voz, portanto, guarda o sentido de uma onomatopeia e, ao mesmo tempo, indica
uma metáfora visual, em que o espaço é delimitado pelas palavras que o antecedem
e o sucedem (CALIL; DEL RE, 2009, p. 31).
a imagem das mãos de Isabel, associada ao que diz, confirma a presença do espaço
em branco entre as escritas de “Oi. Tudo bem?” e “Então eles perceberam.”,
significando a “resposta sem responder” dos três Todinhos que fariam “sim, com a
cabeça”. Sua marcação na contiguidade da cadeia sintagmática aproxima-se da
forma que toma um “balão mudo”, à maneira do que aparece nas HQs que lê.
(CALIL; DEL RE, 2009, p. 34-35).
E, ainda segundo Calil e Del Re (2009), essa associação entre a “voz muda” e sua
representação gráfica que remete à imagem de um “balão vazio”, como nas HQ, mas sem sua
80
Agradecemos aos autores a gentileza em conceder o excerto do manuscrito tornando possível, ao nosso leitor,
uma rápida visualização do evento pesquisado.
81
Em uma “transcrição normativa” (CALIL, 2008a, p. 71).
79
linha de contorno, é a responsável pela emergência dessa fusão entre a representação de uma
“onomatopeia” e de um “balão”. Deste modo,
METODOLOGIA
Eduardo Calil
Para apoiar didaticamente essa pesquisa elaboramos o projeto didático “Gibi na sala”
82
, ancorado no que propõe Calil (2008) ao vincular as práticas de textualização e os processos
de escritura em ato a um projeto didático que tem como ponto de partida a imersão dos alunos
no gênero discursivo eleito e a interferência nas práticas didáticas desenvolvidas pela escola.
Para tanto, elegemos as HQ da Turma da Mônica, por se constituir através da relação entre
imagem e texto, além de ter no humor seu atrativo central.
82
A produção e aplicação deste projeto, além de constituir os dados empíricos utilizados nesta dissertação,
amplia o banco de dados “Práticas de Textualização na Escola”, coordenado pelo professor Eduardo Calil.
81
Nesse sentido, o projeto didático “Gibi na sala” tem o mesmo propósito que o “Projeto
didático Poema de cada dia” elaborado pelo professor Eduardo Calil, cujo objetivo primordial
é fornecer situações de ensino-aprendizagem adequadas ao gênero, “permitindo que eles se
apresentem em sala de aula de modo intenso, sistemático e significativo” (CALIL, 2006, p. 7).
83
Disponível nas páginas semanais do sítio oficial da Turma da Mônica <www.monica.com.br.>
84
acompanhavam os personagens da história original. Para que esse tratamento pudesse ser
feito, selecionamos histórias curtas (com, no máximo, três páginas) e “carregadas” de humor.
Essa escolha justifica-se pelo fato de, pelo seu alto grau de complexidade, a articulação entre
“fazer uma sequência de quadrinhos” e criar o “texto (diálogo) que a acompanha” ter-nos
parecido inviável. Para exemplificar, disponibilizamos a sexta proposta.
todo e qualquer escrito mobilizado por uma demanda escolar, seja ele produzido à
mão, à máquina ou no computador, seja ele escrito em folha avulsa, no livro
didático, no caderno escolar de estudo de língua Portuguesa, de Matemática, de
Ciências, de Geografia, ou ainda uma breve nota, um bilhete, uma história
inventada, um conto de fada reescrito, um poema copiado, as respostas a uma prova
bimestral de Matemática, a uma questão de Ciências... (CALIL, 2008a, p. 24-25).
84
Antes de realizarmos esse estudo, buscamos a autorização da escola e dos pais dos alunos através do “Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido” fornecido pelo Comitê de Ética desta universidade.
85
Para ser utilizada à medida que os alunos manifestassem interesse pela leitura e recebessem incentivos da
professora para leitura coletiva. Durante a realização do projeto disponibilizamos duas gibitecas. Ambas
constituídas por 40 gibis da Turma da Mônica. No entanto, ao recolher as caixas, no término do projeto, a
primeira gibiteca continha apenas 33 gibis e a segunda, 36. A relação de todos esses gibis disponibilizados
consta no anexo desse trabalho.
86
Podemos dizer, então, que o manuscrito escolar, produto de uma proposta de atividade
sustentada numa sequência de imagens da Turma da Mônica, pode ser denominado
manuscrito escolar de HQ. Deste modo, temos 144 manuscritos escolares de HQ constituindo
nosso material de análise sendo esses o produto das propostas de produção de texto a partir do
projeto didático “Gibi na sala”.
ONOMATOPEIA NOS
MANUSCRITOS ESCOLARES DE HQ
Essas formas inusitadas representadas acima, e muitas outras que veremos no decorrer
do capítulo, ajudam a compor as produções infantis. São as onomatopeias criadas por alunos
recém-alfabetizados que aqui discutiremos.
88
Todavia, antes de iniciar tal discussão, urge fazer um resgate de alguns trabalhos, cujo
escopo pauta-se na incidência de onomatopeias na linguagem infantil, pois verificamos que há
poucos estudos que se preocupam com essa questão. Dentre eles, apontamos para os trabalhos
de Højholt (2008), Calil (2008b; 2008c) e Calil e Del Re (2009). Estes dois últimos estudos
apresentam análises sobre onomatopeias criadas por duas crianças de seis anos de idade
quando escrevem histórias inventadas.
Fragmento 1: Holger e seu pai estão lendo um livro juntos e Holger aponta para uma
vaca87:
86
O fragmento original é: “The child in this study made good use of the linguistically very productive and
communicatively very effective strategy of onomatopoeia. As for many other children, onomatopoeia was a
large part of his initial vocabulary, but where most other children give in to the conventional words around them
around 18-24 months, Holger continued to use these and invent a number of rather “wild” onomatopoeic words.
(…) His excessive use of this phenomenon, points to a central aspects of language acquisition: imitation of the
sounds that surround us”.
87
Holger and his father are reading a book together, and Holger points to a cow:
Holger: “De-deeet?” (Ing.: “what’s that?”)
Father: “It’s a cow. Can you say cow, Holger?”
Holger: “De-deet?”
Father: “Cow”
Holger: “De-deeet?”
Father : “Come on Holger, cow-cow-cow, can you say cow”?
Holger: “De-de-de de de de deeeeeeeeeet?”
(looks at his father with excitement and expectation: “now I must get some pay-off!”)
Father: “So what does the cow say?”
89
A autora afirma ainda que Holger era muito persistente na utilização de holófrases88 e,
muitas vezes, insistia fortemente em esgueirar-se da palavra convencional. Em seu estudo,
Højholt, se depara com a seguinte questão: como explicar o “comportamento onomatopaico
extremo” de Holger? Alguns estudos apontam para uma vantagem na estratégia de utilização
de onomatopeias em certas situações de comunicação: “as experiências mostram que o tempo
de reação para os seres humanos, os julgamentos corretos sobre os significados de palavras
são mais rápidos para o som de palavras-simbólicas do que por palavras arbitrárias comuns”
(HINTON apud Højholt, 2008, p. 33). Deste modo, a ansiedade da família para interpretá-lo,
provavelmente reforçou o sucesso comunicacional de Holger.
Holger: “Muuuuuuuuuuh”
Father: “Yeah, you make a good “muuu” like the cow, - can you also say cow?
Holger: “No!!” (quite angry)
88
Ou “fala de uma só palavra”. Segundo Lemos (2002) é um termo utilizado na Aquisição da Linguagem para
dar um estatuto de sentença/enunciado completo ao fragmento ou palavra isolada na fala inicial da criança, com
base na intenção comunicativa da criança, inferida de seu suposto contexto de enunciação.
89
Os manuscritos de Nara compõem um dos vários corpus reunidos no acervo “Práticas de textualização na sala
de aula”, organizado pelo professor e pesquisador Eduardo Calil.
90
Visar a propor uma ordem ao mesmo tempo nos fenômenos estudados, de maneira a
classificá-los segundo um princípio racional, e nos métodos de análise, para
construir uma descrição coerente, organizada segundo os mesmos conceitos e os
mesmos critérios (BENVENISTE, 2005, p.127).
90
Tal como comentado no quinto capítulo.
91
6,87%
Onomatopeias
expressivas
Onomatopeias de
12,72%
ações/movimentos
43,64%
Onomatopeias
36,77% indefinidas
Onomatopeias de
vozes de animais
Riso
17,32% Choro
55,12% Grito
24,41% Soluço
O autor acrescenta ainda que todas as quatro formas poderiam ser grafadas de jeito
mais simples e bem realistas: Rá! Rá! Rá! ou Ré! Ré! Ré! e assim por diante. Henfil, Ziraldo
e, algumas vezes as produções de Maurício de Sousa, utilizam essa forma de expressão. Há
também a forma “Quá! Quá! Quá!”. Observe no exemplo a seguir:
91
Em estudo posterior, retomaremos as onomatopeias expressivas de grito e soluço e, subsequentemente, a
análise de dados.
93
92
Figura 21: QUÁ! QUÁ! QUÁ! : onomatopeia que
representa o som de gargalhadas
Além dessas produções, surgem as formas “QUIÁ! QUIÁ!” e “HUÁ! HUÁ! HUÁ!”.
Segundo Ramos (2009) as risadas são representadas em geral de maneira análoga à forma
como são emitidas verbalmente. A caracterização varia de autor para autor. Diante disso,
questionamos: como alunos recém-alfabetizados representam onomatopeias de risadas? Como
a imagem favorece o surgimento deste tipo de onomatopeia nos manuscritos?
Nos textos dos alunos verificamos que as onomatopeias de riso totalizam 55,47% do
total referente as onomatopeias expressivas. Desse montante, a forma mais encontrada é “ra ra
ra” com 28 incidências.
93
Figura 22: “arrarara”
92
Extrato retirado da história “Cebolinha, Cascão e Mônica em: Pegadinha não doi!” da Revista Almanaque do
Cebolinha, nº 06, p. 06. São Paulo: Panini Comics, 2007.
93
Extrato retirado da história de Ana B. e Deyse, intitulada “O Breçemte malaco da mônica”, ambas tinham 8
anos e 1 mês.
94
97
Figura 23: “ra ra ra ra”
94
De acordo com Houaiss (2001) o balão-fala é um espaço geralmente arredondado, limitado por uma linha, que
encerra as falas de um personagem, frequente com uma ponta alongada direcionada para o mesmo.
95
Convém realçar, a partir disto, que essas duas vertentes guiarão nossa análise. Dizendo de outro modo,
pretendemos descrever e analisar a formação da onomatopeia, destacando os recursos da reduplicação e da
alternância (vocálica e/ou consonântica) e a possível relação existente entre onomatopeia e imagem.
96
Esta proposta foi efetivada no dia 28/11/2008. Ela mostra, no primeiro quadro, Cebolinha se aproximando do
coelho de pelúcia da Mônica (chamado Sansão). No segundo, ele dando nós nas orelhas do coelho. No terceiro,
Mônica encontra o Cebolinha e ele toma um susto. No quarto, Mônica sai correndo atrás do Cebolinha. No
quinto, Cebolinha correndo vai em direção a uma casa. No sexto, ele bate na porta. No sétimo, Cascão abre a
porta e Cebolinha gesticula. No oitavo, Cascão entrega uma caixa de primeiros socorros ao Cebolinha.
97
Extrato retirado da história de Joyce e Lisly, intitulada “o ceBolilha pegado ocoelho bamonica”, que tinham 8
anos e 3 meses e 7 anos e 5 meses, respectivamente.
95
Não obstante é fácil reconhecer que essas onomatopeias, escritas no segundo e sétimo
quadros da HQ numa espécie de balão-fala e com letras cursivas, são constituídas de acordo
com a reduplicação explicada por Ullman (1964)98 da forma significante99 “ra”. No entanto,
algo chama-nos atenção. Observemos os dois quadros. Em ambos, as expressões do
Cebolinha são completamente diferentes. No segundo quadro da HQ, atentando para o olhar
arteiro e para o sorriso, ele demonstra um certo prazer ao dar nós nas orelhas do Sansão. Já no
sétimo quadrinho, a expressão de medo é fortemente marcada pelo olhar temeroso e pelas
gotas de suor. Assim sendo, poder-se-ia dizer que as formas “ra ra ra ra” e “ra ra ra”
produzidas, respectivamente, são duas onomatopeias diferentes? Ou melhor, de que maneira
as ações e os gestos do personagem influenciam essas produções? Sendo duas manifestações
encontradas no mesmo manuscrito, poderíamos dizer que nessa escrita não houve um retorno
e, consequentemente, uma relação com o já dito/escrito no quadro anterior?
98
No segundo capítulo mostramos como alguns linguistas concebem a onomatopeia. Elegemos as definições de
Ullman (1964) para analisar as produções dos alunos, visto que esta contempla a emergência de alguns conceitos
importantes, tais como a reduplicação e a alternância (vocálica e/ou consonântica).
99
Conforme definido em Calil (2008b; 2008c).
96
101
Figura 25: “eR eR eR eR”
102
Figura 26: “anranan”
100
Esta proposta foi efetivada no dia 30/10/2008. Ela mostra, no primeiro quadro, o Cebolinha passeando com
sua irmã, Mariazinha. No segundo, ela chorando. No terceiro, quarto e quinto, o Cebolinha fazendo gestos,
cantando, dançando para ela parar de chorar. No sexto, um homem aproxima-se, faz um carinho e dá um doce
para ela. No sétimo, ela para de chorar e fica alegre com o docinho. No oitavo, o Cebolinha começa a chorar e
vai atrás do homem.
101
Extrato retirado da história de Ana P. e Daniela, intitulada “O SeBonia caRecamo a mamiazia”, que tinham 8
anos e 1 mês e 8 anos e 2 meses, respectivamente.
102
Extrato retirado da história de Bianca e Lucas N., intitulada “mariaSinha e SeBolinha”, que tinham 8 anos e 7
anos e 9 meses, respectivamente.
97
No entanto, assim como discutimos em Santos; Calil (2010, p. 81), a relação entre a
onomatopeia e a imagem que a representa não é algo evidente para os alunos. Elas trazem um
caráter relativamente indeterminado, e nem sempre é possível definir com clareza o seu
sentido e o tipo de relação que há entre ela e a imagem. Para ilustramos essa heterogeneidade,
observemos o que acontece em apenas um manuscrito que, produzido por Douglas e Eduardo,
fez onomatopeias em cinco deles.
103
Em consonância com a distinção entre onomatopeia primária e secundária desenhada por Ullman (1964) no
quadro teórico que assumimos nesse trabalho, as produções ora analisadas correspondem às onomatopeias
primárias, pois sua representação sugere uma escrita interpretada do som, pelo aluno que a produziu.
99
Além dessa aproximação entre a forma “oem”, proposta por Eduardo e Douglas, e a
forma “unhéé”, usada no gibi da Turma para a representação de um bebê berrando, há outro
aspecto curioso a ser destacado. Tanto no segundo quadrinho, quanto no primeiro e no oitavo
quadrinhos, há uma reduplicação das onomatopeias, característica igualmente observável
nesses gibis.
Contudo, se a forma “oem” pode ser aproximada da forma “unhéé”, a forma “um”,
que prepondera em quase todos os quadrinhos, está mais distante do som do choro,
particularmente de sua representação estabilizada: “buááá”. Além disso, e o que talvez seja o
mais surpreendente, a mesma (?) onomatopeia representa imagens completamente diferentes,
quase opostas: o primeiro quadrinho, quando Cebolinha está cantando, e o oitavo quadrinho,
quando está chorando, têm exatamente a mesma representação ortográfica e gráfica106.
104
Extrato retirado da história “Mônica em: com um beijinho passa”. Revista Almanaque da Mônica, n. 02. São
Paulo: Panini Comics, 2007.
105
Extrato retirado da história “Mauricio apresenta Cebolinha”. Revista Almanaque historinhas de uma página.
Turma da Mônica, n. 04. São Paulo: Panini Comics, 2009, p. 35.
106
Poderíamos dizer, em outra situação, caso fosse uma produção encontrada na HQ da Turma da Mônica, ser
um caso de homonímia constituindo a onomatopeia, conforme comentado em Santos, Braga e Calil (2008). No
entanto, o que se tem nessa produção é apenas uma representação que não diferencia um sentido do outro.
100
A que se deve isso? Por que esses alunos— e outros também —, por vezes, indiciam
certa apropriação desse recurso linguístico e sua relação com a imagem que o representa e,
por outras, dissociam uma coisa da outra?
107
Figura 34: “larala rarala laaa”
107
Extrato retirado da história de Isley e João L. Ar. intitulada “UCABELO DA MÔNICA”, em que ambos
tinham 7 anos e 5 meses.
101
Além dessa representação, surgem as formas “Hu, Hu” e “runru”, formas que se
aproximam “da “lalação” que crianças pequenas costumam fazer pelo simples prazer de
repetir sons e ruídos diversos” (CALIL, 2008c, p. 200), que embora apresente uma distinta
estrutura vocabular, são semanticamente semelhantes.
109
Figura 36: “POFE”
Como se pode verificar, essa é a onomatopeia do título deste trabalho. Escrita com
letras grandes e dentro da metáfora visual, tendo como diferenciação apenas a ortografia da
onomatopeia110, a representação da forma “POFE” não foge muito ao perfil das encontradas
nos gibis da Turma. Nesse tipo de representação, a letra grande e o seu formato peculiar dão
volume e intensidade ao som da pancada. É o que Ramos (2009) advoga sobre a
108
Excerto retirado da história “Mônica, a bonequinha” colhida no sítio eletrônico oficial da Turma da Mônica, a
saber, <http://www.monica.com.br/cgi-bin/load.cgi?file=news/welcome.htm&pagina=../../mural/cinegibi4.htm.>
Acesso em 31/01/2010.
109
Extrato retirado da história de Ana B. e Deyse, intitulada “O Breçemte malaco da mônica”, ambas tinham 8
anos e 1 mês.
110
Segundo Aizen (1970, p. 276) a ortografia das onomatopeias não foi estabelecida, mas a tendência moderna é
encarar as onomatopeias vocabulizadas com a sua categoria de vocábulos, subordinando-as, assim, às leis
ortográficas.
102
111
Figura 37: “zizi”
Ao deparar com essa formação, escrita numa espécie de balão-fala apontada para o
personagem e constituída por reduplicação, questionamo-nos se de fato “zizi” é uma
onomatopeia ou se mantém, nomeada como tal, apenas pela característica da reduplicação da
forma significante “zi”. Vejamos agora a outra incidência:
111
Extrato retirado da história de Mylena e Sara, intitulada “cebolinha pega o coelho da monica e a caba a
panhano da monica”, que tinham 7 anos e 5 meses e 7 anos e 9 meses, respectivamente.
103
112
Figura 38: “T tix”
Tem-se aqui a emergência da forma “T tix” demarcada por uma espécie de balão-fala,
mas, diferentemente da anterior, esta não é formada por reduplicação. Então, o que poderia
caracterizá-la como onomatopeia?
No sentido das interrogações que essas formas incitam, Carvalho (2008) aponta para a
chamada “indeterminação do significado”113, que
seria um efeito provocado naquele que escuta/lê uma palavra ou um enunciado. Esse
efeito, por sua vez, consistiria numa impossibilidade de fixar (ou representar) o
significado (ou significados) de uma palavra (ou de um enunciado), qualquer que
fosse a natureza da atividade implicada na significação (CARVALHO, 2008, p.
107).
Assim, nesses casos, as imagens das HQ são pouco suficientes para produzir a
compreensão das formas significantes produzidas pelos alunos. Isto indica que sua formação
conta com a subjetividade de quem a produz, ou seja, ela está vinculada ao sujeito-falante e,
em decorrência, ao imprevisível da língua. Nesse sentido, a interpretação do investigador
“recebe sua mensagem como “estranha”, não pode nela se reconhecer e, ao mesmo tempo, (o
que é fundamental), reconhece a “matéria” da língua, sob a forma de enigma, de onde é
convocado como sujeito a advir” (LEMOS, M. T., 2002, p. 153).
112
Extrato retirado da história de João L. An. e Nilton, intitulada “O cebolinha Foi jogar bola”, que tinham 7
anos e 6 meses e 7 anos e 4 meses, respectivamente.
113
No decorrer do texto, a autora, ao assumir a posição de Cláudia Lemos (2000) substitui esse termo pela
definição “opacidade de significado”, que na aquisição de linguagem, “seria um efeito produzido pela fala da
criança (no início de seu percurso linguístico) sobre o investigador, tornando-lhe impossível atribuir, com
segurança, um significado aos significantes dessa fala” (LEMOS M. T apud CARVALHO, 2008, p. 110).
104
São dois tipos de vozes de animais que surgem nos manuscritos: o chiar do rato e o
latido do cão. Elas detêm 6,87% das produções. Surgem as formas “Ti, Ti, Ti”, “chiri chiri
chiri” e “TiO TiO TiO TiO TiO”, representando a voz do rato e “AU AU” a do cachorro,
encontradas, respectivamente, na primeira114 e na quarta propostas de criação de HQ.
Atentamos para as incidências denotativas da voz do ratinho.
Num quadro comparativo, além da formação ser sustentada por reduplicação e a forma
significante “Ti” permanecer em ambas as estruturas, podemos facilmente visualizar que na
114
Ela mostra, no primeiro quadro, a Mônica levando uma caixa de presente enquanto Cebolinha e Cascão estão
escondidos atrás de uma moita. No segundo, Cebolinha tem uma ideia. No terceiro, Cebolinha cochicha com
Cascão. No quarto, uma mão mostra um ratinho próximo a caixa. No quinto, um deles coloca o ratinho na caixa.
No sexto, a Mônica entrega o presente para a Magali e os meninos permanecem escondidos na moita. No sétimo,
eles observam. No oitavo, um gatinho sai de dentro da caixa.
115
A primeira proposta foi efetivada duas vezes durante a aplicação do projeto didático. A primeira versão no dia
01/10/2008, ao iniciar as atividades do projeto didático “Gibi na sala”, e a segunda, no dia 12/12/2008,
concluindo as atividades do projeto.
116
Extrato retirado da história de Gian, intitulada “O cebolinha Foi jogar bola”, que tinha 7 anos e 6 meses.
105
escrita da segunda versão (figura 40) não aparece a vírgula, mas surge a vogal “O” 117 e o
chiado do ratinho está dentro de uma espécie de balão-fala.
Assim como nas formações anteriores, esta onomatopeia encontra-se constituída pela
reduplicação da forma significante “chiri” e apresenta-se delimitada numa espécie de bala-fala
apontada para o ratinho. Diante dessa representação, poderíamos dizer que a forma “chi” faz
referência ao verbo “chiar”, deliberadamente designada como a voz do “rato” em Houaiss
(2001), tendo em vista que ele pode ser de origem onomatopeica119?
Enfim, essas distintas representações, não obstante está da forma encontrada nos gibis
da Turma da Mônica. Observemos:
117
Essas questões, no entanto, fogem ao escopo desse trabalho. Elas podem ser aprofundadas no quadro teórico
que averigua a complexidade das rasuras e reformulações tanto em manuscritos literários quanto em manuscritos
escolares. Sugerimos ao leitor interessado a leitura de Fabre (1987), Willemart (1991), Calil (2008a), Felipeto
(2003, 2008), dentre outros.
118
Extrato retirado da história de Douglas e José, intitulada “a turma Da mônica e do ceBolinha”, que tinham 8
anos e 5 meses e 8 anos e 2 meses, respectivamente.
119
De acordo com o dicionarista, o verbo chiar tem uma origem controversa, mas provavelmente é de origem
onomatopeica.
106
120
Figura 42: “TIC TIC TIC”
Traçando um pequeno paralelo entre as formas “Ti, Ti, Ti”, “chiri chiri chiri” e “TiO
TiO TiO TiO TiO”, encontradas nos manuscritos, e a forma “TIC TIC TIC”, encontrada no
gibi da Turma, podemos demarcar que há algo em comum: o som agudo emitido pela vogal
/i/.
120
Extrato retirado de uma história sem título da Revista Almanaque historinhas de uma página. Turma da
Mônica, n. 04. São Paulo: Panini Comics, 2009, p. 72.
107
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sérgio Rodrigues121
A onomatopeia está presente tanto na língua falada quanto na escrita, está na fala
cotidiana e na literatura consagrada, na fala da criança e também na fala do adulto, no tupi
antigo e no latim... Enfim, é um fenômeno linguístico inerente à própria linguagem,
manifestando-se nas mais diferentes culturas e civilizações. É entre os inúmeros aspectos
verbais e não verbais que constituem as HQ que debruçamo-nos detidamente sobre a
onomatopeia.
121
Sérgio Rodrigues é jornalista, editor e colunista de uma revista eletrônica, na qual mantém uma seção diária
intitulada “A palavra é”, sobre curiosidades da língua.
108
últimos anos, tal gênero ganhou espaço no contexto escolar e, hoje, “a leitura de quadrinhos já
é considerada erudição” (GONSALES, 2006, p. 9), tem seu reconhecimento em diversos
materiais didáticos.
No terceiro capítulo elaboramos uma breve descrição dos conceitos trazidos em dois
tipos de gramáticas, as normativas e as de textos. Nas distintas abordagens, consideramos que
Bechara (2005) e, na gramática de textos Campedelli e Souza (2002), são os únicos que
constituem um conceito diferencial por aprofundar o processo de formação da onomatopeia
como a reduplicação e a alternância vocálica e por apresentar as distintas representações nas
HQ.
Com nossa atenção voltada para a incidência das onomatopeias nas HQ, pois é nela
que se tem presença mais marcada, se torna mais forte, ao ponto de extrapolar as definições,
devido estar associada a outras características específicas das HQ, como a cor, o traço, o estilo
do autor, elaboramos o quinto capítulo. Nele, organizamos um breve histórico da
onomatopeia nas HQ; discutimos a relação intricada entre onomatopeia e metáfora visual;
sobre a utilização desse recurso em um mangá e em HQ de super-herois e a inusitada presença
da onomatopeia como personagem na HQ do Batman; e, descrevemos a abordagem da
onomatopeia nos gibis da Turma da Mônica. Vimos que esse recurso linguístico apresenta-se
em quatro diferentes formas: a primeira, com a identificação de homonímias dentre as
onomatopeias; a segunda, a identificação de onomatopeias diferentes com o mesmo sentido; a
109
terceira, demarcada pela presença das onomatopeias “imprevisíveis” e a quarta, por certos
tipos de interjeição, que favorecem um “efeito onomatopeico”. Dentre essas, destacamos a
manifestação das onomatopeias “imprevisíveis”, cujo funcionamento extrapola as definições
dadas pela linguística, pela gramática e pelos dicionários, em que a palavra estabilizada no
léxico da língua, seja ele verbo ou substantivo, adquire propriedades onomatopeicas.
Observemos:
122
Figura 43: “MASTIGA! MASTIGA!”
123
Figura 44: “umHA!”
122
Extrato retirado da história “Cebolinha em: igualzinho ao Popai” da Revista Almanaque do Cebolinha, n. 08.
São Paulo: Panini Comics, 2008, p. 55.
123
Extrato retirado da história de Bianca e Keloany, intitulada “A Beijoquera destarida”, que tinham 7 anos e 9
meses e 9 anos e 4 meses, respectivamente.
110
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ANEXOS
A – Sobre a escola
A escola municipal selecionada para participar do projeto didático “Gibi na sala” está
localizada num condomínio fechado no bairro Tabuleiro dos Martins, em Maceió (Alagoas).
Com 255 alunos (sendo cinco desistentes, nove evadidos e 23 transferidos), ela atende a
educação infantil e o Ensino Fundamental (do 1º ao 5º ano). De acordo com o diretor da
instituição, 80% desses alunos residem em zonas próximas da escola, nos conjuntos Village
Campestre II, Graciliano Ramos e Tabuleiro dos Martins.
O corpo técnico da escola estava constituído por um diretor, uma vice-diretora, uma
coordenadora pedagógica, oito funcionários e 13 professores. Os gestores da escola foram
formados na Universidade Federal de Alagoas. O diretor possui graduação em História; a
vice-diretora e a coordenadora pedagógica em Pedagogia, tendo esta última Especialização
em Psicopedagogia. Todos são profissionais atuantes desde a inauguração da instituição, em
maio de 2006. No período em que lá estivemos, verificamos que:
Ela não possuía vínculo com qualquer tipo de organização não governamental
(ONG) ou com a universidade federal, mas contava com a parceria do
condomínio onde está localizada. As aulas de judô e dança (coco de roda),
estavam sendo financiadas pelo condomínio, estando os alunos isentos de
qualquer tipo de pagamento.
Não existia na escola um Projeto Político Pedagógico (PPP) que norteasse a atuação
de cada agente educativo. De acordo com a coordenadora pedagógica, este documento estava
sendo elaborado.
Vespertino
2 (Turma participante
2º Ano 13h30 às 17h
(A; B) da pesquisa:
2º ano A)
2
3º Ano Matutino 7h30 às 11h30
(A; B)
3 7h30 às 11h30/
4º Ano Matutino/Vespertino
(A; B; C) 13h30 às 17h
O planejamento das aulas com as professoras era realizado individualmente uma hora
por semana enquanto os alunos estavam no intervalo. É o momento denominado pela
coordenadora de “departamento”, em que são discutidas as atividades realizadas na semana,
sugestões de atividades da semana seguinte, leitura de textos e discussões de vídeos
assistidos. A divisão fornecida pela coordenadora consiste em:
Turno Turno
Dias da semana
Matutino Vespertino
3º ano A
Quinta-feira 4º ano C
3º ano B
5º ano
4º ano A
Sexta-feira
4º ano B
2º ano A
2º ano B
Fonte: Dados da escola
1º Período Dinossauros
2º Período Alimentação
2º ano A
Leão
2º ano B
3º ano A
Sistema digestório
3º ano B
4º ano A
Alagoas
4º ano B
4º ano C
Tubarão
5º ano
Fonte: Dados da escola
Além desses projetos isolados a escola dispunha do “Projeto: Contos de Fada” sendo
efetivados concomitantemente por todas as turmas.
B – Exemplares da Gibiteca 01
18. Revista do Chico Bento. nº 200. São Paulo: Globo, setembro, 1994.
19. Revista do Chico Bento. nº 336. São Paulo: Globo, dezembro, 1999.
20. Revista do Chico Bento. nº 365. São Paulo: Globo, janeiro 2001.
21. Revista do Chico Bento. nº 369. São Paulo: Globo, março, 2001.
22. Revista do Chico Bento. nº 62. São Paulo: Globo, março, 2001.
23. Revista da Magali. nº 100. São Paulo: Globo, abril, 1993.
24. Revista da Magali. nº 185. São Paulo: Globo, junho, 1996.
25. Revista da Magali. nº 313. São Paulo: Globo, junho, 2001.
26. Revista da Magali. nº 401. São Paulo: Globo, outubro, 2006.
27. Revista da Mônica. nº 87. São Paulo: Globo, março, 1994.
28. Revista da Mônica. nº 99. São Paulo: Globo, março, 1995.
29. Revista da Mônica. nº 103 São Paulo: Globo, julho, 1995.
30. Revista da Mônica. nº 122. São Paulo: Globo, fevereiro, 1997.
31. Revista da Mônica. nº 155. São Paulo: Globo, setembro, 1999.
32. Revista da Mônica. nº 117. São Paulo: Globo, maio, 2001 (22 exemplares iguais).
33. Revista Parque da Mônica. nº 132. São Paulo: Globo, dezembro 2003.
C – Exemplares da Gibiteca 02
124
Revista sem a capa. Não foi possível identificar o número da publicação.
125
Revista sem a capa. Não foi possível identificar o número da publicação.
123
D – Manuscritos escolares de HQ
Proposta de Criação textual nº 01 (1ª versão)