Vamos apresentar a residência do Comendador João Baptista Scuracchio, que se localizava na Avenida Paulista n.º 33-A, entre as Ruas Augusta e Peixoto Gomide onde hoje está instalado o Edifício Paulista 2028.
Depois deste Casarão
A casa 33-A parece ter sido construída pelo Sr. Braz Alário, proprietário da empresa Braz Alário & Cia, do ramo de ferragens para o setor industrial e ferroviário.
Em dezembro de 1921 é informado em jornal que o empresário tinha adquirido um terreno na Avenida Paulista e, em 1923, a Prefeitura Municipal solicita que ele chanfre a guia da Paulista 33-A. Pelo que foi apurado, o Sr. Alário morou entre os anos 1917 e 1923 em uma casa alugada, no número 156 da Paulista e, a partir de 1927, aparece já residindo onde era o terreno de sua propriedade, a casa foi construída com ptojeto do escritório de Ramos Azevedo.
Em 1929, a Braz Alário & Cia foi a falência por uma quebra de contrato com o seu maior cliente: as Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, que pediu a falência da empresa. Provavelmente, por esse motivo, ou a casa foi vendida ou foi entregue para pagamento de dívida, pois em 1930 ela já aparece em nome de João Baptista Scuracchio.
Quem foi João Baptista Scuracchio
O italiano João Baptista Scuracchio nasceu em 25 de fevereiro de 1878, em Civita, Cosenza, Calabria, Itália. Em 1886, veio para o Brasil e alojou-se primeiramente na cidade de São Carlos, no estado de São Paulo, mas pouco tempo depois, mudou-se para a capital a procura de novos negócios. Assim que chegou à cidade, casou-se com Nicolina Anna Vincenza Scuracchio, que teve cinco filhos: Letícia, José Sérgio, Nelson, Nela e Wilson.
Na vida profissional, até os anos 1920, dedicou-se ao comércio, tanto de importação como de exportação. Teve destaque na exportação do café e na importação de artigos italianos para o Brasil, fortalecendo os laços entre os dois países.
Era membro do conselho da associação comercial e, por meio dela integrou, em abril de 1910 a comissão responsável pelas exposições de Turim e Roma na Câmara do Comércio.
Empreendedor como era, logo após a Primeira Guerra Mundial, investiu na incipiente industrialização brasileira. Foi responsável pela abertura de 3 diferentes fábricas: duas de tecidos e uma de chapéus, que eram aparelhadas com máquinas e equipamentos modernos para a época e, além disso, empregavam mais de 2.000 operários no processo de fabricação.
Uma delas era a S.A. Cotonifício Paulista, que mantinha em sua área, a fiação, tecelagem e tinturaria, com 400 teares e 18.000 fusos (que é utilizado num movimento circular para transformar a lã que vem do tear em fio).
Além das fábricas, o Comendador Scuracchio investiu em muitos imóveis comerciais que ficaram famosos por sua importância na sociedade da época como no seu valor histórico nos dias atuais. Entre eles está o Edifício do Clube Comercial, que foi inaugurado em 1930 e possuía várias lojas e escritórios, além de salões de baile.
O autor do projeto do edifício era o italiano Felisberto Ranzini, principal projetista do escritório Ramos de Azevedo. O prédio era situado no limite entre o então Parque do Anhangabaú e o chamado hoje de “centro velho”. Por um período, o edifício abrigou a Bolsa de Mercadorias de São Paulo. Foi derrubado no final dos anos 1960 para a construção do Edifício Grande São Paulo.
Além do Clube Comercial, outro importante empreendimento do Comendador Scuracchio foi o conhecido Hotel Municipal, que fica localizado na Avenida São João esquina com a Conselheiro Crispiniano, que se constituiu como uma das mais belas obras arquitetônicas do centro de São Paulo, com sua formosa construção – ainda hoje preservada (mas não conservada) – que representou a arquitetura francesa típica do século XIX na cidade. Atualmente, o edifício está fechado e ocupado comercialmente apenas em seu nível térreo.
E o palacete da Avenida Paulista, que é o motivo deste artigo? Vamos a ele!
Muito provavelmente, quando adquiriu a casa do número 33-A, o Comendador Scuracchio encomendou um novo projeto para Felisberto Ranzini, que também foi responsável pelo projeto arquitetônico do Clube Comercial.
No site da Casa Ranzini, que era a residência do arquiteto, encontramos a seguinte alusão relativa ao palacete do comendador.
A casa (Ranzini) filia-se ao denominado “estilo florentino” – plasmado no Quatrocento e recolocado em voga na Itália, da passagem dos séculos XIX / XX – temperado com as liberdades ecléticas então vigentes e praticado com destaque pelo arquiteto (…). Era um estilo particularmente apreciado por setores abastados da colônia italiana – saudosos da pátria e sempre dispostos a homenageá-la, de então: na avenida Paulista, “passarela” do ecletismo historicista desses tempos, tínhamos nessa linguagem arquitetônica a bela propriedade de João Batista Scuracchio.
Em sua vida pessoal, o Comendador também ficou conhecido como um grande benemérito que ajudou em diversas ocasiões tanto a população paulistana como a italiana em diversas áreas: filantrópicas, esportivas e sociais. Foi um dos responsáveis pela edificação da Clínica Infantil Ipiranga, hoje conhecido como Hospital Dom Alvarenga, na Avenida Nazaré.
Ele se empenhou diretamente para ajudar, na época, da epidemia de gripe em 1918, tanto que em 1922 foi nomeado Cavalheiro da Coroa e, em 1928, recebeu a Comenda da Coroa Italiana.
Até ao morrer, a família e o Comendador tiveram pompas. Foram sepultados em um dos mais belos exemplares de arte tumular do Cemitério São Paulo, que conta com o último exemplar de escultura realizada por Victor Brecheret (Título da obra: Ave Maria – Quadra 27 – Terrenos 31,32 e 34).
Brecheret usou o estilo expressionista para esculpir os anjos do mausoléu, tendo atrás uma grande parede, com cerca de 3 metros de altura, construída com placas de mármore, onde estão as inscrições e o nome da família com uma coloração rósea. Nessa parede, atrás da cruz, um nicho representa um portal de passagem para o desconhecido do “outro lado” do umbral.
No lugar do casarão, em estilo florentino, surgiu, em 1976, o Edifício Paulista 2028, tema de nossa próxima publicação.
Contribua com a Série Avenida Paulista: se tiver uma foto antiga em que este casarão/edifício/local público apareça ou se conhecer alguém que possa fornecer mais informações sobre a residência ou edifício e pessoas relacionadas (família, amigos e outros), entre em contato com a gente. Muito obrigada!
12 thoughts on “O palacete ao estilo florentino de João Baptista Scuracchio”
Norma Mazulo
Que bela história.
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
Muito obrigada!
CurtirCurtir
Pingback: Paulista 2028 e seu retrofit sustentável | Série Avenida Paulista
Pingback: As casas dos Matarazzo na Av. Paulista | Série Avenida Paulista
Silvana
Jà comentei diversas vezes na pàgina do grupo VIVA SAO PAULO ANTIGA, que é lamentàvel ver como Sao Paulo, no decorrer das décadas, tenha deixado todo seu patrimonio històrico em estado de abandono ou demolido na pior das hipòteses. Uma visao miòpica e imediatista de quem nos governou. Se antes era escarso, ou até inexistente os investimentos, ou leis que favorecessem a manutençao deste patriomonio, imaginamos agora, com uma situaçao economica tao difìcil onde a urgencia é tirar da miséria um povo inteiro.
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
Olá Silvana, obrigada por sei comentário. É verdade, a situação está bastante complicada atualmente, mas temos que continuar tentando resgatar e disseminar nosso patrimônio histórico e cultural. E é esse o propósito da Série Avenida Paulista.
CurtirCurtir
Fadiga de Cariátides
Lu…O projeto desta residência é de 1922 e foi projetada por Ramos de Azevedo.
CurtirCurtir
Luciana Cotrim
Oi Paulo, é mesmo? Onde tem essa informação? Como o Felisberto Ranzini era projetista do escritório de Ramos de Azevedo, talvez tenha projetado pelo escritório..
CurtirCurtir
Paulo
…consegui as plantas originais com a família e algumas fotos que foram incorporadas ao meu acervo. Inclusive passei para o Marcus fotos das plantas para que ele pudesse fazer algumas revisões no Janela da História.
CurtirCurtido por 1 pessoa
Luciana Cotrim
É mesmo? Você é demais! Passa para mim também…você tem fotos da casa e/ou da família?
CurtirCurtir
Pingback: O livro sobre a casa de Caetano Zammataro – parte 1 | Série Avenida Paulista
Pingback: A casa alugada da família Mignone na Avenida Paulista | Série Avenida Paulista