Ir para o Conteúdo da página Ir para o Menu da página
Carregando Dados...
FIQUE POR DENTRO DE TODAS AS INFORMAÇÕES DAS ELEIÇÕES 2024!

Há 36 anos, a maior tragédia da mineração (VÍDEO)

Acidente matou 31 mineiros em Urussanga e foi um marco na história da atividade
Marciano Bortolin / Bruna Tomé Borges / Especial Urussanga, SC, 10/09/2020 - 10:30 Atualizado em 10/09/2020 - 11:50
Divulgação
Divulgação

Quer receber notícias como esta em seu Whatsapp? Clique aqui e entre para nosso grupo

O 10 de setembro de 1984 ficou marcado pela maior tragédia da mineração. Naquele dia, há exatos 36 anos, 31 mineiros perderam a vida após uma explosão em uma mina de carvão na comunidade de Santana, em Urussanga.

Em 2017, uma reportagem especial assinada pelos jornalistas Marciano Bortolin e Bruna Tomé Borges, e publicada pelo jornal Diário de Notícias, recontou a história. Na ocasião, sobreviventes e parentes das vítimas relataram fatos da época.

Confira abaixo:

Em Urussanga, a maior tragédia da mineração de carvão do Brasil
 
Aos 26 anos, Arestide José Goulart nutria sonhos como qualquer homem de sua idade. A compra de uma casa nova, onde poderia viver com a esposa, os dois filhos, pai, mãe e irmãos, estava entre as prioridades. Para conseguir um dinheiro extra, o mineiro decidiu negociar as férias. Isso seria fundamental para que ele terminasse de quitar o carro e os móveis novos, recém-adquiridos.

 

Trabalhar em plena madrugada não era problema. Ele estava acostumado a ir ao subsolo naquele horário. Depois do feriadão de Sete de Setembro, voltou ao trabalho na mina de carvão da Companhia Carbonífera de Urussanga (CCU), na localidade de Santana, em Urussanga. Na segunda-feira, 10 de setembro, iniciou mais uma semana de trabalho. Ao lado de 30 colegas, desceu os 80 metros, pronto para exercer as funções, terminar o turno, voltar para casa e rever a esposa e os filhos. Algo que nunca aconteceu.

 

A nebulosidade sobre a comunidade de Santana, a 13 quilômetros do Centro de Urussanga, parece trazer o passado à tona. Em cada rua, cada casa, cada rosto está cravado o dia 10 de setembro de 1984. A explosão no Painel Seis da mina, que matou 31 trabalhadores, marcou para sempre a localidade.


Tristes lembranças que a irmã de Arestide, Cirlene Terezinha Goulart de Jesus, de 61 anos, não consegue esquecer. “Ele tinha muitos sonhos. Queria comprar uma casa em Itanema (localidade nas proximidades de Santana) e nos levar para morar lá. Desde o acontecido, a mãe e o pai ficaram mal, pois foi muito sofrimento”, conta.

 

Causa ainda desconhecida
 
Naquela segunda-feira, por volta das 5h, logo no início do turno, uma explosão, possivelmente por acúmulo de gás metano, matou todos os trabalhadores do Painel Seis. Até hoje, não se tem nada de concreto sobre o caso. Especulações apontam para cigarro, faísca de interruptor, ou até mesmo brincadeira com explosivos.


A combustão teria acontecido porque nos dias em que a mineração ficou interrompida, no feriado prolongado, a mina não recebeu a ventilação necessária por causa de quedas de energia elétrica, prejudicando o funcionamento dos exaustores que levam o ar da superfície para o subsolo, o que fez com que o gás ficasse preso no local. As dimensões do acidente fazem com que a tragédia seja considerada a maior da mineração no Brasil. De saldo, 24 viúvas e 57 órfãos.
 


Irreparável
 
As lágrimas de Cirlene, que tanto caíram desde o acidente, voltam a ser derramadas ao recordar do irmão e dos cuidados que não foram tomados para evitar o acidente. “Avisaram que havia cheiro de gás, mas mesmo assim permitiram que eles entrassem”, fala.


Segundo relatos da época, o Corpo de Bombeiros chegou ao local por volta das 5h30min, mas pôde iniciar o resgate dos corpos somente 24 horas depois. Entre os últimos estava Arestide, resgatado na quinta-feira, três dias depois da explosão. “Sabíamos que era difícil tirá-lo com vida, mas tínhamos esperança. Foi triste saber como eles estavam, queimados, desfigurados. Somente Deus para nos dar forças”, relata a irmã.
 
Sonho de ser mineiro
 
Arestide, que trabalhava na mina há sete anos, seguia os passos do pai e de tantos outros homens, na maioria jovens, na época. Ser mineiro era lucrativo, além de permitir chegar à aposentadoria mais cedo.


Este também era o sonho dos filhos de Lorena Librelato dos Santos. “Por pouco não perdi três filhos neste acidente”, recorda.

 

Aos 86 anos, Lorena conta que, enquanto estava vivo, o marido não permitia que os filhos seguissem a carreira de mineiro, mas, com a morte, eles acabaram trilhando o mesmo caminho de muitos amigos e conhecidos. 


 
Falta sempre sentida
 
Ronaldo Francisco dos Santos, conhecido como Nem, é o filho de Lorena, que perdeu a vida na explosão da CCU. “Pedi para um deles trocar o turno e outro perdeu o horário, por isso não estavam no local”, salienta.


Ronaldo era marido de Maria Vieira dos Santos, que após perder o esposo, precisou aprender ser, além de mãe, também um pai, para criar os dois filhos que, em 1984, tinham oito e dez anos.

 

Morte é uma palavra que não sai da boca de Maria, ela prefere dizer que Ronaldo, que viveu com ela por 17 anos, partiu. “Acostumamos com a falta, mas não esquecemos nunca. Mantenho uma foto dele ao lado do telefone, às vezes a pego e converso com ele. Este é um fato que não esqueceremos nunca”, relata Maria.
 
Encontros e desencontros
 
A história do acidente é cheia de encontros e desencontros. Ronaldo é mais um dos mineiros que não deveria estar no local. Ele deveria ir à mina na segunda-feira à tarde, mas trocou o horário com um amigo.


Maria recorda os motivos que o levaram a trabalhar na mina. “Como éramos novos, esta era uma boa profissão, pois pagavam bem. Além disso, só existia a mina aqui. Quem quisesse trabalhar com outra coisa precisava ir para outro lugar”, acrescenta.


Além do marido, a dona de casa perdeu um cunhado. Ederli Melo, o último a ser encontrado. “Podemos ter a idade que for que nunca vamos esquecer. Eles saíram de casa com vida e saúde e voltaram desfigurados”, diz.

 

Publicações de jornais e revistas da época relatam que os mineiros morreram por asfixia e queimaduras e que nos dois primeiros dias de resgate, quem se aproximava da mina acabava intoxicado. Para retirar os trabalhadores, foi necessário montar uma força-tarefa com Corpo de Bombeiros de Criciúma, Itajaí, Florianópolis e Porto Alegre.

 

Acontecimento registrado na memória
 

Djalma José dos Santos acordou com um grande susto. O forte barulho parecia próximo de casa. O movimento na rua não era comum em Santana às 5h. Preocupado, foi se informar e logo recebeu a notícia da explosão da mina da Companhia Carbonífera Urussanga. O local do acidente o deixou ainda mais preocupado. O Painel Seis era o seu local de trabalho e, se não bastasse, era para ele estar lá naquele horário. “Eu era encarregado deste painel e só não estava lá porque um colega pediu para trocar o horário. Então eu iria à tarde”, relata.

 

Com tantos amigos, em meio ao caos provocado pelo acidente, Santos foi até a mina. “Fui somente até um trecho porque tinha muita fumaça e não tinha como ficar lá”, fala.

 

Hoje ajudando o filho em um mercado de propriedade da família, o mineiro aposentado lembra os momentos difíceis vividos por todos da comunidade. “Todos os familiares e amigos se reuniram. Foi terrível, muito triste”, recorda.

 

O aposento veio anos depois e na mesma empresa. Por ser chefe de setor, ele precisou trabalhar 20 anos e não 15 como os demais mineiros de subsolo. Mesmo presenciando um incidente tão devastador, Santos diz que, para ele, não há profissão melhor que a de mineiro. “Eu gostava. Para mim é um dos melhores serviços”, afirma.


 Famílias impactadas
 
Euclides Ronsani não teve a mesma sorte que Santos. De uma família de dez irmãos, onde todos os homens seguiram a profissão de mineiro, ele está na lista dos que morreram na explosão. “Fazia um bom tempo que ele trabalhava na mina. Atuava na superfície, mas preferiu ir ao subsolo para se aposentar mais cedo. Foi algo triste que dificilmente será superado”, conta o irmão Osni Ronsani, que seguiu na profissão após a morte de Euclides. “Continuei trabalhando após o acidente e me aposentei com 50 anos”, revela.


 Medo da profissão
 
A família de Carmem Machado Felippe tem cicatrizes profundas deixadas pela mineração. Em 1980, ela perdeu o pai na mina. Quatro anos mais tarde, o irmão Valdir Machado morreu no acidente da CCU. “Tínhamos muito medo deste trabalho. Víamos eles indo trabalhar, mas não sabíamos se voltariam para casa”, recorda.


Valdir é mais um que deixou esposa e filhas e, para ele, assim como para muitos outros chefes de família, se arriscar no subsolo era uma forma de dar melhores condições de vida. “Foi um dia muito triste para todos nós. Não gosto nem de lembrar. Só ficou a tristeza”, lamenta Carmem.
 
Mineiros mortos na tragédia:
 
1 Aloisio Schmidt
2 Antônio Acedir da Silva
3 Antonio Eliziario Mendes
4 Arestide Goulart
5 Cesário Borba Camilo
6 Dionisio Modolon da Silva
7 Ederli Melo
8 Euclides Ronsani
9 Francisco Jeremias
10 Gilmar Belmiro Ribeiro
11 Hedi Cesário Scarabelot
12 Itamar Belmiro Ribeiro
13 Jaime Alfredo Coelho
14 Jair Mendes
15 Jorge José Pereira
16 Luiz Carlos Galdino
17 Luiz Carlos Leopoldino
18 Luiz Cesar Cardoso
19 Luiz da Cruz
20 Paulo Rogério Alves
21 Pedro Engel José
22 Pedro Paulo Leopoldo
23 Reginaldo Araújo
24 Ronaldo Francisco dos Santos
25 Santos Tezza
26 Valdemiro Fioravante Bonot
27 Valdir Machado
28 Vanderlei Mendes
29 Vilmar Fernandes Madeira
30 Volnei Dalazen
31 Wilson Claudio Miranda
 

No documentário Ouro Negro, do diretor Ivy Goulart, os relatos do acidente:

Copyright © 2022.
Todos os direitos reservados ao Portal 4oito