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Derecho Lotinoomericono
Estudios en Homenaje al Profesor
Carlos Ramos Nuiez
Volumen
Coordinadores
Paulo Aragão
José Marco Tayah
Letícia Danielle Romano
Presentación de
Ricardo D. Rabinovich-Berman
Fortaleza 1 Buenos Aires
2016
J
Copyright© 2016 por Paulo Aragão,
José Marco Tayah e
A venda dos exemplares é feita exclusivamente
para os autores 1 La venta de los ejemplares se la
Letícia Danielle Romano
hace solamente a los autores:
Reflexiones sobre Derecho
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Latinoamericano - Volumen 21
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Paulo Aragão, José Marco Tayah e Letícia Danielle Romano
(Coordenadores/ Coordinadores)
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Ficha Catalográica feita pela editora
T23u Aragão, Paulo; Tayah, José Marco; Romano, Letícia Danielle
Reflexiones sobre Derecho Latinoamericano: Estudios en Homenaje al Profesor Carlos
Ramos Nutez / Paulo Aragão; José Marco Tayah; Letícia Danielle Romano. - Fortaleza Buenos Aires: Expressão Gráica e Editora, 2016.
324 p.: 16 x 23 cm ; 11. Foto
ISBN 978-85-420-0734-3
l.Derecho. 2. Derecho Internacional Público. 3. Genocídio - Dereho. Internacional.
4.Derecho Internacional Privado. 5. Derecho Latinoamericano. 6. Direito Civil. 7. Direito
Penal. 8. Direito Constitucional. 9. Direito do Trabalho 1. Aragão, Paulo II. Tayah, José
III. Romano, Letícia Danielle I. Título.
CDD 340
341.1
Índice para catálogo sistémico
l.Derecho. 2. Derecho Internacional Público. 3. Genocídio - Derecho Internacional. 4.Derecho
Internacional Privado. 5. Derecho Latinoamericano. 6. Direito Civil. 7. Direito Penal. 8. Direito
Constitucional. 9. Direito do Trabalho
õumório
L
J
A MODO DE PRESENTACIÓN
Profesor D. Ricardo Rabinovich-Berkman l 9
NOTA DE LOS COORDINADORES
NOTA DOS COORDENADORES
l 11
l 13
SALUDOS A ZAFFARONI
Paulo Aragão l 15
O ESCRIVÃO BARTLEBYE A PADRONIZAÇÃO DAS CONDUTAS HUMANAS
Letícia Danielle Romano
José Marco Tayah l 21
POLÍTICA, CORRUPÇÃO E LIBERDADE NO PENSAMENTO DE MAQUIAVEL
Adilson Silva Ferraz
Hilton Boenos Aires 1 33
DERECHO Y POESÍA: MÁQUINA E IMAGINARIO POR UNA HISTORIOGRAFÍA
CONSTITUCIONAL INSPIRADA EN SOR JUANA INÉS DE LA CRUZ
Adriana do Carmo Figueiredo l 4 7
DO DIREITO DE ACESSO A JUSTIÇA AOS ENTRAVES APRESENTADOS
PELO CMPED: A SITUAÇÃO DO MERCOSUL
Ana Maria Santos Dias 1 69
GUARDA COMPARTILHADA: TEND�NCIAS E DESAFIOS
CONTEMPORÃNEOS
Deborah Marques Pereira
Ana Paula Gimenez
Gabriela Rodrigues Macedo de Souza 1 89
DOCTRINA PENAL DE EUSEBIO GÓMEZ CON RELACIÓN AL DELINCUENTE
Edimar Carmo da Silva l 105
[ Volumen 21 ]
[ 5]
POLÍTICA, CORRUPÇÃO E LIBERDADE NO
PENSAMENTO DE MAQUIAVEL
L
J
Adilson Silva Ferraz
Hilton Boenos Aires
1.
INTRODUÇÃO
Maquiavel é requentemente compreendido como expõe Leo Strauss
em seu consagrado livro sobre o lorentino "houghts on Machiavellr'. O au
tor d'O Príncipe, segundô Strauss, seria um pensador típico da modernida
de, porque com ele teria sido possível haver uma verdadeira separação en
tre o domínio da lei moral e o âmbito da política. Maquiavel, diz Strauss,
pensa que nenhuma lei moral possui validade incondicionada.1 As situações
políticas mais relevantes em Maquiavel (alternância de poder, guerra, rela
ção entre soberano e povo, etc.) seriam analisadas aparentemente sem um
compromisso moral que nortearia as ações dos atores políticos. Essa leitura,
no entanto, demanda uma compreensão complementar dos atos de governar,
pois, como veremos, a liberdade é um elemento fundamental no pens·amento
do autor.
Outra interessante interpretação é de John Pocock, que em seu livro
"he Machiavellian Moment"2 mostrou que o livro "Discursos sobre a primei
ra década de Títo Lívio" é uma obra fundamental para retratar o marco his
tórico do republicanismo moderno. Neste sentido, Maquiavel seria o pioneiro
1 "here cannot be a moral law of unconditional validity; the moral law cannot possibly ind
listeners and hence addresses beore men have become members of civil society, or have
become civilized:' STAUSS, Leo. houghts on Machiaveli. Chicago: University of Chicago
Press, 1958, p. 255.
2 Cf. POCOCK, JohnGrevileAgard. he Machiavelian Moment. Princeton: Princeton
University Press, 1975.
[ Volumen 21 ]
[ 33]
de todo o pensamento da autonomia política e as artes de governar não teriam
valor se não ossem capazes de prevenir a corrupção das instituições políticas.
Daí ser importante reletir sobre a oposição entre vir tu e fortuna, que nos
levam igualmente a pensar sobre as contingências históricas que avorecem a
degeneração dos Estados e os esorços para combatê-la.3 Estes dois polos in
terpretativos correspondem, de ato, a duas perspectivas teóricas fundamen
tais no seio do corpo maquiaveliano: as artes de governar (ou a prudência dos
príncipes de um lado) e a teoria da liberdade política do outro.
Uma deiciência comum a vários intérpretes de Maquiavel é que o
entendem como um pensador das artes de governar e da liberdade política,
precursor do republicanismo moderno, sem compreender como o choque en
tre essas duas perspectivas se encontra no centro da sua doutrina política da
liberdade. O ponto nevrálgico se localiza na insistência em elencar as artes
de governar como superiores, em detrimento das teses da liberdade política
republicana, ou ainda, de insistir nesta última, sem dar-se conta da primeira.4
1.
CONFLITO E LIBERDADE POLÍTICA
É preciso estar ciente que não é possível vislumbrar a concepção de
liberdade em Maquiavel de maneira isolada. Existem outros elementos atrela
dos a ela organizados de orma sistemática em seu pensamento. Desta manei
ra, as concepções de ordem, conlito, corrupção e república estão interligadas
de modo indissociável em seu pensamento. Ele não observa a liberdade como
algo intrínseco ao ser humano em uma perspectiva ontológica. Em seus escri
tos é advinda do mundo político, observada e resguardada na esfera pública,
não havendo análises em uma perspectiva privada. No capítulo 2 do livro "Os
Clássicos da Política", encontramos que a ordem é advinda das ações huma
nas, não sendo algo natural nem eterno, e o espaço político é regido por me
canismos e orças que não se ligam à vida privada. 5 A liberdade se assemelha
à ordem, e como veremos mais à rente, a existência da ordem é pressuposto
da liberdade, e esta por sua vez é condição para que a primeira também exista,
numa relação de dependência.
3 NADEAU, Christian. Machiavel: domination et liberté polique. ln: Philosophiques, vol. 30,
nº 2, 2003, p.321-351. Disponível em:< http://id.erudit.org/iderudit/008644ar > acesso em: 10/
Julho/2015.
4 Idem. Ibidem.
5 WEFFORT, Francisco (Orgs.) [et al] Os Clássicos da Política vol 1. São Paulo: Editora
Ática, 2006.
.
[ 34]
REFLEXIONES SOBRE DERECHO LATINOAMERICANO
Faz-se pertinente mencionar que a visão maquiaveliana de liberda
de, advém dos conlitos e tumultos, sendo estes multiacetados e diversiica
dos nas searas sociais. Ele mostra que sempre existirão no Estado, das mais
variadas ormas e pelos mais diversos motivos. Suas análises convergem para
a constante manutenção da ordem, ou, sendo inevitável a precipitação da de
sordem, disserta sobre as maneiras de azer a ordem existir por mais tempo,
pois a desordem acarreta a perda de liberdade do povo, causando, além disto,
insegurança e corrupção. Buscar pela liberdade implica necessariamente rea
lizar também uma busca pela ordem e segurança, contra invasões externas e/
ou conflitos internos.
Também não é possível vislumbrar a liberdade política em Maquiavel,
sem observar o conronto entre a liberdade do povo, cujas condições são ex
postas essencialmente nos "Discursos Sobre a Primeira Década de Tito Lívio";
e os exercícios de poder ou de dominação dos grandes, cujos princípios são ex
postos em maior parte n'O Príncipe. Em outros termos: uma análise completa
da liberdade não pode ser feita apenas pela ótica do republicanismo, já que o
exercício do poder também é uma expressão de liberdade para Maquiavel, só
que da liberdade dos grandes. Skinner cita a importância que Maquiavel dava
à liberdade como chave para entender o sucesso de algumas nações. Atenas,
por exemplo, oi capaz de alcançar muita riqueza no curto espaço de cem
anos somente após ter-se libertado da tirania de Psístrato. Roma alcançou sua
grandeza após se libertar dos reis. Para alcançar a riqueza e a grandeza deve
-se primeiramente haver a libertação de qualquer servidão política. 6
O objetivo de Maquiavel, em nossa compreensão, era duplo: pro
por análises adequadas sobre os encontros conlituosos que se davam dentro
dos Estados, expressados pelas artes de governar dos grandes e o desejo de
liberdade do povo, para em seguida ormular regras em vista de tornar pos
sível a existência de uma comunidade política coesa e ordenada. Tanto em O
Príncipe, como nos Discursos, esse intento se mostra claro à medida que expõe
sua constante preocupação com a boa ordem, resolução de conlitos internos e
externos, prevenção à ·corrupção e perpetuação da segurança, que consequen
temente acarretaria preservação da liberdade. Portanto, não se pode reduzir o
valor dos elementos normativos presentes no pensamento de Maquiavel, e es
tes devem ser levados a sério. Dessa orma, pode-se questionar: quais os tipos
--
6 SINNER, Quentin. Maquiavel. São Paulo: Editora Brasiliense, 1988, p. 83.
[ Volumen 21 ]
[ 35]
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de instituições propostas por Maquiavel para assegurar a liberdade política?
Nossa resposta é que não existe nenhum gênero institucional propriamente
dito, que esteja isento de críticas do lorentino. Todas as Ordenações e ormas
de governo estão sujeitas à corrupção, que trazem risco à segurança e à liber
dade do povo.7 Embora as repúblicas sejam apontadas pelo autor, como as
mais adequadas, pois são as guardiãs da liberdade e da virtu.
Se o papel fundamental de uma instituição é de estabilizar as re
lações entre os membros da comunidade política, então as teses normativas
de Maquiavel não devem ser veriicadas em tal quadro. A estabilidade do
Estado é importante, mas ela não tem valor nela mesma, desde que, como
talvez possamos explicar mais à rente, resultem das dissensões: a estabilidade
é dependente das situações que a ameaçam. Esta airmação é naturalmente
uma situação paradoxal. Questiona-se: o valor normativo no pensamento de
Maquiavel é de certa orma, reduzido? Ao contrário: de um lado, grande par
te do pensamento demonstra o valor político das dissensões entre os grupos
sociais. Em outra parte, ela se concentra em mostrar que a vontade "de ser
livre" não é necessariamente uma vontade de poder. 8 Pode ser uma vontade de
não sorer privações. No entanto não deixa de ser verdade que, ao menos uma
parcela de indivíduos de determinada sociedade, a airmação de suas liberda
des se exprime por uma vontade de poder. São essas rivalidades que, segundo
Maquiavel, dinamizam as relações sociais. É preciso permiti-las, na medida
do possível, pois estas discordâncias e tumultos asseguram às comunidades
políticas suas liberdades, e sustentabilidade às instituições públicas.
No décimo quinto capítulo de "O Príncipe", encontramos ensina
mentos indicando que os homens devem deixar de lado as ormas idealiza
das de governo, e buscarem a "verdade efetiva das coisas".9 Isto signiica que
não é possível compreender o campo político, se icarmos observando como
as coisas deveriam ser. Ao invés disto, olhemos como as coisas efetivamente
são. Dessa orma, distanciando-se de uma das principais características do
pensamento ético (a observância do "dever-ser" ), Maquiavel nos diz que se os
conlitos de interesse, trapaças, dissensões, e tantos outros choques advindos
7 MAQUIAVEL, Nicolau. Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio.1ª Edição. São
Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 12-19.
8 NADEAU, Christian. Machiavel: domination et liberte polique. ln: Philosophiques, vol. 30,
nº 2, 2003, p. 326. Disponível em: < http://id.erudit.org/iderudit/008644ar > acesso em: 10/
Julho/2015.
9 MAQUAVEL, Nicolau. O Príncipe. 1ªEdição. São Paulo: Martin Claret, 2000, p. 93.
[ 36)
REFLEXIONES SOBRE DERECHO LATINOAMERICANO
..
as relações políticas, são inevitáveis, a sociedade não deve prender-se a essas
:aracterísticas negativas da natureza humana, esperando que os homens agis
em de maneira diversa. Ao contrário, devem utilizá-las em beneício próprio
para assim poderem progredir e desenvolver-se10Na contramão do que é re
quentemente encontrado na teoria política contemporânea, Maquiavel pre
fere discutir a ordem de uma política possível, começando com o estudo das
dissensões, em vez de pressupor um acordo civil hipotético entre indivíduos.
Atentamos à importância de ser dada especial ênase ao papel dos
conlitos políticos dentro de seu pensamento. Para Maquiavel a vitalidade das
comunidades políticas se encontra dentro destas discórdias existentes no seio
da sociedade. Situando estas discórdias e os tumultos no coração do pensa
mento de Maquiavel, toda a leitura republicana como herdeira da tradição do
humanismo cívico, passa a ser questionada.11 Neste ponto incide a participa
�ão política, sendo esta encorajada pela proteção das liberdades fundamen
is, e não porque ela inspire algum ideal de boa vida. Se não existe alguma
ioção clara do que seja o bem em Maquiavel, então o bem comum será restri
:o ao bem do Estado.
De maneira geral, é difícil lançar luz sobre o conceito de liberdade
p0lítica em Maquiavel, já que ao ler seus textos, apesar de requentemente
nencionada, não é deinida. Para isto devemos analisar a relação existente na
oposição entre a expressão da liberdade do povo e o desejo de dominação dos
randes. Contudo, se nossa leitura sugere necessariamente uma neutralidade
moral em Maquiavel em relação ao que cada um az com sua liberdade, de
orma alguma negamos que a liberdade seja vista pelo autor como um bem
undamental, até porque ela é conceitualizada ora das reerências morais e
éicas e sim, eminentemente políticas, incidindo aqui, a referência citada aci
na de Leo Strauss.
MAQUIAVEL, Nicolau. Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio.lª Edição. São
lo: Martins Fontes, 2007, p. 27-33 .
� 1 NADEAU, Christian. Machiavel: domination et liberte polique. ln: Phlosophiques, vol.
0, nº 2, 2003, p. 326. Disponível em: < http://id.eru� it.org/iderudit/008644ar > acesso em: 10/
ho/2015.
.o
·
: loumen 21 ]
[37]
2.
·
A DOUTRINA DOS HUMORES: OS GRANDES E O POVO
Um dos pontos de partida do pensamento político de Maquiavel é a
importância de harmonizar os humores ou paixões, os impulsos. Esses divi
dem a sociedade em dois grupos: os grandes (ou aqueles cujas paixões os im
pulsionam a querer dominar os outros), e o povo (que quer dizer aqueles cujos
desejos os inclinam a procurar a liberdade a todo custo, sem que isto aça com
que eles queiram dominar os demais). Os primeiros são deinidos pelas suas
vontades de dominação, os segundos não aspiram nada além de sua liberdade.
Para estes, o desejo de ser livre não signiica uma sede de poder, mas uma re
sistência instintiva à toda tentativa de dominação sobre eles e sobre seus bens.
Eles não querem dominar, eles querem não ser dominados.12
No capítulo 5 dos "Discursos", Maquiavel indaga sobre quem deve
ser o responsável pela guarda da liberdade: o povo, ou os nobres? Se todos
os Estados são fundados em vista de assegurar a liberdade e segurança dos
cidadãos, a questão é então, saber com quem se deve residir o poder máximo.
Deve-se dar ao povo? Esta hipótese não iria funcionar, porque suas intenções
os põem a lutar pela sua liberdade, sem haver em seus interesses, inclinações
em comandar as questões do Estado.13 Deve-se conferi-lo aos nobres? Ao
Príncipe? Se esta situação é avorável no que se refere às inclinações naturais
da nobreza em dominar, abre vistas ao problema da ganância, dando espaço à
corrupção, que de igual orma prejudicará a liberdade.14 Em ambos os casos,
com o poder do príncipe ou com sua rejeição pelo povo (rejeição do príncipe,
propriamente dito, ou também rejeição do domínio do príncipe), az-se pre
sente o elemento "interesse". Neste aspecto lembremos que Maquiavel taxa
os homens como sendo todos maus, que só azem o bem caso haja algum
interesse por trás (vantagem), caso contrário, não tardarão em mostrar sua
"malignidade".15
12 MAQUIAVEL, Nicolau. Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio. 1ªEdição. São
Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 7-12, 12-19, 27-33.
13 MAQUIAVEL, Nicolau. Discursos sobre a Primeira Década d e Tito Lívio.1ª Edição. São
Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 21-26, 64-72.
14 Maquiavel explica no Livro I, capítulo 2 dos Discursos que existem seis tipos de modelo de
governo, três bons e três ruins. Os três bons quando se corrompem, tornam-se o três ruins,
perazendo um ciclo gerado pela corrupção que leva qualquer Estado à ruína, pondo em risco
a liberdade.
15 MAQUIAVEL, Nicolau. Discursos sobre a primeira década de Tito Líio.lª Edição. São
Paulo: Martins Fontes, 2007, p.20
REFLEXIONES SOBRE DERECHO LATINOAMERICANO
Entretanto, com perspicácia ainada, Maquiavel indica que os impul
�Js dos indivíduos podem induzi-los a agirem contra seus próprios interesses.
�\o capítulo XIX de "O Príncipe", por exemplo, é explicado porque o gover
.ante deve se aliar ao exército para assegura seu poder. Tal aliança oferece ao
:xército a oportunidade de satisazer sua "avareza"16, e isto conduz à opressão
:o povo. Os crimes militares seriam assim acobertados pela autoridade po
iica do soberano. Se vários imperadores aceitaram tal troca para assegurar
�u poder, o clima de soltura e impunidade às ações dadas ao exército o trans
Jrmam em uma ameaça. Com efeito, diz Maquiavel, que a grande maioria
.os imperadores baixavam sua cabeça aos exércitos, pois eles não possuíam
�utoridade moral para comandá-los, e isto explica o porquê dos assassinatos
2e governantes, e a instituição de milícias e facções dentro das cidades.17
Entretanto, assassinando os imperadores os soldados agiam por
.npulso, contra seus próprios interesses, pois dessa orma seus crimes não
�riam mais acobertados por alguma autoridade legítima. No capítulo 8 dos
Jiscursos encontramos a tese sobre a importância de resguardar os interesses
:ontra os impulsos, ao serem criadas leis que combatam as calúnias, a cor
-ipção (Livro I, capítulo 43), ou ainda as técnicas de governo que impeçam a
�1veja (Livro III, capítulo 30).18
Encontram-se então dois problemas. Em primeiro lugar, os proble
,as ligados ao interesse: de início, o povo é passivo (politicamente), onde não
;-�seu interesse em deender o Estado, apenas em defender-se do Estado, mo-.,-:ndo-se em resistência à opressão. Em seguida o apetite voraz dos grandes,
:m sua eterna ganância. Como são os detentores do poder, vivem inclinados a
�vorecer seus interesses próprios ao invés do bem coletivo. Em segundo lugar,
: inversamente, vê-se o problema relacionado à ausência de racionalidade dos
�andes ou do povo, onde seus impulsos superam uma concepção clara dos
.eios que são possíveis de serem escolhidos, para satisazer seus interesses. É,
>r conseguinte, o interesse mal dirigido ou a ausência de interesse, podem
:onduzir a comunidade política à ruína. É também o contrário, os impulsos
�6 \lAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe.ia Edição. São Paulo: Martin Claret, 2000, p. 110.
� �ADEAU, Christian. Machiavel: domination et liberté polique. ln: Philosophiques, vol. 30,
-: 2, 2003, p.321-351. Disponível em: < http://id.erudit.org/iderudit/008644ar >acesso em: 10/
-
-ho/2015.
� � \IAQUIAVEL, Nicolau. Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio. São Paulo: Mar
s Fontes, 2007, p. 33-37, 132-133, 409-413.
.. ::__men 21 J
[39]
podem inringir danos à busca pelos interesses, que serão de todas as manei
ras, nocivos ao Estado.19
É preciso ainda explicar um último item. Maquiavel rejeita comple
tamente a tese que defende o interesse público em detrimento do privado com
base em convicções de amor e altruísmo. Se o interesse público deve ser bus- �
cado, deve-se azê-lo não por estas razões. Com efeito, o interesse público em
Maquiavel, é advindo do argumento da virtu republicana. O interesse público
deve sempre prevalecer em relação ao privado, porque um depende do outro.
Neste aspecto, o vívere civile não pressupõe nenhuma orma de altruísmo na
tural nem teológico, porque a união civil é o instrumento que se utiliza para
o bem individual. Querer o bem dos outros não se dá porque isto advém de
nossa natureza, caso o osse, este "querer" estaria ligado à vontade divina.
Queremos o bem do outro porque isto az parte de nosso interesse querê-lo.
Dessa orma quanto mais interesses orem avorecidos, mais indivíduos serão
beneiciados. 20
Esta interpretação quanto ao interesse do bem comum pelo indivi
dual, aastando-o da presença da divindade, é de ato apropriada, pois, como
ora dito na introdução, o pensamento de Maquiavel é estruturado sem a
existência de pressupostos metaísicos ou de mandamentos extraterrenos. As
ordenações e todo o campo político advêm das ações humanas, e do mundo
humano somente. No capítulo II, do Livro II dos "Discursos", encontramos a
seguinte passagem:
[ ...] E é ácil entender donde provém nos povos essa feição pela vida livre,
porque a experiência mostra que as cidades nunca crescem em domínio e
em riquezas, ao não ser quando são livres. [ ...]. Mas é de admirar acima de
qualquer coisa a grandeza a que chegou Roma depois que se libertou de
seus reis. É ácil entender a razão, pois o que enobrece as cidades não é o
bem individual, e sim o bem comum. E, sem dúvida, esse bem comum só é
observado nas repúblicas, porque tudo que é feito, é feito para o seu bem, e
mesmo que aquilo que se aça cause dando a um ou outro homem privado,
são tantos os que se beneiciam que é possível executar as coisas contra a
vontade de poucos que por elas sejam prejudicados.
19 NADEAU, Christian. Machiavel: domination et liberté polique. ln: Phlosophiques, vol.
30, nº 2, 2003, p. 327. Disponível em: < http://id.erudit.org/iderudit/008644ar > acesso em: 10/
Julho/2015.
20 NADEAU, Christian. Machiavel: domination et liberté polique. ln: Phlosophiques, vol.
30, nº 2, 2003, p.328. Disponível em: < htp;, l/id.erudit.org/iderudit/008644ar > acesso em: 10/
Julho/2015.
[40]
REFLEXIONES SOBRE DERECHO LATINOAMERICANO
Quanto mais livre or uma república, maior será sua glória, virtt e
fortuna, e dessa orma, poderá proporcionar aos grandes e ao povo, a satisa
ção de suas aspirações, porque todo povo livre tem dois objetivos: prosperar e
manter-se livre. É esta esperança que revigora o ideal de virtt aonde a defesa
do Estado é feito por todos, permitindo um cumprimento do dever individu
l e coletivo. (Discursos, Livro III, capítulo 49). Certamente, cada indivíduo,
para o seu próprio bem, deve estar pronto para servir ao Estado. Há na histó
ria diversos exemplos onde os homens são capazes de se unirem em mútuo en
tendimento, para o bem da comunidade política.21 Entretanto, este sentimen
to pode vir a desvanecer. A maioria dos homens não compreende que sem o
bem comum, a busca pelo bem individual é vã ou penosa. Essa "raternidade"
é um ator de auxílio nesta busca.
Na introdução dos "Discursos" encontramos a importância da fo r
tuna para engrandecer o Estado. Seu papel é inegável, entretanto, apenas ela
não basta para manter esta grandeza. Com efeito, se os homens não são total
mente bons nem maus, eles são mais inclinados ao mal do que ao bem (Livro
I, capítulo 3) e, portanto, suas paixões e impulsos os conduzem quase que
atalmente a levar a sociedade à ruína. Dessa orma, Maquiavel se inspira e
admite a possibilidade de as Cidades serem derrubadas pela corrupção, da
mesma orma que todo organismo vivo se sujeita a este ciclo, tal qual obser
vara os ilósoos gregos.
Filósoos como Heráclito, Platão e Aristóteles, quando analisaram
o ciclo de vida dos seres, perceberam que todo organismo passa pelas etapas
de nascimento, crescimento e desenvolvimento até alcançar o ápice, para em
seguida, ser iniciado um encadeamento de degradação, em que o corpo lan
guesce até o indivíduo morrer. Os ilósoos, após compreenderem-na pelo viés
biológico, passaram a examinar os entes políticos e a sociedade, como "corpos
naturais", vislumbrando dessa orma o mesmo ciclo de nascimento, cresci
mento, desenvolvimento e decadência, desta vez na sociedade e instituições
políticas. Sob o ponto de vista naturalista, a entidade pública daria seus sinais
de corrupção, na hora em que começasse a perder sua orça e vigor, desvian
do-a dos seus primeiros princípios.22
Maquiavel no capítulo I, do Livro 1 dos Discursos, explica a origem das cidades e dos Es
tados, tendo como marco inicial para seus surgimentos essa união dos homens. Este capítulo
claramente serviu de inspiração e de embasamento teórico para os autores célebres que o suce
deram, icando conhecidos como os "contratualistas':
21 MARTINS, José Antônio. Corrupção. São Paulo: Globo, 2008, p. 13-1�
21
[ Volumen 21]
[ 41]
Maquiavel reserva três capítulos (16, 17e18) do livro I dos "Discursos,,
para outras análises da corrupção. Explica que ela começa a contaminar o
povo (que é a matéria de um Estado); este, que também az parte do aparelho
burocrático da Cidade (a forma do Estado) começa a corromper o próprio
sistema político e as ordenações (instituições públicas forma). Assim sendo,
com o passar do tempo, todo o sistema está comprometido e a cidade cor
rompidíssima de tal maneira, que os bons costumes não mais existem. Nem
eles, nem as leis, antigas ou novas, são capazes de reestruturar a ordem na
quele lugar (meios ordinários); então será preciso uma revolução, a utilização
de meios extraordináiros e o surgimento de um governo orte, para reduzir
,,
aquele Estado a um "governo régio .23
Diante disto, temos a tese de José Antônio Martins, que ao estudar o
autor renascentista, explana que há duas maneiras de compreender a corrup
,,
ção em Maquiavel. Têm-se a distinção entre "corrupção moral e "corrupção
,,
política . Segundo Martins, sua tese é que Maquiavel as analisa como dois
elementos distintos, pois o mundo político tem regras próprias, devendo ser
analisadas de orma autônoma e desvinculadas da moral particular, pois a no
ção de corrupção política é diferente da concepção de corrupção moral.24 De
,,
acordo com o "Mestre dos príncipes é possível analisar a corrupção lato sen
su por dois prismas interpretativos: um ligado a moral individual que indica a
ruptura com a virtude, o empobrecimento do caráter, levando consequências
terríveis à sociedade, e do outro lado, mostrando que a corrupção é um efeito
que vem diretamente dos resultados das regras do mundo político, sem maio
res ligações com a retidão do homem.
Este modo de enxergar a corrupção moral e os vícios particulares da
pessoa, não tem grande relevância para se analisar a administração daquele
que ocupa algum cargo público. O maior problema da acepção moralista, é
que acarreta a inversão da qualiicação do mundo político, levando o caráter
individual das pessoas como sendo o principal vetor de avaliação da corrup
ção de algum lugar. Sendo esta vista, analisada e julgada de acordo com o
próprio indivíduo. Mesmo que este seja um agente público, a alçada moralista
-
23 BOENOS AIRES, Hlton; CINTRA FILHO, Darci. O Combate à Corrupção como Me
canismo de Proteção à Cidadania. ln: Revista Cidadania e Direitos Humanos, v. 1 º, p.
40-66, 2015.Disponível em: <hp://ww.revistacidadaniadh.com.br/index.php/revistaci
dadaniadh/article/view/6> acesso em: 17/Dezembro/2015.
24 MARTINS, José Antônio. Corrupção. São Paulo: Globo, 2008, p. 21.
[42)
REFLEXIONES SOBRE DERECHO LATINOAMERICANO
'xclui" a presença da corrupção política, ao airmar que o que de ato existe
� ndivíduos políticos que são "corruptos". 25
Esta linha de raciocínio é a mais apropriada para se compreender a
::)rrupção em nossos dias, pois responsabiliza a raqueza das leis e das ins
=uições políticas, a alta de preocupação e ação do cidadão em relação às
:oisas públicas, como sendo geradoras desta "doença endêmica".26 Por isso
�1.�aquiavel explicara, que, quando a Cidade atinge elevados níveis de corrup
:ão política, tornando-se corrompidíssima, os meios ordinários já não são
-'pazes de reverter o quadro. O corpo político já está completamente com
:ometido, não importando a moral daquele servidor público, pois, honesto
YJ. desonesto, a corrupção continuará a existir, já que, quando esta se torna
:idêmica, vira a própria maneira de atuação de alguma instituição pública. A
:orrupção deixa de ser a exceção e vira a regra naquela realidade. Tanto é que
-,Js novos funcionários, que chegarem neste meio, logo terão que agir conor
::e essa regra."27 Quando a corrupção passa a ser regra, não se ala mais em
"iembros ou indivíduos corruptos, e sim que a própria entidade está corrom
;ida, azendo com que pessoas honestas ou mal-intencionadas, atuem conor
ne essas burlas à lei.
Então como será possível evitar que a corrupção assegure a preva
��ncia do interesse privado em detrimento do comum? Com é possível gover
::r de uma maneira que a liberdade seja preservada? Nesta seara incide a lei
?ara rereá-la. Vejamos que no capítulo 4 do livro 1 dos "Discursos", é airma
do que os conlitos entre a plebe e os nobres trouxeram liberdade para Roma.
�sses dois humores existentes devem ser observados para não haver desordem
e caos. Segundo Maquiavel, as leis que se azem a avor da liberdade não os ig
ioram. Ora, como dito ao longo deste artigo, conlitos são inevitáveis, sempre
:xistirão, e por isso devem ser trazidos em sua grande maioria para o campo
:.n.stitucional, sob a tutela do Estado, a im de evitar tumultos que causem
Jesordem, e consequentemente, perda de liberdade. Essas observações estão
?resentes de igual orma nos capítulos 6 e 8 da mesma obra.
No entanto, no capítulo 2, ao dissertar sobre a corrupção que surge
aos modelos de governo e o ciclo pelo qual estes passam quando corrompidos,
25 Idem, Ibidem.
26 Cf. BOENOS
AIRES, Hilton; CINTRA FILHO, Darci. O Combate à Corrupção como
�Iecanismo de Proteção à Cidadania. In:Revista Cidadania e Direitos Humanos, v. 1 º, p.
40-66, 2015.Disponível em: <http:/ww.revistacidadaniadh.com.br/index. php/revistaci
dadaniadh/article/view/6> acesso em: 17/Dezembro/2015.
27 MARTINS, José Antônio. Corrupção. São Paulo: Globo, 2008, p. 68.
[ Volumen 21]
[43]
o pensador italiano airma que um Estado que passar por este ciclo completo,
não conseguirá manter sua unidade, sendo logo invadido e dominado por
outro Estado; ou desmembrando-se em Estados menores. Ambos os casos
acarretam na perda de liberdade. É com base nesta primeira análise, que em
seguida, mais à rente nos capítulos 16, 17 e 18, observa outras maneiras de
perda e manutenção de liberdade decorrente da corrupção.
Percebe-se que Maquiavel mostra que a esta função de evitar a cor
rupção, e por seu turno preservar não só a integridade das instituições políti
cas, mas também da liberdade, reside no papel dessas instituições e do povo.
Quentin Skinner, ao interpretar Maquiavel no tocante à prevenção da corrup
ção, atribui ao povo o dever de "vigília". Também menciona que para o loren
tino, a verdadeira liberdade residirá no ato que o conlito existente entre os
grandes o povo, não resulte na vitória nem de um, nem de outro. 28
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A concepção de liberdade política em Maquiavel é intrinsecamente
ligada às questões de ordem. Para manter esta ordem, é preciso preservar a
integridade das instituições políticas, o que quer dizer combater a corrupção
que, devido à natureza gananciosa dos homens e do constante desejo de domi
nar dos grandes, não tardará em surgir num Estado, independentemente do
modelo político adotado para governá-lo. Entretanto, o conceito de liberdade
em Maquiavel não se restringe este quadro teórico.
É bem verdade que para a maioria de seus leitores, Maquiavel é ta
xado como amante dos déspotas, serviçal dos tiranos. Um homem sem ética,
que visa a perpetuação do poder a todo custo, sem importar-se com nada
além dos ins que se almejam alcançar. A esta interpretação parcial e equi
vocada, surgiu o adjetivo pejorativo de "Maquiavélico", alguém de profunda
maldade que sempre se utiliza de estratagemas e manobras traiçoeiras. No
entanto, uma lida rápida nos "Discursos", nos az olhar o autor com outros
olhos. Maquiavel, no im das contas, oi o grande escritor da liberdade, tendo
o bem-estar do povo, grande relevância em suas preocupações. E como disse
ra Rousseau: "Maquiavel, ingindo dar lições aos Príncipes, deu grandes lições
ao povo". 29
28 SKINNER, Quentin. Maquiavel. São Paulo: Editora Brasiliense, 1988, p. 104-112
29 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 89.
REFLEXIONES SOBRE DERECHO LATINOAMERICANO
REFER�NCIAS
BOENOS AIRES, Hilton; CINTRA FILHO, Darci. O Combate à Corrupção
como Mecanismo de Proteção à Cidadania. ln: Revista Cidadania e Direitos
Humanos, v. 1°, p. 40-66, 2015. Disponível em: <http:/ww.revistacidada
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