O Poeta Visual: José Maria Carneiro de Albuquerque e Mello e a trajetória da
Revista do Norte
The Visual Poet: Jose Maria Carneiro de Albuquerque e Mello and the trajectory of
the Revista do Norte
Yvana O. de Alencastro
tipografia, revista, história
José Maria Carneiro de Albuquerque e Mello foi um homem que desde cedo trabalhou por Pernambuco.
Ainda na sua infância aprendeu com sua família o patriotismo pernambucano, no Jornal A Provìncia que
pertencia a sua família. Como tipógrafo, poeta visual e diretor da Revista do Norte, ele foi o mentor de
grandes artistas. A Revista do Norte não foi apenas uma publicação e sim um grupo de intelectuais que
trabalhou e assimilou conceitos do regionalismo e do modernismo paulista. Esta revista passou por três
fases distintas, onde mostrou o crescimento estético e literário no decorrer dos anos. José Maria criou
esta publicação de extrema importância que ocasionou na ascensão de poetas como Joaquim Cardoso e
Ascenso Ferreira.
typography, magazine, history
Jose Maria Carneiro de Albuquerque e Mello was a man who since early worked for Pernambuco. Still in
his infancy he learned with his family about the pernambucano patriotism in the Provincia’s journal that
belonged his family. As typographer, visual poet and managing of the Revista do Norte, he was the mentor
of great artists. The Revista do Norte was not only a publication and yes a group of intellectuals that
worked and assimilated concepts of the regionalism and the modernism from São Paulo. This magazine
passed for three distinct phases, where it showed the aesthetic and literary growth in elapsing of the years.
This publication of extreme importance created for Jose Maria helped to divulge names as: Joaquin
Cardoso and Ascenso Ferreira.
1 Introdução
José Maria Carneiro de Albuquerque e Mello desenvolveu no Grupo Revista do Norte algumas
obras de reconhecido valor artístico e sua principal produção foi a publicação da Revista do
Norte. A revista mostrou em sua história, a evolução dos pensamentos de uma geração. Não
apenas literariamente, mas também graficamente, é a expressão dos anseios de sua época.
A Revista do Norte foi criada durante um período de grande efervescência artística no
Brasil, pouco tempo depois da Semana de Arte Moderna Brasileira. Porém as mudanças
ocasionadas com o movimento moderno não provocaram modificações formais, de
composição, e nem na tipografia. Nos trabalhos editorias, as inovações ficaram no campo dos
temas e na perícia estética (Cunha Lima, 1997). A Revista do Norte se destacou por sua
qualidade estética, por seu conteúdo, mas não realizou uma composição que acompanhasse
as vanguardas mundiais.
Sobre o valor do trabalho de José Maria, afirmou Guilherme Cunha Lima (1997): ‘Os seus
trabalhos, projetados e impressos por ele mesmo, foram poucos, mas de uma qualidade
material e um rigor formal digno de menção’.
Souza Barros (1985) relata a dedicação de José Maria para com as publicações do grupo
da Revista do Norte:
Interessava-lhe a forma da composição da página, o equilíbrio gráfico, o resultado da impressão em
bom papel, o efeito conseguido com os contrastes de cor, a perfeição e a segurança de cor, a
perfeição e a segurança do clichê...
José Maria Carneiro de Albuquerque e Mello acreditava que as preocupações estéticas do
modernismo futurista de São Paulo e as preocupações históricas e antropológicas do
regionalismo de Gilberto Freyre eram complementares (Vieira, 2002). Sob essas condições, ele
produziu a Revista do Norte, e fez dela destaque entre a produção editorial existente no Brasil.
Os modernistas de São Paulo, na década de 20, buscavam inspiração na estética vinda da
França para fazer sua arte. Muitas vezes, apenas a temática era de origem brasileira, mas não
havia preocupações com a cultura regional, eles pensavam apenas na criação da arte para o
desenvolvimento do futuro. Queriam apagar o passado “vergonhoso” da colonização e da
escravidão no Brasil. Já José Maria, fazendo uso da história regional e de conhecimentos
antropológicos, conceituou seu trabalho, e, juntamente com o estilo francês de fazer arte,
desenvolveu o estilo da Revista do Norte.
Foram fontes de inspiração de José Maria, os fatos importantes da história do estado, como
a também os causos do povo. Na antropologia, o grupo da Revista do Norte valorizou a
sociedade como um todo, com todas as suas manifestações culturais. Tinham vez na revista,
do mocambo, ao palácio do governo.
Outra fonte que influenciou José Maria foram os antigos impressos e manuscritos do
Nordeste, confeccionados mesmo antes da vinda da família real portuguesa ao Brasil. Esses
impressos eram da coleção iniciada por seu pai, Manuel Caetano, e que ele próprio deu
continuidade (Caetano Filho, s.d.). A coleção era composta principalmente por missais e
cânticos da igreja, alguns datavam da metade do séc. XVIII. Sobre peças dessa coleção José
Maria escreveu um artigo para a Revista do Norte (1952, n. 5).
Todos os volumes foram escritos com a letra que figura nos compêndios da caligrafia com o nome de
antiga ou de redonda de livros.
(...)
Desde cedo a letra tipográfica foi se distanciando da escrita a mão. Na tipografia, além da elegância,
restava somente assegurar a facilidade de leitura. Na escrita era necessário ainda conseguir a
facilidade do traçado.
(...)
No momento não existia nenhuma oficina tipográfica em Pernambuco. O calígrafo era chamado para
executar o serviço que mais naturalmente cabia ao tipógrafo.
Figura 1: Capa do n. 3 da primeira fase da Revista do Norte, acervo Biblioteca Pública de Pernambuco.
2 Primeira Fase
A Revista do Norte foi lançada no dia 8 de outubro de 1923. Ela chegou às ruas com o intuito
de reviver as páginas sugestivas do passado e estudar homens e fatos da história regional
(REVISTA DO NORTE, 1923, n. 1).
Abaixo um trecho da abertura do primeiro número da Revista do Norte (1923, n. 1):
Sempre acompanhados de contos, notas e narrativas, silhuetas de coqueiros, de caiçaras e de velas
arrojadas ao mar, de vaqueiros ousados e de cantadores, cenas típicas da natureza e da vida
pernambucanas, ilustrarão constantemente as páginas desta revista.
Ao todo, na primeira fase, foram desenvolvidos 9 números da revista no decorrer de 3 anos.
Tabela 1: Informações segundo Luiz do Nascimento (1954) e Revistas do Norte da 1ª fase.
Ano
1923
Nº
1
Data
8 de outubro
1924
2
1ª quinzena
de janeiro
3
2ª quinzena
de janeiro
4
1ª quinzena
de maio
2ª quinzena
de outubro
5
1925
6
1ª quinzena
de novembro
7
2ª quinzena
de novembro
1
2
sem data
sem data
Impressão
Oficina d’A
Tribuna
Rua da Aurora,
197, Boa Vista,
Recife-PE.
Oficina de José
Maria. Rua
Numa Pompílio
(atual Rua das
Crioulas), 536,
Derby, RecifePE.
Diretores
José Maria C. de
Albuquerque e
Mello
Amaro B. de
Albuquerque e
Mello
João Monteiro
(entrou do segundo
número em diante).
Características
Período: o 1º número tinha o
intuito de ser semanal. Os
demais eram quinzenais.
Formato: 24x15cm.
Páginas: 16 a 28 páginas.
Papel: miolo em acetinado e
capa em couchê. No último
número, o miolo foi feito em
papel Bouffant.
Capa: ilustrações de Manoel
Bandeira
Composição: texto em dupla
coluna.
Nesta fase, a revista era dividida em secções. As mais freqüentes foram: Femina,
Cinematographo, Estudantadas, Vida Frívola e Caricaturas.
Após a capa, a revista tem uma série de propagandas até vir a abertura com o frontispício e
o cabeçalho com informações sobre o número.
Figura 2: Abertura da secção Femina, n. 4 da primeira fase da Revista do Norte, acervo Biblioteca Pública
de Pernambuco.
A seguir, trecho da abertura do primeiro número (1923): ‘Páginas de caricaturas, de
humorísmos, de sports, de comentários e atualidades serão também assiduamente publicadas
na Revista do Norte’.
Alguns dos artistas responsáveis pelas páginas de humorismo e caricaturas foram: J.
Ranulpho, Victoriano Lima, Manoel Bandeira, Zuzú (José Borges da Silva), Lula Cardoso Aires
(com apenas 13 anos), Caio Cavalcante, Mauro, Luiz Soares, Fininho (Fausto Silveira),
Joaquim Cardoso, Felix e Manoel Caetano Filho (REVISTA DO NORTE, 1923, n. 1).
No segundo número, em 1924, Ozório Borba escreve um artigo, no qual apresenta os
artistas da decoração e do humor como grande vocações a serem trabalhados e valorizados na
Revista do Norte (REVISTA DO NORTE, 1924, n. 2):
Recife não possui, não poderia possuir ainda grandes humoristas do lápis. A caricatura, arte da
síntese, de requinte, de instantaneidade, não poderia medrar com maior esplendor num meio de
cultura rudimentar, sem ambiente propício, e nem mesmo uma elite reduzida que a compreendesse
(...) A Revista do Norte (...) tem entre os pontos de seu programa o objetivo de contribuir para um mais
intenso cultivo desse gênero requintado de humorismo.
A Revista do Norte mostrou sua indignação ao pouco espaço dedicado na imprensa para a
decoração das páginas com ilustrações, caricaturas e humorismo, que perdiam espaço para as
publicidades (REVISTA DO NORTE, 1924, n. 2). Um outro fator que também diminuía a
valorização do desenho era ele não ser considerado uma arte.
Figura 3: Caricatura do Sr. Pereira Leça feita por Victoriano. n. 7 da primeira fase da Revista do Norte,
1924, acervo Biblioteca Pública de Pernambuco.
Do Art Nouveau, movimento francês do início do século XX, José Maria recebeu influências.
Na primeira fase da revista, o design possuía características do estilo francês. O Art Nouveau
foi o primeiro movimento orientado para o design gráfico, e que revolucionou a produção da
página impressa. O movimento produziu famosos pôsteres, ítens da propaganda publicitária da
Belle Époque francesa, que tinham uma diagramação fluída e com diferenciado uso das cores
(Hurlburt, 2002). Essas características do Art Nouveau foram decorrentes das inovações
tecnológicas, das novas teorias do conhecimento e da utilização da litografia no meio comercial
no final do século XIX, período que na França ficou conhecido como Belle Époque. As
circunstâncias possibilitaram aos artistas e designers da época uma composição mais livre,
desenhada diretamente na pedra de impressão. A litografia permitia também, a impressão em
várias cores numa mesma composição.
Essa tendência Art Nouveau, que foi visível na primeira fase da Revista do Norte, era
comum entre as publicações da época. A Revista Fon Fon, do Rio de Janeiro, tinha estilo
semelhante aos números da primeira fase da Revista do Norte e também tinhas características
Art Nouveau.
Figura 4 e 5: Capa da Fon Fon, 191?. Capa da Revista do Norte, 1924 n.3. Acervo Biblioteca Pública de Pernambuco.
Nos últimos números desta primeira fase, o design da revista começa a receber as
primeiras influências do regionalismo de Gilberto Freyre, começando a ganhar diferencial das
demais publicações de sua geração. O primeiro número que trouxe um design com ornamentos
inspirados na região foi o número 6, de 1924, que saiu na primeira quinzena de novembro. Este
número foi desenvolvido logo após a criação do Centro Regionalista do Nordeste e a Revista
do Norte começou a trazer como subtítulo “Aspectos de Vida Regional”.
O estilo, que começou a aparecer no final da primeira fase da revista, será aclamado na
segunda fase, quando a Revista do Norte se apresentará como um dos esteios do pensamento
regionalista.
Figura 6: Abertura do n. 6 da primeira fase da Revista do Norte, 1924. Acervo Biblioteca Pública.
3 Segunda Fase
O comportamento da Revista do Norte em relação ao regionalismo era mais expressionista do
que documentário (Barros, 1985). Seu design e sua literatura expressavam subjetivamente os
sentimentos humanos. Neste período, José Maria usou ornamentos e textos como unidade,
fazendo com que o design da página impressa expressasse o conteúdo escrito.
Na primeira fase da revista, o projeto feito por José Maria não contava com o uso de
espaços de respiração, espaços em branco. A página era aproveitada no máximo, se algum
espaço em branco surgisse, um ornamento seria colocado ou os espaçamentos da página
teriam de ser modificados. Na reformulação do projeto gráfico da revista, o conteúdo e sua
apresentação passaram a ter a mesma importância.
José Maria era admirador de uma grande dinastia francesa de tipógrafos, os Didot.
Inventores de uma composição tipográfica que serviu de base para o desenvolvimento da
moderna tipografia francesa. Eles produziram livros que chegaram a ser proclamados como a
produção mais perfeita entre todos os países e de todos os tempos. Os Didot não eram uma
simples tipografia, mas sim uma escola produtora de grandes tipógrafos (Martins, 1998).
No novo projeto gráfico da Revista do Norte é possível encontrar semelhanças com as
composições Didot. Pode-se verificar a que estrutura das duas folhas de rosto são
semelhantes. Porém no lugar da assinatura dos Didot, a Revista do Norte tem uma vinheta
com um cacto. O mesmo aconteceu com os ornamentos internos. Entre os ornamentos da
revista de José Maria é possível identificar cactos, arbustos da região, cajus e detalhes
inspirados nas construções e igrejas do período colonial de Pernambuco, enquanto nos livros
Didot os ornamentos são clássicos.
Figura 7 e 8: Folha de rosto dos Didot de 1829 (Ribeiro, 2003), Folha de rosto da Revista do Norte (1926)
Em relação ao design da primeira fase, a Revista do Norte em sua segunda fase ganha uma
diagramação mais simples, mais elegante, com mais funcionalidade. A combinação do
espaçamento maior, margens mais amplas, forma e corpo do tipo tornou a página mais
harmoniosa. Mesmo seguindo uma linha decorativa a revista começa a adotar, em relação à
sua fase anterior, dois princípios básicos do modernismo: ‘simplicidade da apresentação e a
funcionalidade da forma’ (Hurlburt, 2002).
A abertura do primeiro número da segunda fase da Revista do Norte mostra o valor que
daquele instante em diante seria dado a obra como um todo: ‘O propósito de reforçar, pelo
rythmo de suas páginas, de seu aspecto typographico, o rythmo de seu programa, é resultado
o presente número da Revista do Norte (REVISTA DO NORTE, 1926, n. 1)’.
Em junho de 1926, a revista foi relançada e inaugurou sua nova fase. Nesta fase, para a
lamentação dos que gostavam do trabalho da revista, apenas saíram quatro números. Gilberto
Freyre olhava com simpatia a Revista do Norte, mas lamentava que o perfeccionismo de José
Maria, o amor pela perfeição estética, adiasse o “aparecimento” do tão admirável “esporádico”
(não periódico) (Jardim apud Barros, 1985).
Tabela 2: Informações segundo Luiz do Nascimento (1954) e Revistas do Norte da 2ª fase.
Ano
1926
1927
Nº.
1
2
Data
junho
agosto
3
setembro
4
Exemplar
único,
presenteado
a Manoel
Bandeira ( o
pintor).
Impressão
Oficina de José
Maria. Rua Numa
Pompílio (atual
Rua das Crioulas),
536, Derby,
Recife-PE.
Diretores
José Maria C.
de Albuquerque
e Mello
João Monteiro
Joaquim
Cardoso
Características
Período: mensal
Formato: 24x15cm
Páginas: 20 páginas
Papel: miolo em Bouffant e capa
em couchê. As páginas com
ilustrações e fotografias eram em
couchê.
Capa: ilustração de Manoel
Bandeira. A mesma ilustração foi
usada em todos os números, a
única variação foi cromática.
Esta nova fase da revista era caracterizada pelo luxo gráfico. Papel de alta qualidade,
impressão criteriosa e ornamentos rebuscados. A sua estrutura era formada pela capa, folha
de rosto com frontispício, “Bela página” nos inícios dos capítulos, capitulares, vinhetas, cul-delampes, linhas e bigodes. As ilustrações da capa e do frontispício foram feitas por Manoel
Bandeira e mantidas as mesmas em todos os números.
As vinhetas, as iniciais, os culs-de-lampes que vamos adoptar serão não só aqueles que influenciados
pelo mesmo rythmo tiveram o espírito de graça nova e uma linha de pesquisa sincera mesmo arrojada
e audaciosa na estylização da nossa flora e fauna cômoda representação dos nossos costumes ainda
virgens desse cosmopolitismo de segunda mão que vai tristemente embrumando o nosso ambiente e
a nossa alma.
(REVISTA DO NORTE, 1926, n. 1)
Figura 9 e 10: Abertura do n.1 da segunda fase da Revista do Norte, 1926. Abertura de artigo sobre Teles Júnior. n. 2
da segunda fase da Revista do Norte. Acervo Fundação Joaquim Nabuco.
Sobre o estilo da revista, Guilherme Cunha Lima (1997) afirma que: ‘O design da Revista do
Norte conheceu diversas fases: inicialmente com evidente influência Art Nouveau, passa
gradualmente para o Art Decô, sempre sob forte influxo do design editorial francês’.
O Art Decô era um estilo de design, que não foi considerado um movimento, e que não
cumpria os princípios da simplicidade e da funcionalidade do modernismo – menos é mais
(Hurlburt, 2002). Mesmo parecendo contraditório, o Art Decô também serviu de inspiração para
o trabalho de José Maria, pois ele como homem ligado à cultura e as artes recebia informações
de todas as vanguardas da época e acabava simpatizando com vários posicionamentos
artísticos que, para uns, podem ser completamente diferentes, porém para outros cada um tem
seu lado bom. A semelhança que o design da revista tem com o estilo Art Decô estava na
ornamentação superficial, na produção mais elegante e com o uso de espaços em branco.
Todavia a decoração da Revista do Norte não tinha ornamentos tão geometricos quantos os do
Art Decô. Os ornamentos da revista ainda guardavam herança do Art Nouveau. Contudo, o
trabalho de José Maria, que mais mostra influências do Art Decô não foi a Revista do Norte, foi
o livro Guia Prático, Histórico e Sentimental do Recife, de Gilberto Freyre.
Figura 11 e 12: Final de artigo, com a utilização de um cul-de-lampe. n. 1 da segunda fase da Revista do Norte. Página
do livro Guia Prático, Histórico e Sentimental, de Gilberto Freyre (1935). Acervo Fundação Joaquim Nabuco
A polaridade da temática regionalista com a qualidade estética apreciada pelos escritores
modernistas fez da Revista do Norte um exemplar ímpar de sua geração.
4 Terceira Fase
Somente em 1942 foi inaugurada a terceira fase da revista. A Revista do Norte completava 19
anos e atingia a sua maturidade. O seu design tornou-se mais sereno. O formato foi reduzido.
Os ornamentos foram simplificados, apareceram em menor quantidade e em tamanho inferior
aos da fase anterior. O tipo utilizado tinha forma menos rebuscada. O design tornou-se mais
claro, ainda mais direto e mais funcional. O design da Revista do Norte foi o resultado da
evolução pela qual passou em suas fases e do crescimento que José Maria e seus
colaboradores tiveram em suas vidas. A terceira fase da revista foi o “tempo da perfeição”.
Nessa nova fase a Revista do Norte adota novo subtítulo “Ciências, Letras, Artes e Ofícios”.
Agora seu conteúdo passaria a englobar não apenas a história e a antropologia, mas também
outros temas de interesse regional.
Tabela 3: Informações segundo Luiz do Nascimento (1954) e Revistas do Norte da 3ª fase.
Ano
1942
1944
1947
?
Nº
1
2
3
4
Data
abril
dezembro
outubro
-
1952
5
junho
Impressão
Oficina da Revista do
Norte. Rua Manoel
Caetano, 72/74,
Derby, Recife-PE.
Anos mais tarde o
número foi alterado
para 42.
Diretores
José Maria C.
de Albuquerque
e Mello
Características
Período: indefinido
Formato: 15x21cm
Páginas: 60 páginas
Papel: miolo em Bouffant e capa
em couchê. As páginas com
ilustrações e fotografias eram em
couchê.
Capa: título mais ilustração. No n.
1: gravura de uma inicial da missa
in Festo Gaudorum B.V.M.; nos 2,
3 e 5: gravura de Joaquim
Cardoso.
O número 3, de 1947, foi dedicado a Joaquim Cardoso em homenagem devido ao seu
aniversário de 50 anos. A Revista do Norte fez uma coletânea de todos os trabalhos de
Joaquim Cardoso publicados e reeditou neste número. Esse número é considerado por muitos
a última Revista do Norte publicada (Nascimento, 1966). Porém houve a publicação até um
número 5, um exemplar deste número pertence à Fundação Joaquim Nabuco em Pernambuco.
Na abertura do número 5, que saiu em 1952, estão expostos a missão e o resultado
conquistado pela revista.
Revista do Norte que de agora vae se constituindo uma officina de boa typographia, que pretende
continuar a norma poderosamente expressiva da arte de imprimir, (...), não é como possa parecer a
alguém um órgão destinado a exumar velharias de antigos textos esquecidos, e sem orientação na
grande lição dos processos modernos, uma esforçada colecionadora de sugestões que o antigo nos
pode fornecer com a limpidez de suas fontes aliada a nítida comprehensão de nosso scenario social
em que a paisagem se apresenta num verdadeiro e singular caracter.
Figura 15 e 16: Capa do n. 1 da terceira da fase da Revista do Norte, 1942. Abertura de artigo de Willy Lewin da
Revista do Norte (1952). Acervo Fundação Joaquim Nabuco
5 Considerações Finais
José Maria Carneiro de Albuquerque e Mello nasceu numa família que fez história. Um clã que
desde cedo usou a imprensa como arma contra os desmandos que afligiam a sociedade
pernambucana. Ele desde menino aprendeu a amar Pernambuco e a defender o estado em
que nasceu.
José Maria nasceu no prédio do jornal A Província, viveu até os seus três anos de idade por
entre as máquinas e cresceu ouvindo as conversas sobre Pernambuco, democracia e cultura.
A arte gráfica que fez parte de sua vida até sua morte, também foi a vida de seu pai, do pai de
seu pai e assim por diante. Mas as idéias de José Maria para defender Pernambuco não se
detinham nas artes gráficas, iam além. Porém ele não foi um homem de muitas ações, mas as
ações que fez geraram resultado.
Como um homem participante das questões que afligiam Pernambuco, José Maria foi
militante da revolução de 30. No desenvolvimento de suas atividades no governo
pernambucano, ele ficou com menos tempo para investir em seus projetos editoriais, mas tinha
novas formas de continuar investindo na cultura pernambucana. Ele tornou-se diretor da
Biblioteca Pública de Pernambuco, professor e fundador da Escola de Belas Artes de
Pernambuco, depois secretário do governo de Agamenon, de onde conseguiu por sua
influência alguns ganhos para a cultura como a criação da sede própria do Museu do Estado
de Pernambuco. Nesse período, fez alguns números de sua revista valiosos para a cultura
pernambucana, mas finalizou a produção desta sua grande obra ao tornar-se diretor do Museu
do Estado.
A Revista do Norte foi a obra da vida de José Maria. Ela foi considerada, devido ao design e
ao conteúdo, um modelo único da sua geração. Ela foi desenvolvida, visando a união entre
conteúdo literário e sua diagramação, ambos com a mesma importância. Seu design é o
resultado da mistura de estética do design editorial francês com a reflexão dos pensamentos
da sua geração.
A Revista passou por três fases, pelas quais sofreu evidente evolução. De início, seu design
possuiu características influenciadas pela Art Nouveau com ilustrações fluídas e coloridas,
semelhante a produção editorial existente na época no Brasil. Aos poucos ela ganhou
características do Art Decó com um design elegante e decorativo com temas regionais. Por fim,
em sua fase mais madura, a revista diminui seus ornamentos passa a possuir um design mais
simples, com menos uso de cores, tornando-se mais funcional, seria esta a fase da sua maior
perfeição.
A Revista do Norte teve o importante papel de ser predecessora do grupo Gráfico Amador
que, segundo Guilherme Cunha Lima (1997), produziu entre 1954 e 1961 as primeiras obras
realmente modernas do design editorial brasileiro, com projetos visuais arrojados e inovadores,
afinados com o que de melhor se fazia no mundo.
6 Referências
Cunha LIMA, Guilherme. O Gráfico Amador: as origens da moderna tipografia brasileira /
Guilherme Cunha Lima; Prefácio de Emanuel Araújo. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997. p
25, 58, 59, 60.
HURLBURT, Allen. Layout: o design da página impressa. São Paulo: Nobel, 2002. Tradução
Edimilson Conceição e Flávio Martins.
MARTINS, Wilson. A palavra escrita: história do livro da imprensa e da Biblioteca. 3.ed. rev. e
atual. São Paulo: Ática, 1998. 519 p.
CAETANO FILHO, Manuel. Manuel Caetano: um jornalista de Pernambuco. Recife: Revista do
Norte, s. data.
NASCIMENTO, Luiz do. História da Imprensa em Pernambuco (1821-1954). Recife: Editora
Universitária, Universidade Federal de Pernambuco, 1966. v. 8. p. 169-173.
Albuquerque e Mello, José M. Revista do Norte. Recife: Revista do Norte, 1923. Fase 1, n. 1.
__________. Revista do Norte. Recife: Revista do Norte, 1924. Fase 1, n. 2.
__________. Revista do Norte. Recife: Revista do Norte, 1926. Fase 2 n. 1.
__________. Revista do Norte. Recife: Revista do Norte, 1926. Fase 3, n. 5.
BARROS, Souza. A Década de 20 em Pernambuco. Recife, Fundação de Cultura do Recife,
1985.
VIEIRA, Anco Márcio Tenório. Centenário de José Maria Carneiro de Albuquerque, Gazeta
Mercantil, Caderno Nordeste, Recife, 18 set. 2002, p. 2.