CADERNOS
MARÇO 2018
MARCH 2018
ANO YEAR 13 | Nº 32
ISSN 19844883
CIDADES
SUSTENTÁVEIS
SUSTAINABLE CITIES
Entrevista | Interview
SIMONE RASKOB
Depoimentos | Testimonials
MARILENE RAMOS
ELIZABETH YEE
Primeiro Presidente Fundador | Founder and First President
Luiz Simões Lopes
Diretor | Director
Cesar Cunha Campos
Presidente | President
Carlos Ivan Simonsen Leal
Diretor Técnico | Technical Director
Ricardo Simonsen
Vice-Presidentes | Vice-Presidents
Sergio Franklin Quintella, Francisco Oswaldo Neves Dornelles &
Marcos Cintra Cavalcante de Albuquerque
Diretor de Controle | Director of Control
Antônio Carlos Kfouri Aidar
Diretor de Qualidade | Director of Quality
Francisco Eduardo Torres de Sá
CONSELHO DIRETOR | BOARD OF DIRECTORS
Presidente | President
Carlos Ivan Simonsen Leal
Vice-Presidentes | Vice-Presidents
Sergio Franklin Quintella, Francisco Oswaldo Neves Dornelles &
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque
Vogais | Voting Members
Armando Klabin, Carlos Alberto Pires de Carvalho e Albuquerque,
Cristiano Buarque Franco Neto, Ernane Galvêas, José Luiz Miranda,
Lindolpho de Carvalho Dias, Marcílio Marques Moreira & Roberto Paulo
Cezar de Andrade
Suplentes | Deputies
Aldo Floris, Antonio Monteiro de Castro Filho, Ary Oswaldo Mattos Filho,
Eduardo Baptista Vianna, Gilberto Duarte Prado, Jacob Palis Júnior,
José Ermírio de Moraes Neto, Marcelo José Basílio de Souza Marinho &
Maurício Matos Peixoto
CONSELHO CURADOR | BOARD OF TRUSTEES
Presidente | President
Carlos Alberto Lenz César Protásio
Vice-Presidente | Vice-President
João Alfredo Dias Lins (Klabin Irmãos e Cia)
Vogais | Voting Members
Alexandre Koch Torres de Assis, Andrea Martini (Souza Cruz S.A.), Antonio Alberto Gouvea Vieira,
Eduardo M. Krieger, Rui Costa (Governador do Estado da Bahia), José Ivo Sartori (Governador
do Estado do Rio Grande Do Sul), José Carlos Cardoso (IRB - Brasil Resseguros S.A.), Luiz Chor,
Marcelo Serfaty, Márcio João de Andrade Fortes, Murilo Portugal Filho (Federação Brasileira
de Bancos), Orlando dos Santos Marques (Publicis Brasil Comunicação Ltda.), Pedro Henrique
Mariani Bittencourt (Banco BBM S.A.), Raul Calfat (Votorantim Participações S.A.), Ronaldo
Mendonça Vilela (Sindicato das Empresas de Seguros Privados, de Previdência Complementar e
de Capitalização nos Estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo), Sandoval Carneiro Junior &
Willy Otto Jorden Neto
Suplentes | Deputies
Cesar Camacho, Clóvis Torres (Vale S.A.), José Carlos Schmidt Murta Ribeiro, Luiz Ildefonso
Simões Lopes (Brookfield Brasil Ltda.), Luiz Roberto Nascimento Silva, Manoel Fernando
Thompson Motta Filho, Nilson Teixeira (Banco de Investimentos Crédit Suisse S.A.), Olavo
Monteiro de Carvalho (Monteiro Aranha Participações S.A.), Patrick de Larragoiti Lucas (Sul
América Companhia Nacional de Seguros), Rui Barreto, Sergio Andrade e Victório Carlos de
Marchi
Sede | Headquarters
Praia de Botafogo, 190, Rio de Janeiro-RJ, CEP 22250-900 ou/or Caixa Postal 62.591
CEP 22257-970, Tel: (21) 3799-5498 | www.fgv.br
Instituição de caráter técnico-científico, educativo e filantrópico, criada em 20 de dezembro de 1944
como pessoa jurídica de direito privado, tem por finalidade atuar, de forma ampla, em todas as matérias
de caráter científico, com ênfase no campo das ciências sociais: administração, direito e economia,
contribuindo para o desenvolvimento econômico-social do país.
Institution of technical-scientific, educational and philanthropic character, created on December
20th, 1944, as a legal entity of private law with the objective to act, broadly, in all subjects of scientific
character, with emphasis on social sciences: administration, law and economics, contributing for the
socioeconomical development of the country.
Impresso em papel certificado, proveniente de lorestas plantadas de forma sustentável,
com base em práticas que respeitam o meio ambiente e as comunidades.
Printed on certified paper from sustainably planted forests using practices that respect
the environment and communities.
Diretor de Mercado | Market Director
Sidnei Gonzalez
EDITORIAL | EDITORIAL CREDITS
Editor-Chefe | Editor in Chief
Sidnei Gonzalez
Orientação Técnica | Technical Direction
Carlos Augusto Costa
Coordenação Editorial | Editorial Coordination
Silvia Finguerut
Manuela Fantinato
Coordenação de Design | Design Coordination
Patricia Werner
Produção Editorial | Editorial Production
Talita Marçal
Marina Bichara
Projeto Gráfico e Diagramação | Graphic Design & Layout
Fernanda Macedo
Julia Travassos
Luísa Ulhoa
Sílvia Dantas
Edição e Revisão | Editing and Proofreading
Isabel Ferreira
Cristina Romanelli
Maria Arréllaga
Tradução | Translation
James Mulholand
Jones de Freitas
Peter Lenny
Alex Mervart
Global Translations
Fotos | Photos
http://www.shutterstock.com
PUBLICAÇÃO PERIÓDICA DA
FGV PROJETOS
PERIODICAL PUBLICATION
OF FGV PROJETOS
Os textos são de responsabilidade dos autores e não reletem,
necessariamente, a opinião da FGV
The texts are of authors’ responsabilities and do not
necessarily relect the opinion of FGV Foundation
Esta edição está disponível para download no site da FGV
Projetos: www.fgv.br/fgvprojetos
This issue is avaiable for download at FGV Projetos’
website: www.fgv.br/fgvprojetos
CADERNOS
CIDADES
SUSTENTÁVEIS
SUSTAINABLE
CITIES
MARÇO 2018
MARCH 2018
ANO YEAR 13 | Nº 32 | ISSN 19844883
SUMÁRIO
CONTENTS
8
Editorial
Editorial
CESAR CUNHA CAMPOS
12
Entrevista
Interview
SIMONE RASKOB
Nesta entrevista, Simone Raskob fala sobre as
iniciativas de desenvolvimento sustentável da cidade
de Essen, na Alemanha, que recebeu o título de
Capital Verde da Europa 2017. Ela lembra que a região
empreendeu mudanças estruturais importantes para
abandonar um passado industrial e tornar-se um
modelo de metrópole verde.
In this interview, Simone Raskob talks about the
sustainable development initiatives of the city of
Essen, Germany, which was awarded the title of
Green Capital of Europe 2017. She recalls that the
region underwent major structural changes to
transform its industrial past and become a model
green metropolis.
30
42
Depoimento
Testimonial
Depoimento
Testimonial
MARILENE RAMOS
ELIZABETH YEE
A atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social para promover uma infraestrutura urbana mais sustentável e comprometida com as
questões socioambientais é o principal tema tratado
por Marilene Ramos. Em seu depoimento, ela aborda a
política do banco para inanciar e fomentar projetos de
energia, saneamento básico e mobilidade urbana.
Marilene Ramos’ main subject here is the National
Social and Economic Development Bank’s role in promoting urban infrastructure that is both more sustainable and committed to socioenvironmental concerns. She talks about the bank’s policy of inancing and
supporting projects in energy, basic sanitation and
urban mobility.
A 100 Resilient Cities é uma iniciativa internacional sem
ins lucrativos que auxilia cidades em mais de 45 países a
construir e a desenvolver infraestruturas mais resilientes.
Neste depoimento, Elizabeth Yee fala sobre o programa e
alguns dos principais desaios sociais, econômicos e ambientais da atualidade, chamando atenção para a importância de se estabelecer uma rede global de contatos para
o compartilhamento de soluções e estratégias que valorizem a resiliência urbana.
100 Resilient Cities is an international nonproit iniciative that helps cities in over 45 countries to build
and develop more resilient infrastructure. In this testimonial, Elizabeth Yee talks about the actions carried
out by the program, and also about some of the main
contemporary social, economic, and environmental
challenges. She calls our attention to the importance
of establishing a global network of contacts to share
solutions and strategies that value resilience.
SUMÁRIO
CONTENTS
56
CLARA BRANDI
86
RONALDO LEMOS, FABRO STEIBEL & VICTOR VICENTE
Artigo
Article
Artigo
Article
O papel das cidades: implementação da Agenda 2030 e do
Acordo de Paris
The role of cities: implementation of the Agenda 2030 and
the Paris agreement
Participação cidadã e a crise ambiental nas cidades:
caminhos para o desenvolvimento sustentável
Citizens’ participation and the enviromental crisis in the cities:
pathdays for sustainable growth
116
ROSSANA PAVANELLI
168
CARLOS AUGUSTO COSTA & ANA CRISTINA MATOS
Artigo
Article
Cidades inteligentes: o desafio do planejamento sustentável
Smart cities: the challenge of sustainable planning
186
MARCO CONTARDI, MARCO SAVERIO RISTUCCIA &
ANDREA RACCICHINI
Artigo
Article
Artigo
Article
Modelos de negócio em economia colaborativa: estruturas e
impactos no âmbito das cidades
Business models in the collaborative economy: structures and
impacts in the urban context
Cidades inteligentes e sustentáveis: inovações para
transformação urbana no Brasil
Smart, sustainable cities: innovative urban changes in Brazil
224
CLARISSE CUNHA LINKE &
JOÃO PEDRO MACIENTE ROCHA
258
CAROLINA HELDT D’ALMEIDA &
SIMONE GUERESI
310
ZECA BRANDÃO
338
ROGÉRIO GUTIERREZ GAMA
Artigo
Article
Artigo
Article
Artigo
Article
Artigo
Article
Ciclo Rotas Centro: um caminho para a mobilidade
urbana sustentável no Rio de Janeiro
Ciclo Rotas Centro: a path to sustainable urban mobility
in Rio de Janeiro
Plano diretor e operações urbanas: o desafio da gestão
pública em território de reestruturação urbana
The director plan and city operations: the challenge for
public management in the area of urban re-structuring
Planejamento Estratégico + Desenho Urbano: a importância do projeto urbano e do arquiteto urbanista na
produção da cidade contemporânea
Strategic Planning and Urban Design: the importance of
the urban project and the urbanist-architect in building
today’s cities
Sustentabilidade e resiliência urbana: dados,
informações e tecnologia como ferramentas para
gestão territorial
Urban sustainability and resilience: data, information
and technology as tools for land management
EDITORIAL
EDITORIAL
CESAR CUNHA CAMPOS
Diretor da FGV Projetos
Director of FGV Projetos
P
ensar novos caminhos para um desenvolvimento urbano mais sustentável é um dos
principais desaios da atualidade, principalmente se considerarmos o protagonismo
crescente das cidades no cenário internacional. Segundo a Organização das Nações Unidas,
mais da metade da população mundial vive hoje em áreas urbanas, e a perspectiva é de que
esse percentual suba para dois terços até 2050.
O avanço da urbanização em escala global torna ainda mais urgente e necessário o processo
de transformação das cidades contemporâneas a partir de uma abordagem mais ampla e integrada, que seja capaz de equilibrar economia, meio ambiente e qualidade de vida.
Assim, a implementação de uma nova agenda urbana tem como foco não só a competitividade e a expansão das atividades produtivas, o estímulo à inovação, à comunicação e ao
uso da tecnologia, buscando fazer das cidades espaços mais modernos e inteligentes, como
também prioriza a adoção de medidas resilientes e de práticas ambientais, que sejam engajadas com a eiciência energética, o combate às mudanças climáticas, a prevenção de desastres
naturais e, principalmente, a preservação do meio ambiente.
Ao mesmo tempo, essa nova agenda urbana está comprometida com a implantação de estruturas e de serviços mais eicientes, voltados para promover o bem-estar das pessoas e uma
cidade mais inclusiva, seja pelo acesso à sustentabilidade, educação, cultura, saúde, segurança pública e mobilidade urbana, seja pela criação de um ambiente que gere oportunidades e
inclusão social e que permita aos indivíduos potencializar seus talentos e sua criatividade.
Com o objetivo de estimular esse importante debate e de contribuir para o processo de reinvenção sustentável das cidades, esta publicação reúne especialistas e proissionais do terceiro
setor e de organizações públicas e privadas do Brasil e do exterior, que apresentam não só
valiosas relexões e pontos de vista sobre o tema, como também apontam tendências e compartilham experiências bem-sucedidas para a construção de um futuro mais verde.
Boa leitura!
O
ne of the main challenges we face today is inding new ways to promote a more sustainable urban development, especially when we take into account the growing role
that cities play in the world scenario. The United Nations has calculated that more than half
of the world’s population now lives in urban areas, and this igure is expected to rise to twothirds by the year 2050.
Urbanization has advanced on a global scale, which makes it even more urgent and necessary for the process of transforming today’s cities to adopt a wider-sweeping and more
integrated approach, one capable of coordinating the triptych economy, environment and
quality of life.
Accordingly, implementing a new urban agenda is concentrated not only on expanding
and making productive activities more competitive; stimulating innovation, communication
and the use of technology; and making more modern and intelligent spaces, but at the same
time prioritizing the introduction of resilient measures and environmental practices committed to making energy more eficient; facing climate change; preventing natural disasters;
and, above all, preserving the environment.
Aside from the above-mentioned goals, this new urban agenda has a binding commitment to implementing more eficient structures and services meant to promote the well-being of people and a more inclusive city, either through access to sustainability, education,
culture, health, public safety and urban mobility, or by creating an environment that not
only offers opportunities and social inclusion but also enables individuals to enhance their
talents and creativity.
In order to stimulate this important debate on sustainability and contribute to the process
of reinventing our cities, this publication brings together specialists and professionals from
the third sector and public and private organizations both in Brazil and overseas who present
valuable observations and opinions on the matter, as well as pointing to current trends and
sharing successful experiences to ensure a more sustainable future.
Have a good read!
ENTREVISTA INTERVIEW
SIMONE RASKOB
Conselheira para a área de Meio Ambiente e Construção de Essen e líder
do projeto Capital Verde da Europa
Councillor for the Environment and Construction of Essen and project
leader of the European Green Capital
Formou-se em administração pública pela Universidade Técnica de Munique, na Alemanha.
Atua como conselheira para a área de Meio Ambiente e Construção da cidade alemã de Essen
e é líder do projeto Capital Verde da Europa. Foi presidente do Comitê de Meio Ambiente das
Cidades e membro do Conselho da Aliança Climática.
Graduated in state administration at the Technical University of Munich, Germany. She is
councillor for the Environment and Construction of the German city of Essen and project
leader of the European Green Capital. She was chairman of the Environment Committee of
Cities and member of the board of Climate Alliance Council.
As conquistas ambientais de Essen, na Alemanha, e suas práticas de desenvolvimento
sustentável renderam à cidade o título de Capital Verde da Europa 2017. Nesta
entrevista, Simone Raskob fala sobre a transformação da região, que deixou de ser
um centro industrial de mineração para tornar-se uma metrópole verde. Além dos
desaios que permearam essa mudança, Raskob aponta as principais iniciativas
da cidade para promover a revitalização urbana, a mobilidade, o uso de energias
alternativas, a proteção climática, e melhorar a qualidade de vida dos seus cidadãos.
Segundo ela, o título produz efeitos positivos expressivos não só em âmbito local, ao
fortalecer os esforços rumo a um futuro verde, como também na esfera internacional,
já que Essen passa a ser vista como um exemplo para outras cidades do mundo.
The environmental achievements in Essen, Germany, and its sustainable
development practices earned the city the title of Green Capital of Europe in 2017.
In this interview, Simone Raskob talks about the transformation of the region from
an industrial mining center to a green metropolis. In addition to the challenges
involved in this change, Raskob points out the city’s main initiatives to promote
urban revitalization, mobility, the use of alternative energy, climate protection and
to improve the quality of life of its citizens. According to her, the title has produced
signiicant positive effects not just at local level, by reinforcing efforts for a green
future, but in the international sphere as well, as Essen is seen as an example for
other cities in the world to follow.
fgv projetos A cidade alemã de Essen
fgv projetos The German city of Essen
deixou de ser uma cidade industrial
para tornar-se uma metrópole verde.
A senhora poderia nos contar sobre
esse processo de transformação,
apontando os principais desafios
urbanos que a cidade enfrentou para
promover a sustentabilidade?
has developed from an industrial city
into a green metropolis. Could you tell
us about this transformation process
by contextualizing it and pointing out
the main urban challenges that the city
had to face to promote sustainability?
simone raskob No inal da década de 1960,
Essen e toda a região estavam enfrentando
grandes desaios: os primeiros sinais de desaparecimento das indústrias do carvão e do aço
trouxeram a missão de mudar estruturalmente
a região, fazendo disso uma prioridade para a
agenda de negócios da área e de seus agentes
políticos. Naquela época, múltiplos obstáculos,
nem sempre aparentes, foram encontrados:
contaminação química do solo, materiais de
construção perigosos e subsidência.1 As metas de melhoria das condições ambientais e
de vida, especialmente nos distritos da região
norte da cidade de Essen, e a obtenção de um
redesenvolvimento sustentável das minas
abandonadas e dos sítios industriais requeriam
a deinição de novos objetivos para o planejamento urbano e dos espaços livres: a previsão
de planejamento e a expansão de um sistema
funcional de áreas verdes. Inúmeros projetos
contribuíram para o avanço da mudança estrutural em Essen e no Vale do Ruhr, como a
simone raskob In the late 1960’s, Essen
and the entire region were facing tremendous challenges: The irst signs of the demise of the coal and steel industries put the
task of structurally changing the region on
top of the agenda for the region’s businesses and political stakeholders. They were
met by manifold and not always apparent
obstacles, i.e. chemical soil contamination,
hazardous building materials and subsidence.1 The objectives of improving the environmental and living conditions, especially
in the northern districts of the City of Essen,
and achieving a sustainable redevelopment
of the abandoned mines and industrial sites
required the deinition of new objectives for
urban planning and the planning of free
spaces: the foresighted planning and the expansion of a functional system of green areas. Numerous projects advanced the structural change in Essen and the entire Ruhr
Area, i.e. the creation of green areas in the
1
1
Referente ao afundamento do solo.
Concerning the sinking of the soil.
cadernos fgv projetos
15
criação de áreas verdes nos distritos do norte
de Essen, que começou em 1975 com o projeto Green 14 e continuou, em 1989, como parte
do projeto O International Building Exhibition Emscher Park (IBA Emscher Park). Essas iniciativas contemplaram a criação de um
abrangente sistema de áreas verdes, que consistia em mais de 100 áreas e se estendia por
aproximadamente 400 hectares, com a maioria das áreas estabelecidas em sítios industriais
abandonados e em áreas de armazenamento. O
IBA Emscher Park foi um grandioso programa
de dez anos, desenvolvido pelo governo da Renânia do Norte-Vestfália, para combater a crise
estrutural pela qual passava a parte setentrional do Vale do Ruhr. Seu objetivo era oferecer
novas ideias e projetos associados ao desenvolvimento urbano, à cultura e ao meio ambiente, que pudessem estimular a transformação
econômica daquela histórica região industrial.
Com o estabelecimento do IBA Emscher Park,
as áreas livres do Vale do Ruhr deixaram de ser
vistas como relíquias isoladas de uma antiga região industrial para serem consideradas como
uma estrutura verde interconectada. Muitos
dos projetos de infraestrutura relacionados a
culturas e paisagens industriais que surgiram
no contexto do IBA continuam a servir como
importantes atrações culturais e de recreação.
Agora, como a Capital Verde da Europa 2017,
a cidade de Essen quer fortemente estimular
uma visão ecológica do futuro.
northern districts of Essen, which started
in 1975 with the project Green 14 and was
continued as part of the International Building Exhibition Emscher Park (IBA Emscher
Park) in 1989. These initiatives saw the creation of a comprehensive green area system
spanning over around 400 hectares and
consisting of more than 100 green areas,
with most of them established on abandoned
industrial sites and stockpile areas. The IBA
Emscher Park was a visionary ten-year
programme by the government of North
Rhine-Westphalia designed to overcome the
structural crisis experienced in the northern
part of the Ruhr Area. Its aim was to offer
new ideas and projects associated with urban development, culture and the ecological
environment that would provide stimuli for
the economical transformation of this historical industrial region. By establishing
the IBA Emscher Park, the Ruhr Area’s free
spaces changed from being perceived as isolated relics of a former industrial region to
being perceived as an interconnected green
structure. Many of the infrastructure projects concerned with industrial culture and
landscape that came out of the IBA context
continue to serve as important local recreational and cultural attractions. The City of
Essen is now aspiring to offer strong stimuli
in its role as the ecologically visionary European Green Capital of the year 2017.
entrevista interview
16
Em 2017, Essen recebeu o título de
Capital Verde da Europa, concedido
às cidades que demonstram altos
padrões ambientais e que buscam,
de forma consistente, atingir
metas importantes para melhorar
o meio ambiente e favorecer o
desenvolvimento sustentável. Quais
foram as principais realizações locais e
em quais critérios ambientais a cidade
mais se destacou para obter o título?
• A Comissão Europeia concedeu o título de
Capital Verde da Europa 2017 para a cidade
de Essen em 18 de junho de 2015. Em sua
decisão, a Comissão destacou a importância
da atuação de Essen como modelo para muitas cidades europeias, assim como seu papel
na área metropolitana do Ruhr. O júri icou
impressionado com a abordagem integrada
utilizada pela cidade em sua candidatura ao
título. As visões de futuro de uma cidade habitável, levando em conta as implicações trazidas por uma signiicativa mudança estrutural – de uma cidade dominada pelo carvão e
pelo gás para uma cidade verde –, foram valorizadas pela Comissão.
Obter a distinção de Capital Verde da Europa 2017 produz efeitos positivos expressivos, tanto em nível local como continental, já
que nos habilita a discutir questões futuras
sobre mudança de clima e meio ambiente,
e nos permite validá-las de maneira sustentável dentro da própria cidade. A distinção
também fortalece extraordinariamente os
atuais esforços de Essen para encaminhar a
mudança rumo a um “futuro verde”, transformando nossa cidade em um lugar cada
vez melhor para viver. Além disso, o título
demonstra que estamos verdadeiramente no
caminho certo para a Essen do futuro: uma
In 2017, Essen was awarded with
the title of European Green Capital,
which is given to those cities that have
demonstrated high environmental
standards and consistently pursue
important targets to improve the
environment and sustainable
development. What were the main
local achievements that led the
city to win this title and in what
environmental criteria the city most
stood out?
• The European Commission awarded the ti-
tle European Green Capital 2017 to the City
of Essen on 18 June 2015. In its decision, the
Commission highlighted the signiicance of
the City of Essen acting as a role model for
many European cities, as well as Essen’s role
within the Ruhr Metropolis. The jury was impressed with the integrated approach taken
by the city in its application for the distinction. The visions for the future of a liveable
city in consideration of the implications
brought about by the structural change from
a city dominated by coal and gas to a green
city was rewarded with additional points.
Being awarded the title European Green
Capital 2017 entails a signiicant positive
effect, both on local as well as European
level. It offers an opportunity to communicate the future issues of climate change and
environmental issues on all levels, and to
enshrine them sustainably within the city.
It also provides extraordinary support for
the City of Essen’s ongoing efforts to direct
the structural change into a “green future”,
and to make our city an even better place
to live, now and in the future. The title also
demonstrates that we are well and truly on
the way toward the Essen of the future – an
cadernos fgv projetos
17
cidade a cada dia mais preocupada com seus
cidadãos e com o clima; uma cidade resiliente
e habitável, com baixas emissões de carbono,
que oferece uma excelente qualidade de vida;
um lugar onde o crescimento econômico e o
crescimento ecológico andam de mãos dadas.
Nossa habilidade de transformar nossa cidade e nossa abordagem integrada vão muito
além da área metropolitana do Ruhr.
Essen apresenta grandes áreas em
desuso que foram utilizadas pela
indústria. O que a prefeitura tem feito
para revitalizar essas áreas e torná-las
mais sustentáveis?
•
Grande parte do nosso atual desenvolvimento urbano está ocorrendo em antigos
sítios industriais. No passado, essas áreas industriais desocupadas – que são um legado
da era das indústrias – eram vistas simplesmente como um fardo. Agora, o quadro é ou-
even more socially caring, climate-friendly,
resilient and liveable city with lower carbon emissions that offers a high quality of
life. A place where economical and ecological growth go hand in hand. Our ability to
transform our city and our integrated approach are noticed well beyond the limits of
the Ruhr Metropolis.
Essen has large areas of disused land
previously used by industry. What
has the City Hall done to revitalize
these areas and make them more
sustainable?
•
The majority of our city’s urban development is now happening on former industrial sites. In the past, these industrial wastelands, the legacy of the industrial era, were
only perceived as a great burden. It’s a different picture now: Unlike extremely dense
cities such as Munich or Vienna, the Ruhr
entrevista interview
18
“
Grande parte
do nosso atual
desenvolvimento
urbano está
ocorrendo em antigos
sítios industriais.
No passado, essas
áreas industriais
desocupadas - que
são um legado da era
das indústrias - eram
vistas simplesmente
como um fardo.
Agora, o quadro
é outro
”
tro: diferentemente de cidades extremamente densas, como Munique e Viena, a área do
Ruhr ainda oferece espaços disponíveis para
usos sustentáveis, como parques ou lagos
para retenção de água da chuva, por exemplo.
Essen tem dois parques que ilustram exatamente o redesenvolvimento sustentável de
áreas industriais. Entre 2007 e 2012, um parque foi criado nos antigos terrenos da então
fábrica de ferro fundido Krupp, formando um
espaço convidativo para recreação local nas
margens do centro da cidade. O parque apresenta um lago que é reabastecido pelas águas
da chuva oriundas dos telhados da sede do
atual grupo ThyssenKrupp. Assim, as águas
do lago seguem um luxo natural. A natureza
também foi rápida na reconquista dos sítios
de mineração adjacentes ao Zollverein Park,
patrimônio mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco). A diversidade de espécies
no Zollverein Park é única e impressionante:
540 tipos de samambaias e plantas loríferas,
100 variedades de liquens, cerca de 60 espécies de pássaros, 20 de borboletas e seis de
anfíbios. Espécies exóticas se juntaram a espécies residentes.
No que se refere à mobilidade, uma
série de mudanças vêm sendo
planejadas para os próximos anos.
A senhora poderia falar sobre
essa transição nos transportes,
mencionando o que já foi
implementado na cidade, as futuras
etapas e metas?
• A região do Ruhr é caracterizada pela quanti-
dade de carros. Existe, portanto, um grande potencial de redução de gás carbônico nessa área.
cadernos fgv projetos
19
Area still offers free spaces available for
sustainable use - for example by establishing
parks or lakes for rainwater retention.
The City of Essen has two parks that are
particularly suited to illustrate the sustainable redevelopment of industrial wastelands.
Between 2007 and 2012, a new park was created on the former grounds of the Krupp cast
steel factory, forming an inviting space for
local recreation at the fringe of the city centre. The park features a lake, which is also replenished by rainwater from the roofs of the
current ThyssenKrupp group headquarters.
The water from the lake then lows into a natural stream. Nature was quick to reconquer
the mining sites adjacent to the Zollverein
Park - United Nations Educational, Scientiic
and Cultural Organization (Unesco) World
Heritage Site. The diversity of species in the
Zollverein Park is impressive and unique:
540 species of ferns and lowering plants, 100
species of lichen, around 60 species of birds,
20 of butterlies and 6 of amphibians now call
this area their home. And the resident species
were joined by exotic species. This is because
the transport of goods from around the world
has also resulted in rare plants establishing
themselves on the grounds.
When it comes to mobility, a number
of changes have been planned over
the coming years. Could you tell us
about this transport transition by
explaining what has already been
implemented in the city and its future
steps and goals?
•
The Ruhr Area is a region characterised
by cars, and the greatest potential for cutting back on carbon gas thus also exists in
“
The majority of
our city’s urban
development is now
happening on former
industrial sites. In the
past, these industrial
wastelands, the legacy
of the industrial era,
were only perceived as
a great burden. It’s a
different picture now
”
entrevista interview
20
A cidade de Essen quer aproveitar a oportunidade do ano da Capital Verde para iniciar uma
revolução nas questões de tráfego e transporte.
Até o ano de 2035, pretendemos obter a seguinte coniguração referente a meios de transporte:
25% de usuários utilizando bicicleta, 25% em
transporte público, 25% em veículos motores e
25% a pé. A RS1 é um dos mais importantes projetos da região: a primeira ciclovia de pista rápida da Alemanha, que conectará cidades da região
do Ruhr, incluindo todo o trajeto desde Hamm,
a leste de Essen, até Duisburg, a oeste. Quando a
RS1 estiver concluída em 2020, estima-se que 52
mil viagens de carro poderão deixar de ocorrer
por dia e, consequentemente, 16 mil toneladas de
gás carbônico deixarão de ser emitidas por ano.
this area. The City of Essen wants seize the
opportunity of the Green Capital year to
initiate a revolution in traffic and transportation. By the year 2035, the following
split between different means of transportation is envisaged: 25% by bicycle, 25%
by public transport, 25% by motor vehicle and 25% by foot. The RS1 is one of
the region’s flagship projects: Germany’s
first fast cycleway, connecting the cities
and municipalities of the Ruhr Area, all
the way from Hamm in the east to Duisburg in the west. When the RS1 is completed in 2020, it is planned that 52,000 car
journeys can be saved per day, and thus
16,000 tonnes of carbon gas per year.
A proteção do clima é outra iniciativa
de sustentabilidade adotada pela
cidade. Quais são as principais ações e
metas relacionadas a ela?
Climate protection is another
sustainable initiative adopted by
Essen. What are the main measures
and goals concerning this issue?
•
Our city in the heart of the Ruhr Metropolis accepts its responsibility for climate protection and strives to infuse its
urban development with the notion of sustainability. The city expects a 40% drop
in carbon gas emissions by the year 2020
and 95% by the year 2050. Like many
other cities, Essen also accepts its special
responsibility for climate protection with
great commitment. The City of Essen considers the sustainability and environmental friendliness of its municipal business
as an absolutely crucial concern directly
impacting on the public services offered to
the city’s citizens. The focus is on caring
for and maintaining the city’s public green
areas and other local recreation areas as
well as the further development of the cy-
Nossa cidade, no coração da região metropolitana do Ruhr, aceita sua responsabilidade
para com a proteção do clima e se empenha em
implantar seu desenvolvimento urbano baseado na noção de sustentabilidade. Existe a expectativa de que Essen apresente uma queda de
40% nas emissões de gás carbônico até o ano de
2020 e de 95% até 2050. Assim como muitas
outras cidades, Essen também aceita, com grande comprometimento, sua responsabilidade especial de proteger o clima. Nós consideramos a
sustentabilidade e a preocupação com o meio
ambiente como fundamentos absolutamente
cruciais, que impactam nos serviços públicos
oferecidos aos nossos cidadãos. O foco é cuidar
das áreas verdes públicas e das áreas de recreação da cidade e mantê-las, do mesmo modo que
pretendemos fazer com as ciclovias e passarelas
•
cadernos fgv projetos
21
entrevista interview
22
cadernos fgv projetos
23
para pedestres. Existem muitas ações e projetos
concretos relacionados à nossa iniciativa de sustentabilidade. Em 2009, por exemplo, Essen foi
a primeira cidade a desenvolver o “Conceito de
Energia e Clima Integrado” (IECC, em inglês),
que foi profundamente revisado e estendido
em 2013. De um lado, o conceito focaliza na
expansão da cogeração da energia termossolar
e eólica; de outro, concentra-se na distribuição
dos meios de transporte e na proporcionalidade
do transporte cicloviário. Em 2011, a cidade de
Essen já havia reunido todas as suas atividades
relacionadas à proteção climática sob a égide do
projeto klima|werk|stadt|essen. O sucesso de
Essen na consecução de seus objetivos é revisado anualmente com base no relatório de balanço
do IECC e semestralmente com base no relatório
relacionado aos gases de efeito estufa. Metas e
princípios correspondentes foram deinidos no
plano de zoneamento regional, que também especiicou as zonas prioritárias para energia eólica. A cidade de Essen não apenas se dedica ativamente à proteção do clima, mas atua também na
promoção de pesquisas sobre mudanças climáticas e suas implicações para a cidade como um
todo, buscando desenvolver soluções estratégicas de adaptação a essas mudanças. As diretrizes
para o planejamento urbano com otimização de
energia estão sendo utilizadas para avaliar quase
todos os planos de desenvolvimento residencial
para otimização do consumo de energia.
cle paths and pedestrian walkways. There
are manifold concrete measures and projects: In 2009, Essen was first to develop
an “Integrated Energy and Climate Concept” (IECC), which was fundamentally
revised and extended in 2013. The concept
focuses on the expansion of cogeneration,
solar-thermal energy and wind power on
the one hand, and on the split between
means of transport and the proportion
of transport by bicycle. In 2011, the City
of Essen already pooled its entire climate
protection activities under the aegis of the
klima|werk|stadt|essen project. The success of the City of Essen in achieving its
targets is reviewed annually on the basis
of the IECC balance report, and bi-annually on the basis of the greenhouse gas
report. Corresponding targets and principles were defined in the regional zoning
plan, which also specified priority zones
for wind power. The City of Essen not only
actively engages in climate protection,
but also investigates climate changes and
their implications for the city as a whole
and develops strategic options for adapting to climate change. The guidelines for
energy-optimised urban planning is now
used to evaluate nearly all residential development plans on the optimisation of
energy consumption.
A senhora poderia citar outros
exemplos práticos de ações e
projetos implementados em Essen
que contribuíram para a mudança do
desenvolvimento urbano em direção à
sustentabilidade?
Could you give us other practical
examples of projects and measures
implemented in Essen that have
contributed to change urban
development towards sustainability?
•
“Torne sua vida verde” é nosso lema para o
ano de Essen como a Capital Verde da Euro-
•
“Green up your life” is our motto for Essen’s year as the European Green Capital.
Our city offers many surprises that would
entrevista interview
24
pa. Essen oferece surpresas que não seriam
esperadas no centro de uma área metropolitana com forte herança industrial como a
nossa. Vejam nossos rios Ruhr e Emscher,
por exemplo. O Ruhr, ao sul, destacou-se
como o primeiro rio utilizado industrialmente na Europa que foi tratado e voltou a oferecer condições de balneabilidade. Em maio
de 2017, inauguramos um ponto oicial de
banho, que rapidamente se tornou um local popular. Até mesmo o salmão retornou
ao Ruhr, que agora também abastece toda a
região com água potável de qualidade. O rio
Emscher, ao norte, que costumava ser considerado biologicamente morto, agora está
sendo renaturalizado e devolvido ao público.
“Essen – novos caminhos para a água” é
outro projeto centrado na sustentabilidade. Na última década, 150 km de passarelas
not be expected in the heart of a metropolis
with an industrial legacy as ours. There are,
for example, two rivers that run through
Essen. The river Ruhr in the south made
headlines as the irst industrially used river in Europe that has been cleaned up and
can now be used for swimming again. We
opened an oficial swimming spot in May
2017, which has quickly become a popular
feature. And even the salmon has returned
to the Ruhr, which also supplies the entire
region with high-quality drinking water.
The river Emscher, which runs through the
city’s north and used to be biologically dead,
is now being renaturalised and returned to
the public.
“Essen - new ways to the water” is another project focused on sustainability. The
last decade saw 150 km of walkways and
cadernos fgv projetos
25
para pedestres e ciclovias foram construídos
na região entre o Vale do Emscher, ao norte,
e o Vale do Ruhr, ao sul. Essa nova infraestrutura eliminou efetivamente a separação
norte-sul dentro da cidade. Nos últimos dez
anos, o desenvolvimento urbano verde foi a
grande força por trás do desenvolvimento da
nossa cidade. Isso signiica que a criação de
áreas verdes, extensões de água, passarelas
e ciclovias – que foram geradas como uma
rede de conexão entre distritos e regiões –
foi o ponto de partida para o êxito do desenvolvimento urbano de áreas mais amplas,
no âmbito de uma estratégia de adaptação
integrada às mudanças climáticas.
cycle paths being constructed in the area between Emscher Valley in the north and the
Ruhr Valley in the south. This new infrastructure has effectively eliminated the separation between north and south within the
City of Essen. For the last ten years, green
urban development was the driving force
behind our city’s urban development. This
means that the creation of green areas, expanses of water, walkways and cycle paths,
which were created as a network connecting
the districts and regions, was the starting
point for the successful urban development
of larger areas in the sense of a strategy for
integrated adaptation to climate change.
É importante que os governos locais
estabeleçam diálogos com outras
esferas governamentais (nacional,
regional e estadual, por exemplo). A
senhora poderia apontar como se dá a
interação da municipalidade de Essen
com outras instâncias governamentais
em termos de desenvolvimento
sustentável?
It is important that local governments
engage with different spheres of
governments (national, regional
and metropolitan). Could you point
out how does Essen’s municipality
dialogue with other spheres of
government regarding sustainable
development?
•
A cidade de Essen está fortemente interconectada dentro de sua região. Nós consideramos nosso ano como Capital Verde da Europa como o prenúncio de uma década verde
para toda a região: a conversão do Emscher
será concluída em 2020, a região receberá a
apresentação dos resultados da KlimaExpo.
NRW em 2022, e a proposta da região para a
International Horticultural Exhibition 2027
foi recebida com êxito. O ano como Capital
Verde nos dará a oportunidade de viver ricas
experiências, que serão valiosas para o futuro
verde de toda a região. Nossa região se uniu
mais durante o período em que Essen igurou como a Capital da Cultura – somos au-
•
The City of Essen is tightly interconnected
within the region. We consider our year as
European Green Capital as the prelude to a
green decade for the entire region: The Emscher conversion will be completed in 2020,
the results presentation of the KlimaExpo.
NRW will be hosted in 2022, and the region’s
bid for the International Horticultural Exhibition 2027 was announced successful in
December. The year as Green Capital will
allow us to collect valuable experiences that
may be important for the green future of the
entire region. Our region also converged
during our city’s tenure as the Capital of
Culture – we are autonomous as a city, yet
see ourselves as part of the Ruhr Metropolis.
entrevista interview
26
tônomos como cidade, mas nos vemos como
parte da Metrópole do Ruhr. Nosso ano como
Capital Verde da Europa tem o apoio tanto do
governo estadual da Renânia do Norte-Vestfália
como do governo federal em termos de recursos
inanceiros e relacionados a conteúdo. Acredito
que uma cooperação estreita é essencial para alcançar e consagrar nossos objetivos ambientais.
Como Capital Verde, nós tomamos a missão de
sermos um exemplo para outras cidades, tanto
dentro como fora da Alemanha, que ainda estão por aperfeiçoar essa importante mudança
estrutural. Nós também estamos fazendo parte
de várias redes internacionais e receberemos visitantes de todo o mundo.
Our year as Green Capital is supported by both the state government of North
Rhine-Westphalia and the federal government in terms of financial resources as
well as related to content. I believe that a
close cooperation is crucial to achieve and
enshrine our environmental objectives.
This is because as the Green Capital, we
take our mission of being a role model
for other cities, which are yet to master
the structural change, very serious, both
within and beyond Germany. We are also
participating in various international
networks and will welcome visitor groups
from all over the world.
Como os cidadãos têm participado
na transformação da cidade industrial
rumo à sustentabilidade e de que
forma a prefeitura de Essen tem
procurado engajar a sociedade na
promoção da sustentabilidade?
How have citizens participated in
the transformation of the industrial
city towards sustainability and how
does Essen’s municipality seek to
engage society in the promotion of
sustainability?
• Devemos a honra de termos recebido o títu- •
lo de Capital Verde da Europa aos incontáveis
indivíduos que defendem a noção de
sustentabilidade e que levam carinhosamente a
visão verde de Essen em seus corações e mentes.
Muitos dos avanços alcançados nos últimos
30 anos contribuíram para que a nossa cidade
comemorasse um destaque especial em 2010:
a Capital Europeia da Cultura. Essen celebrou
aquele ano com mais de 2.500 eventos e com
cerca de 300 projetos, que serviram de estímulo para novos avanços. Nossa cidade colhe os
frutos dessa honraria até hoje. As experiências
vividas naquela ocasião moldaram uma nova
impressão da cidade aos olhos dos próprios habitantes de Essen. Agora estamos empenhados
em entusiasmar nossos cidadãos com a noção e
o título de Capital Verde da Europa. Queremos
We owe the honour of being awarded
the title “European Green Capital” to the
countless individuals advocating the notion of sustainability and fondly carrying
Essen’s green vision in their hearts and
minds. Many of the developments over
the past 30 years contributed to our city
celebrating a special highlight in the year
2010: The European Capital of Culture.
The city celebrated the year with 2,500
events and around 300 projects that provided stimulus for new developments and
our city continues to reap the rewards until today. The experiences collected during
this time have shaped a new impression of
Essen in the inner eye of the city’s citizens.
We now set out to enthuse our citizens for
the notion and title of the European Green
cadernos fgv projetos
27
mostrar nosso trabalho e a qualidade de vida da
nossa cidade para eles, para as muitas pessoas
que vivem na região, na Alemanha e em todo o
mundo. Fazendo assim, coniamos que nossos
cidadãos se juntarão a nós nos esforços para vivermos essa honra que nos foi concedida. Aproximadamente 200 projetos elaborados por eles
receberão inanciamento e serão implementados, contando com a contribuição de mais de
150 voluntários para o sucesso da sua Capital
Verde. O fato de tantos cidadãos decidirem se
envolver ativamente mostra como eles são apaixonados por sua cidade verde e como apoiam
essa mudança estrutural.
Capital and to showcase our city’s quality
of life and work to them and many other
people living in the region, in Germany
and around the world. In doing so, we
rely and count on the citizens of our city to
join us in our efforts to live up the honour
bestowed upon us. Approx. 200 citizens’
projects will be assisted with funding and
implemented, with more than 150 volunteers contributing to the success of their
Green Capital. The fact that so many of
the city’s citizens chose to become actively
involved illustrates that they are passionate about their green city and that they
support its structural change.
entrevista interview
28
Quais são os principais planos e metas
para o futuro da cidade em relação à
sustentabilidade?
What are Essen’s main plans and
goals for the future concerning
sustainability?
• A cidade de Essen tem metas ambiciosas: •
nós desejamos continuar a bem-sucedida
transformação da nossa cidade, em razão da
qual recebemos uma distinção da Comissão
Europeia. Essen continuará avançando na
busca para ser uma cidade com mais equilíbrio social, mais cuidado com o clima, mais
resiliência e menos emissões de carbono, com
o objetivo de oferecer uma alta qualidade de
vida para seus cidadãos. Alguns de nossos
planos são: ter 20 mil empregos relacionados
ao meio ambiente até 2025, dobrar o número
de jardins comunitários para 20 até o inal de
2017; continuar a trabalhar na redução das
emissões de óxido de nitrogênio.
Na sua concepção, quais são os
principais desafios para as cidades
de países em desenvolvimento,
como o Brasil e os outros integrantes
dos BRICs, para se tornarem mais
sustentáveis? Que áreas devem
ser priorizadas?
•
Nós acreditamos que as cidades precisam
fazer da proteção climática sua prioridade,
principalmente as megacidades como Rio de
Janeiro e São Paulo. Estamos lidando com
uma questão de magnitude existencial: as cidades do futuro ainda serão habitáveis? Temos passado por ondas de calor, inundações
The City of Essen has indeed set itself
ambitious goals – we aspire to continue
the successful transformation our city was
distinguished for by the EU Commission.
Essen will continue to develop itself into
a city that will be even more socially balanced, climate-friendly, low-carbon and
resilient in the future, offering its citizens
a high quality of life. Here are a few examples: We aspire to have 20,000 environmental jobs in Essen by 2025, we propose
to double the number of community gardens to 20 by the end of 2017 and we will
continue to work on reducing nitrogen oxide emissions.
From your point of view, what are
the main challenges for cities from
developing countries such as Brazil
and other Brics to become more
sustainable and what areas should
be prioritized?
•
We believe that the cities need to make
climate protection a top priority - especially in megacities such as Rio de Janeiro and
Sao Paulo. We are dealing with a question of
existential magnitude: will the cities of the
future still be habitable? Heatwaves, looding – to mention only two of the very real
threats we are facing. The effects of climate
cadernos fgv projetos
29
– para citar apenas duas das ameaças reais de
nossos tempos. Os efeitos das mudanças climáticas são palpáveis e causam implicações
em nossas interações sociais. As cidades têm
uma grande oportunidade, assim como responsabilidade, de realizar mudanças verdadeiras: a dimensão absoluta de uma metrópole indica que até mesmo o menor avanço
causa um vasto impacto direto sobre o nosso
planeta. Estou convencida de que as cidades
devem ser a fonte de ações efetivas para a
proteção do clima.
•
change are very real and not without implications for our social interactions. The cities
have the great opportunity, as well as responsibility, to implement real changes: The
sheer dimension of a metropolis means that
even the smallest improvement will make a
vast direct impact on our planet. I am convinced that the cities must be the source of
effective climate protection action.
•
DEPOIMENTO TESTIMONIAL
MARILENE
RAMOS
Diretora do BNDES e professora da Ebape/FGV
Director at BNDES and professor at Ebape/FGV
Doutora em engenharia do meio ambiente e engenheira civil pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro. Possui especialização em gestão ambiental, saneamento e gestão de recursos hídricos.
Atualmente, é diretora das áreas de Energia, Gestão Pública e Socioambiental, Saneamento e
Transporte do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, e professora da Escola
Brasileira de Administração Pública e Empresas da Fundação Getulio Vargas. Foi presidente
do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, bem como do
Instituto Estadual do Ambiente.
Graduated in Civil Engineering from the Rio de Janeiro Federal University, later gaining
a PhD in Environmental Engineering, as well as specialist postgraduate qualiications in
Environmental Management, Sanitation and Water Resource Management. She is currently
Director for Energy, Public and Socioenvironmental Management, Sanitation and Transport
at the National Social and Economic Development Bank and Professor at the Fundação
Getulio Vargas’ Brazilian School of Public and Business Administration. Previously, she was
President of the Brazilian Environment and Renewable Natural Resource Institute and the
Rio de Janeiro State Environment Institute.
Neste depoimento, Marilene Ramos fala sobre o papel do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para inanciar uma infraestrutura
urbana com foco em sustentabilidade, principalmente nas áreas de eiciência
energética, saneamento básico e mobilidade urbana. Segundo ela, os impactos
socioambientais de cada projeto são levados em consideração pelo banco para a
concessão de crédito e o estabelecimento de taxas de juros e prazos de pagamento,
buscando-se priorizar e oferecer condições mais favoráveis àqueles que produzam
resultados mais amplos e positivos para a sociedade e para o meio ambiente. Além
do aporte de recursos, Marilene Ramos chama atenção para o fato de o BNDES
atuar como um indutor de boas práticas socioambientais e como estruturador de
concessões e de parcerias público-privadas.
Marilene Ramos talks here about the role of Brazil’s National Social and
Economic Development Bank (BNDES) in inancing sustainability-focused
urban infrastructure, particularly in the ields of energy eficiency, basic
sanitation and urban mobility. She explains that the bank considers each project’s
socioenvironmental impacts when granting credit and setting interest rates and
payment timeframes, in an effort to prioritise and offer more favourable conditions
to those that yield outcomes that are more broadly beneicial to society and the
environment. In addition to funding, she highlights the BNDES’s role in promoting
socioenvironmental best practices and in structuring concessions and publicprivate partnerships.
C
omo instituição inanceira, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
e Social (BNDES) está submetido a uma legislação que o obriga a observar requisitos
ambientais em todos os seus inanciamentos
e projetos. Entretanto, longe de restringir-se
ao simples atendimento das leis e das regulações do Banco Central, o BNDES possui uma
política de responsabilidade socioambiental
que se propõe a ser mais abrangente, possibilitando o aprofundamento do olhar sobre as
questões sociais e ambientais.
Ao aperfeiçoar sua política de responsabilidade socioambiental e as exigências em relação aos projetos que inancia, o BNDES desempenha um importante papel de indutor,
na medida em que impulsiona todo um conjunto de atores a adequar e a aprimorar suas
próprias políticas sociais e ambientais para
poder trabalhar com o banco, promovendo,
assim, uma reação em cadeia que envolve
uma ampla rede de clientes e fornecedores.
Por outro lado, para se pensar o papel do
banco no desenvolvimento de infraestruturas
urbanas mais sustentáveis, é preciso considerar outro importante foco institucional:
a prioridade dada na locação de recursos. O
BNDES busca inanciar a taxas menores e
a prazos mais lexíveis projetos que tragam
maior retorno socioambiental e contribuam
para tornar as cidades mais sustentáveis,
como aqueles voltados para eiciência ener-
A
s a financial institution, the National Social and Economic Development
Bank (BNDES) is subject to legislation requiring that all its funding and projects
meet environmental prerequisites. However, far from limiting itself to simple
compliance with the law and Central Bank
regulations, the BNDES’ socioenvironmental responsibility policy is designed
to be comprehensive, making for a more
in-depth approach to social and environmental concerns.
By upgrading its socioenvironmental responsibility policy and the requirements of
the projects it inances, the BNDES plays an
important leading role, in that it drives a
whole series of stakeholders to adjust and
improve their own social and environmental policies in order to be able to work with
the bank, thus setting in motion a chain reaction involving a far-lung network of clients and suppliers.
Meanwhile, in thinking about the bank’s
role in the development of more sustainable
urban infrastructures, another important
institutional focus to be considered is its
fund allocation priority-setting. The BNDES
endeavours to offer lower interest rates and
more lexible timeframes when inancing
projects, such as those directed to energy
eficiency, basic sanitation, urban mobility
and so on, that yield greater socioenviron-
cadernos fgv projetos
33
gética, saneamento básico, mobilidade urbana, entre outros.
Em maio de 2017, o BNDES tornou-se o
primeiro banco brasileiro a fazer a emissão
de títulos verdes – os green bonds – no mercado internacional. Esses papéis possuem
características semelhantes aos bonds convencionais, com a particularidade de que os
recursos obtidos devem inanciar projetos
ambientalmente sustentáveis. O BNDES captou um bilhão de dólares com os green bonds,
superando a expectativa inicial de atrair metade desse valor. Apesar de o banco possuir
recursos disponíveis, a busca de funding internacional foi importante não só para que o
banco voltasse ao mercado, uma vez que não
realizava nenhum tipo de emissão de bonds
desde 2014, como também pelo fato de seu
risco ter sido bem avaliado pelo mercado externo, o que agrega valor à instituição.
Além de inanciar, o BNDES atua como
fonte de apoio técnico para estruturação de
concessões e Parcerias Público-Privadas
(PPPs) em diversas áreas, entre elas as de iluminação pública e saneamento, trazendo, assim, o setor privado para auxiliar na redução
do deicit de infraestrutura em diversos municípios brasileiros. O banco funciona como
uma espécie de Project Management Ofice
(PMO) desses processos, sendo responsável
pela modelagem e estruturação de PPPs nos
âmbitos federal, estadual e municipal.
mental returns and contribute to making
cities more sustainable.
In May 2017, the BNDES became the
first Brazilian bank to issue green bonds
on the international market. These papers
have characteristics similar to those of
conventional bonds, with the special feature that the funds so raised are earmarked
for financing environmentally sustainable
projects. The BNDES raised one billion
dollars with green bonds, surpassing the
initial expectation of attracting half that
amount. Although the bank had funds in
hand, it was important to seek international funding not only to mark the bank’s
return to the market (it had made no bond
issues of any kind since 2014), but also because related risk assessment by the external market was good, adding value to the
institution.
In addition to its inancing, the BNDES
acts as a source of technical support for
structuring concessions and public-private
partnerships (PPPs) in a variety of areas,
including street lighting and sanitation,
thus engaging the private sector to assist in
reducing infrastructure deicits in a number
of Brazil’s municipalities. In these processes, the bank functions as a kind of project
management ofice, taking responsibility for
modelling and structuring PPPs at the federal, state and municipal levels.
depoimento testimonial
34
EFICIÊNCIA ENERGÉTICA
“
Graças ao
investimento
realizado, em um
intervalo de 15
anos, a energia
eólica passou
a representar
cerca de 7% da
matriz energética
brasileira,
chegando à
produção de 11
gigawatts nos
dias de hoje.
”
Em termos de investimentos em infraestrutura para cidades mais sustentáveis, uma
das frentes de atuação do BNDES é na área
de energia. Em 2016, o banco anunciou sua
nova política de inanciamento para o setor
elétrico, aumentando sua participação no
aporte de recursos voltados para a energia
solar e dando prioridade às fontes renováveis alternativas, além de não inanciar mais
energia a carvão e a óleo.
Seguindo essa direção, foi aprovado recentemente o primeiro inanciamento para uma
grande usina de energia solar. A expectativa
é de que essa modalidade energética percorra
o mesmo caminho trilhado pela energia eólica, cuja geração passou a ser incentivada pelo
governo federal no início dos anos 2000 devido à então crise energética no país. O BNDES
apoiou quase a totalidade dos projetos desse
período, com taxas de juros melhores que as
do mercado, no intuito de fazer essa cadeia
produtiva crescer.
Houve o fomento para que equipamentos
necessários à geração de energia eólica – pás,
rotores, hélices, entre outros – passassem a
ser fabricados no Brasil. O banco inancia a
cadeia produtiva como um todo, desde a produção do maquinário até a geração de energia, incluindo a parte de inovação tecnológica. Graças ao investimento realizado, em um
intervalo de 15 anos, a energia eólica passou
a representar cerca de 7% da matriz energética brasileira, chegando à produção de 11
gigawatts nos dias de hoje. Esse número continua crescendo e a previsão é de que novos
parques entrem em operação.
Agora é o momento de concentrar esforços
na energia solar e aproveitar o alto potencial do
país para a sua geração. Para que se tenha uma
ideia, no Brasil, o lugar onde há menor irradia-
cadernos fgv projetos
35
ENERGY EFFICIENCY
One of the fronts where the BNDES is investing actively in infrastructure for more
sustainable cities is energy. In 2016, the
bank announced its new financing policy
for the electric sector, increasing its share
of funding for solar energy and prioritising alternative renewable sources, in addition to no longer financing energy from
coal and oil.
In that same direction, funding was approved for the first time for a major solar power plant. The expectation is that
this energy source will take the same path
as blazed by wind generation, for which
the federal government started offering
incentives in the early 2000s during the
energy crisis in Brazil at the time. The
BNDES supported practically all the projects of that period, at better-than-market
rates of interest and with the intention of
encouraging growth in the related production chain.
Funding was provided for the equipment necessary for wind power generation
– blades, rotors, helical rotors and so on –
to be manufactured in Brazil. The bank finances the overall production chain, from
manufacture of the machinery to power
generation as such, including the technological innovation component. Thanks
to these investments, in a 15-year period, wind power generation has reached
11 Gigawatts, today representing around
7% of Brazil’s energy matrix. This number
continues to rise and new wind farms are
scheduled to come into operation.
Now is the time to concentrate efforts in
solar power and in harnessing Brazil’s high
generation potential. To give you some idea,
the site in Brazil that receives least solar ir-
“
Thanks to these
investments, in
a 15-year period,
wind power
generation
has reached 11
Gigawatts, today
representing
around 7% of
Brazil’s energy
matrix.
”
depoimento testimonial
36
ção solar tem potencial energético 40% superior ao local na Alemanha que registra o maior
índice de irradiação. No entanto, os alemães
possuem 30% de sua matriz energética solar,
ao passo que no Brasil essa participação representa menos que 1%. Por isso, o BNDES tem
aumentado seus investimentos na área e já tem
projetos aprovados de apoio à sua cadeia produtiva, como o de fabricação de painéis fotovoltaicos. Paralelamente, tem buscando incentivar
uma política de nacionalização progressiva dos
equipamentos de geração de energia solar mediante a oferta de melhores condições de inanciamento. Se um projeto possui uma grande
parcela de itens importados, o banco não consegue inanciá-lo utilizando a Taxa de Juros de
Longo Prazo (TJLP), por exemplo.
Ademais, ainda que haja críticas no setor
elétrico de que as energias eólicas e solar são
intermitentes e de que agregam complexidade ao sistema, isso pode ser resolvido pela
radiance has 40% greater energy potential than the site with the highest radiation index in Germany. Nonetheless, the
Germans’ energy matrix is 30% solar,
while in Brazil solar energy accounts for
less than 1%. That is why the BNDES has
boosted its investments in this area and
is now approving projects to support the
solar production chain, such as manufacture of photovoltaic panels. In parallel, it
is seeking to encourage a policy of progressive nationalisation of solar power
generation equipment by offering better
financing conditions. If a project comprises a large portion of imported items, the
bank will not be able to finance it at the
TJLP long-term interest rate, for example.
Even though there are criticisms in the
electricity sector that wind and solar power are intermittent and heighten system
complexity, this can be solved by technol-
cadernos fgv projetos
37
tecnologia e pelo emprego de boas técnicas,
e não tido como um fator que limite o desenvolvimento dessas fontes abundantes no
país. É fundamental pensar na composição
da matriz energética nacional e que ela deve
ser operada com toda a segurança necessária
para o desenvolvimento brasileiro. Por outro
lado, as áreas onde está localizada a maior
parte do potencial eólico e solar correspondem às mais pobres do país, como o semiárido nordestino. Nessa região, os investimentos do BNDES representam alternativas de
desenvolvimento regional e geração de renda
e empregos, o que faz com que o impacto social desses projetos seja muito elevado.
Em conjunto com os Ministérios de Minas e Energia e do Meio Ambiente, o banco
também está buscando fomentar projetos
de geração de energia a partir da biomassa
florestal e do lixo, procurando adotar uma
política de financiamento agressiva, com
taxas de juros atrativas e prazos de financiamento adequados.
Na concepção do BNDES, a utilização de
biomassa lorestal traz não só o benefício de
ser uma fonte renovável, como também ajuda
o Brasil a promover, até 2030, o relorestamento de 12 milhões de hectares de lorestas
nativas e comerciais, conforme estabelecido
no Acordo de Paris, tratado irmado em 2015,
no âmbito da Convenção-Quadro das Nações
Unidas sobre a Mudança do Clima, que visa à
redução de emissão de gases de efeito estufa.
Já em relação a projetos de geração de
energia a partir do lixo, o banco acredita que, com o uso da tecnologia, é possível
transformar diretamente o lixo em energia
sem passar pelo aterro sanitário, que receberá apenas o resíduo inal. Além de viável, esse
caminho trará ganhos ambientais e sociais,
principalmente se estiver associado à reciclagem de parcela expressiva do lixo coletado.
ogy and by applying good technique, and
should not be seen as a limiting factor on
development of these abundant sources
in Brazil. What is fundamental is to think
about the composition of the national
energy matrix, which must be operated
with all the security necessary for Brail’s
development. On the other hand, the areas where most of the wind and solar
potential is located, such as the semiarid
northeast, are also the country’s poorest.
In that region, BNDES investments represent regional development, income generation and job creation alternatives, which
means these projects have very strong social impact.
Jointly with the Ministry of Mines and
Energy and the Ministry of the Environment, the bank is also seeking to foster
projects in energy generation from forest
biomass and solid waste, endeavouring to
adopt a policy of aggressive financing at
attractive rates of interest and to appropriate timeframes.
The BNDES’ conception is that use of forest
biomass offers the beneit not only of being a
renewable source, but also of helping Brazil
to implement, by 2030, the reforestation of
12 million hectares of native and commercial
forests, as stipulated in the Paris Agreement,
a treaty signed in 2015, as part of the United
Nations Framework Convention on Climate
Change, which is intended to reduce greenhouse gas emissions.
As regards projects in power generation
from solid waste, the bank believes it is possible to turn garbage directly into energy
without going through sanitary landills,
which would receive only the inal residue.
Besides being feasible, this pathway will
yield environmental and social gains, particularly if associated with recycling of a
depoimento testimonial
38
Hoje, os aterros sanitários recebem cerca de
60% dos resíduos produzidos, sendo que os
40% restantes são despejados em lixões. Ao
mesmo tempo em que esses depósitos estão
chegando ao im de suas vidas úteis, há uma
resistência cada vez maior para a construção
de novos aterros devido aos impactos que
promovem. A alternativa de geração energética a partir do lixo contribui para o im dos
lixões, evitando, assim, a degradação do solo,
a contaminação dos lençóis freáticos e a proliferação de doenças e de seus vetores.
SANEAMENTO BÁSICO E
MOBILIDADE URBANA
Na área de infraestrutura das cidades, o
BNDES tem também como foco o saneamento básico, dado o enorme deicit desses serviços no país, tanto no que diz respeito ao abastecimento de água quanto na parte de coleta
e tratamento de esgoto. O banco está dando
suporte técnico a prefeituras e a governos estaduais para modelar concessões nessa área,
promovendo-se, assim, a efetiva universalização do saneamento e, consequentemente, a
melhoria na qualidade de vida. Com essa atuação, o banco busca assegurar um pipeline
de novos projetos de saneamento que serão
inanciados no futuro.
Outra contribuição para o inanciamento
de estruturas urbanas mais sustentáveis diz
respeito à mobilidade urbana, sobretudo no
tocante a transporte de massa. O BNDES
prioriza projetos de alta capacidade, fornecendo taxas melhores e prazos mais extensos. O banco inanciou praticamente todos
os atuais projetos de metrô do país, apoiando a expansão metroviária em Salvador e a
implantação de novas linhas em São Paulo
e no Rio de Janeiro, onde também investiu
signiicant proportion of the waste collected.
Today, sanitary landills receive nearly 60%
of all waste produced, while the remaining
40% is discharged at dumping sites. At the
same time as these facilities are reaching the
end of their useful lives, there is mounting
resistance to the construction of new landills, in view of the impacts they cause. The
alternative of generating power from solid
waste will contribute to the passing of garbage dumps, thus averting soil degradation,
contamination of groundwater and proliferation of diseases and their vectors.
BASIC SANITATION AND URBAN
MOBILITY
In relation to city infrastructure, the
BNDES is also focussing on basic sanitation, given Brazil’s enormous deficits in
these services, both provision of drinking
water and sewage collection and treatment. The bank is providing technical
support to city and state governments in
modelling concessions in this area, thus
helping to universalise sanitation and,
as a result, improve quality of life. In this
way, the bank is seeking to assure a pipeline of new sanitation projects to be financed in the future.
Another of the bank’s contributions to
financing more sustainable urban structures is directed to urban mobility, especially mass transit. The BNDES is prioritising high-capacity projects by offering
better rates and longer maturities. The
bank has financed practically all Brazil’s
current rapid transit projects, supporting
expansion of the metro network in Salvador and the introduction of new lines in
São Paulo and in Rio de Janeiro, where
cadernos fgv projetos
39
depoimento testimonial
40
no Veículo Leve sobre Trilhos (VLT). Foram
projetos inanciados com baixa taxa de juros
e prazos compatíveis – alguns, em torno de
30 anos –, condições de inanciamento que o
mercado não tem condições de oferecer.
O grau dos impactos socioambientais gerados é levado em consideração, de modo a priorizar e a favorecer o inanciamento de projetos
com maior capacidade, ou seja, aqueles que
beneiciem um número maior de pessoas e que
trabalhem com emissões menores, ou mesmo
nulas, de poluentes. Assim, um projeto de Bus
Rapid Transit (BRT), por ser um meio de transporte de capacidade média e emitir poluentes,
não recebe condições de inanciamento tão favoráveis quanto as de um projeto metroferroviário. A mesma lógica aplica-se ao inanciamento de ônibus, nos quais os veículos elétricos ou
biarticulados têm um prazo de inanciamento
maior, que pode chegar a nove anos.
Todos os projetos que almejam inanciamento do BNDES passam por uma avaliação
na fase de enquadramento, na qual se utiliza
uma metodologia que analisa diferentes dimensões, como a social, a ambiental, a econômica, entre outras. Cada dimensão recebe
uma nota, que, quanto mais alta for, melhores serão as condições de inanciamento concedidas. Essa avaliação passa pelo comitê de
crédito do banco, que indica para a equipe de
análise as lacunas que podem ser aperfeiçoadas. É possível negociar e sinalizar para o
empreendedor que a realização de determinados ajustes, mesmo que não seja obrigatória, pode melhorar a percepção de risco da
empresa e a linha de crédito dada a ela.
Em resumo, o banco atua de três maneiras principais em prol do desenvolvimento
urbano com foco em sustentabilidade: como
animador da cadeia econômica, no sentido
de buscar que os seus clientes e fornecedores tenham práticas socioambientais mais
it also invested in the VLT light rail system. These projects were financed at low
rates of interest and over compatible timeframes (some around 30 years), the kind
of conditions the market is in no position
to offer.
It also takes into consideration the extent
of the socioenvironmental impacts the projects will generate, so as to favour and prioritise inancing for higher-capacity projects,
that is, those that beneit the largest number
of people and operate with least or even no
emission of pollutants. Accordingly a Bus
Rapid Transit system – as it is a medium-capacity means of transport and does emit
pollutants – will not receive inancing under
such favourable conditions as a metro rail
project. The same logic applies to inancing
for buses: here, electric or bi-articulated vehicles are entitled to longer inancing terms
of up to nine years.
All projects aspiring to BNDES inancing undergo assessment at the scoping stage, where
the analysis methodology examines a number
of different dimensions, including social, environmental, economic and other concerns. Each
dimension receives points and, the higher the
score, the better the loan conditions that are
granted. This assessment is submitted to the
bank’s credit committee, which indicates to the
assessment team where there is room for improvement. It is then possible to negotiate with
the entrepreneurs involved and signal that by
making certain adjustments, even though these
are not mandatory, they can improve risk perceptions and thus the line of credit extended to
the company.
In summary, the bank operates in three
main ways in favour of sustainability-focussed urban development: as a catalyst of
the economic chain, with a view to assuring its clients and suppliers apply more sus-
cadernos fgv projetos
41
sustentáveis; como inanciador, ao priorizar
recursos de longo prazo a uma taxa baixa,
para inanciar projetos de elevado retorno
socioambiental; e como estruturador de concessões e PPPs, para ampliar a oferta dos serviços nessas áreas. Dessa forma, o BNDES
procura cumprir sua missão de contribuir
para o desenvolvimento econômico e social
do país, alinhado com a sustentabilidade.
•
tainable socioenvironmental practices; as a
source of inancing, by prioritising long-term
funding at low rates of interest in order to
inance projects with high socioenvironmental return; and as a structurer of concessions
and PPPs, in order to expand supply of services in these areas. In this way, the BNDES
endeavours to fulil its mission of contributing to Brazil’s sustainability-aligned economic and social development.
•
DEPOIMENTO TESTIMONIAL
ELIZABETH YEE
Vice-presidente de Soluções para Cidades do programa 100 Resilient Cities
Vice President of City Solutions at 100 Resilient Cities
Formou-se na Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, onde estudou relações
internacionais e alemão. Atualmente, é vice-presidente de Soluções para Cidades do
programa 100 Resilient Cities (em português, 100 Cidades Resilientes), sendo responsável
pela supervisão das funções de implementação, operações e pesquisa globais. Antes de entrar
no 100 Resilient Cities, trabalhou em banco, na área de inanciamento público, atuando junto
a cidades e a agências municipais e estaduais norte-americanas, para desenvolver e executar
estratégias de inanciamento em infraestrutura. Também foi uma das responsáveis por liderar
práticas de pensão e benefícios pós-emprego dos bancos Barclays e Lehman Brothers.
Graduated from University of Pennsylvania, United States, where she studied International
Relations and German. Currently, she is Vice President of City Solutions at 100 Resilient
Cities, and is also responsible for overseeing the global delivery, operations and research
functions. Prior to joining 100 Resilient Cities, she was a public inance banker working with
U.S. cities, and municipal and state agencies, to develop and execute inancing strategies
related to infrastructure. She was also jointly responsible for leading the pension and postemployment beneits practice at Barclays and Lehman Brothers.
Auxiliar cidades ao redor do mundo a tornarem-se mais resilientes frente aos
desaios sociais, econômicos e ambientais do século XXI é o principal objetivo do
100 Resilient Cities, programa sem ins lucrativos com escopo de atuação global. Em
seu depoimento, Elizabeth Yee explica o trabalho desenvolvido pela iniciativa e o que
ela oferece às suas cidades-membros para fomentar a resiliência. Além disso, aponta
quais são alguns dos principais desaios urbanos contemporâneos, que, segundo
ela, são muito parecidos, apesar das especiicidades locais. Elizabeth Yee defende a
importância do estabelecimento de uma rede internacional de contatos pela qual seja
possível partilhar soluções e estratégias.
The main objective of 100 Resilient Cities, a nonproit program working globally, is
to help cities around the world to address the social, economic, and environmental
challenges of the 21st century. In her testimonial, Elizabeth Yee explains the
work carried out by this initiative and what it offers to its member cities to foster
resilience. In addition, she lists some of the main contemporary urban challenges
which, according to her, are very similar, despite local speciicities. Elizabeth Yee
argues for the importance of establishing an international contact network to share
solutions and strategies.
O
programa 100 Resilient Cities (em português, 100 Cidades Resilientes) foi criado
em 2013 pela Fundação Rockefeller, para comemorar o centenário da instituição. Nosso foco é
ajudar cidades em todo o mundo a desenvolver
resiliência frente aos desaios suscitados pelas
pressões do século XXI no tocante à urbanização, globalização e mudança climática.
Nossa deinição de resiliência é muito holística e ampla. Observamos a capacidade das cidades de sobreviverem, prosperarem e crescerem
frente não só aos estresses cotidianos, como
também aos impactos intermitentes, tais como
terremotos e outros desastres naturais. Também temos uma perspectiva multigeracional,
reletindo sobre o que precisamos fazer nos próximos anos para desenvolver resiliência a longo prazo. A resiliência considera essa visão de
uma cidade holística, na qual olhamos todos os
fatores conjuntamente, e como é possível otimizar as interseções entre os diferentes sistemas e
áreas do desenvolvimento.
Em nosso trabalho, pensamos sobre todos
os diferentes cobenefícios que podem ocorrer
por intervenções especíicas. Por exemplo, se
estão construindo uma rua numa cidade, é importante reletirmos sobre de que maneiras sua
infraestrutura pode ser utilizada para conectar
pessoas de um ponto a outro e também como
poderá ser feita a drenagem de águas pluviais
por meio de pavimentação permeável. As ruas
de uma cidade também podem ser pensadas e
usadas como mecanismos multitransporte, não
T
he 100 Resilient Cities program was
founded in 2013 by the Rockefeller
Foundation in celebration of its centennial.
We focus on helping cities around the world
build resilience to the challenges posed by
the 21st Century pressures of urbanization,
globalization and climate change.
Our deinition of resilience is very holistic and broad. We look at the capacity of
cities to survive, thrive and grow in the face
of the stresses they deal with every day, as
well as intermittent shocks like earthquakes
and other natural disasters. We also have
a multi-generational perspective, thinking
about what we need to do in the next years
to build resilience in the long term. Resilience takes this view of a holistic city in
which we look at all of the factors together
and how it is possible to optimize the intersections that occur between the different
systems and areas of development.
In our work, we think about all of the different co-beneits that can occur because of
speciic interventions. For example, if you
are building a road in a city, it is important to relect on the ways its infrastructure
can be used to connect people from point to
point and also how it can provide sustainable storm water drainage through permeable pavement. City roads can be thought of
and used as multi-transport mechanisms as
well, not just for cars, but also for buses and
cadernos fgv projetos
45
somente para carros, mas também para ônibus
e bicicletas. Ao planejar a rua, é possível ainda
expandir a conectividade de internet.
A resiliência busca criar valores e benefícios
múltiplos por meio de intervenções individuais.
Assim, para desenvolvê-la, escolhemos 100
cidades, representando 49 países diferentes,
dentre as 1.100 solicitações de cidades que recebemos. Atualmente, trabalhamos com uma população de cerca de 322 milhões de pessoas, que
esperamos estar afetando positivamente. Oferecemos às cidades que fazem parte de nosso programa quatro tipos distintos de intervenções.
A primeira é uma doação para a contratação de um Chefe Executivo de Resiliência (CER), uma pessoa logo abaixo do
prefeito, que desenvolve uma ação transversal em toda a cidade para identificar os
desafios urbanos e desenvolver iniciativas
para enfrentá-los. Isso é feito com nossa
segunda oferta, a Estratégia de Resiliência
e seu processo de desenvolvimento. O processo é liderado pelo CER e tem por objetivo galvanizar o movimento de resiliência
urbana, informando quais são os desafios
de resiliência da cidade em nome das diversas partes interessadas, buscando reuni-los
com vistas a criar iniciativas nas quais a
cidade possa atuar. A terceira intervenção
para as nossas cidades é o acesso a uma plataforma de parceiros de todo o mundo que
provê serviços gratuitos para ajudar as cidades a ativar e iniciar a implementação de
bikes. In laying out that road, it is also possible to expand internet connectivity.
Resilience seeks to create multiple values and multiple benefits through single
interventions. Therefore, to build resilience we chose 100 cities, representing 49
different countries, from among the 1100
city applications we received. Currently,
we are working with, and hopefully positively affecting, a population of around
322 million people. We provide the cities
that are a part of our program with four
different kinds of interventions.
The first is grant funding for a Chief Resilience Officer (CRO), a person that sits in
the city below the mayor and works transversally across the city to identify what the
urban challenges are and develop initiatives that address those challenges. They
do this through our second offering, the
Resilience Strategy and the process of developing it. The process is lead by the CRO
and is intended to galvanize the urban resilience movement by informing what the
city’s resilience challenges are on behalf of
a variety of stakeholders, seeking to pull
them together to create initiatives that the
city can act upon. The third intervention
for our cities is access to a platform of
partners from around the globe that provides services on a pro-bono basis to help
activate and initiate the implementation
of their strategies. The fourth key element
depoimento testimonial
46
“
Faz parte da nossa
teoria a ideia de
que as cidades
não têm desaios
singulares. Eles são,
na verdade, muito
semelhantes. Por
exemplo, mais de 70%
de nossas cidades
detectaram problemas
relacionados à água
– águas pluviais, água
potável e falta de água
– como o principal
desaio de resiliência
em seu processo
de candidatura
ao programa 100
Resilient Cities. A
questão hídrica é
fundamental.
”
suas estratégias. O quarto elemento-chave
que fornecemos é a rede de todos os CERs
ao redor do mundo, que podem apoiar uns
aos outros de muitas maneiras.
DESAFIOS DA CIDADE
Faz parte da nossa teoria a ideia de que as cidades não têm desaios singulares. Eles são, na
verdade, muito semelhantes. Por exemplo, mais
de 70% de nossas cidades detectaram problemas relacionados à água – águas pluviais, água
potável e falta de água – como o principal desaio de resiliência em seu processo de candidatura ao programa 100 Resilient Cities. A questão
hídrica é fundamental. Também devemos lembrar que, considerando-se que 90% das áreas
urbanas são costeiras, muitas de nossas cidades
serão as primeiras a serem afetadas pelas consequências do aumento do nível do mar e por
inundações crônicas. As inundações costeiras
são uma questão-chave que estamos administrando, assim como a demanda global por água,
que deve aumentar cerca de 50% até 2030.
Também podemos reletir sobre o tópico mobilidade. Cerca de dez de nossas 100
cidades identiicaram esse desaio em suas
estratégias. Santiago tem uma iniciativa que
estimula o transporte público e a mobilidade
ativa por meio do transporte intermodal. Ao
mesmo tempo, Porto Alegre busca meios de
implantar mecanismos integrados de transporte e, de forma similar, a Cidade do México está preocupada com a popularização das
ciclovias, do transporte a pé e do transporte
público, no lugar do privado. Pittsburgh também está atenta às maneiras de melhorar o
sistema de transporte multimodal da cidade.
O saneamento é outro tema bastante comum. Muitas cidades que têm tido grandes e
contínuos inluxos de migrantes estão enfren-
cadernos fgv projetos
47
we provide is the network of all the CROs
around the world that can support one another in many ways.
CITY CHALLENGES
Part of our theory is that cities don’t have
unique challenges. They are, in fact, very
much alike. For example, over 70% of our
cities flagged water challenges – storm
water, potable water and lack of water –
as a primary resilience challenge in their
100 Resilient Cities application process.
Water is a key area. We should also consider that 90% of urban areas are coastal,
and because of that many of our cities will
be the first to experience the consequences of sea-level rise and chronic flooding.
Coastal flooding is a key issue that we are
managing, as well as the global demand
for water, which is supposed to increase
around 50% by 2030.
We can also think about the issue of
mobility. About ten of our 100 cities have
identiied this challenge in their strategies.
Santiago has an initiative about promoting public transport and active mobility
through inter-modal transport. At the same
time, Porto Alegre is looking at how to deploy integrated transport mechanisms,
and, similarly, Mexico City is concerned
with the popularization of bike lanes, pedestrian and public transport over private
transport. Pittsburgh is also paying attention to how to improve the city’s multi-modal transport system.
Sanitation is another very common
theme. Many cities experiencing large
and continuous influxes of migrants are
dealing with sanitation challenges – both
providing access to it and the higher lev-
“
Part of our theory is
that cities don’t have
unique challenges.
They are, in fact,
very much alike. For
example, over 70%
of our cities lagged
water challenges –
storm water, potable
water and lack of
water – as a primary
resilience challenge
in their 100 Resilient
Cities application
process. Water
is a key area.
”
depoimento testimonial
48
tando desaios de saneamento, tanto no que
diz respeito a prover o acesso a ele quanto no
que se refere a lidar com a maior quantidade de
lixo gerada. Temos as cidades de Dacar, Amã e
Rio de Janeiro buscando soluções abrangentes
para seu lixo e promovendo a economia circular para mitigar alguns desses desaios. Santiago está reletindo sobre como criar campanhas
de conscientização pública para expandir sua
infraestrutura urbana de reciclagem.
Equidade e coesão social também são questões identiicadas por muitas cidades, especialmente ao lidarem com a integração de populações recém-chegadas. É essencial assegurar a
criação de oportunidades econômicas, educacionais e habitacionais para as novas pessoas
que chegam à cidade e a integração dos grupos
mais vulneráveis à sociedade, provendo serviços sociais e outros tipos de apoio.
Dessa forma, a rede do 100 Resilient Cities tem como objetivo facilitar o compartilhamento de experiências sobre esses desafios e suas soluções, de forma que algumas
destas possam ser difundidas globalmente
e ser úteis a outras cidades.
RESILIÊNCIA URBANA
NO BRASIL
Para nós, a adoção da resiliência urbana,
tanto no Brasil quanto globalmente, é um
dos pilares do sucesso, e uma das formas
de isso acontecer é por meio de mudanças
na governança. A criação do cargo de CER
facilita esse processo, pois trata-se de uma
pessoa que trabalha com todas as secretarias
da cidade e com as diferentes partes interessadas, para desenvolver e executar projetos
que não sejam unidimensionais, mas que, ao
contrário, resultem em benefícios múltiplos
e na construção da resiliência. Assim, o CER
els of waste being generated. We have the
cities of Dakar, Amman and Rio de Janeiro, all searching for comprehensive waste
solutions and circular economy in order to
mitigate some of these challenges. Santiago is thinking about how to create citizen
awareness campaigns to expand urban
recycling infrastructure.
Equity and social cohesion are also issues
that many cities have identiied, especially
with the integration of new arriving populations. It is essential to make sure that we
have developed economic, education and
housing opportunities for the new people
coming to the cities and igure out how we
integrate more vulnerable groups into society by providing social services and other
kinds of support.
In this way, the 100 Resilient Cities’ network is meant to facilitate sharing experiences regarding those challenges and solutions so that some of these can potentially be
scaled across the globe in a way that may be
useful for other cities.
URBAN RESILIENCE
IN BRAZIL
To us, the adoption of urban resilience both
in Brazil and globally is one of the pillars
of success, and one of the ways that we see
that happening is through the change in
governance. Creating the role of the CRO
facilitates this process, because it is someone who works across all city departments
and with different stakeholders to develop
and deliver projects that are not one-dimensional, but that achieve multiple beneits and accomplish city resilience building.
Thereby, the CRO is a main mechanism that
cadernos fgv projetos
49
é um mecanismo fundamental que ajudará a
catalisar ainda mais o movimento de resiliência.
As cidades brasileiras de Porto Alegre e Rio
de Janeiro estão realizando trabalhos muito
interessantes e contribuindo para essa construção. Porto Alegre está trabalhando com o Banco
Mundial para entender, qualitativa e quantitativamente, os impactos de inundações sobre pessoas em situação de vulnerabilidade que vivem
em áreas de risco. O Rio de Janeiro está trabalhando com um de nossos parceiros, o World Resources Institute (Instituto de Recursos
Mundiais), na Avaliação de Resiliência Urbana
Comunitária, tentando avaliar a coesão social e
a familiaridade com alguns dos riscos locais e
sistemas de gestão de desastres, para incorporá-los ao Centro de Operações do Rio.
would be helpful in further catalyzing the
resilience movement.
Our Brazilian cities of Porto Alegre and
Rio de Janeiro are doing some very interesting work and contributing to resilience
building. Porto Alegre is working with the
World Bank to understand, both qualitatively and quantitatively, the impacts of lood
disasters on people in vulnerable situations
living in risk areas. Rio is working with one
of our partners, the World Resources Institute (WRI), on the Urban Community Resilience Assessment, in which they are trying to
assess social cohesion and familiarity with
some of the local risks and disaster management systems to incorporate that into the
Rio Operations Center.
depoimento testimonial
50
Essa iniciativa integra, em um mesmo
edifício, dezenas de secretarias municipais
e concessionárias de serviços públicos com
o intuito de monitorar a operação diária da
cidade e, assim, minimizar seus impactos na
rotina do cidadão ou durante a realização de
grandes eventos, em busca de antecipar soluções e de alertar os setores responsáveis
sobre os riscos e as medidas urgentes que
precisam ser tomadas em casos emergenciais,
como chuvas fortes, deslizamentos de terra e
acidentes de tráfego. O Centro de Operações
do Rio utiliza tecnologia soisticada para gerir as informações fornecidas pelas agências
integradas e por vários tipos de sensores
posicionados estrategicamente na cidade.
O primeiro CER do Rio de Janeiro era, na
época, diretor do Centro de Operações e trouxe
esse conhecimento para algumas de nossas cidades, como Glasgow, que estava pensando em
criar um tipo similar de centro de operações.
Esse é um exemplo de como as cidades brasileiras podem difundir parte de seu trabalho não
só para outras cidades do país, como também
globalmente. Resiliência signiica criar cidades
mais fortes de forma generalizada.
This initiative integrates in a single
building dozens of municipal secretariats
and local utility concessionaires with the
purpose of monitoring the daily operation
of the city in order to minimize the impacts
on the citizen’s routine or during major
events, seeking to anticipate solutions and
alert the responsible sectors about existing risks and the urgent measures that
must be taken in cases of such emergencies, such as heavy rains, landslides and
traffic accidents. Rio Operations Center
uses sophisticated technology to manage
the information provided by the integrated agencies and by various types of sensors strategically placed in the city.
Our irst CRO from Rio was at the time director of the Operations Center and brought
that knowledge to some of our other cities,
like Glasgow, which was also thinking about
creating a similar kind of operations center.
This is an example of how Brazilian cities
can also scale some of their work and experience not only to other Brazilian cities, but
also globally. Resilience is about creating
stronger cities overall.
cadernos fgv projetos
51
FINANCIAMENTO
DA RESILIÊNCIA
FINANCING
RESILIENCE
Junto com a Ernst & Young, fomos coautores de
um documento no qual izemos um levantamento para analisar algumas das questões enfrentadas pelas cidades para inanciar sua infraestrutura. Para fazer esse estudo, consultamos o setor
privado, CERs e a nossa própria equipe para
entender melhor as principais questões e obstáculos que impedem a construção da resiliência em termos de infraestrutura. Os resultados
foram realmente interessantes. Em relação aos
obstáculos, o setor privado enfatizou que as cidades precisam praticar o que pregam e começar, efetivamente, a adotar a resiliência. Também houve uma discussão sobre a resiliência
ser mais onerosa que outros mecanismos mais
tradicionais e convencionais e que as cidades devem estar dispostas a pagar esse custo, mesmo
que seja mais alto. Além disso, o levantamento
tratou de como precisamos integrar mais a resiliência ao processo de planejamento e exigir
resultados como parte do processo de aquisições, visto que essas são formas de garantirmos
que o que vai ser construído e inanciado será de
fato uma estrutura resiliente.
No que diz respeito aos mecanismos de inanciamento, existem diferentes formas de incentivar, criar e implementar novas estratégias
pelo cálculo e pela quantiicação dos cobenefícios derivados da resiliência. A ideia de desenvolver um mecanismo de crédito que inclua o
valor da melhoria do PIB, de aspectos sociais
ou mesmo da drenagem de águas pluviais como
consequência de uma infraestrutura resiliente
tem um grande potencial. Atualmente estamos
trabalhando com a Fundação Rockefeller na estruturação de vínculos de impacto ambiental.
Esses vínculos estão associados a cidades dos
Estados Unidos onde projetos de infraestrutura
verdes podem ajudar a desenvolver a resiliên-
We are co-authoring a paper with Ernst &
Young in which we did a survey to look at
some of the issues cities face in financing
resilient infrastructure. For this study, we
consulted the private sector, CROs and our
own team to better understand the primary issues and obstacles impeding resilience building in terms of infrastructure.
The results were really interesting. In relation to the obstacles, the private sector
emphasized that cities need to “walk the
talk” and actually begin embracing resilience. There was also a conversation about
how resilience costs more than other more
traditional and conventional mechanisms
and that cities should be willing to pay
for it, even if it is more expensive. Besides
that, the survey approached how we need
to integrate resilience more into the planning process and demand outcomes as
part of the procurement process, as a way
of ensuring that the resilient infrastructure is in fact what is going to be financed
and built.
Concerning inancing mechanisms, there
are different forms of incentivizing, creating and implementing new strategies by
calculating and quantifying the co-beneits
derived from resilience. The idea of developing a credit mechanism that captures the
value of improved GDP, social or even storm
water drainage outcomes as a result of resilient infrastructure holds great potential. We
are currently working with the Rockefeller
Foundation in structuring environmental
impact bonds. They are associated with U.S.
cities where green infrastructure projects
can help build these cities’ resilience. We
are interested in seeing how we can quan-
depoimento testimonial
52
cia desses locais. Estamos interessados em ver
como podemos quantiicar os benefícios da resiliência através deste novo mecanismo de inanciamento, de modo que os investidores possam
ter retorno sobre seus investimentos.
Outro fator relacionado aos mecanismos de
inanciamento refere-se ao engajamento das comunidades no inanciamento e direcionamento
de fundos para projetos que precisam ser implementados. Porto Alegre fez um trabalho signiicativo com o orçamento participativo, que
impulsionou vários projetos de resiliência. Há
ainda a necessidade, especialmente no mercado inanceiro municipal norte-americano, de se
dar acesso à participação das partes interessadas locais no tocante a levantamento de fundos
e a inanciamento para projetos.
Quando falamos dos principais benefícios
de desenvolver a resiliência urbana, isso nos
tify the resilience benefits through this
new finance mechanism so that investors
may receive a return on their investments.
Another factor related to financing
mechanisms is engaging communities in
the financing and directing of funding for
projects that need to happen. Porto Alegre
has done a significant amount of work in
participatory budgeting that has driven
the financing of several resilience projects. There is also a need, especially in the
US municipal market, to provide access
for local stakeholders to participate in the
funding and financing of projects.
When we talk about the main beneits of
developing urban resilience, this goes back
to the discussion about equity and social cohesion. The point is how do we ensure that
we are providing opportunities for people
cadernos fgv projetos
53
leva de volta à discussão sobre equidade e
coesão social. A questão é como assegurar
que estamos oferecendo oportunidades a
pessoas que não necessariamente têm acesso a recursos suicientes. Há muita coisa que
podemos extrair de benefícios econômicos e
sociais, de uma perspectiva inanceira, como
um modelo do tipo Pay for Success,1 para
ajudar não só os investidores a entenderem
sobre o retorno de crédito, mas também a
descobrir como quantiicar o retorno social
que, em última análise, resulta numa melhora da performance da cidade e do projeto.
who don’t necessarily have access to suficient resources. There is a lot that we can
capture from economic and social beneits
from a inancial perspective, such as a Pay
for Success1 type of model, to help investors
understand the credit return, but also igure out how we quantify the social return
that ultimately results in improved city and
project performance.
1 Pay for Success é um modelo inovador de contratação que impulsiona os
recursos do governo para programas sociais de alta performance. Esse modelo
acompanha a eicácia dos programas ao longo do tempo para garantir que o
inanciamento seja direcionado para programas que tenham sucesso em
melhorar de forma mensurável a vida das pessoas mais necessitadas.
1
Pay for Success is an innovative contracting model that drives
government resources toward high-performing social programs.
This model tracks the effectiveness of programs over time to ensure
that funding is directed toward programs that succeed in measurably
improving the lives of people most in need.
depoimento testimonial
54
À PROCURA DE NOVAS
SOLUÇÕES
SEEKING NEW
SOLUTIONS
Por meio da Fundação Rockefeller, estamos tentando descobrir como acelerar o movimento de união nos Estados Unidos relativo ao impacto ambiental. Transações do tipo
Pay for Success podem demorar muito tempo
para produzir retornos para os investidores.
Esse é o motivo para facilitar o inanciamento
de projetos de infraestrutura verdes por meio
desse mecanismo e, ao mesmo tempo, acelerar a taxa de retorno das transações.
Além disso, temos trabalhado com nossos
parceiros na criação de um novo sistema que
permita às cidades repensar os mecanismos
de transferência de riscos. Assim, na ocorrência de um evento, em vez da aquisição de uma
apólice de seguro para evitar perdas inanceiras associadas a esse evento e o recebimento
de uma indenização, propomos uma mudança de paradigma de riscos e benefícios, pois
sabemos que as cidades não necessitam somente de dinheiro após um grande furacão,
por exemplo, elas também precisam de apoio
humano e logístico para reconstruir a cidade.
Queremos focar em como canalizar o dinheiro do seguro para as pessoas, no lugar de uma
mera transferência monetária para a cidade.
Outro projeto que administramos com nossos parceiros trata de terrenos vazios ao longo
das margens de rios para encontrar estratégias que reduzam os desaios das inundações e
alavancar o processo de relexão sobre o melhor
uso desses espaços desocupados.
Recentemente, realizamos um evento chamado Network Exchange (Intercâmbio em
Rede), em Melbourne (um dos três que organizamos), com foco na diversidade urbana e
na resiliência da cidade. Nele discutimos as
diversas formas de difundir soluções exitosas adotadas em outras cidades. Por exem-
Through the Rockefeller Foundation, we
are trying to igure out how to accelerate the
environmental impact bond movement in
the United States. Pay-for-success transactions can take a long time to produce
returns to investors. That’s the reason
why we want to facilitate the financing
of green infrastructure projects by this
mechanism while accelerating the return
rate on the transactions.
In addition, we have also been working with our partners on creating a new
system that allows cities to reimagine risk
transfer mechanisms. So, as opposed to
having an event occur and taking out policy for that in order to prevent the financial
losses associated with the event and get financial compensation for it, we propose a
risk & benefit paradigm shift, because we
know that cities not only need the money after a major hurricane happens, for
example, they also need the human and
logistical support to rebuild the city. We
want to focus on how can we channel that
insurance funding into funding people,
rather than a pure monetary transfer to
the city.
Another project we are managing with
our partners concerns vacant land along
river banks to address strategies for reducing the challenges posed by flooding,
as well as leveraging the thinking process
around how we can better use those vacant spaces.
Recently, we held an event called a Network Exchange in Melbourne (one of three
we have held) focused on urban biodiversity and city resilience, in which we looked at
different ways that we can scale up success-
cadernos fgv projetos
55
plo, Roterdã apresentou um plano para um
parque aquático e shopping, que a Cidade do
México está analisando como adotar.
Esses são somente alguns exemplos das
soluções que estamos explorando. Uma grande variedade de estratégias inovadoras está
sendo desenvolvida em nossas cidades, e
muitas soluções já existem. É por essa razão
que as redes de cidades são tão importantes,
tanto para difundir quanto para criar novas
soluções que permitam a elas enfrentar seus
desaios de forma mais eiciente.
•
ful solutions adopted in other cities, such as
Rotterdam, that presented a plan for a water plaza and park that Mexico City is analyzing how to adopt as well.
These are just a few examples of the solutions we are exploring. A wide range of innovative strategies are being formed throughout our cities and many of the solutions
already exist, which is why city networks
are so important for both scaling and creating new solutions that allow cities to address
their challenges more eficiently.
•
ARTIGO ARTICLE
O PAPEL
DAS CIDADES:
IMPLEMENTAÇÃO DA
AGENDA 2030 E DO
ACORDO DE PARIS
THE ROLE
OF CITIES:
IMPLEMENTATION OF
THE AGENDA 2030 AND
THE PARIS AGREEMENT
Tendo em vista o papel central das cidades para a transformação global rumo à
sustentabilidade, este artigo analisa a importância da implementação, nesses espaços
urbanos, da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e do Acordo de Paris. Ao
reletir sobre essas duas agendas, a autora mostra seus principais pontos de convergência
e defende que a sinergia entre elas, a partir de uma abordagem mais integrada, sistêmica e
resiliente, é fundamental para a construção de cidades mais sustentáveis.
Considering the central role of cities in the global transformation towards sustainability, this article focuses on analyzing the importance of implementing the 2030
Sustainable Development Agenda and the Paris Agreement in urban spaces. Relecting on these two agendas, the author demonstrates the main points of convergence
and argues that the sinergy between them, based on a more integrated, systemic and
resilient approach, is fundamental for the sustainable cities construction.
CLARA BRANDI
Pesquisadora Sênior e Líder de Projetos do DIE
Senior Researcher and Project Leader at DIE
Doutora pelo Instituto Universitário Europeu, na Itália, e mestre em ilosoia política pela
Universidade de Oxford, no Reino Unido. Também estudou na Universidade de Wisconsin,
nos Estados Unidos, e formou-se em economia na Universidade de Friburgo, na Alemanha.
Atualmente, é pesquisadora sênior e líder de projetos no Departamento de Economia Mundial
e Financiamento de Desenvolvimento do Instituto de Desenvolvimento Alemão. Seus
principais focos de pesquisa são governança global e a relação entre comércio internacional,
desenvolvimento sustentável e mudanças climáticas.
She holds a PhD from the European University Institute, in Italy, and a Master’s degree
in Political Philosophy from the University of Oxford, in the United Kingdom. She also
studied at the University of Wisconsin, in the United States, and graduated in Economics
at University of Freiburg, in Germany. Currently, she is a senior researcher and project
leader in the Department of World Economics and Development Finance of the German
Development Institute. Her research focuses on global governance and the relationship
between international trade, sustainable development and climate change.
A
adoção da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável1 e de seus 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs)
marca um momento histórico dos esforços internacionais pela transformação da economia
global e da sociedade em direção à sustentabilidade. Tão fundamental quanto esses esforços
para garantir o futuro sustentável do nosso planeta é o Acordo de Paris sobre mudanças climáticas, que foi assinado e ratiicado pelas 196 partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas
sobre Mudança do Clima em Paris, em 2015.
Muitos especialistas já indicaram as fortes interligações que podem contribuir para
a implementação de ações de colaboração
mútua com vistas a efetivar os 17 ODSs elaborados pela Agenda 2030 e pelas chamadas
Contribuições Nacionalmente Determinadas2 que embasam o Acordo de Paris.3 Essas
duas agendas se alinham em diversas áreas e
esse vínculo mostra como benefícios mútuos
podem surgir. Isso se aplica ao Objetivo 13 da
Agenda 2030, que é dedicado especiicamente à proteção do clima, mas também a outras
1
A Agenda 2030 consiste em um conjunto de programas, ações e
diretrizes que orientam os trabalhos das Nações Unidas (ONU) e de seus
países-membros para o desenvolvimento sustentável. As negociações
da Agenda resultaram em um documento que propõe 17 Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 metas correspondentes, cuja
implementação deverá ocorrer entre 2016 e 2030. Essa nova agenda foi
oicialmente adotada em setembro de 2015 durante a Cúpula da ONU para
Desenvolvimento Sustentável, em Nova York.
2
As Contribuições Nacionalmente Determinadas (em inglês, Nationally
Determined Contributions, ou NDCs) explicam as ações que os países pretendem
tomar para enfrentar as mudanças climáticas, tanto em termos de adaptação quanto
de mitigação.
3
Casado-Asensio; Steurer, 2014. Le Blanc, 2015.
T
he adoption of the 2030 Agenda for
Sustainable Development1 and 17 Sustainable Development Goals (SDGs) marks
a historic moment in the international effort
to transform the global economy and society
towards sustainability. Equally fundamental for ensuring the sustainable future of
our planet is the Paris Agreement on climate
change, which was signed into force by the
196 Parties to the United Nations Framework Convention on Climate Change in Paris in 2015.
Many have pointed to the strong interlinkages between and potential for
the mutually supportive implementation
of the 17 SDGs elaborated by the 2030
Agenda and the Nationally Determined
Contributions2 underpinning the Paris
Agreement.3 Several areas in which these
two agendas align show where mutual
benefits may be generated. This applies
not only to Goal 13 of the 2030 Agenda,
which is dedicated specifically to climate
protection, but also to many other critical
dimensions of sustainable development.
1 The Agenda 2030 consists of a set of programs, actions and guidelines
that guide the work of the United Nations (UN) and its member countries
for sustainable development. The Agenda negotiations resulted in a
document proposing 17 Sustainable Development Objectives (ODS) and
169 corresponding targets, whose implementation is expected to take
place between 2016 and 2030. This new Agenda was oficially adopted
in September 2015 during the UN Summit for Sustainable Development,
held in New York.
2 The Nationally Determined Contributions (NDCs) spell out the actions
countries intend to take to address climate change – both in terms of
adaptation and mitigation.
3
Casado-Asensio; Steurer, 2014. Le Blanc, 2015.
cadernos fgv projetos
59
importantes dimensões do desenvolvimento
sustentável. Existem muitas formas de melhorar a sinergia entre as duas agendas, como
a implementação exitosa do Acordo de Paris,
que reduziria o risco de desastres naturais
relacionados ao clima, promovendo, assim, a
segurança alimentar de partes vulneráveis da
população (Objetivo 2). Outros exemplos que
ajudam a combater a mudança climática (Objetivo 13) são a proteção de lorestas, que contribui para a preservação da biodiversidade
(Objetivo 15), e o aumento da produção e da
utilização de energias renováveis, o que ajuda
a cumprir o Objetivo 7. De forma concomitante, no entanto, essa ampliação poderia causar
contestações com relação à reivindicação de
recursos aquáticos e terrestres. As sinergias
e contraposições entre o Acordo de Paris e a
Agenda 2030 devem ser consideradas a im
de promover a implementação efetiva e a
coerência política.4 Isso é especialmente importante no contexto do Objetivo 11, que trata
do desenvolvimento urbano.
As cidades – e a tendência global de urbanização – têm papel central no cumprimento de
um desenvolvimento sustentável no mundo,
além de terem relevância especial no sucesso esperado em relação ao Acordo de Paris e à Agenda 2030.5 Hoje, mais pessoas vivem em áreas
There are numerous examples for leveraging synergies between the two agendas. For instance, the successful implementation of the Paris Agreement would
reduce the risk of weather-related natural
disasters, thereby also promoting the food
security of vulnerable parts of the population (Goal 2). The protection of forests
contributes to both the preservation of
biodiversity (Goal 15) and to combating
of climate change. The expansion of renewable energies helps to fulfill Goal 7
and also tackle climate change (Goal 13).
At the same time, however, this expansion
could also cause trade-offs in regard to
claims to water and land resources. The
synergies and trade-offs between the Paris Agreement and the 2030 Agenda should
be taken into account in order to promote
effective implementation and policy coherence.4 This is especially important in
the context of Goal 11, which distinctly
concerns urban development.
Cities – and the global urbanisation
trend – play a central role in achieving
sustainable development worldwide and
are of particular relevance to the prospective success of the Paris Agreement
and the 2030 Agenda.5 Today, more peo-
4
4
Lay et al, 2017.
5 Wissenschaftlicher
Beirat
der
Bundesregierung
Globale
Umweltveränderungen (WBGU) / Conselho Consultivo Alemão sobre
Mudanças Globais, 2016.
Lay et al, 2017.
5 Wissenschaftlicher
Beirat
der
Bundesregierung
Globale
Umweltveränderungen (WBGU) / German Advisory Council on Global
Change, 2016.
artigo
article
60
urbanas do que em áreas rurais – embora as
cidades representem apenas 2% da superfície da
Terra. Até 2050, dois terços da população mundial estará vivendo em áreas urbanas, sendo que
90% desse crescimento urbano ocorrerá em
países de economia emergente e em desenvolvimento.6 Ao mesmo tempo em que as cidades são
sinônimo de oportunidade para desenvolvimento econômico, cultural e social e que fomentam
recursos e eiciência energética, a urbanização
traz consigo diversos desaios, como a garantia
de habitação adequada e a necessidade de evitar
trajetórias prejudiciais de dependência.
As cidades são parte fundamental na
transformação do mundo rumo à sustentabilidade e à implementação da Agenda 2030
e do Acordo de Paris devido, principalmente, à escala e à velocidade da atual onda de
urbanização. Elas podem oferecer grande potencial de desenvolvimento sustentável, mas
também podem representar diversos desaios na promoção desse processo.7 Tal como
airmou o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon:8 “nossa luta pela sustentabilidade
global será vencida ou perdida nas cidades”. 9
Sendo assim, este artigo discute por
que as cidades são essenciais para a implementação da Agenda 2030 e do Acordo
de Paris e analisa o seu papel no contexto
dessas duas grandes agendas, destacando
a Nova Agenda Urbana acordada durante
a Habitat III,10 que representa um importante passo em direção à implementação
da Agenda 2030. Por último, apresenta al-
6 Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas
(DESA), 2014.
7
ple live in urban than in rural areas – although cities cover merely 2% of the earth’s
surface. Two thirds of the world’s population
will live in urban areas by 2050, with 90% of
this urban growth taking place in emerging
economies and developing countries.6 While
cities entail a multitude of opportunities for
economic, cultural and social development,
and for fostering resource and energy eficiency, urbanisation poses numerous challenges such as providing adequate housing
and avoiding detrimental path dependencies.
In light of the scale and speed of the ongoing wave of urbanisation, cities play a key
role in the transformation of the world towards sustainability and the implementation
of the 2030 Agenda and Paris Agreement.
Cities can offer both enormous potential for
sustainable development but can also pose
immense challenges for promoting sustainable development.7 As Ban Ki-moon, Secretary-General of the United Nations (UN) has
exclaimed:8 “Our struggle for global sustainability will be lost or won in cities.” 9
Therefore, this article discusses why cities
are essential for the implementation of the
2030 Agenda and the Paris Agreement. After
an introduction to the 2030 Agenda and the
Paris Agreement, the article analyses the role
of cities in the context of these two key agendas. Moreover, the article highlights the New
Urban Agenda agreed upon at Habitat III,10
the United Nations Conference on Housing
and Sustainable Urban Development, which
took place in 2016 and represents a key step
towards implementing the 2030 Agenda. Fi-
Mesner; Brandi, 2015.
8 Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2007
a 2016.
6 The United Nations Department of Economic and Social Affairs (UN
DESA), 2014.
9
Remarks to the High-level Delegation of Mayors and Regional
Authorities (Apresentação para a Delegação de Alto Nível de Prefeitos e
Autoridades Regionais), em Nova York, em 23 de abril de 2012.
7
10 Conferência das Nações Unidas sobre Habitação e Desenvolvimento
Urbano Sustentável realizada em 2016.
Mesner; Brandi, 2015.
8 Secretary-General of the United Nations (2007-2016)
9
Remarks to the High-level Delegation of Mayors and Regional
Authorities, in New York, 23 April 2012.
10 United Nations Conference on Housing and Sustainable Urban
Development.
cadernos fgv projetos
61
Figura 1 Conquistas em 2015 – A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e o Acordo de Paris
Figure 1 Milestones in 2015 - The 2030 Agenda for Sustainable Development
and the Paris Agreement
A Agenda 2030 se aplica a todos os países do mundo. Ela foi aprovada
pelos estados-membros da ONU após um processo transparente e
inclusivo. Em seu coração estão os 17 Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODSs) que devem ser implementados até 2030.
Nova Iorque
New York
The 2030 Agenda applies to all countries of the world. It was approved
by the UN member states after a transparent and inclusive process. Its
centrepiece comprises 17 sustainable development goals (SDGs), to be
implemented by 2030.
Setembro de 2015
September 2015
1
Erradicação da
pobreza
No poverty
7
Energia
renovável e
acessível
Affordable and
clean energy
13
Combate às
mudanças
climáticas
Climate action
2
Erradicação da
fome
Zero hunger
8
3
4
5
6
Saúde e
bem-estar
Good health
and well-being
Educação de
qualidade
Quality
education
Igualdade de
gênero
Gender
equality
Água limpa e
saneamento
Clean water
and sanitation
10
11
12
9
Empregos
dignos e
crescimento
econômico
Decent work
and economic
growth
Indústria,
inovação e
infraestrutura
Industry,
innovation and
infrastructure
Redução das
desigualdades
Reduced
inequalities
Cidades e
comunidades
sustentáveis
Sustainable
cities and
communities
14
15
16
17
Vida debaixo
d'água
Life below
water
Vida sobre
a terra
Life on land
Paz e justiça/
instituições
fortes
Peace and
justice/strong
institutions
Parcerias
pelos objetivos
Partnerships
for the goals
Igualmente essencial para o futuro do nosso planeta é o acordo da ONU
sobre o clima, assinado em Paris. Ele representa o acordo da comunidade mundial a respeito de tópicos importantes, como buscar esforços
para limitar o aumento da temperatura global de 1,5 grau acima do nível
pré-industrial, onde for possível.
Equally seminal for the future of our planet is the UN climate agreement
signed in Paris. This saw the world community agree on key issues such
as pursuing efforts to limit the global temperature increase to 1.5
degrees above the pre-industrial level, where possible.
Fonte: German Development Institute - Deutsches Institut für Entwicklungspolitik (DIE)
Source: German Development Institute - Deutsches Institut für Entwicklungspolitik (DIE)
Consumo e
produção
responsável
Responsible
consumption
and production
Objetivos
globais pelo
desenvolvimento sustentável
The global goals
for sustainable
development
Paris
Paris
Dezembro de 2015
December 2015
artigo
article
62
guns dos principais passos a serem dados,
seguidos de comentários conclusivos.
“
As sinergias e
contraposições
entre o Acordo de
Paris e a Agenda
2030 devem ser
consideradas a
im de promover
a implementação
efetiva e a
coerência política.
”
A AGENDA 2030 PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
O preâmbulo da Agenda 2030 apresenta um resumo de seus objetivos mais amplos, enfatizando a interdependência entre as pessoas, o planeta, a paz, a prosperidade e a parceria, e entre os
objetivos especíicos e suas metas.11 Esses objetivos abrangentes incluem: erradicação da pobreza e da fome extremas e obtenção de uma vida
digna, igualitária e em um ambiente saudável
(em relação às pessoas); proteção dos ecossistemas da Terra para as gerações atuais e futuras
(em relação ao planeta); prosperidade de todas
as pessoas por meio de um progresso econômico
e tecnológico em harmonia com a natureza (em
relação à prosperidade); sociedades pacíicas,
inclusivas, justas e livres do medo e da violência
(em relação à paz); e uma cooperação internacional fortalecida (em relação à parceria).
A agenda também destaca os princípios
que devem guiar a implementação dos objetivos, que incluem:12
i) Universalidade – a agenda é válida
para todos os países;
ii) Indivisibilidade – a agenda deve ser
implementada como um todo (todos os objetivos e suas interligações);
iii) Não deixar ninguém para trás – os
objetivos só são considerados cumpridos
se tiverem sido alcançados pelos quintis
mais pobres (ou os 40% menos favorecidos) da população;
iv) Responsabilidade – os governos devem
gerar relatórios regulares sobre a implementação dos objetivos de forma transparente e
11
Scholz; Brandi, 2017.
12
United Nations, 2015.
cadernos fgv projetos
63
nally, the article presents some of the key steps
ahead and provides concluding comments.
THE 2030 AGENDA FOR
SUSTAINABLE DEVELOPMENT
The preamble of the 2030 Agenda provides
a summary of its overarching goals, emphasizing the interdependencies between
people, planet, peace, prosperity and
partnership, and between the specific
goals and their targets.11 These overarching goals include: abolish extreme poverty
and hunger and achieve a life in dignity,
equality and in a healthy environment
(people), protection of the Earth’s ecosystems for present and future generations
(planet), prosperity of all people through
economic and technological progress in
harmony with nature (prosperity), peaceful, inclusive and just societies free of fear
and violence (peace), and a strengthened
international cooperation (partnership).
The agenda also highlights the principles
intended to guide implementation of the
goals, which include:12
i) Universality – the agenda is valid
for all countries;
ii) Indivisibility – the agenda has to
be implemented as a whole (all goals and
their interlinkages);
iii) Leave no one behind – goals only
count as achieved if they have been achieved for the poorest quintiles (or lowest
40%) of the population;
iv) Accountability – governments report regularly on implementation in a
transparent and plausible way, at home
11
Scholz; Brandi, 2017.
12
United Nations, 2015.
“
The synergies
and trade-offs
between the
Paris Agreement
and the 2030
Agenda should
be taken into
account in order to
promote effective
implementation
and policy
coherence.
”
artigo
article
64
plausível, em seu país e na ONU, com a participação de todos os setores da sociedade;
v) Parceria – a implementação não é
apenas de responsabilidade dos governos
nacionais, mas também conta com a contribuição do setor privado, das divisões administrativas, das cidades, dos municípios
e das sociedades civil e acadêmica.
and at the UN, with participation of all
sectors of society;
v) Partnership – implementation is
not only the responsibility of national
governments but also counts with contributions by the private sector, subnational entities, cities, municipalities,
civil society and academia.
Muitos dos 17 ODSs são importantes para as
cidades e para lidar com a urbanização, como em
áreas de fornecimento de água (Objetivo 6) e de
infraestrutura (Objetivo 9). Um dos ODSs, conforme mencionado anteriormente, tem seu foco
diretamente nas cidades (Objetivo 11): “Tornar
as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis”.
O Objetivo 11 inclui sete metas e três sugestões de como implementá-las. As Metas 11.1
e 11.2 focam no fornecimento de serviços em
assentamentos urbanos (habitação, transporte etc.), a Meta 11.3 trata do planejamento e
do gerenciamento do assentamento humano,
a Meta 11.4 aborda as heranças cultural e natural, a Meta 11.5 refere-se às consequências
dos desastres e as Metas 11.6 e 11.7 envolvem
questões ambientais (qualidade do ar, gestão
de resíduos e espaços verdes e públicos).
Apesar de coincidir em diversos aspectos
com outros objetivos, o Objetivo 11 é importante
como um ODS independente focado nas cidades por incentivar os responsáveis pela elaboração de políticas públicas a assumir uma perspectiva mais ampla sobre o planejamento e o
desenvolvimento urbanos.13 Ao mesmo tempo,
a maioria dessas metas são muito abrangentes
e contam com poucas especiicações e informações sobre sua instrumentalização. Além disso,
diversas questões essenciais não são suicientemente contempladas no Objetivo 11. Desta-
Several of the 17 SDGs are important
for cities and for addressing urbanisation,
such as in the areas of water supply (Goal
6) and infrastructure (Goal 9). Moreover,
as mentioned previously, one SDG puts the
focus directly on cities (Goal 11): “Make
cities and human settlements inclusive,
safe, resilient and sustainable”.
Goal 11 includes seven targets and three
suggestions for means of implementation.
Targets 11.1 and 11.2 focus on the supply
of services in urban settlements (housing,
transport, etc.); Target 11.3 concerns human settlement planning and management; Target 11.4 deals with world cultural and natural heritage; Target 11.5
pertains to the effects of disasters; and
Targets 11.6 and 11.7 involve environmental issues (air quality, waste management,
and green and public spaces).
Despite several overlaps with other
goals, Goal 11 is important as a standalone
SDG focused on cities, because it encourages policy-makers to assume a broader perspective on urban planning and development.13 At the same time, it should be noted
that most of its targets are very broad and
lack specifications and information about
operationalisation. A number of essential
issues are not sufficiently addressed in
Goal 11, among them, inequality, social
13 Brandi, 2015a.
13 Brandi, 2015a.
cadernos fgv projetos
65
cam-se, entre elas, a desigualdade, o bem-estar
social e a tecnologia da informação e da comunicação. Ademais, o Objetivo 11 corre o risco de
negligenciar a maneira como as cidades afetam
o sistema do próprio planeta e contribuem para
a mudança ambiental global, com emissões de
gases poluentes ou pela dependência de serviços ecossistêmicos distantes.14
Se por um lado as cidades e os atores locais
são essenciais no contexto do Objetivo 11, por
outro, são também fundamentais para a implementação geral da Agenda 2030. Aproximadamente 65% das metas dos ODSs podem
ser cumpridas somente se forem implementadas em conjunto pelas cidades e pelos atores locais.15 Esforços e cooperação locais são
extremamente importantes para a implementação de estratégias de desenvolvimento
sustentável, bem como para a sua elaboração,
monitoramento e revisão.16 Destacar o papel
principal das cidades e da urbanização nessas
estratégias também pode ajudar a elevar a capacidade urbana para a implementação dos
ODSs e para a promoção do desenvolvimento
sustentável de forma mais ampla. Devido à
sua inluência econômica e política, os mem-
well-being and information and communication technology. Moreover, Goal 11 runs
the risk of overlooking how cities affect
the Earth’s system and contribute to global environmental change, such as through
emissions or dependence on distant ecosystem services.14
If on the one hand cities and local actors
are key in the context of Goal 11, on the
other hand they are essential for the overall implementation of the 2030 Agenda as
well. Around 65% of the SDG targets can
only be achieved if they are implemented
in cooperation with local actors.15 Local
efforts and cooperation are critical for the
implementation of sustainable development strategies, as well as their elaboration, monitoring and review.16 Highlighting the key role of cities and urbanisation
in these strategies can also help leverage
the urban capacity for implementing the
SDGs and promoting sustainable development more generally. Due to their economic and political influence, G20 members can also play an especially important
14
Brandi, 2015a.
14
Brandi, 2015a.
15
Misselwitz et al, 2015.
15
Misselwitz et al, 2015.
16
Scholz, 2017.
16
Scholz, 2017.
artigo
article
66
bros do G20 também podem ter um papel
especialmente importante ao motivar as cidades a focar na implementação dos ODSs.17
role in motivating cities to focus on implementation of the SDGs.17
THE PARIS AGREEMENT
O ACORDO DE PARIS
Em dezembro de 2015, membros da ONU
assumiram o Acordo de Paris na 21ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das
Nações Unidas Sobre Mudança do Clima, demonstrando o comprometimento internacional de manter o aumento da temperatura média global abaixo de 2ºC em comparação aos
níveis pré-industriais, com o objetivo de não
ultrapassar 1,5ºC. Nesse contexto, as partes
signatárias acordaram em zerar as emissões
líquidas na segunda metade deste século.
O Acordo de Paris é caracterizado por uma
abordagem ascendente e lexível que deixa
em aberto quais ações climáticas cada país
busca implementar individualmente. Antes
das negociações de Paris, os países anunciaram publicamente suas metas climáticas pós-2020, ou as chamadas Pretendidas
Contribuições Nacionalmente Determinadas
(em inglês, Intended Nationally Determined
Contribution, ou INDC). A ambição das me-
In December 2015, members of the UN adopted the Paris Agreement at the 21st Conference of the Parties to the United Nations
Framework Convention on Climate Change,
demonstrating the international commitment to keeping the global average temperature increase below 2°C in comparison to
pre-industrial levels, aiming to not surpass
1.5°C. In this context, the signatory parties
agreed to achieve net zero emissions in the
second half of this century.
The Paris Agreement is characterised by
a lexible bottom-up approach that leaves
open which climate actions the individual
countries seek to implement. In the run-up
to the Paris negotiations, countries publicly
announced their post-2020 climate targets,
or Intended Nationally Determined Contribution (INDC). The ambition of the climate
targets and actions communicated in these
INDCs, and the extent to which they are implemented, will determine whether or not
17
17
Brandi; Scholz, 2017. Chen et al, 2017. G20, 2016.
Brandi; Scholz, 2017. Chen et al, 2017. G20, 2016.
cadernos fgv projetos
67
tas e ações climáticas informadas nessas INDCs e a dimensão em que são implementadas
determinarão se o mundo cumprirá as metas
do Acordo de Paris em longo prazo ou não.
Mais de 160 países enviaram INDCs que
reletem suas ambições para mitigar as emissões de gases causadores do efeito estufa,
considerando suas circunstâncias e capacidades domésticas. Muitos países também
chamam a atenção para outras questões
que contribuem para a mudança climática,
como o tipo de apoio que precisam receber
ou podem oferecer a outros países.18 Em seus
planos de ação climática, cada país comunica suas contribuições e condicionalidades.
Quando um país ratiica o Acordo de Paris,
suas INDCs são convertidas em Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs).
Diversos países já se uniram formalmente ao
Acordo de Paris e converteram suas INDCs
em NDCs. No futuro, sob as provisões desse
acordo, os países deverão enviar NDCs atualizadas a cada cinco anos, que deverão ser
mais ambiciosas do que as anteriores, o que é
conhecido como mecanismo “de catraca” ou
“de ambição”.19
No contexto do Acordo de Paris, o regime
climático avançou em direção a uma abordagem universal, que demanda esforços de
todos os países. Juntamente com o comprometimento de aumentar a ambição ao longo
do tempo, essa ação mantém o potencial de
gerar a resposta necessária à mudança climática para evitar os níveis de aquecimento
global mais perigosos. Após a adoção histórica do acordo, é essencial garantir que ele não
ique apenas no papel, mas que seja imple-
the world achieves the long-term goals of the
Paris Agreement.
More than 160 countries submitted INDCs relecting their ambition to mitigate
greenhouse gas emissions, taking into consideration each of their domestic circumstances and capabilities. Many countries
also address other issues in the climate contributions, for instance what kind of support they need from or are able to provide
to other countries.18 In their climate action
plans, each country communicates both
their contributions and conditionalities.
Once a country ratiies the Paris Agreement,
its INDC is converted into a Nationally Determined Contribution (NDC). Many countries have already formally joined the Paris
Agreement and converted their INDCs into
NDCs. In the future, under the provisions of
the Paris Agreement, countries will be asked
to submit an updated NDC every ive years,
which will have to be more ambitious than
the country’s previous NDC (this is known as
a “ratchet” or “ambition” mechanism).19
In the context of the Paris Agreement,
the climate regime has moved towards a
universal approach, which demands efforts
from all countries. This, together with the
commitment to increase ambition over time,
holds the potential to generate the response
to climate change that is needed to avoid the
most dangerous levels of global warming.
After the agreement´s historic adoption, it
is now essential to make sure it does not remain a paper tiger but that it is properly implemented, including each of the signatory
countries’ NDCs. Cities play a fundamental
18
18
Pauw et al, 2016.
19 O mecanismo conhecido como “de catraca” ou “de ambição” do Acordo
de Paris estabelece um processo contínuo e regular para aumentar seu nível
de ambição. Os países devem apresentar o seu progresso a cada cinco anos
e, com base na reavaliação da situação, enviar um plano de ação climática
que seja mais ambicioso do que o anterior.
Pauw et al, 2016.
19
The so-called “ratchet” or “ambition mechanism“ of the Paris
Agreement established an ongoing, regular process to raise its level of
ambition; countries must take stock of progress every 5 years and, based
on this stocktake, submit a climate action plan that is progressively more
ambitious than the previous one.
artigo
article
68
Figura 2 Conteúdo urbano nas NDCs
Figure 2 Urban content in the NDCs
Referência direta ao conteúdo urbano
Direct reference to urban content
Referência indireta ao conteúdo urbano
Indirect reference to urban content
Ausência de referência explícita ao conteúdo urbano
No explicit reference to urban content
Fonte: UN-Habitat 2016
Source: UN-Habitat 2016
cadernos fgv projetos
69
artigo
article
70
mentado de forma adequada, incluindo cada
NDC dos países signatários. As cidades têm
papel fundamental na implementação das
NDCs, das quais 110 contam com conteúdo
urbano, incluindo referências diretas nos cabeçalhos e/ou no texto (Figura 2).20
É necessário integrar medidas pertinentes
para a implementação do Acordo de Paris
com os objetivos e metas da Agenda 2030 de
forma inteligente e voltada para o futuro. É
primordial, por exemplo, lidar com a falta de
capacidade de adaptação, nomeadamente,
nas áreas de fornecimento de água (ODS 6),
de infraestrutura (ODS 9) e de conservação
dos serviços de ecossistema (ODS 15), o que
diiculta o cumprimento dos ODSs.
AS CIDADES NO CONTEXTO DA
AGENDA 2030 E DO ACORDO
DE PARIS
role in implementing the NDCs: 110 NDCs
contain urban content, including direct reference within headers and/or within the text
(See Figure 2).20
Moving forward, it is necessary to integrate
pertinent measures for the implementation of
the Paris Agreement with the goals and targets
of 2030 Agenda in a forward-looking and intelligent manner. For example, it is paramount
to address the lack of climate adaptation capacities in the areas of water supply (SDG 6),
infrastructure (SDG 9) and the conservation of
ecosystem services (SDG 15), which is hindering achievement of the SDGs.
CITIES IN THE CONTEXT OF
THE 2030 AGENDA AND
THE PARIS AGREEMENT
As cidades são locais onde os maiores desaios e
potenciais do desenvolvimento sustentável convergem. A tendência à urbanização é uma força
que deve ser aproveitada e reconigurada a im
de atender às principais metas estabelecidas
pelas agendas de desenvolvimento sustentável.
Existe, portanto, uma necessidade urgente de
uma abordagem integrada, sistêmica e resiliente para o desenvolvimento urbano sustentável.21
Como indicado anteriormente, a proporção
de pessoas vivendo em áreas urbanas ao redor
do mundo deve subir para dois terços até 2050
e 90% desse aumento deve ocorrer em países
em desenvolvimento. Grande parte da infraestrutura para atender às necessidades crescentes da população urbana ainda deve ser desenvolvida para cumprir os objetivos globais de
redução da pobreza e da desigualdade, confor-
Cities are where both major challenges
and potentials of sustainable development
converge. Urbanisation is a force that
must be harnessed and reconfigured in order to address the main goals established
by the sustainable development agendas.
As such, there is an urgent need for an integrated, systemic and resilient approach
to sustainable urban development.21
As previously indicated, the proportion
of people living in urban areas worldwide is
set to rise to two thirds by 2050, and 90% of
the urban population increase is expected to
take place in developing countries. Much of
the infrastructure for meeting the increasing urban population´s needs must still be
built in order to accomplish the global poverty and inequality reduction goals underpinning the sustainable development agendas. A growing number of city-dwellers live
20
United Nations Human Settlements Programme (UN-Habitat), 2016.
20
United Nations Human Settlements Programme (UN-Habitat), 2016.
21
Tollin; Hamhaber, 2017.
21
Tollin; Hamhaber, 2017.
cadernos fgv projetos
71
me as agendas de desenvolvimento sustentável. Um número crescente de habitantes das
cidades vive em condições vulneráveis e não
tem acesso à infraestrutura, nem a serviços
sociais e técnicos básicos. Enquanto muitos
países em desenvolvimento passaram por um
rápido crescimento econômico nas últimas
décadas, o processo foi amplamente desigual.
Um número cada vez maior de habitantes da
cidade vive e trabalha informalmente sem ter
acesso à infraestrutura social e técnica adequada, enfrentando desaios de governança e
expostos a desigualdades crescentes.
Além disso, se a construção urbana e o planejamento das cidades continuarem a seguir o
padrão das últimas décadas, corremos o risco
de esgotar o nível limitado de terras e recursos, diicultando ou tornando quase impossível cumprir os ODSs e limitar o aquecimento
global aos níveis identiicados no Acordo de
Paris. Com mais de 70% das emissões de gases
causadores do efeito estufa geradas pelas cidades, a urbanização é extremamente importante para a perspectiva do Acordo de Paris. Dessa forma, a implementação do acordo requer
uma transformação urbana.
As cidades são motores do desenvolvimento
por alimentarem as economias de aglomeração, das quais as empresas se beneiciam por
estarem próximas umas das outras.22 Também
são o ponto central do crescimento econômico
e, devido ao seu potencial de inovação, podem
contribuir para facilitar a transformação social
e ambiental necessária para o cumprimento dos
objetivos sustentáveis. O planejamento urbano
inclusivo inadequado de cidades emergentes
e em crescimento não apenas gera obstáculos
complexos para o desenvolvimento da sustentabilidade urbana, como também para o desenvolvimento sustentável em larga escala.
in vulnerable conditions and lack access to
basic social and technical infrastructure
and services. While many developing nations have experienced rapid economic
growth in the last decades, the process has
been largely unequal. Urban populations
still face signiicant challenges associated
with severe inequality and access, particularly in regard to decision-making and
governance structures.
Furthermore, if urban construction and
city planning continue to follow the mould
of recent decades, we risk exhausting a
detrimental level of land and resources, making it difficult or near impossible
to accomplish the SDGs and limit global warming to the levels identified in the
Paris Agreement. With over 70% of all
greenhouse gas emissions generated by
towns and cities, urbanisation is extremely relevant from the perspective of the
Paris Agreement. As such, the implementation of the Paris Agreement requires an
urban transformation.
Cities are engines of development, because they provide for economies of agglomeration, in which businesses benefit
from being near to each other.22 Cities
are hubs of economic growth and, due to
their potential for innovation, they can
contribute to facilitating the social and
environmental transformation needed to
meet the goals. Inadequate inclusive urban planning of emerging and growing
cities, on the other hand, will not only lead
to difficult obstacles for developing urban
sustainability but also to sustainable development at large.
One central problem is that fast-growing cities can generate detrimental
22
22
Guranton, 2014.
Guranton, 2014.
artigo
article
72
Figura 3 Principais desafios no contexto da urbanização
Figure 3 Key challenges in the context of urbanization
PROBLEMAS E DESAFIOS
PROBLEMS AND CHALLENGES
Emissão de gases do efeito estufa
Emission of greenhouse gases
Falta de infraestrutura
Lack of infrastructure
Consumo de terras e recursos
Consumption of land and resources
Desafios de governança
Governance challenges
Trânsito caótico
Traffic chaos
Desigualdade social
Social inequality
Fonte: German Development Institute - Deutsches Institut für Entwicklungspolitik (DIE). Disponível em:<https://www.
die-gdi.de/ileadmin/user_upload/pdfs/dauerthemen_spezial/DIE_Infograik_03_Urbanisierung_englisch.pdf>
Source: German Development Institute - Deutsches Institut für Entwicklungspolitik (DIE). Available: <https://
www.die-gdi.de/ileadmin/user_upload/pdfs/dauerthemen_spezial/DIE_Infograik_03_Urbanisierung_englisch.pdf>
Um problema central é que as cidades em
rápido crescimento podem gerar dependências
prejudiciais de trajetórias, sobretudo ao criar
grandes entraves causados pela dependência
do carbono no contexto de grandes projetos de
infraestrutura, como, por exemplo, estradas e
usinas elétricas. O desenvolvimento de novas
infraestruturas em economias emergentes e
em países em desenvolvimento já representa
cerca de um terço do montante remanescente
de carbono, caso o aumento da temperatura
global seja limitado a menos de 2ºC, e mais de
três quartos do montante, se ele for limitado a
1,5ºC.23 Os processos de urbanização em andamento, por sua vez, envolvem o uso de maiores
quantidades de recursos que geram altas emis-
path-dependencies, above all by creating enormous huge carbon lock-ins in the
context of large infrastructure projects,
for example for roads or power plants:
The development of new infrastructure
in emerging economies and developing
countries already accounts for around one
third of the total remaining carbon budget
if global temperature rise are to be limited
to less than 2°C, and over three quarters
of the budget if it is to be limited to 1.5°C.23
The ongoing urbanisation processes thus
involve the use of escalated amounts of resources that generate massive greenhouse
gas emissions. The dynamism and speed
23
23
Müller et al, 2013.
Müller et al, 2013.
cadernos fgv projetos
73
sões de gases do efeito estufa. O dinamismo e
a velocidade da urbanização global e as suas
respectivas implicações associadas à mitigação
da mudança climática e ao consumo de recursos diicilmente podem ser subestimados. Até
2050, a infraestrutura urbana no mundo todo
deve acomodar 2,5 bilhões de novos moradores
das cidades.
Embora cidades em rápido crescimento impliquem desaios substanciais, elas também oferecem uma importante janela de oportunidades
para a transformação rumo a sociedades mais
sustentáveis no que diz respeito às diferentes dimensões de sustentabilidade.24 Essa janela, no
entanto, está se fechando rapidamente e resta
pouco tempo para adequar o processo de urbanização em andamento. Algumas perguntas
importantes sobre essa adequação são: como
entraves negativos de carbono podem ser evitados, quais são os tipos de soluções sustentáveis
de pequena escala existentes e como a inclusão
de milhões de cidadãos em cidades recém-planejadas pode ser garantida e fortalecida. A governança desempenha um papel essencial na
promoção dessas mudanças.25
A NOVA AGENDA URBANA
Tendo como base a última a segunda edição
da Conferência das Nações Unidas Sobre Habitação e Habitats Sustentáveis de 1996, em
Istambul, na Turquia, a Habitat III foi realizada em 2016, em Quito, no Equador, proporcionando a primeira oportunidade de transferir comprometimentos do Acordo de Paris
e da Agenda 2030 ao nível das cidades.26 A
conferência Habitat III adotou a Nova Agenda Urbana (NUA), e, embora o documento
of global urbanisation and the associated
implications for climate change mitigation and resource consumption can hardly
be underestimated. By 2050, urban infrastructure across the globe must accommodate 2.5 billion new city dwellers.
While fast-growing cities entail substantial challenges, they also offer an important
window of opportunity for the transformation towards more sustainable societies in terms of the different dimensions of
sustainability.24 However, this window is
closing quickly and little time remains to
adequately shape the ongoing urbanization
process. Key questions include how negative
lock-ins can be avoided, what kind of-scaling of small-scale sustainable solutions exist
and how the inclusion of millions of citizens
in newly-planned cities can be safeguarded
and strengthened. Governance plays an essential role in propelling these changes.25
THE NEW URBAN AGENDA
Building on the last United Nations Conference on Housing and Sustainable Habitat II in 1996 in Istanbul (Turkey), Habitat III took place in Quito (Ecuador) in
2016, providing the first chance to transfer commitments of the Paris Agreement
and 2030 Agenda to the level of the cities.26 The Habitat III conference adopted
the New Urban Agenda (NUA) and, while
the document underlines the importance
of social inclusion and calls for good urban governance, it falls short in to fully
24
WBGU, 2011.
Dick, 2016a.
WBGU, 2017.
24
WBGU, 2011.
25
25
Dick, 2016a.
26
26
WBGU, 2017.
artigo
article
74
destaque a importância da inclusão social e
convoque a boa governança urbana, ele falha
em reconhecer o quão fundamentais as cidades são para o futuro da humanidade.27
Uma dimensão essencial da NUA consiste
em enfatizar o “direito à cidade”, no sentido
de que há o direito de usufruir da sua infraestrutura e de moldar as características dessa cidade. Frente às crescentes desigualdades, esse
direito é fundamental, principalmente porque
as cidades são frequentemente marcadas por
diferenças sociais e econômicas enormes, o
que também é um tema importante da Agenda
2030. Apesar de ser positivo que a NUA peça
o aumento da capacidade das autoridades municipais para agir em níveis locais e nacionais,
o documento não se atenta à importância do
nível internacional como, por exemplo, o papel
essencial dos governos urbanos e locais no desenvolvimento de políticas da ONU.28
Hoje, a implementação da NUA pede por
uma cooperação transnacional fortalecida.
No chamado Plano de Implementação de
Quito, governos, municípios, organizações
da sociedade civil, empresas do setor privado, instituições cientíicas e outras entidades
receberam convites para enviar medidas tangíveis para a implementação da NUA. Até o
inal da conferência Habitat III, no entanto,
apenas 64 compromissos foram enviados.
Além disso, apesar de o Plano de Implementação de Quito categorizar todas as iniciativas
propostas quanto a temas abrangentes como
habitação e infraestrutura ou coesão social,
ele não esclarece como os diferentes comprometimentos devem se resumir em uma estratégia adequada de desenvolvimento urbano
em escala global.29 Outro grande desaio é o
fato de a NUA não incluir indicadores obje-
recognising how critical cities are for humankind’s future.27
One essential dimension of the NUA is
that it underlines that there is a “right
to the city” in the sense of being entitled
to use its infrastructure and shaping its
characters. In light of rising inequalities,
this right is pivotal, especially because cities are often marked by enormous social
and economic disparities, also a key theme
addressed by the 2030 Agenda. While it is
welcomed that the NUA calls for improving municipal authorities’ capacity to act
at national and local levels, the document
overlooks the importance of the international level and, for example, the essential
roles for urban and local governments in
UN policy-making.28
Implementation of the NUA now calls for
strengthened transnational cooperation. In
the so-called Quito Implementation Plan,
governments, municipalities, civil-society
organisations, private-sector companies,
scientiic institutions and other players were
invited to submit tangible measures to implement the NUA, however by the end of
the Habitat III conference, only 64 commitments were submitted. Moreover, while the
Quito Implementation Plan categorises all
proposed initiatives in light of overarching
themes such as housing and infrastructure
or social cohesion, it does not clarify how the
different commitments are meant to sum up
to an adequate urban development strategy
at the global level.29 Another key challenge is
that the NUA does not include clear-cut indicators for measuring its implementation,
27
Dick, 2016b.
27
28
Dick, 2016b.
28
Dick, 2016b.
Dick, 2016b.
29
Dick, 2016b.
29
Dick, 2016b.
cadernos fgv projetos
75
Figura 4 O importante papel das cidades na Agenda 2030
Figure 4 The key role of cities for the 2030 Agenda
Cidades e comunidades
sustentáveis
11
Sustainable cities
and communities
O Objetivo 11 de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030
busca “tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos,
seguros, resilientes e sustentáveis”, e 65% das metas só pode ser
alcançadas se forem implementadas com personagens locais.
Sustainable Development Goal 11 of Agenda 2030 seeks to
“make cities and human settlements inclusive, safe, resilient and
sustainable”. And 65% of the targets can only be achieved if they
are implemented with local actors.
16
1
17
2
15
3
14
4
65%
13
5
6
12
7
11
10
9
8
A Nova Agenda Urbana foi adotada na Conferência das Nações
Unidas Sobre Habitação e Desenvolvimento Urbano Sustentável
(Habitat III), realizada em Quito, em 2016, e é crucial para a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável globais.
The New Urban Agenda was adopted at the United Nations
Conference on Housing and Sustainable Urban Development
(Habitat III) in Quito in 2016. It is crucial to the implementation of
the global Sustainable Development Goals.
Fonte: German Development Institute - Deutsches Institut für Entwicklungspolitik (DIE). Disponível em: <https://www.
die-gdi.de/ileadmin/user_upload/pdfs/dauerthemen_spezial/DIE_Infograik_03_Urbanisierung_englisch.pdf>
Source: German Development Institute - Deutsches Institut für Entwicklungspolitik (DIE). Avaiable at: <: https://www.
die-gdi.de/ileadmin/user_upload/pdfs/dauerthemen_spezial/DIE_Infograik_03_Urbanisierung_englisch.pdf>
artigo
article
76
“
Embora cidades em
rápido crescimento
impliquem desaios
substanciais, elas
também oferecem
uma importante janela
de oportunidades
para a transformação
rumo a sociedades
mais sustentáveis no
que diz respeito às
diferentes dimensões
de sustentabilidade.
”
tivos para o acompanhamento de sua implementação, deixando em aberto como o monitoramento do impacto será realizado.30
Embora a NUA mencione os 17 ODSs, ela não
fornece novos incentivos para o debate sobre o
papel das cidades e da urbanização na Agenda
2030 e no Acordo de Paris. Isso resulta na perda de uma oportunidade importante. Ainda que
a primeira seção da NUA aponte que ela pode
contribuir para o cumprimento dos ODSs, o
documento não oferece nenhum detalhe sobre
isso. A NUA também faz referência ao Acordo
de Paris apenas duas vezes. No geral, não reconhece a enorme importância das cidades no
desenvolvimento sustentável global, na mitigação da mudança climática e na adaptação a seus
impactos. Para alcançarmos uma transformação urbana rumo à sustentabilidade, os esforços
combinados devem ser fortalecidos.31
A TRANSFORMAÇÃO URBANA
RUMO À SUSTENTABILIDADE
Frente ao desaio de aproveitar o potencial da
urbanização para cumprir a Agenda 2030 e o
Acordo de Paris, em seu mais recente relatório,
o Conselho Consultivo Alemão Sobre Mudanças Globais traduz as principais dimensões da
Agenda 2030 em uma bússola normativa que
fornece orientações para a modelagem dos processos de urbanização futuros e em andamento,
englobando três dimensões.32
A primeira delas requer que a urbanização
permaneça alinhada com os sistemas naturais
sustentáveis de suporte à vida, ao cumprir os
chamados “limites”33 ou “fronteiras planetá-
30
Dick, 2016b.
31
WBGU, 2016. WBGU, 2017.
32
WBGU, 2016.
33
WBGU, 2014.
cadernos fgv projetos
77
thereby leaving open how the monitoring of
the impact will take place.30
While the NUA mentions the 17 SDGs, it
does not provide new impetus into the debate
on the role of cities and urbanization for the
2030 Agenda and for the Paris Agreement.
This results in an important missed opportunity. Whereas the NUA’s irst section mentions that it can contribute to achieving the
SDGs, the document does not spell out any
details. The NUA also only mentions the Paris Agreement twice. Overall, the NUA does
not acknowledge the huge importance of cities for global sustainable development and
for mitigating climate change and adapting
to its impacts. To achieve the urban transformation towards sustainability, concerted
efforts must be strengthened.31
THE URBAN TRANSFORMATION
TOWARDS SUSTAINABILITY
In light of the challenge in harnessing the
potential of urbanisation to meet the 2030
Agenda and Paris Agreement, in its latest
report, the German Advisory Council on
Global Change translates the key dimensions of the 2030 Agenda into a normative
compass that offers orientation for shaping
ongoing and future urbanisation processes
entailing three dimensions.32
The irst dimension demands that urbanization remains in line with sustaining natural life-support systems by complying with
so-called planetary guard rails,33 or plane-
30
Dick, 2016b.
31
WBGU, 2016. WBGU, 2017.
32
WBGU, 2016.
33
WBGU, 2014,
“
While fast-growing
cities entail substantial
challenges, they also
offer an important
window of opportunity
for the transformation
towards more
sustainable societies
in terms of the
different dimensions
of sustainability.
”
artigo
article
78
rias”34 e ao proteger o meio ambiente local:
“todas as cidades e sociedades urbanas devem
buscar os caminhos do desenvolvimento que
considerem os limites planetários e que solucionem problemas ambientais locais. Isso envolve, por exemplo, alcançar o limite da barreira de proteção climática de 2ºC e combater
a poluição do ar prejudicial à saúde”.35
A segunda dimensão está relacionada à inclusão substantiva, política e econômica dos
habitantes das cidades: “padrões universais
mínimos para inclusão substantiva, política
e econômica devem ser alcançados em todas
as sociedades urbanas”.36 Isso inclui acesso à
alimentação, água potável limpa, saneamento, cuidados com a saúde e a educação, mercados de trabalho, direitos eleitorais e direitos processuais de informação.
A terceira dimensão da bússola normativa
para o desenvolvimento urbano refere-se à di-
tary boundaries,34 and protecting the local
environment: “All cities and urban societies
should pursue development pathways that
take the planetary guard rails into account
and solve local environmental problems.
This involves, for example, meeting the 2°C
climate-protection guard rail and combating health-damaging air pollution”.35
The second dimension is linked to the
substantive, political and economic inclusion of city dwellers: “Universal minimum standards for substantive, political
and economic inclusion should be met in
all urban societies”.36 This includes access
to food, clean drinking water, sanitation,
healthcare and education, access to labour
markets as well as electoral rights and procedural rights of information.
The third dimension of the normative
compass for urban development refers to
34
Steffen et al, 2015.
34
Steffen et al, 2015.
35
WBGU, 2016: 132.
35
WBGU, 2016: 132.
36
WBGU, 2016: 132.
36
WBGU, 2016: 132.
cadernos fgv projetos
79
versidade sociocultural e espacial das cidades
e sociedades urbanas. Essa Eigenart (palavra
que, em alemão, quer dizer “característica”) é
essencial para a criação de qualidade de vida
e identidade urbana, além de ser um recurso
indispensável para o desenvolvimento do potencial especíico de criatividade e inovação37
de cada cidade. Como dimensão orientadora
de transformações urbanas, Eigenart “enfatiza que devem ser criadas condições em ambientes de vida urbana que garantam: (a) que
as pessoas possam desenvolver autoeiciência
nas estruturas espaciais, que possam vivenciar
e criar qualidade de vida urbana para elas mesmas; (b) que seja possível desenvolver identidade local e coesão social; e (c) que ocorra um
fortalecimento do potencial para a criatividade
e a inovação social e econômica, gerado pelas
interações locais (conectividade) entre os atores de diferentes esferas da sociedade”.38
Os principais campos de ação para a transformação urbana rumo à sustentabilidade
incluem:39
the socio-cultural and spatial diversity of
cities and urban societies. This Eigenart,
a German word meaning ‘character’, is
both essential for creating urban quality
of life and identity and an indispensable
resource in the sense of developing each
city’s specific potential for creativity and
innovation.37 As an orientation dimension
of urban transformations, Eigenart “emphasizes that conditions should be created
in urban living environments which ensure: (a) that people can develop self-efficacy in the spatial structures and can feel
and create urban quality of life for themselves; (b) that local identity and social
cohesion can develop; and (c) that there
is a strengthening of the potential for social and economic creativity and innovation generated via local interactions (connectivity) between actors from different
spheres of society”.38
Key action fields for urban transformation towards sustainability include:39
Energia e Mitigação da Mudança Climática:
Energy and Mitigation of Climate Change:
as emissões de dióxido de carbono nas cidades
devem ser zeradas para permitir a transformação energética global em direção aos sistemas de energia livres de emissão de dióxido
de carbono. No entanto, o acesso à energia e à
infraestrutura ainda deve ser garantido a milhões de habitantes das cidades.
Adaptação às Mudanças Climáticas: o desenvolvimento urbano deve levar mais em consideração a necessidade de adaptação às mudanças
climáticas, por exemplo, ao integrar a mitigação
da mudança climática e a adaptação climática
em um planejamento de longo prazo e ao desenvolver estratégias de conscientização e de
preparação para desastres naturais para proteger a população.
carbon dioxide emissions in cities should
be reduced to zero to enable the global energy transformation towards carbon dixide-emissions-free energy systems. However, access to energy and infrastructure
is still must be safeguarded for millions of
city dwellers.
Adaptation to Climate Change: Urban development should take better account of the
need to adapt to climate change, for example by integrating the mitigation of climate
change and climate adaptation into longterm planning and by developing awareness raising and disaster preparedness
strategies to protect the population.
37
WBGU, 2016.
37
38
WBGU, 2016: 133.
38
WBGU, 2016: 133.
39
WBGU, 2016.
39
WBGU, 2016.
WBGU, 2016.
artigo
article
80
Mobilidade e Transporte: a mobilidade urbana oferece um potencial considerável, visto que os sistemas de transporte urbanos são
grandes responsáveis pela emissão de carbono.
Os sistemas de transporte devem ser totalmente descarbonizados, no máximo, até 2070, por
exemplo, por meio de um sistema de transporte
público local que funcione de forma adequada
e que seja bem desenvolvido, além de uma estrutura que facilite a locomoção de pedestres
e ciclistas. Ao mesmo tempo, deve-se tornar a
mobilidade inclusiva para que os indivíduos de
todas as classes sociais possam viajar pelas cidades de forma fácil e com baixo custo.
Forma Urbana: deve haver um foco maior em
conceitos lexíveis no desenvolvimento arquitetônico e urbano para aumentar as possibilidades de se responder à dinâmica populacional
ou à mudança climática. Planejamento e desenvolvimento urbano não devem apenas ter baixa
emissão de carbono, mas também devem realçar estratégias locais adaptadas que respeitem
contextos geográicos e culturais.
Redução da Pobreza e da Desigualdade: governos locais devem garantir que não só atores-chave, como também aqueles menos bem-organizados e as partes interessadas da sociedade
civil tenham perspectivas suicientes para contribuir para a modelagem do desenvolvimento
urbano e para a melhoria de suas condições de
vida, por exemplo, ao fortalecer e desenvolver
distritos informais e frequentemente precários
e ao mobilizar recursos inanceiros públicos e
privados adequados.40
Tratando-se do avanço e da apresentação de
recomendações de políticas concretas, deveríamos focar em campos de ação transformativos,
como, por exemplo, as áreas de desenvolvimento
urbano que oferecem os maiores efeitos de alavancagem potencial para a transformação urbana rumo à sustentabilidade.41
Mobility and Transport: Urban mobility
offers considerable potential, as urban
transport systems are a major driver
of carbon emissions. Transport systems
should be fully decarbonised by 2070
at the latest, for example, by means of a
properly functioning and well developed
local public transport system, and a facilitative infrastructure for pedestrians and
cyclists. At the same time, mobility should
be made inclusive so that individuals from
all income groups can travel around cities
easily and at low cost.
Urban Form: There should be a stronger
focus on flexible concepts in architecture
and urban development in order to improve possibilities to respond to population dynamics or climate change. Urban
planning and development should not
only be low-carbon in character but also
stress locally adapted strategies that respect geographical and cultural contexts.
Poverty Reduction and Inequality: Local
governments should safeguard that existing key actors, but also less well-organized, civil-society stakeholders have sufficient prospects to contribute to shaping
urban development and the improvement
of their living conditions, for example by
strengthening and developing informal,
often precarious city districts and mobilizing adequate public and private financial resources.40
In terms of the way forward and proposing concrete policy recommendations,
we should put the spotlight on transformative action ields, i.e. areas of urban development, which offer the greatest potential
leverage effects for the urban transformation towards sustainability.41
40
WBGU, 2016.
40
WBGU, 2016.
41
WBGU, 2016.
41
WBGU, 2016.
cadernos fgv projetos
81
CONCLUSÃO
CONCLUSION
As cidades são cada vez mais vistas como
os centros de desenvolvimento sustentável.
O Acordo de Paris, a Agenda 2030 e a Nova
Agenda Urbana oferecem pontos de ligação
de referência importantes e internacionais
que podem e devem ser utilizados para catalisar políticas transformadoras em todos
os níveis de ação. Para integrar as agendas
do clima, sustentabilidade e urbanização de
forma objetiva é importante que cada compromisso multilateral seja incorporado em
planos de ação nos níveis nacional e local.
Sem investimento adequado e o apoio técnico, institucional e, acima de tudo, político
adequado para implementar os planos de
ação, as ambições de mudança das declarações multilaterais facilmente serão transformadas em “negócios corriqueiros”.42
Cities are increasingly understood to be the
focal centres of sustainable development.
The Paris Agreement, 2030 Agenda and the
New Urban Agenda provide major, internationally binding points of reference which
can and must serve to catalyse transformative policies at all levels of action. In order
to integrate climate, sustainability and urbanisation agendas in a targeted way, it is
critical for each of the multilateral pledges to
be incorporated into national and local level
action plans. Without adequate investment
and the necessary technical, institutional
and, above all, political support to implement action plans, the transformative ambitions of the multilateral declarations will
easily vanish into day to day “business as
usual”.42
42
42
Brandi; Bauer; Pegels, 2016.
Brandi; Bauer; Pegels, 2016.
artigo
article
82
O objetivo deve ser a implementação simultânea e estratégica do Acordo de Paris
e dos ODSs como forma de promover uma
transformação estrutural radical em nível
global. Esse processo vai exigir criatividade e coordenação entre os diversos atores
e setores para aumentar sistematicamente
o potencial apresentado pela urbanização
para alcançar os objetivos estipulados. A
implementação efetiva do Acordo de Paris e
da Agenda 2030 pode ser capaz de marcar,
potencialmente, o inal da era dos combustíveis fósseis e incentivar a descarbonização da
economia mundial rumo ao desenvolvimento
sustentável global.43
Para cumprir esses objetivos e promover a transformação urbana sustentável, um
foco sólido deve ser mantido nas áreas de
ação previamente destacadas. Para que essas
mudanças sejam implementadas também é
essencial democratizar e fortalecer a governança urbana. Elementos essenciais de uma
abordagem como essa devem incluir a determinação da urbanização como tema central
da cooperação internacional e o reforço da
capacidade urbana de moldar políticas eicazes por meio da governança colaborativa.44
Como consequência da urbanização, observamos que os desaios e o potencial do desenvolvimento global sustentável estão cada vez
mais concentrados nas cidades. O papel das
cidades é, sem dúvidas, imperativo para a implementação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e para o cumprimento
dos objetivos do Acordo de Paris. Enquanto a
urbanização pode ser administrada de forma
alinhada com os objetivos determinados pelas
agendas internacionais de desenvolvimento
sustentável, precauções relevantes devem ser
adotadas agora para garantir que as cidades
evoluam de forma sustentável.
•
43
Brandi; Bauer; Pegels, 2016.
44
WBGU, 2016.
The goal should be the simultaneous and
strategic implementation of the Paris Agreement and SDGs as a means of promoting
a radical structural transformation at the
global level. This process will demand both
creativity and coordination among multiple
actors and sectors in order to systematically
leverage the potential presented by urbanisation to achieve the goals set. The effective
implementation of the Paris Agreement and
the 2030 Agenda could potentially mark the
end of the fossil fuel age and drive decarbonisation of the world economy in the interests of sustainable global development.43
To achieve these objectives and to promote sustainable urban transformation, a
strong spotlight must be placed on the areas of action previously outlined. In order
for these changes to be implemented, it is
also essential to democratize and strengthen urban governance. Key elements of such
an approach should include making urbanisation a central theme in international cooperation and bolstering urban capacity to
shape effective policies through collaborative governance.44
As a consequence of urbanisation, we
observe that the challenges and the potential of sustainable global development are
increasingly concentrated in cities. The
role of cities is unquestionably imperative
for implementing the 2030 Agenda for
Sustainable Development and achieving
the goals of the Paris Agreement. While
urbanisation can be managed in line with
the goals set by the international agendas for sustainable development, relevant
precautions must be taken now to ensure
that cities evolve sustainably.
•
43
Brandi; Bauer; Pegels, 2016.
44
WBGU, 2016.
cadernos fgv projetos
83
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS | BIBLIOGRAPHIC REFERENCES
Brandi, C. (2015a). Goal 11: Make cities and human settlements inclusive, safe, resilient
and sustainable. In: Loewe, Markus / Nicole Rippin (eds.), Translating an ambitious vision
into global transformation: the 2030 agenda for sustainable development, Bonn: German
Development Institute / Deutsches Institut für Entwicklungspolitik (DIE), (Discussion Paper
7/2015), p. 69-72.
Brandi, C. (2015b). The role of cities in global deals and international affairs
Interview, published on TheCityFix 2 December 2015.
Brandi, C.; Bauer, S.; Pegels, A. (2016). Paris Climate Agreement, 2030 Agenda and New
Urban Agenda: the future of transformative policies, Annual Report 2015-2016: Building
bridges between research and practice, Bonn: German Development Institute / Deutsches
Institut für Entwicklungspolitik (DIE), p. 14-17.
Brandi, C.; Scholz, I. (2017). The G20 should champion the 2030 Agenda for Sustainable Development, T20 Germany. Disponível em | Available at: <http://blog.t20germany.org/2017/03/14/the-g20-should-champion-the-2030-agenda-for-sustainable-development/>.
Casado-Asensio, J.; Steurer, R. (2014). Integrated strategies on sustainable development,
climate change mitigation and adaptation in Western Europe: communication rather than
coordination. In: Journal of Public Policy, vol. 38, nº. 3, p. 437-473.
Chen, D.; Scholz, I.; Esteves, P.; Martinez, E. (2017). Implementation of the 2030 Agenda
by G20 members: how to address the transformative and integrated character of the SDGs by
individual and collective action. Disponível em | Available at: <http://www.g20-insights.org/
policy_briefs/implementation-2030-agenda-g20-members-address-transformative-integrated-character-sdgs-individual-collective-action/>.
Dick, E. (2016a). Urban governance for sustainable global development: from the SDGs
to the New Urban Agenda (Brieing Paper 8/2016).
Dick, E. (2016b). Mixed results, Development and Cooperation (11/2016). Disponível em |
Available at: <https://www.dandc.eu/en/article/new-urban-agenda-adopted-un-conference-habitat-iii-quito-october>.
G20 (2016). G20 Action Plan on the 2030 Agenda for Sustainable Development, Hangzhou
Guranton, G. (2014): Growing through Cities in Developing Countries. In: Policy Research
Working Paper Series. Nº 6818. World Bank, Washington D.C.
Lay, J.; Brandi, C.; Das, R.U.; Klein, R.; Thiele, R.; Alexander, N.; Scholz, I (2017). Coherent G20 policies towards the 2030 Agenda for Sustainable Development. Disponível em |
Available at: <http://www.g20-insights.org/policy_briefs/coherent-g20-policies-towards-2030-agenda-sustainable-development/>.
Le Blanc, D. (2015). Towards integration at last? The sustainable development goals as a
network of targets. New York: UN DESA Working Paper Nº. 141
Loewe, M.; N. Rippin (eds.) (2015). Translating an ambitious vision into global transformation: the 2030 agenda for sustainable development. In: Discussion Paper (7/2015), Bonn:
DIE.
artigo
article
84
Messner, D.; Brandi, C. (2015). Urbanisation: a megatrend that will deine our future,
Diplomatisches Magazin (2/2015), p. 36-39.
Misselwitz, P. et al. The Urban Dimension of the SDGs: Implications for the New Urban
Agenda. In: Sustainable Development Goals and Habitat III: Opportunities for a successful
New Urban Agenda. Cities Alliance Discussion Paper nº 3. November 2015.
Müller, D. B.; Liu, G.; Lovik, A. N.; Modaresi, R.; Pauliuk, S.; Steinhoff, F. S.; Brattebo, H. (2013).
Carbon emissions of infrastructure development. In: Environmental Science & Technology 47.
Pauw, W.P.; Cassanmagnano, D.; Mbeva, K.; Hein, J.; Guarin, A.; Brandi, C.; Bock, T.;
Helms, J.; Zalewski, A.; Frommé. E.; Lindener, A.; Muhammad, D. (2016). NDC Explorer.
German Development Institute, Deutsches Institut für Entwicklungspolitik (DIE), Bonn and
African Centre for Technology Studies (ACTS). Nairobi.
Scholz, I. (2017). National Strategies for Sustainable Development between Rio 1992 and
New York 2015. In: Von Hauff, M.; Kuhnke, C. (eds.) Sustainable Development Policy: A
European Perspective (Routledge Studies in Sustainable Development), Oxford: Routledge.
Scholz, I. (2015). Introduction: A universal agenda for sustainable development and global cooperation. In: Loewe, M.; N. Rippin (eds.) Translating an ambitious vision into global
transformation: the 2030 agenda for sustainable development. Discussion Paper (7/2015),
Bonn: DIE, p. 1-9.
Scholz, I.; Brandi. C. (2017). The G20 and the 2030 Agenda for Sustainable Development,
forthcoming book chapter.
Steffen, W. et al. (2015). Planetary boundaries: Guiding human development on a changing
planet. In: Science, vol. 347, Issue 6223, DOI: 10.1126/science.
Tollin, N.; Hamhaber, J. (2017). Sustainable and Resilient Cities: SDGs, New Urban Agenda and the Paris Agreement. Disponível em | Available at: <http://eai.enea.it/archivio/smart-city/sustainable-and-resilient-cities-sdgs-new-urban-agenda-and-the-paris-agreement>.
United Nations (2015). Transforming our World: The 2030 Agenda for Sustainable Development, New York.
Un-Habitat (2016). Sustainable Urbanization in the Paris Agreement: Comparative Review
of Nationally Determined Contributions for Urban Content. Nairobi: UN-Habitat.
WBGU, Wissenschaftlicher Beirat der Bundesregierung Globale Umweltveränderungen,
German Advisory Council on Global Change (2011). World in Transition – A Social Contract
for Sustainability. Flagship Report, Berlin: WBGU.
WBGU, Wissenschaftlicher Beirat der Bundesregierung Globale Umweltveränderungen,
German Advisory Council on Global Change (2014). Human Progress within Planetary
Guard Rails – A Contribution to the SDG Debate. Policy Paper 8, Berlin: WBGU.
WBGU, Wissenschaftlicher Beirat der Bundesregierung Globale Umweltveränderungen,
German Advisory Council on Global Change (2016). Humanity on the move: Unlocking the
transformative power of cities. Policy Paper 8, Berlin: WBGU.
WBGU, Wissenschaftlicher Beirat der Bundesregierung Globale Umweltveränderungen,
German Advisory Council on Global Change (2017). New Urban Agenda: Implementation
Demands Concerted Effort Now. Berlin: WBGU.
cadernos fgv projetos
85
ARTIGO ARTICLE
PARTICIPAÇÃO
CIDADÃ E A
CRISE AMBIENTAL
NAS CIDADES:
CAMINHOS PARA O
CRESCIMENTO SUSTENTÁVEL
CITIZENS’
PARTICIPATION
AND THE
ENVIROMENTAL
CRISIS IN THE CITIES:
PATHWAYS FOR
SUSTAINABLE GROWTH
A importância da participação social para o futuro das cidades sustentáveis é o
tema deste artigo, que não só analisa os caminhos para o crescimento sustentável,
problematizando os impactos positivos e negativos das grandes cidades, como
também destaca o papel da indústria criativa, da diversidade cultural e das tecnologias
da informação e da comunicação nesse debate.
The importance of social participation to inluence the future of sustainable cities
is the theme of this article, which not only analyzes the pathways for sustainable
growth and probe into issues posed by large cities’ positive and negative impacts,
but also highlights the role of creative industry, cultural diversity and information
and communication technologies in this debate.
RONALDO LEMOS
FABRO STEIBEL
VICTOR VICENTE
RONALDO LEMOS
Diretor-fundador do ITS Rio e professor da Uerj
Founding director of ITS and professor at Uerj
Doutor em direito pela Universidade de São Paulo e mestre em direito pela Universidade de
Harvard, nos Estados Unidos. É diretor-fundador do Instituto de Tecnologia e Sociedade do
Rio de Janeiro, professor de direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e pesquisador
visitante do MIT Media Lab, sendo também liaison oficer dessa instituição para o Brasil. Foi
pesquisador das Universidades de Oxford, no Reino Unido, e de Princeton, além de professor
visitante da Universidade de Columbia, as duas últimas nos Estados Unidos.
He has a PhD in law from the São Paulo University and a Mvaster’s degree from Harvard University,
United States. He is a founding director of Rio de Janeiro Institute of Technology and Society, a law
professor at Rio de Janeiro State University, a visiting researcher at the Massachusetts Institute of
Technology Media Lab and also the latter institution’s liaison oficer for Brazil. He was a researcher
at Oxford University, United Kingdom, and at Princeton University, in addition to being a visiting
professor at Columbia University, both in United States.
FABRO STEIBEL
Diretor-executivo do ITS Rio e professor da ESPM
ITS Rio Executive Director, and professor at ESPM
Pós-doutor em consultas públicas pela Universidade Federal Fluminense e doutor em
comunicação pela Universidade de Leeds, no Reino Unido. É diretor-executivo do Instituto
de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, fellow em governo aberto pela Organização dos
Estados Americanos e pesquisador independente da Parceria para Governo Aberto no Brasil.
Também leciona inovação e tecnologia na Escola Superior de Propaganda e Marketing. Foi
pesquisador visitante na Universidade das Nações Unidas e na Universidade da Califórnia em
San Diego.
He has a post-doctorate in Public Consultations from Rio de Janeiro Federal University and
a PhD in Communication from Leeds University, United Kingdom. He is executive director of
Rio de Janeiro Institute of Technology and Society, OAS Fellow on Open Government, and an
independent researcher for the Open Government Partnership in Brazil. He teaches Innovation
and Technology at Higher School of Advertising and Marketing, and was a visiting researcher
at the United Nations University, and at the University of California San Diego.
VICTOR VICENTE
Coordenador de comunicação do ITS Rio
ITS Rio Communication Coordinator
Mestrando em tecnologias da comunicação e estéticas na Universidade Federal do Rio de Janeiro
e pós-graduado em marketing e design digital pela Escola Superior de Propaganda e Marketing.
Formou-se em jornalismo na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. É coordenador de
comunicação do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.
He is currently taking a Master’s degree in Communication Technologies and Esthetics
at the Rio de Janeiro Federal University, and holds a postgraduate degree in Marketing
and Digital Design from Higher School of Advertising and Marketing. He graduated in
journalism at the Rio de Janeiro State University. He is the communication coordinator at
Rio de Janeiro Institute of Technology and Society.
N
ão há dúvidas de que as cidades continuarão a crescer. Como apresentado na
Habitat III, a Conferência das Nações Unidas
sobre Moradia e Desenvolvimento Urbano Sustentável de 2016, espera-se que a área urbana
ocupada triplique entre os anos 2000 e 2030
– passando de 400 mil km² para 1,2 milhão de
km².1 Tendo esse número em vista e sabendo
que a população mundial já é majoritariamente
urbana,2 precisamos nos perguntar: qual modelo de cidade estamos construindo para impedir
um futuro de calamidade climática?
O economista Edward Glaeser defende
que as cidades são a principal invenção e o
grande motor da humanidade. É a partir delas que surgem as inovações e as oportunidades necessárias para transformar a ordem
atual do mundo. Alguns dados parecem contribuir para essa visão, como os índices de
desempenho econômico. As cidades respondem, em média, por 80% do Produto Interno Bruto (PIB) de um país.3 Glaeser também
pontua a importância desses centros para o
aumento da circulação de ideias e da produtividade em geral.4 O autor ainda sugere que
a característica essencial da humanidade é a
habilidade de aprender com experiências e
1 Habitat III. Cidades, Mudanças Climáticas e a Gestão de Riscos de
Desastres. Nova York, 2015.
2
UN DESA. World Urbanization Prospects. Nova York, 2014.
U
ndoubtedly, cities will continue to
grow. As presented at the 2016 UN
Conference on Housing and Sustainable
Urban Development (Habitat III), it is expected that the occupied urban area will
triplicate between 2000 and 2030 – from
400,000 km² to 1.2 million km².1 Taking
this igure into account, and knowing that
the world population is already mostly urban,2 we need to ask ourselves: what model
of city are we developing to prevent a future climate catastrophe?
Economist Edward Glaeser argues that
cities are humankind’s main invention
and its greatest engine. Innovations and
opportunities needed to transform the
world’s current order emerge from them.
Some data, such as economic performance
indexes, seem to contribute to this vision.
On average, cities account for 80% of a
country’s Gross Domestic Product (GDP).3 Glaeser also signals the importance
of urban centers for the increased circulation of ideas and productivity in general.4
In addition, the author suggests that the
essential characteristic of humankind is
its ability to learn from experiences and
1 Habitat III. Cidades, Mudanças Climáticas e a Gestão de Riscos de
Desastres. New York, 2015.
2
UN DESA. World Urbanization Prospects. New York, 2014.
3
World Bank. Cities and Climate Change: An Urgent Agenda.
Washington, 2010.
3
World Bank. Cities and Climate Change: An Urgent Agenda.
Washington, 2010.
4 Glaeser, Edward. Cities, Productivity, and Quality of Life In: Science, v.
333, n. 592. Nova York, 2011.
4 Glaeser, Edward. Cities, Productivity, and Quality of Life. In: Science
v. 333, n. 592. New York, 2011.
cadernos fgv projetos
91
conhecimentos compartilhados. Nesse sentido, são as cidades os grandes polos conectores de pessoas, possibilitando oportunidades
de troca, crescimento organizacional e abertura.5 Por outro lado, as cidades são também
responsáveis por 71% a 76% das emissões globais de gás carbônico em função do volume
de energia que produzem e consomem, além
de registrarem mais crimes violentos, desaios de mobilidade e insalubridade pública.6
Ao mesmo tempo heroína e vilã, a cidade
se tornou palco da inversão mais curiosa – e
importante – do debate ambiental contemporâneo. Defende-se, agora, que só será possível salvar a natureza se, antes, repensarmos
de maneira radical o urbano. A inversão é
curiosa porque começa a revelar a impossibilidade de pensarmos as cidades como desconectadas do ambiente, apontando para a relação de ambas na equação da existência. Há
muito tempo a cultura guia seus esforços de
desenvolvimento a partir de uma distinção
binária entre rural e urbano, bárbaro e civilizado, mas esse esquema perigoso começou
a dar sinais de esgotamento. Os esforços para
dirimir essa visão de mundo vêm de uma
profusão de setores e iguras. Todo o debate
sobre o Antropoceno, por exemplo, se funda
shared knowledge. Hence, cities are great
poles connecting people, offering opportunities for exchanges, organizational
growth, and openness.5 On the other hand,
cities are also accountable for 71-76% of
the global CO² emissions because of the
amount of energy they produce and consume. They also entail higher levels of violent crime, urban mobility challenges, and
public insalubrity.6
Hero and villain at the same time, the
city has become the stage of a curious and
important inversion in the contemporary
environmental debate. It is now argued
that it is only possible to save nature if we
begin by radically rethinking the urban.
This inversion is curious because it starts to
reveal the impossibility of relecting on the
city disconnected from the environment,
pointing to the relations between them in
life’s equation. For a long time, culture has
guided its efforts for development based on a
binary distinction between rural and urban,
barbarian and civilized. However, this dangerous approach has begun to show signs of
exhaustion. Efforts to overcome this world
view come from many different sectors and
igures. For example, the whole debate on
5
Glaeser, Edward. The Triumph of the City: How Our Greatest
Invention Makes Us Richer, Smarter, Greener, Healthier, and Happier.
Nova York: Penguin Books, 2012.
5
Glaeser, Edward. The Triumph of the City: How Our Greatest
Invention Makes Us Richer, Smarter, Greener, Healthier, and Happier.
New York: Penguin Books, 2012.
6 Renate, Christ. Technical Expert Meeting: Urban Environment at
International Panel on Climate Change. Bonn, 2014. Glaeser, Edward.
Cities, Productivity, and Quality of Life. In: Science, v. 333, n. 592. Nova
York, 2011.
6 Renate, Christ. Technical Expert Meeting: Urban Environment at
International Panel on Climate Change. Bonn, 2014. Glaeser, Edward.
Cities, Productivity, and Quality of Life. In: Science v. 333, n. 592. New
York, 2011.
artigo
article
92
“
Ao mesmo tempo
heroína e vilã, a cidade
se tornou palco da
inversão mais curiosa
– e importante – do
debate ambiental
contemporâneo.
Defende-se, agora,
que só será possível
salvar a natureza se,
antes, repensarmos de
maneira radical
o urbano.
”
na constatação do impacto humano (urbano,
civilizado) no clima da Terra e no funcionamento de seus ecossistemas (natural, ecológico), destacando a necessária reciprocidade
das partes.
De uma forma ou de outra, é esse exercício
de aproximação que precisamos trazer para
a construção conceitual e prática das cidades
sustentáveis, mas essa tentativa de integração não é simples. Há cerca de 12 mil anos,
Gobekli Tepe, o primeiro templo da humanidade, foi erguido. Alguns milênios depois,
vieram as primeiras grandes cidades da antiguidade, como Jericó e Uruk. Comumente
cercados por altos muros, esses espaços tinham a defesa como sua maior preocupação
e, nesse caso, a preocupação vinha obrigatoriamente do exterior. O propósito era criar
uma separação entre as ameaças representadas pelo lado de fora e o interior delineado
pelos muros. Essa separação conceitual se
mostrou insuiciente para lidar com a complexidade deste início do século XXI. A gênese da cidade, residindo na própria noção de
exclusão, se mostrou danosa. Devemos agora
expor essa issura no modelo adotado para
tornar imprescindível a integração entre o
ecossistema urbano, com seus modos de produção e consumo, e a natureza.
Esse esforço exige que repensemos nosso
papel social e deveres ambientais. A boa notícia é que este, talvez, seja o melhor momento
para enfrentarmos um desaio de proporções
tão grandes. Ainal, a era digital trouxe consigo
novas ferramentas e modelos de organização,
horizontalizando mecanismos de participação e
democratizando o acesso a dados fundamentais
para a tomada de decisão. É a partir desse paradigma de revolução digital que o escritor Clay
Shirky trata das relações organizacionais pós-Internet. Em seu livro Here Comes Everybody,
Shirky airma que existem as transformações de
cadernos fgv projetos
93
the Anthropocene is based on human impact
(urban, civilized) on the Earth’s climate and
on the functioning of its ecosystems (natural, ecologic) – highlighting the reciprocity
between the parts.
In any case, we need this exercise of approximation to bring about the conceptual
and practical construction of sustainable
cities. However, this integration is not a
simple task. Around 12,000 years ago,
Gobekli Tepe, humankind’s first temple,
was built. Some millennia later, the first
great cities of Antiquity, such as Jericho
and Uruk, appeared. Usually surrounded
by high walls, these spaces were mostly
concerned with defense against those beyond the walls. The purpose was to create a separation between the threats represented by the exterior and the interior
outlined by the walls. This conceptual separation has proven insufficient to tackle
the complexities of the early 21st century.
The original notion of cities based on exclusion has proven to be harmful. Now we
should unveil this fracture in the adopted
model in order to make indispensable the
integration between the urban ecosystem, with its production and consumption
modes, and nature.
This effort requires rethinking our social role and environmental duties. The
good news is that this is perhaps the best
moment to tackle such a great challenge.
After all, the digital era brought forth new
tools and organizational models, horizontalizing participation mechanisms and
democratizing access to key data for decision making. Based on this digital revolution paradigm, writer Clay Shirky
discusses the post-Internet organizational relations. In his book “Here Comes Everybody,” Shirky argues that there are
“
Hero and villain at
the same time, the
city has become the
stage of a curious and
important inversion
in the contemporary
environmental debate.
It is now argued that it
is only possible to save
nature if we begin by
radically rethinking
the urban.
”
artigo
94
article
cadernos fgv projetos
95
grau ou/e gênero: mudanças de grau são aquelas que não fazem alterar a essência da dinâmica presente, enquanto as de gênero modiicam
radicalmente sua estrutura – a ponto de substituí-la por uma nova realidade. Shirky esclarece o
conceito a partir de uma análise sobre a cultura
do compartilhamento. Segundo ele, o desejo por
compartilhar informações vem de antes da Internet, quando tínhamos cartas e jornais locais
comunitários. O que acontece com a internet é
que e-mails, mídias sociais e blogs facilitaram
tanto a prática do compartilhamento (grau) que
acabaram por estabelecer uma nova dinâmica social (gênero). Isso nos leva a perceber que
mudanças de grau, quando implementadas em
larga escala, podem gerar mudanças de gênero.7
No debate das cidades sustentáveis, precisamos nos perguntar quais são as soluções de
grau e quais são as de gênero. Precisamos de
propostas radicais para um futuro desejável.
Por isso, devemos incentivar aplicações disruptivas nas cidades, tornando-nos mais abertos a
diferentes estruturas organizacionais e a ideias
que intentem articular respostas eicientes em
larga escala. É por isso que a transição para uma
economia verde vai necessariamente requerer
investimentos massivos, não apenas em tecnologias sustentáveis, mas buscando concretizar
toda uma nova prática social em relação ao espaço e ao consumo.
Implementação de tecnologias verdes e
de uma legislação receptiva a novos modelos
de produção são passos cruciais rumo às cidades sustentáveis. Ainda assim, é também
necessário que se perceba o lugar do cidadão neste debate. A população nunca está à
margem dos acontecimentos do tempo presente. A sensação da falência ambiental já se
difunde em escolas, escritórios e casas, sendo
percebida nas mais diversas regiões e classes
transformations of degree and/or of kind.
Changes in degree are those that do not alter the current dynamics, while changes in
kind radically modify its structure – to the
point of replacing it with another reality.
Shirky clariies this concept with an analysis of the sharing culture. According to him,
the desire to share information predates
the Internet, when people used letters and
local newspapers. The Internet, e-mails,
social media, and blogs have so much facilitated sharing (degree) that it ended up
establishing a new social dynamics (kind).
This makes us understand that changes in
degree, when implemented in large scale,
can generate changes in kind.7
In debating sustainable cities, we should
ask: what solutions are of degree and what
are of kind. We need radical proposals to
attain a desirable future, thus we should
stimulate disruptive applications in cities, being more open to different organizational structures and ideas that aim to
articulate efficient large-scale solutions.
This is why the transition to a green economy will require massive investments, not
only in sustainable technologies, but also
in a new social practice in relation to the
space and consumption.
Implementation of green technologies
and legislation responsive to new models
of production are crucial steps toward
sustainable cities. Even so, it is also necessary to understand the place of the citizen
in this debate. People are never unaware
of what is presently happening. The feeling of environmental failure has already
spread to schools, offices, and households.
It is perceived in the most diverse regions
and social classes. It is exactly because of
7 Shirky, Clay. Here Comes Everybody. 1. ed. p. 149. Londres: Penguin
Books, 2008.
7 Shirky, Clay. Here Comes Everybody. 1. ed. p. 149. London: Penguin
Books, 2008.
artigo
article
96
sociais. É exatamente por essa penetração
ampla no tecido social que o problema do
“aquecimento global” começa também a ser
negado, em uma tentativa vã de retornar a
relação de interdependência da humanidade
com a natureza ao esquecimento.
Apesar de o discurso de urgência sobre essa
transição a modelos verdes ainda não ter se traduzido à prática diária, a conscientização se fez
presente. Basta lembrar das recorrentes conversas sobre a falta de chuva, o calor excessivo ou a
perda da distinção entre as estações do ano para
perceber isso. Mesmo o cuidado com a saúde
pessoal, o bem-estar do corpo e da mente, pode
ser apontado como parte dessa nova ordem.
Ecoando as palavras do diretor-executivo
do Earth Institute da Universidade de Columbia, Steven Cohen, o ambientalismo diz muito
respeito à esfera política, mas o grande desaio
é promover e aprofundar uma mudança social
acerca do tema.8 Nas últimas décadas, acompanhamos o fortalecimento de movimentos
this broad penetration of the social fabric
that the issues of “global warming” begin to be denied. This is a futile attempt
at pushing back the relation of interdependence between humankind and nature
into oblivion.
Although the discourse on the urgent
need for a transition to green models has
yet to be translated into everyday practice,
people’s awareness is already in place. It is
enough to recall the recurrent talks about
the lack of rains, excessive heat, or the loss
of separation between seasons, to recognize
this reality.
Echoing the words of Columbia University Earth Institute executive director
Steven Cohen, environmentalism has a lot
to do with the political sphere, but the key
challenge is to promote and deepen social
change around this issue.8 In the last few
decades, we have followed the strengthening of social movements that helped to
8 Cohen, Steven. Sustainability Management: Lessons from and for
New York City, America, and the Planet. New York: Columbia University
Press, 2011.
8 Cohen, Steven. Sustainability Management: Lessons from and for
New York City, America, and the Planet. New York: Columbia University
Press, 2011.
cadernos fgv projetos
97
sociais que ajudaram a repensar a igualdade de
gêneros, raças e crenças. Ainda que o sexismo, a
homofobia e o racismo continuem retornando
à superfície de maneira traumática, é inegável
que houve avanços. Esses avanços sociais, por
sua vez, foram responsáveis, em grande medida, por mudanças na política pública dos últimos anos – e não o contrário. Assim, é crucial
que se preserve (ou reconquiste) na opinião pública a importância dessas causas.
A sociedade, é claro, não é composta por
um único setor, por isso soluções devem partir de campos comuns de diálogo. Apenas assim poderemos fundar uma nova experiência
coletiva, construída a partir de um espaço
produtivo de disputas. É nesse sentido que a
emergência das cidades sustentáveis deve necessariamente passar pelo multissetorialismo:
sociedade civil, academia, setor público e privado colaborando entre si na promoção de resiliência e sustentabilidade. É exatamente por
isso que o Painel Intergovernamental sobre
Mudanças Climáticas é composto por gestores
públicos, policymakers e um grande corpo de
cientistas voluntários. Além dele, o Grupo C40
rethink the equality of genders, races, and
beliefs. Although sexism, homophobia,
and racism keep resurfacing in a traumatic manner, advances are undeniable.
In turn, these social advances were largely responsible for the changes in public
policies in recent years – and not the contrary. Thus, it is crucial to maintain (or
re-assert) the importance of these causes
in the public eye.
Of course, society is not made up of a
single sector; hence, solutions should come
from common dialogue. That is the only way
to begin a new collective experience, based
on a productive space for disputes. To this
extent, the emergence of sustainable cities
must and can only come about through a
multisectorial approach – civil society, academia, public and private sectors collaborating among themselves to promote resilience and sustainability. This is exactly why
the Intergovernmental Panel on Climate
Change (IPCC) is made up of public managers, policymakers, and a large body of volunteer scientists. In addition, the C40 Cities
artigo
article
98
de Grandes Cidades para a Liderança Climática conecta prefeitos e outros setores a partir
do reconhecimento de que o futuro do mundo
será conquistado ou perdido nas cidades.
Tendo isso em vista, o papel do cidadão na
cidade sustentável deve ser encarado como
parte de um esforço maior. Com a Internet,
a promoção e a adoção de tecnologias se horizontalizaram. As redes hiperconectaram a
população, empurrando usuários para um
novo regime de compartilhamento de bens
e ideias. Relações de poder são modiicadas
a partir disso. Tornar produtos e visões de
mundo desejáveis fez nascer uma acumulação de conhecimento sem precedentes nos
campos do marketing e da comunicação
como um todo. O sociólogo e ilósofo Maurizio Lazzarato chama essa prática, que busca
persuadir o cidadão ao invadir sua atenção
e memória, de noopolítica.9 A noopolítica
ajuda a deinir o estado atual do capitalismo
cognitivo e da economia da atenção. As utopias das cidades do futuro, sejam elas conceituadas como inteligentes, resilientes ou
sustentáveis, se subscrevem nessa lógica de
produção de desejo. Ainda assim, há todo um
campo de ressigniicação e desdobramentos
possíveis na implementação desses projetos
a partir da apropriação coletiva.
Espera-se que cerca de 70% da população mundial viva em ambientes urbanos em
2050.10 Essa tendência, concomitante a crises ambientais e econômicas, torna a cidade
o espaço de excelência para experimentação
no início do século XXI. Passamos, portanto,
por um momento de intensa reconstrução da
metrópole que oportuniza novas dinâmicas
políticas e sociais – não necessariamente benéicas. Em uma realidade de recursos escas-
Climate Leadership Group connects mayors
and other sectors, thus acknowledging that
the world’s future will be conquered or lost
in the cities.
Taking all this into account, the citizen’s
role in the sustainable city should be viewed
as part of a greater effort. With the Internet, the promotion and adoption of technologies have been horizontalized. Networks
have hyperconnected people, pushing users
into a new regimen of sharing goods and
ideas. Based on this, power relations have
been modiied. Making products and world
visions desirable have given birth to an unprecedented accumulation of knowledge in
the ields of marketing and communication
as a whole. The sociologist and philosopher
Maurizio Lazzarato called this practice
noopolitics,9 which seeks to persuade citizens by occupying their attention and memory. Noopolitics helps to deine the current
state of cognitive capitalism and the attention economy. Utopias of future cities, conceptualized as intelligent, resilient, or sustainable cities, are part of this logic of desire
production. Even so, there is an entire ield
of resigniication and possible unfoldings for
implementation of those projects based on
collective appropriation.
Seventy per cent of the world population
is expected to live in urban areas by 2050.10
This trend, together with the environmental and economic crises, makes the city the
space par excellence for experimentation
in the early 21st century. Hence, we are in a
moment of intense reconstruction of the metropolis, which creates new political and social dynamics. These dynamics are not necessarily beneicial. In a situation of scarce
9 Lazzarato, Maurizio. As Revoluções do Capitalismo. Rio de Janeiro:
Record, 2007.
9 Lazzarato, Maurizio. As Revoluções do Capitalismo. Rio de Janeiro:
Record, 2007.
10
UN DESA. World Urbanization Prospects. Nova York, 2014.
10
UN DESA. World Urbanization Prospects. New York, 2014.
cadernos fgv projetos
99
sos, como propor e implementar soluções de
maneira horizontal? O desaio é forjar uma
economia que consuma majoritariamente recursos renováveis.
resources, how can we put forward and implement horizontal solutions? The challenge
is to forge an economy that would mostly
consume renewable resources.
CIDADES COMPARTILHADAS
SHARED CITIES
A sensação geral de que as cidades estão crescendo rápido demais, e de maneira desordenada, não está alheia aos cidadãos. É grande
também a preocupação acerca dos excessivos
estímulos urbanos: altos decibéis dos carros
nas avenidas invadem casas e escritórios dos
centros às periferias, telas digitais de variados
tamanhos procuram a atenção de cada um dos
olhos que atravessam as calçadas e a experiência de violência física e mental passa a inundar
os corpos de moradores e transeuntes.
Mas ainda que a experiência vivida nas metrópoles atuais seja considerada hiperestimulante, uma transformação ainda mais poderosa
acontecia no inal do século XIX, quando o crescimento explosivo de cidades se tornou parte da
Citizens are not unaware of the general feeling that cities are growing too fast
and without order. There is also great
concern about excessive urban stimuli:
high decibels from vehicles invade households and offices from downtown to the
outskirts, digital screens of various sizes
try to capture the attention of passersby,
and the experience of physical and mental
violence inundates the bodies of dwellers
and people passing by.
Although experiences in current metropolises are considered to be hyper-stimulating, an even more powerful transformation occurred in the late 19th century,
when the explosive growth of cities be-
artigo
article
100
“
Algo incrível começava
a acontecer nas ruas
de Chicago durante
a virada do século
XIX para o XX. Pela
primeira vez na
história, sociólogos
passaram a estudar
a cidade enquanto
um laboratório social,
analisando fenômenos
como a inluência da
infraestrutura para
a organização da
população (e viceversa), os efeitos
da tecnologia na
mobilidade urbana, a
questão da segregação
e a relação de
imigrantes em
comunidades locais.
”
experiência cotidiana de maneira generalizada.
Chicago é um dos grandes exemplos desse processo de intensa urbanização e crescimento. Em
apenas dez anos, entre 1880 e 1890, a cidade
americana mais do que dobrou sua população,
chegando a 600 mil. Autores contemporâneos
relacionam esse momento caótico de aumento
da violência, da industrialização e da imigração
massiva à formalização da sociologia nos Estados Unidos.
Muitas soluções para as cidades do futuro intentam viabilizar narrativas a-históricas, afastando-se de uma longa tradição de
experiências e pensamentos. Por isso, neste
debate é também preciso observar o passado.
Algo incrível começava a acontecer nas ruas
de Chicago durante a virada do século XIX
para o XX. Pela primeira vez na história, sociólogos passaram a estudar a cidade enquanto
um laboratório social, analisando fenômenos
como a inluência da infraestrutura para a
organização da população (e vice-versa), os
efeitos da tecnologia na mobilidade urbana, a
questão da segregação e a relação de imigrantes em comunidades locais. Albion Small,
John Dewey, Louis Wirth, Herbert Mead,
Robert Park, Ernest Burgess e outros viam
em suas pesquisas um novo problema a ser
compreendido de maneira urgente. O urbano
se tornou, então, uma questão central para a
organização humana.
O corpo de pesquisa da Universidade de
Chicago pode ser uma inspiração para o debate
contemporâneo sobre novos modelos de cidade
de muitas maneiras diferentes. Podemos olhar
para a preocupação que tinham ao pensar a cidade enquanto um organismo vivo, buscando
enxergar padrões que a aproximasse de um funcionamento holístico. Ou poderíamos destacar
o esforço para coletar dados em uma época na
qual informações eram extremamente escassas.
Como estudiosos de campo, suas preocupações
cadernos fgv projetos
101
came part of the everyday experience in a
general way. Chicago is one of the best examples of this process of intense urbanization and growth. In just ten years (18801890), this U.S. city more than doubled its
population, reaching 600,000. Contemporary authors relate this chaotic period of
increased violence, industrialization, and
massive immigration to the formalization
of sociology in the U.S.
Many solutions for future cities try to
make ahistorical narratives viable, thus
taking distance from a long tradition of
experiences and relections. Hence, in this
debate one must keep the past in mind.
Something incredible was happening in the
streets of Chicago at the turn of the 19th and
the 20th centuries. For the irst time in history, sociologists began to study the city as
a social laboratory, examining phenomena
such as the inluence of infrastructure on
people’s organization (and vice-versa), the
effects of technology on urban mobility, the
issue of segregation, and the relations of
immigrants with local communities. Albion
Small, John Dewey, Louis Wirth, Herbert
Mead, Robert Park, Ernest Burgess, and
others found in their research a new problem that required urgent understanding.
Henceforth, the urban became a central issue for human organization.
In many different ways, the University
of Chicago researchers can be an inspiration for the contemporary debate on new
models of cities. We can look at their concern to reflect on the city as a living organism, and to search for patterns that would
approximate its holistic functioning. Or,
we could highlight their efforts to collect
data in a time of extremely scarce information. As field researchers, their concerns went beyond the mere description
“
Something incredible
was happening in the
streets of Chicago at
the turn of the 19th
and the 20th centuries.
For the irst time in
history, sociologists
began to study the city
as a social laboratory,
examining phenomena
such as the inluence
of infrastructure on
people’s organization
(and vice-versa), the
effects of technology on
urban mobility, the issue
of segregation, and the
relations of immigrants
with local communities.
”
artigo
article
102
transcendiam a simples descrição dos fatos humanos. O que buscavam era o conhecimento
necessário para aprofundar e gerar transformações informadas na cidade e a partir dela. Não
era cabível, airmavam, continuar em um processo de densiicação urbana sem que esse fosse
acompanhado por agentes atentos.
Do que é feita uma cidade? A Escola de
Chicago nos mostra que não apenas de sua
estrutura física. Segundo os pesquisadores
dessa escola, uma cidade fantasma, despovoada e impessoal, não poderia sequer existir.11
O que constitui o urbano ou o rural é também
sua cultura, ou culturas, as pessoas que habitam os variados espaços públicos e privados,
aproximados em geograia ou não. A interação entre essas pessoas ou grupos, a forma
como habitam e vivenciam a cidade tornam-se indispensáveis. E é a partir dessa integração entre corpos e ideias que devemos propor
a criatividade como possível solução para a
cidade sustentável. Como Steven Cohen já
alertou, a economia global precisa depender
de mais softwares (ideias, educação, interação social e entretenimento) e menos de hardwares (bens materiais).
Na virada do século XIX, o sociólogo Robert
Park apontava para o risco de retornarmos,
nas grandes cidades, ao que ele chamou de sociedades primitivas.12 Hiperestimuladas e informadas a partir de “máquinas políticas”, as
pessoas tenderiam a se identiicar em grupos
de “nós”, isolando-se do restante da cidade, os
“outros”. Quase cem anos depois, o cientista
político Robert Putnam publicaria um alerta semelhante em seu livro Bowling Alone,
quando defendeu que as expansões urbanas
possibilitadas por carros eram parcialmente
11 Wirth, Louis. O Urbanismo como modo de vida. In: O Fenômeno
Urbano. Rio de Janeiro: Zahar, 1967.
of human facts. They sought the necessary
knowledge to deepen and generate informed transformations in the city, based
on such knowledge. It was unacceptable,
they argued, to proceed with a process of
urban densification without follow-up by
attentive agents.
What a city is made of? The Chicago
school shows us that it is not merely a physical structure. According to the researches of this school, a ghost city, unpopulated
and impersonal, could not even exist.11 What
makes up the urban or the rural is also culture (or cultures), the people who inhabit
the various public and private spaces, geographically close or not. Hence, the interaction between these people or groups, the
form of inhabiting and experiencing the city
has become indispensable. We should put
forward creativity as a possible solution for
the sustainable city, based on this integra-
12 Park, Robert. The City: Suggestions for the Investigation of Human
Behavior in the Urban Environment. Chicago: The University of Chicago
Press, 1915.
11 Wirth, Louis. O Urbanismo como modo de vida. In: O Fenômeno
Urbano. Rio de Janeiro: Zahar, 1967.
cadernos fgv projetos
103
culpadas pela diminuição do capital social e da
participação cívica dos americanos.13 Parece
que quanto mais tempo perdemos no trânsito,
nos deslocamentos entre condomínios e escritórios, menos participamos da vida pública.
Esses dois fenômenos, pensamento isolado
e distanciamento geográico, parecem contribuir para um estado generalizado de medo nas
metrópoles latino-americanas, como aponta o
semiólogo, antropólogo e ilósofo colombiano
Jesús Martín-Barbero.14 Ele critica esses espaços enquanto agentes de homogeneização
ou anulação das diferenças, exercendo mais
impacto nesse sentido que os próprios meios
de comunicação. Na relação entre a máquina
política e a cultura como produtoras de uma
cidade sem “outros”, é possível redescobrir
a democracia na própria relação com a diferença. Exatamente por isso, os modelos de
tion of bodies and ideas. As Steven Cohen
already warned, the global economy should
rely more on software (ideas, education, social interaction, entertainment) and less on
hardware (material goods).
At the turn of the 19th century, the sociologist Robert Park warned against the risk of
a return to what he denominated primitive
societies in the large cities.12 Hyperstimulated and informed by “political machines,”
people would tend to identify themselves in
groups of “us” isolated from the rest of the
city – the “others”. Almost 100 years later,
the political scientist Robert Putnam would
publish a similar warning in his book “Bowling Alone,” where he argued that the urban
expansion made possible by cars was partially responsible for diminishing social capital and Americans’ ‘civic participation.13 It
seems that the more time we lose in trafic,
in traveling between condos and ofices, the
less we participate in public life.
These two phenomena – isolated relection and geographic distance – seem to
have contributed to generalized fear in Latin American metropolises, as argued by the
Colombian anthropologist and philosopher
Jesús Martín-Barbero.14 He criticizes those
spaces as agents of homogenization or annulment of differences, having more impact
than the media. In the relation between the
“political machine” and culture as producers of a city without “others,” it is possible
to rediscover democracy in the very relations with the difference. This is exactly
why the models of sustainable, intelligent,
12 Park, Robert. The City: Suggestions for the Investigation of Human
Behavior in the Urban Environment. Chicago: The University of Chicago
Press, 1915.
13 Putnam, Robert. Bowling Alone. New York: Touchstone Books by
Simon & Schuster, 2000.
13 Putnam, Robert. Bowling Alone. New York: Touchstone Books by
Simon & Schuster, 2000.
14 Martín-Barbero, Jesús. ¿Desde dónde pensamos la comunicación hoy?
In: Revista Latinoamericana de Comunicación, n. 128. p. 13-29. Equador:
CIESPAL, 2015.
14 Martín-Barbero, Jesús. ¿Desde dónde pensamos la comunicación
hoy? In: Revista Latinoamericana de Comunicación. n. 128. pp. 13-29.
Ecuador: CIESPAL, 2015.
artigo
article
104
cidades sustentáveis, inteligentes ou criativas
devem necessariamente atravessar esse debate, tendo em vista a positivação produzida
pela ampla participação de diferentes grupos
sociais e setores. Nas novas utopias da cidade, há sérios riscos de adotarmos modelos que
viabilizam concentração de poder em graus
sem precedentes e isso só será evitado se horizontalizarmos a criação de modelos.
Onde impera a vontade do afastamento, a
criatividade será sempre tangencial. Por isso,
é preciso estimular na indústria criativa a produção plural, que funcione sobre os pilares de
ciclos virtuosos de cooperação mútua. A teoria econômica por muitos anos prestou-se a
tratar do papel da competição no desenvolvimento. O economista Joseph Schumpeter, por
exemplo, introduziu com retumbante sucesso
o conceito de destruição criativa15 para expressar a lógica de substituição que, ele defendia,
é inerente ao capitalismo. “Esse processo de
destruição criativa é o fato essencial sobre o
capitalismo. É no que o capitalismo consiste
e é o que precisa preocupar cada capitalista”,
escreveu ele em seu livro Capitalism, Socialism and Democracy. Para Schumpeter, o empreendedor era a força que sustentava o crescimento econômico a longo prazo, destruindo
as possibilidades de estagnação do sistema de
duas formas básicas: ao incentivar que empresas consolidadas continuassem investindo
em melhores produtos e ao trazer novas ideias
que iriam suplantar processos e produtos ultrapassados. Não se argumenta contra isso,
mas é importante deslocar os debates econômicos também para a cooperação.
Em The Intercultural City,16 Charles Landry e Phil Wood fazem exatamente isso. Os
or creative cities should necessarily transverse this debate, taking into account the
positive impact of broad participation of
different social groups and sectors. In the
new urban utopias, there are serious risks
of adopting models that would result in unprecedented power concentration. This can
only be prevented by horizontalizing the
creation of the models.
Wherever the will to keep others at a distance prevails, creativity will always be tangential. Hence, it is necessary to stimulate
plural productions in the creative industry,
based on virtuous cycles of mutual cooperation. For many years, economic theory tried
to tackle the role of competition in development. For example, the economist Joseph
Schumpeter introduced with resounding
success the concept of creative destruction15
to explain the logic of substitution that, he
argued, was inherent to capitalism. “This
process of creative destruction is the essential fact about capitalism. It is what capitalism consists in and what every capitalist
concern has got to live in,” he wrote in his
book “Capitalism, Socialism and Democracy.” For Schumpeter, the entrepreneur was
the force supporting long-term economic
growth, destroying stagnation trends in two
basic ways: stimulating consolidated companies to continue investing in better products, and bringing forth new ideas to overcome outdated processes and products. We
do not argue against this view, but we think
it is also important to shift economic debates
toward cooperation.
In “The Intercultural City,”16 Charles
Landry and Phil Wood do exactly this.
15 Schumpeter, Joseph. Capitalism, Socialism and Democracy. Londres:
Routledge, 1943.
15 Schumpeter, Joseph. Capitalism, Socialism and Democracy. London:
Routledge, 1943.
16
Wood, Phil; LANDRY, Charles. The Intercultural City: Planning for
Diversity Advantage. Londres: Routledge, 2007.
16 Wood, Phil; Landry, Charles. The Intercultural City: Planning for
Diversity Advantage. London: Routledge, 2007.
cadernos fgv projetos
105
autores conclamam cidades a promoverem
ecossistemas de diversidade, já que, nesta era
de intensa mobilidade, a atração de talentos
e culturas diferentes deve gerar indústrias
mais produtivas. Seus argumentos baseiam-se em tradições literárias que possibilitam
quatro conclusões:
These authors call on cities to promote
diversity ecosystems, as in this epoch of
intense mobility attracting talents and
different cultures should generate more
productive industries. Their arguments
are based on literary traditions that enable four conclusions:
1. Cidades cosmopolitas atraem e retêm
talentos por recebê-los com diversidade;
2. Empresas inclusivas estão mais preparadas para desaios e internacionalização;
3. Promoção de ambientes de diferença
e troca favorece a criatividade;
4. Choques culturais podem gerar estratégias de superação.
Cosmopolitan cities attract and retain talents because they are received
with diversity.
2.
Inclusive enterprises are better prepared for challenges and internationalization.
3.
Promoting environments with differences and exchanges facilitates creativity.
4. Cultural shocks can generate winning strategies.
1.
artigo
article
106
“
EM NOSSA SOCIEDADE HIPERCONECTADA,
SURGEM INÚMERAS NOVAS FORMAS DE
PARTICIPAÇÃO PARA O PLANEJAMENTO
E A EXECUÇÃO DE MODELOS DE
METRÓPOLES. A CIDADE SUSTENTÁVEL
DEVE SER OPORTUNIZADA A PARTIR DISSO,
PROMOVENDO AMPLA PARTICIPAÇÃO
DE QUEM É AFETADO PELO MOMENTO
CLIMÁTICO GLOBAL: TODOS NÓS.
“
”
MANY NEW FORMS OF PARTICIPATION FOR
PLANNING AND EXECUTING CITY MODELS
EMERGE IN OUR HYPERCONNECTED SOCIETY.
HENCE, THE SUSTAINABLE CITY SHOULD
BE MADE POSSIBLE THROUGH BROAD
PARTICIPATION OF THOSE AFFECTED BY
GLOBAL CLIMATE CHANGE: ALL OF US.
”
cadernos fgv projetos
107
A produção de ideias e novos modelos ao
desaio da sustentabilidade passa tanto por
um novo cosmopolita, como proposto também por Ackbar Abbas em Cosmopolitan
De-scriptions: Shanghai and Hong Kong,17
quanto por grande atenção aos fenômenos
e produções locais. Se cidades sustentáveis
demandam repensar práticas de produção,
consumo e um novo urbanismo, este sendo
humano e não meramente territorial, o artista e oleiro Theaster Gates pode ser fonte
de inspiração. Ele vive em Chicago, mas no
lado sul da cidade, que registra altos índices
de desemprego, abandono de residências e
violência. Há alguns anos, Theaster fundou
a Rebuid, uma organização criada para viabilizar a recuperação dessa parte de Chicago. O artista/empreendedor começou esse
trabalho coletando materiais de casas abandonadas para, com eles, criar arte. A renda
gerada pela venda das obras era convertida
em investimento para manutenção e construção de espaços de convívio cultural, como
uma biblioteca, um cinema negro, uma casa
de música e um grande centro de cultura –
erguido a partir da estrutura de um antigo e
falido banco. Suas ações reforçam o senso de
comunidade local, além da valorização e do
resgate da identidade negra, que representa
99,6% da população que ali vive.
A importância dessa experiência não deve
ser menosprezada por pesquisadores e policy
makers que trabalham com cidades. Theaster
recupera objetos esquecidos, ilumina-os e dá
novo valor a eles. Além disso, ele compreende
o papel do espaço e da beleza para positivar
sensibilidades dos moradores locais. Também
se esforça para estimular a tradição negra da
região, evitando práticas a-históricas. Por im,
propõe participação coletiva nesses projetos,
The production of ideas and new models
to meet the sustainability challenge goes
through a new cosmopolitan approach, as
proposed by Ackbar Abbas in “Cosmopolitan De-Scriptions: Shanghai and Hong
Kong,”17 as well as through great attention
to local phenomena and productions. If sustainable cities require rethinking production and consumption practices, as well as
a new urbanism – the latter being human
and not merely territorial – the artist and
ceramist Theaster Gates can be a source of
inspiration. He lives in Chicago, but in the
south of the city, with high unemployment,
abandoned homes, and violence. Some years
ago, Theaster founded Rebuild, an organization created to recover southern Chicago.
The artist/entrepreneur began this work by
collecting materials in abandoned houses to
create art with them. The income from the
sales of these works was invested in maintaining and building cultural spaces, such
as a library, a Black movie theater, a music hall, and a large cultural center, erected
where there was an old and failed bank. His
actions reinforce the sense of local community, in addition to valuing and recovering
the Black identity. Blacks account for 99.6%
of the population in this part of the city.
The importance of this experience should
not be underestimated by researchers and
policymakers working with cities. Theaster recovers forgotten objects, illuminates
them and assigns new value to them. In addition, he understands the role of space and
beauty to enhance local dwellers’ sensitivity. He also makes an effort to stimulate the
region’s Black tradition, avoiding ahistorical practices. Finally, he proposes collective
participation in those projects, knowing
17
Abbas, Ackbar. Cosmopolitan De-scriptions: Shanghai and Hong
Kong. In: Public Culture. v. 12. n. 3. p. 769-786, 2000.
17 Abbas, Ackbar. Cosmopolitan De-Scriptions: Shanghai and Hong
Kong. In: Public Culture. v. 12. n. 3. pp. 769-786, 2000.
artigo
article
108
“
Mas a conectividade
não irá retroceder,
demandando
novas formas de
participação.
Aplicações, leis e
dispositivos atuais
devem se aprimorar
para continuar
potencializando novas
formas de democracia
”
sabendo que a mudança deve sempre ser liderada por quem vive a situação-objeto de maneira cotidiana. Está aí um modelo de cidade
que deveria ser mais propagandeado.
CIDADANIA INTELIGENTE
E O ESPAÇO URBANO
A vida urbana se acelerou. Produtividade e a
superação do tempo livre tornaram-se questões centrais para o pensamento na economia
global. O escritor e crítico de arte Jonathan
Crary, por exemplo, demonstra já no início de
seu livro 24/718 que o sono se tornou uma espécie de fronteira inal para o trabalho, citando
estudos e experimentos que buscam permitir
que pessoas iquem sem dormir e ainda continuem produzindo, funcionando de maneira eiciente. Há uma erosão do sono acontecendo a
todo momento na cultura atual, tendo como im
principal a manutenção da ordem competitiva.
O sono não é mais visto como algo natural e necessário, ele diz, mas passível de gestão a partir
de instrumentalizações. As tecnologias digitais,
claro, são inerentes a esse processo. Pervasivos
à vida, esses dispositivos vão se acumular para
capturar os minutos de ócio da população. Ilustrando esse argumento, o autor sugere que o ato
de dormir nos dias atuais se assemelha mais ao
modo sleep dos computadores: nunca completamente desligado, apenas atuando em uma reserva de energia para que essa seja novamente
acionada a qualquer instante.
Quando Robert Putnam escreveu sobre o impacto do espalhamento urbano para o declínio
da participação cívica e do sentido de comunidade, o que queria demonstrar eram os efeitos
do distanciamento, da individualização e da falta de tempo para a vida social.19 Aqui também a
18 Crary, Jonathan. 24/07: Capitalismo Tardio e os Fins do Sono. São
Paulo: Cosac Naify, 2014.
19
Putnam, Robert. Bowling Alone. New York: Touchstone Books by
Simon & Schuster, 2000.
cadernos fgv projetos
109
full well that change should always be led
by those who experience the situation every
day. This is a model of city that deserves
more diffusion.
SMART CITIZENSHIP AND THE
URBAN SPACE
Urban life has accelerated. Productivity
and overcoming free time have become
central issues of the global economy. For
example, the writer and art critic Jonathan Crary has demonstrated at the beginning of his book “24/7”18 that sleep has
become a sort of final frontier for work.
He quotes studies and experiments which
seek to allow people to skip sleep and
still be efficiently productive. In the current culture there is an ongoing erosion
of sleep with the main objective of maintaining the competitive order. Sleeping
is no more viewed as natural and necessary, but as something that can be instrumentally managed. Clearly, digital
technologies are intrinsic to this process.
Pervasive in our lives, these devices will
capture people’s idle minutes. Illustrating
his argument, the author suggests that the
act of sleeping in our time is similar to the
computers’ sleep mode: never completely
off, but using an energy reserve to be activated at any instant.
When Robert Putnam wrote about the
impact of urban spreading on declining
civic participation and sense of community, he wanted to demonstrate the effects of
distancing, individualization, and lack of
time for social life.19 In this case technolo18 Crary, Jonathan. 24/07: Capitalismo Tardio e os Fins do Sono. São
Paulo: Cosac Naify, 2014.
19 Putnam, Robert. Bowling Alone. New York: Touchstone Books by
Simon & Schuster, 2000.
“
However, connectivity
will not retrogress;
it will demand new
forms of participation.
Applications,
instruments, and laws
should continue to be
enhanced to make
new forms of
democracy viable.
”
artigo
article
110
tecnologia está implicada, ainal são os carros que intensiicam o espalhamento urbano. Mas há uma curiosa oposição entre essas
duas visões do impacto tecnológico na vida
urbana. Para Crary, as tecnologias se mobilizam como parte de uma organização ampla
que demanda mais produtividade. Assim,
necessariamente estamos conectados a uma
rede que é externa ao “eu”, já que é assim que
se pode produzir nas sociedades contemporâneas. Já para Putnam, a organização urbana viabilizada pelo carro nos afastava uns
dos outros, individualizando-nos e de certa
forma privatizando a experiência que antes
era pública.
Mas por que visões tão distintas? Em uma
frase: devido às tecnologias da informação
e comunicação. É a partir delas, ainal, que
fundamos o que muitos vêm a chamar de sociedade em rede. Nicholas Negroponte é um
dos autores que mostram como as tecnologias
digitais transformariam o mundo de maneira
gy is also involved as cars intensify urban
sprawl. However, there is a curious opposition between those two views of the technological impact on urban life. For Crary, technologies are mobilized as part of a broad
organization that requires more productivity. Thus, we are necessarily connected to a
network external do the “self” because that is
how one can produce in contemporary societies. While for Putnam, urban organization
made possible by cars set us apart, individualizing and in a way privatizing an experience that used to be public.
But why are these views so different? In
one sentence: because of information and
communication technologies. After all, it is
based on these technologies that we founded what came to be known by many as networked society. Nicholas Negroponte is one
of the authors who have shown how digital
technologies have radically changed the
world. In a passage of “Being Digital,” pub-
cadernos fgv projetos
111
radical. Em um trecho de Being Digital, publicado em 1995, ele escreveu: “A maior parte
da informação é entregue a nós na forma de
átomo: jornais, livros. Medimos o comércio e
escrevemos nossas planilhas de balanço em
átomos. O Acordo Geral de Tarifas e Comércio é sobre átomos. Um bit não tem cor, peso
ou tamanho, e pode viajar na velocidade da
luz. É o menor elemento atômico do DNA da
informação”.20 Essa distinção entre átomos,
materiais físicos, e bits, os digitais, é a base
da compreensão de quase tudo no mundo
atual. A infraestrutura, ou seja, as instalações
necessárias para o funcionamento do espaço,
de países e de cidades, não é mais meramente
analógica, composta por átomos. É também
bits de informação. A vida social agora é permeada, suportada por tecnologias digitais.
Em nossa sociedade hiperconectada, surgem inúmeras novas formas de participação
para o planejamento e a execução de modelos de metrópoles. A cidade sustentável deve
ser oportunizada a partir disso, promovendo
ampla participação de quem é afetado pelo
momento climático global: todos nós. Da
mesma forma, não basta participação apenas
da sociedade civil, mas colaboração multissetorial para que tenhamos avanços reais e políticas públicas efetivas.
Algumas iniciativas brasileiras já procuram construir essa relação. O aplicativo Colab, por exemplo, conecta cidadãos a prefeituras para que ambos tenham um canal
de comunicação rápido e desburocratizado
para solução de problemas. O usuário pode
fazer denúncias, como buracos na rua, água
parada ou poluição, e propor melhorias. No
momento em que este texto é escrito, cerca
de 100 cidades já estão na plataforma, que
20
Negroponte, Nicholas. Being Digital. New York: Vintage, 1996.
lished in 1995, he wrote: “Most of our information is delivered to us in the form of atoms: newspapers, books. We measure trade
and write our balance sheets with atoms in.
The General Agreement on Tariffs and Trade
is about atoms. A bit has no color, size, or
weight and it can travel at the speed of light.
It is the smallest atomic element of the DNA
of information.”20 The distinction between
atoms, physical materials, and bits (digital)
is the basis for understanding almost everything in the current world. The infrastructure, i.e., the necessary installations for the
functioning of spaces, cities, and countries,
is no longer merely analogic, made up of atoms. It also comprises bits of information.
Social life is now permeated, supported by
digital technologies.
Many new forms of participation for
planning and executing city models emerge
in our hyperconnected society. Hence, the
sustainable city should be made possible
through broad participation of those affected by global climate change: all of us.
Likewise, participation of civil society is not
enough; multisectorial collaboration is necessary to attain real advances and to implement public policies.
Some Brazilian initiatives already seek
to build this relation. For example, the application Colab connects citizens and municipal governments so both can have a
fast and debureaucratized communication
channel to solve problems. Users can report
problems, such as street potholes, stagnant
water or pollution, as well as propose improvements. As of this writing, about 100
cities are already on this platform, which
has 155,000 users, 35,000 requests re20
Negroponte, Nicholas. Being Digital. New York: Vintage, 1996.
artigo
article
112
conta com 155 mil usuários, 35 mil pedidos
resolvidos e 38 consultas públicas realizadas
por prefeituras.
Já a plataforma Mudamos, desenvolvida
por nossa equipe no Instituto de Tecnologia e
Sociedade do Rio (ITS Rio), disponibiliza projetos de lei de iniciativa popular para assinaturas
digitais pela primeira vez na história do Brasil.
A partir do aplicativo, cidadãos podem exercer
a democracia direta criando ou apoiando projetos de lei que, segundo a Constituição brasileira,
devem ser votados nas Casas Legislativas caso
atinjam o número mínimo de assinaturas deinido por lei. O aplicativo foi lançado em abril de
2017 e após dois meses no ar já conta com usuários de mais de 3.190 municípios do país, mais
de 50% do total nacional. Todos os municípios
com mais de 90 mil habitantes já têm usuários
do aplicativo. Mais interessante: dos seis projetos de lei de iniciativa popular que já foram
propostos usando o aplicativo, quatro dizem
respeito a cidades mais sustentáveis.
solved, and 38 public consultations done by
municipal governments.
The platform Mudamos, developed by
our staff at ITS Rio, makes available draft
popular initiative legislative proposals
for digital signature for the first time in
Brazil. Based on this application, citizens
can exercise direct democracy, creating or
supporting draft proposals that, according to the Brazilian Constitution, should
be voted by the Legislative if they reach the
minimum number of signatures required
by law. Launched in April 2017, after two
months it already had users in 3,190 Brazilian municipalities – over 50% of the national total. All municipalities with more
than 90,000 people already have users of
this application. It gets more interesting:
out of six popular initiative legislative
proposals using the application, four were
related to more sustainable cities.
cadernos fgv projetos
113
Essa oportunidade de participação direta na vida política e na construção de cidades horizontais ainda é embrionária. Basta
lembrarmos que a Internet se massiicou no
Brasil a partir dos anos 2000 para vislumbrarmos o quão novas são todas essas ferramentas. Mas a conectividade não irá retroceder, demandando novas formas participação.
Aplicações, leis e dispositivos atuais devem
se aprimorar para continuar potencializando
novas formas de democracia. Essa colaboração em massa deve ser o principal caminho
para um futuro de estabilidade ecológica nas
cidades. Como os autores Michal Lyons, Carin Smuts e Anthea Stephens indicam, o desenvolvimento de projetos e construções não
necessariamente demanda participação de
comunidades locais, mas efeitos positivos são
prolongados quando há mais colaboração.21
Estamos frente a um desaio ecológico enorme. Períodos como este podem gerar soluções
em prol do avanço da igualdade social, política
e econômica. Mas é também durante a crise que
surgem as respostas mais cruéis da história,
como as ditaduras, a escravidão e os extermínios. Uma das primeiras iniciativas do desastroso Grande Salto Adiante, lançado na China por
Mao Tsé-Tung em 1958, foi a Campanha das
Quatro Pragas. Nela, Mao Tsé-Tung ordenou
que pardais fossem caçados e mortos para que
estes deixassem de comer as sementes de plantações do povo chinês. O extermínio dos pardais
gerou um desequilíbrio ecológico drástico, permitindo a proliferação de animais que atacaram
as plantações do país. Essa campanha foi uma
das inúmeras ações do governo que acabaram
por gerar a Grande Fome Chinesa, que causou a
morte de 20 a 30 milhões de pessoas.
21
Lyons, Michal; Smuts, Carin; Stephens, Anthea. Participation,
Empowerment and Sustainability: (How) Do the Links Work? Urban
Studies, v. 38. n. 8 p. 1233–1251, 2001.
This opportunity to directly participate in
political life and in the construction of horizontal cities is still embryonic. We just have
to recall that the Internet began to reach
massive number of users in Brazil only in the
2000s to realize how new all these tools are.
However, connectivity will not retrogress;
it will demand new forms of participation.
Applications, instruments, and laws should
continue to be enhanced to make new forms
of democracy viable. This massive collaboration should be the main pathway for the
future ecological stability of cities. As the
authors Michal Lyons, Carin Smuts, and
Anthea Stephens indicated, project development and construction do not necessarily
require participation of local communities,
but prolonged positive effects result from
that collaboration.21
We face a huge ecological challenge.
Periods such as this one can generate
solutions that advance social, political,
and economic equality. However, during
crises, the cruelest answers also emerge,
such as dictatorships, slavery, and exterminations. One of the first initiatives of
Mao Zedong’s Great Leap Forward (1958)
was the Four Pests Campaign. In this campaign Mao ordered people to hunt down
and kill sparrows that ate seeds in Chinese
farms. Extermination of sparrows resulted in a drastic ecological imbalance, allowing the proliferation of other animals
that attacked the country’s farmlands.
This campaign was one of many government actions that ended up generating the
Great Chinese Famine that killed 20-30
million people.
21
Lyons, Michal; Smuts, Carin; Stephens, Anthea. Participation,
Empowerment and Sustainability: (How) Do the Links Work? Urban
Studies, v. 38. n. 8 pp. 1233–1251, 2001.
artigo
article
114
Naquela época, não havia meio viável
para descentralizar o processo de tomada
de decisão, mas hoje há. Soluções de séculos anteriores, como taxação, redução de
impostos e ains, são importantes, mas não
serão suicientes para contornarmos a crise
ambiental. É necessário que a população se
envolva, cocriando soluções para uma cidade sustentável e inclusiva a partir de experiências individuais. Como a sociológa María
Ángeles-Duran22 nos mostra, não é possível
falar em apenas uma cidade, tendo em vista que essa só existe a partir da experiência
de cada um de seus moradores e visitantes.
A cidade é múltipla, repleta de sensações
e experiências contraditórias. O problema
ambiental é uma das teias que deve conectar
toda essa experiência, e boas soluções serão
construídas a partir disso.
At the time, there was no viable means to
decentralize the decision-making process.
But today we have. Solutions from past centuries, such as taxation, tax reduction, and
other similar proposals are still important,
but they are not suficient to overcome the
current environmental crisis. People’s involvement is needed, co-creating solutions
for a sustainable city, including from their
individual experiences. As the sociologist
María Ángeles-Duran22 has shown us, it is
not possible to speak of just one city, as a city
only exists based on the experience of each
of its dwellers and visitors. Hence, the city
is multiple, illed with contradictory sensations and experiences. The environmental
issue is one of the webs connecting all this
experience; based on this, good solutions
will be built.
22 Ángeles-Duran, María. La Ciudad Compartida. Santiago do Chile:
Ediciones SUR, 2008.
22 Ánglees-Duran, María. La Ciudad Compartida. Santiago de Chile:
Ediciones SUR, 2008.
•
•
cadernos fgv projetos
115
ARTIGO ARTICLE
MODELOS DE
NEGÓCIO EM
ECONOMIA
COLABORATIVA:
ESTRUTURAS E IMPACTOS NO ÂMBITO DAS CIDADES
BUSINESS
MODELS IN THE
COLLABORATIVE
ECONOMY:
STRUCTURES AND IMPACTS IN THE URBAN CONTEXT
Neste artigo, a autora apresenta uma relexão acerca dos conceitos relacionados à economia
colaborativa e dos seus respectivos impactos na sociedade, geograicamente representada
pelas cidades. A autora analisa a ampliação das estruturas em rede, o avanço da tecnologia
e a importância do incentivo à inovação. A partir desses três eixos, avalia como novas
empresas estão se desenvolvendo e modiicando o mercado.
In this article, the author relects on concepts related to the collaborative economy
and its respective impacts on society, geographically represented by cities. The
author analyses the expansion of network structures, the advancement of technology
and the importance of encouraging innovation. From these three pillars the author
evaluates how new companies are developing and modifying the market.
ROSSANA PAVANELLI
Coordenadora de MBA e professora da FGV
MBA Coordinator and Professor at FGV
Doutora em administração pela Universidade Cristã da Flórida, nos Estados Unidos, mestre
em gestão empresarial pela Fundação Getulio Vargas, com especialização pela mesma
instituição. Possui Certiicação MBA Internacional em Marketing e Business, junto à
Universidade Chinesa de Hong Kong. É coordenadora e professora do Post MBA em Gestão
da Inovação da FGV. Também leciona no Programa de Educação Continuada de Economia
Criativa e Cidades Criativas da EAESP/FGV. Presta assessoria técnica para a FGV Projetos,
onde coordenou projetos para o governo e a iniciativa privada.
PhD in Business Administration from Florida Christian University, United States, Master in
Business Management from Fundação Getulio Vargas, specializing in the same institution.
She holds an MBA in International Business and Marketing from The Chinese University
of Hong Kong. She is a coordinator and professor of Post-MBA in Innovation Management
at FGV. She also teaches in the Further Education Program entitled Creative Economy and
Creative Cities at EAESP/FGV. Provides technical advice to FGV Projects, where she has
coordinated projects for the government and private sector.
INOVAÇÃO E ECONOMIA
COLABORATIVA:
CONTEXTO GERAL1
INNOVATION AND THE
COLLABORATIVE ECONOMY:
GENERAL CONTEXT1
Esta introdução tem por objetivo apresentar
o contexto geral que possibilitou a ampliicação das estruturas de rede, que representam
a base da chamada economia colaborativa,
fundamentada em inovação, tecnologia e capacidade operacional excedente.2
É inquestionável que a tecnologia tem proporcionado grandes mudanças no cenário
mundial e a inovação é a base para a obtenção
de resultados que levem ao aprimoramento
da performance, seja esta relacionada ao âmbito organizacional ou social, representado
geograicamente por cidades e nações.
O economista Joseph Schumpeter3 atenta
para dois formatos de inovação: o primeiro
trata da inovação incremental, que resulta
de melhorias em processos, métodos ou produtos, e o segundo trata da inovação radical,
This introduction aims to present the general context that allowed the ampliication of
network structures which form the basis of
the so-called collaborative economy, based
on innovation, technology and surplus operational capacity.2
There is no doubt that technology has
brought great changes in the global scenario and innovation is the basis for achieving
results that lead to improved performance.
This holds true when related to organizational or social contexts represented geographically by cities and nations.
The economist Joseph Schumpeter3 focuses on two forms of innovation: the irst deals
with incremental innovation, which results
from improvements in processes, methods
or products, and the second deals with rad-
1 Todos os dados e informações deste artigo foram consolidados a partir
de análises de referências em modelos de negócios da chamada economia
colaborativa, considerando informações públicas disponíveis e pesquisas
primárias realizadas, estando os mesmos contemplados em tese inédita –
não antes publicada, defendida pela autora em 08 de dezembro de 2016
junto à Florida Christian University (FCU) para obtenção do título de
Doctor of Philosophy in Business Administration (PhD). Ressalta-se que
as informações e o conteúdo aqui publicados fazem parte de um livro que
será publicado no segundo semestre de 2017. A título de complementação,
foram acrescentadas novas relexões e perspectivas, a im de possibilitar
um olhar mais aguçado sobre os impactos na sociedade e nas cidades,
destacando-se questões de sustentabilidade.
1
All the data and information in this article were consolidated
from the analysis of references in business models of the so-called
collaborative economy, considering available public information and
primary research carried out, and are the same as those used in the
unpublished thesis defended by the author on December 8, 2016 at Florida
Christian University (FCU) to obtain a PhD of Philosophy in Business
Administration (PhD). It should be emphasized that the information and
content published here is part of a book that will be published in the second
half of 2017. Over and above, new relections and perspectives were added
to enable a sharper look at the impacts on society and cities, highlighting
sustainability issues.
2 Esta introdução é embasada em artigo publicado pela mesma autora na
Revista Excelência em Gestão, da Fundação Nacional da Qualidade (FNQ)
– edição número 09 de outubro de 2016.
3
Schumpeter (1939).
2 This introduction is based on an article published by the same author
in the Revista Excelência em Gestão from the Fundação Nacional da
Qualidade (FNQ) - edition number 09, October 2016.
3
Schumpeter (1939).
cadernos fgv projetos
119
caracterizada pelo rompimento dos limites da
inovação incremental, estabelecendo novos
padrões. A mesma linha é seguida pelo Manual de Oslo,4 que representa uma importante
referência em âmbito mundial ainda nos dias
atuais: inovação seria a implementação de um
produto, na forma de bem ou serviço, novo ou
signiicativamente melhorado, podendo, ainda, ser espelhada em um novo processo ou um
novo método nas práticas de negócios, abrangendo as relações internas e externas.
O Global Innovation Index (GII), elaborado pela INSEAD Business School e parceiros desde 2007, insere-se entre diversos
relatórios que monitoram competitividade
e inovação no mundo, se destacando pela
combinação de dados quantitativos e qualitativos advindos de fontes como o Fórum Econômico Mundial, as Nações Unidas, o Banco
Mundial e a Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico. No relatório,
são analisados o desempenho e a capacidade,
em termos de resultados de inovação, em 125
países. O termo inovação é tratado no GII de
forma bastante ampla em três perspectivas
complementares: caráter da inovação - podendo ser radical ou incremental -, forma da
inovação e local em que uma ideia é transformada em realidade (como empresa, sociedade e centros de tecnologia). O GII baseia-se
nos índices input e output, representando
ical innovation, characterized by breaking
the limits of incremental innovation, setting
new standards. The same line is followed by
the Oslo Manual,4 which still represents an
important worldwide reference today: innovation would be the implementation of
a new or signiicantly improved product
or service, which can also be mirrored in a
new process or a new method of business
practice, encompassing internal and external relationships.
The Global Innovation Index (GII), developed by INSEAD Business School and partners since 2007, is among several reports
that monitor competitiveness and innovation in the world, highlighting the combination of quantitative and qualitative data
from sources such as the World Economic
Forum, The United Nations, the World Bank
and the Organization for Economic Cooperation and Development. The report analyses
performance and capacity in terms of the
results of innovation in 125 countries. The
term innovation is considered quite broadly in the GII from three complementary
perspectives: the character of innovation
- whether it is radical or incremental -, the
form of innovation and the place where an
idea is transformed into reality (such as a
company, society and a technology centre).
The GII is based on input and output indices,
4
4
Manual de Oslo (2005).
Manual de Oslo (2005).
artigo
article
120
“
É preciso desenvolver
maior articulação com
o mercado, por meio
da identiicação de
demandas e soluções
concretas e alinhadas.
”
um contexto e um desempenho efetivos em
termos de inovação.
A análise dos dados e informações globais
sobre competividade e inovação, considerando o recorte temporal de 2009 a 2012,5 indica
que o desempenho do Brasil deixa a desejar
quando comparado com países como Alemanha, China e Estados Unidos. Apesar de todos
os esforços e aportes de recursos em inovação
realizados no país, ainda são observados resultados bastante tímidos em termos do que
é gerado efetivamente por meio da inovação
em benefícios e ganhos sociais, resultado da
pouca inovação efetiva, sobretudo no que se
refere aos setores industriais. Diferentemente
do observado nos países mais desenvolvidos
e inovadores apontados nas pesquisas mundiais, no Brasil, uma parte considerável dos
pesquisadores formados continua atuando
apenas na academia. É preciso desenvolver
maior articulação com o mercado, por meio
da identiicação de demandas e soluções concretas e alinhadas. Além disso, boa parte das
inovações realizadas nas empresas no Brasil
são inovações incrementais: poucas empresas investem e realizam inovações radicais,
que resultem em novos produtos, processos
e métodos que possam diferenciá-las em seus
mercados em âmbito nacional e internacional.
O conceito de open innovation6 tem sido
amplamente utilizado por vários segmentos
da indústria, não estando restrito apenas às
empresas relacionadas diretamente à tecnologia. Em contrapartida aos modelos fechados de gestão da inovação observados
no século passado, quando se pressupunha
que talentos e competências pudessem ser
desenvolvidos apenas internamente, a disseminação do conhecimento, reforçada pela
5
Steinbeis et FIESC/IEL (2015).
6
Open innovation foi um termo cunhado pelo professor Henry
Chesbrough, da Universidade de Berkeley (2003).
cadernos fgv projetos
121
representing context and effective performance in terms of innovation.
The analysis of global data and information on competitiveness and innovation,
considering the period from 2009 to 2012,5
indicates that Brazil’s performance is poor
when compared to countries like Germany,
China and the United States. Despite all the
efforts and contributions towards innovation from resources in the country, effective generation of beneits and social gains
through innovation is quite limited. This
results from a lack of effective innovation,
especially with regard to industrial sectors.
The global surveys show that in contrast
with what can be observed in the most developed and innovative countries, in Brazil
a considerable part of trained researchers
continue to work exclusively in academia. It
is necessary to develop a greater connection
with the market, by identifying concrete and
aligned demands and solutions. In addition,
a signiicant part of the innovations made in
Brazilian companies are incremental innovations: few companies invest and carry out
radical innovations, resulting in new products, processes and methods that can differentiate them in their national and international markets.
The concept of open innovation6 has been
widely used by many industry segments
and is not restricted to companies directly related to technology. In contrast to the
closed models of innovation management
observed in the last century, when it was assumed that talents and skills could only be
developed internally, the dissemination of
knowledge, reinforced by the globalization
of research and development centres, has
5
Steinbeis et FIESC/IEL (2015).
6 Open innovation was a term coined by professor Henry Chesbrough of
the University of Berkeley (2003).
“
It is necessary to
develop a greater
connection with the
market, by identifying
concrete and aligned
demands and solutions.
”
artigo
article
122
globalização das bases de pesquisa e desenvolvimento, ampliou as bases para inovação que
agora podem ser aplicadas por todas as pessoas, em qualquer lugar e tempo. A internet,
como tecnologia disruptiva, teve papel de extrema importância nesse sentido, viabilizando
plataformas para atuação em rede.
A colaboração abre um espaço frutífero para
a troca de conhecimento e de inovação, tanto
na esfera privada como na pública. Pesquisa e
desenvolvimento, assim como a identiicação de
possíveis soluções a problemas ou desaios, não
são mais exclusivos às áreas técnicas de organizações e instituições. O conhecimento está em
todos os lugares e pode, por meio de redes estruturadas, ser mais bem aproveitado. Os consumidores e usuários de bens e serviços estão
ávidos por participar desse processo. O grande
desaio é o que as organizações farão a respeito
disso e como aproveitarão essas novas relações
estabelecidas. Nesse ambiente de inovação, surgem novos modelos de negócios pautados em
tecnologia e em eiciência operacional, apoiando-se em princípios como sustentabilidade
ambiental, social e econômica. Entre os novos
broadened the foundations for innovation
which can now be applied by all people,
at any place and time. The Internet, as a
disruptive technology, played an extremely important role in this regard, enabling
platforms for networking.
Collaboration opens up a fruitful space
for the exchange of knowledge and innovation, both in the private and public spheres.
Research and development, as well as the
identiication of possible solutions to problems or challenges, are no longer exclusive
to the technical areas of organizations and
institutions. Knowledge is everywhere and
can, through structured networks, be better
utilized. Consumers and users of goods and
services are eager to participate in this process. Organizations face the big challenge
of what to do about this and how to take
advantage of these newly established relationships. In this environment of innovation,
new business models based on technology
and operational eficiency emerge, based on
principles such as environmental, social and
economic sustainability. Among the new
cadernos fgv projetos
123
modelos organizacionais destacam-se os relacionados à chamada economia colaborativa,
que abrange os conceitos de common thinks e
de economia compartilhada.
O conceito de economia colaborativa não é
novo. Ele existe desde que compartilhamentos e
trocas de bens ou de serviços são realizados por
meio de uma rede de coniança estabelecida. O
impacto dessa colaboração, que ganhou corpo
com a ascensão tecnológica, é relativamente recente. Esse conceito é baseado em dois pilares:
o do compartilhamento e o da colaboração. O
compartilhamento pressupõe que existam bens
ou serviços que possam ser compartilhados por
tempo determinado entre interessados a im de
atender necessidades especíicas – nas quais
a questão do uso se sobrepõe a da posse. Já a
colaboração extrapola o compartilhamento e
pode ser estendida, por exemplo, para encontrar soluções para desaios identiicados, sejam
relacionados à iniciativa privada ou ao setor público, por meio de ações de crowdsourcing.
Ambos os conceitos implicam em tipos
diferentes de colaboração que pode ser - em
termos de oferta e de demanda - de muitos
para um, de um para um (peer-to-peer), ou
até mesmo seguindo o luxo mais observado
na economia de mercado, que é o de um para
muitos. Na verdade, representam muito mais
novos modelos de negócio, que surgem em
resposta à evolução natural de mercado do
que “um novo modelo econômico”. Trata-se
de um conceito em formação considerado por
muitos como modelos diferentes de atuação
dentro da própria economia de mercado. Independentemente de questões conceituais,
ele representa um fenômeno que vem ganhando escala e trazendo à tona importantes
questões relacionadas à concorrência, a ganhos incrementais e à eiciência operacional
com grande potencial, inclusive, para contribuição aos modelos tradicionais já instalados.
organizational models are those related to
the so-called collaborative economy, which
encompasses the concepts of common thinks
and the shared economy.
The concept of the collaborative economy
is not new. It comes into existence once the
sharing and exchange of goods or services
is carried out through an established trust
network. The impact of this collaboration,
which has gained momentum with the technological rise, is relatively recent. This concept is based on two pillars: sharing and collaboration. Sharing presupposes that there
are goods or services that can be shared
for a speciic period among stakeholders
in order to meet speciic needs - where the
use overlaps with ownership. Collaboration, however, goes beyond sharing and can
be extended, for example, to ind solutions
to identiied challenges, whether related
to private initiative or to the public sector,
through crowdsourcing.
Both concepts imply different types of collaboration that may be - in terms of supply
and demand - from many to one, from one
to one (peer-to-peer), or even the most common low in the market economy - from one
to many. In fact, they represent much newer business models, which arise in response
to the natural evolution of the market rather than to the “new economic model.” This
is a concept in development, considered by
many to be a variety of different performance models within the market economy
itself. Regardless of conceptual issues, it represents a phenomenon that has been gaining
weight and bringing to the fore important
issues related to competition, incremental
gains and operational eficiency, with great
potential, including contribution to previously installed traditional models.
artigo
article
124
Os negócios fundamentados no princípio
da chamada economia compartilhada, em geral, possuem dois grandes apelos: o primeiro
é vinculado à sustentabilidade e o segundo a
princípios de consumo racional, com vistas à
economia de recursos inanceiros. A crescente conscientização, sobretudo das gerações
mais jovens, acerca da preservação de recursos naturais e do meio ambiente abre espaço
para modelos de negócio mais sustentáveis,
nos quais o foco deixa de ser na posse e passa
a ser no uso. Por que comprar um bem, como
por exemplo um carro ou uma bolsa, se o que
importa não é o fato de tê-lo, mas poder utilizá-lo? Esse é o mote de negócios que vêm ganhando espaço frente aos modelos tradicionais. Um exemplo é a plataforma brasileira
“Tem Açúcar?”, na qual a proposta é aproximar a vizinhança e promover empréstimos e
trocas de bens relacionados ao uso doméstico
sem desembolso inanceiro. Para que comprar uma furadeira se o uso por ano será de
apenas alguns minutos? Abre-se, assim, espaço para plataformas de empréstimos de
bens ou de aluguel por tempo determinado.
O mesmo vale para tipos diversos de bens,
que vão desde uma bolsa até um carro, com
uso por tempo determinado. Hoje, há um número crescente de plataformas de aluguel de
carros onde o fornecedor deixa de ser a locadora tradicional e passa a ser o cidadão comum,
que participa de redes que realizam a intermediação entre o bem a ser ofertado e a demanda
do mercado, por meio do pagamento de taxas
relacionadas. Pelos sites de oferta desse tipo
de serviço, é possível colocar o veículo à disposição para uso mediante pagamento (aluguel)
nos períodos em que o automóvel não seria
utilizado, por exemplo, por seu proprietário.
Do ponto de vista do usuário, seja ele cliente pagante ou não (no caso dos modelos com
apelo social sem trocas inanceiras), a relação
Businesses based on the principle of the
so-called shared economy generally have
two major appeals: the first is linked to
sustainability and the second to principles of rational consumption, with a view
to saving financial resources. The growing awareness of the preservation of natural resources and of the environment,
especially among younger generations,
makes room for more sustainable business models, where the focus is no longer
on possession but on use. Why buy a good,
such as a car or a purse, if what matters is
not having it, but being able to use it? This
is the motto of businesses that have been
gaining ground on traditional models. An
example is the Brazilian platform Tem
Açúcar?, where the idea is for members
of a neighborhood to loans and exchange
goods related to domestic use without financial disbursement. Why buy a drill
if you will only use it for a few minutes
per year? There is space for lending platforms for goods or for renting things for
a fixed time.
The same goes for various types of goods,
ranging from a purse to a car, with ixed time
usage. Today, there are a growing number
of car rental platforms where the supplier
ceases to be the traditional rental company
and becomes the common citizen, participating in networks that intermediate between
the good to be offered and market demand,
in return for the payment of related fees.
Through sites offering this type of service, it
is possible to make the vehicle available for
use in return for payment (rent) in periods
when the car would not usually be used, for
example, by its owner.
From the point of view of the user, whether they are a paying customer or not (as is
the case in models with social appeal with-
cadernos fgv projetos
125
é bastante vantajosa. Além de não ter que
se preocupar com um investimento elevado
para aquisição do bem – e com questões relacionadas com manutenção e depreciação –,
ele pode escolher entre diferentes ofertantes,
aumentando o número de escolhas possíveis
e o poder de barganha frente a esses players.
Já no caso dos ofertantes, abre-se a possibilidade de geração de receita adicional, muito bem-vinda em momentos de crise, como
o atualmente veriicado no Brasil. Por outro
lado, o proprietário do bem tem que estar
preparado para eventuais problemas, como,
no caso do compartilhamento de veículos, a
ocorrência de pequenos sinistros.
O Uber tem revolucionado a forma com a
qual se utiliza serviços rápidos de deslocamento, pois possui uma estrutura de negócio
otimizada, de baixo custo, apoiada em modelos de rede. Destaca-se o sistema de avaliação dos serviços prestados – preconizado
pelo Uber e seguido por diversas empresas de
diferentes setores – no qual o usuário avalia
o serviço diretamente na rede intermediária.
out inancial exchanges), the relationship is
quite advantageous. In addition to not having to worry about a high investment for the
acquisition of goods - and with issues related
to maintenance and depreciation - they can
choose from different suppliers, increasing
the number of possible choices and their bargaining power in front of these players. In
the case of suppliers, there is the possibility of
additional revenue generation, which is very
welcome in times of crisis, as can currently
be seen in Brazil. On the other hand, the owner of the property has to be prepared for possible problems, such as, in the case of vehicle
sharing, the occurrence of minor accidents.
Uber has revolutionized the way in which
services for quick travel are used because it
has an optimized, low-cost business structure, supported by network models. Of particular note is the service evaluation system
- recommended by Uber and replicated by
several companies from different sectors - in
which the user evaluates the service directly in the intermediary network. If the ser-
artigo
article
126
Caso o prestador de serviços, na outra ponta
da cadeia, não consiga manter o patamar de
qualidade mínimo estabelecido (nota média
de referência a atributes de atendimento), ele
é descredenciado. Esse tipo de modelo empodera o consumidor e fortalece a competição,
sob o ponto de vista do mercado.
O Airbnb, hoje, tem o valor de mercado cotado acima do valor da rede de hotéis Hyatt, que
é uma das grandes referências mundiais em hotelaria de luxo no mundo, sem possuir nenhum
imóvel e operando com uma estrutura bastante
enxuta. Trata-se de um modelo de hospedagem
semelhante ao veriicado no “compartilhamento
de carros”, no qual proprietários podem disponibilizar espaços não utilizados mediante pagamento de taxas de intermediação – podendo ser
desde um quarto até a oferta de um imóvel inteiro,
como um apartamento ou uma casa. O Airbnb co-
vice provider, at the other end of the chain,
is unable to maintain the minimum level of
standards established (average score on attendance attributes), they lose their accreditation. From the point of view of the market,
this type of model empowers the consumer
and strengthens competition.
Airbnb today has a market value above
that of the Hyatt hotel chain, which is one
of the world’s leading luxury hotels in the
world, despite having no property and operating on a lean structure. This is a hosting model similar to that of “car sharing”,
in which owners can make unused spaces
available - from a room to a whole property, such as an apartment or a house.
This is made possible through payment of
service fees to the intermediary. Airbnb
connects those interested in this type of
cadernos fgv projetos
127
necta interessados no tipo de serviço à sua rede
de fornecedores de espaços, constituída por cidadãos comuns e não por pessoas jurídicas.
Um exemplo para ilustrar os modelos colaborativos seriam processos de inovação ou de
produção realizados a partir de colaboração
externa, como nos casos em que são abertas competições para se solucionar desaios
apresentados pela iniciativa privada ou pelo
governo. Durante muitos anos a IBM incentivou competições ao redor do mundo para
identiicar novas soluções que pudessem ser
incorporadas pela organização. Participaram
desse tipo de evento, instituições de ensino de excelência representadas por alunos e
professores-tutores, bem como a população
em geral. Em contrapartida, os vencedores,
além de premiações pontuais geralmente em
dinheiro, recebiam ofertas para passar a integrar o quadro de colaboradores da empresa.
Esse modelo é amplamente utilizado por vários segmentos da indústria. No Brasil, a Natura
realiza rodadas de inovação com participação
de representantes de diferentes setores da sociedade, como professores, cidadãos comuns e
cientistas. Independentemente do ramo do negócio ou setor de atuação, os resultados tendem
a ser extremamente positivos, ampliando-se as
bases internas das organizações em pesquisa,
desenvolvimento e inovação. Atualmente, as
empresas têm que compreender que o processo
de inovação pode ser fortalecido com a colaboração externa de outros atores.
É inegável que esses novos modelos de negócio
trazem impactos às indústrias tradicionais, na
medida em que ofertam soluções alternativas
aos consumidores, em geral apoiadas em plataformas gerenciais bastante lexíveis e de baixo
custo. A evolução tecnológica talvez tenha sido
o principal fator crítico de sucesso desse tipo de
modelo, uma vez que a grande maioria opera
em rede e em plataformas digitais.
service to its network of space providers,
made up of ordinary citizens rather than
legal entities.
Innovation or production processes
carried out through external collaboration serve as an example of collaborative
models. In such cases, competitions are
opened to solve challenges presented by
the private sector or by the government.
For many years IBM encouraged competitions around the world to identify new
solutions that could be incorporated by
the organization. Institutions of excellence represented by students and teachers/tutors, as well as the population in
general would participate in this type of
event. In return, the winners, in addition
to occasional cash prizes, received offers
to join the company’s staff. This model
is widely used by various industry segments. In Brazil, Natura runs innovation
workshops with the participation of representatives from different sectors of society, such as teachers, ordinary citizens
and scientists. Regardless of the type of
business or industry, the results tend to
be extremely positive, expanding the internal foundations of the organizations in
terms of research, development and innovation. Today, companies have to understand that the innovation process can be
strengthened with the external collaboration of other actors.
It is undeniable that these new business
models impact traditional industries, as they
offer alternative solutions to consumers, often supported by very lexible and low-cost
management platforms. Technological evolution may have been the main critical success factor for this type of model, since the
vast majority operate on networks and on
digital platforms.
artigo
article
128
ESTRUTURAS DE REDE COMO
BASE PARA A INOVAÇÃO E A
COLABORAÇÃO
NETWORK STRUCTURES AS A
BASIS FOR INNOVATION AND
COLLABORATION
A emergência do fenômeno das redes adquiriu maior força a partir do século XX, a princípio relacionado a questões de comunicação,
no sentido de representar o conjunto de pontos com mútuo interesse, espelhando relações de reciprocidade entre os envolvidos. A
partir do inal da década de 1960, são observadas as primeiras tentativas para deinição
de conceito mais amplo, abstrato: o antropólogo J. Clyde Mitchell7 compara os nós existentes em redes físicas – como a de pesca –,
aos homens, a relação de rede como um tipo
The emergence of the networks phenomenon
gained greater traction from the twentieth
century onwards, in principle related to
communication issues, in the sense of representing a set of points with mutual interest,
mirroring relations of reciprocity among
those involved. From the late 1960s, the
irst attempts to deine a broader, abstract
concept are observed: the anthropologist J.
Clyde Mitchell7 compares the nodes in physical networks - such as ishing - to men, the
network relationship as a speciic type of re-
7
7
Mitchell (1969).
Mitchell (1969).
Figura 1 Elementos para o estabelecimento das redes
Figure 1 Elements for establishing networks
INTERAÇÃO
Conectividade
Identidade, complexidade e autenticidade
Laços fortes e laços fracos
Densidade e cliques
Equivalência, buracos e autonomia estrutural
Centralidade e proximidade
Poder de Bonacich
OBJETIVOS COMUNS
Acessar recursos
Exercer assimetria
Buscar reciprocidade
Ganhar estabilidade
Atingir legitimidade
Possibilitar lexibilidade
Fonte: Balestrin e Verschoore (2016, p.168)
Source: Balestrin and Verschoore (2016, p.168)
INTERACTION
Connectivity
Identity, complexity and authenticity
Strong ties and weak ties
Density and clicks
Equivalence, holes and structural autonomy
Centrality and proximity
Bonacich power
COMMON OBJECTIVES
Access to resources
Exercise asymmetry
Search for reciprocity
Gain stability
Attain legitimacy
Enable lexibility
cadernos fgv projetos
129
especíico de relacionamento entre homens,
objetivos e eventos; os ios, às informações e aos
recursos que ligam os nós. Uma vez constituída,
a rede passa a perseguir um objetivo especíico,
que seja interesse das partes relacionadas.
Já os estudiosos Alsones Balestrin e Jorge
Renato Verschoore8 discorrem a respeito da
relevância das estruturas de rede nos tempos
atuais, como sendo resultante da ascensão
de um mundo interdependente e conectado, fazendo alusão à deinição de rede a um
conjunto de nós interconectados, nos quais a
estrutura social em rede atuaria como um sistema aberto, dinâmico e sustentável, que precisa ser sustentado por regras de governança
objetivas e claras.
lationship between men, goals and events;
the wires, the information, and the resources that connect the nodes. Once established,
the network will pursue a speciic objective,
which is of interest to the related parties.
The scholars Alsones Balestrin and Jorge
Renato Verschoore8 discuss the relevance
of network structures in present times, as a
result of the rise of an interdependent and
connected world, alluding to the deinition of
a network as a set of interconnected nodes,
where the networked social structure would
act as an open, dynamic and sustainable
system, which must be sustained by objective and clear governance rules.
8
8
Balestrin and Verschoore (2016).
Balestrin e Verschoore (2016).
GANHOS COMPETITIVOS
COMPETITIVE GAINS
Escala e poder de mercado
Soluções coletivas
Redução de custos e riscos
Acúmulo de capital social
Aprendizagem coletiva
Inovação colaborativa
Market size and power
Collective solutions
Reduction of costs and risks
Accumulate social capital
Collective learning
Collaborative innovation
GESTÃO
Instrumentos contratuais
Instrumentos estratégicos
Instrumentos de tomada de decisão
Instrumentos de integração
MANAGEMENT
Contractual instruments
Strategic instruments
Decision making instruments
Integrational instruments
artigo
article
130
As estruturas de rede representam, junto
à tecnologia e às novas expectativas e formações sociais, a base das indústrias que operam
na economia colaborativa, possibilitando,
inclusive, trocas e complementações entre
diferentes segmentos de atuação em associação possível à estrutura apresentada por Jeremiah Owyang, fundador da Crowd Companies, voltada para novos modelos de negócio.9
A evolução do processo de inovação proposta pelo especialista Roy Rothwell10 e
adaptada por Balestrin e Verschoore,11 ganha
uma sexta geração – a da “Participação da
Sociedade e dos Clientes”, em alusão ao conceito de open innovation, que apresenta relação direta ao conceito de rede.
O termo open innovation não é restrito às
empresas relacionadas diretamente à tecnologia, pois a disseminação do conhecimento,
reforçada pela globalização das bases de pesquisa e desenvolvimento, ampliou as bases
para inovação, que agora podem ser aplicadas por qualquer um, em qualquer lugar e a
qualquer tempo. A internet, como tecnologia
disruptiva, teve papel de extrema importância nesse sentido, viabilizando plataformas
para atuação em rede, e a inovação beneicia-se de forma direta das redes formais e informais de colaboração.
Independentemente da coniguração especíica de cada rede, a estrutura de governança
de organizações que operam com bases de cooperação possui forma distinta das veriicadas
em organizações mais tradicionais, uma vez que
não operam individualmente. Nas organizações
privadas, por exemplo, o maior objetivo é o lucro e as interações são respaldadas por relações
hierárquicas bem delimitadas; por sua vez, nas
redes de cooperação o objetivo maior pode estar
representado nos ganhos de eiciência, de escala
The network structures represent, together
with technology, new expectations and social
formations, the basis of the industries that
operate in the collaborative economy, even
allowing exchanges and additions between
different operating segments in a possible
association with the structure presented by
Jeremiah Owyang, founder of Crowd Companies, focused on new business models.9
The evolution of the innovation process
proposed by the expert Roy Rothwell Rothwell10 and adapted by Balestrin and Verschoore,11 adds a sixth generation - the “Participation of Society and Customers”, alluding
to the concept of open innovation, which has
a direct relation to the concept of network.
The term open innovation is not restricted to companies directly related to
technology, since the dissemination of
knowledge, reinforced by the globalization of research and development centres,
has broadened the basis for innovation,
which can now be applied by anyone,
anywhere and anytime. The internet, as
disruptive technology, played an extremely important role in this regard, enabling
platforms for networking, and innovation
benefits directly from formal and informal networks of collaboration.
Regardless of the specific configuration
of each network, the governance structure
of organizations operating on a cooperative basis takes a distinct form from that
found in more traditional organizations,
since they do not operate individually. In
private organizations, for example, the
biggest goal is profit and interactions are
backed by well-delimited hierarchical relationships; on the other hand, in cooperative networks the main goal may be gains
9
9
Owyang (2016).
Owyang (2016).
10
Rothwell (1995).
10
Rothwell (1995).
11
Balestrin e Verschoore (2016).
11
Balestrin e Verschoore (2016).
cadernos fgv projetos
131
Gráico 1 Evolução do processo de inovação
Graph 1 Evolution of the innovation process
6a G Colaboração individual
6th Generation Individual
collaboration
2000
5a G Sistema aberto e colaborativo
5th Generation Open and
collaborative system
1990
4a G Modelo integrado
4th Generation Integrated model
1980
3a G Misto entre tecnologia e mercado
3rd Generation Mix of technology and the market
1970
2a G Puxado pelo mercado
2nd Generation Market driven
1960
1a G Empurrado pela tecnologia
1st Generation Technology driven
1950
Individual na empresa
Individual in the company
Coletivo de rede
Network collective
Legenda/Key: G = Geração/Generation
Fonte: Adaptação livre de Balestrin e Verschoore (2016, p.120)
Source: Free Adaptation of Balestrin and Verschoore (2016, p.120)
e de competitividade que, em um segundo momento, serão convertidos em lucro para as empresas participantes.
O estabelecimento de relações contratuais em
redes, pautadas em um modelo consistente de
governança do negócio comum aos participantes, pode assegurar o envolvimento das organizações e facilitar a operacionalização do modelo,
tanto em termos de execução como em termos
jurídicos. Cabe registrar que a contratualização
nas redes não espelha o padrão rígido observado
em organizações individuais, uma vez que tem
por principal propósito representar uma plataforma inicial para as relações que serão estabelecidas pelas mesmas, em termos de interesse
comum e de papéis a serem desempenhados.
in eficiency, scale and competitiveness that
will be converted into proit for the participating companies at a later date.
The establishment of contractual relations in networks, guided by a consistent
and commonly shared model of business
governance, can assure the organizations
involved and facilitate the operationalization of the model, both in terms of execution
and in legal terms. It should be noted that the
contractual process in networks does not relect the rigid pattern observed in individual
organizations, since its main purpose is to
provide an initial platform for the relations
that will be established by them, in terms of
common interest and roles to be performed.
artigo
article
132
A capacidade excedente representa, em negócios relacionados à economia colaborativa, “o
combustível de baixo custo que faz valer a pena
o empenho de criar uma plataforma”.12 É possível compartilhar desde bens físicos, que se encontrem disponíveis em determinado momento
– como carros, casas, locais físicos, instalações,
equipamentos, peças de vestuário e outros –,
até bens virtuais que até então tenham permanecido sem grande atenção, como banco de
dados, informações e aplicativos abertos. Esse
novo olhar amplia as possibilidades de negócio
relacionadas a novos empreendimentos ou a setores tradicionais de atuação.
Essa capacidade excedente também pode
ser aproveitada para otimizar recursos e trazer um novo olhar à gestão pública, como
exemplos veriicados em Bogotá, desde 1976,
com a ação pioneira de “parque pop-up” para
a ciclovia formada a partir de uma avenida de
40 quilômetros fechada aos domingos e aos
feriados das sete da manhã às duas da tarde.
Hoje, a cidade organiza aulas de ginástica e
dança, feiras de artesanato e gastronomia e
apresentações culturais diversas em diferentes espaços com destinações semelhantes.
Um exemplo, bastante pontual, são os sites de
carona que também contribuem, a partir de
capacidade ociosa utilizada, para colaborar
com as questões de mobilidade. Na mesma
linha, aplicativos como o Waze, que utilizam
tecnologia abundante e até então subutilizada – aparelho de smartphone e tecnologia
GPS, a serviço de soluções de mobilidade que
têm favorecido cidadãos e governos em diferentes países.13 Esses movimentos têm adquirido cada vez mais força ao redor do mundo,
com diferentes formatos e aplicações.
In businesses connected to the collaborative economy, the excess capacity represents, “the low-cost fuel that makes it
worth the effort to create a platform.” 12
It is possible to share from physical goods
that are available at a given moment such as cars, houses, physical locations,
facilities, equipment, garments and others
- to virtual goods that have not received
attention thus far, such as databases, information, and open applications. This
new look expands the business possibilities related to new ventures or traditional
sectors of activity.
This excess capacity can also be harnessed
to optimize resources and bring a new look
to public management, as exempliied in Bogota since 1976, with the pioneering practice
of the “pop-up park” a cycle path created
from a 40 mile long avenue which is closed
on Sundays and holidays from seven in the
morning to two in the afternoon. Today, the
city organizes gymnastics and dance classes, handicraft and gastronomy markets and
various cultural presentations in different
spaces with similar applications. Another
timely example is the hitchhiking sites that,
in terms of idle capacity used, contribute
to mobility issues. In the same vein, applications such as Waze, which use abundant
and previously underutilized technology a smartphone device and GPS technology,
to provide mobility solutions that have favoured citizens and governments in different
countries.13 These movements have become
more and more powerful around the world,
with different formats and applications.
12
Chase (2015).
12
Chase (2015).
13
Chase (2015).
13
Chase (2015).
cadernos fgv projetos
133
Os autores Salim Ismail, Michael Malone
e Youri Van Geest14 corroboram o conceito de
capacidade excedente por meio da “expansão
tecnológica”, mediante novas combinações
de tecnologia e convergência, tendo como
pano de fundo custos baixos e entrada. Essa
nova visão, de se identiicar o que pode ser
desenvolvido ou criado a partir de bases tecnológicas já existentes, traz um novo olhar a
respeito de como podem ser criados novos
negócios ou aprimorados modelos de negócio existentes. Da mesma forma, o conceito
de inovação aberta – que será tratado neste
trabalho – apresenta inúmeras possibilidades de contribuição utilizada via redes livres
estabelecidas para inalidades especíicas,
como identiicação de solução para desaios
públicos ou privados, ou mesmo redes mais
bem estruturadas, como cooperativas e redes
de fornecedores relacionados a cadeias produtivas. A colaboração, sem dúvida, representa um fator de incremento em diferentes
modelos de negócios e setores de atuação.
The authors Salim Ismail, Michael
Malone and Yuri Van Geest14 endorse the
concept of excess capacity through “technological expansion”, via new combinations of technology and convergence,
against the backdrop of low costs and entry. This new vision, of identifying what
can be developed or created from existing
technological foundations, brings a new
approach to how new business models can
be created or existing models can be improved. Likewise, the concept of open innovation - which will be dealt with in this
work - presents numerous ways to contribute via free networks established for
specific purposes, such as identifying solutions to public or private challenges, or
through better structured networks such
as cooperatives and supplier networks related to productive chains. Collaboration,
undoubtedly, represents an incremental
factor in different business models and
sectors of activity.
14
14
Ismail, Malone & Geest; Organizações Exponenciais (2015).
Ismail, Malone & Geest; Organizações Exponenciais (2015).
artigo
article
134
A seguir, é apresentado um quadro com
conceitos gerais relacionados à economia colaborativa e à economia compartilhada, a partir
dos conceitos de Rachel Botsman,15 bem como
conceitos gerais de uso comum relacionados.
Jeremiah Owyang vem estudando economia
colaborativa, modelos de negócio participativos (crowd business models), rupturas em um
mundo autônomo (autonomous world disruptions) desde 2014, por meio da Crowd Companies, que representa um conselho de inovação constituído a partir de grandes empresas,
líderes de referência, startups e comunidades
relacionadas. Owyang propôs, em 2014, a primeira representação da colmeia da economia
colaborativa, denominada de Honeycomb Graic, construída a partir de seis segmentos: transporte, espaço, serviços, alimentação, bens de
consumo e dinheiro. Na segunda versão, foram
acrescentados outros seis setores: saúde e bem-estar, logística, corporações, utilidades, municípios e educação.
O conceito de colmeia faz alusão ao fato de
ser necessário o trabalho conjunto, por parte
das abelhas, para o crescimento e fortalecimento da estrutura: esse é o conceito por trás da colaboração. Em 2015, 120 líderes empresariais e
34 empresas da Fortune 500 faziam parte como
membros do conselho da Crowd Companies,
com mais de 80 marcas exponenciais globais
tendo adotado essas técnicas junto às principais
forças de mercado relacionadas, como: a) motivações sociais, abrangendo fatores como sustentabilidade, aumento população e contato social; b) motivações econômicas, contemplando
questões relacionadas ao ambiente inanceiro,
a recursos inexplorados e ao inanciamento de
startups; e c) capacitadores tecnológicos, englobando tecnologias móveis, redes sociais e a
internet das coisas.
The following is a table with general
concepts related to the collaborative economy and the shared economy, based on
Rachel Botsman’s15 concepts, as well as
common usage.
Through Crowd Companies, which represents an innovation council comprised
of large companies, important leaders,
startups and related communities, Jeremiah Owyang has been studying collaborative economics, crowd business models and autonomous world disruptions
since 2014. In 2014, Owyang proposed
the first outline of the collaborative honeycomb, called Honeycomb Grafic, built
from six segments: transportation, space,
services, food, consumer goods and money. In the second version, six other sectors
were added: health and well-being, logistics, corporations, utilities, municipalities
and education.
The honeycomb concept alludes to the fact
that bees need to work together to grow and
strengthen the structure: this is the concept
behind collaboration. In 2015, 120 business
leaders and 34 Fortune 500 companies were
part of Crowd Companies’ board of directors, with more than 80 growing global
brands that adopted these techniques and
applied them to the main market forces, such
as: a) social motivations, including factors
such as sustainability, population increase
and social contact; b) economic motivations,
including issues related to the inancial environment, unexplored resources and inancing of startups; and c) technological enablers, encompassing mobile technologies,
social networks and the internet of things.
15
15
Professora visitante da Universidade de Oxford (HarperCollins, 2010).
Visiting Professor at Oxford University (HarperCollins, 2010).
cadernos fgv projetos
135
Quadro 1 Conceitos centrais relacionados à economia colaborativa e à economia compartilhada
Table 1 Central concepts related to the collaborative economy and shared economy
Conceitos Centrais
Central Concepts
Signiicado Geral
General Meaning
Economia Colaborativa
Collaborative Economy
Apoiada em redes, de indivíduos ou comunidades, em oposição a instituições
centralizadas, modificando a forma com a qual ocorrem as relações de produção, consumo, finanças e educação. De consumidores passivos para criadores,
colaboradores, financiadores, produtores e fornecedores.
Supported by networks of individuals or communities as opposed to centralized institutions, modifying the way in which relations of production, consumption, finance and education take place. From passive consumers to creators,
collaborators, financiers, producers and suppliers.
Economia Compartilhada
Shared Economy
Modelo econômico baseado no compartilhamento de bens e serviços subutilizados, que pode ser realizado mediante benefícios monetários ou não monetários.
An economic model based on the sharing of underutilized goods and services,
which can be realized through monetary or non-monetary benefits.
Consumo Colaborativo
Collaborative Consumption
Baseado na partilha, troca, comércio, ou produtos e serviços de aluguel, permitindo o acesso sobre a posse. Ele está reinventando não apenas o que nós
consumimos, mas como nós consumimos.
Based on sharing, exchange, trade, or renting products and services, allowing
access over ownership. It is reinventing not just what we consume, but how we
consume.
Peer-to-peer
Peer-to-peer
Relações negociais estabelecidas de forma individual, em geral representadas por
duas pessoas, sendo uma a provedora da solução e, a outra, a usuária da solução.
Individually established business relationships, generally represented by “two
people“, one being the solution provider and the other the solution user.
Drivers do Consumo
Colaborativo
Drivers of Collaborative
Consumption
Inovação tecnológica, compartilhamento de crenças e valores, consumo consciente, realidade econômica e relações de confiança.
Technological innovation, sharing of beliefs and values, conscious consumption, economic reality and relationships of trust.
Peer-to-business
Peer-to-business
Em bases informais, tem-se falado em conceitos que fazem alusão a “pessoas”
que possam atuar como fornecedoras de corporações.
On an informal basis, referring to “persons“ who can act as suppliers to corporations.
Crowd companies
Crowd Companies
Companhias/organizações que são constituídas a partir do coletivo e que operam
em plataformas de colaboração livre, visando ao alcance de um objetivo comum.
Companies/organizations that are formed from the collective and operate in
free collaboration platforms, aiming to reach a common goal.
Crowdsourcing
Crowdsourcing
Estrutura de colaboração coletiva, aplicada para projetos específicos ou para processos, em organizações públicas, privadas e do terceiro setor, sendo, em geral,
relacionada a contribuições específicas identificadas/propostas como desafio.
Collective collaboration structure, applied to specific projects or processes, in
public, private and third sector organizations, generally related to specific contributions identified/proposed as a challenge.
Crowdfunding
Crowdfunding
Estrutura de financiamento coletivo, aplicada para finalidades diversas, desde
empreendimentos que visam ao retorno financeiro, passando por ações pontuais (como shows, projetos) e ações sociais.
Collective financing structure, used for various purposes, from projects aiming for financial return, to specific campaigns (such as concerts, projects) and social actions.
Fonte: Autoria própria, 2016
Source: Author, 2016
artigo
article
136
A última versão da colmeia da economia
colaborativa de Owyang, publicada em 2016,
contempla todas as categorias anteriores,
espelhadas em segmentos-chave, tendo sido
a de transporte fragmentada em serviços de
mobilidade e compartilhamento de veículos
e a de saúde e bem-estar subdividida em saúde e em bem-estar e beleza. Além disso, duas
novas categorias foram incluídas, a análise de
dados e reputação e o suporte ao empreendedor, totalizando 16 categorias ao modelo.
A colmeia de Owyang claramente ilustra
as inúmeras possibilidades relacionadas à
economia do compartilhamento, tanto em
relação ao incentivo de negócios a serem realizados por microempresas, como para oportunidades a serem exploradas por grandes
corporações, sejam estas representadas por
novos empreendimentos/modelos de negócio, como o Uber e o Airbnb, ou por empresas
relacionadas a setores tradicionais, como a
GM e a BMW, que incluíram em suas pautas
programas relacionados a serviços de compartilhamento de carros e introduziram boas
práticas relacionadas ao aprimoramento de
suas cadeias produtivas.
Cada categoria desdobra-se em uma série de subcategorias, como transporte, que
pode ser subdividido em serviços de transporte como “os de táxi”, ilustrados pelo modelo Uber, serviços de empréstimo de carros,
como o Getaround e a Zipcar, e serviços de
otimização de carros, como o SherpaShare.
Segundo Arun Sundararajan,16 o capitalismo dos dias atuais tem dado espaço para a
criação de novas instituições para organizar
atividades econômicas que ofereçam valor
para as pessoas, considerado todo o espectro
econômico, desde consumidores a produtores. O mesmo pode ser verdade para a nova
The latest version of the Owyang Collaborative Economy Honeycomb, published in
2016, encompasses all of the above categories, spread in key segments, with transportation being divided into “mobility services”
and “vehicle sharing” and health and well-being subdivided into “health” and “well-being
and beauty”. In addition, two new categories
were included, data analysis and reputation
and support to the entrepreneur, with a total
of 16 categories in the model.
The Owyang Honeycomb clearly illustrates the countless possibilities related
to the sharing economy, both in terms of
incentivising small enterprises to conduct
business, and in opportunities to be explored by large corporations. These are
represented by both new ventures/business models, such as Uber and Airbnb, or
by companies working in traditional sectors such as GM and BMW. These more
established companies have included programmes related to car sharing services
in their guidelines and introduced best
practices related to the improvement of
their production chains.
Each category splits into a series of subcategories, such as transport, which can
be subdivided into transport services like
“taxis”, illustrated by the Uber model, car
hire services such as Getaround and Zipcar, and car optimization services such as
SherpaShare.
According to Arun Sundararajan,16 contemporary capitalism has made room for
the creation of new institutions to organize
economic activities that offer value to people, considering the entire economic spectrum, from consumers to producers. The
same may be true for the new generation of
16
16
Sundararajan. The Sharing Economy (2015).
Sundararajan. The Sharing Economy (2015).
cadernos fgv projetos
137
Figura 2 Colmeia da economia colaborativa, por Jeremiah Owyang –
Crowd Companies
Figure 2 Collaborative economy honeycomb, by Jeremiah Owyang –
Crowd Companies
el
gu
s
aluces
e
i
ins egur
d
ura o
os serv
ç
i
nc
rv er
e
se rent
or
e
op
p ntr
tadutor ed eer- e pa
n
to- res
e
r
l
ori inst torpe
er
uc
r
t
ins
SUPORTE AO TRABALHADOR
WORKER SUPPORT
APRENDIZAGEM
LEARNING
beleza
beauty
BEM-ESTAR E BELEZA
WELLNESS & BEAUTY
to
en
bem-estar
ams
s
h
l
i
o
rt ro
wellness
urs ces
pa e liv aring
c
e
r
m
r ou
d sh
co
fin
s
k
s
e
o
an
r
da s
bo
to
pr
oe cie c co ciam
en
row let en
im ores ent emp odu
om rren
t
v
i
p
t
o
v
loa res tos
dfu o o
m azed vem
cri tocu
ne tad
nd
f mo
p
rg
ing
r
cry
oo os
ke
ds
ma
DINHEIRO
BENS
MONEY
GOODS
plataformas
platforms
MUNICIPAIS
MUNICIPAL
bicicletas urbanas patrocinadas
city sponsored bikes
ESPAÇO
SPACE
entre pares
s
do
P2P
sa ods
u
s
o
uto ed g
a
d
d
n
pro -ow
mi
co
c
pre
de ivery com om
a
sh part ida
eg del
r
PESSOAS EMPODERADAS
t
a
d
n
red ilha
o
PRODUTORES, COCRIADORES, e fo
foo da
d
CROWDFUNDERS, COLEGAS,
COMIDA
FOOD
CONSUMIDORES
espaço de trabalho
work space
SERVIÇOS DE
UTILIDADE PÚBLICA
UTILITIES
SAÚDE
HEALTH
o
tim o
rés heir ng
p
i
em e din lend
d ey
n
o
m
espaço pessoal
personal space
telecomunicações
telecommunications
serviços
services
rte
po
su porte
su
EMPOWERED PEOPLE
MAKERS, CO-CREATORS,
CROWDFUNDERS, PEERS,
CUSTOMERS
se
m rv
va anoiços
let br de
se ista
rvi
pessoais
ce
s
personal
SERVIÇOS DE
MOBILIDADE
MOBILITY SERVICES
energia
energy
veículos emprestados
loaner vehicles
COMPARTILHAMENTO
DE VEÍCULO
VEHICLE SHARING
barcos emprestados
loaner boats
SERVIÇO
SERVICES
ida
om a
e c lhad p
d
re
ro rti
pa pa od p
pre com d fo
en
e
ar
loc treg
ga
sh
al a lo
tre ing
n
de
e pp
live cal
i
sh
ry
LOGÍSTICA
LOGISTIC
iço
empresarial
nto
erv
o s ice
me
business
m
na e
o erv
e
c
z
a
as as s
rag
ide
c
s
arm sto
ron
ca rides
su ade
ma
de
repntida
r
p
i
s
o
a
s
u d
ço ta s i
taf rm supprime de
rvi ris ce redent taçã e e
pla latfo
ly c nto
se oto ervi
pu ity o
p
ha s
s
m
t
r
ati &
in
ve
on
dri
EMPRESAS E
ORGANIZAÇÕES
ANÁLISE E REPUTAÇÃO
CORPORATIONS &
ANALYTICS &
ORGANIZATIONS
REPUTATION
a
el
r
gu
pa os s
s
alu es
o ad ice
e
ç
i
g rv
rv
s d rvic
se mpre e se
iço se
e oye
erv nter
s
l
p
re
em
Fonte: CrowdCompanies.com, por Jeremiah Owyang 2016
Source: CrowdCompanies.com, by Jeremiah Owyang 2016
artigo
article
138
geração de tecnologias descentralizadas direcionadas a atender o luxo peer-to-peer, de
relações de negócio individualizadas.17
Para Robin Chase,18 o principal fator crítico
de sucesso observado nos modelos operados
encontra-se na forma com que as plataformas
são conectadas aos atores envolvidos no negócio, aproximando fornecedores e consumidores.
A Figura 3 apresenta uma leitura feita pela
Revista da Fundação Nacional da Qualidade
quanto aos atores do modelo colaborativo,
em alinhamento ao preconizado pela Comissão Europeia.
decentralized technologies geared toward
addressing the peer-to-peer low of individualized business relationships. 17
For Robin Chase,18 the key critical success
factor in the operating models is the way
in which the platforms are connected to the
actors involved in the business, bringing together suppliers and consumers.
Figure 3 shows the Revista da Fundação
Nacional da Qualidade’s interpretation of
the actors in the collaborative model, in
line with that recommended by the European Commission.
CLASSIFICAÇÕES DE MODELOS
DE NEGÓCIOS EM ECONOMIA
COLABORATIVA: NOVAS
CATEGORIAS PROPOSTAS
CLASSIFICATIONS OF
BUSINESS MODELS IN THE
COLLABORATIVE ECONOMY:
NEW CATEGORIES PROPOSALS
Como resultado da tese de PhD defendida pela
autora do presente artigo, estabelecendo-se
como base fundamental estudos e análises de
modelos de negócio relacionados a partir de
informações secundárias (públicas) de pesquisas primárias realizadas (entrevistas), foi
proposta e validada a classiicação dos modelos de negócio relacionados à economia colaborativa em três diferentes dimensões, conforme o apresentado na Figura 4.
A partir das categorias deinidas – enquadramentos lógicos realizados –, foram apresentadas, a título de exempliicação e defesa, linhas
centrais de modelos de negócio, considerando
organizações de referência em seus segmentos
de atuação e casos de sucesso. As análises a seguir apresentadas foram estruturadas por meio
de matrizes especíicas com identiicação dos
As a result of the PhD thesis defended by the
author of the present article, using the studies and analyses of business models related
to secondary (public) information of primary research conducted (interviews) as a
research base, the following classiication
of business models related to the collaborative economy in three different dimensions
was proposed and validated, as shown in
Figure 4.
Based on the defined categories (logical frameworks), by way of an example
and a defense, the main aspects of business models were presented. Key organizations in their segments and successful cases were considered. The following
analyses were structured through specific
matrices identifying the main critical suc-
17
17
Sundararajan (2015).
18
Chase; Peers Inc, (2015).
Sundararajan (2015).
18
Chase. Peers Inc - tradução para a versão brasileira: Economia
Compartilhada, como pessoas e plataformas da Peers Inc estão
reinventando o capitalismo (2015).
cadernos fgv projetos
139
Figura 3 Atores centrais do modelo colaborativo
Figure 3 Central actors in the collaborative model
As transações da economia colaborativa podem ser conduzidas tanto para o
lucro quanto sem ins lucrativos. Segundo a Comissão Europeia, são três os
atores principais no modelo de negócio:
Transactions in the collaborative economy can be undertaken for both proit
and non-proit purposes. According to the European Commission, there are
three main actors in the business model:
PRESTADORES DE SERVIÇOS
que compartilham bens,
recursos, tempo e/ou
habilidades - inserem-se aqui
os particulares que oferecem
serviços de forma ocasional ou
prestadores de serviços
profissionais
SERVICE PROVIDERS
who share goods, resources,
time and/or skills – included
here are individuals who offer
occasional services or professional service providers
USUÁRIOS/ CONSUMIDORES
desses prestadores. São pessoas
no mundo inteiro que, tendo
acesso à internet, usufruem de
serviços ou produtos compartilhados, pagando por eles ou simplesmente trocando ou emprestando.
USERS/CONSUMERS
of these providers’ offering. They
are people all over the world who,
having access to the internet,
enjoy services or shared products,
paying for them or simply
exchanging or lending them.
INTERMEDIÁRIOS
que conectam, através de uma plataforma digital, fornecedores e usuários (as
chamadas plataformas colaborativas).
Também podem ser serviços auxiliares
como, por exemplo, ferramentas de
facilitação dos pagamentos.
INTERMEDIARIES
that connect through a digital platform,
suppliers and users (so-called collaborative platforms). They can also be ancillary
services, such as tools for payments.
Fonte: Revista Excelência em Gestão. Fundação Nacional da Qualidade, ano VII, no 09, outubro 2016 (p. 12)
Source: Revista Excelência em Gestão. Fundação Nacional da Qualidade, year 7, no. 09, October 2016 (p. 12)
artigo
article
140
principais fatores críticos de sucesso relacionados aos negócios e os impactos no mercado tradicional, por categoria estabelecida.
cess factors related to the business and
the impacts in the traditional market, by
defined category.
CATEGORIA 1:
COMPARTILHAMENTOS
E COLABORAÇÕES VIA
PAGAMENTO PELO ACESSO/
PELO USO (TROCA FINANCEIRA)
CATEGORY 1: SHARING AND
COLLABORATION VIA PAYMENT
FOR ACCESS/USE
(FINANCIAL EXCHANGE)
A primeira categoria é aquela que se associa
com maior recorrência à economia colaborativa ou à economia compartilhada, representando, entre todas as categorias, a mais
conhecida pela população em geral. Entre
os exemplos mais recorrentemente citados
The irst category is the one that is the most
common in the collaborative economy or
the shared economy, representing, among
all categories, the best known by the general populace. Among the most frequently
cited examples are Uber, a model compet-
Figura 4 Categorias para classificação dos modelos de negócio relacionados à
economia colaborativa
Figure 4 Categories to classify the business models related to the collaborative
economy
relação monetária
monetary relationship
modelos de negócio em
economia criativa
business models in the
collaborative economy
custo marginal zero ou
próximo de zero
zero marginal cost or
close to zero
Fonte: Autoria própria, 2016
Source: Author, 2016
produção compartilhada
e colaborações diversas
shared production and
diverse collaborations
cadernos fgv projetos
141
encontram-se o Uber, modelo concorrente ao
serviço de táxi, e o Airbnb, modelo concorrente
ao serviço de hotelaria. Também se encontram
nessa categoria plataformas de negócio como o
Prime Fraction, que possibilita o compartilhamento de veículos de luxo, incluindo carros esportivos, jatos e iates. É possível tanto utilizar
um serviço de transporte, similar ao ofertado no
“modelo táxi” ou, por exemplo, usar um carro
esportivo, popular, utilitário e até um carro de
luxo por um tempo determinado – horas ou
dias. Da mesma forma, hospedar-se em um local alternativo a um hotel, como um quarto em
uma casa, um lat ou uma residência completa
e ter uma experiência diferenciada.
Quem usa essa categoria não possui a posse, mas sim o acesso – e paga por isso. A grande questão por trás desse tipo de negócio é a
utilidade em detrimento da posse. Dentro dessa mesma categoria encontra-se uma série de
serviços, como os de espaços compartilhados
de trabalho para inalidades distintas, que vão
desde ambientes de escritório até infraestruturas para operar um restaurante por um dia.
ing with taxi services, and Airbnb, which
competes with hotel services. Also in this
category are business platforms such as
Prime Fraction, which enables the sharing of luxury vehicles, including sports
cars, jets and yachts. It is possible to use
a transport service, similar to that offered in the “taxi model” or, for example,
to use a sports car, an economy car, a
utility vehicle and even a luxury car for a
specified time - hours or days. Likewise,
one can stay in an alternative location to
a hotel, such as a room in a house, a flat
or a complete residence and have a differentiated experience.
Whoever uses this category does not
have ownership, but access - and pays
for it. The big question behind this kind of
business is utility to the detriment of ownership. Within this category are a series of
services, such as shared work spaces for
different purposes, ranging from offices to
infrastructure for operating a restaurant
for a day.
PRINCIPAIS FATORES CRÍTICOS
DE SUCESSO IDENTIFICADOS:
KEY CRITICAL SUCCESS
FACTORS IDENTIFIED:
Baixos custos de entrada, em
geral em função de:
Low entry costs, generally due to:
• Custos operacionais reduzidos – os
negócios, em geral, operam por meio de
plataformas web, estabelecendo relação
entre fornecedor e usuários;
• Infraestrutura física mínima para a
operação, na grande maioria dos casos, se
comparada a observada nos negócios tradicionais (por exemplo, frente a estrutura
do Airbnb frente à de grandes redes, como
Accor e Hyatt);
• Reduced operating costs – businesses generally operate through web platforms, establishing a relationship between suppliers and users;
• Minimal physical infrastructure for
the operation, in the vast majority of cases, when compared to traditional businesses (for example, comparing the structure of Airbnb with that of large chains
such as Accor and Hyatt);
artigo
article
142
• Operações em rede com fornecedores;
• Quadro de colaboradores reduzido.
Uso de recursos tecnológicos
avançados, em geral apoiados em
algoritmos:
• Viabilizam a operação da plataforma;
• Possibilitam a obtenção de um banco
de dados detalhado a respeito dos hábitos
de usuários e dos peris dos fornecedores.
Apropriação da chamada
capacidade operacional excedente:
• Por parte dos fornecedores, por meio
do uso da disponibilidade de bens, espaços
ou serviços;
• Por parte dos usuários, por meio da
utilização de recursos do próprio cliente,
como o telefone e dados GPS.
Consolidação da relação de
coniança:
• Com fornecedores, a im de estimulá-los a entrar e permanecer na plataforma, e por ações de proteção – como seguros e correlatos;
• Com usuários, para construção e
manutenção da credibilidade e da marca,
por meio do monitoramento da qualidade
dos serviços prestados.
•
•
Network operations with suppliers;
Reduced staff.
Using advanced technological
resources, generally supported
by algorithms:
• Enable the operation of the platform;
• Enable the creation of a detailed database on user habits and supplier proiles.
Appropriating so-called surplus
operational capacity:
•
By the suppliers, through the use of
available goods, spaces or services;
• By the users, through the use of the
customer’s own resources, such as their
phone and GPS data.
Consolidating relationships
of trust:
• With suppliers, in order to encourage them to enter and remain on the platform, and through protective actions –
such as insurance and the like;
• With users, to build and maintain
credibility and branding, by monitoring
the quality of the services provided.
cadernos fgv projetos
143
Garantia da qualidade:
• Com fornecedores, por meio da investigação de antecedentes e/ou da solicitação
de referências, além de ações de treinamento
e manuais de procedimentos para efetivação
do cadastro na plataforma. Os fornecedores
são avaliados pelos próprios usuários: abaixo
da linha de corte estabelecida para a avaliação são descredenciados;
• Com usuários, por meio das avaliações realizadas, que diferentemente dos
modelos mais tradicionais de negócio tendem a ser imediatas na grande maioria dos
negócios – o cliente usa e avalia.
Divulgação da marca e do negócio:
• Inicialmente, apoiada principalmente em redes sociais, no boca-a-boca e nas
próprias plataformas. Atualmente, grandes
players como Airbnb e Uber realizam ações
promocionais de propaganda, como inserções na televisão e em periódicos diversos;
• Uso de espaços promocionais em
pontos estratégicos, como mídia de elevadores e aeroportos.
Apresentação de uma boa
proposta de valor custo-benefício:
• Para fornecedores, com a possibilidade
de representar única fonte de renda ou forma
de complementação. Em geral, os pagamen-
Quality assurance:
• For suppliers, through background checks and/or a request for references, in addition to training and procedure manuals for effecting registration on
the platform. The suppliers are evaluated by users themselves: falling below
the established cut-off point - they lose
accreditation;
• For users, through assessments,
which unlike most traditional business
models tend to be immediate - the client
uses and evaluates.
Brand and business promotion:
•
Initially, mainly through social networks, word of mouth and platforms.
Nowadays, major players like Airbnb and
Uber run promotional campaigns like
adverts on television and across various
newspapers;
• Use of promotional spaces at strategic
locations such as elevators and airports.
Providing a good value proposition
cost-beneit:
• For suppliers, with the possibility of being the only source of income or
additional income. In general, payments
are made weekly, which encourages ser-
artigo
article
144
tos são feitos semanalmente, o que incentiva a manutenção na rede, mas isso depende
muito do modelo e do segmento especíicos
de negócio;
• Para usuários, com a possibilidade
de utilização em detrimento da posse ou
pelo fato de os negócios relacionados aos
modelos colaborativos concorrerem com
os tradicionais de forma mais competitiva,
apresentando melhor razão entre benefício e preço. Além disso, possuem apelo
relevante em relação à sustentabilidade
ambiental (preservação dos recursos do
planeta) e social (sentimento de colaboração com o “empreendedor”, o fornecedor).
vicing the network. However, this depends a lot on the speciic business model
and segment;
• For users, irstly by providing the
possibility of use instead of ownership and
secondly by virtue of the fact that the businesses using collaborative models compete
with traditional ones in a more competitive way, presenting a better ratio between
beneits and costs. In addition, their appeal
in relation to environmental sustainability (preservation of the planet’s resources)
and social appeal (a feeling of collaboration with the “entrepreneur”, the supplier)
is of importance.
CATEGORIA 2:
COMPARTILHAMENTOS E
COLABORAÇÕES COM CUSTO
MARGINAL ZERO OU PRÓXIMO DE
ZERO (SEM PAGAMENTO DIRETO
PELO ACESSO/PELO USO)
CATEGORY 2: SHARING AND
COLLABORATION WITH ZERO
MARGINAL COST, OR CLOSE
TO ZERO (WITHOUT DIRECT
PAYMENT FOR ACCESS/USE)
A segunda categoria são os serviços considerados como de custo marginal zero ou próximo de zero,19 ou seja, para adquiri-los não é
preciso, necessariamente, ter uma contrapartida inanceira. Por exemplo, existe uma plataforma no Brasil chamada “Tem Açúcar?”,
na qual o compartilhamento de bens entre as
vizinhanças é incentivado, sem necessariamente ter que se pagar por isso, como ocorre
nos modelos do Uber, do Airbnb e com outros tantos provedores de serviços. Esses modelos em geral são sustentados no “modelo
Google”, por meio de patrocinadores e da comercialização de ações e de espaços publicitários. O Waze e o Facebook, com inalidades
distintas, representam grandes destaques
dessa categoria.
The second category is the services considered to have zero marginal cost or close to
zero,19 that is, to acquire them you do not
necessarily have to have inancial compensation. For example, in Brazil there is a
platform called Tem Açucar? which encourages the sharing of goods between neighbors. Here you do not necessarily have to
pay for the service, in contrast to what happens with Uber, Airbnb and other services.
These models are generally supported by
the “Google model”, through sponsors, the
trading of shares and advertising space.
Waze and Facebook, despite having different objectives, represent great success stories in this category.
19
19
Rifkin (2015).
Rifkin (2015).
cadernos fgv projetos
145
Quadro 2 Matriz-síntese do descrito de exemplos de negócios relacionados
à Categoria 1
Table 2 Synthesis Matrix of descriptions of business examples related to
Category 1
Uber
Serviços de mobilidade (transporte
de passageiros)
Transportation
services (passenger transport)
Empresa criada nos
EUA. Atualmente, opera em 108 países, como
EUA, Canadá, México,
Brasil, Alemanha, Itália,
Holanda, Espanha,
Filipinas, Índia, China,
Autrália,
Nova Zelândia.
Founded in the
USA. Currently
operates in 108
countries such as the
USA, Canada, Mexico,
Brazil, Germany Italy,
Holland, Spain, the
Philippines, India,
China, Australia and
New Zealand.
Uber Black carros executivos escuros, de médio luxo e luxo, dirigidos por motoristas de terno
e gravata. Disponibilizam água mineral e balas.
Em algumas localidades, há wi-i nos veículos.
Uber X carros mais populares, sem exigência
de serem dirigidos por motoristas de terno e
gravata; não há origatoriedade de oferta de
água e balas.
Uber Pool serviço permite que você divida a
viagem com outros usuários que estão em um
trajeto similar ao seu, colocando mais pessoas
em menos carros.
UberSUV Carros com mais lugares e conforto,
do tipo SUV.
UberLUX Veículos de marcas de luxo para locomover-se com classe pelas ruas.
UberPOP Carros compactos fazem as viagens,
com preço ainda mais competitivo que o uberX.
UberRUSH Serviço de courier por bicicleta.
UberEATS Serviço que permite ao usuário solicitar refeições em restaurantes.
Uber Black dark executive cars from semi-luxurious to luxurious. Drivers wear a suit and tie.
Mineral water and sweets are available. Wi-Fi is
available in the vehicle in some regions.
Uber X economy cars, the driver doesn’t have
to wear a suit and tie, water and sweets do not
have to be made available.
Uber Pool service allows you to share the trip
with other users who are on a similar route to
yours, facilitating more people in less cars.
UberSUV cars with more space and comfort,
SUV style.
UberLUX luxury cars to get around in style.
UberPOP compact cars that make journeys at
an even more competitive price than Uber X.
UberRUSH courier service using bicycles.
UberEATS service which allows users to order
meals from restaurants.
cont.
artigo
article
146
cont.
Modelo de negócio
Segmento de
atuação
Business
segment
TruckPad
Serviços de logística (transporte de
cargas)
Logistics services
(cargo transport)
Zipcar
Compartilhamento de carro
(aluguel
de veículos)
Logistics services
(cargo transport)
Business description
Região de atuação
Tipo de serviços ofertados
Operating area
Types of services offered
Empresa criada no
Brasil, inspirada nos
EUA. Atualmente atua
em todo o Brasil.
Founded in Brazil, inspired by the
USA. Currently operates across all
of Brazil.
Empresa surgiu nos
EUA. Posteriormente
adquirida pela Avis.
Atualmente, opera em
mais de oito países
que são EUA, Canadá,
Reino Unido, Espanha,
Aústria, França, Alemanha e Turquia.
Began in the
USA. Subsequently
purchased by
Avis. Currently operates in more than eight
countries, which are
the USA, Canada,
the UK, Spain, Austria,
France, Germany
and Turkey.
Fleety
Compartilhamento de carro (aluguel de veículos)
Car sharing
(car hire)
Fonte: Autoria própria, 2016
Source: Author, 2016
Empresa localiza motorista conforme a carga
que deseja transportar por meio do aplicativo.
Through the application, the company locates
a driver according to the load one wishes to
transport.
Zipcar usuário utiliza o veículo conforme plano
contratado, serviço de self-service e frota diversificada 24/7.
Zipcar for Business é uma alternativa para táxis, serviços de veículos, locação de veículos, o
reembolso do empregado e frotas de empresas
de economia de tempo.
Zipcar the vehicle is used according to the
users’ contracted plan. Self-service with a diversified leet 24/7.
Zipcar for Business an alternative to taxis,
vehicle services, vehicle rental, employee reimbursement and company leets. Time saving.
Surgiu no Brasil.
Atualmente nas cidades de Curitiba, São
Paulo, Florianópolis e
Rio de Janeiro.
Fleety - compartilhamento de carros, negociação de aluguel direto com locatário dentro
das especificações sugeridas pela empresa,
locador e locatário. Fleety Garage - aluguel de
carros elétricos.
Began in Brazil. Currently operates in
the following cities:
Curitiba, Sao Paulo,
Florianopolis and Rio
de Janeiro.
Fleety – car sharing, bargaining rental direct
with the lessor within specifications suggested
by the company, lessor and lessee.
Fleety Garage – electric car hire.
cadernos fgv projetos
147
Quadro 3 Matriz-síntese de exemplos modelos de negócios relacionados à
Categoria 1
Table 3 Synthesis matrix of examples of business models related to Category 1
Modelo de negócio
Business description
Uber
TruckPad
Fornecedor
Plataforma
Usuários/clientes
Supplier
Platform
Users/clients
Motoristas, proprietários
de veículos que queiram
trabalhar com transporte
de passageiro, em tempo
integral ou parcial (lexibilidade de escolha e de
atuação). Todos os custos
de manutenção do veículo
são de responsabilidade
dos proprietários.
Pesquisa antecedentes do motorista. Possui manual de capacitação (regras e normas). Realiza
a conexão, por meio de estrutura
de rede e de aplicativos, entre fornecedor e usuário. Cobra taxa do
fornecedor. Realiza o pagamento.
Monitora as avaliações dos usuários e descredencia fornecedores
abaixo da linha de corte.
Utilizam aplicativo web
para realizar chamadas.
Pagam pelo serviço de
transporte por meio de
cartão pré-cadastrado ou
em dinheiro. Avaliam o serviço. Podem realizar reclamações.
Drivers, vehicle owners
who want to work with
passenger transportation,
full or part time (lexibility
to choose when and how
to work). All maintenance
costs of the vehicle are
the responsibility of the
owners.
Researches the driver’s background. Provides a training manual (rules and standards). Creates the
connection, through a network
and application structure, between supplier and user. Charges a
supplier fee. Makes payments.
Monitors user ratings and takes
accreditation away from suppliers
below the cut-off point.
Motoristas, proprietários
de veículos utilitários e de
caminhões que queiram
trabalhar com transporte de cargas, em tempo
integral ou parcial (lexibilidade de escolha e de
atuação). Todos os custos
de manutenção do veículo
são de responsabilidade
dos proprietários.
Pesquisa antecedentes do motorista. Possui manual de capacitação (regras e normas). Realiza a
conexão, por meio de estrutura de
rede e de aplicativos, entre fornecedor e usuário (em geral, relação
com empresas). Cobra taxa do
fornecedor. Realiza o pagamento.
Monitora as avaliações dos usuários e descredencia fornecedores
abaixo da linha de corte.
Drivers, utility vehicle and
truck owners who want to
work with freight transportaion, full or part-time
(lexibility to choose when
and how to work). All maintenance costs of the vehicle are the responsibility of
the owners.
Researches the driver’s background. Provides a training manual
(rules and standards). Creates the
connection, through a network
and application structure, between supplier and user (usually B2B).
Charges a supplier fee. Makes
payments. Monitors user ratings
and takes accreditation away from
suppliers below the cut-off point.
They use the web app to
make requests. They pay
for the transport service by
means of a pre-registered
card or cash. They evaluate
the service. They can make
complaints.
Utilizam aplicativo web
para realizar chamadas.
Pagam pelo serviço de
transporte por meio de catão cadastrado no ato da
contratação ou por meio
de boleto bancário. Avaliam o serviço. Podem realizar reclamações.
They use the web app to
make requests. They pay
for the transport service by
means of a card, registered
when making the transaction, or through a bank slip.
They evaluate the service.
They can make complaints.
cont.
artigo
article
148
cont.
Modelo de negócio
Business description
Zipcar
Fornecedor
Plataforma
Usuários/clientes
Supplier
Platform
Users/clients
Empresa fornece rede de
veículos para locação. Todos os custos de manutenção do veículo são de
responsabilidade dos proprietários.
Usuário realiza cadastro no site, seleciona o plano que melhor atende
as necessidades e receberá o cartão de acesso aos veículos.
Por meio de aplicativo o
cliente localiza o veículo,
destranca-o com o cartão
recebido e utiliza pelo tempo estabelecido.
Company provides network
of vehicles for rental. All
vehicle maintenance costs
are the responsibility of the
owners.
Fleety
Proprietários de veículos
que queiram alugar o veículo por tempo integral ou
parcial (lexibilidade de escolha e de atuação). Todos
os custos de manutenção
do veículo são de responsabilidade dos proprietários.
Vehicle owners who want
to rent the vehicle full or
part time. (lexibility to
choose when and how to
work). All maintenance
costs of the vehicle are the
responsibility of the own
Fonte: Autoria própria, 2016
Source: Author, 2016
User registers on the site, selects
the plan that best meets their ne- Through the app the custoeds and receives a card to access mer locates the vehicle, unlothe vehicles.
cks it with their card, and uses
it for the established time.
Realiza a conexão, por meio de
estrutura de rede e de aplicativos,
entre fornecedor e usuário. Cobra
taxa do fornecedor. Realiza o pagamento.
Creates the connection, through
a network and application structure, between supplier and user.
Charges a supplier fee. Makes
payments.
Utilizam aplicativo web
para realizar chamadas.
Pagam pelo serviço de
transporte por meio de
cartão
pré-cadastrado.
Avaliam o serviço. Podem
realizar reclamações.
They use the web app to
make requests. They pay
for the transport service by
means of a pre-registered
card. They evaluate the service. They can make complaints.
cadernos fgv projetos
149
PRINCIPAIS FATORES CRÍTICOS
DE SUCESSO IDENTIFICADOS
KEY CRITICAL SUCCESS
FACTORS IDENTIFIED
Baixos custos de entrada, em
geral em função de:
Low entry costs,
generally due to:
• Custos operacionais intermediários,
uma vez que esses negócios costumam operar com plataformas tecnológicas bastante
avançadas – mesmo assim, em geral, menores que os observados em negócios que operem em segmentos da indústria tradicionais;
• Infraestrutura física reduzida para a
operação, na grande maioria dos casos, se
comparada a observada nos negócios tradicionais (por exemplo, a estrutura do Waze
e do Facebook frente a de grandes players
como Google e Apple);
• Operações em rede com fornecedores;
• Quadro de colaboradores intermediário.
Uso de recursos tecnológicos
avançados, em geral apoiados
em algoritmos:
•
Middle level operating costs, since these businesses usually operate with
very advanced technological platforms
- even though they are generally smaller
than those seen in businesses operating
within traditional industry segments;
• Reduced physical infrastructure
for the operation, in the vast majority of
cases, compared to traditional business
(for example, comparing the structure
of Waze and Facebook with that of large
players such as Google and Apple);
• Network operations with suppliers;
• Middle sized workforce
Use of advanced technological
resources, generally supported
by algorithms:
•
• Viabilizam a operação da plataforma;
• Possibilitam a obtenção de um banco
de dados detalhado a respeito de questões
como mobilidade e hábitos dos usuários.
Apropriação da chamada
capacidade operacional
excedente:
• Por parte dos usuários, por meio da
utilização de recursos do próprio cliente,
como o telefone e dados GPS.
Enable the operation of the platform;
• Enable the creation of a detailed database on user habits and portability.
Appropriating so-called surplus
operational capacity:
• By the users, through the use of the
customer’s own resources, such as their
phone and GPS data.
artigo
article
150
Consolidação da relação
de coniança:
• Com usuários, para construção e
manutenção da credibilidade e da marca,
por meio do monitoramento da qualidade
dos serviços prestados;
• Com clientes patrocinadores, em
geral representados por anunciantes e/ou
organizações que queiram ofertar seus serviços, a im de estimulá-los a manter os investimentos promocionais e publicitários.
Garantia da qualidade:
• Da operação, por meio de infraestrutura tecnológica e de gestão, com investimentos elevados em atualização e segurança;
• Com usuários, por meio do provimento de um serviço de qualidade, que vá
de encontro às necessidades veriicadas,
que seja ágil e efetivo (tempo de alimentação e resposta de dados para esse modelo
de negócios é fundamental);
• Com clientes patrocinadores, em
geral representados por anunciantes e/
ou organizações que queiram ofertar seus
serviços, por meio de retornos efetivos às
ações realizadas.
Divulgação da marca e do negócio:
• Apoiada basicamente em redes sociais, no boca-a-boca e nas próprias plataformas;
• Uso de espaços em mídia espontânea tem representado um fator positivo a
esse tipo de negócio.
Consolidating relationships
of trust:
•
With users, to build and maintain
credibility and branding, by monitoring the quality of the services provided
• With client sponsors, usually represented by advertisers and/or organizations that want to offer their services, in
order to encourage them to maintain promotional and advertising investments.
Quality assurance:
• Operational, through technological and management infrastructure,
with high investments in updating and
security;
• With users, by providing a quality
service, that meets the needs veriied, that
is agile and effective (processing and data
response times are fundamental for this
business model);
• With client sponsors, usually represented by advertisers and/or organizations that want to offer their services,
through effective returns for the actions
performed.
Brand and business promotion:
• Basically supported by social networks, word-of-mouth and platforms
themselves;
• Use of spontaneous media has been
a positive factor in this type of business.
cadernos fgv projetos
151
Gratuidade para os usuários:
• Os usuários operam como “alimentadores de informação e de conteúdo” e
precisam ser estimulados a isso. Em geral,
o estímulo ocorre em função da própria
qualidade da solução disponibilizada;
• Os anunciantes, na grande maioria dos
casos, representam a principal fonte de receita para esse tipo de modelo de negócios.
Being free for users:
• Users operate as “information and
content feeders” and need to be encouraged to do so. In general, the stimulus
occurs as a function of the quality of the
solution available;
• In most cases advertisers represent
the main source of revenue for this type of
business model.
CATEGORIA 3:
COMPARTILHAMENTOS
E COLABORAÇÕES PARA
CONTRIBUIÇÃO A QUESTÕES
ESPECÍFICAS (PODENDO SER
REMUNERADOS OU NÃO)
CATEGORY 3:
SHARING AND
COLLABORATION TO
CONTRIBUTE TO SPECIFIC
ISSUES (PAID OR FREE)
A terceira categoria abre para produção compartilhada e para identiicação de soluções que
podem vir para a sociedade como um todo,
para o cidadão: a colaboração pode ocorrer da
sociedade para o governo, da sociedade para
organizações ou de organizações para organizações. Um bom exemplo seria o governo disponibilizar dados e lançar desaios à sociedade
para ajudá-lo a encontrar melhores práticas.
Grandes corporações, como a Procter & Gamble e outras tantas, no Brasil, a Natura, têm
incentivado o estabelecimento de redes de trocas em formatos como competições e ciclos de
inovação, que contam com a participação de
diferentes representantes da sociedade, entre
professores, consultores, especialistas, técnicos em segmentos especíicos que vão alavancar de maneira exponencial a produtividade e
a inovação dentro de corporações tradicionais.
Esse tipo de colaboração pode ou não ser
remunerada pelas organizações. Os modelos
de negócio podem, ainda, ser sustentados por
meio de patrocínio público ou privado, a de-
The third category includes private citizens in shared production and identifying solutions that can impact society
as a whole. Collaboration can occur between society and government, society
and organizations or organizations and
organizations. A good example would be
when a government makes data available and challenges society to help it find
best practices. Large corporations, such
as Procter & Gamble and Natura in Brazil have encouraged the establishment of
exchange networks, in the form of competitions and innovation cycles with the
participation of different representatives
of society. These include teachers, consultants, specialists, and technicians in
specific segments that will exponentially leverage productivity and innovation
within traditional corporations.
This type of collaboration may or may not
be remunerated by organizations. The business models can also be sustained through
artigo
article
152
Quadro 4 Matriz-síntese do descrito de exemplos de negócios relacionados à Categoria 2
Table 4 Synthesis matrix of descriptions of business examples related to Category 2
Modelo de negócio
Empresa
Company
Waze
Segmento de
atuação
Business
segment
Serviços de
mobilidade
(localização
e status)
Mobility solutions
(localisation and
status)
Business description
Segmento de
atuação
Operating
area
Empresa surgiu em Israel.
Atualmente,
opera em 32
países, como
EUA, Canadá,
Brasil, Reino
Unido, França,
Alemanha.
Founded in Israel. Currently
operates in 32
countries such
as the USA,
Canada, Brazil,
the UK, France
and Germany.
Tipo de serviços ofertados
Types of services offered
Waze Connected Citizens Program torna as vias mais seguras e eficientes por meio da troca de dados anônimos com cerca de 80 organizações municipais.
Waze for Broadcasters atende mais de 170 parceiros globais de transmissão, com dados em tempo real e insights dos usuários do Waze em rota.
The Waze Transport SDK capacita seis empresas de transporte ou
de entrega sob demanda a melhorar seu serviço e ampliar negócios
com itens exibidos em suas aplicações nativas, como o Horário Estimado de Chegada (HEC) do Waze, a navegação ponto a ponto e as
rotas preferidas.
The Waze Global Event Partner Program ajudará estádios, maratonas e
outros organizadores de eventos em todo o mundo a tornar o tráfego relacionado a esses acontecimentos mais inteligente e a comunicar melhor
informações sobre as vias para os espectadores e o público em geral.
Waze Connected Citizens Program makes routes safer and more efficient through the exchange of anonymous messages with about 80
municipal organizations.
Waze for Broadcasters provides 170 global broadcast partners with
real-time data and insights from Waze users en route.
The Waze Transport SDK enables six carriers and on-demand delivery
companies to enhance their service and expand business with items
displayed in their native applications, such as Waze’s Estimated Time of
Arrival (ETA), point-to-point navigation, and preferred routes.
The Waze Global Event Partner Program is going to help stadiums,
marathons and other event organizers around the world to ensure that the
traffic low related to these events is smarter and communicate information about the routes to viewers and the general public in a better way.
Facebook
Serviços pessoais e
profissionais
(rede social)
Personal and professional services
(social network)
Empresa surgiu
nos EUA. Atualmente, opera
em 137 países,
como EUA,
Austrália, Reino
Unido, Japão,
Itália, Índia,
Brasil.
Founded in the
USA. Currently
operates in 137
countries such
as the USA,
Australia, the
UK, Japan, Italy,
India
and Brazil.
Facebook contém o feed de notícias, a lista com as publicações de amigos, páginas e outros contatos.
Messenger aplicativo de envio de mensagem instantânea a outros
usuários. Pode enviar fotos, anexos, figuras e GIFs.
Paper tem a intenção de servir como um equivalente à base do telefone de um jornal ou revista impressa.
Gerenciador de Páginas permite gerenciar a fanpage pelo computador
ou celular/tablet.
Informações do Público permitem que se conheça o público-alvo para
criação de conteúdo mais relevante.
Facebook contains the news feed, a list with friend’s publications, pages and other contacts. It has an e-commerce platform.
Messenger application for sending instant messages to other users.
You can send photos, attachments, pictures and GIFs.
Paper intends to serve as a phone based equivalent to a newspaper or
print magazine.
Page Manager allows you to manage a fanpage on your computer or
phone/tablet.
Audience insights let you know the target audience for the most relevant content creation.
Fonte: Autoria própria, 2016
Source: Own authorship, 2016
cont.
cadernos fgv projetos
153
cont.
Modelo de negócio
Empresa
Company
Youtube
Segmento de
atuação
Business
segment
Serviços pessoais e
profissionais
(compartilhamento
de conteúdo)
Personal and professional services
(content sharing)
Business description
Segmento de
atuação
Operating
area
Empresa surgiu nos EUA.
Atualmente,
opera em 88
países, como
EUA, Brasil,
Canadá, Espanha, França,
Polônia.
Tipo de serviços ofertados
Types of services offered
YouTube carregamento e compartilhamento de vídeos em
formato digital.
Anúncios lançamento de publicação em marketing em vídeo.
YouTube uploading and sharing videos in digital format.
Adverts video marketing publishing launch.
Founded in
the USA.
Currently
operates in 88
countries such
as the USA,
Brazil, Canada,
Spain, France
and Poland.
Bliive
Tem
Açúcar?
Serviços Pessoais
(tarefas, cursos e
correlatos)
Empresa
surgiu no
Brasil.
Personal services
(tasks, courses and
the like)
Founded in
Brazil and
operates in
Brazil.
Serviços Pessoais
(compartilhamento de utilidades
domésticas)
Empresa
surgiu no
Brasil.
Personal services
(sharing of domestic utilities)
Founded in
Brazil and
operates in
Brazil.
TimeMoneys é a moeda de tempo do Bliive, cada hora equivale a um TimeMoney.
TimeMoneys is Bliive’s time currency, every hour is equivalent
to TimeMoney.
Tem Açúcar? incentiva o empréstimo e/ou doação de objetos
entre moradores do bairro/região.
Tem Açúcar? encourages the loaning and/or donation of objects among residents of the same neighborhood/region.
artigo
article
154
Quadro 5 Matriz-síntese de exemplos modelos de negócios relacionados à Categoria 2
Table 5: Synthesis matrix of examples of business models related to Category 2
Modelo de negócio
Business description
Empresa
Company
Waze
Fornecedor
Plataforma
Usuários/Clientes
Supplier
Platform
Users/Clients
Sistema de GPS integrado ao
aplicativo que possibilita a inclusão de informações de trânsito
pelo usuário em tempo real.
Usuário faz download do aplicativo, realiza o cadastro com
endereço de e-mail. Realiza a conexão, por meio de estrutura do
aplicativo. Não há cobrança de
taxa para o usuário.
Usuários utilizam o aplicativo para realizar pesquisa sobre trânsito e/ou
adicionar
informações
como acidentes, vias
congestionadas etc.
User downloads the application,
registers with an e-mail address
and connects through the application structure. There is no user fee.
The application is used to
research traffic conditions
and/or add information
such as accidents, congested roads, and so on.
Usuário/empresa faz o cadastro
no site/aplicativo com endereço
de e-mail e pode utilizar o site
ou aplicativo para interação e
divulgação de produtos/serviços. A conta do perfil e página
são gratuitos, são cobradas as
divulgações realizadas a partir
das fanpage.
Usuários utilizam o site/
aplicativo para interação
com outros usuários ou
empresas com compartilhamento de informações,
dúvidas, notícias, imagens,
textos nos perfis.
GPS system integrated into the
application that allows traffic information to be included by the
user in real time.
Facebook
Rede social onde há a integração entre usuários, empresas e
comunidades. Gratuito para usuário. Anúncios e divulgações são
taxados de acordo com o plano
desejado pelo proprietário da
página.
Social network where there is
integration between users, companies and communities. Free for
the user. Ads and marketing activities are priced according to the
plan chosen by the page owner.
User/company registers on the
site/application with an e-mail
address, and can use the site or
application for interaction and
dissemination of products/services. The account and profile
page are free. They are charged
for marketing actions made on/
from the fanpage.
The site/application is
used to interact with
other users or companies with information
sharing, doubts, news,
images, and texts in the
profiles.
cont.
Fonte: Autoria própria, 2016
Source: Own authorship, 2016
cadernos fgv projetos
155
cont.
Modelo de negócio
Business description
Empresa
Company
Youtube
Bliive
Tem
Açúcar?
Fornecedor
Plataforma
Usuários/clientes
Supplier
Platform
Users/clients
Usuário compartilha vídeo em formato digital. Gratuito para usuário.
Anúncios e divulgações são taxados de acordo com o plano desejado pelo proprietário da conta.
Usuário faz o cadastro no site/
aplicativo com endereço de
e-mail. A conta do perfil é gratuito, são cobradas taxas para
anúncios na plataforma.
Usuário pode utilizar o
site/aplicativo para assistir ou compartilhar vídeo,
além de poder deixar comentário sobre o mesmo
no site/aplicativo.
User shares video in digital format. Free for the user. Ads and
marketing activities are priced
according to the plan chosen by
the account owner.
User registers on the site/application with an e-mail address.
The profile account is free. Fees
are charged for ads on the platform.
Usuário disponibiliza experiência que deseja compartilhar, e
a moeda de troca é o “tempo”
utilizado para compartilhar essa
experiência.
Usuário faz o cadastro no site com
endereço de e-mail. Disponibiliza a
experiência que quer compartilhar.
Informa a troca realizada. A conta
do perfil é gratuita.
User chooses the experience that
he/she wants to share. The currency of this exchange is the “time”
used to share this experience.
User registers on the site with an
e-mail address. User makes the
experience they want to share
available. Informs what was exchanged. The user account is free.
Usuário solicita o item para empréstimo e localiza um vizinho
com o item, e realiza o empréstimo. Não há cobrança de taxas.
Usuário faz download do aplicativo, realiza o cadastro com
endereço de e-mail e residência.
Realiza a conexão com outros
usuários, por meio de estrutura
do aplicativo. Não há cobrança
de taxa para o usuário.
User requests the item to borrow
and locates a neighbor with the
item. The item is then lent. There
are no fees.
User downloads the application,
registers with an e-mail address
and residential adress. Connects with other users through
the application structure. There
is no user fee.
The site/app can be used
to watch or share videos, and users may leave
comments about them
on the site/application.
Usuário utiliza para troca
de experiência/serviços/
conhecimento com outros usuários. A forma de
pagamento é em “horas”
de serviço. Avalia o serviço. Pode realizar reclamações.
The site is used to exchange experiences/services/
knowledge with other
users. Payment takes the
form of “hours” of service.
Users evaluate the service. They can make complaints. Recently extended
the services to include
groups and companies.
Usuário informa qual item
deseja e outro usuário
disponibiliza o item para
empréstimo. Avalia a experiência. Pode realizar
reclamações.
User informs which item
he wants and another
user makes the item
available to be borrowed.
They evaluate the experience. They can make
complaints.
artigo
article
156
pender do objeto-alvo do desaio, se assemelhando, de certa forma, ao “modelo Google”
citado na categoria anterior (o de acesso com
custo marginal zero ou próximo de zero).
public or private sponsorship, depending on
the target object of the challenge, resembling
in a certain way the “Google model” mentioned in the previous category (where access
has a zero marginal cost or close to zero).
PRINCIPAIS FATORES CRÍTICOS
DE SUCESSO IDENTIFICADOS
KEY CRITICAL SUCCESS FACTORS IDENTIFIED
Baixos custos de entrada, em
geral em função de:
Low entry costs,
generally due to:
• Custos operacionais baixos, uma
vez que esses negócios costumam ser operacionalizados no formato de projetos de
curto, médio ou longo prazo, podendo ser
operados por meio de plataformas tecnológicas ou de inserção desses projetos no
ambiente organizacional do “cliente buscador da solução”;
• Infraestrutura física reduzida para a
operação, na grande maioria dos casos, se
comparada a observada nos negócios tradicionais (por exemplo, áreas de pesquisa
e desenvolvimento de grandes empresas);
• Quadro de colaboradores reduzido e,
em geral, devido à natureza de projetos para
esse tipo de operação, por tempo limitado;
• Possibilidade de patrocínio externo,
seja por parte de governo ou de empresas
privadas que queiram associar suas marcas ao projeto.
Apropriação da chamada
capacidade operacional
excedente:
• Por parte dos usuários clientes da
solução, por meio da utilização de soluções
apresentadas, remuneradas ou não;
•
Low operating costs, since these
businesses usually operate in the form of
short, medium or long term projects, which can be operated through technological
platforms or inserted in the organizational environment of the “client searching
for a solution”;
• Reduced physical infrastructure for
the operation, in the vast majority of cases, when compared to that seen in traditional businesses (for example, research
and development departments of large
companies);
• Reduced staff numbers and, in general, due to the nature of projects for this
type of operation, for a limited time;
• Possibility of external sponsorship,
either from the government or private
companies that want to associate their
brands with the project.
Appropriating so-called surplus
operational capacity:
•
By the users of the solution, through
the use of solutions given, remunerated or
not;
cadernos fgv projetos
157
artigo
article
158
• Por parte de organizações de naturezas
diversas, como universidades e centros tecnológicos – ou até mesmo startups, corroborando com o conceito de corporate venturing.
Ampliação das bases de
conhecimento, por parte do
“cliente buscador da solução”:
• Redução dos custos com pesquisa e
desenvolvimento e inovação;
• Maior agilidade em processos de
aprimoramento e inovação (incremental
ou radical);
• Maior interação com a sociedade e
até mesmo com clientes inais, que passam
a ser partícipes do processo de criação e de
desenvolvimento de produtos e serviços;
• Formação de redes.
Garantia da qualidade:
• Da operação, por meio da adoção de
metodologias consistentes, que possibilitem realizar a ponte entre a colaboração
externa e o negócio;
• Do relacionamento com os usuários
colaboradores, por meio do reconhecimento,
monetário ou não, de suas contribuições.
Apoio político e institucional ao
modelo de negócio:
• No que se refere ao setor público, por
meio de políticas, programas, projetos e
ações alinhados aos resultados esperados;
• No que se refere à iniciativa privada
e ao terceiro setor, por meio de patrocínio
das lideranças envolvidas, tanto interna-
• By different types of organizations,
such as universities and technology centres - or even startups, supporting the
concept of corporate venturing.
Expansion of knowledge bases,
by the “client searching for a
solution”:
• Reduction of research, development
and innovation costs;
• Greater agility in improvement and
innovation processes (incremental or radical);
• Increased interaction with society
and even with inal customers, who become part of the process of creating and
developing products and services;
• Networking.
Quality assurance:
• Operational, by adopting consistent
methodologies that allow bridge building
between external collaboration and the
business;
• Of the relationship with collaborating users, through recognition, monetary or otherwise, of their contributions.
Political and institutional support
for the business model:
• With regard to the public sector,
through policies, programs, projects and
actions aligned with expected results;
• With regard to the private sector
and the third sector, through the sponsorship of the leaders involved, both inter-
cadernos fgv projetos
159
mente como as que representam o “cliente
buscador da solução”.
Reconhecimento das contribuições:
• Os usuários colaboradores podem
ser remunerados ou não, entretanto, o
reconhecimento faz-se fundamental para
esse tipo de operação.
nally and those who represent the “client
searching for a solution”.
Recognition of contributions:
• Collaborating users can be paid of
not, however, recognition is essential for
this type of operation.
PRINCIPAIS ACHADOS E
CONSIDERAÇÕES FINAIS
KEY FINDINGS AND FINAL
CONSIDERATIONS
Como resultado inal, a título de principais
contribuições, destaque para: a identiicação
objetiva de conceitos relacionados à economia
colaborativa, abrangendo conceitos da economia compartilhada, com ênfase em modelos
de negócio relacionados; a identiicação de
conceitos relacionados a estruturas de rede e
modelos de governança, como base estruturante aos modelos colaborativos de negócios;
a identiicação e análise de modelos de negócio
relacionados à economia colaborativa, a partir
de recortes intencionais realizados (organizações escolhidas); a proposição de três novas
categorias-lógicas de referência, propostas a
partir dos diferentes tipos de modelos de negócio observados na economia colaborativa;
e a identiicação de fatores críticos de sucesso
comuns às categorias propostas.
Quanto às novas categorias propostas: a)
compartilhamentos e colaborações via pagamento pelo acesso/pelo uso (troca inanceira);
b) compartilhamentos e colaborações com
custo marginal zero ou próximo de zero (sem
pagamento direto pelo acesso/pelo uso); e c)
compartilhamentos e colaborações para contribuição a questões especíicas (podendo ser
remunerados ou não). Como principais fato-
Finally, the main contributions we highlight here are: the objective identiication of concepts related to the collaborative economy, encompassing concepts of
shared economy, with emphasis on related
business models; identiication of concepts
related to network structures and governance models, as a structural basis for
collaborative business models; the identiication and analysis of business models related to the collaborative economy, based
on intentional selections made (elected
organizations); the proposal of three new
logical categories of reference, based on
the different types of business models observed in the collaborative economy; and
the identiication of critical success factors
common to the proposed categories.
The new proposed categories are: a)
sharing and collaboration via payment for
access/use (inancial exchange) b) sharing
and collaboration with zero marginal cost,
or close to zero (without direct payment for
access/use); and c) sharing and collaboration to contribute to speciic issues (paid or
free). The main critical success factors identiied, common to the three categories, we
artigo
article
160
Quadro 6
Matriz-síntese do descrito de exemplos de negócios relacionados à
Categoria 3
Table 6 Synthesis matrix of descriptions of business examples related to
Category 3
Modelo de negócio
Empresa
Company
Criaticidades
Segmento de
atuação
Business
Segment
Serviços municipais/nacionais
(estímulo a cidades e negócios
criativos)
Municipal/national
services (stimulating cities and
creative
businesses)
SampaCriAtiva
Serviços
municipais
(plataforma de colaboração aberta
ao cidadão)
Municipal services
(collaboration
platform open to
citizens)
Business Description
Região de atuação
Tipo de serviços/produtos ofertados
Operating Area
Types of Services/Products Offered
Surgiu no Brasil
(projeto
descontinuado)
Founded in Brazil
(discontinued project)
Procura identificar oportunidades e fornecer serviços que permitam que o setor da
economia criativa contribua para o desenvolvimento socioeconômico das cidades
brasileiras.
It seeks to identify opportunities and provide services that allow the creative economy sector to contribute to the socioeconomic development of Brazilian cities.
São Paulo, Brasil
(projeto
descontinuado)
São Paulo, Brazil
(discontinued project)
Canal colaborativo de expressão e articulação, que propõe um espaço ao cidadão
paulistano para pensar sobre a cidade e
reletir sobre como melhorá-la.
A collaborative channel for expression and
connection, which proposes a space for
the citizens of São Paulo to think about the
city and relect on how to improve it.
cont.
Fonte: Autoria própria, 2016
Source: Own authorship, 2016
cadernos fgv projetos
161
cont.
Modelo de negócio
Empresa
Company
Waze
Connected
Clients
Segmento de
atuação
Business
Segment
Business Description
Região de atuação
Tipo de serviços/produtos ofertados
Operating Area
Types of Services/Products Offered
Serviços municipais/nacionais
(informações
sobre mobilidade
urbana)
Presente em cerca
de 80 municípios,
como Rio de Janeiro,
São Paulo, Nova York,
Barcelona e Boston.
Municipal/national
services (information on urban
mobility)
Created in Israel,
present in close to 80
municipalities such
as Rio de Janeiro, São
Paulo, New York, Barcelona and Boston.
Waze Connected Citizens Program torna
as vias mais seguras e eficientes por meio
da troca de dados anônimos com organizações municipais. Contém informações
filtradas para a área específica, monitorada, incluindo alertas de congestionamentos gerados pelo sistema e fatos do
trânsito relatados por usuários (incluindo
congestionamentos, acidentes, perigos,
obra, buracos, atropelamento, veículos parados, objetos na via e falta de sinalização).
Waze Connected Citizens Program makes
the routes safer and more efficient by exchanging anonymous data with municipal
organizations. Contains information filtered for the specific area, which is monitored, including system-generated congestion alerts and user-reported traffic events
including congestion, accidents, hazards,
works, holes, overpasses, run over people,
stopped vehicles, objects in the road and a
lack of signs.
Natura
Organizações e
corporações
(ciclos de
inovação)
Brasil, Argentina,
Chile, Colômbia,
México, Peru,
Venezuela e França.
Organizations and
corporations (innovation cycles)
Created in Brazil,
present in Brazil,
Argentina, Chile,
Colombia, Mexico,
Peru, Venezuela
and France.
Fabrica e comercializa produtos de tratamento para o rosto, corpo, sabonetes, barba, desodorantes, óleos corporais, maquiagem, perfumaria, cabelos, proteção solar,
e infantil (produtos de beleza e higiene
pessoal). Possui forte apelo de sustentabilidade ambiental, reforçado pelo uso de
plantas, ervas e sementes brasileira.
It manufactures and sells products for face
treatments, the body, beard, soap, deodorants, body oils, makeup, perfume, hair
products, sun protection, and children’s
products (beauty and personal hygiene
products). It has a strong appeal among
those interested in environmental sustainability, reinforced by the use of Brazilian
plants, herbs and seeds.
artigo
article
162
Quadro 7 Matriz-síntese de exemplos modelos de negócios relacionados à
Categoria 3
Table 7 Synthesis matrix of examples of business models related to Category 3
Criaticidades
Cidadãos em
geral, podendo
ser representados por meio
de entidades
de classes ou
organizações.
Citizens in general that can
be represented
through class
entities or organizations.
Como principais atividades-chave, a criação de peças audiovisuais para difusão dos
conceitos, contendo entrevistas e casos
práticos, e a formação de uma rede de cidades. O recurso principal, nesse caso, foi
a contribuição das pessoas. O projeto foi
destinado a economistas, urbanistas, jornalistas, gestores públicos e privados, estudantes, cidadãos interessados em geral.
O principal canal utilizado foi o próprio portal e a diretriz central para relacionamento
com clientes foi investir em redes sociais.
Key activities were the creation of audiovisual pieces for the diffusion of concepts,
containing interviews and real cases as wel
as creating a network of cities. The main
resource in this case was people’s contributions. The project aimed at economists,
urban planners, journalists, public and private managers, students and interested
citizens in general. The main channel used
was the portal itself and the central guideline for customer relations was to invest in
social networks.
Governos estaduais e
municipais interessados
em investir em políticas
e em ações em prol do
desenvolvimento de cidades criativas, apoiadas
nas indústrias criativas.
O cidadão, de forma geral, como beneficiário das
iniciativas adotadas.
State and municipal governments interested in
investing in policies and
actions for the development of creative cities,
supported by the creative industries. The citizen,
in general, as a beneficiary of the initiatives
adopted.
cont.
cadernos fgv projetos
163
cont.
Modelo de negócio
Business Description
Empresa
Company
SampaCriAtiva
Fornecedor
Plataforma
Usuários/Clientes
Supplier
Platform
Users/Clients
Cidadãos em
geral, podendo
ser representados por meio
de pessoas
físicas, jurídicas, entidades
de classes ou
organizações.
Iniciativa transversal entre organizações
privadas, com contribuições ao governo.
Espaço virtual, por meio de uma plataforma aberta, para proposições de agenda
positiva para a cidade de São Paulo e uma
ampliação, em termos de canal de comunicação com os cidadãos, do exercício da
cidadania. Entre as atividades-chave principais encontravam-se o levantamento de
histórias reais para a transformação urbana, o acolhimento de propostas e o direcionamento das propostas para o poder público municipal (Câmara e Prefeitura). Contou
com uma equipe de jornalistas e demais
profissionais de geração de conteúdo e a
coordenação de profissionais de referência
em economia criativa e cidades.
Governo municipal de
São Paulo, interessados
em investir em políticas
e em ações em prol do
desenvolvimento de iniciativas relacionadas às
indústrias criativas.
O cidadão, de forma geral, como beneficiário das
iniciativas adotadas.
Citizens in general, that may
be represented
by individuals,
legal entities,
class entities or
organizations.
Transversal initiative among private organizations, with contributions to the government. Virtual space, through an open platform, for proposals of a positive nature for
the city of São Paulo and an expansion, in
terms of a channel of communication with
citizens, of the exercise of citizenship. Key
activities included analysing real stories of
urban transformation, gathering proposals
and directing proposals to the municipal
public authority (City Hall). It relied on a
team of journalists and other professionals
for content generation and the coordination of important professionals in the creative economy and cities.
São Paulo municipal government, those interested in investing in policies
and actions for the development of initiatives
related to the creative
industries. The citizen, in
general, as a beneficiary
of the initiatives adopted.
cont.
artigo
article
164
cont.
Modelo de negócio
Business Description
Empresa
Company
Waze
Connected
Clients
Fornecedor
Plataforma
Usuários/Clientes
Supplier
Platform
Users/Clients
Usuários do
Waze e desenvolvedores de
tecnologia.
Utiliza a plataforma original do Waze e uma
plataforma operacional, que incentiva a troca de dados (alimentação por parte de usuários anônimos), como forma de subsidiar
organizações municipais para tornar as vias
mais seguras e eficientes. Em 2016, atuava
com cerca de 80 organizações municipais.
Principais funcionalidades: saber o que
está acontecendo nas vias/estradas; encaminhar informações de incidentes em
tempo real mais rápido do que outros métodos de relatório; aumentar a eficiência da
resposta a incidentes; detectar e verificar
com exatidão onde ocorrem os incidentes,
criando tempos de resposta e limpeza mais
rápidos; reduzir o congestionamento de
tráfego; redirecionar usuários do Waze em
torno de encerramentos de rodovias e incidentes em tempo real; subsidiar a tomada
de decisões de infraestrutura baseada em
dados em tempo real e confiáveis.
Municípios e órgãos relacionados. O cidadão, de
forma geral, como beneficiário das informações
disponibilizadas e dado
aumento da eficiência
pública na gestão de vias.
Waze users
and technology
developers.
Municipalities and related bodies. The citizen, in
general, as a beneficiary
of the information made
available and increased
public efficiency in the
management of roads.
It uses the original Waze platform and an
operational platform that encourages data
exchange (fed by anonymous members) as
a way to support municipal organizations to
make the routes safer and more efficient.
In 2016, it operated in conjunction with
about 80 municipal organizations.Main features: know what is happening on roads/
highways; forward real-time incident information faster than other reporting methods; increase the efficiency of incident
response; detect and verify exactly where
the incidents occur; providing faster response and resolution times; reduce traffic
congestion; redirect Waze users away from
real-time road closures and incidents; subsidise infrastructure decision making based on real-time and reliable data.
cont.
Fonte: Autoria própria, 2016
Source: Own authorship, 2016
cadernos fgv projetos
165
cont.
Modelo de negócio
Business Description
Empresa
Company
Natura
Fornecedor
Plataforma
Usuários/Clientes
Supplier
Platform
Users/Clients
Cidadãos em
geral, com ou
sem áreas de
especialização,
universidades e centros
tecnológicos e
startups.
A empresa incentiva estruturas de redes de
colaboração desde a sua fundação, iniciando pela área comercial (rede de vendedores) e hoje investindo fortemente em bases
para aprimoramento e desenvolvimento
de produtos. A interação com universidades e centros de pesquisa, a participação
em eventos relacionados à pesquisa e a
estrutura criada para captação de ideias e
projetos. Possui campus próprio. Como iniciativa de destaque, a construção de uma
rede formada por consumidores, consultoras e formadores de opinião para desenvolver projetos de inovação. Realiza ciclos
de inovação frequentes e sistematizados,
integrados ao planejamento.
A própria organização,
podendo estender o processo e os resultados a
fornecedores parceiros.
Citizens in
general, with
or without
specializations,
univerisities,
technology
centres and
startups.
The company has encouraged collaborative network structures since its inception,
starting with the commercial area (vendors
network) and now investing heavily in bases for product improvement and development. It interacts with universities and
research centers, participates in research-related events and has created a structure
so as to capture ideas and projects. It has
its own campus. A prominent initiative is
the construction of a network of consumers, consultants and opinion shapers to
develop innovation projects. It implements
frequent and systematized cycles of innovation, integrated within its planning.
The organization itself,
being able to extend the
process and the results
to supplier partners.
artigo
article
166
res críticos de sucesso identiicados, comuns
às três categorias, destaque para: operação em
rede; baixos custos de entrada; apropriação da
chamada capacidade operacional excedente;
ampliação do acesso, seja a bens, serviços ou ao
conhecimento; estabelecimento de relação de
coniança, com fornecedores e usuários/clientes; qualidade e agilidade.
Ressalta-se que os modelos que operam
em colaboração representam importantes
aliados à sustentabilidade ambiental, espacial/geográica e econômica de cidades e
de nações, uma vez que um de seus pilares
encontra-se apoiado no aproveitamento da
capacidade ociosa, seja esta relacionada à
tecnologia, a materiais e bens de consumo, a
espaços ou mesmo a serviços. Por outro lado,
os modelos colaborativos tendem a tomar espaços até então dominados pelas chamadas
indústrias tradicionais, a exemplo de uma
montadora versus um serviço de transporte
de passageiros (como o Uber ou o Fleety), o
que levará a revisão não somente de marcos
regulatórios, mas sobretudo de modelos econômicos e políticos que possam assegurar
equilíbrio e condições para desenvolvimento. Demandará profunda relexão estendida
aos novos formatos a serem assumidos pela
a força de trabalho, que passa a ser “Eu S/A”,
não somente pela capacidade de oferta de um
para um – em reforço ao conceito do peer-topeer –, mas sobretudo pela mudança projetada para as relações trabalhistas – de “empregados” a “prestadores de serviço”.
Os novos modelos de negócio relacionados
à chamada economia colaborativa trazem
impactos às indústrias tradicionais, na medida em que ofertam soluções alternativas aos
consumidores, em geral apoiadas em plataformas gerenciais bastante lexíveis e de baixo custo. A evolução tecnológica talvez tenha
sido o principal fator crítico de sucesso desse
highlight are: network operations; low entry costs; appropriation of so-called surplus
operational capacity; access to goods, services or knowledge; establishment of trust,
with suppliers and users/clients; quality
and agility.
It should be emphasized that collaborative models are important contributors to
the environmental, spatial/geographic and
economic sustainability of cities and nations. This is particularly true given that
one of the pillars of the collaborative economy is the use of idle capacity, be it related to
technology, materials and consumer goods,
spaces or even services. On the other hand,
collaborative models tend to occupy places previously dominated by so-called traditional industries, such as an automobile
manufacturer versus a passenger transport service (such as Uber or Fleety), which
will lead to a review not only of regulatory
milestones , but above all of economic and
political models that can ensure equilibrium and conditions for development. This
will demand profound relection, extended
to the new formats being undertaken by
the work force, which become “Me, Inc.”,
not only due the possibility of one to one
offerings - reinforcing the concept of peerto- peer -, but above all, due to the projected
change in labor relations - from “employees” to “service providers.”
The new business models related to the
so-called collaborative economy impact traditional industries, as they offer consumers
alternative solutions, generally supported
by very lexible and low-cost management
platforms. Technological evolution may
have been the main critical success factor
for this type of model, since the vast majority operate on networks and on digital
platforms. Organizations operating in dif-
cadernos fgv projetos
167
tipo de modelo, uma vez que a grande maioria opera em rede e em plataformas digitais.
Organizações que operam em diferentes segmentos, como indústria automotiva e cosméticos, têm se apropriado da colaboração para
rever relacionamentos com fornecedores e
clientes, reduzir custos e ampliar suas áreas
de pesquisa, desenvolvimento e inovação.
As análises constantes no presente trabalho, embora restritas às empresas-chave
selecionadas para o estudo, apresentam potencial de contribuição para a compreensão
dos modelos de negócio e das estruturas relacionadas, bem como para a identiicação
de oportunidades dentro do contexto da economia colaborativa. É possível, ainda, inferir
que as mesmas possam ser utilizadas como
referência por organizações que operem com
modelos mais convencionais e tradicionais
de negócio, sobretudo no que se refere à atuação em rede com fornecedores e usuários/
clientes, à exploração do conceito de modelos
colaborativos, apoiados em processos de inovação ou de produção realizados a partir de
colaboração externa, e à busca de modelos de
negócios mais inteligentes e sustentáveis.
•
ferent segments, such as the automotive and
cosmetics industry, have appropriated collaboration concepts to review relationships
with suppliers and customers, reduce costs
and expand their research, development and
innovation areas.
The analyses included in the present
study, although restricted to the key companies selected, have the potential to contribute
to the understanding of business models and
related structures, as well as to the identiication of opportunities within the context of
the collaborative economy. It is also possible to infer that they can be used as a reference by organizations that operate with
more conventional and traditional business
models, especially with regard to networking with suppliers and users/customers, exploring the concept of collaborative models,
supporting innovation or production processes based on external collaboration, and
the search for smarter and more sustainable
business models.
•
ARTIGO ARTICLE
CIDADES
INTELIGENTES:
O DESAFIO DO
PLANEJAMENTO SUSTENTÁVEL
SMART CITIES:
THE CHALLENGE OF
SUSTAINABLE PLANNING
O artigo relete sobre a necessidade de reorganização das cidades a partir de diretrizes
mais sustentáveis. Para isso, os autores destacam o modelo de cidades inteligentes,
analisando esse conceito, seus fundamentos e principais características.
This article relects on the need for cities to reorganise along more sustainable lines.
For this, the authors highlight the smart cities model, by analyzing this concept, its
foundations and main characteristics.
CARLOS AUGUSTO COSTA
Coordenador de Projetos e do Laboratório de Neuromarketing da
FGV Projetos
Projects Coordinator and Coordinator of the Neuromarketing Laboratory
at FGV Projetos
Engenheiro eletrônico pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. É coordenador
projetos e do Laboratório de Neuromarketing da FGV Projetos. Foi diretor-executivo
empresa MCI Estratégia, consultor no Sebrae Nacional e na Promon Engenharia, além
ter sido coordenador especial de relações institucionais, superintendente de tecnologia
informação e engenheiro da Companhia Hidroelétrica do São Francisco.
de
da
de
da
Graduated in Electronic Engineering from Rio de Janeiro Federal University. Currently
Projects Coordinator and Coordinator of the Neuromarketing Laboratory at FGV Projetos.
He was company executive director of MCI Estratégia, served as consultant to Sebrae at
the national level, as well as with Promon Engenharia. At Companhia Hidroelétrica do São
Francisco, he was both an engineer and Special Coordinator for Institutional Relations as
well as Superintendent for Information Technology.
ANA CRISTINA MATOS
Especialista da FGV Projetos
Specialist at FGV Projetos
Pós-Graduada em gestão estratégica e econômica de negócios pela Fundação Getulio Vargas,
formou-se em administração pela Universidade Federal da Bahia. É especialista da FGV
Projetos em gestão e neuromarketing.
Graduated in Administration from Bahia Federal University and achieved postgraduate
qualiications in Strategic and Economic Business Management at Fundação Getulio
Vargas. She is currently a Management and Neuromarketing Specialist with FGV Projetos.
N
ovos modelos de desenvolvimento urbano
constituem-se em um dos grandes desaios do século XXI. A complexidade contemporânea das cidades tem trazido diversos questionamentos quanto ao que uma cidade pode e
deve oferecer aos seus cidadãos. Assim, emerge
o desaio de como melhor planejá-las, torná-las
competitivas e, ao mesmo tempo, garantir condições de vida sustentáveis aos seus habitantes.
Nesse contexto, fortalece-se a criação das
cidades inteligentes, que deriva não somente da aplicação do desenvolvimento tecnológico, mas também da busca pelo equilíbrio
entre variáveis como governança, gestão pública, economia, meio ambiente, mobilidade
e qualidade de vida.
Segundo o Banco Mundial, atualmente, mais
de 50% da população vive em áreas urbanas
no mundo. Em 2050, a Organização das Nações Unidas projeta uma população de quase
dez bilhões de habitantes, dos quais dois terços
deverão viver nas cidades. Esse adensamento
populacional em áreas urbanas é acompanhado
por uma forte demanda sobre serviços básicos,
como fornecimento de água, energia, transporte
e habitação, e o consequente aumento sobre a
utilização dos recursos naturais. Ainda de acordo com o Banco Mundial, as cidades constituem
cerca de 60% do consumo global de energia e
são responsáveis por aproximadamente 70%
das emissões globais de efeito estufa.
Conclui-se que as cidades precisam se reorganizar em busca da sua sustentabilidade, levando
N
ew models of urban development are
one of the major challenges of the 21st
century. The complexity of contemporary
cities has posed a number of questions as to
what cities can and should offer their citizens. This raises the challenge of how better
to plan, then make them competitive while,
at the same time, assuring sustainable conditions of life for their inhabitants.
Gathering strength in this context is the
notion of the smart city, deriving not only
from the application of technological development, but also the endeavour to strike
a balance among variables such as governance, public management, economy, environment, mobility and quality of life.
The World Bank estimates that today
more than 50% of the world’s population
lives in urban areas. The United Nations
forecasts that in 2050 world population
will stand at nearly 10 billion, two thirds
living in cities. This mounting population
density in urban areas is accompanied by
strong demand for basic services, such as
drinking water, energy, transport and
housing and, as a result, increasing use of
natural resources. The World Bank also
estimates that cities account for around
60% of global energy consumption and
are responsible for approximately 70% of
global greenhouse gas emissions.
The conclusion is that cities need to reorganise in order to attain sustainability,
cadernos fgv projetos
171
em conta as diretrizes do desenvolvimento sustentável, de modo que possam oferecer serviços
básicos e infraestrutura à sua população em
expansão. A reorganização implica a elaboração de uma agenda para torná-las sustentáveis
e inclusivas. Isso pode ser realizado por meio
da transformação das cidades preexistentes ou
da criação de cidades inteligentes. Essa agenda
pressupõe que os líderes desenvolvam e implementem o planejamento do crescimento urbano, com foco em soluções integradas e cooperação entre os atores envolvidos.
O desenvolvimento sustentável contradiz o
planejamento urbano moderno, pautado pelo
crescimento econômico como principal objetivo.1 O processo de urbanização não avançou sob
as diretrizes de um planejamento sustentável.
O crescimento das cidades, embora apresente
benefícios à sociedade no que diz respeito ao
incremento econômico, à saúde, educação e
inovação, apresenta padrões insustentáveis de
expansão urbana, com forte consequência nas
questões sociais e ambientais. Ampliam-se a
desigualdade, a informalidade e o impacto nas
mudanças climáticas, por exemplo.
É importante ressaltar que o crescimento
das cidades não se deu de forma semelhante,
mesmo sendo um fenômeno ligado à industrialização. Nos países desenvolvidos, foi um
processo gradativo, que favoreceu a criação
de infraestrutura para o aumento gradual da
bearing in mind sustainable development
guidelines, so as to be able to offer basic services and infrastructure to their expanding
populations. That reorganisation entails
drawing up an agenda to make cities sustainable and inclusive. This can be achieved
by modifying existing cities or by setting up
smart cities. The agenda presupposes that
in conducting and implementing planning
for urban growth, leaders will focus on integrated solutions and cooperation among
the stakeholders involved.
Modern urban planning, which is posited on economic growth as its main goal,
is at odds with sustainable development.1
The process of urbanisation has not taken
place under sustainable planning guidelines. The growth of cities, despite yielding
benefits to society in terms of economic
growth, health, education and innovation,
has produced unsustainable patterns of
urban sprawl, with strong effects on social
and environmental concerns. Inequality,
informality and climate change impact,
for example, are all on the increase.
It is important to stress that different cities have grown differently, even where that
growth is a phenomenon bound up with industrialisation. In the developed countries,
the process was more gradual, which favoured the introduction of infrastructure to
1
1
Sachs, 2008.
Sachs, 2008.
artigo
article
172
população, diferentemente do que ocorreu
nos países subdesenvolvidos, que apresentaram um processo rápido, desordenado e
concentrado em algumas regiões, o que resultou em diversos problemas como o surgimento de assentamentos informais, a ausência de saneamento básico e altos índices
de desemprego, que culminam em uma elevada desigualdade social.
A urbanização traz consigo um modelo que
tem sido colocado em xeque, no que concerne
ao seu processo de formação e dinâmica das
cidades. Segundo a UN-Habitat, o avanço das
cidades não está ligado somente ao desempenho econômico, há uma relação entre aspectos
tangíveis e intangíveis. A visão predominante
de desenvolvimento das cidades apresenta-se
ligada ao domínio econômico, em detrimento
de dimensões como a qualidade de vida, infraestrutura adequada, equidade e sustentabilidade ambiental. Desse modo, o Programa
das Nações Unidas para os Assentamentos
Humanos (UN-Habitat) traz uma nova abordagem de prosperidade das cidades, que melhor responde aos efeitos de crises econômicas
e reformula o espaço urbano por meio de um
planejamento apropriado. Para o alcance desse equilíbrio e a prosperidade das cidades, o
UN-Habitat destaca cinco funções urbanas,
descritas na Tabela 1.
Observa-se que esses elementos combinados
consistem na base para o modelo de cidades
inteligentes, que favorece o progresso e a competitividade. O estabelecimento das funções
urbanas implica um processo de urbanização
planejado e integrado, como forma de resgatar
o papel central das cidades e permitir o enfrentamento de desaios relacionados à sustentabilidade socioeconômica e ao esgotamento dos
recursos. Ainal, as cidades são as catalisadoras
das atividades econômicas, políticas, cientíicas
e tecnológicas.
match the gradual increase in population.
In the less-developed countries, on the contrary, the process has been rapid, disorderly
and concentrated in a few regions, resulting
in a number of problems, such as the emergence of informal settlements, lack of basic
sanitation and higher rates of unemployment, all of which culminates in extreme social inequality.
Urbanisation embodies a model that has
been called into question, as regards the
process by which cities are formed and their
dynamics. the United Nations Human Settlements Programme (UN-Habitat) regards
the advance of cities as connected with not
only economic performance, but a relation
between tangible and intangible aspects.
The prevailing view of cities’ development
is from an economic perspective, to the detriment of dimensions such as quality of life,
appropriate infrastructure equity and environmental sustainability. Accordingly,
UN-Habitat offers a new approach to the
prosperity of cities, one that responds better
to the effects of economic crises and reformulates urban space through appropriate
planning. In order to attain this balance and
prosperity for cities, UN-Habitat highlights
ive urban functions, which are described in
the Table 1.
The combination of these components
constitutes the basis for smart cities that foster progress and competitiveness. Securing
these urban functions requires planned integrated urbanisation as a means to restoring
cities’ core role and meeting the challenges of
socioeconomic sustainability and resource
depletion. After all, cities are catalysts of
economic, political, scientiic and technological activities.
cadernos fgv projetos
173
Tabela 1 Definição de uma cidade próspera / O que ela deve fornecer
Table 1 Definition of a prosperous city / What it should provide
Produtividade
Productivity
Infraestrutura
Infrastructure
Qualidade de Vida
Quality of Life
Equidade e
Inclusão Social
Equity and Social
Inclusion
Sustentabilidade
Ambiental
Environmental
Sustainability
Contribui para o crescimento e desenvolvimento econômico, gera
renda, oferece empregos decentes e igualdade de oportunidades
para todos por meio de políticas e reformas econômicas efetivas.
Contributes to economic growth and development, generates income, provides decent jobs and equal opportunities for all through effective economic policies and reforms.
Fornecimento de infraestrutura adequada – água, saneamento, estradas, tecnologia de informação e comunicação – a fim de melhorar os
padrões de vida e aumentar a produtividade, a mobilidade e a conectividade.
Provides adequate infrastructure – water, sanitation, roads, information and communication technology – in order to improve living standards and enhance productivity, mobility and connectivity.
Melhora o uso de espaços públicos em prol da coesão da comunidade
e da identidade cívica, e fornece segurança individual e material.
Enhances the use of public spaces for the sake of community cohesion and civic identity, and guarantees individual and material safety
and security.
Garante uma distribuição equitativa dos benefícios da prosperidade,
reduz a pobreza e a incidência de favelas, protege os direitos dos grupos minoritários e vulneráveis, melhora e reforça a igualdade de gênero e a garantia cívica, e assegura a participação nas esferas social,
política e cultural.
Ensures equitable (re)distribution of the benefits of prosperity, reduces poverty and the incidence of slums, protects the rights of minority and vulnerable groups, enhances gender equality, and ensures
civic participation in the social, political and cultural spheres.
Valoriza a proteção do ambiente urbano e dos recursos naturais, assegurando o crescimento e a busca pela eficiência energética, reduz a pressão
em torno da terra e dos recursos naturais, e diminui as perdas ambientais
por meio de soluções criativas, que melhorem o meio ambiente.
Values the protection of the urban environment and natural assets
while ensuring growth, pursues energy efficiency, reduces pressure
on surrounding land and natural resources, reduces environmental
losses through creative, environment-enhancing solutions.
Fonte: UN-Habitat, 2012. State of the World’s Cities 2012/2013 report, p. 11
Source: UN-Habitat, 2012. State of the World’s Cities 2012/2013 report, p. 11
artigo
article
174
CIDADES INTELIGENTES
“
Atualmente, as
cidades inteligentes
já possuem um
escopo maior, no que
se refere à aplicação
de tecnologia, e
têm como objetivo
o fornecimento
de serviços
mais eicientes
aos cidadãos, o
incremento da
infraestrutura e
a maior colaboração
entre os
diferentes atores
socioeconômicos
em áreas públicas e
privadas. Iniciativas
dessa natureza
tornam as cidades
mais sustentáveis.
”
A temática das cidades inteligentes tem ganhado força e já é realidade em diversas partes do mundo. Isso não só pela globalização
e pelo papel das cidades na economia global,
mas também como alternativa para o equacionamento e o enfrentamento de questões
que restringem a qualidade de vida da população urbana. Hoje, as cidades deparam-se
com a initude dos recursos, as alterações climáticas e o forte crescimento populacional.
Assim, o grande desaio consiste na adoção
de uma nova forma de gestão que as estruture e as torne inteligentes e sustentáveis.
Segundo a Comissão Europeia (2011), o conceito de cidade inteligente dá apoio à ideia de
sustentabilidade ambiental, já que o principal
objetivo consiste na redução da emissão de
gases do efeito estufa em áreas urbanas pela
implantação de tecnologias inovadoras. Atualmente, as cidades inteligentes já possuem um
escopo maior, no que se refere à aplicação de
tecnologia, e têm como objetivo o fornecimento
de serviços mais eicientes aos cidadãos, o incremento da infraestrutura e a maior colaboração
entre os diferentes atores socioeconômicos em
áreas públicas e privadas. Iniciativas dessa natureza tornam as cidades mais sustentáveis.
O relatório Smart cities – Ranking of European medium-sized cities2 aponta que são
seis os pilares das cidades inteligentes:
•
•
•
•
•
•
Economia;
Pessoas;
Governança;
Mobilidade;
Ambiente;
Modo de vida.
Esses pilares possuem características e fatores especíicos, descritos na Tabela 2:
2
Gifinger R. et al. 2007.
cadernos fgv projetos
175
SMART CITIES
The subject of smart cities has been gaining
prominence and these are now a reality in
several parts of the world. This has resulted not just from globalisation and cities’
role in the global economy, but also as an
alternative means of framing and tackling
problems that limit quality of life for urban
populations. Today, cities face problems of
inite resources, climate change and strong
population growth. Accordingly, the key
challenge consists in adopting a form of
management that will structure them and
make them smart and sustainable.
The European Commission (2011) sees
the smart city concept as supporting the
idea of environmental sustainability, given
that its main aim is to reduce greenhouse
gas emissions in urban areas by introducing innovative technologies. At present,
smart cities now offer greater scope for applying technology and are designed to provide their citizens with more eficient services, to expand infrastructure and foster
greater collaboration among the different
socioeconomic stakeholders in public and
private spaces. Initiatives of these kinds
make cities more sustainable.
The report Smart cities – Ranking of European medium-sized cities2 speciies the six
pillars of smart cities as:
•
•
•
•
•
•
Economy;
People;
Governance;
Mobility;
Environment; and
Living.
These pillars have speciic characteristics
and factors, as described in Table 2:
2
Gifinger R. et al. 2007.
“
At present, smart
cities now offer
greater scope for
applying technology
and are designed to
provide their citizens
with more eficient
services, to expand
infrastructure
and foster greater
collaboration
among the different
socioeconomic
stakeholders in
public and private
spaces. Initiatives
of these kinds
make cities more
sustainable.
”
artigo
article
176
Tabela 2 Características e fatores de uma Cidade Inteligente
Table 2 Characteristics and factors of a Smart City
Economia Inteligente (Competitividade)
Mobilidade Inteligente (Transportes e TIC)
Smart Economy (Competitiveness)
Smart Mobility (Transport and ICT)
• Espírito inovador
• Empreendedorismo
• Imagem econômica e marcas registradas
• Produtividade
• Flexibilidade do mercado de trabalho
• Integração internacional
• Innovative spirit
• Entrepreneurship
• Economic image & trademarks
• Productivity
• Flexibility of labour market
• International embeddedness
• Acessibilidade local
• Acessibilidade (inter) nacional
• Disponibilidade de infraestrutura de TIC
• Sistemas de transporte sustentáveis, inovadores e
seguros
• Local accessibility
• (Inter-)national accessibility
• Availability of ICT-infrastructure
• Sustainable, innovative and safe transport systems
Pessoas Inteligentes (Capital Social e Humano)
Ambiente Inteligente (Recursos Naturais)
Smart People (Social and Human Capital)
Smart Environment (Natural Resources)
• Nível de qualificação
• Afinidade para a aprendizagem ao longo da vida
• Pluralidade social e étnica
• Flexibilidade
• Criatividade
• Cosmopolita / Receptividade
• Participação na vida pública
• Level of qualification
• Affinity to lifelong learning
• Social and ethnic plurality
• Flexibility
• Creativity
• Cosmopolitanism/Open-mindedness
• Participation in public life
• Atratividade das condições naturais
• Poluição
• Proteção ambiental
• Gerenciamento de recursos sustentáveis
• Attractivity of natural conditions
• Pollution
• Environmental protection
• Sustainable resource management
Governança Inteligente (Participação)
Modo de Vida Inteligente (Qualidade de Vida)
Smart Governance (Participation)
Smart Lifestyle (Quality of Life)
• Participação na tomada de decisões
• Serviços públicos e sociais
• Governança transparente
• Estratégias e perspectivas políticas
• Participation in decision-making
• Public and social services
• Transparent governance
• Political strategies & perspectives
• Instalações culturais
• Condições saudáveis
• Segurança individual
• Qualidade da habitação
• Instalações de educação
• Atratividade turística
• Coesão social
• Cultural facilities
• Health conditions
• Individual safety
• Housing quality
• Education facilities
• Touristic attractivity
• Social cohesion
Fonte: Smart Cities – Ranking of European medium-sized cities – Gifinger et al, 2007, p. 12
Source: Smart Cities – Ranking of European medium-sized cities – Gifinger et al, 2007, p. 12
cadernos fgv projetos
177
As características e os fatores mencionados
na Tabela 2 são pressupostos para a formação
ou o planejamento de uma cidade inteligente. As cidades são consideradas ecossistemas
urbanos com a reunião de fatores bióticos e
abióticos, composto por relações e interações
nas esferas ambiental, social, econômica, tecnológica e cultural. Conclui-se que a adoção
de uma gestão inteligente tem como objetivo
melhorar a qualidade de vida da população
por meio do fornecimento de melhores serviços e do uso inteligente de recursos.
The characteristics and factors mentioned in Table 2 are preconditions for
forming or planning a smart city. Cities
are regarded as urban ecosystems which
bring together biotic and abiotic factors,
comprising environmental, social, economic, technological and cultural relations and
interactions. The conclusion here is that the
aim of adopting smart management is to
improve quality of life for city populations
by providing better services and making
smart use of resources.
MENT
VIRO
EN
E
T
EN
BI
TIC ICT
TIC
ICT
TI
C
T
TI
C
TIC I
CT
TIC ICT
TIC ICT
INTELIGENTE
SMART
CT
CI
TI
TIC
ICT
GO
VE
IC
T
IC
ICT
TIC
ERNANCE
GOV
ÇA
AN
RN
TIC IC
T
TIC
IC
T
LE
OP
PE
T
PE
S
SO
AS
Fonte: ASCIMER, 2015 - Smart Cities Concept and Challenges, p. 30
Source: ASCIMER, 2015 - Smart Cities Concept and Challenges, p. 30
IA ECONOMY
OM
ON
EC
ICT
TIC
DO DE VIDA LIV
MO
ING
M
O
T
IC
IC
ICT
TIC
MOBIL
IDA
DE
TY
LI
BI
AM
Figura 1 Dimensões das Cidades Inteligentes
Figure 1 Dimensions of Smart Cities
artigo
article
178
Um estudo de 2015 do projeto de pesquisa
Assessing Smart City Initiatives for the Mediterranean Region (Ascimer), apoiado pelo
Banco Europeu de Investimento, considera os
seis pilares das cidades inteligentes como dimensões compostas por aspectos especíicos e
iniciativas estratégicas para alcançar os objetivos esperados, que envolvem sustentabilidade,
eiciência e qualidade de vida. A tecnologia não
é considerada um campo de ação, mas um facilitador que melhora a eiciência dos projetos,
como demonstra a Figura 1. Assim, as dimensões são caracterizadas conforme a Tabela 3.
Deve-se considerar que as dimensões podem ser redeinidas e focadas em aspectos
especíicos de determinada cidade, de modo
que sejam favorecidos o desenvolvimento estratégico e sua transformação.
A 2015 study, as part of the research project Assessing Smart City Initiatives for the
Mediterranean Region (Ascimer), supported
by the European Investment Bank, considers the six pillars of smart cities as dimensions, each with speciic aspects and strategic initiatives to attain the expected goals,
which involve sustainability, eficiency and
quality of life. Technology is not considered
a sphere for action, but rather as a facilitator to improve project eficiency, as relected
in Figure 1. In this way, the dimensions are
characterised as in Table 3.
It must be borne in mind that these dimensions may be redefined and focussed
on specific aspects of any given city, so as
to favour its strategic development and
change.
TRANSFORMAÇÃO PARA
CIDADES INTELIGENTES
CHANGE TOWARDS
SMART CITIES
“Uma cidade sustentável e inteligente é uma
“A smart sustainable city is an innovative
cidade inovadora que utiliza tecnologias de
city that uses information and communi-
informação e comunicação (TICs) e outros
cation technologies (ICTs) and other me-
meios para melhorar a qualidade de vida, a
ans to improve quality of life, eficiency of
eiciência da operação e dos serviços urba-
urban operation and services, and compe-
nos e a competitividade, assegurando que
titiveness, while ensuring that it meets the
atenda às necessidades das gerações pre-
needs of present and future generations
sentes e futuras com respeito aos aspectos
with respect to economic, social, environ-
econômicos, sociais, ambientais e culturais.”
mental as well as cultural aspects.”
(ITU Focus Groups on Smart Sustainable
(ITU Focus Groups on Smart Sustainable
Cities, 2015)
Cities, 2015)
Segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento (2016), a transformação e a
modernização da gestão da cidade geram
uma série de resultados concretos e positivos,
com ganhos de eiciência por meio da integração de diferentes áreas de atuação – mobilidade, tráfego, segurança, vigilância, água,
The Inter-American Development Bank
(2016) reports that the transformation and
modernisation of city management produce a series of positive, concrete results,
with eficiency gains through integration
among various ields of activity – mobility,
trafic, safety/security, surveillance, water,
cadernos fgv projetos
179
energia, gestão de riscos, entre outras. Atuando de forma colaborativa, os gestores compartilham informações de qualidade para a prestação de melhores serviços para a população.
Em síntese, uma cidade inteligente apresenta
as características apontadas na Figura 2.
O século XXI introduziu o conceito da sustentabilidade ligada aos objetivos das cidades
inteligentes. Como consequência, a deinição
de sustentabilidade aplicada às cidades possui uma visão holística, em que as ações são
coordenadas e integradas entre vários atores
que interagem em diferentes esferas, como
ambiente, saúde, transportes e educação, isso
dentro de um ecossistema que utiliza as tecnologias da informação como um meio para
tornar as cidades inteligentes e sustentáveis.
energy, risk management and so on. Working collaboratively, managers share quality information in order to provide better
services to the population. In summary, a
smart city displays the characteristics described in Figure 2.
The twenty-irst century brought the concept of sustainability into connection with the
goals of smart cities. As a result, the deinition of sustainability applied to cities takes a
holistic view in which actions are coordinated and integrated among various stakeholders that interact in different spheres such as
environment, health, transport and education – and this within an ecosystem that uses
information technologies as a means to making cities smart and sustainable.
Figura 2
Figure 2
Gera procedimentos
comuns que aumentam a
eficiência do governo
Gera integração que
abastece a administração
pública com informações
necessárias e transparentes
Generates integration that
supplies the government
with necessary and
transparent information
Permite maior envolvimento
da sociedade civil na
administração
Ensures greater involvement
of civil society in public
administration
Tem elevado grau de
satisfação dos habitantes
Has a high level of
satisfaction of residents
Em síntese,
uma smart city
In summary, a
smart city
Generates common
procedures that improve
government efficiency
Otimiza a alocação
de recursos
Optimizes the allocation
of resources
Produz indicadores de
desempenho que auxiliam
na medição, comparação
e melhoria das
políticas públicas
Produces performance
indicators that help
measure, benchmark, and
improve public policy
Fonte: Caminho para as smart cities: da gestão tradicional para a cidade inteligente – Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), 2016, p. 19
Source: The road towards smart cities: from traditional management to the smart city – Inter-American Development Bank (IADB), 2016, p. 19
artigo
article
180
Tabela 3 Dimensões das Cidades Inteligentes
Table 3 Dimensions of Smart Cities
DIMENSÕES DAS CIDADES INTELIGENTES
ECONOMIA INTELIGENTE
PESSOAS INTELIGENTES
GOVERNANÇA INTELIGENTE
MOBILIDADE INTELIGENTE
AMBIENTE INTELIGENTE
Uma economia urbana é considerada uma economia inteligente
quando o setor reúne inovação e produtividade para se adaptar
ao mercado e aos trabalhadores e precisa de novos modelos de
negócios e um modelo global resiliente para competir tanto local
quanto globalmente.
Uma Cidade Inteligente precisa que o cidadão se envolva para
que novas iniciativas tenham sucesso. É necessário que os
cidadãos sejam capazes de participar de uma vida urbana inteligente e de se adaptar a novas soluções que ofereçam criatividade, inovação e diversidade para as comunidades. A educação
aparece como a principal ferramenta para melhorar essa
dimensão, bem como iniciativas para reter perfis criativos.
O governo inteligente faz uso da tecnologia disponível para estar
ciente das atividades realizadas por outros municípios, coordená-las em parceria, obter sinergias pelas colaborações com
outras partes interessadas e alcançar as necessidades dos
cidadãos, a fim de melhorar tanto os serviços públicos como a
confiança nas instituições públicas.
A Mobilidade Inteligente procura oferecer a rede de transporte
mais eficiente, limpa e equitativa para pessoas, bens e dados.
Além disso, aproveita as tecnologias disponíveis para reunir e
fornecer informações aos usuários, planejadores e gerentes de
transporte, permitindo a remodelação dos padrões de mobilidade urbana, mecanismos de planejamento e aprimoramento da
multimodalidade, melhorando a coordenação e a integração de
diferentes modos de transporte.
O Ambiente Inteligente usa a coleta de dados de redes de serviços
públicos, usuários, ar, água e outros recursos da cidade, a fim de
estabelecer as principais áreas de ação em planejamento urbano
e de infraestrutura da cidade, bem como fornecer informações às
cidades para que alcancem uma economia mais eficiente e
sustentável, melhorando a qualidade de vida dos cidadãos.
O Modo de Vida Inteligente é considerado como a gestão sensata de instalações, espaços públicos e serviços que utilizam
tecnologias TIC com foco para melhorar a acessibilidade e a
MODO DE VIDA INTELIGENTE flexibilidade de uso, aproximando-se das necessidades dos
cidadãos.
cadernos fgv projetos
181
DIMENSIONS OF SMART CITIES
SMART ECONOMY
SMART PEOPLE
SMART GOVERNANCE
SMART MOBILITY
SMART ENVIROMENT
SMART LIVING
An urban economy is considered to be a Smart Economy when
the sector gathers innovation and productivity to adapt to the
market and workers’ needs to enhance new business models and
a resilient global model for competing both locally and globally.
A Smart City needs the citizen to participate in order for the
incoming initiatives to succeed. The existence of citizens able to
participate wisely in smart urban life and to adapt to new
solutions providing creative solutions, innovation and diversity
to their communities is needed. Education appears as the main
tool to improve this dimension, as well as initiatives to retain
creative profiles.
Smart Government makes use of available technology to be aware
of – andcoordinate with – theactivities carried out by other municipalities, achieve synergies through collaborations with other
stakeholders and reach out citizens needs in order to improve
both, public services, and confidence in the public institutions.
Smart Mobility seeks to offer the most efficient, clean and
equitable transport network for people, goods and data. It leverages the available technologies to gather and provide information to users, planners and transport managers, allowing the
reshaping of urban mobility patterns, of planning mechanisms
and the enhancement of multimodality by improving the coordination and integration of different transportation modes.
Smart Environment uses data collection from utility networks,
users, and air, water, and other city resources in order to establish
main areas of action in urban planning and city infrastructure
planning as well as to inform urban services managers to achieve
a more efficient and sustainable urban environment while improving the citizens’ quality of life.
Smart Living is considered the wise management of facilities,
public spaces and services using ICT technologies to put focus
on improving accessibility, on flexibility of uses, and on getting
closer to the citizens’ needs.
artigo
182
article
cadernos fgv projetos
183
Tabela 4 Dimensões – Performance e Potencial
Table 4 Dimensions – Performance and Outlook
Performance Atual
Potencial Futuro
Present Performance
Outlook
Atividade comercial (30%): luxo de capital, dinâmica
do mercado e grandes empresas presentes.
Bem-estar pessoal (25%): segurança, saúde, desigualdade e desempenho ambiental.
Business activity (30%): capital low, market dynamics
and major companies present.
Personal well-being (25%): safety, health care, inequality and environmental performance.
Capital humano (30%): níveis educacionais.
Economia (25%): investimentos de longo prazo e PIB.
Human capital (30%): education levels.
Economics (25%): long-term investments and GDP.
Intercâmbio de informações (15%): acesso à informação por meio da Internet e de outras fontes de mídia.
Inovação (25%): empreendedorismo por meio de patentes, investimentos privados e incubadoras.
Information exchange (15%): access to information
through the Internet and other media sources.
Innovation (25%): entrepreneurship through patents,
private investments and incubators.
Experiência cultural (15%): acesso a grandes eventos
esportivos, museus e outras exposições.
Governança (25%): atratividade para investimentos
de longo prazo por meio da transparência, qualidade
da burocracia e facilidade de fazer negócios.
Cultural experience (15%): access to major sporting
events, museums and other exhibitions.
Governance (25%): attractiveness for long-term investment through transparency, quality of bureaucracy and ease of doing business.
Envolvimento político (10%): eventos políticos, think
tanks e embaixadas.
Political engagement (10%): political events, think
tanks and embassies.
Fonte: A. T Kearney - Global Cities 2017. Adaptado pelos autores
Source: A. T Kearney - Global Cities 2017. Adapted by the authors
artigo
article
184
EMPRESAS E INOVAÇÃO
COMPANIES AND INNOVATION
De acordo com estudo da consultoria norte-americana A. T. Kearney, as cidades são
ecossistemas para empresas e inovação. A
força da rede de negócios de um centro urbano, o talento de seus cidadãos, a estabilidade das instituições políticas e a criatividade
das organizações culturais contribuem para
um ambiente em que as empresas existentes
prosperem e criem novos negócios. O estudo
ainda apresenta uma metodologia que mede
a performance atual das cidades e o potencial
futuro, conforme Tabela 4.
Para inalizar, pode-se dizer que a competividade das cidades está fortemente atrelada
a um planejamento que contemple os pilares
e as dimensões das cidades inteligentes e o
desenvolvimento de iniciativas que garantam
a competitividade econômica, mas, acima de
tudo, que reforce a coesão social, a sustentabilidade ambiental e, com isso, assegure
maior qualidade de vida para aos cidadãos.
A study by the United states consultancy
irm, A. T. Kearney, found that cities are ecosystems for companies and innovation. The
strength of an urban centre’s business network, the talent of its citizens, the stability
of its political institutions and the creativity of its cultural organisations contribute to
an environment where existing companies
prosper and generate new business. The
study also offered a methodology for measuring cities’ present performance and future potential, as in Table 4.
Finally, cities’ competitiveness can be said
to be strongly bound up with planning that
contemplates the pillars and dimensions of
smart cities and makes provision for initiatives that guarantee economic competitiveness, but above all reinforce social cohesion,
environmental sustainability and thus assure better quality of life to their citizens.
•
•
cadernos fgv projetos
185
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS | BIBLIOGRAPHIC REFERENCES
Ascimer, Assessing Smart City Initiatives for the Mediterranean Region. Smart Cities:
Concept & Challenges Deliverable, 1A, 2015. Disponível em | Available at: <http://www.
eiburs-ascimer.transyt-projects.com/project/reports>.
ATKearney. Global Cities 2017: Leaders in the World of Disruptive Innovation, 2017. Disponível em | Available at: <https://www.atkearney.com/documents/10192/12610750/Global+Cities+2017+-+Leaders+in+a+World+of+Disruptive+Innovation.pdf/c00b71dd-18ab-4d6b-8ae6-526e380d6cc4>.
BID, Banco Interamericano de Desenvolvimento. Caminho para as Smart Cities: da Gestão Tradicional para a Cidade, 2016. Disponível em | Available at: <https://publications.
iadb.org/handle/11319/7743?locale-attribute=pt&>.
Economic Commission for Europe - Committee on Housing and Land Management. The
UNECE–ITU Smart Sustainable Cities Indicators, 2015. Disponível em | Available at: <http://
www.unece.org/ileadmin/DAM/hlm/projects/SMART_CITIES/ECE_HBP_2015_4.pdf>.
European Commission. Cities of Tomorrow 2011. Disponível em | Available at:< http://
ec.europa.eu/regional_policy/pt/information/publications/reports/2011/cities-of-tomorrow-challenges-visions-ways-forward>.
Gifinger, R.; Fertner, C.; Kramar, H.; Kalasek, R.; Pichler-Milanovic, N. e Meijers, E.
Smart Cities – Ranking of European Medium-Sized Cities. Research Report, Vienna: University of Technology, 2007. Disponível em | Available at: <http://www.smart-cities.eu/ download/smart_cities_inal_report.pdf>.
ONU Brasil. Disponível em | Available at: <http://www.onu.org.br>. Acesso em |
Accessed on: 29 jun. 2017.
Sachs, I. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2008.
UN-Habitat. State of the World’s Cities 2012/2013 - Prosperity of Cities, 2012.Disponível em | Available at: <http://mirror.unhabitat.org/pmss/listItemDetails.aspx?publicationID=3387>.
UN-Habitat. Chapter 1: From Habitat II to Habitat III: Twenty Years of Urban Development. Chapter 2: Urbanization as a Transformative Force. In: World Cities Report 2016.
Disponível em | Available at: <http://wcr.unhabitat.org/main-report/>.
World Bank. Disponível em | Available at: <http://www.worldbank.org>. Acesso em |
Accessed on: 04 jul. 2017.
World Government Summit. Smart Cities: Regional Perspectives, 2015. Disponível em |
Available at: <https://worldgovernmentsummit.org/api/publications/document?id=d1d75ec4-e97c-6578-b2f8-ff0000a7ddb6>.
ARTIGO ARTICLE
CIDADES
INTELIGENTES E
SUSTENTÁVEIS:
INOVAÇÕES PARA
TRANSFORMAÇÃO
URBANA NO BRASIL
SMART,
SUSTAINABLE
CITIES:
INNOVATIVE URBAN
CHANGES IN BRAZIL
Direcionando o olhar para o processo de urbanização brasileiro, o artigo aborda o
paradigma da Smart City, ou cidade inteligente, em português. Segundo os autores,
esse paradigma evoca um leque de oportunidades para a superação dos desaios
urbanos e a transformação das cidades rumo à sustentabilidade. Eles defendem
que a base desse processo de mudanças está na inovação, que pode ser associada à
tecnologia disruptiva e aos ambientes institucional, social e de business.
With a focus on the Brazilian urbanization process, the article addresses the
paradigm of the Smart City. According to the authors, this paradigm provides a
range of opportunities for overcoming urban challenges and for transforming cities
into sustainable urban environments. They argue that the basis for this process of
change lies in innovation, which can be associated with disruptive technology and
institutional, social and business environments.
MARCO CONTARDI
MARCO SAVERIO RISTUCCIA
ANDREA RACCICHINI
MARCO CONTARDI
Coordenador de Projetos da FGV Projetos
Project Coordinator at FGV Projetos
Mestre em economia pela Universidade Luigi Bocconi de Milão, na Itália. Fez cursos de
infraestrutura e desenvolvimento e de análise inanceira para projetos de infraestrutura
no Banco Mundial e de Parcerias Público-Privadas (PPPs) na empresa inglesa Partnership
UK. Atualmente, é coordenador de projetos da FGV Projetos, com foco em desenvolvimento
territorial, urbano e de clusters, smart cities, PPPs, inanciamento de infraestrutura e mudança
climática. Foi consultor sênior do Banco Interamericano de Desenvolvimento e do Banco de
Desenvolvimento da América Latina no apoio à elaboração da Lei de PPPs e do Programa Piloto
de PPPs do governo federal brasileiro.
Marco Contardi holds a Master’s degree in economics from Luigi Bocconi University in
Milan, Italy. He has taken courses in infrastructure and development and inancial analysis
for infrastructure projects at the World Bank as well as courses offered by Public-Private
Partnerships (PPPs) at the British company Partnership UK. At present, he is a project
coordinator at FGV Projetos, focusing on land, urban and cluster development, smart cities,
PPPs, infrastructure inancing and climate change. He was a senior consultant for the InterAmerican Development Bank and the Development Bank of Latin America for supporting
the drafting of the PPPs Act and the Brazilian federal government’s Pilot Program for PPPs.
MARCO SAVERIO RISTUCCIA
Coordenador de Projetos da FGV Projetos
Project Coordinator at FGV Projetos
Mestre em ciências econômicas e de empresa pela Universidade La Sapienza, na Itália, onde
se formou em economia. Especializou-se em matemática probabilística para controle de riscos
inanceiros. É coordenador de projetos da FGV Projetos, atuando em projetos de inovação e
transferência tecnológica para o desenvolvimento urbano sustentável, de Parcerias Público-Privadas
no âmbito de soluções de smart cities e de criação de valor compartilhado para o desenvolvimento
socioeconômico.
He holds a master’s degree in economics and business from La Sapienza University, Italy, where he
graduated in economics. He specialized in probabilistic mathematics to control inancial risks. He
is a project coordinator at FGV Projetos, where he is involved in projects in the areas of innovation
and technology transfer for sustainable urban development, public-private partnerships for smart
cities solutions and the creation of shared value for socio-economic development.
ANDREA RACCICHINI
Especialista de Projetos da FGV Projetos
Project Specialist at FGV Projetos
Mestre em políticas públicas, estratégias e desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio
de Janeiro, e em inanças, intermediários e mercados pela Universidade de Bolonha, na Itália,
onde se formou em administração. É especialista de projetos da FGV Projetos nas áreas de
Parcerias Público-Privadas, desenvolvimento territorial sustentável, políticas de meio ambiente,
planejamento estratégico, modelos e instrumentos de governança territorial, criação de valor
compartilhado, sustentabilidade empresarial, smart cities e soluções urbanas inovadoras.
He holds a master’s degree in public policies, strategy and development from the Federal University
of Rio de Janeiro and has a degree in inance, intermediaries and markets from the University of
Bologna, Italy, where he graduated in business administration. He is a project specialist at FGV
Projetos in the areas of public-private partnerships, sustainable land development, environmental
policy, strategic planning, models and instruments for land management, shared value creation,
business sustainability, smart cities and innovative urban solutions.
prefácio
190
PROCESSOS DE
TRANSFORMAÇÃO URBANA NO
BRASIL: DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL E O PARADIGMA
DE SMART CITY
PROCESSES OF URBAN
CHANGE IN BRAZIL:
SUSTAINABLE DEVELOPMENT
AND THE SMART CITY
PARADIGM
Uma mudança de paradigmas está ocorrendo nos atuais sistemas econômicos globais. O
modelo de produção e consumo relacionado
não só ao mero ganho no curto prazo – que
desconsidera os efeitos socioambientais e os
limites ecológicos –, como também a uma
cultura antropocêntrica e à dicotomia entre
sistemas produtivos regidos, de um lado, puramente por mercados, e de outro, voltados
para um viés meramente público e de redistribuição da riqueza, encontra-se em processo de esgotamento, o que é evidenciado por
desaios ecológicos, sociais e econômicos presentes no mundo todo.
Somado a esse contexto mais amplo, a sociedade possui uma nova plataforma tecnológica que combina os mundos físicos, digitais
e biológicos, tendo impactos em todas as disciplinas, economias e indústrias, e que chega
a desaiar, inclusive, a própria ideia de ser
humano.1 Nesse cenário, enseja-se a necessidade de reconsiderar estratégias e práticas de
desenvolvimento que irão colocar a competitividade dos países em novas trajetórias de
mudança baseadas na inovação.
A change of paradigm is under way in the
economic systems currently in use across
the world. The production-consumption
model is not only related to the mere ratio of
short-term proit regardless of the socio-environmental and ecological impacts, but
also to an anthropocentric culture and the
dichotomy between productive regimes that
on one hand are ruled solely by markets and
on the other geared to a merely public bias
aimed at re-distributing wealth. This model is going through a process of exhaustion,
as witnessed in worldwide challenges of an
ecological, social and economic nature.
In addition to this broad set of circumstances, society is now in possession of a
new technological platform that pools together the physical, digital and biological
worlds, inluences every discipline, economy
and industry, and even poses a challenge to
the very idea of the human being.1 In such a
scenario, the need arises to reconsider strategies and practices of development capable
of fostering competitiveness among countries on new paths based on innovation.
1 Schwab, Klaus. The Fourth Industrial Revolution, 2017. Disponível em:
<https://www.weforum.org/about/the-fourth-industrial-revolution-byklaus-schwab>. Acesso em: 27/06/2017.
1 Schwab, Klaus. The Fourth Industrial Revolution, 2017. Available at:
<https://www.weforum.org/about/the-fourth-industrial-revolution-byklaus-schwab>. Accessed on: 06/27/2017.
cadernos fgv projetos
191
O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO URBANO GLOBAL
THE PROCESS OF GLOBAL
URBAN DEVELOPMENT
No processo de desenvolvimento urbano
mundial, as cidades têm um papel crucial,
pois são centros socioeconômicos que contribuem para o uso e a gestão de recursos
naturais quando inalizados a produção e o
consumo de bens e serviços. Os polos urbanos geram um amplo leque de possibilidades
para dinamizar as economias, desenvolver
soluções inovadoras e criar condições para
garantir qualidade de vida às populações.
Existe, então, uma janela de oportunidade
de desenvolvimento que visa identiicar novas estruturas de governança e planejamento,
novas políticas públicas e oportunidades de
negócios, além de promover a inclusão socioeconômica, estimular a inovação, implementar
projetos de desenvolvimento e de melhoria de
infraestruturas. Ao mesmo tempo, as cidades
geram diversos impactos e desequilíbrios sociais e ecológicos, como a exclusão social, o
crescimento urbano descontrolado, a poluição
de recursos naturais e seu uso descontrolado,
a baixa resiliência a eventos extremos, os wicked problems e a competição para os recursos humanos e naturais.
As cidades tornam-se loci em que convivem dinâmicas heterogêneas que precisam
ser geridas e orientadas rumo ao desenvolvimento sustentável. Essas dinâmicas vêm ganhando mais relevância e ocupam um papel
Cities play a crucial role In the process of
global urban development, insofar as they
are socio-economic centers that contribute
to the use and management of natural resources after goods and services have been
produced and consumed. Urban poles create
a vast array of possibilities that dynamize
the economy, develop innovating solutions
and provide conditions to guarantee a decent quality of life.
Accordingly, there exists a window for development aimed at identifying new governance and planning structures, in addition
to new public policies and business opportunities, besides promoting socio-economic
inclusion, stimulating innovation and implementing projects to develop and improve
infrastructures. At the same time, cities are
responsible for different impacts and imbalance of a social and ecological nature,
such as social exclusion, uncontrolled urban
growth, pollution and excessive use of natural resources, reduced resilience to extreme
situations, “wicked problems” and competition for human and natural resources.
Cities become loci where a combination of
heterogeneous dynamics needs to be managed and oriented in respect to sustainable
development. These increasingly more relevant dynamics play a major role; according
artigo
article
192
Figura 1 População mundial urbana e rural (1950-2050)
Figure 1 The urban and rural world population (1950-2050)
12000
População (milhões)
Population (millions)
10000
8000
6000
4000
2000
0
1950
1970
1990
Pop. Urbana
Urban Pop.
2010
Pop. Rural
Rural Pop.
2030
2050
Total Pop.
Total Pop.
Fonte: elaboração própria a partir de dados das Nações Unidas (UN 2015)
Source: prepared by the authors based on United Nations data (UN 2015)
de destaque. De acordo com as projeções das
Nações Unidas no relatório World Urbanization Prospects: The 2014 Revision, considerando-se o período até 2050, a população
urbana continuará crescendo, ao passo que a
rural irá se estabelecer e diminuir (Figura 1).
Outro documento que corrobora essa tendência é a New Urban Agenda, formulada na
Terceira Conferência das Nações Unidas sobre Moradia e Desenvolvimento Urbano Sustentável (Habitat III), que ocorreu em Quito,
no Equador, em 2016. O texto assevera que:
to the projections of United Nations in its
report World Urbanization Prospects: The
2014 Revision, from now until the year 2050
the urban population will continue to grow,
while the rural segment will settle and diminish (Figure 1).
Another document to corroborate this
tendency is the New Urban Agenda, drawn
up at the Third United Nations Conference
on Housing and Sustainable Urban Development (Habitat III), held in Quito, Ecuador
in 2016. The text asserts that:
Até 2050, a população urbana mundial
deverá quase dobrar, tornando a urbanização uma das tendências mais transformadoras do século XXI. Como a população, as atividades econômicas, as
interações sociais e culturais, bem como
os impactos ambientais e humanitários,
estão cada vez mais concentrados nas
By 2050 the world urban population is
expected to nearly double, making urbanization one of the 21st century’s most
transformative trends. As the population, economic activities, social and
cultural interactions, as well as environmental and humanitarian impacts, are
increasingly concentrated in cities, this
cadernos fgv projetos
193
cidades, o que representa desaios em
massa de sustentabilidade em termos
de habitação, infraestrutura, serviços
básicos, segurança alimentar, saúde,
educação, empregos dignos, segurança
e recursos naturais, entre outros. (UN,
2016)
poses massive sustainability challenges
in terms of housing, infrastructure, basic services, food security, health, education, decent jobs, safety, and natural resources, among others. (United Nations,
2016)
Ainda de acordo com o Energy Technology Perspectives 2016, Towards Sustainable
Urban Energy Systems, elaborado pela International Energy Agency, as cidades estão
no centro dos esforços de descarbonização
da economia. O estudo aponta que as cidades
são responsáveis por cerca de dois terços da
demanda de energia primária e por 70% das
emissões de gás carbônico do setor de energia.
Nesse contexto, o ano de 2015 foi muito importante, por ter sido irmada em Paris, durante a 21a Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do
Clima, a decisão unívoca de 195 países de implementar ações para a descarbonização da economia dentro de um arcabouço legal comum,2
o Acordo de Paris, que pretende atingir zero de
emissões líquidas na segunda metade deste século, manter o aumento da temperatura média
global em bem menos de 2°C acima dos níveis
pré-industriais e não poupar esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C acima dos
níveis pré-industriais.3
As cidades mostram, assim, uma tendência
de crescimento que, junto ao chamado do desenvolvimento sustentável (New Urban Agenda e Acordo de Paris), torna essencial não só
moldar novos sistemas e padrões de produção e
consumo, como também a solução de questões
globais e locais. Com efeito, trata-se de conigu-
Also, according to Energy Technology
Perspectives 2016, Towards Sustainable
Urban Energy Systems, prepared by the International Energy Agency, cities are at the
heart of the efforts to de-carbonize the economy. The study points out that cities account
for approximately two thirds of the demand
for primary energy and 70% of the carbonic
gas emitted by the energy sector.
Given this situation, the year 2015 was extremely important for the signing, in Paris
during the 21st United Nations Framework
Convention on Limate Change, of the unanimous decision of 195 countries to undertake
actions to de-carbonize the economy within
a common legal framework.2 The Agreement of Paris commits to achieve zero net
emissions in the second half of this century,
make sure that the average world temperature rises far less than 2°C above pre-industrial levels, and spare no efforts to limit the
increase in temperature at 1,5°C above the
same igure.3
Cities thus show a tendency to grow
that, together with the sustainable development campaign (New Urban Agenda
and the Agreement of Paris), make it essential not only to mold new systems and
standards of production and consumption
but also to produce solutions to global and
local issues. In fact, the question involves
2
2
IEA, 2016.
3 Fonte: Ministério do Meio Ambiente. Disponível em: <http://www.
mma.gov.br/clima/convencao-das-nacoes-unidas/acordo-de-paris> .
Acesso em: 05/05/2017.
IEA, 2016.
3 Source: Ministry of the Environment. Available at: <http://www.
mma.gov.br/clima/convencao-das-nacoes-unidas/acordo-de-paris>.
Accessed on: 05/05/2017.
artigo
article
194
rar novamente o papel das cidades para fazer
parte de forma mais efetiva dos desaios colocados nesta mudança de paradigmas.
Por sinal, as cidades e as autoridades locais são parceiras-chaves nesse processo de
transformação e precisam ser empoderadas
nos aspectos inanceiros, institucionais e políticos, para que haja uma redução de riscos
políticos, sociais, econômicos e ecológicos, e
seja possível estimular um crescimento resiliente e inclusivo em todos os níveis.4
“
Assim, há
uma janela de
oportunidade para
os municípios
brasileiros, que
poderão se tornar
protagonistas na
implementação
de soluções
inovadoras
para superar os
principais desaios
contemporâneos
e contribuir para o
desenvolvimento
sustentável.
”
DESENVOLVIMENTO URBANO
NO BRASIL
Diante desse cenário global, o Brasil é um
país que caracteriza, de forma paradigmática,
o conjunto de desaios ecológicos, econômicos, sociais e institucionais. De tamanha amplitude territorial e valiosas riquezas ecológicas e sociais, o país tem uma população de
206 milhões de habitantes,5 que residem, em
sua maioria, em cidades (85,7%) e, em menor
parte, em áreas rurais (14,3%).6
Ao mesmo tempo, o país tem vivenciado um
êxodo migratório7 para centros urbanos de média dimensão, observando-se uma descentralização da população para centros urbanos periféricos em função do declínio signiicativo da
capacidade de retenção migratória da grande
cidade, que está longe de ser restaurada.8
Assim, há uma janela de oportunidade
para os municípios brasileiros, que poderão
se tornar protagonistas na implementação de
soluções inovadoras para superar os princi4
Eickelberg Fortes Tigre A., Contardi M., Zeller K., 2017.
5
IBGE, 2016.
6 Disponível em: <https://www.cia.gov/library/publications/the-worldfactbook/geos/br.html>. Acesso em: 27/06/2017.
7 Disponível em: <http://g1.globo.com/brasil/Cidades-queencolheram-2000-2013>. Acesso em 27/06/2017.
8
Van Timmeren, A., Henriquez, L., Reynolds, 2015.
cadernos fgv projetos
195
configuring a new and more effective role
for cities to play in the light of the challenges posed by this paradigmatic change.
As a matter of fact, cities and local authorities are key partners in this process of
transformation and need to be empowered
inancially, institutionally and politically
so as to reduce political, social, economic
and ecological risks and make it possible to
stimulate resilient and inclusive growth on
all levels.4
URBAN DEVELOPMENT
IN BRAZIL
Within this global scenario, Brazil is a country that paradigmatically characterizes the
set of ecological, economic, social and institutional challenges. With such territorial dimensions and its invaluable ecological and
social richness, the country has a population
of 206 million inhabitants,5 most of whom
live in cities (85,7%), and less in rural areas (14,3%).6
At the same time, the country has experienced a migratory exodus7 to average-size
urban centers, with the population decentralizing to peripheral urban centers on account of the signiicant decline in the capacity of big cities to retain the migratory low,
a capacity that is far from being restored.8
This situation produces a window of opportunity for Brazilian municipalities, which
can play a signiicant part in implementing
innovative solutions to overcome the main
4
Eickelberg Fortes Tigre A., Contardi M., Zeller K, 2017.
5
IBGE, 2016.
6 Available at: <https://www.cia.gov/library/publications/the-worldfactbook/geos/br.html>. Accessed on: 06/27/2017.
7 Available at: <http://g1.globo.com/brasil/Cidades-queencolheram-2000-2013>. Accessed on 06/27/2017.
8
Van Timmeren, A., Henriquez, L., Reynolds, 2015.
“
This situation
produces a window
of opportunityfor
Brazilian
municipalities,
which can play a
signiicant part
in implementing
innovative
solutions to
overcome the
main challenges
faced today
and contribute
to sustainable
development.
”
artigo
article
196
pais desaios contemporâneos e contribuir
para o desenvolvimento sustentável.9
Na atual conjuntura nacional, a realidade dos
municípios é caracterizada por um problema de
falta de abordagem integrada e holística de planejamento e de um modelo de governança efetivo. Ademais, entre outros aspectos interligados
a esse problema geral, podem ser destacadas a
deterioração das condições de vida urbana, a
necessidade de implantação de soluções viáveis,
a falta de inanciamento para investimentos em
serviços públicos, a ausência de oportunidades
de trabalho e a necessidade de melhoria das capacidades técnicas do poder público.
Destarte, o processo de urbanização no Brasil requer respostas consistentes para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos e a competitividade da economia, e para contribuir no
processo de desenvolvimento sustentável.
challenges faced today and contribute to
sustainable development.9
As things stand today, the reality of
Brazil’s municipalities is characterized by
a lack of an integrated, holistic approach
to planning and a model of effective governance. Moreover, among other aspects
linked to this problem, special mention goes
to the deterioration of the conditions of city
life, the need to implant feasible solutions,
the lack of inancing to invest in public services, the absence of job opportunities and
the need to improve the technical capacity
of the government.
Given this scenario, the process of urbanization in Brazil calls for consistent answers
to improve the citizens’ quality of life, make
the economy more competitive and contribute to the process of sustainable development.
O PARADIGMA DA SMART CITY
E AS SUAS CARACTERIZAÇÕES
THE PARADIGM OF THE SMART
CITY AND ITS CHARACTERISTICS
O paradigma da smart city, ou, em português,
cidade inteligente, traz consigo um leque de
oportunidades e possibilidades a serem exploradas para superar os desaios trazidos pelo
processo de urbanização brasileiro. Esse conceito, como acontece com algumas das novas
ideias que surgem ao longo da história, não possui deinição unívoca e aceita de forma plúrima.
Após ampla pesquisa, observou-se que, ao
termo smart city podem ser associados vários
conceitos e fatores, como: TIC e web 2.0, interconectado, digital, living lab, otimização de
recursos, planejamento, integração, automonitoramento, “forward looking”, sustentável,
The Smart City paradigm involves a whole
array of opportunities and possibilities to
be explored in order to overcome the challenges posed by the process of Brazil’s urbanization. This concept, as happens with
some of the new ideas that arise throughout
history, has no unanimous and plurally acceptable deinition.
Estensive research has shown that the term
Smart City is associated with a series of concepts and factors, such as: TIC and web 2.0, interconnected, digital, “living lab”, optimization
of resources, planning, integration, self-monitoring, “forward-looking”, sustainable, eco-
9
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas
podem ser considerados como elementos que dão tangibilidade ao conceito
de Desenvolvimento Sustentável. Para mais informações a respeito,
consultar: <https://nacoesunidas.org/pos2015/>.
9 The United Nations Sustainable Development Goals can be considered
as elements that make the concept of sustainable development tangible.
For further information in this regard, see:
<https://nacoesunidas.org/pos2015/>.
cadernos fgv projetos
197
ecológica, humano, criativo, integrado, resiliência, adaptação, equitativo e acessível.
Dessa forma, o paradigma Smart City pode
ser entendido como uma ideia polissêmica e
normativa, que vem sendo trabalhada e construída por múltiplos atores da sociedade ao
longo do tempo. Sem pretensão de dar uma
deinição a essa ideia, este artigo propõe-se
a destacar alguns aspectos que são considerados relevantes quando se trata de cidade
inteligente, a saber:
•
•
•
•
•
•
cidade humana;
cidade sustentável;
cidade integrada;
cidade eiciente;
cidade interconectada e tecnológica;
cidade participativa.
logical, human, creative, integrated, resilience,
adaptation, equitable and accessible.
Accordingly, the Smart City paradigm
can be understood as a polysemic, normative
idea that has been worked on and elaborated for a long time by multiple social actors.
Without any pretension of deining the concept, this article sets out to underscore some
aspects considered to be relevant when we
are dealing with “intelligent” cities, namely:
• the human city;
• the sustainable city;
• the integrated city;
• the eficient city;
• the interconnected and
•
technological city;
the participatory city.
artigo
article
198
Esses itens serão detalhados brevemente.
Quando é ressaltado o aspecto da cidade humana, considera-se relevante colocar o bem-estar e a qualidade de vida do cidadão em
todas as suas facetas e níveis de renda como a
inalidade do desenvolvimento da cidade.
No que tange à cidade sustentável, acrescentam-se elementos do desenvolvimento
sustentável para ins urbanos, tais como a
sustentabilidade – cuja origem etimológica (do latim sustentare) signiica sustentar,
apoiar e conservar ao longo do tempo – e a
questão do desenvolvimento – que remonta à
transformação de um estado para um outro.10
Assim, sobressai-se no ambiente urbano o
processo de melhoria das condições de vida
materiais (infraestrutura, serviços, equipa-
These items will be detailed further ahead.
When the aspect of the human city is emphasized, it is considered relevant to deine the
objective of city development as the welfare
and quality of life of the citizen in all facets
and income brackets.
As regards the sustainable city, elements
are added for urban objectives, such as sustainability (a word of Latin origin, sustentare, that means to sustain, support and conserve through time), as well as the question
of development (itself rooted in the concept
of transforming from one state to another).10 In this sense, the urban environment
stresses the process of improving both the
material conditions of living (infrastructure,
services, equipment) and the subjective ones
10
10
Daly, 1996.
Daly, 1996.
cadernos fgv projetos
199
mentos) e subjetivas (expressão social, cultural, econômica e política do indivíduo e da
coletividade), caraterizado pela mentalidade,
atitude e estratégia socialmente justa, ecologicamente correta, economicamente viável e
que respeita e valoriza as vocações e as identidades culturais.
No que diz respeito à cidade integrada,
ressalta-se a integração de redes físicas e virtuais para valorar os ativos tangíveis e intangíveis do contexto urbano. A cidade eiciente,
no entanto, aponta para o sistema complexo
urbano, que procura valorizar as interconexões e as sinergias entre subsistemas setoriais no espaço da cidade, procurando a equidade territorial e social.
Em relação à cidade interconectada e
tecnológica, é importante distinguir que as
tecnologias são um meio, e não um im, da
cidade inteligente. Logo, o novo leque de
tecnologias inovadoras é uma oportunidade
para: i) facilitar a vida urbana; ii) coletar,
distribuir e analisar dados para entender as
dinâmicas da cidade; iii) melhorar os serviços urbanos; e iv) implementar o uso ótimo
dos ativos da cidade. Assim, o processo de
inovação urbana deve prever a acessibilidade às tecnologias e a distribuição equânime
desses equipamentos.
No que concerne à cidade participativa, salienta-se a necessidade da participação ativa do
cidadão na construção e na implantação de soluções para a cidade. Isso pode levar potencialmente a novos moldes democráticos para planejamento e implementação de políticas públicas.
Em suma, o paradigma de Smart City abarca diversos aspectos que podem trazer soluções para os desaios da urbanização. Com
efeito, esse paradigma impulsiona um processo de transformação da cidade voltado para o
alcance do desenvolvimento sustentável.
(the social, cultural, economic and political
expression of the individual and the community), characterized by a mentality, attitude
and strategy that are socially fair, ecologically correct and economically viable, while
at the same time respecting and giving value
to cultural vocations and identities.
As for the integrated city, here emphasis
is made on the integration of physical and
virtual networks to highlight the tangible
and intangible assets of the urban context.
The eficient city deals with the complex urban system that seeks to valorize the interconnections and synergies between sectoral
sub-systems within the city space in order to
measure territorial and social equity.
As far as the interconnected and technological city is concerned, it is important to
point out that technologies are a means, not
an end, for the smart city. Therefore, the new
variety of innovative technologies is an opportunity to: i) make urban life easier; ii) collect, distribute and analyze data in order to
understand the dynamics of the city; iii) improve urban services; and iv) implement the
optimum use of the city’s assets. The process
of urban innovation must therefore provide
for accessibility to the technologies and equanimous distribution of these installations.
With regard to the participatory city, here
the need is stressed for the citizen to take an
active part in elaborating and implanting
solutions for the city. This can potentially
lead to new democratic molds for planning
and implementing public policies.
To sum up, the Smart City paradigm entails different aspects that can provide solutions to the challenges that face urbanization. Indeed, this paradigm is what drives
a process of transforming the city aimed at
sustainable development.
artigo
article
200
Esse processo de transformação baseia-se
na inovação, que é central para as transformações das dinâmicas socioeconômicas em
geral e, neste caso, também o é, em especíico, para as cidades. Entende-se aqui a inovação “como um processo de aprendizado interativo, não linear, cumulativo, especíico da
localidade e diicilmente replicável”.11
This process of change is based on innovation, which is at the core of the transformations
of socio-economic dynamics in general and in
this speciic case applies to cities. Here innovation is understood to be “similar to a process of
apprenticeship that is at one and the same time
interactive, non-linear, cumulative, speciic to
the locality and dificult to repeat”.11
VETORES DE INOVAÇÃO NAS
SMART CITIES
INNOVATING VECTORS IN
SMART CITIES
Dentro do paradigma de smart cities, é possível identiicar dois vetores de inovação. O
primeiro é relativo à inovação tecnológica
disprutiva e o outro diz respeito às inovações que vão além do fator tecnológico, como
aquelas do ambiente social e institucional e o
de business favorável à implementação tanto
de novas soluções disponíveis quanto daquelas que estão por vir.
Two innovative vectors can be identified
in the Smart City paradigm. The first is
related to disruptive technological innovation, the other to the innovations that
go beyond the technological factor, such
as those in the social and institutional
sphere as well as business favorable to implementing both available new solutions
and those still embryonic.
Inovação tecnológica disruptiva
Disruptive technological innovation
No que se refere à inovação tecnológica disruptiva, a sociedade atual está diante da chamada
quarta revolução industrial. Essa revolução disruptiva está gerando uma nova plataforma tecnológica, que expande e permite usos múltiplos,
cria novas soluções e abre novos horizontes de
atuação. Somente para citar algumas novas
tecnologias protagonistas nessa revolução que
conluem de forma conjunta, elencam-se:
Concerning disruptive technological innovation, society today is experiencing the socalled “fourth industrial revolution”. This
disruptive revolution is creating a new technological platform that expands and enables
multiple uses, devises new solutions and
opens up new horizons for action. The list below mentions only a few of these new technologies that are co-active in this revolution:
•
•
•
•
11
Inteligência artiicial;
Robótica;
Internet das Coisas (IoT);
Veículos autônomos;
Cassiolato & Podcameni, 206, p. 51 In. GESEL 2016.
•
•
•
•
11
Artiicial intelligence;
Robotics;
Internet of Things (IoT);
Autonomous vehicles;
Cassiolato & Podcameni, 206, p. 51 In. GESEL 2016.
cadernos fgv projetos
201
•
•
•
•
•
Nanotecnologia;
Biotecnologia;
Ciência dos materiais;
Armazenamento de energia;
Computação quântica.
Essas tecnologias trazem consigo potenciais
benefícios, bem como consequências negativas.
De acordo com o relatório The Global Risks, Report 2017, do Fórum Econômico Global, relatam-se, dentre outros assuntos, os resultados de
uma pesquisa de percepção na qual foram entrevistados 745 especialistas no mundo inteiro
sobre os riscos e os benefícios de 12 tecnologias
emergentes.12 Esses resultados destacam que há
um otimismo em relação ao equilíbrio entre benefícios e riscos. No entanto, aponta que a maximização dos benefícios e a redução dos riscos
dependerá da qualidade de governança dessas
12 São elencadas as 12 tecnologias emergentes: 1) Impressão 3D; 2)
Materiais e nanomaterias avançados; 3) Inteligência Artiicial e robótica; 4)
Biotecnologia; 5) Captação, storage e transmissão de energia; 6) Blockchain
and distributed ledger; 7) Geoengenharia; 8) Proliferação e presença ubíqua
de sensores interligados; 9) Neurotecnologia; 10) Novas tecnologias da
computação; 11) Tecnologias espaciais; 12) Realidade virtual e aumentada.
•
•
•
•
•
Nanotechnology;
Biotechnology;
Science of materials;
Storing energy;
Quantic computation.
These technologies carry with them both
potential beneits and negative consequences. Among other topics, The Global Risks,
Report 2017 of the World Economic Forum,
reports on the results of a world-wide survey containing interviews with 745 specialists concerning the risks and beneits of 12
emerging technologies.12 These results point
to optimism as regards the balance between
beneits and risks. However, they also point
out that maximizing beneits and reducing
risks will depend on the quality of how these
12
The list of the 12 technologies: 1) 3D printing; 2) Advanced
materials and nano-materials; 3) Artiicial Intelligence and robotics;
4) Biotechnology; 5) Obtaining, storing and transmitting energy; 6)
Blockchain and distributed ledger; 7) Geo-engineering 8) Proliferation
and ubiquitous presence of interlinked sensors; 9) Neuro-technology; 10)
New computer technologies; 11) Spatial Technologies; 12) Virtual and
augmented reality.
artigo
article
202
tecnologias – regras, normas, padrões, incentivos, instituições e outros mecanismos que
moldam o desenvolvimento e a implantação de
cada uma delas.
Ainda conforme esse relatório, a evolução
das novas tecnologias será inluenciada fortemente por normas sociais, políticas corporativas, padrões industrias e princípios regulatórios que estão sendo debatidos e redigidos
atualmente. Ademais, de acordo com esse relatório, o progresso tecnológico gera diversas
e complexas questões a serem tratadas, tais
como: o desemprego, a segurança pessoal e
cibernética, a eliminação da privacidade que
reduz a coesão social, a disseminação rápida
de informações erradas, os dilemas éticos que
existem em áreas como inteligência artiicial
(AI) e biotecnologia, e a melhor governança
das tecnologias emergentes.
Em especiico, a questão da governança
é muito relevante. Faz-se necessário, então,
colaborar para gerar formas mais ágeis e
adaptáveis de governança local, nacional e
global e de gerenciamento de riscos dessas
tecnologias. Outro fator relevante, destacado
no artigo Right Tech, Wrong Time,13 da Harvard Business Review, é relativo ao timing
de implementação da inovação. Embora haja
bastante conhecimento sobre como identiicar as mudanças tecnológicas e seus riscos, o
timing desse processo é ainda desconhecido.
Destarte, a difusão das novas tecnologias sobre as antigas irá depender dos avanços tecnológicos, bem como dos seus ecossistemas
institucionais, nos quais as tecnologias estão
enraizadas. (Figura 2)
Esse novo leque de tecnologias – com seus
benefícios e riscos atrelados – proporciona
grandes oportunidades para as cidades brasileiras. É possível citar alguns exemplos de aplicação de novas tecnologias em âmbito urbano:
technologies are managed – rules, regulations, standards, incentives, institutions and
other mechanisms that shape the development and implantation of each one of them.
This report also claims that the evolution
of the new technologies will be powerfully
inluenced by the social rules, corporative
policies, industrial standards and regulatory principles that are currently being debated and drawn up. Furthermore, according to
the report, technological progress provokes
many complex questions to be answered, for
instance: unemployment, personal and cybernetic security, elimination of privacy and
its impact on social cohesion, rapid dissemination of wrong information, ethical dilemmas in areas such as artiicial intelligence
(AI) and biotechnology and better supervision of new technologies.
Speciically, the issue of governance is
highly relevant. Collaboration is necessary
to come up with more agile and adaptable
forms of local, national and international
governance and risk-management of these
technologies. Another relevant factor noted
in the article Right Tech, Wrong Time13 of
the Harvard Business Review refers to the
timing to implement innovations. Although
there is abundant knowledge about identifying technological changes and their risks,
the timing of this process is still unknown.
Consequently, diffusing new technologies
in opposition to old ones will depend on the
technological advances, in addition to the institutional eco-systems on which the technologies are based. (Figure 2)
This new array of technologies – along
with their beneits and corresponding risks
– offers great opportunities for Brazil’s cities. Some examples of applying new technologies in the urban sphere can be mentioned:
13
13
Adner & Kapoor, 2016.
Adner & Kapoor, 2016.
cadernos fgv projetos
203
Figura 2 Dinâmica de difusão de tecnologias
Figure 2 The dynamics of diffusing technologies
Desempenho
Performance
Tecnologia Nova
New Technology
Tecnologia Antiga
Old Technology
Tempo
Time
Fonte: elaboração própria com base em Adner & Kapoor (2016)
Source: prepared by the authors based on Adner & Kapoor (2016)
i) Mobilidade inteligente: mobilidade urbana multimodal e compartilhada,
como o compartilhamento de carros, e sistemas de mobilidade e energia, a exemplo
do carro elétrico;
ii) Gestão inteligente de resíduos sólidos:
coleta com compartimento de compactador
de lixo com energia solar, sistemas de monitoramento com sensores e IoT, otimização de
rotas logísticas, separador inteligente de resíduos sólidos e aproveitamento energético;
iii) Gestão inteligente da água: sistemas
inteligentes de água, de prevenção de perdas, de monitoramento com sensores e
IoT, de irrigação inteligente, entre outros;
iv) Iluminação pública inteligente: a infraestrutura de iluminação pública é eixo
vertical de transformação para tornar uma
i) Intelligent mobility: multi-modal and
shared urban mobility, such as car-pooling
and a system of mobility and energy, for
example, electric cars;
ii) Intelligent management of solid
waste: collecting with a solar-energy
trash-compactor, monitoring systems
with sensors and IoT, optimizing logistic routes, intelligent solid-waste sorter
and energy savings;
iii) Intelligent management of water:
intelligent water systems, prevention of
leaks, monitoring with sensors and IoT,
intelligent irrigation, among others;
iv) Intelligent public lighting: the infrastructure of public lighting is a vertical axis of change to turn a city into a
smart city, because it allows installing
artigo
article
204
cidade uma Smart City, porque permite a
instalação de diversas tecnologias com capilaridade no contexto urbano, como sensores de presença, wi-i público, totens,
câmeras de vigilância, monitoramento de
consumo de recursos, controle de tráfego e
pontos de ônibus;14
v) Energia elétrica: possibilita a integração de diversas tecnologias, o uso
de recursos renováveis para a geração de
energia elétrica e novas soluções de distribuição de energia. Nesse âmbito, as tecnologias são relativas a recursos distribuídos,
redes inteligentes, armazenamento de
energia e eiciência energética.
different technologies that permeate the urban context, such as presence
sensors, public Wi-Fi, totems, security
cameras, monitoring and consumption
of resources, traffic control and bus
stops; 14
v) Electric energy: enables integrating different technologies, using renewable resources to generate electric
energy and new solutions to energy distribution. The technologies in this area
concern distributed resources, intelligent networks, storage of energy and
energy efficiency.
14 Com base em: Vitor Amuri Antunes, Parcerias Público-Privadas para
Smart Cities, 2017; p. 66.
14 Based on: Vitor Amuri Antunes, Parcerias Público-Privadas para
Smart Cities, 2017; p. 66.
Figura 3 Alta velocidade da inovação tecnológica e baixa velocidade das
mudanças nas cidades
Figure 3 The high speed of technological change and the low speed of
changes in cities
INSTITUIÇÕES DE PESQUISA
INOVAÇÃO TECNOLÓGICA
MUDANÇAS NAS CIDADES
TECHNOLOGICAL INNOVATION
CHANGES IN CITIES
RESEARCH INSTITUTES
+
EMPRESAS PROVEDORAS
DE SOLUÇÕES TECNOLÓGICAS
COMPANIES PROVIDING
TECHNOLOGICAL SOLUTIONS
Fonte: elaboração própria
Source: prepared by the authors
=
...
cadernos fgv projetos
205
O vetor da inovação tecnológica disruptiva
strictu sensu apresenta uma evolução rápida, bem como dinamiza múltiplos e novos
usos de recursos para a cidade. Entretanto, a
velocidade da geração de invenções e da disponibilidade das novas tecnologias é muito
superior à das cidades nos processos de absorção apropriada dessas oportunidades tecnológicas e da capacidade de implementar
processos de transformação urbana rumo a
um desenvolvimento sustentável.
Strictly speaking the vector of distributive
technological innovation presents a rapid
evolution that dynamizes a myriad of new
uses of resources for cities. Nonetheless, the
speed in which inventions are introduced
and the availability of new technologies is
far superior to that of cities in the process of
appropriately absorbing these technological
opportunities and the capacity to implement
processes of urban change aimed at sustainable development.
ECOSSISTEMAS
INSTITUCIONAIS E DE
MERCADO INOVADORES
INSTITUTIONAL AND
INNOVATIVE-MARKET
ECO-SYSTEMS
Com efeito, a cidade, como sistema complexo
que depende de um grande número de variáveis, precisa ter um ambiente habilitante para
que haja uma difusão equânime da inovação
tecnológica. Desse modo, ressalta-se que a
inovação acontece dentro de ecossistemas
institucionais e de mercado – as cidades –,
que permitem a criação e a difusão de tecnologias. Nesse sentido, é possível destacar que:
Indeed, the city as a complex system that depends on a great deal of variables needs to
have an environment that offers the possibility
of equanimous diffusion of technological innovation. So it bears stressing that innovation
takes place within institutional and market
eco-systems – cities – that allow technologies
to be created and diffused. In this sense, what
follows deserves emphasizing:
Os novos paradigmas alteram as fronteiras
The new paradigms alter the technological
tecnológicas e criam novos conjuntos de pa-
frontiers and create new sets of standards,
drões, práticas e processos produtivos. Ge-
practices and productive processes. In ge-
ralmente a mudança tecnológica é rápida,
neral, technological change is fast, whereas
enquanto as mudanças nas instituições e nas
changes in public and private institutions
organizações públicas e privadas tendem a
and organizations tend to be slower. Thus,
ser mais lentas. Assim, é comum que as mu-
it is common for technological changes to
danças tecnológicas sejam acompanhadas
be accompanied by a certain inertia in ins-
por uma inércia nas instituições. (Cassiolato
titutions. (Cassiolato & Podcameni, 206, p.
& Podcameni, 206, p. 52 In. GESEL 2016)
52 In. GESEL 2016)
Os ecossistemas institucionais e de mercado trazem à tona o segundo vetor de inovação,
que se refere ao ambiente socioinstitucional
e de business favorável à implementação de
Institutional and market eco-systems
present the second vector of innovation,
which refers to the socio-institutional and
business atmosphere favorable to imple-
artigo
article
206
“
existe uma grande
diferença entre
tornar uma cidade já
existente uma smart
city (investimentos
brownield) e gerar
uma nova cidade
já nos moldes de
cidade inteligente
(investimentos
greenield). Esses
processos não
são triviais, pois
a complexidade e
os desaios são de
graus e intensidades
diferentes.
”
novas soluções disponíveis e daquelas que
estão por vir.
Um aspecto inicial a ser destacado nesse
segundo vetor é que existe uma grande diferença entre tornar uma cidade já existente
uma smart city (investimentos brownield)
e gerar uma nova cidade já nos moldes de
cidade inteligente (investimentos greenield). Esses processos não são triviais, pois
a complexidade e os desaios são de graus e
intensidades diferentes. A aplicação de novas
tecnologias em cidades já existentes requer a
identiicação de soluções que sejam moldadas em coerência com as vocações, identidades e infraestruturas já instaladas, além dos
próprios vínculos impostos pela estrutura
social e urbana. No entanto, cidades a serem
construídas “do zero” se beneiciam do fato
de ser possível planejar e conceber antecipadamente as soluções urbanas a partir de
uma ótica smart. Para o Brasil, investimentos greenield de cidades são uma escolha
estratégica difícil, embora existam exemplos
como a smart city de Laguna, no Ceará, e a
de Granja Marileusa, em Minas Gerais. Por
outro lado, para o Brasil, o desaio maior é a
“smartization” de complexos sistemas urbanos já existentes. A heterogeneidade e a multiplicidade dos desaios ecológicos, sociais,
econômicos e institucionais nesses sistemas
urbanos são muito relevantes e cruciais.
Assim, para abordar esses desaios, são
necessárias inovações que vão além da questão da inovação tecnológica strictu sensu
– isto é, a inovação do ambiente social e
institucional e de modelo de business que
permitirá a favorável implantação de smart
cities no Brasil. De forma geral, esse ambiente pode ser caracterizado, entre outros
elementos, pelo(a):
cadernos fgv projetos
207
menting available new solutions and those
still in the embryonic stage.
An initial aspect of this second vector that
needs to be emphasized is that there exists a
big difference between turning an already
existing city into a smart city (brownield investments) and creating a new city already
in the molds of an intelligent city (greenield
investments). These are not trivial processes; their complexity and the challenges involved differ in degree and intensity. Applying new technologies to already existing
cities requires inding solutions coherent
with the already installed vocations, identities and infrastructures, in addition to the
links themselves imposed by the social and
urban structure. Nevertheless, cities to be
built “from zero” beneit from the fact that it
is possible to plan and conceive urban solutions in advance using a smart approach. In
the case of Brazil, greenield investments in
cities is a dificult strategic choice, although
there are examples such as the smart city of
Laguna in Ceará and the Granja Marileusa
in Minas Gerais. On the other hand, the big
challenge for Brazil is to “smartify” complex urban systems that already exist. The
heterogeneous, multiple nature of the ecological, social, economic and institutional
challenges of these urban systems are very
relevant and crucial.
Approaching these challenges calls for innovations that go beyond the question of mere
technological innovation; that is to say, innovations in the social and institutional environment, as well as in the business model, that will
allow smart cities to be successfully implanted
in Brazil. In a general sense, such an environment can be characterized by the following elements, among others:
“
there exists a
big difference
between turning
an already existing
city into a smart
city (brownield
investments)
and creating a
new city already
in the molds of
an intelligent
city (greenield
investments).
These are not
trivial processes;
their complexity
and the challenges
involved differ
in degree and
intensity.
”
artigo
article
208
• Melhoria da habilidade de deinir
necessidades e demandas sociais para
identiicar soluções efetivas de Smart City;
• Consolidação do papel do poder
público como promotor e articulador de
ecossistemas de políticas públicas multissetoriais em prol do benefício da população;
• Aprendizado de trabalhar em conjunto com os mercados e a sociedade civil;
• Estruturação de novas relações entre
empresas e territórios;
• Melhoria e fortalecimento das habilidades e vocações locais, a exemplo da
inclusão social produtiva;
• Geração de condições para garantir a segurança jurídica de modelos de negócios para
implementação de soluções de Smart City;
• Promoção do uso ótimo de recursos
disponíveis (públicos e privados) por meio
de visão, planejamento e pragmatismo.
• Improving aptitudes to deine social
needs and demands to identify effective
Smart City solutions;
• Consolidating the role of the government in promoting and articulating
multi-sectoral public-policy eco-systems
for the beneit of the population;
• Learning to work in conjunction
with the markets and civil society;
• Structuring new relationships between companies and territories;
• Improving and strengthening local
skills and vocations, following the example of productive social inclusion;
• Creating conditions to ensure the legal security of business models for implementing Smart City solutions;
• Promoting the best use of available
(public and private) resources by means
of planning, pragmatism and vision.
Em especíico, nessa linha de argumentação, são detalhados esses elementos identiicando duas categorias de inovações que
compõem a inovação social e institucional e
de business. Essas inovações são apresentadas a seguir.
Specifically, pursuing this line of reasoning, these elements are detailed in order to identify two categories of innovations that make up social-institutional and
business innovation. Such innovations are
presented below.
INOVAÇÃO DO AMBIENTE
SOCIAL E INSTITUCIONAL
INNOVATION IN THE SOCIAL AND
INSTITUTIONAL ENVIRONMENT
No que diz respeito à inovação do ambiente
social e institucional, são consideradas a inclusão e a participação de múltiplos atores
por meio de novos modelos de cooperação
urbana no âmbito dos processos de planejamento e de governança municipal, que possibilitem a implantação das melhores soluções
de Smart City, considerando as especiicidades de cada cidade. É possível, então, caracte-
With regard to innovation in the social
and institutional area, one has to take into
consideration the inclusion and participation of multiple agents by means of new
models of urban cooperation in the sphere
of municipal planning and governance
to enable implanting the best Smart City
solutions, taking into account the specificities of each city. This innovation can
cadernos fgv projetos
209
rizar nessa inovação o desaio da cooperação
entre stakeholders para o planejamento, o
desenho, a implantação, a execução e o monitoramento de soluções inteligentes.
Assim, observa-se que o poder público
brasileiro aparece como um aparelho estatal
de caráter tecnocrata, insulado da sociedade
e com pouca transparência. Por isso, há necessidade de uma mudança que se baseia na
teoria democrática. Requer-se, então, uma
ruptura de paradigma para se obter um poder público lexível, inserido na sociedade e
capaz de dialogar e interagir com os múltiplos
atores sociais envolvidos. Procuram-se novas
formas de parcerias entre Estado e sociedade
civil – junto com o aprimoramento de instru-
thus be characterized by the challenge for
stakeholders to cooperate in planning, designing, implanting, executing and monitoring smart solutions.
In the light of the above, the Brazilian
government seems like a technocrat-style
state entity insulated from society and endowed with little transparency. That is why
a change is needed, a change based on the
tenets of democracy. The paradigm must be
broken in order to build a lexible government that is inserted in society and is capable of dialoguing and interacting with the
many social agents involved. New forms of
partnership between State and civil society
are required – along with better instru-
artigo
article
210
mentos de governança multi-stakeholders –
e o fortalecimento da gestão pública.
O poder público coloca-se como o interlocutor principal, enquanto a sociedade civil possui
expressões coletivas heterogêneas, que podem
ser fracas ou fortes. Por um lado, as formas de
parceria são requeridas para suprir a necessidade de obtenção de informações cruciais para o
processo de política pública e, por outro, para
obter o comprometimento com os atores sociais. Este último fator ressalta um elemento
crucial, pois os serviços ligados aos bens coletivos são coproduzidos.15 Além disso, salienta a
necessidade e o desaio da sociedade civil em se
organizar e participar de forma ativa nos processos de políticas públicas.
Nesse bojo, a sociedade civil tem a necessidade de gerar ecossistemas facilitadores para
viabilizar sua participação na identiicação de
soluções para o sistema urbano a partir da ótica
de uma Smart City. Dessa forma, enseja-se a
criação de novas plataformas de comunicação e cooperação, a difusão de conhecimento
e informação, a participação da sociedade no
planejamento estratégico, o co-design e a execução de soluções inteligentes.
Os ecossistemas facilitadores permitem
envidar esforços e competências de múltiplos
stakeholders. Isso pode ser realizado por
meio de modelos tradicionais de participação
social, como conselhos, conferências, comissões, mesas de diálogo, audiências e consultas públicas e fóruns, bem como com novos
modelos de participação, tais como ambientes virtuais, espaços inovadores e o Urban
Lab, que, em português, signiica Laboratório Urbano. Esses modelos são complementares e podem conviver, sendo escolhidos em
função da especiicidade do desaio urbano a
ser abordado. (Figura 4)
ments of multi-stakeholder governance –
and more effective public management.
The government fulills the role of main interlocutor while civil society possesses heterogeneous collective expressions that can be either weak or strong. On one hand, partnership
models are required on account of the need to
obtain information that is crucial to the process
of public policy, and on the other hand to ensure commitment with the social actors. This
latter factor is a vital element, since the services
relating to collective assets are produced in cooperative fashion.15 Besides this, emphasis is
lent to the need and challenge for civil society to
organize and participate actively in public-policy processes.
In these circumstances, civil society needs
to create eco-systems that help to make feasible its participation in identifying solutions
for the urban system based on the Smart
City concept. To this end, new platforms of
communication and cooperation must be established, as well as diffusion of knowledge
and information, participation of society in
strategic planning, co-design and execution
of smart solutions.
Such facilitator eco-systems help multiple stakeholders in their initiatives and
competences. This can be done through
traditional models of social participation
such as boards, conferences, commissions,
debates, audiences, public consultation and
forums, as well as through new models of
participation provided by the likes of virtual environments, innovative spaces and the
Urban Lab. These models are complementary to one another and can be chosen by
taking into account the speciic characteristics of the urban challenge to be addressed.
(Figure 4)
15
15
Ostrom, 1996.
Ostrom, 1996.
cadernos fgv projetos
211
Figura 4 Modelos tradicionais e novos de participação
Figure 4 Traditional and new models of participation
CONSELHOS E CONFERÊNCIAS
BOARDS AND CONFERENCES
AMBIENTE VIRTUAL
VIRTUAL ENVIRONMENT
COMISSÕES E MESAS DE DIÁLOGO
COMISSIONS AND DEBATES
AUDIÊNCIAS E
CONSULTAS PÚBLICAS
AUDIENCES AND
PUBLIC CONSULTATION
PARTICIPAÇÃO
PARTICIPATION
ESPAÇOS INOVADORES
INNOVATIVE SPACES
URBAN LAB
URBAN LAB
FÓRUNS
FORUMS
Fonte: elaboração própria
Source: prepared by the authors
Os novos modelos de participação, no
entanto, têm caráter mais disruptivo, pois
viabilizam e permitem ter uma escala
maior de engajamento dos atores municipais e de atuação conjunta, com alta velocidade e efetividade das ações propostas pela
sociedade civil.
Somente como exemplo destaca-se o Urban Lab. Trata-se de um espaço físico ou virtual (plataforma on-line) dedicado ao planejamento e à implantação colaborativa da cidade
sustentável e inteligente, visando à identiicação de soluções inovadoras. É um ambiente
propício à estruturação criativa de soluções
smart, coerentes com os interesses dos múl-
Notwithstanding, the new models of participation are more disruptive inasmuch as
they allow for a larger degree of engagement on the part of the municipal actors,
plus joint action to guarantee that the actions proposed by civil society are carried
out faster and more effectively.
In illustration, let us consider the Urban
Lab, which is a physical or virtual space
(online platform) dedicated to collaborative
planning and implementation of sustainable
and intelligent cities and aimed at identifying innovative solutions. This environment is propitious for creatively structuring
smart solutions that are coherent with the
artigo
article
212
tiplos atores municipais, que facilita a colaboração e a cooperação entre eles. O Laboratório
Urbano de uma cidade precisa estar integrado
à trajetória de desenvolvimento dessa cidade
e pode ser não só uma ferramenta de comunicação entre os atores-chave, como também
uma forma inovadora de interação e participação entre eles, sendo um lugar permanente
de discussão e construção de consensos entre
os atores locais, de modo a garantir continuidade e coerência ao processo de planejamento e implantação de soluções para uma cidade
sustentável e inteligente.
Entretanto, a participação social parte do
pressuposto de que haja um cidadão ativo,
participativo e colaborativo na criação de uma
Smart City. É necessário, assim, um cidadão
smart, que não tenha uma atitude reativa
e passiva. O cidadão torna-se smart ao ser
proativo, dominar e compartilhar tecnologias
que o ajudam a se expressar, a se conectar
com outros, a compartilhar recursos e ideias
e a reletir sobre como é possível decidir o
melhor curso de ação.16 Em outras palavras,
trata-se da formação de cidadania, também
pelo uso de novas tecnologias que, potencialmente, podem unir, com menor custo, diversos stakeholders em prol da busca de soluções
inovadoras para o contexto urbano.
A participação social ativa, dinamizada
pelo uso de novas tecnologias, permite a criação de ecossistemas facilitadores para uma
relação mais efetiva entre sociedade civil e
poder público, em prol da criação de uma
Smart City.
Dito isso, no que tange ao poder público,
o contexto brasileiro apresenta como relevante a atuação do Estado nas trajetórias
de desenvolvimento. Logo, há necessida-
interests of the multiple municipal agents
and facilitates collaboration and cooperation among them. The Urban Laboratory of
a city needs to be integrated with the development trajectory of that city, more than a
mere tool for communication among the key
agents. At the same time, it is an innovative
form of interaction and participation and a
permanent place for discussing and building
consensuses among the local actors in order
to guarantee continuity and coherence of the
process of planning and implanting solutions for a sustainable and intelligent city.
Nonetheless, social participation is based
on the supposition that there is an active
citizen who participates and collaborates
in building a Smart City. It is necessary
for this smart citizen not to have a reactive,
passive attitude. Citizens become smart by
being proactive, by mastering and sharing
technologies that help them to express themselves and connect with others, sharing resources and ideas and relecting on how to
decide on the best course of action.16 In other
words, this is training to be a citizen, using
new technologies that have the potential to
bring together, at less cost, different stakeholders in search of innovative solutions for
the urban context.
Active social participation, dynamized by
the use of new technologies, promotes the
creation of facilitator eco-systems geared to
making the relationship between civil society and government more effective on behalf
of setting up a Smart City.
This said, as regards the government,
the Brazilian context shows the action of
the State in matters of development to be
relevant. Accordingly, this has to be one
16
Disponível em: <http://waag.org/nl/project/resilient-cities-smartcitizens>. Acesso em: 28/06/2017.
16
Available at: <http://waag.org/nl/project/resilient-cities-smartcitizens>. Accessed on: 06/28/2017.
cadernos fgv projetos
213
de de incluí-lo com relevo nessa discussão.
No contexto de Smart City e, em especíico,
no Brasil, o poder público poderá liderar o
processo de transformação para uma cidade inteligente. O município deverá ser uma
máquina estatal lexível, que desenvolva o
papel de articulador e promotor de ambientes de cooperação e diálogo entre a sociedade civil e o sistema empresarial, em favor da
construção de um processo legítimo e sustentável ao longo dos anos. (Figura 5)
Para isso, entretanto, a administração
pública precisa enfrentar e gerir os seguintes desafios:
of the principal parts of this discussion. In
the case of the Smart City, and speciically
in Brazil, the government can lead the process of change for the purpose of building
intelligent cities. A municipality should be a
lexible state machine that plays the role of
articulator and promoter of environments
of cooperation and dialogue between civil
society and the business sector in favor of
constructing a legitimate process that is sustainable throughout the years. (Figure 5)
For all of this to become real, however,
public administration has to face and manage the following challenges:
Figura 5 Liderança do município e governança
Figure 5 Leadership of municipalities and governance
MUNICÍPIO
MUNICIPALITY
PLANEJAMENTO
PLANNING
Fonte: elaboração própria
Source: prepared by the authors
GOVERNANÇA
GOVERNANCE
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTING
artigo
article
214
• Catalisar e sintetizar os interesses
comuns, considerando as diferentes necessidades de múltiplos atores municipais;
• Promover processos participativos e
novos modelos de governança;
• Desenvolver uma lógica de regulação efetiva;
• Difundir uma cultura de planejamento;
• Melhorar a capacidade de inanciamento;
• Prover serviços de qualidade em
parcerias com outros atores;
• Aprimorar as competências nos processos de avaliação de resultados (monitoramento e controle).
Nessa visão de poder público lexível e em
diálogo com a sociedade, é importante ressaltar
o papel fundamental de se ter accountability
para avaliação e monitoramento das evoluções
de políticas públicas. Por sinal, esta possui três
dimensões: transparência – divulgação de informações; capacidade de resposta (responsi-
• Catalyze and synthesize interests in
common, taking into consideration the various needs of multiple municipal actors;
• Promote participatory processes
and new models of governance;
• Develop an effective regulatory logic;
• Spread a culture of planning;
• Improve inancing capacity;
• Provide quality services in partnership with other actors;
• Enhance monitoring and control
capacities in processes to evaluate results.
In this concept of lexible government engaged in dialogue with society, it is imperative to assert the fundamental role of accountability in evaluating and monitoring
the performance of public policies. There
are three dimensions to this important role:
transparency – divulging information; responsiveness – requests for explanations
and responsibilities; and enforcement -
cadernos fgv projetos
215
veness) – pedidos de explicação e responsabilização; capacidade de sanção ou correção
(enforcement) – fazer valer a obrigação.
Em síntese, a inovação do ambiente social
e institucional, por um lado, requer uma sociedade civil ativa e, por outro, pede uma reformulação das competências e capacidades
de gestão do poder público. Além disso, põe
em questão a relação entre Estado e o sistema empresarial, que tem papel relevante no
processo de transformação para uma cidade
sustentável e inteligente.
sanctioning or correcting to ensure that obligations are met.
In synthesis, innovating in the social and
institutional environment requires, on one
hand, an active civil society, while on the
other hand requesting a reformulation of
the obligations and capacities of government management. Aside from this, it questions the relationship between State and
the business system, which plays a relevant
part in the process of making a city sustainable and intelligent.
INOVAÇÃO DO AMBIENTE
DE BUSINESS
INNOVATION OF THE
BUSINESS ENVIRONMENT
Passa-se a discutir, então, a segunda inovação que permitirá a implantação de Smart
Cities no Brasil: a do ambiente de business.
Desse ambiente, salientam-se dois aspectos
cruciais, que são a segurança jurídica e a dimensão econômico-inanceira.
A segurança jurídica permite que o sistema
empresarial tenha a possibilidade de desenvolver os próprios negócios – nesse caso, relativos à implantação das soluções de Smart
City –, garantindo a entrega de serviços de
qualidade e a rentabilidade dos próprios investimentos. Trata-se de ter condições de
igualdade, nas quais as regras do jogo sejam
claras, transparentes e objetivas, principalmente quando as novas soluções tecnológicas
da Smart City permitem a integração de múltiplos serviços que costumavam ser tratados
de forma pontual e separada, como os setores
de energia, telecomunicação, resíduos sólidos, água e saneamento, entre outros. Para
isso, é preciso trabalhar rumo a uma inovação regulatória e normativa, não permitindo
que variáveis exógenas e incontroláveis interiram no ambiente empresarial.
The second innovation that will enable Smart
Cities to be implanted in Brazil, namely the
business environment, will now be discussed.
Two crucial aspects of this environment deserve special emphasis: legal security and the
economic-inancial dimension.
Legal security allows the entrepreneurial system the possibility of developing its
own affairs – in this case relating to the
implantation of Smart City solutions – in
order to guarantee delivering quality services and profitability of its investments.
This implies having equal conditions where
the rules of the game are clear, transparent and objective, especially when the
new technological solutions of the Smart
City make it possible to integrate multiple
services that used to be treated specifically and separately, such as energy, telecommunications, solid waste, water and
sanitation, among others. This demands
working in the direction of a regulatory,
normative innovation and not letting exogenous and uncontrollable variables to
interfere in the business sphere.
artigo
article
216
No que diz respeito à dimensão econômico-inanceira, trata-se de criar condições
para incentivar a alocação de recursos de
diferentes origem e natureza para viabilizar
a implantação de soluções de Smart City.
Essa implantação precisa de investimentos.
Entretanto, a situação das inanças públicas
brasileiras é delicada, tendo como consequência a baixa capacidade de investimento
público. Nesse sentido, é preciso buscar parcerias e novas soluções para alavancar recursos inanceiros, bem como gerar soluções que
tenham uma sustentabilidade econômico-inanceira de longo prazo.
Portanto, para implementar soluções de
Smart City para a cidade, requer-se a transição de soluções tradicionais de contratações
públicas para novas soluções institucionais
que unam os parceiros público e privado na
realização de investimentos para ins de interesse público. De acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a
literatura deine essas novas formas como
Alianças Público-Privadas para o Desenvolvimento (APPDs), que são:
As far as the economic-financial dimension is concerned, here conditions have
to be created to encourage allocating resources of different origin and nature to
make implantation of Smart City solutions feasible. Implanting smart solutions
calls for investments. However, the state
of Brazil’s public finances is delicate, and
this leads to the capacity for public investment being so poor. In this sense it
is essential to seek partnerships and new
solutions to raise funds, as well as to find
solutions that ensure long-term economic-financial sustainability.
Implementing Smart City solutions,
therefore, requires migrating from traditional public-contracting solutions to
new institutional solutions that marry the
public and private sectors to find investments aimed at the interest of the public.
According to the Inter-Inter-American
Development Bank (BID), the literature
defines these new forms as Public-Private
Partnerships for Development (APPDs),
as follows:
Colaborações por meio das quais indiví-
Collaborations by means of which indi-
duos, grupos ou organizações se propõem
viduals, groups or organizations propose
a trabalhar conjuntamente para cumprir
to work together to fulill an obligation or
uma obrigação ou realizar alguma inicia-
develop some speciic initiative, sharing
tiva especíica, compartilhando os riscos,
the risks and beneits, and reviewing their
assim como os benefícios, e revisando a
relationship, whenever this is deemed
relação regularmente, sempre que neces-
necessary. (BID 2015, p. 27)
sário. (BID 2015, p. 27)
Em particular, essa inovação conceitual foi
institucionalizada no Brasil, de forma especíica no setor de infraestrutura, com um contrato de concessão especial, por meio da lei no
11.079, de 2004, conhecida como Lei de Parcerias Público-Privadas (PPPs). Essa legislação não exclui a presença de outros institutos
In particular, this conceptual innovation was institutionalized in Brazil specifically in the infrastructure sector, with a
special-concession contract by means of
Law 11.079 of 2004, known as the Public-Private Partnerships Law (PPPs). This
legislation does not exclude the presence
cadernos fgv projetos
217
jurídicos disponíveis que se inserem dentro
do conceito amplo de APPDs, a exemplo das
Organizações Sociais, Operações Urbanas
Consorciadas, Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, entre outros.
Nessa linha de argumentação, é pertinente
lembrar que no Brasil são previstas algumas
soluções institucionais que permitiriam o
alcance do equilíbrio entre o interesse público – fornecimento de serviços públicos – e o
retorno inanceiro do parceiro privado – na
implantação de novas tecnologias smart. Essas soluções permitem casar os modelos de
negócios com os instrumentos jurídicos viabilizando a captação de recursos. (Figura 6)
of other available legal institutes to which
the broad concept of the APPDs applies,
for instance social organizations, urban
operations consortia, public-interest civil
societies, among others.
According to this line of argument, it
is pertinent to remember that in Brazil
some institutional solutions are in place
to permit reaching a proper balance between the public interest – providing public services – and financial profit for private partners, in implanting new smart
technologies. These solutions join business
models to legal instruments to facilitate
fund-raising. (Figure 6)
Figura 6 Modelos de negócios e captação de recursos
Figure 6 Business models and fund-raising
PREFEITURA
CITY HALL
MODELOS DE NEGÓCIOS E
ESTRUTURA
ECONÔMICO-FINANCEIRA
BUSINESS MODELS AND
ECONOMICFINANCIAL STRUCTURE
Parcerias Público-Privadas
Public-Private Partnerships
INSTITUIÇÕES NACIONAIS
NATIONAL INSTITUTIONS
Concessões
Concessions
Build to Suit
Build to Suit
Fundos de Infraestrutura
Infrastructure Funds
INSTITUIÇÕES INTERNACIONAIS
INTERNATIONAL INSTITUTIONS
Impact Investors
Impact Investors
CARTEIRA DE PROJETOS
PORTFOLIO OF PROJECTS
Leasing
Leasing
CAPTAÇÃO DE RECURSOS
FUND-RAISING
Fonte: elaboração própria
Source: prepared by the authors
artigo
article
218
“
a inovação do
ambiente de
business requer
que o sistema
empresarial tenha
as condições
jurídicas seguras
e a possiblidade
de usar novas
arquiteturas
inanceiras para
poder prestar
serviços de
qualidade em
ótica smart e em
coerência com o
interesse público.
”
Diante desse cenário, identiica-se como arquitetura inanceira desejável para a implantação
de soluções de Smart City aquela de Project Finance. Trata-se de uma opção de inanciamento
de projetos baseada na alavancagem de recursos
inanceiros e, sobretudo, na alocação e mitigação
de riscos para empreendimentos de grande porte,17 cujas principais características são:18
1. A segregação do empreendimento – e
consequentemente de suas responsabilidades – das demais atividades desenvolvidas pelo patrocinador via criação de Sociedade de Propósito Especíico;
2. A alavancagem inanceira por meio de
participação de inanciamentos de origem
pública e privada;
3. A utilização de recebíveis e dos ativos do
empreendimento como garantias principais, em substituição a garantias tradicionais, como hipotecas, alienações iduciárias, avais e ianças;
4. O estabelecimento de uma rede de contratos com delimitação e alocação claras
dos riscos.
Destarte, a inovação do ambiente de business requer que o sistema empresarial tenha
as condições jurídicas seguras e a possiblidade de usar novas arquiteturas inanceiras para
poder prestar serviços de qualidade em ótica
smart e em coerência com o interesse público.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As cidades brasileiras estão diante do desaio
de enquadrar as possibilidades da inovação
tecnológica disruptiva strictu sensu junto às
exigências e necessidades da inovação dos
17
Figueredo, 2015.
18
Figueredo, 2015, de acordo com Enei, 2007.
cadernos fgv projetos
219
This being the scenario, the desirable financial architecture for implanting Smart
City solutions is Project Finance. This option to finance projects is based on raising
and allocating financial resources, as well
as mitigating risks for large-scale undertakings.17 Its main characteristics are given below:18
1. Separating the undertaking – and its
responsibilities – from the other activities developed by the sponsor, by creating a Specific Purpose Company;
2. Fund-raising with resources raised
both by public and private sources;
3. Using receivables and assets of the enterprise as principal guarantees, rather
than traditional guarantees such as mortgage, secured iduciary sale, suretyship
and letters of guarantee;
4. Setting up a network of contracts
with clear delimitation and allocation
of risks.
Considering all the above, the innovation
of the business environment requires the
business system to have safe legal conditions
and the possibility of using new inancial architecture to be able to provide smart quality
services that are coherent with the interests
of the public.
CLOSING REMARKS
Brazilian cities are faced with the challenge
of adapting the possibilities of disruptive
technological innovation to the demands
and necessities of social, institutional and
17
Figueredo, 2015.
18
Figueredo, 2015, according to Enei, 2007.
“
the innovation
of the business
environment
requires the
business system
to have safe legal
conditions and
the possibility of
using new inancial
architecture to
be able to provide
smart quality
services that are
coherent with the
interests of
the public.
”
artigo
article
220
ambientes social e institucional e de business. Assim, estão em busca de caminhos
para implantar soluções de Smart City, com
vistas a alcançar o desenvolvimento sustentável dos próprios municípios, considerando
as especiicidades culturais e sociais existentes e o marco regulatório do país.
Com efeito, neste artigo foi destacado que
o paradigma de Smart City impulsiona um
processo de transformação da cidade que visa
lidar com os desaios da urbanização gerados
pelo aumento da população, pelo crescimento econômico e pelas fragilidades sociais e
ecológicas, buscando, assim, contribuir para
o alcance do desenvolvimento sustentável.
Esse processo de transformação baseado na
inovação tem dinâmicas múltiplas e diferenciadas em função das diversas condições, variáveis e dos requisitos que a cidade precisa
ter para se tornar uma Smart City.
Por im, esse processo pode ser considerado um processo de mudança incremental
e descontínuo, isto é, uma transformação
gradual, que acontece por estágios, nos quais
os novos elementos acoplados às instituições
existentes mudam gradualmente suas estruturas por meio de trajetórias diferenciadas,
com avanços e recuos. Em contextos urbanos
complexos, enraizados em trajetórias sociais
e históricas, essa transformação gradual permite que haja uma possibilidade de desvio
dessa trajetória de dependência histórica relativa à evolução das próprias cidades.19
•
19
Esta leitura do processo de transformação da cidade baseada na
inovação, é embasada na abordagem teórica de Kathleen Thelen (2004)
e Wolfgang Streeck (Streeck & Thelen, 2005) que tratam da mudança
institucional.
business environments. Cities are therefore
seeking ways to implant solutions according
to the Smart City concept in order to guarantee sustainable development for municipalities, taking into account the country’s
cultural and social speciicities and regulatory framework.
This article points out in particular that
the Smart City paradigm impels a process
of change aimed at coping with the challenges of urbanization generated by the increase in population, economic growth and
social-ecological fragility, in this way hoping to contribute to attaining sustainable
development. This process of change based
on innovation is endowed with multiple
differentiated dynamics as a result of the
different conditions, variables and requisites that the city needs in order to become
a Smart City.
In conclusion, this process may be considered as one of incremental and discontinuous change, that is to say, a gradual change
that comes about in stages in which new
elements coupled with existing institutions
gradually alter their structures through
differentiated trajectories, moving both
forwards and backwards. In complex urban contexts rooted in social and historical
trajectories, this gradual change allows the
possibility of the cities themselves evolving
away from these traditions.19
•
19 This reading of the process of city change based on innovation applies
the theoretical approach of Kathleen Thelen (2004) and Wolfgang Streeck
(Streeck & Thelen, 2005) on the subject foreign of institutional change.
cadernos fgv projetos
221
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS | BIBLIOGRAPHIC REFERENCES
Adner R. & Kapoor R., Right Tech, Wrong Time, Harvard Business Review, 2016.
Amuri Antunes V., Parcerias Público Privadas para Smart Cities, Rio de Janeiro: Lumens
Juris Editora 2edição, 2017. 256 p.
Banco Interamericano de Desenvolvimento, O investimento em Infraestrutura no Brasil
– Parcerias Público-Privadas e Operações Urbanas Consorciadas / Banco Interamericano
de Desenvolvimento. Brasília: BID, 2015. (Ciclo de Debates – Alianças Público-Privadas para
o Desenvolvimento).
Daly, H. E., Crescimento Sustentável? Não, obrigado. Este artigo foi originalmente publicado em Mander, Jerry & Goldsmith, Edward (eds.). The case against the global economy
(and for a turn toward the local). San Francisco: Sierra Club Books, sob o título “Sustainable
growth? No thank you”.
Enei, José Virgílio Lopes. Project Finance: inanciamento com foco em empreendimentos: Parcerias Público-Privadas, Leveraged, Buy-outs e outras iguras ains. São Paulo: Saraiva, 2007.
Eickelberg Fortes Tigre A., Contardi M., Zeller K, Making cities part of the global solution – Overcoming obstacles, Exploring opportunities, 2017, FGV – G 20 Insights – POLICY
AREA: Agenda 2030 – G 20 Germany 2017 Think 20 Dialogue.
Gesel, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Grupo de Estudos do Setor Elétrico Políticas públicas para redes inteligentes / GESEL. — Rio de Janeiro: Publit, 2016. 368 p.
FGV Projetos, Cidades Inteligentes e Mobilidade Urbana, Cadernos FGV Projetos, outubro 2015, ano 10, n. 24.
International Energy Agency, Energy Technology Perspectives 2016, Towards Sustainable Urban Energy Systems, OECD/IEA, 2016.
Ostrom, E. Crossing the great divide: Coproduction, synergy, and development. World
Development v. 24, n. 6, p. 1073-1087, 1996.
United Nations Economic Commission For Europe, for Green Technologies Innovation, Policy Guide for Policymakers in the Transition Economies of Europe and Central Asia, 2013.
United Nations, Department of Economic and Social Affairs, Population Division. World
Urbanization Prospects: The 2014 Revision, 2015.
United Nations, Habitat III New Urban Agenda, Draft outcome document for adoption in
Quito, October 2016,10 September 2016.
Figueredo, C. R., Uma avaliação dos custos de transação em estruturas híbridas: o caso da
Parceria Público-Privada para construção e manutenção de escolas públicas da Prefeitura de
Belo Horizonte. Rio de Janeiro, 2015.
Shwab K., The Fourth Industrial Revolution, First Edition, New York: Crown Business,
2017.
Streeck, W. E Thelen, K. Introduction, in Wolfgang Streeck and Kathleen Thelen, eds.,
Beyond Continuity: Institutional Change in Advanced Political Economies. Oxford, Oxford
University Press, 2005.
artigo
article
222
Thelen, K. How Institutions Evolve: The Political Economy of Skills in Germany, Britain,
the United States, and Japan. New York: Cambridge University Press, 2004.
Van Timmeren A., Henriquez L. & Reynolds A., Ubikquity & the Illuminated City: From
Smart to Intelligent Urban Environments. TU Delft, 2015.
World Economic Forum, The Global Risks Report 2017, 12th Edition, 2017.
WEBSITES CONSULTADOS | WEBSITES
http://www.mma.gov.br/clima/convencao-das-nacoes-unidas/acordo-de-paris
https://www.weforum.org/about/the-fourth-industrial-revolution-by-klaus-schwab
https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/br.html
http://waag.org/nl/project/resilient-cities-smart-citizens
https://nacoesunidas.org/pos2015/
cadernos fgv projetos
223
ARTIGO ARTICLE
CICLO ROTAS
CENTRO:
UM CAMINHO PARA A
MOBILIDADE URBANA
SUSTENTÁVEL NO
RIO DE JANEIRO
CICLO ROTAS
CENTRO:
A PATH TO SUSTAINABLE
URBAN MOBILITY IN
RIO DE JANEIRO
A bicicleta é um meio de transporte capaz de ampliar o acesso de diversas camadas
sociais às oportunidades de trabalho, lazer, equipamentos públicos e serviços
existentes nas cidades. Este artigo apresenta o projeto Ciclo Rotas Centro, malha de
33 km de rede cicloinclusiva para o centro da cidade do Rio de Janeiro, desenhado por
meio de metodologia participativa.
The bicycle is a means of transportation that allows all social classes to expand
their access to employment, leisure, public services and resources in their cities.
This article discusses the Ciclo Rotas Centro project, a 33-kilometer network of bike
paths for the center of Rio de Janeiro, designed using a participatory methodology.
CLARISSE CUNHA LINKE
Diretora-executiva do ITDP Brasil
Executive Director of ITDP Brazil
Mestre em políticas sociais, ONGs e desenvolvimento pela London School of Economics,
formou-se em comunicação, com ênfase em publicidade, pela Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro. Atualmente, é diretora-executiva do Instituto de Políticas de Transporte e
Desenvolvimento no Brasil.
Clarisse holds a Master’s degree in Social Policy, NGOs and Development from the London
School of Economics and a bachelor’s in Communication with an emphasis on advertising
from the Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. She is currently Executive
Director of the Institute of Transport and Development Policies in Brazil.
JOÃO PEDRO MACIENTE ROCHA
Assistente de programas do ITDP Brasil
ITDP Brazil Program Assistant
Mestrando em engenharia urbana pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, formouse em gestão pública pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da
mesma universidade. É assistente de programas do Instituto de Políticas de Transporte e
Desenvolvimento no Brasil.
Currently pursuing a Master’s degree in urban engineering at Universidade Federal do Rio
de Janeiro, João also holds a bachelor’s degree in public management from the Institute of
Urban and Regional Planning and Research from UFRJ. He is a program assistant at the
Institute of Transport and Development Policies in Brazil.
A
T
* Os autores agradecem o apoio na revisão de Zé Lobo, Pedro Rivera,
Thiago Benicchio e Rafael Siqueira.
* The authors would like to thank Zé Lobo, Pedro Rivera, Thiago Benicchio
and Rafael Siqueira for their help with the revision of this article.
bicicleta é um dos meios de transporte
mais eicientes já inventados: com tecnologia apropriada para distâncias curtas,
baixo custo operacional e sem emissão de
poluentes, contribui para fazer da cidade um
espaço livre de congestionamentos. Com a
bicicleta, amplia-se o acesso de diversas camadas sociais às oportunidades de trabalho
e educação, lazer, equipamentos públicos e
serviços existentes nas cidades. A bicicleta
ainda traz benefícios à saúde, diminuindo a
incidência de doenças relacionadas ao sedentarismo e ajudando a melhorar as condições
gerais de vida da população.
Nas últimas décadas, a bicicleta deixou de
ser um símbolo apenas de cidades europeias,
como Amsterdã e Copenhage, e passou a conigurar no conjunto de políticas públicas urbanas em diversas cidades do mundo, desde
Berlim, Paris e Nova York até Guangzhou, na
China. Na América Latina, Cidade do México,
Bogotá e Buenos Aires são exemplos de cidades que vêm passando por profundas transformações urbanas, nas quais a bicicleta se
encontra presente. No Brasil, a discussão em
torno das políticas cicloviárias como parte do
mosaico da mobilidade urbana tomou força
nos últimos dez anos, com o envolvimento
incisivo da sociedade civil. São Paulo, Belo
Horizonte, Fortaleza e Brasília são exemplos
de cidades de grande porte que, aos poucos,
he bicycle is one of the most eficient
means of transportation ever invented: providing an ideal technology for short
distances, with low operating costs and no
polluting emissions, in addition to helping
to reduce urban trafic. The bicycle offers
diverse social classes access that extends
the range of opportunities for employment,
education, leisure, public services and resources offered by the city. The bicycle also
provides health beneits, reducing the frequency of diseases related to sedentary lifestyles, while helping to improve the general
quality of life of the population.
In recent decades, the bicycle has ceased
to be just a symbol of European cities, such
as Amsterdam and Copenhagen, and has
become part of the urban public policies in
cities around the world, from Berlin, Paris
and New York to Guangzhou, China. In Latin America, Mexico City, Bogota and Buenos
Aires are examples of cities that have been
undergoing profound urban transformations, where the bicycle now plays an important role. In Brazil, discussions on bike
path policies as part of the mosaic of urban
mobility have gained importance over the
last ten years, with the incisive involvement
of civil society. São Paulo, Belo Horizonte, Fortaleza, and Brasilia are examples of
large cities that are gradually expanding
cadernos fgv projetos
227
conseguem expandir suas redes, mas o avanço também é observado em cidades menores
como Sorocaba e Rio Branco.
Em dezembro de 2016, a cidade do Rio
de Janeiro contabilizava 457,58 km de rede
cicloviária, colocando-a entre as cidades
da América Latina que possuem maior extensão de rede. A expansão e qualificação
desta rede tem sido objeto de engajamento,
diálogo, disputa e negociação entre diversos atores interessados em ampliar a mobilidade no território carioca. Este artigo visa
apresentar o Ciclo Rotas Centro, projeto de
33 de rede cicloinclusiva para o centro da
cidade do Rio de Janeiro, desenhado por
meio de metodologia participativa, com
liderança da Transporte Ativo, Instituto
de Políticas de Transportes e Desenvolvimento (ITDP Brasil) e Studio-X Rio, três
organizações da sociedade civil com protagonismo no Rio de Janeiro. Cinco anos
após a finalização da proposta e aprovação
pelo então prefeito Eduardo Paes (20092017), pouco do Ciclo Rotas foi executado.
No entanto, o projeto continua na pauta da
cidade, e mantém seu papel de referência
no que tange a seus princípios norteadores
de participação e engajamento ativista na
formulação de políticas públicas urbanas.
their cycling networks, but progress in this
respect can also be found in smaller cities
such as Sorocaba and Rio Branco.
In December 2016, the city of Rio de Janeiro had a total network of 457.58 kilometers of
bike paths, earning it a place among the top
cities in Latin America with the largest bike
path networks. The expansion and improvement of this network has been the subject of
engagement, dialogue, dispute and negotiation among a number of stakeholders interested in expanding mobility in the urban region of Rio de Janeiro. This paper discusses
the Ciclo Rotas Centro bike path network, a
33-kilometer bicycle-inclusive network project for the city center of Rio de Janeiro, designed using a participative methodology,
under the leadership of Transporte Ativo, the
Institute of Transportation and Development
Policies (ITDP Brazil) and Studio-X Rio, three
civil society organizations with active roles
in Rio de Janeiro. Five years after completing the proposal and its approval by the then
Mayor, Eduardo Paes (2009-2017), very little of the Ciclo Rotas bike path network has
been implemented. However, the project remains on the city’s agenda and continues to
be a reference due to its guiding principles for
participation and citizen engagement in the
formulation of urban public policies.
artigo
article
228
MOBILIDADE URBANA
SUSTENTÁVEL E O FUTURO
DAS CIDADES
SUSTAINABLE URBAN
MOBILITY AND THE FUTURE
OF CITIES
Viver em cidades parece ser uma das opções
mais promissoras deste século. Não é à toa
que mais de 84% dos brasileiros vive em centros urbanos.1 Escolhemos morar em cidades, pois é onde temos mais acesso às oportunidades econômicas, sociais, culturais e de
participação. A percepção é que nas cidades
alcançamos ganho de escala: estamos mais
expostos a interações, ideias, oportunidades,
temos uma gama maior de chances de alçar
voo e realizar sonhos. Mas o futuro das cidades depende intrinsecamente de sistemas
de mobilidade urbana que contribuam com o
desenvolvimento ambiental, social e econômico de nossas sociedades. Os custos e externalidades gerados pelos sistemas de mobilidade são, por um lado, um dos propulsores
da desigualdade territorial e segregação socioespacial presente em nossa sociedade. Por
outro, se equilibrados e planejados de forma
adequada, podem ser o motor de desenvolvimento que resulta em avanços signiicativos
para a agenda urbana sustentável.
Uma análise recente desenvolvida pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente2 indica que
automóveis particulares são responsáveis por
72,6% das emissões de gases de efeito estufa
do setor de transportes, apesar de transportarem somente 30% dos passageiros diariamente. Valores semelhantes ocorrem para outros
gases poluentes locais, que fazem mal à saúde. Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 1,7 milhão de mortes de crianças
no mundo são causadas pela poluição urbana
anualmente.3 As colisões no trânsito também
Living in cities seems to be one of the most
promising options for this century. It is
therefore no wonder that more than 84% of
Brazilians live in urban centers.1 We choose
to live in cities because they offer the greatest access to economic, social, cultural and
participation opportunities. The perception
is that we have seen an increase in scale in
cities: we are more exposed to interactions,
ideas and opportunities; we have a greater
array of chances to grow and fulill dreams.
But the future of cities depends intrinsically
on urban mobility systems that contribute
to the environmental, social and economic
development of our societies. The costs and
external consequences generated by mobility systems are, on the one hand, one of the
drivers of the regional inequality and socio-spatial segregation we ind in our society. On the other hand, if properly balanced
and planned, they can be the engine of development that results in signiicant advances
for a sustainable urban agenda.
A recent study by the Energy and Environment Institute2 shows that private cars
account for 72.6% of greenhouse gas emissions from the transport sector, despite
transporting only 30% of total passengers
daily. Similar values apply to other local
pollutants, which are harmful to health.
According to the World Health Organization, about 1.7 million children die worldwide every year as a result of urban pollution.3 Trafic accidents also contribute to
this alarming scenario of imbalance in the
1
IBGE, 2010.
1 IBGE, 2010.
2
IEMA, 2017.
2
3
OMS, 2017.
3 OMS, 2017.
IEMA, 2017.
cadernos fgv projetos
229
contribuem para esse cenário de desequilíbrio
no impacto do sistema atual de mobilidade
urbana na população. Segundo o Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada,4 o custo dos
acidentes no viário é de R$ 50 bilhões ao ano.
Em 2012, estudo realizado pela Associação
Nacional de Transportes Públicos (ANTP) indicava que nas cidades brasileiras de mais de
60 mil habitantes, 40% de todos os deslocamentos são realizados por transportes ativos:
a pé ou por bicicleta. No entanto, com o crescente aumento do número de carros nas ruas,
a disputa pelo espaço público está icando
cada vez mais acirrada, e o carro é que tem saído vencedor deste embate: uma pessoa sozinha em seu veículo ocupa 15 vezes mais espaço do que um passageiro de ônibus ou ciclista
e 75 vezes mais espaço do que um pedestre.5 O
modo como usamos o carro é uma das formas
mais radicais de privatização do espaço público que cada um de nós faz diariamente.
4
Ipea, 2015.
5
ITDP, 2015.
impacts of the current system of urban mobility on the population. According to the
Institute of Applied Economic Research,4
the cost of car accidents is R$50 billion per
year.
In 2012, a study carried out by the National Association of Public Transport
(ANTP) revealed that in Brazilian cities with
more than 60 thousand inhabitants, 40% of
all transportation is carried out by active
transportation: on foot or by bicycle. However, with the increasing number of cars on
the streets, the ight for public space is getting more and more ierce, and the car has
been the clear winner in this dispute: a single individual in a vehicle occupies 15 times
more space than a bus or bicycle passenger,
and 75 times more space than a pedestrian.5 The way we use cars is one of the most
4
Ipea, 2015.
5
ITDP, 2015.
artigo
article
230
“
Por meio
do sistema de
mobilidade urbana,
nossa sociedade
assegura a
segregação social
no território,
cerceando acesso
de grande parte
da população às
oportunidades que
a cidade oferece.
”
Em junho de 2013, a sociedade brasileira
presenciou uma onda de protestos sem igual,
e que tiveram como estopim o aumento das
tarifas do transporte público. Para além dos
20 centavos, o que a população demandava,
naquela ocasião, era a garantia do acesso das
pessoas à cidade. O custo e a qualidade dos
serviços de transporte, nesse sentido, são percebidos como restritivos à mobilidade da população e, nessa perspectiva, sintomáticos da
restrição mais ampla de acesso à cidade. Por
meio do sistema de mobilidade urbana, nossa
sociedade assegura a segregação social no território, cerceando acesso de grande parte da população às oportunidades que a cidade oferece.
Argumentos para a promoção dos modos
de deslocamento sustentáveis não faltam, mas
nem sempre essa percepção foi tão clara para
arquitetos, urbanistas, engenheiros e planejadores urbanos. Durante as últimas seis décadas, no pós-guerra, o desenvolvimento das
cidades ocorreu com um foco bem especíico:
garantir a prioridade ao transporte individual
motorizado, com o objetivo de se produzir cidades máquinas, segundo os preceitos modernistas, onde os luxos são pensados de maneira
a garantir eiciência e rapidez. Com grandes investimentos para ampliação da capacidade viária, duplicando vias, construindo túneis, vias
expressas e mergulhões, optamos por fazer das
cidades lugares menos gentis ao lâneur de
Baudelaire, menos passíveis aos encontros e
às trocas na rua. Ao mesmo tempo, investimos
cada vez menos nos transportes públicos, deixando com que a mobilidade exclusivamente a
pé, por bicicleta ou por transporte coletivo se
tornasse um “mal necessário” para as pessoas
que não possuem seu automóvel próprio.
A rua tornou-se espaço de passagem, conexão entre duas vagas de estacionamentos. O
aumento da infraestrutura para automóveis
leva, consequentemente, a um aumento in-
cadernos fgv projetos
231
radical forms of the privatization of public
space, something that each of us does daily.
In June of 2013, Brazil witnessed an unprecedented wave of protests, triggered by
an increase in public transportation fares.
At that time, apart from the 20 centavos increase in fares, the population demanded the
guarantee of access to the city for the population. In this sense, the cost and quality
of transportation services are perceived as
restrictive to the mobility of the population
and, by extension, symptomatic of a broader
restriction to access to the city. Our society
suffers social segregation in the urban area
via our urban mobility system, denying a
large part of the population access to the opportunities that cities offer.
Arguments for the adoption of sustainable means of transportation are not lacking, but this insight has not always been so
clear to architects, urbanists, engineers,
and urban planners. Over the last six decades in the postwar period, the development of cities has occurred with a very
speciic focus: to give priority to individual
motorized transportation, with the objective of producing machine cities, according to modernist precepts, where the low
is conceived to ensure eficiency and speed.
With large investments to expand road capacity, duplicating roads, building tunnels,
expressways and underpasses, we chose to
make our cities less hospitable to Baudelaire’s lâneur, less amenable to encounters and exchanges on the street. At the
same time, we are investing less and less in
public transportation, turning mobility on
foot, bicycle or public transportation into a
“necessary evil” for people who do not own
their own car.
The street has become an artery, connecting two parking spaces. The increase
“
Our society
suffers social
segregation in the
urban area via our
urban mobility
system, denying
a large part of
the population
access to the
opportunities that
cities offer.
”
artigo
article
232
duzido de demanda. Além disso, nas últimas
décadas, as políticas nacionais econômicas
e de desoneração tributária incentivaram a
compra de carros pelo mercado interno. Entre 2001 e 2011, a taxa de motorização nas
doze regiões metropolitanas brasileiras cresceu em mais de 8,9 milhões de automóveis
- 77,8% em uma década.6 Em média, foram
adicionados mais de 890 mil veículos por ano
nas cidades. Assim como maior infraestrutura resulta em maior uso, aumento da propriedade também resulta em mais carros circulando nas ruas. Como resultado, as cidades
brasileiras se transformaram em sinônimo de
trânsito intenso, conturbado e violento. Cidades hostis, com pouco espaço para o pedestre
e o ciclista, e onde o transporte público perde
passageiro de forma contínua.
A cidade moldada para ser vista de dentro
de um veículo a 70 km por hora também é
pensada para proteger a propriedade privada. Esse modelo de cidade criou um cenário
alarmante: além de congestionadas, com baixa qualidade no serviço de transporte público,
com altos índices de poluentes locais e fatalidades no trânsito, as cidades se tornaram sinônimo de insegurança e medo. Segundo o sociólogo Zygmunt Bauman,
in infrastructure for cars, therefore, leads to
an increase induced by demand. In addition,
in the last decades, national economic policies
and tax exemptions have encouraged the purchase of cars in the domestic market. Between
2001 and 2011, the rate of motorization in the
twelve largest Brazilian metropolitan regions
grew by more than 8.9 million cars - 77.8% in
a decade.6 On average, more than 890,000
new vehicles were being added annually to
cities. As more infrastructure results in increased usage, an increase in property also
results in more cars circulating on the streets.
As a result, Brazilian cities have become synonymous with intense, turbulent and violent
trafic. Cities have become hostile, with little
space for pedestrians and cyclists, and where
public transportation is continuously losing
passengers.
A city designed to be seen from within a
vehicle at 70 kilometers per hour is also conceived to protect private property. This model of cities has created an alarming scenario:
in addition to the trafic, poor quality public
transportation services, high rates of local
pollutants and trafic fatalities, cities have become synonymous with a lack of security and
fear. According to the sociologist Zygmunt
Bauman:
“A insegurança alimenta o medo: não há
6
novidade, portanto, no fato de que a guer-
“Insecurity fuels fear: there is no novelty,
ra à insegurança tenha grande destaque na
therefore, in the fact that the war on insecu-
lista das prioridades dos planejadores ur-
rity is high on the list of priorities of urban
banos. Eles acreditam - e, quando pergun-
planners. They believe - and when asked,
tados, reairmam isso - que deveria ser as-
reafirm - that it should be so. The problem,
sim mesmo. O problema, porém, é que, com
however, is that with insecurity, things like
a insegurança, estão destinadas a desapa-
spontaneity, the lexibility and capacity to
recer das ruas da cidade a espontaneidade,
be surprised and the chance for adventure,
a lexibilidade, a capacidade de surpreen-
in short all the attractions of urban life, are
der e a oferta de aventura, em suma, todos
destined to disappear from the streets of the
os atrativos da vida urbana”. (p. 68, 2005)
city.” (p.68, 2005)
Observatório das Metrópoles, 2012.
6 Observatório das Metrópoles, 2012.
cadernos fgv projetos
233
Esse modelo de desenvolvimento adotado
nas cidades no pós-guerra vem sendo há bastante tempo questionado por autores como
Jane Jacobs7 e Jan Gehl,8 que buscam valorizar em seus estudos a produção de cidades
que respeitem a escala humana. As cidades
mais prósperas e com melhor qualidade de
vida são aquelas que limitam o espaço para
o carro, que estimulam a interação entre as
pessoas, e que buscam um equilíbrio territorial entre pessoas e oportunidades.
Nesse contexto, a bicicleta possui um papel
de protagonismo no mosaico de mobilidade
urbana das cidades do futuro. Uma pessoa
pedalando viaja duas vezes mais rápido, carrega quatro vezes mais carga e cobre três vezes a distância percorrida por uma pessoa caminhando. A implantação de infraestrutura
cicloviária é uma alternativa simples, econômica e eiciente para deslocamentos curtos,
entre 5 e 10 km. Nesse percurso, a bicicleta é
um meio tão rápido quanto o automóvel.
This model of development adopted by cities in the post-war period has long been questioned by authors such as Jane Jacobs7 and
Jan Gehl,8 who in their studies seek to value the
creation of cities that respect the human scale.
The most prosperous cities with the best quality of life are those that limit space for cars, that
stimulate interaction between people, and that
seek a territorial balance between people and
opportunities.
In this context, the bicycle has an important
and active role to play in the mosaic of urban
mobility in the cities of the future. A cyclist
travels twice as fast, carries four times more
cargo and covers three times the distance
traveled by a person on foot. The implementation of cycling infrastructure is a simple, economical and eficient alternative for short
journeys of between 5 and 10 kilometers. For
journeys in this range, a bicycle is as fast as
a car.
7
1961
7
1961
8
2010
8
2010
Figura 1 Tempo de deslocamento por modal (IEMA, 2010)
Figure 1 Travel time per means of transportation (IEMA, 2010)
Tempo (minutos) Time (minutes)
35
30
25
20
15
10
5
0
1
2
3
4
5
6
Distância percorrida (km) Distance traveled (km)
7
8
artigo
article
234
Cidades que buscam um modelo de desenvolvimento urbano mais humano e sustentável devem priorizar uma rede densa e bem
distribuída de infraestruturas cicloviária, que
propiciem conveniência, conectividade, segurança e conforto para o ciclista.
Cities seeking a more human and sustainable urban development model should prioritize a dense and well-distributed network
of cycling infrastructure that provides convenience, connectivity, safety and comfort
for cyclists.
MARCO REGULATÓRIO DA
MOBILIDADE URBANA
REGULATORY FRAMEWORK FOR
URBAN MOBILITY
Um importante marco para a promoção da
mobilidade urbana sustentável foi a promulgação da Política Nacional de Mobilidade Urbana. Após 17 anos sendo discutida dentro e
fora do Congresso Federal, foi aprovada a lei
n° 12.587/2012, que deine os conceitos de
transporte urbano, mobilidade, acessibilidade, modos motorizados e não motorizados9
(a pé e bicicleta), públicos, privados, individuais, coletivos e de carga a serem seguidos
pelas cidades brasileiras. Dentre as suas principais diretrizes, consta no art. 6º, deinindo
a “prioridade dos modos de transportes não
motorizados sobre os motorizados e dos serviços de transporte público coletivo sobre o
transporte individual motorizado”, invertendo assim a primazia do automóvel no planejamento urbano.
Na lei, os Planos Municipais de Mobilidade Urbana são o principal instrumento de
gestão e precisam ser elaborados por todos
os municípios com mais de 20 mil habitantes, integrando uso de solo e planejamento
de transporte. Após a deinição desse instrumento legal que resguarda e destaca a
importância de uma política de mobilidade
urbana sustentável, um desaio, dentre muitos, é o desenvolvimento de políticas locais
An important milestone in the promotion of
sustainable urban mobility was the creation
of the National Policy on Urban Mobility.
After 17 years of debate within and outside
of the Federal Congress, Law 12.587/2012
was approved, which deines the concepts
of urban transportation, mobility, accessibility, motorized and non-motorized means
of transportation9 (foot and bicycle), public, private, individual, collective and for
cargo, to be followed in Brazilian cities.
Among its main guidelines, Art. 6 deines
the “priority of non-motorized means of
transportation over motorized and collective public transportation services and
over individual motorized transport,” thus
reversing the primacy of the automobile in
urban planning.
Under the law, Municipal Urban Mobility Plans become the main management tool
and need to be elaborated by all municipalities with more than 20,000 inhabitants,
integrating land use and transportation
planning. Following the creation of this legal instrument that deines and emphasizes
the importance of a sustainable urban mobility policy, a challenge, among many others, is the development of local policies that
9
O termo Transportes Não Motorizados é utilizado na legislação.
No entanto, neste artigo, utilizaremos apenas transportes ativos como
referência à mobilidade a pé, de bicicleta e demais modos a propulsão
humana.
9 The term Non-Motorized Transportation is used in legislation.
However, in this article, we use the term active transportation to refer to
mobility on foot, bicycle and other modes of human propulsion.
cadernos fgv projetos
235
Figura 2 Inversão na pirâmide de prioridades segundo a Política Nacional da
Mobilidade Urbana (ITDP, 2015)
Figure 2 Inversion of the priority pyramid according to the National Policy on
Urban Mobility (ITDP, 2015)
que contemple integralmente a ciclomobilidade e a mobilidade a pé. Para isso, não
basta importar o modelo de outras cidades:
é fundamental o desenho de iniciativas que
contemplem as demandas e realidades locais, tais como traçados urbanos, usos da
via, práticas sociais, gestão institucional e
aspectos naturais como clima, topograia ou
barreiras hídricas.
Os planos são obrigatórios, e devem ser
participativos. Como parte do Plano Diretor,
se aplicam as penalidades no caso de ausência
de mecanismos de participação, ou parcialidade dos mesmos, seguindo os parâmetros
do art. n° 42 da lei nº 10.257/2001 (Estatuto
das Cidades). Do mesmo modo, se aplicam os
instrumentos participativos de gestão democrática da cidade descritos no art. n° 43, que
prevê a iniciativa popular de projeto de lei e
de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano.
fully include cycling and mobility on foot.
To achieve this, it is not enough to simply
import models from other cities: it is fundamental that the design of initiatives takes
into consideration local demands and realities, such as urban spaces, road uses, social
practices, institutional management and
natural aspects such as climate, topography
and waterways.
These plans are mandatory, and must be
participatory. As part of the Comprehensive
Municipal Plan, penalties are levied in cases
of an absence of participation mechanisms
or biases, in compliance with the parameters of Art. 42 of Law 10.257/2001 (Statute
of Cities). In the same way, the participatory instruments of democratic management
of the city described in Art. 43 are applied,
which provides for a public initiative for
laws and plans and urban development
campaigns and projects.
artigo
article
236
A BICICLETA NO RIO DE JANEIRO
BICYCLES IN RIO DE JANEIRO
Viagens diárias
Daily trips
A bicicleta ganhou importância e passou a
estar mais presente no cenário carioca nas
últimas três décadas. Nas pesquisas de origem-destino realizadas em 1994 e 2004, o
percentual de pessoas que utilizam a bicicleta
como meio de transporte principal em seus
deslocamentos diários (trajeto casa-trabalho) dobrou. Como observado na Tabela 1, o
número de viagens por dia passou de 169.459
(1,28%) para 645.510 (3,24%). Dados de
2012 mostram aumento signiicativo nos
transportes individuais motorizados, assim
como aumento no transporte coletivo. Mobilidade a pé e por bicicleta, no entanto, sofreram quedas.
Apesar do aumento signiicativo, esse número não chega a representar a realidade.
A experiência internacional comprova que
o número real é geralmente de quatro a seis
vezes maior,10 dado que pesquisas de origem
e destino contabilizam apenas “o principal
modo utilizado” e não incluem as integrações
com outros modais. Tampouco contabilizam
viagens curtas feitas dentro dos bairros com
inalidades outras que não trabalho.
The bicycle has gained importance and has
become increasingly present in Rio over the
last three decades. In the origin/destination
travel surveys conducted in 1994 and 2004,
the percentage of people who use a bicycle
as their main means of transportation in
their daily commutes (home-work trajectory) has doubled. As seen in Table 1, the
number of trips per day went from 169,459
(1.28%) to 645,510 (3.24%). Data for 2012
shows a signiicant increase in individual
motorized transportation, as well as an increase in public transportation. Mobility on
foot and bicycle, however, suffered a relative decline.
Despite the signiicant increase, this number does not relect reality. International
experience shows that the actual number
is generally four to six times higher,10 since
origin/destination surveys only take into
account the “the main means of transportation used” and do not include combinations
with other means. Neither do they account
for short trips made within neighborhoods
for purposes other than work.
Infraestrutura
Infrastructure
Os primeiros 27 km de ciclovias na cidade do
Rio de Janeiro foram construídos na orla da
cidade durante os preparativos para a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
The irst 27 kilometers of bike paths in the city
of Rio de Janeiro were built along the waterfront of the city during the preparations for
the United Nations Conference on Environ-
10 Estimativa ampliada para total de bicicletas em uso incluídas todas
as viagens.
10 Estimate expanded for the total of bikes in use, including all trips.
cadernos fgv projetos
237
Tabela 1 Número de viagens por modo
Table 1 Number of trips per means of transportation
Modo
Nº de Viagens (%)
Means of transportation
Number of trips (%)
1994
2004
2012
Coletivo
Collective
Metrô
Subway
300.988 (2,3%)
355.404 (1,8%)
665.000 (2,9%)
Trem
Train
412.140 (3,1%)
303.578 (1,5%)
568.000 (2,5%)
Barcas
Boat
89.942 (0,7%)
82.091 (0,4%)
105.000 (0,5%)
Ônibus
Bus
8.043.786 (61,2%)
6.583.742 (33,1%)
8.538.000 (37,8%)
Vans
Van
-
1.630.895 (8,2%)
658.000 (2,9%)
3.108.743 (15,6%)
4.713.000 (20.8%)
Individual Motorizado
Individual motorized transportation
Automóveis e Táxis
Cars and Taxis
1.514.421 (11,5%)
Individual Não Motorizado
Individual non-motorized transportation
Bicicleta
Bicycle
169.459 (1,3%)
645.510 (3,2%)
546.000 (2,4%)
A Pé
On foot
2.594.178 (19,7%)
6.740.688 (33,9%)
6.634.000 (29,4%)
Outros
Other
67.805 (0,4%)
462.210 (2,3%)
169.000 (0,75%)
Total
13.182.719 (100%)
19.915.954 (100%)
22.594.000 (100%)
Dados 1994: Processo de Estruturação dos Transportes na RMRJ – PTM
Dados 2004 e 2012: Plano Diretor de Transporte Urbano (PDTU) da Região Metropolitana do Rio de Janeiro
Data from 1994: RMRJ - PTM Transport Structuring Process
Data from 2004 and 2012: Comprehensive Plan for Urban Transportation (PDTU) for the Metropolitan Region of
Rio de Janeiro
artigo
article
238
Ambiente e Desenvolvimento - Rio-92.11 Em
2010, a cidade do Rio de Janeiro contava com
150 km de malha cicloviária. Em 2012, dentro do programa “Rio, Capital da Bicicleta”,
este número dobrou e a cidade passou a contar com aproximadamente 300 km de rede.
Na gestão do prefeito Eduardo Paes, a partir
de 2009, foi dada ênfase para construção de
infraestruturas nas Zonas Norte e Oeste em
detrimento da Zona Sul.
A região central da cidade, no entanto, jamais teve infraestrutura dedicada, apesar de
já ter sido objeto de estudos em diversos mo11 Binatti, 2016.
ment and Development - Rio-92.11 In 2010,
the city of Rio de Janeiro had 150 kilometers
of bike paths. In 2012, with the “Rio, Capital
da Bicicleta” campaign, this number doubled,
and the city’s network is now made up of approximately 300 kilometers of bike paths. In
Mayor Eduardo Paes’ administration, from
2009 onwards emphasis was given to building the infrastructure in the North and West
Zones, to the detriment of the South Zone.
The central region of the city, however, has
never had a dedicated cycling infrastructure,
although it has been studied at various points in
11
Binatti, 2016.
Gráico 1 Construção de infraestrutura cicloviária por região da cidade entre
1991 e 2012 (Binatti, 2012)
Graph 1 Construction of cycling infrastructure per city region between 1991 and
2012 (Binatti, 2012)
80
70
60
KM
50
40
30
20
10
0
2
99
1/1
9
19
96
94
/19
/19
1
3
99
5
99
1
98
00
/19
1
7
99
/20
1
9
99
2
06
04
00
1/2
0
20
/20
3
00
2
2
10
08
/20
5
00
/20
2
7
00
/20
2
9
00
2
01
1/2
1
20
ANO/ YEAR
Zona Sul
Zona Oeste
Zona Norte
cadernos fgv projetos
239
mentos. Desde os anos 1990, cinco redes foram propostas por diferentes administrações
públicas, seja para circulação interna no centro, seja para conexões às Zonas Norte e Sul:
1. Conexão MAM-Praça Mauá
time. Since the 1990s, ive networks have been
proposed by different public administrations,
either for internal circulation in the center, or
for connections to the North and South Zones:
1. Connection MAM-Praça Mauá
2. Rede Pedala Rio, desenvolvida pelo Instituto Pereira Passos
3. Corredor Saens Peña-Praça XV, desenvolvido pelo Governo do Estado (Setrans),
com o ITDP como parceiro
4. Rede proposta para o sistema Bike Rio,
desenvolvida pela Transporte Ativo
5. Ciclovia proposta para o projeto Rio
Branco corredor verde
2. Pedala Rio network, developed by the
Instituto Pereira Passos
3. Saens Peña-Praça XV corridor, developed by the State Government (Setrans),
with ITDP as a partner
4. Network proposed for the Bike Rio system, developed by Transporte Ativo
5. Bike path proposed for the Rio Branco
green corridor project
Nenhuma dessas propostas foi levada
adiante pela administração pública. Em
2009, o projeto do Porto Maravilha deu novo
impulso ao debate. À semelhança de diversas
cidades do mundo, uma das iniciativas emblemáticas encampadas pelo prefeito Eduardo Paes foi a recuperação da infraestrutura
urbana, dos transportes, do meio ambiente
e dos patrimônios histórico e cultural da Região Portuária, com o Porto Maravilha. Esta
foi a maior operação urbana da América Latina, numa área de cinco milhões de metros
quadrados, no valor de cinco bilhões de dólares investidos ao longo de seis anos, e expectativa de mais de 25 bilhões de investimento
privado ao longo de três décadas. Dentre as
obras planejadas, as de mobilidade urbana tinham especial destaque, incluindo implantação de Veículo Leve sobre os Trilhos (VLT) e
do Teleférico da Providência, conexão com o
Bus Rapid Transit (BRT) da Transbrasil, demolição da Perimetral e requaliicação de 3,5
km de passeio público. A bicicleta também foi
incorporada no projeto, com uma malha de
17 km de vias cicláveis.
Not one of these proposals has been acted
on by the public administration. In 2009, the
Porto Maravilha project provided new impetus to the debate. Like many cities around
the world, one of the emblematic initiatives
sponsored by Mayor Eduardo Paes was the
development of the urban infrastructure,
transportation, environment and the historical and cultural heritage of the Port area,
with the Porto Maravilha project. This was
the largest urban infrastructure development plan in Latin America, involving an
area of ive million square meters, with ive
billion dollars invested over a period of six
years, and an expected 25 billion from private investment over three decades. Among
the planned projects, urban mobility was
especially highlighted, including the implementation of a Light Rail Vehicle (LRV) and
the Providencia Cable Car, the connection
with Transbrasil’s Bus Rapid Transit (BRT),
the demolition of the Perimetral overpass
and restoration of the 3.5 kilometers of public walkways. Bicycles were also incorporated
into the project, with a network of 17 kilometers
of bike paths.
artigo
article
240
Figura 3 Mapa esquemático da rede cicloviária na Zona Sul, Zona Norte e Região Portuária do Rio de Janeiro em 2012
Figure 3 Schematic map of the bike path network in the South Zone, North Zone
and Port area of Rio de Janeiro in 2012
PORTO
PORT
CENTRO
CENTER
ZONA SUL
SOUTH ZONE
LAGOA
LAGOON
Em face às redes existentes – ainda que
deicitárias – das Zonas Norte e Sul, e a rede
proposta para o Porto, icou claro que o centro do Rio continuaria sendo a única das regiões da cidade não contemplada por uma
malha cicloviária. Seria, portanto, um obstáculo para a circulação interna do centro, e
um limitador nas conexões com outras malhas adjacentes.
Nesse contexto surgiu o projeto Ciclo Rotas
Centro, cujos objetivos especíicos consistiram em: (i) explorar a potencialidade da bicicleta no centro da cidade, considerando seus
desaios e suas oportunidades, e (ii) construir
coletivamente uma iniciativa popular de projeto de desenvolvimento urbano com foco na
rede cicloviária para região, conectando-a ao
restante da cidade e contribuindo para a visão de mobilidade urbana para a cidade do
Rio de Janeiro.
In view of the existing networks – albeit
insuficient - of the North and South Zones
and the proposed network for the Port, it
became clear that the center of Rio would
remain the only region of the city not being
considered for a bike path network. It would
therefore be an obstacle to the internal circulation of the center, and limit connections
with other nearby networks.
Within this context, the Ciclo Rotas Centro project was created, whose speciic objectives were: (i) to explore the potential of
the bicycle in the city center by analyzing
the challenges and opportunities; and (ii)
to collectively create a popular urban development project initiative with a focus on
a bike path network for the region that connects it to the rest of the city, and contributing to the urban mobility vision for the city
of Rio de Janeiro.
cadernos fgv projetos
241
CICLO ROTAS CENTRO
CICLO ROTAS CENTRO
O projeto Ciclo Rotas Centro foi desenvolvido durante seis meses em parceria entre a
Transporte Ativo, o ITDP Brasil e o Studio-X
Rio, e contou com a participação de representantes da sociedade civil, urbanistas, arquitetos e interessados na temática. Representantes do setor público também participaram.
Entre julho e dezembro de 2012, uma série
de atividades foram realizadas, incluindo:
• Reuniões abertas para desenvolver o
conceito do projeto, revisão das propostas
para a área desde os anos 90, deinição de
prioridades;
• Oicinas in loco e coleta de dados online para mapeamento de demanda;
• Contagens de ciclistas em pontos
estratégicos da área de abrangência do
projeto, para conirmar a demanda e veriicar particularidades e desaios dos usuários atuais;
• Medições e coleta de dados em todas as ruas da rede sugerida para avaliação das possíveis alternativas de implantação;
• Discussões com a administração pública sobre potencial de implantação; e
• Discussões com todos os envolvidos
para validação da proposta.
O princípio norteador do projeto Ciclo
Rotas Centro era a ampliação e o aprofundamento do diálogo entre governantes e a sociedade, entendendo que a discussão informada
na arena pública se faz central para repactuação de uma nova forma de se viver na cidade.
Para isso, era imprescindível quebrar paradigmas e o status quo que orienta o desenvolvimento de nossas cidades, onde nos acostumamos a uma cultura tecnicista na qual
somente o engenheiro ou arquiteto são considerados aptos a discutir, propor e produzir ci-
The Ciclo Rotas Centro project was developed
over six months in a partnership between
Transporte Ativo, ITDP Brasil and Studio-X
Rio, and involved the participation of representatives of civil society, urban planners,
architects and others interested in the project.
Public sector representatives also participated.
Between July and December of 2012, a number
of activities were carried out, including:
• Open meetings to develop the concept of the project, review the proposals
for the area since the 1990s, and deine
priorities;
• On-site workshops and online data
collection for mapping the demands;
• Counting the number of cyclists at
strategic points in the area covered by the
project in order to conirm the demand
and verify the particularities and challenges of the current users;
• Measurements and data collection
for all the paths in the proposed network
to evaluate possible alternatives for implementation;
• Discussions with the public administration about implementation potential; and
• Discussions with all the stakeholders to validate the proposal.
The guiding principle of the Ciclo Rotas
Centro project was the expansion and deepening of the dialogue between government
oficials and society whilst understanding
that informed discussion in the public arena
is central to negotiating a new way of living
in the city. In order to achieve this, it was essential to break the paradigms and the status quo that guides the development of our
cities, where we have become accustomed
to a technicist culture in which only an engineer or architect is considered qualiied to
artigo
article
242
dade. São, assim, considerados os detentores do
monopólio sobre relexão e os únicos capazes
de fazer proposições. Christopher Alexander12
enfatizou o efeito dessa prática no envolvimento
da população com a produção da cidade:
“A maioria das pessoas se acha incompe-
discuss, propose and produce cities. In this
way, they are considered to have a monopoly over relection and as the only ones capable of making proposals. Christopher Alexander12 emphasized the effect this practice
has on the population’s involvement in the
production of the city:
tente para projetar qualquer coisa e acredita que somente os arquitetos e planejadores
“Most people believe themselves to be in-
poderiam fazer da maneira correta. Este
competent to design anything and believe
entendimento foi tão longe que a maioria
only architects and planners can do it the
das pessoas se afasta, com medo, da tarefa
right way. This understanding has gone so
de projetar seu entorno”. (1979:232)
far that most people, due to fear, shy away
from the task of designing their environ-
Com o Ciclo Rotas Centro, no entanto,
essa premissa foi questionada, partindo-se
do pressuposto de que era fundamental capacitar e equipar diferentes atores da sociedade civil – organizada ou não – para
que se tornem protagonistas e ativistas no
fazer a cidade. Dessa forma, a conexão do
usuário da cidade deve estar para além das
informações utilizadas por engenheiros e
arquitetos, influenciando diretamente o
ato de desenhar e construir:
ment.” (1979: 232)
With the Ciclo Rotas Centro project, however, this premise was questioned by starting
with the assumption that it is fundamental to
train and equip different stakeholders from
civil society - organized or not - to become
key players and activists in making the city.
In this way, the user of the city’s relationship
must go beyond the information used by engineers and architects, and directly inluence
the act of designing and constructing:
“Ou as pessoas constroem por si próprias,
com as próprias mãos, ou falam direta-
“People either build on their own, with
mente com os artesãos que constroem para
their own hands, or they speak directly
eles, mas neste caso com quase o mesmo
with the craftsmen that build for them.
grau de controle sobre os pequenos deta-
However in this case, with almost the same
lhes do que será construído. [...] Cada pes-
degree of control over the small details of
soa em uma cidade sabe que seus pequenos
what will be built, [...] each person in a city
atos ajudam a criar e manter o todo. Cada
knows that their small acts help to create
pessoa se sente portanto ligada na socieda-
and maintain it as a whole. Therefore each
de, orgulhosa”. (Alexander, 1979:231)
person feels linked to society and is proud.”
(Alexander, 1979: 231)
Nessa perspectiva, entendemos que empoderar a população significa trazê-la para
o debate sobre a cidade desejada, não somente no campo teórico ou da narrativa,
mas também nas fases de mapeamento
In this perspective, we believe that empowering the population means including
the public in the debate about our desired
city, not only in the theoretical or narrative,
12 Um arquiteto e matemático dos anos 1960.
12
An Architect and Mathematician of the 1960s.
cadernos fgv projetos
243
de diagnósticos, coleta de dados, desenho
e negociação com o poder público. Desse
modo, a importância do projeto Ciclo Rotas Centro se dá pela sua natureza intrinsecamente ativista e de inclusão de detalhes
importantes para a população no processo
de planejamento urbano.
but also in the phases of mapping diagnoses,
collecting data, designing and negotiating
with public powers. In this way, the importance of the Ciclo Rotas Centro project lies in
its intrinsically activist nature and the inclusion of details, important for the population,
in the urban planning process.
SOBREPOSIÇÕES DE
PROPOSTAS, USOS E DESEJOS
OVERLAYS OF PROPOSALS,
USES AND DESIRES
A primeira atividade coletiva do Ciclo Rotas
teve como objetivo avaliar se a sobreposição
das seis propostas existentes era suiciente para compor um plano diretor cicloviário
para a região. O objetivo seguinte foi comparar essa malha composta com as rotas normalmente utilizadas pelos ciclistas que navegam pela área. Em seguida, a comparação foi
feita com as rotas de desejo dos participantes
ciclistas e não-ciclistas.
The irst collective activity of Ciclo Rotas
was to assess whether the overlap of the six
existing proposals was suficient to create a
comprehensive plan for a network of bike
paths for the region. The next objective was
to compare this composite network with the
routes normally used by cyclists who ride in
the area. Then a comparison was made with
the desired routes of the participant cyclists
and non-cyclists.
artigo
article
244
A mera sobreposição das propostas existentes não foi suiciente para a elaboração de uma
proposição para o centro, considerando os eixos de deslocamento prioritários da cidade.
O mapeamento dos principais eixos vis-à-vis
os equipamentos locais e as infraestruturas de
transporte existentes e em planejamento (como
o caso do VLT e do Transbrasil) indicou a necessidade de uma malha com capilaridade mas
com melhor conectividade, que fosse também
consistente com os outros modais existentes ou
que estavam sendo implantados na área.
The mere overlapping of the existing
proposals was not sufficient to elaborate
a proposal for the center, considering the
priority routes of movement of the city.
The mapping of the main routes vis-àvis local equipment and the existing and
planned transportation infrastructure
(such as LRV and Transbrasil) indicated
the need for a capillary network with better connectivity, that was also consistent
with other existing or planned means of
transportation in the area.
Figura 4 Mapa com sobreposição das rotas planejadas anteriormente, de uso
diário e desejo dos participantes
Figure 4 Map of the previously planned overlay of routes which are used daily
and desired by the participants
cadernos fgv projetos
245
Em seguida, foi feito também um mapeamento de áreas que constituem grandes polos geradores de viagem (dentro do
centro ou de ligação ao centro), cujos trajetos poderiam ser realizados por bicicleta
devido às suas curtas distâncias (Gráfico
2). Destaca-se a conexão Tijuca-Praça XV
a partir da praça Saens Peña, que levaria
aproximadamente 35 minutos, e o deslocamento entre a Central e a Praça XV, que
levaria apenas 7 minutos. Essa análise ajudou a justificar a possibilidade de maior
uso da bicicleta nestes deslocamentos, que
segundo O Perfil do Ciclista 2015, aponta
para “As razões para o uso da bicicleta no
Rio”, mostra rapidez e praticidade como o
principal motivo para uso da bicicleta para
52% dos ciclistas, seguidos por baixo custo
(18%) e saúde (16%).13
Following this, we also performed a mapping of the areas that constitute large travel-generating poles (in the center or linked
to the center), whose trajectories could be
traveled by bicycle due to their short distances (Graph 2), Notably is the Tijuca-Praça
XV connection from the Praça Saens Peña
square, which would take approximately 35
minutes, and the trajectory between the Central and Praça XV square, which would take
only 7 minutes. This analysis helped to justify
the possibility of a greater use of bicycles for
these trajectories, which, according to O Peril do Ciclista 2015 (The Proile of the Cyclist
2015) research that describes the “the reasons for using a bicycle in Rio”, shows speed
and practicality as the main reasons for using a bicycle for 52% of cyclists, followed by
low cost (18%) and health beneits (16%).13
13 Transporte Ativo, 2015.
13 Transporte Ativo, 2015.
Gráico 2 Tempo de deslocamento por bicicleta em minutos
Graph 2 Travel time by bicycle, in minutes
40
35
30
25
20
15
10
5
0
a
aç
Pr
o
Lid
ns
a
raç
P
V-
aX
aç
Pr
a
a
ap
-L
e
Sa
ñ
Pe
aeir
u
ng
Ma
L
o
od
arg
do
rgo
a
Pr
C
da
La
ria
iá
ov
a-
elh
erm
zV
ru
aC
d
ça
a
oc
ari
a
ch
Ma
ia
lár
de
n
Ca
d
Ro
Ce
al
ntr
il -
ras
B
do
dia
Cid
ad
a
ov
eN
to
ris
lân
e
Cin
-S
C
to
an
V
aX
al
ntr
raç
-P
Ce
aç
Pr
aM
á
au
a
raç
-P
s
nte
de
a
Tir
artigo
article
246
MAPEAMENTO DOS CICLISTAS:
TORNANDO-OS VISÍVEIS
MAPPING CYCLISTS: MAKING
THEM VISIBLE
Um questionamento presente no início do
projeto dizia respeito ao volume de ciclistas
existentes, dado que, muitas vezes, os ciclistas são invisíveis na cidade. Dessa forma, os
participantes selecionaram pontos estratégicos para contagens, tanto dentro do centro, de
modo a mensurar a circulação interna, quanto
nos pontos de conexão com bairros adjacentes, em horários de pico e fora de pico.
Ao contrário do que se esperava, o número
de ciclistas que circulam diariamente no centro do Rio é alto, principalmente se considerarmos a infraestrutura inóspita para tal. As
contagens foram realizadas na Candelária, no
Passeio Público, Estácio-Cidade Nova, Praça
XV e Av. Chile. O levantamento mostra um
total de mais de 3 mil ciclistas por dia (Gráico 3). Apesar da alta incidência de bicicletas
a serviço (Gráico 4), observa-se um volume
ainda maior de bicicletas particulares, que
chegam ao bairro pela manhã, deixando-o no
inal da tarde, conforme dados das contagens
no Passeio Público e Estácio, que funcionam
como “portais de entrada e saída” do centro
nos horários de pico.
Um achado importante na pesquisa foi a
constatação de que 40% das bicicletas que
circulam são de serviço e, dentre estas, 25%
são triciclos (Figura 6).
Um estudo complementar realizado pela
Transporte Ativo e ITDP em 2014 sobre entregas de carga feitas por bicicleta contabilizou uma média de 732 entregas por dia realizadas por bicicleta no centro (abrangência
Subprefeitura Centro e Centro Histórico),
onde 72% das entregas são feitas em um raio
de até três km. Em decorrência deste sistema, são abatidos 233 kg de gás carbônico, 29
kg de hidrocarbonetos, 19 kg de óxido de ni-
A questioning at the beginning of the project concerned the number of existing cyclists, since cyclists are often invisible in
the city. To do this, the participants selected
strategic points for counting cyclists, both
within the center, to measure the internal
circulation, and at connection points with
adjacent neighborhoods, at peak and nonpeak times.
Contrary to expectations, the number of
cyclists that circulate daily in downtown Rio
is high, especially when considering the inhospitable infrastructure. The counting was
carried out in Candelária, at the Passeio
Público, Estácio-Cidade Nova, Praça XV
and Av. Chile. The survey revealed a total of
more than 3,000 cyclists per day (Graph 3).
In spite of the high number of bicycles in service (Graph 4), we can observe an even higher number of private bicycles arriving in the
neighborhood in the morning and leaving
late in the afternoon, according to the counts
made at Passeio Público and Estácio which
function as “inbound and outbound portals”
of the center at peak times.
An important inding in the research was
the discovery that 40% of the bicycles that
circulate are for service and, of these, 25%
are tricycles (Figure 6).
A supplementary study carried out in
2014 by Transporte Ativo and ITDP on bicycle deliveries recorded an average of 732
deliveries performed by bicycle per day in
the center (covering both the city center and
historical center), where 72% of deliveries
were made within a radius of up to three kilometers. As a result of this system, the release of 233 kg of carbon dioxide, 29 kg of
hydrocarbons, 19 kg of nitrogen oxide and
cadernos fgv projetos
247
Gráico 3 Número total de ciclistas por dia nos pontos de contagem em
dezembro de 2012
Graph 3 Total number of cyclists per day at the counting points in December,
2012
1000
800
600
400
200
0
eio
io
tác
ss
Pa
Es
e
hil
V
aX
aç
Pr
.C
Av
ia
lár
de
n
Ca
Gráico 4 Contagem de ciclistas por região, com distribuição entre finalidade de
uso (particular ou a serviço), tipo de bicicleta de serviço (comum, cargueira ou
triciclo) e gênero do usuário em dezembro de 2012
Graph 4 - Cyclist counts by region, with a distinction between purpose of use (private or service), type of service bicycle (common, delivery or tricycle) and gender
of user in December, 2012
100
Candelária
80
Av. Chile
60
Praça XV
40
Estácio
Passeio
20
0
tas
cle
i
Bic
P
erv
S
sa
eta
icl
Bic
as
eir
iço
res
ula
ic
art
so
un
s
eta
icl
Bic
m
Co
uC
u
arg
os
icl
c
Tri
ns
me
Ho
res
lhe
Mu
artigo
article
248
Figura 5 Comparação entre largura de triciclo e bicicleta padrão
Figure 5 Comparison of tricycle and standard bicycle widths
85 - 105 CM
45 - 70 CM
trogênio e 17.9 t de dióxido de carbono. Além
disso, há economia de espaço de 930m²,
equivalente a mais de duas quadras de basquete oiciais.
Ao se deinir a inalidade da rede cicloviária
para o centro da cidade, considerando esse tipo
de usuário, torna-se relevante planejar o dimensionamento adequado da infraestrutura cicloviária para veículos maiores. A comparação entre
a largura de uma bicicleta comum e um triciclo
pode chegar a ser mais do dobro. Neste caso, é
necessário ter pelo menos dois metros de largura livre mínima para ciclofaixas ou ciclovias
unidirecionais com luxo de triciclos. No caso
de infraestruturas bidirecionais, pelo menos um
metro e meio por sentido são necessários.
17.9 t of carbon dioxide are avoided. In addition, there is a space savings of 930m²,
equivalent to more than two oficial basketball courts.
When deining the inal purpose of the
bike path network for the city center, and
considering this type of user, it becomes
relevant to plan the proper scale of the bike
path infrastructure for larger vehicles. The
width of a tricycle can be more than double
the width of a regular bicycle. In this case,
it is necessary to have at least two meters of
free width for bike paths or unidirectional
bike paths to accommodate tricycles. In the
case of bidirectional bike paths, at least one
and a half meters per direction is required.
cadernos fgv projetos
249
AUSÊNCIA DE MULHERES:
INDICATIVO DA FALTA DE
SEGURANÇA
ABSENCE OF WOMEN: AN
INDICATION OF A LACK OF
SECURITY
Um dos indicadores universais de uma cidade
amiga das bicicletas é o número de mulheres,
idosos e crianças circulando em bicicletas. O
Rio vem a cada dia se tornando mais amigo das
bicicletas, mas a percentagem de mulheres circulando de bicicleta pelo centro (3%) deixa clara
a necessidade de muito trabalho para adequar o
bairro e a cidade para circulação segura e coniante por diferentes grupos demográicos.
Para ilustrar essa questão, é interessante analisar dados de São Paulo. Comparando dados da
pesquisa de origem-destino realizada na Região
Metropolitana de São Paulo em 2002 e 2012, observa-se que homens realizam mais viagens diárias do que mulheres, e realizam mais viagens
por automóvel ou motocicleta. No que diz respeito ao transporte ativo, a mulher é quem mais
se desloca a pé, ao passo que o homem é quem
mais usa a bicicleta. Enquanto a presença da bicicleta na divisão modal não ultrapassa 2-3%,
padrão que se repete em outras cidades brasileiras, a participação feminina nessas viagens
“se manteve, em média, abaixo de 10% em toda
a série histórica da pesquisa, ultrapassando essa
marca somente em 2012, quando houve um aumento notável da proporção, passando de 9% em
2007 para 12% na última edição da aferição”.14
Nesse modelo de cidade produzido para
beneiciar a luidez do deslocamento dos veículos motorizados, algumas questões apresentam-se como fundamentais quanto à demanda
do transporte para a mulher. São elas a segurança: viária, a segurança pública e a conveniência. Para entender o impacto da segurança
viária na decisão da mulher sobre utilizar a bicicleta, basta analisar dados de uso antes e de-
One of the universal indicators of a
bike-friendly city is the number of women,
elderly and children riding bicycles. Every
day, Rio becomes more bike-friendly, but
the percentage of women cycling through
the center (3%) underlines the need for
greater efforts to adapt the neighborhood
and city for the safe and conident circulation of different demographic groups.
To illustrate this issue, it is interesting to
analyze data from São Paulo. Comparing
the data from the Origin-Destination survey
carried out in the Metropolitan Region of São
Paulo in 2002 and 2012, it can be observed
that men make more daily trips than women, and make more trips by car or motorcycle. As far as active transport is concerned,
women circulate the most on foot, while men
use bicycles the most. While the presence of
the bicycle by gender does not exceed 2-3%
(a pattern which is repeated in other Brazilian cities), the participation of women in
these trips “remained, on average, below
10% throughout the research, surpassing
this mark only in 2012, when there was a
notable increase in the proportion, from 9%
in 2007 to 12% in the latest survey.”14
In this model of the city, which has been
produced to beneit the low and movement of
motor vehicles, some questions become fundamental regarding women’s needs for transportation: namely, safe bike paths, public safety
and convenience. To understand the impact of
safe bike paths on women’s decisions to use a
bicycle, it is suficient to analyze the usage data
before and after the implementation of segre-
14
14
Lemos, Harkot e Santoro, 2017.
Lemos, Harkot and Santoro, 2017.
artigo
article
250
“
A infraestrutura
existente tanto na
origem quanto no
destino e a qualidade
dessa infraestrutura,
seja para transportes
coletivos ou
transportes ativos,
são questões
que impactam
na percepção de
segurança não apenas
para pessoas do gênero
feminino, mas para
todo um conjunto de
pessoas em situação
de vulnerabilidade
como crianças,
idosos e pessoas com
mobilidade reduzida.
”
pois da implantação de infraestruturas segregadas. Contagens realizadas pela associação
Ciclocidade em 2010 e 2015 encontraram: (i)
aumento em 188% no número total de ciclistas, mas 1.004% no número de ciclistas mulheres após a implantação da ciclovia na Av.
Paulista; e (ii) aumento em 122% no total de
ciclistas e 1.444% nas ciclistas mulheres na Av.
Eliseu de Almeida.15 Infraestrutura cicloviária,
portanto, importa.
Diversos estudos mostram que mulheres optam por modais mais caros ou menos eicientes
de transporte se estes forem percebidos como
mais seguros. Dados também de São Paulo demonstram que viagens feitas diariamente por
mulheres em automóveis aumentam conforme
a renda: 3% no quintil mais baixo, 45% no quintil mais alto.
A infraestrutura existente tanto na origem
quanto no destino e a qualidade dessa infraestrutura, seja para transportes coletivos ou transportes ativos, são questões que impactam na
percepção de segurança não apenas para pessoas
do gênero feminino, mas para todo um conjunto
de pessoas em situação de vulnerabilidade como
crianças, idosos e pessoas com mobilidade reduzida. As características das viagens das mulheres
muitas vezes potencializam a sua vulnerabilidade. Trajetos curtos, variados, dispersos fora dos
horários de pico, nos quais muitas vezes estão
acompanhadas de crianças, idosos ou carregando sacolas e carrinhos as transformam em um
alvo mais fácil, aumentando a percepção de insegurança e o medo de estar no espaço público.
AS TIPOLOGIAS DA REDE
PROPOSTA
Um passo importante para deinição da tipologia cicloviária foi a compreensão das
características do viário existente nos tre15
Lemos, Harkot e Santoro, 2017.
cadernos fgv projetos
251
gated infrastructures. Counts carried out by
the Ciclocidade association in 2010 and 2015
found: (i) a 188% increase in the total number
of cyclists, but a 1,004% increase in the number of women cyclists after the implantation
of the bicycle path on Av. Paulista; and (ii) an
increase of 122% in the total number of cyclists
and a 1,444% increase in women cyclists on Av.
Eliseu de Almeida.15 Therefore bike path infrastructure is important.
Several studies show that women opt
for more expensive or less efficient modes
of transportation if it is perceived to be
safer. Data, also from São Paulo, shows
that daily trips by women in automobiles
increase according to income: 3% in the
lowest quintile, 45% in the highest quintile.
The existing infrastructure of both origin and destination, and the quality of
this infrastructure, whether for public
transportation or active transportation,
are issues that impact on the perception
of safety not only for women, but for all
potentially vulnerable people such as children, the elderly and people with reduced
mobility. The characteristics of women’s
travel often increases their vulnerability.
Short, varied journeys outside peak times,
often accompanied by children, elderly or
carrying bags and trolleys, make them
an easier target and therefore increasing
their perception of insecurity and fear of
being in a public space.
THE TYPOLOGIES OF THE
PROPOSED NETWORK
An important step to deine the bike path typology was the understanding of the characteristics of existing roads in the stretches
15
Lemos, Harkot e Santoro, 2017.
“
The existing
infrastructure of both
origin and destination,
and the quality of
this infrastructure,
whether for public
transportation or
active transportation,
are issues that impact
on the perception of
safety not only for
women, but for all
potentially vulnerable
people such as
children, the elderly
and people with
reduced mobility.
”
artigo
article
252
chos onde a rede cicloviária estaria inserida. A equipe envolvida coletou dados em
100 pontos do centro da cidade para analisar elementos presentes nos diversos segmentos das ruas, incluindo: tipo de via e
segregação (ciclovias, ciclofaixas ou ciclorrota), sinalização (vertical, horizontal e semafórica), estacionamentos (bicicletários e
paraciclos), identiicação visual (marcas e
cores), localização e tamanho das estações
de bicicletas compartilhadas.
As vias sinalizadas para o tráfego compartilhado (por exemplo, ciclorrotas) tiveram sua
implementação recomendada em vias com baixo luxo e velocidade, devido ao baixo risco de
colisões entre veículos motorizados e bicicletas
que compartilham o mesmo espaço. A sinalização horizontal de tráfego compartilhado indica
o posicionamento e percurso do ciclista, e os
automóveis devem guardar distância lateral e
reduzir a velocidade para ultrapassagem. Já as
ciclofaixas são recomendadas quando o luxo e/
ou velocidade dos automóveis oferecerem riscos
moderados ou limitação à circulação do ciclista,
e sua implantação prevê a utilização de sinalização horizontal e elementos reletivos (tachas),
sem barreiras físicas. Por im, as ciclovias são
implementadas em vias de maior luxo e/ou
velocidade. Por motivos de segurança, é necessária uma segregação física entre automóveis e
bicicletas, podendo ser realizada por canteiros,
áreas verdes ou faixas de estacionamento.
where the bike path network would be built.
The team collected data at 100 different
points in the city center to analyze the elements present in various segments of the
streets, including: type of road and segregation (bike paths, bike lanes or bike routes),
signaling (vertical, horizontal and trafic
lights), parking facilities (bike storage and
stands), visual identiication (marks and
colors) and location and size of communal
bicycle stations.
Roads designated for shared trafic (for
example, bike routes) were recommended
for low-low and low-speed roads due to the
lower risk of collision between motor vehicles and bicycles sharing the same space.
Horizontal trafic signaling indicates the position and course of the cyclists and that the
cars should keep a certain lateral distance
from them and reduce speed when passing.
Bike lanes are recommended for when the
low and/or speed of cars offer moderate
risks or limit the cyclist’s circulation, and
their implementation allows for the use of
horizontal signaling and relective pavement markers (Botts dots), without physical
barriers. Finally, bike paths are implemented in streets that have more trafic and/or a
higher speed. For safety reasons, there is a
need for physical segregation between cars
and bicycles, which may be done using barriers, green areas or parking lanes.
RESULTADOS DO PROJETO
CICLO ROTAS E O CAMINHO
AINDA POR TRILHAR
RESULTS OF THE CICLO ROTAS
PROJECT AND THE ROAD AHEAD
No inal de 2012, o projeto Ciclo Rotas Centro foi apresentado ao então prefeito Eduardo Paes, como uma proposta alinhada a um
novo paradigma de mobilidade na cidade do
At the end of 2012, the Ciclo Rotas Centro
project was presented to the then Mayor,
Eduardo Paes, as a proposal in alignment
with the new paradigm of mobility in the
cadernos fgv projetos
253
Figura 7 Rede cicloviária proposta
Figure 7 Proposed bike path network
CENÁRIO DE MOBILIDADE PARA O CENTRO EM 2016
MOBILITY SCENARIO FOR THE CENTER IN 2016
PONTOS COLETADOS
POINTS CONSIDERED
CICLOVIA
BIKE PATHS
PROJETO CICLORROTAS
BIKE ROUTE PROJECT
PROJETOS EM ESTUDO
PROJECTS UNDER STUDY
EXISTENTES
EXISTING BIKE PATHS
OUTROS
OTHERS
BRT TRANSBRASIL
BRT TRANSBRASIL
VLT
LRV
BIKE-RIO
BIKE-RIO
METRÔ
SUBWAY
AEROPORTO
AIRPORT
BARCAS
BOATS
ESTAÇÃO DE TREM
TRAIN STATION
TERMINAL DE ÔNIBUS
BUS TERMINAL
Rio de Janeiro. O projeto reunia 33 km de rotas a um custo estimado de implantação de
R$ seis milhões.16
Em 2014, a prefeitura do Rio tirou do
papel as três primeiras rotas, que juntas
somam 3,3 km. Foram elas: MAM – Praça
Henrique Lage/Buraco do Lume/ Largo da
Carioca: Calógeras, Graça Aranha e Nilo
Peçanha (1,3 km); MAM – Cinelândia: via
Beira Mar e Rio Branco (500m) e; MAM –
Praça XV: via Santa Luzia (1,2 km). Apesar
de apenas 1,3 km de extensão, a primeira delas conecta o centro (e diversas estações de
transporte público como metrô e barcas) à
infraestrutura cicloviária existente no Ater16 Excluindo os 17km já contemplados pelo projeto do Porto Maravilha e
considerando o valor médio de R$ 320 mil/km, adotado internacionalmente.
TELEFÉRICO
CABLE CAR
TELEFÉRICO
CABLE CAR
TERMINAL
CRUZEIRO / MARINA
CRUISE SHIP
TERMINAL / MARINA
ESTACIONAMENTO
PARKING
LOT
BONDE
TRAM
city of Rio de Janeiro. The project brought
together 33 kilometers of routes at an estimated cost of R$ six million.16
In 2014, the city of Rio de Janeiro removed
the irst three routes from the project, which
together total 3.3 kilometers. The routes
removed were: MAM - Praça Henrique
Lage/ Buraco do Lume/ Largo da Carioca:
Calógeras, Graça Aranha and Nilo Peçanha
(1.3 km); MAM - Cinelândia: via Beira Mar
and Rio Branco (500 m); MAM - Praça XV:
via Santa Luzia (1.2 km). Despite being only
1.3 kilometers in length, the irst route connects the center (and several public trans16 Excluding the 17 kilometers already included in the Porto Maravilha
project and considering the average cost of R$ 320,000/km that is
internationally adopted for estimating costs.
artigo
article
254
ro do Flamengo, integrando assim centro
e Zona Sul da cidade. Para a criação dessa
infraestrutura, vagas de estacionamento em
vias públicas foram removidas e 90 vagas de
estacionamento para bicicletas foram instaladas na região. Esse é um exemplo emblemático de redistribuição do espaço viário,
recuperando espaço público de uma área
excessivamente dedicada a veículos motorizados e dando lugar aos ciclistas.
Em 2015, o ITDP Brasil, o Studio-X Rio e
a Transporte Ativo realizaram uma atividade
colaborativa com o objetivo de promover a replicação da metodologia Ciclo Rotas em outras
áreas da cidade, por meio do desenvolvimento de um aplicativo para dispositivos móveis.
Este projeto ainda se encontra em andamento. Em 2016, o Ciclo Rotas foi um dos projetos
selecionados para o pavilhão brasileiro na 15ª
Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza. Com o tema JUNTOS, o projeto para o Pavilhão do Brasil buscou evidenciar histórias de
pessoas e organizações que lutam e alcançam
mudanças na passividade institucional das
grandes cidades do país.
O desequilíbrio de oferta de infraestrutura e
serviços no território intensiicam a segregação
espacial e a exclusão social, realidades tão presentes no contexto das cidades latino-americanas. No entanto, o momento é oportuno para
ampliar e aprofundar o diálogo entre governantes e a sociedade, no qual é possível deinir uma
nova forma de se viver na cidade.
As viagens realizadas no dia a dia começam desde o momento que se sai de casa até
a chegada ao destino. Para uma cidade ser
considerada ideal em termos de mobilidade
acessível, segura, confortável e inclusiva, esta
deve oferecer opções de qualidade para todos, com meios de transporte diversiicados e
de qualidade. Acima de tudo, é preciso redis-
portation stations such as the metro and
boats) to the existing bicycle infrastructure
in the Aterro do Flamengo, thus integrating
the downtown with the south of the city. To
create this infrastructure, parking spaces on
public roads were removed and 90 parking
spaces for bicycles were installed in the region. This is an emblematic example of the
redistribution of road space, recovering
public space from an area that is excessively
dedicated to motor vehicles, and providing
space for cyclists.
In 2015, ITDP Brasil, Studio-X Rio and
Transporte Ativo carried out a collaborative activity to promote the replication of the
Ciclo Rotas methodology in other areas of
the city through the development of an app
for mobile devices. This project is still underway. In 2016, Ciclo Rotas was one of the
projects selected for the Brazilian Pavilion at
the 15th International Architecture Biennale
in Venice. With the theme JUNTOS [Together], the project for the Brazilian Pavilion
sought to highlight stories of people and organizations that struggle for, and achieve,
changes in the institutional passivity of the
country’s major cities.
The imbalance in the supply of infrastructure and services in the region intensiies spatial segregation and social exclusion; a reality that is very common in Latin American
cities. However, it is an opportune moment
to broaden and deepen the dialogue between
administrators and society, making it possible to deine a new way of living in the city.
The day-to-day trips start from the moment you leave your house to your arrival at
your destination. For a city to be considered
ideal in terms of accessible, safe, comfortable
and inclusive mobility, it must offer quality
options for everyone by providing diverse
cadernos fgv projetos
255
tribuir o espaço da cidade, oferecendo qualidade para todos. Nesse sentido, as condições
das infraestruturas de calçadas, ciclovias e
transporte público, assim como sua inserção
no espaço urbano, deinem a qualidade de
vida das pessoas.
O projeto Ciclo Rotas Centro trouxe a
possibilidade de fazer com que os ativistas,
homens ou mulheres, jovens ou idosos usuários de bicicleta ou não - se tornassem
também participantes no planejamento urbano, respeitando o desejo dos cidadãos de
estarem envolvidos no pensar e fazer cidade. Para isso, foram pensadas não somente
as rotas que já são feitas diariamente, mas
abriu-se espaço para as rotas de desejo, ou
seja, são cidadãos desenhando a circulação
da cidade de seu desejo, do seu sonho.
A democracia participativa é um processo longo e que pode ser tido como oneroso, mas que empodera e torna possível aos
cidadãos ter uma visão de cidade desejada, conhecer instrumentos de cobrança e
construção coletiva, participar ativamente
da cidade. Além disso, apresenta possibilidades e ensina cada vez mais que uma
cidade justa e sustentável, que respeita as
necessidades das mulheres, crianças e idosos, pedestres e ciclistas, é naturalmente
uma cidade que respeita a todos.
•
and high-quality means of transportation.
Above all, it is necessary to redistribute the
spaces in the city, providing a better quality
of life for all citizens. In this sense, the conditions of the infrastructure of sidewalks, bike
paths and public transportation, as well as
their insertion into the urban environment,
deine the quality of life of citizens.
The Ciclo Rotas Centro project has made it
possible for activists, whether they are men or
women, young or old - cyclists or non-cyclists
- to become participants in urban planning,
by respecting the population’s desire to be involved in designing and making the city. To
achieve this, we considered not only the routes
that are already used daily, but also space for
the desired routes was made, that is to say, the
citizens are now designing the circulation of the
city according to their wishes and their dreams.
Participatory democracy is a long process
that can be considered burdensome, but it empowers people and makes it possible for citizens to have a vision of a city they wish for,
to understand the instruments used to achieve
their demands and collective construction, and
to actively participate in their city. Besides, it
presents possibilities, and continuously teaches people that a just and sustainable city which
respects the needs of women, children and the
elderly, pedestrians and cyclists, is, naturally,
a city that respects everyone.
•
artigo
article
256
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS | BIBLIOGRAPHIC REFERENCES
ALEXANDER, Christopher. The timeless way of building, New York, Oxford University
Press. 1979. Disponível em | Available at: <http://library.uniteddiversity.coop/Ecological_
Building/The_Timeless_Way_of_Building_Complete.pdf>. Acesso em: 28/06/2016. Accessed on: 06/28/2016.
ANTP. Sistema de Informações da Mobilidade Urbana,- Relatório Geral 2011. 2012. Disponível em | Available at: <http://iles-server.antp.org.br/_5dotSystem/userFiles/SIMOB/
relatorio%202011.pdf>. Acesso em: 11/07/2017. Accessed on: 07/11/2017.
BAUMAN, Zygmunt. Coniança e medo na cidade; tradução Eliana Aguiar – Rio de Janeiro: Jorge Zahar E. 2009.
BINATTI, Gabriela, Mobilidade e Cultura de Bicicleta no Rio de Janeiro. 2012. Disponível em | Available at: <http://ta.org.br/educativos/docs/cmb_rio.pdf>. Acesso em:
20/06/2016. Accessed on: 06/20/2016.
GEHL, Jan. Cities for People. Island Press, 1st Edition. 2010.
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Pesquisa Origem e Destino 2007 – Síntese das
Informações da Pesquisa Domiciliar – dezembro de 2008. 2008. Disponível em | Available at: <http://www.metro.sp.gov.br/metro/arquivos/OD2007/sintese-od2007.pdf>. Acesso
em: 26/06/2016. Accessed on: 06/26/2016.
GOVERNO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Plano Diretor de Transporte d Região
Metropolitana do Rio de Janeiro - PDTU. 2014. Disponível em | Available at: <http://www.
rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/5333332/4139325/25PDTUGovEstado092014.pdf>. Acesso em :
11/07/2017. Accessed on: 07/11/2017.
IBGE, Censo Demográico 2010.
IEMA. A bicicleta e as cidades: como inserir a bicicleta na política de mobilidade urbana. 2010. Disponível em | Available at: <http://www.energiaeambiente.org.br/wp-content/uploads/2015/09/A-bicicleta-e-as-cidades.pdf>. Acesso em: 11/07/2017. Accessed on:
07/11/2017.
IEMA. Inventário de Emissões Atmosféricas do Transporte Rodoviário de Passageiros no
Município de São Paulo. 2017. Disponível em | Available at: http://emissoes.energiaeambiente.org.br/. Acesso em: 11/07/2017. Accessed on: 07/11/2017.
ITDP. Há espaço para mais carros? A dura batalha por uma cidade limpa, segura e com
o espaço distribuído de forma justa. 2015. Disponível em | Available at: <http://itdpbrasil.
org.br/ha-espaco-para-mais-carros/>. Acesso em: 10/07/2017. Accessed on: 07/10/2017.
ITDP. Transporte Ativo. A bicicleta no comércio do Rio de Janeiro. 2015. Disponível em |
Available at: <http://2rps5v3y8o843iokettbxnya.wpengine.netdna-cdn.com/wp-content/
uploads/2015/03/Bicicletas-de-Carga-Completo-PDF.pdf>. Acesso em: 10/07/2017. Accessed on: 07/10/2017.
ITDP; Studio-X Rio; Transporte Ativo. Ciclo Rotas Centro, Uma malha cicloviária para o
Centro do Rio de Janeiro. 2013.
cadernos fgv projetos
257
IPEA. Estimativa dos Custos dos Acidentes de Trânsito no Brasil com Base na Atualização Simpliicada das Pesquisas Anteriores do Ipea, Relatório de Pesquisa. 2015. Disponível
em | Available at: <http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/7456/1/RP_Estimativa_2015.pdf>. Acesso em: 10/07/2017. Accessed on: 07/10/2017.
JACOBS, Jane. The Death and Life of Great American Cities. New York: Vintage. 1961.
LEMOS, Letícia; HARKOT, Marina; SANTORO, Paula. Mulheres de bicicleta em São Paulo: da “cidade imoral” para a “cidade conquistada”. 2017. , Disponível em | Available at:
<https://observasp.wordpress.com/2017/05/17/mulheres-de-bicicleta-em-sao-paulo-da-cidade-imoral-para-a-cidade-conquistada/>. Acesso em 12/07/2017. Accessed on: 07/12/2016.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Inheriting a sustainable world? Atlas on children’s health and the environment. 2017. Disponível em | Available at: <http://www.who.
int/ceh/publications/inheriting-a-sustainable-world/en/>. Acesso em: 10/07/2017. Accessed on: 07/10/2016.
PREFEITURA DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO. Rio Capital da Bicicleta. 2010. Disponível em | Available at: <http://www.rio.rj.gov.br/web/smac/exibeconteudo?article-id=756384>. Acesso em: 22/06/2016. Accessed on: 06/22/2016.
RODRIGUES, Juciano. Crescimento da frota de automóveis e motocicletas nas metrópoles brasileiras 2001/2011. Observatório das Metrópoles. 2011. Disponível em | Available at:
<http://observatoriodasmetropoles.net/download/relatorio_automotos.pdf>. Acesso em:
12/07/2017. Accessed on: 07/12/2017.
TRANSPORTE ATIVO. Parceria Nacional pela Mobilidade por Bicicleta, Pesquisa Peril do Ciclista. 2015. Disponível em | Available at: http://www.ta.org.br/peril/ciclista.pdf.
Acesso em: 11/07/2017. Accessed on: 07/11/2017.
________. Lei Nº 12.587, de 3 de Janeiro de 2012 – Política Nacional de Mobilidade
Urbana.
________. Lei Nº 10.257 de 10 de Julho de 2001 – Estatuto da Cidade.
ARTIGO ARTICLE
PLANO
DIRETOR E
OPERAÇÕES
URBANAS:
O DESAFIO DA GESTÃO
PÚBLICA EM TERRITÓRIO DE
REESTRUTURAÇÃO URBANA
THE DIRECTOR
PLAN AND CITY
OPERATIONS:
THE CHALLENGE FOR PUBLIC
MANAGEMENT IN THE AREA
OF URBAN RE-STRUCTURING
O artigo aborda as estratégias e os desaios que se colocam diante do poder público para a reestruturação urbana. A análise toma como estudo de caso o plano diretor e as operações urbanas da cidade
de São Paulo, observando o que foi colocado em prática e os aspectos em que ainda é preciso avançar.
In this article the authors address the strategies and challenges faced by the government as
regards urban re-structuring. This analysis takes as a case study the director plan and the
urban operations for the city of São Paulo showing what has been achieved and the aspects
in which it is still necessary to move forward.
CAROLINA HELDT D’ALMEIDA
Consultora do Cities Alliance para a Política Metropolitana
Cities Alliance Consultant for City Policies
Doutoranda, mestre e graduada em arquitetura e urbanismo pela Universidade de São Paulo. Atualmente,
é consultora do Cities Alliance para a política metropolitana e professora na Universidade São Judas
Tadeu, na Escola Paulista de Direito e na Escola da Cidade. Foi assessora do Gabinete da Secretaria de
Desenvolvimento Urbano da Prefeitura de São Paulo, tendo participado da formulação do Plano Diretor, Lei
de Zoneamento e Planos Regionais de São Paulo, e também foi chefe da Assessoria de Pesquisa Aplicada e
Fomento. Coordenou a Comissão Técnica do Plano Metropolitano de São Paulo.
Ph.D. candidate with Master’s and Bachelor’s degrees from the University of São Paulo. Currently a Cities
Alliance consultant for City Policies and professor at the São Judas Tadeu University, the Paulista School
of Law and the School of the City. Former advisor in the Ofice of the Secretariat of Urban Development at
São Paulo City Hall, participating in drawing up the Director Plan, the Zoning Law and Regional Plans
for São Paulo, and heading the Advisory staff of Applied Research and Development. She coordinated the
Technical Commission of the Metropolitan Plan of São Paulo.
SIMONE GUERESI
Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal
Specialist in the federal government’s Public Policies and Governmental Management
Mestre em planejamento urbano pela Universidade de Brasília. É especialista em políticas públicas e gestão
governamental do governo federal. Foi assessora no Ministério das Cidades, coordenadora de regularização
fundiária na Secretaria do Patrimônio da União, diretora de Gestão das Operações Urbanas na Prefeitura
de São Paulo e de Gestão Estratégica do Ministério do Desenvolvimento Agrário e do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária.
Holds a Master’s degree in urban planning from the University of Brasília. Specialist in the federal
government’s Public Policies and Governmental Management. Formerly advisor in the Ministry of
Cities, coordinator of Land-Tenure Regularization at the Secretariat of Federal Patrimony, director of
Management of Urban Operations in the São Paulo City Hall and director of Strategic Management in the
Ministry of Agrarian Development and at the National Institute of Colonization and Agrarian Reform.
O
s municípios veem aumentar os desaios
para induzir o desenvolvimento urbano
e superar persistentes problemas das cidades brasileiras quando dimensões estruturais
(como o padrão de urbanização segundo o
qual se organizaram as nossas maiores cidades, os grandes contingentes populacionais
expostos à exclusão socioterritorial e a partição de competências e inanciamento entre os entes federados) se somam a aspectos
conjunturais, como a atual crise econômica e
política pela qual passa o país.
A regulação urbanística para ins de planejamento urbano, elemento da alçada municipal com destaque na tarefa de gerir as cidades,
enfoca os setores privados de produção imobiliária como agentes econômicos preponderantes no desenvolvimento territorial. Com
efeito, os instrumentos urbanísticos utilizados pelo poder público orientam, incentivam,
constrangem ou oneram a atuação desse setor
econômico, como estratégia para promover
adensamento urbano, reorientar a localização de áreas de centralidade, induzir reestruturações urbanas e minimizar a segregação
socioespacial. Esse caráter potencialmente
(re)distributivo da regulação urbanística faz
com que seus efeitos mais signiicativos sejam
medidos tanto pelas transformações físicas
da cidade, quanto no âmbito de disputas subjetivas: conquistas do direito à cidade pelas
parcelas menos favorecidas econômica e socialmente, ampliação de espaços democráti-
M
unicipalities are experiencing increasingly more challenges to promote urban
development and remedy persistent problems
of Brazil’s cities. This comes at a time when
structural dimensions - such as the urbanization standards according to which our big
cities were organized, large population contingents exposed to socio-territorial exclusion and
sharing both competence and inancing among
federated entities – are added to conjunctural
aspects such as the ongoing economic and political crisis that the country is going through.
Urban regularization for the purpose of
city planning, an element of municipal responsibility with the special task of managing cities, focuses on the private sectors
of property production as preponderant
economic agents in territorial development.
It is indeed true that the urbanistic instruments used by the government orientate,
incentivize, constrain or impose on the activities of this economic sector as a strategy
to promote urban densiication, re-direct the
localization of central areas, induce urban
re-structuring and minimize socio-spatial
segregation. This potentially (re)distributive characteristic of urban regularization
makes its more signiicant effects felt both
by the city’s physical transformations and in
the sphere of subjective disputes. The latter
include the economically and socially less favored segments of the population conquering the right to the city, expanding demo-
cadernos fgv projetos
261
cos com práticas participativas e transparência das informações, qualiicação dos debates
programáticos sobre o destino que se quer dar
a porções da cidade, em função de uma visão
integrada de desenvolvimento urbano construída no pacto coletivo.
O desaio de conectar o universo ideal das
regras (necessário, mas não suiciente) à efetiva realização das transformações no meio
urbano se torna mais evidente neste momento, passados quinze anos de implementação
da agenda da reforma urbana, desde a aprovação do Estatuto da Cidade.1 Atualmente, é
possível avaliar, a partir das experiências de
muitas cidades brasileiras, a relação entre o
avanço conceitual do instrumental urbanístico consolidado no estatuto, as diferenças nos
processos de gestão das políticas urbanas e
os resultados empíricos na vida desses municípios. Esse foi o período estabelecido pelo
Estatuto da Cidade para a primeira revisão
do marco regulatório da política urbana das
cidades brasileiras, cujos planos diretores elaborados nos cinco anos posteriores à aprovação da lei federal - devem ser revisados ao
menos a cada dez anos.
A cidade de São Paulo teve o seu primeiro
Plano Diretor aprovado em 2002, já em cum-
cratic spaces with participative practices
and transparent information, programming debates on how portions of the city
should be treated, all this within an integrated vision of urban development based
on a collective pact.
The challenge of connecting the ideal
(necessary but not suficient) universe of
rules to actually bringing about changes
in cities becomes more evident now, ifteen
years after implementation of the urban-reform agenda, since the City Statute was approved.1 Today, based on the experiences of
many Brazilian cities, one can evaluate the
relation between the conceptual advance of
the urbanistic instruments consolidated in
the statute, the differences in the processes
of managing urban policies and the empirical results in the life of these municipalities.
This was the period set by the City Statute for the irst revision of the regulatory
framework of the urban policies of Brazil’s
cities, the director plans of which, drawn up
in the ive years following approval of the
federal law, should be revised at least every
ten years.
The city of São Paulo had its irst Director Plan approved in 2002, already in com-
1 O marco regulatório da política urbana brasileira se estrutura a partir
do Estatuto da Cidade (lei nº 10.257/2001), que institui uma série de
instrumentos da política urbana e determina a obrigatoriedade do plano
diretor para todas as cidades com mais de 20 mil habitantes. O plano
diretor, aprovado em lei municipal, é entendido como o instrumento
básico para guiar o desenvolvimento urbano das cidades. Cabe também ao
município a regulação sobre parcelamento, uso e ocupação do solo.
1 The regulatory mark of the Brazilian urban policy is based on the
Statute of the City (law nº 10.257/2001), which institutes a series of
instruments of urban policy and determines the obligatory nature of the
director plan for all cities with over 20,000 inhabitants. Approved by
municipal law, the director plan is understood to be the basic instrument
to guide the urban development of cities. The municipality is also in charge
of regulating on allotment, use and occupation of the soil.
artigo
article
262
primento ao Estatuto. A agenda de avaliação
foi realizada a partir de 2013,2 quando se
iniciou um intenso processo de revisão participativa da legislação urbanística da cidade.
Após uma década, a avaliação dos resultados da implementação do Plano Diretor Estratégico (PDE) de 2002, reletidos em cada
parcela do território da cidade e analisados
segundo várias dimensões e instrumentos
urbanísticos, permitiu que as discussões e a
interação entre os diversos atores que participaram das revisões se dessem com base
em informações técnicas disponibilizadas,
possibilitando o aprofundamento dos debates sobre as propostas colocadas em pauta.
Foram revistos, em 2014, o PDE; em 2015, a
Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo
(Luos), também chamada de Lei de Zoneamento; em 2016, os Planos Regionais; e está
prevista para 2018 a elaboração do primeiro
Plano Metropolitano (PDUI) de São Paulo, em acordo com o Estatuto de Metrópole
(lei nº 13.089/2015). Essas leis constituem o
sistema de planejamento urbano da cidade,
que articula um conjunto de instrumentos
urbanísticos, inanceiros e ambientais para
viabilizar, até 2030, a implementação dos
conteúdos programáticos previstos no PDE,
que é a peça central e estabelece as diretrizes
fundamentais desse sistema (ver Figura 1),
em acordo com o Estatuto da Cidade.
Mesmo sendo muito curto o prazo decorrido desde a aprovação das peças desse sistema, sem tempo de implementação suiciente
para uma avaliação consistente de resultados, está em curso um novo processo de discussão de revisões de dispositivos legais, com
propostas de alteração da Lei de Zoneamento
pliance with the Statute. The evaluation
agenda was carried out as of 2013,2 when
an intense process of participative revision of the city’s urbanistic legislation was
initiated. A decade later, evaluation of the
results of implementation of the Strategic
Director Plan (PDE) of 2002, reflected in
each part of the city’s territory and analyzed in accordance with various urbanistic dimensions and instruments, allowed
the discussions and interaction between
the different actors who took part in the
revisions to avail themselves of technical
information and intensify the debates on
the proposals on the agenda. The PDE was
revised in 2014; the Law of Allotment, the
Law of Allotment, Use and Occupation of
the Soil (Luos), also called Zoning Law, in
2015; the Regional Plans in 2016; and São
Paulo’s first Metropolitan Plan (PDUI) is
due in 2018, according to the Statute of
the Metropolis (Law 13.089/2015). These
laws comprise the urban planning system
for the city, which articulates a set of urbanistic, financial and environmental instruments designed to make implementation of the programmed contents set out
in the PDE feasible by 2030, this being the
core element that establishes the fundamental guidelines of this system (see Figure 1), in keeping with the City Statute.
Despite the short time elapsed between
approval of the pieces in this system, without sufficient time for a consistent evaluation of the results, a new process of discussion of revisions of legal provisions is
underway, with proposed alterations to
the Zoning Law and the laws of three of the
2 A revisão do PDE de 2002, em São Paulo, prevista para 2012, conforme
o Estatuto da Cidade (lei nº 10.257/2001), foi iniciada pela gestão do
prefeito Gilberto Kassab (2009-2012). Contudo, o processo não foi levado
adiante (http://www.nossasaopaulo.org.br/programa-de-metas). A gestão
do prefeito Fernando Haddad (2013-2016) reiniciou o processo de revisão
do marco regulatório, em 2013, começando pela revisão do Plano Diretor
Estratégico.
2 Revision of the PDE of 2002 in São Paulo, programmed for 2012, in
accordance with the Statute of the City (law nº 10.257/2001), was initiated
by the administration of Mayor Gilberto Kassab (2009-2012). However,
the process was not carried forward (http://www.nossasaopaulo.org.br/
programa-de-metas). The administration of Mayor Fernando Haddad
(2013-2016) reinitiated the process of revising the regulatory mark in
2013, beginning with the revision of the Strategic Director Plano.
MUNICIPAL
MUNICIPAL
INTERFEDERATIVO
INTER-FEDERATIVE
Fig. 1 Sistema de Planejamento Urbano do marco regulatório da política urbana
da cidade de São Paulo
Fig. 1 Urban Planning System of the regulatory framework for the urban policy of
the city of São Paulo
PLANO METROPOLITANO
METROPOLITAN PLAN
PLANO DIRETOR
DIRECTOR PLAN
ZONEAMENTO
ZONING
PLANOS REGIONAIS
DAS SUBPREFEITURAS
REGIONAL PLANS OF
THE SUB-DIVISIONS
PLANO ARTICULADOR DAS POLÍTICAS
PARA AS FUNÇÕES PÚBLICAS DE
INTERESSE COMUM (região metropolitana)
PLAN ARTICULATING POLICIES FOR
PUBLIC COMMON-INTEREST
FUNCTIONS (metropolitan region)
PLANO DIRETOR DE ORIENTAÇÃO
DO DESENVOLVIMENTO URBANO
(cidade)
DIRECTOR PLAN TO GUIDE
URBAN DEVELOPMENT (city)
PLANO REGULADOR DO USO E OCUPAÇÃO
DO SOLO (áreas privadas da cidade)
PLAN REGULATING USE AND
OCCUPATION OF THE LAND
(private areas of the city)
PLANO ARTICULADOR DAS POLÍTICAS
PÚBLICAS DE INTERESSE LOCAL
(áreas públicas da cidade)
PLAN ARTICULATING PUBLIC
POLICIES OF LOCAL INTEREST
(public areas of the city)
Define: instrumentos, macrozonas, diretrizes
da ação da política metropolitana
Defines instruments, macro-zones,
guidelines for metropolitanpolicy actions
Define: instrumentos, macroáreas, diretrizes
da política urbana da cidade
Defines instruments, macro-areas,
guidelines for the city’s urban policy
Define: zonas e parâmetros
Defines zones and parameters
Define: intervenções locais estratégicas
Defines local strategic interventions
e das leis de três das quatro operações urbanas vigentes na cidade de São Paulo.3 A principal razão apresentada como justiicativa
para a abertura de consulta pública para revisão da Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação
é a necessidade de São Paulo se tornar mais
atrativa para investimentos econômicos, notadamente mediante maiores incentivos para
fomentar o mercado imobiliário.4
four urban operations in place in the city
of São Paulo.3 The main reason presented
to justify opening a public consultation for
revision of the Law on Allotment, Use and
Occupation is the need for São Paulo to
become more attractive for economic investments, especially by means of bigger
incentives to strengthen the real-estate
market.4
3 A cidade de São Paulo possui quatro Operações Urbanas vigentes: a
Operação Urbana Centro, instituída pela lei nº 12.349/1997; a Operação
Urbana Consorciada Água Espraiada, a primeira aprovada após o Estatuto
da Cidade, pela lei nº 13.260/2001, alterada pela lei nº 15.416/2011;
a Operação Urbana Consorciada Faria Lima, instituída pela lei nº
13.769/2004 e precedida pela lei nº 11.732/1995; e a Operação Urbana
Consorciada Água Branca (lei n.º 15.893/2013), precedida pela lei nº
11.774/1995.
3 The city of São Paulo has four Urban Operations in place: the Center
Urban Operation, instituted by law nº 12.349/1997; the Água Espraiada
Consortium Urban Operation, the irst approved following the Statute of
the City, by law nº 13.260/2001, altered by law nº 15.416/2011; the Faria
Lima Consortium Urban Operation, instituted by law nº 13.769/2004 and
preceded by law nº 11.732/1995; and the Água Branca Consortium Urban
Operation (law n.º 15.893/2013), preceded by law nº 11.7tium##/1995.
4 Em maio de 2017, a Prefeitura abriu o processo de “revisão e readequação
de alguns dispositivos da Lei de Zoneamento” (http://gestaourbana.
4 In May of 2017, the City Hall opened the process of “revision and readjustment of some provisions of the Zoning Law” (http://gestaourbana.
prefeitura.sp.gov.br/noticias/prefeitura-inicia-processo-de-revisao-
artigo
article
264
“
O ponto
central é que a
concretização
das diretrizes e
anseios expressos
no plano diretor
depende do vínculo
entre esse sistema
de planejamento
urbano e a efetiva
gestão da
política urbana
”
A alteração de partes de um sistema de planejamento urbano não se dá sem que a lógica
sistêmica seja afetada. O marco regulatório
com frequência é objeto de intervenção para
se obter respostas imediatas, no intuito de
fomentar setores da economia afetados por
uma situação conjuntural. As alterações da
legislação urbanística são bastante inluenciadas pelas avaliações da conjuntura sobre
a produção imobiliária, pela estreita relação
que esta última tem com os instrumentos de
regulação e inanciamento urbano.
Nesse contexto de ajustes conjunturais sobre
questões estruturais, o presente artigo busca
apresentar alguns elementos para contribuir
com a relexão que se apresenta. Não se pretende, aqui, lançar luz sobre o sistema de planejamento urbano como elemento de formulação
de política urbana ou sobre o conteúdo programático de seus componentes, por si só. O ponto central é que a concretização das diretrizes e
anseios expressos no plano diretor depende do
vínculo entre esse sistema de planejamento urbano e a efetiva gestão da política urbana.
Inicialmente, buscamos caracterizar a lógica do sistema de planejamento urbano do
PDE de 2014, em que se inserem algumas
inovações em comparação à versão anterior
do PDE, de 2002, buscando promover maior
controle público à gestão urbana e, ao mesmo tempo, contrabalancear a preponderância do setor imobiliário ao ampliar a participação de outros setores no desenvolvimento
de projetos urbanos. São apresentados os
instrumentos urbanísticos e inanceiros apliprefeitura.sp.gov.br/noticias/prefeitura-inicia-processo-de-revisao-ereadequacao-de-alguns-dispositivos-da-lei-de-zoneamento/; e http://
gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/noticias/secretaria-da-smul-debatena-camara-retomada-do-mercado-imobiliario-na-cidade/). As discussões
para revisão das leis das operações urbanas foram pautadas nas reuniões
dos grupos gestores de cada uma delas. Sobre as motivações apresentadas,
ver
http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/noticias/prefeitura-iniciaprocesso-de-revisao-e-readequacao-de-alguns-dispositivos-da-lei-dezoneamento/ e https://www.abecip.org.br/imprensa/noticias/doria-podemudar-o-plano-diretor-de-sao-paulo.
cadernos fgv projetos
265
Changing parts of a system of urban
planning cannot be done without affecting
the systemic logic. The regulatory framework is often the object of intervention
to obtain immediate answers in order to
stimulate sectors of the economy impacted by a conjunctural situation. Alterations
to urbanistic legislation are substantially influenced by assessments of property
production, given how closely this sector
is related to the instruments of urban regulation and financing.
Within this context of conjunctural adjustments to structural questions, this article sets out to contribute some elements
for reflection. The aim here is not to cast
light on the system of urban planning as
an element of urban policy or on the programmatic content of its components per
se. The main point is that concretizing the
guidelines and aspirations expressed in
the director plan depends on the link between this system of urban planning and
effective management of urban policy.
We began by attempting to characterize
the logic of the system of urban planning in
the PDE of 2014, where some innovations
are inserted in comparison with the previous
version of the PDE in 2002, in an endeavor
to promote more public control of urban administration and at the same time counterbalance the preponderance of the property
sector by encouraging the participation of
other sectors engaged in developing urban
projects. The urbanistic and inancial ine-readequacao-de-alguns-dispositivos-da-lei-de-zoneamento/
and
http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/noticias/secretaria-da-smuldebate-na-camara-retomada-do-mercado-imobiliario-na-cidade/). The
discussions for revising the urban-operation laws were on the agenda of
the meetings of the managing groups of each one of them. With regard
to motivations presented, see http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.
br/noticias/prefeitura-inicia-processo-de-revisao-e-readequacao-dealguns-dispositivos-da-lei-de-zoneamento/ and https://www.abecip.org.
br/imprensa/noticias/doria-pode-mudar-o-plano-diretor-de-sao-paulo.
“
The main point is
that concretizing
the guidelines
and aspirations
expressed in the
director plan
depends on the
link between
this system of
urban planning
and effective
management of
urban policy
”
artigo
article
266
cáveis na Macroárea de Estruturação Metropolitana, região de reestruturação urbana e
principal território de intervenção via projetos urbanos, como as operações urbanas
consorciadas. Em seguida, considerando que
o principal desaio da política urbana não
está na formulação do sistema, mas em sua
implementação, apresentamos alguns elementos de desempenho das operações urbanas consorciadas em São Paulo, evidenciando desaios de gestão para o controle público
do desenvolvimento de projetos urbanos
nesse território de reestruturação urbana.
Pretendemos demonstrar que medidas conjunturais podem agravar problemas urbanos
estruturais, ao levar a um desenvolvimento
urbano mais concentrador e mais suscetível
à centralidade de alguns setores econômicos
predominantes.
struments applicable to the Macro-area of
Metropolitan Structuring are presented, this
being the region of urban re-structuring and
the principal territory of intervention via
urban projects, such as urban operations
in consortium. Following this, considering
that the main challenge to urban policy lies
not in formulating the system but rather in
implementing it, we present some elements
of the performance of the consortium urban
operations in São Paulo, showing challenges
to management for public control of developing urban projects in this sphere of urban
re-structuring. We aim to demonstrate how
conjunctural measures can worsen structural urban problems and lead to a more
concentrated form of urban development,
a form more susceptible to the centrality of
certain predominant economic sectors.
OS INSTRUMENTOS
DE ORDENAMENTO E
REESTRUTURAÇÃO URBANA NO
PLANO DIRETOR
THE INSTRUMENTS FOR
PLANNING AND URBAN
RE-STRUCTURING IN THE
DIRECTOR PLAN
O PDE 2014 organiza o território da cidade em
oito macroáreas, deinidas como regiões homogêneas que orientam ações prioritárias da
política urbana e a aplicação dos instrumentos
urbanísticos e ambientais, em função dos problemas urbanos e dos objetivos especíicos de
desenvolvimento estabelecidos para cada uma
dessas regiões.5 Deve-se destacar que a macroárea não tem efeito per se, como instrumento
no interior do sistema de planejamento urbano. A gestão do sistema e a deinição de ins-
The PDE of 2014 organizes the city territory into eight macro-areas which are deined
as homogeneous regions that serve to guide
priority actions of urban policy and application of the urbanistic and environmental
instruments by virtue of the urban problems
and speciic objectives of development set for
each of these regions.5 It should be stressed
that the macro-area has no effect per se as
an instrument within the system of urban
planning. Managing the system and de-
5 As macroáreas deinidas no PDE 2014 são: Macroárea de Estruturação
Metropolitana; Macroárea de Urbanização Consolidada; Macroárea de
Qualiicação da Urbanização; Macroárea de Redução da Vulnerabilidade
Urbana; Macroárea de Redução da Vulnerabilidade e Recuperação
Ambiental; Macroárea de Controle e Qualiicação Urbana e Ambiental;
Macroárea de Contenção Urbana e Uso Sustentável; Macroárea de
Preservação de Ecossistemas Naturais.
5 The macro-areas deined in the 2014 PDE are: the Macro-area of
Metropolitan Structuring; Macro-area of Consolidated Urbanization; the
Macro-area of Qualiication of Urbanization; the Macro-area of Reduction
of Urban Vulnerability; the Macro-area of Reduction of Vulnerability and
Environmental Recuperation; the Macro-area of Urban and Environmental
Control and Urban Improvement; the Macro-area of Urban Contention and
Sustainable Use; the Macro-area of Preservation of Natural Eco-systems.
cadernos fgv projetos
267
Fig. 2 Mapa-síntese das Macroáreas do PDE de São Paulo
Fig. 2 Synthetic map of the Macro-areas of the PDE of São Paulo
Fonte: SMDU, 2016
Source: SMDU, 2016
trumentos e projetos, somados à condução da
máquina pública, orientando esforços e recursos, são o que poderá ensejar a realização dos
objetivos especíicos para o desenvolvimento
urbano de cada macroárea.
Dentre as oito macroáreas, o território da
Macroárea de Estruturação Metropolitana
(MEM)6 é deinido como espaço estratégico
para a reorientação da centralidade urbana
(atualmente concentrada no vetor sudoeste
da cidade), para promover o adensamento
urbano (nesse espaço já beneiciado de infraestrutura) e para a necessária reversão de
usos deprimidos mediante a diversiicação da
economia urbana.
Conforme as diretrizes programáticas do
PDE, os instrumentos urbanísticos aplicados
nesse território devem ter por objetivo melhorar o aproveitamento da terra e da infraestrutura urbana existente, aumentando as densidades
demográicas e construtivas, promovendo o desenvolvimento de novas atividades econômicas,
a criação de empregos, a produção de habitação
de interesse social e de equipamentos públicos.
Isso porque se trata da região da cidade caracterizada pelo maior potencial de transformação e
de renovação de áreas subutilizadas, em função
da sua localização central na cidade, além de se
concentrarem os espaços atingidos pelo processo de reestruturação produtiva, haja vista sua
tradição industrial.
ining instruments and projects, as well as
leading the public machine and orienting efforts and resources, all this can be achieved
by the speciic objectives for the urban development of each macro-area.
Within the eight macro-areas, the territory of the Macro-area of Metropolitan
Structuring (MEM)6 is deined as the strategic space to re-orient urban centrality
(at present concentrated in the south-west
vector of the city), to promote urban densification (in this already privileged space
of infrastructure) and for the necessary
inversion of depressed uses by diversifying the urban economy.
According to the PDE’s programmatic
guidelines, the urbanistic instruments applied in this territory are meant to improve
how to beneit from the existing land and
urban infrastructure by increasing demographic and constructive densities, promoting new economic activities, creating jobs,
building social-interest housing and public
installations. The concept behind this program is that this region of the city is believed
to possess the greatest potential to transform and revive under-used areas, given its
central localization in the city, besides concentrating the spaces impacted by the process of productive re-structuring in view of
its industrial past.
6 Segundo o Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo, a
Macroárea de Estruturação Metropolitana abrange áreas das planícies
luviais dos rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí, com articulação com
o Centro e prolongamento junto às avenidas Jacu-Pêssego, Cupecê e
Raimundo Pereira de Magalhães e das rodovias Anhanguera e Fernão
Dias. Caracteriza-se pela existência de vias estruturais, sistema ferroviário
e rodovias que articulam diferentes municípios e polos de empregos
da Região Metropolitana de São Paulo, onde se veriicam processos de
transformação econômica e de padrões de uso e ocupação do solo, com a
necessidade de equilíbrio na relação entre emprego e moradia. Trata-se
de uma região que equivale a aproximadamente 15% da área do Município
de São Paulo e 3% da área da Região Metropolitana. O PDE deine para a
MEM setores e subsetores cuja subdivisão aponta para hipóteses de ação
especíicas, em função dos desaios programáticos e institucionais que se
colocam para cada parcela territorial. Ver uma análise especíica da MEM
em Franco, F. M.; D’Almeida, C. H.; Mendonça Abreu, G. K., 2015.
6 According to the Strategic Director Plan of the City of São Paulo,
the Macro-area of Metropolitan Structuring covers areas of the luvial
plains of the Tietê, Pinheiros and Tamanduateí rivers, articulating with
the Center and extending along the Jacu-Pêssego, Cupecê and Raimundo
Pereira de Magalhães avenues and the Anhanguera and Fernão Dias
highways. The main feature of this macro-area is the existence of
structural roads, a railroad system and highways that join different
municipalities and job poles of the Metropolitan Region of São Paulo,
where one can see processes of economic transformation and patterns of
use and occupation of the land, witnessing the necessity of balancing the
relationship between employment and housing. This is a region equivalent
to approximately 15% of the area of the Municipality of São Paulo and
3% of the area of the Metropolitan Region. The PDE deines for the MEM
sectors and sub-sectors whose sub-division suggests speciic actions by
virtue of the programmatic and institutional challenges posed for each
territorial segment. See a speciic analysis of the MEM in Franco, F. M.;
D’Almeida, C. H.; Mendonça Abreu, G. K., 2015.
cadernos fgv projetos
269
Fig. 3 Mapa-síntese de leitura/diagnóstico: localização da concentração dos
empregos formais urbanos em relação à localização das áreas mais vulneráveis
da cidade
Fig. 3 Synthetic map for reading/diagnosis: localization of the concentration of formal urban jobs in relation to the localization of the most vulnerable areas in the city
Fonte: SMDU, 2016 e 2014
Source: SMDU, 2016 and 2014
artigo
article
270
Fig. 4 Mapa-síntese de leitura/diagnóstico: localização das plantas fabris da cidade em relação ao território da MEM
Fig. 4 Synthetic map for localization of the city’s factories in relation to the territory of the MEM
Fonte: SMDU, 2016 e 2014
Source: SMDU, 2016 and 2014
cadernos fgv projetos
271
Historicamente, esse território acolheu as
zonas destinadas ao uso industrial, para garantir terrenos grandes e bem localizados
para o desenvolvimento produtivo. Em função de mudanças no padrão de uso do solo e
da diversiicação da economia da cidade, a estratégia de regulação sobre essa área também
foi se transformando, privilegiando-a para a
reconversão urbana até chegar à constituição
de um mosaico de operações urbanas consorciadas (OUCs),7 no PDE de 2002. Contudo,
algumas áreas demarcadas naquele plano se
mostraram inviáveis para a utilização desse
instrumento, por sua lógica de arrecadação da
mais-valia urbana não ser operacional ou desejável na parcela territorial ali determinada.8
A última década mostrou que os desaios
para indução do desenvolvimento urbano em
territórios de reestruturação produtiva, como
a MEM, passam por incluir outros agentes de
desenvolvimento territorial, para além do setor imobiliário, que têm interesse econômico
na renovação urbana desses territórios pela
oportunidade de reversão das antigas plantas industriais subutilizadas. Esses desaios
implicam, ainda, diversiicar as formas de i-
This territory used to be the location of
the zones intended for industrial use, guaranteeing large terrains well located for productive development. Due to changes in the
rules for use of the land and the diversiication of the city’s economy, the regulating
strategy in respect to this area also underwent change, prioritizing it for urban reconversion until it grew into a mosaic of consortium urban operations (OUCs)7 in the PDE
of 2002. Nevertheless, some of the areas demarked in that plan proved inadequate for
the use of this instrument since the logic of
collecting urban added-value was neither
operational nor desirable in that particular
territorial segment.8
The last ten years have shown that the
challenges to promote urban development
in territories of productive re-structuring,
such as the MEM, now include other agents
involved in territorial development besides
the property sector, agents interested in the
urban revival of these territories based on
the economic opportunity of transforming
the old under-used industrial plants. These
challenges also entail diversifying the forms
7 A Operação Urbana Consorciada é um instrumento de reordenamento
urbanístico deinido no Estatuto da Cidade como um “conjunto de
intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal,
com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes
e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área
transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização
ambiental” (Brasil, 2001). Para sua aplicação, é necessária a aprovação
de uma lei municipal especíica que delimite uma área para aplicação do
instrumento. A especiicidade da Operação Urbana Consorciada está na
possibilidade de alteração de parâmetros de uso do solo, especialmente com
relação ao potencial construtivo da área, associada à venda, pela Prefeitura,
de Certiicados de Potencial Adicional de Construção (CEPACs), livremente
negociados no mercado. O valor arrecadado com a venda dos CEPACs é
destinado à viabilização das intervenções planejadas para o território
especiicado.
7
The Consortium Urban Operation is an instrument of urbanistic
planning deined in the Statute of the City as a “set of interventions and
measures coordinated by the municipal government with the participation
of owners, residents, permanent users and private investors aiming
at bringing about structural urbanistic changes, social improvements
and environmental valorization in a given area” (Brasil, 2001). The
application of the instrument requires the approval of a speciic municipal
law delimiting the area. The speciic characteristic of the Consortium
Urban Operation lies in the possibility of altering the parameters for
use of the land, especially in respect to the building potential of the area,
together with the City Hall selling Certiicates of Additional Potential
of Construction (CEPACs) freely negotiated on the market. The value
collected with the sale of the CEPACs is destined to make feasible the
interventions planned for the speciied territory.
8
Os estudos realizados sobre a Operação Urbana Consorciada Rio
Verde-Jacu (OUC-RVJ), por exemplo, revelaram que a dimensão do
perímetro previsto era muito maior que das demais operações urbanas,
e a situação de precariedade que caracteriza esse território tornavam o
modelo tradicional de OUC (baseado na captação de recursos pela emissão
de CEPACs) inviável. Não havia interesse da iniciativa privada em investir
naquele perímetro e sua viabilidade dependeria de uma primeira onda
de vultosos investimentos públicos. Revogada a operação urbana, foram
adotados outros mecanismos, como a Lei de Incentivos Fiscais, para induzir
a reestruturação produtiva e fomentar o desenvolvimento das centralidades
urbanas na região.
8 The studies carried out on the Rio Verde-Jacu (OUC-RVJ) Consortium
Urban Operation, for example, revealed that the dimension of the
considered perimeter was much bigger than the other urban operations,
and the precarious situation that characterized this territory made the
traditional OUC model (based on capturing resources via emission of
CEPACs) unfeasible. Private initiative had no interest in investing in
that perimeter and its feasibility would depend on an initial low of
large public investments. Once the Urban Operation was revoked, other
mechanisms were adopted, such as the Law of Tax Incentives, in order to
promote productive restructuring and foster the development of the urban
centralities in the region.
artigo
article
272
nanciamento da ação pública e os instrumentos de intervenção urbana e, ao mesmo tempo, induzir a ampliação de oferta e qualidade
de empregos, a diversiicação da economia e
a inovação, por meio de programas de desenvolvimento econômico. Finalmente, é preciso
promover o adensamento populacional, considerando esse território como estratégico
para a produção de habitação de interesse
social. Trata-se, portanto, de induzir um processo de reestruturação urbana com a valorização do uso do espaço urbano, sem impulsionar estritamente a valorização da terra e
sem agravar a segregação socioespacial.
Essa complexa equação impõe a revisão
da tradicional proposição de instrumentos
urbanísticos autoaplicáveis,9 em direção à articulação de mecanismos indutores e ativos,
o que requer maior controle e coordenação,
pelo poder público, do processo de reestruturação fundiária e implementação de projetos
de interesse público. Em princípio, foi da relexão sobre essas questões que surgiu uma
das inovações do PDE 2014: o Projeto de Intervenção Urbana (PIU).
O PDE prevê um conjunto de instrumentos de ordenamento passíveis de utilização
na MEM: Operações Urbanas Consorciadas,
Concessões Urbanísticas, Áreas de Intervenção Urbana e Áreas de Estruturação Local.
Muitos desses instrumentos já existiam. A
inovação (além de novas redações e conteúdo
dados à lei) é a associação entre eles e o fato
de que, em vez de serem demarcados a priori, passam a requerer que sua utilização seja
precedida de um PIU. É a discussão e a estruturação do PIU, no momento em que for proposto, que indica o instrumento adequado à
intervenção urbana pretendida, vis-à-vis os
of inancing such public actions and the
instruments of urban intervention, at the
same time inducing increased supply and
the quality of jobs, diversifying the economy and innovation through programs of
economic development. Lastly, population
density needs to be promoted by considering this territory as strategic for the building of social-interest housing. It is therefore
a matter of inducing a process of urban
re-structuring that valorizes the use of urban space without strictly raising the value of the land and without worsening socio-spatial segregation.
This complex equation calls for a revision
of the old proposition of self-applicable urbanistic instruments,9 replacing them with
articulated active mechanisms. This requires
giving the government more control and coordination of the process of land-tenure by
re-structuring and implementing projects of
public interest. In principle, it was relecting
on such issues that one of the innovations of
the 2014 PDE was conceived: the Urban Intervention Project (PIU).
The PDE provides for a set of planning
instruments available to the MEM: Consortium Urban Operations, Urbanistic Concessions, Areas of Urban Intervention and Areas of Local Re-structuring. Many of these
instruments already existed. The innovation
(aside from new texts and content added to
the law) lies in their being associated with
the fact that instead of being demarked a
priori, they now require to be used following
a PIU. The discussion and structuring of the
PIU, at the moment it is proposed, is what
indicates which instrument is appropriate
for the intended urban intervention, vis-à-
9 Instrumentos autoaplicáveis passam a vigorar assim que aprovada a
lei que os institui, ou seja, não requerem uma ação de gestão para a sua
implantação ou indução.
9 Instruments become self-applicable as soon the law instituting them
is approved, that is to say, there is no need for administrative action for
implantation or induction.
cadernos fgv projetos
273
Fig. 5 Mapa-síntese de leitura/diagnóstico: localização da concentração da
densidade populacional bruta na cidade em relação ao território da MEM
Fig. 5 Synthetic maps for reading/diagnosis: localization of the concentration of
gross population density in the city in relation to the territory of the MEM
Fonte: SMDU, 2016
Source: SMDU, 2016
artigo
article
274
Fig. 6 Mapa-síntese de leitura/diagnóstico: localização das zonas de ocupação
especial, zonas de desenvolvimento econômico e zonas de preservação industrial em relação ao território da MEM
Fig. 6 Synthetic maps for reading/diagnosis: localization of the zones of special
occupation, zones of economic development and zones of industrial preservation
in relation to the territory of the MEM
Fonte: SMDU, 2016
Source: SMDU, 2016
cadernos fgv projetos
275
objetivos e diretrizes de transformação urbana da área em questão. Isso inverte (em relação ao PDE de 2002) a lógica e o processo de
proposição e discussão de determinado instrumento para a transformação urbana em
um território de interesse para intervenção.10
Além disso, o PDE possibilita a combinação desses instrumentos de ordenamento e
reestruturação urbana a um processo de reorganização fundiária, quando necessário: o
Reordenamento Urbanístico Integrado. Podem se associar, também, instrumentos de
combate à ociosidade de terras e garantia do
cumprimento da função social de imóveis,
como o Parcelamento, Ediicação e Utilização
Compulsórios (PEUC) e o Imposto Predial
e Territorial Urbano Progressivo no Tempo
(IPTU). Existe a possibilidade de combinação com mecanismos de fomento às centralidades urbanas: o Programa de Incentivos
Fiscais, que isenta ou reduz impostos municipais para a atração de atividades econômicas,
e as Zonas de Desenvolvimento Econômico e
Zonas Predominantemente Industriais para
fomentar a produção econômica industrial e
diversiicada na cidade. É prevista, ainda, a
articulação com a política habitacional, pela
demarcação de Zonas Especiais de Interesse
Social (Zeis) para a promoção de Habitação de
Interesse Social (HIS), com foco sobre a população com renda de até três salários mínimos;
e pela destinação de fontes de recursos para a
produção habitacional: o equivalente a 10% da
área computável de novos empreendimentos
vis the objectives and guidelines for transforming the area in question. In relation to
the PDE of 2002, this inverts the logic and
the process of proposition and discussion of
a given instrument for urban transformation in a territory selected for intervention.10
Furthermore, the PDE enables combining
these instruments of urban planning and
re-structuring with a process of land-tenure re-organization, whenever necessary:
Integrated Urbanistic Re-planning. Other
instruments to combat idle land and guarantee enforcement of the social function
of property can also be associated, for instance Compulsory Allotment, Building
and Use (PEUC) and the Progressive-Time
Urban Building and Territory Tax (IPTU).
Mechanisms to foster urban centralities
can also be combined, for example the Tax
Incentives Program, which exempts or reduces municipal taxes in order to attract
economic activities, and the Zones of Economic Development and Predominantly
Industrial Zones to promote economic and
diversiied industrial production in the
city. It is also provided to articulate with
the housing policy, by demarking Special
Zones of Social Interest (Zeis) in order to
promote Social-Interest Housing (HIS),
focusing on the population with an income of up to three minimum wages. Resources directed toward building houses
are equivalent to 10% of the computable
area of large new enterprises (Solidarity
10 As etapas previstas para o desenvolvimento do Projeto de Intervenção
Urbana (decreto nº 56.901, de 30 de março de 2016) são: 1- os estudos
devem propor o programa de interesse público para o desenvolvimento
urbano especíico ao local; 2- os estudos do programa são levados a debate
público em processo participativo para a validação do seu real interesse
público; 3- aprovado o programa, os estudos devem detalhar as modelagens
econômico-inanceiras, jurídicas e de gestão que demonstrem a viabilidade
do projeto; 4- todo o detalhamento é novamente submetido a debate
público para a sua avaliação consistente, mediante demonstração pelos
estudos detalhados. Caso aprovado, a implementação se dá por meio de
decreto regulamentador ou por meio de projeto de lei.
10 The stages foreseen for development of the Urban Intervention
Project (decree nº 56.901 of 30 March 2016) are as follows: 1 –
the studies must propose the public-interest program for specific
urban development of the space; 2 – the studies of the program are
submitted to public debate in a participative process to validate its
real public interest; 3 – once the program is approved, the studies
must detail economic-financial, juridical and administrative models to
demonstrate the viability of the project; 4 – all detailing is once again
submitted to public debate for its consistent evaluation guaranteed by
the detailed studies. If approved, implementation occurs by means of
an executive order or draft law.
artigo
article
276
de grande porte (Cota de Solidariedade), mínimo de 30% do Fundo de Desenvolvimento
Urbano (Fundurb) e 25% dos recursos arrecadados em Operações Urbanas Consorciadas
(OUC) e Áreas de Intervenção Urbana (AIU).
O PIU é proposto como o elemento de
articulação e coordenação entre as políticas
setoriais e a proposta programática da intervenção, com base em estudos de viabilidade e
na modelagem econômico-inanceira de sua
implementação, que devem ser apresentados
publicamente para subsidiar o debate sobre o
interesse público do projeto. Assim, em tese,
o PIU instrui o debate e estrutura a avaliação
sobre o melhor instrumento urbanístico para
viabilizar uma proposta de intervenção urbana. Uma operação urbana consorciada, por
exemplo, passa a requerer um estudo prévio
de viabilidade e a submissão ao debate público na forma de PIU, para apenas então seguir
como projeto de lei ao Legislativo.
Outro aspecto central do PDE 2014 foi a
proposição de dois dispositivos estruturantes
para o sistema de planejamento. Primeiro,
a revisão da fórmula de cálculo da Outorga
Onerosa do Direito de Construir (OODC),
constatado o reduzido valor arrecadado pelo
poder público em relação ao custo total das
incorporações privadas, com base na fórmula
vigente no PDE de 2002.11 Em segundo lugar,
o estabelecimento do coeiciente de aproveitamento básico (CAbas) gratuito igual a 1,0
em toda a cidade. O coeiciente de aprovei-
Quota), a minimum of 30% of the Urban
Development Fund (Fundurb) and 25% of
the resources collected from Consortium
Urban Operations (OUC) and Areas of Urban Intervention (AIU).
The PIU is seen as a the element that articulates and coordinates sectorial policies
and the programmatic proposal of the intervention, based on feasibility studies and the
economic-inancial modeling of implementation; these are to be presented publicly as
a contribution to the debate on the public interest of the project. In doing so, the PIU is in
thesis instructing the debate and structuring
the assessment of the best urbanistic instrument to make a proposed urban intervention
feasible. A consortium urban operation, for
instance, demands a prior feasibility study
and in the PIU version is submitted to public
debate and only then proceeds to the Legislative as a draft law.
Another key aspect of the 2014 PDE was
the proposition of two structuring provisions for the planning system. Firstly, revision of the formula to calculate the Onerous
Concession of Building Rights (OODC), following the reduced amount collected by
the government with regard to the total
costs of private takeovers, based on the
formula used in the PDE of 2002.11 Secondly, setting the free basic-benefit coefficient (CAbas) equal to 1,0 for the whole
city. The maximum-benefit coefficient
11
Segundo Montandon e Ignatios (2016), o reduzido desempenho
econômico da arrecadação da Outorga Onerosa do Direito de Construir
em relação ao custo total da incorporação, incluindo custo de terreno (o
valor arrecadado com a contrapartida foi inferior a 1,5% na participação
dos empreendimentos – em valores corrigidos pelo INCC), observandose o período entre 2004 e 2014, período de vigência da arrecadação com
base na fórmula adotada no PDE 2002, se deve a algumas razões: (i) a base
de cálculo adotada (PGV) para estabelecer o valor do terreno se mostrou
defasada em relação aos valores praticados pelo mercado imobiliário;
(ii) a própria fórmula de cálculo adotada gerou redução do valor unitário
pago por metro quadrado de área construída adicional; e (iii) a pouca
quantidade de metros quadrados adquirida, uma vez que o coeiciente de
aproveitamento básico igual a 2 redundou em menor consumo de estoque
de potencial construído adicional.
11
According to Montandon and Ignatios (2016), the diminished
economic performance of capturing the Onerous Concession of Building
Rights vis-à-vis the total cost of the incorporation, including the cost of
the terrain (the value collected with the counterpart was less than 1,5%
of the share of the enterprises – in values updated by the INCC), for the
2004-2014 effective period of capture, based on the formula used in the
2002 PDE, was explained by several reasons: (i) the base for calculating
used (PGV) to establish the value of the terrain was lagged vis-à-vis
the values in effect practiced in the realty market; (ii) the very formula
adopted for calculating led to a drop in the unitary value paid per square
meter of additional area constructed; and (iii) the scant amount of square
meters bought, since the basic coeficient of use equal to 2 made for smaller
consumption of the stock of additional potential construction.
cadernos fgv projetos
277
Fig. 7 Mapa-síntese dos projetos estruturantes das propostas dos Projetos de
Intervenção Urbana na MEM
Fig. 7 Synthetic map of the structuring projects of the proposals of the Urban
Intervention Projects in the MEM
1 Arco Tietê
Arco Faria Lima-Água Espreiada
3 Projetos estruturantes: Requalificação da
Projetos estruturantes:
OUC Água Branca;
Apoios Urbanos Norte e
Sul; Centralidade
Metropolitana; Projeto
Urbano da Lapa
Arco Pinheiros
2 Projetos estruturantes:
Reparcelamento
CEAGESP; Polo
Tecnológico Jaguaré
1
5
2
Arco Jurubatuba
7 Projetos estruturantes: Centralidade
econômica regional de Santo Amaro
Largo 13; Centrais de triagem e
indústria de reciclagem com vínculo a
transporte hidroviário; Plataforma
logística nas proximidades da usina de
Piratininga; Incentivo a habitação na
margem leste do rio; Mobilidade urbana
de pedestres e ciclistas; Parques e
áreas verdes ao longo dos rios
Pinheiros, Guarapiranga e Jurubatuba
4
6
3
Avenida Santo Amaro e da Avenida
Juscelino Kubistchek; Implantação da Av.
Chucre Zaidan; Habitação de interesse
social Jardim Panorama; Habitação de
interesse social e espaços produtivos
Favela Coliseu; Rede local de equipamentos, espaços públicos, áreas verdes, e
transposição de pedestres e ciclistas por
sobre o Rio Pinheiros; Ciclovia e
equipamentos de apoio aos ciclistas e
mobiliário urbano no Largo da Batata
Arco Centro
4 Projetos estruturantes: Requalificação
7
Arco Tamanduatei 6
Projetos estruturantes: OUC BT:
obras de drenagem, espaços
públicos, mobilidade, Eixo
Monumental, recuperação do
Córrego do Ipiranga, retirada do
Tampão do rio Tamanduatei,
implantação de polo de
desenvolvimento econômico e
corredores de Ônibus; Parque
Linear Córrego dos Meninos
do vale do Anhangabaú; Reforma dos
calçadões; Centro Aberto; Parklets;
Projeto circuito de compras; Ocupação
de baixo de viadutos; Requalificação das
vias de ligação entre equipamentos e
espaços públicos
Arco Leste
5 Projetos estruturantes: Rede de
estruturação; Habitação para
populações em áreas de risco;
Recuperação ambiental ao longo dos
córregos; Corredor Celso Garcia
1
Tietê Arch
Structuring projects: Água Branca OUC; North and South Urban Supports; Metropolitan Centrality; Lapa Urban Project
2
Pinheiros Arch
Structuring projects: CEAGESP re-allotment; Jaguaré technological pole
3
Faria Lima-Água Espreiada Arch
Structuring projects: Improvements to Santo Amaro and JuscelinoKubitschek Avenues; Implantation of ChucreZaidan
Avenue; Jardim Panorama social-interest housing; Favela Coliseu social-interest housing and productive spaces; Local
network of equipments, public spaces, green areas and transposition of pedestrians and cyclists over the Pinheiros river;
Bicycle lane and support for cyclists and urban housing in Largo da Batata
4
Central Arch
Structuring projects: Improvements to Anhangabau Valley; Sidewalks reform; Open Center; Parklets; Shopping circuit
project; Occupation under viaducts; Improvement of streets linking public equipmentand spaces
5
East Arch
Structuring projects: Structuring network; Housing for population in areas of risk; Environmental recuperation along
waterways; Celso Garcia Corridor
6
Tamanduatei Arch
Structuring projects: BT OUC: drainage works, public spaces, mobility, Monumental Axis, recuperation of Ipiranga
waterway; removal of the Tampão of the Tamanduatei River; implantation of economic development pole and bus
corridors; Corrego dos Meninos Linear Park
7
Jurubatuba Arch
Structuring projects: Regional economic centrality of Santo Amaro Largo 13; Triage centersand recycling industry linked to
waterwaytransportation; logistics platform near Piratininga plant; incentive to housing on the east bank of the river; urban
mobility for pedestrians and cyclists; parks and green areas along the Pinheiros, Guarapiranga and Jurubatuba Rivers
Fonte: SMDU, 2016
Source: SMDU, 2016
artigo
article
278
tamento máximo (CAmax) foi ixado em 2,0,
mediante pagamento de OODC, exceto nos
Eixos de Estruturação da Transformação
Urbana, no qual o coeiciente de aproveitamento máximo (CAmax) é igual a 4,0, para
promover o adensamento urbano junto aos
principais eixos de transporte de média e alta
capacidade. A exceção se apresenta como medida possível apenas no território da MEM,
que pode ampliar CAmax, mediante aprovação de lei especíica que adote os instrumentos de ordenamento e reestruturação urbana,
como se demonstrou anteriormente, a partir
da apresentação da proposta de um PIU.
Assim, o sistema de planejamento urbano
estabelecido pelo marco regulatório da cidade de São Paulo apresenta-se como um cardápio diversiicado de instrumentos urbanísticos, mecanismos de inanciamento e outros
dispositivos, a serem articulados em projetos
urbanos para ins de intervenção, com estratégias distintas para territórios diferentes.
Esse arranjo possibilita a promoção de iniciativas especíicas e adaptações conjunturais,
sem que se perca o vínculo com as diretrizes
gerais e as inalidades programáticas do PDE,
que balizam os conteúdos dos projetos de interesse público, sob ação e orientação da gestão pública.
(CAmax) was set at 2,0 upon payment of
OODC, save for the Urban Transformation
Structuring Axes, in which case the maximum-benefit coefficient (CAmax) is equal
to 4,0 for the purpose of promoting urban
density close to the main medium- and
high-capacity transportation axes. This
exception is presented as a possible measure only in the MEM territory, which can
expand CAmax by means of approval of a
specific law that adopts the instruments
for urban planning and re-structuring,
as previously demonstrated, pursuant to
presentation of the proposal of a PIU.
Accordingly, the urban planning system
established by the regulatory framework
of the city of São Paulo is presented as a diversiied menu of urbanistic instruments, inancing mechanisms and other provisions,
all to be articulated in urban projects for the
purpose of intervention, with different strategies for different territories. This arrangement enables promoting speciic initiatives
and conjunctural adaptations without losing the link with the general guidelines and
programmatic objectives of the PDE, which
lend support to the content of the projects of
public interest under the action and orientation of the public administration.
A EXPERIÊNCIA DAS
OPERAÇÕES URBANAS NA
CIDADE SÃO PAULO
THE EXPERIENCE OF URBAN
OPERATIONS IN THE CITY OF
SÃO PAULO
As operações urbanas da cidade de São Paulo têm sido, com frequência, criticadas por
seus resultados frente a sua capacidade de
arrecadação de recursos, como mecanismo de
recuperação da mais-valia fundiária urbana.12
The urban operations of the city of São Paulo have frequently been criticized for their
results vis-à-vis their capacity to capture
resources as a means to recover the urban
land-tenure value-added.12 The instrument,
12 A análise bibliográica sobre as OUC, sobretudo na experiência urbana
em São Paulo, aborda a avaliação dos resultados da sua implementação sob
12
Bibliographical analysis of the OUCs, especially in the urban
experience of São Paulo, addresses evaluation of the results of their
cadernos fgv projetos
279
Fig. 8 Mapa-síntese dos territórios com CA máximo acima de 2 na cidade: os
Eixos de Estruturação da Transformação Urbana, com CA máximo de 4; a MEM,
com possibilidade de acréscimo do CA conforme seja proposto pelos estudos de
viabilidade de Projeto de Intervenção Urbana
Fig. 8 Synthetic map of territories with maximum CA above 2 in the city: the Axes
of the Structuring of Urban Transformation, with maximum CA of 4; the MEM,
with the possible addition of the CA as proposed by feasibility studies of the Urban Intervention Project
Fonte: SMDU, 2014
Source: SMDU, 2014
artigo
article
280
O instrumento, que teoricamente poderia
ter resultados distributivos, na prática tem
revelado signiicativo caráter concentrador,
do ponto de vista social e espacial, principalmente na comparação entre a OODC e os
Certiicados de Potencial Adicional de Construção (Cepac).13
A OODC e os Cepacs demostram efeitos e
comportamentos bastante diferentes no território: o território principal de captura da
Outorga Onerosa é o vetor sudoeste da cidade, enquanto a destinação dos recursos arrecadados, na forma de investimentos públicos,
se dá basicamente nas áreas mais periféricas.
Já os Cepacs, pela própria natureza da OUC,
têm origem e destinação em áreas coincidentes (ver Figuras 9 a 11).
Relexões e disputas em torno dessas avaliações motivaram a busca por aprimorar as
operações urbanas e sua relação com outros
instrumentos urbanísticos, desde a abordagem no plano diretor até o que estabelecem
suas leis especíicas. O caminho trilhado desde as operações interligadas14 até o projeto
de lei nº 273/2015, que propôs a Operação
which theoretically could bear distributive
results, have in practice revealed a signiicant concentrating characteristic from the
social and spatial point of view, principally when compared with the OODC and the
Certiicates of Additional Building Potential
(Cepac).13
The effects and behavior of the OODC and
the Cepacs in the territory are quite different: the principal territory for capturing the
Onerous Concession is the south-west vector
of the city, whereas the resources collected in
the form of public investments are basically
destined to the areas more on the outskirts.
As for the Cepacs, by the very nature of the
OUC these originate in and are destined to
coinciding areas (see Figures 9-11).
Relections and disputes concerning these
assessments motivated attempting to improve urban operations and their relationship with other urbanistic instruments, from
the approach in the director plan to what
speciic laws establish. The path trodden
since the interlinked operations14 up to draft
law 273/2015, which proposed the Taman-
diferentes aspectos, como a consequência à segregação socioespacial (Fix,
2001; Fix e Ferreira, 2001; Maricato e Ferreira, 2002), a pouca eicácia
na recuperação da mais-valia gerada em comparação aos investimentos
realizados (Montandon, 2007), a proeminência das grandes obras viárias
que ganham relevo nessas experiências (Nobre, 2009). Ver um apanhado
geral sobre as OUCs e as críticas dos que as estudam em Nobre, 2016.
implementation from different angles, such as the consequent sociospatial segregation (Fix, 2001; Fix and Ferreira, 2001; Maricato and
Ferreira, 2002), ineficacy in recovering the added-value generated when
compared with the investments made (Montandon, 2007), prominence of
the large road works prioritized in these experiences (Nobre, 2009). See
general comments on the OUCs and the criticism of those who study them
in NOBRE, 2016.
13 A Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC) e os Certiicados
de Potencial Adicional de Construção (Cepacs) são concebidos como
instrumentos de recuperação da mais-valia fundiária urbana, entendida
como o incremento no valor do imóvel alheio ao esforço do proprietário
(por exemplo, em decorrência de ações públicas). Os dois instrumentos,
previstos no Estatuto da Cidade (2001), baseiam-se no princípio do solo
criado, que é o potencial construtivo acima do coeiciente de aproveitamento
básico igual a 1 e que deve ser objeto de contrapartida (compensação),
porque o potencial construtivo é um bem público. (Montandon, D.T.;
Ignatios, M.F., 2016).
14 As operações interligadas, antecessoras das operações urbanas, tiveram
origem na lei municipal nº 10.209/1986, por meio da qual proprietários
de terrenos ocupados por favelas ou núcleos habitacionais subnormais
poderiam requerer alteração de índices e regras de uso e ocupação do
terreno ocupado ou de outro de sua propriedade, desde que construíssem
habitações de interesse social para a população “favelada”. Posteriormente,
a lei municipal nº 11.773/1995 abriu essa possibilidade a todos os terrenos,
vinculando os recursos de contrapartida ao fundo habitacional.
13
The Onerous Concession of Building Rights (OODC) and the
Certiicates of Additional Building Potential (Cepacs) are devised as
instruments to recover urban land-tenure added-value, this being
understood as the increase of the value of the property independent of
the efforts of the owner (for example, as a result of public actions). Both
instruments, provided in the Statute of the City (2001), are based on
the principle of “created land”, this being the building potential above
the coeficient of basic use equal to 1 and which should be liable to a
counterpart (compensation), since the building potential is a public asset.
(Montandon, D.T.; Ignatios, M.F., 2016).
14
The interlinked operations that came before urban operations
originated in municipal law nº 10.209/1986, by means of which the
owners of land occupied by shantytowns or sub-normal housing nuclei
could request alterations to indices and rules for use and occupation of
the occupied terrain or another of their property, provided that they build
social-interest housing for the “slum” population. Later on, municipal
law nº 11.773/1995 opened this possibility to all terrains, linking the
counterpart resources to the housing fund.
cadernos fgv projetos
281
Fig. 9 Mapa-síntese do comportamento do mecanismo de OODC: os territórios
prioritários de origem da captura da mais-valia (ano base 2013)
Fig. 9 Synthetic map of the behavior of the OODC mechanism: the priority territories for capturing added-value (base-year 2013)
Fonte: SMDU, 2015
Source: SMDU, 2015
artigo
article
282
Fig. 10 Mapa-síntese do comportamento do mecanismo de OODC: os territórios prioritários de destinação da OODC arrecadada (ano base 2014)
Fig. 10 Synthetic map of the territories prioritized for destination of the collected OODC (base-year 2014)
Fonte: SMDU, 2015
Source: SMDU, 2015
cadernos fgv projetos
283
Fig. 11 Mapa-síntese do comportamento do mecanismo de CEPAC: cada OUC é
o território de origem e de destinação da captura arrecadada
Fig. 11 Synthetic map of the behavior of the CEPAC mechanism: each OUC is the
territory of origin and destination of the resources collected
Fonte: SMDU, 2014
Source: SMDU, 2014
artigo
article
284
“
Duas décadas
de experiência
permitem reletir
sobre o que se situa
entre o desenho do
instrumento e os
resultados que vão
se consolidando ao
longo dos anos: a
implementação da
operação urbana
como um conjunto
de ações e políticas
levadas a cabo
pela administração
municipal
”
Urbana Consorciada Bairros do Tamanduateí (ainda não apreciado pela Câmara Municipal), revela incrementos na deinição do
projeto urbanístico (que orienta o rol de intervenções a serem executadas e as exceções
à legislação geral que serão oferecidas), no
estabelecimento de percentuais para habitações de interesse social, na abrangência das
intervenções de interesse público, bem como
nos mecanismos de gestão participativa e de
controle social.
Duas décadas de experiência permitem reletir sobre o que se situa entre o desenho do
instrumento e os resultados que vão se consolidando ao longo dos anos: a implementação da operação urbana como um conjunto
de ações e políticas levadas a cabo pela administração municipal, somadas às transformações de ocupação e uso que se concretizam no território. São 20 anos de vigência
da Operação Urbana Centro (OUC), 16 anos
da Operação Urbana Consorciada Água Espraiada (OUCAE), 13 anos da revisão da
Operação Urbana Consorciada Faria Lima
(OUCFL), antecedidos por nove anos da lei
nº 11.732/1995, e quatro anos da revisão da
Operação Urbana Consorciada Água Branca
(OUCAB), somados aos 18 anos de vigência
da Operação Urbana Água Branca (OUAB)
que a antecedeu. Atualmente, ainda que haja
espaço para novos ciclos, registra-se que um
primeiro pico de arrecadação de recursos e
de apresentação de propostas privadas de
adesão às operações urbanas vigentes em São
Paulo já aconteceu. Os estoques de potencial
adicional de construção estão esgotados na
maior parte dos setores da OUCAE, o que
não permite, até que haja revisão legal, novos empreendimentos privados. O último leilão de Cepacs da OUCFL, realizado em 2016,
vendeu apenas 2.405 dos 30 mil Cepacs ofertados. No território da OUCAB, houve grande
cadernos fgv projetos
285
duateí Neighborhoods Consortium Urban
Operation (still awaiting the appreciation
of the City Chambers), reveals an increased
deinition of the urbanistic project (which
orients the roster of interventions to be carried out and the exceptions to the general
legislation to be offered), in setting percentages for social-interest housing, in the range
of public-interest interventions, and in the
mechanisms of participative administration
and social control.
Two decades of experience allow relecting on what lies between the instrument designed and the results consolidated
throughout the years, namely, implementation of the urban operation as a set of
actions and policies carried out by the city
administration, plus the changes brought
about in the territory as regards occupation and use. The Center Urban Operation
(OUC) has been in place for 20 years, the
Água Espraiada Consortium Urban Operation (OUCAE) for 16, the Faria Lima
Consortium Urban Operation (OUCFL)
was revised 13 years ago, 9 years after law
11.732/1995 and 4 years following revision
of the Água Branca Consortium Urban Operation (OUCAB), added to the 18 years of
existence of its predecessor, Água Branca
Urban Operation (OUAB). At present, although there is space for new cycles, a irst
peak of collected resources and presentation of private proposals of adhesion to the
urban operations underway in São Paulo
has already been reported. The stocks of
additional building potential are already
exhausted in most of the OUCAE sectors,
which does not allow for any new private
enterprises until legal revision has been undertaken. The last auction of Cepacs in the
OUCFL, held in 2016, sold only 2,405 of the
30,000 Cepacs on offer. In the territory of
“
Two decades of
experience allow
relecting on
what lies between
the instrument
designed and the
results consolidated
throughout the
years, namely,
implementation of
the urban operation
as a set of actions
and policies carried
out by the city
administration
”
artigo
article
286
demanda por OODC, às vésperas da revisão
da lei que a transformou em consorciada, em
2013, de forma que apenas seis mil Cepacs
foram vendidos no primeiro leilão, realizado
em 2015. Nenhuma aplicação de Cepac foi realizada até o momento na versão consorciada
desta operação urbana.
Passado o momento de maior participação
do mercado de produção imobiliária, ganha
centralidade a discussão sobre a destinação
de recursos arrecadados e a avaliação dos resultados, em que é determinante a atuação do
poder público. Essa alternância de momentos na implementação da operação urbana
envolve o predomínio de diferentes procedimentos administrativos e o desempenho de
diferentes papeis pela prefeitura em sua atribuição de coordenação. Ainda que o interesse
do mercado imobiliário seja ressaltado como
imprescindível para o sucesso da operação
urbana, cabe ressaltar que é do poder público
a prerrogativa de apresentar a proposta legislativa, disponibilizar recursos técnico-administrativos para sua implementação, assim
como de mobilizar/convocar os colegiados
de gestão e provê-los de informações para a
tomada de decisão. Se os resultados da operação urbana são determinados por seu desenho e pela dinâmica de produção imobiliária,
é na ação (ou inação) da administração pública que eles são conformados.
Como instrumento de inanciamento de
intervenções e políticas públicas de desenvolvimento urbano, as operações urbanas de
São Paulo mostraram considerável potência
arrecadatória. O total de recursos auferidos
pelas quatro operações urbanas, de 1995 a
2016, em valores atualizados para 2016 (IPC-Fipe), ultrapassa os R$ 10 bilhões. Esse
montante corresponde, em sua maior parte
(64,66%), aos Certiicados de Potencial Adicional de Construção (Cepacs) das operações
the OUCAB there was a great demand for
OODC prior to the revision of the law that
changed it into a consortium in 2013, which
resulted in only 6,000 Cepacs being sold in
the irst auction held in 2015. So far, no Cepac application has been made in the consortium version of thus urban operation.
In the wake of the largest participation of
the property-building market, discussing the
destination of captured resources and evaluating the results are given priority, the determining factor being how the government
acts. These alternating moments in the implementation of urban operations involves
the predominance of different administrative
procedures and the performance of different
coordinating roles in City Hall. Despite the
emphasis on the interest of the property market being indispensable for the success of urban operations, it should be underscored that
the government has the prerogative of presenting the legislative proposal and making
technical-administrative resources available
for its implementation, as well as mobilizing/
convoking management colleagues and providing them with adequate information for
decision-taking. If the results of urban operations are determined by their design and the
dynamics of real-estate production, it is in the
action (or inaction) of the public administration that they are brought into harmony.
As instruments of inancing interventions
and public policies of urban development,
the urban policies of São Paulo have shown
considerable collecting power. The total of
resources registered by the four urban operations from 1995 to 2016, in values updated to 2016 (IPC-Fipe), exceeds R$ 10 billion.
This amount corresponds in large measure
(64,66%) to the Certiicates of Additional
Building Potential (Cepacs) of consortium
urban operations sold in auctions or used
cadernos fgv projetos
287
urbanas consorciadas, vendidos em leilões
ou utilizados para pagamento de obras do
programa de intervenções (as chamadas
“colocações privadas”). Adicionalmente, entram os recursos arrecadados com a Outorga
Onerosa do Direito de Construir, nas operações urbanas não consorciadas (OU Centro
e OUs Faria Lima e Água Branca antigas),
com 16,25%, e as receitas inanceiras decorrentes das aplicações bancárias, com 19,09%
(ver Tabela 1). As operações urbanas Água
Espraiada (OUCAE) e Faria Lima (OUCFL)
respondem por 88,68% do total das receitas
– 52,99% e 35,69%, respectivamente, a Água
Branca (OUCAB) por 10,45%, quase em sua
totalidade por recursos de OODC prévia à revisão que a transformou em consorciada e a
OU Centro entra com menos de 1% do total.
to pay for works of the interventions program (the so-called “private placements”).
In addition to this, the resources collected
through the Onerous Concession of Building Rights also enter the list, in the non-consortium urban operations (the Center OU
and the old Faria Lima and Água Branca
OUs), with 16,25%, plus the inancial revenue resulting from bank investments, with
19,09% (see Table 1). The Água Espraiada
(OUCAE) and Faria Lima (OUCFL) urban
operations account for 88,68% of the total
revenue – 52,99% and 35,69%, respectively,
Água Branca (OUCAB) for 10,45%, almost
all referring to OODC resources prior to the
revision that changed it into a consortium;
the Center OU is accountable for less than
1% of the total.
Tabela 1 Receitas das Operações Urbanas da Cidade de São Paulo (1997-2016)1
Table 1 Revenue of Urban Operations of the City of São Paulo (1997-2016)1
Cepac
-
4.308,58
2.190,72
10,28
6.509,58
64,66%
OODC
48,86
-
856,98
729,83
1.635,68
16,25%
Receitas Financeiras
Financial revenues
38,84
1.026,60
545,03
311,73
1.922,20
19,09%
TOTAL
TOTAL
87,71
5.335,17
3.592,74
1.051,83
10.067,45
100,00%
%
0,87%
52,99%
35,69%
10,45%
100,00%
Fonte: SP-Urbanismo, 2016
Source: SP-Urbanismo, 2016
1 Total de receitas com base no controle de entradas das contas bancárias das operações urbanas. Arrecadação com a venda de Cepac com base no valor
total arrecadado em cada leilão e colocação privada calculada com base no valor unitário do último leilão. Arrecadação com a venda de OODC com base no
total arrecadado por ano.
1 Total revenue based on the control of entries in the bank accounts of the urban operations. Collection from the sale of Cepacs based on the total revenue
captured at each auction and private placement calculated on the basis of the unitary value of the last auction. Collection from the sale of OODCs based
on the total captured per year.
artigo
article
288
Do total arrecadado pelas quatro operações
urbanas, foram gastos aproximadamente R$
6,5 bilhões, dos quais 60,86% correspondem
a gastos na função orçamentária urbanismo,
que abrange intervenções viárias e espaços
públicos (41,25% obras e serviços + 19,61%
desapropriações). A função habitação representa 17,89% dos gastos (11,39% obras e serviços + 6,50% desapropriações) e transportes
10,49%.15 As despesas com administração (remuneração pela gestão e execução das obras,
agentes inanceiros e despesas bancárias) somaram 7,17%, saneamento 3,57%; e cultura
menos de 1% (ver Tabela 2). Essa dominância
das despesas de urbanismo é explicada pela
participação signiicativa de algumas obras:
Of the total collected by the four urban operations, approximately R$ 6,5 billion were
spent, 60,86% of which corresponding to expenditure in the Urbanism budgetary function,
which covers road interventions and public
spaces (41,25% works and services + 19,61%
expropriations). The Housing function represents 17,89% of costs (11,39% works and services + 6,50% expropriations) and transportation 10,49%.15 Expenditure with administration
(remuneration for managing and executing
the works, inancial agents and bank expenses) amounted to 7,17%, sanitation 3,57%; and
culture less than 1% (see Table 2). This predominance of the urbanism costs is explained
by the signiicant share of certain works: the
15 A Prefeitura Municipal de São Paulo classiica as despesas típicas
da subfunção Transportes Coletivos Urbanos na função orçamentária
Transporte, embora essas sejam despesas tradicionalmente vinculadas à
função Urbanismo, conforme a Portaria MPOG nº 42/1999.
15 The São Paulo City Hall classiies the typical costs of the Urban
Collective Transportation sub-function in the Transportation budget
function, although these expenses are conventionally tied to the Urbanism
function, in accordance with MPOG Directive nº 42/1999.
cadernos fgv projetos
289
as pontes Octávio Frias de Oliveira (a ponte
Estaiada) e Laguna, os prolongamentos das
avenidas Chucri Zaidan e Jornalista Roberto
Marinho, na OUCAE, em conjunto com os
túneis Fernando Vieira de Melo e Max Feffer
e a reconversão do Largo da Batata, na OUCFL, representam aproximadamente 54% do
total gasto nessa função. Os investimentos na
função transportes referem-se basicamente
ao repasse para o Metrô (OUCAE e OUCFL) e
para o Corredor Berrini (OUCAE), enquanto
na função saneamento destacam-se as obras
de drenagem da OUCAB.
Octávio Frias de Oliveira (Estaiada) and Laguna bridges, the extensions made on Chucri
Zaidan and Jornalista Roberto Marinho avenues in the OUCAE, along with the Fernando
Vieira de Melo and Max Feffer tunnels and the
re-conversions of the Largo da Batata in the
OUCFL, amount to approximately 54% of the
total costs of this function. Investments in the
transportation function refer basically to the
pass-through for the Metro (OUCAE and OUCFL) and the Berrini Corrido (OUCAE), while
the sanitation function was especially notable
for the drainage works carried out in the OUCAB.
Tabela 2 Gastos das Operações Urbanas da Cidade de São Paulo, por operação
e por tipo do gasto (1997-2016)
Table 2 Cost of the Urban Operations of the City of São Paulo, by operation and
type of cost (1997-2016)
TOTAL
TOTAL
353,3
3.929,6
2.691,9
23,1
6.997,9
Cultura
Culture
-
-
-
1,3
1,3
0,02%
36,5
2.368,8
1.842,3
11,6
4.259,2
60,86%
Urb-Obras e Serviços
Urban Works
and Services
36,5
1.363,8
1.474,8
11,6
2.886,7
41,25%
Urb-Desapropriação
Urban Expropriation
-
1.005,0
367,6
-
1.372,5
19,61%
0,8
824,1
421,1
5,8
1.251,7
17,89%
Hab-Obras e Serviços
Housing Works and
Services
0,8
408,1
388,1
0,0
797,0
11,39%
Hab-Desapropriação
Housing Expropriation
-
415,9
33,0
5,7
454,6
6,50%
249,8
-
-
-
249,8
3,57%
Urbanismo
Urbanism
Habitação
Housing
Saneamento
Sanitation
cont.
artigo
article
290
cont.
Todas as OUs
OUCAB
OUCAE
OUCFL
OUC
Transporte
Transportation
-
480,1
253,7
-
733,8
10,49%
Administração
Administration
66,2
256,5
174,8
4,5
502,0
7,17%
All the OUs
%
Fonte: SP-Urbanismo, 2016
Source: SP-Urbanismo, 2016
A evolução no tempo (Gráico 1) mostra
sensível variação em intensidade e direcionamento dos gastos: adquiriram ritmo mais
elevado a partir de 2012, tendo sido registrados picos anteriores nos anos de 2004
e 2008, estes basicamente relacionados a
despesas com obras e serviços na função urbanismo. A partir de 2012, adquirem relevância os gastos na função habitação (79%
das despesas na função habitação são posteriores a 2012), transportes (78% pós-2012)
e saneamento (96% pós-2014). Essa mudança programática na aplicação dos recursos,
considerando-se as obras que causam maior
impacto em cada uma das funções, como foi
apontado, representa uma evolução distributiva nos investimentos, entendendo que
transporte coletivo, habitação e drenagem
beneiciam uma parcela mais abrangente da
população que os complexos viários. Entretanto, essas funções somadas representam
uma parcela pequena dos recursos (31,95%).
Destaca-se, também, o crescimento das
despesas com desapropriações, tanto na função urbanismo quanto na função habitação. As
desapropriações respondem por 26% do total
The time-frame (Graph 1) shows a remarkable variation in terms of intensity and
distribution of costs: these speeded up as of
2012, following previous peaks registered in
2004 and 2008, these being basically related to expenses with works and services of the
urbanism function. As of 2012, costs become
more noticeable in the housing function
(79% of expenses in the housing function appear after 2012), transportation (78% post2012) and sanitation (96% post-2014). This
programmatic change in the application of
resources, considering the works that cause
greater impact in each of the functions,
as shown above, represents a distributive
evolution in investments, since collective
transportation, housing and drainage are
understood to beneit a wider portion of the
population than the road complexes. Notwithstanding, as a whole these items together represent a small portion of the resources
(31,95%).
Special mention is also due to the growth
of expenses with expropriations, in both the
urbanism and housing functions. Expropriations account for 26% of the total costs
cadernos fgv projetos
291
dos gastos ao longo das duas décadas consideradas e o período 2013-2016 concentra 71% dessas despesas. Dividem-se em 75% relacionadas
a desapropriações na área de urbanismo e 25%
na área de habitação. Essa é outra questão que
merece aprofundamento. É certo que as despesas com desapropriações são inevitáveis frente
ao porte de intervenções das operações urbanas
e que, especiicamente na função habitação,
podem contribuir para a constituição de um
parque público de HIS. Porém, o custo elevado
da terra, inluenciado pela própria incidência
da operação urbana, especialmente por terem
se concentrado os gastos nos últimos anos do
período analisado, pode representar o retorno
à iniciativa privada de uma parcela elevada dos
recursos que haviam sido arrecadados como
recuperação da valorização imobiliária.
across the two decades under consideration
and the 2013-2016 period concentrates 71%
of such costs (75% related to expropriations for urbanism and 25% for housing).
This is yet another matter that deserves
more attention. It is true that spending on
expropriations is inevitable in view of the
great number of interventions of the urban
operations, which – speciically as regards
housing – can contribute to creating a social-interest public park. However, the high
cost of the land, inluenced by the incidence
of the urban operation itself, and especially having concentrated costs in the last few
years of the period under analysis, may
represent a return to the private initiative
of a high portion of the resources collected
as recuperation of property valorization.
Gráico 1 Gastos das Operações Urbanas da Cidade de São Paulo, por ano e por
função (1997-2016)
Graph 1 Cost of Urban Operations of the City of São Paulo, by year and function
(1997-2016)
1200
1000
800
600
400
200
0
1
1
97 1998 1999 000 200 002 003 004 005 006 007 008 009 2010 201 2012 2013 2014 2015 2016
2
2
2
2
2
2
2
2
2
19
Fonte: SP-Urbanismo, 2016
Source: SP-Urbanismo, 2016
Administração
Administration
Transporte
Transportation
Saneamento
Sanitation
Habitação
Housing
Urbanismo
Urbanism
Cultura
Culture
artigo
article
292
Os investimentos realizados com recursos
das operações urbanas nas funções urbanismo, habitação, saneamento e transportes
têm ampliado sua importância no total de
investimentos do município nessas funções,
passando de 19% em 2011 a 30% em 2016,
basicamente pelo incremento nos gastos das
OUC (Gráico 2). Pode-se dizer que a ampliação da participação dos valores vinculados
às operações urbanas signiica uma concentração territorial mais signiicativa dos investimentos públicos, uma vez que esses recursos têm aplicação vinculada ao perímetro
da operação urbana e que a maior parte dos
investimentos se restringe a duas delas. Isto
requer ainda maior atenção em relação ao
conteúdo qualitativo dos gastos, ou seja, para
que tipo de obras e serviços estão sendo direcionados, de forma a buscar intervenções que
beneiciem parcelas maiores da população e
tenham impacto territorial mais estruturante
para a cidade.
The investments made with resources
from urban operations in the urbanism,
housing, sanitation and transportation
functions have gained more importance
in the total investments of the city in such
functions, rising from 19% in 2011 to 30% in
2016, basically on account of the increased
costs of the OUC (graph 2). It may be said
that the growth of the share of the values
linked to the urban operations points to a
more signiicant territorial concentration of
public investments, seeing as the application
of these resources is connected to the perimeter of urban operations and most of such
investments are limited to two of them. This
calls for even more attention with regard to
the qualitative content of the costs, in other
words, for which type of works and services
they are meant, so as to select interventions
that beneit larger segments of the population and have a more structuring territorial
impact on the city.
Gráico 2 Participação percentual dos investimentos das operações urbanas no
total de investimentos do município, para as funções orçamentárias urbanismo,
habitação, saneamento e transporte
Graph 2 Percentage share of investments in urban operations in the total investments of the municipality, for the urbanism, housing, sanitation and transportation budgetary functions
0,2991
30%
0,2868
0,2589
27%
0,2646
0,2358
23%
20%
0,1862
16%
2011
Fonte: SP Urbanismo, 2016
Source: SP Urbanismo, 2016
2012
2013
2014
2015
2016
cadernos fgv projetos
293
No que se refere à produção privada com
base nos benefícios oferecidos pelas operações urbanas, registra-se que foram adquiridos, nas quatro operações (OUCAE, OUCFL,
OUCAB e OUC), 5,9 milhões de metros quadrados de potencial adicional de construção,
o que resulta em um preço médio por metro
quadrado de R$1.224,03.16 Considerando-se
apenas o potencial adquirido com pagamento em Cepac (OUCAE e OUCFL), esse valor é
de R$ 1.405,58 por metro quadrado. Uma vez
que existem diferenças de preço entre as operações urbanas e entre setores de uma mesma
operação urbana, o valor do metro quadrado
chega a cifras ainda maiores. Com efeito, o valor praticado no último leilão da OUCFL foi de
R6.501,01 por Cepac e há setores desta operação urbana em que um Cepac vale 0,5 metro
quadrado. Assim, a incidência das operações
urbanas sobre áreas de grande interesse para o
mercado imobiliário e a garantia de um grande
volume de investimentos públicos, pela própria natureza do instrumento, faz com que os
custos para o aumento do potencial construtivo nas operações urbanas sejam elevados,
mas, ainda assim, vantajosos para os empreendedores privados.
Considerando que o interesse imobiliário
se restringe territorialmente a parcelas especíicas dos perímetros deinidos pelas leis das
operações urbanas, a coordenação pelo poder
público é o que deve garantir a observância
dos objetivos que representam o interesse
público no “consorciamento”. Além dos objetivos gerais estabelecidos em sua própria
lei, as operações urbanas devem atender aos
objetivos do plano diretor vigente quando de
sua proposição e aprovação e, de forma mais
In respect to private production based
on the benefits offered by urban operations, the four such operations (OUCAE,
OUCFL, OUCAB and OUC), acquired 5,9
million square meters for potential additional construction, at an average price
of R$1.224,03 per square meter.16 Taking
into account only the potential acquired
with the payment in Cepac (OUCAE and
OUCFL), this comes to R$ 1.405,58 per
square meter. Since there are price differences between urban operations and
sectors of the same operation, the value of
the square meter is even higher. As a matter of fact, the value practiced in the last
auction of the OUCFL was R$ 6.501,01 per
Cepac and in certain sectors of this operation one Cepac is worth 0,5 square meter. Accordingly, the incidence of the urban operations in areas of great interest
to the realty market, plus the guarantee of
a large volume of public investments, by
the very nature of the instrument, result
in the costs to increase the construction
potential in urban operations being high but even so, still advantageous for private
entrepreneurs.
Bearing in mind that the interest of the real-estate sector is territorially restricted to speciic portions of the perimeters deined by the
laws of urban operations, the coordination of
the government is what should guarantee enforcement of the objectives that represent the
public interest in “setting up a consortium”. Besides the general objectives established in the
their very law, the urban operations must comply with the objectives set out in the director
plan in effect at the moment they are proposed
16
Consideradas apenas as receitas provenientes de Cepac e OODC.
Descontado, do total arrecadado com Cepac, o valor correspondente
ao número de Cepacs em circulação (não utilizados) ou utilizados para
alterações de parâmetros urbanísticos não relacionados a potencial
construtivo multiplicado pelo preço unitário praticado no último leilão e
atualizado pelo IPC-Fipe para 2016.
16 Taking into account only the revenue resulting from Cepacs and
OODCs. Deducted from the total collected through Cepacs, the value
corresponding to the number of Cepacs in circulation but not used, or used
for alterations of urbanistic parameters un-related to building potential
multiplied by the unitary price practiced in the last auction and updated
by the IPC-Fipe for 2016.
artigo
article
294
ampla, atender as regras gerais da administração pública e do desenvolvimento urbano,
estabelecidos desde a Constituição Federal
até as normas gerais municipais, passando
por leis federais de referência.
Após a aprovação da lei da operação urbana, a prefeitura é responsável: (i) pela análise
e concessão das exceções permitidas pela lei a
proprietários e empreendedores, aplicando a
legislação aos casos concretos; (ii) pela realização das intervenções públicas previstas explicitamente na lei da operações urbanas ou em
acordo com seus objetivos e procedimentos;
(iii) pela administração e controle dos recursos
inanceiros das operações urbanas; e (iv) pela
promoção do controle e participação sociais e
prestação de contas à sociedade em geral e aos
colegiados de gestão de cada operação.
A gestão da implementação da operação urbana está sujeita, evidentemente,
às obrigações e aos procedimentos típicos
da administração pública (regras para
contratações e pagamentos, por exemplo),
às posturas que caracterizam a burocracia
estatal e às exigências de transparência e
prestação de contas que permitam o controle
social. Cada operação urbana tem, ainda, regras especíicas em relação à gestão participativa e controle social, que estabelece uma
dinâmica de prestação de contas e compartilhamento de decisões com a sociedade civil.
Além disso, a execução do que estabelece a
lei que criou (ou revisou) a operação urbana
é inluenciada pelas variações de prioridades e “estilo” de gestão dos governos eleitos
e pela permeabilidade de governantes e tomadores de decisão a pressões e interesses
de determinados atores sociais, assim como
pela conjuntura política e econômica.
Considerando o tempo de duração das operações urbanas, esses aspectos e a sucessão de
governos têm considerável inluência sobre
os resultados da operação urbana, para além
and approved, and in a much broader sense,
attend to the general rules of public administration and urban development established by
the Federal Constitution and the general municipal rules, including federal reference laws.
Following approval of the law of urban operations, the City Hall is responsible: (i) for analyzing and conceding the executions permitted
by law to owners and entrepreneurs, applying
the legislation to the concrete cases; (ii) for
carrying out the public interventions explicitly provided in the urban operations law or in
accordance with its objectives and procedures;
(iii) for administrating and controlling the inancial resources of urban operations; and (iv)
for promoting social control and participation
and rendering accounts to society at large and
to those who manage each operation.
Managing the implementation of the urban operation is obviously subject to the
obligations and procedures typical of public administration (rules for contracting
and payment, for instance), to the attitudes
that characterize state bureaucracy, and to
the requirements as to transparence and
accountability demanded by social control.
Each urban operation also has speciic rules
concerning participative management and
social control, thereby creating a dynamic
of rendering accounts and sharing decisions
with civil society. Besides this, the execution
of what the law that created (or revised) the
urban operation established is inluenced by
the various priorities and the “style” of management of the elected governments and
by the permeability of governors and decision-makers to the interests and pressure
exerted by certain social agents, as well as
to political and economic circumstances.
When the time-frame of the urban operations is taken into consideration, these
aspects and the succession of governments
bear considerable inluence on the results of
cadernos fgv projetos
295
artigo
article
296
“
A deinição sobre
quais obras e
onde devem
ser realizadas
prioritariamente,
bem como os
formatos de
contratação e
elaboração de
projetos são
exemplos claros de
escolhas realizadas
dentro da máquina
administrativa
e que podem
determinar o luxo
de início e o ritmo
de execução das
intervenções.
”
do seu desenho. São aspectos inerentes à dinâmica da administração pública, que podem
trazer consequências tanto negativas quanto
positivas. A incorporação de conhecimentos e
mecanismos próprios da gestão pública pode
minimizar os efeitos perversos dessa dinâmica (solução de continuidade, paralisações em
ações e obras, privilégio de alguns interesses em detrimento de outros, por exemplo)
e potencializar benefícios (possibilidade de
ajustes e aprimoramentos ao longo dos anos,
ampliação dos mecanismos de gestão participativa e controle social, institucionalização
de práticas e procedimentos que perpassem
diferentes governos). O efetivo exercício do
papel de coordenação de todos os aspectos
e fases da operação urbana – da formulação
à implementação – é essencial. A gestão pública envolve uma sequência de escolhas, que
podem ser mais ou menos racionais, mais ou
menos explícitas. A própria deinição de política pública incorpora a noção de escolha na
alocação de recursos, por serem escassos (recursos humanos, inanceiros, políticos e técnicos, por exemplo). Essas escolhas são feitas
em diversos níveis da administração, desde a
tomada de decisões até o estritamente operacional. Assim, não basta aprovar a lei da
operação urbana, instalar o respectivo grupo
de gestão, aprovar os processos de empreendimentos particulares de adesão, delegar ao
moto-contínuo da administração a execução
das obras e a realização dos serviços previstos
e aguardar que os objetivos escritos e os croquis impressos se realizem. Coordenação não
se resume a determinações legais e comando,
embora sejam esses elementos que facilitam
o desempenho desse papel. Sabendo que escolhas serão feitas o tempo todo, durante a
implementação, é mais razoável conhecê-las.
A deinição sobre quais obras e onde devem
ser realizadas prioritariamente, bem como
cadernos fgv projetos
297
urban operations, beyond their design. Such
aspects are inherent to the dynamic of public
administration and can have both negative
and positive consequences. Incorporating the
knowledge and mechanisms proper to public management can minimize the perverse
effects of this dynamic (solving continuity,
paralyzed actions and works, privilege of
certain interests to the detriment of others,
for example) and potentialize beneits (possibility of adjustments and improvements
across the years, expanding the mechanisms
of participative management and social control, institutionalizing practices and procedures that persist in different governments).
The effective exercise of the role of coordinator
of all the aspects and phases of urban operations – from formulation to implementation –
is essential. Public administration involves a
sequence of choices which can be more or less
rational, more or less explicit. The very deinition of public policy incorporates the notion
of choice in allocating resources, these being
scarce (human resources, inancial resources,
political and technical resources, for instance).
These choices are made on various levels of
administration, from decision-making to the
strictly operational. So it is not enough just to
approve the law of urban operation, install
the respective management group, approve
the processes of particular enterprises involving adhesion, delegate to the moto-continuo of
the administration the execution of the works
and carrying out the programmed services,
and then wait for the written objectives and
the printed croquis to become real. Coordination is not limited to legal determinations and
command, although such elements make the
fulillment of this duty all the easier. Aware
that choices are to be made all the time during
implementation, it is more reasonable to be
familiar with these choices. Deining which
“
Deining which works
are priority and
where these should
be executed, as well
as the formats for
contracting and
drawing up projects
are clear examples of
choices made within
the administrative
machine that can
determine the
low and rhythm
of the execution of
interventions.
”
artigo
article
298
os formatos de contratação e elaboração de
projetos são exemplos claros de escolhas realizadas dentro da máquina administrativa e
que podem determinar o luxo de início e o
ritmo de execução das intervenções. Da mesma forma, a dinâmica de proposição e apresentação das questões a serem deliberadas
nos colegiados de gestão compartilhada com
a sociedade acaba sendo deinida, em muito,
pela prefeitura.
Ademais, as operações urbanas envolvem
ações como a execução de grandes obras, a
provisão habitacional em grandes números e
o enfrentamento de estruturas fundiárias diversas e complexas. São iniciativas que, regra
geral, envolvem várias instituições e demandam tempo. Para citar as principais, envolvem as estruturas municipais responsáveis
pelas políticas de desenvolvimento urbano,
habitação, licenciamento urbanístico e ambiental, execução de obras públicas, inanças
works are priority and where these should be
executed as well as the formats for contracting
and drawing up projects, are clear examples
of choices made within the administrative machine that can determine the low and rhythm
of the execution of interventions. Likewise, the
dynamic of proposing and presenting the questions to be resolved by the management shared
with society is to a great extent ultimately deined by City Hall.
Moreover, urban operations involve actions such as executing large works, providing a great number of houses, and coping with different complex land-tenure
situations. Such initiatives usually involve a
number of institutions and consume a lot of
time. To mention just the main actions, these
involve the municipal structures responsible
for the policies of urban development, housing, urbanistic and environmental licensing,
executing public works, inances and juridi-
cadernos fgv projetos
299
e negócios jurídicos. Cada uma dessas organizações vê as operações urbanas segundo a
lógica de suas atribuições e procedimentos,
não raro conlitantes. É necessário que haja,
na estrutura administrativa, a sistematização
dessa transversalidade, tendo como norte os
objetivos da operação urbana, a convergência
com as prioridades de governo e com as diretrizes da política de desenvolvimento urbano. Além disso, deve-se observar o respeito
às deliberações do grupo de gestão compartilhada com representantes da sociedade civil.
Esse lugar institucional não precisa comandar os demais, nem deve duplicar suas atribuições, mas deve ter acesso aos tomadores
de decisão de cada um deles e, sempre que
necessário, ao comando de governo. A relação dessa organização com as demais deve se
dar também no nível técnico, para que o luxo de informações e resolução de problemas
administrativos se deem de forma periódica e
em tempo razoável.
cal business. Each of these organizations sees
the urban operations in accordance with the
logic of its own duties and procedures, which
often conlict. The administrative structure
needs to systematize this transversality,
guided by the objectives of the urban operation and converging with the priorities of the
government and the guidelines of the policy of urban development. Besides this, the
administration must respect the decisions
of the managing group shared with representatives of civil society. This institutional
space does not need to command the others
or duplicate its duties, but it must enjoy access to the decision-makers of each one of
them and whenever necessary to the command of the government. The relationship
of this organization with the others should
also be on the technical level so that the low
of information and solutions to administrative problems occurs periodically and quite
promptly.
artigo
article
300
Na Prefeitura de São Paulo, a atribuição
de coordenação das operações urbanas é oicialmente da empresa pública São Paulo Urbanismo, vinculada à secretaria responsável
pelo desenvolvimento urbano – atualmente a
Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL). Não obstante, esse papel
pode ser desempenhado por outras estruturas de governo, inclusive por mais de uma delas, de forma combinada em espaços não formais, a depender da centralidade da política
urbana na gestão municipal e da relevância
das intervenções das operações urbanas para
o programa de governo. A estrutura formal
deverá manter, de qualquer forma, a coordenação das ações administrativas e a gestão
das informações que subsidiam a tomada de
decisões e permitem o controle social.
In São Paulo’s City Hall, the coordination
of urban operations is oficially the responsibility of the public company São Paulo
Urbanismo, which is connected to the secretariat in charge of urban development
- currently the Municipal Secretariat of
Urbanism and Licensing (SMUL). However, this role can be fulilled by other government structures, and even by more than one,
combined in non-formal spaces, depending
on the centrality of urban policy in the municipal administration and the relevance of
the interventions in urban operations to the
government´s program. The formal structure should maintain the coordination of administrative actions and management of the
information that aids decision-making and
enables social control.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
FINAL REMARKS
A análise apresentada, neste artigo, sobre o
desempenho das operações urbanas vigentes não pretende reposicionar ou repisar
problemas relacionados ao que determina
seu desenho, como a expressão de um ideal
intangível, tampouco apresentar seus resultados como decorrência apenas da natureza do instrumento. Antes, incrementar
uma nova perspectiva de análise, a partir
de elementos gerais de sua implementação,
sob a perspectiva da gestão, e especificamente da gestão da política urbana.
Como instrumento, a operação urbana é
um mecanismo de inanciamento da política
urbana limitado e em território limitado, estreitamente relacionado à lógica de operação
de um setor econômico sobredeterminante
- o mercado imobiliário. Na fase de proposição da operação urbana, a deinição do
perímetro é baseada na avaliação das áreas
The analysis presented in this article on the
performance of the urban operations in place
is not aimed at reformulating or repeating
problems related to the reasons for their design, such as the expression of some unattainable ideal; nor is it aimed at presenting its results as the mere consequence of the nature of
the instrument. Rather, it sets out to contribute a new perspective of analysis, one based
on general elements of its implementation,
from the angle of management, and speciically the management of urban policy.
As an instrument, the urban operation is
a inancing mechanism of urban policy, both
limited and in a limited territory, and strictly
related to the operational logic of a super-determining economic sector, namely the property market. In the propositional phase of the urban operation, the deinition of the perimeter is
based on the evaluation of the areas with most
cadernos fgv projetos
301
com maior potencial arrecadatório, em cenários projetados que permitem a identiicação
das áreas passíveis de transformação.17 Essas
análises balizam a modelagem econômica do
instrumento, deinindo valores, quantidades
e áreas prioritárias para venda de Cepacs,
bem como o conjunto de obras produto da
operação. Na fase de implementação, além
da permanente reavaliação das questões
econômicas, para a tomada de decisão sobre novos leilões, por exemplo, a dinâmica
do mercado imobiliário é determinante no
longo processo de transformações urbanas
no território da operação urbana, seja pela
produção imobiliária, em si, seja pela inluência nos debates e decisões sobre as obras
prioritárias dentre as previstas na carteira
de projetos da operação urbana. O papel
de coordenação pelo poder público é crucial
diante dessa preponderância do mercado
resource-capturing potential, in projected scenarios that enable identiication of the areas
liable to transformation.17 These analyses support the economic modeling of the instrument,
deining values, quantities and priority areas
for selling Cepacs, as well as the set of works
produced by the operation. In the implementation phase, besides permanent re-evaluation of
the economic matters, for example for making
decisions concerning new auctions, the dynamic of the property market is determining
throughout the lengthy process urban changes
in the territory of the urban operation, whether
by means of production of property per se or
through the inluence of debates and decisions
on the priority works among those provided
in the agenda of urban operation projects. The
coordinating role played by the government
is crucial in light of the preponderance of the
property market in the whole process, guar-
17 O método adotado pela São Paulo Urbanismo considera inúmeras
combinações e variáveis para construir cenários prováveis de substituição
de usos horizontais (casas, terrenos vagos e estacionamentos, por exemplo)
por usos verticais (prédios residenciais ou comerciais), de forma a simular
o consumo do potencial construtivo adicional oneroso.
17 The method adopted by São Paulo Urbanismo takes into account
numerous combinations and variables to build likely scenarios of
substitution of horizontal uses (houses, waste land and parking lots, for
instance) by vertical uses (residential or commercial buildings) in order
to simulate the consumption of the onerous additional building potential.
artigo
article
302
“
O papel de
coordenação
pelo poder
público é crucial
diante dessa
preponderância
do mercado
imobiliário em
todo o processo,
garantindo o
interesse público
e mitigando
os efeitos
concentradores
do instrumento
”
imobiliário em todo o processo, garantindo
o interesse público e mitigando os efeitos
concentradores do instrumento.
As experiências das OUCs mostram que
o programa de intervenções, independente
da precisão e da abrangência com que esteja
deinido em lei, é implementado com ritmo
e volume de investimentos distintos, a depender da intervenção e do momento em que
está a operação urbana. Esse processo é inluenciado tanto pelas decisões internas à administração, em seus diversos níveis, quanto
por pressões externas. O que está garantido
em lei é imprescindível, mas evidentemente
é insuiciente. A sujeição à gestão é própria
da implementação das políticas públicas, não
sendo este o problema, em si. Medidas como
coordenação, gestão de informações, gestão
participativa, transparência e controle social
permitem a correção de rumos pela avaliação
de resultados, a adaptação a mudanças conjunturais e a legítima impressão das marcas
de cada governo eleito. Por outro lado, a implementação das operações urbana está sujeita a problemas, previstos e não previstos
em seu desenho, que vão desde as disfunções
da burocracia estatal até as paralisações de
obras e mudanças nas prioridades estabelecidas pelos governos eleitos. O maior risco de
gestão para as operações urbanas talvez seja
o poder público assumir a representação dos
interesses do mercado imobiliário.
Em um cenário recessivo e de contração
dos gastos públicos, o setor público reduz
investimentos, ao mesmo tempo em que os
demais agentes econômicos tendem a se restringir a ações de curto prazo, baixo risco e
poucas contrapartidas. Nessa conjuntura, é
certo que surgem pressões e disputas sobre
a manutenção e direção dos investimentos
públicos, assim como demandas dos setores
cadernos fgv projetos
303
anteeing the public interest and mitigating the
concentrating effects of the instrument.
The experiences of the OUCs show that the
interventions program, regardless of the precision and range with which it is deined in
the law, is implemented with different rhythm
and volume of investments, depending on
the intervention and the stage which the urban operation has reached. This process is
affected both by internal decisions of the administration at various levels and by external pressures. What is guaranteed by law is
indispensable, but this is insuficient. Being
subjected to management is part and parcel
of the implementation of public policies; that
in itself is not the problem. Measures such as
coordination, handling information, shared
management, transparence and social control allow correcting trajectories by evaluating results, adapting to conjunctural changes
and the legitimate imprinting of the marks of
each elected government. On the other hand,
implementation of the urban operations is liable to problems, whether foreseen or not in
their design, problems that range from dysfunctions of state bureaucracy to paralysation of works and changes to the priorities set
by the elected governments. Perhaps the biggest risk in managing urban operations is the
government taking over as representatives of
the interests of the property market.
In a scenario of recession and contraction
of public spending, the public sector reduces investments, at the same time that the
other economic agents tend to limit themselves to short-term actions of low risk and
few counterparts. In such circumstances it
is clear that pressures and disputes appear
as regards keeping and directing public investments, as well as demands from the economic sectors for adjustments to be made to
minimize losses or reduced proits. Revision
“
The coordinating
role played by the
governmentis
crucial in light of the
preponderance of
the property market
in the whole process,
guaranteeing the
public interest
and mitigating the
concentrating effects
of the instrument
”
artigo
article
304
“
O DESAFIO DE DESENVOLVER A POLÍTICA
URBANA, FINANCIÁ-LA E REVERTER PROCESSOS E
DINÂMICAS DO TERRITÓRIO DE UMA METRÓPOLE
COMO SÃO PAULO EXIGE O FORTALECIMENTO DAS
AÇÕES DE COORDENAÇÃO DA GESTÃO PÚBLICA
”
“
THE CHALLENGE TO DEVELOP URBAN POLICY,
FINANCING IT AND REVERTING PROCESSES
AND DYNAMICS OF THE TERRITORY OF A
METROPOLIS LIKE SÃO PAULO REQUIRES
STRENGTHENING THE COORDINATING ACTIONS
OF PUBLIC ADMINISTRATION.
”
cadernos fgv projetos
305
econômicos para que sejam feitos ajustes que
minimizem suas perdas ou redução de ganhos. A revisão das leis e políticas urbanas,
inclusive no que se refere às operações urbanas, surge como uma demanda estratégica do
setor imobiliário, por menores ônus e maiores benefícios para construtoras e incorporadoras. Um exemplo claro são as demandas
pela redução do preço mínimo de Cepacs e da
OODC, em função da retração conjuntural do
mercado. Medidas como essa não podem ser
analisadas individualmente ou apenas sob o
ponto de vista instrumental imediato. Os resultados estruturais precisam ser considerados: há estreita relação entre a estrutura de
cobrança de OODC e as exceções oferecidas
em territórios especiais, cobradas em Cepacs.
Além disso, ao se rebaixar o potencial arrecadatório, o poder público vê rebaixada sua capacidade de investimento em obras públicas,
mas se mantém o processo de valorização da
terra apropriada com a realização imobiliária
dos empreendimentos privados. Em um cenário de retração da economia, essa valorização tende a se realizar para poucos investidores, em empreendimentos dispersos, uma vez
que o setor privado também vê reduzida sua
capacidade de investimento, ou seja, permite
ganhos individuais, mas não necessariamente representa ganho setorial ou coletivo, o que
resulta, apenas, em concentração de riqueza,
em poucos agentes e em poucos territórios.
Há que se reletir, portanto, sobre a adoção
de medidas conjunturais para a solução de
problemas estruturais. Não que vicissitudes
conjunturais não possam levar projetos de
longo prazo a reverem seus desenhos iniciais.
Trata-se, antes, de avaliar e testar se medidas
de gestão, considerando o sistema de planejamento urbano existente, não podem absorver os problemas conjunturais, em vez de incorporá-los pontualmente, pela revisão neste
of urban laws and policies, including in respect to urban operations, appears as a strategic demand of the real-estate market for
less onus and more beneits for construction
and incorporating companies. One clear example is the demand to lower the minimum
price of Cepacs and the OODC because of the
conjunctural retraction suffered by the market. Such measures cannot be analyzed on
an individual basis or even from the immediate instrumental view-point. The structural results must be taken into consideration:
there is a close relation between the OODC
structure of charging and the exceptions offered in special territories and charged in
Cepacs. Aside from this, when the collecting
potential goes down, the government sees
its capacity to invest in public works jeopardized, but the process of valorizing the
appropriated land is safeguarded with production on the part of private enterprises. In
a scenario of economic retraction, this valorization tends to be made for few investors
in scant enterprises, since the private sector
also sees its investment capacity reduced,
that is to say, the individual gains that are
made do not necessarily represent a sectorial or collective proit, which only results in a
concentration of wealth for few agents and
in few territories.
Adopting conjunctural measures to solve
structural problems has to be considered.
Not that conjunctural vicissitudes are incapable of leading long-term projects to review
their original designs. It is rather a question
of evaluating and testing whether, considering the urban planning in effect, management measures are not able to absorb the
conjectural problems instead of incorporating them speciically, revising this or that
instrument, but with a structural impact on
a system. Perhaps this is the opportunity for
artigo
article
306
ou naquele instrumento, mas com impacto
estrutural em um sistema. Essa, talvez, seja
a oportunidade de completa revisão do modelo, no caso das operações urbanas consorciadas, para que se torne menos vulnerável a
um setor econômico sobredeterminante e se
estruture de forma mais consertada na gestão
pública da política urbana.
O desaio de desenvolver a política urbana,
inanciá-la e reverter processos e dinâmicas
do território de uma metrópole como São
Paulo exige o fortalecimento das ações de coordenação da gestão pública. Um dos meios
de subsidiá-la é prover um cardápio diverso
de instrumentos, no marco regulatório da cidade, para a implementação de projetos urbanos considerando as regiões prioritárias de
intervenção da política urbana, com medidas
intersetoriais e sistêmicas, envolvendo múltiplos atores da sociedade civil e um universo
variado de setores econômicos, consonantes
com um projeto de longo prazo para a cidade, mas que depende, fundamentalmente, do
empenho dos governos em dar centralidade à
política urbana na agenda pública.
•
a complete revision of the model, in the case
of consortium urban operations, in order to
make it less vulnerable to a super-determining economic sector and structured more
compatible with the public management of
urban policies.
The challenge to develop urban policy,
financing it and reverting processes and
dynamics of the territory of a metropolis
like São Paulo requires strengthening the
coordinating actions of public administration. One of the ways to contribute is to
provide a varied menu of instruments in
the regulatory framework of the city for
implementation of urban projects, considering the priority regions for intervention
of the urban policy, employing intersectoral and systemic measures, involving
multiple actors of civil society and a varied universe of economic sectors in consonance with a long-term project for the
city, but one that depends fundamentally
on the performance of the governments
in giving a central role to urban policy on
the public agenda.
•
cadernos fgv projetos
307
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS | BIBLIOGRAPHIC REFERENCES
Brasil. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Estatuto da Cidade. Regulamenta os artigos
182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras
providências. Disponível em | Available at: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/
LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 15/07/2017. Accessed on: 07/15/2017.
Fix, M. Parceiros da exclusão: duas histórias da construção de uma “nova cidade” em São
Paulo: Faria Lima e Água Espraiada. São Paulo: Boitempo Editorial, 2001.
Fix, M.; Ferreira, J.S.W. A urbanização e o falso milagre do CEPAC. Folha de São Paulo,
São Paulo, “Tendências e Debates”, 17 de abr. de 2001.
Franco, F. M.; D’Almeida, C. H.; Mendonça Abreu, G. K. A Macroárea de Estruturação
Metropolitana de São Paulo: o projeto urbano como instrumento de transformação do território. In: Revista Iberoamericana de Urbanismo, v. 12, p. 53-74, 2015. Disponível em |
Available at: <http://www.raco.cat/index.php/RIURB/article/view/307462>. Acesso em:
15/07/2017. Accessed on: 07/15/2017.
Maricato, E.; Ferreira, J. S. W. Operação urbana consorciada: diversiicação urbanística
participativa ou aprofundamento da desigualdade? In: Osório, L. M. (Org.). Estatuto da Cidade e reforma urbana: novas perspectivas para as cidades brasileiras. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris, 2002. p. 215-250.
Montandon, D. T. Operações urbanas em São Paulo: da negociação inanceira ao compartilhamento equitativo de custos e benefícios. 2009. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São
Paulo, 2009.
Montandon, D.T.; Ignatios, M.F. A dimensão urbanística da Outorga Onerosa do Direito de Construir no Município de São Paulo. Working Paper: Lincoln Institute of Land
Policy, 2016.
Nobre, E. A. C. Quem ganha e quem perde com os grandes projetos urbanos? Avaliação
da Operação Urbana Consorciada Água Espraiada em São Paulo. Cadernos IPPUR, Rio de
Janeiro, v. 23, p. 203-219, 2009.
Nobre, E. A. C. Recuperação da valorização imobiliária para inanciamento da transformação urbana. In Balbim, R. e Krause, L. (editores) Eixos de estruturação da transformação
urbana: inovação e avaliação em São Paulo. Rio de Janeiro: Ipea, 2016. Disponível em | Available at: <http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2015/07/160905_
livro_eixos_de_estruturacao-1.pdf>. Acesso em: 15/07/2017. Accessed on: 07/15/2017.
PMSP; Consórcio ABC; PMG. Caderno Preliminar de Propostas ao Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado da Região Metropolitana de São Paulo. São Paulo; São Bernardo,
novembro, 2016. Disponível em | Available at: <http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/
wp-content/uploads/2016/06/PDUI-contributo-ao-Caderno-Preliminar-de-Propostas.pdf>.
Acesso em: 15/07/2017. Accessed on: 07/15/2017.
São Paulo (Município). Lei nº 16.050, de 31 de julho de 2014. Plano Diretor Estratégico.
Aprova a Política de Desenvolvimento Urbano e o Plano Diretor Estratégico do Município de
São Paulo e revoga a Lei nº 13.430/2002. Disponível em | Available at: <http://gestaour-
artigo
article
308
bana.prefeitura.sp.gov.br/arquivos/PDE_lei_inal_aprovada/TEXTO/2014-07-31%20-%20
LEI%2016050%20-%20PLANO%20DIRETOR%20ESTRAT%C3%89GICO.pdf>. Acesso em:
15/07/2017. Accessed on: 07/15/2017.
São Paulo (Município). Lei nº 16.402, de 23 de março de 2016. Lei de Parcelamento, Uso e
Ocupação do Solo. Disciplina o parcelamento, o uso e a ocupação do solo no Município de São
Paulo, de acordo com a Lei nº 16.050, de 31 de julho de 2014. Disponível em | Available at:
<http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2016/03/PL-272-15-com-raz%C3%B5es-de-veto.pdf>. Acesso em: 15/07/2017. Accessed on: 07/15/2017.
São Paulo (Município). Plataforma digital: Gestão UrbanaSP. Disponível em | Available at: <http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br>. Acesso em: 15/07/2017. Accessed on:
07/15/2017.
Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano. Subsídio ao Macrozoneamento. São
Paulo: SMDU, 2016. Apresentação em PPT.
Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano. Subsídio ao Zoneamento. São Paulo:
SMDU, 2014. Apresentação em PPT.
Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano. Instrumentos inanceiros da política
urbana: a experiência do município de São Paulo. São Paulo: SMDU, 2015. Apresentação em
PPT.
SP-URBANISMO – SÃO PAULO URBANISMO. Gestão das operações urbanas na cidade de São Paulo. São Paulo: SP-Urbanismo; DGO, 2016. Disponível em | Available at:
<http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2016/12/OUCs_BALAN%C3%87O_GERAL.pdf>. Acesso em: 15/07/2017. Accessed on: 07/15/2017.
cadernos fgv projetos
309
ARTIGO ARTICLE
PLANEJAMENTO
ESTRATÉGICO +
DESENHO URBANO:
A IMPORTÂNCIA DO PROJETO
URBANO E DO ARQUITETO
URBANISTA NA PRODUÇÃO DA
CIDADE CONTEMPORÂNEA
STRATEGIC
PLANNING AND
URBAN DESIGN:
THE IMPORTANCE OF THE
URBAN PROJECT AND THE
URBANIST-ARCHITECT IN
BUILDING TODAY’S CITIES
Para superar o antigo modelo de cidades dispersas, monofuncionais e rodoviárias, os
projetos urbanos contemporâneos seguem conceitos que apontam para uma cidade
compacta, funcional e na qual os pedestres sejam os protagonistas. Para tornar essa
cidade uma realidade, o autor aborda a importância do planejamento estratégico e a
prioridade que deve ser dada ao projeto urbano e ao plano. Além disso, relete sobre
as contribuições do desenho urbano como área de conhecimento e sobre o papel do
arquiteto urbanista na construção das cidades.
In their endeavor to replace the old model of dispersive, mono-functional and road- connected
cities, today’s urban projects follow concepts aimed at cities that are compact and functional
and where pedestrians play a major role. In order for this city to become a reality, the author
stresses the importance of strategic planning and the priority to be lent to urban projects and
planning. In addition, he relects on the contributions made by urban design as an area of
fundamental knowledge, as well as the architect’s role in the city construction.
ZECA BRANDÃO
Professor da UFPE, arquiteto e urbanista
Professor at the Federal University of Pernambuco, architect and urbanist
Doutor pela Architectural Association School of Architecture, em Londres. É professor da
Universidade Federal de Pernambuco e do programa de pós-graduação em desenvolvimento urbano.
Tem desenvolvido projetos e estudos na área de arquitetura e urbanismo, com ênfase em planejamento
e projeto do espaço urbano. Foi secretário-executivo das Cidades em Pernambuco. Recebeu o 1º
prêmio na 10ª Bienal Pan-americana de Arquitetura, categoria Desenho Urbano/Conjunto de Obras,
e na 3ª Bienal Internacional de Arquitetura do Brasil, na categoria Intervenção Urbana. É autor dos
livros The Role of Urban Design in Strategic Planning: the case of Rio de Janeiro e Núcleo Técnico
de Operações Urbanas: estudos 2007-2010.
Holds a PhD from the Architectural Association School of Architecture in London. Professor at the
Federal University of Pernambuco and at the Postgraduate Program in Urban Development, he
developed projects and studies in the area of architecture and urbanism, mainly in urban-space
planning and projects. Former Executive-Secretary of Cities in the State of Pernambuco, he was
awarded 1st prize at the 10th Pan-American Biennial of Architecture (in the category of Urban Design
and Collected Works), and at the 3rd International Biennial of Brazilian Architecture (in the category
of Urban Intervention). He is the author of The Role of Urban Design in Strategic Planning: the case
of Rio de Janeiro and Technical Nucleus of Urban Operations: studies 2007-2010.
A
pós um período de desvalorização do planejamento a partir da década de 1980 do
século passado, quando muitos projetos urbanos foram conduzidos pelo setor privado em
vários países do mundo, ressurge na virada
deste século o reconhecimento internacional da
relevância do poder público no controle do desenvolvimento urbano. São vários os modelos
de planejamento que reivindicam o lugar antes
ocupado pelos conhecidos Planos Diretores. O
Planejamento Estratégico aplicado às cidades
destaca-se como sendo um dos mais utilizados
em todo o mundo, inclusive no Brasil.
Assim como os planos desenvolvidos na
segunda metade dos anos de 1940, que tinham como objetivo acelerar o processo de
reconstrução das cidades destruídas durante
a Segunda Guerra Mundial, esse modelo de
planejamento também enfatiza a importância dos projetos urbanos na produção da cidade. Há, entretanto, dois fatores referentes
a essa questão que parecem diferenciar entre
si esses modelos: o relacionamento entre as
escalas do plano e do projeto e o referencial
teórico que fundamenta esses projetos.
O primeiro fator se refere à relação dialética
entre o plano e o projeto urbano presente no Planejamento Estratégico, rejeitando formalmente
a hierarquia do planejamento convencional. O
F
ollowing a period of devalorization
of planning – dating from the 1980s
– when many urban projects were dominated by the private sector in several
countries across the world, the turn of
the century witnessed the international
recognition of the relevance of the government having control of urban development. Many planning models claim the
place once occupied by the well-known
Director Plans. Strategic Planning as applied to cities stands out as one of the most
used worldwide, including in Brazil.
Just like the plans developed in the second half of the 1940s to speed up the process of re-constructing the cities razed
during the Second World War, this planning model also emphasizes the importance of urban projects in building a city.
However, two factors involved in this
question seem to differentiate these models, namely the relationship between the
scales of plan and project, and the theoretical reference behind such projects.
The irst factor has to do with the dialectic relation between the plan and the urban
project present in Strategic Planning, which
formally rejects the hierarchy of conventional planning. The project is not seen as a
cadernos fgv projetos
313
projeto não é mais visto apenas como um produto derivado do planejamento, no qual os seus
impactos supostamente obedecem a uma lógica
preestabelecida nos objetivos do plano. Nesse
modelo de planejamento, portanto, o projeto
abandona a posição passiva diante do plano urbano, podendo até mesmo redirecioná-lo.
O segundo fator diz respeito ao referencial
teórico utilizado pelos arquitetos urbanistas na
concepção desses dois tipos de projeto urbano.
Enquanto os projetos desenvolvidos no período
pós-guerra baseavam-se nos paradigmas modernistas estabelecidos pelo Congresso Internacional de Arquitetura Moderna,1 os projetos
urbanos mais recentes seguem os princípios
desenvolvidos pelo Desenho Urbano, uma disciplina autônoma e fundamentada exatamente
na crítica ao urbanismo moderno.
O presente artigo pretende discutir esses
dois pontos: o resgate do projeto urbano e
a sua nova relação com o plano estabelecida no Planejamento Estratégico de cidades
e a importância do Desenho Urbano como
instrumento teórico na elaboração desses
novos projetos. Pretende ainda refletir
sobre o papel do arquiteto urbanista e da
qualidade do projeto urbano na construção
da cidade contemporânea.
mere product derived from planning, with
impacts that supposedly obey a logic pre-established in the objectives of the plan. In this
planning model, therefore, the project abandons its passive position vis-à-vis the urban
plan, and may even re-direct it.
The second factor concerns the theoretical reference adopted by urbanist-architects in drawing up these two types
of urban project. Whereas the projects
developed in the post-war period were
based on the modernist paradigms established by the International Congress
of Modern Architecture,1 the more recent
projects adhere to the principles developed by Urban Design, an autonomous
discipline based precisely on the criticism
made of modern urbanism.
This article sets out to discuss these two
points: reclaiming the urban project and its
new relationship with the plan established in
the strategic planning of cities, and the importance of urban design as a theoretical instrument in elaborating these new projects.
The article is also aimed at considering the
role played by the urbanist-architect, and
the quality of the urban project in building
today’s cities.
1 Congresso Internacional de Arquitetura Moderna: fórum realizado nos
anos 1920 para debater o desenvolvimento do Movimento Moderno nas
escalas arquitetônica e urbana.
1
The International Congress of Modern Architecture was a forum
held in the 1920s to debate the development of the Modern Movement on
architectonic and urban scales.
artigo
article
314
O PLANEJAMENTO URBANO
NO BRASIL
URBAN PLANNING IN BRAZIL
O apreço ao planejamento urbano não tem sido
uma preocupação constante dos nossos gestores públicos. As cidades brasileiras, no geral,
foram produzidas de forma desorganizada,
imediatista e com imposição do individual em
detrimento do coletivo. A ineiciência cada vez
maior do planejamento no processo de produção das cidades contemporâneas tem agravado
substancialmente a crise urbana.
O excelente momento pelo qual a nossa
economia passou em um passado recente,
paradoxalmente, agravou esse quadro e piorou ainda mais a qualidade de vida da população. Se o planejamento urbano é importante quando a economia se encontra estagnada,
torna-se ainda mais importante durante o
processo de crescimento econômico. O resultado da economia aquecida desacompanhada do planejamento urbano está explícito no
caos que vivem hoje as nossas cidades, com
grandes congestionamentos, apagões por insuiciência energética, adensamento construtivo desenfreado, superlotação dos transportes públicos, alagamentos frequentes, enim,
uma falência das infraestruturas urbanas.
Muitos gestores públicos consideraram os
protestos de junho de 2013, que aconteceram
nas principais capitais brasileiras, difusos e desprovidos de propósitos precisos. Na verdade,
esses novos movimentos sociais urbanos protestavam por uma causa muito simples: a melhoria das suas cidades. As pessoas entenderam
que a sua qualidade de vida está irreversivelmente vinculada à qualidade de suas cidades. E
que pouco adianta o país ser a sétima economia
do mundo se isso não for transformado em qualidade de vida da população. O que ainda falta
perceber, no entanto, é que o instrumento capaz
de realizar essa transformação é o urbanismo.
Favoring urban planning has not been
a constant concern of our public administrators. Generally speaking, Brazilian
cities were put together in a disorganized,
immediatist manner that lent priority to
the individual rather than the community. The increasingly more inefficient planning in the process of building cities today
have contributed significantly to worsen
the urban crisis.
The excellent moment that our economy
experienced in the recent past paradoxically aggravated this situation and made the
quality of life of the population even poorer. If urban planning is important when
the economy is stagnated, it becomes all the
more important during the process of economic growth. The result of a over-heated
economy unaccompanied by urban planning is explicit in the chaos our cities are
witnessing today, with awfully congested
trafic, blackouts because of energy failures,
un-controlled construction density, overcrowding of public transportation and frequent looding. In a word: the breakdown of
urban infrastructures.
Many public administrators consider the
protests of June 2013 in Brazil’s principal
cities to be diffuse and lacking in precise
purposes. The truth is that these new urban
social movements protested for a very simple cause: improvement of our cities. People
understood that their quality of life is irreversibly linked to the quality of their cities.
And that it matters little if the country is
ranked the world’s seventh economy if this is
not translated into the population’s quality
of life. However, it still has to be understood
cadernos fgv projetos
315
Para ilustrar melhor a fragilidade do nosso
planejamento contemporâneo, é possível citarmos a oportunidade perdida quando sediamos a Copa do Mundo de 2014. Experiências
realizadas em outras cidades do mundo demonstram o poder de transformação urbana
desses grandes eventos esportivos, principalmente as Olimpíadas e a Copa. Os casos mais
conhecidos são Barcelona e Londres que, por
meio de uma série de projetos urbanos motivados para os Jogos Olímpicos de 1992 e
2012, respectivamente, transformaram áreas
abandonadas e degradadas em bairros residenciais providos de excelente infraestrutura urbana.
No Brasil, o legado urbano não apresentou
o mesmo resultado. Foram realizadas obras
que nem sempre eram necessárias e teve-se
que lidar com o superfaturamento, obras inacabadas ou mesmo mal executadas, como os
casos do elevado em Belo Horizonte e da Cliclovia Tim Maia, no Rio de Janeiro, que desabaram. Qual foi a diferença entre o desempenho brasileiro e o de cidades como Barcelona
that the instrument capable of carrying out
this change is urbanism.
The better to illustrate the fragility of
contemporary planning, one can mention
the opportunity lost when we hosted the
World Cup in 2014. Experiences registered in other cities across the globe show
the power of transformation that these
major sports events have, in particular
the Olympic Games and the World Cup.
The best known cases are Barcelona and
London, which, as a result of a series of
urban projects stimulated by the Olympics of 1992 and 2012 respectively, turned
abandoned and decrepit areas into residential neighborhoods with first-class urban infrastructure.
In Brazil, the urban legacy failed to produce the same result. Works were undertaken that were not always necessary and many
problems had to be faced, such as overbilling,
work left uninished or even poorly executed.
For example, the lyover in Belo Horizonte
and the Tim Maia Bike Path in Rio de Janeiro,
artigo
article
316
e Londres? Simples: enquanto nessas cidades havia um plano estratégico protagonizado pelo poder público, articulando todas as
ações necessárias para a realização do evento
e potencializando seus efeitos benéicos, aqui
os projetos foram concebidos de forma isolada e focados em interesses privados.
O crescimento acelerado da população urbana mundial tem aumentado a importância
do planejamento. No caso brasileiro, as cidades têm crescido e se multiplicado numa
velocidade espantosa. Entramos no século
XX com apenas 10% da população vivendo
em áreas urbanas. Na década de 1960 desse
mesmo século a população urbana já tinha
ultrapassado a rural e, atualmente, mais de
85% da população brasileira vive em cidades.
Podemos airmar que somos um dos países
mais urbanos do mundo, o que não signiica
dizer que somos um dos mais urbanizados.
Muitas cidades brasileiras ainda carecem
de infraestrutura básica, como saneamento,
drenagem e pavimentação, necessidades há
muito tempo supridas nas cidades dos países
mais desenvolvidos.
Frente à atual conjuntura política do nosso
país, estamos vivendo uma crise econômica
que, seja qual for o resultado desse impasse, não será de fácil superação, de modo que
possivelmente icaremos um bom tempo com
o mercado imobiliário desaquecido e sem recursos públicos para a construção de infraestrutura urbana. Talvez essa desaceleração do
desenvolvimento urbano tenha um lado positivo, na medida que proporciona uma pausa
para reletirmos sobre o papel do planejamento na produção das nossas cidades. Precisamos encarar essa crise como uma oportunidade para pensar a cidade que queremos e
como vamos viabilizá-la.
A retomada de um planejamento urbano
mais consistente parece ser um dos principais
which both collapsed. What is the difference
between the performance of Rio de Janeiro
and that of cities like Barcelona and London?
Simply that while those cities have a strategic
plan administered by the government, which
coordinates all the actions necessary to hold
the event and guarantees its beneicial consequences, here the projects were devised in
isolation and focused on private interests.
The rapid rate of growth of the world’s
urban population has made planning all
the more important. In the case of Brazil,
cities have grown and proliferated at an
astonishing rate. In the early 20th century,
only 10% of our population lived in urban
areas. The 1960s saw this same urban population already in front of its rural counterpart, and at the moment, over 85% of the
national population resides in cities. It can
be asserted that ours is one of the most urban countries in the world, which does not
mean that we are among the most urbanized. Many Brazilian cities are still in need
of basic infrastructure, such as sanitation,
drainage and paving, essentials already
provided for a long time in cities in the
more developed countries.
Given the present political status of our
country, we are suffering an economic
crisis that - whatever the outcome of this
impasse - will not be easily overcome,
and might very well eventually see the
real-estate market cool off and without
any public resources available for urban
infrastructure. Perhaps there is a positive
side to this slowing down of urban development, insofar as it provides a pause for
us to reflect on the role of planning in the
building of our cities. We must face this
crisis as an opportunity to think about the
kind of city that we want and how to make
it feasible.
cadernos fgv projetos
317
Gráfico do crescimento das populações urbana e rural do Brasil
Graph showing the growth of the urban and rural population in Brazil
BRASIL URBANO URBAN BRAZIL
180.000.000
160.000.000
140.000.000
120.000.000
100.000.000
80.000.000
60.000.000
40.000.000
20.000.000
1960
1970
1980
Rural
Rural
1990
2000
2010
Urbana
Urban
População nos Censos Demográficos 1960/2010 (IBGE, 2010)
Population in Demographic Censuses - 1960-2010 (IBGE, 2010)
O Brasil é um país urbano desde os anos de 1970. O processo de urbanização das cidades brasileiras acelerou-se
sobretudo nos anos de 1960 e 1970, mas ocorreu de forma desordenada e excludente. Hoje, 85% da população
brasileira vive em cidades. O Brasil tornou-se um dos maiores países urbanos do mundo.
Brazil has been an urban country since the 1970s. The process of urbanization of Brazilian cities accelerated
especially in the in the 60s and 70s, but this growth happened in a disorderly and exclusive fashion. Today, 85% of the
Brazilian population lives in cities. Brazil has become one of the biggest urban countries in the world.
desaios atuais do país. Esse planejamento,
entretanto, não deve ser apenas normativo
como no passado, quando as cidades eram
concebidas exclusivamente por meio de Planos Diretores. Nesses planos, as tendências
urbanas maléicas à cidade eram identiicadas para, posteriormente, serem evitadas por
uma série de normas. Imaginava-se uma cidade que não queríamos para depois estabelecer
uma legislação urbanística com o objetivo de
(tentar) impedir que ela se materializasse.
Sem desmerecer a importância dos Planos
Diretores, que continuam sendo necessários, a
dinâmica e a complexidade da cidade contemporânea exigem do poder público uma postura
mais propositiva. É preciso aderir ao que poderíamos chamar de um “urbanismo propositivo”,
One of the country’s main challenges involves adopting a more consistent model
of urban planning. This planning, however, should not be just normative, as it was
in the past, when cities were conceived exclusively by means of Director Plans. These
plans identiied the urban tendencies that
were harmful to the city only to be avoided
later on through a series of rules. A city was
imagined that we did not want and then an
urbanistic legislation was presented that
was designed to (try to) prevent it from materializing.
Without detracting from the important
(and still necessary) Director Plans, the dynamics and complexity of today’s a cities call
for a more propositive mentality on the part
artigo
article
318
“
Nos países
desenvolvidos, as
novas gerações
passaram a
escolher a cidade
onde querem viver
antes mesmo
da atividade
proissional que
querem exercer.
”
a partir da elaboração de um plano estratégico
no qual a cidade seja idealizada, para depois
ser realizada por meio de projetos urbanos e de
outras ações urbanísticas pertinentes.
PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO:
AS RELAÇÕES ENTRE O PLANO
E O PROJETO
Durante muito tempo, o poder de atração das
cidades foi atribuído apenas às questões de
ordem econômica. No inal dos anos de 1970,
proissionais de tecnologia da informação
chegaram a profetizar o im da cidade, airmando que a era digital libertaria as pessoas
da necessidade de viverem no stress do ambiente urbano e que elas realizariam os seus
supostos sonhos de morar na tranquilidade
do campo. No entanto, as cidades não desapareceram, ao contrário, continuam atraindo
cada vez mais pessoas.
Sabemos hoje que as cidades representam
muito mais do que oportunidade de trabalho.
Elas são, na verdade, um estímulo poderoso ao desenvolvimento pessoal, proporcionando o acesso à diversidade sociocultural,
ao crescimento intelectual, à criatividade,
à inovação e ao lazer produtivo. Nos países
desenvolvidos, as novas gerações passaram
a escolher a cidade onde querem viver antes
mesmo da atividade proissional que querem
exercer. As cidades, por sua vez, têm se esforçado cada vez mais para oferecer melhor
qualidade de vida aos seus habitantes, com o
objetivo de atrair proissionais mais capacitados. Em suma, estabeleceu-se uma grande
competição entre as cidades globalizadas na
busca de capital humano e inanceiro, que
frequentemente costumam caminhar juntos.
cadernos fgv projetos
319
of the government. It is necessary to adopt
what could be called a “propositive urbanism”, based on elaborating a strategic plan
in which the city is idealized and then later
made real by installing urban projects and
other pertinent urbanistic actions.
STRATEGIC PLANNING: THE
RELATIONSHIP BETWEEN PLAN
AND PROJECT
For a long while the attraction of cities was
attributed only to questions of an economic
nature. In the late 1970s, information-technology professionals reached the point of
prophesying the end of the city, claiming
that the digital era would free people from
the need to live in the stress of the urban environment; they would make their supposed
dreams come true in the peace and tranquility of the countryside. But cities did not disappear, as a matter of fact they still attract
(even more) people.
Today we know that cities represent
far more than job opportunities, in fact
they are a powerful stimulus to personal
development by providing access to socio-cultural diversity, intellectual growth,
creativity, innovation and productive leisure. The new generations in the developed countries now choose the city where
they want to live even before deciding on
the professional activity they want to follow. In turn, cities have been trying more
and more to offer their inhabitants a better quality of life so as to attract more efficient professionals. In short, competitiveness has grown between the globalized
cities in their search for human and financial capital; indeed, cities often accompany one another in this endeavor.
“
The new
generations in
the developed
countries now
choose the city
where they want
to live even before
deciding on the
professional
activity they want
to follow.
”
artigo
article
320
Segundo os planejadores catalães Jordi
Borja e Manuel Castells,2 se por um lado o
processo de globalização tem transformado
as cidades em grandes protagonistas do século XXI, por outro, tem induzido o desenvolvimento de um profundo senso de competitividade na disputa acirrada pelo seu espaço
próprio nessa rede internacional. Baseado
nessa premissa, o Planejamento Estratégico
de cidades, que teve os seus principais conceitos importados do planejamento empresarial, propõe-se a adaptar as grandes metrópoles a esse novo contexto. Tendo como
paradigma o inegável sucesso de Barcelona,
esse modelo de planejamento sugere a elaboração de um “projeto de cidade” que teria
como objetivo geral levá-la à conquista de sua
posição global.
Embora algumas tentativas de implantar
o Planejamento Estratégico no país venham
ocorrendo desde meados dos anos de 1990,
sendo o Rio de Janeiro o caso mais ambicioso, nenhuma delas foi realmente bem-sucedida. As metrópoles brasileiras ainda não
possuem sistema de transporte eiciente,
habitação social em escala, espaços públicos
de qualidade e muitas outras infraestruturas
urbanas que as cidades globais já conquistaram no século passado. Por mais bem-intencionados e competentes que sejam os nossos
gestores públicos, não será possível inserir
a cidade brasileira nessa rede global em um
futuro próximo. É preciso iniciar o processo
de qualiicação das nossas cidades o quanto
antes, sob pena de icarmos deinitivamente
fora do cenário internacional.
Em termos conceituais, existe uma grande
diferença entre o tradicional Plano Diretor e
o Plano Estratégico. O primeiro apresenta-se
According to Catalunyan planners Jordi Borja and Manuel Castells,2 if on the
one hand the process of globalization has
changed cities into major protagonists of
the 21st century, on the other hand it has
induced the development of a profound
sense of competitiveness in the cut-throat
dispute for their space in this international network. Based on this premise,
the strategic planning of cities, the principal concepts of which were imported
from entrepreneurial planning, proposes
to adapt large metropolises to this new
context. This model of planning, using the
paradigm of the undeniable success of the
city of Barcelona, suggests elaborating a
“city project” with the general objective of
achieving worldwide recognition.
Although some attempts to implant
Strategic Planning in the country date
from the mid-1990s - the city of Rio de
Janeiro being the most ambitious of such
attempts - none of them have really met
with success. Brazil’s metropolises still
lack an efficient transportation system,
social housing, public spaces of good quality and many other urban infrastructure
elements installed in the global cities last
century. No matter how well-intentioned
and competent our public administrators
may be, it will not be possible to promote
Brazil’s cities to this global network in the
near future. The process of qualifying our
cities must be done as soon as possible,
otherwise we will remain definitively absent from the international scenario.
In terms of concept, there exists a large
difference between the traditional Director Plan and Strategic Planning. The
2 Jordi Borja e Manuel Castells (1997) estão entre os principais mentores
teóricos do Planejamento Estratégico de Cidades, que também é conhecido
como “modelo catalão” de planejamento urbano.
2
Jordi Borja and Manuel Castells (1997) feature among the main
theoretical mentors of Strategic City Planning, also known as the
“Catalunyan model” of urban planning.
cadernos fgv projetos
321
fundamentalmente como um plano normativo, mais preocupado com a regulamentação
de futuras e eventuais intervenções urbanas.
Já o segundo, propõe-se a ser um plano de
ações visando a soluções de problemas atuais
e concentrando-se nas possíveis articulações
de agentes urbanos com o objetivo de explorar as reais possibilidades da cidade. Um
plano que deine não só o que não pode ser
feito mas, sobretudo, o que é possível fazer,
ou seja, um plano comprometido com a viabilidade da sua própria implementação.
Ciente da limitação cada vez maior do capital público, o Planejamento Estratégico valoriza a sua capacidade promotora e propõe
que o urbanismo contemporâneo seja baseado na negociação com agentes privados,
aproveitando, ou até mesmo criando, oportunidades para o desenvolvimento local.3 A
former is presented fundamentally as a
normative plan more concerned with regulating any future urban interventions.
As for the second, here the proposition is
a plan of actions designed to solve current
problems and concentrating on possible
articulations of urban agents aimed at exploring the city’s real possibilities. A plan
that defined not only what cannot be done,
but also and especially what can be done,
in other words a plan committed to making its own implementation feasible.
Aware of the ever-increasing limitation of
public capital, Strategic Planning valorizes
its promoting capacity and proposes that
contemporary urbanism should be based
on negotiations held with private agents,
taking advantage of – or even creating –
opportunities for local development.3 The
3
3
Em algumas cidades a mobilização social e política necessária para a
In some cities the social and political mobilization necessary to
artigo
article
322
ideia é unir a visão ampla e coletiva dos planejadores públicos com a agilidade e o senso
de mercado das instituições privadas. Nesse
sentido, as parcerias entre o setor público e o
privado são imprescindíveis para a realização
desse “projeto de cidade”. Talvez essa seja a
nossa maior limitação e o grande obstáculo
a ser vencido, visto que não temos práticas
bem-sucedidas nesse tipo de convivência
proissional. Mais uma vez, é possível citar
como um exemplo a não ser seguido as parcerias realizadas na preparação da Copa e dos
Jogos Olímpicos realizados no Brasil.
A característica mais relevante do Planejamento Estratégico, no que diz respeito a este
artigo, é o retorno à ênfase conferida ao projeto urbano e a sua nova relação com o plano.
Além de desempenhar um papel importante,
os projetos urbanos não se apresentam como
produtos derivados de um plano já concluído
como no planejamento convencional. Nesse
modelo de planejamento, os projetos urbanos nascem e se desenvolvem numa relação
aberta, lexível e, sobretudo, desprovida de
qualquer sentido hierárquico com o plano.4
A relação dialética entre essas duas escalas
urbanas presente no Planejamento Estratégico possibilita que o desenvolvimento do plano deina os projetos e as prioridades entre
eles, ao mesmo tempo em que esses mesmos
projetos, ao serem desenhados e implementados, ajudam a aperfeiçoar os objetivos do
plano. Assim sendo, da mesma maneira que
o plano ao articular um grupo de projetos
pode legitimá-los, o contrário também pode
ocorrer. Projetos urbanos elaborados antes
mesmo do início do plano podem ser incorporados a ele, atribuindo-lhe credibilidade e
senso de eicácia.5
elaboração e a implantação do Planejamento Estratégico tem sido facilitada
pela promoção de grandes eventos internacionais.
4
Portas, 1990.
5 Este foi o caso do Plano Estratégico de Barcelona, que, durante a
preparação das Olimpíadas de 1992, incorporou uma série de projetos
urbanos já em andamento.
idea is to join together the broad, collective
vision of public planners and the agility and
market sense of private institutions. In this
sense, partnerships between the public and
private sectors are indispensable to the success of this “city project”. This is perhaps our
biggest limitation and obstacle to be overcome, seeing as we have no successful experience in this sort of professional alliance.
Once again, mention should be made of the
example to be avoided, namely the partnerships signed for the World Cup and Olympic
Games held in Brazil.
In respect to this article, the most relevant
characteristic of Strategic Planning is the return to the emphasis lent to the urban project and its new relation to the plan. Besides
fulilling an important role, urban projects
are not presented as products originating
in an already concluded plan, as in conventional planning. According to this model of
planning, urban projects are generated and
developed in a relationship that is open, lexible and above all stripped of any hierarchical sense with the plan.4
The dialectic relationship between these
two urban scales present in Strategic Planning allows the development of the plan to
deine the projects and priorities between
them, at the same time that these projects,
once designed and implemented, help to perfect the objectives of the plan. This being so,
just as the plan, on articulating a group of
projects, can legitimize them, the opposite
can also happen. Urban projects that are
elaborated even before the plan begins can
be incorporated with it, thereby lending it
credibility and a sense of eficacy.5
elaborate and implant Strategic Planning has been made all the easier by
hosting major international events.
4
Portas, 1990.
5 This was the case of the strategic planning of Barcelona; during the
preparation of the 1992 Olympic Games, a series of urban projects already
underway were incorporated.
cadernos fgv projetos
323
Esse modelo de planejamento propõe a
articulação de projetos urbanos estrategicamente localizados no território, de forma que
os seus efeitos transcendam as áreas de intervenções. O potencial dessas intervenções
urbanas depende da coerência dos projetos
com outras intervenções e do poder de gerar
benefícios sobre os seus entornos imediatos,
tanto no que diz respeito aos aspectos socioeconômicos como físico-espaciais.6 Muitos
arquitetos urbanistas têm atribuído a esse
tipo de estratégia uma imagem metafórica de
“acupuntura urbana”,7 na qual a sinergia gerada por uma série de intervenções pontuais
e localizadas – assim como agulhas aplicadas
no corpo humano - produzem efeitos positivos no território como um todo.
É importante ressaltar, no entanto, que o
referencial teórico utilizado pelos arquitetos urbanistas na elaboração desses projetos não é mais fundamentado nos princípios
This model of planning proposes articulating urban projects strategically located
in the territory so as to make their effects
transcend the areas of interventions. The
potential of such urban interventions depends on coherence between the projects
and other interventions and on the power
of generating beneits for their immediate
surroundings, in respect to both socio-economic and physical-spatial aspects.6 Many
urbanist-architects have attributed to this
type of strategy a metaphorical image of
“urban acupuncture”,7 where the synergy created by a series of speciic localized
interventions – like needles applied to the
human body – has a positive impact on the
territory as a whole.
It bears stressing, however, that the theoretical reference used by urbanist-architects
when preparing these projects is no longer
grounded in the principles of the modern
6 É exatamente esta capacidade de ampliar os benefícios às áreas vizinhas
das intervenções que legitima a concentração de recursos públicos investido
em determinados pontos da cidade.
6 It is precisely this capacity to extend beneits to the areas surrounding
the interventions that legitimizes concentrating public resources invested
in determined points of the city.
7
Esse conceito foi criado pelo arquiteto urbanista inlandês Marco
Casagrande e foi lançado no Brasil por Jaime Lerner, ex-prefeito de Curitiba
e ex-governador do Paraná.
7 This concept was created by the Finnish urbanist-architect Marco
Casagrande and launched in Brazil by Jaime Lerner, ex-mayor of Curitiba
city and ex-governor of Paraná state.
artigo
article
324
“
A ideia é unir
a visão ampla
e coletiva dos
planejadores
públicos com
a agilidade e o
senso de mercado
das instituições
privadas.
”
do movimento moderno. A cidade dispersa,
monofuncional e rodoviarista proposta pelo
modernismo há muito se apresenta como um
modelo ultrapassado. Os projetos urbanos
contemporâneos seguem os conceitos derivados da disciplina do Desenho Urbano, sugerindo uma cidade compacta, multifuncional e
protagonizada pelo pedestre.8
DESENHO URBANO: O
EMBASAMENTO TEÓRICO NA
AÇÃO PROJETUAL
Embora só recentemente o Desenho Urbano
tenha sido considerado uma atividade especíica, ele abraça práticas que, de alguma forma, sempre estiveram presentes nos estudos
referentes à arquitetura e ao urbanismo. Focada no desenho tridimensional dos assentamentos humanos e suas partes, a disciplina
aborda questões consideradas relevantes em
qualquer tentativa de apreender o ambiente
construído. De certa maneira, o entendimento do edifício esteve sempre atrelado ao espaço urbano ao longo dos séculos, mesmo que
eventualmente essa relação tenha apresentado diferentes graus de intensidade.
Assim, relexões teóricas sobre os aspectos funcionais e estéticos dos espaços urbanos, provavelmente começaram junto com
os estudos referentes à arquitetura. Não seria
exagero dizer que as pesquisas atuais voltadas para uma melhor compreensão teórica
desses espaços, na verdade, começaram com
o arquito romano Marcus Vitruvius.9 Embora seu trabalho não tenha sido direcionado à
escala urbana, mas sim arquitetônica, Vitruvius investigou com maestria a relação entre
8
Speck, 2012.
9 Marcus Vitruvius Pollio (séc I a.C), autor do tratado De Architecture,
considerado o primeiro texto teórico ocidental sobre a disciplina.
cadernos fgv projetos
325
movement. The dispersed, mono-functional
and road-related city proposed by modernism has for quite a while been viewed as an
outdated model. Current urban projects follow the concepts borrowed from Urban Design, that is to say, they suggest a city that
is compact, multi-functional and privileging
the pedestrian.8
URBAN DESIGN: THE
THEORETICAL FOUNDATION OF
PROJECT-RELATED ACTION
Although Urban Design has only recently
been considered a speciic activity, it contains practices that in some way have always been present in studies referring to
architecture and urbanism. Focused on the
tridimensional design of human settlements
and their segments, the discipline addresses
questions considered to be relevant to any attempt to understand the built environment.
In a certain way, throughout the centuries
buildings have always been understood as
being connected to the city space, even if this
relationship occasionally presented different degrees of intensity.
Therefore, theoretical relections on the
functional and aesthetic aspects of urban
spaces probably began together with studies
related to architecture. It could even be said
that current research aimed at a better theoretical understanding of these spaces really began with the Roman architect Marcus
Vitruvius.9 Although his work was focused
not on the city scale but rather on the architectural, Vitruvius masterfully investigated
8
Speck, 2012.
9 Marcus Vitruvius Pollio (1st B.C.), author of the treatise De
Architecture, considered to be the irst Western theoretical text on the
discipline.
“
The idea is to join
together the broad,
collective vision
of public planners
and the agility and
market sense of
private institutions.
”
artigo
article
326
o edifício e seu entorno imediato. Ao analisar
o desempenho dos edifícios inseridos em tipologias urbanas clássicas, como a Ágora Grega
e o Fórum Romano, ele não só estabeleceu a
arquitetura como uma disciplina compreendida por meio de princípios racionais e articulados, mas também demonstrou a relevância da
dimensão urbana nos estudos arquitetônicos.
No entanto, a versão contemporânea do
Desenho Urbano surgiu em meados do século XX. A urgente demanda de reconstruir
as cidades europeias parcialmente destruídas na segunda guerra mundial trouxe à tona
uma série de espaços urbanos projetados
segundo princípios modernistas. Muitos arquitetos urbanistas propuseram uma renovação radical da cidade tradicional por meio de
uma massiva engenharia viária e de um desenvolvimento mono funcionalista. O espaço
urbano era tratado como uma tábula rasa, na
qual novas formas arquitetônicas poderiam
ser inseridas de maneira aleatória.
Gradativamente a cidade modernista foi
sendo construída, com suas ediicações soltas no lote e isoladas em grandes áreas livres,
substituindo as quadras compactas e os espaços públicos bem deinidos que caracterizam
a cidade tradicional. Novos bairros foram
projetados priorizando o uso do automóvel
e a cidade modernista surgiu com uma paisagem urbana dispersa, composta de supermercados, condomínios fechados e shopping
centers, conectados por grandes avenidas
expressas. Nasce o que o arquiteto e urbanista holandês Rem Koolhaas deiniu como
a “cidade genérica”.10 Uma cidade que pouco
a pouco vem perdendo a sua identidade própria, diante de um acelerado processo de homogeneização do espaço urbano.
the relation between the building and its immediate vicinity. On analyzing the performance of the buildings inserted in classic urban typologies, such as the Greek Agora and
the Roman Forum, he not only established
architecture as a discipline understood by
means of rational and articulated principles, but also showed the relevance of the urban dimension in architectural studies.
Nonetheless, the contemporary version of
Urban Design arose in the middle of the 20th
century. The pressing demand to rebuild
the cities of Europe destroyed in the Second
World War exposed a series of urban spaces projected in accordance with modernist
principles. Many urbanist-architects proposed a radical renovation of the traditional
city by adopting massive road engineering
and mono-functional development. The urban space was treated as a tabula rasa on
which new architectural forms could be inserted at random.
The modernist city was gradually erected, with its buildings standing alone on
the terrain and isolated in large free areas, replacing the compact blocks and the
well-defined public spaces that characterized the traditional city. New neighborhoods were projected that prioritized the
use of the automobile; this modernist city
emerged with an urban landscape that
was dispersive, composed of supermarkets, condominiums and shopping-centers, all linked together by large express
avenues. What the Dutch urbanist Rem
Koolhaas defined as the “generic city” was
born.10 A city that little by little is losing
its own identity due to a rapid process of
homogenization of the urban space.
10
10
Rem Koolhaas, 1995.
Rem Koolhaas, 1995.
cadernos fgv projetos
327
Apesar do objetivo de criar espaços urbanos confortáveis e funcionais, a maioria desses projetos realizados no período
pós-guerra não respondeu às necessidades
humanas diante do ambiente construído.
Com isso, uma gradual e constante insatisfação entre os usuários sobre a qualidade espacial desses ambientes urbanos
começou a tomar corpo. Pela sistematização dessas críticas ao urbanismo moderno desenvolveu-se a estrutura teórica do
Desenho Urbano, que, aos poucos, vem se
estabelecendo como uma atividade profissional especializada.
No início dos anos de 1960, a jornalista
americana Jane Jacobs publicou, em 1961,
o livro The Death and Life of Great American
Cities,11 que constituiu, como ela mesma disse,
“um ataque aos fundamentos do planejamento
moderno e de reurbanização ora vigentes”, bem
como uma “tentativa de introduzir novos princípios de planejamento”, que visavam essencialmente à promoção de ambientes urbanos
com maior vitalidade. Esse livro inaugurou uma
nova visão crítica da vida urbana e apresentou
Despite the stated objective of creating
comfortable and functional urban spaces, most of the projects that emerged in the
post-war period do not meet human needs in
respect to the built environment. This led to
gradual and constant dissatisfaction among
the users with regard to the spatial quality
of these urban environments; this dissatisfaction became stronger and stronger. The
systematization of these critiques of modern urbanism developed into the theoretical
structure of Urban Design, which little by
little has established itself as a specialized
professional activity.
In 1961, the American journalist Jane Jacobs published The Death and Life of Great
American Cities,11 which in her own words
constituted “an attack on the fundamentals
of modern planning and re-urbanizations
currently in effect”, as well as an “attempt
to introduce new principles of planning”
which intended essentially to promote urban environments with more vitality. This
book inaugurated a new critical view of urban life and presented an original perspec-
11 Esse livro só foi traduzido para o português no ano 2000, com o título
de “Morte e Vida das Grandes Cidades”.
11 This book was translated into Portuguese in 2000, under the title
“Morte e Vida das Grandes Cidades” (The Life and Death of Big Cities).
artigo
article
328
uma perspectiva original para o planejamento,
tornando-se uma espécie de “marco zero bibliográico” do urbanismo contemporâneo.
Um grande número de estudos acadêmicos
direcionados ao entendimento da relação entre os espaços públicos e privados vem sendo
realizado desde então, e o Desenho Urbano
é considerado hoje um campo disciplinar
distinto da arquitetura e do urbanismo, com
sua agenda própria e seu conteúdo teórico
especíico. Situado entre essas duas escalas, a
disciplina pretende exatamente preencher as
lacunas existentes entre elas. Tem como foco
o domínio público dos espaços urbanos, mas
não envolve apenas ruas, calçadas, pátios,
praças e parques. Alguns aspectos do domínio
privado que afetam o espaço público, como
uso, densidade e tipologia arquitetônica, também fazem parte do escopo da disciplina.
Apesar de as relações intrínsecas entre os
espaços público e privado estarem ainda longe de ser totalmente decifradas, é inegável
que informações relevantes e com aplicação
imediata no processo projetual já foram produzidas. Um corpo de conhecimento consistente vem sendo consolidado nesse campo
disciplinar, estruturando um dos mais importantes conceitos do urbanismo contemporâneo: o conceito de urbanidade.
Deinir com precisão o conceito de urbanidade não é uma tarefa simples, visto que esse
termo tem sido utilizado de forma indiscriminada e com signiicados bastante genéricos.
Trata-se assim de um conceito abrangente e
extremamente abstrato. No entanto, apesar da
diiculdade em deini-lo, parece ser fácil identiicá-lo quando vivenciamos a condição de
urbanidade. Por uma razão que muitas vezes
não sabemos exatamente o porquê, nos sentimos mais confortáveis e acolhidos em determinados espaços urbanos do que em outros.
tive for planning, thereby becoming a sort
of “bibliographic ground zero” of contemporary urbanism.
Since then, a large number of academic studies have been written on the relation between public and private spaces,
and nowadays Urban Design is seen as a
discipline different from architecture and
urbanism, with an agenda of its own and
a speciic theoretical content. Situated between these two scales, the discipline aims
precisely to ill the lacunas that exist between them, focusing on the public domain
of urban spaces, but not involving streets,
sidewalks, patios, squares and parks. Some
aspects of private domain that affect the
public space, such as use, density and architectonic typology, are also part of the scope
of Urban Design.
Although the specific relations between
public and private spaces are still far from
being totally deciphered, it cannot be denied that relevant information immediately applicable to the project process
has been produced. A body of consistent
knowledge is being consolidated in this
area to construct one of the most significant concepts of contemporary urbanism:
the concept of urbanity.
Finding an exact definition of the concept of urbanity is no easy task, since this
term has been employed indiscriminately
and with rather generic meanings. The
concept is wide-ranging and extremely abstract. Nevertheless, in spite of the
difficulty in defining it, it seems easily
recognizable when we actually experience
the condition of urbanity. We often fail
to understand exactly why certain urban
spaces make us feel more comfortable and
welcome than in others.
cadernos fgv projetos
329
A princípio – e no senso comum do termo – o nível de urbanidade de uma cidade
está relacionado com o grau de civilidade de
sua população diante do convívio urbano. Ou
seja, estaria mais relacionada ao comportamento humano do que à materialidade do
espaço urbano. Entretanto, pesquisas acadêmicas indicam que existem condições físicas
geradoras de urbanidade, que, quando bem
aplicadas, podem produzir espaços urbanos
mais hospitaleiros. É exatamente na interface da população com o espaço urbano que
se encontra a urbanidade, que, por sua vez,
pode ser capturada e reproduzida, desde que
sejam respeitadas as especiicidades do local.
Apesar de a condição de urbanidade apresentar variações de ordem sociocultural, de
uma forma geral, a cidade compacta, multifuncional, policêntrica, detentora de uma rede de
espaço público qualiicada e de um sistema de
First of all – and as the term is commonly
used – the degree of a city’s urbanity has to
do with how its inhabitants adapt to living
together, in other words, their civic sense. In
this sense, urbanity is related more human
behavior than to the materiality of the urban
space. Nonetheless, academic studies show
that urbanity comes from certain physical
conditions that, when properly applied, can
create more hospitable urban spaces. It is
precisely in the interface of the population
with the urban space that we ind urbanity,
which in turn can be captured and re-produced as long as the speciic features of the
place are respected.
Despite the fact that urbanity presents
variations of a socio-cultural nature, in general the city that is compact, multi-functional, polycentric and enjoys a qualiied network of public space and an eficient system
artigo
article
330
mobilidade eiciente, tem se apresentado como
o modelo ideal da metrópole contemporânea.12
“
Apesar de a condição
de urbanidade
apresentar
variações de ordem
sociocultural, de
uma forma geral, a
cidade compacta,
multifuncional,
policêntrica,
detentora de uma
rede de espaço
público qualiicada
e de um sistema de
mobilidade eiciente,
tem se apresentado
como o modelo
ideal da metrópole
contemporânea.
”
CONSIDERAÇÕES FINAIS: A
POSTURA PROJETUAL DO
ARQUITETO URBANISTA
Como exposto neste artigo, uma nova geração
de projetos urbanos tem sido vista de maneira distinta da geração pós-guerra, fundamentada nos princípios modernistas. Muitos autores airmam que esses projetos possuem uma
abordagem mais contextualizada, comprometida com a dimensão sociocultural e histórica
da cidade. São projetos preocupados com a
identidade do local e se apresentam conectados entre si por meio de um plano urbano, caracterizado como um “projeto de cidade”.
No entanto, alguns desses projetos contemporâneos, assim como os projetos modernistas do passado, mostram-se descontextualizados e desconectados a uma escala maior
de planejamento. São intervenções egocêntricas que mais parecem grandes projetos
arquitetônicos isolados na paisagem do que
propriamente projetos urbanos integrados à
cidade. Alguns deles, inclusive, apresentam
um forte apelo visual com o claro objetivo
de atrair a atenção do público, agindo mais
como instrumentos de marketing urbano.
O desconhecimento, por parte do arquiteto
urbanista, das complexas relações entre plano e
projeto no planejamento contemporâneo pode
ter sérias consequências com graves repercussões sociais. A mais óbvia seria favorecer a manipulação do Planejamento Estratégico para
legitimar uma série de intervenções pontuais
desarticuladas, que tenham como objetivo beneiciar grupos privilegiados pela valorização
12
Gehl e Svarrer, 2013.
cadernos fgv projetos
331
of mobility has proved to be the ideal model
of today’s metropolis .12
FINAL REMARKS: THE PROJECTRELATED SPIRIT OF THE
URBANIST-ARCHITECT
This article has set out to show that a new
generation of urban projects has been treated differently from those based on modernist
principles that appeared in the post-war period. Many authors claim that these projects
have a more contextualized approach, one
committed to the city’s socio-cultural and
historical dimension. Their concern is with
the identity of the place, and they connect
with one another by means of an urban plan
that is characterized as a “city project”.
Some of these contemporary projects,
however, just like the modernist projects
in the past, are de-contextualized and lacking a higher level of planning. Egocentric
interventions, they convey the idea of large
architectonic projects isolated in the landscape rather than actual urban projects integrated with the city. Some of them even
present a strong visual appeal with the obvious objective of attracting the attention of
the public and acting more like instruments
of urban marketing.
The urbanist-architect’s unfamiliarity
with the complex relations between plan
and project in contemporary planning
can lead to serious social repercussions.
The most obvious would be to favor Strategic Planning being manipulated in order to legitimize a series of specific disarticulated interventions designed to benefit
privileged real-estate groups interested in
12
Gehl and Svarrer, 2013.
“
Despite the fact that
urbanity presents
variations of a sociocultural nature, in
general the city that
is compact, multifunctional, polycentric
and enjoys a qualiied
network of public
space and an eficient
system of mobility has
proved to be the i
deal model of
today’s metropolis .
”
artigo
article
332
imobiliária de nichos urbanos.13 O consentimento formal do poder público por meio da má
utilização desse modelo de planejamento tornaria essas intervenções ainda mais danosas do
que as realizadas nas décadas de 1980 e 1990,
quando uma série de projetos isolados e conduzidos pelo setor privado foram implantados.
Seria ingênuo acreditar que a postura do
arquiteto urbanista diante do seu projeto seja
suiciente para impedir o sentido deformador
do Planejamento Estratégico. Outros atores
urbanos envolvidos nesse processo, como
as instituições públicas, os empreendedores
privados e a própria comunidade também
desempenham papéis importantes nesse
contexto. A função do arquiteto urbanista
como responsável pelo projeto é determinante, e é muito importante que ele não priorize
apenas os aspectos artísticio da sua proissão.
O foco aqui se concentra na natureza intelectual da disciplina. Desenvolve-se a partir da
dicotomia existente na sua prática enquanto
atividade artística de base intuitiva e/ou atividade quase-cientíica de base dedutiva. Aborda a diferença entre a atitude projetual centrada na arte pura, que prioriza a qualidade
visual do espaço urbano por meio da utilização de princípios estéticos e a atitude projetual
comprometida com ações direcionadas ao melhoramento da qualidade de vida das pessoas
que utilizam o ambiente construído.
É fato que em toda ação projetual sempre
está, e provavelmente sempre estará, presente a dimensão artística de fundamentação
predominantemente intuitiva. Ainal, todo
projeto arquitetônico ou urbano, além de
servir ao seu uso, expressa pela sua estética
um estilo que nada mais é do que a materialização do pensamento de um povo numa determinada época. A história tem estabelecido
such urban niches.13 The formal consent of
the government by misusing this model of
planning would make these interventions
even more harmful than those carried out
in the 1980s and 1990s, when a series of
isolated private-sector projects were implanted.
It would be naïve to believe that the attitude of the urbanist-architect toward his/
her project is in itself suficient to prevent
Strategic Planning being deformed. Other
urban actors involved in this process, such
as public interventions, private entrepreneurs and the community itself also play important roles in this context. The function of
the responsible urbanist-architect vis-à-vis
the project is decisive, and it is very important that priority only be given to the artistic
aspects of his/her profession.
Here the focus is on the intellectual nature
of the discipline, developed according to the
dichotomy that exists in practice as an artistic activity based on intuition and/or a
quasi-scientiic activity based on deduction.
Here we are dealing with the difference between the project-related mentality centered
on pure art and prioritizing the visual quality of the urban space by using aesthetic principles, and the attitude committed to actions
aimed at improving the quality of life of people who use the built environment.
The truth is that all project-related actions
always – and probably will always – contain an artistic dimension that is predominantly based on intuition. After all, every
architectural or urban project, in addition
to serving its use, expresses through its aesthetic spirit a style that is nothing other than
the materialization of the spirit of a people in
a certain period of time. History has estab-
13
13
Arantes, Vainer e Maricato, 2000.
Arantes, Vainer and Maricato, 2000.
cadernos fgv projetos
333
artigo
article
334
relações nítidas entre os espaços urbanos, o
tempo e as sociedades nas quais foram construídos. Enim, o espaço urbano é também
uma obra de arte na qual um momento especíico da cultura humana é retratado.
Assim, como em qualquer outra atividade
artística, faz-se imprescindível um certo grau
de personalismo na projetação desses espaços. Entretanto, parece indiscutível que o
excesso desse componente pode diicultar ou
mesmo comprometer o entrosamento funcional e estético entre os projetos - visto que
muitas vezes eles são concebidos por proissionais diferentes - e suas articulações com
o plano urbano. É nesse particular que se
apresenta a grande complexidade do relacionamento entre as intervenções pontuais propostas pelo Planejamento Estratégico. Como
garantir a individualização da ação projetual
e a articulação coletiva dos projetos resultantes dessa ação?
Nesse sentido, as relações estabelecidas entre o comportamento social e o espaço urbano,
que tão bem fundamentam o Desenho Urbano,
podem atuar como um elo de ligação conceitual
entre as propostas. Seria o embasamento teórico inserido no processo projetual que, ao ser
somado à criatividade intuitiva do arquiteto, garantiria a realização de espaços urbanos qualiicados. Assim, o Desenho Urbano deve ser visto como uma disciplina híbrida, composta por
elementos de base quase-cientíica somados à
dimensão artística de natureza intuitiva.
Parece ser fundamental que o arquiteto
contemporâneo supere a sua autoimagem de
artista em estado puro e assuma essa ambiguidade contida na concepção dos projetos
urbanos, sem receio de que a utilização do
conhecimento adquirido pelas pesquisas acadêmicas limite o seu potencial criativo. Ainal, é essa mesma ambiguidade que impede
o desenvolvimento de teorias precisas que,
lished clear relations between urban spaces,
time and the societies in which theses spaces were built. Urban space, after all, is also
a work of art in which a speciic moment of
human culture is portrayed.
Accordingly, as in any other artistic activity, a certain degree of personalism is indispensable in projecting these spaces. Nevertheless, it seems unquestionable that an
excess of this component can complicate or
even compromise the functional and aesthetic collaboration between the project – since
it is often conceived by different professionals – and how it articulates with the urban
plan. This is the component that presents
the great complexity of the relationship between the speciic interventions proposed by
Strategic Planning. How can we guarantee
individualizing the project-based action and
articulating collectively the projects that result from this action?
In this sense, the rapport set up between
social behavior and urban space, and which
supports Urban Design so well, can act as
a conceptual link between the proposals.
This could be the theoretical foundation of
the project process which, once added to the
architect’s intuitive creativity, would ensure
that qualiied urban spaces would become a
reality. In this way, Urban Design should be
seen as a hybrid discipline made up of elements of a quasi-scientiic basis plus the artistic intuitive dimension.
It seems fundamental that today’s architects should get over the self-image of the
artist in a pure state and assume this ambiguity contained in conceiving urban projects
without being afraid that using the knowledge gathered in academic research will restrict their creative potential. After all, it is
this very same ambiguity that prevents the
development of precise theories that, if ap-
cadernos fgv projetos
335
ao serem aplicadas corretamente, garantam
a realização de um espaço urbano de qualidade. O misterioso componente denominado
“criatividade”, que insiste em permanecer indecifrável, é o principal fator diferencial entre o resultado mediano e o genial.
Para inalizar, é sempre bom lembrar que o
fracasso das intervenções urbanas modernistas em atender às necessidades dos seus usuários contribuiu de forma imperativa para o
descrédito do projeto urbano. Tendo como
consequência uma espécie de “desespacialização” do planejamento urbano, que passou
a ser normativo e protagonizado pelos Planos
Diretores. Com isso, a imagem do arquiteto urbanista também foi comprometida, de
modo que esse proissional passou a ser visto
durante um longo período como uma peça de
importância secundária, convocado apenas
no inal do processo para materializar graicamente propostas já concebidas.
No Planejamento Estratégico de cidades,
a revalorização do projeto urbano se apresenta como uma grande oportunidade para o
arquiteto urbanista reconquistar o seu protagonismo no processo de planejamento. Para
tal, entretanto, é imprescindível que a sua
postura projetual demonstre coerência com
o novo papel desempenhado pelo projeto urbano no planejamento contemporâneo. Caso
contrário, corremos o risco de voltarmos a
ser considerados simples maquiadores de espaços urbanos.
•
plied correctly, will guarantee that a quality urban space is produced. The mysterious
component called “creativity”, which insists
in remaining indecipherable, is the main
factor that differentiates between an average research and one that is outstanding.
In closing, it is always wise to remember that the failure of the modernist urban interventions to attend to the needs
of their users contributed decisively to the
discredit of the urban project, the consequence of which was a sort of “de-spatialization” of urban planning, which then became normative and protagonized by the
Director Plans. As a result, the image of
the urbanist-architect was also compromised, in such a way that for a long time
these professionals were seen as secondary in importance and only summoned
at the end of the process to materialize
graphically proposals already conceived.
In the Strategic Planning of cities, revalorization of the urban project presents itself
as a great opportunity for urbanist-architects to regain their prominent place in the
planning process. For this to happen, however, it is essential that their project-related
mentality proves to be coherent with the new
role fulilled by the urban project in contemporary planning. Otherwise, we run the risk
of once again being considered mere makeup artists of urban spaces.
•
artigo
article
336
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS | BIBLIOGRAPHIC REFERENCES
Arantes, Otilia; Vainer, Carlos and Maricato, Erminia A Cidade do Pensamento Único:
Desmanchando Consensos. Editora Vozes Ltda, Petrópolis, 2000.
Borja, Jordi and Castells, Manuel Local and Global: The Management of Cities in the Information Age. Earthscan Publications Limited, London, 1997.
Gehl, Jan and Svarre, Birgitte How to Study Public Life. Island Press, London, 2013.
Jacobs, Jane The Death and Life of Great American Cities: The Failure of Town Planning.
Pelican, Middlesex, 1974 (irst published in 1961).
Koolhaas, R & Mau, B, S, M, L, XL. Monacelli Press, New York, 1995.
Portas, Nuno, Un nuevo Urbanism. In: Borja-Castells-Dorado-Quintana. (org.) Las Grandes Ciudades en la Decada de los Noventa. Ed. Sistema, Madri, 1990.
Speck, Jeff Walkable City: How Downtown can Save America, one Step at a Time. North
Point Press, New York, 2012.
cadernos fgv projetos
337
ARTIGO ARTICLE
SUSTENTABILIDADE
E RESILIÊNCIA
URBANA:
DADOS, INFORMAÇÕES
E TECNOLOGIA COMO
FERRAMENTAS PARA
GESTÃO TERRITORIAL
URBAN
SUSTAINABILITY
AND RESILIENCE:
DATA, INFORMATION AND
TECHNOLOGY AS TOOLS FOR
LAND MANAGEMENT
Ao lado da tecnologia, a produção, a organização e a visualização de dados e
informações são ferramentas importantes para a gestão urbana, sobretudo no que diz
respeito ao desenvolvimento de cidades mais sustentáveis e resilientes. O artigo aborda
como esses instrumentos não só auxiliam na observação e na melhor compreensão
das estruturas urbanas e dos desaios existentes nas cidades, como também podem
ser decisivos para ajudar na tomada de decisão e promover aperfeiçoamentos. Além
disso, são apresentadas algumas iniciativas inovadoras que têm propiciado às cidades
experiências positivas e que podem servir de inspiração para o futuro.
Alongside technology, the production, organization and visualization of data
and information are important tools for urban management, especially for the
development of more sustainable and resilient cities. The article discusses how these
tools not only help in the observation and understanding of urban structures and
the challenges that exist in cities, but can also be instrumental in helping decision
making and promoting improvements. In addition, a number of innovative
initiatives are presented which have provided cities with positive experiences and
which can serve as an inspiration for the future.
ROGÉRIO GUTIERREZ GAMA
Subsecretário de Urbanismo e Mobilidade da Prefeitura Municipal
de Niterói
Undersecretary of Urban Planning and Mobility of the Municipality
of Niterói
Mestre em estudos populacionais e pesquisa social pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas
do Instituto Brasileiro de Geograia e Estatística e geógrafo pela Universidade de São Paulo.
Atualmente, é subsecretário de Urbanismo e Mobilidade da Prefeitura Municipal de Niterói.
Master of Arts in population studies and social research from the National School of
Statistical Sciences of the Brazilian Institute of Geography and Statistics and a degree in
geography from the University of São Paulo. He is currently Undersecretary of Urban
Planning and Mobility of the Municipality of Niterói.
E
T
DESAFIOS URBANOS
URBAN CHALLENGES
As cidades são expressas em sua organização territorial por meio de uma complexa
rede de interações sociais, econômicas e políticas, que perpassam os elementos físicos
e naturais. Essa interatividade inerente às
áreas urbanas é retratada pela concentração
de pessoas, automóveis, prédios, casas, ruas,
avenidas, praças, asfaltos, lugares de contemplação da natureza, arborização, parques
e todos os elementos criados e recriados dentro do espaço urbano.
Segundo dados da Organização das Nações
Unidas (ONU), em 1960, 34% da população
mundial vivia em áreas urbanas, ao passo
que, em 2014, essa proporção subiu para
54%. As projeções são de que, no período entre 2015 a 2020, a população urbana cresça
Cities are expressed in their territorial organization through a complex network of
social, economic, and political interactions
that permeate the physical and natural elements of a city. This interactivity inherent
to urban areas is seen in the concentration
of people, automobiles, buildings, houses,
streets, avenues, squares, pavements, places to contemplate nature, trees, parks and in
all the elements created and recreated within the urban environment.
According to data from the United Nations (UN), in 1960, 34% of the world’s population lived in urban areas and, by 2014, this
proportion had risen to 54%. The current
projections are that between 2015 and 2020
the urban population will grow at an annual
ste artigo tem como foco os desaios trazidos pela urbanização frente à perspectiva de desenvolvimento de cidades mais sustentáveis e resilientes, além de abordar como
a produção, a organização e a visualização de
dados pode inluenciar nestes desaios. Para
ilustrar esse enfoque serão apresentadas algumas iniciativas que, mesmo de forma discreta, já propiciam melhorias para a vida nas
cidades e auxiliam os tomadores de decisões,
tanto públicos como privados, a dialogar continuamente com as questões urbanas.
his article focuses on the challenges of
urbanization with a view toward the
development of more sustainable and resilient cities, as well as how the production,
organization and visualization of data can
inluence these challenges. To illustrate this
approach, we will present some initiatives
that, even in a discreet way, have provided improvements for life in cities and have
helped decision makers, both public and
private, to dialogue continuously with urban issues.
cadernos fgv projetos
341
a uma taxa anual de 1,84% e, entre 2020 e
2025, de que cresça 1,63%.
Essa visão quantitativa global serve como
parâmetro para entender que mais pessoas
têm suas vidas sociais pautadas nas relações
complexas e contraditórias que as cidades
proporcionam – complexas pela natureza
política, social e econômica, e contraditórias,
pois, se por um lado, podem proporcionar
ambientes urbanos harmoniosos para a vida
urbana, com habitabilidade e convívio social,
por outro, podem coexistir núcleos urbanos
completamente hostis, com precariedade
habitacional e de infraestrutura (saneamento, transporte e espaços públicos), os quais
normalmente estão associados às áreas mais
pobres das cidades. Isso implica que o modo
de vida urbano relete diretamente no cotidiano social das pessoas.
Ademais, o mundo experimenta a plena
consolidação das condicionantes da globalização, na qual a produção de informações
sobre pessoas, objetos, lugares e distâncias
podem ser realizadas on-line e inluenciam
nas formas de consumo da vida cotidiana em
uma velocidade nunca antes registrada de comunicação e que se amplia cada vez mais.
As cidades são os espaços dessas realizações registradas pelo on-line por meio de uma
gama de sensores que buscam registrar o modus operandi da sociedade. Sensores esses
que foram criados com ins militares e públicos e que, hoje, foram recriados para ins civis
rate of 1.84% and between 2020 and 2025, it
will grow by 1.63%.
This global quantitative view serves
as a parameter to understand that more
people have their social lives based on the
complex and contradictory relationships
that cities provide – complex in their political, social and economic nature, and
contradictory because, on the one hand,
while they can provide harmonious urban
environments for urban life, that offer
habitability and social interaction, on the
other hand, completely hostile urban centers with poor housing and infrastructure
(sanitation, transport and public spaces)
may coexist, conditions usually associated
with the poorest areas of cities. This implies that the urban way of life reflects directly on people’s daily social lives.
Furthermore, the world experiences the
complete consolidation of the conditioning factors of globalization, in which the production of
information about people, objects, places and
distances can be done online and therefore inluences the forms of consumption of daily life.
This is occurring at a continually increasing,
never before seen speed of communication.
Cities are the spaces in which these activities are registered online, through a
range of sensors that seek to record the
modus operandi of society. These sensors
were created for military and state purposes, but have been recreated today for
artigo
article
342
BOX 1
O poder da análise de rede sociais associado à localização e à
visualização de dados
Em artigo, os autores Evelien Otte e Ronald Rousseau1 descrevem a Análise de Redes Sociais (Social Network Analysis) como uma estratégia para investigar as estruturas sociais,
que tem como ferramenta os princípios das ciências da informação, cujo enfoque consiste
em maneiras de mensurar e de categorizar redes de publicação, citações e cocitações, estruturas de colaboração e outras formas de redes de interação social. A ampliação dessas
técnicas abrange uma amplitude interdisciplinar que pode ser incorporada à sociologia,
economia, geograia, administração pública, engenharia de transportes, marketing digital,
entre outros campos do conhecimento. O papel preponderante da internet nesse processo
é inegável.
A base de informações para esse tipo de análise vem de estruturas de redes sociais como
Twitter, Facebook, Instagram, WhatsApp, entre outros aplicativos nos quais as pessoas
manifestam sentimentos e opiniões, bem como sua localização, seus hábitos e suas buscas.
Trata-se assim de aplicativos que armazenam milhares de informações pessoais que podem
ser analisadas.
Para exempliicar o poder desse tipo de ferramenta de análise, é pertinente citar o
site Locals & Tourists, criado por meio de ferramentas disponíveis na internet, como
um instrumento de visualização de dados de atividades turísticas em diferentes cidades do mundo. A partir dos dados captados por milhões de tweets foram elaborados
mapas baseados nos geotags das publicações, com a ideia de separar as publicações
dos moradores locais das dos turistas.2 Para conferir as imagens que comparam as publicações realizadas em Moscou, na Rússia, e na área do Time Square, em Nova York,
nos Estados Unidos, acesse o QR Code.
1 Otte, Evelien; Rousseau, Ronald. Social network analysis: a powerful strategy, also for the information sciences. Journal of Information
Science, v. 28, n. 6, p. 441-453, 2002.
2 Disponível em: <http://www.b9.com.br/38429/design/mapas-de-cidades-mostram-turistas-vs-locais-atraves-de-tweets/>.
cadernos fgv projetos
343
BOX 1
The power of social network analysis associated with location and
data viewing
In their article, authors Evelien Otte and Ronald Rousseau1 describe Social Network Analysis as a strategy to investigate social structures, which uses the principles of information science as a tool to focus on ways of measuring and categorizing publication networks, citations and co-citations, collaboration structures and
other forms of social interaction networks. The expansion of these techniques encompasses an interdisciplinary scope that can be incorporated into sociology, economics, geography, public administration, transportation engineering and digital
marketing, among other areas of knowledge. The preponderant role of the internet
in this process is undeniable.
The information base for this type of analysis comes from social networking
structures like Twitter, Facebook, Instagram and WhatsApp, among other applications, in which people manifest their feelings and opinions, as well as their location,
habits and searches. These are applications that store thousands of personal data
that can be analyzed.
To exemplify the power of this type of analysis tool, it is pertinent to cite the website Locals & Tourists, created using tools available on the internet, as a tool for visualizing data on tourist activities in different cities of the world. Based on the data
collected by millions of tweets, they were able to create maps based on the geotags
of the publications, with the idea of excluding those of local residents from those of
tourists.² To see the images which compare the publications made in Moscow, Russia, and those in the area of Time Square in New York, in the United States, access
the QR Code.
1 Otte, Evelien; Rousseau, Ronald. Social network analysis: a powerful strategy, also for the information sciences. Journal of Information
Science, v. 28, n. 6, p. 441-453, 2002.
2 Available at: <http://www.b9.com.br/38429/mapas-de-cidades-mostram-turistas-vs-locais-atraves-de-tweets/>.
artigo
article
344
e privados. Esses dados e informações gerados
e registrados, além do seu atributo qualitativo
e/ou quantitativo, são informações espaciais,
pois são geocodiicadas em qualquer lugar do
espaço terrestre. O exemplo mais característico desse modo de produzir informações na
vida cotidiana é a opção GPS ou a localização
dos telefones móveis, que, ao ser acionada por
milhares de pessoas que circulam nas cidades, gera um mapeamento espontâneo de um
modo de vida que é essencialmente urbano.
Essa informação locacional atrelada, por exemplo, às redes sociais é uma poderosa ferramenta
de análise sobre a percepção social no tocante
a qualquer tipo de assunto, seja ele político,
econômico, social ou ambiental, além de ser de
interesse dos tomadores de decisão públicos e
privados (Ver Box 1).
As grandes corporações já se apropriam
desse tipo de informação e a utilizam para a
modelagem de seus negócios ou mesmo para a
prospecção de novos modelos. O maior exemplo disso são as grandes empresas de tecnologia que mineram informações pelas redes
sociais e sobre seus respectivos seguidores, a
im de entender comportamentos e padrões
de consumo para o direcionamento de suas
atividades ou para a modelagem de produtos.
Por outro lado, para os tomadores de decisão
públicos, o desaio consiste em usar essa produção de informações para melhorar a leitura
das áreas urbanas e das necessidades sociais,
econômicas, ambientais e estruturais que exigem os modos de vida urbanos. Isto é, usar a
tecnologia como ponte para aproximar as escolhas dos cidadãos dos processos de decisão
da gestão pública que busquem uma visão de
sustentabilidade para o tecido urbano.
Diante desse contexto, algumas questões são
pertinentes de serem suscitadas como guia para
a leitura das cidades, tais como: em quais estruturas a população está vivendo, qual o futuro es-
civil and private use. The data generated and recorded, in addition to its qualitative and/or quantitative attributes, is
spatial information, since it is geo-coded
anywhere in terrestrial space. The most
characteristic example of this way of producing information in everyday life is GPS
or mobile phone tracking, which, when
used by thousands of people circulating in
cities, generates a spontaneous mapping
of a way of life that is essentially urban.
This location and tracking information,
for example, when linked to social networks, is a powerful tool for analyzing
social perception on any topic, be it political, economic, social or environmental,
besides being of interest to public and private decision makers (See Box 1).
Large corporations have already appropriated this type of information and
use it to model their business and even
to develop new business models. The best
examples of this are the large technology companies that gather information
through social networks and their respective followers in order to understand consumer behavior and patterns for targeting their activities or modeling products.
On the other hand, for public decision
makers, the challenge is to use this information to improve our understanding
of urban areas and the social, economic,
environmental and structural needs of urban lifestyles. That is, to use technology as
a bridge to bring citizens’ decisions closer
to the decision-making processes of public
management that seek a vision of sustainability for the urban fabric.
Given this context, some pertinent issues
should be raised as a guide for reading
the data on cities, such as: the structures
the population lives in, expectations with
cadernos fgv projetos
345
perado no tocante à organização territorial urbana, quais os problemas de gestão de cidades que
envolvem a sustentabilidade e de que maneira a
organização, a divulgação e o monitoramento de
dados e de informações sobre os luxos das cidades podem inluenciar em ambientes urbanos
mais resilientes ou na maior participação social
no planejamento e na gestão urbana.
O fato de aproximadamente 4 bilhões de
pessoas viverem em áreas urbanas no mundo,
principalmente em países mais pobres e em desenvolvimento, gerou acúmulos de problemas
que impactam diretamente nas condições de
habitabilidade, que, por sua vez, são caracterizadas por aspectos como a precariedade não só
habitacional, como também dos espaços públicos, das condições de trabalho, de mobilidade e
de segurança. Dentro dessa perspectiva, o relatório da ONU Urbanization and Development:
Emerging Futures/World Cities Report, de
2016, aponta oito temas relevantes e os desaios
globais para as cidades urbanas. Em síntese, são
apresentados os seguintes fundamentos:
• Crescimento urbano – entendido
como a base de todos os desaios colocados
para as áreas urbanas.
• Mudança dos arranjos familiares –
estrutura social que rege os desaios urbanos, uma vez que as novas condições demográicas - como a queda da fecundidade, a
diminuição da taxa de mortalidade infantil
e o aumento da expectativa de vida - são
exemplos que inluenciam nas mudanças
demográicas urbanas.
• Aumento de moradia em favelas e de
assentamentos informais – é o principal
desaio para os países mais pobres e em
desenvolvimento e ratiica a importância
das políticas públicas municipais na gestão
do uso e da ocupação do solo orientadas à
redução desse tipo de habitação e à promoção de moradia digna.
regard to urban territorial organization,
which city management problems involve
sustainability, and in what way can the organization, dissemination, and monitoring
of data and information on city lows help
to ensure more resilient urban environments and greater social participation in
urban planning and management.
The fact that approximately 4 billion
people live in urban areas around the
world, especially in poorer and developing countries, has resulted in the growing
problems that directly affect living conditions, which, in turn, are characterized by
aspects such as precariousness, not only in
housing, but also in public spaces, working
conditions, mobility and security. With this
perspective, the 2016 UN report Urbanization and Development: Emerging Futures/
World Cities Report points out eight relevant themes and global challenges for urban cities. In summary, the fundamental
issues are listed as follows:
• Urban growth – understood as
the source of all the challenges in urban
areas.
• Changing family structures – the
social structure that governs urban
challenges, as new demographic patterns – such as falling fertility rates,
decreasing infant mortality rates and
increasing life expectancy rates – influence urban demographic changes.
• Increased habitation in slums and
informal settlements – this is the main
challenge for poorer and developing
countries, and underscores the importance of municipal public policies for
land use and land use management,
aimed at reducing this type of housing
and promoting decent housing.
artigo
article
346
• Desaio no provimento de serviços
urbanos – todo processo de urbanização,
ou de reforma urbana, deve considerar o
provimento de serviços urbanos, o que
passa pela infraestrutura básica de saneamento (água, esgoto e lixo), por sistemas
de tratamento de resíduos e eluentes, pelo
transporte e pelos espaços públicos.
• Mudanças climáticas – os efeitos
das mudanças climáticas impactam diretamente os ambientes urbanos, seja pelos efeitos de eventos climáticos extremos
(chuva e seca), seja pela inluência do aumento do nível do mar para as cidades litorâneas. Dessa maneira, todas as cidades
devem repensar seu planejamento urbano
com o conceito de resiliência norteando as
ações de adaptação a esses efeitos.
• Exclusão e crescente desigualdade
– a exclusão e a desigualdade social em
áreas urbanas são consequências da diferenciação de renda e trabalho, do acesso a
sistemas de educação e saúde de qualidade
e de todos os problemas e desaios apresentados nos itens anteriores;
• Insegurança – este tema é consequência dos problemas acumulados da urbanização somado à exclusão e à desigualdade social. O ambiente urbano que permite
a livre circulação de pessoas e que é estimulado por espaços públicos coletivos
dotados de toda infraestrutura representa
um primeiro passo para a redução da insegurança. Outra questão remete à diminuição das desigualdades de renda por meio
de uma agenda de trabalho decente e de
estímulo ao empreendedorismo.
• Aumento da migração internacional
– é um desaio para as cidades, que são os
receptores desses cidadãos motivados a
emigrar devido às diiculdades de se manter em seus lugares de origem e que, em
• Challenges in the provision of urban services – any process of urbanization, or urban reform, must consider
the provision of urban services, which
includes basic sanitation infrastructure (water, sewage and waste disposal),
waste and sewage treatment systems,
transportation and public spaces.
• Climate change – the effects of climate change directly affect urban environments, through either the effects
of extreme weather events (rain and
drought) or the influence of rising sea
levels in coastal cities. All cities must
rethink their urban planning to incorporate the concept of resilience, orienting their actions towards adapting to
these effects.
• Exclusion and growing inequality
– exclusion and social inequality in urban areas are consequences of income
and labor inequality, access to quality
education and health services and all the
problems and challenges presented in the
previous items;
• Lack of security – this issue is a
consequence of the accumulated problems of urbanization coupled with exclusion and social inequality. An urban
environment that allows the free movement of people and provides collective
public spaces equipped with decent infrastructure represents the first step
towards improving security. Another
step is the reduction of income inequalities through a decent work agenda and
the stimulation of entrepreneurship.
• Increasing international migration – this is a significant challenge for
cities, which are the recipients of citizens emigrating because of difficulties
staying in their places of origin, and
cadernos fgv projetos
347
Figura 1
Figure 1
QUESTÕES PERSISTENTES E DESAFIOS URBANOS EMERGENTES
DEVIDO À POPULAÇÃO URBANA CRESCENTE
PERSISTENT ISSUES AND EMERGING URBAN CHALLENGES
DUE TO INCREASED URBAN POPULATION
Crescimento urbano
Urban growth
Mudança climática
Climate change
Mudança nos padrões
familiares
Change in family
patterns
Exclusão e desigualdade
crescente
Maior capacidade de
resiliência em favelas e em
assentamentos informais
Increased residency in slums
and informal settlements
Insegurança
Insecurity
Exclusion and rising
inequality
muitos casos, são forçados a buscar outros
territórios para a manutenção de suas vidas.
Considerando esses aspectos, uma nova
agenda urbana vem sendo promovida internacionalmente pela ONU, em especíico
pelo Programa das Nações Unidas para os
Assentamentos Humanos (UN-Habitat). A
perspectiva futura desejada é a de aumentar
o número de cidades:
• Ambientalmente sustentáveis e resilientes;
• Socialmente inclusivas, com mais
segurança para a vida das pessoas;
• Melhor conectadas no âmbito urbano, diminuindo deslocamentos e aumentando a qualidade de vida; e
Desafios na prestação
de serviços urbanos
Challenges in providing
urban services
Aumento da migração
internacional
Upsurge in international
migration
who, in many cases, are forced to seek
other places to live.
Considering these aspects, the UN,
specifically through the United Nations
Human Settlements Programme (UN-Habitat), is promoting a new urban agenda
internationally. The desired future perspective is to increase the number of cities
that are:
•
Environmentally sustainable and
resilient;
• Socially inclusive, offering greater
security for people´s lives;
• Better urban transportation, reducing travel and increasing quality of
life; and
artigo
article
348
• Economicamente produtivas em serviços e produtos e que contribuam para a
transformação rural, com incentivo a uma
produção sem defensivos agrícolas.
• Economically productive in services
and products and that contribute to rural
transformation, with incentives for agricultural production without pesticides.
Todos esses pontos estão em consonância
com a agenda de 2030 e com os Objetivos para
o Desenvolvimento Sustentável, especialmente
o Objetivo 11, que versa sobre tornar as cidades
e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis. Para isso, depende-se da boa governança, que engloba:
All of these points are in line with the
2030 agenda and the Sustainable Development Goals, especially Goal 11, which aims
to make cities and human settlements more
inclusive, safe, resilient and sustainable. To
do so, depends on good governance, which
includes:
• Lideranças políticas mais for-
• Stronger and more effective
tes e efetivas para fomentar a implementação de estratégias e promover um sistema de governaça positiva.
• Planejamento de Uso e Ocupação do Solo, que, particularmente, com
estratégias territoriais e espaciais, tem sido
usado em diferentes setores políticos para
enfrentar riscos de mudanças climáticas e
construir estratégias efetivas de mitigação
e adaptação.
• Coordenação jurisdicional entre
áreas setoriais de desenvolvimento urbano
como aquelas relativas a usos do solo, transporte e energia, a im de se planejar procedimentos para situações de emergência, soluções iscais de inanciamento e de questões
sociais ligadas à pobreza e a serviços públicos. As regiões metropolitanas são um exemplo desse tipo de coordenação jurisdicional,
nas quais estão reunidos os municípios que
têm áreas urbanas conurbadas e precisam se
estruturar institucionalmente para o enfrentamento das soluções comuns no desenvolvimento urbano.
• Participação cidadã inclusiva nos
projetos públicos de infraestrutura e
desenvolvimento de espaço públicos
em áreas urbanas que deem legitimidade
political leadership to foster the implementation of strategies and to promote a
positive governance system.
• Land Use and Occupancy Planning, which, particularly in conjunction
with territorial and spatial strategies, has
been used in different political sectors to
address the risks of climate change and to
build effective mitigation and adaptation
strategies.
• Jurisdictional coordination
between sectoral urban development
areas such as land use, transport and
energy, in order to plan procedures for
emergencies, fiscal solutions for financing and social issues related to poverty
and public services. The metropolitan
areas are an example of this type of
jurisdictional coordination, in which
municipalities that have adjacent urban areas are integrated and need to be
structured institutionally to find common solutions for urban development.
• Inclusive citizen participation
in public infrastructure and public
space development projects in urban areas that give legitimacy to the
planning process and enable cities to
cadernos fgv projetos
349
ao processo de planejamento e permitam
que as cidades aproveitem a expertise de
seus stakeholders. (Ver Box 2)
• Estrutura de inanciamento
eiciente que ajude a superar os desaios
existentes para essa nova agenda urbana
pautada pelo acúmulo de velhos problemas e que incentive outras estratégias de
inanciamento por meio de Parcerias Público-Privadas para que os governos alavanquem capital do setor privado para
projetos de interesse público.
increase the expertise of their stakeholders. (See Box 2)
• Eficient inancing structuring
that helps overcome the challenges in this
new urban agenda, to resolve the accumulation of old problems, and encourage
other funding strategies through Private-Public Partnerships so that governments can raise private sector capital for
projects of public interest.
artigo
article
350
BOX 2
Aplicativos móveis e participação cidadã
Em que medida a tecnologia pode melhorar a vida cotidiana dos moradores da cidade em todo o mundo? Essa foi a pergunta que o jornal inglês The Guardian1 fez
em um artigo que apresentava a iniciativa da New Cities Foundation no lançamento
da competição global AppMyCity!, de 2014, para encontrar a melhor aplicação móvel
urbana do mundo, com o objetivo de melhorar a experiência urbana, conectar pessoas
e promover cidades mais divertidas, vibrantes e sustentáveis. Nesse ano, a startup
brasileira Colab.re2 venceu essa batalha com um aplicativo que se propõe a ser a ponte
entre os cidadãos e as prefeituras, ao fomentar a iscalização da qualidade dos serviços
públicos e incentivar a tomada de decisões do governo com base na participação popular. Para se ter uma ideia da consolidação do Colab.re nessa fase inicial, a startup
encerrou 2016 com 130 clientes ativos, sendo a maioria deles prefeituras, tais como
São Paulo, Campinas e Santos, Niterói e Rio de Janeiro. Em 2017, a meta é chegar a
200 cidades, estrear a adesão de governos estaduais e ultrapassar 500 mil usuários
cadastrados - três vezes mais que os 150 mil atuais. No ano passado, o Colab.re foi
eleito o Negócio de Maior Impacto Social do Mundo e a Startup de Maior Potencial
Global pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, o que contribuiu para reverberar a startup brasileira na rota dos investidores estrangeiros.3
Este é um excelente exemplo de como a tecnologia pode auxiliar os gestores públicos em uma aproximação com a população para escutá-la sobre projetos e ações
que estão sendo planejados. Hoje, os meios formais de participação social, como as
audiências públicas, não têm, efetivamente, poder de comunicação e escuta em massa
e dispõem de poucos mecanismos de respostas mais eicientes para que se tenha uma
visão mais ampla das expectativas, dos questionamentos e das reivindicações da sociedade. Aplicativos como o Colab.re tornam-se mais uma ferramenta de escuta popular
e podem ajudar no reinamento das políticas, além de ter a capacidade de geolocalizar
as pessoas e os problemas urbanos.
1 Disponível em: <https://www.theguardian.com/cities/2014/mar/11/worlds-best-new-city-app-competition>. Consultado em: 01/06/2017.
2 Consultar: <www.colab.re>.
3 Disponível em: <http://www.proxxima.com.br/home/proxxima/noticias/2017/05/18/startup-colab-re-que-iscaliza-servicos-publicosrecebe-r-4-milhoes.html>. Consultado em: 01/06/2017.
cadernos fgv projetos
351
BOX 2
Mobile applications and citizen participation
To what extent can technology improve the everyday lives of urban citizens around
the world? This was the question the English newspaper The Guardian1 asked in an
article presenting the New Cities Foundation initiative to launch the 2014 global
competition called AppMyCity! to ind the best urban mobile application in the world
with the goal of improving the urban experience, connecting people and promoting
cities that are more fun, vibrant and sustainable. That year, the Brazilian startup
Colab.re2 won this contest with an application that aims to be the bridge between citizens and city halls, by promoting the monitoring of the quality of public services and
encouraging government decision-making based on popular participation. To get an
idea of the success of Colab.re in this initial phase, the startup closed 2016 with 130
active clients, most of them municipal governments, such as the cities of São Paulo,
Campinas and Santos, Niterói and Rio de Janeiro. In 2017, the goal is to reach 200
cities, to get state governments to adopt the app and to surpass 500,000 registered
users - three times more than the current 150,000 users. Last year, Colab.re was
elected the Business with the Greatest Social Impact in the World and the Startup
with the Greatest Global Potential by the Inter-American Development Bank, which
contributed to exposing the Brazilian startup to foreign investors.3
This is an excellent example of how technology can help public managers to
reach out to the public to get their views on projects and actions being planned. Today, formal means of social participation, such as public hearings, do not effectively offer mass communication and listening power and have few eficient response
mechanisms to get a broader view of society’s expectations, concerns and needs.
Applications such as Colab.re have become another popular listening tool and can
help in the reinement of policies, as well as having the ability to geo-localize people
and urban problems.
1 Available at: <https://www.theguardian.com/cities/2014/mar/11/worlds-best-new-city-app-competition>. Accessed on: 06/01/2017.
2 See: <www.colab.re>.
3 Available at: <http://www.proxxima.com.br/home/proxxima/noticias/2017/05/18/startup-colab-re-que-iscaliza-servicos-publicosrecebe-r-4-milhoes.html>. Accessed on: 06/01/2017.
artigo
article
352
TECNOLOGIA E A NOVA
AGENDA URBANA
TECHNOLOGY AND THE NEW
URBAN AGENDA
Dentro dessa nova agenda para a discussão do
papel do desenvolvimento urbano das cidades, o
World Cities Report 2016,1 do UN-Habitat, aponta quatro pontos-chave para o direcionamento de
políticas públicas e de investimentos privados no
sentido de permitir um desenvolvimento transformador e sustentável: (Ver Figura 2)
Within this new agenda for the discussion
of the role of urban development in cities,
UN-Habitat’s World Cities Report 20161
identifies four key points to guide public
policies and private investment in order
to enable transformative and sustainable
development: (See Figure 2)
1. A dinâmica da transição econômica das
1. The dynamics of the economic transi-
cidades em contextos nacionais e globais.
2. A evolução da forma espacial das cidades.
3. A capacidade das cidades para enfrentar
riscos ambientais.
4. O surgimento de cidades inteligentes e
conexas, impulsionadas pelas tecnologias de
informação e comunicação (TIC), movimentos de dados urbanos no campo do big data.
tion of cities in national and global contexts.
2 The evolution of the spatial form of cities.
3. The capacity of cities to address environmental risks.
4. The emergence of smart and connected
cities, driven by information and communication technologies (ICT), urban data movements in the big data ield.
Esses quatro pontos estão diretamente relacionados a ambientes urbanos que têm, em
sua concepção, a manutenção e a transformação de ações que envolvam o uso de sistema de
informações para informações geoespaciais e
tecnologia, tanto da iniciativa privada quanto
dos sistemas governamentais associados a serviços da cidade, de forma a criar uma base de
conhecimento que permita aos tomadores de
decisão direcionar investimentos e ações que
tornem as cidades resilientes e sustentáveis.
O primeiro ponto-chave destacado pelo
relatório é o de que a transição da dinâmica
econômica das cidades passa por ambientes urbanos capazes de suportar também as
transformações das atividades econômicas
existentes dentro da lógica dos luxos territoriais. Para exempliicar o que isso signiica,
basta lembrar que um dos grandes serviços
These four points are directly related to
urban environments that have, in their conception, the maintenance and transformation of actions that involve the use of information systems for geospatial information
and technology, both private governmental systems, used for the services provided
by the city, in order to create a knowledge
base that allows decision makers to develop investments and actions that make cities
more resilient and sustainable.
The first key point highlighted by the
report is that the transition of economic
dynamics of cities passes through urban
environments capable of also supporting
the transformations of existing economic activities within the logic of territorial
flows. To illustrate what this means, we
should remember that one of the most
1 Disponível em: <https://unhabitat.org/wp-content/uploads/2014/03/
WCR-%20Full-Report-2016.pdf>.
1 Available at: <https://unhabitat.org/wp-content/uploads/2014/03/
WCR-%20Full-Report-2016.pdf>.
cadernos fgv projetos
353
Figura 2
Figure 2
QUESTÕES-CHAVE QUE POSICIONAM AS CIDADES RUMO AO
DESENVOLVIMENTO TRANSFORMADOR E SUSTENTÁVEL
KEY ISSUES THAT POSITION CITIES AT THE FORE TOWARDS
ENABLING TRANSFORMATIVE AND SUSTAINABLE DEVELOPMENT
A dinâmica de transição
econômica das cidades em
contextos nacional e global
A capacidade das cidades de
lidar com riscos ambientais
The capacity of cities to adress
environmental risks
The dynamic economic
transition of cities in national
and global contexts
01
O formato espacial em
evolução das cidades
The evolving spatial
form of cities
02
03
04
A emergência de cidades inteligentes e
conectadas impulsionada pela informação,
pelas TICs, por movimentos de city data
e pelo campo da big data
The emergence of smart and connected
cities, driven by information and
communication technologies (ICT), city
data movements and the field of big data
hoje é o e-commerce, com a venda de produtos pela internet, que tem como lógica a conexão entre dois pontos: o vendedor/produtor e
o consumidor. Para que esse luxo econômico
funcione de forma efetiva as cidades precisam ter todas as suas ruas mapeadas e com
nomes atribuídos, para atender a essa lógica
de conexão entre a oferta e a procura. Porém,
dotar todas as ruas de uma cidade de nome
e um código de endereço, formatando assim
um sistema de endereçamento completo ainda é um problema, principalmente, para as
áreas urbanas mais pobres, ou mesmo devido
ao fato de que não existe um formato padrão
de endereço global, o que acaba diicultando
transações locais e internacionais.
important services today is e-commerce,
with the sale of products over the internet, which involves the connection between two points: the seller/producer and
the consumer. For this economic flow to
work effectively, cities must have all their
streets mapped and named to make the
connection between supply and demand
possible. However, giving all the streets
in a city a name and a postal code, thus
providing a complete addressing system,
is still a problem, especially in poorer
urban areas, or even because there is no
global standard format for addresses,
which can make local and international
transactions difficult.
artigo
article
354
“
Os principais
benefícios [do
Digital Twin]
são: ajudar na
melhoraria da
coniabilidade e
da disponibilidade
operacional,
minimizar custos,
reduzir o tempo
de inatividade não
programado e o
risco operacional.
”
Uma startup propôs uma solução ao criar
um sistema de geocodiicação para endereçamento chamado What3words, que consiste basicamente em dividir toda a superfície terrestre
em quadrados de três metros por três metros,
gerar um endereço pela associação aleatória
de três palavras e disponibilizá-lo por meio de
um aplicativo. Essa é uma solução interessante, que mostra o potencial transformador para
as cidades que tenham esse problema de reconhecimento de localização.2 De acordo com alguns dados levantados pelos criadores do What3words, cerca de 145 países não têm sistema de
endereçamento e isto signiica que cerca de 75%
da população mundial não tem endereço oicial.
Os tópicos-chave subsequentes delineados
pelo relatório da UN-Habitat têm em comum a
sistematização de informações que possa fornecer, principalmente aos gestores públicos, diagnósticos com capacidade de simulação de cenários e previsibilidade em questões que ajudem
a diminuir custos públicos, minimizar desastres
por causas naturais, aumentar a eiciência dos
serviços, proporcionar ambientes de inovação,
oferecer transparência aos cidadãos e planejar
cidades nas quais as pessoas possam não só utilizar-se dos espaços públicos, como também ter
conforto e segurança em seus espaços privados.
Nesse sentido, o segundo ponto diz respeito a como as cidades evoluíram na sua forma
espacial, contemplando-se discussões sobre
como as cidades devem continuar desenvolvendo seu modelo urbano, se por meio de um
modelo pautado em longas distâncias ou de
cidades compactas. Este último representa
a antítese dos padrões urbanos baseados no
modelo automobilístico, que fez com que as
cidades absorvessem o espraiamento urbano,
alongando distâncias, aumentando custos de
infraestrutura e segregando espaços.
2 Disponível
em:
<http://citiscope.org/story/2016/what3wordseveryone-planet-inally-has-address> e <http://what3words.com/> .
cadernos fgv projetos
355
One startup proposed a solution by creating a geocoding system for addressing called
What3words, which basically consists of dividing the entire earth’s surface into threeby-three meter squares, generating addresses by the random association of three
words, and making it available through an
app. This is an interesting solution, which
shows the transformative potential for cities that have alocation recognition problem.2 According to data collected by the creators of What3words, about 145 countries
have no addressing system and this means
that around 75% of the world’s population
has no oficial address.
All the subsequent key topics outlined in
the UN-Habitat report have in common the
systematization of information that can
provide, principally for public managers,
diagnostics with scenario simulation and
predictability capabilities for issues that
help to reduce public costs, minimize natural
disasters, increase the eficiency of services,
provide innovative environments, provide
citizens with transparency and plan cities
where people can not only use public spaces,
but also enjoy comfort and security in their
private spaces.
In this sense, the second point concerns how cities evolved in their spatial
form, involving discussions on how cities
should continue to develop their urban
model, whether through a model based
on long distances or compact cities. The
latter represents the antithesis of urban
standards based on the automobile model, which has allowed cities to accomodate
urban sprawl, lengthening distances, increasing infrastructure costs and segregating spaces.
2
Available at: <http://citiscope.org/story/2016/what3wordseveryone-planet-inally-has-address> and <http://what3words.com/> .
“
The key beneits
[of the Digital
Twins] are:
improved reliability
and operational
availability,
reduced costs
and a reduction
in unscheduled
downtime and
lower operational
risks.
”
artigo
article
356
Segundo o relatório da Organização para
a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), de 2012,3 existem variadas formas para
o entendimento do que é uma cidade compacta,
mas existem três características em comum:
• Padrões de desenvolvimento voltados para a proximidade e densidade. A densidade envolve a intensidade do uso urbano,
e a proximidade diz respeito à localização das
aglomerações urbanas em uma área metropolitana. Em uma cidade compacta, os usos
urbanos são caracterizados pela intensidade
de utilização, as aglomerações urbanas são
contíguas ou próximas e a fronteira entre o
uso da terra urbana e rural na franja urbana é
clara. No entanto, espaços públicos, quadras,
ruas e parques, também são elementos essenciais nesta relação entre intensidade e localização. Densidade e proximidade são dois
principais elementos físicos (ou morfológicos) que caracterizam uma cidade compacta
e devem ser considerados elementos norteadores dos padrões de desenvolvimento urbano de qualquer cidade no mundo.
• Áreas urbanas ligadas por sistemas
de transporte público. Sua densidade in-
dica a eicácia do uso do solo urbano. Os
sistemas de transporte público facilitam a
mobilidade nas áreas urbanas e permitem
que essas áreas funcionem de forma eicaz,
quando associados a usos compatíveis que
levem em conta os dois conceitos anteriores: proximidade e densidade.
• Acessibilidade aos serviços e em-
According to the Organization for Economic Co-operation and Development’s
(OECD) 20123 report, there are various
ways to understand what a compact city is,
but there are three common characteristics:
•
Patterns of development focused on
proximity and density. Density involves
the intensification of urban use, and
proximity is related to the location of
urban agglomerations in a metropolitan area. In a compact city, urban uses
are characterized by their intensity,
urban agglomerations are contiguous
or close and the border between urban
and rural land use on the urban fringe
is clear. However, public spaces, blocks, streets and parks are also essential
elements in this relationship between
intensity and location. Density and proximity are two main physical (or morphological) elements that characterize
a compact city and should be considered guiding elements in the urban development standards of any city in the
world.
•
Urban areas linked by public trans-
port systems. Density demands the ef-
fective use of urban land. Public transportation systems facilitate mobility
in urban areas and allow these areas
to function effectively when associated
with compatible uses that take into account the two previous concepts: proximity and density.
pregos locais. Este ponto remete à facilidade com que os residentes podem alcançar
serviços locais, como comércio, restaurantes e clínicas, bem como uma distribuição
equilibrada de empregos entre os bairros da
which residents can access local services, such as commerce, restaurants
and clinics, as well as a balanced dis-
3
OECD (2012). Compact City Policies: A Comparative Assessment,
OECD Green Growth Studies, OECD Publishing. Disponível em: <http://
dx.doi.org/10.1787/9789264167865-en>.
3 OECD (2012). Compact City Policies: A Comparative Assessment,
OECD Green Growth Studies, OECD Publishing. Available at: <http://
dx.doi.org/10.1787/9789264167865-en>.
•
Accessibility to local services and
jobs. This point refers to the ease with
cadernos fgv projetos
357
cidade, considerando a proximidade, a densidade e o sistema de mobilidade. Em uma
cidade compacta, o uso do solo é misturado
e a maioria dos moradores tem acesso a esses serviços a pé ou de bicicleta ou usando o
transporte público. Além disso, o relatório da
OCDE considera as áreas urbanas funcionais
como uma unidade de análise. Identiica as
cidades como unidades econômicas funcionais caracterizadas por um “núcleo urbano”
densamente habitado e por um “interior”,
cujo mercado de trabalho está altamente
integrado com o “núcleo” da cidade. As políticas para uma cidade compacta fazem sentido nessa escala, uma vez que os padrões
de deslocamento relevantes para as áreas
urbanas de uma cidade na maioria dos casos
se estende além dos limites administrativos
municipais. Por exemplo, um novo empreendimento comercial de grande porte em
um município periférico de uma região metropolitana pode afetar signiicativamente os
padrões de tráfego do eixo de transporte na
qual essa cidade está conectada.
tribution of jobs between city districts,
considering the proximity, density and
transportation system. In a compact
city, land use is mixed and most residents have access to these services on
foot or by bicycle or using public transportation. In addition, the OECD report
considers functional urban areas as a
unit of analysis. It identifies cities as
functional economic units characterized by a densely populated “urban core”
and an “interior,” whose labor market
is highly integrated with the “core”
of the city. Policies for a compact city
make sense on this scale, since the movement patterns relevant to the urban
areas of a city, in most cases, extend
beyond the municipal administrative
boundaries. For example, a new large
commercial enterprise in a peripheral
municipality of a metropolitan region
can significantly affect the traffic patterns of the transport hub in which the
city is connected.
artigo
article
358
Essas três características acenam diretamente para o direcionamento que os gestores públicos brasileiros e de países em desenvolvimento
devem seguir nesse debate: o de que é preciso
ter todas as informações que pautam a discussão sobre o modelo de cidades organizadas, de
modo que possam ser gerados diagnósticos de
forma rápida e clara, principalmente levando-se
em consideração as cidades que estão inseridas
em contexto metropolitano.
A Empresa Metropolitana do Estado de São
Paulo (Emplasa) vem desenvolvendo esse trabalho de centralização de informações geoespaciais produzidas e cooperando com as decisões
de planejamento. Outro exemplo brasileiro que
atende à escala municipal é o Instituto Pereira
Passos, no Rio de Janeiro, que coordena a organização e a sistematização de informações sobre
a cidade, fornece apoio a todas as secretarias do
município na análise dessas informações e na
produção de estudos que deem suporte aos trabalhos desenvolvidos pelos técnicos das secreta-
These three characteristics directly signal the direction that Brazilian and other developing country public managers
must follow in this debate: the necessity
of having all the information that guides
the discussion on the model of well-organized cities, so that diagnoses can be
generated in a timely and clear manner,
especially considering cities in metropolitan contexts.
The Metropolitan Company of the State
of São Paulo (Emplasa) has been developing
this work of centralizing geospatial information and cooperating with planning decisions. Another Brazilian body that serves
municipalities is the Pereira Passos Institute, in Rio de Janeiro, which coordinates
the organization and systematization of information about the city, providing support
to all municipal secretariats for the analysis of this information and in the creation of
studies that support the work developed by
cadernos fgv projetos
359
rias. O Sistema de Informações Urbanas (Siurb)
da cidade do Rio de Janeiro é resultado desse
trabalho. Emplasa e Siurb são exemplos de ciclos de desenvolvimento de mais de 20 anos, o
que quer dizer que são ciclos de implementação
de política pública de médio a longo prazo.
Retomando o terceiro ponto chave elencado pelo World Cities Report 2016 para a
orientação de políticas públicas e de investimentos voltados para um desenvolvimento
urbano mais sustentável, a capacidade das
cidades para enfrentar riscos ambientais
apresenta uma alta sensibilidade no Brasil.
Nas últimas duas décadas, com a expansão
urbana desordenada, como a ocupação de
encostas e várzeas de rios sem planejamento, diretrizes urbanísticas e habitacionais,
houve um aumento no número absoluto e na
magnitude de eventos causados por desastres
naturais como inundações, enxurradas e deslizamentos, que ocasionaram mortes, perdas
econômicas, destruição de habitações e de infraestrutura pública.
Por meio do decreto presidencial nº
7.513/2011, foi criado o Centro Nacional de
Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden) - órgão vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações
e Comunicações - com o objetivo principal
de realizar o monitoramento e de emitir alertas de desastres naturais que subsidiem a
salvaguarda de vidas e a diminuição da vulnerabilidade social, ambiental e econômica
decorrente desses eventos. O Cemaden opera 24 horas por dia, sem interrupção, monitorando, em todo o território nacional, as
áreas de risco de 957 municípios classiicados
como vulneráveis a desastres naturais. Entre
outras competências, o Cemaden envia os
alertas de desastres naturais ao Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres
(Cenad), do Ministério da Integração Nacional,
the technicians of the secretariats. The Urban Information System (Siurb) of the city
of Rio de Janeiro is a result of this work.
Emplasa and Siurb are examples of development cycles of more than 20 years, which
means that they are medium to long-term
public policy implementation cycles.
Concerning the third key point listed in
the World Cities Report 2016 for the guiding of public policies and investments aimed
at more sustainable urban development,
the capacity of cities to face environmental
risks is very relevant for Brazil. In the last
two decades, with unchecked urban sprawl,
such as the occupation of slopes and loodplains of rivers, without any planning or
application of urban and housing guidelines, there has been an increase in the absolute number and magnitude of events
caused by natural disasters such as looding
and landslides, resulting in loss of life, economic losses, and the destruction of housing
and public infrastructure.
Presidential Decree no. 7,513 / 2011 created the National Center for Monitoring
and Alert of Natural Disasters (Cemaden)
– an organ linked to the Ministry of Science, Technology, Innovation and Communications – with the main objective of
monitoring and issuing natural disaster
warnings to protect lives and reduce the
social, environmental and economic vulnerability resulting from these events. Cemaden operates 24 hours a day, without
interruption, monitoring, throughout the
national territory, the risk areas of 957 municipalities classiied as vulnerable to natural disasters. Among other responsibilities,
Cemaden sends natural disaster alerts to
the National Center for Risk and Disaster
Management (Cenad) of the Ministry of
National Integration, which assists the
artigo
article
360
auxiliando o Sistema Nacional de Defesa Civil.
Desde seu período de criação até o momento já
foram emitidos mais de 5 mil alertas ao Cenad.4
Os três pontos discutidos anteriormente levam o debate ao último ponto chave do World
Cities Report 2016, que remete ao surgimento
de cidades inteligentes e conexas, impulsionadas pelas TICs e por movimentos de dados
urbanos no campo de big data. A primeira
imagem que se vislumbra é a de um modelo digital em 3D de uma cidade onde se monitoram
todos os luxos – trânsito, transporte, sistemas
de água e esgoto – e onde todas as ediicações
estão ligadas a esse modelo. Trata-se, assim, de
uma réplica digital da cidade. É essa imagem
que fomenta a Internet of Things (loT), ou,
em português, a Internet das Coisas. De forma
simples, o loT signiica conectar dispositivos
diversos à internet e habilitá-los para serem
controlados por um computador, mudando a
forma de relacionamento pessoa-coisas para
coisa-coisa. Esse conceito pode ser aplicado a
um smartphone ou em uma linha de produção
automatizada de uma fábrica de componentes
industriais de alta complexidade.
Sobre o tema IoT, outra correlação interessante é aquela apresentada pelo geógrafo
e executivo da área de tecnologia geoespacial
e informação Niall Conway5 a respeito do caminho que a relação entre smart cities e TIC
pode seguir. Em texto publicado, Conway
discute a trama entre os conceitos aplicados
da análise geoespacial, a IoT e o chamado Digital Twin.
O fenômeno de IoT, embora ainda embrionário, revolucionou quase todos os setores
industriais no mundo nos últimos dez anos
e tem associado um campo de desenvolvi-
National Civil Defense System. Since its
creation up to now, more than 5 thousand
alerts have been issued to Cenad.4
The three points discussed earlier conduct the debate to the last key point of
the World Cities Report 2016, namely
the emergence of smart, connected cities,
driven by ICTs and urban data transmission in the big data field. The first image
to behold is a 3D digital model of a city
where all flows – traffic, transportation,
water systems and sewage – are monitored, and where all buildings are linked
to this model. It is thus a digital replica of
the city. This image fosters the Internet
of Things (loT). Simply put, loT means
connecting various devices to the internet and enabling them to be controlled by
a computer, changing the person-thing
relationship to a thing-thing one. This
concept can be applied to a Smartphone
or in an automated production line in a
factory that produces highly-complex industrial components.
On the topic of IoT, another interesting
correlation is presented by the geographer
and executive in the geospatial and information technology area, Niall Conway,5
with respect to the path that the relationship between smart cities and ICT can follow. In a published text, Conway discusses
the correlation between the applied concepts of geospatial analysis, the IoT and the
Digital Twin.
The IoT phenomenon, though still embryonic, has revolutionized almost every
industrial sector in the world in the last
ten years, and has become associated
4
4
Disponível em: <http://www.cemaden.gov.br/>.
5 Fundador do geobreadbox.com, blog voltado para o campo geoespacial,
no qual dissemina conteúdos para fomentar a discussão sobre inovação e
tendências dos sistemas de informações geográicas. Para mais informações,
consultar: <https://www.linkedin.com/in/niall-conway-01b38b19/>.
Available at: <http://www.cemaden.gov.br/>.
5
Founder of geobreadbox.com, a geospatial blog, in which he
disseminates content to foster discussions about innovation and trends in
geographic information systems. For more information, visit:
<https://www.linkedin.com/in/niall-conway-01b38b19/>.
cadernos fgv projetos
361
artigo
article
362
“
a complexidade
dos luxos de uma
cidade faz com que
ainda não são seja
possível monitorálos e modelálos de forma
simultânea a seus
acontecimentos.
”
mento conhecido como o Digital Twin. Esse
conceito refere-se a uma estrutura pela qual
máquinas industriais, edifícios, dispositivos
e seus componentes são projetados, monitorados e mantidos tanto física quanto digitalmente. Essencialmente, o Digital Twin é uma
representação virtual de um ativo e é baseado
no raciocínio de que se pode entender melhor
como tal ativo opera e interage em seu ambiente de funcionamento por meio da concepção de uma réplica digital exata.6 Assim,
um edifício que seja construído nesta concepção pode ser monitorado em tempo real por
meio de sua réplica digital, que recebe todas
as informações relativas a uso de energia,
sistemas hidráulicos, climatização e todos os
outros aspectos que o fazem funcionar.
Do ponto de vista da engenharia, da manutenção e do gerenciamento de ativos, o Digital
Twin permite aos engenheiros obter uma visão
melhor do desempenho operacional do ativo
em tempo real. Os principais benefícios são:
ajudar na melhoraria da coniabilidade e da disponibilidade operacional, minimizar custos, reduzir o tempo de inatividade não programado e
o risco operacional. Do ponto de vista inanceiro, Conway mostra que na visão da empresa Juniper Research, especializada na identiicação
e na avaliação de novos setores de mercado de
alto crescimento no meio digital, até 2021, esse
tipo de tecnologia de digital grid deverá economizar quase US$ 19 bilhões de custos em todo
o mundo, principalmente pela redução do uso
de energia e dos custos de se evitar emissões de
gases poluentes.7
A partir dessa conceituação, é possível levantar a questão de se os insumos (mapas
digitais) e as análises geoespaciais podem ser
6 O texto Geospatial, IoT and the ‘Digital Twin’ está disponível em:
<https://www.linkedin.com/pulse/74-geospatial-iot-digital-twin-niallconway>.
7 Disponível em: <https://www.juniperresearch.com/document-library/
white-papers/smart-cities-on-the-faster-track-to-success>.
cadernos fgv projetos
363
with a development known as the Digital
Twin. This concept refers to a structure by
which industrial machines, buildings, devices and their components are designed,
monitored and maintained both physically and digitally. Essentially, Digital Twin
is a virtual representation of an asset and
is based on the rationale that one can best
understand how such an asset operates
and interacts in its operating environment by designing an exact digital replica of it.6 Thus, a building that is built with
this design can be monitored, in real time,
through its digital replica, which receives
all the information regarding energy use,
hydraulic systems, air conditioning and
all other aspects that make it work.
From the standpoint of engineering,
maintenance and asset management,
Digital Twin enables engineers to gain a
better insight into the asset’s operational
performance in real time. The key benefits
are: improved reliability and operational
availability, reduced costs and a reduction in unscheduled downtime and lower
operational risks. From a financial point
of view, Conway shows that, according
to the company Juniper Research, which
specializes in identifying and evaluating
new high-growth digital media industries, by 2021, this type of digital grid
technology is expected to save almost
US$ 19 billion in costs around the world,
mainly due to the reduction of energy use
and the costs of avoiding emissions of polluting gases.7
From this conceptualization, we can
raise the question of whether the inputs
6 The text Geospatial, IoT and the ‘Digital Twin’ is available at: <https://
www.linkedin.com/pulse/74-geospatial-iot-digital-twin-niall-conway>.
7 Available at: <https://www.juniperresearch.com/document-library/
white-papers/smart-cities-on-the-faster-track-to-success>.
“
the complexity
of a city’s lows
makes it not yet
possible to monitor
and model them
simultaneously as
the events occur.
”
artigo
article
364
considerados Digital Twin. A resposta é não.
Embora possam ter localização, atributos precisos e organização em rede, ainda são apenas
representações em rede. Os dados usados em
um sistema de informações geográicas de
uma cidade têm muitas diferenças nas formas
de captura de uma mesma informação, o que
pode causar defasagem nos dados e impossibilitar a elaboração de um modelo de previsibilidade. Em linhas gerais, a complexidade dos
luxos de uma cidade faz com que ainda não
são seja possível monitorá-los e modelá-los de
forma simultânea a seus acontecimentos.
Porém, segundo Conway, a conexão entre
a informação geoespacial e a loT vem aumentando com o fornecimento do contexto locacional para esses ambientes virtuais.
As informações geoespaciais, por sua vez,
ajudam o Digital Twin a incorporar informações sobre onde o ativo está em relação
às condições do seu entorno, por exemplo o
tipo de terreno, o clima ou mesmo as condições de segurança. Conway cita um exemplo
de possibilidade de interface considerando a
crescente produção de dados por meio de um
sistema de imageamento a laser e de sensores
de monitoramento em tempo real de alguns
aspectos das cidades, como a mobilidade. Segundo ele, cidades como Manchester, no Reino Unido, estão desenvolvendo inciativas de
smart cities criando representações digitais
em tempo real de áreas urbanas. A iniciativa
CityVerve,8 por exemplo, propõe-se a conectar as pessoas que desenvolvem a IoT para
oferecer soluções para a cidade.
Esse contexto apresentado demonstra que
a tecnologia existente pode oferecer soluções
para a nova agenda urbana que indica o contexto das cidades como a escala das grandes
transformações sociais e econômicas. Porém,
(digital maps) and geospatial analysis
can be considered as Digital Twin. The
answer is no. Although they offer location,
precise attributes, and network organization, they are still just networked representations. The data used in a geographic information system of a city has many
differences in the ways to gather the same
information, which can result in outdated
data and make it impossible to elaborate a
predictability model. Along general lines,
the complexity of a city’s flows makes
it not yet possible to monitor and model
them simultaneously as the events occur.
However, according to Conway, the
connection between geospatial information and the loT is increasing with the
provision of the locational context for
these virtual environments. Geospatial
information, in turn, helps Digital Twin
to incorporate information about where
the asset is in relation to its surroundings,
for example the type of terrain, climate or
even security conditions. Conway cites an
example of the possibility of an interface
considering the increasing production of
data using a laser imaging system and
real-time monitoring sensors of some aspects of cities, such as mobility. According to him, cities like Manchester, in the
United Kingdom, are developing smart
city initiatives by creating real-time digital representations of urban areas. The
CityVerve8 initiative, for example, aims
to connect people who develop IoT to offer
solutions to the city.
The context shown here demonstrates
that existing technology can offer solutions for the new urban agenda that place
cities on the scale of major social and
8
8
Consultar: <http://www.cityverve.org.uk>.
See: <http://www.cityverve.org.uk>.
cadernos fgv projetos
365
a probabilidade dessa relação não é binária
dado que quando se tem tecnologia, existe
também a certeza de que haverá transformação. Há uma quantidade de variáveis que
aumentou a complexidade dessa relação. Algumas questões mostram essa amplitude, tais
como: de que maneira os governos municipais
estão direcionando o planejamento urbano e
seu sistema de governança? Como são organizadas as informações sobre a produção urbana
e o uso do solo das cidades? Qual a capacidade
de desenvolvimento de novas tecnologias pelo
sistema público? Esses três questionamentos
podem dar uma primeira visão da diiculdade,
principalmente no contexto brasileiro, para
associar a tecnologia às diretrizes da nova
agenda urbana que estimula essa correlação
para a efetivação de uma política de transformações sociais e econômicas.
Os desaios, portanto, para os gestores
públicos na interrelação entre os problemas
urbanos e o uso de sistemas de informações
geoespacias estão colocados, na medida em
que a tecnologia já está sendo desenvolvida
para responder a algumas questões, mas é
preciso criar uma estrutura básica de aplicação. Além disso, é necessário entender que
esse tipo de organização é uma base para a
tomada de decisões que possam reletir na
melhora da qualidade de vida das pessoas
que vivem em aglomerados urbanos. Tomar
essa decisão é um passo importante em qualquer gestão pública que visa uma melhoria
direta na aplicação de uma política de desenvolvimento urbano.
•
economic transformations. However, the
probability of this relationship is not binary, since when you have technology,
there is also the certainty that there will
be transformation. A number of variables
have increased the complexity of this relationship. Some issues show the extent of
this, such as: how are municipal governments directing urban planning and its
governance system? How is information
on urban production and urban land use
organized? What is the public system’s capacity to develop new technologies? These
three questions offer a first glimpse of
the difficulties, especially in the Brazilian
context, to associate technology with the
guidelines of the new urban agenda that
stimulates this correlation for the creation
of policies for social and economic transformations.
The challenges for public managers,
therefore, in the interrelationship between
urban problems and the use of geospatial
information systems are clear, as technology is already being developed to answer
some of these questions, but it is necessary
to create a basic structure for their application. In addition, it is necessary to understand that this type of organization is a
basis for decision making that can impact
the improvement of the quality of life of
the people living in urban agglomerates.
Making this decision is an important step
for any public management seeking direct
improvements in the implementation of an
urban development policy.
•
www.fgv.br/fgvprojetos
SÃO PAULO
RIO DE JANEIRO
COLÔNIA
Av. Paulista 1294/15º andar
Praia de Botafogo 190/6º andar
Deutz-Mülheimer Straße 30/6. Obergeschoss
Tel.: +55 11 3799.4170
Tel.: +55 21 3799.5498
Tel.: +49 (0) 221 284.9340
Fax: +55 11 3262.3569
Fax: +55 21 2553.8810