1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
Reitor
Carlos Edilson de Almeida Maneschy
Vice-Reitor
Horacio Schneider
Pró-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento
Erick Nelo Pedreira
Pró-Reitor de Administração
Edson Ortiz de Matos
Pró-Reitora de Graduação
Marlene Rodrigues Medeiros Freitas
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação
2
Emmanuel Zagury Tourinho
Pró-Reitor de Extensão
Fernando Arthur de Freitas Neves
Pró-Reitor de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal
João Cauby de Almeida Júnior
Diretor Executivo da FADESP
João Farias Guerreiro
________________________________________
Capa, projeto gráfico e editoração
Oficina de Criação - UFPA
Aristóteles Guilliod de Miranda
José Maria de Castro Abreu Jr.
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Belém, Pará
2010
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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) –
Biblioteca Central/ UFPA, Belém-PA
Miranda, Aristóteles Guilliod de.
Memória histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará,
1919- 1950: da fundação à federalização / Aristóteles Guilliod de Miranda, José Maria de Castro Abreu Junior. — Belém: EDUFPA, 2009.
ISBN 978-85-901172-3-0
1. Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará - História. 2. Medi
cina – Pará - História. I. Abreu Junior, José Maria de Castro. II. Título.
CDD: 21. ed. 610.711098115
CDU: 378.094(818.5)
Para Leônidas Braga Dias (in memoriam),
O grande guardião da memória da Faculdade de Medicina e Cirurgia do
Pará, que certamente gostaria de ter participado desta empreitada, os
nossos respeitos, a nossa admiração e a nossa saudade pela ausência.
Aristóteles Guilliod de Miranda
Para meu pai e amigo José Maria de Castro Abreu que me transmitiu, entre outros valores, o amor a nossa profissão e a nossa querida Faculdade.
Um dia, aos nove anos, ali me levou.
E parte de mim lá ficou para sempre.
José Maria de Castro Abreu Junior
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FACULDADE
Às tardes,
meu caminho encontrava
um casarão de esquina,
cinzento,
onde via, na porta,
pessoas que se inteiravam
dos mistérios de curar.
Com a mente cheia
de sonhos,
um dia entrei lá.
Aristóteles Miranda
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Um livro nunca deixa de ser escrito – é tarefa inesgotável.
Em determinado momento, o autor simplesmente
o abandona. Caso contrário ficará seu refém para sempre.
Foi o que fizemos.
José Maria Abreu Jr.
Agradecimentos
A elaboração de um livro como este não seria possível sem a colaboração de várias pessoas. Ainda que correndo o risco de sermos traídos
pela memória, pelo que antecipadamente pedimos nossas desculpas
prometendo repará-las no momento adequado, gostaríamos de agradecer a Sra. Vilma Costa Bastos, bibliotecária da Faculdade de Medicina, pelo acesso ao acervo documental da velha escola, elemento primordial para feitura deste; além dela, sua diligente bolsista Glaucilene
Tavares, pela paciência com que nos atendeu no início da caminhada
aos arquivos da Faculdade; a Simone Matos e sua equipe do setor de
microfilmagem da Biblioteca Pública “Arthur Vianna”, pela amizade e
competência com que nos auxiliaram na pesquisa em busca de pistas
nos jornais antigos, de grande valia para o tricotar das histórias aqui
relatadas; ainda na Biblioteca Pública, ao bibliotecário Alexandre Lobo
Pinheiro, que solicitado para um novo olhar e sugestões às referências, o fez com presteza e dedicação; a Ana Maria Cruz, bibliotecária
da Biblioteca Central da UFPA, pelo carinho e desvelo e através de
quem pudemos ter acesso a Silvia Bittar, então diretora daquele órgão
fundamental da Universidade Federal do Pará, e quem nos abriu todas
as portas às pesquisas e à sua competente equipe de colaboradoras,
dentre estas, em especial, Elisangela Silva da Costa, responsável pela
normatização do livro; ao amigo João Guilherme Ferreira de Araújo
que restaurou digitalmente algumas das fotografias aqui presentes; a
arquiteta Graça Barroso Santos que habilmente recriou o monograma
do Barão de Anajás a partir de um desenho original muito pequeno;
ao prof. Armando Mendes, cujas informações sobre a UAP foram de
grande valia para o texto sobre a Federalização; à sra. Glicia Dias, pela
doação de grande parte do acervo do nosso saudoso mestre Leônidas
Braga Dias, um dos responsáveis pela preservação da memória da Faculdade, salvando-a, literalmente, do lixo.
Agradecemos também àqueles médicos testemunhas de parte desta história que nos forneceram seus depoimentos e impressões pessoais indicando pistas que muitas vezes nortearam esta pesquisa, começando
pelos decanos da medicina paraense, ambos da turma de 1939, Adolfo
de Xerez e Oliveira Góes e Guaraciaba Quaresma Gama, passando por
colegas de turmas posteriores como Eduardo Augusto Dias Pereira Braga, Manuel Ayres, Acea Raichel Azulay e Camilo Viana entre outros. Sem
esquecer é lógico Rubem David Azulay que mesmo não tendo terminado
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o curso aqui, viveu intensamente a escola do Largo de Santa Luzia até o
quarto ano.
Alguns colegas, infelizmente não mais entre nós, temos que agradecer in
memoriam como José Luiz de Araújo Mindello, Carlos Alberto Monteiro
Leite, Clodoaldo Beckmann, Mário Rubens Martins e Raynero de Carvalho Maroja, este último em especial, com quem conversamos quando
a ideia de escrever algo sobre a Faculdade sequer existia, não passando
de uma curiosidade aguçada sendo o assunto abordado informalmente.
Após responder a uma sabatina de perguntas sobre a FMCP, Dr. Raynero
sugeriu que se gostávamos tanto do tema, deveríamos escrever um livro
sobre o assunto.
Outra ausência dolorosamente sentida é do mestre de gerações, o Prof.
Dr. José Monteiro Leite, que desejariamos muito pudesse ter lido este
trabalho e, quem sabe, até o prefaciado.
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Não podemos esquecer também de pessoas como Paulo Sérgio Roffé
Azevedo, Ubirajara Salgado, David Rubem Azulay, Reinaldo e Helena
Andrade da Silveira, os quais, simpáticos à nossa iniciativa permitiram
que vasculhássemos o acervo de suas famílias; Roseana Aben-Athar Kipman, que forneceu informações inéditas sobre seu pai e seu avô, e Bolívar Fernandez, que nos colocou diante do livro “Bosquejo Cronológico
da Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência do GramPará”, raríssima publicação de Antonio Nicolau Monteiro Baena datada
de 1878, a mais antiga fonte de pesquisa que utilizamos, e que esclareceu
pontos obscuros da vida do Barão de Anajás.
Lembramos que muito do material e das informações cedidas ainda que
não tenham sido publicados aqui por não se enquadrarem na proposta
inicial do livro, são importantes fontes para novas pesquisas e certamente
serão revistos para ensaios futuros.
Um agradecimento mais que especial à equipe da Oficina de Criação da
UFPA: Ana Petruccelli, Lívia Barbosa, Káyra Matos e Filipe Almeida,
pelo carinho e competência com que abraçaram nosso projeto, produzindo um livro com uma belíssima apresentação gráficovisual valorizando sobremodo o conteúdo.
Por fim, a nossa mais sincera gratidão ao Prof. Dr. João Farias Guerreiro, diretor executivo da FADESP, que efetivamente adotou este projeto,
tornando-o uma realidade. Não fosse seu verdadeiro entusiasmo, talvez
este livro permanecesse mais tempo engavetado.
Os autores
Edited by Foxit Reader
Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010
For Evaluation Only.
Sumário
Prefácio...11
Apresentação...15
1. Os Primórdios...17
2. A Fundação da Faculdade – O Dia que o Tempo Apagou...27
3. A Instalação – Era preciso começar...35
4. Doutores Haja – A campanha para a Aquisição do prédio...45
5. A Formação do Corpo Docente...65
6. O Ensino...75
7. O Hospital Escola Primaz:
A Santa Casa no contexto da Faculdade...91
8. O Hospício dos Alienados e Outras Instituições de Apoio...109
9. Equiparação a Jato...119
10. Os primeiros médicos...135
11. Professores, Cátedras e Docências...149
12. Os Doutores e suas Teses...175
13. A Manutenção Financeira...185
14. A Expansão...213
15. A Enfermagem Obstétrica...251
16. Casamento por Dote – a Farmácia & a Medicina...259
9
17. A Colação de grau - Cerimonial e Formandos até 1950...273
18. Apontamentos para uma História do DAM – 1930-1949...293
19. A Atlética...331
20. A Sociedade Acadêmica de Medicina e Cirurgia do Pará...337
21. O Serviço de Verificação de Óbitos...341
22. Pirâmides de Borracha e Feriados – A 2ª Guerra
chega ao Palacete Santa Luzia...351
23. O Prêmio Raul Leite e outras Premiações...359
24. Houve uma vez um Barão...371
25. Camilo Salgado – O Berço do Mito...387
26. Olympio – Um homem para dizer Não...407
10
27. Retalhos da Vida Acadêmica...421
28. A Federalização...441
29. O que não tivemos - a título de posfácio...479
30. Índice de Ilustrações...487
31. Referências...493
Prefácio
O AVESSO DE UMA HISTÓRIA
Meirevaldo Paiva
Educador
O escritor tcheco Milan Kundera ressaltou, num dos seus livros, o tema do esquecimento como perda da identidade. Ele
disse certa vez que: “quando uma grande potência quer privar
um país pequeno de sua consciência nacional, ela utiliza o método do esquecimento organizado”. É o que acontece, em qualquer
regime ditatorial ou nas falsas democracias, com divergentes,
dissidentes, opositores, inimigos e alcança perversamente os desafetos pessoais e profissionais.
Guardadas as devidas proporções de praxe, os médicos Aristóteles Guilliod de Miranda e José Maria de Castro Jr. conseguem
com sensibilidade romper as barreiras do esquecimento político, administrativo, educacional e cultural a que foi relegado a
história da Faculdade de Medicina da fundação à federalização.
Registre-se que, sob o impacto da burocracia e do tradicional
reformismo brasileiro que nada reforma, a Faculdade mudou
tanto de nome até chegar numa obscura designação de “curso”
de medicina da Universidade Federal do Pará que, se não apequena a inteligência ali praticada, olvida a luta educacional de
um punhado de homens que esteve à altura da própria história
da medicina brasileira.
De frente a esse esquecimento, também atropelado pela reforma
universitária dos anos 70 mal copiada pedagogicamente e que
dividiu as partes, mas esqueceu a a totalidade, jamais um apresentador de livro pediria ao leitor que o lesse pelo final, ainda
que instigado pela advertência dos autores, “O que não tivemos
- a título de pósfácio”, à medida que buscaram mais respostas às
decifradoras perguntas da inquietante desmemoria que marca a
perda de identidade histórica da Faculdade.
No último parágrafo da obra, “Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, 1919-1950, Da Fundação à
Federalização”, os autores assim finalizam: “São tantos os ques-
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tionamentos ... São tantas as lacunas a serem preenchidas ... De
algum modo preenchemos várias e, sem modéstia, podemos dizer que abrimos um leque bem amplo para a continuação das
pesquisas. Se tivéssemos todas as respostas, um outro livro teria
sido escrito”.
Não há, porém, “modéstia” diante da verdade. Há, sim, a sensibilidade para desocultar o que está escondido pelo avesso da
história. Caberá ao leitor preencher lacunas, vazios, omissões,
desafiar a própria memória, ou optar por enfrentar a desmemória da sociedade transtornada pela hipocrisia social, pela inveja
e pelo ciúme profissional que, sem coincidência, tem origem nos
desatinos dos deuses gregos e continuado entre os novos deuses
do capital globalizado.
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Ao pesquisar a história da Faculdade de Medicina os autores focalizaram as ações, os gestos, as palavras de homens que lutaram
contra preconceitos, preterimentos, tabus, subterfúgios e que
souberam pela inteligência fazer história até se transformaram
eles mesmos em mitos, heróis e santos. Muitos, porém, foram
castigados cruelmente pelo esquecimento, apagados da história
por elites de mentalidade colonizada incapazes de aprender a
discernir com as lições da própria história. O desaparecimento
de uma ata, perdida ou escondida, é a supressão de uma página
da história, por exemplo.
Mas é no cotidiano que se descortina o mundo da Faculdade dos alunos aos professores, dos funcionários aos secretários, dos
diretores às autoridades da época. Entre os alunos a solidariedade, a fraternidade, a amizade, as inimizades, as divergências
de um convívio cruzado de lutas e de aspirações, de alegrias e
tristezas, mas tudo fortalecido consciente ou inconscientemente
pelo sentido de comunidade, de que a Faculdade era um lugar
comum a todos.
Os movimentos estudantis pelos melhores professores, o controle do acesso de professores à faculdade, a coleta para pagar a
mensalidade dos mais pobres, a atuação de líderes em congressos nacionais, a liberdade de expressão, a defesa da federalização da escola, as festas e os bailes inesquecíveis, as defesas de
trabalhos científicos, o orgulho de pertencer a uma Faculdade
de conceito nacional, a veneração por mestres identificados pelo
acentuado espírito público, as brincadeiras e arruaças e as lutas
contra as políticas do sistema, são recortes de um cotidiano que
aperfeiçoava o conhecimento, mas dignificava o estudante nesse
momento histórico.
Entre os professores pontificava o espírito público e, por conseqüência, a luta por uma Faculdade que passou a ser a defesa de
uma causa educacional e política no Estado. A correspondência
trocada entre os diretores da Faculdade e as autoridades constituídas mostra a dignidade com que agiam os professores, principalmente, a lucidez que expressa um tempo que não poderia
ser mais adiado, ou seja, o momento de organizar um curso de
medicina no Pará com reflexo em toda a Amazônia.
É comovente a disponibilidade dos professores abdicarem de
seus salários para cobrir despesas da Faculdade, resistindo, assim, à crônica falta de investimento oficial em prol da educação.
Na disposição dos professores em defender o ensino da medicina, para que o Estado do Pará não se sujeitasse a um tipo de
centralização política que submetia o conhecimento a centros
supostamente mais adiantados, na linha de uma indisfarçável
colonização existente entre o Norte e o Sul.
Essa mesma disposição de honrar uma causa provocou a inteligência, a sensibilidade e a cultura dos médicos Aristóteles Miranda e José Maria Abreu para evitar que o esquecimento pela
via da burocracia, da desmemoria, da falta de orgulho cívico,
de auto-estima, destrua a identidade da Faculdade de Medicina,
hoje, integrada à Universidade Federal do Pará, uma integração
burocrática e desumanizadora da história dos primeiros estudantes, professores, secretários e diretores de uma instituição
que é um símbolo de dignidade e de honradez.
Coube a esses médicos, hoje, como outros, ontem, que a fundação da Faculdade de Medicina não fosse jogada no lixo da
história, não fosse totalmente esquecida por não ser respeitada
e considerada em seu passado e em sua tradição.
Excetuando os nomes dos autores do livro, não poderia citar
nomes de fundadores, de alunos e de professores. Eles estão nas
páginas do livro, eles recebem, portanto, as honrarias de uma
memória a ser mais reconquistada pelas respostas de cada leitor
que se dispuser continuar essa história.
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Apresentação
Num país onde se reclama tanto da “falta de memória” sentimonos felizes por escrever sobre um curso de medicina que caminha
para seu centenário, o que é motivo de júbilo para todos.
Este livro certamente interessará não só aos estudiosos da história da medicina do Pará, mas, principalmente, aos formados
por aquela que, após várias denominações, chama-se novamente,
Faculdade de Medicina*.
Como o título informa, abordamos os primórdios do curso, em
1919 - e até mesmo antes dele -, até a Federalização, em 1950,
delimitando, assim um período de tempo em torno de 30 anos.
A proposta inicial seria escrever três livros: o primeiro; em acordo com o acima; o segundo compreenderia da Federalização até
o período da Reforma Universitária; e o último abordaria dos
tempos pós-Reforma e as outras tantas, até o momento atual.
Por razões óbvias, este livro surge no momento em que a Faculdade, como carinhosamente sempre a chamaremos independentemente do nome que ostente oficialmente, completou recentemente 90 anos de sua criação. Uma longa trajetória durante a
qual tem alternado períodos de crescimento, desenvolvimento e
reconhecimento de sua importância, com outros menos notáveis,
tornando-se objeto de críticas ou de elogios, na dependência da
avaliação de seu desempenho como aparelho formador.
Abstraindo circunstâncias eventuais, procuramos oferecer o máximo de informações obtidas, seja por meio de documentos, jornais de época e fotos, seja através de depoimentos pessoais e tudo
o que nos fizesse chegar o mais próximo ao longínquo ano de
1919 e os posteriores até 1950.
Em alguns tópicos fomos um pouco além de 1950, haja vista que
os fatos históricos seguem um fluxo contínuo e nem sempre são
facilmente divisíveis em períodos bem delimitados.
Partindo de um esboço da sociedade paraense nos anos iniciais
do século XX, tentamos reproduzir os primórdios da Escola, sua
instalação e formação do corpo docente; o cotidiano da Faculda-
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de, suas atividades e correlações, os locais onde se desenvolvia a
prática médica; as atividades acadêmicas e a premiações; as lutas
para a equiparação e, posteriormente, a Federalização; o crescimento da Faculdade, em sua importância e patrimônio.
A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará foi construída por
muitos, como acontece com qualquer instituição. Em meio a tantas possibilidades, traçar apenas o perfil de três dos seus construtores pode parecer injusto. Mas não é por acaso que a efígie
dos três — Barão de Anajás, Camilo Salgado e Olimpio da Silveira — figura na medalha alusiva aos 50 anos da Instituição,
comemorados em 1969.
Como não falar de nomes ainda hoje lembrados como Jaime
Aben-Athar, Acylino de Leão, Lauro de Magalhães, José Alves
Dias Junior, Orlando Lima, Ophyr de Loyola, Porto de Oliveira, Renato Chaves e Prisco dos Santos? Todavia se o livro enveredasse por este caminho acabaríamos nos afastando da sua
finalidade principal, que é a de contar um pouco da história da
Faculdade de Medicina, e assim criaríamos um livro de perfis
biográficos.
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Além disso, seria preciso resgatar outros professores que não tiveram a sorte dos anteriores e desapareceram completamente da memória da Faculdade como Othon Chateau, Gastão Vieira, Carlos
Arnóbio Franco, Francisco Pondé, Jayme da Silva Rosado, Arthur
França, Hermógens Pinheiro, Sousa Castro, Hygino Amanajás
Filho, Manoel Ferreira Bastos, Acatauassú Nunes Filho e muitos
outros nomes que aguardam um merecido reconhecimento.
E finalmente, partindo de uma frase que certa vez ouvimos,
quando este livro ainda não havia nem sido pensado, que era
“impossível” escrever a história da Faculdade de Medicina, e esperando não desapontar os possíveis leitores, poderíamos responder: “pelo menos, tentamos”!
* Os nomes foram Faculdade de Medicina do Pará, Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará,
Faculdade de Medicina da Universidade do Pará, Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Pará e até recentemente curso de medicina da Universidade Federal do Pará.
1
Os primórdios
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18
Detalhe de um dos pisos da FMCP - 3º andar.
Escrever sobre a história do curso de medicina da Universidade Federal do Pará é
escrever sobre a instalação dos cursos médicos no norte e nordeste do Brasil, uma
vez que a antiga Faculdade de Medicina do Pará (seu primeiro nome) precede a
do Recife — a primeira do Nordeste, após a da Bahia — em um ano (PEREIRA
NETO, 2001, p. 112).
É evidente que não se pode tentar contar essa história e sua importância para o
desenvolvimento da região Norte, sem contextualizá-la socioeconomicamente.
Ao ser fundada a Faculdade, em 9 de janeiro de 1919, e instalada em 1ºde maio do
mesmo ano1 (BECKMANN, 2003, p. 235), o Pará, após os anos de fausto proporcionados pela exportação da borracha, vivia a grande crise econômica desencadeada pelo surgimento no mercado da borracha produzida pelos ingleses no leste
asiático. Depois do “maior surto econômico já verificado na região” (MOREIRA,
1989, p. 13), o estado amargava uma crise sem precedentes.
Os anos de 1910 marcaram internacionalmente o final da ‘belle époque’, “expressando a dissolução da organização econômica do século XIX – do que certamente a
Amazônia não estaria isolada2” (DAOU, 2000, p. 64). Na Amazônia esta fase coincide, também, com o declínio da atividade extrativista da borracha, pela perda do
monopólio da sua produção suplantada em volume e, consequentemente em preço,
pelo produto da Malásia, obtido a partir de plantações organizadas cientificamente, causando a débâcle amazônica3 (WEINSTEIN, 1993).
Se durante o ciclo da borracha os reflexos se fizeram sentir em termos culturais e educacionais, tais ações resultaram apenas na expansão da rede escolar, notabilizando-se,
também, pelo aspecto arquitetônico das escolas, naquilo que Eidorfe Moreira chamou
de “monumentalização” dos edifícios públicos destinados a este fim, como os Institutos
Gentil Bitttencourt e Lauro Sodré (MOREIRA, 1989, p. 14). Todo este progresso econômico não resultou na criação de cursos superiores, sendo os únicos do período a Faculdade Livre de Direito (1902) e a Escola de Farmácia (1903), ambos funcionando precariamente; particularmente o curso de Farmácia, instalado no próprio Palácio de Governo e
utilizando o Laboratório do Serviço Sanitário do Estado (MOREIRA,1989, p. 14).
Esse desinteresse seria um reflexo das ações da elite dominante paraense, surgida
com a economia da borracha (SARGES, 2000)4, que mais facilmente mandava seus
filhos estudar na Europa do que no Brasil, atitude típica de países colonizados, mantendo a dependência intelectual e “emocional” à metrópole. Também poderia apontar para uma prosperidade “efêmera e superficial”, com a manutenção de uma economia ainda vivendo e praticando usos do período colonial (WEINSTEIN, 1993)5. Por
tudo isso, seria desnecessário estimular a formação de “doutores” no próprio estado.
Deste modo, chama atenção a criação de tais cursos superiores no Pará em plena
depressão econômica (BECKMANN, 1985)6. A justificativa, para Eidorfe Morei-
Os primórdios
19
seria a de que “uma força de retardamento atuara neste sentido, impedindo assim que
esse incremento se processasse no período socioeconomicamente propício” (MOREIRA, 1989, p. 14). Seria por ter havido um aumento significativo da população,
entre os anos de 1880 e 1910, por conta da imigração nordestina em fuga das secas
e para trabalhar nos seringais, com parcela de colaboração da imigração estrangeira,
particularmente européia (SANTOS, 1980)7? Ou porque a crise da borracha fizera
“secar a fonte” dos recursos da burguesia paraense, que deste modo teve necessidade
de criar condições para a reorganização da elite intelectual paraense, a sua “elite de
doutores” (SARGES, 2000, p. 46), agora utilizando os meios locais?
Assim, logo após a grande crise da borracha, cujos anos emblemáticos vão de 1911
a 1914, quando a queda do preço deste produto atinge duramente a economia e a
sociedade amazônicas (SARGES, 2000, p. 58), surgem a Escola Livre de Odontologia (1914), seguindo-se a de Agronomia e Veterinária (1918) e a de Medicina
(1919) (MOREIRA, 1989, p. 14).
Por volta de 1920, Belém deixa de ser considerada a capital da borracha. A Amazônia entrava em processo de liquidação (SARGES, 2000)8, ainda que outros autores
discordem desta afirmação (WEINSTEIN, 1993)9.
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Se a criação do curso de medicina não coincide com o surto econômico propiciado
pela borracha, não se pode deixar de levar em consideração que o período de fausto
econômico e a conseqüente organização de uma elite intelectual médica (no caso)
representada pela Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará (FIGUEIREDO, 2006)10,
contribuíram para a “gestação” do novo curso de medicina.
Outros fatores preponderantes eram as condições sanitárias da região, assolada
constantemente por grandes epidemias, como a cólera, em meados do século XIX
(BELTRÃO, 2004)11 e a febre amarela, no início do século XX (BRITTO; CARDOSO, 1973)12, sem contar com a endemicidade da varíola, malária e tuberculose,
entre outras, o que certamente repercutiria no desenvolvimento das cidades financiadas pela borracha.
Devido às péssimas condições de saneamento do estado no início do século XX,
medidas necessitariam ser adotadas para modificar esse panorama. A vinda de
Oswaldo Cruz, contratado pelo governo do Pará para o combate e erradicação da
febre amarela, em 1910, resultaria na melhoria do estado sanitário de Belém como
um todo (COSTA, 1973, p. 177). Como reforço à empreitada saneadora era necessária a formação de pessoal capacitado – entenda-se médicos - para aplicar na área
da saúde os ares desenvolvimentistas já presentes nos outros setores da sociedade.
Ao lado disso, a borracha atraíra muita gente para o Norte. Não apenas os nordestinos fugitivos das secas que arrasavam aquela região, mas também uma nova elite
intelectual, que se formava nas faculdades estrangeiras ou nas do Rio ou da Bahia,
aqui chegavam para tentar a vida, contando com a colaboração dos membros da
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
elite econômica local, cujos filhos antes eram mandados para estudar na Europa,
em geral retornando a Belém depois de formados.
Vale destacar também naqueles anos, o início da tentativa de consolidação da medicina como classe e organismo social, “contrastando com o exercício oculto da pajelança” (FIGUEIREDO, 2006, p. 42)13, em que a atuação dos médicos se fazia presente
através da imprensa e outras publicações, participando de associações científicas e
literárias debatendo problemas, divulgando os feitos nacionais e as conquistas científicas, compondo a “imagem da autoridade médica, do herói da cura e do benemérito
cidadão” (FIGUEIREDO, 2006, p. 42). A medicina científica buscando seu lugar na
sociedade, com os médicos amparados no prestígio da profissão ocupando cargos na
vida pública, firmando-se como locus de conhecimento e de poder.
Esta tese é encampada por Acylino de Leão, em seu discurso em 1º de maio de
1919, quando da instalação da Faculdade14.
Embora todo este esforço e a par do desenvolvimento alcançado, o número de
médicos em Belém, na década de 191015, era muito pequeno, fazendo com que a
população preferisse o “tratamento” através da medicina popular, embora alguns
médicos fossem também “acusados” de utilizar os mesmos “produtos farmacêuticos” prescritos pelos curadores, “incluindo-se aqui, as mesmas ervas e beberagens”
(FIGUEIREDO, 2006, p. 42). Paralelamente, começava-se a divulgar a atuação de
médicos, já se definindo por especializações, culminando com a criação de uma sociedade científica mais específica para a divulgação de suas atividades e que seria a
Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, fundada em 12 de julho de 1914, por cisão da
Sociedade Medico-Pharmaceutica do Para (PARÁ-MEDICO, set. 1922, p. 225).
Diante desses dados Clodoaldo Beckmann se pergunta qual teria sido o fator desencadeante para a fundação de uma faculdade de medicina no Pará e fornece algumas respostas:
A exigência social, em sentido largo, é o fator preponderante ou, mesmo,
determinante da criação de uma Escola Superior. Há sempre a ideia de
atribuir o papel criador a homens, grupos ou facções. Se a premissa anterior estiver satisfeita, os acontecimentos fluirão subseqüentemente em
sentido positivo. Caso contrário a Instituição degenera e morre” [...] O
poder governamental por certo não foi. Ela se manteve longe de intromissão do poder público por mais de trinta anos. A qualificação profissional e científica e da comunidade médica de Belém teve sua influência. Os
médicos possuíam um elevado padrão de conhecimentos e não é exagero
afirmar, que praticavam a mesma medicina convencional do resto do país.
Constituíam, no entanto, uma elite intelectual, um círculo fechado, pois
o caminho da formação médica estava vedado àqueles que não possuíam
recursos para sair de Belém. Aqui está uma parcela da exigência social.
Outra, seria a necessidade numérica de médicos para atender aos problemas sanitários do Estado... (BECKMANN, 2003, p. 245).
Os primórdios
21
Por outro lado, não se pode deixar de reconhecer que com a “quebra” da borracha
a sociedade empobrecera; ficara mais difícil, se não impossível, mandar os filhos
para a Europa. E por que não criar, então, condições para a elite estudar em casa,
mesmo, permitindo, de qualquer maneira, que se mantivesse o status quo?
Além disso, depois da profunda crise vivida pela região devido à borracha, a mãode-obra oriunda dos seringais migrou para os núcleos abertos na área da estrada de
ferro Belém-Bragança, onde tentaria manter-se com o cultivo de uma agricultura de
subsistência. Esta nova atividade agrícola aliada à extração madeireira e coadjuvada
pela coleta da castanha-do-pará — que chegaria inclusive a suplantar a borracha
como produto de exportação16 —, buscava injetar algum ânimo na combalida economia do estado, levando a que se considere que a economia amazônica “caminharia em
convalescença até 1920 (SANTOS, 1980, p. 279), com interessantes inserções que
colocariam o Pará, em 1918, entre os dez maiores produtores de milho, feijão e arroz,
e como o quarto produtor de farinha do país (WEINSTEIN, 1993, p. 283).
22
Ao lado deste cenário regional, o século XX revelaria um “lento e profundo processo de transformação do conhecimento médico e de seu mercado de trabalho”, com
o desenvolvimento científico e tecnológico da medicina, levando-a à especialização
franca, refletindo-se nos currículos dos cursos, e também introdução de equipamentos permitindo uma melhora na precisão diagnóstica (PEREIRA NETO, 2001,
p. 19). Isto tudo alteraria o modo de fazer medicina, iniciando a fase da “medicina
tecnológica”, cujo apogeu seria a partir dos anos 50 daquele século.
Em meio a isso tudo, surge a Faculdade de Medicina do Pará, tornando realidade o
projeto sonhado ainda no governo Paes de Carvalho, quando este governador — e
também médico — pensou na criação de cursos superiores para o estado, ao ponto
de editar uma lei sobre o assunto ainda em 189917. A referida lei previa cursos de
direito, medicina e engenharia a serem criados no ano seguinte18 (BRASIL, 1899).
Não praticada em sua gestão, foi esquecida pelos governos subseqüentes, assim
como também o seu próprio autor quando se escreve sobre a(s) história(s) da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Somente vinte anos depois da lei editada por Paes de Carvalho é que “um grupo de
medicos clínicos, nesta capital, desejosos de espalhar as sciencias que professam e
de ensinar sua arte, deliberaram fundar uma escola de medicina” (PARÁ. Governador 1921-1925: Antonino Emiliano de Souza Castro, 07.09.1924, p. 63). Conforme
atestaria Lauro Sodré três anos depois em carta para Camillo Salgado, num cenário
nebuloso, cheio de indefinições19.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
NOTAS
1
Para ter acesso à transcrição da ata de instalação e posse dos professores
consulte Beckmann (2002, p. 256).
2
“A ‘bela época’ é expressão da euforia e do triunfo da sociedade burguesa no
momento em que se notabilizavam as conquistas materiais e tecnológicas, se
ampliaram as redes de comercialização e foram incorporadas á dinâmica da economia internacional vastas áreas do globo antes isoladas. (DAOU, 2000, p. 7).
3
“Após vinte anos de trabalho dedicado de botânicos e empresários britânicos,
as plantações de hévea na Ásia tinham, afinal, começado a produzir borracha
em quantidades consideráveis” (WEINSTEIN, 1993, p. 243).
4
“A economia da borracha determinou alterações acentuadas na estrutura
social belenense. Surge, então, uma classe de homens políticos e burocratas
formada por nacionais; os comerciantes, basicamente portugueses; os profissionais liberais, geralmente de famílias ricas e oriundos de universidades européias. Esta era a composição da elite dominante.” (SARGES, 2000, p. 58).
5
“A prosperidade promovida pelo negócio da borracha, ao contrário, mostrouse efêmera e superficial. Os teatros de ópera mundialmente famosos, as mansões suntuosas e as extravagâncias de legendários nababos criaram para a região uma deslumbrante fachada, por detrás da qual, porém, havia um sistema
de produção e uma rede de trocas que pouco diferiam das estruturas sócioeconômicas características do período colonial”. (WEINSTEIN, 1993, p. 16).
6
“Somente após a quebra da borracha, em 1912, é que viria a expandir-se o
nosso ensino superior, num evidente contraste econômico-social”. (BECKMANN, 1985, Tomo 1).
7
“houve colonização dirigida pelo governo e por particulares para fins agrícolas; por parte dos imigrantes, face o fracasso das colônias, encaminharamse para os seringais. Houve imigração induzida por intermediários mais ou
menos inescrupulosos, que arregimentavam gente no Nordeste brasileiro
para os trabalhos extrativos de borracha”. (SANTOS, 1980, p. 87). “No período de apenas 40 anos, de 1870 a 1910, ela (a população) subiu de 323.000 a
1.217.000 habitantes, quase quatro vezes” (SANTOS, 1980, p. 109).
8
“Por volta de 1920, configura-se o fim de um ‘ciclo’ de crescimento, em
razão da redução da produção do látex amazônico, determinada pela concorrência asiática e pela produção da borracha sintética em laboratórios europeus e norte-americanos. Belém deixou de ser a ‘capital da borracha’; [...]
(SARGES, 2000, p. 46).
9
“Por mais grave que possa ter sido a decadência, os relatos que descrevem a
região como tendo entrado em total agonia exageraram a extensão da calamidade”. (WEINSTEIN, 1993, p. 286).
10
“O problema da formação de médicos era tão urgente entre as lideranças
da classe que, apenas cinco anos depois de fundada a confraria, os mesmos
diretores da casa estiveram à frente da criação da Faculdade de Medicina e
Cirurgia do Pará” (FIGUEIREDO, 2006, p. 44).
11
“Estudar a cólera no Grão-Pará é resgatar à História, as gentes que, nos
anos 40, 50, 60 do século XIX, ainda cuidando das feridas abertas pela Cabanagem, debateram-se com as diversas epidemias”. (BELTRÃO, 2004, p. 23).
12
“O quadriênio administrativo do engenheiro João Antonio Luiz Coelho,
por mandato popular, na mais alta magistratura do Pará, em cujo exercício
se investiu a 1º de fevereiro de 1909, ficou decisivamente ligado à história da
Os primórdios
23
24
febre amarela neste Estado” (BRITTO; CARDOSO, 1973, p. 49).
13
“A visibilidade da atividade médica deveria, cada vez mais, contrastar com o
exercício “oculto” da pajelança [...]” (FIGUEIREDO, 2006, p. 42).
14
“começa o illustre clinico dizendo que o magno problema, no Brasil, era o
povoamento do solo, pondo em evidencia o desamparo dos nossos sertões,
cujas populações estão entregues á corte dos ‘pagés’ e ‘mandingueiros’, e reputa como factor principal, para solução desse problema, a acção da sciencia
medica, enviando para lá a sua fonte de recursos. Ao amparo dessa theoria,
continúa o orador, veiu a idea da fundação da Faculdade de Medicina do
Pará, cujos fructos serão os mais preciosos” (Estado do Pará, 03.05.1919).
15
Em seu relatório do primeiro ano de gestão como Diretor da Faculdade de Medicina, Camillo Salgado contabilizava pouco mais de cem médicos
em atividade no estado, para atender, só em Belém, duzentos mil habitantes
(FMCP, 1923).
16
“em 1921, a castanha-do-pará havia passado à frente da borracha como
produto de exportação mais valioso do Pará” (WEINSTEIN, 1993, p. 289).
17
José Paes de Carvalho foi governador do Pará de 1897 a 1901. Eleito senador em 1903 assumiu e retirou-se em definitivo para Paris. Médico humanitário foi durante muitos anos amigo dos paraenses e brasileiros na capital
francesa, além de assessor das relações financeiras entre o Brasil e seus banqueiros europeus. Cf. (BORGES, 1986, p. 176-181).
18
“Lei 629 de 22 de maio de 1899:
Art. 1º - Ficam creadas n’esta capital as seguintes escholas superiores: direito, medicina e engenharia, com as divisões relativas aos differentes cursos, de
accordo com o programma das escholas congeneres da União.
Art. 2º - O Governador promoverá a installação de todas ou de algumas das
faculdades, no começo do anno vindouro, decretando-lhes os respectivos estatutos e fazendo as primeiras nomeações.” D.O.E. 24.05.1899.
19
“Quando essa idéa de crear uma Escola de Medicina surgiu ahi, era eu governo, e como tal fiz o que em minhas mãos esteve para ajudal-os no ousado
commetimento, que a meus olhos apparecia como uma temeridade, um acto
de coragem e ao mesmo tempo de fé e confiança nas energias da nossa gente.”
Uma carta de Lauro Sodré. In: Faculdade de Medicina do Pará (1923, p. 21).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Foto 1: Dr. José Paes de
Carvalho, governador do
Pará de 1897 até 1901,
possivelmente o primeiro
a pensar em um curso de
medicina para o estado do
chegando a editar uma lei
que criava Faculdades de
Medicina, Engenharia e
Direito no Estado do Pará.
Entretanto, tal lei jamais
foi efetivada.
Fonte: CÁCCAVONI,
Arthur. Album Descrittivo
Annuario dello Stato del
Pará 1898.
25
26
2
A Fundação da
Faculdade de Medicina
do Pará – o dia que
o tempo apagou
27
28
Detalhe de um dos pisos da FMCP - entrada principal.
Bastaram algumas décadas de descaso para que as circunstâncias da fundação da
Faculdade de Medicina do Pará1 fossem completamente cobertas pela poeira do
esquecimento, tornando sua reconstrução nebulosa e insatisfatória. Com o passar
dos anos determinados trechos de uma edição especial da revista Pará-Médico de
1922, passaram a ser repetidos, sempre que se mencionava a fundação da Faculdade, quase de forma dogmática:
Foi no derradeiro dos annos de 1918 que alguns membros da Associação
Scientífica do Pará, mantedora da Escola de Odontologia, procuraram o
illustre médico paraense Dr. Camillo Salgado e apellaram ao seu espírito
elevado e ao seu legítimo prestígio na classe medica, para que pudesse
ser realidade a creação de uma Faculdade de Medicina cuja direcção lhe
foi oferecida (PARÁ-MÉDICO, 1922, p. 360).
As ideias, surgem muitas vezes, da vontade coletiva, sem dúvida, mas há sempre
alguém que pensa antes. Partindo deste ponto, quais foram estes membros da Associação Científica do Pará que procuraram Camilo Salgado? Ou mesmo o que foi
esta Associação?
Acreditava-se que a Associação Científica do Pará teria sido primeiramente conhecida como Sociedade Propagadora das Ciências, entidade fundada em maio de 1914
por Joaquim Tavares Vianna2. Pouco depois, em 4 de julho de 1914, na casa dele e
sob sua presidência, a Associação Científica do Pará contando com membros como
Antônio Magno e Silva, Carmelino Salgado, Antônio Peryassú, Camilo Salgado,
Pinheiro Sozinho, Jayme Aben-Athar e o farmacêutico Lima e Silva, decide criar a
“Escola Livre de Odontologia do Pará”. O grupo transforma-se na Congregação da
nova instituição e nomeia Joaquim Tavares Vianna como Diretor, Antônio Magno
e Silva como Vice e Lima e Silva como Secretário (RIBEIRO, 2005, p. 12).
Em 1915, Antônio Peryassú assume a direção da “Escola Livre de Odontologia do
Pará”; de 1916 até meados de 1917 é Jayme Aben-Athar quem a dirige; de 1917 em
diante, Antônio Magno e Silva torna-se diretor, cargo que deixaria somente em
1938 (RIBEIRO, 2005, p. 13).
É durante a gestão de Magno e Silva, por resolução da Congregação da escola em
deliberação unânime, que é criada, em 9 de janeiro de 1919, a Faculdade de Medicina do Pará (RIBEIRO, 2005, p. 13).
O que ocorreu de fato naquela reunião é pura especulação, haja vista sua ata ter
sido dada como desaparecida. Diz-se que a ideia de criar uma escola médica no
Pará teria partido de Magno e Silva, como informa Folha do Norte, a quando do
falecimento deste:
Foi ainda por sua iniciativa que se fundou a nossa Faculdade de Medicina,
idéa considerada por muitos como uma loucura, mas que para sua alma
de grande batalhador era uma realidade insophismável.
A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará - O dia que o tempo apagou
29
E após os primeiros embates, a Faculdade de Medicina surgiu, como mais
uma clara vereda, aberta aos horizontes do ensino superior de nossa terra. E nella Magno e Silva se fez médico, após brilhante tirocínio, pra ir
afirmar na vida clinica os seus meritos, os seus grandes conhecimentos
scientificos (Folha do Norte, 28.01.1939).
Clodoaldo Beckmann (2003, p. 248) confirma o mesmo fato acrescentando outros
nomes que abraçaram a iniciativa:
O que parece não deixar dúvida é que a ideia da fundação da Faculdade de
Medicina nasceu na Escola Livre de Odontologia, que era mantida pela
Associação Científica do Pará. Orlando Lima, professor catedrático de
Obstetrícia disse-me em 1950:
“A Faculdade de Medicina nasceu graças à dissidência que se verificara
na Escola de Odontologia, ao final de 1918. Antônio Magno e Silva deu
a ideia. A ele se uniram Renato Franco, Hermógenes Pinheiro, Evaristo
Silva, Álvaro Gonçalves e Carlos Arnóbio Franco, que saíram pelas ruas
do comércio, com uma bandeira brasileira, angariando donativos. Conseguiram um conto e setecentos mil réis, dos quais quinhentos mil réis
doados pelo Banco Ultramarino”. E acrescentou: “Foram estes os verdadeiros fundadores”. É de notar que alguns deles sequer eram médicos
nem são citados nos trabalhos que indicam a galeria de fundadores.
30
A dissidência, na Escola Livre de Odontologia, mencionada por Beckmann é mais
bem esclarecida por fontes mais antigas, que derrubam a ideia vigente que a “Associação Científica do Pará” e a “Sociedade Propagadora das Ciências” eram a mesma
instituição com uma mera mudança de nomenclatura (RIBEIRO, 2005, p. 12). O
“Relatório do Governador Lauro Sodré de 1918” destrói este mito e acrescenta
novos fatos:
O Centro Propagador das Sciencias, fundado nesta capital em 23 de
janeiro deste anno, tem por fim a creação e manutenção de cursos e ensino
superior. Desde sua installação fundou a Faculdade de Odontologia,
adoptando um programa de ensino theorico-prático em 3 annos, confiadas
as cadeiras que os constituem a professores bem escolhidos. A direção
desta faculdade está confiada ao dr. Jayme Aben-Athar.
O mesmo Centro installou a Escola de Agronomia com um curso dado
em tres annos, sendo as cadeiras que elle abrange regidas por lentes de
reconhecida aptidão.
[...]
A Diretoria do Centro Propagador das Sciencias está a cargo dos Drs. Arthur
França, Pinheiro Sosinho, Porto de Oliveira e Carvalho Lima.
Funciona regularmente a Escola Livre de Odontologia do Pará, fundada
em Belem a 4 de Julho de 1914.
[...]
Dirige-a o professor Magno e Silva e é bem constituido seu corpo docente, constituido por medicos e cirurgiões dentistas.
(PARÁ. Governador (1917-1921: Lauro Sodré), 07.09.1918, p. 58).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Fica claro então que a “Sociedade Propagadora das Ciências” ou “Centro Propagador das Ciências” foi fruto de uma dissidência entre alguns membros da “Associação Científica do Pará”, como Jayme Aben-Athar e Pinheiro Sozinho.
Na ausência de fontes melhores, os jornais da época trazem um pouco mais de
luz à questão: Pinheiro Sozinho, então secretário da Escola Livre de Odontologia,
estaria “dizendo-se indevidamente director do estabelecimento e annullando actos
da congregação, o que provocou protesto dos proprios alumnos da Escola” e sua
demissão do cargo, bem como instauração de um processo disciplinar contra ele
(Folha do Norte, 12.10.1917).
Um mês antes, em setembro de 1917, Jayme Aben-Athar, durante acalorada reunião
extraordinária da Congregação, para discussão a respeito de um abaixo-assinado
feito pelos alunos de odontologia, que solicitavam a equiparação da Escola Livre
de Odontologia e a anexação desta à Escola de Farmácia, “demittiu-se dos logares
de director e lente de histologia, physiologia e hygiene, retirando-se do recinto da
Escola” (Folha do Norte, 20.07.1917).
Pinheiro Sozinho, Jayme Aben-Athar e outros dissidentes logo criariam a “Sociedade
Propagadora das Ciências”, que fundaria a “Faculdade de Odontologia do Pará”, a qual,
em janeiro de 1918, já contava com vinte e dois candidatos à matricula no primeiro ano,
funcionando sua secretária provisoriamente na Rua Nova de Sant´Anna, nº 36, para posterior transferência para o prédio onde funcionava a Santa Casa de Misericórdia na praça
Frei Caetano Brandão. (Folha do Norte, 31.01.1918, p. 2).
Na competição realizada via anúncios nos jornais (Folha do Norte, 16.02.1918, p. 1)
entre a “Escola Livre de Odontologia do Pará” e a “Faculdade de Odontologia do
Pará” cada uma ressaltando suas qualidades, sobreviveria a mais antiga3. Em março
de 1919, por interferência do senador Cypriano Santos, as instituições entraram
em acordo e o curso odontológico criado pela “Sociedade Propagadora das Ciências” foi extinto valendo aos alunos que ali estavam matriculados a transferência
para a “Escola Livre de Odontologia”. A “Sociedade Propagadora das Ciências”
manteve apenas seu curso de agronomia (Estado do Pará, 26.03.1919).
Deste modo, pode-se afirmar que a Faculdade de Medicina nasceu não apenas em
um contexto econômico incerto4, mas também em um momento de discórdia entre
membros importantes da classe médica. Jayme Aben-Athar seria o exemplo mais
notório: mesmo sendo nomeado para reger a cadeira de Anatomia Patológica da
Faculdade na ata de 3 de abril de 1919, sua assinatura não aparece no documento.
Ele somente assumiria o cargo, até então ocupado por Prisco dos Santos, em 12 de
janeiro de 1924 (FMCP [1950]). Por outro lado, Porto de Oliveira, que também
era membro da “Sociedade Propagadora de Ensino”, parece ter colocado suas diferenças de lado, assumindo a cadeira de psiquiatria desde o início.
A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará - O dia que o tempo apagou
31
Outro ponto ligado à Associação Científica do Pará e à Faculdade de Medicina, e
ainda obscuro, diz respeito às relações entre ambas. O já citado número especial
da Pará-Médico, referindo-se à criação da Faculdade, cita que: “Em pouco mais de
um anno caminhando promissoramente, a Faculdade, se desligou da Associação
Scientífica e passou a ser administrada pelo seu corpo docente.’ (PARÁ-MÉDICO,
1922, p. 360).
O que teria motivado este desligamento tão prematuro, fato que não ocorreu com a
Escola Livre de Odontologia do Pará, que permaneceu vinculada àquela associação
por muito mais tempo? Uma hipótese talvez recaia sobre o fato de Antônio Magno e Silva pertencer à primeira turma da Faculdade de Medicina. Poderia ter sido
considerado antiético que a Associação Científica então controladora da Faculdade
fosse composta por alunos desta última?5
Por fim, independente do que tenha acontecido naquele 9 de janeiro e do que ainda
se venha a descobrir sobre as circunstâncias que cercaram a criação da Faculdade
de Medicina do Pará, o pioneirismo de seus fundadores é eterno e seu mérito inquestionável. Nascia assim a oitava escola médica do Brasil6.
NOTAS
32
1
Era assim que a Faculdade era conhecida em seus primórdios. O “de Cirurgia” surge em algum ponto após 1923. Em alguns relatórios dos governadores outros nomes são observados com menos frequencia como “Faculdade
Livre de Medicina do Pará”. (N.A).
2
Figura injustamente esquecida e que durante toda sua vida exerceu magistério em diversas escolas de Belém, como no Liceu Paraense onde foi
professor de História Natural, na Escola Normal, na Escola da Marinha
Mercante do Pará e ainda na Escola de Farmácia, onde chegou a diretor. Era
catedrático de Química Mineral, Orgânica e Industrial, e foi lente de Química Orgânica e Biológica na Escola de Agronomia e Medicina Veterinária
(REGO, 2002, p. 94).
3
Em 12 de abril de 1920 a Escola Livre de Odontologia do Pará passou a
chamar-se “Faculdade Livre de Odontologia do Pará” sendo hoje parte da
Universidade Federal do Pará (UFPA). (RIBEIRO, 2005).
4
Ver capítulo “Os Primórdios”.
5
Clodoaldo Beckmann contava uma antiga anedota a respeito da fundação
da Faculdade de Medicina do Pará: Magno e Silva teria viajado para o Rio
de Janeiro para formar-se em medicina. Entretanto, sabe-se lá porquê voltou
dentista para aborrecimento de seu pai. Este desejando ver seu filho médico a todo custo, mas já sem recursos para custeá-lo em outro estado, lhe
obrigou a criar uma Faculdade de Medicina no Pará. A anedota é bastante
interessante, ainda que careça de fontes que a comprovem.
6
A ordem de criação das dez primeiras escolas médicas no Brasil é a seguinte:
1ª - Salvador. Fundada em 18 de fevereiro de 1808. Escola de Anatomia, Medicina e Cirurgia, Faculdade após 1832. Ligada atualmente à UFBA.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
2ª - Rio de Janeiro. Fundada em 5 de novembro de 1808. Escola de Anatomia,
Medicina e Cirurgia, Faculdade após 1832, posteriormente Faculdade Nacional de Medicina da Universidade do Brasil. Ligada atualmente à UFRJ.
3ª - Porto Alegre. Fundada em 25 de junho de 1898, início do curso em 1899.
Ligada atualmente à UFRS.
4ª - Belo Horizonte. Fundada em 5 de março de 1911, início do curso em 8
de abril de 1912. Integrada hoje à UFMG.
5ª - Rio de Janeiro. Faculdade de Medicina Homeopática do Rio de Janeiro,
ou Faculdade Hahnemanniana, posteriormente Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro. Fundada em 1912, início do curso em 1º de fevereiro
de 1913. Integrada hoje à Uni-Rio.
6ª - São Paulo. Faculdade de Medicina de São Paulo. Fundada em 19 de dezembro de 1912, início do curso em 2 de abril de 1913. Atual FMUSP.
7ª - Curitiba. Faculdade de Medicina do Paraná. Fundada em 28 de outubro de
1913, início do curso em 13 de abril de 1914. Ligada atualmente à UFPR.
8ª - Belém. Faculdade de Medicina do Pará. Fundada em 9 de janeiro de 1919,
início do curso em 1º de maio de 1919. Integrada atualmente à UFPA.
9ª - Recife. Faculdade de Medicina do Recife. Fundada em 5 de abril de 1915,
início do curso em 16 de julho de 1920. Integrada atualmente à UFPE.
10ª - Niterói. Faculdade Fluminense de Medicina. Fundada em 25 de junho
de 1925, início do curso em 31 de maio de 1926. Integra hoje a UFF. In SARINHO, Clóvis Travassos. Faculdades de Medicina do Brasil (As dez mais
antigas)-Resumo Histórico. Nordeste Gráfica. Natal, 1989.
33
A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará - O dia que o tempo apagou
34
3
A instalação era preciso começar
35
36
Detalhe do assoalho do Salão Nobre da FMCP.
Da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, em 9 de janeiro de
1919, até sua instalação, em 1º de maio do mesmo ano, se passaram cento e treze
dias. Isto é, menos de quatro meses. Em se tratando da criação e da instalação de
uma Faculdade de Medicina, partida exclusivamente da iniciativa particular, é um
tempo recorde. Basta que se compare com instituições surgidas de forma semelhante na Velha República.
A Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, por exemplo, levou mais de um ano
desde a fundação até sua aula inaugural (SALLES, 2004, p. 121). No Rio Grande
do Sul, o tempo foi de quase sete meses (SARINHO, 1989, p. 167). No Paraná as
coisas foram um pouco mais velozes e a Faculdade levou aproximadamente seis
meses para iniciar suas aulas (SARINHO, 1989, p. 167). No extremo oposto ficou a
Faculdade de Medicina do Recife, que amargou cinco longos anos após a fundação
para iniciar suas atividades (KELNER, 1985). Se fosse uma competição, somente
a Faculdade de Medicina de São Paulo ganharia a iniciativa paraense por cerca de
uma semana: apenas cento e cinco dias decorreram entre sua fundação e a aula
inaugural (SALLES, 2004, p. 127).
Convém ressaltar que se não fosse talvez pela falta de recursos ou possíveis problemas na formação do corpo docente, o tempo decorrido entre fundação e instalação
da Faculdade de Medicina do Pará teria sido ainda menor, pois o jornal Estado do
Pará, após noticiar a criação de uma Faculdade de Medicina no estado1, anunciava
o início das aulas para dois de abril2.
Por mais que a rapidez dos médicos paraenses possa ter sido interpretada como
imprudência por muitos de seus contemporâneos, Belém já contava com mão de
obra capacitada para formação de um corpo docente satisfatório, além de um hospital adequado, condições básicas para a instalação de um curso médico. Podia até
faltar dinheiro, mas sobrava vontade de transformar3.
A cidade também não ficou completamente indiferente à iniciativa. Alguns comerciantes contagiados pela idéia contribuíram com o que puderam:
É assim que os srs. Manoel Pedro e Bernardino da Cunha Mendes num
gesto altuistico offereceram material no valor de 220$ o primeiro e 140$
o segundo. O sr. Tavares Cardoso promptificou-se a fornecer generosamente material de papelaria para o expediente. Egual proceder tiveram
o sr. Moraes Cunha e o Paris N’ America, que cooperaram na medida
de suas posses, com varios donativos de valor. Prometteram auxiliar a
Faculdade, enviando beneficios, os proprietarios da conhecida Fabrica de
Moveis Esperança, de Azevedo e Talhadas e o commerciante de nossa
praça, sr. Ignacio Obadia. Sabemos que varias pessôas irão auxiliar a Faculdade. Todo e qualquer auxilio deve ser enviado para a séde da Escola,
á rua João Diogo, andar terreo do Gymnasio Paes de Carvalho. (Estado
do Pará, 14.02.1919, p. 1).
A Instalação - Era preciso começar
37
E ainda:
Enviaram donativos para a fundação da Faculdade de Medicina [...]. Os
srs. Pires Teixeira e Cia, Moreira Gomes, Sousa Fernandes e Cia, Cortez
Coelho, Sabino Silva, B. S. Vianna, a quantia de 100$ cada um; Azevedo e
Talhadas uma carteira no valor de 120$; Mauricio Gama e Silva material
escolar na quantia de 100$.
Prometteram auxiliar o altaneiro tentamem os srs. A. Mourão & Cia, Ribeiro da Silva & Cia, Barbosa Rodrigues & Cia, Bazar Liquidador e outros.
O benemérito governador do Estado cedeu a impressão gratuita dos programmas, regulamentos, etc (Estado do Pará, 25.02.1919, p. 1).
Os primeiros exames de admissão para o curso médico estavam previstos para
24 de março, sendo o prazo para inscrição prorrogado “por mais nove dias, dando
assim tempo sufficiente a que todos os candidatos se inscrevam” (Folha do Norte,
11.03.1919, p. 1). A congregação decidiu ainda que, somente naquele ano, estariam
dispensados dos exames de admissão os bacharéis de direito, engenheiros, farmacêuticos, dentistas, professores normalistas e os que “hajam completado o seu curso de humanidades em quaesquer estabelecimentos de ensino superior do Estado
ou a elles equiparados” (Folha do Norte, 11.03.1919, p. 1).
38
A atitude da congregação parece mostrar que a Faculdade de Medicina procurava
candidatos e não o contrário. Tal situação, que certamente contribuiu para que o
curso não começasse em 2 de abril, pode ser interpretada como uma certa incredulidade para com a nova Escola.
As medidas parecem ter surtido efeito, visto que pouco tempo depois o mesmo
jornal afirmava ser elevado o número de candidatos matriculados na Faculdade de
Medicina do Pará (Folha do Norte, 22.03.1919, p. 1)4.
De qualquer forma a iniciativa ultrapassou as fronteiras do estado havendo notícias de que a criação de uma nova escola médica atraiu a atenção de candidatos do
Amazonas, Maranhão, Ceará e Pernambuco (Estado do Pará, 25.02.1919, p. 1).
Assim, em 1º de maio de 1919, seria oficialmente instalada a Faculdade.
Por seu inquestionável valor histórico, transcrevemos, integralmente, a sua ata de
instalação:
Acta da sessão solemne de Inauguração da Faculdade de Medicina do
Pará, realizada no salão nobre do “Gymnasio Paes de Carvalho”.
Ao primeiro dia do mez de maio do anno de mil novecentos de dezenove,
nesta cidade de Belém do Pará, reunidos no salão de honra do Gymnasio
Paes de Carvalho, gentilmente cedido pelo Excellentissimo Senhor Doutor Secretario Geral do Estado, os Excellentissimos Senhores: Doutor
Barão de Anajáz, Director da Faculdade; Capitão Pedro Borges do Rego,
ajudante de ordens e representante do Governador do Estado; Major
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Dr. Luiz Lobo, representante do General Calheiros de Lima, chefe da
Região Militar, Capitão José Vicente Franco e Tenente Alfredo Câmara pelo Coronel Cearense Cyleno, commandante da Brigada Militar do
Estado; Conego João Crolet, pelo Gymnasio Paes de Carvalho; Coronel
Vicente Hollanda, pelo Club Militar do Pará, Sociedade Mecanica Paraense e Collegio Gram-Pará; professor João Amaral pela Escola Livre
de Odontologia; Henrique José de Lima, Helio Coelho e José Aranha,
pela Alliança Academica do Norte; Altino de Almeida Telles, pela Escola
de Pharmacia; doutores Penna de Carvalho, Francisco Caribé da Rocha,
Acylino de Leão, Mario Chermont, Arnobio Franco, Camillo Salgado
dos Santos, Porto de Oliveira; presentes também os Drs. Camillo Salgado, Vice-Director da Faculdade, Raymundo de Mattos Cascaes, Jayme
Rozado, Evaristo Silva; conego Andrade Pinheiro; senador Marco Nunes; Dr. Ignacio Moura, pelo Instituto Histórico Geographico; professor Bertholdo Nunes; Dr. Heraclito Pinheiro, Saturnino Fernandez, José
Penna e Costa; Dr. Genaro Ponte e Sousa, redactor da edição vespertina
do “ Estado”; Cantidio Lopes da Silva; Oscar Salvador; professor Manuel
João Alves, sub-secretario da Faculdade; pharmaceuticos Aristoteles Balestrero e Bernardino Couto; Olavo Mendes, cirurgião dentista; Eudoxio
Lyra Lobato; Rubens Serra Freire; Asthyfero Lima; Horacio Lettra; Mario Paiva; Vulphilda e Guiomar Freire; Maria Monteiro da Silva; Manuel
Bezerra; Henrique Alves Ribeiro; Maria dos Anjos e Esmeralda Monteiro, acadêmicas de Odontologia; professora Eugenia Hollanda; senhoritas
Olga Paes de Andrade; Gabriella Hollanda; Anna Elizabeth Hammon;
Edith Castro e outras pessôas, foi aberta a sessão sob a presídencia do
Exmo. Sr. Barão de Anajáz, secretariado pelo Dr. Hermogenes Pinheiro.
O mesmo Sr. Presidente declarou que a presente reunião tinha por fim a
inauguração da Faculdade de Medicina do Pará, e em seguida passou a
expôr de modo conciso as vantagens que este estabelecimento de ensino
superior poderá trazer ao progresso deste Estado e ao desenvolvimento
da Sciencia e do Trabalho em prol da Humanidade. Terminada a sua
oração, o Sr. Presidente deu a palavra ao Sr. Dr. Acylino de Leão, que,
em nome da Congregação agradeceu, o comparecimento das autoridades
superiores do Estado, dos representantes das diversas classes presentes
e bem assim das Exmas. Snras. e senhorinhas que se dignaram com suas
presenças, abrilhantar a solemnidade. Começou o orador dizendo que o
magno problema no Brasil, era o povoamento do solo, pondo em evidência o desamparo dos nossos sertões, cujas populações estão entregues
à côrte dos pagés e mandigueiros e reputa como fator principal, para a
solução desse problema, a acção da sciencia médica, enviando ate lá a sua
fonte de recursos. Diz mais que ao amparo d`essa theoria, veio a idéa da
fundação da Faculdade de Medicina do Pará, cujos fructos serão os mais
preciosos. Mostra que nos necessitamos de médicos, homens de sciencia,
que levem ao interior o concurso de sua actividade, libertando aquellas
populações da pajelança, velando pela saúde desses braços que produzem
o trabalho. Diz que a pratica tem demonstrado que os médicos formados
pelas academias do sul, na maioria tomam o caminho de S. Paulo, Minas
e outras capitais, onde as fortunas lhes acenam melhor um futuro proveitoso, e, assim, diz, só os nossos, os formados aqui, é que poderão lançar as
A Instalação - Era preciso começar
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suas vistas para o interior, já movidos pelo trabalho, já pelo amor ao seu
berço natal, ou pelos laços de família que ali os prendem. Faz o histórico
do que era Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro há dez anos, quando
elle, orador, se formara, mostrando que nós estávamos em condições de
oferecer os mesmos médicos que aquelles que alli se diplomam. Faz ver
mais que naquelle tempo alli, as falhas eram inúmeras, a chimica medica
era rudimentar, a bacteriologia muito superficial e até a propria anatomia, que é base principal da sciencia medica, era falha, pelo grande numeros de alumnos que cursam a Faculdade. E nem por isso os formados pela
academia do Rio de Janeiro, deixam de ser medicos. Expõe longamente que o sucesso da carreira medica está na clínica hospitalar e, nessas
condições, nós poderemos ter excellentes diplomados. Accrescenta que a
celeuma que se levanta é natural e, como exemplo, cita a fundação da Faculdade de Direito, que tanto deu que falar e a interrogar a muitos – Para
que precisamos de tantos bacharéis? No entretanto, e pouco tempo
tampo está
ella provando o seu mais proveitoso resultado. No interior, onde os juizes
sempre foram leigos, e, as mais das vezes, até analphabetos, temos hoje a
substituil-os rapazes talentosos e formados em nossa Escola de Direito.
È este o papel que está reservado á Faculdade de Medicina do Pará, cujo
programa, acabava de expor. Diz também que o Brasil reclama de agrônomos e pergunta, como progredir si esses braços fortes não tiverem a
mão protectora da medicina? Termina agradecendo a prova de confiança
de seus colegas em escolhel-o para orador do acto. Em seguida usou da
palavra o academico Deserée Pannain, que por algum tempo prendeu a
attenção do audictorio, sendo, ao terminar, bastante aplaudido. Ninguem
mais desejando usar da palavra, o Sr. Presidente dá por terminada a solemnidade e declara achar-se inaugurada a Faculdade de Medicina do
Pará com os seguintes alumnos: - Antônio Magno e Silva, José Theophilo
Ferreira, Salvador Pannain, Antônio Simões Pereira e Raymundo Magalhães (dentistas); Angelino Lima, Pio Ramos e José Martins Sant`Anna
(advogados); Raymundo Proença, Manoel Dias Maia, Eugenia Hollanda, Edith Castro e Anna Hammond (professores); padre Emilio Martins;
Justino Barroso; Aristóteles Fernandez; Manoel Ismael de Castro; Antônio Siqueira Mendes; Manoel Tertuliano de Cerqueira; Aluisio Cardoso;
Matheus Lydio Pereira de Sousa; Francisco da Silva Nunes; Olga Paes de
Andrade; Rodrigo Penna e Costa; Américo Dantas Ribeiro; Carlos Hygino da Silva; Peregrino Júnior; Thereza Hollanda; Gabriella Hollanda;
Isauro Gonçalves da Costa; Anna Ismael Nunes; Gileno Pedrosa; Manuel
Barbosa Rodrigues; Adelino Augusto de Miranda; Lucilo Fender; Eurico
Barroso; João Angyone da Costa; Altino Novoa; Sebastião Bayma; B. Penalber, Raymundo da Silva Magno, Vinicius Corrêa Nunes, Jorge Franco
de Almeida, Raymundo Godinho Filho, Luiz Antônio Paula Feio e Luiz
Martins e Silva”. Em seguida o Exmo. Sr. Barão de Anajáz presidente do
acto agradece o comparecimento de todas as pessôas que se dignaram
a concorrer com suas presenças ao acto de inauguração da Faculdade
de Medicina do Pará. E nada mais ocorrendo, é encerrada a sessão, e,
para constar, eu Manoel João Alves, sub-secretario da Faculdade, lavrei a
presente acta que será assignada pelo Sr. Presidente e mais membros da
Congregação, e subscrita pelo sr. Secretário Dr. Hermogenes Pinheiro5.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Os jornais da época definiram o acontecimento como tendo sido uma solenidade
simples, com plateia seleta (Folha do Norte, 03.05.1919, p. 2), iniciada às dez da
manhã e encerrada às onze (Estado do Pará, 03.05.1919)6, com direito a banda de
música dos Bombeiros Municipais na frente do “Paes de Carvalho” (Folha do Norte,
03.05.1919, p. 2).7 e duas “chapas photograficas” feitas por Antônio Brasil: uma dos
professores da Faculdade e outra de seus acadêmicos (Folha do Norte, 03.05.1919).
A transcrição da ata nos brinda ainda com algumas curiosidades: derruba o mito,
surgido com o passar dos anos, de que o governador Lauro Sodré teria comparecido ao evento8, quando na verdade sua única visita à Faculdade foi em 1934 (Folha
do Norte, 29.12.1934), muitos anos depois do seu apogeu como político. E comprova por alguns pronunciamentos nitidamente defensivos do Dr. Acilino de Leão,
que a iniciativa de criar uma escola médica em Belém não foi de todo bem aceita.
Camilo Salgado definiria assim o momento:
Basta evocar como começamos, causando sensação e provocando o commentarios ridiculos dos que se admiravam como se queria manter uma
Faculdade de Medicina em terra, na actualidade tão pobre de recursos
financeiros (FMCP, 1923, p. 5).
Dez anos depois Folha do Norte recordaria aquele inicio:
Quando aqui se fundou nossa Faculdade de Medicina muito sorriso de
mofa perpassou pelos labios dos entendidos, no tocante ao futuro desta
casa de instrucção superior. Depois, com a sequencia dos annos, parece
que aquella incredulidade a pouco e pouco foi desapparecendo, sobretudo
quando, dos Estados vizinhos começaram a chegar os estudantes, e os
estabelecimento, já equiparado aos melhores da nação, a emittir os primeiros diplomas (Folha do Norte, 24.02.1929, p. 1).
Talvez a mais bela síntese do que significou tudo aquilo, tenha cabido a Orlando
Lima, Catedrático de Clínica Obstétrica, em seu discurso como paraninfo à segunda turma de médicos, em janeiro de 1926:
...um grupo de Periodeutas plantou no solo fecundo do Pará a semente do
ensino médico. E ella medrou, cresceu, desenvolveu-se, transformandose no arbusto e depois na arvore adulta que agora começa a dar seus
nutrientes e saborosos fructos. Ao sopro da descrença ella curvou seu
caule longo, mas não se quebrou. Luctou e venceu (PARÁ-MÉDICO,
ago. 1927, p. 426).
Naquela manhã o ensino médico na Amazônia dava seus primeiros passos concretos, ainda que claudicantes.
A Instalação - Era preciso começar
41
NOTAS
1
42
“Ás melhores noticias com que surprehendemos o leitor todas as manhãs,
ajunta-se hoje da próxima fundação, nesta capital, de uma Faculdade de Medicina [...]” (Estado do Pará, 15.01.1919, p. 1).
2
“Os fundadores da nova Escola juntamente com o director da mesma, o respeitavel e conceituado clinico Barão de Anajás e o vice-director dr. Camillo
Salgado, gloria da cirurgia patria, estão desenvolvendo grande actividade,
afim de que no dia 2 de abril comece a funccionar o futuroso estabelecimento” (Estado do Pará, 14.02.1919, p. 1).
3
Ver capítulos “Formação do Corpo Docente” e “O Hospital Escola primaza Santa Casa no contexto da Faculdade”.
4
A mesma nota neste dia afirma que os exames seriam realizados em 23 de
março e a matrícula ocorreria até o dia 31.
5
Acta da sessão solemne de inauguração da Faculdade de Medicina do Pará, realizada no salão nobre do Gymnasio Paes de Carvalho. (FMCP, 1944, p. 67-70).
6
O jornal Folha do Norte do mesmo dia refere inicio às nove horas. No entanto, talvez o “Estado” seja uma fonte mais fidedigna, uma vez que foi o único
periódico com representação na cerimônia.
7
O jornal o “Estado” do mesmo dia refere a banda de música da Brigada
Militar.
8
“...foi, 1º de Maio de 1920 (outro erro histórico) installada officialmente a
Faculdade, em sessão solenne realisada no salão nobre do Gymnasio Paes de
Carvalho, sob o patrocinio do Dr. Lauro Sodré, então governador do Estado, e com um discurso justificativo pronunciado pelo Dr. Acylino de Leão.
Faculdade de Medicina do Pará”. In: PARÁ-MEDICO (1922). Este número
da Pará-Médico, por ser uma fonte tão antiga e de fácil acesso, acabou tendo seus erros perpetuados por muitos que pesquisaram sobre as origens da
Faculdade.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Foto 2: Edifício do
tradicional Colégio
Paes de Carvalho,
então “Gymnasio Paes
de Carvalho”
a primeira morada
da Faculdade
de Medicina em duas
salas ali cedidas.
Fonte: Álbum do Pará
[1899]. Gov. Paes
de Carvalho.
43
Foto 3: Professores
fundadores da
Faculdade de Medicina
do Pará, posam para
a primeira foto
da instituição.
Fonte: Estado do Pará,
04.05.1919.
Foto 4:
Barão de Anajás
(sentado entre
as senhoras)
em meio aos
primeiros
alunos
matriculados.
Fonte: Estado
do Pará,
04.05.1919.
Foto 5: Salas de aula
do Colégio Paes de Carvalho
no início do Século XX.
Em duas salas como estas
a Faculdade de Medicina
encontrou seu primeiro abrigo.
Fonte: REGO (2002, p. 71).
44
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
4
Doutores Haja...
A campanha para
aquisição do prédio
45
46
Detalhe do portão principal da FMCP.
Applaudi a idéa, não tendo podido dar aos fundadores dessa Escola até
hoje senão as salas do edifício do Gymnasio Paes de Carvalho onde funccionam. Desde que possa o Estado dispôr de recursos, bom será que sejam
votados auxílios que permittam dar a essa instituição melhores recursos,
quaes exigirá o ensino que nella se ministra, e que difficilmente poderão
ser obtidos de particulares, em terra em que não abundam gentes ricas
nem é grande o rol de capitalistas abastados. (PARÁ. Mensagem... 1920).
Foi assim que, em 1920, o então Governador do Estado, Lauro Sodré, sintetizaria a
contribuição do governo para a Faculdade: aplausos e duas salas de frente para rua
João Diogo, dependências que certa vez foram assim definidas:
Jazia a Faculdade no rez-do-chão de um velho sobrado, que, se tem algum valor histórico, não apresentava nenhuma comodidade para servir
ao ensino médico.
Os seus cubículos acanhados, por cujas portas e janelas espiava o sol, sem
entrar, e por onde o ar benéfico não circulava livremente, despertavam a
descrença e a troça. Quem se aproximava dos baixos do vetusto casarão,
que pretendia ser um templo de Esculápio, dizia intimamente: - daqui
fugiu a higiene (FMCP, 1945c, p. 81).
É claro, que se os fundadores do curso aguardassem as condições ideais para seu
início muito mais tempo teria demandado, porém é mais que evidente que nenhum
curso de medicina se faz em apenas duas salas acanhadas e improvisadas.
No primeiro aniversário da Faculdade, algumas melhorias já eram percebidas:
Effectivamente, no transcorrer desses doze mezes de trabalhos profícuos
e abnegados, não se póde negar o êxito da Faculdade de Medicina do Pará,
que se conseguiu firmar solidamente e em condições recomendaveis.
Convergidos todos os esforços dos nossos distinctos médicos para o importante emprehendimento, em rapido decorrer de tempo eram registados notaveis melhoramentos nelle introduzidos, principalmente o da
installação de gabinetes.
E ainda não estacará ahi a dedicação dos dirigentes do estabelecimento
que nos há de orgulhecer, tão imprescindivel elle é no extremo norte da
Republica e cujos resultados auspiciosos serão motivo de engrandecimento ao Pará (Folha do Norte, 02.05.1920).
Mas uma sede condigna ainda era um sonho.
Certamente esta foi uma das grandes preocupações de Camilo Salgado, ao assumir
a direção da Faculdade de Medicina do Pará, em 25 de março de 1922. Por mais boa
vontade que houvesse do corpo docente, e por mais nova e bem equipada que fosse a
Santa Casa, faltava um local decente para as aulas teóricas; uma sede que inspirasse
respeito e tradição, somando credibilidade a uma instituição que precisava se impor,
fator preponderante para seu reconhecimento oficial, a fim de que seus formandos
pudessem gozar dos direitos e prerrogativas concedidas pelo Governo.
Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio
47
A questão de uma sede digna para a Faculdade atinge ainda mais relevância, quando lembramos como era a Belém de então, cujos prédios públicos nada deviam ao
que havia de melhor no continente europeu.
Ideias deviam ser muitas, mas nada que saísse do papel, visto que o dinheiro era
escasso naquele período de decadência econômica. O governo realmente pouco
poderia colaborar, e mesmo o governador seguinte, Emiliano de Souza Castro, médico, professor da Faculdade, filho de seu primeiro diretor, o Barão de Anajás, encontraria uma recessão ainda maior, conseguindo contribuir com 50:000$000 (cinquenta contos de réis) para o orçamento da Faculdade somente em 1924. (PARÁ.
Mensagem... 1924).
Deste modo, para aquisição de instalações condignas para a Faculdade de Medicina do Pará restaria a Camilo Salgado recorrer aos particulares, aos “capitalistas
abastados”, que, conforme já mencionado por Lauro Sodré, seriam uma fonte difícil
para obtenção de recursos. Teria ele prestígio suficiente para contrariar as previsões de Lauro Sodré?
A resposta talvez esteja em uma notícia publicada nos principais jornais de Belém,
no dia 27 de dezembro de 1922:
48
Dr. Camillo Salgado
Uma mensagem que contem 1.045 assinaturas
O nosso presado amigo dr. Camillo Salgado teve sabbado último, uma
agradável surpresa. Um grupo de amigos e admiradores seus levou á sua
residência um abaixo-assignado, contendo 1.045 assinaturas de médicos,
engenheiros, advogados, chefes de importantes firmas de nossa praça,
funcionários públicos, artistas, operários, o povo emfim cumprimentando-o, pela solução do incidente havido na Beneficente Portugueza, solução essa respeitadora dos direitos que alli foram por elle adquiridos a
golpes de trabalho e competência.
Esse invulgar documento esta encadernado em velludo azul, com as seguintes inscripções a ouro: “Homenagem. Ao dr. Camillo Salgado- 1922”.
A primeira parte esta copiada com dactylographia, em papel “couché”, e
a segunda em original, tendo depois da assignatura da comissão que é
composta dos srs [...] (Folha do Norte, 27.12.1922).
Camilo Salgado receberia o documento com sua “habitual fidalguia”, conforme a nota,
e qualquer que tenha sido o incidente ocorrido no Hospital Beneficente Portuguesa, o
motivo se perdeu no tempo. Porém, a homenagem talvez tenha servido para mostrar ao
próprio Camilo Salgado que ele desfrutava de grande popularidade em todas as camadas
da sociedade paraense e que poderia contar com o apoio desta em outras oportunidades.
Respaldado em seu prestígio e popularidade, Camillo inicia ainda em janeiro de
1923, uma campanha de subscrição popular, visando angariar recursos para a compra de um imóvel para a instalação do curso.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Sobre este fato, assim se manifestou Estado do Pará:
Faculdade de Medicina do Pará
O predio para sua sede
Começaram a circular no dia 1º do corrente as listas da grande subscrição publica destinada a angariar os recursos necessarios á compra de um
predio para sede da Faculdade de Medicina do Pará.
Movimento esse de iniciativa do dr. Camillo Salgado, conhecido cirurgião paraense e director daquelle estabelecimento, foi elle recebido com
sympathia no seio de todas as pessoas, o que é, sem duvida, auspicioso
signal de que muito breve será uma realidade a idéa do illustre medico.
Á proporção que lhe fôrem sendo devolvidas as listas, serão publicados os
nome das pessoas que as tenham assignado (Estado do Pará, 3 de janeiro
de 1923, p. 1).
Pouco depois, em 6 de janeiro de 1923, na revista A Semana, um semanário ilustrado paraense publica a seguinte nota a favor da campanha:
O dr. Camillo Salgado esta prestando um serviço ao Pará, que pella sua grandeza é o sufficiente para intitullal-o benemérito, quando ele já não o fosse por
tudo quanto, em devotamento e philantropia, tem feito, aos impulsos do seu
grande coração em prol dos que soffrem e encontram um lenitivo consolador
na sua bondade infinita.
Referimo-nos a iniciativa que o notavel e abalisado cirurgião vem por em prática desde o dia primeiro corrente, valendo-se de seu prestígio e da popularidade do seu nome para conseguir, como conseguirá, á importância necessária a
aquisição de um prédio em que, definitivamente, funccionará a nossa Faculdade de Medicina, cujos destinos na mais acertada das escolhas, foram entregues
áquele sabio scientista paraense eminente.
Estando á frente de tão dignificante movimento um homem de valor das
imcomparaveis sympathias do dr. Salgado, pode-se calcular o enthusiasmo
com que todos o cercaram sem distinccção de classes e cores políticas, com o
fim muito applausivel de concorrer para o melhoramento de mais relevancia
na existencia florescente de um estabelecimento que honra os creditos do ensino superior, tão acatado nos grandes centros do Paiz.
O dr. Camillo Salgado quer um edifício próprio para a Faculdade de Medicina.
Não ha, afirmamol-o, quem se recuse a coadjuval-o, mesmo com um pequeno
contingente, que representa um grande concurso á realidade de uma nobre aspiração. Quando o preclaro médico não fosse o apostolo desta alevantada cruzada bastará que todos os que presam esta terra portenosa, seus filhos ou não,
se compenetrem de que qualquer amparo ao nosso principal estabelecimento
de ensino scientifico visa o engrandecimento econômico della, para garantir de
antemão que a idea triumphou. (A Semana, 06.01.1923).
Três dias depois, coincidido com o aniversário de fundação da Faculdade, é a vez do
jornal Estado do Pará publicar nota sobre o tema, assinada por “Agapito Solenne”:
A FACULDADE DE MEDICINA
É uma triste verdade: nós nos desinteressamos muito pelas nossas coisas,
boas, ou más, e o nosso pessimismo doentio completa a obra, jereminan-
Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio
49
50
do sobre as nossas pobrezas franciscanas, comparadas com as opulências
de outras gentes.
Tratemos de substituir estes oculos enfumados, que emprestam côres
tão sombrias mesmo ao que mais brilha, e tornam tão lamurienta a nossa
apreciação sobre tudo o quanto nos cerca.
Ao mesmo tempo, cumpre dar outra direcção ás nossas inclinações pessoaes, satisfazendo melhor ou mais elevadamente as necessidades de nossa intelligencia, da nossa actividade intellectual, de modo que, em vez da curiosidade fútil, que se compraz em vêr durante horas como se faz a demolição
de uma parede velha, tenhamos a curiosidade viril de conhecer coisas mais
nobres, as nossas bôas instituições e os nossos homens de mérito.
Occorrem-nos estas reflexões ao lembrarmo-nos do emprehendimento
que abnegadamente metteu os hombros o dr. Camillo Salgado, qual seja a
compra por auxilio popular, de um prédio para a Faculdade de Medicina do
Pará. Essa idéa é digna de todos os encomios e, quando em realidade, sera
de facto uma das obras de mais feliz creação e de mais fecunda utilidade.
O glorioso medico acalenta com carinho em seu coração a ambição de ser
útil á terra que lhe foi berço, á terra que representa seu lar, sua familia,
seus maiores. Sua actividade, sua intelligencia, sua força de vontade são
altruisticas como as dos grandes homens que só querem servir a patria,
e contenta-se apenas que lhe dêem a gosar este prazer intimo, esta satisfacção do dever cumprido – de ter afagado paternalmente a idéa de acquisição de um predio em que se installe a nossa Faculdade de Medicina,
e cujas tubas de fama proclamem o nome do Pará.
E os homens assim não são muitos.
Os tempos são de frio positivismo, de coisas praticas da vida, de estreitos
egoismos e mesquinhas invejas. Por isso mesmo, o emprehendimento do
dr. Camilo Salgado merece o maior applauso a maior solicitude e o maior
esforço em pról de sua realização.
O povo paraense, os filhos dos outros Estados aqui domiciliados, os estrangeiros que mourejam sob o pavilhão da paz e da amizade, que não
deixem de subscrever as listas, para esse fim, concorrendo, no mínimo
COM 10 TOSTÕES, pois só assim poderemos entoar hosanas á idéa do
grande e humanitário medico paraense.
Todos os que se interessam pelo progresso e pela prosperidade das coisas
medicas no Pará não devem perder de vistas o empreendimento em questão. Dignifiquemos os nossos creditos scientificos. Amemos a prosperidade desta terra. Não deixemos de transformar em realidade esta idéa,
robustecendo a chamma da esperança de exito completo. A victoria dessa
idéa é a victoria do Pará.
Trabalhemos por adquirir um predio proprio para nossa Faculdade de
Medicina com installações confortáveis e completas. Com isto só lucrarão os moços estudiosos, com isso só ganhará o estudo medico entre nós,
e só assim podemos aspirar um logar digno e uma collocação honrosa
entre os povos que estudam e produzem. Emquanto ha bons terrenos
plantam-se arvores fructiferas.
Prestemos, pois, mão forte ao dr. Camillo Salgado, facultando-lhe os
meios que lhe são necessarios para se tornar em um facto o seu altuistico
e acariciado emprehendimento. Ajudemol-o a dotar a nossa cidade de
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
predio que accommode convenientemente a nossa Faculdade de Medicina e corresponda ao nosso adeantamento intellectual.
O Pará, que dia a dia, vae disputando a golpes de estudos scientificos o
logar que lhe compete entre os primeiros Estados do Brasil precisava, ha
muito desse melhoramento, cuja realização agora se inicia no meio dos
applausos de todos os habitantes desta capital.
E o dr. Camillo Salgado – que temos fé em Deus – que possue a disciplina
da vontade e esta habituado aos sucessos e á gloria gosará o supremo
prazer de vér tornar-se em confortante realidade o seu emprehendimento, que alias tem despertado a admiração e o applauso unanime apesar
destes tempos de derrocada financeira.
Afaguemos e antevejamos a victoria de grande e excelso medico paraense, a quem o chronista já se habituou a venerar, a amar e a querer com
toda sinceridade d’alma (Estado do Pará, 09.01.1923, p. 2).
A imprensa definitivamente abraçara a causa e outra nota, mais uma vez em A Semana, de autoria de J. Eusthaquio de Azevedo viria pouco depois:
Obra Meritória
As ideas generosas e altruísticas são recebidas sempre com applauso pelas multidões. E o nome de seus auctores fica fundamente inmortalisado senão no bronze das estátuas commemorativas, ao menos nos fastos
históricos da terra que lhes foi berço e no coração agradecido de seus
compatriotas.
O dr. Camillo Salgado pertence ao número desses heróes, desses phalangiarios, benemeritos da humanidade; seu nome, já agora, nunca mais será
esquecido por nós, filhos deste grande Estado nortista que viu nascer
Gurjão e Gama Malcher, e que teve a gloria de assistir, pesaroso e magoado, os últimos alentos de Carlos Gomes.
A posteridade é já delle; póde, por isso bolsar dos labios a phrase altiloqua do poeta lusíada, sem que vá nesse gesto nenhum exaggero ou
laivo de vaidade: elle a conquistou pelos seus meritos e actos radiosos
de philantrophia; pelos seus rasgos de generosidade e altruísmo; pelos
serviços inestimaveis que tem prestado, como homem da sciencia á alta
sociedade paraense, ao proletariado, á pobreza envergonhada, á grande
massa anonyma que se estorna nos pardieiros sem lume e nas mansardas
sem pão.
Agora quer mais metteu-se-lhe em cabeça doptar o Pará com um grande
melhoramento: a construção de um amplo e confortável edifício, prédio
próprio onde funccione a nossa Faculdade de Medicina, viveiro que vae
ser de nossos futuros médicos.
Quem, no Pará, resistirá ao appello?
Desde o salão nobre do abastado, ao quarto pobre do operário, a mão da
beneficencia vae despejando com satisfação, da cornocupia de suas graças, no monte edificante o quinhão relativo, para que a idea de Camillo
Salgado seja uma realidade dignificadora.
E sel-a-á muito em breve.
Ella caminha firme com o impeto das avalanches polares; nada faz recuar ou deter, nem a maledicencia dos invidos, nem o grasnar dos corvos
Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio
51
incidiosos e impotentes: avança com rapidez e está prestes a alcançar o
marco postremo.
Cojita-se já nos alicerces do prédio; antes, talvez do fim deste anno elle
avulte soberbo e majestoso, numa de nossas principaes praças, como demonstração positiva do gráu de cultura a que attigimos, do nosso progresso da nossa comprehensão cívica.
Acham-se ao lado do benemérito scientista, collaborando nesta obra meritória, os bem intencionados, os que amam verdadeiramente esta terra,
sem exaggeros chauvinistas, e desejam vê-la na vanguarda da civilisação
e do progresso.
A Camillo Salgado vão nestas linhas os nossos applausos pela empreza
a que metteu hombros, com a perseverança dos que sabem vencer, e as
nossas sinceras homenagens pelo muito que nos merece como laureado
medico, eminente cirurgião, distincto amigo e bemfeitor de todos aquelles
quê, em boa hora, o procuram (A Semana, n. 250, 03.02.1923, s.p.).
Além do estilo rebuscado, tradicional à época, fica evidente que Camilo já dispunha
de assustadora popularidade e penetração na sociedade, mais que suficientes para iniciar uma campanha de tal porte. No texto de Eustachio de Azevedo nota-se ainda o
quanto pode ter sido ambicioso o projeto inicial, prevendo não apenas a compra, mas
a construção inteira de instalações para a Faculdade de Medicina do Pará.
52
É bem verdade que o único texto conhecido que menciona angariar fundos para
edificação de um prédio próprio para a Faculdade é o de J. Eusthaquio de Azevedo,
podendo tratar-se apenas de uma interpretação equivocada da finalidade da campanha deflagrada por Camillo, coisa comum nos jornais de então.
Se realmente houve a ideia de construção de uma sede, esta deve ter sido logo posta
de lado, tendo em vista que seria bem menos onerosa a compra de uma edificação
já finalizada, ainda mais levando-se em conta a situação financeira pela qual atravessava o Pará daqueles idos.
A escolha do prédio ideal parece óbvia, quando levamos em conta o fator localização. E a melhor edificação próxima à Santa Casa era o prédio do Sexto Grupo
Escolar, que naqueles anos já se chamava Grupo Escolar Wenceslau Braz, situado
no Largo de Santa Luzia e dirigido pelo professor normalista Joaquim Amanajás
de Carvalho (Estado do Pará, 13.05.1923, p. 2).
Embora sem precisar a data, pode-se afirmar que aquele prédio, conhecido na época
como Palacete Santa Luzia, remonta ao século XIX, uma vez que este grupo escolar
foi criado pelo Governador Augusto Montenegro por meio do Decreto nº 1029, de
08 de junho de 1901, e instalado ali no dia 17 do mesmo mês (FEITOSA, 1987, s.p).
O prédio é descrito no processo de Tombamento pelo IPHAN como de “arquitetura eclética, dois pavimentos com platibanda ornada com balaustres”. No primeiro
pavimento as janelas tinham guarda-corpo entalhado em ferro trabalhado e, no
segundo pavimento, guarda-corpo sacado em ferro1.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Curiosamente como podemos ver pelo trecho do relatório de seu Diretor Joaquim
Amanajás de Carvalho, encaminhado ao Diretor Geral da Instrução Pública Primária do Estado, professor João Paulo de Albuquerque Maranhão, em 15 de julho
de 1919, o prédio era considerado um desastre dentro de sua função:
O edifício em que funciona este grupo escolar está em completa desarmonia com as leis pedagógicas a que deve obedecer a instalação dos grupos escolares. Edificado em lugar baixo, sujeito à inundação embora temporária,
na estação chuvosa, tem ainda o inconveniente de se achar nas vizinhanças
de um hospital e de uma praça onde funciona uma feira bastante concorrida, sendo ainda cortada por bondes elétricos que constituem um perigo
às crianças que freqüentam o grupo. Com relação aos compartimentos em
que funciona a escola tudo deixa a desejar. Nem um deles tem as dimensões
exigidas pela pedagogia, nem iluminação e cubagem de ar necessárias à
conservação da saúde dos alunos (FEITOSA, 1987).
Alguns dos motivos que fizeram com que o governo do Estado perdesse interesse no prédio, tais como a proximidade do Hospital da Santa Casa e a facilidade
de acesso pelos bondes, criticados no relatório, certamente devem ter contribuído
para sua escolha como sede da Faculdade.
Um dos fundadores da Faculdade, Lauro Magalhães, pioneiro na urologia no Pará,
então ocupando cargo de diretor da mesma, definiria assim a importância da “ideia
genial e luminosa” de Camilo Salgado de localizá-la em frente à Santa Casa:
A vizinhança à Santa Casa veio completar e facilitar o ensino médico
teórico-adquirido nas suas modestas salas, com a arte médica aurida nas
centenas de doentes que o hospital lhe oferecia, fornecendo aos seus alunos elementos inestimáveis, e preciosos de observação experiência e prática, que muito concorreram para o sucesso rápido que eles têm obtido
no exercício da profissão, não só na clínica civil, como nos concursos nas
competições, e nas várias repartições e comissões nacionais e extrangeiras, das quais a Faculdade tem recebido as mais elogiosas referencias e os
mais honrosos agradecimentos (FMCP, 1943b, p. 31-32).
A busca por recursos teve então início com várias listas distribuídas pelos professores, alunos, autoridades e outras pessoas interessadas em colaborar com a campanha para a arrecadação. A sociedade, sensibilizada pelo apelo de Camilo Salgado
responderia de pronto, com as doações não tardando, oriundas não apenas da capital e do interior, mas também de outros estados.
A Folha Norte noticiava com frequencia sobre o assunto, reproduzindo ainda o
resultado das doações. Tanto que já na edição de 7 de janeiro de 1923, sob o título
Faculdade de Medicina, dizia o seguinte:
Estão sendo bem acolhidas pelo publico as listas de donativos para a acquisição de um prédio destinado á Faculdade de Medicina.
Damos abaixo o resultado de algumas listas:
Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio
53
Lista n. 22, a cargo do dr. Camillo Salgado: Januário Nunes de Moraes, 500$.
Lista n. 21, a cargo do dr. Camillo Salgado: José Leal Martins e Carlos
Mello de Araújo, pelo Banco Commercial do Pará, 300$.
[...]
Total das listas fechadas: 1:130$
Conclui a notícia com a seguinte nota:
O dr. Camillo Salgado, como professor de clinica cirurgica da Faculdade de
Medicina, abriu mão de dois mezes de ordenado para a compra do predio.
Também os drs. Prisco dos Santos, Otto Santos e Ferreira Bastos tiveram o mesmo gesto, doando um mez dos seus vencimentos, como lentes
do mesmo estabelecimento2.
Essas quantias figurarão em lista especial.
No auge da campanha, Folha do Norte de 21 de janeiro de 1923 publica em primeira
página, extenso artigo do padre Florêncio Dubois, articulista renomado na imprensa da época, denominado Doutores haja..., que tece grandes elogios à empreitada de Camilo Salgado:
54
Todo homem tem uma idéa que o persegue, Archimedes, obsesso por um
problema de physica, desabalou no famoso “eureka”. O doutor Camillo
Salgado resfolegará somente depois de ver enthronisado a Faculdade de
Medicina em predio proprio, no largo de Santa Luzia. Voejam listas. Movimentam-se os poderes públicos. Acodem municípios do interior. A empreitada marcha de victorias em victorias, porque não é facil resistir a um
pedido de Camillo Salgado, cujo nome é o melhor padrinho da interpresa.
A medicina é uma fidalga que não se contenta com aposentos emprestados.
Precisa de amplidão para seus laboratórios, arsenaes cirúrgicos, bibliothecas, colleccções, salas e amphitheatros. Bem sei que a Faculdade do Pará
dispensaria, provisoriamente tantos luxos, mas ha um minimum de conforto que não pode renunciar, e que lhe era negado no local antigo.
Com a sua alacridade do costume, a falar aqui, a cavar alli, a supplicar, o
doutor Camillo Salgado encellou a cruzada, de olhos fitos sobre o palacete, onde os futuros esculapios terão uma sede que nada fique a dever
as demais faculdades. Cumpre-nos pois, vulgarizar a campanha que visa
dotar o Pará de uma instituição relevante.
Ninguém acalenta sonhos megalomaniacos. O diretor da Faculdade não
mira adquirir um edifício que envergonhe os congeneres da Bahia e do
Rio. Falta aqui um Carnegie ou Rockfeller opulentador de gremios scientificos. É claro que só um casarão como o Gentil Bittencourt ou o Lauro
Sodré hospedaria todas as dependencias de uma universidade, com o seu
babelismo de aulas. Os estudos medico-cirurgicos são de uma complexidade que requer para innumeras especialidades repartições as dúzias.
Modesto será o principio.
O predio de S. Luzia prestar-se-á facilmente ao ensino theorico, ficando
a Santa Casa para o clinico. O Necrotério, que já presenciou algumas
autopsias, servirá as dissecções. As salas de operações e curativos familiarizarão o alumno no mistér de enfermeiro e de cirurgião. A Maternidade
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
offerecerá um bom campo de estudos especiaes. Melhor sitio não encontrá a Faculdade de Medicina.
Occorreria montar sem tardança uma sala de chimica e outra de physica.
Com seus contos de réis o dr. Camillo Salgado espera comprar o essencial.
Peço vênia para apontar-lhe os gabinetes da Escola de Chimica commercial, realmente modelares. A maior difficuldade esta em se achar um microscopio optimo para exames bacteriológicos, mas a verba há de surgir.
A Faculdade limitar-se-á, por emquanto ao indispensável. Mais tarde zelará ao sabor das possibilidades as installações de radiologia, electrotherapia,
analyse medical, ophtalmologia, collecções anatômicas, etc. Roma não se
fez num dia. Não crearam nome do pé para a mão as escolas do Rio e da
Bahia. De mais a mais, é crêr que os consultorios particulares se abrirão
aos alumnos, para inicial-os nos segredos da instrumentação moderna.
Outrora um cirurgião precisava apenas de um paciente e de uma faca,
para abrir uma fistula ou cortar uma perna. A miagoa dos ferros operatorios era largamente supprida pela copia dos berros que o paciente soltava
deante do barbeiro impassível. Hoje quem se afoita a mobiliar uma Faculdade, deve ser ribeirinho do Pactolo, navegar em rios de ouro. A arte de
curar é um sorvedouro de recursos. Se uns vinte contos são necessarios á
montagem de uma clinica particular, orcem a despesa de uma Faculdade
que, por si só, deve enfeixar todos os apetrecchos dos especialistas!
Ha quem não se alegre com a criação paraense de médicos. Para certos, multiplicar esculapios, não significa favorecer a saude publica. Taes
críticos diriam como Isaías: “multiplicasti gentem, sed non magficasti
lactiam”. Senhor, aumentaste o numero dos homens, mas não as alegrias.
Deixemos de lado pilherias de almanack. Quanto mais numerosos os
médicos, melhor. O publico escolherá mais facilmente entre os bons. O
abarrotamento prejudicará talvez aos doutores, mas não aos enfermos. A
verdade é que a Faculdade de Medicina de Belém poderá coadjuvar, cedo
ou tarde os amazonenses, na lucta contra as endemias deste valle, com
licença dos maçons.
Não esqueçam, aliás, uma ressalva importantíssima. Se, como diz o matuto,
a Faculdade bater com o rabo na cerca, o espolio reverterá automaticamente á Misericordia Paraense. Em caso de fracasso, as offertas não mofarão
no bucho de um cofre bancário, ou no ventre mysterioso de uma secretaria,
longe das vistas do publico subscripor. Os donativos serão incorporados
ao patrimonio do Hospital, a bem da humanidade padecente. É impossível
offerecer maiores e melhores garantias de seriedade, aos cidadãos escrupulosos que receiam sempre pela sorte final do seu dinheiro.
Objectam que Belém não é um meio intellectual, e que se temos bons
medicos faltam lentes de medicina. O soldado se forma num ambiente
militar e o sabio numa atmosphera scientifica. Sem côres a defender, ou
tradições a sustentar, ou rivaes a sobrepujar, ou professores a honrar,
o alumno fica amollentado. Estamos num empório commercial alheio a
estudos superiores.
Arrozados reterquiveis! As tradições academicas serão vantajosamente
substituídas pelo esforço do corpo discente. A sciencia dos mestres acertará com a techinica professoral que os lentes do Sul adquiriram paulatinamente. Innegavel dizeis, a influencia do meio sobre os espíritos: não
Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio
55
56
menos innegavel vos afirmo a acção dos homens sobre o meio. A falta de
um passado academico proporcionará os rapazes o ensejo de prefaciarem
com formosas paginas os annaes da Faculdade.
Para tudo ha remédio, menos para morte.
A Providencia que dá a roupa conforme o frio, proverá também o espirito
estudantino os moços da Faculdade. De resto, Rio e Bahia não receberam
logo uma Universidade ao nascedouro, como brinde que lhes depositaram perto do berço. Belém poderá egualmente crear foros acadêmicos.
- Sim, sim! Mas aquillo tudo é luxo,insiste um casmurro!
Não balburdiemos o assumpto! Luxo é gastar dez dias para aportar numa
Faculdade de Medicina. Luxo é viver longe da família, em cidades onde
tudo está por preços de arrancar cabello e couro. Luxo é estudar na terra
da mulata velha e sob os céus de Sebastianopolis o que ensinariam no
Pará. A fundação da Escola Medica obedece a intuitos de poupança e não
de esbanjamento. Nos tempos idos, com uma pequena mesada um estudante se ageitava na região do vatapá, mas hoje com o encarecimento das
batatas, só um filho de Cresus se agüenta em cidades longínquas.
Penso que o Pará deve se tornar uma Salamanca extremo-nortista. Nos
paizes de comunicações rápidas multiplicam-se os fócos de cultura. Existem vinte e mais Faculdades de Medicina em França, entre officiaes e
catholicos. Neste vastíssimo Brasil conviria escalonar cinco ou seis Universidades ao longo da costa, dos pampas ao Amapá. O ultimo reducto
da sciencia brasileira estaria em Belém, onde florescem escolas de direito,
agronomia, pharmacia, chimica, odontologia. Estamos no albor da jornada
universitaria: os lindos arrebóes ora visiveis prenunciam um sol glorioso.
O dr. Camillo Salgado desconhecerá desfallecimentos. Sabe que contra
Hercules no berço rastejaram duas cobras mandadas a estrangularem o
neonato mas que morreram suffocadas por elle. Serpejam objecções insidiosas contra a Faculdade no nascedouro, mas esta tem vitalidade para
dar cabo dos malevolos, mormente se for amparada pelo povo paraense.
(Folha do Norte, 21.01.1923).
Além de “sacramentar” a campanha, é possível perceber, principalmente nos últimos
parágrafos, que o padre Dubois buscava “exorcizar” as eventuais críticas ao projeto.
Superando o ceticismo de alguns, os jornais seguiriam publicando as listas com
cada vez mais doadores e valores variando desde quantias quase simbólicas até
pequenas fortunas.
Em meio ao mar de nomes encontram-se médicos, farmacêuticos, advogados, padres, freiras, políticos, militares, não raro famílias inteiras, sem falar de algumas
instituições como o Banco Commercial do Pará (Folha do Norte, 07.01.1923), o
Banco do Pará, Pará Eletric, Booth & Co3 General Rubber e Co. of Brasil4; de casas
comerciais como: Mercearia Oriental, Casa Conde, Paiva Ribeiro e Cia5, Ferreira
Gomes e Cia, Santiago e Cia, La Roque Pinho e Co6, Saunders e Co7; de farmácias
como a Farmácia Brasil, Farmácia Comercial, Farmácia Normal8 e César Santos9;
de industrias como a Fábrica de Cervejas Paraense10, Companhia Brahma e Charu-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
tos Suerdvitch11, de agremiações como Assembléia Paraense12, Nacional Foot-ball
Club13, e praças da Primeira, Terceira Companhia, estado-menor do 26 B.C14 (atual
segundo B.I.S), de hospitais como a “Casa de Saúde Marítima15” e de prefeituras
como dos municípios de Cachoeira16, Marabá, Acará17, Baião, Irituia18, Altamira,
Mazagão e Belém19. O governo do Estado não ficou de fora, auxiliando com 5 contos de réis “...a patriotica iniciativa daquelle eminente cirugião”20.
Curiosamente em algumas listas, nota-se que os doadores preferiam, talvez por
modéstia, preservar suas identidades, assinando como “um anônimo21”, “um órfão”,
“um a favor da ideia22”, “um patriota”, “um paraense23”, “um católico24”, “em honra
do dr. Salgado25”, “um amigo particular26” ou “um amigo da instrução27”, ou, por
vezes, pondo somente as iniciais.
A grande subscrição popular, como a imprensa designava na época28, extrapolou o
estado do Pará, chegando à capital federal, quando o então deputado Eurico Valle
doou cem mil réis e solicitou a Camilo Salgado uma lista para angariar fundos
no Rio de Janeiro29, recebendo também 300$000 de Geminiano de Lyra Castro30,
médico paraense, na ocasião radicado no Rio e deputado federal pelo Pará, e que
posteriormente viria a ser ministro no governo Washington Luis.
A campanha seguiria vitoriosa, sendo acompanhada pela população por meio da divulgação entusiasmada dos jornais, permitindo que os doadores fizessem também
sua promoção pessoal, conforme nota publicada em 6 de maio de 1923:
Faculdade de Medicina
A idéa do illustre dr. Camillo Salgado, director da Faculdade de Medicina
do Pará, de installar um importante estabelecimento de ensino scientifico
num predio proprio e convenientemente adaptado, tem encontrado o mais
eloquente apoio, podendo-se considerar vitorioso tão patriótica iniciativa.
O eminente cirurgião recebeu do sr. Joaquim Torres, residente em Natal,
a importancia de duzentos mil réis, como offerta áquelle fim.
O offertante é muito conhecido no nosso meio, onde foi proprietario da
pharmacia Baptista Campos, e actualmente é deputado estadual no Rio
Grande do Norte (Estado do Pará, 06.05.1923, p. 2).
Como era de se esperar, no sábado 2 de junho de 1923, apenas seis meses após o início
da campanha, Folha do Norte, noticiava em primeira página, com direito à fotografia,
coisa pouco comum então, que a Faculdade já tinha sua sede própria, adquirida do Sr.
Adolph Kolb (FMCP, 1923a) pelo valor de 25 contos de réis (SANTOS, 1979, p. 8).
A Nova Séde da Faculdade de Medicina do Pará
A poderosa boa vontade do nosso illustre amigo e operador dr. Camillo
Salgado acaba de receber a mais solene confirmação de sua pertinancia:
- é uma realidade tangível a nova séde, o edificio proprio em que vae
funccionar a Faculdade de Medicina do Pará. Eis afinal consummado o
grande sonho daquelle esforçado clínico.
Effectivamente, talvez nenhum outro dos nossos mais conceituados faDoutores Haja... A campanha para aquisição do prédio
57
cultativos tivesse conseguido esse milagre: levantar entre amigos o numerario preciso para adquirir o predio em que vinha funccionando o
grupo escolar “Wenceslau Braz” o primeiro predio em blócos construido
nesta capital.
E tão poderosa e suggestiva é a força de vontade do dr. Camillo Salgado,
tão communicativo o seu altruismo que, metendo hombros á empresa,
que se mostrava incerta e mesmo fallivel, logrou alcançar a meta dos seus
desejos (Folha do Norte, 02.06.1923, p. 1).
O jornal O Estado do Pará do mesmo dia também daria grande destaque ao fato,
acrescentado detalhes importantes:
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FACULDADE DE MEDICINA DO PARÁ
O seu novo predio
Em notas do tabellião José Joaquim Pereira de Araújo, foi assignada hontem a escriptura de compra do confortavel e espaçoso predio á praça
Santa Luzia, para a Faculdade de Medicina do Pará.
Passo agigantado em favor da futurosa escola medica, só mesmo tendo a
frente um homem da envergadura moral e scientifica do dr. Camillo Salgado, poderia ser levado a termo como foi, porque o illustre operador, o
distincto mestre empenhou todo o seu esforço, influencia em nosso meio
social, numa palavra, entregou-se de alma á consecução desse desiderato,
e venceu a toda sorte de óbices, dentre os quaes a nossa endemica indifferença por coisas assim grandiosas!
A Faculdade de Medicina do Pará tem, agora, sua séde propria, adaptada
a seus nobres e humanitarios fins, bem ao lado dos sanatorios da Santa
Casa de Misericordia, os mais poderosos subsidios ao estudo perfeito da
sciencia medica.
Teve o illustre professor Camillo Salgado a suprema dita, além do mais,
de associar ao seu emprehendimento elementos varios, que todos, cada
qual por seu lado, e dentro da sua sphera de acção, concorreram para tão
elevado fim hoje uma grande realidade.
É assim que o governo do Estado, dispensando o onus da transmissão de
propriedade, o intendente municipal, dispensando laudemio e tributos de
domínio e foros, muito ajudaram o emprehendimento, não sendo justo
esquecer a bôa vontade e o esforço do tenente-coronel Jones Hesketh
que, na sua dupla função de solicitador e de despachante, tudo promoveu
para que a acquisição fosse imediatamente legalizada, além da gratuidade
de seus serviços profissionais.
Tem felizmente, o Pará, a sua Faculdade de Medicina localizada em um predio confortavel e promettendo fructos os mais sazonados em bem da humanidade e do futuro que se nos desenha ainda cheio de sombras,mas ha de ser,
porque tem de ser, de progresso e de luz (Estado do Pará, 02.06.1923, p. 1).
No dia seguinte, em artigo denominado A nova séde da Faculdade de Medicina do
Pará, Camilo assim se expressaria:
Ha tres dias que a Faculdade de Medicina do Pará possue o seu predio
proprio, que receberá installações condignas e definitivas, para servir de
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
galhardo attestado do quanto avança o ensino superior da nossa terra,
cujos creditos, mau grado as vicissitudes que preponderam no extremo
norte do Paiz, mantemos em condições proeminentes.
No decorrer do anno proximo findo, ao receber do preclaro Barão de
Anajaz a direção do nosso principal instituto scientifico, fil-o não animado pelo relevo que do meu obscuro nome viesse emprestar o desempenho
do cargo, mas desejoso de aprestar as minhas energias ao lado de companheiros desvelados, que são os illustrados e dignos professores da nossa
Faculdade de Medicina, em prol de uma obra vultuosa e de desmedido
alcance para a grandeza economica do Pará.
Enthusiata de principio, quando ainda no alvorecer do estabelecimento
hoje sob minha direção, sempre acreditei que esforços multiplicados haviam de se conjugar para tornar em brilhante realidade a iniciativa de
espíritos infatigaveis que se propuzeram, sob os fagueiros auspícios de
uns e o motejo derruidor de outros a dotar o Pará de uma Faculdade de
Medicina, estimulados pelo exemplo de Estados de menos importancia,
que lá haviam dado esse passo de progredimento.
Foi por isso que, sem excusas, apenas para levar o meu contingente de trabalho ao emprehendimento de marcha tão promissora, aceitei o encargo
ora sob as minhas responsabilidades. Effectivando providencias irretardaveis, que se impunham no momento, logo me preocupou uma necessidade de vulto: o melhor apparelhamento de nossa Faculdade, em edificio
proprio e convenientemente adaptado. E, aos impulsos desse anhelo, no
primeiro dia do corrente anno, lancei uma subscripção popular destinada
a receber de todos os interessados pela prosperidade do Pará qualquer
que fosse a contribuição a um fim dos mais enobrecedores. Distribuiramse as listas respectivas, em numero de 250, e dentro em pouco eu via,
infinitamente alegre, que o meu appêllo não fôra improficuo, tantos eram
os amigos que se apressavam em trazer o seu auxilio. Convencido assim
de que me seria facil alcançar o exito almejado, e no conhecimento de
que o proprietario do palacete Santa Luzia, em que funcionava o grupo
escolar Wenceslau Braz, exatamente na melhor approximação da Santa
Casa de Misericordia, desejava vendel-o, procurei-o e ajustamos o seu
traspasse á Faculdade de Medicina. Assumi o compromisso de pagar a
importancia combinada em prazos certos, e tive a fortuna de saldar essa
obrigação á proporção que as listas me eram devolvidas com sommas
animadoras, muitas dellas avultadas, conforme os resultados que venho
inserindo na imprensa diaria. Ha alguns dias, graças a Deus e aos amigos,
effectuei o pagamento da derradeira prestação, e, porque assim o fizesse,
lavrou-se a escriptura do predio em allusão, que passou ao patrimonio da
nossa Faculdade de Medicina.
Radiante por esse effeito compensador, que representava muito patriotismo da parte dos que me coadjuvaram, tomo a liberdade de scientificar
áquelles a quem mereço qualquer consideração, os quaes têm as listas da
subscrição em seu poder, que a minha tarefa não findou. O predio da Faculdade de Medicina foi adquirido, é certo, mas para que elle passe pelas
remodelações imprescindiveis, que pretendo realizar quanto mais breve
possível, reclamo o concurso dos que ainda não me o deram, e assim conto reunir a importancia precisa deante dos resultados das mesmas listas
Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio
59
por devolver. Faço, nesse sentido, um appêllo a cada uma dessas pessoas,
nas quaes tanto confio, e que, servindo a mim, particularmente, servem,
antes de tudo, ao Pará, que ha de se impor na Federação pelo que vale.
Só após a devolução de todas as listas, completando o meu tentame, prestarei minuciosas contas ao publico31.
Obedecendo ao apelo, as doações prosseguiriam ainda por boa parte do segundo semestre, permitindo que com o dinheiro arrecadado pudessem ser realizadas
reformas e adaptações no prédio, além de auxiliar na compra de material e equipamentos para os laboratórios. O Palacete Santa Luzia continuaria alugado para
governo até o final de 1923.
Um fato curioso é que, por ironia do destino, a tão decantada crise econômica por que
passava o Estado, devido à queda nos preços da borracha, contribuiu para a compra
do prédio que abrigaria a Faculdade. É o próprio Camillo Salgado quem revela isso
no seu relatório apresentado à Congregação, ao final dos trabalhos letivos de 1923:
60
...amparado por um banco da praça, fechei negocio com o proprietario do
palacete da praça Santa Luzia, adquirindo-o para a Faculdade. [...] Ella
será nossa, em pouco tempo, soffrendo remodelações e concertos, por
menos de cem contos de reis, quando o seu valor é de mais de duzentos.
Em Belém as casas ficaram desvalorizadas e os seus alugueis chegaram
ao mínimo. É o resultado da crise que atravessamos, graças á qual devemos a bellissima compra realizada (FMCP, 1923c, p. 13).
Este dado sobre o valor dos imóveis, após a queda dos preços da borracha, também
é assinalado por Bárbara Weinstein em A borracha na Amazônia: expansão e decadência (1850-1920)32.
Desta forma, em primeiro de abril de 1924, as aulas passam a ser ministradas no
casarão do largo de Santa Luzia33, hoje praça Camilo Salgado. Em dezembro daquele ano formavam-se os primeiros médicos pela Faculdade de Medicina do Pará,
já com seus diplomas válidos em todo o território nacional. A cerimônia de colação
e grau ocorreria somente em abril de 1925, após as defesas de tese.
Mas fica uma dúvida: como o prédio adquiriu condições para abrigar o curso de
medicina? Quais as modificações executadas por Camilo Salgado?
Segundo Lauro de Magalhães, “O velho prédio colonial passou por uma reforma
integral de adaptação às suas finalidades, sendo seus quartos e cubiculos transformados em salas de aulas e laboratórios, de acordo com as necessidades mais urgentes e imperiosas” (MAGALHÃES, 28.10.1948).
De acordo com Ernesto Leitão,
Este prédio após sua aquisição foi adaptado proporcionando condições
de modo a permitir instalações de laboratórios e anfiteatros para o estudo da Anatomia Descritiva, História Natural e Química Biológica, além
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
de aparelhagem mínima necessária ao estudo da Histologia (LEITÃO,
1985, v. 1, p. 29).
Entretanto, no relatório apresentado em 1926 ao Diretor do Departamento Nacional de Ensino, Juvenil da Rocha Vaz, pelo Diretor de Seção de Expediente e
Contabilidade, José Bernardino Paranhos da Silva, as modificações e adaptações
iniciais parecem ter sido insuficientes, pois seu documento descreve uma Faculdade
que funcionava em condições insatisfatórias em um prédio “velho e acanhado”, sem
laboratórios suficientes para o ensino prático. Os gabinetes de química, física e história natural eram deficientes contando apenas com quatro ou cinco microscópios.
O relatório frisava ainda que somente as aulas de Clínica Médica ministradas pelo
professor Acylino de Leão Rodrigues, era o que se apresentava de melhor, por funcionar no Hospital da Santa Casa da Misericórdia, considerado por Paranhos um
dos melhores hospitais do norte do país, sem contar com Hospital do Centenário
do Recife (FIOCRUZ, 2006).
Assim começou a trajetória do curso de Medicina em sua localização ao lado da
Santa Casa, em um prédio que, embora bastante descaracterizado em sua construção
original, foi tombado pelo Patrimônio Histórico, por meio do Processo de Tombamento nº 0997/97, publicado no Diário Oficial do Estado, em 12 de fevereiro de
1999. Posteriormente, com a inclusão da sede do Conselho Regional de Medicina, no
quarteirão adiante, passaria a constituir, juntamente com a Santa Casa, um complexo
arquitetônico de grande valor histórico para a medicina paraense.
NOTAS
1
Documento do processo de tombamento do prédio Faculdade de Medicina.
Exemplo que seria seguido por vários outros professores da Faculdade,
como Amanajás Filho, conforme notícias seguintes. (N.A).
3
Estado do Pará, 17 de janeiro de 1923, p. 2.
4
Folha do Norte, 7 de fevereiro de 1923.
5
Folha do Norte, 18 de janeiro de 1923.
6
Estado do Pará, 10 de fevereiro de 1923, p. 3.
7
Estado do Pará, 21 de março de 1923, p. 3.
8
Estado do Pará, 27 de abril de 1923, p. 2.
9
Estado do Pará, 29 de junho de 1923, p. 2.
10
Estado do Pará, 17 de janeiro de 1923, p. 2.
11
Estado do Pará, 22 de junho de 1923, p. 2.
12
Folha do Norte, 7 de fevereiro de 1923.
13
Folha do Norte, 7 de fevereiro de 1923.
14
Folha do Norte, 20 de fevereiro de 1923.
15
Estado do Pará, 12 de junho de 1923.
16
Folha do Norte, 1 de abril de 1923.
2
Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio
61
17
Folha do Norte, 6 de Junho de 1923.
Estado do Pará, 28 de março de 1923, p. 2.
19
Estado do Pará, 10 de abril de 1923, p. 2.
20
Estado do Pará, 16 de maio de 1923, p. 1.
21
Folha do Norte, 18 de maio de 1923.
22
Folha do Norte, 17 de abril de 1923.
23
Folha do Norte, 24 de maio de 1923.
24
Estado do Pará, 22 de fevereiro de 1923, p. 2.
25
Estado do Pará, 11 de março de 1923, p. 2.
26
Estado do Pará, 4 de maio de 1923, p. 1.
27
Folha do Norte, 6 de junho de 1923.
28
Folha do Norte, 24 de março de 1923.
29
Estado do Pará, 17 de março de 1923, p. 2.
30
Segundo o jornal, a doação de Lyra Castro foi acompanhada da seguinte
carta: “Permitta que offereça essa importancia para a sua obra benemerita
da Faculdade. Digo benemerita, porque não comprehendo Faculdade de Medicina sem installações condignas. O Pará sempre fez obras uteis e dignas
do seu progresso e não deve ter uma casa de alto ensino sem os requisitos
precisos para os fins visados” (Estado do Pará, 13.05.1923, p. 2).
31
Folha do Norte, 3 de junho de 1923. Também publicado no Estado do Pará
do mesmo dia.
32
“Os imóveis urbanos, há muito considerados investimento mais seguro
pela comunidade financeira de Belém, e, assim, a forma mais confiável para
garantia de empréstimos, mostraram-se quase tão vulneráveis às pressões
da depressão quanto os seringais. Em 1913, os bens imobiliários urbanos
haviam caído em até 50%, e é de admirar que não tenham caído ainda mais,
uma vez que grande parte da população da elite de Belém estava enormemente necessitada de dinheiro e as casas da cidade esvaziavam-se às dezenas.
(WEINSTEIN, 1993, p. 265).
33
“Faculdade de Medicina do Pará, que começou a funcionar no prédio onde
está hoje instalada, à praça Santa Luzia, no dia 1º de abril de 1924.” (CRUZ
Ernesto, [19--], p. 718) Estado do Pará divulga a seguinte nota, em 1º de
abril de 1924: “Faculdade de Medicina – Começa hoje a mudança da Faculdade de Medicina para a nova séde, ao largo de Santa Luzia. Por esse motivo
não reabrirão hoje as aulas deste estabelecimento de ensino superior”.
18
62
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
63
Foto 6: Grupo Escolar Wenceslau Braz e alunos, futura sede da Faculdade.
Fonte: Postal confeccionado a partir de fotografia do álbum comemorativo do governo Augusto Montenegro.
64
Foto 7: Sede logo após sua aquisição pela Faculdade de Medicina.
Fonte: FMCP (1923).
5
A formação
do corpo docente
65
66
Detalhe da pintura de uma parede da FMCP.
Criar um curso superior no Pará, principalmente com as peculiaridades de um
curso de medicina, naquele princípio de século XX, representava um desafio sem
precedentes. Além das instalações havia material, equipamentos e, sem sombra de
dúvidas, a questão dos professores.
Uma escola não existe sem alunos, e muito menos sem seus professores. E em se
tratando de um curso de medicina, estes precisariam ser competentes como professores e – por que não? – como profissionais.
Bem apropriadamente, Octavio de Freitas, um dos fundadores da Faculdade de
Medicina do Recife, argumentando em favor de seu projeto, assim se refere em
relação ao que seria esperado do corpo docente de uma nova escola: “Não ha Faculdade constituida exclusivamente por celebridades ou por sábios. O que se exige de
todos os professores, para que a escola seja respeitada, é que êles saibam as matérias a lecionar e tenham amor e interesse pêlo ensino” (FREITAS, 1944, p. 55).
Por esse aspecto a escolha não deve ter sido das mais trabalhosas. Contando o Estado,
na ocasião, com apenas quatro cursos superiores (Direito, Farmácia, Odontologia e Veterinária), um dos questionamentos poderia ser o número restrito de profissionais habilitados e com experiência didática para atuar no novo curso, assunto inclusive abordado e contraditado no artigo do padre Dubois “Doutores haja”: “Objectam que Belem
não é um meio intellectual, e que se temos bons médicos, faltam lentes de medicina”.
No mesmo artigo, Dubois incentiva a empreitada, apontando a solução:
O soldado se forma num ambiente militar e o sábio numa atmosfera
scientifica. [...] As tradições academicas serão vantajosamente substituídas pelo esforço do corpo discente.
[...] A sciencia dos mestres acertará com a techica professoral que os
lentes do sul adquiriram paulatinamente. [...]
A falta de um passado academico proporcionará aos rapazes o ensejo
de prefaciarem com formosas paginas os annaes da Faculdade (Folha do
Norte, 23.01.1919).
A tão alegada falta de tradição na docência é perfeitamente questionável, partindo
do princípio de que o ensino em escolas tradicionais do Pará como o Ginásio Paes
de Carvalho — antigo Liceu Paraense — e a Escola Normal — hoje Instituto de
Educação do Pará — era considerado da mais alta qualidade, à semelhança da
capital federal, onde o Colégio Pedro II e o Instituto de Educação eram seus equivalentes. Por esse fato, o corpo de professores de ambos os colégios paraenses era
composto por profissionais de grande competência, dentre os quais vários médicos,
com o ingresso e a sequência da carreira do magistério regidos por concursos, que
incluíam provas e elaboração de teses, com sustentação oral perante uma banca
examinadora. Tudo isto certamente denotava o saber dos candidatos, conferindolhes, ao final, uma grande experiência para a carreira docente.
A formação do corpo docente
67
Seja por esse aspecto, seja para tentar imprimir maior credibilidade ao novo curso
de medicina, observa-se, desde as primeiras notícias sobre sua criação uma preocupação constante em citar os professores que fariam parte da nova escola. Ainda em
janeiro de 1919, Folha do Norte publicava notas sobre a futura faculdade, chamando
atenção para o corpo docente: “Para lente do estabelecimento foram convidados os
mais eminentes medicos do nosso meio, que têm acolhido com enthusiasmo a idea”
(Folha do Norte, 15.01.1919).
Outra notícia, além de citar que à frente da Faculdade estavam o Barão de Anajás,
como Diretor; Camilo Salgado, como vice, e Hermógenes Pinheiro, como secretário, fazia menção ao nome de alguns futuros professores:
Para o corpo docente da Faculdade foram convidados muitos medicos
illustres do nosso meio, entre os quaes destacamos os seguintes, que
receberam com agrado em enthusiasmo a idéa e que constituem por si
sós o melhor titulo de recomendação do novel instituto scientifico; drs.
Barão de Anajás, Camillo Salgado, Hermógenes Pinheiro, Jayme AbenAthar, Cyriaco Gurjão, Souza Castro, Dionysio Bentes, Dias Junior, Pedro Miranda, Penna de Carvalho, Fernandes Penna, Evaristo Silva, Carlos Arnobio Franco, Francisco Pondé e muitos outros (Folha do Norte,
18.01.1919).
68
A ata de instalação da Faculdade é outro documento em que é feito referência aos
professores. Reproduzida pela imprensa no jornal Estado do Pará, do dia 3 de maio
de 1919, nela se lê que entre as várias pessoas que haviam assistido a solenidade
estavam os
[...] drs. Penna de Carvalho, Caribé da Rocha, Cruz Moreira, Camillo
Salgado, Hermogenes Pinheiro, Mattos Cascaes, Otto Santos, Camillo
Salgado dos Santos, Acylino de Leão, Evaristo Silva, Jayme Rosado, Mario Chermont e Porto de Oliveira, do corpo docente da Faculdade de
Medicina [...] (Estado do Pará, 03.05.1919).
O jornal Folha do Norte, dias depois da instalação, também mencionaria os professores e suas respectivas disciplinas:
É este o corpo docente da nossa recém fundada Faculdade de Medicina:
Physica medica, dr. Mario Chermont; Chimica medica, dr. Salgado dos
Santos; Historia Natural medica e parasitologica, dr. Caribé da Rocha;
Anatomia descriptiva, dr. Hermogenes Pinheiro; Histologia, dr. Fernandes Penna; Physiologia, dr. Dionysio Bentes; Microbiologia, dr. Acatauassú Nunes; Therapeutica e arte de formular, dr. Mattos Cascaes; Pathologia geral, dr. Barão de Anajás; Anatomia e physiologia pathologicas,
dr. Oswaldo Barbosa; Anatomia medico-cirurgica e operações e apparelhos, dr. Cruz Moreira; Hygiene, dr. Carlos Franco; Medicina Legal, dr.
Francisco Pondé; Clinica medica (1ª cadeira), dr. Acylino de Leão; Clinica
medica (2ª cadeira), dr. Arthur França; Clinica medica (3ª cadeira), dr.
Souza Castro; Clinica cirúrgica (1ª cadeira), dr. Camillo Salgado; CliniMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
ca cirúrgica (2ª cadeira), dr. Penna de Carvalho; Clinica gynecologica,
dr. Silva Rosado; Clinica ophtalmologica, Dr. Pedro Miranda; Clinica
otho-rhyno-laryngologica, dr. Chaves de Freitas; Clinica pediatrica cirurgica e orthopedica, dr. C. Gurjão; Clinica infantil e pediatrica medica, dr. Otto Santos; Clinica dermatologica e syphiligrafica, dr. (Izidoro)
Azevedo Ribeiro; Clinica neurologica e psychiatrica, dr. Porto de Oliveira; Clinica obstétrica, dr. Agostinho Monteiro; Radiologia medica,
dr. Jayme Rosado (Folha do Norte, 09.04.1919).
Esta relação inicial sofreria modificações logo no início. O livro de atas de posse
dos professores, de 3 de abril de 1919, registra algumas alterações na lista acima
citada. Na cadeira de Anatomia e Fisiologia Patológicas, por exemplo, temos o
registro de posse de Jayme Aben-Athar1, no lugar de Oswaldo Barbosa, que seria
empossado numa quarta cadeira de Clínica Médica; Oscar de Carvalho aparece
no lugar de Penna de Carvalho, na 2ª cadeira de Clínica cirúrgica, que não é mencionado, embora seu nome conste como signatário da ata; Lauro de Magalhães,
numa 3ª cadeira de Clínica cirúrgica; Cyriaco Gurjão em Clinica pediátrica medica
e Higiene infantil, ao invés de Clínica pediátrica cirúrgica e ortopédica. Para esta
tomou posse Otto Santos, que constava em Clínica pediátrica médica. Na mesma
leva seria empossado Evaristo Silva na cadeira de Clínica neurológica, que aparece
assim separada de psiquiatria (FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO
PARÁ, [1950?]). Estas posses aconteceram na sala da Congregação da Faculdade,
no Ginásio Paes de Carvalho, com os professores sendo nomeados “para a regencia
das cadeiras que constituem o curso medico” (FACULDADE DE MEDICINA E
CIRURGIA DO PARÁ, [1950?]).
Examinando com mais detalhes o corpo docente inicial da Faculdade, observamos que ele, entre outras coisas, guarda estreita relação com a Sociedade MédicoCirúrgica (SMCP), entidade criada em 1914 e cujos sócios fundadores foram: os
médicos: Barão de Anajás, Camillo Salgado, Cruz Moreira, Penna de Carvalho,
Arthur França, Caribé da Rocha, Ophyr de Loyola, Agostinho Monteiro, Jayme
Aben-Athar, Francisco Pondé, Oswaldo Barbosa, Orlando Lima, Crasso Barbosa,
J.A. de Magalhães, Renato Chaves, Pedro Miranda, Porto de Oliveira, Ageleo Rodrigues, Synval Coutinho, Bernardo Ruttowitz, Humberto Mello, Veiga Cabral,
Urbano de Menezes, Fernando Penna, Mattos Cascaes, Silva Rosado, Acylino de
Leão, Amanajás Filho, Castro Valente, Emilio Sá, Raymundo Faria, Coelho de Souza, Lauro Magalhães, Mario Chermont, Aleixo Simões, Appio Medrado, (Izidoro)
Azevedo Ribeiro, Theodorico Macedo, Rodrigues de Souza, Francisco Miranda e
José Valente2 (CARVALHO, 1922, p. 226).
Observa-se, assim, que praticamente todo o corpo docente da Faculdade fazia parte
da referida agremiação científica, a qual, embora de criação recente, contava, em
sua composição com notáveis profissionais, o que lhe conferia alta credibilidade,
conquistando de pronto a simpatia e respeito do Estado e da sociedade.
A formação do corpo docente
69
A primeira diretoria da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, para o biênio 19141915, era constituída pelos seguintes membros:
Presidente: Dr. Camillo Salgado
Vice-presidente: Dr. Cruz Moreira
1º secretário: Dr. Penna de Carvalho
2º secretário: Dr. Arthur França
Orador: Dr. Acylino de Leão
Tesoureiro: Dr. Amanajás Filho (PARÁ MEDICO, 1922, p. 227-8)
Ao tempo da fundação da Faculdade de Medicina, a Diretoria da Sociedade Médico-Cirúrgica, para o biênio 1919-1920, era composta pelos médicos:
Presidente: Penna de Carvalho
Vice: J. A. Magalhães
1º secretário: Ophyr de Loyola
2º secretário: Renato Cunha
Tesoureiro: Jayme Aben-Athar
Orador: Bentes de Carvalho
Foi acrescido o cargo de bibliotecário, sendo eleito para este, Caribé da Rocha
(DIAS, 2002, p. 35).
70
Se a relação entre a Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará e a Faculdade de Medicina
do Pará era de grande proximidade, o mesmo se pode dizer quanto à Santa Casa.
Em 1916, o hospital sofreria uma grande reforma em sua organização sendo estruturado em três grandes divisões — homens (compreendendo Clínica médica, Clínica dermatológica e sifiligráfica, Clínica cirúrgica, Clínica das vias urinárias, Clínica
oftalmológica e oto-rino-laringológica), mulheres (compreendendo Clínica médica,
Clínica dermatológica e sifiligráfica, Clínica cirúrgica, Clínica ginecológica, Clínica
obstétrica, Clínica oftalmológica e oto-rino-laringológica) e crianças (compreendendo Clínica médica, Clínica cirúrgica e ortopédica) (A SANTA Casa de Misericórdia
do Pará, 1922). Nesta reorganização, o hospital criaria, também, laboratório de análises clínicas, serviço de radiologia e a figura do Diretor Clínico, eleito anualmente
pelo corpo clínico, sendo o primeiro Diretor Clínico o Dr. Cruz Moreira (A SANTA
Casa de Misericórdia do Pará, 1922), que viria a fazer parte do corpo docente da
Faculdade. Tal divisão, em muito favoreceria, posteriormente, a acolhida dos alunos
da nova escola médica.
Em 1922 compunham o corpo clínico da Santa Casa os seguintes médicos: Clínica
médica de adultos, Dr. Albino Cordeiro; Clínica médica de crianças, Dr. Ophyr de
Loyola; Clínica oftalmológica, Dr. Pedro Miranda, adjunto, Dr. Deusdedit Coelho;
Clínica oto-rino-laringológica, Dr. Lauro Sodré Filho; Clínica homeopática, Dr. Bacellar Filho; Clínica médica de homens, Drs. Augusto Eduardo Pinto e Antonio de
O´de Almeida, adjuntos, Drs. Acylino de Leão e Remigio Filgueiras; Clínica médica
de mulheres, efetivos, Drs. João Henriques e Francisco Miranda, adjunto, Dr. OswalMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
do Barbosa; Clínica cirúrgica de homens, efetivos, Drs. Appio Medrado e Penna de
Carvalho, adjuntos Drs. Amanajás Filho e Ferreira Bastos; Clínica cirúrgica de mulheres, efetivos, Drs. Carlos Ornstein e Aleixo Simões, adjuntos, Drs. Dagoberto de
Souza e Orlando Costa; Clínica ginecológica, Dr. Cruz Moreira, adjunto, Dr. Teixeira Mendes; Clínica obstétrica, efetivo, Dr. Orlando Lima, adjuntos, Drs. Ausier
Bentes, Gaston Vieira e Dagoberto Souza; Gabinete de Radiologia, efetivo Dr. Jayme
Rosado; Gabinete de Biologia, efetivo, Dr. Acatauassú Nunes Filho, adjunto Dr. Prisco dos Santos (A SANTA Casa de Misericórdia do Pará, 1922, p. 320-321). Grande
parte destes comporia o corpo docente da Faculdade de Medicina do Pará, tendo Dr.
Camillo Salgado ocupado inclusive o cargo de Diretor do Hospital em 1924, convidado que fora em virtude do falecimento do Dr. Cypriano Santos3.
Também havia professores da Faculdade que faziam parte do Corpo docente do Ginásio Paes de Carvalho, como Antonio Marçal, catedrático de Química, tendo inclusive se aposentado no cargo em 1935 (MEIRA, 1986b, p. 34) Juliano Pinheiro Lyra
Sosinho, lente de História Natural (REGO, 2002, p. 455).
Atuavam na então Escola Normal os seguintes: Francisco Pondé, catedrático de História Natural. Interinamente exerceu a disciplina de Física e Química e Noções de
História Natural; Antonio Periassu, Pedagogia, Instrução Moral e Psicologia. Interinamente exerceu a cadeira de Física e Química e Noções de História Natural;
Geminiano Coelho e Prisco dos Santos exerceram interinamente a cadeira de História Natural; Vitruvio Gonçalves Campos era lente efetivo de Higiene; Hermógenes
Pinheiro exerceu interinamente a mesma disciplina (REGO, 1972, p. 160).
Vários professores lecionaram em outros cursos superiores, como Acylino de Leão,
que também ensinou na Escola de Medicina Veterinária (MEIRA, 1986b, p. 139).
Jayme Aben-Athar, um dos fundadores do curso de Odontologia, juntamente com
Antonio Periassú, Carmelino Salgado, Pinheiro Sozinho, Camillo Salgado, Antonio
Magno e Silva, entre outros (RIBEIRO, 2005, p. 12), foi professor do referido curso, chegando à sua Direção em 1917. Teve atividade docente, também, nos cursos
de Medicina Veterinária e de Farmácia (MEIRA, 1986b, p. 152). Prisco dos Santos
lecionou Zoologia e Microbiologia no curso de Farmácia (MEIRA, 1986b, p. 270).
Também no curso de Farmácia foi professor de História Natural, Otto Santos (PARÁ
MEDICO, 1922, p. 370).
Agostinho Monteiro lecionou Física e Química na Escola Prática de Comércio do
Pará (MEIRA, 1986b, p. 253), que ainda não fosse um curso superior, era uma escola
bem recomendada.
No plano intelectual, vale destacar a presença de Acylino de Leão no grupo que reorganizou a Academia Paraense de Letras, em 1913, instituição da qual também faria
parte o Dr. Orlando Lima, ambos fundadores da Faculdade de Medicina (REVISTA
DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS, 1952).
A formação do corpo docente
71
Do Instituto Histórico e Geográfico do Pará (IHGP) fizeram parte Américo Vitruvio Gonçalves Campos, Francisco Caribé da Rocha, João Baptista Penna de Carvalho, Ophyr
Pinto de Loyola (fundadores – reinstalação em 6 de março de 1917), Antonino Emiliano
de Souza Castro, Francisco Pondé, Izidoro de Azevedo Ribeiro, Mario Midosi Chermont,
Oscar de Carvalho, todos componentes do grupo inicial da Faculdade (Revista do Instituto
Histórico e Geográfico do Pará, 1931). Na Revista do IHGP de 1968 não aparece o nome
de Camillo Salgado como membro do Instituto, constando na relação de fundadores (1917)
o nome do Dr. Higino Amanajás, que não conseguimos confirmar se era o do também professor fundador da Faculdade de Medicina (REVISTA DO IHGP, 1968, p. 9).
72
Outro aspecto que vale a pena abordar diz respeito aos professores no exercício da profissão médica. Se tomarmos como referência a revista Pará-Medico de agosto de 1917,
no Indicador Médico são citados os seguintes profissionais, com seus respectivos locais
de trabalho: Agostinho Monteiro, Alberto Conceição Silva, Almeida Pernambuco, Amanajás Filho, Antonio Acatauassú Nunes, Antonino de Souza Castro, Appio Medrado,
Arthur França, Augusto E. Pinto, Ausier Bentes, (Izidoro) Azevedo Ribeiro, Bacellar
Junior, Camillo Salgado, Cardoso de Menezes, Caribé da Rocha, Carlos Aguiar, Carlos Franco, Carlos Ornstein, Carlos Silva, Castro Valente, Cerqueira Bião, Chaves de
Freitas, Chaves de Moraes Bittencourt, Coelho de Souza, Crasso Barbosa, Cruz Moreira, Cyriaco Gurjão, Diógenes Ferreira de Lemos, Dyonisio Bentes, Emilio Sá, Evaristo
Silva, Ezequiel Antunes, Fernandes Penna, Ferreira Bastos, Francisco Pondé, Franco
Lobo, Geminiano Coelho, Humberto de Mello, Jayme Aben-Athar, Jayme Rosado, Joaquim Paulo de Souza, J. A. de Magalhães, Lauro Magalhães, Lindolpho Campos, Macedo
Rocha, Mario Chermont, Mattos Cascaes, Ophyr de Loyola, Orlando Costa, Oswaldo
Barbosa, Otto Santos, Pedro Miranda, Pedro Nunes Rodrigues, Penna de Carvalho, Porto de Oliveira, Raymundo Faria, Redomark de Albuquerque, Renato Chaves de Souza,
Silva Rosado, Veiga Cabral e Virgílio Mendonça (PARÁ-MEDICO, 1917, p. 242). É evidente que a revista não iria anunciar profissionais que não gozassem de prestígio e boa
reputação. E entre eles encontramos vários futuros professores do curso de medicina.
Também relacionado à atividade médico-profissional, no Relatório de 1918, da Sociedade Portugueza Beneficente do Pará, temos como constituintes do corpo clínico
do Hospital D. Luiz I os seguintes médicos: Camillo Salgado, Cyriaco Gurjão, Pedro Miranda, Cruz Moreira, Lauro Magalhães e José A. de Magalhães, como efetivos, e Ausier Bentes, Porto de Oliveira, Agostinho Monteiro, Penna de Carvalho,
Otto Santos, Gelmirez Gomes e Zaqueu Cordeiro, como adjuntos (SOCIEDADE
PORTUGUEZA BENEFICENTE DO PARÁ, 1919). A maioria destes seria docente da Faculdade de Medicina.
Deste modo, não se pode falar em inexperiência, profissionais desconhecidos ou
sem vivência didática com relação aos professores dos primeiros tempos da Faculdade de Medicina do Pará.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
NOTAS
1
Não assumiu a cátedra naquele dia, ver capítulo “A Fundação da Faculdade
de Medicina do Pará – O dia que tempo apagou”.
2
Registre-se que o Barão de Anajás, Camilo Salgado, Antonio Marçal e Silva
Rosado figuram entre os organizadores da primeira associação científica do
Pará, a Sociedade Médico-Farmacêutica do Pará, de 1898. (PARÁ MEDICO,
1900).
3
“Em 6 de novembro de 1923 falleceu o Dr. Cypriano José dos Santos, que
vinha exercendo com abnegação o cargo de Director do Hospital de Caridade. [...] A vista disso resolveu o Conselho convidar o nosso prestimoso
consorcio Dr. Camillo Henrique Salgado, orgulho da classe medica do Pará,
o que foi feito em officio de 24 do mesmo mez (setembro de 1924 – grifo
nosso), assumindo elle no daí seguinte o cargo de Director do Hospital de
Caridade, no desempenho do qual vem prestanto com a melhor boa vontade o melhor dos seus esforços”. (SANTA CASA DE MISERICORDIA DO
PARÁ, 1923, p. 4).
73
A formação do corpo docente
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6
O ensino
75
76
Estátua de Asclépio doada pelo professor Silva Rosado.
Após a aula inaugural realizada em 1º de maio de 1919, às 10 horas, no salão nobre
do Ginásio Paes de Carvalho, pelo professor Acylino de Leão Rodrigues, a Faculdade só começaria a funcionar efetivamente, no dia 6 de maio do mesmo ano1, uma
segunda-feira, quando o Dr. Caribé da Rocha, lente da cadeira de História Natural
e Parasitologia, iniciou seu curso, proferindo assim a primeira aula regular do curso de medicina (FMCP, Acta, 1919).
A partir desse momento as aulas tiveram seguimento, baseado em que a grande
maioria dos professores já havia sido empossada em suas respectivas cadeiras, conforme o livro de atas referente2.
Por circunstâncias óbvias, contando apenas com duas salas cedidas no Ginásio Paes
de Carvalho, as quais tiveram que ser mobiliadas, conforme atesta o ofício de agradecimento do Barão de Anajás ao prof. Paulo Maranhão, Diretor da Instrução Pública Primária do Estado, pela cessão de trinta e cinco carteiras para os alunos da
Faculdade3, o início do curso não deve ter sido dos mais agradáveis.
Os alunos após aprovação nos exames vestibulares – alguns, pois que ampla era a
lista dos dispensáveis destas4, que consistiram em provas escritas e orais de Francês,
Alemão ou Inglês, além de Física, Química e História Natural (FMCP, 1924b, p. 1213) -, assistiam suas aulas teóricas no Ginásio. As aulas práticas eram desenvolvidas
no Necrotério do Estado — prédio ainda existente na pedra do Ver-o-Peso, embora
bastante descaracterizado —, sendo utilizados, também os laboratórios de química e
farmácia do Serviço Sanitário do Estado (MOREIRA, E., 1977, p. 14), que sediava,
ainda, o curso de Farmácia, no Parque Afonso Penna com a travessa da Vigia (FIOCRUZ, 2007), além do laboratório da Santa Casa. Posteriormente, à medida que as
turmas foram entrando, e o curso avançando, seriam utilizadas as instalações do antigo Hospital dos Alienados para as práticas de Neurologia e Psiquiatria.
O currículo do curso seguia a norma legal, oficialmente estabelecido pela Reforma Maximiano, por meio do Decreto 11.530, de 5 de março de 1915 (KELNER,
1991, p. 134), sendo adotado na Faculdade do Pará o mesmo regimento da Faculdade do Rio de Janeiro, “excepto quanto a parte econômica, como determina o
Decreto n. 16.782-A” (FMRJ, 1926).
No estatuto da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, datado de 1921 são relacionadas as seguintes cadeiras:
Physica Medica; Chimica Medica; Chimica Biológica; Historia Natural
Medica com desenvolvimento de parasitologia; Anatomia descriptiva;
Physiologia; Histologia; Microbiologia; Therapeutica; Pharmacologia e
arte de formular; Pathologia geral; Anatomia e physiologia pathologicas;
Anatomia medico-cirurgica e operações; Hygiene; Medicina Legal; Clinica
Medica (1ª, 2ª, 3ª e 4ª cadeiras); Clinica cirurgica (1ª, 2ª, 3ª e 4ª); Clinica
obstétrica; Clinica gynecologica; Clinica Ophtalmologica; Clinica Oto-
O ensino
77
rhino-laryngologica; Clinica pediatrica medica e Hygiene infantil; Clinica
pediatrica cirurgica e orthopedia; Clinica dermatologica e syphiligraphica;
Clinica neurologica e Clinica psychiatrica (FMCP, 1933a, p. 4).
Já no Regimento Interno de 1924 notam-se algumas alterações nas disciplinas,
podendo-se traçar um roteiro aproximado do ensino nos primeiros anos da Faculdade de Medicina do Pará.
Seguindo sempre o modelo do Rio de Janeiro e, consequentemente, da Bahia (KELNER, S.; KELNER, M., 1991, p. 134), em 1924, no primeiro ano eram ministradas
as disciplinas:
- Física Médica
- Química Médica
- História Natural Médica (com desenvolvimento especial de parasitologia)
No segundo anos as disciplinas eram
- Anatomia descritiva (1ª parte)
- Química biológica
- Histologia normal
- Fisiologia (1ª parte)
78
Eram estudadas no terceiro ano as matérias
- Anatomia descritiva (2ª parte)
- Fisiologia (2ª parte)
- Microbiologia
- Clínica propedêutica médica e clínica propedêutica cirúrgica.
Para o quarto ano as matérias eram
- Patologia geral
- Anatomia e fisiologia patológicas
- Farmacologia e arte de formular
- Clínica dermatológica e sifiligráfica
- Clínica oftalmológica
- Clínica cirúrgica
Quinto ano
- Anatomia medico-cirurgica
- Operações e aparelhos
- Terapêutica
- Clínica Cirúrgica
- Clínica Médica
- Clínica pediátrica médica e higiene infantil
- Clínica pediátrica cirúrgica e ortopedia
- Clínica Otorrinolaringológica
No sexto ano
- Higiene
- Medicina legal
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
- Clínica Médica
- Clínica das vias geniturinárias
- Clínica obstétrica
- Clínica ginecológica
- Clínica neurológica
- Clínica psiquiátrica
- Radiologia e Fisioterapia.
(FMCP, 1924, p. 7-9).
79
Foto 8: Laboratório de Farmacologia.
Fonte: FMCP (1946b, s.p.).
Compilando os programas que conseguimos obter das disciplinas, observa-se que
tanto os referidos programas quanto a disposição das matérias pelos anos de duração do curso sofreriam modificações, com desmembramento de cadeiras, criação
de outras e deslocamento de algumas de uma série para outra, adequando-se às
mudanças necessárias e às exigências legais. Por exemplo: o programa do terceiro
ano para 1921 previa Anatomia descritiva (2ª parte), Fisiologia (2ª parte) e Microbiologia. Já para o ano de 1928, as matérias para aquela série eram Patologia geral,
Fisiologia (2ª parte), Farmacologia e Microbiologia.
O ensino
Observa-se também que no currículo inicial não existiam algumas disciplinas
como a destinada ao estudo das doenças tropicais — uma incoerência para a realidade amazônica de então e de hoje, ainda. A disciplina seria criada com o nome
de Doenças Tropicais ou Infectuosas, em 19255, sendo hoje denominada Doenças
Infecciosas e Parasitárias. A cátedra foi criada na Faculdade Nacional de Medicina
do Rio de Janeiro, sendo seu primeiro titular o médico Carlos Chagas, como reconhecimento do Governo Federal pelo notável trabalho deste cientista descobridor
da Doença de Chagas (LEWINSOHN, 2003, p. 194).
Outra coisa que chama a atenção, também, é o horário de funcionamento da Faculdade e das aulas. Conforme o citado Regimento Interno de 1924, “As horas normaes
do expediente diario decorrerão desde as 8 até ás 18 horas” (FMCP, 1924, p. 35); a
Secretaria funcionava “todos os dias, com excepção dos domingos e feriados, das 11
ás 16 horas” (FMCP, 1924, p. 27); a Biblioteca “todos os dias uteis, das 10 ás 22 horas”
(FMCP, 1924, p. 31).
Quanto às aulas, em 1935, a grade curricular era a seguinte:
1º ano: Anatomia (1ª parte), Anatomia (2ª parte) e Histologia e embriologia geral;
2º ano: Física biológica, Química biológica e Fisiologia;
80
3º ano: Microbiologia, Parasitologia, Farmacologia e Patologia geral;
4º ano: Clínica propedêutica médica, Clínica dermatológica e sifiligráfica, propedêutica cirúrgica e clínica cirúrgica, Técnica operatória e Anatomia patológica;
5º ano: Clínica urológica, Clínica cirúrgica, Clinica de doenças tropicais e infectuosas, Terapêutica clinica, Higiene, Medicina legal e Clínica médica;
6º ano: Clínica pediátrica médica e higiene infantil, Clínica obstétrica, Clínica ginecológica, Clínica psiquiátrica, Clínica oftalmológica, Clínica neurológica, Clínica
otorinolaringológica e Clínica cirúrgica infantil e ortopédica.
As aulas de Anatomia Humana (1ª parte), por exemplo, eram às terças, quintas e
sábados das 15 às 16h, seguidas pelas da 2ª parte, das 16 às 17h. Um detalhe ainda
dentro do mesmo assunto: dos 46 alunos matriculados na referida disciplina, somente 4 foram “inhabilitados por media ou frequencia” (FMCP, 1936).
Outras disciplinas também tinham aulas dias de sábado: Farmacologia, Anatomia
e Fisiologia Patológicas, Clínica Dermatológica e Sifiligráfica, Clínica urológica,
Clínica cirúrgica, Terapêutica, entre outras. Cite-se que as aulas de Psiquiatria,
no 5º ano, eram ministradas às terças, quintas e sábado, de 13h30 às 14h30! Em
resumo, das 32 disciplinas do currículo daquele ano, 15 tinham aulas dia de sábado,
coisa impensável nos dias de hoje, quando os fins de semana são tão concorridos
que geralmente começam na quinta-feira.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
No Relatório de Atividades do ano de 1949, as disciplinas eram ministradas na
seguinte ordem:
1ºano
Anatomia Humana (1ª parte)
Anatomia Humana (2ª parte)
Histologia e Embriologia Geral
2º ano
Física Biológica
Química Fisiológica
Fisiologia
Anatomia Humana (3ª parte)
3º ano
Microbiologia
Parasitologia
Farmacologia
Patologia Geral
4º ano
Clínica Propedêutica Médica
Clínica Dermatológica e Sifiligráfica
Clínica Propedêutica Cirúrgica e Clínica Cirúrgica
Técnica Operatória e Cirurgia Experimental
Anatomia e Fisiologia Patológicas
81
5º ano
Clínica Médica (1ª cadeira)
Clínica Cirúrgica
Clínica Urológica
Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas
Terapêutica Clínica
Higiene e Medicina Preventiva
Medicina Legal
6º ano
Clínica Médica (2ª cadeira)
Clínica Obstétrica
Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil
Clínica Neurológica
Clínica Psiquiátrica
Clínica Oto-rino-laringologica
Clínica Ginecológica
Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica
Clínica Oftalmológica
O ensino
Foto 9: Gabinete de Fisiologia.
Fonte: FMCP (1949b, s.p.).
82
Foto 10: Gabinete de Química Fisiológica.
Fonte: FMCP (1949b, s.p.).
Já federalizada, em 1951 a Faculdade apresentava a seguinte grade curricular:
1° ano
Anatomia
Histologia e Embriologia
2° ano
Anatomia
Fisiologia
Física Biológica
Química Fisiológica
3° ano
Farmacologia
Microbiologia
Parasitologia
Patologia geral
4° ano
Anatomia e Fisiologia Patológicas
Clínica Dermatológica e Sifiligráfica
Clínica Propedêutica Médica
Técnica Operatória e Cirurgia Experimental
83
5° ano
Clínica Cirúrgica (1ª cadeira)
Clínica Médica (1ªcadeira)
Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas
Clínica Urológica
Terapêutica Clínica
Higiene (2° período)
Medicina Legal (2° período)
6° ano
Clínica Médica (2ª cadeira)
Clínica Obstétrica
Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil
Clínica Ginecológica (1° período)
Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica (1° período)
Clínica Neurológica (1° período)
Clínica Oftalmológica (2° período)
Clínica Psiquiátrica (1° período)
Clínica Oto-rino-Laringológica (2° período)
O ensino
84
Foto 11: Laboratório de Microbiologia.
Fonte: FMCP (1946b, s.p.).
Destaque-se que uma das funções do Conselho Técnico Administrativo era avaliar
anualmente o programa aplicado naquele ano e apresentar sugestões ou modificações para o ano vindouro. Uma interessante sugestão apresentada pelo professor
Oscar Miranda, em 1939, foi a criação de uma cadeira de Tisiologia, ideia que infelizmente não recebeu apoio dos demais membros do Conselho6.
Um fato que convém ser observado é que não havia um ano dedicado ao internato
obrigatório. Só mais tarde as disciplinas foram condensadas em cinco anos para
permitir que o sexto ano fosse dedicado unicamente ao internato. Atualmente, o
currículo mínimo estabelecido pelo Ministério da Educação e Cultura prevê o internato em dois anos, condensando ainda mais as disciplinas médicas.
A ausência do internato no currículo das faculdades de medicina brasileiras é assim lembrada por Doyle Maia, da Faculdade Nacional de Medicina da Universidade do Brasil:
O internato, até então, era uma atividade facultativa e de escolha do aluno. Cada um procurava o serviço que mais lhe agradava e, se quisesse,
pleiteava o lugar de interno; a maioria aceitava faze-lo sem qualquer remuneração. O simples fato para ter autorização para freqüentar e estar
ligado a determinados serviços era motivo de orgulho e enriquecimento
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
do currículo. Havia serviços tão rigorosos que, além de não remunerarem os internos, cobravam multas por qualquer falha no cumprimento
das obrigações estabelecidas. Era comum ler-se no bloco de receituário
dos médicos, como título importante, ex-interno a serviço do professor.
Mas ninguém era obrigado a ser interno e muitos formavam-se sem nunca ter freqüentado um serviço clínico ou cirúrgico, ou faziam o correspondente ao internato em cadeiras básicas orientando, desde estudantes,
suas atividades para estas cadeiras, hoje quase totalmente ocupadas por
especialistas que não tem formação médica (MAIA, 1996, p. 175).
Fazendo um apanhado geral, chega-se à conclusão que classificar o ensino da Faculdade
naqueles dias em termos simplistas como “bom”, “regular” ou mesmo “ruim”, seria por
demais injusto. Melhor fosse, talvez uma análise individual de cada disciplina, o que,
entretanto, fugiria do objetivo deste capítulo, além de também não ser isenta de erros.
Pode-se afirmar, de forma mais concreta que o ensino, era irregular, havendo altos
e baixos de acordo com as disciplinas, mas nada que num cômputo geral comprometesse severamente a formação de um bom médico.
Para esta irregularidade na avaliação do ensino vários motivos contribuíam, dentre
os quais podemos citar, por exemplo, que as disciplinas clínicas tinham mais sorte,
já que eram desenvolvidas na Santa Casa ou em outros hospitais de apoio, de modo
que, mesmo que o professor não fosse muito bom, a quantidade de pacientes era
enorme, propiciando um bom aprendizado. E quando o catedrático era alguém
como Acylino de Leão, criava-se uma combinação perfeita.
O próprio Acylino descreveria a Santa Casa como um manancial inesgotável para
a prática clínica, já que para aquele hospital:
[...] affluem não só doentes de todo o interior do Estado do Pará, onde
não há recursos médicos, como tambem do Amazonas e Acre, do Maranhão e do Piauhy, até do Ceará.
Apesar de suas vastas proporções as enfermarias vivem completamente
cheias, utilisando-se mesmo os porões.
Disponho de trinta e seis leitos; mas meus eminentes collegas, Prof. Remigio Figueiras e dr. Augusto Pinto, me franquearam os seus serviços,
podendo eu dispor de qualquer de seus doentes e indicando-me elles proprios os casos interessantes que apparecem.
Os casos bons, didáticos, que surgem em minha clinica particular, conduzo-os com habilidade para o exame do alumno (FMCP, 1923c, p. 16).
Na contramão, as disciplinas do chamado ciclo básico, instaladas em sua maioria no
Palacete Santa Luzia, dependiam mais do talento dos professores já que a carência
de material era grande e os laboratórios muito incipientes.
O professor de anatomia José Alves Dias Junior, em 1943, refere-se às dificuldades
que encontrava para lecionar, mesmo levando em conta o recém inaugurado anfiteatro anatômico:
O ensino
85
O curso de Anatomia (2ª cadeira) não se processou, como era de se esperar das novas instalações introduzidas no anfiteatro.
Alega-se que a discontinuidade da corrente eletrica é principal motivo
de não se poder fixar dentro das cubas uma atmosfera baixa permanente,
para conservação das peças. Os cadáveres apodrecem tornando-se o ambiente incompatível com a execução de trabalhos pacientes e demorados
como os de Anatomia Humana. As últimas lições do corrente âno (preparação da bexiga, prostata, uretra, penis e testiculos) fôram feitas em
peças que somente a compreensão de deveres faria deter numerosa turma
diante de exemplares em péssimas condições de conservação. (FMCP,
1944b, p. 37).
Seguiam os anos e as dificuldades continuavam sendo relatadas pelo mesmo professor:
Acontece, porem, que, nem sempre se consegue, penetrar o anfiteatro
para se dar as aula. Cadaveres, que da rua vêm para as autopsias policiais,
aí permanecem se decompondo e exalando insuportavel fétido. Alias,
isso vem acontecendo sempre. Depois desses exames, os corpos descem
para as mêsas do anfiteatro, permanecendo geralmente abandonados, entram em franca decomposição, aguardando condução para enterramento.
Sendo o anfiteatro uma sala de aula, não é justo que o transformem em
câmara funerária ou necrotério público, onde os achados de rua podem
permanecer putrefactos o tempo que assim entendam os encarregados de
tal serviço (FMCP, 1948c, p. 66).
86
Entretanto a dedicação de Dias Junior ao ensino da Anatomia era tão extrema que
ultrapassava a sala de aula, fazendo inclusive de sua própria casa um verdadeiro
museu de mapas e peças anatômicas (SILVA, 1977, p. 190). Dias Júnior permaneceria na memória de seus alunos como um daqueles professores capazes de extrair
o máximo diante do mínimo que a Faculdade podia oferecer.
Para o aprendizado dos alunos, a situação era grave particularmente quando havia
o casamento entre as dificuldades estruturais das disciplinas básicas com a mediocridade de alguns professores. Tal situação geraria inflamados protestos, como os
do professor Amanajás Filho, manifestado em uma reunião do Conselho Técnico
Administrativo de 1932:
Com a palavra o Dr. Amanajás Filho, que principia dizendo que ia tratar
de um assunto muito importante para a vida da nossa Faculdade. Dirigindo-se ao Dr. Salgado diz que ele representa a força vital, o sustentáculo dessa obra grandiosa que é a Faculdade de Medicina. Continuando
diz que em princípio foi um descrente, mas passados anos enfileirou-se
também entre os que com dedicação trabalharam pelo alevantamento da
nossa Faculdade. Mas, sr. presidente, é essa obra grandiosa que vejo periclitar, quero referir-me a certos professores faltosos, professores que
não dão aulas e contra semelhantes fatos quero que fique gravado na ata
meu protesto. Sr. presidente, o Conselho já havia deliberado como medida de acerto a para a normalização do fato acima, o livro e frequencia, no
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
qual constava a assinatura e o ponto explicado pelo professor, podendo
o professor ter até três faltas por mês. Entretanto, isto não tem sido observado. Pessoa vinda do Rio, disse-nos que a Faculdade de Medicina do
Pará está em franco descrédito, pois os alunos que daqui vão transferidos,
quando em aulas de anos adiantados não compreendem as explicações
pela ausência de conhecimento das cadeiras dos anos inferiores e isto
porque os professores não dão aulas. É preciso, sr. presidente tomar medidas sérias, pois a continuar assim é preferível fechar a nossa Faculdade.
E o que é mais quero admirar, sr presidente. É que os professores faltosos
mal chega o dia 28 começam logo a telefonar para a tesouraria sabendo
se já há dinheiro.
Eu quero, sr presidente que a Faculdade mantenha o seu prestigio, que já
teve e que seja acatada e respeitada.
Eu não especifico os nomes dos professores faltosos, porque V. Excia.
sabe quem são. Terminando, sr. presidente, quero, repito, que fique gravado na ata o meu protesto contra semelhante fato para que mais tarde
quando se escrever a história da nossa Faculdade não se diga que ninguém ousou protestar (CTA, Ata do dia 29.12.1932).
As palavras do professor Amanajás Filho deveriam ter ficado gravadas, perenemente, em lugar destacado do palacete de Santa Luzia, como símbolo de uma época
em que havia abnegados professores, comprometidos em dar o melhor de si, para
que a jovem Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará se estabelecesse como referencial de ensino médico e viesse a ser respeitada no Brasil inteiro. E, também,
como incômoda premonição, para que os pósteros constatassem que o descompromisso de certos docentes não é privilégio de uma época.
NOTAS
1
“Cópia da acta da primeira aula professada na Faculdade de Medicina e que foi remmettida ao Instituto Histórico e Geographico do Pará, à pedido do dr. Ignacio Moura.
Aos seis dias do mez de Maio do anno de mil novecentos e dezenove, em uma
das salas de aulas da Faculdade de Medicina, pelas trez horas da tarde, iniciou o curso da cadeira de Historia Natural e Parasitologia e professor dessa
cadeira, Dr. Caribé da Rocha, com a assistência dos alumnos matriculados,
professores, alumnos da Escola de Odontologia e diversas outras pessoas. E,
por ter sido a primeira aula do curso d’esta Faculdade, lavrou-se este termo,
que vae assignado pelo respectivo professor e alumnos presentes.
Faculdade de Medicina, 6 de Maio de 1919.
Assinados: Dr. Caribé da Rocha, José Theophilo Ferreira, Salvador Desiré Pannain, Justino da Silva Barroso, Angelino Rodrigues de Lima, Pio de
Andrade Ramos, Aristoteles de Mattos Fernandez, Manoel Ismael de Castro, Emilio Martins Lopez, Antônio Siqueira Mendes, Manoel Tertuliano
de Cerqueira, Aluizio Cláudio Cardoso, Matheus Lydio Pereira de Sousa,
Raymundo de Campos Proença, Antônio Simões Pereira, Anna Elizabeth
Hammond, Francisco da Silva Nunes, Olga Maia Paes de Andrade, Rodrigo Augusto Penna e Costa, Américo Dantas Ribeiro, Carlos Hygino da Silva, João Peregrino da Rocha F. Júnior, Eugenia Ferreira de Paiva Hollanda,
O ensino
87
Thereza Ferreira de Paiva Hollanda, Gabriella Ferreira de Paiva Hollanda,
Izauro Gonçalves da Costa, Gileno Pedrosa, Edith Olympia da Silva Castro, Manoel Barbosa Rodrigues, Avelino Augusto de Miranda, Raymundo de
Pinho Magalhães, Lucilo Fender, Manoel Dias Maia, Eurico Barroso, José
Martins Sant’Anna, Antônio Magno e Silva, Pedro Jorge de Carvalho, João
Angyone Costa, Altino Mendes de Novôa, Raymundo da Silva Magno, Bianor Martins Penalber, Raymundo Alves Godinho Filho, Luiz Antônio Paula
Feio, Sebastião Bayma, Jorge Franco de Almeida, Antônio Chaves Martins,
Luiz Martins e Silva, João José Teixeira Marques, José Maria César Corrêa
Nunes, Estrella Zagury Benayon, Hypolito Carelli, José de Carvalho Lima,
Leopoldo Penna Teixeira.” Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Sua
instalação (FMCP 1944b, p. 75-76).
2
Ver capítulo “Professores, cátedras e docências”.
3
“Em 14 de maio de 1920
Exmo. Snr. Professor Paulo Maranhão
Em meu nome e pela Faculdade de Medicina, que tenho a honra de dirigir,
apresento a V. Ex. sinceros agradecimentos pela generosa offerta que acabaes de fazer a mesma faculdade de 33 carteiras que se acham, 5 na escola da
Penitenciaria e 28 no grupo escolar “José Verissimo”.
Aproveito-me da opportunidade para apresentar a V. Ex. os protestos de
elevada estima e distinta considerações.
88
Saude e Fraternidade
Barão de Anajáz”
Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará - Livro de ofícios 1919 - ***
4
“Dessas provas de exame, estão dispensados, por deliberação da congregação, somente no corrente anno, os bachareis em direito, engenheiros, pharmaceuticos, dentistas, diplomados pelas Escolas do Brasil ou que tenham
seus títulos scientificos por ellas reconhecidos, e bem assim os professores
normalistas e mais aqueles ainda que hajam completado o seu curso de humanidades em quaesquer estabelecimentos de ensino superior do Estado ou
a elles equiparados” (Folha do Norte, 11.03.1919).
5
“Em cumprimento da resolução da Congregação desta Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, de 4 de maio do corrente anno, foi transferido o
Doutor Oswaldo Ferreira Barbosa, professor cathedratico de clinica medica
(primeira cadeira) para exercer identico cargo na cadeira de Medicina Tropical criada pelo decreto 16.782ª, de 13 de Janeiro de 1925. Faculdade de
Medicina e Cirurgia do Pará, 6 de Maio de 1925”. (FMCP, [1950]).
6
“Depois de examinado o caso, os senhores conselheiros negam apoio à criação da cadeira, não só porque não existe nas faculdades do Brasil, como
também porque os artigos 24 e 25 do Regimento interno cogitam da organização e realização do curso especializado em tisiologia”. (CTA. Ata do
dia 25.02.1939). Vale lembrar que esta não foi a primeira vez que se tentou
criar uma disciplina aplicada à realidade epidemiológica do Pará. Há registro
que em nove de agosto de 1928, Orlando Lima, catedrático de obstetrícia
em conferência apresentada na Academia Nacional de Medicina no Rio de
Janeiro propôs ao prof. Miguel Couto presidente daquela academia, que este
intercedesse junto ao Conselho Nacional de Ensino pela criação da cadeira
de Leprologia na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (BORDALO,
2000, p. 83).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
89
Foto 12: Laboratório de Química.
Fonte: FMCP (1936b, s.p.).
90
7
O Hospital Escola
Primaz: A Santa Casa
no contexto da Faculdade
91
92
Monograma da Santa Casa de Misericórdia do Pará em detalhe na fachada da mesma.
Nenhum curso de medicina, por melhores professores que tenha, pode ser puramente teórico. Parafraseando Sir William Osler, um médico que não domine a teoria seria como um navegante que vai ao mar sem uma bússola; porém aquele que
sustente uma formação unicamente teórica é como um navegante que nunca foi ao
mar. O “mar” que Osler menciona nada mais é do que a prática hospitalar.
Dito isto, em 1921, quando a primeira turma da Faculdade de Medicina do Pará chegou ao terceiro ano, defrontando-se com disciplinas como Clínica Propedêutica Médica
e Clínica Propedêutica Cirúrgica (FMCP, 1933a), que exigiam um contato direto com
pacientes, fazia-se indispensável colocar aqueles estudantes dentro de um hospital.
Levando em conta critérios que até hoje definem um bom hospital escola, quais
sejam: tamanho, bons equipamentos, variabilidade de casos, corpo clínico competente e experiente dentro de diferentes especialidades, a escolha da Santa Casa de
Misericórdia parece mais que evidente.
Ao contrário da jovem Faculdade, a Santa Casa de Misericórdia do Pará já era uma
instituição consolidada, de tradição e reconhecimento, naqueles idos de 1919. Teria
sido fundada em 24 de fevereiro de 1650, localizando-se em um prédio de taipa e pilão
na rua Santo Antônio dos Capuchos com o Largo da Misericórdia, hoje Praça Barão
do Guajará. Posteriormente, em 1807, transferiu-se para o Largo da Sé, atual Praça
Frei Caetano Brandão, para o hospital “Senhor Bom Jesus dos Pobres”, inaugurado
em 1787 pelo então bispo do Pará que hoje empresta seu nome à praça1.
Em 15 de agosto de 1900, aniversário da adesão do Pará à independência, a Santa
Casa ganharia novas e modernas instalações em ato solene presidido pelo Governador José Paes de Carvalho, estando presentes o Intendente Senador Antônio
José Lemos, o Bispo Diocesano D. Castilho Brandão, membros do Conselho Administrativo, e outras autoridades. Era oficialmente inaugurado o novo Hospital
de Caridade, na rua Oliveira Belo, bairro do Umarizal, sendo o orador oficial do
evento o médico Geminiano de Lyra Castro2.
O hospital projetado pelo engenheiro Odorico Nina Ribeiro até hoje impressiona
pela grandiosidade, fruto do apogeu econômico que a cidade vivia no fim do século
XIX e início do século XX. Era constituído de diversos pavilhões, um salão nobre
imponente e um bloco cirúrgico de formato oval, com a sala de operações “Senador
Antônio Lemos”, revestida por enormes azulejos de opalina, sendo considerada
uma das mais modernas do país, então3.
Ao assumir pela primeira vez a direção da Faculdade, em 7 de março de 1921, ainda
que interinamente por motivo de viagem do Barão de Anajás, Camilo Salgado buscou logo aproximação com aquela instituição que vivia um período esplêndido. Em
carta enviada em 20 de abril daquele ano, ao senador e médico Cypriano Santos,
professor honorário da Faculdade4 e então provedor da Santa Casa, solicita:
O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade
93
Estándo já funccionado as aulas d’esta Faculdade, e havendo necessidade
de frequencia hospitalar aos alumnos do terceiro anno, nas salas da clinica bem como no laboratorio da microbiologia, solicito a V. Exa. a necessaria autorisacção para que possam os mesmos estudantes freqüentar
o Hospital da Santa Casa com o fim de ouvirem as licções dos senhores
professores e faserem suas observações. Reitero os meus protestos de
alta estima e consideração.
Saudações.
(FCMP, 1921)
Dois dias depois Cypriano Santos assim responderia:
94
Em resposta ao officio que vos dignitastes a dirigir-me, tenho a declararvos não ser possivel, em consequencia de se achar licenceado o Dr. Director do Laboratorio de Biologia do Hospital de Caridade, os alumnos da
faculdade assistirem os trabalhos daquella secção, presentemente a cargo
de uma das irmãs de SantAnna. O medico nomeado para substiuil-o não
acceitou, por isto quando estiver funccionando o referido Laboratorio
com a responsabilidade de outro facultativo e nomeado interinamente
por esta directoria v.exc.será disso avisado para providenciar, como deseja, a fim de que os alumnos ali compareçam sempre por turmas.
Quanto a frequencia dos ditos academicos ás diferentes clinicas não há
nisso inconveniente, uma vez que se trate de doentes indigentes, e que os
alumnos venham acompanhados dos respectivos professores, egualmente
por turmas que não sejam numerosas e havendo entendimento com os
medicos chefes das referidas clinicas.
Julgando respondido, assim, o vosso officio, reitero a v. exc., os protestos
de minha estima e muito apreço.
Saude e Fraternidade.
(FCMP, 1921)
Foto 13: Prédio
onde ficava o
salão nobre da
Santa Casa,
situado de frente
para rua Oliveira
Belo, posteriormente demolido
dando lugar a
edificação de
linhas modernas.
Fonte: Faculdade
de Medicina e
Cirurgia do Pará
(1945c, s.p.).
Apesar da aparente má vontade de alguns em receber os acadêmicos, nasceria ali
o tradicional binômio Faculdade de Medicina e Santa Casa, que se consolidaria
com a transferência da Escola para o Largo de Santa Luzia, em 1924. O começo foi
modesto sendo prevista à Faculdade a responsabilidade por apenas vinte leitos (Estado do Pará, 08.03.1922); depois ela assumiria as enfermarias São Pedro (FCMP,
1933a) e São Roque (Folha do Norte, 11.08.1923). E logo o entendimento entre os
professores e os chefes de clínica ficaria bem mais fácil do que Cyprano Santos
poderia imaginar, já que em pouco tempo todas as chefias das enfermarias seriam
ocupadas por médicos professores da Faculdade (FMCP, 1936c).
O professor de Clínica Obstétrica (2ª cadeira) Argemiro Orlando Pereira Lima,
assim descreveria o ensino que ocorria nas enfermarias:
Parecia-me a mim que, disponho de um serviço de obstetricia ao qual eu
dedicava com ardor o meu carinho, não poderia sem desaire trancal-o á
frequencia de alumnos que desejassem aprender, antes o mais comesinho
principio de humanidade forçava-me abrir-lhe as portas, de par em par,
escancarando-as para quantos quisessm gozar dos sublimes ensinamentos da nobre arte de ser mãe. [...] se de um lado havia a vontade energica de aprender, do outro existia o desejo vehemente de transmitir o
ensinamento util, unico proveitoso, unico necessário, sem phantasia, nem
embromação (PARÁ-MÉDICO, 1926).
95
Foto 14: Enfermaria
de Clínica Obstétrica.
Maternidade da Santa
Casa. Professor
Dr. Orlando Lima
(no centro) ladeado
por alunos.
Fonte: FMCP
(1936c, s.p.).
O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade
Camilo Salgado também recordaria a rotina daqueles dias, a larga prática que os
alunos encontravam nas enfermarias, relatando ainda um caso interessante:
96
Contenta-me affirmar que os nossos estudantes estão affeiçoados ao trabalho sem grandes vacilações, tanto que sem temer desastre, permitti,
com a minha assistência fizessem, pequenas operações, como suturas em
ferimentos incisos, debridamentos de pequenos abscessos, panarícios,
mesmo phymoses e hydroceles.
Cada alumno dispõe hoje de seis leitos, sendo responsaveis pelos curativos
e, em se tratando de ocorrencias de maior importancia, apresentam-me por
scripto, a successão de factos, com as conclusões adequadas.
Nossa estatística registra um grande número de hérnias estranguladas, enterorrhaphias, resecções e auto-enxertias osseas, nephropexia (1), nephrotomianephropexia, por calculos (3), nephrotomia com drenagem por pionefrose (2),
ureterotomia por calculo (2), cystostomias, uretrotomias, hydroceles, extracções de projectis de arma de fogo, alguns na cavidade abdominal, um caso de
operação de Kondoleon, etc. A titulo de contribuição ao estudo dos antisepticos
em feridas infeccionadas, usamos do chloreto de sódio em pequenos envoltórios de gase, esterelizados, em uma ferida por arma de fogo, na perna esquerda
de um homem vindo da E. F. de Bragança, victima, havia 3 dias, de uma carga
de chumbo grosso, que lhe esphacelou, os tecidos molles, produzindo fractura
complexa, dos ossos, principalmente, do peroneo, cujos fragmentos se destacavam. Admiravel foi o resultado, notando-se apenas consolidação viciosa dos
segmentos tibiaes adherentes ao periósteo do peroneo. Quando a cicatrização
era completa a ponto de permitir marcha, propusemos a auto-enxertia ossea
para que dessa forma fosse o tratamento digno de nossa clinica. Com decepção
geral, no dia marcado para a intervenção, o doente retirou-se do hospital e nem
ao menos nos disse adeus (FMCP, 1923c, p. 19).
Acylino de Leão, catedrático de Propedêutica médica, confirma o quanto o campo
era fértil para prática dos alunos:
...ensinei a propedeutica pratica, mostrando como se pesquisam, no leito
do doente, os symptomas e signaes, e como se reúnem para a deducção diagnostica. Fil-os repetir, um por um, as manobras, de maneira a
se exercitarem as mãos como os sentidos nesta pratica apparentemente
fácil de palpar, percutir, auscultar. Não descurei o uso de apparelhos e,
nos dias convenientes, aplicaram-se no manejo do phonendoscopio, do
esphygmografo, do esphygmomanometro, do cardiographo, etc.
[...]
...não escolho somente os casos ditos interessantes, pela sua raridade,
mas mostrei os casos corriqueiros da clinica diaria, insistindo particularmente sobre a pathologia regional.
Para pratica de clinica medica, o Hospital de Caridade é um manancial
inesgotável.
[...]
...nomeei internos seis alumnos do 4º anno [...] elles diagnosticam, receitam, praticam injecções endovenosas, thoracenteses, paracenteses, injecções rachidianas, tudo sob minha fiscalização e direção. Habituo-os assim a
se guiarem por si mesmo na pratica clinica (FMCP, 1923c, p. 15).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Desta forma, durante décadas as enfermarias daquele hospital, bem como seus
laboratórios, maternidade e o pavilhão da infância “Bartholomeu Menezes”, serviriam de palco para o aprendizado de gerações inteiras de estudantes, cedendo não
apenas pacientes, mas também cadáveres adequados para o estudo da anatomia.
Como naqueles primeiros anos a Faculdade ainda não dispunha de uma sede com
anfiteatro, os cadáveres dos indigentes provenientes da Santa Casa eram levados
para o necrotério do estado, edificação localizada no Ver-o-Peso e ainda hoje existente, palco das primeiras sessões anatômicas, conforme expediente de 1º de junho
de 1921 do professor de Anatomia Descritiva e secretário da Faculdade, Dr. Hermógenes Pinheiro, à Sra. Superiora do Hospital da Caridade:
Havendo necessidade de um novo cadaver para o estudo Anatômico dos alumnos d’ esta Faculdade e de accordo com a recommendação do Exmo. Senador Doutor Cypriano Santos, peço a V. Exa. de remeter para o necrotério do
Estado um cadáver de doente que não tenha soffrido ferimentos penetrantes
ou fratura de craneo, ferimentos que não tenham destruido vasos.
Reitero protesto de alta estima e consideração (FMCP, 1921).
97
Foto 15: Necrotério
onde foram realizados
os primeiros estudos
anatômicos da Faculdade
de Medicina e Cirurgia
do Pará. Edificação ainda
existente ainda que
bastante modificada.
Fonte: Álbum de Belém Pará (1902, s,p.).
O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade
Além de tudo isso a parceria com a Santa Casa agregaria ainda mais credibilidade
à recém-criada escola médica, reduzindo um pouco a desconfiança que uma parcela
da população tinha do ousado projeto, facilitando também o processo de equiparação da Faculdade às instituições congêneres do país, o que ocorreria em 1924. Provavelmente, se Belém não possuísse um hospital daquele porte, o ensino médico do
Pará teria ficado ainda muitos anos limitado ao plano das ideias.
Em relatório apresentado em 1926 ao Diretor do Departamento Nacional de Ensino, Juvenil da Rocha Vaz, sobre os institutos de ensino do Norte da República, feito
pelo Diretor de Seção de Expediente e Contabilidade, José Bernardino Paranhos da
Silva, a Faculdade seria definida como uma instituição que funcionava em precárias
condições, instalada em um prédio “velho e acanhado”, sem laboratórios suficientes
para o ensino experimental, contando apenas com gabinetes deficientes de Química,
Física e História Natural, além de quatro ou cinco microscópios. Apenas o ensino de
clínicas médicas, ministrado pelo professor Acylino de Leão Rodrigues, seria apontado como o único que se apresentava em condições mais adequadas, exatamente por
funcionar na Santa Casa, que para o autor do relatório era um dos melhores do norte
do Brasil, fora o Hospital Centenário do Recife (FIOCRUZ, 2008)5.
98
Para uma pessoa vinda de fora, como foi o caso de J. B. Paranhos da Silva, desconhecendo as credenciais e o sacrifício do corpo docente local, e sem poder imaginar
o esforço que aquele casarão “velho e acanhado” custara para a população paraense,
as instalações da Santa Casa de Misericórdia eram o único fator que impunha respeito à Faculdade de Medicina do Pará.
Logicamente a parceria entre as instituições também beneficiava o hospital, que podia contar com os acadêmicos como mão de obra qualificada e gratuita. Além do mais,
de acordo com o primeiro estatuto da Faculdade, ainda assinado pelo Barão de Anajás, “no caso de dissolução ou extincção da Faculdade, o fundo ou patrimonio, então
existente será entregue á Santa Casa de Misericordia d’esta capital” (FMCP, 1921).
Mais do que tudo isso, chegou a ser firmado um contrato que previa que a Faculdade pagaria para a Santa Casa um conto de réis por mês pelo uso de suas dependências (FMCP, 1934). Este item, entre outros, fez parte da proposta enviada à
Santa Casa em 1933 com intuito de “regularizar as relações entre o Hospital e a
Faculdade” (CTA, 1933) e que previa o seguinte:
1º - que as aulas das diversas clínicas no curso médico continuem a funcionar nas enfermarias desse hospital, sob a regência dos respectivos
professores e a frequencia, apenas, dos alunos do 4º, 5º e 6º anos;
2º - que sejam cedidas a esta faculdade as salas situadas nos fundos das
enfermarias Santo Antonio e São Pedro, a primeira para clinica de moléstias infectuosas e tropicais e a segunda para clinica de moléstias das
vias urinarias;
3º - a instalação de dois ambulatórios para esta faculdade, nesse hospital,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
dirigidos pelos professores de clinica otorrinolaringológica e dermatologia e sifiligrafia, funcionando duas vezes por semana, para curativos,
pequenas intervenções e receituários (sem o aviamento de receitas);
4º - a permissão por esta faculdade de utilizar do Laboratório de Biologia desse hospital, para serviços de histologia normal e patológica e
anatomia patológica, que juntamente com os serviços de anatomia desse
estabelecimento e as instalações médico-legais do Estado, passam a constituir o Instituto Anatômico Biológico, recentemente criado por esta Faculdade a exemplo da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, serviços
estes que em nada prejudicam os interesses dessa casa de caridade visto
não acarretarem aumento de despesas.
Como retribuição aos favores supra mencionados, esta Faculdade se compromete a concorrer com a subvenção de doze contos de réis anuais
(12:000$000);
A manter os serviços das clinicas durante o período de férias escolares e,
quando as suas finanças o permitirem, terminar a construção e instalação
do Necrotério Modelo dessa casa de saúde (CTA, 1933).
Bem verdade que na prática muita coisa do acordo jamais saiu do papel. Um dos
provedores da Santa Casa, Antônio Faciola chegou a cobrar sete meses de atraso
da Faculdade, em 3 de outubro de 1934 (FMCP, 1934).
Esta inadimplência não era de se estranhar diante da situação financeira em que a
escola médica vivia6.
Camilo Salgado responderia a Faciola que:
...esta Faculdade lucta actualmente com enormes dificuldades, resultado do
não recebimento da subvenção federal e atrazo das mensalidades os alumnos, motivos estes que me forçam a não poder attender o pedido de V. S.
Considerando também que este Instituto relevantes serviços vem prestando ao norte do Paiz, pagando reduzidos vencimentos ao seu professorado, dando 19 vagas gratuitas, não acarretando despesas a Santa Casa o
ensino ministrado nas suas enfermarias e sendo quase todos os professores medicos do Hospital, onde prestam relevantes serviços, é de justiça
que a Santa Casa auxilie este estabelecimento de ensino superior que é
realmente um padrão de glória para nós (FMCP, 1934).
Diante de tal justificativa, o provedor se manifestaria quase que pedindo desculpas
pela cobrança, desejando que em breve a Faculdade estivesse em condições de arcar
com seus compromissos (FMCP, 1934).
Na década de 1930, a “Misericórdia Paraense” já estava mais do que consagrada
como hospital-escola da já conhecida como Faculdade de Medicina e Cirurgia do
Pará. E fazia anúncios de seus serviços para particulares, os ditos “pensionistas”
em revistas especializadas, ressaltando:
Optimas acomodações para pensionistas de 1ª, 2ª, e 3ª classes.
Apartamentos de luxo para homens e senhoras
O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade
99
Maternidade inteiramente isolada do Hospital
Instalações completas (as melhores do Norte do Brasil)
Para exames radiologicos, eletrocardiograficos e analyses clinicas
Moderna aparelhagem para os serviços fisio-terapicos
Ondas curtas e ultra curtas, diatermia, bisturi elétrico, raios ultra-violetas e infra-vermelhos (PARÁ-MÉDICO, dez. 1939).
100
Foto 16: Enfermaria São Paulo. Clínica Cirúrgica de Homens. Professor Dr. Prisco
dos Santos (sentado) ladeado por alunos.
Fonte: FMCP (1936c, s.p.).
A questão dos “pensionistas” acabaria por criar um ambiente que anteciparia o
conceito de “dedicação exclusiva” dos docentes, algo que é tido hoje como um dos
elementos definidores de uma boa escola médica, visto que os professores poderiam ministrar suas aulas, realizar suas consultas nas respectivas enfermarias de
caridade, e mais tarde atender a clientela particular alojada nos apartamentos destinados exclusivamente aos pensionistas.
O corpo clínico da Santa Casa era outro grande destaque, sendo formado sempre por profissionais competentes e de projeção na sociedade. Sua constituição em
1938 era a seguinte:
Clínica Médica de Homens – Enfermaria Santo Antônio – chefes de clínica, Acylino de Leão e Artur França; adjuntos David Gabbay, Rosário
Conte e Lucival Lobato.
Clínica Médica de Homens – Enfermaria São Marcos – chefes de clínica,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Luis Araújo e Olympio da Silveira; adjuntos, Aluízio da Fonseca, Benedito Klautau, Pedro Borges e Armando Pingarilho.
Clínica Dermatologia – chefe de clínica, Ferreira Bastos.
Clínica Cirúrgica de Homens – Enfermaria São Paulo - chefes de clínica,
Prisco dos Santos e Appio Medrado; Adjuntos, Emygdio Pedreira, Marcos Pinto, Hermínio Pessoa e Oswaldo Medrado.
Clínica Cirúrgica de Homens – Enfermaria São José - chefes de clínica,
Bianor Penalber e Castro Valente; adjuntos, Alderico Costa, Sousa Aranha e Paiva Menezes.
Clínica Médica de Mulheres – Enfermaria Santa Isabel - chefes de clínica, Rodrigues de Sousa e João Henriques; adjuntos, Oscar Miranda,
Cândido Pereira e Anísio Maroja.
Clínica Cirúrgica de Mulheres – Enfermaria Santa Ludovina – chefe de
clínica, Ausier Bentes; adjuntos, Luis Corrêa, Paulo Bentes de Carvalho.
Clínica Ginecológica – Enfermaria Santa Maria D’ Assunção – chefe de
clínica, Cruz Moreira, adjuntos, Adriano Guimarães e Jacyntho Moreira.
Clínica Obstétrica – Enfermaria Sant’Anna – chefe de clínica, Orlando
Lima; adjuntos, Carlos Silva e José Chaves.
Clínica Obstétrica – Enfermaria São Raimundo e Santa Terezinha – Feliciano Mendonça e Albino Figueiredo.
Clínica Pediátrica – Enfermaria Santa Ignez – chefe de clínica, Froylan
Barata; adjuntos, Joaquim Magalhães, Ferdinando Santos, Lucidéa Lobato e Valle Paiva.
Clínica Pediátrica – Enfermaria São Luiz Gonzaga – chefe de clínica, Dagoberto de Souza; adjuntos, Hylário Gurjão, A. Pinto da Costa, Alberto
Moraes.
Clínica de Otorrinolaringologia – Enfermaria São Sebastião – chefe de
clínica, Lauro Sodré Filho; adjunto, Lobato de Abreu.
Clínica Oftalmológica – Enfermaria São Sebastião – chefe de clínica, Ferreira de Lemos; adjuntos, Deusdedit Coelho e Linhares de Paiva.
Clínica Radiológica – Gelmirez Gomes.
Gabinete de Fisioterapia – José de Sousa Macedo.
Laboratório de Biologia – Acatauassú Filho e Jayme Aben-Athar; adjunto, Honorato Neves.
Ambulatório – Medicina, Honorato Filgueiras; Cirurgia e Ginecologia,
Gastão Vieira; adjunto, Reis de Carvalho.
Clínica Sifiligráfica – Enfermaria São José – chefe de clínica, Sousa Castro; adjunto, Ruy Pondé.
Clínica Urológica – Enfermaria São Roque – chefe de clínica, Lauro Magalhães, adjunto; Aristides Rodrigues.
Clínica Médico-cirurgica dos Militares – Enfermaria São Vicente – chefe de clínica Raymundo Ferro e Silva; adjunto, Olavo Leôncio (PARÁMÉDICO, 1938, p. 30).
Em função de seu competente corpo clínico e de suas instalações modernas, que
contavam com equipamentos como raio-x e laboratórios bem equipados, a Santa
Casa tornar-se-ia uma referência não somente no Pará, mas também para estados
como Amazonas, Acre, Maranhão, Piauí e até no Ceará, de onde viria a receber
pacientes.
O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade
101
102
Foto 17: Enfermaria São João. Clínica de Doenças Tropicais. Professor Dr. Antonino Emiliano
de Souza Castro (no centro de óculos e de bigode) ladeado por alunos.
Fonte: FMCP (1936, s.p.)
Contudo, como toda instituição de caridade, dependendo principalmente de doações
para sobreviver, o “Hospital de Misericórdia” começaria a ficar pequeno para a sua
crescente demanda. Padre Dubois, tradicional articulista de Folha do Norte, em artigo
de 1936, intitulado “Obras da Misericórdia” (Folha do Norte, 17.06.1936, p. 1) traçaria
um panorama da Santa Casa naqueles dias. Mencionaria uma campanha para angariar
fundos para reforma e construção de novos Pavilhões encabeçada pelo então senador
Abelardo Condurú e pelo professor contratado de Terapêutica Clínica, Dr. Luis Araújo.
Citaria também que a Santa Casa possuía muitos críticos que apontavam para falta de
espaço e presteza no atendimento dos doentes, para a existência de porões abafados, e
viam aquele hospital como a antecâmara do necrotério. Mas, em sua opinião, o grande
defeito da Santa Casa era o excesso de boa vontade, que a impedia de regular a entrada
de pacientes. Construída para abrigar quatrocentos doentes ela acolhia oitocentos.
Os planos de arrecadação previam não somente ampliação, mas também remodelação de áreas antigas, ação que já havia começado pelos porões e pela sala “Antônio
Lemos”, que, antes do início da campanha, estava com o teto podre, cheia de goteiras e com iluminação deficiente. “As janelas carcomidas davam uma idéa de casa
abandonada” (Folha do Norte, 17.06.1936, p. 1).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Dubois refere ainda que as despesas daquele hospital, em 1934, foram de 1.383
contos, enquanto a receita real chegara a 1.230. Naquele mesmo ano, foram acolhidos 7.774 pacientes, entre 1.507 pensionistas e 6.267 indigentes. O artigo concluía
dizendo que “visivelmente a Santa Casa não pode emprehender melhoramentos
sem a caridade particular” (Folha do Norte, 17.06.1936, p. 1).
Em fevereiro de 1946, reportagem publicada na “Revista do Acadêmico de Medicina”, seção “Nossa Revista nos Hospitais”, faz um Raio-x da Santa Casa daqueles
anos, quando esta era alvo de uma série de transformações, “adaptando-se continuamente aos modernos preceitos de organização hospitalar” (Revista do Acadêmico
de Medicina, 1946, p. 51). Aponta dados positivos na ala feminina, como as boas
instalações da enfermaria de cirurgia Santa Ludovina, onde funcionava a escola
de enfermagem “Magalhães Barata”, bem como da enfermaria Santa Rosa, para
tratamento exclusivo de “doenças venéreas”, que dispunha de banheiros próprios
inteiramente separados do resto do hospital.
Na ala masculina, a revista destacava as enfermarias Santo Antônio e São João, ambas
contando com piso e parede impermeabilizados, com azulejos até a altura de um metro e
sessenta e eliminação dos ângulos formados pelo encontro das paredes. A enfermaria São
João, também destinada exclusivamente ao tratamento de doenças sexualmente transmissíveis encontrava-se nas mesmas condições sanitárias que sua contraparte feminina.
O serviço de cirurgia contava com várias salas para pequena cirurgia, além da
sempre citada sala “Antônio Lemos”, que, mesmo com quase quarenta anos era
ainda considerada como uma das melhores do país. A matéria reiterava que naquele
momento achava-se em construção uma nova e moderna sala, na qual seriam instalados uma fonte de luz ultravioleta para esterilização do ambiente, um ar refrigerado e uma lâmpada com foco dirigido para o campo operatório, capaz de funcionar
automaticamente, “independente da corrente geral, fato este de grande valia para
nos que jogamos com a incerteza da energia elétrica distribuída à cidade”.
Elogiava, ainda a capacitação dos profissionais responsáveis pelos serviços de Raio-x,
cardiologia e eletricidade médica, mencionando ser plano da diretoria criar serviços
de traumatologia, alergia, alimentação, um ambulatório de cardiologia e um serviço
oftalmológico com enfermaria própria, sala de operação anexa e ambulatório.
Como aspectos negativos, a revista referia que os ambulatórios criados para descongestionar as enfermarias “Muito embora contem com a bôa vontade dos médicos,
não nos oferecem o rendimento desejado dada a falta de medicamentos e, no caso
do ambulatório de cirurgia, pela deficiência do material cirúrgico a ele reservado”.
Mencionava ainda que:
...doentes mesmo em estado precário de saúde, voltam da portaria para suas
residências. Pacientes vindos do interior, sem alojamento na cidade, são obri-
O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade
103
gados a aguardar um leito acomodando-se de qualquer maneira, o que constitue um espetaculo verdadeiramente impressionante às pessoas que porventura os avistem.
A falta de medicamentos era uma constante: “Muitas vêzes pela falta de meios, a
terapêutica é conduzida à custa de drogas menos eficientes, prolongando-se desta
maneira a permanência dos pacientes nas Enfermarias” (Revista do Acadêmico de
Medicina, 1946, p. 51).
A questão da alimentação dos pacientes também era reconhecidamente deficiente, visto serem as refeições processadas de modo uniforme sem que os médicos pudessem
prescrever uma dieta de acordo com as necessidades e restrições de cada paciente.
Pelo teor do texto da Revista do Acadêmico fica patente que a Santa Casa entrara
em declínio, e que embora tentando se modernizar, não conseguia acompanhar no
mesmo passo o crescimento da população do Estado. Em certos quesitos pode-se
até mesmo afirmar que o Hospital de Misericórdia regredira, pois já não contava
mais, por exemplo, com um serviço de lavanderia mecanizado, como nos dias de
sua inauguração na rua Oliveira Belo.
104
Foto 18:
Enfermaria
Santa Izabel. Clínica
Médica de Mulheres.
Terapêutica Clínica.
Professor Dr. Luiz
Araújo (sentado em
primeiro plano)
e alunos.
Fonte: FMCP
(1936c. s.p.)
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Para algumas disciplinas como Ginecologia, a Santa Casa continuava servindo de modo
razoável, conforme relatório de 3 de dezembro de 1947 feito pelo catedrático de Clínica
Ginecológica, Dr. Raimundo Cruz Moreira, e apresentado à direção da Faculdade:
Para realização das aulas do curso se utilizou o serviço de Clínica Ginecológica do Hospital da Santa Casa, enfermaria Santa Ludovina, que está
sob nossa chefia clínica e onde, pela frequencia de casos da especialidade
ginecológica, se tornou de aproveitamento eficiente da matéria aos alunos matriculados.
As operações praticadas pelo catedrático, como também pelo substituto
da cadeira, sempre tiveram como auxiliares os alunos mais assíduos e que
mais aptidões demonstraram pela especialização ginecológica (FMCP,
1948c, p. 83).
No entanto, a escassez de materiais como colposcópio, histeriscópio, proctoscópio
e outros aparelhos era frequentemente lembrada nos relatórios desta disciplina
(FMCP, 1948, p. 88).
Para outras cadeiras como Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil, a Santa Casa
tornara-se pequena, com o catedrático Oscar Pereira de Miranda buscando complementar o ensino em “ambiente público do Estado, como sejam o Centro de Saúde nº 2, em
lactário, Asilo Santa Terezinha, Assistência à Infância do Pará” (FMCP, 1948c, p. 85).
Para disciplinas como Neurologia, cujos conhecimentos haviam crescido com o
passar dos anos, a Santa Casa apresentava-se inadequada para o bom ensino prático, conforme diria o catedrático de Clínica Neurológica João Batista Penna de Carvalho em relatório enviado ao Diretor da Faculdade em 14 de novembro de 1947:
O ensino de clínica neurológica deve ser essencialmente prático, isto
é, feito no leito do doente; e, como o Hospital não tem uma enfermaria, especialmente para reunir todos os casos neurológicos, o professor
sente-se em dificuldade para administrar o ensino prático aos alunos,
êsses casos são raros entre nós e estão distribuídos pelas diferentes enfermarias, obrigando o catedrático a peregrinar, solicitando permissão
aos respectivos chefes de clínica, para utilizar dos que aparecem ainda
que espaçadamente.
Sugiro, pois, que a Diretoria da Faculdade entre em contato com a Provedoria do Hospital para instalação ou construção de um pavilhão onde fiquem
concentrados todos os doentes desta especialidade (FMCP, 1948c, p. 82).
Nem sempre reinou a harmonia entre a Faculdade e a Santa Casa. Por vezes houve
desavenças entre o provedor, o plenipotenciário dirigente do Hospital de Misericórdia e os acadêmicos. O professor de Clínica Pediátrica e Higiene Infantil, Ophir
de Loyola, quando ocupou o cargo de diretor daquele Hospital enviou, entre os
anos de 1931 e 1932, diversos memorandos à direção da Faculdade, queixando-se
do comportamento inadequado dos acadêmicos, os quais, segundo o provedor, chegavam a depredar a mobília das enfermarias (FMCP, 1932-1933).
O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade
105
Em determinadas situações os alunos pareciam não ser tão culpados. Cite-se como
exemplo o seguinte fato: como já era tradição, a Santa Casa realizava o “Natal dos
Indigentes”, ocasião em que os estudantes trabalhavam com listas com o carimbo
da instituição para aquisição de donativos. Em ofício do dia 19 de janeiro de 1948,
destinado ao Diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães, o provedor da Santa
Casa, Dr. Lucival Lobato, queixava-se ter descoberto, para sua surpresa que um
aluno do sexto ano “tinha diversas listas em seu poder, sem número de ordem e
sem rubrica do Provedor, mas todas carimbadas com o sinete do Hospital de Caridade”. Lucival Lobato, em seguida, diz que censurou o aluno, apreendeu as listas,
e lhe deu um prazo de 48 horas para recolher, junto à Tesouraria da Santa Casa, a
quantia da arrecadação que tivesse feito (FMCP, 1948a).
106
O estudante em questão e seus colegas de internato sentiram-se naturalmente ofendidos. Naquela época, os doutorandos de Belém encontravam-se bastante
organizados e integrados pela “Sociedade de Internos dos Hospitais de Belém”
(S.I.H.B), cuja sede era na própria Santa Casa. A S.I.H.B defendeu seus associados
da “desconsideração insolente, agressiva, e injustificável” com que a provedoria
tratara o dito acadêmico, tesoureiro da comissão organizadora do “Natal dos Indigentes”, nomeado pela própria S.I.H.B, alegando que o “Natal dos Indigentes” era
uma realização de inteira e exclusiva responsabilidade da sociedade de internos,
e, sendo esta uma sociedade autônoma, era “descabida a exigência” de entregar ao
hospital a quantia arrecadada.
Diante destes fatos, até que a provedoria explicasse em termos claros e precisos
sua atitude, a S.I.H.B decidiu suspender os plantões na Santa Casa. E, em nota a
imprensa seguida de abaixo assinado, foi a público atestar a honestidade do doutorando em questão “ante a manobra sórdida com que o Provedor interino da Santa
Casa pretende mesquinhamente manchar seu nome impoluto” (FMCP, 1948a).
Como era de se esperar nestes casos, a “corda” arrebentou do lado dos estudantes, tendo
a provedoria respondido de forma enérgica, proibindo, por sessenta dias, a entrada no
hospital dos doutorandos que apoiaram o colega; para o aluno envolvido, a proibição foi
de noventa dias, além de não permitir que este morasse no hospital (FMCP, 1948a).
Apesar das dificuldades, que aumentariam com o passar dos anos, e da convivência nem sempre tão pacífica com a Faculdade7, a Santa Casa continuaria sendo o
palco principal do ensino na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, até o final
dos anos 80, quando ocorre a transformação do Hospital João de Barros Barreto
em Hospital Universitário, e a criação do Hospital Bettina Ferro de Souza, ambos
pertencentes à Universidade Federal do Pará (UFPA). Entretanto, ainda hoje os
serviços de Pediatria, Ginecologia, Obstetrícia e Dermatologia, que funcionam na
Santa Casa, estão ligados à Faculdade de Medicina da UFPA, mantendo viva a histórica parceria entre as instituições.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
NOTAS
1
A data de fundação da Santa Casa do Pará é motivo de controvérsias. O Pará
Médico de setembro de 1922 (p. 301) cita um artigo do Dr. Azevedo Ribeiro,
de 1918, “A fundação da Santa Casa de Misericórdia do Pará”, onde fala da
instalação da “Confraria da Santa Casa de Misericordia do Pará”, em “acto
solennissimo” realizado nos primeiros dias “do anno de 1619”. Vianna (1992,
p. 14 e p.79). fala em 1650.
2
“Interpretou os sentimentos do conselho da benemerita associação o Dr. Geminiano de Lyra Castro e, orou em seguida o Dr. Elyseu Cezar”. Idem. p. 360
3
“A 24 de Abril de 1910, foi inaugurada a magnifica e suptuosa sala de operações asepticas, planeada pelos engenheiros João de Palma Muniz e Joaquim
Gonçalves Lalor. É uma das mais notaveis da America, com o seu arsenal
cirurgico riquissimo e completo, que a põe a par dos melhores estabelecimentos congeneres da Europa, causando a todos seus visitantes a mais viva
admiração, quer pelo lado scientifico da construção, quer pelas instalações
rigorosamente asepticas ...” (A SANTA Casa de Misericordia do Pará. Hospital da Caridade (1922, p. 316).
4
“Brevemente será installada a Faculdade, com solennidade, sendo nessa
ocasião entregue o diploma de professor honorario ao dr. Cypriano Santos.”
(Folha do Norte, 22.03.1919).
5
Nesta época a divisão do país era em Norte e Sul. Pernambuco, portanto,
era considerado oficialmente Norte.
6
Ver capítulo “Manutenção Financeira”.
7
Talvez o único período em que houve plena harmonia entre a Santa Casa e a
Faculdade de Medicina aconteceu quando Camilo Salgado assumiu a diretoria
de ambas as instituições: “A escolha do illustre dr. Camillo Salgado desperta
os mais vivos applausos e o hospital de Caridade só terá a lucrar com a sua
direcção, que ha de ser fructuosa e brilhante como a da Faculdade de Medicina
do Pará, que hoje é, graças a sua abnegação e ao seu patriotismo, motivo de
orgulho à nossa terra” (Estado do Pará, 27 de agosto de 1924, p. 1).
O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade
107
108
8
O Hospício
dos Alienados e outras
instituições de apoio
109
110
Detalhe de um azulejo de uma parede da FMCP.
Já dotado de um regular apparelhamento, localisado a na visinhança do
Hospital da Santa Casa, os cursos theoricos são secundados por outros verdadeiros e realmente praticos, em todos os ramos e especialidades (PARÁ.
Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes, 07.09.1926, p. 33).
Esta era a visão do governador Dionysio Ausier Bentes, em 1926, sobre o ensino
da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. O governador, também médico, foi
um dos fundadores da Escola, nomeado professor de Fisiologia na primeira ata de
posse do corpo docente (FMCP, 1919).
Dionysio Bentes não estava totalmente certo. O hospital da rua Oliveira Belo não
comportava todas as especialidades médicas da época, mesmo estando bem aparelhado. A Psiquiatria, pelas suas próprias peculiaridades, necessitava de um local
adequado, no caso o Hospício dos Alienados. Foi neste hospital também administrado pela Santa Casa, situado bem longe da área residencial, no bairro do “Marco
da Légua”, nos limites da Belém de então, que os alunos da Faculdade de Medicina
e Cirurgia do Pará tiveram suas primeiras aulas naquela especialidade.
A criação do Hospital dos Alienados remete às leis nº 1. 289, de 13 de dezembro de
1886, e nº1. 314, de 1º de dezembro de 1887, ainda do império, e que autorizavam
a aquisição de um edifício para servir de hospício no Pará. Já na república pensouse em construir um situado no bairro do Marco da Légua, próximo ao Bosque
Municipal (FMCP, 1948, p. 31). Até então os doentes mentais eram isolados no
leprosário do Tucunduba (CUTRIN, 1967, p. 36).
O prédio do Hospício dos Alienados datava de 1892, sendo um projeto de Manuel
Odorico Nina Ribeiro, o mesmo arquiteto que em 1900 entregaria a nova Santa
Casa. No entanto, o Hospício não teria de saída o mesmo sucesso que seu projeto
posterior. Tanto que finalizada a construção em 29 de julho de 1892, só viria a
funcionar efetivamente a partir de 27 agosto daquele ano, devido à necessidade de
grandes modificações e adaptações higiênicas e médicas (CUTRIN, 1967, p. 38).
Por volta de 1901, a assistência aos pacientes internados no Hospício era baseada em um
revezamento mensal entre os médicos da Santa Casa. Como as polinevrites dizimavam os
enfermos, o então governador Augusto Montenegro determinou grandes melhoramentos ao prédio como a construção de salas de hidroterapia, que contavam com banheiras
vindas especialmente da França, quartos para pensionistas e gabinetes de eletroterapia
(PARÁ-MEDICO, 1922, p. 396). O governador enviou ainda para Europa o médico e
inspetor sanitário Azevedo Ribeiro, que já havia trabalhado no hospício, para um ano de
aperfeiçoamento em psiquiatria, dando-lhe o cargo de diretor do hospital após seu retorno,
que até então era ocupado pelo oftalmologista Dr. Lyra Castro (CUTRIN, 1967, p. 39).
Azevedo Ribeiro foi um marco na psiquiatria do Pará abolindo todos os meios
violentos de contenção dos pacientes como troncos e camisas de força, instituindo
ainda o regime “open-door” (PARÁ-MEDICO, 1922, p. 396).
O Hospício dos Alienados e outras Instituições de apoio
111
Contudo com a crise financeira que o Estado atravessou após o declínio da borracha, a situação pela qual passaria o hospício seria assim definida pelo psiquiatra
Antônio Porto de Oliveira, um dos fundadores da Faculdade e primeiro professor
de sua especialidade: “Sucederam-se as administrações do Estado e a sorte dos
loucos no Pará manteve-se entre o descaso mais deprimente e a indiferença mais
chocante” (FMCP, 1948c, p. 31).
Em 1918, às vésperas da fundação da Faculdade, o hospício que tinha capacidade
para 150 pacientes abrigava 300, sendo que muitos doentes dormiam nos corredores dificultando a ronda noturna dos enfermeiros e guardas (FMCP, 1948c, p. 32).
Segundo Porto de Oliveira, tal situação perduraria até a Revolução de 1930, quando como diretor do hospício enviou o seguinte relatório ao então Interventor Magalhães Barata:
112
O nosso Hospício, sr. Interventor, dadas as condições de progresso que
atingimos, é melhor chamado um “depósito de loucos”. Mal construído
pessimamente dividido, e já deficientíssimo para o número de doentes
existentes.
Ocorre que com o crescimento geral da população, embora pouco pronunciado no Pará, e por várias outras causas sociais e econômicas, o aumento do número de alienados se torna sensível anualmente.
[...]
Tomando em consideração o Relatório a Interventoria imediatamente
modificou o deplorável estado das coisas. Foi aumentando o número de
médicos; criando lugares de internos-acadêmicos de medicina de anos
superiores; aumentadas as verbas; procedidas obras urgentes, e limpeza
geral – e instalada uma Secretaria que nunca existiu, estando o serviço
de expediente e de boletins a cargo de uma Irmã, completamente leiga no
assunto (FMCP, 1948, p. 31).
Os internos referidos acima eram os doutorandos Pedro Rosado e Benedito Klautau acompanhados dos acadêmicos Aluízio da Fonseca e Menadro Tapajós, os quais
tinham direito à alimentação e 100mil réis mensais (CUTRIN, 1967, p. 42). Criavase assim uma “escola” de psiquiatria. Muitos destes alunos seriam posteriormente
psiquiatras de renome, chegando alguns a diretores daquela instituição e a professores catedráticos da Faculdade.
Em 1937 o Hospício dos Alienados receberia a denominação de “Hospital Juliano
Moreira”, em homenagem ao renomado psiquiatra baiano. No ano seguinte seria
palco das primeiras aplicações de cardiasolterapia no Pará, moderno tratamento de
então, que havia sido instituído na Alemanha em 1935 (CUTRIN, 1967, p. 43).
Em 19 de abril de 1942 seria realizada ali a primeira aplicação de eletroconvulsoterapia no estado pelo acadêmico José Cutrim, na presença do corpo médico, enfermeiras e freiras do hospital (CUTRIN, 1967, p. 43).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
No mesmo decênio, o “Juliano Moreira” serviria em alguns momentos como cenário também das aulas de neurologia ministradas pelo professor contratado Benedito Klautau (FMCP, 1946, p. 58).
Nas décadas seguintes, embora contando com competentes administradores, o descaso do poder público predominaria em relação a algumas escassas e paliativas melhorias, levando o “Juliano Moreira” a uma escalada progressiva de sucateamento.
O hospital funcionaria regularmente até o início dos anos de 1980, quando sucumbiu consumido em parte pelo fogo e em parte pelo abandono. Com o seu desaparecimento os pacientes e os acadêmicos de medicina perdiam um centro de referência
com quase um século de história.
113
Foto 19: Hospício dos Alienados, posteriormente Hospital Juliano Moreira, por volta de 1902.
Fonte: ÁLBUM DE BELÉM- PARÁ (1902, s.p.).
O Hospício dos Alienados e outras Instituições de apoio
114
Foto 20: “Hospital Evandro Chagas, atual hospital de pronto socorro Mário Pinotti, onde era lecionada a Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas”.
Fonte: FMCP (1944, s.p.).
Além do “Juliano Moreira”, durante um curto período de tempo exatamente nos
anos de 1940, os alunos puderam contar com outro hospital de apoio especificamente voltado para a disciplina de doenças tropicais. Era o “Hospital Evandro Chagas”
(FMCP, 1945), criado pelo Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) para treinamento de profissionais da área de saúde no atendimento das principais doenças amazônicas, que inicialmente era realizado na enfermaria São João, na Santa Casa1.
Após um acordo com a prefeitura de Belém, em 29 de janeiro de 1943, esta cedeu
ao SESP, por um período de nove anos, um edifício localizado no terreno da Santa
Casa e que seria destinado ao pavilhão de alimentação (BASTOS, 1993, p. 413).
O edifício de dois andares, situado na Travessa 14 de Março, ainda não estava
terminado, sendo adaptado e remodelado para suas novas funções. Foi inaugurado
em 10 de novembro de 1943, com o funcionamento apenas do laboratório e ambulatório; as enfermarias foram abertas pouco depois, em 15 de dezembro do mesmo
ano (BASTOS, 1993, p. 413).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Era o hospital mais moderno de Belém, com todo seu equipamento proveniente
dos Estados Unidos. Possuía no pavimento térreo salas para atendimento ambulatorial, farmácia, laboratório de análises clinicas, auditório para conferências, refeitório, cozinha e lavanderia. No pavimento superior contava com duas enfermarias
com capacidade para quarenta leitos, dois quartos para pacientes particulares, bloco
cirúrgico, raio-x e uma biblioteca com cerca de 3.000 volumes. Dispunha ainda de
gerador próprio e elevador para o transporte de alimentos (BASTOS, 1993, p. 414).
Compunham sua equipe:
Dr. H. Vizie Markhan, chefe do hospital e diretor local do programa de treinamento e pesquisas;
Dr. Charles J. Lopez, assistente;
Dr. Souza Ferreira, assistente e encarregado o ambulatório;
Dr. Calista Causey, diretor do laboratório;
Enf. Elizabeth Reed, diretora de enfermagem;
Enf. Agnes Chagas, instrutora de enfermagem (BASTOS, 1993, p. 413).
Para um estabelecimento nascido com os melhores recursos da época e administrado por estrangeiros, o “Hospital Evandro Chagas” deixou muito a desejar. Pelos
mais diversos motivos ninguém ficava muito tempo na diretoria, havendo até casos
de graves irregularidades administrativas. Tamanha era sua inconstância que em
pouco tempo o hospital até de nome mudou passando a se chamar “Hospital de
Belém” (BASTOS, 1993, p. 414); sendo às vezes referido simplesmente como “Hospital
do Serviço Especial de Saúde Pública”.
O prazo de devolução do prédio para a prefeitura e Belém vencia em 1º de fevereiro de
1952. Entretanto, no final de 1946 o prefeito de Belém, Dr. Chermont, solicitou sua
devolução antecipadamente, justificando a necessidade de transferir o Pronto Socorro
Municipal para aquele local, visto que o original, localizado no centro da cidade, não
tinha mais condições de atender a população adequadamente (BASTOS, 1993, p. 415).
Considerando seu alto custo de manutenção, a necessidade de fazer grandes reformas para atender certos serviços e talvez a perda de sua finalidade com o fim da
Segunda Guerra, o SESP devolveria em 27 de janeiro de 1949 o prédio com grande
parte de seus equipamentos para serem usado no novo Pronto Socorro Municipal
de Belém, que ali se encontra até hoje (BASTOS, 1993, p. 416).
Esforços foram feitos com intuito de transformar o “Hospital Evandro Chagas” em
um centro de excelência em doenças tropicais, ligado à Faculdade de Medicina e
Cirurgia do Pará. Contudo com o término do contrato do serviço cooperativo em
30 de dezembro de 1948, a ideia não progrediu (BASTOS, 1993, p. 416).
Ressalte-se que enquanto o “Juliano Moreira” possuía dirigentes que eram professores da Faculdade de Medicina garantindo estreita relação entre ambas as ins-
O Hospício dos Alienados e outras Instituições de apoio
115
tituições e maior acesso dos alunos, o “Hospital Evandro Chagas” nunca teve um
diretor ligado à escola. As aulas práticas ali realizadas eram uma cortesia daquele
estabelecimento. Este distanciamento fazia com que apesar de seu equipamento
moderno e ótimas instalações, aquele hospital não fosse um palco tão bom para
aulas como poderia ser, conforme as palavras do professor interino de Clínica de
Doenças Tropicais e Infectuosas, Dr. Gervásio de Brito Melo dirigidas ao diretor
da Faculdade Acilino de Leão:
116
V. Excia. deve estar bem informado que a Enfermaria S. João, de Clínica
de Doenças Tropicais e Infectuosas, da Santa Casa, desde o momento em
que o Serviço Especial de Saúde Pública a entregou à atual Diretoria do
Hospital de Misericórdia não voltou a ser utilizada pela referida cadeira,
em virtude da mesma ser futuramente destinada a outros serviços clínicos. Em consequência disso as aulas praticas, principalmente, fôram deficientes por falta de uma enfermaria apropriada e destinada ao ensino da
referida cadeira, pois não foi possível acompanhar, com os alunos, os casos observados no decorrer do ano letivo porque os doentes eram gentilmente cedidos pelos colegas que trabalham nas diversas clínicas da Santa
Casa, impossibilitando-nos a melhor orientar o ensino terapêutico dos
casos observados. A maioria das aulas práticas foram dadas no Hospital
Evandro Chagas, do S.E.S.P., sendo os casos, para tal fim cedidos pelo
ilustre médico americano dr. Markhan, quando Diretor do aludido estabelecimento. Embora os casos de doenças tropicais e infectuosas, como
bem sabe V. Excia., sejam abundantes entre nós, sentimos dificuldade em
mostra-los com maior frequencia, aos alunos e tomamos a liberdade de
lembrar a V. Excia. que seria proveitoso se nos fosse facultada a escolha
de doentes no Ambulatório da Santa Casa (FMCP, 1945c, p. 54).
Outros lugares esporadicamente também serviriam às aulas práticas de Doenças
Tropicais, como o Leprosário de Marituba (FMCP, 1943b, p. 50). Na busca pelas
melhores instalações possíveis até o Instituto Evandro Chagas3 serviu durante algum tempo para aulas práticas de Parasitologia4.
Ainda que totalmente desvinculados da Faculdade outros hospitais de Belém também
seriam procurados espontaneamente por acadêmicos em busca de aperfeiçoamento profissional. O Pronto Socorro Municipal, por exemplo, era muito requisitado pelos que se
interessavam pelas áreas de urgência e emergência, particularmente a cirurgia, embora
o aprendizado ali não tivesse nenhuma ligação direta com o Palacete Santa Luzia5.
A Faculdade bem que tentou oficializar parcerias com o Pronto Socorro e outras
instituições. Na ata do Conselho Técnico Administrativo (CTA) de nove de fevereiro de 1933 existe a transcrição da seguinte solicitação enviada ao então Interventor Federal Magalhães Barata:
O Conselho Técnico Administrativo da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, representado pela comissão abaixo assinada, no propósito de
melhorar o ensino dos cursos administrados pelo estabelecimento que
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
dirige, com o fito de torná-los mais eficientes, pede a V. Excia. o seu
valioso concurso para iniciar o funcionamento do Instituto Anatômico
Biológico que acaba de criar a exemplo da Faculdade de Medicina do Rio
de Janeiro. Para isso pede o consentimento de V. Excia. no sentido de ser
permitida a frequencia dos alunos do 6º ano do curso medico desta faculdade no Instituto Médico Legal e Necrotério do Estado; na Assistência
Pública e no Hospital do Pronto Socorro, quando funcionar, com a devida
autorização para se poderem utilizar das respectivas instalações, responsabilizando-se esta faculdade pelos danos que, porventura, possam ser
causados no material e aparelhos das citadas instalações (CTA, 1933).
Todas estas parcerias, essenciais para uma instituição ainda em expansão e com
cada vez maior número de alunos, ao que tudo indica jamais chegaram de fato a ser
formalizadas. O porto seguro da Faculdade era mesmo a Santa Casa constituindo
um binômio que persiste até hoje em algumas disciplinas.
NOTAS
1
Criado durante a Segunda Guerra por um acordo firmado entre o governo brasileiro e norte americano, tendo como prioridade naquele momento
sanear a Amazônia e a região do vale do rio doce, locais de extração de borracha e ferro, matéria prima essencial para o esforço de guerra americano.
Trocando em miúdos: a meta era garantir que os “Soldados da Borracha”
cumprissem sua missão e não tombassem por malária, etc. (BASTOS, 1993,
p. 412), (N.A).
2
“...foram dadas aulas práticas, sendo para isso, escolhidos os casos nas Enfermarias da Santa Casa de Misericórdia e do Hospital do Serviço Especial
de Saúde Pública” (FMCP, 1947b, p. 79).
3
Apesar do nome existem controvérsias quanto a relação entre o Hospital
Evandro Chagas e o Instituto do mesmo nome existente até hoje e cuja sede
localiza-se na Avenida Almirante Barroso (BASTOS, 1993, p. 414).
4
“Ali os estudantes utilizaram todo ótimo equipamento, assim como o material de que é dotado aquele Instituto, tendo sido feitas demonstrações e
estudos detalhados...” Dr. Orlando Rodrigues da Costa, chefe do laboratório
de Parasitologia. (FMCP, 1947b, p. 73).
5
“Foi em 1937 [...] que procurei o Dr. Álvaro Camelier para pedir que me
admitisse como acadêmico estagiário, sem nada ganhar a não ser o que viesse
aprender” (MEIRA, 1986a, p. 64).
O Hospício dos Alienados e outras Instituições de apoio
117
118
9
Equiparação a Jato
119
120
Detalhe das cadeiras do Salão Nobre.
Funcionando desde 1º de maio de 1919, a Faculdade de Medicina e Cirurgia do
Pará demorou apenas cinco anos para ser “equiparada às officiaes”, — como passou
a constar nos papéis timbrados —, por portaria do Ministério da Justiça e Relações
Interiores, de 4 de setembro de 1924.
Para que se tenha ideia desse espaço de tempo é preciso acompanhar o processo
de equiparação de outras escolas. A de Minas, por exemplo, criada em 1911, foi
equiparada em 19181; a do Paraná, fundada em 1912, somente foi equiparada em
19222. Recife, inaugurada em 1920, foi equiparada em 19273; a de São Paulo, com
atividades iniciadas em 1913, obteve seu reconhecimento em 19224.
A equiparação de um curso superior significava o reconhecimento em todo o território nacional dos diplomas expedidos pela Instituição, o que conferia credibilidade
aos profissionais ali formados e a conseqüente autorização para o exercício profissional, uma vez que, de outra forma, os profissionais somente poderiam exercer
suas atividades na jurisdição estadual a que a escola estivesse vinculada5.
Tal processo de equiparação foi regulamentado pelo Decreto nº. 11.530, de 18 de
março de 1915, que reorganizou o ensino secundário e superior da República e
previa que
Art. 11. As academias que pretenderem que os diplomas por ellas conferidos sejam registrados nas repartições federaes, afim de produzirem os fins
previstos em leis vigentes requererão ao Conselho Superior do Ensino o
deposito da quota de fiscalização na Delegacia Fiscal do Estado em que funccionarem (BRASIL, 1915).
A equiparação não era definitiva, obedecendo a regras bastante rígidas, com previsão, inclusive, da cassação ao direito à equiparação já concedida, não podendo esta
ser requerida novamente no prazo de seis anos, ainda que o estabelecimento mudasse de nome (BRASIL, 1915, Art. 22). A Faculdade de Odontologia do Pará, por
exemplo, perdeu sua equiparação de 1927 até 1938, com os alunos formados neste
período não conseguindo registrar seus diplomas no Departamento Nacional de
Ensino (PARÁ-MÉDICO, dez. 1939, p. 23).
As dificuldades deviam ser muitas, pois, conforme conta o fundador da Faculdade
de Medicina do Recife, Octávio Freitas, o Conselho Nacional de Educação não era
“muito simpatizante de equiparações de escolas livres, sobretudo das de medicina”
(FREITAS, 1944, p. 110).
No caso da FMCP parece que algumas “facilidades” foram agregadas. Por exemplo, de acordo com o art. 16 do referido decreto
Não será inspector pessoa ligada por affinidade de qualquer natureza aos
directores ou professores da academia, e, quando possivel, não residirá
siquer no Estado em que o instituto funccionar (BRASIL, 1915).
Equiparação a jato
121
Entretanto, o inspetor designado para a fiscalização foi o Dr. Lauro Sodré Filho,
médico, “Chefe da clinica de nariz, garganta e ouvidos da Santa Casa de Misericórdia6”, não só paraense como também filho do senador Lauro Sodré7.
Previa também o decreto que a nomeação do inspetor seria anual, embora podendo
o referido cidadão ser designado uma ou mais vezes para a função (BRASIL, 1915,
Art. 19). Tais benesses parecem ter sido fruto da amizade entre o senador Lauro
Sodré e o Barão Ramiz Galvão (Folha do Norte, 29.12.1934, p. 1), o todo poderoso
membro do Conselho Superior de Ensino, criado com a Reforma Rivadávia, de
1911 (BRASIL, 1911), e ao qual estava subordinada a fiscalização dos estabelecimentos, competindo a ele indicação dos inspetores. Ramiz Galvão seria o primeiro
Reitor da Universidade do Brasil8.
Outro dado relevante a ser observado no processo de equiparação da Faculdade de
Medicina e Cirurgia do Pará diz respeito ao artigo 22 do Decreto citado. Segundo
o artigo “Não será equiparada ás officiaes academia que funccione em cidade de menos de cem mil habitantes, salvo si esta for capital de Estado de mais de um milhão
de habitantes e o instituto fôr fortemente subvencionado pelo governo regional”.
122
Essa “forte subvenção estadual” não parece ter sido marcante na escola paraense,
posto que quase sempre a Direção da Faculdade reclamava do Estado pelo não
cumprimento das obrigações financeiras deste para com a escola. No Relatório
relativo ao ano de 1922, Camilo Salgado já reclamava não ter recebido o auxílio do
Governo Federal, bem como fazia referência à situação financeira do Estado.9
Do mesmo modo que em 1924 certamente a Faculdade não preenchia todos os requisitos necessários para a equiparação, previstos nas atribuições do inspetor:
Art. 14. O inspector inquirirá, por todos os meios ao seu alcance, inclusive o
exame de toda a escripta do instituto:
a) se este funcciona regularmente ha mais de cinco annos;
b) se ha moralidade nas distribuições de notas de exames;
c) se os professores manteem cursos particulares frequentados pelos alumnos da academia;
d) se as materias constantes dos programmas são suficientes para os cursos
de Engenharia, Direito, Medicina ou Pharmacia;
e) se, pelo menos, tres quartas partes do programma de cada materia são
effectivamente explicadas pelo respectivo professor;
f) se ha exame vestibular e se é este rigoroso;
g) se a academia possue os laboratorios indispensaveis e se estes são utilizados convenientemente;
h) se o corpo docente é escolhido pelo processo de concurso de provas estabelecido na presente lei;
i) se as rendas da academia são sufficientes para o custeio de um ensino integral, das materias do curso, ministrado por professores sufficientemente
remunerados;
j) se a quota de fiscalização é depositada na época legal.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
A fiscalização e a conseqüente equiparação foi uma das principais medidas tomadas
por Camilo Salgado, após assumir definitivamente a Direção da Faculdade, e antes
mesmo da transferência do curso para o palacete de Santa Luzia10.
Já no Relatório de Atividades de 1922, publicado em 1923, Camilo discorre sobre
o assunto, informando inclusive a indicação do inspetor, e vendo o gesto como
prestigio da Escola junto ao Conselho Superior de Ensino, para desagrado dos
descrentes iniciais do projeto.11
Um dado que merece registro é que na Mensagem Governamental apresentada ao
Congresso Legislativo do Estado e relativa ao ano de 1923, o governador Antonino Emiliano de Souza Castro, ao discorrer sobre o ensino superior, já menciona o
processo de equiparação da Faculdade de Medicina.12
Mas, além das peças políticas certamente envolvidas no processo de equiparação, Camilo Salgado também fez sua parte, procurando dotar a Faculdade de condições básicas
para o referido processo. Assim é que Folha do Norte de 18 de março de 1924 noticia a
chegada de equipamentos para a Faculdade, importantes para a equiparação:
A FACULDADE DE MEDICINA
PREPARA-SE PARA A EQUIPARAÇÃO OFFICIAL
O paquete “Santos”, do Lloyd Brasileiro, esperado hoje neste porto, traz
parte do Laboratorio de Microbiologia destinado á Faculdade de Medicina do Pará. Esses apparelhos, adquiridos com os proprios recursos do
estabelecimento, compõem-se de seis excellentes microscopios e outras
peças indispensaveis, de immediata utilidade nos trabalhos de microbiologia. São de fabricação allemã e foram adquiridos na sucursal da casa
Lutz, no Rio.
A parte integrante desse como os demais laboratorios completos de Physica, Chimica, Histologia, Physiologia e Anatomia Pathologica, necessarios
ao apparelhamento perfeito da nossa Faculdade de Medicina, deverão ser
embarcados precisamente hoje, no “Hildebrand”, no porto do Havre.
Á excepção do de Microbiologia, os demais laboratorios são franceses,
comprados na Casa Pils, de Emilio Deyrolle, de Paris.
Com a acquisição de taes apparelhos, por que tanto se empenhou o director
do estabelecimento, dr. Camillo Salgado, a quem já tanto deve a nascente
mas já acreditada instituição de ensino medico, fica a Faculdade de Medicina do Pará apta a conquistar a sua equiparação aos demais estabelecimentos officiaes congeneres da Republica, condição que o Conselho Superior
de Ensino julgou imprescindível, na sua ultima reunião, conforme noticiou
um telegramma publicado na FOLHA (Folha do Norte, 18.03.1924, p. 1).
A data da equiparação é motivo de controvérsias. Folha do Norte de 30 de abril de
1924, sob o título “A equiparação da Faculdade de Medicina” informa o seguinte:
Pessoa chegada hontem do Rio, pelo “Campos Salles, e que procurou bem
se informar do que resolveu o Conselho Superior de Ensino sobre a equiparação da Faculdade de Medicina do Pará, declarou-nos que o parecer
Equiparação a jato
123
favorável a essa concesão foi brilhantemente elaborado pelo dr. Aloysio
de Castro, director da Faculdade do Rio de Janeiro.
A equiparação deverá ser approvada na sessão de junho vindouro, quando a nossa Escola já terá completos os cinco annos de funccionamento,
exigidos pelo Reg. do Conselho.
Por essa data devem estar installados os seus laboratorios no predio proprio, onde ella tem séde. Nesse sentido, o dr. Lauro Sodré Filho, fiscal
federal, acaba de ter communicação do presidente do Conselho Barão dr.
Ramiz Galvão (Folha do Norte, 30.04.1924, p. 1).
A mesma Folha do Norte, repetindo o título da matéria de 30 de abril, noticia em 12
de junho a equiparação como já tendo ocorrido:
124
A Faculdade de Medicina do Pará e a sua equiparação
Está justamente regosijada a mocidade que cursa a Faculdade de Medicina de Belém, pelo recente acto do Conselho Superior de Ensino, que a
equipara aos demais estabelecimentos congeneres do paiz, satisfazendo,
assim, uma das grandes aspirações da juventude paraense.
Por esse motivo e tendo em alta conta os esforços a tal respeito despendidos pelo senador dr. Camillo Salgado, director da Faculdade e mestre
querido no seio daquella agremiação de moços, será hoje realizada ás 5
horas da tarde, uma grande assembleia geral de estudantes da Faculdade,
para deliberar sobre o modo de significar o jubilo academico em face do
grande triumpho alcançado.
Desde já, é sabido que as manifestações serão feitas á Congregação da
Faculdade e principalmente ao seu egrégio director.
Uma commissão de academicos de Medicina esteve hontem na FOLHA,
communicando a resolução das homenagens que o corpo discente da Faculdade pretende fazer ao dr. Camillo Salgado, que bem merece de seus
discipulos e amigos taes provas de alta consideração e sympatia.
Assim nos falou a commissão de que são membros os srs. Almir Pereira, Raymundo Ferro e Silva e Alexandre Magno (Folha do Norte, 08.09.1924).
Outra nota sobre o assunto, aumentando a confusão com as datas, encontra-se no
jornal A Província do Pará, de 7 de agosto de 1924:
Em virtude de achar-se o Paiz enluctado pela morte do Dr. Raul Soares,
presidente do Estado de Minas Geraes, resolveram os alumnos esta Faculdade adiar a manifestação que tinham projectado fazer ao dr. Camillo
Salgado, em regosijo pela equiparação da mesma (A Província do Pará,
07.08.1924).
Em nota de primeira página, Estado do Pará, de 8 de agosto do mesmo ano destacava: “A equiparação da Faculdade de Medicina do Pará – vão commemoral-a com
uma elegante festa social”. De acordo com a notícia,
Tendo á frente os drs. Oswaldo Barbosa,Oscar de Carvalho, Renato Chaves,
Prisco dos Santos e Dagoberto Souza, doutorandos Magno e Silva, Bianor Penalber, Teixeira Marques e Barbosa Rodrigues, vae a Faculdade de Medicina
commemorar a sua recente equiparação, de maneira brilhante e memorável.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Nos salões da aristocratica agremiação, que para o fim serão gentilmente
cedidos, effectuarão elegante festa, que approximará, em horas de encanto, alegria, o que houver de mais em evidencia na sociedade paraense.
Com o cunho de rigorosa seleção e fidalguia que lhe pertencem emprestar, a reunião projectada para dia muito proximo ha de marcar um acontecimento social (Estado do Pará, 08.08.1924, p. 3).
A nota, assinada apenas com as iniciais “B. P.” (Bianor Penalber?), curiosamente
omite o local da realização da festa.
Folha do Norte, de 9 de agosto de 1924, informa dos organizadores da festa comemorativa pela equiparação, ressaltando que a festa, apesar de ainda não ter data
marcada, já tinha local para sua realização.13
No dia 12 de agosto, A Província do Pará divulga ter recebido uma comunicação
oficial de Camilo Salgado, datada do dia anterior, anunciando a equiparação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. De fato o livro de documentos expedidos
da Faculdade que cobre o ano de 1924, contém cópias de diversos memorandos datados de 11 de agosto, dando ciência aos mais diversos estabelecimentos de ensino
do “recente acto do Conselho Superior de Ensino da Republica” (FMCP, 1924a).
Ainda em agosto, Estado do Pará publicaria nova nota sobre as comemorações pela
equiparação: “A ‘soirée’ da Faculdade de Medicina”, desta vez informando que a
festa realizar-se-ia no dia 23, nos salões do Sport Club, “gentilmente cedidos” para
esse fim. A nota dizia ainda que a comissão organizadora estava empenhada para
que tudo decorresse “sob uma atmosphera de agrado, prazer e cordialidade”, sendo
um dos pontos primordiais, a “rigorosa seleção na distribuição dos convites”, que
começariam a circular no dia seguinte. A nota finaliza dizendo que o professor Clemente Souza preparava-se “para que sua orchestra possa executar um programma
esmerado e de successo” (Estado do Pará, 17.08.1924, p. 1).
Estado do Pará voltaria a noticiar sobre o baile no dia 20 de agosto, dizendo estar
definitivamente marcado para o dia 23, um sábado. A nota prossegue dizendo que
algumas famílias haviam tentado junto à comissão organizadora o adiamento do
baile para o sábado seguinte, dia 30, em virtude de estar programado para o dia
23 a estréia da companhia Trianon, no Palace Theatre. Entretanto, num gesto de
“sympathica gentileza á sociedade paraense”, a companhia antecipou sua estréia
para a sexta-feira, dia 22 (Estado do Pará, 20.08.1925, p. 2).
Em correspondência encaminhada ao Senado do Estado, Camilo informa a equiparação ocorrida em agosto de 192414. Em papéis timbrados da Faculdade tem-se
“Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará - Fundada em 9 de Janeiro de 1919
- Equiparada ás officiaes por portaria do Snr. Ministro da Justiça e Negócios Interiores de 4 de Setembro de 1924”. Na Revista do Acadêmico de Medicina de dezembro
de 1946 consta a data de 24 de setembro de 192415.
Equiparação a jato
125
Até na Mensagem governamental relativa ao ano de 1924, apresentada ao Congresso Legislativo do Estado em 7 de setembro do referido ano, o governador
Antonino Emiliano de Souza Castro, ao referir-se ao ensino superior do Estado,
menciona a equiparação aumentando a confusão das datas.16
O fato é que Folha do Norte, de 23 de agosto de 1924 repetindo o título da notícia de
18 de março do mesmo ano, fala das comemorações pela equiparação da Faculdade
126
A Faculdade de Medicina do Pará e a sua equiparação official
Os professores e alumnos da Faculdade de Medicina do Pará festejam hoje,
com uma brilhante festa social, a equiparação deste estabelecimento de ensino superior ás congeneres officiaes do paiz.
Para os que tem fé no futuro da nossa terra este facto obra grandiosa dos
esforços e da tenacidade benedictina do eminente professor Camillo Salgado,
vale pela affirmação de que temos elementos materiaes e moraes para vencer.
Ninguem ignora como nasceu a Faculdade de Medicina do Pará, que agora
attingiu, com o acto equiparativo, o ponto em que queriam vel-a a abnegação
e o amor do notavel cirurgião paraense, que, desde a fundação, vem dirigindo
com fraternal carinho, essa casa de sciencia.
A elle, pois, ao professor Camillo Salgado, que consubstancia o esforço collectivo
em favor da finalidade que hoje se festeja, devemos dirigir parabens e agradecimentos calorosos por essa conquista com que engrandeceu o nosso Estado.
Em commemoração ao facto auspicioso, haverá hoje uma elegante “soirée”
nos salões do Sport Club.
A commissão, que tomou a si essa iniciativa festiva, empenha-se para que
esse sarau seja uma nota de alto relevo social.
Principiará a festa ás 10 horas em ponto. A commissão solicita a apresentação
dos respectivos convites, a fim de que uma fiscalisação rigorosa possa ser feita.
O professor Clemente Souza organizou o seguinte programa musical:
Ouverture – Royal Auvergue. 1ª parte: rag-time, Fare Well; samba, Papagaio
sem bico; fox-trot, Explanade; one-step, Oneonta; fox-trot, Karussel; samba,
Tem coração de quem é?; valsa, Violetas perdidas; fox-trot, My little girl;
two-step, Sybille; tanguinho, Que numero, faz favor; fox-trot, Assim chora
Pierrot; rag-time, Im Dorfkruggel; fox-trot, Satan.
2ª parte: fox-trot, Cigano; samba, Até debaixo dagua; one-step paso doble,
Rosita; fox-trot, When hearts are young; samba, Teu despreso me mata;
rag-time, Rubenstreiche; fox-trot, La chula tanguista; two-step, Quando o
champagne ferve na taça; tanguinho, O Palhaço; fox-trot, Fires; rag-time,
Aufzung der teepuppen; samba, Conversa fiada; fox-trot, Dance-o-mania
(Folha do Norte, 23.08.1924).
Os ecos de tão badalada festa seriam reproduzidos no mesmo Estado do Pará, de 25
de agosto. Afirmando que “poucas festas sociaes alcançarão o successo de que se
revestiu a linda ‘soirée’ do Sport Club”, a nota detalha o acontecimento elegante,
“pelo cunho de distincção e, sobretudo, intensa alegria que lhe imprimiram”. O
baile contou com uma “concorrencia desusada e selecta”, dando um aspecto “incommum e brilhante aos salões da veterana sociedade nazarena. A animação prolongou-se até à madrugada, bastando dizer que às 4 horas a festa prosseguia “com
o enthusiasmo vibrante e inarrefecido do principio”.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
A sede do Sport Club apresentava “feerica iluminação tocando á entrada dos convidados a banda da Força Publica do Estado”. Quando a orquestra iniciou a tocar, às
22 horas, a comissão de recepção composta pelos Drs. Oswaldo Barbosa, Acatauassu Nunes Filho e Oscar de Carvalho e os doutorandos Bianor Penalber e Barbosa
Rodrigues “já haviam dado ingresso ás mais representativas figuras do mundo
oficial e elegante” e a “um bando garrulo e formoso de senhorinhas, que imprimiam
á serenata a maior graça e todo esplendor”. O jornal destaca a presença do “notável professor Brumpt, da Faculdade de Medicina de Paris”, que teve que retirar-se
mais cedo para embarcar com destino a Soure, mas deixou sua “gentilissima consorte em companhia da família do professor Acatauassu Nunes Filho, permitindo
que a distinta senhora “experimentasse uma approximação mais demorada com a
sociedade paraense”17. No intervalo, autoridades, professores da Faculdade e pessoas mais gradas estiveram reunidas numa sala especial, “onde brindes amistosos
trocaram-se ao ‘champagne’”.
Em nome da Faculdade manifestou-se o professor Agostinho Monteiro, agradecendo as palavras do Dr. Luiz Barreiros. Exaltando a obra de Camilo Salgado,
Agostinho Monteiro fez sentir que a equiparação da Faculdade de Medicina representava inegavelmente, “o facto mais culminante nestes dez annos de vida do
Pará”, chamando atenção para as vantagens e benefícios que daí adviriam para o
“engrandecimento da nossa vida economica”. A noticia conclui citando ter sido o
governador Souza Castro representado por seu ajudante de ordem, o 1º tenente
Alfredo Câmara (Estado do Pará, 25.08.1924, p. 4). Não há informação da participação dos diretores da Faculdade na citada festa.
Realmente, como não poderia ser diferente, a imprensa reconheceu o valor de tudo
aquilo. E assim se manifestou a revista A Semana:
Si a Amazônia, victima das endemias que inutilisam tantas atividades
uteis ao Brasil, muito tem a ganhar, com uma Faculdade de Medicina
equiparada no extremo-norte, o Pará [...] deve particularmente sentir-se
ufano, porque o acontecimento que assignalamos com jubilo é um passo
de progresso que Estados mais ricos o que o nosso não conseguiram (A
Semana, n. 329, 1924).
Deve ser citado, é claro, que nem sempre os “Estados mais ricos” faziam tanta questão da equiparação. Orlando Lima, catedrático de Clínica Obstétrica refere que:
Quando se dizia que uma das faculdades de S. Paulo não era equiparada
á sua congênere da Capital Federal, não raro era ouvir-se, de paulistas a
asserveração de que ela era tão notável que não tinha a necessidade de
se equiparar a nenhuma outra. Esta, se quisesse, que a tomasse como
padrão (FÁBRICA de Doutores, 1938, p. 3).
Lógico que tal realidade não se aplicava à região norte do país. Aqui a equiparação era essencial, sua ausência colocaria em risco a credibilidade e quiçá a existência da Faculdade.
Equiparação a jato
127
A equiparação como já mencionado precisava ser renovada periodicamente. Para
isso a Faculdade tinha que passar por inspeção rigorosa do Conselho Federal de
Ensino Superior. Mesmo contando com o apoio do médico Lauro Sodré Filho como
Inspetor Federal junto a Faculdade, pelo menos uma destas inspeções gerou algum
constrangimento.
Foi exatamente a inspeção realizada em 1926 pelo Dr. Paranhos da Silva, então
secretário do Departamento Nacional de Ensino. Aparentemente, enquanto esteve
em Belém, Paranhos “nunca revelou que tivesse recebido má impressão de nossa
Faculdade de Medicina. Ao contrario, falando da conveniencia do fechamento da
Escola de Odontologia, elle teria dito que ia propôr a annexação da mesma áquela
Faculdade” (Folha do Norte, 07.10.1926).
No entanto, após voltar ao Rio de Janeiro, o jornal carioca “A Manhã” publicou uma
reportagem, que logo foi divulgada em Belém via Folha do Norte, na qual afirmava
que Paranhos havia descoberto
128
escandalos incríveis, sobretudo na Faculdade de Medicina do Pará, aonde
estes escandalos são innominaveis.
Havia alli alumnos que, para matricular-se, apresentaram documentos, os
mais irrisórios, como attestados sem menor validade, entre os quaes os de
exame na Escola Normal e até de piloto fluvial.
Aprofundando as suas pesquizas, o dr. Paranhos teria verificado estarem clinicando medicos ahi diplomados nas mais graves condições. Um delles teria
entrado na Faculdade com simples preparatorios de um collegio particular;
outros com preparatorios feitos na Áustria, outros com simples preparatorios da “gripe”, e ainda outros com dois exames primarios apenas, prestados
em Lisboa. Este ultimo teria conseguido isso por haver emprestado dinheiro
sem juros á Faculdade e presenteados com cavallos de puro sangue a alguns
professores.
Assim, conclue a “Manhã”, em troca de duas ou tres cavalgaduras aos professores, estes, na sua gratidão, deram uma cavalgadura á medicina. E todos
estes medicos estão exercendo sua profissão, ou melhor, estão matando na
capital paraense (A INSPEÇÃO Paranhos ao Norte, 1926).
A reação local ao incidente foi dividida: enquanto uns escreveram violentos ataques pessoais a Paranhos, outros responderam defendendo-o afirmando que este
jamais teria dito tais coisas:
Que importam noticias estapafurdias estampadas em jornaes cariocas sedentos em espalhar novidades escandalosas sobre as cousas nacionaes?
A que para ca foi transmittida por telegramma, nem siquer tem caracter
de entrevista, que pudesse envolver a responsabilidade do dr. Paranhos
(DR. PARANHOS da Silva, 1926).
Paranhos responderia enviando um telegrama ao Dr. Dionysio Bentes (FMCP,
1926), então governador do Pará e um dos fundadores da Faculdade, e outro ao
Dr. Amazonas de Figueiredo, diretor do Colégio Paes de Carvalho (Folha do Norte,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
26.12.1926). Em ambos diria mais ou menos a mesma coisa: que jamais fez nenhuma declaração à imprensa e que conhecia bem a responsabilidade de suas funções
para ficar divulgando informações sigilosas; que nunca fugiu de suas responsabilidades e que suas ocupações não lhe deixavam tempo livre para ler e desmentir notícias tendenciosas; que tinha apenas tomado conhecimento de uma denúncia e que
esta após cuidadoso e sigiloso estudo havia sido arquivada por ser improcedente.
Por mais que Paranhos não tenha realmente feito aquelas declarações, são grandes
as possibilidades que alguma coisa tenha vazado e o jornal carioca tenha aproveitado
para criar uma pauta sensacionalista em torno de fatos não comprovados.
O relatório definitivo da visita de Paranhos, se não foi tão catastrófico como a notícia
que havia sido vinculada, também não foi tão benevolente: considerou as instalações
da Faculdade precárias funcionando em um prédio “velho e acanhado”, salvando-se
apenas o ensino de clínicas médicas ministrado pelo professor Acylino de Leão, por
se localizar na Santa Casa, que era um dos melhores hospitais da época18.
O fato não ameaçou a equiparação, mas ilustra como uma parcela da imprensa da então
capital federal estava pronta para ridicularizar a Faculdade de Medicina e Cirurgia do
Pará, um estabelecimento cuja criação talvez parecesse por demais audaciosa aos olhos
dos jornalistas cariocas. Realmente o tratamento depreciativo que os jornais do Rio
de Janeiro dedicavam a Faculdade não era novidade. Um ano antes, em 1925, aquela
imprensa carioca emitiria “palavras desfavoraveis quanto ao reconhecimento da Faculdade de Medicina” (Estado do Pará, 10.12.1925, p. 1), procurando demonstrar a “inefficacia de tal equiparação, por não preencher a faculdade, tanto no dominio techinico,
como administrativo as condições requeridas pela lei e pelo ensino alli proporcionado”
(Estado do Pará, 10.12.1925, p. 1) desmerecendo o preparo profissional “dos ministradores da sciencia medica no Pará” (Estado do Pará, 10.12.1925, p. 1).
Como se já não bastassem estas inspeções, alguns problemas internos volta e meia
vinham à tona ameaçando a equiparação. Um memorando de Camilo Salgado solicitando que determinado professor faltasse menos às aulas ilustra bem a situação:
Caso não possa devido a seus multiplos affazeres, reger esta disciplina,
peço scientificar disto o Conselho Technico Administrativo, afim de que
sejam tomadas medidas asseguratorias da efficiencia do ensino.
O Director Nacional de Educação, em repetidos telegrammas, tem solicitado o numero de faltas dadas pelos professores, todos os mezes.
Ha de convir V. Sa. que não fica bem nem para Faculdade nem para os
professores, fornecer a Directoria uma nota official, dando o numero de
faltas dadas pelos professores, o que poderia determinar a desequiparação desta Escola. (FMCP, 1937a).
Hoje, passados muitos anos do episódio da equiparação, nunca é demais lembrar o
esforço de Camillo Salgado e sua equipe para atingir este propósito. E se depois da
morte de Camilo, uma boa parcela da população acredita que ele realize milagres,
Equiparação a jato
129
mesmo os mais céticos hão de concordar que o grande milagre talvez tenha ocorrido ainda com ele em vida, e que foi não só conseguir a equiparação “relâmpago”
de uma Faculdade que ainda engatinhava por caminhos bastante tortuosos, como
também mantê-la equiparada ao longo dos anos, “transformando em realidade radiante a esperança dos por ela formados, de exercerem a profissão em toda a imensidade do território pátrio”.19
130
Foto 21: Palacete Santa Luzia no ano da equiparação da Faculdade de Medicina.
Fonte: FMCP (1944, s.p.).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
NOTAS
1
“A Associação Médico-Cirúrgica de Minas Gerais declarou, então, criada a
Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, na data de 5 de março de 1911,
quando governava o Estado Júlio Bueno Brandão. [...] Diante do relatório
apresentado pelo inspetor, em 20 de fevereiro de 1918, o Conselho Superior
de Ensino votou a favor da equiparação da instituição aos institutos congêneres, ato aprovado pelo Governo Federal, através de portaria de 21 de
março do mesmo ano” (FIOCRUZ, 2007).
2
“O Curso de Medicina e Cirurgia da Universidade do Parana foi criado em
1912. [...] Em 1922, a Faculdade de Medicina incluindo os cursos de farmacia e odontologia obteve reconhecimento oficial” (FIOCRUZ, 2007).
3
“A inauguração oficial da Faculdade de Medicina ocorreu no dia 16 de julho de
1920, quando foi proferida a aula inaugural pelo professor e diretor da instituição, José Octávio de Freitas. [...] Em 25 de julho de 1927, o Conselho Nacional
de Ensino emitiu parecer a favor da equiparação da Faculdade de Medicina do
Recife, sendo baixado ato pelo Ministro da Justiça e Negócios Interiores, Augusto Vianna do Castelo, em 27 de julho de 1927” (FIOCRUZ, 2007).
4
“A lei de criação da Faculdade foi regulamentada pelo decreto nº 2.344 de
31/01/1913. A aula inaugural, versando sobre física, foi proferida pelo professor Edmundo Xavier na Escola Politécnica de São Paulo, no dia 2 de abril
de 1913. Neste período, a lei nº 4.615 de 07/12/1922, assinada pelo Presidente da República, Arthur Bernardes, reconhecia em todo o país os títulos
emitidos pela Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo. A partir de
então, a Escola teve de se submeter à vigilância e fiscalização do Conselho
Superior de Ensino” (FIOCRUZ, 2007).
5
Em longa correspondência enviada ao Diretor do Serviço da Educação e
Saúde, Dr. M. A. Teixeira de Freitas, em 28 de outubro de 1948, o Diretor
da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães, faz um breve histórico da fundação, dizendo em determinado trecho: “Iniciou-se com o carater de Faculdade
integralmente livre, tolerada pelo Governo Estadual, sob a condição dos
profissionais por ela diplomados só poderem exercer a clinica no territorio
Estadual”. (FMCP, 1948b).
6
De acordo com propaganda publicada em Estado do Pará, o Dr. Lauro Sodré Filho era ex-medico auxiliar da mesma clinica da Santa Casa do Rio de
Janeiro, além de médico assistente do Instituto de Higiene. Seu consultório
localizava-se à travessa São Mateus nº15, altos da Alfaiataria Pinto, atendendo de 11h às 13h e de 16h30 às 18h30. (Estado do Pará, 24.11.1924, p. 3).
7
Lauro Nina Sodré e Silva foi governador do Pará de 1891 a 1897 e de 1917
a 1921, período de criação da Faculdade de Medicina. Exerceu ainda os cargos de deputado federal (1891 a 1893) e senador (1897 a 1902; 1903 a 1912;
1912 a 1917; 1921 a 1929 e 1930 a 1930). (BRASIL, Senado Federal, 2007).
8
“Recebeu o nome de Universidade do Rio de Janeiro e seu primeiro Reitor foi
o Barão Ramiz Galvão, médico, professor da Faculdade de Medicina e Diretor
da Instrução Pública”. (GOMES; VARGAS; VALLADARES, 2001, p. 34).
9
“Ainda não obtivemos auxilio pecuniário do governo federal e o do Estado,
não ignoraes, está em situação precaria embaraçosa...” Faculdade de Medicina do Pará (FMCP, 1923c, p. 12).
10
Camilo Salgado assume a Direção em 22 de abril de 1922. A Faculdade
passa a funcionar no palacete Santa Luzia em 1º de abril de 1924. No projeto
Equiparação a jato
131
132
de Federalização da Faculdade apresentado à Câmara pelo Deputado Federal
Deodoro de Mendonça em 23 de outubro de 1946, consta a data de 6 de abril
de 1923 como “inspeção preliminar” e a data de 24/9/1924 como “equiparação”, “por ato do Ministro da Justiça, consoante o art. 20 do Decreto 11.530,
de 18/3/1915” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946).
11
“O relatorio do primeiro anno de minha gestão foi apresentado em congregação da Faculdade, no mez de janeiro proximo findo, e, porque resolvessemos
pleitear acertadamente a fiscalisação do Conselho Superior de Ensino da Republica, delle enviamos copia aos eminentes membros dessa douta instituição,
os quaes, por maioria de votos, deferiram nosso pedido e, então, foi nomeado
fiscal o distincto clinico dr. Lauro de Almeida Sodré (Lauro Sodré Filho, filho do ex-governador do Pará. N.A.) Não preciso evidenciar a significação
do gesto do Conselho, que veiu prestigiar um estabelecimento que, ao principio combatido pelo estrépito maléfico dos descontentes e de espirito sombrio,
impoz-se por sua moralidade, de tanto rigor que chegou a ser considerada
clamorosa. Talvez em todo o Paiz — permittam-me o avanço de expressão
— sejam raríssimas as escolas livres, como a nossa, de idoneidade inabalável.
Mantida, aos primeiros tempos, pela exclusiva remuneração dos seus alumnos,
estes, em numero de monta, viam-se reprovados, ao fim do anno lectivo, á falta
de preparo demonstrado nos respectivos exames. E assim nos firmamos precocemente, erguendo como principal bandeira a moralidade do ensino superior,
que nunca por nós foi aviltado”. (FMCP, 1923c, p. 4).
12
“... a Faculdade Livre de Medicina do Pará, já dispondo de prédio proprio,
como a Faculdade de Direito e actualmente fiscalisada pelo Governo Federal, em processo de equiparação requerida; ...” (PARÁ. Governador (19211925: Antonino Emiliano de Souza Castro), 07.09.1923, p. 62).
13
“Projetam os professores e alumnos da Faculdade de Medicina promover
uma auspiciosa festa de regosijo pelo acto da equiparação concedido áquelle
Instituto, pelo Conselho Superior de Ensino da Republica.
A frente da sympatica iniciativa encontram-se os drs. Oswaldo Barbosa,
Oscar de Carvalho, Renato Chaves, Prisco dos Santos e Dagoberto Souza,
doutorandos Magno e Silva, Bianor Penalber, Teixeira Marques e Barbosa
Rodrigues, que envidam todos os esforços para que a reunião projectada se
revista e um cunho rigorosamente selecto e distincto.
O dia da festa ainda não está marcado, mas já está escolhido o local, que será
o Sport Club”. (Folha do Norte, 09 agosto de 1924, p. 3).
14
“Exmº. Snr. Dr. Presidente do Senado.
Approveitando a presente reunião do Congresso do Estado, é-me grato
dirigir-me á V. Excia., como presidente, para communicar a equiparação da
Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará ás suas congêneres officiaes, facto
occorrido numa das sessões do Conselho Superior do Ensino da República,
em Agosto próximo findo.
V. Excia. e os eminentes Senadores, cujo escopro não é outro senão o soerguimento brilhante do nosso grandioso Estado, hão de receber esta communicação com o enthusiasmo e o interesse sincero que merece o grande
passo progressista conquistado pelo ensino superior paraense, á custa de
sacrificios, que não foram diminutos.
A equiparação da Faculdade de Medicina é, não ha a negar, um symptoma de florescimento das nossas energias, que muito ainda poder dar em
beneficios do nosso futuro economico, que se auspicia magnífico, graças a
iniciativas de tamanho valor.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Sirvo-me da opportunidade para fazer um appello á V. Excia. e a seus dignos pares: que não faltem com o estimulo e o amparo, já dispensados no anno
transacto, ao principal estabelecimento scientifico do Pará, cuja manutenção
e progresso dependem do auxilio dos que se interessem pelo que é nosso,
com o patriotismo que não ha de faltar aos acatados membros do Senado.
Apresento a V. Excia. e aos Snrs. Senadores, as minhas homenagens muito cordiais.
Saude e Fraternidade”
(FMCP, 1930)
15
Ver nota nº13.
16
“O Conselho Superior de Ensino da Republica, em acto de julho findo reconheceu a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, officialisando o seu
ensino, justo premio ao merecimento da obra ingente que ella representa”.
(PARÁ. Governador (1921-1925: Antonino Emiliano de Souza Castro)
07.09.1924, p. 69).
17
O prof. Émile Brumpt era parasitologista e autor de um famoso compêndio
desta área (N.A).
18
Ver capítulo “O Hospital Escola Primaz - A Santa Casa no contexto da
Faculdade”.
19
Do ofício encaminhado em 28 de outubro de 1948 pelo Diretor, Dr. Lauro
de Magalhães, ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde, contendo “um
breve histórico da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará”.
(FMCP, Livro de Ofícios expedidos–1948b).
133
Equiparação a jato
134
10
Os Primeiros Médicos
135
136
Detalhe do gradil da FMCP.
Tendo iniciado suas atividades normais em 6 de maio de 1919, a Faculdade de Medicina do Pará diplomou seus primeiros médicos em 1924.
O acontecimento, inédito, repercutiu para além dos muros do casarão de Santa Luzia,
constituindo-se num evento público, que contou com concorrida assistência merecendo inclusive cobertura jornalística desde as primeiras reuniões, entre os doutorandos, para a discussão dos detalhes pertinentes às solenidades e comemorações.
Em Estado do Pará, de 9 de junho de 1924, temos a divulgação da reunião dos doutorandos “que em breve formarão a turma inicial de médicos paraenses”, “afim de
assentarem medidas sobre a sua colação de grau”. Por unanimidade foi escolhido o
professor Acylino de Leão, como paraninfo à turma, e Magno e Silva como orador.
O nome do Barão de Anajás, primeiro diretor da Faculdade, não foi esquecido, devendo seu retrato figurar no quadro de formatura, juntamente com os do Dr. Souza
Castro, governador e também professor da Faculdade, e do Dr. Lauro Sodré, governador a quando da fundação da Escola, “a cujo progresso ambos ligaram os seus nomes”. Ficou decidido, ainda, que deveria figurar no quadro de formatura, o retrato
do Dr. Lauro Sodré Filho, fiscal do Governo federal junto à Faculdade1.
Durante a reunião, o doutorando Bianor Penalber recordou a abnegação e o carinho com que o Dr. Camilo Salgado vinha trabalhando pela Faculdade, “com uma
coragem e uma decisão que venceram os maiores sacrifícios”, sendo merecedor da
gratidão e das homenagens dos primeiros médicos paraenses, ficando combinado
“que se trataria opportunamente das bases de um grande preito de reconhecimento
e amizade áquelle preclaro cirurgião”.
Ao final do encontro, Magno e Silva propôs que toda turma procurasse o Dr. Acylino de Leão “para dizer-lhe da satisfacção com que o acclamara seu paranympho”,
indicando o doutorando Bianor Penalber para “interpretar o sincero sentir de todos os collegas”.
À reunião compareceram os doutorandos Magno e Silva, Bianor Penalber, Teixeira
Marques, Hypolito Carelli e Ferro e Silva, deixando de comparecer o doutorando Honorato Filgueiras, por encontrar-se fora do Estado (Estado do Pará, 09.06.1924, p. 2).
Em Folha do Norte de 7 de dezembro de 1924 encontramos a notícia: “Os novos medicos. A 1ª turma de diplomados da Faculdade de Medicina do Pará”. O texto dava
conta dos exames realizados no dia anterior, pela manhã, com término às 11 horas,
e constituídos por provas práticas e orais de Clínica Médica, perante banca examinadora composta pelos professores Drs. Arthur França, Mattos Cascaes e Acylino
de Leão. Utilizando pacientes sorteados da Enfermaria São Pedro, os candidatos
tiveram 30 minutos para firmar o diagnóstico, trinta para sustentação oral e mais
trinta para argüição pela banca.
Os primeiros médicos
137
O resultado foi a aprovação plena de Antonio Magno e Silva e Bianor Martins Penalber com a nota 9; Honorato Remigio de Castro Filgueiras, com 8 e aprovação
simples de Hippolyto Carelli, com 5.
Os resultados dos demais exames foram:
Clínica Obstétrica: aprovados plenamente: Hippolyto Carelli, com 8; Bianor Penalber, com 7; Magno e Silva, com 6. Aprovados simplesmente: Honorato Filgueiras
e Antonio Ferro e Silva, ambos com nota 5.
Medicina Legal: aprovados plenamente: Honorato Filgueiras, Bianor Penalber,
Antonio Magno e Silva e Antonio Ferro e Silva, todos com nota 9; Hippolyto Carelli, com 8. A notícia registra, ainda que um aluno ficou reprovado2.
Estado do Pará também destacaria a conclusão de curso dos primeiros médicos
formados no Pará com notícia mais detalhada e mais festiva, certamente para isso
concorrendo o fato de Bianor Penalber trabalhar no referido jornal. Assim, com o
título “Os primeiros medicos formados neste Estado”, o jornal dizia que:
138
A Faculdade de Medicina do Pará teve hontem, nos annaes brilhantes de
sua existência, assignalada outra pagina victoriosa que é a mais expressiva
de todas, como marco do adeantamento a que pôde chegar o ensino superior do nosso Estado, cujas escolas, são mantidas sempre galhardamente.
Registou-se, com o termino das respectivas provas, a formatura da primeira turma de medicos paraenses, constituida apenas de quatro dos 58
candidatos matriculados em maio de 1919, na Faculdade de Medicina,
que chegou a firmar-se, em pouco tempo, pelo critério de moralidade,
base que foi de sua equiparação ás congeneres officiaes, verificada na reunião do Conselho Superior de Ensino da Republica, de agosto ultimo,
em face de um parecer honroso firmado pelos drs. Aloysio de Castro,
director da Faculdade de Medicina do Rio; Paulo de Frontin, director da
Escola Polytechnica, e Conde Affonso Celso, director da Faculdade de
Direito do Rio. Poucas serão, effectivamente, as Faculdades, livre como a
nossa, que registem porcentagem de reprovações tão elevada, mesmo no
ultimo ano, como acaba de suceder (Estado do Pará, 07.12.1924, p. 1).
A notícia concluía dizendo que o “illustre dr. Camillo Salgado, dedicado Director
da Faculdade de Medicina”, assistira as provas práticas, recebendo muitas felicitações pelo brilhantismo das mesmas2.
Antonio Magno e Silva era paraense, odontólogo formado no Rio de Janeiro, tendo
sido um dos fundadores da Escola Livre de Odontologia, e membro a Associação
Científica do Pará, que mantinha aquele curso e inicialmente manteve o de medicina,
também. Na ocasião, Magno e Silva era professor catedrático e Diretor do curso de
Odontologia, cargo que ocuparia até sua morte em1938 (RIBEIRO, 2005, p. 13).
Honorato Remigio de Castro Filgueiras era nascido no Ceará, tendo iniciado seu
curso na Faculdade Nacional de Medicina, no Rio de Janeiro, transferindo-se para
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Belém em 1922, matriculando-se com a turma que cursava o 4º ano (LEITÃO,
1985, p. 25).
Hippolyto Carelli tinha nacionalidade grega. Bianor Penalber era jornalista, atuando, além de Estado do Pará, em “A Semana”, revista de amenidades, ilustrada,
publicada à época. Ressalte-se que todos quatro formandos defenderam tese, o que
não era obrigatório, sendo assim conferido a eles o grau de doutor em medicina3.
Do mesmo modo que a conclusão do curso, a defesa das teses despertou o interesse
da imprensa, merecendo cobertura destacada. Assim, Estado do Pará, em 7 de janeiro de 1925, noticiava em primeira página:
Defesas de these
Encontram-se na secretaria da Faculdade de Medicina do Pará, afim de
serem defendidas perante as respectivas bancas examinadoras, já escolhidas em reunião de congregação, as theses da primeira turma de medicos
dalli saídos recentemente.
Apesar do caracter de facultativas, que lhe deu uma das ultimas reformas
do ensino, os novos esculapios paraenses assentaram todos apresentar o
trabalho escripto que vae merecer a critica e o julgamento dos mestres.
Os assumptos escolhidos para as theses apresentas são os seguintes: “Etiopathogenia das cirroses (dr. Magno e Silva); “Contribuição ao estudo do tratamento da filariose” (dr. Bianor Penalber); “Docimasia pulmonar” (dr. Honorato
Filgueiras) e “Hygiene da tuberculose” dr. Hyppolito Carelli.
Parece definitivamente marcada a proxima semana para a defesa respectiva, que se vae realizar pela primeira vez no Pará (Estado do Pará,
07.04.1925, p. 1).
Na semana seguinte, o mesmo jornal fazia referência ao início das defesas das teses,
informando que o primeiro a defender seria Magno e Silva, o que não ocorreu5,
cabendo esta primazia a Bianor Penalber, conforme o mesmo jornal, em 15 de abril
de 1925, em que é destacada a participação do referido jornalista e, agora, doutor
em medicina, sem esquecer de mencionar Camilo Salgado:
Defesas de These – o acto de hontem na Faculdade de Medicina
Pela primeira vez, no Pará, registou-se a solennidade de uma defesa de
these medica, verificada na manha de hontem, com assistencia vultuosa,
na Faculdade de Medicina. Os novos esculápios, que haviam concluído o
curso em dezembro ultimo, em numero de quatro, resolveram apresentar
these e defendel-a perante os professores, apesar do caracter facultativo
de que hoje ella se reveste. Dos candidatos inscriptos fôram chamados os
drs. Bianor Penalber e Magno e Silva.
A banca examinadora do primeiro, constituindo assumpto de therapeutica, estava formada pelos Profs. Matos Cascaes, Oscar de Carvalho e
Rodrigues de Souza. Ás oito horas, teve inicio o acto, declarando o dr.
Cascaes, que falou por espaço de quarenta minutos, a bôa impressão que
lhe causara a these em julgamento, lida com particular carinho, tendo em
consideração as tradições de talento e apurado gosto pelo estudo de medi-
Os primeiros médicos
139
cina, que o dr. Bianor Penalber deixára na Faculdade, alvo, portanto, das
sympathias dos mestres. Tinha o prazer de confessar, perante aquella assistência, que a these em alusão, apesar da declaração modesta do autor,
no preambulo, possuia o seu valor. Era uma questão, a do tratamento do
assacuhy no combate á filariose. E se era uma questão aberta, predestinada a melhores observações, o seu apêllo era por que o proprio dr. Bianor
prosseguisse num estudo mais minucioso, quer sobre o principio activo
da planta, como outras particularidades, pois não lhe faltavam qualidades de merito e que constituem, por certo, a segurança de um futuro
brilhante na carreira encetada. Conhecia muito bem o valor do candidato
cuja these commentava e tão seguro estava, naquelle momento de despedida final, que elle nunca maccularia a brancura do seu arminho. Além
de tudo, para recommendal-o fôra abrigar-se á sombra da sabedoria de
Camillo Salgado, o notável cirurgião, que era capaz de operar tudo, até a
realidade da Medicina do Pará (Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2).
Conforme o jornal, o Dr. Matos Cascaes fez uma “peroração brilhante, por vezes de fundo altamente scientifico”, entremeando com frases de incentivo ao Dr. Bianor Penalber.
140
Em seguida, falou o Dr. Oscar de Carvalho, que declarou nada mais ter a dizer
depois da majestosa oração do seu antecessor, mas ainda assim afirmou que, se
nada valesse a tese, “bastava a colaboração de Camillo Salgado para emprestar-lhe
realce absoluto” (Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2). Após fazer eruditas e bellas considerações sobre as manifestações pathologicas da filariose”, concluiu felicitando o
candidato, considerando-o digno de todos os louvores.
Após a manifestação do Dr. Rodrigues de Souza,“que em expressões muito carinhosas
manifestou solidariedade com o pensamento acertado de seus companheiros de banca”,
foi a vez do Dr. Bianor Penalber. Confessando que ali chegara, timidamente, perante os
mestres, convicto que sua tese iria sofrer “uma accusação cerrada”, o que não chegou
a ser realidade, pois emocionado ouvira “uma chuva de elogios e incentivos”, viu que
“os illustres professores não procuraram diminuir seu trabalho; antes, muito generosos,
exalçaram-no demais, a alturas immerecidas”. E aproveitou o ensejo para numa confissão
sincera proclamar perante aquela assistência que se os aplausos o estimulavam e confortavam, “eram mais uma significativa justiça ao muito que vale o seu preclaro e presado
mestre Prof. Camillo Salgado, que o orientára no assumpto da these”. Num compromisso solene, conforme dissera o prof. Cascaes, prometia que jamais haveria de “macular a
brancura do seu arminho de medico, turvando os esplendores da profissão abraçada, para
a qual levára como ensinamentos a cultura fulgurante e a verticalidade moral de seus
mestres”(Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2). Segundo o jornal, “a banca examinadora approvou a these do dr. Bianor Penalber com distincção” (Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2).
Em seguida foi a vez de Antonio Magno e Silva defender sua tese. Examinado
pelos professores Acylino de Leão, Oswaldo Barbosa e Arthur França, o candidato
mereceu rasgados elogios de todos em consideração sobre o assunto da tese, na qual
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
“se havia discordancia de doutrinas nenhum deixou de reconhecer a obra de esforço
e de valor apresentada pelo dr. Magno em mais de cem paginas impressas.” Após a
manifestação dos outros dois professores, o prof. Oswaldo Barbosa, tendo discorrido
demoradamente sobre a etiologia das cirroses, concluiu dizendo que “se agradava
em affirmar que o dr. Magno e Silva fazia honra á primeira turma da Faculdade de
Medicina do Pará, pelo destacado fulgor com que se devotára ao tirocínio acadêmico”. Também foi aprovado com distinção”. A notícia conclui dizendo que “ambos os
candidatos foram vivamente felicitados (Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2).
A revista “A Semana”, de 18 de abril de 1925, assim destacaria a participação de
ambos os médicos. Sobre o Dr. Bianor Penalber e sua “brilhante defesa de these”:
Bianor Penalber continua a manter, e sempre em horizontes muitos altos, as
suas tradicções de intelligencia e acendrado amor ao estudo. Tendo terminado o curso medico em dezembro ultimo, coroado de louros, o nosso festejado
collaborador e apreciado intellectual, escreveu uma these e defendeu galhardamente perante os professores da Faculdade de Medicina do Pará. Foi mais
uma conquista expressiva e mais um triumpho assignalavel para o talentoso
e distincto medico nosso conterraneo. Os mestres classificaram-na optima e
deram lhe, justamente, a approvação mais elevada distincção.
Em relação ao Dr. Magno e Silva:
Foi muito brilhante e applaudida a defesa de these do dr. Magno e Silva,
que é uma das mais lidimas affirmações de talento e competencia da turma de medicos recém formados.
Versou o seu magnifico trabalho sobre a “Etio pathogenia das cirroses” e
merceu de professores acatados, como Acylino de Leão, Arthur França e
Oswaldo Barbosa, os rasgados encômios (Revista A Semana, n. 365, 1925).
Honorato Filgueiras defenderia sua tese no dia 16 de abril de 1925, conforme Estado do Pará, perante a comissão julgadora composta pelos professores Renato Chaves, Prisco dos Santos e Francisco Pondé. De acordo com a notícia, “o novo medico
discorreu sobre o assumpto com grande proficiencia, respondendo, com segurança,
ás inquirições da banca examinadora durante tres horas seguidas, merecendo aprovação com distinção” (Estado do Pará, 18.04.1925, p. 1).
A defesa de tese de Hipolyto Carelli aconteceria em 18 de abril, ainda segundo Estado
do Pará, que também informava ter o novo médico colado grau no mesmo dia6.
A defesa das teses continuaria rendendo notícia, uma vez que os novos doutores
encaminhariam seus trabalhos ao jornal, que divulgaria o fato, inclusive com comentários acerca do assunto abordado, com maior destaque, para Bianor Penalber
(Estado do Pará, 19.05.1925, p. 1).
A despeito do noticiário do jornal sobre a conclusão do curso, a cerimônia de colação de grau seria realizada somente no dia 16 de abril de 1925, depois da defesa das
Os primeiros médicos
141
teses7. Conforme assento no Livro de Colação de Grau da Faculdade, na data referida, às nove horas, na secretaria da Faculdade, na presença dos professores Doutores
Acylino de Leão Rodrigues, Dagoberto Rodrigues de Souza e Oscar Pereira de Carvalho, o Doutor Camilo Salgado, na qualidade de Diretor da Faculdade, conferiu o
“gráo de doutor em medicina“ a Antonio Magno e Silva e Bianor Martins Penalber
“depois de terem os referidos doutorandos prestado o juramento exigido e o Doutor
Director pronunciado as palavras usadas nestas solemnidades”. Estes, portanto, foram os primeiros médicos formados pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
A cerimônia de colação de grau dos outros dois concluintes aconteceu em 18 de
abril de 1925. Desta feita receberam o grau de doutor em medicina Honorato Remigio de Castro Figueiras e Hippolyto Carelli,
perante os professores Doutores Antonio Remigio de Castro Filgueiras,
paraninpho, Gabriel Rodrigues de Souza, Renato Chaves da Silva e Souza, Francisco de Souza Pondé, João Prisco dos Santos, Argemiro Orlando
Pereira Lima, Hermógenes Pinheiro, Deusdedit Coelho e Oscar Pereira
de Carvalho, o excellentissimo senhor Director Doutor Camillo Henrique Salgado, depois de terem os doutorandos prestado o juramento de
estylo, o Doutor Director depois de proferidas as palavras usadas nestas
solemnidades, conferiu-lhes o grão de doutor em medicina8.
142
Pelo que se depreende, a cerimônia de colação da primeira turma não teve um caráter solene, ainda que tal fosse previsto no Estatuto da Faculdade, como a publicação na imprensa da relação dos colandos, a convocação de todos os professores
catedráticos, substitutos, honorários e convidados “pessoas notáveis pelos seus títulos científicos, ou literários, como pela posição social”, sendo ainda permitido aos
graduandos dar todo realce à solenidade (FMCP, 1933. Art. 245, p. 46).
Como a Faculdade do Pará já estava equiparada às suas congêneres oficiais desde
4 de setembro daquele ano, o diploma recebido pelos formandos do Pará teria validade em todo território nacional. Na ocasião o fiscal federal junto à Faculdade era
o Dr. Lauro Sodré Filho.
A partir do ano seguinte, em 1926, com o evento acontecendo no salão nobre da
Santa Casa, a formatura assumiria pela primeira vez um caráter mais solene e por
esta peculiaridade também merece ser destacada. Na verdade as celebrações tiveram início ainda em dezembro de 1925. Estado do Pará em nota de 11 de dezembro
intitulada “Os Médicos de 1925” menciona que:
Com os exames de clinica medica, realizados ante-hontem na Santa Casa
de Misericórdia concluiram o curso na Faculdade de Medicina os drs.
Antonio Barbosa Rodrigues, Jorge Maia, Antonio Siqueira Mendes, Tertuliano de Cerqueira e Isauro Costa, que faziam parte da turma de 33
alumnos do anno de 1920.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
O jornal destacava ainda que as últimas provas práticas ocorridas na Santa Casa
haviam sido assistidas por elevado número de pessoas entre médicos e estudantes
“em cujo espírito, certo, ficou a melhor impressão que os candidatos deixaram da
efficiencia da pratica hospitalar” (Estado do Pará, 11.12.1925, p. 1).
A banca examinadora que aprovou a todos plenamente foi constituída pelos professores Acylino de Leão, Oswaldo Barbosa e Arthur França. Para comemorar o fim
do curso os novos médicos festejaram todos à noite em um jantar no “Rotisserie
Suisse” (Estado do Pará, 11.12.1925, p. 1), ocasião em que:
Gentilmente convidado a participar do agradavel agape, o dr. Bianor Penalber brindou os novos medicos, á sobremesa, para os quais teve palavras de muito carinho e enthusiasmo, convidando-os a beber pela felicidade, sempre ininterrupta, do preclaro mestre dr. Camillo Salgado, que
não podia ser esquecido naquelle momento de justas alegrias (Estado do
Pará, 11.12.1925, p. 1).
E eis que em 10 de janeiro de 1926 às oito horas da manhã teria início a programação
daquela que seria a primeira formatura solene da Faculdade de Medicina do Pará.
A cerimônia começou com missa de ação de graças rezada na capela da Santa Casa
pelo cônego Clemente Contente, com a presença das irmãs de Santanna de serviço no hospital, familiares dos colandos e numerosos convidados (Estado do Pará,
11.01.1926, p. 2).
Terminada a missa os presentes se dirigiram ao Salão Nobre da Santa Casa “aonde já
era enorme a affluencia de cavalheiros e famílias da nossa melhor sociedade, bem assim
de auctoridades, civis, militares e ecclesiasticas” (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2).
Às nove horas chegou o então Governador do Estado, Dr. Dionysio Bentes, acompanhado de seu assistente militar, Major Antônio Nascimento, sendo recebido no alto da
escadaria da entrada da Santa Casa pelo diretor da Faculdade Camilo Salgado, pelos
membros da congregação e pelos novos médicos (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2).
Já no salão nobre daquele hospital Camilo Salgado assumiu a presidência da mesa
e deu por iniciada a sessão, dizendo algumas palavras alusivas ao ato. Foi feita a
chamada dos doutorandos Jorge Alves Maia, Antonio Barbosa Rodrigues, Antonio
Siqueira Mendes, Isauro Gonçalves da Costa e Manuel Tertuliano de Cerqueira, os
quais foram introduzidos no recinto pelo seu paraninfo Orlando Lima, e tomaram
lugar na bancada da congregação onde já se encontravam os professores Acylino
de Leão, vice-diretor da Faculdade, Prisco dos Santos, Renato Chaves, Lauro Sodré
Filho, Oscar de Carvalho, Amanajás Filho, Dagoberto de Souza e Matos Cascaes
(Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2).
Jorge Alves Maia proferiu em português o juramento clássico “de pé, face á mesa
da presidência”, com a mão estendida horizontalmente9. O diretor da FaculdaOs primeiros médicos
143
de, também em português, proferiu a fórmula consagrada10. Após longa salva de
palmas seguiu-se o juramento e colação de cada um dos doutorandos que foram
“igualmente muito applaudidos”.
Terminada a colação, Camilo Salgado passou a presidência ao Governador do Estado (Estado do Pará, 11.01.1926), o qual concedeu a palavra ao orador da turma
Isauro Gonçalves da Costa “que preferiu bem elaborado discurso” (Estado do Pará,
11 de janeiro de 1926, p. 2).
Depois subiu a tribuna Orlando Lima que proferiu “uma bella peça oratória, cheia
de conselhos e ensinamentos scientificos, tendo arrancado vibrantes applausos á
assistencia” (Estado do Pará, 11 de janeiro de 1926, p. 2).
Na sequência usou então da palavra o governador, Dr. Dionysio Bentes:
...o qual, num feliz improviso, sauda os novos medicos, concitando-os a
praticar medicina como um sacerdócio, procurando dignifica-la dignificando-se a si mesmos.
Sua Excelência extende-se em considerações acerca da medicina, externando profundos conceitos scientificos (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2).
144
Depois de terminada a cerimônia de colação de grau, por volta das dez e meia da
manhã, todos os presentes se dirigiriam à sede da Faculdade de Medicina, onde
por iniciativa dos novos médicos iria ser inaugurado um retrato a óleo do diretor
Camilo Salgado11.
Uma vez ali reunidos, o Governador do Estado assumiu a presidência do ato e
explicou que o motivo daquela reunião era pagar uma dívida de gratidão da Faculdade de Medicina e do Pará ao seu “eminente director e querido filho, o dr. Camillo
Salgado honra e glória da classe medica paraense e legitimo orgulho da cirurgia
brasileira” (Estado do Pará, 10 de janeiro de 1926, p. 1).
Usou da palavra então o orador oficial da cerimônia Antonio Barbosa Rodrigues, que
preferiu rápido discurso oferecendo à Faculdade de Medicina o retrato de seu diretor.
Em seguida foi descerrada a bandeira nacional que cobria o retrato de autoria de
Manoel Pastana12 e que até então havia ficado exposto na Livraria Universal (Estado do Pará, 19 de dezembro de 1925, p. 1). Realizaram o descerramento o juiz seccional Luiz Estevão e o cônego Lemereier, representante do arcebispado (Estado do
Pará, 11 de janeiro de 1926, p. 2).
Após longos aplausos Camilo Salgado visivelmente emocionado agradeceria ressaltando a sinceridade do gesto, alegando que: “Levantaste por demais longe vossa
estima por mim, e é essa verdadeira demasia de generosidade, transbordante de
grandeza de vossas almas, que me sensibiliza muito e me faz agradecido” (Estado
do Pará, 11 de janeiro de 1926, p. 2).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Referiu ainda nada ter realizado para merecer a homenagem, pois tudo que fizera
fora estimular os estudantes - com o calor de seu afeto, de sua lealdade e de seu
civismo - a não desanimarem e vencerem os maiores sacrifícios. Desejou as maiores
felicidades na carreira dos novos médicos confiando “sinceramente no desempenho
honesto e brilhante de vossa nova actividade”. E finalizou:
Aonde o destino vos leve, para as sublimes bellezas do vosso sacerdócio, sede médicos capazes da honra desse titulo! E, desse modo, nenhum
contentamento mais forte poderá experimentar, empenhado em vossas
venturas, o humilde amigo, grato que sou, e que não esquecerá a ternura
tocante desta homenagem, tão benevola quanto immerecida!
Ide! Sêde felizes! (Estado do Pará de 11.12.1925, p. 1).
Durante a cerimônia de colação de grau tocou a banda de música da Força Pública
“em frente ao Salão Nobre da Santa Casa e na Faculdade de Medicina” (Estado do
Pará , 11 de dezembro de 1925, p. 1).
Camilo seria, pois, homenageado ainda em vida, com a introdução de seu retrato na
galeria dos professores, quando, conforme o Regimento Interno, esse fato somente
ocorreria após a morte do professor. Seria o início da interminável série de homenagens que receberia ao longo da vida e também depois de morto.
É preciso registrar que a quantidade diminuta de formandos, a despeito do número
inicial de alunos deveu-se, provavelmente, aos rigores do curso assim como ao fato
de muitos alunos já serem profissionais em outras áreas, conforme citado na ata
de inauguração, dificultando a conciliação das atividades durante o curso médico;
outros desistiram devido aos custos das mensalidades e outras taxas cobradas; alguns mais, transferiram-se para outras faculdades, certamente por não apostarem
na sobrevivência do projeto da nova escola.
O número reduzido de alunos, que persistiria por muitos anos, fato sempre citado
nos Relatórios anuais das atividades da Faculdade, aliado às matriculas gratuitas
como contrapartida à subvenção estadual e ao atraso no repasse da referida subvenção, dificultavam sobremodo o crescimento da Faculdade.
Somente a partir dos anos de 1930 é que o número de alunos e, consequentemente,
de formandos aumentaria significativamente, com a Faculdade diplomando uma média de vinte alunos por ano, passando a se constituir, verdadeiramente, as turmas.
NOTAS
1
Nenhuma informação conseguimos obter sobre o destino do quadro e até se
chegou a ser confeccionado. Apesar do aparente interesse da imprensa sobre
o evento, nada consta de cobertura fotográfica nos jornais da época. (N.A.).
2
Trata-se de Antônio Ferro e Silva, visto que este só colaria grau em 7 de
agosto de 1926. Ver capítulo “Colação de Grau- Cerimonial e Formandos até
Os primeiros médicos
145
146
1950”. O curioso é que Estado do Pará, de 29 de março de 1925, publica nota
com o título “Os novos medicos”, inclusive com foto, informando que o Dr.
Antonio Ferro e Silva acabara de concluir o curso médico na Faculdade de
Medicina e Cirurgia do Pará, o que era “uma justa e merecida recompensa
aos seus esforços”, por ser ele “um dos mais applicados alumnos da primeira
turma de médicos pela nossa conceituada Faculdade de Medicina” Finaliza
dizendo que pelo feito, Dr. Ferro e Silva, que era também, farmacêutico, “tem
sido muito cumprimentado” (Estado do Pará, 29.03.1925, p. 1).
3
A presença de pessoas importantes assistindo ao exames tinha a finalidade
de conferir mais credibilidade às provas. Deste modo, em novembro de 1924,
a imprensa destacava a presença do Dr. J. Ausier Bentes, Diretor da Profilaxia Rural e livre docente de Higiene da Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro, que em Belém assistira as provas orais da referida disciplina, realizados pelos alunos do 6º ano da Faculdade. Ao final felicitou o Dr. Prisco dos
Santos, professor da cadeira, pelos belos exames, ressaltando que estes haviam ultrapassado sua expectativa, se equiparando “brilhantemente áquelles
realizados na Faculdade do Rio de Janeiro (Estado do Pará, 29.11.1924).
4
Ver capítulo “Os Doutores e suas Teses”.
“Iniciam-se amanhã, ás 8 horas, as defesas de these dos alumnos que concluíram o curso medico. Será chamado o doutorando Antonio Magno e Silva.
A banca examinadora está assim constituída: drs. Acylino de Leão, Oswaldo Barbosa e Arthur França. (Cadeira de Clinica Medica)”. (Estado do Pará,
14.04.1925, p. 1).
5
“Defendeu these hontem pela manha, na Faculdade de Medicina, o dr. Hipolyto Carelli, da primeira turma de nossos medicos. A banca examinadora
compunha-se dos drs. Renato Chaves, Francisco Pondé e Prisco dos Santos
e a these é intitulada ‘Profilaxia da tuberculose’, tendo sido approvada. Hontem mesmo o dr. Carelli collou grau na secretaria da Faculdade” (Estado do
Pará, 19.04.1925, p. 1).
6
Estado do Pará, de 16 de abril de 1925 noticia a colação de grau de Bianor
Penalber como tendo acontecido no dia anterior, data da defesa da tese: “Colou
grau, hontem, na Faculdade de Medicina, o dr. Bianor Penalber, nosso apreciado colaborador. O novel medico, que obteve approvação distincta na defesa de
sua these, merecendo os mais francos e justos elogios dos seus mestres, é uma
das mais formosas intelligencias da actual geração de moços, e a quem, por isso
mesmo, se abrem os mais amplos horizontes para reaffirmar, na vida pratica,
os triumphos que lhe coroaram o invejavel tirocínio academico”.
7
As palavras a que se refere o texto são: “Lêde e meditae as obras de Hippocrates; regule-se a vossa vida pela sua e os homens cobrirão de bençãos
o vosso nome. Recebei este annel como symbolo do grau que vos confiro.
Podeis praticar e ensinar a MEDICINA”. Formulas de juramento e de investidura (FMCP, 1935d, p. 78).
8
“Prometto exercer sempre a medicina com honestidade, caridade e sciencia.
No lar alheio os meus olhos serão cegos, e muda minha bôcca para guardar
religiosamente os segredos que me forem confiados, o que terei como ponto
capital de honra. Nunca tambem usarei da medicina para corromper os costumes e favorecer o crime” (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2).
9
“Lê e medita a obra de Hippocrates. Seguindo os seus exemplos, alcançarás as bênçãos da humanidade. Recebe este anel, symbolo do grau que te
conferimos” O fato foi visto pelo jornal como uma quebra de tradição já que
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o juramento e a fórmula proferida pelo diretor costumavam ser em latim.
Entretanto tal fato foi interpretado como uma homenagem à língua portuguesa. A tradução para o português foi feita por Edgar Serra Freire, repórter
do jornal (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2).
11
Há menção, também, de que o doutorando Jorge Alves Maia discursaria
e ofereceria o quadro de formatura ao paraninfo à turma. (Estado do Pará,
10.01.1926, p. 1).
12
Estado do Pará de 11 de dezembro de 1925, p. 1 atribui a autoria do quadro
ao Sr. Fidanza, possivelmente trata-se de um erro já que Fidanza era fotógrafo e não pintor como Manuel Pastana.
147
Foto 22: “Grupo de alunos do terceiro ano que na presente época de exames tiveram acesso
para o quarto. São os que se acham em pé, notando-se da esquerda para direita os Srs.
Antônio Ferro e Silva, Magno e xxx
Sivla, J. J. Teixeira Marques, Bianor Penalber,
Hipólito Carelli. Sentados ao centro os Drs. Barão de Anajás e Camillo Salgado,
diretor e vice-diretor da faculdade, ladeados pelo Dr. Acylino de Leão, Américo Campos,
Prisco dos Santos e Dagoberto de Souza, professores em exercício do terceiro ano”.
Fonte: Revista A Semana em 14 de Janeiro de 1922, número 197.
Os primeiros médicos
Magno e Silva
148
11
Professores,
Cátedras e
Docências
149
150
Detalhe de um dos pisos da FMCP.
Desde sua fundação a Faculdade de Medicina contou com grande número de professores. Muitos ligaram definitivamente seus nomes ao Palacete Santa Luzia; outros tiveram uma passagem efêmera pelo curso, sendo praticamente engolidos pela
poeira do tempo. De qualquer maneira todos contribuíram para formação de um
pensamento médico da região.
Com relação aos professores fundadores existem discordâncias entre as fontes pesquisadas. No capítulo relativo ao curso de Medicina, nos Anais do Simpósio sobre
a História da Ciência e da Tecnologia no Pará, são relacionados como fundadores
da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará os seguintes:
Drs. Camilo Salgado, Ofhyr Loiola, Hermógenes Bentes Pinheiro, José Alves Dias
Júnior, Antônio Porto de Oliveira, João Batista Pena de Carvalho, Gabriel Rodrigues
de Souza, Dagoberto Rodrigues de Souza, Antônio Acatauassú Nunes Filho, Américo Campos, Renato Chaves, Antônio Marçal, Arnóbio Franco, Antônio Remígio
de Castro Filgueiras, Arthur França, Oswaldo Barbosa, Juliano Pinheiro Sozinho,
Mário Chermont, Geminiano Coelho, Dionísio Auzier Bentes, Evaristo Silva, Acylino de Leão Rodrigues, Salgado dos Santos, Antonino Emiliano de Souza Castro,
Cruz Moreira, Lauro Magalhães, Izidoro Azevedo Ribeiro, Pedro Miranda, Jayme
da Silva Rosado, Agostinho de Menezes Monteiro e Antônio Joaquim da Silva Rosado (LEITÃO, 1985, p. 28).
Já a ata de fundação da Faculdade, em 1 de maio de 1919, reproduzida no Relatório
de 1944, ano do Jubileu do curso, dá como participantes da referida fundação os
seguintes professores: Barão de Anajás (Diretor), Penna de Carvalho, Francisco
Caribé da Rocha, Acylino de Leão, Mario Chermont, Arnobio Franco, Camillo Salgado dos Santos1, Porto de Oliveira, Camillo Salgado (vice-Diretor), Raymundo de
Mattos Cascaes, Jayme Rosado e Evaristo Silva (FMCP, 1945c, p. 67).
Entretanto, na notícia do jornal Estado do Pará, de 3 de maio de 1919, temos:
Presidindo a sessão o sr. Barão de Anajás, director da Faculdade
[...]
Assistiram ao acto as seguintes pessoas [...] drs. Penna de Carvalho,
Caribé da Rocha, Cruz Moreira, Camillo Salgado, Hermógenes Pinheiro, Mattos Cascaes, Otto Santos, Camilo Salgado dos Santos, Acylino de
Leão, Evaristo Silva, Jayme Rosado, Mario Chermont e Porto de Oliveira, do corpo docente da Faculdade.
Teríamos, assim, um impasse: quem seriam os fundadores da Faculdade? Todos os que
participaram de reuniões, discussões, etc. e da fundação em 9 de janeiro de 1919, de que
não conseguimos documentação a respeito? Somente os que estiveram na sessão de
instalação? Ou seriam os primeiros professores empossados, em 3 de abril de 1919:
Mario Midosi Chermont, Física Médica;
Camillo Salgado dos Santos, Química Médica;
Professores, cátedras e docências
151
152
Francisco Caribé da Rocha, História Natural Médica;
Hermogenes Pinheiro, Anatomia Descritiva;
Fernandes Penna, Histologia;
Dyonisio Auzier Bentes, Fisiologia;
Acatauassú Nunes Filho, Microbiologia;
Mattos Cascaes, Terapêutica Clínica e experimental e arte de formular;
Barão de Anajáz, Patologia Geral;
Jayme Aben-Athar, Anatomia e Fisiologia Patológicas2;
Raymundo da Cruz Moreira, Anatomia médico-cirúrgica e operações;
Carlos Arnobio Franco, Higiene;
Francisco de Souza Pondé, Medicina Legal;
Acylino de Leão Rodrigues, Clínica Médica, primeira cadeira;
Arthur França, Clínica Médica, segunda cadeira;
A. de Souza Castro, Clínica Médica terceira cadeira;
Oswaldo Barbosa, Clínica Médica, quarta cadeira;
Camillo Salgado, Clínica Cirúrgica primeira cadeira;
Oscar de Carvalho, Clínica Cirúrgica, segunda cadeira;
Lauro Magalhães, Clínica Cirúrgica, terceira cadeira;
Silva Rosado, Clínica Ginecológica;
Pedro Miranda, Clínica Oftalmológica;
Clidenor Freitas, Clínica Otorrinolaringológica;
Cyriaco Gurjão, Clínica Pediátrica Médica e Higiene infantil;
Otto Santos, Clínica Pediátrica Cirúrgica e Ortopédica;
Azevedo Ribeiro, Clínica Dermatológica e Sifiligráfica;
Evaristo Silva, Clínica Neurológica;
Antonio Porto de Oliveira, Clínica psiquiátrica;
Agostinho Monteiro, Clínica Obstétrica;
Jayme Rosado, Radiologia Clínica (FMCP, [1950]).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
153
Foto 23: Professores em exercício reunidos em 1922 para edição comemorativa
da revista Pará-Médico. Ao centro Camilo Salgado já como diretor ladeado a sua
direita pelos professores Américo Campos, Amanajás Filho e Prisco dos Santos,
a sua esquerda Mário Chermont, Antônio Marçal, Remigio Filgueiras
e Acatauassú Nunes Filho.
De pé da esquerda para direita Rodrigues de Souza, Gaston Vieira,
Acylino de Leão, Dagoberto de Souza e Ophir de Loyola. O último homem
não é identificado na foto.
Fonte: Pará-Médico (1922, p. 363).
Professores, cátedras e docências
Esse grupo inicial sofreria várias alterações já nos primeiros anos. Má remuneração, falta de vocação para o magistério, melhores possibilidades em outros empregos ou pura e simples descrença com a nova Faculdade podem ter sido alguns
fatores que fizeram com que o início dos anos 1920 ficassem marcados por um
enorme entra-e-sai de professores3.
Enquanto o curso progredia alguns professores eram deslocados constantemente
como professores interinos ou substitutos de disciplinas diversas, uma vez que
os verdadeiros lentes destas encontravam-se “impedidos”. Assumiam assim várias
disciplinas ao mesmo tempo.
Tal fenômeno era comum também em outras escolas médicas iniciantes dada à
falta de professores. Na Faculdade de Medicina do Paraná estes docentes que se
desdobravam por várias disciplinas receberam o apelido de “Gramofones Universitários” (FIOCRUZ, [2007a]).
154
Um exemplo de “Gramofone Universitário” na Faculdade de Medicina e Cirurgia
do Pará seria o cirurgião João Prisco dos Santos. Ele entrou ali em 15 de abril de
1921 como lente substituto de Microbiologia, mas logo seria convidado também
a reger interinamente Fisiologia (1ª e 2ª cadeiras) em agosto daquele ano (FMCP,
[1950]). Em 30 de março de 1922 foi nomeado catedrático de Anatomia e Fisiologia Patológica, onde permaneceu até ser transferido para a cátedra de Higiene, em
12 de janeiro de 1924 (FMCP, [1950]). Em seguida, passou, ainda interinamente,
para Histologia normal, em 5 de agosto de 1924, e Patologia Geral, em 2 de julho
de 1926, percorrendo assim um longo caminho até chegar à cátedra na qual é mais
lembrado: Clínica Propedêutica Cirúrgica e Clínica Cirúrgica (FMCP, [1950]).
Outro professor que não ficou atrás nesta versatilidade foi Renato Chaves da Silva
e Souza, que passou por Higiene e Medicina Legal, Anatomia descritiva, Anatomia
Médico-Cirurgica, Operações e Aparelhos, até chegar a catedrático de Medicina
Operatória, em 16 de junho de 1925 (FMCP, [1950]).
Com cinco anos de funcionamento, a Faculdade parecia mais estabilizada e o Regimento Interno apresentava o corpo docente constituído pelos seguintes professores e suas respectivas cadeiras:
Mario Midosi Chermont
Antonio Marçal
Juliano Pinheiro Lyra Sobrinho
Geminiano Alves Coelho
Hermogenes Pinheiro
José Alves Dias Junior
João Evaristo da Silva
Antonio Remigio de Castro Filgueiras
Física Medica
Química Medica
História Natural e Parasitologia
Química Biológica
Anatomia Descritiva (1ª parte)
Anatomia Descritiva (2ª parte)
Histologia Normal
Fisiologia (1ª parte)
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Americo Vitruvio Gonçalves Campos
Antonio Acatauassú Nunes Filho
Oscar Pereira de Carvalho
Gabriel Rodrigues de Souza
Jayme Jacyntho Aben-Athar
Renato Chaves da Silva e Souza
Dagoberto Rodrigues de Souza
Raymundo F. de Mattos Cascaes
João Prisco dos Santos
Francisco de Souza Pondé
Acylino de Leão Rodrigues
Oswaldo Ferreira Barbosa
Arthur Pinto de França
Antonino Emiliano de Souza Castro
Hygino Amanajás Filho
Camillo Henrique Salgado
Raymundo da Cruz Moreira
Lauro Antunes de Magalhães
Otto Santos
Agostinho de Menezes Monteiro
Argemiro Orlando Pereira Lima
Antonio Joaquim da Silva Rosado
Ophyr Pinto de Loyola
Manoel Ferreira dos Santos Bastos
Deudedit Coelho Duarte
João Batista Penna de Carvalho
Antonio Porto de Oliveira
Jayme da Silva Rosado
Carlos Arnobio Franco
Fisiologia (2ª parte)
Microbiologia
Patologia Geral
Farmacologia e Arte de formular
Anatomia e Fisiologia
Patológicas
Anatomia Médico-Cirurgica
Operações e Aparelhos
Terapêutica
Higiene
Medicina Legal e Toxicologia
Clínica Propedêutica Médica
Clínica Médica (1ª cadeira)
Clínica Médica (2ª cadeira)
Clínica Médica (3ª cadeira)
Clínica Propedêutica Cirúrgica
Clínica Cirúrgica (1ª cadeira)
Clínica Cirúrgica (2ª cadeira)
Clínica Cirúrgica (vias urinarias)
Clínica Pediátrica Cirúrgica e Ortopédica
Clínica Obstétrica (1ª cadeira)
Clínica Obstétrica (2ª cadeira)
Clínica Ginecológica
Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil
Clínica Dermatológica e Sifiligráfica
Clínica Oftalmológica
Clínica Oto-Rino-Laringológica
Clínica Neurológica
Clínica Psychiátrica
Radiologia e Fisiotherapia
Anatomia e Fisiologia etc.
Obstétricas
Constam ainda como Professores Substitutos os seguintes:
Amaro Theodoro Damasceno Junior Física Médica
Hilario Gurjão Historia Natural Médica
Gastão Vieira Anatomia Descritiva, Anatomia
Medico-Cirurgica e Operações e Aparelhos
Filogenio Lisboa Histologia, Anatomia e Fisiologia
Patológicas
Manoel Wilson Rodrigues dos Santos Fisiologia
Homero Taveira Lobato Terapêutica, Farmacologia e Arte de Formular
Antonio Teixeira Mendes Filho Clínica Ginecológica
Professores, cátedras e docências
155
E também os professores em disponibilidade:
Barão de Anajás
Dionysio Ausier Bentes
Eduardo Azevedo Ribeiro4
José Cyriaco Gurjão
Camillo Salgado dos Santos
Pedro Jose de Miranda
Patologia Geral
Fisiologia
Clínica Sifiligráfica e Dermatológica
Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil
Clínica Pediátrica Cirurgica
Clínica Oftalmológica
(FMCP, 1924, p. 41)
O ano de 1928 apresenta um corpo docente com algumas modificações, não só pela
chegada de novos nomes, como também por alterações no currículo do curso médico decorrentes da nova Lei de Ensino, decreto 16.782 A, de 13 de janeiro de 1925,
que mudou o nome de algumas disciplinas e criou outras, notadamente Medicina
Tropical (FMCP, [1950]).
156
Mário Midosi Chermont Phisica
Antônio Marçal Chimica Geral e Mineral
Chimica Organica e Biológica
Juliano Pinheiro de Lyra Sosinho Biologia Geral e Parasitologia
Hermógenes Pinheiro Anatomia Humana
José Alves Dias Junior Anatomia Humana
Philogenio Lisboa Histologia
Antonio Remigio de Castro Filgueiras Physiologia
Antonio Acatauassú Nunes Filho Microbiologia
Gabriel Rodrigues de Sousa Pharmacologia
Oscar Pereira de Carvalho Patologia Geral
Acylino de Leão Rodrigues Clínica Propedêutica Médica
Othon Chateau Pathologia Medica
Renato Chaves da Silva e Sousa Medicina Operatória
Jayme Aben-Athar Anatomia Pathologica
Arthur França Clínica Médica (1ª cadeira)
Antonino Emiliano de Sousa Castro Clínica Médica (2ª cadeira)
Dagoberto Sousa Pathologia Cirúrgica
Hygino Amanajás Filho Clínica Cirúrgica (1ª cadeira)
João Prisco dos Santos Hygiene
Francisco de Sousa Ponde Medicina Legal
Raymundo de Mattos Cascaes Therapeutica
Agostinho de Menezes Monteiro Obstetrícia
Argemiro Orlando Lima Clínica Obstétrica
Camillo Henrique Salgado Clínica Cirúrgica (2ª cadeira)
Raymundo da Cruz Moreira Clínica Cirúrgica (3ª cadeira)
Antonio J. da Silva Rosado Clinica Gynecologica
João Penna de Carvalho Clínica Neurológica
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
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Antonio Porto de Oliveira
Ophyr Pinto de Loyola
Otto Santos
Manoel Ferreira dos Santos Bastos
Clinica Psychiatrica
Clinica Pediátrica Medica e Hygiene Infantil
Clinica Cirúrgica Infantil e Orthopedia
Clinica Dermatológica e Syphiligraphica
Clinica Oto-rhyno-laryngologica
Deusdedit Coelho Duarte Clinica Ophtalmologica
Oswaldo Ferreira Barbosa Medicina Tropical
Exxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
também os professores em disponibilidade:
Oxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
ano de 1928 apresenta um corpo docente com algumas modificações, não só pela
chegada
de novos nomes, como também por alterações no currículo do curso médixxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
co
decorrentes da nova Lei de Ensino, decreto 16.782 A, de 13 de janeiro de 1925,
que mudou o nome de algumas disciplinas e criou outras, notadamente Medicina
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
Tropical (FMCP, [1950]).
Figuravam como professores substitutos Amaro Theodoro Damasceno Junior,
Gastão Vieira, Homero Taveira Lobato, Hylário Gurjão, Pedro de Castro Valente,
e Sulpicio Ausier Bentes (PAES,
xxxxxx 1928, p. 7). ANDRADE
A década de 1930 trouxe grandes transformações curriculares e regimentares, advindas da promulgação, em 11 de abril de 1931, do decreto 19.851, que ficaria
conhecido como Lei dos Estatutos das Universidades5.
Segundo Doyle Maia (1996), mesmo após a citada lei, a atividade docente para quem
não era catedrático continuava a ser “um sacerdócio”. O corpo docente era constituído pelo Professor Catedrático, pelos auxiliares de ensino, docentes livres e eventualmente professores contratados. O catedrático gozava de grande poder, ocupando um
cargo vitalício; nomeava como “auxiliar de ensino” quem fosse de sua confiança.
O auxiliar de ensino deveria obrigatoriamente, após dois anos de atividade, submeter-se ao concurso para Livre Docente, sob pena de perda automática do cargo e de
não poder ser auxiliar de ensino de outra disciplina a menos que houvesse obtido a
livre docência. Uma exigência que na prática nem sempre era cumprida, com muitos passando anos nas instituições sem possuir título de Livre-Docente.
Sendo o “auxiliar de ensino” um cargo de confiança, este era passível de demissão a
qualquer momento por decisão do catedrático. Quando um catedrático se afastava
ou por aposentadoria ou pela morte, o novo catedrático ao assumir poderia demitir
sumariamente todos os assistentes do catedrático anterior. Tal situação somente
se modificaria com a constituição de 1946, que deu estabilidade aos assistentes,
podendo estes inclusive ser transferidos para outra cadeira (MAIA,1996, p. 58).
Passados quinze anos de sua fundação a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará
estava consolidada como instituição atraindo cada vez mais olhares de médicos
Professores, cátedras e docências
157
que pleiteavam ser catedráticos fosse por vocação ou por “status”, já que os vencimentos não eram muito atraentes. Entretanto quando morria um catedrático não
era realizado concurso para ocupação da vaga: a congregação nomeava um novo
catedrático entre os professores.
Tal prática, que durante anos não despertou o interesse de ninguém, causaria acirrados
debates e protestos que chegaram inclusive aos jornais, a partir de outubro de 1934.
Com a morte de Azevedo Ribeiro6 e Ophir de Loyola vagaram as cátedras de Clínica
Médica (2ª Cadeira) e Clínica Pediátrica respectivamente. A congregação prontamente transferiu os professores substitutos Gastão Vieira (Anatomia descritiva) e
Hilário Gurjão (Parasitologia) para as respectivas cátedras vagas (UMA SESSÃO
tumultuosa na Faculdade de Medicina, 1934, p. 1). A sessão da congregação em que
foi tomada esta decisão foi bastante tumultuada, ocorrendo acirrados debates, ficando as opiniões dos professores divididas. O professor Acylino de Leão posicionou-se
contra a ocupação das vagas, principalmente no caso de Clínica Pediátrica, justificando que Froylan Barata (FMCP, 1934), renomado pediatra paraense, havia solicitado
sua inscrição, e considerando que Hilário Gurjão não possuía credenciais para lecionar pediatria (UMA SESSÃO tumultuosa na Faculdade de Medicina, 1934, p. 1).
158
O caso saiu da esfera da Faculdade sendo debatido em assembléia até pelo “Syndicato Medico Paraense”7, do qual Acylino era presidente, repercutindo na imprensa
com o título: “É moral ou imoral o processo adotado pela Faculdade de Medicina
do Pará para preenchimento das cátedras que se vagam, principalmente quando há
pedido de inscrição de candidatos que se querem submeter as provas de um concurso?” (UMA SESSÃO tumultuosa na Faculdade de Medicina, 1934, p. 1).
A Faculdade rapidamente justificaria seu método de escolha de catedráticos dizendo:
Desde logo é de assignalar que nenhum dos actuaes professores da Faculdade conquistou seu logar no corpo docente por meio de concurso. Todos
nelle foram colocados por nomeação ao tempo da organização do instituto,
quando esta ainda representava uma simples tentativa que muitos consideravam ousada e temerária enquanto outros a encaravam com desdem.
Uns foram, então, nomeados cathedraticos e outros substitutos por entendimento mutuo, sem preoccupação de superioridade de valores conforme iam sendo acceitos os convites ou os offerecimentos espontaneos
para essa grande obra da cultura scietifica do nosso Estado.
Em o numero desses benemeritos iniciadores que se prestavam a servir estavam desinteressadamente, quando as liccções não podiam ser remuneradas
se acharam os drs. Gastão Vieira e Hilário Gurjão, que como substitutos
estiveram em exercio effectivo para das cadeiras para que foram nomeados,
tendo perlustrado outras para que foram devidamente designados e em que
revelaram sempre competência, assiduidade e amor a sua missão.
[...]
A Faculdade tem agido sob o criterio de aproveitar a capacidade de dedicação de seus velhos auxiliares dos maus e dos bons dias...
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
[...]
Assim, a Faculdade, apenas, fez justiça e guardou coherencia com os seus
precedentes, o que é verdadeiramente digno e honroso para ella. (A ÚLTIMA reunião da congregação da Faculdade de Medicina, 1934).
Em 27 de outubro de 1934 uma coluna assinada com o pseudônimo “Olivério”
defendia a Faculdade ainda de forma mais contundente afirmando que se havia irregularidades elas eram antigas, começando pelo próprio Azevedo Ribeiro, que era
na fundação da faculdade professor de clínica dermatológica e sifiligráfica, onde
havia ficado em disponibilidade, indo depois parar em Clínica Médica (2ª Cadeira)
(AINDA a ultima reunião da Congregação da Faculdade de Medicina, 1934).
O texto continuava afirmando não entender a razão de toda “essa grita”, alegando que
fatos semelhantes ocorriam em quase todas as faculdades do Brasil sem protesto, citando que no Rio de Janeiro um catedrático havia migrado de Clínica Médica e Higiene
Infantil para Clínica Cirúrgica Infantil, por decisão da Congregação, e que o presidente
Getúlio Vargas havia recentemente nomeado um catedrático de Clínica Cirúrgica sem
concurso8. Deste modo se havia alguma imoralidade na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, igual havia ocorrido na Faculdade Nacional de Medicina e no ato do presidente (AINDA a ultima reunião da Congregação da Faculdade de Medicina, 1934).
Finalizava dizendo não compreender a posição do Syndicato Médico Paraense, pois
este não havia se manifestado quando o professor Castro Valente fora transferido
de substituto de Patologia para a Cátedra de Fisiologia com aprovação do professor
Acylino de Leão, e que havia coisas muito mais importantes para o Syndicato se preocupar (AINDA a ultima reunião da Congregação da Faculdade de Medicina, 1934).
Esta era a postura característica da Faculdade naquele período histórico, de não
aceitar qualquer intromissão em suas decisões, algo compreensível quando é levado em conta que aquela instituição havia surgido sozinha sem grande apoio.
Uma pequena nota em 28 de outubro reforça a afirmativa anterior:
DECLARAÇÃO NECESSÁRIA
A directoria da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, em nome da
Congregação, declara que as resoluções tomadas em conjuncto independem da apreciação e menos da opinião do Syndicato Medico Paraense,
cuja auctoridade desconhece (Folha do Norte, 28.10.1934).
Na reunião do Syndicato Medico Paraense ocorrida em 29 de outubro de 1934, a decisão da Faculdade foi duramente criticada como era de se esperar. Acylino de Leão
defendeu-se afirmando que no caso do professor Castro Valente votou a favor de sua
transferência da Patologia para a cátedra de Fisiologia, porém considerava hoje um
erro, e que a lei permitia esta transferência quando houvesse “interesses irrecusaveis
de ensino”, um expediente que a Faculdade recorreu no seu início para reorganizar
seu corpo docente, “pois demonstrado ficara que alguns professores considerados
Professores, cátedras e docências
159
cathedraticos estavam deslocados nas respectivas cadeiras com prejuízo da efficiencia
do ensino medico” (NO SYNDICATO Medico Paraense, 1934).
Acylino reafirmaria, ainda, que Hylario Gurjão não era especialista em Pediatria,
cadeira que pleiteava, e que no caso de Gastão Vieira a decisão era menos “desrazoada”, pois este já havia lecionado mais de uma vez Clínica Médica (NO SYNDICATO Medico Paraense, 1934).
Outros médicos se manifestaram entre eles Bianor Penalber, ex-aluno formado na
primeira turma de médicos da Faculdade, recordando que em 1931 se inscreveu após
muitas dificuldades na cadeira de Medicina Tropical, que se encontrava vaga. Como o
concurso foi adiado e a cadeira encontrava-se vaga e sendo ele o único candidato inscrito
Camilo Salgado o nomeou como contratado. Entretanto, para sua surpresa, pouco tempo depois “a cadeira era dada de mão beijada” a Emiliano de Sousa Castro “que nunca se
lembrara della antes do concurso aberto” (NO SYNDICATO Medico Paraense, 1934).
No fim das contas o parecer do Syndicato foi que a atitude da Faculdade havia sido
imoral.
160
Como não poderia ser diferente a questão ainda seria discutida por muito tempo, acontecendo nova e “tempestuosa” sessão da Congregação da Faculdade na
qual Lauro de Magalhães lançaria protestos contra o parecer do Sindicato Médico
Paraense e contra Acylino de Leão, mesmo reconhecendo ser este “um brilhante
professor e um dos que mais se têm esforçado por esse instituto de ensino” (UMA
REUNIÃO tempestuosa na Congregação da Faculdade de Medicina, 17.01.1935).
Sobraria até para Bianor Penalber, acusado de autor intelectual desta campanha que:
...movido pelo odio e pelo despeito pretendeu achincalhar a Congregação,
esquecendo-se dos grandes favores recebidos, pois fez todo seu curso
gratuitamente, sem ao menos ter pago o diploma, como poderia ser verificado na scripta da Faculdade.
[...]
...e os mesmos professores que o Sr. Bianor pretendeu alcunhar de immoraes, são os mesmo que sacrificavam seus interesses particulares, para o
lecionar gratuitamente (UMA REUNIÃO tempestuosa na Congregação
da Faculdade de Medicina, 17.01.1935).
O fato é que a partir dali a Faculdade entraria em um período de transição quanto ao
critério de escolha de seus docentes: se de um lado ainda existiriam por algum tempo aqueles catedráticos que “pulavam” de uma disciplina vaga para outra, por outro
começariam os primeiros concursos, conforme cita o Relatório de 19359. Apenas no
final daquela década os concursos se tornariam a única forma de alcançar a cátedra.
O mesmo relatório apresenta um corpo docente novamente com diferenças tanto
no nome das disciplinas como no dos professores. Observe-se que Gastão Vieira e
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Hilário Gurjão acabaram não migrando para as cátedras que almejavam.
Professores Catedráticos
Mário Midosi Chermont
Antonio Marçal
Juliano Pinheiro Lyra Sozinho
Hermógenes Pinheiro
José Alves Dias Junior
Raymundo da Cruz Moreira
Antonio Acatauassu Nunes Filho
João Prisco dos Santos
Oscar Pereira de Carvalho
Gabriel Rodrigues de Souza
Jayme Aben-Athar
Dagoberto Rodrigues de Sousa
Raymundo Mattos Cascaes
Arthur França
Antonino Emiliano de Souza Castro
Camillo Henrique Salgado
Lauro Antunes de Magalhães
Agostinho Monteiro
Orlando Lima
Manoel Ferreira Bastos
Deusdedit Coelho
João Batista Penna de Carvalho
Antonio Porto de Oliveira
Carlos Arnobio Franco
Othon Chateau
Acylino de Leão
Professores Substitutos
Hilário Gurjão10
Gastão Vieira
Pedro de Castro Valente
Homero Taveira Lobato
Sulpicio Ausier Bentes
Professores Contratados
Armando Appio de Moura Medrado
Luis Romano da Motta Araújo
Benedito Cavalleiro de M. Klautau
Diógenes Ferreira de Lemos
Physica Biológica
Chimica Biológica
Parasitologia
Anatomia Humana (1ª parte)
Anatomia Humana (2ª parte)
Propedeutica Cirúrgica
Microbiologia
Clínica Gynecologica
Pathologia Geral
Pharmacologia
Anatomia Pathologica
Clinica Cirúrgica Infantil e Ortopédica
Therapeutica Clinica
Clinica Médica
Clinica de Doenças Tropicaes
Clinica Cirúrgica
Clínica Urológica
Medicina Legal
Clinica Obstétrica
Clinica Dermatológica e Syphiligrafica
Clinica Ophtalmologica
Clinica Neurológica
Clinica Psychiatrica
Técnica Operatória e Cirurgia Experimental
Hygiene
Clinica Propedeutica Medica
Parasitologia
Anatomia Humana
Pathologia Geral
Therapeutica Clinica
Clinica Obstétrica
Clinica Cirúrgica
Therapeutica Clinica
Physica Biológica
Clinica Oto-rhino-larygologica
Professores, cátedras e docências
161
Auxiliares de Ensino
Antonio Magno e Silva
Raymundo Reis de Carvalho
Oswaldo Bezerra Medrado
Luiz Corrêa
Waldemar Walter Gonçalvez
Armando de M. Maroja
Inálio Martins de Castro
Anísio Mendonça Maroja
Clinica Médica
Clinica Médica
Clinica Cirúrgica
Technica Operatória
Anatomia Humana
Microbiologia
Chimica Physiologica
Therapeutica Clinica
Feliciano C. de M. Junior Clinica Obstétrica
Professores em Disponibilidade
Americo Vitruvio Gonçalves Campos
Oswaldo Ferreira Barbosa
Antonio Joaquim da Silva Rosado
Dionísio Ausier Bentes
Filogenio Lisbôa
Physiologia
Clinica Médica
Clinica Ginecológica
Physiologia
Hystologia e Embriologia Geral
(FMCP, 1936c, p. 12).
162
Note-se que naquele período o curso de Farmácia havia sido anexado a Faculdade de
Medicina, sendo mencionados ainda os seguintes professores, privativos daquele curso:
Joaquim Tavares Viana
Antonio A. de Carvalho Brasil
Raymundo Felippe de Souza
Joaquim de Britto Pontes
Manoel C. da Cunha Coimbra
Henrique Esteves
Pharmacia Chimica
Chimica toxologica e bromatologica
Chimica Analytica
Pharmacognosia
Pharmacia Galenica (FMCP, 1936c, p. 11)
Chimica Orgânica e Biologica
(FMCP, 1936c, p. 14)
Já haviam falecido: Francisco Pondé, Renato Chaves, Otto Santos, Ophyr Pinto de
Loyola, Geminiano Alves Coelho, Manoel Waldomiro dos Santos, Antônio Teixeira Mendes, Antônio Remígio de Castro Filgueiras, João Evaristo Silva, Izidoro
Azevedo Ribeiro e Hygino Amanajás Filho, este último em 14 de julho de 1935 na
cidade do Porto, em Portugal (FMCP, 1936, p. 13).
No ano de 1938, com o falecimento de Camilo Salgado, diretor e catedrático de
Clínica Cirúrgica, Prisco dos Santos é transferido para cátedra de Clínica Propedêutica Cirúrgica e Clínica Cirúrgica e Raimundo da Cruz Moreira fica como catedrático de Clínica Ginecológica. Pedro de Castro Valente aparece como catedrático
de Fisiologia11, Henrique Moreira Esteves como de Química Biológica e Gastão
Vieira chega à cátedra de Clínica Médica12. O professor de Terapêutica Clínica,
Raymundo Mattos Cascaes não figura mais na lista (FMCP, 1939c).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
As demais alterações ficam por conta de:
Docentes Livres
Oscar Pereira de Miranda Clínica Propedêutica Médica
Alberto Morais Farmacologia
Auxiliares de Ensino
Hermíno Pessoa Hygiene
Pedro Lago da Costa Borges
Ruy Pena Pondé
José Maria Lins de V. Chaves
Emidio P. de Albuquerque
Terapêutica Clinica
Clínica de Doenças Tropicaes e infecctuosas
Clínica Obstétrica
Clínica Prop. Cirúrgica e Clínica Cirúrgica
(FMCP, 1939c).
O ano de 1939 marcaria novas mudanças nas cátedras: entravam Luis Romano
da Mota Araújo, em Terapêutica Clínica, e Alberto Pereira de Morais em Clínica
Pediátrica Médica e Higiene Infantil. No mesmo ano, em 25 de julho, faleceu Antônio Marçal, catedrático aposentado de Química Fisiológica, e que já havia sido
substituído por Henrique Moreira Esteves (FMCP, 1940b).
163
Foto 24: Gabinete de Histologia. Professor Dr. Jayme Aben-Athar (no centro de gravata
de borboleta) e alunos.
Fonte: FMCP (1936, s.p.).
Na lista de professores em disponibilidade acrescentou-se Raimundo F. de M. Cascaes e Homero T. Lobato, ambos em Terapêutica Clinica (FMCP, 1940b, p. 12).
Os auxiliares de ensino eram:
Hermínio Pessoa
Pedro L. da Costa Borges
Celso da Gama Malcher
Raimundo do Vale Paiva
Medicina Legal
Terapêutica Clínica
Clínica Otorrinolaringológica
Clínica pediátrica Médica e Higiene Infantil
Em 1940 a principal alteração no corpo docente se deu pelo falecimento do professor
catedrático em disponibilidade de Clínica Ginecológica Antônio da Silva Rosado ocorrido em 5 de julho (FMCP, 1941, p. 5) e por uma turma de novos auxiliares de ensino:
Ruy Romano da Silva Romariz
Francisco Rosário Conte
Afonso Rodrigues Filho
Hermínio Pessoa
Adriano Pereira Guimarães
Celso da Gama Malcher
Raimundo do Vale Paiva
164
Anatomia Humana 1ª Parte
Fisiologia
Terapêutica Clínica
Medicina Legal
Clínica Ginecológica
Clínica Otorrinolaringológica
Clínica Pediátrica Médica e Higiene
Infantil (FMCP, 1941, p. 12).
Professor Contratado
Amando Apio de Moura Medrado Clínica Cirúrgica
Foto 25:
Laboratório de
Biologia parte interna dirigido pelo
Prof. Dr. Antônio
Acatauassú.
Fonte: FMCP
(1936, s.p.).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Apenas Hilário Gurjão e Sulpício Ausier Bentes figuram como professores substitutos de Parasitologia e Clínica Obstétrica respectivamente (FMCP, 1941, p. 11).
Já no ano de 1941 Amando Apio de M. Medrado assume a cátedra de Clínica Cirúrgica,
preenchendo a vaga de Camilo Salgado, sendo empossado em 30 de janeiro daquele ano.
Os novos auxiliares de ensino eram Flávio de Brito Pontes (Obstetrícia), Honorato A.
Neves (Microbiologia) e Álvaro Camelier (Clínica Cirúrgica) (FMCP, 1942b, p. 11-12).
Saíam da lista Celso Malcher, Raimundo Vale Paiva e Hermínio Pessoa.
No ano de 1942 Hilário Gurjão permaneceria como substituto de Parasitologia e
Oscar Pereira de Miranda como Livre-Docente de Clínica Propedêutica Médica
(FMCP, 1943b, p. 7).
Auxiliares de Ensino
Álvaro Camelier
Agostinho Monteiro Filho
Flávio de Brito Pontes
Gervásio de Brito Melo
Honorato de Albuquerque Neves
Jaime Jacinto Teixeira
Aben-Athar13
Luiz Tito de Castro Leão
Rui Romano da Silva
Romariz
Olimpio da Silveira Filho
Professores em Disponibilidade
Americo Vitruvio de Gonçalves Campos
Dionísio Ausier Bentes
Filogenio Lisboa
Homero Taveira Lobato
Oswaldo Ferreira Barbosa
Raimundo F. de Matos Cascaes
Sulpicio Ausier Bentes
Clínica Cirúrgica
Medicina Legal
Clínica Obstétrica
Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas
Microbiologia
Histologia e Embriologia Geral
Técnica Operatória e Cirurgia Experimental
Anatomia Humana
Farmacologia (FMCP, 1943b, p. 8)
Fisiologia
Fisiologia
Histologia e Embriologia Geral
Terapêutica Clínica
Clínica Médica
Terapêutica Clínica
Clínica Obstétrica (FMCP, 1943b, p. 8)
De março a agosto de 1942, o professor contratado Sandoval Rodrigues Cardoso
assumiu a disciplina de Patologia Geral (FMCP, 1943b, p. 8).
No ano seguinte (1943) Oscar Pereira de Miranda assume a cátedra de Clínica
Pediátrica Médica e Higiene Infantil com o falecimento de Alberto Pereira de Morais14. No quadro de auxiliares de ensino as modificações ficaram por conta da
entrada de Domingos Barbosa da Silva na disciplina Clínica Pediátrica e Higiene
Infantil e José Guilherme Cavaleiro de Macêdo em Patologia Geral, saindo Álvaro
Camelier (FMCP, 1944b, p. 8).
Professores, cátedras e docências
165
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Em 1944, Rui Romano Romariz atingiria o grau de Docente Livre. Entre os auxiliares de ensino José Guilherme Cavaleiro de Macêdo passou para a disciplina
de Fisiologia; entravam Silvio de A. Bentes em Clínica Médica (2ª cadeira), Mário
Sampaio em Patologia Geral e José Rodrigues da Silveira Netto em Higiene e Medicina Preventiva. Saiu Agostinho Monteiro Filho (FMCP, 1945c, p. 8).
No ano de 1945 a Faculdade perderia três catedráticos: faleceram em 16 de janeiro Othon Chateau, que respondia por Higiene e Medicina Preventiva, e em 13 de
agosto Deusdedit Coêlho Duarte de Clínica Oftalmológica (FMCP, 1946b, p. 8);
aposentou-se por motivo de saúde Antonino Emiliano de Souza Castro de Doenças
Tropicais e Infectuosas (FMCP, 1946b, p. 11).
Auxiliares de Ensino
Artur Porto Marques
Araci Barreto
Alfredo Barroso Rebelo
Domingos Barbosa da Silva
Francisco Rosário Conte
José Guilherme C. de Macedo
José Rodrigues da Silveira Netto
Luiz Tito de Castro Leão
Mário Machado Sampaio
Orlando Cerdeira Bordalo
Orlando Rodrigues da Costa
166
Anatomia e Fisiologia Patológica
Clínica Oftalmológica
Medicina Legal
Farmacologia
Clínica Médica 2ª cadeira
Fisiologia
Higiene e Medicina Preventiva
Técnica Operatória e Cirurgia Experimental
Patologia Geral
Clínica Ginecológica
Parasitologia
Paulo Cordeiro de Azevedo Microbiologia (FMCP, 1946b, p. 10)
(FMCP, 1946b, p. 10).
No mesmo
prédio, hoje
demolido,
funcionou o
serviço de Der
matologia da
UFPA
Foto 26:
Laboratório de
Biologia –
parte externa –
Prof. Dr. Antonio
Acatauassú
(sentado
no centro).
No mesmo prédio
atualmente funciona o serviço de
Dermatologia da
UFPA
na Santa Casa
de Misericórdia.
Fonte: FMCP
(1936, s.p.).
Professores Contratados
Benedito C. Macêdo Klautau
Celso da Gama Malcher
José Maria de V. Chaves
Lucival Lage Lobato
Clínica Neurológica
Clínica Otorrinolaringológica
Enfermagem Obstétrica
Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas
Em 22 de maio de 1946 faleceu Henrique Moreira Esteves professor catedrático de
Química Fisiológica (FMCP, 1947b, p. 12), e assumia como catedrático de clínica
Otorrinolaringológica Celso Malcher, assim ficando configuradas as cátedras:
Hermógenes Pinheiro
José Alves Dias Jr.
Vaga
Mário Midosi Chermont
Vaga
Vaga
Antônio Acatauassú Nunes Filho
Gabriel Rodrigues de Souza
Oscar P. de Carvalho
Juliano P. Lira Sozinho
Acilino de Leão Rodrigues
Manoel dos Santos Ferreira Bastos
João Prisco dos Santos
Carlos Arnóbio Franco
Jayme J. Aben-Athar
Lauro A. de Magalhães
Amando Apio de Moura Medrado
Vaga
Artur Pinto França
Luis Romano da Motta Araújo
Agostinho de M. Monteiro
Vaga
Argemiro Orlando P. Lima
Gastão Vieira
Oscar Pereira de Miranda
Raimundo da Cruz Moreira
Vaga
Antônio Porto de Oliveira
João Batista Pena de Carvalho
Dagoberto Rodrigues de Sousa
Celso C. da Gama Malcher
Anatomia Humana 1ª parte
Anatomia Humana 2ª parte
Histologia e Embriologia Geral
Física Biológica
Química Fisiológica
Fisiologia
Microbiologia
Farmacologia
Patologia Geral
Parasitologia
Propedêutica Médica
Clínica Dermatológica e Sifiligráfica
Clínica Prop. Cirúrgica e Clínica Cirúrgica
Técnica Operatória e Cirurgia Experimental
Anatomia e Fisiologia Patológica
Clínica Urológica
Clínica Cirúrgica
Doenças Tropicais e Infectuosas
Clínica Média 1ª Cadeira
Terapêutica Clínica
Medicina Legal
Higiene e Medicina Preventiva
Clínica Obstétrica
Clínica Médica 2ª Cadeira
Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil
Clínica Ginecológica
Clínica Oftalmológica
Clínica Psiquiátrica
Clínica Neurológica
Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica
Clínica Otorrinolaringológica
(FMCP, 1947b, p. 9)
Professores, cátedras e docências
167
Os demais professores eram:
Professores Interinos
Aracy Barreto Clínica Oftalmológica
Benedito Cavaleiro de Macêdo Klautau Química Fisiológica
Gervásio de Brito Melo Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas
Os demais professores eram:
Professores Interinos
Aracy Barreto
Benedito Cavaleiro de Macêdo Klautau
Gervásio de Brito Melo
José Guilherme Araújo Cavaleiro de Macedo
José Rodrigues da Silveira Netto
Clínica Oftalmológica
Química Fisiológica
Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas
Fisiologia
Higiene e Medicina Preventiva
(FMCP, 1947b, p. 9)
Professores Contratados
Flávio de Brito Pontes Clínica Obstétrica
José Maria Lins de Vasconcelos Chaves Enfermagem Obstétrica (FMCP, 1947b, p. 10)
168
Docentes Livres
Luis Tito de Castro Leão Técnica Operatória e Cirurgia Experimental
Orlando Cerdeira Bordalo Clínica Ginecológica
Rui Romano Romariz Anatomia Humana (FMCP, 1947b, p. 10)
Auxiliares de Ensino
Alfredo Barroso Rebelo
Artur Porto Marques
Cláudio Mendonça Dias
Domingos Barbosa da Silva
Francisco Rosário Conte
Lucival Lage Lobato
Orlando Rodrigues da Costa
Paulo Cordeiro de Azevedo
Medicina Legal
Anatomia e Fisiologia Patológica
Clínica Urológica
Farmacologia
Clínica Médica 2ª Cadeira
Patologia Geral
Parasitologia
Microbiologia (FMCP, 1947b, p. 10)
Em dezembro de 1947 Aracy Barreto assumia a cátedra de Clínica Oftalmológica e
Paulo Cordeiro de Azevedo passava a professor interino. Entre os auxiliares de ensino
entravam Maurício Queima Coêlho de Sousa, em Terapêutica Clínica, e Rui Teles de
Borborema em Microbiologia. Saiu Artur Porto Marques (FMCP, 1948c, p. 8-10).
No ano seguinte (1948) a cátedra de Clínica Dermatológica e Sifiligráfica ficaria
vaga com a morte de Manoel Ferreira dos Santos Bastos em 21 de dezembro. Naquele mesmo mês José da Silveira Netto faria concurso para a cátedra de Higiene e
Medicina preventiva (FMCP, 1949b, p. 10). Domingos Barbosa da Silva tornava-se
Livre Docente de Farmacologia.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
As demais listas de professores assim permaneciam:
Professores Interinos
Paulo Cordeiro de Azevedo
Orlando Rodrigues da Costa
José Guilherme Cavaleiro de Macedo
Alfredo Barroso Rebelo
Lucival Lage Lobato
Gervásio de Brito Melo
Benedito Cavaleiro de Macedo Klautau
Auxiliares de Ensino
Maurício Queima Coêlho de Sousa
Rui Teles de Borborema
Rui Ferreira dos Santos
José Luis de Sousa Ferreira
Microbiologia
Parasitologia
Fisiologia
Medicina Legal
Patologia Geral
Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas
Química Fisiológica
(FMCP, 1949b, p. 10)
Terapêutica Clínica
Microbiologia
Clínica Otorrinolaringológica
Clínica Dermatológica e Sifiligráfica
(FMCP, 1949b, p. 11)
Professores Contratados
José Maria Lins de Vasconcelos Enfermagem obstétrica
(FMCP, 1949b, p. 11)
Em 1949 três novos catedráticos prestariam concurso. Assim assumia a cátedra de
Doenças Tropicais e Infecctuosas, Gervásio de Brito Melo; José Guilherme Araújo
Cavaleiro de Macêdo a de Fisiologia; a de Química Fisiológica seria ocupada por
Benedito Cavaleiro de Macêdo Klautau.
Professores Catedráticos
Hermógenes Pinheiro
José Alves Dias Jr.
Vaga
Mário Midosi Chermont
José Guilherme Cavaleiro de Macedo
Benedito Cavaleiro de Macêdo Klautau
Antônio Acatauassú Nunes Filho
Gabriel Rodrigues de Souza
Oscar P. de Carvalho
Juliano P. Lira Sozinho
Acilino de Leão Rodrigues
Vaga
João Prisco dos Santos
Carlos Arnóbio Franco
Jayme J. Aben-Athar
Anatomia Humana 1ª parte
Anatomia Humana 2ª parte
Histologia e Embriologia Geral
Física Biológica
Fisiologia
Química Fisiológica
Microbiologia
Farmacologia
Patologia Geral
Parasitologia
Propedêutica Médica
Clínica Dermatológica e Sifiligráfica
Clínica Prop. Cirúrgica e Clínica Cirúrgica
Técnica Operatória e Cirurgia Experimental
Anatomia e Fisiologia Patológica
Professores, cátedras e docências
169
Lauro A. de Magalhães
Amando Apio de Moura Medrado
Artur Pinto França
Gervásio de Brito Mello
Luis Romano da Motta Araújo
Agostinho de M. Monteiro
José Rodrigues da Silveira Netto
Argemiro Orlando P. Lima
Gastão Vieira
Oscar Pereira de Miranda
Raimundo da Cruz Moreira
Aracy Barreto
Antônio Porto de Oliveira
João Batista Pena de Carvalho
Dagoberto Rodrigues de Sousa
Celso C. da Gama Malcher
Clínica Urológica
Clínica Cirúrgica
Clínica Média 1ª Cadeira
Doenças Tropicais e Infectuosas
Terapêutica Clínica
Medicina Legal
Higiene e Medicina Preventiva
Clínica Obstétrica
Clínica Médica 2ª Cadeira
Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil
Clínica Ginecológica
Clínica Oftalmológica
Clínica Psiquiátrica
Clínica Neurológica
Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica
Clínica Otorrinolaringológica
(FMCP, 1950b, p. 11)
Professores Interinos
Lucival Lage Lobato Medicina Legal
(FMCP, 1950b, p. 11)
170
Docentes Livres
Luis Tito de Castro Leão
Orlando Cedeira Bordallo
Rui Romano da Silva Romariz
Domingos Barbosa da Silva
Paulo Cordeiro de Azevedo
Orlando Rodrigues da Costa
Guaraciaba Quaresma da Gama
Abelardo Santos
Alfredo Barroso Rabello
Técnica Operatória e Cirurgia Experimental
Clínica Ginecológica
Anatomia Humana 3ª parte
Farmacologia
Microbiologia
Parasitologia
Clínica Cirúrgica
Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil
Medicina Legal
(FMCP, 1950b, p. 11)
Professor Substituto
Hilário Gurjão Parasitologia
(FMCP, 1950b, p. 12)
Professores em Disponibilidade
Oswaldo Ferreira Barbosa Clínica Médica
Raimundo F. de M. Cascaes Terapêutica Clínica
Homero T. Lobato Terapêutica Clínica
(FMCP, 1950b, p. 12)
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Professores Falecidos
Antônio José da Silva Rosado
Antônio Marçal
Antônio R. de C. Filgueiras
Antônio Teixeira Mendes Filho
Alberto Pereira de Moraes
Deusdedit Coêlho Duarte
Dionysio Ausier Bentes
Francisco de Souza Ponde
Filogênio Lisboa
Geminiano A. Coelho
Higino Amanajás Filho
Henrique Moreira Esteves
Izidoro Azevedo Ribeiro
João Evaristo Silva
Manoel Ferreira dos Santos Bastos
Othon Cheteau
Oto Santos
Ofir Pinto de Loyola
Renato Chaves da Silva e Souza
Clínica Ginecológica
Química Fisiológica
Fisiopatologia
Anatomia Descritiva 1ª parte
Clínica Pediátrica Médica
Clínica Oftalmológica
Fisiologia15
Medicina Legal
Histologia e Embriologia Geral
Química Biológica
Clínica Propedêutica Cir. e Clínica Cirúrgica
Química Fisiológica
Clínica Médica
Histologia e Embriologia Geral
Clínica Dermatológica e Sifiligráfica
Higiene e Medicina Preventiva
Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica
Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil
Medicina Operatória
(FMCP, 1950b, p. 12)
O relatório de 1949 anuncia ainda mais dois concursos para catedrático, que seriam
realizados somente no ano seguinte, e desta vez com uma novidade: mais de um
candidato por vaga em ambos, coisa que nunca havia acontecido antes: Histologia
e Embriologia Geral, que há mais de quinze anos permanecia sem catedrático16,
enquanto os editais de concurso abriam e fechavam sem que houvessem inscritos,
possuía agora dois candidatos: Mário Nazareno Machado Sampaio e Jayme Jacyntho Teixeira Aben-Athar. A outra cadeira era a de Clínica Dermatológica e Sifiligráfica a ser disputada por Domingos Barbosa da Silva e Rubem David Azulay.
No caso de Histologia e Embriologia, Mário Sampaio sairia vencedor assumindo o
cargo de professor catedrático; Jayme Jacyntho Teixeira Aben-Athar seria promovido a livre-docente(FMCP, 1951, p. 36). Como na ocasião Aben-Athar já era professor assistente daquela disciplina na Universidade do Paraná retornaria àquele
estado (PARAENSE que revê a terra natal, 1950, p. 2).
No concurso para Clínica Dermatológica e Sifiligráfica, que acabaria sendo realizado somente em plena década de 1950, quem teve o melhor desempenho tornado-se
catedrático foi Rubem David Azulay. Já Domingos Silva ganharia apenas uma nova
livre-docência. Azulay após a aprovação, imediatamente retornaria para o Rio, não
ministrando nenhuma aula na Faculdade. Estivera aqui apenas para prestar o concurso visando somente a obtenção do título para aprimorar seu currículo. Deste
Professores, cátedras e docências
171
modo, poucos anos depois Domingos Silva pode realizar novo concurso tornandose catedrático daquela disciplina (BECKMANN, 2006, p. 19-20).
No ano de 1950 aconteceria a federalização, trazendo muitas vantagens para aqueles que durante anos trabalharam no Palacete Santa Luzia, tais como melhora nos
vencimentos e direito à aposentadoria no sistema federal. Nada mais justo para os
que se dedicaram tantos anos àquela instituição.
Registre-se que curiosamente a federalização traria também até um catedrático que
ficara diversas vezes de licença até perder o cargo (FMCP, 1947b, p. 10). Voltaria ele em
20 de dezembro de 1950 amparado por um mandato de segurança (FMCP, [1950]).
Decididamente os tempos eram outros, agora ninguém queria ficar de fora...17
Na prática mesmo, a mudança nas cátedras naquele ano ficaria por conta da entrada de Mário Sampaio em Histologia e Embriologia, permanecendo vaga a cátedra
de Clínica Dermatológica e Sifiligráfica, visto que o concurso acabou não acontecendo naquele ano (FMCP, 1951, p. 7).
172
Lucival Lage Lobato permanecia como professor interino de Patologia Geral, e Hilário Gurjão como professor substituto de Parasitologia. Entre os Docentes-Livres
somavam-se Affonso Rodrigues Filho (Terapêutica Clínica), Flávio Brito Pontes
(Clínica Obstétrica), Rui Ferreira dos Santos (Clínica Otorrinolarigológica) e Rui
Teles de Borborema (Microbiologia) (FMCP, 1951, p. 8).
A lista de professores falecidos também aumentaria naquele ano com a morte de
Acilino de Leão em 27 de setembro e Gastão Vieira em 15 de outubro (FMCP,
1951, p. 29-30). Seguia assim o tempo em sua marcha inexorável.
Este capítulo está longe de ser uma lista definitiva de professores da Faculdade de
Medicina e Cirurgia do Pará de 1919 até 1950, dada a escassez documental que não
permite a recriação do período sem lacunas. Também é necessário frisar que o corpo docente do Casarão da Generalíssimo seja analisado sem demasiado ufanismo.
Houve sim grandes professores, notáveis clínicos, cirurgiões e cientistas.
...homens ousados, fortes, intrépidos e destemidos que assumiram o comando da Instituição, mantiveram um programa de trabalho e incluíram
a Faculdade entre suas principais preocupações. Estes, sim, inscreveramse honrosamente nos anais do ensino (BECKMANN, 2003, p. 249).
Se entrássemos na vida de cada um, além do risco de omissões, teríamos um livro
de perfis biográficos que se distanciaria do objetivo deste trabalho18.
Entretanto não deve ser esquecido que existiram também professores que deixavam a desejar; aqueles que, segundo ofícios enviados pelos alunos ao então diretor Camilo Salgado
transformavam aulas práticas em teóricas e “por preguiça ou falta de tempo vae sabrecando com umas tintas theoricas e mal mastigadas que até provocam risos” (FMCP, 1932b).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Outro ofício sobre o mesmo professor afirma que “Com difficuldades pagamos nossas mensalidades e com tal professor não podemos deixar de asseverar que estamos
sendo ludibriados” (FMCP, 1932b).
É natural em um ambiente onde uns professores trabalham e outros não, que aqueles que produzem fiquem muitas vezes aborrecidos com este desequilíbrio, expressando sua insatisfação em sala de aula. Certa vez, em 1925, Ophyr de Loyola, durante uma aula de pediatria para alunos do 5º ano, teria dito que os professores da
Faculdade eram embromadores. O caso chegaria à direção e Camilo Salgado, com
sua habitual fidalguia e lucidez, repreenderia Ophyr de Loyola em ofício, embora, de
certo modo, pelo teor do ofício, não discordando de todo da assertiva de Loyola, pois
afinal: “...-haveis de concordar- nem todos são embromadores...” (FMCP, 1925b).
NOTAS
1
Não confundir Camillo Salgado dos Santos com Camillo Henriques Salgado,
vice diretor e posteriormente diretor da Faculdade.
2
Mesmo estando entre os professores nomeados naquele dia, Jayme Aben
Athar não assinou a ata, perdendo a condição de fundador. Ele só assumiria o
cargo em 12 de janeiro de 1924, sendo a cadeira de Anatomia Patológica ocupada no período inicial pelo cirurgião Prisco dos Santos. Mais detalhes sobre o
assunto no capítulo “A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará”. (N.A).
3
“O convite para a regência das cadeiras foi embasado no prestígio e no desempenho profissional dos interessados. Com raras exceções, foram desprezadas
as especializações – em algumas áreas até inexistente, em outras incipientes –
e não houve outra espécie de seleção” (BECKMANN, 2003, p. 249).
4
Trata-se de um provável erro, posto que em outras fontes o nome que aparece é Isidoro de Azevedo Ribeiro. (N.A).
5
...reflexo da criação do Ministério da Educação e Saúde e centralização político administrativa do ensino superior. O ministro era Francisco Campos.
Foi estabelecido o padrão de organização das instituições de ensino superior. [...] O corpo docente deveria se constituir de professores catedráticos
– vitalícios, auxiliares de ensino – indicados pelos catedráticos, que estariam
obrigados ao concurso de livre docentes – e de livre-docentes. Os Diretórios
acadêmicos deveriam ser estabelecidos (GOMES; VARGAS; VALLADARES, 2001, p. 10).
6
Este professor que se encontrava em disponibilidade na cadeira de Clínica
Dermatológica e Sifiligráfica retornou a Faculdade em 25 de maio de 1931
para reger Clínica Médica (2ª Cadeira). (FMCP, 1950).
7
Órgão já extinto, cuja história urge ser resgatada, e sem relação direta com
o atual Sindicato dos Médicos do Pará. (N.A).
8
Ao contrário do que “Olivério” quer fazer crer, o caso dos catedráticos impostos por Getúlio Vargas gerava sim protestos no Rio como recorda Doyle
Maia – “Durante a ditadura de Getúlio Vargas foi nomeado um professor
sem prestar concurso. Houve reação dos alunos que fecharam as portas da
Professores, cátedras e docências
173
174
Faculdade, colocaram uma escada apoiada numa janela e, aos gritos de que
“quem não faz concurso, não entra pela porta, entra pela janela”, impediram
o ingresso do professor. Após muitas negociações o caso foi resolvido entrando o professor pela porta, mas tendo o desprazer de caminhar até a Sala
da Congregação atravessando um verdadeiro corredor polonês formado por
alunos que o vaiavam” (MAIA, 1996, p. 142).
9
“O Conselho Técnico Administrativo determinou pelo prazo de seis mezes, a partir de 1º de dezembro, a abertura de inscripção para concurso de
professores cathedráticos de Clínica Médica, Physiologia, Hystologia e Embriologia Geral, Clinica Pediátrica Médica e Hygiene Infantil e de Clinica
Oto-rino-laryngologica, a encerrar-se no dia 1º de junho de 1936, conforme
edital que tem sido regularmente publicado no Diario Official do Estado”
(FMCP, 1936c, p. 33).
10
Também era interino de Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil
(FMCP, 1936c, p. 10).
11
Assumiu em 17 de agosto de 1936 (FMCP, [1950]).
12
Assumiu em 17 de agosto de 1936 a cátedra de Clínica Médica (2ª cadeira)
(FMCP, [1950]).
13
Não confundir com o pai Jayme Aben-Athar catedrático de Anatomia Patológica. (N.A.).
14
Ocorrido em 21 de setembro de 1941 (MORAES, 1992, p. 19).
15
Falecido em dezembro daquele ano era catedrático em disponibilidade de
Fisiologia. (FMCP, 1950b, p. 15).
16
Era ocupada interinamente pelo catedrático de Anatomia Patológica Jayme
Aben-Athar. (FMCP, 1949b, p. 9).
17
Guaraciaba da Gama, da turma de 1939, menciona em depoimento outro
caso que teria ocorrido com um catedrático que havia ministrado aulas somente nos primórdios da escola e estava há muito em disponibilidade, domiciliado inclusive em outro estado, que teria retornado para reassumir seu
posto para logo em seguida se aposentar. Com o diferencial que este último
contaria com o aval da administração da Faculdade (GAMA, 2008).
18
Recomenda-se o trabalho de Clóvis Meira “Médicos de Outrora no Pará.
Belém Ed. Grafisa. 1986”.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
12
Os Doutores
e suas teses
175
176
Detalhe de azulejo de uma das paredes da FMCP.
As chamadas “Teses de Doutoramento ou Inaugurais” apresentadas no final do
curso médico foram introduzidas no Brasil pela reforma de 1832, quando as Academias Médico-Cirúrgicas da Bahia e do Rio de Janeiro passaram a ser denominadas Faculdades de Medicina. Sua apresentação era obrigatória ao final do curso,
permanecendo assim até o primeiro quarto do século XX (RIBEIRO, 1997, p. 59).
Nesta época, de acordo com Marcos Ribeiro, as teses encontravam-se em um período de franca decadência iniciado ainda no final do século XIX. Criadas para serem
um instrumento de avaliação e estímulo à produção científica, haviam falhado em
seus objetivos seja pela falta de experiência dos doutorandos para criar um trabalho original, por desinteresse dos estudantes que frequentemente copiavam ou encomendavam as teses ou ainda por negligência dos professores, que demonstravam
ser excessivamente benevolentes com trabalhos de tão má qualidade (RIBEIRO,
1997, p. 64).
A iniciativa de tornar a defesa de tese algo opcional pode ser encarada como uma
tentativa agonizante de salvá-las partindo do princípio que somente aqueles estudantes realmente interessados as fariam. Entretanto, como tudo o que não é obrigatório para o acadêmico, as teses foram sendo gradativamente esquecidas.
A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará surge exatamente neste período de
descrédito das teses. Seu estatuto mais antigo, datado de 24 de fevereiro de 1921,
menciona no capítulo XVII, Art. 225 que “É obrigatoria a defeza da these como
prova final, aos alumnos que completarem o Curso de Medicina...” (FMCP, 1933a,
p. 43), com seu Regimento Interno, de 4 de janeiro de 1924, mantendo tal obrigatoriedade1. Já o regimento de 1926 coloca a defesa de tese como opcional para
aqueles que desejassem receber o título de “Doutor em Medicina”; os que não apresentassem receberiam somente o diploma de médico (FMRJ, 1926, p. 19, Art. 54).
O doutorando interessado em defender tese pagaria uma taxa de inscrição de
300$000 e deveria apresentar 60 exemplares ao diretor da Faculdade (FMRJ, 1926,
p. 20). Este enviaria o trabalho para uma comissão de ensino que daria um parecer
sobre o seu valor. Se o parecer fosse favorável, o candidato poderia defender a tese
diante da Congregação (FMRJ, 1926, p. 20). Caso contrário, o autor poderia apresentar uma nova tese somente um ano depois (FMCP, 1924b, p. 15).
O estatuto de 1924 menciona ainda que a Congregação nomearia uma banca examinadora composta por 3 professores, sendo pelo menos um catedrático. Cada professor
poderia argüir o candidato por vinte minutos (FMCP, 1924b, p. 16).
O julgamento da tese seria baseado no mérito do trabalho e nos conhecimentos
exibidos pelo doutorando durante a defesa (FMCP, 1933a, Art. 237, p. 44), cujo resultado final poderia ser “aprovado com distinção”, “aprovado plenamente”, “aprovado simplesmente” ou “reprovado” (FMCP, 1933a, Art. 237, p. 45).
Os doutores e suas teses
177
O dia da defesa de tese reunia em torno de si um cerimonial somente comparável à
colação de grau. O diretor e os examinadores deveriam se dirigir “à sala dos Actos
Solemnes com as insignias de seu grao e subindo ao doutoral o Director tomará
o primeiro assento, seguindo-se os lentes cathedraticos e substitutos na ordem de
antiguidade” (FMCP, 1933a, Art. 241, p. 45). Em seguida os candidatos eram recebidos à porta pelo Secretário que os acompanhava aos seus lugares no lado direto
da sala onde ficava a banca examinadora (FMCP, 1933a, Art. 242).
De acordo com os relatórios apresentados à Congregação do ano de 1944 e 1945 as
teses apresentadas na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará foram:
1924
Antônio Magno e Silva Etio-patogenia das cirroses do fígado
Bianor Martins Penalber Contribuição ao estudo do tratamento
da filariose
Hippolito Carelli Higiene da tuberculose entre nós
Honorato Remigio de Castro Filgueiras Docimasia Pulmonarmétodo Icard-Davilla
178
1925
Antonio Siqueira Mendes Contribuição à profilaxia
do paludismo na Amazônia
Antonio Barbosa Rodrigues Contribuição ao estudo
da Proteinoterapia específica
Isauro Gonçalves da Costa Contribuição ao estudo
do alcoolismo no Estado do Pará
Jorge Alves Maia Prenhez tripla em mulher tuberculosa
Manuel Tertuliano de Cerqueira A Patogenia das icterícias
1926
Almir Pedreira Considerações em torno
de duas operações cesareanas
Aguinaldo Alves Dias Infecção Puerperal
Edgar Bentes Rodrigues Dos Abscessos ditos de fixação. Seu valor
quando oportunamente provocados.
José Colier Cavalcante Patogenia dos edemas
nas nefrites cloretemicas
Raimundo Ferro e Silva A cura radical da hidrocele vaginal
pelo processo Camilo Salgado
Raimundo da Silva Magno Terapêutica cirúrgica da litíase biliar
Waldemar Freitas Ribeiro Sinal de Argyll-Robertson
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
1927
Edgardo Rôxo Pereira
Roberto Monteiro Lopes Guimarães
Sebastião Francisco de Melo Junior
Theodoro Maria de Sousa Aranha
Histerorexis expontanea
Causas prováveis de tuberculose no Pará
Nefrose Lipoídica
Considerações em tôrno
de um caso de hematometria
1928
Antonio Simões Pereira Mortalidade infantil em Belém
Carlos Higino da Silva Medicações reativantes
e esterilizantes do Paludismo
Edgar Antunes Salgado Das oportunidades cirúrgicas
para o emprego da opsonoterapia
Eugenia Ferreira de Paiva Holanda Considerações gerais sobre a sífilis
Estrela Zaguri Benaion As afecções do naso-faringe como fator
predisponente no desenvolvimento
das pseudo-tuberculoses e tuberculoses
Felix Bessa de Oliveira Bubão poredenico
Gentil Eloi de Figueiredo Do valor da Higiene
Olga Maia Pais de Andrade Molestia de Recklinghausen
1929
José Teófilo Ferreira Etio-patogenia da demencia precoce
João Siqueira Mendes Tratamento da magreza
e do emagrecimento pela insulina
Raimundo Avertano Barreto da Rocha Etiologia, Psico-patogenia
e Sintomatologia do Tédio mórbido;
seu tratamento e profilaxia
1930
Anísio de Mendonça Maroja O problema da Tuberculose em Belém
Armando Bordalo da Silva Das vitaminas e das avitaminoses
Epaminondas de Paiva Menezes Cura radical da Hidrocele vaginal
pelo processo cirúrgico de V. Pauchet
Lucidéa Lage Lobato Biotropismo
Oscar Pereira de Miranda Do pneumotórax artificial
na cura da Tuberculose Pulmonar
Os doutores e suas teses
179
1931
Honorato de Albuquerque Neves Da Sífilis Cardio-Vascular
e seu tratamento pelo “Neo-Salvarsan”
Roberto Candido Pereira Do Germen de Friedmann,
sua morfologia, biologia, poder
patogênico, ação profilática e curativa.
1933
Armando de Mendonça Maroja Sedimentação dos Eritrócitos
e sua importância em Medicina
Alderico de Oliveira Costa Contribuição ao tratamento
cirúrgico da Varicocele
(Processo Dr. Zeferino Vaz)
180
1943
Jaime Jacinto Teixeira Aben Athar Mielopoiése Esplênica Comparativa –
contribuição para o estudo dos focos
mielóides do baço em várias espécies
de mamíferos silvestres, domésticos
e de laboratório com especial
referência aos megacariócitos
(FMCP, 1945. Mapa 7).
1945
Luiz Gonzaga Pires Anemia Verminótica – Contribuição ao seu
estudo na Amazônia (FMCP, 1946. p. 29).
Fica claro na listagem o crescente desinteresse na apresentação de teses de doutoramento a partir dos anos de 1930, não sendo encontrado nenhum registro de
defesa de teses entre 1946 e 1951, o que leva a crer que o título de “Doutor em
medicina” não fazia muita diferença em termos profissionais naquele período.
Somado a isso, na reunião do Conselho Técnico Administrativo de 28 de setembro de 1931, o professor de microbiologia Acatauassú Nunes Filho lembrou que
por não ser mais a defesa de tese algo obrigatório, o conselho “não deveria ser
demasiado benévolo e assim aceitar somente as teses que estivessem dentro dos
referidos parâmetros” (CTA, 1933), ideia compartilhada por outros professores
como Acylino de Leão que acreditava que só deviam ser aceitas as teses que fossem
“consideradas como afirmação da capacidade científica do candidato a título de
doutor” (CTA, 1933). Essa maior rigidez certamente foi outro fator determinante
para a extinção das mesmas.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
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Anos depois, seguindo um modelo diferente, a defesa de um trabalho científico
retornaria como item obrigatório para a conclusão do curso médico da UFPA recebendo o nome de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) . Entretanto ainda que
possuam inquestionável valor na formação acadêmica, muitos TCC spadecem hoje
do mesmo mal que decretou a decadência e desaparecimento das “Theses”.
Mais ou menos no mesmo período em que as teses dos doutorandos se extinguiam,
as teses dos professores começaram a aparecer no Largo de Santa Luzia, para concurso de Livre-docente ou de Catedrático. A Faculdade já possuía cerca de quinze
anos quando foram realizados os primeiros concursos para professores, posto que
na sua fundação os cargos foram preenchidos por nomeação.
Os auxiliares de ensino, após dois anos, deveriam submeter-se a concurso para
Livre-docentes, o que entre outras coisas exigia uma defesa de tese. De acordo
com Ernesto Gondim
Godim Leitão, as teses para livre-docência defendidas na Faculdade
de Medicina e Cirurgia do Pará até 1950 foram:
1) Oscar Pereira de Miranda — Do pneumotórax artificial no tratamento da tuberculose pulmonar, 1934.
2) Ruy Romano da Silva Romariz — Contribuição ao estudo topográfico das regiões femoro-ingüino-crural e glútea femural, 1943.
3) Orlando Cerdeira Bordallo — Aspectos da profilaxia do câncer cérvico-uterino, 1945.
4) Luiz Tito de Castro Leão — Contribuição do estudo das hérnias ingüinais, 1946.
5) Domingos Barbosa da Silva — BAL (British antilewisite), 1947.
6) Guaraciaba Quaresma Gama — O levantar precoce nos operados do abdome, 1947.
7) Alfredo Barroso Rebello — Aspecto médico legal das intoxicações do timbó, 1948.
8) Abelardo Santos — Considerações sobre a inapetência infantil, 1948.
9) Paulo Cordeiro de Azevedo — Algumas considerações sobre a micose de Jorge
Lobo, 1948.
10) Affonso Rodrigues Filho — Contribuição ao estudo das colecistopatias em
Belém, 1948.
11) Emidio Pedreira de Albuquerque — Contribuição à cura das hérnias recidivantes pelo processo da mioplastia do costureiro, 1949.
12) Flávio de Britto Pontes — Ruturas uterinas, 1949.
13) Orlando Rodrigues da Costa — Contribuição ao conhecimento da incidência
dos helmintos e protozoário na Amazônia, 1949.
14) Ruy Telles de Borborema — Contribuição ao estudo do fator RH, 1949.
15) Ruy Ferreira dos Santos — Contribuição ao tratamento cirúrgico da tonsilite
crônica, 1950 (LEITÃO, 1985, p. 55).
O concurso para a cátedra de também previa a defesa de uma tese que seria apresentada diante de:
...uma comissão de cinco membros, que deverão possuir conhecimentos
aprofundados da disciplina em concurso, dos quais dois serão indicados pela
Os doutores e suas teses
181
Congregação e três outros escolhidos pelo Conselho técnico-administrativo
dentre professores de outros institutos de ensino superior ou profissionais
especializados de instituições técnicas ou científicas (BRASIL, 1931).
Se no concurso para Livre-Docente os membros escolhidos pelo Conselho Técnico
Administrativo eram normalmente especialistas locais, para catedráticos o rigor
costumava ser maior, sendo comum a vinda de professores de outras faculdades de
medicina do Brasil para compor a banca examinadora.
182
Ainda de acordo com Gondim Leitão, a lista de teses para cátedra apresentadas na
Faculdade até 1950 é a seguinte:
1) Gastão Vieira — Considerações sobre a lithiase biliar. Cátedra de Clínica Médica,
3ª Cadeira, 1936.
2) Alberto Pereira de Morais — Doenças de carência na infância. Cátedra de Clínica Pediátrica e Higiene infantil, 1938.4
3) Armando Appio de Moura Medrado — Considerações acerca do abcesso
subphrenico de origem apendicular e seu tratamento. Cátedra de Clínica Cirúrgica, 1ª Cadeira, 1939.
4) Celso Cunha da Gama Malcher — As sinusites maxilares crônicas. Estudo de sua
etio-patogenia e indicação terapêutica no conceito moderno. Tese de Cátedra de
Clínica Oto-Rino-Laringológica, 1942.
5) Oscar Pereira de Miranda — Ensaio clássico sobre tuberculose infantil; dados
estatísticos sobre a tuberculose em Belém. Tese de Cátedra, 1942.
6) José Rodrigues da Silveira Netto — Aspectos da higiene mental na infância.
Cátedra de Higiene e Medicina Preventiva, 1946.
7) José Guilherme Araújo Cavalleiro de Macedo — Contribuição ao estudo da função fisiológica do timo.Cátedra de Fisiologia, 1947.
8) Aracy Amazonas Barretto — Glaucoma Verum. Cátedra de Clínica Oftalmológica, 1948.
9) Benedito Cavaleiro de Macedo Klautau — Sobre o descenso da glicose sangüínea.
Tese de Cátedra de Química Fisiológica, 1949.
10) Gervasio de Britto Mello — Filariose. Cátedra de Clínica de Doenças Tropicais
e Infecciosas, 1949.
11) Mário Nazareno Machado Sampaio — O Pulmão; com especial referência ao estudo do alvéolo pulmonar. Cátedra de Histologia e Embriologia, 1949.
12) Domingos Barbosa da Silva. Dermatoses carênciais na infância. Cátedra de
Dermatologia, 1949.
13) Ruben David Azulay. Contribuição ao estudo da micose de Lutz, Cátedra de
Dermatologia, 1950.
14) Jaime T. Aben-Athar. Variações cíclicas das glândulas cutâneas, Cátedra de
Histologia, 1950.
Numa análise superficial as teses da Faculdade, em sua maioria, constituem-se no
que hoje é denominado “revisão bibliográfica”, correspondendo a textos que bus-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
cam trazer atualizações sobre um determinado tema revisando o que existe de
consistente na literatura mais atual.
Beckmann (2006, p. 19) assim as definiu:
De modo geral, tratavam-se de trabalhos monográficos finalizados por
uma série mais ou menos extensa de observações clínicas, cirúrgicas,
anatomo-patológicas, laboratoriais ou radiológicas que haviam servido
de supedâneo à exposição. A ausência de um bom embasamento bibliográfico era também constante.
Entretanto não se pode julgar a produção científica da época sob um ponto de vista
contemporâneo, quando um trabalho de revisão é rapidamente concluído através de
pesquisa via internet no que existe de mais atual nos grandes periódicos médicos
mundiais sem sair de casa. Deve-se lembrar que naquele período as revistas médicas
eram poucas, nem sempre de fácil obtenção, ainda mais levando em conta que Belém
era e ainda é uma cidade muito distante dos grandes centros médicos nacionais.
Outro fator que impedia a produção de trabalhos baseados em pesquisas experimentais que pudessem de fato iniciar a produção de um conhecimento genuinamente local e não uma simples reprodução de doutrinas, era a escassez de tempo
para elaboração das teses conforme afirma Doyle Maia (1996, p. 143):
De qualquer modo, 45 ou 24 dias eram absolutamente insuficientes para
a elaboração de qualquer trabalho original, dando oportunidade ao candidato somente de mostrar sua capacidade de exposição e síntese. Por
esse motivo as teses da época eram, em geral pequenas, e excediam-se em
assuntos não diretamente relacionados com o tema.
Com todos os defeitos que se lhes possa encontrar, o valor das teses é inquestionável, pois serviam como fonte de atualização sobre os mais diversos temas médicos
numa época em que a literatura técnica era muito restrita.
Infelizmente é possível que a lista apresentada neste capítulo esteja incompleta.
Após tantas reformas e descaracterizações na Faculdade de Medicina muita coisa
se perdeu; a coleção de “theses” que a Biblioteca Central da UFPA possui é muito
pequena; na biblioteca setorial do Instituto de Ciências da Saúde não existe nenhum exemplar. Salvo algumas em coleções particulares ou na Sociedade MédicoCirurgica do Pará, a grande maioria das teses defendida até 1950 é dada como
desaparecida restando como consolo apenas o registro de seus títulos.
Um fim melancólico de mais uma parte importante de nossa história médica.
Os doutores e suas teses
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NOTAS
1
“Capítulo V - Da defesa de these. Art. 55º - Os alumnos que concluirem o
curso medico deverão defender these sobre assumpto á sua escolha dentre as
materias ensinadas no referido curso” (FMCP, 1924b, p. 15).
2
Atualmente os Trabalhos de Conclusão de Curso da Faculdade de Medicina
da UFPA são apresentados em um evento que recebe o nome de “Jornada
Acadêmica Ronaldo de Araújo”.
3
Ver Capítulo “Professores, Cátedras e Docências”.
4
As Teses de número 2, 12 e 13 não figuram na lista de Ernesto Gondim
Godim
Leitão, sendo localizada sua referência em http://www.sibi.ufpa.br/Portal/
DTD/ICS.htm. Acesso em 26.03.2008. A tese 14 foi localizada em Estado do
Pará, 23 de fevereiro de 1950, p. 2.
184
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
13
A Manutenção
Financeira
185
186
Detalhe de azulejo de uma das paredes da FMCP.
Os primeiros tempos foram bastante difíceis para a Faculdade de Medicina do Pará,
especialmente no que se refere à sua sustentação financeira, incluindo a remuneração dos professores, quase todos profissionais de relevo na sociedade.
Em principio, a Faculdade seria mantida com o dinheiro do pagamento das mensalidades e das demais taxas, como as de inscrição para as provas de habilitação ao
curso, taxas de matrícula, taxas para as provas durante o curso, transferência, liberação de documentos e diplomas, conforme o Relatório de 19381. Além disso, outras
fontes seriam buscadas, como doações, subvenções oficiais do governo estadual e
da Intendência municipal, para fazer frente às despesas, entre as quais se incluía
a taxa de remuneração do Inspetor, responsável pela fiscalização de escola após a
equiparação, e que em 1925 era de 12:000$000 anuais, mais ou menos equivalente à
remuneração de um professor catedrático (BRASIL, 1925). O próprio governador
Lauro Sodré, na mensagem governamental de 1920, assim se manifestava quanto
a auxiliar a Faculdade:
Desde que possa o Estado dispôr de recursos, bom será que sejam votados auxílios que permittam dar a essa instituição melhores recursos,
quaes exigirá o ensino que nella se ministra, e que difficilmente poderão
ser obtidos de particulares, em terra que não abundam gentes ricas nem é
grande o rol dos capitalistas abastados (PARÁ. Governador (1917-1921:
Lauro Sodré, p. 63).
Lauro Sodré, quando no exercício da atividade de senador, procurou ajudar financeiramente a nova escola. Em carta de 25 de janeiro de 1923, endereçada a Camilo Salgado
por ocasião da campanha para a compra do prédio da Faculdade, revela sua iniciativa em
conseguir ajuda financeira do governo federal e a discriminação sofrida pelo Norte2.
Deve-se levar em conta que mesmo as subvenções oficiais nem sempre eram pagas
com regularidade, gerando mais instabilidade financeira para a Faculdade, que vivia no impasse em precisar crescer para oferecer cursos de qualidade e deste modo
firmar seu nome, e também honrar seus compromissos tanto com o corpo docente
quanto com funcionários e fornecedores, além das despesas gerais de manutenção3.
Desde os seus primeiros dias a Faculdade recorreu a doações, haja vista a compra
do prédio4. No primeiro Relatório da Faculdade sob sua direção, Camilo Salgado
revela que a despeito da “situação precária embaraçosa” do Estado
Temos no thezouro do Estado pouco mais de vinte contos de reis e, felismente, para solver os nossos compromissos, conseguimos, exclusivamente,
a coadjuvação valiosa de particulares, que são filhos e têm interesses neste
Estado, sem falar na contribuição dos alumnos (FMCP, 1923c, p. 12).
Ao agradecer ao tesoureiro, sr. Vicente Ferreira de Hollanda, Camilo informa que
de 1919 a 1922 a receita havia atingido 86:002$910 e a despesa 84:551$782, com
o ativo chegando a 78:684$448 e o passivo a 6:910$384, evidenciando um saldo de
A manutenção financeira
187
71:738$064, ainda que reclamando da falta de auxílio dos Governos Federal e
Estadual5.
Talvez por isso é que os dirigentes da Escola tiveram a ideia de enviar às Intendências municipais uma circular solicitando ajuda financeira à Faculdade, ideia apresentada ao Intendente Municipal de Belém Dr. Cypriano Santos6. Por seu significativo
valor, transcrevemos na íntegra o ofício circular datado de 18 de setembro de 1923.
188
Faculdade de Medicina e Cirugia do Pará
Belém, 18 de setembro de 1923
Ilm. Snr. Intendente Municipal
Venho renovar o appello que ha alguns annos, na phase mais embryonaria da Faculdade de Medicina, fiz aos gestores dos municipios paraenses,
em pról desse estabelecimento, cuja manutenção, com sacrificios que só
Deus o sabe, é motivo de orgulho para a nossa terra, ao lado de constituir
um eloquente attestado da nossa cultura e da nossa civilisação.
Cumpre que todos os que amam entranhadamente este pedaço da Amazonia e pedaço tambem do Brazil, se congreguem para fortalecer esse
monumento magnifico que é a Faculdade de Medicina do Pará. Urge,
sim, para tornal-a mais efficiente e mais bem apparelhada, que todo o
amparo lhe seja proporcionado, principalmente da parte dos municipios
do nosso Estado, que são, em verdade, os mais compensados pelos fructos
dessa obra tão grandiosa.
A expressão “sanear para povoar” do eminente Snr. Dr. Washington Luiz,
deve ser bem reflectida pelo patriotismo dos que estão á testa das nossas
municipalidades. A affirmativa vibrante do preclaro chefe da Nação, representa uma verdade crystalina: - não póde haver povoamento sem que
preliminarmente se registe o saneamento. E a vasta extensão territorial
do Pará reclama, mais do que qualquer outro Estado, auxilio de braços,
mas aos quaes precisa ser assegurado o elemento essencial da felicidade
humana – a saúde.
Bem sabeis que o medico é o factor de que precisaes para esse desiderato.
O Pará, especialmente o seu interior, ainda em grande parte insalubre,
esmagado pelo paludismo e pelas verminoses, tem necessidade de homens de sciencia, que substituam o chalatanismo e cooperem para a hygidez do povo.
Salientando-vos essa necessidade e esse indeclinavel dever de patriotismo, é que appelamos novamente para que auxilieis pecuniariamente e
annualmente a Faculdade de Medicina de que sou director, fazendo votar pelo respectivo Concelho Municipal a verba que julgardes acertada
e dando disso conhecimento, com a brevidade possivel, á minha pessoa,
que vos antecipa sinceros agradecimentos7.
Ainda no seu primeiro Relatório Camillo destacava a confirmação de municípios
que haviam incluído em seus orçamentos auxílio para a Faculdade, mencionando
que faltavam cerca de trinta municípios, que embora tendo se comprometido, ainda
não haviam enviado o documento oficial8. No total, a Faculdade esperava alcançar
“uns cincoenta contos de reis, graças á intervenção valorosa do illustre actual goMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
vernador do Estado, que merece de nós toda a gratidão” (FMCP, 1923c, p. 12).
Vários foram os ofícios enviados pelas prefeituras municipais – na ocasião, denominadas intendências – dando conta da sua participação em tão nobre causa,
qual seja a manutenção da Faculdade de Medicina. Contanto que já em março de
1923, Camillo Salgado acusa o recebimento de ofício do Intendente Municipal de
Altamira dando conta da consignação de verba no valor de 1.200$000, por aquela
Intendência, “em auxilio desta Faculdade”, consignada na lei orçamentária de 20
de outubro de 1922. No ofício a Altamira Camillo enaltece a Faculdade, para ele
merecedora do auxílio por seu valor científico, certo de que ela será “o ostentaculo
que engrandecera o nosso Estado”.
Ofícios com o mesmo teor foram enviados aos municípios de Monte Alegre, Portel,
Cachoeira e Quatipuru e outros mais, que contribuíram com quantias variando de
150$000, 300$000, 500$000 até 600$000.
Embora não esteja explicito no ofício circular solicitando ajuda, algumas correspondências recebidas pela Faculdade demonstram que, em função das doações, as
Intendências tinham o direito de indicar alunos para estudar às custas do município que fizera a dotação orçamentária. A Intendência Municipal do Moju, por
exemplo, apresenta, em 9 de março de 1926, determinado estudante, “que se pretende matricular nesse util Estabelecimento, na vaga destinada a este municipio”.
Sobre o mesmo assunto trata o ofício datado de 30 de março de 1923 “por proprio
punho escripto” por Camillo Salgado e endereçado ao Dr. Cypriano José dos Santos,
Intendente Municipal de Belém. No documento é informado que a Intendência de
Belém teria à sua disposição uma vaga “para a qual indicará um estudante, que a
aproveitará sem dispendio de especie alguma”. Camillo diz ainda que a resolução
é um sinal de gratidão a quem vem “cooperando na elevação daquelle Instituto”. E
pede que o Intendente aceite a oferta, que é “desvaliosa, mas tem uma significação
muito alta: a sinceridade de que se reveste e característica de todos os meus actos”.
Quando as Intendências não indicavam nenhum aluno a doação revertia para a Faculdade. É o que trata o ofício de 15 de janeiro de 1927, endereçado ao Intendente
de Breves acusando o recebimento da lei orçamentária para o ano de 1927, “onde
está consignada a verba de 600$000 em benefício da Faculdade.
Seja por parte da Faculdade, seja pelas Intendências, o pedido de doações originou
alguns ofícios interessantes, que aqui registramos alguns, sem seguir uma sequência cronológica, como o enviado ao Delegado de Monte Alegre, em 11 de junho de
1923, quando Camillo Salgado informa não ser possível matricular, como candidato do citado município, determinado estudante no 4º ano porque, embora houvesse
uma verba de subvenção, esta ainda não havia sido liberada para a Faculdade. E diz
que estará pronto a aceitar o candidato, “uma vez comprida essa exigencia”.
A manutenção financeira
189
Igarapé Açu recebeu seu ofício, de 13 de junho de 1923, onde Camillo Salgado
diz deixar de atender o candidato apresentado, “porquanto o municipio ainda não
votou uma verba especial para satisfazer as despesas de vosso candidato” e que sua
conduta se prende ao dispositivo por ele firmado “que só terá direito a vaga o Municipio que contribuir annualmente com a importancia necessaria ao custeio das
despezas feitas pelo candidato”.
Ofício da Intendência de Alenquer, em 16 de setembro de 1925, dava conta que a
quantia de seiscentos mil réis constante do orçamento daquele município reverteria
em favor de determinado aluno nominado no documento. Entretanto, o ofício solicita
urgente pagamento da quantia “para não ser prejudicado o referido alumno”.
Para a Intendência de Bragança foi encaminhado, em 14 de outubro de 1926, documento dando conta que embora aquela intendência houvesse indicado um aluno
para ocupar a vaga de um outro que era mantido pela citado município, o novo candidato poderia ser prejudicado uma vez que a Faculdade ainda não havia recebido a
importância devida, não podendo o candidato ser inscrito nos exames de 1ª época,
“se essa Intendencia não entrar com a importancia respectiva”.
190
O mesmo município seria informado em 7 de abril de 1927 do recebimento do ofício de
apresentação de aluno para ocupar a vaga a que o municipio tinha direito. E acrescenta que “devido ás difficuldades financeiras, o snr. Dr. Director pede vênia a V. S. para
solicitar a fineza de mandar satisfazer esse pagamento no mais breve tempo possivel”.
Na mesma data foi expedido ofício para Muaná. A Faculdade informava haver recebido a importância de trezentos mil réis, insuficientes para o candidato daquele
município inscrever-se para os exames.
Para Altamira, em abril de 1927, dando conta do recebimento do ofício daquela
Intendência revertendo o benefício para dois alunos nominados no dito documento, com a subvenção votada pelo conselho daquela cidade. A Faculdade solicita a
remessa da lei que aprovou a doação e alerta que “a subvenção para dois alumnos
deve ser pelo menos de dois contos de reis”9. Quer dizer, diferente do ofício circular
que fala na “verba que julgardes acertada”.
Em um outro ofício para a mesma Intendência, este de 11 de julho de 1929, a diretoria da Faculdade acusa o recebimento da lei orçamentária daquele município,
com a consignação de dois mil contos de réis, “em beneficio porém dos alumnos,
candidatos de V. Sa. e do exmº. Snr. Senador José Porphirio”. E diz que para receber
o dinheiro, “de que muito necessita actualmente a Faculdade para reparos urgentes
e inadiáveis”, seria necessário oficiar ao Diretor da Recebedoria de Rendas do Estado, “ordenando o pagamento pela forma que melhor lhe aprouver”.
Ainda para Altamira foi endereçado ofício em 3 de julho de 1928 remetendo uma
prestação de contas das despesas com determinado aluno, certamente com os es-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
tudos custeados por aquele município. O documento detalha as despesas servindo
também para ser ter uma ideia dos valores cobrados pela Faculdade:
Mensalidades: de abril a novembro a 75$000 (8)
Matricula
Inscrição para exame
Total
600$000
140$000
125$000
865$000
O documento lembra ao gestor de Altamira que no ano anterior (1928) havia estudado por conta da Intendência do citado município um aluno indicado pelo senador
José Porphirio de Miranda Junior, que não tinha tido sua situação regularizada até
aquela data, sendo solicitado providências.
Em outro ofício, de 12 de dezembro de 1929, à mesma Intendência, é informado
ser a referida “a unica que deixou de officiar ao snr. Director da Recebedoria de
Rendas do Estado, autorisando o pagamento da subvenção votada”, em benefício da
Faculdade de Medicina. Prossegue dizendo que o Diretor espera que o Intendente
“se dignará a mandar por nosso intermedio o referido officio a fim de que possa ser
a citada subvenção recebida”.
Em outra correspondência, de 16 de setembro de 1925, endereçada ao Intendente
de Alenquer, a Direção da Faculdade lembra que a referida intendência havia subvencionado a Escola, no orçamento daquele ano, com a quantia de seiscentos mil
réis, que reverteriam em benefício de determinado aluno. Na oportunidade solicitava o “urgente pagamento para não ser prejudicado o aluno”.
Para Igarapé Açu é enviado documento em 26 de janeiro de 1927 acusando o recebimento de ofício daquela Intendência sobre concessão de auxílio para matrícula de
determinado aluno. O secretário da Faculdade comunica que a Diretoria aceitará
o candidato “depois que essa Intendencia saldar com os cofres desta Faculdade
compromissos anteriores, provenientes de auxilios votados pelo mesmo conselho e
até hoje não recebidos”.
A Intendencia do Mujú (sic) recebe interessante ofício, datado de 28 de maio de
1929, onde, em nome do Dr. Camillo Salgado, Diretor da Faculdade e “conscpicuo
membro da comissão executiva do P.R.P., presidente do Senado e Vice-Governador
do Estado” é solicitado, pela segunda vez, a remessa da lei orçamentária do referido município. O secretário, signatário do ofício, espera que, não em atenção à sua
pessoa, “mas em consideração ao referido senador, eminente presidente do senado”
que fosse atendida a solicitação.
Portel recebe, em 10 de junho de 1929, ofício cobrando “pela segunda ou terceira
vez” o envio à Recebedoria de Rendas autorização para o pagamento da subvenção
daquela Intendência à Faculdade de Medicina.
A manutenção financeira
191
Endereçado à Intendência de Curralinho, o ofício de 9 de maio de 1927 dá conta do
recebimento da apresentação de determinado aluno “para occupar a vaga ‘concedida a
esse Municipio’”. Entretanto, o secretário da Faculdade, que assina o ofício da mesma,
diz não ter ainda o Diretor recebido a lei orçamentária do referido município e pede que
seja informado o valor da subvenção, “que não deve ser inferior a um conto de réis, para
o candidato de V. S. gosar de todas as regalias neste Instituto de ensino Superior”.
O município de Quatipuru também é “contemplado” com ofício de cobrança. Data do
de 13 de fevereiro de 1929, o secretário da Faculdade acusa o recebimento de ofício de
apresentação de determinado candidato à matricula no primeiro ano na vaga de competência do citado município. A Faculdade diz ignorar qual seja a vaga, “pois a Faculdade
de Medicina e Cirurgia do Pará não tem infelizmente recebido auxilio algum do município”. E avisa que a importância para aquele ano letivo “orça em 865$000”.
A Intendência de Belém também recebia seus ofícios. Em 4 de novembro de 1926
é endereçado ao dr. Paulo Eleutério, secretário da Intendência de Belém ofício com
a lista dos estudantes mantidos pela referida prefeitura e informando não haver
vagas a preencher, “havendo mesmo superlotação”.
192
Em abril de 1927 é informado ao Intendente de Belém que duas alunas que ocupavam vagas bancadas pela citada Intendência haviam passado a estudar por conta
da Faculdade, “ficando assim essas vagas para outros candidatos que por ventura
queiraes indicar”.
De acordo com a documentação existente, por exemplo, um ofício 17 de Janeiro de
1928, percebe-se que, pelo menos no que tange à Intendência de Belém, estando as
vagas preenchidas, poderia haver substituições ou qualquer outra transformação,
“tudo, porem, dentro da subvenção concedida”. No mesmo documento há a solicitação da concessão de um passe de bonde para a Escola.
Em 25 de novembro de 1929, foi enviado ao senador Antonio Faciola, Intendente
de Belém o seguinte ofício:
Tendo essa Intendencia concedido este anno a subvenção de 12:000$000
á Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará e apresentado oito candidatos e o Concelho Municipal trez e, como até hoje tivesse sido pago apenas a importancia de 3:000$000, que beneficia somente trez candidatos,
esta Directoria, forçada pelas alíneas b e c do artigo 36 do Regimento
Interno – prova do pagamento das taxas de frequencia e de exame – pede
a V. Excia. a fineza de mandar indicar com urgencia dentre os onze candidatos o nome dos trez preferidos afim de poderem ser admittidos aos
exames da presente época.
Para o Governador do Estado, Dr. Dionysio Bentes, membro do corpo docente
da Faculdade, com um teor mais formal, foi enviado ofício resposta em 17 de novembro de 1925 dando conta do “immediato cumprimento a ordem nelle exarada,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
mandando inscrever, em uma das vagas de que dispõe o governo de V. Excia. no
corpo discente desta Faculdade” determinado aluno. O ofício termina de forma
bem interessante (ou interesseira):
A opportunidade faz-me interprete da affirmativa da Congregação do
muito de gratidão que devemos a V. Excia., cujo nome destaca-se, magnanimo, dentre tantos benfeitores deste Instituto de educação.
Dirigido ao Secretario Geral do Estado, Dr. Deodoro de Mendonça, de 25 de outubro de 1926 é o documento informando ter a tesouraria da Faculdade recebido a
quantia de seiscentos mil réis da Intendência de Marabá e a mesma quantia da de
Cametá, “importâncias insufficientes para os candidatos das referidas intendências
[...] inscreverem-se nos exames da presente época”.
Para o mesmo Secretario Geral do Estado, o ofício de 20 de abril de 1927 dá conta
da indicação de determinado aluno para estudar às custas da prefeitura de Marabá.
Ressalta o secretário da Faculdade que “para regularidade da escripta deste instituto de ensino” era necessário saber o valor da doação, uma vez que as despesas do
candidato orçariam em “920$000 annualmente”.
Mas as correspondências para as Intendências não eram só para cobrar. Havia
também a parte social, como o ofício endereçado a Muaná, em 24 de setembro de
1925, onde a Faculdade acusa o recebimento da comunicação da posse do Intendente, com votos de “fecunda administração”.
Em 30 de abril de 1927, a Faculdade oficia ao mesmo município perguntando se
este mantém o mesmo candidato do ano anterior e a verba votada, bem como solicita a lei orçamentária vigente.
Um ofício com teor semelhante seria enviado ao novo Intendente de São Miguel do
Guamá, em 31 de outubro de 1925, afirmando que “essa Intendencia muito lucrará
sob a criteriosa administração de V. S.”.
Para o Intendente de Montenegro10 é enviado ofício datado de 28 de maio de 1929 acusando o documento de autorização do pagamento da subvenção à Faculdade por parte
do referido município “ora sob sua honesta e progressiva administração”. Ao agradecer
ao Intendente, o secretário da Faculdade expressa suas “respeitosas homenagens”.
O sr. Antonio Faciola, intendente de Belém recebe, em 14 de fevereiro de 1929 congratulações por ter assumido “o exercício do cargo”. Agradece a atenção dispensada e faz
votos, em nome da congregação “para que o governo de V. Excia. seja prospero e como
é de esperar das qualidades de V. Excia., engrandecedor para o município de Belem”.
Interessante ofício foi o enviado ao Intendente de Ourém, datado de 3 de abril
de 1929. Ao acusar o recebimento de documento daquela prefeitura apresentando
determinado aluno para a vaga de um outro, o secretário da Faculdade, signatário
A manutenção financeira
193
do ofício desta, diz ter-lhe causado surpresa a indicação “porque o auxilio que diz ser
concedido a esta escola NUNCA foi pago, apezar dos offícios dirigidos á V. Sa., que
sempre ficaram sem resposta”. E sugere que “melhor seria que o auxilio fosse concedido directamente ao seu candidato, que faria pessoalmente entrega das mensalidades
á thesouraria, [...] evitando desta forma provaveis prejuízos.” Finaliza dizendo que o
auxilio “não deve ser inferior a 865$000 para o candidato gozar de todas as regalias”.
De janeiro de 1929 é o ofício dirigido ao Intendente de São Domingos da Boa Vista. Nele é informado que durante o ano letivo de 1928 determinado aluno, como
candidato daquele município, “requereu e fez exames do 1º anno, apezar de ter
essa intendencia apenas satisfeito a importancia de cem mil réis”. Diz ainda que o
auxilio é prestado exclusivamente ao candidato e não à Faculdade, pelo que sugere
que a quantia seja entregue ao aluno, “que assim gosará, sem constrangimento, de
todas as regalias”.
194
Outro ofício, em resposta ao tema acima, datado de 30 de janeiro de 1929 depreende-se rebater a argumentação da Intendência de São Domingos da Boa Vista. O
secretário da Faculdade diz ter-lhe causado estranheza “affirmar V. Sa. que o pagamento foi iniciado em Agosto, tendo sido satisfeito mensalmente até Janeiro deste
anno.” E continua dizendo não por em dúvida “que a Recebedoria fizesse annotação
no “documento de entrega de reditos desse Municipio’, mas a Secretaria, até hoje,
não teve conhecimento desse pagamento”.
Determinados documentos dão conta que o oferecimento de “apadrinhamento” de
vagas extendia-se a outros órgãos - a imprensa, por exemplo. Em correspondência
enviada à Faculdade, em 31 de março de 1927, o diretor do jornal Estado do Pará
lembra de ter sido posto à disposição do jornal “ uma vaga para ser occupada por
(alguém) pelo mesmo indicado” e havendo o indicado anterior concluído o curso
o jornal queria indicar um outro nome, um “moço intelligente e dedicado, que já
possue o primeiro anno dessa digna Faculdade”11.
A resposta incisiva não se fez esperar: a Faculdade informa que havia seis meses
a Congregação extinguira os lugares destinados à imprensa, continuando apenas
aquele que concluía o curso, sendo impossível atender o pedido devido às dificuldades financeiras da Escola.
Observa-se que particulares também tinham problemas em saldar seus débitos
para com a Faculdade, sofrendo as consequências. Em correspondência de 10 de
outubro de 1923 endereçada ao Diretor um cidadão informava que seu filho matriculado no primeiro ano, por motivos alheios a sua vontade, “deixou-se atrazar em
suas mensalidades correspondentes aos mezes de janeiro a outubro” do referido
ano, num montante de 250$000. Com o aluno impedido de freqüentar as aulas, o
pai solicita um prazo de 90 dias para saldar o débito e pede que seja liberada a presença do estudante. O despacho do Diretor é lacônico: “acceite-se”.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Outro modo de pagamento era fazer consignações para a manutenção de alunos
na Faculdade. Assim se depreende do ofício do secretário da Faculdade ao tesoureiro da mesma, datado de 12 de setembro de 1927, dando conta que determinado
cidadão fizera na Diretoria Geral da Fazenda Pública do Estado uma consignação “na importância de um conto e duzentos réis (Rs.1:200$000) para occorrer
ao pagamento da despesa de mensalidades de seus filhos”, alunos do 3º e 1º anos,
respectivamente.
Sobre a situação financeira da Faculdade, o secretário manifesta-se em correspondência de 3 de setembro de 1926, endereçada ao Dr. Lauro Sodré Filho, inspetor federal junto à Faculdade, enviando o referido documento e alertando que “de ordem
superior [...] d’ora vante todas as informações deverão ser pedidas por escripto e
não verbalmente”.
A prestação de contas é feita, também, junto ao Governo Federal. Em ofício dirigido ao Ministro da Justiça e Negócios do Interior, em 18 de outubro de 1927, a
direção da Faculdade encaminha o demonstrativo de pagamentos realizados com a
importância de cinquenta contos de réis, oriundos da subvenção votada pelo Congresso Federal, através da lei nº 5.156, art. 32, de 12 de janeiro de 1927.
Parece que a Faculdade nasceu sob o signo de pedir; e nem sempre conseguir. Em
5 de fevereiro de 1927 foi solicitado ao Intendente de Belém, dois passes de bonde,
justificando as “crescentes despezas deste novel Instituto de Ensino Superior”.
O pedido não foi aceito, conforme ofício da Intendência, de 21 de fevereiro do mesmo ano, por já terem sido distribuídos todos os passes, “actualmente em numero
mais redusido que dantes”. Então, em 20 de dezembro de 1927 foi enviado ao mesmo Intendente o seguinte oficio
Exmº Snr. Dr. Crespo de Castro
DD. Intendente de Belem.
Em officio numero 43, de 5 de fevereiro deste anno e de ordem do Snr.
Dr. Camillo Salgado, solicitei a V. Excia. um passe de bond para esta Faculdade, representando este um valioso auxilio á nossa Escola Medica.
Infelizmente, por ser feito tardiamente, não poude o nosso pedido ser
attendido, conforme communicação do illustrado secretario dessa Intendencia, snr. dr. Paulo Eleutherio.
Agora, com antecedencia e com auctorização do snr. Dr. Salgado, renovo
o pedido, crente de que V. Excia. desta vez satisfará o desejo do esforçado
director desta Academia.
Prevaleço-me do ensejo para reaffirmar a V. Excia. as seguranças de muito apreço e profunda admiração.
Saúde e Fraternidade
Dr. Olympio da Silveira
Secretario
A manutenção financeira
195
Do mesmo modo, em 2 de fevereiro de 1927, foi solicitado ao snr. J. D’. Rane, gerente da Companhia Para Eletric a concessão de “um ou dois passes de bonds”, apelando para o “alto espirito philantropico que tanto caracterisa V. S., em virtude das
crescentes despesas e das diminutas rendas. A resposta, endereçada ao Secretário
da Faculdade, foi de “não poder acceder ao vosso pedido por já haver distribuido
o numero de passes estipulado pela Directoria”. A resposta da Faculdade veio em
ofício de 5 de fevereiro do mesmo ano e endereçado ao referido gerente: o secretário da Faculdade diz ter havido um “manifesto equivoco” do Sr. D’. Rane, pois a
solicitação fora feita em nome do diretor da Faculdade e não na dele, secretário.
196
Outro fato bem interessante relacionado à obtenção de recursos para a Faculdade é assunto de correspondência do cônsul da Áustria ao Dr. Camillo Salgado, datada de 4 de
março de 1924. Na citada correspondência é mencionado um concerto realizado por um
casal de artistas austríacos, marido pianista e mulher cantora, “dedicado à Faculdade”.
O cônsul relata ter cobrado do músico a quantia devida à Faculdade, tendo como resposta “que nada podia ceder do arrecadado, em virtude de não haver as receitas chegado
para cobrir as despesas”. O cônsul prossegue dizendo ter agido energicamente, inclusive
ameaçando o casal de não viajar para os Estados Unidos. Estando o músico desprovido de dinheiro, fê-lo assinar uma declaração de dívida no valor de 200$000, sendo o
documento remetido a representantes nos Estados Unidos (presume-se) para a devida
cobrança. E conclui dizendo que tão logo receba qualquer notícia comunicará ao Dr. Camillo, além de lamentar que o concerto não tivesse dado o resultado que se esperava.
Deste modo, não soa estranho o ofício de 28 de setembro de 1926, endereçado ao
Dr. J. Gesteira, proprietário do laboratório Gesteira onde “confiando no alto espirito philantropico que tanto (o) caracterisa” solicita um auxilio “para a montagem do
laboratorio de bacteriologia de que tanto se ressente a nossa Escola”. E prossegue
“Conscio de que V. S., sempre devotado ás causas nobres e que de perto interessam
ao Pará, terra sua pelo coração e do nascimento de entes que tão caros lhe são, attenderá solicito a este appello”. (FMCP, 1923b).
Em meio à choradeira da Faculdade na busca de recursos financeiros é digno de registro
a correspondência encaminhada e esta, em 19 de setembro de 1930, por Francisco Maria Bordallo, exportador de madeiras sediado em Curralinho. Como lembrança da passagem de seu filho, que estudara dois anos na Faculdade do Pará, oferecia determinado
valor não mencionado no texto à Escola, pedindo desculpas pela “pequena offerta”.12
Mas se a Faculdade buscava doações, ao mesmo tempo em que tentava alternativas
para receber o que o Governo lhe devia, por exemplo13, para receber o que lhe era
de direito tinha que recorrer a lobistas, conforme teor do ofício abaixo:
Ilmo. Sr. Director da Escola de Medicina
Sendo essa Instituição contemplada, annualmente, com um auxilio no
Orçamento Federal, venho propôr a V. S. encarregar-me, mediante modi-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
cos honorarios, da liquidação do respectivo processo de pagamento.
Com longa pratica de serviços dessa natureza, acompanho, de perto, toda
a marcha dos papeis, apressando sua passagem pelo Ministerio da Justiça, Tribunal de Contas e Thesouro Nacional, de sorte a, no menor prazo
possivel, receber a importância da subvenção.
Aguardando a resposta de V. S., para, então, transmittir-lhes as informações de que, porventura, necessite, subscrevo-me, cordialmente,
Dr. Álvaro Leite Penteado - advogado
Eis mais alguns exemplos de correspondências dirigidas à Direção da Faculdade e
relacionadas a pedidos de vagas:
Belém, 1 de Junho de 1927
Presado amo. Dr. Camillo Salgado
Pelo exmo. Snr. dr. Dionysio Bentes, nosso digno Governador me foi
pessoalmente assegurada, para meu filho (*********), matriculado nessa Faculdade, a vaga por ella destinada ao Estado de que é chefe aquelle
nosso illustre conterraneo.
Como não existem motivos para que me autorisem a por em duvida a promessa acima alludida, peço-lhe a fineza de providenciar no sentido de não
me ser novamente enviado o recibo da mensalidade do referido aluno
__________________________________________________________
Secretaria Geral do Estado
Belém,13 de Junho de 1927
Ilmo Sr. Dr. Director da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará
Solicito a V. S. a fineza de conceder, mais uma vaga, alem da que poz á disposição do Governo, nessa Faculdade, para o academico (*********).
Deodoro de Mendonça
__________________________________________________________
Muaná, 12 de Julho de 1926
Exmo. Snr. Director da Faculdade de Medicina do Pará
Communico a V. Excia. que a verba estabelecida pela Lei orçamentária
deste municipio em a secção XVIII, n. 2 de trezentos mil réis (300$000)
é para ser applicada no pagamento das mensalidades, na Faculdade de
Medicina, do alumno (********).
__________________________________________________________
O discurso sobre a precária situação financeira da Faculdade acompanha a trajetória da mesma. É recorrente, nos Relatórios anuais de atividades menção às dificuldades financeiras, embora quase sempre haja acréscimo de patrimônio, compra ou
inauguração de novas instalações. Bem verdade que no Relatório de 1935 é mencionado déficit nas contas de Instituição e onde tal fato iria repercutir14. Por outro
lado, no mesmo relatório é citado no balanço das atividades do Conselho TécnicoAdministrativo um auxílio recebido do governo federal, bem como a destinação do
mesmo.15 No mesmo ano, o Diretor oficia ao Prefeito municipal solicitando auxílio
para a locomoção dos funcionários que executavam serviços externos.16
A manutenção financeira
197
Dado interessante encontra-se em ofício encaminhado pela Faculdade ao Chefe
do Imposto de Renda, em 30 de agosto de 1935. No documento, Camilo Salgado
encaminha ao referido setor a relação de professores e funcionários da Instituição e
solicita que estes “ficassem dispensados do imposto de renda, referente ás alludidas
gratificações”, com a justificativa que a Escola vivia da renda das mensalidades dos
alunos, sem auxílio dos poderes públicos (FMCP, 1935c).
A situação chegou a ficar tão crítica que em 1936, o professor Dias Jr., catedrático
da Faculdade e exercendo mandato de Deputado Estadual, tentou, por duas vezes,
e através do Legislativo, conseguir verbas para a Escola de Medicina. Inicialmente
em 13 de outubro, durante a discussão do orçamento do Estado para o exercício
seguinte, propôs emenda ao projeto aumentando de 60:000$000 para 100:000$000,
a verba de auxílio para as Faculdades de Medicina e Farmácia do Pará. A emenda,
ainda que aprovada, não chegou a surtir efeito, em virtude de ter sido aprovada
outra emenda que prejudicou o projeto como um todo.
Em novembro de 1936, já visando o orçamento do ano seguinte, o Dr. Dias Junior
apresentou projeto de lei reconhecendo a dívida do Estado para com a Faculdade
de Medicina, com o seguinte teor:
198
PROJETO DE LEI Nº143
Reconhece a divida passiva do Estado para com a Faculdade de Medicina do Pará e dá outras providencias
A Assembléa Legislativa estatue a seguinte lei:
Art. 1º - fica reconhecida a divida passiva do Estado até a presente época, pra com a Faculdade de Medicina do Pará, na importancia de trezentos
e sessenta e um contos e oitocentos e trinta e seis mil réis (361:836$000),
decorrente de subvenções em atrazo, consignações e taxas escolares de estudantes pobres, matriculados por conta do Estado, igualmente atrazadas.
§ único - O pagamento da divida de que trata a disposição supra será
feito mediante amortizações anuais, sendo duas de cem contos de réis
(100:000$000) e uma de cento e sessenta e um contos oitocentos e trinta
e seis mil réis (161:836$000), acrescidas, em caso de móra, dos juros de
cinco por cento (5%) ao ano.
Art. 2º - O predio onde funciona, actualmente, o Grupo Escolar “Rui
Barbosa” do patrimonio da citada Faculdade17, ser-lhe-á entregue, desocupado, dentro de seis (6) mezes, da data da publicação da presente lei e,
se o não poder fazer, passará o Estado a pagar áquela instituição de ensino superior o aluguel mensal de quinhentos mil réis (500$000).
Art. 3º - Os estudantes matriculados por conta do Estado, que não
obtiverem média anual para promoção, igual ou superior a sete (7), serão
imediatamente desligados, devendo o Poder Executivo evitar novo atrazo
no pagamento das respectivas taxas.
Art. 4º - Revogam-se as disposições em contrario.
Sala das sessões da Assembléa Legislativa, 30 de novembro de 1936.
aa) Dias Junior
João Botelho
Antonino Melo
(FMCP, 1939c, p. 77)
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Na exposição de motivos do referido projeto de lei, o Prof. Dias Junior cita que um
professor da Faculdade recebia “os ridículos vencimentos de 360$000 mensais”, resultantes da contribuição de 25 contos pelo Governo Federal, dos quais 50% foram
aplicados no pagamento dos professores e o restante na aquisição de material, “como
manda a lei”18. Ainda na mesma exposição de motivos, o Dr. Dias Junior faz saber que
a falta de repasse das verbas estaduais para com a Faculdade de Medicina já somavam 361:000$000, relativo ao período de 1923 a 1929 (FMCP, 1939c, p. 84).
O projeto do deputado Dias Junior foi aprovado em todas as comissões e transformado em lei. Entretanto foi vetado pelo Governo do Estado sob a alegação que a
dívida reconhecida pelo Estado para com a Faculdade era de 74:000$000. Também, que o projeto de lei não providenciava os recursos para o pagamento a que
se destinava. Quanto ao prédio da Escola de Farmácia, dizia que a matéria era de
exame e atribuição do Executivo, “quer relativamente a execução dessa lei, jamais
requerida, quer quanto ao contrato de locação do mesmo, si efetivamente pertencer á Faculdade”. Em relação aos alunos mantidos pelo Estado, dizia ser, também,
assunto pertinente ao Executivo (FMCP, 1939c, p. 86).
O veto à lei do deputado Dias Junior rendeu desdobramentos no noticiário. A Folha
do Norte de 23 de outubro de 1937 contesta as “contas” do Governo e diz que a
dívida é até maior19. Em 26 do mesmo mês, o referido jornal publica o que poderia
ser considerado como a opinião do Governo20. A resposta viria no dia seguinte,
pelo mesmo jornal.21
De qualquer modo, viu-se a Faculdade “tungada” em seus direitos legítimos pelo
Estado, que ainda encaminhava ofícios como o seguinte:
Belém, 17 de janeiro de 1935
Ilmo. Sr. Director da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará
Comunico-vos, para os devidos fins, que o sr. Major Interventor Federal,
por despacho de 14 de dezembro ultimo exarado no requerimento de
**************, alumno da 5ª serie dessa Faculdade, dispensou-o do
pagamento da quantia de 345$000 (TREZENTOS E QUARENTA E
CINCO MIL REIS), que deve ahi de emolumentos de matricula e curso
(FMCP, 1935c).
Ou este outro, também muito interessante:
De ordem do exmº sr. Major Interventor Federal, solicito-vos as necessárias providencias no sentido de ser o Estado indemnisado da quantia
de 55$000 (cincoenta e cinco mil réis), correspondente ao consumo de
luz desse estabelecimento de ensino, no periodo de Agosto a Novembro
de 1934 a saber:
Agosto ....................20$000
Setembro ...............14$000
Outubro ...................16$000
Novembro .................4$000
A manutenção financeira
199
Aproveito o ensejo para scientificar-vos, ainda da ordem do exmº sr. Interventor Federal, que, a partir deste mez, o Governo do Estado não
mais se responsabilisa pelo pagamento da já aludida despesa que, assim,
passará a ser estipendiada por essa Faculdade (FMCP, 1935c).
Sem dúvida, a Faculdade não se dava por vencida e, sempre que possível, contraatacava na luta por seus direitos:
Belém, 7 de Março de 1934
Exmo. Sr. Diretor Geral de Ensino
Em obediencia ao oficio de V. Excia., nº 222, de 2º de Novembro do ano p.
findo, foi submetido a exame o aluno ************, devedor aos cofres
desta Faculdade da importancia de 730$000, despesa esta que será paga
“pelos cofres do Estado”, nos termos do referido oficio.
Assim, solicito a V. Excia. as necessárias providencias nesse sentido.22
200
O número reduzido de alunos e as vagas gratuitas contribuíam para a situação financeira
delicada da Faculdade, pois as taxas escolares pagas não eram suficientes para manter a estrutura da Escola23. E como as verbas oficiais geralmente atrasavam, a Faculdade vivia sempre com seu orçamento apertado. Ainda assim, graças à tenacidade e pulso firme de seus
dirigentes e, certamente, ao devotamento e compreensão de seus professores e funcionários,
conseguiu ir ampliando sua área, adquirindo terrenos adjacentes ao prédio central, onde
pôde construir o magnífico conjunto arquitetônico da Escola, hoje, infelizmente, esquartejado por vários outros cursos e funções ficando o curso de medicina - o grande empreendedor da obra -, como um verdadeiro intruso dentro dos seus (antigos) próprios domínios.
Assumindo a Direção da Faculdade em 1938, o Dr. Lauro de Magalhães em seu primeiro
Relatório de atividades menciona a situação financeira da Escola. Segundo ele, mandou
Proceder um balanço geral dos bens e de sua tesouraria, que revelou
uma situação financeira pouco lisongeira, impossibilitando a realisação
do orçamentos votado para o ano de 1938 e nos obrigou a aconselhar ao
Conselho Administrativo e á congregação a reforma-lo com a verdadeira
situação e estabelecer um equilíbrio entre a receita e a despesa, o que foi
aceito e realizado (FMCP, 1939c, p. 5).
Lauro de Magalhães cita os fatores para aquela situação: a diminuição dos alunos matriculados nas várias séries, devido à criação do curso complementar, “que privou a
Escola de alunos durante dois anos na primeira e segunda séries”: o não recebimento
do auxílio federal, de sessenta contos, “na época devida” e a desanexação da Escola de
Farmácia, “que nos desfalcou do auxílio de 72:000$000” (FMCP, 1939c, p. 5).
A solução para o equilíbrio teria que ser drástica: corte de despesas, de salários,
inclusive dos professores, e aumento das taxas.24
O Relatório do ano seguinte aponta uma melhoria, mas ainda com déficit, permitindo a
retomada da ampliação do espaço físico da escola, embora sejam citadas as dificuldades:
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
A nossa situação financeira, se ainda não atingiu a meta desejada, contudo vai melhorando pouco a pouco, de modo a nos ter permitido, em
Dezembro, o inicio da construção do novo pavilhão, [...]. Continuando
ainda reduzida a matricula nas diversas séries, contando a Faculdade apenas com o auxilio federal, que poderá falhar, maiores realizações não nos
foi possivel empreender (FMCP, 1940b, p. 3).
Também é citado o auxilio emprestado à Faculdade pelo prefeito de Belém, Abelardo Condurú, com abundantes elogios à sua figura.25 Do mesmo modo é lembrado
que a Faculdade somente poderia progredir, materialmente, “com o concurso financeiro de governos patrióticos e argutos” e que compreendessem o sacrifício do
corpo docente. “empenhado tão somente em dotar o nosso Estado com uma Escola
que honra a cultura do Norte” (FMCP, 1940b, p. 4).
Em 1940, o Relatório aponta para uma situação financeira mais ou menos equilibrada,
com a Diretoria cumprindo integralmente o que prometera no relatório e orçamento
anteriores, “não perdendo um real de sua receita”, encerrando o ano “com seus bens e
patrimônios móveis e imóveis conservados, melhorados e aumentados”, sendo citado
o início da construção do pavilhão de anatomia, que contou com um auxilio federal de
oitenta contos de réis, “totalmente empregado na construção” (FMCP, 1941, p. 43).
Novamente é exaltada a participação do prefeito Abelardo Condurú como partícipe
do estágio de evolução da Faculdade.26 Assim conclui o Diretor:
Conservamos e exaltamos o nível moral, social e cientifico que a Faculdade já alcançara, solidificamos o seu credito financeiro, destruímos
velhas praxes e corrigimos as irregularidades existentes; melhoramos a
situação econômica, aumentando os vencimentos dos professores e dos
funcionários, enriquecemos o seu patrimônio... (FMCP, 1941, p. 7).
O balancete da Receita e de Despesa da Faculdade para aquele ano de 1940, menciona os valores de 14:000$000 e 80:000$000, respectivamente como auxilio estadual e auxilio federal (FMCP, 1941 p. 7).
Nas palavras iniciais do Relatório de 1941, o Dr. Lauro de Magalhães fala na “relativa prosperidade financeira e economica”, se achando “melhor aparelhada para
os fins a que se dedica” (FMCP, 1942b, p. 3). Curiosamente o balancete para aquele
ano registraria a quantia de 362:527$800 de Despesa e 351:600$700 de Receita,
respectivamente, o que geraria um déficit de 10:921$100. Os auxílios municipal,
federal e estadual seriam na ordem de 12:000$000; 80:000$000 e 10:000$000, respectivamente (FMCP, 1942b, Mapa n. 6).
Em 1942, foi inaugurado o pavilhão de Anatomia e iniciada a construção de outro
prédio. Referindo-se às obras, o Diretor assim se manifesta: “Como sabeis, este melhoramentos imprescindiveis e urgentes, são feitos com grande sacrifícios, à custa
dos nossos minguados recursos e dos auxilios generosamente prodigalizados pelos
governos Federal e Estadual e pela Prefeitura de Belém” (FMCP, 1943b, p. 4).
A manutenção financeira
201
A menção faz justiça aos valores recebidos pela Faculdade naquele ano, a saber: 12:000$000, da Prefeitura Municipal; 40:000$000, do Governo Estadual e
80:000$000, do Governo Federal (FMCP, 1943b, Mapa n. 6).
O relatório de 1943 menciona que a situação da Faculdade era “lisonjeira”, permitindo algumas obras e também que fossem aumentados os vencimentos dos professores e funcionários. Entretanto, restou um pequeno déficit de Cr$ 7.250,00
(FMCP, 1944b, p. 4). As subvenções para naquele ano somaram Cr$ 128.666,30,
assim distribuídas: auxilio municipal: Cr$ 12.000,00; auxilio federal Cr$ 80.000,00;
auxilio estadual CR$ 36.666,30. (FMCP, 1944b, mapa n. 6).
No ano de 1944, embora sejam mencionadas a realização de obras de construção
e de reforma, devido à “carestia atual da vida e do excessivo preço dos materiais
de construção e laboratório”, os avanços foram lentos. A situação financeira da
faculdade, “se não é de penúria, longe está, porém, de ser folgada”, uma vez que “a
(nossa) principal fonte de renda provém das contribuições dos alunos”, que naquele
ano somaram apenas 155 matriculados, com muitos ocupando vagas gratuitas (em
número de 10) solicitadas pelo Estado. Como comparação é mencionado haver em
Belém colégios com seiscentos a mil alunos que pagam, entre outras contribuições,
a taxa de oitenta cruzeiros, para a fiscalização federal, enquanto esta despesa é paga
pela Faculdade, “com seus parcos recursos” (FMCP, 1945c, p. 4).
202
O Relatório daquele ano informa as dotações oficiais para a Faculdade: auxilio municipal: Cr$ 12.000,00; auxilio federal: Cr$ 80.000,00; auxilio estadual: Cr$ 40.000,00
e mais Cr$ 3.333,70 como resto de 1943, perfazendo um total de Cr$ 135.333,70.
Levando em consideração que o pavilhão destinado à biblioteca e à sala da Diretoria
custou Cr$ 130.000,00 temos uma idéia do que representavam estes valores no orçamento da Faculdade.
O ano de 1945 terminaria com um saldo de Cr$ 2.350,00, mesmo com despesas
com a compra de um motor para as câmaras frigoríficas e de livros para a biblioteca
(FMCP, 1946b, p. 4). Também é informado o auxilio de Cr$ 36.000,00 concedidos
pela Prefeitura de Belém, através do prefeito Alberto Engelhard, e que foram “totalmente empregados na melhoria do prédio”, e o recebimento de Cr$ 35.000,00
mandados pagar pelo Interventor coronel Magalhães Barata, “por conta do crédito que temos no Tesouro do Estado” (FMCP, 1946b, p. 35). No balancete anual
é informado o montante recebido a título de subvenção do poder público: auxílio
federal: Cr$ 80.000,00; estadual: Cr$ 36.666,30; municipal: Cr$ 24.000,00; S.V.O.:
Cr$ 55.000,00, perfazendo um total de Cr$ 195.000,00.
O Relatório de 1946 continua falando de uma Escola que não dispõe de “largos recursos financeiros”, do Norte “tão pouco acarinhado pela República”, das poucas matrículas (133), das vagas gratuitas, dos exíguos auxílios recebidos do poder público, mas
informa que as condições financeiras “são lisongeiras”, os compromissos em dia, invesMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
timentos de Cr$ 100.294,30 em material de consumo e aquisição de novos aparelhos,
Cr$ 26.961,10 na aquisição de obras para a biblioteca e um saldo de Cr$ 15.765,6027.
As subvenções públicas somaram um total de Cr$ 219.000,00 assim distribuídas:
federal: Cr$ 100.000,00; estadual Cr$ 40.000,00; municipal: Cr$ 24.000,00; S.V.O.:
Cr$ 55.000,00. Com as taxas cobradas a Faculdade arrecadou Cr$ 288.070,00. O
total de receita e despesa foi de Cr$ 644.024,80 e Cr$ 628.259,60, respectivamente,
terminando o ano com lucro, já mencionado (FMCP, 1947b, mapa n. 8).
O Relatório de 1947 inicia reclamando do não recebimento da subvenção anual de
cem mil cruzeiros do governo federal e do “pequeno auxílio de doze mil cruzeiros
constante da lei orçamentária do Município”, assim como do pagamento de apenas
60% da verba estadual (FMCP, 1948c, p. 3-4). Sem muitos dados a confrontar, temos,
pelo balancete, o recebimento de Cr$ 98.333,10 de subsídios, a saber: Cr$ 53.333,10
de auxilio estadual e Cr$ 40.000,00 do S.V.O. As taxas arrecadadas somaram o montante de Cr$ 399.085,00. Além disso, Folha do Norte noticiava a liberação, pelo governo federal, de 400 mil cruzeiros para o aparelhamento da Faculdade.28
No ano de 1948 voltou a acontecer o não recebimento das subvenções públicas.
Tanto o governo estadual quanto o municipal não honraram seus compromissos em
pagar os auxílios previstos em seus orçamentos, respectivamente Cr$ 100.000,00
e Cr$ 12.000,00. Também por conta do não repasse da verba prevista para o S.V.O,
no valor de Cr$ 5.000,00 mensais, a Faculdade foi obrigada a rescindir o contrato
de prestação do serviço. Ainda assim, o Relatório informa ter a Faculdade encerrado o ano social com todos os compromissos pagos em dia (FMCP, 1949b, p. 4).
Volta e meia, a Faculdade tinha que “lembrar” ao governo do Estado dos débitos
deste para com a Escola, conforme teor do ofício encaminhado ao secretário geral
do Estado em 22 de junho de 1948.
Ao Ilmº Sr.
Dr. Armando de Souza Corrêa
M. D. Secretário Geral do Estado
Ilmº. Sr.
Pelo ofício nº 240, de 23 de Março de 1948, foi apresentado por V. S., de
ordem do sr. Major Governador do Estado, o aluno *****, para ocupar
uma vaga paga pelo Tesouro do Estado.
A Faculdade, atendendo á solicitação, matriculou o referido aluno cujo debito,
presentemente, eleva-se a mil trezentos e trinta cruzeiros (Cr$ 1.330,00).
Aguardando qualquer resolução neste sentido, sirvo-me da oportunidade
para apresentar-lhe.
Atenciosas saudações
Dr. Lauro de Magalhães
Diretor
(FMCP, 1948a)
A manutenção financeira
203
Para aquele ano de 1948, a subvenção dos poderes públicos ficou restrita apenas
ao auxílio do governo federal, no valor de Cr$ 120.000,00. As taxas arrecadadas
somaram Cr$ 361.355,00 e o montante total de receitas foi de Cr$ 4.951.495,10,
com as despesas no valor de Cr$ 4.950.926,40, deixando para a Faculdade um saldo
de Cr$ 568,70 (FMCP, 1949b. Mapa nº 7).
A luta da Faculdade para receber seus débitos continuava: em 24 de março daquele
ano, a escola cobrava do governo do Estado o pagamento de Cr$ 2.630,00 referente às taxas escolares de um aluno mantido pelo governo, “de modo que não sofra
qualquer interrupção o seu curso” (FMCP, 1949a). Referido ofício seria reiterado
em 19 de abril, ressaltando que a Faculdade vivia “apenas das taxas escolares, sem
receber qualquer auxílio do Estado e da Prefeitura” (FMCP, 1949a).
Em outra correspondência, de 19 de maio de 1949, era informado a um interessado em
cursar a Faculdade, além dos documentos necessários à inscrição, os valores das taxas
para o próximo ano letivo: Cr$ 2.600,00 divididos em 4 prestações de Cr$ 650,00, nas
datas de 10 a 25 de fevereiro, 1 a 10 de maio, 1 a 10 de agosto e 1 a 10 de novembro. A
inscrição para o concurso de Habilitação era de Cr$ 200,00 (FMCP, 1949a).
204
Em 6 de agosto de 1949, o Diretor, Dr. Lauro de Magalhães oficiava ao DAM
solicitando que os alunos pagassem a 3ª prestação até o dia 10 do referido mês,
“sob pena de proibir a entrada às aulas aos faltosos”. (FMCP, 1949a) Este ofício
geraria protestos dos acadêmicos, merecendo resposta do Diretor, afirmando que a
determinação para as suspensões dos alunos às aulas fora sua e não, do secretário.
(FMCP, 1949a).
Como além do Governo do Estado, as entidades estudantis também tinham direito à
vagas gratuitas, o ofício de 22 de outubro de 1949, assinado pelo secretário da Faculdade, informava ao presidente da União Acadêmica Paraense que a referida entidade
mantinha naquele ano duas vagas para alunos da Faculdade. (FMCP, 1949a).
Em ofício de 8 de novembro de 1949, o Diretor da Faculdade informava ao presidente do DAM que “a última prestação das taxas só será dispensada quando e depois
que a Faculdade receber integralmente o auxílio federal pela Verba de Valorização
da Amazônia”; que por ter recebido apenas a metade da referida verba, “sente-se
obrigada a cobrar a última prestação, para não perturbar a vida financeira, e encontrar dificuldades na cobrança futura quando os atos escolares encerrados”; que se a
Faculdade receber a segunda prestação em tempo, “as taxas serão dispensadas e se
receber depois de pagas serão leal e honestamente devolvidas (FMCP, 1949a).
Apesar de tantas lutas internas relacionadas ao sustento financeiro da Faculdade,
o ano de 1949 continuou positivo para a mesma, com a construção de um novo
pavilhão, inicialmente orçado em Cr$ 950.000,00 e que por conta de serviços complementares acabou elevando-se a Cr$ 1.110.000,00. No mesmo ano foi iniciada a
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
construção do Biotério, cuja obra inicialmente orçada em Cr$ 246.000,00 foi reajustada para Cr$ 470.000,00 (FMCP, 1950b, p. 3).
Comentando sobre as verbas necessárias para as construções, o Diretor afirma
que: “Não chegam, sem dúvida, as verbas de procedência federal para o fim a que
se destinam, mas nem por isso, deixam de representar uma satisfação às contínuas
exposições de motivos apresentados pela Faculdade” (FMCP, 1950b, p. 3).
E faz um balanço da destinação do dinheiro recebido do Tesouro Nacional, na
ordem de Cr$ 3.900.000,00, “auxilio este concedido pela verba de Valorização Econômica da Amazônia”, sendo parte da verba utilizada na melhoria dos vencimentos
de professores e funcionários e o restante Cr$ 1.310.000,00 “que serão aplicados
em material de ensino, na aquisição de terrenos contíguos á nossa Escola e necessários à sua ampliação, segundo plano traçado, cuja planta e orçamento se acham
oficialmente aprovados (FMCP, 1950b, p. 3). Exultante, referindo-se à situação
financeira da escola, o Diretor assim se manifesta:
Não obstante ao pessimo malsão dos céticos e derrotistas, há trinta (30)
anos passados, quando fundámos esta Escola, [...], vamos, ano a ano, aumentando o nosso patrimônio, que orça por vários milhões de cruzeiros,
e firmando crédito apreciável e importante renome, não só aqui, mas em
todo Brasil... (FMCP, 1950b, p. 5).
Um fato citado no Relatório de 1949 e considerado capital para a vida financeira
da Faculdade foi a participação dos parlamentares federais paraenses integrantes
da Comissão de Valorização Econômica da Amazônia, dentre eles sendo citado
o Dr. Agostinho Monteiro, um dos fundadores da Faculdade. Através da citada
comissão foi consignada a verba de Cr$ 3.900.000,00 em beneficio da Faculdade,
para que esta pudesse ser enquadrada “no padrão às correlatas federais”. (FMCP,
1950b, p. 8) Esta verba, concedida desde 1948, permitiu a continuação do projeto
de ampliação da Escola, criando condições para que viesse acontecer a tão desejada federalização.
O balancete de 1949 apresentou como Receita: Cr$ 10.346.128,50 e Despesa:
Cr$ 10.356.850,50, verificando-se um saldo de Cr$ 7.278,00.
A luta por recursos foi uma constante na história da Faculdade de Medicina e
Cirurgia do Pará. Nos anos mais próximos a 1950 observa-se uma intensa troca
de correspondência entre a Escola e diversos seguimentos, principalmente autoridades, solicitando verbas para a manutenção e obras, cobrando a liberação do
que já fora definido, pedindo mais ajuda aos diversos setores, entrando em atrito
com os alunos por conta das taxas tudo visando dotar a Instituição de condições
ideais para o ensino e a formação de seus alunos, tornando-a uma unidade padrão,
sem nada dever às demais escolas médicas de então, estágio a que chegou naquela
metade do século XX.
A manutenção financeira
205
Embora federalizada em 3 de janeiro de 1950, o Relatório de atividades daquele
ano não difere muito dos anteriores, no que se refere às questões financeiras. Pelo
contrário, levando em consideração a nova situação da Escola, a situação permanecia inalterada ou até mais complicada, como afirmava o Diretor no inicio do Relatório: “Infelizmente, não obstante os esforços empregados, a situação permanece a
mesma – os corpos docente e administrativo não foram nomeados – continuando a
Faculdade sem verba para a manutenção dos seus serviços”.
Apesar desse impasse, o espírito empreendedor dos dirigentes conseguia levar
adiante seu projeto de ampliação e modernização da Escola. Deste modo, da verba
de Cr$ 3.822.000,00, concedida em 1949 pela Comissão Econômica do Vale da
Amazônia, a Faculdade receberia Cr$ 1.911.000,00 em novembro de 1950. Deste
valor, Cr$ 250.000,00 seriam destinados ao prosseguimento das obras do Instituto
de Higiene e Cr$ 95.387,00 para pagamento de material para os laboratórios. O
restante seria empregado no pagamento dos corpos docente e administrativo da
instituição (FMCP, 1951, p. 3).
O diretor expressaria sua opinião sobre os “novos tempos” vividos pela Faculdade:
206
Jamais nos anuviaram os horizontes as sombras dos maldizentes. O pessimismo dêstes é cera dúctil em que se moldam as suas imagens de semideuses, aureolados de um predomínio inexistente. Mantemos o nosso prestigio intelectual passando-o sempre pelo crisol da instrução nacional, da
qual não desmerecemos (FMCP, 1951, p. 4).
Mesmo com todos os percalços, o balancete do ano de 1950 apontou um saldo
de Cr$ 68.078,90 com a receita chegando a Cr$ 4.474.233,30 e as despesas
Cr$ 4.406.154,40 (FMCP, 1951).
Se em 1950 a Faculdade funcionou sem as verbas federais a que teria direito com
a federalização, o ano seguinte não seria diferente. O relatório do ano de 1951 dá
conta das dificuldades enfrentadas pela Escola. No dizer do Diretor, Dr. Lauro de
Magalhães, 1951 fora de “intensa labuta”, para enquadrar a Faculdade no regime das
federais, mas que folgava de ver que a obra estava quase terminada (FMCP, 1951).
Pelos dados do Relatório de 1951, temos que embora federalizada, nenhuma verba
foi concedida, tanto para pagamento de professores e funcionários, quanto para
custeio dos laboratórios e administração. Segundo o diretor, a Faculdade somente
funcionou “devido a bôa vontade e espírito de compreensão e sacrifício dos professores e funcionários” (FMCP, 1952, p. 5).
Sobre as verbas devidas, o Relatório de 1951 diz terem sido gastos Cr$ 300.000,00
para pagamento de material adquirido no segundo semestre de 1950, “tão logo
que a Faculdade recebeu, em junho de 1951, a verba correspondente ao primeiro
semestre de 1950”, frisando que a verba relativa ao primeiro semestre de 1950,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
não havia sido paga. O referido relatório enfatiza ainda não ter sido possível “enriquecer a Biblioteca com novos livros porque nos foi negada a verba de material,
consignada no orçamento de 1951” (FMCP, 1951, p. 27).
Como se observa mesmo com a federalização a Faculdade de Medicina e Cirurgia do
Pará não passou logo a desfrutar de uma situação financeira cômoda, pois a falta do
repasse de verbas demandaria um tempo para sua regularização, atingindo inclusive
o corpo docente e funcional. Com a normalização dos repasses e a conseqüente absorção dos recursos humanos pela União, a parcela maior dos problemas financeiros
seria equacionada, permitindo que a Escola vivesse dias mais tranquilos, pelo menos
no que se refere à sua manutenção financeira, até ser agregada à Universidade.
NOTAS
1
“Sua receita compreendia subvenções dos poderes publicos, taxas e emolumentos escolares e administrativos e outras rendas eventuais.” (FMCP,
1939c, p. 70).
2
“Bem viu não esqueci essa Escola. E, novamente, voltei a pedir o modesto
auxilio de vinte contos ao Congresso Nacional. Uma vez ainda a Câmara dos
Deputados não approvou o auxilio, que a Comissão de Finanças do Senado
reduziu a doze contos. E essa recusa era feita ao ser votada do orçamento em
que figuram auxílios vultuosos às Escolas de Medicina de outros Estados.
Espero que lograremos ser attendidos este anno. Já é tempo de conseguimos
que também para nossa terra se voltem os olhares dos que em tão pequena
conta parecem ter o Norte, o eterno desamparado do Império e tão pouco
acarinhado pela República.” (FMCP, 1945c, p. 79-80).
3
De 1924 a 1927 constam nas mensagens governamentais o auxílio de 50 contos de réis para a Faculdade. A mensagem de 1928 diz apenas “Da parte do
Estado, temos feito, quanto permitte nossa situação financeira”. (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes) 07.09.1928, p. 100). Na mensagem
de 1929, o governador Eurico Valle diz: “A Faculdade de Medicina é auxiliada
pela União, que annualmente registra em seus orçamentos uma verba destinada
á Faculdade, subvencionando-a também o Estado e o Municipio de Belém. As
municipalidades do interior, por sua vez, prestam-lhe seu concurso” (PARÁ.
Governador (1929-1930: Eurico de Freitas Valle) 07.09.1929, p. 113).
Embora constassem em lei, os auxílios estaduais, de 1923 a 1929, respectivamente, 50:000$000; 25:000$000; 50:000$000; 50:000$000; 50:000$000; 50:000$000;
50:000$000, não foram repassados à Diretoria, conforme o discurso do deputado
Dias Jr. In Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. (FMCP, 1939c, p. 84).
4
Ver capítulo Doutores haja ...
5
“Ainda não obtivemos auxilio pecuniario do governo federal e o do Estado,
não ignoraes, está em situação embaraçosa” (FMCP, 1923c, p. 12).
6
“Busquei o concurso inestimavel do dr. Cypriano Santos, actualmente na
governança do Estado, e com elle resolvi solicitarmos a ajuda de todos os
municipios do Pará, que patrioticamente não se excusaram a nos attender,
dando-nos logo a intendencia de Belém um auxilio de seis contos de reis”
(FMCP, 1923c, p. 12).
A manutenção financeira
207
7
208
Esta circular foi enviada durante vários anos, conforme atestam ofícios posteriores a 1930. (N.A.). FMCP, [1925b-1929].
8
“Possuo já em mãos communicações officiaes dos chefes dos executivos de
Altamira, Santarém, Soure, Igarapé-miry, Irituia, Anajás, Vizeu, Baião, Abaeté, Alemquer, Chaves, Cachoeira, Monte-Alegre, Mazagão e Cametá, sobre
os auxilios monetarios incluídos nas leis orçamentárias para 1923. Importam
em 14:800$000, e ainda a Intendencia de Belem com mais tres contos de reis,
faltando seguramente trinta municípios, que nos auxiliarão também, mas
ainda não nos informaram em documento official”. (FMCP, 1923c, p. 12).
9
O Decreto nº 16.782 A, de 13 de janeiro de 1925, que organizava o Departamento Nacional de Ensino e reformava o ensino secundário e superior, apresenta uma tabela de taxas a serem cobradas pelos estabelecimentos de ensino superior. Para dar uma ideia dos valores cobrados dele retiramos: taxa de inscrição
para o vestibular: 120$000; taxa de frequencia por ano, pagas em duas prestações semestrais: 480$000; taxa de matricula: 100$000; taxa de guia de transferência: 50$000; diploma de doutor: 200$000; diploma de medico: 150$000.
10
O município posteriormente receberia o nome de Amapá; hoje faz parte do
Estado homônimo (N.A).
11
Por decisão dos autores, os nomes dos alunos citados nos documentos e
candidatos às vagas gratuitas foram omitidos. (N.A).
12
A título de informação, os valores das taxas cobradas em 1931 eram as seguintes: exame vestibular: 120$000; matrícula inclusive certificado: 140$000;
mensalidades de março a outubro: 600$000; inscrição de exame: 125$000, o
que perfazia um total de 865$000 de despesa por aluno, anualmente. (FMCP,
[1930-1932a]).
13
Em reunião do CTA, de 10 de junho de 1933, o Prof. Acatauassu Nunes Filho
propõe que Conselho dirija petição ao Major Interventor requerendo que mande
custear ou executar obras de urgência de que a Faculdade porventura necessite,
por conta dos atrasos que tem a mesma no tesouro do estado. (CTA, 1933).
14
“Por influencia de factores multiplos que não cabe discutir aqui, poderão ver
que encerramos o nosso exercicio financeiro com o deficit de noventa e um
contos oitocentos e setenta mil e quatrocentos reis (91:870$400). É certo que
esse déficit vem ferir tão somente o interesse dos senhores docentes, porém é
tambem certo que, no momento, contamos com o seu espirito sempre renovado de sacrifício e abenegação que, comprehendendo a situação premente, seguros de que se trata de algo passivel de modificaçao para melhor, elles, os únicos
sacrificados, conjugam esforços, confiam e esperam que o governo federal nos
auxilie com subvenção nessa importância” (FMCP, 1936c, p. 6).
15
“Dentre esses documentos, figura o auxilio de vinte e cinco contos
(25:000$000) recebido do Governo Federal, que foi dividido, 50% aos senhores professores e 50% para material dos laboratorios, como é de lei. Saliento
que, como é também de lei, o pessoal superior da administração nada percebeu dessa subvenção, como nunca percebeu de outras anteriormente recebidas.” (FMCP, 1936c, p. 34) No balancete publicado como anexo ao Relatório
de 1935, constam sob a rubrica “Subvenção dos poderes públicos – Subvenção Estadual” os valores de 55:000$000, como ‘auxilio’ e 12:000$000, como
‘Fiscalização federal” (FMCP, 1936c, mapa nº11).
16
“Ao Exmo Snr. Prefeito Municipal de Belém.
Luctando este Instituto de ensino superior com serias difficuldades financeiras, oriundas do não recebimento da subvenção federal, appelo para V. Excia.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
no sentido de nos ser concedida por essa Prefeitura uma chapa de bond para
o nosso serviço externo”. (FMCP, 1935).
17
Prédio onde funcionava o curso de Farmácia e que passava para o patrimônio da Faculdade com a anexação daquele curso ao de Medicina. (Decreto da
Interventoria nº 133, de 12 de fevereiro de 1931).
18
Registre-se que em discurso pleiteando auxilio para a Faculdade o Prof. Dias
Junior cita que os professores chegaram a ganhar a ‘ridicula cota da 75$000,
depois 100$000’, passado posteriormente para 200$000, e somente com a ajuda do Governo Federal é que foi além dos 300$000 (FMCP, 1939, p. 96). Um
vencimento de 360$000 mensais dá um montante de 4:200$000 por ano. A
título de comparação, o vencimento de um catedrático previsto pelo Decreto
16.782. A era de 14:400$000, sendo 9:600$000 de ordenado e 4:800$000 de
gratificação.
19
“Na sessão de 15 de outubro vigente os srs. deputados populistas e liberaes approvaram o véto, não reconhecendo assim o crédito da Faculdade.
Entretanto, a Faculdade pleiteou menos do que lhe cabia, porque o governo,
nas razões do véto, declarou ser o Estado devedor apenas da importância de
74:637$000; a dívida real eleva-se a 399:087$000, uma vez que o Estado ainda não pagou as subvenções abaixo discriminadas, cujo total de 325:000$000,
addicionado á dívida de 74:087$000, já reconhecida pelo governo, perfaz o
citado total de 399:087$000” (Folha do Norte, 22 de outubro de 1937, p. 1).
20
“A Faculdade de Medicina, ou alguém por ella, julgou lavrar um tento,
como diz o vulgo, fazendo publicar na A FOLHA, de 22 do corrente, uma demonstração do crédito que entende ter no Thesouro do Estado e este reduziu para fundamentar as razões do veto, opposto pelo governador ao projeto
do deputado Dias Junior, reconhecendo a dívida passiva do Estado para com
ella, de 362:836$000 para 74:087$100, que em verdade, é o que alli figura
como crédito do conceituado instituto de ensino superior.
O tapeamento, todavia, é evidente. Effectivamente, leis de 1924 a 1929 auctorizaram o governo a conceder á Faculdade os auxílios que especificam no
valor total de 325:000$000, mas si taes leis não foram executadas, ou porque
não requeresse a directoria da Faculdade a execução delles; ou porque os
governos desses exercícios não quizeram ou não puderam utilizar a auctorização legislativa; ou porque, ainda, constantes de leis orçamentárias não
foram cumpridas, e, neste último caso, não promovesse a Faculdade a inscripção das sommas respectivas na “Divida Fluctuante”: - a verdade é que,
evidentemente, ficaram taes leis sem execução ou o que é peor, encerrados os
exercícios financeiros respectivos, caducas os auxílios, sem remédio possível
na therapeutica adminstrativa para serem realizados por uma administração,
que dista dessas auctorizações cerca de dez annos.
O véto foi, portanto, verdadeiro, pretende o articulista provar a existência de
um crédito que si existiu foi-se evaporou-se e, custa a crer, por dissídio do corpo
administrativo da Faculdade”. (Folha do Norte, 26 de outubro de 1937, p. 1).
21
“O Thesouro do Estado, ou alguem por elle, pretendeu refutar, hontem, pelas
columnas da Folha do Norte, a demonstração publicada no dia 22 do corrente,
a qual provou que as razões do véto não se haviam fundado na verdade.
A “União Popular do Pará, na Columna Política, do Estado do Pará”, de 15
deste mez, diz: “Em que nos pese a revide é preciso que a opinião pública
conheça que o Congresso antigo do Estado já legislou a respeito, suspendendo as prescripção de dividas”. Mais abaixo, affirma: Mas, senhores da
A manutenção financeira
209
210
Frente Única, por que essa facção política que tem juristas, contabilistas,
hygienistas, aparadistas, agiotistas (para conservar a rima), farristas e mais
alguma coisa terminada em ista e agora se declara calotista, não apresenta,
na Assembléia, uma lei restaurando essa prescripção?
Vê, portanto, o articulista do Thesouro ou alguém por elle, que não houve
dissídio do corpo administrativo da Faculdade, uma vez que o Congresso já
havia interrompido taes prescrições.
A Faculdade, porém, acceita os 74:037$000, dispensando os 100 réis – que
não estão incluídos na demonstração – importância esta proveniente de consignações e não de auxílios, ficando os 325:000$000 aguardando melhores
tempos”. (Folha do Norte, 27 de Outubro de 1937, p. 1).
22
O oficio seria reiterado em 28 de Março e em 5 de setembro, devido o pagamento ainda não ter sido efetuado. (FMCP, 1934).
23
A título de informação: em 1934, o orçamento foi elaborado contando com
a matricula de 230 alunos. Entretanto, matricularam-se 183, sendo que 19
gozavam de gratuidade (13 pelo Governo Estadual e 6 pela Faculdade), restando 164 pagantes, ou seja 71% da previsão orçamentária. Livro de ofícios
expedidos 1934. Para 1935, as taxas cobradas eram as seguintes: inscrição
ao vestibular: 120$000; taxa de matricula na 1ª série: 140$000; mensalidade:
75$000 (de março a outubro); taxa de promoção: 125$000. (FMCP, 1935b).
24
“Ficando a Faculdade a viver apenas das taxas escolares e não sendo estas
suficientes para mante-la, fomos constrangidos e forçados a exigir sacrificios
dos corpos docente, discente e administrativo, para equilibrar o orçamento,
diminuindo os vencimentos dos professores, reduzindo algumas despesas e
aumentando as taxas escolares”. (FMCP, 1939c, p. 5).
25
“É de justiça salientar a bôa vontade do infatigavel Prefeito de Belém, o
exmo. Snr. Abelardo Condurú, que sempre nos tem auxiliado dentro das
possibilidades orçamentárias. Este Prefeito, patriotico cultor da estética, que
aformosêa Belém e ampara o ensino superior, como tem feito neste Instituto,
em sua inteligente visão, vem demonstrando haver compreendido o alto desígnio da Faculdade de Medicina do Pará, oficina de técnicos defensores da
salubridade da Amazônia” (FMCP, 1940b, p. 3).
26
“É necessário enaltecer o valioso auxilio que ás obras do Pavilhão e á Faculdade tem prestado, com sua esclarecida e sensata visão de administrador
e homem público, o exmo. Snr. Abelardo Condurú, prestimoso e incansável
Prefeito de Belém...” (FMCP, 1941, p. 4).
27
Do mesmo Relatório temos os valores das taxas cobradas pela Faculdade: matricula: Cr$ 200,00; promoção: Cr$ 200,00 laboratório e biblioteca, Cr$ 100,00 (cada);
certificado de frequencia por prova parcial Cr$ 150,00 (por 3 provas); frequencia
- 9 meses a Cr$ 150,00: Cr$ 1.350,00, perfazendo um total de Cr$ 2.100,00; transferência: Cr$ 100,00; diploma de médico: cr$ 1.000,00 ; defesa de tese: Cr$ 300,00;
inscrição para concurso de catedrático: Cr$ 300,00; inscrição para concurso de docente-livre: Cr$ 100,00; histórico escolar; Cr$ 1.900,00; exame final: Cr$ 150,00.
Também é mencionado o salário de um professor: Cr$ 700,00 mensais. Para o
ano de 1947 seria proposto um reajuste nas taxas, que chegariam ao valor total de
Cr$ 2.600,00, a serem pagas em quatro prestações de Cr$ 650,00, nos seguintes
vencimentos: 10 a 25 de fevereiro; 1 a 10 de maio; 1 a 10 de agosto e 1 a 10 de
novembro. O reajuste geraria uma grande reação dos estudantes, culminando com
o movimento pela federalização da Faculdade (FMCP, 1947b, p. 330).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
28
“Com a presença do ministro Clemente Mariani, o deputado Epílogo de
Campos assinou hoje o acordo definitivo com a União que se compromete
a entrar com a quantia de quatrocentos mil cruzeiros a fim de ser melhorado o aparelhamento da Faculdade de Medicina do Pará” (Folha do Norte,
24.05.1947, p. 1).
211
A manutenção financeira
212
14
A Expansão
213
214
Pintura na parede do Salão Nobre da FMCP.
Após a aquisição do prédio de Santa Luzia, a direção da Faculdade tratou de promover as adaptações necessárias ao seu perfeito funcionamento, bem como dotá-lo
de equipamentos e material para o curso médico, aproveitando os recursos provenientes das listas de doações idealizadas por Camillo Salgado, distribuídas pela
sociedade paraense, bem como os oriundos das prefeituras do interior.
O relatório referente ao ano de 1922, o primeiro sob a direção efetiva de Camilo Salgado (que assumiria definitivamente em abril daquele ano), aponta para um crescimento
das contas da Faculdade e sua conseqüente aplicação. Além disso, o relatório detalha
Que addicionado ao valor do novo predio (de Santa Luzia), ora em remodelação;
ao valor dos predios localizados á avenida Generalissimo Deodoro e á rua Bernal do Couto; do material cirurgico de anatomia, operações e anatomia pathologica, dos laboratorios modestos e dos utensilios e moveis existentes, quer no
laboratorio de microbiologia da Santa Casa, quer no necrotério do Estado, quer
na sede da escola, e mais a importancia 67:850$000,00, de auxilio das intendencias municipais, alem dos titulos de divida do thesouro do Estado, eleva-se o patrimônio da nossa Faculdade de Medicina a 369:959$890 (FMCP, 1923, p. 6).
Note-se que o relatório, publicado em julho de 1923, além de mencionar o prédio
de Santa Luzia – já sendo reformado –, inclui ainda no patrimônio da Faculdade
os prédios adjacentes, onde seriam construídos os demais componentes da Escola,
fazendo com que a quando da constituição da Universidade Federal do Pará, seu
patrimônio fosse considerado o maior a ser incorporado à nova Instituição1.
As reformas e adaptações da nova sede da escola, ao lado dos necessários equipamentos foram notícia em Folha do Norte:
O paquete “Santos” do Lloyd Brasileiro, esperado hoje neste porto, traz
parte do Laboratório de Microbiologia destinado á Faculdade de Medicina do Pará. Esses apparelhos, adquiridos com os proprios recursos
do estabelecimento, compõem-se de seis excellentes microscópios... [...]
(Folha do Norte, 18.03.1924).
A menção aos melhoramentos da Faculdade também está presente nas Mensagens
Governamentais relativas aos primeiros anos da Escola. Na Mensagem de 1924, o
governador Dr. Antonino Emiliano de Souza Castro, fundador e também professor
da Faculdade, a esta assim se refere:
Tendo adquirido predio proprio, á praça Santa Luzia, em frente ao hospital da Santa Casa de Misericórdia, ahi, depois de completamente remodelado e adaptado, está funcionando a Faculdade, com laboratórios
modernamente installados e um corpo docente, em numero de 34 professores, capaz e devotado ao levantamento do ensino (PARÁ. Governador
(1921-1925: Antonino Emiliano de Souza Castro), 07.09.1924, p. 68).
No ano seguinte, o Governador Dionysio Ausier Bentes, também professor da
Faculdade, fala das melhorias da escola2. O mesmo Governador, em sua Mensa-
A expansão
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gem para 1926, menciona o razoável aparelhamento com que contava a Faculdade
(PARÁ. Governador (1921-1925: Dionysio Ausier Bentes 07.09.1926, p. 33).
Voltando ao Relatório de 1922, Camillo Salgado destaca o gesto do Dr. Cypriano Santos, Diretor Clínico do hospital da Santa Casa, pela cessão de uma enfermaria especial
para as aulas de Clínica Cirúrgica sob a responsabilidade do próprio Camillo (FMCP,
1923c, p. 11). Em ofício encaminhado ao Dr. Rebello Horta, o Diretor da Faculdade
informa, em 12 de novembro de 1927, o envio da planta de ampliação da Faculdade
“de modo a dispormos de espaço para instalarmos um hospital para molestias tropicais exclusivamente para tratamento de indigentes” (FMCP, [1925-1928]).
Sempre se queixando de problemas financeiros, a Direção da Faculdade — segundo ela,
fazendo milagres — foi aos poucos equipando-se com o que havia de mais moderno, a
fim de oferecer um curso de alta qualidade. Assim é que na Mensagem Governamental
para o ano de 1930, o governador Eurico Valle referindo-se à Faculdade de Medicina,
menciona a construção de um pavilhão anexo ao prédio principal3. No mesmo documento é informado que os aparelhos para os laboratórios já haviam sido encomendados na
Alemanha (PARÁ. Governador (1929-1930: Eurico de Freitas Valle) 07.09.1930, p. 92).
216
A planta deste pavilhão era de “auctoria do Snr. Augusto P. Lobão que a fez desenhar
pelo Snr. Obi Rodrigues da Silva de accordo com as indicações desta Directoria”4
Este prédio foi construído em continuação ao prédio principal, pela Generalíssimo
Deodoro, e pode ser observado em foto existente no Relatório de 1935. No novo
prédio encontrava-se o salão nobre, cuja inauguração foi citada na imprensa por
conta do início das aulas em 1932:
[A abertura dos cursos] Realizou-se no novo e amplo salão da congregação, recentemente construído em estylo moderno, onde os lavores em
madeira se destacam e impressionam agradavelmente a todos. Foram ao
mesmo tempo inauguradas as novas bancadas da congregação, que assentam em dois planos, ficando ao fundo a mesa da direção dos trabalhos
em que tomaram logares... (Folha do Norte, 02.03.1932).
O Relatório de 1935 refere que “as difficuldades pecuniarias não impediram que,
em 1935 adquirissemos ainda material para o laboratório de Physiologia, no valor
de doze contos e quinhentos (12:500$000) (FMCP, 1936c, p. 6). Naquela ocasião já
estavam em funcionamento os laboratórios de Física, Química, Histologia, Anatomia
Patológica e Microbiologia, sendo este último anexo ao hospital da Santa Casa, “provido de apparelhagem moderna e material indispensavel ao fim a que se destina”.5
Os dados do referido relatório informam ainda que o laboratório de Parasitologia inaugurado naquele ano estava instalado na sala de frente do novo pavilhão (pela Generalíssimo). Embora considerado como modesto, possuía “mesa de cimento armado com
tampo de azulejo verde, provida de gaz, água e duas grandes pias com despejo para o
exgotto” (FMCP, 1936c, p. 35). No local eram também ministradas aulas teóricas.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Foto 27:
Faculdade
de Medicina
e Cirurgia
do Pará em
1935 já com
o pavilhão
do Salão Nobre
em anexo.
Fonte: FMCP
(1936, s.p.).
217
Foto 28:
Salão Nobre
da Faculdade
de Medicina
e Cirurgia
do Pará.
Fonte: FMCP
(1936, s.p.).
218
Foto 29: Laboratório de Parasitologia.
Fonte: FMCP (1942b, s.p.).
Em outra sala, atrás da de Parasitologia foi instalado o gabinete de Histologia e de
Anatomia Patológica. Este gabinete é assim descrito no Relatório:
Possue quinze mesas de marmorite, providas de gavetas e logar apropriado para guardar os microscópios; uma grande mesa de cimento armado
com tampo azulejado de verde, provida de gaz, agua e duas grandes pias
com despejo para o exgotto.
Ao lado tem uma sala – gabinete do professor, que, infelizmente, ainda
se recente de algumas falhas; e um pouco adiante, outra, destinada ás
estufas (FMCP, 1936c, p. 35).
Os equipamentos também são detalhados:
Já contamos com um diascopia para micro e macro projecções, com iluminação de arco voltaico e um epidiascopio com iluminação electrica por
incandescência.
Possuímos vários microscópios, monoculares uns, e binoculares, outros,
além de moderníssimo apparelho denominado “Metaphot”, não só para
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
observação microscópica directa de corpos transparentes e opacos, quer
por um só observador, que por diversos, como também para projecção a
distancia media (FMCP, 1936c, p. 36).
As aulas práticas de Técnica operatória e de Anatomia eram feitas no necrotério
da Faculdade, que ficava localizado no prédio principal, pelo lado da Generalíssimo. O gabinete de Farmacologia estava para ser instalado, com as aulas sendo
ainda ministradas no laboratório do curso de Farmácia, que funcionava na própria
Faculdade de Medicina, naquele período. O gabinete de Fisiologia, já com alguns
equipamentos adquiridos, deveria ser montado ao longo do ano de 1936.
Ainda em 1935, a Faculdade recebeu um auxílio do Governo Federal no valor
de vinte e cinco contos de réis (25:000$000), que foi dividido cabendo 50% para
os vencimentos dos professores e 50% para compra de material dos laboratórios,
“como é de lei” (FMCP, 1936c, p. 36).
Entre 1936 e 1937, o prédio principal da Faculdade sofreu uma grande reforma,
mudando profundamente suas características e, particularmente, sua fachada. Para
a tal reforma foram apresentados orçamentos para análise pelo Conselho Técnico
Administrativo, que concluiu pela indicação do orçamento apresentado por Manoel Francisco do Carmo por várias razões:
1 - porque o seu signatário é pessôa conhecida desta Faculdade, onde trabalhou na construcção do pavilhão novo, tendo revelado indiscutivel capacidade profissional e firmado, ao que parece, inteira idoneidade moral;
2 - porque sendo embora seu orçamento laconico, feito em termos muito gerais, abrange todas as obras de que necessita o predio, silenciando
apenas sobre o mirante, ao alto da fachada da frente, que a Commissão
pensa que deve ser modificado na sua architectura, assemelhando-a á da
fachada;
3 - porque entre os orçamentos é o que se propõe a fazer as obras por
preço menos elevado [...] (FMCP,1936b).
Segundo a proposta apresentada pelo sr. Manoel Francisco do Carmo, os serviços
a serem realizados consistiriam de:
1. Derribar a massa velha da fachada do prédio velho, tirar as sacadas,
as grades de ferro, e portas e caixilios que correspondem a fachada; nas
portas de baixo será fechada com tijolos até a altura de 1m. conforme está
no prédio novo, as grades de ferro passarão para as portas de cima, nas
janelas de baixo levará soleira de marmorite.
2. Rebocar a fachada do predio velho, levando massa de 14x1, ficando de
accordo conforme está no predio novo, levando caixilios de acapú, venezianas de acapú, portas de seguranças com os seus respectivos caixilios
de freijó; nas portas de cima levarão caixilios de acapú, e portas acapú
com postigos de freijó; os trez vões da porta da frente serão de acapú.
3. Fechar trez vões de portas, e calçar o assoalho do salão onde vae ser
biblioteca, fazer sete vões de porta em acapú para banheiros e centinas.
A expansão
219
4. Caiar o predio velho por dentro, nos compartimentos que são caiados,
e pintar os que são pintados, concertar o estuque, e pintar todos os caixilios e portas, e janelas por dentro e por fora do prédio velho, o necrotério
levará uma limpesa geral e moisaicar a thesouraria (FMCP, 1936b).
Ao final do documento, o proponente se comprometia a preparar prédio velho para que
ficasse “conforme está no predio novo, tudo muito bem acabado” (FMCP, 1936b, p. 36).
Digno de registro, por seu valor histórico, são os orçamentos apresentados por
outras duas firmas, que implicavam, também, grandes modificações ao prédio original. Um dos orçamentos propunha: “Modificação nas três frentes para ficarem
iguais ao prédio a ser construído; fechamento de janelas do térreo; cortar terraços
e marquises de cimento armado;”
Outro orçamento previa mudanças mais radicais:
Demolição dos terraços, inclusive a parte superior;
Construção de terraços de cimento armado em substituição aos demolidos;
Demolição completa das guarnições da fachada principal e seu revestimento para igualar ao prédio recém construido;
Fechamento de janelas e de portas no térreo6.
220
Ressalte-se que todos os orçamentos mencionavam que as modificações seriam
para adaptar o prédio antigo ao recém construído.
Deste modo, tomados, quem sabe, por um ímpeto de modernidade, os dirigentes da
Faculdade autorizariam a primeira grande descaracterização do palacete de Santa
Luzia. Este fato foi saudado pela Revista do Acadêmico de fevereiro de 1948, em
artigo intitulado: “Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Sua fundação e condições atuais de existência”, onde temos que: “O prédio primitivo continuamente
tem sofrido profundas e radicais remodelações, adaptando-se cada vez mais à sua
finalidade” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 48).
Outras tantas se seguiriam até os dias atuais. Com a saída das aulas práticas e a “divisão” dos prédios pelos outros cursos da área da saúde, bem como sua destinação
para outras funções, praticamente desapareceu o conjunto que se poderia chamar
de Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, ou mesmo Faculdade de Medicina
da Universidade Federal do Pará.
O laboratório de Farmacologia seria inaugurado em 1938. Construído e montado
pelo prefeito municipal Dr. Alcindo Comba do Amaral Cacela, recebeu o nome
deste, em homenagem a seu construtor, “pelos relevantes serviços prestados á Faculdade durante a sua profícua administração (FMCP, 1936b, p. 6). Uma placa, hoje
desaparecida, foi afixada no referido laboratório, marcando o acontecimento.
Para a instalação do laboratório de Farmacologia, o antigo anfiteatro teve o porão
aterrado e revestido por mosaico, suas paredes revestidas de azulejo e construídas
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
duas mesas de marmorite, além da necessária instalação de gás, água e despejo
de esgoto. Para sua construção, a Faculdade solicitou ajuda também do senador
Abelardo Conduru, a quem foi encaminhado orçamento de “mosaicos e aterro necessarios para o futuro gabinete (FMCP, 1936a). A aparelhagem foi adquirida na
Alemanha (FMCP, 1939c).
Naquele ano de 1938 estudavam na Faculdade apenas 154 alunos, o que concorria
para a condição financeira da Escola. É citado, também “a criação do curso complementar, que privou a Escola de alunos durante dois anos na primeira série” (FMCP,
1939c, p. 35), o que culminaria por não haver formatura em 1942.
Fazendo um resumo da gestão de Camilo Salgado à frente da Faculdade, o Dr. Lauro de Magalhães relaciona a expansão da área física da Escola no período:
Nos áureos dezesseis anos de sua direção, Camillo Salgado, aproveitando criteriosamente os peregrinos dotes fisicos, temperamentais, morais
e intelectivos com que Deus o agraciára, cristalizou sua obra magna,
construindo um pavilhão modesto, mas capaz, para o estudo de Anatomia
prática, o salão da Congregação, que honrará qualquer instituição congênere e os laboratórios de Parasitologia, Histologia, Fisiologia, Farmacologia, Física e Química Fisiológica que completam e fortaleceram com
prática, as disciplinas iniciais e básicas do curso médico. (FMCP, 1948b).
O Relatório do ano de 1939 informa que a melhora da situação financeira permitiu o início da construção de um novo pavilhão, destinado ao instituto anatômico
e orçado em 150:000$000, fora os equipamentos7. O Relatório complementa que,
por ser pequeno o número de alunos e contando a Faculdade apenas com o auxílio
federal, não seria possível maiores realizações. Deste modo:
A nossa Faculdade, de exíguos recursos, como bem sabeis, somente poderá
progredir, materialmente, com o concurso financeiro de governos patrioticos e argutos, que vão além das promessas mal cumpridas e que bem compreendam o sacrifício do nosso corpo docente, empenhado tão somente em
dotar o nosso Estado com uma Escola que honra a cultura do Norte e que
vem prestando assinalados serviços, principalmente á Amazônia, com a
colaboração dos nossos médicos. (FMCP, 1940b, p. 3-4).
Sobre o novo pavilhão, o referido Relatório diz que as obras foram iniciadas em 3
de dezembro daquele ano, sob a direção do engenheiro Bertino Lima. O edifício é
descrito da seguinte maneira:
Construído de cimento armado, com as paredes revestidas de azuleijos brancos
até a altura de dois metros, tetos estucados e pizos mozaicados, com arejamento
e iluminação naturais e artificiais necessarios, conta de dois pavimentos, um terreo, destinado á Anatomia descritiva humana e Técnica operatoria e um superior, á Anatomia e Fisiologia patologicas. Será provido de camara frigorífica para
conservação de cadaveres, museu e biblioteca Anatomicas e de todo o material
necessario ao ensino das disciplinas a que são destinados (FMCP, 1941, p. 4).
A expansão
221
Foto 30:
Gabinete de
Histologia.
Fonte: FMCP
(1936c, s.p.).
222
Foto 31:
Laboratório
de Histologia.
Fonte: FMCP
(1942b, s.p.).
Foto 32: Um projeto
de como poderia ficar
a fachada da Faculdade
após sua remodelação.
Fonte: FMCP
(1936b, s.p.).
223
Foto 33: Fachada
da Faculdade após
a grande reforma
entre 1936 e 1937
que lhe deu
as feições atuais.
Fonte: FMCP
(1940b, s.p.).
224
Foto 34: Instituto
de Anatomia
“Camilo Salgado”.
Fonte: FMCP
(1941, s.p.).
Nela viria a funcionar, também, o Serviço de Verificação de Óbitos. Segundo consta do
discurso do deputado Dias Jr., por ocasião da apresentação de seu projeto de lei reconhecendo a dívida do Estado para com a Faculdade, o aparelhamento do gabinete de Anatomia Patológica, “no valor de vinte e um contos de réis”, foi um oferecimento do Interventor Magalhães Barata à Faculdade (FMCP, 1939, p. 84). O prefeito Abelardo Condurú,
além de material de construção, prometera a câmara frigorífica (FMCP, 1941, p. 4).
Este pavilhão, denominado “Camillo Salgado”8, foi construído pela rua Bernal do
Couto, adiante do prédio central, porém separado deste, sendo o acesso por aquela
rua, conforme foto existente no Relatório de 1940.
O Relatório de 1941 destaca como acontecimento de maior relevância o término
da construção do novo pavilhão de Anatomia, “em substituição ao antigo, já insu-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
ficiente para o serviço”, mencionando ainda a pretensão de inicio da construção de
um novo pavilhão destinado à biblioteca e ao gabinete da Diretoria, “conforme planta
e orçamento que serão submetidos aos senhores professores” (FMCP, 1943b, p. 4).
Mais adiante detalha o pavilhão, citando que o andar superior seria destinado ao
ensino de Anatomia descritiva e Técnica operatória e cirurgia experimental, “sob a
competente direção dos provectos e esforçados professores desta Faculdade, doutores José Alves Dias Junior e Carlos Arnobio Franco, respectivamente”. Era composto por quatro salas: uma para o professor, “onde será instalada uma outra biblioteca
especializada”, uma para projeções, “montada com aparelhagem moderna” e duas
outras, “para preparações anatomo-patologicas e autopsias”.
O andar inferior é descrito da seguinte maneira:
O pavilhão terreo consta de um vasto salão, com uma galeria de madeira,
construida de acapú, e páu amarelo, movel, com atracações de ferro, com
dois andares, encurvada em U, de maneira que os estudantes que a ocuparem, em numero de cincoenta, possam vêr facilmente a demonstração
que fôr feita na mesa operatoria, disposta no centro.
Possue ainda quatro mesas para dissecção, de marmorite, fixas, com descarga para o esgoto geral.
Uma sala de estudo para o professor, onde será instalada uma biblioteca
especializada, e outra para a montagem de uma camara frigorifica, com
capacidade para seis cadáveres (FMCP, 1943b, p. 57).
225
Foto 35: Sala para aulas
de Anatomia Humana
e Técnica Operatória,
vendo-se a galeria
encurvada em “U”
e com capacidade para
50 alunos.
Fonte: FMCP (1941, s.p.).
Segue-se o detalhamento das outras salas, como a de autopsia, composta de três
mesas de marmorite, fixas, “com descarga para o esgoto geral”, de um tanque com
água corrente abundante e de uma mesa de mármore, “provida de gás”.
Foto 36: Sala de Autopsias.
Fonte: FMCP (1941, s.p.).
226
A sala de projeções possuía “quatorze mesas de marmore, com tomada elétrica ao
lado para os microscópios” além de três aparelhos “para projeções no écran,” dois
dos quais destinados também a microfotografias.
Foto 37: Sala de Projeção.
Fonte: FMCP (1941, s.p.).
Na sala para estudos anatomo-patologicos é mencionada a existência de uma mesa
de cimento armado, “revestida de azulejos brancos”, provida de gás, água e “duas
grandes pias de louça, com despejo para o esgoto”. São mencionados ainda “um
possante centrifugador elétrico, balança de precisão e o material indispensavel ao
ensino prático”. Tudo isso ficaria sob a direção técnica “do competente e estudioso
professor dr. Jayme Aben-Athar, catedrático de Anatomia e Fisiologia patológicas”
(FMCP, 1941, p. 57).
227
Foto 38: Laboratório de Anatomia Patológica.
Fonte: FMCP (1941, s.p.).
Em 3 de março de 1942, Folha do Norte noticia o início do ano letivo na Faculdade
e a inauguração do novo pavilhão, ocorrido no dia anterior, após a aula inaugural
proferida pelo professor Prisco dos Santos, sobre o tema “Abdome Agudo”, e que
A expansão
contou com a presença de várias autoridades como os representantes do Exercito,
da Marinha e da Aeronáutica, do Interventor e o prefeito municipal.
Acompanhados pelo Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, os visitantes percorreram o
novo prédio, que custou à Faculdade a quantia de 254 contos, estando o frigorífico,
com suas oito cubas, ainda em fase de conclusão. Após a visitação houve a inauguração do retrato do prefeito municipal, professor Abelardo Condurú, na sala da
principal do pavilhão9, sendo o homenageado saudado pelo professor Dias Junior.
A notícia conclui que “sob o artístico retrato do sr. prefeito, está fixada uma placa
de prata (com) esta dedicatória: ‘Ao prefeito Abelardo Conduru, a Faculdade de
Medicina agradecida”10. Do retrato do prefeito, com sua “placa de prata”, não se
tem notícia, soando como profético o trecho final do agradecimento a ele constante
do Relatório de 1941:
...a lembrança dos bons que a morte leva fica na memória do coração dos
vivos, como há de ficar na Faculdade de Medicina do Pará a de Abelardo
Condurú, ainda mesmo que as traças, valendo-se futuramente dos descuidos dos homens ingratos, consigam apagar as feições do magnanimo
Prefeito [...] (FMCP, 1942b, p. 8).
228
Foto 39:
Aspecto
da inauguração do
Pavilhão de Anatomia
“Dr. Camilo Salgado”
quando falava
o Diretor Dr. Lauro
de Magalhães, direita
João Prisco dos Santos,
a esquerda no fundo e
de bigode Emiliano de
Souza Castro (filho).
Fonte: FMCP
(1942b, s.p.).
Foto 41: Aspecto da inauguração do Pavilhão de Anatomia “Dr. Camilo Salgado” quando falava,
agradecendo a aposição de seu retrato, o sr. professor Abelardo Condurú, Prefeito de Belém.
Fonte: FMCP (1942b, s.p.).
229
Foto 40: “Um aspecto da inauguração do Pavilhão de Anatomia quando falava o Dr. Dias Junior”.
Fonte: FMCP (1942b, s.p.).
Foto 42:
Um aspecto
da inauguração
do Pavilhão
de Anatomia
“Dr. Camilo Salgado”.
Fonte: FMCP
(1942b, s.p.).
230
Foto 43:
Câmara frigorífica
com capacidade para
seis cadáveres.
Fonte: FMCP
(1942b, s.p.).
Foto 44: Tanque para
conservação, em formol,
de peças cadavéricas.
Fonte: FMCP
(1942b, s.p.).
O pavilhão, posteriormente teve sua entrada externa fechada, ficando o acesso pelo
pátio interno da Faculdade. Desativado como unidade de ensino e desvirtuado de
suas funções, abriga atualmente uma agencia bancária, um auditório denominado
Prof. Monteiro Leite e seções administrativas.
Em 20 julho de 1942, com a Faculdade sob a direção do Dr. Lauro de Magalhães,
seria iniciada a construção de um novo prédio, “com dois pavimentos, o inferior
destinado a biblioteca e o superior ao gabinete da Diretoria”, cuja inauguração estava prevista para o “dia da sessão solene de reabertura das aulas” (FMCP, 1943b).
Esta obra é mencionada no discurso do prof. Dias Jr., em saudação ao prefeito Abelardo Conduru, por conta de uma futura homenagem ao presidente Getulio Vargas
e o governador do Estado, José Carneiro da Gama Malcher:
Infelizmente, por circunstancias especiais, não fôra ainda possivel apôr as efígies do eminente presidente Getulio Vargas e do ilustre chefe deste Estado
no salão de honra destinado à Diretoria e para cuja construção s. excia. está a
concorrer com dadivosas contribuições, que põem certamente brilhantes reflexos nas altruísticas qualidades morais de s. excia. (FMCP, 1943b, p. 29).
No ano de 1943 prosseguiram as obras na Faculdade. Segundo o Diretor, no Relatório daquele ano, apesar do reduzido número de alunos, a situação financeira era
“lisonjeira”, sendo possível realizar obras de “carater inadiavel”. Assim, foi concluído
A expansão
231
o pavilhão destinado à biblioteca – no térreo – e ao gabinete da Diretoria – no andar
superior. A inauguração aconteceria em 1º de março daquele ano (FMCP, 1944b, p. 4).
Este pavilhão era contíguo ao prédio principal, pela Generalíssimo Deodoro.
Além do novo pavilhão, mais algumas obras são descritas no Relatório:
Derrubamos paredes para alargar uma sala destinada á secretaria, que
foi completamente remodelada, tendo sido substituído o soalho, que se
achava em mau estado de conservação, por um piso de mosaico.
Para essa repartição foi adquirido também o necessário mobiliário.
Mosaicamos a sala, onde primitivamente funcionou a Congregação, depois de ter sido construída uma viga de cimento armado.
Foram mosaicados também os corredores e azulejadas as paredes, até um
metro e oitenta centimetros de altura.
Sendo insuficiente a distribuição de água nos diversos gabinetes e outras
dependências do prédio, construímos dois tanques de cimento armado,
com capacidade, cada um, para dois mil litros, ficando um na parte terrea
e outro no andar superior.
Para este fim, adquirimos, por quatro mil e cem cruzeiros, uma bomba
motor acionada por eletricidade.
Pintamos externa e internamente o prédio, que necessitava de uma limpeza geral (FMCP, 1945b, p. 4).
232
No ano seguinte, novas obras são detalhadas no Relatório da Faculdade, como a
construção do laboratório de Microbiologia e remodelações no prédio principal,
com derrubada de paredes, alargamento de salas, aterramento de porões, substituição dos soalhos por piso de cerâmica e azulejamento de paredes, ao custo de
Cr$ 108.427,40, a despeito da situação financeira ser considerada difícil. Também
foi adquirido um terreno contíguo ao prédio, para a construção de uma nova ala
(FMCP, 1945b, p. 4).
O laboratório de Microbiologia foi construído na sala onde funcionou o laboratório
de Farmácia galênica. O local teve o porão aterrado e revestido por cerâmica; as
paredes azulejadas. Foi construída uma mesa de cimento armado e outra de madeira impermeabilizada, provida de gás, água e duas grandes pias com despejo para o
esgoto. Quatro mesas semi-ovais de mármore foram colocadas nos vãos das janelas
para receberem luz diretamente (FMCP, 1945b, p. 29).
No discurso alusivo aos 25 anos de fundação, comemorados naquele ano de 1944, o
professor Acylino de Leão faz uma síntese do quanto crescera a Faculdade em seu
espaço físico e em equipamentos:
Começamos mediocremente instalados, apenas contando de vulto com
a Santa Casa de Misericórdia para os cursos práticos das clínicas, a que
Orlando Lima ajuntou o Laboratório de Biologia, criado principalmente para proveito do ensino, embora de real utilidade ao hospital. Hoje,
a nossa Faculdade, que se ostenta em face a uma das alas do grande
nosocômio, pode ser mostrada aos peregrinos, com a sua bela sala da
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Congregação, laboratórios de Parasitologia e de Histologia, realizações
do saudoso Camilo Salgado; o vistoso salão da Diretoria, a Biblioteca e
o vasto Pavilhão de Anatomia, provindo de tudo para a ministração das
cadeiras básicas da medicina, [...] (FMCP, 1945b, p. 66).
Dando continuidade às reformas e ampliações do “complexo” de Santa Luzia, o
Relatório de 1945, mesmo continuamente reclamando da falta de verbas, do descaso do governo e da reduzida matrícula faz referência à substituição de escadas
e portas do prédio principal e à compra de um motor para a câmara frigorífica11.
Também seriam adquiridas novas obras para a biblioteca, que passaria a contar
com 1.626 obras e 2.120 volumes (FMCP, 1946b, p. 66).
No Relatório do ano seguinte, 1946, o Diretor Dr. Acylino de Leão diz ter feito
“o que [me] foi possível realizar”, dentro das condições financeiras da Faculdade,
citando a melhoria do prédio, o aparelhamento dos laboratórios e a aquisição de
livros para a biblioteca, além da aquisição de dois terrenos, “para a construção de
nova ala” (FMCP, 1947b, p. 3). O relatório enviado ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde diz o seguinte, sobre este período
[Dr. Acilino de Leão, eleito em janeiro de 1944] continuou, criteriosa e
dignamente, a grande obra iniciada, remodelando toda a parte terrea do
velho prédio, além de muitos melhoramentos introduzidos, inclusive a
instalação e aparelhamento do laboratório de Microbiologia, substituição
da antiquada escada que dá acesso ao prédio por outra de marmorite e
completa remodelação da sala da Secretaria, que ficou com acomodações
condignas.12
Foto 45:
Biblioteca
da Faculdade
de Medicina e
Cirurgia do Pará.
Fonte: FMCP
(1944b. s.p.).
233
Foto 46:
Mesas de Estudo
da Biblioteca da
Faculdade
de Medicina e
Cirurgia do Pará.
Fonte: FMCP
(1944b, s.p.).
234
Foto 47:
Estanteria
da Biblioteca da
Faculdade
de Medicina e
Cirurgia do Pará.
Fonte: FMCP
(1951, s.p.).
Foto 48: Gabinete
da Diretoria.
Observando-se
no canto direito
a estátua de Asclépio,
posteriormente
colocada nos jardins
da Faculdade.
Fonte: FMCP
(1944b. s.p.).
235
A Revista do Acadêmico de Medicina, de fevereiro de 1946, também menciona os
melhoramentos realizados na Faculdade:
Nessa ala que outrora constituída o único edifício, encontramos as diversas salas de aulas, dependências da administração, salão nobre, laboratório de Química Biológica, Departamento de Histologia e Embriologia,
Gabinete de Física Médica, de Farmacologia e o Laboratório de Microbiologia. (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 48).
O texto faz referência, ainda, aos dois pavilhões recém construídos, citando em um
deles o anfiteatro de anatomia contendo frigorífico para seis cadáveres e cubas para
formol, sala de projeção bem equipada no térreo. No andar superior, o Departamento de Anatomia Patológica e o Serviço de Verificação Óbitos. Era o Instituto
Anatômico, denominado “Camilo Salgado”.
O outro pavilhão continha a biblioteca, com cerca de 2.000 volumes, chamando
atenção pelo seu “admirável mobiliário” com os móveis contendo as inicias FM
esculpidas na madeira13. No andar superior localizava-se a sala do Diretor.
A expansão
Apesar de toda a ampliação, equipamentos e melhorias, o ministro da Educação
e Saúde, Dr. Ernesto de Souza Campos, em visita a Faculdade, em 30 de julho de
1946, assim se manifestou sobre as condições da Escola:
A [Faculdade] do Pará está em funcionamento há quase três decênios,
mas ainda não está aparelhada, como é de desejar para desenvolver trabalho mais perfeito de preparação dos nossos médicos. Há um elemento que
é primordial: a objetivação para os laboratórios e para os livros.
[...]
O aparelhamento da Faculdade do Pará é já considerável, mas é necessário
envidar esforços para que o aluno possa participar do ensino prático.
Devem apelar para que haja um auxílio do govêrno federal, ou do estadual, ou do
municipal, destinado a aquisição do material... (Folha do Norte, 31.7.1946, p. 4).
As obras das primeiras gestões de Lauro de Magalhães são lembradas no relatório
enviado pelo próprio ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde:
236
Foi eleito para substitui-lo, no dia 12 de março de 1938, o professor dr.
Lauro Antunes de Magalhães [...] continuou com assombro, orientado
pelos mesmos principios, metodos e sentimentos, a sua patriotica obra,
construindo um pavilhão com dois andares, em cimento armado, um térreo para Anatomia e Técnica Operatória e outro superior para Anatomia
e Fisiologia Patológicas, dentro dos moldes e exigencias mais modernas,
com frigorifico para consevação de cadaveres e toda a aparelhagem indispensavel à prática do ensino anatomico.
[...]
No segundo triênio de sua administração, além de conservar e melhorar
tudo que até então fora feito, construiu um salão de Diretoria e recepção com o conforto e mobiliário digno de suas finalidades e a Biblioteca, incontestavelmente a obra mais meritoria e necessária, onde o corpo
discente encontra atualmente tudo de mais antigo, de mais classico e
também de mais moderno, da literatura cientifica médica...14
Os dados de 1947, apesar de mencionarem a falha no pagamento das verbas públicas,
revela a aquisição de novos e modernos aparelhos para os laboratórios, abundante
material de consumo, mobiliário para o gabinete da diretoria e livros para a biblioteca
(FMCP, 1948c, p. 3-4). Folha do Norte, de 7 de maio de 1947, noticiava para o mês seguinte o inicio da construção de uma nova ala, cuja planta havia sido encaminhada ao
Ministério da Educação, para efeito de aprovação. O novo prédio seria construído em
dois terrenos adquiridos pela Faculdade em 1944 e 1946 pela importância de 50.000
cruzeiros, contando a Faculdade inicialmente com uma dotação orçamentária de Cr$
400.000,00 incluída no orçamento da União pelo deputado Epílogo de Campos.15
O ano de 1948 foi um “ano fecundo, cheio de realizações”, com o inicio da construção
de uma nova ala, constando de um grande salão de vinte e cinco metros de comprimento, por quinze de largura, para conferências; dois gabinetes, um para Química Fisiológica e outro para Fisiologia e duas confortáveis salas de aulas. O salão
encontrava-se devidamente mobiliado e os gabinetes montados com o material inMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
dispensável para o ensino. Os dados do Relatório daquele ano informam que, com a
construção do novo pavilhão, executado com todo rigor da ciência moderna, “fica a
Faculdade melhor aparelhada para transmitir à mocidade ensino útil e eficiente”16.
Na sequência do texto é informado que a Faculdade pretendia iniciar em 1949 a
construção de um pavilhão para o Instituto de Higiene, visando à criação de cursos
especializados para a formação de médicos de Saúde Pública (FMCP, 1949b, p. 3).
O Relatório do Ano de 1949 cita que aquele ano fora de “notáveis empreendimentos”,
com a inauguração, “em primeiro de maio – trigésimo aniversário da instalação deste
Instituto de ensino superior”, do novo prédio, “construído em cimento armado”, com
laboratório de Química Fisiológica e de Fisiologia, “devidamente aparelhados”, além
de duas salas de aulas e de um auditório “de vinte e cinco metros de comprimento
por quinze de largura, com capacidade para duzentas e cinquenta pessoas sentadas”.
Sem conter a emoção, o Dr. Lauro de Magalhães, Diretor da Faculdade, referindo-se
ao novo prédio, arremata: “Quem nele penetra sente sobre o moral e o físico, a influência benéfica do meio”. A obra, orçada inicialmente em Cr$ 950.000,00, elevou-se a
Cr$ 1.100.000,00, “devido a serviços complementares” (FMCP, 1950b, p. 3).
No exaustivamente citado relatório ao Diretor de Educação e Saúde, o próprio
Lauro de Magalhães assim descreve as construções:
[Lauro de Magalhães] iniciou a construção de um grande pavilhão de
dois andares, em cimento armado, o inferior com duas amplas salas bem
iluminadas e arejadas para aulas e duas outras para os laboratórios de
Química Fisiológica e Fisiologia, montados com todos os requisitos da
ciência; e no superior um salão de proporções amplas, de linhas severas e
elegantes, verdadeiro auditorium, para conferencias e outros fins similares, até então realizados no salão da Congregação (FMCP, 1948b, p. 3).
Em seu discurso na inauguração do novo Pavilhão, o Dr. Lauro de Magalhães destacaria:
A inauguração deste Pavilhão não é mais do que a realização de um sonho, que mais uma vez se materializa em uma obra, parte de um plano
idealizado há 30 anos por seus abnegados fundadores, dirigidos pelo gênio criador e paternal de Camillo Salgado
[...]
neste momento, quando abrimos, a professores e alunos, os portais de
quatro novas salas de aulas teóricas e práticas, e os de um salão para conferências, construídos num só bloco, ungidos aos princípios e modelos
arquiteturais e artísticos, simples, elegantes e modernos, e aparelhados
com o que há de mais necessário e útil para fins médicos, didáticos e
instrutivos. Destaca-se de todos êste salão, denominado com justeza —
auditorium — amplo, confortavel, claro e arejado, com iluminação artificial e velada, para utilização noturna, provido dos modernos artifícios
de acústica, aparelhos de projeções e filmagens, e com acomodações para
mais de duas centenas de espectadores, satisfazendo às necessidades culturais e didáticas da Faculdade e dos Institutos e Sociedades que lhe são
correlatos (FMCP, 1948b, p. 13).
A expansão
237
Auditório.
achada do
Foto 49: F
, s.p.).
b
CP (1950
Fonte: FM
238
itório.
interna do Aud
Foto 50: Vista (1950b, s.p.).
Fonte: FMCP
rio.
ário do Auditó
Foto 51: Mobili
.).
s.p
,
(1950b
Fonte: FMCP
239
Este seria o prédio do Pavilhão posteriormente denominado Lauro de Magalhães, em
homenagem ao seu construtor, inaugurado oficialmente em 1º de maio de 1949, no
30º ano de fundação da Faculdade. Atualmente é ocupado pelo curso de enfermagem,
restando para uso comum o auditório, que já foi um dos maiores e mais modernos
que a cidade já teve, hoje bastante maltratado pela falta de conservação. É mencionado ainda, no Relatório de 1949, a inauguração do Biotério, para maio do ano seguinte,
informando a modificação da planta deste e o conseqüente reajuste do orçamento, e
também a aquisição de terrenos para a construção do Instituto de Higiene17.
Sobre o Biotério, o Dr. Lauro de Magalhães disse em seu discurso de inauguração
que o referido prédio encerrava “o ciclo de construções no decurso da brilhante e
agitada vida de Escola livre e autônoma”, pois para completar o ensino AnátomoBio-Fisológico humano, faltava um instituto onde se pudesse praticar a Medicina e
Cirurgia experimentais comparadas, em todos os setores, “como nas Escolas Médicas modernas”.
Também desde a inauguração do Pavilhão de Anatomia, sete anos antes, já estava
prevista a construção do Biotério. Entretanto, “outras necessidades mais prementes e mais imperiosas [...] encheram este longo período de sete anos”, e que somente no ano anterior é que surgiram “oportunidade e recursos financeiros para
dar corpo a mais um projeto”, que se apresenta “na plenitude elegante das linhas
A expansão
arquitetônicas e na grandeza, confôrto e instalação das dependências, criteriosamente ajustadas”.
Frisava Lauro de Magalhães que o novo prédio exprimia, como um marco simbólico, “materializado em pedra, cal e cores”, a separação de duas idades distintas de
uma vida, “que promete resistir à ação destruidora do tempo e ao esquecimento e
ingratidão dos homens, como os monumentos perenes ou as obras eternas”.
Explicitando, o Diretor definia a primeira fase como a “fase de ouro de uma longa
e radiosa adolescência”, iniciada havia 31 anos, na mesma data, “no porão de um
prédio quase secular”, “revelada por um espírito de escol e filho dileto de Deus” –
Camilo Salgado,
240
que imitando os santos fundadores de ordens monásticas e instituições
religiosas, congregou em volta de inconfundível personalidade, à sombra de incomparável prestigio, ao endôsso de imaculado nome e tutela
e garantia de qualidades intelectuais e morais, uma plêiade de colegas,
discípulos e devotos, sonhadores e idealistas à sua imagem, que, numa
união sagrada, movida pelo mais puro altruísmo e sublime despreendimento, lenta e progressivamente, os três corpos integrantes, o docente,
o administrativo e o discente. Conjugados numa corrente de sacrifícios,
desinterêsses e coadjuvações, numa vontade forte de economia, e honestidade, conseguiu êle elevar êste monumento de Ensino Superior, que
imortaliza os seus fundadores, honra a nossa terra natal e dignifica a
nossa Pátria, que, agradecida, acaba de recompensar-nos com o prêmio,
justo e merecido: a Federalização.
Nas palavras de Lauro de Magalhães, se a segunda fase, representada pela Federalização, iniciava-se com a privação do bem mais precioso, “a relativa liberdade”
que havia antes, por outro lado prenunciava-se “radiante de promessas e risonhas
esperanças”, garantindo uma vida mais calma, mais tranqüila e mais fácil, tanto em
recursos financeiros quanto em elementos didáticos, “facilitando financeiramente
o curso aos dependentes, continuando as obras iniciadas e executando o programa
construtivo estabelecido, que deve culminar com a construção do Hospital das Clínicas e encerrar-se com a Universidade” (FMCP, 1951, p. 28).
Foto 52: Vista lateral do Biotério. A esquerda a estátua de Asclépio já em sua localização atual.
Fonte: FMCP (1951 s.p.).
241
53: Biotério – Sala para criação de coelhos.
Fonte: FMCP (1951, s.p).
Foto 54: Sala para animais inoculados. Ao fundo a sala para animais de médio porte. À frente escada de Acesso
ao Pav. Superior. Vê-se a grade para a jaula dos macacos.
Fonte: FMCP (1951, s.p.).
242
Foto 55: Biotério – Sala de Esterilização.
Fonte: FMCP (1951, s.p.).
Foto 56: Sala de operações e anfiteatro para aulas práticas localizada no segundo andar do prédio.
Fonte: FMCP (1951, s.p.).
243
Foto 57: Sala para animais de médio porte. Ào fundo a escada de Acesso ao Pav. Superior.
Fonte: FMCP (1951, s.p.).
Foto 58:
Vista posterior
do Biotério.
Fonte: FMCP
(1951, s.p.).
244
O Instituto de Higiene
De acordo com Folha do Norte, de 16 de dezembro de 1955, no decorrer do ano de
1948, o Conselho Técnico-Administrativo designou uma comissão de professores
para, juntamente com a firma de engenharia M. C. Macedo, proceder aos estudos
necessários a construção de um edifício que constituísse o núcleo de ensino que
pretendia dar ao alunos de Faculdade de Medicina do Pará – o da Patologia Tropical (SERÁ Inaugurado hoje o Instituto de Higiene,1955, p. 10).
No Relatório das atividades do ano de 1949, o Diretor informa que para a construção do Instituto de Higiene, fora adquirida “uma área de 2.912,00m² com edificações, na Avenida Generalíssimo Deodoro, em seguimento ao novo pavilhão (o
Lauro de Magalhães, recém-inaugurado) (FMCP, 1950b, p. 4).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Possivelmente uma outra área fora desapropriada pela Prefeitura Municipal de Belém, conforme o teor do ofício encaminhado ao Prefeito Municipal, em 5 de fevereiro
de 1949, pelo secretário da Faculdade, em que este solicita uma audiência à autoridade
municipal, “para tratar de assunto referente aos terrenos desapropriados pelo Conselho Municipal e que vão ser cedidos à Faculdade de Medicina” (FMCP, 1949a).
Sobre o mesmo assunto versa o ofício encaminhado ao Prefeito Municipal, Dr. Waldir Bouhid:
Exº. Sr.
Tendo o Conselho Municipal desapropriado os terrenos de números 30,
34, 36, 40, na Generalíssimo Deodoro, para serem dados à Faculdade, de
acordo com o entendimento prévio que tivemos com a Prefeitura, solicito
a V. Excia. sua interferência neste sentido, mesmo porque o decreto fixou
o prazo de 12 meses para o início das obras.
Aproveito a oportunidade para convidar V. Excia. para nos dar a honra
de visitar o pavilhão recentemente construído, para verificar o que já
realizamos e o que pretendemos realizar.
Respeitosas saudações,
Dr. Lauro de Magalhães
Diretor
(FMCP, 1949a)
A Folha Vespertina, de 3 de janeiro de 1950, informa o início da construção do pavilhão
“onde terão de ser instalados os serviços de Higiene e Saúde Pública e onde também
ficarão funcionando os Laboratórios de Microbiologia e Parasitologia e diversos ambulatórios”. O terreno onde seria construído o novo pavilhão, pela av. Generalíssimo Deodoro, contíguo ao bloco inaugurado em maio de 1949, custou à Faculdade a
quantia de Cr$ 300.000,00.
O Relatório de 1950 relata a paralisação das obras do Instituto, porque uma das
cláusulas contratuais dizia que a Faculdade deveria entrar com Cr$ 500.000,00, o
que não pôde fazer em virtude da indefinição da nova situação financeira por conta
da federalização (FMCP, 1951, p. 3).
A Revista do Acadêmico de Medicina de dezembro de 1954 detalhava a construção e informava que ainda naquele ano estariam concluídas as obras do referido instituto, “o segundo do Brasil”. De acordo com a Revista, o Conselho Técnico da Faculdade adquirira
em 1949 quatro terrenos juntos ao prédio antigo da Faculdade, num total de 3.920 m²,
pela quantia de Cr$ 300.000,00. As obras, estavam orçadas em Cr$ 3.800.000,00, para
uma verba de Cr$ 500.000,00. Ao se esgotar o dinheiro, a construção foi paralisada.
Em 1953, o orçamento da União alocou uma verba no valor de Cr$ 1.300.000,00,
sendo reforçada posteriormente por outra de Cr$ 700.000,00.
Para 1954 foram apresentadas novas emendas ao orçamento da União, através dos
deputados Coaracy Nunes e Paulo Maranhão, visando liberar para a Faculdade mais
A expansão
245
Cr$ 1.500.000,00, aos quais viriam se juntar Cr$ 2.320.000,00 conseguidos no Plano
Qüinqüenal da S.P.V.E.A. (Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia),
posteriormente SUDAM (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia) e Cr$
2.500.000,00 do orçamento da República. Parte do dinheiro para a aquisição de aparelhos já havia sido entregue, tendo a Faculdade encomendado vários para a instalação.
Prossegue a Revista dizendo que as obras estavam bem adiantadas, com o primeiro
pavimento já concluído e previsto para entrar em funcionamento em junho.
No referido Instituto funcionariam as cadeiras de Higiene, Microbiologia, Parasitologia, além de duas cadeiras de Clínica: Dermatologia e Doenças Tropicais
A matéria termina afirmando que “a aparelhagem de que será dotado o Instituto
será a mais moderna, sendo mesmo superior àquela do Instituto de Higiene de São
Paulo” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1954).
As obras, sob a responsabilidade da firma M. C. Macedo, foram iniciadas em 29 de dezembro de 1949 e ficaram paradas durante 26 meses por falta de verbas e também para
a adaptação da faculdade de particular para federal, em função da federalização (Folha do
Norte, 16.12.1955). A matéria da Folha ressalta que o Instituto seria o primeiro e único
até aquela data a ser “inteiramente projetado e construído ao fim a que se destina”.
A matéria prossegue descrevendo o prédio
246
Ocupa a edificação uma área de mil e oitocentos metros quadrados
(1.800.000m²) distribuídos por três (3) pavimentos de seiscentos metros
quadrados (600.000m²) e terá instalações moderníssimas para a cadeiras
de Microbiologia e Parasitologia do curso de formação médica e também o de Nutrição, Saneamento, Epidemiologia, Bioestatística, Higiene
do Trabalho, dos cursos de pós-graduação que terão início no próximo
ano, além de amplo salão para Biblioteca e departamentos especiais para
desenho e macro e microfotografia e está o mesmo dotado de um moderníssimo auditório para 100 pessoas a ser equipado com ar condicionado
(Folha do Norte, 16.12.1955, p. 10).
Além de detalhar sobre as verbas empregadas na construção, a matéria dá maiores
detalhes sobre materiais e equipamentos do prédio:
8 mesas de aço inoxidável para trabalhos dos alunos; 2 mesas para microscopia de fórmica negra; 2 mesas para Professor; 75 carteiras de aço
inoxidável, individual, para alunos; 2 estufas elétricas; 1 centrifugador
elétrico; 28 microscópios monoculares “Zeiss-Winkell”; 3 microscópios
binoculares “Zeiss-Winkell” com contraste de fase; 16 microscópios esterioscópios “Meopta” e aparelhagem completa para fotografia (Folha do
Norte, 16.12.1955, p. 10).
Em matéria especial para Folha do Norte, por ocasião da inauguração, o professor
Garcia Filho, afirmava que o novo prédio serviria, ainda, para o funcionamento de
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
cursos de pós-graduação “em assuntos de interesse sanitário da região amazônica”.
E descreve assim o edifício:
Construção em linhas modernas foi planejado e edificado especialmente
ao fim a que se destina e dotado de completo equipamento – e bem traduz
a mais arrojada da atual administração, em boa hora entregue ao espírito idealista e disciplinado do professor José da Silveira Netto (GARCIA
FILHO, 1955, p. 3).
O Instituto de Higiene “Dr. Olimpio da Silveira”18 foi inaugurado em 16 de dezembro de 1954, quando o homenageado completou 50 anos de formado pela Faculdade de Medicina da Bahia. Foi o último prédio construído pelos criadores da Faculdade e seus sucessores. Hoje abriga o Núcleo de Patologia Tropical, sem nenhuma
ligação com a graduação em medicina.
O projeto de expansão da Faculdade previa a construção de outros prédios, que
não chegaram a ser viabilizados. Um deles era o Instituto de Anatomia; na verdade
uma ampliação de prédio já existente. O jornal do DAM “Acadêmico de Medicina”,
de março de 1956, referindo-se ao assunto dizia que em breve seria iniciada a construção do referido Instituto, quando seria aproveitada a parte da Faculdade onde
funcionavam as aulas de Anatomia Humana e Anatomia Patológica.
O prédio, que deveria possuir 3 andares e um subsolo, abrangeria as cadeiras de
Anatomia Humana, Histologia e Embriologia, Patologia Geral, Técnica Operatória
e Anatomia Patológica. O subsolo seria utilizado para a conservação e preparação
de cadáveres e contaria com frigorífico, cubas para formol, etc. No primeiro andar
seria instalado o departamento de Anatomia. No segundo, a Anatomia Patológica e
também a Patologia Geral. No último andar seria para Histologia e Embriologia.
A notícia dava conta de que as plantas já estavam prontas, bem como as demais
planificações exigidas (Revista do Acadêmico de Medicina, 1956, p. 6).
Outro projeto era o da construção de um Centro de Saúde Modelo e da Casa do
Estudante de Medicina do Pará, que por serem de uma época posterior ao período
abrangido por este livro, deixamos de detalhá-lo, embora faça-se o registro.
Da transferência do curso do Ginásio Paes de Carvalho para o palacete de Santa
Luzia, até a inauguração desta última obra, foram mais de trinta anos de batalha
para dotar o curso de instalações e equipamentos adequados, visando à preparação
dos formados pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Este patrimônio
invejável, citado como o maior incorporado quando da criação da UFPA, fruto do
trabalho de homens comprometidos com a Escola desde a sua criação, simplesmente foi repartido (melhor seria dizer: esquartejado) por vários segmentos da Universidade desfazendo a unidade do curso, um dos propósitos não oficiais da Reforma
Universitária implantada na década de 1970.
A expansão
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Deste modo, certamente os atuais usuários destes pavilhões, hoje bastante modificados, descaracterizados da suas origens e finalidades, despidos de suas placas
alusivas, nem sequer imaginam a saga de sua construção, bem como os nomes
dos principais responsáveis por esta história, que teimosamente insiste em resistir
através de algumas sobreviventes placas comemorativas de suas inaugurações, ainda não “estirpadas” pela ação saneadora de administradores descompromissados
com a História, ainda que esmaecidas pelo tempo e ignoradas por todos os que
circulam por seus corredores.
Desde sua fundação até a federalização, a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará
teve quatro diretores: Antonino Emiliano de Souza Castro (1919- 1922); Camilo Salgado (1922-1938); Lauro de Magalhães (1938-1943); Acylino de Leão (1944-1946);
Lauro de Magalhães (1947-1954). Se o Barão emprestou seu nome e seu prestígio para
o nascimento da FMCP, Camilo constituiu-se no baluarte para sua estabilização e início
do crescimento e aparelhamento. E se Acylino de Leão representou um administrador
sóbrio, sob o comando de Lauro de Magalhães a Faculdade experimentou o período
de maior ampliação das suas instalações. Entretanto, todos a seu modo, contribuíram
inegavelmente para que a Escola de Santa Luzia viesse a ocupar o lugar de destaque
que chegou a ter, em nada deixando a desejar às demais congêneres brasileiras.
248
Foto 59: Instituto de Higiene alguns anos após sua inauguração. Atualmente o prédio abriga o
Núcleo de Medicina Tropical xe não possuindo mais nenhum vínculo com a graduação médica.
Fonte: Acervo da UFPA.
NOTAS
1
“Quer antes da criação da Universidade, quer como parte integrante da
mesma, a Faculdade de Medicina sempre teve posição destacada no concerto
do ensino superior dos Estado. Era o estabelecimento de maior número de
funcionários e professores e o que concorreu com maior patrimônio para a
formação da Universidade” (MOREIRA, 1989. vol 7).
2
“Esta Faculdade (...) já adquiriu e remodelou o predio onde funcciona dotando-o do apparelhamento necessario a esse ensino”. (PARÁ. Governador
1925-1929: Dionysio Ausier Bentes, p. 58).
3
“Apesar das difficuldades financeiras, sempre crescentes numa obra de vulto
como a Faculdade de Medicina do Pará, iniciada sem os recursos indispensaveis ao seu completo apparelhamento, muito custoso, a Directoria está construindo um pavilhao anexo ao edifício principal, de cimento armado, sendo
destinado o pavilhão terreo aos laboratorios de microbiologia e anatomia
pathologica e á biblioteca, e o superior ao salão da Congregação”. (PARÁ.
Governador (1929-1930: Eurico de Freitas Valle) 07.09.1930). De acordo
com ofício de 25 de agosto de 1989, endereçado ao Reitor da UFPA pelo então Diretor do CCS/UFPA e Presidente da Comissão Especial encarregada
de estudar e sugerir a destinação a ser dada ao prédio de Santa Luzia, Dr.
Arival Cardoso de Brito, o novo pavilhão foi construído com a primeira verba
federal, no valor de cem contos de réis, sendo inaugurado solenemente em 3
de outubro de 1932, quando se comemorou o Centenário da Transformação
das antigas academias Médico-Cirúrgicas, criadas em 1808, em Faculdades
de Medicina. (N.A).
4
O mesmo ofício informa a existência de uma cópia da planta, na Faculdade,
o que já não existe. (FMCP, 1930-1931).
5
Este prédio é onde hoje está atualmente instalado o serviço de Dermatologia do curso de Medicina (FMCP, 1936c, p. 35).
6
Resumo do orçamento apresentado (FMCP, 1936).
7
O Relatório de 1941 informaria que o preço da construção elevar-se-ia a
254:676$700, com a câmara frigorífica orçada em 54:000$000. (FMCP,
1942b, p. 58).
8
“É um dever de gratidão e de justiça associar a este novo patrimonio, deste
este instante denominado ‘Camilo Salgado’... (FMCP, 1943b, p. 25).
9
Em seu discurso de saudação ao homenageado, o prof. Dias Jr. menciona
que o retrato estava localizado no gabinete do professor de anatomia: “... no
momento em que se inaugura este anfiteatro anatomico [...]. Descerrada,
pois, sua efígie no gabinete de estudo do professor desta cadeira...” (FMCP,
1943, p. 28).
10
Ao que parece, a homenagem foi bem mais singela do que a prevista no
Relatório de 1941. No citado Relatório é mencionado que abaixo do quadro
poder-se-ia gravar “em bonze rijo” a seguinte inscrição: “De vivis nil nisi bonum
(Dos vivos nada, a não ser o bom)”, com a justificativa que num anfiteatro anatômico, onde se estuda nos mortos para melhor conhecer os segredos da vida,
os estudantes, visando a curta legenda, lembrar-se-iam de que a bondade deve
ser uma das qualidades principais do médico. (Folha do Norte, 03.03.1942, p. 8).
Também que descobririam na face serena do retratado os reflexos de sua grande generosidade, “manifestada em valiosos e inolvidáveis auxílios oferecidos e
empregados na parte nova da Faculdade” (FMCP, 1943, p. 7).
A expansão
249
11
250
“...substituímos – longa e inestética escadaria por outra de marmorite, as três
portas principais por elegantes portões de ferro e adquirimos por Cr$ 4.200,00,
um motor de 2HP para acionar a camara frigorífica para conservação de cadáveres...” (FMCP, 1946b, p. 4).
12
Do ofício encaminhado em 28 de outubro de 1948 pelo Diretor, Dr. Lauro
de Magalhães, ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde, contendo “um
breve histórico da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará”
(FMCP, 1948b).
13
Até os anos de 1970-80 os móveis originais “resistiam” na biblioteca. Atualmente apenas uma mesa daquela época ainda permanece. Existem ainda
algumas cadeiras originais em outros setores, “desviadas” de suas funções.
14
Do ofício encaminhado em 28 de outubro de 1948 pelo Diretor, Dr. Lauro
de Magalhães, ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde, contendo “um
breve histórico da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará”.
(FMCP, 1948b).
15
Ofício do Diretor do CCS/UFPA ao Magnífico Reitor, Dr. Nilson Pinto de
Oliveira, em 25 de agosto de 1989.
16
Mais adiante, o Relatório pormenoriza o novo pavilhão: “Em 20 de janeiro
de 1948, iniciou a Faculdade a construção de mais um pavilhão, de dois pavimentos, em cimento armado, sob a direção e responsabilidade da firma construtora Macêdo & Azevedo, de acôrdo com o orçamento e plantas apresentadas e, posteriormente, aprovados pelo Conselho Técnico-Administrativo.
No andar terreo, acham-se os Departamentos de Fisiologia e Química Fisológica, cada um dispondo de: sala do professor, sala de aula e laboratórios.
As salas de aula são de 9x6 metros, cabendo, assim, quarenta alunos folgadamente, com pisos mosaicados e paredes revestidas de azulejos brancos, até a
altura de 1,80 metros.
Dispõem de cortinas especiais para escurecê-las, de modo a permitir o uso de
aparelhos de projeção. Em cada uma funcionará um epidiascópio.
Os laboratórios são providos, cada um, de dez mêsas em cimento armado
e guarnecidas de azulejos brancos, com canalização de água e gaz e de pias
com despejo para o esgôto.
Em cada mêsa existe um armário de cedro, para dois alunos.
Na sala do professor, ficará instalada uma pequena biblioteca especializada.
No andar superior, funcionará o auditório, com luz indireta e capacidade para
600 pessôas, dispondo de cinema falado e alto falante para facilitar a audição
das conferências.
A construção, que orça em Cr$ 1.110.000,000, inclusive instalações e mobiliário, foi entregue pela firma construtora, no fim do mês de dezembro.
17
Conforme ofício expedido em 28 de abril de 1950, o Biotério seria inaugurado em 1º de maio de 1950. (FMCP, 1950a). “Em primeiro de maio, inaugurouse solenemente o moderno pavilhão destinado ao Biotério, que se acha devidamente aparelhado. Foi construído pelo engenheiro Manoel Ibiapina Cavaleiro
de Macedo, orçando a construção em Cr$ 470.000,00. (FMCP, 1950a, p. 4).
18
Em sessão da Congregação, em 21 de janeiro de 1951, o prof. José Rodrigues da Silveira Netto propõe a denominação. (FMCP, 1951).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
15
A enfermagem
obstétrica
251
252
Quadro com formandos de enfermagem obstétrica do ano de 1946.
Com a criação do curso de medicina no Pará, em 1919, é possível que os envolvidos com o processo de desenvolvimento e melhoria das condições sanitárias da
região tenham observado que, além da formação de profissionais de medicina seria
necessário também a preparação de pessoal de apoio às ações de saúde, no caso,
profissionais na área de enfermagem.
Evidentemente que a enfermagem como profissão regulamentada ainda não havia
atingido o grau de diferenciação como a conhecemos hoje. Pelo contrário, na década de 1920 dava seus primeiros passos rumo à sua estruturação profissional em
nosso país, fruto da ação conjunta dos Estados Unidos e do Brasil, através da Fundação Rockefeller e do Departamento Nacional de Saúde Pública, respectivamente
(MOREIRA, 1999).
O estatuto da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, datado de 1921, já previa
em seu artigo 7º que, além do curso de medicina, a Faculdade promoveria outros
cursos especiais, dentre eles, o de obstetrícia1. Prosseguindo, o Estatuto detalha a
organização do curso:
Art. 8º - O curso de obstetricia será feito em dois annos e comprehenderá
as materias seguintes:
1º Anno
Anatomia obstétrica (anatomia descriptiva e medico-cirurgica do abdômen, comprehendendo o canal pelviano, em particular os orgãos genitourinarios).
Physiologia obstétrica (Physiologia da geração, noções de embryogenia
e theratologia).
Obstetrícia, com desenvolvimento do estudo da estatica e dynamica do
parto normal.
Clinica obstétrica, comprehendendo o diagnostico clinico, a dystocia materna e fetal, hygiene das parturientes e os cuidados ás puerperas e recém
nascidos.
2º Anno
Clinica obstetrica
(FMCP, 1933a, p. 6).
As atividades do curso de obstetrícia são mais detalhadas no Regimento Interno da
FMCP, publicado em 1926. Assim:
Art. 174. - Na forma do art. 133, § unico, do decreto 16.782-A, haverá um
curso de enfermeiras especializadas, destinadas ao serviço de parturientes e recemparidas que será feito nas clinicas obstétrica e gynecologica da Faculdade.
§ 1º- Este curso se fará em dois annos.
§ 2º - No primeiro anno serão ensinadas ás alumnas noções de anatomia
e physiologia, especialmente do apparelho genital, durante o primeiro
periodo do anno lectivo.
§ 3º - No segundo periodo farao as alumnas a pratica da assistencia ás
doentes na clinica gynecologica.
A enfermagem obstétrica
253
§ 4º - No segundo anno farão a pratica de assistencia ás gestantes e recémparidas na clinica obstétrica.
Art. 175. - Os professores de clinica obstetrica e gynecologica organizarão os respectivos programmas e designarão um assistente de cada uma
das cadeiras, para leccional-os.
Art. 176. - Os diplomas ou certificados serão de enfermeiras especializadas e serão conferidos após approvação aos exames.
Art. 177. - A banca de exames será organizada com um professor de
clinica obstétrica e com dois docentes livres especializados, um em obstetricia e outro em gynecologia (FMRJ, 1926, p. 40).
Deste modo, pouco depois de ter assumido a direção da Faculdade de Medicina,
Camillo Salgado, “comprehendeu a vantagem da instituição do curso de obstetrícia”, designando o professor Agostinho Monteiro para dirigi-lo (PARÁ-MÉDICO,
1922, p. 364), fazendo referência ao fato no primeiro relatório de atividades da
Faculdade sob sua direção, onde informa ter sido realizado o primeiro exame de
admissão ao curso de obstetrícia (FMCP, 1923c, p. 10).
254
Pelo fato do Dr. Agostinho Monteiro ser, também, o diretor da Maternidade do Hospital da Ordem Terceira, isto contribuiu sobremodo para a melhoria do curso das
obstetrizes, que já em 1923, por decisão de Camilo Salgado, passaram a ter o 2º ano
do curso ministrado naquele hospital, preparando melhor aquelas que comporiam a
primeira turma (Estado do Pará, 09.01.1923). Como referido no Regimento Interno,
o curso era para “enfermeiras”, isto é, direcionado para pessoas do sexo feminino.
O curso de enfermagem obstétrica está intimamente ligado à história da Faculdade de Medicina, pois além de ser ministrado pelos professores do curso de medicina, a primeira colação de grau promovida pela Faculdade de Medicina e Cirurgia
do Pará, ocorrida no dia 16 de abril de 1925, na secretaria da Faculdade, não foi
de medicina: foi a de enfermeiras obstetrizes. De acordo com a ata lavrada pelo
Dr. Olympio da Cardoso da Silveira, na qualidade de secretário, na referida data
“depois de satisfeitas as exigências da lei do Ensino Superior, compareceram as
senhoritas Maria Magdalena Bello da Conceição e Angelina Rebello de Souza e
perante os professores Doutores Agostinho de Menezes Monteiro, Renato Chaves da Silva e Souza e Hermógenes Pinheiro, o Excellentissimo Senhor Doutor
Camillo Henrique Salgado, Director da Faculdade, conferiu-lhes o grão de Obstetriz” (FMCP, livro de ata das colações 1925)2. A outra referência de colação gráu
de obstetriz no livro de atas de colação de medicina é de 6 de janeiro de 1926.
Supõe-se tenha havido um livro específico para registro das atas de colação de
grau das obstetrizes, posto que há relatos da entrega de certificados às concluintes, após a “lavratura da ata”, porém nada encontramos a respeito.
As referências ao curso nos Relatórios de Atividades de Faculdade são irregulares,
ainda que não tenhamos podido manusear todos os Relatórios3. Assim sendo, não
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
há menção ao curso no Relatório de 1922. No Relatório de 1935, somente o curso
de Farmácia é mencionado, ficando a dúvida: o curso de enfermagem teria tido
alunas matriculadas naquele ano?
Em relação ao ano de 1936, um documento encaminhado pela Direção da Faculdade ao Diretor Geral de Educação e Saúde Pública, em abril daquele ano, informa a
criação de um “curso de enfermagem obstétrica” anexo á cadeira de Clínica Obstétrica, “de acordo com o artigo 211 do Regimento Interno da Faculdade de Medicina
da Universidade do Rio de Janeiro”. No mesmo documento, a Faculdade solicita a
extensão da fiscalização federal ao referido curso, “para que as futuras enfermeiras
especializadas tenham seus diplomas legalisados e assegurados seus direitos”.4
O Relatório de 1938, faz referência ao curso de enfermagem, constando o número
de alunas matriculadas (4: duas em cada série), seu desempenho e o nome das duas
concluintes, o que demonstra o funcionamento normal do curso nos anos anteriores, posto que a duração do curso era de dois anos (FMCP, 1939c, p. 30-36).
O Relatório de 1939 menciona a matrícula de 4 alunas no primeiro ano, sendo que
somente duas inscreveram-se para os exames e foram aprovadas (FMCP, 1940b,
p. 26). Além disso, informa também que os trabalhos dos cursos médico e de enfermagem aconteceram no dia 7 de março, ás 8 horas, em sessão solene realizada
no salão nobre, com a aula inaugural proferida pelo professor Oscar Pereira de
Carvalho, catedrático de Patologia geral, que dissertou sobre “Antigas e modernas
ideias e doutrinas médicas. Vida, saúde e doença” (FMCP, 1940b, p. 15).
De acordo com o Relatório do ano de 1940, 4 alunas matricularam-se no 2º ano;
os cursos de medicina e de enfermagem obstétrica “funcionaram com a costumada
regularidade”, todas as alunas se inscreveram para os exames e foram aprovadas
(FMCP, 1941, p. 15-16, 23). Um fato relevante do Relatório é que a colação de grau
foi conjunta, sendo as enfermeiras paraninfadas pelo professor Orlando Lima, que
teve seu discurso reproduzido no referido Relatório (FMCP, 1941, p. 38, 40).
O Relatório de 1941 informa não ter havido matrícula e nem conclusão de curso de
enfermagem obstétrica no referido ano (FMCP, 1942b, p. 25).
O Relatório de 1942 informa não ter havido matrícula nem conclusão do curso de
enfermagem obstétrica naquele ano (FMCP, 1943b, p. 18), o mesmo acontecendo
com o ano de 19435.
No ano de 1944, o Relatório de Atividades informa que os exames finais do curso
de enfermagem realizaram-se na segunda quinzena de novembro, tendo-se inscrito
seis alunas, ficando uma reprovada (FMCP, 1944b, p. 25).
No ano de 1945 havia seis alunas matriculadas no primeiro ano, tendo uma ficado
reprovada, e cinco no segundo, as quais foram aprovadas. O Relatório cita ainda
A enfermagem obstétrica
255
nominalmente as concluintes do curso naquele ano (FMCP, 1946b, p. 17, 28), bem
como a entrega dos certificados às concluintes6. Destaque para o Relatório de Atividades do curso, encaminhado ao Diretor da Faculdade:
CURSO DE ENFERMAGEM OBSTÉTRICA
Exmo. Sr. Dr. Diretor da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará
Belém, 5/12/1945
Ao terminar o ano letivo de 1945, tenho a honra de informar a V. Excia.
que no curso de Enfermagem Obstétrica, a meu cargo, nada ocorreu de
anormal, tendo sido exgotados os programas de ambas as séries.
A parte prática foi realizada na Maternidade do Hospital da Santa Casa de
Misericórdia, onde as alunas tiveram vasto campo para a sua aprendizagem.
Aproveito a oportunidade para apresentar a V. Excia.
Atenciosas saudações.
(a) Dr. José Maria Chaves
Professor contratado encarregado pelo Curso de Enfermagem Obstétrica
(FMCP, 1946b, p. 62)
O Relatório de 1946 informa a matrícula de seis alunas no primeiro ano e três no
segundo, além da entrega dos certificados (FMCP, 1947b, p. 15, 27). Há ainda o
Relatório do curso, de redação idêntica ao do ano anterior (FMCP, 1947b, p. 90).
256
Em 1947 estavam matriculadas sete alunas no primeiro ano, tendo sido quatro
aprovadas, e cinco no segundo, não havendo reprovações (FMCP, 1948c, p. 24). Há
menção, ainda, da entrega na Secretaria, dos certificados às concluintes do curso
(FMCP, 1948c, p. 39).
O número de alunas matriculadas em 1948 era de nove no primeiro ano, tendo duas ficado reprovadas, e quatro no segundo, não havendo reprovações (FMCP, 1949b, p. 29).
O ano de 1949 apresentou duas alunas inscritas no primeiro ano e sete no segundo ano,
sendo todas aprovadas e tendo seus nomes citados como concluintes (FMCP, 1950b).
A partir de 1949, não conseguimos mais informações sobre a Enfermagem Obstétrica.
Segundo Clóvis Meira, o curso funcionou até aquele ano (MEIRA,1986a, p. 115). Sabese que era equiparado ao da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro7 e reconhecido
em todo país, conforme a nota publicada em fevereiro de 1946, em Folha do Norte:
FACULDADE DE MEDICINA
Curso de Enfermagem Obstétrica
Acham-se abertas de 10 a 23 de fevereiro corrente as matrículas para este
curso que é válido em todo o Brasil.
Informações na Secretaria.
(Folha do Norte, 15.02.1946, p. 2)
Sua extinção pode estar relacionada à questão financeira, conforme ofício de 3 de
agosto de 1949, enviado pelo Diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães, ao
Dr. José Maria Chaves, professor e coordenador do curso,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Belém, 3 de agosto de 1949
Sr. Dr. José Maria Chaves
Não tendo a Faculdade recebido pontualmente a pequena mensalidade de
Cr$ 70,00, que é quanto pagam as alunas de enfermagem obstétrica, importância esta destinada totalmente ao pagamento do professor, podeis
suspender as aulas, ficando desta forma extinto o respectivo curso.
Cordiais cumprimentos,
Dr. Lauro de Magalhães
Diretor
(FMCP, 1949a)
Outros fatores devem ser considerados com relação à extinção do curso de enfermagem obstétrica. Em 6 de agosto de 1949, por exemplo, o governo federal edita
a lei nº 775, que dispunha sobre o ensino da enfermagem. Referida lei dividia o ensino da enfermagem em dois cursos: o de enfermagem, com duração de 36 meses, e
o de auxiliar de enfermagem, com a duração de 18 meses. A lei dizia ainda que “em
cada Centro Universitário ou sede de Faculdade de Medicina, deverá haver escola
de enfermagem, com os dois cursos”.
Também que:
Aos atuais cursos de enfermagem obstétrica será facultada a adaptação
às exigências da presente Lei, de modo que se convertam em cursos de
enfermagem e de auxiliares de enfermagem, destinados à formação de
enfermeiras e de auxiliares de enfermeiras especializadas para a assistência obstétrica (BRASIL, 1949).
A nova lei implicaria adaptações da Faculdade a ela.
Outro aspecto diz respeito à Federalização da Faculdade, em 1950, o que certamente
viria a modificar a organização administrativa da Escola. Vale lembrar, ainda, a criação, em 1944, da Escola de Enfermagem Magalhães Barata, que passou a oferecer um
curso com a duração de três anos e mais abrangente8. Ressalte-se que o novo curso
também se utilizava das instalações da Faculdade de Medicina, além da Santa Casa9.
NOTAS
1
“Art. 7º - Alem do curso integral de Medicina e Cirurgia, a Faculdade terá os cursos especiaes de Obstetrícia, Pharmacia e Odontologia.” (FMCP, 1933a, p. 6).
2
O Estatuto fala em ‘parteiro’: “Art. 220 – Aos alunos que tiverem sido approvados em todas as materias do curso de Obstetrícia será concedido o
titulo de parteiro” (FMCP, 1933a).
3
Só tivemos acesso aos Relatórios dos anos de 1922, 1935, 1938, 1939, 1940,
1941, 1942, 1943, 1944, 1945, 1946, 1947, 1948, 1949, 1950 e 1951.
4
Não conseguimos maiores dados sobre este fato, que parece sinalizar para
uma nova modalidade de curso, muito embora os relatos dos anos seguintes
apontem para a manutenção daquele curso inicial. (FMCP, 1936b).
A enfermagem obstétrica
257
5
258
“Curso de Enfermagem obstétrica: Não houve matricula e nem conclusão
de curso de enfermagem obstética”. (FMCP, 1944, p. 23).
6
“ Na secretaria da Faculdade, após a lavratura da áta, foram entregues às
alunas que terminaram o Curso de Enfermagem Obstétrica, os respectivos
certificados” (FMCP, 1946, p. 30).
7
“Curso de Enfermagem Obstétrica. Acha-se aberta, até o dia 25 do corrente,
a inscripção aos exames de admissão ao Curso de Enfermagem Obstétrica. As diplomadas por este curso têm os seus direitos assegurados podendo
exercer a profissão em qualquer parte do Brasil. o curso é equiparado ao da
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Informações na secretaria da Faculdade” (Folha do Norte, 15.01.1937, p. 2).
8
“Por decreto de 10 de novembro de 44, foi suprida uma grande lacuna em
nosso Estado, com a criação da Escola de Enfermagem Magalhães Barata,
iniciativa do Doutor João de Barros Barreto, diretor de Saúde do Brasil e
grande incentivador da profissão de enfermeira-sanitarista. [...] De acordo
com o programa daquela escola [Escola “Ana Néri”, da Universidade do Brasil], o curso é realizado em três anos, tem caráter intensivo, e a teoria está
estreitamente ligada à prática, sendo obrigatório um estágio em quase todas
as especialidades, principalmente no que diz respeito à saúde pública, uma
vez que a manutenção desta é o fim principal visado por aquela instituição”
(Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 49-50).
9
“A parte teórica do estudo é ministrada não só na escola como também
na Faculdade de Medicina, onde são aproveitadas as instalações tecnicas.
A prática às futuras enfermeiras adquirem nos principais hospitais da cidade, principalmente na Santa Casa, onde a enfermaria “Santa Ludovina” foi
especialmente remodelada e adaptada para esse fim, transformando-se em
enfermaria-escola”. (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 50). Ainda
sobre a criação de uma escola de enfermagem, Folha do Norte registra uma
“collação de gráo” de enfermeiros que concluíram o curso em 1936, com a
turma contendo dez mulheres e oito homens, a cerimônia realizada no “salão
nobre do Hospital de Caridade, sendo o Dr. Prisco dos Santos o Diretor da
Escola, “fundada em fevereiro de 1932”. (Folha do Norte, 22.05.1937, p. 6)
Seria curso de enfermagem ou o equivalente a auxiliar de enfermagem?
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
16
Casamento por dote:
a questão do curso
de Farmácia na
Faculdade de Medicina
259
260
Detalhe do entalhe de uma cadeira da FMCP.
Entre o século XIX e início do século XX o ensino de Farmácia nos estados brasileiros surgiria invariavelmente de três formas:
Primeiro, atrelado à criação de Faculdades de Medicina como curso anexo a estas,
tal como ocorreu no Rio de Janeiro e na Bahia em 1832, ano do início do ensino de
farmácia no Brasil (SILVA, 2003, p. 34), conforme previsto no Regimento Interno
da Faculdade Nacional de Medicina do Rio de Janeiro, que seria adotado pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará1.
Também, como unidades precursoras que serviriam de base para posterior criação
de uma escola médica, pois dada a escassez de recursos era mais fácil abrir uma escola de Farmácia ou mesmo Odontologia, as quais depois seriam encampadas como
curso anexos da futura Faculdade de Medicina, como foi o caso de Porto Alegre em
1896 (FIOCRUZ, [2007]).
Ou ainda como uma escola isolada desvinculada de um curso médico como ocorreu
em Ouro Preto em 1839 e em São Paulo em 1898 (SILVA, 2003, p. 34).
O Pará seguiria o último modelo, e no governo Augusto Montenegro, pela Lei
Estadual nº 874, de 23 de outubro de 1903, nasceria a Escola de Farmácia do Pará.
Seria o segundo estabelecimento de ensino superior do estado, regulamentado pela
lei nº 1274, de 1º de fevereiro de 1904, e oficialmente instalado em 11 de fevereiro do
mesmo ano, no Salão da Biblioteca do Serviço Sanitário do Estado (SILVA, 2003).
Tinha como professores efetivos os farmacêuticos Francisco da Silva Miranda, Pedro Juvenal Cordeiro e Giuseppe Martina (SILVA, 2003) e como substitutos, Izidoro Azevedo Ribeiro, Joaquim Vianna e Augusto Pinto (LEITÃO, 1985, p. 35).
A Escola funcionaria no pequeno prédio do Serviço Sanitário localizado em frente
à praça Dom Pedro II, antigo Largo do Palácio. Sendo as instalações bastante precárias, Augusto Montenegro anteviu logo a necessidade de mudança para um local
mais condigno:
Penso que com pouco dispêndio poder-se-á construir em um terreno baldio contíguo aos fundos do palacio do Governo, um pequeno e elegante
edificio destinado a abrigar a novel escola de pharmacia que me parece
veio preencher uma lacuna do nosso ensino e ao mesmo tempo prestar
um serviço relevantissimo a saúde publica (PARÁ. Governador (19011909: Augusto Montenegro) 07.09.1904, p. 55).
No entanto, com a crise do látex tal ideia acabou não saindo do papel, e a Faculdade
de Farmácia seguiria funcionando em condições desfavoráveis. Em 1918 chegou-se
a pleitear uma fusão com a Escola de Odontologia, o que não ocorreu entre outras
coisas pela falta de verba orçamentária (Folha do Norte, 18.01.1918, p. 2).
Em 1925 o curso de Farmácia contava apenas com um “minguado corpo discente”
de apenas 18 alunos (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes)
Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina
261
07.09.1925, p. 59). Com passar do tempo o ensino ia se desenvolvendo da forma
mais heróica possível, baseado principalmente na boa vontade dos professores visto que, as carências materiais eram grandes:
A Faculdade achava-se desprovida de salas apropriadas ao ensino theorico e pratico, sendo tambem muito reduzido o material existente, e
mesmo, em parte imprestavel sendo necessario e inadiavel effectuar taes
obras, além da acquisição de material para o ensino pratico, o que foi feito
com todo zelo sob a inspecção do respectivo director 2.
Mesmo assim, em 1927, o inspetor federal Dr. Paranhos da Silva consideraria que o estabelecimento dispunha de material adequado para o preenchimento de sua função (PARÁ.
Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes) 07.09.1927, p. 43). Entretanto, pela
mensagem do governador do estado Dyonisio Bentes feita apenas um ano depois, fica
óbvio o quanto o inspetor federal fora benevolente com aquela claudicante Faculdade:
A Faculdade de Pharmacia achava-se com seu edificio em pessimas condições de hygiene, as paredes fendidas ameaçando desmoronamento, desprovida de gabinetes e laboratorios, sendo muito reduzido e, em parte
imprestavel, o material para o ensino pratico e mobiliario.
Determinamos providencias a respeito e tudo foi recomposto, offerecendo hoje conforto e hygiene, requisitos indispensaveis aos institutos
de instrução (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes)
07.09.1928, p. 102).
262
Os “requisitos indispensáveis” mencionados pelo governador tiveram um custo total
de 14:850$000, enquanto que o rendimento líquido da Faculdade naquele ano fora
de 10:223$000 (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes, p. 102-3).
Para uma escola que formava poucos alunos, sua manutenção acabava saindo consideravelmente cara para um Estado cujo apogeu econômico já ia longe.
O último governador eleito antes da revolução de 1930, Eurico Valle, confirmaria
esta hipótese, mesmo reconhecendo a importância da Faculdade de Farmácia:
A matrícula atual não excede de 12 alumnos, numero lastimavelmente
insufficiente para a manutenção da Escola. Entretanto, todos sabem que
o Pará, por sua larga extensão e pelos seus nucleos de população, muito
densos e importantes, não possuem pharmacias. No interior, onde as ha,
são na maioria dirigidas por práticos (PARÁ. Governador (1929-1930:
Eurico de Freitas Valle) 07.09.1930, p. 93).
Após a revolução de 1930, o então Interventor Federal Magalhães Barata ciente
da situação frágil pelo qual o curso passava e do poder que detinha no cargo que
ocupava, resolveria, pelo Decreto n° 133, de 12 de fevereiro de 1931, anexar a Faculdade de Farmácia à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará:
O capitão interventor federal do Estado do Pará, por nomeação legal do
governo provisório da República, usando de suas atribuições, e, conside-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
rando que a Faculdade de Pharmácia, mantida pelo Estado, deve obedecer
a uma organização compatível com as exigências pedagógicas modernas;
Considerando que os estabelecimentos de ensino dessa natureza, correspondem melhor a sua finalidade quando anexados as Faculdades de
Medicina, a exemplo do que vem se observando no Distrito Federal e
Estado da Bahia.
Considerando que as condições econômicas atuais do Estado, não comportam
as despesas necessárias ao funcionamento regular da referida Faculdade;
Considerando que a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, em virtude de sua equiparação à Faculdade oficial do país, e do auxílio econômico
que lhe prestam não só o governo do Estado como os vários municípios
do interior, está em condições de manter eficientemente o ensino das
diversas disciplinas que constituem o Curso de Pharmácia.
Considerando, finalmente que a unificação do ensino médico e pharmacêutico se impõe hoje como uma necessidade imperiosa à completa eficiência de ambos os cursos,
Decreta:
Art. 1 - Fica anexada à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará a Faculdade de Pharmácia mantida pelo Estado.
Art. 2 - O acervo da Faculdade de Pharmácia passará à propriedade da
Faculdade de Medicina, à qual competirá a direção científica e econômica
do curso pharmacêutico.
Art. 3 - Serão mantidos como catedráticos, nos termos do art.115 do
Decreto n 16782 de 13 de janeiro de 1925, os atuais professores das matérias privativas do referido curso.
Art. 4 - O governo do Estado auxiliará a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, para manutenção do seu curso e do de Pharmácia, com a
importância de setenta e dois contos de réis (72:000$000) anuais.
Art. 5 - Revogam-se as disposições em contrário.
O Secretário de Educação e Saúde Pública assim o faça executar.
Palácio do Governo do Estado do Pará, 12 de fevereiro de 1931.
Joaquim de Magalhães Cardoso Barata.
Capitão Interventor
(SILVA, 2003, p. 63).
Na ata da 2ª Sessão Ordinária da Congregação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, realizada em 14 de abril de 1931, é declarada oficialmente anexada a
Faculdade de Farmácia à Faculdade de Medicina, havendo a posse dos catedráticos de Farmácia nas cadeiras privativas do referido curso, professores Raymundo
Felippe de Souza, Joaquim Tavares Vianna, Joaquim de Britto Pontes e Antônio
Augusto Carvalho Brasil, respectivamente nas cadeiras de Química Analítica, Farmácia Química, Fármaco-cognose e Química Bromatologica e Toxicológica.
Ao fim do ato solene, o então diretor da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará,
Camilo Salgado congratulou-se com os novos professores empossados “nomes res-
Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina
263
peitados no magistério, tradicionalmente honestos e competentes”, solicitando que
os mesmos continuassem “nesta casa com essa mesma dedicação ao ensino, com
essa mesma honestidade pelo bem e pelo engrandecimento de nossa terra”. O professor Raymundo Felipe de Souza agradeceria em nome dos professores de farmácia prometendo bons esforços de todos. Pediu a palavra então o professor Mário
Chermont que como representante do governo e professor fundador da Faculdade
de Medicina, prometeu todo o auxílio possível “disposto como está o senhor Interventor em amparar a Faculdade” (LEITÃO, 1985, p. 38).
A Faculdade de Medicina cumpriria à risca o combinado, e o número de professores
do Curso de Farmácia seria elevado de apenas cinco para onze, passando os mesmos
a receber o mesmo valor que os professores de medicina (FMCP, 1939c, p. 71).
O governo do Pará, por sua vez, nunca seria muito firme em seus compromissos com
a Faculdade. Se por um lado pagava pontualmente os setenta e dois contos de réis, não
cumpriria o disposto no decreto que passava para a Faculdade de Medicina os bens da
Faculdade de Farmácia, o que incluía o prédio da praça Dom Pedro II (FMCP, 1939c).
Caso tivesse sido repassado à Faculdade de Medicina, conforme o combinado, o prédio poderia ser facilmente alugado, o que renderia pelo menos 500$000 réis mensais.
No entanto, o prédio seria transformado em grupo escolar estadual (FMCP, 1939c).
264
Ressalte-se que desde antes da revolução de 1930, o governo do estado já se tornara devedor da Faculdade de uma soma que alcançava trezentos e vinte e cinco
contos de réis, oriundos de subvenções correspondentes aos anos de 1924 a 1929,
consignadas em lei, porém não pagas (FMCP, 1939c). Isso sem contar as inúmeras
matriculas de alunos a pedido do Estado, cujas taxas escolares também nunca foram
pagas, aumentando a dívida para trezentos e sessenta e um contos oitocentos e trinta
e seis mil réis (361:836$000) (FMCP, 1939c).
Por mais que a Faculdade tentasse resgatar o pagamento das dívidas do Estado, as
propostas sempre eram vetadas (FMCP, 1939c, p. 72). Se já era quase impossível obter
dinheiro nos governos de Souza Castro e Dyonisio Bentes, ambos médicos e fundadores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, que dirá com o Interventor Magalhães Barata, que não tinha nenhum vínculo com o “casarão” da Generalíssimo.
Ainda assim, a Faculdade seguiria em frente seu caminho a duras penas; mesmo
com o pequeno auxílio do governo do estado, “carregar” o Curso de Farmácia não
era tarefa fácil, o dinheiro era escasso, e as despesas, grandes.
Camilo Salgado descreveria bem a situação financeira daqueles anos, que por vezes
terminavam no vermelho:
Dentre os problemas, porém, o que mais avulta para nós, e eu desejava
para isso chamar a attenção dos senhores professores, é o problema
economico.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Por influencia de factores múltiplos que não cabe discutir aqui, poderão
ver que encerramos o nosso exercicio financeiro com um deficit de noventa
e um contos oitocentos e setenta mil e quatrocentos réis (91:870$400).
É certo que este deficit vem ferir tão somente o interesse dos senhores
docentes, porém é tambem certo que, no momento, contamos com seu
espírito sempre renovado de sacrifício e abnegação e que comprehendendo a situação premente, seguros de que se trata de algo passivel de
modificação para melhor, elles, os unicos sacrificados, conjugam esforços,
confiam e esperam que o governo federal nos auxilie com subvenção nesta importância (FMCP, 1936c, p. 6).
Apesar das finanças desfavoráveis, a Faculdade não contribuiu apenas com espaço físico para o curso de Farmácia, cedendo ainda alguns dos seus professores como Antônio
Marçal, Juliano Pinheiro Lyra Sozinho, Antônio Acatauassú Nunes Filho, além de
conseguir também equipamentos novos indispensáveis para as aulas práticas, como
um centrifugador elétrico e uma moderna balança de precisão (FMCP, 1936c, p. 36).
Mesmo com estas pequenas melhorias o curso continuava com um número de alunos
pouco expressivo havendo apenas 13 matriculados no ano de 1935 (FMCP, 1936c, p. 15).
Esta anexação compulsória não duraria muito. Com os ventos da política do estado
soprando em outras direções, em junho de 1937 o novo Interventor Deodoro de
Mendonça suspenderia o pagamento do auxílio ao Curso de Farmácia até dezembro. Ainda que com apenas 3 alunos matriculados no curso de Farmácia naquele
ano e com a verba estadual suspensa, a Faculdade de Medicina continuou pagando
os professores de farmácia até 31 de dezembro (FMCP, 1939c, p. 68).
Em 1938 continuando suspenso o pagamento sem motivo aparente, apesar de a verba
correspondente constar na lei orçamentária, o então diretor da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, Camilo Salgado, solicitou uma reunião com o Interventor para
tratar do assunto buscando uma solução conciliatória (FMCP, 1939c, p. 68).
Neste encontro realizado em 25 de fevereiro, Deodoro de Mendonça justificou o corte do pagamento pelo diminuto número de alunos matriculados no curso, e pela necessidade do estado em reduzir suas despesas ao mínimo possível, dizendo ainda que
baixaria um decreto extinguindo definitivamente o auxílio, visto que se mantivesse
a verba os professores do Curso de Farmácia, que salvo um eram todos funcionários
públicos, incorreriam em acumulação de vencimentos, prática que estava proibida
pelo Decreto Lei número 24, de 29 de novembro de 1937 (FMCP, 1939c, p. 73).
Deste modo, em 9 de março de 1938, o Decreto nº 2951 de forma curta e calcado
nas justificativas já citadas extinguiria o auxílio destinado à Faculdade de Medicina (FMCP, 1939c, p. 69).
A sessão da Congregação de 12 de março de 1938, ficaria marcada por dois fatos:
seria a primeira sem Camilo Salgado, que falecera em 2 de março e que vinha sendo
Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina
265
diretor da Faculdade desde 1922, e assinalava o fim do curso de farmácia no Palacete Santa Luzia.
Transcreve-se abaixo alguns trechos da ata daquela acalorada sessão presidida por
Antônio Porto de Oliveira:
266
Ata da Segunda Sessão Ordinária da Congregação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, realizada no dia 12 de março de 1938, sob a
presidência do Exmo Sr. Dr. Antônio Porto de Oliveira e assistência do
Dr. Lauro Sodré Filho, Inspetor Federal junto a esta Faculdade. Reuniram-se os senhores professores: Gastão Vieira, Dagoberto de Souza, Gabriel Rodrigues de Souza, Manoel Ferreira dos Santos Bastos, José Alves
Dias Junior, Hermógenes Pinheiro, Henrique Esteves, Hilário Gurjão,
Agostinho Monteiro, Carlos Arnóbio Franco, Othon Chateau, Jayme
Aben-Athar, Arthur França, Acylino de Leão, Antônio Acatauassú Nunes Filho, Antonino Emiliano de Souza Castro, Lauro de Magalhães,
Mário Chermont, Raymundo da Cruz Moreira, Pedro de Castro Valente
e Juliano Lyra Pinheiro Sozinho. Compareceram também, os senhores
farmacêuticos: Raymundo Felipe de Souza, Antônio Augusto de Carvalho Brasil, Joaquim de Brito Pontes e Manoel Cardoso da Cunha Coimbra, ficando, porém condicionado o comparecimento à solução imediata
da Congregação sobre o Sustamento do curso de Farmácia. Às quatro
horas da tarde o Sr. Presidente abre a sessão e anuncia seguinte ordem
do dia: 1-Eleição para o triênio 1938/1941. 2-O que ocorrer. O Sr. Presidente consulta à casa se consente na inversão da ordem do dia, para tratar em primeiro lugar da portaria número três (3), de vinte e cinco de
fevereiro findo, da diretoria passada, já aprovada pelo Conselho TécnicoAdministrativo, sobre o desligamento do Curso de Farmácia. S. Excia.
explica os motivos que o levaram a pedir a inversão da ordem do dia, e a
convidar os professores de Farmácia tendo antes consultado juristas, foi
a dúvida sobre a legalidade do ato da Faculdade e até da Interventoria,
querendo assim que a Congregação se manifestasse e partilhasse das responsabilidades decorrentes deste ato. O Sr. Professor Antônio Brasil interpela a presidência sobre os termos do convite, não compreendidos por
S. Excia., e sobre a ilegalidade da inversão dos trabalhos que ele quis
sugerir. O Sr. Presidente explica que o convite foi condicionado a solução
imediata da Congregação, sobre o sustamento do Curso de Farmácia, e a
inversão da ordem do dia foi para saber se os senhores farmacêuticos
podiam tomar parte nos trabalhos da Congregação. Continuando com a
palavra, o professor Brasil faz referência a um ofício que recebeu da tesouraria, de ordem da diretoria, convidando-o a restituir, diz S. Excia., a
insignificante quantia de cinquenta e sete mil réis, prêmio do seguro referente ao mês de janeiro já pago. A presidência explica que a Faculdade
não tem obrigação de pagar seguros particulares, e, o Sr. Professor Brasil
sabia perfeitamente que decorridos 30 dias sem que fosse efetuado o pagamento, a apólice podia caducar e, para que sua S. Excia. não viesse mais
tarde alegar ignorância e culpar a Faculdade, resolveu mandar avisa-lo
para que tomasse as providências que julgasse necessária, assumindo disto inteira responsabilidade, que S. Excia., e os seus companheiros foram
cientificados, da portaria que lhes foi enviada por cópia acompanhada de
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
um ofício, ficando, portanto, ciente S. Excia., que não mais receberia os
vencimentos do mês de janeiro. Encerrada a discussão e deferida a consulta, por unanimidade, a presidência manda o secretário proceder a leitura da Ata da Sessão do Conselho Técnico Administrativo, de 28 de fevereiro, onde se acha transcrita a portaria 3 (três), e, em seguida, expõe
claramente os motivos determinantes da referida portaria, dando a palavra aquém dela quisesse fazer uso. Pede a palavra o professor Felipe de
Souza, e diz que a portaria foi um ato arbitrário da diretoria passada, não
só quanto ao sustamento do Curso de Farmácia, que foi anexado à Faculdade de Medicina pelo Decreto Federal número 133 de 12 de fevereiro de
1931, e anuência do Sr. Ministro de Educação e Saúde Pública, ficando os
professores de farmácia com seus direitos garantidos, como também pelo
não recebimento de seus vencimentos durante as férias, vencimentos esses diz S. Excia. que são sagrados; o Sr. Presidente diz que não vai defender a quem não mais existe e explica que a diretoria passada somente
tomou essa resolução depois de haver conferenciado com o Sr. Interventor Federal, e este haver lhe assegurado que se continuasse o Estado a
auxiliar a Faculdade de Medicina para manutenção do seu curso e o de
Farmácia, incidiria ela na Lei das Acumulações, como aconteceu com a
Escola Prática do Comércio, que por coincidência tinha o mesmo auxilio
da Faculdade de Medicina – setenta e dois contos de réis. Que os professores de farmácia não podiam receber os vencimentos do mês de janeiro,
não só porque esses vencimentos dependiam do recebimento por parte da
Faculdade, do auxílio do Governo do Estado, o que não se deu, como
também o prazo concedido pelo Ministro da Justiça para as desacumulações findou no dia 3 de janeiro. Assim, não podia a Faculdade pagar com
o seu recurso os professores de Farmácia, e se pagasse com o auxílio do
Governo, caso tivesse recebido, incidiram eles na Lei das Acumulações,
porque são todos funcionários públicos, exceto o professor Brito Pontes.
Continuando com a palavra, o professor Felipe de Souza, salienta os direito adquiridos pelos alunos aprovados no curso de habilitação, e que se
já achavam matriculados, como também o dos professores catedráticos de
Farmácia. O professor Arnóbio Franco, aparteia, dizendo que em 1934,
sozinho bateu-se na Congregação contra a participação dos professores
privativos do Curso de Farmácia que não são catedráticos, nos nossos
trabalhos e, nesse sentido, dirigiu uma petição ao Conselho Nacional de
Educação, que, em discussão brilhante e memorável, decidiu por maioria
de votos, que os farmacêuticos não podem tomar posse na Congregação
e no Conselho Técnico-Administrativo da Faculdade de Medicina. Requer ao Sr. Presidente que mande proceder à leitura dessa decisão, que se
acha inserta no Diário Oficial da União de 12 de dezembro de 1934. A
presidência explica conhecer essa decisão, mas sendo o nosso regimento
aprovado posteriormente, em 1935, reconheceu-lhes os mesmos direitos
e regalias dos professores catedráticos da nossa Faculdade. Assim, pede
ao professor Arnóbio Franco, que retire sua proposta. O professor Arnóbio Franco acedendo ao pedido do Sr. Presidente, declarou que o regimento não pode conter disposições contrárias à Lei do Ensino, cujo artigo 308, do Decreto 19852, de 11 de abril de 1931, é claro e taxativo
nesse ponto. Continuando a palavra, o professor Felipe de Souza pede a
Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina
267
268
presidência o Regimento Interno e o Livro da Tesouraria, referente a
recebimento dos Srs. professores, no que foi satisfeito. O Sr. Presidente
observa que o orador está se desviando propositalmente do assunto, com
o fim de obstruir a sessão. O orador protesta, alegando que está defendendo os seus direitos; diz que a Faculdade de farmácia foi fundida à de
Medicina com a anuência do Sr. Ministro da Educação e Saúde Pública e
constitui uma Sociedade Civil com o nome de Instituto de Medicina e
Farmácia, não tendo portanto, a Congregação poderes para extingui-la.
Termina finalmente fazendo um apelo à casa para amparar a Escola de
Farmácia, criada em 1903, e também os seus alunos e professores. Levanta-se o professor Acylino de Leão e em voz clara e pausada, lê os artigos
do nosso Regimento Interno e o Decreto 133 de 12 de fevereiro de 1931,
do então Interventor Major Magalhães Barata. Diz S. Excia., que o Decreto no Artigo quatro estipula a importância de setenta e dois contos de
réis, como auxilio a Faculdade de Medicina para manutenção do Curso
de Farmácia, que se a Faculdade aceitou a anexação foi mediante esse
auxílio, mas se o Governo suspendeu os pagamentos desde junho de
1937 e o Interventor atual, o Sr. Deodoro de Mendonça, baixou o Decreto número 29251 no dia 9 de março de 1938, e publicado no Diário Oficial do dia 10 do mesmo mês, extinguindo esse auxílio e revogando as
disposições em contrário, ipso facto, diz S. Excia., cessaram os nossos
compromissos que estavam cimentados apenas por aquele auxílio. A anexação da Faculdade de Farmácia à de Medicina, exclama S. Excia., não
foi um casamento por amor, e sim mediante o dote de setenta dois contos
de réis, que acabava de ser extinto por decreto. Travam-se, então, acaloradíssimos debates entre S. Excia., e os senhores farmacêuticos. Pede a
palavra o professor Souza Castro e declara preliminarmente que vota
pela aprovação da Portaria; tece, então comentários sobre a situação dos
alunos de Farmácia, que assim, seriam prejudicados com a extinção da
Escola. Sugere, então, um entendimento da Diretoria com os poderes
públicos no sentido de conciliar os interesses comuns. O Sr. Professor
Henrique Esteves aparteia, dizendo que a Faculdade de Farmácia, que é
estadual, não foi extinta, e sim desligada da Faculdade de Medicina, por
assim exigirem as circunstâncias atuais. O Governo, certamente, tomará
prontas providências asseguratórias dos direitos dos alunos, uma vez
que o desligamento se funda no Decreto do Sr. Interventor, que extinguiu o auxílio que dava a Faculdade de Medicina para a manutenção
deste Curso. Propõe então que o desligamento atinja também o primeiro
ano. Pede a palavra o professor Agostinho Monteiro e declara votar pela
aprovação da Portaria, porque o Sr. Interventor Federal, posteriormente,
a 9 de março, baixou Decreto número 2951, que foi publicado no Diário
Oficial no dia 10 do mesmo mês, extinguindo o auxílio concedido a Faculdade de Medicina para manutenção do Curso de Farmácia, reforçando
assim a Portaria da diretoria passada, que é de 25 de fevereiro. Termina
pedindo para a diretoria interceder junto aos poderes públicos pelo amparo da Escola de Farmácia, seus alunos e professores. O Sr. Presidente
conclui: está encerrada a discussão, os Srs. aprovam a portaria e a emenda do professor Henrique Esteves, isto é, que o desligamento atinja também o primeiro ano, queiram conservar-se sentados. Foi unanimemente
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
aprovada. O Sr. Professor Mário Chermont pede permissão para se retirar do recinto alegando ter concorrido para a anexação no tempo da Interventoria Barata; declara retirar-se para não votar contra a Portaria
em homenagem à memória dos seu saudoso e eminente amigo Dr. Camilo Salgado. O Sr. Presidente declara que sendo aprovada a Portaria, é
com pesar que a congregação se vê privada do convívio dos companheiros de longos anos, que reais serviços prestaram à nossa Faculdade, e,
assim, convida os senhores farmacêuticos presentes a deixarem o recinto, por não poderem tomar parte nos trabalhos, o que os mesmos o fizeram. Por proposta do Dr. Ferreira Bastos, todos os membros da Congregação mantiveram-se em pé, em silêncio durante um minuto, em
homenagem a memória do saudoso Diretor Dr. Camilo Salgado. Logo
após passou-se a eleição do novo diretor... (LEITÃO, 1985, p. 39).
Logo ao assumir a Diretoria da Faculdade, Lauro de Magalhães mandaria então lavrar
uma portaria sustando o funcionamento do Curso de Farmácia (FMCP, 1939c, p. 70).
Nem todos casam por amor...
Os professores de Farmácia naturalmente sentiriam-se prejudicados e a questão iria
parar nos jornais, que questionariam a “desanexação sumária” solicitando “...uma
explicação regular do que se fez, com prejuizo de docentes e alumnos, alguns destes
sem recursos para uma forçada e inesperada transferencia para instituições congeneres, de ensino no sul do paiz” (Folha do Norte, 24.03.1938, p. 1).
E daí foi um pulo para o problema atingir esferas superiores chegando até o Diretor Geral de Educação (FMCP, 1939c, p. 70).
Sobraria para Lauro de Magalhães, o recém empossado diretor, defender a Faculdade dos ataques, alegando que o desligamento do Curso de Farmácia havia se dado
por descumprimento do acordo por parte do Estado. E como os professores de Farmácia eram funcionários do Estado, deveriam dirigir suas reclamações ao governo
estadual e não à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP, 1939c, p. 74).
O Diretor alegaria ainda, em longa carta dirigida ao Diretor Geral de Educação,
em 20 de abril de 1938, que caso a Faculdade continuasse a pagar os professores de
Farmácia este fato “...tomaria o aspecto de uma aventura de estrada com escândalo
criminoso, pois importaria em exigir uma acumulação de vencimentos, proibida
pelo decreto-lei n 24, de 29 de novembro de 1937” (FMCP, 1939c, p. 74).
Resquícios da questão ainda incomodariam a direção da Faculdade nos anos seguintes. Em 20 de junho de 1939, o Secretario Geral do Estado Antenor Cavalcante, por ordem do Interventor Federal, solicitaria que a Faculdade entregasse
à Sociedade Civil de Agronomia e Veterinária do Pará todo material pertencente
à extinta escola de Farmácia que estivesse depositado no interior da Faculdade
(FMCP, 1940b, p. 58).
Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina
269
Lauro de Magalhães responderia diretamente ao Interventor Federal em 7 de julho
de 1939 alegando que o referido material não estava simplesmente depositado na Faculdade, mas sim que era propriedade daquela nos termos do artigo segundo do decreto estadual número 133 de 12 de fevereiro de 1931 (FMCP, 1940b, p. 59) e que:
Em segundo logar, quero esclarecer a V. Excia., que o dito material adquirido por este Estado, da extinta Farmácia Pontes, tem aplicação especial ás escolas de Medicina e Farmácia, não sendo justo seja empregado
em outro qualquer mister.
A reabertura da Faculdade de Farmácia é providencia que se impõe, assim que permitam as condições financeiras do Pará, que V. Excia. superiormente administra.
Ora, esse estabelecimento que, enaltecerá a atual administração paraense, será operado, certamente, mediante a anexação do curso farmacêutico
ao de Medicina, como aconselham a lógica e as conquistas científicas
hodiernas.
Assim sendo, a permanência nesta Faculdade do material a que se refere
o ofício nº 1058, é uma imperiosa necessidade, como V. Excia. muito bem
compreende à vista das razões que acabo de expor (FMCP, 1940b).
[...]
270
O Interventor então buscou um parecer quanto à questão diante do Procurador Geral do Estado Lauro Chaves, o qual foi favorável à permanência do material na Faculdade de Medicina tendo em vista os argumentos já expostos (FMCP, 1940b, p. 63).
Em 29 de agosto, o Secretário Geral do Estado, cargo então ocupado por Deodoro
de Mendonça (que fora no ano anterior o Interventor responsável pelo decreto que
interrompeu o auxílio ao Curso de Farmácia) solicitaria, a pedido do Interventor
Federal, que a Faculdade de Medicina fixasse o valor de quanto seria preciso para
o Estado custear a reabertura do Curso de Farmácia, para ser enviado à Comissão
de Orçamento (FMCP, 1940b, p. 60). No que Lauro de Magalhães responderia em
9 de setembro:
Tenho a honra de acusar o recebimento do ofício nº 1511 de 29 de Agosto
p. findo do snr. secretário geral do Estado, solicitando a esta Diretoria,
de ordem de V. Excia. a fixação do quantum preciso para o estado custear
a reabertura do curso de Farmácia.
Reunido o Conselho Técnico Administrativo, ficou o assunto para ser
resolvido posteriormente, em virtude da portaria de 4 do corrente mês,
na qual determina V. Excia. que sejam “adiadas iniciativas e trabalhos que
acarretem despesas” (FMCP, 1940b, p. 61).
[...]
Colocou-se assim uma pedra no assunto durante um ano.
Até que, em 19 de setembro de 1940 o tema voltaria à pauta em uma reunião da
Congregação, que aprovaria por unanimidade o restabelecimento do Curso de Farmácia de acordo com o desejo do Interventor, ficando por enviar as bases para o
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Estado “custear a reabertura do referido curso”. Ao ser notificado do fato o governo do estado limitou-se a “agradecer a comunicação do restabelecimento do curso
de farmácia, para o que auguro as melhores prosperidades” (FMCP, 1941, p. 57).
Lauro de Magalhães rapidamente tentaria esclarecer o mal entendido referindo
que a Congregação da Faculdade apenas havia concordado com o restabelecimento
do Curso de Farmácia,
...dependendo o seu funcionamento da aprovação por parte do governo,
das bases para o Estado custear a reabertura do referido curso e que
serão enviadas para prévio exame, quando V. Excia. julgar oportuno
(FMCP, 1941, p. 58).
Em 4 de outubro de 1940 o Secretário Geral do Estado, Deodoro de Mendonça, solicitaria o “envio urgente das bases para o Estado custear a reabertura do referido
curso, para as providências cabíveis” (FMCP, 1941, p. 58).
As ditas bases seriam encaminhadas por Lauro de Magalhães em 11 de novembro
no documento abaixo transcrito:
BASES PARA O RESTABELECIMENTO DO CURSO DE FARMÁCIA
A FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ
- considerando o empenho do Governo do Estado no restabelecimento
do curso de Farmácia;
- mas atendendo que a situação econômico-financeira deste Instituto não
comporta o funcionamento daquele curso a expensas próprias; e
- considerando o fato lamentavel, verificado desde 1938, da interrupção
do dito curso, ocorrencia aliás comunicada, como era devido á autoridade
federal competente;
- considerando que esta interrupção foi motivada pela falta de pagamento, de parte do Estado, desde Junho de 1937, do auxilio previsto no decreto nº 133 de 12 de fevereiro de 1931, auxilio esse afinal extinto por força
do decreto nº 2951 de 9 de março de 1938;
- considerando cumprir evitar, a todo transe (desde que se leve a cabo o
restabelecimento objetivado), nova interrupção, o que deixaria mal este
Instituto perante a opinião pública, perante as autoridades competentes
federais, e perante a mocidade que tem o direito de exigir o cumprimento
da dívida reconhecida com a matrícula de estudantes e que somente será
resgatada com a ajudicação dos gráus que almejam, sem interrupções
forçadas no curso;
- considerando mais que o auxílio de 24:000$000, consignado no orçamento do Estado a partir de Janeiro de 1940 está em atrazo desde Agosto;
- considerando, além disso, a necessidade imperiosa de despesas urgentes, exigidas para o restabelecimento do curso em questão; e
- considerando a necessidade de regularisar a situação do patrimônio da
Faculdade;
RESOLVE apresentar ao Governo do Estado as seguintes sugestões, visando o funcionamento normal do curso de Farmácia:
Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina
271
I - o Estado pagará, antes do restabelecimento do curso de Farmácia, a
quantia de 74:087$000, divida reconhecida em razões de veto ao projeto
de lei n 143 de 30 de Novembro de 1936, da extinta Assembléia Legislativa; bem assim, a importância de 25$000.000 restantes do auxilio de
1937 que deixou de ser pago de Junho deste ano até a data de sua extinção (9 de março de 1938), período em que nada obstante, a Faculdade
pagou integralmente aos professores do curso de Farmácia, enquanto
estiverem no exercício de suas funções e atendeu as outras despesas decorrentes do funcionamento das aulas;
II - o Estado pagará, anualmente sob forma duodecimal o auxílio de
100:000$000;
III - desde que o funcionamento do curso de Farmácia com a consequente obrigação de pagamento pontual do professorado respectivo, depende
da normalidade do recebimento mensal do auxilio referido no Item II, o
estado assumirá o compromisso formal de efetuar mensalmente o pagamento desse auxilio, a fim de que a Faculdade não se veja na dura contingencia de novamente interromper este curso;
IV - o Estado facilitará, obedecidas as exigências legais, a transferencia,
para o patrimônio da Faculdade, do prédio em que funcionou a Escola
de Farmácia, sito á praça Pedro II (antigo Largo do Palácio), esquina da
travessa da Vigia e onde funciona hoje o Grupo Escolar Ruy Barbosa,
transferencia esta prevista no artigo segundo do decreto 133, de 12 de
fevereiro de 1931 (FMCP, 1941, p. 60).
272
Diante das condições expostas pela Faculdade, o Estado responderia em 14 de novembro de forma lacônica: “Arquive-se, visto não permitirem as condições atuais
do erário o restabelecimento do curso” (FMCP, 1941, p. 61).
Enterrava-se definitivamente o assunto. A Faculdade de Farmácia só viria a ressurgir pelas mãos dos próprios farmacêuticos em 16 de junho de 1941, desta vez
sem nenhuma participação da Faculdade de Medicina. Paradoxalmente talvez por
falta de apoio financeiro ela só seria instalada efetivamente bem mais tarde, em
primeiro de janeiro de 1946, em um prédio doado pelo Governo do Estado na Generalíssimo esquina com a rua Braz de Aguiar (SILVA, 2003, p. 75).
NOTAS
1
“Art. 2 – A Faculdade manterá os seguintes cursos:
a) curso medico
b) curso de obstetrícia.
Paragrapho único – Quando lhe convier e os seus recursos o permittirem
poderá iniciar os cursos de pharmacia, odontologia, enfermeiros e microscopista.” (FMCP, 1924b, p. 7).
2
O Diretor na época era Joaquim Vianna. (PARÁ. Governador (1925-1929:
Dyonisio Ausier Bentes) 07.09.1928, p. 43).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
17
Colação de grau:
Cerimonial e formandos
até 1950
273
274
Placa da turma dos médicos de 1928.
As determinações a respeito da conclusão do curso de medicina, como defesa de
tese e grau de doutor em medicina, assim como da solenidade de outorga do grau
na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará encontram-se nos capítulos XVI,
XVII e XVIII do primeiro estatuto da instituição, datado de 24 de fevereiro de
1921 e assinado pelo Barão de Anajás (FMCP, 1933a, p. 42-47).
O estatuto, decerto adaptado da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, como
também o era o Regimento Interno, detalhava os vários aspectos relacionados à
formatura, como a publicação na imprensa e na secretaria da Faculdade da relação
dos colandos, (“candidatos ao gráo de Doutor”), a convocação de todos os professores catedráticos, substitutos, honorários e convidados (“pessoas notáveis pelos seus
títulos científicos, ou literários, como pela posição social”), para estarem presentes
“no dia e hora designados, na sala destinada para a colação de gráo”, ocasião em
que os graduandos seriam “admittidos pelo secretário que fará a chamada de todos,
declarando os nomes dos que se acharem presentes”, sendo ainda permitido aos
graduandos “dar todo realce a solenidade” (FMCP, 1933a, p. 47).
A sessão começaria com a leitura das notas de aprovação nos exames finais, feita
pelo secretário da faculdade, sendo em seguida chamados os graduandos, “cada um
por sua vez, para receberem a investidura”. O primeiro que a recebesse, seria o responsável por fazer a promessa, de conformidade com os dizeres da fórmula (o juramento de Hipócrates), constante do “regulamento interno da Faculdade e seguida
nas demais Faculdades da União, com os outros alunos repetindo os dizeres1.
O diretor, ao conferir o grau a cada aluno, colocava-lhe no dedo o anel simbólico2 e
na cabeça a borla da Faculdade e o capelo. Neste momento pronunciaria “a formula
adotada nas mesmas faculdades da União”, que era a seguinte:
Lêde e meditai as obras de Hipócrates; regulai vossa vida pela sua e os
homens cobrirão de bênçãos o vosso nome. Recebei este anel como simbolo do gráo que vos confio. Ide, podeis praticar e ensinar a Medicina.3
Ressalte-se que durante a colação de grau, “os lentes e espectadores”deveriam permanecer de pé e em silêncio. “Feita a collação de grau”, um dos novos graduandos anteriormente escolhido pelos colegas, “recitará um discurso congratulatório”,
“previamente apresentado ao Director, que eliminará o que n’elle houver de inconveniente”. A este discurso responderia com um pronunciamento, o paraninfo, “que
será um lente eleito pelos referidos graduandos” (FMCP, 1924b, Art. 249, p. 47).
O graduando que por motivo justificado, “a juizo do Director”, não pudesse comparecer à cerimônia, receberia o grau em uma nova data, a ser escolhida pelo diretor,
devendo haver a presença de três professores no evento.
Observa-se que a data da outorga do grau não era definida, não havendo, portanto,
nenhuma menção ao 8 de dezembro, data que tornar-se-ia, posteriormente, tradiColação de grau: cerimonial e formandos até 1950
275
cional, com regularidade a partir de 1934, sendo adotada pela grande maioria das
turmas da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
A primeira colação de grau promovida pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do
Pará aconteceu no dia 16 de abril de 1925, na secretaria da Faculdade, e não foi de
medicina. Foi de enfermeiras obstetrizes, curso ministrado, também, pela Faculdade de Medicina. De acordo com a ata lavrada pelo Dr. Olympio da Cardoso da
Silveira, na qualidade de secretário, na referida data,
depois de satisfeitas as exigências da lei do Ensino Superior, compareceram as senhoritas Maria Magdalena Bello da Conceição e Angelina Rebello de Souza e perante os professores Doutores Agostinho de Menezes
Monteiro, Renato Chaves da Silva e Souza e Hermógenes Pinheiro, o
Excellentissimo Senhor Doutor Camillo Henrique Salgado, Director da
Faculdade, conferiu-lhes o gráo de Obstetriz4.
276
No mesmo dia, às nove horas, também na secretaria da Faculdade, na presença dos
professores Doutores Acylino de Leão Rodrigues, Dagoberto Rodrigues de Souza
e Oscar Pereira de Carvalho, o Doutor Camilo Salgado, na qualidade de Diretor
da Faculdade, confere o “gráo de doutor em medicina a Antonio Magno e Silva e
Bianor Martins Penalber “depois de terem os referidos doutorandos prestado o juramento exigido e o Doutor Director pronunciado as palavras usadas nestas solemnidades”. Estes, portanto, foram os primeiros médicos formados pela Faculdade
de Medicina e Cirurgia do Pará.
A colação seguinte aconteceria em 18 de abril de 1925, também de enfermeiras
obstetrizes e de doutores em medicina. Desta feita receberam o grau de doutor em
medicina: Honorato Remigio de Castro Filgueiras e Hippolito Carelli,
perante os professores Doutores Antonio Remigio de Castro Filgueiras,
paraninpho, Gabriel Rodrigues de Souza, Renato Chaves da Silva e Souza, Francisco de Souza Pondé, João Prisco dos Santos, Argemiro Orlando
Pereira Lima, Hermógenes Pinheiro, Deusdedit Coelho e Oscar Pereira
de Carvalho, o excellentissimo senhor Director Doutor Camillo Henrique Salgado, depois de terem os doutorandos prestado o juramento de
estylo, o Doutor Director depois de proferidas as palavras usadas nestas
solemnidades, conferiu-lhes o gráo de doutor em medicina.
Em 10 de janeiro de 1926, às 9 horas, no salão nobre do Hospital da Santa Casa
de Misericórdia do Pará, ocorreria nova formatura, desta vez com um caráter mais
solene. Na ocasião colaram o grau os doutorandos Jorge Alves Maia, Antonio Barbosa Rodrigues, Antonio Siqueira Mendes, Izauro Gonçalves da Costa e Manoel
Tertuliano de Cerqueira,
perante os professores Argemiro Orlando Pereira Lima, paraninpho da
turma, Oscar Pereira de Carvalho, Acylino de Leão Rodrigues, Américo
Campos, Renato Chaves, Prisco dos Santos, Raymundo Matos Cascaes,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Dagoberto Souza, Amanajás Filho, Jayme Jacyntho Aben-Athar e Suplicio Ausier Bentes, Doutor Lauro de Almeida Sodré (filho), Inspector do
Ensino, Doutor Dionysio Bentes, Governador do Estado, representante
do Doutor Rodrigues dos Santos, Intendente de Belém, e do Snr. Arcebispo, autoridades federais, alumnos da Faculdade, representantes da
imprensa e muitas pessoas gradas, o Snr. Dr. Camillo Henrique Salgado,
Director da Faculdade, abriu a sessão, mandando proceder a chamada,
pelo secretario, dos doutorandos, que depois de haverem prestado o Juramento de Estylo e o Snr. Doutor Director proferido as palavras usadas
nestas solemnidades, foi-lhes conferido o gráo de doutor em medicina.
Ainda de acordo com a ata,
O Senhor Doutor Camillo Salgado, de pé, com voz clara e firme declarou
que em nome do Governo da Republica e na qualidade de Director da
Faculdade, concedia-lhes o diploma, afim de que podessem exercer a sua
profissão nos Estados Unidos do Brasil.
Após esta manifestação o Diretor passaria a presidência da sessão ao Governador
do Estado,
que convidou para da mesma fazerem parte o Snr. Cel Manoel Henrique,
commandante da 8ª Região, Dr. Luiz Estevam de Oliveira, Juiz seccional,
e representantes do Snr. Rodrigues dos Santos, Intendente de Belém, e
do Snr. Arcebispo.
Sua Excia. Snr. Dr. Dionysio Bentes deu a palavra ao doutorando Izauro
Gonçalves da Costa, orador da turma, e depois ao illustrado professor
Orlando Lima, paraninpho da turma.
Ao encerrar a sessão, o eminente Governador e illustrado professor de
phisiologia desta Faculdade, proferio empolgante discurso, abordando
com proficiencia e profundo conhecimento, os pontos mais modernos da
medicina; explicou o papel que exercem no nosso organismo as glandulas endocrinas e seus hormonios – thymus, thyreoide, parathyreoide,
capsulas supra-renais, etc – e que a medicina tinha ainda muito que progredir, dando de tudo explicações claras e positivas.
Ao perorar, fez Sua Excellencia, uma bellissima saudação aos jovens medicos incitando-os a praticarem a medicina de accordo com os conselhos
de Hyppocrates.
As ultimas palavras do eminente homem publico, honra e gloria do Pará
e uma das mais radiantes esperanças do Brasil, foram abafadas pelos assistentes, de pé, por prolongada e estridente salva de palmas5.
Em 7 de agosto de 1926 aconteceria nova cerimônia de colação de grau, com a
formatura de Antonio Ferro e Silva. Talvez evidenciando, naqueles primeiros tempos, uma certa falta de estruturação administrativa, onde os alunos iam recebendo
seus diplomas à medida que iam concluindo seus cursos, sem uma programação
pré-determinada, naquela data, na Secretaria da Faculdade, perante os professores
Américo Vitruvio Gonçalves de Campos, paraninfo, Mario Midosi Chermont, Antonio Marçal, Othon Chateau e Renato Chaves de Silva e Souza, o Diretor Camilo
Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950
277
Salgado concede o gráo de médico (grifo nosso) ao acima citado. Ressalte-se que
possivelmente por não ter o aluno apresentado uma tese ao final do curso, não lhe
foi outorgado o grau de doutor em medicina.
Em 8 de janeiro de 1927, aconteceria a colação de grau de Raymundo Ferro e Silva,
Almir Pedreira e Raymundo da Silva Magno, todos doutores em medicina. Presentes os professores Acylino de Leão Rodrigues, paraninfo da turma, Renato Chaves
da Silva e Souza, Antonio Remigio de Castro Filgueiras, Dagoberto Rodrigues de
Souza e Jayme Jacintho Aben-Athar. A cerimônia foi presidida pelo Dr. Acylino de
Leão, na qualidade de vice-diretor, em virtude da impossibilidade do comparecimento do Diretor, o Dr. Camilo Salgado.
Da ata, transcrevemos:
O Snr. Doutor Acylino de Leão pede a palavra e durante cerca de trinta minutos, em linguagem firme e eloquente dissertou sobre o papel do medico
que inicia a clinica, mostrando-lhes o caminho que deveriam trilhar e tambem sobre o movimento da medicina moderna, alargando-se minunciosamente com argumentos convinventes, principalmente, á cerca da prophilaxia e hygiene do paludismo sobretudo no valle do Amazonas. Ao terminar
sua bella oração, o illustrado professor foi enthusiaticamente palmeado.
278
Nova formatura aconteceria em 29 de março de 1927, quando o Diretor, Dr. Camilo Salgado, na secretaria da Faculdade, conferiria o grau de doutor em medicina
aos seguintes concluintes: José Collier Cavalcante, Waldemar de Freitas Ribeiro,
Aguinaldo Alves Dias e Edgard Bentes Rodrigues, paraninfados pelo professor
Acylino de Leão e na presença dos professores Renato Chaves, Antonio Remigio
Filgueiras, Américo Campos e Deusdedit Coelho Duarte.
No final do mesmo ano, precisamente no dia 31 de dezembro de 1927, perante a Congregação e a presença do Dr. Lauro de Almeida Sodré, inspetor do Departamento
Nacional do Ensino, sem menção do local, aconteceria a cerimônia de formatura de Sebastião Francisco de Mello Junior, Theodoro Maria de Souza Aranha, Edgardo Roxo
Pereira e Roberto Monteiro Lopes Guimarães. O paraninfo da turma foi o professor
Arthur Pinto França que juntamente como orador da turma, o doutorando Sebastião
de Mello Jr., proferiram “eloquentes discursos allusivos ao ato”. O Dr. Camilo Salgado
“fez-lhes depois brilhante saudação, incitando-os a trilharem sempre o caminho do dever profissional e a praticarem a medicina seguindo aos caminhos de Hyppocrates”.
Nova colação de médico (grifo nosso) aconteceria em 25 de fevereiro de 1928. Na secretaria
da Faculdade, às 9 horas, receberia o grau Petronio José de Souza. Presentes os professores Deusdedit Coelho, Américo Campos, Remigio Filgueiras e Mario Midosi Chermont.
A cerimônia seguinte ocorreria em 29 de dezembro de 1928, com a formatura de Gentil Eloy
de Figueiredo, a quem o Diretor conferiu o grau de doutor em medicina. Presentes os professores Mario Midosi Chermont, Deusdedit Coelho, Antonio Marçal e Amanajás Filho.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Em 31 de dezembro do mesmo ano aconteceria nova formatura. Às 10 horas, na
Secretaria da Faculdade, na presença dos professores Mario Midosi Chermont, Amanajás Filho, Antonio Marçal e Deusdedit Coelho, o Dr. Camilo Salgado, na qualidade
de Diretor, confere o grau de doutora em medicina à Olga Maria Paes de Andrade6,
que se constitui, assim, na primeira mulher a formar-se na referida Faculdade.
No dia 5 de janeiro de 1929, às 8 horas, também na secretaria da Faculdade, ocorreria a formatura de Carlos Hygino da Silva, a quem é conferido o grau de doutor
em medicina, na presença dos professores Jayme Aben-Athar, Renato Chaves, Hermógenes Pinheiro e Francisco Pondé.
O doutorando Bessa de Oliveira recebe o grau de doutor em medicina em 21 de
março de 1929, na presença dos professores Antonio Marçal, Remigio Filgueiras
e Oscar de Carvalho.
Em 31 de março de 1929 acontece uma colação de grau de medico cirurgião (grifo
nosso). Realizada às 8h30, na secretaria da Faculdade, na presença dos professores
Antonio Marçal, Oscar de Carvalho, Deusdedit Coelho e Othon Chateau, o Diretor,
Dr. Camilo Salgado, confere o grau de médico cirurgião aos doutorandos João da
Silva Novaes, Cândida Augusta de Jesus e Silva e Matheus Lydio Pereira de Souza.
A cerimônia seguinte, em 3 de abril de 1929, também pela manhã e ainda na secretaria da Faculdade seria para a outorga do grau de doutor em medicina aos doutorandos Edgard Antunes Salgado e Antonio Simões Pereira. Presentes os professores
Argemiro Orlando Lima, Higino Amanajás Filho, Camilo Salgado, Porto de Oliveira
e Ferreira Bastos. A cerimônia foi presidida pelo vice-diretor Dr. Acylino de Leão.
Em 11 de outubro de 1929, às 16 horas, aconteceria a cerimônia de formatura da
doutoranda Eugenia Ferreira de Paiva Hollanda. Na secretaria da Faculdade, com
a presença dos professores Oscar de Carvalho, Remigio Filgueiras, Antonio Marçal e Ferreira Bastos, o Dr. Camilo Salgado conferiu o grau de doutor em medicina
à referida doutoranda.
Nova formatura acontece em 18 de dezembro de 1929. Desta feita receberam o
grau de doutor em medicina João Siqueira Mendes, Raymundo Avertano Barreto
da Rocha e Estrella Zagury Benayon. Presentes os professores Othon Chateau,
Antonio Marçal e João Prisco dos Santos; o Diretor, Camilo Salgado.
No ano seguinte, 1930, em 26 de maio, acontece a colação de grau de José Theophilo Ferreira, na presença dos professores Othon Chateau, Antonio Marçal e
Deusdedit Coelho. Camilo Salgado, como Diretor, outorga ao doutorando o grau
de doutor em medicina.
A cerimônia seguinte realiza-se em 11 de dezembro de 1930. Naquela data é outorgado o título de médico cirurgião a Djalma José Pereira7 Ferreira da Cruz. Presentes
Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950
279
o professores Antonio Marçal, Othon Chateau e Castro Valente, além do Diretor
Camilo Salgado.
No mesmo mês, dia 31, a colação de grau realiza-se no salão nobre da Faculdade de
medicina, sendo esta a primeira vez que o referido salão é mencionado como local
de formatura8. Da ata lavrada pelo secretário Dr. Olympio da Silveira:
No salão nobre da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, reuniu-se a
Congregação para a solemne colação de gráo dos doutorandos que concluiram o curso. Ás nove horas da manhã o senhor Dr. Camillo Salgado,
Director da Faculdade, comunica aos presentes o fim da reunião e passa
a presidencia ao Snr. Abguar Bastos, representante official do excellentissimo senhor capitão Joaquim Magalhães Cardoso Barata, digno interventor militar no Estado do Pará.
280
Os formandos eram: Oscar Pereira de Miranda, Lucidea Lage Lobato, Anísio de
Mendonça Maroja, Epaminondas de Paiva Menezes, Armando Bordallo da Silva,
doutores em medicina, e Alexandre Magno de Araujo e Lucilo Fender médicos cirurgiões (grifo nosso). O doutorando Oscar de Miranda, “em voz alta e pausada,
proferio o juramento da lei; em seguida os demais doutorandos, um a um, com a
mão espalmada sobre o livro diziam: ‘Assim o prometto’”. Em seguida o Sr. Abguar
Bastos deu a palavra ao professor Amanajás Filho, que como paraninfo da turma:
“prophere eloquente peça oratória”. Posteriormente subiu a tribuna o doutorando
Armando Bordallo da Silva, orador da turma, “que ao terminar o seu discurso foi
calorosamente aplaudido”. O representante do Interventor “congratula-se com os
novos medicos pelo termino de seu curso, desejando-lhes toda sorte de felicidades
na espinhosa e sublime carreira que abraçaram”.
Em 10 de janeiro de 1931, na secretaria da Faculdade, às 15 horas, acontece a colação de grau de médico cirurgião de Oseas Santos Antunes e Epaminondas Anselmo
Figueira de Mello. É registrada a presença dos professores Antonio Marçal, Castro Valente, Deudedit Coelho, além do Diretor, Camilo Salgado.
Em 21 de março de 1931 há registro da colação grau de farmacêuticos, acontecida
na secretaria da Faculdade.
No Salão Nobre do Hospital da Santa Casa, em 24 de dezembro de 1931, às 10 horas, ocorre a cerimônia solene de colação de grau de doutores em medicina e de médicos cirurgiões, que terminaram o curso médico em outubro. A Congregação, sob
presidência do Diretor, Camilo Salgado. Entre os presentes Abguar Bastos, representante do major Magalhães Barata, interventor federal no Estado, Dr. Angelino
Lima, representante do Prefeito, padre Leandro Pinheiro, cônego Antonio Lobato,
representante do vigário capitular, 1º tenente Álvaro Alves Pinto, representante
do comandante da 8ª Região Militar. Receberam o grau de médicos cirurgiões
Roberto Candido Pereira, José Fernandes Ramos, Emilio Bastos Fiuza de Mello,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Renato Augusto de Oliveira, Annibal Celestino Teixeira e Eduardo Valente de Azevedo Ribeiro; de doutor em medicina Honorato de Albuquerque Neves. O orador da
turma foi o doutorando Eduardo Azevedo Ribeiro, “que proferiu um bem elaborado
discurso, ao qual respondeu o professor Antonio Marçal, paraninpho da mesma, em
brilhantissima oração, tendo, ao terminar, recebido calorosos applausos”.
Em 3 de outubro de 1932 a cerimônia solene acontece no salão nobre da Faculdade
para colação de grau de médicos e farmacêuticos, “achando-se o salão repleto de familiares, medicos, advogados, estudantes e representantes de todas as classes sociais”.
A sessão foi iniciada às 21 horas pelo Diretor da Faculdade, que se manifestou
dizendo que havia cem anos, naquela data, os cursos cirúrgicos já existentes no
Brasil passaram a ser denominados Faculdades de Medicina. E que em comemoração àquela data, em todos os estados onde havia Faculdades de Medicina, haveria
colação de grau dos médicos daquele ano letivo, sendo extensivo aos farmacêuticos, por deliberação do Ministério da Educação e Saúde Pública. A presidência dos
trabalhos foi em seguida passada ao Dr. Clementino de Almeida Lisboa, secretário
geral do Estado e representante do major Magalhães Barata, interventor do Estado. Estavam presentes, também, Abelardo Conduru, prefeito municipal, Dr. Nilo
Penna, representante do Desembargador Raymundo Nogueira de Faria, chefe de
policia, Luiz Estevam de Oliveira, juiz federal, Genuino Amazonas de Figueiredo,
Diretor da Faculdade de Direito, Lauro Sodré Filho, inspetor federal do ensino,
alem de Camilo Salgado e Olympio da Silveira. O juramento foi prestado pelo doutorando Olavo Martins Leôncio.
A nova turma era composta por Amyntor Virgolino do Amaral Basto, José Gutierrez Garcia Filho, Pedro Nicolau Gonçalves dos Santos Rosado, Mario de Oliveira
Salgado, Scylla Lage da Silva, Julio Felippe Baças, Luiz Joaquim Barbosa, Raymundo Valle Paiva, José Thomas Nabuco de Oliveira Filho, João Ismael Nunes de
Araujo, Ignácio Moura Filho e Cassio Rodrigues da Cunha. O paraninfo foi o professor Acylino de Leão, “que proferio brilhante discurso, descrevendo as phases em
que se divide a medicina, desde o embryonarismo das epocas recuadas até a quase
certeza scientifica do momento que passa e fazendo outras series de considerações
em torno da cerimonia”. Não há referência de discurso de orador da turma.
No dia seguinte, 4 de outubro, na secretaria da Faculdade, colaria grau de médico
José Valentim de Araujo. Em 7 de outubro do mesmo ano, seria a formatura de
Benedicto Cavalleiro de Macedo Klautau, José Mariano Cavalleiro de Macedo e
Chardival Monteiro Figueira.
A formatura seguinte seria realizada em 16 de dezembro de 1933, às 20 horas,
solene, no salão nobre da Faculdade e conjunta com o curso de Farmácia. Aberta
a sessão, o Diretor da Faculdade passa a presidência ao desembargador Genuino
Amazonas de Figueirdo, representante do major Magalhães Barata, Interventor
Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950
281
Federal. Presentes o coronel Costa Araujo, comandante da Região Militar e seu
ajudante de ordens, o representante do sr. Abelardo Conduru, prefeito municipal e
o sr. Loris Olympio Correa de Araujo, inspetor federal interino do ensino. O juramento foi prestado pelo doutorando Ferdinando Rapisardi dos Santos. Os demais
formandos foram: Orion do Couto Loureiro, Alderico de Oliveira Costa, Jesuíno
de Souza Lins, Humberto Furtado de Oliveira Cabral, Humberto Veiga Franco,
Astrogilda Mesquita Assis, Raymundo Scylla Castro de Andrade, Moacyr Pinto
da Costa e Armando de Mendonça Maroja. Destaque-se que Alderico de Oliveira
Costa e Armando de Mendonça Maroja colaram grau de “doutor em medicina”. O
orador da turma foi o doutorando Raymundo Scylla Castro de Andrade; o paraninfo, o professor Hygino Amanajás Filho. Desta data em diante não há mais menção
de outorga do grau de “doutor em medicina”.
Em 23 de dezembro de 1933, acontece a formatura de Inalio Martins de Castro,
como “médico”, realizada na secretaria da Faculdade.
No dia 19 de janeiro de 1934, na secretaria da Faculdade, foi conferido o grau de
médico para Mario Rodrigues Ferreira. Nova sessão acontece em 31 do mesmo
mês, quando foi conferido o grau de médico para Menandro Rodrigues Tapajós.
282
A sessão seguinte foi solene e realizada no salão nobre da Faculdade em 8 de dezembro de 1934 para a colação de grau de médico. É a primeira vez que se realiza
nesta data, que posteriormente seria considerada tradicional para as cerimônias de
colação de grau do curso de medicina. Aberta a sessão às 21 horas pelo Dr. Camilo
Salgado, a presidência da mesma foi passada para o major Magalhães Barata, Interventor Federal do Estado. Presentes ainda, major Joaquim Aguiar, chefe de polícia,
representantes do comandante da 8ª Região Militar, do Inspetor do Arsenal de
Marinha, do prefeito municipal e o Dr. Lauro Sodré Filho, inspetor federal do ensino. Prestou juramento pela turma o doutorando Fernando Martins Mendes. Os
formandos eram: Abelina Garcia Rocha, Renato Augusto de Moura, Jacintho Moreira Netto, Abrahão Antonio José, Álvaro Fernando do Nacimento, Aluisio Mendonça da Fonseca, Almir Serra Martins Menezes, Arnaldo Correa Prado, José de
Souza Macedo, Emygdio Pedreira de Albuquerque, José Chaves Muller e Alberto
Carneiro da Silva. O orador foi o doutorando Arnaldo Correa Prado; o paraninfo,
o professor Antonio Acatauassú Nunes Filho.
Somente haveria nova formatura de médicos em 8 de dezembro de 1935, também
conjunta com a Farmácia. Solene, no salão nobre da Faculdade, com a presença do
Dr. Lauro Martins, representante do Dr. José Carneiro da Gama Malcher, governador do estado, do comandante Adalberto Cotrim Coimbra, inspetor do Arsenal
de Marinha, do Dr. Oswaldo Orico, diretor geral do Ensino Público, de representantes do comandante da 8ª Região, do capitão dos portos e do prefeito municipal e
o Dr. Lauro de Almeida Sodré Filho, “inspector federal junto á Faculdade”. O jura-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
mento de praxe foi prestado pelo doutorando Albino Figueiredo Junior. Os demais
formandos eram: Alberto Moacyr Benayon, Milton Cordovil, Milton Luna Lobato,
Ruy Penna Ponde, Leônidas de Mello Deane, Gladstone de Mello Deane, Aristides de Souza Rodrigues, Haydée Serrão de Castro, Francisco Manoel da Cunha
Cerqueira, Raymundo de Castro Menezes Pereira Carneiro, Bettina Ferreira9 de
Souza, David Gabbay, Lacy Faria Ribeiro e Paulo Bentes de Carvalho. O orador foi
o doutorando Gladstone de Mello Deane; o paraninfo foi
O illustrado professor Lauro Magalhães [...] que pronunciou bello discurso allusivo á cerimonia, que, ao terminar, foi calorosamente applaudido. Ás 18 horas, após a entrega do premio ‘Raul Leite’ pelo representante
do Chefe de Estado ao sr. Dr. Leônidas de Mello Deane, o Sr. Dr. Director, depois de dirigir palavras de encorajamento aos novos médicos e
pharmaceuticos e de profundo agradecimento aos que se dignaram comparecer a essa cerimônia, encerrou a sessão10.
283
Foto 60: Diploma da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará na década de 1930.
Fonte: Museu da Santa Casa.
Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950
Nos dias 10 e 31 de dezembro do mesmo ano, acontecem as formaturas de Lucival
Lage Lobato e João Joaquim Ramos Ribeiro, respectivamente, sendo a cerimônia
de ambos realizada na secretaria da Faculdade.
As formaturas seguintes seriam realizadas em 18 e 29 de janeiro de 1936, com a colação
de grau de Abílio Maranhão Gonçalves e Waldimir Alves Sant’Anna. Em 13 de março
acontece a formatura de Nizomar Pinheiro de Azevedo e Élson Damasceno Lopes.
Em 8 de dezembro de 1936 acontece a sessão solene de colação de grau de médico
“aos sextanistas de 1936”, em “sessão solemne da Congregação”.
Conforme a ata:
Ás vinte e meia horas, o Snr. Dr. Camillo Salgado, Director da Faculdade,
abrio a sessão, ficando ladeado pelos representantes do snr. Dr. José Carneiro da Gama Malcher, Governador do Estado, do Exmº Snr. D. Antonio de Almeida Lustosa, Arcebispo do Pará e pelos doutores Lauro Sodré
Filho e Olympio da Silveira, inspector federal de ensino e secretario da
Faculdade, respectivamente.
284
Pela turma, leu o juramento de praxe o doutorando Percy Monteiro de Menezes.
Os formandos: Wenceslau Botelho, Hermínio Pessoa, Emilio Nasser, Raymundo
Ferreira de Oliveira, Francisco Baptista de Lima, José Ribamar Serra, Francisco
Rosario Conte, Adalberto Bastos de Menezes, Celso de Mattos Leão, Nelson Correa
de Oliveira, Candido Pereira da Costa, Augusto Olívio Chaves Rodrigues, José Linhares de Paiva, Flavio de Britto Pontes, Carlos Soares de Mello, Clovis Eugenio de
Vasconcellos Chaves, Affonso Rodrigues Filho, Danilo de Aguiar Corrêa, Armando
Cardoso Pingarilho, Saint-Clair Leoncio Martins, José Amazonas Palhano, Ary Tupinambá Penna Pinheiro, Rubens da Silveira Britto e Diniz Oeiras Botelho. O orador
da turma foi o doutorando Hermínio Pessoa e o paraninfo o professor Jayme Jacintho
Aben-Athar. O Prêmio Raul Leite foi conferido ao doutorando Hermínio Pessoa.
Em 12 de dezembro colaram grau, na secretaria da Faculdade, Odmar Rangel
Barata, Adolpho Roessing e Felipe Nery Guimarães. Em 31 de dezembro, Eliezer
Pará-Assú da Serra Freire.
A ata de formatura seguinte registra: “sessão solemne da Congregação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, realizada no dia 8 de dezembro de 1937, para a
collação de gráo de medico, phamaceutico e enfermeira obstetrica”.
Sessão aberta pelo Diretor da Faculdade às 20 horas, com a presença de autoridades e representantes. O juramento dos médicos foi feito pela doutoranda Maria
Luiza Monteiro de Menezes. A turma era composta pelos seguintes doutorandos:
Tarquinio José Lopes, Antonio Souza de Oliveira, Maria de Nazareth Salles, José
Roberto da Silva Lima Junior, Renato Borralho de Medeiros, Orlando da Costa
Tavares Videira, Manoel Marinho Monte, Ruy Ferreira dos Santos, Luizileno de
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Roma Amoêdo Brasil, Miguel Lupi Martins e João Hamilton Ferro Costa. O orador foi o doutorando Manoel Marinho Monte e o paraninfo o professor José Alves
Dias Junior. Da ata: “...o senhor Presidente deu a palavra ao venerando professor
Dr. Antonio Marçal, homenageado no quadro de formatura dos novos médicos,
que proferio formoso e emocionante discurso, sendo delirantemente palmeado pela
assistência, ao terminar”.
Em 11 de dezembro receberam o grau de médico, na secretaria da Faculdade, os
seguintes: Claudio de Mendonça Dias, Claudio Pastor Dacier Lobato, Maria José
Rodrigues von Paumgartten, Maria do Carmo Sarmento de Carvalho, Carlos de
Souza Vasconcelos, Pedro Vallinoto, Nilson Carvalho da Silva, Orlando Rodrigues
da Costa, Rubens Bezerra Valente e Paulo Hugo Craveiro Durand. Registre-se a
ata ter sido lavrada pelo Dr. Theodoro de Souza Aranha.
A formatura seguinte não ocorreu em 8 de dezembro de 1938, mas no dia 11 do
referido mês. No salão nobre da Faculdade, sob a presidência do Dr. Lauro de
Magalhães, Diretor da Faculdade em virtude da morte de Camilo Salgado em 2 de
março daquele ano.
Da ata:
teve inicio a memoravel sessão ás nove horas da manhã, quando os novos facultativos volviam da basilica de Nazareth, onde foram assistir á
missa solemne celebrada por D. Antonio da Almeida Lustosa, que nessa
ocasião, procedeu á benção dos aneis. O director da Faculdade ficou ladeado pelo snr. dr. interventor federal do Estado; D. Antonio de Almeida
Lustosa, arcebispo do Pará; dr. João Baptista Ferreira de Souza, director
da Faculdade de Direito do Pará; dr. Lauro Sodré Filho, inspector federal
do ensino, dr. Olympio da Silveira, secretario da Faculdade e tambem dos
representantes do general commandante da 8ª Região Militar, do prefeito municipal de Belém, do commandante da Policia Militar do Estado e
do commandante do 26 Batalhão de Caçadores.
O juramento foi proferido pelo doutorando José Rodrigues da Silveira Netto, “que
leu, em vóz pauzada e clara”. Os demais formandos eram: Alfredo Barroso Rebello,
José da Silva Salazar, Lauro Rodrigues Lima, Ruy da Silva Romariz, José Guilherme
Araujo Cavalleiro de Macedo, Manoel Baliu Monteiro, Francisco de Assis Maciel de
Silveira, Gervasio de Britto Mello, Sandoval Rodrigues Cardoso, Joaquim Fernandes
de Araujo Filho, José Moussallem Falcão, Harold da Cunha Franco, Carlos Guimarães Pereira da Silva, Eduardo Granhem Hermes, Vicente Magno de Miranda,
Dirceu Pereira Gondim, Ocyr Fidanza Dutra, Arthur Gonçalves Arantes, Antonio
Euzébio da Costa Rodrigues, Ary Lage da Silva, Carlos Simões Pereira Netto, Renausto Pedrosa Amanajás, Francisco Victorino de Luna, Amílcar Carvalho da Silva,
Atahualpa José Lobato Fernandez, Moacyr Pedro de Valmont, Eduardo Fernandes
Gomes e Epilogo de Gonçalves Campos. O “premio Raul Leite” foi concedido ao
Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950
285
doutorando Amílcar Carvalho da Silva, “por ter sido o detentor das melhores notas
obtidas durante o curso, recebendo elle nessa ocasião prolongadas salvas de palmas”.
O orador foi o doutorando José Guilherme Cavalleiro de Macedo. Sobre o paraninfo
temos: “Pela impossibilidade do comparecimento do dr. Othon Chateau, paraninpho
á turma, o dr. Luiz Araujo leu a oração de seu collega, que foi uma scintillante peça
de erudição scientifica e de brilho litterario”.
Em seguida a palavra foi concedida
ao venerando mestre da Faculdade, dr. Antonio Marçal, que, com um
enthusiamo juvenil saudou seus novos collegas e agradeceu, commmovido, a homenagem que estes lhe tributaram, incluindo-lhe o retrato no
quadro de formatura. Ao terminar o seu formoso e emocionante discurso,
foi delirantemente palmeado pela assistência.
O presidente da sessão encerrou-a “ás onze (11) horas, sendo então o hymno nacional harmoniosamente executado pela banda municipal dos Bombeiros”.11
Em 7 de agosto de 1939, na secretaria da Faculdade aconteceu a formatura de Pojucan Moura Tapajós.
286
A sessão solene seguinte realizou-se em 10 de dezembro de 1939, com a ata registrando “sessao solemne para a collação de grão á primeira turma de alumnos que
terminaram o curso medico”. Ausente o Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, a sessão
foi presidida pelo seu substituto legal, o Dr. Acylino de Leão. Entre as autoridades,
o Dr. Epilogo de Campos, inspetor federal. Sessão realizada pela manhã, às 9 horas,
sendo juramentista o doutorando Guilherme Lins de Vasconcellos Chaves. Demais formandos: Pedro Constantino Jorge, Antonio Sebastião dos Reis, Sylvio de
Almeida Bentes, Ivaldo Mattos Guerra, Adolpho de Xerez e Oliveira Góes, Jorge
Antonio da Silva, Hamilton Raposo de Miranda, Orlandino Martins Fonseca, Antonio de Castro Menezes Pereira Carneiro, Zildo Cardoso Centeio Lopes, Wagner
Brasiliense Eleutherio, Mario Nazarethno Machado Sampaio, Alvaro José de Pinho Simões, Aniceto de Castro Menezes Pereira Carneiro e José Pereira Gonzalez. O
orador foi o doutorando Wagner Eleutherio e o paraninfo o professor Orlando Lima.
Em 14 de dezembro de 1939 aconteceu nova sessão solene da Congregação, no salão nobre da Faculdade, para colação de grau da segunda turma de médicos12. Pela
primeira vez a ata nomina os professores presentes:
Achavam-se nas bancadas os senhores professores Carlos Arnobio Franco, Oscar Pereira de Carvalho, Othon Chateau, Raymundo da Cruz Moreira, Jayme Jacintho Aben-Athar, Gabriel Rodrigues de Souza, Alberto
Pereira de Moraes, José Alves Dias Junior, Luiz Romano da Motta Araujo, Oscar Pereira de Miranda, Orlando Lima e Appio Medrado.
A sessão teve inicio às 9h30, presidida pelo Dr. Lauro de Magalhães,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
quando os novos facultativos, acompanhados de seus paraninphos, volviam da capella da Santa Casa de Misericordia, onde foram assistir á
missa solemne celebrada por D. Antonio de Almeida Lustosa, arcebispo
do Pará, que nessa ocasião, procedeu á benção dos aneis.
O Diretor estava ladeado pelo general Lobato Filho, comandante da 8ª Região e representante do sr. Getulio Vargas, Presidente da Republica. Presentes ainda: Dr. Deodoro de Mendonça, secretario geral do Estado e representante do Dr. José Carneiro da
Gama Malcher, interventor federal, sr. Abelardo Conduru, prefeito municipal. Dr. Heitor Castello Branco, presidente do Departamento Administrativo do Estado, João Malato, representante do jornal Folha do Norte, e Dr. Epilogo de Campos, inspetor federal
do ensino. O juramento foi prestado pela doutoranda Eunice Tupinambá Rodrigues. Os
demais componentes da turma eram: Domingos Barbosa da Silva, Christovam Pinto
Martins, Abelardo dos Santos. Orlando Cerdeira Bordallo, Amedeo Vivacqua, Guaraciaba Quaresma da Gama, José Casemiro Pereira de Moura e Paulo Queima Coelho de
Souza, que foi o orador da turma. O paraninfo foi o professor Orlando Lima. O prêmio
“Raul Leite” constou de um cheque no valor de “um conto de réis”, e foi entregue pelo
jornalista João Malato, representante de Folha do Norte, cujo diretor fora convidado
pelos representantes do laboratório Raul Leite para fazer a referida entrega. Da ata:
“Assim, o snr. João Malato, depois de proferir palavras de louvor e incentivo, passou o
premio ás mãos do diplomando Domingos Barbosa da Silva, que o conquistara pela sua
applicação constante e proveitosa aos estudos”.
Não há menção à execução do hino nacional ao encerramento da sessão.
Na mesma data, 14 de dezembro, na secretaria da Faculdade, às 15 horas, é concedido pelo Diretor o grau de médico a Belmira Leão Ferreira. Em 30 de dezembro
para Telmo Rodrigues Sarmento.
A formatura seguinte aconteceu em 8 de dezembro de 1940, quando houve, também, formatura de enfermagem obstétrica. Sessão solene da Congregação, realizada no salão nobre da Faculdade, iniciada às 18 horas, com o retorno dos novos
médicos da Basílica de Nazaré, onde assistiram missa e houve a benção dos anéis.
Na presença de autoridades e representantes, o doutorando Olympio Cardoso da
Silveira Filho leu o juramento, “recebendo nesta ocasião o anel symbolico sob uma
calorosa salva de palmas da assistência”. Os demais formandos: Emilio Assmar,
Ernesto Laudelino de Almeida, José Cyriaco Gurjão Sampaio, Luiz Tito de Castro Leão, Ursulino Velloso de Souza Martins, Geraldo Caetano Corrêa Sobrinho,
Arthur Porto Marques, Osmar Lima Sampaio, José Luiz de Souza Ferreira, Clovis Olintho de Bastos Meira, Alcyr de Morisson Faria, Wilson da Motta Silveira, Guiomar Duarte de Aragão, Laura Guimarães Caldas, José Clarindo de Souza
Martins, Celio Martins de Oliveira Mello, Carlos Alberto Monteiro Leite, Arcelino Chicre Miguel Bitar, Jayme Jacintho Teixeira Aben-Athar, Oscar Pinheiro dos
Santos Abranches, Joaquim Oriente de Arruda Genú e Flavio Francisco Dulcetti.
Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950
287
O orador foi o doutorando Wilson da Motta Silveira e o paraninfo o professor
Jayme Aben-Athar. A sessão foi encerrada às 20 horas com a execução do hino
nacional pela banda dos Bombeiros.
Em 4 de maio de 1941, na secretaria da Faculdade, o Diretor concedeu ao grau de
médico a Guiomar Vanda de Medeiros. Em 16 de julho, para Conceição de Maria
Alvares dos Prazeres.
Em 7 de dezembro de 1941, no salão nobre da Faculdade, realizou-se a sessão solene da Congregação para colação de grau de médico. Às 19 horas, com a presença
de autoridades e representantes, o Diretor Dr. Lauro de Magalhães deu inicio à
cerimônia. A juramentista foi a doutoranda Alzira Castro Dieguez. Os demais formandos eram: Herbert Spencer Ferreira, Estelio José dos Santos Lobato, Walter
Gillet Machado, Salomão José Zagury, Salomão Moisés Levi, Humberto Lima dos
Santos, Claudio Pereira de Souza, Emir José Kouri e Osvaldo Pinheiro dos Santos Abranches. O orador foi o doutorando Herbert Spencer Ferreira. O paraninfo
professor Lauro de Magalhães, que “depois de explicar os motivos que o forçaram
a paraninfar a turma, apesar de ser o diretor da Faculdade, fez uso da palavra,
pronunciando empolgante, eloquente e oportuno discurso, sendo, ao terminar, calorosamente aplaudido”.
288
Não houve formatura em 1942.
Em 8 de dezembro de 1943, aconteceu a sessão solene para colação de grau, no
salão nobre da Faculdade, “para ser deferido o gráu de médico aos sextanistas que
concluíram o respectivo curso”. Sessão iniciada às 20h30, presidida pelo Dr. Lauro
de Magalhães, com a presença de autoridades e representantes. O doutorando Antonio de Oliveira Lobão leu o juramento, recebendo em seguida o anel simbólico. A
turma era composta pelos seguintes doutorandos: Vitor Rocha de Matos Cardoso,
Alberto Rodrigues Cruz, Otavio de Mendonça Maroja, Miguel Cordeiro de Azevedo, Paulo Cordeiro de Azevedo, José Braulio dos Santos, Gastão Feio Valente,
Nicolau Biagio Panzuti, Leopoldo Cirilo Kerichanã da Silva, Aníbal da Silva Marques, Alirio Macedo, Laurenio Teixeira da Costa, Antonio do Nascimento Araujo, Dulcimar Nazaré Guimarães de Macêdo, Abraam Eliezer Levy, José Edmundo
Carneiro Cutrim, Raimundo de Mendonça Dias, Antonio Ribeiro Alves Junior, Pedro Gomes de Oliveira Lopes, Lucimar Pedrosa Ribeiro, César Beserra Medrado,
Fernando José Cardoso de Oliveira, Paulo Nunes Avelino, Armando Sabaa Srur,
Demétrio Beserra de Medrado, Ritacinio Ramos Pereira e Amir Rocha Franco. O
orador foi o doutorando Ritacinio Ramos Pereira e o paraninfo o professor José
Alves Dias Junior. Sessão encerrada às 22h45, sem maiores referências13.
A cerimônia seguinte realizou-se em 8 de dezembro de 1944, também no salão nobre
da Faculdade. Foi presidida pelo Dr. Acylino de Leão, Diretor da escola. Entre as autoridades presentes ou representadas cite-se: representante do Interventor Federal,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
coronel Magalhães Barata, comandante do 26 BC, representante do prefeito de Belém, chefe de policia, comandante da Base Aérea, comando naval do Norte, Arcebispo
metropolitano e Tribunal de Apelação, presidente do Conselho Administrativo, Diretor do Departamento Estadual de Saúde, Dr. Epilogo de Campos, inspetor federal de
ensino junto à Faculdade. O juramento foi lido pelo doutorando Lourival Gomes Bogéa, que recebeu depois o anel simbólico. Os demais componentes da turma: Mario
de Medeiros Barbosa, Aarão Moisés Serruya, Alberto Gomes Ferreira, Alberto de
Vasconcelos Santos Cavalcante, Helio Chaves de Oliveira, Mauricio Queima Coelho
de Souza, Pedro de Brito Tupinambá, Sidonio Lucas de Figueiredo, Abner José Cavalcante, Alcindo Nova da Costa, Aristolina dos Santos Neves, Aurelio Osmar Cardoso de Oliveira, Luciano Dias Maia, Luiz Mansour Maklouf, Mario Lobato de Abreu,
Raimundo da Costa Chaves e Otavio Augusto Pereira Lobo. O orador foi o doutorando Pedro de Brito Tupinambá e o paraninfo o professor Lauro de Magalhães.
Em 8 de dezembro de 1945, ocorreu nova formatura, com sessão solene no salão nobre da Faculdade, iniciada às 10 horas. Presidida pelo Diretor Acylino de Leão. Presença do general Zacarias Assunção, comandante da 8ª Região Militar, desembargador Manoel Maroja Neto, representante do Interventor Federal, Brigadeiro do Ar,
comandante da 1ª Zona Aérea, Dr. Augusto Serra, representante do Comando Naval
do Norte, representante do prefeito de Belém, Dr. Epilogo de Campos, inspetor federal do ensino junto à Faculdade. Juramentista e orador: Luiz Gonzaga Pires; formandos: Rui Teles de Borborema, Amílcar da Silva Pereira, Francisco D’Assunção dos
Santos Rosado Filho, José Carvalho da Cruz, Hamilton Mesquita das Neves, Messias
Guimarães Filho, Manoel Maria de Paiva Dias Ferreira, Candido Cardoso de Brito,
Joaquim Beserra Neto, Ivaldo Perdigão Freire e Edgar Beserra Valente. Paraninfo:
professor Orlando Lima. Sem menção de hino ou premiação.
Em 8 de dezembro de 1946, nova colação de grau. Presidida pelo Diretor, Dr. Acylino de Leão, estando presentes: Dr. Octavio Meira, representante do Interventor Federal, arcebispo D. Mario de Miranda Villas-Boas, comandantes do 26 BC e da Base
Naval, sr. Euclides Comarú, representante do prefeito municipal. O juramento foi
proferido pelo graduando Herminio Alves Filho. A turma era composta por: João
Damasceno Serra Figueiredo, Eloy Simões Bona, Leonel Rodrigues Bogéa, Zilo Pires, Ramiro Koury, Antonio Augusto de Moraes Bittencourt, Rubens Guilhon Coutinho, Milton Benedito Ericieira e Pedro Amazonas de Souza Pedroso. O orador foi
Milton Ericeira e o paraninfo o professor Gastão Vieira.
Nova cerimônia em 8 de dezembro de 1947, às 19 horas, presidida pelo Dr. Lauro de Magalhães. Entre as autoridades cite-se o diretor do Departamento de Educação e Cultura, do prefeito interino de Belém, sr. Euclides Comarú, do inspetor
federal de ensino, sr. Edgar Pinheiro Porto. Juramento proferido pelo doutorando
José Maria Direito Alvares. Graduandos: Sarah Roffé de Lemos, José Luiz de Araujo
Mindelo, Emilio Hage Karam, Aloysio de Andrade Melo, Odorico de Carvalho Kós,
Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950
289
João Fecury, José Bezerra dos Santos, Augusto Benedito de Leão Guilhon, Gervásio
d’Araujo da Cunha Gonçalves, Galdino Batista de Souza, Manoel da Silva Braga,
Carlos Augusto da Silva Costa, José Vieira Ibiapina, Renato Chalu Pacheco, Paulo
Mota de Castro, José Monteiro Leite, Graciliano Muniz, Avelino Fernandes Corrêa
Junior, Victor Hilário da Paz, Eduardo Augusto Dias Pereira Braga, Jean Chicre Miguel Bitar, Armando Goró Toda e José Maria Dejard de Mendonça. O orador foi o
graduando Graciliano Muniz e o paraninfo o professor Antonio Porto de Oliveira.
Nova turma formou-se em 8 de dezembro de 1948, em sessão iniciada às 19h30
e presidida pelo Dr. Lauro de Magalhães. Entre os presentes o sr. Antonio Teixeira Gueiros, vice-governador, tenente Aboud, representante do almirante Braz
Velloso, comandante do 4º Distrito Naval. Prestou juramento a doutoranda Elisa
Chermont Roffé. Demais formandos: Anna Roffé Ferreira de Lemos, Zoênio Motta
Gueiros, Jorge Moussallem, Antonio Juracy de Britto, Agostinho Leão de Salles
Filho, Manuel Ayres, João Maranhão Aires, João Abreu Reis, Lélio Gonçalves da
Silva, Antonio Tancredi, Flavio Pires Filho, Mário Ruben de Mello Martins e Hilmo de Farias Moreira, “que, acompanhados dos seus paraninfos, receberam igualmente o anel, repetindo o senhor diretor as palavras: ‘Podeis praticar e ensinar a
Medicina.’”. O orador da turma foi o graduando Hilmo Moreira e o paraninfo, o
professor Aracy Barretto. “Em seguida foi feita da entrega dos diplomas de Tisiologistas aos doutorandos que concluíram o curso de Extensão Universitária”.
290
Em 8 de dezembro de 1949, às 20 horas, o Diretor da Faculdade, Dr. Lauro de
Magalhães “abriu a sessão proferindo eloquente saudação aos novos médicos”. A
doutoranda Gilberta Bensabath proferiu o juramento. A turma: Leopoldo Domingos Amaral Costa, Otavio Bandeira Cascais, Heber Chilon de Monção, Mário Xavier Teixeira, Raimundo Mendes Libório, Raynero de Carvalho Maroja, Canuto
de Figueiredo Brandão, Raimundo Nonato Oriente de Vasconcellos, Tylson King
de Mello, Maria da Graça da Silva Ferreira, Lindolfo Pedro Aires, Antonio Pereira
da Silva Neto, Eduardo Braga Pereira Motta, Sebastião Faial Neto, Nilton Bastos
Barroso, Antonio Maria Amoêdo, Lauro Corrêa Pinto e Henrique Sandres Filho. O
orador da turma foi o doutorando Raynero Maroja. “Em seguida ocupou a tribuna
o docente-livre Orlando Rodrigues da Costa, paraninfo à turma, que pronunciou
bem elaborado e eloquente discurso”.
No ano de 1950 não houve sessão solene de colação de grau. Houve duas formaturas, ambas na secretaria da Faculdade. A primeira ocorreu em 17 de fevereiro de 1950, às 16 horas, quando receberam do Diretor da Faculdade, Dr. Lauro
de Magalhaes, o grau de médicos os doutorandos Wilson Deodoro Coqueiro de
Oliveira e Ernesto Gondim Leitão. A seguinte aconteceu em 25 de dezembro de
1950, às 9 horas. Juramento proferido pelo doutorando Clodoaldo Fernando Ribeiro Beckmann. Demais formandos: Hélio Couto de Oliveira, Mario Augusto Pinto
de Morais, Orlando de Saboya Barros, Nathercia Horta de Souza Moitta, Marina
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Roffé Ferreira de Lemos, Lydia Duarte Mesquita, Pedro Mata de Oliveira Roma Junior,
Claudio Dias da Motta, Ancindino Paschoal de Leão, Almiro Pinheiro Monte, Carlos
Asclepiades de Lima, Alceu Alfredo Brazão e Silva, Domingo Rio Fernandez, Dorvalino Frazão Braga, Issac Jayme Gabbay, Elizeu de Souza Rodrigues, Joaquim Rodrigues
Pacheco, José Vasques VerVallen, Kenard Pacheco de Andrade e Pedro Megale. “Finda
essa cerimônia, o sr. dr. Diretor congratulou-se com os novos médicos, augurando-lhes
muitas felicidades nesta nova fase da vida”. Não há menção de orador e nem paraninfo.
291
Foto 61: Diploma da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará da década de 1940.
Fonte: Acervo do Dr. Eduardo Augusto Dias Pereira Braga.
NOTAS
1
“Prometto que no exercicio da medicina serei sempre fiél aos deveres da honra,
da sciencia e da caridade. Penetrando no interior das familias, os meus olhos serão cégos e a minha lingua calará os segredos que me forem confiados; nunca me
servirei da minha profissão para corromper os costumes nem para favorecer o
crime”. (FMRJ, 1926, p. 42). De acordo com nota ao final da Fórmula: “quando a
cerimonia fôr colletiva, bastará que as palavras de compromisso constantes desta
formula proferidas por um dos novos medicos ou doutores em medicina, sejam
secundadas por todos os outros apenas com a expressão: ‘Assim prometto’.”
Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950
292
O Regimento Interno editado em 1924 contém a fórmula em Latim: “Ego N.
N. (nome) premitto me in exercenda medendi arti, fidelem semper exhibiturum honestatis, caritatis, scientiae praeceptis. Lares ingressus, oculi mei tanqam caecierunt,
mutumque os ad commissa secreta rite servanda, quod pro munere honoris precipue
habebo; nunquan etiam disciplina medica ad mores corrumpendos, fovendave crimina utar. Os outros alunos respondiam somente: Idem spondeo., p. 45.
2
“O distinctivo do gráo de Doutor em medicina e cirurgia é um anel de esmeralda, circumdado de pedras de brilhante com duas cobras no arco, proximas
do engaste; a borla e o capello” (FMRJ, 1926, art. 223, p. 43).
3
Em Latim: Hippocratica opera legito ac meditator, tuoque nomini benedicent homines, si exempla quoque in vitae ratione referas. Accipe annulum hunc, symbolum gradus quem tibi conferimus. Esto, igitur, medicam artem tum exercere tum docere liceat.
4
Todos os dados referentes às cerimônias de colação de grau foram extraidos do livros de atas de colação, acervo da Faculdade. (N.A).
5
Pela riqueza e sutileza do estilo, vale a transcrição detalhada desta cerimônia de
colação de grau, também assinada pelo secretário da Faculdade, o Dr. Olympio
da Silveira. (N.A).
6
É possível que seu nome tenha sido transcrito errado já que em sua Tese ele
aparece como Olga Maia Paes de Andrade. (ANDRADE).
7
Outro possível erro, pois em outros documentos seu nome aparece como
“Djalma José Peixe Ferreira da Cruz” (N.A). (FMCP, 1936c. Mapa número 7).
8
Provavelmente trata-se de um salão nobre diferente do que conhecemos atualmente, visto que a versão ainda hoje existente seria inaugurada em 1º de
março de 1932 durante a aula inaugural do curso médico daquele ano proferida pelo professor Orlando Lima. (Folha do Norte, 2 de março de 1932). (N.A).
9
Provavelmente outro erro das atas já que o correto é Ferro, ao invés de
Ferreira (N.A).
10
Observa-se a referência ao “Prêmio Raul Leite”, concedido a partir daquele
ano ao aluno que tivesse tido o melhor aproveitamento durante o curso. O
prêmio era concedido nacionalmente, aos melhores alunos de medicina de
cada Faculdade (N.A).
11
Observe-se, o registro de algumas modificações como missa com benção
dos anéis e a execução do hino nacional. (N.A).
12
Segundo o Dr. Guaraciaba Gama, em depoimento aos autores, a cisão deuse por conta da divergência quanto ao nome do paraninfo. (GAMA, 2008).
13
Esta turma adotou o nome de “Turma Evandro Chagas” e assim ficaria
conhecida posteriormente. É possível que tenha sido a primeira turma da
Faculdade a adotar um nome próprio já que foi o único registro de turma
com nome localizado naquele período. A Revista do Acadêmico de Medicina de
Fevereiro de 1944 (ano 2, número 3) registra a escolha:
“A novel turma de esculápios resolveu denominar-se “Dr. Evandro Chagas”,
como homenagem sincera àquele que tão bem soube compreender e se dedicar aos problemas sanitários da Amazônia...” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 54).
18
Apontamentos
para uma história
do DAM, 1930-1949
293
294
Logotipo do Diretório Acadêmico de Medicina do Pará em ofício de 1933.
Quem quer que entre atualmente no Diretório Acadêmico de Medicina (DAM) da
UFPA sairá de lá com a impressão que aquela instituição foi criada recentemente,
tendo no máximo dez ou quinze anos de idade. Talvez a reforma universitária, que
causou o desaparecimento da Faculdade de Medicina como instituição autônoma; a
criação temporária do Diretório Acadêmico do Centro Bio-Médico, que durante um
período forçou a fusão dos diretórios de todos os cursos de saúde; as várias arbitrariedades “educacionais” da revolução de 1964, ou simplesmente o descaso, tenham
ajudado a obscurecer a história do DAM, ficando a impressão de que as gestões mais
recentes vão inconscientemente enterrando a memória das mais antigas.
O que restou de acervo documental dos primórdios do órgão de representação dos
estudantes de medicina encontra-se apenas nos arquivos da Faculdade de Medicina, especificamente nos livros de documentos recebidos, de forma muito fragmentada, e nos jornais da época, não sendo possível reconstruir plenamente as ações
de cada gestão. Em alguns casos, nem a relação completa dos componentes de
algumas gestões foi localizada.
Mesmo fontes antigas, que por estarem cronologicamente mais perto dos fatos deveriam conter informações mais precisas, não raro incorrem em erros grosseiros,
como por exemplo, que o DAM teria sido fundado em 1934 (Revista do Acadêmico de
Medicina, 1946, p. 47), ou em 1933 por Edward Catete Pinheiro (Revista Amazônia,
1955), o qual posteriormente viria a ser senador, governador interino do estado e
ministro da Saúde no governo Jânio Quadros.
O que se pode afirmar concretamente é que o Diretório não nasceu imediatamente
com a Faculdade. A menção mais antiga encontrada sobre sua criação data de 6 de
maio de 1923, em nota no jornal Estado do Pará:
CENTRO ACADEMICO DE MEDICINA
Os acadêmicos da Faculdade de Medicina deste Estado têm em vista fundar
o Centro Academico de Medicina, aggremiação que terá por fim defender e
amparar os interesses da respectiva classe e ao mesmo tempo, por meio de
conferencias e palestras scientificas, desenvolver o estudo entre nós.
Para lançar as bases da nova instituição academica os estudantes de medicina reunir-se-ão, no próximo dia 8, ás 5 horas, no edificio da Faculdade de Medicina, e para esta reunião ficam convidados todos os alumnos
desta casa de ensino superior.
A reunião será presidida pelo dr. Camillo Salgado.
Cinco dias depois o mesmo jornal publica uma segunda nota:
CENTRO ACADEMICO DE MEDICINA
Na séde da Faculdade reunem hoje, ás 5 horas da tarde, os academicos de
medicina, afim de elegerem a directoria e a commisão que têm de elaborar os estatutos do Centro Academico, ultimamente inaugurado.
Presidirá a sessão o lente cathedratico dr. Pinheiro Sozinho (Estado do
Pará, 11.05.1923, p. 1).
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
295
Depois destas notas, aparentemente o movimento para criação de um órgão de
classe estudantil entraria num período de hibernação. Entretanto, pequenas notas
soltas nos jornais mostram que mesmo não tendo se efetivado a criação de um diretório ou centro acadêmico, algumas vezes os estudantes se reuniam - ou ao menos
tentavam-, convocando os colegas para tratar de interesses da classe1, ainda que
sem a existência de uma representação oficial, como nesta convocação:
Por meio de nosso intermédio, os academicos de medicina Raymundo da
Silva Magno, Lauro Miranda Solheiro, Petronio José de Lima, Edgardo
Rôxo Pereira, e Edgard Antunes Salgado convidam todos os alumnos do
1º ao 6º anno, da nossa Faculdade de Medicina, para uma reunião hoje,
ás 4 horas da tarde, na séde daquelle instituto superior de ensino, afim
de tratarem de assumpto de grande e palpitante interesse para a classe
(Estado do Pará, 28.07.1926, p. 1).
Ao que tudo indica os estudantes não conseguiam de fato se organizar em uma agremiação, seja pelo elevado número de transferências daqueles que não acreditavam no
curso, associado às desistências dos que não conseguiam arcar com as despesas de
uma instituição privada, ou mesmo pela falta de lideranças estudantis. O fato é que
um novo esboço de uma organização estudantil surgiria apenas em 1927, conforme
memorando encaminhado ao diretor da Faculdade, Camilo Salgado, em 10 de maio:
296
Tenho a honra de levar ao conhecimento de V. Excia., que em sessão dos
estudantes desta Faculdade realizada a 7 do corrente, sob a presidencia
do representante de V. Excia., Dr. Hygino Amanajás Filho, ficou fundada nesta capital, uma sociedade dos estudantes de medicina para fins
de beneficência, manutenção de uma revista e commemoração das datas
nacionaes, sendo constituida a seguinte directoria provisoria:
Presidente- Dr. Oséas Santos Antunes
Vice-Presidente- Edgard Antunes Salgado
Primeiro Secretario- Theodoro Aranha
Segundo Secretario- José Fernandes Ramos
Thezoureiro- José Estevam Guimarães
Orador- Raymundo Avertano Barreto da Rocha
Comisão de estatutos- Avertano Rocha, Lauro Solheiro, e Raymundo Paiva.
Na próxima assembléa geral será discutido a denominação da sociedade.
Esperando inteiro apoio de V. Excia. respeitosamente subscreve-se como
protesto de alta consideração.
José Fernandes Ramos
(FMCP, 1927b).
Não se descobriu qual o tempo de duração deste “pré-diretório”, se chegou a possuir um estatuto, se teve alguma influência na posterior fundação do DAM, ou ao
menos passou desta gestão.
Somente em 21 de abril de 1930 seria fundado um órgão representativo dos estudantes de medicina de uma forma mais sólida, organizada e inicialmente denoMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
minado “Centro Acadêmico de Medicina do Pará” (CAM), cuja primeira diretoria
eleita e empossada foi:
Presidente- Oscar Pereira de Miranda
Vice-presidente- José Fernandes Ramos
Primeiro Secretário- Menandro Rodrigues Tapajós
Segundo Secretário- Miguel Martins
Tesoureiro- Amyntor Virgolino Bastos
Vice-tesoureiro- Albino Figueredo
Orador- Eduardo Azevedo Ribeiro
Vice-orador- Roberto Cândido Pereira
Bibliotecário- Waldemar Santanna
(Folha do Norte, 17 de maio de 1930, p. 2).
O CAM tinha entre seus objetivos, a intensificação dos estudos médicos, a defesa
dos interesses dos associados quando necessário ou assim determinasse o conselho
deliberativo, a edição, quando possível, de um jornal ou revista para publicação dos
melhores trabalhos científicos, com prêmios para estes “quando tal permitirem os
cofres sociais”, auxilio aos acadêmicos em dificuldade para pagar o curso e na eminência de abandoná-lo.
Pelos estatutos, haveria pelo menos três assembléias gerais anualmente: a primeira em 21 de abril para eleição da nova diretoria e dos representantes do conselho
deliberativo; a segunda para posse solene dos eleitos; e a terceira no fim do ano
social para prestação de contas do tesoureiro e leitura do relatório do presidente.
Qualquer outra assembléia seria considerada sessão extraordinária.
O Centro Acadêmico seria dirigido por representantes de diversas séries, dois de cada
ano, os quais, juntamente com a diretoria iriam compor o conselho deliberativo. A diretoria seria composta por presidente, vice-presidente, primeiro secretário, segundo
secretário, orador, vice-orador, tesoureiro, vice-tesoureiro, bibliotecário. Os cargos de
presidente e vice seriam ocupados somente por alunos do quinto e sexto anos.
O número de sócios seria ilimitado, divididos em cinco categorias: sócio fundador, (composto pelos que assinaram a ata de fundação); sócio contribuinte, (alunos
que estivessem em dia com o pagamento); sócios correspondentes (ex-alunos da
Faculdade, especialmente indicados); sócios honorários (todos os professores da
Faculdade, ou de outras escolas médicas, que fossem aprovados pelo conselho deliberativo, bem como sócios fundadores ou sócios contribuintes já formados, mas
que tivessem prestado grandes serviços ao centro); sócio benemérito (diretor, vicediretor, e primeiro secretário da Faculdade, e todos aqueles que prestassem ao
centro auxílio de alta significação).
Curiosamente, o Centro Acadêmico não era gratuito. Tanto os sócios fundadores
como os contribuintes deveriam pagar uma jóia de dez mil réis, parcelada ou não,
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
297
e contribuição mensal de dois mil réis. O Centro poderia ainda cobrar multa de
dez mil réis aos membros do conselho deliberativo que faltassem sem justificativa
às reuniões. Outro fato interessante é que o Centro não poderia tomar parte em
manifestações políticas de qualquer natureza e em caso de dissolução seus bens
reverteriam à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP, 1930).
O estatuto previa ainda uma seção esportiva, que poderia organizar o seu regimento interno desde que este não contrariasse o Centro, tendo receita e despesa próprias, sendo tal seção composta por diretor de esportes, secretário e tesoureiro.
Uma das primeiras ações da diretoria do recém criado Centro Acadêmico foi reunir-se junto aos demais diretores dos outros centros acadêmicos de Belém com o
intuito de criar uma “Federação Acadêmica”, a qual reuniria todos os alunos das
escolas superiores do estado (FEDERAÇÃO Acadêmica, 1930, p. 2).
298
Com pouco mais de um ano o CAM enfrentaria sua primeira batalha, na qual os
adversários seriam os próprios alunos em disputas internas, uma situação que se
repetiria com frequência nos anos seguintes. Em nota enviada à Folha do Norte, em 9
de maio de 1931, sugestivamente intitulada “Centro Reaccionario dos Academicos de
Medicina”, os estudantes Miguel Martins Filho, Nelson Corrêa de Oliveira, Palma
Lima, Wladimir Sant’Anna, Cuvor Telles e Nery Guimarães, lamentavam profundamente que a diretoria da Faculdade reconhecesse a recém eleita gestão do CAM “que
não acatamos, não apoiamos, e não reconhecemos em virtude de innumeras anormalidades de que a mesma é responsavel”. E seguiam citando como exemplo que:
Os elementos que compõe a hypothetica directoria do C.A.M, não tem,
em absoluto, direito algum de expedir convites á festa do dia 16 do corrente mez, em virtude de ser essa iniciativa da alçada da directoria que a
precede, a qual só por deliberação conjuncta, poderá empossar com uma
solennidade a nova directoria...
Levantavam ainda a possibilidade dos membros daquela nova gestão, terem organizado um novo estatuto em sigilo, antes do prazo fixado para reformas estatutárias e
sem a participação dos demais estudantes. E finalizavam: “E é a esse centro dirigido
por uma pretensa directoria, arbitraria em decisões, falha em conhecimentos e maníaca por exhibicionismos a quem a directoria da Faculdade de Medicina e Cirurgia do
Pará reconhece e apóia. Infeliz e lamentavel decisão...” (ASSOCIAÇÕES, 1931).
Em 1931, com a anexação da escola de farmácia à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP), fez-se necessário um novo estatuto para o Centro Acadêmico.
O memorando de 23 de abril de 1932, endereçado ao presidente e demais membros
do conselho técnico e administrativo da FMCP informa:
De ordem da diretoria do Centro Academico de Medicina do Pará, venho
por meio deste oficio trazer a vossa presença os estatutos do referido
Centro para sua aprovação e reconhecimento oficial.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
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Outrossim aproveito o ensejo para comunicar que a supra dita sociedade
já foi reconhecida publicamente pelos Exms. Snrs. Drs. Diretor, Vicediretor, e Fiscal da Faculdade em declaração feita a imprensa da capital
do dia 8 de maio de 1931, conforme documento junto (FMCP, 1932a).
O documento sobre o novo estatuto data de 29 de abril de 1932 constando que:
Tendo submettido a V. V. Excias., para os fins do artigo 103, parágrafo primeiro do decreto número 19851, de 11 de abril de 1931, os estatutos do Centro acadêmico de Medicina o Pará, voltam a presença deste conselho os organizadores dos referidos estatutos trazendo-lhes a comunicação seguinte:
Os sócios do dito centro, depois de minucioso estudo do decreto acima
anunciado, verificaram que não se justifica o facto de não fazerem parte
de sua associação os estudantes do curso de Pharmácia, quando uns e
outros se acham sob regime da mesma faculdade, onde todos recebem o
ensino de acordo com as disposições que lhes são referentes.
Por isso em reunião em que collaboraram uns e outros em conjunto resolveram que o Centro os abrangesse todos, modificando-se sua denominação e sendo substituída pela de Centro Acadêmico de Medicina e
Pharmácia do Pará (FMCP, 1932a).
As modificações em relação ao antigo estatuto são pequenas: desaparecem os sócios
correspondentes e os sócios contribuintes passam a ser conhecidos como sócios efetivos; a diretoria deixa de ter vice-orador e vice-tesoureiro; as eleições ocorreriam no
dia 21 de março de cada ano. O novo estatuto previa ainda a criação da festa do “Calouro”, quando estes deveriam contribuir cada um com 10$000, e a festa do “Thermometro2”. A diretoria desta nova fase deveria ser eleita em mesa eleitoral presidida
pelo Prof. João Prisco dos Santos e seria composta pelos seguintes membros:
Presidente- sextanista Benedicto C. de Macedo Klautau
Vice-Presidente- quintanista Humberto Franco
Primeiro Secretário- quintanista Alderico de Oliveira Costa
Segundo Secretário- terceiranista Lucival Lobato
Tesoureiro- quartanista Fernando
Fernado Mendes
Mendes
Vice-Tesoureiro- terceiranista Albino Figueiredo
Orador- secundanista Hermínio Pessoa
Vice-Orador- secundanista Paulo Fender
Bibliotecário- Eduardo Motta3
Primeiro supplente- Mário Acatauassú Nunes
Segundo supplente- Ruy Pondé
Terceiro supplente- José Serra
(Folha do Norte, 15.03.1932).
Entretanto a assembléia estudantil para a eleição não chegaria ao fim “em virtude
de um grupo de alumnos chefiados por socios eliminados do Centro Academico
terem promovido discussões por quererem passar por cima das determinações do
estatuto” (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 23.04.1932). Nova assembléia seria realizada desta vez presidida pelo Prof. Acatauassú Nunes Filho, visto que Prisco
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
299
dos Santos retirara-se em protesto alegando não ter iniciado os trabalhos “devido
a anarquia reinante entre os estudantes divididos em partidos, a ponto de faltarem
em plena secretaria com o respeito devido a um professor desta Faculdade então
presente” (CTA, Ata de 5.05.1932).
A outra sessão para a eleição ocorreria sem maiores incidentes, com a nova gestão
empossada trazendo pequenas modificações em sua composição como Ruy Pondé
como vice-tesoureiro, José Serra como vice-orador e Nilson Silva como bibliotecário, além do seguinte conselho deliberativo: Mário Salgado e Olavo Leôncio pelo
sexto ano, Mário Ferreira e Scylla Andrade pelo quinto, Arnaldo Prado e José
Macedo pelo quarto, Nizomar Azevedo e Milton Cordovil pelo terceiro, Cândido
Ferreira e Ernani Lima pelo segundo, Amílcar Silva e Eduardo Motta pelo primeiro (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 23.04.1932).
300
As disputas eleitorais não se encerrariam ali como mostra Folha do Norte de 24 de
abril de 1932, que noticiaria a devolução, pelo Conselho Técnico Administrativo da
Faculdade, de uma petição dos sextanistas requerendo o reconhecimento da chapa
apresentada pelos mesmos, por considerarem as eleições ilegais estando em desacordo com o artigo 193 do decreto 19.891 (Estatutos das Universidades). O mesmo
artigo cita ainda que chapa eleita pela maioria tinha como presidente o acadêmico
Armando Maroja e não Benedito Klautau conforme fora publicado, e avisava que a
minoria dissidente, três membros de cada diretoria em questão, se reuniriam no dia
seguinte na Santa Casa, às nove horas da manhã para um possível acordo (Folha do
Norte, Vida Acadêmica, 24.04.1932).
No dia seguinte, os acadêmicos Benedicto Klautau, Raymundo do Valle Paiva e
Scylla Lage da Silva compareceram à redação do jornal levando uma carta do Conselho Técnico Administrativo assinada pelo Dr. Camilo Salgado declarando “não
ser verdade ter o referido Conselho, em sua sessão de 22 do corrente devolvido a
petição dos sextanistas referente à eleição do Centro Acadêmico”. O documento de
Camilo afirmava ainda que a petição dos sextanistas teria sido entregue à comissão para estudos e modificações de acordo com a nova lei do ensino. Ao jornal, os
estudantes informaram não ser verdade a notícia de que as eleições haviam sido
anuladas, “continuando de pé a chapa eleita pelo Centro Academico de Medicina”,
no dia 21 de abril (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 26.04.1932).
Mais lenha seria posta na fogueira no dia 27. A nota intitulada “A Alliança Academica não Propoz Accordo”, que secamente dizia:
O accôrdo tratado na reunião que se realizou na Santa Casa não foi proposto pela Alliança e sim pela minoria dissidente.
Não se comprehende, pois, que a maioria depois de formidavel victoria
alcançada, procurasse a minoria para qualquer conciliação.
Teve um caracter todo pessoal a visita do academico Armando Maroja
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
ao doutorando Benedicto Cavalleiro Klautau e não consoante se notificou
no “O Estado”, de hontem, ter ido aquelle academico propôr um accôrdo
em nome da Alliança4.
Mas tudo indica que a polêmica acabaria em festa, pois: “Os acadêmicos de medicina realizam hoje uma festa dançante, na Assembléia Paraense, o acto de posse da
nova directoria do Centro Academico de Medicina, e que terá início ás 9 horas da
noite” (Folha do Norte Vida Acadêmica, 30 de abril de 1932).
A chapa vitoriosa apresentada pela Alliança Acadêmica ficaria assim constituída:
Presidente- Armando Maroja
Vice-Presidente- Humberto Cabral
Primeiro secretário- Nelson Corrêa
Segundo secretário- Padna Filho
Orador- Miguel Martins
Vice-Orador- Paulo Fender
Tesoureiro- Augusto Moreira
Vice-Tesoureiro- Augusto Rocha
Bibliotecário- Rubem Paiva
(Folha do Norte, Vida Acadêmica, 30 de abril de 1932).
Em 14 de outubro de 1933, já como Diretório Acadêmico de Medicina do Pará e
obedecendo a um novo estatuto não localizado, o diretório encontrava-se assim
constituído:
Presidente- Doutorando Humberto Cabral
Vice-Presidente- Edward Cattete Pinheiro
Primeiro secretário- Clidenor de Freitas Santos
Segundo secretário- Celso de Mattos Leão
Primeiro Tesoureiro- Pedro Valinoto
Segundo Tesoureiro- Paulo Bentes
Bibliotecário- Emanuel Mendes
Orador- Odemar Barata
Consultor- Lauro Lima (FMCP, 1933b)
Esta gestão, apresentava-se com uma organização mais complexa que as anteriores, sendo subdividida em diversas comissões, visando “desenvolver as suas actividades em todos os sentidos” (FMCP, 1933b), sendo estas:
Comissão Científica
Doutorando Inálio Castro (Diretor)
Doutorando Armando Maroja
Aluízio Fonseca
Emídio Pedreira
Leônidas Deane
Gladstone Deane (Secretário Geral)
Hermínio Pessoa
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
301
Clidenor Santos
Luizileno Brazil
Amílcar Silva
Comissão Social
Hermínio Pessoa (Diretor)
Rubens Paiva
Armando Pingarilho
José de Pádua Filho
Vicente Miranda
Agostinho Monteiro
Paulo Murtinho
Cláudio Dias
Comissão de Beneficência e Previdência
Cattete Pinheiro (Diretor)
Abílio Maranhão Gonçalvez
Maria do Carmo Sarmento
Ruy da Silva Romariz
Cândido Pereira
302
Comissão de Esportes
Nery Costa (Diretor)
Roberval da Matta
Álvaro Norat
Olívio Rodrigues
Mâncio Lima
Carlos Vasconcellos
Clodomir Maroja
Comissão de Imprensa
Rubens Britto (Diretor Geral)
Ferro Costa (Redator Chefe)
Corpo de Redatores
Emmanuel Castro
Wladimir Paraense
Nilson Silva
Britto Pontes
Celso Leão
Diniz Botelho
José Lemos
Lauro Lima
Sandoval Cardoso
Francisco Luna
Um dos grandes feitos desta gestão foi o lançamento em 31 de outubro de 1933 do
jornal “O Acadêmico de Medicina”, o primeiro periódico dos estudantes da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, que tinha como diretor Rubens da Silveira
Brito e redator chefe Ferro Costa, ambos cursando o terceiro ano (DIAS, 1996,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
p. 62)5. O jornal aceitava colaboração de toda classe acadêmica local, desde que
se tratasse de assuntos científicos. Os artigos deveriam ser dirigidos à comissão
de imprensa, na sala do DAM, na Faculdade de Medicina. (Folha do Norte, Vida
Acadêmica,16.10.1933).
Fato interessante da época é que o Diretório tinha o hábito de divulgar em notas
publicadas nos jornais de maior circulação qualquer assunto interno da Faculdade,
talvez como forma de respaldar seus argumentos e decisões, além de divulgar os
fatos de forma rápida entre a comunidade acadêmica. A nota publicada na seção
“Vida Academica” intitulada “Promoção por Medidas” é um exemplo clássico:
Attendendo a pedidos de varios colegas interessados no assumpto, o academico Cattete Pinheiro, do Directorio Academico de Medicina, passou
ao dr. Arnobio Franco, lente da cadeira de Technica operatoria em nossa
Faculdade, o seguinte telegramma:
“Dr. Arnobio Franco. – Rio. – Favor informar Departamento accôrdo
decreto baixado se alumno tem média 6 duas provas parciaes já feitas é
obrigado prestar terceira prova”.
O dr. Arnobio Franco respondeu nos seguintes termos:
“Cattete Pinheiro. – Belem – Media seis duas provas parciaes fica dispensado além exame final terceira prova parcial.”
Hontem esteve o academico Cattete Pinheiro em nossa redacção para mostrar-nos esse telegramma, pedindo-nos tornassemos publica a informação
nele contida, por ser assumpto de real interesse para os estudantes.
Ficam assim os academicos que já fizeram as provas parciaes de maio e
agosto, dispensados das que tinham que prestar este mez, caso tenham a
media 6” (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 24.11.1933).
Durante esta gestão, mas sem apoio do Diretório, Folha do Norte noticia sobre uma
festa para recepcionar os calouros, denominada “Festa da Esperança”, encabeçada
pelos alunos do quinto e sexto ano e com representantes das demais séries divididos em comissões para organizar o evento, confeccionar os convites, recepcionar as
famílias convidadas e cobrar mediante recibo a “Taxa dos Calouros”(Folha do Norte,
Vida Acadêmica, 17.02.1934). No dia seguinte o mesmo jornal publica nota oficial do
DAM reconhecida pelo diretor da Faculdade Camilo Salgado, informando que:
ficam a cargo da comissão social, annexa ao mesmo, as iniciativas de recepção e quaesquer outras manifestações que refiram aos calouros, a qual
providenciará para que seja dado aos novos collegas um tratamento a
altura do nível social que desfructamos.
E quanto a taxa do calouro, o Directorio não deu autorização a quem
quer que seja para fazer essa cobrança sendo, portanto inidoneas as commissões que porventura se apresentem com este objetivo (Folha do Norte.
Vida Acadêmica, 18.02.1934).
O Diretório buscaria assim assumir o controle do evento, e em 5 de março de
1934, já com a formação de uma comissão diferente desta vez ligada inteiramente
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
303
ao DAM lançaria a “Festa da Esmeralda”, nome como ficaria conhecida a festa de
recepção aos calouros e que durante décadas marcaria o calendário social de Belém.
A nota dizia ainda que apenas dois acadêmicos estavam autorizados a receber a
“Taxa do Calouro” (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 05.03.1934).
Em 11 de abril 1934 tendo como presidente Edward Cattete Pinheiro, o DAM teria
uma das gestões mais atribuladas de sua história, começando a entrar em choque com
o secretário da Faculdade, Dr. Olympio da Silveira, pelo que este solicitaria a criação de
uma comissão indicada pelo Conselho Técnico Administrativo para verificar as contas
apresentadas pelo Diretório no período de outubro a dezembro do ano de 1933.
A resposta do DAM dirigida ao secretário foi imediata:
304
O Diretorio Academico, hontem reunido, em sessão extraordinária, para
tomar conhecimento do officio em questão não poude comprehender
quais os esclarecimentos exigidos pela referida Comissão, por quanto já
apresentou todos os documentos necessários e comprobativos da ordem
e absoluta integridade na applicação de suas rendas.
Entretanto para maior salvaguarda da nossa honestidade, que temos em
consciência ser inatacável, procuramos o Senhor J. Castro, abalisado contabilista de nossa praça e de conceito firmado em todo o paiz, para que fizesse
meticulosa vistoria em nossa escripta e emittisse parecer a respeito. Hontem
mesmo recebemos esta opinião valiosa, que agora tomamos a liberdade de
remetter, por intermédio dessa Secretaria, à Comissão julgadora, de modo
que fique perfeitamente demonstrada a maneira criteriosa com que é escripturada, o nosso movimento financeiro, reflexo, aliás das attitudes claras e definidas peculiares ao DIRECTORIO ACADEMICO no trabalho incansável
pelo alevantamento do nome desta casa ao nível que ella realmente merece.
Enviamos os dois números do “O ACADEMICO DE MEDICINA” pedidos.
Esperando que esta Secretaria, nos indique de modo preciso, quaes as
informações desejadas pela comissão do Conselho Technico Administrativo, subscrevo-me.6
Clidenor de Freitas - Secretário
Em 18 de abril de 1934 o diretório cutucaria um vespeiro, em correspondência ao
Conselho Técnico Administrativo:
...vem mui respeitosamente levar ao conhecimento da esclarecida visão
dos membros deste conselho certos rumores sobre irregularidades que
se estariam verificando com relação aos serviços da Secretaria e Thesouraria da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, suspeitas essas que
muito abalam e maiores prejuízos poderão causar ao bom nome deste estabelecimento que temos a obrigação moral e indeclinável de zelar como
nos permittam as forças, quer como estudantes orgulhosos de seu educandário e compenetrados de seus deveres, quer como paraenses amigos
de sua terra, que sabem velar pelo conceito que desfructa o nosso estado,
no concerto das demais unidades da Federação.
E porque continuem a ter curso estes rumores, com denúncias gravíssimas chegadas ao DIRECTORIO ACADEMICO DE MEDICINA, acer-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
ca de sérias anormalidades existentes nos referidos serviços, todas com
caracter de impressionante veracidade, solicitamos deste Conselho a instauração de um inquérito rigoroso a respeito, que apure convenientemente
o fundamento de taes denúncias, de modo a ficar, de uma vez por todas e
de maneira cathegorica, devidamente averiguadas as responsabilidades por
ventura verificadas no caso, sendo, para este fim, necessária a suspensão
prévia de todos os funcionários encarregados dos trabalhos alludidos, sem
o que não poderá haver a indispensável liberdade de acção, por parte da
commisão que tiver de proceder as investigações agora requeridas.7
Cattete Pinheiro - Presidente
A situação do DAM tornar-se-ia mais difícil, e quase simultaneamente Cattete Pinheiro teria que defendê-lo de outro ataque, endereçando a seguinte solicitação ao
Conselho Técnico Administrativo da Faculdade:
Tendo, o DIRECTORIO ACADEMICO, sido miseravelmente infamado,
atravez de cartas anonymas, dirigidas ao professor Orlando Lima, em
nome desta associação, e empenhado que se esclareçam as responsabilidades, vem este DIRECTORIO, requerer desse Conselho um exame
pericial nas machinas da Secretaria desta faculdade, já que todas as suposições convergem para ella. Igualmente, como tem surgido suspeitas
sobre este DIRECTORIO, que desde já declaramos alheio às taes cartas,
collocamos à disposição do perito a machina de que nos servimos.
Esperando assim que possam ser esclarecidas quaisquer responsabilidades (FMCP, 1934a).
Em meio a denúncias, ataques e contra ataques, o Diretório encontraria tempo para em 30
de abril de 1934 inaugurar sua biblioteca (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 29.04.1934).
Criada com recursos angariados entre os professores e alunos e em um “Festival Artistico-Academico” organizado pelo DAM e realizado em 9 de abril no “Palácio Teatro”(Folha
do Norte, Vida Acadêmica, 05.04.1934), que contou com a presença da pianista paraense
Anna Carolina, das “senhorinhas” Helena Coelho e Astréa Buarque e de um conjunto
“constituído de elementos de nossa alta sociedade” (Folha do Norte, 05.04.1934). A biblioteca, que passaria a funcionar em uma sala cedida pela direção da Faculdade, tinha
como objetivo servir aos estudantes, especialmente dos primeiros anos, que não tinham
condições de adquirir livros indispensáveis para o curso, e nem de pagar as taxas de uso
da biblioteca da Faculdade (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 29.04.1934).
Outra grande conquista deste período foi o acordo com a empresa Teixeira Martins, que
garantia aos acadêmicos 50% de desconto nas entradas do Cinema Iracema, às quartas
e sábados, a partir do mês de maio (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 08.04.1934).
Em 5 de maio de 1934, em seção solene presidida pelo diretor da Faculdade, Dr. Camilo Salgado, tomou posse a nova gestão do DAM, assim composta:
Vice-Presidente - Cattete Pinheiro
Primeiro Secretário - Clidenor dos Santos
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
305
Terceiro Secretário - Octavio Velloso
Primeiro Tesoureiro - Lauro Lima
Segundo Tesoureiro - Benedicto Abreu
Primeiro Orador - Nilson Silva
Segundo Orador - Luizileno Brasil
Bibliotecário - Wagner Eleuthério (FMCP, 1934)
Consultores - José de Sousa Macedo
Lucival Lobato
Aniceto Carneiro
(Folha do Norte, Vida Acadêmica, 28.04.1934)
Talvez prevendo que a corda costuma arrebentar do lado mais fraco, o presidente
Emygdio Pedreira e o segundo secretário Milton Cordovil, deixaram de comparecer
sem motivo justificado, portanto não tomaram posse (Folha do Norte, 28.04.1934;
FMCP, 1934).
Esta nova gestão criaria em 21 de julho um curso noturno de Alemão para os estudantes, a ser ministrado nas dependências do DAM, e solicitaria permissão para que
o porteiro da Faculdade viesse abri-la à noite, “mediante remuneração justa, já combinada”, o que além de servir para as aulas do Curso, iria ”permittir que a Bibliotheca
do Directório, se conserve aberta pelo tempo das mesmas, o que muito dará lucro aos
collegas” (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 28.04.1934; FMCP, 1934).
306
A aparente calmaria seria quebrada através de uma série de declarações feitas pelo
DAM à imprensa local, em 3 de setembro de 1934, denunciando supostas irregularidades administrativas na Faculdade (Folha do Norte, 28.04.1934; FMCP, 1934). Após longo julgamento do caso, o Conselho Técnico Administrativo decidiu suspender Cattete
Pinheiro e Clidenor de Freitas por dois anos, nada demovendo de tal decisão, nem os
apelos do Capelão da Santa Casa (FMCP, 1934), considerando entre outras coisas:
que a inveracidade e a temeridade das alegações formuladas não diminuem o desrespeito e a injuria constantes desse ato imprudente; considerando que a aludida representação constitue já união deplorável reincidência ampliada da injuria contida no oficio do referido Diretorio, de 18
de abril e do qual juntaram cópia à representação argüida; considerando,
finalmente, a dolorosa necessidade de punir essas transgressões do Regimento para evitar reprodução da falta (CTA, 1934).
Alegando irregularidades no processo e amparados pelo Diretor Geral de Ensino e pelo
Inspetor Federal junto a Faculdade, os dois estudantes conseguiram ganhar tempo e solicitaram transferência para a Faculdade de Medicina do Recife (CTA. Ata de 27.02.1935).
Neste meio tempo Cattete Pinheiro seria ainda chamado para depor no Conselho
Técnico Administrativo, onde se defenderia dizendo:
1º - que no caso citado, agi como mandatário do DA e não em caráter
pessoal;
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
2º - que nenhum interesse tenho mais no presente caso, porque não pertenço mais ao DA, e nele agi unicamente em virtude das funções que exercia,
e alem disso, estou perfeitamente convencido, hoje, de ter sido iludido em
minha boa fé, ter sido enganado quanto aos fatos citados, os quais estou
perfeitamente capacitado serem inverídicos, produto de informações falsas
que eram levadas então ao DA por pessoas que então julgávamos de fé, e
que hoje reconhecemos terem sido uns exploradores de nossa vontade de
acertar, se aproveitando da nossa inexperiência sobretudo;
3º - que estas declarações faço em meu nome e do meu colega Clidenor
de Freitas Santos. É o que em resumo, além do mais que perante o douto
CTA declarei; tenho a dizer em verdade quanto ao caso em que sou chamado a prestar esclarecimentos (CTA. Ata de 16.03.1935).
Após o depoimento, na mesma sessão o Conselho decidiu dar por terminada a pena
de suspensão imposta aos estudantes. Mesmo assim, provavelmente temendo outras
represálias, Cattete Pinheiro e Clidenor de Freitas concluiriam seu curso médico no
Recife. Segundo Clóvis Meira caso não tivessem conseguido a transferência, acabariam cedo ou tarde sendo definitivamente expulsos (MEIRA, 1990, p. 43).
Em 1935, com o objetivo de evitar constantes atritos e alegando que o DAM queria
e pretendia se intrometer até na administração da Faculdade, o Conselho Técnico
Admistrativo decidiu fechar aquele órgão. Era presidente em exercício Luizileno
Brasil (CTA. Ata de 13.04.1935; CTA. Ata de 17.06.1935).
Em 7 de abril de 1937 um grupo de estudantes solicita a reabertura do DAM, alegando que a ausência de vida social e administrativa daquele órgão trazia graves
prejuízos à coletividade acadêmica (FMCP, 1937b).
O apelo surtiria efeito, com a ressalva da Direção da Faculdade de “suspender
este órgão academico tão logo se manifestem atos de indisciplina” (CTA. Ata de
07.04.1937). Em 30 de abril em mesa eleitoral presidida pelo Dr. José Alves Dias
Junior8, o diretório ressurgia com a seguinte composição:
Presidente - Miguel Lupi Martins
Vice-Presidente - José Rebello de Albuquerque
Primeiro secretário - Álvaro José Pinho Simões
Segundo secretário - Herbert Spencer Ferreira
Primeiro tesoureiro - Geraldo Corrêa Sobrinho
Segundo tesoureiro - Colombo Carioca
Orador - Epílogo Campos
Bibliotecário - Carlos Leite
Consultores - Manuel Marinho Monte
José Silveira Netto
Telmo Sarmento
Oriovaldo de Souza Coutinho.
A nova gestão provavelmente buscava uma maior sintonia com a administração da
faculdade, contando entre seus consultores com um filho do Secretário Dr. OlymApontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
307
pio da Silveira, o então acadêmico José da Silveira Netto, e assumindo “propósitos
de cooperação, lealdade, e respeito aos illustres mestres, bem como o desejo que
nos anima de sermos úteis aos nossos collegas e de elevar cada vez mais as honrosas tradições de nossa Faculdade” (FMCP, 1937b).
Esta aparente ausência de atritos com a direção da Faculdade fica mais evidente
quando observamos a liberdade que esta gestão teve para fazer pedidos como a
concessão de uma sala contígua a sala da Congregação para instalação do DAM;
instalação de um filtro “Senum” - espécie de bebedouro da época - destinado aos
estudantes em uma das salas do diretório; autorização para transformar o campo
da Faculdade em um pequeno estádio para disputa de vôlei e basquete entre os
acadêmicos; empréstimo em caráter provisório de uma pequena estante, e alguns
livros da biblioteca da Faculdade, para a (re)inauguração da biblioteca científica do
diretório, que ocorreria em 5 de agosto de 1937 (FMCP, 1937b).
Mesmo tendo conseguido um diálogo mais pacífico com a Direção, o DAM renasceu em precária situação financeira por ter se reorganizado justamente após o período de matrícula, época na qual, conforme o estatuto vigente cabia, a tesouraria
da escola cobrar de cada aluno uma taxa anual de 5$000 destinada àquele órgão
estudantil. E por mais que solicitasse a cobrança retroativa, não conseguiu ter a
necessária autorização do Conselho Técnico Administrativo (FMCP, 1937b).
308
Assim, quando a “Liga Athletica Paraense” organizou um campeonato acadêmico,
as taxas de inscrição da Faculdade e a matrícula dos jogadores, num valor total de
120$000, foram pagas pelos próprios alunos, interessados em “representar officialmente esta faculdade, cujo nome esportivo defenderemos com o mesmo ardor que
defendemos o seu nome scientífico” (FMCP, 1937b).
Não foi possível confirmar se a direção da Faculdade autorizou um auxílio financeiro para compra de 12 camisas para futebol, 12 camisas para vôlei e basquete,
12 pares de meias, 12 pares de chuteiras e uma dúzia de calções, em um custo total
avaliado em 500$000, conforme fora solicitado pelo Diretório Acadêmico de Medicina. Na verdade a resposta do Conselho Técnico Administrativo para o caso foi
bem vaga, limitando-se a um “aguarde oportunidade” (CTA, Ata de 07.08.1937).
Deste modo, meio trôpega foi como a Faculdade participou daquela que talvez tenha sido sua primeira grande competição desportiva.
O ano de 1938 seria muito marcante para toda a Faculdade: a morte de Camilo Salgado, que vinha sendo diretor havia dezesseis anos, deixava uma lacuna que dificilmente seria preenchida. O DAM em nota oficial definiria Camilo como alguém que
era mais que um diretor; um grande amigo dos acadêmicos, e convocava todos os
alunos para comparecerem ao seu enterro (Folha do Norte, 3 de março de 1938, p. 1).
De fato ocorreu uma participação maciça dos estudantes no que foi talvez a maior
homenagem que um diretor da Faculdade já recebeu, ainda que póstuma.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
O novo diretor eleito, Lauro de Magalhães, contaria com a “irrestricta solidariedade” do Diretório cujo presidente naquele momento era Álvaro José Pinho Simões.
Sem dúvida a nova diretoria conquistou a simpatia dos estudantes ao dar caráter
oficial à “Festa da Esmeralda” (FMCP, 1938b).
Em meio a esta aparente calmaria, noticia-se em abril de 1938, aquela que talvez
tenha sido a primeira greve dos doutorandos de medicina, solicitando o afastamento de um auxiliar de ensino (Folha do Norte, 5 de abril de 1938, p. 1).
Em 5 de agosto de 1938 ocorrem novas eleições, sendo a seguinte a nova constituição do Diretório:
Presidente - Álvaro José Pinho Simões
Vice-Presidente - Clóvis Olinto de Bastos Meira
Primeiro Secretário - Guaraciaba Quaresma da Gama
Segundo Secretário - Emir José Koury
Primeiro Tesoureiro - José Rovere Teixeira
Segundo Tesoureiro - Colombo Carioca
Orador - Ritacinio Ramos Pereira
Bibliotecário - José Luiz de Sousa Ferreira
Consultores - José da Silveira Neto
Orivaldo Coutinho
Milton Beltrão Cavalcante
Comissão de Beneficência e Previdência
Diretor - Carlos Alberto Monteiro Leite
Membros - Orlandino Fonseca
Aben-Athar Filho
Antônio Sebastião dos Reis
Comissão Científica
Diretor - Arcelino Bitar
Secretário Geral - Domingos Barbosa da Silva
Membros - Cristovam de Jesus Pinto Martins
Jefferson Leão
Comissão Social
Diretor - Manoel Baliú Monteiro
Membros - Abelardo Santos
Luis Tito de Castro Leão
Comissão de Imprensa
Diretor - Ritacínio Ramos Pereira
Membros - José Clarindo Martins
Anaxágoras Barreiros
Wagner Eleutério
Comissão de Esportes
Diretor - Milton Beltão Cavalcante
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
309
Membros - César Medrado
Paulo Lemos da Silva
(FMCP, 1938b)
Ao que tudo indica o ano de 1939 não foi dos melhores para o DAM, sendo grande
a escassez documental relativa ao período, não sendo possível recuperar a gestão
daquele ano. Sabe-se que o Professor Dias Junior chegou a ser convocado para presidir as eleições gerais do Diretório marcadas para 22 de abril.
Um curto edital datado de 13 de outubro de 1939, assinado pelo secretário da Faculdade parece ter selado o destino do DAM naquele ano.
310
EDITAL
DE ORDEM DO SNR. DR. DIRECTOR FAÇO SCIENTE AOS INTERESSADOS QUE EM VIRTUDE DE RESOLUÇÃO UNANIME
DO CONSELHO TECHINICO ADMINISTRATIVO DESTA FACULDADE, BASEADA NO PARAGRAFO 4º DO ARTIGO 2º DOS ESTATUTOS DO DIRECTORIO ACADEMICO, DEIXOU DE EXISTIR
ESTA AGREMIAÇÃO.
OUTROSIM, FICAM INTIMADOS OS MEMBROS DO EXTINCTO
DIRECTORIO A PRESTAR CONTAS À DIRECTORIA DESTA FACULDADE E ENTREGAR O ARCHIVO EXISTENTE.
DR. OLYMPIO DA SILVEIRA
(FMCP, 1939a)
O parecer de uma reunião do Conselho Técnico Administrativo de 21 de setembro
de 1939 coloca um pouco mais de luz na questão:
Pensamos que a comissão designada pelo CTA para tomar conhecimento
da divergência existente entre membros do DAM, se julga dispensada de
opinar, baseada numa razão simples e única: a não existência do referido
Diretório. O parágrafo 4º do artigo 2º dos Estatutos do Diretorio determina que os seus membros, após eleição regular, devem tomar posse
dos cargos em data fixada (1º de maio) posse solene que é presidida pelo
Diretor da Faculdade. Não se tendo realizado esse ato fundamental, isto
é, a posse, conforme nos informou a secretaria e se conclui da leitura das
representações, perante o CTA e a Diretoria desta Faculdade, não existe Diretório Academico. Diante do exposto, julgamos que a agremiação
rotulada Diretorio Academico deve ser chamada a prestar contas à Diretoria da Faculdade, entregando o arquivo existente na sede do Diretório
(CTA. Ata de 13.10.1939).
Ao que parece desta vez o fechamento do DAM foi causado pelas divergências entre os próprios estudantes, segundo Dias Junior:
...dizem os reclamantes que durante as eleições, houve pressão da parte
do antigo Diretório, que organizou chapa oficial com carinho próprio
para dar mais força e prestígio a seus candidatos. Dizem mais, que tal
chapa oficial influiu de modo positivo no espírito de alguns votantes, soMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
bretudo dos estudantes do primeiro ano, que ainda não tinham firmado
juízo sobre a atitude que deviam assumir (CTA. Ata de 13.10.1939).
Como não podia ser diferente nestas situações a sessão acabou em anarquia “incompatível com os processos de gentileza e lealdade, que devem reunir os componentes da briosa classe acadêmica paraense” (CTA. Ata de 13.10.1939).
O DAM ressurgiria em 20 de abril de 1940 em sessão presidida pelo Dr. José Alves
Dias Junior, especialmente designado pelo Conselho Técnico Administrativo. Foram eleitos os seguintes membros:
Presidente - doutorando Clóvis Olinto de Bastos Meira
Vice-presidente - quintanista Emir José Koury
Primeiro secretário - doutorando José Luis de Souza Ferreira
Segundo secretário - primeiranista Luiz Gonzaga Pires
Primeiro tesoureiro - terceiranista José Maria Bastos
Segundo tesoureiro - primeiranista Edgar Bezerra Valente
Orador - terceiranista Aníbal Maranhão
Bibliotecário - segundanista Abner Cavalcante
Consultores - quintanista Humberto Lima Santos
- quartanista Colombo Carioca
- quartanista Orivaldo Coutinho
- segundanista Alcindo Neves
(FMCP, 1940a),
No diretório capitaneado por Clóvis Meira há registro de grandes realizações,
como a concessão pela Companhia Paraense de Eletricidade (que também controlava o serviço de bondes) de um abatimento de 50% em seus passes para estudantes
de medicina. Na mesma época o DAM (re)conquistaria, ainda, a meia-entrada nos
cinemas para os acadêmicos. Nesta gestão encontra-se a também menção a tradicional “Festa da Esmeralda”, realizada nos salões da Assembléia Paraense, bem
como festejos juninos no Hospício Juliano Moreira “fazendo-se distribuir óbulos
aos pacientes” (FMCP, 1940a), além de promover a campanha “Esporte pela Raça”,
incentivando a prática de desportos no meio estudantil.
Durante visita do presidente Getúlio Vargas a Belém houve uma audiência universitária com o chefe da nação, quando o DAM fez-se representar solicitando maior
auxílio financeiro a Faculdade. E a convite da União Nacional dos Estudantes
(UNE), o diretório mandou dois representantes (Clóvis Meira e Gonçalves Bastos)
para o Congresso Nacional dos Estudantes realizado no Rio de Janeiro.
Clóvis Meira recorda de sua gestão o encontro com o então prefeito de Belém Abelardo Condurú, dando conta dos esforços do DAM em benefício dos acadêmicos
que não conseguiam arcar com as despesas da Faculdade:
Eu, presidente do Diretório Acadêmico de Medicina, o procurara para
pedir uma certa importância, auxílio necessário ao pagamento das menApontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
311
salidades de colegas que não estavam em condições de satisfaze-lo e que
iriam perder os exames finais. Depois de examinar cuidadosamente os
nomes que lhe apresentei, levantou os olhos azuis e disse-me: “Não vou
lhe dar esta importância”. Fez uma pausa de expectativa, como quem pensa e avalia, e continuou: “o senhor vai levar mais um pouco. Poderá haver
algum retardatário”. Verdadeira premonição. O retardatário aguardava a
minha chegada na porta da Faculdade (MEIRA, 1986b, p. 90).
O incidente mostra também que naqueles dias era possível contar com o poder
público.
A gestão que assumiria em 30 de abril de 1941 ficaria assim organizada:
312
Presidente - Emir José Koury
Vice-presidente - Walter Gillet
1º Secretário - Abraham Levy
2º Secretário - Luiz Pires
1º Tesoureiro - Gil Maneschy
2º Tesoureiro - Alberto Cavalcanti
Orador - Ritacínio Pereira
Conselheiro - Pedro Pedroso
Milton Ericeira
Comissão Científica - Presidente Emir José Koury
Membros - Aníbal Maranhão
Maurício Coelho de Souza
Comissão de Esportes -Presidente Gil Maneschy
Membros - Alcindo Costa
José Bastos
Eloy Bonna
Comissão de Beneficiência e Previdência - Presidente Ritacínio Ramos Pereira
Membros - Ramiro Koury
Francisco Rosado
(FMCP, 1941a)
Em 24 de abril de 1942, eleita nova gestão, volta-se a encontrar referências a diversas comissões, ficando o diretório assim constituído:
Presidente - quintanista Abraham Eliezer Levy
Vice-presidente - quartanista Raimundo da Costa Chaves
Orador - quintanista Ritacínio Pereira
Primeiro secretário - quartanista Maurício Queima Coelho de Souza
Segundo secretário - primeiranista Jean Chicre Bitar
Primeiro tesoureiro - terceiranista Francisco Rosado
Segundo tesoureiro - primeiranista Carlos Augusto da Silva Costa
Bibliotecário - terceiranista Amílcar da Silva Pereira
Consultores - segundanista Pedro Amazonas Pedroso
- segundanista Eloy Bona
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Comissão de Beneficiência
Presidente - Jean Bitar
Membros - Pedro Gomes de Oliveira Lopes
Maria Medeiros Barboza
José Eduardo Guimarães
Rubens Guilhon Coutinho
Aristolina dos Santos Neves
Comissão Científica
Presidente - Maurício Queima Coelho de Souza
Membros - Paulo Cordeiro de Azevedo
Edgar Bezerra Valente
Sidonio Lucas Figueredo
José Santos Junior
Hélio Chaves de Oliveira
Luiz Mansur Maklouf
Comissão Social
Presidente - Abraham Levy
Membros - Raymundo da Costa Chaves
Aníbal da Silva Marques
Sarah Roffé de Lemos
Jacyara Vasconcelos
Alda Melo
313
Comissão de Imprensa
Presidente - Ritacínio Pereira
Membros - Ramiro Koury
Luiz Gonzaga Pires
Antônio Bittencourt
Joaquim Bezerra Neto
Pedro Amazonas Pedroso
Pedro Braga Filho
Cícero Pimenta
Comissão de Esportes
Presidente - Alcindo Nova da Costa
Membros - Carlos Augusto da Silva Costa
Amílcar da Silva Pereira
Rui Teles de Borborema
José Edmundo Coutrin
Messias Guimarães
Eloy Bona
Paulo Motta de Castro
Iran Loureiro
(FMCP, 1942a)
O período em que Abraham Levy permaneceu como presidente do DAM foi dos
mais produtivos deste órgão recebendo grande reconhecimento de seus contempo-
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
râneos. Sobre Abraham Levy consta que em 1941 era secretário do DAM “quando
foi forçado por circunstâncias especiais, a assumir a direção deste órgão de representação”. Daí, “começou, então, o trabalho de construção que somente veio interromper o fim de seu curso”
[...]
Quem assistiu às reuniões do Diretório não se lembra de tê-lo ouvido
falar senão de modo coletivo. “Esta semana fizemos isto, promovemos
isso”. Nada de “eu” e de “fiz”, [...] e aqueles que compuzeram os Diretórios de 1941, 1942, 1943, sob sua presidência, guardaram destes dias a
lembrança de uma colaboração sadia e forte entre seus membros, sem o
amargo da imposição pessoal, nem o deprimento das facções” (Revista do
Acadêmico de Medicina, 1944, p. 47).
Durante o triênio em que o DAM foi encabeçado por Levy, começou a existir uma
maior aproximação entre as Escolas Superiores de Belém, “separadas outrora, por
certa hostilidade que não se compreendia”. E o diretório esteve presente em diversas
ações como na Campanha da Borracha, Campanha do Livro, colaborando ainda com
diversas instituições como a Legião Brasileira de Assistência e a Cruz Vermelha.
314
Abraham Levy foi também um dos fundadores e primeiro presidente da União Acadêmica Paraense (U.A.P), órgão que congregava os estudantes paraenses (MENDES, 1998, p. 41), sendo ainda por três vezes representante do DAM no 4º, 5º e 6º
Congressos Nacionais dos Estudantes realizados no Rio de Janeiro, então Capital
Federal, em 1941, 1942 e 1943 (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 48).
No campo internacional Abraham Levy representou o diretório em 1942 na Conferência de Iquitos, no Peru, realizada para a aproximação dos estudantes da Amazônia, por ocasião dos festejos do 4º centenário do descobrimento do Rio Amazonas (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 48).
Em fevereiro de 1943 sua gestão transformaria o jornal “O Acadêmico de Medicina”, na
“Revista do Acadêmico de Medicina”, que tinha caráter científico – publicando trabalhos
de alunos e professores – e noticioso, pois divulgava assuntos gerais sobre a Faculdade, como festas, eventos e artigos variados. Era patrocinada por médicos e laboratórios, que nela anunciavam seus serviços e produtos. De periodicidade irregular, foram
publicados quinze números até 1957, por puro esforço e obstinação dos membros
do DAM. Em muitos números da revista lê-se no cabeçalho “Fundada em 1933, por
Rubens da Silveira Brito”, como uma forma de homenagem pelo seu pioneirismo em
editar um órgão de divulgação das atividades da classe acadêmica (DIAS, 1996)11.
Em 13 de outubro de 1943, comemorando dez anos de sua existência legal (Revista
do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 52)12, o diretório (re)inaugura sua biblioteca,
desta vez com o nome de “Biblioteca Dr. Camilo Salgado”. Graças à doação de uma
coleção de compêndios especializados, no valor de cinco mil cruzeiros, oferecida
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
pelo então Interventor Federal no Estado, coronel Joaquim de Magalhães Cardoso
Barata, a biblioteca contava então com mais de trezentos volumes, não incluindo
revistas ou outros impressos (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 53)13.
Ainda em 1943, o DAM organizou o primeiro Curso de Extensão Universitária
realizado em Belém cujo tema foi tuberculose, dirigido pelo professor catedrático
de Terapêutica Clínica Luis Araújo, que era tisiologista. O curso constou de cinquenta aulas teórico-práticas, de 9 de setembro até 6 de novembro. Foram inscritos
13 alunos do quinto e sexto ano, sendo onze os concluintes. O curso abordou diversos aspectos da tuberculose, introduzindo inclusive noções de Raios-X e visitas
ao Hospital Domingos Freire centro de referência no assunto então (Revista do
Acadêmico de Medicina, 1944, p. 50).
Nem tudo foram flores no ano de 1943. Fevereiro seria marcado por mudanças
no modo de cobrança de taxas e mensalidades da Faculdade, o que geraria não só
uma crescente insatisfação no meio acadêmico, como também novos atritos com o
secretário da Faculdade, Dr. Olympio da Silveira. Nascia ali uma longa luta que se
encerraria somente com a federalização da Faculdade.
A reação do Diretório diante das mudanças no modo de cobranças das taxas foi o
seguinte ofício de 17 de fevereiro de 1943, endereçado ao presidente do Conselho
Técnico Administrativo:
Com referência à portaria de 16-02-1943 do Sr. Diretor da Faculdade,
relativa ao pagamento das taxas da Faculdade, este Diretório reunido em
sessão extraordinária resolveu dirigir a Vv. Excias. solicitando a reconsideração do ato apoiado por este Conselho de majoração e estipulação de
datas fixas de pagamento prévio das referidas taxas.
Como se sabe a situação financeira da grande maioria dos estudantes da
Faculdade não permite os mesmos maiores sacrifícios para satisfação das
obrigações assumidas para com a Tezouraria da Faculdade.
Concordamos, até certo ponto, com as necessidades financeiras que cercam a nossa Faculdade e temos feito o máximo possível para corresponder à supressão destas necessidades.
Em troca disso fosse-nos facultada, por parte da Faculdade, a liberdade de
satisfazer a esses pagamentos com menores restrições e maiores facilidades.
É viável concordar que para jovens que lutam contra dificuldades de toda
sorte, dentro de um meio pobre como é o nosso, cria-se uma situação
insustentável ao estabelecer o pagamento antecipado da taxa, tanto mais
que como de comum se verifica, até mesmo horas antes das provas ainda
o pobre estudante se esforça na obtenção das quantias exigidas para pagamento de suas taxas.
Este Diretório credenciou-se, principalmente no ano recém findo, para julgar melhor das necessidades monetárias dos estudantes que representa.
Solicitado pelos mais necessitados, o Diretório satisfez, na medida de suas
possibilidades, o pagamento de mensalidades num total de 7.000 cruzeiros.
Fê-lo, porém, de bom grado, consciente de haver cumprido seu dever de
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
315
amparo ao estudante pobre desta Faculdade.
Estamos certos que Vv. Excias., por seu lado, apóiam e aplaudem esta
obra elevada do Diretório e não concorrerão em absoluto para o prejuízo
dos nossos estudantes.
Pedindo a Vv. Excias. a reconsideração daquele ato e a criação de uma
fórmula mais simples que não acarrete maiores sacrifícios aos estudantes,
fazemo-lo confiados no alto espírito de compreensão de Vv. Excias. e na
elevação de seus sentimentos.
Aproveitamos a oportunidade para reafirmar a Vv. Excias. os nossos protestos de estima e consideração (FMCP, 1943a).
Aparentemente, em princípio o ofício não chegou a seu destino, e no dia 20 de
fevereiro o DAM enviaria outro documento, desta vez destinado diretamente ao
diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães, com o seguinte teor:
316
O Diretório Acadêmico de Medicina do Pará em reunião do dia 17 corrente
resolveu enviar um ofício ao Presidente e Membros do Conselho Técnico
da Faculdade de Medicina pleiteando certas medidas relativas ao modo do
pagamento de taxas e mensalidades, determinado por portaria de V. Excia.
Acontece, porém, que o referido oficio não poude dar entrada na Secretaria da Faculdade em virtude de ordem expressa do Sr. Secretário, a
todos os funcionários, para que não recebessem toda e qualquer correspondência remetida pelo Diretório, ordem essa que nos foi confirmada
verbalmente quando procuravamos, perante o Sr. Secretário, dar entrada
ao documento em questão.
Ante essa circunstância tomamos liberdade de envia-lo diretamente à V.
Excia., afim de que o mesmo possa ser tomado em apreço (FMCP, 1943a).
Em 15 de maio de 1943 toma posse a nova diretoria do DAM, assim composta:
Presidente
vice-presidente
Orador
1º secretario
2º secretario
1º Tesoureiro
2º Tesoureiro
Bibiliotecario
Consultores
Abraham Levy
Raimundo da Costa Chaves
Edgar Valente
Jean Chicre Bitar
José Damasceno
Ary Salgado
Carlos Costa
Agostinho Sales
Antonio Lobão
Presidente da Comissão de Beneficência
Mauricio Coelho de Souza
Presidente da Comissão de Imprensa e Publicidade
Miguel Cruz e Silva
Presidente da Comissão Social
José Guimarães
Presidente da Comissão Científica
(FMCP, 1943a)
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
A crise desencadeada pelo aumento das taxas, associada à falta de diálogo entre o DAM
e a secretaria da Faculdade, seguiria adiante, atingindo proporções ainda maiores no
ano de 1944, já na gestão de Raimundo Chaves, chegando inclusive aos jornais.
O Diretório posicionava-se terminantemente contra o sistema de pagamentos de
taxas de 4 quotas de Cr$ 500,00 em prazos fixos. No dia 11 de fevereiro de 1944,
em nota oficial publicada nos jornais, assinada pelo primeiro secretário Jean Chicre
Miguel Bittar, o Diretório
avisa que ainda não obteve resposta do recurso que dirigiu ao Conselho
Técnico Administrativo da Faculdade de Medicina, pedindo a revogação
da medida que determinou o pagamento das taxas e mensalidades por
antecipação, isto é, em quotas e datas estipuladas.
Deste modo, comunica aos colegas que não efetuem aqueles pagamentos
até ulterior deliberação, que será previamente anunciada por este Diretório (FMCP, 1944a).
No dia 20, com a situação sem resolução, o diretório seguiria firme exigindo que
os estudantes não se matriculassem, “enquanto não se solucionar o impasse criado
com o ato da Diretoria daquela Faculdade, instituindo a cobrança de taxas, englobadamente com cotas e prazos fixos” (FMCP, 1944a).
O diretor da Faculdade Dr. Acylino de Leão, resolve a questão de forma enérgica e
responde com a seguinte nota nos jornais:
A Diretoria da Faculdade de Medicina informa que:
a) O Conselho Técnico Administrativo resolveu definitivamente o caso
das taxas escolares, mandando cumprir o disposto na Portaria número 3, de
26 de fevereiro de 1943, sendo disso cientificado o Diretório Acadêmico;
b) Que absolutamente não houve aumento das taxas escolares;
c) Que cerrará as portas da Faculdade, caso não tenha alunos matriculados nas diversas séries do curso médico até o dia 25 do corrente mês de
fevereiro, às 16 horas (FMCP, 1943a).
No dia 25, em nota oficial o DAM informa que “tendo sido solucionado satisfatoriamente a questão das cobranças das taxas e mensalidades”, os estudantes deveriam efetuar
a matrícula, com o pagamento das taxas obedecendo ao seguinte sistema: Taxa de matrícula seria no ato da mesma; mensalidades até o dia 5 de cada mês; promoção, taxa de
laboratório e biblioteca, seriam pagas de primeiro a 15 de dezembro (FMCP, 1942a).
Em 27 de abril de 1944 é eleita a nova diretoria, ficando o diretório assim constituído:
Presidente
vice-presidente
orador
1º secretario
Pedro de Brito Tupinambá
Francisco D’Assunção S. Rosado Filho
Edgar Bezerra Valente
Ramiro Khoury
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
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2º secretario
1º Tesoureiro
2º Tesoureiro
Bibiliotecario
Consultores
Milton Benedito Ericeira
Sidonio Lucas de Figueiredo
João Abreu Reis
Antonio Juraci de Brito
Daphnis Ferrreira Souto Ferreira
Raynéro de Carvalho Maroja
Otávio Bandeira Cascaes
Miguel Lucio Cruz e Silva (FMCP, 1944a)
Comissões Científica-Presidente
Mário Medeiros
Beneficente-Presidente
José Carvalho da Cruz Barbosa
Social-Presidente
Miguel Lucio Cruz e Silva
Imprensa e Propaganda
Otávio Cascaes
(A Folha Vespertina, 03.05.1944)
Esta gestão seguiu uma linha diferente das anteriores conseguido talvez estabelecer mais diálogo com a Direção da escola, pois recebeu até elogios do Diretor Dr.
Acylino de Leão:
318
É de justiça consignar aqui os nossos aplausos ao Diretorio Acadêmico que
pela primeira vez, sob clarividente presidência do doutorando Pedro de Brito
Tupinambá, enveredou pelo caminho da disciplina, colaborando com a administração da Faculdade, em prol da nobre classe que representa.
O doutorando Tupinambá, com seus companheiros de Diretório, deu outra
orientação a este orgão de classe, que cumpriu fielmente esse ano aos fins a
que se destina. Os principais objetivos do Diretorio são congregar os representantes da classe e, principalmente, pugnar por seus interesses o que nunca se poderá conseguir sem a repulsa dos indesejáveis (FMCP, 1945c, p. 30).
No ano de 1945, o diretório apresentava a seguinte composição:
Presidente
vice-presidente
orador
1º secretario
2º secretario
1º Tesoureiro
2º Tesoureiro
Bibiliotecario
Consultores
Amílcar Pereira
Pedro Amazonas Pedroso
Luiz Pires
Milton Ericeira
Daphinis Souto
Carlos Costa
Agostinho Sales
Canuto Brandão
Alcimar Brígido
Antônio Souto
José Austregésilo Medeiros
Eliseu Rodrigues (FMCP, 1945a)
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Corpo da Revista do Acadêmico
Direção Jean C. Bitar
Diretor-gerente João Fecury
Diretor-secretário Renato Chalú Pacheco
Diretor-tesoureiro Gervásio Cunha Gonçalves
(Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 1).
Esta formação do DAM também manteria o período de “paz” com a diretoria da
Faculdade iniciado na gestão anterior:
O Diretório Acadêmico, superiormente dirigido pelo culto doutorando
Amílcar da Silva Pereira, seguiu a orientação do Diretório de 1944, que
inaugurou na Faculdade um período, de ordem, disciplina e progresso,
cuidando seriamente dos interesses da classe que nobremente representa
e dos principais problemas atinentes ao ensino.
Cumprindo a missão precipua de defender os interesses gerais dos estudantes e de tornar agradavel e educativo o convívio entre os membros do
corpo discente, alijando os indesejaveis e aproveitando os bons elementos, esse órgão da classe estudantina mereceu nossos aplausos pela orientação superior, clarividente e ordeira com que norteou seus trabalhos no
ano que findou (FMCP, 1946b, p. 33).
A “trégua”, contudo, não duraria muito e no início de 1946, tendo Pedro Amazonas
Pedroso como presidente, o DAM colidiria novamente com a Congregação e com
a Secretaria da Faculdade, pelos mesmos motivos dos últimos anos: aumentos das
taxas de mensalidades (sobretudo para alunos do primeiro ano), de laboratório e
biblioteca, que haviam sido aprovados em 25 de janeiro. Em abaixo assinado solicita a revogação das novas taxas com os seguintes argumentos:
a) Os parcos ordenados percebidos por alguns alunos desta Faculdade ou
por seus genitores não permitem fazer face às necessidades criadas pela
carestia de vida, situação que se torna insuportável com este aumento;
b) Temos sobejas razões para creditar que esta majoração de taxas, embora crie ingentes dificuldades a alguns colegas, não poderá de modo
algum melhorar os vencimentos dos dignos professores;
c) Não nos parece razoável criar dentro da escola distinção entre alunos,
devendo uns efetuar pagamento superior aos demais, o que contraria uma
aspiração deste Diretório, que é a igualdade de todos os colegas em qualquer ano ou condição em que se encontrem;
d) Esta entidade acadêmica compreende perfeitamente a situação difícil de
nossa Faculdade no que se refere às finanças, sendo nosso desejo trabalhar
afim que os ínclitos professores que aqui exercem magistério tenham uma
retribuição condigna com as elevadas funções que desempenham. Sabemos que as subvenções concedidas a esta escola não são suficientes, sendo
muito inferiores às concedidas a outras Faculdades do Brasil, razão porque este Diretório assume perante esta Congregação o compromisso de
envidar, juntamente com a Diretoria no decorrer do ano letivo de 46, to-
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
319
dos os seus esforços afim de que essa contribuição dos governos federal e
estadual seja elevada ao nível que se torna necessário, de modo a permitir
a nossa escola manter-se a altura das congêneres do país e continuar assim a preencher a lacuna do ensino médico na Amazônia (FMCP, 1946a).
A resposta do Secretário e do Tesoureiro teria sido “que a Faculdade não necessitava nem queria a colaboração dos estudantes. O que lhes interessava era o dinheiro
e nada mais”, adiantando ainda que o recurso seria inútil já que dificilmente a Congregação se reuniria com dois terços dos professores, muito embora o aumento das
taxas tenha sido votado sem o número de docentes previsto no regimento interno
da escola (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 55).
O diretório tentaria ganhar tempo, solicitando em outro abaixo assinado, desta vez
destinado ao diretor da Faculdade, que se “digne de sustar a execução da resolução da Congregação” (FMCP, 1946a), pois de acordo com a legislação da época o
aumento das taxas só poderia vigorar após a aprovação do Conselho Nacional de
Educação portanto seria “prematura e indevida referida cobrança [...] por faltarlhes um elemento essencial para sua validade e vigência. Até sua aprovação, as
modificações são um projeto de Lei e não Lei” (FMCP, 1946a).
Não conseguindo acordos o presidente do DAM, Pedro Amazonas Pedroso, dirige
o seguinte memorando ao Interventor Federal no Estado, Dr. Otávio Meira:
320
Exmo. Sr. Dr. Interventor Federal do Estado
O Diretório Acadêmico de Medicina, expressão da vontade coletiva dos
alunos desta Escola, confiante no sentido de justiça e no interesse demonstrado por V. Excia. em tudo que se refere o importante problema do
ensino, pede vênia para expôr o seguinte:
Este órgão de classe foi notificado há dias de que as taxas de laboratório e
biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará haviam sido majoradas para cem cruzeiros (Cr$ 100,00), cada e que a mensalidade dos alunos da
primeira série tinha sido elevada para duzentos cruzeiros (Cr$ 200,00). Ora,
já há muito que os jovens que tentam estudar medicina em nossa terra vêem
realizando ingentes sacrifícios para satisfazer o aumento sempre crescente
das taxas escolares. Quase anualmente, ou se criam novas taxas ou se aumentam as já existentes, criando-se para os alunos embaraços inumeráveis.
Agora, esta nova majoração, elevando as já enormes quantias exigidas, vem
tornar insuportável a situação de alguns colegas, que terão que abandonar o
curso por não poder efetuar tal pagamento.
Esta entidade acadêmica procurou entrar em entendimento com a escola,
enviando à Congregação da mesma um memorial, cuja cópia remetemos
à apreciação de V. Excia., e tentando mesmo entrar em contacto com a
Diretoria afim de procurar uma solução satisfatória, que harmonizasse
os interesses de ambas as partes. Nada logrou em virtude da má vontade
dos que se julgam proprietários desta Faculdade.
Quanto a descabida alegação da Escola de que o grande número de alunos
transferidos para o sul do país veio afetar enormemente as suas finanças,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
este Diretório tem a esclarecer a V. Excia. que cada um dos colegas a transferir-se deve efetuar o pagamento de dois mil cruzeiros (Cr$ 2.000,00),
afim de conseguir o seu intento.
Esperando as sábias providências de V. Excia., reitera seus protestos de elevada
estima e distinta consideração (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 56).
A questão atingiria esferas ainda mais elevadas no telegrama enviado ao General
Gaspar Dutra, presidente da República, ao ministro da Educação e ao diretor de
Divisão de Ensino Superior.
Comunicamos a V. Excia. Faculdade de Medicina vem de fazer nova e
descabida majoração das taxas escolares desrespeito tabela aprovada
Conselho Nacional Educação constante Regimento Interno pt Solicitamos urgentes providências sentido tornar sem efeito aumento em que
nada influenciará receita Faculdade subvencionada cem mil cruzeiros governo federal vg sessenta mil Estado e vinte mil prefeitura vg influindo
entretando vida estudantes grande maioria pobres e filhos funcionários
pt Certos tomareis providências urgentes agradecemos atenciosamente
solução – Atenciosas saudações – P. A Pedroso – Presidente (Revista do
Acadêmico de Medicina, 1946, p. 56).
Diante disso, em nota oficial o DAM declararia que:
os estudantes de medicina não se matricularão sujeitos as novas taxas e
para concretização de um dos maiores desejos dos universitários paraenses, solicitarão ao govêrno que seja encampada a Faculdade de Medicina,
tendo-se já iniciado as “demárches” nesse sentido que adiantamos, marcham para o fim almejado (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 56).
Começava a nascer ali um maior envolvimento dos discentes com a ideia de federalização da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará12.
Diga-se de passagem que estes aumentos anuais das taxas, tidos como arbitrários
pelos estudantes, eram o único recurso garantido que a Faculdade poderia dispor
para sua manutenção e lenta ampliação, visto que as subvenções públicas eram
sempre muito incertas. Conforme diria, quase em tom de desabafo, o Dr. Lauro de
Magalhães, quando diretor da Faculdade:
apesar de continuar reduzida a matricula [...] com muitas vagas gratuitas solicitadas pelo Govêrno do Estado, de não havermos recebido a subvenção anual de cem mil cruzeiros, do Govêrno Federal, e nem mesmo o
pequeno auxilio de doze mil cruzeiros, constante da lei orçamentária do
município, alegando o Sr. Prefeito de Belém dificuldades financeiras, e de
nos terem sido pagos apenas 60% do auxilio estadual, adquirimos novos
e modernos aparelhos, para nossos laboratórios, abundante material de
consumo, mobiliário para o gabinete da diretoria e livros para a biblioteca que se acha devidamente aparelhada e sempre à disposição dos estudantes, como se verificará no livro de consultas, encerramos o nosso ano
social com os nossos compromissos pagos em dia (FMCP, 1948c, p. 3).
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
321
O Largo de Santa Luzia ia ganhando cada vez mais ares de um campo de batalha,
e o DAM comprando novas brigas com o corpo docente. Agora o alvo era o professor de anatomia Dr. Ruy Romano Romariz, que em 22 de fevereiro de 1946,
endereçaria a seguinte carta ao Conselho Técnico Administrativo:
O infra assinado docente livre desta Faculdade tendo sido publicamente
atacado pelas colunas da “Folha Vespertina” edição de 20/02/46, pelo
indivíduo Pedro Amazônas de Souza Pedroso, infelizmente aluno desta
Faculdade e que se intitula Presidente do Diretório Acadêmico de Medicina, atualmente funcionando irregularmente com apenas cinco (5)
membros, solicita a V. V. Excias. nos termos do artigo 244 do Regimento
Interno a abertura de rigoroso inquérito afim de que seja devidamente
apurada e esclarecida as acusações feitas à minha pessôa, referentes ao
curso de preparação dos alunos que pretendem ingressar na Faculdade
(FMCP, 1946a).
O Diretório defenderia seu presidente alegando que a imprensa havia deturpado
a entrevista, sendo que os seguintes termos mencionados “testa de ferro” e “curso
clandestino” não haviam sido aprovados pelo DAM, conforme registrado em ata.
No mais o que mais havia sido dito tinha sido em defesa dos alunos, e com aval de
todos os demais membros do Diretório, portanto não poderia haver um inquérito
visando unicamente a figura de Pedro Amazonas Pedroso (FMCP, 1946a).
322
Em 22 de abril de 1946 são realizadas as eleições para nova gestão do DAM, em sessão presidida pelo catedrático Dr. Henrique Esteves, com o pleito transcorrendo sem
problemas. Dias depois, em nova sessão para aprovação da ata do dia 22, realizou-se
entre os 12 membros eleitos a votação para preenchimento dos cargos do Diretório, tendo os representantes do sexto ano eleitos para cargos de vice-presidente e
consultor, ficando como presidente um aluno do quinto ano. Não satisfeitos com o
resultado, os alunos sextanistas levantaram-se e apresentaram verbalmente o pedido
de renúncia à representação de sua série.
No dia 30 de Abril, alegando a renúncia dos representantes do sexto ano, o Conselho Técnico Administrativo reunido em sessão, decidiu não reconhecer o Diretório
negando a posse de seus membros, o que deveria ocorrer em primeiro de maio.
Sem conseguir o reconhecimento devido, em 13 de maio de 1946, os alunos eleitos,
mas não empossados, Jean Bitar, José Austregésilo Mendes, Durval Frazão Braga,
Canuto F. Brandão, Manoel Aires, Agostinho Leão de Sales, Carlos Augusto da
Silva Costa, Mário Augusto Morais, Abílio Cavaleiro Brito, e Orlando Almeida
Pinto, resolvem recorrer em recurso encaminhado ao Dr. Jurandir Lodi, Diretor da
Divisão de Ensino Superior (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946).
O recurso alegava que nenhuma disposição estatutária previa o cargo de presidente
como um privilégio dos sextanistas, podendo este ser ocupado por qualquer aluno
da Faculdade, muito embora em inúmeras vezes o DAM tenha sido encabeçado por
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
um aluno do sexto ano. E em dado momento sugere que o Conselho Técnico Administrativo teria tomado tal medida por serem os eleitos, “aquêles que no início do
corrente ano se opuzeram ao aumento, cada vez mais asfixiante, das taxas escolares em nossa Faculdade” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946). Finaliza dizendo
que a Faculdade encontrava-se desde o dia primeiro de maio em situação irregular,
visto que não contava com a participação de um órgão da classe discente.
A Congregação da Faculdade tentaria por sua vez desmoralizar ainda mais o Diretório por volta de junho, instaurando um inquérito para avaliar a situação do livro
caixa deste; e dada a aparente falta de recibos, falta de lançamentos, ausências de
páginas rubricadas pelo presidente e contradições em relação ao livro da Faculdade
foi fácil considerar a situação do Diretório irregular.
No entanto, a carta encaminhada ao Diretor da Divisão de Ensino Superior surtiu
efeito, e graças à intervenção deste a Congregação da Faculdade de Medicina e
Cirurgia do Pará resolveu em 18 de julho de 1946 reconhecer a legalidade da nova
gestão do DAM, assim constituída:
Presidente
vice-presidente
orador
1º secretario
2º secretario
1º Tesoureiro
2º Tesoureiro
Bibiliotecario
Consultores
Jean Chicre Miguel Bitar
Agostinho Sales
José Austregésilo Mendes
Manuel Aires
Mário Moraes
Carlos Costa
Canuto Brandão
Durvalino Braga
Rubens Coutinho
Agostinho Sales
Orlando Pinto
Abílio Brito
(Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 53)
Corpo da Revista do Acadêmico
Diretor Geral Jean C. Bitar
Corpo diretor Renato Chalu Pacheco
João Fecury
Gervasio C. Gonçalves
Eduardo Braga
(Revista do Acadêmico de Medicina, dez. 1946, p. 2)
Observe-se que a primeira formação desta gestão, logo após a eleição de abril contava com o acadêmico Milton Ericeira como vice-presidente ao invés de Agostinho
Sales. (FMCP, 1946a).
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
323
Jean Bitar vinha de outras gestões, tendo sido inclusive diretor da Revista do Acadêmico
de Medicina, portanto conhecia bem quais os problemas que o DAM costumava enfrentar. Agora como presidente levaria às últimas instâncias à ideia de federalização da Faculdade, tendo durante a realização do IX Congresso Nacional de Estudantes, submetido à consideração daquela Assembléia estudantil a “tese”: Federalização da Faculdade
de Medicina Necessidade vital do vale Amazônico (BECKMANN, 2002, p. 175).
A tese seria aprovada com unanimidade e segundo Beckmann:
Bitar e Armando Mendes percorreram, após, vários órgãos ministeriais
e o mau acolhimento que tiveram os fez tentar uma entrevista com o
Presidente da República. Recebeu-os Eurico Gaspar Dutra que os ouviu
e perguntou: “E o Pará tem Faculdade de Medicina?”, dando o tom anedótico à entrevista (BECKMANN, 2002, p. 175)13.
Armando Dias Mendes, então estudante de direito, mas que fazia parte da delegação da UAP que compareceu ao evento, recorda aquele congresso de estudantes e
episódios de “mau acolhimento” na peregrinação do DAM na então capital Federal
em busca de apoio a Federalização:
324
E em julho de 1946 mandamos uma dilatada delegação ao Congresso
Nacional dos Estudantes, que se realizava na sede da UNE – “União Nacional dos Estudantes”, no Rio de Janeiro.
[...]
Representavamos cada uma das Faculdades existentes e a própria UAP.
Na sessão inaugural, além de políticos de distintas legendas [...], falaram
depois os representantes dos estados, por ordem alfabética destes. A vez
do Pará chegou pelas duas horas da madrugada, e o alvo preferido foi o
Diretor de Ensino Superior do MEC. Na véspera, ou nesse mesmo dia, ao
receber a delegação paraense, que pleiteava a federalização da Faculdade
de Medicina e a abolição das taxas escolares, respondera de maneira muito expedita que quem não podia pagar devia ir plantar batatas. Desnecessário dizer que a referência ao episódio fez o nome do ilustre dirigente
ser não propriamente ovacionado (MENDES, 1998, p. 45).
Ficaria portanto marcada esta gestão por ter catalisado o processo de federalização
da Faculdade.
Tentaria ainda Jean Bitar mudar algumas disciplinas do sexto ano, do turno da manhã para o turno da tarde, “considerando a necessidade imperiosa da prática hospitalar nos últimos anos do curso médico; considerando que os diversos Serviços
do Hospital da Santa Casa, campo de ação dos estudantes de medicina funcionam
pela manhã...” (FMCP, 1946a).
Mesmo sem contar com a simpatia dos dirigentes da Faculdade, o DAM realizaria
outros feitos, seguindo ideias criadas ainda na gestão de Abraham Levy como: obtenção de vagas gratuitas junto ao Governo do Estado, visando auxiliar os colegas
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
mais pobres, emprestimos aos colegas que não conseguiam o suficiente para pagar
as taxas da Faculdade, aquisição de novos livros para a biblioteca “Dr. Camilo Salgado”, realização de conferências científicas e Cursos de Extensão Universitária
(Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 47).
Após as eleições em 24 de abril 1947, surge nova gestão empossada em primeiro de
maio, com a seguinte composição:
Presidente
vice-presidente
orador
1º secretario
2º secretario
1º Tesoureiro
2º Tesoureiro
Bibiliotecario
Consultores
Aloysio de Andrade Mello
João Maranhão Aires
José Austregésilo Mendes
Raynero de Carvalho Maroja
Almiro Monte
Abilio Cavalleiro de Brito
Nagib Hage
Agostinho Araújo Barbosa
Agostinho Salles Filho
Eduardo Braga Motta
Eduardo Pereira Braga
Henry Checralla Kayath (FMCP, 1947a)
Corpo da Revista do Acadêmico
Diretor Geral Josias F. Macedo
Redatores Aloisio Melo
Eduardo B. Motta
Almiro Monte
Agostinho A. Barbosa
(Revista do Acadêmico de Medicina, 1947, p. 2).
Entre os feitos registrados desta gestão, há a realização da tradicional “Festa da Esmeralda”, que mereceu a seguinte cobertura na “Revista do Acadêmico de Medicina”:
Foi um acontecimento que deslumbrou a todos os que tiveram o ensejo
de assistir a festa de confraternização entre calouros e “doutores” de nossa Faculdade de Medidina.
Nada faltou para que esta festa fosse cognominada como “líder” de nossas
faculdades. A ornamentação esteve estonteante. As moças bonitas com seus
vestidos policrômicos tentavam ofuscar o brilho das luzes da noite de luar.
Lá fora, a lua, como para homenagear a noitada dos acadêmicos de Medicina, apresentava-se vestida magnificamente: era o plenilúnio.
Os jovens se divertiam. A orquestra, aliás, a melhor de Belém, com Maçaneta à
frente, tocava entre sustenidos e bemóis o fox “Laura” e o samba “Marina”.
Tudo era alegria. Os pares dançavam e até os acadêmicos de Medicina
esquecidos das Anatômias, Microbiologias e Clínica Médica, também externavam sua satisfação por terem organizado tão linda festa... (Revista
do Acadêmico de Medicina, 1947, p. 38).
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
325
Ainda no mesmo ano, encontramos o registro da “Noite Verde”, evento realizado
em benefício dos colegas sem condições de arcar com as mensalidades da Faculdade. Segue transcrição da “Revista do Acadêmico”:
Num ambiênte de requitada elegância, a sociedade paraense se reuniu no
dia 25, numa agradável noitada, promovida pelo Diretório Acadêmico de
Medicina, na Barraca do Sagrado Coração de Jesús, no arraial de Nazaré.
É mais uma realização de vulto de nosso órgão classista, cuja direção
congregou o mundo diplomático e oficial de nossa metrópole, numa ceia
“sui-generis” cognominada a “Ceia das Nações”. O “grand-mond” social
belemense, emprestou a sua colaboração ao nosso colega pobre, em pról
de quem reverterá o produto da noite.
Um bem organizado cardápio foi servido aos convivas, por “delicieuses
poupeés” ornamentos raros de nossos salões, que emprestaram ao jantar
o fulgor de sua graça e o brilho de sua belêsa.
Estão de parabens os nossos colégas do Diretório pela sua notável inicitiva,
à qual obteve pleno exito (Revista do Acadêmico de Medicina, 1947, p. 39).
O DAM de 1947 conseguiria ainda a criação de uma vaga gratuita que recebeu o nome
de “Abraham Levy” em justa homenagem aquele que foi para seus contemporâneos
um dos maiores presidentes do diretório e havia falecido tragicamente por afogamento na praia de Copacabana pouco depois de formado (BENCHIMOL, 1998, p. 145).
326
Em 1948 disputas políticas entre os estudantes causariam novo tumulto durante
as eleições do DAM:
O CORPO DISCENTE desta nobre e tradicional instituição de ensino
médico do Norte, ainda profundamente surpreso com a inexplicável atitude de alguns de seus membros, que no dia 29 de abril próximo passado,
empastelaram violentamente a sessão da Assêmbleia Geral que o Diretório Acadêmico relizava para eleição da diretoria para o período 19481949... (FMCP, 1948a).
Diante da balburdia, o Conselho Técnico Administrativo decidiu “moldado nos
mais firmes sentimentos de justiça e disciplina” (FMCP, 1948a), mais uma vez, não
reconhecer o DAM naquele ano, não permitindo novas eleições.
Iniciavam-se novamente em 15 de maio os apelos estudantis pela volta de seu órgão representativo, solicitando nova data para realização das eleições.
considerando que os fomentadores daquele movimento, constituem inegavelmente uma restrita minoria desta briosa falange acadêmica; considerando que ao Diretório Acadêmico, não coube exclusivamente culpa
alguma no fato ocorrido, e que o mesmo, apezar de seus esforços, não
conseguio infelizmente manter a órdem dos trabalhos, por se tratar de
um movimento premeditado com fins subversivos; [...] considerando ser
de inteira justiça permitir a realização das eleições dêsse órgão classista,
infelizmente tão desvirtuadas que fôram, por alguns colegas rebeldes e
mal intencionados... (FMCP, 1948a).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Desta vez, os estudantes devem ter passado dos limites, pois mesmo um abaixo assinado de 15 de maio de 1948, dos alunos do quinto ano alegando que o Diretório
“não é apenas um orgão de defêsa dos interesses da Classe Acadêmica, mas também um colaboradôr dos orgãos dirigentes de nossa Escola, no sentido de torna-la
sempre maior e mais respeitada” (FMCP, 1948a), não surtiu nenhum efeito, sendo
um novo pleito dentro da legalidade permitido apenas no segundo semestre. O
professor Dr. Rui Romariz que presidiria a nova eleição, escreveria para o Diretor
da Faculdade e Conselho Técnico Administrativo sobre o novo pleito:
Desobrigando-me do que me foi designado pelos doutos membros do Conselho Técnico Administrativo, levo aos vossos conhecimentos que a eleição regimental para composição do Diretório Acadêmico, decorreu dentro de perfeita
ordem, sem deslise disciplinar algum, observando-se mesmo perfeita cordialidade entre os contendores. Com grande satisfação constatei que os senhores
acadêmicos, desta vez, enveredaram pelo caminho ordeiro, ao contrário das
outras eleições, nas quais tiveram atitudes desabonadoras, muito aquém da linha que deviam manter como futuros membros da nobilissima classe médica.
As atas que o Secretário eventual compôs, e a mesa apresenta, as quais
tive ocasião de assinar, são expressão da verdade. Em palavras singelas,
esboçam tudo o que se passou.
Dentre as providências que tomei tive o cuidado de cômpor a mesa com
membros das duas faccções em litígio, dois membros da quinta série e
dois do Diretório que era considerado ilegal. Interessei assim as duas
facções na execução das eleições, o que deu ótimo resultado. Os escrutinadores em número de dois, foram escolhidos dentre os acadêmicos que
no momento se encontravam no recinto.
Congratulo-me, pois, com a Diretoria pela execução perfeita das instruções emanadas deste Conselho Técnico Administrativo, transformando
em cordial uma questão litigiosa, que vinha dividindo os discentes, provocando mesmo polêmicas algo desairosas pela imprensa (FMCP, 1948a).
Desta forma ficava assim constituído para o ano de 1948, o Diretório Acadêmico
de Medicina:
Presidente
vice-presidente
orador
1º secretario
2º secretario
1º Tesoureiro
2º Tesoureiro
Bibiliotecario
Consultores
Agostinho Sales Filho
Nagib Jorge Hage
Almiro Monte
Carlos Asclepíades de Lima
Elias Gattasse Kalume
José Contente
Coryntho Silva
Everaldo Martins
Henry Kayath
Raimundo Nonato Vasconcelos
Raynero Maroja
João Abreu Reis (FMCP, 1948a).
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
327
Tal gestão chegou a instituir mais uma vaga gratuita em auxilio dos estudantes pobres, que recebeu o nome de vaga “Camilo Salgado” (FMCP, 1948a). No entanto, essa
gestão teria vida curta, ficando o ano de 1948 marcado como um ano cinzento para o
DAM, conforme o relatório da Faculdade, pelo Diretor, Dr. Lauro Magalhães:
Não obstante terem sido realizadas três (3) eleições para formação do
corpo dirigente desse órgão de classe, os representantes das diversas séries não chegaram a um resultado satisfatório.
Deixou, por isto, o Diretório de ter existência legal este ano (FMCP,
1949b, p. 35).
Os livros de documentos expedidos e recebidos do ano de 1949 trazem poucas
informações da gestão daquele ano, que eleita em de 22 de abril teria os seguintes
integrantes:
328
Presidente - Almiro Pinheiro Monte
Vice-Presidente - Roberto Lobato da Costa
1º Secretário - Everaldo de Souza Martins
2º Secretário - João Paulo Mendes
1º Tesoureiro - Nagib Jorge Hage
2º Tesoureiro - Anísio Ferreira Jordy
Orador - José Haroldo de Menezes
Bibliotecário - Orlando Salomão Zoghbi
Consultores - Raimundo Nonato de Vasconcelos
- Heber Monção
- Carlos Asclepíades de Lima
- Renee Sá de Figueredo
(FMCP, 1949a)
E em pouco tempo Nagib Jorge Hage passaria a assinar como vice-presidente.
Este é um panorama dos primeiros anos do Diretório, “baluarte inquebrantável,
sofrendo sempre a ação demolidora dos mal avisados, mas resistindo a todas as
refrégas” (Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 47). Longe de um estudo
definitivo, haja vista que dados sobre algumas gestões não foram encontrados, é
apenas uma amostra dos primórdios de uma agremiação atuante que lutava então
somente pelo interesse dos discentes, sem conotações partidárias. Um órgão cujo
principal adversário, além das acirradas disputas internas, era o corpo administrativo da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Não que isso coloque os dirigentes da escola como vilões, mas apenas como “homens habituados à luta, capazes de
defender o que julgavam justo e conveniente para sobrevivência da instituição que
ajudaram a construir” (BECKMANN, 2002, p. 175), e que tudo faziam para que a
Faculdade seguisse o caminho por eles planejado.
Fazer parte do DAM era sinônimo de atritos com a Direção. Por mais que os exmembros do diretório se projetassem após formados, como por exemplo Edward
Catete Pinheiro (que se tornou político de renome), Abraham Levy, Pedro AmazoMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
nas Pedroso (ambos hoje emprestam seus nomes a escolas públicas em Belém), Jean
Bitar (diretor durante muitos anos do Hospital Servidores do Estado, do Instituto
Ofir Loyola e primeiro diretor da Faculdade de Medicina do Estado do Pará), eles
dificilmente conseguiriam ambiente para voltar a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará como professores.
Restou-lhes o reconhecimento como destacados líderes estudantis.
NOTAS
1
“Haverá hoje, às 5 horas da tarde na séde da Faculdade de Medicina, uma
reunião collectiva do corpo discente, para tratar de interesse da classe. Por
nosso intermedio os promotores dessa reunião convocam o comparecimento
de todos os alumnos” (Estado do Pará, 01.06.1926, p. 3).
2
A festa do “Thermometro” é a mais antiga festa dos acadêmicos da FMCP
da qual se tem notícia, precedendo a criação do CAM. A referência mais
remota encontrada sobre este evento é em Estado do Pará de 17 de maio de
1925: “Entre outras coisas ficou deliberada a escolha do dia 14 de julho para
a tradicional festa do “Thermometro”, com o concurso de todos os alumnos
da Faculdade”. (N.A).
3
Diferente do livro de documentos recebidos pela Faculdade, a Folha do Norte coloca como bibliotecário o acadêmico do primeiro ano Nilson Silva.
4
Folha do Norte, Vida Acadêmica, 27 de abril de 1932. Alliança Academica
era o nome da chapa vencedora. (N.A).
5
Nenhum exemplar deste jornal foi localizado, o que seria uma fonte importantíssima para traçar um panorama mais completo da vida acadêmica de
então. (N.A).
6
Assinada pelo seu primeiro secretário, Clidenor de Freitas. (FMCP, 1934a).
7
Assinava o presidente do DAM, Cattete Pinheiro. (FMCP, 1934a).
8
O professor Dias Junior possuía um prestígio enorme entre os alunos, sendo sempre bem aceito como representante da Congregação nas reuniões do
Diretório, Antônio Juracy Brito conta que: “numa ocasião talvez para nos
castigar, a Congregação se fez representar por outro professor. Os alunos
não aceitaram:
se rebelaram, tumultuando, não deixando se realizar a desejada eleição. Ficamos, por isso, durante muitos dias, com o Vice-Presidente, de mandato
extinto, meu colega de turma João Maranhão Ayres, respondendo pelo Diretório até que o mestre voltasse a presidir a eleição” (BRITO, 1991, p. 14).
9
Até o momento foram localizados apenas onze números, sendo que de alguns talvez reste apenas um exemplar. (N.A).
10
A data do reconhecimento do DAM é a mesma de quando ele deixa de ser
chamado de Centro Acadêmico de Medicina passando a Diretório. Muitas
fontes, inclusive do próprio DAM, colocam esta data como de fundação, ignorando por completo a existência e as ações do CAM. (N.A).
11
Observa-se que esta é a terceira vez que a biblioteca do DAM é “inaugurada”, e sempre sem menção às iniciativas anteriores, como se o projeto
partisse sempre do zero. (N.A).
Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949
329
12
A questão da federalização dada sua complexidade é melhor analisada em
outro capítulo. (N.A).
13
Em depoimento para este livro, Armando Mendes apresenta sua versão
para o episódio: “No que diz respeito, especificamente, à audiência com o
Presidente Dutra, recordo-a perfeitamente. Não recordo os termos precisos
do diálogo travado. Mas o Prof. Beckman -- apoiado não sei se na tradição
oral ou em algum testemunho dado por escrito -- é fonte confiável. E se o
Presidente Dutra disse, foi a sério que o disse, não era homem de brincadeirinhas, ainda mais com dois molecotes desconhecidos do norte”. (N.A).
330
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
19
A Atlética
331
332
Detalhe de azulejo de uma das paredes da FMCP.
Quando um estudante de medicina da UFPA ou mesmo um médico formado em
Belém tem contato com as escolas médicas do sudeste, ele se defronta com uma instituição completamente desconhecida atualmente no Estado do Pará: são as chamadas Associações Atléticas Acadêmicas de Medicina, ou simplesmente “Atléticas”.
As Atléticas são, em geral, uma seção do Diretório ou Centro Acadêmico cuja finalidade é organizar eventos esportivos para os alunos, como por exemplo, jogos
inter-classes de diferentes modalidades. Não raro a Atlética se torna tão importante que adquire autonomia suficiente para separar-se por completo do Diretório,
rivalizando com este na popularidade entre os estudantes.
No sudeste, inicialmente apenas em São Paulo, e hoje em outros estados da região,
são as Atléticas que organizam durante a Semana da Pátria os chamados “Jogos
Intermed”, uma grande e acirrada competição desportiva, abrangendo diferentes
modalidades, envolvendo diversas escolas médicas do estado e cada ano sediada
em uma cidade diferente onde haja uma escola participante. No caso de São Paulo,
que sedia a Intermed mais antiga e tradicional, e talvez por contar com um grande
número de escolas médicas, existe espaço até para uma segunda divisão.
Mas e no Pará, já houve uma Atlética? Eis a questão.
Para as gerações mais novas a resposta certamente será não, uma vez que tal instituição, como dito anteriormente, lhes é completamente desconhecida, embora
tenha existido, sim. E se reconstruir as gestões passadas do DAM, que existe até
hoje, já é um trabalho ingrato pela falta de documentação, o que dizer então de uma
instituição que desapareceu completamente sem deixar vestígio algum?
No entanto no estatuto do ainda Centro Acadêmico de Medicina do Pará, datado
de sua fundação em 21 de abril de 1930, o artigo 63 prevê uma seção esportiva que
poderia ser filiada ao centro:
Paragrafo 1: Esta secção esportiva poderá organisar um regimento interno, contanto que suas disposições não infrinjam estes Estatutos;
Paragrafo 2: Sua direccção deverá recahir em seus próprios filiados e
constará dos seguintes membros: Director de Esportes, Secretario e
Thezoureiro;
Paragrafo 3: O Director de Esportes poderá comparecer ás reuniões da
Directoria ou do Conselho Deliberativo desde que para isso tenha sido
convidado pelo Presidente;
Paragrafo 4: O Centro Acadêmico de Medicina do Pará não responderá
pelas obrigações contrahidas pelos dirigentes desta secção. Para responder por estas obrigações, deverá ter a dita secção esportiva um movimento de receita e depesa independente do Centro;
Paragrafo 5: O Centro poderá desde que suas possibilidades o permittam
auxiliar pecuniariamente a dita seção (FMCP, 1930).
A Atlética
333
Nascia ali, ainda que possa ter sido apenas estatutariamente, o embrião da Atlética
da Faculdade, já com relativa autonomia.
Não encontramos documentação que demonstrasse quando a Atlética foi efetivamente criada. Sabe-se que em 1937 a “Liga Athlética Paraense” organizou um
campeonato acadêmico envolvendo modalidades como futebol, vôlei e basquete e
convidou o Diretório (FMCP, 1937b). A documentação da época mostra inclusive
solicitação feita pelo DAM à diretoria da Faculdade visando uma ajuda de custo
para compra de uniformes esportivos. No entanto, não há nenhuma menção à Associação Atlética Acadêmica de Medicina.
O documento mais antigo encontrado, e que demonstra a existência efetiva e já
bem estabelecida da Associação Atlética Acadêmica de Medicina do Pará, é uma
nota em um exemplar de 1944 da Revista do Acadêmico apresentando a Atlética
de Medicina unida com as de Direito, Engenharia e Odontologia na criação de
um órgão destinado ao controle completo de todas as atividades esportivas universitárias do estado: a Federação Acadêmica Paraense de Esportes (FAPE), cujo
primeiro diretor foi o doutorando Alcindo Nova da Costa, que durante os três anos
anteriores vinha dirigindo a comissão de esportes do DAM.
334
Outra informação encontrada a respeito da Atlética é uma nota em uma Revista do
Acadêmico do ano de 1946 a qual, pela escassez de documentação sobre o assunto,
transcrevemos integralmente:
ASSOCIAÇÃO ATLÉTICA ACADÊMICA DE MEDICINA
No Pará, os estudantes de medicina jamais deixaram de sentir necessidade da prática dos esportes, em todos os seus ramos. Assim vencendo certos obstáculos que se impuzeram, em setembro próximo passado, na Faculdade de Medicina, teve lugar uma reunião de Assembléia Geral, afim
de eleger o corpo dirigente da AAAM para o período de 1945-1946.
A diretoria eleita, compenetrada de suas obrigações, desde o início procurou empregar o maior de seus esforços no sentido do alevantamento de
nossa Associação Atlética. Iniciou-se desde logo campanha com o objetivo de reunir numerário suficiente para aquisição de material esportivo e
ao mesmo tempo reorganizar, também em material, a secretaria.
Do produto desta campanha lançada entre os alunos e médicos de nossos
hospitais farto material já se encontra em nossa sede.
O dia 29 de setembro marca uma das maiores vitórias da agremiação esportiva da Faculdade de Medicina. Nessa data teve lugar a realização de
seu festival, levado a efeito na praça de esportes do Clube do Remo. Nele
tomariam parte os diversos Colégios secundários e superiores, tendo constituído a prova de honra, um encontro entre médicos e bachareis locais.
Após longos anos de ausência voltaram os eternos rivais ao gramado
afim de resolver uma velha questão. Embora o quadro de bacharéis fosse
o favorito, a equipe de médicos após uma partida disputadissima, conseguiu levar da melhor, derrotando seus adversários pela elevada contagem
de 6 x 0. Dessa maneira foram portadores de valioso troféu, que foi genMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
tilmente oferecido aos estudantes de medicina. Nessa mesma manhã, o
quadro representativo da Faculdade de Medicina, num encontro com a
Faculdade de Direito conseguiu vitória pelo escore de 3 x 1.
Movimentam-se nestas condições os estudantes de medicina, procurando
desenvolver ao máximo, os esportes em nossa Escola, visando justamente o valor da cultura física como fator importante no desenvolvimento da
raça (Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 53).
A mesma revista em outra nota define a Atlética como uma seção do DAM, filiada
a Confederação Brasileira de Desportos Universitários (CBDU), e “...que muito
tem contribuído para o progresso dos esportes universitários em nosso Estado”
(Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 50).
Além dos tradicionais futebol, volei e basquete, um dos esportes mais populares
entre os estudantes de então, hoje desaparecido do meio acadêmico, eram as regatas realizadas na baía do Guajará. As disputas entre Medicina, Engenharia e Direito eram bastante acirradas nesta modalidade. A organização das competições era
grande, contando até com embarcações cedidas para as torcidas. A Folha do Norte
de setembro de 1946, notícia que o diretório acadêmico de engenharia havia conseguido o vapor “State of Delaware” da SNAPP, e bastava aos estudantes que desejassem prestigiar as competições apresentarem suas carteiras da União Acadêmica
Paraense (UAP) na hora do embarque, ou algum convite especialmente distribuído.
Dentro do barco a banda de Jazz do maestro Maçaneta garantiria a animação. A
equipe de Medicina que competiria naquele dia contra Direito e Engenharia era a
seguinte, devidamente identificada com uma flâmula verde: Raimundo Libório (patrão), Pedro Megalli (voga), Ilmo Moreira (sota-voga), Agostinho Sales (sota-proa)
e Heber Monção (proa). (Folha do Norte, 29 de setembro de 1946).
A Atlética seguiria em frente existindo outras rápidas menções a ela após 1949,
período que ultrapassa os limites deste livro. E do mesmo modo como não foi
possível precisar quando a Atlética começou, não se sabe exatamente quando ela
desapareceu, muito menos por quê, uma vez que a documentação mais recente
encontrada a esse respeito é um livro de termos de posse, iniciado em 1967, e
cuja última data registrada é de 25 de agosto de 1970 ficando repentinamente em
branco a partir daí (ASSOCIAÇÃO ATLÉTICA DE MEDICINA, 1967). Esperamos que a leitura deste texto possa despertar lembranças nos que de algum modo
militaram na Atlética e que eles o enriqueçam com contribuições, a fim de que se
possa preencher mais essa lacuna do passado de nossa Faculdade de Medicina e
Cirurgia do Pará.
A Atlética
335
336
20
A Sociedade
Acadêmica de Medicina
e Cirurgia do Pará
337
338
Detalhe de pintura nas paredes da FMCP.
Além do Diretório pelo menos mais uma agremiação dos acadêmicos de medicina surgiu na década de 1930: a Sociedade Acadêmica de Medicina e Cirurgia do Pará –SAMCP. Fundada em 11 de agosto de 1933, tendo como endereço a praça da República,
nº 40, sob os “auspícios dos acadêmicos do quarto, quinto e sexto ano [...], destinada
a desenvolver os conhecimentos médicos de seus sócios e estabelecer o intercâmbio
médico-científico com os demais núcleos congêneres do país...” (FMCP, 1933b)1.
Contava com os seguintes fundadores
Presidente
vice-presidente
orador
1º secretário
2º secretário
Tesoureiro
Bibiliotecário
1º suplente
2º suplente
3º suplente
Humberto Franco
Mário Ferreira
Sila Andrade
Arnaldo Prado
José Macedo
Milton Cordovil
Abilio Gonçalves
Aluízio Fonseca
Fernando Mendes
Milton Lobato
Esta sociedade realizava apresentação e discussão de trabalhos científicos feitos pelos
próprios associados, não tomando parte na realização de eventos festivos (Folha do Norte, 18.02.1934). Sua primeira sessão aconteceu em 23 de setembro de 1933, às 20h30,
quando foram apresentados os trabalhos “Consideração sobre um caso de hipertensão”
e “Uma família hemofílica” de autoria dos doutorandos Humberto Franco e Ferdinando
Santos. Os comentários dos assuntos explanados foram feitos pelos estudantes Scylla
Andrade, Arnaldo Prado, Lucival Lobato, Armando Maroja, Fernando Mendes e Leônidas Deane. As discussões foram “...animadas sempre bem conduzidas e nas quaes tomou parte tambem a maioria dos academicos presentes” (Folha do Norte, 23.09.1933).
Nota-se que entre os alunos citados, havia, também, componentes do Diretório, o
que derruba qualquer teoria de que a SAMCP pudesse ser fruto de uma dissidência
do DAM. Na verdade, a SAMCP aparece mais como um órgão de cunho meramente
científico, assumindo um caminho paralelo ao do diretório e não antagônico a este.
Tal hipótese é reforçada pelas atividades desenvolvidas em conjunto entre as duas
instituições, como uma sessão solene realizada em 16 de fevereiro de 1934, em
homenagem ao centenário do nascimento do cientista alemão Ernest Haeckel, na
qual Leônidas Deane representou a SAMCP e Hermínio Pessoa, Nery Guimarães
e Clidenor dos Santos representaram o diretório (Folha do Norte, 10.02.1934).
Outros temas foram apresentados em sessões posteriores, como na sessão de 8 de
março de 1934, quando “A diferença do poder acidógeno do bacillus bulgaricus e
do bacilus acidophilos”, de autoria do quintanista Leônidas Deane, e “Um caso de
retenção completa provocado por fimose”, do doutorando José de Sousa Macedo,
A Sociedade Acadêmica de Medicina e Cirurgia do Pará
339
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foram debatidos. A comissão crítica ao primeiro trabalho foi composta por Álvaro
Nascimento, Lucival Lobato e Gladstone Deane, e do segundo Jacyntho Moreira
Netto, Paulo Bentes de Carvalho e Albino Figueredo Junior, todos estudantes de
medicina (Folha do Norte, 03.03.1934).
Ainda em 24 de abril daquele ano o quartoanista Emanuel de Castro apresentou
“Um caso de piopneumotórax”, cujos comentários ficaram a cargo do doutorando Emydio Pereira, do quintanista Abílio Maranhão Gonsalvez e do quartanista
Adalberto Menezes (Folha do Norte, 24.04.1934).
Os acadêmicos da FMCP buscavam com a Sociedade uma forma de iniciação científica, além de preencher eventuais lacunas do ensino, tomando contato com assuntos menos comuns.
Esta saudável iniciativa infelizmente não duraria muito e logo as referências a respeito da “Sociedade Acadêmica de Medicina e Cirurgia do Pará” desaparecem dos
jornais, não sendo possível precisar com exatidão a duração desta agremiação engolida pelo tempo, da qual nem sequer um estatuto foi encontrado.
340
Observar
Foto 62: Acadêmicos
da turma de 1937
em frente à Faculdade.
xxxxxxxxx
Obeservar detalhes
da fachada antes das
grandes reformas.
Fonte: Acervo
dos autores.
NOTA
1
Memorando endereçado ao Conselho Técnico Administrativo em 9 de setembro de 1933.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
21
O Serviço de
Verificação de Óbitos
341
342
Detalhe em gesso do teto de uma sala da FMCP.
Embora a princípio possa parecer estranho, mas a história da Faculdade de Medicina contempla, também, a existência e a participação de um Serviço de Verificação
Óbitos – SVO, atividade de vital importância para o planejamento de adequadas
ações na área da saúde, ao fornecer dados relacionados à morbimortalidade de um
determinado grupo social. Ainda que inexista atualmente, sendo vez por outra
lembrada sua necessidade e reclamada sua “criação”, o SVO figura nos anais da
antiga Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Sim, é verdade que já tivemos um SVO no estado do Pará. Sua criação se deu em
1945, no período de interventoria do então coronel Magalhães Barata, e através do
Decreto- Lei Nº. 4.745, de 23 de Abril de 1945. Depois de entendimentos entre a
Diretoria da Faculdade, o Chefe de Polícia, capitão Moura Carvalho, e o Diretor do
Serviço Médico Legal, Dr. José Mariano Cavaleiro de Macêdo, o referido decreto
transferia para a Faculdade as atividades pertinentes ao órgão e antes executadas
pelo Serviço Médico Legal. O novo Serviço ficaria anexo ao Departamento de
Anatomia e Fisiologia Patológicas da Faculdade de Medicina, sob a direção do
professor Dr. Jayme Aben-Athar.
A íntegra do Decreto, por sua importância histórica, transcrevemos:
DECRETO-LEI Nº. 4.745 — DE 23 DE ABRIL DE 1945
Passa o Serviço de Verificação de Óbitos para o Departamento de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, e dá outras providências.
O INTERVENTOR FEDERAL:
usando da atribuição que lhe confere o artigo 6.°, item V, do decreto-lei
n.° 1.202, de 8 de abril de 1939,
DECRETA:
Art. l.° — O Serviço de Verificação de Óbitos, no Município da
Capital, será entregue ao Departamento de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Art. 2.° — Para ocorrer às dêspesas com a realização do serviço
a que se refere o artigo anterior, o Govêrno do Estado contribuirá com
cinco mil cruzeiros mensais (Cr$ 5.000,00).
Art. 3.° — Incumbe ao Serviço de Verificação de Óbitos a determinação da causa-mortis:
a) dos indivíduos falecidos sem assistência médica;
b) dos indivíduos falecidos com assistência e atestado médico,
sempre que o Departamento Estadual de Saúde ou o Serviço MédicoLegal julgar necessário apurar a exatidão do diagnóstico.
Art. 4.° — Não poderá o oficial do Registro Civil, nos óbitos sem
assistência médica, fornecer guia para enterramento sem que lhe seja
apresentado atestado fornecido pelo Serviço de Verificação de Óbitos.
Art. 5.° — O Serviço de Verificação de Óbitos fará registrar os
atestados, por êle expedidos, nos Cartórios do Registro Civil do Distrito
em que se der o óbito, independentemente do pagamento de emolumen-
O serviço de verificação de óbitos
343
344
tos, que, todavia, serão cobrados dos interessados, quando estes pedirem
certidão de óbito.
Art. 6.° — Os atestados de óbitos serão assinados pelos médicos
assistentes e obedecerão ao modelo adotado pelo Departamento Estadual de Saúde.
§ Único — O médico que tiver assistido à última doença não
poderá se furtar a passar o atestado de óbito, salvo razões especiais, que
apresentará por escrito, ao Serviço de Verificação de Óbitos.
Art. 7.° — Nenhuma verificação de óbito de indivíduo falecido
sem assistência médica será feita sem apresentação da guia fornecida pela
autoridade policial, declarando não se tratar de crime.
§ Único — Se, apesar dêste documento, houver suspeita de crime, suicidio ou acidente, deverá o Serviço de Verificação de Óbito recusar
o atestado de óbito, declarando à autoridade policial os seus motivos,
para a necessária perícia médico-legal.
Art. 8.° — Ao Serviço Médico-Legal incumbirá, ainda, acompanhar as necropsias do Serviço de Verificação de Óbitos que necessitarem
de assistência do médico legista, a juízo dos médicos do Departamento
de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Art. 9.° — Quando fôr apresentado para registro atestado de
óbito de que conste “causa-mortis’’ mal definida, o oficial do Registro
Civil procederá o registro, porém, não expedirá guia de enterramento,
devendo comunicar, imediatamente, a ocorrência ao Serviço MédicoLegal, que providenciará o encaminhamento do cadáver, ao Serviço de
Verificação de Óbitos, o qual procederá a necessária necropsia.
Art. 10.° — O Serviço de Verificação de Óbitos manterá para
com o Serviço Médico-Legal um serviço de informações e dados estatísticos, notificando, quinzenalmente, os diagnósticos, remetendo os protocolos das necropsias, diariamente, ao Departamento Estadual de Saúde.
Art. 11.° — O Serviço de Verificação de Óbitos será feito sob
segredo profissional.
Art. 12.º — Ao Serviço de Verificação de Óbitos incumbirá a fiscalização de embarques de cadáveres para fora do Município da Capital.
Art. 13.° — O transporte de cadáveres só poderá ser feito sem
conservação, ate o prazo de 24 horas, entre o falecimento e o sepultamento, a critério do Serviço de Verificação de Óbitos.
§ Único — Será exigida a conservação simples do cadáver, quando se trate de sepultamento a ser feito dentro de três (3) dias após o
falecimento e embalsamamento, com caixão hermeticamente fechado e
selado, se se tratar de prazos maiores.
Art. 14.° — Após reconstituição, serão os cadáveres entregues a familia, que tomara providencias para o enterramento, ou, no caso de indigentes e não reclamados, ao Serviço de Verificação de Óbitos, para o mesmo fim.
Art. 15.° — As necropsias médico-legais serão realizadas pelos
legistas no Instituto de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina,
que fornecerá todos os elementos necessários para que se torne possível
a realização das referidas perícias.
§ Único — Havendo necessidade de exame bacteriológico ou
histopatológico será o mesmo requisitado ao Departamento de Anatomia
Patológica da Faculdade de Medicina.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Art. 16.° — O transporte para o Serviço de Verificação de Óbitos será feito pela Permanência da Central de Policia, mediante guia.
Art. 17.° — As instruções necessárias para a execução do Serviço de Verificação de Óbitos serão baixadas pela Diretoria e Conselho
Técnico-Administrativo da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Art. 18.° — Será lavrado na Procuradoria Fiscal da Fazenda
contrato em devida forma, pelo prazo de cinco (5) anos, prorrogável por
igual período, no qual serão previstas as obrigações decorrentes da execução do serviço de verificação de Óbitos, nos termos deste decreto-lei.
§ Único — Esse contrato será considerado automaticamente extinto, sem estrépito judiciário, no caso de inadimplemento das obrigações
contraídas por qualquer das partes.
Art. 19.° — Serão passiveis de multa de Cr$ 500,00 a Cr$ 2.000,00
e o dôbro na reincidência, imposta pela sub-secção da Fiscalização da Medicina e Farmácia do Departamento de Saúde Pública, os que infringirem
as disposições dêste decreto-lei, quer os proprietários de casa funerária,
quer os médicos que assistirem o doente nos seus últimos dias, ou os que
assinarem os atestados de óbitos. Aqueles que exerçam função pública estarão sujeitos às penalidades previstas nos decretos-leis ns. 3.902 e 4.151.
Art. 20.° — As despêsas referidas no artigo segundo dêste decreto-lei correrão à conta dos recursos financeiros do Estado no exercício
vigente, cabendo ao Govêrno a abertura do respectivo crédito especial,
mediante o competente estatuto legal.
Art. 21.° — Revogam-se as disposições em contrário.
O Secretário Geral assim o faça executar.
Palácio do Governo do Estado do Pará, 23 de abril de 1945.
Cel. JOAQUIM DE MAGALHÃES CARDOSO BARATA,
Interventor Federal.
Osvaldo da Silva Brandão,
Secretário Geral, interino.
(“Diário Oficial” n.° 14.937, de 25-4-1945).
O Serviço não começou a funcionar de imediato, uma vez que em 16 de junho daquele ano, o Diretor da Faculdade, Dr. Acylino de Leão, encaminha ofício ao Prof.
Dr. Jayme Aben-Athar com o seguinte teor:
Comunico a V. Excia., para os devidos fins, que em oficio a esta Diretoria
sob o nº 1.942, de ontem datado, o sr. Capitão Chefe de Policia, transmitiu-nos as necessarias instruções afim de que seja iniciado o Serviço de
Verificação de Obitos, regulado pelo Decreto-lei nº 4.745, de 23 de abril
do ano em curso (FMCP, 1945b).
De acordo com o relatório das atividades do ano de 1945, encaminhado pelo Chefe
do SVO ao Diretor da Faculdade, “o serviço começou a funcionar regularmente a
partir de 15 de junho de 1945”, “instalado em dependencia do proprio edificio da Faculdade de Medicina” e contando com “o seguinte corpo de funcionários: um medico
chefe (Dr. Jayme Jacyntho Aben-Athar); dois medicos assistentes (Dr. Artur Porto
O serviço de verificação de óbitos
345
Marques, Dr. Mario Nazareno Machado Sampaio, Dr. Alfredo Barroso Rebelo (interino); dois auxiliares academicos (José Monteiro Leite, Agostinho Leão de Sales Filho); uma datilografa (Maria Nazarena de Brito), um auxiliar de laboratório
(Amintor de Sousa Goudinho), e dois serventes1.
O balanço inicial de seu trabalho já figura no Relatório do ano de 1945, onde o
professor Aben-Athar menciona a existência do Serviço como fator de importância
nas atividades do Departamento de Anatomia Patológica2.
O Relatório de atividades da Faculdade do ano de 1946 apresenta o resumo dos
trabalhos realizados pelo SVO no ano anterior, com um total de 126 necropsias,
detalhadas por mês e discriminando a causa mortis, ressalvando que não incluíam
os exames histológicos complementares às necropsias e que haviam sido, também,
“avultados” (FMCP, 1947b, p. 57). Digno de registro é que apenas um óbito foi
considerado de causa desconhecida.
346
As atividades do SVO foram aumentando gradativamente, como seria de se esperar de um Serviço bem organizado, importante e diretamente atrelado ao curso
médico, e que tinha o hospital da Santa Casa com seus indigentes como o grande
fornecedor de material de trabalho. Deste modo, o Relatório do ano de 1947 aponta
um crescimento do referido Serviço, com a realização de 209 necrópsias, com uma
média mensal de 17 necrópsias. Destaque-se que nenhuma referida como de causa
desconhecida (FMCP, 1948c, p. 55-57).
A Revista do Acadêmico de Medicina, em seu número de fevereiro de 1946, também
faz referência à criação do SVO e sobre a importância deste:
Ao ser instalado o Serviço de autopsias e verificação de óbitos, anéxo ao
Departamento de Anatômia Patológica, da Faculdade de Medicina, nosso Estado acaba de preencher importante lacuna até então existente em
seu seio. Criado segundo um acôrdo entre a Faculdade de Medicina e a
Saúde Pública, o Serviço acha-se em funcionamento desde julho próximo
passado e já conta com um número significante de autopsias.
O áto veio atender a imprescindível necessidade, pois, anterioremente, os
doentes falecidos sem diagnostico estabelecido, levavam ao seio da terra
o segredo do mal que os vitimou. Hoje, lançando mão de meios eficiêntes
de investigação, vai-se descobrir a causa da morte, não somente para a
simples satisfação da curiosidade humana, mas também por outro motivo
muito mais importante, pois, sabemos ser a autopsia a última lição dada
ao médico e que muito lhe vai servir para salvar vidas ameaçadas pela
mesma causa. Além do mais, informado sobre a causa do obito, nos fornece dados estatísticos exatos, permitindo-nos a execução de um quadro
nosológico rigoroso.
Com a criação do Serviço, sob a orientação dos drs. Jaime Aben-Athar,
catedrático de Anatômia Patológica, e Arthur Marques, assistente da
mesma cadeira, nossa Escola muito veio a lucrar. As autopsias, além de
fornecerem excelentes aulas, proporcionam abundante material para a
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
organização de importante coleção.
De parabens, pois os estudantes da Faculdade de Medicina do Pará e o
próprio Estado, pela criação de um Serviço há muito tempo reclamado
(Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 52).
Como nem tudo são flores, desde o início houve problemas com o Governo do Estado
por conta da falta do repasse de verbas previsto no Decreto de criação do SVO, como
já acontecia com os outros repasses previstos para a Faculdade. De acordo com o
artigo 2º do citado documento de criação do Serviço, o governo estadual contribuiria
com cinco mil cruzeiros mensais (Cr$ 5.000,00) para sua manutenção, quantia citada
no Relatório de 1948, como “pequena importância” (FMCP, 1949b, p. 4).
Por conta deste fato, o Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, após tentar por várias vezes marcar audiência com o governador para tratar do assunto, envia ofício a este,
em 27 de fevereiro de 1948, informando a paralisação dos serviços e os motivos que
levaram a tal decisão3.
No relatório das atividades de 1948, o Diretor diz ter sido obrigado a rescindir o
contrato, “apesar do serviço ser feito a contento, com toda a regularidade, por não
ter sido possível ao governo cumprir as cláusulas contratuais”. De qualquer modo,
o Diretor até alivia a responsabilidade do estado, ao justificar que a falha talvez se
devesse “à crise financeira que assoberba o Tesouro”.
Lamentando o fato o Diretor prossegue afirmando que, deste modo, o Estado ficava
privado de um Serviço importante e prejudicada a estatística de mortalidade, uma vez
que a determinação das causas de morte passariam a “repousar em bases inseguras,
desviando-se do espírito moderno que só admite a verdade”. Conclui o Dr. Lauro de
Magalhães que um serviço tão importante custava aos cofres do Estado “a insignificante importância de sessenta mil cruzeiros (Cr$ 60.000,00) anuais”. (FMCP, 1949b,
p. 4-5). Mais adiante, em outra nota sobre o SVO, no mesmo Relatório temos:
Serviço de Verificação de Óbitos
Este serviço, criado pelo decreto nº 4.745, de 23 de abril de 1945, e que
relevantes serviços vinha prestando, foi extinto, por não ter o Govêrno
do Estado cumprido as cláusulas estipuladas no contrato.
A Faculdade ficou, entretanto, no desembolso de Cr$ 20.000,00 (FMCP,
1949b, p. 41).
Ofício interessante, sobre o assunto, foi o enviado pelo secretário da Faculdade, Dr. Olympio
da Silveira, em 2 de março de 1948, ao Delegado Federal de Saúde, que transcrevemos:
Sr. Delegado Federal de Saúde
Comunico-vos, para os devidos fins, que a Faculdade de Medicina suspendeu o Serviço de Verificação de Óbitos, por não ter o governo do Estado do Pará cumprido o Decreto Lei nº 4.745, de 23 de Abril de 1945.
É lastimável que o Governo prejudique um estabelecimento como a nossa Escola que, inegavelmente, vem prestando relevantes serviços a Ama-
O serviço de verificação de óbitos
347
zônia, além de ser um padrão de gloria do nosso Estado.
Ficamos no desembolso de vinte mil cruzeiros, mas temos a satisfação de
proclamar que o serviço foi rigorosamente executado pelo professor Jayme
Aben-Athar e pagos em dia os funcionarios e todo o material adquirido.
Nas administrações Otavio Meira- Alberto Engelhard, Maroja NetoAugusto Serra, a Faculdade foi grandemente auxiliada.
Começou a sua odisséa na malfadada administração José Faustino, de
triste recordação, quando aqui chegou com o seu ballet.
Aguardemos melhores dias, quando o povo tiver nitida compreensão dos
seus deveres civicos.
Saúdo-vos cordialmente,
Dr. Olympio da Silveira
(FMCP, 1948b)
O SVO teve vida curta, funcionando até 30 de abril de 1948. Preocupado com a
situação, o Diretor da Faculdade apela para o Diretor do Serviço Médico Legal,
conforme a correspondência de 3 de janeiro de 1947
348
Ilmo. Sr. Dr. Diretor do Serviço Médico Legal
Havendo o Diário Oficial do Estado publicado em seu número 15.432, de
29 de dezembro de 1946 o Decreto-lei nº 5.259-A, de 14 de novembro
do mesmo ano que fixa o Orçamento do Estado para o ano vigente e não
constando do mesmo a dotação para o Serviço de Verificação de Óbitos,
criado pelo Decreto-lei nº 4.725, de 23 de abril de 1945 e anexado ao
Departamento de Anatomia Patológica desta Faculdade, venho solicitar
a V. S. para tomar as necessárias providencias afim de que tal serviço não
sofra interrupção, que seria desastrosa não só para o Serviço que V. S.
dirige com dedicação e competencia, como também para o Estado que
veria assim extinto um órgão da importancia do Serviço de Verificação
de Óbitos, de ambito nacional, e que em todas as capitais dos Estados em
que existem Faculdades de Medicina a elas são anexos (FMCP, 1947b).
Enquanto funcionou o SVO teve sua parcela de colaboração, também, na melhoria
da qualidade do ensino prestado pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará,
sendo citado destacadamente nos Relatórios de atividades desta.
De lá pra cá, por várias vezes tem-se ouvido falar na “criação” do SVO, embora,
inicialmente tenha sido pensada a sua reativação, conforme trecho de notícia publicada em Folha do Norte, de 31 de Abril de 1954, com o título “Para a Faculdade de
Medicina o Serviço de Verificação de Óbitos”.
Brevemente será discutido na Assembléia Legislativa o decreto que faz
voltar à Faculdade de Medicina e Cirurgia o Serviço de Verificação de
Óbitos do município de Belém.
[...]
Em virtude de não serem atendidos os pedidos de pagamento das cotas mensais, a que estava obrigado o Estado, a Faculdade suspendeu esses serviços
por força das circunstancias. Agora volta a solicitar ao governador o reinicio
desses serviços, sob novos moldes e novas bases (Folha do Norte, 31.04.1954).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Evidentemente, mesmo sem o SVO as necropsias continuaram a ser realizadas,
pelo Serviço de Anatomia e Fisiologia Patológicas da Faculdade, escola criada pelo
Prof. Aben-Athar, como parte do aprendizado dos estudantes, muito embora sem
a força legal prevista num Serviço de Verificação de Óbitos, ainda que a legislação
vigente na ocasião e a existência de cidadãos sem direito à assistência – os indigentes - facilitassem bastante a realização dos exames necroscópicos. Assim foi até a
Reforma Universitária, que desestruturando as Faculdades pulverizou o curso de
medicina e, consequentemente, os serviços de qualidade ali existentes.
NOTAS
1
No Relatório das Atividades da Faculdade do ano de 1945, no que se refere
ao SVO consta um servente, o qual é nominado: Antonio de Souza Esteves
(FMCP, 1946b, p. 39).
2
“...o Departamento de Anatomia Patológica está completa e satisfatoriamente instalado. Para o ensino desta disciplina dispomos duma excelente
sala de autopsias, doutra para aulas teóricas, além de laboratórios convenientemente aparelhado e arquivos. Graças ao Serviço de Verificação de Óbitos,
inaugurado este ano, não nos tem faltado material para trabalho” (FMCP,
1946b, p. 53).
3
“Exmº. Sr. Major Luiz Geolás de Moura Carvalho
Governador do Estado
Tendo ido ao Palacio, por três vezes, a convite de V. Excia., para tratar de
assunto concernente ao Serviço de Verificação de Óbitos, que tem sido rigorosamente executado no Departamento de Anatomia Patológica, nos termos
do Decreto-Lei nº 4745, de 23/4/1945, e não me tendo V. Excia. recebido,
hoje, como de outras vezes, apesar de longa espera, vejo-me forçado a comunicar-lhe que a Congregação e o Conselho Técnico Administrativo resolveram, a contra-gosto, não mais fazer esse Serviço, para não aumentar o nosso
prejuizo, que já se eleva a vinte mil cruzeiros, além do não recebimento de
quarenta e dois mil cruzeiros do auxilio consignado no Orçamento de 1947.
A Faculdade de Medicina, sr. Governador, vive quase que exclusivamente
das taxas escolares e, por este motivo, foi que resolvemos, penalisados, tomar
esta decisão.
Atenciosas saudações.
Dr. Lauro de Magalhães” - Livro de Ofícios expedidos em 1948.
O serviço de verificação de óbitos
349
350
22
Pirâmides de
Borracha e feriados A 2ª Guerra chega ao
Palacete Santa Luzia
351
352
Anúncio publicado na Revista do Acadêmico de Medicina, ano 2, número 3, de fevereiro de 1944, pág. 57.
A Segunda Guerra Mundial não foi a primeira vez que alunos da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP) foram convocados para frentes de batalha; durante a revolução de 1932, pelo menos dois acadêmicos: Renato Augusto de Moura,
que também era comissário de polícia em Belém, e Luis Geolás de Moura Carvalho,
que então cursava o primeiro ano, tiveram que entrar com atestado de abono de
faltas por terem sido convocados para aquele conflito, além de solicitarem, ainda, a
redução da média escolar para nota três (FMCP, 1932a). Em seus ofícios argumentavam: “...como exigir-se aos ex-combatentes após tão grandes sacrifícios – muitos
ainda ausentes dos lares – que voltem aos labores escolares e façam provas parciais
ou exames sob a exigencia da mesma media do anno passado?” (FMCP, 1932a).
É interessante notar que em 1932 houve até maior participação estudantil no lado
considerado subversivo e cuja liderança coube ao acadêmico Miguel Lupi Martins.
O então Interventor Major Magalhães Barata, em carta destinada ao Diretor de
Faculdade, Camilo Salgado, assim relembra o fato:
A este moço coube principalmente a organisação e direcção de grave perturbação da ordem publica, aqui, em setembro do anno passado, ao tempo
do movimento subversivo paulista, com o qual estava articulada. Antes
mesmo que explodisse, nesta cidade, no dia 6 de setembro o motim para
derrubar o governo da Interventoria, os estudantes de medicina, alliados
a grande numero de gymnasianos e outros alumnos das escolas superiores, dirigidos por Miguel Martins, entre os mais exaltados, promoveram
desordens em frente ao edificio desta Escola, sendo eu forçado, no dever
que me cabe de manter a ordem, maximo, num momento em que estava
o Paiz convulsionado, como aquelle, a ordenar severas medidas á Policia
Militar para contel-os em frente e nas immediações dessa casa de ensino,
com o intuito de não alastrar-se pela cidade aquella arruaça.
Como sabe V. S., somente pela decisiva intervenção da força publica, consegui que não tomasse serias proporções o conflito promovido pelos estudantes de medicina, na praça da Escola, chefiados por Miguel Martins,
pouco antes de explodir o motim de 6 e setembro (FMCP, 1933b).
Possivelmente foi ali a primeira vez que uma manifestação estudantil bloqueou a
Avenida Generalíssimo Deodoro.
Em 1944, em plena Segunda Guerra, novamente apenas três acadêmicos de medicina seriam convocados como parte do “Contingente da Amazônia da Força Expedicionária Brasileira”. Foram eles: João Abreu Reis, Raimundo Mendes Libório
(Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 52) e o doutorando Pedro de Brito
Tupinambá (MIRANDA, 1998, p. 148)1.
Mesmo com uma representação tão pequena no “front”, um conflito daquelas proporções teria reflexos na Faculdade, podendo-se afirmar que se a Faculdade não foi
efetivamente à guerra, esta teve maiores repercussões no Largo de Santa Luzia do
que o conflito de 1932.
Pirâmides de borracha e feriados - A 2ª Guerra chega ao Palacete Santa Luzia
353
Os relatórios apresentados à congregação mostram que muitos alunos tiveram
que prestar serviço militar obrigatório, mesmo que acabassem não indo de fato aos
campos de batalha, ficando como contingente de reserva. Hermógenes Pinheiro,
catedrático de Anatomia (1ª cadeira), assim se manifestou em 1943:
...tenho a informar que nada de anormal foi ocorrido, notando-se entretanto a pequena frequencia dos alunos ocasionada por motivo de serem obrigados ao serviço militar observando-se o esforço que empregaram para
corresponder ao estudo da cadeira que leciono (FMCP, 1944b, p. 36).
Acylino de Leão, catedrático de Propedêutica, também foi bastante benevolente
com os alunos diante da situação em que se encontravam: “Não tenho nada a sugerir enquanto persistir o estado de guerra. A irregularidade do comparecimento
dos alunos, a fadiga física em que se encontram não permitem qualquer exigência”
(FMCP, 1944b, p. 44).
Nos relatórios encontram-se também frequentes reclamações de professores culpando a guerra pela falta de material didático. O professor Jayme Aben-Athar, que
além de catedrático de Anatomia Patológica era na época professor interino de
Histologia e Embriologia, descreveria assim a situação:
354
A carência de material por motivo da guerra se fez sentir não só na nossa
Faculdade como noutras do País, reduzindo nossa atividade prática, que
se limitou para os alunos, à simples observação das preparações microscópicas de nossa coleção (FMCP, 1946b, p. 48).
O professor catedrático de anatomia José Alves Dias Junior (2ª cadeira) viveu situação até pior:
Restam do programa 36 pontos que não fôram estudados por motivos
sabidos dessa Diretoria: as peças que estavam depositadas em cubas especiais apodreceram por falta de renovação de formol. A falta de formol
foi motivada tão somente por circunstancias infelizmente decorrentes do
momento que atravessamos (FMCP, 1943b, p. 40).
Outras disciplinas também referiram dificuldades inerentes ao momento, ainda que
de forma meio vaga, como foi o caso da Ginecologia e Obstetrícia do catedrático
Cruz Moreira:
As aulas foram ministradas no serviço de clínica Ginecológica do Hospital da Santa Casa, enfermaria Santa Ludovina, sob a nossa chefia clínica,
e, apesar das dificuldades que se apresentaram inherentes ainda aos efeitos da grande guerra mundial, devo declarar que foi bastante satisfatória
a frequencia dos alunos (FMCP, 1946b, p. 60).
Para outros professores, como Paulo Cordeiro de Azevedo, de Microbiologia, e Porto de
Oliveira, de Psiquiatria, o final da guerra foi mais prejudicial às suas disciplinas do que seu
intercurso propriamente dito, conforme transcrição de trechos dos respectivos relatórios:
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Não nos foi possível lecionar os pontos 42 e 60 do atual programa, devido
a uma série de fatôres inesperados, como feriados devido ao término da
guerra, falta de condução, etc. (FMCP, 1946b, p. 49).
Houve alguma irregularidade na frequencia e no desenvolvimento do
programa, não só pela deficiência de condução, como pela ocorrência
excessiva de feriados e dias tolerados pelo término da guerra mundial
(FMCP, 1946b, p. 50).
Até colar grau era complicado, conforme cita Clóvis Meira:
E pelas restrições que a guerra nos impôs, como foi difícil comemorar
condignamente o fim do nosso curso: faltava cerveja, não havia açúcar
para a confecção de doces, os tecidos para as roupas elegantes escasseavam, enfim, a turma de 1943, foi marcada pelas dificuldades de um país
em guerra (MEIRA, 1986a, p. 45).
O fato mais curioso ligado àqueles dias partiu mesmo do Diretório Acadêmico de Medicina (DAM). Durante a Segunda Guerra, com a ocupação da Malásia pelos paises do Eixo,
ficou difícil a comercialização da borracha produzida ali, fazendo com que a borracha da
Amazônia voltasse a ser valorizada no cenário mundial, uma vez que os países aliados
estavam preocupados em acelerar a produção do látex, matéria prima vital na indústria da
guerra. O governo Vargas incentivou a vinda para a Amazônia de um grande contingente de nordestinos, a fim de trabalhar nos seringais. Eram os chamados “Soldados da Borracha”, personagens que marcariam este segundo e efêmero ciclo da borracha na região.
A juventude também era chamada a colaborar procurando pneus inservíveis e outros artefatos feitos de borracha, já sem uso, sucata de ferro e outros metais. Recolhidos em logradouros públicos, a borracha era separada do metal em montes
apelidados de “pirâmides”. Quando atingiam volume considerável os caminhões do
exército americano transferiam as “pirâmides” para navios que os conduziam para
a reciclagem (MENDONÇA, 2002, p. 208).
Neste contexto, assim se manifestaria a Revista do Acadêmico de Medicina, voz oficial do Diretório:
Solidário a iniciativa, o Diretório de Medicina logo ofereceu seus prestimos pondo-se a disposição dos poderes públicos dispostos a cooperar
com todo o vigor e maior entusiasmo da mocidade, que o integra para o
êxito completo do movimento que se iniciava.
Na “Caravana da Vitória” expedição de um punhado de jovens universitários a região do Tapajós, zona notável de extração da “hévea”, o Diretório fez-se representar, sendo-lhe atribuída a direção da excursão.
Percorrendo seringais, cortando estradas e mantendo contáto direto com
os trabalhadores da borracha, os moços universitários trouxeram-lhes
sua palavra de fé, incentivando-os ao trabalho, fazendo-os compreender
a razão e o móvel de seu esforço; o resultado não se fez esperar, em consequência do animo consciente de colaboração destes nobres combatenPirâmides de borracha e feriados - A 2ª Guerra chega ao Palacete Santa Luzia
355
tes de uma frente oculta no silêncio das estradas juncadas da preciosa
gomífera.
Havendo as exigências do consumo de guerra depauperado o país da
matéria prima, viu-se o govêrno na necessidade de usar um expediente e
sanar esta situação daí a grande “Campanha da Borracha”, visando a coleta de artefatos do referido artigo, já sem utilidade e que, após processos
especiais, tornam-se susceptíveis de industrialização.
Mais uma vêz empenhou-se o Diretório, traduzindo-se sua ação numa
atividade férrea da totalidade dos estudantes desta Faculdade que, por
todos os recursos a seu alcance percorriam os diversos bairros da cidade,
acumulando objétos sem uso requisitados pela campanha. Como fruto
de nosso esforço empilhou-se em frente à Faculdade de Medicina uma
gigantesca pirâmide, sobre a qual momentos depois, tremulou a bandeira
nacional, dando-se por inaugurada a pirâmide “OSWALDO CRUZ”.
A convite do prefeito de Mojú, uma comissão de estudantes de nossa
Escola, deslocou-se aquele município, levando sua palavra de entusiasmo
aos soldados da “hévea” ali sediados.
Integrando uma caravana de Universitários, membros desta entidade
percorreram a zona bragantina no “Expresso da Vitória”, retornando a
capital com mais de uma tonelada de borracha que, somada a já coletada,
constitue uma quota que bem expressa o êxito da empresa (Revista do
Acadêmico de Medicina, 1944, p. 56).
356
Foto 63:
Acadêmicos iniciam o
asteamento da bandeira
do Brasil em meio
a “Pirâmide
Oswaldo Cruz”. Ao
fundo observa-se
o Mercado
de Santa Luzia.
Fonte: Revista
do Acadêmico de Medicina
(1944, p. 57).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Foto 64: Acadêmicos
diante da “pirâmide”
de borracha, ao fundo
Mercado de Santa
Luzia. A direita
o quiosque “Buraco
Gelado” tradicional
parada para lanches do
período, hoje demolido.
Fonte: Revista
do Acadêmico
de Medicina
(1944, p. 57).
357
Terminada a guerra e passadas as comemorações, o DAM voltaria às suas lutas
habituais, entre as quais a federalização da Faculdade. E outros motivos seriam
encontrados pelos professores para justificar o não cumprimento integral dos programas e a baixa frequencia de alguns alunos. A Amazônia sumiria novamente
do cenário econômico mundial e o esforço patriótico dos “Soldados da Borracha”
ficaria relegado ao esquecimento.
Mas o maior o impacto da segunda guerra no ensino médico seria silencioso e
permanente, indo muito além do Largo de Santa Luzia, atingindo todas as escolas
médicas brasileiras e por que não dizer da América Latina.
A doutrina médica ensinada até então era proveniente das escolas européias notadamente da francesa. Os estudantes manuseavam com desenvoltura livros como
L. Testut e A. Latarjet clássico da anatomia em quatro volumes, e outros como
Brumpt, Dieulafoy, Trousseau e a Presse Médicale. Ter conhecimento pelo menos
de francês era básico na vida acadêmica pré-segunda guerra. Após o conflito as
coisas nunca mais seriam como antes.
Rodolfo Teixeira da Faculdade de Medicina da Bahia explica o que aconteceu:
Os azares da segunda grande guerra precipitaram uma crise no prestígio
da França, o que, aliás, já se desenhava nos anos que antecederam ao
Pirâmides de borracha e feriados - A 2ª Guerra chega ao Palacete Santa Luzia
conflito. O espaço aberto pelo retrocesso europeu, e particularmente o
francês, foi ocupado pelos Estados Unidos, com todo o peso da sua visão
objetiva, das suas técnicas, dos seus livros e periódicos, da sua filosofia de
trabalho, da sua cultura (TEIXEIRA, 1999, p. 138).
Na Faculdade Nacional de Medicina a história não poderia ser diferente conforme
recorda Doyle Maia:
Como consequência da guerra e dificuldades de comunicação com a Europa houve alteração que teve importante influência na formação cultural dos futuros médicos. Até o início da guerra praticamente todos os
livros adotados no curso eram de autores franceses.
[...]
Com a impossibilidade de importação de livros franceses, os americanos
tomaram conta do mercado. O primeiro grande sucesso foi a edição, em
inglês, da Fisiologia de Best and Taylor (MAIA, 1996, p. 196).
A substituição seria definitiva, e mesmo após o fim da guerra a França não recuperaria sua posição como formadora de opinião no cenário médico mundial, assim
como nenhum outro país europeu. Desapareciam as saudáveis divergências entre
as escolas européias, notadamente a francesa e a alemã.
358
Desde então a medicina ensinada no Brasil tornou-se monoglota, sendo sua única
“língua oficial” o inglês norte-americano.
NOTA
1
Vale citar que na época o serviço de saúde do Exército era “organizado”
de uma forma bem diferente da atual: fosse médico, acadêmico, ou qualquer
outro curso superior todos eram convocados como soldados. Talvez por ser
doutorando Pedro Tupinambá teve um pouco mais de sorte e foi convocado
como soldado do serviço de saúde e não soldado de infantaria como costumava ocorrer (N.A).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
23
O Prêmio Raul Leite
e outras premiações
359
360
Certificado que conferiu a Medalha de Ouro - Prêmio Raul Leite recebido pelo Dr. José Monteiro Leite.
Nas primeiras décadas do século XX, ainda não havia, no Brasil, uma indústria farmacêutica tão poderosa como a atual, quase que totalmente constituída por capital
estrangeiro, movimentando grandes volumes financeiros e deixando praticamente
sem chances a indústria nacional.
Naqueles tempos, a indústria farmacêutica paraense ainda estava fortemente ligada as grandes “pharmácias” de então, as quais manipulavam diversos medicamentos
destinados principalmente ao tratamento das principais doenças que atingiam a população, como o impaludismo, a sífilis, e a tuberculose, por exemplo, assim como sintomáticos, purgativos, tônicos revigorantes ditos “neuro-troficos”, anti-anêmicos, e
reguladores do ciclo menstrual. Um arsenal terapêutico muito questionável nos dias
de hoje, mas era o que se dispunha naquele recuado período, quando muitos preceitos
científicos, hoje consagrados, ainda não eram conhecidos. Vale citar como curiosidade: até refrigerantes eram vistos como produtos com qualidades terapêuticas. O Guaraná Soberano, por exemplo, era apontado como favorecedor do restabelecimento,
apressando a cura, conforme diziam os anúncios das revistas Pará-Médico da época.
Outros refrigerantes hoje já extintos seguiam o mesmo caminho: “Guaraná Simões
não é apenas um refrigerante; contém qualidades tônicas e aperitivas, motivo porque os medicos apreciam e o recommendam” (PARÁ-MÉDICO, 1939, p. 25).
Dentre os muitos estabelecimentos comerciais que marcaram época com produtos
de sua fabricação poderíamos citar a “Pharmácia Cezar Santos”, com produtos como
o “Guarafeno”, tido como infalível ao combate a dor, qualquer que fosse (PARÁMÉDICO, 1927), e a “Malarina”, que não só prometia evitar o paludismo, como
também agia contra a febre (PARÁ-MÉDICO, 1927); a farmácia “Nacional”, com
suas “Pílulas Africanas” outro “específico” anti-malárico, o “Balsamo das dores” indicado para males cardíacos e gastrointestinais, e a “Phosphiokola” tônico regenerador a base de vinho do Porto (PARÁ-MÉDICO, 1927). Havia também a farmácia
“Batista Campos” com suas “Pílulas Verdes”, e o “Sanovar (Sana Ovário), o remédio
das senhoras”; a Farmacia Beirão”, do “Sedativo Regulador Beirão, das “Pílulas de
café Quinado Beirão”, do “Diabeticida” e o famoso revigorante “Guaraná Sórbilis”.
Devido ao prestigio social da categoria era comum os médicos emprestarem sua
fama a produtos dando seu nome a algumas formulações. Muito mais que o principio ativo o que ditava o sucesso do remédio era o seu sobrenome. Existindo assim
produtos como o “Colírio Amarelo Lyra Castro1”, fabricado pela farmácia Cesar
Santos (que consistia em 20cc de água destilada, 20g de Sulfato de Zinco Puro, 8g
de Cloridrato de Amoníaco e 2g de Açafrão) (MEIRA, 1986b, p. 46), o “Tônico das
Parturientes, do Prof. Agostinho Monteiro2” possivelmente a base de complexo B
e vinho como eram a maioria dos tônicos para gestantes3; a “Pomada do Dr. Lauro
Magalhães”4 a base de mercúrio com fenol, salol, iodofórmio, antipirina e vaselina
(MEIRA, 1986a, p. 173) e muitos outros.
O Prêmio Raul Leite e outras premiações
361
Em meio a esta bem estruturada indústria local já havia a concorrência dos grandes
laboratórios internacionais como a alemã Bayer, para citar apenas um exemplo, e
também de laboratórios nacionais. Nesta última categoria, sem dúvida um dos maiores laboratórios farmacêuticos de abrangência nacional era o “Raul Leite S. A.”.
Fundado em 19 de novembro de 1921 por Raul Leite e José Gama, com capital inicial de apenas cem contos de réis, e sob a administração de seus fundadores, o laboratório não parou de crescer adquirindo novos sócios e produzindo medicamentos
de larga aplicação clínica como a “Intestinofagina”:
Polibacterifago polivalente ativo contra os bacilos disentéricos Shiga e
Flexner, bacilos tíficos e paratificos A e B, Enteritides Gaertner, Salmonella Pestis Caviae, colibacilos, estafilococos, estreptococos, enterococos.
Uso oral.
Caixa com 6 ampolas de 2 cc.
Indicado em todas as infecções intestinais, e principalmente nas colites,
enterites, infecções de causa indeterminada.
Notável ação nas diarréias das crianças.
É um produto brasileiro dos Laboratórios Raul Leite.
(PARÁ-MÉDICO, n. 48, 1939, s.p.)
Além de uma série de injeções de endo e exotoxinas, a “novíssima arma terapeutica
para a cura das infecções ” todas com o sufixo “tox”.
362
BRONCOTOX - Infecções bronchicas e catharros pulmonares.
COLITOX - Colibaciloses em geral.
DERMOTOX - Espinhas e infecções cutâneas em geral.
ESTREPOX - Erisipela, febre puerperal, septicemias estreptococcicas.
GENITOX - Infecções genitaes; gonorheia e suas complicações.
PLURITOX - Infecções piógenas em geral.
QUINTOX - Coqueluche.
RHEUMOTOX - Reumatismo agudo e suas complicações.
(PARÁ-MÉDICO, n. 47, 1939, s.p.)
Nos anos seguintes a expansão do laboratório progrediu a largos passos havendo
filiais em todo o Brasil e até no exterior. Em 1939 suas instalações cobriam uma
área de 5.000 metros quadrados, possuindo ainda 20.000 metros quadrados em terrenos, empregando 3.000 pessoas, distribuídas em diversas seções como injetáveis,
hormonioterapia, sais e alcalóides, microbiologia, veterinária e etc (Folha do Norte,
30. 01 de 1939). Belém inclusive chegou a ter uma grande filial localizada em prédio
próprio situado na rua 15 de novembro, nº 98 e 102, inaugurada com toda pompa e
circunstância, com direito à bênção do arcebispo de Belém, Dom Mário de Miranda
Vilas-Boas, presença do Interventor Federal do Estado Otávio Meira, e Olympio da
Silveira representando a Faculdade de Medicina (Folha do Norte, 30.11 de 1946).
Tendo um faro aguçado para propaganda, Raul Leite criou um prêmio a ser ofertado ao aluno que obtivesse o primeiro lugar geral no curso médico em cada uma das
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
faculdades de medicina que existiam no país então, colocando desde cedo o nome de
sua marca na cabeça dos jovens médicos e, paralelamente, incentivando o ensino superior e o aprimoramento da cultura médica (PARÁ-MÉDICO, 1939, n. 48, p. 39).
O gesto do laboratório foi saudado com muita satisfação pela Faculdade através de
ofício ao gerente local
Accuso recebida a carta de Vª Sª, de 9 do fluente, communicando a esta
Directoria haver o laboratório Raul Leite instituído o premio “Raul Leite” de 1:000$000, em beneficio do alumno que, a juízo da Congregação,
tenha se distinguido no respectivo curso.
Somente louvores merece a iniciativa desse Laboratório, que deve ser
imitada por outros, servindo isso de incentivo aos moços estudiosos da
nossa Faculdade.
O detentor do premio recebel-o-á na sessão solemne de collação de gráo,
em Dezembro próximo, para cuja cerimônia receberá Vª Sª comunicação
previa (FMCP, 1935b).
O Relatório de atividades de 1935 destaca a instituição da premiação mencionando
o nome do aluno distinguido com a honraria:
Este anno foi a nossa Faculdade distinguida com a doação de um prêmio
annual de 10.000$000 em dinheiro, pelo Laboratório Raul Leite, do Rio
de Janeiro, a ser conferido ao doutorando que melhores notas obtenha
durante o curso.
Este premio, que ficou sendo denominado “Premio Raul Leite”, foi conferido ao doutorando Leônidas de Mello Deane, em sessão solemne de
collação de gráo, realisada a 8 de Dezembro (FMCP, 1936c, p. 33).
Curiosamente o segundo regimento interno da Faculdade datado de 1924 já previa
a distribuição de prêmios escolares:
CAPITULO XII
Dos prêmios escolares
Art. 143 – A Faculdade distribuirá, opportunamente, logo que suas condições o permittam, prêmios escolares aos alunos que houverem concluido o curso de medicina.
§ Único – Os referidos prêmios serão designados com o nome de notaveis
clínicos paraenses já fallecidos, como um preito de homenagem e respeito
ao seu saber e á sua intelligencia (FMCP, 1924a, p. 27).
Obviamente como as condições não permitiram, quis o destino que a primeira premiação dedicada aos alunos da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, partisse
da iniciativa privada, levando o nome de um médico de outro estado.
Raul Leite viria a falecer na cidade de Salvador em 23 de janeiro de 1939 durante
uma viagem que realizava aos estados do norte e nordeste (PARÁ-MÉDICO, n. 48,
1939, p. 39) causando grande comoção entre a classe médica. Em Belém os funcioná-
O Prêmio Raul Leite e outras premiações
363
rios da filial do laboratório mandaram celebrar uma missa de sétimo dia na catedral
(Folha do Norte, 28.01.1939) em memória do “grande amigo dos estudantes” (Folha
do Norte, 30.01.1939).
Mesmo após sua morte o laboratório e, consequentemente, o prêmio continuariam
a existir ainda por muitos anos.
Além da quantia de 1.000$000 em dinheiro (um conto de réis)5 o prêmio Raul Leite
era constituído de uma medalha de ouro com o bastão de Asclépio onde de um lado
lia-se: “Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará – Prêmio Raul Leite”, e na outra
face estava escrito “A congregação da Faculdade confere este prêmio ao primeiro
aluno turma...”6 seguido do nome do agraciado.
364
Foto 65: Medalha Raul Leite – Frente.
Fonte: Acervo do Dr. José Monteiro Leite.
Foto 66: Medalha Raul Leite – Verso.
Fonte: Acervo do Dr. José Monteiro Leite.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Recebiam ainda um belo certificado com os seguintes dizeres:
Prêmio Raul Leite.
O Dr..............., aluno mais distinto da turma a que concluiu o curso médico
em..., no consenso da colenda Congregação da Faculdade de Medicina e
Cirurgia do Pará, foi conferida a medalha de ouro – prêmio Raul Leite7.
Nem todos os alunos tiveram a felicidade de receber este prêmio no momento da colação
de grau. O doutorando Arcelino Bittar foi um dos casos que “ganhou mas não levou”; pelo
menos no dia da formatura, o que certamente deve ter gerado algum constrangimento:
Este ano, precisamente quarenta e oito horas antes da cerimonia de colação de gráu e depois de já ter sido anunciado o nome do detentor do
premio – o talentoso doutorando Arcelino Chicre Miguel Bittar – foi a
Diretoria cientificada pelo representante desses Laboratórios, aqui em
Belém, que havia sido sustado o referido premio.
Isto, porém, nada diminuiu o mérito do candidato.
(FMCP, 1941, p. 42).
Episódio semelhante aconteceria na formatura do ano de 1944, quando, segundo o
Relatório de atividades da Faculdade, o aluno a ser distinguido com a premiação, o
graduando Mauricio Queima Coelho de Souza, também nada recebeu8.
A disputa pela premiação entre os melhores alunos de cada sala era muitas vezes das
mais acirradas, seguindo os seis anos do curso médico até o dia da apuração do resultado. A nota transcrita abaixo demonstra que o clima no dia da entrega às vezes era
tenso, com direito a boatos nos bastidores, assunto que acabava nos jornais:
Na secretaria da Faculdade de Medicina, perante regular número de alumnos, foi feita hontem á tarde, a verificação dos pontos dos estudantes
candidatos ao Premio Raul Leite.
Sommados os valores conseguidos durante os annos de todo o curso
medico, nas provas parciaes, sahiu victorioso o doutorando Nilson Silva
seguido de perto pelo seu colega Luizileno Brasil.
A secretaria daquella casa de ensino facultou aos interessados os livros
competentes, havendo a maxima lisura e correcção na apuração das medias, sendo assim desfeita a noticia de que se estava planejando uma substituição que iria prejudicar determinado estudante.
O dr. Olympio da Silveira, secretario da Faculdade, officiou hontem mesmo á firma Raul Leite communicando que o doutorando Nilson Silva havia conquistado o premio instituido por aquelle benemerito industrial.
Só merece applausos a attitude do secretario da Faculdade, mantendo-se
rigoroso e estrictamente nos limites de suas funcções, impedindo assim
que houvesse uma escolha imparcial e, portanto deshonesta (Folha do
Norte, 08.12.1937, p. 5).
A lista completa dos agraciados9 com o “Raul Leite” na Faculdade de Medicina e
Cirurgia do Pará é:
O Prêmio Raul Leite e outras premiações
365
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366
1935
1936
1937
1938
1939
1940
1941
1942
1943
1944
1945
1946
1947
1948
1949
1950
1951
1952
1953
1954
1955
1956
Leônidas de Mello Deane
Hermínio Pessoa
Nilson Carvalho da Silva
Amilcar Carvalho da Silva
Domingos Barbosa da Silva
Arcelino Chicre Miguel Bittar10
Herbert Spencer Ferreira
Não houve colação de grau neste ano11
Paulo Cordeiro de Azevedo
Maurício Queima Coelho de Souza12
Luiz Gonzaga Pires
Ramiro Koury
José Monteiro Leite
Elisa Chermont Roffé
Raynéro de Carvalho Maroja
Clodoaldo Beckmann
Ruy da Silva Ventura
Henry Checralla Kayahat
xxxxxxx Kayath
Haroldo Pinheiro
João Paulo do Valle Mendes
Maria de Nazaré Petrucceli José de Moraes Rego
Almir José de Oliveira Gabriel
O impacto do prêmio Raul Leite foi muito grande na Faculdade marcando uma
geração inteira, tanto que era comum se ouvir, mesmo muitos anos após o desaparecimento do laboratório, que “fulano foi o Raul Leite de sua turma”, apenas como
sinônimo de primeiro lugar no curso.
Um exemplo disso é que a partir de 1957, com o fim do laboratório, o prêmio ganhou outro patrocinador passando a se chamar “Chimica Bayer S/A”13, e que teve
uma curta sobrevida. Entretanto, os ganhadores deste são até hoje lembrados pelos
seus contemporâneos como vencedores do “Raul Leite”.
A lista até onde se conhece dos vencedores do prêmio “Chimica Bayer S/A” é a seguinte:
1957
1958
1959
1961
Carlos Rodrigues Cunha
Ronaldo de Araújo
Margarida Martins Boneff
Manoel Wilson Pena
Em 1960 o prêmio, que os alunos continuavam chamando de “Raul Leite”, não foi
concedido, conforme relatado por Alfredo Oliveira, formado naquele ano14.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Ainda hoje, mesmo sem levar um nome especial, a Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Pará oferece uma placa, ou ao menos um certificado, ao primeiro lugar geral entre os doutorandos. Resquícios do “Raul Leite”.
Outros prêmios escolares foram surgindo com o passar dos anos. Em 1945 houve
uma tentativa de criar um que levasse o nome de um professor já falecido, mais ou
menos conforme previam os estatutos da Faculdade. Ao contrário do que se poderia imaginar, tal honraria não coube a Camilo Salgado, mas sim ao Dr. Othon Chateau15, professor catedrático de Higiene e Medicina Preventiva, que havia falecido
16 de janeiro daquele ano, hoje completamente esquecido.
Ressalte-se que a iniciativa também não partiu diretamente da Faculdade, mas sim
da solicitação de ex-alunos formados na turma de 1938, que dirigiram uma petição
junto ao Conselho Técnico-Administrativo:
“...desejando cooperar para o maior engrandecimento do nome dêsse Instituto de Ensino Superior, e por outro lado, querendo homenagear a memoria do inesquecivel, pranteado e emerito Mestre. Dr. Othon Chateau,
solicitam a V. V. Excias. a criação de um prêmio – PRÊMIO DR. OTHON
CHATEAU – no valôr de dois mil cruzeiros (Cr$ 2.000,00), a ser concedido anualmente, à melhor tese sobre Higiene e Medicina Preventiva.
Todas as despêsas decorrentes da criação do referido prêmio correrão
por conta dos requerentes” (FMCP, 1946b, p. 31).
Os idealizadores e financiadores deste prêmio foram: José da Silveira, Epílogo de
Campos, Moacir de Valmont, Eduardo Hermes, Ataualpa Fernadez, Alfredo Barroso Rebello, Vicente Magno de Miranda, Rui Romariz, Joaquim Araújo Filho,
Guilherme Macedo, Gervásio de Brito Melo.
É possível que nenhum deles tenha gastado um tostão sequer para o pagamento do
“Prêmio Othon Chateau” visto que até 1951, último ano em que se obteve notícia
dele, nenhum aluno ganhou tal honraria.
Continua a não ter concorrentes o prêmio “Othon Chateau”, a ser concedido anualmente, á melhor tése sobre Higiene e Medicina Preventiva
(FMCP, 1952, p. 26).
Não é de hoje que a área de Medicina Preventiva é negligenciada por boa parte dos
acadêmicos, que não ficam estimulados pelo assunto nem pagando...
Já na década de 50, com o falecimento de outros professores dos primórdios da Faculdade, foram criados dois prêmios destinados aos melhores trabalhos científicos
feitos por acadêmicos, por uma iniciativa do Departamento de Medicina Interna,
seguindo uma sugestão do Prof. Affonso Rodrigues Filho. Estes foram: o prêmio
Prof. Jayme Aben-Athar, conferido ao melhor trabalho individual, constituído por
medalha de ouro e diploma16, e o prêmio Acilino de Leão, conferido ao melhor trabalho em grupo, constituído por diplomas. No entanto não foi encontrada nenhuO Prêmio Raul Leite e outras premiações
367
ma outra menção aos vencedores de tais prêmios, sendo possivelmente mais uma
iniciativa que ficou restrita ao papel.
Na biografia de Almir Gabriel, ex-aluno e ex-governador do Pará, escrita por Alfredo Oliveira17, existe menção a um outro prêmio chamado “Acilino de Leão”, oferecido pelo governo do Estado, sem nenhuma relação, além do nome, com o prêmio
proposto pelo Departamento de Medicina Interna. Este outro “Acilino de Leão” foi
criado pelo deputado Amintor Cavalcante, médico e deputado e ex-presidente do
DAM. Na lei aprovada pela Assembléia Legislativa constava o seguinte:
368
Lei n. 1266 – de 21 de fevereiro de 1956.
Cria o prêmio científico “Acilino de Leão” e dá outras providências.
A Assembléia Legislativa do Estado estatui e eu sanciono a seguinte lei:
Art. 1º - Fica criado pelo Govêrno do Estado o prêmio “Acilino de Leão”, para
o doutorando que conseguir durante o curso médico a maior soma de notas.
Art. 2º - O prêmio de que trata o artigo anterior será anual no valor de
vinte mil cruzeiros (Cr$ 20.000,00).
Art. 3º - A despesa prevista nesta lei correrá a conta dos recursos disponíveis do Estado, no ano de 1955, devendo ser incluída obrigatoriamente
nos orçamentos financeiros do nosso Estado, a partir de 1956.
Art. 4º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as
disposições em contrário.
Palácio do Govêrno do Estado do Pará, 21 de fevereiro de 1956.
Edward Cattete Pinheiro
Governador do Estado
José Jacynto Aben-Athar
Secretário do Estado de Finanças
(Jornal do Acadêmico de Medicina, março de 1956).
Não se sabe quanto tempo durou este prêmio, nem por que acabou. Soma-se a mais
uma iniciativa que não vingou. Se existe um fato repetitivo na história da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará é a descontinuidade das coisas.
NOTAS
1
Oftalmologista paraense de destaque que chegou a ser ministro da agricultura durante o Governo Washington Luis. (N.A).
2
Agostinho Monteiro, um dos fundadores da Faculdade de Medicina e professor de Obstetrícia e Medicina Legal. Também um dos fundadores do Conselho Federal de Medicina, tendo exercido a presidência. (N.A).
3
“Disse-me o colega Milton Luna Lobato que o “Tônico” tinha um ótimo
paladar, era uma espécie de vinho de Málaga. Quando menino, às escondidas
e pelo gargalo, surrupiava boas talagadas de uma de suas irmãs que o tomava
habitualmente”. (MEIRA, 1986a, p. 172).
4
Um dos fundadores da Faculdade de Medicina chegando a diretor da mesma, pioneiro na Urologia no Pará, especialidade na qual era professor catedrático. (N.A).
5
No relatório de 1935 o prêmio é referido com o valor de 10:000$000, o que
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
deve tratar-se de erro de impressão (FMCP, 1941, p. 42).
6
Dados da Medalha do Prof. Dr. José Monteiro Leite.
7
Dados do Diploma do Prof. Dr. Paulo Cordeiro de Azevedo.
8
“O premio escolar “Dr. Raul Leite” devia ser conquistado pelo graduando
Mauricio Queima Coelho de Souza. Infelizmente, porém, como aconteceu em
1940, não nos foi enviado, talvez por medida de economia. É de ressaltar que
o premio foi espontanemente oferecido à Faculdade pelos Laboratórios Raul
Leite S.A., para ser conferido ao aluno que melhores notas obtivesse durante
o curso.” (FMCP, 1945c, p. 26).
9
As referências para os premiados são: 1935, 1938 até 1951 são os respectivos
relatórios apresentados a Congregação; 1936, 1957 até 1959 e 1961 são registros no livro de atas das colações de grau; 1937 - Folha do Norte 8 de dezembro
de 1937, pág 5; 1952- informação do Dr. Camilo Viana; 1955 - informação do
Dr. Eduardo Demétrio; 1956 - Biografia de Almir Gabriel escrita por Alfredo
Oliveira; 1953, 1954 - informações dos respectivos agraciados.
10
Foi indicado para o prêmio, porém não recebeu; pelo menos no dia da colação. De acordo com o Relatório de Atividades da Faculdade referente ao ano
de 1941, o prêmio fora sustado pelo Laboratório neste ano e reestabelecido
no ano seguinte (FMCP, 1942b, p. 43). Em suas memórias Bittar recorda o
desfecho do caso: “Eu havia sido o primeiro mas o prêmio não me foi entregue naquela noite. Oito anos depois, já morando no Rio de Janeiro, o laboratório mandou me entregar o prêmio, diploma e medalha. Reparava uma
injustiça. O prêmio me foi entregue no consultório e foi feita uma fotografia
que foi publicada na revista do laboratório” (PEREIRA, 2006, p. 39).
11
“Não tivemos este âno alunos matriculados na sexta série, em consequencia da criação do curso complementar, que privou a escola de alunos durante
dois ânos, na primeira e segunda séries” (FMCP, 1943b, p. 4).
12
Indicado ao prêmio, não o recebeu, ao menos no dia da colação.
13
Ver capítulo “A colação de grau - cerimonial e formandos até 1950”.
14
Descrevendo a colação ele diz: “Relâmpagos de flashes - registros fotográficos do momento. Cochichos ao pé do ouvido. De quem será o prêmio
“Raul Leite”? A face de meu pai irradia ansiedade. Todavia, nenhum prêmio é
concedido. Não precisaria estar perto para saber o que papai, homem sincero
e objetivo, terá resmungado:
- Reacionários...
Explicação posterior e desconcertante: o patrocinador do prêmio falira, fechara as portas.” (OLIVEIRA, 1986, p. 190).
15
Médico maranhense, formado na Bahia na mesma turma que Olympio da
Silveira, secretário da Faculdade. Há uma curiosa relação entre Othon Chateau e Raul Leite, além de ambos terem sido nomes de prêmios na Faculdade.
Quando os laboratórios “Raul Leite” inauguraram sua nova sede em Belém
em 29 de novembro de 1946, havia no salão principal do edifício uma foto do
Dr. Othon Chateau, como forma de homenagear a classe médica da cidade
especialmente os professores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Olympio da Silveira discursaria neste dia em homenagem a Othon Chateau.
(Folha do Norte, 30.11.1946, p. 3). (N.A).
16
Revista do Acadêmico de Medicina, ano XXIV, número 14, maio de 1957.
O Prêmio Raul Leite e outras premiações
369
17
“Orgulhosa do filho, a professora Palmira o viu receber, além do ‘canudo’
que o declarava médico, os dois prêmios anunciados durante a solenidade
realizada no salão nobre da Congregação: ‘Raul Leite’ e ‘Acilino de Leão’.
O prêmio ‘Raul Leite’, entregue na ocasião, correspondia ao certificado de
melhor aluno da turma. O prêmio ‘Acilino de Leão, em dinheiro, igualmente
distinguia o aluno de maiores notas da turma, sendo oferecido pelo governo
do Estado. Só foi recebido dias depois, na audiência marcada com Magalhães
Barata...” (OLIVEIRA, 2002, p. 55).
370
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
24
Houve uma vez
um barão
371
372
Monograma do Barão de Anajás em cinza solferino sob coroa de barão. DREYFUS (1982, p.238).
Nem todos os médicos que fizeram parte do grupo fundador da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, naquele inicio de 1919, tiveram a mesma sorte no que diz
respeito à sua permanência na memória das gerações que se sucederam. Se de um
lado Camilo Salgado é uma espécie de unanimidade, canonizado pela população, em
um culto que aumenta a cada ano, tornando-se difícil, por vezes, separar o homem
que existiu de fato, do santo popular surgido com o passar dos anos1, outros tantos
não tiveram a mesma sorte.
Personagens importantes como Lauro de Magalhães ou Acylino de Leão, do grupo de fundadores da Faculdade, ou pioneiros que entraram pouco após o início de
seu funcionamento, como João Prisco dos Santos e Jayme Aben-Athar, continuam
sendo lembrados de forma bastante incipiente, seja por seus ex-alunos, ou por
estudiosos da história da medicina no Pará, (MEIRA, 1986b) recebendo modestas
homenagens públicas como nomes de comendas, clínicas e laboratórios, o que não
deixa de ser uma forma de poupar-lhes do esquecimento total.
Num outro extremo temos aqueles que foram completamente engolidos pela voragem do tempo, estando inteiramente apagados da consciência coletiva ou reduzidos a pequenos verbetes em alguns ensaios esporádicos. Dentre estes muito injustiçados, talvez o maior de todos seja o primeiro diretor da Faculdade, Antonino
Emiliano de Sousa Castro, o Barão de Anajás.
Mesmo em obras específicas sobre o assunto, como o “Archivo Nobiliárquico Brasileiro” do Barão de Vasconcelos, ou livros de grande importância regional como os
trabalhos de Ricardo Borges (1986), em relação ao Barão encontram-se apenas as
datas de seu nascimento, do seu falecimento, que era médico e que vivia em Belém.
O fato de o Barão de Anajás ter um filho que possuía o mesmo nome, o Dr. Sousa
Castro, que chegou a ser Governador do Pará, e de ambos também serem médicos
e fundadores da Faculdade, gerou grande confusão com o passar dos anos, ajudando mais ainda a eclipsar a memória do Barão, pois mesmo historiadores abalizados,
por vezes escrevem como se pai e filho fossem a mesma pessoa (FIGUEIREDO,
2006); e em alguns relatos a foto do filho aparece como querendo se referir ao Barão (MEIRA, 1986b, s.p.).
Antonino Emiliano de Sousa Castro, o Barão de Anajás, nasceu em 23 de abril de
1847, em Belém do Pará, sendo filho de Antônio Feliciano de Sousa e Maurícia
Josepha de Castro da Gama.2 Ainda em Belém fez seus estudos de humanidades – o
correspondente ao atual ensino médio -, partindo para o Rio de Janeiro, onde foi
cursar medicina na Faculdade de Medicina e Pharmacia do Rio de Janeiro, recebendo o grau no dia 9 janeiro de 1872 (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5)3.
Voltando a sua terra natal, tornou-se um dos mais abalizados “operadores-ginecologistas” de então, conseguindo vasta clientela e largo circulo de amizades, pas-
Houve uma vez um Barão
373
374
Foto 67: O Barão de Anajás.
Fonte: Estado do Pará, 03.08.1929.
sando a fazer parte do corpo clínico de todos os hospitais de Belém, dedicando-se
notadamente ao Hospital da Ordem Terceira de São Francisco, onde se tornou
médico adjunto em 21 de outubro de 1873 (BAENA, 1878, p. 82), chegando a
médico efetivo em 28 de junho do ano seguinte (BAENA, 1878, p. 84). Por relevantes serviços prestados, recebeu titulo honroso e teve seu retrato colocado no
salão principal daquela instituição4 (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5). Era médico
também do Instituto Gentil Bittencourt, função que assumiu ainda no primeiro
governo de Lauro Sodré (Estado do Pará, 03.08.1929, p. 1).
Abraçando a política, militou nas fileiras do antigo Partido Conservador, sob a
chefia do cônego Siqueira Mendes, tornando-se figura política de destaque no Império, sendo eleito deputado provincial por duas vezes. Na primeira legislatura
deixou de ocupar o cargo por ter partido para Europa em busca de aprimoramento
profissional, permanecendo no Velho Continente por longo tempo. Na segunda
legislatura não chegou a desempenhar seu mandato em virtude da proclamação da
República (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5).
Recebeu, em 6 de outubro de 1887, pela princesa Izabel, o título de comendador da
Ordem da Rosa, em atenção aos seus “relevantes serviços prestados a província do
Pará, a humanidade e a instrução pública”, referendando o decreto desta condecoração o chefe do ministério, o Barão de Cotegipe (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5).
Em 20 de outubro de 1888 recebeu do Imperador Dom Pedro II o título de Barão
de Anajás, sendo o respectivo título referendado pelo então ministro José Fernandes da Costa Pereira Junior (Estado do Pará, 03.08.1929, p. 1).
Foi ainda nomeado pelo ministro Antônio Ferreira Viana, em 13 de abril de 1889,
vice-presidente da província do Pará (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5).
Fez parte em Belém da Liga Abolicionista tendo dado liberdade voluntária aos seus
escravos antes mesmo da lei Áurea (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5).
Também foi nomeado em 11 de fevereiro de 1889 membro de uma comissão composta por seis médicos, um engenheiro e um arquiteto que deveriam decidir qual
melhor terreno para construção do novo Hospital da Santa Casa, se na praça da Sé,
ou na rua Oliveira Belo onde se localiza até hoje (VIANNA, 1992, p. 324)5.
Com o advento da República foi convidado por seu velho amigo e colega, o Dr. Paes
de Carvalho, um dos fundadores do Clube Republicano do Pará e um dos primeiros
governadores após o novo regime, para ocupar uma cadeira no Senado Federal, o
que não aceitou, permanecendo fiel aos seus ideais monárquicos até o fim de sua
vida (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5).
Após a morte da Imperatriz, em 28 de dezembro de 1889, o Barão de Anajás e
outros monarquistas como Dr. Jaime Pombo Brício, José Brício Gama e Abreu, JoHouve uma vez um Barão
375
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aquim Vitorino de Souza Cabral, Barão Mata Bacelar, Clementino Lisboa e Antônio
Cardoso Danin, liderados pelo conselheiro Tito Franco, exacerbaram-se no pranto
de pesar, promovendo aparatosas exéquias, enchendo os jornais de necrológios, enviando noticiário da imprensa e fotografias em álbum a Dom Pedro II no exílio. Tal
fato irritou profundamente os republicanos, culminando com acirrados debates nos
jornais. O mesmo grupo irritaria os republicanos pelo menos mais uma vez repetin127 1986, p.127
do as mesmas homenagens após a morte do Imperador (BORGES, 1993,
1986 p. 78).
Por mais que provocasse os republicanos, seu prestígio como médico - coisa que nunca dependeu de sua simpatia pela monarquia - continuava em alta no novo regime.
Pelo menos dois eventos ocorridos no fim daquele século reforçam a afirmativa:
No dia 15 de maio de 1896 seu nome figurou entre os 23 médicos convocados por
Paes de Carvalho que em conferência se reuniram na casa em que o maestro Carlos
Gomes se hospedou em Belém numa tentativa de salvá-lo6. E em 1º de fevereiro de
1898 durante a instalação da Sociedade Médico-Pharmacêutica do Pará, foi empossado vice-presidente daquela que foi a primeira associação médica do estado. Na
ocasião agradeceu sua escolha para o cargo e prometeu
376
...hypothecar o seu concurso dedicado, somente pelo desejo de prestar
serviço e não por vaidade de ocupar posições; que na sua idade não lhe
pesava no ânimo a ambição de glórias, mesmo das que podem advir dos
labores da profissão; desta profissão cujos triumphos não passam muita
vez do recôndito das alcovas e no exercicio da qual se formam também
heróes, obscuros embora, mais não menos uteis a humanidade (PARÁMÉDICO, 1901, p. 82).
No início do século XX, mesmo afastado da política partidária, o Barão conseguiu
se envolver em um incidente curioso durante a primeira visita de Oswaldo Cruz a
Belém. Em 1905, a política do estado estava dividida entre “lemistas”, os partidários de Antônio Lemos, intendente de Belém no período, e “lauristas”, que apoiavam Lauro Sodré, a oposição. Conforme Amaral Costa:
Estava sendo preparada pela classe médica uma expressiva manifestação
de apreço, mas em consequência da falta de unanimidade na escolha do
presidente da comissão, devido a intromissão da política local, em que
os partidários de Lauro Sodré, desejavam para presidir aquela o Barão
de Anajás, enquanto os adeptos de Antônino Lemos, tinham preferência
pelo médico Lyra Castro (COSTA, 1972, p. 99).
Este último uma figura de projeção política que já despontava no período e posteriormente viria a ser ministro da agricultura de Washington Luís (MEIRA, 1986b, p. 45).
De fato, cada grupo tentava tirar proveito do evento em causa própria. De um
lado queriam os “lemistas” aproveitar a passagem do sanitarista por Belém, para
prestar-lhe estrondosa homenagem em desagravo ao episódio do levante liderado
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
por Lauro Sodré, em consequência à promulgação da lei que determinava a obrigatoriedade da vacinação anti-variólica ocorrido em 14 de novembro de 1904, no
Rio de Janeiro (FRAIHA, 1972, p. 29). Já Antônio Lemos justificava a exigência
de Lyra Castro, pois este era o diretor do Serviço Terrestre Sanitário do Estado
(AMARAL, 2006, p. 199).
Na outra mão, os “lauristas” queriam evitar qualquer ataque a Lauro Sodré no evento, considerando que a indicação de Lyra Castro era uma
imposição de Antônio Lemos, não aceitando tamanha interferência, visto
que já haviam convidado previamente o Barão de Anajás para presidência
da festa. Alegavam ainda que o mesmo “tem ideias políticas conhecidas,
é adversário intransigente das atuais instituições. A sua comparecência
a manifestação nada tinha que ver por conseguinte, com o laurismo, e
não seria mesmo em caráter político que presidiria esta manifestação,
mas simplesmente como membro da classe a que pertence o Sr. Oswaldo
Cruz, e só assim condesceria em aceitar, estamos certos, o convite espontâneo que lhe fora feito” (Folha do Norte, 11.11.1905).
Ainda que o Barão não estivesse ligado diretamente às correntes políticas de então,
seu filho, o Dr. Sousa Castro, que começava a se projetar na política, era definido
por Ricardo Borges como um “laurista roxo” (BORGES, 1986, p. 366). Portanto
havia uma conotação política na sua indicação, mesmo que os “lauristas” negassem
descaradamente (AMARAL, 2006, p. 199).
De qualquer modo, a discórdia na escolha do representante da classe médica esquentou a política local, com acalorados editoriais publicados tanto na Província do Pará,
jornal de Antônio Lemos, como na Folha do Norte, órgão de tendências “lauristas”.
Chegando animosidade a tal ponto que em determinado momento, o Dr. Jayme Brício, que escrevia na Folha do Norte, afirmou em um editorial que os “lemistas” “não
passavam de vagabundos e batedores de carteiras” (AMARAL, 2006, p. 199).
Ao tomar conhecimento destes fatos, Oswaldo Cruz, que era avesso a manifestações
políticas e homenagens oportunistas, partiu antecipadamente de Belém, embarcando para Manaus silenciosamente à noite, deixando as duas correntes políticas se
acusando mutuamente da sua partida precoce.
Os tempos eram outros no final de 1918, quando os membros da Associação Científica do Pará, instituição que já mantinha a escola de Odontologia, procuraram
Camilo Salgado com intuito de fundar uma Faculdade de Medicina no estado, oferecendo a este o cargo de diretor. Camilo aceitou a ideia, mas preferiu permanecer
como vice-diretor, indicando para o cargo o Barão de Anajás, que já não era mais
um jovem “operador-ginecologista”, e sim um médico septuagenário “especialista
em moléstias e operações de olhos, garganta, nariz e bocca”, especialidade adquirida provavelmente após sua permanência no Velho Continente, e que atendia na
rua 13 de maio, número 27, das 9 às 11 da manhã, e recebia chamadas a domicílio
Houve uma vez um Barão
377
no mesmo período matinal, e das 3 às 5 da tarde, conforme anúncio publicado no
jornal (Folha do Norte, 12.02.1919).
A indicação do Barão, por Camilo Salgado, além de uma homenagem a um dos decanos da medicina paraense de então, poderia ter outro significado. Uma Faculdade
surgia do nada, num estado em plena crise econômica após a queda da borracha,
sem nenhum patrimônio material, ou mesmo local próprio, seria de se pensar duas
vezes antes de embarcar numa empreitada dessas. Tudo que dispunham era alguns
homens e muitas ideias, portanto seria mais do que necessário ligar um empreendimento tão arriscado a nomes que emprestassem credibilidade ao projeto.
Da mesma forma que a Associação Científica buscou em Camilo Salgado “seu legítimo prestígio junto a classe médica” (PARÁ-MÉDICO, 1922, p. 360), este buscava
os mesmos atributos no Barão, ou seja um nome tradicional e reconhecido que
“devia imprimir naqueles jovens idealizadores, essa impressão de estímulo austero,
com que a ciência absorve os espíritos privilegiados”. Isto é, “precisava existir fervente a disposição inicial do sacrifício, para o começo da jornada. Foi quando mais
necessário se fazia a influência moral daquele ancião de espírito juvenil animando
os companheiros moços” (A NOSSA Faculdade de Medicina, 08.01.1963).
378
O Barão seria então mais um nome de peso pra alavancar a iniciativa, atraindo
médicos de todas as gerações, coisa que dificilmente ocorreria caso a recém criada
instituição fosse encabeçada apenas por médicos com poucos anos de formados,
ainda que cheios de boas intenções.
É bom lembrar, também, que neste mesmo período, o Dr. Sousa Castro, filho do Barão
e também um dos fundadores da Faculdade de Medicina, era deputado no Congresso
Federal, colega e companheiro de Camilo Salgado no Partido Republicano Federal, vivia
uma fase de ascendência política, que culminaria com sua eleição para Governador do
Pará, cargo que ocuparia entre 1º de fevereiro de 1921 e 1º de fevereiro de 1925. Tal fato
poderia também ter tido algum peso na sugestão do Barão como diretor. A verdade é que
se poderia afirmar que aos 72 anos incompletos o Barão de Anajás havia sido “premiado”
com um grande “abacaxi”. Era diretor de uma instituição que surgia em um Estado financeiramente instável, contando apenas com a fé de alguns e a descrença de muitos.
Apesar das circunstâncias, o Barão não pode ser considerado um neófito em questões
educacionais. Fazia já alguns anos que ele exercia o cargo de fiscal federal junto ao colégio “Paes de Carvalho”, tendo participado da equiparação deste ao colégio “Pedro II”, do
Rio de Janeiro (PARÁ. Governador (1917-1921: Lauro Sodré), 1919, p. 120). Seu prestígio talvez tenha auxiliado o empréstimo de duas salas de aula no térreo daquele estabelecimento e de frente para rua João Diogo. Primeira morada da Faculdade de Medicina.
De concreto mesmo, tendo como base os poucos documentos que sobreviveram,
sabe-se que coube ao Barão, organizar as cadeiras e nomear os professores, tarefa
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
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bastante ingrata, visto que passada a empolgação inicial, veio a incerteza quanto
à remuneração, e mesmo a falta de vocação para o magistério, sendo grande o
número de desistências e abandono por parte dos docentes. Este período inicial
seria definido por Clodoaldo Beckmann como “dança das cátedras”7 tamanho foi
o entra-e-sai de professores, muitos dos quais sequer chegaram a ministrar uma
aula. Um exemplo entre tantos foi o do Dr. Pedro Miranda, renomado oftalmologista de então, nome hoje de larga avenida em Belém, nomeado professor de sua
especialidade em 3 de abril de 1919, mas que nunca chegou a assumir a cadeira de
fato (FMCP, 1919. Ata de 03.04.1919).
Registre-se que além dos professores, os funcionários administrativos também foram perdendo o interesse pelo projeto, cabendo ao Barão substituí-los com habilidade como mostra este memorando enviado ao então tesoureiro da Faculdade.
Ilmo Sr. Antônio Barbosa Rodrigues
Em 16 de Fevereiro de 1922
Esta directoria attenta aos múltiplos problemas a manutenção e progresso
desta Faculdade, tem notado toda a bôa vontade de Vossa Senhoria e todo
esforço que vem fazendo em seu favor com sacrifício alias das innumeras
preoccupações de sua vida commercial, preoccupações que o privam da assistência neste Instituto, principalmente agora que de um lado a Praça exige
todo seu intelligente esforço nas coisas mercantis, emquanto que do outro
lado carece a Faculdade do seu Thesoureiro, por causa do movimento de
matriculas, exames e et cetera.
Não é justo, pois, exigir de vossa senhoria mais do que sua bondade e affecto
a esta casa lhe permittem fazer, o que infelizmente não basta; e por isto, esta
Directoria resolva nomear outro funccionario para exercer o cargo de Thesoureiro, indo assim ao encontro das difficuldades, por Vossa Senhoria nunca
expostas, como era de se esperar de sua proverbial gentileza.
Cabe registrar aqui a maior gratidão à V. Sa., da parte da Faculdade de Medicina posto vosso empenho em prol de seu progresso, lamentando que as
exigências de vossos muitos afazeres houvessem determinado o afastamento
de cargo que tão gentilmente vinha exercendo.
Aceite V. Sa. os meus protestos de mais elevada consideração.
Saúde e Fraternidade
Barão de Anajás
(FMCP, 1922a).
Dada à carência de material didático, o Barão buscou estabelecer contatos com centros mais adiantados visando solucionar problemas urgentes. Deste modo, enviou
diversas correspondências, como para o médico Bruno Lobo, paraense radicado no
Rio de Janeiro, professor catedrático de Microbiologia
Anatomia Patológica
xxxx da Faculdade Nacional de Medicina e Diretor do Museu Nacional, onde solicitou coleções de mineralogia e zoologia necessárias para as aulas de história natural, no que prontamente
Houve uma vez um Barão
379
foi atendido recebendo entre 19 e 24 de setembro de 1919 doações do Museu Nacional compostas por 25 tipos de minérios, oriundos alguns do exterior, e diversos
espécimes zoológicos entre moluscos, crustáceos, zoofítos, equinodermas e culicídeos (FMCP, 1919b).
O Barão recorreria ainda a Bruno Lobo, pelo menos mais uma vez, no ano seguinte, em
4 de maio, solicitando “com a máxima brevidade, telegraphando dizendo-nos o custo,
afim de ser imediatamente remetido o devido pagamento” preparados histológicos
para as aulas práticas de histologia que se iniciavam. A “máxima brevidade” naquela
época ocorreria em 9 de agosto do mesmo ano, quando a Faculdade recebia novamente
em nome do Museu Nacional, duas coleções de lâminas, uma de histologia normal e
uma de histologia patológica, preparadas pelo próprio Bruno Lobo (FMCP, 1919b).
Ainda em 1920, o Diretor da Faculdade consegue do Governo do Estado, através
do Diretor Geral da Instrução Pública Primária do Estado, o professor Paulo Maranhão, a doação de trinta e três carteiras, sendo cinco da escola da penitenciária e
vinte e oito do grupo escolar “José Veríssimo” (FMCP, 1920).
Prosseguindo com suas atividades à frente do novo curso de medicina, em 24 de
fevereiro de 1921, o Barão organiza e publica o primeiro estatuto da Faculdade
calcado nos moldes da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro.8
380
No dia 7 de março de 1921, o Barão envia correspondência a Camilo Salgado onde
diz que:
Tendo que retirar-me temporariamente d´este estado com destino ao Rio
de Janeiro, tenho o prazer de transmittir durante meu impedimento a
vossa excelência a direção d´este Estabelecimento de ensino superior,
que assim ficará sobre a sabia orientação e alto descortino de vossa excelência que concorrerá para o progresso e engrandecimento d´esta Instituição (FMCP, 1921).
Deste modo, Camilo assumiria pela primeira vez a direção da Faculdade, em uma
espécie de ensaio para o que viria depois.
Após seu retorno, por volta de junho do mesmo ano, o Barão continuaria na rotina
entre nomeação e pedidos de afastamento de professores catedráticos, lentes substitutos, funcionários amanuenses, e secretários.
Por intermédio de Antônio Porto de Oliveira, professor catedrático de psiquiatria,
conseguiu no início de fevereiro de 1922, a doação de livros científicos e revistas
médicas do Dr. J. A. de Magalhães, que fora vice-presidente da Sociedade Médico
Cirúrgica do Pará no biênio de 1919-1920, e que “partindo de Belém, houve por
bem mimosear e enriquecer nossa biblioteca”. O Barão responde que recebeu a
“inestimável offerta [...] com os mais sinceros protestos de consideração e agradecimento” (FMCP, 1922b).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
As coisas pareciam transcorrer normalmente até que em 25 de março de 1922,
Camilo Salgado recebeu a seguinte notificação do Barão informando que:
Impossibilitado em virtude de encommodos de saúde dos misteres dos
cargos que occupo n´essa Faculdade, passo as mãos de V. Exa. por tempo
indeterminado o exercício do cargo de Director da mesma Faculdade que
actualmente occupo.
Saudações.
(FMCP, 1922b).
O Barão de Anajás assinava ali seu último documento como Diretor da Faculdade
de Medicina do Pará.
A questão de saúde aludida pelo Barão para largar o cargo não passou de um
eufemismo, como pode ser visto em discurso pronunciado à congregação pelo já
Diretor Camilo Salgado:
...o que occorreu no estabelecimento que passou a minha direcção em
abril do ano passado, quando bem sabeis, vinham de ter logar as occorencias que deram ensejo ao afastamento do nosso venerado e acatado
collega Barão de Anajás, que com tanto critério e sabedoria, orientava a
Faculdade de Medicina do Pará, desde a sua fundação, de modo a não lhe
escassearmos applausos, que se ajustam aos que bem se compenetram da
responsabilidade dos seus deveres.
Não esquecestes que fui investido das funcções de director justamente na
época em que aquelle preclaro clinico paraense, reputando desacertadas
e exaggeradas as reprovações em certas cadeiras do curso medico como
anatomia descriptiva, microbiologia e physiologia, se demissionava do
seu cargo, corrigindo o gesto que tomou a interferências nossas, com a
licença em que permanece.
A esse tempo a imprensa se occupou dos fatos em allusão, desenvolvendo
Estado do Pará conceituado orgão de publicidade, séria campanha aos
professores e auctores das reprovações em foco, porque as considerava
como perseguição a determinados candidatos. Verifiquei então, porque
ainda prosseguiam os exames da época, que os lentes em questão não
exhorbitaram nas suas cathedras e que o corte de 60% dos candidatos em
exame obedecia a um criterio muito alevantado e moralisador (FMCP,
1923c, p. 9).
Buscando o jornal “Estado do Pará”, de 22 de março de 1922, a real motivação para
saída do Barão fica completamente esclarecida na nota “Faculdade de Medicina –
uma Scena Desagradável”.
Ocorreu ante-hontem à tarde na Faculdade de Medicina, uma scena desagradável, entre o director Barão de Anajás, e alguns lentes e estudantes do 2º anno em consequencia das reprovações havidas nos ultimos
exames praticos.
O director mostrou-se contrariado com a severidade dos lentes e as reclamações dos estudantes, não deixando entretanto da dar razões a estes.
Houve uma vez um Barão
381
Os exames realizaram-se naquelle dia, de manhã e á tarde, no hospital
da Santa Casa.
De manhã responderam á chamada em microbiologia 9 candidatos, passando 3, sendo um bacharel, e dois auxiliares da Profilaxia Rural.
Foram examinadores os drs. Prisco dos Santos, Americo Campos e Dagoberto Sousa.
Nos exames de histologia e anatomia, 2º anno, em que serviram como
examinadores os drs. Teixeira Mendes, Prisco dos Santos e Evaristo Silva nenhum dos candidatos logrou approvação.
A tarde fôram chamados mais dois candidatos, nessas ultimas cadeiras,
passando um, simplesmente, em histologia.
Sciente do ocorrido o Barão de Anajás manifestou francamente sua opinião
que nenhum estudante devia ser reprovado, emquanto os examinadores
se mantiveram firmes na suas deliberações, tomadas, segundo affirmaram,
com absoluta isenção de animo e só baseadas nas provas exhibidas.
Em face da attitude do director da Faculdade, os lentes julgando-se desconsiderados, procuraram o vice-director, dr. Camillo Salgado, a quem
pediram providencias.
(Estado do Pará, 22 de março de 1922).
Como Camilo Salgado ficou a favor dos professores, o Barão sentiu sua autoridade desprestigiada e reduzida. Como resultado, no dia 27 de março, às onze horas da manhã,
Camilo Salgado assumiu a direção da Faculdade (Estado do Pará, 28 de março de 1922).
382
Em 7 de abril de 1922 foi comunicado que na sessão da congregação do dia quatro,
o Dr. Camilo Salgado, “Vice-Diretor em exercício de Diretor” apresentou um voto
de louvor ao Barão de Anajás “em consideração aos serviços inestimáveis prestados
por vossa excelência, a este futuroso estabelecimento de ensino superior”, que foi
lançado em ata depois de aprovado por unanimidade (FMCP, 1922b). Numa forma
de homenagem o documento ainda refere o Barão como diretor, mas este havia se
desligado definitivamente da Faculdade.
Um incidente curioso, que ocorreria pouco depois, confirma a hipótese de que o
Barão de Anajás, naquela fase de sua vida, podia tomar decisões intempestivas e
precipitadas quando era contrariado.
Na tarde de 12 de abril de 1922 o Barão viajava em um bonde da linha Santa Izabel. O
condutor Francisco de Assis, como era de rotina, foi cobrar as passagens. Ao chegar
a vez do Barão, este disse que possuía “passe”, e conforme a lei vigente o condutor
pediu que ele apresentasse seu “passe”. O Barão provavelmente sentiu-se ofendido
por não ser reconhecido e respondeu asperamente que o condutor o veria na polícia.
Minutos depois, quando o veículo chegou a estação central, Francisco de Assis foi
preso “por ordem superior” sendo liberado somente na manhã seguinte. A imprensa, como não poderia ser diferente, criticou duramente o pai do governador que
“por um capricho, mandou prender o conductor número 6” (UMA INIQÜIDADE.
14.04.1922).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
O afastamento da Faculdade não marcou de imediato o fim de suas atividades médicas, visto que em 1923 seu nome ainda figurava como médico do Instituto Lauro
Sodré (ILS, 1923), porém com o passar dos anos as notícias a seu respeito vão
ficando mais escassas e seu nome aparece cada vez mais ligado a fatos alusivos a
seu filho mais famoso, que já senador vinha volta e meia até Belém para “...abraçar
seu venerado progenitor, o Barão de Anajás, e repousar das fadigas parlamentares”
(Revista A Semana, n. 516, 1928).
Antonino Emiliano de Souza Castro, o Barão de Anajás, viveria ainda mais seis
anos. Até que no dia 2 de agosto de 1929, por volta das 17h25, após cerca de dois
meses de convalescença depois de “longos e atrozes padecimentos” (Estado do Pará,
03.08.1929, p. 1), que haviam se agravado nos três últimos dias, falecia em sua residência na travessa Dr. Moraes número 11, o homem que um dia foi definido por
seus contemporâneos como “um dos membros mais acatados da classe médica do estado e cavalheiro largamente estimado e relacionado nesta capital” e “...um coração
magnanimo, devotado ao próximo, a quem não recusava seus serviços profissionaes
humanitariamente, procurando sempre consolar os que soffriam, mitigando-lhes as
dores e alliviando os pesares” (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 2). Viúvo de D. Merandolina Fernandes de Sousa Castro, a Baronesa do Anajás, vítima de meningite
streptocócica em 10 de março de 1910 (Folha do Norte, 10.03.1910), deixava aos 82
anos os seguintes filhos: Dr. Antonino Emiliano de Sousa Castro, Arthur de Sousa
Castro, Anna Sousa Castro de Campos, Maria Sousa Castro de Campos, e Joanna
Fernandes de Sousa Castro, assim como os seguintes netos Dr. Fernando de Sousa
Castro, Olga Sousa Castro Acatauassú Nunes, Conceição de Sousa Castro Cardoso
e mais quatro bisnetos. Seu atestado de óbito preenchido pelo Dr. Acatauassú Nunes
Filho dá como causa mortis “Artherio sclerose generalizado, colapso cardíaco9”.
O colégio Paes de Carvalho em sinal de pesar pelo falecimento do Barão que fora
fiscal federal durante muitos anos daquela instituição, suspendeu suas aulas naquele dia (Folha do Norte, 03.08.1929), a Beneficente Portuguesa deixou sua bandeira a
meio mastro (Estado do Pará, 04.08.1929, p. 2).
A Faculdade de Medicina, que o tinha então como diretor honorário (FMCP,
1924b), mandaria uma coroa de flores “Ao seu distincto fundador” (Estado do Pará,
04.08.1929, p. 2) e em seguida rapidamente esqueceria o homem que um dia emprestou seu prestígio quando aquela instituição mais precisava.
Houve uma vez um Barão
383
Foto 68/69:
Como era comum entre
os titulares do Império
Brasileiro, o Barão de
Anajás possuía sua
prataria em porcelana de
Limoges personalizada
com o monograma “BA”
em cinza e solferino sob
coroa de Barão. Apenas
estas duas peças de seu
acervo foram localizadas
em coleções particulares
no estado de São Paulo.
Fonte: DREYFUS
(1982, p. 238).
384
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
NOTAS
1
Cf. COSTA, Éden Moraes da. Médico de ontem e de hoje: ciência, fé e santidade no culto a Camilo Salgado (1874-1938) em Belém do Pará. Dissertação
de mestrado – UFPa, 2003.
2
Atestado de óbito.
3
Estado do Pará do mesmo dia cita a data de sua formatura como sendo 6 de
outubro de 1877, trata-se provavelmente de um erro.
4
Acredita-se que o referido retrato não mais existe no hospital.
5
Curiosamente apenas um membro da comissão emitiu um parecer por escrito e uma nova comissão teve que ser formada.
6
O Maestro faleceria em Belém em 16 de setembro de 1896 (REGO, 2004,
p. 462).
7
“...iniciou-se uma verdadeira dança das cátedras, com licenças, transferências, substituições e o que mais fosse, materializadas numa pletora de portarias e atos de nomeação para professores interinos, substitutos, regentes,
efetivos, catedráticos, o que forçosamente haveria de desacreditar a Faculdade”. (BECKMANN, 2003, p. 250).
8
Estatutos da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
9
Atestado de óbito.
385
Houve uma vez um Barão
386
25
Camilo Salgado O Berço do Mito
387
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388
Matéria da Folha do Norte de 28 abril de 1938 jornal.
xxxxx
“- Fui a muitos médicos, ninguém descobria o que tinha, cheguei até a ser
desenganada por um deles, aí recorri ao Dr. Camilo e ele me curou”.
A frase em epígrafe é facilmente ouvida em Belém em qualquer ocasião. Na verdade,
não haveria nada de especial nela; em todos os lugares do mundo muitos pacientes com
doenças crônicas e raras muitas vezes passam de médico em médico em uma longa e
penosa peregrinação, até que um deles consegue estabelecer um diagnóstico preciso,
seja por deter mais conhecimentos ou mesmo por pura sorte. O que confere a esta frase, aparentemente banal, um aspecto no mínimo curioso é que o Dr. Camilo em questão encontra-se desde 1938 enterrado no cemitério Santa Izabel, o maior de Belém.
O Brasil está cheio de médicos visionários, que em condições adversas na velha
República, ajudaram a criar Faculdades de Medicina pelo país. Em Pernambuco,
por exemplo, há Octavio de Freitas, que lutou para a criação da Faculdade Medicina do Recife, aguardando pelo menos cinco longos anos entre a fundação e sua
efetiva instalação (KELNER, 1985). Em São Paulo está aquele que talvez seja o
exemplo mais famoso, Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho, criador da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), merecedor de enorme busto
na entrada desta e nome da larga avenida em frente (LACAZ, 1985).
Todos estes médicos criadores de escolas gozam ainda hoje de prestígio entre seus
pares, mas nenhum deles adquiriu a honraria de “Santo Popular”, que coube exclusivamente a Camilo Salgado, ainda hoje “procurado” por gerações que sequer o
conheceram profissionalmente (COSTA, É., 2003).
Inicialmente o mito teve a vantagem de preservar a memória de Camilo Salgado em
um país acostumado ao esquecimento. Por outro lado, o culto ao “santo” acabou por
transformar o homem que realmente existiu em uma lenda tão grande que eclipsou os
outros fundadores e consolidadores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Ressalte-se que o Pará já havia tido médicos de grande prestígio político e popular
muito antes de Camilo. Ainda no tempo do Império pode ser citado o Dr. José da
Gama Malcher, que teve estátua sua esculpida de corpo inteiro na Bélgica, paga
com dinheiro obtido via contribuições da população e colocada no Largo das Mercês, atual Praça Visconde do Rio Branco. Entretando nenhum outro médico paraense “...conseguiu dar ao seu nome a aura, o carisma, a verdadeira mística, entre o
povo...”, como Camilo Salgado (MEIRA, 1986b, p. 71).
Camilo Henriques Salgado Junior1 nasceu em Belém em 22 de maio de 1874 ao meio
dia, em uma quinta-feira santa, na casa de número 110 na antiga rua Cruz das Almas,
atual Arcipreste Manoel Teodoro, local onde hoje existe o Hospital Guadalupe2.
Era filho de Camilo Henrique Salgado3 e de Angélica de Alméria Tanellas Salgado.
Teve dois irmãos, Angelina Salgado dos Santos e Carmelino Salgado4, cirurgião dentista, um dos fundadores e por duas vezes diretor da Faculdade de Odontologia5.
Camilo Salgado o berço do mito
389
Camilo Salgado recebeu sua instrução primária em casa, com o pai. Posteriormente, após exame de admissão, matriculou-se no antigo Lyceu Paraense, atual colégio
Paes de Carvalho (MORELLI, 1991, p. 24).
Em 1891 viajou para Salvador matriculando-se na Faculdade de Medicina da Bahia,
transferindo-se para o Rio de Janeiro no quarto ano. Concluiu o curso em 1896 na
Faculdade de Medicina e Farmácia do Rio de Janeiro, posteriormente Faculdade
Nacional de Medicina. Foi interno acadêmico no Hospital São João Batista em Niterói (PANTOJA, 1938, p. 6).
Depois de formado regressou a Belém, partindo logo em seguida para Paris em
viagem de estudos, para cursos de especialização, tendo freqüentado importantes
centros cirúrgicos dentre os quais a Clínica do Prof. Charcot, chegando inclusive a
viajar com este de trem de Paris até Versalhes (PANTOJA, 1938, p. 6).
390
De volta a Belém montou seu consultório atendendo às segundas, quartas e sextas, de
3 às 4 horas da tarde no “Gabinete Physioterapico”, localizado no Largo do Palácio,
atual Praça Dom Pedro II, e às terças, quintas e sábados de uma às 3 da tarde na “Farmácia Pará” (Folha do Norte, 25.09.1923, p. 5), situada na Avenida Conselheiro, tornando-se sócio desta última. Como todo seu receituário era atendido ali de modo quase totalmente gratuito, os prejuízos não tardariam, e para que ela não fosse a falência,
Camilo logo vendeu sua parte da sociedade (MORELLI, 1991, p. 24). Os jornais da
época por ocasião de seu falecimento recordariam o fato de que “...as suas pharmacias
foram as unicas no mundo que fecharam as portas por falta de lucros, nunca por falta
de receituarios” (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1). Esta, aliás, é uma das características mais marcantes e recordadas pelos que conviveram com Camilo Salgado. “Tudo
o quanto fazia, ou quase tudo, era de graça. Não cobrava porque o doente era pobre e
não cobrava porque era rico, compadre e amigo” (MEIRA, 1986b, p. 71).
Camilo atendia a todos sem distinção de classe social, chegando a casebres distantes
onde seu automóvel não podia chegar. Os moradores do Jurunas, bairro periférico próximo de onde morava, o tinham como um amigo e o chamavam a qualquer hora que
fosse preciso. Sua casa muitas vezes amanhecia cheia de pacientes à frente, que lá iam
em busca de um pedido de qualquer natureza ou de uma consulta, no que eram sempre
prontamente atendidos (Estado do Pará, 03.03.1938, p. 4). Além da receita era comum
sair de seu bolso o valor do remédio e da dieta (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1).
Esse lado humanitário aliado a uma boa qualificação profissional lhe rendeu rapidamente larga clientela e conseqüente fama como um dos melhores médicos de
Belém. Um trágico incidente ocorrido em 1900 exemplifica isto. Em 11 de abril
daquele ano chegava ao Pará a “Companhia Lírica Italiana”. Patrocinada pelo governo do Estado, contava com 107 participantes entre maestros, bailarinos, cantores, músicos e professores. Estrearam com a ópera “Aída” de Verdi, e em 45 dias
já haviam apresentado 12 óperas diferentes com sucesso estrondoso. Logo a febre
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
amarela, então endêmica na cidade, começou a ceifar a vida dos membros da companhia praticamente dizimando-a, perdendo inclusive a cantora Maria Cavallini,
um dos principais talentos líricos da Europa com apenas 27 anos (NUNES, 1989,
p. 12). Os pacientes foram internados no recém inaugurado Hospital Domingos
Freire6 e:
“...de acordo com o regulamento deste, os doentes deveriam ser atendidos pelo corpo clínico do hospital, mas obedecendo a um princípio humanitário e ético, abriu excessão permitindo que fossem assistidos por
médicos contratados pela companhia, os conceituados clínicos Torreão
Rocho e Camilo Salgado” (COSTA, C., 1972, p. 71-72).
391
Foto 70: Camilo Salgado.
Fonte: Museu da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará – quadro de formatura da turma de 1938.
Considerado pela imprensa o melhor cirurgião do Pará (Folha do Norte, 03.03.1938,
p. 1), algumas de suas intervenções marcaram época, como a de um paciente vindo
de Manaus no qual praticou um enxerto na perna com um fragmento ósseo retirado de um cachorro. O resultado teria sido extraordinário, o caso foi fotografado e
circulou o país (MEIRA, 1986, p. 72).
Teria sido o primeiro cirurgião brasileiro a realizar no país, em 1924, o “processo de
rejuvenescimento”, técnica desenvolvida pelo cirurgião russo Voronoff7 que lhe valeu
brilhante carta do então senador Dyonisio Bentes, dirigida ao jornal “Imparcial” do
Rio em defesa do seu nome acerca de “...commentarios insensatos que aquelle orgão
da imprensa lhe havia feito a proposito dessa intervenção” (PANTOJA, 1938, p. 9).
392
Em uma época em que as intervenções cirúrgicas despertavam muita atenção a
ponto das descrições operatórias sairem na imprensa leiga, Camilo não tinha como
ficar de fora dos jornais. Deste modo sua fama foi rompendo fronteiras e em 11 de
outubro de 1921 o jornal carioca “O Paiz”, diário de repercussão nacional, registrou o sucesso de duas operações por ele realizadas para retirada de volumosos cálculos na bexiga e no terço superior do ureter esquerdo, esta última em um paciente
que já tinha tentado tratamento na Europa e no Rio de Janeiro, sem resultado. A
notícia destaca a intervenção como brilhante e “...na curta duração de quarenta e
cinco minutos, sendo que aos 25 o cálculo já se achava retirado” (SANTOS, 1974,
p. 189). Em um período de grandes riscos anestésicos, o tempo operatório era fator
da mais alta relevância.
Mesmo colunas jornalísticas mais satíricas como “Tucháuas de minha taba” ressaltavam as habilidades, a inteligência seu lado humanitário consolidando a imagem
de benemérito cidadão (ver foto 71).
Abaixo da Caricatura de “Cotta” há o seguinte poema de Jacques Flores:
Com este, “tanglomanglo” corta jaca, / digo que corta volta. Dá o fora.../ O enfermo fica são, e sem demora / se, com o saber, elle a doença ataca. / A enjôo manda dar chá de alfavaca. / Emtanto, se o doente não melhora./ fuma um cigarro e
pensa a sós: -Agora / não mais receito. Vou agir a faca.../ Na operação de enxertos
é de facto: / tira o bofe de um typo empaludado, e põe outro de boi, de cão ou gato...
/ Vive sempre glorioso e abençoado, pois rico em sciencia, aos pobres é barato, /
prova que só no nome elle é salgado. (Estado do Pará, 15.08.1926, p. 1).
Seu diário registrava cerca de 450 operações por ano, sendo muitos de seus pacientes oriundos de outros países sul-americanos ligados ao Pará pela bacia amazônica
(PANTOJA, 1938, p. 9). Deste modo, aquele homem considerado
...tímido na vida pública, na profissional foi sempre audaz. Avançado no
tempo, retirou esquírulas parietais na dura-mater, removeu cálculos ureterais, laparotomizou para intervir sobre o estômago, os intestinos e os
anexos, invadiu a seara cirúrgica de ginecologia e da obstetrícia, pene-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
trou os meandros da pneumologia, realizou engênios de ortopedia e traumatologia, enfim poucos foram os sítios do corpo humano que seu exímio
bisturi não perscrutou (SANTOS, 1974, p. 187).
393
Foto 71: Caricatura de Adrelino “Cotta”.
Fonte: Estado do Pará, 15.08.1926, p. 1.
Camilo fazia parte do corpo clínico dos principais hospitais de Belém, tendo participado do conselho administrativo da Santa Casa chegando a ser seu provedor
(MEIRA, 1986b, p. 72). Foi chefe de clínica na Ordem 3ª de São Francisco (Estado
do Pará, 03.03.1938, p. 4). e atuou também no Hospital dos Marítimos (PANTOJA,
1938, p. 9). No Hospital Dom Luiz I, da Imperial Sociedade Beneficente Portuguesa do Pará, não seria diferente. Lá ingressou em 1897, logo depois de formado;
quatro anos depois era nomeado diretor do corpo clínico; em 1904 recebeu o título
de “Sócio Benfeitor”, em 1916 “Sócio Honorário” e finalmente em 1924 “Sócio Benemérito”. Seu prestígio entre a colônia portuguesa era tão grande que em 1931
o novo regimento interno daquele hospital previa que o mandato dos diretores
clínicos fosse de três anos, exceto para Camilo que exerceu o cargo até a morte
(MEIRA, 1986b, p. 77).
Bastante atuante no meio médico e associativo, está entre os fundadores da Sociedade Medico-Pharmaceutica do Pará, em 8 de novembro de 1897, (PARÁ-MÉCamilo Salgado o berço do mito
DICO, 1900, p. 22) - posteriormente desaparecida - e fundaria, em 15 de agosto
de 1914, a Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, instituição existente até hoje, da
qual foi o primeiro presidente (MEIRA, 1986, p. 73). Em 4 de julho do mesmo ano
figurou junto com seu irmão Carmelino entre os fundadores da “Escola Livre de
Odontologia do Pará” (RIBEIRO, 2005, p. 12).
Um homem com tamanho carisma e popularidade não ficaria afastado da vida política, tendo militado durante anos no Partido Republicano Federal, seguindo até o fim
seu grande amigo Lauro Sodré, sem, no entanto deixar que sua orientação política
interferisse em seu lado médico e humanitário. Em 1912, no tempo em que os ânimos
políticos do Pará estavam muito acirrados e a população se dividia entre partidários
de Lauro Sodré e defensores de Antônio Lemos, Camilo Salgado, “laurista” convicto,
impediu, juntamente com o Dr. Antônio Marçal, o linchamento de Antônio Lemos
pela furiosa multidão “laurista” em 30 de agosto (MORELLI, 1991, p. 29).
Foi eleito em 1918 para o antigo Senado Estadual e reeleito em 1927, sendo indicado como vice e depois como presidente do Congresso Estadual (Folha do Norte,
06.03.1938). Nesta condição, chegou a assumir interinamente o Governo do Estado, dias antes do governador Eurico Valle assumir o mandato (Estado do Pará,
03.03.1938).
394
Após a Revolução de 1930 retirou-se temporariamente da política, retornando somente
como vereador da Câmara Municipal de Belém em 1935, com expressiva votação, onde
permaneceu até a extinção desta pelo Estado Novo. Recusou diversos convites para
se candidatar a Deputado Federal, pois não desejava afastar-se de sua terra (Estado do
Pará, 03.03.1938). Seu nome era tão popular, que seu amigo e professor de psiquiatria
da Faculdade, Porto de Oliveira chegou a fundar uma agremiação partidária com seu
nome, a “União Cívico-Politica Camilo Salgado” (Revista A Semana, n. 351, 1925).
Com esta pequena resenha biográfica, sobram motivos para explicar o porquê da
“Associação Cientifica do Pará” ter visto em Camilo Salgado a figura ideal para dirigir a Faculdade de Medicina que estavam por criar. Além de muito popular entre
os pacientes das mais diversas classes sociais, Camilo era respeitado e admirado
por seus colegas, e como se isso já não bastasse tinha um grande poder político,
pertencendo ao partido que dominava a política local no período.
Ele aceita o convite, mas declina a indicação para Diretor, preferindo permanecer
como Vice, indicando em seu lugar o Barão de Anajás. Mais do que um gesto de
humildade, ao indicar o Barão, Camilo agregaria ainda mais credibilidade a um
projeto cuja execução para muitos era duvidosa.
O Barão de Anajás era um dos decanos da medicina paraense, pertencia a uma outra geração de médicos que haviam construído sua imagem ainda no Império, como
Silva Castro, José da Gama Malcher e Jaime Pombo Brício. Como diretor, o Barão
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
passaria a ideia de que médicos de todas as gerações estavam unidos na criação
da Faculdade, fazendo com que a iniciativa não fosse vista como uma aventura de
novatos. Sem esquecer é claro que o filho do Barão, além de médico, era político de
projeção, que logo chegaria ao Governo do Pará8.
Em 1921 o Barão viajou por alguns meses e Camilo assumiu interinamente a direção da Faculdade tomando uma medida fundamental: o convênio com a Santa Casa
de Misericórdia estabelecendo um vínculo entre as instituições, o que perdura até
hoje em certas disciplinas9.
Com a saída definitiva do Barão de Anajás ocorrida em fins de março de 1922, Camilo Salgado tornava-se diretor da Faculdade, cargo que só deixaria por sua morte.
Assumia ali uma instituição que ainda não estava equiparada às suas congêneres
federais e nem sede própria possuía e cujas despesas previstas para aquele ano, tendo em vista a necessidade de compra de equipamentos de laboratório, seriam três
vezes superiores a sua arrecadação (Estado do Pará, 08.05.1922). Uma fonte aparentemente inesgotável de aborrecimentos e dor de cabeça, mas isso não o abalou.
Visando angariar recursos chegou a organizar festas no “Palace-Theatre”, que foi
cedido pela empresa Teixeira Martins e Cia (Estado do Pará, 08.05.1922).
Em janeiro de 1923 lançou uma ambiciosa campanha para doação de fundos visando a
aquisição de uma sede própria para a Faculdade. Graças ao seu enorme prestígio a campanha foi um sucesso absoluto, praticamente toda a população de Belém aderiu, cada
um doando o que podia em uma época que o estado atravessava uma crise econômica.
Conseguiu a quantia de 25 contos de réis, mais 20 contos da hipoteca de sua própria
casa10. Em dois de junho daquele ano a Faculdade de Medicina do Pará já ostentava sua
sede própria, o Palacete Santa Luzia, situado no Largo homônimo, onde funcionava o
grupo escolar Wenceslau Braz, estrategicamente em frente a Santa Casa.11
Só isso já bastaria para sua consagração na história daquela instituição, porém
Camilo Salgado não parou por aí, sua amizade com Lauro Sodré rendeu alguns benefícios a Faculdade. Inicialmente tentou fazer com que Lauro Sodré conseguisse
alguma ajuda financeira junto ao Congresso Nacional para a escola paraense. As
tentativas iniciais, conforme conta o próprio Sodré, não foram nada animadoras:
Rio, 25- Janeiro 1923
Amigo dr. Camillo Salgado
Cumprimentos affectuosos;
É com prazer que vejo o esforço com que se dedica á Escola de Medicina,
cuja direcção lhe foi confiada.
Só applausos e louvores merecem os que assim vão carregando a sua
pedra para o edifício das nossas futuras grandezas moraes.
Quando essa idea de crear uma Escola de Medicina surgiu ahi, era eu
governo, e como tal fiz o que em minhas mãos esteve para ajudal-os no
Camilo Salgado o berço do mito
395
ousado commettimento, que a meus olhos parecia uma temeridade, um
acto de coragem e ao mesmo tempo de fé e confiança nas energias da
nossa gente. Não desacertei de tudo, porque em boa parte os meus prognósticos, oriundos da crença posta no valor moral dos que se punham
assim destemerosos em campo, foram confirmados. Ainda bem que assim
é, por honra e para benefício de nossa generosa terra.
Li como trata de conseguir um edificio para installar dignamente o instituto. Há de ser ouvido o seu appêllo. Nunca foi em vão que palavras
como a sua chegaram aos ouvidos dos que fizeram sua a terra em que
encontram generoso agasalho. Tive vezes diversas provas disso.
Bem viu que não esqueci essa Escola. E de novamente voltei a pedir modesto
auxilio de vinte contos ao Congresso Nacional. Uma vez ainda a Câmara dos
Deputados não approvou o auxilio, que a Commissão de finanças do Senado
reduzira a doze contos. E essa recusa era feita ao ser votado o orçamento em
que figuraram auxílios vultuosos ás Escolas de Medicina em outros Estados.
Espero que lograremos ser attendidos este anno. Já é tempo de conseguirmos que tambem para nossa terra se voltem os olhares dos que em
tão pequena conta parecem ter o Norte, o eterno desamparado do Imperio e tão pouco acarinhado pela República.
Abraços affectuosos. Amigo e correligionário
(FMCP, 1923c, p. 21).
396
Posteriormente Lauro Sodré conseguiria obter uma pequena subvenção do Governo
Federal, o que permitiu que a Faculdade melhorasse seus laboratórios e construísse
o pavilhão onde está o Salão Nobre (Folha do Norte, 29.10.1934, p. 1). O mais importante, porém, foi que graças ao prestígio de Lauro Sodré junto ao Barão de Ramiz
Galvão12, a Faculdade de Medicina do Pará foi equiparada às escolas oficiais em 4 de
setembro de 1924 (Folha do Norte, 29.10.1934, p. 1). Assim, quando a primeira turma
de médicos se formou seus diplomas já valiam em todo território nacional13.
A equiparação não era um título definitivo, precisava ser periodicamente renovada
mediante rigorosa fiscalização realizada pelo Conselho Superior de Ensino da República. Algo que poderia tornar-se um transtorno já estava resolvido ainda antes
da equiparação ocorrer, pois o Inspetor Federal junto a Faculdade era o médico
Lauro Sodré Filho (FMCP, 1923c, p. 4). Qualquer eventualidade que pudesse ameaçar a equiparação podia ser rediscutida quase que em família.
É claro que o rigor no ensino, principalmente naqueles anos iniciais, também foi importante para equiparação transmitindo a ideia de idoneidade da jovem instituição.
Camilo Salgado nunca precisou da Faculdade para obter popularidade. Ele era muito maior do que esta; era uma “instituição” dentro daquela escola, e seu trabalho
como diretor lhe rendeu uma admiração ainda maior entre os acadêmicos e demais
professores que o defenderiam do que fosse.
Um fato ocorrido no inicio dos anos vinte, exemplifica a devoção quase cega que
surgia em torno do diretor. Era comum naquela época que os médicos compusesMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
sem seus próprios medicamentos14, Camilo possuía seu “Xarope de Óxido de Ferro” para Anemia Ferropriva; o “Elixir Santa Cândida” a base de pedras de humecaá,
para diabetes; o “Euforbinol” para combate a Erisipela, todos feitos em sua própria
casa com ajuda de sua esposa. Entre estes medicamentos estava o “Elixir de Assacú” para lepra (MORELLI, 1991, p. 25).
Revistas leigas da época começaram a divulgar artigos como “Um Scientista que
se Notabilisa-As sensacionaes observações do erudito medico paraense dr. Camillo
Salgado, sobre a cura da lepra” (Revista A Semana, n. 173, 30.07.1921) mencionando a cura total de um paciente de nove anos de idade às custas de Assacú-rana.
O médico Heráclides Cezar de Souza Araújo, chefe do Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural no Estado do Pará, responderia nos meios de comunicação de forma muito sutil que, seja de Assacú (Hura crepitans) ou Assacú-rana (Erythrina glauca) ambos extratos
vegetais eram ineficazes no tratamento do mal de Hansen, sendo a casca do primeiro
extremamente tóxica. Afirmava que os pacientes com hanseníase costumam aparentar
melhora com os mais variados processos de tratamento (ARAUJO, 1922, p. 56).
Bastou isso para que:
Magoados com as referencias que o director do serviço de profilaxia Rural no Pará [...] fez aos serviços de hygiene de Belém, envolvendo, embora de maneira vaga, nos seus conceitos depreciadores a valorosa pessôa
do dr. Salgado, os professores e alumnos da Faculdade de Medicina do
Pará, confundidos nos mesmos sentimentos de justiça, promoveram expressiva manifestação de desaggravo áquele abalisado cirurgião, brilhantissima figura de nossa classe medica, que equivaleu a reaffirmar, pela
sua espontaniedade, quanto valle nesta terra o nome do illustre paraense
(Revista A Semana, 14.10.1922).
Camilo havia se tornado um ser inatacável, errado era estar contra ele. Foi esta personalidade magnética que conseguiu manter os melhores médicos de Belém exercendo
magistério à custa de salários inexpressivos. Certa vez em um dos muitos apertos financeiros, que eram uma constante na Faculdade, conseguiu que professores doassem
dinheiro em pleno natal, para que aquela instituição pudesse saldar suas dívidas15.
Uma das questões frequentemente levantadas sobre a participação de Camilo Salgado na Faculdade de Medicina é se ele teria ministrado aulas ou apenas ocupado
os cargos de Diretor e Vice. Alguns estudos sobre sua vida negam que tenha lecionado (MORELLI, 1991, p. 27) e os ex-alunos mais antigos da Faculdade existentes, ambos formados em 1939 lembram de sua figura somente como Diretor.
Sabe-se que nos primórdios foi nomeado para reger a cadeira de Clínica Cirúrgica
(1ª cadeira)16 logo tornando-se catedrático desta (FMCP, 1923c, p. 19). Um relatório escrito pelo próprio Camilo comprova que este atuou como professor ao menos
nos primeiros dias da Faculdade:
Camilo Salgado o berço do mito
397
Procurei emprestar feição eminentemente pratica ao curso de clinica cirúrgica a meu cargo. Dei, no entanto, aulas theoricas e nellas abordei, procurando
tornar tudo claro, assumptos ocorridos na clinica, falando das indicações geraes que se devem observar nas contusões, com ou sem ferida, e nas hérnias,
frisando principalmente o caminho a seguir nos casos de estrangulamento.
Por outro lado, sem alludir a outros pontos, abordei com insistencia a theoria
e o tratamento da appendicite, salientando as difficuldades da interpretação
dos syndromes dolorosos do coecum, e dos ferimentos por arma de fogo.
No vasto campo que é a Santa Casa, dispondo de todos os recursos exigidos pela cirurgia moderna, facil foi aos alumnos do 4º anno o familiarisarem-se com as regras, que os encaminharam, muitas vezes ao diagnostico irreprehensivel.
[...]
Das 164 operações praticadas em doentes da nossa enfermaria especial,
tive a satisfação na quase totalidade dellas de me ver auxiliado por alumnos, quer na anesthesia, em que todos se acham aptos, mesmo a rachidiana, quer nas próprias intervenções (FMCP, 1923c, p. 20).
As atividades no bloco cirúrgico eram mesmo muito produtivas, o suficiente para
que o doutorando Raymundo Ferro e Silva intitulasse sua “These de doutoramento” de “A cura radical da Hydrocele Vaginal, pelo processo Camillo Salgado” cuja
dedicatória dirigida ao criador da técnica é transcrita a seguir:
398
Dedico esta pagina do meu pequeno trabalho ao querido mestre, amigo e
eminente cirurgião paraense, bisturi de ouro do norte, - professor Dr. Camillo Salgado, - auctor do processo operatório para a cura radical da hydrocele vaginal, assumpto que escolhi para a dissertação da minha these.
Das diversas operações que fui humilde auxiliar do Dr. Camillo Salgado, a
esta me dediquei, motivo porque me sinto com coragem de levar esse processo ao conhecimento dos que não o conhecem, pois a modéstia doentia
de seu auctor, deixa-o sempre olvidado (FERRO E SILVA, 1926, p. 20).
Com o passar dos anos Camilo, que tinha muitas outras atividades paralelas às da
Faculdade, foi canalizando sua atuação toda em prol da diretoria, sempre auxiliado
por seu inseparável amigo Olimpio da Silveira, sem o qual muitos questionam se
aquela instituição teria conseguido firmar-se (MORELLI, 1991, p. 27).
De sua atuação como Diretor no olhar dos estudantes, muito bem se expressou o
acadêmico Miguel Lupi Martins;
Camillo Salgado não tinha a índole de castigar ou mesmo advertir. Suas
palavras sempre educadas, valiam mais que as sanções disciplinares.
Nas raras vezes em que descia ao térreo do prédio, em missão de reprimenda à turma que avançara o sinal da disciplina e das conveniências,
vinha com a fisionomia séria, mais serena. E sempre trazia o coração
aberto, largamente aberto, um sorriso sorrateiro para doutrinar, aconselhar, confiar... e ser obedecido. Nunca para punir!
Todos nos acercávamos dele, fazendo alas respeitosas, para ouvir daquela alma
impar o “Bom dia”, ou “Até amanhã, rapaziada!” (MORELLI, 1991, p. 28).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Era um homem de hábitos sedentários, apreciava, mas não praticava esportes, gostava de degustar bons vinhos portugueses, que lhe eram presenteados pela colônia
lusa no Pará e, além disso, fumava muito chegando a três ou quatro carteiras de
cigarro por dia. A principio fumava a marca “Aristocratas” trocando depois para
“Acadêmicos”, os quais considerava excelentes chegando mesmo a fazer uma declaração gratuita por escrito a pedido dos fabricantes e por estes impressa como
propaganda, afirmando que era um produto recomendável para amigos e clientes
(MORELLI, 1991, p. 25). Isso em um tempo em que os males do tabaco estavam
longe de uma definição.
Quando Clóvis Meira o encontra pela primeira vez menciona que tinha cerca de 60 anos,
porém aparentava muito mais, com uma fisionomia cansada (MEIRA, 1986b, p. 74).
O ano de 1938 mal tinha iniciado e logo marcaria a história da Faculdade. O mês
de fevereiro fora duro para Camilo. Em 23 daquele mês ele marcou uma conferência com o então Interventor Federal Deodoro de Mendonça, que havia cortado o
auxilio do Estado para manutenção do Curso de Farmácia. Na carta há um pedido
curioso, uma prévia do que estava por vir:
Amigo Deodoro
Preciso muito entender-me com V. a respeito da situação da Faculdade de Medicina, angustiosa e incerta quanto ao curso de pharmacia.
Pedia-lhe que marcasse o dia e hora para esse entendimento e preferia
que fosse em sua casa, pois me fatiga muito subir as escadas do palacio, o
mais breve possivel.
Abraços do amigo
(FMCP, 1938a)
A reunião ocorreu no dia 25 e foi um grande fiasco, de nada adiantaram seus argumentos. O Interventor alegaria a pouca frequencia de alunos naquele curso e a
necessidade de cortar gastos; em breve, via decreto, iria extinguir definitivamente
o auxílio (FMCP, 1939) Nesta mesma data em carta enviada a um amigo, Camilo
confirma que as coisas andavam ruins não apenas dentro da Faculdade: “Não vou
passando bem, muitos affazeres e mal das minhas artérias. A semana passada fui
atacado de angina do peito. Vou melhor, mas resignado” (PANTOJA, 1938, p. 6).
Em 28 de fevereiro de 1938 assinava o seguinte ofício, uma convocação trivial:
Ilmo. Snr. Dr. Ausier Bentes
Tenho o prazer de convocar o exmo collega, na qualidade se substituto, para reger a cadeira de Clínica Obstétrica, durante a ausencia do
respectivo cathedratico, dr. Orlando Lima.
Cordiaes saudações
(FMCP, 1938a)
Camilo Salgado o berço do mito
399
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Era seu último ato como diretor da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, cargo que ocupou por 16 anos, tempo até hoje não superado pelos seus sucessores.
O dia 2 de março
maio começava como mais um dia de sua rotina. Mesmo sendo uma
quarta-feira de cinzas, ele pela manhã realizou visitas domiciliares a seus pacientes
e operou um doente no Hospital da Beneficente Portuguesa17, conversou com seu
colega Porto de Oliveira, declarando-se bem disposto18. Almoçou em casa e em seguida voltou a Beneficente Portuguesa para dar assistência a um doente19 e esteve
pouco depois das 13 horas em conferência médica com o Dr. Prisco dos Santos20.
Em seguida regressou a sua residência na Rua Pariquis, número 517,
...onde chegou sentindo symptomas de uma syncope, a principio breves
e depois mais agudos. Quando pessoa de sua família procurava chamar
um medico, o dr. Camillo foi acometido de violento colapso, tendo morte
fulminante antes que fosse tomada aquella providencia (Estado do Pará,
03.03.1938).
Folha do Norte acrescenta mais alguns fatos:
400
Voltou ás 2 horas recolhendo-se em seus aposentos e deitando-se numa rede.
Chamou sua senhora e manifestou não se sentir bem, pedindo-lhe que
lhe desse uma injeção de morphina. Chamado imediatamente o dr. Porto
de Oliveira, este, ao chegar constatou o fallecimento do dr. Salgado que
succumbira repentinamente a uma crise de angina no peito (Folha do
Norte, 03.03.1938, p. 1).
O relógio marcava 14h30 (Estado do Pará, 03.03.1938).
A notícia se espalhou rápido, e verdadeira romaria de pessoas de todas as classes
sociais compareceu à sua residência para lhe prestar as últimas homenagens. O Interventor Federal interino Deodoro de Mendonça; o prefeito de Belém, Abelardo
Condurú; o chefe de polícia Salvador Borborema; o Coronel Dias da Silva, o dr. Antonino de Souza Castro, dr. Lauro Sodré Filho foram algumas das autoridades que se
fizeram presentes (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1).
O Interventor Federal, José Malcher, declarou que fosse encerrado imediatamente
o expediente determinando luto oficial por 3 dias em todas as repartições, concedendo honras de chefe de Estado aos funerais de Camilo Salgado, que seriam pagos
às custas do Governo do Pará. A prefeitura estabeleceu ponto facultativo no dia do
enterro (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1).
A Faculdade de Medicina pretendia prestar uma última homenagem ao seu Diretor
realizando o velório no Palacete Santa Luzia, mas a família preferiu que o corpo
permanecesse em sua residência. Por disposição escrita de Camilo Salgado não foram aceitas coroas de flores (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1), certa vez ele diria a
respeito deste tipo de homenagens: “Há o costume de ostentar ser amigo enviando
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uma coroa de flores a um morto. Por principio eu abomino, e não aceitaria mesmo
uma que fosse, se depois de morto eu pudesse protestar” (SANTOS, 1974, p. 186).
O dia 3 de março
maio amanheceu nublado, chovendo constantemente, mesmo assim foi
enorme o número de pessoas que se aglomerou frente sua casa (A Folha Vespertina,
03.03.1938, p. 1). Os estabelecimentos comerciais do Jurunas e Batista Campos
fecharam suas portas em sinal de luto (Estado do Pará, 04.03.1938, p. 1).
O cortejo fúnebre saiu às 10 horas e 40 minutos, encabeçado pelo veículo mortuário
da Santa Casa, ladeado por uma escolta da cavalaria. O ataúde era transportado por
uma carreta dos Bombeiros Municipais puxada por elevado número de acadêmicos
de medicina, e acompanhado por uma crescente multidão constrita e silenciosa de
todas as classes sociais. Seguiu pela Praça Batista Campos, Travessa São Matheus,
atual Padre Eutíquio, avenidas Conselheiro Furtado e Serzedello Corrêa, parando
em frente ao cemitério da Soledade21, onde o batalhão da Polícia Militar deu três
descargas de tiros, enquanto a banda dos bombeiros executou uma marcha fúnebre. Dali o féretro seguiu pela Avenida Nazaré, Independência, atual Magalhães
Barata, travessa José Bonifácio até o Cemitério Santa Izabel onde outra multidão
já o aguardava. Mais de 16 pessoas entre autoridades civis, militares, parentes e
médicos tocaram nas alças da urna funerária da sua casa para a carreta, da carreta
para a capela do cemitério Santa Izabel, e desta para a sepultura (A Folha Vespertina,
03.03.1938, p. 1).
Às 12 horas e 13 minutos debaixo de uma chuva torrencial, sem que ninguém
abandonasse o cemitério, baixou o caixão a sepultura, ao som dos clarins da Polícia
Militar. Falaram à beira do túmulo o doutorando Francisco Luna, interno da Assistência Pública, e os médicos João Botelho e Henrique Esteves, este em nome da
classe. Falou também pelos seus colegas condutores de bonde o condutor número
27 da Pará-Eletric.
Fez as encomendações do ritual católico o padre Miguel Inácio da paróquia da
Trindade.
Fizeram-se presentes também representantes da Faculdade de Odontologia, do Conservatório Carlos Gomes, e do clube do Remo, estes capitaneados pelo médico Adriano
Guimarães e o bacharelando Issacar Bendrihen (Estado do Pará, 04.03.1938, p. 1).
A Folha Vespertina (03.03.1938, p. 3) resumiria:
Não é possível inserir os nomes das pessoas que acompanharam os funeraes. O jornal não chegaria. Basta dizer que estiveram presentes todas
as auctoridades do Estado, do Municipio, da União, do Arcebispado, da
magistratura, etc, bem como representantes de associações de caridade,
de classe, civis e commerciaes. Lá estava tambem coroando essa glorificação, o povo, que ninguem convidára e que para lá seguiu como se cumprisse um dever moral sahido do fundo de sua grande alma.
Camilo Salgado o berço do mito
401
O Estado do Pará arriscou milhares de pessoas e comparou com as últimas homenagens prestadas a Carlos Gomes, o herói Veiga Cabral, e ao Monsenhor Cunha
(Estado do Pará, 04.03.1938, p. 1).
Participaram ainda do cortejo 216 automóveis e 10 bondes22.
As homenagens se estenderiam para fora do Pará, havendo celebração de missas
até no Rio de Janeiro, na igreja de São Francisco de Paula, organizadas pelos paraenses residentes na então Capital Federal (Folha do Norte, 30.03.1938, p. 2).
Camilo Salgado deixava uma esposa, Dona Lina Antunes Salgado que lhe dera três
filhos, Edgar, Maria Angélica e Arthur (Folha do Norte, 5 de maio de 1938, p. 9).
As homenagens não cessariam logo. Diga-se de passagem que, ainda em vida, cerca
de um mês antes do seu falecimento, o Governo do Estado criou no bairro do Jurunas um grupo escolar com o seu nome (Estado do Pará, 03.05.1938, p. 4).
402
A prefeitura de Belém também não tardaria em perpetuar sua memória mandando
fundir em bronze, nas oficinas Pires da Costa, uma placa com sua efígie esculpida
pelo artista maranhense Newton Sá (Folha do Norte, 28.04.1938, p. 1). A placa foi
afixada na entrada do prédio da Faculdade em um domingo, no dia 22 de maio de
1938, às 9 da manhã, com direito a discurso do prefeito Abelardo Condurú e do
novo diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães em meio a diversas autoridades presentes, professores da Faculdade e parentes do homenageado. A cerimônia
marcava a mudança de nome daquele logradouro, que deixava de ser “Largo de
Santa Luzia”, passando a ser reconhecido oficialmente como “Praça Camillo Salgado” (Folha do Norte, 23.05.1938, p. 1). Saia uma santa e entrava um médico que a
população havia canonizado23.
Lauro de Magalhães em seu discurso captou bem o simbolismo daquele ato;
Se o tempo, na sua marcha lenta, irremissível e destruidora, tentar desfazer do pensamento das gerações presente e vindouras a lembrança do
querido mestre e amigo, estas placas, na sua eternidade de ferro e bronze,
onde estão gravado seu nome e esculpido sua expressiva e attrahente
effigie, farão certamente reviver e reflorir a recordação de seu grande
vulto, de sua inconfundivel personalidade e de seu incomparável espírito
(Estado do Pará, 24.05.1938).
Um fato curioso chamou atenção dos jornais que cobriram o evento. Tanto do
Estado do Pará (24.05.1938): “A ausencia dos moços que freqüentam aquella escola
a um acto que lhes tocava de perto, causou geral consternação”, como da Folha do
Norte: “Foi notada, com desolação geral, a ausencia de estudantes da Faculdade,
que alli deviam estar compartilhando da homenagem ao seu mestre e amigo, que
sempre foi de todos os alumnos” (Folha do Norte, 23.05.1938, p. 1).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
As razões deste boicote aparentemente sem motivo permanecem incertas. Desentendimentos com a secretaria da Faculdade, coisa que era comum? Tudo são especulações. A placa permanece até hoje.
A própria Faculdade de Medicina, tão logo foi possível, também prestou-lhe uma
homenagem inaugurando, em 2 de março de 1942, seu novo Pavilhão de Anatomia,
o qual recebeu o nome de “Dr. Camilo Salgado” (FMCP, 1943b). Posteriormente
com a mudança da disciplina de Anatomia para o Campus Universitário do Guamá,
a homenagem se perdeu.
Há ainda uma outra homenagem dentro do Casarão da Generalíssimo, que se não
chama tanta atenção como a Placa de Bronze, ao menos não desapareceu do mapa
como o Pavilhão de Anatomia.
Em janeiro de 1959 a “Sociedade Doutorandos de 1930”24 estava excursionando
por Belém. Seus membros realizaram algumas palestras de temas médicos no auditório da Faculdade e trouxeram do Jardim Botânico do Rio de Janeiro uma palmeira imperial, que foi plantada nos jardins do Palacete Santa Luzia. Na cerimônia,
o médico paulista Arthur Ribeiro de Sabóia, um dos doutorandos de 30, fez um
discurso relembrando Camilo Salgado denominado-o de o Miguel Couto paraense.
Em seguida a viúva do homenageado Dona Lina Antunes Salgado auxiliada por
Olimpio da Silveira, eterno secretario da Faculdade então já aposentado, fizeram o
plantio da árvore símbolo daquela agremiação.
Foi fixada uma pequena placa sobreposta a um pedestal de concreto armado com
os dizeres:
Que a memória do cirurgião prof. Camilo Salgado sirva de exemplo á
posteridade: pelo seu saber, pela sua bondade e pelo seu coração.
Sociedade Doutorandos de 1930, da Faculdade Nacional de Medicina.
Belém - Janeiro de 1959 (Folha do Norte, 16.01.1959, p. 1).
A palmeira se foi em 2001, a placa ainda que tímida, persiste ao lado de outra alusiva a Olimpio da Silveira25.
Porém a maior homenagem àquele homem acontece até hoje: gerações após sua morte, uma multidão de pessoas freqüenta seu imponente túmulo em mármore negro
ofertado pela colônia portuguesa (MORELLI, Belém, 1991, p. 32), depositando flores, rezando para agradecer “milagres” que ele teria realizado ou colocando pequenas
placas que aludem graças que teriam sido alcançadas por sua intercessão.
Para a maioria dos homens a sepultura marca o final, para Camilo Salgado foi o
berço do mito.
Camilo Salgado o berço do mito
403
404
Foto 72: Diploma de doutor em medicina de Camilo Salgado.
Fonte: Acervo do Dr. Ubirajara Salgado.
NOTAS
1
Nos textos mais antigos, anteriores à reforma ortográfica seu nome é grafado como “Camillo”. O “Henriques” por vezes aparece como “Henrique” e
o “Junior” é citado somente em uma única fonte, mas será levado em conta
por ter sido escrita por seu neto e seu bisneto, Ubirajara e Cláudio Salgado
respectivamente. (PARÁ- MÉDICO, 2001, p. 50).
2
Folha do Norte, 28.04.1938, p. 6. e MORELLI, 1991, p. 24.
3
Eminente erudito e professor de pedagogia da antiga Escola Normal, um
dos grandes chefes paraenses do Partido Liberal no Brasil Império, tendo
feito seu curso normalista na Escola Sorbonne em Paris, financiado pelo
Imperador Pedro II. (Folha do Norte, 28.04.1938, p. 6). Faleceria em 1921.
(Revista A Semana, 1921).
4
Folha do Norte, 28.04.1938, p. 6. e MORELLI, 1991, p. 22-34.
5
RIBEIRO (2005, p. 14).
6
Localizado no terreno onde hoje está o Hospital Universitário João de Barros Barreto. Demolido em 1964, somente seu portão de ferro ainda permanece. (N.A).
7
O processo Voronoff consistia no enxerto de tecido de ovários de cabras
ou primatas transplantados em mulheres pós-menopausadas. Prometia rejuvenescimento ou ao menos melhora dos sintomas do climatério. Tal técnica
polêmica foi motivo de acalorados debates no mundo científico da época.
(Folha do Norte, 11, 12, e 13 de Setembro de 1924). (N.A).
8
Ver capítulo “Houve uma vez um Barão”.
9
Ver capítulo “O Hospital Escola Primaz – A Santa Casa no contexto da
Faculdade”.
10
Hipotecada junto a casa bancária Moreira Gomes, resgatada posteriormente por iniciativa do Interventor Federal Magalhães Barata. (MORELLI,
1991, p. 26).
11
Ver capítulo “Doutores Haja... - A Campanha para aquisição do prédio”.
12
Benjamin Franklin Ramiz Galvão médico, professor, filólogo, biógrafo e
orador. Nascido em 1846, ocupou importantes cargos ligados ao ensino tanto no Império como na República, foi entre outras coisas tutor dos netos de
Dom Pedro II. Nesta época tinha sido nomeado o primeiro reitor da recém
criada Universidade do Brasil, atual UFRJ, cuja Faculdade Nacional de Medicina era considerada a instituição modelo com a qual a Faculdade de Medicina do Pará devia ser equiparada. (N.A).
13
Ver capítulo “Equiparação a Jato”.
14
Ver capítulo “O prêmio Raul Leite e outras Premiações”.
15
“Attendendo o que o prezado collega me expoz na conversa que tivemos
sobre a Faculdade, ponho à disposição do amigo, em seu caráter de Director,
a importância de 4$500.000.
Certo da bôa acolhida e judiciosa aplicação d´esta minha pequena dádiva,
cumprimento-o affectuosamente o collega e amigo”.
Assinava Acylino de Leão em 24 de dezembro de 1933. Em 22 do mesmo
mês Othon Chateau com uma bilhete muito semelhante havia doado a mesma quantia. (FMCP, 1933).
16
Livro de ata de posse, ata de 3 de abril de 1919, documento mais antigo
encontrado sobre a Faculdade.
17
Estado do Pará, 3 de março de 1938.
Camilo Salgado o berço do mito
405
18
Folha do Norte, 3 de março de 1938, p. 1.
Idem.
20
Estado do Pará, 3 de março de 1938.
21
Cemitério já desativado naquela época, mas que era visto como uma espécie de panteão dos heróis paraenses, as exéquias de vultos importantes
sempre passavam por lá. (N.A).
22
Folha Vespertina, 3 de março de 1938, p. 3 e Estado do Pará, de 4 de março
quantifica 215 automóveis, pouco importa, o número não deixa de ser impressionante, ainda mais quando levamos em conta que naquele tempo os
carros estavam longe de serem comuns.
23
Há provas de que ainda que extra oficialmente, o Largo de Santa Luzia já
fosse reconhecido como Praça Camilo Salgado, uma nota da segunda página
do jornal Estado do Pará de 10 de dezembro de 1926, diz o seguinte “Têm
inicio amanhã o novenario e os populares festejos em honra de Santa Luzia,
na Praça Dr. Camillo Salgado (antiga Santa Luzia)” e papeis timbrados do
Centro Acadêmico de Medicina do Pará, primeira denominação do Diretório, datados de 1932, trazem como endereço a “Praça Dr. Camillo Salgado”.
Posteriormente nestes cabeçalhos reaparece a denominação “Largo de Santa
Luzia” até a mudança definitiva de 1938. (FMCP, 1932a).
24
Sociedade que congregava todos os médicos formados naquele ano na Faculdade Nacional de Medicina. (Folha do Norte, 16.01.1959, p. 1).
25
Ver capítulo “Um homem para dizer não”.
19
406
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
26
Olympio um homem para
dizer não
407
408
“...tirou seu ‘pince-nez’ e o collocou em cima de uma mesa...”
O diretor da escola era muito bom, mas o grupo que o cercava não deixava ele dar muitas ordens porque era bom demais. Diziam que se fosse por
conta dele “ninguém paga”, a escola ia para as cucuias. Tinha o secretário
da escola Olimpio da Silveira, duro. Estava direito senão a escola ia embora (PARAENSE, 1989).
É possível que haja algum exagero na afirmação de Wladimir Lobato Paraense,
médico que estudou os primeiros anos de sua graduação em Belém. Mas uma instituição que não podia contar sempre com as esparsas verbas do governo, dependendo exclusivamente do pagamento de mensalidades e taxas pelos seus alunos, precisava de alguém que funcionasse como a contraparte de Camilo Salgado, trazendo
equilíbrio financeiro à Faculdade. Este papel era desempenhado com maestria pelo
secretário da Faculdade, Dr. Olimpio Cardoso da Silveira1.
O “velho Olimpio”, como era conhecido pelos estudantes, nasceu em 10 de maio de
1879 no engenho Payayá em Vila Cristina, atual Cristinápolis, no estado de Sergipe
(SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65)2. Era filho de José Rodrigues da Silveira e Maria
dos Anjos Cardoso da Silveira (MEIRA, S., 1979, p. 173). Alfabetizado por sua mãe
(MEIRA, C., 1986, p. 103), aos dez anos de idade seguiu para a Bahia, onde fez os
cursos primário e secundário, convivendo com futuros médicos como Clementino
Fraga (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65). Concluído o ensino médio matriculou-se na
Faculdade de Medicina da Bahia, diplomando-se inicialmente em farmácia e depois
em medicina, em 16 de dezembro de 1905, obtendo o grau de doutor após defesa de
tese intitulada “Da filaria sanguinis homini” (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65)3.
Terminado o curso e antevendo um mercado saturado e competitivo em Salvador,
optou por exercer a medicina em outro centro que apresentasse oportunidades
mais promissoras. Alguns colegas de sua sala como Enjolras Vampré4 e Ovídio
Pires de Campos5 optaram por São Paulo, onde se tornaram notáveis professores
na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Olimpio seguiu o caminho do norte, escolhendo Belém, que então vivia o apogeu do ciclo da borracha
(SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65); assim também seu colega de sala e padrinho de
seu primeiro filho, o maranhense Othon Chateau (REBELLO, 1968), que posteriormente tornar-se-ia professor catedrático de Higiene e Medicina Preventiva na
Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Chegou a Belém em 29 de julho de 1906 (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65), viajando no vapor “Alagoas”, o mesmo que levou Dom Pedro II ao exílio (Folha do Norte,
03.08.1968). Com apenas cem mil réis seus no bolso, mais um conto de réis emprestado de um cunhado, quantia que logo devolveu intacta, estabeleceu-se no “Hotel
América”, localizada na esquina da rua João Alfredo com o Largo do Palácio passando a atender na “Farmácia do Povo”, situada no térreo daquele hotel (SILVEIRA
NETTO, 1980, p. 65).
Olympio - um homem para dizer não
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410
Foto 73: Olympio da Silveira.
Fonte: Foto do quadro de formatura da turma de 1938, Museu da Sociedade Médico-Cirurgica
do Pará.
Consta que seu primeiro cliente, no segundo dia após sua chegada, foi um imigrante (REBELLO, 1968) com febre amarela. Após o diagnóstico e tratamento
bem sucedido aquela figura alta e magra e com um indefectível chapéu tornou-se
conhecido entre os imigrantes que moravam nas cercanias do Largo da Pólvora,
atual praça da República, o que lhe garantiu boa clientela (REBELLO, 1968)6.
Foi por trinta dias médico do Esquadrão de Cavalaria da Brigada Militar do Estado
deixando o cargo por recusar-se a cumprir determinação do governador Augusto
Montenegro para não fornecer atestado de incapacidade física a um cabo que apresentava grave lesão cardíaca (Folha do Norte, 03.08.1968).
Ingressou como médico da antiga companhia de inglesa de navegação “The Amazon River Steam Navigation Company”, viajando pelos rios da região (SILVEIRA
NETTO, 1980, p. 65) durante quinze anos atingindo os mais remotos seringais, onde
conheceu de perto não só as mazelas do homem amazônico como também sua futura
esposa Violante Alvarez da Silveira, com quem se casou em 4 de dezembro de 1915 na
capela do seringal de seu sogro no Alto Purus (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Em 1919, criada a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP), Olimpio
não figurou entre os fundadores. Naqueles primeiros dias o cargo de secretário foi
ocupado por Hermógenes Pinheiro, que também acumulava a função de professor
de Anatomia Descritiva, 1ª parte. Talvez por esta acumulação de cargos, Hermógenes Pinheiro pediu sua exoneração do cargo de Secretário em 27 de abril de 1920
(FMCP, [19--]).
Assumiria o cargo o Dr. Francisco da Silva Pinheiro, que teve vida efêmera como
secretário, sendo exonerado em 19 de julho de 1920, voltando Hermógenes Pinheiro mais uma vez para esta função (FMCP, [19--]). Mesmo assinando muitos
documentos Hermógenes Pinheiro não possuía grande disponibilidade para o cargo, visto que o primeiro estatuto da FMCP é assinado pelo secretário-auxiliar de
então, Matheus Lydio Pereira de Souza (FMCP, [19--]).
Em 17 de junho de 1921, nomeado para o Serviço de Profilaxia Rural e alegando falta
de tempo disponível para exercer suas funções, Hermógenes Pinheiro pede novamente exoneração por tempo indeterminado, desta vez tanto do cargo de secretário como
do de professor (FMCP, 1921). Retornaria posteriormente apenas como professor.
Assume interinamente o cargo de secretário, em 18 de agosto de 1921, o Dr. João
Evaristo Silva, dele se afastando apenas em 24 de janeiro de 1924 por ser lente catedrático de Histologia normal (FMCP, [19--]). A justificativa não explica completamente seu afastamento quando se leva em conta que fora nomeado para o cargo de
professor de clínica neurológica desde a fundação da Faculdade, assumindo interinamente a cadeira de Histologia normal em 3 de fevereiro de 1921 (FMCP, [1950]),
tornando-se catedrático desta em 26 de janeiro de 1923 (FMCP, [1950]).
É provável que durante o período em que exerceu o cargo de secretário, João Evaristo Silva nunca tenha conseguido dedicar-se plenamente ao posto, haja vista que
quem assina a maior parte dos documentos relativos à secretaria no período é o secretário-auxiliar, cargo que foi ocupado pelo Sr. Theodoro Maria de Souza Aranha
em 2 de março de 1922. Funcionário este que havia sido bibliotecário da Faculdade
e então acumulava o cargo de secretário amanuense.
Neste entra e sai Olimpio da Silveira assume o cargo de secretário em 24 de janeiro
de 1924 (FMCP, [19--])7, levado por seu amigo Renato Chaves (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65), então professor daquele estabelecimento8. A faculdade já possuía
o Palacete Santa Luzia, que passava por adaptações, seguindo o curso ainda nas
dependências do colégio Paes de Carvalho.
Olimpio encontrou uma instituição que dava ainda passos bastante trôpegos (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65) com todo seu arquivo depositado improvisadamente
no fundo de uma caixa de cervejas (Folha do Norte, 03.08.1968). As dificuldades
eram muitas, mas nada que fizesse desistir aquele homem alto, magro, de anguloso
Olympio - um homem para dizer não
411
nariz adunco, zigomas salientes, mãos e pés grandes, e timbre de voz personalíssimo (MEIRA, 1986b, p. 107). Pelo contrário, nas próximas três décadas faria da
Faculdade “o centro de gravitação de sua vida” (MEIRA, 1986b, p. 106).
Estudou a legislação do ensino, dominando-a com profundidade (REBELLO, 1968);
organizou a secretaria racionalizando seus recursos, promovendo um equilíbrio entre receita e despesa, preparando as condições indispensáveis para o reconhecimento
oficial da Faculdade, isto é, sua equiparação, de modo que os primeiros formandos tivessem seu diploma reconhecido no resto do país (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65).
412
Equiparada a Faculdade em 4 de setembro de 1924, o trabalho seguiria em frente,
fazendo-se necessário a ampliação do espaço físico desta. Mesmo com a escassez
de recursos Olimpio economizava “cada vintém” (A Província do Pará, 01.11.1968),
conseguindo assim que se iniciassem as ampliações. Logo seria erguido um pavilhão destinado à Histologia e Parasitologia, seguido de um imponente Salão Nobre,
para reunião da Congregação dos Professores. Pouco depois, seria a vez do Instituto de Anatomia; em seguida o salão da Diretoria, amplo e imponente com piso de
madeiras paraenses, hoje inteiramente desaparecido, e a Biblioteca. Posteriormente
o Pavilhão “Lauro de Magalhães”, dotado no andar superior de um auditório que
durante muitos anos foi o único existente em Belém, e no térreo duas salas de aulas e os laboratórios de Fisiologia e de Química Fisiológica (A Província do Pará,
01.11.1968). Olimpio iniciou ainda as obras do que seria o Instituto de Higiene,
prédio que acabaria recebendo o seu nome (MEIRA, 1986b, p. 107).
De fato, os diretores que trabalharam com Olimpio da Silveira sempre reconheceram sua dedicação e empenho. Camilo Salgado assim diria em 1935:
Repito que não mais me foi possível fazer em face das difficuldades economicas que se me antolhavam; não teria todavia, feito nem o pouco que
fiz, se não fosse a cooperação de todos, notadamente as dos que me ajudaram mais de perto. Auxiliares dedicados ao mesmo problema, impulsionados pelo mesmo espírito de dedicação a esta Casa, como verbis gratia o
snr. Dr. Secretário, antigo luctador nas luctas que hemos batalhado para
o prestígio moral e material de nossa Faculdade...” (FMCP, 1936c, p. 6).
Na gestão de Lauro de Magalhães, não seria diferente:
É de justiça desde já associar a construção do Pavilhão Anatomico o
nome do nosso ilustre e digno secretário dr. Olimpio da Silveira, que
além de inestimáveis serviços que á Faculdade tem prestado, como funcionário honesto, incansavel e imprescindivel, tem se dedicado ás obras,
dirigindo-as, fiscalisando-as e administrando-as com os carinhos e cuidados que dispensaria na construção do seu lar (FMCP, 1942b, p. 5).
Entretanto nem tudo eram elogios. Como relata Clóvis Meira, a figura de Olimpio
da Silveira era vista com pouca simpatia por muitos alunos:
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Sendo o Secretário da Faculdade, com espírito de liderança, era natural que
os interesses dos estudantes, principalmente os financeiros, se chocassem
com as necessidades de um estabelecimento de ensino que vivia dos alunos,
sendo ele o pára-raios de todas as disputas. As decisões podiam ser da Congregação, do Conselho Técnico e Administrativo ou do Diretor, mas caso
desagradassem à estudantada, a culpa era sempre do velho Olympio. Posso
falar [...] porque quando estudante sempre participei ativamente dos movimentos universitários, algum tempo como Presidente do Diretório Acadêmico, o que obrigava a contatos permanente com a secretaria e os órgãos de
direção da Faculdade, em acaloradas disputas (MEIRA, 1986b, p. 107).
Somava-se a isso seu temperamento sério e suas atitudes comedidas, lutando sempre
pelo que considerava certo para a escola, atingindo às vezes pontos excessivos (REBELLO, 1968). Sobre sua atitude combatente um de seus adversários na congregação
certa vez teria dito que “Silveira tem a fibra de um jagunço” (MEIRA, 1979, p. 175).
Seu jeito fortemente disciplinador, outro ponto de choque com os estudantes, pode
ser observado na carta de fevereiro de 1932 endereçada a Camilo Salgado.
Olympio da Silveira, secretario desta Faculdade, baseado no artigo 67, alíneas 2 e 8 do Regimento Interno, vem expor a VV. EE. O seguinte facto:
No dia vinte e sete do corrente, á tarde, indo inspeccionar o serviço de
asseio que se estava procedendo internamente em todo o edificio da Faculdade, no laboratorio de histologia deparou com o alumno Clidenor de
Freitas Santos, ás voltas com diversos materiais e microscópio. Chamoulhe attenção que naquele laboratório ora em asseio, não era permittida a
permanencia de alumnos, máxime achando-se no período das férias e não
mais sendo elle alumno daquela disciplina. O referido alumno retirouse. Momentos depois, achando-se o reclamante na thesouraria a redigir
notas para imprensa, foi pello mesmo alumno interpellado em alto tom
nos seguintes termos: “Senhor Secretario, agora mesmo acabo de pagar
minha matricula, e segunda-feira mostrarei ao senhor se trabalharei ou
não no laboratorio de histologia; o senhor aqui não manda, tenho ordens
do Director! Não crê que este alumno tivesse ordem superior para penetrar nos gabinetes, que estão sob a fiscalisação da secretaria, sem que esta
tivesse sciencia previa.
É do conhecimento de todos o procediemento incorrecto e até criminoso
de certos alumnos que primam em destruir os moveis da Faculdade, como
aconteceu agora mesmo com as bancas do salão da Congregação, que se
acham riscadas á tinta, e a capa das cadeiras rotas, conforme mostrou o
senhor Dr. Director. Do gabinete de Histologia já desapparecceram objectivas e um microscópio ficou inutilisado e depois desappareceu também;
materiaes inutilisados atrás das portas, vidros com glycerina já têm sido
encontrados; ossos do amphitheatro de Anatomia não mais existem. Deante do exposto, acha que os alumnos somente devem penetrar nos gabinetes
nos dias de aulas e acompanhado do professor da respectiva cadeira. Procura o Secretario apenas cumprir o seu dever, zelando por tudo que a esta
Faculdade pertence; mas, para isso precisa do apoio moral de VV. EE. Para
não se vér exposto á indisciplina e as aggressões de alumnos.
Olympio - um homem para dizer não
413
Convém ainda notar que este alumno foi um dos que foram beneficiados
pecunitariamente por esta Faculdade no anno proximo passado, apesar de
ser filho de outro Estado, quando, peço venia a VV. EE. para ponderar, os
auxílios deveriam ser dados de preferencias aos alumnos pobres e aproveitáveis do nosso Estado, que os ha em grande numero (FMCP, 1932a).
Na verdade Olimpio era o tipo de personagem que não levava desaforos para casa
chegando mesmo por vezes “às vias de fato”. Um incidente ocorrido nas enfermarias da Santa Casa em 1926, cujas causas se perderam no tempo, ilustra bem esta
faceta de sua personalidade. Segue a narração do enfermeiro Henrique Araújo testemunha ocular do ocorrido:
414
Fui, eu de facto, a pessoa que melhor testemunhou a scena verificada
hontem neste hospital, que não teve a importância que lhe quiz emprestar. A não ser eu, no momento estava presente só uma irmã, de serviço na
clinica cirúrgica, o póde presenciar, pois quando o dr. Mário Chermont
intercedeu a tempestade já havia passado.
O dr. Bianor Penalber, que estava no serviço de sua profissão, na enfermaria São Pedro, de clinica cirúrgica, vinha de terminar o mesmo quando, ao chegar num pequeno gabinete de espera, junto á sala de pequenas
operações, foi abordado pelo dr. Olympio da Silveira, que eu pela primeira vez ali via. O dr. Bianor, attendendo a um pedido do dr. Silveira, para
qualquer entendimento, sentou-se attensiosamente enquanto seu colega
mantinha-se de pé, falando um tanto exaltado.
O dr. Olympio tirou o seu “pince-nez” e o collocou em cima de uma mesa,
o que me fez suppôr que ia aggredir o dr. Bianor, ficando eu de sobre
aviso afim de evitar um scena desgradavel, e mesmo porque o dr. Bianor
parecia despreoccupado, pois continuava sentado.
Effectivamente, dentro de segundos, como eu previa, o dr. Olympio agarrou-se ao dr. Bianor e ambos iam luctar quando immediatamente os separei, ficando exclusivamente nisso o incidente, pois logo depois veio o dr.
Mario Chermont que muito contribuiu para serenar os ânimos (Estado do
Pará, A VERDADE sobre o incidente da Santa Casa, 16.09.1926, p. 1).
Um dos pontos polêmicos a respeito da participação de Olimpio da Silveira na
vida da Faculdade, que ainda há de render grandes debates, seria determinar qual
seu papel na questão da Federalização da FMCP ocorrida em 3 de janeiro de 1950
(BRASIL, 1950).
Como pode ser observado no capítulo referente ao Diretório Acadêmico de Medicina9, Olimpio era visto pelos estudantes como uma grande pedra no sapato da
questão da Federalização. Um obstáculo a ser superado.
Entretanto para seu filho, José da Silveira Netto, Olimpio “lutara heroicamente”
pela causa, mas com um importante diferencial em relação aos alunos, pois defendia também a garantia dos direitos dos professores e do pessoal administrativo “do
esbulho tão comum em ocasiões semelhantes” (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
A posição de Olimpio da Silveira na questão talvez seja melhor explicada se avaliada sua relação com o acadêmico Jean Bittar, então presidente do diretório e responsável pela apresentação do projeto da Federalizção intitulado “Federalização da
Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará - Necessidade Vital do Vale Amazonico”
em um congresso no Rio de Janeiro promovido pela União Nacional de Estudantes10. Beckmann resumiria o fato da seguinte maneira:
Jean Bittar era um brigador eterno com a diretoria. Ele e o velho Silveira
não se davam bem. De parte a parte haviam aquelas pequenas intrigas.
Houve então um congresso nacional de estudantes [...] no qual Jean Bittar apresentou a sua tese.
[...]
O trabalho foi apresentado, e naturalmente, os estudantes acolheram de braços abertos. Daí por diante, todo mundo aderiu. Inclusive os políticos, que cairam como galinhas famintas no milho (JORNAL DO CRM-Pa, 2005, p. 3).
Os fatos acima descritos talvez sejam o início de uma explicação para a postura
conservadora de Olimpio durante a Federalização. Era natural que ele temesse que
após sua efetivação as intervenções do governo viessem a satisfazer mais a interesses de políticos do que do corpo docente, que desde a fundação se sacrificara pela
escola. Sem contar que era provável que não aceitasse bem o fato de que Jean Bittar
pudesse entrar para a história como o “pai da criança”.
Polêmicas a parte, como já mencionado o grande mérito de Olimpio da Silveira foi
equilibrar as finanças da Faculdade. Não que ela fosse uma instituição lucrativa, pelo
contrário, mas não podia se dar ao luxo de ser filantrópica. Era Olimpio quem freiava
eventuais abusos à benevolência de Camilo Salgado. Fossem estes excessivos pedidos
de vagas gratuitas, descontos nas mensalidades ou prefeituras que teimavam em enviar alunos prometendo bancar seus estudos, para no meio do curso sem mais nem
menos deixar de enviar o dinheiro. Era sempre ele quem iria se indispor fosse negando pedidos ou fazendo cobranças, conforme exemplificado abaixo:
Belém, 20 de Janeiro de 1927
Ilmo. Snr. Intendente de Igarapé-assú
De ordem do snr. Dr. Director desta Faculdade, accuso recebido o officio
de V. S., numero 77, de 15 do vigente datado, comunicando-lhe haver o
Conselho Municipal em sessao de 29 de Dezembro passado, resolvido
que o auxilio para esta Faculdade fosse destinado á matricula do snr.
*****.Cumpre-me comunicar a V. S. que a Directoria acceitará o referido
candidato depois que essa Intendencia saldar com os cofres desta Faculdade compromissos anteriores, provienientes de auxilios votados pelo
mesmo Conselho e até hoje não recebidos.
Prevaleço-me da opportunidade para saudar a V. S.
Saude e Fraternidade
a) Dr. Olympio da Silveira
Secretario
(FMCP, 1927b)
Olympio - um homem para dizer não
415
Mário Braga Henriques o primeiro reitor da Universidade Federal do Pará referirse-ia ao binômio Camilo-Olimpio da seguinte forma:
Quando jovem, conheci Camilo Salgado e, dele, guardei a lembrança inapagável de grande cientista, cirurgião excepcional, bisturi infalível, boêmio adorável, político sedutor, nascido para a glória, para eternização na
memória dos pôsteres e gerações sucessivas. Mas, a Camilo Salgado, com
toda a sua bondade, com sua contagiante maneira de agir, de apóstolo
abençoado pelo Senhor, não teria sido possível realizar esta grande obra,
não teria consolidado esta instituição exemplar, não fora a assistência
permanente, constante, perseverante, diuturna, de Olímpio da Silveira,
o homem cristalizador de sonhos, materializador de devaneios, dramatizador de iniciativas. Enquanto Camilo Salgado agia com seu imenso
prestígio político e consagração científica, Olímpio da Silveira construía,
amalgamava, cimentava e, destarte, elevava-se o edifício, a instituição que
enaltece e distingue a novel Universidade do Pará, como entidade modelar, um dos melhores entre os congêneres estabelecimentos de ensino
superior existentes no País (FMCP, 1957)11.
416
Paralelamente à sua vida na Faculdade, Olimpio encontraria tempo para uma rápida passagem pela política, sendo eleito pelo Partido Republicano Conservador para
vogal do Conselho Municipal em 1930, encerrando sua carreira com a extinção
deste partido ocorrida no mesmo ano (Folha do Norte, 03.08.1968). Atendia também diária e matinalmente na enfermaria São Francisco na Santa Casa (MEIRA,
1986b, p. 107), ocupando ainda por algum tempo o cargo de diretor do Hospital
dos Marítimos (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65).
Olimpio da Silveira aposentou-se somente em 1953 (REBELLO, 1968), já com
mais de 70 anos, “...não por invalidez física ou mental, mas por imposição da lei...”
(Revista do Acadêmico de Medicina, 1952, p. 27) como afirmou certa vez.
Entretanto: “Aposentado embora, diariamente aqui vem, percorre as dependências deste edifício, assistindo-lhe à ascensão vitoriosa dentro dos moldes que deixou traçados”
(Folha do Norte, PROFESSOR “Honoris Causa” o dr. Olimpio da Silveira, 10.01.1954).
No ano seguinte, no 35º aniversário de sua fundação, a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, por decisão unânime de sua Congregação (Folha do Norte, PROFESSOR “Honoris Causa” o dr. Olimpio da Silveira, 10.01.1954) baseada em uma proposta do professor Barroso Rebello (Folha do Norte, HOMENAGEM ao dr. Olimpio
da Silveira, 12.01.1954) concedeu a Olimpio o título de “Professor Honoris Causa”
(FMCP, 1949b)12 pelo seu trabalho e dedicação.
Em 9 de agosto de 1968, falecia aquele homem do tipo “que não se fazem simpáticos
para serem agradáveis” (MEIRA, 1979, p. 177), e que um dia foi definido como:
...enérgico e muitas vezes intempestivo e que acompanhara tijolo por tijolo, nas ardências do sol ou na umidade das manhãs friorentas, o cresci-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
mento de um sonho, acalentado sem interrupção, e para onde convergiam
todas as suas forças de lutador e até ao sacrifício, os impulsos sentimentais do coração (REBELLO, 1968).
Mas que:
...por vezes, quando se encoleriza, quando se irrita, seus traços fisionômicos se alteram, as palavras lhe saem fortes e metálicas, como o encontro
de espadas, e o combatente aparece, destemido e indomável, na defesa do
interesse deste estabelecimento (Folha do Norte, PROFESSOR “Honoris
Causa” o dr. Olimpio da Silveira, 10.01.1954).
Deixou dois filhos médicos, Olimpio da Silveira Filho, formado na turma de 1940,
que logo se mudou para o Rio de Janeiro, vindo falecer precocemente em decorrência de um acidente de trânsito (MEIRA, 1986b, p. 108), e José Rodrigues da
Silveira Netto, da turma de 1938, que ocuparia os mais diversos cargos no Palacete Santa Luzia, começando como tesoureiro, passando a professor catedrático
de Higiene e Medicina Preventiva, depois diretor da Faculdade, chegando a ser o
segundo reitor da Universidade Federal do Pará, criador do Campus Universitário
do Guamá que hoje carrega seu nome.
Um homem como Olimpio da Silveira, que ocupou durante tanto tempo um cargo
tão importante, poderia ter escrito muito sobre os primórdios da primeira escola
médica da Amazônia. Infelizmente isso nunca aconteceu. Sobram como consolo
algumas linhas de dois discursos seus, um pronunciado durante um almoço em sua
homenagem por ocasião de sua aposentadoria:
Venho da época em que a Faculdade, fundada em 9 de janeiro de 1919
e instalada em 1º de maio do mesmo ano, começou a funcionar em duas
salas cedidas, por empréstimo, nos baixos do Ginásio Paes de Carvalho, sem arquivo, nem diretriz segura e ridicularizada por alguns, que a
chamavam de baía e que, mais tarde, amparados por políticos influentes,
foram bater em suas portas, solicitando ingresso.
Integrado ao grupo de batalhadores, e é de justiça salientar o entusiasmo
moço de Carlos Arnóbio Franco e Renato Chaves, êste tão cêdo roubado
ao nosso convívio, tendo a frente a figura singular e prestigiosa de Camilo Salgado, conseguimos adquirir o prédio, que é hoje vossa tebaida.
Ali foi a grande luta, ali foi onde sofri os maiores embates que, é preciso dizer, nunca me entibiaram o ânimo, antes, porém, me encorajaram,
porque lutava por uma causa justa – pelo progresso cultural e material
de vossa Faculdade, pela moralidade do ensino, pela manutenção da disciplina e pelo cumprimento da lei que vos rege.
Incompreendido por espíritos trêfegos, invejosos e interesseiros, que
propugnavam apenas pelo seu EU, a tudo resisti, com os olhos fitos no
futuro. E nos combates travados jamais fui vencido, porque sempre era
apoiado pela maioria sensata da Congregação que desejava, como eu, o
progresso, à ordem e o cumprimento da lei.
[...]
Olympio - um homem para dizer não
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Agora nos sentimos todos compensados dos esfôrços despendidos! A Faculdade está federalizada!
[...]
Meus jovens colegas:
Sêde sempre amigos da vossa Faculdade – vossa tebaida.
Não a esqueceis nunca.
Procurai elevá-la, como eu sempre fiz, com dedicação, zelo e carinho.
Ela representa a nossa vida, o nosso passado e o nosso presente (Revista
do Acadêmico de Medicina, 1952, p. 27).
E outro quando recebeu o título de professor “Honoris Causa”:
418
Vimos dos tempos da fundação deste estabelecimento, quando seus passos ainda se mostravam ainda oscilantes, e o futuro pouco promissor.
Tudo denotava desconfiança e incerteza e deste modo, impunha-se trabalhar e lutar com denodo para vencer obstáculos antepostos. E foi realmente o que fizemos – lutar sem tréguas.
Nesta mesma sala, durante vários lustros tomamos parte em agitadas
Congregações, em defesa das boas causas apoiado pela palavra de nosso
ilustre e destemeroso colega Carlos Arnóbio Franco, bem como de Acilino de Leão, Jaime Aben-Athar, Rodrigues de Sousa, Lauro de Magalhães,
Prisco dos Santos, Gastão Vieira, Dagoberto de Souza, Luiz Araújo e outros muitos que, igualmente, pugnavam pelo progresso, pela moralidade
do ensino, manutenção da disciplina e rigoroso cumprimento da lei.
Combatido por um grupo reacionário, de curta visão e oposição sistemática, e que açulava a mocidade inexperiente contra a Secretaria, a tudo
resistimos confiantes no futuro.
[...]
Lutamos convem repetir sobre o dardo de cruéis injustiças, mas não perderamos o ânimo, certo de que propugnávamos por um ideal pelo progresso e renome da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Contudo, estamos certos, senhores professores, de que se não fora o apoio
decisivo por vós prodigializado nos momentos mais difíceis de nossa atuação nesta casa, nada poderíamos conseguir e o grupo reacionário antipatriótico tudo teria levado de vencida, com prejuízo da Faculdade e quiçá das vantagens que desfrutamos.
O que interessava apenas era o nosso aniquilamento. Mas, com vosso
espírito esclarecido, com a vossa ponderação e bom senso a tudo resistimos, marchando sempre de vitória em vitória até a federalização (Folha
do Norte, HOMENAGEM prestada ao Dr. O. da Silveira, 09.01.1954).
Quanto à preservação de sua memória, teve um pouco mais de sorte do que o Barão
de Anajás. Não que seja muito mais lembrado que este último, porém pelo menos
duas tímidas placas garantem a perpetuação do seu nome no Largo de Santa Luzia, atual Praça Camilo Salgado. Uma localiza-se nas dependências do Instituto de
Higiene, hoje Núcleo de Medicina Tropical, referindo que o antigo instituto levava
seu nome13. A outra foi colocada junto a uma palmeira imperial nos jardins da velha Faculdade. A palmeira se foi há anos, mas a placa colocada em outubro de 1958
ainda persiste com os dizeres:
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Ao Professor Olimpio Cardoso da Silveira, exemplo de probidade e devotamento ao ensino médico.
Homenagem do XI Congresso de Gastrenterologia.
Belém - outubro de 1958.
Curiosamente Olimpio nunca foi professor (MEIRA, 1986b, p. 107), recebeu o título “honoris causa” como justa homenagem, mas não há notícia que tenha dado
uma aula14. A pequena placa ignora completamente sua atuação como secretário.
Talvez fosse querer muito em uma instituição pouco acostumada a homenagear
seus construtores.
NOTAS
1
Seu nome aparece como Olympio antes da reforma ortográfica.
2
MEIRA cita como seu local de nascimento a cidade de Estância no mesmo
estado. Preferimos levar em conta as informações escritas por seu filho SILVEIRA NETTO.
3
Leônidas Braga Dias em manuscritos afirma que sua tese seria “Das Relações de Elephantiases dos árabes com a Filária no sangue”. (N.A).
4
Sergipano, considerado o pai da neurologia no estado de São Paulo. (N.A).
5
Paulista de Tatuí, foi professor de clínica médica e diretor da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). (N.A).
6
MEIRA cita como sendo um imigrante português, SILVEIRA NETTO e
REBELLO referem ter sido um espanhol. (N.A).
7
É possível que Olimpio já estivesse exercendo o cargo antes desta data, pois
no segundo estatuto da FMCP, datado de 6 de janeiro de 1924, ele já figura
como secretário. Muitas fontes como obituários da Folha do Norte, A Província do Pará, um discurso de Silveira Netto publicado na revista Hiléia Médica
e os trabalhos de Meira citam sua chegada à Faculdade como sendo em fins
de 1922. A Folha do Norte de 10 de janeiro de 1954 refere 1921. Entretanto
os documentos do período apontam sua entrada na FMCP em 1924. (N.A).
8
Segundo o livro de nomeação dos professores, Renato Chaves iniciou na
FMCP como professor de Higiene e Medicina Legal, passando temporariamente pela Anatomia Descritiva, chegado em Anatomia Médico-Cirurgica
Operações e Aparelhos, que posteriormente recebeu o nome de “Medicina
Operatória”. Renato Chaves faleceu em 13 de dezembro de 1929, em sua residência, fulminado por um ataque cardíaco. O Instituto Médico Legal em Belém recebeu seu nome.
9
Ver capítulo “Apontamentos para uma história do DAM”.
10
Ver capítulo “A Federalização”.
11
Este discurso foi proferido pela primeira vez na colação de grau dos médicos de 1957, e posteriormente o mesmo trecho seria repetido em 31 de
janeiro de 1959 na cerimônia de instalação da Universidade Federal do Pará,
ocorrida no Teatro da Paz. (N.A).
12
A lista de professores “Honoris Causa” presente no relatório de 1948 é:
Mauricío Gudin, Armínio Lalôr Mota, Jurandyr Lodi, e Olimpio Cardoso da
Silveira (FMCP, 1948, s.p.).
Olympio - um homem para dizer não
419
O fato curioso é que trata-se de um relatório de 1948, porém Olimpio receberia este título apenas em 1954, devendo tratar-se de uma folha anexada
posteriormente a este relatório.
13
Na placa esta escrito: “O Instituto de Higiene, iniciado em 28-12-1949 sob
a administração do Prof. Dr. Lauro Antunes de Magalhães e inaugurado
em 16-12-1955, sob a administração do Prof. Dr. José Rodrigues da Silveira
Netto, foi denominado por unânime decisão da congregação em sessão de 21
de janeiro de 1955- Instituto Olympio da Silveira- em homenagem ao grande consolidador da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará”.
14
“...mesmo sem lecionar, conhecia perfeitamente o aproveitamento dos alunos de todas as séries do Curso Médico.” (GARCIA FILHO, 08.01.1954).
420
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
27
Retalhos da
vida acadêmica
421
422
Detalhe de um dos pisos da FMCP.
O que pode ser obtido, hoje, a respeito da vida acadêmica daqueles primeiros tempos da Faculdade de Medicina do Pará, antes mesmo da criação do Diretório é
muito pouco. E se deve basicamente a dois alunos que foram muito importantes,
cada um a sua maneira, a ponto de despertarem o interesse da imprensa. Um era
Antônio Magno e Silva, um dos fundadores e diretor da “Escola Livre de Odontologia”; o outro era Bianor Penalber, então jornalista no periódico A Semana ambos
pertencentes à primeira turma de formandos.
Seria a A Semana, com sua característica de revista de amenidades, que publicaria
as primeiras notas sobre a vida acadêmica na Faculdade, possivelmente escritas
por Penalber, algumas bem jocosas, como a transcrita abaixo sobre uma possível
gafe ocorrida em uma das primeiras necropsias realizadas na Faculdade.
O dr. Arthur França, professor da Faculdade de Medicina do Pará, desejando confirmar um diagnóstico brilhante em doente de sua enfermaria,
registrado o fallecimento reuniu os discípulos e lembrou a necropsia.
Ansiosos pela confimação mestre e alumnos reuniram-se no respectivo
necrotério.
De repente, de um canto, enfarpellado numa capa, com os seus oculos
levanta o dr. Mattehus Bonaparte Lydio Pereira de Sousa.
Vae a mesa e colloca o ouvido no coração do defuncto, procurando-lhe
tambem o pulso...
Depois volta a seu logar.
--Meus senhores, diz o dr. França, vamos ver o estado do pulmão deste
homem.
E mandou abrir o cadaver.
O dr. Pereira não se conformou e gritou:
--Assim tambem não; a sangue frio é uma barbaridade. E o chloroformio?
--Chloroformio para que, atalhou o dr. França?
--Para a anesttesia, insistiu o dr. Mattehus.
Uma gargalhada uníssona poz termo ao incidente pittoresco.
Bisbilhoteiro
(Revista A Semana, n. 271, 11.08.1923, s.p.).
Fica como curiosidade o fato de que Mattheus Lydio Pereira de Sousa aluno da Faculdade desde sua instalação1 também tendo ocupado o cargo de secretário-auxiliar
(FMCP, 1919c), colaria grau somente na turma de 1929 (FMCP, 1936c).
Antônio Magno e Silva, ainda que por outros motivos, também seria vítima das
alfinetadas:
Causou sensação nas rodas elegantes o gesto de desprendimento do
dr. Magno e Silva mandando para o forno crematorio o seu chapéo
cinzento, de grandes abas, que se familiarisara com sua cabeça ha cinco
annos, ou desde quando iniciou o curso de medicina.
Presentemente o dr. Magno anda melhorado: substituiu o saudoso chapéo cinzento por outro, que não lhe da mais aspecto solemne de seringueiro (Revista A Semana, n. 273, 14.07.1923, s.p.).
Retalhos da vida acadêmica
423
Para Penalber, que fazia parte do grupo de colaboradores da revista, naturalmente
sobravam elogios e um ou outro gracejo mais leve, como trovas na seção “Perfis
Acadêmicos”.
Vivo, elegante, sempre bem trajado,
terribil “gavião” que ao longe avista,
prosador, ex-poeta, jornalista,
no calamo é, de ha muito, “diplomado”
Hoje, é doutor de facto: (autorisado
legalmente a mandar-nos á conquista
de uma vida melhor...) o sexto-annista
de topete e do peito do Salgado!
Sua especialidade é o tratamento
das meninas bonitas, de cabello
aparado: - a ellas todo seu talento...
E ha de extinguir- é o que ora se futura, hoje, que está de bórla e de capêllo
dum certo coração o mal sem cura...
(Revista A Semana, 09.08.1924, s.p.).
424
Foto 74: Alunos de diversos semestres da Faculdade reunidos em foto de 1922.
Fonte: Pará-Médico, a. 3, v. 3, n. 10, set. 1922.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Fora uma ou outra nota, como as descritas, as manifestações acadêmicas desta fase inicial
da Faculdade são mesmo dispersas, fato talvez explicado pelo pequeno número de alunos associado ao elevado número de transferências para Faculdades de outros estados.
A primeira grande mobilização, na qual os estudantes tomariam parte, foi mesmo a
campanha para aquisição do Palacete Santa Luzia2, projeto encabeçado por Camilo
Salgado e que mobilizou as mais diversas camadas da sociedade paraense.
Transferida a Faculdade para o Largo de Santa Luzia em 19243, a rotina dos estudantes mudaria; se por um lado ficavam mais próximos da Santa Casa desde o início do curso, perdiam de vez o contato com o centro da cidade pela saída definitiva
do curso do colégio Paes de Carvalho.
Naqueles idos, o bairro do Umarizal era considerado afastado do centro da cidade, o Largo dava para os fundos da Santa Casa, precisamente para o necrotério.
Faziam ainda companhia para a Faculdade o mercado, que ainda hoje perpetua o
nome do Largo, e somente ganharia seu aspecto atual em 10 de novembro de 1943
(VALENTE, 1993, p. 59), o bar de um comerciante português (GÓES, 2008) e no
local onde hoje se encontra o Núcleo de Medicina Tropical havia a “Sabina Acadêmica”, casa de alvenaria onde uma senhora vendia garapa e lanches aos acadêmicos
de medicina (GAMA, 2008).4
Asfalto no entorno da Faculdade nem pensar; o calçamento com paralelepípedos chegava apenas ao longo da Av. Generalíssimo Deodoro, na circunferência do Largo e na
travessa Dom Pedro I, onde a urbanização ainda engatinhava, e até o Largo do Esquadrão, que somente em 1933 transformar-se-ia na praça Brasil (CRUZ, 1945, p. 96).
A rua Bernal do Couto no inverno era um grande lamaçal que levava à Doca de
Souza Franco, em um tempo em que as embarcações ainda por ali atracavam. A
Av. Pedro Miranda nem existia, correspondia então a uma estrada conhecida como
“caminho da Pedreira”, que levava para as partes mais baixas e alagadiças daquele
bairro (VALENTE, 1993, v. 3, p. 25).
Animação no Largo só ocorria mesmo por conta das festas juninas e principalmente em 13 de dezembro, dia de Santa Luzia, quando uma procissão percorria
a Avenida Generalíssimo Deodoro, as ruas Diogo Móia, Alcindo Cacela, e Bernal
do Couto retornando ao seu nicho no mercado (VALENTE, 1993, v. 2, p. 59),
seguindo-se de quinze dias de arraial5.
Sobre alguns aspectos daquele arraial a revista A Victoria de 29 de dezembro de
1927 assim se manifestava:
Viva a Jogatina !!!
A festa que esta tendo logar no Largo de Santa Luzia findou sob o patrocínio da Santa no domingo retrazado, mas vae continuar, agora ampara-
Retalhos da vida acadêmica
425
do pelo São Bicho e Santa Jogatina, até o dia 6 de janeiro vindouro.
Os novos padroeiros estão sendo venerados no Mercado e numa outra
casa da Travessa e a entrada é franca e amparada pela policia, representada pelos milicianos assiduos frequentadores das duas baiúcas (A Victoria,
29.12.1927, p. 2).
O acesso ao centro era mesmo pela Generalíssimo Deodoro até a Estrada de Nazaré. Apesar do aparente isolamento o transporte não era difícil, o Largo de Santa
Luzia era o fim de uma das linhas de bondes, ponto estratégico para garantir a ida
da população à Santa Casa de Misericórdia.
Os bondes eram o principal meio de transporte dos estudantes, algumas vezes para
desespero dos gerentes da “Pará Eletric” como pode ser conferido no oficio enviado
ao então diretor da Faculdade, Camilo Salgado:
Belem, 11 de Maio de 1927
Ilmo. Sr. Dr. Director da Faculdade de Medicina do Pará
426
Transmitto a V. S. a inclusa copia do officio que me dirigio o sr. Gerente
Geral da “The Pará Eletric Railways and Lighting Company Limited”,
relatando um incidente em que estiveram envolvidos 16 alumnos dessa
Faculdade n’um bonde da linha circular, a fim de que essa Directoria tenha conhecimento da occorrencia e se digne a providenciar como melhor
julgar conveniente de modo a evitar sua repetição.
Servindo-me do ensejo apresento a V. S. protestos de estima e distincta
consideração.
Saudações.
Francisco de Paula Pinheiro
Chefe de Policia
__________________________________________________________
CopiaThe Pará Eletric Railways and Lighting Company Limites. Nº. 2.691.
Data, 9 de Maio de 1927.
Exmo Snr.
Trazemos ao conhecimento de V. Excia. o seguinte incidente:
Ás 6 horas da tarde de 5 do corrente tomaram um bonde da linha circular
16 alumnos da Faculdade de Medicina, os quaes, fazendo grande algazarra,
recusaram-se a pagar as passagens. Deante desta attitude dos alumnos,
o revisor mandou parar o vehiculo e telephonou á Chefatura Central de
Policia pedindo providencias, recebendo resposta, porem, que comunicasse
para a Sub-prefeitura do Umarizal. Viajavam no carro praças da Brigada
que allegavam não terem meios para manter a ordem com taes estudantes
que fazem tal exhibição quase diariamente. Ficou para (do) o carro durante
21 minutos, assim prejudicando bastante o movimento do serviço de viação.
Pedindo providencias no sentido de evitar uma reproducção, aproveitamos
o ensejo para reiterar a V. Excia. os nossos protestos de elevada estima e
real apreço. Saúde e fraternidade. A) H. C. Warner – Gerente Geral.
(FMCP, 1927b).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Mesmo quando não tomavam os bondes os estudantes arranjavam outras maneiras
de se divertir à custa destes. Outro ofício da chefatura de polícia datado de 4 de
junho de 1936 menciona que:
...os estudantes de medicina vem levando effeito no Largo de Santa Luzia
ou seja entre as ruas Bernal do Couto e Oliveira Belo certas brincadeiras
de mau gosto, colocando pedras sobre os trilhos de bond, de forma a
acarretar serios embaraços ao tráfego dos electricos (FMCP, 1936b).
Os motorneiros paravam para retirar as pedras dos trilhos e acabavam tendo acaloradas discussões com os acadêmicos (FMCP, 1936b).
Quando não usavam ou abusavam dos bondes, os acadêmicos costumavam voltar
a pé pela Avenida Generalíssimo, muitas vezes acompanhando o Catedrático de
Anatomia Humana, José Alves Dias Junior como recorda Clóvis Meira:
Quando terminavam as aulas ou os estudos que se seguiam, em bloco com
os estudantes, caminhava a pé até o largo de Nazaré. Era como continuação da aula, palestra entrecortada pelos mais variados assuntos. Depois
voltava de bonde Circular. Nós dispersávamos ou íamos bebericar no Bar
Estrela de Nazaré do seu Amaro, isso quando havia dinheiro, o que era
raro. A influência de Dias Júnior era tanta, entre os estudantes de medicina, que a Turma “Evandro Chagas”, diplomada em 1943, desde o primeiro
ano o escolhera para paraninfo e não mudou... (MEIRA, 1986b, p. 95).
O diretor da Faculdade, Camilo Salgado, também ficava entre os favoritos dos estudantes. Tanto que estes, em 1928 chegaram até a mandar celebrar uma missa
de ação de graças na Basílica de Nazaré pela recuperação de sua saúde após dois
meses de enfermidade (Revista A Semana, 29.09.1928).
Além de homenagens, naquela época já se notavam criticas bastante fortes a alguns
professores. Por melhores que estes fossem e por mais que gozassem de prestigio
entre a maior parte dos estudantes, pelas linhas transcritas abaixo se pode observar que sempre foi difícil conter a fúria de um acadêmico reprovado.
A verdade porém e esta sr. redactor: fomos sacrificados para satisfação
e gáudio do professor interino da cadeia de microbiologia - com o qual
antes do exame tiveramos acalorada discusão.
[...]
Que mais esperar de uma banca composta de elementos com os srs. Prisco
dos Santos, Aben-Athar e Remígio Filgueiras? Se o primeiro é um inquisidor pela sua miseria imnata, o segundo baqueia pelo seu estado pathologico, emquanto que o terceiro deixa-se vencer mais por ignorancia do que
por maldade. Este ultimo, na verdade, embora fosse o presidente, ignora
absolutamente o que seja microbiologia, bacteriologia ou cousa equivalente e acreditamos mesmo que nem saiba lidar com um microscopio, tal o
estreitamento ou nenhum conhecimento que tem de todo o que se relaciona com o infinitamente pequeno. Essa faculdade, parece privativa do petit
Retalhos da vida acadêmica
427
Pasteur indú, tão enfatuado e cheio de si que chega a desaparecer nos comesinhos conhecimentos de sua especialisação. Destaca-se o, melhor, quando
no seu posto predileto de chauffeur, para o qual incontestavelmente tem
mais pendor e está mais a calhar do que para o magistério, comquanto o
seu nevropathismo já tenha contribuído para o augmento estatistico dos
esmagamentos por automoveis. Este, é roxinho por uma carreira em desbalada e muito mais roxo ainda por sacrificar os que não confiam muito
no seu preparo de cadernos assim como o Dr. Heraclides desconfiava da
competência profissional de certo titulado. O Sr. Aben-Athar cuja pallidez
tão profunda lhe empresta o aspecto de um cadáver ambulante, era a única
figura que poderia ser justa se não peccasse pela sua origem Shylockeana.
Se não lhe devíamos a obrigação de uma libra de carne do nosso o corpo,
tinhamos commetido a imprudência de não consentir que fallasse conosco como quem falla com um creado seu. Que mais, pois esperar d`esse
neo catholico, do presidente e do professor chauffeur, sinão uma decisão
contra nós? Que a miséria lhes aproveite. E nós – aguardamos Março a
fim de fazermos uma cadeira que nos falta e appellarmos para a justiça do
illustardo cathedratico Dr. Acatauassú Nunes cuja educação moral nos
assegura o que nos foi subtrahido (A Victoria, 29.12.1927, p. 11).
428
Fica patente que a irreverência não é algo da “modernidade”, mas um atributo natural da juventude seja qual for a época que ela pertença. Dr. Guaraciaba Quaresma
da Gama, formado na turma de 1939 e posteriormente professor catedrático de
Clínica Cirúrgica narra um fato que reforça este conceito e mostra que já naquele
período os acadêmicos não poupavam nem seus colegas:
Nas aulas práticas que se realizavam na Santa Casa, nós, os alunos, ficávamos ao redor da mesa de exames, enquanto o professor faria a exposição do caso de que era portador o doente examinado. Alguns colegas
sentavam nas macas que se encontravam no local. Certo dia, por ocasião
de uma aula prática, o colega Antônio Carneiro apanhou um chumaço de
algodão, ensopou-o com éter sulfúrico e quando outro colega (não vou
citar o nome) preparou-se para tomar impulso e sentar-se na maca, ele,
o Antônio Carneiro, colocou a bola de algodão embaixo do traseiro do
colega que sentou-se sobre ela, mas incontinenti, deu um pulo da maca
arriando as calças o que não foi suficiente para alivia-lo e arrancando
também a cueca ficou semipelado na presença do mestre, enquanto se
abanava em desespero. O professor Lauro (de Magalhães) aborreceu-se
dizendo-se desrespeitado mas terminou por relevar o incidente e até sorriu, continuando sua aula (GAMA, 2004, p. 8).
Na década de 1930, os acadêmicos foram adquirindo cada vez mais o espírito corporativista que culminaria com a criação de agremiações como o “Centro Acadêmico de Medicina do Pará”, o atual DAM, a “Sociedade Acadêmica de Medicina
do Pará” e, posteriormente, a “Sociedade de Internos dos Hospitais de Belém”.
Ressalte-se que apesar disso muitas manifestações partiam ainda de grupos não
ligados a nenhuma agremiação.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Um exemplo seriam os eventos realizados com a finalidade de angariar fundos para
auxílio dos acadêmicos com dificuldade de pagar as taxas escolares:
Festival de benefício
Os rapazes que cursam o quarto ano da Faculdade de Medicina vão realizar quinta-feira no Palace Theatre, um festival em beneficio de alguns
de seus colegas que se encontram em difficuldades para prosseguir no
curso medico.
Um gesto de tal natureza tem despertado applausos e merecida acolhida
benevolente da parte do publico, segundo nos asseverou a comissão que
veio a FOLHA constituída dos academicos Olavo Leoneto, Raymundo
Paiva, Arnaldo Prado e Jose Thomaz Nabuco.
O espetáculo que vae ser enscenado é constituído por uma peça intitulada
“Casar para morrer” e de um acto de variedades (Folha do Norte, Vida
Acadêmica, 19.08.1930, p. 3).
Numa época em que a cidade não contava com grandes opções de entretenimento até o
Teatro da Paz, a maior casa de espetáculos de Belém, servia de palco para estes festivais:
FESTIVAL EM BENEFICIO DO ACADEMICO POBRE
Os academicos de Medicina Nelson Corrêa, Miguel Martins, Nery Guimarães, Pádua Filho e Deusdedith Moura com apoio de todos os seus
colegas da Faculdade, organizaram um festival em benefício de alguns
collegas que estão na imminencia de perder o anno.
A commissão está solicitando da sociedade paraense, dos seus collgas de
curso e da mocidade estudantina, do commercio um auxilio justo para a
cruzada que se vae dedicar.
Será uma noite no Theatro da Paz, em dia opportunamente marcado.
Breve será divulgado o programma dessa festa na qual tomarão parte os
academicos: Gentil Puget, Deusdedith Moura, com seu “Jazz”, Augusto
Moreira, Nery Guimarães, Paulo Fender, Marcos Bahia, Paulo Darand,
José Amorim, Renato Medeiros, Miguel Martins, e as gentis academicas
Maria von Paungartten e Maria Izabel Coelho.
(Folha do Norte, Vida Acadêmica, 13.04.1932).
A organização de tais eventos posteriormente seria assumida inteiramente pelo
Diretório6.
Outro evento “encampado” pelo DAM foi a realização de uma festa que ficaria conhecida como “Festa da Esmeralda”, a partir de uma ideia de alunos do quinto e sexto ano que realizariam um evento semelhante chamado “Festa da Esperança”. Neste
caso o Diretório chegou inclusive a manifestar-se publicamente repudiando qualquer
iniciativa de festa com cobrança de taxas que não partisse daquela agremiação7.
O trote dos calouros também começou como uma iniciativa independente do DAM.
As notícias mais antigas mostram que ele consistia em uma passeata dos estudantes de medicina pelas ruas de Belém, com direito a visitas aos principais jornais,
uma forma de apresentar a sociedade paraense os novos acadêmicos de medicina:
Retalhos da vida acadêmica
429
PASSEATA DOS ACADEMICOS DE MEDICINA
Num desses arrancos que são próprio da vida acadêmica ou que definem
os arroubos da mocidade, hontem, os estudantes da Faculdade de Medicina, festejando o dia do calouro, fizeram uma visita a FOLHA, vivando
este jornal.
Uma comissão constituída de veteranos subiu á nossa redacção, falando o
academico Miguel Martins Filho que disse da satisfação dos estudantes
em homenagear a FOLHA que, não poucas vezes, tem advogado a causa
dos academicos paraenses.
Depois de “ale-guapes” festivos a farandula academica continuou o seu
passeio festivo, levando pelas ruas as alegrias proprias da mocidade.
Os academicos – veteranos e calouros – eram acompanhados por grande
massa de populares, sendo saudados em muita parte por senhoras e senhorinhas (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 02.03.1932).
Outras referências mencionam ainda “o tradicional exame de admissão da calourada, promovido pelos veteranos alumnos” (Folha do Norte, Vida Acadêmica,
21.02.1934), sem maiores detalhes sobre o que consistia de fato este “exame”. Sabese que todos os veteranos eram convocados para assistir e as calouras eram examinadas à parte por veteranas.
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Pouco a pouco o trote iria adquirindo as feições que o tornaram conhecido por
gerações. Ao assumir a organização deste evento, o Diretório criaria até um departamento especial chamado “Grande Conselho de Trote” (A Folha Vespertina,
23.02.1942). A tradição era sair em uma passeata fantasiado e empunhando cartazes que criticavam um fato ou autoridade do momento.
Um ofício curioso, com o timbre de “URGENTE”, encaminhado ao Diretor da
Faculdade pelo Chefe de Polícia, em 8 de março de 1935, mostra que as críticas
realmente incomodavam:
Tendo chegado ao meu conhecimento que alumnos dessa Faculdade pretendem sahir á rua em passeata, num “trote” aos calouros e em critica
ao governo, esta Chefia crê de bom aviso o prevenir V. Excia. de que a
Policia não permittirá, em absoluto, que tal passeata se realize para que o
tomará todas as providencias ao seu alcance.
Quanto ao castigo applicado aos primeiranistas pelos seus collegas dos
outros annos de curso, no interior do estabelecimento, esta Chefia está
prompta a auxiliar V. Excia. no que for necessário, attendendo com presteza ás solicitações que V. Excia. houver por bem fazer-lhe (FMCP, 1935c).
O então calouro Danilo Virgílio de Mendonça, que mais tarde seria professor de
Fisiologia da Faculdade, recorda bem o seu trote no ano de 1948:
A essa época tinham ocorrido dois desastres graves com aviões da FAB
(Força Aérea Brasileira). Tomamos os fatos trágicos como uma crítica à
Força Aérea Militar. Um calouro, o Mário Herculano Marinho da Silva,
metido em roupas rasgadas com pseudo curativos na testa e no rosto,
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
pintado com mercúrio-cromo em várias partes, para imitar sangue, portando uma maleta furada e uma tabuleta com os dizeres “Viajei de um
avião da nota musical fá, seguida de um B”.
Mas o grosso das críticas eram dirigidas aos concursos de misses, tão em
moda na sociedade local, e ao professor Lucival Lage Lobato, oficial da
Aeronáutica que diziam ser um mestre nada eficiente boato arquitetado
pelo veterano “Buda” um estudante “profissional”, sempre reprovado merecidamente pelo mestre Lucival.
Posta a procissão em andamento percorremos alegremente a Av. Generalíssimo Deodoro, Av. Nazareth, Praça da República, Sto. Antonio e João
Alfredo, sendo nossa previsão dissolvermos a passeata em frente ao Palácio do Governo, também incluído nas críticas.
Eram sete ou oito calouros fantasiados de “miss” eu inclusive, fantasiado de
“rainha das cobradoras” (de ônibus). Ao chegarmos quase no início da João
Alfredo, pois trafegávamos em sentido contrário, fomos barrados por um
grupo de civis armados de paus e fios elétricos, alguns soldados, cabos e
sargentos e um oficial fardado. Foram se infiltrando no trote até chegarem
ao Mário Herculano, que portava o cartaz alusivo a FAB. Aí o pau comeu,
espalhando estudantes para todos os lados, apanhados que fomos de surpresa. Quando tomaram o cartaz do Mário ele ainda reclamou:
- Peraí pessoal! Vocês estão estragando nosso trote!
A esta altura já estava apanhando.
[...]
Desarmado distribuí chutes para todos os lados, tentando safar-me da
pancadaria. Mas os militares e civis da Aeronáutica cometeram um erro
estratégico; tinham penetrado fundo demais na massa estudantil que, refeita da surpresa inicial, transformara as ripas e cabos dos cartazes em
armas de defesa, saindo para o merecido revide. Encurralados, os militares não tinham para onde recuar e passaram a apanhar muito mais do que
haviam dado, até que os veteranos passaram a pedir calma aos calouros
(MENDONÇA, 2002, p. 215).
Os militares desta vez acabariam por fugir em meio a vaias, mas se não venceram
pelo menos conseguiram retirar a “ofensa” a FAB (MENDONÇA, 2002, p. 216).
Diga-se de passagem, confusões com militares eram comuns entre os acadêmicos.
Um boletim da Chefatura de Polícia destinado à direção da Faculdade conta que,
em 4 de abril de 1934, um cabo fuzileiro passava pelo largo de Santa Luzia quando
perguntou para um acadêmico onde ficava a Faculdade de Medicina. Este respondeu que se o cabo não sabia ler, que aprendesse. Iniciou-se uma discussão, que
logo virou luta corporal. Outros acadêmicos entraram em auxílio do colega, assim
como outros militares apoiando o cabo, generalizando a desordem. O cabo chegou
a exibir sua navalha, mas a luta foi apartada. Resultado final: ferimento contuso
sobre o olho esquerdo do acadêmico e uma contusão no frontal do cabo, além de
um pequeno ferimento no pavilhão auricular esquerdo de um dos amigos do militar
(FMCP, 1934a).
Retalhos da vida acadêmica
431
Em outro ofício, datado de outubro do mesmo ano um capitão do 26º B. C., atual 2º B.I.S, comunica que os acadêmicos de medicina estavam desrespeitando a
farda do Exército Brasileiro, pois andavam vaiando os praças daquele batalhão;
pedia para que o diretor tomasse providências, pois não poderia se responsabilizar pelas consequências daqueles atos... (FMCP, 1934a).
432
Foto 75:
Calouro em dia de trote
desfilando com cartaz de
protesto em frente
a Santa Casa.
Fonte: Revista do Acadêmico
de Medicina,
dez. 1946, p. 43.
Voltando ao trote dos calouros, este de certa forma não acabava após a “passeata”.
Professores como José Alves Dias Junior faziam de sua primeira aula uma extensão
do trote determinando que os calouros medissem a lateral inteira da sala com um
palito de fósforo, entre outras brincadeiras:
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
- Não queira ludibriar o mestre, pois já sei quantos palitos medem esta
parede, né siô? Interrogava com um sotaque, se imitável, impossível de
reproduzi-lo fielmente no papel. E, com uma gesticulação toda própria
onde as mãos eram preponderantes, ordenava:
- Vá à cuba de formol e me traga um fígado, né siô?!
Lá vinha o assombrado calouro com o fígado às mãos e a boca amarga
pela expressão emocional de sua própria vesícula hepática.
- Isto não é fígado, né siô! Isto é um pâncreas! Divertia-se o mestre com
a expressão duvidosa do calouro.
- Traduz o que está escrito naquela parede! Lá estava a frase latina “Nosce te Ipsum” trazida do grego inserida no portão do templo de Delfo,
em Atenas (Conhece-te a ti mesmo). Na indecisão do “calouro burro” o
mestre traduzia jocosamente:
- É proibido fumar, né siô? (MENDONÇA, 2002, p. 222).
433
Fonte 76: Passeata do trote
dos calouros de medicina
no ano [19--].
Fonte: Coleção Dr. Carlos
Amaral Costa, Museu
da Sociedade Médico
Cirúrgica do Pará.
Retalhos da vida acadêmica
Deixadas para trás as emoções e alegrias da entrada na Faculdade, os acadêmicos
passariam a conviver com a dura realidade das elevadas despesas do curso. Como se
já não bastassem as taxas escolares, os livros médicos também eram caros. Mesmo
que o estudante não comprasse nenhum livro e vivesse na biblioteca, cuja utilização
também era paga, ele deveria ter alguma compreensão de francês e espanhol, pois os
tratados eram de um modo geral nestes idiomas. Tinha que ser assim ou nada entenderia do Brumpt de Parasitologia, do “Medicine Operatorie” de A. Broca, muito menos dos quatro volumes de anatomia de L. Testut e A. Letarjet, sem falar de outros
como “Thibau” de Física Médica, o “Elements d´Obstetrique” de W. Wallich, e etc.
Em português mesmo somente “Semiologia Médica” de Vieira Romeiro, “Medicina
Legal” e “Hygiene” ambos de Afrânio Peixoto e “Farmacologia Geral” de Pedro Pinto
(Folha do Norte, 13 de março de 1932). Os livros de autores europeus só começariam
a ser substituídos pelos livros norte-americanos a partir da segunda guerra.
O “status” dos acadêmicos de Medicina, bem como os de Direito e de Engenharia,
era elevado. O que quer que fizessem e por onde quer que passassem eram recebidos com honras, tudo noticiado pela imprensa. Um exemplo disso eram as chamadas “caravanas acadêmicas”, nada mais do que viagens organizadas por estudantes.
A Folha do Norte de 23 de março de 1932 dá um grande destaque a uma “Excursão
dos Futuros Esculápios a Bragança”8:
434
A embaixada academica de medicina, que partira ás 6 horas da manhã de
sabbado da estação de S. Braz indo até Bragança regressou antehontem
a Belem.
Em caminho para Ananindeua, o orador da comitiva, 2º annista Paulo Fender, em nome de todos os academicos, confiou ao professor dr. Francisco
Freitas a presidência da caravana. Este agradeceu em palavras incentivadoras. Depois falou o academico de Direito E. Sousa Filho, congratulandose com todos e lançando a semente do Clube Academico, congregação sem
distincção de todos os estudantes de cursos superiores.
A viagem decorreu sob a maior cordialidade possível, executando o “jazz
academico” varios numeros de seu repertorio.
Almoçaram em Igarapé-Assu. As 5 ½ da tarde, chegaram a Bragança
onde já estavam sendo esperados pelas auctoridades do município.
Depois de optimamente hospedados pela proficiencia da direcção da embaixada, os academicos, que se distinguiam pelas boinas verdes e vermelhas, foram recepcionados na casa do prefeito de Bragança, sr. Raymundo
Naziazeno Ferreira, que a todos comutou de gentilezas.
Na manhã de domingo visitaram toda a cidade, acompanhados do sr. Naziazeno. Depois destas visitas dirigiram-se ao local do comício que annunciaram em boletins, ao largo da Matriz em prol dos Lázaros. Falaram os
academicos Paulo Fender, Nery Guimarães, Sousa Filho e disse uns versos
allusivos o poeta Rocha Moreira, nosso companheiro de trabalho.
Foi feito então um bando precatório que percorreu o commercio juntando
esmolas para os lazaros, sendo bem correspondida pelo povo a iniciativa.
O sr. Naziazeno offereceu aos excursionistas um banho no igarapé Chumucuí, para onde foram todos de caminhão por uma bem construída estrada.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Depois de um banho, de um lauto almoço, prepararam-se os academicos
com uma equipe formada á ultima hora , para enfrentar o forte conjuncto local da “Team Negra F. C.”, campeão de Bragança. A derrota era
inevitável, mas o “score” era marcado antecipadamente pelos torcedores
bragantinos: 5 x 0 a favor dos locaes.
Mas não succedeu assim. Os academicos num esforço admiravel, conseguiram que o “score” fosse apenas de 2 x 1. Foi um bello jogo em que a
vontade suppriu a technica.
Á noite no grupo escolar foram realizadas as conferencias annunciadas.
Augusto Moreira fez um histórico da Faculdade de Medicina, terminando por destruir certo boato que se estava propalando, em torno da desequiparação da Faculdade. Nery Guimarães falou sobre hygiene.
Depois das conferencias, realizou-se o baile official ainda na residência do
sr. Naziazeno. O “jazz acadêmico” conseguiu bello exito em sua finalidade.
A volta fez-se ás 6 horas da manhã de segunda-feira quando de Bragança
partiu o trem-horario.
Almoçaram os academicos em Igarapé-Assu e chegaram a Belém ás 5 horas da tarde.
A embaixada era composta de cincoenta estudantes, inclusive tres senhorinhas e os acadêmicos E. Sousa Filho pelo “Estado do Pará”, Paulo
Eleutherio Filho, desta secção e Rocha Moreira, ambos pela Folha do
Norte. (Folha do Norte, 23 de março de 1932).
Existem notícias de “embaixadas acadêmicas” bem mais audaciosas, que foram muito mais longe ultrapassando as fronteiras do estado. Em setembro de 1935 partiu
com destino a Porto Alegre para assistir aos festejos do centenário da Revolução
Farroupilha a embaixada acadêmica “Camilo Salgado” a primeira enviada “...aos
centros cultos do paiz” (FMCP, 1935a), que contava com dezenove estudantes de
medicina e um de farmácia, tendo como presidente e orador respectivamente os
então acadêmicos Alberto Moacyr Benayon e Hermínio Pêssoa. Tal embaixada possuía caráter oficial, recebendo dez contos de réis da Faculdade, sendo portadora de
uma mensagem do diretor da FMCP, Camilo Salgado (FMCP, 1936c, p. 37)9.
A embaixada visitou além de Porto Alegre, as cidades de Pelotas, Rio de Janeiro,
Niterói, Salvador, Recife e Fortaleza mantendo contato com entidades acadêmicas, médicas e visitando hospitais e faculdades. Ao travarem contato com outras
instituições de ensino médico os estudantes perceberam o quanto a sua escola era
“modesta, a luctar com lamentável falta de recursos e quase abandonada do auxilio
do governo da Republica”10. Ficaram muito entusiasmados com a receptividade e
simpatia do povo gaúcho “por intermédio de todas as suas classes, estudantes, auctoridades, jornalistas, intellectuaes, elemento femenino etc” (FMCP, 1935a).
Em 1938 seria a vez de uma embaixada com menos integrantes, e que ficou conhecida como “Abelardo Condurú” (FMCP, 1939c, p. 59), constituída pelos doutorandos Epílogo de Campos, Ocyr Dutra, Atahualpa Fernandes, Antonio Costa Rodrigues, J. Araújo Filho, Carlos Guimarães e Vicente Magno de Miranda. Desta vez
Retalhos da vida acadêmica
435
o destino era o Rio de Janeiro, então capital federal, e outras capitais do país. No
Rio, além da visita aos centros médicos locais , tentariam obter audiências junto às
autoridades de ensino superior solicitando algumas vantagens para a Faculdade de
Medicina e Cirurgia do Pará. Já estava confirmada também uma parada de um dia
em Pernambuco, onde os acadêmicos retribuiriam a visita dos alunos da Faculdade
de Medicina do Recife, que haviam estado em Belém há alguns meses (Folha do
Norte, 12.06.1938, p. 1).
A última embaixada oficial registrada no período data de 1943, composta apenas
por três estudantes: o doutorando Pedro de Brito Tupinambá e os acadêmicos Luis
Gonzaga Pires e Edgar Bezerra Valente. Representou a Faculdade no II Congresso Médico-Academico Inter-Estadual ocorrido em Recife. Lá apresentaram vários
trabalhos entre os quais “Anemia Verminótica – Problema médico-social da Amazônia”, que foi bastante elogiado (FMCP, 1945c, p. 30).
Nem tudo eram viagens e alegrias. A década de 1930 marca um acontecimento
trágico no meio acadêmico, apenas descrito por Clóvis Meira, ainda que vivo na
memória de muitos alunos daqueles anos:
436
Quando entrei, em 1935, ainda ressoava o trágico incidente que envolvera os professores Acylino de Leão, Mattos Cascaes e Arthur França, ao
reprovarem um aluno de sexto ano, levaram-no ao suicídio. Mesmo no
último ano o aluno ainda era podado. Esse rigor é que deu a Faculdade de
Medicina e Cirurgia do Pará o renome que passou a desfrutar entre as suas
congêneres, apesar de situada no extremo norte (MEIRA, 1986a, p. 17).
Outro incidente desagradável daquele período, ainda que esteja mais para cômico do
que para trágico, ficou registrado no livro de documentos recebidos pela Faculdade
no ano de 1937. O Chefe de Policia do Estado pede em setembro daquele ano que
Camilo Salgado tome providências a respeito de um acadêmico de medicina bastante
alcoolizado que “...amedrontava com um dedo humano as meretrizes residentes á rua
General Gurjão”. Camilo apuraria o caso e diplomaticamente como era seu costume
responderia que o acadêmico havia levado “...para sua residencia o orgão referido no
officio, e independente da vontade delle...” (FMCP, 1937a) um aluno secundarista
havia feito a exibição pública conhecida. Finalizava que cabia a polícia punir os culpados, não havendo a Faculdade nenhuma responsabilidade naquele caso.
Enquanto uns brincavam com peças anatômicas, outros faziam grandes sacrifícios
em prol de “material didático”:
Conseguíamos os cadáveres dos indigentes da Santa Casa e ficávamos
horas a fio dissecando e preparando as peças anatômicas de que necessitávamos. Os ossos eram mais difíceis de se conseguir. O bedel do anfiteatro, que jocosamente chamávamos de “capanga” descarnava os ossos e
nos vendia, mas o dinheiro era curto. Resolvemos pedir uma autorização
do diretor do cemitério para termos acesso à vala comum. Consegui-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
mos uma escada e descemos pisando nos ossos e escolhendo os mais bem
conservados. O lugar era úmido, cheio de insetos de toda a natureza, as
paredes gélidas e gotejando água (MEIRA, 1986a, p. 27).
Outro aspecto que marcaria a Faculdade nos anos de 1930 seriam as fortes tensões
políticas daquele período histórico e que acabavam de alguma forma se refletindo
no Casarão da Generalíssimo. Posições partidárias não só dificultavam a vida de
alguns estudantes como às vezes forçavam sua transferência para outros estados.
Ruben David Azulay11 um daqueles estudantes “convidados” a se transferir no ano
de 1938 (FMCP, 1945c, Mapa 8), conta sua história:
...a faculdade era paga. Decidi procurar o major Barata, já eleito governador, e pedi uma bolsa de estudos. Me dedicava muito na faculdade e me
destaquei na cadeira de Embriologia e Histologia, onde o professor costumava reprovar em massa. Durante nove meses, estudei de graça, mas
o major Barata foi deposto. Cassaram minha bolsa de estudos e me cobraram os meses que estudei sem pagar. Como não tinha nem os 100 mil
réis de uma mensalidade e nem o acumulado, a única saída seria largar a
medicina. Mas decidi criar um curso paralelo de Histologia para todos os
alunos reprovados da faculdade. Cobrava 100 mil réis por aluno e fiquei
rico. Consegui pagar os atrasados e me manter na faculdade.
[...]
O único problema político que tive foi quando tentaram me expulsar da
faculdade e fui preso. Mas não porque era conhecido do major.
[...]
Fui escolhido orador da União Democrática Estudantil. Era a época do
integralismo, o fascismo brasileiro. Não consegui terminar meu discurso devido a pancadaria que saiu entre as correntes políticas. Na manhã
seguinte, fui acordado pela polícia. Precisava dar declarações sobre o
discurso que havia feito. Só não fiquei preso porque o procurador geral
Casimiro Gomes da Silva havia escutado meu discurso e me defendeu.
Ao mesmo tempo, sofri um inquérito na faculdade para ser expulso. Só
não fui expulso porque o professor de Anatomia, Dias Júnior, alegou que
a faculdade não poderia expulsar o seu melhor aluno. Como minha situação política e social não estava das melhores em Belém, decidi concluir
minha faculdade no Rio de Janeiro. Peguei o Ita do Norte (INSTITUTO
DE DERMATOLOGIA PROF. RUBEN DAVID AZULAY, 2008).
Outro acadêmico que tomou um “Ita do Norte”, em 1937, Armando Lemos Monteiro da Silva, narra sua experiência:
Em Belém do Pará, como na maioria das cidades, o meio estudantil sempre
foi o mais visado pelos políticos. As agitações se sucediam contra o Governo
imposto. Cursava o quarto ano da Faculdade de Medicina do Pará, quando a
agitação começou novamente a invadir as escolas. Surgiu um sério desentendimento entre alguns alunos e professores, políticos, governistas.
[...]
Tornaram-se frequentes as perseguições de origem políticas no meio
universitário.
Retalhos da vida acadêmica
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[...]
...os estudantes organizaram uma passeata para homenagear o General
Sotero de Menezes na sua residência na Cremação. Recebeu-nos na sacada de sua casa e quando falava para agradecer aquela manifestação carinhosa de nossa parte começou a fuzilaria promovida pelos capangas do
governo. A estudantada só teve tempo de correr para o matagal vizinho
de uma cervejaria lugar pantanoso para fugir dos tiros e da pancadaria
inesperada. Outros atentados foram praticados. Certa vez a nossa Faculdade de Medicina quase foi invadida por capangas a mando de adversários
políticos, misturados, infelizmente, com tropas federais, frequentemente
usadas fora de suas atribuições quando era seu comandante o irmão do
Governador, coronel Mário Barata. O simples fato de acompanhar o Mestre Dias Junior, pertencente a tradicional família de políticos do Pará, era
o bastante para cair na ira dos inimigos (SILVA, A., 1977, p. 192).
[...]
Também, de outra feita surgiu na frente de nossa Escola um soldado
caído, em péssimo estado de etilismo e telefonamos pedindo que o recolhessem. Não demorou trinta minutos compareceu ao local um pelotão
enviado pelo irmão do Governador que no momento comandava o quartel com ordem para espancar os estudantes. A pancadaria foi grossa e revidamos então com paus e pedras que estavam ao nosso alcance. Dezenas
de atentados contra os estudantes foram cometidos e estes não tinham a
quem apelar, na época da ditadura (SILVA, A., 1977, p. 100).
438
Até mesmo as já citadas caravanas acadêmicas tornaram-se inseguras conforme
segue a narrativa de Armando Lemos em uma excursão dos acadêmicos de medicina que por pouco não acabou em tragédia:
Numa linda manhã de setembro os estudantes da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará receberam um convite do Prefeito de Bragança,
Sr. Augusto Corrêa, para visitarem esta cidade. Foi com entusiasmo que
cerca de trinta estudantes aderiram ao convite. Até o Prefeito de Belém,
Prof. Alcindo Cacela colaborou financeiramente para o bom êxito dessa
excursão. Estávamos em plena ditadura.
[...]
partimos da Estação de São Braz e, no mesmo dia à tardinha, chegávamos a gare de Bragança. Uma multidão, tendo a frente o Prefeito AugustoCorrêa
Corria que a patrocinara já nos esperava. A banda de musica do
Governo tocava os dobrados e alegrava o ambiente. A viagem decorreu
no meio de intensa alegria e entusiasmo.
Em todas as cidades intermediárias nos eram prestadas manifestações
de apreço e carinho. A poeira da estrada, as fagulhas do trem e o intenso
calor que fazia, tudo isso era recebido com muita esportividade pelos
estudantes (SILVA, A., 1977, p. 96).
Recebidos pelo prefeito de Bragança e instalados no Hotel, os estudantes receberam a programação estabelecida que incluía passeios, visitas e conferências sobre
temas diversos como por exemplo “Dia da Árvore”. Neste dia o então acadêmico
Epílogo de Campos faria em praça pública uma saudação ao povo bragantino.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
A praça principal foi bem iluminada e o pequeno coreto central preparado para os
oradores. A multidão começou a chegar e às sete horas a banda começou a tocar.
Logo em seguida subiram ao palanque todos os acadêmicos acompanhados do prefeito e demais autoridades locais. Epílogo de Campos tomou a palavra debaixo de
aplausos e iniciou seu discurso. Decorreram poucos minutos quando apagaram
todas as luzes da cidade e no meio da escuridão...
Iniciou-se tremendo tiroteio partindo da praça. O povo tomado de surpresa começou a correr desabaladamente. Estávamos desarmados e perplexos.
Só tivemos tempo de nos deitar no chão para melhor nos proteger das balas assassinas. Era a presença do Baratismo (SILVA, A., 1977, p. 98).12
Evacuada a praça a programação continuou no dia seguinte sem maiores transtornos, exceto por um novo tumulto na partida, desta vez causado pelos próprios
estudantes:
Cervejas continuavam sendo servidas e a pressão alcoólica subindo. Alguns estudantes começaram a cantar canções com paródias pejorativas.
A banda de música não gostou. Insistiram. Ofensas pessoais. Veio o desacato. Iniciou-se uma luta entre os estudantes e os militares da banda.
Houve imediata intervenção do sargento responsável que consegui acalmar os ânimos (SILVA, A., 1977, p. 99)13.
Este ambiente hostil existente então no Pará, de acordo com Armando Lemos, teria determinado a transferência de muitos estudantes (SILVA, A., 1977, p. 138).
Encerramos por aqui esta exposição de “causos”, uma pálida amostra do muito
que ainda se tem a buscar das outras “histórias” da Faculdade, particularmente as
acontecidas nos seus primeiros anos de funcionamento, quando ela ainda lutava
bravamente contra todas as adversidades na tentativa de firmar-se como estabelecimento de ensino de qualidade.
Existem ainda muitos episódios – pitorescos ou não – envolvendo os estudantes
da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, ao longo de sua trajetória, seja fora
das salas de aula ou dentro dos gabinetes e laboratórios do Palacete Santa Luzia.
A divulgação de fatos na imprensa com a participação de acadêmicos e professores,
ainda que possa soar como fofoca ou amenidade decerto contribuíram para fixar
junto à sociedade paraense a “marca” da instituição.
NOTAS
1
Ver seu nome entre os presentes na ata de Instalação, no capítulo “A instalação- Era preciso começar”.
2
Ver capítulo “Doutores Haja... - A campanha para aquisição do prédio”.
3
Idem.
Retalhos da vida acadêmica
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4
440
Curiosamente Doyle Maia em seu livro sobre a Faculdade de Medicina do
Rio de Janeiro afirma que na realidade “Sabina” era um apelido que pertencia
a uma dinastia de vendedoras de laranjas muito apreciadas pelos estudantes.
Após o desaparecimento da Sabina original o nome foi adotado por outra
vendedora que a substituíu. (MAIA, 1996, p. 76).
Como muitos dos professores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará
se formaram na escola da Praia Vermelha o apelido provavelmente veio “importado”.
5
“Têm inicio amanhã o novenario e os populares festejos em honra de Santa
Luzia, na praça Dr. Camillo Salgado (antiga Santa Luzia).
O arraialzinho está recebendo profusa ornamentação e é fartamente illuminado.
Uma banda de musica militar tocará no pavilhão levantado ao meio da Praça
de Santa Luzia.
As novenas serão cantadas em lindo altar, artisticamente decorado”. (Estado
do Pará, 10.12.1926, p. 2).
6
Ver capítulo “Apontamentos para uma história do DAM 1930-1949”.
7
Idem.
8
Folha do Norte, 23 de março de 1932.
9
Os outros componentes da embaixada eram os acadêmicos de medicina:
David Gabbay, Ruy Penna Pondé, Leônidas de Mello Deane, Milton Luna
Lobato, Gladstone de Mello Deane, Milton Cordovil, Nelson Corrêa de Oliveira, Celso de Mattos Leão, Emílio Nasser, Felippe Nery Guimarães, Nilson
Carvalho da Silva, Claudio de Mendonça Dias, Orlando da Costa Tavares
Videira, Francisco da Cruz Luna, José Luiz Lemos da Silva, Guilherme Lins
de Vasconcellos Chaves, Abelardo Santos e Francisco Siqueira Mendes Pereira este representando o curso de Farmácia.
10
Relatório da chegada. (FMCP, 1935a).
11
Dermatologista e professor emérito da UFRJ e UFF. Radicado no Rio de
Janeiro.
12
Baratismo, no Pará, era o termo usando para definir a política do então
Interventor Major Magalhães Barata. (N.A).
13
Estavam presentes nesta excursão: Armando Monteiro da Silva, Epílogo Gonçalves Campos, José da Silveira Netto, Clodomir Mendonça Maroja, Waldir Vieira Alves, Hugo Bastos, Gervásio Brito Melo, Nelson Ribeiro
Filho, Ary Lage da Silva, Carlos Simões Pereira da Silva, Olavo da Mota
Cardoso, Octávio Velloso Salgado e etc.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
28
A Federalização
441
442
Detalhe de azulejo de uma das paredes da FMCP.
A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará foi federalizada através da lei nº 1.049,
de 3 de janeiro de 1950. Mais que uma simples data ou numeração de uma lei, o ato
significa o coroamento de um processo iniciado muitos anos antes, por iniciativa
da própria Faculdade, provavelmente por volta de 1930, conforme mencionado em
ata de reunião do Conselho Técnico Administrativo, em 23 de fevereiro de 1933,
mas que só se concretizaria na prática após a intensa e brilhante participação do
Diretório Acadêmico1.
De acordo com o Relatório de Atividades do ano de 1949, o projeto de federalização
da Faculdade de Medicina de Cirurgia do Pará, fora esboçado em 1937 pelo senador paraense Abelardo Conduru e posteriormente apresentado à Câmara Federal
pelo deputado Deodoro de Mendonça (FMCP, 1950b, p. 5). Desta participação do
senador Abelardo Conduru, não conseguimos maiores detalhes.
Antes do “Projeto Deodoro”, como ficaria conhecida a proposição do deputado, já
havia uma movimentação visando à almejada federalização. A questão do valor das
taxas cobradas pela Faculdade, mote para ações dos estudantes, acentuar-se-ia a
partir de 1943, com os alunos pregando boicote à matrícula, ao ponto da Direção
da Faculdade ameaçar “cerrar as portas da Faculdade”, caso estes não se matriculassem até determinada data.2
De 1943 para frente, alternando períodos de acalmia com outros de maior conflito
entre os dirigentes do DAM e a Direção da Faculdade por causa das taxas, as coisas
seguiriam caminhando.
Em fevereiro de 1944, a Revista do Acadêmico de Medicina, em artigo intitulado “Até
quando...” manifestava-se sobre as dificuldades de cursar medicina devido ao custo
elevado do curso, imputando o encarecimento às taxas cobradas pela Faculdade,
“taxas que vem se avolumendo(sic) de âno para âno, devendo-se acrescer, a tudo
isso, o preço elevadissimo que têm, em todo país, os livros de medicina”.
Paralelamente, o artigo celebrava o resultado do apelo feito pelo Diretório ao Interventor Federal no Estado e que culminou com a criação e manutenção de seis
vagas gratuitas sob a responsabilidade do Governo estadual, considerando ser
“mais um passo na caminhada difícil de libertar o estudo médico do insolúvel problema monetário da Faculdade de Medicina”. Mencionava ainda o artigo, estar em
vias de implantação a nova reforma do ensino superior, “que visa acabar com a exploração quasi que comercializada do ensino”, o qual “não deve e não pode ser um
privilégio dos ricos”, “devendo se tornar cada vês mais acessível a todos” (Revista
do Academico de Medicina, v. 3, n. 49, 1946, p. 58).3
O ano de 1946 seria o divisor de águas desse impasse que resultaria na federalização. O problema das taxas mereceria destaque na imprensa, com a Folha do Norte
de 15 de fevereiro de 1946 noticiando que o DAM depois de tomar conhecimento
A Federalização
443
da decisão da Congregação de majorar as taxas e mensalidades4 convocara uma
assembléia geral onde fora decidido o seguinte:
a) Enviar à Congregação da Faculdade um memorial expondo as inconveniências das taxas e mensalidades, pedindo a revogação do ato e oferecendo a colaboração decisiva do órgão máximo da classe discente para,
no ano de 46, reivindicar com a diretoria, junto as autoridades federal e
estaduais, o aumento das subvenções, afim(sic) de que as necessidades
da Faculdade sejam satisfeitas sem o prejuízo dos alunos, os quais já se
sentem “asfixiados” pelo preço do curso médico.
b) Caso não seja atendido o referido memorial, o D.A.M. solicitará a intervenção do presidente da República, ministro da Educação e Saúde,
diretor do Ensino Superior e diretor do Conselho Nacional de Educação,
que terão interesse em baratear o ensino médico, tão necessário na Amazônia como parte de seu saneamento, mesmo que para isso seja preciso o
governo federal encampar a nossa faculdade.
c) Envidados todos os recursos dos discentes da Faculdade de Medicina
e Cirurgia do Pará, pelo seu órgão de classe, o D.A.M. declarará greve
geral (Folha do Norte, 15.02.1946, p. 4).
Por sua importância transcrevemos o memorial encaminhado ao Interventor Federal do Estado pelo Diretório Acadêmico:
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Exmo. Sr. Dr. Interventor Federal do Estado
O Diretório Acadêmico de Medicina, expressão da vontade coletiva dos
alunos desta Escola, confiante no espírito de justiça e no interesse demonstrado por V. Exa. em tudo que se refere ao importante problema do
ensino, pede vênia para expor o seguinte:
Este órgão de classe foi notificado há dias de que as taxas de laboratório e
biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará haviam sido majoradas para cem cruzeiros (Cr$ 100,00), cada, e que a mensalidade dos
alunos da 1ª serie tinha sido elevada para duzentos cruzeiros (Cr$ 200,00).
Ora, já há muito que os jovens que tentam estudar medicina em nossa terra veem realizando ingêntes sacrifícios para satisfazer o aumento sempre
crescente das taxas escolares. Quase anualmente, ou se criam novas taxas
ou se aumentam as já existentes, criando-se para os alunos embaraços inumeraveis. Agora, essa nova majoração, elevando as já enormes quantias
exigidas, vem tornar insuportavel a situação de alguns colegas, que terão
de abandonar o curso por não poder efetuar tal pagamento.
Esta entidade acadêmica procurou entrar em entendimento com a escola,
enviando à Congregação da mesma um memorial, cuja cópia remetemos
à apreciação de V. Excia., e tentando mesmo entrar em contacto com a
Diretoria afim de procurar uma solução satisfatória, que harmonizasse
os interesses de ambas as partes. Nada logrou, porém, em virtude unicamente da má vontade dos que se julgam proprietários desta Faculdade.
Quanto à descabida alegação da Escola de que o grande número de alunos transferidos para o sul do país veio afetar enormemente as suas
finanças, este Diretório tem a esclarecer a V. Excia., que cada um dos
colegas a transferir-se deve efetuar um pagamento de dois mil cruzeiros
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
(Cr$ 2.000,00), afim de conseguir o seu intento.
Esperando as sábias providencias de V. Excia., reitera os seus protestos
de elevada estima e distinta consideração.
Pelo D.A.M.
Pedro Amazonas Pedroso
Presidente
(Revista do Acadêmico de Medicina, v. 5, n. 56, 1946).
Do mesmo modo, o memorial encaminhado à Congregação:
Nós, abaixo-assinados, representantes das diversas séries junto a esse
Diretório, conhecedores da decisão tomada por V. V. Excias. em sessão
realizada a 25 de janeiro p.p., de que resultou o aumento das taxas de
laboratório e biblioteca e bem assim da contribuição mensal dos alunos
do 1º ano desta Escola, pedimos vênia para solicitar a V. V. Excias. seja
revogada a referida deliberação, pelos motivos infra-citados:
a) os parcos ordenados percebidos por alguns alunos desta Faculdade ou
por seus genitores são permitem fazer face às necessidades criadas pela
carestia de vida, situação que se tornaria insuportável com esse aumento;
b) temos sobejas razões para acreditar que essa majoração das taxas, embora crie ingentes dificuldades a alguns colegas, não poderá de modo
algum melhorar os vencimentos dos dignos preceptores;
c) não nos parece razoavel criar dentro da Escola distinção entre alunos,
devendo uns efetuar pagamento superior aos demais, o que contraria uma
aspiração deste Diretório, que é a igualdade de todos os colegas em qualquer ano ou condição em que se encontrem;
d) esta entidade acadêmica compreende perfeitamente a situação difícil de
nossa Faculdade, no que se refere às finanças, sendo nosso desejo trabalhar
afim de que os ínclitos professores que aqui exercem o magistério tenham
uma retribuição condigna com as elevadas funções que desempenham.
Sabemos que as subvenções concedidas a esta Escola não são suficientes,
sendo inferiores às concedidas a outras Faculdades do Brasil, razão por
que este Diretório assume perante essa Congregação o compromisso de
envidar, juntamente com a Diretoria, no decorrer do ano letivo de 46, todos os seus esforços afim de que essa contribuição dos governos federal e
estadual seja elevada ao nível que se torna necessário, de modo a permitir à
nossa Escola manter-se à altura das congêneres do país e continuar assim
a preencher a lacuna do ensino médico na Amazônia.
Outrossim, solicitamos a V.V. Excias. seja dado à Congregação conhecimento deste nosso justo apêlo.
Certo de sermos atendidos, desde já nos confessamos gratos.
aa) Pedro Amazonas Pedroso, Carlos Costa, Jean Bitar, Alcimar Chaves
Brigido e Agostinho Sales Filho (Estado do Pará, 20.02.1946, p. 1).
Foram enviados telegramas de comunicação da atitude do D.A.M., com pedido
de solidariedade, à União Nacional dos Estudantes, União Acadêmica Paraense
(U.A.P), Diretórios de Medicina das Faculdades da Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Belo Horizonte e Diretórios das Faculdades de
Engenharia e Odontologia do Pará (Estado do Pará, 15.02.1946, p. 6).5
A Federalização
445
Em 19 de fevereiro a U.A.P. reuniu-se “para estudar, medir, imparcial e criteriosamente o ruidoso caso em que vêm de levantar os acadêmicos de Medicina”. Após a reunião
estiveram na sede do jornal Estado do Pará solicitando o apoio deste, “para a justa
e patriótica campanha em que vão se empenhar, lutando para evitar o negro crime
de servir o ensino de fonte de lucros extraordinários”. Os representantes da U.A.P.
disseram ainda ser clara e maliciosa a intenção da Diretoria da Faculdade em manter uma medida contraria aos interesses da coletividade, “que não quer sujeitar-se a
arbitrariedade e servilismo”. Afirmavam que esgotados os recursos pacíficos a U.A.P.
decretaria greve geral, não permitindo a matrícula de nenhum aluno em qualquer
Faculdade. “Seremos uma só voz, um só peito, um só braço reivindicando um direito
justo”; prometiam inclusive envolver os estudantes secundários. Ameaçavam também,
desmascarar publicamente a direção da escola, com publicações diárias pela imprensa,
“citando, relatando, estudando, concluindo fatos e argumentos insofismáveis”.
446
Um dos pontos citados era o fato de a Faculdade apregoar dificuldades financeiras,
não obstante “as suntuosas obras que tem realizado, algumas necessárias, mas outras
francamente sem razão”, dispondo ainda depositada em bancos da elevada quantia
de Cr$ 97.000,000. Diziam, também, que as subvenções estaduais e federais haviam
passado de 40 e 60 mil cruzeiros, respectivamente, para 60 e 100 mil, além de mais 12
mil da prefeitura de Belém. E perguntavam os estudantes, se antes com recursos inferiores a Escola podia manter-se e realizar edificações em seu prédio, como é que agora
não, tendo em vista o aumento de suas verbas? (Estado do Pará, 20.02.1946, p. 1).
O assunto ganharia as páginas dos jornais, praticamente todos os dias. Noticiando
que o D.A.M. estava em reunião permanente, Estado do Pará, de 16 de fevereiro,
informava que o assunto discutido no dia anterior fora o valor de dois mil cruzeiros para a taxa de transferência de “dezenas de alunos que não suportando o
preço avultado do curso médico em Belém e também outras inúmeras e frequentes
arbitrariedades vêm-se na contingência de emigrar para o sul” (Estado do Pará,
16.02.1946, p. 4).
A mobilização dos estudantes para não efetuar suas matrículas e as decisões tomadas pela Direção da Escola, não acatando o apelo dos alunos gerariam um clima de
conflito, com os estudantes propondo a deflagração de greve.
A nota do Diretório publicada em Folha do Norte de 20 de fevereiro de 1946 dá
conta desse estado de coisas:
ESTUDANTES DE MEDICINA
ENTRARÃO HOJE EM GREVE GERAL
Despacho incongruente do sr. Diretor no apêlo dos alunos à Congregação e
ao Conselho Técnico e Administrativo - Em Assembléia geral será pedida a
eliminação do seio da classe para os alunos que se matricularem
Como foi noticiado, o D.A.M. dirigiu à Congregação e ao Conselho Téc-
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
nico e Administrativo da Faculdade um memorial, no qual pedia, após
justas ponderações, que fosse revogada a medida iníqua que majorou as
já elevadas taxas da Faculdade. O sr. diretor, porém, a quem cabia, de
acôrdo com o nº 5 do artigo 104, do Regimento Interno, convocar os
responsáveis pela direção técnica e administrativa da escola, julgou-se no
direito, direito indébito, de despachar o recurso do D.A.M. sem levar ao
conhecimento daqueles a quem era dirigido. O pretexto foi o mais irrisório possível. No memorial dirigido à Congregação respondeu que não havia dois terços dos membros presentemente na capital, como se, antes de
convocá-los, pudesse tomar tal resolução. No outro, enviado ao Conselho
Técnico e Administrativo, fechou um circulo vicioso, indeferindo por não
poder o C.T.A. decidir assunto resolvido pela Congregação, não obstante
termos solicitado a este Conselho que levasse ao conhecimento daquela o
nosso justo apêlo. Ainda desta vez, o sr. diretor andou fugindo ao direito,
pois não tem atribuições para tomar pessoalmente qualquer deliberação
pelo Conselho Técnico e Administrativo da escola. Era este que se devia
declarar incompetente, se fosse o caso.
Vemos assim a intenção maliciosa da Diretoria em tentar manter de pé a
todo custo u’a medida contrária aos interesses de uma coletividade, que
não quer sujeitar-se à injustiça e ao servilismo.
Em vista dessa decisão arbitrária do sr. diretor em impedir chegue às
mãos dos órgãos competentes os recursos interpostos pelos alunos este
Diretório solicitou a ss.excias srs. presidente da República, ministro da
Educação, diretor da Divisão do Ensino Superior e presidente do Conselho Nacional de Educação, providências urgentíssimas, afim de evitar que
a greve perdure até o fim do ano (Folha do Norte, 20.02.1946, p. 4).
No dia 22 de fevereiro, Estado do Pará publicaria uma nota encaminhada pelo Diretório:
[...], os estudantes da Faculdade de Medicina vem pleiteando a revogação do [...] aumento das taxas escolares. Não é de hoje que esses aumentos sucessivos vêm sendo feitos, engendrados pelos espíritos maquiavélicos dos Silveiras e que muito se gabam de manobrar as diretorias e os
próprios professores.
O aumento atual é [...] ilegal. Em primeiro lugar majorou as taxas dos
alunos do primeiro ano, colocando-os em desigualdade perante os demais,
[...]. Em segundo lugar, a reunião da congregação a que o sr. secretário
alude como tendo resolvido a majoração foi ilegal e não pode prevalecer.
O Regimento Interno [...] determina que a congregação só pode reunir e
deliberar contando com pelo menos dois terços de seus professores. [...]
não estão em Belém professores catedráticos em número suficiente ao
exigido [...] e desafiamos o sr. secretário e a própria diretoria da Escola
a publicarem os nomes dos [...] presentes á reunião [...] e o teor da ata
[...]. É nula ainda, [...], porque, o dr. Epílogo de Campos, fiscal federal
da Faculdade foi eleito deputado federal e encontra-se presentemente
no Rio de Janeiro e já lá se encontrava na data da reunião, [...], o que
era necessário para sua validade. Desafiamos o sr. Silveira a provar em
contrário. É nula [...] porque o Regimento Interno contém em seu texto
uma tabela de taxas, aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação e
somente o referido Conselho tem atribuições para modificá-la e, ainda
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mesmo que a Congregação pudesse fazer qualquer modificação no Regimento, esta para que pudesse ser posta em vigor teria que ser submetida
á apreciação e aprovação do Conselho [...]. É contra a ilegalidade patente
e irretorquível de tais atos que os estudantes se batem. Enviado um recurso dos mesmos á Congregação da Faculdade o sr. diretor, certamente
guiado pelo sr. Olimpio da Silveira, mais uma vez agiu ilegalmente e indo
além de suas atribuições indeferiu indevidamente um recurso que não
lhe era dirigido e que somente a Congregação poderia deliberar. [...] os
estudantes endereçaram novo e bem documentado recurso ao Conselho
Técnico Administrativo e que mereceu novo indeferimento por parte do
dr. diretor embora lhe escapassem atribuições.
[...] o aumento em apreço em nada influirá no orçamento da Escola,
auxiliada com cento e oitenta mil cruzeiros pelo Governo Federal, Estadual e Municipal e que a única justificativa apresentada pelo professor
Henrique Esteves na reunião ilegal da Congregação foi de que o ensino
médico estava barato. Com dados falsos fornecidos certamente pelo sr.
secretário, ludibriado em sua bôa fé, chegou a afirmar que um litro de
formol, que antigamente custava sete cruzeiros estava custando noventa
e que as taxas da Faculdade de Belém eram as mais suaves do Brasil. [...]
um litro de formol custa atualmente apenas nove cruzeiros.
Diante do indeferimento “ilegal” exarado pelo dr. diretor aos requerimentos quer nos parecer que os dirigentes da Faculdade de Medicina
estão na certeza de poder pensar pelos professores e que o Regimento de
nada vale. Com o afastamento [...] do dr. Epílogo de Campos [...], urge
a nomeação de novo fiscal federal para pôr termos aos atos ilegais que
vêm sendo praticados.
Justiça é tudo quanto desejam os acadêmicos da nossa Faculdade de Medicina e Cirurgia.
Diretório Acadêmico de Medicina
(Estado do Pará, 22.02.1946, p. 1).
Na mesma data, pela manhã, aconteceria reunião extraordinária do VII Conselho
Regional dos Estudantes para avaliar a situação do aumento das taxas, contando
com a presença do Dr. Epílogo de Campos, ex-fiscal federal junto à Faculdade, na
ocasião deputado federal (Estado do Pará, 23.02.1946, p. 4).
Epílogo abriu os trabalhos falando do momento político e da importância dos estudantes no mesmo. Concluiu reconhecendo serem justas as reivindicações dos estudantes, porque “ainda há quem julgue que o ensino é privilégio de uma classe”.
Em seguida, o presidente da U.A.P., Armando Mendes, após solicitar apoio ao
Dr. Epílogo, pediu aos colegas que usassem de toda franqueza, sem receios, pois
a resolução pré-estabelecida era levar até às últimas consequências, o que ficasse
ali resolvido.
Seguiu com a palavra o presidente do D.A.M., Pedro Amazonas Pedroso, resumindo os acontecimentos e os fatos que levaram o Diretório ao recurso extremo da
greve e porque recorria à U.A.P. na busca de uma solução definitiva para o caso.
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O acadêmico Luiz Ozires da Silva, da Faculdade de Direito, disse que, esgotados os
recursos pacíficos, só havia o recurso da greve, que teria que ser geral, estendendose a todos os acadêmicos, até que o presidente da República interviesse.
Wilson Barroso, pela Medicina, propôs um último recurso, que seria a interferência do Dr. Epílogo de Campos. Epílogo aceita participar e fala que, por não ser mais
fiscal federal, para melhor avaliar sua participação, pedia a suspensão dos trabalhos
por 48h, o que seria aceito pela assembléia.
O Dr. Roberto Chalu, advogado pelo D.A.M, ao manifestar-se mostra a impossibilidade do aumento das taxas lendo portaria do Ministério da Educação, de 6 de
agosto de 1944, mais especificamente seus artigos 1º e 2º, respectivamente:
Art. 1º os estabelecimentos de ensino de todo País não poderão elevar os preços cobrados a seus alunos, além dos limites em vigor a 17 de abril de 1944;
Art. 2º o Departamento Nacional de Ensino examinará desde logo, o
aumento de preço verificado em cada estabelecimento secundário e de
ensino superior, entre 1943 e 1944, e representará ao Ministério da Educação contra a majoração porventura excessiva.
E conclui dizendo que o único serviço que o Dr. Epílogo teria que fazer seria dar conhecimento da referida portaria; a Diretoria da Faculdade, que tinha conhecimento
da lei, se não desistisse de seus intuitos estaria agindo com premeditada e insofismável má fé, pois tinha condições financeiras suficientes para sua manutenção.
Em aparte, o presidente do Diretório, Pedro Amazonas, pede ao plenário a aprovação da publicação de uma nota rebatendo as infâmias assacadas contra o Diretório,
pois estava impossibilitado de fazê-lo pela suspensão do Conselho pelas 48 horas
proposto pelo Dr. Epílogo. O plenário também aprova que, resolvida a questão da
medicina, favorável ou não, “seja o sr. Secretário da Faculdade desmentido nas afirmações que fez, por faltarem á verdade, ofendendo a briosa integridade do D.A.M”.
O acadêmico Luiz Ozires propõe que fossem considerados acadêmicos os estudantes aprovados nos exames de admissão às Faculdades, para sua integração ao
movimento, evitando a exploração das diretorias das Escolas, levando os calouros
a se matricular por medo de serem prejudicados. Também que o Conselho tomasse
a decisão firme e inabalável de que nenhum veterano se matriculasse, “caso essa
matrícula fosse negada aos calouros”.
Um acadêmico de medicina impedido de fazer exames de 2ª época, por já estar encerrada a matrícula, denuncia ter sabido que o secretário da Faculdade estava prometendo a alguns estudantes nas mesmas condições, de realizarem a 2ª chamada,
desde que se matriculassem “furando a parede dos acadêmicos”.
Avaliando o pânico natural dos calouros e também dos veteranos, para efeito legal
em caso de uma greve geral e também por falha nas negociações do Dr. Epílogo de
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Campos, o acadêmico Carlos Lima propõe que fosse requerido em juízo um mandato de segurança, “colocando-se no banco a quantia correspondente à matricula
para o presente exercício escolar nas várias faculdades”. Roberto Chalu diz que
não seria propriamente um mandato, pois, em virtude do pouco tempo que havia
até a data legal do fechamento da matrícula e da entidade a qual seria dirigida, o
que deveria ser feito era “um protesto, que já deverá estar pronto na segunda-feira, dia 25, quando dará entrada na Repartição competente, se fracassar a mediação
do Dr. Epílogo de Campos”.
Após a redação da nota oficial, seriam aprovados votos de louvor ao Dr. Epílogo de
Campos e ao jornal Estado do Pará.
A notícia concluía dizendo ter o jornal procurado o Dr. Epílogo, à noite, para saber
de seus movimentos, com este afirmando ter contatado com a Direção da Faculdade,
encontrando dificuldades aos seus esforços. O texto prosseguia dizendo que “tornase crônica, pois, a intransigência da Direção Médica é quase inevitável a greve geral,
consequentemente, dos universitários paraenses, solidários aos colegas de medicina”.
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O Conselho de Estudantes reiniciaria sua reunião dia 23, à tarde. O Dr. Epílogo de
Campos faria um resumo das suas atividades: tendo procurado não só o tesoureiro
da Faculdade como também seu Diretor, o secretário e membros do corpo docente,
falara das dificuldades encontradas. Disse que naquela manhã fora procurado pelo
Dr. Acilino de Leão para assistir a reunião do Conselho Técnico, mesmo sem já não
ser mais o fiscal federal. Na ocasião da reunião tomara conhecimento que a questão
iria ser “posta nas mãos do dr. Otavio Meira, interventor federal no Estado”.
O interventor, ao tomar conhecimento do problema através do noticiário e das
dificuldades encontradas por Epílogo, escrevera a administração da Faculdade oferecendo-se como mediador, sendo esse o motivo da reunião do Conselho Técnico
Administrativo (CTA, 1946, p. 175-179). Por esta razão, o Dr. Epílogo resolvera
abster-se de qualquer manifestação, “ficando a Interventoria Federal encarregada
do mesmo fim a que se propunha”. Pondo-se à disposição dos estudantes paraenses
na capital da república, após sua explanação retirou-se da reunião.
Em seguida, o presidente da U.A.P. disse ter tido conhecimento que alguns estudantes haviam efetuado sua matrícula na Faculdade de Medicina, “que a ser verdade, patentearia um caráter doentio e faltoso dos mais elementares princípios de
união”. Pedro Pedroso rebate dizendo que eram apenas boatos visando quebrar a
solidariedade entre os acadêmicos. Armando Mendes, presidente da U.A.P., disse
ter absoluta certeza da matrícula do acadêmico Josias Macedo, pedindo um voto de
censura ao mesmo.
Prosseguindo, Armando Mendes disse ter sido a presidência da U.A.P. e particularmente do Diretório de Medicina, procurada pelo Interventor Federal. Por estar
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
em cima da hora, somente ele comparecera à residência do Dr. Otavio Meira no
dia 23. Após ouvir um relato dos fatos, o Interventor ofereceu-se como mediador,
tendo os estudantes, sem poder para deliberar naquele momento, prometido levar
a resposta às 18h, juntamente com o presidente do D.A.M. A proposta foi aprovada
pela plenária, com o presidente do D.A.M. divulgando correspondência enviada
pelo Interventor:
Governo do Estado do Pará
Gabinete do Interventor Federal
Belém, 23-2-46
Senhores membros do Diretório Acadêmico de Medicina,
Cordiais saudações
Neste momento, acabo de escrever ao professor Acilino de Leão, diretor
da Faculdade de Medicina, uma carta na qual ofereço-me a servir como
árbitro na pendência existente entre os jovens estudantes de Medicina
e aquela Escola. Venho dar-lhes conhecimento dêsse oferecimento para
que êsse Diretório declare se aceita a minha intervenção arbitral, pois
só mediante a anuência irrestrita de ambas as partes poderei funcionar
como juiz no caso.
Quero deixar bem claro que a decisão que por mim for proferida deverá
ser aceita por ambas as partes, que a isso deverão se obrigar.
Aguardando sua deliberação, subscrevo-me, cordialmente.
Otavio Meira6
A resposta dos estudantes de aceitar sem restrições a mediação foi levada ao Interventor, no Palácio, juntamente com um relatório sobre todas as etapas da questão
das taxas (Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1).
A primeira medida solicitada ao Interventor era a prorrogação do prazo para as
matrículas. Em seguida o presidente do D.A.M. discutiu rebater “ás infundadas afirmações, que por um vespertino, vem fazendo o sr. Silveira, secretário da Faculdade,
ferindo até a dignidade do Diretório daquele Estabelecimento”. Fica decidido aguardar o fim das negociações do interventor “para devida a resposta de desafronta”.
Na mesma reunião foi aprovada uma nota oficial com voto de louvor aos professores
da Faculdade e um protesto contra as acusações infundadas do sr. Secretário da Faculdade “cujo único objetivo é criar desharmonia entre os corpos docente e discente”.
A resposta da Congregação seria tirada em reunião com a presença de 17 catedráticos. Por onze votos contra seis o órgão acatava a mediação do Interventor (Folha
do Norte, 22.02.1946, p. 1). O teor do documento da Congregação é o seguinte:
A Congregação da Faculdade de Medicina, tendo ouvido a leitura da carta do Exmo. Sr. Dr. Otavio Meira, dirigida ao Sr. Dr. Diretor desta Faculdade, resolve aceitar a mediação de S. Excia., comprometendo-se a acatar
sua decisão sôbre a situação financeira desde que fique já assegurado o
aumento da taxa de frequencia, para todos os alunos, para Cr$ 200,00 en-
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sais, a partir de 1947, bem como o aumento das taxas de laboratório e biblioteca, também partindo do ano vindouro (Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1).
A carta entregue pessoalmente pelo Diretor, Dr. Acylino de Leão, reapresentava a proposta feita ao então interventor Magalhães Barata: “se o Estado der Cr$ 600.000,00
anuais à Faculdade, o ensino será gratuito; se der Cr$ 300.000,00, os alunos terão
abatimento de 50% nas atuais mensalidades e taxas” (CTA, Ata de 23.02.1946). A
Congregação só não aceitava interferência na parte disciplinar.
No dia 26 de fevereiro, o mesmo jornal noticiava que a situação continuava sem
solução, e que o secretário da Faculdade, alegando cumprir ordens da Congregação e do Conselho Técnico, “permanecia firme no aumento já anunciado, tentando
dar um caráter político á reação que no seio da classe estudantina provocou aquela
medida.” (Estado do Pará, 26.02.1946, p. 1) Afirmando não haver nenhuma medida
legal que amparasse os estudantes e nenhum dispositivo em que se baseasse o aumento, o secretário “deixa entrever claramente que é um critério econômico, único
e exclusivamente, que está dando motivo á luta universitária”.
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A notícia destacava a expectativa para com a reunião do Conselho Técnico, marcada para aquele dia “para discutir a mediação do interventor”, com a esperança de
que, “dado o espírito magnânimo de muitos que o integram, saibam compreender
o apelo da classe médica acadêmica”.
A edição do dia 27 traria pesadas críticas ao secretário da Faculdade, em função de
suas declarações A Folha Vespertina, do dia 22 do mesmo mês.
Em nota aprovada em sessão de 22, o D.A.M. rebate as declarações do secretário.
Começava dizendo que este teria arbitrado sobre o prazo de matrícula, à revelia da legislação (Estado do Pará, 27.02.1946, p. 1). Também, quanto ao secretário não se achar
“inimigo dos estudantes”, os estudantes diriam que isto seria julgado pelo público, pois
“embora diante de tantas tentativas para agravar a situação de mais de uma centena de
estudantes, estes não poderão considerar o sr. Silveira como seu amigo”. O secretário
afirmara que, “o que os alunos pagam, não dá nem para as despesas do professorado”.
Entretanto, o diretor, no relatório de 1944, declarava que a principal fonte de renda
era a contribuição dos alunos; e quanto maior o número de alunos matriculados, maior
a receita. Estas declarações deixavam os alunos indecisos sobre em quem acreditar.
Em relação à subvenção federal de oitenta mil cruzeiros só poder ser aplicada em
“construções novas, aquisição de material para o laboratório e livros para a biblioteca”, os alunos diziam que ela aumentara para cem mil cruzeiros. E agradecendo
a informação sobre sua utilização sugeriam ao secretário que “em vez de outras
despesas suntuárias (como derrubar uma bôa escada para construir outra, etc.)
empregasse uma parte daquela quantia em beneficio do laboratório”, tornando desnecessário o aumento tão rápido da taxa de laboratório.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Quanto ao pessoal do diretório dever para a Faculdade – “quem mais me ataca é quem
mais favor deve á Faculdade. Há dois anos não paga nada (palavras de Olimpio)” –
repeliam dizendo nada dever e que as vagas gratuitas eram dadas pelo Estado, sendo
obrigação deste zelar pela educação do povo. Citavam que o presidente do Diretório,
abrira mão de sua vaga gratuita em favor de outro colega em pior situação.
A matéria prosseguia com várias contestações às declarações do secretário, culminando com o revide à afirmação deste de que se não fosse a Faculdade, Pedro
Pedroso seria um caixeiro de taberna, o que foi rebatida com: “a um médico com
a mentalidade do sr. Silveira, antes ser um caixeiro de taberna”. Por fim, os estudantes lançam um desafio: se o secretario provar que o sr. Pedroso é comunista, ele
renunciaria ao Diretório; se não provar, o secretário renunciaria.
À reportagem do jornal, o secretário da Faculdade justificaria a legalidade do aumento das taxas, dizendo que a portaria apresentada pelo advogado Roberto Chalu
não estava mais em vigor, sendo o aumento consequência das despesas que a Faculdade tivera que arcar para equiparar-se as congêneres do país: “isso não se faz
sem dinheiro”, havendo várias obras a serem concluídas, como o laboratório de
Microbiologia e o início de um para Tisiologia:“de alguma parte tem de vir o metal
para esses empreendimentos e a manutenção dos já efetuados”. Disse ainda que as
subvenções no total de Cr$ 195.666,30 e mais as taxas cobradas “formaram em 44,
uma Receita de Cr$ 481.831,60 e em 45 de Cr$ 629.175,10”, sendo que nesses anos,
as despesas foram “respectivamente, de Cr$ 578.955,70 e Cr$ 626.824,20”, e que
“tudo, pois, é uma questão de dinheiro”. Também que, por intermédio do diretor, já
havia sido procurado um entendimento com o governo do estado, no sentido de se
“amenizarem as taxas escolares”, mas não fora possível um acordo.
Segundo a reportagem, o secretário finalizava dizendo o seguinte: “deem-nos trezentos mil cruzeiros de subvenção anual e baixaremos a metade do atualmente
cobrado o preço das taxas escolares; deem-nos seiscentos mil e o ensino em nossa
Faculdade será completamente gratuito” (Estado do Pará, 27.02.1946, p. 1).
Com base na exposição dos dois litigantes, o Interventor elaborou e enviou a ambas as partes um longo relatório para consubstanciar sua decisão, a qual, conforme
exigência feita, deveria ser acatada “sem reclamações por nenhuma das partes”.
Após detalhar o valor das taxas em vigor na Faculdade no ano de 1945 e como
elas eram cobradas, citava a quantia disponível em banco, conforme o relatório de
1944, além do aumento das subvenções oficiais, incluindo o Serviço de Verificação
de Óbitos. Relatava, também, os valores propostos pela Congregação mencionando que as despesas da Faculdade “tem sofrido decréscimo em suas relações para
com os alunos”, pois o material das aulas práticas é permanente, sendo utilizadas,
ainda, as projeções; e que a conservação dos cadáveres é feita em geladeira, menos
dispendiosa que as cubas de formol.
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Em seguida, relatava as etapas empregadas pelos estudantes no sentido de resolver
o impasse causado pelo aumento das taxas, bem como as ações do corpo dirigente
da Faculdade.
Por fim, dizendo não duvidar das razões apresentadas seja pelos dirigentes, seja
pelos alunos, decidia:
1º - No ano corrente ficarão em vigor na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará as mesmas taxas e emolumentos que vigoraram em 1945,
sem nenhum aumento.
2º - O Governo do Estado aumentará de mais Cr$ 24.000,00 a subvenção que
presta áquela Faculdade, aumento este que indenizará este Estabelecimento
do que deixa de receber dos estudantes pela não concessão do aumento.
3º - Nenhuma punição ou diminuição de direitos sofrerá qualquer estudante em consequência da resistência que opuzeram ao aumento das taxas.
4º - A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará promoverá pelos meios
regulares uma revisão nas suas tarifas, procurando para isso um cordial
entendimento com o corpo discente, de modo que no futuro tudo possa
se conciliar sem atrito e divergências.
Belém, 27 de fevereiro de 1946
(a) Otavio Meira – Interventor Federal
(Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1)
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A decisão de não punir os estudantes não seria bem aceita pelos dirigentes da Faculdade. Procurado pela reportagem do Estado do Pará, o secretário da Faculdade,
Dr. Olimpio da Silveira, dizendo-se inconformado com o resultado da intermediação intervencional, afirmaria:
A Congregação vai se reunir ‘para estudar’ (aspas é do repórter), a presente
decisão. Não concordo com os itens 3 e 4. Sôbre a punição de alunos de Medicina que se empenharam na campanha, bem como sôbre os futuros aumentos
– isto é cá conosco. Não toleraremos intervenções neste sentido. A Faculdade
durante 26 anos de existência nunca teve pressão de nenhum governo.
(Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1)
Por outro lado, os estudantes mostravam-se “grandemente satisfeitos com a mediação do dr. Otavio Meira”. Elementos da U.A.P. e do Diretório de Medicina, disseram saber que o Interventor “compreenderia a sua situação e os motivos justos por
que enfrentaram todos os riscos, expondo-se a um largo movimento de classe”.
Depois de longos debates, os estudantes decidiram que iriam matricular-se. Entretanto, decidiram também que, caso seus requerimentos fossem recusados, “deverão
os acadêmicos dirigirem-se ao Cartório do Registro de Documentos [...], onde
o registrarão, colocando depois o dinheiro respectivo da matrícula no Banco do
Brasil”. Outra decisão tomada foi a de que nada “impedirá de irem á greve se for
tentada qualquer medida punitiva pela Direção da Faculdade contra elementos da
Presidência do seu Diretório. (Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Para discutir a decisão do Interventor, particularmente os itens 3º e 4º, a Congregação reuniu-se no dia 1º de março. Numa sessão definida como “violenta” por
15 votos a dois (Profs. Dias Jr. e Acylino de Leão) seria refutada a proposta do
interventor pelo não acatamento do item 3º.7 Deste modo, o inquérito mandado
instaurar pelo C.T.A. para apurar as declarações dos estudantes Pedro Pedroso e
Jean Bitar, consideradas “injuriosas à tradição da Faculdade” prosseguiria8.
Estava declarada a guerra. Mesmo com a mediação do interventor federal, o clima era
tenso em Santa Luzia. Com os alunos em greve a Faculdade não poderia funcionar.
O assunto voltou à discussão na Congregação em 9 de março. Após “violentos
debates”, “em escrutínio aberto”, com um resultado apertado (9 votos a 8), saiu
vencedora a proposta do interventor Octavio Meira pela não punição dos acadêmicos9. Votaram a favor os professores: Acilino de Leão, Arnobio Franco, Prisco
dos Santos, Porto de Oliveira, Aben-Athar, Dias Junior, Pena de Carvalho, Luiz
Araújo e Hermógenes Pinheiro; votaram contra: Lauro Magalhães, Henrique Esteves, Gastão Vieira, Oscar Miranda, Rodrigues de Souza, Cruz Moreira, Pinheiro
Sozinho e Rui Romariz (Folha do Norte, 10.03.1946, p. 1).
Vale ressaltar que na reunião do C.T.A., de 28 de março de 1946, o Dr. Edgar Porto,
inspetor federal junto à Faculdade, manifesta-se dizendo que a Faculdade para promover alguma alteração nos valores das taxas escolares tinha que “dirigir-se ao sr.
Ministro da Educação, expondo os motivos”, e que o ministro, “depois de devidamente informado”, remeteria ao diretor do ensino superior” (CTA, 1946, p. 178-182).
Em meio a toda a celeuma gerada pela questão do aumento dos valores das taxas,
Folha do Norte reproduziria em sua edição de 7 de maio de 1946 trecho do discurso do
paraninfo à turma de professoras normalistas. Nele, o advogado e professor Aldebaro
Klautau, dizia que o ensino secundário já fora gratuito em virtude de uma lei de autoria dele; que o golpe de Estado de 10 de novembro de 1937 impediu que se transformasse em lei outro projeto de sua autoria instituindo a gratuidade no ensino superior;
que essas medidas legislativas tinham tido o apoio do atual interventor, na época deputado estadual; que o Pará, antes mesmo de a gratuidade absoluta e plena da educação transformar-se em preceito constitucional no Brasil, deveria proclamá-la em sua
legislação ordinária, decretando imediatamente a sua obrigatoriedade. E apresentava
o seu projeto de decreto-lei, onde após vários considerandos sobre a responsabilidade
do Poder Público para com a educação; sobre o custo de vida não dever influenciar os
valores das taxas cobradas; sobre os valores cobrados representarem pouco na receita
do Estado e muito na economia das classes pobres; sobre o regime de vagas gratuitas
não resolver o problema, causando inclusive humilhação pela seleção; sobre a educação e a cultura influenciam na vitalidade econômica de um povo; decretava:
Artigo. 1º - Fica instituída no Pará a gratuidade absoluta da educação
em todos os estabelecimentos de ensino de qualquer grau, criados ou por
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criar, mantidos pelo Estado e, consequentemente, extintos todos os emolumentos e taxas que vinham sendo cobradas dos estudantes nos educandários
de ensino normal, secundário e superior e no Instituto Carlos Gomes.
Artigo 2º - Este decreto-lei entrará em vigor na data de sua publicação,
revogadas as disposições em contrário.
O Secretário Geral do Estado assim o faça executar.
Palácio do Governo do Estado do Pará, abril de 1946
(Folha do Norte, 07.05.1946, p.1)
Outro fator “complicante” para as pretensões da Faculdade em aumentar o valor das
taxas era a cobrança da taxa para transferência de alunos para outras escolas. Em
reunião do C.T.A., de 4 de junho de 1946, foi lido ofício do inspetor federal dando
conta das determinações emanadas pela Diretoria do Ensino Superior, as quais diziam que, “com exceção da taxa de transferência, as demais deveriam ser fixadas pela
própria Faculdade” e que a taxa de transferência (Cr$ 1.900,00) havia sido considerada ilegal, devendo ser restituída aos alunos transferidos (CTA, 1946, p. 186-191)10.
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Embora os dirigentes da Faculdade não concordassem com a decisão da Diretoria de
Ensino Superior, teriam que obedecer às ordens, uma vez que a finalidade da reunião
do C.T.A. de 22 de agosto de 1946 foi exclusivamente para que tomassem conhecimento das novas determinações da citada Diretoria, que advertia que “funestas consequencias advirão para esta Faculdade, caso não fosse imediatamente reconsiderada
a decisão [...] relativa a não devolução das taxas de Cr$ 1.900,00 cobradas aos alunos
transferidos”. Ainda assim, os membros do Conselho resolveram manter a sua decisão, por entenderem não haver infração à lei (C.T.A., 1946, p. 198-200). Infelizmente,
por falta de documentação, não pudemos acompanhar o desfecho deste tópico.
Em 16 de junho de 1946, atendendo o aprovado pelo C.T.A. em reunião de 4 de
junho11, a Faculdade publica em Folha do Norte a nota oficial com os valores propostos para o ano seguinte:
No ano de 1947, conforme resolveu a Congregação de 26 de fevereiro do ano
em curso, vigorarão as seguintes taxas, pagas em quatro (4) prestações:
1ª de 10 a 25 de fevereiro ........... Cr$ 650,00
2ª de 1 a 10 de maio ..................... Cr$ 650,00
3ª de 1 a 10 de agosto .................. Cr$ 650,00
4ª de 1 a 10 de novembro .......... Cr$ 650,00
(Folha do Norte, 07.05.1946, p. 2)
O movimento em prol gratuidade do ensino ganharia mais adeptos. Em 25 de
junho de 1946, o médico e jornalista Bianor Penalber publica artigo em Folha do
Norte louvando o interventor do Amazonas, sr. Julio Néri, por seu decreto pela
gratuidade do ensino, “não só no curso primário como no secundário, normal e
superior”. Criticando “certos interventores”, que após a revolução de 1930, “entraram a criar desordenadamente impostos e taxas”, com a instrução pública não
escapando a esta “sede de ostentar artificialmente receitas à custa do sacrifício do
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
povo”, lembrava que o ensino normal e secundário na Velha República “sempre
fôra acessível à juventude pobre”, agora passando a ser “privilégio dos melhores
aquinhoados da fortuna”.
Dizia que devido à situação econômico-financeira, “é impossível a muita gente ir além
do curso primário”, e que em relação ao curso superior, “quase que só podem aspirar
a ser médicos, engenheiros e bacharéis, nesse país, os filhos de papai rico”. Reforçava
a necessidade dos administradores bem assistirem a população, com a instrução sendo “motivo de cuidados, zelo e preocupação constante”, não bastando abrir escolas,
mas, também, “possibilitar acesso aos Ginásios, às Escolas Normais e às Faculdades”.
Finalizava pedindo que os demais governantes imitassem o exemplo do interventor
do Amazonas (GRATUIDADE do Ensino, 25.06.1946, p. 1, 2º cad).
Em julho de 1946 aconteceria o 9º Congresso Nacional de Estudantes, no Rio de
Janeiro. Uma das bandeiras dos estudantes amazonenses, em acordo com os paraenses, era a criação de uma universidade na Amazônia (Folha do Norte, 25.09.1946,
p. 1). A delegação paraense conseguiria o apoio da UNE e veria aprovada sua tese
de emenda constitucional propondo a gratuidade do ensino, bem como a federalização da Faculdade de Medicina, em sessão de 27 de julho de 194612.
Referida proposição teve como relator Jean Chicre Bitar, na qualidade de presidente do Diretório Acadêmico de Medicina. Por sua importância história na trajetória
da Faculdade, transcreve-mo-la na íntegra:
Federalização da Faculdade de Medicina do Pará
Necessidade Vital do Vale Amazônico
A representação paraense e o Diretório Acadêmico de Medicina do Pará,
em particular, solicitam a atenção deste nobre Congresso para a exposição abaixo a que se relacione a um dos problemas máximos dos setores
educacional, sanitário e econômico da Amazônia.
A ninguém deixa dúvida ser o Serviço de Saneamento o passo primeiro
e decisivo para a realização da monumental obra de recuperação e aproveitamento do Vale Amazônico. A questão é de atualidade e mereceu a
consideração e o carinho de todos os que compreenderam o seu sentido
econômico-social no processo do Brasil. Evidentemente verbas de vulto
têm sido investidas e o Serviço Especial de Saúde Pública, objeto de um
acordo entre nosso Governo e o dos Estados Unidos não têm outra finalidade. Ainda agora acaba de ser proposto no Congresso Nacional serem
aplicados cinco por cento da receita da União no trabalho de soerguimento da Amazônia. Este, porém, é apenas uma das faces na apreciação
dos fatores. Quem quer que fale em saúde pública na Amazônia, inegavelmente reconhecerá a base sólida que representa a Faculdade de Medicina
e Cirurgia do Pará.
Servindo a meio-Brasil, pois é a única existente de Pernambuco ao Acre,
concentra o ensino médico de cinco Estados e quatro Territórios, no total de 4.345.302 Km2 e 5.500.000 habitantes, sustém-se das subvenções
A Federalização
457
dos governos federal, estadual e municipal, ao lado das elevadíssimas taxas
cobradas aos estudantes, na sua grande maioria desprovidos de recursos
financeiros e muitos ainda com obrigação de família. Isso pode-se constatar examinando as fichas de concorrência e vagas gratuitas mantidas pelo
Governo do Estado e distribuídas a critério do Diretório. Além do mais, de
ano a ano, as taxas vêm sendo majoradas, do que resulta um número reduzido de matrículas, para grande prejuízo do Serviço Sanitário da Região.
Até o corrente ano, em nossa Escola, está em vigor a seguinte tabela de
preços:
Taxa de matrícula .................................Cr$ 200,00
Mensalidades (9 meses a Cr$ 150,00).....1.350,00
Taxas de frequencia.......................................150,00
Taxa de laboratório..........................................50,00
Taxa de biblioteca............................................50,00
458
Por uma guia de transferência cobra a Faculdade de Medicina a quantia
de dois mil cruzeiros, evidentemente ilegal, uma vez que a taxa autorizada pelo Ministério é de, apenas, cem cruzeiros. Para agravar e como
pelos precedentes não constituiu surpresa, já foi anunciado aumento para
1947, quando o aluno terá de pagar bimensalmente seiscentos e cincoenta cruzeiros ou sejam trezentos e vinte e cinco mensais, ficando liquidada
a taxa de promoção antes que se realize a prova parcial final, isto é a
terceira. Disposição visceralmente e arbitrária, porque o seu fundamento sendo incerto, como é o acesso a uma série seguinte, não há porque
antecipar-se o pagamento. O sistema será o seguinte: primeira prestação,
a ser liquidada de 30 a 25 de fevereiro — Cr$ 650,00; segunda — de 1
a 10 de maio — Cr$ 650,00; terceira — 1 a 10 de agosto — Cr$ 650,00;
quarta —1 a 10 de novembro — Cr$ 650,00. No fim do ano letivo, o estudante terá pago Cr$ 2.000,00, soma que, para a grande maioria, dado
o seu nível econômico de subsistente, é realmente exorbitante. Isso para
o estudante paraense. O que dizer dos colegas dos Estados vizinhos, que,
além de taxas, têm ainda de encarar a agravação do seu padrão de vida
longe da família e das facilidades de seu centro natal. Fossem as cifras
mais modestas e teríamos provavelmente um grande incremento de matrículas, no curso médico. Não faltam as vocações médicas. A barreira
está no custo da carreira. Conforme prevê o art. 5°, § 2° do Regimento
Interno da Faculdade de Medicina, o número de vagas, em cada série, é
fixado em cem (100). O de matrículas realizadas efetivamente fornece a
média de 25,5 por série — quer dizer mais ou menos um quarto da previsão regimental. (Relatório de 1945, da Diretoria).
A Faculdade diploma anualmente, a média de 20 alunos, de procedência
diversa. Desses cerca de trinta por cento são de outros Estados e voltam
à sua origem. Ora, o Pará, por exemplo, só na capital com seus duzentos
e cincoenta mil habitantes, absorve completamente o coeficiente de médicos que lhe cabe em cada turma (14 ou 15), sem que, nessa fração, tenha
preenchido o mínimo de suas necessidades. O Estado, nessas condições,
encontra os maiores óbices para ajustar o seu quadro sanitário. Cincoenta municípios vivem em uma alarmante indigência médica, dada a insuficiência de elementos. Ê quase dispensável focalizar os prejuízos de toda
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
natureza advindos dessa lacuna. Em uma região onde a assistência social
é esteio de sua prosperidade, a oscilação econômica é vertiginosa, sem
o desvelo diuturno e permanente pela saúde do material humano. Não
cansa repetir que as fontes explicativas dessa pobreza — é a formação
demasiadamente dispendiosa de um médico. A Faculdade de Medicina
do Pará, sugestivamente, com 26 anos de existência, serviu a região apenas com 318 médicos. Número irrisório, se atentarmos ser em grosso
o de diplomados anualmente pela Universidade do Brasil, neste campo.
Gradativamente e de maneira assustadora, ser médico no Pará torna-se
prerrogativa de minoria restrita de abastados.
“Estuda medicina quem póde”. O Secretário da Faculdade de Medicina revela que já se perdeu de vista a finalidade coletiva da instituição,
esquecendo-se de que êle têm um alto significado humanitário e sagrado,
verdadeiro patrimônio da comunhão pela utilidade e fins a preencher. Em
entrevista concedida à “Folha Vespertina”, de 27 de fevereiro do corrente
ano (recorte anexo), aquele senhor presta as seguintes declarações: “Estuda Medicina quem pode”. “Não se vive só da Medicina. O Brasil precisa
de quem cultive os campos”. Referindo-se à mocidade: “Todos sabem que
o porco prefere sempre o chiqueiro”, etc, Essa é a maneira de pensar
daqueles que se julgam proprietários de um instituto de ensino superior,
que surgiu da bôa vontade de um grupo de médicos bem intencionados,
já falecidos na sua maioria. Fundada cm 1919, funcionou até 1924 em
uma dependência do então Ginásio, hoje “Colégio Estadual Pais de Carvalho”. Daí passou ao atual edifício da Praça Camilo Salgado, outrora de
“Santa Luzia”, adquirido com o produto de subscrição popular, lançada
pelo saudoso mestre Camilo Salgado, uma das figuras de tradição mais
simpático no seio da Escola pela sua humanidade e seu altruísmo profundo. Nascido sob esse signo generoso de amparo à carreira do estudante
paraense que não poderia, por seus recursos parcos, freqüentar as Faculdades do Sul, ainda contando em seu ativo o beneficiamento da região
com o provimento de um corpo clínico, a Escola vê-se hoje desnaturada
nesses dois objetivos, mau grado a abnegação de alguns.
Desde os primeiros dias de sua vida, subsiste da contribuição dos alunos,
que, em 1945, atingiu Cr$ 318.200,00, de auxílio federal de Cr$ 80.000,00;
estadual de Cr$ 40.000,00 e municipal de Cr$ 20.000,00. Na inversão dessa
verba, na qual se encontram obras de natureza suntuária, como o majestoso salão Diretoria, ressente-se ainda a necessidade de laboratórios bem
equiparados capazes de proporcionar aos discentes conhecimentos práticos fundamentais.
Não há hesitação em se julgar da eficiência dos médicos diplomados pela
Faculdade de Medicina do Pará, mas, releva frisar, que isto se deve à bôa
vontade dos estudantes, ao par da dedicação dos professores, muito mal remunerados na base de setecentos cruzeiros mensais. Daí a se concluir por
uma restruturação inelutável da nossa Faculdade, tornando-a acessível a
um maior número de candidatos, o que não se obterá nas condições atuais.
O Diretório Acadêmico de Medicina do Pará, encarando com real interesse a situação delicada de estudantes não apoiados em base financeira
estável, tem dispensado somas relativamente consideráveis no pagamento de taxas inadiáveis na sua liquidação. Apesar disso, contamos ainda
A Federalização
459
460
com estudantes que interrompem o seu curso por falta de numerário
suficiente, com grande prejuízo para a região. É indiscutível que o problema amazônico é um problema médico.
Assim:
Considerando que a Faculdade de Medicina do Pará é de interesse público, mesmo porque não existe outro estabelecimento congênere na vasta
extensão territorial que vem beneficiando;
Considerando que é dever dos Poderes Públicos facilitar a instrução das
massas com as medidas adequadas que a previdência do Estado ditar;
Considerando que nas bases atuais o elevado preço do ensino médico no
Pará veda terminantemente o ingresso de grande número de candidatos;
Considerando o papel obrigatório que à Faculdade de Medicina do Pará
cabe desempenhar no serviço de recuperação do Vale Amazônico, com a
formação de turmas crescentes de médicos;
Considerando que, no seio da Assembléia Constituinte Nacional, já se
cogitou em dados concretos de inserir o auxílio à região amazônica como
uma das atribuições constitucionais da União;
Considerando ser de inteira justiça remunerar condignamente o corpo
docente da Escola;
Considerando não vir a medida que no final desta se pleiteia ferir interesses invertidos na Escola, pois que, nascida de subscrição popular,
mantida pelos estudantes e subvenções governamentais, pertence antes à
coletividade que lhe deu existência;
Considerando ser imprescindível substituir a iniciativa privada pela iniciativa pública, mais poderosa e eficiente;
A Delegação Paraense e o Diretório Acadêmico de Medicina apresentam
ao IX Congresso Nacional de Estudantes a presente sugestão para que
seja encaminhada aos Poderes Competentes e resumida na decretação da
federalização da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, única medida
capaz de solucionar o ensino médico no Pará e mais um gráu conquistado
para a criação da Universidade do Norte.
(Revista do Academico de Medicina, Belém, v. 6, 1946, p. 29-31).
Enquanto se desenrolava o Congresso Nacional dos Estudantes, em julho do mesmo
ano, o ministro da Educação e Saúde, professor Ernesto de Souza Campos, médico e
professor da Faculdade de Medicina da USP, onde chegou a Diretor, esteve em Belém
visitando a Faculdade de Medicina, a convite do deputado Epílogo de Campos.
Depois de percorrer as instalações da Escola, reuniu-se com a Direção e representantes dos corpos docente e discente da mesma, além de representantes do Governo estadual e prefeitura. Na sala da congregação, após a saudação inicial pelo Diretor, Dr. Acylino de Leão, foi saudado pelo doutorando Ramiro Khoury, que “num
discurso equilibrado, em nome dos discentes, expôs ao sr. ministro as necessidades
e os anseios dos estudantes paraenses” (Folha Vespertina, 31.07.1946, p. 4).
Em sua manifestação, o ministro discorreu sobre os problemas fundamentais do
Brasil, sobretudo a tuberculose e a malária, que como os demais problemas de saúMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
de precisavam ser cuidados, juntamente com as condições de ensino, sendo grande
a responsabilidade das escolas médicas.
Após fazer um apanhado da evolução do ensino médico no Brasil, desde a fundação da
primeira escola, na Bahia, em 1808, chegou à Faculdade de Medicina que ora visitava:
O aparelhamento da Faculdade de Medicina do Pará já é considerável,
mas é necessário envidar esforços para que o aluno possa participar do
ensino prático. Devem apelar para que haja um auxílio do govêrno federal, ou do estadual, ou do municipal, destinado à aquisição de material,
pois este é o meio do aluno adquirir conhecimentos que o habilitem a
proteger as populações (Folha Vespertina, 31.07.1946, p. 4).
A proposição dos estudantes paraenses teve grande repercussão, sendo distribuídas várias cópias aos representantes do Pará, na Constituinte (BARRETO, 1950, p. 3). Posteriormente seria encampada pelo Deputado Federal Deodoro de Mendonça, que em 23
de outubro de 1946 apresentaria em plenário seu projeto de federalização da Faculdade
de Medicina e Cirurgia do Pará (Revista do Academico de Medicina, n. 6, 1946).
Em sua justificativa, o parlamentar paraense dizia que a federalização era uma “velha aspiração não somente da classe acadêmica interessada diretamente, como do
povo”, e que embora a Escola tivesse assinalado “notável progresso”, necessitava
“melhor e maior aparelhamento técnico nas instalações” e “um corpo docente devidamente remunerado”, a fim de que pudesse “consagrar toda sua capacidade do
ensino médico teórico e prático”. Afirmava que o governo federal tomando a si a
Faculdade de Medicina, “realizará obra meritória e de maior alcance nacional”.
Depois de tecer comentários sobre a situação sanitária da Amazônia, com altos índices de
mortalidade, várias endemias, surtos epidêmicos devastadores, especialmente de malária,
grande número de vitimados por verminoses, lepra e tuberculose, afirmava que “30% de
nossa população vive retida nos leitos de doença, sem poder trabalhar, inerte, ou a caminho
da morte”, e que “o plano de recuperação econômica da Amazônia [...] deve ser antes de
tudo um plano sanitário”, pois “somente a saúde resolve o caso da civilização amazônica”.
Mencionava o encaminhamento ao Presidente da República, através do Ministro da
Educação, com exposição favorável deste, do relatório em que o Diretório da Faculdade
solicitava a federalização desta, o que não pôde ser deferido, depois de 18 de setembro,
“por lhe faltarem as atribuições que a Constituição fez reverter ao Poder Legislativo”.
Dizia que:
A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará é a (peça) primordial do
aparelhamento de recuperação da Amazônia e é providencial que ela se
encontre no ponto avançado de suas brilhantes conquistas, reclamando
apenas recursos para ampliar o vasto programa que as necessidades humanas do setentrião brasileiro estão a exigir.
A Federalização
461
Traça um histórico da Faculdade que, iniciada em 1919, criada num momento de
“depressão econômica dos produtos nativos da floresta nortista”, com a Amazônia
“entregue aos seus próprios elementos para sobreviver”, sendo este o imperativo
que levara os grandes vultos do Pará a fundarem os cursos superiores de direito,
medicina, [...], “uma vez que o Governo estadual, sem recursos financeiros, “não
podia tomar a iniciativa pública que lhe competia”; que embora a Escola tivesse iniciado “improvisando professores com vencimentos nulos, usando prédios rústicos,
vivendo de taxas precárias e auxílios insuficientes”, era “um dos mais acreditados
institutos superiores do país, e seus diplomados por toda parte exibem um alto
padrão científico”.
Afirmando que o Pará possuía todos os cursos superiores exigidos para a fundação
da sua universidade, dizia que seu projeto era “uma parte da necessária federalização de tôdos os cursos superiores da Amazônia”.
462
Relatava que os órgãos técnicos do Ministério da Educação, “mais de uma vez têm
proposto a federalização do crédito da faculdade paraense”; que depois de 1930,
o diretor do Ensino Superior, sugeriu ao governo “a instalação de faculdades de
medicina no sul e no norte do país, de vez que no centro já existiam as duas tradicionais da Baía (sic) e Rio de Janeiro, sem falar das estaduais e particulares”; que federalizada em 1931 a Faculdade de Medicina de Porto Alegre, ficara a do Pará “relegada ao esquecimento e até hoje insuficiente para a alta finalidade do seu curso”.
Falava das dificuldades financeiras para a manutenção da Escola; que os governos
federal e estadual “nunca deram o que deviam dar a faculdade”, tendo sido cortado
em 1929 um “modesto auxilio de 20 contos que Lauro Sodré propuzera no Senado”.
Faz um balanço das finanças da Faculdade citando que o ativo incluía laboratórios,
imóveis, aparelhos e instrumentos técnicos, e que a transferência para a União
levaria este ativo, que embora não sendo vultuoso para a obra a que está servindo,
“vale alguma coisa no acêrvo federal”.
Tão logo o deputado apresentou seu projeto, comunicou o fato ao Diretório Acadêmico de Medicina através do seguinte telegrama
Jean Bitar – Presidente do Diretório Acadêmico de Medicina – Belém- Pará
Prazer comunicar apresentei tribuna Câmara transferência Faculdade
Medicina para Ensino Superior União abrindo crédito valor 3817 mil
cruzeiros pt Congratulações nobre classe breve concretização sua brilhante luta cultural pt Abraços – Deodoro de Mendonça.
(Revista do Academico de Medicina, n. 6, 1946, p. 35)13
A apresentação do “projeto Deodoro” ensejou manifestações de apoio importantes.
Em seu discurso, por ocasião de inauguração do novo pavilhão da Faculdade assim
se manifestou o Diretor, Dr. Lauro de Magalhães:
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Até o ano de 1947, todos os auxílios obtidos dos governos Federal, Estadual e Municipal foram integralmente utilizados na realização deste
severo e rígido programa, e só em 1948, com o aumento do auxílio Federal, com a verba da Valorização Amazônica, por imposição taxativa da
lei de aplicação de verbas e auxílios, começamos a utilizar metade, para
beneficiar professores e funcionários, e o resto em construções, melhoramentos e conservações, necessários e imprescindíveis para a realização
do grande sonho e encerramento da nobre missão de seus fundadores;
credenciar a Faculdade para alcançar o prêmio almejado e merecido: a
Federalização (FMCP, 1950b, p. 44).
Os professores catedráticos da Faculdade encaminharam ao presidente da República, ministro da Educação, presidente da Câmara dos Deputados, presidente da
Comissão de Finanças e ao presidente da Comissão de Educação e Cultura, o seguinte telegrama:
Apelamos sentimentos patrióticos Vossência apoiando projéto deputado Deodoro de Mendonça que federaliza Faculdade Medicina Pará,
com quase trinta anos existência vem prestando inestimáveis serviços
Amazônia. Professores catedráticos: Acilino Leão, Orlando Lima, Gastão Vieira, Apio Medrado, Prisco dos Santos, Jaime Aben-Athar, Arthur
França, Mário Chermont, Porto Oliveira, Pena Carvalho, Lauro Magalhães, Dagoberto Souza, Luiz Araújo, Dias Junior, Oscar Miranda, Arnóbio Franco, Rodrigues Souza e Celso Malcher (Revista do Academico de
Medicina, n. 6, 1946, p. 32).14
Também expressaria sua opinião o Dr. Orlando Lima, professor da Faculdade e, de
certa forma, parte interessada na questão. Em 12 de novembro de 1946, através de
Folha do Norte, o professor manifesta-se favoravelmente ao projeto dizendo dos “novos e promissores horizontes (que) acabam de rasgar-se com a notícia”, que vinha
de encontro às necessidades científicas, pelo que não acreditava que alguém pudesse
“regatear aplausos ao ato do operoso e ilustre representante paraense”. Com ênfase
afirmava ainda que: “Não há, não pode haver, não é possível admitir a existência de
ente algum, professor, aluno, funcionário, ou mesmo leigo de mediana cultura, que
desconheça o alcance formidável dessa medida, sobre todas, benemérita.”
Lembra da rápida federalização da Faculdade de Direito do Recife e da Escola Politécnica da Bahia, ocorridas em janeiro daquele ano, por conta do que o Diretório
Acadêmico da nossa Faculdade enviara documento ao Governo e a vários de seus
órgãos, solicitado medida semelhante para a Faculdade de Medicina e Cirurgia do
Pará, capaz de uma vez por todas “de pôr termo às constantes dissidências entre os
estudantes e a administração, filiadas, quase todas, a questões de dinheiro”.
Fala das vantagens da federalização, onde a contribuição do aluno reduzir-se-ia a
uma insignificância, “enquanto que o professor, gozando de todas as regalias dos
funcionários federais, passará a receber um salário digno de sua função”. Diz das
A Federalização
463
melhorias que deveriam acontecer nos laboratórios, que seriam dotados “de todos
os requisitos necessários às indagações científicas, dando gosto ao trabalho”; que
nos concursos, não se apresentariam candidato único, “porque de outros Estados
virão outras competências”; que não mais se veria “professores a lecionar disciplinas diferentes das de sua secção”.
Informa que o apelo dos estudantes paraenses, após ter encontrado “eco na alma de
Deodoro de Mendonça”, já dava seus primeiros passos junto ao Presidente Dutra, “que
imediatamente assentiu na adoção de tão importante medida”; que se não fora a viagem do ministro Souza Campos ao exterior, “nossa Faculdade já estaria federalizada”.
Faz um apanhado da trajetória da Faculdade, que
lutando pela vida há quase trinta anos, serena a galgar obstáculos sem
conta, colocando a sua despesa em quadro cuja moldura tem o nome de
receita, sem nada a dever a ninguém, a Faculdade de Medicina do Pará,
embora a passos de cágado, vem sempre progredindo. Tendo visto a luz
do dia em sala de empréstimo nos baixos do Ginásio, ela pôde, amparada
pelo carinho de seus dirigentes, pela abnegação de seus professores, assim como pelos favores do govêrno, chegar ao ponto em que se encontra
e apresentar a Nação um patrimônio de quatro milhões de cruzeiros.
464
Reforçando o aspecto econômico afirma que um “‘boy’ de qualquer banco recebia atualmente 800 cruzeiros mensais”, enquanto que os professores da Faculdade
“percebem 680 cruzeiros por mês”.
Finalizando o artigo, o prof. Orlando Lima dizia da sua desconfiança no “vultoso
do donativo”, habituado que estava a ver “a nossa terra menosprezada pela mãe
grande”, o que não lhe impedia de mandar ao autor do projeto os seus mais sinceros “prolfaças, e de parelha, os votos que faço a Deus para que o benemérito projeto
breve se concretize na realidade” (Folha do Norte, 12.11.1946, p. 4).
Orlando Lima voltaria ao assunto pelo mesmo jornal em de 19 de novembro. Com
o mesmo título do artigo anterior – O Projeto Deodoro – e num aparente propósito de sensibilizar seus pares de docência, fala do “formidável alcance do projeto
recentemente apresentado à Câmara” e diz que a federalização da Faculdade
será o ponto máximo a que essa casa de ensino superior poderá ascender na
escala das benemerências, de parabéns devendo estar, por sem dúvida, os que
a fundaram, e, a vêm ninando a quase três décadas, com extremo de carinho,
desde o berço, radiantes de poder entregá-la agora, já na idade adulta, louçã,
garrida e próspera, ao único noivo que lhe convêm: - o governo federal.
Ressalva a importância da questão econômico-financeira e suas consequências pela
redução das despesas dos alunos e aumento do salário dos professores, resultando
num “maior estimulo, maior incentivo aos seus trabalhos e lições”.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Acrescenta a importância da cátedra, que “será sempre a aspiração precípua de
todo médico que não seja rotineiro, displicente ou desiludido” e se pergunta o que
poderia animar alguém a conquistá-la “quando ele sabe que o seu salário não irá
além de setecentos cruzeiros mensais?”, sem direito a aposentadoria, tendo que
trabalhar “até morrer”.
Dizia que com a federalização, o professor teria, com a compulsória, “o prêmio da
sua dedicação, do seu labôr, exercido na minoração do sofrimento humano”. E apelava para que todos congregassem suas energias, “agindo junto aos grandes” para
que o projeto “não fique para sempre sepulto no interior de uma gaveta, ou não
esbarre diante da muralha da falta de dinheiro que eternamente se levanta diante
das pretensões nortistas” (Folha do Norte, 19.11.1946, p. 8).
Como ocorre na maioria dos casos, o projeto Deodoro teve uma lenta tramitação
na Câmara. Somente em julho de 1948 seria transformado em projeto de lei (BRASIL, 1948), seguindo ao sabor das águas políticas até seu desfecho, após rápida
tramitação no senado, onde contou com o apoio dos senadores pelo Pará: Augusto
Meira, que foi o relator; Magalhães Barata, que pediria a dispensa dos interstícios
para acelerar o andamento do projeto; e Álvaro Adolfo, “incansável em sua faina de
levá-lo (o projeto) a bom termo” (BARRETO, 1950, p. 3).
Entretanto, a trajetória do projeto não pode ser considerada tranqüila. Em 22 de
novembro de 1949, Folha do Norte informava que a federalização estava ameaçada
de veto pelo presidente da República. Mencionando a recente federalização da Faculdade de Direito do Amazonas, dizia que o presidente tinha intenção de vetar este
projeto, só não o fazendo em homenagem ao governador do Amazonas, Leopoldo
Neves, que havia chegado à capital federal. E que na mesma hora em que assinara
a mencionada federalização, “assinava o ato aprovando o novo plano do Ministério
da Educação, referente ao ensino superior”, o qual estabelecia várias exigências
para a federalização das faculdades, ficando assim, a federalização da Faculdade de
Medicina do Pará, ameaçada de veto (Folha do Norte, 22.11.1949, p. 4).
Em 16 de dezembro de 1949, Folha do Norte noticiava algo mais concreto sobre as
pretensões paraenses: informava que o projeto, após ter sido aprovado no senado,
dependia apenas da sansão presidencial.
Vale registrar que, embora de maneira discreta, a Direção da Faculdade também tentava dar sua ajuda. Em relatório contendo “um breve histórico da fundação da Faculdade” encaminhado ao Diretor do Serviço da Educação e Saúde, o Diretor da escola,
Dr. Lauro de Magalhães, concluiria sua detalhada explanação da seguinte maneira:
Todos estes grandes melhoramentos que elevam o seu patrimonio ao
valor de cerca de dez milhões de cruzeiros, a moralidade e eficiencia de
ensino aqui ministrado, concorreram para a apresentação de um projeto
A Federalização
465
que se acha na Camara Federal, pleiteando sua federalisação e que teve o
parecer favorável das comissões de Educação e Finanças. 15
Da mesma forma se pode depreender o interesse da direção da escola pela federalização através de outro ofício do Diretor encaminhado em 29 de dezembro de
1949 ao “Diretor”, sem identificação, mas presumivelmente ao mesmo Diretor do
Serviço de Educação e Saúde, relacionado à criação da cadeira de Tisiologia. Em
determinado ponto, o Dr. Lauro Magalhães dizia:
466
[...]resposta, recorro à sinceridade e boa vontade do meu prezado Diretor e amigo para esclarecer-me sobre o assunto, principalmente na
parte financeira, sem dúvida a mais importante, visto que a didática e a
administrativa já conhecemos. Aproveito a oportunidade que o amável
amigo me ofereceu, para pedir informações reais e definitivas sobre a
federalização da nossa faculdade, visto até o presente momento estar o
assunto como no ar, duvidoso, obscuro e nebuloso. A única comunicação
oficial que recebi foi do Exmº Sr. Ministro, por telegrama, informando
que por seu próprio alvitre o Exº Sr. Presidente da República enviara
uma mensagem ao Congresso pedindo a oficialização de algumas Faculdades, inclusive a nossa. Extra-oficialmente sei que o projeto primitivo
de federalização foi aprovado nas duas Câmaras e acha-se presentemente
me mãos do Exmº Sr. Presidente, dependendo da sanção de S. Excia. Telegrafei ao Exmº Sr. Ministro agradecendo o comunicado e solicitando
informações da situação deste projeto perante a mensagem do Exmº Sr.
Presidente e como até hoje não recebesse (FMCP, 1948b).
Finalmente, o projeto Deodoro, com poucas modificações, seria sancionado pelo
presidente da República e transformado na lei nº 1049, de 03 de Janeiro de 1950,
publicada no Diário Oficial da União em 23 de janeiro de 1950, Seção 1, p. 1122, e
cujo teor é o seguinte:
Lei nº 1.049, de 3 de janeiro de 1950
Federaliza a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA:
Faço saber que o CONGRESSO NACIONAL decreta e eu sanciono a
seguinte Lei:
Art. 1º - A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará é transformada
em estabelecimento federal de ensino superior, incorporados todos seus
direitos, bens móveis e imóveis ao Patrimônio Nacional.
Art. 2º - Para execução do disposto no artigo 1º, a administração federal adotará, desde logo, as seguintes providências:
a) - pelo Ministério da Fazenda Serviço do Domínio da União o arrolamento e arrecadação de todos os bens imóveis;
b) - pelo Ministério da Educação e Saúde, Diretoria do Ensino Superior, além dos direitos patrimoniais respectivos o arrolamento de todos
os bens móveis.
Art. 3º - Os cursos incorporados, que passarão a subordinar-se ao
Ministério da Educação e Saúde, Diretoria do Ensino Superior, obedecerão ao regulamento dos congêneres federais, aprovado pelo Decreto
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
nº 20.865, de 20 de dezembro de 1931, até expedição de regulamentos
próprios, dentro de noventa (90) dias, por decreto do Poder Executivo.
Art. 4º - Aos atuais professores catedráticos e aos funcionários administrativos serão expedidos decretos de nomeação, assegurados, para
todos os efeitos legais, o tempo de serviço e reajustados os vencimentos
às carreiras do serviço público federal.
Parágrafo único. Para êsse reajustamento, são criados, no Quadro
Permanente do Ministério da Educação e Saúde, os seguintes cargos: 31
(trinta e um) professores M; 3 (três) oficiais administrativos J, K e L; 1
(um) arquivista G; 1 (um) bibliotecário J; 3 (três) escriturários E, F e G;
2 (dois) datilógrafos E; 1 (um) almoxarife I; e, no Quadro Extranumerários: 15 (quinze) serventes, referência V, e 31 (trinta e um) assistentes
(um para cada cátedra), referência XVIII.
Art. 5º - O professor catedrático, aposentando em consequência de invalidez, terá direito, como pensão a vencimentos integrais estabelecidos nesta Lei.
Art. 6º - A presente Lei entrará em vigor na data da sua publicação.
Art. 7º - Revogam-se as disposições em contrário.
Rio de Janeiro, 3 de Janeiro de 1950; 129º da Independência e 62º da
República.
Eurico G. Dutra
Clemente Mariani
Guilherme da Silveira
(BRASIL, 1950)
Assim que a notícia chegou a Belém, alguns professores foram procurados para dar
sua opinião sobre o assunto16. Embora satisfeitos pela concretização de um velho
sonho, mostraram-se pouco orientados a respeito do assunto e sem perfeito conhecimento das bases estabelecidas na sanção, desconhecendo mesmo se a reforma
seria feita em toda a extensão, passando o financiamento da Faculdade a ser feito
pelo Ministério da Educação, ou se continuaria, pelo menos durante mais aquele
ano, a funcionar com a dotação da Comissão de Valorização da Amazônia.
Falando sobre a questão salarial dos professores e as taxas pagas pelos alunos, o Dr.
Olimpio da Silveira, secretário da Faculdade, dizia achar difícil a passagem imediata
para o âmbito do ministério, uma vez que o orçamento para 1950 já estava aprovado,
juntamente com a verba correspondente pela Comissão de Valorização da Amazônia.
Sobre as vantagens pela federalização, Olimpio mencionava a melhoria nos salários
dos professores, que passariam de Cr$ 4.500,00 para Cr$ 8.400,00, enquanto que
os alunos passariam a pagar taxas menores, semelhantes às cobradas pelo Rio de
Janeiro, ou seja pouco mais de Cr$ 50,00 por cadeira em cada período letivo.
O Dr. Olimpio também divulgaria o telegrama por ele recebido ainda no dia 3,
enviado pelo senador Álvaro Adolfo e com a seguinte mensagem:
Dr. Olimpio da Silveira – O sr. presidente da República acaba de sancionar a lei que federalizou a Faculdade de Medicina. Congratulo-me com o
prezado amigo, como velho batalhador da vitória alcançada, pedindo esA Federalização
467
tender minhas congratulações aos corpos docente e discente. Quero logo
salientar a atuação do dr. Juranddyr Lodi, diretor do ensino superior, na
defesa dos foros da nossa Faculdade e sua cooperação para apressar a
sanção da lei votada. Abraços. - (a) Álvaro Adolfo
(Folha Vespertina, 04.01.1950, p. 3).
Outros professores também deram suas opiniões. O Dr. Mario Chermont, decano
da Faculdade, disse que a Federalização era o reconhecimento ao esforço de um
punhado da abnegados e um prêmio pelos benefícios que a Escola tinha proporcionado, não apenas para o ensino superior como também pela formação de uma
geração de médicos que tinham sabido elevar o conceito geral e o valor da ciência
médica, destacando-se em exames e concursos pelo país.
O Dr. Arthur França disse que a federalização satisfazia uma justíssima aspiração
dos dedicados lentes da Escola e um prêmio à obra de Camilo Salgado. De início
modesto, chegou ao ponto majestoso de um grande patrimônio.
O Dr. Paulo Azevedo disse que materialmente era vantajoso para os professores e
alunos, mas não saberia dizer se a faculdade continuaria a ter o desenvolvimento
que sempre tivera, lembrando que ela começara em duas salas do Ginásio Paes de
Carvalho e que agora possuía um grande patrimônio.
468
Satisfeito com o ato presidencial, o Dr. Luiz Araújo, desejava que a merecida federalização não determinasse a estagnação da vitoriosa trajetória da Escola e nem
tampouco o último passo do seu progresso.
Para o Dr. Cruz Moreira esta era mais uma etapa vencida no seio cultural paraense; uma vitória a que fazia jus a ciência médica do Pará, pois ninguém poderia
negar os benefícios trazidos à coletividade pela Faculdade, onde uma coorte de
professores abnegados contribuiu para a formação de profissionais competentes, já
se espalhando por todos os cantos do Brasil.
Um dos fundadores da Escola, o Dr. Arnóbio Franco, recebeu a notícia como um
grande ato que o presidente poderia conceber para uma boa gestão presidencial.
Lembrou os nomes de Renato Franco, Evaristo Silva, Magno e Silva e outros,
como participantes da cruzada inicial havia 30 anos. Disse que materialmente a
redução das taxas dos alunos era medida sensata e justíssima, permitindo a maior
difusão dos ensinamentos de Hipócrates.
Para o Dr. Prisco dos Santos, a federalização representava um ato de estrita justiça,
pois a Faculdade pelo seu passado fazia jus a esse prêmio. Ele que era professor
desde a fundação e acompanhara todas as fases de sua evolução, recebia a notícia
com grande emoção e alegria.
Igualmente satisfeito manifestou-se o Dr. Jaime Aben-Athar, exaltando o significado da medida.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Para o Dr. Oscar Miranda a federalização era um ato de justiça do presidente Dutra; um prêmio de honra a seus médicos fundadores e o reconhecimento do progresso em que sempre caminhou. Disse que este passo agigantado assinalava o
advento da Universidade do extremo norte do Brasil.
Os estudantes, do mesmo modo, foram ouvidos acerca da federalização. A Folha
Vespertina, de 6 de janeiro de 1950, publicou a opinião de vários alunos. O então
presidente do D.A.M., Almiro Monte assim se expressou:
...depois de 4 anos de árdua campanha, [...], eis concretizado o maior dos
sonhos de nossa classe. Neste momento, [...], maior ainda é o nosso júbilo, por vermos materializada a luminosa ideia de um ex-colega, o então
acadêmico e hoje dr. Jean Bitar, autor da tese: Federalização da Faculdade
de Medicina do Pará, necessidade vital do vale amazônico e que hoje se
constitui uma realidade.
[...]
...movimento pro-federalização de nossa faculdade foi, desde os seus albores,
promovido e ardorosamente defendido pelos estudantes. Atendendo as suas
instancias, foi que o dr. Deodoro, a 23 de outubro de 1946, apresentou á Câmara Federal o ante-projeto de sua notável lei; dali por diante, os Diretórios Acadêmicos que sucederam ao de Jean Bitar, continuaram sua louvável iniciativa;
em nossos arquivos possuímos dezenas de exemplares de correspondência especializada do assunto, trocada com as mais eminentes figuras do mundo nacional. Quatro anos se passaram, e cada presidente, recém-eleito recebia a seu
tempo, a tremenda incumbência de “descascar” o “abacaxi” da Federalização...
[...]
...a vitória e hoje não pertence apenas aos nossos dignos mestres; todos sabemos do seu labor e devotamento [...]; ela também nos pertence e muito,
a todos nós que, durante quatro anos, vimos labutando incansavelmente
[...]; pertence igualmente aos colegas que nos precederam e, conosco lutaram, lado a lado, ano após ano, para concretizar nosso sonho...
[...]
O acadêmico Amyntor Cavalcante disse que este era o “grande sonho da mocidade
estudiosa da nossa terra”, e que os benefícios seriam “grandes e inestimáveis, pois
atingem alunos, corpo docente e corpo administrativo”.
Nagib Matni disse desejar que a federalização “faça com que o professor respeite o
aluno, concorrendo assim para um ambiente de reciprocidade útil”.
Everaldo Martins, secretário do DAM, disse que todos os alunos estavam satisfeitos e ansiosos por usufruir os efeitos de seus esforços, lembrando que a ideia partiu
de um estudante e foi o objetivo principal de todos os Diretórios. Esperava que a
contribuição dos alunos não fosse posta de lado, uma vez que “tantos querem chamar para si os louros da vitória”.
Para Durvalino Braga, a federalização, “pelo objetivo social que visa, assinalará
mais um gigantesco passo da juventude de nossa terra”, deixando a medicina de
A Federalização
469
ser “atração dos privilegiados da fortuna, como tão prepotentemente se tem apregoado” e os pobres deixarão de ouvir “o tilintar excitante das moedas” (Folha Vespertina, 05.01.1950, p. 1).
Tão logo foi sancionado o projeto de federalização seu autor cuidou de informar
aos amigos e correligionários. Assim, A Folha Vespertina, 6 de janeiro de 1950,
reproduz um telegrama enviado pelo Deputado Deodoro de Mendonça ao prof.
Paulo Maranhão e a seu filho, João Maranhão, diretores do referido jornal nos
seguintes termos:
Rogo aos prezados compadres serem intermediários das minhas vivas
congratulações com a mocidade paraense, à ilustrada classe médica e ao
nosso generoso povo pela sanção do Presidente da República do projeto de minha autoria que federaliza a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, digna de figurar entre os mais creditados centros da cultura brasileira. Cordialmente, Deodoro de Mendonça. (Folha Vespertina,
06.01.1950, p. 1).
470
No mesmo dia, com o titulo de “Federalização da Faculdade de Medicina e os parlamentares paraenses”, o mesmo jornal informava que os professores da Faculdade
iriam oferecer um banquete ao deputado Deodoro de Mendonça, autor do projeto, “ao senador Álvaro Adolfo e demais representantes do Pará na Câmara Alta”,
“pelo empenho com que defenderam a causa da federalização”. Informava ainda que
a irmã Dalmazia, da Santa Casa, estava encarregada de colher as assinaturas de
professores que desejassem “coparticipar do ágape”, já contando com a adesão dos
professores Orlando Lima, Aracy Barreto, Acilino de Leão, Arthur França, Jaime
Aben-Athar, Arnóbio Franco, Porto de Oliveira, Oscar Miranda e Cruz Moreira.
(Folha Vespertina, 06.01.1950, p. 1).
Tendo à frente o Dr. Orlando Lima, o grande banquete — “no qual não se exige
traje a rigor” (Folha Vespertina, 16.01.1950, p. 1) — em homenagem àquele que
“com esforço inaudito, tornou possível a concretização desse grande sonho da classe médica do Pará e de todo o povo de nossa terra” realizou-se no dia 19 de janeiro
de 1950, no salão de recepções do Hotel e Restaurante Mme. Garés.
Além do deputado, foram homenageados os senadores Álvaro Adolfo (na ocasião
representado pelo Dr. Acilino de Leão) e Augusto Meira, o Dr. Jean Bitar e “parlamentares presentes em Belém”. Compareceram ainda, além dos homenageados,
os Drs. Orlando Lima, Acilino de Leão, Aracy Barreto, Arnóbio Franco, Arthur
França, Prisco dos Santos, Jaime Aben-Athar, Oscar Miranda, Abdias Junior, Pena
de Carvalho, Celso Malcher, Orlando Costa, Flavio de Brito Pontes, João Fecury
e Otto Ailtner”. Não puderam comparecer os Drs. Cruz Moreira, (representado
pelo Dr. Adriano Guimarães), Pinheiro Sozinho, (representado pelo Dr. Orlando
Costa), Hermogenes Pinheiro e Pedreira de Albuquerque”.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Segundo o jornal,
Servidos vinhos finos e variadas iguarias, o Dr. Orlando Lima ofereceu
o banquete, em nome do corpo docente da Faculdade, em nome dos homenageados. Historiou as lutas que terminaram com a vitória da federalização e terminou por acentuar os significativos papéis representados
sobretudo pelos Drs. Deodoro de Mendonça e Jean Bitar (Folha Vespertina, 20.01.1950, p. 1).
Na ocasião, o ex-presidente do Diretório Acadêmico, relator da tese de federalização da Faculdade e já médico Jean Bitar17 fez o seguinte pronunciamento:
Senhores, permiti que eu renuncie a favor dos estudantes da Faculdade
de Medicina e Cirurgia a honrosa homenagem com que me distinguis,
unindo-me, na vossa bondade a vultos propulsionadores da ideia que hoje
comemoramos.
Foi o Diretório Acadêmico de Medicina, representado por seu presidente,
integrando a embaixada paraense ao IX Congresso Nacional dos Estudantes, sob a diretriz serena e eficiente de Armando Mendes, que apresentou
àquele conclave a tese logo aprovada por unanimidade e transformada, por
nossa iniciativa, em projeto de lei oferecido ao Congresso sob autoria do
deputado Deodoro de Mendonça, a quem rendeis justa homenagem.
Nessa época, ainda impressionava vivamente a luta desproporcional que
sustentava o Diretório, o providencial e oportuno Diretório de Medicina,
para sustar o aumento das taxas proclamado para o ano seguinte. Luta
que não poderia ser censurada, pois constituía apenas premissa rudimentar das finalidades daquele órgão.
Com a aproximação do IX Congresso de estudantes, arena normal das
reivindicações estudantis da Nação, vimos o momento crucial para o debate da matéria tão relevante e a necessidade de uma instancia definitiva
para coibir a permanente e asfixiante majoração das mensalidades.
Impunha-se também considerar o problema de saneamento, recuperação
e aproveitamento do Vale Amazônico, em cuja solução não poderia ficar
extranha a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
A formação de profissionais é vital para a conquista sanitária da Amazônia. Como conseguir tal objetivo com as dificuldades obstrutoras do curso médico, permitindo que apenas uma elite abastada pudesse alcançar o
diploma final?
Daí a nossa tese com as razões que a instruíram: servir a Faculdade a
vasta zona norte, do Acre ao Ceará; dever dos poderes públicos de prover
a instrução adequada das massas; o barateamento do ensino como estímulo à grande concorrência; o papel eminente da Faculdade na recuperação do Vale Amazônico; a iniciativa da Constituinte em estabelecer a valorização da Amazônia em busca concretas e positivas; a necessidade de
remunerar justa e condignamente o corpo docente. Enfim, a substituição
da iniciativa privada pela tutela ampla do poder público. E hoje colhemos
os frutos daquela ideia depois de toda trajetória sempre impulsionada
pela boa vontade simpática das duas casas do legislativo federal.
É necessário realçar, senhores a repercussão incomensurável desse ato
na disseminação da cultura médica na Amazônia. De todas as faces essa
A Federalização
471
conclusão é obrigatória: De um lado pelo afluxo de estudantes incentivados pela redução de suas contribuições, democratizada dessa maneira
a profissão de médico que apenas sofrerá os limites vocacionistas dos
interessados; de outro lado a dignificação do magistério médico provido
de maiores recursos; e mais ainda, pelo símbolo de formação cultural que
representa a nossa Escola.
Senhores, se a minha voz neste momento é um eco dos grandes anseios
dos estudantes do Pará, aos quais continuo preso por laços de grande afeto e solidariedade, consenti que termine o meu agradecimento almejando
que o gesto do governo federal seja um aceno promissor para a criação da
Universidade da Amazônia.
(Folha Vespertina, 21.01.1950, p. 1).
O deputado Deodoro de Mendonça, alvo das homenagens, também se manifestou em
discurso. Depois de tecer comentários sobre a realidade sanitária da Amazônia e as
condições de criação e manutenção da Faculdade de Medicina, “cuja existência, nas
etapas mais difíceis, só foi transposta graças a tenacidade apostólica de Camilo Salgado”, disse do início modesto do curso, “engrandecido pela sabedoria dos docentes
idealistas e pertinazes”, o que não impediu de produzir profissionais competentes,
“espalhando pela Amazônia e por todo o Brasil médicos e operadores colocados entre
os mais distintos”, fazendo com que até mesmo os que possuíam recursos, deixassem
de buscar “as Faculdades do Novo Mundo, do Rio de Janeiro ou da Bahia”.
472
Prosseguindo, chegou ao ponto deflagrador do processo de federalização: “a insignificância da remuneração aos professores e funcionários e o exagero das taxas
exigidas aos estudantes, sacrificando a uns e impedindo a muitos o ingresso, reduzindo a produtividade escolar”.
Comenta as tentativas de transferir para a União os cursos médicos e da conduta governamental de somente manter os cursos da Bahia e do Rio de Janeiro. Fala também
do relatório do Dr. Jurandir Lodi, Diretor do Ensino Superior, aventando a hipótese
de federalizar uma faculdade de medicina no sul – a de Porto Alegre – e uma no
norte – a de Belém. Comenta que primeira foi federalizada18 e a de Belém, esquecida.
Lembra que ao invés de esmorecer, a Faculdade continuou sua trajetória, formando
“novas e brilhantes turma de médicos, dirigidos às mais diversas especialidades”.
Diz que a ideia da federalização foi defendida em vários congressos de estudantes,
até que em 1946, “organizaram notável estudo”, sendo aprovada e recomendada
pelo congresso. Que tendo à frente a “personalidade esclarecida e lutadora de Jean
Bitar”, tiraram cópia de seu trabalho enviando-o ao presidente da República, ministros, parlamentares e entidades científicas de todo Brasil.
Revela que, ao ler a proposta tomou-se de entusiasmo por ela “apaixonado que
sempre fui pelos objetivos de seu tema”, tendo apresentado em 26 de outubro daquele ano o projeto, que foi sancionado pelo presidente em 3 de janeiro, “após uma
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
demorada e tenaz luta, que esgotou todos os recursos para ver triunfante a benemérita ideia da federalização”.
Imagina o que será o curso,
Favorecido de aparelhagem lecionado pela seleção de grandes professores, buscado por um maior número de alunos de todo o norte do Brasil;
com seus modernos laboratórios, suas clínicas eficientes, biblioteca em dia,
mestres e alunos estudando, as doenças do nosso vale pesquisadas e dominadas – um instituto científico, em resumo, que ativa e represente a Amazônia, sirva a seu povo e represente a cultura que aqui vamos alicerçando.
Deu conta das dificuldades para aprovação do projeto, “às vezes parecendo pequeno a quanto se imagina fácil e criando a descrença na maior parte; que talvez achasse grande demais o feito para tão pequeno iniciador”, embora sempre acreditando,
por ser justo e o Pará merecer.
Agradece não só aos organizadores da homenagem, mas também aos senadores Magalhães Barata, Álvaro Adolfo e Augusto Meira, que jamais negaram seu apoio, e “sinceramente interessados em conduzir no Senado o projeto 374 até sua final aprovação”.
Reconhece o muito que ainda há por fazer pela cultura amazônica e lança um apelo ao
governo e à mocidade amazônica pela criação de uma Universidade no Pará, citando
outros estados que já possuem a sua em funcionamento e afirmando ser Belém o
“centro geográfico do norte e, sem dúvida, o seu fulcro econômico e cultural”, apesar
de sermos o “grupo humano mais desprovido de recursos de todo Brasil”.
Finaliza convocando a todos para a cruzada de criação da Universidade (Folha Vespertina, 25.01.1950, p. 1).
Após o discurso do deputado Deodoro de Mendonça falou pelos parlamentares
paraenses o deputado João Botelho, que em vibrante oração, mostrou ter sido antes
de todos o deputado Deodoro de Mendonça o “grande lutador pela causa finalmente vitoriosa”.
Em seguida falou o Dr. Acilino de Leão traçando um paralelo entre D. João VI e
o presidente Dutra no muito que fizeram pelo ensino superior no Brasil, “evidenciando as finalidades psicológicas existentes entre os dois governantes”. Ao final
levantou um brinde ao presidente da República, “feito ao som do Hino Nacional,
executado pela orquestra do salão, com o que foi dado por encerrado o banquete”
(Folha Vespertina, 21.01.1950, p. 1).
Além das manifestações dos professores da Faculdade, o D.A.M. ofereceu ao deputado Deodoro de Mendonça, na noite do dia 2 de fevereiro de 1950, um coquetel no
Avenida Hotel. A manifestação foi extensiva ao dr. Jean Bitar, “o primeiro dirigente
do DAM que alvitrou a campanha da Federalização”.
A Federalização
473
O presidente do DAM, Almiro Monte, exaltou o mérito do trabalho encetado pelo
parlamentar, externando também a gratidão dos estudantes ao Dr. Jean Bitar.
Em seu pronunciamento, o Dr. Jean Bitar disse da sua alegria em se encontrar no
meio dos estudantes, pois embora afastado pela conclusão de seu curso, considerava-se um deles, principalmente por ter-se identificado com as lutas estudantis, suas
aspirações e necessidades. E que jamais se sentiu longe dos amigos da Faculdade,
pois tinha os mesmos ideais. Disse que aquela era a comemoração de um sonho, que
por muito tempo empolgou a classe estudantil, “pelo que representava de bonança
e justiça para o estudante de medicina da Amazônia”, e que todos os universitários
do Pará estavam de parabéns, por formarem um bloco único de idealistas. Dizendo
não ter a veleidade de dar conselhos, lembrou aos estudantes a “contraprestação
rigorosa de vossa parte, no tirocínio e no currículo normais de vossos estudos”,
lembrando ainda que “Redução de taxas, aparelhagem a altura das necessidades
do curso, corpo docente bem remunerado, bibliotecas ampliadas – clima de prosperidade e conforto — tudo são fatores de progresso dentro da Faculdade”. (Folha
Vespertina, 03.02.1950, p. 1).
474
Usando a palavra num improviso, o deputado Deodoro de Mendonça frisou que a
grande luta da classe acadêmica do Pará não terminara; apenas começava a etapa
mais árdua, “que terminaria pela concretização do maior sonho, que era a criação
da Universidade do Pará”. Expondo as dificuldades antepostas quando defendia seu
projeto, pedia ajuda para a criação da Universidade. A matéria cita ainda que “no
decorrer dos discursos foram formuladas varias criticas à direção da Faculdade, que
vem mantendo um ‘regime de prepotência e menosprezo aos direitos dos alunos’”.
A federalização rendeu mais noticiário, homenagens, muitas dúvidas e discussões
ao longo de 1950. Ceticismo, descrença, esperança, orgulho pela vitória foram os
sentimentos que nortearam o período após o ato presidencial.
Segundo A Folha Vespertina, de 23 de janeiro de 1950, alguns professores não compareceram ao banquete, pois “nem tudo era regozijo, mormente a homenagem
prestada no Restaurante Gares”, tendo o assunto “federalização” sido motivo de
debates na Congregação. Diante da situação, o jornal formulou a seguinte pergunta, pedindo para alguns professores responderem:
Sendo a federalização da nossa Faculdade de Medicina um justo galardão
para a Amazônia, cujo nível cultural com isso subirá extraordinariamente, por que v. s. como catedrático beneficiado não participou do banquete
em que se rendia um preito de gratidão à bancada paraense federal, que
tanto trabalhou para a consecução desse notável acontecimento?
Alguns professores responderam com evasivas; o Dr. Silveira Netto, disse que não
fora consultado e recusou-se a entrar em detalhes; o Dr. Luiz Araújo disse que preferia silenciar, por ser assunto bastante discutido na Congregação; o Dr. Ruy RoMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
mariz dizendo-se regozijado com as vantagens financeiras, tinha sérias restrições às
questões administrativas, tendo sido, na Congregação, um dos contrários “ao banquete oficializado, a parlamentares”; que cada um pode homenagear quem quiser,
mas não via vantagens em homenagear parlamentares, “pelo fato de terem cumprido
o seu dever, de fazerem aquilo que a Nação a eles pagando, espera que façam”.
Simbolicamente, a federalização delimita uma fase na vida da Faculdade de Medicina e “uma bela página de luta do Diretório Acadêmico de Medicina” (BECKMANN, 1985, p. 510). Com ela, aos poucos vão saindo de cena os antigos professores, fundadores da Escola, e assumindo os catedráticos formados na própria casa.
Com propriedade, Antonio Lobão assim se manifesta:
Na evolução natural dos acontecimentos educacionais, cresceu a Faculdade e trinta anos após sua fundação passou a integrar o sistema nacional de ensino, subordinado ao Ministério da Educação e Saúde, como se
chamava na época.
Os antigos professores, aos quais nunca é demais lembrar para a História, foram-se afastando por implemento da idade. Uma nova geração
passou a constituir o corpo docente da Faculdade de Medicina, após cerca de meia centena de concursos para a cátedra ou para a docência livre
(LOBÃO, 2006, p. 9).
Deste modo, com a federalização e a reestruturação do seu corpo docente, além
da conclusão, em 1949, do Pavilhão Lauro Magalhães e do início da construção do
Instituto da Higiene, que viria a ser concluído em 1955, o último prédio a ser construído no “complexo de Santa Luzia”, a Faculdade estava pronta para mais uma
batalha: a criação da Universidade do Pará, que aconteceria em 1957.
NOTAS
1
Trecho da ata da reunião de 23 de fevereiro 1933: “Do expediente constam
a redação final do oficio a ser dirigido ao sr. Ministro de Estado de Educação
e Saúde Pública pedindo a federalização desta Faculdade, redação esta que
foi aprovada”. (CTA, 1933). Em reunião do dia 9 de fevereiro do mesmo ano,
um memorial a ser encaminhado ao Interventor Federal também pedia a
interferência deste junto ao Governo Federal, “no sentido de tornar, este
estabelecimento scientifico, officialisado”, posto que com isto, o Governo Federal praticaria um ato de justiça para o extremo norte,”uma vez que já foi
concedido igual favor ao extremo sul”. Mais adiante, em reunião do CTA de
16 de março de 1933, o Dr. Ofir de Loiola propõe envio de telegrama ao Dr.
Souza Araújo solicitando a intervenção deste junto ao Ministro da Educação
e Saúde Pública, “para deferimento do requerimento desta Faculdade, relativo a sua federalização”. Digno de registro, também, é o ofício datado de 12
de junho de 1932 e enviado pela Direção da Faculdade ao Prof. Dr. Azevedo
Ribeiro. No referido documento, Camilo Salgado comunicava a designação
daquele professor “para pleitear no Rio de Janeiro, junto aos altos poderes da
República, a federalização (grifo nosso) desta Faculdade”. (FMCP, Livro de
A Federalização
475
476
ofícios expedidos [1930-1933]. Também sobre este assunto, não obtivemos
maiores referências.
2
Ver capítulo “Apontamentos para uma história do DAM 1930-1949”.
3
Outra nota a página 58 diz o seguinte: “O Diretório Acadêmico de Medicina não póde, cumprindo um dever de gratidão, deixar de tornar público o
seu reconhecimento à maneira acolhedora e amiga que lhe tem dispensado
o Exmo. Sr. Coronel Joaquim de Magalhães Barata, Interventor Federal no
Estado. [...] A criação de vagas gratuitas para alunos pobres em nossas Faculdades, é uma providência que objetiva ajudar a juventude a vencer a situação de precariedade econômica em nosso meio, parco de recursos.” (Revista
do Acadêmico de Medicina, v. 3, n. 49, 1946, p. 58).
4
De acordo com a ata da reunião do C.T.A, de 23 de fevereiro de 1946, a resolução da Congregação, de 25 de janeiro, fez “um pequeno aumento nas taxas da
biblioteca e laboratório – cem cruzeiros anuais e cincoenta cruzeiros nas taxas
de prestações mensais, estas, porém, recaindo apenas nos candidatos que vão
se ingressar no primeiro ano” e que “os interessados fôram avisados antes de
se submeterem ao Concurso de habilitação”. (CTA, 1946, p. 175-179).
5
A mesma nota ainda mencionava que até aquela data nenhum aluno efetuara sua matricula, “apesar de aberta desde o dia 10, devendo encerrar-se o
prazo respectivo no próximo dia 25”.
6
O teor da notícia completa: “como vemos é um documento histórico para a
vida universitária do nosso estado” (Estado do Pará, 23.02.1946, p. 4).
7
A reportagem informa, ainda, que o secretário da Faculdade recusou-se
a receber os requerimentos de matrícula, alegando que só o faria quando
tivesse em mãos os Cr$ 24.000,00 prometidos pelo Interventor. (Estado do
Pará, 02.03.1946, p. 4).
8
A Comissão de Inquérito era composta pelos professores Drs. Prisco dos
Santos, Jayme Aben-Athar e Pinheiro Sozinho (Folha do Norte, 02.03.1946,
p. 1). O motivo foi uma denúncia do prof. Ruy Romariz, que teria sido publicamente atacado pelas colunas da Folha Vespertina, de 20 de fevereiro de
1946, por Pedro Amazonas Pedroso, presidente do Diretório, com referência
ao curso preparatório para alunos que pretendiam ingressar na Faculdade
(CTA, 1946, p. 175-179).
9
A reportagem menciona ainda um “provável pedido de demissão do dr. Olimpio da Silveira do cargo de secretário, [...] em função da última decisão de seus
pares”. (Estado do Pará, 10.03.1946, p. 1).
10
Na mesma ata temos a informação que a taxa de transferência que vinha
sendo cobrada era no valor de Cr$ 100,00.
11
“propoe o sr. conselheiro Prisco dos Santos que a Faculdade publique uma
nota oficial, para conhecimento dos interessados, das taxas que vão vigorar
em 1947...” (CTA, 1946, p. 188).
12
“Foi aprovada, por unanimidade, a proposta do Diretório Acadêmico de
Medicina do Pará sobre a federalização da Faculdade de Medicina”. Ainda de
acordo com a notícia, os estudantes paraenses visitaram os deputados constituintes, com o deputado Carlos Nogueira comprometendo-se a encaminhálos aos presidente da república, quando exporiam os problemas educacionais
do norte (Folha do Norte, 28.07.1946, p. 10).
13
Sem menção da data do telegrama.
14
Não há menção da data do telegrama.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
15
Do ofício encaminhado em 28 de outubro de 1948 pelo Diretor, Dr. Lauro
de Magalhães, ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde, contendo “um
breve histórico da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará”.
(FMCP, 1948b).
16
Lauro Magalhães, Orlando Lima, Olimpio da Silveira e Araci Barreto. “Federalizada a Faculdade de Medicina (Folha Vespertina, 04.01.1950, p. 1).
17
Formado em 8 de dezembro de 1947.
18
Federalizada pelo Decreto 20.530, de 17.10.1931. (BRASIL, 1931)[2007].
477
A Federalização
478
29
O que não tivemos a título de posfácio
479
480
Símbolo da FMCP.
Escrever sobre uma história qualquer – pessoa, entidade, cidade, - a única coisa realmente desejável seria uma máquina do tempo. A partir daí, o resto viria a contento.
Se possuíssemos tal artefato, escrever sobre a Faculdade de Medicina e Cirurgia
do Pará teria sido extremamente fácil, pois além dos boletins, jornais, documentos, fotografias, depoimentos, vivenciaríamos os fatos na hora. Assim, teríamos
participado das reuniões iniciais visando a criação do curso. E saberíamos quais os
verdadeiros interesses na referida criação, deixando de lado qualquer especulação
socioeconômica – ou filosófica, até, agora já bem distanciados pelo tempo e numa
época em que abrir um curso superior significa principalmente visar o lucro.
Por exemplo: o que existe de registro sobre a Sociedade Propagadora das Ciências
e sua “seguidora” a Associação Científica do Pará, mantedora do curso de odontologia e, depois, do de medicina, pois esse dado apesar de exaustivamente citado
todas as vezes que se escreveu - com propriedade ou não sobre a Faculdade de
Medicina e Cirurgia do Pará e mesmo sobre a Odontologia - não vai adiante dessa
informação vazia? E por que a Faculdade de Medicina logo se tornou independente
desta associação? Coisa que não ocorreu com a Escola Livre de Odontologia.
E qual teria sido o verdadeiro papel da Escola Livre de Odontologia do Pará e,
particularmente, o de Antonio Magno e Silva na criação da Faculdade de Medicina, uma vez que existe o relato de que foi sob a Direção do referido professor,
“por resolução da Congregação da Escola, em deliberação unânime, (que) se cria
a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, nos idos de 1919” (RIBEIRO, 2005,
p. 12)? O mesmo fato é citado por ocasião do falecimento do Dr. Magno e Silva,
quando a Folha do Norte diz: “Foi ainda por sua iniciativa que se fundou a nossa
Faculdade de Medicina, idea considerada por muitos como uma loucura, mas que
para sua alma de grande batalhador era uma realidade insophismavel” (Folha do
Norte, 28.01.1939).
Nunca houve preocupação em esmiuçar as referidas entidades e mesmo as pessoas
envolvidas ou nada existe sobre elas? Onde estão os livros da Congregação da
Escola Livre de Odontologia do Pará? Aliás, por que Magno e Silva, que teria tido
posição de destaque na “tramitação” da Escola somente chegou a professor auxiliar
de Clínica Médica ele que seria componente da sua primeira turma?
Retrocedendo um pouco mais no tempo, por que não vingou a lei editada por Paes
de Carvalho, em 1899, que criava o curso de medicina juntamente com o de direito
e de engenharia? Simplesmente as elites teriam achado que tal “avanço” não era
necessário? Que era muita “modernidade” para o atrasado extremo norte, mero
fornecedor de matérias-primas e de riquezas para o sustento da república que se
iniciava? E por que Paes de Carvalho, idealista da referida lei, jamais é mencionado
nas “histórias” sobre a Faculdade de Medicina, ele que era médico, também?
O que não tivemos - a título de posfácio
481
Teríamos presenciado a elaboração da ata de instalação, no dia 9 de janeiro de 1919
- quem sabe até assinaríamos a referida. E não ficaríamos à procura de um documento que todos têm como perdido, mas que pode ainda existir, uma vez que há uma
citação que diz: “do acto [de instalação] consta um documento que o Instituto Histórico do Pará tomou ao seu archivo”? (PARÁ-MÉDICO, set. 1922, p. 362). Como
o referido documento não se encontra no IHGP, pode ser que esteja guardado em
algum outro arquivo, à espera que alguém de sorte ou com visão de sua importância
o traga a lume, aclarando mais essa página da nossa história, não tão antiga assim.
Qual a repercussão da notícia veiculada na Folha do Norte de 15 de janeiro de 1919,
dando conta da futura criação do curso1? O que pensaram os futuros estudantes,
alguns já formados, como Magno e Silva, por exemplo, um dos criadores da Faculdade de Odontologia? Qual a credibilidade de uma nova escola de medicina fora
do eixo Bahia-Rio de Janeiro e, por conseguinte, não oficial, implicando o não reconhecimento dos diplomas expedidos? Que “tradição” ofereceria aos seus futuros
alunos, quando ainda era praxe buscar os diplomas nas escolas citadas e, ao regressar, divulgar ruidosamente pela imprensa seu feito? O que aliás, ainda acontece, de
certo modo, com as devidas modificações e adaptações que o tempo exige.
482
Quais os critérios para a escolha do corpo docente? Apadrinhamentos? Importância social? Notório saber? Por que médicos que também ocupavam funções de
destaque no meio social e científico do Estado não vieram a fazer parte do corpo
docente? Não se interessaram? Não era vantajoso financeiramente? Não apostaram que o projeto vingasse? Ou simplesmente não foram convidados?
Retornando aos primeiros tempos da criação do curso, quais as negociações para a
instalação de mais um curso superior no Ginásio Paes de Carvalho? Relações pessoais, políticas, sentimentais, institucionais? Havia salas sobrando? Salas desocupadas
ou ocupadas com outras finalidades que não o ensino? Quantas seriam necessárias
para o início? Houve alguma compensação financeira para aquele estabelecimento
de ensino e seus funcionários, que de qualquer maneira seriam envolvidos no funcionamento deste novo “apêndice” ao Ginásio? Como teria seria a convivência entre
os ginasianos e os acadêmicos de medicina? De quem teria sido a ideia de solicitar
carteiras para preenchimento das salas a fim de que as aulas pudessem ser ministradas? E a imprescindível parte administrativa, como e onde funcionava?
Quando e de quem foi a ideia de criação de um símbolo, um logotipo para a Faculdade? Quem o desenhou e baseado em que? Por que não ficou nada registrado? Ou
ficou e também não se conseguiu encontrar o fio de Ariadne? A título de curiosidade, o oficio mais antigo encontrado com o símbolo da Faculdade no cabeçalho data
de 29 de março de 1928.
Por que a escolha do Barão de Anajás como Diretor se consta que Camillo Salgado
havia sido indicado? Por seu título de Barão, que talvez conferisse maior credibiliMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
dade à nova Escola, embora já vivêssemos o período republicano? Por ser ele um
profissional bastante conceituado? Ou apenas por que ele era pai de um político de
destaque, também médico e componente do corpo docente da Escola, e que seria
governador mais adiante, o que poderia significar facilidades para ajuda oficial? E
por que o Barão renunciaria em 1922, em mais um episódio nebuloso? Somente por
discordar do rigor de alguns professores, conforme reza a versão oficial? Alguma
pitada de ciúme em relação ao seu vice, por se sentir um tanto ofuscado por este ou
por não ter tino administrativo para a condução do curso?
Como descobriram que o dono do palacete Santa Luzia, Sr. Adolph Kolb, queria
vender a casa, já que ela estava alugada para o Governo, lá funcionando uma escola? Foi oferecida ao Governo? Quem era Adolph Kolb? O que foi feito dos alunos
que ali estudavam? Como era o prédio enquanto residência? Quando foi construído, já que consta ter sido o primeiro prédio em blocos da cidade? O que havia em
seu entorno, ali no largo de Santa Luzia? Algum boteco bem na esquina, no lugar
onde seria construído o mercado, local de reunião dos acadêmicos antes ou depois
das aulas? O que mais havia além do palacete?
E se não tivesse dado certo o plano de Camillo – foi dele a ideia? Se não, de quem?
- de angariar fundos para a aquisição de uma sede para a Faculdade? Até quando
o Ginásio Paes de Carvalho comportaria as turmas? Seria comprado um terreno
para sua construção? Seria possível pensar a Faculdade de Medicina, naquele tempo, longe da Santa Casa? E hoje?
Além do necrotério do Estado, como e onde se desenrolaram as aulas práticas? Onde
mais seria possível aprender medicina? Os alunos podiam freqüentar os outros hospitais para aprendizado e treinamento? Os professores os levavam para acompanhar
seus pacientes privados? Livros, biblioteca, microscópios, quais foram os “estrategistas” do miolo burocrático imprescindível para o funcionamento de qualquer coisa e,
particularmente, de um curso médico, com todas as suas peculiaridades?
Depois da aquisição da casa, quais as reformas iniciais necessárias para o funcionamento do curso em sua nova sede, uma vez que o prédio fora considerado insalubre, em 1919, para o funcionamento de uma escola? Como foi a rotina de funcionamento da Faculdade em 1º de Abril de 1924, quando iniciaram as atividades no
palacete Santa Luzia? Houve alguma comemoração especial? Por que esta data não
é lembrada nos anais da Faculdade?
Quando os jardins da Faculdade teriam assumido seu aspecto atual, com o chafariz e a
estátua de Asclépio? Sabemos que a estátua chegou ao Palacete Santa Luzia em 1940,
como doação do professor Antonio Joaquim da Silva Rosado2. E de acordo com foto do
relatório de 1943 (FMCP, 1945c) a estátua ficava no gabinete da diretoria. Quando migrou para os jardins, levando-se em conta que no Relatório de Atividades do ano de 1950,
em uma foto do Biotério vê-se a citada estátua no lugar onde ainda hoje permanece?
O que não tivemos - a título de posfácio
483
A primeira turma formada se sentia segura em praticar a medicina? Teria credibilidade junto aos seus futuros pacientes? Os prêmios Raul Leite que não estão
registrados em ata, por quê? Proposital, em função do (possível) ganhador? E os
prêmios dos anos posteriores à morte do seu criador, por que foi mantido o nome
inicial? O laboratório continuou bancando as despesas? Os anos patrocinados pela
“Chimica Bayer”, não houve questionamento quanto ao nome da premiação?
Como se mantinha a faculdade, seus professores e funcionários, suas despesas de
ordem geral, como água e luz, por exemplo, se o número de alunos era pequeno e
nem sempre as subvenções eram pontuais?
Onde estão os primeiros livros de ata de reunião da Congregação e do Conselho
Técnico Administrativo, dando conta dos primeiros tempos, das primeiras divergências, das primeiras dissensões entre os professores, das “insubordinações” dos
acadêmicos, indo de encontro aos todos poderosos dirigentes e professores?
São tantos os questionamentos... São tantas as lacunas a serem preenchidas... De algum modo preenchemos várias e, sem falsa modéstia, podemos dizer que abrimos um
leque bem amplo para a continuação das pesquisas. Se tivéssemos todas as respostas,
um outro livro teria sido escrito. Mas aí já seria, também, uma outra história...
484
Foto 77:
As origens do símbolo
da Faculdade
permanecem obscuras,
sendo a versão mais
antiga encontrada
datada de 29 de março
de 1928.
Fonte: FMCP
(1928a).
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
NOTAS
1
“Dentro em poucos dias será fundado nesta cidade um importante estabelecimento de ensino superior, que se denominará Faculdade de Medicina do Pará.
Esta feliz idéa, nascida no seio dos mais illustres membros da nossa classe medica, teve logo, como era de prever, a mais enthusiastica e sympatica acolhida
da parte de todos quantos se interessam pelo progresso intellectual e scientifico do nosso Estado, merecendo de toda gente os mais francos encomios.
A Faculdade de Medicina, que está amparada pelos melhores e mais eminentes medicos de Belém, é o primeiro instituto do genro (sic) que se vae abrir
no norte, da Bahia ao Pará.
Dest’arte, vindo já satisfazer uma necessidade do meio, a Faculdade decerto
contará com o applauso unanime da população deste Estado.
A direcção do novo e utillissimo Instituto scientifica (sic) foi confiada ao
venerando clinico dr. Barão de Anajáz, sendo vice-director o dr. Camillo Salgado e secretario o dr. H. Pinheiro.
Para lente do estabelecimento foram convidados os mais eminentes medicos
do nosso meio, que já têm acolhido com enthusiasmo a idéa.
Já se tem realizado varias reuniões para deliberar a respeito, devendo o curso
ser aberto brevemente”. (Folha do Norte, 15.01.1919 p. 1).
2
“Um infausto acontecimento enlutou a Faculdade no ano de 1940: o falecimento no dia 5 de Junho do dr. Antonio Joaquim da Silva Rosado, um de seus
fundadores e professor catedrático, em disponibilidade, da cadeira de Clinica
Ginecológica e expressão mais pura, mais perfeita e mais digna de médico e
homem público e particular.
[...]
Como última prova de admiração e zelo pela nossa Faculdade, o ilustre morto legou a suas preciosa e seleta biblioteca médica e uma valiosa estátua de
bronze, de Hipócrates.” (FMCP, 1941, p. 5-6).
Nota: O relatório menciona estátua de Hipócrates, entretanto trata-se na
verdade de uma estátua de Asclépio ou Esculápio.
O que não tivemos - a título de posfácio
485
486
30
Lista de ilustrações
487
488
Detalhe de um dos pisos da FMCP.
Foto 1
Dr. José Paes de Carvalho, governador do Pará de 1897 a 1901, o primeiro a pensar em um curso de
medicina para o estado do chegando a editar uma lei criando Faculdades de Medicina, Engenharia
e Direito no Estado do Pará. Tal lei jamais foi efetivada.
Foto 2
Edifício do tradicional Colégio Paes de Carvalho, então “Gymnasio Paes de Carvalho” a primeira
morada da Faculdade de Medicina em duas salas ali cedidas.
Foto 3
Professores fundadores da Faculdade de Medicina do Pará, posam para a primeira foto da instituição.
Foto 4
Barão de Anajás (sentado entre as senhoras) em meio aos primeiros alunos matriculados.
Foto 5
Salas de aula do Colégio Paes de Carvalho no iníco do Século XX.
Foto 6
Grupo Escolar Wenceslau Braz e alunos, futura sede da Faculdade.
Foto 7
Sede logo após sua aquisição pela Faculdade de Medicina.
Foto 8
Laboratório de Farmacologia.
Foto 9
Gabinete de Fisiologia.
489
Foto 10
Laboratório de Química Fisiológica.
Foto 11
Laboratório de Microbiologia.
Foto 12
Laboratório de Química.
Foto 13
Prédio onde ficava o salão nobre da Santa Casa, situado de frente para rua Oliveira Belo, posteriormente demolido.
Foto 14
Enfermaria de Clínica Obstétrica. Maternidade da Santa Casa. Professor Dr. Orlando Lima (no
centro) ladeado por alunos.
Foto 15
Necrotério onde foram realizados os primeiros estudos anatômicos da Faculdade de Medicina e
Cirurgia do Pará. Edificação ainda existente ainda que bastante modificada.
Foto 16
Enfermaria São Paulo. Clínica Cirúrgica de Homens. Professor Dr. Prisco dos Santos (sentado)
ladeado por alunos.
Lista de ilustrações
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Foto 17
Enfermaria São João. Clínica de Doenças Tropicais. Professor Dr. Antonino Emiliano de Souza
Castro (no centro de óculos e de bigode) ladeado por alunos.
Foto 18
Enfermaria Santa Izabel. Clínica Médica de Mulheres. Terapêutica Clínica. Professor Dr. Luiz
Araújo (sentado em primeiro plano) e alunos.
Foto 19
Hospício dos Alienados, posteriormente Hospital Juliano Moreira, por volta de 1902.
Foto 20
“Hospital Evandro Chagas, onde era lecionada a Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas”.
Foto 21
Palacete Santa Luzia no ano da equiparação da Faculdade de Medicina.
Foto 22
Grupo de alunos do terceiro ano que na presente época de exames tiveram acesso para o quarto.
Foto 23
Professores em exercício reunidos em 1922 para edição comemorativa da revista Pará-Médico.
Foto 24
Gabinete de Histologia. Professor Dr. Jayme Aben-Athar (no centro de gravata de borboleta) e alunos.
Foto 25
Laboratório de Biologia parte interna, dirigido pelo Dr. Anatônio Acatauassú.
490
Corrigir legenda da
foto 26.
Foto 26
Laboratório de Biologia – Parte Externa – Prof. Dr. Antonio Acatauassú (sentado no centro). No mesmo prédio atualmente funciona o serviço de Dermatologia da UFPA na Santa Casa de Misericórdia.
Foto 27
Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará em 1935 já com o pavilhão do Salão Nobre em anexo.
Foto 28
Salão Nobre da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Foto 29
Laboratório de Parasitologia.
Foto 30
Gabinete de Histologia.
Foto 31
Laboratório de Histologia.
Foto 32
Um projeto de como poderia ficar a fachada da Faculdade após sua remodelação.
Foto 33
Fachada da Faculdade após a grande reforma de 1936 que lhe deu as feições atuais.
Foto 34
Instituto de Anatomia “Camilo Salgado”.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
Foto 35
Sala para aulas de Anatomia Humana e Técnica Operatória, vendo-se a galeria encurvada em “U”
e com capacidade para 50 alunos.
Foto 36
Sala de Autopsias.
Foto 37
Sala de Projeção.
Fotos 38
Laboratório de Anatomia Patológica.
Foto 39, 40, 41, 42
Aspectos da inauguração do Pavilhão de Anatomia “Dr. Camilo Salgado”.
Foto 43
Câmara frigorífica com capacidade para seis cadáveres.
Foto 44
Tanque para conservação, em formol, de peças cadavéricas.
Foto 45
Biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Foto 46
Mesas de Estudo da Biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
Foto 47
Estanteria da Biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.
491
Foto 48
Gabinete da Diretoria. Observando-se no canto direito a estátua de Asclépio, posteriormente colocada nos jardins da Faculdade.
Foto 49
Fachada do Auditório.
Foto 50
Vista interna do Auditório.
Foto 51
Mobiliário do Auditório.
Foto 52
Vista lateral do Biotério. A esquerda a estátua de Asclépio já em sua localização atual.
Foto 53
Biotério – Sala para criação de coelhos.
Foto 54
Sala para animais inoculados. Ao fundo a sala para animais de médio porte. À frente escada de Acesso ao Pav. Superior. Vê-se a grade para a jaula dos macacos.
Foto 55
Biotério – Sala de Esterilização.
Foto 56
Sala de operações e anfiteatro para aulas práticas localizada no segundo andar do prédio.
Lista de ilustrações
Foto 57
Sala para animais de médio porte. Ao fundo a escada de Acesso ao Pav. Superior.
Foto 58
Vista posterior do Biotério.
Foto 59
Instituto de Higiene alguns anos após sua inauguração.
Foto 60
Diploma da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará na década de 1930.
Foto 61
Diploma da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará na década de 1940.
Foto 62
Acadêmicos da turma de 1937 em frente à Faculdade. Observar detalhes da fachada antes das
grandes reformas.
Foto 63
Acadêmicos iniciam o asteamento da bandeira do Brasil em meio a “Pirâmide Oswaldo Cruz”, ao
fundo observa-se o Mercado de Santa Luzia.
Foto 64
Acadêmicos diante da “pirâmide” de borracha, ao fundo Mercado de Santa Luzia, a direita o quiosque “Buraco Gelado” tradicional parada para lanches do período, hoje demolido.
492
Foto 65 e 66
Medalha Raul Leite
Foto 67
O Barão de Anajás.
Foto 68 e 69
Louça com o anagrama do Barão de Anajás.
Foto 70
Camilo Salgado.
Foto 71
Caricatura de “Cotta”.
Foto 72
Diploma de doutor em medicina de Camilo Salgado.
Foto 73
Olympio da Silveira.
Foto 74
Alunos de diversos semestres da Faculdade reunidos em foto de 1922.
Foto 75
Calouro de 1946 em dia de trote desfilando com cartaz de protesto em frente a Santa Casa.
Foto 76
Passeata do trote dos calouros de medicina no ano [19--].
Foto 77
Símbolo da Faculdade.
Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
31
Referências
493
494
Detalhe de um dos pisos da FMCP.
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_____, Belém, 31 de julho de 1946, p. 4
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Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950
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UMA PÁGINA AVULSA
O estudo dos fatos históricos desperta reflexões interessantes: se por um lado a cada
dia os acontecimentos estudados se distanciam mais do nosso presente , por outro eles
sempre poderão ser revistos ou mesmo reinterpretados, desde que as fontes de pesquisa
sejam preservadas. Sendo assim, após a conclusão deste trabalho, quando decidimos
por um ponto final – pelo menos temporariamente – nas pesquisas; enquanto
batalhávamos para que o livro fosse editado, por conta de outros objetos de estudo,
veio-nos às mãos uma notícia publicada na primeira página de O Estado do Pará, em 18
de agosto de 1914.
O assunto era a instalação da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará. A matéria, não
assinada, versa entre outras coisas sobre a necessidade da criação de uma Faculdade
Livre de Medicina e Cirurgia em Belém, em que se formassem farmacêuticos, dentistas,
médicos e cirurgiões. Pelo ineditismo do texto, que é a única referência – até agora
encontrada - sobre a criação de uma Faculdade de Medicina no Pará no período situado
entre a lei de 1899, esquecida após o governo Paes de Carvalho, e a criação efetiva de
nossa escola em 1919, transcrevêmo-lo parcialmente:
De menos urgência talvez, mas de não menos necessidade, é a
creação, entre nós, de uma Faculdade Livre de Medicina e
Cirurgia, onde se formassem pharmaceuticos, dentistas, medicos
e cirurgiões.
Uma Faculdade de Medicina em Belem facilitaria os estudos da
mocidade do Extremo Norte e do Meio Norte até Pernambuco.
Muitas vocações neste vasto trecho do nosso paiz ficam
impossibilitadas de fazer os seus estudos scientificos por não
poderem se transportar para Bahia ou Rio e alli se manter.
Além disso, uma Faculdade de Medicina nesta capital, que está
em plena zona tropical, seria em pouco tempo, por força de
circumstancias, um verdadeiro instituto de medicina tropical,
especialidade que muito interessa o mundo scientifico por causa
das tendencias colonizadoras das grandes potencias. É evidente
que um instituto scientifico desta especialidade, funccionando no
local apropriado, operando “in loco”, teria mais possibilidades de
êxito que os que estão afastados do foro das moléstias que
estudam, como o Instituto de Medicina Tropical de Liverpool.
É nossa convicção que, dentro de alguns annos, depois de
repetidas communicações levadas ao conhecimento dos grandes
centros scientificos, a Faculdade de Medicina gosaria de grande
auctoridade em materia de medicina tropical e, como o Instituto
de Manguinhos, iria levar a bôa fama da sciencia brazileira, ao
mundo inteiro.
A idéa da creação de uma Faculdade de Medicina no Pará,
alimentada e encaminhada pela Sociedade Médico-Cirurgica
será fatalmente posta em execução mais anno menos anno, para
alegria da terra paraense.
Serviços como estes marcarão, estamos certos, a marcha
progressista da Sociedade Medico-Cirurgica, há dias iniciada sob
applausos animadores da sociedade paraense.
O texto quase centenário não poderia ser mais atual. O restante da história já sabemos
de cor...
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