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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ Reitor Carlos Edilson de Almeida Maneschy Vice-Reitor Horacio Schneider Pró-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento Erick Nelo Pedreira Pró-Reitor de Administração Edson Ortiz de Matos Pró-Reitora de Graduação Marlene Rodrigues Medeiros Freitas Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação 2 Emmanuel Zagury Tourinho Pró-Reitor de Extensão Fernando Arthur de Freitas Neves Pró-Reitor de Desenvolvimento e Gestão de Pessoal João Cauby de Almeida Júnior Diretor Executivo da FADESP João Farias Guerreiro ________________________________________ Capa, projeto gráfico e editoração Oficina de Criação - UFPA Aristóteles Guilliod de Miranda José Maria de Castro Abreu Jr. 3 Belém, Pará 2010 4 Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) – Biblioteca Central/ UFPA, Belém-PA Miranda, Aristóteles Guilliod de. Memória histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, 1919- 1950: da fundação à federalização / Aristóteles Guilliod de Miranda, José Maria de Castro Abreu Junior. — Belém: EDUFPA, 2009. ISBN 978-85-901172-3-0 1. Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará - História. 2. Medi cina – Pará - História. I. Abreu Junior, José Maria de Castro. II. Título. CDD: 21. ed. 610.711098115 CDU: 378.094(818.5) Para Leônidas Braga Dias (in memoriam), O grande guardião da memória da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, que certamente gostaria de ter participado desta empreitada, os nossos respeitos, a nossa admiração e a nossa saudade pela ausência. Aristóteles Guilliod de Miranda Para meu pai e amigo José Maria de Castro Abreu que me transmitiu, entre outros valores, o amor a nossa profissão e a nossa querida Faculdade. Um dia, aos nove anos, ali me levou. E parte de mim lá ficou para sempre. José Maria de Castro Abreu Junior 5 FACULDADE Às tardes, meu caminho encontrava um casarão de esquina, cinzento, onde via, na porta, pessoas que se inteiravam dos mistérios de curar. Com a mente cheia de sonhos, um dia entrei lá. Aristóteles Miranda 6 Um livro nunca deixa de ser escrito – é tarefa inesgotável. Em determinado momento, o autor simplesmente o abandona. Caso contrário ficará seu refém para sempre. Foi o que fizemos. José Maria Abreu Jr. Agradecimentos A elaboração de um livro como este não seria possível sem a colaboração de várias pessoas. Ainda que correndo o risco de sermos traídos pela memória, pelo que antecipadamente pedimos nossas desculpas prometendo repará-las no momento adequado, gostaríamos de agradecer a Sra. Vilma Costa Bastos, bibliotecária da Faculdade de Medicina, pelo acesso ao acervo documental da velha escola, elemento primordial para feitura deste; além dela, sua diligente bolsista Glaucilene Tavares, pela paciência com que nos atendeu no início da caminhada aos arquivos da Faculdade; a Simone Matos e sua equipe do setor de microfilmagem da Biblioteca Pública “Arthur Vianna”, pela amizade e competência com que nos auxiliaram na pesquisa em busca de pistas nos jornais antigos, de grande valia para o tricotar das histórias aqui relatadas; ainda na Biblioteca Pública, ao bibliotecário Alexandre Lobo Pinheiro, que solicitado para um novo olhar e sugestões às referências, o fez com presteza e dedicação; a Ana Maria Cruz, bibliotecária da Biblioteca Central da UFPA, pelo carinho e desvelo e através de quem pudemos ter acesso a Silvia Bittar, então diretora daquele órgão fundamental da Universidade Federal do Pará, e quem nos abriu todas as portas às pesquisas e à sua competente equipe de colaboradoras, dentre estas, em especial, Elisangela Silva da Costa, responsável pela normatização do livro; ao amigo João Guilherme Ferreira de Araújo que restaurou digitalmente algumas das fotografias aqui presentes; a arquiteta Graça Barroso Santos que habilmente recriou o monograma do Barão de Anajás a partir de um desenho original muito pequeno; ao prof. Armando Mendes, cujas informações sobre a UAP foram de grande valia para o texto sobre a Federalização; à sra. Glicia Dias, pela doação de grande parte do acervo do nosso saudoso mestre Leônidas Braga Dias, um dos responsáveis pela preservação da memória da Faculdade, salvando-a, literalmente, do lixo. Agradecemos também àqueles médicos testemunhas de parte desta história que nos forneceram seus depoimentos e impressões pessoais indicando pistas que muitas vezes nortearam esta pesquisa, começando pelos decanos da medicina paraense, ambos da turma de 1939, Adolfo de Xerez e Oliveira Góes e Guaraciaba Quaresma Gama, passando por colegas de turmas posteriores como Eduardo Augusto Dias Pereira Braga, Manuel Ayres, Acea Raichel Azulay e Camilo Viana entre outros. Sem esquecer é lógico Rubem David Azulay que mesmo não tendo terminado 7 o curso aqui, viveu intensamente a escola do Largo de Santa Luzia até o quarto ano. Alguns colegas, infelizmente não mais entre nós, temos que agradecer in memoriam como José Luiz de Araújo Mindello, Carlos Alberto Monteiro Leite, Clodoaldo Beckmann, Mário Rubens Martins e Raynero de Carvalho Maroja, este último em especial, com quem conversamos quando a ideia de escrever algo sobre a Faculdade sequer existia, não passando de uma curiosidade aguçada sendo o assunto abordado informalmente. Após responder a uma sabatina de perguntas sobre a FMCP, Dr. Raynero sugeriu que se gostávamos tanto do tema, deveríamos escrever um livro sobre o assunto. Outra ausência dolorosamente sentida é do mestre de gerações, o Prof. Dr. José Monteiro Leite, que desejariamos muito pudesse ter lido este trabalho e, quem sabe, até o prefaciado. 8 Não podemos esquecer também de pessoas como Paulo Sérgio Roffé Azevedo, Ubirajara Salgado, David Rubem Azulay, Reinaldo e Helena Andrade da Silveira, os quais, simpáticos à nossa iniciativa permitiram que vasculhássemos o acervo de suas famílias; Roseana Aben-Athar Kipman, que forneceu informações inéditas sobre seu pai e seu avô, e Bolívar Fernandez, que nos colocou diante do livro “Bosquejo Cronológico da Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência do GramPará”, raríssima publicação de Antonio Nicolau Monteiro Baena datada de 1878, a mais antiga fonte de pesquisa que utilizamos, e que esclareceu pontos obscuros da vida do Barão de Anajás. Lembramos que muito do material e das informações cedidas ainda que não tenham sido publicados aqui por não se enquadrarem na proposta inicial do livro, são importantes fontes para novas pesquisas e certamente serão revistos para ensaios futuros. Um agradecimento mais que especial à equipe da Oficina de Criação da UFPA: Ana Petruccelli, Lívia Barbosa, Káyra Matos e Filipe Almeida, pelo carinho e competência com que abraçaram nosso projeto, produzindo um livro com uma belíssima apresentação gráficovisual valorizando sobremodo o conteúdo. Por fim, a nossa mais sincera gratidão ao Prof. Dr. João Farias Guerreiro, diretor executivo da FADESP, que efetivamente adotou este projeto, tornando-o uma realidade. Não fosse seu verdadeiro entusiasmo, talvez este livro permanecesse mais tempo engavetado. Os autores Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. Sumário Prefácio...11 Apresentação...15 1. Os Primórdios...17 2. A Fundação da Faculdade – O Dia que o Tempo Apagou...27 3. A Instalação – Era preciso começar...35 4. Doutores Haja – A campanha para a Aquisição do prédio...45 5. A Formação do Corpo Docente...65 6. O Ensino...75 7. O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade...91 8. O Hospício dos Alienados e Outras Instituições de Apoio...109 9. Equiparação a Jato...119 10. Os primeiros médicos...135 11. Professores, Cátedras e Docências...149 12. Os Doutores e suas Teses...175 13. A Manutenção Financeira...185 14. A Expansão...213 15. A Enfermagem Obstétrica...251 16. Casamento por Dote – a Farmácia & a Medicina...259 9 17. A Colação de grau - Cerimonial e Formandos até 1950...273 18. Apontamentos para uma História do DAM – 1930-1949...293 19. A Atlética...331 20. A Sociedade Acadêmica de Medicina e Cirurgia do Pará...337 21. O Serviço de Verificação de Óbitos...341 22. Pirâmides de Borracha e Feriados – A 2ª Guerra chega ao Palacete Santa Luzia...351 23. O Prêmio Raul Leite e outras Premiações...359 24. Houve uma vez um Barão...371 25. Camilo Salgado – O Berço do Mito...387 26. Olympio – Um homem para dizer Não...407 10 27. Retalhos da Vida Acadêmica...421 28. A Federalização...441 29. O que não tivemos - a título de posfácio...479 30. Índice de Ilustrações...487 31. Referências...493 Prefácio O AVESSO DE UMA HISTÓRIA Meirevaldo Paiva Educador O escritor tcheco Milan Kundera ressaltou, num dos seus livros, o tema do esquecimento como perda da identidade. Ele disse certa vez que: “quando uma grande potência quer privar um país pequeno de sua consciência nacional, ela utiliza o método do esquecimento organizado”. É o que acontece, em qualquer regime ditatorial ou nas falsas democracias, com divergentes, dissidentes, opositores, inimigos e alcança perversamente os desafetos pessoais e profissionais. Guardadas as devidas proporções de praxe, os médicos Aristóteles Guilliod de Miranda e José Maria de Castro Jr. conseguem com sensibilidade romper as barreiras do esquecimento político, administrativo, educacional e cultural a que foi relegado a história da Faculdade de Medicina da fundação à federalização. Registre-se que, sob o impacto da burocracia e do tradicional reformismo brasileiro que nada reforma, a Faculdade mudou tanto de nome até chegar numa obscura designação de “curso” de medicina da Universidade Federal do Pará que, se não apequena a inteligência ali praticada, olvida a luta educacional de um punhado de homens que esteve à altura da própria história da medicina brasileira. De frente a esse esquecimento, também atropelado pela reforma universitária dos anos 70 mal copiada pedagogicamente e que dividiu as partes, mas esqueceu a a totalidade, jamais um apresentador de livro pediria ao leitor que o lesse pelo final, ainda que instigado pela advertência dos autores, “O que não tivemos - a título de pósfácio”, à medida que buscaram mais respostas às decifradoras perguntas da inquietante desmemoria que marca a perda de identidade histórica da Faculdade. No último parágrafo da obra, “Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, 1919-1950, Da Fundação à Federalização”, os autores assim finalizam: “São tantos os ques- 11 tionamentos ... São tantas as lacunas a serem preenchidas ... De algum modo preenchemos várias e, sem modéstia, podemos dizer que abrimos um leque bem amplo para a continuação das pesquisas. Se tivéssemos todas as respostas, um outro livro teria sido escrito”. Não há, porém, “modéstia” diante da verdade. Há, sim, a sensibilidade para desocultar o que está escondido pelo avesso da história. Caberá ao leitor preencher lacunas, vazios, omissões, desafiar a própria memória, ou optar por enfrentar a desmemória da sociedade transtornada pela hipocrisia social, pela inveja e pelo ciúme profissional que, sem coincidência, tem origem nos desatinos dos deuses gregos e continuado entre os novos deuses do capital globalizado. 12 Ao pesquisar a história da Faculdade de Medicina os autores focalizaram as ações, os gestos, as palavras de homens que lutaram contra preconceitos, preterimentos, tabus, subterfúgios e que souberam pela inteligência fazer história até se transformaram eles mesmos em mitos, heróis e santos. Muitos, porém, foram castigados cruelmente pelo esquecimento, apagados da história por elites de mentalidade colonizada incapazes de aprender a discernir com as lições da própria história. O desaparecimento de uma ata, perdida ou escondida, é a supressão de uma página da história, por exemplo. Mas é no cotidiano que se descortina o mundo da Faculdade dos alunos aos professores, dos funcionários aos secretários, dos diretores às autoridades da época. Entre os alunos a solidariedade, a fraternidade, a amizade, as inimizades, as divergências de um convívio cruzado de lutas e de aspirações, de alegrias e tristezas, mas tudo fortalecido consciente ou inconscientemente pelo sentido de comunidade, de que a Faculdade era um lugar comum a todos. Os movimentos estudantis pelos melhores professores, o controle do acesso de professores à faculdade, a coleta para pagar a mensalidade dos mais pobres, a atuação de líderes em congressos nacionais, a liberdade de expressão, a defesa da federalização da escola, as festas e os bailes inesquecíveis, as defesas de trabalhos científicos, o orgulho de pertencer a uma Faculdade de conceito nacional, a veneração por mestres identificados pelo acentuado espírito público, as brincadeiras e arruaças e as lutas contra as políticas do sistema, são recortes de um cotidiano que aperfeiçoava o conhecimento, mas dignificava o estudante nesse momento histórico. Entre os professores pontificava o espírito público e, por conseqüência, a luta por uma Faculdade que passou a ser a defesa de uma causa educacional e política no Estado. A correspondência trocada entre os diretores da Faculdade e as autoridades constituídas mostra a dignidade com que agiam os professores, principalmente, a lucidez que expressa um tempo que não poderia ser mais adiado, ou seja, o momento de organizar um curso de medicina no Pará com reflexo em toda a Amazônia. É comovente a disponibilidade dos professores abdicarem de seus salários para cobrir despesas da Faculdade, resistindo, assim, à crônica falta de investimento oficial em prol da educação. Na disposição dos professores em defender o ensino da medicina, para que o Estado do Pará não se sujeitasse a um tipo de centralização política que submetia o conhecimento a centros supostamente mais adiantados, na linha de uma indisfarçável colonização existente entre o Norte e o Sul. Essa mesma disposição de honrar uma causa provocou a inteligência, a sensibilidade e a cultura dos médicos Aristóteles Miranda e José Maria Abreu para evitar que o esquecimento pela via da burocracia, da desmemoria, da falta de orgulho cívico, de auto-estima, destrua a identidade da Faculdade de Medicina, hoje, integrada à Universidade Federal do Pará, uma integração burocrática e desumanizadora da história dos primeiros estudantes, professores, secretários e diretores de uma instituição que é um símbolo de dignidade e de honradez. Coube a esses médicos, hoje, como outros, ontem, que a fundação da Faculdade de Medicina não fosse jogada no lixo da história, não fosse totalmente esquecida por não ser respeitada e considerada em seu passado e em sua tradição. Excetuando os nomes dos autores do livro, não poderia citar nomes de fundadores, de alunos e de professores. Eles estão nas páginas do livro, eles recebem, portanto, as honrarias de uma memória a ser mais reconquistada pelas respostas de cada leitor que se dispuser continuar essa história. 13 14 Apresentação Num país onde se reclama tanto da “falta de memória” sentimonos felizes por escrever sobre um curso de medicina que caminha para seu centenário, o que é motivo de júbilo para todos. Este livro certamente interessará não só aos estudiosos da história da medicina do Pará, mas, principalmente, aos formados por aquela que, após várias denominações, chama-se novamente, Faculdade de Medicina*. Como o título informa, abordamos os primórdios do curso, em 1919 - e até mesmo antes dele -, até a Federalização, em 1950, delimitando, assim um período de tempo em torno de 30 anos. A proposta inicial seria escrever três livros: o primeiro; em acordo com o acima; o segundo compreenderia da Federalização até o período da Reforma Universitária; e o último abordaria dos tempos pós-Reforma e as outras tantas, até o momento atual. Por razões óbvias, este livro surge no momento em que a Faculdade, como carinhosamente sempre a chamaremos independentemente do nome que ostente oficialmente, completou recentemente 90 anos de sua criação. Uma longa trajetória durante a qual tem alternado períodos de crescimento, desenvolvimento e reconhecimento de sua importância, com outros menos notáveis, tornando-se objeto de críticas ou de elogios, na dependência da avaliação de seu desempenho como aparelho formador. Abstraindo circunstâncias eventuais, procuramos oferecer o máximo de informações obtidas, seja por meio de documentos, jornais de época e fotos, seja através de depoimentos pessoais e tudo o que nos fizesse chegar o mais próximo ao longínquo ano de 1919 e os posteriores até 1950. Em alguns tópicos fomos um pouco além de 1950, haja vista que os fatos históricos seguem um fluxo contínuo e nem sempre são facilmente divisíveis em períodos bem delimitados. Partindo de um esboço da sociedade paraense nos anos iniciais do século XX, tentamos reproduzir os primórdios da Escola, sua instalação e formação do corpo docente; o cotidiano da Faculda- 15 de, suas atividades e correlações, os locais onde se desenvolvia a prática médica; as atividades acadêmicas e a premiações; as lutas para a equiparação e, posteriormente, a Federalização; o crescimento da Faculdade, em sua importância e patrimônio. A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará foi construída por muitos, como acontece com qualquer instituição. Em meio a tantas possibilidades, traçar apenas o perfil de três dos seus construtores pode parecer injusto. Mas não é por acaso que a efígie dos três — Barão de Anajás, Camilo Salgado e Olimpio da Silveira — figura na medalha alusiva aos 50 anos da Instituição, comemorados em 1969. Como não falar de nomes ainda hoje lembrados como Jaime Aben-Athar, Acylino de Leão, Lauro de Magalhães, José Alves Dias Junior, Orlando Lima, Ophyr de Loyola, Porto de Oliveira, Renato Chaves e Prisco dos Santos? Todavia se o livro enveredasse por este caminho acabaríamos nos afastando da sua finalidade principal, que é a de contar um pouco da história da Faculdade de Medicina, e assim criaríamos um livro de perfis biográficos. 16 Além disso, seria preciso resgatar outros professores que não tiveram a sorte dos anteriores e desapareceram completamente da memória da Faculdade como Othon Chateau, Gastão Vieira, Carlos Arnóbio Franco, Francisco Pondé, Jayme da Silva Rosado, Arthur França, Hermógens Pinheiro, Sousa Castro, Hygino Amanajás Filho, Manoel Ferreira Bastos, Acatauassú Nunes Filho e muitos outros nomes que aguardam um merecido reconhecimento. E finalmente, partindo de uma frase que certa vez ouvimos, quando este livro ainda não havia nem sido pensado, que era “impossível” escrever a história da Faculdade de Medicina, e esperando não desapontar os possíveis leitores, poderíamos responder: “pelo menos, tentamos”! * Os nomes foram Faculdade de Medicina do Pará, Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, Faculdade de Medicina da Universidade do Pará, Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Pará e até recentemente curso de medicina da Universidade Federal do Pará. 1 Os primórdios 17 18 Detalhe de um dos pisos da FMCP - 3º andar. Escrever sobre a história do curso de medicina da Universidade Federal do Pará é escrever sobre a instalação dos cursos médicos no norte e nordeste do Brasil, uma vez que a antiga Faculdade de Medicina do Pará (seu primeiro nome) precede a do Recife — a primeira do Nordeste, após a da Bahia — em um ano (PEREIRA NETO, 2001, p. 112). É evidente que não se pode tentar contar essa história e sua importância para o desenvolvimento da região Norte, sem contextualizá-la socioeconomicamente. Ao ser fundada a Faculdade, em 9 de janeiro de 1919, e instalada em 1ºde maio do mesmo ano1 (BECKMANN, 2003, p. 235), o Pará, após os anos de fausto proporcionados pela exportação da borracha, vivia a grande crise econômica desencadeada pelo surgimento no mercado da borracha produzida pelos ingleses no leste asiático. Depois do “maior surto econômico já verificado na região” (MOREIRA, 1989, p. 13), o estado amargava uma crise sem precedentes. Os anos de 1910 marcaram internacionalmente o final da ‘belle époque’, “expressando a dissolução da organização econômica do século XIX – do que certamente a Amazônia não estaria isolada2” (DAOU, 2000, p. 64). Na Amazônia esta fase coincide, também, com o declínio da atividade extrativista da borracha, pela perda do monopólio da sua produção suplantada em volume e, consequentemente em preço, pelo produto da Malásia, obtido a partir de plantações organizadas cientificamente, causando a débâcle amazônica3 (WEINSTEIN, 1993). Se durante o ciclo da borracha os reflexos se fizeram sentir em termos culturais e educacionais, tais ações resultaram apenas na expansão da rede escolar, notabilizando-se, também, pelo aspecto arquitetônico das escolas, naquilo que Eidorfe Moreira chamou de “monumentalização” dos edifícios públicos destinados a este fim, como os Institutos Gentil Bitttencourt e Lauro Sodré (MOREIRA, 1989, p. 14). Todo este progresso econômico não resultou na criação de cursos superiores, sendo os únicos do período a Faculdade Livre de Direito (1902) e a Escola de Farmácia (1903), ambos funcionando precariamente; particularmente o curso de Farmácia, instalado no próprio Palácio de Governo e utilizando o Laboratório do Serviço Sanitário do Estado (MOREIRA,1989, p. 14). Esse desinteresse seria um reflexo das ações da elite dominante paraense, surgida com a economia da borracha (SARGES, 2000)4, que mais facilmente mandava seus filhos estudar na Europa do que no Brasil, atitude típica de países colonizados, mantendo a dependência intelectual e “emocional” à metrópole. Também poderia apontar para uma prosperidade “efêmera e superficial”, com a manutenção de uma economia ainda vivendo e praticando usos do período colonial (WEINSTEIN, 1993)5. Por tudo isso, seria desnecessário estimular a formação de “doutores” no próprio estado. Deste modo, chama atenção a criação de tais cursos superiores no Pará em plena depressão econômica (BECKMANN, 1985)6. A justificativa, para Eidorfe Morei- Os primórdios 19 seria a de que “uma força de retardamento atuara neste sentido, impedindo assim que esse incremento se processasse no período socioeconomicamente propício” (MOREIRA, 1989, p. 14). Seria por ter havido um aumento significativo da população, entre os anos de 1880 e 1910, por conta da imigração nordestina em fuga das secas e para trabalhar nos seringais, com parcela de colaboração da imigração estrangeira, particularmente européia (SANTOS, 1980)7? Ou porque a crise da borracha fizera “secar a fonte” dos recursos da burguesia paraense, que deste modo teve necessidade de criar condições para a reorganização da elite intelectual paraense, a sua “elite de doutores” (SARGES, 2000, p. 46), agora utilizando os meios locais? Assim, logo após a grande crise da borracha, cujos anos emblemáticos vão de 1911 a 1914, quando a queda do preço deste produto atinge duramente a economia e a sociedade amazônicas (SARGES, 2000, p. 58), surgem a Escola Livre de Odontologia (1914), seguindo-se a de Agronomia e Veterinária (1918) e a de Medicina (1919) (MOREIRA, 1989, p. 14). Por volta de 1920, Belém deixa de ser considerada a capital da borracha. A Amazônia entrava em processo de liquidação (SARGES, 2000)8, ainda que outros autores discordem desta afirmação (WEINSTEIN, 1993)9. 20 Se a criação do curso de medicina não coincide com o surto econômico propiciado pela borracha, não se pode deixar de levar em consideração que o período de fausto econômico e a conseqüente organização de uma elite intelectual médica (no caso) representada pela Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará (FIGUEIREDO, 2006)10, contribuíram para a “gestação” do novo curso de medicina. Outros fatores preponderantes eram as condições sanitárias da região, assolada constantemente por grandes epidemias, como a cólera, em meados do século XIX (BELTRÃO, 2004)11 e a febre amarela, no início do século XX (BRITTO; CARDOSO, 1973)12, sem contar com a endemicidade da varíola, malária e tuberculose, entre outras, o que certamente repercutiria no desenvolvimento das cidades financiadas pela borracha. Devido às péssimas condições de saneamento do estado no início do século XX, medidas necessitariam ser adotadas para modificar esse panorama. A vinda de Oswaldo Cruz, contratado pelo governo do Pará para o combate e erradicação da febre amarela, em 1910, resultaria na melhoria do estado sanitário de Belém como um todo (COSTA, 1973, p. 177). Como reforço à empreitada saneadora era necessária a formação de pessoal capacitado – entenda-se médicos - para aplicar na área da saúde os ares desenvolvimentistas já presentes nos outros setores da sociedade. Ao lado disso, a borracha atraíra muita gente para o Norte. Não apenas os nordestinos fugitivos das secas que arrasavam aquela região, mas também uma nova elite intelectual, que se formava nas faculdades estrangeiras ou nas do Rio ou da Bahia, aqui chegavam para tentar a vida, contando com a colaboração dos membros da Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 elite econômica local, cujos filhos antes eram mandados para estudar na Europa, em geral retornando a Belém depois de formados. Vale destacar também naqueles anos, o início da tentativa de consolidação da medicina como classe e organismo social, “contrastando com o exercício oculto da pajelança” (FIGUEIREDO, 2006, p. 42)13, em que a atuação dos médicos se fazia presente através da imprensa e outras publicações, participando de associações científicas e literárias debatendo problemas, divulgando os feitos nacionais e as conquistas científicas, compondo a “imagem da autoridade médica, do herói da cura e do benemérito cidadão” (FIGUEIREDO, 2006, p. 42). A medicina científica buscando seu lugar na sociedade, com os médicos amparados no prestígio da profissão ocupando cargos na vida pública, firmando-se como locus de conhecimento e de poder. Esta tese é encampada por Acylino de Leão, em seu discurso em 1º de maio de 1919, quando da instalação da Faculdade14. Embora todo este esforço e a par do desenvolvimento alcançado, o número de médicos em Belém, na década de 191015, era muito pequeno, fazendo com que a população preferisse o “tratamento” através da medicina popular, embora alguns médicos fossem também “acusados” de utilizar os mesmos “produtos farmacêuticos” prescritos pelos curadores, “incluindo-se aqui, as mesmas ervas e beberagens” (FIGUEIREDO, 2006, p. 42). Paralelamente, começava-se a divulgar a atuação de médicos, já se definindo por especializações, culminando com a criação de uma sociedade científica mais específica para a divulgação de suas atividades e que seria a Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, fundada em 12 de julho de 1914, por cisão da Sociedade Medico-Pharmaceutica do Para (PARÁ-MEDICO, set. 1922, p. 225). Diante desses dados Clodoaldo Beckmann se pergunta qual teria sido o fator desencadeante para a fundação de uma faculdade de medicina no Pará e fornece algumas respostas: A exigência social, em sentido largo, é o fator preponderante ou, mesmo, determinante da criação de uma Escola Superior. Há sempre a ideia de atribuir o papel criador a homens, grupos ou facções. Se a premissa anterior estiver satisfeita, os acontecimentos fluirão subseqüentemente em sentido positivo. Caso contrário a Instituição degenera e morre” [...] O poder governamental por certo não foi. Ela se manteve longe de intromissão do poder público por mais de trinta anos. A qualificação profissional e científica e da comunidade médica de Belém teve sua influência. Os médicos possuíam um elevado padrão de conhecimentos e não é exagero afirmar, que praticavam a mesma medicina convencional do resto do país. Constituíam, no entanto, uma elite intelectual, um círculo fechado, pois o caminho da formação médica estava vedado àqueles que não possuíam recursos para sair de Belém. Aqui está uma parcela da exigência social. Outra, seria a necessidade numérica de médicos para atender aos problemas sanitários do Estado... (BECKMANN, 2003, p. 245). Os primórdios 21 Por outro lado, não se pode deixar de reconhecer que com a “quebra” da borracha a sociedade empobrecera; ficara mais difícil, se não impossível, mandar os filhos para a Europa. E por que não criar, então, condições para a elite estudar em casa, mesmo, permitindo, de qualquer maneira, que se mantivesse o status quo? Além disso, depois da profunda crise vivida pela região devido à borracha, a mãode-obra oriunda dos seringais migrou para os núcleos abertos na área da estrada de ferro Belém-Bragança, onde tentaria manter-se com o cultivo de uma agricultura de subsistência. Esta nova atividade agrícola aliada à extração madeireira e coadjuvada pela coleta da castanha-do-pará — que chegaria inclusive a suplantar a borracha como produto de exportação16 —, buscava injetar algum ânimo na combalida economia do estado, levando a que se considere que a economia amazônica “caminharia em convalescença até 1920 (SANTOS, 1980, p. 279), com interessantes inserções que colocariam o Pará, em 1918, entre os dez maiores produtores de milho, feijão e arroz, e como o quarto produtor de farinha do país (WEINSTEIN, 1993, p. 283). 22 Ao lado deste cenário regional, o século XX revelaria um “lento e profundo processo de transformação do conhecimento médico e de seu mercado de trabalho”, com o desenvolvimento científico e tecnológico da medicina, levando-a à especialização franca, refletindo-se nos currículos dos cursos, e também introdução de equipamentos permitindo uma melhora na precisão diagnóstica (PEREIRA NETO, 2001, p. 19). Isto tudo alteraria o modo de fazer medicina, iniciando a fase da “medicina tecnológica”, cujo apogeu seria a partir dos anos 50 daquele século. Em meio a isso tudo, surge a Faculdade de Medicina do Pará, tornando realidade o projeto sonhado ainda no governo Paes de Carvalho, quando este governador — e também médico — pensou na criação de cursos superiores para o estado, ao ponto de editar uma lei sobre o assunto ainda em 189917. A referida lei previa cursos de direito, medicina e engenharia a serem criados no ano seguinte18 (BRASIL, 1899). Não praticada em sua gestão, foi esquecida pelos governos subseqüentes, assim como também o seu próprio autor quando se escreve sobre a(s) história(s) da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Somente vinte anos depois da lei editada por Paes de Carvalho é que “um grupo de medicos clínicos, nesta capital, desejosos de espalhar as sciencias que professam e de ensinar sua arte, deliberaram fundar uma escola de medicina” (PARÁ. Governador 1921-1925: Antonino Emiliano de Souza Castro, 07.09.1924, p. 63). Conforme atestaria Lauro Sodré três anos depois em carta para Camillo Salgado, num cenário nebuloso, cheio de indefinições19. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 NOTAS 1 Para ter acesso à transcrição da ata de instalação e posse dos professores consulte Beckmann (2002, p. 256). 2 “A ‘bela época’ é expressão da euforia e do triunfo da sociedade burguesa no momento em que se notabilizavam as conquistas materiais e tecnológicas, se ampliaram as redes de comercialização e foram incorporadas á dinâmica da economia internacional vastas áreas do globo antes isoladas. (DAOU, 2000, p. 7). 3 “Após vinte anos de trabalho dedicado de botânicos e empresários britânicos, as plantações de hévea na Ásia tinham, afinal, começado a produzir borracha em quantidades consideráveis” (WEINSTEIN, 1993, p. 243). 4 “A economia da borracha determinou alterações acentuadas na estrutura social belenense. Surge, então, uma classe de homens políticos e burocratas formada por nacionais; os comerciantes, basicamente portugueses; os profissionais liberais, geralmente de famílias ricas e oriundos de universidades européias. Esta era a composição da elite dominante.” (SARGES, 2000, p. 58). 5 “A prosperidade promovida pelo negócio da borracha, ao contrário, mostrouse efêmera e superficial. Os teatros de ópera mundialmente famosos, as mansões suntuosas e as extravagâncias de legendários nababos criaram para a região uma deslumbrante fachada, por detrás da qual, porém, havia um sistema de produção e uma rede de trocas que pouco diferiam das estruturas sócioeconômicas características do período colonial”. (WEINSTEIN, 1993, p. 16). 6 “Somente após a quebra da borracha, em 1912, é que viria a expandir-se o nosso ensino superior, num evidente contraste econômico-social”. (BECKMANN, 1985, Tomo 1). 7 “houve colonização dirigida pelo governo e por particulares para fins agrícolas; por parte dos imigrantes, face o fracasso das colônias, encaminharamse para os seringais. Houve imigração induzida por intermediários mais ou menos inescrupulosos, que arregimentavam gente no Nordeste brasileiro para os trabalhos extrativos de borracha”. (SANTOS, 1980, p. 87). “No período de apenas 40 anos, de 1870 a 1910, ela (a população) subiu de 323.000 a 1.217.000 habitantes, quase quatro vezes” (SANTOS, 1980, p. 109). 8 “Por volta de 1920, configura-se o fim de um ‘ciclo’ de crescimento, em razão da redução da produção do látex amazônico, determinada pela concorrência asiática e pela produção da borracha sintética em laboratórios europeus e norte-americanos. Belém deixou de ser a ‘capital da borracha’; [...] (SARGES, 2000, p. 46). 9 “Por mais grave que possa ter sido a decadência, os relatos que descrevem a região como tendo entrado em total agonia exageraram a extensão da calamidade”. (WEINSTEIN, 1993, p. 286). 10 “O problema da formação de médicos era tão urgente entre as lideranças da classe que, apenas cinco anos depois de fundada a confraria, os mesmos diretores da casa estiveram à frente da criação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará” (FIGUEIREDO, 2006, p. 44). 11 “Estudar a cólera no Grão-Pará é resgatar à História, as gentes que, nos anos 40, 50, 60 do século XIX, ainda cuidando das feridas abertas pela Cabanagem, debateram-se com as diversas epidemias”. (BELTRÃO, 2004, p. 23). 12 “O quadriênio administrativo do engenheiro João Antonio Luiz Coelho, por mandato popular, na mais alta magistratura do Pará, em cujo exercício se investiu a 1º de fevereiro de 1909, ficou decisivamente ligado à história da Os primórdios 23 24 febre amarela neste Estado” (BRITTO; CARDOSO, 1973, p. 49). 13 “A visibilidade da atividade médica deveria, cada vez mais, contrastar com o exercício “oculto” da pajelança [...]” (FIGUEIREDO, 2006, p. 42). 14 “começa o illustre clinico dizendo que o magno problema, no Brasil, era o povoamento do solo, pondo em evidencia o desamparo dos nossos sertões, cujas populações estão entregues á corte dos ‘pagés’ e ‘mandingueiros’, e reputa como factor principal, para solução desse problema, a acção da sciencia medica, enviando para lá a sua fonte de recursos. Ao amparo dessa theoria, continúa o orador, veiu a idea da fundação da Faculdade de Medicina do Pará, cujos fructos serão os mais preciosos” (Estado do Pará, 03.05.1919). 15 Em seu relatório do primeiro ano de gestão como Diretor da Faculdade de Medicina, Camillo Salgado contabilizava pouco mais de cem médicos em atividade no estado, para atender, só em Belém, duzentos mil habitantes (FMCP, 1923). 16 “em 1921, a castanha-do-pará havia passado à frente da borracha como produto de exportação mais valioso do Pará” (WEINSTEIN, 1993, p. 289). 17 José Paes de Carvalho foi governador do Pará de 1897 a 1901. Eleito senador em 1903 assumiu e retirou-se em definitivo para Paris. Médico humanitário foi durante muitos anos amigo dos paraenses e brasileiros na capital francesa, além de assessor das relações financeiras entre o Brasil e seus banqueiros europeus. Cf. (BORGES, 1986, p. 176-181). 18 “Lei 629 de 22 de maio de 1899: Art. 1º - Ficam creadas n’esta capital as seguintes escholas superiores: direito, medicina e engenharia, com as divisões relativas aos differentes cursos, de accordo com o programma das escholas congeneres da União. Art. 2º - O Governador promoverá a installação de todas ou de algumas das faculdades, no começo do anno vindouro, decretando-lhes os respectivos estatutos e fazendo as primeiras nomeações.” D.O.E. 24.05.1899. 19 “Quando essa idéa de crear uma Escola de Medicina surgiu ahi, era eu governo, e como tal fiz o que em minhas mãos esteve para ajudal-os no ousado commetimento, que a meus olhos apparecia como uma temeridade, um acto de coragem e ao mesmo tempo de fé e confiança nas energias da nossa gente.” Uma carta de Lauro Sodré. In: Faculdade de Medicina do Pará (1923, p. 21). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Foto 1: Dr. José Paes de Carvalho, governador do Pará de 1897 até 1901, possivelmente o primeiro a pensar em um curso de medicina para o estado do chegando a editar uma lei que criava Faculdades de Medicina, Engenharia e Direito no Estado do Pará. Entretanto, tal lei jamais foi efetivada. Fonte: CÁCCAVONI, Arthur. Album Descrittivo Annuario dello Stato del Pará 1898. 25 26 2 A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará – o dia que o tempo apagou 27 28 Detalhe de um dos pisos da FMCP - entrada principal. Bastaram algumas décadas de descaso para que as circunstâncias da fundação da Faculdade de Medicina do Pará1 fossem completamente cobertas pela poeira do esquecimento, tornando sua reconstrução nebulosa e insatisfatória. Com o passar dos anos determinados trechos de uma edição especial da revista Pará-Médico de 1922, passaram a ser repetidos, sempre que se mencionava a fundação da Faculdade, quase de forma dogmática: Foi no derradeiro dos annos de 1918 que alguns membros da Associação Scientífica do Pará, mantedora da Escola de Odontologia, procuraram o illustre médico paraense Dr. Camillo Salgado e apellaram ao seu espírito elevado e ao seu legítimo prestígio na classe medica, para que pudesse ser realidade a creação de uma Faculdade de Medicina cuja direcção lhe foi oferecida (PARÁ-MÉDICO, 1922, p. 360). As ideias, surgem muitas vezes, da vontade coletiva, sem dúvida, mas há sempre alguém que pensa antes. Partindo deste ponto, quais foram estes membros da Associação Científica do Pará que procuraram Camilo Salgado? Ou mesmo o que foi esta Associação? Acreditava-se que a Associação Científica do Pará teria sido primeiramente conhecida como Sociedade Propagadora das Ciências, entidade fundada em maio de 1914 por Joaquim Tavares Vianna2. Pouco depois, em 4 de julho de 1914, na casa dele e sob sua presidência, a Associação Científica do Pará contando com membros como Antônio Magno e Silva, Carmelino Salgado, Antônio Peryassú, Camilo Salgado, Pinheiro Sozinho, Jayme Aben-Athar e o farmacêutico Lima e Silva, decide criar a “Escola Livre de Odontologia do Pará”. O grupo transforma-se na Congregação da nova instituição e nomeia Joaquim Tavares Vianna como Diretor, Antônio Magno e Silva como Vice e Lima e Silva como Secretário (RIBEIRO, 2005, p. 12). Em 1915, Antônio Peryassú assume a direção da “Escola Livre de Odontologia do Pará”; de 1916 até meados de 1917 é Jayme Aben-Athar quem a dirige; de 1917 em diante, Antônio Magno e Silva torna-se diretor, cargo que deixaria somente em 1938 (RIBEIRO, 2005, p. 13). É durante a gestão de Magno e Silva, por resolução da Congregação da escola em deliberação unânime, que é criada, em 9 de janeiro de 1919, a Faculdade de Medicina do Pará (RIBEIRO, 2005, p. 13). O que ocorreu de fato naquela reunião é pura especulação, haja vista sua ata ter sido dada como desaparecida. Diz-se que a ideia de criar uma escola médica no Pará teria partido de Magno e Silva, como informa Folha do Norte, a quando do falecimento deste: Foi ainda por sua iniciativa que se fundou a nossa Faculdade de Medicina, idéa considerada por muitos como uma loucura, mas que para sua alma de grande batalhador era uma realidade insophismável. A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará - O dia que o tempo apagou 29 E após os primeiros embates, a Faculdade de Medicina surgiu, como mais uma clara vereda, aberta aos horizontes do ensino superior de nossa terra. E nella Magno e Silva se fez médico, após brilhante tirocínio, pra ir afirmar na vida clinica os seus meritos, os seus grandes conhecimentos scientificos (Folha do Norte, 28.01.1939). Clodoaldo Beckmann (2003, p. 248) confirma o mesmo fato acrescentando outros nomes que abraçaram a iniciativa: O que parece não deixar dúvida é que a ideia da fundação da Faculdade de Medicina nasceu na Escola Livre de Odontologia, que era mantida pela Associação Científica do Pará. Orlando Lima, professor catedrático de Obstetrícia disse-me em 1950: “A Faculdade de Medicina nasceu graças à dissidência que se verificara na Escola de Odontologia, ao final de 1918. Antônio Magno e Silva deu a ideia. A ele se uniram Renato Franco, Hermógenes Pinheiro, Evaristo Silva, Álvaro Gonçalves e Carlos Arnóbio Franco, que saíram pelas ruas do comércio, com uma bandeira brasileira, angariando donativos. Conseguiram um conto e setecentos mil réis, dos quais quinhentos mil réis doados pelo Banco Ultramarino”. E acrescentou: “Foram estes os verdadeiros fundadores”. É de notar que alguns deles sequer eram médicos nem são citados nos trabalhos que indicam a galeria de fundadores. 30 A dissidência, na Escola Livre de Odontologia, mencionada por Beckmann é mais bem esclarecida por fontes mais antigas, que derrubam a ideia vigente que a “Associação Científica do Pará” e a “Sociedade Propagadora das Ciências” eram a mesma instituição com uma mera mudança de nomenclatura (RIBEIRO, 2005, p. 12). O “Relatório do Governador Lauro Sodré de 1918” destrói este mito e acrescenta novos fatos: O Centro Propagador das Sciencias, fundado nesta capital em 23 de janeiro deste anno, tem por fim a creação e manutenção de cursos e ensino superior. Desde sua installação fundou a Faculdade de Odontologia, adoptando um programa de ensino theorico-prático em 3 annos, confiadas as cadeiras que os constituem a professores bem escolhidos. A direção desta faculdade está confiada ao dr. Jayme Aben-Athar. O mesmo Centro installou a Escola de Agronomia com um curso dado em tres annos, sendo as cadeiras que elle abrange regidas por lentes de reconhecida aptidão. [...] A Diretoria do Centro Propagador das Sciencias está a cargo dos Drs. Arthur França, Pinheiro Sosinho, Porto de Oliveira e Carvalho Lima. Funciona regularmente a Escola Livre de Odontologia do Pará, fundada em Belem a 4 de Julho de 1914. [...] Dirige-a o professor Magno e Silva e é bem constituido seu corpo docente, constituido por medicos e cirurgiões dentistas. (PARÁ. Governador (1917-1921: Lauro Sodré), 07.09.1918, p. 58). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Fica claro então que a “Sociedade Propagadora das Ciências” ou “Centro Propagador das Ciências” foi fruto de uma dissidência entre alguns membros da “Associação Científica do Pará”, como Jayme Aben-Athar e Pinheiro Sozinho. Na ausência de fontes melhores, os jornais da época trazem um pouco mais de luz à questão: Pinheiro Sozinho, então secretário da Escola Livre de Odontologia, estaria “dizendo-se indevidamente director do estabelecimento e annullando actos da congregação, o que provocou protesto dos proprios alumnos da Escola” e sua demissão do cargo, bem como instauração de um processo disciplinar contra ele (Folha do Norte, 12.10.1917). Um mês antes, em setembro de 1917, Jayme Aben-Athar, durante acalorada reunião extraordinária da Congregação, para discussão a respeito de um abaixo-assinado feito pelos alunos de odontologia, que solicitavam a equiparação da Escola Livre de Odontologia e a anexação desta à Escola de Farmácia, “demittiu-se dos logares de director e lente de histologia, physiologia e hygiene, retirando-se do recinto da Escola” (Folha do Norte, 20.07.1917). Pinheiro Sozinho, Jayme Aben-Athar e outros dissidentes logo criariam a “Sociedade Propagadora das Ciências”, que fundaria a “Faculdade de Odontologia do Pará”, a qual, em janeiro de 1918, já contava com vinte e dois candidatos à matricula no primeiro ano, funcionando sua secretária provisoriamente na Rua Nova de Sant´Anna, nº 36, para posterior transferência para o prédio onde funcionava a Santa Casa de Misericórdia na praça Frei Caetano Brandão. (Folha do Norte, 31.01.1918, p. 2). Na competição realizada via anúncios nos jornais (Folha do Norte, 16.02.1918, p. 1) entre a “Escola Livre de Odontologia do Pará” e a “Faculdade de Odontologia do Pará” cada uma ressaltando suas qualidades, sobreviveria a mais antiga3. Em março de 1919, por interferência do senador Cypriano Santos, as instituições entraram em acordo e o curso odontológico criado pela “Sociedade Propagadora das Ciências” foi extinto valendo aos alunos que ali estavam matriculados a transferência para a “Escola Livre de Odontologia”. A “Sociedade Propagadora das Ciências” manteve apenas seu curso de agronomia (Estado do Pará, 26.03.1919). Deste modo, pode-se afirmar que a Faculdade de Medicina nasceu não apenas em um contexto econômico incerto4, mas também em um momento de discórdia entre membros importantes da classe médica. Jayme Aben-Athar seria o exemplo mais notório: mesmo sendo nomeado para reger a cadeira de Anatomia Patológica da Faculdade na ata de 3 de abril de 1919, sua assinatura não aparece no documento. Ele somente assumiria o cargo, até então ocupado por Prisco dos Santos, em 12 de janeiro de 1924 (FMCP [1950]). Por outro lado, Porto de Oliveira, que também era membro da “Sociedade Propagadora de Ensino”, parece ter colocado suas diferenças de lado, assumindo a cadeira de psiquiatria desde o início. A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará - O dia que o tempo apagou 31 Outro ponto ligado à Associação Científica do Pará e à Faculdade de Medicina, e ainda obscuro, diz respeito às relações entre ambas. O já citado número especial da Pará-Médico, referindo-se à criação da Faculdade, cita que: “Em pouco mais de um anno caminhando promissoramente, a Faculdade, se desligou da Associação Scientífica e passou a ser administrada pelo seu corpo docente.’ (PARÁ-MÉDICO, 1922, p. 360). O que teria motivado este desligamento tão prematuro, fato que não ocorreu com a Escola Livre de Odontologia do Pará, que permaneceu vinculada àquela associação por muito mais tempo? Uma hipótese talvez recaia sobre o fato de Antônio Magno e Silva pertencer à primeira turma da Faculdade de Medicina. Poderia ter sido considerado antiético que a Associação Científica então controladora da Faculdade fosse composta por alunos desta última?5 Por fim, independente do que tenha acontecido naquele 9 de janeiro e do que ainda se venha a descobrir sobre as circunstâncias que cercaram a criação da Faculdade de Medicina do Pará, o pioneirismo de seus fundadores é eterno e seu mérito inquestionável. Nascia assim a oitava escola médica do Brasil6. NOTAS 32 1 Era assim que a Faculdade era conhecida em seus primórdios. O “de Cirurgia” surge em algum ponto após 1923. Em alguns relatórios dos governadores outros nomes são observados com menos frequencia como “Faculdade Livre de Medicina do Pará”. (N.A). 2 Figura injustamente esquecida e que durante toda sua vida exerceu magistério em diversas escolas de Belém, como no Liceu Paraense onde foi professor de História Natural, na Escola Normal, na Escola da Marinha Mercante do Pará e ainda na Escola de Farmácia, onde chegou a diretor. Era catedrático de Química Mineral, Orgânica e Industrial, e foi lente de Química Orgânica e Biológica na Escola de Agronomia e Medicina Veterinária (REGO, 2002, p. 94). 3 Em 12 de abril de 1920 a Escola Livre de Odontologia do Pará passou a chamar-se “Faculdade Livre de Odontologia do Pará” sendo hoje parte da Universidade Federal do Pará (UFPA). (RIBEIRO, 2005). 4 Ver capítulo “Os Primórdios”. 5 Clodoaldo Beckmann contava uma antiga anedota a respeito da fundação da Faculdade de Medicina do Pará: Magno e Silva teria viajado para o Rio de Janeiro para formar-se em medicina. Entretanto, sabe-se lá porquê voltou dentista para aborrecimento de seu pai. Este desejando ver seu filho médico a todo custo, mas já sem recursos para custeá-lo em outro estado, lhe obrigou a criar uma Faculdade de Medicina no Pará. A anedota é bastante interessante, ainda que careça de fontes que a comprovem. 6 A ordem de criação das dez primeiras escolas médicas no Brasil é a seguinte: 1ª - Salvador. Fundada em 18 de fevereiro de 1808. Escola de Anatomia, Medicina e Cirurgia, Faculdade após 1832. Ligada atualmente à UFBA. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 2ª - Rio de Janeiro. Fundada em 5 de novembro de 1808. Escola de Anatomia, Medicina e Cirurgia, Faculdade após 1832, posteriormente Faculdade Nacional de Medicina da Universidade do Brasil. Ligada atualmente à UFRJ. 3ª - Porto Alegre. Fundada em 25 de junho de 1898, início do curso em 1899. Ligada atualmente à UFRS. 4ª - Belo Horizonte. Fundada em 5 de março de 1911, início do curso em 8 de abril de 1912. Integrada hoje à UFMG. 5ª - Rio de Janeiro. Faculdade de Medicina Homeopática do Rio de Janeiro, ou Faculdade Hahnemanniana, posteriormente Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro. Fundada em 1912, início do curso em 1º de fevereiro de 1913. Integrada hoje à Uni-Rio. 6ª - São Paulo. Faculdade de Medicina de São Paulo. Fundada em 19 de dezembro de 1912, início do curso em 2 de abril de 1913. Atual FMUSP. 7ª - Curitiba. Faculdade de Medicina do Paraná. Fundada em 28 de outubro de 1913, início do curso em 13 de abril de 1914. Ligada atualmente à UFPR. 8ª - Belém. Faculdade de Medicina do Pará. Fundada em 9 de janeiro de 1919, início do curso em 1º de maio de 1919. Integrada atualmente à UFPA. 9ª - Recife. Faculdade de Medicina do Recife. Fundada em 5 de abril de 1915, início do curso em 16 de julho de 1920. Integrada atualmente à UFPE. 10ª - Niterói. Faculdade Fluminense de Medicina. Fundada em 25 de junho de 1925, início do curso em 31 de maio de 1926. Integra hoje a UFF. In SARINHO, Clóvis Travassos. Faculdades de Medicina do Brasil (As dez mais antigas)-Resumo Histórico. Nordeste Gráfica. Natal, 1989. 33 A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará - O dia que o tempo apagou 34 3 A instalação era preciso começar 35 36 Detalhe do assoalho do Salão Nobre da FMCP. Da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, em 9 de janeiro de 1919, até sua instalação, em 1º de maio do mesmo ano, se passaram cento e treze dias. Isto é, menos de quatro meses. Em se tratando da criação e da instalação de uma Faculdade de Medicina, partida exclusivamente da iniciativa particular, é um tempo recorde. Basta que se compare com instituições surgidas de forma semelhante na Velha República. A Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, por exemplo, levou mais de um ano desde a fundação até sua aula inaugural (SALLES, 2004, p. 121). No Rio Grande do Sul, o tempo foi de quase sete meses (SARINHO, 1989, p. 167). No Paraná as coisas foram um pouco mais velozes e a Faculdade levou aproximadamente seis meses para iniciar suas aulas (SARINHO, 1989, p. 167). No extremo oposto ficou a Faculdade de Medicina do Recife, que amargou cinco longos anos após a fundação para iniciar suas atividades (KELNER, 1985). Se fosse uma competição, somente a Faculdade de Medicina de São Paulo ganharia a iniciativa paraense por cerca de uma semana: apenas cento e cinco dias decorreram entre sua fundação e a aula inaugural (SALLES, 2004, p. 127). Convém ressaltar que se não fosse talvez pela falta de recursos ou possíveis problemas na formação do corpo docente, o tempo decorrido entre fundação e instalação da Faculdade de Medicina do Pará teria sido ainda menor, pois o jornal Estado do Pará, após noticiar a criação de uma Faculdade de Medicina no estado1, anunciava o início das aulas para dois de abril2. Por mais que a rapidez dos médicos paraenses possa ter sido interpretada como imprudência por muitos de seus contemporâneos, Belém já contava com mão de obra capacitada para formação de um corpo docente satisfatório, além de um hospital adequado, condições básicas para a instalação de um curso médico. Podia até faltar dinheiro, mas sobrava vontade de transformar3. A cidade também não ficou completamente indiferente à iniciativa. Alguns comerciantes contagiados pela idéia contribuíram com o que puderam: É assim que os srs. Manoel Pedro e Bernardino da Cunha Mendes num gesto altuistico offereceram material no valor de 220$ o primeiro e 140$ o segundo. O sr. Tavares Cardoso promptificou-se a fornecer generosamente material de papelaria para o expediente. Egual proceder tiveram o sr. Moraes Cunha e o Paris N’ America, que cooperaram na medida de suas posses, com varios donativos de valor. Prometteram auxiliar a Faculdade, enviando beneficios, os proprietarios da conhecida Fabrica de Moveis Esperança, de Azevedo e Talhadas e o commerciante de nossa praça, sr. Ignacio Obadia. Sabemos que varias pessôas irão auxiliar a Faculdade. Todo e qualquer auxilio deve ser enviado para a séde da Escola, á rua João Diogo, andar terreo do Gymnasio Paes de Carvalho. (Estado do Pará, 14.02.1919, p. 1). A Instalação - Era preciso começar 37 E ainda: Enviaram donativos para a fundação da Faculdade de Medicina [...]. Os srs. Pires Teixeira e Cia, Moreira Gomes, Sousa Fernandes e Cia, Cortez Coelho, Sabino Silva, B. S. Vianna, a quantia de 100$ cada um; Azevedo e Talhadas uma carteira no valor de 120$; Mauricio Gama e Silva material escolar na quantia de 100$. Prometteram auxiliar o altaneiro tentamem os srs. A. Mourão & Cia, Ribeiro da Silva & Cia, Barbosa Rodrigues & Cia, Bazar Liquidador e outros. O benemérito governador do Estado cedeu a impressão gratuita dos programmas, regulamentos, etc (Estado do Pará, 25.02.1919, p. 1). Os primeiros exames de admissão para o curso médico estavam previstos para 24 de março, sendo o prazo para inscrição prorrogado “por mais nove dias, dando assim tempo sufficiente a que todos os candidatos se inscrevam” (Folha do Norte, 11.03.1919, p. 1). A congregação decidiu ainda que, somente naquele ano, estariam dispensados dos exames de admissão os bacharéis de direito, engenheiros, farmacêuticos, dentistas, professores normalistas e os que “hajam completado o seu curso de humanidades em quaesquer estabelecimentos de ensino superior do Estado ou a elles equiparados” (Folha do Norte, 11.03.1919, p. 1). 38 A atitude da congregação parece mostrar que a Faculdade de Medicina procurava candidatos e não o contrário. Tal situação, que certamente contribuiu para que o curso não começasse em 2 de abril, pode ser interpretada como uma certa incredulidade para com a nova Escola. As medidas parecem ter surtido efeito, visto que pouco tempo depois o mesmo jornal afirmava ser elevado o número de candidatos matriculados na Faculdade de Medicina do Pará (Folha do Norte, 22.03.1919, p. 1)4. De qualquer forma a iniciativa ultrapassou as fronteiras do estado havendo notícias de que a criação de uma nova escola médica atraiu a atenção de candidatos do Amazonas, Maranhão, Ceará e Pernambuco (Estado do Pará, 25.02.1919, p. 1). Assim, em 1º de maio de 1919, seria oficialmente instalada a Faculdade. Por seu inquestionável valor histórico, transcrevemos, integralmente, a sua ata de instalação: Acta da sessão solemne de Inauguração da Faculdade de Medicina do Pará, realizada no salão nobre do “Gymnasio Paes de Carvalho”. Ao primeiro dia do mez de maio do anno de mil novecentos de dezenove, nesta cidade de Belém do Pará, reunidos no salão de honra do Gymnasio Paes de Carvalho, gentilmente cedido pelo Excellentissimo Senhor Doutor Secretario Geral do Estado, os Excellentissimos Senhores: Doutor Barão de Anajáz, Director da Faculdade; Capitão Pedro Borges do Rego, ajudante de ordens e representante do Governador do Estado; Major Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Dr. Luiz Lobo, representante do General Calheiros de Lima, chefe da Região Militar, Capitão José Vicente Franco e Tenente Alfredo Câmara pelo Coronel Cearense Cyleno, commandante da Brigada Militar do Estado; Conego João Crolet, pelo Gymnasio Paes de Carvalho; Coronel Vicente Hollanda, pelo Club Militar do Pará, Sociedade Mecanica Paraense e Collegio Gram-Pará; professor João Amaral pela Escola Livre de Odontologia; Henrique José de Lima, Helio Coelho e José Aranha, pela Alliança Academica do Norte; Altino de Almeida Telles, pela Escola de Pharmacia; doutores Penna de Carvalho, Francisco Caribé da Rocha, Acylino de Leão, Mario Chermont, Arnobio Franco, Camillo Salgado dos Santos, Porto de Oliveira; presentes também os Drs. Camillo Salgado, Vice-Director da Faculdade, Raymundo de Mattos Cascaes, Jayme Rozado, Evaristo Silva; conego Andrade Pinheiro; senador Marco Nunes; Dr. Ignacio Moura, pelo Instituto Histórico Geographico; professor Bertholdo Nunes; Dr. Heraclito Pinheiro, Saturnino Fernandez, José Penna e Costa; Dr. Genaro Ponte e Sousa, redactor da edição vespertina do “ Estado”; Cantidio Lopes da Silva; Oscar Salvador; professor Manuel João Alves, sub-secretario da Faculdade; pharmaceuticos Aristoteles Balestrero e Bernardino Couto; Olavo Mendes, cirurgião dentista; Eudoxio Lyra Lobato; Rubens Serra Freire; Asthyfero Lima; Horacio Lettra; Mario Paiva; Vulphilda e Guiomar Freire; Maria Monteiro da Silva; Manuel Bezerra; Henrique Alves Ribeiro; Maria dos Anjos e Esmeralda Monteiro, acadêmicas de Odontologia; professora Eugenia Hollanda; senhoritas Olga Paes de Andrade; Gabriella Hollanda; Anna Elizabeth Hammon; Edith Castro e outras pessôas, foi aberta a sessão sob a presídencia do Exmo. Sr. Barão de Anajáz, secretariado pelo Dr. Hermogenes Pinheiro. O mesmo Sr. Presidente declarou que a presente reunião tinha por fim a inauguração da Faculdade de Medicina do Pará, e em seguida passou a expôr de modo conciso as vantagens que este estabelecimento de ensino superior poderá trazer ao progresso deste Estado e ao desenvolvimento da Sciencia e do Trabalho em prol da Humanidade. Terminada a sua oração, o Sr. Presidente deu a palavra ao Sr. Dr. Acylino de Leão, que, em nome da Congregação agradeceu, o comparecimento das autoridades superiores do Estado, dos representantes das diversas classes presentes e bem assim das Exmas. Snras. e senhorinhas que se dignaram com suas presenças, abrilhantar a solemnidade. Começou o orador dizendo que o magno problema no Brasil, era o povoamento do solo, pondo em evidência o desamparo dos nossos sertões, cujas populações estão entregues à côrte dos pagés e mandigueiros e reputa como fator principal, para a solução desse problema, a acção da sciencia médica, enviando ate lá a sua fonte de recursos. Diz mais que ao amparo d`essa theoria, veio a idéa da fundação da Faculdade de Medicina do Pará, cujos fructos serão os mais preciosos. Mostra que nos necessitamos de médicos, homens de sciencia, que levem ao interior o concurso de sua actividade, libertando aquellas populações da pajelança, velando pela saúde desses braços que produzem o trabalho. Diz que a pratica tem demonstrado que os médicos formados pelas academias do sul, na maioria tomam o caminho de S. Paulo, Minas e outras capitais, onde as fortunas lhes acenam melhor um futuro proveitoso, e, assim, diz, só os nossos, os formados aqui, é que poderão lançar as A Instalação - Era preciso começar 39 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. 40 suas vistas para o interior, já movidos pelo trabalho, já pelo amor ao seu berço natal, ou pelos laços de família que ali os prendem. Faz o histórico do que era Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro há dez anos, quando elle, orador, se formara, mostrando que nós estávamos em condições de oferecer os mesmos médicos que aquelles que alli se diplomam. Faz ver mais que naquelle tempo alli, as falhas eram inúmeras, a chimica medica era rudimentar, a bacteriologia muito superficial e até a propria anatomia, que é base principal da sciencia medica, era falha, pelo grande numeros de alumnos que cursam a Faculdade. E nem por isso os formados pela academia do Rio de Janeiro, deixam de ser medicos. Expõe longamente que o sucesso da carreira medica está na clínica hospitalar e, nessas condições, nós poderemos ter excellentes diplomados. Accrescenta que a celeuma que se levanta é natural e, como exemplo, cita a fundação da Faculdade de Direito, que tanto deu que falar e a interrogar a muitos – Para que precisamos de tantos bacharéis? No entretanto, e pouco tempo tampo está ella provando o seu mais proveitoso resultado. No interior, onde os juizes sempre foram leigos, e, as mais das vezes, até analphabetos, temos hoje a substituil-os rapazes talentosos e formados em nossa Escola de Direito. È este o papel que está reservado á Faculdade de Medicina do Pará, cujo programa, acabava de expor. Diz também que o Brasil reclama de agrônomos e pergunta, como progredir si esses braços fortes não tiverem a mão protectora da medicina? Termina agradecendo a prova de confiança de seus colegas em escolhel-o para orador do acto. Em seguida usou da palavra o academico Deserée Pannain, que por algum tempo prendeu a attenção do audictorio, sendo, ao terminar, bastante aplaudido. Ninguem mais desejando usar da palavra, o Sr. Presidente dá por terminada a solemnidade e declara achar-se inaugurada a Faculdade de Medicina do Pará com os seguintes alumnos: - Antônio Magno e Silva, José Theophilo Ferreira, Salvador Pannain, Antônio Simões Pereira e Raymundo Magalhães (dentistas); Angelino Lima, Pio Ramos e José Martins Sant`Anna (advogados); Raymundo Proença, Manoel Dias Maia, Eugenia Hollanda, Edith Castro e Anna Hammond (professores); padre Emilio Martins; Justino Barroso; Aristóteles Fernandez; Manoel Ismael de Castro; Antônio Siqueira Mendes; Manoel Tertuliano de Cerqueira; Aluisio Cardoso; Matheus Lydio Pereira de Sousa; Francisco da Silva Nunes; Olga Paes de Andrade; Rodrigo Penna e Costa; Américo Dantas Ribeiro; Carlos Hygino da Silva; Peregrino Júnior; Thereza Hollanda; Gabriella Hollanda; Isauro Gonçalves da Costa; Anna Ismael Nunes; Gileno Pedrosa; Manuel Barbosa Rodrigues; Adelino Augusto de Miranda; Lucilo Fender; Eurico Barroso; João Angyone da Costa; Altino Novoa; Sebastião Bayma; B. Penalber, Raymundo da Silva Magno, Vinicius Corrêa Nunes, Jorge Franco de Almeida, Raymundo Godinho Filho, Luiz Antônio Paula Feio e Luiz Martins e Silva”. Em seguida o Exmo. Sr. Barão de Anajáz presidente do acto agradece o comparecimento de todas as pessôas que se dignaram a concorrer com suas presenças ao acto de inauguração da Faculdade de Medicina do Pará. E nada mais ocorrendo, é encerrada a sessão, e, para constar, eu Manoel João Alves, sub-secretario da Faculdade, lavrei a presente acta que será assignada pelo Sr. Presidente e mais membros da Congregação, e subscrita pelo sr. Secretário Dr. Hermogenes Pinheiro5. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Os jornais da época definiram o acontecimento como tendo sido uma solenidade simples, com plateia seleta (Folha do Norte, 03.05.1919, p. 2), iniciada às dez da manhã e encerrada às onze (Estado do Pará, 03.05.1919)6, com direito a banda de música dos Bombeiros Municipais na frente do “Paes de Carvalho” (Folha do Norte, 03.05.1919, p. 2).7 e duas “chapas photograficas” feitas por Antônio Brasil: uma dos professores da Faculdade e outra de seus acadêmicos (Folha do Norte, 03.05.1919). A transcrição da ata nos brinda ainda com algumas curiosidades: derruba o mito, surgido com o passar dos anos, de que o governador Lauro Sodré teria comparecido ao evento8, quando na verdade sua única visita à Faculdade foi em 1934 (Folha do Norte, 29.12.1934), muitos anos depois do seu apogeu como político. E comprova por alguns pronunciamentos nitidamente defensivos do Dr. Acilino de Leão, que a iniciativa de criar uma escola médica em Belém não foi de todo bem aceita. Camilo Salgado definiria assim o momento: Basta evocar como começamos, causando sensação e provocando o commentarios ridiculos dos que se admiravam como se queria manter uma Faculdade de Medicina em terra, na actualidade tão pobre de recursos financeiros (FMCP, 1923, p. 5). Dez anos depois Folha do Norte recordaria aquele inicio: Quando aqui se fundou nossa Faculdade de Medicina muito sorriso de mofa perpassou pelos labios dos entendidos, no tocante ao futuro desta casa de instrucção superior. Depois, com a sequencia dos annos, parece que aquella incredulidade a pouco e pouco foi desapparecendo, sobretudo quando, dos Estados vizinhos começaram a chegar os estudantes, e os estabelecimento, já equiparado aos melhores da nação, a emittir os primeiros diplomas (Folha do Norte, 24.02.1929, p. 1). Talvez a mais bela síntese do que significou tudo aquilo, tenha cabido a Orlando Lima, Catedrático de Clínica Obstétrica, em seu discurso como paraninfo à segunda turma de médicos, em janeiro de 1926: ...um grupo de Periodeutas plantou no solo fecundo do Pará a semente do ensino médico. E ella medrou, cresceu, desenvolveu-se, transformandose no arbusto e depois na arvore adulta que agora começa a dar seus nutrientes e saborosos fructos. Ao sopro da descrença ella curvou seu caule longo, mas não se quebrou. Luctou e venceu (PARÁ-MÉDICO, ago. 1927, p. 426). Naquela manhã o ensino médico na Amazônia dava seus primeiros passos concretos, ainda que claudicantes. A Instalação - Era preciso começar 41 NOTAS 1 42 “Ás melhores noticias com que surprehendemos o leitor todas as manhãs, ajunta-se hoje da próxima fundação, nesta capital, de uma Faculdade de Medicina [...]” (Estado do Pará, 15.01.1919, p. 1). 2 “Os fundadores da nova Escola juntamente com o director da mesma, o respeitavel e conceituado clinico Barão de Anajás e o vice-director dr. Camillo Salgado, gloria da cirurgia patria, estão desenvolvendo grande actividade, afim de que no dia 2 de abril comece a funccionar o futuroso estabelecimento” (Estado do Pará, 14.02.1919, p. 1). 3 Ver capítulos “Formação do Corpo Docente” e “O Hospital Escola primaza Santa Casa no contexto da Faculdade”. 4 A mesma nota neste dia afirma que os exames seriam realizados em 23 de março e a matrícula ocorreria até o dia 31. 5 Acta da sessão solemne de inauguração da Faculdade de Medicina do Pará, realizada no salão nobre do Gymnasio Paes de Carvalho. (FMCP, 1944, p. 67-70). 6 O jornal Folha do Norte do mesmo dia refere inicio às nove horas. No entanto, talvez o “Estado” seja uma fonte mais fidedigna, uma vez que foi o único periódico com representação na cerimônia. 7 O jornal o “Estado” do mesmo dia refere a banda de música da Brigada Militar. 8 “...foi, 1º de Maio de 1920 (outro erro histórico) installada officialmente a Faculdade, em sessão solenne realisada no salão nobre do Gymnasio Paes de Carvalho, sob o patrocinio do Dr. Lauro Sodré, então governador do Estado, e com um discurso justificativo pronunciado pelo Dr. Acylino de Leão. Faculdade de Medicina do Pará”. In: PARÁ-MEDICO (1922). Este número da Pará-Médico, por ser uma fonte tão antiga e de fácil acesso, acabou tendo seus erros perpetuados por muitos que pesquisaram sobre as origens da Faculdade. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Foto 2: Edifício do tradicional Colégio Paes de Carvalho, então “Gymnasio Paes de Carvalho” a primeira morada da Faculdade de Medicina em duas salas ali cedidas. Fonte: Álbum do Pará [1899]. Gov. Paes de Carvalho. 43 Foto 3: Professores fundadores da Faculdade de Medicina do Pará, posam para a primeira foto da instituição. Fonte: Estado do Pará, 04.05.1919. Foto 4: Barão de Anajás (sentado entre as senhoras) em meio aos primeiros alunos matriculados. Fonte: Estado do Pará, 04.05.1919. Foto 5: Salas de aula do Colégio Paes de Carvalho no início do Século XX. Em duas salas como estas a Faculdade de Medicina encontrou seu primeiro abrigo. Fonte: REGO (2002, p. 71). 44 Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 4 Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio 45 46 Detalhe do portão principal da FMCP. Applaudi a idéa, não tendo podido dar aos fundadores dessa Escola até hoje senão as salas do edifício do Gymnasio Paes de Carvalho onde funccionam. Desde que possa o Estado dispôr de recursos, bom será que sejam votados auxílios que permittam dar a essa instituição melhores recursos, quaes exigirá o ensino que nella se ministra, e que difficilmente poderão ser obtidos de particulares, em terra em que não abundam gentes ricas nem é grande o rol de capitalistas abastados. (PARÁ. Mensagem... 1920). Foi assim que, em 1920, o então Governador do Estado, Lauro Sodré, sintetizaria a contribuição do governo para a Faculdade: aplausos e duas salas de frente para rua João Diogo, dependências que certa vez foram assim definidas: Jazia a Faculdade no rez-do-chão de um velho sobrado, que, se tem algum valor histórico, não apresentava nenhuma comodidade para servir ao ensino médico. Os seus cubículos acanhados, por cujas portas e janelas espiava o sol, sem entrar, e por onde o ar benéfico não circulava livremente, despertavam a descrença e a troça. Quem se aproximava dos baixos do vetusto casarão, que pretendia ser um templo de Esculápio, dizia intimamente: - daqui fugiu a higiene (FMCP, 1945c, p. 81). É claro, que se os fundadores do curso aguardassem as condições ideais para seu início muito mais tempo teria demandado, porém é mais que evidente que nenhum curso de medicina se faz em apenas duas salas acanhadas e improvisadas. No primeiro aniversário da Faculdade, algumas melhorias já eram percebidas: Effectivamente, no transcorrer desses doze mezes de trabalhos profícuos e abnegados, não se póde negar o êxito da Faculdade de Medicina do Pará, que se conseguiu firmar solidamente e em condições recomendaveis. Convergidos todos os esforços dos nossos distinctos médicos para o importante emprehendimento, em rapido decorrer de tempo eram registados notaveis melhoramentos nelle introduzidos, principalmente o da installação de gabinetes. E ainda não estacará ahi a dedicação dos dirigentes do estabelecimento que nos há de orgulhecer, tão imprescindivel elle é no extremo norte da Republica e cujos resultados auspiciosos serão motivo de engrandecimento ao Pará (Folha do Norte, 02.05.1920). Mas uma sede condigna ainda era um sonho. Certamente esta foi uma das grandes preocupações de Camilo Salgado, ao assumir a direção da Faculdade de Medicina do Pará, em 25 de março de 1922. Por mais boa vontade que houvesse do corpo docente, e por mais nova e bem equipada que fosse a Santa Casa, faltava um local decente para as aulas teóricas; uma sede que inspirasse respeito e tradição, somando credibilidade a uma instituição que precisava se impor, fator preponderante para seu reconhecimento oficial, a fim de que seus formandos pudessem gozar dos direitos e prerrogativas concedidas pelo Governo. Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio 47 A questão de uma sede digna para a Faculdade atinge ainda mais relevância, quando lembramos como era a Belém de então, cujos prédios públicos nada deviam ao que havia de melhor no continente europeu. Ideias deviam ser muitas, mas nada que saísse do papel, visto que o dinheiro era escasso naquele período de decadência econômica. O governo realmente pouco poderia colaborar, e mesmo o governador seguinte, Emiliano de Souza Castro, médico, professor da Faculdade, filho de seu primeiro diretor, o Barão de Anajás, encontraria uma recessão ainda maior, conseguindo contribuir com 50:000$000 (cinquenta contos de réis) para o orçamento da Faculdade somente em 1924. (PARÁ. Mensagem... 1924). Deste modo, para aquisição de instalações condignas para a Faculdade de Medicina do Pará restaria a Camilo Salgado recorrer aos particulares, aos “capitalistas abastados”, que, conforme já mencionado por Lauro Sodré, seriam uma fonte difícil para obtenção de recursos. Teria ele prestígio suficiente para contrariar as previsões de Lauro Sodré? A resposta talvez esteja em uma notícia publicada nos principais jornais de Belém, no dia 27 de dezembro de 1922: 48 Dr. Camillo Salgado Uma mensagem que contem 1.045 assinaturas O nosso presado amigo dr. Camillo Salgado teve sabbado último, uma agradável surpresa. Um grupo de amigos e admiradores seus levou á sua residência um abaixo-assignado, contendo 1.045 assinaturas de médicos, engenheiros, advogados, chefes de importantes firmas de nossa praça, funcionários públicos, artistas, operários, o povo emfim cumprimentando-o, pela solução do incidente havido na Beneficente Portugueza, solução essa respeitadora dos direitos que alli foram por elle adquiridos a golpes de trabalho e competência. Esse invulgar documento esta encadernado em velludo azul, com as seguintes inscripções a ouro: “Homenagem. Ao dr. Camillo Salgado- 1922”. A primeira parte esta copiada com dactylographia, em papel “couché”, e a segunda em original, tendo depois da assignatura da comissão que é composta dos srs [...] (Folha do Norte, 27.12.1922). Camilo Salgado receberia o documento com sua “habitual fidalguia”, conforme a nota, e qualquer que tenha sido o incidente ocorrido no Hospital Beneficente Portuguesa, o motivo se perdeu no tempo. Porém, a homenagem talvez tenha servido para mostrar ao próprio Camilo Salgado que ele desfrutava de grande popularidade em todas as camadas da sociedade paraense e que poderia contar com o apoio desta em outras oportunidades. Respaldado em seu prestígio e popularidade, Camillo inicia ainda em janeiro de 1923, uma campanha de subscrição popular, visando angariar recursos para a compra de um imóvel para a instalação do curso. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Sobre este fato, assim se manifestou Estado do Pará: Faculdade de Medicina do Pará O predio para sua sede Começaram a circular no dia 1º do corrente as listas da grande subscrição publica destinada a angariar os recursos necessarios á compra de um predio para sede da Faculdade de Medicina do Pará. Movimento esse de iniciativa do dr. Camillo Salgado, conhecido cirurgião paraense e director daquelle estabelecimento, foi elle recebido com sympathia no seio de todas as pessoas, o que é, sem duvida, auspicioso signal de que muito breve será uma realidade a idéa do illustre medico. Á proporção que lhe fôrem sendo devolvidas as listas, serão publicados os nome das pessoas que as tenham assignado (Estado do Pará, 3 de janeiro de 1923, p. 1). Pouco depois, em 6 de janeiro de 1923, na revista A Semana, um semanário ilustrado paraense publica a seguinte nota a favor da campanha: O dr. Camillo Salgado esta prestando um serviço ao Pará, que pella sua grandeza é o sufficiente para intitullal-o benemérito, quando ele já não o fosse por tudo quanto, em devotamento e philantropia, tem feito, aos impulsos do seu grande coração em prol dos que soffrem e encontram um lenitivo consolador na sua bondade infinita. Referimo-nos a iniciativa que o notavel e abalisado cirurgião vem por em prática desde o dia primeiro corrente, valendo-se de seu prestígio e da popularidade do seu nome para conseguir, como conseguirá, á importância necessária a aquisição de um prédio em que, definitivamente, funccionará a nossa Faculdade de Medicina, cujos destinos na mais acertada das escolhas, foram entregues áquele sabio scientista paraense eminente. Estando á frente de tão dignificante movimento um homem de valor das imcomparaveis sympathias do dr. Salgado, pode-se calcular o enthusiasmo com que todos o cercaram sem distinccção de classes e cores políticas, com o fim muito applausivel de concorrer para o melhoramento de mais relevancia na existencia florescente de um estabelecimento que honra os creditos do ensino superior, tão acatado nos grandes centros do Paiz. O dr. Camillo Salgado quer um edifício próprio para a Faculdade de Medicina. Não ha, afirmamol-o, quem se recuse a coadjuval-o, mesmo com um pequeno contingente, que representa um grande concurso á realidade de uma nobre aspiração. Quando o preclaro médico não fosse o apostolo desta alevantada cruzada bastará que todos os que presam esta terra portenosa, seus filhos ou não, se compenetrem de que qualquer amparo ao nosso principal estabelecimento de ensino scientifico visa o engrandecimento econômico della, para garantir de antemão que a idea triumphou. (A Semana, 06.01.1923). Três dias depois, coincidido com o aniversário de fundação da Faculdade, é a vez do jornal Estado do Pará publicar nota sobre o tema, assinada por “Agapito Solenne”: A FACULDADE DE MEDICINA É uma triste verdade: nós nos desinteressamos muito pelas nossas coisas, boas, ou más, e o nosso pessimismo doentio completa a obra, jereminan- Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio 49 50 do sobre as nossas pobrezas franciscanas, comparadas com as opulências de outras gentes. Tratemos de substituir estes oculos enfumados, que emprestam côres tão sombrias mesmo ao que mais brilha, e tornam tão lamurienta a nossa apreciação sobre tudo o quanto nos cerca. Ao mesmo tempo, cumpre dar outra direcção ás nossas inclinações pessoaes, satisfazendo melhor ou mais elevadamente as necessidades de nossa intelligencia, da nossa actividade intellectual, de modo que, em vez da curiosidade fútil, que se compraz em vêr durante horas como se faz a demolição de uma parede velha, tenhamos a curiosidade viril de conhecer coisas mais nobres, as nossas bôas instituições e os nossos homens de mérito. Occorrem-nos estas reflexões ao lembrarmo-nos do emprehendimento que abnegadamente metteu os hombros o dr. Camillo Salgado, qual seja a compra por auxilio popular, de um prédio para a Faculdade de Medicina do Pará. Essa idéa é digna de todos os encomios e, quando em realidade, sera de facto uma das obras de mais feliz creação e de mais fecunda utilidade. O glorioso medico acalenta com carinho em seu coração a ambição de ser útil á terra que lhe foi berço, á terra que representa seu lar, sua familia, seus maiores. Sua actividade, sua intelligencia, sua força de vontade são altruisticas como as dos grandes homens que só querem servir a patria, e contenta-se apenas que lhe dêem a gosar este prazer intimo, esta satisfacção do dever cumprido – de ter afagado paternalmente a idéa de acquisição de um predio em que se installe a nossa Faculdade de Medicina, e cujas tubas de fama proclamem o nome do Pará. E os homens assim não são muitos. Os tempos são de frio positivismo, de coisas praticas da vida, de estreitos egoismos e mesquinhas invejas. Por isso mesmo, o emprehendimento do dr. Camilo Salgado merece o maior applauso a maior solicitude e o maior esforço em pról de sua realização. O povo paraense, os filhos dos outros Estados aqui domiciliados, os estrangeiros que mourejam sob o pavilhão da paz e da amizade, que não deixem de subscrever as listas, para esse fim, concorrendo, no mínimo COM 10 TOSTÕES, pois só assim poderemos entoar hosanas á idéa do grande e humanitário medico paraense. Todos os que se interessam pelo progresso e pela prosperidade das coisas medicas no Pará não devem perder de vistas o empreendimento em questão. Dignifiquemos os nossos creditos scientificos. Amemos a prosperidade desta terra. Não deixemos de transformar em realidade esta idéa, robustecendo a chamma da esperança de exito completo. A victoria dessa idéa é a victoria do Pará. Trabalhemos por adquirir um predio proprio para nossa Faculdade de Medicina com installações confortáveis e completas. Com isto só lucrarão os moços estudiosos, com isso só ganhará o estudo medico entre nós, e só assim podemos aspirar um logar digno e uma collocação honrosa entre os povos que estudam e produzem. Emquanto ha bons terrenos plantam-se arvores fructiferas. Prestemos, pois, mão forte ao dr. Camillo Salgado, facultando-lhe os meios que lhe são necessarios para se tornar em um facto o seu altuistico e acariciado emprehendimento. Ajudemol-o a dotar a nossa cidade de Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 predio que accommode convenientemente a nossa Faculdade de Medicina e corresponda ao nosso adeantamento intellectual. O Pará, que dia a dia, vae disputando a golpes de estudos scientificos o logar que lhe compete entre os primeiros Estados do Brasil precisava, ha muito desse melhoramento, cuja realização agora se inicia no meio dos applausos de todos os habitantes desta capital. E o dr. Camillo Salgado – que temos fé em Deus – que possue a disciplina da vontade e esta habituado aos sucessos e á gloria gosará o supremo prazer de vér tornar-se em confortante realidade o seu emprehendimento, que alias tem despertado a admiração e o applauso unanime apesar destes tempos de derrocada financeira. Afaguemos e antevejamos a victoria de grande e excelso medico paraense, a quem o chronista já se habituou a venerar, a amar e a querer com toda sinceridade d’alma (Estado do Pará, 09.01.1923, p. 2). A imprensa definitivamente abraçara a causa e outra nota, mais uma vez em A Semana, de autoria de J. Eusthaquio de Azevedo viria pouco depois: Obra Meritória As ideas generosas e altruísticas são recebidas sempre com applauso pelas multidões. E o nome de seus auctores fica fundamente inmortalisado senão no bronze das estátuas commemorativas, ao menos nos fastos históricos da terra que lhes foi berço e no coração agradecido de seus compatriotas. O dr. Camillo Salgado pertence ao número desses heróes, desses phalangiarios, benemeritos da humanidade; seu nome, já agora, nunca mais será esquecido por nós, filhos deste grande Estado nortista que viu nascer Gurjão e Gama Malcher, e que teve a gloria de assistir, pesaroso e magoado, os últimos alentos de Carlos Gomes. A posteridade é já delle; póde, por isso bolsar dos labios a phrase altiloqua do poeta lusíada, sem que vá nesse gesto nenhum exaggero ou laivo de vaidade: elle a conquistou pelos seus meritos e actos radiosos de philantrophia; pelos seus rasgos de generosidade e altruísmo; pelos serviços inestimaveis que tem prestado, como homem da sciencia á alta sociedade paraense, ao proletariado, á pobreza envergonhada, á grande massa anonyma que se estorna nos pardieiros sem lume e nas mansardas sem pão. Agora quer mais metteu-se-lhe em cabeça doptar o Pará com um grande melhoramento: a construção de um amplo e confortável edifício, prédio próprio onde funccione a nossa Faculdade de Medicina, viveiro que vae ser de nossos futuros médicos. Quem, no Pará, resistirá ao appello? Desde o salão nobre do abastado, ao quarto pobre do operário, a mão da beneficencia vae despejando com satisfação, da cornocupia de suas graças, no monte edificante o quinhão relativo, para que a idea de Camillo Salgado seja uma realidade dignificadora. E sel-a-á muito em breve. Ella caminha firme com o impeto das avalanches polares; nada faz recuar ou deter, nem a maledicencia dos invidos, nem o grasnar dos corvos Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio 51 incidiosos e impotentes: avança com rapidez e está prestes a alcançar o marco postremo. Cojita-se já nos alicerces do prédio; antes, talvez do fim deste anno elle avulte soberbo e majestoso, numa de nossas principaes praças, como demonstração positiva do gráu de cultura a que attigimos, do nosso progresso da nossa comprehensão cívica. Acham-se ao lado do benemérito scientista, collaborando nesta obra meritória, os bem intencionados, os que amam verdadeiramente esta terra, sem exaggeros chauvinistas, e desejam vê-la na vanguarda da civilisação e do progresso. A Camillo Salgado vão nestas linhas os nossos applausos pela empreza a que metteu hombros, com a perseverança dos que sabem vencer, e as nossas sinceras homenagens pelo muito que nos merece como laureado medico, eminente cirurgião, distincto amigo e bemfeitor de todos aquelles quê, em boa hora, o procuram (A Semana, n. 250, 03.02.1923, s.p.). Além do estilo rebuscado, tradicional à época, fica evidente que Camilo já dispunha de assustadora popularidade e penetração na sociedade, mais que suficientes para iniciar uma campanha de tal porte. No texto de Eustachio de Azevedo nota-se ainda o quanto pode ter sido ambicioso o projeto inicial, prevendo não apenas a compra, mas a construção inteira de instalações para a Faculdade de Medicina do Pará. 52 É bem verdade que o único texto conhecido que menciona angariar fundos para edificação de um prédio próprio para a Faculdade é o de J. Eusthaquio de Azevedo, podendo tratar-se apenas de uma interpretação equivocada da finalidade da campanha deflagrada por Camillo, coisa comum nos jornais de então. Se realmente houve a ideia de construção de uma sede, esta deve ter sido logo posta de lado, tendo em vista que seria bem menos onerosa a compra de uma edificação já finalizada, ainda mais levando-se em conta a situação financeira pela qual atravessava o Pará daqueles idos. A escolha do prédio ideal parece óbvia, quando levamos em conta o fator localização. E a melhor edificação próxima à Santa Casa era o prédio do Sexto Grupo Escolar, que naqueles anos já se chamava Grupo Escolar Wenceslau Braz, situado no Largo de Santa Luzia e dirigido pelo professor normalista Joaquim Amanajás de Carvalho (Estado do Pará, 13.05.1923, p. 2). Embora sem precisar a data, pode-se afirmar que aquele prédio, conhecido na época como Palacete Santa Luzia, remonta ao século XIX, uma vez que este grupo escolar foi criado pelo Governador Augusto Montenegro por meio do Decreto nº 1029, de 08 de junho de 1901, e instalado ali no dia 17 do mesmo mês (FEITOSA, 1987, s.p). O prédio é descrito no processo de Tombamento pelo IPHAN como de “arquitetura eclética, dois pavimentos com platibanda ornada com balaustres”. No primeiro pavimento as janelas tinham guarda-corpo entalhado em ferro trabalhado e, no segundo pavimento, guarda-corpo sacado em ferro1. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Curiosamente como podemos ver pelo trecho do relatório de seu Diretor Joaquim Amanajás de Carvalho, encaminhado ao Diretor Geral da Instrução Pública Primária do Estado, professor João Paulo de Albuquerque Maranhão, em 15 de julho de 1919, o prédio era considerado um desastre dentro de sua função: O edifício em que funciona este grupo escolar está em completa desarmonia com as leis pedagógicas a que deve obedecer a instalação dos grupos escolares. Edificado em lugar baixo, sujeito à inundação embora temporária, na estação chuvosa, tem ainda o inconveniente de se achar nas vizinhanças de um hospital e de uma praça onde funciona uma feira bastante concorrida, sendo ainda cortada por bondes elétricos que constituem um perigo às crianças que freqüentam o grupo. Com relação aos compartimentos em que funciona a escola tudo deixa a desejar. Nem um deles tem as dimensões exigidas pela pedagogia, nem iluminação e cubagem de ar necessárias à conservação da saúde dos alunos (FEITOSA, 1987). Alguns dos motivos que fizeram com que o governo do Estado perdesse interesse no prédio, tais como a proximidade do Hospital da Santa Casa e a facilidade de acesso pelos bondes, criticados no relatório, certamente devem ter contribuído para sua escolha como sede da Faculdade. Um dos fundadores da Faculdade, Lauro Magalhães, pioneiro na urologia no Pará, então ocupando cargo de diretor da mesma, definiria assim a importância da “ideia genial e luminosa” de Camilo Salgado de localizá-la em frente à Santa Casa: A vizinhança à Santa Casa veio completar e facilitar o ensino médico teórico-adquirido nas suas modestas salas, com a arte médica aurida nas centenas de doentes que o hospital lhe oferecia, fornecendo aos seus alunos elementos inestimáveis, e preciosos de observação experiência e prática, que muito concorreram para o sucesso rápido que eles têm obtido no exercício da profissão, não só na clínica civil, como nos concursos nas competições, e nas várias repartições e comissões nacionais e extrangeiras, das quais a Faculdade tem recebido as mais elogiosas referencias e os mais honrosos agradecimentos (FMCP, 1943b, p. 31-32). A busca por recursos teve então início com várias listas distribuídas pelos professores, alunos, autoridades e outras pessoas interessadas em colaborar com a campanha para a arrecadação. A sociedade, sensibilizada pelo apelo de Camilo Salgado responderia de pronto, com as doações não tardando, oriundas não apenas da capital e do interior, mas também de outros estados. A Folha Norte noticiava com frequencia sobre o assunto, reproduzindo ainda o resultado das doações. Tanto que já na edição de 7 de janeiro de 1923, sob o título Faculdade de Medicina, dizia o seguinte: Estão sendo bem acolhidas pelo publico as listas de donativos para a acquisição de um prédio destinado á Faculdade de Medicina. Damos abaixo o resultado de algumas listas: Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio 53 Lista n. 22, a cargo do dr. Camillo Salgado: Januário Nunes de Moraes, 500$. Lista n. 21, a cargo do dr. Camillo Salgado: José Leal Martins e Carlos Mello de Araújo, pelo Banco Commercial do Pará, 300$. [...] Total das listas fechadas: 1:130$ Conclui a notícia com a seguinte nota: O dr. Camillo Salgado, como professor de clinica cirurgica da Faculdade de Medicina, abriu mão de dois mezes de ordenado para a compra do predio. Também os drs. Prisco dos Santos, Otto Santos e Ferreira Bastos tiveram o mesmo gesto, doando um mez dos seus vencimentos, como lentes do mesmo estabelecimento2. Essas quantias figurarão em lista especial. No auge da campanha, Folha do Norte de 21 de janeiro de 1923 publica em primeira página, extenso artigo do padre Florêncio Dubois, articulista renomado na imprensa da época, denominado Doutores haja..., que tece grandes elogios à empreitada de Camilo Salgado: 54 Todo homem tem uma idéa que o persegue, Archimedes, obsesso por um problema de physica, desabalou no famoso “eureka”. O doutor Camillo Salgado resfolegará somente depois de ver enthronisado a Faculdade de Medicina em predio proprio, no largo de Santa Luzia. Voejam listas. Movimentam-se os poderes públicos. Acodem municípios do interior. A empreitada marcha de victorias em victorias, porque não é facil resistir a um pedido de Camillo Salgado, cujo nome é o melhor padrinho da interpresa. A medicina é uma fidalga que não se contenta com aposentos emprestados. Precisa de amplidão para seus laboratórios, arsenaes cirúrgicos, bibliothecas, colleccções, salas e amphitheatros. Bem sei que a Faculdade do Pará dispensaria, provisoriamente tantos luxos, mas ha um minimum de conforto que não pode renunciar, e que lhe era negado no local antigo. Com a sua alacridade do costume, a falar aqui, a cavar alli, a supplicar, o doutor Camillo Salgado encellou a cruzada, de olhos fitos sobre o palacete, onde os futuros esculapios terão uma sede que nada fique a dever as demais faculdades. Cumpre-nos pois, vulgarizar a campanha que visa dotar o Pará de uma instituição relevante. Ninguém acalenta sonhos megalomaniacos. O diretor da Faculdade não mira adquirir um edifício que envergonhe os congeneres da Bahia e do Rio. Falta aqui um Carnegie ou Rockfeller opulentador de gremios scientificos. É claro que só um casarão como o Gentil Bittencourt ou o Lauro Sodré hospedaria todas as dependencias de uma universidade, com o seu babelismo de aulas. Os estudos medico-cirurgicos são de uma complexidade que requer para innumeras especialidades repartições as dúzias. Modesto será o principio. O predio de S. Luzia prestar-se-á facilmente ao ensino theorico, ficando a Santa Casa para o clinico. O Necrotério, que já presenciou algumas autopsias, servirá as dissecções. As salas de operações e curativos familiarizarão o alumno no mistér de enfermeiro e de cirurgião. A Maternidade Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 offerecerá um bom campo de estudos especiaes. Melhor sitio não encontrá a Faculdade de Medicina. Occorreria montar sem tardança uma sala de chimica e outra de physica. Com seus contos de réis o dr. Camillo Salgado espera comprar o essencial. Peço vênia para apontar-lhe os gabinetes da Escola de Chimica commercial, realmente modelares. A maior difficuldade esta em se achar um microscopio optimo para exames bacteriológicos, mas a verba há de surgir. A Faculdade limitar-se-á, por emquanto ao indispensável. Mais tarde zelará ao sabor das possibilidades as installações de radiologia, electrotherapia, analyse medical, ophtalmologia, collecções anatômicas, etc. Roma não se fez num dia. Não crearam nome do pé para a mão as escolas do Rio e da Bahia. De mais a mais, é crêr que os consultorios particulares se abrirão aos alumnos, para inicial-os nos segredos da instrumentação moderna. Outrora um cirurgião precisava apenas de um paciente e de uma faca, para abrir uma fistula ou cortar uma perna. A miagoa dos ferros operatorios era largamente supprida pela copia dos berros que o paciente soltava deante do barbeiro impassível. Hoje quem se afoita a mobiliar uma Faculdade, deve ser ribeirinho do Pactolo, navegar em rios de ouro. A arte de curar é um sorvedouro de recursos. Se uns vinte contos são necessarios á montagem de uma clinica particular, orcem a despesa de uma Faculdade que, por si só, deve enfeixar todos os apetrecchos dos especialistas! Ha quem não se alegre com a criação paraense de médicos. Para certos, multiplicar esculapios, não significa favorecer a saude publica. Taes críticos diriam como Isaías: “multiplicasti gentem, sed non magficasti lactiam”. Senhor, aumentaste o numero dos homens, mas não as alegrias. Deixemos de lado pilherias de almanack. Quanto mais numerosos os médicos, melhor. O publico escolherá mais facilmente entre os bons. O abarrotamento prejudicará talvez aos doutores, mas não aos enfermos. A verdade é que a Faculdade de Medicina de Belém poderá coadjuvar, cedo ou tarde os amazonenses, na lucta contra as endemias deste valle, com licença dos maçons. Não esqueçam, aliás, uma ressalva importantíssima. Se, como diz o matuto, a Faculdade bater com o rabo na cerca, o espolio reverterá automaticamente á Misericordia Paraense. Em caso de fracasso, as offertas não mofarão no bucho de um cofre bancário, ou no ventre mysterioso de uma secretaria, longe das vistas do publico subscripor. Os donativos serão incorporados ao patrimonio do Hospital, a bem da humanidade padecente. É impossível offerecer maiores e melhores garantias de seriedade, aos cidadãos escrupulosos que receiam sempre pela sorte final do seu dinheiro. Objectam que Belém não é um meio intellectual, e que se temos bons medicos faltam lentes de medicina. O soldado se forma num ambiente militar e o sabio numa atmosphera scientifica. Sem côres a defender, ou tradições a sustentar, ou rivaes a sobrepujar, ou professores a honrar, o alumno fica amollentado. Estamos num empório commercial alheio a estudos superiores. Arrozados reterquiveis! As tradições academicas serão vantajosamente substituídas pelo esforço do corpo discente. A sciencia dos mestres acertará com a techinica professoral que os lentes do Sul adquiriram paulatinamente. Innegavel dizeis, a influencia do meio sobre os espíritos: não Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio 55 56 menos innegavel vos afirmo a acção dos homens sobre o meio. A falta de um passado academico proporcionará os rapazes o ensejo de prefaciarem com formosas paginas os annaes da Faculdade. Para tudo ha remédio, menos para morte. A Providencia que dá a roupa conforme o frio, proverá também o espirito estudantino os moços da Faculdade. De resto, Rio e Bahia não receberam logo uma Universidade ao nascedouro, como brinde que lhes depositaram perto do berço. Belém poderá egualmente crear foros acadêmicos. - Sim, sim! Mas aquillo tudo é luxo,insiste um casmurro! Não balburdiemos o assumpto! Luxo é gastar dez dias para aportar numa Faculdade de Medicina. Luxo é viver longe da família, em cidades onde tudo está por preços de arrancar cabello e couro. Luxo é estudar na terra da mulata velha e sob os céus de Sebastianopolis o que ensinariam no Pará. A fundação da Escola Medica obedece a intuitos de poupança e não de esbanjamento. Nos tempos idos, com uma pequena mesada um estudante se ageitava na região do vatapá, mas hoje com o encarecimento das batatas, só um filho de Cresus se agüenta em cidades longínquas. Penso que o Pará deve se tornar uma Salamanca extremo-nortista. Nos paizes de comunicações rápidas multiplicam-se os fócos de cultura. Existem vinte e mais Faculdades de Medicina em França, entre officiaes e catholicos. Neste vastíssimo Brasil conviria escalonar cinco ou seis Universidades ao longo da costa, dos pampas ao Amapá. O ultimo reducto da sciencia brasileira estaria em Belém, onde florescem escolas de direito, agronomia, pharmacia, chimica, odontologia. Estamos no albor da jornada universitaria: os lindos arrebóes ora visiveis prenunciam um sol glorioso. O dr. Camillo Salgado desconhecerá desfallecimentos. Sabe que contra Hercules no berço rastejaram duas cobras mandadas a estrangularem o neonato mas que morreram suffocadas por elle. Serpejam objecções insidiosas contra a Faculdade no nascedouro, mas esta tem vitalidade para dar cabo dos malevolos, mormente se for amparada pelo povo paraense. (Folha do Norte, 21.01.1923). Além de “sacramentar” a campanha, é possível perceber, principalmente nos últimos parágrafos, que o padre Dubois buscava “exorcizar” as eventuais críticas ao projeto. Superando o ceticismo de alguns, os jornais seguiriam publicando as listas com cada vez mais doadores e valores variando desde quantias quase simbólicas até pequenas fortunas. Em meio ao mar de nomes encontram-se médicos, farmacêuticos, advogados, padres, freiras, políticos, militares, não raro famílias inteiras, sem falar de algumas instituições como o Banco Commercial do Pará (Folha do Norte, 07.01.1923), o Banco do Pará, Pará Eletric, Booth & Co3 General Rubber e Co. of Brasil4; de casas comerciais como: Mercearia Oriental, Casa Conde, Paiva Ribeiro e Cia5, Ferreira Gomes e Cia, Santiago e Cia, La Roque Pinho e Co6, Saunders e Co7; de farmácias como a Farmácia Brasil, Farmácia Comercial, Farmácia Normal8 e César Santos9; de industrias como a Fábrica de Cervejas Paraense10, Companhia Brahma e Charu- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 tos Suerdvitch11, de agremiações como Assembléia Paraense12, Nacional Foot-ball Club13, e praças da Primeira, Terceira Companhia, estado-menor do 26 B.C14 (atual segundo B.I.S), de hospitais como a “Casa de Saúde Marítima15” e de prefeituras como dos municípios de Cachoeira16, Marabá, Acará17, Baião, Irituia18, Altamira, Mazagão e Belém19. O governo do Estado não ficou de fora, auxiliando com 5 contos de réis “...a patriotica iniciativa daquelle eminente cirugião”20. Curiosamente em algumas listas, nota-se que os doadores preferiam, talvez por modéstia, preservar suas identidades, assinando como “um anônimo21”, “um órfão”, “um a favor da ideia22”, “um patriota”, “um paraense23”, “um católico24”, “em honra do dr. Salgado25”, “um amigo particular26” ou “um amigo da instrução27”, ou, por vezes, pondo somente as iniciais. A grande subscrição popular, como a imprensa designava na época28, extrapolou o estado do Pará, chegando à capital federal, quando o então deputado Eurico Valle doou cem mil réis e solicitou a Camilo Salgado uma lista para angariar fundos no Rio de Janeiro29, recebendo também 300$000 de Geminiano de Lyra Castro30, médico paraense, na ocasião radicado no Rio e deputado federal pelo Pará, e que posteriormente viria a ser ministro no governo Washington Luis. A campanha seguiria vitoriosa, sendo acompanhada pela população por meio da divulgação entusiasmada dos jornais, permitindo que os doadores fizessem também sua promoção pessoal, conforme nota publicada em 6 de maio de 1923: Faculdade de Medicina A idéa do illustre dr. Camillo Salgado, director da Faculdade de Medicina do Pará, de installar um importante estabelecimento de ensino scientifico num predio proprio e convenientemente adaptado, tem encontrado o mais eloquente apoio, podendo-se considerar vitorioso tão patriótica iniciativa. O eminente cirurgião recebeu do sr. Joaquim Torres, residente em Natal, a importancia de duzentos mil réis, como offerta áquelle fim. O offertante é muito conhecido no nosso meio, onde foi proprietario da pharmacia Baptista Campos, e actualmente é deputado estadual no Rio Grande do Norte (Estado do Pará, 06.05.1923, p. 2). Como era de se esperar, no sábado 2 de junho de 1923, apenas seis meses após o início da campanha, Folha do Norte, noticiava em primeira página, com direito à fotografia, coisa pouco comum então, que a Faculdade já tinha sua sede própria, adquirida do Sr. Adolph Kolb (FMCP, 1923a) pelo valor de 25 contos de réis (SANTOS, 1979, p. 8). A Nova Séde da Faculdade de Medicina do Pará A poderosa boa vontade do nosso illustre amigo e operador dr. Camillo Salgado acaba de receber a mais solene confirmação de sua pertinancia: - é uma realidade tangível a nova séde, o edificio proprio em que vae funccionar a Faculdade de Medicina do Pará. Eis afinal consummado o grande sonho daquelle esforçado clínico. Effectivamente, talvez nenhum outro dos nossos mais conceituados faDoutores Haja... A campanha para aquisição do prédio 57 cultativos tivesse conseguido esse milagre: levantar entre amigos o numerario preciso para adquirir o predio em que vinha funccionando o grupo escolar “Wenceslau Braz” o primeiro predio em blócos construido nesta capital. E tão poderosa e suggestiva é a força de vontade do dr. Camillo Salgado, tão communicativo o seu altruismo que, metendo hombros á empresa, que se mostrava incerta e mesmo fallivel, logrou alcançar a meta dos seus desejos (Folha do Norte, 02.06.1923, p. 1). O jornal O Estado do Pará do mesmo dia também daria grande destaque ao fato, acrescentado detalhes importantes: 58 FACULDADE DE MEDICINA DO PARÁ O seu novo predio Em notas do tabellião José Joaquim Pereira de Araújo, foi assignada hontem a escriptura de compra do confortavel e espaçoso predio á praça Santa Luzia, para a Faculdade de Medicina do Pará. Passo agigantado em favor da futurosa escola medica, só mesmo tendo a frente um homem da envergadura moral e scientifica do dr. Camillo Salgado, poderia ser levado a termo como foi, porque o illustre operador, o distincto mestre empenhou todo o seu esforço, influencia em nosso meio social, numa palavra, entregou-se de alma á consecução desse desiderato, e venceu a toda sorte de óbices, dentre os quaes a nossa endemica indifferença por coisas assim grandiosas! A Faculdade de Medicina do Pará tem, agora, sua séde propria, adaptada a seus nobres e humanitarios fins, bem ao lado dos sanatorios da Santa Casa de Misericordia, os mais poderosos subsidios ao estudo perfeito da sciencia medica. Teve o illustre professor Camillo Salgado a suprema dita, além do mais, de associar ao seu emprehendimento elementos varios, que todos, cada qual por seu lado, e dentro da sua sphera de acção, concorreram para tão elevado fim hoje uma grande realidade. É assim que o governo do Estado, dispensando o onus da transmissão de propriedade, o intendente municipal, dispensando laudemio e tributos de domínio e foros, muito ajudaram o emprehendimento, não sendo justo esquecer a bôa vontade e o esforço do tenente-coronel Jones Hesketh que, na sua dupla função de solicitador e de despachante, tudo promoveu para que a acquisição fosse imediatamente legalizada, além da gratuidade de seus serviços profissionais. Tem felizmente, o Pará, a sua Faculdade de Medicina localizada em um predio confortavel e promettendo fructos os mais sazonados em bem da humanidade e do futuro que se nos desenha ainda cheio de sombras,mas ha de ser, porque tem de ser, de progresso e de luz (Estado do Pará, 02.06.1923, p. 1). No dia seguinte, em artigo denominado A nova séde da Faculdade de Medicina do Pará, Camilo assim se expressaria: Ha tres dias que a Faculdade de Medicina do Pará possue o seu predio proprio, que receberá installações condignas e definitivas, para servir de Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 galhardo attestado do quanto avança o ensino superior da nossa terra, cujos creditos, mau grado as vicissitudes que preponderam no extremo norte do Paiz, mantemos em condições proeminentes. No decorrer do anno proximo findo, ao receber do preclaro Barão de Anajaz a direção do nosso principal instituto scientifico, fil-o não animado pelo relevo que do meu obscuro nome viesse emprestar o desempenho do cargo, mas desejoso de aprestar as minhas energias ao lado de companheiros desvelados, que são os illustrados e dignos professores da nossa Faculdade de Medicina, em prol de uma obra vultuosa e de desmedido alcance para a grandeza economica do Pará. Enthusiata de principio, quando ainda no alvorecer do estabelecimento hoje sob minha direção, sempre acreditei que esforços multiplicados haviam de se conjugar para tornar em brilhante realidade a iniciativa de espíritos infatigaveis que se propuzeram, sob os fagueiros auspícios de uns e o motejo derruidor de outros a dotar o Pará de uma Faculdade de Medicina, estimulados pelo exemplo de Estados de menos importancia, que lá haviam dado esse passo de progredimento. Foi por isso que, sem excusas, apenas para levar o meu contingente de trabalho ao emprehendimento de marcha tão promissora, aceitei o encargo ora sob as minhas responsabilidades. Effectivando providencias irretardaveis, que se impunham no momento, logo me preocupou uma necessidade de vulto: o melhor apparelhamento de nossa Faculdade, em edificio proprio e convenientemente adaptado. E, aos impulsos desse anhelo, no primeiro dia do corrente anno, lancei uma subscripção popular destinada a receber de todos os interessados pela prosperidade do Pará qualquer que fosse a contribuição a um fim dos mais enobrecedores. Distribuiramse as listas respectivas, em numero de 250, e dentro em pouco eu via, infinitamente alegre, que o meu appêllo não fôra improficuo, tantos eram os amigos que se apressavam em trazer o seu auxilio. Convencido assim de que me seria facil alcançar o exito almejado, e no conhecimento de que o proprietario do palacete Santa Luzia, em que funcionava o grupo escolar Wenceslau Braz, exatamente na melhor approximação da Santa Casa de Misericordia, desejava vendel-o, procurei-o e ajustamos o seu traspasse á Faculdade de Medicina. Assumi o compromisso de pagar a importancia combinada em prazos certos, e tive a fortuna de saldar essa obrigação á proporção que as listas me eram devolvidas com sommas animadoras, muitas dellas avultadas, conforme os resultados que venho inserindo na imprensa diaria. Ha alguns dias, graças a Deus e aos amigos, effectuei o pagamento da derradeira prestação, e, porque assim o fizesse, lavrou-se a escriptura do predio em allusão, que passou ao patrimonio da nossa Faculdade de Medicina. Radiante por esse effeito compensador, que representava muito patriotismo da parte dos que me coadjuvaram, tomo a liberdade de scientificar áquelles a quem mereço qualquer consideração, os quaes têm as listas da subscrição em seu poder, que a minha tarefa não findou. O predio da Faculdade de Medicina foi adquirido, é certo, mas para que elle passe pelas remodelações imprescindiveis, que pretendo realizar quanto mais breve possível, reclamo o concurso dos que ainda não me o deram, e assim conto reunir a importancia precisa deante dos resultados das mesmas listas Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio 59 por devolver. Faço, nesse sentido, um appêllo a cada uma dessas pessoas, nas quaes tanto confio, e que, servindo a mim, particularmente, servem, antes de tudo, ao Pará, que ha de se impor na Federação pelo que vale. Só após a devolução de todas as listas, completando o meu tentame, prestarei minuciosas contas ao publico31. Obedecendo ao apelo, as doações prosseguiriam ainda por boa parte do segundo semestre, permitindo que com o dinheiro arrecadado pudessem ser realizadas reformas e adaptações no prédio, além de auxiliar na compra de material e equipamentos para os laboratórios. O Palacete Santa Luzia continuaria alugado para governo até o final de 1923. Um fato curioso é que, por ironia do destino, a tão decantada crise econômica por que passava o Estado, devido à queda nos preços da borracha, contribuiu para a compra do prédio que abrigaria a Faculdade. É o próprio Camillo Salgado quem revela isso no seu relatório apresentado à Congregação, ao final dos trabalhos letivos de 1923: 60 ...amparado por um banco da praça, fechei negocio com o proprietario do palacete da praça Santa Luzia, adquirindo-o para a Faculdade. [...] Ella será nossa, em pouco tempo, soffrendo remodelações e concertos, por menos de cem contos de reis, quando o seu valor é de mais de duzentos. Em Belém as casas ficaram desvalorizadas e os seus alugueis chegaram ao mínimo. É o resultado da crise que atravessamos, graças á qual devemos a bellissima compra realizada (FMCP, 1923c, p. 13). Este dado sobre o valor dos imóveis, após a queda dos preços da borracha, também é assinalado por Bárbara Weinstein em A borracha na Amazônia: expansão e decadência (1850-1920)32. Desta forma, em primeiro de abril de 1924, as aulas passam a ser ministradas no casarão do largo de Santa Luzia33, hoje praça Camilo Salgado. Em dezembro daquele ano formavam-se os primeiros médicos pela Faculdade de Medicina do Pará, já com seus diplomas válidos em todo o território nacional. A cerimônia de colação e grau ocorreria somente em abril de 1925, após as defesas de tese. Mas fica uma dúvida: como o prédio adquiriu condições para abrigar o curso de medicina? Quais as modificações executadas por Camilo Salgado? Segundo Lauro de Magalhães, “O velho prédio colonial passou por uma reforma integral de adaptação às suas finalidades, sendo seus quartos e cubiculos transformados em salas de aulas e laboratórios, de acordo com as necessidades mais urgentes e imperiosas” (MAGALHÃES, 28.10.1948). De acordo com Ernesto Leitão, Este prédio após sua aquisição foi adaptado proporcionando condições de modo a permitir instalações de laboratórios e anfiteatros para o estudo da Anatomia Descritiva, História Natural e Química Biológica, além Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 de aparelhagem mínima necessária ao estudo da Histologia (LEITÃO, 1985, v. 1, p. 29). Entretanto, no relatório apresentado em 1926 ao Diretor do Departamento Nacional de Ensino, Juvenil da Rocha Vaz, pelo Diretor de Seção de Expediente e Contabilidade, José Bernardino Paranhos da Silva, as modificações e adaptações iniciais parecem ter sido insuficientes, pois seu documento descreve uma Faculdade que funcionava em condições insatisfatórias em um prédio “velho e acanhado”, sem laboratórios suficientes para o ensino prático. Os gabinetes de química, física e história natural eram deficientes contando apenas com quatro ou cinco microscópios. O relatório frisava ainda que somente as aulas de Clínica Médica ministradas pelo professor Acylino de Leão Rodrigues, era o que se apresentava de melhor, por funcionar no Hospital da Santa Casa da Misericórdia, considerado por Paranhos um dos melhores hospitais do norte do país, sem contar com Hospital do Centenário do Recife (FIOCRUZ, 2006). Assim começou a trajetória do curso de Medicina em sua localização ao lado da Santa Casa, em um prédio que, embora bastante descaracterizado em sua construção original, foi tombado pelo Patrimônio Histórico, por meio do Processo de Tombamento nº 0997/97, publicado no Diário Oficial do Estado, em 12 de fevereiro de 1999. Posteriormente, com a inclusão da sede do Conselho Regional de Medicina, no quarteirão adiante, passaria a constituir, juntamente com a Santa Casa, um complexo arquitetônico de grande valor histórico para a medicina paraense. NOTAS 1 Documento do processo de tombamento do prédio Faculdade de Medicina. Exemplo que seria seguido por vários outros professores da Faculdade, como Amanajás Filho, conforme notícias seguintes. (N.A). 3 Estado do Pará, 17 de janeiro de 1923, p. 2. 4 Folha do Norte, 7 de fevereiro de 1923. 5 Folha do Norte, 18 de janeiro de 1923. 6 Estado do Pará, 10 de fevereiro de 1923, p. 3. 7 Estado do Pará, 21 de março de 1923, p. 3. 8 Estado do Pará, 27 de abril de 1923, p. 2. 9 Estado do Pará, 29 de junho de 1923, p. 2. 10 Estado do Pará, 17 de janeiro de 1923, p. 2. 11 Estado do Pará, 22 de junho de 1923, p. 2. 12 Folha do Norte, 7 de fevereiro de 1923. 13 Folha do Norte, 7 de fevereiro de 1923. 14 Folha do Norte, 20 de fevereiro de 1923. 15 Estado do Pará, 12 de junho de 1923. 16 Folha do Norte, 1 de abril de 1923. 2 Doutores Haja... A campanha para aquisição do prédio 61 17 Folha do Norte, 6 de Junho de 1923. Estado do Pará, 28 de março de 1923, p. 2. 19 Estado do Pará, 10 de abril de 1923, p. 2. 20 Estado do Pará, 16 de maio de 1923, p. 1. 21 Folha do Norte, 18 de maio de 1923. 22 Folha do Norte, 17 de abril de 1923. 23 Folha do Norte, 24 de maio de 1923. 24 Estado do Pará, 22 de fevereiro de 1923, p. 2. 25 Estado do Pará, 11 de março de 1923, p. 2. 26 Estado do Pará, 4 de maio de 1923, p. 1. 27 Folha do Norte, 6 de junho de 1923. 28 Folha do Norte, 24 de março de 1923. 29 Estado do Pará, 17 de março de 1923, p. 2. 30 Segundo o jornal, a doação de Lyra Castro foi acompanhada da seguinte carta: “Permitta que offereça essa importancia para a sua obra benemerita da Faculdade. Digo benemerita, porque não comprehendo Faculdade de Medicina sem installações condignas. O Pará sempre fez obras uteis e dignas do seu progresso e não deve ter uma casa de alto ensino sem os requisitos precisos para os fins visados” (Estado do Pará, 13.05.1923, p. 2). 31 Folha do Norte, 3 de junho de 1923. Também publicado no Estado do Pará do mesmo dia. 32 “Os imóveis urbanos, há muito considerados investimento mais seguro pela comunidade financeira de Belém, e, assim, a forma mais confiável para garantia de empréstimos, mostraram-se quase tão vulneráveis às pressões da depressão quanto os seringais. Em 1913, os bens imobiliários urbanos haviam caído em até 50%, e é de admirar que não tenham caído ainda mais, uma vez que grande parte da população da elite de Belém estava enormemente necessitada de dinheiro e as casas da cidade esvaziavam-se às dezenas. (WEINSTEIN, 1993, p. 265). 33 “Faculdade de Medicina do Pará, que começou a funcionar no prédio onde está hoje instalada, à praça Santa Luzia, no dia 1º de abril de 1924.” (CRUZ Ernesto, [19--], p. 718) Estado do Pará divulga a seguinte nota, em 1º de abril de 1924: “Faculdade de Medicina – Começa hoje a mudança da Faculdade de Medicina para a nova séde, ao largo de Santa Luzia. Por esse motivo não reabrirão hoje as aulas deste estabelecimento de ensino superior”. 18 62 Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 63 Foto 6: Grupo Escolar Wenceslau Braz e alunos, futura sede da Faculdade. Fonte: Postal confeccionado a partir de fotografia do álbum comemorativo do governo Augusto Montenegro. 64 Foto 7: Sede logo após sua aquisição pela Faculdade de Medicina. Fonte: FMCP (1923). 5 A formação do corpo docente 65 66 Detalhe da pintura de uma parede da FMCP. Criar um curso superior no Pará, principalmente com as peculiaridades de um curso de medicina, naquele princípio de século XX, representava um desafio sem precedentes. Além das instalações havia material, equipamentos e, sem sombra de dúvidas, a questão dos professores. Uma escola não existe sem alunos, e muito menos sem seus professores. E em se tratando de um curso de medicina, estes precisariam ser competentes como professores e – por que não? – como profissionais. Bem apropriadamente, Octavio de Freitas, um dos fundadores da Faculdade de Medicina do Recife, argumentando em favor de seu projeto, assim se refere em relação ao que seria esperado do corpo docente de uma nova escola: “Não ha Faculdade constituida exclusivamente por celebridades ou por sábios. O que se exige de todos os professores, para que a escola seja respeitada, é que êles saibam as matérias a lecionar e tenham amor e interesse pêlo ensino” (FREITAS, 1944, p. 55). Por esse aspecto a escolha não deve ter sido das mais trabalhosas. Contando o Estado, na ocasião, com apenas quatro cursos superiores (Direito, Farmácia, Odontologia e Veterinária), um dos questionamentos poderia ser o número restrito de profissionais habilitados e com experiência didática para atuar no novo curso, assunto inclusive abordado e contraditado no artigo do padre Dubois “Doutores haja”: “Objectam que Belem não é um meio intellectual, e que se temos bons médicos, faltam lentes de medicina”. No mesmo artigo, Dubois incentiva a empreitada, apontando a solução: O soldado se forma num ambiente militar e o sábio numa atmosfera scientifica. [...] As tradições academicas serão vantajosamente substituídas pelo esforço do corpo discente. [...] A sciencia dos mestres acertará com a techica professoral que os lentes do sul adquiriram paulatinamente. [...] A falta de um passado academico proporcionará aos rapazes o ensejo de prefaciarem com formosas paginas os annaes da Faculdade (Folha do Norte, 23.01.1919). A tão alegada falta de tradição na docência é perfeitamente questionável, partindo do princípio de que o ensino em escolas tradicionais do Pará como o Ginásio Paes de Carvalho — antigo Liceu Paraense — e a Escola Normal — hoje Instituto de Educação do Pará — era considerado da mais alta qualidade, à semelhança da capital federal, onde o Colégio Pedro II e o Instituto de Educação eram seus equivalentes. Por esse fato, o corpo de professores de ambos os colégios paraenses era composto por profissionais de grande competência, dentre os quais vários médicos, com o ingresso e a sequência da carreira do magistério regidos por concursos, que incluíam provas e elaboração de teses, com sustentação oral perante uma banca examinadora. Tudo isto certamente denotava o saber dos candidatos, conferindolhes, ao final, uma grande experiência para a carreira docente. A formação do corpo docente 67 Seja por esse aspecto, seja para tentar imprimir maior credibilidade ao novo curso de medicina, observa-se, desde as primeiras notícias sobre sua criação uma preocupação constante em citar os professores que fariam parte da nova escola. Ainda em janeiro de 1919, Folha do Norte publicava notas sobre a futura faculdade, chamando atenção para o corpo docente: “Para lente do estabelecimento foram convidados os mais eminentes medicos do nosso meio, que têm acolhido com enthusiasmo a idea” (Folha do Norte, 15.01.1919). Outra notícia, além de citar que à frente da Faculdade estavam o Barão de Anajás, como Diretor; Camilo Salgado, como vice, e Hermógenes Pinheiro, como secretário, fazia menção ao nome de alguns futuros professores: Para o corpo docente da Faculdade foram convidados muitos medicos illustres do nosso meio, entre os quaes destacamos os seguintes, que receberam com agrado em enthusiasmo a idéa e que constituem por si sós o melhor titulo de recomendação do novel instituto scientifico; drs. Barão de Anajás, Camillo Salgado, Hermógenes Pinheiro, Jayme AbenAthar, Cyriaco Gurjão, Souza Castro, Dionysio Bentes, Dias Junior, Pedro Miranda, Penna de Carvalho, Fernandes Penna, Evaristo Silva, Carlos Arnobio Franco, Francisco Pondé e muitos outros (Folha do Norte, 18.01.1919). 68 A ata de instalação da Faculdade é outro documento em que é feito referência aos professores. Reproduzida pela imprensa no jornal Estado do Pará, do dia 3 de maio de 1919, nela se lê que entre as várias pessoas que haviam assistido a solenidade estavam os [...] drs. Penna de Carvalho, Caribé da Rocha, Cruz Moreira, Camillo Salgado, Hermogenes Pinheiro, Mattos Cascaes, Otto Santos, Camillo Salgado dos Santos, Acylino de Leão, Evaristo Silva, Jayme Rosado, Mario Chermont e Porto de Oliveira, do corpo docente da Faculdade de Medicina [...] (Estado do Pará, 03.05.1919). O jornal Folha do Norte, dias depois da instalação, também mencionaria os professores e suas respectivas disciplinas: É este o corpo docente da nossa recém fundada Faculdade de Medicina: Physica medica, dr. Mario Chermont; Chimica medica, dr. Salgado dos Santos; Historia Natural medica e parasitologica, dr. Caribé da Rocha; Anatomia descriptiva, dr. Hermogenes Pinheiro; Histologia, dr. Fernandes Penna; Physiologia, dr. Dionysio Bentes; Microbiologia, dr. Acatauassú Nunes; Therapeutica e arte de formular, dr. Mattos Cascaes; Pathologia geral, dr. Barão de Anajás; Anatomia e physiologia pathologicas, dr. Oswaldo Barbosa; Anatomia medico-cirurgica e operações e apparelhos, dr. Cruz Moreira; Hygiene, dr. Carlos Franco; Medicina Legal, dr. Francisco Pondé; Clinica medica (1ª cadeira), dr. Acylino de Leão; Clinica medica (2ª cadeira), dr. Arthur França; Clinica medica (3ª cadeira), dr. Souza Castro; Clinica cirúrgica (1ª cadeira), dr. Camillo Salgado; CliniMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 ca cirúrgica (2ª cadeira), dr. Penna de Carvalho; Clinica gynecologica, dr. Silva Rosado; Clinica ophtalmologica, Dr. Pedro Miranda; Clinica otho-rhyno-laryngologica, dr. Chaves de Freitas; Clinica pediatrica cirurgica e orthopedica, dr. C. Gurjão; Clinica infantil e pediatrica medica, dr. Otto Santos; Clinica dermatologica e syphiligrafica, dr. (Izidoro) Azevedo Ribeiro; Clinica neurologica e psychiatrica, dr. Porto de Oliveira; Clinica obstétrica, dr. Agostinho Monteiro; Radiologia medica, dr. Jayme Rosado (Folha do Norte, 09.04.1919). Esta relação inicial sofreria modificações logo no início. O livro de atas de posse dos professores, de 3 de abril de 1919, registra algumas alterações na lista acima citada. Na cadeira de Anatomia e Fisiologia Patológicas, por exemplo, temos o registro de posse de Jayme Aben-Athar1, no lugar de Oswaldo Barbosa, que seria empossado numa quarta cadeira de Clínica Médica; Oscar de Carvalho aparece no lugar de Penna de Carvalho, na 2ª cadeira de Clínica cirúrgica, que não é mencionado, embora seu nome conste como signatário da ata; Lauro de Magalhães, numa 3ª cadeira de Clínica cirúrgica; Cyriaco Gurjão em Clinica pediátrica medica e Higiene infantil, ao invés de Clínica pediátrica cirúrgica e ortopédica. Para esta tomou posse Otto Santos, que constava em Clínica pediátrica médica. Na mesma leva seria empossado Evaristo Silva na cadeira de Clínica neurológica, que aparece assim separada de psiquiatria (FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ, [1950?]). Estas posses aconteceram na sala da Congregação da Faculdade, no Ginásio Paes de Carvalho, com os professores sendo nomeados “para a regencia das cadeiras que constituem o curso medico” (FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ, [1950?]). Examinando com mais detalhes o corpo docente inicial da Faculdade, observamos que ele, entre outras coisas, guarda estreita relação com a Sociedade MédicoCirúrgica (SMCP), entidade criada em 1914 e cujos sócios fundadores foram: os médicos: Barão de Anajás, Camillo Salgado, Cruz Moreira, Penna de Carvalho, Arthur França, Caribé da Rocha, Ophyr de Loyola, Agostinho Monteiro, Jayme Aben-Athar, Francisco Pondé, Oswaldo Barbosa, Orlando Lima, Crasso Barbosa, J.A. de Magalhães, Renato Chaves, Pedro Miranda, Porto de Oliveira, Ageleo Rodrigues, Synval Coutinho, Bernardo Ruttowitz, Humberto Mello, Veiga Cabral, Urbano de Menezes, Fernando Penna, Mattos Cascaes, Silva Rosado, Acylino de Leão, Amanajás Filho, Castro Valente, Emilio Sá, Raymundo Faria, Coelho de Souza, Lauro Magalhães, Mario Chermont, Aleixo Simões, Appio Medrado, (Izidoro) Azevedo Ribeiro, Theodorico Macedo, Rodrigues de Souza, Francisco Miranda e José Valente2 (CARVALHO, 1922, p. 226). Observa-se, assim, que praticamente todo o corpo docente da Faculdade fazia parte da referida agremiação científica, a qual, embora de criação recente, contava, em sua composição com notáveis profissionais, o que lhe conferia alta credibilidade, conquistando de pronto a simpatia e respeito do Estado e da sociedade. A formação do corpo docente 69 A primeira diretoria da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, para o biênio 19141915, era constituída pelos seguintes membros: Presidente: Dr. Camillo Salgado Vice-presidente: Dr. Cruz Moreira 1º secretário: Dr. Penna de Carvalho 2º secretário: Dr. Arthur França Orador: Dr. Acylino de Leão Tesoureiro: Dr. Amanajás Filho (PARÁ MEDICO, 1922, p. 227-8) Ao tempo da fundação da Faculdade de Medicina, a Diretoria da Sociedade Médico-Cirúrgica, para o biênio 1919-1920, era composta pelos médicos: Presidente: Penna de Carvalho Vice: J. A. Magalhães 1º secretário: Ophyr de Loyola 2º secretário: Renato Cunha Tesoureiro: Jayme Aben-Athar Orador: Bentes de Carvalho Foi acrescido o cargo de bibliotecário, sendo eleito para este, Caribé da Rocha (DIAS, 2002, p. 35). 70 Se a relação entre a Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará e a Faculdade de Medicina do Pará era de grande proximidade, o mesmo se pode dizer quanto à Santa Casa. Em 1916, o hospital sofreria uma grande reforma em sua organização sendo estruturado em três grandes divisões — homens (compreendendo Clínica médica, Clínica dermatológica e sifiligráfica, Clínica cirúrgica, Clínica das vias urinárias, Clínica oftalmológica e oto-rino-laringológica), mulheres (compreendendo Clínica médica, Clínica dermatológica e sifiligráfica, Clínica cirúrgica, Clínica ginecológica, Clínica obstétrica, Clínica oftalmológica e oto-rino-laringológica) e crianças (compreendendo Clínica médica, Clínica cirúrgica e ortopédica) (A SANTA Casa de Misericórdia do Pará, 1922). Nesta reorganização, o hospital criaria, também, laboratório de análises clínicas, serviço de radiologia e a figura do Diretor Clínico, eleito anualmente pelo corpo clínico, sendo o primeiro Diretor Clínico o Dr. Cruz Moreira (A SANTA Casa de Misericórdia do Pará, 1922), que viria a fazer parte do corpo docente da Faculdade. Tal divisão, em muito favoreceria, posteriormente, a acolhida dos alunos da nova escola médica. Em 1922 compunham o corpo clínico da Santa Casa os seguintes médicos: Clínica médica de adultos, Dr. Albino Cordeiro; Clínica médica de crianças, Dr. Ophyr de Loyola; Clínica oftalmológica, Dr. Pedro Miranda, adjunto, Dr. Deusdedit Coelho; Clínica oto-rino-laringológica, Dr. Lauro Sodré Filho; Clínica homeopática, Dr. Bacellar Filho; Clínica médica de homens, Drs. Augusto Eduardo Pinto e Antonio de O´de Almeida, adjuntos, Drs. Acylino de Leão e Remigio Filgueiras; Clínica médica de mulheres, efetivos, Drs. João Henriques e Francisco Miranda, adjunto, Dr. OswalMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 do Barbosa; Clínica cirúrgica de homens, efetivos, Drs. Appio Medrado e Penna de Carvalho, adjuntos Drs. Amanajás Filho e Ferreira Bastos; Clínica cirúrgica de mulheres, efetivos, Drs. Carlos Ornstein e Aleixo Simões, adjuntos, Drs. Dagoberto de Souza e Orlando Costa; Clínica ginecológica, Dr. Cruz Moreira, adjunto, Dr. Teixeira Mendes; Clínica obstétrica, efetivo, Dr. Orlando Lima, adjuntos, Drs. Ausier Bentes, Gaston Vieira e Dagoberto Souza; Gabinete de Radiologia, efetivo Dr. Jayme Rosado; Gabinete de Biologia, efetivo, Dr. Acatauassú Nunes Filho, adjunto Dr. Prisco dos Santos (A SANTA Casa de Misericórdia do Pará, 1922, p. 320-321). Grande parte destes comporia o corpo docente da Faculdade de Medicina do Pará, tendo Dr. Camillo Salgado ocupado inclusive o cargo de Diretor do Hospital em 1924, convidado que fora em virtude do falecimento do Dr. Cypriano Santos3. Também havia professores da Faculdade que faziam parte do Corpo docente do Ginásio Paes de Carvalho, como Antonio Marçal, catedrático de Química, tendo inclusive se aposentado no cargo em 1935 (MEIRA, 1986b, p. 34) Juliano Pinheiro Lyra Sosinho, lente de História Natural (REGO, 2002, p. 455). Atuavam na então Escola Normal os seguintes: Francisco Pondé, catedrático de História Natural. Interinamente exerceu a disciplina de Física e Química e Noções de História Natural; Antonio Periassu, Pedagogia, Instrução Moral e Psicologia. Interinamente exerceu a cadeira de Física e Química e Noções de História Natural; Geminiano Coelho e Prisco dos Santos exerceram interinamente a cadeira de História Natural; Vitruvio Gonçalves Campos era lente efetivo de Higiene; Hermógenes Pinheiro exerceu interinamente a mesma disciplina (REGO, 1972, p. 160). Vários professores lecionaram em outros cursos superiores, como Acylino de Leão, que também ensinou na Escola de Medicina Veterinária (MEIRA, 1986b, p. 139). Jayme Aben-Athar, um dos fundadores do curso de Odontologia, juntamente com Antonio Periassú, Carmelino Salgado, Pinheiro Sozinho, Camillo Salgado, Antonio Magno e Silva, entre outros (RIBEIRO, 2005, p. 12), foi professor do referido curso, chegando à sua Direção em 1917. Teve atividade docente, também, nos cursos de Medicina Veterinária e de Farmácia (MEIRA, 1986b, p. 152). Prisco dos Santos lecionou Zoologia e Microbiologia no curso de Farmácia (MEIRA, 1986b, p. 270). Também no curso de Farmácia foi professor de História Natural, Otto Santos (PARÁ MEDICO, 1922, p. 370). Agostinho Monteiro lecionou Física e Química na Escola Prática de Comércio do Pará (MEIRA, 1986b, p. 253), que ainda não fosse um curso superior, era uma escola bem recomendada. No plano intelectual, vale destacar a presença de Acylino de Leão no grupo que reorganizou a Academia Paraense de Letras, em 1913, instituição da qual também faria parte o Dr. Orlando Lima, ambos fundadores da Faculdade de Medicina (REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS, 1952). A formação do corpo docente 71 Do Instituto Histórico e Geográfico do Pará (IHGP) fizeram parte Américo Vitruvio Gonçalves Campos, Francisco Caribé da Rocha, João Baptista Penna de Carvalho, Ophyr Pinto de Loyola (fundadores – reinstalação em 6 de março de 1917), Antonino Emiliano de Souza Castro, Francisco Pondé, Izidoro de Azevedo Ribeiro, Mario Midosi Chermont, Oscar de Carvalho, todos componentes do grupo inicial da Faculdade (Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, 1931). Na Revista do IHGP de 1968 não aparece o nome de Camillo Salgado como membro do Instituto, constando na relação de fundadores (1917) o nome do Dr. Higino Amanajás, que não conseguimos confirmar se era o do também professor fundador da Faculdade de Medicina (REVISTA DO IHGP, 1968, p. 9). 72 Outro aspecto que vale a pena abordar diz respeito aos professores no exercício da profissão médica. Se tomarmos como referência a revista Pará-Medico de agosto de 1917, no Indicador Médico são citados os seguintes profissionais, com seus respectivos locais de trabalho: Agostinho Monteiro, Alberto Conceição Silva, Almeida Pernambuco, Amanajás Filho, Antonio Acatauassú Nunes, Antonino de Souza Castro, Appio Medrado, Arthur França, Augusto E. Pinto, Ausier Bentes, (Izidoro) Azevedo Ribeiro, Bacellar Junior, Camillo Salgado, Cardoso de Menezes, Caribé da Rocha, Carlos Aguiar, Carlos Franco, Carlos Ornstein, Carlos Silva, Castro Valente, Cerqueira Bião, Chaves de Freitas, Chaves de Moraes Bittencourt, Coelho de Souza, Crasso Barbosa, Cruz Moreira, Cyriaco Gurjão, Diógenes Ferreira de Lemos, Dyonisio Bentes, Emilio Sá, Evaristo Silva, Ezequiel Antunes, Fernandes Penna, Ferreira Bastos, Francisco Pondé, Franco Lobo, Geminiano Coelho, Humberto de Mello, Jayme Aben-Athar, Jayme Rosado, Joaquim Paulo de Souza, J. A. de Magalhães, Lauro Magalhães, Lindolpho Campos, Macedo Rocha, Mario Chermont, Mattos Cascaes, Ophyr de Loyola, Orlando Costa, Oswaldo Barbosa, Otto Santos, Pedro Miranda, Pedro Nunes Rodrigues, Penna de Carvalho, Porto de Oliveira, Raymundo Faria, Redomark de Albuquerque, Renato Chaves de Souza, Silva Rosado, Veiga Cabral e Virgílio Mendonça (PARÁ-MEDICO, 1917, p. 242). É evidente que a revista não iria anunciar profissionais que não gozassem de prestígio e boa reputação. E entre eles encontramos vários futuros professores do curso de medicina. Também relacionado à atividade médico-profissional, no Relatório de 1918, da Sociedade Portugueza Beneficente do Pará, temos como constituintes do corpo clínico do Hospital D. Luiz I os seguintes médicos: Camillo Salgado, Cyriaco Gurjão, Pedro Miranda, Cruz Moreira, Lauro Magalhães e José A. de Magalhães, como efetivos, e Ausier Bentes, Porto de Oliveira, Agostinho Monteiro, Penna de Carvalho, Otto Santos, Gelmirez Gomes e Zaqueu Cordeiro, como adjuntos (SOCIEDADE PORTUGUEZA BENEFICENTE DO PARÁ, 1919). A maioria destes seria docente da Faculdade de Medicina. Deste modo, não se pode falar em inexperiência, profissionais desconhecidos ou sem vivência didática com relação aos professores dos primeiros tempos da Faculdade de Medicina do Pará. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 NOTAS 1 Não assumiu a cátedra naquele dia, ver capítulo “A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará – O dia que tempo apagou”. 2 Registre-se que o Barão de Anajás, Camilo Salgado, Antonio Marçal e Silva Rosado figuram entre os organizadores da primeira associação científica do Pará, a Sociedade Médico-Farmacêutica do Pará, de 1898. (PARÁ MEDICO, 1900). 3 “Em 6 de novembro de 1923 falleceu o Dr. Cypriano José dos Santos, que vinha exercendo com abnegação o cargo de Director do Hospital de Caridade. [...] A vista disso resolveu o Conselho convidar o nosso prestimoso consorcio Dr. Camillo Henrique Salgado, orgulho da classe medica do Pará, o que foi feito em officio de 24 do mesmo mez (setembro de 1924 – grifo nosso), assumindo elle no daí seguinte o cargo de Director do Hospital de Caridade, no desempenho do qual vem prestanto com a melhor boa vontade o melhor dos seus esforços”. (SANTA CASA DE MISERICORDIA DO PARÁ, 1923, p. 4). 73 A formação do corpo docente 74 6 O ensino 75 76 Estátua de Asclépio doada pelo professor Silva Rosado. Após a aula inaugural realizada em 1º de maio de 1919, às 10 horas, no salão nobre do Ginásio Paes de Carvalho, pelo professor Acylino de Leão Rodrigues, a Faculdade só começaria a funcionar efetivamente, no dia 6 de maio do mesmo ano1, uma segunda-feira, quando o Dr. Caribé da Rocha, lente da cadeira de História Natural e Parasitologia, iniciou seu curso, proferindo assim a primeira aula regular do curso de medicina (FMCP, Acta, 1919). A partir desse momento as aulas tiveram seguimento, baseado em que a grande maioria dos professores já havia sido empossada em suas respectivas cadeiras, conforme o livro de atas referente2. Por circunstâncias óbvias, contando apenas com duas salas cedidas no Ginásio Paes de Carvalho, as quais tiveram que ser mobiliadas, conforme atesta o ofício de agradecimento do Barão de Anajás ao prof. Paulo Maranhão, Diretor da Instrução Pública Primária do Estado, pela cessão de trinta e cinco carteiras para os alunos da Faculdade3, o início do curso não deve ter sido dos mais agradáveis. Os alunos após aprovação nos exames vestibulares – alguns, pois que ampla era a lista dos dispensáveis destas4, que consistiram em provas escritas e orais de Francês, Alemão ou Inglês, além de Física, Química e História Natural (FMCP, 1924b, p. 1213) -, assistiam suas aulas teóricas no Ginásio. As aulas práticas eram desenvolvidas no Necrotério do Estado — prédio ainda existente na pedra do Ver-o-Peso, embora bastante descaracterizado —, sendo utilizados, também os laboratórios de química e farmácia do Serviço Sanitário do Estado (MOREIRA, E., 1977, p. 14), que sediava, ainda, o curso de Farmácia, no Parque Afonso Penna com a travessa da Vigia (FIOCRUZ, 2007), além do laboratório da Santa Casa. Posteriormente, à medida que as turmas foram entrando, e o curso avançando, seriam utilizadas as instalações do antigo Hospital dos Alienados para as práticas de Neurologia e Psiquiatria. O currículo do curso seguia a norma legal, oficialmente estabelecido pela Reforma Maximiano, por meio do Decreto 11.530, de 5 de março de 1915 (KELNER, 1991, p. 134), sendo adotado na Faculdade do Pará o mesmo regimento da Faculdade do Rio de Janeiro, “excepto quanto a parte econômica, como determina o Decreto n. 16.782-A” (FMRJ, 1926). No estatuto da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, datado de 1921 são relacionadas as seguintes cadeiras: Physica Medica; Chimica Medica; Chimica Biológica; Historia Natural Medica com desenvolvimento de parasitologia; Anatomia descriptiva; Physiologia; Histologia; Microbiologia; Therapeutica; Pharmacologia e arte de formular; Pathologia geral; Anatomia e physiologia pathologicas; Anatomia medico-cirurgica e operações; Hygiene; Medicina Legal; Clinica Medica (1ª, 2ª, 3ª e 4ª cadeiras); Clinica cirurgica (1ª, 2ª, 3ª e 4ª); Clinica obstétrica; Clinica gynecologica; Clinica Ophtalmologica; Clinica Oto- O ensino 77 rhino-laryngologica; Clinica pediatrica medica e Hygiene infantil; Clinica pediatrica cirurgica e orthopedia; Clinica dermatologica e syphiligraphica; Clinica neurologica e Clinica psychiatrica (FMCP, 1933a, p. 4). Já no Regimento Interno de 1924 notam-se algumas alterações nas disciplinas, podendo-se traçar um roteiro aproximado do ensino nos primeiros anos da Faculdade de Medicina do Pará. Seguindo sempre o modelo do Rio de Janeiro e, consequentemente, da Bahia (KELNER, S.; KELNER, M., 1991, p. 134), em 1924, no primeiro ano eram ministradas as disciplinas: - Física Médica - Química Médica - História Natural Médica (com desenvolvimento especial de parasitologia) No segundo anos as disciplinas eram - Anatomia descritiva (1ª parte) - Química biológica - Histologia normal - Fisiologia (1ª parte) 78 Eram estudadas no terceiro ano as matérias - Anatomia descritiva (2ª parte) - Fisiologia (2ª parte) - Microbiologia - Clínica propedêutica médica e clínica propedêutica cirúrgica. Para o quarto ano as matérias eram - Patologia geral - Anatomia e fisiologia patológicas - Farmacologia e arte de formular - Clínica dermatológica e sifiligráfica - Clínica oftalmológica - Clínica cirúrgica Quinto ano - Anatomia medico-cirurgica - Operações e aparelhos - Terapêutica - Clínica Cirúrgica - Clínica Médica - Clínica pediátrica médica e higiene infantil - Clínica pediátrica cirúrgica e ortopedia - Clínica Otorrinolaringológica No sexto ano - Higiene - Medicina legal Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 - Clínica Médica - Clínica das vias geniturinárias - Clínica obstétrica - Clínica ginecológica - Clínica neurológica - Clínica psiquiátrica - Radiologia e Fisioterapia. (FMCP, 1924, p. 7-9). 79 Foto 8: Laboratório de Farmacologia. Fonte: FMCP (1946b, s.p.). Compilando os programas que conseguimos obter das disciplinas, observa-se que tanto os referidos programas quanto a disposição das matérias pelos anos de duração do curso sofreriam modificações, com desmembramento de cadeiras, criação de outras e deslocamento de algumas de uma série para outra, adequando-se às mudanças necessárias e às exigências legais. Por exemplo: o programa do terceiro ano para 1921 previa Anatomia descritiva (2ª parte), Fisiologia (2ª parte) e Microbiologia. Já para o ano de 1928, as matérias para aquela série eram Patologia geral, Fisiologia (2ª parte), Farmacologia e Microbiologia. O ensino Observa-se também que no currículo inicial não existiam algumas disciplinas como a destinada ao estudo das doenças tropicais — uma incoerência para a realidade amazônica de então e de hoje, ainda. A disciplina seria criada com o nome de Doenças Tropicais ou Infectuosas, em 19255, sendo hoje denominada Doenças Infecciosas e Parasitárias. A cátedra foi criada na Faculdade Nacional de Medicina do Rio de Janeiro, sendo seu primeiro titular o médico Carlos Chagas, como reconhecimento do Governo Federal pelo notável trabalho deste cientista descobridor da Doença de Chagas (LEWINSOHN, 2003, p. 194). Outra coisa que chama a atenção, também, é o horário de funcionamento da Faculdade e das aulas. Conforme o citado Regimento Interno de 1924, “As horas normaes do expediente diario decorrerão desde as 8 até ás 18 horas” (FMCP, 1924, p. 35); a Secretaria funcionava “todos os dias, com excepção dos domingos e feriados, das 11 ás 16 horas” (FMCP, 1924, p. 27); a Biblioteca “todos os dias uteis, das 10 ás 22 horas” (FMCP, 1924, p. 31). Quanto às aulas, em 1935, a grade curricular era a seguinte: 1º ano: Anatomia (1ª parte), Anatomia (2ª parte) e Histologia e embriologia geral; 2º ano: Física biológica, Química biológica e Fisiologia; 80 3º ano: Microbiologia, Parasitologia, Farmacologia e Patologia geral; 4º ano: Clínica propedêutica médica, Clínica dermatológica e sifiligráfica, propedêutica cirúrgica e clínica cirúrgica, Técnica operatória e Anatomia patológica; 5º ano: Clínica urológica, Clínica cirúrgica, Clinica de doenças tropicais e infectuosas, Terapêutica clinica, Higiene, Medicina legal e Clínica médica; 6º ano: Clínica pediátrica médica e higiene infantil, Clínica obstétrica, Clínica ginecológica, Clínica psiquiátrica, Clínica oftalmológica, Clínica neurológica, Clínica otorinolaringológica e Clínica cirúrgica infantil e ortopédica. As aulas de Anatomia Humana (1ª parte), por exemplo, eram às terças, quintas e sábados das 15 às 16h, seguidas pelas da 2ª parte, das 16 às 17h. Um detalhe ainda dentro do mesmo assunto: dos 46 alunos matriculados na referida disciplina, somente 4 foram “inhabilitados por media ou frequencia” (FMCP, 1936). Outras disciplinas também tinham aulas dias de sábado: Farmacologia, Anatomia e Fisiologia Patológicas, Clínica Dermatológica e Sifiligráfica, Clínica urológica, Clínica cirúrgica, Terapêutica, entre outras. Cite-se que as aulas de Psiquiatria, no 5º ano, eram ministradas às terças, quintas e sábado, de 13h30 às 14h30! Em resumo, das 32 disciplinas do currículo daquele ano, 15 tinham aulas dia de sábado, coisa impensável nos dias de hoje, quando os fins de semana são tão concorridos que geralmente começam na quinta-feira. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 No Relatório de Atividades do ano de 1949, as disciplinas eram ministradas na seguinte ordem: 1ºano Anatomia Humana (1ª parte) Anatomia Humana (2ª parte) Histologia e Embriologia Geral 2º ano Física Biológica Química Fisiológica Fisiologia Anatomia Humana (3ª parte) 3º ano Microbiologia Parasitologia Farmacologia Patologia Geral 4º ano Clínica Propedêutica Médica Clínica Dermatológica e Sifiligráfica Clínica Propedêutica Cirúrgica e Clínica Cirúrgica Técnica Operatória e Cirurgia Experimental Anatomia e Fisiologia Patológicas 81 5º ano Clínica Médica (1ª cadeira) Clínica Cirúrgica Clínica Urológica Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas Terapêutica Clínica Higiene e Medicina Preventiva Medicina Legal 6º ano Clínica Médica (2ª cadeira) Clínica Obstétrica Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil Clínica Neurológica Clínica Psiquiátrica Clínica Oto-rino-laringologica Clínica Ginecológica Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica Clínica Oftalmológica O ensino Foto 9: Gabinete de Fisiologia. Fonte: FMCP (1949b, s.p.). 82 Foto 10: Gabinete de Química Fisiológica. Fonte: FMCP (1949b, s.p.). Já federalizada, em 1951 a Faculdade apresentava a seguinte grade curricular: 1° ano Anatomia Histologia e Embriologia 2° ano Anatomia Fisiologia Física Biológica Química Fisiológica 3° ano Farmacologia Microbiologia Parasitologia Patologia geral 4° ano Anatomia e Fisiologia Patológicas Clínica Dermatológica e Sifiligráfica Clínica Propedêutica Médica Técnica Operatória e Cirurgia Experimental 83 5° ano Clínica Cirúrgica (1ª cadeira) Clínica Médica (1ªcadeira) Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas Clínica Urológica Terapêutica Clínica Higiene (2° período) Medicina Legal (2° período) 6° ano Clínica Médica (2ª cadeira) Clínica Obstétrica Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil Clínica Ginecológica (1° período) Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica (1° período) Clínica Neurológica (1° período) Clínica Oftalmológica (2° período) Clínica Psiquiátrica (1° período) Clínica Oto-rino-Laringológica (2° período) O ensino 84 Foto 11: Laboratório de Microbiologia. Fonte: FMCP (1946b, s.p.). Destaque-se que uma das funções do Conselho Técnico Administrativo era avaliar anualmente o programa aplicado naquele ano e apresentar sugestões ou modificações para o ano vindouro. Uma interessante sugestão apresentada pelo professor Oscar Miranda, em 1939, foi a criação de uma cadeira de Tisiologia, ideia que infelizmente não recebeu apoio dos demais membros do Conselho6. Um fato que convém ser observado é que não havia um ano dedicado ao internato obrigatório. Só mais tarde as disciplinas foram condensadas em cinco anos para permitir que o sexto ano fosse dedicado unicamente ao internato. Atualmente, o currículo mínimo estabelecido pelo Ministério da Educação e Cultura prevê o internato em dois anos, condensando ainda mais as disciplinas médicas. A ausência do internato no currículo das faculdades de medicina brasileiras é assim lembrada por Doyle Maia, da Faculdade Nacional de Medicina da Universidade do Brasil: O internato, até então, era uma atividade facultativa e de escolha do aluno. Cada um procurava o serviço que mais lhe agradava e, se quisesse, pleiteava o lugar de interno; a maioria aceitava faze-lo sem qualquer remuneração. O simples fato para ter autorização para freqüentar e estar ligado a determinados serviços era motivo de orgulho e enriquecimento Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 do currículo. Havia serviços tão rigorosos que, além de não remunerarem os internos, cobravam multas por qualquer falha no cumprimento das obrigações estabelecidas. Era comum ler-se no bloco de receituário dos médicos, como título importante, ex-interno a serviço do professor. Mas ninguém era obrigado a ser interno e muitos formavam-se sem nunca ter freqüentado um serviço clínico ou cirúrgico, ou faziam o correspondente ao internato em cadeiras básicas orientando, desde estudantes, suas atividades para estas cadeiras, hoje quase totalmente ocupadas por especialistas que não tem formação médica (MAIA, 1996, p. 175). Fazendo um apanhado geral, chega-se à conclusão que classificar o ensino da Faculdade naqueles dias em termos simplistas como “bom”, “regular” ou mesmo “ruim”, seria por demais injusto. Melhor fosse, talvez uma análise individual de cada disciplina, o que, entretanto, fugiria do objetivo deste capítulo, além de também não ser isenta de erros. Pode-se afirmar, de forma mais concreta que o ensino, era irregular, havendo altos e baixos de acordo com as disciplinas, mas nada que num cômputo geral comprometesse severamente a formação de um bom médico. Para esta irregularidade na avaliação do ensino vários motivos contribuíam, dentre os quais podemos citar, por exemplo, que as disciplinas clínicas tinham mais sorte, já que eram desenvolvidas na Santa Casa ou em outros hospitais de apoio, de modo que, mesmo que o professor não fosse muito bom, a quantidade de pacientes era enorme, propiciando um bom aprendizado. E quando o catedrático era alguém como Acylino de Leão, criava-se uma combinação perfeita. O próprio Acylino descreveria a Santa Casa como um manancial inesgotável para a prática clínica, já que para aquele hospital: [...] affluem não só doentes de todo o interior do Estado do Pará, onde não há recursos médicos, como tambem do Amazonas e Acre, do Maranhão e do Piauhy, até do Ceará. Apesar de suas vastas proporções as enfermarias vivem completamente cheias, utilisando-se mesmo os porões. Disponho de trinta e seis leitos; mas meus eminentes collegas, Prof. Remigio Figueiras e dr. Augusto Pinto, me franquearam os seus serviços, podendo eu dispor de qualquer de seus doentes e indicando-me elles proprios os casos interessantes que apparecem. Os casos bons, didáticos, que surgem em minha clinica particular, conduzo-os com habilidade para o exame do alumno (FMCP, 1923c, p. 16). Na contramão, as disciplinas do chamado ciclo básico, instaladas em sua maioria no Palacete Santa Luzia, dependiam mais do talento dos professores já que a carência de material era grande e os laboratórios muito incipientes. O professor de anatomia José Alves Dias Junior, em 1943, refere-se às dificuldades que encontrava para lecionar, mesmo levando em conta o recém inaugurado anfiteatro anatômico: O ensino 85 O curso de Anatomia (2ª cadeira) não se processou, como era de se esperar das novas instalações introduzidas no anfiteatro. Alega-se que a discontinuidade da corrente eletrica é principal motivo de não se poder fixar dentro das cubas uma atmosfera baixa permanente, para conservação das peças. Os cadáveres apodrecem tornando-se o ambiente incompatível com a execução de trabalhos pacientes e demorados como os de Anatomia Humana. As últimas lições do corrente âno (preparação da bexiga, prostata, uretra, penis e testiculos) fôram feitas em peças que somente a compreensão de deveres faria deter numerosa turma diante de exemplares em péssimas condições de conservação. (FMCP, 1944b, p. 37). Seguiam os anos e as dificuldades continuavam sendo relatadas pelo mesmo professor: Acontece, porem, que, nem sempre se consegue, penetrar o anfiteatro para se dar as aula. Cadaveres, que da rua vêm para as autopsias policiais, aí permanecem se decompondo e exalando insuportavel fétido. Alias, isso vem acontecendo sempre. Depois desses exames, os corpos descem para as mêsas do anfiteatro, permanecendo geralmente abandonados, entram em franca decomposição, aguardando condução para enterramento. Sendo o anfiteatro uma sala de aula, não é justo que o transformem em câmara funerária ou necrotério público, onde os achados de rua podem permanecer putrefactos o tempo que assim entendam os encarregados de tal serviço (FMCP, 1948c, p. 66). 86 Entretanto a dedicação de Dias Junior ao ensino da Anatomia era tão extrema que ultrapassava a sala de aula, fazendo inclusive de sua própria casa um verdadeiro museu de mapas e peças anatômicas (SILVA, 1977, p. 190). Dias Júnior permaneceria na memória de seus alunos como um daqueles professores capazes de extrair o máximo diante do mínimo que a Faculdade podia oferecer. Para o aprendizado dos alunos, a situação era grave particularmente quando havia o casamento entre as dificuldades estruturais das disciplinas básicas com a mediocridade de alguns professores. Tal situação geraria inflamados protestos, como os do professor Amanajás Filho, manifestado em uma reunião do Conselho Técnico Administrativo de 1932: Com a palavra o Dr. Amanajás Filho, que principia dizendo que ia tratar de um assunto muito importante para a vida da nossa Faculdade. Dirigindo-se ao Dr. Salgado diz que ele representa a força vital, o sustentáculo dessa obra grandiosa que é a Faculdade de Medicina. Continuando diz que em princípio foi um descrente, mas passados anos enfileirou-se também entre os que com dedicação trabalharam pelo alevantamento da nossa Faculdade. Mas, sr. presidente, é essa obra grandiosa que vejo periclitar, quero referir-me a certos professores faltosos, professores que não dão aulas e contra semelhantes fatos quero que fique gravado na ata meu protesto. Sr. presidente, o Conselho já havia deliberado como medida de acerto a para a normalização do fato acima, o livro e frequencia, no Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 qual constava a assinatura e o ponto explicado pelo professor, podendo o professor ter até três faltas por mês. Entretanto, isto não tem sido observado. Pessoa vinda do Rio, disse-nos que a Faculdade de Medicina do Pará está em franco descrédito, pois os alunos que daqui vão transferidos, quando em aulas de anos adiantados não compreendem as explicações pela ausência de conhecimento das cadeiras dos anos inferiores e isto porque os professores não dão aulas. É preciso, sr. presidente tomar medidas sérias, pois a continuar assim é preferível fechar a nossa Faculdade. E o que é mais quero admirar, sr presidente. É que os professores faltosos mal chega o dia 28 começam logo a telefonar para a tesouraria sabendo se já há dinheiro. Eu quero, sr presidente que a Faculdade mantenha o seu prestigio, que já teve e que seja acatada e respeitada. Eu não especifico os nomes dos professores faltosos, porque V. Excia. sabe quem são. Terminando, sr. presidente, quero, repito, que fique gravado na ata o meu protesto contra semelhante fato para que mais tarde quando se escrever a história da nossa Faculdade não se diga que ninguém ousou protestar (CTA, Ata do dia 29.12.1932). As palavras do professor Amanajás Filho deveriam ter ficado gravadas, perenemente, em lugar destacado do palacete de Santa Luzia, como símbolo de uma época em que havia abnegados professores, comprometidos em dar o melhor de si, para que a jovem Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará se estabelecesse como referencial de ensino médico e viesse a ser respeitada no Brasil inteiro. E, também, como incômoda premonição, para que os pósteros constatassem que o descompromisso de certos docentes não é privilégio de uma época. NOTAS 1 “Cópia da acta da primeira aula professada na Faculdade de Medicina e que foi remmettida ao Instituto Histórico e Geographico do Pará, à pedido do dr. Ignacio Moura. Aos seis dias do mez de Maio do anno de mil novecentos e dezenove, em uma das salas de aulas da Faculdade de Medicina, pelas trez horas da tarde, iniciou o curso da cadeira de Historia Natural e Parasitologia e professor dessa cadeira, Dr. Caribé da Rocha, com a assistência dos alumnos matriculados, professores, alumnos da Escola de Odontologia e diversas outras pessoas. E, por ter sido a primeira aula do curso d’esta Faculdade, lavrou-se este termo, que vae assignado pelo respectivo professor e alumnos presentes. Faculdade de Medicina, 6 de Maio de 1919. Assinados: Dr. Caribé da Rocha, José Theophilo Ferreira, Salvador Desiré Pannain, Justino da Silva Barroso, Angelino Rodrigues de Lima, Pio de Andrade Ramos, Aristoteles de Mattos Fernandez, Manoel Ismael de Castro, Emilio Martins Lopez, Antônio Siqueira Mendes, Manoel Tertuliano de Cerqueira, Aluizio Cláudio Cardoso, Matheus Lydio Pereira de Sousa, Raymundo de Campos Proença, Antônio Simões Pereira, Anna Elizabeth Hammond, Francisco da Silva Nunes, Olga Maia Paes de Andrade, Rodrigo Augusto Penna e Costa, Américo Dantas Ribeiro, Carlos Hygino da Silva, João Peregrino da Rocha F. Júnior, Eugenia Ferreira de Paiva Hollanda, O ensino 87 Thereza Ferreira de Paiva Hollanda, Gabriella Ferreira de Paiva Hollanda, Izauro Gonçalves da Costa, Gileno Pedrosa, Edith Olympia da Silva Castro, Manoel Barbosa Rodrigues, Avelino Augusto de Miranda, Raymundo de Pinho Magalhães, Lucilo Fender, Manoel Dias Maia, Eurico Barroso, José Martins Sant’Anna, Antônio Magno e Silva, Pedro Jorge de Carvalho, João Angyone Costa, Altino Mendes de Novôa, Raymundo da Silva Magno, Bianor Martins Penalber, Raymundo Alves Godinho Filho, Luiz Antônio Paula Feio, Sebastião Bayma, Jorge Franco de Almeida, Antônio Chaves Martins, Luiz Martins e Silva, João José Teixeira Marques, José Maria César Corrêa Nunes, Estrella Zagury Benayon, Hypolito Carelli, José de Carvalho Lima, Leopoldo Penna Teixeira.” Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Sua instalação (FMCP 1944b, p. 75-76). 2 Ver capítulo “Professores, cátedras e docências”. 3 “Em 14 de maio de 1920 Exmo. Snr. Professor Paulo Maranhão Em meu nome e pela Faculdade de Medicina, que tenho a honra de dirigir, apresento a V. Ex. sinceros agradecimentos pela generosa offerta que acabaes de fazer a mesma faculdade de 33 carteiras que se acham, 5 na escola da Penitenciaria e 28 no grupo escolar “José Verissimo”. Aproveito-me da opportunidade para apresentar a V. Ex. os protestos de elevada estima e distinta considerações. 88 Saude e Fraternidade Barão de Anajáz” Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará - Livro de ofícios 1919 - *** 4 “Dessas provas de exame, estão dispensados, por deliberação da congregação, somente no corrente anno, os bachareis em direito, engenheiros, pharmaceuticos, dentistas, diplomados pelas Escolas do Brasil ou que tenham seus títulos scientificos por ellas reconhecidos, e bem assim os professores normalistas e mais aqueles ainda que hajam completado o seu curso de humanidades em quaesquer estabelecimentos de ensino superior do Estado ou a elles equiparados” (Folha do Norte, 11.03.1919). 5 “Em cumprimento da resolução da Congregação desta Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, de 4 de maio do corrente anno, foi transferido o Doutor Oswaldo Ferreira Barbosa, professor cathedratico de clinica medica (primeira cadeira) para exercer identico cargo na cadeira de Medicina Tropical criada pelo decreto 16.782ª, de 13 de Janeiro de 1925. Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, 6 de Maio de 1925”. (FMCP, [1950]). 6 “Depois de examinado o caso, os senhores conselheiros negam apoio à criação da cadeira, não só porque não existe nas faculdades do Brasil, como também porque os artigos 24 e 25 do Regimento interno cogitam da organização e realização do curso especializado em tisiologia”. (CTA. Ata do dia 25.02.1939). Vale lembrar que esta não foi a primeira vez que se tentou criar uma disciplina aplicada à realidade epidemiológica do Pará. Há registro que em nove de agosto de 1928, Orlando Lima, catedrático de obstetrícia em conferência apresentada na Academia Nacional de Medicina no Rio de Janeiro propôs ao prof. Miguel Couto presidente daquela academia, que este intercedesse junto ao Conselho Nacional de Ensino pela criação da cadeira de Leprologia na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (BORDALO, 2000, p. 83). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 89 Foto 12: Laboratório de Química. Fonte: FMCP (1936b, s.p.). 90 7 O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade 91 92 Monograma da Santa Casa de Misericórdia do Pará em detalhe na fachada da mesma. Nenhum curso de medicina, por melhores professores que tenha, pode ser puramente teórico. Parafraseando Sir William Osler, um médico que não domine a teoria seria como um navegante que vai ao mar sem uma bússola; porém aquele que sustente uma formação unicamente teórica é como um navegante que nunca foi ao mar. O “mar” que Osler menciona nada mais é do que a prática hospitalar. Dito isto, em 1921, quando a primeira turma da Faculdade de Medicina do Pará chegou ao terceiro ano, defrontando-se com disciplinas como Clínica Propedêutica Médica e Clínica Propedêutica Cirúrgica (FMCP, 1933a), que exigiam um contato direto com pacientes, fazia-se indispensável colocar aqueles estudantes dentro de um hospital. Levando em conta critérios que até hoje definem um bom hospital escola, quais sejam: tamanho, bons equipamentos, variabilidade de casos, corpo clínico competente e experiente dentro de diferentes especialidades, a escolha da Santa Casa de Misericórdia parece mais que evidente. Ao contrário da jovem Faculdade, a Santa Casa de Misericórdia do Pará já era uma instituição consolidada, de tradição e reconhecimento, naqueles idos de 1919. Teria sido fundada em 24 de fevereiro de 1650, localizando-se em um prédio de taipa e pilão na rua Santo Antônio dos Capuchos com o Largo da Misericórdia, hoje Praça Barão do Guajará. Posteriormente, em 1807, transferiu-se para o Largo da Sé, atual Praça Frei Caetano Brandão, para o hospital “Senhor Bom Jesus dos Pobres”, inaugurado em 1787 pelo então bispo do Pará que hoje empresta seu nome à praça1. Em 15 de agosto de 1900, aniversário da adesão do Pará à independência, a Santa Casa ganharia novas e modernas instalações em ato solene presidido pelo Governador José Paes de Carvalho, estando presentes o Intendente Senador Antônio José Lemos, o Bispo Diocesano D. Castilho Brandão, membros do Conselho Administrativo, e outras autoridades. Era oficialmente inaugurado o novo Hospital de Caridade, na rua Oliveira Belo, bairro do Umarizal, sendo o orador oficial do evento o médico Geminiano de Lyra Castro2. O hospital projetado pelo engenheiro Odorico Nina Ribeiro até hoje impressiona pela grandiosidade, fruto do apogeu econômico que a cidade vivia no fim do século XIX e início do século XX. Era constituído de diversos pavilhões, um salão nobre imponente e um bloco cirúrgico de formato oval, com a sala de operações “Senador Antônio Lemos”, revestida por enormes azulejos de opalina, sendo considerada uma das mais modernas do país, então3. Ao assumir pela primeira vez a direção da Faculdade, em 7 de março de 1921, ainda que interinamente por motivo de viagem do Barão de Anajás, Camilo Salgado buscou logo aproximação com aquela instituição que vivia um período esplêndido. Em carta enviada em 20 de abril daquele ano, ao senador e médico Cypriano Santos, professor honorário da Faculdade4 e então provedor da Santa Casa, solicita: O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade 93 Estándo já funccionado as aulas d’esta Faculdade, e havendo necessidade de frequencia hospitalar aos alumnos do terceiro anno, nas salas da clinica bem como no laboratorio da microbiologia, solicito a V. Exa. a necessaria autorisacção para que possam os mesmos estudantes freqüentar o Hospital da Santa Casa com o fim de ouvirem as licções dos senhores professores e faserem suas observações. Reitero os meus protestos de alta estima e consideração. Saudações. (FCMP, 1921) Dois dias depois Cypriano Santos assim responderia: 94 Em resposta ao officio que vos dignitastes a dirigir-me, tenho a declararvos não ser possivel, em consequencia de se achar licenceado o Dr. Director do Laboratorio de Biologia do Hospital de Caridade, os alumnos da faculdade assistirem os trabalhos daquella secção, presentemente a cargo de uma das irmãs de SantAnna. O medico nomeado para substiuil-o não acceitou, por isto quando estiver funccionando o referido Laboratorio com a responsabilidade de outro facultativo e nomeado interinamente por esta directoria v.exc.será disso avisado para providenciar, como deseja, a fim de que os alumnos ali compareçam sempre por turmas. Quanto a frequencia dos ditos academicos ás diferentes clinicas não há nisso inconveniente, uma vez que se trate de doentes indigentes, e que os alumnos venham acompanhados dos respectivos professores, egualmente por turmas que não sejam numerosas e havendo entendimento com os medicos chefes das referidas clinicas. Julgando respondido, assim, o vosso officio, reitero a v. exc., os protestos de minha estima e muito apreço. Saude e Fraternidade. (FCMP, 1921) Foto 13: Prédio onde ficava o salão nobre da Santa Casa, situado de frente para rua Oliveira Belo, posteriormente demolido dando lugar a edificação de linhas modernas. Fonte: Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (1945c, s.p.). Apesar da aparente má vontade de alguns em receber os acadêmicos, nasceria ali o tradicional binômio Faculdade de Medicina e Santa Casa, que se consolidaria com a transferência da Escola para o Largo de Santa Luzia, em 1924. O começo foi modesto sendo prevista à Faculdade a responsabilidade por apenas vinte leitos (Estado do Pará, 08.03.1922); depois ela assumiria as enfermarias São Pedro (FCMP, 1933a) e São Roque (Folha do Norte, 11.08.1923). E logo o entendimento entre os professores e os chefes de clínica ficaria bem mais fácil do que Cyprano Santos poderia imaginar, já que em pouco tempo todas as chefias das enfermarias seriam ocupadas por médicos professores da Faculdade (FMCP, 1936c). O professor de Clínica Obstétrica (2ª cadeira) Argemiro Orlando Pereira Lima, assim descreveria o ensino que ocorria nas enfermarias: Parecia-me a mim que, disponho de um serviço de obstetricia ao qual eu dedicava com ardor o meu carinho, não poderia sem desaire trancal-o á frequencia de alumnos que desejassem aprender, antes o mais comesinho principio de humanidade forçava-me abrir-lhe as portas, de par em par, escancarando-as para quantos quisessm gozar dos sublimes ensinamentos da nobre arte de ser mãe. [...] se de um lado havia a vontade energica de aprender, do outro existia o desejo vehemente de transmitir o ensinamento util, unico proveitoso, unico necessário, sem phantasia, nem embromação (PARÁ-MÉDICO, 1926). 95 Foto 14: Enfermaria de Clínica Obstétrica. Maternidade da Santa Casa. Professor Dr. Orlando Lima (no centro) ladeado por alunos. Fonte: FMCP (1936c, s.p.). O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade Camilo Salgado também recordaria a rotina daqueles dias, a larga prática que os alunos encontravam nas enfermarias, relatando ainda um caso interessante: 96 Contenta-me affirmar que os nossos estudantes estão affeiçoados ao trabalho sem grandes vacilações, tanto que sem temer desastre, permitti, com a minha assistência fizessem, pequenas operações, como suturas em ferimentos incisos, debridamentos de pequenos abscessos, panarícios, mesmo phymoses e hydroceles. Cada alumno dispõe hoje de seis leitos, sendo responsaveis pelos curativos e, em se tratando de ocorrencias de maior importancia, apresentam-me por scripto, a successão de factos, com as conclusões adequadas. Nossa estatística registra um grande número de hérnias estranguladas, enterorrhaphias, resecções e auto-enxertias osseas, nephropexia (1), nephrotomianephropexia, por calculos (3), nephrotomia com drenagem por pionefrose (2), ureterotomia por calculo (2), cystostomias, uretrotomias, hydroceles, extracções de projectis de arma de fogo, alguns na cavidade abdominal, um caso de operação de Kondoleon, etc. A titulo de contribuição ao estudo dos antisepticos em feridas infeccionadas, usamos do chloreto de sódio em pequenos envoltórios de gase, esterelizados, em uma ferida por arma de fogo, na perna esquerda de um homem vindo da E. F. de Bragança, victima, havia 3 dias, de uma carga de chumbo grosso, que lhe esphacelou, os tecidos molles, produzindo fractura complexa, dos ossos, principalmente, do peroneo, cujos fragmentos se destacavam. Admiravel foi o resultado, notando-se apenas consolidação viciosa dos segmentos tibiaes adherentes ao periósteo do peroneo. Quando a cicatrização era completa a ponto de permitir marcha, propusemos a auto-enxertia ossea para que dessa forma fosse o tratamento digno de nossa clinica. Com decepção geral, no dia marcado para a intervenção, o doente retirou-se do hospital e nem ao menos nos disse adeus (FMCP, 1923c, p. 19). Acylino de Leão, catedrático de Propedêutica médica, confirma o quanto o campo era fértil para prática dos alunos: ...ensinei a propedeutica pratica, mostrando como se pesquisam, no leito do doente, os symptomas e signaes, e como se reúnem para a deducção diagnostica. Fil-os repetir, um por um, as manobras, de maneira a se exercitarem as mãos como os sentidos nesta pratica apparentemente fácil de palpar, percutir, auscultar. Não descurei o uso de apparelhos e, nos dias convenientes, aplicaram-se no manejo do phonendoscopio, do esphygmografo, do esphygmomanometro, do cardiographo, etc. [...] ...não escolho somente os casos ditos interessantes, pela sua raridade, mas mostrei os casos corriqueiros da clinica diaria, insistindo particularmente sobre a pathologia regional. Para pratica de clinica medica, o Hospital de Caridade é um manancial inesgotável. [...] ...nomeei internos seis alumnos do 4º anno [...] elles diagnosticam, receitam, praticam injecções endovenosas, thoracenteses, paracenteses, injecções rachidianas, tudo sob minha fiscalização e direção. Habituo-os assim a se guiarem por si mesmo na pratica clinica (FMCP, 1923c, p. 15). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Desta forma, durante décadas as enfermarias daquele hospital, bem como seus laboratórios, maternidade e o pavilhão da infância “Bartholomeu Menezes”, serviriam de palco para o aprendizado de gerações inteiras de estudantes, cedendo não apenas pacientes, mas também cadáveres adequados para o estudo da anatomia. Como naqueles primeiros anos a Faculdade ainda não dispunha de uma sede com anfiteatro, os cadáveres dos indigentes provenientes da Santa Casa eram levados para o necrotério do estado, edificação localizada no Ver-o-Peso e ainda hoje existente, palco das primeiras sessões anatômicas, conforme expediente de 1º de junho de 1921 do professor de Anatomia Descritiva e secretário da Faculdade, Dr. Hermógenes Pinheiro, à Sra. Superiora do Hospital da Caridade: Havendo necessidade de um novo cadaver para o estudo Anatômico dos alumnos d’ esta Faculdade e de accordo com a recommendação do Exmo. Senador Doutor Cypriano Santos, peço a V. Exa. de remeter para o necrotério do Estado um cadáver de doente que não tenha soffrido ferimentos penetrantes ou fratura de craneo, ferimentos que não tenham destruido vasos. Reitero protesto de alta estima e consideração (FMCP, 1921). 97 Foto 15: Necrotério onde foram realizados os primeiros estudos anatômicos da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Edificação ainda existente ainda que bastante modificada. Fonte: Álbum de Belém Pará (1902, s,p.). O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade Além de tudo isso a parceria com a Santa Casa agregaria ainda mais credibilidade à recém-criada escola médica, reduzindo um pouco a desconfiança que uma parcela da população tinha do ousado projeto, facilitando também o processo de equiparação da Faculdade às instituições congêneres do país, o que ocorreria em 1924. Provavelmente, se Belém não possuísse um hospital daquele porte, o ensino médico do Pará teria ficado ainda muitos anos limitado ao plano das ideias. Em relatório apresentado em 1926 ao Diretor do Departamento Nacional de Ensino, Juvenil da Rocha Vaz, sobre os institutos de ensino do Norte da República, feito pelo Diretor de Seção de Expediente e Contabilidade, José Bernardino Paranhos da Silva, a Faculdade seria definida como uma instituição que funcionava em precárias condições, instalada em um prédio “velho e acanhado”, sem laboratórios suficientes para o ensino experimental, contando apenas com gabinetes deficientes de Química, Física e História Natural, além de quatro ou cinco microscópios. Apenas o ensino de clínicas médicas, ministrado pelo professor Acylino de Leão Rodrigues, seria apontado como o único que se apresentava em condições mais adequadas, exatamente por funcionar na Santa Casa, que para o autor do relatório era um dos melhores do norte do Brasil, fora o Hospital Centenário do Recife (FIOCRUZ, 2008)5. 98 Para uma pessoa vinda de fora, como foi o caso de J. B. Paranhos da Silva, desconhecendo as credenciais e o sacrifício do corpo docente local, e sem poder imaginar o esforço que aquele casarão “velho e acanhado” custara para a população paraense, as instalações da Santa Casa de Misericórdia eram o único fator que impunha respeito à Faculdade de Medicina do Pará. Logicamente a parceria entre as instituições também beneficiava o hospital, que podia contar com os acadêmicos como mão de obra qualificada e gratuita. Além do mais, de acordo com o primeiro estatuto da Faculdade, ainda assinado pelo Barão de Anajás, “no caso de dissolução ou extincção da Faculdade, o fundo ou patrimonio, então existente será entregue á Santa Casa de Misericordia d’esta capital” (FMCP, 1921). Mais do que tudo isso, chegou a ser firmado um contrato que previa que a Faculdade pagaria para a Santa Casa um conto de réis por mês pelo uso de suas dependências (FMCP, 1934). Este item, entre outros, fez parte da proposta enviada à Santa Casa em 1933 com intuito de “regularizar as relações entre o Hospital e a Faculdade” (CTA, 1933) e que previa o seguinte: 1º - que as aulas das diversas clínicas no curso médico continuem a funcionar nas enfermarias desse hospital, sob a regência dos respectivos professores e a frequencia, apenas, dos alunos do 4º, 5º e 6º anos; 2º - que sejam cedidas a esta faculdade as salas situadas nos fundos das enfermarias Santo Antonio e São Pedro, a primeira para clinica de moléstias infectuosas e tropicais e a segunda para clinica de moléstias das vias urinarias; 3º - a instalação de dois ambulatórios para esta faculdade, nesse hospital, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 dirigidos pelos professores de clinica otorrinolaringológica e dermatologia e sifiligrafia, funcionando duas vezes por semana, para curativos, pequenas intervenções e receituários (sem o aviamento de receitas); 4º - a permissão por esta faculdade de utilizar do Laboratório de Biologia desse hospital, para serviços de histologia normal e patológica e anatomia patológica, que juntamente com os serviços de anatomia desse estabelecimento e as instalações médico-legais do Estado, passam a constituir o Instituto Anatômico Biológico, recentemente criado por esta Faculdade a exemplo da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, serviços estes que em nada prejudicam os interesses dessa casa de caridade visto não acarretarem aumento de despesas. Como retribuição aos favores supra mencionados, esta Faculdade se compromete a concorrer com a subvenção de doze contos de réis anuais (12:000$000); A manter os serviços das clinicas durante o período de férias escolares e, quando as suas finanças o permitirem, terminar a construção e instalação do Necrotério Modelo dessa casa de saúde (CTA, 1933). Bem verdade que na prática muita coisa do acordo jamais saiu do papel. Um dos provedores da Santa Casa, Antônio Faciola chegou a cobrar sete meses de atraso da Faculdade, em 3 de outubro de 1934 (FMCP, 1934). Esta inadimplência não era de se estranhar diante da situação financeira em que a escola médica vivia6. Camilo Salgado responderia a Faciola que: ...esta Faculdade lucta actualmente com enormes dificuldades, resultado do não recebimento da subvenção federal e atrazo das mensalidades os alumnos, motivos estes que me forçam a não poder attender o pedido de V. S. Considerando também que este Instituto relevantes serviços vem prestando ao norte do Paiz, pagando reduzidos vencimentos ao seu professorado, dando 19 vagas gratuitas, não acarretando despesas a Santa Casa o ensino ministrado nas suas enfermarias e sendo quase todos os professores medicos do Hospital, onde prestam relevantes serviços, é de justiça que a Santa Casa auxilie este estabelecimento de ensino superior que é realmente um padrão de glória para nós (FMCP, 1934). Diante de tal justificativa, o provedor se manifestaria quase que pedindo desculpas pela cobrança, desejando que em breve a Faculdade estivesse em condições de arcar com seus compromissos (FMCP, 1934). Na década de 1930, a “Misericórdia Paraense” já estava mais do que consagrada como hospital-escola da já conhecida como Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. E fazia anúncios de seus serviços para particulares, os ditos “pensionistas” em revistas especializadas, ressaltando: Optimas acomodações para pensionistas de 1ª, 2ª, e 3ª classes. Apartamentos de luxo para homens e senhoras O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade 99 Maternidade inteiramente isolada do Hospital Instalações completas (as melhores do Norte do Brasil) Para exames radiologicos, eletrocardiograficos e analyses clinicas Moderna aparelhagem para os serviços fisio-terapicos Ondas curtas e ultra curtas, diatermia, bisturi elétrico, raios ultra-violetas e infra-vermelhos (PARÁ-MÉDICO, dez. 1939). 100 Foto 16: Enfermaria São Paulo. Clínica Cirúrgica de Homens. Professor Dr. Prisco dos Santos (sentado) ladeado por alunos. Fonte: FMCP (1936c, s.p.). A questão dos “pensionistas” acabaria por criar um ambiente que anteciparia o conceito de “dedicação exclusiva” dos docentes, algo que é tido hoje como um dos elementos definidores de uma boa escola médica, visto que os professores poderiam ministrar suas aulas, realizar suas consultas nas respectivas enfermarias de caridade, e mais tarde atender a clientela particular alojada nos apartamentos destinados exclusivamente aos pensionistas. O corpo clínico da Santa Casa era outro grande destaque, sendo formado sempre por profissionais competentes e de projeção na sociedade. Sua constituição em 1938 era a seguinte: Clínica Médica de Homens – Enfermaria Santo Antônio – chefes de clínica, Acylino de Leão e Artur França; adjuntos David Gabbay, Rosário Conte e Lucival Lobato. Clínica Médica de Homens – Enfermaria São Marcos – chefes de clínica, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Luis Araújo e Olympio da Silveira; adjuntos, Aluízio da Fonseca, Benedito Klautau, Pedro Borges e Armando Pingarilho. Clínica Dermatologia – chefe de clínica, Ferreira Bastos. Clínica Cirúrgica de Homens – Enfermaria São Paulo - chefes de clínica, Prisco dos Santos e Appio Medrado; Adjuntos, Emygdio Pedreira, Marcos Pinto, Hermínio Pessoa e Oswaldo Medrado. Clínica Cirúrgica de Homens – Enfermaria São José - chefes de clínica, Bianor Penalber e Castro Valente; adjuntos, Alderico Costa, Sousa Aranha e Paiva Menezes. Clínica Médica de Mulheres – Enfermaria Santa Isabel - chefes de clínica, Rodrigues de Sousa e João Henriques; adjuntos, Oscar Miranda, Cândido Pereira e Anísio Maroja. Clínica Cirúrgica de Mulheres – Enfermaria Santa Ludovina – chefe de clínica, Ausier Bentes; adjuntos, Luis Corrêa, Paulo Bentes de Carvalho. Clínica Ginecológica – Enfermaria Santa Maria D’ Assunção – chefe de clínica, Cruz Moreira, adjuntos, Adriano Guimarães e Jacyntho Moreira. Clínica Obstétrica – Enfermaria Sant’Anna – chefe de clínica, Orlando Lima; adjuntos, Carlos Silva e José Chaves. Clínica Obstétrica – Enfermaria São Raimundo e Santa Terezinha – Feliciano Mendonça e Albino Figueiredo. Clínica Pediátrica – Enfermaria Santa Ignez – chefe de clínica, Froylan Barata; adjuntos, Joaquim Magalhães, Ferdinando Santos, Lucidéa Lobato e Valle Paiva. Clínica Pediátrica – Enfermaria São Luiz Gonzaga – chefe de clínica, Dagoberto de Souza; adjuntos, Hylário Gurjão, A. Pinto da Costa, Alberto Moraes. Clínica de Otorrinolaringologia – Enfermaria São Sebastião – chefe de clínica, Lauro Sodré Filho; adjunto, Lobato de Abreu. Clínica Oftalmológica – Enfermaria São Sebastião – chefe de clínica, Ferreira de Lemos; adjuntos, Deusdedit Coelho e Linhares de Paiva. Clínica Radiológica – Gelmirez Gomes. Gabinete de Fisioterapia – José de Sousa Macedo. Laboratório de Biologia – Acatauassú Filho e Jayme Aben-Athar; adjunto, Honorato Neves. Ambulatório – Medicina, Honorato Filgueiras; Cirurgia e Ginecologia, Gastão Vieira; adjunto, Reis de Carvalho. Clínica Sifiligráfica – Enfermaria São José – chefe de clínica, Sousa Castro; adjunto, Ruy Pondé. Clínica Urológica – Enfermaria São Roque – chefe de clínica, Lauro Magalhães, adjunto; Aristides Rodrigues. Clínica Médico-cirurgica dos Militares – Enfermaria São Vicente – chefe de clínica Raymundo Ferro e Silva; adjunto, Olavo Leôncio (PARÁMÉDICO, 1938, p. 30). Em função de seu competente corpo clínico e de suas instalações modernas, que contavam com equipamentos como raio-x e laboratórios bem equipados, a Santa Casa tornar-se-ia uma referência não somente no Pará, mas também para estados como Amazonas, Acre, Maranhão, Piauí e até no Ceará, de onde viria a receber pacientes. O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade 101 102 Foto 17: Enfermaria São João. Clínica de Doenças Tropicais. Professor Dr. Antonino Emiliano de Souza Castro (no centro de óculos e de bigode) ladeado por alunos. Fonte: FMCP (1936, s.p.) Contudo, como toda instituição de caridade, dependendo principalmente de doações para sobreviver, o “Hospital de Misericórdia” começaria a ficar pequeno para a sua crescente demanda. Padre Dubois, tradicional articulista de Folha do Norte, em artigo de 1936, intitulado “Obras da Misericórdia” (Folha do Norte, 17.06.1936, p. 1) traçaria um panorama da Santa Casa naqueles dias. Mencionaria uma campanha para angariar fundos para reforma e construção de novos Pavilhões encabeçada pelo então senador Abelardo Condurú e pelo professor contratado de Terapêutica Clínica, Dr. Luis Araújo. Citaria também que a Santa Casa possuía muitos críticos que apontavam para falta de espaço e presteza no atendimento dos doentes, para a existência de porões abafados, e viam aquele hospital como a antecâmara do necrotério. Mas, em sua opinião, o grande defeito da Santa Casa era o excesso de boa vontade, que a impedia de regular a entrada de pacientes. Construída para abrigar quatrocentos doentes ela acolhia oitocentos. Os planos de arrecadação previam não somente ampliação, mas também remodelação de áreas antigas, ação que já havia começado pelos porões e pela sala “Antônio Lemos”, que, antes do início da campanha, estava com o teto podre, cheia de goteiras e com iluminação deficiente. “As janelas carcomidas davam uma idéa de casa abandonada” (Folha do Norte, 17.06.1936, p. 1). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Dubois refere ainda que as despesas daquele hospital, em 1934, foram de 1.383 contos, enquanto a receita real chegara a 1.230. Naquele mesmo ano, foram acolhidos 7.774 pacientes, entre 1.507 pensionistas e 6.267 indigentes. O artigo concluía dizendo que “visivelmente a Santa Casa não pode emprehender melhoramentos sem a caridade particular” (Folha do Norte, 17.06.1936, p. 1). Em fevereiro de 1946, reportagem publicada na “Revista do Acadêmico de Medicina”, seção “Nossa Revista nos Hospitais”, faz um Raio-x da Santa Casa daqueles anos, quando esta era alvo de uma série de transformações, “adaptando-se continuamente aos modernos preceitos de organização hospitalar” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 51). Aponta dados positivos na ala feminina, como as boas instalações da enfermaria de cirurgia Santa Ludovina, onde funcionava a escola de enfermagem “Magalhães Barata”, bem como da enfermaria Santa Rosa, para tratamento exclusivo de “doenças venéreas”, que dispunha de banheiros próprios inteiramente separados do resto do hospital. Na ala masculina, a revista destacava as enfermarias Santo Antônio e São João, ambas contando com piso e parede impermeabilizados, com azulejos até a altura de um metro e sessenta e eliminação dos ângulos formados pelo encontro das paredes. A enfermaria São João, também destinada exclusivamente ao tratamento de doenças sexualmente transmissíveis encontrava-se nas mesmas condições sanitárias que sua contraparte feminina. O serviço de cirurgia contava com várias salas para pequena cirurgia, além da sempre citada sala “Antônio Lemos”, que, mesmo com quase quarenta anos era ainda considerada como uma das melhores do país. A matéria reiterava que naquele momento achava-se em construção uma nova e moderna sala, na qual seriam instalados uma fonte de luz ultravioleta para esterilização do ambiente, um ar refrigerado e uma lâmpada com foco dirigido para o campo operatório, capaz de funcionar automaticamente, “independente da corrente geral, fato este de grande valia para nos que jogamos com a incerteza da energia elétrica distribuída à cidade”. Elogiava, ainda a capacitação dos profissionais responsáveis pelos serviços de Raio-x, cardiologia e eletricidade médica, mencionando ser plano da diretoria criar serviços de traumatologia, alergia, alimentação, um ambulatório de cardiologia e um serviço oftalmológico com enfermaria própria, sala de operação anexa e ambulatório. Como aspectos negativos, a revista referia que os ambulatórios criados para descongestionar as enfermarias “Muito embora contem com a bôa vontade dos médicos, não nos oferecem o rendimento desejado dada a falta de medicamentos e, no caso do ambulatório de cirurgia, pela deficiência do material cirúrgico a ele reservado”. Mencionava ainda que: ...doentes mesmo em estado precário de saúde, voltam da portaria para suas residências. Pacientes vindos do interior, sem alojamento na cidade, são obri- O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade 103 gados a aguardar um leito acomodando-se de qualquer maneira, o que constitue um espetaculo verdadeiramente impressionante às pessoas que porventura os avistem. A falta de medicamentos era uma constante: “Muitas vêzes pela falta de meios, a terapêutica é conduzida à custa de drogas menos eficientes, prolongando-se desta maneira a permanência dos pacientes nas Enfermarias” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 51). A questão da alimentação dos pacientes também era reconhecidamente deficiente, visto serem as refeições processadas de modo uniforme sem que os médicos pudessem prescrever uma dieta de acordo com as necessidades e restrições de cada paciente. Pelo teor do texto da Revista do Acadêmico fica patente que a Santa Casa entrara em declínio, e que embora tentando se modernizar, não conseguia acompanhar no mesmo passo o crescimento da população do Estado. Em certos quesitos pode-se até mesmo afirmar que o Hospital de Misericórdia regredira, pois já não contava mais, por exemplo, com um serviço de lavanderia mecanizado, como nos dias de sua inauguração na rua Oliveira Belo. 104 Foto 18: Enfermaria Santa Izabel. Clínica Médica de Mulheres. Terapêutica Clínica. Professor Dr. Luiz Araújo (sentado em primeiro plano) e alunos. Fonte: FMCP (1936c. s.p.) Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Para algumas disciplinas como Ginecologia, a Santa Casa continuava servindo de modo razoável, conforme relatório de 3 de dezembro de 1947 feito pelo catedrático de Clínica Ginecológica, Dr. Raimundo Cruz Moreira, e apresentado à direção da Faculdade: Para realização das aulas do curso se utilizou o serviço de Clínica Ginecológica do Hospital da Santa Casa, enfermaria Santa Ludovina, que está sob nossa chefia clínica e onde, pela frequencia de casos da especialidade ginecológica, se tornou de aproveitamento eficiente da matéria aos alunos matriculados. As operações praticadas pelo catedrático, como também pelo substituto da cadeira, sempre tiveram como auxiliares os alunos mais assíduos e que mais aptidões demonstraram pela especialização ginecológica (FMCP, 1948c, p. 83). No entanto, a escassez de materiais como colposcópio, histeriscópio, proctoscópio e outros aparelhos era frequentemente lembrada nos relatórios desta disciplina (FMCP, 1948, p. 88). Para outras cadeiras como Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil, a Santa Casa tornara-se pequena, com o catedrático Oscar Pereira de Miranda buscando complementar o ensino em “ambiente público do Estado, como sejam o Centro de Saúde nº 2, em lactário, Asilo Santa Terezinha, Assistência à Infância do Pará” (FMCP, 1948c, p. 85). Para disciplinas como Neurologia, cujos conhecimentos haviam crescido com o passar dos anos, a Santa Casa apresentava-se inadequada para o bom ensino prático, conforme diria o catedrático de Clínica Neurológica João Batista Penna de Carvalho em relatório enviado ao Diretor da Faculdade em 14 de novembro de 1947: O ensino de clínica neurológica deve ser essencialmente prático, isto é, feito no leito do doente; e, como o Hospital não tem uma enfermaria, especialmente para reunir todos os casos neurológicos, o professor sente-se em dificuldade para administrar o ensino prático aos alunos, êsses casos são raros entre nós e estão distribuídos pelas diferentes enfermarias, obrigando o catedrático a peregrinar, solicitando permissão aos respectivos chefes de clínica, para utilizar dos que aparecem ainda que espaçadamente. Sugiro, pois, que a Diretoria da Faculdade entre em contato com a Provedoria do Hospital para instalação ou construção de um pavilhão onde fiquem concentrados todos os doentes desta especialidade (FMCP, 1948c, p. 82). Nem sempre reinou a harmonia entre a Faculdade e a Santa Casa. Por vezes houve desavenças entre o provedor, o plenipotenciário dirigente do Hospital de Misericórdia e os acadêmicos. O professor de Clínica Pediátrica e Higiene Infantil, Ophir de Loyola, quando ocupou o cargo de diretor daquele Hospital enviou, entre os anos de 1931 e 1932, diversos memorandos à direção da Faculdade, queixando-se do comportamento inadequado dos acadêmicos, os quais, segundo o provedor, chegavam a depredar a mobília das enfermarias (FMCP, 1932-1933). O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade 105 Em determinadas situações os alunos pareciam não ser tão culpados. Cite-se como exemplo o seguinte fato: como já era tradição, a Santa Casa realizava o “Natal dos Indigentes”, ocasião em que os estudantes trabalhavam com listas com o carimbo da instituição para aquisição de donativos. Em ofício do dia 19 de janeiro de 1948, destinado ao Diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães, o provedor da Santa Casa, Dr. Lucival Lobato, queixava-se ter descoberto, para sua surpresa que um aluno do sexto ano “tinha diversas listas em seu poder, sem número de ordem e sem rubrica do Provedor, mas todas carimbadas com o sinete do Hospital de Caridade”. Lucival Lobato, em seguida, diz que censurou o aluno, apreendeu as listas, e lhe deu um prazo de 48 horas para recolher, junto à Tesouraria da Santa Casa, a quantia da arrecadação que tivesse feito (FMCP, 1948a). 106 O estudante em questão e seus colegas de internato sentiram-se naturalmente ofendidos. Naquela época, os doutorandos de Belém encontravam-se bastante organizados e integrados pela “Sociedade de Internos dos Hospitais de Belém” (S.I.H.B), cuja sede era na própria Santa Casa. A S.I.H.B defendeu seus associados da “desconsideração insolente, agressiva, e injustificável” com que a provedoria tratara o dito acadêmico, tesoureiro da comissão organizadora do “Natal dos Indigentes”, nomeado pela própria S.I.H.B, alegando que o “Natal dos Indigentes” era uma realização de inteira e exclusiva responsabilidade da sociedade de internos, e, sendo esta uma sociedade autônoma, era “descabida a exigência” de entregar ao hospital a quantia arrecadada. Diante destes fatos, até que a provedoria explicasse em termos claros e precisos sua atitude, a S.I.H.B decidiu suspender os plantões na Santa Casa. E, em nota a imprensa seguida de abaixo assinado, foi a público atestar a honestidade do doutorando em questão “ante a manobra sórdida com que o Provedor interino da Santa Casa pretende mesquinhamente manchar seu nome impoluto” (FMCP, 1948a). Como era de se esperar nestes casos, a “corda” arrebentou do lado dos estudantes, tendo a provedoria respondido de forma enérgica, proibindo, por sessenta dias, a entrada no hospital dos doutorandos que apoiaram o colega; para o aluno envolvido, a proibição foi de noventa dias, além de não permitir que este morasse no hospital (FMCP, 1948a). Apesar das dificuldades, que aumentariam com o passar dos anos, e da convivência nem sempre tão pacífica com a Faculdade7, a Santa Casa continuaria sendo o palco principal do ensino na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, até o final dos anos 80, quando ocorre a transformação do Hospital João de Barros Barreto em Hospital Universitário, e a criação do Hospital Bettina Ferro de Souza, ambos pertencentes à Universidade Federal do Pará (UFPA). Entretanto, ainda hoje os serviços de Pediatria, Ginecologia, Obstetrícia e Dermatologia, que funcionam na Santa Casa, estão ligados à Faculdade de Medicina da UFPA, mantendo viva a histórica parceria entre as instituições. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 NOTAS 1 A data de fundação da Santa Casa do Pará é motivo de controvérsias. O Pará Médico de setembro de 1922 (p. 301) cita um artigo do Dr. Azevedo Ribeiro, de 1918, “A fundação da Santa Casa de Misericórdia do Pará”, onde fala da instalação da “Confraria da Santa Casa de Misericordia do Pará”, em “acto solennissimo” realizado nos primeiros dias “do anno de 1619”. Vianna (1992, p. 14 e p.79). fala em 1650. 2 “Interpretou os sentimentos do conselho da benemerita associação o Dr. Geminiano de Lyra Castro e, orou em seguida o Dr. Elyseu Cezar”. Idem. p. 360 3 “A 24 de Abril de 1910, foi inaugurada a magnifica e suptuosa sala de operações asepticas, planeada pelos engenheiros João de Palma Muniz e Joaquim Gonçalves Lalor. É uma das mais notaveis da America, com o seu arsenal cirurgico riquissimo e completo, que a põe a par dos melhores estabelecimentos congeneres da Europa, causando a todos seus visitantes a mais viva admiração, quer pelo lado scientifico da construção, quer pelas instalações rigorosamente asepticas ...” (A SANTA Casa de Misericordia do Pará. Hospital da Caridade (1922, p. 316). 4 “Brevemente será installada a Faculdade, com solennidade, sendo nessa ocasião entregue o diploma de professor honorario ao dr. Cypriano Santos.” (Folha do Norte, 22.03.1919). 5 Nesta época a divisão do país era em Norte e Sul. Pernambuco, portanto, era considerado oficialmente Norte. 6 Ver capítulo “Manutenção Financeira”. 7 Talvez o único período em que houve plena harmonia entre a Santa Casa e a Faculdade de Medicina aconteceu quando Camilo Salgado assumiu a diretoria de ambas as instituições: “A escolha do illustre dr. Camillo Salgado desperta os mais vivos applausos e o hospital de Caridade só terá a lucrar com a sua direcção, que ha de ser fructuosa e brilhante como a da Faculdade de Medicina do Pará, que hoje é, graças a sua abnegação e ao seu patriotismo, motivo de orgulho à nossa terra” (Estado do Pará, 27 de agosto de 1924, p. 1). O Hospital Escola Primaz: A Santa Casa no contexto da Faculdade 107 108 8 O Hospício dos Alienados e outras instituições de apoio 109 110 Detalhe de um azulejo de uma parede da FMCP. Já dotado de um regular apparelhamento, localisado a na visinhança do Hospital da Santa Casa, os cursos theoricos são secundados por outros verdadeiros e realmente praticos, em todos os ramos e especialidades (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes, 07.09.1926, p. 33). Esta era a visão do governador Dionysio Ausier Bentes, em 1926, sobre o ensino da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. O governador, também médico, foi um dos fundadores da Escola, nomeado professor de Fisiologia na primeira ata de posse do corpo docente (FMCP, 1919). Dionysio Bentes não estava totalmente certo. O hospital da rua Oliveira Belo não comportava todas as especialidades médicas da época, mesmo estando bem aparelhado. A Psiquiatria, pelas suas próprias peculiaridades, necessitava de um local adequado, no caso o Hospício dos Alienados. Foi neste hospital também administrado pela Santa Casa, situado bem longe da área residencial, no bairro do “Marco da Légua”, nos limites da Belém de então, que os alunos da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará tiveram suas primeiras aulas naquela especialidade. A criação do Hospital dos Alienados remete às leis nº 1. 289, de 13 de dezembro de 1886, e nº1. 314, de 1º de dezembro de 1887, ainda do império, e que autorizavam a aquisição de um edifício para servir de hospício no Pará. Já na república pensouse em construir um situado no bairro do Marco da Légua, próximo ao Bosque Municipal (FMCP, 1948, p. 31). Até então os doentes mentais eram isolados no leprosário do Tucunduba (CUTRIN, 1967, p. 36). O prédio do Hospício dos Alienados datava de 1892, sendo um projeto de Manuel Odorico Nina Ribeiro, o mesmo arquiteto que em 1900 entregaria a nova Santa Casa. No entanto, o Hospício não teria de saída o mesmo sucesso que seu projeto posterior. Tanto que finalizada a construção em 29 de julho de 1892, só viria a funcionar efetivamente a partir de 27 agosto daquele ano, devido à necessidade de grandes modificações e adaptações higiênicas e médicas (CUTRIN, 1967, p. 38). Por volta de 1901, a assistência aos pacientes internados no Hospício era baseada em um revezamento mensal entre os médicos da Santa Casa. Como as polinevrites dizimavam os enfermos, o então governador Augusto Montenegro determinou grandes melhoramentos ao prédio como a construção de salas de hidroterapia, que contavam com banheiras vindas especialmente da França, quartos para pensionistas e gabinetes de eletroterapia (PARÁ-MEDICO, 1922, p. 396). O governador enviou ainda para Europa o médico e inspetor sanitário Azevedo Ribeiro, que já havia trabalhado no hospício, para um ano de aperfeiçoamento em psiquiatria, dando-lhe o cargo de diretor do hospital após seu retorno, que até então era ocupado pelo oftalmologista Dr. Lyra Castro (CUTRIN, 1967, p. 39). Azevedo Ribeiro foi um marco na psiquiatria do Pará abolindo todos os meios violentos de contenção dos pacientes como troncos e camisas de força, instituindo ainda o regime “open-door” (PARÁ-MEDICO, 1922, p. 396). O Hospício dos Alienados e outras Instituições de apoio 111 Contudo com a crise financeira que o Estado atravessou após o declínio da borracha, a situação pela qual passaria o hospício seria assim definida pelo psiquiatra Antônio Porto de Oliveira, um dos fundadores da Faculdade e primeiro professor de sua especialidade: “Sucederam-se as administrações do Estado e a sorte dos loucos no Pará manteve-se entre o descaso mais deprimente e a indiferença mais chocante” (FMCP, 1948c, p. 31). Em 1918, às vésperas da fundação da Faculdade, o hospício que tinha capacidade para 150 pacientes abrigava 300, sendo que muitos doentes dormiam nos corredores dificultando a ronda noturna dos enfermeiros e guardas (FMCP, 1948c, p. 32). Segundo Porto de Oliveira, tal situação perduraria até a Revolução de 1930, quando como diretor do hospício enviou o seguinte relatório ao então Interventor Magalhães Barata: 112 O nosso Hospício, sr. Interventor, dadas as condições de progresso que atingimos, é melhor chamado um “depósito de loucos”. Mal construído pessimamente dividido, e já deficientíssimo para o número de doentes existentes. Ocorre que com o crescimento geral da população, embora pouco pronunciado no Pará, e por várias outras causas sociais e econômicas, o aumento do número de alienados se torna sensível anualmente. [...] Tomando em consideração o Relatório a Interventoria imediatamente modificou o deplorável estado das coisas. Foi aumentando o número de médicos; criando lugares de internos-acadêmicos de medicina de anos superiores; aumentadas as verbas; procedidas obras urgentes, e limpeza geral – e instalada uma Secretaria que nunca existiu, estando o serviço de expediente e de boletins a cargo de uma Irmã, completamente leiga no assunto (FMCP, 1948, p. 31). Os internos referidos acima eram os doutorandos Pedro Rosado e Benedito Klautau acompanhados dos acadêmicos Aluízio da Fonseca e Menadro Tapajós, os quais tinham direito à alimentação e 100mil réis mensais (CUTRIN, 1967, p. 42). Criavase assim uma “escola” de psiquiatria. Muitos destes alunos seriam posteriormente psiquiatras de renome, chegando alguns a diretores daquela instituição e a professores catedráticos da Faculdade. Em 1937 o Hospício dos Alienados receberia a denominação de “Hospital Juliano Moreira”, em homenagem ao renomado psiquiatra baiano. No ano seguinte seria palco das primeiras aplicações de cardiasolterapia no Pará, moderno tratamento de então, que havia sido instituído na Alemanha em 1935 (CUTRIN, 1967, p. 43). Em 19 de abril de 1942 seria realizada ali a primeira aplicação de eletroconvulsoterapia no estado pelo acadêmico José Cutrim, na presença do corpo médico, enfermeiras e freiras do hospital (CUTRIN, 1967, p. 43). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 No mesmo decênio, o “Juliano Moreira” serviria em alguns momentos como cenário também das aulas de neurologia ministradas pelo professor contratado Benedito Klautau (FMCP, 1946, p. 58). Nas décadas seguintes, embora contando com competentes administradores, o descaso do poder público predominaria em relação a algumas escassas e paliativas melhorias, levando o “Juliano Moreira” a uma escalada progressiva de sucateamento. O hospital funcionaria regularmente até o início dos anos de 1980, quando sucumbiu consumido em parte pelo fogo e em parte pelo abandono. Com o seu desaparecimento os pacientes e os acadêmicos de medicina perdiam um centro de referência com quase um século de história. 113 Foto 19: Hospício dos Alienados, posteriormente Hospital Juliano Moreira, por volta de 1902. Fonte: ÁLBUM DE BELÉM- PARÁ (1902, s.p.). O Hospício dos Alienados e outras Instituições de apoio 114 Foto 20: “Hospital Evandro Chagas, atual hospital de pronto socorro Mário Pinotti, onde era lecionada a Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas”. Fonte: FMCP (1944, s.p.). Além do “Juliano Moreira”, durante um curto período de tempo exatamente nos anos de 1940, os alunos puderam contar com outro hospital de apoio especificamente voltado para a disciplina de doenças tropicais. Era o “Hospital Evandro Chagas” (FMCP, 1945), criado pelo Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) para treinamento de profissionais da área de saúde no atendimento das principais doenças amazônicas, que inicialmente era realizado na enfermaria São João, na Santa Casa1. Após um acordo com a prefeitura de Belém, em 29 de janeiro de 1943, esta cedeu ao SESP, por um período de nove anos, um edifício localizado no terreno da Santa Casa e que seria destinado ao pavilhão de alimentação (BASTOS, 1993, p. 413). O edifício de dois andares, situado na Travessa 14 de Março, ainda não estava terminado, sendo adaptado e remodelado para suas novas funções. Foi inaugurado em 10 de novembro de 1943, com o funcionamento apenas do laboratório e ambulatório; as enfermarias foram abertas pouco depois, em 15 de dezembro do mesmo ano (BASTOS, 1993, p. 413). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Era o hospital mais moderno de Belém, com todo seu equipamento proveniente dos Estados Unidos. Possuía no pavimento térreo salas para atendimento ambulatorial, farmácia, laboratório de análises clinicas, auditório para conferências, refeitório, cozinha e lavanderia. No pavimento superior contava com duas enfermarias com capacidade para quarenta leitos, dois quartos para pacientes particulares, bloco cirúrgico, raio-x e uma biblioteca com cerca de 3.000 volumes. Dispunha ainda de gerador próprio e elevador para o transporte de alimentos (BASTOS, 1993, p. 414). Compunham sua equipe: Dr. H. Vizie Markhan, chefe do hospital e diretor local do programa de treinamento e pesquisas; Dr. Charles J. Lopez, assistente; Dr. Souza Ferreira, assistente e encarregado o ambulatório; Dr. Calista Causey, diretor do laboratório; Enf. Elizabeth Reed, diretora de enfermagem; Enf. Agnes Chagas, instrutora de enfermagem (BASTOS, 1993, p. 413). Para um estabelecimento nascido com os melhores recursos da época e administrado por estrangeiros, o “Hospital Evandro Chagas” deixou muito a desejar. Pelos mais diversos motivos ninguém ficava muito tempo na diretoria, havendo até casos de graves irregularidades administrativas. Tamanha era sua inconstância que em pouco tempo o hospital até de nome mudou passando a se chamar “Hospital de Belém” (BASTOS, 1993, p. 414); sendo às vezes referido simplesmente como “Hospital do Serviço Especial de Saúde Pública”. O prazo de devolução do prédio para a prefeitura e Belém vencia em 1º de fevereiro de 1952. Entretanto, no final de 1946 o prefeito de Belém, Dr. Chermont, solicitou sua devolução antecipadamente, justificando a necessidade de transferir o Pronto Socorro Municipal para aquele local, visto que o original, localizado no centro da cidade, não tinha mais condições de atender a população adequadamente (BASTOS, 1993, p. 415). Considerando seu alto custo de manutenção, a necessidade de fazer grandes reformas para atender certos serviços e talvez a perda de sua finalidade com o fim da Segunda Guerra, o SESP devolveria em 27 de janeiro de 1949 o prédio com grande parte de seus equipamentos para serem usado no novo Pronto Socorro Municipal de Belém, que ali se encontra até hoje (BASTOS, 1993, p. 416). Esforços foram feitos com intuito de transformar o “Hospital Evandro Chagas” em um centro de excelência em doenças tropicais, ligado à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Contudo com o término do contrato do serviço cooperativo em 30 de dezembro de 1948, a ideia não progrediu (BASTOS, 1993, p. 416). Ressalte-se que enquanto o “Juliano Moreira” possuía dirigentes que eram professores da Faculdade de Medicina garantindo estreita relação entre ambas as ins- O Hospício dos Alienados e outras Instituições de apoio 115 tituições e maior acesso dos alunos, o “Hospital Evandro Chagas” nunca teve um diretor ligado à escola. As aulas práticas ali realizadas eram uma cortesia daquele estabelecimento. Este distanciamento fazia com que apesar de seu equipamento moderno e ótimas instalações, aquele hospital não fosse um palco tão bom para aulas como poderia ser, conforme as palavras do professor interino de Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas, Dr. Gervásio de Brito Melo dirigidas ao diretor da Faculdade Acilino de Leão: 116 V. Excia. deve estar bem informado que a Enfermaria S. João, de Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas, da Santa Casa, desde o momento em que o Serviço Especial de Saúde Pública a entregou à atual Diretoria do Hospital de Misericórdia não voltou a ser utilizada pela referida cadeira, em virtude da mesma ser futuramente destinada a outros serviços clínicos. Em consequência disso as aulas praticas, principalmente, fôram deficientes por falta de uma enfermaria apropriada e destinada ao ensino da referida cadeira, pois não foi possível acompanhar, com os alunos, os casos observados no decorrer do ano letivo porque os doentes eram gentilmente cedidos pelos colegas que trabalham nas diversas clínicas da Santa Casa, impossibilitando-nos a melhor orientar o ensino terapêutico dos casos observados. A maioria das aulas práticas foram dadas no Hospital Evandro Chagas, do S.E.S.P., sendo os casos, para tal fim cedidos pelo ilustre médico americano dr. Markhan, quando Diretor do aludido estabelecimento. Embora os casos de doenças tropicais e infectuosas, como bem sabe V. Excia., sejam abundantes entre nós, sentimos dificuldade em mostra-los com maior frequencia, aos alunos e tomamos a liberdade de lembrar a V. Excia. que seria proveitoso se nos fosse facultada a escolha de doentes no Ambulatório da Santa Casa (FMCP, 1945c, p. 54). Outros lugares esporadicamente também serviriam às aulas práticas de Doenças Tropicais, como o Leprosário de Marituba (FMCP, 1943b, p. 50). Na busca pelas melhores instalações possíveis até o Instituto Evandro Chagas3 serviu durante algum tempo para aulas práticas de Parasitologia4. Ainda que totalmente desvinculados da Faculdade outros hospitais de Belém também seriam procurados espontaneamente por acadêmicos em busca de aperfeiçoamento profissional. O Pronto Socorro Municipal, por exemplo, era muito requisitado pelos que se interessavam pelas áreas de urgência e emergência, particularmente a cirurgia, embora o aprendizado ali não tivesse nenhuma ligação direta com o Palacete Santa Luzia5. A Faculdade bem que tentou oficializar parcerias com o Pronto Socorro e outras instituições. Na ata do Conselho Técnico Administrativo (CTA) de nove de fevereiro de 1933 existe a transcrição da seguinte solicitação enviada ao então Interventor Federal Magalhães Barata: O Conselho Técnico Administrativo da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, representado pela comissão abaixo assinada, no propósito de melhorar o ensino dos cursos administrados pelo estabelecimento que Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 dirige, com o fito de torná-los mais eficientes, pede a V. Excia. o seu valioso concurso para iniciar o funcionamento do Instituto Anatômico Biológico que acaba de criar a exemplo da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Para isso pede o consentimento de V. Excia. no sentido de ser permitida a frequencia dos alunos do 6º ano do curso medico desta faculdade no Instituto Médico Legal e Necrotério do Estado; na Assistência Pública e no Hospital do Pronto Socorro, quando funcionar, com a devida autorização para se poderem utilizar das respectivas instalações, responsabilizando-se esta faculdade pelos danos que, porventura, possam ser causados no material e aparelhos das citadas instalações (CTA, 1933). Todas estas parcerias, essenciais para uma instituição ainda em expansão e com cada vez maior número de alunos, ao que tudo indica jamais chegaram de fato a ser formalizadas. O porto seguro da Faculdade era mesmo a Santa Casa constituindo um binômio que persiste até hoje em algumas disciplinas. NOTAS 1 Criado durante a Segunda Guerra por um acordo firmado entre o governo brasileiro e norte americano, tendo como prioridade naquele momento sanear a Amazônia e a região do vale do rio doce, locais de extração de borracha e ferro, matéria prima essencial para o esforço de guerra americano. Trocando em miúdos: a meta era garantir que os “Soldados da Borracha” cumprissem sua missão e não tombassem por malária, etc. (BASTOS, 1993, p. 412), (N.A). 2 “...foram dadas aulas práticas, sendo para isso, escolhidos os casos nas Enfermarias da Santa Casa de Misericórdia e do Hospital do Serviço Especial de Saúde Pública” (FMCP, 1947b, p. 79). 3 Apesar do nome existem controvérsias quanto a relação entre o Hospital Evandro Chagas e o Instituto do mesmo nome existente até hoje e cuja sede localiza-se na Avenida Almirante Barroso (BASTOS, 1993, p. 414). 4 “Ali os estudantes utilizaram todo ótimo equipamento, assim como o material de que é dotado aquele Instituto, tendo sido feitas demonstrações e estudos detalhados...” Dr. Orlando Rodrigues da Costa, chefe do laboratório de Parasitologia. (FMCP, 1947b, p. 73). 5 “Foi em 1937 [...] que procurei o Dr. Álvaro Camelier para pedir que me admitisse como acadêmico estagiário, sem nada ganhar a não ser o que viesse aprender” (MEIRA, 1986a, p. 64). O Hospício dos Alienados e outras Instituições de apoio 117 118 9 Equiparação a Jato 119 120 Detalhe das cadeiras do Salão Nobre. Funcionando desde 1º de maio de 1919, a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará demorou apenas cinco anos para ser “equiparada às officiaes”, — como passou a constar nos papéis timbrados —, por portaria do Ministério da Justiça e Relações Interiores, de 4 de setembro de 1924. Para que se tenha ideia desse espaço de tempo é preciso acompanhar o processo de equiparação de outras escolas. A de Minas, por exemplo, criada em 1911, foi equiparada em 19181; a do Paraná, fundada em 1912, somente foi equiparada em 19222. Recife, inaugurada em 1920, foi equiparada em 19273; a de São Paulo, com atividades iniciadas em 1913, obteve seu reconhecimento em 19224. A equiparação de um curso superior significava o reconhecimento em todo o território nacional dos diplomas expedidos pela Instituição, o que conferia credibilidade aos profissionais ali formados e a conseqüente autorização para o exercício profissional, uma vez que, de outra forma, os profissionais somente poderiam exercer suas atividades na jurisdição estadual a que a escola estivesse vinculada5. Tal processo de equiparação foi regulamentado pelo Decreto nº. 11.530, de 18 de março de 1915, que reorganizou o ensino secundário e superior da República e previa que Art. 11. As academias que pretenderem que os diplomas por ellas conferidos sejam registrados nas repartições federaes, afim de produzirem os fins previstos em leis vigentes requererão ao Conselho Superior do Ensino o deposito da quota de fiscalização na Delegacia Fiscal do Estado em que funccionarem (BRASIL, 1915). A equiparação não era definitiva, obedecendo a regras bastante rígidas, com previsão, inclusive, da cassação ao direito à equiparação já concedida, não podendo esta ser requerida novamente no prazo de seis anos, ainda que o estabelecimento mudasse de nome (BRASIL, 1915, Art. 22). A Faculdade de Odontologia do Pará, por exemplo, perdeu sua equiparação de 1927 até 1938, com os alunos formados neste período não conseguindo registrar seus diplomas no Departamento Nacional de Ensino (PARÁ-MÉDICO, dez. 1939, p. 23). As dificuldades deviam ser muitas, pois, conforme conta o fundador da Faculdade de Medicina do Recife, Octávio Freitas, o Conselho Nacional de Educação não era “muito simpatizante de equiparações de escolas livres, sobretudo das de medicina” (FREITAS, 1944, p. 110). No caso da FMCP parece que algumas “facilidades” foram agregadas. Por exemplo, de acordo com o art. 16 do referido decreto Não será inspector pessoa ligada por affinidade de qualquer natureza aos directores ou professores da academia, e, quando possivel, não residirá siquer no Estado em que o instituto funccionar (BRASIL, 1915). Equiparação a jato 121 Entretanto, o inspetor designado para a fiscalização foi o Dr. Lauro Sodré Filho, médico, “Chefe da clinica de nariz, garganta e ouvidos da Santa Casa de Misericórdia6”, não só paraense como também filho do senador Lauro Sodré7. Previa também o decreto que a nomeação do inspetor seria anual, embora podendo o referido cidadão ser designado uma ou mais vezes para a função (BRASIL, 1915, Art. 19). Tais benesses parecem ter sido fruto da amizade entre o senador Lauro Sodré e o Barão Ramiz Galvão (Folha do Norte, 29.12.1934, p. 1), o todo poderoso membro do Conselho Superior de Ensino, criado com a Reforma Rivadávia, de 1911 (BRASIL, 1911), e ao qual estava subordinada a fiscalização dos estabelecimentos, competindo a ele indicação dos inspetores. Ramiz Galvão seria o primeiro Reitor da Universidade do Brasil8. Outro dado relevante a ser observado no processo de equiparação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará diz respeito ao artigo 22 do Decreto citado. Segundo o artigo “Não será equiparada ás officiaes academia que funccione em cidade de menos de cem mil habitantes, salvo si esta for capital de Estado de mais de um milhão de habitantes e o instituto fôr fortemente subvencionado pelo governo regional”. 122 Essa “forte subvenção estadual” não parece ter sido marcante na escola paraense, posto que quase sempre a Direção da Faculdade reclamava do Estado pelo não cumprimento das obrigações financeiras deste para com a escola. No Relatório relativo ao ano de 1922, Camilo Salgado já reclamava não ter recebido o auxílio do Governo Federal, bem como fazia referência à situação financeira do Estado.9 Do mesmo modo que em 1924 certamente a Faculdade não preenchia todos os requisitos necessários para a equiparação, previstos nas atribuições do inspetor: Art. 14. O inspector inquirirá, por todos os meios ao seu alcance, inclusive o exame de toda a escripta do instituto: a) se este funcciona regularmente ha mais de cinco annos; b) se ha moralidade nas distribuições de notas de exames; c) se os professores manteem cursos particulares frequentados pelos alumnos da academia; d) se as materias constantes dos programmas são suficientes para os cursos de Engenharia, Direito, Medicina ou Pharmacia; e) se, pelo menos, tres quartas partes do programma de cada materia são effectivamente explicadas pelo respectivo professor; f) se ha exame vestibular e se é este rigoroso; g) se a academia possue os laboratorios indispensaveis e se estes são utilizados convenientemente; h) se o corpo docente é escolhido pelo processo de concurso de provas estabelecido na presente lei; i) se as rendas da academia são sufficientes para o custeio de um ensino integral, das materias do curso, ministrado por professores sufficientemente remunerados; j) se a quota de fiscalização é depositada na época legal. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 A fiscalização e a conseqüente equiparação foi uma das principais medidas tomadas por Camilo Salgado, após assumir definitivamente a Direção da Faculdade, e antes mesmo da transferência do curso para o palacete de Santa Luzia10. Já no Relatório de Atividades de 1922, publicado em 1923, Camilo discorre sobre o assunto, informando inclusive a indicação do inspetor, e vendo o gesto como prestigio da Escola junto ao Conselho Superior de Ensino, para desagrado dos descrentes iniciais do projeto.11 Um dado que merece registro é que na Mensagem Governamental apresentada ao Congresso Legislativo do Estado e relativa ao ano de 1923, o governador Antonino Emiliano de Souza Castro, ao discorrer sobre o ensino superior, já menciona o processo de equiparação da Faculdade de Medicina.12 Mas, além das peças políticas certamente envolvidas no processo de equiparação, Camilo Salgado também fez sua parte, procurando dotar a Faculdade de condições básicas para o referido processo. Assim é que Folha do Norte de 18 de março de 1924 noticia a chegada de equipamentos para a Faculdade, importantes para a equiparação: A FACULDADE DE MEDICINA PREPARA-SE PARA A EQUIPARAÇÃO OFFICIAL O paquete “Santos”, do Lloyd Brasileiro, esperado hoje neste porto, traz parte do Laboratorio de Microbiologia destinado á Faculdade de Medicina do Pará. Esses apparelhos, adquiridos com os proprios recursos do estabelecimento, compõem-se de seis excellentes microscopios e outras peças indispensaveis, de immediata utilidade nos trabalhos de microbiologia. São de fabricação allemã e foram adquiridos na sucursal da casa Lutz, no Rio. A parte integrante desse como os demais laboratorios completos de Physica, Chimica, Histologia, Physiologia e Anatomia Pathologica, necessarios ao apparelhamento perfeito da nossa Faculdade de Medicina, deverão ser embarcados precisamente hoje, no “Hildebrand”, no porto do Havre. Á excepção do de Microbiologia, os demais laboratorios são franceses, comprados na Casa Pils, de Emilio Deyrolle, de Paris. Com a acquisição de taes apparelhos, por que tanto se empenhou o director do estabelecimento, dr. Camillo Salgado, a quem já tanto deve a nascente mas já acreditada instituição de ensino medico, fica a Faculdade de Medicina do Pará apta a conquistar a sua equiparação aos demais estabelecimentos officiaes congeneres da Republica, condição que o Conselho Superior de Ensino julgou imprescindível, na sua ultima reunião, conforme noticiou um telegramma publicado na FOLHA (Folha do Norte, 18.03.1924, p. 1). A data da equiparação é motivo de controvérsias. Folha do Norte de 30 de abril de 1924, sob o título “A equiparação da Faculdade de Medicina” informa o seguinte: Pessoa chegada hontem do Rio, pelo “Campos Salles, e que procurou bem se informar do que resolveu o Conselho Superior de Ensino sobre a equiparação da Faculdade de Medicina do Pará, declarou-nos que o parecer Equiparação a jato 123 favorável a essa concesão foi brilhantemente elaborado pelo dr. Aloysio de Castro, director da Faculdade do Rio de Janeiro. A equiparação deverá ser approvada na sessão de junho vindouro, quando a nossa Escola já terá completos os cinco annos de funccionamento, exigidos pelo Reg. do Conselho. Por essa data devem estar installados os seus laboratorios no predio proprio, onde ella tem séde. Nesse sentido, o dr. Lauro Sodré Filho, fiscal federal, acaba de ter communicação do presidente do Conselho Barão dr. Ramiz Galvão (Folha do Norte, 30.04.1924, p. 1). A mesma Folha do Norte, repetindo o título da matéria de 30 de abril, noticia em 12 de junho a equiparação como já tendo ocorrido: 124 A Faculdade de Medicina do Pará e a sua equiparação Está justamente regosijada a mocidade que cursa a Faculdade de Medicina de Belém, pelo recente acto do Conselho Superior de Ensino, que a equipara aos demais estabelecimentos congeneres do paiz, satisfazendo, assim, uma das grandes aspirações da juventude paraense. Por esse motivo e tendo em alta conta os esforços a tal respeito despendidos pelo senador dr. Camillo Salgado, director da Faculdade e mestre querido no seio daquella agremiação de moços, será hoje realizada ás 5 horas da tarde, uma grande assembleia geral de estudantes da Faculdade, para deliberar sobre o modo de significar o jubilo academico em face do grande triumpho alcançado. Desde já, é sabido que as manifestações serão feitas á Congregação da Faculdade e principalmente ao seu egrégio director. Uma commissão de academicos de Medicina esteve hontem na FOLHA, communicando a resolução das homenagens que o corpo discente da Faculdade pretende fazer ao dr. Camillo Salgado, que bem merece de seus discipulos e amigos taes provas de alta consideração e sympatia. Assim nos falou a commissão de que são membros os srs. Almir Pereira, Raymundo Ferro e Silva e Alexandre Magno (Folha do Norte, 08.09.1924). Outra nota sobre o assunto, aumentando a confusão com as datas, encontra-se no jornal A Província do Pará, de 7 de agosto de 1924: Em virtude de achar-se o Paiz enluctado pela morte do Dr. Raul Soares, presidente do Estado de Minas Geraes, resolveram os alumnos esta Faculdade adiar a manifestação que tinham projectado fazer ao dr. Camillo Salgado, em regosijo pela equiparação da mesma (A Província do Pará, 07.08.1924). Em nota de primeira página, Estado do Pará, de 8 de agosto do mesmo ano destacava: “A equiparação da Faculdade de Medicina do Pará – vão commemoral-a com uma elegante festa social”. De acordo com a notícia, Tendo á frente os drs. Oswaldo Barbosa,Oscar de Carvalho, Renato Chaves, Prisco dos Santos e Dagoberto Souza, doutorandos Magno e Silva, Bianor Penalber, Teixeira Marques e Barbosa Rodrigues, vae a Faculdade de Medicina commemorar a sua recente equiparação, de maneira brilhante e memorável. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Nos salões da aristocratica agremiação, que para o fim serão gentilmente cedidos, effectuarão elegante festa, que approximará, em horas de encanto, alegria, o que houver de mais em evidencia na sociedade paraense. Com o cunho de rigorosa seleção e fidalguia que lhe pertencem emprestar, a reunião projectada para dia muito proximo ha de marcar um acontecimento social (Estado do Pará, 08.08.1924, p. 3). A nota, assinada apenas com as iniciais “B. P.” (Bianor Penalber?), curiosamente omite o local da realização da festa. Folha do Norte, de 9 de agosto de 1924, informa dos organizadores da festa comemorativa pela equiparação, ressaltando que a festa, apesar de ainda não ter data marcada, já tinha local para sua realização.13 No dia 12 de agosto, A Província do Pará divulga ter recebido uma comunicação oficial de Camilo Salgado, datada do dia anterior, anunciando a equiparação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. De fato o livro de documentos expedidos da Faculdade que cobre o ano de 1924, contém cópias de diversos memorandos datados de 11 de agosto, dando ciência aos mais diversos estabelecimentos de ensino do “recente acto do Conselho Superior de Ensino da Republica” (FMCP, 1924a). Ainda em agosto, Estado do Pará publicaria nova nota sobre as comemorações pela equiparação: “A ‘soirée’ da Faculdade de Medicina”, desta vez informando que a festa realizar-se-ia no dia 23, nos salões do Sport Club, “gentilmente cedidos” para esse fim. A nota dizia ainda que a comissão organizadora estava empenhada para que tudo decorresse “sob uma atmosphera de agrado, prazer e cordialidade”, sendo um dos pontos primordiais, a “rigorosa seleção na distribuição dos convites”, que começariam a circular no dia seguinte. A nota finaliza dizendo que o professor Clemente Souza preparava-se “para que sua orchestra possa executar um programma esmerado e de successo” (Estado do Pará, 17.08.1924, p. 1). Estado do Pará voltaria a noticiar sobre o baile no dia 20 de agosto, dizendo estar definitivamente marcado para o dia 23, um sábado. A nota prossegue dizendo que algumas famílias haviam tentado junto à comissão organizadora o adiamento do baile para o sábado seguinte, dia 30, em virtude de estar programado para o dia 23 a estréia da companhia Trianon, no Palace Theatre. Entretanto, num gesto de “sympathica gentileza á sociedade paraense”, a companhia antecipou sua estréia para a sexta-feira, dia 22 (Estado do Pará, 20.08.1925, p. 2). Em correspondência encaminhada ao Senado do Estado, Camilo informa a equiparação ocorrida em agosto de 192414. Em papéis timbrados da Faculdade tem-se “Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará - Fundada em 9 de Janeiro de 1919 - Equiparada ás officiaes por portaria do Snr. Ministro da Justiça e Negócios Interiores de 4 de Setembro de 1924”. Na Revista do Acadêmico de Medicina de dezembro de 1946 consta a data de 24 de setembro de 192415. Equiparação a jato 125 Até na Mensagem governamental relativa ao ano de 1924, apresentada ao Congresso Legislativo do Estado em 7 de setembro do referido ano, o governador Antonino Emiliano de Souza Castro, ao referir-se ao ensino superior do Estado, menciona a equiparação aumentando a confusão das datas.16 O fato é que Folha do Norte, de 23 de agosto de 1924 repetindo o título da notícia de 18 de março do mesmo ano, fala das comemorações pela equiparação da Faculdade 126 A Faculdade de Medicina do Pará e a sua equiparação official Os professores e alumnos da Faculdade de Medicina do Pará festejam hoje, com uma brilhante festa social, a equiparação deste estabelecimento de ensino superior ás congeneres officiaes do paiz. Para os que tem fé no futuro da nossa terra este facto obra grandiosa dos esforços e da tenacidade benedictina do eminente professor Camillo Salgado, vale pela affirmação de que temos elementos materiaes e moraes para vencer. Ninguem ignora como nasceu a Faculdade de Medicina do Pará, que agora attingiu, com o acto equiparativo, o ponto em que queriam vel-a a abnegação e o amor do notavel cirurgião paraense, que, desde a fundação, vem dirigindo com fraternal carinho, essa casa de sciencia. A elle, pois, ao professor Camillo Salgado, que consubstancia o esforço collectivo em favor da finalidade que hoje se festeja, devemos dirigir parabens e agradecimentos calorosos por essa conquista com que engrandeceu o nosso Estado. Em commemoração ao facto auspicioso, haverá hoje uma elegante “soirée” nos salões do Sport Club. A commissão, que tomou a si essa iniciativa festiva, empenha-se para que esse sarau seja uma nota de alto relevo social. Principiará a festa ás 10 horas em ponto. A commissão solicita a apresentação dos respectivos convites, a fim de que uma fiscalisação rigorosa possa ser feita. O professor Clemente Souza organizou o seguinte programa musical: Ouverture – Royal Auvergue. 1ª parte: rag-time, Fare Well; samba, Papagaio sem bico; fox-trot, Explanade; one-step, Oneonta; fox-trot, Karussel; samba, Tem coração de quem é?; valsa, Violetas perdidas; fox-trot, My little girl; two-step, Sybille; tanguinho, Que numero, faz favor; fox-trot, Assim chora Pierrot; rag-time, Im Dorfkruggel; fox-trot, Satan. 2ª parte: fox-trot, Cigano; samba, Até debaixo dagua; one-step paso doble, Rosita; fox-trot, When hearts are young; samba, Teu despreso me mata; rag-time, Rubenstreiche; fox-trot, La chula tanguista; two-step, Quando o champagne ferve na taça; tanguinho, O Palhaço; fox-trot, Fires; rag-time, Aufzung der teepuppen; samba, Conversa fiada; fox-trot, Dance-o-mania (Folha do Norte, 23.08.1924). Os ecos de tão badalada festa seriam reproduzidos no mesmo Estado do Pará, de 25 de agosto. Afirmando que “poucas festas sociaes alcançarão o successo de que se revestiu a linda ‘soirée’ do Sport Club”, a nota detalha o acontecimento elegante, “pelo cunho de distincção e, sobretudo, intensa alegria que lhe imprimiram”. O baile contou com uma “concorrencia desusada e selecta”, dando um aspecto “incommum e brilhante aos salões da veterana sociedade nazarena. A animação prolongou-se até à madrugada, bastando dizer que às 4 horas a festa prosseguia “com o enthusiasmo vibrante e inarrefecido do principio”. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 A sede do Sport Club apresentava “feerica iluminação tocando á entrada dos convidados a banda da Força Publica do Estado”. Quando a orquestra iniciou a tocar, às 22 horas, a comissão de recepção composta pelos Drs. Oswaldo Barbosa, Acatauassu Nunes Filho e Oscar de Carvalho e os doutorandos Bianor Penalber e Barbosa Rodrigues “já haviam dado ingresso ás mais representativas figuras do mundo oficial e elegante” e a “um bando garrulo e formoso de senhorinhas, que imprimiam á serenata a maior graça e todo esplendor”. O jornal destaca a presença do “notável professor Brumpt, da Faculdade de Medicina de Paris”, que teve que retirar-se mais cedo para embarcar com destino a Soure, mas deixou sua “gentilissima consorte em companhia da família do professor Acatauassu Nunes Filho, permitindo que a distinta senhora “experimentasse uma approximação mais demorada com a sociedade paraense”17. No intervalo, autoridades, professores da Faculdade e pessoas mais gradas estiveram reunidas numa sala especial, “onde brindes amistosos trocaram-se ao ‘champagne’”. Em nome da Faculdade manifestou-se o professor Agostinho Monteiro, agradecendo as palavras do Dr. Luiz Barreiros. Exaltando a obra de Camilo Salgado, Agostinho Monteiro fez sentir que a equiparação da Faculdade de Medicina representava inegavelmente, “o facto mais culminante nestes dez annos de vida do Pará”, chamando atenção para as vantagens e benefícios que daí adviriam para o “engrandecimento da nossa vida economica”. A noticia conclui citando ter sido o governador Souza Castro representado por seu ajudante de ordem, o 1º tenente Alfredo Câmara (Estado do Pará, 25.08.1924, p. 4). Não há informação da participação dos diretores da Faculdade na citada festa. Realmente, como não poderia ser diferente, a imprensa reconheceu o valor de tudo aquilo. E assim se manifestou a revista A Semana: Si a Amazônia, victima das endemias que inutilisam tantas atividades uteis ao Brasil, muito tem a ganhar, com uma Faculdade de Medicina equiparada no extremo-norte, o Pará [...] deve particularmente sentir-se ufano, porque o acontecimento que assignalamos com jubilo é um passo de progresso que Estados mais ricos o que o nosso não conseguiram (A Semana, n. 329, 1924). Deve ser citado, é claro, que nem sempre os “Estados mais ricos” faziam tanta questão da equiparação. Orlando Lima, catedrático de Clínica Obstétrica refere que: Quando se dizia que uma das faculdades de S. Paulo não era equiparada á sua congênere da Capital Federal, não raro era ouvir-se, de paulistas a asserveração de que ela era tão notável que não tinha a necessidade de se equiparar a nenhuma outra. Esta, se quisesse, que a tomasse como padrão (FÁBRICA de Doutores, 1938, p. 3). Lógico que tal realidade não se aplicava à região norte do país. Aqui a equiparação era essencial, sua ausência colocaria em risco a credibilidade e quiçá a existência da Faculdade. Equiparação a jato 127 A equiparação como já mencionado precisava ser renovada periodicamente. Para isso a Faculdade tinha que passar por inspeção rigorosa do Conselho Federal de Ensino Superior. Mesmo contando com o apoio do médico Lauro Sodré Filho como Inspetor Federal junto a Faculdade, pelo menos uma destas inspeções gerou algum constrangimento. Foi exatamente a inspeção realizada em 1926 pelo Dr. Paranhos da Silva, então secretário do Departamento Nacional de Ensino. Aparentemente, enquanto esteve em Belém, Paranhos “nunca revelou que tivesse recebido má impressão de nossa Faculdade de Medicina. Ao contrario, falando da conveniencia do fechamento da Escola de Odontologia, elle teria dito que ia propôr a annexação da mesma áquela Faculdade” (Folha do Norte, 07.10.1926). No entanto, após voltar ao Rio de Janeiro, o jornal carioca “A Manhã” publicou uma reportagem, que logo foi divulgada em Belém via Folha do Norte, na qual afirmava que Paranhos havia descoberto 128 escandalos incríveis, sobretudo na Faculdade de Medicina do Pará, aonde estes escandalos são innominaveis. Havia alli alumnos que, para matricular-se, apresentaram documentos, os mais irrisórios, como attestados sem menor validade, entre os quaes os de exame na Escola Normal e até de piloto fluvial. Aprofundando as suas pesquizas, o dr. Paranhos teria verificado estarem clinicando medicos ahi diplomados nas mais graves condições. Um delles teria entrado na Faculdade com simples preparatorios de um collegio particular; outros com preparatorios feitos na Áustria, outros com simples preparatorios da “gripe”, e ainda outros com dois exames primarios apenas, prestados em Lisboa. Este ultimo teria conseguido isso por haver emprestado dinheiro sem juros á Faculdade e presenteados com cavallos de puro sangue a alguns professores. Assim, conclue a “Manhã”, em troca de duas ou tres cavalgaduras aos professores, estes, na sua gratidão, deram uma cavalgadura á medicina. E todos estes medicos estão exercendo sua profissão, ou melhor, estão matando na capital paraense (A INSPEÇÃO Paranhos ao Norte, 1926). A reação local ao incidente foi dividida: enquanto uns escreveram violentos ataques pessoais a Paranhos, outros responderam defendendo-o afirmando que este jamais teria dito tais coisas: Que importam noticias estapafurdias estampadas em jornaes cariocas sedentos em espalhar novidades escandalosas sobre as cousas nacionaes? A que para ca foi transmittida por telegramma, nem siquer tem caracter de entrevista, que pudesse envolver a responsabilidade do dr. Paranhos (DR. PARANHOS da Silva, 1926). Paranhos responderia enviando um telegrama ao Dr. Dionysio Bentes (FMCP, 1926), então governador do Pará e um dos fundadores da Faculdade, e outro ao Dr. Amazonas de Figueiredo, diretor do Colégio Paes de Carvalho (Folha do Norte, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 26.12.1926). Em ambos diria mais ou menos a mesma coisa: que jamais fez nenhuma declaração à imprensa e que conhecia bem a responsabilidade de suas funções para ficar divulgando informações sigilosas; que nunca fugiu de suas responsabilidades e que suas ocupações não lhe deixavam tempo livre para ler e desmentir notícias tendenciosas; que tinha apenas tomado conhecimento de uma denúncia e que esta após cuidadoso e sigiloso estudo havia sido arquivada por ser improcedente. Por mais que Paranhos não tenha realmente feito aquelas declarações, são grandes as possibilidades que alguma coisa tenha vazado e o jornal carioca tenha aproveitado para criar uma pauta sensacionalista em torno de fatos não comprovados. O relatório definitivo da visita de Paranhos, se não foi tão catastrófico como a notícia que havia sido vinculada, também não foi tão benevolente: considerou as instalações da Faculdade precárias funcionando em um prédio “velho e acanhado”, salvando-se apenas o ensino de clínicas médicas ministrado pelo professor Acylino de Leão, por se localizar na Santa Casa, que era um dos melhores hospitais da época18. O fato não ameaçou a equiparação, mas ilustra como uma parcela da imprensa da então capital federal estava pronta para ridicularizar a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, um estabelecimento cuja criação talvez parecesse por demais audaciosa aos olhos dos jornalistas cariocas. Realmente o tratamento depreciativo que os jornais do Rio de Janeiro dedicavam a Faculdade não era novidade. Um ano antes, em 1925, aquela imprensa carioca emitiria “palavras desfavoraveis quanto ao reconhecimento da Faculdade de Medicina” (Estado do Pará, 10.12.1925, p. 1), procurando demonstrar a “inefficacia de tal equiparação, por não preencher a faculdade, tanto no dominio techinico, como administrativo as condições requeridas pela lei e pelo ensino alli proporcionado” (Estado do Pará, 10.12.1925, p. 1) desmerecendo o preparo profissional “dos ministradores da sciencia medica no Pará” (Estado do Pará, 10.12.1925, p. 1). Como se já não bastassem estas inspeções, alguns problemas internos volta e meia vinham à tona ameaçando a equiparação. Um memorando de Camilo Salgado solicitando que determinado professor faltasse menos às aulas ilustra bem a situação: Caso não possa devido a seus multiplos affazeres, reger esta disciplina, peço scientificar disto o Conselho Technico Administrativo, afim de que sejam tomadas medidas asseguratorias da efficiencia do ensino. O Director Nacional de Educação, em repetidos telegrammas, tem solicitado o numero de faltas dadas pelos professores, todos os mezes. Ha de convir V. Sa. que não fica bem nem para Faculdade nem para os professores, fornecer a Directoria uma nota official, dando o numero de faltas dadas pelos professores, o que poderia determinar a desequiparação desta Escola. (FMCP, 1937a). Hoje, passados muitos anos do episódio da equiparação, nunca é demais lembrar o esforço de Camillo Salgado e sua equipe para atingir este propósito. E se depois da morte de Camilo, uma boa parcela da população acredita que ele realize milagres, Equiparação a jato 129 mesmo os mais céticos hão de concordar que o grande milagre talvez tenha ocorrido ainda com ele em vida, e que foi não só conseguir a equiparação “relâmpago” de uma Faculdade que ainda engatinhava por caminhos bastante tortuosos, como também mantê-la equiparada ao longo dos anos, “transformando em realidade radiante a esperança dos por ela formados, de exercerem a profissão em toda a imensidade do território pátrio”.19 130 Foto 21: Palacete Santa Luzia no ano da equiparação da Faculdade de Medicina. Fonte: FMCP (1944, s.p.). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 NOTAS 1 “A Associação Médico-Cirúrgica de Minas Gerais declarou, então, criada a Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, na data de 5 de março de 1911, quando governava o Estado Júlio Bueno Brandão. [...] Diante do relatório apresentado pelo inspetor, em 20 de fevereiro de 1918, o Conselho Superior de Ensino votou a favor da equiparação da instituição aos institutos congêneres, ato aprovado pelo Governo Federal, através de portaria de 21 de março do mesmo ano” (FIOCRUZ, 2007). 2 “O Curso de Medicina e Cirurgia da Universidade do Parana foi criado em 1912. [...] Em 1922, a Faculdade de Medicina incluindo os cursos de farmacia e odontologia obteve reconhecimento oficial” (FIOCRUZ, 2007). 3 “A inauguração oficial da Faculdade de Medicina ocorreu no dia 16 de julho de 1920, quando foi proferida a aula inaugural pelo professor e diretor da instituição, José Octávio de Freitas. [...] Em 25 de julho de 1927, o Conselho Nacional de Ensino emitiu parecer a favor da equiparação da Faculdade de Medicina do Recife, sendo baixado ato pelo Ministro da Justiça e Negócios Interiores, Augusto Vianna do Castelo, em 27 de julho de 1927” (FIOCRUZ, 2007). 4 “A lei de criação da Faculdade foi regulamentada pelo decreto nº 2.344 de 31/01/1913. A aula inaugural, versando sobre física, foi proferida pelo professor Edmundo Xavier na Escola Politécnica de São Paulo, no dia 2 de abril de 1913. Neste período, a lei nº 4.615 de 07/12/1922, assinada pelo Presidente da República, Arthur Bernardes, reconhecia em todo o país os títulos emitidos pela Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo. A partir de então, a Escola teve de se submeter à vigilância e fiscalização do Conselho Superior de Ensino” (FIOCRUZ, 2007). 5 Em longa correspondência enviada ao Diretor do Serviço da Educação e Saúde, Dr. M. A. Teixeira de Freitas, em 28 de outubro de 1948, o Diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães, faz um breve histórico da fundação, dizendo em determinado trecho: “Iniciou-se com o carater de Faculdade integralmente livre, tolerada pelo Governo Estadual, sob a condição dos profissionais por ela diplomados só poderem exercer a clinica no territorio Estadual”. (FMCP, 1948b). 6 De acordo com propaganda publicada em Estado do Pará, o Dr. Lauro Sodré Filho era ex-medico auxiliar da mesma clinica da Santa Casa do Rio de Janeiro, além de médico assistente do Instituto de Higiene. Seu consultório localizava-se à travessa São Mateus nº15, altos da Alfaiataria Pinto, atendendo de 11h às 13h e de 16h30 às 18h30. (Estado do Pará, 24.11.1924, p. 3). 7 Lauro Nina Sodré e Silva foi governador do Pará de 1891 a 1897 e de 1917 a 1921, período de criação da Faculdade de Medicina. Exerceu ainda os cargos de deputado federal (1891 a 1893) e senador (1897 a 1902; 1903 a 1912; 1912 a 1917; 1921 a 1929 e 1930 a 1930). (BRASIL, Senado Federal, 2007). 8 “Recebeu o nome de Universidade do Rio de Janeiro e seu primeiro Reitor foi o Barão Ramiz Galvão, médico, professor da Faculdade de Medicina e Diretor da Instrução Pública”. (GOMES; VARGAS; VALLADARES, 2001, p. 34). 9 “Ainda não obtivemos auxilio pecuniário do governo federal e o do Estado, não ignoraes, está em situação precaria embaraçosa...” Faculdade de Medicina do Pará (FMCP, 1923c, p. 12). 10 Camilo Salgado assume a Direção em 22 de abril de 1922. A Faculdade passa a funcionar no palacete Santa Luzia em 1º de abril de 1924. No projeto Equiparação a jato 131 132 de Federalização da Faculdade apresentado à Câmara pelo Deputado Federal Deodoro de Mendonça em 23 de outubro de 1946, consta a data de 6 de abril de 1923 como “inspeção preliminar” e a data de 24/9/1924 como “equiparação”, “por ato do Ministro da Justiça, consoante o art. 20 do Decreto 11.530, de 18/3/1915” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946). 11 “O relatorio do primeiro anno de minha gestão foi apresentado em congregação da Faculdade, no mez de janeiro proximo findo, e, porque resolvessemos pleitear acertadamente a fiscalisação do Conselho Superior de Ensino da Republica, delle enviamos copia aos eminentes membros dessa douta instituição, os quaes, por maioria de votos, deferiram nosso pedido e, então, foi nomeado fiscal o distincto clinico dr. Lauro de Almeida Sodré (Lauro Sodré Filho, filho do ex-governador do Pará. N.A.) Não preciso evidenciar a significação do gesto do Conselho, que veiu prestigiar um estabelecimento que, ao principio combatido pelo estrépito maléfico dos descontentes e de espirito sombrio, impoz-se por sua moralidade, de tanto rigor que chegou a ser considerada clamorosa. Talvez em todo o Paiz — permittam-me o avanço de expressão — sejam raríssimas as escolas livres, como a nossa, de idoneidade inabalável. Mantida, aos primeiros tempos, pela exclusiva remuneração dos seus alumnos, estes, em numero de monta, viam-se reprovados, ao fim do anno lectivo, á falta de preparo demonstrado nos respectivos exames. E assim nos firmamos precocemente, erguendo como principal bandeira a moralidade do ensino superior, que nunca por nós foi aviltado”. (FMCP, 1923c, p. 4). 12 “... a Faculdade Livre de Medicina do Pará, já dispondo de prédio proprio, como a Faculdade de Direito e actualmente fiscalisada pelo Governo Federal, em processo de equiparação requerida; ...” (PARÁ. Governador (19211925: Antonino Emiliano de Souza Castro), 07.09.1923, p. 62). 13 “Projetam os professores e alumnos da Faculdade de Medicina promover uma auspiciosa festa de regosijo pelo acto da equiparação concedido áquelle Instituto, pelo Conselho Superior de Ensino da Republica. A frente da sympatica iniciativa encontram-se os drs. Oswaldo Barbosa, Oscar de Carvalho, Renato Chaves, Prisco dos Santos e Dagoberto Souza, doutorandos Magno e Silva, Bianor Penalber, Teixeira Marques e Barbosa Rodrigues, que envidam todos os esforços para que a reunião projectada se revista e um cunho rigorosamente selecto e distincto. O dia da festa ainda não está marcado, mas já está escolhido o local, que será o Sport Club”. (Folha do Norte, 09 agosto de 1924, p. 3). 14 “Exmº. Snr. Dr. Presidente do Senado. Approveitando a presente reunião do Congresso do Estado, é-me grato dirigir-me á V. Excia., como presidente, para communicar a equiparação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará ás suas congêneres officiaes, facto occorrido numa das sessões do Conselho Superior do Ensino da República, em Agosto próximo findo. V. Excia. e os eminentes Senadores, cujo escopro não é outro senão o soerguimento brilhante do nosso grandioso Estado, hão de receber esta communicação com o enthusiasmo e o interesse sincero que merece o grande passo progressista conquistado pelo ensino superior paraense, á custa de sacrificios, que não foram diminutos. A equiparação da Faculdade de Medicina é, não ha a negar, um symptoma de florescimento das nossas energias, que muito ainda poder dar em beneficios do nosso futuro economico, que se auspicia magnífico, graças a iniciativas de tamanho valor. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Sirvo-me da opportunidade para fazer um appello á V. Excia. e a seus dignos pares: que não faltem com o estimulo e o amparo, já dispensados no anno transacto, ao principal estabelecimento scientifico do Pará, cuja manutenção e progresso dependem do auxilio dos que se interessem pelo que é nosso, com o patriotismo que não ha de faltar aos acatados membros do Senado. Apresento a V. Excia. e aos Snrs. Senadores, as minhas homenagens muito cordiais. Saude e Fraternidade” (FMCP, 1930) 15 Ver nota nº13. 16 “O Conselho Superior de Ensino da Republica, em acto de julho findo reconheceu a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, officialisando o seu ensino, justo premio ao merecimento da obra ingente que ella representa”. (PARÁ. Governador (1921-1925: Antonino Emiliano de Souza Castro) 07.09.1924, p. 69). 17 O prof. Émile Brumpt era parasitologista e autor de um famoso compêndio desta área (N.A). 18 Ver capítulo “O Hospital Escola Primaz - A Santa Casa no contexto da Faculdade”. 19 Do ofício encaminhado em 28 de outubro de 1948 pelo Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde, contendo “um breve histórico da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará”. (FMCP, Livro de Ofícios expedidos–1948b). 133 Equiparação a jato 134 10 Os Primeiros Médicos 135 136 Detalhe do gradil da FMCP. Tendo iniciado suas atividades normais em 6 de maio de 1919, a Faculdade de Medicina do Pará diplomou seus primeiros médicos em 1924. O acontecimento, inédito, repercutiu para além dos muros do casarão de Santa Luzia, constituindo-se num evento público, que contou com concorrida assistência merecendo inclusive cobertura jornalística desde as primeiras reuniões, entre os doutorandos, para a discussão dos detalhes pertinentes às solenidades e comemorações. Em Estado do Pará, de 9 de junho de 1924, temos a divulgação da reunião dos doutorandos “que em breve formarão a turma inicial de médicos paraenses”, “afim de assentarem medidas sobre a sua colação de grau”. Por unanimidade foi escolhido o professor Acylino de Leão, como paraninfo à turma, e Magno e Silva como orador. O nome do Barão de Anajás, primeiro diretor da Faculdade, não foi esquecido, devendo seu retrato figurar no quadro de formatura, juntamente com os do Dr. Souza Castro, governador e também professor da Faculdade, e do Dr. Lauro Sodré, governador a quando da fundação da Escola, “a cujo progresso ambos ligaram os seus nomes”. Ficou decidido, ainda, que deveria figurar no quadro de formatura, o retrato do Dr. Lauro Sodré Filho, fiscal do Governo federal junto à Faculdade1. Durante a reunião, o doutorando Bianor Penalber recordou a abnegação e o carinho com que o Dr. Camilo Salgado vinha trabalhando pela Faculdade, “com uma coragem e uma decisão que venceram os maiores sacrifícios”, sendo merecedor da gratidão e das homenagens dos primeiros médicos paraenses, ficando combinado “que se trataria opportunamente das bases de um grande preito de reconhecimento e amizade áquelle preclaro cirurgião”. Ao final do encontro, Magno e Silva propôs que toda turma procurasse o Dr. Acylino de Leão “para dizer-lhe da satisfacção com que o acclamara seu paranympho”, indicando o doutorando Bianor Penalber para “interpretar o sincero sentir de todos os collegas”. À reunião compareceram os doutorandos Magno e Silva, Bianor Penalber, Teixeira Marques, Hypolito Carelli e Ferro e Silva, deixando de comparecer o doutorando Honorato Filgueiras, por encontrar-se fora do Estado (Estado do Pará, 09.06.1924, p. 2). Em Folha do Norte de 7 de dezembro de 1924 encontramos a notícia: “Os novos medicos. A 1ª turma de diplomados da Faculdade de Medicina do Pará”. O texto dava conta dos exames realizados no dia anterior, pela manhã, com término às 11 horas, e constituídos por provas práticas e orais de Clínica Médica, perante banca examinadora composta pelos professores Drs. Arthur França, Mattos Cascaes e Acylino de Leão. Utilizando pacientes sorteados da Enfermaria São Pedro, os candidatos tiveram 30 minutos para firmar o diagnóstico, trinta para sustentação oral e mais trinta para argüição pela banca. Os primeiros médicos 137 O resultado foi a aprovação plena de Antonio Magno e Silva e Bianor Martins Penalber com a nota 9; Honorato Remigio de Castro Filgueiras, com 8 e aprovação simples de Hippolyto Carelli, com 5. Os resultados dos demais exames foram: Clínica Obstétrica: aprovados plenamente: Hippolyto Carelli, com 8; Bianor Penalber, com 7; Magno e Silva, com 6. Aprovados simplesmente: Honorato Filgueiras e Antonio Ferro e Silva, ambos com nota 5. Medicina Legal: aprovados plenamente: Honorato Filgueiras, Bianor Penalber, Antonio Magno e Silva e Antonio Ferro e Silva, todos com nota 9; Hippolyto Carelli, com 8. A notícia registra, ainda que um aluno ficou reprovado2. Estado do Pará também destacaria a conclusão de curso dos primeiros médicos formados no Pará com notícia mais detalhada e mais festiva, certamente para isso concorrendo o fato de Bianor Penalber trabalhar no referido jornal. Assim, com o título “Os primeiros medicos formados neste Estado”, o jornal dizia que: 138 A Faculdade de Medicina do Pará teve hontem, nos annaes brilhantes de sua existência, assignalada outra pagina victoriosa que é a mais expressiva de todas, como marco do adeantamento a que pôde chegar o ensino superior do nosso Estado, cujas escolas, são mantidas sempre galhardamente. Registou-se, com o termino das respectivas provas, a formatura da primeira turma de medicos paraenses, constituida apenas de quatro dos 58 candidatos matriculados em maio de 1919, na Faculdade de Medicina, que chegou a firmar-se, em pouco tempo, pelo critério de moralidade, base que foi de sua equiparação ás congeneres officiaes, verificada na reunião do Conselho Superior de Ensino da Republica, de agosto ultimo, em face de um parecer honroso firmado pelos drs. Aloysio de Castro, director da Faculdade de Medicina do Rio; Paulo de Frontin, director da Escola Polytechnica, e Conde Affonso Celso, director da Faculdade de Direito do Rio. Poucas serão, effectivamente, as Faculdades, livre como a nossa, que registem porcentagem de reprovações tão elevada, mesmo no ultimo ano, como acaba de suceder (Estado do Pará, 07.12.1924, p. 1). A notícia concluía dizendo que o “illustre dr. Camillo Salgado, dedicado Director da Faculdade de Medicina”, assistira as provas práticas, recebendo muitas felicitações pelo brilhantismo das mesmas2. Antonio Magno e Silva era paraense, odontólogo formado no Rio de Janeiro, tendo sido um dos fundadores da Escola Livre de Odontologia, e membro a Associação Científica do Pará, que mantinha aquele curso e inicialmente manteve o de medicina, também. Na ocasião, Magno e Silva era professor catedrático e Diretor do curso de Odontologia, cargo que ocuparia até sua morte em1938 (RIBEIRO, 2005, p. 13). Honorato Remigio de Castro Filgueiras era nascido no Ceará, tendo iniciado seu curso na Faculdade Nacional de Medicina, no Rio de Janeiro, transferindo-se para Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Belém em 1922, matriculando-se com a turma que cursava o 4º ano (LEITÃO, 1985, p. 25). Hippolyto Carelli tinha nacionalidade grega. Bianor Penalber era jornalista, atuando, além de Estado do Pará, em “A Semana”, revista de amenidades, ilustrada, publicada à época. Ressalte-se que todos quatro formandos defenderam tese, o que não era obrigatório, sendo assim conferido a eles o grau de doutor em medicina3. Do mesmo modo que a conclusão do curso, a defesa das teses despertou o interesse da imprensa, merecendo cobertura destacada. Assim, Estado do Pará, em 7 de janeiro de 1925, noticiava em primeira página: Defesas de these Encontram-se na secretaria da Faculdade de Medicina do Pará, afim de serem defendidas perante as respectivas bancas examinadoras, já escolhidas em reunião de congregação, as theses da primeira turma de medicos dalli saídos recentemente. Apesar do caracter de facultativas, que lhe deu uma das ultimas reformas do ensino, os novos esculapios paraenses assentaram todos apresentar o trabalho escripto que vae merecer a critica e o julgamento dos mestres. Os assumptos escolhidos para as theses apresentas são os seguintes: “Etiopathogenia das cirroses (dr. Magno e Silva); “Contribuição ao estudo do tratamento da filariose” (dr. Bianor Penalber); “Docimasia pulmonar” (dr. Honorato Filgueiras) e “Hygiene da tuberculose” dr. Hyppolito Carelli. Parece definitivamente marcada a proxima semana para a defesa respectiva, que se vae realizar pela primeira vez no Pará (Estado do Pará, 07.04.1925, p. 1). Na semana seguinte, o mesmo jornal fazia referência ao início das defesas das teses, informando que o primeiro a defender seria Magno e Silva, o que não ocorreu5, cabendo esta primazia a Bianor Penalber, conforme o mesmo jornal, em 15 de abril de 1925, em que é destacada a participação do referido jornalista e, agora, doutor em medicina, sem esquecer de mencionar Camilo Salgado: Defesas de These – o acto de hontem na Faculdade de Medicina Pela primeira vez, no Pará, registou-se a solennidade de uma defesa de these medica, verificada na manha de hontem, com assistencia vultuosa, na Faculdade de Medicina. Os novos esculápios, que haviam concluído o curso em dezembro ultimo, em numero de quatro, resolveram apresentar these e defendel-a perante os professores, apesar do caracter facultativo de que hoje ella se reveste. Dos candidatos inscriptos fôram chamados os drs. Bianor Penalber e Magno e Silva. A banca examinadora do primeiro, constituindo assumpto de therapeutica, estava formada pelos Profs. Matos Cascaes, Oscar de Carvalho e Rodrigues de Souza. Ás oito horas, teve inicio o acto, declarando o dr. Cascaes, que falou por espaço de quarenta minutos, a bôa impressão que lhe causara a these em julgamento, lida com particular carinho, tendo em consideração as tradições de talento e apurado gosto pelo estudo de medi- Os primeiros médicos 139 cina, que o dr. Bianor Penalber deixára na Faculdade, alvo, portanto, das sympathias dos mestres. Tinha o prazer de confessar, perante aquella assistência, que a these em alusão, apesar da declaração modesta do autor, no preambulo, possuia o seu valor. Era uma questão, a do tratamento do assacuhy no combate á filariose. E se era uma questão aberta, predestinada a melhores observações, o seu apêllo era por que o proprio dr. Bianor prosseguisse num estudo mais minucioso, quer sobre o principio activo da planta, como outras particularidades, pois não lhe faltavam qualidades de merito e que constituem, por certo, a segurança de um futuro brilhante na carreira encetada. Conhecia muito bem o valor do candidato cuja these commentava e tão seguro estava, naquelle momento de despedida final, que elle nunca maccularia a brancura do seu arminho. Além de tudo, para recommendal-o fôra abrigar-se á sombra da sabedoria de Camillo Salgado, o notável cirurgião, que era capaz de operar tudo, até a realidade da Medicina do Pará (Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2). Conforme o jornal, o Dr. Matos Cascaes fez uma “peroração brilhante, por vezes de fundo altamente scientifico”, entremeando com frases de incentivo ao Dr. Bianor Penalber. 140 Em seguida, falou o Dr. Oscar de Carvalho, que declarou nada mais ter a dizer depois da majestosa oração do seu antecessor, mas ainda assim afirmou que, se nada valesse a tese, “bastava a colaboração de Camillo Salgado para emprestar-lhe realce absoluto” (Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2). Após fazer eruditas e bellas considerações sobre as manifestações pathologicas da filariose”, concluiu felicitando o candidato, considerando-o digno de todos os louvores. Após a manifestação do Dr. Rodrigues de Souza,“que em expressões muito carinhosas manifestou solidariedade com o pensamento acertado de seus companheiros de banca”, foi a vez do Dr. Bianor Penalber. Confessando que ali chegara, timidamente, perante os mestres, convicto que sua tese iria sofrer “uma accusação cerrada”, o que não chegou a ser realidade, pois emocionado ouvira “uma chuva de elogios e incentivos”, viu que “os illustres professores não procuraram diminuir seu trabalho; antes, muito generosos, exalçaram-no demais, a alturas immerecidas”. E aproveitou o ensejo para numa confissão sincera proclamar perante aquela assistência que se os aplausos o estimulavam e confortavam, “eram mais uma significativa justiça ao muito que vale o seu preclaro e presado mestre Prof. Camillo Salgado, que o orientára no assumpto da these”. Num compromisso solene, conforme dissera o prof. Cascaes, prometia que jamais haveria de “macular a brancura do seu arminho de medico, turvando os esplendores da profissão abraçada, para a qual levára como ensinamentos a cultura fulgurante e a verticalidade moral de seus mestres”(Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2). Segundo o jornal, “a banca examinadora approvou a these do dr. Bianor Penalber com distincção” (Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2). Em seguida foi a vez de Antonio Magno e Silva defender sua tese. Examinado pelos professores Acylino de Leão, Oswaldo Barbosa e Arthur França, o candidato mereceu rasgados elogios de todos em consideração sobre o assunto da tese, na qual Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 “se havia discordancia de doutrinas nenhum deixou de reconhecer a obra de esforço e de valor apresentada pelo dr. Magno em mais de cem paginas impressas.” Após a manifestação dos outros dois professores, o prof. Oswaldo Barbosa, tendo discorrido demoradamente sobre a etiologia das cirroses, concluiu dizendo que “se agradava em affirmar que o dr. Magno e Silva fazia honra á primeira turma da Faculdade de Medicina do Pará, pelo destacado fulgor com que se devotára ao tirocínio acadêmico”. Também foi aprovado com distinção”. A notícia conclui dizendo que “ambos os candidatos foram vivamente felicitados (Estado do Pará, 15.04.1925, p. 2). A revista “A Semana”, de 18 de abril de 1925, assim destacaria a participação de ambos os médicos. Sobre o Dr. Bianor Penalber e sua “brilhante defesa de these”: Bianor Penalber continua a manter, e sempre em horizontes muitos altos, as suas tradicções de intelligencia e acendrado amor ao estudo. Tendo terminado o curso medico em dezembro ultimo, coroado de louros, o nosso festejado collaborador e apreciado intellectual, escreveu uma these e defendeu galhardamente perante os professores da Faculdade de Medicina do Pará. Foi mais uma conquista expressiva e mais um triumpho assignalavel para o talentoso e distincto medico nosso conterraneo. Os mestres classificaram-na optima e deram lhe, justamente, a approvação mais elevada distincção. Em relação ao Dr. Magno e Silva: Foi muito brilhante e applaudida a defesa de these do dr. Magno e Silva, que é uma das mais lidimas affirmações de talento e competencia da turma de medicos recém formados. Versou o seu magnifico trabalho sobre a “Etio pathogenia das cirroses” e merceu de professores acatados, como Acylino de Leão, Arthur França e Oswaldo Barbosa, os rasgados encômios (Revista A Semana, n. 365, 1925). Honorato Filgueiras defenderia sua tese no dia 16 de abril de 1925, conforme Estado do Pará, perante a comissão julgadora composta pelos professores Renato Chaves, Prisco dos Santos e Francisco Pondé. De acordo com a notícia, “o novo medico discorreu sobre o assumpto com grande proficiencia, respondendo, com segurança, ás inquirições da banca examinadora durante tres horas seguidas, merecendo aprovação com distinção” (Estado do Pará, 18.04.1925, p. 1). A defesa de tese de Hipolyto Carelli aconteceria em 18 de abril, ainda segundo Estado do Pará, que também informava ter o novo médico colado grau no mesmo dia6. A defesa das teses continuaria rendendo notícia, uma vez que os novos doutores encaminhariam seus trabalhos ao jornal, que divulgaria o fato, inclusive com comentários acerca do assunto abordado, com maior destaque, para Bianor Penalber (Estado do Pará, 19.05.1925, p. 1). A despeito do noticiário do jornal sobre a conclusão do curso, a cerimônia de colação de grau seria realizada somente no dia 16 de abril de 1925, depois da defesa das Os primeiros médicos 141 teses7. Conforme assento no Livro de Colação de Grau da Faculdade, na data referida, às nove horas, na secretaria da Faculdade, na presença dos professores Doutores Acylino de Leão Rodrigues, Dagoberto Rodrigues de Souza e Oscar Pereira de Carvalho, o Doutor Camilo Salgado, na qualidade de Diretor da Faculdade, conferiu o “gráo de doutor em medicina“ a Antonio Magno e Silva e Bianor Martins Penalber “depois de terem os referidos doutorandos prestado o juramento exigido e o Doutor Director pronunciado as palavras usadas nestas solemnidades”. Estes, portanto, foram os primeiros médicos formados pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. A cerimônia de colação de grau dos outros dois concluintes aconteceu em 18 de abril de 1925. Desta feita receberam o grau de doutor em medicina Honorato Remigio de Castro Figueiras e Hippolyto Carelli, perante os professores Doutores Antonio Remigio de Castro Filgueiras, paraninpho, Gabriel Rodrigues de Souza, Renato Chaves da Silva e Souza, Francisco de Souza Pondé, João Prisco dos Santos, Argemiro Orlando Pereira Lima, Hermógenes Pinheiro, Deusdedit Coelho e Oscar Pereira de Carvalho, o excellentissimo senhor Director Doutor Camillo Henrique Salgado, depois de terem os doutorandos prestado o juramento de estylo, o Doutor Director depois de proferidas as palavras usadas nestas solemnidades, conferiu-lhes o grão de doutor em medicina8. 142 Pelo que se depreende, a cerimônia de colação da primeira turma não teve um caráter solene, ainda que tal fosse previsto no Estatuto da Faculdade, como a publicação na imprensa da relação dos colandos, a convocação de todos os professores catedráticos, substitutos, honorários e convidados “pessoas notáveis pelos seus títulos científicos, ou literários, como pela posição social”, sendo ainda permitido aos graduandos dar todo realce à solenidade (FMCP, 1933. Art. 245, p. 46). Como a Faculdade do Pará já estava equiparada às suas congêneres oficiais desde 4 de setembro daquele ano, o diploma recebido pelos formandos do Pará teria validade em todo território nacional. Na ocasião o fiscal federal junto à Faculdade era o Dr. Lauro Sodré Filho. A partir do ano seguinte, em 1926, com o evento acontecendo no salão nobre da Santa Casa, a formatura assumiria pela primeira vez um caráter mais solene e por esta peculiaridade também merece ser destacada. Na verdade as celebrações tiveram início ainda em dezembro de 1925. Estado do Pará em nota de 11 de dezembro intitulada “Os Médicos de 1925” menciona que: Com os exames de clinica medica, realizados ante-hontem na Santa Casa de Misericórdia concluiram o curso na Faculdade de Medicina os drs. Antonio Barbosa Rodrigues, Jorge Maia, Antonio Siqueira Mendes, Tertuliano de Cerqueira e Isauro Costa, que faziam parte da turma de 33 alumnos do anno de 1920. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 O jornal destacava ainda que as últimas provas práticas ocorridas na Santa Casa haviam sido assistidas por elevado número de pessoas entre médicos e estudantes “em cujo espírito, certo, ficou a melhor impressão que os candidatos deixaram da efficiencia da pratica hospitalar” (Estado do Pará, 11.12.1925, p. 1). A banca examinadora que aprovou a todos plenamente foi constituída pelos professores Acylino de Leão, Oswaldo Barbosa e Arthur França. Para comemorar o fim do curso os novos médicos festejaram todos à noite em um jantar no “Rotisserie Suisse” (Estado do Pará, 11.12.1925, p. 1), ocasião em que: Gentilmente convidado a participar do agradavel agape, o dr. Bianor Penalber brindou os novos medicos, á sobremesa, para os quais teve palavras de muito carinho e enthusiasmo, convidando-os a beber pela felicidade, sempre ininterrupta, do preclaro mestre dr. Camillo Salgado, que não podia ser esquecido naquelle momento de justas alegrias (Estado do Pará, 11.12.1925, p. 1). E eis que em 10 de janeiro de 1926 às oito horas da manhã teria início a programação daquela que seria a primeira formatura solene da Faculdade de Medicina do Pará. A cerimônia começou com missa de ação de graças rezada na capela da Santa Casa pelo cônego Clemente Contente, com a presença das irmãs de Santanna de serviço no hospital, familiares dos colandos e numerosos convidados (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2). Terminada a missa os presentes se dirigiram ao Salão Nobre da Santa Casa “aonde já era enorme a affluencia de cavalheiros e famílias da nossa melhor sociedade, bem assim de auctoridades, civis, militares e ecclesiasticas” (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2). Às nove horas chegou o então Governador do Estado, Dr. Dionysio Bentes, acompanhado de seu assistente militar, Major Antônio Nascimento, sendo recebido no alto da escadaria da entrada da Santa Casa pelo diretor da Faculdade Camilo Salgado, pelos membros da congregação e pelos novos médicos (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2). Já no salão nobre daquele hospital Camilo Salgado assumiu a presidência da mesa e deu por iniciada a sessão, dizendo algumas palavras alusivas ao ato. Foi feita a chamada dos doutorandos Jorge Alves Maia, Antonio Barbosa Rodrigues, Antonio Siqueira Mendes, Isauro Gonçalves da Costa e Manuel Tertuliano de Cerqueira, os quais foram introduzidos no recinto pelo seu paraninfo Orlando Lima, e tomaram lugar na bancada da congregação onde já se encontravam os professores Acylino de Leão, vice-diretor da Faculdade, Prisco dos Santos, Renato Chaves, Lauro Sodré Filho, Oscar de Carvalho, Amanajás Filho, Dagoberto de Souza e Matos Cascaes (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2). Jorge Alves Maia proferiu em português o juramento clássico “de pé, face á mesa da presidência”, com a mão estendida horizontalmente9. O diretor da FaculdaOs primeiros médicos 143 de, também em português, proferiu a fórmula consagrada10. Após longa salva de palmas seguiu-se o juramento e colação de cada um dos doutorandos que foram “igualmente muito applaudidos”. Terminada a colação, Camilo Salgado passou a presidência ao Governador do Estado (Estado do Pará, 11.01.1926), o qual concedeu a palavra ao orador da turma Isauro Gonçalves da Costa “que preferiu bem elaborado discurso” (Estado do Pará, 11 de janeiro de 1926, p. 2). Depois subiu a tribuna Orlando Lima que proferiu “uma bella peça oratória, cheia de conselhos e ensinamentos scientificos, tendo arrancado vibrantes applausos á assistencia” (Estado do Pará, 11 de janeiro de 1926, p. 2). Na sequência usou então da palavra o governador, Dr. Dionysio Bentes: ...o qual, num feliz improviso, sauda os novos medicos, concitando-os a praticar medicina como um sacerdócio, procurando dignifica-la dignificando-se a si mesmos. Sua Excelência extende-se em considerações acerca da medicina, externando profundos conceitos scientificos (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2). 144 Depois de terminada a cerimônia de colação de grau, por volta das dez e meia da manhã, todos os presentes se dirigiriam à sede da Faculdade de Medicina, onde por iniciativa dos novos médicos iria ser inaugurado um retrato a óleo do diretor Camilo Salgado11. Uma vez ali reunidos, o Governador do Estado assumiu a presidência do ato e explicou que o motivo daquela reunião era pagar uma dívida de gratidão da Faculdade de Medicina e do Pará ao seu “eminente director e querido filho, o dr. Camillo Salgado honra e glória da classe medica paraense e legitimo orgulho da cirurgia brasileira” (Estado do Pará, 10 de janeiro de 1926, p. 1). Usou da palavra então o orador oficial da cerimônia Antonio Barbosa Rodrigues, que preferiu rápido discurso oferecendo à Faculdade de Medicina o retrato de seu diretor. Em seguida foi descerrada a bandeira nacional que cobria o retrato de autoria de Manoel Pastana12 e que até então havia ficado exposto na Livraria Universal (Estado do Pará, 19 de dezembro de 1925, p. 1). Realizaram o descerramento o juiz seccional Luiz Estevão e o cônego Lemereier, representante do arcebispado (Estado do Pará, 11 de janeiro de 1926, p. 2). Após longos aplausos Camilo Salgado visivelmente emocionado agradeceria ressaltando a sinceridade do gesto, alegando que: “Levantaste por demais longe vossa estima por mim, e é essa verdadeira demasia de generosidade, transbordante de grandeza de vossas almas, que me sensibiliza muito e me faz agradecido” (Estado do Pará, 11 de janeiro de 1926, p. 2). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Referiu ainda nada ter realizado para merecer a homenagem, pois tudo que fizera fora estimular os estudantes - com o calor de seu afeto, de sua lealdade e de seu civismo - a não desanimarem e vencerem os maiores sacrifícios. Desejou as maiores felicidades na carreira dos novos médicos confiando “sinceramente no desempenho honesto e brilhante de vossa nova actividade”. E finalizou: Aonde o destino vos leve, para as sublimes bellezas do vosso sacerdócio, sede médicos capazes da honra desse titulo! E, desse modo, nenhum contentamento mais forte poderá experimentar, empenhado em vossas venturas, o humilde amigo, grato que sou, e que não esquecerá a ternura tocante desta homenagem, tão benevola quanto immerecida! Ide! Sêde felizes! (Estado do Pará de 11.12.1925, p. 1). Durante a cerimônia de colação de grau tocou a banda de música da Força Pública “em frente ao Salão Nobre da Santa Casa e na Faculdade de Medicina” (Estado do Pará , 11 de dezembro de 1925, p. 1). Camilo seria, pois, homenageado ainda em vida, com a introdução de seu retrato na galeria dos professores, quando, conforme o Regimento Interno, esse fato somente ocorreria após a morte do professor. Seria o início da interminável série de homenagens que receberia ao longo da vida e também depois de morto. É preciso registrar que a quantidade diminuta de formandos, a despeito do número inicial de alunos deveu-se, provavelmente, aos rigores do curso assim como ao fato de muitos alunos já serem profissionais em outras áreas, conforme citado na ata de inauguração, dificultando a conciliação das atividades durante o curso médico; outros desistiram devido aos custos das mensalidades e outras taxas cobradas; alguns mais, transferiram-se para outras faculdades, certamente por não apostarem na sobrevivência do projeto da nova escola. O número reduzido de alunos, que persistiria por muitos anos, fato sempre citado nos Relatórios anuais das atividades da Faculdade, aliado às matriculas gratuitas como contrapartida à subvenção estadual e ao atraso no repasse da referida subvenção, dificultavam sobremodo o crescimento da Faculdade. Somente a partir dos anos de 1930 é que o número de alunos e, consequentemente, de formandos aumentaria significativamente, com a Faculdade diplomando uma média de vinte alunos por ano, passando a se constituir, verdadeiramente, as turmas. NOTAS 1 Nenhuma informação conseguimos obter sobre o destino do quadro e até se chegou a ser confeccionado. Apesar do aparente interesse da imprensa sobre o evento, nada consta de cobertura fotográfica nos jornais da época. (N.A.). 2 Trata-se de Antônio Ferro e Silva, visto que este só colaria grau em 7 de agosto de 1926. Ver capítulo “Colação de Grau- Cerimonial e Formandos até Os primeiros médicos 145 146 1950”. O curioso é que Estado do Pará, de 29 de março de 1925, publica nota com o título “Os novos medicos”, inclusive com foto, informando que o Dr. Antonio Ferro e Silva acabara de concluir o curso médico na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, o que era “uma justa e merecida recompensa aos seus esforços”, por ser ele “um dos mais applicados alumnos da primeira turma de médicos pela nossa conceituada Faculdade de Medicina” Finaliza dizendo que pelo feito, Dr. Ferro e Silva, que era também, farmacêutico, “tem sido muito cumprimentado” (Estado do Pará, 29.03.1925, p. 1). 3 A presença de pessoas importantes assistindo ao exames tinha a finalidade de conferir mais credibilidade às provas. Deste modo, em novembro de 1924, a imprensa destacava a presença do Dr. J. Ausier Bentes, Diretor da Profilaxia Rural e livre docente de Higiene da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, que em Belém assistira as provas orais da referida disciplina, realizados pelos alunos do 6º ano da Faculdade. Ao final felicitou o Dr. Prisco dos Santos, professor da cadeira, pelos belos exames, ressaltando que estes haviam ultrapassado sua expectativa, se equiparando “brilhantemente áquelles realizados na Faculdade do Rio de Janeiro (Estado do Pará, 29.11.1924). 4 Ver capítulo “Os Doutores e suas Teses”. “Iniciam-se amanhã, ás 8 horas, as defesas de these dos alumnos que concluíram o curso medico. Será chamado o doutorando Antonio Magno e Silva. A banca examinadora está assim constituída: drs. Acylino de Leão, Oswaldo Barbosa e Arthur França. (Cadeira de Clinica Medica)”. (Estado do Pará, 14.04.1925, p. 1). 5 “Defendeu these hontem pela manha, na Faculdade de Medicina, o dr. Hipolyto Carelli, da primeira turma de nossos medicos. A banca examinadora compunha-se dos drs. Renato Chaves, Francisco Pondé e Prisco dos Santos e a these é intitulada ‘Profilaxia da tuberculose’, tendo sido approvada. Hontem mesmo o dr. Carelli collou grau na secretaria da Faculdade” (Estado do Pará, 19.04.1925, p. 1). 6 Estado do Pará, de 16 de abril de 1925 noticia a colação de grau de Bianor Penalber como tendo acontecido no dia anterior, data da defesa da tese: “Colou grau, hontem, na Faculdade de Medicina, o dr. Bianor Penalber, nosso apreciado colaborador. O novel medico, que obteve approvação distincta na defesa de sua these, merecendo os mais francos e justos elogios dos seus mestres, é uma das mais formosas intelligencias da actual geração de moços, e a quem, por isso mesmo, se abrem os mais amplos horizontes para reaffirmar, na vida pratica, os triumphos que lhe coroaram o invejavel tirocínio academico”. 7 As palavras a que se refere o texto são: “Lêde e meditae as obras de Hippocrates; regule-se a vossa vida pela sua e os homens cobrirão de bençãos o vosso nome. Recebei este annel como symbolo do grau que vos confiro. Podeis praticar e ensinar a MEDICINA”. Formulas de juramento e de investidura (FMCP, 1935d, p. 78). 8 “Prometto exercer sempre a medicina com honestidade, caridade e sciencia. No lar alheio os meus olhos serão cegos, e muda minha bôcca para guardar religiosamente os segredos que me forem confiados, o que terei como ponto capital de honra. Nunca tambem usarei da medicina para corromper os costumes e favorecer o crime” (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2). 9 “Lê e medita a obra de Hippocrates. Seguindo os seus exemplos, alcançarás as bênçãos da humanidade. Recebe este anel, symbolo do grau que te conferimos” O fato foi visto pelo jornal como uma quebra de tradição já que Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. o juramento e a fórmula proferida pelo diretor costumavam ser em latim. Entretanto tal fato foi interpretado como uma homenagem à língua portuguesa. A tradução para o português foi feita por Edgar Serra Freire, repórter do jornal (Estado do Pará, 11.01.1926, p. 2). 11 Há menção, também, de que o doutorando Jorge Alves Maia discursaria e ofereceria o quadro de formatura ao paraninfo à turma. (Estado do Pará, 10.01.1926, p. 1). 12 Estado do Pará de 11 de dezembro de 1925, p. 1 atribui a autoria do quadro ao Sr. Fidanza, possivelmente trata-se de um erro já que Fidanza era fotógrafo e não pintor como Manuel Pastana. 147 Foto 22: “Grupo de alunos do terceiro ano que na presente época de exames tiveram acesso para o quarto. São os que se acham em pé, notando-se da esquerda para direita os Srs. Antônio Ferro e Silva, Magno e xxx Sivla, J. J. Teixeira Marques, Bianor Penalber, Hipólito Carelli. Sentados ao centro os Drs. Barão de Anajás e Camillo Salgado, diretor e vice-diretor da faculdade, ladeados pelo Dr. Acylino de Leão, Américo Campos, Prisco dos Santos e Dagoberto de Souza, professores em exercício do terceiro ano”. Fonte: Revista A Semana em 14 de Janeiro de 1922, número 197. Os primeiros médicos Magno e Silva 148 11 Professores, Cátedras e Docências 149 150 Detalhe de um dos pisos da FMCP. Desde sua fundação a Faculdade de Medicina contou com grande número de professores. Muitos ligaram definitivamente seus nomes ao Palacete Santa Luzia; outros tiveram uma passagem efêmera pelo curso, sendo praticamente engolidos pela poeira do tempo. De qualquer maneira todos contribuíram para formação de um pensamento médico da região. Com relação aos professores fundadores existem discordâncias entre as fontes pesquisadas. No capítulo relativo ao curso de Medicina, nos Anais do Simpósio sobre a História da Ciência e da Tecnologia no Pará, são relacionados como fundadores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará os seguintes: Drs. Camilo Salgado, Ofhyr Loiola, Hermógenes Bentes Pinheiro, José Alves Dias Júnior, Antônio Porto de Oliveira, João Batista Pena de Carvalho, Gabriel Rodrigues de Souza, Dagoberto Rodrigues de Souza, Antônio Acatauassú Nunes Filho, Américo Campos, Renato Chaves, Antônio Marçal, Arnóbio Franco, Antônio Remígio de Castro Filgueiras, Arthur França, Oswaldo Barbosa, Juliano Pinheiro Sozinho, Mário Chermont, Geminiano Coelho, Dionísio Auzier Bentes, Evaristo Silva, Acylino de Leão Rodrigues, Salgado dos Santos, Antonino Emiliano de Souza Castro, Cruz Moreira, Lauro Magalhães, Izidoro Azevedo Ribeiro, Pedro Miranda, Jayme da Silva Rosado, Agostinho de Menezes Monteiro e Antônio Joaquim da Silva Rosado (LEITÃO, 1985, p. 28). Já a ata de fundação da Faculdade, em 1 de maio de 1919, reproduzida no Relatório de 1944, ano do Jubileu do curso, dá como participantes da referida fundação os seguintes professores: Barão de Anajás (Diretor), Penna de Carvalho, Francisco Caribé da Rocha, Acylino de Leão, Mario Chermont, Arnobio Franco, Camillo Salgado dos Santos1, Porto de Oliveira, Camillo Salgado (vice-Diretor), Raymundo de Mattos Cascaes, Jayme Rosado e Evaristo Silva (FMCP, 1945c, p. 67). Entretanto, na notícia do jornal Estado do Pará, de 3 de maio de 1919, temos: Presidindo a sessão o sr. Barão de Anajás, director da Faculdade [...] Assistiram ao acto as seguintes pessoas [...] drs. Penna de Carvalho, Caribé da Rocha, Cruz Moreira, Camillo Salgado, Hermógenes Pinheiro, Mattos Cascaes, Otto Santos, Camilo Salgado dos Santos, Acylino de Leão, Evaristo Silva, Jayme Rosado, Mario Chermont e Porto de Oliveira, do corpo docente da Faculdade. Teríamos, assim, um impasse: quem seriam os fundadores da Faculdade? Todos os que participaram de reuniões, discussões, etc. e da fundação em 9 de janeiro de 1919, de que não conseguimos documentação a respeito? Somente os que estiveram na sessão de instalação? Ou seriam os primeiros professores empossados, em 3 de abril de 1919: Mario Midosi Chermont, Física Médica; Camillo Salgado dos Santos, Química Médica; Professores, cátedras e docências 151 152 Francisco Caribé da Rocha, História Natural Médica; Hermogenes Pinheiro, Anatomia Descritiva; Fernandes Penna, Histologia; Dyonisio Auzier Bentes, Fisiologia; Acatauassú Nunes Filho, Microbiologia; Mattos Cascaes, Terapêutica Clínica e experimental e arte de formular; Barão de Anajáz, Patologia Geral; Jayme Aben-Athar, Anatomia e Fisiologia Patológicas2; Raymundo da Cruz Moreira, Anatomia médico-cirúrgica e operações; Carlos Arnobio Franco, Higiene; Francisco de Souza Pondé, Medicina Legal; Acylino de Leão Rodrigues, Clínica Médica, primeira cadeira; Arthur França, Clínica Médica, segunda cadeira; A. de Souza Castro, Clínica Médica terceira cadeira; Oswaldo Barbosa, Clínica Médica, quarta cadeira; Camillo Salgado, Clínica Cirúrgica primeira cadeira; Oscar de Carvalho, Clínica Cirúrgica, segunda cadeira; Lauro Magalhães, Clínica Cirúrgica, terceira cadeira; Silva Rosado, Clínica Ginecológica; Pedro Miranda, Clínica Oftalmológica; Clidenor Freitas, Clínica Otorrinolaringológica; Cyriaco Gurjão, Clínica Pediátrica Médica e Higiene infantil; Otto Santos, Clínica Pediátrica Cirúrgica e Ortopédica; Azevedo Ribeiro, Clínica Dermatológica e Sifiligráfica; Evaristo Silva, Clínica Neurológica; Antonio Porto de Oliveira, Clínica psiquiátrica; Agostinho Monteiro, Clínica Obstétrica; Jayme Rosado, Radiologia Clínica (FMCP, [1950]). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 153 Foto 23: Professores em exercício reunidos em 1922 para edição comemorativa da revista Pará-Médico. Ao centro Camilo Salgado já como diretor ladeado a sua direita pelos professores Américo Campos, Amanajás Filho e Prisco dos Santos, a sua esquerda Mário Chermont, Antônio Marçal, Remigio Filgueiras e Acatauassú Nunes Filho. De pé da esquerda para direita Rodrigues de Souza, Gaston Vieira, Acylino de Leão, Dagoberto de Souza e Ophir de Loyola. O último homem não é identificado na foto. Fonte: Pará-Médico (1922, p. 363). Professores, cátedras e docências Esse grupo inicial sofreria várias alterações já nos primeiros anos. Má remuneração, falta de vocação para o magistério, melhores possibilidades em outros empregos ou pura e simples descrença com a nova Faculdade podem ter sido alguns fatores que fizeram com que o início dos anos 1920 ficassem marcados por um enorme entra-e-sai de professores3. Enquanto o curso progredia alguns professores eram deslocados constantemente como professores interinos ou substitutos de disciplinas diversas, uma vez que os verdadeiros lentes destas encontravam-se “impedidos”. Assumiam assim várias disciplinas ao mesmo tempo. Tal fenômeno era comum também em outras escolas médicas iniciantes dada à falta de professores. Na Faculdade de Medicina do Paraná estes docentes que se desdobravam por várias disciplinas receberam o apelido de “Gramofones Universitários” (FIOCRUZ, [2007a]). 154 Um exemplo de “Gramofone Universitário” na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará seria o cirurgião João Prisco dos Santos. Ele entrou ali em 15 de abril de 1921 como lente substituto de Microbiologia, mas logo seria convidado também a reger interinamente Fisiologia (1ª e 2ª cadeiras) em agosto daquele ano (FMCP, [1950]). Em 30 de março de 1922 foi nomeado catedrático de Anatomia e Fisiologia Patológica, onde permaneceu até ser transferido para a cátedra de Higiene, em 12 de janeiro de 1924 (FMCP, [1950]). Em seguida, passou, ainda interinamente, para Histologia normal, em 5 de agosto de 1924, e Patologia Geral, em 2 de julho de 1926, percorrendo assim um longo caminho até chegar à cátedra na qual é mais lembrado: Clínica Propedêutica Cirúrgica e Clínica Cirúrgica (FMCP, [1950]). Outro professor que não ficou atrás nesta versatilidade foi Renato Chaves da Silva e Souza, que passou por Higiene e Medicina Legal, Anatomia descritiva, Anatomia Médico-Cirurgica, Operações e Aparelhos, até chegar a catedrático de Medicina Operatória, em 16 de junho de 1925 (FMCP, [1950]). Com cinco anos de funcionamento, a Faculdade parecia mais estabilizada e o Regimento Interno apresentava o corpo docente constituído pelos seguintes professores e suas respectivas cadeiras: Mario Midosi Chermont Antonio Marçal Juliano Pinheiro Lyra Sobrinho Geminiano Alves Coelho Hermogenes Pinheiro José Alves Dias Junior João Evaristo da Silva Antonio Remigio de Castro Filgueiras Física Medica Química Medica História Natural e Parasitologia Química Biológica Anatomia Descritiva (1ª parte) Anatomia Descritiva (2ª parte) Histologia Normal Fisiologia (1ª parte) Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Americo Vitruvio Gonçalves Campos Antonio Acatauassú Nunes Filho Oscar Pereira de Carvalho Gabriel Rodrigues de Souza Jayme Jacyntho Aben-Athar Renato Chaves da Silva e Souza Dagoberto Rodrigues de Souza Raymundo F. de Mattos Cascaes João Prisco dos Santos Francisco de Souza Pondé Acylino de Leão Rodrigues Oswaldo Ferreira Barbosa Arthur Pinto de França Antonino Emiliano de Souza Castro Hygino Amanajás Filho Camillo Henrique Salgado Raymundo da Cruz Moreira Lauro Antunes de Magalhães Otto Santos Agostinho de Menezes Monteiro Argemiro Orlando Pereira Lima Antonio Joaquim da Silva Rosado Ophyr Pinto de Loyola Manoel Ferreira dos Santos Bastos Deudedit Coelho Duarte João Batista Penna de Carvalho Antonio Porto de Oliveira Jayme da Silva Rosado Carlos Arnobio Franco Fisiologia (2ª parte) Microbiologia Patologia Geral Farmacologia e Arte de formular Anatomia e Fisiologia Patológicas Anatomia Médico-Cirurgica Operações e Aparelhos Terapêutica Higiene Medicina Legal e Toxicologia Clínica Propedêutica Médica Clínica Médica (1ª cadeira) Clínica Médica (2ª cadeira) Clínica Médica (3ª cadeira) Clínica Propedêutica Cirúrgica Clínica Cirúrgica (1ª cadeira) Clínica Cirúrgica (2ª cadeira) Clínica Cirúrgica (vias urinarias) Clínica Pediátrica Cirúrgica e Ortopédica Clínica Obstétrica (1ª cadeira) Clínica Obstétrica (2ª cadeira) Clínica Ginecológica Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil Clínica Dermatológica e Sifiligráfica Clínica Oftalmológica Clínica Oto-Rino-Laringológica Clínica Neurológica Clínica Psychiátrica Radiologia e Fisiotherapia Anatomia e Fisiologia etc. Obstétricas Constam ainda como Professores Substitutos os seguintes: Amaro Theodoro Damasceno Junior Física Médica Hilario Gurjão Historia Natural Médica Gastão Vieira Anatomia Descritiva, Anatomia Medico-Cirurgica e Operações e Aparelhos Filogenio Lisboa Histologia, Anatomia e Fisiologia Patológicas Manoel Wilson Rodrigues dos Santos Fisiologia Homero Taveira Lobato Terapêutica, Farmacologia e Arte de Formular Antonio Teixeira Mendes Filho Clínica Ginecológica Professores, cátedras e docências 155 E também os professores em disponibilidade: Barão de Anajás Dionysio Ausier Bentes Eduardo Azevedo Ribeiro4 José Cyriaco Gurjão Camillo Salgado dos Santos Pedro Jose de Miranda Patologia Geral Fisiologia Clínica Sifiligráfica e Dermatológica Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil Clínica Pediátrica Cirurgica Clínica Oftalmológica (FMCP, 1924, p. 41) O ano de 1928 apresenta um corpo docente com algumas modificações, não só pela chegada de novos nomes, como também por alterações no currículo do curso médico decorrentes da nova Lei de Ensino, decreto 16.782 A, de 13 de janeiro de 1925, que mudou o nome de algumas disciplinas e criou outras, notadamente Medicina Tropical (FMCP, [1950]). 156 Mário Midosi Chermont Phisica Antônio Marçal Chimica Geral e Mineral Chimica Organica e Biológica Juliano Pinheiro de Lyra Sosinho Biologia Geral e Parasitologia Hermógenes Pinheiro Anatomia Humana José Alves Dias Junior Anatomia Humana Philogenio Lisboa Histologia Antonio Remigio de Castro Filgueiras Physiologia Antonio Acatauassú Nunes Filho Microbiologia Gabriel Rodrigues de Sousa Pharmacologia Oscar Pereira de Carvalho Patologia Geral Acylino de Leão Rodrigues Clínica Propedêutica Médica Othon Chateau Pathologia Medica Renato Chaves da Silva e Sousa Medicina Operatória Jayme Aben-Athar Anatomia Pathologica Arthur França Clínica Médica (1ª cadeira) Antonino Emiliano de Sousa Castro Clínica Médica (2ª cadeira) Dagoberto Sousa Pathologia Cirúrgica Hygino Amanajás Filho Clínica Cirúrgica (1ª cadeira) João Prisco dos Santos Hygiene Francisco de Sousa Ponde Medicina Legal Raymundo de Mattos Cascaes Therapeutica Agostinho de Menezes Monteiro Obstetrícia Argemiro Orlando Lima Clínica Obstétrica Camillo Henrique Salgado Clínica Cirúrgica (2ª cadeira) Raymundo da Cruz Moreira Clínica Cirúrgica (3ª cadeira) Antonio J. da Silva Rosado Clinica Gynecologica João Penna de Carvalho Clínica Neurológica Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. Antonio Porto de Oliveira Ophyr Pinto de Loyola Otto Santos Manoel Ferreira dos Santos Bastos Clinica Psychiatrica Clinica Pediátrica Medica e Hygiene Infantil Clinica Cirúrgica Infantil e Orthopedia Clinica Dermatológica e Syphiligraphica Clinica Oto-rhyno-laryngologica Deusdedit Coelho Duarte Clinica Ophtalmologica Oswaldo Ferreira Barbosa Medicina Tropical Exxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx também os professores em disponibilidade: Oxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx ano de 1928 apresenta um corpo docente com algumas modificações, não só pela chegada de novos nomes, como também por alterações no currículo do curso médixxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx co decorrentes da nova Lei de Ensino, decreto 16.782 A, de 13 de janeiro de 1925, que mudou o nome de algumas disciplinas e criou outras, notadamente Medicina xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx Tropical (FMCP, [1950]). Figuravam como professores substitutos Amaro Theodoro Damasceno Junior, Gastão Vieira, Homero Taveira Lobato, Hylário Gurjão, Pedro de Castro Valente, e Sulpicio Ausier Bentes (PAES, xxxxxx 1928, p. 7). ANDRADE A década de 1930 trouxe grandes transformações curriculares e regimentares, advindas da promulgação, em 11 de abril de 1931, do decreto 19.851, que ficaria conhecido como Lei dos Estatutos das Universidades5. Segundo Doyle Maia (1996), mesmo após a citada lei, a atividade docente para quem não era catedrático continuava a ser “um sacerdócio”. O corpo docente era constituído pelo Professor Catedrático, pelos auxiliares de ensino, docentes livres e eventualmente professores contratados. O catedrático gozava de grande poder, ocupando um cargo vitalício; nomeava como “auxiliar de ensino” quem fosse de sua confiança. O auxiliar de ensino deveria obrigatoriamente, após dois anos de atividade, submeter-se ao concurso para Livre Docente, sob pena de perda automática do cargo e de não poder ser auxiliar de ensino de outra disciplina a menos que houvesse obtido a livre docência. Uma exigência que na prática nem sempre era cumprida, com muitos passando anos nas instituições sem possuir título de Livre-Docente. Sendo o “auxiliar de ensino” um cargo de confiança, este era passível de demissão a qualquer momento por decisão do catedrático. Quando um catedrático se afastava ou por aposentadoria ou pela morte, o novo catedrático ao assumir poderia demitir sumariamente todos os assistentes do catedrático anterior. Tal situação somente se modificaria com a constituição de 1946, que deu estabilidade aos assistentes, podendo estes inclusive ser transferidos para outra cadeira (MAIA,1996, p. 58). Passados quinze anos de sua fundação a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará estava consolidada como instituição atraindo cada vez mais olhares de médicos Professores, cátedras e docências 157 que pleiteavam ser catedráticos fosse por vocação ou por “status”, já que os vencimentos não eram muito atraentes. Entretanto quando morria um catedrático não era realizado concurso para ocupação da vaga: a congregação nomeava um novo catedrático entre os professores. Tal prática, que durante anos não despertou o interesse de ninguém, causaria acirrados debates e protestos que chegaram inclusive aos jornais, a partir de outubro de 1934. Com a morte de Azevedo Ribeiro6 e Ophir de Loyola vagaram as cátedras de Clínica Médica (2ª Cadeira) e Clínica Pediátrica respectivamente. A congregação prontamente transferiu os professores substitutos Gastão Vieira (Anatomia descritiva) e Hilário Gurjão (Parasitologia) para as respectivas cátedras vagas (UMA SESSÃO tumultuosa na Faculdade de Medicina, 1934, p. 1). A sessão da congregação em que foi tomada esta decisão foi bastante tumultuada, ocorrendo acirrados debates, ficando as opiniões dos professores divididas. O professor Acylino de Leão posicionou-se contra a ocupação das vagas, principalmente no caso de Clínica Pediátrica, justificando que Froylan Barata (FMCP, 1934), renomado pediatra paraense, havia solicitado sua inscrição, e considerando que Hilário Gurjão não possuía credenciais para lecionar pediatria (UMA SESSÃO tumultuosa na Faculdade de Medicina, 1934, p. 1). 158 O caso saiu da esfera da Faculdade sendo debatido em assembléia até pelo “Syndicato Medico Paraense”7, do qual Acylino era presidente, repercutindo na imprensa com o título: “É moral ou imoral o processo adotado pela Faculdade de Medicina do Pará para preenchimento das cátedras que se vagam, principalmente quando há pedido de inscrição de candidatos que se querem submeter as provas de um concurso?” (UMA SESSÃO tumultuosa na Faculdade de Medicina, 1934, p. 1). A Faculdade rapidamente justificaria seu método de escolha de catedráticos dizendo: Desde logo é de assignalar que nenhum dos actuaes professores da Faculdade conquistou seu logar no corpo docente por meio de concurso. Todos nelle foram colocados por nomeação ao tempo da organização do instituto, quando esta ainda representava uma simples tentativa que muitos consideravam ousada e temerária enquanto outros a encaravam com desdem. Uns foram, então, nomeados cathedraticos e outros substitutos por entendimento mutuo, sem preoccupação de superioridade de valores conforme iam sendo acceitos os convites ou os offerecimentos espontaneos para essa grande obra da cultura scietifica do nosso Estado. Em o numero desses benemeritos iniciadores que se prestavam a servir estavam desinteressadamente, quando as liccções não podiam ser remuneradas se acharam os drs. Gastão Vieira e Hilário Gurjão, que como substitutos estiveram em exercio effectivo para das cadeiras para que foram nomeados, tendo perlustrado outras para que foram devidamente designados e em que revelaram sempre competência, assiduidade e amor a sua missão. [...] A Faculdade tem agido sob o criterio de aproveitar a capacidade de dedicação de seus velhos auxiliares dos maus e dos bons dias... Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 [...] Assim, a Faculdade, apenas, fez justiça e guardou coherencia com os seus precedentes, o que é verdadeiramente digno e honroso para ella. (A ÚLTIMA reunião da congregação da Faculdade de Medicina, 1934). Em 27 de outubro de 1934 uma coluna assinada com o pseudônimo “Olivério” defendia a Faculdade ainda de forma mais contundente afirmando que se havia irregularidades elas eram antigas, começando pelo próprio Azevedo Ribeiro, que era na fundação da faculdade professor de clínica dermatológica e sifiligráfica, onde havia ficado em disponibilidade, indo depois parar em Clínica Médica (2ª Cadeira) (AINDA a ultima reunião da Congregação da Faculdade de Medicina, 1934). O texto continuava afirmando não entender a razão de toda “essa grita”, alegando que fatos semelhantes ocorriam em quase todas as faculdades do Brasil sem protesto, citando que no Rio de Janeiro um catedrático havia migrado de Clínica Médica e Higiene Infantil para Clínica Cirúrgica Infantil, por decisão da Congregação, e que o presidente Getúlio Vargas havia recentemente nomeado um catedrático de Clínica Cirúrgica sem concurso8. Deste modo se havia alguma imoralidade na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, igual havia ocorrido na Faculdade Nacional de Medicina e no ato do presidente (AINDA a ultima reunião da Congregação da Faculdade de Medicina, 1934). Finalizava dizendo não compreender a posição do Syndicato Médico Paraense, pois este não havia se manifestado quando o professor Castro Valente fora transferido de substituto de Patologia para a Cátedra de Fisiologia com aprovação do professor Acylino de Leão, e que havia coisas muito mais importantes para o Syndicato se preocupar (AINDA a ultima reunião da Congregação da Faculdade de Medicina, 1934). Esta era a postura característica da Faculdade naquele período histórico, de não aceitar qualquer intromissão em suas decisões, algo compreensível quando é levado em conta que aquela instituição havia surgido sozinha sem grande apoio. Uma pequena nota em 28 de outubro reforça a afirmativa anterior: DECLARAÇÃO NECESSÁRIA A directoria da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, em nome da Congregação, declara que as resoluções tomadas em conjuncto independem da apreciação e menos da opinião do Syndicato Medico Paraense, cuja auctoridade desconhece (Folha do Norte, 28.10.1934). Na reunião do Syndicato Medico Paraense ocorrida em 29 de outubro de 1934, a decisão da Faculdade foi duramente criticada como era de se esperar. Acylino de Leão defendeu-se afirmando que no caso do professor Castro Valente votou a favor de sua transferência da Patologia para a cátedra de Fisiologia, porém considerava hoje um erro, e que a lei permitia esta transferência quando houvesse “interesses irrecusaveis de ensino”, um expediente que a Faculdade recorreu no seu início para reorganizar seu corpo docente, “pois demonstrado ficara que alguns professores considerados Professores, cátedras e docências 159 cathedraticos estavam deslocados nas respectivas cadeiras com prejuízo da efficiencia do ensino medico” (NO SYNDICATO Medico Paraense, 1934). Acylino reafirmaria, ainda, que Hylario Gurjão não era especialista em Pediatria, cadeira que pleiteava, e que no caso de Gastão Vieira a decisão era menos “desrazoada”, pois este já havia lecionado mais de uma vez Clínica Médica (NO SYNDICATO Medico Paraense, 1934). Outros médicos se manifestaram entre eles Bianor Penalber, ex-aluno formado na primeira turma de médicos da Faculdade, recordando que em 1931 se inscreveu após muitas dificuldades na cadeira de Medicina Tropical, que se encontrava vaga. Como o concurso foi adiado e a cadeira encontrava-se vaga e sendo ele o único candidato inscrito Camilo Salgado o nomeou como contratado. Entretanto, para sua surpresa, pouco tempo depois “a cadeira era dada de mão beijada” a Emiliano de Sousa Castro “que nunca se lembrara della antes do concurso aberto” (NO SYNDICATO Medico Paraense, 1934). No fim das contas o parecer do Syndicato foi que a atitude da Faculdade havia sido imoral. 160 Como não poderia ser diferente a questão ainda seria discutida por muito tempo, acontecendo nova e “tempestuosa” sessão da Congregação da Faculdade na qual Lauro de Magalhães lançaria protestos contra o parecer do Sindicato Médico Paraense e contra Acylino de Leão, mesmo reconhecendo ser este “um brilhante professor e um dos que mais se têm esforçado por esse instituto de ensino” (UMA REUNIÃO tempestuosa na Congregação da Faculdade de Medicina, 17.01.1935). Sobraria até para Bianor Penalber, acusado de autor intelectual desta campanha que: ...movido pelo odio e pelo despeito pretendeu achincalhar a Congregação, esquecendo-se dos grandes favores recebidos, pois fez todo seu curso gratuitamente, sem ao menos ter pago o diploma, como poderia ser verificado na scripta da Faculdade. [...] ...e os mesmos professores que o Sr. Bianor pretendeu alcunhar de immoraes, são os mesmo que sacrificavam seus interesses particulares, para o lecionar gratuitamente (UMA REUNIÃO tempestuosa na Congregação da Faculdade de Medicina, 17.01.1935). O fato é que a partir dali a Faculdade entraria em um período de transição quanto ao critério de escolha de seus docentes: se de um lado ainda existiriam por algum tempo aqueles catedráticos que “pulavam” de uma disciplina vaga para outra, por outro começariam os primeiros concursos, conforme cita o Relatório de 19359. Apenas no final daquela década os concursos se tornariam a única forma de alcançar a cátedra. O mesmo relatório apresenta um corpo docente novamente com diferenças tanto no nome das disciplinas como no dos professores. Observe-se que Gastão Vieira e Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Hilário Gurjão acabaram não migrando para as cátedras que almejavam. Professores Catedráticos Mário Midosi Chermont Antonio Marçal Juliano Pinheiro Lyra Sozinho Hermógenes Pinheiro José Alves Dias Junior Raymundo da Cruz Moreira Antonio Acatauassu Nunes Filho João Prisco dos Santos Oscar Pereira de Carvalho Gabriel Rodrigues de Souza Jayme Aben-Athar Dagoberto Rodrigues de Sousa Raymundo Mattos Cascaes Arthur França Antonino Emiliano de Souza Castro Camillo Henrique Salgado Lauro Antunes de Magalhães Agostinho Monteiro Orlando Lima Manoel Ferreira Bastos Deusdedit Coelho João Batista Penna de Carvalho Antonio Porto de Oliveira Carlos Arnobio Franco Othon Chateau Acylino de Leão Professores Substitutos Hilário Gurjão10 Gastão Vieira Pedro de Castro Valente Homero Taveira Lobato Sulpicio Ausier Bentes Professores Contratados Armando Appio de Moura Medrado Luis Romano da Motta Araújo Benedito Cavalleiro de M. Klautau Diógenes Ferreira de Lemos Physica Biológica Chimica Biológica Parasitologia Anatomia Humana (1ª parte) Anatomia Humana (2ª parte) Propedeutica Cirúrgica Microbiologia Clínica Gynecologica Pathologia Geral Pharmacologia Anatomia Pathologica Clinica Cirúrgica Infantil e Ortopédica Therapeutica Clinica Clinica Médica Clinica de Doenças Tropicaes Clinica Cirúrgica Clínica Urológica Medicina Legal Clinica Obstétrica Clinica Dermatológica e Syphiligrafica Clinica Ophtalmologica Clinica Neurológica Clinica Psychiatrica Técnica Operatória e Cirurgia Experimental Hygiene Clinica Propedeutica Medica Parasitologia Anatomia Humana Pathologia Geral Therapeutica Clinica Clinica Obstétrica Clinica Cirúrgica Therapeutica Clinica Physica Biológica Clinica Oto-rhino-larygologica Professores, cátedras e docências 161 Auxiliares de Ensino Antonio Magno e Silva Raymundo Reis de Carvalho Oswaldo Bezerra Medrado Luiz Corrêa Waldemar Walter Gonçalvez Armando de M. Maroja Inálio Martins de Castro Anísio Mendonça Maroja Clinica Médica Clinica Médica Clinica Cirúrgica Technica Operatória Anatomia Humana Microbiologia Chimica Physiologica Therapeutica Clinica Feliciano C. de M. Junior Clinica Obstétrica Professores em Disponibilidade Americo Vitruvio Gonçalves Campos Oswaldo Ferreira Barbosa Antonio Joaquim da Silva Rosado Dionísio Ausier Bentes Filogenio Lisbôa Physiologia Clinica Médica Clinica Ginecológica Physiologia Hystologia e Embriologia Geral (FMCP, 1936c, p. 12). 162 Note-se que naquele período o curso de Farmácia havia sido anexado a Faculdade de Medicina, sendo mencionados ainda os seguintes professores, privativos daquele curso: Joaquim Tavares Viana Antonio A. de Carvalho Brasil Raymundo Felippe de Souza Joaquim de Britto Pontes Manoel C. da Cunha Coimbra Henrique Esteves Pharmacia Chimica Chimica toxologica e bromatologica Chimica Analytica Pharmacognosia Pharmacia Galenica (FMCP, 1936c, p. 11) Chimica Orgânica e Biologica (FMCP, 1936c, p. 14) Já haviam falecido: Francisco Pondé, Renato Chaves, Otto Santos, Ophyr Pinto de Loyola, Geminiano Alves Coelho, Manoel Waldomiro dos Santos, Antônio Teixeira Mendes, Antônio Remígio de Castro Filgueiras, João Evaristo Silva, Izidoro Azevedo Ribeiro e Hygino Amanajás Filho, este último em 14 de julho de 1935 na cidade do Porto, em Portugal (FMCP, 1936, p. 13). No ano de 1938, com o falecimento de Camilo Salgado, diretor e catedrático de Clínica Cirúrgica, Prisco dos Santos é transferido para cátedra de Clínica Propedêutica Cirúrgica e Clínica Cirúrgica e Raimundo da Cruz Moreira fica como catedrático de Clínica Ginecológica. Pedro de Castro Valente aparece como catedrático de Fisiologia11, Henrique Moreira Esteves como de Química Biológica e Gastão Vieira chega à cátedra de Clínica Médica12. O professor de Terapêutica Clínica, Raymundo Mattos Cascaes não figura mais na lista (FMCP, 1939c). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 As demais alterações ficam por conta de: Docentes Livres Oscar Pereira de Miranda Clínica Propedêutica Médica Alberto Morais Farmacologia Auxiliares de Ensino Hermíno Pessoa Hygiene Pedro Lago da Costa Borges Ruy Pena Pondé José Maria Lins de V. Chaves Emidio P. de Albuquerque Terapêutica Clinica Clínica de Doenças Tropicaes e infecctuosas Clínica Obstétrica Clínica Prop. Cirúrgica e Clínica Cirúrgica (FMCP, 1939c). O ano de 1939 marcaria novas mudanças nas cátedras: entravam Luis Romano da Mota Araújo, em Terapêutica Clínica, e Alberto Pereira de Morais em Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil. No mesmo ano, em 25 de julho, faleceu Antônio Marçal, catedrático aposentado de Química Fisiológica, e que já havia sido substituído por Henrique Moreira Esteves (FMCP, 1940b). 163 Foto 24: Gabinete de Histologia. Professor Dr. Jayme Aben-Athar (no centro de gravata de borboleta) e alunos. Fonte: FMCP (1936, s.p.). Na lista de professores em disponibilidade acrescentou-se Raimundo F. de M. Cascaes e Homero T. Lobato, ambos em Terapêutica Clinica (FMCP, 1940b, p. 12). Os auxiliares de ensino eram: Hermínio Pessoa Pedro L. da Costa Borges Celso da Gama Malcher Raimundo do Vale Paiva Medicina Legal Terapêutica Clínica Clínica Otorrinolaringológica Clínica pediátrica Médica e Higiene Infantil Em 1940 a principal alteração no corpo docente se deu pelo falecimento do professor catedrático em disponibilidade de Clínica Ginecológica Antônio da Silva Rosado ocorrido em 5 de julho (FMCP, 1941, p. 5) e por uma turma de novos auxiliares de ensino: Ruy Romano da Silva Romariz Francisco Rosário Conte Afonso Rodrigues Filho Hermínio Pessoa Adriano Pereira Guimarães Celso da Gama Malcher Raimundo do Vale Paiva 164 Anatomia Humana 1ª Parte Fisiologia Terapêutica Clínica Medicina Legal Clínica Ginecológica Clínica Otorrinolaringológica Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil (FMCP, 1941, p. 12). Professor Contratado Amando Apio de Moura Medrado Clínica Cirúrgica Foto 25: Laboratório de Biologia parte interna dirigido pelo Prof. Dr. Antônio Acatauassú. Fonte: FMCP (1936, s.p.). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Apenas Hilário Gurjão e Sulpício Ausier Bentes figuram como professores substitutos de Parasitologia e Clínica Obstétrica respectivamente (FMCP, 1941, p. 11). Já no ano de 1941 Amando Apio de M. Medrado assume a cátedra de Clínica Cirúrgica, preenchendo a vaga de Camilo Salgado, sendo empossado em 30 de janeiro daquele ano. Os novos auxiliares de ensino eram Flávio de Brito Pontes (Obstetrícia), Honorato A. Neves (Microbiologia) e Álvaro Camelier (Clínica Cirúrgica) (FMCP, 1942b, p. 11-12). Saíam da lista Celso Malcher, Raimundo Vale Paiva e Hermínio Pessoa. No ano de 1942 Hilário Gurjão permaneceria como substituto de Parasitologia e Oscar Pereira de Miranda como Livre-Docente de Clínica Propedêutica Médica (FMCP, 1943b, p. 7). Auxiliares de Ensino Álvaro Camelier Agostinho Monteiro Filho Flávio de Brito Pontes Gervásio de Brito Melo Honorato de Albuquerque Neves Jaime Jacinto Teixeira Aben-Athar13 Luiz Tito de Castro Leão Rui Romano da Silva Romariz Olimpio da Silveira Filho Professores em Disponibilidade Americo Vitruvio de Gonçalves Campos Dionísio Ausier Bentes Filogenio Lisboa Homero Taveira Lobato Oswaldo Ferreira Barbosa Raimundo F. de Matos Cascaes Sulpicio Ausier Bentes Clínica Cirúrgica Medicina Legal Clínica Obstétrica Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas Microbiologia Histologia e Embriologia Geral Técnica Operatória e Cirurgia Experimental Anatomia Humana Farmacologia (FMCP, 1943b, p. 8) Fisiologia Fisiologia Histologia e Embriologia Geral Terapêutica Clínica Clínica Médica Terapêutica Clínica Clínica Obstétrica (FMCP, 1943b, p. 8) De março a agosto de 1942, o professor contratado Sandoval Rodrigues Cardoso assumiu a disciplina de Patologia Geral (FMCP, 1943b, p. 8). No ano seguinte (1943) Oscar Pereira de Miranda assume a cátedra de Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil com o falecimento de Alberto Pereira de Morais14. No quadro de auxiliares de ensino as modificações ficaram por conta da entrada de Domingos Barbosa da Silva na disciplina Clínica Pediátrica e Higiene Infantil e José Guilherme Cavaleiro de Macêdo em Patologia Geral, saindo Álvaro Camelier (FMCP, 1944b, p. 8). Professores, cátedras e docências 165 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. Em 1944, Rui Romano Romariz atingiria o grau de Docente Livre. Entre os auxiliares de ensino José Guilherme Cavaleiro de Macêdo passou para a disciplina de Fisiologia; entravam Silvio de A. Bentes em Clínica Médica (2ª cadeira), Mário Sampaio em Patologia Geral e José Rodrigues da Silveira Netto em Higiene e Medicina Preventiva. Saiu Agostinho Monteiro Filho (FMCP, 1945c, p. 8). No ano de 1945 a Faculdade perderia três catedráticos: faleceram em 16 de janeiro Othon Chateau, que respondia por Higiene e Medicina Preventiva, e em 13 de agosto Deusdedit Coêlho Duarte de Clínica Oftalmológica (FMCP, 1946b, p. 8); aposentou-se por motivo de saúde Antonino Emiliano de Souza Castro de Doenças Tropicais e Infectuosas (FMCP, 1946b, p. 11). Auxiliares de Ensino Artur Porto Marques Araci Barreto Alfredo Barroso Rebelo Domingos Barbosa da Silva Francisco Rosário Conte José Guilherme C. de Macedo José Rodrigues da Silveira Netto Luiz Tito de Castro Leão Mário Machado Sampaio Orlando Cerdeira Bordalo Orlando Rodrigues da Costa 166 Anatomia e Fisiologia Patológica Clínica Oftalmológica Medicina Legal Farmacologia Clínica Médica 2ª cadeira Fisiologia Higiene e Medicina Preventiva Técnica Operatória e Cirurgia Experimental Patologia Geral Clínica Ginecológica Parasitologia Paulo Cordeiro de Azevedo Microbiologia (FMCP, 1946b, p. 10) (FMCP, 1946b, p. 10). No mesmo prédio, hoje demolido, funcionou o serviço de Der matologia da UFPA Foto 26: Laboratório de Biologia – parte externa – Prof. Dr. Antonio Acatauassú (sentado no centro). No mesmo prédio atualmente funciona o serviço de Dermatologia da UFPA na Santa Casa de Misericórdia. Fonte: FMCP (1936, s.p.). Professores Contratados Benedito C. Macêdo Klautau Celso da Gama Malcher José Maria de V. Chaves Lucival Lage Lobato Clínica Neurológica Clínica Otorrinolaringológica Enfermagem Obstétrica Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas Em 22 de maio de 1946 faleceu Henrique Moreira Esteves professor catedrático de Química Fisiológica (FMCP, 1947b, p. 12), e assumia como catedrático de clínica Otorrinolaringológica Celso Malcher, assim ficando configuradas as cátedras: Hermógenes Pinheiro José Alves Dias Jr. Vaga Mário Midosi Chermont Vaga Vaga Antônio Acatauassú Nunes Filho Gabriel Rodrigues de Souza Oscar P. de Carvalho Juliano P. Lira Sozinho Acilino de Leão Rodrigues Manoel dos Santos Ferreira Bastos João Prisco dos Santos Carlos Arnóbio Franco Jayme J. Aben-Athar Lauro A. de Magalhães Amando Apio de Moura Medrado Vaga Artur Pinto França Luis Romano da Motta Araújo Agostinho de M. Monteiro Vaga Argemiro Orlando P. Lima Gastão Vieira Oscar Pereira de Miranda Raimundo da Cruz Moreira Vaga Antônio Porto de Oliveira João Batista Pena de Carvalho Dagoberto Rodrigues de Sousa Celso C. da Gama Malcher Anatomia Humana 1ª parte Anatomia Humana 2ª parte Histologia e Embriologia Geral Física Biológica Química Fisiológica Fisiologia Microbiologia Farmacologia Patologia Geral Parasitologia Propedêutica Médica Clínica Dermatológica e Sifiligráfica Clínica Prop. Cirúrgica e Clínica Cirúrgica Técnica Operatória e Cirurgia Experimental Anatomia e Fisiologia Patológica Clínica Urológica Clínica Cirúrgica Doenças Tropicais e Infectuosas Clínica Média 1ª Cadeira Terapêutica Clínica Medicina Legal Higiene e Medicina Preventiva Clínica Obstétrica Clínica Médica 2ª Cadeira Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil Clínica Ginecológica Clínica Oftalmológica Clínica Psiquiátrica Clínica Neurológica Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica Clínica Otorrinolaringológica (FMCP, 1947b, p. 9) Professores, cátedras e docências 167 Os demais professores eram: Professores Interinos Aracy Barreto Clínica Oftalmológica Benedito Cavaleiro de Macêdo Klautau Química Fisiológica Gervásio de Brito Melo Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas Os demais professores eram: Professores Interinos Aracy Barreto Benedito Cavaleiro de Macêdo Klautau Gervásio de Brito Melo José Guilherme Araújo Cavaleiro de Macedo José Rodrigues da Silveira Netto Clínica Oftalmológica Química Fisiológica Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas Fisiologia Higiene e Medicina Preventiva (FMCP, 1947b, p. 9) Professores Contratados Flávio de Brito Pontes Clínica Obstétrica José Maria Lins de Vasconcelos Chaves Enfermagem Obstétrica (FMCP, 1947b, p. 10) 168 Docentes Livres Luis Tito de Castro Leão Técnica Operatória e Cirurgia Experimental Orlando Cerdeira Bordalo Clínica Ginecológica Rui Romano Romariz Anatomia Humana (FMCP, 1947b, p. 10) Auxiliares de Ensino Alfredo Barroso Rebelo Artur Porto Marques Cláudio Mendonça Dias Domingos Barbosa da Silva Francisco Rosário Conte Lucival Lage Lobato Orlando Rodrigues da Costa Paulo Cordeiro de Azevedo Medicina Legal Anatomia e Fisiologia Patológica Clínica Urológica Farmacologia Clínica Médica 2ª Cadeira Patologia Geral Parasitologia Microbiologia (FMCP, 1947b, p. 10) Em dezembro de 1947 Aracy Barreto assumia a cátedra de Clínica Oftalmológica e Paulo Cordeiro de Azevedo passava a professor interino. Entre os auxiliares de ensino entravam Maurício Queima Coêlho de Sousa, em Terapêutica Clínica, e Rui Teles de Borborema em Microbiologia. Saiu Artur Porto Marques (FMCP, 1948c, p. 8-10). No ano seguinte (1948) a cátedra de Clínica Dermatológica e Sifiligráfica ficaria vaga com a morte de Manoel Ferreira dos Santos Bastos em 21 de dezembro. Naquele mesmo mês José da Silveira Netto faria concurso para a cátedra de Higiene e Medicina preventiva (FMCP, 1949b, p. 10). Domingos Barbosa da Silva tornava-se Livre Docente de Farmacologia. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 As demais listas de professores assim permaneciam: Professores Interinos Paulo Cordeiro de Azevedo Orlando Rodrigues da Costa José Guilherme Cavaleiro de Macedo Alfredo Barroso Rebelo Lucival Lage Lobato Gervásio de Brito Melo Benedito Cavaleiro de Macedo Klautau Auxiliares de Ensino Maurício Queima Coêlho de Sousa Rui Teles de Borborema Rui Ferreira dos Santos José Luis de Sousa Ferreira Microbiologia Parasitologia Fisiologia Medicina Legal Patologia Geral Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas Química Fisiológica (FMCP, 1949b, p. 10) Terapêutica Clínica Microbiologia Clínica Otorrinolaringológica Clínica Dermatológica e Sifiligráfica (FMCP, 1949b, p. 11) Professores Contratados José Maria Lins de Vasconcelos Enfermagem obstétrica (FMCP, 1949b, p. 11) Em 1949 três novos catedráticos prestariam concurso. Assim assumia a cátedra de Doenças Tropicais e Infecctuosas, Gervásio de Brito Melo; José Guilherme Araújo Cavaleiro de Macêdo a de Fisiologia; a de Química Fisiológica seria ocupada por Benedito Cavaleiro de Macêdo Klautau. Professores Catedráticos Hermógenes Pinheiro José Alves Dias Jr. Vaga Mário Midosi Chermont José Guilherme Cavaleiro de Macedo Benedito Cavaleiro de Macêdo Klautau Antônio Acatauassú Nunes Filho Gabriel Rodrigues de Souza Oscar P. de Carvalho Juliano P. Lira Sozinho Acilino de Leão Rodrigues Vaga João Prisco dos Santos Carlos Arnóbio Franco Jayme J. Aben-Athar Anatomia Humana 1ª parte Anatomia Humana 2ª parte Histologia e Embriologia Geral Física Biológica Fisiologia Química Fisiológica Microbiologia Farmacologia Patologia Geral Parasitologia Propedêutica Médica Clínica Dermatológica e Sifiligráfica Clínica Prop. Cirúrgica e Clínica Cirúrgica Técnica Operatória e Cirurgia Experimental Anatomia e Fisiologia Patológica Professores, cátedras e docências 169 Lauro A. de Magalhães Amando Apio de Moura Medrado Artur Pinto França Gervásio de Brito Mello Luis Romano da Motta Araújo Agostinho de M. Monteiro José Rodrigues da Silveira Netto Argemiro Orlando P. Lima Gastão Vieira Oscar Pereira de Miranda Raimundo da Cruz Moreira Aracy Barreto Antônio Porto de Oliveira João Batista Pena de Carvalho Dagoberto Rodrigues de Sousa Celso C. da Gama Malcher Clínica Urológica Clínica Cirúrgica Clínica Média 1ª Cadeira Doenças Tropicais e Infectuosas Terapêutica Clínica Medicina Legal Higiene e Medicina Preventiva Clínica Obstétrica Clínica Médica 2ª Cadeira Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil Clínica Ginecológica Clínica Oftalmológica Clínica Psiquiátrica Clínica Neurológica Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica Clínica Otorrinolaringológica (FMCP, 1950b, p. 11) Professores Interinos Lucival Lage Lobato Medicina Legal (FMCP, 1950b, p. 11) 170 Docentes Livres Luis Tito de Castro Leão Orlando Cedeira Bordallo Rui Romano da Silva Romariz Domingos Barbosa da Silva Paulo Cordeiro de Azevedo Orlando Rodrigues da Costa Guaraciaba Quaresma da Gama Abelardo Santos Alfredo Barroso Rabello Técnica Operatória e Cirurgia Experimental Clínica Ginecológica Anatomia Humana 3ª parte Farmacologia Microbiologia Parasitologia Clínica Cirúrgica Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil Medicina Legal (FMCP, 1950b, p. 11) Professor Substituto Hilário Gurjão Parasitologia (FMCP, 1950b, p. 12) Professores em Disponibilidade Oswaldo Ferreira Barbosa Clínica Médica Raimundo F. de M. Cascaes Terapêutica Clínica Homero T. Lobato Terapêutica Clínica (FMCP, 1950b, p. 12) Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Professores Falecidos Antônio José da Silva Rosado Antônio Marçal Antônio R. de C. Filgueiras Antônio Teixeira Mendes Filho Alberto Pereira de Moraes Deusdedit Coêlho Duarte Dionysio Ausier Bentes Francisco de Souza Ponde Filogênio Lisboa Geminiano A. Coelho Higino Amanajás Filho Henrique Moreira Esteves Izidoro Azevedo Ribeiro João Evaristo Silva Manoel Ferreira dos Santos Bastos Othon Cheteau Oto Santos Ofir Pinto de Loyola Renato Chaves da Silva e Souza Clínica Ginecológica Química Fisiológica Fisiopatologia Anatomia Descritiva 1ª parte Clínica Pediátrica Médica Clínica Oftalmológica Fisiologia15 Medicina Legal Histologia e Embriologia Geral Química Biológica Clínica Propedêutica Cir. e Clínica Cirúrgica Química Fisiológica Clínica Médica Histologia e Embriologia Geral Clínica Dermatológica e Sifiligráfica Higiene e Medicina Preventiva Clínica Cirúrgica Infantil e Ortopédica Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil Medicina Operatória (FMCP, 1950b, p. 12) O relatório de 1949 anuncia ainda mais dois concursos para catedrático, que seriam realizados somente no ano seguinte, e desta vez com uma novidade: mais de um candidato por vaga em ambos, coisa que nunca havia acontecido antes: Histologia e Embriologia Geral, que há mais de quinze anos permanecia sem catedrático16, enquanto os editais de concurso abriam e fechavam sem que houvessem inscritos, possuía agora dois candidatos: Mário Nazareno Machado Sampaio e Jayme Jacyntho Teixeira Aben-Athar. A outra cadeira era a de Clínica Dermatológica e Sifiligráfica a ser disputada por Domingos Barbosa da Silva e Rubem David Azulay. No caso de Histologia e Embriologia, Mário Sampaio sairia vencedor assumindo o cargo de professor catedrático; Jayme Jacyntho Teixeira Aben-Athar seria promovido a livre-docente(FMCP, 1951, p. 36). Como na ocasião Aben-Athar já era professor assistente daquela disciplina na Universidade do Paraná retornaria àquele estado (PARAENSE que revê a terra natal, 1950, p. 2). No concurso para Clínica Dermatológica e Sifiligráfica, que acabaria sendo realizado somente em plena década de 1950, quem teve o melhor desempenho tornado-se catedrático foi Rubem David Azulay. Já Domingos Silva ganharia apenas uma nova livre-docência. Azulay após a aprovação, imediatamente retornaria para o Rio, não ministrando nenhuma aula na Faculdade. Estivera aqui apenas para prestar o concurso visando somente a obtenção do título para aprimorar seu currículo. Deste Professores, cátedras e docências 171 modo, poucos anos depois Domingos Silva pode realizar novo concurso tornandose catedrático daquela disciplina (BECKMANN, 2006, p. 19-20). No ano de 1950 aconteceria a federalização, trazendo muitas vantagens para aqueles que durante anos trabalharam no Palacete Santa Luzia, tais como melhora nos vencimentos e direito à aposentadoria no sistema federal. Nada mais justo para os que se dedicaram tantos anos àquela instituição. Registre-se que curiosamente a federalização traria também até um catedrático que ficara diversas vezes de licença até perder o cargo (FMCP, 1947b, p. 10). Voltaria ele em 20 de dezembro de 1950 amparado por um mandato de segurança (FMCP, [1950]). Decididamente os tempos eram outros, agora ninguém queria ficar de fora...17 Na prática mesmo, a mudança nas cátedras naquele ano ficaria por conta da entrada de Mário Sampaio em Histologia e Embriologia, permanecendo vaga a cátedra de Clínica Dermatológica e Sifiligráfica, visto que o concurso acabou não acontecendo naquele ano (FMCP, 1951, p. 7). 172 Lucival Lage Lobato permanecia como professor interino de Patologia Geral, e Hilário Gurjão como professor substituto de Parasitologia. Entre os Docentes-Livres somavam-se Affonso Rodrigues Filho (Terapêutica Clínica), Flávio Brito Pontes (Clínica Obstétrica), Rui Ferreira dos Santos (Clínica Otorrinolarigológica) e Rui Teles de Borborema (Microbiologia) (FMCP, 1951, p. 8). A lista de professores falecidos também aumentaria naquele ano com a morte de Acilino de Leão em 27 de setembro e Gastão Vieira em 15 de outubro (FMCP, 1951, p. 29-30). Seguia assim o tempo em sua marcha inexorável. Este capítulo está longe de ser uma lista definitiva de professores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará de 1919 até 1950, dada a escassez documental que não permite a recriação do período sem lacunas. Também é necessário frisar que o corpo docente do Casarão da Generalíssimo seja analisado sem demasiado ufanismo. Houve sim grandes professores, notáveis clínicos, cirurgiões e cientistas. ...homens ousados, fortes, intrépidos e destemidos que assumiram o comando da Instituição, mantiveram um programa de trabalho e incluíram a Faculdade entre suas principais preocupações. Estes, sim, inscreveramse honrosamente nos anais do ensino (BECKMANN, 2003, p. 249). Se entrássemos na vida de cada um, além do risco de omissões, teríamos um livro de perfis biográficos que se distanciaria do objetivo deste trabalho18. Entretanto não deve ser esquecido que existiram também professores que deixavam a desejar; aqueles que, segundo ofícios enviados pelos alunos ao então diretor Camilo Salgado transformavam aulas práticas em teóricas e “por preguiça ou falta de tempo vae sabrecando com umas tintas theoricas e mal mastigadas que até provocam risos” (FMCP, 1932b). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Outro ofício sobre o mesmo professor afirma que “Com difficuldades pagamos nossas mensalidades e com tal professor não podemos deixar de asseverar que estamos sendo ludibriados” (FMCP, 1932b). É natural em um ambiente onde uns professores trabalham e outros não, que aqueles que produzem fiquem muitas vezes aborrecidos com este desequilíbrio, expressando sua insatisfação em sala de aula. Certa vez, em 1925, Ophyr de Loyola, durante uma aula de pediatria para alunos do 5º ano, teria dito que os professores da Faculdade eram embromadores. O caso chegaria à direção e Camilo Salgado, com sua habitual fidalguia e lucidez, repreenderia Ophyr de Loyola em ofício, embora, de certo modo, pelo teor do ofício, não discordando de todo da assertiva de Loyola, pois afinal: “...-haveis de concordar- nem todos são embromadores...” (FMCP, 1925b). NOTAS 1 Não confundir Camillo Salgado dos Santos com Camillo Henriques Salgado, vice diretor e posteriormente diretor da Faculdade. 2 Mesmo estando entre os professores nomeados naquele dia, Jayme Aben Athar não assinou a ata, perdendo a condição de fundador. Ele só assumiria o cargo em 12 de janeiro de 1924, sendo a cadeira de Anatomia Patológica ocupada no período inicial pelo cirurgião Prisco dos Santos. Mais detalhes sobre o assunto no capítulo “A Fundação da Faculdade de Medicina do Pará”. (N.A). 3 “O convite para a regência das cadeiras foi embasado no prestígio e no desempenho profissional dos interessados. Com raras exceções, foram desprezadas as especializações – em algumas áreas até inexistente, em outras incipientes – e não houve outra espécie de seleção” (BECKMANN, 2003, p. 249). 4 Trata-se de um provável erro, posto que em outras fontes o nome que aparece é Isidoro de Azevedo Ribeiro. (N.A). 5 ...reflexo da criação do Ministério da Educação e Saúde e centralização político administrativa do ensino superior. O ministro era Francisco Campos. Foi estabelecido o padrão de organização das instituições de ensino superior. [...] O corpo docente deveria se constituir de professores catedráticos – vitalícios, auxiliares de ensino – indicados pelos catedráticos, que estariam obrigados ao concurso de livre docentes – e de livre-docentes. Os Diretórios acadêmicos deveriam ser estabelecidos (GOMES; VARGAS; VALLADARES, 2001, p. 10). 6 Este professor que se encontrava em disponibilidade na cadeira de Clínica Dermatológica e Sifiligráfica retornou a Faculdade em 25 de maio de 1931 para reger Clínica Médica (2ª Cadeira). (FMCP, 1950). 7 Órgão já extinto, cuja história urge ser resgatada, e sem relação direta com o atual Sindicato dos Médicos do Pará. (N.A). 8 Ao contrário do que “Olivério” quer fazer crer, o caso dos catedráticos impostos por Getúlio Vargas gerava sim protestos no Rio como recorda Doyle Maia – “Durante a ditadura de Getúlio Vargas foi nomeado um professor sem prestar concurso. Houve reação dos alunos que fecharam as portas da Professores, cátedras e docências 173 174 Faculdade, colocaram uma escada apoiada numa janela e, aos gritos de que “quem não faz concurso, não entra pela porta, entra pela janela”, impediram o ingresso do professor. Após muitas negociações o caso foi resolvido entrando o professor pela porta, mas tendo o desprazer de caminhar até a Sala da Congregação atravessando um verdadeiro corredor polonês formado por alunos que o vaiavam” (MAIA, 1996, p. 142). 9 “O Conselho Técnico Administrativo determinou pelo prazo de seis mezes, a partir de 1º de dezembro, a abertura de inscripção para concurso de professores cathedráticos de Clínica Médica, Physiologia, Hystologia e Embriologia Geral, Clinica Pediátrica Médica e Hygiene Infantil e de Clinica Oto-rino-laryngologica, a encerrar-se no dia 1º de junho de 1936, conforme edital que tem sido regularmente publicado no Diario Official do Estado” (FMCP, 1936c, p. 33). 10 Também era interino de Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil (FMCP, 1936c, p. 10). 11 Assumiu em 17 de agosto de 1936 (FMCP, [1950]). 12 Assumiu em 17 de agosto de 1936 a cátedra de Clínica Médica (2ª cadeira) (FMCP, [1950]). 13 Não confundir com o pai Jayme Aben-Athar catedrático de Anatomia Patológica. (N.A.). 14 Ocorrido em 21 de setembro de 1941 (MORAES, 1992, p. 19). 15 Falecido em dezembro daquele ano era catedrático em disponibilidade de Fisiologia. (FMCP, 1950b, p. 15). 16 Era ocupada interinamente pelo catedrático de Anatomia Patológica Jayme Aben-Athar. (FMCP, 1949b, p. 9). 17 Guaraciaba da Gama, da turma de 1939, menciona em depoimento outro caso que teria ocorrido com um catedrático que havia ministrado aulas somente nos primórdios da escola e estava há muito em disponibilidade, domiciliado inclusive em outro estado, que teria retornado para reassumir seu posto para logo em seguida se aposentar. Com o diferencial que este último contaria com o aval da administração da Faculdade (GAMA, 2008). 18 Recomenda-se o trabalho de Clóvis Meira “Médicos de Outrora no Pará. Belém Ed. Grafisa. 1986”. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 12 Os Doutores e suas teses 175 176 Detalhe de azulejo de uma das paredes da FMCP. As chamadas “Teses de Doutoramento ou Inaugurais” apresentadas no final do curso médico foram introduzidas no Brasil pela reforma de 1832, quando as Academias Médico-Cirúrgicas da Bahia e do Rio de Janeiro passaram a ser denominadas Faculdades de Medicina. Sua apresentação era obrigatória ao final do curso, permanecendo assim até o primeiro quarto do século XX (RIBEIRO, 1997, p. 59). Nesta época, de acordo com Marcos Ribeiro, as teses encontravam-se em um período de franca decadência iniciado ainda no final do século XIX. Criadas para serem um instrumento de avaliação e estímulo à produção científica, haviam falhado em seus objetivos seja pela falta de experiência dos doutorandos para criar um trabalho original, por desinteresse dos estudantes que frequentemente copiavam ou encomendavam as teses ou ainda por negligência dos professores, que demonstravam ser excessivamente benevolentes com trabalhos de tão má qualidade (RIBEIRO, 1997, p. 64). A iniciativa de tornar a defesa de tese algo opcional pode ser encarada como uma tentativa agonizante de salvá-las partindo do princípio que somente aqueles estudantes realmente interessados as fariam. Entretanto, como tudo o que não é obrigatório para o acadêmico, as teses foram sendo gradativamente esquecidas. A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará surge exatamente neste período de descrédito das teses. Seu estatuto mais antigo, datado de 24 de fevereiro de 1921, menciona no capítulo XVII, Art. 225 que “É obrigatoria a defeza da these como prova final, aos alumnos que completarem o Curso de Medicina...” (FMCP, 1933a, p. 43), com seu Regimento Interno, de 4 de janeiro de 1924, mantendo tal obrigatoriedade1. Já o regimento de 1926 coloca a defesa de tese como opcional para aqueles que desejassem receber o título de “Doutor em Medicina”; os que não apresentassem receberiam somente o diploma de médico (FMRJ, 1926, p. 19, Art. 54). O doutorando interessado em defender tese pagaria uma taxa de inscrição de 300$000 e deveria apresentar 60 exemplares ao diretor da Faculdade (FMRJ, 1926, p. 20). Este enviaria o trabalho para uma comissão de ensino que daria um parecer sobre o seu valor. Se o parecer fosse favorável, o candidato poderia defender a tese diante da Congregação (FMRJ, 1926, p. 20). Caso contrário, o autor poderia apresentar uma nova tese somente um ano depois (FMCP, 1924b, p. 15). O estatuto de 1924 menciona ainda que a Congregação nomearia uma banca examinadora composta por 3 professores, sendo pelo menos um catedrático. Cada professor poderia argüir o candidato por vinte minutos (FMCP, 1924b, p. 16). O julgamento da tese seria baseado no mérito do trabalho e nos conhecimentos exibidos pelo doutorando durante a defesa (FMCP, 1933a, Art. 237, p. 44), cujo resultado final poderia ser “aprovado com distinção”, “aprovado plenamente”, “aprovado simplesmente” ou “reprovado” (FMCP, 1933a, Art. 237, p. 45). Os doutores e suas teses 177 O dia da defesa de tese reunia em torno de si um cerimonial somente comparável à colação de grau. O diretor e os examinadores deveriam se dirigir “à sala dos Actos Solemnes com as insignias de seu grao e subindo ao doutoral o Director tomará o primeiro assento, seguindo-se os lentes cathedraticos e substitutos na ordem de antiguidade” (FMCP, 1933a, Art. 241, p. 45). Em seguida os candidatos eram recebidos à porta pelo Secretário que os acompanhava aos seus lugares no lado direto da sala onde ficava a banca examinadora (FMCP, 1933a, Art. 242). De acordo com os relatórios apresentados à Congregação do ano de 1944 e 1945 as teses apresentadas na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará foram: 1924 Antônio Magno e Silva Etio-patogenia das cirroses do fígado Bianor Martins Penalber Contribuição ao estudo do tratamento da filariose Hippolito Carelli Higiene da tuberculose entre nós Honorato Remigio de Castro Filgueiras Docimasia Pulmonarmétodo Icard-Davilla 178 1925 Antonio Siqueira Mendes Contribuição à profilaxia do paludismo na Amazônia Antonio Barbosa Rodrigues Contribuição ao estudo da Proteinoterapia específica Isauro Gonçalves da Costa Contribuição ao estudo do alcoolismo no Estado do Pará Jorge Alves Maia Prenhez tripla em mulher tuberculosa Manuel Tertuliano de Cerqueira A Patogenia das icterícias 1926 Almir Pedreira Considerações em torno de duas operações cesareanas Aguinaldo Alves Dias Infecção Puerperal Edgar Bentes Rodrigues Dos Abscessos ditos de fixação. Seu valor quando oportunamente provocados. José Colier Cavalcante Patogenia dos edemas nas nefrites cloretemicas Raimundo Ferro e Silva A cura radical da hidrocele vaginal pelo processo Camilo Salgado Raimundo da Silva Magno Terapêutica cirúrgica da litíase biliar Waldemar Freitas Ribeiro Sinal de Argyll-Robertson Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 1927 Edgardo Rôxo Pereira Roberto Monteiro Lopes Guimarães Sebastião Francisco de Melo Junior Theodoro Maria de Sousa Aranha Histerorexis expontanea Causas prováveis de tuberculose no Pará Nefrose Lipoídica Considerações em tôrno de um caso de hematometria 1928 Antonio Simões Pereira Mortalidade infantil em Belém Carlos Higino da Silva Medicações reativantes e esterilizantes do Paludismo Edgar Antunes Salgado Das oportunidades cirúrgicas para o emprego da opsonoterapia Eugenia Ferreira de Paiva Holanda Considerações gerais sobre a sífilis Estrela Zaguri Benaion As afecções do naso-faringe como fator predisponente no desenvolvimento das pseudo-tuberculoses e tuberculoses Felix Bessa de Oliveira Bubão poredenico Gentil Eloi de Figueiredo Do valor da Higiene Olga Maia Pais de Andrade Molestia de Recklinghausen 1929 José Teófilo Ferreira Etio-patogenia da demencia precoce João Siqueira Mendes Tratamento da magreza e do emagrecimento pela insulina Raimundo Avertano Barreto da Rocha Etiologia, Psico-patogenia e Sintomatologia do Tédio mórbido; seu tratamento e profilaxia 1930 Anísio de Mendonça Maroja O problema da Tuberculose em Belém Armando Bordalo da Silva Das vitaminas e das avitaminoses Epaminondas de Paiva Menezes Cura radical da Hidrocele vaginal pelo processo cirúrgico de V. Pauchet Lucidéa Lage Lobato Biotropismo Oscar Pereira de Miranda Do pneumotórax artificial na cura da Tuberculose Pulmonar Os doutores e suas teses 179 1931 Honorato de Albuquerque Neves Da Sífilis Cardio-Vascular e seu tratamento pelo “Neo-Salvarsan” Roberto Candido Pereira Do Germen de Friedmann, sua morfologia, biologia, poder patogênico, ação profilática e curativa. 1933 Armando de Mendonça Maroja Sedimentação dos Eritrócitos e sua importância em Medicina Alderico de Oliveira Costa Contribuição ao tratamento cirúrgico da Varicocele (Processo Dr. Zeferino Vaz) 180 1943 Jaime Jacinto Teixeira Aben Athar Mielopoiése Esplênica Comparativa – contribuição para o estudo dos focos mielóides do baço em várias espécies de mamíferos silvestres, domésticos e de laboratório com especial referência aos megacariócitos (FMCP, 1945. Mapa 7). 1945 Luiz Gonzaga Pires Anemia Verminótica – Contribuição ao seu estudo na Amazônia (FMCP, 1946. p. 29). Fica claro na listagem o crescente desinteresse na apresentação de teses de doutoramento a partir dos anos de 1930, não sendo encontrado nenhum registro de defesa de teses entre 1946 e 1951, o que leva a crer que o título de “Doutor em medicina” não fazia muita diferença em termos profissionais naquele período. Somado a isso, na reunião do Conselho Técnico Administrativo de 28 de setembro de 1931, o professor de microbiologia Acatauassú Nunes Filho lembrou que por não ser mais a defesa de tese algo obrigatório, o conselho “não deveria ser demasiado benévolo e assim aceitar somente as teses que estivessem dentro dos referidos parâmetros” (CTA, 1933), ideia compartilhada por outros professores como Acylino de Leão que acreditava que só deviam ser aceitas as teses que fossem “consideradas como afirmação da capacidade científica do candidato a título de doutor” (CTA, 1933). Essa maior rigidez certamente foi outro fator determinante para a extinção das mesmas. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. Anos depois, seguindo um modelo diferente, a defesa de um trabalho científico retornaria como item obrigatório para a conclusão do curso médico da UFPA recebendo o nome de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) . Entretanto ainda que possuam inquestionável valor na formação acadêmica, muitos TCC spadecem hoje do mesmo mal que decretou a decadência e desaparecimento das “Theses”. Mais ou menos no mesmo período em que as teses dos doutorandos se extinguiam, as teses dos professores começaram a aparecer no Largo de Santa Luzia, para concurso de Livre-docente ou de Catedrático. A Faculdade já possuía cerca de quinze anos quando foram realizados os primeiros concursos para professores, posto que na sua fundação os cargos foram preenchidos por nomeação. Os auxiliares de ensino, após dois anos, deveriam submeter-se a concurso para Livre-docentes, o que entre outras coisas exigia uma defesa de tese. De acordo com Ernesto Gondim Godim Leitão, as teses para livre-docência defendidas na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará até 1950 foram: 1) Oscar Pereira de Miranda — Do pneumotórax artificial no tratamento da tuberculose pulmonar, 1934. 2) Ruy Romano da Silva Romariz — Contribuição ao estudo topográfico das regiões femoro-ingüino-crural e glútea femural, 1943. 3) Orlando Cerdeira Bordallo — Aspectos da profilaxia do câncer cérvico-uterino, 1945. 4) Luiz Tito de Castro Leão — Contribuição do estudo das hérnias ingüinais, 1946. 5) Domingos Barbosa da Silva — BAL (British antilewisite), 1947. 6) Guaraciaba Quaresma Gama — O levantar precoce nos operados do abdome, 1947. 7) Alfredo Barroso Rebello — Aspecto médico legal das intoxicações do timbó, 1948. 8) Abelardo Santos — Considerações sobre a inapetência infantil, 1948. 9) Paulo Cordeiro de Azevedo — Algumas considerações sobre a micose de Jorge Lobo, 1948. 10) Affonso Rodrigues Filho — Contribuição ao estudo das colecistopatias em Belém, 1948. 11) Emidio Pedreira de Albuquerque — Contribuição à cura das hérnias recidivantes pelo processo da mioplastia do costureiro, 1949. 12) Flávio de Britto Pontes — Ruturas uterinas, 1949. 13) Orlando Rodrigues da Costa — Contribuição ao conhecimento da incidência dos helmintos e protozoário na Amazônia, 1949. 14) Ruy Telles de Borborema — Contribuição ao estudo do fator RH, 1949. 15) Ruy Ferreira dos Santos — Contribuição ao tratamento cirúrgico da tonsilite crônica, 1950 (LEITÃO, 1985, p. 55). O concurso para a cátedra de também previa a defesa de uma tese que seria apresentada diante de: ...uma comissão de cinco membros, que deverão possuir conhecimentos aprofundados da disciplina em concurso, dos quais dois serão indicados pela Os doutores e suas teses 181 Congregação e três outros escolhidos pelo Conselho técnico-administrativo dentre professores de outros institutos de ensino superior ou profissionais especializados de instituições técnicas ou científicas (BRASIL, 1931). Se no concurso para Livre-Docente os membros escolhidos pelo Conselho Técnico Administrativo eram normalmente especialistas locais, para catedráticos o rigor costumava ser maior, sendo comum a vinda de professores de outras faculdades de medicina do Brasil para compor a banca examinadora. 182 Ainda de acordo com Gondim Leitão, a lista de teses para cátedra apresentadas na Faculdade até 1950 é a seguinte: 1) Gastão Vieira — Considerações sobre a lithiase biliar. Cátedra de Clínica Médica, 3ª Cadeira, 1936. 2) Alberto Pereira de Morais — Doenças de carência na infância. Cátedra de Clínica Pediátrica e Higiene infantil, 1938.4 3) Armando Appio de Moura Medrado — Considerações acerca do abcesso subphrenico de origem apendicular e seu tratamento. Cátedra de Clínica Cirúrgica, 1ª Cadeira, 1939. 4) Celso Cunha da Gama Malcher — As sinusites maxilares crônicas. Estudo de sua etio-patogenia e indicação terapêutica no conceito moderno. Tese de Cátedra de Clínica Oto-Rino-Laringológica, 1942. 5) Oscar Pereira de Miranda — Ensaio clássico sobre tuberculose infantil; dados estatísticos sobre a tuberculose em Belém. Tese de Cátedra, 1942. 6) José Rodrigues da Silveira Netto — Aspectos da higiene mental na infância. Cátedra de Higiene e Medicina Preventiva, 1946. 7) José Guilherme Araújo Cavalleiro de Macedo — Contribuição ao estudo da função fisiológica do timo.Cátedra de Fisiologia, 1947. 8) Aracy Amazonas Barretto — Glaucoma Verum. Cátedra de Clínica Oftalmológica, 1948. 9) Benedito Cavaleiro de Macedo Klautau — Sobre o descenso da glicose sangüínea. Tese de Cátedra de Química Fisiológica, 1949. 10) Gervasio de Britto Mello — Filariose. Cátedra de Clínica de Doenças Tropicais e Infecciosas, 1949. 11) Mário Nazareno Machado Sampaio — O Pulmão; com especial referência ao estudo do alvéolo pulmonar. Cátedra de Histologia e Embriologia, 1949. 12) Domingos Barbosa da Silva. Dermatoses carênciais na infância. Cátedra de Dermatologia, 1949. 13) Ruben David Azulay. Contribuição ao estudo da micose de Lutz, Cátedra de Dermatologia, 1950. 14) Jaime T. Aben-Athar. Variações cíclicas das glândulas cutâneas, Cátedra de Histologia, 1950. Numa análise superficial as teses da Faculdade, em sua maioria, constituem-se no que hoje é denominado “revisão bibliográfica”, correspondendo a textos que bus- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 cam trazer atualizações sobre um determinado tema revisando o que existe de consistente na literatura mais atual. Beckmann (2006, p. 19) assim as definiu: De modo geral, tratavam-se de trabalhos monográficos finalizados por uma série mais ou menos extensa de observações clínicas, cirúrgicas, anatomo-patológicas, laboratoriais ou radiológicas que haviam servido de supedâneo à exposição. A ausência de um bom embasamento bibliográfico era também constante. Entretanto não se pode julgar a produção científica da época sob um ponto de vista contemporâneo, quando um trabalho de revisão é rapidamente concluído através de pesquisa via internet no que existe de mais atual nos grandes periódicos médicos mundiais sem sair de casa. Deve-se lembrar que naquele período as revistas médicas eram poucas, nem sempre de fácil obtenção, ainda mais levando em conta que Belém era e ainda é uma cidade muito distante dos grandes centros médicos nacionais. Outro fator que impedia a produção de trabalhos baseados em pesquisas experimentais que pudessem de fato iniciar a produção de um conhecimento genuinamente local e não uma simples reprodução de doutrinas, era a escassez de tempo para elaboração das teses conforme afirma Doyle Maia (1996, p. 143): De qualquer modo, 45 ou 24 dias eram absolutamente insuficientes para a elaboração de qualquer trabalho original, dando oportunidade ao candidato somente de mostrar sua capacidade de exposição e síntese. Por esse motivo as teses da época eram, em geral pequenas, e excediam-se em assuntos não diretamente relacionados com o tema. Com todos os defeitos que se lhes possa encontrar, o valor das teses é inquestionável, pois serviam como fonte de atualização sobre os mais diversos temas médicos numa época em que a literatura técnica era muito restrita. Infelizmente é possível que a lista apresentada neste capítulo esteja incompleta. Após tantas reformas e descaracterizações na Faculdade de Medicina muita coisa se perdeu; a coleção de “theses” que a Biblioteca Central da UFPA possui é muito pequena; na biblioteca setorial do Instituto de Ciências da Saúde não existe nenhum exemplar. Salvo algumas em coleções particulares ou na Sociedade MédicoCirurgica do Pará, a grande maioria das teses defendida até 1950 é dada como desaparecida restando como consolo apenas o registro de seus títulos. Um fim melancólico de mais uma parte importante de nossa história médica. Os doutores e suas teses 183 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. NOTAS 1 “Capítulo V - Da defesa de these. Art. 55º - Os alumnos que concluirem o curso medico deverão defender these sobre assumpto á sua escolha dentre as materias ensinadas no referido curso” (FMCP, 1924b, p. 15). 2 Atualmente os Trabalhos de Conclusão de Curso da Faculdade de Medicina da UFPA são apresentados em um evento que recebe o nome de “Jornada Acadêmica Ronaldo de Araújo”. 3 Ver Capítulo “Professores, Cátedras e Docências”. 4 As Teses de número 2, 12 e 13 não figuram na lista de Ernesto Gondim Godim Leitão, sendo localizada sua referência em http://www.sibi.ufpa.br/Portal/ DTD/ICS.htm. Acesso em 26.03.2008. A tese 14 foi localizada em Estado do Pará, 23 de fevereiro de 1950, p. 2. 184 Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 13 A Manutenção Financeira 185 186 Detalhe de azulejo de uma das paredes da FMCP. Os primeiros tempos foram bastante difíceis para a Faculdade de Medicina do Pará, especialmente no que se refere à sua sustentação financeira, incluindo a remuneração dos professores, quase todos profissionais de relevo na sociedade. Em principio, a Faculdade seria mantida com o dinheiro do pagamento das mensalidades e das demais taxas, como as de inscrição para as provas de habilitação ao curso, taxas de matrícula, taxas para as provas durante o curso, transferência, liberação de documentos e diplomas, conforme o Relatório de 19381. Além disso, outras fontes seriam buscadas, como doações, subvenções oficiais do governo estadual e da Intendência municipal, para fazer frente às despesas, entre as quais se incluía a taxa de remuneração do Inspetor, responsável pela fiscalização de escola após a equiparação, e que em 1925 era de 12:000$000 anuais, mais ou menos equivalente à remuneração de um professor catedrático (BRASIL, 1925). O próprio governador Lauro Sodré, na mensagem governamental de 1920, assim se manifestava quanto a auxiliar a Faculdade: Desde que possa o Estado dispôr de recursos, bom será que sejam votados auxílios que permittam dar a essa instituição melhores recursos, quaes exigirá o ensino que nella se ministra, e que difficilmente poderão ser obtidos de particulares, em terra que não abundam gentes ricas nem é grande o rol dos capitalistas abastados (PARÁ. Governador (1917-1921: Lauro Sodré, p. 63). Lauro Sodré, quando no exercício da atividade de senador, procurou ajudar financeiramente a nova escola. Em carta de 25 de janeiro de 1923, endereçada a Camilo Salgado por ocasião da campanha para a compra do prédio da Faculdade, revela sua iniciativa em conseguir ajuda financeira do governo federal e a discriminação sofrida pelo Norte2. Deve-se levar em conta que mesmo as subvenções oficiais nem sempre eram pagas com regularidade, gerando mais instabilidade financeira para a Faculdade, que vivia no impasse em precisar crescer para oferecer cursos de qualidade e deste modo firmar seu nome, e também honrar seus compromissos tanto com o corpo docente quanto com funcionários e fornecedores, além das despesas gerais de manutenção3. Desde os seus primeiros dias a Faculdade recorreu a doações, haja vista a compra do prédio4. No primeiro Relatório da Faculdade sob sua direção, Camilo Salgado revela que a despeito da “situação precária embaraçosa” do Estado Temos no thezouro do Estado pouco mais de vinte contos de reis e, felismente, para solver os nossos compromissos, conseguimos, exclusivamente, a coadjuvação valiosa de particulares, que são filhos e têm interesses neste Estado, sem falar na contribuição dos alumnos (FMCP, 1923c, p. 12). Ao agradecer ao tesoureiro, sr. Vicente Ferreira de Hollanda, Camilo informa que de 1919 a 1922 a receita havia atingido 86:002$910 e a despesa 84:551$782, com o ativo chegando a 78:684$448 e o passivo a 6:910$384, evidenciando um saldo de A manutenção financeira 187 71:738$064, ainda que reclamando da falta de auxílio dos Governos Federal e Estadual5. Talvez por isso é que os dirigentes da Escola tiveram a ideia de enviar às Intendências municipais uma circular solicitando ajuda financeira à Faculdade, ideia apresentada ao Intendente Municipal de Belém Dr. Cypriano Santos6. Por seu significativo valor, transcrevemos na íntegra o ofício circular datado de 18 de setembro de 1923. 188 Faculdade de Medicina e Cirugia do Pará Belém, 18 de setembro de 1923 Ilm. Snr. Intendente Municipal Venho renovar o appello que ha alguns annos, na phase mais embryonaria da Faculdade de Medicina, fiz aos gestores dos municipios paraenses, em pról desse estabelecimento, cuja manutenção, com sacrificios que só Deus o sabe, é motivo de orgulho para a nossa terra, ao lado de constituir um eloquente attestado da nossa cultura e da nossa civilisação. Cumpre que todos os que amam entranhadamente este pedaço da Amazonia e pedaço tambem do Brazil, se congreguem para fortalecer esse monumento magnifico que é a Faculdade de Medicina do Pará. Urge, sim, para tornal-a mais efficiente e mais bem apparelhada, que todo o amparo lhe seja proporcionado, principalmente da parte dos municipios do nosso Estado, que são, em verdade, os mais compensados pelos fructos dessa obra tão grandiosa. A expressão “sanear para povoar” do eminente Snr. Dr. Washington Luiz, deve ser bem reflectida pelo patriotismo dos que estão á testa das nossas municipalidades. A affirmativa vibrante do preclaro chefe da Nação, representa uma verdade crystalina: - não póde haver povoamento sem que preliminarmente se registe o saneamento. E a vasta extensão territorial do Pará reclama, mais do que qualquer outro Estado, auxilio de braços, mas aos quaes precisa ser assegurado o elemento essencial da felicidade humana – a saúde. Bem sabeis que o medico é o factor de que precisaes para esse desiderato. O Pará, especialmente o seu interior, ainda em grande parte insalubre, esmagado pelo paludismo e pelas verminoses, tem necessidade de homens de sciencia, que substituam o chalatanismo e cooperem para a hygidez do povo. Salientando-vos essa necessidade e esse indeclinavel dever de patriotismo, é que appelamos novamente para que auxilieis pecuniariamente e annualmente a Faculdade de Medicina de que sou director, fazendo votar pelo respectivo Concelho Municipal a verba que julgardes acertada e dando disso conhecimento, com a brevidade possivel, á minha pessoa, que vos antecipa sinceros agradecimentos7. Ainda no seu primeiro Relatório Camillo destacava a confirmação de municípios que haviam incluído em seus orçamentos auxílio para a Faculdade, mencionando que faltavam cerca de trinta municípios, que embora tendo se comprometido, ainda não haviam enviado o documento oficial8. No total, a Faculdade esperava alcançar “uns cincoenta contos de reis, graças á intervenção valorosa do illustre actual goMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 vernador do Estado, que merece de nós toda a gratidão” (FMCP, 1923c, p. 12). Vários foram os ofícios enviados pelas prefeituras municipais – na ocasião, denominadas intendências – dando conta da sua participação em tão nobre causa, qual seja a manutenção da Faculdade de Medicina. Contanto que já em março de 1923, Camillo Salgado acusa o recebimento de ofício do Intendente Municipal de Altamira dando conta da consignação de verba no valor de 1.200$000, por aquela Intendência, “em auxilio desta Faculdade”, consignada na lei orçamentária de 20 de outubro de 1922. No ofício a Altamira Camillo enaltece a Faculdade, para ele merecedora do auxílio por seu valor científico, certo de que ela será “o ostentaculo que engrandecera o nosso Estado”. Ofícios com o mesmo teor foram enviados aos municípios de Monte Alegre, Portel, Cachoeira e Quatipuru e outros mais, que contribuíram com quantias variando de 150$000, 300$000, 500$000 até 600$000. Embora não esteja explicito no ofício circular solicitando ajuda, algumas correspondências recebidas pela Faculdade demonstram que, em função das doações, as Intendências tinham o direito de indicar alunos para estudar às custas do município que fizera a dotação orçamentária. A Intendência Municipal do Moju, por exemplo, apresenta, em 9 de março de 1926, determinado estudante, “que se pretende matricular nesse util Estabelecimento, na vaga destinada a este municipio”. Sobre o mesmo assunto trata o ofício datado de 30 de março de 1923 “por proprio punho escripto” por Camillo Salgado e endereçado ao Dr. Cypriano José dos Santos, Intendente Municipal de Belém. No documento é informado que a Intendência de Belém teria à sua disposição uma vaga “para a qual indicará um estudante, que a aproveitará sem dispendio de especie alguma”. Camillo diz ainda que a resolução é um sinal de gratidão a quem vem “cooperando na elevação daquelle Instituto”. E pede que o Intendente aceite a oferta, que é “desvaliosa, mas tem uma significação muito alta: a sinceridade de que se reveste e característica de todos os meus actos”. Quando as Intendências não indicavam nenhum aluno a doação revertia para a Faculdade. É o que trata o ofício de 15 de janeiro de 1927, endereçado ao Intendente de Breves acusando o recebimento da lei orçamentária para o ano de 1927, “onde está consignada a verba de 600$000 em benefício da Faculdade. Seja por parte da Faculdade, seja pelas Intendências, o pedido de doações originou alguns ofícios interessantes, que aqui registramos alguns, sem seguir uma sequência cronológica, como o enviado ao Delegado de Monte Alegre, em 11 de junho de 1923, quando Camillo Salgado informa não ser possível matricular, como candidato do citado município, determinado estudante no 4º ano porque, embora houvesse uma verba de subvenção, esta ainda não havia sido liberada para a Faculdade. E diz que estará pronto a aceitar o candidato, “uma vez comprida essa exigencia”. A manutenção financeira 189 Igarapé Açu recebeu seu ofício, de 13 de junho de 1923, onde Camillo Salgado diz deixar de atender o candidato apresentado, “porquanto o municipio ainda não votou uma verba especial para satisfazer as despesas de vosso candidato” e que sua conduta se prende ao dispositivo por ele firmado “que só terá direito a vaga o Municipio que contribuir annualmente com a importancia necessaria ao custeio das despezas feitas pelo candidato”. Ofício da Intendência de Alenquer, em 16 de setembro de 1925, dava conta que a quantia de seiscentos mil réis constante do orçamento daquele município reverteria em favor de determinado aluno nominado no documento. Entretanto, o ofício solicita urgente pagamento da quantia “para não ser prejudicado o referido alumno”. Para a Intendência de Bragança foi encaminhado, em 14 de outubro de 1926, documento dando conta que embora aquela intendência houvesse indicado um aluno para ocupar a vaga de um outro que era mantido pela citado município, o novo candidato poderia ser prejudicado uma vez que a Faculdade ainda não havia recebido a importância devida, não podendo o candidato ser inscrito nos exames de 1ª época, “se essa Intendencia não entrar com a importancia respectiva”. 190 O mesmo município seria informado em 7 de abril de 1927 do recebimento do ofício de apresentação de aluno para ocupar a vaga a que o municipio tinha direito. E acrescenta que “devido ás difficuldades financeiras, o snr. Dr. Director pede vênia a V. S. para solicitar a fineza de mandar satisfazer esse pagamento no mais breve tempo possivel”. Na mesma data foi expedido ofício para Muaná. A Faculdade informava haver recebido a importância de trezentos mil réis, insuficientes para o candidato daquele município inscrever-se para os exames. Para Altamira, em abril de 1927, dando conta do recebimento do ofício daquela Intendência revertendo o benefício para dois alunos nominados no dito documento, com a subvenção votada pelo conselho daquela cidade. A Faculdade solicita a remessa da lei que aprovou a doação e alerta que “a subvenção para dois alumnos deve ser pelo menos de dois contos de reis”9. Quer dizer, diferente do ofício circular que fala na “verba que julgardes acertada”. Em um outro ofício para a mesma Intendência, este de 11 de julho de 1929, a diretoria da Faculdade acusa o recebimento da lei orçamentária daquele município, com a consignação de dois mil contos de réis, “em beneficio porém dos alumnos, candidatos de V. Sa. e do exmº. Snr. Senador José Porphirio”. E diz que para receber o dinheiro, “de que muito necessita actualmente a Faculdade para reparos urgentes e inadiáveis”, seria necessário oficiar ao Diretor da Recebedoria de Rendas do Estado, “ordenando o pagamento pela forma que melhor lhe aprouver”. Ainda para Altamira foi endereçado ofício em 3 de julho de 1928 remetendo uma prestação de contas das despesas com determinado aluno, certamente com os es- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 tudos custeados por aquele município. O documento detalha as despesas servindo também para ser ter uma ideia dos valores cobrados pela Faculdade: Mensalidades: de abril a novembro a 75$000 (8) Matricula Inscrição para exame Total 600$000 140$000 125$000 865$000 O documento lembra ao gestor de Altamira que no ano anterior (1928) havia estudado por conta da Intendência do citado município um aluno indicado pelo senador José Porphirio de Miranda Junior, que não tinha tido sua situação regularizada até aquela data, sendo solicitado providências. Em outro ofício, de 12 de dezembro de 1929, à mesma Intendência, é informado ser a referida “a unica que deixou de officiar ao snr. Director da Recebedoria de Rendas do Estado, autorisando o pagamento da subvenção votada”, em benefício da Faculdade de Medicina. Prossegue dizendo que o Diretor espera que o Intendente “se dignará a mandar por nosso intermedio o referido officio a fim de que possa ser a citada subvenção recebida”. Em outra correspondência, de 16 de setembro de 1925, endereçada ao Intendente de Alenquer, a Direção da Faculdade lembra que a referida intendência havia subvencionado a Escola, no orçamento daquele ano, com a quantia de seiscentos mil réis, que reverteriam em benefício de determinado aluno. Na oportunidade solicitava o “urgente pagamento para não ser prejudicado o aluno”. Para Igarapé Açu é enviado documento em 26 de janeiro de 1927 acusando o recebimento de ofício daquela Intendência sobre concessão de auxílio para matrícula de determinado aluno. O secretário da Faculdade comunica que a Diretoria aceitará o candidato “depois que essa Intendencia saldar com os cofres desta Faculdade compromissos anteriores, provenientes de auxilios votados pelo mesmo conselho e até hoje não recebidos”. A Intendencia do Mujú (sic) recebe interessante ofício, datado de 28 de maio de 1929, onde, em nome do Dr. Camillo Salgado, Diretor da Faculdade e “conscpicuo membro da comissão executiva do P.R.P., presidente do Senado e Vice-Governador do Estado” é solicitado, pela segunda vez, a remessa da lei orçamentária do referido município. O secretário, signatário do ofício, espera que, não em atenção à sua pessoa, “mas em consideração ao referido senador, eminente presidente do senado” que fosse atendida a solicitação. Portel recebe, em 10 de junho de 1929, ofício cobrando “pela segunda ou terceira vez” o envio à Recebedoria de Rendas autorização para o pagamento da subvenção daquela Intendência à Faculdade de Medicina. A manutenção financeira 191 Endereçado à Intendência de Curralinho, o ofício de 9 de maio de 1927 dá conta do recebimento da apresentação de determinado aluno “para occupar a vaga ‘concedida a esse Municipio’”. Entretanto, o secretário da Faculdade, que assina o ofício da mesma, diz não ter ainda o Diretor recebido a lei orçamentária do referido município e pede que seja informado o valor da subvenção, “que não deve ser inferior a um conto de réis, para o candidato de V. S. gosar de todas as regalias neste Instituto de ensino Superior”. O município de Quatipuru também é “contemplado” com ofício de cobrança. Data do de 13 de fevereiro de 1929, o secretário da Faculdade acusa o recebimento de ofício de apresentação de determinado candidato à matricula no primeiro ano na vaga de competência do citado município. A Faculdade diz ignorar qual seja a vaga, “pois a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará não tem infelizmente recebido auxilio algum do município”. E avisa que a importância para aquele ano letivo “orça em 865$000”. A Intendência de Belém também recebia seus ofícios. Em 4 de novembro de 1926 é endereçado ao dr. Paulo Eleutério, secretário da Intendência de Belém ofício com a lista dos estudantes mantidos pela referida prefeitura e informando não haver vagas a preencher, “havendo mesmo superlotação”. 192 Em abril de 1927 é informado ao Intendente de Belém que duas alunas que ocupavam vagas bancadas pela citada Intendência haviam passado a estudar por conta da Faculdade, “ficando assim essas vagas para outros candidatos que por ventura queiraes indicar”. De acordo com a documentação existente, por exemplo, um ofício 17 de Janeiro de 1928, percebe-se que, pelo menos no que tange à Intendência de Belém, estando as vagas preenchidas, poderia haver substituições ou qualquer outra transformação, “tudo, porem, dentro da subvenção concedida”. No mesmo documento há a solicitação da concessão de um passe de bonde para a Escola. Em 25 de novembro de 1929, foi enviado ao senador Antonio Faciola, Intendente de Belém o seguinte ofício: Tendo essa Intendencia concedido este anno a subvenção de 12:000$000 á Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará e apresentado oito candidatos e o Concelho Municipal trez e, como até hoje tivesse sido pago apenas a importancia de 3:000$000, que beneficia somente trez candidatos, esta Directoria, forçada pelas alíneas b e c do artigo 36 do Regimento Interno – prova do pagamento das taxas de frequencia e de exame – pede a V. Excia. a fineza de mandar indicar com urgencia dentre os onze candidatos o nome dos trez preferidos afim de poderem ser admittidos aos exames da presente época. Para o Governador do Estado, Dr. Dionysio Bentes, membro do corpo docente da Faculdade, com um teor mais formal, foi enviado ofício resposta em 17 de novembro de 1925 dando conta do “immediato cumprimento a ordem nelle exarada, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 mandando inscrever, em uma das vagas de que dispõe o governo de V. Excia. no corpo discente desta Faculdade” determinado aluno. O ofício termina de forma bem interessante (ou interesseira): A opportunidade faz-me interprete da affirmativa da Congregação do muito de gratidão que devemos a V. Excia., cujo nome destaca-se, magnanimo, dentre tantos benfeitores deste Instituto de educação. Dirigido ao Secretario Geral do Estado, Dr. Deodoro de Mendonça, de 25 de outubro de 1926 é o documento informando ter a tesouraria da Faculdade recebido a quantia de seiscentos mil réis da Intendência de Marabá e a mesma quantia da de Cametá, “importâncias insufficientes para os candidatos das referidas intendências [...] inscreverem-se nos exames da presente época”. Para o mesmo Secretario Geral do Estado, o ofício de 20 de abril de 1927 dá conta da indicação de determinado aluno para estudar às custas da prefeitura de Marabá. Ressalta o secretário da Faculdade que “para regularidade da escripta deste instituto de ensino” era necessário saber o valor da doação, uma vez que as despesas do candidato orçariam em “920$000 annualmente”. Mas as correspondências para as Intendências não eram só para cobrar. Havia também a parte social, como o ofício endereçado a Muaná, em 24 de setembro de 1925, onde a Faculdade acusa o recebimento da comunicação da posse do Intendente, com votos de “fecunda administração”. Em 30 de abril de 1927, a Faculdade oficia ao mesmo município perguntando se este mantém o mesmo candidato do ano anterior e a verba votada, bem como solicita a lei orçamentária vigente. Um ofício com teor semelhante seria enviado ao novo Intendente de São Miguel do Guamá, em 31 de outubro de 1925, afirmando que “essa Intendencia muito lucrará sob a criteriosa administração de V. S.”. Para o Intendente de Montenegro10 é enviado ofício datado de 28 de maio de 1929 acusando o documento de autorização do pagamento da subvenção à Faculdade por parte do referido município “ora sob sua honesta e progressiva administração”. Ao agradecer ao Intendente, o secretário da Faculdade expressa suas “respeitosas homenagens”. O sr. Antonio Faciola, intendente de Belém recebe, em 14 de fevereiro de 1929 congratulações por ter assumido “o exercício do cargo”. Agradece a atenção dispensada e faz votos, em nome da congregação “para que o governo de V. Excia. seja prospero e como é de esperar das qualidades de V. Excia., engrandecedor para o município de Belem”. Interessante ofício foi o enviado ao Intendente de Ourém, datado de 3 de abril de 1929. Ao acusar o recebimento de documento daquela prefeitura apresentando determinado aluno para a vaga de um outro, o secretário da Faculdade, signatário A manutenção financeira 193 do ofício desta, diz ter-lhe causado surpresa a indicação “porque o auxilio que diz ser concedido a esta escola NUNCA foi pago, apezar dos offícios dirigidos á V. Sa., que sempre ficaram sem resposta”. E sugere que “melhor seria que o auxilio fosse concedido directamente ao seu candidato, que faria pessoalmente entrega das mensalidades á thesouraria, [...] evitando desta forma provaveis prejuízos.” Finaliza dizendo que o auxilio “não deve ser inferior a 865$000 para o candidato gozar de todas as regalias”. De janeiro de 1929 é o ofício dirigido ao Intendente de São Domingos da Boa Vista. Nele é informado que durante o ano letivo de 1928 determinado aluno, como candidato daquele município, “requereu e fez exames do 1º anno, apezar de ter essa intendencia apenas satisfeito a importancia de cem mil réis”. Diz ainda que o auxilio é prestado exclusivamente ao candidato e não à Faculdade, pelo que sugere que a quantia seja entregue ao aluno, “que assim gosará, sem constrangimento, de todas as regalias”. 194 Outro ofício, em resposta ao tema acima, datado de 30 de janeiro de 1929 depreende-se rebater a argumentação da Intendência de São Domingos da Boa Vista. O secretário da Faculdade diz ter-lhe causado estranheza “affirmar V. Sa. que o pagamento foi iniciado em Agosto, tendo sido satisfeito mensalmente até Janeiro deste anno.” E continua dizendo não por em dúvida “que a Recebedoria fizesse annotação no “documento de entrega de reditos desse Municipio’, mas a Secretaria, até hoje, não teve conhecimento desse pagamento”. Determinados documentos dão conta que o oferecimento de “apadrinhamento” de vagas extendia-se a outros órgãos - a imprensa, por exemplo. Em correspondência enviada à Faculdade, em 31 de março de 1927, o diretor do jornal Estado do Pará lembra de ter sido posto à disposição do jornal “ uma vaga para ser occupada por (alguém) pelo mesmo indicado” e havendo o indicado anterior concluído o curso o jornal queria indicar um outro nome, um “moço intelligente e dedicado, que já possue o primeiro anno dessa digna Faculdade”11. A resposta incisiva não se fez esperar: a Faculdade informa que havia seis meses a Congregação extinguira os lugares destinados à imprensa, continuando apenas aquele que concluía o curso, sendo impossível atender o pedido devido às dificuldades financeiras da Escola. Observa-se que particulares também tinham problemas em saldar seus débitos para com a Faculdade, sofrendo as consequências. Em correspondência de 10 de outubro de 1923 endereçada ao Diretor um cidadão informava que seu filho matriculado no primeiro ano, por motivos alheios a sua vontade, “deixou-se atrazar em suas mensalidades correspondentes aos mezes de janeiro a outubro” do referido ano, num montante de 250$000. Com o aluno impedido de freqüentar as aulas, o pai solicita um prazo de 90 dias para saldar o débito e pede que seja liberada a presença do estudante. O despacho do Diretor é lacônico: “acceite-se”. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Outro modo de pagamento era fazer consignações para a manutenção de alunos na Faculdade. Assim se depreende do ofício do secretário da Faculdade ao tesoureiro da mesma, datado de 12 de setembro de 1927, dando conta que determinado cidadão fizera na Diretoria Geral da Fazenda Pública do Estado uma consignação “na importância de um conto e duzentos réis (Rs.1:200$000) para occorrer ao pagamento da despesa de mensalidades de seus filhos”, alunos do 3º e 1º anos, respectivamente. Sobre a situação financeira da Faculdade, o secretário manifesta-se em correspondência de 3 de setembro de 1926, endereçada ao Dr. Lauro Sodré Filho, inspetor federal junto à Faculdade, enviando o referido documento e alertando que “de ordem superior [...] d’ora vante todas as informações deverão ser pedidas por escripto e não verbalmente”. A prestação de contas é feita, também, junto ao Governo Federal. Em ofício dirigido ao Ministro da Justiça e Negócios do Interior, em 18 de outubro de 1927, a direção da Faculdade encaminha o demonstrativo de pagamentos realizados com a importância de cinquenta contos de réis, oriundos da subvenção votada pelo Congresso Federal, através da lei nº 5.156, art. 32, de 12 de janeiro de 1927. Parece que a Faculdade nasceu sob o signo de pedir; e nem sempre conseguir. Em 5 de fevereiro de 1927 foi solicitado ao Intendente de Belém, dois passes de bonde, justificando as “crescentes despezas deste novel Instituto de Ensino Superior”. O pedido não foi aceito, conforme ofício da Intendência, de 21 de fevereiro do mesmo ano, por já terem sido distribuídos todos os passes, “actualmente em numero mais redusido que dantes”. Então, em 20 de dezembro de 1927 foi enviado ao mesmo Intendente o seguinte oficio Exmº Snr. Dr. Crespo de Castro DD. Intendente de Belem. Em officio numero 43, de 5 de fevereiro deste anno e de ordem do Snr. Dr. Camillo Salgado, solicitei a V. Excia. um passe de bond para esta Faculdade, representando este um valioso auxilio á nossa Escola Medica. Infelizmente, por ser feito tardiamente, não poude o nosso pedido ser attendido, conforme communicação do illustrado secretario dessa Intendencia, snr. dr. Paulo Eleutherio. Agora, com antecedencia e com auctorização do snr. Dr. Salgado, renovo o pedido, crente de que V. Excia. desta vez satisfará o desejo do esforçado director desta Academia. Prevaleço-me do ensejo para reaffirmar a V. Excia. as seguranças de muito apreço e profunda admiração. Saúde e Fraternidade Dr. Olympio da Silveira Secretario A manutenção financeira 195 Do mesmo modo, em 2 de fevereiro de 1927, foi solicitado ao snr. J. D’. Rane, gerente da Companhia Para Eletric a concessão de “um ou dois passes de bonds”, apelando para o “alto espirito philantropico que tanto caracterisa V. S., em virtude das crescentes despesas e das diminutas rendas. A resposta, endereçada ao Secretário da Faculdade, foi de “não poder acceder ao vosso pedido por já haver distribuido o numero de passes estipulado pela Directoria”. A resposta da Faculdade veio em ofício de 5 de fevereiro do mesmo ano e endereçado ao referido gerente: o secretário da Faculdade diz ter havido um “manifesto equivoco” do Sr. D’. Rane, pois a solicitação fora feita em nome do diretor da Faculdade e não na dele, secretário. 196 Outro fato bem interessante relacionado à obtenção de recursos para a Faculdade é assunto de correspondência do cônsul da Áustria ao Dr. Camillo Salgado, datada de 4 de março de 1924. Na citada correspondência é mencionado um concerto realizado por um casal de artistas austríacos, marido pianista e mulher cantora, “dedicado à Faculdade”. O cônsul relata ter cobrado do músico a quantia devida à Faculdade, tendo como resposta “que nada podia ceder do arrecadado, em virtude de não haver as receitas chegado para cobrir as despesas”. O cônsul prossegue dizendo ter agido energicamente, inclusive ameaçando o casal de não viajar para os Estados Unidos. Estando o músico desprovido de dinheiro, fê-lo assinar uma declaração de dívida no valor de 200$000, sendo o documento remetido a representantes nos Estados Unidos (presume-se) para a devida cobrança. E conclui dizendo que tão logo receba qualquer notícia comunicará ao Dr. Camillo, além de lamentar que o concerto não tivesse dado o resultado que se esperava. Deste modo, não soa estranho o ofício de 28 de setembro de 1926, endereçado ao Dr. J. Gesteira, proprietário do laboratório Gesteira onde “confiando no alto espirito philantropico que tanto (o) caracterisa” solicita um auxilio “para a montagem do laboratorio de bacteriologia de que tanto se ressente a nossa Escola”. E prossegue “Conscio de que V. S., sempre devotado ás causas nobres e que de perto interessam ao Pará, terra sua pelo coração e do nascimento de entes que tão caros lhe são, attenderá solicito a este appello”. (FMCP, 1923b). Em meio à choradeira da Faculdade na busca de recursos financeiros é digno de registro a correspondência encaminhada e esta, em 19 de setembro de 1930, por Francisco Maria Bordallo, exportador de madeiras sediado em Curralinho. Como lembrança da passagem de seu filho, que estudara dois anos na Faculdade do Pará, oferecia determinado valor não mencionado no texto à Escola, pedindo desculpas pela “pequena offerta”.12 Mas se a Faculdade buscava doações, ao mesmo tempo em que tentava alternativas para receber o que o Governo lhe devia, por exemplo13, para receber o que lhe era de direito tinha que recorrer a lobistas, conforme teor do ofício abaixo: Ilmo. Sr. Director da Escola de Medicina Sendo essa Instituição contemplada, annualmente, com um auxilio no Orçamento Federal, venho propôr a V. S. encarregar-me, mediante modi- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 cos honorarios, da liquidação do respectivo processo de pagamento. Com longa pratica de serviços dessa natureza, acompanho, de perto, toda a marcha dos papeis, apressando sua passagem pelo Ministerio da Justiça, Tribunal de Contas e Thesouro Nacional, de sorte a, no menor prazo possivel, receber a importância da subvenção. Aguardando a resposta de V. S., para, então, transmittir-lhes as informações de que, porventura, necessite, subscrevo-me, cordialmente, Dr. Álvaro Leite Penteado - advogado Eis mais alguns exemplos de correspondências dirigidas à Direção da Faculdade e relacionadas a pedidos de vagas: Belém, 1 de Junho de 1927 Presado amo. Dr. Camillo Salgado Pelo exmo. Snr. dr. Dionysio Bentes, nosso digno Governador me foi pessoalmente assegurada, para meu filho (*********), matriculado nessa Faculdade, a vaga por ella destinada ao Estado de que é chefe aquelle nosso illustre conterraneo. Como não existem motivos para que me autorisem a por em duvida a promessa acima alludida, peço-lhe a fineza de providenciar no sentido de não me ser novamente enviado o recibo da mensalidade do referido aluno __________________________________________________________ Secretaria Geral do Estado Belém,13 de Junho de 1927 Ilmo Sr. Dr. Director da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará Solicito a V. S. a fineza de conceder, mais uma vaga, alem da que poz á disposição do Governo, nessa Faculdade, para o academico (*********). Deodoro de Mendonça __________________________________________________________ Muaná, 12 de Julho de 1926 Exmo. Snr. Director da Faculdade de Medicina do Pará Communico a V. Excia. que a verba estabelecida pela Lei orçamentária deste municipio em a secção XVIII, n. 2 de trezentos mil réis (300$000) é para ser applicada no pagamento das mensalidades, na Faculdade de Medicina, do alumno (********). __________________________________________________________ O discurso sobre a precária situação financeira da Faculdade acompanha a trajetória da mesma. É recorrente, nos Relatórios anuais de atividades menção às dificuldades financeiras, embora quase sempre haja acréscimo de patrimônio, compra ou inauguração de novas instalações. Bem verdade que no Relatório de 1935 é mencionado déficit nas contas de Instituição e onde tal fato iria repercutir14. Por outro lado, no mesmo relatório é citado no balanço das atividades do Conselho TécnicoAdministrativo um auxílio recebido do governo federal, bem como a destinação do mesmo.15 No mesmo ano, o Diretor oficia ao Prefeito municipal solicitando auxílio para a locomoção dos funcionários que executavam serviços externos.16 A manutenção financeira 197 Dado interessante encontra-se em ofício encaminhado pela Faculdade ao Chefe do Imposto de Renda, em 30 de agosto de 1935. No documento, Camilo Salgado encaminha ao referido setor a relação de professores e funcionários da Instituição e solicita que estes “ficassem dispensados do imposto de renda, referente ás alludidas gratificações”, com a justificativa que a Escola vivia da renda das mensalidades dos alunos, sem auxílio dos poderes públicos (FMCP, 1935c). A situação chegou a ficar tão crítica que em 1936, o professor Dias Jr., catedrático da Faculdade e exercendo mandato de Deputado Estadual, tentou, por duas vezes, e através do Legislativo, conseguir verbas para a Escola de Medicina. Inicialmente em 13 de outubro, durante a discussão do orçamento do Estado para o exercício seguinte, propôs emenda ao projeto aumentando de 60:000$000 para 100:000$000, a verba de auxílio para as Faculdades de Medicina e Farmácia do Pará. A emenda, ainda que aprovada, não chegou a surtir efeito, em virtude de ter sido aprovada outra emenda que prejudicou o projeto como um todo. Em novembro de 1936, já visando o orçamento do ano seguinte, o Dr. Dias Junior apresentou projeto de lei reconhecendo a dívida do Estado para com a Faculdade de Medicina, com o seguinte teor: 198 PROJETO DE LEI Nº143 Reconhece a divida passiva do Estado para com a Faculdade de Medicina do Pará e dá outras providencias A Assembléa Legislativa estatue a seguinte lei: Art. 1º - fica reconhecida a divida passiva do Estado até a presente época, pra com a Faculdade de Medicina do Pará, na importancia de trezentos e sessenta e um contos e oitocentos e trinta e seis mil réis (361:836$000), decorrente de subvenções em atrazo, consignações e taxas escolares de estudantes pobres, matriculados por conta do Estado, igualmente atrazadas. § único - O pagamento da divida de que trata a disposição supra será feito mediante amortizações anuais, sendo duas de cem contos de réis (100:000$000) e uma de cento e sessenta e um contos oitocentos e trinta e seis mil réis (161:836$000), acrescidas, em caso de móra, dos juros de cinco por cento (5%) ao ano. Art. 2º - O predio onde funciona, actualmente, o Grupo Escolar “Rui Barbosa” do patrimonio da citada Faculdade17, ser-lhe-á entregue, desocupado, dentro de seis (6) mezes, da data da publicação da presente lei e, se o não poder fazer, passará o Estado a pagar áquela instituição de ensino superior o aluguel mensal de quinhentos mil réis (500$000). Art. 3º - Os estudantes matriculados por conta do Estado, que não obtiverem média anual para promoção, igual ou superior a sete (7), serão imediatamente desligados, devendo o Poder Executivo evitar novo atrazo no pagamento das respectivas taxas. Art. 4º - Revogam-se as disposições em contrario. Sala das sessões da Assembléa Legislativa, 30 de novembro de 1936. aa) Dias Junior João Botelho Antonino Melo (FMCP, 1939c, p. 77) Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Na exposição de motivos do referido projeto de lei, o Prof. Dias Junior cita que um professor da Faculdade recebia “os ridículos vencimentos de 360$000 mensais”, resultantes da contribuição de 25 contos pelo Governo Federal, dos quais 50% foram aplicados no pagamento dos professores e o restante na aquisição de material, “como manda a lei”18. Ainda na mesma exposição de motivos, o Dr. Dias Junior faz saber que a falta de repasse das verbas estaduais para com a Faculdade de Medicina já somavam 361:000$000, relativo ao período de 1923 a 1929 (FMCP, 1939c, p. 84). O projeto do deputado Dias Junior foi aprovado em todas as comissões e transformado em lei. Entretanto foi vetado pelo Governo do Estado sob a alegação que a dívida reconhecida pelo Estado para com a Faculdade era de 74:000$000. Também, que o projeto de lei não providenciava os recursos para o pagamento a que se destinava. Quanto ao prédio da Escola de Farmácia, dizia que a matéria era de exame e atribuição do Executivo, “quer relativamente a execução dessa lei, jamais requerida, quer quanto ao contrato de locação do mesmo, si efetivamente pertencer á Faculdade”. Em relação aos alunos mantidos pelo Estado, dizia ser, também, assunto pertinente ao Executivo (FMCP, 1939c, p. 86). O veto à lei do deputado Dias Junior rendeu desdobramentos no noticiário. A Folha do Norte de 23 de outubro de 1937 contesta as “contas” do Governo e diz que a dívida é até maior19. Em 26 do mesmo mês, o referido jornal publica o que poderia ser considerado como a opinião do Governo20. A resposta viria no dia seguinte, pelo mesmo jornal.21 De qualquer modo, viu-se a Faculdade “tungada” em seus direitos legítimos pelo Estado, que ainda encaminhava ofícios como o seguinte: Belém, 17 de janeiro de 1935 Ilmo. Sr. Director da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará Comunico-vos, para os devidos fins, que o sr. Major Interventor Federal, por despacho de 14 de dezembro ultimo exarado no requerimento de **************, alumno da 5ª serie dessa Faculdade, dispensou-o do pagamento da quantia de 345$000 (TREZENTOS E QUARENTA E CINCO MIL REIS), que deve ahi de emolumentos de matricula e curso (FMCP, 1935c). Ou este outro, também muito interessante: De ordem do exmº sr. Major Interventor Federal, solicito-vos as necessárias providencias no sentido de ser o Estado indemnisado da quantia de 55$000 (cincoenta e cinco mil réis), correspondente ao consumo de luz desse estabelecimento de ensino, no periodo de Agosto a Novembro de 1934 a saber: Agosto ....................20$000 Setembro ...............14$000 Outubro ...................16$000 Novembro .................4$000 A manutenção financeira 199 Aproveito o ensejo para scientificar-vos, ainda da ordem do exmº sr. Interventor Federal, que, a partir deste mez, o Governo do Estado não mais se responsabilisa pelo pagamento da já aludida despesa que, assim, passará a ser estipendiada por essa Faculdade (FMCP, 1935c). Sem dúvida, a Faculdade não se dava por vencida e, sempre que possível, contraatacava na luta por seus direitos: Belém, 7 de Março de 1934 Exmo. Sr. Diretor Geral de Ensino Em obediencia ao oficio de V. Excia., nº 222, de 2º de Novembro do ano p. findo, foi submetido a exame o aluno ************, devedor aos cofres desta Faculdade da importancia de 730$000, despesa esta que será paga “pelos cofres do Estado”, nos termos do referido oficio. Assim, solicito a V. Excia. as necessárias providencias nesse sentido.22 200 O número reduzido de alunos e as vagas gratuitas contribuíam para a situação financeira delicada da Faculdade, pois as taxas escolares pagas não eram suficientes para manter a estrutura da Escola23. E como as verbas oficiais geralmente atrasavam, a Faculdade vivia sempre com seu orçamento apertado. Ainda assim, graças à tenacidade e pulso firme de seus dirigentes e, certamente, ao devotamento e compreensão de seus professores e funcionários, conseguiu ir ampliando sua área, adquirindo terrenos adjacentes ao prédio central, onde pôde construir o magnífico conjunto arquitetônico da Escola, hoje, infelizmente, esquartejado por vários outros cursos e funções ficando o curso de medicina - o grande empreendedor da obra -, como um verdadeiro intruso dentro dos seus (antigos) próprios domínios. Assumindo a Direção da Faculdade em 1938, o Dr. Lauro de Magalhães em seu primeiro Relatório de atividades menciona a situação financeira da Escola. Segundo ele, mandou Proceder um balanço geral dos bens e de sua tesouraria, que revelou uma situação financeira pouco lisongeira, impossibilitando a realisação do orçamentos votado para o ano de 1938 e nos obrigou a aconselhar ao Conselho Administrativo e á congregação a reforma-lo com a verdadeira situação e estabelecer um equilíbrio entre a receita e a despesa, o que foi aceito e realizado (FMCP, 1939c, p. 5). Lauro de Magalhães cita os fatores para aquela situação: a diminuição dos alunos matriculados nas várias séries, devido à criação do curso complementar, “que privou a Escola de alunos durante dois anos na primeira e segunda séries”: o não recebimento do auxílio federal, de sessenta contos, “na época devida” e a desanexação da Escola de Farmácia, “que nos desfalcou do auxílio de 72:000$000” (FMCP, 1939c, p. 5). A solução para o equilíbrio teria que ser drástica: corte de despesas, de salários, inclusive dos professores, e aumento das taxas.24 O Relatório do ano seguinte aponta uma melhoria, mas ainda com déficit, permitindo a retomada da ampliação do espaço físico da escola, embora sejam citadas as dificuldades: Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 A nossa situação financeira, se ainda não atingiu a meta desejada, contudo vai melhorando pouco a pouco, de modo a nos ter permitido, em Dezembro, o inicio da construção do novo pavilhão, [...]. Continuando ainda reduzida a matricula nas diversas séries, contando a Faculdade apenas com o auxilio federal, que poderá falhar, maiores realizações não nos foi possivel empreender (FMCP, 1940b, p. 3). Também é citado o auxilio emprestado à Faculdade pelo prefeito de Belém, Abelardo Condurú, com abundantes elogios à sua figura.25 Do mesmo modo é lembrado que a Faculdade somente poderia progredir, materialmente, “com o concurso financeiro de governos patrióticos e argutos” e que compreendessem o sacrifício do corpo docente. “empenhado tão somente em dotar o nosso Estado com uma Escola que honra a cultura do Norte” (FMCP, 1940b, p. 4). Em 1940, o Relatório aponta para uma situação financeira mais ou menos equilibrada, com a Diretoria cumprindo integralmente o que prometera no relatório e orçamento anteriores, “não perdendo um real de sua receita”, encerrando o ano “com seus bens e patrimônios móveis e imóveis conservados, melhorados e aumentados”, sendo citado o início da construção do pavilhão de anatomia, que contou com um auxilio federal de oitenta contos de réis, “totalmente empregado na construção” (FMCP, 1941, p. 43). Novamente é exaltada a participação do prefeito Abelardo Condurú como partícipe do estágio de evolução da Faculdade.26 Assim conclui o Diretor: Conservamos e exaltamos o nível moral, social e cientifico que a Faculdade já alcançara, solidificamos o seu credito financeiro, destruímos velhas praxes e corrigimos as irregularidades existentes; melhoramos a situação econômica, aumentando os vencimentos dos professores e dos funcionários, enriquecemos o seu patrimônio... (FMCP, 1941, p. 7). O balancete da Receita e de Despesa da Faculdade para aquele ano de 1940, menciona os valores de 14:000$000 e 80:000$000, respectivamente como auxilio estadual e auxilio federal (FMCP, 1941 p. 7). Nas palavras iniciais do Relatório de 1941, o Dr. Lauro de Magalhães fala na “relativa prosperidade financeira e economica”, se achando “melhor aparelhada para os fins a que se dedica” (FMCP, 1942b, p. 3). Curiosamente o balancete para aquele ano registraria a quantia de 362:527$800 de Despesa e 351:600$700 de Receita, respectivamente, o que geraria um déficit de 10:921$100. Os auxílios municipal, federal e estadual seriam na ordem de 12:000$000; 80:000$000 e 10:000$000, respectivamente (FMCP, 1942b, Mapa n. 6). Em 1942, foi inaugurado o pavilhão de Anatomia e iniciada a construção de outro prédio. Referindo-se às obras, o Diretor assim se manifesta: “Como sabeis, este melhoramentos imprescindiveis e urgentes, são feitos com grande sacrifícios, à custa dos nossos minguados recursos e dos auxilios generosamente prodigalizados pelos governos Federal e Estadual e pela Prefeitura de Belém” (FMCP, 1943b, p. 4). A manutenção financeira 201 A menção faz justiça aos valores recebidos pela Faculdade naquele ano, a saber: 12:000$000, da Prefeitura Municipal; 40:000$000, do Governo Estadual e 80:000$000, do Governo Federal (FMCP, 1943b, Mapa n. 6). O relatório de 1943 menciona que a situação da Faculdade era “lisonjeira”, permitindo algumas obras e também que fossem aumentados os vencimentos dos professores e funcionários. Entretanto, restou um pequeno déficit de Cr$ 7.250,00 (FMCP, 1944b, p. 4). As subvenções para naquele ano somaram Cr$ 128.666,30, assim distribuídas: auxilio municipal: Cr$ 12.000,00; auxilio federal Cr$ 80.000,00; auxilio estadual CR$ 36.666,30. (FMCP, 1944b, mapa n. 6). No ano de 1944, embora sejam mencionadas a realização de obras de construção e de reforma, devido à “carestia atual da vida e do excessivo preço dos materiais de construção e laboratório”, os avanços foram lentos. A situação financeira da faculdade, “se não é de penúria, longe está, porém, de ser folgada”, uma vez que “a (nossa) principal fonte de renda provém das contribuições dos alunos”, que naquele ano somaram apenas 155 matriculados, com muitos ocupando vagas gratuitas (em número de 10) solicitadas pelo Estado. Como comparação é mencionado haver em Belém colégios com seiscentos a mil alunos que pagam, entre outras contribuições, a taxa de oitenta cruzeiros, para a fiscalização federal, enquanto esta despesa é paga pela Faculdade, “com seus parcos recursos” (FMCP, 1945c, p. 4). 202 O Relatório daquele ano informa as dotações oficiais para a Faculdade: auxilio municipal: Cr$ 12.000,00; auxilio federal: Cr$ 80.000,00; auxilio estadual: Cr$ 40.000,00 e mais Cr$ 3.333,70 como resto de 1943, perfazendo um total de Cr$ 135.333,70. Levando em consideração que o pavilhão destinado à biblioteca e à sala da Diretoria custou Cr$ 130.000,00 temos uma idéia do que representavam estes valores no orçamento da Faculdade. O ano de 1945 terminaria com um saldo de Cr$ 2.350,00, mesmo com despesas com a compra de um motor para as câmaras frigoríficas e de livros para a biblioteca (FMCP, 1946b, p. 4). Também é informado o auxilio de Cr$ 36.000,00 concedidos pela Prefeitura de Belém, através do prefeito Alberto Engelhard, e que foram “totalmente empregados na melhoria do prédio”, e o recebimento de Cr$ 35.000,00 mandados pagar pelo Interventor coronel Magalhães Barata, “por conta do crédito que temos no Tesouro do Estado” (FMCP, 1946b, p. 35). No balancete anual é informado o montante recebido a título de subvenção do poder público: auxílio federal: Cr$ 80.000,00; estadual: Cr$ 36.666,30; municipal: Cr$ 24.000,00; S.V.O.: Cr$ 55.000,00, perfazendo um total de Cr$ 195.000,00. O Relatório de 1946 continua falando de uma Escola que não dispõe de “largos recursos financeiros”, do Norte “tão pouco acarinhado pela República”, das poucas matrículas (133), das vagas gratuitas, dos exíguos auxílios recebidos do poder público, mas informa que as condições financeiras “são lisongeiras”, os compromissos em dia, invesMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 timentos de Cr$ 100.294,30 em material de consumo e aquisição de novos aparelhos, Cr$ 26.961,10 na aquisição de obras para a biblioteca e um saldo de Cr$ 15.765,6027. As subvenções públicas somaram um total de Cr$ 219.000,00 assim distribuídas: federal: Cr$ 100.000,00; estadual Cr$ 40.000,00; municipal: Cr$ 24.000,00; S.V.O.: Cr$ 55.000,00. Com as taxas cobradas a Faculdade arrecadou Cr$ 288.070,00. O total de receita e despesa foi de Cr$ 644.024,80 e Cr$ 628.259,60, respectivamente, terminando o ano com lucro, já mencionado (FMCP, 1947b, mapa n. 8). O Relatório de 1947 inicia reclamando do não recebimento da subvenção anual de cem mil cruzeiros do governo federal e do “pequeno auxílio de doze mil cruzeiros constante da lei orçamentária do Município”, assim como do pagamento de apenas 60% da verba estadual (FMCP, 1948c, p. 3-4). Sem muitos dados a confrontar, temos, pelo balancete, o recebimento de Cr$ 98.333,10 de subsídios, a saber: Cr$ 53.333,10 de auxilio estadual e Cr$ 40.000,00 do S.V.O. As taxas arrecadadas somaram o montante de Cr$ 399.085,00. Além disso, Folha do Norte noticiava a liberação, pelo governo federal, de 400 mil cruzeiros para o aparelhamento da Faculdade.28 No ano de 1948 voltou a acontecer o não recebimento das subvenções públicas. Tanto o governo estadual quanto o municipal não honraram seus compromissos em pagar os auxílios previstos em seus orçamentos, respectivamente Cr$ 100.000,00 e Cr$ 12.000,00. Também por conta do não repasse da verba prevista para o S.V.O, no valor de Cr$ 5.000,00 mensais, a Faculdade foi obrigada a rescindir o contrato de prestação do serviço. Ainda assim, o Relatório informa ter a Faculdade encerrado o ano social com todos os compromissos pagos em dia (FMCP, 1949b, p. 4). Volta e meia, a Faculdade tinha que “lembrar” ao governo do Estado dos débitos deste para com a Escola, conforme teor do ofício encaminhado ao secretário geral do Estado em 22 de junho de 1948. Ao Ilmº Sr. Dr. Armando de Souza Corrêa M. D. Secretário Geral do Estado Ilmº. Sr. Pelo ofício nº 240, de 23 de Março de 1948, foi apresentado por V. S., de ordem do sr. Major Governador do Estado, o aluno *****, para ocupar uma vaga paga pelo Tesouro do Estado. A Faculdade, atendendo á solicitação, matriculou o referido aluno cujo debito, presentemente, eleva-se a mil trezentos e trinta cruzeiros (Cr$ 1.330,00). Aguardando qualquer resolução neste sentido, sirvo-me da oportunidade para apresentar-lhe. Atenciosas saudações Dr. Lauro de Magalhães Diretor (FMCP, 1948a) A manutenção financeira 203 Para aquele ano de 1948, a subvenção dos poderes públicos ficou restrita apenas ao auxílio do governo federal, no valor de Cr$ 120.000,00. As taxas arrecadadas somaram Cr$ 361.355,00 e o montante total de receitas foi de Cr$ 4.951.495,10, com as despesas no valor de Cr$ 4.950.926,40, deixando para a Faculdade um saldo de Cr$ 568,70 (FMCP, 1949b. Mapa nº 7). A luta da Faculdade para receber seus débitos continuava: em 24 de março daquele ano, a escola cobrava do governo do Estado o pagamento de Cr$ 2.630,00 referente às taxas escolares de um aluno mantido pelo governo, “de modo que não sofra qualquer interrupção o seu curso” (FMCP, 1949a). Referido ofício seria reiterado em 19 de abril, ressaltando que a Faculdade vivia “apenas das taxas escolares, sem receber qualquer auxílio do Estado e da Prefeitura” (FMCP, 1949a). Em outra correspondência, de 19 de maio de 1949, era informado a um interessado em cursar a Faculdade, além dos documentos necessários à inscrição, os valores das taxas para o próximo ano letivo: Cr$ 2.600,00 divididos em 4 prestações de Cr$ 650,00, nas datas de 10 a 25 de fevereiro, 1 a 10 de maio, 1 a 10 de agosto e 1 a 10 de novembro. A inscrição para o concurso de Habilitação era de Cr$ 200,00 (FMCP, 1949a). 204 Em 6 de agosto de 1949, o Diretor, Dr. Lauro de Magalhães oficiava ao DAM solicitando que os alunos pagassem a 3ª prestação até o dia 10 do referido mês, “sob pena de proibir a entrada às aulas aos faltosos”. (FMCP, 1949a) Este ofício geraria protestos dos acadêmicos, merecendo resposta do Diretor, afirmando que a determinação para as suspensões dos alunos às aulas fora sua e não, do secretário. (FMCP, 1949a). Como além do Governo do Estado, as entidades estudantis também tinham direito à vagas gratuitas, o ofício de 22 de outubro de 1949, assinado pelo secretário da Faculdade, informava ao presidente da União Acadêmica Paraense que a referida entidade mantinha naquele ano duas vagas para alunos da Faculdade. (FMCP, 1949a). Em ofício de 8 de novembro de 1949, o Diretor da Faculdade informava ao presidente do DAM que “a última prestação das taxas só será dispensada quando e depois que a Faculdade receber integralmente o auxílio federal pela Verba de Valorização da Amazônia”; que por ter recebido apenas a metade da referida verba, “sente-se obrigada a cobrar a última prestação, para não perturbar a vida financeira, e encontrar dificuldades na cobrança futura quando os atos escolares encerrados”; que se a Faculdade receber a segunda prestação em tempo, “as taxas serão dispensadas e se receber depois de pagas serão leal e honestamente devolvidas (FMCP, 1949a). Apesar de tantas lutas internas relacionadas ao sustento financeiro da Faculdade, o ano de 1949 continuou positivo para a mesma, com a construção de um novo pavilhão, inicialmente orçado em Cr$ 950.000,00 e que por conta de serviços complementares acabou elevando-se a Cr$ 1.110.000,00. No mesmo ano foi iniciada a Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 construção do Biotério, cuja obra inicialmente orçada em Cr$ 246.000,00 foi reajustada para Cr$ 470.000,00 (FMCP, 1950b, p. 3). Comentando sobre as verbas necessárias para as construções, o Diretor afirma que: “Não chegam, sem dúvida, as verbas de procedência federal para o fim a que se destinam, mas nem por isso, deixam de representar uma satisfação às contínuas exposições de motivos apresentados pela Faculdade” (FMCP, 1950b, p. 3). E faz um balanço da destinação do dinheiro recebido do Tesouro Nacional, na ordem de Cr$ 3.900.000,00, “auxilio este concedido pela verba de Valorização Econômica da Amazônia”, sendo parte da verba utilizada na melhoria dos vencimentos de professores e funcionários e o restante Cr$ 1.310.000,00 “que serão aplicados em material de ensino, na aquisição de terrenos contíguos á nossa Escola e necessários à sua ampliação, segundo plano traçado, cuja planta e orçamento se acham oficialmente aprovados (FMCP, 1950b, p. 3). Exultante, referindo-se à situação financeira da escola, o Diretor assim se manifesta: Não obstante ao pessimo malsão dos céticos e derrotistas, há trinta (30) anos passados, quando fundámos esta Escola, [...], vamos, ano a ano, aumentando o nosso patrimônio, que orça por vários milhões de cruzeiros, e firmando crédito apreciável e importante renome, não só aqui, mas em todo Brasil... (FMCP, 1950b, p. 5). Um fato citado no Relatório de 1949 e considerado capital para a vida financeira da Faculdade foi a participação dos parlamentares federais paraenses integrantes da Comissão de Valorização Econômica da Amazônia, dentre eles sendo citado o Dr. Agostinho Monteiro, um dos fundadores da Faculdade. Através da citada comissão foi consignada a verba de Cr$ 3.900.000,00 em beneficio da Faculdade, para que esta pudesse ser enquadrada “no padrão às correlatas federais”. (FMCP, 1950b, p. 8) Esta verba, concedida desde 1948, permitiu a continuação do projeto de ampliação da Escola, criando condições para que viesse acontecer a tão desejada federalização. O balancete de 1949 apresentou como Receita: Cr$ 10.346.128,50 e Despesa: Cr$ 10.356.850,50, verificando-se um saldo de Cr$ 7.278,00. A luta por recursos foi uma constante na história da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Nos anos mais próximos a 1950 observa-se uma intensa troca de correspondência entre a Escola e diversos seguimentos, principalmente autoridades, solicitando verbas para a manutenção e obras, cobrando a liberação do que já fora definido, pedindo mais ajuda aos diversos setores, entrando em atrito com os alunos por conta das taxas tudo visando dotar a Instituição de condições ideais para o ensino e a formação de seus alunos, tornando-a uma unidade padrão, sem nada dever às demais escolas médicas de então, estágio a que chegou naquela metade do século XX. A manutenção financeira 205 Embora federalizada em 3 de janeiro de 1950, o Relatório de atividades daquele ano não difere muito dos anteriores, no que se refere às questões financeiras. Pelo contrário, levando em consideração a nova situação da Escola, a situação permanecia inalterada ou até mais complicada, como afirmava o Diretor no inicio do Relatório: “Infelizmente, não obstante os esforços empregados, a situação permanece a mesma – os corpos docente e administrativo não foram nomeados – continuando a Faculdade sem verba para a manutenção dos seus serviços”. Apesar desse impasse, o espírito empreendedor dos dirigentes conseguia levar adiante seu projeto de ampliação e modernização da Escola. Deste modo, da verba de Cr$ 3.822.000,00, concedida em 1949 pela Comissão Econômica do Vale da Amazônia, a Faculdade receberia Cr$ 1.911.000,00 em novembro de 1950. Deste valor, Cr$ 250.000,00 seriam destinados ao prosseguimento das obras do Instituto de Higiene e Cr$ 95.387,00 para pagamento de material para os laboratórios. O restante seria empregado no pagamento dos corpos docente e administrativo da instituição (FMCP, 1951, p. 3). O diretor expressaria sua opinião sobre os “novos tempos” vividos pela Faculdade: 206 Jamais nos anuviaram os horizontes as sombras dos maldizentes. O pessimismo dêstes é cera dúctil em que se moldam as suas imagens de semideuses, aureolados de um predomínio inexistente. Mantemos o nosso prestigio intelectual passando-o sempre pelo crisol da instrução nacional, da qual não desmerecemos (FMCP, 1951, p. 4). Mesmo com todos os percalços, o balancete do ano de 1950 apontou um saldo de Cr$ 68.078,90 com a receita chegando a Cr$ 4.474.233,30 e as despesas Cr$ 4.406.154,40 (FMCP, 1951). Se em 1950 a Faculdade funcionou sem as verbas federais a que teria direito com a federalização, o ano seguinte não seria diferente. O relatório do ano de 1951 dá conta das dificuldades enfrentadas pela Escola. No dizer do Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, 1951 fora de “intensa labuta”, para enquadrar a Faculdade no regime das federais, mas que folgava de ver que a obra estava quase terminada (FMCP, 1951). Pelos dados do Relatório de 1951, temos que embora federalizada, nenhuma verba foi concedida, tanto para pagamento de professores e funcionários, quanto para custeio dos laboratórios e administração. Segundo o diretor, a Faculdade somente funcionou “devido a bôa vontade e espírito de compreensão e sacrifício dos professores e funcionários” (FMCP, 1952, p. 5). Sobre as verbas devidas, o Relatório de 1951 diz terem sido gastos Cr$ 300.000,00 para pagamento de material adquirido no segundo semestre de 1950, “tão logo que a Faculdade recebeu, em junho de 1951, a verba correspondente ao primeiro semestre de 1950”, frisando que a verba relativa ao primeiro semestre de 1950, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 não havia sido paga. O referido relatório enfatiza ainda não ter sido possível “enriquecer a Biblioteca com novos livros porque nos foi negada a verba de material, consignada no orçamento de 1951” (FMCP, 1951, p. 27). Como se observa mesmo com a federalização a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará não passou logo a desfrutar de uma situação financeira cômoda, pois a falta do repasse de verbas demandaria um tempo para sua regularização, atingindo inclusive o corpo docente e funcional. Com a normalização dos repasses e a conseqüente absorção dos recursos humanos pela União, a parcela maior dos problemas financeiros seria equacionada, permitindo que a Escola vivesse dias mais tranquilos, pelo menos no que se refere à sua manutenção financeira, até ser agregada à Universidade. NOTAS 1 “Sua receita compreendia subvenções dos poderes publicos, taxas e emolumentos escolares e administrativos e outras rendas eventuais.” (FMCP, 1939c, p. 70). 2 “Bem viu não esqueci essa Escola. E, novamente, voltei a pedir o modesto auxilio de vinte contos ao Congresso Nacional. Uma vez ainda a Câmara dos Deputados não approvou o auxilio, que a Comissão de Finanças do Senado reduziu a doze contos. E essa recusa era feita ao ser votada do orçamento em que figuram auxílios vultuosos às Escolas de Medicina de outros Estados. Espero que lograremos ser attendidos este anno. Já é tempo de conseguimos que também para nossa terra se voltem os olhares dos que em tão pequena conta parecem ter o Norte, o eterno desamparado do Império e tão pouco acarinhado pela República.” (FMCP, 1945c, p. 79-80). 3 De 1924 a 1927 constam nas mensagens governamentais o auxílio de 50 contos de réis para a Faculdade. A mensagem de 1928 diz apenas “Da parte do Estado, temos feito, quanto permitte nossa situação financeira”. (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes) 07.09.1928, p. 100). Na mensagem de 1929, o governador Eurico Valle diz: “A Faculdade de Medicina é auxiliada pela União, que annualmente registra em seus orçamentos uma verba destinada á Faculdade, subvencionando-a também o Estado e o Municipio de Belém. As municipalidades do interior, por sua vez, prestam-lhe seu concurso” (PARÁ. Governador (1929-1930: Eurico de Freitas Valle) 07.09.1929, p. 113). Embora constassem em lei, os auxílios estaduais, de 1923 a 1929, respectivamente, 50:000$000; 25:000$000; 50:000$000; 50:000$000; 50:000$000; 50:000$000; 50:000$000, não foram repassados à Diretoria, conforme o discurso do deputado Dias Jr. In Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. (FMCP, 1939c, p. 84). 4 Ver capítulo Doutores haja ... 5 “Ainda não obtivemos auxilio pecuniario do governo federal e o do Estado, não ignoraes, está em situação embaraçosa” (FMCP, 1923c, p. 12). 6 “Busquei o concurso inestimavel do dr. Cypriano Santos, actualmente na governança do Estado, e com elle resolvi solicitarmos a ajuda de todos os municipios do Pará, que patrioticamente não se excusaram a nos attender, dando-nos logo a intendencia de Belém um auxilio de seis contos de reis” (FMCP, 1923c, p. 12). A manutenção financeira 207 7 208 Esta circular foi enviada durante vários anos, conforme atestam ofícios posteriores a 1930. (N.A.). FMCP, [1925b-1929]. 8 “Possuo já em mãos communicações officiaes dos chefes dos executivos de Altamira, Santarém, Soure, Igarapé-miry, Irituia, Anajás, Vizeu, Baião, Abaeté, Alemquer, Chaves, Cachoeira, Monte-Alegre, Mazagão e Cametá, sobre os auxilios monetarios incluídos nas leis orçamentárias para 1923. Importam em 14:800$000, e ainda a Intendencia de Belem com mais tres contos de reis, faltando seguramente trinta municípios, que nos auxiliarão também, mas ainda não nos informaram em documento official”. (FMCP, 1923c, p. 12). 9 O Decreto nº 16.782 A, de 13 de janeiro de 1925, que organizava o Departamento Nacional de Ensino e reformava o ensino secundário e superior, apresenta uma tabela de taxas a serem cobradas pelos estabelecimentos de ensino superior. Para dar uma ideia dos valores cobrados dele retiramos: taxa de inscrição para o vestibular: 120$000; taxa de frequencia por ano, pagas em duas prestações semestrais: 480$000; taxa de matricula: 100$000; taxa de guia de transferência: 50$000; diploma de doutor: 200$000; diploma de medico: 150$000. 10 O município posteriormente receberia o nome de Amapá; hoje faz parte do Estado homônimo (N.A). 11 Por decisão dos autores, os nomes dos alunos citados nos documentos e candidatos às vagas gratuitas foram omitidos. (N.A). 12 A título de informação, os valores das taxas cobradas em 1931 eram as seguintes: exame vestibular: 120$000; matrícula inclusive certificado: 140$000; mensalidades de março a outubro: 600$000; inscrição de exame: 125$000, o que perfazia um total de 865$000 de despesa por aluno, anualmente. (FMCP, [1930-1932a]). 13 Em reunião do CTA, de 10 de junho de 1933, o Prof. Acatauassu Nunes Filho propõe que Conselho dirija petição ao Major Interventor requerendo que mande custear ou executar obras de urgência de que a Faculdade porventura necessite, por conta dos atrasos que tem a mesma no tesouro do estado. (CTA, 1933). 14 “Por influencia de factores multiplos que não cabe discutir aqui, poderão ver que encerramos o nosso exercicio financeiro com o deficit de noventa e um contos oitocentos e setenta mil e quatrocentos reis (91:870$400). É certo que esse déficit vem ferir tão somente o interesse dos senhores docentes, porém é tambem certo que, no momento, contamos com o seu espirito sempre renovado de sacrifício e abenegação que, comprehendendo a situação premente, seguros de que se trata de algo passivel de modificaçao para melhor, elles, os únicos sacrificados, conjugam esforços, confiam e esperam que o governo federal nos auxilie com subvenção nessa importância” (FMCP, 1936c, p. 6). 15 “Dentre esses documentos, figura o auxilio de vinte e cinco contos (25:000$000) recebido do Governo Federal, que foi dividido, 50% aos senhores professores e 50% para material dos laboratorios, como é de lei. Saliento que, como é também de lei, o pessoal superior da administração nada percebeu dessa subvenção, como nunca percebeu de outras anteriormente recebidas.” (FMCP, 1936c, p. 34) No balancete publicado como anexo ao Relatório de 1935, constam sob a rubrica “Subvenção dos poderes públicos – Subvenção Estadual” os valores de 55:000$000, como ‘auxilio’ e 12:000$000, como ‘Fiscalização federal” (FMCP, 1936c, mapa nº11). 16 “Ao Exmo Snr. Prefeito Municipal de Belém. Luctando este Instituto de ensino superior com serias difficuldades financeiras, oriundas do não recebimento da subvenção federal, appelo para V. Excia. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 no sentido de nos ser concedida por essa Prefeitura uma chapa de bond para o nosso serviço externo”. (FMCP, 1935). 17 Prédio onde funcionava o curso de Farmácia e que passava para o patrimônio da Faculdade com a anexação daquele curso ao de Medicina. (Decreto da Interventoria nº 133, de 12 de fevereiro de 1931). 18 Registre-se que em discurso pleiteando auxilio para a Faculdade o Prof. Dias Junior cita que os professores chegaram a ganhar a ‘ridicula cota da 75$000, depois 100$000’, passado posteriormente para 200$000, e somente com a ajuda do Governo Federal é que foi além dos 300$000 (FMCP, 1939, p. 96). Um vencimento de 360$000 mensais dá um montante de 4:200$000 por ano. A título de comparação, o vencimento de um catedrático previsto pelo Decreto 16.782. A era de 14:400$000, sendo 9:600$000 de ordenado e 4:800$000 de gratificação. 19 “Na sessão de 15 de outubro vigente os srs. deputados populistas e liberaes approvaram o véto, não reconhecendo assim o crédito da Faculdade. Entretanto, a Faculdade pleiteou menos do que lhe cabia, porque o governo, nas razões do véto, declarou ser o Estado devedor apenas da importância de 74:637$000; a dívida real eleva-se a 399:087$000, uma vez que o Estado ainda não pagou as subvenções abaixo discriminadas, cujo total de 325:000$000, addicionado á dívida de 74:087$000, já reconhecida pelo governo, perfaz o citado total de 399:087$000” (Folha do Norte, 22 de outubro de 1937, p. 1). 20 “A Faculdade de Medicina, ou alguém por ella, julgou lavrar um tento, como diz o vulgo, fazendo publicar na A FOLHA, de 22 do corrente, uma demonstração do crédito que entende ter no Thesouro do Estado e este reduziu para fundamentar as razões do veto, opposto pelo governador ao projeto do deputado Dias Junior, reconhecendo a dívida passiva do Estado para com ella, de 362:836$000 para 74:087$100, que em verdade, é o que alli figura como crédito do conceituado instituto de ensino superior. O tapeamento, todavia, é evidente. Effectivamente, leis de 1924 a 1929 auctorizaram o governo a conceder á Faculdade os auxílios que especificam no valor total de 325:000$000, mas si taes leis não foram executadas, ou porque não requeresse a directoria da Faculdade a execução delles; ou porque os governos desses exercícios não quizeram ou não puderam utilizar a auctorização legislativa; ou porque, ainda, constantes de leis orçamentárias não foram cumpridas, e, neste último caso, não promovesse a Faculdade a inscripção das sommas respectivas na “Divida Fluctuante”: - a verdade é que, evidentemente, ficaram taes leis sem execução ou o que é peor, encerrados os exercícios financeiros respectivos, caducas os auxílios, sem remédio possível na therapeutica adminstrativa para serem realizados por uma administração, que dista dessas auctorizações cerca de dez annos. O véto foi, portanto, verdadeiro, pretende o articulista provar a existência de um crédito que si existiu foi-se evaporou-se e, custa a crer, por dissídio do corpo administrativo da Faculdade”. (Folha do Norte, 26 de outubro de 1937, p. 1). 21 “O Thesouro do Estado, ou alguem por elle, pretendeu refutar, hontem, pelas columnas da Folha do Norte, a demonstração publicada no dia 22 do corrente, a qual provou que as razões do véto não se haviam fundado na verdade. A “União Popular do Pará, na Columna Política, do Estado do Pará”, de 15 deste mez, diz: “Em que nos pese a revide é preciso que a opinião pública conheça que o Congresso antigo do Estado já legislou a respeito, suspendendo as prescripção de dividas”. Mais abaixo, affirma: Mas, senhores da A manutenção financeira 209 210 Frente Única, por que essa facção política que tem juristas, contabilistas, hygienistas, aparadistas, agiotistas (para conservar a rima), farristas e mais alguma coisa terminada em ista e agora se declara calotista, não apresenta, na Assembléia, uma lei restaurando essa prescripção? Vê, portanto, o articulista do Thesouro ou alguém por elle, que não houve dissídio do corpo administrativo da Faculdade, uma vez que o Congresso já havia interrompido taes prescrições. A Faculdade, porém, acceita os 74:037$000, dispensando os 100 réis – que não estão incluídos na demonstração – importância esta proveniente de consignações e não de auxílios, ficando os 325:000$000 aguardando melhores tempos”. (Folha do Norte, 27 de Outubro de 1937, p. 1). 22 O oficio seria reiterado em 28 de Março e em 5 de setembro, devido o pagamento ainda não ter sido efetuado. (FMCP, 1934). 23 A título de informação: em 1934, o orçamento foi elaborado contando com a matricula de 230 alunos. Entretanto, matricularam-se 183, sendo que 19 gozavam de gratuidade (13 pelo Governo Estadual e 6 pela Faculdade), restando 164 pagantes, ou seja 71% da previsão orçamentária. Livro de ofícios expedidos 1934. Para 1935, as taxas cobradas eram as seguintes: inscrição ao vestibular: 120$000; taxa de matricula na 1ª série: 140$000; mensalidade: 75$000 (de março a outubro); taxa de promoção: 125$000. (FMCP, 1935b). 24 “Ficando a Faculdade a viver apenas das taxas escolares e não sendo estas suficientes para mante-la, fomos constrangidos e forçados a exigir sacrificios dos corpos docente, discente e administrativo, para equilibrar o orçamento, diminuindo os vencimentos dos professores, reduzindo algumas despesas e aumentando as taxas escolares”. (FMCP, 1939c, p. 5). 25 “É de justiça salientar a bôa vontade do infatigavel Prefeito de Belém, o exmo. Snr. Abelardo Condurú, que sempre nos tem auxiliado dentro das possibilidades orçamentárias. Este Prefeito, patriotico cultor da estética, que aformosêa Belém e ampara o ensino superior, como tem feito neste Instituto, em sua inteligente visão, vem demonstrando haver compreendido o alto desígnio da Faculdade de Medicina do Pará, oficina de técnicos defensores da salubridade da Amazônia” (FMCP, 1940b, p. 3). 26 “É necessário enaltecer o valioso auxilio que ás obras do Pavilhão e á Faculdade tem prestado, com sua esclarecida e sensata visão de administrador e homem público, o exmo. Snr. Abelardo Condurú, prestimoso e incansável Prefeito de Belém...” (FMCP, 1941, p. 4). 27 Do mesmo Relatório temos os valores das taxas cobradas pela Faculdade: matricula: Cr$ 200,00; promoção: Cr$ 200,00 laboratório e biblioteca, Cr$ 100,00 (cada); certificado de frequencia por prova parcial Cr$ 150,00 (por 3 provas); frequencia - 9 meses a Cr$ 150,00: Cr$ 1.350,00, perfazendo um total de Cr$ 2.100,00; transferência: Cr$ 100,00; diploma de médico: cr$ 1.000,00 ; defesa de tese: Cr$ 300,00; inscrição para concurso de catedrático: Cr$ 300,00; inscrição para concurso de docente-livre: Cr$ 100,00; histórico escolar; Cr$ 1.900,00; exame final: Cr$ 150,00. Também é mencionado o salário de um professor: Cr$ 700,00 mensais. Para o ano de 1947 seria proposto um reajuste nas taxas, que chegariam ao valor total de Cr$ 2.600,00, a serem pagas em quatro prestações de Cr$ 650,00, nos seguintes vencimentos: 10 a 25 de fevereiro; 1 a 10 de maio; 1 a 10 de agosto e 1 a 10 de novembro. O reajuste geraria uma grande reação dos estudantes, culminando com o movimento pela federalização da Faculdade (FMCP, 1947b, p. 330). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 28 “Com a presença do ministro Clemente Mariani, o deputado Epílogo de Campos assinou hoje o acordo definitivo com a União que se compromete a entrar com a quantia de quatrocentos mil cruzeiros a fim de ser melhorado o aparelhamento da Faculdade de Medicina do Pará” (Folha do Norte, 24.05.1947, p. 1). 211 A manutenção financeira 212 14 A Expansão 213 214 Pintura na parede do Salão Nobre da FMCP. Após a aquisição do prédio de Santa Luzia, a direção da Faculdade tratou de promover as adaptações necessárias ao seu perfeito funcionamento, bem como dotá-lo de equipamentos e material para o curso médico, aproveitando os recursos provenientes das listas de doações idealizadas por Camillo Salgado, distribuídas pela sociedade paraense, bem como os oriundos das prefeituras do interior. O relatório referente ao ano de 1922, o primeiro sob a direção efetiva de Camilo Salgado (que assumiria definitivamente em abril daquele ano), aponta para um crescimento das contas da Faculdade e sua conseqüente aplicação. Além disso, o relatório detalha Que addicionado ao valor do novo predio (de Santa Luzia), ora em remodelação; ao valor dos predios localizados á avenida Generalissimo Deodoro e á rua Bernal do Couto; do material cirurgico de anatomia, operações e anatomia pathologica, dos laboratorios modestos e dos utensilios e moveis existentes, quer no laboratorio de microbiologia da Santa Casa, quer no necrotério do Estado, quer na sede da escola, e mais a importancia 67:850$000,00, de auxilio das intendencias municipais, alem dos titulos de divida do thesouro do Estado, eleva-se o patrimônio da nossa Faculdade de Medicina a 369:959$890 (FMCP, 1923, p. 6). Note-se que o relatório, publicado em julho de 1923, além de mencionar o prédio de Santa Luzia – já sendo reformado –, inclui ainda no patrimônio da Faculdade os prédios adjacentes, onde seriam construídos os demais componentes da Escola, fazendo com que a quando da constituição da Universidade Federal do Pará, seu patrimônio fosse considerado o maior a ser incorporado à nova Instituição1. As reformas e adaptações da nova sede da escola, ao lado dos necessários equipamentos foram notícia em Folha do Norte: O paquete “Santos” do Lloyd Brasileiro, esperado hoje neste porto, traz parte do Laboratório de Microbiologia destinado á Faculdade de Medicina do Pará. Esses apparelhos, adquiridos com os proprios recursos do estabelecimento, compõem-se de seis excellentes microscópios... [...] (Folha do Norte, 18.03.1924). A menção aos melhoramentos da Faculdade também está presente nas Mensagens Governamentais relativas aos primeiros anos da Escola. Na Mensagem de 1924, o governador Dr. Antonino Emiliano de Souza Castro, fundador e também professor da Faculdade, a esta assim se refere: Tendo adquirido predio proprio, á praça Santa Luzia, em frente ao hospital da Santa Casa de Misericórdia, ahi, depois de completamente remodelado e adaptado, está funcionando a Faculdade, com laboratórios modernamente installados e um corpo docente, em numero de 34 professores, capaz e devotado ao levantamento do ensino (PARÁ. Governador (1921-1925: Antonino Emiliano de Souza Castro), 07.09.1924, p. 68). No ano seguinte, o Governador Dionysio Ausier Bentes, também professor da Faculdade, fala das melhorias da escola2. O mesmo Governador, em sua Mensa- A expansão 215 gem para 1926, menciona o razoável aparelhamento com que contava a Faculdade (PARÁ. Governador (1921-1925: Dionysio Ausier Bentes 07.09.1926, p. 33). Voltando ao Relatório de 1922, Camillo Salgado destaca o gesto do Dr. Cypriano Santos, Diretor Clínico do hospital da Santa Casa, pela cessão de uma enfermaria especial para as aulas de Clínica Cirúrgica sob a responsabilidade do próprio Camillo (FMCP, 1923c, p. 11). Em ofício encaminhado ao Dr. Rebello Horta, o Diretor da Faculdade informa, em 12 de novembro de 1927, o envio da planta de ampliação da Faculdade “de modo a dispormos de espaço para instalarmos um hospital para molestias tropicais exclusivamente para tratamento de indigentes” (FMCP, [1925-1928]). Sempre se queixando de problemas financeiros, a Direção da Faculdade — segundo ela, fazendo milagres — foi aos poucos equipando-se com o que havia de mais moderno, a fim de oferecer um curso de alta qualidade. Assim é que na Mensagem Governamental para o ano de 1930, o governador Eurico Valle referindo-se à Faculdade de Medicina, menciona a construção de um pavilhão anexo ao prédio principal3. No mesmo documento é informado que os aparelhos para os laboratórios já haviam sido encomendados na Alemanha (PARÁ. Governador (1929-1930: Eurico de Freitas Valle) 07.09.1930, p. 92). 216 A planta deste pavilhão era de “auctoria do Snr. Augusto P. Lobão que a fez desenhar pelo Snr. Obi Rodrigues da Silva de accordo com as indicações desta Directoria”4 Este prédio foi construído em continuação ao prédio principal, pela Generalíssimo Deodoro, e pode ser observado em foto existente no Relatório de 1935. No novo prédio encontrava-se o salão nobre, cuja inauguração foi citada na imprensa por conta do início das aulas em 1932: [A abertura dos cursos] Realizou-se no novo e amplo salão da congregação, recentemente construído em estylo moderno, onde os lavores em madeira se destacam e impressionam agradavelmente a todos. Foram ao mesmo tempo inauguradas as novas bancadas da congregação, que assentam em dois planos, ficando ao fundo a mesa da direção dos trabalhos em que tomaram logares... (Folha do Norte, 02.03.1932). O Relatório de 1935 refere que “as difficuldades pecuniarias não impediram que, em 1935 adquirissemos ainda material para o laboratório de Physiologia, no valor de doze contos e quinhentos (12:500$000) (FMCP, 1936c, p. 6). Naquela ocasião já estavam em funcionamento os laboratórios de Física, Química, Histologia, Anatomia Patológica e Microbiologia, sendo este último anexo ao hospital da Santa Casa, “provido de apparelhagem moderna e material indispensavel ao fim a que se destina”.5 Os dados do referido relatório informam ainda que o laboratório de Parasitologia inaugurado naquele ano estava instalado na sala de frente do novo pavilhão (pela Generalíssimo). Embora considerado como modesto, possuía “mesa de cimento armado com tampo de azulejo verde, provida de gaz, água e duas grandes pias com despejo para o exgotto” (FMCP, 1936c, p. 35). No local eram também ministradas aulas teóricas. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Foto 27: Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará em 1935 já com o pavilhão do Salão Nobre em anexo. Fonte: FMCP (1936, s.p.). 217 Foto 28: Salão Nobre da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Fonte: FMCP (1936, s.p.). 218 Foto 29: Laboratório de Parasitologia. Fonte: FMCP (1942b, s.p.). Em outra sala, atrás da de Parasitologia foi instalado o gabinete de Histologia e de Anatomia Patológica. Este gabinete é assim descrito no Relatório: Possue quinze mesas de marmorite, providas de gavetas e logar apropriado para guardar os microscópios; uma grande mesa de cimento armado com tampo azulejado de verde, provida de gaz, agua e duas grandes pias com despejo para o exgotto. Ao lado tem uma sala – gabinete do professor, que, infelizmente, ainda se recente de algumas falhas; e um pouco adiante, outra, destinada ás estufas (FMCP, 1936c, p. 35). Os equipamentos também são detalhados: Já contamos com um diascopia para micro e macro projecções, com iluminação de arco voltaico e um epidiascopio com iluminação electrica por incandescência. Possuímos vários microscópios, monoculares uns, e binoculares, outros, além de moderníssimo apparelho denominado “Metaphot”, não só para Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 observação microscópica directa de corpos transparentes e opacos, quer por um só observador, que por diversos, como também para projecção a distancia media (FMCP, 1936c, p. 36). As aulas práticas de Técnica operatória e de Anatomia eram feitas no necrotério da Faculdade, que ficava localizado no prédio principal, pelo lado da Generalíssimo. O gabinete de Farmacologia estava para ser instalado, com as aulas sendo ainda ministradas no laboratório do curso de Farmácia, que funcionava na própria Faculdade de Medicina, naquele período. O gabinete de Fisiologia, já com alguns equipamentos adquiridos, deveria ser montado ao longo do ano de 1936. Ainda em 1935, a Faculdade recebeu um auxílio do Governo Federal no valor de vinte e cinco contos de réis (25:000$000), que foi dividido cabendo 50% para os vencimentos dos professores e 50% para compra de material dos laboratórios, “como é de lei” (FMCP, 1936c, p. 36). Entre 1936 e 1937, o prédio principal da Faculdade sofreu uma grande reforma, mudando profundamente suas características e, particularmente, sua fachada. Para a tal reforma foram apresentados orçamentos para análise pelo Conselho Técnico Administrativo, que concluiu pela indicação do orçamento apresentado por Manoel Francisco do Carmo por várias razões: 1 - porque o seu signatário é pessôa conhecida desta Faculdade, onde trabalhou na construcção do pavilhão novo, tendo revelado indiscutivel capacidade profissional e firmado, ao que parece, inteira idoneidade moral; 2 - porque sendo embora seu orçamento laconico, feito em termos muito gerais, abrange todas as obras de que necessita o predio, silenciando apenas sobre o mirante, ao alto da fachada da frente, que a Commissão pensa que deve ser modificado na sua architectura, assemelhando-a á da fachada; 3 - porque entre os orçamentos é o que se propõe a fazer as obras por preço menos elevado [...] (FMCP,1936b). Segundo a proposta apresentada pelo sr. Manoel Francisco do Carmo, os serviços a serem realizados consistiriam de: 1. Derribar a massa velha da fachada do prédio velho, tirar as sacadas, as grades de ferro, e portas e caixilios que correspondem a fachada; nas portas de baixo será fechada com tijolos até a altura de 1m. conforme está no prédio novo, as grades de ferro passarão para as portas de cima, nas janelas de baixo levará soleira de marmorite. 2. Rebocar a fachada do predio velho, levando massa de 14x1, ficando de accordo conforme está no predio novo, levando caixilios de acapú, venezianas de acapú, portas de seguranças com os seus respectivos caixilios de freijó; nas portas de cima levarão caixilios de acapú, e portas acapú com postigos de freijó; os trez vões da porta da frente serão de acapú. 3. Fechar trez vões de portas, e calçar o assoalho do salão onde vae ser biblioteca, fazer sete vões de porta em acapú para banheiros e centinas. A expansão 219 4. Caiar o predio velho por dentro, nos compartimentos que são caiados, e pintar os que são pintados, concertar o estuque, e pintar todos os caixilios e portas, e janelas por dentro e por fora do prédio velho, o necrotério levará uma limpesa geral e moisaicar a thesouraria (FMCP, 1936b). Ao final do documento, o proponente se comprometia a preparar prédio velho para que ficasse “conforme está no predio novo, tudo muito bem acabado” (FMCP, 1936b, p. 36). Digno de registro, por seu valor histórico, são os orçamentos apresentados por outras duas firmas, que implicavam, também, grandes modificações ao prédio original. Um dos orçamentos propunha: “Modificação nas três frentes para ficarem iguais ao prédio a ser construído; fechamento de janelas do térreo; cortar terraços e marquises de cimento armado;” Outro orçamento previa mudanças mais radicais: Demolição dos terraços, inclusive a parte superior; Construção de terraços de cimento armado em substituição aos demolidos; Demolição completa das guarnições da fachada principal e seu revestimento para igualar ao prédio recém construido; Fechamento de janelas e de portas no térreo6. 220 Ressalte-se que todos os orçamentos mencionavam que as modificações seriam para adaptar o prédio antigo ao recém construído. Deste modo, tomados, quem sabe, por um ímpeto de modernidade, os dirigentes da Faculdade autorizariam a primeira grande descaracterização do palacete de Santa Luzia. Este fato foi saudado pela Revista do Acadêmico de fevereiro de 1948, em artigo intitulado: “Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Sua fundação e condições atuais de existência”, onde temos que: “O prédio primitivo continuamente tem sofrido profundas e radicais remodelações, adaptando-se cada vez mais à sua finalidade” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 48). Outras tantas se seguiriam até os dias atuais. Com a saída das aulas práticas e a “divisão” dos prédios pelos outros cursos da área da saúde, bem como sua destinação para outras funções, praticamente desapareceu o conjunto que se poderia chamar de Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, ou mesmo Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Pará. O laboratório de Farmacologia seria inaugurado em 1938. Construído e montado pelo prefeito municipal Dr. Alcindo Comba do Amaral Cacela, recebeu o nome deste, em homenagem a seu construtor, “pelos relevantes serviços prestados á Faculdade durante a sua profícua administração (FMCP, 1936b, p. 6). Uma placa, hoje desaparecida, foi afixada no referido laboratório, marcando o acontecimento. Para a instalação do laboratório de Farmacologia, o antigo anfiteatro teve o porão aterrado e revestido por mosaico, suas paredes revestidas de azulejo e construídas Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 duas mesas de marmorite, além da necessária instalação de gás, água e despejo de esgoto. Para sua construção, a Faculdade solicitou ajuda também do senador Abelardo Conduru, a quem foi encaminhado orçamento de “mosaicos e aterro necessarios para o futuro gabinete (FMCP, 1936a). A aparelhagem foi adquirida na Alemanha (FMCP, 1939c). Naquele ano de 1938 estudavam na Faculdade apenas 154 alunos, o que concorria para a condição financeira da Escola. É citado, também “a criação do curso complementar, que privou a Escola de alunos durante dois anos na primeira série” (FMCP, 1939c, p. 35), o que culminaria por não haver formatura em 1942. Fazendo um resumo da gestão de Camilo Salgado à frente da Faculdade, o Dr. Lauro de Magalhães relaciona a expansão da área física da Escola no período: Nos áureos dezesseis anos de sua direção, Camillo Salgado, aproveitando criteriosamente os peregrinos dotes fisicos, temperamentais, morais e intelectivos com que Deus o agraciára, cristalizou sua obra magna, construindo um pavilhão modesto, mas capaz, para o estudo de Anatomia prática, o salão da Congregação, que honrará qualquer instituição congênere e os laboratórios de Parasitologia, Histologia, Fisiologia, Farmacologia, Física e Química Fisiológica que completam e fortaleceram com prática, as disciplinas iniciais e básicas do curso médico. (FMCP, 1948b). O Relatório do ano de 1939 informa que a melhora da situação financeira permitiu o início da construção de um novo pavilhão, destinado ao instituto anatômico e orçado em 150:000$000, fora os equipamentos7. O Relatório complementa que, por ser pequeno o número de alunos e contando a Faculdade apenas com o auxílio federal, não seria possível maiores realizações. Deste modo: A nossa Faculdade, de exíguos recursos, como bem sabeis, somente poderá progredir, materialmente, com o concurso financeiro de governos patrioticos e argutos, que vão além das promessas mal cumpridas e que bem compreendam o sacrifício do nosso corpo docente, empenhado tão somente em dotar o nosso Estado com uma Escola que honra a cultura do Norte e que vem prestando assinalados serviços, principalmente á Amazônia, com a colaboração dos nossos médicos. (FMCP, 1940b, p. 3-4). Sobre o novo pavilhão, o referido Relatório diz que as obras foram iniciadas em 3 de dezembro daquele ano, sob a direção do engenheiro Bertino Lima. O edifício é descrito da seguinte maneira: Construído de cimento armado, com as paredes revestidas de azuleijos brancos até a altura de dois metros, tetos estucados e pizos mozaicados, com arejamento e iluminação naturais e artificiais necessarios, conta de dois pavimentos, um terreo, destinado á Anatomia descritiva humana e Técnica operatoria e um superior, á Anatomia e Fisiologia patologicas. Será provido de camara frigorífica para conservação de cadaveres, museu e biblioteca Anatomicas e de todo o material necessario ao ensino das disciplinas a que são destinados (FMCP, 1941, p. 4). A expansão 221 Foto 30: Gabinete de Histologia. Fonte: FMCP (1936c, s.p.). 222 Foto 31: Laboratório de Histologia. Fonte: FMCP (1942b, s.p.). Foto 32: Um projeto de como poderia ficar a fachada da Faculdade após sua remodelação. Fonte: FMCP (1936b, s.p.). 223 Foto 33: Fachada da Faculdade após a grande reforma entre 1936 e 1937 que lhe deu as feições atuais. Fonte: FMCP (1940b, s.p.). 224 Foto 34: Instituto de Anatomia “Camilo Salgado”. Fonte: FMCP (1941, s.p.). Nela viria a funcionar, também, o Serviço de Verificação de Óbitos. Segundo consta do discurso do deputado Dias Jr., por ocasião da apresentação de seu projeto de lei reconhecendo a dívida do Estado para com a Faculdade, o aparelhamento do gabinete de Anatomia Patológica, “no valor de vinte e um contos de réis”, foi um oferecimento do Interventor Magalhães Barata à Faculdade (FMCP, 1939, p. 84). O prefeito Abelardo Condurú, além de material de construção, prometera a câmara frigorífica (FMCP, 1941, p. 4). Este pavilhão, denominado “Camillo Salgado”8, foi construído pela rua Bernal do Couto, adiante do prédio central, porém separado deste, sendo o acesso por aquela rua, conforme foto existente no Relatório de 1940. O Relatório de 1941 destaca como acontecimento de maior relevância o término da construção do novo pavilhão de Anatomia, “em substituição ao antigo, já insu- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 ficiente para o serviço”, mencionando ainda a pretensão de inicio da construção de um novo pavilhão destinado à biblioteca e ao gabinete da Diretoria, “conforme planta e orçamento que serão submetidos aos senhores professores” (FMCP, 1943b, p. 4). Mais adiante detalha o pavilhão, citando que o andar superior seria destinado ao ensino de Anatomia descritiva e Técnica operatória e cirurgia experimental, “sob a competente direção dos provectos e esforçados professores desta Faculdade, doutores José Alves Dias Junior e Carlos Arnobio Franco, respectivamente”. Era composto por quatro salas: uma para o professor, “onde será instalada uma outra biblioteca especializada”, uma para projeções, “montada com aparelhagem moderna” e duas outras, “para preparações anatomo-patologicas e autopsias”. O andar inferior é descrito da seguinte maneira: O pavilhão terreo consta de um vasto salão, com uma galeria de madeira, construida de acapú, e páu amarelo, movel, com atracações de ferro, com dois andares, encurvada em U, de maneira que os estudantes que a ocuparem, em numero de cincoenta, possam vêr facilmente a demonstração que fôr feita na mesa operatoria, disposta no centro. Possue ainda quatro mesas para dissecção, de marmorite, fixas, com descarga para o esgoto geral. Uma sala de estudo para o professor, onde será instalada uma biblioteca especializada, e outra para a montagem de uma camara frigorifica, com capacidade para seis cadáveres (FMCP, 1943b, p. 57). 225 Foto 35: Sala para aulas de Anatomia Humana e Técnica Operatória, vendo-se a galeria encurvada em “U” e com capacidade para 50 alunos. Fonte: FMCP (1941, s.p.). Segue-se o detalhamento das outras salas, como a de autopsia, composta de três mesas de marmorite, fixas, “com descarga para o esgoto geral”, de um tanque com água corrente abundante e de uma mesa de mármore, “provida de gás”. Foto 36: Sala de Autopsias. Fonte: FMCP (1941, s.p.). 226 A sala de projeções possuía “quatorze mesas de marmore, com tomada elétrica ao lado para os microscópios” além de três aparelhos “para projeções no écran,” dois dos quais destinados também a microfotografias. Foto 37: Sala de Projeção. Fonte: FMCP (1941, s.p.). Na sala para estudos anatomo-patologicos é mencionada a existência de uma mesa de cimento armado, “revestida de azulejos brancos”, provida de gás, água e “duas grandes pias de louça, com despejo para o esgoto”. São mencionados ainda “um possante centrifugador elétrico, balança de precisão e o material indispensavel ao ensino prático”. Tudo isso ficaria sob a direção técnica “do competente e estudioso professor dr. Jayme Aben-Athar, catedrático de Anatomia e Fisiologia patológicas” (FMCP, 1941, p. 57). 227 Foto 38: Laboratório de Anatomia Patológica. Fonte: FMCP (1941, s.p.). Em 3 de março de 1942, Folha do Norte noticia o início do ano letivo na Faculdade e a inauguração do novo pavilhão, ocorrido no dia anterior, após a aula inaugural proferida pelo professor Prisco dos Santos, sobre o tema “Abdome Agudo”, e que A expansão contou com a presença de várias autoridades como os representantes do Exercito, da Marinha e da Aeronáutica, do Interventor e o prefeito municipal. Acompanhados pelo Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, os visitantes percorreram o novo prédio, que custou à Faculdade a quantia de 254 contos, estando o frigorífico, com suas oito cubas, ainda em fase de conclusão. Após a visitação houve a inauguração do retrato do prefeito municipal, professor Abelardo Condurú, na sala da principal do pavilhão9, sendo o homenageado saudado pelo professor Dias Junior. A notícia conclui que “sob o artístico retrato do sr. prefeito, está fixada uma placa de prata (com) esta dedicatória: ‘Ao prefeito Abelardo Conduru, a Faculdade de Medicina agradecida”10. Do retrato do prefeito, com sua “placa de prata”, não se tem notícia, soando como profético o trecho final do agradecimento a ele constante do Relatório de 1941: ...a lembrança dos bons que a morte leva fica na memória do coração dos vivos, como há de ficar na Faculdade de Medicina do Pará a de Abelardo Condurú, ainda mesmo que as traças, valendo-se futuramente dos descuidos dos homens ingratos, consigam apagar as feições do magnanimo Prefeito [...] (FMCP, 1942b, p. 8). 228 Foto 39: Aspecto da inauguração do Pavilhão de Anatomia “Dr. Camilo Salgado” quando falava o Diretor Dr. Lauro de Magalhães, direita João Prisco dos Santos, a esquerda no fundo e de bigode Emiliano de Souza Castro (filho). Fonte: FMCP (1942b, s.p.). Foto 41: Aspecto da inauguração do Pavilhão de Anatomia “Dr. Camilo Salgado” quando falava, agradecendo a aposição de seu retrato, o sr. professor Abelardo Condurú, Prefeito de Belém. Fonte: FMCP (1942b, s.p.). 229 Foto 40: “Um aspecto da inauguração do Pavilhão de Anatomia quando falava o Dr. Dias Junior”. Fonte: FMCP (1942b, s.p.). Foto 42: Um aspecto da inauguração do Pavilhão de Anatomia “Dr. Camilo Salgado”. Fonte: FMCP (1942b, s.p.). 230 Foto 43: Câmara frigorífica com capacidade para seis cadáveres. Fonte: FMCP (1942b, s.p.). Foto 44: Tanque para conservação, em formol, de peças cadavéricas. Fonte: FMCP (1942b, s.p.). O pavilhão, posteriormente teve sua entrada externa fechada, ficando o acesso pelo pátio interno da Faculdade. Desativado como unidade de ensino e desvirtuado de suas funções, abriga atualmente uma agencia bancária, um auditório denominado Prof. Monteiro Leite e seções administrativas. Em 20 julho de 1942, com a Faculdade sob a direção do Dr. Lauro de Magalhães, seria iniciada a construção de um novo prédio, “com dois pavimentos, o inferior destinado a biblioteca e o superior ao gabinete da Diretoria”, cuja inauguração estava prevista para o “dia da sessão solene de reabertura das aulas” (FMCP, 1943b). Esta obra é mencionada no discurso do prof. Dias Jr., em saudação ao prefeito Abelardo Conduru, por conta de uma futura homenagem ao presidente Getulio Vargas e o governador do Estado, José Carneiro da Gama Malcher: Infelizmente, por circunstancias especiais, não fôra ainda possivel apôr as efígies do eminente presidente Getulio Vargas e do ilustre chefe deste Estado no salão de honra destinado à Diretoria e para cuja construção s. excia. está a concorrer com dadivosas contribuições, que põem certamente brilhantes reflexos nas altruísticas qualidades morais de s. excia. (FMCP, 1943b, p. 29). No ano de 1943 prosseguiram as obras na Faculdade. Segundo o Diretor, no Relatório daquele ano, apesar do reduzido número de alunos, a situação financeira era “lisonjeira”, sendo possível realizar obras de “carater inadiavel”. Assim, foi concluído A expansão 231 o pavilhão destinado à biblioteca – no térreo – e ao gabinete da Diretoria – no andar superior. A inauguração aconteceria em 1º de março daquele ano (FMCP, 1944b, p. 4). Este pavilhão era contíguo ao prédio principal, pela Generalíssimo Deodoro. Além do novo pavilhão, mais algumas obras são descritas no Relatório: Derrubamos paredes para alargar uma sala destinada á secretaria, que foi completamente remodelada, tendo sido substituído o soalho, que se achava em mau estado de conservação, por um piso de mosaico. Para essa repartição foi adquirido também o necessário mobiliário. Mosaicamos a sala, onde primitivamente funcionou a Congregação, depois de ter sido construída uma viga de cimento armado. Foram mosaicados também os corredores e azulejadas as paredes, até um metro e oitenta centimetros de altura. Sendo insuficiente a distribuição de água nos diversos gabinetes e outras dependências do prédio, construímos dois tanques de cimento armado, com capacidade, cada um, para dois mil litros, ficando um na parte terrea e outro no andar superior. Para este fim, adquirimos, por quatro mil e cem cruzeiros, uma bomba motor acionada por eletricidade. Pintamos externa e internamente o prédio, que necessitava de uma limpeza geral (FMCP, 1945b, p. 4). 232 No ano seguinte, novas obras são detalhadas no Relatório da Faculdade, como a construção do laboratório de Microbiologia e remodelações no prédio principal, com derrubada de paredes, alargamento de salas, aterramento de porões, substituição dos soalhos por piso de cerâmica e azulejamento de paredes, ao custo de Cr$ 108.427,40, a despeito da situação financeira ser considerada difícil. Também foi adquirido um terreno contíguo ao prédio, para a construção de uma nova ala (FMCP, 1945b, p. 4). O laboratório de Microbiologia foi construído na sala onde funcionou o laboratório de Farmácia galênica. O local teve o porão aterrado e revestido por cerâmica; as paredes azulejadas. Foi construída uma mesa de cimento armado e outra de madeira impermeabilizada, provida de gás, água e duas grandes pias com despejo para o esgoto. Quatro mesas semi-ovais de mármore foram colocadas nos vãos das janelas para receberem luz diretamente (FMCP, 1945b, p. 29). No discurso alusivo aos 25 anos de fundação, comemorados naquele ano de 1944, o professor Acylino de Leão faz uma síntese do quanto crescera a Faculdade em seu espaço físico e em equipamentos: Começamos mediocremente instalados, apenas contando de vulto com a Santa Casa de Misericórdia para os cursos práticos das clínicas, a que Orlando Lima ajuntou o Laboratório de Biologia, criado principalmente para proveito do ensino, embora de real utilidade ao hospital. Hoje, a nossa Faculdade, que se ostenta em face a uma das alas do grande nosocômio, pode ser mostrada aos peregrinos, com a sua bela sala da Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Congregação, laboratórios de Parasitologia e de Histologia, realizações do saudoso Camilo Salgado; o vistoso salão da Diretoria, a Biblioteca e o vasto Pavilhão de Anatomia, provindo de tudo para a ministração das cadeiras básicas da medicina, [...] (FMCP, 1945b, p. 66). Dando continuidade às reformas e ampliações do “complexo” de Santa Luzia, o Relatório de 1945, mesmo continuamente reclamando da falta de verbas, do descaso do governo e da reduzida matrícula faz referência à substituição de escadas e portas do prédio principal e à compra de um motor para a câmara frigorífica11. Também seriam adquiridas novas obras para a biblioteca, que passaria a contar com 1.626 obras e 2.120 volumes (FMCP, 1946b, p. 66). No Relatório do ano seguinte, 1946, o Diretor Dr. Acylino de Leão diz ter feito “o que [me] foi possível realizar”, dentro das condições financeiras da Faculdade, citando a melhoria do prédio, o aparelhamento dos laboratórios e a aquisição de livros para a biblioteca, além da aquisição de dois terrenos, “para a construção de nova ala” (FMCP, 1947b, p. 3). O relatório enviado ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde diz o seguinte, sobre este período [Dr. Acilino de Leão, eleito em janeiro de 1944] continuou, criteriosa e dignamente, a grande obra iniciada, remodelando toda a parte terrea do velho prédio, além de muitos melhoramentos introduzidos, inclusive a instalação e aparelhamento do laboratório de Microbiologia, substituição da antiquada escada que dá acesso ao prédio por outra de marmorite e completa remodelação da sala da Secretaria, que ficou com acomodações condignas.12 Foto 45: Biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Fonte: FMCP (1944b. s.p.). 233 Foto 46: Mesas de Estudo da Biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Fonte: FMCP (1944b, s.p.). 234 Foto 47: Estanteria da Biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Fonte: FMCP (1951, s.p.). Foto 48: Gabinete da Diretoria. Observando-se no canto direito a estátua de Asclépio, posteriormente colocada nos jardins da Faculdade. Fonte: FMCP (1944b. s.p.). 235 A Revista do Acadêmico de Medicina, de fevereiro de 1946, também menciona os melhoramentos realizados na Faculdade: Nessa ala que outrora constituída o único edifício, encontramos as diversas salas de aulas, dependências da administração, salão nobre, laboratório de Química Biológica, Departamento de Histologia e Embriologia, Gabinete de Física Médica, de Farmacologia e o Laboratório de Microbiologia. (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 48). O texto faz referência, ainda, aos dois pavilhões recém construídos, citando em um deles o anfiteatro de anatomia contendo frigorífico para seis cadáveres e cubas para formol, sala de projeção bem equipada no térreo. No andar superior, o Departamento de Anatomia Patológica e o Serviço de Verificação Óbitos. Era o Instituto Anatômico, denominado “Camilo Salgado”. O outro pavilhão continha a biblioteca, com cerca de 2.000 volumes, chamando atenção pelo seu “admirável mobiliário” com os móveis contendo as inicias FM esculpidas na madeira13. No andar superior localizava-se a sala do Diretor. A expansão Apesar de toda a ampliação, equipamentos e melhorias, o ministro da Educação e Saúde, Dr. Ernesto de Souza Campos, em visita a Faculdade, em 30 de julho de 1946, assim se manifestou sobre as condições da Escola: A [Faculdade] do Pará está em funcionamento há quase três decênios, mas ainda não está aparelhada, como é de desejar para desenvolver trabalho mais perfeito de preparação dos nossos médicos. Há um elemento que é primordial: a objetivação para os laboratórios e para os livros. [...] O aparelhamento da Faculdade do Pará é já considerável, mas é necessário envidar esforços para que o aluno possa participar do ensino prático. Devem apelar para que haja um auxílio do govêrno federal, ou do estadual, ou do municipal, destinado a aquisição do material... (Folha do Norte, 31.7.1946, p. 4). As obras das primeiras gestões de Lauro de Magalhães são lembradas no relatório enviado pelo próprio ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde: 236 Foi eleito para substitui-lo, no dia 12 de março de 1938, o professor dr. Lauro Antunes de Magalhães [...] continuou com assombro, orientado pelos mesmos principios, metodos e sentimentos, a sua patriotica obra, construindo um pavilhão com dois andares, em cimento armado, um térreo para Anatomia e Técnica Operatória e outro superior para Anatomia e Fisiologia Patológicas, dentro dos moldes e exigencias mais modernas, com frigorifico para consevação de cadaveres e toda a aparelhagem indispensavel à prática do ensino anatomico. [...] No segundo triênio de sua administração, além de conservar e melhorar tudo que até então fora feito, construiu um salão de Diretoria e recepção com o conforto e mobiliário digno de suas finalidades e a Biblioteca, incontestavelmente a obra mais meritoria e necessária, onde o corpo discente encontra atualmente tudo de mais antigo, de mais classico e também de mais moderno, da literatura cientifica médica...14 Os dados de 1947, apesar de mencionarem a falha no pagamento das verbas públicas, revela a aquisição de novos e modernos aparelhos para os laboratórios, abundante material de consumo, mobiliário para o gabinete da diretoria e livros para a biblioteca (FMCP, 1948c, p. 3-4). Folha do Norte, de 7 de maio de 1947, noticiava para o mês seguinte o inicio da construção de uma nova ala, cuja planta havia sido encaminhada ao Ministério da Educação, para efeito de aprovação. O novo prédio seria construído em dois terrenos adquiridos pela Faculdade em 1944 e 1946 pela importância de 50.000 cruzeiros, contando a Faculdade inicialmente com uma dotação orçamentária de Cr$ 400.000,00 incluída no orçamento da União pelo deputado Epílogo de Campos.15 O ano de 1948 foi um “ano fecundo, cheio de realizações”, com o inicio da construção de uma nova ala, constando de um grande salão de vinte e cinco metros de comprimento, por quinze de largura, para conferências; dois gabinetes, um para Química Fisiológica e outro para Fisiologia e duas confortáveis salas de aulas. O salão encontrava-se devidamente mobiliado e os gabinetes montados com o material inMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 dispensável para o ensino. Os dados do Relatório daquele ano informam que, com a construção do novo pavilhão, executado com todo rigor da ciência moderna, “fica a Faculdade melhor aparelhada para transmitir à mocidade ensino útil e eficiente”16. Na sequência do texto é informado que a Faculdade pretendia iniciar em 1949 a construção de um pavilhão para o Instituto de Higiene, visando à criação de cursos especializados para a formação de médicos de Saúde Pública (FMCP, 1949b, p. 3). O Relatório do Ano de 1949 cita que aquele ano fora de “notáveis empreendimentos”, com a inauguração, “em primeiro de maio – trigésimo aniversário da instalação deste Instituto de ensino superior”, do novo prédio, “construído em cimento armado”, com laboratório de Química Fisiológica e de Fisiologia, “devidamente aparelhados”, além de duas salas de aulas e de um auditório “de vinte e cinco metros de comprimento por quinze de largura, com capacidade para duzentas e cinquenta pessoas sentadas”. Sem conter a emoção, o Dr. Lauro de Magalhães, Diretor da Faculdade, referindo-se ao novo prédio, arremata: “Quem nele penetra sente sobre o moral e o físico, a influência benéfica do meio”. A obra, orçada inicialmente em Cr$ 950.000,00, elevou-se a Cr$ 1.100.000,00, “devido a serviços complementares” (FMCP, 1950b, p. 3). No exaustivamente citado relatório ao Diretor de Educação e Saúde, o próprio Lauro de Magalhães assim descreve as construções: [Lauro de Magalhães] iniciou a construção de um grande pavilhão de dois andares, em cimento armado, o inferior com duas amplas salas bem iluminadas e arejadas para aulas e duas outras para os laboratórios de Química Fisiológica e Fisiologia, montados com todos os requisitos da ciência; e no superior um salão de proporções amplas, de linhas severas e elegantes, verdadeiro auditorium, para conferencias e outros fins similares, até então realizados no salão da Congregação (FMCP, 1948b, p. 3). Em seu discurso na inauguração do novo Pavilhão, o Dr. Lauro de Magalhães destacaria: A inauguração deste Pavilhão não é mais do que a realização de um sonho, que mais uma vez se materializa em uma obra, parte de um plano idealizado há 30 anos por seus abnegados fundadores, dirigidos pelo gênio criador e paternal de Camillo Salgado [...] neste momento, quando abrimos, a professores e alunos, os portais de quatro novas salas de aulas teóricas e práticas, e os de um salão para conferências, construídos num só bloco, ungidos aos princípios e modelos arquiteturais e artísticos, simples, elegantes e modernos, e aparelhados com o que há de mais necessário e útil para fins médicos, didáticos e instrutivos. Destaca-se de todos êste salão, denominado com justeza — auditorium — amplo, confortavel, claro e arejado, com iluminação artificial e velada, para utilização noturna, provido dos modernos artifícios de acústica, aparelhos de projeções e filmagens, e com acomodações para mais de duas centenas de espectadores, satisfazendo às necessidades culturais e didáticas da Faculdade e dos Institutos e Sociedades que lhe são correlatos (FMCP, 1948b, p. 13). A expansão 237 Auditório. achada do Foto 49: F , s.p.). b CP (1950 Fonte: FM 238 itório. interna do Aud Foto 50: Vista (1950b, s.p.). Fonte: FMCP rio. ário do Auditó Foto 51: Mobili .). s.p , (1950b Fonte: FMCP 239 Este seria o prédio do Pavilhão posteriormente denominado Lauro de Magalhães, em homenagem ao seu construtor, inaugurado oficialmente em 1º de maio de 1949, no 30º ano de fundação da Faculdade. Atualmente é ocupado pelo curso de enfermagem, restando para uso comum o auditório, que já foi um dos maiores e mais modernos que a cidade já teve, hoje bastante maltratado pela falta de conservação. É mencionado ainda, no Relatório de 1949, a inauguração do Biotério, para maio do ano seguinte, informando a modificação da planta deste e o conseqüente reajuste do orçamento, e também a aquisição de terrenos para a construção do Instituto de Higiene17. Sobre o Biotério, o Dr. Lauro de Magalhães disse em seu discurso de inauguração que o referido prédio encerrava “o ciclo de construções no decurso da brilhante e agitada vida de Escola livre e autônoma”, pois para completar o ensino AnátomoBio-Fisológico humano, faltava um instituto onde se pudesse praticar a Medicina e Cirurgia experimentais comparadas, em todos os setores, “como nas Escolas Médicas modernas”. Também desde a inauguração do Pavilhão de Anatomia, sete anos antes, já estava prevista a construção do Biotério. Entretanto, “outras necessidades mais prementes e mais imperiosas [...] encheram este longo período de sete anos”, e que somente no ano anterior é que surgiram “oportunidade e recursos financeiros para dar corpo a mais um projeto”, que se apresenta “na plenitude elegante das linhas A expansão arquitetônicas e na grandeza, confôrto e instalação das dependências, criteriosamente ajustadas”. Frisava Lauro de Magalhães que o novo prédio exprimia, como um marco simbólico, “materializado em pedra, cal e cores”, a separação de duas idades distintas de uma vida, “que promete resistir à ação destruidora do tempo e ao esquecimento e ingratidão dos homens, como os monumentos perenes ou as obras eternas”. Explicitando, o Diretor definia a primeira fase como a “fase de ouro de uma longa e radiosa adolescência”, iniciada havia 31 anos, na mesma data, “no porão de um prédio quase secular”, “revelada por um espírito de escol e filho dileto de Deus” – Camilo Salgado, 240 que imitando os santos fundadores de ordens monásticas e instituições religiosas, congregou em volta de inconfundível personalidade, à sombra de incomparável prestigio, ao endôsso de imaculado nome e tutela e garantia de qualidades intelectuais e morais, uma plêiade de colegas, discípulos e devotos, sonhadores e idealistas à sua imagem, que, numa união sagrada, movida pelo mais puro altruísmo e sublime despreendimento, lenta e progressivamente, os três corpos integrantes, o docente, o administrativo e o discente. Conjugados numa corrente de sacrifícios, desinterêsses e coadjuvações, numa vontade forte de economia, e honestidade, conseguiu êle elevar êste monumento de Ensino Superior, que imortaliza os seus fundadores, honra a nossa terra natal e dignifica a nossa Pátria, que, agradecida, acaba de recompensar-nos com o prêmio, justo e merecido: a Federalização. Nas palavras de Lauro de Magalhães, se a segunda fase, representada pela Federalização, iniciava-se com a privação do bem mais precioso, “a relativa liberdade” que havia antes, por outro lado prenunciava-se “radiante de promessas e risonhas esperanças”, garantindo uma vida mais calma, mais tranqüila e mais fácil, tanto em recursos financeiros quanto em elementos didáticos, “facilitando financeiramente o curso aos dependentes, continuando as obras iniciadas e executando o programa construtivo estabelecido, que deve culminar com a construção do Hospital das Clínicas e encerrar-se com a Universidade” (FMCP, 1951, p. 28). Foto 52: Vista lateral do Biotério. A esquerda a estátua de Asclépio já em sua localização atual. Fonte: FMCP (1951 s.p.). 241 53: Biotério – Sala para criação de coelhos. Fonte: FMCP (1951, s.p). Foto 54: Sala para animais inoculados. Ao fundo a sala para animais de médio porte. À frente escada de Acesso ao Pav. Superior. Vê-se a grade para a jaula dos macacos. Fonte: FMCP (1951, s.p.). 242 Foto 55: Biotério – Sala de Esterilização. Fonte: FMCP (1951, s.p.). Foto 56: Sala de operações e anfiteatro para aulas práticas localizada no segundo andar do prédio. Fonte: FMCP (1951, s.p.). 243 Foto 57: Sala para animais de médio porte. Ào fundo a escada de Acesso ao Pav. Superior. Fonte: FMCP (1951, s.p.). Foto 58: Vista posterior do Biotério. Fonte: FMCP (1951, s.p.). 244 O Instituto de Higiene De acordo com Folha do Norte, de 16 de dezembro de 1955, no decorrer do ano de 1948, o Conselho Técnico-Administrativo designou uma comissão de professores para, juntamente com a firma de engenharia M. C. Macedo, proceder aos estudos necessários a construção de um edifício que constituísse o núcleo de ensino que pretendia dar ao alunos de Faculdade de Medicina do Pará – o da Patologia Tropical (SERÁ Inaugurado hoje o Instituto de Higiene,1955, p. 10). No Relatório das atividades do ano de 1949, o Diretor informa que para a construção do Instituto de Higiene, fora adquirida “uma área de 2.912,00m² com edificações, na Avenida Generalíssimo Deodoro, em seguimento ao novo pavilhão (o Lauro de Magalhães, recém-inaugurado) (FMCP, 1950b, p. 4). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Possivelmente uma outra área fora desapropriada pela Prefeitura Municipal de Belém, conforme o teor do ofício encaminhado ao Prefeito Municipal, em 5 de fevereiro de 1949, pelo secretário da Faculdade, em que este solicita uma audiência à autoridade municipal, “para tratar de assunto referente aos terrenos desapropriados pelo Conselho Municipal e que vão ser cedidos à Faculdade de Medicina” (FMCP, 1949a). Sobre o mesmo assunto versa o ofício encaminhado ao Prefeito Municipal, Dr. Waldir Bouhid: Exº. Sr. Tendo o Conselho Municipal desapropriado os terrenos de números 30, 34, 36, 40, na Generalíssimo Deodoro, para serem dados à Faculdade, de acordo com o entendimento prévio que tivemos com a Prefeitura, solicito a V. Excia. sua interferência neste sentido, mesmo porque o decreto fixou o prazo de 12 meses para o início das obras. Aproveito a oportunidade para convidar V. Excia. para nos dar a honra de visitar o pavilhão recentemente construído, para verificar o que já realizamos e o que pretendemos realizar. Respeitosas saudações, Dr. Lauro de Magalhães Diretor (FMCP, 1949a) A Folha Vespertina, de 3 de janeiro de 1950, informa o início da construção do pavilhão “onde terão de ser instalados os serviços de Higiene e Saúde Pública e onde também ficarão funcionando os Laboratórios de Microbiologia e Parasitologia e diversos ambulatórios”. O terreno onde seria construído o novo pavilhão, pela av. Generalíssimo Deodoro, contíguo ao bloco inaugurado em maio de 1949, custou à Faculdade a quantia de Cr$ 300.000,00. O Relatório de 1950 relata a paralisação das obras do Instituto, porque uma das cláusulas contratuais dizia que a Faculdade deveria entrar com Cr$ 500.000,00, o que não pôde fazer em virtude da indefinição da nova situação financeira por conta da federalização (FMCP, 1951, p. 3). A Revista do Acadêmico de Medicina de dezembro de 1954 detalhava a construção e informava que ainda naquele ano estariam concluídas as obras do referido instituto, “o segundo do Brasil”. De acordo com a Revista, o Conselho Técnico da Faculdade adquirira em 1949 quatro terrenos juntos ao prédio antigo da Faculdade, num total de 3.920 m², pela quantia de Cr$ 300.000,00. As obras, estavam orçadas em Cr$ 3.800.000,00, para uma verba de Cr$ 500.000,00. Ao se esgotar o dinheiro, a construção foi paralisada. Em 1953, o orçamento da União alocou uma verba no valor de Cr$ 1.300.000,00, sendo reforçada posteriormente por outra de Cr$ 700.000,00. Para 1954 foram apresentadas novas emendas ao orçamento da União, através dos deputados Coaracy Nunes e Paulo Maranhão, visando liberar para a Faculdade mais A expansão 245 Cr$ 1.500.000,00, aos quais viriam se juntar Cr$ 2.320.000,00 conseguidos no Plano Qüinqüenal da S.P.V.E.A. (Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia), posteriormente SUDAM (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia) e Cr$ 2.500.000,00 do orçamento da República. Parte do dinheiro para a aquisição de aparelhos já havia sido entregue, tendo a Faculdade encomendado vários para a instalação. Prossegue a Revista dizendo que as obras estavam bem adiantadas, com o primeiro pavimento já concluído e previsto para entrar em funcionamento em junho. No referido Instituto funcionariam as cadeiras de Higiene, Microbiologia, Parasitologia, além de duas cadeiras de Clínica: Dermatologia e Doenças Tropicais A matéria termina afirmando que “a aparelhagem de que será dotado o Instituto será a mais moderna, sendo mesmo superior àquela do Instituto de Higiene de São Paulo” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1954). As obras, sob a responsabilidade da firma M. C. Macedo, foram iniciadas em 29 de dezembro de 1949 e ficaram paradas durante 26 meses por falta de verbas e também para a adaptação da faculdade de particular para federal, em função da federalização (Folha do Norte, 16.12.1955). A matéria da Folha ressalta que o Instituto seria o primeiro e único até aquela data a ser “inteiramente projetado e construído ao fim a que se destina”. A matéria prossegue descrevendo o prédio 246 Ocupa a edificação uma área de mil e oitocentos metros quadrados (1.800.000m²) distribuídos por três (3) pavimentos de seiscentos metros quadrados (600.000m²) e terá instalações moderníssimas para a cadeiras de Microbiologia e Parasitologia do curso de formação médica e também o de Nutrição, Saneamento, Epidemiologia, Bioestatística, Higiene do Trabalho, dos cursos de pós-graduação que terão início no próximo ano, além de amplo salão para Biblioteca e departamentos especiais para desenho e macro e microfotografia e está o mesmo dotado de um moderníssimo auditório para 100 pessoas a ser equipado com ar condicionado (Folha do Norte, 16.12.1955, p. 10). Além de detalhar sobre as verbas empregadas na construção, a matéria dá maiores detalhes sobre materiais e equipamentos do prédio: 8 mesas de aço inoxidável para trabalhos dos alunos; 2 mesas para microscopia de fórmica negra; 2 mesas para Professor; 75 carteiras de aço inoxidável, individual, para alunos; 2 estufas elétricas; 1 centrifugador elétrico; 28 microscópios monoculares “Zeiss-Winkell”; 3 microscópios binoculares “Zeiss-Winkell” com contraste de fase; 16 microscópios esterioscópios “Meopta” e aparelhagem completa para fotografia (Folha do Norte, 16.12.1955, p. 10). Em matéria especial para Folha do Norte, por ocasião da inauguração, o professor Garcia Filho, afirmava que o novo prédio serviria, ainda, para o funcionamento de Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 cursos de pós-graduação “em assuntos de interesse sanitário da região amazônica”. E descreve assim o edifício: Construção em linhas modernas foi planejado e edificado especialmente ao fim a que se destina e dotado de completo equipamento – e bem traduz a mais arrojada da atual administração, em boa hora entregue ao espírito idealista e disciplinado do professor José da Silveira Netto (GARCIA FILHO, 1955, p. 3). O Instituto de Higiene “Dr. Olimpio da Silveira”18 foi inaugurado em 16 de dezembro de 1954, quando o homenageado completou 50 anos de formado pela Faculdade de Medicina da Bahia. Foi o último prédio construído pelos criadores da Faculdade e seus sucessores. Hoje abriga o Núcleo de Patologia Tropical, sem nenhuma ligação com a graduação em medicina. O projeto de expansão da Faculdade previa a construção de outros prédios, que não chegaram a ser viabilizados. Um deles era o Instituto de Anatomia; na verdade uma ampliação de prédio já existente. O jornal do DAM “Acadêmico de Medicina”, de março de 1956, referindo-se ao assunto dizia que em breve seria iniciada a construção do referido Instituto, quando seria aproveitada a parte da Faculdade onde funcionavam as aulas de Anatomia Humana e Anatomia Patológica. O prédio, que deveria possuir 3 andares e um subsolo, abrangeria as cadeiras de Anatomia Humana, Histologia e Embriologia, Patologia Geral, Técnica Operatória e Anatomia Patológica. O subsolo seria utilizado para a conservação e preparação de cadáveres e contaria com frigorífico, cubas para formol, etc. No primeiro andar seria instalado o departamento de Anatomia. No segundo, a Anatomia Patológica e também a Patologia Geral. No último andar seria para Histologia e Embriologia. A notícia dava conta de que as plantas já estavam prontas, bem como as demais planificações exigidas (Revista do Acadêmico de Medicina, 1956, p. 6). Outro projeto era o da construção de um Centro de Saúde Modelo e da Casa do Estudante de Medicina do Pará, que por serem de uma época posterior ao período abrangido por este livro, deixamos de detalhá-lo, embora faça-se o registro. Da transferência do curso do Ginásio Paes de Carvalho para o palacete de Santa Luzia, até a inauguração desta última obra, foram mais de trinta anos de batalha para dotar o curso de instalações e equipamentos adequados, visando à preparação dos formados pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Este patrimônio invejável, citado como o maior incorporado quando da criação da UFPA, fruto do trabalho de homens comprometidos com a Escola desde a sua criação, simplesmente foi repartido (melhor seria dizer: esquartejado) por vários segmentos da Universidade desfazendo a unidade do curso, um dos propósitos não oficiais da Reforma Universitária implantada na década de 1970. A expansão 247 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. Deste modo, certamente os atuais usuários destes pavilhões, hoje bastante modificados, descaracterizados da suas origens e finalidades, despidos de suas placas alusivas, nem sequer imaginam a saga de sua construção, bem como os nomes dos principais responsáveis por esta história, que teimosamente insiste em resistir através de algumas sobreviventes placas comemorativas de suas inaugurações, ainda não “estirpadas” pela ação saneadora de administradores descompromissados com a História, ainda que esmaecidas pelo tempo e ignoradas por todos os que circulam por seus corredores. Desde sua fundação até a federalização, a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará teve quatro diretores: Antonino Emiliano de Souza Castro (1919- 1922); Camilo Salgado (1922-1938); Lauro de Magalhães (1938-1943); Acylino de Leão (1944-1946); Lauro de Magalhães (1947-1954). Se o Barão emprestou seu nome e seu prestígio para o nascimento da FMCP, Camilo constituiu-se no baluarte para sua estabilização e início do crescimento e aparelhamento. E se Acylino de Leão representou um administrador sóbrio, sob o comando de Lauro de Magalhães a Faculdade experimentou o período de maior ampliação das suas instalações. Entretanto, todos a seu modo, contribuíram inegavelmente para que a Escola de Santa Luzia viesse a ocupar o lugar de destaque que chegou a ter, em nada deixando a desejar às demais congêneres brasileiras. 248 Foto 59: Instituto de Higiene alguns anos após sua inauguração. Atualmente o prédio abriga o Núcleo de Medicina Tropical xe não possuindo mais nenhum vínculo com a graduação médica. Fonte: Acervo da UFPA. NOTAS 1 “Quer antes da criação da Universidade, quer como parte integrante da mesma, a Faculdade de Medicina sempre teve posição destacada no concerto do ensino superior dos Estado. Era o estabelecimento de maior número de funcionários e professores e o que concorreu com maior patrimônio para a formação da Universidade” (MOREIRA, 1989. vol 7). 2 “Esta Faculdade (...) já adquiriu e remodelou o predio onde funcciona dotando-o do apparelhamento necessario a esse ensino”. (PARÁ. Governador 1925-1929: Dionysio Ausier Bentes, p. 58). 3 “Apesar das difficuldades financeiras, sempre crescentes numa obra de vulto como a Faculdade de Medicina do Pará, iniciada sem os recursos indispensaveis ao seu completo apparelhamento, muito custoso, a Directoria está construindo um pavilhao anexo ao edifício principal, de cimento armado, sendo destinado o pavilhão terreo aos laboratorios de microbiologia e anatomia pathologica e á biblioteca, e o superior ao salão da Congregação”. (PARÁ. Governador (1929-1930: Eurico de Freitas Valle) 07.09.1930). De acordo com ofício de 25 de agosto de 1989, endereçado ao Reitor da UFPA pelo então Diretor do CCS/UFPA e Presidente da Comissão Especial encarregada de estudar e sugerir a destinação a ser dada ao prédio de Santa Luzia, Dr. Arival Cardoso de Brito, o novo pavilhão foi construído com a primeira verba federal, no valor de cem contos de réis, sendo inaugurado solenemente em 3 de outubro de 1932, quando se comemorou o Centenário da Transformação das antigas academias Médico-Cirúrgicas, criadas em 1808, em Faculdades de Medicina. (N.A). 4 O mesmo ofício informa a existência de uma cópia da planta, na Faculdade, o que já não existe. (FMCP, 1930-1931). 5 Este prédio é onde hoje está atualmente instalado o serviço de Dermatologia do curso de Medicina (FMCP, 1936c, p. 35). 6 Resumo do orçamento apresentado (FMCP, 1936). 7 O Relatório de 1941 informaria que o preço da construção elevar-se-ia a 254:676$700, com a câmara frigorífica orçada em 54:000$000. (FMCP, 1942b, p. 58). 8 “É um dever de gratidão e de justiça associar a este novo patrimonio, deste este instante denominado ‘Camilo Salgado’... (FMCP, 1943b, p. 25). 9 Em seu discurso de saudação ao homenageado, o prof. Dias Jr. menciona que o retrato estava localizado no gabinete do professor de anatomia: “... no momento em que se inaugura este anfiteatro anatomico [...]. Descerrada, pois, sua efígie no gabinete de estudo do professor desta cadeira...” (FMCP, 1943, p. 28). 10 Ao que parece, a homenagem foi bem mais singela do que a prevista no Relatório de 1941. No citado Relatório é mencionado que abaixo do quadro poder-se-ia gravar “em bonze rijo” a seguinte inscrição: “De vivis nil nisi bonum (Dos vivos nada, a não ser o bom)”, com a justificativa que num anfiteatro anatômico, onde se estuda nos mortos para melhor conhecer os segredos da vida, os estudantes, visando a curta legenda, lembrar-se-iam de que a bondade deve ser uma das qualidades principais do médico. (Folha do Norte, 03.03.1942, p. 8). Também que descobririam na face serena do retratado os reflexos de sua grande generosidade, “manifestada em valiosos e inolvidáveis auxílios oferecidos e empregados na parte nova da Faculdade” (FMCP, 1943, p. 7). A expansão 249 11 250 “...substituímos – longa e inestética escadaria por outra de marmorite, as três portas principais por elegantes portões de ferro e adquirimos por Cr$ 4.200,00, um motor de 2HP para acionar a camara frigorífica para conservação de cadáveres...” (FMCP, 1946b, p. 4). 12 Do ofício encaminhado em 28 de outubro de 1948 pelo Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde, contendo “um breve histórico da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará” (FMCP, 1948b). 13 Até os anos de 1970-80 os móveis originais “resistiam” na biblioteca. Atualmente apenas uma mesa daquela época ainda permanece. Existem ainda algumas cadeiras originais em outros setores, “desviadas” de suas funções. 14 Do ofício encaminhado em 28 de outubro de 1948 pelo Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde, contendo “um breve histórico da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará”. (FMCP, 1948b). 15 Ofício do Diretor do CCS/UFPA ao Magnífico Reitor, Dr. Nilson Pinto de Oliveira, em 25 de agosto de 1989. 16 Mais adiante, o Relatório pormenoriza o novo pavilhão: “Em 20 de janeiro de 1948, iniciou a Faculdade a construção de mais um pavilhão, de dois pavimentos, em cimento armado, sob a direção e responsabilidade da firma construtora Macêdo & Azevedo, de acôrdo com o orçamento e plantas apresentadas e, posteriormente, aprovados pelo Conselho Técnico-Administrativo. No andar terreo, acham-se os Departamentos de Fisiologia e Química Fisológica, cada um dispondo de: sala do professor, sala de aula e laboratórios. As salas de aula são de 9x6 metros, cabendo, assim, quarenta alunos folgadamente, com pisos mosaicados e paredes revestidas de azulejos brancos, até a altura de 1,80 metros. Dispõem de cortinas especiais para escurecê-las, de modo a permitir o uso de aparelhos de projeção. Em cada uma funcionará um epidiascópio. Os laboratórios são providos, cada um, de dez mêsas em cimento armado e guarnecidas de azulejos brancos, com canalização de água e gaz e de pias com despejo para o esgôto. Em cada mêsa existe um armário de cedro, para dois alunos. Na sala do professor, ficará instalada uma pequena biblioteca especializada. No andar superior, funcionará o auditório, com luz indireta e capacidade para 600 pessôas, dispondo de cinema falado e alto falante para facilitar a audição das conferências. A construção, que orça em Cr$ 1.110.000,000, inclusive instalações e mobiliário, foi entregue pela firma construtora, no fim do mês de dezembro. 17 Conforme ofício expedido em 28 de abril de 1950, o Biotério seria inaugurado em 1º de maio de 1950. (FMCP, 1950a). “Em primeiro de maio, inaugurouse solenemente o moderno pavilhão destinado ao Biotério, que se acha devidamente aparelhado. Foi construído pelo engenheiro Manoel Ibiapina Cavaleiro de Macedo, orçando a construção em Cr$ 470.000,00. (FMCP, 1950a, p. 4). 18 Em sessão da Congregação, em 21 de janeiro de 1951, o prof. José Rodrigues da Silveira Netto propõe a denominação. (FMCP, 1951). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 15 A enfermagem obstétrica 251 252 Quadro com formandos de enfermagem obstétrica do ano de 1946. Com a criação do curso de medicina no Pará, em 1919, é possível que os envolvidos com o processo de desenvolvimento e melhoria das condições sanitárias da região tenham observado que, além da formação de profissionais de medicina seria necessário também a preparação de pessoal de apoio às ações de saúde, no caso, profissionais na área de enfermagem. Evidentemente que a enfermagem como profissão regulamentada ainda não havia atingido o grau de diferenciação como a conhecemos hoje. Pelo contrário, na década de 1920 dava seus primeiros passos rumo à sua estruturação profissional em nosso país, fruto da ação conjunta dos Estados Unidos e do Brasil, através da Fundação Rockefeller e do Departamento Nacional de Saúde Pública, respectivamente (MOREIRA, 1999). O estatuto da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, datado de 1921, já previa em seu artigo 7º que, além do curso de medicina, a Faculdade promoveria outros cursos especiais, dentre eles, o de obstetrícia1. Prosseguindo, o Estatuto detalha a organização do curso: Art. 8º - O curso de obstetricia será feito em dois annos e comprehenderá as materias seguintes: 1º Anno Anatomia obstétrica (anatomia descriptiva e medico-cirurgica do abdômen, comprehendendo o canal pelviano, em particular os orgãos genitourinarios). Physiologia obstétrica (Physiologia da geração, noções de embryogenia e theratologia). Obstetrícia, com desenvolvimento do estudo da estatica e dynamica do parto normal. Clinica obstétrica, comprehendendo o diagnostico clinico, a dystocia materna e fetal, hygiene das parturientes e os cuidados ás puerperas e recém nascidos. 2º Anno Clinica obstetrica (FMCP, 1933a, p. 6). As atividades do curso de obstetrícia são mais detalhadas no Regimento Interno da FMCP, publicado em 1926. Assim: Art. 174. - Na forma do art. 133, § unico, do decreto 16.782-A, haverá um curso de enfermeiras especializadas, destinadas ao serviço de parturientes e recemparidas que será feito nas clinicas obstétrica e gynecologica da Faculdade. § 1º- Este curso se fará em dois annos. § 2º - No primeiro anno serão ensinadas ás alumnas noções de anatomia e physiologia, especialmente do apparelho genital, durante o primeiro periodo do anno lectivo. § 3º - No segundo periodo farao as alumnas a pratica da assistencia ás doentes na clinica gynecologica. A enfermagem obstétrica 253 § 4º - No segundo anno farão a pratica de assistencia ás gestantes e recémparidas na clinica obstétrica. Art. 175. - Os professores de clinica obstetrica e gynecologica organizarão os respectivos programmas e designarão um assistente de cada uma das cadeiras, para leccional-os. Art. 176. - Os diplomas ou certificados serão de enfermeiras especializadas e serão conferidos após approvação aos exames. Art. 177. - A banca de exames será organizada com um professor de clinica obstétrica e com dois docentes livres especializados, um em obstetricia e outro em gynecologia (FMRJ, 1926, p. 40). Deste modo, pouco depois de ter assumido a direção da Faculdade de Medicina, Camillo Salgado, “comprehendeu a vantagem da instituição do curso de obstetrícia”, designando o professor Agostinho Monteiro para dirigi-lo (PARÁ-MÉDICO, 1922, p. 364), fazendo referência ao fato no primeiro relatório de atividades da Faculdade sob sua direção, onde informa ter sido realizado o primeiro exame de admissão ao curso de obstetrícia (FMCP, 1923c, p. 10). 254 Pelo fato do Dr. Agostinho Monteiro ser, também, o diretor da Maternidade do Hospital da Ordem Terceira, isto contribuiu sobremodo para a melhoria do curso das obstetrizes, que já em 1923, por decisão de Camilo Salgado, passaram a ter o 2º ano do curso ministrado naquele hospital, preparando melhor aquelas que comporiam a primeira turma (Estado do Pará, 09.01.1923). Como referido no Regimento Interno, o curso era para “enfermeiras”, isto é, direcionado para pessoas do sexo feminino. O curso de enfermagem obstétrica está intimamente ligado à história da Faculdade de Medicina, pois além de ser ministrado pelos professores do curso de medicina, a primeira colação de grau promovida pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, ocorrida no dia 16 de abril de 1925, na secretaria da Faculdade, não foi de medicina: foi a de enfermeiras obstetrizes. De acordo com a ata lavrada pelo Dr. Olympio da Cardoso da Silveira, na qualidade de secretário, na referida data “depois de satisfeitas as exigências da lei do Ensino Superior, compareceram as senhoritas Maria Magdalena Bello da Conceição e Angelina Rebello de Souza e perante os professores Doutores Agostinho de Menezes Monteiro, Renato Chaves da Silva e Souza e Hermógenes Pinheiro, o Excellentissimo Senhor Doutor Camillo Henrique Salgado, Director da Faculdade, conferiu-lhes o grão de Obstetriz” (FMCP, livro de ata das colações 1925)2. A outra referência de colação gráu de obstetriz no livro de atas de colação de medicina é de 6 de janeiro de 1926. Supõe-se tenha havido um livro específico para registro das atas de colação de grau das obstetrizes, posto que há relatos da entrega de certificados às concluintes, após a “lavratura da ata”, porém nada encontramos a respeito. As referências ao curso nos Relatórios de Atividades de Faculdade são irregulares, ainda que não tenhamos podido manusear todos os Relatórios3. Assim sendo, não Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 há menção ao curso no Relatório de 1922. No Relatório de 1935, somente o curso de Farmácia é mencionado, ficando a dúvida: o curso de enfermagem teria tido alunas matriculadas naquele ano? Em relação ao ano de 1936, um documento encaminhado pela Direção da Faculdade ao Diretor Geral de Educação e Saúde Pública, em abril daquele ano, informa a criação de um “curso de enfermagem obstétrica” anexo á cadeira de Clínica Obstétrica, “de acordo com o artigo 211 do Regimento Interno da Faculdade de Medicina da Universidade do Rio de Janeiro”. No mesmo documento, a Faculdade solicita a extensão da fiscalização federal ao referido curso, “para que as futuras enfermeiras especializadas tenham seus diplomas legalisados e assegurados seus direitos”.4 O Relatório de 1938, faz referência ao curso de enfermagem, constando o número de alunas matriculadas (4: duas em cada série), seu desempenho e o nome das duas concluintes, o que demonstra o funcionamento normal do curso nos anos anteriores, posto que a duração do curso era de dois anos (FMCP, 1939c, p. 30-36). O Relatório de 1939 menciona a matrícula de 4 alunas no primeiro ano, sendo que somente duas inscreveram-se para os exames e foram aprovadas (FMCP, 1940b, p. 26). Além disso, informa também que os trabalhos dos cursos médico e de enfermagem aconteceram no dia 7 de março, ás 8 horas, em sessão solene realizada no salão nobre, com a aula inaugural proferida pelo professor Oscar Pereira de Carvalho, catedrático de Patologia geral, que dissertou sobre “Antigas e modernas ideias e doutrinas médicas. Vida, saúde e doença” (FMCP, 1940b, p. 15). De acordo com o Relatório do ano de 1940, 4 alunas matricularam-se no 2º ano; os cursos de medicina e de enfermagem obstétrica “funcionaram com a costumada regularidade”, todas as alunas se inscreveram para os exames e foram aprovadas (FMCP, 1941, p. 15-16, 23). Um fato relevante do Relatório é que a colação de grau foi conjunta, sendo as enfermeiras paraninfadas pelo professor Orlando Lima, que teve seu discurso reproduzido no referido Relatório (FMCP, 1941, p. 38, 40). O Relatório de 1941 informa não ter havido matrícula e nem conclusão de curso de enfermagem obstétrica no referido ano (FMCP, 1942b, p. 25). O Relatório de 1942 informa não ter havido matrícula nem conclusão do curso de enfermagem obstétrica naquele ano (FMCP, 1943b, p. 18), o mesmo acontecendo com o ano de 19435. No ano de 1944, o Relatório de Atividades informa que os exames finais do curso de enfermagem realizaram-se na segunda quinzena de novembro, tendo-se inscrito seis alunas, ficando uma reprovada (FMCP, 1944b, p. 25). No ano de 1945 havia seis alunas matriculadas no primeiro ano, tendo uma ficado reprovada, e cinco no segundo, as quais foram aprovadas. O Relatório cita ainda A enfermagem obstétrica 255 nominalmente as concluintes do curso naquele ano (FMCP, 1946b, p. 17, 28), bem como a entrega dos certificados às concluintes6. Destaque para o Relatório de Atividades do curso, encaminhado ao Diretor da Faculdade: CURSO DE ENFERMAGEM OBSTÉTRICA Exmo. Sr. Dr. Diretor da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará Belém, 5/12/1945 Ao terminar o ano letivo de 1945, tenho a honra de informar a V. Excia. que no curso de Enfermagem Obstétrica, a meu cargo, nada ocorreu de anormal, tendo sido exgotados os programas de ambas as séries. A parte prática foi realizada na Maternidade do Hospital da Santa Casa de Misericórdia, onde as alunas tiveram vasto campo para a sua aprendizagem. Aproveito a oportunidade para apresentar a V. Excia. Atenciosas saudações. (a) Dr. José Maria Chaves Professor contratado encarregado pelo Curso de Enfermagem Obstétrica (FMCP, 1946b, p. 62) O Relatório de 1946 informa a matrícula de seis alunas no primeiro ano e três no segundo, além da entrega dos certificados (FMCP, 1947b, p. 15, 27). Há ainda o Relatório do curso, de redação idêntica ao do ano anterior (FMCP, 1947b, p. 90). 256 Em 1947 estavam matriculadas sete alunas no primeiro ano, tendo sido quatro aprovadas, e cinco no segundo, não havendo reprovações (FMCP, 1948c, p. 24). Há menção, ainda, da entrega na Secretaria, dos certificados às concluintes do curso (FMCP, 1948c, p. 39). O número de alunas matriculadas em 1948 era de nove no primeiro ano, tendo duas ficado reprovadas, e quatro no segundo, não havendo reprovações (FMCP, 1949b, p. 29). O ano de 1949 apresentou duas alunas inscritas no primeiro ano e sete no segundo ano, sendo todas aprovadas e tendo seus nomes citados como concluintes (FMCP, 1950b). A partir de 1949, não conseguimos mais informações sobre a Enfermagem Obstétrica. Segundo Clóvis Meira, o curso funcionou até aquele ano (MEIRA,1986a, p. 115). Sabese que era equiparado ao da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro7 e reconhecido em todo país, conforme a nota publicada em fevereiro de 1946, em Folha do Norte: FACULDADE DE MEDICINA Curso de Enfermagem Obstétrica Acham-se abertas de 10 a 23 de fevereiro corrente as matrículas para este curso que é válido em todo o Brasil. Informações na Secretaria. (Folha do Norte, 15.02.1946, p. 2) Sua extinção pode estar relacionada à questão financeira, conforme ofício de 3 de agosto de 1949, enviado pelo Diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães, ao Dr. José Maria Chaves, professor e coordenador do curso, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Belém, 3 de agosto de 1949 Sr. Dr. José Maria Chaves Não tendo a Faculdade recebido pontualmente a pequena mensalidade de Cr$ 70,00, que é quanto pagam as alunas de enfermagem obstétrica, importância esta destinada totalmente ao pagamento do professor, podeis suspender as aulas, ficando desta forma extinto o respectivo curso. Cordiais cumprimentos, Dr. Lauro de Magalhães Diretor (FMCP, 1949a) Outros fatores devem ser considerados com relação à extinção do curso de enfermagem obstétrica. Em 6 de agosto de 1949, por exemplo, o governo federal edita a lei nº 775, que dispunha sobre o ensino da enfermagem. Referida lei dividia o ensino da enfermagem em dois cursos: o de enfermagem, com duração de 36 meses, e o de auxiliar de enfermagem, com a duração de 18 meses. A lei dizia ainda que “em cada Centro Universitário ou sede de Faculdade de Medicina, deverá haver escola de enfermagem, com os dois cursos”. Também que: Aos atuais cursos de enfermagem obstétrica será facultada a adaptação às exigências da presente Lei, de modo que se convertam em cursos de enfermagem e de auxiliares de enfermagem, destinados à formação de enfermeiras e de auxiliares de enfermeiras especializadas para a assistência obstétrica (BRASIL, 1949). A nova lei implicaria adaptações da Faculdade a ela. Outro aspecto diz respeito à Federalização da Faculdade, em 1950, o que certamente viria a modificar a organização administrativa da Escola. Vale lembrar, ainda, a criação, em 1944, da Escola de Enfermagem Magalhães Barata, que passou a oferecer um curso com a duração de três anos e mais abrangente8. Ressalte-se que o novo curso também se utilizava das instalações da Faculdade de Medicina, além da Santa Casa9. NOTAS 1 “Art. 7º - Alem do curso integral de Medicina e Cirurgia, a Faculdade terá os cursos especiaes de Obstetrícia, Pharmacia e Odontologia.” (FMCP, 1933a, p. 6). 2 O Estatuto fala em ‘parteiro’: “Art. 220 – Aos alunos que tiverem sido approvados em todas as materias do curso de Obstetrícia será concedido o titulo de parteiro” (FMCP, 1933a). 3 Só tivemos acesso aos Relatórios dos anos de 1922, 1935, 1938, 1939, 1940, 1941, 1942, 1943, 1944, 1945, 1946, 1947, 1948, 1949, 1950 e 1951. 4 Não conseguimos maiores dados sobre este fato, que parece sinalizar para uma nova modalidade de curso, muito embora os relatos dos anos seguintes apontem para a manutenção daquele curso inicial. (FMCP, 1936b). A enfermagem obstétrica 257 5 258 “Curso de Enfermagem obstétrica: Não houve matricula e nem conclusão de curso de enfermagem obstética”. (FMCP, 1944, p. 23). 6 “ Na secretaria da Faculdade, após a lavratura da áta, foram entregues às alunas que terminaram o Curso de Enfermagem Obstétrica, os respectivos certificados” (FMCP, 1946, p. 30). 7 “Curso de Enfermagem Obstétrica. Acha-se aberta, até o dia 25 do corrente, a inscripção aos exames de admissão ao Curso de Enfermagem Obstétrica. As diplomadas por este curso têm os seus direitos assegurados podendo exercer a profissão em qualquer parte do Brasil. o curso é equiparado ao da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Informações na secretaria da Faculdade” (Folha do Norte, 15.01.1937, p. 2). 8 “Por decreto de 10 de novembro de 44, foi suprida uma grande lacuna em nosso Estado, com a criação da Escola de Enfermagem Magalhães Barata, iniciativa do Doutor João de Barros Barreto, diretor de Saúde do Brasil e grande incentivador da profissão de enfermeira-sanitarista. [...] De acordo com o programa daquela escola [Escola “Ana Néri”, da Universidade do Brasil], o curso é realizado em três anos, tem caráter intensivo, e a teoria está estreitamente ligada à prática, sendo obrigatório um estágio em quase todas as especialidades, principalmente no que diz respeito à saúde pública, uma vez que a manutenção desta é o fim principal visado por aquela instituição” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 49-50). 9 “A parte teórica do estudo é ministrada não só na escola como também na Faculdade de Medicina, onde são aproveitadas as instalações tecnicas. A prática às futuras enfermeiras adquirem nos principais hospitais da cidade, principalmente na Santa Casa, onde a enfermaria “Santa Ludovina” foi especialmente remodelada e adaptada para esse fim, transformando-se em enfermaria-escola”. (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 50). Ainda sobre a criação de uma escola de enfermagem, Folha do Norte registra uma “collação de gráo” de enfermeiros que concluíram o curso em 1936, com a turma contendo dez mulheres e oito homens, a cerimônia realizada no “salão nobre do Hospital de Caridade, sendo o Dr. Prisco dos Santos o Diretor da Escola, “fundada em fevereiro de 1932”. (Folha do Norte, 22.05.1937, p. 6) Seria curso de enfermagem ou o equivalente a auxiliar de enfermagem? Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 16 Casamento por dote: a questão do curso de Farmácia na Faculdade de Medicina 259 260 Detalhe do entalhe de uma cadeira da FMCP. Entre o século XIX e início do século XX o ensino de Farmácia nos estados brasileiros surgiria invariavelmente de três formas: Primeiro, atrelado à criação de Faculdades de Medicina como curso anexo a estas, tal como ocorreu no Rio de Janeiro e na Bahia em 1832, ano do início do ensino de farmácia no Brasil (SILVA, 2003, p. 34), conforme previsto no Regimento Interno da Faculdade Nacional de Medicina do Rio de Janeiro, que seria adotado pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará1. Também, como unidades precursoras que serviriam de base para posterior criação de uma escola médica, pois dada a escassez de recursos era mais fácil abrir uma escola de Farmácia ou mesmo Odontologia, as quais depois seriam encampadas como curso anexos da futura Faculdade de Medicina, como foi o caso de Porto Alegre em 1896 (FIOCRUZ, [2007]). Ou ainda como uma escola isolada desvinculada de um curso médico como ocorreu em Ouro Preto em 1839 e em São Paulo em 1898 (SILVA, 2003, p. 34). O Pará seguiria o último modelo, e no governo Augusto Montenegro, pela Lei Estadual nº 874, de 23 de outubro de 1903, nasceria a Escola de Farmácia do Pará. Seria o segundo estabelecimento de ensino superior do estado, regulamentado pela lei nº 1274, de 1º de fevereiro de 1904, e oficialmente instalado em 11 de fevereiro do mesmo ano, no Salão da Biblioteca do Serviço Sanitário do Estado (SILVA, 2003). Tinha como professores efetivos os farmacêuticos Francisco da Silva Miranda, Pedro Juvenal Cordeiro e Giuseppe Martina (SILVA, 2003) e como substitutos, Izidoro Azevedo Ribeiro, Joaquim Vianna e Augusto Pinto (LEITÃO, 1985, p. 35). A Escola funcionaria no pequeno prédio do Serviço Sanitário localizado em frente à praça Dom Pedro II, antigo Largo do Palácio. Sendo as instalações bastante precárias, Augusto Montenegro anteviu logo a necessidade de mudança para um local mais condigno: Penso que com pouco dispêndio poder-se-á construir em um terreno baldio contíguo aos fundos do palacio do Governo, um pequeno e elegante edificio destinado a abrigar a novel escola de pharmacia que me parece veio preencher uma lacuna do nosso ensino e ao mesmo tempo prestar um serviço relevantissimo a saúde publica (PARÁ. Governador (19011909: Augusto Montenegro) 07.09.1904, p. 55). No entanto, com a crise do látex tal ideia acabou não saindo do papel, e a Faculdade de Farmácia seguiria funcionando em condições desfavoráveis. Em 1918 chegou-se a pleitear uma fusão com a Escola de Odontologia, o que não ocorreu entre outras coisas pela falta de verba orçamentária (Folha do Norte, 18.01.1918, p. 2). Em 1925 o curso de Farmácia contava apenas com um “minguado corpo discente” de apenas 18 alunos (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes) Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina 261 07.09.1925, p. 59). Com passar do tempo o ensino ia se desenvolvendo da forma mais heróica possível, baseado principalmente na boa vontade dos professores visto que, as carências materiais eram grandes: A Faculdade achava-se desprovida de salas apropriadas ao ensino theorico e pratico, sendo tambem muito reduzido o material existente, e mesmo, em parte imprestavel sendo necessario e inadiavel effectuar taes obras, além da acquisição de material para o ensino pratico, o que foi feito com todo zelo sob a inspecção do respectivo director 2. Mesmo assim, em 1927, o inspetor federal Dr. Paranhos da Silva consideraria que o estabelecimento dispunha de material adequado para o preenchimento de sua função (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes) 07.09.1927, p. 43). Entretanto, pela mensagem do governador do estado Dyonisio Bentes feita apenas um ano depois, fica óbvio o quanto o inspetor federal fora benevolente com aquela claudicante Faculdade: A Faculdade de Pharmacia achava-se com seu edificio em pessimas condições de hygiene, as paredes fendidas ameaçando desmoronamento, desprovida de gabinetes e laboratorios, sendo muito reduzido e, em parte imprestavel, o material para o ensino pratico e mobiliario. Determinamos providencias a respeito e tudo foi recomposto, offerecendo hoje conforto e hygiene, requisitos indispensaveis aos institutos de instrução (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes) 07.09.1928, p. 102). 262 Os “requisitos indispensáveis” mencionados pelo governador tiveram um custo total de 14:850$000, enquanto que o rendimento líquido da Faculdade naquele ano fora de 10:223$000 (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes, p. 102-3). Para uma escola que formava poucos alunos, sua manutenção acabava saindo consideravelmente cara para um Estado cujo apogeu econômico já ia longe. O último governador eleito antes da revolução de 1930, Eurico Valle, confirmaria esta hipótese, mesmo reconhecendo a importância da Faculdade de Farmácia: A matrícula atual não excede de 12 alumnos, numero lastimavelmente insufficiente para a manutenção da Escola. Entretanto, todos sabem que o Pará, por sua larga extensão e pelos seus nucleos de população, muito densos e importantes, não possuem pharmacias. No interior, onde as ha, são na maioria dirigidas por práticos (PARÁ. Governador (1929-1930: Eurico de Freitas Valle) 07.09.1930, p. 93). Após a revolução de 1930, o então Interventor Federal Magalhães Barata ciente da situação frágil pelo qual o curso passava e do poder que detinha no cargo que ocupava, resolveria, pelo Decreto n° 133, de 12 de fevereiro de 1931, anexar a Faculdade de Farmácia à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará: O capitão interventor federal do Estado do Pará, por nomeação legal do governo provisório da República, usando de suas atribuições, e, conside- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 rando que a Faculdade de Pharmácia, mantida pelo Estado, deve obedecer a uma organização compatível com as exigências pedagógicas modernas; Considerando que os estabelecimentos de ensino dessa natureza, correspondem melhor a sua finalidade quando anexados as Faculdades de Medicina, a exemplo do que vem se observando no Distrito Federal e Estado da Bahia. Considerando que as condições econômicas atuais do Estado, não comportam as despesas necessárias ao funcionamento regular da referida Faculdade; Considerando que a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, em virtude de sua equiparação à Faculdade oficial do país, e do auxílio econômico que lhe prestam não só o governo do Estado como os vários municípios do interior, está em condições de manter eficientemente o ensino das diversas disciplinas que constituem o Curso de Pharmácia. Considerando, finalmente que a unificação do ensino médico e pharmacêutico se impõe hoje como uma necessidade imperiosa à completa eficiência de ambos os cursos, Decreta: Art. 1 - Fica anexada à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará a Faculdade de Pharmácia mantida pelo Estado. Art. 2 - O acervo da Faculdade de Pharmácia passará à propriedade da Faculdade de Medicina, à qual competirá a direção científica e econômica do curso pharmacêutico. Art. 3 - Serão mantidos como catedráticos, nos termos do art.115 do Decreto n 16782 de 13 de janeiro de 1925, os atuais professores das matérias privativas do referido curso. Art. 4 - O governo do Estado auxiliará a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, para manutenção do seu curso e do de Pharmácia, com a importância de setenta e dois contos de réis (72:000$000) anuais. Art. 5 - Revogam-se as disposições em contrário. O Secretário de Educação e Saúde Pública assim o faça executar. Palácio do Governo do Estado do Pará, 12 de fevereiro de 1931. Joaquim de Magalhães Cardoso Barata. Capitão Interventor (SILVA, 2003, p. 63). Na ata da 2ª Sessão Ordinária da Congregação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, realizada em 14 de abril de 1931, é declarada oficialmente anexada a Faculdade de Farmácia à Faculdade de Medicina, havendo a posse dos catedráticos de Farmácia nas cadeiras privativas do referido curso, professores Raymundo Felippe de Souza, Joaquim Tavares Vianna, Joaquim de Britto Pontes e Antônio Augusto Carvalho Brasil, respectivamente nas cadeiras de Química Analítica, Farmácia Química, Fármaco-cognose e Química Bromatologica e Toxicológica. Ao fim do ato solene, o então diretor da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, Camilo Salgado congratulou-se com os novos professores empossados “nomes res- Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina 263 peitados no magistério, tradicionalmente honestos e competentes”, solicitando que os mesmos continuassem “nesta casa com essa mesma dedicação ao ensino, com essa mesma honestidade pelo bem e pelo engrandecimento de nossa terra”. O professor Raymundo Felipe de Souza agradeceria em nome dos professores de farmácia prometendo bons esforços de todos. Pediu a palavra então o professor Mário Chermont que como representante do governo e professor fundador da Faculdade de Medicina, prometeu todo o auxílio possível “disposto como está o senhor Interventor em amparar a Faculdade” (LEITÃO, 1985, p. 38). A Faculdade de Medicina cumpriria à risca o combinado, e o número de professores do Curso de Farmácia seria elevado de apenas cinco para onze, passando os mesmos a receber o mesmo valor que os professores de medicina (FMCP, 1939c, p. 71). O governo do Pará, por sua vez, nunca seria muito firme em seus compromissos com a Faculdade. Se por um lado pagava pontualmente os setenta e dois contos de réis, não cumpriria o disposto no decreto que passava para a Faculdade de Medicina os bens da Faculdade de Farmácia, o que incluía o prédio da praça Dom Pedro II (FMCP, 1939c). Caso tivesse sido repassado à Faculdade de Medicina, conforme o combinado, o prédio poderia ser facilmente alugado, o que renderia pelo menos 500$000 réis mensais. No entanto, o prédio seria transformado em grupo escolar estadual (FMCP, 1939c). 264 Ressalte-se que desde antes da revolução de 1930, o governo do estado já se tornara devedor da Faculdade de uma soma que alcançava trezentos e vinte e cinco contos de réis, oriundos de subvenções correspondentes aos anos de 1924 a 1929, consignadas em lei, porém não pagas (FMCP, 1939c). Isso sem contar as inúmeras matriculas de alunos a pedido do Estado, cujas taxas escolares também nunca foram pagas, aumentando a dívida para trezentos e sessenta e um contos oitocentos e trinta e seis mil réis (361:836$000) (FMCP, 1939c). Por mais que a Faculdade tentasse resgatar o pagamento das dívidas do Estado, as propostas sempre eram vetadas (FMCP, 1939c, p. 72). Se já era quase impossível obter dinheiro nos governos de Souza Castro e Dyonisio Bentes, ambos médicos e fundadores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, que dirá com o Interventor Magalhães Barata, que não tinha nenhum vínculo com o “casarão” da Generalíssimo. Ainda assim, a Faculdade seguiria em frente seu caminho a duras penas; mesmo com o pequeno auxílio do governo do estado, “carregar” o Curso de Farmácia não era tarefa fácil, o dinheiro era escasso, e as despesas, grandes. Camilo Salgado descreveria bem a situação financeira daqueles anos, que por vezes terminavam no vermelho: Dentre os problemas, porém, o que mais avulta para nós, e eu desejava para isso chamar a attenção dos senhores professores, é o problema economico. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Por influencia de factores múltiplos que não cabe discutir aqui, poderão ver que encerramos o nosso exercicio financeiro com um deficit de noventa e um contos oitocentos e setenta mil e quatrocentos réis (91:870$400). É certo que este deficit vem ferir tão somente o interesse dos senhores docentes, porém é tambem certo que, no momento, contamos com seu espírito sempre renovado de sacrifício e abnegação e que comprehendendo a situação premente, seguros de que se trata de algo passivel de modificação para melhor, elles, os unicos sacrificados, conjugam esforços, confiam e esperam que o governo federal nos auxilie com subvenção nesta importância (FMCP, 1936c, p. 6). Apesar das finanças desfavoráveis, a Faculdade não contribuiu apenas com espaço físico para o curso de Farmácia, cedendo ainda alguns dos seus professores como Antônio Marçal, Juliano Pinheiro Lyra Sozinho, Antônio Acatauassú Nunes Filho, além de conseguir também equipamentos novos indispensáveis para as aulas práticas, como um centrifugador elétrico e uma moderna balança de precisão (FMCP, 1936c, p. 36). Mesmo com estas pequenas melhorias o curso continuava com um número de alunos pouco expressivo havendo apenas 13 matriculados no ano de 1935 (FMCP, 1936c, p. 15). Esta anexação compulsória não duraria muito. Com os ventos da política do estado soprando em outras direções, em junho de 1937 o novo Interventor Deodoro de Mendonça suspenderia o pagamento do auxílio ao Curso de Farmácia até dezembro. Ainda que com apenas 3 alunos matriculados no curso de Farmácia naquele ano e com a verba estadual suspensa, a Faculdade de Medicina continuou pagando os professores de farmácia até 31 de dezembro (FMCP, 1939c, p. 68). Em 1938 continuando suspenso o pagamento sem motivo aparente, apesar de a verba correspondente constar na lei orçamentária, o então diretor da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, Camilo Salgado, solicitou uma reunião com o Interventor para tratar do assunto buscando uma solução conciliatória (FMCP, 1939c, p. 68). Neste encontro realizado em 25 de fevereiro, Deodoro de Mendonça justificou o corte do pagamento pelo diminuto número de alunos matriculados no curso, e pela necessidade do estado em reduzir suas despesas ao mínimo possível, dizendo ainda que baixaria um decreto extinguindo definitivamente o auxílio, visto que se mantivesse a verba os professores do Curso de Farmácia, que salvo um eram todos funcionários públicos, incorreriam em acumulação de vencimentos, prática que estava proibida pelo Decreto Lei número 24, de 29 de novembro de 1937 (FMCP, 1939c, p. 73). Deste modo, em 9 de março de 1938, o Decreto nº 2951 de forma curta e calcado nas justificativas já citadas extinguiria o auxílio destinado à Faculdade de Medicina (FMCP, 1939c, p. 69). A sessão da Congregação de 12 de março de 1938, ficaria marcada por dois fatos: seria a primeira sem Camilo Salgado, que falecera em 2 de março e que vinha sendo Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina 265 diretor da Faculdade desde 1922, e assinalava o fim do curso de farmácia no Palacete Santa Luzia. Transcreve-se abaixo alguns trechos da ata daquela acalorada sessão presidida por Antônio Porto de Oliveira: 266 Ata da Segunda Sessão Ordinária da Congregação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, realizada no dia 12 de março de 1938, sob a presidência do Exmo Sr. Dr. Antônio Porto de Oliveira e assistência do Dr. Lauro Sodré Filho, Inspetor Federal junto a esta Faculdade. Reuniram-se os senhores professores: Gastão Vieira, Dagoberto de Souza, Gabriel Rodrigues de Souza, Manoel Ferreira dos Santos Bastos, José Alves Dias Junior, Hermógenes Pinheiro, Henrique Esteves, Hilário Gurjão, Agostinho Monteiro, Carlos Arnóbio Franco, Othon Chateau, Jayme Aben-Athar, Arthur França, Acylino de Leão, Antônio Acatauassú Nunes Filho, Antonino Emiliano de Souza Castro, Lauro de Magalhães, Mário Chermont, Raymundo da Cruz Moreira, Pedro de Castro Valente e Juliano Lyra Pinheiro Sozinho. Compareceram também, os senhores farmacêuticos: Raymundo Felipe de Souza, Antônio Augusto de Carvalho Brasil, Joaquim de Brito Pontes e Manoel Cardoso da Cunha Coimbra, ficando, porém condicionado o comparecimento à solução imediata da Congregação sobre o Sustamento do curso de Farmácia. Às quatro horas da tarde o Sr. Presidente abre a sessão e anuncia seguinte ordem do dia: 1-Eleição para o triênio 1938/1941. 2-O que ocorrer. O Sr. Presidente consulta à casa se consente na inversão da ordem do dia, para tratar em primeiro lugar da portaria número três (3), de vinte e cinco de fevereiro findo, da diretoria passada, já aprovada pelo Conselho TécnicoAdministrativo, sobre o desligamento do Curso de Farmácia. S. Excia. explica os motivos que o levaram a pedir a inversão da ordem do dia, e a convidar os professores de Farmácia tendo antes consultado juristas, foi a dúvida sobre a legalidade do ato da Faculdade e até da Interventoria, querendo assim que a Congregação se manifestasse e partilhasse das responsabilidades decorrentes deste ato. O Sr. Professor Antônio Brasil interpela a presidência sobre os termos do convite, não compreendidos por S. Excia., e sobre a ilegalidade da inversão dos trabalhos que ele quis sugerir. O Sr. Presidente explica que o convite foi condicionado a solução imediata da Congregação, sobre o sustamento do Curso de Farmácia, e a inversão da ordem do dia foi para saber se os senhores farmacêuticos podiam tomar parte nos trabalhos da Congregação. Continuando com a palavra, o professor Brasil faz referência a um ofício que recebeu da tesouraria, de ordem da diretoria, convidando-o a restituir, diz S. Excia., a insignificante quantia de cinquenta e sete mil réis, prêmio do seguro referente ao mês de janeiro já pago. A presidência explica que a Faculdade não tem obrigação de pagar seguros particulares, e, o Sr. Professor Brasil sabia perfeitamente que decorridos 30 dias sem que fosse efetuado o pagamento, a apólice podia caducar e, para que sua S. Excia. não viesse mais tarde alegar ignorância e culpar a Faculdade, resolveu mandar avisa-lo para que tomasse as providências que julgasse necessária, assumindo disto inteira responsabilidade, que S. Excia., e os seus companheiros foram cientificados, da portaria que lhes foi enviada por cópia acompanhada de Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 um ofício, ficando, portanto, ciente S. Excia., que não mais receberia os vencimentos do mês de janeiro. Encerrada a discussão e deferida a consulta, por unanimidade, a presidência manda o secretário proceder a leitura da Ata da Sessão do Conselho Técnico Administrativo, de 28 de fevereiro, onde se acha transcrita a portaria 3 (três), e, em seguida, expõe claramente os motivos determinantes da referida portaria, dando a palavra aquém dela quisesse fazer uso. Pede a palavra o professor Felipe de Souza, e diz que a portaria foi um ato arbitrário da diretoria passada, não só quanto ao sustamento do Curso de Farmácia, que foi anexado à Faculdade de Medicina pelo Decreto Federal número 133 de 12 de fevereiro de 1931, e anuência do Sr. Ministro de Educação e Saúde Pública, ficando os professores de farmácia com seus direitos garantidos, como também pelo não recebimento de seus vencimentos durante as férias, vencimentos esses diz S. Excia. que são sagrados; o Sr. Presidente diz que não vai defender a quem não mais existe e explica que a diretoria passada somente tomou essa resolução depois de haver conferenciado com o Sr. Interventor Federal, e este haver lhe assegurado que se continuasse o Estado a auxiliar a Faculdade de Medicina para manutenção do seu curso e o de Farmácia, incidiria ela na Lei das Acumulações, como aconteceu com a Escola Prática do Comércio, que por coincidência tinha o mesmo auxilio da Faculdade de Medicina – setenta e dois contos de réis. Que os professores de farmácia não podiam receber os vencimentos do mês de janeiro, não só porque esses vencimentos dependiam do recebimento por parte da Faculdade, do auxílio do Governo do Estado, o que não se deu, como também o prazo concedido pelo Ministro da Justiça para as desacumulações findou no dia 3 de janeiro. Assim, não podia a Faculdade pagar com o seu recurso os professores de Farmácia, e se pagasse com o auxílio do Governo, caso tivesse recebido, incidiram eles na Lei das Acumulações, porque são todos funcionários públicos, exceto o professor Brito Pontes. Continuando com a palavra, o professor Felipe de Souza, salienta os direito adquiridos pelos alunos aprovados no curso de habilitação, e que se já achavam matriculados, como também o dos professores catedráticos de Farmácia. O professor Arnóbio Franco, aparteia, dizendo que em 1934, sozinho bateu-se na Congregação contra a participação dos professores privativos do Curso de Farmácia que não são catedráticos, nos nossos trabalhos e, nesse sentido, dirigiu uma petição ao Conselho Nacional de Educação, que, em discussão brilhante e memorável, decidiu por maioria de votos, que os farmacêuticos não podem tomar posse na Congregação e no Conselho Técnico-Administrativo da Faculdade de Medicina. Requer ao Sr. Presidente que mande proceder à leitura dessa decisão, que se acha inserta no Diário Oficial da União de 12 de dezembro de 1934. A presidência explica conhecer essa decisão, mas sendo o nosso regimento aprovado posteriormente, em 1935, reconheceu-lhes os mesmos direitos e regalias dos professores catedráticos da nossa Faculdade. Assim, pede ao professor Arnóbio Franco, que retire sua proposta. O professor Arnóbio Franco acedendo ao pedido do Sr. Presidente, declarou que o regimento não pode conter disposições contrárias à Lei do Ensino, cujo artigo 308, do Decreto 19852, de 11 de abril de 1931, é claro e taxativo nesse ponto. Continuando a palavra, o professor Felipe de Souza pede a Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina 267 268 presidência o Regimento Interno e o Livro da Tesouraria, referente a recebimento dos Srs. professores, no que foi satisfeito. O Sr. Presidente observa que o orador está se desviando propositalmente do assunto, com o fim de obstruir a sessão. O orador protesta, alegando que está defendendo os seus direitos; diz que a Faculdade de farmácia foi fundida à de Medicina com a anuência do Sr. Ministro da Educação e Saúde Pública e constitui uma Sociedade Civil com o nome de Instituto de Medicina e Farmácia, não tendo portanto, a Congregação poderes para extingui-la. Termina finalmente fazendo um apelo à casa para amparar a Escola de Farmácia, criada em 1903, e também os seus alunos e professores. Levanta-se o professor Acylino de Leão e em voz clara e pausada, lê os artigos do nosso Regimento Interno e o Decreto 133 de 12 de fevereiro de 1931, do então Interventor Major Magalhães Barata. Diz S. Excia., que o Decreto no Artigo quatro estipula a importância de setenta e dois contos de réis, como auxilio a Faculdade de Medicina para manutenção do Curso de Farmácia, que se a Faculdade aceitou a anexação foi mediante esse auxílio, mas se o Governo suspendeu os pagamentos desde junho de 1937 e o Interventor atual, o Sr. Deodoro de Mendonça, baixou o Decreto número 29251 no dia 9 de março de 1938, e publicado no Diário Oficial do dia 10 do mesmo mês, extinguindo esse auxílio e revogando as disposições em contrário, ipso facto, diz S. Excia., cessaram os nossos compromissos que estavam cimentados apenas por aquele auxílio. A anexação da Faculdade de Farmácia à de Medicina, exclama S. Excia., não foi um casamento por amor, e sim mediante o dote de setenta dois contos de réis, que acabava de ser extinto por decreto. Travam-se, então, acaloradíssimos debates entre S. Excia., e os senhores farmacêuticos. Pede a palavra o professor Souza Castro e declara preliminarmente que vota pela aprovação da Portaria; tece, então comentários sobre a situação dos alunos de Farmácia, que assim, seriam prejudicados com a extinção da Escola. Sugere, então, um entendimento da Diretoria com os poderes públicos no sentido de conciliar os interesses comuns. O Sr. Professor Henrique Esteves aparteia, dizendo que a Faculdade de Farmácia, que é estadual, não foi extinta, e sim desligada da Faculdade de Medicina, por assim exigirem as circunstâncias atuais. O Governo, certamente, tomará prontas providências asseguratórias dos direitos dos alunos, uma vez que o desligamento se funda no Decreto do Sr. Interventor, que extinguiu o auxílio que dava a Faculdade de Medicina para a manutenção deste Curso. Propõe então que o desligamento atinja também o primeiro ano. Pede a palavra o professor Agostinho Monteiro e declara votar pela aprovação da Portaria, porque o Sr. Interventor Federal, posteriormente, a 9 de março, baixou Decreto número 2951, que foi publicado no Diário Oficial no dia 10 do mesmo mês, extinguindo o auxílio concedido a Faculdade de Medicina para manutenção do Curso de Farmácia, reforçando assim a Portaria da diretoria passada, que é de 25 de fevereiro. Termina pedindo para a diretoria interceder junto aos poderes públicos pelo amparo da Escola de Farmácia, seus alunos e professores. O Sr. Presidente conclui: está encerrada a discussão, os Srs. aprovam a portaria e a emenda do professor Henrique Esteves, isto é, que o desligamento atinja também o primeiro ano, queiram conservar-se sentados. Foi unanimemente Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 aprovada. O Sr. Professor Mário Chermont pede permissão para se retirar do recinto alegando ter concorrido para a anexação no tempo da Interventoria Barata; declara retirar-se para não votar contra a Portaria em homenagem à memória dos seu saudoso e eminente amigo Dr. Camilo Salgado. O Sr. Presidente declara que sendo aprovada a Portaria, é com pesar que a congregação se vê privada do convívio dos companheiros de longos anos, que reais serviços prestaram à nossa Faculdade, e, assim, convida os senhores farmacêuticos presentes a deixarem o recinto, por não poderem tomar parte nos trabalhos, o que os mesmos o fizeram. Por proposta do Dr. Ferreira Bastos, todos os membros da Congregação mantiveram-se em pé, em silêncio durante um minuto, em homenagem a memória do saudoso Diretor Dr. Camilo Salgado. Logo após passou-se a eleição do novo diretor... (LEITÃO, 1985, p. 39). Logo ao assumir a Diretoria da Faculdade, Lauro de Magalhães mandaria então lavrar uma portaria sustando o funcionamento do Curso de Farmácia (FMCP, 1939c, p. 70). Nem todos casam por amor... Os professores de Farmácia naturalmente sentiriam-se prejudicados e a questão iria parar nos jornais, que questionariam a “desanexação sumária” solicitando “...uma explicação regular do que se fez, com prejuizo de docentes e alumnos, alguns destes sem recursos para uma forçada e inesperada transferencia para instituições congeneres, de ensino no sul do paiz” (Folha do Norte, 24.03.1938, p. 1). E daí foi um pulo para o problema atingir esferas superiores chegando até o Diretor Geral de Educação (FMCP, 1939c, p. 70). Sobraria para Lauro de Magalhães, o recém empossado diretor, defender a Faculdade dos ataques, alegando que o desligamento do Curso de Farmácia havia se dado por descumprimento do acordo por parte do Estado. E como os professores de Farmácia eram funcionários do Estado, deveriam dirigir suas reclamações ao governo estadual e não à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP, 1939c, p. 74). O Diretor alegaria ainda, em longa carta dirigida ao Diretor Geral de Educação, em 20 de abril de 1938, que caso a Faculdade continuasse a pagar os professores de Farmácia este fato “...tomaria o aspecto de uma aventura de estrada com escândalo criminoso, pois importaria em exigir uma acumulação de vencimentos, proibida pelo decreto-lei n 24, de 29 de novembro de 1937” (FMCP, 1939c, p. 74). Resquícios da questão ainda incomodariam a direção da Faculdade nos anos seguintes. Em 20 de junho de 1939, o Secretario Geral do Estado Antenor Cavalcante, por ordem do Interventor Federal, solicitaria que a Faculdade entregasse à Sociedade Civil de Agronomia e Veterinária do Pará todo material pertencente à extinta escola de Farmácia que estivesse depositado no interior da Faculdade (FMCP, 1940b, p. 58). Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina 269 Lauro de Magalhães responderia diretamente ao Interventor Federal em 7 de julho de 1939 alegando que o referido material não estava simplesmente depositado na Faculdade, mas sim que era propriedade daquela nos termos do artigo segundo do decreto estadual número 133 de 12 de fevereiro de 1931 (FMCP, 1940b, p. 59) e que: Em segundo logar, quero esclarecer a V. Excia., que o dito material adquirido por este Estado, da extinta Farmácia Pontes, tem aplicação especial ás escolas de Medicina e Farmácia, não sendo justo seja empregado em outro qualquer mister. A reabertura da Faculdade de Farmácia é providencia que se impõe, assim que permitam as condições financeiras do Pará, que V. Excia. superiormente administra. Ora, esse estabelecimento que, enaltecerá a atual administração paraense, será operado, certamente, mediante a anexação do curso farmacêutico ao de Medicina, como aconselham a lógica e as conquistas científicas hodiernas. Assim sendo, a permanência nesta Faculdade do material a que se refere o ofício nº 1058, é uma imperiosa necessidade, como V. Excia. muito bem compreende à vista das razões que acabo de expor (FMCP, 1940b). [...] 270 O Interventor então buscou um parecer quanto à questão diante do Procurador Geral do Estado Lauro Chaves, o qual foi favorável à permanência do material na Faculdade de Medicina tendo em vista os argumentos já expostos (FMCP, 1940b, p. 63). Em 29 de agosto, o Secretário Geral do Estado, cargo então ocupado por Deodoro de Mendonça (que fora no ano anterior o Interventor responsável pelo decreto que interrompeu o auxílio ao Curso de Farmácia) solicitaria, a pedido do Interventor Federal, que a Faculdade de Medicina fixasse o valor de quanto seria preciso para o Estado custear a reabertura do Curso de Farmácia, para ser enviado à Comissão de Orçamento (FMCP, 1940b, p. 60). No que Lauro de Magalhães responderia em 9 de setembro: Tenho a honra de acusar o recebimento do ofício nº 1511 de 29 de Agosto p. findo do snr. secretário geral do Estado, solicitando a esta Diretoria, de ordem de V. Excia. a fixação do quantum preciso para o estado custear a reabertura do curso de Farmácia. Reunido o Conselho Técnico Administrativo, ficou o assunto para ser resolvido posteriormente, em virtude da portaria de 4 do corrente mês, na qual determina V. Excia. que sejam “adiadas iniciativas e trabalhos que acarretem despesas” (FMCP, 1940b, p. 61). [...] Colocou-se assim uma pedra no assunto durante um ano. Até que, em 19 de setembro de 1940 o tema voltaria à pauta em uma reunião da Congregação, que aprovaria por unanimidade o restabelecimento do Curso de Farmácia de acordo com o desejo do Interventor, ficando por enviar as bases para o Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Estado “custear a reabertura do referido curso”. Ao ser notificado do fato o governo do estado limitou-se a “agradecer a comunicação do restabelecimento do curso de farmácia, para o que auguro as melhores prosperidades” (FMCP, 1941, p. 57). Lauro de Magalhães rapidamente tentaria esclarecer o mal entendido referindo que a Congregação da Faculdade apenas havia concordado com o restabelecimento do Curso de Farmácia, ...dependendo o seu funcionamento da aprovação por parte do governo, das bases para o Estado custear a reabertura do referido curso e que serão enviadas para prévio exame, quando V. Excia. julgar oportuno (FMCP, 1941, p. 58). Em 4 de outubro de 1940 o Secretário Geral do Estado, Deodoro de Mendonça, solicitaria o “envio urgente das bases para o Estado custear a reabertura do referido curso, para as providências cabíveis” (FMCP, 1941, p. 58). As ditas bases seriam encaminhadas por Lauro de Magalhães em 11 de novembro no documento abaixo transcrito: BASES PARA O RESTABELECIMENTO DO CURSO DE FARMÁCIA A FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ - considerando o empenho do Governo do Estado no restabelecimento do curso de Farmácia; - mas atendendo que a situação econômico-financeira deste Instituto não comporta o funcionamento daquele curso a expensas próprias; e - considerando o fato lamentavel, verificado desde 1938, da interrupção do dito curso, ocorrencia aliás comunicada, como era devido á autoridade federal competente; - considerando que esta interrupção foi motivada pela falta de pagamento, de parte do Estado, desde Junho de 1937, do auxilio previsto no decreto nº 133 de 12 de fevereiro de 1931, auxilio esse afinal extinto por força do decreto nº 2951 de 9 de março de 1938; - considerando cumprir evitar, a todo transe (desde que se leve a cabo o restabelecimento objetivado), nova interrupção, o que deixaria mal este Instituto perante a opinião pública, perante as autoridades competentes federais, e perante a mocidade que tem o direito de exigir o cumprimento da dívida reconhecida com a matrícula de estudantes e que somente será resgatada com a ajudicação dos gráus que almejam, sem interrupções forçadas no curso; - considerando mais que o auxílio de 24:000$000, consignado no orçamento do Estado a partir de Janeiro de 1940 está em atrazo desde Agosto; - considerando, além disso, a necessidade imperiosa de despesas urgentes, exigidas para o restabelecimento do curso em questão; e - considerando a necessidade de regularisar a situação do patrimônio da Faculdade; RESOLVE apresentar ao Governo do Estado as seguintes sugestões, visando o funcionamento normal do curso de Farmácia: Casamento por dote: a questão do curso de farmárcia na Faculdade de Medicina 271 I - o Estado pagará, antes do restabelecimento do curso de Farmácia, a quantia de 74:087$000, divida reconhecida em razões de veto ao projeto de lei n 143 de 30 de Novembro de 1936, da extinta Assembléia Legislativa; bem assim, a importância de 25$000.000 restantes do auxilio de 1937 que deixou de ser pago de Junho deste ano até a data de sua extinção (9 de março de 1938), período em que nada obstante, a Faculdade pagou integralmente aos professores do curso de Farmácia, enquanto estiverem no exercício de suas funções e atendeu as outras despesas decorrentes do funcionamento das aulas; II - o Estado pagará, anualmente sob forma duodecimal o auxílio de 100:000$000; III - desde que o funcionamento do curso de Farmácia com a consequente obrigação de pagamento pontual do professorado respectivo, depende da normalidade do recebimento mensal do auxilio referido no Item II, o estado assumirá o compromisso formal de efetuar mensalmente o pagamento desse auxilio, a fim de que a Faculdade não se veja na dura contingencia de novamente interromper este curso; IV - o Estado facilitará, obedecidas as exigências legais, a transferencia, para o patrimônio da Faculdade, do prédio em que funcionou a Escola de Farmácia, sito á praça Pedro II (antigo Largo do Palácio), esquina da travessa da Vigia e onde funciona hoje o Grupo Escolar Ruy Barbosa, transferencia esta prevista no artigo segundo do decreto 133, de 12 de fevereiro de 1931 (FMCP, 1941, p. 60). 272 Diante das condições expostas pela Faculdade, o Estado responderia em 14 de novembro de forma lacônica: “Arquive-se, visto não permitirem as condições atuais do erário o restabelecimento do curso” (FMCP, 1941, p. 61). Enterrava-se definitivamente o assunto. A Faculdade de Farmácia só viria a ressurgir pelas mãos dos próprios farmacêuticos em 16 de junho de 1941, desta vez sem nenhuma participação da Faculdade de Medicina. Paradoxalmente talvez por falta de apoio financeiro ela só seria instalada efetivamente bem mais tarde, em primeiro de janeiro de 1946, em um prédio doado pelo Governo do Estado na Generalíssimo esquina com a rua Braz de Aguiar (SILVA, 2003, p. 75). NOTAS 1 “Art. 2 – A Faculdade manterá os seguintes cursos: a) curso medico b) curso de obstetrícia. Paragrapho único – Quando lhe convier e os seus recursos o permittirem poderá iniciar os cursos de pharmacia, odontologia, enfermeiros e microscopista.” (FMCP, 1924b, p. 7). 2 O Diretor na época era Joaquim Vianna. (PARÁ. Governador (1925-1929: Dyonisio Ausier Bentes) 07.09.1928, p. 43). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 17 Colação de grau: Cerimonial e formandos até 1950 273 274 Placa da turma dos médicos de 1928. As determinações a respeito da conclusão do curso de medicina, como defesa de tese e grau de doutor em medicina, assim como da solenidade de outorga do grau na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará encontram-se nos capítulos XVI, XVII e XVIII do primeiro estatuto da instituição, datado de 24 de fevereiro de 1921 e assinado pelo Barão de Anajás (FMCP, 1933a, p. 42-47). O estatuto, decerto adaptado da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, como também o era o Regimento Interno, detalhava os vários aspectos relacionados à formatura, como a publicação na imprensa e na secretaria da Faculdade da relação dos colandos, (“candidatos ao gráo de Doutor”), a convocação de todos os professores catedráticos, substitutos, honorários e convidados (“pessoas notáveis pelos seus títulos científicos, ou literários, como pela posição social”), para estarem presentes “no dia e hora designados, na sala destinada para a colação de gráo”, ocasião em que os graduandos seriam “admittidos pelo secretário que fará a chamada de todos, declarando os nomes dos que se acharem presentes”, sendo ainda permitido aos graduandos “dar todo realce a solenidade” (FMCP, 1933a, p. 47). A sessão começaria com a leitura das notas de aprovação nos exames finais, feita pelo secretário da faculdade, sendo em seguida chamados os graduandos, “cada um por sua vez, para receberem a investidura”. O primeiro que a recebesse, seria o responsável por fazer a promessa, de conformidade com os dizeres da fórmula (o juramento de Hipócrates), constante do “regulamento interno da Faculdade e seguida nas demais Faculdades da União, com os outros alunos repetindo os dizeres1. O diretor, ao conferir o grau a cada aluno, colocava-lhe no dedo o anel simbólico2 e na cabeça a borla da Faculdade e o capelo. Neste momento pronunciaria “a formula adotada nas mesmas faculdades da União”, que era a seguinte: Lêde e meditai as obras de Hipócrates; regulai vossa vida pela sua e os homens cobrirão de bênçãos o vosso nome. Recebei este anel como simbolo do gráo que vos confio. Ide, podeis praticar e ensinar a Medicina.3 Ressalte-se que durante a colação de grau, “os lentes e espectadores”deveriam permanecer de pé e em silêncio. “Feita a collação de grau”, um dos novos graduandos anteriormente escolhido pelos colegas, “recitará um discurso congratulatório”, “previamente apresentado ao Director, que eliminará o que n’elle houver de inconveniente”. A este discurso responderia com um pronunciamento, o paraninfo, “que será um lente eleito pelos referidos graduandos” (FMCP, 1924b, Art. 249, p. 47). O graduando que por motivo justificado, “a juizo do Director”, não pudesse comparecer à cerimônia, receberia o grau em uma nova data, a ser escolhida pelo diretor, devendo haver a presença de três professores no evento. Observa-se que a data da outorga do grau não era definida, não havendo, portanto, nenhuma menção ao 8 de dezembro, data que tornar-se-ia, posteriormente, tradiColação de grau: cerimonial e formandos até 1950 275 cional, com regularidade a partir de 1934, sendo adotada pela grande maioria das turmas da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. A primeira colação de grau promovida pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará aconteceu no dia 16 de abril de 1925, na secretaria da Faculdade, e não foi de medicina. Foi de enfermeiras obstetrizes, curso ministrado, também, pela Faculdade de Medicina. De acordo com a ata lavrada pelo Dr. Olympio da Cardoso da Silveira, na qualidade de secretário, na referida data, depois de satisfeitas as exigências da lei do Ensino Superior, compareceram as senhoritas Maria Magdalena Bello da Conceição e Angelina Rebello de Souza e perante os professores Doutores Agostinho de Menezes Monteiro, Renato Chaves da Silva e Souza e Hermógenes Pinheiro, o Excellentissimo Senhor Doutor Camillo Henrique Salgado, Director da Faculdade, conferiu-lhes o gráo de Obstetriz4. 276 No mesmo dia, às nove horas, também na secretaria da Faculdade, na presença dos professores Doutores Acylino de Leão Rodrigues, Dagoberto Rodrigues de Souza e Oscar Pereira de Carvalho, o Doutor Camilo Salgado, na qualidade de Diretor da Faculdade, confere o “gráo de doutor em medicina a Antonio Magno e Silva e Bianor Martins Penalber “depois de terem os referidos doutorandos prestado o juramento exigido e o Doutor Director pronunciado as palavras usadas nestas solemnidades”. Estes, portanto, foram os primeiros médicos formados pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. A colação seguinte aconteceria em 18 de abril de 1925, também de enfermeiras obstetrizes e de doutores em medicina. Desta feita receberam o grau de doutor em medicina: Honorato Remigio de Castro Filgueiras e Hippolito Carelli, perante os professores Doutores Antonio Remigio de Castro Filgueiras, paraninpho, Gabriel Rodrigues de Souza, Renato Chaves da Silva e Souza, Francisco de Souza Pondé, João Prisco dos Santos, Argemiro Orlando Pereira Lima, Hermógenes Pinheiro, Deusdedit Coelho e Oscar Pereira de Carvalho, o excellentissimo senhor Director Doutor Camillo Henrique Salgado, depois de terem os doutorandos prestado o juramento de estylo, o Doutor Director depois de proferidas as palavras usadas nestas solemnidades, conferiu-lhes o gráo de doutor em medicina. Em 10 de janeiro de 1926, às 9 horas, no salão nobre do Hospital da Santa Casa de Misericórdia do Pará, ocorreria nova formatura, desta vez com um caráter mais solene. Na ocasião colaram o grau os doutorandos Jorge Alves Maia, Antonio Barbosa Rodrigues, Antonio Siqueira Mendes, Izauro Gonçalves da Costa e Manoel Tertuliano de Cerqueira, perante os professores Argemiro Orlando Pereira Lima, paraninpho da turma, Oscar Pereira de Carvalho, Acylino de Leão Rodrigues, Américo Campos, Renato Chaves, Prisco dos Santos, Raymundo Matos Cascaes, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Dagoberto Souza, Amanajás Filho, Jayme Jacyntho Aben-Athar e Suplicio Ausier Bentes, Doutor Lauro de Almeida Sodré (filho), Inspector do Ensino, Doutor Dionysio Bentes, Governador do Estado, representante do Doutor Rodrigues dos Santos, Intendente de Belém, e do Snr. Arcebispo, autoridades federais, alumnos da Faculdade, representantes da imprensa e muitas pessoas gradas, o Snr. Dr. Camillo Henrique Salgado, Director da Faculdade, abriu a sessão, mandando proceder a chamada, pelo secretario, dos doutorandos, que depois de haverem prestado o Juramento de Estylo e o Snr. Doutor Director proferido as palavras usadas nestas solemnidades, foi-lhes conferido o gráo de doutor em medicina. Ainda de acordo com a ata, O Senhor Doutor Camillo Salgado, de pé, com voz clara e firme declarou que em nome do Governo da Republica e na qualidade de Director da Faculdade, concedia-lhes o diploma, afim de que podessem exercer a sua profissão nos Estados Unidos do Brasil. Após esta manifestação o Diretor passaria a presidência da sessão ao Governador do Estado, que convidou para da mesma fazerem parte o Snr. Cel Manoel Henrique, commandante da 8ª Região, Dr. Luiz Estevam de Oliveira, Juiz seccional, e representantes do Snr. Rodrigues dos Santos, Intendente de Belém, e do Snr. Arcebispo. Sua Excia. Snr. Dr. Dionysio Bentes deu a palavra ao doutorando Izauro Gonçalves da Costa, orador da turma, e depois ao illustrado professor Orlando Lima, paraninpho da turma. Ao encerrar a sessão, o eminente Governador e illustrado professor de phisiologia desta Faculdade, proferio empolgante discurso, abordando com proficiencia e profundo conhecimento, os pontos mais modernos da medicina; explicou o papel que exercem no nosso organismo as glandulas endocrinas e seus hormonios – thymus, thyreoide, parathyreoide, capsulas supra-renais, etc – e que a medicina tinha ainda muito que progredir, dando de tudo explicações claras e positivas. Ao perorar, fez Sua Excellencia, uma bellissima saudação aos jovens medicos incitando-os a praticarem a medicina de accordo com os conselhos de Hyppocrates. As ultimas palavras do eminente homem publico, honra e gloria do Pará e uma das mais radiantes esperanças do Brasil, foram abafadas pelos assistentes, de pé, por prolongada e estridente salva de palmas5. Em 7 de agosto de 1926 aconteceria nova cerimônia de colação de grau, com a formatura de Antonio Ferro e Silva. Talvez evidenciando, naqueles primeiros tempos, uma certa falta de estruturação administrativa, onde os alunos iam recebendo seus diplomas à medida que iam concluindo seus cursos, sem uma programação pré-determinada, naquela data, na Secretaria da Faculdade, perante os professores Américo Vitruvio Gonçalves de Campos, paraninfo, Mario Midosi Chermont, Antonio Marçal, Othon Chateau e Renato Chaves de Silva e Souza, o Diretor Camilo Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950 277 Salgado concede o gráo de médico (grifo nosso) ao acima citado. Ressalte-se que possivelmente por não ter o aluno apresentado uma tese ao final do curso, não lhe foi outorgado o grau de doutor em medicina. Em 8 de janeiro de 1927, aconteceria a colação de grau de Raymundo Ferro e Silva, Almir Pedreira e Raymundo da Silva Magno, todos doutores em medicina. Presentes os professores Acylino de Leão Rodrigues, paraninfo da turma, Renato Chaves da Silva e Souza, Antonio Remigio de Castro Filgueiras, Dagoberto Rodrigues de Souza e Jayme Jacintho Aben-Athar. A cerimônia foi presidida pelo Dr. Acylino de Leão, na qualidade de vice-diretor, em virtude da impossibilidade do comparecimento do Diretor, o Dr. Camilo Salgado. Da ata, transcrevemos: O Snr. Doutor Acylino de Leão pede a palavra e durante cerca de trinta minutos, em linguagem firme e eloquente dissertou sobre o papel do medico que inicia a clinica, mostrando-lhes o caminho que deveriam trilhar e tambem sobre o movimento da medicina moderna, alargando-se minunciosamente com argumentos convinventes, principalmente, á cerca da prophilaxia e hygiene do paludismo sobretudo no valle do Amazonas. Ao terminar sua bella oração, o illustrado professor foi enthusiaticamente palmeado. 278 Nova formatura aconteceria em 29 de março de 1927, quando o Diretor, Dr. Camilo Salgado, na secretaria da Faculdade, conferiria o grau de doutor em medicina aos seguintes concluintes: José Collier Cavalcante, Waldemar de Freitas Ribeiro, Aguinaldo Alves Dias e Edgard Bentes Rodrigues, paraninfados pelo professor Acylino de Leão e na presença dos professores Renato Chaves, Antonio Remigio Filgueiras, Américo Campos e Deusdedit Coelho Duarte. No final do mesmo ano, precisamente no dia 31 de dezembro de 1927, perante a Congregação e a presença do Dr. Lauro de Almeida Sodré, inspetor do Departamento Nacional do Ensino, sem menção do local, aconteceria a cerimônia de formatura de Sebastião Francisco de Mello Junior, Theodoro Maria de Souza Aranha, Edgardo Roxo Pereira e Roberto Monteiro Lopes Guimarães. O paraninfo da turma foi o professor Arthur Pinto França que juntamente como orador da turma, o doutorando Sebastião de Mello Jr., proferiram “eloquentes discursos allusivos ao ato”. O Dr. Camilo Salgado “fez-lhes depois brilhante saudação, incitando-os a trilharem sempre o caminho do dever profissional e a praticarem a medicina seguindo aos caminhos de Hyppocrates”. Nova colação de médico (grifo nosso) aconteceria em 25 de fevereiro de 1928. Na secretaria da Faculdade, às 9 horas, receberia o grau Petronio José de Souza. Presentes os professores Deusdedit Coelho, Américo Campos, Remigio Filgueiras e Mario Midosi Chermont. A cerimônia seguinte ocorreria em 29 de dezembro de 1928, com a formatura de Gentil Eloy de Figueiredo, a quem o Diretor conferiu o grau de doutor em medicina. Presentes os professores Mario Midosi Chermont, Deusdedit Coelho, Antonio Marçal e Amanajás Filho. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Em 31 de dezembro do mesmo ano aconteceria nova formatura. Às 10 horas, na Secretaria da Faculdade, na presença dos professores Mario Midosi Chermont, Amanajás Filho, Antonio Marçal e Deusdedit Coelho, o Dr. Camilo Salgado, na qualidade de Diretor, confere o grau de doutora em medicina à Olga Maria Paes de Andrade6, que se constitui, assim, na primeira mulher a formar-se na referida Faculdade. No dia 5 de janeiro de 1929, às 8 horas, também na secretaria da Faculdade, ocorreria a formatura de Carlos Hygino da Silva, a quem é conferido o grau de doutor em medicina, na presença dos professores Jayme Aben-Athar, Renato Chaves, Hermógenes Pinheiro e Francisco Pondé. O doutorando Bessa de Oliveira recebe o grau de doutor em medicina em 21 de março de 1929, na presença dos professores Antonio Marçal, Remigio Filgueiras e Oscar de Carvalho. Em 31 de março de 1929 acontece uma colação de grau de medico cirurgião (grifo nosso). Realizada às 8h30, na secretaria da Faculdade, na presença dos professores Antonio Marçal, Oscar de Carvalho, Deusdedit Coelho e Othon Chateau, o Diretor, Dr. Camilo Salgado, confere o grau de médico cirurgião aos doutorandos João da Silva Novaes, Cândida Augusta de Jesus e Silva e Matheus Lydio Pereira de Souza. A cerimônia seguinte, em 3 de abril de 1929, também pela manhã e ainda na secretaria da Faculdade seria para a outorga do grau de doutor em medicina aos doutorandos Edgard Antunes Salgado e Antonio Simões Pereira. Presentes os professores Argemiro Orlando Lima, Higino Amanajás Filho, Camilo Salgado, Porto de Oliveira e Ferreira Bastos. A cerimônia foi presidida pelo vice-diretor Dr. Acylino de Leão. Em 11 de outubro de 1929, às 16 horas, aconteceria a cerimônia de formatura da doutoranda Eugenia Ferreira de Paiva Hollanda. Na secretaria da Faculdade, com a presença dos professores Oscar de Carvalho, Remigio Filgueiras, Antonio Marçal e Ferreira Bastos, o Dr. Camilo Salgado conferiu o grau de doutor em medicina à referida doutoranda. Nova formatura acontece em 18 de dezembro de 1929. Desta feita receberam o grau de doutor em medicina João Siqueira Mendes, Raymundo Avertano Barreto da Rocha e Estrella Zagury Benayon. Presentes os professores Othon Chateau, Antonio Marçal e João Prisco dos Santos; o Diretor, Camilo Salgado. No ano seguinte, 1930, em 26 de maio, acontece a colação de grau de José Theophilo Ferreira, na presença dos professores Othon Chateau, Antonio Marçal e Deusdedit Coelho. Camilo Salgado, como Diretor, outorga ao doutorando o grau de doutor em medicina. A cerimônia seguinte realiza-se em 11 de dezembro de 1930. Naquela data é outorgado o título de médico cirurgião a Djalma José Pereira7 Ferreira da Cruz. Presentes Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950 279 o professores Antonio Marçal, Othon Chateau e Castro Valente, além do Diretor Camilo Salgado. No mesmo mês, dia 31, a colação de grau realiza-se no salão nobre da Faculdade de medicina, sendo esta a primeira vez que o referido salão é mencionado como local de formatura8. Da ata lavrada pelo secretário Dr. Olympio da Silveira: No salão nobre da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, reuniu-se a Congregação para a solemne colação de gráo dos doutorandos que concluiram o curso. Ás nove horas da manhã o senhor Dr. Camillo Salgado, Director da Faculdade, comunica aos presentes o fim da reunião e passa a presidencia ao Snr. Abguar Bastos, representante official do excellentissimo senhor capitão Joaquim Magalhães Cardoso Barata, digno interventor militar no Estado do Pará. 280 Os formandos eram: Oscar Pereira de Miranda, Lucidea Lage Lobato, Anísio de Mendonça Maroja, Epaminondas de Paiva Menezes, Armando Bordallo da Silva, doutores em medicina, e Alexandre Magno de Araujo e Lucilo Fender médicos cirurgiões (grifo nosso). O doutorando Oscar de Miranda, “em voz alta e pausada, proferio o juramento da lei; em seguida os demais doutorandos, um a um, com a mão espalmada sobre o livro diziam: ‘Assim o prometto’”. Em seguida o Sr. Abguar Bastos deu a palavra ao professor Amanajás Filho, que como paraninfo da turma: “prophere eloquente peça oratória”. Posteriormente subiu a tribuna o doutorando Armando Bordallo da Silva, orador da turma, “que ao terminar o seu discurso foi calorosamente aplaudido”. O representante do Interventor “congratula-se com os novos medicos pelo termino de seu curso, desejando-lhes toda sorte de felicidades na espinhosa e sublime carreira que abraçaram”. Em 10 de janeiro de 1931, na secretaria da Faculdade, às 15 horas, acontece a colação de grau de médico cirurgião de Oseas Santos Antunes e Epaminondas Anselmo Figueira de Mello. É registrada a presença dos professores Antonio Marçal, Castro Valente, Deudedit Coelho, além do Diretor, Camilo Salgado. Em 21 de março de 1931 há registro da colação grau de farmacêuticos, acontecida na secretaria da Faculdade. No Salão Nobre do Hospital da Santa Casa, em 24 de dezembro de 1931, às 10 horas, ocorre a cerimônia solene de colação de grau de doutores em medicina e de médicos cirurgiões, que terminaram o curso médico em outubro. A Congregação, sob presidência do Diretor, Camilo Salgado. Entre os presentes Abguar Bastos, representante do major Magalhães Barata, interventor federal no Estado, Dr. Angelino Lima, representante do Prefeito, padre Leandro Pinheiro, cônego Antonio Lobato, representante do vigário capitular, 1º tenente Álvaro Alves Pinto, representante do comandante da 8ª Região Militar. Receberam o grau de médicos cirurgiões Roberto Candido Pereira, José Fernandes Ramos, Emilio Bastos Fiuza de Mello, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Renato Augusto de Oliveira, Annibal Celestino Teixeira e Eduardo Valente de Azevedo Ribeiro; de doutor em medicina Honorato de Albuquerque Neves. O orador da turma foi o doutorando Eduardo Azevedo Ribeiro, “que proferiu um bem elaborado discurso, ao qual respondeu o professor Antonio Marçal, paraninpho da mesma, em brilhantissima oração, tendo, ao terminar, recebido calorosos applausos”. Em 3 de outubro de 1932 a cerimônia solene acontece no salão nobre da Faculdade para colação de grau de médicos e farmacêuticos, “achando-se o salão repleto de familiares, medicos, advogados, estudantes e representantes de todas as classes sociais”. A sessão foi iniciada às 21 horas pelo Diretor da Faculdade, que se manifestou dizendo que havia cem anos, naquela data, os cursos cirúrgicos já existentes no Brasil passaram a ser denominados Faculdades de Medicina. E que em comemoração àquela data, em todos os estados onde havia Faculdades de Medicina, haveria colação de grau dos médicos daquele ano letivo, sendo extensivo aos farmacêuticos, por deliberação do Ministério da Educação e Saúde Pública. A presidência dos trabalhos foi em seguida passada ao Dr. Clementino de Almeida Lisboa, secretário geral do Estado e representante do major Magalhães Barata, interventor do Estado. Estavam presentes, também, Abelardo Conduru, prefeito municipal, Dr. Nilo Penna, representante do Desembargador Raymundo Nogueira de Faria, chefe de policia, Luiz Estevam de Oliveira, juiz federal, Genuino Amazonas de Figueiredo, Diretor da Faculdade de Direito, Lauro Sodré Filho, inspetor federal do ensino, alem de Camilo Salgado e Olympio da Silveira. O juramento foi prestado pelo doutorando Olavo Martins Leôncio. A nova turma era composta por Amyntor Virgolino do Amaral Basto, José Gutierrez Garcia Filho, Pedro Nicolau Gonçalves dos Santos Rosado, Mario de Oliveira Salgado, Scylla Lage da Silva, Julio Felippe Baças, Luiz Joaquim Barbosa, Raymundo Valle Paiva, José Thomas Nabuco de Oliveira Filho, João Ismael Nunes de Araujo, Ignácio Moura Filho e Cassio Rodrigues da Cunha. O paraninfo foi o professor Acylino de Leão, “que proferio brilhante discurso, descrevendo as phases em que se divide a medicina, desde o embryonarismo das epocas recuadas até a quase certeza scientifica do momento que passa e fazendo outras series de considerações em torno da cerimonia”. Não há referência de discurso de orador da turma. No dia seguinte, 4 de outubro, na secretaria da Faculdade, colaria grau de médico José Valentim de Araujo. Em 7 de outubro do mesmo ano, seria a formatura de Benedicto Cavalleiro de Macedo Klautau, José Mariano Cavalleiro de Macedo e Chardival Monteiro Figueira. A formatura seguinte seria realizada em 16 de dezembro de 1933, às 20 horas, solene, no salão nobre da Faculdade e conjunta com o curso de Farmácia. Aberta a sessão, o Diretor da Faculdade passa a presidência ao desembargador Genuino Amazonas de Figueirdo, representante do major Magalhães Barata, Interventor Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950 281 Federal. Presentes o coronel Costa Araujo, comandante da Região Militar e seu ajudante de ordens, o representante do sr. Abelardo Conduru, prefeito municipal e o sr. Loris Olympio Correa de Araujo, inspetor federal interino do ensino. O juramento foi prestado pelo doutorando Ferdinando Rapisardi dos Santos. Os demais formandos foram: Orion do Couto Loureiro, Alderico de Oliveira Costa, Jesuíno de Souza Lins, Humberto Furtado de Oliveira Cabral, Humberto Veiga Franco, Astrogilda Mesquita Assis, Raymundo Scylla Castro de Andrade, Moacyr Pinto da Costa e Armando de Mendonça Maroja. Destaque-se que Alderico de Oliveira Costa e Armando de Mendonça Maroja colaram grau de “doutor em medicina”. O orador da turma foi o doutorando Raymundo Scylla Castro de Andrade; o paraninfo, o professor Hygino Amanajás Filho. Desta data em diante não há mais menção de outorga do grau de “doutor em medicina”. Em 23 de dezembro de 1933, acontece a formatura de Inalio Martins de Castro, como “médico”, realizada na secretaria da Faculdade. No dia 19 de janeiro de 1934, na secretaria da Faculdade, foi conferido o grau de médico para Mario Rodrigues Ferreira. Nova sessão acontece em 31 do mesmo mês, quando foi conferido o grau de médico para Menandro Rodrigues Tapajós. 282 A sessão seguinte foi solene e realizada no salão nobre da Faculdade em 8 de dezembro de 1934 para a colação de grau de médico. É a primeira vez que se realiza nesta data, que posteriormente seria considerada tradicional para as cerimônias de colação de grau do curso de medicina. Aberta a sessão às 21 horas pelo Dr. Camilo Salgado, a presidência da mesma foi passada para o major Magalhães Barata, Interventor Federal do Estado. Presentes ainda, major Joaquim Aguiar, chefe de polícia, representantes do comandante da 8ª Região Militar, do Inspetor do Arsenal de Marinha, do prefeito municipal e o Dr. Lauro Sodré Filho, inspetor federal do ensino. Prestou juramento pela turma o doutorando Fernando Martins Mendes. Os formandos eram: Abelina Garcia Rocha, Renato Augusto de Moura, Jacintho Moreira Netto, Abrahão Antonio José, Álvaro Fernando do Nacimento, Aluisio Mendonça da Fonseca, Almir Serra Martins Menezes, Arnaldo Correa Prado, José de Souza Macedo, Emygdio Pedreira de Albuquerque, José Chaves Muller e Alberto Carneiro da Silva. O orador foi o doutorando Arnaldo Correa Prado; o paraninfo, o professor Antonio Acatauassú Nunes Filho. Somente haveria nova formatura de médicos em 8 de dezembro de 1935, também conjunta com a Farmácia. Solene, no salão nobre da Faculdade, com a presença do Dr. Lauro Martins, representante do Dr. José Carneiro da Gama Malcher, governador do estado, do comandante Adalberto Cotrim Coimbra, inspetor do Arsenal de Marinha, do Dr. Oswaldo Orico, diretor geral do Ensino Público, de representantes do comandante da 8ª Região, do capitão dos portos e do prefeito municipal e o Dr. Lauro de Almeida Sodré Filho, “inspector federal junto á Faculdade”. O jura- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 mento de praxe foi prestado pelo doutorando Albino Figueiredo Junior. Os demais formandos eram: Alberto Moacyr Benayon, Milton Cordovil, Milton Luna Lobato, Ruy Penna Ponde, Leônidas de Mello Deane, Gladstone de Mello Deane, Aristides de Souza Rodrigues, Haydée Serrão de Castro, Francisco Manoel da Cunha Cerqueira, Raymundo de Castro Menezes Pereira Carneiro, Bettina Ferreira9 de Souza, David Gabbay, Lacy Faria Ribeiro e Paulo Bentes de Carvalho. O orador foi o doutorando Gladstone de Mello Deane; o paraninfo foi O illustrado professor Lauro Magalhães [...] que pronunciou bello discurso allusivo á cerimonia, que, ao terminar, foi calorosamente applaudido. Ás 18 horas, após a entrega do premio ‘Raul Leite’ pelo representante do Chefe de Estado ao sr. Dr. Leônidas de Mello Deane, o Sr. Dr. Director, depois de dirigir palavras de encorajamento aos novos médicos e pharmaceuticos e de profundo agradecimento aos que se dignaram comparecer a essa cerimônia, encerrou a sessão10. 283 Foto 60: Diploma da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará na década de 1930. Fonte: Museu da Santa Casa. Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950 Nos dias 10 e 31 de dezembro do mesmo ano, acontecem as formaturas de Lucival Lage Lobato e João Joaquim Ramos Ribeiro, respectivamente, sendo a cerimônia de ambos realizada na secretaria da Faculdade. As formaturas seguintes seriam realizadas em 18 e 29 de janeiro de 1936, com a colação de grau de Abílio Maranhão Gonçalves e Waldimir Alves Sant’Anna. Em 13 de março acontece a formatura de Nizomar Pinheiro de Azevedo e Élson Damasceno Lopes. Em 8 de dezembro de 1936 acontece a sessão solene de colação de grau de médico “aos sextanistas de 1936”, em “sessão solemne da Congregação”. Conforme a ata: Ás vinte e meia horas, o Snr. Dr. Camillo Salgado, Director da Faculdade, abrio a sessão, ficando ladeado pelos representantes do snr. Dr. José Carneiro da Gama Malcher, Governador do Estado, do Exmº Snr. D. Antonio de Almeida Lustosa, Arcebispo do Pará e pelos doutores Lauro Sodré Filho e Olympio da Silveira, inspector federal de ensino e secretario da Faculdade, respectivamente. 284 Pela turma, leu o juramento de praxe o doutorando Percy Monteiro de Menezes. Os formandos: Wenceslau Botelho, Hermínio Pessoa, Emilio Nasser, Raymundo Ferreira de Oliveira, Francisco Baptista de Lima, José Ribamar Serra, Francisco Rosario Conte, Adalberto Bastos de Menezes, Celso de Mattos Leão, Nelson Correa de Oliveira, Candido Pereira da Costa, Augusto Olívio Chaves Rodrigues, José Linhares de Paiva, Flavio de Britto Pontes, Carlos Soares de Mello, Clovis Eugenio de Vasconcellos Chaves, Affonso Rodrigues Filho, Danilo de Aguiar Corrêa, Armando Cardoso Pingarilho, Saint-Clair Leoncio Martins, José Amazonas Palhano, Ary Tupinambá Penna Pinheiro, Rubens da Silveira Britto e Diniz Oeiras Botelho. O orador da turma foi o doutorando Hermínio Pessoa e o paraninfo o professor Jayme Jacintho Aben-Athar. O Prêmio Raul Leite foi conferido ao doutorando Hermínio Pessoa. Em 12 de dezembro colaram grau, na secretaria da Faculdade, Odmar Rangel Barata, Adolpho Roessing e Felipe Nery Guimarães. Em 31 de dezembro, Eliezer Pará-Assú da Serra Freire. A ata de formatura seguinte registra: “sessão solemne da Congregação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, realizada no dia 8 de dezembro de 1937, para a collação de gráo de medico, phamaceutico e enfermeira obstetrica”. Sessão aberta pelo Diretor da Faculdade às 20 horas, com a presença de autoridades e representantes. O juramento dos médicos foi feito pela doutoranda Maria Luiza Monteiro de Menezes. A turma era composta pelos seguintes doutorandos: Tarquinio José Lopes, Antonio Souza de Oliveira, Maria de Nazareth Salles, José Roberto da Silva Lima Junior, Renato Borralho de Medeiros, Orlando da Costa Tavares Videira, Manoel Marinho Monte, Ruy Ferreira dos Santos, Luizileno de Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Roma Amoêdo Brasil, Miguel Lupi Martins e João Hamilton Ferro Costa. O orador foi o doutorando Manoel Marinho Monte e o paraninfo o professor José Alves Dias Junior. Da ata: “...o senhor Presidente deu a palavra ao venerando professor Dr. Antonio Marçal, homenageado no quadro de formatura dos novos médicos, que proferio formoso e emocionante discurso, sendo delirantemente palmeado pela assistência, ao terminar”. Em 11 de dezembro receberam o grau de médico, na secretaria da Faculdade, os seguintes: Claudio de Mendonça Dias, Claudio Pastor Dacier Lobato, Maria José Rodrigues von Paumgartten, Maria do Carmo Sarmento de Carvalho, Carlos de Souza Vasconcelos, Pedro Vallinoto, Nilson Carvalho da Silva, Orlando Rodrigues da Costa, Rubens Bezerra Valente e Paulo Hugo Craveiro Durand. Registre-se a ata ter sido lavrada pelo Dr. Theodoro de Souza Aranha. A formatura seguinte não ocorreu em 8 de dezembro de 1938, mas no dia 11 do referido mês. No salão nobre da Faculdade, sob a presidência do Dr. Lauro de Magalhães, Diretor da Faculdade em virtude da morte de Camilo Salgado em 2 de março daquele ano. Da ata: teve inicio a memoravel sessão ás nove horas da manhã, quando os novos facultativos volviam da basilica de Nazareth, onde foram assistir á missa solemne celebrada por D. Antonio da Almeida Lustosa, que nessa ocasião, procedeu á benção dos aneis. O director da Faculdade ficou ladeado pelo snr. dr. interventor federal do Estado; D. Antonio de Almeida Lustosa, arcebispo do Pará; dr. João Baptista Ferreira de Souza, director da Faculdade de Direito do Pará; dr. Lauro Sodré Filho, inspector federal do ensino, dr. Olympio da Silveira, secretario da Faculdade e tambem dos representantes do general commandante da 8ª Região Militar, do prefeito municipal de Belém, do commandante da Policia Militar do Estado e do commandante do 26 Batalhão de Caçadores. O juramento foi proferido pelo doutorando José Rodrigues da Silveira Netto, “que leu, em vóz pauzada e clara”. Os demais formandos eram: Alfredo Barroso Rebello, José da Silva Salazar, Lauro Rodrigues Lima, Ruy da Silva Romariz, José Guilherme Araujo Cavalleiro de Macedo, Manoel Baliu Monteiro, Francisco de Assis Maciel de Silveira, Gervasio de Britto Mello, Sandoval Rodrigues Cardoso, Joaquim Fernandes de Araujo Filho, José Moussallem Falcão, Harold da Cunha Franco, Carlos Guimarães Pereira da Silva, Eduardo Granhem Hermes, Vicente Magno de Miranda, Dirceu Pereira Gondim, Ocyr Fidanza Dutra, Arthur Gonçalves Arantes, Antonio Euzébio da Costa Rodrigues, Ary Lage da Silva, Carlos Simões Pereira Netto, Renausto Pedrosa Amanajás, Francisco Victorino de Luna, Amílcar Carvalho da Silva, Atahualpa José Lobato Fernandez, Moacyr Pedro de Valmont, Eduardo Fernandes Gomes e Epilogo de Gonçalves Campos. O “premio Raul Leite” foi concedido ao Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950 285 doutorando Amílcar Carvalho da Silva, “por ter sido o detentor das melhores notas obtidas durante o curso, recebendo elle nessa ocasião prolongadas salvas de palmas”. O orador foi o doutorando José Guilherme Cavalleiro de Macedo. Sobre o paraninfo temos: “Pela impossibilidade do comparecimento do dr. Othon Chateau, paraninpho á turma, o dr. Luiz Araujo leu a oração de seu collega, que foi uma scintillante peça de erudição scientifica e de brilho litterario”. Em seguida a palavra foi concedida ao venerando mestre da Faculdade, dr. Antonio Marçal, que, com um enthusiamo juvenil saudou seus novos collegas e agradeceu, commmovido, a homenagem que estes lhe tributaram, incluindo-lhe o retrato no quadro de formatura. Ao terminar o seu formoso e emocionante discurso, foi delirantemente palmeado pela assistência. O presidente da sessão encerrou-a “ás onze (11) horas, sendo então o hymno nacional harmoniosamente executado pela banda municipal dos Bombeiros”.11 Em 7 de agosto de 1939, na secretaria da Faculdade aconteceu a formatura de Pojucan Moura Tapajós. 286 A sessão solene seguinte realizou-se em 10 de dezembro de 1939, com a ata registrando “sessao solemne para a collação de grão á primeira turma de alumnos que terminaram o curso medico”. Ausente o Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, a sessão foi presidida pelo seu substituto legal, o Dr. Acylino de Leão. Entre as autoridades, o Dr. Epilogo de Campos, inspetor federal. Sessão realizada pela manhã, às 9 horas, sendo juramentista o doutorando Guilherme Lins de Vasconcellos Chaves. Demais formandos: Pedro Constantino Jorge, Antonio Sebastião dos Reis, Sylvio de Almeida Bentes, Ivaldo Mattos Guerra, Adolpho de Xerez e Oliveira Góes, Jorge Antonio da Silva, Hamilton Raposo de Miranda, Orlandino Martins Fonseca, Antonio de Castro Menezes Pereira Carneiro, Zildo Cardoso Centeio Lopes, Wagner Brasiliense Eleutherio, Mario Nazarethno Machado Sampaio, Alvaro José de Pinho Simões, Aniceto de Castro Menezes Pereira Carneiro e José Pereira Gonzalez. O orador foi o doutorando Wagner Eleutherio e o paraninfo o professor Orlando Lima. Em 14 de dezembro de 1939 aconteceu nova sessão solene da Congregação, no salão nobre da Faculdade, para colação de grau da segunda turma de médicos12. Pela primeira vez a ata nomina os professores presentes: Achavam-se nas bancadas os senhores professores Carlos Arnobio Franco, Oscar Pereira de Carvalho, Othon Chateau, Raymundo da Cruz Moreira, Jayme Jacintho Aben-Athar, Gabriel Rodrigues de Souza, Alberto Pereira de Moraes, José Alves Dias Junior, Luiz Romano da Motta Araujo, Oscar Pereira de Miranda, Orlando Lima e Appio Medrado. A sessão teve inicio às 9h30, presidida pelo Dr. Lauro de Magalhães, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 quando os novos facultativos, acompanhados de seus paraninphos, volviam da capella da Santa Casa de Misericordia, onde foram assistir á missa solemne celebrada por D. Antonio de Almeida Lustosa, arcebispo do Pará, que nessa ocasião, procedeu á benção dos aneis. O Diretor estava ladeado pelo general Lobato Filho, comandante da 8ª Região e representante do sr. Getulio Vargas, Presidente da Republica. Presentes ainda: Dr. Deodoro de Mendonça, secretario geral do Estado e representante do Dr. José Carneiro da Gama Malcher, interventor federal, sr. Abelardo Conduru, prefeito municipal. Dr. Heitor Castello Branco, presidente do Departamento Administrativo do Estado, João Malato, representante do jornal Folha do Norte, e Dr. Epilogo de Campos, inspetor federal do ensino. O juramento foi prestado pela doutoranda Eunice Tupinambá Rodrigues. Os demais componentes da turma eram: Domingos Barbosa da Silva, Christovam Pinto Martins, Abelardo dos Santos. Orlando Cerdeira Bordallo, Amedeo Vivacqua, Guaraciaba Quaresma da Gama, José Casemiro Pereira de Moura e Paulo Queima Coelho de Souza, que foi o orador da turma. O paraninfo foi o professor Orlando Lima. O prêmio “Raul Leite” constou de um cheque no valor de “um conto de réis”, e foi entregue pelo jornalista João Malato, representante de Folha do Norte, cujo diretor fora convidado pelos representantes do laboratório Raul Leite para fazer a referida entrega. Da ata: “Assim, o snr. João Malato, depois de proferir palavras de louvor e incentivo, passou o premio ás mãos do diplomando Domingos Barbosa da Silva, que o conquistara pela sua applicação constante e proveitosa aos estudos”. Não há menção à execução do hino nacional ao encerramento da sessão. Na mesma data, 14 de dezembro, na secretaria da Faculdade, às 15 horas, é concedido pelo Diretor o grau de médico a Belmira Leão Ferreira. Em 30 de dezembro para Telmo Rodrigues Sarmento. A formatura seguinte aconteceu em 8 de dezembro de 1940, quando houve, também, formatura de enfermagem obstétrica. Sessão solene da Congregação, realizada no salão nobre da Faculdade, iniciada às 18 horas, com o retorno dos novos médicos da Basílica de Nazaré, onde assistiram missa e houve a benção dos anéis. Na presença de autoridades e representantes, o doutorando Olympio Cardoso da Silveira Filho leu o juramento, “recebendo nesta ocasião o anel symbolico sob uma calorosa salva de palmas da assistência”. Os demais formandos: Emilio Assmar, Ernesto Laudelino de Almeida, José Cyriaco Gurjão Sampaio, Luiz Tito de Castro Leão, Ursulino Velloso de Souza Martins, Geraldo Caetano Corrêa Sobrinho, Arthur Porto Marques, Osmar Lima Sampaio, José Luiz de Souza Ferreira, Clovis Olintho de Bastos Meira, Alcyr de Morisson Faria, Wilson da Motta Silveira, Guiomar Duarte de Aragão, Laura Guimarães Caldas, José Clarindo de Souza Martins, Celio Martins de Oliveira Mello, Carlos Alberto Monteiro Leite, Arcelino Chicre Miguel Bitar, Jayme Jacintho Teixeira Aben-Athar, Oscar Pinheiro dos Santos Abranches, Joaquim Oriente de Arruda Genú e Flavio Francisco Dulcetti. Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950 287 O orador foi o doutorando Wilson da Motta Silveira e o paraninfo o professor Jayme Aben-Athar. A sessão foi encerrada às 20 horas com a execução do hino nacional pela banda dos Bombeiros. Em 4 de maio de 1941, na secretaria da Faculdade, o Diretor concedeu ao grau de médico a Guiomar Vanda de Medeiros. Em 16 de julho, para Conceição de Maria Alvares dos Prazeres. Em 7 de dezembro de 1941, no salão nobre da Faculdade, realizou-se a sessão solene da Congregação para colação de grau de médico. Às 19 horas, com a presença de autoridades e representantes, o Diretor Dr. Lauro de Magalhães deu inicio à cerimônia. A juramentista foi a doutoranda Alzira Castro Dieguez. Os demais formandos eram: Herbert Spencer Ferreira, Estelio José dos Santos Lobato, Walter Gillet Machado, Salomão José Zagury, Salomão Moisés Levi, Humberto Lima dos Santos, Claudio Pereira de Souza, Emir José Kouri e Osvaldo Pinheiro dos Santos Abranches. O orador foi o doutorando Herbert Spencer Ferreira. O paraninfo professor Lauro de Magalhães, que “depois de explicar os motivos que o forçaram a paraninfar a turma, apesar de ser o diretor da Faculdade, fez uso da palavra, pronunciando empolgante, eloquente e oportuno discurso, sendo, ao terminar, calorosamente aplaudido”. 288 Não houve formatura em 1942. Em 8 de dezembro de 1943, aconteceu a sessão solene para colação de grau, no salão nobre da Faculdade, “para ser deferido o gráu de médico aos sextanistas que concluíram o respectivo curso”. Sessão iniciada às 20h30, presidida pelo Dr. Lauro de Magalhães, com a presença de autoridades e representantes. O doutorando Antonio de Oliveira Lobão leu o juramento, recebendo em seguida o anel simbólico. A turma era composta pelos seguintes doutorandos: Vitor Rocha de Matos Cardoso, Alberto Rodrigues Cruz, Otavio de Mendonça Maroja, Miguel Cordeiro de Azevedo, Paulo Cordeiro de Azevedo, José Braulio dos Santos, Gastão Feio Valente, Nicolau Biagio Panzuti, Leopoldo Cirilo Kerichanã da Silva, Aníbal da Silva Marques, Alirio Macedo, Laurenio Teixeira da Costa, Antonio do Nascimento Araujo, Dulcimar Nazaré Guimarães de Macêdo, Abraam Eliezer Levy, José Edmundo Carneiro Cutrim, Raimundo de Mendonça Dias, Antonio Ribeiro Alves Junior, Pedro Gomes de Oliveira Lopes, Lucimar Pedrosa Ribeiro, César Beserra Medrado, Fernando José Cardoso de Oliveira, Paulo Nunes Avelino, Armando Sabaa Srur, Demétrio Beserra de Medrado, Ritacinio Ramos Pereira e Amir Rocha Franco. O orador foi o doutorando Ritacinio Ramos Pereira e o paraninfo o professor José Alves Dias Junior. Sessão encerrada às 22h45, sem maiores referências13. A cerimônia seguinte realizou-se em 8 de dezembro de 1944, também no salão nobre da Faculdade. Foi presidida pelo Dr. Acylino de Leão, Diretor da escola. Entre as autoridades presentes ou representadas cite-se: representante do Interventor Federal, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 coronel Magalhães Barata, comandante do 26 BC, representante do prefeito de Belém, chefe de policia, comandante da Base Aérea, comando naval do Norte, Arcebispo metropolitano e Tribunal de Apelação, presidente do Conselho Administrativo, Diretor do Departamento Estadual de Saúde, Dr. Epilogo de Campos, inspetor federal de ensino junto à Faculdade. O juramento foi lido pelo doutorando Lourival Gomes Bogéa, que recebeu depois o anel simbólico. Os demais componentes da turma: Mario de Medeiros Barbosa, Aarão Moisés Serruya, Alberto Gomes Ferreira, Alberto de Vasconcelos Santos Cavalcante, Helio Chaves de Oliveira, Mauricio Queima Coelho de Souza, Pedro de Brito Tupinambá, Sidonio Lucas de Figueiredo, Abner José Cavalcante, Alcindo Nova da Costa, Aristolina dos Santos Neves, Aurelio Osmar Cardoso de Oliveira, Luciano Dias Maia, Luiz Mansour Maklouf, Mario Lobato de Abreu, Raimundo da Costa Chaves e Otavio Augusto Pereira Lobo. O orador foi o doutorando Pedro de Brito Tupinambá e o paraninfo o professor Lauro de Magalhães. Em 8 de dezembro de 1945, ocorreu nova formatura, com sessão solene no salão nobre da Faculdade, iniciada às 10 horas. Presidida pelo Diretor Acylino de Leão. Presença do general Zacarias Assunção, comandante da 8ª Região Militar, desembargador Manoel Maroja Neto, representante do Interventor Federal, Brigadeiro do Ar, comandante da 1ª Zona Aérea, Dr. Augusto Serra, representante do Comando Naval do Norte, representante do prefeito de Belém, Dr. Epilogo de Campos, inspetor federal do ensino junto à Faculdade. Juramentista e orador: Luiz Gonzaga Pires; formandos: Rui Teles de Borborema, Amílcar da Silva Pereira, Francisco D’Assunção dos Santos Rosado Filho, José Carvalho da Cruz, Hamilton Mesquita das Neves, Messias Guimarães Filho, Manoel Maria de Paiva Dias Ferreira, Candido Cardoso de Brito, Joaquim Beserra Neto, Ivaldo Perdigão Freire e Edgar Beserra Valente. Paraninfo: professor Orlando Lima. Sem menção de hino ou premiação. Em 8 de dezembro de 1946, nova colação de grau. Presidida pelo Diretor, Dr. Acylino de Leão, estando presentes: Dr. Octavio Meira, representante do Interventor Federal, arcebispo D. Mario de Miranda Villas-Boas, comandantes do 26 BC e da Base Naval, sr. Euclides Comarú, representante do prefeito municipal. O juramento foi proferido pelo graduando Herminio Alves Filho. A turma era composta por: João Damasceno Serra Figueiredo, Eloy Simões Bona, Leonel Rodrigues Bogéa, Zilo Pires, Ramiro Koury, Antonio Augusto de Moraes Bittencourt, Rubens Guilhon Coutinho, Milton Benedito Ericieira e Pedro Amazonas de Souza Pedroso. O orador foi Milton Ericeira e o paraninfo o professor Gastão Vieira. Nova cerimônia em 8 de dezembro de 1947, às 19 horas, presidida pelo Dr. Lauro de Magalhães. Entre as autoridades cite-se o diretor do Departamento de Educação e Cultura, do prefeito interino de Belém, sr. Euclides Comarú, do inspetor federal de ensino, sr. Edgar Pinheiro Porto. Juramento proferido pelo doutorando José Maria Direito Alvares. Graduandos: Sarah Roffé de Lemos, José Luiz de Araujo Mindelo, Emilio Hage Karam, Aloysio de Andrade Melo, Odorico de Carvalho Kós, Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950 289 João Fecury, José Bezerra dos Santos, Augusto Benedito de Leão Guilhon, Gervásio d’Araujo da Cunha Gonçalves, Galdino Batista de Souza, Manoel da Silva Braga, Carlos Augusto da Silva Costa, José Vieira Ibiapina, Renato Chalu Pacheco, Paulo Mota de Castro, José Monteiro Leite, Graciliano Muniz, Avelino Fernandes Corrêa Junior, Victor Hilário da Paz, Eduardo Augusto Dias Pereira Braga, Jean Chicre Miguel Bitar, Armando Goró Toda e José Maria Dejard de Mendonça. O orador foi o graduando Graciliano Muniz e o paraninfo o professor Antonio Porto de Oliveira. Nova turma formou-se em 8 de dezembro de 1948, em sessão iniciada às 19h30 e presidida pelo Dr. Lauro de Magalhães. Entre os presentes o sr. Antonio Teixeira Gueiros, vice-governador, tenente Aboud, representante do almirante Braz Velloso, comandante do 4º Distrito Naval. Prestou juramento a doutoranda Elisa Chermont Roffé. Demais formandos: Anna Roffé Ferreira de Lemos, Zoênio Motta Gueiros, Jorge Moussallem, Antonio Juracy de Britto, Agostinho Leão de Salles Filho, Manuel Ayres, João Maranhão Aires, João Abreu Reis, Lélio Gonçalves da Silva, Antonio Tancredi, Flavio Pires Filho, Mário Ruben de Mello Martins e Hilmo de Farias Moreira, “que, acompanhados dos seus paraninfos, receberam igualmente o anel, repetindo o senhor diretor as palavras: ‘Podeis praticar e ensinar a Medicina.’”. O orador da turma foi o graduando Hilmo Moreira e o paraninfo, o professor Aracy Barretto. “Em seguida foi feita da entrega dos diplomas de Tisiologistas aos doutorandos que concluíram o curso de Extensão Universitária”. 290 Em 8 de dezembro de 1949, às 20 horas, o Diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães “abriu a sessão proferindo eloquente saudação aos novos médicos”. A doutoranda Gilberta Bensabath proferiu o juramento. A turma: Leopoldo Domingos Amaral Costa, Otavio Bandeira Cascais, Heber Chilon de Monção, Mário Xavier Teixeira, Raimundo Mendes Libório, Raynero de Carvalho Maroja, Canuto de Figueiredo Brandão, Raimundo Nonato Oriente de Vasconcellos, Tylson King de Mello, Maria da Graça da Silva Ferreira, Lindolfo Pedro Aires, Antonio Pereira da Silva Neto, Eduardo Braga Pereira Motta, Sebastião Faial Neto, Nilton Bastos Barroso, Antonio Maria Amoêdo, Lauro Corrêa Pinto e Henrique Sandres Filho. O orador da turma foi o doutorando Raynero Maroja. “Em seguida ocupou a tribuna o docente-livre Orlando Rodrigues da Costa, paraninfo à turma, que pronunciou bem elaborado e eloquente discurso”. No ano de 1950 não houve sessão solene de colação de grau. Houve duas formaturas, ambas na secretaria da Faculdade. A primeira ocorreu em 17 de fevereiro de 1950, às 16 horas, quando receberam do Diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhaes, o grau de médicos os doutorandos Wilson Deodoro Coqueiro de Oliveira e Ernesto Gondim Leitão. A seguinte aconteceu em 25 de dezembro de 1950, às 9 horas. Juramento proferido pelo doutorando Clodoaldo Fernando Ribeiro Beckmann. Demais formandos: Hélio Couto de Oliveira, Mario Augusto Pinto de Morais, Orlando de Saboya Barros, Nathercia Horta de Souza Moitta, Marina Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Roffé Ferreira de Lemos, Lydia Duarte Mesquita, Pedro Mata de Oliveira Roma Junior, Claudio Dias da Motta, Ancindino Paschoal de Leão, Almiro Pinheiro Monte, Carlos Asclepiades de Lima, Alceu Alfredo Brazão e Silva, Domingo Rio Fernandez, Dorvalino Frazão Braga, Issac Jayme Gabbay, Elizeu de Souza Rodrigues, Joaquim Rodrigues Pacheco, José Vasques VerVallen, Kenard Pacheco de Andrade e Pedro Megale. “Finda essa cerimônia, o sr. dr. Diretor congratulou-se com os novos médicos, augurando-lhes muitas felicidades nesta nova fase da vida”. Não há menção de orador e nem paraninfo. 291 Foto 61: Diploma da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará da década de 1940. Fonte: Acervo do Dr. Eduardo Augusto Dias Pereira Braga. NOTAS 1 “Prometto que no exercicio da medicina serei sempre fiél aos deveres da honra, da sciencia e da caridade. Penetrando no interior das familias, os meus olhos serão cégos e a minha lingua calará os segredos que me forem confiados; nunca me servirei da minha profissão para corromper os costumes nem para favorecer o crime”. (FMRJ, 1926, p. 42). De acordo com nota ao final da Fórmula: “quando a cerimonia fôr colletiva, bastará que as palavras de compromisso constantes desta formula proferidas por um dos novos medicos ou doutores em medicina, sejam secundadas por todos os outros apenas com a expressão: ‘Assim prometto’.” Colação de grau: cerimonial e formandos até 1950 292 O Regimento Interno editado em 1924 contém a fórmula em Latim: “Ego N. N. (nome) premitto me in exercenda medendi arti, fidelem semper exhibiturum honestatis, caritatis, scientiae praeceptis. Lares ingressus, oculi mei tanqam caecierunt, mutumque os ad commissa secreta rite servanda, quod pro munere honoris precipue habebo; nunquan etiam disciplina medica ad mores corrumpendos, fovendave crimina utar. Os outros alunos respondiam somente: Idem spondeo., p. 45. 2 “O distinctivo do gráo de Doutor em medicina e cirurgia é um anel de esmeralda, circumdado de pedras de brilhante com duas cobras no arco, proximas do engaste; a borla e o capello” (FMRJ, 1926, art. 223, p. 43). 3 Em Latim: Hippocratica opera legito ac meditator, tuoque nomini benedicent homines, si exempla quoque in vitae ratione referas. Accipe annulum hunc, symbolum gradus quem tibi conferimus. Esto, igitur, medicam artem tum exercere tum docere liceat. 4 Todos os dados referentes às cerimônias de colação de grau foram extraidos do livros de atas de colação, acervo da Faculdade. (N.A). 5 Pela riqueza e sutileza do estilo, vale a transcrição detalhada desta cerimônia de colação de grau, também assinada pelo secretário da Faculdade, o Dr. Olympio da Silveira. (N.A). 6 É possível que seu nome tenha sido transcrito errado já que em sua Tese ele aparece como Olga Maia Paes de Andrade. (ANDRADE). 7 Outro possível erro, pois em outros documentos seu nome aparece como “Djalma José Peixe Ferreira da Cruz” (N.A). (FMCP, 1936c. Mapa número 7). 8 Provavelmente trata-se de um salão nobre diferente do que conhecemos atualmente, visto que a versão ainda hoje existente seria inaugurada em 1º de março de 1932 durante a aula inaugural do curso médico daquele ano proferida pelo professor Orlando Lima. (Folha do Norte, 2 de março de 1932). (N.A). 9 Provavelmente outro erro das atas já que o correto é Ferro, ao invés de Ferreira (N.A). 10 Observa-se a referência ao “Prêmio Raul Leite”, concedido a partir daquele ano ao aluno que tivesse tido o melhor aproveitamento durante o curso. O prêmio era concedido nacionalmente, aos melhores alunos de medicina de cada Faculdade (N.A). 11 Observe-se, o registro de algumas modificações como missa com benção dos anéis e a execução do hino nacional. (N.A). 12 Segundo o Dr. Guaraciaba Gama, em depoimento aos autores, a cisão deuse por conta da divergência quanto ao nome do paraninfo. (GAMA, 2008). 13 Esta turma adotou o nome de “Turma Evandro Chagas” e assim ficaria conhecida posteriormente. É possível que tenha sido a primeira turma da Faculdade a adotar um nome próprio já que foi o único registro de turma com nome localizado naquele período. A Revista do Acadêmico de Medicina de Fevereiro de 1944 (ano 2, número 3) registra a escolha: “A novel turma de esculápios resolveu denominar-se “Dr. Evandro Chagas”, como homenagem sincera àquele que tão bem soube compreender e se dedicar aos problemas sanitários da Amazônia...” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 54). 18 Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 293 294 Logotipo do Diretório Acadêmico de Medicina do Pará em ofício de 1933. Quem quer que entre atualmente no Diretório Acadêmico de Medicina (DAM) da UFPA sairá de lá com a impressão que aquela instituição foi criada recentemente, tendo no máximo dez ou quinze anos de idade. Talvez a reforma universitária, que causou o desaparecimento da Faculdade de Medicina como instituição autônoma; a criação temporária do Diretório Acadêmico do Centro Bio-Médico, que durante um período forçou a fusão dos diretórios de todos os cursos de saúde; as várias arbitrariedades “educacionais” da revolução de 1964, ou simplesmente o descaso, tenham ajudado a obscurecer a história do DAM, ficando a impressão de que as gestões mais recentes vão inconscientemente enterrando a memória das mais antigas. O que restou de acervo documental dos primórdios do órgão de representação dos estudantes de medicina encontra-se apenas nos arquivos da Faculdade de Medicina, especificamente nos livros de documentos recebidos, de forma muito fragmentada, e nos jornais da época, não sendo possível reconstruir plenamente as ações de cada gestão. Em alguns casos, nem a relação completa dos componentes de algumas gestões foi localizada. Mesmo fontes antigas, que por estarem cronologicamente mais perto dos fatos deveriam conter informações mais precisas, não raro incorrem em erros grosseiros, como por exemplo, que o DAM teria sido fundado em 1934 (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 47), ou em 1933 por Edward Catete Pinheiro (Revista Amazônia, 1955), o qual posteriormente viria a ser senador, governador interino do estado e ministro da Saúde no governo Jânio Quadros. O que se pode afirmar concretamente é que o Diretório não nasceu imediatamente com a Faculdade. A menção mais antiga encontrada sobre sua criação data de 6 de maio de 1923, em nota no jornal Estado do Pará: CENTRO ACADEMICO DE MEDICINA Os acadêmicos da Faculdade de Medicina deste Estado têm em vista fundar o Centro Academico de Medicina, aggremiação que terá por fim defender e amparar os interesses da respectiva classe e ao mesmo tempo, por meio de conferencias e palestras scientificas, desenvolver o estudo entre nós. Para lançar as bases da nova instituição academica os estudantes de medicina reunir-se-ão, no próximo dia 8, ás 5 horas, no edificio da Faculdade de Medicina, e para esta reunião ficam convidados todos os alumnos desta casa de ensino superior. A reunião será presidida pelo dr. Camillo Salgado. Cinco dias depois o mesmo jornal publica uma segunda nota: CENTRO ACADEMICO DE MEDICINA Na séde da Faculdade reunem hoje, ás 5 horas da tarde, os academicos de medicina, afim de elegerem a directoria e a commisão que têm de elaborar os estatutos do Centro Academico, ultimamente inaugurado. Presidirá a sessão o lente cathedratico dr. Pinheiro Sozinho (Estado do Pará, 11.05.1923, p. 1). Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 295 Depois destas notas, aparentemente o movimento para criação de um órgão de classe estudantil entraria num período de hibernação. Entretanto, pequenas notas soltas nos jornais mostram que mesmo não tendo se efetivado a criação de um diretório ou centro acadêmico, algumas vezes os estudantes se reuniam - ou ao menos tentavam-, convocando os colegas para tratar de interesses da classe1, ainda que sem a existência de uma representação oficial, como nesta convocação: Por meio de nosso intermédio, os academicos de medicina Raymundo da Silva Magno, Lauro Miranda Solheiro, Petronio José de Lima, Edgardo Rôxo Pereira, e Edgard Antunes Salgado convidam todos os alumnos do 1º ao 6º anno, da nossa Faculdade de Medicina, para uma reunião hoje, ás 4 horas da tarde, na séde daquelle instituto superior de ensino, afim de tratarem de assumpto de grande e palpitante interesse para a classe (Estado do Pará, 28.07.1926, p. 1). Ao que tudo indica os estudantes não conseguiam de fato se organizar em uma agremiação, seja pelo elevado número de transferências daqueles que não acreditavam no curso, associado às desistências dos que não conseguiam arcar com as despesas de uma instituição privada, ou mesmo pela falta de lideranças estudantis. O fato é que um novo esboço de uma organização estudantil surgiria apenas em 1927, conforme memorando encaminhado ao diretor da Faculdade, Camilo Salgado, em 10 de maio: 296 Tenho a honra de levar ao conhecimento de V. Excia., que em sessão dos estudantes desta Faculdade realizada a 7 do corrente, sob a presidencia do representante de V. Excia., Dr. Hygino Amanajás Filho, ficou fundada nesta capital, uma sociedade dos estudantes de medicina para fins de beneficência, manutenção de uma revista e commemoração das datas nacionaes, sendo constituida a seguinte directoria provisoria: Presidente- Dr. Oséas Santos Antunes Vice-Presidente- Edgard Antunes Salgado Primeiro Secretario- Theodoro Aranha Segundo Secretario- José Fernandes Ramos Thezoureiro- José Estevam Guimarães Orador- Raymundo Avertano Barreto da Rocha Comisão de estatutos- Avertano Rocha, Lauro Solheiro, e Raymundo Paiva. Na próxima assembléa geral será discutido a denominação da sociedade. Esperando inteiro apoio de V. Excia. respeitosamente subscreve-se como protesto de alta consideração. José Fernandes Ramos (FMCP, 1927b). Não se descobriu qual o tempo de duração deste “pré-diretório”, se chegou a possuir um estatuto, se teve alguma influência na posterior fundação do DAM, ou ao menos passou desta gestão. Somente em 21 de abril de 1930 seria fundado um órgão representativo dos estudantes de medicina de uma forma mais sólida, organizada e inicialmente denoMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 minado “Centro Acadêmico de Medicina do Pará” (CAM), cuja primeira diretoria eleita e empossada foi: Presidente- Oscar Pereira de Miranda Vice-presidente- José Fernandes Ramos Primeiro Secretário- Menandro Rodrigues Tapajós Segundo Secretário- Miguel Martins Tesoureiro- Amyntor Virgolino Bastos Vice-tesoureiro- Albino Figueredo Orador- Eduardo Azevedo Ribeiro Vice-orador- Roberto Cândido Pereira Bibliotecário- Waldemar Santanna (Folha do Norte, 17 de maio de 1930, p. 2). O CAM tinha entre seus objetivos, a intensificação dos estudos médicos, a defesa dos interesses dos associados quando necessário ou assim determinasse o conselho deliberativo, a edição, quando possível, de um jornal ou revista para publicação dos melhores trabalhos científicos, com prêmios para estes “quando tal permitirem os cofres sociais”, auxilio aos acadêmicos em dificuldade para pagar o curso e na eminência de abandoná-lo. Pelos estatutos, haveria pelo menos três assembléias gerais anualmente: a primeira em 21 de abril para eleição da nova diretoria e dos representantes do conselho deliberativo; a segunda para posse solene dos eleitos; e a terceira no fim do ano social para prestação de contas do tesoureiro e leitura do relatório do presidente. Qualquer outra assembléia seria considerada sessão extraordinária. O Centro Acadêmico seria dirigido por representantes de diversas séries, dois de cada ano, os quais, juntamente com a diretoria iriam compor o conselho deliberativo. A diretoria seria composta por presidente, vice-presidente, primeiro secretário, segundo secretário, orador, vice-orador, tesoureiro, vice-tesoureiro, bibliotecário. Os cargos de presidente e vice seriam ocupados somente por alunos do quinto e sexto anos. O número de sócios seria ilimitado, divididos em cinco categorias: sócio fundador, (composto pelos que assinaram a ata de fundação); sócio contribuinte, (alunos que estivessem em dia com o pagamento); sócios correspondentes (ex-alunos da Faculdade, especialmente indicados); sócios honorários (todos os professores da Faculdade, ou de outras escolas médicas, que fossem aprovados pelo conselho deliberativo, bem como sócios fundadores ou sócios contribuintes já formados, mas que tivessem prestado grandes serviços ao centro); sócio benemérito (diretor, vicediretor, e primeiro secretário da Faculdade, e todos aqueles que prestassem ao centro auxílio de alta significação). Curiosamente, o Centro Acadêmico não era gratuito. Tanto os sócios fundadores como os contribuintes deveriam pagar uma jóia de dez mil réis, parcelada ou não, Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 297 e contribuição mensal de dois mil réis. O Centro poderia ainda cobrar multa de dez mil réis aos membros do conselho deliberativo que faltassem sem justificativa às reuniões. Outro fato interessante é que o Centro não poderia tomar parte em manifestações políticas de qualquer natureza e em caso de dissolução seus bens reverteriam à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP, 1930). O estatuto previa ainda uma seção esportiva, que poderia organizar o seu regimento interno desde que este não contrariasse o Centro, tendo receita e despesa próprias, sendo tal seção composta por diretor de esportes, secretário e tesoureiro. Uma das primeiras ações da diretoria do recém criado Centro Acadêmico foi reunir-se junto aos demais diretores dos outros centros acadêmicos de Belém com o intuito de criar uma “Federação Acadêmica”, a qual reuniria todos os alunos das escolas superiores do estado (FEDERAÇÃO Acadêmica, 1930, p. 2). 298 Com pouco mais de um ano o CAM enfrentaria sua primeira batalha, na qual os adversários seriam os próprios alunos em disputas internas, uma situação que se repetiria com frequência nos anos seguintes. Em nota enviada à Folha do Norte, em 9 de maio de 1931, sugestivamente intitulada “Centro Reaccionario dos Academicos de Medicina”, os estudantes Miguel Martins Filho, Nelson Corrêa de Oliveira, Palma Lima, Wladimir Sant’Anna, Cuvor Telles e Nery Guimarães, lamentavam profundamente que a diretoria da Faculdade reconhecesse a recém eleita gestão do CAM “que não acatamos, não apoiamos, e não reconhecemos em virtude de innumeras anormalidades de que a mesma é responsavel”. E seguiam citando como exemplo que: Os elementos que compõe a hypothetica directoria do C.A.M, não tem, em absoluto, direito algum de expedir convites á festa do dia 16 do corrente mez, em virtude de ser essa iniciativa da alçada da directoria que a precede, a qual só por deliberação conjuncta, poderá empossar com uma solennidade a nova directoria... Levantavam ainda a possibilidade dos membros daquela nova gestão, terem organizado um novo estatuto em sigilo, antes do prazo fixado para reformas estatutárias e sem a participação dos demais estudantes. E finalizavam: “E é a esse centro dirigido por uma pretensa directoria, arbitraria em decisões, falha em conhecimentos e maníaca por exhibicionismos a quem a directoria da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará reconhece e apóia. Infeliz e lamentavel decisão...” (ASSOCIAÇÕES, 1931). Em 1931, com a anexação da escola de farmácia à Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP), fez-se necessário um novo estatuto para o Centro Acadêmico. O memorando de 23 de abril de 1932, endereçado ao presidente e demais membros do conselho técnico e administrativo da FMCP informa: De ordem da diretoria do Centro Academico de Medicina do Pará, venho por meio deste oficio trazer a vossa presença os estatutos do referido Centro para sua aprovação e reconhecimento oficial. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. Outrossim aproveito o ensejo para comunicar que a supra dita sociedade já foi reconhecida publicamente pelos Exms. Snrs. Drs. Diretor, Vicediretor, e Fiscal da Faculdade em declaração feita a imprensa da capital do dia 8 de maio de 1931, conforme documento junto (FMCP, 1932a). O documento sobre o novo estatuto data de 29 de abril de 1932 constando que: Tendo submettido a V. V. Excias., para os fins do artigo 103, parágrafo primeiro do decreto número 19851, de 11 de abril de 1931, os estatutos do Centro acadêmico de Medicina o Pará, voltam a presença deste conselho os organizadores dos referidos estatutos trazendo-lhes a comunicação seguinte: Os sócios do dito centro, depois de minucioso estudo do decreto acima anunciado, verificaram que não se justifica o facto de não fazerem parte de sua associação os estudantes do curso de Pharmácia, quando uns e outros se acham sob regime da mesma faculdade, onde todos recebem o ensino de acordo com as disposições que lhes são referentes. Por isso em reunião em que collaboraram uns e outros em conjunto resolveram que o Centro os abrangesse todos, modificando-se sua denominação e sendo substituída pela de Centro Acadêmico de Medicina e Pharmácia do Pará (FMCP, 1932a). As modificações em relação ao antigo estatuto são pequenas: desaparecem os sócios correspondentes e os sócios contribuintes passam a ser conhecidos como sócios efetivos; a diretoria deixa de ter vice-orador e vice-tesoureiro; as eleições ocorreriam no dia 21 de março de cada ano. O novo estatuto previa ainda a criação da festa do “Calouro”, quando estes deveriam contribuir cada um com 10$000, e a festa do “Thermometro2”. A diretoria desta nova fase deveria ser eleita em mesa eleitoral presidida pelo Prof. João Prisco dos Santos e seria composta pelos seguintes membros: Presidente- sextanista Benedicto C. de Macedo Klautau Vice-Presidente- quintanista Humberto Franco Primeiro Secretário- quintanista Alderico de Oliveira Costa Segundo Secretário- terceiranista Lucival Lobato Tesoureiro- quartanista Fernando Fernado Mendes Mendes Vice-Tesoureiro- terceiranista Albino Figueiredo Orador- secundanista Hermínio Pessoa Vice-Orador- secundanista Paulo Fender Bibliotecário- Eduardo Motta3 Primeiro supplente- Mário Acatauassú Nunes Segundo supplente- Ruy Pondé Terceiro supplente- José Serra (Folha do Norte, 15.03.1932). Entretanto a assembléia estudantil para a eleição não chegaria ao fim “em virtude de um grupo de alumnos chefiados por socios eliminados do Centro Academico terem promovido discussões por quererem passar por cima das determinações do estatuto” (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 23.04.1932). Nova assembléia seria realizada desta vez presidida pelo Prof. Acatauassú Nunes Filho, visto que Prisco Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 299 dos Santos retirara-se em protesto alegando não ter iniciado os trabalhos “devido a anarquia reinante entre os estudantes divididos em partidos, a ponto de faltarem em plena secretaria com o respeito devido a um professor desta Faculdade então presente” (CTA, Ata de 5.05.1932). A outra sessão para a eleição ocorreria sem maiores incidentes, com a nova gestão empossada trazendo pequenas modificações em sua composição como Ruy Pondé como vice-tesoureiro, José Serra como vice-orador e Nilson Silva como bibliotecário, além do seguinte conselho deliberativo: Mário Salgado e Olavo Leôncio pelo sexto ano, Mário Ferreira e Scylla Andrade pelo quinto, Arnaldo Prado e José Macedo pelo quarto, Nizomar Azevedo e Milton Cordovil pelo terceiro, Cândido Ferreira e Ernani Lima pelo segundo, Amílcar Silva e Eduardo Motta pelo primeiro (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 23.04.1932). 300 As disputas eleitorais não se encerrariam ali como mostra Folha do Norte de 24 de abril de 1932, que noticiaria a devolução, pelo Conselho Técnico Administrativo da Faculdade, de uma petição dos sextanistas requerendo o reconhecimento da chapa apresentada pelos mesmos, por considerarem as eleições ilegais estando em desacordo com o artigo 193 do decreto 19.891 (Estatutos das Universidades). O mesmo artigo cita ainda que chapa eleita pela maioria tinha como presidente o acadêmico Armando Maroja e não Benedito Klautau conforme fora publicado, e avisava que a minoria dissidente, três membros de cada diretoria em questão, se reuniriam no dia seguinte na Santa Casa, às nove horas da manhã para um possível acordo (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 24.04.1932). No dia seguinte, os acadêmicos Benedicto Klautau, Raymundo do Valle Paiva e Scylla Lage da Silva compareceram à redação do jornal levando uma carta do Conselho Técnico Administrativo assinada pelo Dr. Camilo Salgado declarando “não ser verdade ter o referido Conselho, em sua sessão de 22 do corrente devolvido a petição dos sextanistas referente à eleição do Centro Acadêmico”. O documento de Camilo afirmava ainda que a petição dos sextanistas teria sido entregue à comissão para estudos e modificações de acordo com a nova lei do ensino. Ao jornal, os estudantes informaram não ser verdade a notícia de que as eleições haviam sido anuladas, “continuando de pé a chapa eleita pelo Centro Academico de Medicina”, no dia 21 de abril (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 26.04.1932). Mais lenha seria posta na fogueira no dia 27. A nota intitulada “A Alliança Academica não Propoz Accordo”, que secamente dizia: O accôrdo tratado na reunião que se realizou na Santa Casa não foi proposto pela Alliança e sim pela minoria dissidente. Não se comprehende, pois, que a maioria depois de formidavel victoria alcançada, procurasse a minoria para qualquer conciliação. Teve um caracter todo pessoal a visita do academico Armando Maroja Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 ao doutorando Benedicto Cavalleiro Klautau e não consoante se notificou no “O Estado”, de hontem, ter ido aquelle academico propôr um accôrdo em nome da Alliança4. Mas tudo indica que a polêmica acabaria em festa, pois: “Os acadêmicos de medicina realizam hoje uma festa dançante, na Assembléia Paraense, o acto de posse da nova directoria do Centro Academico de Medicina, e que terá início ás 9 horas da noite” (Folha do Norte Vida Acadêmica, 30 de abril de 1932). A chapa vitoriosa apresentada pela Alliança Acadêmica ficaria assim constituída: Presidente- Armando Maroja Vice-Presidente- Humberto Cabral Primeiro secretário- Nelson Corrêa Segundo secretário- Padna Filho Orador- Miguel Martins Vice-Orador- Paulo Fender Tesoureiro- Augusto Moreira Vice-Tesoureiro- Augusto Rocha Bibliotecário- Rubem Paiva (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 30 de abril de 1932). Em 14 de outubro de 1933, já como Diretório Acadêmico de Medicina do Pará e obedecendo a um novo estatuto não localizado, o diretório encontrava-se assim constituído: Presidente- Doutorando Humberto Cabral Vice-Presidente- Edward Cattete Pinheiro Primeiro secretário- Clidenor de Freitas Santos Segundo secretário- Celso de Mattos Leão Primeiro Tesoureiro- Pedro Valinoto Segundo Tesoureiro- Paulo Bentes Bibliotecário- Emanuel Mendes Orador- Odemar Barata Consultor- Lauro Lima (FMCP, 1933b) Esta gestão, apresentava-se com uma organização mais complexa que as anteriores, sendo subdividida em diversas comissões, visando “desenvolver as suas actividades em todos os sentidos” (FMCP, 1933b), sendo estas: Comissão Científica Doutorando Inálio Castro (Diretor) Doutorando Armando Maroja Aluízio Fonseca Emídio Pedreira Leônidas Deane Gladstone Deane (Secretário Geral) Hermínio Pessoa Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 301 Clidenor Santos Luizileno Brazil Amílcar Silva Comissão Social Hermínio Pessoa (Diretor) Rubens Paiva Armando Pingarilho José de Pádua Filho Vicente Miranda Agostinho Monteiro Paulo Murtinho Cláudio Dias Comissão de Beneficência e Previdência Cattete Pinheiro (Diretor) Abílio Maranhão Gonçalvez Maria do Carmo Sarmento Ruy da Silva Romariz Cândido Pereira 302 Comissão de Esportes Nery Costa (Diretor) Roberval da Matta Álvaro Norat Olívio Rodrigues Mâncio Lima Carlos Vasconcellos Clodomir Maroja Comissão de Imprensa Rubens Britto (Diretor Geral) Ferro Costa (Redator Chefe) Corpo de Redatores Emmanuel Castro Wladimir Paraense Nilson Silva Britto Pontes Celso Leão Diniz Botelho José Lemos Lauro Lima Sandoval Cardoso Francisco Luna Um dos grandes feitos desta gestão foi o lançamento em 31 de outubro de 1933 do jornal “O Acadêmico de Medicina”, o primeiro periódico dos estudantes da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, que tinha como diretor Rubens da Silveira Brito e redator chefe Ferro Costa, ambos cursando o terceiro ano (DIAS, 1996, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 p. 62)5. O jornal aceitava colaboração de toda classe acadêmica local, desde que se tratasse de assuntos científicos. Os artigos deveriam ser dirigidos à comissão de imprensa, na sala do DAM, na Faculdade de Medicina. (Folha do Norte, Vida Acadêmica,16.10.1933). Fato interessante da época é que o Diretório tinha o hábito de divulgar em notas publicadas nos jornais de maior circulação qualquer assunto interno da Faculdade, talvez como forma de respaldar seus argumentos e decisões, além de divulgar os fatos de forma rápida entre a comunidade acadêmica. A nota publicada na seção “Vida Academica” intitulada “Promoção por Medidas” é um exemplo clássico: Attendendo a pedidos de varios colegas interessados no assumpto, o academico Cattete Pinheiro, do Directorio Academico de Medicina, passou ao dr. Arnobio Franco, lente da cadeira de Technica operatoria em nossa Faculdade, o seguinte telegramma: “Dr. Arnobio Franco. – Rio. – Favor informar Departamento accôrdo decreto baixado se alumno tem média 6 duas provas parciaes já feitas é obrigado prestar terceira prova”. O dr. Arnobio Franco respondeu nos seguintes termos: “Cattete Pinheiro. – Belem – Media seis duas provas parciaes fica dispensado além exame final terceira prova parcial.” Hontem esteve o academico Cattete Pinheiro em nossa redacção para mostrar-nos esse telegramma, pedindo-nos tornassemos publica a informação nele contida, por ser assumpto de real interesse para os estudantes. Ficam assim os academicos que já fizeram as provas parciaes de maio e agosto, dispensados das que tinham que prestar este mez, caso tenham a media 6” (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 24.11.1933). Durante esta gestão, mas sem apoio do Diretório, Folha do Norte noticia sobre uma festa para recepcionar os calouros, denominada “Festa da Esperança”, encabeçada pelos alunos do quinto e sexto ano e com representantes das demais séries divididos em comissões para organizar o evento, confeccionar os convites, recepcionar as famílias convidadas e cobrar mediante recibo a “Taxa dos Calouros”(Folha do Norte, Vida Acadêmica, 17.02.1934). No dia seguinte o mesmo jornal publica nota oficial do DAM reconhecida pelo diretor da Faculdade Camilo Salgado, informando que: ficam a cargo da comissão social, annexa ao mesmo, as iniciativas de recepção e quaesquer outras manifestações que refiram aos calouros, a qual providenciará para que seja dado aos novos collegas um tratamento a altura do nível social que desfructamos. E quanto a taxa do calouro, o Directorio não deu autorização a quem quer que seja para fazer essa cobrança sendo, portanto inidoneas as commissões que porventura se apresentem com este objetivo (Folha do Norte. Vida Acadêmica, 18.02.1934). O Diretório buscaria assim assumir o controle do evento, e em 5 de março de 1934, já com a formação de uma comissão diferente desta vez ligada inteiramente Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 303 ao DAM lançaria a “Festa da Esmeralda”, nome como ficaria conhecida a festa de recepção aos calouros e que durante décadas marcaria o calendário social de Belém. A nota dizia ainda que apenas dois acadêmicos estavam autorizados a receber a “Taxa do Calouro” (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 05.03.1934). Em 11 de abril 1934 tendo como presidente Edward Cattete Pinheiro, o DAM teria uma das gestões mais atribuladas de sua história, começando a entrar em choque com o secretário da Faculdade, Dr. Olympio da Silveira, pelo que este solicitaria a criação de uma comissão indicada pelo Conselho Técnico Administrativo para verificar as contas apresentadas pelo Diretório no período de outubro a dezembro do ano de 1933. A resposta do DAM dirigida ao secretário foi imediata: 304 O Diretorio Academico, hontem reunido, em sessão extraordinária, para tomar conhecimento do officio em questão não poude comprehender quais os esclarecimentos exigidos pela referida Comissão, por quanto já apresentou todos os documentos necessários e comprobativos da ordem e absoluta integridade na applicação de suas rendas. Entretanto para maior salvaguarda da nossa honestidade, que temos em consciência ser inatacável, procuramos o Senhor J. Castro, abalisado contabilista de nossa praça e de conceito firmado em todo o paiz, para que fizesse meticulosa vistoria em nossa escripta e emittisse parecer a respeito. Hontem mesmo recebemos esta opinião valiosa, que agora tomamos a liberdade de remetter, por intermédio dessa Secretaria, à Comissão julgadora, de modo que fique perfeitamente demonstrada a maneira criteriosa com que é escripturada, o nosso movimento financeiro, reflexo, aliás das attitudes claras e definidas peculiares ao DIRECTORIO ACADEMICO no trabalho incansável pelo alevantamento do nome desta casa ao nível que ella realmente merece. Enviamos os dois números do “O ACADEMICO DE MEDICINA” pedidos. Esperando que esta Secretaria, nos indique de modo preciso, quaes as informações desejadas pela comissão do Conselho Technico Administrativo, subscrevo-me.6 Clidenor de Freitas - Secretário Em 18 de abril de 1934 o diretório cutucaria um vespeiro, em correspondência ao Conselho Técnico Administrativo: ...vem mui respeitosamente levar ao conhecimento da esclarecida visão dos membros deste conselho certos rumores sobre irregularidades que se estariam verificando com relação aos serviços da Secretaria e Thesouraria da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, suspeitas essas que muito abalam e maiores prejuízos poderão causar ao bom nome deste estabelecimento que temos a obrigação moral e indeclinável de zelar como nos permittam as forças, quer como estudantes orgulhosos de seu educandário e compenetrados de seus deveres, quer como paraenses amigos de sua terra, que sabem velar pelo conceito que desfructa o nosso estado, no concerto das demais unidades da Federação. E porque continuem a ter curso estes rumores, com denúncias gravíssimas chegadas ao DIRECTORIO ACADEMICO DE MEDICINA, acer- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 ca de sérias anormalidades existentes nos referidos serviços, todas com caracter de impressionante veracidade, solicitamos deste Conselho a instauração de um inquérito rigoroso a respeito, que apure convenientemente o fundamento de taes denúncias, de modo a ficar, de uma vez por todas e de maneira cathegorica, devidamente averiguadas as responsabilidades por ventura verificadas no caso, sendo, para este fim, necessária a suspensão prévia de todos os funcionários encarregados dos trabalhos alludidos, sem o que não poderá haver a indispensável liberdade de acção, por parte da commisão que tiver de proceder as investigações agora requeridas.7 Cattete Pinheiro - Presidente A situação do DAM tornar-se-ia mais difícil, e quase simultaneamente Cattete Pinheiro teria que defendê-lo de outro ataque, endereçando a seguinte solicitação ao Conselho Técnico Administrativo da Faculdade: Tendo, o DIRECTORIO ACADEMICO, sido miseravelmente infamado, atravez de cartas anonymas, dirigidas ao professor Orlando Lima, em nome desta associação, e empenhado que se esclareçam as responsabilidades, vem este DIRECTORIO, requerer desse Conselho um exame pericial nas machinas da Secretaria desta faculdade, já que todas as suposições convergem para ella. Igualmente, como tem surgido suspeitas sobre este DIRECTORIO, que desde já declaramos alheio às taes cartas, collocamos à disposição do perito a machina de que nos servimos. Esperando assim que possam ser esclarecidas quaisquer responsabilidades (FMCP, 1934a). Em meio a denúncias, ataques e contra ataques, o Diretório encontraria tempo para em 30 de abril de 1934 inaugurar sua biblioteca (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 29.04.1934). Criada com recursos angariados entre os professores e alunos e em um “Festival Artistico-Academico” organizado pelo DAM e realizado em 9 de abril no “Palácio Teatro”(Folha do Norte, Vida Acadêmica, 05.04.1934), que contou com a presença da pianista paraense Anna Carolina, das “senhorinhas” Helena Coelho e Astréa Buarque e de um conjunto “constituído de elementos de nossa alta sociedade” (Folha do Norte, 05.04.1934). A biblioteca, que passaria a funcionar em uma sala cedida pela direção da Faculdade, tinha como objetivo servir aos estudantes, especialmente dos primeiros anos, que não tinham condições de adquirir livros indispensáveis para o curso, e nem de pagar as taxas de uso da biblioteca da Faculdade (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 29.04.1934). Outra grande conquista deste período foi o acordo com a empresa Teixeira Martins, que garantia aos acadêmicos 50% de desconto nas entradas do Cinema Iracema, às quartas e sábados, a partir do mês de maio (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 08.04.1934). Em 5 de maio de 1934, em seção solene presidida pelo diretor da Faculdade, Dr. Camilo Salgado, tomou posse a nova gestão do DAM, assim composta: Vice-Presidente - Cattete Pinheiro Primeiro Secretário - Clidenor dos Santos Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 305 Terceiro Secretário - Octavio Velloso Primeiro Tesoureiro - Lauro Lima Segundo Tesoureiro - Benedicto Abreu Primeiro Orador - Nilson Silva Segundo Orador - Luizileno Brasil Bibliotecário - Wagner Eleuthério (FMCP, 1934) Consultores - José de Sousa Macedo Lucival Lobato Aniceto Carneiro (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 28.04.1934) Talvez prevendo que a corda costuma arrebentar do lado mais fraco, o presidente Emygdio Pedreira e o segundo secretário Milton Cordovil, deixaram de comparecer sem motivo justificado, portanto não tomaram posse (Folha do Norte, 28.04.1934; FMCP, 1934). Esta nova gestão criaria em 21 de julho um curso noturno de Alemão para os estudantes, a ser ministrado nas dependências do DAM, e solicitaria permissão para que o porteiro da Faculdade viesse abri-la à noite, “mediante remuneração justa, já combinada”, o que além de servir para as aulas do Curso, iria ”permittir que a Bibliotheca do Directório, se conserve aberta pelo tempo das mesmas, o que muito dará lucro aos collegas” (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 28.04.1934; FMCP, 1934). 306 A aparente calmaria seria quebrada através de uma série de declarações feitas pelo DAM à imprensa local, em 3 de setembro de 1934, denunciando supostas irregularidades administrativas na Faculdade (Folha do Norte, 28.04.1934; FMCP, 1934). Após longo julgamento do caso, o Conselho Técnico Administrativo decidiu suspender Cattete Pinheiro e Clidenor de Freitas por dois anos, nada demovendo de tal decisão, nem os apelos do Capelão da Santa Casa (FMCP, 1934), considerando entre outras coisas: que a inveracidade e a temeridade das alegações formuladas não diminuem o desrespeito e a injuria constantes desse ato imprudente; considerando que a aludida representação constitue já união deplorável reincidência ampliada da injuria contida no oficio do referido Diretorio, de 18 de abril e do qual juntaram cópia à representação argüida; considerando, finalmente, a dolorosa necessidade de punir essas transgressões do Regimento para evitar reprodução da falta (CTA, 1934). Alegando irregularidades no processo e amparados pelo Diretor Geral de Ensino e pelo Inspetor Federal junto a Faculdade, os dois estudantes conseguiram ganhar tempo e solicitaram transferência para a Faculdade de Medicina do Recife (CTA. Ata de 27.02.1935). Neste meio tempo Cattete Pinheiro seria ainda chamado para depor no Conselho Técnico Administrativo, onde se defenderia dizendo: 1º - que no caso citado, agi como mandatário do DA e não em caráter pessoal; Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 2º - que nenhum interesse tenho mais no presente caso, porque não pertenço mais ao DA, e nele agi unicamente em virtude das funções que exercia, e alem disso, estou perfeitamente convencido, hoje, de ter sido iludido em minha boa fé, ter sido enganado quanto aos fatos citados, os quais estou perfeitamente capacitado serem inverídicos, produto de informações falsas que eram levadas então ao DA por pessoas que então julgávamos de fé, e que hoje reconhecemos terem sido uns exploradores de nossa vontade de acertar, se aproveitando da nossa inexperiência sobretudo; 3º - que estas declarações faço em meu nome e do meu colega Clidenor de Freitas Santos. É o que em resumo, além do mais que perante o douto CTA declarei; tenho a dizer em verdade quanto ao caso em que sou chamado a prestar esclarecimentos (CTA. Ata de 16.03.1935). Após o depoimento, na mesma sessão o Conselho decidiu dar por terminada a pena de suspensão imposta aos estudantes. Mesmo assim, provavelmente temendo outras represálias, Cattete Pinheiro e Clidenor de Freitas concluiriam seu curso médico no Recife. Segundo Clóvis Meira caso não tivessem conseguido a transferência, acabariam cedo ou tarde sendo definitivamente expulsos (MEIRA, 1990, p. 43). Em 1935, com o objetivo de evitar constantes atritos e alegando que o DAM queria e pretendia se intrometer até na administração da Faculdade, o Conselho Técnico Admistrativo decidiu fechar aquele órgão. Era presidente em exercício Luizileno Brasil (CTA. Ata de 13.04.1935; CTA. Ata de 17.06.1935). Em 7 de abril de 1937 um grupo de estudantes solicita a reabertura do DAM, alegando que a ausência de vida social e administrativa daquele órgão trazia graves prejuízos à coletividade acadêmica (FMCP, 1937b). O apelo surtiria efeito, com a ressalva da Direção da Faculdade de “suspender este órgão academico tão logo se manifestem atos de indisciplina” (CTA. Ata de 07.04.1937). Em 30 de abril em mesa eleitoral presidida pelo Dr. José Alves Dias Junior8, o diretório ressurgia com a seguinte composição: Presidente - Miguel Lupi Martins Vice-Presidente - José Rebello de Albuquerque Primeiro secretário - Álvaro José Pinho Simões Segundo secretário - Herbert Spencer Ferreira Primeiro tesoureiro - Geraldo Corrêa Sobrinho Segundo tesoureiro - Colombo Carioca Orador - Epílogo Campos Bibliotecário - Carlos Leite Consultores - Manuel Marinho Monte José Silveira Netto Telmo Sarmento Oriovaldo de Souza Coutinho. A nova gestão provavelmente buscava uma maior sintonia com a administração da faculdade, contando entre seus consultores com um filho do Secretário Dr. OlymApontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 307 pio da Silveira, o então acadêmico José da Silveira Netto, e assumindo “propósitos de cooperação, lealdade, e respeito aos illustres mestres, bem como o desejo que nos anima de sermos úteis aos nossos collegas e de elevar cada vez mais as honrosas tradições de nossa Faculdade” (FMCP, 1937b). Esta aparente ausência de atritos com a direção da Faculdade fica mais evidente quando observamos a liberdade que esta gestão teve para fazer pedidos como a concessão de uma sala contígua a sala da Congregação para instalação do DAM; instalação de um filtro “Senum” - espécie de bebedouro da época - destinado aos estudantes em uma das salas do diretório; autorização para transformar o campo da Faculdade em um pequeno estádio para disputa de vôlei e basquete entre os acadêmicos; empréstimo em caráter provisório de uma pequena estante, e alguns livros da biblioteca da Faculdade, para a (re)inauguração da biblioteca científica do diretório, que ocorreria em 5 de agosto de 1937 (FMCP, 1937b). Mesmo tendo conseguido um diálogo mais pacífico com a Direção, o DAM renasceu em precária situação financeira por ter se reorganizado justamente após o período de matrícula, época na qual, conforme o estatuto vigente cabia, a tesouraria da escola cobrar de cada aluno uma taxa anual de 5$000 destinada àquele órgão estudantil. E por mais que solicitasse a cobrança retroativa, não conseguiu ter a necessária autorização do Conselho Técnico Administrativo (FMCP, 1937b). 308 Assim, quando a “Liga Athletica Paraense” organizou um campeonato acadêmico, as taxas de inscrição da Faculdade e a matrícula dos jogadores, num valor total de 120$000, foram pagas pelos próprios alunos, interessados em “representar officialmente esta faculdade, cujo nome esportivo defenderemos com o mesmo ardor que defendemos o seu nome scientífico” (FMCP, 1937b). Não foi possível confirmar se a direção da Faculdade autorizou um auxílio financeiro para compra de 12 camisas para futebol, 12 camisas para vôlei e basquete, 12 pares de meias, 12 pares de chuteiras e uma dúzia de calções, em um custo total avaliado em 500$000, conforme fora solicitado pelo Diretório Acadêmico de Medicina. Na verdade a resposta do Conselho Técnico Administrativo para o caso foi bem vaga, limitando-se a um “aguarde oportunidade” (CTA, Ata de 07.08.1937). Deste modo, meio trôpega foi como a Faculdade participou daquela que talvez tenha sido sua primeira grande competição desportiva. O ano de 1938 seria muito marcante para toda a Faculdade: a morte de Camilo Salgado, que vinha sendo diretor havia dezesseis anos, deixava uma lacuna que dificilmente seria preenchida. O DAM em nota oficial definiria Camilo como alguém que era mais que um diretor; um grande amigo dos acadêmicos, e convocava todos os alunos para comparecerem ao seu enterro (Folha do Norte, 3 de março de 1938, p. 1). De fato ocorreu uma participação maciça dos estudantes no que foi talvez a maior homenagem que um diretor da Faculdade já recebeu, ainda que póstuma. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 O novo diretor eleito, Lauro de Magalhães, contaria com a “irrestricta solidariedade” do Diretório cujo presidente naquele momento era Álvaro José Pinho Simões. Sem dúvida a nova diretoria conquistou a simpatia dos estudantes ao dar caráter oficial à “Festa da Esmeralda” (FMCP, 1938b). Em meio a esta aparente calmaria, noticia-se em abril de 1938, aquela que talvez tenha sido a primeira greve dos doutorandos de medicina, solicitando o afastamento de um auxiliar de ensino (Folha do Norte, 5 de abril de 1938, p. 1). Em 5 de agosto de 1938 ocorrem novas eleições, sendo a seguinte a nova constituição do Diretório: Presidente - Álvaro José Pinho Simões Vice-Presidente - Clóvis Olinto de Bastos Meira Primeiro Secretário - Guaraciaba Quaresma da Gama Segundo Secretário - Emir José Koury Primeiro Tesoureiro - José Rovere Teixeira Segundo Tesoureiro - Colombo Carioca Orador - Ritacinio Ramos Pereira Bibliotecário - José Luiz de Sousa Ferreira Consultores - José da Silveira Neto Orivaldo Coutinho Milton Beltrão Cavalcante Comissão de Beneficência e Previdência Diretor - Carlos Alberto Monteiro Leite Membros - Orlandino Fonseca Aben-Athar Filho Antônio Sebastião dos Reis Comissão Científica Diretor - Arcelino Bitar Secretário Geral - Domingos Barbosa da Silva Membros - Cristovam de Jesus Pinto Martins Jefferson Leão Comissão Social Diretor - Manoel Baliú Monteiro Membros - Abelardo Santos Luis Tito de Castro Leão Comissão de Imprensa Diretor - Ritacínio Ramos Pereira Membros - José Clarindo Martins Anaxágoras Barreiros Wagner Eleutério Comissão de Esportes Diretor - Milton Beltão Cavalcante Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 309 Membros - César Medrado Paulo Lemos da Silva (FMCP, 1938b) Ao que tudo indica o ano de 1939 não foi dos melhores para o DAM, sendo grande a escassez documental relativa ao período, não sendo possível recuperar a gestão daquele ano. Sabe-se que o Professor Dias Junior chegou a ser convocado para presidir as eleições gerais do Diretório marcadas para 22 de abril. Um curto edital datado de 13 de outubro de 1939, assinado pelo secretário da Faculdade parece ter selado o destino do DAM naquele ano. 310 EDITAL DE ORDEM DO SNR. DR. DIRECTOR FAÇO SCIENTE AOS INTERESSADOS QUE EM VIRTUDE DE RESOLUÇÃO UNANIME DO CONSELHO TECHINICO ADMINISTRATIVO DESTA FACULDADE, BASEADA NO PARAGRAFO 4º DO ARTIGO 2º DOS ESTATUTOS DO DIRECTORIO ACADEMICO, DEIXOU DE EXISTIR ESTA AGREMIAÇÃO. OUTROSIM, FICAM INTIMADOS OS MEMBROS DO EXTINCTO DIRECTORIO A PRESTAR CONTAS À DIRECTORIA DESTA FACULDADE E ENTREGAR O ARCHIVO EXISTENTE. DR. OLYMPIO DA SILVEIRA (FMCP, 1939a) O parecer de uma reunião do Conselho Técnico Administrativo de 21 de setembro de 1939 coloca um pouco mais de luz na questão: Pensamos que a comissão designada pelo CTA para tomar conhecimento da divergência existente entre membros do DAM, se julga dispensada de opinar, baseada numa razão simples e única: a não existência do referido Diretório. O parágrafo 4º do artigo 2º dos Estatutos do Diretorio determina que os seus membros, após eleição regular, devem tomar posse dos cargos em data fixada (1º de maio) posse solene que é presidida pelo Diretor da Faculdade. Não se tendo realizado esse ato fundamental, isto é, a posse, conforme nos informou a secretaria e se conclui da leitura das representações, perante o CTA e a Diretoria desta Faculdade, não existe Diretório Academico. Diante do exposto, julgamos que a agremiação rotulada Diretorio Academico deve ser chamada a prestar contas à Diretoria da Faculdade, entregando o arquivo existente na sede do Diretório (CTA. Ata de 13.10.1939). Ao que parece desta vez o fechamento do DAM foi causado pelas divergências entre os próprios estudantes, segundo Dias Junior: ...dizem os reclamantes que durante as eleições, houve pressão da parte do antigo Diretório, que organizou chapa oficial com carinho próprio para dar mais força e prestígio a seus candidatos. Dizem mais, que tal chapa oficial influiu de modo positivo no espírito de alguns votantes, soMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 bretudo dos estudantes do primeiro ano, que ainda não tinham firmado juízo sobre a atitude que deviam assumir (CTA. Ata de 13.10.1939). Como não podia ser diferente nestas situações a sessão acabou em anarquia “incompatível com os processos de gentileza e lealdade, que devem reunir os componentes da briosa classe acadêmica paraense” (CTA. Ata de 13.10.1939). O DAM ressurgiria em 20 de abril de 1940 em sessão presidida pelo Dr. José Alves Dias Junior, especialmente designado pelo Conselho Técnico Administrativo. Foram eleitos os seguintes membros: Presidente - doutorando Clóvis Olinto de Bastos Meira Vice-presidente - quintanista Emir José Koury Primeiro secretário - doutorando José Luis de Souza Ferreira Segundo secretário - primeiranista Luiz Gonzaga Pires Primeiro tesoureiro - terceiranista José Maria Bastos Segundo tesoureiro - primeiranista Edgar Bezerra Valente Orador - terceiranista Aníbal Maranhão Bibliotecário - segundanista Abner Cavalcante Consultores - quintanista Humberto Lima Santos - quartanista Colombo Carioca - quartanista Orivaldo Coutinho - segundanista Alcindo Neves (FMCP, 1940a), No diretório capitaneado por Clóvis Meira há registro de grandes realizações, como a concessão pela Companhia Paraense de Eletricidade (que também controlava o serviço de bondes) de um abatimento de 50% em seus passes para estudantes de medicina. Na mesma época o DAM (re)conquistaria, ainda, a meia-entrada nos cinemas para os acadêmicos. Nesta gestão encontra-se a também menção a tradicional “Festa da Esmeralda”, realizada nos salões da Assembléia Paraense, bem como festejos juninos no Hospício Juliano Moreira “fazendo-se distribuir óbulos aos pacientes” (FMCP, 1940a), além de promover a campanha “Esporte pela Raça”, incentivando a prática de desportos no meio estudantil. Durante visita do presidente Getúlio Vargas a Belém houve uma audiência universitária com o chefe da nação, quando o DAM fez-se representar solicitando maior auxílio financeiro a Faculdade. E a convite da União Nacional dos Estudantes (UNE), o diretório mandou dois representantes (Clóvis Meira e Gonçalves Bastos) para o Congresso Nacional dos Estudantes realizado no Rio de Janeiro. Clóvis Meira recorda de sua gestão o encontro com o então prefeito de Belém Abelardo Condurú, dando conta dos esforços do DAM em benefício dos acadêmicos que não conseguiam arcar com as despesas da Faculdade: Eu, presidente do Diretório Acadêmico de Medicina, o procurara para pedir uma certa importância, auxílio necessário ao pagamento das menApontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 311 salidades de colegas que não estavam em condições de satisfaze-lo e que iriam perder os exames finais. Depois de examinar cuidadosamente os nomes que lhe apresentei, levantou os olhos azuis e disse-me: “Não vou lhe dar esta importância”. Fez uma pausa de expectativa, como quem pensa e avalia, e continuou: “o senhor vai levar mais um pouco. Poderá haver algum retardatário”. Verdadeira premonição. O retardatário aguardava a minha chegada na porta da Faculdade (MEIRA, 1986b, p. 90). O incidente mostra também que naqueles dias era possível contar com o poder público. A gestão que assumiria em 30 de abril de 1941 ficaria assim organizada: 312 Presidente - Emir José Koury Vice-presidente - Walter Gillet 1º Secretário - Abraham Levy 2º Secretário - Luiz Pires 1º Tesoureiro - Gil Maneschy 2º Tesoureiro - Alberto Cavalcanti Orador - Ritacínio Pereira Conselheiro - Pedro Pedroso Milton Ericeira Comissão Científica - Presidente Emir José Koury Membros - Aníbal Maranhão Maurício Coelho de Souza Comissão de Esportes -Presidente Gil Maneschy Membros - Alcindo Costa José Bastos Eloy Bonna Comissão de Beneficiência e Previdência - Presidente Ritacínio Ramos Pereira Membros - Ramiro Koury Francisco Rosado (FMCP, 1941a) Em 24 de abril de 1942, eleita nova gestão, volta-se a encontrar referências a diversas comissões, ficando o diretório assim constituído: Presidente - quintanista Abraham Eliezer Levy Vice-presidente - quartanista Raimundo da Costa Chaves Orador - quintanista Ritacínio Pereira Primeiro secretário - quartanista Maurício Queima Coelho de Souza Segundo secretário - primeiranista Jean Chicre Bitar Primeiro tesoureiro - terceiranista Francisco Rosado Segundo tesoureiro - primeiranista Carlos Augusto da Silva Costa Bibliotecário - terceiranista Amílcar da Silva Pereira Consultores - segundanista Pedro Amazonas Pedroso - segundanista Eloy Bona Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Comissão de Beneficiência Presidente - Jean Bitar Membros - Pedro Gomes de Oliveira Lopes Maria Medeiros Barboza José Eduardo Guimarães Rubens Guilhon Coutinho Aristolina dos Santos Neves Comissão Científica Presidente - Maurício Queima Coelho de Souza Membros - Paulo Cordeiro de Azevedo Edgar Bezerra Valente Sidonio Lucas Figueredo José Santos Junior Hélio Chaves de Oliveira Luiz Mansur Maklouf Comissão Social Presidente - Abraham Levy Membros - Raymundo da Costa Chaves Aníbal da Silva Marques Sarah Roffé de Lemos Jacyara Vasconcelos Alda Melo 313 Comissão de Imprensa Presidente - Ritacínio Pereira Membros - Ramiro Koury Luiz Gonzaga Pires Antônio Bittencourt Joaquim Bezerra Neto Pedro Amazonas Pedroso Pedro Braga Filho Cícero Pimenta Comissão de Esportes Presidente - Alcindo Nova da Costa Membros - Carlos Augusto da Silva Costa Amílcar da Silva Pereira Rui Teles de Borborema José Edmundo Coutrin Messias Guimarães Eloy Bona Paulo Motta de Castro Iran Loureiro (FMCP, 1942a) O período em que Abraham Levy permaneceu como presidente do DAM foi dos mais produtivos deste órgão recebendo grande reconhecimento de seus contempo- Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 râneos. Sobre Abraham Levy consta que em 1941 era secretário do DAM “quando foi forçado por circunstâncias especiais, a assumir a direção deste órgão de representação”. Daí, “começou, então, o trabalho de construção que somente veio interromper o fim de seu curso” [...] Quem assistiu às reuniões do Diretório não se lembra de tê-lo ouvido falar senão de modo coletivo. “Esta semana fizemos isto, promovemos isso”. Nada de “eu” e de “fiz”, [...] e aqueles que compuzeram os Diretórios de 1941, 1942, 1943, sob sua presidência, guardaram destes dias a lembrança de uma colaboração sadia e forte entre seus membros, sem o amargo da imposição pessoal, nem o deprimento das facções” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 47). Durante o triênio em que o DAM foi encabeçado por Levy, começou a existir uma maior aproximação entre as Escolas Superiores de Belém, “separadas outrora, por certa hostilidade que não se compreendia”. E o diretório esteve presente em diversas ações como na Campanha da Borracha, Campanha do Livro, colaborando ainda com diversas instituições como a Legião Brasileira de Assistência e a Cruz Vermelha. 314 Abraham Levy foi também um dos fundadores e primeiro presidente da União Acadêmica Paraense (U.A.P), órgão que congregava os estudantes paraenses (MENDES, 1998, p. 41), sendo ainda por três vezes representante do DAM no 4º, 5º e 6º Congressos Nacionais dos Estudantes realizados no Rio de Janeiro, então Capital Federal, em 1941, 1942 e 1943 (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 48). No campo internacional Abraham Levy representou o diretório em 1942 na Conferência de Iquitos, no Peru, realizada para a aproximação dos estudantes da Amazônia, por ocasião dos festejos do 4º centenário do descobrimento do Rio Amazonas (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 48). Em fevereiro de 1943 sua gestão transformaria o jornal “O Acadêmico de Medicina”, na “Revista do Acadêmico de Medicina”, que tinha caráter científico – publicando trabalhos de alunos e professores – e noticioso, pois divulgava assuntos gerais sobre a Faculdade, como festas, eventos e artigos variados. Era patrocinada por médicos e laboratórios, que nela anunciavam seus serviços e produtos. De periodicidade irregular, foram publicados quinze números até 1957, por puro esforço e obstinação dos membros do DAM. Em muitos números da revista lê-se no cabeçalho “Fundada em 1933, por Rubens da Silveira Brito”, como uma forma de homenagem pelo seu pioneirismo em editar um órgão de divulgação das atividades da classe acadêmica (DIAS, 1996)11. Em 13 de outubro de 1943, comemorando dez anos de sua existência legal (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 52)12, o diretório (re)inaugura sua biblioteca, desta vez com o nome de “Biblioteca Dr. Camilo Salgado”. Graças à doação de uma coleção de compêndios especializados, no valor de cinco mil cruzeiros, oferecida Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 pelo então Interventor Federal no Estado, coronel Joaquim de Magalhães Cardoso Barata, a biblioteca contava então com mais de trezentos volumes, não incluindo revistas ou outros impressos (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 53)13. Ainda em 1943, o DAM organizou o primeiro Curso de Extensão Universitária realizado em Belém cujo tema foi tuberculose, dirigido pelo professor catedrático de Terapêutica Clínica Luis Araújo, que era tisiologista. O curso constou de cinquenta aulas teórico-práticas, de 9 de setembro até 6 de novembro. Foram inscritos 13 alunos do quinto e sexto ano, sendo onze os concluintes. O curso abordou diversos aspectos da tuberculose, introduzindo inclusive noções de Raios-X e visitas ao Hospital Domingos Freire centro de referência no assunto então (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 50). Nem tudo foram flores no ano de 1943. Fevereiro seria marcado por mudanças no modo de cobrança de taxas e mensalidades da Faculdade, o que geraria não só uma crescente insatisfação no meio acadêmico, como também novos atritos com o secretário da Faculdade, Dr. Olympio da Silveira. Nascia ali uma longa luta que se encerraria somente com a federalização da Faculdade. A reação do Diretório diante das mudanças no modo de cobranças das taxas foi o seguinte ofício de 17 de fevereiro de 1943, endereçado ao presidente do Conselho Técnico Administrativo: Com referência à portaria de 16-02-1943 do Sr. Diretor da Faculdade, relativa ao pagamento das taxas da Faculdade, este Diretório reunido em sessão extraordinária resolveu dirigir a Vv. Excias. solicitando a reconsideração do ato apoiado por este Conselho de majoração e estipulação de datas fixas de pagamento prévio das referidas taxas. Como se sabe a situação financeira da grande maioria dos estudantes da Faculdade não permite os mesmos maiores sacrifícios para satisfação das obrigações assumidas para com a Tezouraria da Faculdade. Concordamos, até certo ponto, com as necessidades financeiras que cercam a nossa Faculdade e temos feito o máximo possível para corresponder à supressão destas necessidades. Em troca disso fosse-nos facultada, por parte da Faculdade, a liberdade de satisfazer a esses pagamentos com menores restrições e maiores facilidades. É viável concordar que para jovens que lutam contra dificuldades de toda sorte, dentro de um meio pobre como é o nosso, cria-se uma situação insustentável ao estabelecer o pagamento antecipado da taxa, tanto mais que como de comum se verifica, até mesmo horas antes das provas ainda o pobre estudante se esforça na obtenção das quantias exigidas para pagamento de suas taxas. Este Diretório credenciou-se, principalmente no ano recém findo, para julgar melhor das necessidades monetárias dos estudantes que representa. Solicitado pelos mais necessitados, o Diretório satisfez, na medida de suas possibilidades, o pagamento de mensalidades num total de 7.000 cruzeiros. Fê-lo, porém, de bom grado, consciente de haver cumprido seu dever de Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 315 amparo ao estudante pobre desta Faculdade. Estamos certos que Vv. Excias., por seu lado, apóiam e aplaudem esta obra elevada do Diretório e não concorrerão em absoluto para o prejuízo dos nossos estudantes. Pedindo a Vv. Excias. a reconsideração daquele ato e a criação de uma fórmula mais simples que não acarrete maiores sacrifícios aos estudantes, fazemo-lo confiados no alto espírito de compreensão de Vv. Excias. e na elevação de seus sentimentos. Aproveitamos a oportunidade para reafirmar a Vv. Excias. os nossos protestos de estima e consideração (FMCP, 1943a). Aparentemente, em princípio o ofício não chegou a seu destino, e no dia 20 de fevereiro o DAM enviaria outro documento, desta vez destinado diretamente ao diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães, com o seguinte teor: 316 O Diretório Acadêmico de Medicina do Pará em reunião do dia 17 corrente resolveu enviar um ofício ao Presidente e Membros do Conselho Técnico da Faculdade de Medicina pleiteando certas medidas relativas ao modo do pagamento de taxas e mensalidades, determinado por portaria de V. Excia. Acontece, porém, que o referido oficio não poude dar entrada na Secretaria da Faculdade em virtude de ordem expressa do Sr. Secretário, a todos os funcionários, para que não recebessem toda e qualquer correspondência remetida pelo Diretório, ordem essa que nos foi confirmada verbalmente quando procuravamos, perante o Sr. Secretário, dar entrada ao documento em questão. Ante essa circunstância tomamos liberdade de envia-lo diretamente à V. Excia., afim de que o mesmo possa ser tomado em apreço (FMCP, 1943a). Em 15 de maio de 1943 toma posse a nova diretoria do DAM, assim composta: Presidente vice-presidente Orador 1º secretario 2º secretario 1º Tesoureiro 2º Tesoureiro Bibiliotecario Consultores Abraham Levy Raimundo da Costa Chaves Edgar Valente Jean Chicre Bitar José Damasceno Ary Salgado Carlos Costa Agostinho Sales Antonio Lobão Presidente da Comissão de Beneficência Mauricio Coelho de Souza Presidente da Comissão de Imprensa e Publicidade Miguel Cruz e Silva Presidente da Comissão Social José Guimarães Presidente da Comissão Científica (FMCP, 1943a) Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 A crise desencadeada pelo aumento das taxas, associada à falta de diálogo entre o DAM e a secretaria da Faculdade, seguiria adiante, atingindo proporções ainda maiores no ano de 1944, já na gestão de Raimundo Chaves, chegando inclusive aos jornais. O Diretório posicionava-se terminantemente contra o sistema de pagamentos de taxas de 4 quotas de Cr$ 500,00 em prazos fixos. No dia 11 de fevereiro de 1944, em nota oficial publicada nos jornais, assinada pelo primeiro secretário Jean Chicre Miguel Bittar, o Diretório avisa que ainda não obteve resposta do recurso que dirigiu ao Conselho Técnico Administrativo da Faculdade de Medicina, pedindo a revogação da medida que determinou o pagamento das taxas e mensalidades por antecipação, isto é, em quotas e datas estipuladas. Deste modo, comunica aos colegas que não efetuem aqueles pagamentos até ulterior deliberação, que será previamente anunciada por este Diretório (FMCP, 1944a). No dia 20, com a situação sem resolução, o diretório seguiria firme exigindo que os estudantes não se matriculassem, “enquanto não se solucionar o impasse criado com o ato da Diretoria daquela Faculdade, instituindo a cobrança de taxas, englobadamente com cotas e prazos fixos” (FMCP, 1944a). O diretor da Faculdade Dr. Acylino de Leão, resolve a questão de forma enérgica e responde com a seguinte nota nos jornais: A Diretoria da Faculdade de Medicina informa que: a) O Conselho Técnico Administrativo resolveu definitivamente o caso das taxas escolares, mandando cumprir o disposto na Portaria número 3, de 26 de fevereiro de 1943, sendo disso cientificado o Diretório Acadêmico; b) Que absolutamente não houve aumento das taxas escolares; c) Que cerrará as portas da Faculdade, caso não tenha alunos matriculados nas diversas séries do curso médico até o dia 25 do corrente mês de fevereiro, às 16 horas (FMCP, 1943a). No dia 25, em nota oficial o DAM informa que “tendo sido solucionado satisfatoriamente a questão das cobranças das taxas e mensalidades”, os estudantes deveriam efetuar a matrícula, com o pagamento das taxas obedecendo ao seguinte sistema: Taxa de matrícula seria no ato da mesma; mensalidades até o dia 5 de cada mês; promoção, taxa de laboratório e biblioteca, seriam pagas de primeiro a 15 de dezembro (FMCP, 1942a). Em 27 de abril de 1944 é eleita a nova diretoria, ficando o diretório assim constituído: Presidente vice-presidente orador 1º secretario Pedro de Brito Tupinambá Francisco D’Assunção S. Rosado Filho Edgar Bezerra Valente Ramiro Khoury Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 317 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. 2º secretario 1º Tesoureiro 2º Tesoureiro Bibiliotecario Consultores Milton Benedito Ericeira Sidonio Lucas de Figueiredo João Abreu Reis Antonio Juraci de Brito Daphnis Ferrreira Souto Ferreira Raynéro de Carvalho Maroja Otávio Bandeira Cascaes Miguel Lucio Cruz e Silva (FMCP, 1944a) Comissões Científica-Presidente Mário Medeiros Beneficente-Presidente José Carvalho da Cruz Barbosa Social-Presidente Miguel Lucio Cruz e Silva Imprensa e Propaganda Otávio Cascaes (A Folha Vespertina, 03.05.1944) Esta gestão seguiu uma linha diferente das anteriores conseguido talvez estabelecer mais diálogo com a Direção da escola, pois recebeu até elogios do Diretor Dr. Acylino de Leão: 318 É de justiça consignar aqui os nossos aplausos ao Diretorio Acadêmico que pela primeira vez, sob clarividente presidência do doutorando Pedro de Brito Tupinambá, enveredou pelo caminho da disciplina, colaborando com a administração da Faculdade, em prol da nobre classe que representa. O doutorando Tupinambá, com seus companheiros de Diretório, deu outra orientação a este orgão de classe, que cumpriu fielmente esse ano aos fins a que se destina. Os principais objetivos do Diretorio são congregar os representantes da classe e, principalmente, pugnar por seus interesses o que nunca se poderá conseguir sem a repulsa dos indesejáveis (FMCP, 1945c, p. 30). No ano de 1945, o diretório apresentava a seguinte composição: Presidente vice-presidente orador 1º secretario 2º secretario 1º Tesoureiro 2º Tesoureiro Bibiliotecario Consultores Amílcar Pereira Pedro Amazonas Pedroso Luiz Pires Milton Ericeira Daphinis Souto Carlos Costa Agostinho Sales Canuto Brandão Alcimar Brígido Antônio Souto José Austregésilo Medeiros Eliseu Rodrigues (FMCP, 1945a) Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Corpo da Revista do Acadêmico Direção Jean C. Bitar Diretor-gerente João Fecury Diretor-secretário Renato Chalú Pacheco Diretor-tesoureiro Gervásio Cunha Gonçalves (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 1). Esta formação do DAM também manteria o período de “paz” com a diretoria da Faculdade iniciado na gestão anterior: O Diretório Acadêmico, superiormente dirigido pelo culto doutorando Amílcar da Silva Pereira, seguiu a orientação do Diretório de 1944, que inaugurou na Faculdade um período, de ordem, disciplina e progresso, cuidando seriamente dos interesses da classe que nobremente representa e dos principais problemas atinentes ao ensino. Cumprindo a missão precipua de defender os interesses gerais dos estudantes e de tornar agradavel e educativo o convívio entre os membros do corpo discente, alijando os indesejaveis e aproveitando os bons elementos, esse órgão da classe estudantina mereceu nossos aplausos pela orientação superior, clarividente e ordeira com que norteou seus trabalhos no ano que findou (FMCP, 1946b, p. 33). A “trégua”, contudo, não duraria muito e no início de 1946, tendo Pedro Amazonas Pedroso como presidente, o DAM colidiria novamente com a Congregação e com a Secretaria da Faculdade, pelos mesmos motivos dos últimos anos: aumentos das taxas de mensalidades (sobretudo para alunos do primeiro ano), de laboratório e biblioteca, que haviam sido aprovados em 25 de janeiro. Em abaixo assinado solicita a revogação das novas taxas com os seguintes argumentos: a) Os parcos ordenados percebidos por alguns alunos desta Faculdade ou por seus genitores não permitem fazer face às necessidades criadas pela carestia de vida, situação que se torna insuportável com este aumento; b) Temos sobejas razões para creditar que esta majoração de taxas, embora crie ingentes dificuldades a alguns colegas, não poderá de modo algum melhorar os vencimentos dos dignos professores; c) Não nos parece razoável criar dentro da escola distinção entre alunos, devendo uns efetuar pagamento superior aos demais, o que contraria uma aspiração deste Diretório, que é a igualdade de todos os colegas em qualquer ano ou condição em que se encontrem; d) Esta entidade acadêmica compreende perfeitamente a situação difícil de nossa Faculdade no que se refere às finanças, sendo nosso desejo trabalhar afim que os ínclitos professores que aqui exercem magistério tenham uma retribuição condigna com as elevadas funções que desempenham. Sabemos que as subvenções concedidas a esta escola não são suficientes, sendo muito inferiores às concedidas a outras Faculdades do Brasil, razão porque este Diretório assume perante esta Congregação o compromisso de envidar, juntamente com a Diretoria no decorrer do ano letivo de 46, to- Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 319 dos os seus esforços afim de que essa contribuição dos governos federal e estadual seja elevada ao nível que se torna necessário, de modo a permitir a nossa escola manter-se a altura das congêneres do país e continuar assim a preencher a lacuna do ensino médico na Amazônia (FMCP, 1946a). A resposta do Secretário e do Tesoureiro teria sido “que a Faculdade não necessitava nem queria a colaboração dos estudantes. O que lhes interessava era o dinheiro e nada mais”, adiantando ainda que o recurso seria inútil já que dificilmente a Congregação se reuniria com dois terços dos professores, muito embora o aumento das taxas tenha sido votado sem o número de docentes previsto no regimento interno da escola (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 55). O diretório tentaria ganhar tempo, solicitando em outro abaixo assinado, desta vez destinado ao diretor da Faculdade, que se “digne de sustar a execução da resolução da Congregação” (FMCP, 1946a), pois de acordo com a legislação da época o aumento das taxas só poderia vigorar após a aprovação do Conselho Nacional de Educação portanto seria “prematura e indevida referida cobrança [...] por faltarlhes um elemento essencial para sua validade e vigência. Até sua aprovação, as modificações são um projeto de Lei e não Lei” (FMCP, 1946a). Não conseguindo acordos o presidente do DAM, Pedro Amazonas Pedroso, dirige o seguinte memorando ao Interventor Federal no Estado, Dr. Otávio Meira: 320 Exmo. Sr. Dr. Interventor Federal do Estado O Diretório Acadêmico de Medicina, expressão da vontade coletiva dos alunos desta Escola, confiante no sentido de justiça e no interesse demonstrado por V. Excia. em tudo que se refere o importante problema do ensino, pede vênia para expôr o seguinte: Este órgão de classe foi notificado há dias de que as taxas de laboratório e biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará haviam sido majoradas para cem cruzeiros (Cr$ 100,00), cada e que a mensalidade dos alunos da primeira série tinha sido elevada para duzentos cruzeiros (Cr$ 200,00). Ora, já há muito que os jovens que tentam estudar medicina em nossa terra vêem realizando ingentes sacrifícios para satisfazer o aumento sempre crescente das taxas escolares. Quase anualmente, ou se criam novas taxas ou se aumentam as já existentes, criando-se para os alunos embaraços inumeráveis. Agora, esta nova majoração, elevando as já enormes quantias exigidas, vem tornar insuportável a situação de alguns colegas, que terão que abandonar o curso por não poder efetuar tal pagamento. Esta entidade acadêmica procurou entrar em entendimento com a escola, enviando à Congregação da mesma um memorial, cuja cópia remetemos à apreciação de V. Excia., e tentando mesmo entrar em contacto com a Diretoria afim de procurar uma solução satisfatória, que harmonizasse os interesses de ambas as partes. Nada logrou em virtude da má vontade dos que se julgam proprietários desta Faculdade. Quanto a descabida alegação da Escola de que o grande número de alunos transferidos para o sul do país veio afetar enormemente as suas finanças, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 este Diretório tem a esclarecer a V. Excia. que cada um dos colegas a transferir-se deve efetuar o pagamento de dois mil cruzeiros (Cr$ 2.000,00), afim de conseguir o seu intento. Esperando as sábias providências de V. Excia., reitera seus protestos de elevada estima e distinta consideração (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 56). A questão atingiria esferas ainda mais elevadas no telegrama enviado ao General Gaspar Dutra, presidente da República, ao ministro da Educação e ao diretor de Divisão de Ensino Superior. Comunicamos a V. Excia. Faculdade de Medicina vem de fazer nova e descabida majoração das taxas escolares desrespeito tabela aprovada Conselho Nacional Educação constante Regimento Interno pt Solicitamos urgentes providências sentido tornar sem efeito aumento em que nada influenciará receita Faculdade subvencionada cem mil cruzeiros governo federal vg sessenta mil Estado e vinte mil prefeitura vg influindo entretando vida estudantes grande maioria pobres e filhos funcionários pt Certos tomareis providências urgentes agradecemos atenciosamente solução – Atenciosas saudações – P. A Pedroso – Presidente (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 56). Diante disso, em nota oficial o DAM declararia que: os estudantes de medicina não se matricularão sujeitos as novas taxas e para concretização de um dos maiores desejos dos universitários paraenses, solicitarão ao govêrno que seja encampada a Faculdade de Medicina, tendo-se já iniciado as “demárches” nesse sentido que adiantamos, marcham para o fim almejado (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 56). Começava a nascer ali um maior envolvimento dos discentes com a ideia de federalização da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará12. Diga-se de passagem que estes aumentos anuais das taxas, tidos como arbitrários pelos estudantes, eram o único recurso garantido que a Faculdade poderia dispor para sua manutenção e lenta ampliação, visto que as subvenções públicas eram sempre muito incertas. Conforme diria, quase em tom de desabafo, o Dr. Lauro de Magalhães, quando diretor da Faculdade: apesar de continuar reduzida a matricula [...] com muitas vagas gratuitas solicitadas pelo Govêrno do Estado, de não havermos recebido a subvenção anual de cem mil cruzeiros, do Govêrno Federal, e nem mesmo o pequeno auxilio de doze mil cruzeiros, constante da lei orçamentária do município, alegando o Sr. Prefeito de Belém dificuldades financeiras, e de nos terem sido pagos apenas 60% do auxilio estadual, adquirimos novos e modernos aparelhos, para nossos laboratórios, abundante material de consumo, mobiliário para o gabinete da diretoria e livros para a biblioteca que se acha devidamente aparelhada e sempre à disposição dos estudantes, como se verificará no livro de consultas, encerramos o nosso ano social com os nossos compromissos pagos em dia (FMCP, 1948c, p. 3). Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 321 O Largo de Santa Luzia ia ganhando cada vez mais ares de um campo de batalha, e o DAM comprando novas brigas com o corpo docente. Agora o alvo era o professor de anatomia Dr. Ruy Romano Romariz, que em 22 de fevereiro de 1946, endereçaria a seguinte carta ao Conselho Técnico Administrativo: O infra assinado docente livre desta Faculdade tendo sido publicamente atacado pelas colunas da “Folha Vespertina” edição de 20/02/46, pelo indivíduo Pedro Amazônas de Souza Pedroso, infelizmente aluno desta Faculdade e que se intitula Presidente do Diretório Acadêmico de Medicina, atualmente funcionando irregularmente com apenas cinco (5) membros, solicita a V. V. Excias. nos termos do artigo 244 do Regimento Interno a abertura de rigoroso inquérito afim de que seja devidamente apurada e esclarecida as acusações feitas à minha pessôa, referentes ao curso de preparação dos alunos que pretendem ingressar na Faculdade (FMCP, 1946a). O Diretório defenderia seu presidente alegando que a imprensa havia deturpado a entrevista, sendo que os seguintes termos mencionados “testa de ferro” e “curso clandestino” não haviam sido aprovados pelo DAM, conforme registrado em ata. No mais o que mais havia sido dito tinha sido em defesa dos alunos, e com aval de todos os demais membros do Diretório, portanto não poderia haver um inquérito visando unicamente a figura de Pedro Amazonas Pedroso (FMCP, 1946a). 322 Em 22 de abril de 1946 são realizadas as eleições para nova gestão do DAM, em sessão presidida pelo catedrático Dr. Henrique Esteves, com o pleito transcorrendo sem problemas. Dias depois, em nova sessão para aprovação da ata do dia 22, realizou-se entre os 12 membros eleitos a votação para preenchimento dos cargos do Diretório, tendo os representantes do sexto ano eleitos para cargos de vice-presidente e consultor, ficando como presidente um aluno do quinto ano. Não satisfeitos com o resultado, os alunos sextanistas levantaram-se e apresentaram verbalmente o pedido de renúncia à representação de sua série. No dia 30 de Abril, alegando a renúncia dos representantes do sexto ano, o Conselho Técnico Administrativo reunido em sessão, decidiu não reconhecer o Diretório negando a posse de seus membros, o que deveria ocorrer em primeiro de maio. Sem conseguir o reconhecimento devido, em 13 de maio de 1946, os alunos eleitos, mas não empossados, Jean Bitar, José Austregésilo Mendes, Durval Frazão Braga, Canuto F. Brandão, Manoel Aires, Agostinho Leão de Sales, Carlos Augusto da Silva Costa, Mário Augusto Morais, Abílio Cavaleiro Brito, e Orlando Almeida Pinto, resolvem recorrer em recurso encaminhado ao Dr. Jurandir Lodi, Diretor da Divisão de Ensino Superior (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946). O recurso alegava que nenhuma disposição estatutária previa o cargo de presidente como um privilégio dos sextanistas, podendo este ser ocupado por qualquer aluno da Faculdade, muito embora em inúmeras vezes o DAM tenha sido encabeçado por Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 um aluno do sexto ano. E em dado momento sugere que o Conselho Técnico Administrativo teria tomado tal medida por serem os eleitos, “aquêles que no início do corrente ano se opuzeram ao aumento, cada vez mais asfixiante, das taxas escolares em nossa Faculdade” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946). Finaliza dizendo que a Faculdade encontrava-se desde o dia primeiro de maio em situação irregular, visto que não contava com a participação de um órgão da classe discente. A Congregação da Faculdade tentaria por sua vez desmoralizar ainda mais o Diretório por volta de junho, instaurando um inquérito para avaliar a situação do livro caixa deste; e dada a aparente falta de recibos, falta de lançamentos, ausências de páginas rubricadas pelo presidente e contradições em relação ao livro da Faculdade foi fácil considerar a situação do Diretório irregular. No entanto, a carta encaminhada ao Diretor da Divisão de Ensino Superior surtiu efeito, e graças à intervenção deste a Congregação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará resolveu em 18 de julho de 1946 reconhecer a legalidade da nova gestão do DAM, assim constituída: Presidente vice-presidente orador 1º secretario 2º secretario 1º Tesoureiro 2º Tesoureiro Bibiliotecario Consultores Jean Chicre Miguel Bitar Agostinho Sales José Austregésilo Mendes Manuel Aires Mário Moraes Carlos Costa Canuto Brandão Durvalino Braga Rubens Coutinho Agostinho Sales Orlando Pinto Abílio Brito (Revista do Acadêmico de Medicina, 1946, p. 53) Corpo da Revista do Acadêmico Diretor Geral Jean C. Bitar Corpo diretor Renato Chalu Pacheco João Fecury Gervasio C. Gonçalves Eduardo Braga (Revista do Acadêmico de Medicina, dez. 1946, p. 2) Observe-se que a primeira formação desta gestão, logo após a eleição de abril contava com o acadêmico Milton Ericeira como vice-presidente ao invés de Agostinho Sales. (FMCP, 1946a). Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 323 Jean Bitar vinha de outras gestões, tendo sido inclusive diretor da Revista do Acadêmico de Medicina, portanto conhecia bem quais os problemas que o DAM costumava enfrentar. Agora como presidente levaria às últimas instâncias à ideia de federalização da Faculdade, tendo durante a realização do IX Congresso Nacional de Estudantes, submetido à consideração daquela Assembléia estudantil a “tese”: Federalização da Faculdade de Medicina Necessidade vital do vale Amazônico (BECKMANN, 2002, p. 175). A tese seria aprovada com unanimidade e segundo Beckmann: Bitar e Armando Mendes percorreram, após, vários órgãos ministeriais e o mau acolhimento que tiveram os fez tentar uma entrevista com o Presidente da República. Recebeu-os Eurico Gaspar Dutra que os ouviu e perguntou: “E o Pará tem Faculdade de Medicina?”, dando o tom anedótico à entrevista (BECKMANN, 2002, p. 175)13. Armando Dias Mendes, então estudante de direito, mas que fazia parte da delegação da UAP que compareceu ao evento, recorda aquele congresso de estudantes e episódios de “mau acolhimento” na peregrinação do DAM na então capital Federal em busca de apoio a Federalização: 324 E em julho de 1946 mandamos uma dilatada delegação ao Congresso Nacional dos Estudantes, que se realizava na sede da UNE – “União Nacional dos Estudantes”, no Rio de Janeiro. [...] Representavamos cada uma das Faculdades existentes e a própria UAP. Na sessão inaugural, além de políticos de distintas legendas [...], falaram depois os representantes dos estados, por ordem alfabética destes. A vez do Pará chegou pelas duas horas da madrugada, e o alvo preferido foi o Diretor de Ensino Superior do MEC. Na véspera, ou nesse mesmo dia, ao receber a delegação paraense, que pleiteava a federalização da Faculdade de Medicina e a abolição das taxas escolares, respondera de maneira muito expedita que quem não podia pagar devia ir plantar batatas. Desnecessário dizer que a referência ao episódio fez o nome do ilustre dirigente ser não propriamente ovacionado (MENDES, 1998, p. 45). Ficaria portanto marcada esta gestão por ter catalisado o processo de federalização da Faculdade. Tentaria ainda Jean Bitar mudar algumas disciplinas do sexto ano, do turno da manhã para o turno da tarde, “considerando a necessidade imperiosa da prática hospitalar nos últimos anos do curso médico; considerando que os diversos Serviços do Hospital da Santa Casa, campo de ação dos estudantes de medicina funcionam pela manhã...” (FMCP, 1946a). Mesmo sem contar com a simpatia dos dirigentes da Faculdade, o DAM realizaria outros feitos, seguindo ideias criadas ainda na gestão de Abraham Levy como: obtenção de vagas gratuitas junto ao Governo do Estado, visando auxiliar os colegas Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 mais pobres, emprestimos aos colegas que não conseguiam o suficiente para pagar as taxas da Faculdade, aquisição de novos livros para a biblioteca “Dr. Camilo Salgado”, realização de conferências científicas e Cursos de Extensão Universitária (Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 47). Após as eleições em 24 de abril 1947, surge nova gestão empossada em primeiro de maio, com a seguinte composição: Presidente vice-presidente orador 1º secretario 2º secretario 1º Tesoureiro 2º Tesoureiro Bibiliotecario Consultores Aloysio de Andrade Mello João Maranhão Aires José Austregésilo Mendes Raynero de Carvalho Maroja Almiro Monte Abilio Cavalleiro de Brito Nagib Hage Agostinho Araújo Barbosa Agostinho Salles Filho Eduardo Braga Motta Eduardo Pereira Braga Henry Checralla Kayath (FMCP, 1947a) Corpo da Revista do Acadêmico Diretor Geral Josias F. Macedo Redatores Aloisio Melo Eduardo B. Motta Almiro Monte Agostinho A. Barbosa (Revista do Acadêmico de Medicina, 1947, p. 2). Entre os feitos registrados desta gestão, há a realização da tradicional “Festa da Esmeralda”, que mereceu a seguinte cobertura na “Revista do Acadêmico de Medicina”: Foi um acontecimento que deslumbrou a todos os que tiveram o ensejo de assistir a festa de confraternização entre calouros e “doutores” de nossa Faculdade de Medidina. Nada faltou para que esta festa fosse cognominada como “líder” de nossas faculdades. A ornamentação esteve estonteante. As moças bonitas com seus vestidos policrômicos tentavam ofuscar o brilho das luzes da noite de luar. Lá fora, a lua, como para homenagear a noitada dos acadêmicos de Medicina, apresentava-se vestida magnificamente: era o plenilúnio. Os jovens se divertiam. A orquestra, aliás, a melhor de Belém, com Maçaneta à frente, tocava entre sustenidos e bemóis o fox “Laura” e o samba “Marina”. Tudo era alegria. Os pares dançavam e até os acadêmicos de Medicina esquecidos das Anatômias, Microbiologias e Clínica Médica, também externavam sua satisfação por terem organizado tão linda festa... (Revista do Acadêmico de Medicina, 1947, p. 38). Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 325 Ainda no mesmo ano, encontramos o registro da “Noite Verde”, evento realizado em benefício dos colegas sem condições de arcar com as mensalidades da Faculdade. Segue transcrição da “Revista do Acadêmico”: Num ambiênte de requitada elegância, a sociedade paraense se reuniu no dia 25, numa agradável noitada, promovida pelo Diretório Acadêmico de Medicina, na Barraca do Sagrado Coração de Jesús, no arraial de Nazaré. É mais uma realização de vulto de nosso órgão classista, cuja direção congregou o mundo diplomático e oficial de nossa metrópole, numa ceia “sui-generis” cognominada a “Ceia das Nações”. O “grand-mond” social belemense, emprestou a sua colaboração ao nosso colega pobre, em pról de quem reverterá o produto da noite. Um bem organizado cardápio foi servido aos convivas, por “delicieuses poupeés” ornamentos raros de nossos salões, que emprestaram ao jantar o fulgor de sua graça e o brilho de sua belêsa. Estão de parabens os nossos colégas do Diretório pela sua notável inicitiva, à qual obteve pleno exito (Revista do Acadêmico de Medicina, 1947, p. 39). O DAM de 1947 conseguiria ainda a criação de uma vaga gratuita que recebeu o nome de “Abraham Levy” em justa homenagem aquele que foi para seus contemporâneos um dos maiores presidentes do diretório e havia falecido tragicamente por afogamento na praia de Copacabana pouco depois de formado (BENCHIMOL, 1998, p. 145). 326 Em 1948 disputas políticas entre os estudantes causariam novo tumulto durante as eleições do DAM: O CORPO DISCENTE desta nobre e tradicional instituição de ensino médico do Norte, ainda profundamente surpreso com a inexplicável atitude de alguns de seus membros, que no dia 29 de abril próximo passado, empastelaram violentamente a sessão da Assêmbleia Geral que o Diretório Acadêmico relizava para eleição da diretoria para o período 19481949... (FMCP, 1948a). Diante da balburdia, o Conselho Técnico Administrativo decidiu “moldado nos mais firmes sentimentos de justiça e disciplina” (FMCP, 1948a), mais uma vez, não reconhecer o DAM naquele ano, não permitindo novas eleições. Iniciavam-se novamente em 15 de maio os apelos estudantis pela volta de seu órgão representativo, solicitando nova data para realização das eleições. considerando que os fomentadores daquele movimento, constituem inegavelmente uma restrita minoria desta briosa falange acadêmica; considerando que ao Diretório Acadêmico, não coube exclusivamente culpa alguma no fato ocorrido, e que o mesmo, apezar de seus esforços, não conseguio infelizmente manter a órdem dos trabalhos, por se tratar de um movimento premeditado com fins subversivos; [...] considerando ser de inteira justiça permitir a realização das eleições dêsse órgão classista, infelizmente tão desvirtuadas que fôram, por alguns colegas rebeldes e mal intencionados... (FMCP, 1948a). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Desta vez, os estudantes devem ter passado dos limites, pois mesmo um abaixo assinado de 15 de maio de 1948, dos alunos do quinto ano alegando que o Diretório “não é apenas um orgão de defêsa dos interesses da Classe Acadêmica, mas também um colaboradôr dos orgãos dirigentes de nossa Escola, no sentido de torna-la sempre maior e mais respeitada” (FMCP, 1948a), não surtiu nenhum efeito, sendo um novo pleito dentro da legalidade permitido apenas no segundo semestre. O professor Dr. Rui Romariz que presidiria a nova eleição, escreveria para o Diretor da Faculdade e Conselho Técnico Administrativo sobre o novo pleito: Desobrigando-me do que me foi designado pelos doutos membros do Conselho Técnico Administrativo, levo aos vossos conhecimentos que a eleição regimental para composição do Diretório Acadêmico, decorreu dentro de perfeita ordem, sem deslise disciplinar algum, observando-se mesmo perfeita cordialidade entre os contendores. Com grande satisfação constatei que os senhores acadêmicos, desta vez, enveredaram pelo caminho ordeiro, ao contrário das outras eleições, nas quais tiveram atitudes desabonadoras, muito aquém da linha que deviam manter como futuros membros da nobilissima classe médica. As atas que o Secretário eventual compôs, e a mesa apresenta, as quais tive ocasião de assinar, são expressão da verdade. Em palavras singelas, esboçam tudo o que se passou. Dentre as providências que tomei tive o cuidado de cômpor a mesa com membros das duas faccções em litígio, dois membros da quinta série e dois do Diretório que era considerado ilegal. Interessei assim as duas facções na execução das eleições, o que deu ótimo resultado. Os escrutinadores em número de dois, foram escolhidos dentre os acadêmicos que no momento se encontravam no recinto. Congratulo-me, pois, com a Diretoria pela execução perfeita das instruções emanadas deste Conselho Técnico Administrativo, transformando em cordial uma questão litigiosa, que vinha dividindo os discentes, provocando mesmo polêmicas algo desairosas pela imprensa (FMCP, 1948a). Desta forma ficava assim constituído para o ano de 1948, o Diretório Acadêmico de Medicina: Presidente vice-presidente orador 1º secretario 2º secretario 1º Tesoureiro 2º Tesoureiro Bibiliotecario Consultores Agostinho Sales Filho Nagib Jorge Hage Almiro Monte Carlos Asclepíades de Lima Elias Gattasse Kalume José Contente Coryntho Silva Everaldo Martins Henry Kayath Raimundo Nonato Vasconcelos Raynero Maroja João Abreu Reis (FMCP, 1948a). Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 327 Tal gestão chegou a instituir mais uma vaga gratuita em auxilio dos estudantes pobres, que recebeu o nome de vaga “Camilo Salgado” (FMCP, 1948a). No entanto, essa gestão teria vida curta, ficando o ano de 1948 marcado como um ano cinzento para o DAM, conforme o relatório da Faculdade, pelo Diretor, Dr. Lauro Magalhães: Não obstante terem sido realizadas três (3) eleições para formação do corpo dirigente desse órgão de classe, os representantes das diversas séries não chegaram a um resultado satisfatório. Deixou, por isto, o Diretório de ter existência legal este ano (FMCP, 1949b, p. 35). Os livros de documentos expedidos e recebidos do ano de 1949 trazem poucas informações da gestão daquele ano, que eleita em de 22 de abril teria os seguintes integrantes: 328 Presidente - Almiro Pinheiro Monte Vice-Presidente - Roberto Lobato da Costa 1º Secretário - Everaldo de Souza Martins 2º Secretário - João Paulo Mendes 1º Tesoureiro - Nagib Jorge Hage 2º Tesoureiro - Anísio Ferreira Jordy Orador - José Haroldo de Menezes Bibliotecário - Orlando Salomão Zoghbi Consultores - Raimundo Nonato de Vasconcelos - Heber Monção - Carlos Asclepíades de Lima - Renee Sá de Figueredo (FMCP, 1949a) E em pouco tempo Nagib Jorge Hage passaria a assinar como vice-presidente. Este é um panorama dos primeiros anos do Diretório, “baluarte inquebrantável, sofrendo sempre a ação demolidora dos mal avisados, mas resistindo a todas as refrégas” (Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 47). Longe de um estudo definitivo, haja vista que dados sobre algumas gestões não foram encontrados, é apenas uma amostra dos primórdios de uma agremiação atuante que lutava então somente pelo interesse dos discentes, sem conotações partidárias. Um órgão cujo principal adversário, além das acirradas disputas internas, era o corpo administrativo da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Não que isso coloque os dirigentes da escola como vilões, mas apenas como “homens habituados à luta, capazes de defender o que julgavam justo e conveniente para sobrevivência da instituição que ajudaram a construir” (BECKMANN, 2002, p. 175), e que tudo faziam para que a Faculdade seguisse o caminho por eles planejado. Fazer parte do DAM era sinônimo de atritos com a Direção. Por mais que os exmembros do diretório se projetassem após formados, como por exemplo Edward Catete Pinheiro (que se tornou político de renome), Abraham Levy, Pedro AmazoMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 nas Pedroso (ambos hoje emprestam seus nomes a escolas públicas em Belém), Jean Bitar (diretor durante muitos anos do Hospital Servidores do Estado, do Instituto Ofir Loyola e primeiro diretor da Faculdade de Medicina do Estado do Pará), eles dificilmente conseguiriam ambiente para voltar a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará como professores. Restou-lhes o reconhecimento como destacados líderes estudantis. NOTAS 1 “Haverá hoje, às 5 horas da tarde na séde da Faculdade de Medicina, uma reunião collectiva do corpo discente, para tratar de interesse da classe. Por nosso intermedio os promotores dessa reunião convocam o comparecimento de todos os alumnos” (Estado do Pará, 01.06.1926, p. 3). 2 A festa do “Thermometro” é a mais antiga festa dos acadêmicos da FMCP da qual se tem notícia, precedendo a criação do CAM. A referência mais remota encontrada sobre este evento é em Estado do Pará de 17 de maio de 1925: “Entre outras coisas ficou deliberada a escolha do dia 14 de julho para a tradicional festa do “Thermometro”, com o concurso de todos os alumnos da Faculdade”. (N.A). 3 Diferente do livro de documentos recebidos pela Faculdade, a Folha do Norte coloca como bibliotecário o acadêmico do primeiro ano Nilson Silva. 4 Folha do Norte, Vida Acadêmica, 27 de abril de 1932. Alliança Academica era o nome da chapa vencedora. (N.A). 5 Nenhum exemplar deste jornal foi localizado, o que seria uma fonte importantíssima para traçar um panorama mais completo da vida acadêmica de então. (N.A). 6 Assinada pelo seu primeiro secretário, Clidenor de Freitas. (FMCP, 1934a). 7 Assinava o presidente do DAM, Cattete Pinheiro. (FMCP, 1934a). 8 O professor Dias Junior possuía um prestígio enorme entre os alunos, sendo sempre bem aceito como representante da Congregação nas reuniões do Diretório, Antônio Juracy Brito conta que: “numa ocasião talvez para nos castigar, a Congregação se fez representar por outro professor. Os alunos não aceitaram: se rebelaram, tumultuando, não deixando se realizar a desejada eleição. Ficamos, por isso, durante muitos dias, com o Vice-Presidente, de mandato extinto, meu colega de turma João Maranhão Ayres, respondendo pelo Diretório até que o mestre voltasse a presidir a eleição” (BRITO, 1991, p. 14). 9 Até o momento foram localizados apenas onze números, sendo que de alguns talvez reste apenas um exemplar. (N.A). 10 A data do reconhecimento do DAM é a mesma de quando ele deixa de ser chamado de Centro Acadêmico de Medicina passando a Diretório. Muitas fontes, inclusive do próprio DAM, colocam esta data como de fundação, ignorando por completo a existência e as ações do CAM. (N.A). 11 Observa-se que esta é a terceira vez que a biblioteca do DAM é “inaugurada”, e sempre sem menção às iniciativas anteriores, como se o projeto partisse sempre do zero. (N.A). Apontamentos para uma história do DAM, 1930-1949 329 12 A questão da federalização dada sua complexidade é melhor analisada em outro capítulo. (N.A). 13 Em depoimento para este livro, Armando Mendes apresenta sua versão para o episódio: “No que diz respeito, especificamente, à audiência com o Presidente Dutra, recordo-a perfeitamente. Não recordo os termos precisos do diálogo travado. Mas o Prof. Beckman -- apoiado não sei se na tradição oral ou em algum testemunho dado por escrito -- é fonte confiável. E se o Presidente Dutra disse, foi a sério que o disse, não era homem de brincadeirinhas, ainda mais com dois molecotes desconhecidos do norte”. (N.A). 330 Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 19 A Atlética 331 332 Detalhe de azulejo de uma das paredes da FMCP. Quando um estudante de medicina da UFPA ou mesmo um médico formado em Belém tem contato com as escolas médicas do sudeste, ele se defronta com uma instituição completamente desconhecida atualmente no Estado do Pará: são as chamadas Associações Atléticas Acadêmicas de Medicina, ou simplesmente “Atléticas”. As Atléticas são, em geral, uma seção do Diretório ou Centro Acadêmico cuja finalidade é organizar eventos esportivos para os alunos, como por exemplo, jogos inter-classes de diferentes modalidades. Não raro a Atlética se torna tão importante que adquire autonomia suficiente para separar-se por completo do Diretório, rivalizando com este na popularidade entre os estudantes. No sudeste, inicialmente apenas em São Paulo, e hoje em outros estados da região, são as Atléticas que organizam durante a Semana da Pátria os chamados “Jogos Intermed”, uma grande e acirrada competição desportiva, abrangendo diferentes modalidades, envolvendo diversas escolas médicas do estado e cada ano sediada em uma cidade diferente onde haja uma escola participante. No caso de São Paulo, que sedia a Intermed mais antiga e tradicional, e talvez por contar com um grande número de escolas médicas, existe espaço até para uma segunda divisão. Mas e no Pará, já houve uma Atlética? Eis a questão. Para as gerações mais novas a resposta certamente será não, uma vez que tal instituição, como dito anteriormente, lhes é completamente desconhecida, embora tenha existido, sim. E se reconstruir as gestões passadas do DAM, que existe até hoje, já é um trabalho ingrato pela falta de documentação, o que dizer então de uma instituição que desapareceu completamente sem deixar vestígio algum? No entanto no estatuto do ainda Centro Acadêmico de Medicina do Pará, datado de sua fundação em 21 de abril de 1930, o artigo 63 prevê uma seção esportiva que poderia ser filiada ao centro: Paragrafo 1: Esta secção esportiva poderá organisar um regimento interno, contanto que suas disposições não infrinjam estes Estatutos; Paragrafo 2: Sua direccção deverá recahir em seus próprios filiados e constará dos seguintes membros: Director de Esportes, Secretario e Thezoureiro; Paragrafo 3: O Director de Esportes poderá comparecer ás reuniões da Directoria ou do Conselho Deliberativo desde que para isso tenha sido convidado pelo Presidente; Paragrafo 4: O Centro Acadêmico de Medicina do Pará não responderá pelas obrigações contrahidas pelos dirigentes desta secção. Para responder por estas obrigações, deverá ter a dita secção esportiva um movimento de receita e depesa independente do Centro; Paragrafo 5: O Centro poderá desde que suas possibilidades o permittam auxiliar pecuniariamente a dita seção (FMCP, 1930). A Atlética 333 Nascia ali, ainda que possa ter sido apenas estatutariamente, o embrião da Atlética da Faculdade, já com relativa autonomia. Não encontramos documentação que demonstrasse quando a Atlética foi efetivamente criada. Sabe-se que em 1937 a “Liga Athlética Paraense” organizou um campeonato acadêmico envolvendo modalidades como futebol, vôlei e basquete e convidou o Diretório (FMCP, 1937b). A documentação da época mostra inclusive solicitação feita pelo DAM à diretoria da Faculdade visando uma ajuda de custo para compra de uniformes esportivos. No entanto, não há nenhuma menção à Associação Atlética Acadêmica de Medicina. O documento mais antigo encontrado, e que demonstra a existência efetiva e já bem estabelecida da Associação Atlética Acadêmica de Medicina do Pará, é uma nota em um exemplar de 1944 da Revista do Acadêmico apresentando a Atlética de Medicina unida com as de Direito, Engenharia e Odontologia na criação de um órgão destinado ao controle completo de todas as atividades esportivas universitárias do estado: a Federação Acadêmica Paraense de Esportes (FAPE), cujo primeiro diretor foi o doutorando Alcindo Nova da Costa, que durante os três anos anteriores vinha dirigindo a comissão de esportes do DAM. 334 Outra informação encontrada a respeito da Atlética é uma nota em uma Revista do Acadêmico do ano de 1946 a qual, pela escassez de documentação sobre o assunto, transcrevemos integralmente: ASSOCIAÇÃO ATLÉTICA ACADÊMICA DE MEDICINA No Pará, os estudantes de medicina jamais deixaram de sentir necessidade da prática dos esportes, em todos os seus ramos. Assim vencendo certos obstáculos que se impuzeram, em setembro próximo passado, na Faculdade de Medicina, teve lugar uma reunião de Assembléia Geral, afim de eleger o corpo dirigente da AAAM para o período de 1945-1946. A diretoria eleita, compenetrada de suas obrigações, desde o início procurou empregar o maior de seus esforços no sentido do alevantamento de nossa Associação Atlética. Iniciou-se desde logo campanha com o objetivo de reunir numerário suficiente para aquisição de material esportivo e ao mesmo tempo reorganizar, também em material, a secretaria. Do produto desta campanha lançada entre os alunos e médicos de nossos hospitais farto material já se encontra em nossa sede. O dia 29 de setembro marca uma das maiores vitórias da agremiação esportiva da Faculdade de Medicina. Nessa data teve lugar a realização de seu festival, levado a efeito na praça de esportes do Clube do Remo. Nele tomariam parte os diversos Colégios secundários e superiores, tendo constituído a prova de honra, um encontro entre médicos e bachareis locais. Após longos anos de ausência voltaram os eternos rivais ao gramado afim de resolver uma velha questão. Embora o quadro de bacharéis fosse o favorito, a equipe de médicos após uma partida disputadissima, conseguiu levar da melhor, derrotando seus adversários pela elevada contagem de 6 x 0. Dessa maneira foram portadores de valioso troféu, que foi genMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 tilmente oferecido aos estudantes de medicina. Nessa mesma manhã, o quadro representativo da Faculdade de Medicina, num encontro com a Faculdade de Direito conseguiu vitória pelo escore de 3 x 1. Movimentam-se nestas condições os estudantes de medicina, procurando desenvolver ao máximo, os esportes em nossa Escola, visando justamente o valor da cultura física como fator importante no desenvolvimento da raça (Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 53). A mesma revista em outra nota define a Atlética como uma seção do DAM, filiada a Confederação Brasileira de Desportos Universitários (CBDU), e “...que muito tem contribuído para o progresso dos esportes universitários em nosso Estado” (Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 50). Além dos tradicionais futebol, volei e basquete, um dos esportes mais populares entre os estudantes de então, hoje desaparecido do meio acadêmico, eram as regatas realizadas na baía do Guajará. As disputas entre Medicina, Engenharia e Direito eram bastante acirradas nesta modalidade. A organização das competições era grande, contando até com embarcações cedidas para as torcidas. A Folha do Norte de setembro de 1946, notícia que o diretório acadêmico de engenharia havia conseguido o vapor “State of Delaware” da SNAPP, e bastava aos estudantes que desejassem prestigiar as competições apresentarem suas carteiras da União Acadêmica Paraense (UAP) na hora do embarque, ou algum convite especialmente distribuído. Dentro do barco a banda de Jazz do maestro Maçaneta garantiria a animação. A equipe de Medicina que competiria naquele dia contra Direito e Engenharia era a seguinte, devidamente identificada com uma flâmula verde: Raimundo Libório (patrão), Pedro Megalli (voga), Ilmo Moreira (sota-voga), Agostinho Sales (sota-proa) e Heber Monção (proa). (Folha do Norte, 29 de setembro de 1946). A Atlética seguiria em frente existindo outras rápidas menções a ela após 1949, período que ultrapassa os limites deste livro. E do mesmo modo como não foi possível precisar quando a Atlética começou, não se sabe exatamente quando ela desapareceu, muito menos por quê, uma vez que a documentação mais recente encontrada a esse respeito é um livro de termos de posse, iniciado em 1967, e cuja última data registrada é de 25 de agosto de 1970 ficando repentinamente em branco a partir daí (ASSOCIAÇÃO ATLÉTICA DE MEDICINA, 1967). Esperamos que a leitura deste texto possa despertar lembranças nos que de algum modo militaram na Atlética e que eles o enriqueçam com contribuições, a fim de que se possa preencher mais essa lacuna do passado de nossa Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. A Atlética 335 336 20 A Sociedade Acadêmica de Medicina e Cirurgia do Pará 337 338 Detalhe de pintura nas paredes da FMCP. Além do Diretório pelo menos mais uma agremiação dos acadêmicos de medicina surgiu na década de 1930: a Sociedade Acadêmica de Medicina e Cirurgia do Pará –SAMCP. Fundada em 11 de agosto de 1933, tendo como endereço a praça da República, nº 40, sob os “auspícios dos acadêmicos do quarto, quinto e sexto ano [...], destinada a desenvolver os conhecimentos médicos de seus sócios e estabelecer o intercâmbio médico-científico com os demais núcleos congêneres do país...” (FMCP, 1933b)1. Contava com os seguintes fundadores Presidente vice-presidente orador 1º secretário 2º secretário Tesoureiro Bibiliotecário 1º suplente 2º suplente 3º suplente Humberto Franco Mário Ferreira Sila Andrade Arnaldo Prado José Macedo Milton Cordovil Abilio Gonçalves Aluízio Fonseca Fernando Mendes Milton Lobato Esta sociedade realizava apresentação e discussão de trabalhos científicos feitos pelos próprios associados, não tomando parte na realização de eventos festivos (Folha do Norte, 18.02.1934). Sua primeira sessão aconteceu em 23 de setembro de 1933, às 20h30, quando foram apresentados os trabalhos “Consideração sobre um caso de hipertensão” e “Uma família hemofílica” de autoria dos doutorandos Humberto Franco e Ferdinando Santos. Os comentários dos assuntos explanados foram feitos pelos estudantes Scylla Andrade, Arnaldo Prado, Lucival Lobato, Armando Maroja, Fernando Mendes e Leônidas Deane. As discussões foram “...animadas sempre bem conduzidas e nas quaes tomou parte tambem a maioria dos academicos presentes” (Folha do Norte, 23.09.1933). Nota-se que entre os alunos citados, havia, também, componentes do Diretório, o que derruba qualquer teoria de que a SAMCP pudesse ser fruto de uma dissidência do DAM. Na verdade, a SAMCP aparece mais como um órgão de cunho meramente científico, assumindo um caminho paralelo ao do diretório e não antagônico a este. Tal hipótese é reforçada pelas atividades desenvolvidas em conjunto entre as duas instituições, como uma sessão solene realizada em 16 de fevereiro de 1934, em homenagem ao centenário do nascimento do cientista alemão Ernest Haeckel, na qual Leônidas Deane representou a SAMCP e Hermínio Pessoa, Nery Guimarães e Clidenor dos Santos representaram o diretório (Folha do Norte, 10.02.1934). Outros temas foram apresentados em sessões posteriores, como na sessão de 8 de março de 1934, quando “A diferença do poder acidógeno do bacillus bulgaricus e do bacilus acidophilos”, de autoria do quintanista Leônidas Deane, e “Um caso de retenção completa provocado por fimose”, do doutorando José de Sousa Macedo, A Sociedade Acadêmica de Medicina e Cirurgia do Pará 339 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. foram debatidos. A comissão crítica ao primeiro trabalho foi composta por Álvaro Nascimento, Lucival Lobato e Gladstone Deane, e do segundo Jacyntho Moreira Netto, Paulo Bentes de Carvalho e Albino Figueredo Junior, todos estudantes de medicina (Folha do Norte, 03.03.1934). Ainda em 24 de abril daquele ano o quartoanista Emanuel de Castro apresentou “Um caso de piopneumotórax”, cujos comentários ficaram a cargo do doutorando Emydio Pereira, do quintanista Abílio Maranhão Gonsalvez e do quartanista Adalberto Menezes (Folha do Norte, 24.04.1934). Os acadêmicos da FMCP buscavam com a Sociedade uma forma de iniciação científica, além de preencher eventuais lacunas do ensino, tomando contato com assuntos menos comuns. Esta saudável iniciativa infelizmente não duraria muito e logo as referências a respeito da “Sociedade Acadêmica de Medicina e Cirurgia do Pará” desaparecem dos jornais, não sendo possível precisar com exatidão a duração desta agremiação engolida pelo tempo, da qual nem sequer um estatuto foi encontrado. 340 Observar Foto 62: Acadêmicos da turma de 1937 em frente à Faculdade. xxxxxxxxx Obeservar detalhes da fachada antes das grandes reformas. Fonte: Acervo dos autores. NOTA 1 Memorando endereçado ao Conselho Técnico Administrativo em 9 de setembro de 1933. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 21 O Serviço de Verificação de Óbitos 341 342 Detalhe em gesso do teto de uma sala da FMCP. Embora a princípio possa parecer estranho, mas a história da Faculdade de Medicina contempla, também, a existência e a participação de um Serviço de Verificação Óbitos – SVO, atividade de vital importância para o planejamento de adequadas ações na área da saúde, ao fornecer dados relacionados à morbimortalidade de um determinado grupo social. Ainda que inexista atualmente, sendo vez por outra lembrada sua necessidade e reclamada sua “criação”, o SVO figura nos anais da antiga Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Sim, é verdade que já tivemos um SVO no estado do Pará. Sua criação se deu em 1945, no período de interventoria do então coronel Magalhães Barata, e através do Decreto- Lei Nº. 4.745, de 23 de Abril de 1945. Depois de entendimentos entre a Diretoria da Faculdade, o Chefe de Polícia, capitão Moura Carvalho, e o Diretor do Serviço Médico Legal, Dr. José Mariano Cavaleiro de Macêdo, o referido decreto transferia para a Faculdade as atividades pertinentes ao órgão e antes executadas pelo Serviço Médico Legal. O novo Serviço ficaria anexo ao Departamento de Anatomia e Fisiologia Patológicas da Faculdade de Medicina, sob a direção do professor Dr. Jayme Aben-Athar. A íntegra do Decreto, por sua importância histórica, transcrevemos: DECRETO-LEI Nº. 4.745 — DE 23 DE ABRIL DE 1945 Passa o Serviço de Verificação de Óbitos para o Departamento de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, e dá outras providências. O INTERVENTOR FEDERAL: usando da atribuição que lhe confere o artigo 6.°, item V, do decreto-lei n.° 1.202, de 8 de abril de 1939, DECRETA: Art. l.° — O Serviço de Verificação de Óbitos, no Município da Capital, será entregue ao Departamento de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Art. 2.° — Para ocorrer às dêspesas com a realização do serviço a que se refere o artigo anterior, o Govêrno do Estado contribuirá com cinco mil cruzeiros mensais (Cr$ 5.000,00). Art. 3.° — Incumbe ao Serviço de Verificação de Óbitos a determinação da causa-mortis: a) dos indivíduos falecidos sem assistência médica; b) dos indivíduos falecidos com assistência e atestado médico, sempre que o Departamento Estadual de Saúde ou o Serviço MédicoLegal julgar necessário apurar a exatidão do diagnóstico. Art. 4.° — Não poderá o oficial do Registro Civil, nos óbitos sem assistência médica, fornecer guia para enterramento sem que lhe seja apresentado atestado fornecido pelo Serviço de Verificação de Óbitos. Art. 5.° — O Serviço de Verificação de Óbitos fará registrar os atestados, por êle expedidos, nos Cartórios do Registro Civil do Distrito em que se der o óbito, independentemente do pagamento de emolumen- O serviço de verificação de óbitos 343 344 tos, que, todavia, serão cobrados dos interessados, quando estes pedirem certidão de óbito. Art. 6.° — Os atestados de óbitos serão assinados pelos médicos assistentes e obedecerão ao modelo adotado pelo Departamento Estadual de Saúde. § Único — O médico que tiver assistido à última doença não poderá se furtar a passar o atestado de óbito, salvo razões especiais, que apresentará por escrito, ao Serviço de Verificação de Óbitos. Art. 7.° — Nenhuma verificação de óbito de indivíduo falecido sem assistência médica será feita sem apresentação da guia fornecida pela autoridade policial, declarando não se tratar de crime. § Único — Se, apesar dêste documento, houver suspeita de crime, suicidio ou acidente, deverá o Serviço de Verificação de Óbito recusar o atestado de óbito, declarando à autoridade policial os seus motivos, para a necessária perícia médico-legal. Art. 8.° — Ao Serviço Médico-Legal incumbirá, ainda, acompanhar as necropsias do Serviço de Verificação de Óbitos que necessitarem de assistência do médico legista, a juízo dos médicos do Departamento de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Art. 9.° — Quando fôr apresentado para registro atestado de óbito de que conste “causa-mortis’’ mal definida, o oficial do Registro Civil procederá o registro, porém, não expedirá guia de enterramento, devendo comunicar, imediatamente, a ocorrência ao Serviço MédicoLegal, que providenciará o encaminhamento do cadáver, ao Serviço de Verificação de Óbitos, o qual procederá a necessária necropsia. Art. 10.° — O Serviço de Verificação de Óbitos manterá para com o Serviço Médico-Legal um serviço de informações e dados estatísticos, notificando, quinzenalmente, os diagnósticos, remetendo os protocolos das necropsias, diariamente, ao Departamento Estadual de Saúde. Art. 11.° — O Serviço de Verificação de Óbitos será feito sob segredo profissional. Art. 12.º — Ao Serviço de Verificação de Óbitos incumbirá a fiscalização de embarques de cadáveres para fora do Município da Capital. Art. 13.° — O transporte de cadáveres só poderá ser feito sem conservação, ate o prazo de 24 horas, entre o falecimento e o sepultamento, a critério do Serviço de Verificação de Óbitos. § Único — Será exigida a conservação simples do cadáver, quando se trate de sepultamento a ser feito dentro de três (3) dias após o falecimento e embalsamamento, com caixão hermeticamente fechado e selado, se se tratar de prazos maiores. Art. 14.° — Após reconstituição, serão os cadáveres entregues a familia, que tomara providencias para o enterramento, ou, no caso de indigentes e não reclamados, ao Serviço de Verificação de Óbitos, para o mesmo fim. Art. 15.° — As necropsias médico-legais serão realizadas pelos legistas no Instituto de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina, que fornecerá todos os elementos necessários para que se torne possível a realização das referidas perícias. § Único — Havendo necessidade de exame bacteriológico ou histopatológico será o mesmo requisitado ao Departamento de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Art. 16.° — O transporte para o Serviço de Verificação de Óbitos será feito pela Permanência da Central de Policia, mediante guia. Art. 17.° — As instruções necessárias para a execução do Serviço de Verificação de Óbitos serão baixadas pela Diretoria e Conselho Técnico-Administrativo da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Art. 18.° — Será lavrado na Procuradoria Fiscal da Fazenda contrato em devida forma, pelo prazo de cinco (5) anos, prorrogável por igual período, no qual serão previstas as obrigações decorrentes da execução do serviço de verificação de Óbitos, nos termos deste decreto-lei. § Único — Esse contrato será considerado automaticamente extinto, sem estrépito judiciário, no caso de inadimplemento das obrigações contraídas por qualquer das partes. Art. 19.° — Serão passiveis de multa de Cr$ 500,00 a Cr$ 2.000,00 e o dôbro na reincidência, imposta pela sub-secção da Fiscalização da Medicina e Farmácia do Departamento de Saúde Pública, os que infringirem as disposições dêste decreto-lei, quer os proprietários de casa funerária, quer os médicos que assistirem o doente nos seus últimos dias, ou os que assinarem os atestados de óbitos. Aqueles que exerçam função pública estarão sujeitos às penalidades previstas nos decretos-leis ns. 3.902 e 4.151. Art. 20.° — As despêsas referidas no artigo segundo dêste decreto-lei correrão à conta dos recursos financeiros do Estado no exercício vigente, cabendo ao Govêrno a abertura do respectivo crédito especial, mediante o competente estatuto legal. Art. 21.° — Revogam-se as disposições em contrário. O Secretário Geral assim o faça executar. Palácio do Governo do Estado do Pará, 23 de abril de 1945. Cel. JOAQUIM DE MAGALHÃES CARDOSO BARATA, Interventor Federal. Osvaldo da Silva Brandão, Secretário Geral, interino. (“Diário Oficial” n.° 14.937, de 25-4-1945). O Serviço não começou a funcionar de imediato, uma vez que em 16 de junho daquele ano, o Diretor da Faculdade, Dr. Acylino de Leão, encaminha ofício ao Prof. Dr. Jayme Aben-Athar com o seguinte teor: Comunico a V. Excia., para os devidos fins, que em oficio a esta Diretoria sob o nº 1.942, de ontem datado, o sr. Capitão Chefe de Policia, transmitiu-nos as necessarias instruções afim de que seja iniciado o Serviço de Verificação de Obitos, regulado pelo Decreto-lei nº 4.745, de 23 de abril do ano em curso (FMCP, 1945b). De acordo com o relatório das atividades do ano de 1945, encaminhado pelo Chefe do SVO ao Diretor da Faculdade, “o serviço começou a funcionar regularmente a partir de 15 de junho de 1945”, “instalado em dependencia do proprio edificio da Faculdade de Medicina” e contando com “o seguinte corpo de funcionários: um medico chefe (Dr. Jayme Jacyntho Aben-Athar); dois medicos assistentes (Dr. Artur Porto O serviço de verificação de óbitos 345 Marques, Dr. Mario Nazareno Machado Sampaio, Dr. Alfredo Barroso Rebelo (interino); dois auxiliares academicos (José Monteiro Leite, Agostinho Leão de Sales Filho); uma datilografa (Maria Nazarena de Brito), um auxiliar de laboratório (Amintor de Sousa Goudinho), e dois serventes1. O balanço inicial de seu trabalho já figura no Relatório do ano de 1945, onde o professor Aben-Athar menciona a existência do Serviço como fator de importância nas atividades do Departamento de Anatomia Patológica2. O Relatório de atividades da Faculdade do ano de 1946 apresenta o resumo dos trabalhos realizados pelo SVO no ano anterior, com um total de 126 necropsias, detalhadas por mês e discriminando a causa mortis, ressalvando que não incluíam os exames histológicos complementares às necropsias e que haviam sido, também, “avultados” (FMCP, 1947b, p. 57). Digno de registro é que apenas um óbito foi considerado de causa desconhecida. 346 As atividades do SVO foram aumentando gradativamente, como seria de se esperar de um Serviço bem organizado, importante e diretamente atrelado ao curso médico, e que tinha o hospital da Santa Casa com seus indigentes como o grande fornecedor de material de trabalho. Deste modo, o Relatório do ano de 1947 aponta um crescimento do referido Serviço, com a realização de 209 necrópsias, com uma média mensal de 17 necrópsias. Destaque-se que nenhuma referida como de causa desconhecida (FMCP, 1948c, p. 55-57). A Revista do Acadêmico de Medicina, em seu número de fevereiro de 1946, também faz referência à criação do SVO e sobre a importância deste: Ao ser instalado o Serviço de autopsias e verificação de óbitos, anéxo ao Departamento de Anatômia Patológica, da Faculdade de Medicina, nosso Estado acaba de preencher importante lacuna até então existente em seu seio. Criado segundo um acôrdo entre a Faculdade de Medicina e a Saúde Pública, o Serviço acha-se em funcionamento desde julho próximo passado e já conta com um número significante de autopsias. O áto veio atender a imprescindível necessidade, pois, anterioremente, os doentes falecidos sem diagnostico estabelecido, levavam ao seio da terra o segredo do mal que os vitimou. Hoje, lançando mão de meios eficiêntes de investigação, vai-se descobrir a causa da morte, não somente para a simples satisfação da curiosidade humana, mas também por outro motivo muito mais importante, pois, sabemos ser a autopsia a última lição dada ao médico e que muito lhe vai servir para salvar vidas ameaçadas pela mesma causa. Além do mais, informado sobre a causa do obito, nos fornece dados estatísticos exatos, permitindo-nos a execução de um quadro nosológico rigoroso. Com a criação do Serviço, sob a orientação dos drs. Jaime Aben-Athar, catedrático de Anatômia Patológica, e Arthur Marques, assistente da mesma cadeira, nossa Escola muito veio a lucrar. As autopsias, além de fornecerem excelentes aulas, proporcionam abundante material para a Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 organização de importante coleção. De parabens, pois os estudantes da Faculdade de Medicina do Pará e o próprio Estado, pela criação de um Serviço há muito tempo reclamado (Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 52). Como nem tudo são flores, desde o início houve problemas com o Governo do Estado por conta da falta do repasse de verbas previsto no Decreto de criação do SVO, como já acontecia com os outros repasses previstos para a Faculdade. De acordo com o artigo 2º do citado documento de criação do Serviço, o governo estadual contribuiria com cinco mil cruzeiros mensais (Cr$ 5.000,00) para sua manutenção, quantia citada no Relatório de 1948, como “pequena importância” (FMCP, 1949b, p. 4). Por conta deste fato, o Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, após tentar por várias vezes marcar audiência com o governador para tratar do assunto, envia ofício a este, em 27 de fevereiro de 1948, informando a paralisação dos serviços e os motivos que levaram a tal decisão3. No relatório das atividades de 1948, o Diretor diz ter sido obrigado a rescindir o contrato, “apesar do serviço ser feito a contento, com toda a regularidade, por não ter sido possível ao governo cumprir as cláusulas contratuais”. De qualquer modo, o Diretor até alivia a responsabilidade do estado, ao justificar que a falha talvez se devesse “à crise financeira que assoberba o Tesouro”. Lamentando o fato o Diretor prossegue afirmando que, deste modo, o Estado ficava privado de um Serviço importante e prejudicada a estatística de mortalidade, uma vez que a determinação das causas de morte passariam a “repousar em bases inseguras, desviando-se do espírito moderno que só admite a verdade”. Conclui o Dr. Lauro de Magalhães que um serviço tão importante custava aos cofres do Estado “a insignificante importância de sessenta mil cruzeiros (Cr$ 60.000,00) anuais”. (FMCP, 1949b, p. 4-5). Mais adiante, em outra nota sobre o SVO, no mesmo Relatório temos: Serviço de Verificação de Óbitos Este serviço, criado pelo decreto nº 4.745, de 23 de abril de 1945, e que relevantes serviços vinha prestando, foi extinto, por não ter o Govêrno do Estado cumprido as cláusulas estipuladas no contrato. A Faculdade ficou, entretanto, no desembolso de Cr$ 20.000,00 (FMCP, 1949b, p. 41). Ofício interessante, sobre o assunto, foi o enviado pelo secretário da Faculdade, Dr. Olympio da Silveira, em 2 de março de 1948, ao Delegado Federal de Saúde, que transcrevemos: Sr. Delegado Federal de Saúde Comunico-vos, para os devidos fins, que a Faculdade de Medicina suspendeu o Serviço de Verificação de Óbitos, por não ter o governo do Estado do Pará cumprido o Decreto Lei nº 4.745, de 23 de Abril de 1945. É lastimável que o Governo prejudique um estabelecimento como a nossa Escola que, inegavelmente, vem prestando relevantes serviços a Ama- O serviço de verificação de óbitos 347 zônia, além de ser um padrão de gloria do nosso Estado. Ficamos no desembolso de vinte mil cruzeiros, mas temos a satisfação de proclamar que o serviço foi rigorosamente executado pelo professor Jayme Aben-Athar e pagos em dia os funcionarios e todo o material adquirido. Nas administrações Otavio Meira- Alberto Engelhard, Maroja NetoAugusto Serra, a Faculdade foi grandemente auxiliada. Começou a sua odisséa na malfadada administração José Faustino, de triste recordação, quando aqui chegou com o seu ballet. Aguardemos melhores dias, quando o povo tiver nitida compreensão dos seus deveres civicos. Saúdo-vos cordialmente, Dr. Olympio da Silveira (FMCP, 1948b) O SVO teve vida curta, funcionando até 30 de abril de 1948. Preocupado com a situação, o Diretor da Faculdade apela para o Diretor do Serviço Médico Legal, conforme a correspondência de 3 de janeiro de 1947 348 Ilmo. Sr. Dr. Diretor do Serviço Médico Legal Havendo o Diário Oficial do Estado publicado em seu número 15.432, de 29 de dezembro de 1946 o Decreto-lei nº 5.259-A, de 14 de novembro do mesmo ano que fixa o Orçamento do Estado para o ano vigente e não constando do mesmo a dotação para o Serviço de Verificação de Óbitos, criado pelo Decreto-lei nº 4.725, de 23 de abril de 1945 e anexado ao Departamento de Anatomia Patológica desta Faculdade, venho solicitar a V. S. para tomar as necessárias providencias afim de que tal serviço não sofra interrupção, que seria desastrosa não só para o Serviço que V. S. dirige com dedicação e competencia, como também para o Estado que veria assim extinto um órgão da importancia do Serviço de Verificação de Óbitos, de ambito nacional, e que em todas as capitais dos Estados em que existem Faculdades de Medicina a elas são anexos (FMCP, 1947b). Enquanto funcionou o SVO teve sua parcela de colaboração, também, na melhoria da qualidade do ensino prestado pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, sendo citado destacadamente nos Relatórios de atividades desta. De lá pra cá, por várias vezes tem-se ouvido falar na “criação” do SVO, embora, inicialmente tenha sido pensada a sua reativação, conforme trecho de notícia publicada em Folha do Norte, de 31 de Abril de 1954, com o título “Para a Faculdade de Medicina o Serviço de Verificação de Óbitos”. Brevemente será discutido na Assembléia Legislativa o decreto que faz voltar à Faculdade de Medicina e Cirurgia o Serviço de Verificação de Óbitos do município de Belém. [...] Em virtude de não serem atendidos os pedidos de pagamento das cotas mensais, a que estava obrigado o Estado, a Faculdade suspendeu esses serviços por força das circunstancias. Agora volta a solicitar ao governador o reinicio desses serviços, sob novos moldes e novas bases (Folha do Norte, 31.04.1954). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Evidentemente, mesmo sem o SVO as necropsias continuaram a ser realizadas, pelo Serviço de Anatomia e Fisiologia Patológicas da Faculdade, escola criada pelo Prof. Aben-Athar, como parte do aprendizado dos estudantes, muito embora sem a força legal prevista num Serviço de Verificação de Óbitos, ainda que a legislação vigente na ocasião e a existência de cidadãos sem direito à assistência – os indigentes - facilitassem bastante a realização dos exames necroscópicos. Assim foi até a Reforma Universitária, que desestruturando as Faculdades pulverizou o curso de medicina e, consequentemente, os serviços de qualidade ali existentes. NOTAS 1 No Relatório das Atividades da Faculdade do ano de 1945, no que se refere ao SVO consta um servente, o qual é nominado: Antonio de Souza Esteves (FMCP, 1946b, p. 39). 2 “...o Departamento de Anatomia Patológica está completa e satisfatoriamente instalado. Para o ensino desta disciplina dispomos duma excelente sala de autopsias, doutra para aulas teóricas, além de laboratórios convenientemente aparelhado e arquivos. Graças ao Serviço de Verificação de Óbitos, inaugurado este ano, não nos tem faltado material para trabalho” (FMCP, 1946b, p. 53). 3 “Exmº. Sr. Major Luiz Geolás de Moura Carvalho Governador do Estado Tendo ido ao Palacio, por três vezes, a convite de V. Excia., para tratar de assunto concernente ao Serviço de Verificação de Óbitos, que tem sido rigorosamente executado no Departamento de Anatomia Patológica, nos termos do Decreto-Lei nº 4745, de 23/4/1945, e não me tendo V. Excia. recebido, hoje, como de outras vezes, apesar de longa espera, vejo-me forçado a comunicar-lhe que a Congregação e o Conselho Técnico Administrativo resolveram, a contra-gosto, não mais fazer esse Serviço, para não aumentar o nosso prejuizo, que já se eleva a vinte mil cruzeiros, além do não recebimento de quarenta e dois mil cruzeiros do auxilio consignado no Orçamento de 1947. A Faculdade de Medicina, sr. Governador, vive quase que exclusivamente das taxas escolares e, por este motivo, foi que resolvemos, penalisados, tomar esta decisão. Atenciosas saudações. Dr. Lauro de Magalhães” - Livro de Ofícios expedidos em 1948. O serviço de verificação de óbitos 349 350 22 Pirâmides de Borracha e feriados A 2ª Guerra chega ao Palacete Santa Luzia 351 352 Anúncio publicado na Revista do Acadêmico de Medicina, ano 2, número 3, de fevereiro de 1944, pág. 57. A Segunda Guerra Mundial não foi a primeira vez que alunos da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP) foram convocados para frentes de batalha; durante a revolução de 1932, pelo menos dois acadêmicos: Renato Augusto de Moura, que também era comissário de polícia em Belém, e Luis Geolás de Moura Carvalho, que então cursava o primeiro ano, tiveram que entrar com atestado de abono de faltas por terem sido convocados para aquele conflito, além de solicitarem, ainda, a redução da média escolar para nota três (FMCP, 1932a). Em seus ofícios argumentavam: “...como exigir-se aos ex-combatentes após tão grandes sacrifícios – muitos ainda ausentes dos lares – que voltem aos labores escolares e façam provas parciais ou exames sob a exigencia da mesma media do anno passado?” (FMCP, 1932a). É interessante notar que em 1932 houve até maior participação estudantil no lado considerado subversivo e cuja liderança coube ao acadêmico Miguel Lupi Martins. O então Interventor Major Magalhães Barata, em carta destinada ao Diretor de Faculdade, Camilo Salgado, assim relembra o fato: A este moço coube principalmente a organisação e direcção de grave perturbação da ordem publica, aqui, em setembro do anno passado, ao tempo do movimento subversivo paulista, com o qual estava articulada. Antes mesmo que explodisse, nesta cidade, no dia 6 de setembro o motim para derrubar o governo da Interventoria, os estudantes de medicina, alliados a grande numero de gymnasianos e outros alumnos das escolas superiores, dirigidos por Miguel Martins, entre os mais exaltados, promoveram desordens em frente ao edificio desta Escola, sendo eu forçado, no dever que me cabe de manter a ordem, maximo, num momento em que estava o Paiz convulsionado, como aquelle, a ordenar severas medidas á Policia Militar para contel-os em frente e nas immediações dessa casa de ensino, com o intuito de não alastrar-se pela cidade aquella arruaça. Como sabe V. S., somente pela decisiva intervenção da força publica, consegui que não tomasse serias proporções o conflito promovido pelos estudantes de medicina, na praça da Escola, chefiados por Miguel Martins, pouco antes de explodir o motim de 6 e setembro (FMCP, 1933b). Possivelmente foi ali a primeira vez que uma manifestação estudantil bloqueou a Avenida Generalíssimo Deodoro. Em 1944, em plena Segunda Guerra, novamente apenas três acadêmicos de medicina seriam convocados como parte do “Contingente da Amazônia da Força Expedicionária Brasileira”. Foram eles: João Abreu Reis, Raimundo Mendes Libório (Revista do Acadêmico de Medicina, fev. 1946, p. 52) e o doutorando Pedro de Brito Tupinambá (MIRANDA, 1998, p. 148)1. Mesmo com uma representação tão pequena no “front”, um conflito daquelas proporções teria reflexos na Faculdade, podendo-se afirmar que se a Faculdade não foi efetivamente à guerra, esta teve maiores repercussões no Largo de Santa Luzia do que o conflito de 1932. Pirâmides de borracha e feriados - A 2ª Guerra chega ao Palacete Santa Luzia 353 Os relatórios apresentados à congregação mostram que muitos alunos tiveram que prestar serviço militar obrigatório, mesmo que acabassem não indo de fato aos campos de batalha, ficando como contingente de reserva. Hermógenes Pinheiro, catedrático de Anatomia (1ª cadeira), assim se manifestou em 1943: ...tenho a informar que nada de anormal foi ocorrido, notando-se entretanto a pequena frequencia dos alunos ocasionada por motivo de serem obrigados ao serviço militar observando-se o esforço que empregaram para corresponder ao estudo da cadeira que leciono (FMCP, 1944b, p. 36). Acylino de Leão, catedrático de Propedêutica, também foi bastante benevolente com os alunos diante da situação em que se encontravam: “Não tenho nada a sugerir enquanto persistir o estado de guerra. A irregularidade do comparecimento dos alunos, a fadiga física em que se encontram não permitem qualquer exigência” (FMCP, 1944b, p. 44). Nos relatórios encontram-se também frequentes reclamações de professores culpando a guerra pela falta de material didático. O professor Jayme Aben-Athar, que além de catedrático de Anatomia Patológica era na época professor interino de Histologia e Embriologia, descreveria assim a situação: 354 A carência de material por motivo da guerra se fez sentir não só na nossa Faculdade como noutras do País, reduzindo nossa atividade prática, que se limitou para os alunos, à simples observação das preparações microscópicas de nossa coleção (FMCP, 1946b, p. 48). O professor catedrático de anatomia José Alves Dias Junior (2ª cadeira) viveu situação até pior: Restam do programa 36 pontos que não fôram estudados por motivos sabidos dessa Diretoria: as peças que estavam depositadas em cubas especiais apodreceram por falta de renovação de formol. A falta de formol foi motivada tão somente por circunstancias infelizmente decorrentes do momento que atravessamos (FMCP, 1943b, p. 40). Outras disciplinas também referiram dificuldades inerentes ao momento, ainda que de forma meio vaga, como foi o caso da Ginecologia e Obstetrícia do catedrático Cruz Moreira: As aulas foram ministradas no serviço de clínica Ginecológica do Hospital da Santa Casa, enfermaria Santa Ludovina, sob a nossa chefia clínica, e, apesar das dificuldades que se apresentaram inherentes ainda aos efeitos da grande guerra mundial, devo declarar que foi bastante satisfatória a frequencia dos alunos (FMCP, 1946b, p. 60). Para outros professores, como Paulo Cordeiro de Azevedo, de Microbiologia, e Porto de Oliveira, de Psiquiatria, o final da guerra foi mais prejudicial às suas disciplinas do que seu intercurso propriamente dito, conforme transcrição de trechos dos respectivos relatórios: Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Não nos foi possível lecionar os pontos 42 e 60 do atual programa, devido a uma série de fatôres inesperados, como feriados devido ao término da guerra, falta de condução, etc. (FMCP, 1946b, p. 49). Houve alguma irregularidade na frequencia e no desenvolvimento do programa, não só pela deficiência de condução, como pela ocorrência excessiva de feriados e dias tolerados pelo término da guerra mundial (FMCP, 1946b, p. 50). Até colar grau era complicado, conforme cita Clóvis Meira: E pelas restrições que a guerra nos impôs, como foi difícil comemorar condignamente o fim do nosso curso: faltava cerveja, não havia açúcar para a confecção de doces, os tecidos para as roupas elegantes escasseavam, enfim, a turma de 1943, foi marcada pelas dificuldades de um país em guerra (MEIRA, 1986a, p. 45). O fato mais curioso ligado àqueles dias partiu mesmo do Diretório Acadêmico de Medicina (DAM). Durante a Segunda Guerra, com a ocupação da Malásia pelos paises do Eixo, ficou difícil a comercialização da borracha produzida ali, fazendo com que a borracha da Amazônia voltasse a ser valorizada no cenário mundial, uma vez que os países aliados estavam preocupados em acelerar a produção do látex, matéria prima vital na indústria da guerra. O governo Vargas incentivou a vinda para a Amazônia de um grande contingente de nordestinos, a fim de trabalhar nos seringais. Eram os chamados “Soldados da Borracha”, personagens que marcariam este segundo e efêmero ciclo da borracha na região. A juventude também era chamada a colaborar procurando pneus inservíveis e outros artefatos feitos de borracha, já sem uso, sucata de ferro e outros metais. Recolhidos em logradouros públicos, a borracha era separada do metal em montes apelidados de “pirâmides”. Quando atingiam volume considerável os caminhões do exército americano transferiam as “pirâmides” para navios que os conduziam para a reciclagem (MENDONÇA, 2002, p. 208). Neste contexto, assim se manifestaria a Revista do Acadêmico de Medicina, voz oficial do Diretório: Solidário a iniciativa, o Diretório de Medicina logo ofereceu seus prestimos pondo-se a disposição dos poderes públicos dispostos a cooperar com todo o vigor e maior entusiasmo da mocidade, que o integra para o êxito completo do movimento que se iniciava. Na “Caravana da Vitória” expedição de um punhado de jovens universitários a região do Tapajós, zona notável de extração da “hévea”, o Diretório fez-se representar, sendo-lhe atribuída a direção da excursão. Percorrendo seringais, cortando estradas e mantendo contáto direto com os trabalhadores da borracha, os moços universitários trouxeram-lhes sua palavra de fé, incentivando-os ao trabalho, fazendo-os compreender a razão e o móvel de seu esforço; o resultado não se fez esperar, em consequência do animo consciente de colaboração destes nobres combatenPirâmides de borracha e feriados - A 2ª Guerra chega ao Palacete Santa Luzia 355 tes de uma frente oculta no silêncio das estradas juncadas da preciosa gomífera. Havendo as exigências do consumo de guerra depauperado o país da matéria prima, viu-se o govêrno na necessidade de usar um expediente e sanar esta situação daí a grande “Campanha da Borracha”, visando a coleta de artefatos do referido artigo, já sem utilidade e que, após processos especiais, tornam-se susceptíveis de industrialização. Mais uma vêz empenhou-se o Diretório, traduzindo-se sua ação numa atividade férrea da totalidade dos estudantes desta Faculdade que, por todos os recursos a seu alcance percorriam os diversos bairros da cidade, acumulando objétos sem uso requisitados pela campanha. Como fruto de nosso esforço empilhou-se em frente à Faculdade de Medicina uma gigantesca pirâmide, sobre a qual momentos depois, tremulou a bandeira nacional, dando-se por inaugurada a pirâmide “OSWALDO CRUZ”. A convite do prefeito de Mojú, uma comissão de estudantes de nossa Escola, deslocou-se aquele município, levando sua palavra de entusiasmo aos soldados da “hévea” ali sediados. Integrando uma caravana de Universitários, membros desta entidade percorreram a zona bragantina no “Expresso da Vitória”, retornando a capital com mais de uma tonelada de borracha que, somada a já coletada, constitue uma quota que bem expressa o êxito da empresa (Revista do Acadêmico de Medicina, 1944, p. 56). 356 Foto 63: Acadêmicos iniciam o asteamento da bandeira do Brasil em meio a “Pirâmide Oswaldo Cruz”. Ao fundo observa-se o Mercado de Santa Luzia. Fonte: Revista do Acadêmico de Medicina (1944, p. 57). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Foto 64: Acadêmicos diante da “pirâmide” de borracha, ao fundo Mercado de Santa Luzia. A direita o quiosque “Buraco Gelado” tradicional parada para lanches do período, hoje demolido. Fonte: Revista do Acadêmico de Medicina (1944, p. 57). 357 Terminada a guerra e passadas as comemorações, o DAM voltaria às suas lutas habituais, entre as quais a federalização da Faculdade. E outros motivos seriam encontrados pelos professores para justificar o não cumprimento integral dos programas e a baixa frequencia de alguns alunos. A Amazônia sumiria novamente do cenário econômico mundial e o esforço patriótico dos “Soldados da Borracha” ficaria relegado ao esquecimento. Mas o maior o impacto da segunda guerra no ensino médico seria silencioso e permanente, indo muito além do Largo de Santa Luzia, atingindo todas as escolas médicas brasileiras e por que não dizer da América Latina. A doutrina médica ensinada até então era proveniente das escolas européias notadamente da francesa. Os estudantes manuseavam com desenvoltura livros como L. Testut e A. Latarjet clássico da anatomia em quatro volumes, e outros como Brumpt, Dieulafoy, Trousseau e a Presse Médicale. Ter conhecimento pelo menos de francês era básico na vida acadêmica pré-segunda guerra. Após o conflito as coisas nunca mais seriam como antes. Rodolfo Teixeira da Faculdade de Medicina da Bahia explica o que aconteceu: Os azares da segunda grande guerra precipitaram uma crise no prestígio da França, o que, aliás, já se desenhava nos anos que antecederam ao Pirâmides de borracha e feriados - A 2ª Guerra chega ao Palacete Santa Luzia conflito. O espaço aberto pelo retrocesso europeu, e particularmente o francês, foi ocupado pelos Estados Unidos, com todo o peso da sua visão objetiva, das suas técnicas, dos seus livros e periódicos, da sua filosofia de trabalho, da sua cultura (TEIXEIRA, 1999, p. 138). Na Faculdade Nacional de Medicina a história não poderia ser diferente conforme recorda Doyle Maia: Como consequência da guerra e dificuldades de comunicação com a Europa houve alteração que teve importante influência na formação cultural dos futuros médicos. Até o início da guerra praticamente todos os livros adotados no curso eram de autores franceses. [...] Com a impossibilidade de importação de livros franceses, os americanos tomaram conta do mercado. O primeiro grande sucesso foi a edição, em inglês, da Fisiologia de Best and Taylor (MAIA, 1996, p. 196). A substituição seria definitiva, e mesmo após o fim da guerra a França não recuperaria sua posição como formadora de opinião no cenário médico mundial, assim como nenhum outro país europeu. Desapareciam as saudáveis divergências entre as escolas européias, notadamente a francesa e a alemã. 358 Desde então a medicina ensinada no Brasil tornou-se monoglota, sendo sua única “língua oficial” o inglês norte-americano. NOTA 1 Vale citar que na época o serviço de saúde do Exército era “organizado” de uma forma bem diferente da atual: fosse médico, acadêmico, ou qualquer outro curso superior todos eram convocados como soldados. Talvez por ser doutorando Pedro Tupinambá teve um pouco mais de sorte e foi convocado como soldado do serviço de saúde e não soldado de infantaria como costumava ocorrer (N.A). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 23 O Prêmio Raul Leite e outras premiações 359 360 Certificado que conferiu a Medalha de Ouro - Prêmio Raul Leite recebido pelo Dr. José Monteiro Leite. Nas primeiras décadas do século XX, ainda não havia, no Brasil, uma indústria farmacêutica tão poderosa como a atual, quase que totalmente constituída por capital estrangeiro, movimentando grandes volumes financeiros e deixando praticamente sem chances a indústria nacional. Naqueles tempos, a indústria farmacêutica paraense ainda estava fortemente ligada as grandes “pharmácias” de então, as quais manipulavam diversos medicamentos destinados principalmente ao tratamento das principais doenças que atingiam a população, como o impaludismo, a sífilis, e a tuberculose, por exemplo, assim como sintomáticos, purgativos, tônicos revigorantes ditos “neuro-troficos”, anti-anêmicos, e reguladores do ciclo menstrual. Um arsenal terapêutico muito questionável nos dias de hoje, mas era o que se dispunha naquele recuado período, quando muitos preceitos científicos, hoje consagrados, ainda não eram conhecidos. Vale citar como curiosidade: até refrigerantes eram vistos como produtos com qualidades terapêuticas. O Guaraná Soberano, por exemplo, era apontado como favorecedor do restabelecimento, apressando a cura, conforme diziam os anúncios das revistas Pará-Médico da época. Outros refrigerantes hoje já extintos seguiam o mesmo caminho: “Guaraná Simões não é apenas um refrigerante; contém qualidades tônicas e aperitivas, motivo porque os medicos apreciam e o recommendam” (PARÁ-MÉDICO, 1939, p. 25). Dentre os muitos estabelecimentos comerciais que marcaram época com produtos de sua fabricação poderíamos citar a “Pharmácia Cezar Santos”, com produtos como o “Guarafeno”, tido como infalível ao combate a dor, qualquer que fosse (PARÁMÉDICO, 1927), e a “Malarina”, que não só prometia evitar o paludismo, como também agia contra a febre (PARÁ-MÉDICO, 1927); a farmácia “Nacional”, com suas “Pílulas Africanas” outro “específico” anti-malárico, o “Balsamo das dores” indicado para males cardíacos e gastrointestinais, e a “Phosphiokola” tônico regenerador a base de vinho do Porto (PARÁ-MÉDICO, 1927). Havia também a farmácia “Batista Campos” com suas “Pílulas Verdes”, e o “Sanovar (Sana Ovário), o remédio das senhoras”; a Farmacia Beirão”, do “Sedativo Regulador Beirão, das “Pílulas de café Quinado Beirão”, do “Diabeticida” e o famoso revigorante “Guaraná Sórbilis”. Devido ao prestigio social da categoria era comum os médicos emprestarem sua fama a produtos dando seu nome a algumas formulações. Muito mais que o principio ativo o que ditava o sucesso do remédio era o seu sobrenome. Existindo assim produtos como o “Colírio Amarelo Lyra Castro1”, fabricado pela farmácia Cesar Santos (que consistia em 20cc de água destilada, 20g de Sulfato de Zinco Puro, 8g de Cloridrato de Amoníaco e 2g de Açafrão) (MEIRA, 1986b, p. 46), o “Tônico das Parturientes, do Prof. Agostinho Monteiro2” possivelmente a base de complexo B e vinho como eram a maioria dos tônicos para gestantes3; a “Pomada do Dr. Lauro Magalhães”4 a base de mercúrio com fenol, salol, iodofórmio, antipirina e vaselina (MEIRA, 1986a, p. 173) e muitos outros. O Prêmio Raul Leite e outras premiações 361 Em meio a esta bem estruturada indústria local já havia a concorrência dos grandes laboratórios internacionais como a alemã Bayer, para citar apenas um exemplo, e também de laboratórios nacionais. Nesta última categoria, sem dúvida um dos maiores laboratórios farmacêuticos de abrangência nacional era o “Raul Leite S. A.”. Fundado em 19 de novembro de 1921 por Raul Leite e José Gama, com capital inicial de apenas cem contos de réis, e sob a administração de seus fundadores, o laboratório não parou de crescer adquirindo novos sócios e produzindo medicamentos de larga aplicação clínica como a “Intestinofagina”: Polibacterifago polivalente ativo contra os bacilos disentéricos Shiga e Flexner, bacilos tíficos e paratificos A e B, Enteritides Gaertner, Salmonella Pestis Caviae, colibacilos, estafilococos, estreptococos, enterococos. Uso oral. Caixa com 6 ampolas de 2 cc. Indicado em todas as infecções intestinais, e principalmente nas colites, enterites, infecções de causa indeterminada. Notável ação nas diarréias das crianças. É um produto brasileiro dos Laboratórios Raul Leite. (PARÁ-MÉDICO, n. 48, 1939, s.p.) Além de uma série de injeções de endo e exotoxinas, a “novíssima arma terapeutica para a cura das infecções ” todas com o sufixo “tox”. 362 BRONCOTOX - Infecções bronchicas e catharros pulmonares. COLITOX - Colibaciloses em geral. DERMOTOX - Espinhas e infecções cutâneas em geral. ESTREPOX - Erisipela, febre puerperal, septicemias estreptococcicas. GENITOX - Infecções genitaes; gonorheia e suas complicações. PLURITOX - Infecções piógenas em geral. QUINTOX - Coqueluche. RHEUMOTOX - Reumatismo agudo e suas complicações. (PARÁ-MÉDICO, n. 47, 1939, s.p.) Nos anos seguintes a expansão do laboratório progrediu a largos passos havendo filiais em todo o Brasil e até no exterior. Em 1939 suas instalações cobriam uma área de 5.000 metros quadrados, possuindo ainda 20.000 metros quadrados em terrenos, empregando 3.000 pessoas, distribuídas em diversas seções como injetáveis, hormonioterapia, sais e alcalóides, microbiologia, veterinária e etc (Folha do Norte, 30. 01 de 1939). Belém inclusive chegou a ter uma grande filial localizada em prédio próprio situado na rua 15 de novembro, nº 98 e 102, inaugurada com toda pompa e circunstância, com direito à bênção do arcebispo de Belém, Dom Mário de Miranda Vilas-Boas, presença do Interventor Federal do Estado Otávio Meira, e Olympio da Silveira representando a Faculdade de Medicina (Folha do Norte, 30.11 de 1946). Tendo um faro aguçado para propaganda, Raul Leite criou um prêmio a ser ofertado ao aluno que obtivesse o primeiro lugar geral no curso médico em cada uma das Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 faculdades de medicina que existiam no país então, colocando desde cedo o nome de sua marca na cabeça dos jovens médicos e, paralelamente, incentivando o ensino superior e o aprimoramento da cultura médica (PARÁ-MÉDICO, 1939, n. 48, p. 39). O gesto do laboratório foi saudado com muita satisfação pela Faculdade através de ofício ao gerente local Accuso recebida a carta de Vª Sª, de 9 do fluente, communicando a esta Directoria haver o laboratório Raul Leite instituído o premio “Raul Leite” de 1:000$000, em beneficio do alumno que, a juízo da Congregação, tenha se distinguido no respectivo curso. Somente louvores merece a iniciativa desse Laboratório, que deve ser imitada por outros, servindo isso de incentivo aos moços estudiosos da nossa Faculdade. O detentor do premio recebel-o-á na sessão solemne de collação de gráo, em Dezembro próximo, para cuja cerimônia receberá Vª Sª comunicação previa (FMCP, 1935b). O Relatório de atividades de 1935 destaca a instituição da premiação mencionando o nome do aluno distinguido com a honraria: Este anno foi a nossa Faculdade distinguida com a doação de um prêmio annual de 10.000$000 em dinheiro, pelo Laboratório Raul Leite, do Rio de Janeiro, a ser conferido ao doutorando que melhores notas obtenha durante o curso. Este premio, que ficou sendo denominado “Premio Raul Leite”, foi conferido ao doutorando Leônidas de Mello Deane, em sessão solemne de collação de gráo, realisada a 8 de Dezembro (FMCP, 1936c, p. 33). Curiosamente o segundo regimento interno da Faculdade datado de 1924 já previa a distribuição de prêmios escolares: CAPITULO XII Dos prêmios escolares Art. 143 – A Faculdade distribuirá, opportunamente, logo que suas condições o permittam, prêmios escolares aos alunos que houverem concluido o curso de medicina. § Único – Os referidos prêmios serão designados com o nome de notaveis clínicos paraenses já fallecidos, como um preito de homenagem e respeito ao seu saber e á sua intelligencia (FMCP, 1924a, p. 27). Obviamente como as condições não permitiram, quis o destino que a primeira premiação dedicada aos alunos da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, partisse da iniciativa privada, levando o nome de um médico de outro estado. Raul Leite viria a falecer na cidade de Salvador em 23 de janeiro de 1939 durante uma viagem que realizava aos estados do norte e nordeste (PARÁ-MÉDICO, n. 48, 1939, p. 39) causando grande comoção entre a classe médica. Em Belém os funcioná- O Prêmio Raul Leite e outras premiações 363 rios da filial do laboratório mandaram celebrar uma missa de sétimo dia na catedral (Folha do Norte, 28.01.1939) em memória do “grande amigo dos estudantes” (Folha do Norte, 30.01.1939). Mesmo após sua morte o laboratório e, consequentemente, o prêmio continuariam a existir ainda por muitos anos. Além da quantia de 1.000$000 em dinheiro (um conto de réis)5 o prêmio Raul Leite era constituído de uma medalha de ouro com o bastão de Asclépio onde de um lado lia-se: “Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará – Prêmio Raul Leite”, e na outra face estava escrito “A congregação da Faculdade confere este prêmio ao primeiro aluno turma...”6 seguido do nome do agraciado. 364 Foto 65: Medalha Raul Leite – Frente. Fonte: Acervo do Dr. José Monteiro Leite. Foto 66: Medalha Raul Leite – Verso. Fonte: Acervo do Dr. José Monteiro Leite. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Recebiam ainda um belo certificado com os seguintes dizeres: Prêmio Raul Leite. O Dr..............., aluno mais distinto da turma a que concluiu o curso médico em..., no consenso da colenda Congregação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, foi conferida a medalha de ouro – prêmio Raul Leite7. Nem todos os alunos tiveram a felicidade de receber este prêmio no momento da colação de grau. O doutorando Arcelino Bittar foi um dos casos que “ganhou mas não levou”; pelo menos no dia da formatura, o que certamente deve ter gerado algum constrangimento: Este ano, precisamente quarenta e oito horas antes da cerimonia de colação de gráu e depois de já ter sido anunciado o nome do detentor do premio – o talentoso doutorando Arcelino Chicre Miguel Bittar – foi a Diretoria cientificada pelo representante desses Laboratórios, aqui em Belém, que havia sido sustado o referido premio. Isto, porém, nada diminuiu o mérito do candidato. (FMCP, 1941, p. 42). Episódio semelhante aconteceria na formatura do ano de 1944, quando, segundo o Relatório de atividades da Faculdade, o aluno a ser distinguido com a premiação, o graduando Mauricio Queima Coelho de Souza, também nada recebeu8. A disputa pela premiação entre os melhores alunos de cada sala era muitas vezes das mais acirradas, seguindo os seis anos do curso médico até o dia da apuração do resultado. A nota transcrita abaixo demonstra que o clima no dia da entrega às vezes era tenso, com direito a boatos nos bastidores, assunto que acabava nos jornais: Na secretaria da Faculdade de Medicina, perante regular número de alumnos, foi feita hontem á tarde, a verificação dos pontos dos estudantes candidatos ao Premio Raul Leite. Sommados os valores conseguidos durante os annos de todo o curso medico, nas provas parciaes, sahiu victorioso o doutorando Nilson Silva seguido de perto pelo seu colega Luizileno Brasil. A secretaria daquella casa de ensino facultou aos interessados os livros competentes, havendo a maxima lisura e correcção na apuração das medias, sendo assim desfeita a noticia de que se estava planejando uma substituição que iria prejudicar determinado estudante. O dr. Olympio da Silveira, secretario da Faculdade, officiou hontem mesmo á firma Raul Leite communicando que o doutorando Nilson Silva havia conquistado o premio instituido por aquelle benemerito industrial. Só merece applausos a attitude do secretario da Faculdade, mantendo-se rigoroso e estrictamente nos limites de suas funcções, impedindo assim que houvesse uma escolha imparcial e, portanto deshonesta (Folha do Norte, 08.12.1937, p. 5). A lista completa dos agraciados9 com o “Raul Leite” na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará é: O Prêmio Raul Leite e outras premiações 365 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. 366 1935 1936 1937 1938 1939 1940 1941 1942 1943 1944 1945 1946 1947 1948 1949 1950 1951 1952 1953 1954 1955 1956 Leônidas de Mello Deane Hermínio Pessoa Nilson Carvalho da Silva Amilcar Carvalho da Silva Domingos Barbosa da Silva Arcelino Chicre Miguel Bittar10 Herbert Spencer Ferreira Não houve colação de grau neste ano11 Paulo Cordeiro de Azevedo Maurício Queima Coelho de Souza12 Luiz Gonzaga Pires Ramiro Koury José Monteiro Leite Elisa Chermont Roffé Raynéro de Carvalho Maroja Clodoaldo Beckmann Ruy da Silva Ventura Henry Checralla Kayahat xxxxxxx Kayath Haroldo Pinheiro João Paulo do Valle Mendes Maria de Nazaré Petrucceli José de Moraes Rego Almir José de Oliveira Gabriel O impacto do prêmio Raul Leite foi muito grande na Faculdade marcando uma geração inteira, tanto que era comum se ouvir, mesmo muitos anos após o desaparecimento do laboratório, que “fulano foi o Raul Leite de sua turma”, apenas como sinônimo de primeiro lugar no curso. Um exemplo disso é que a partir de 1957, com o fim do laboratório, o prêmio ganhou outro patrocinador passando a se chamar “Chimica Bayer S/A”13, e que teve uma curta sobrevida. Entretanto, os ganhadores deste são até hoje lembrados pelos seus contemporâneos como vencedores do “Raul Leite”. A lista até onde se conhece dos vencedores do prêmio “Chimica Bayer S/A” é a seguinte: 1957 1958 1959 1961 Carlos Rodrigues Cunha Ronaldo de Araújo Margarida Martins Boneff Manoel Wilson Pena Em 1960 o prêmio, que os alunos continuavam chamando de “Raul Leite”, não foi concedido, conforme relatado por Alfredo Oliveira, formado naquele ano14. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Ainda hoje, mesmo sem levar um nome especial, a Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Pará oferece uma placa, ou ao menos um certificado, ao primeiro lugar geral entre os doutorandos. Resquícios do “Raul Leite”. Outros prêmios escolares foram surgindo com o passar dos anos. Em 1945 houve uma tentativa de criar um que levasse o nome de um professor já falecido, mais ou menos conforme previam os estatutos da Faculdade. Ao contrário do que se poderia imaginar, tal honraria não coube a Camilo Salgado, mas sim ao Dr. Othon Chateau15, professor catedrático de Higiene e Medicina Preventiva, que havia falecido 16 de janeiro daquele ano, hoje completamente esquecido. Ressalte-se que a iniciativa também não partiu diretamente da Faculdade, mas sim da solicitação de ex-alunos formados na turma de 1938, que dirigiram uma petição junto ao Conselho Técnico-Administrativo: “...desejando cooperar para o maior engrandecimento do nome dêsse Instituto de Ensino Superior, e por outro lado, querendo homenagear a memoria do inesquecivel, pranteado e emerito Mestre. Dr. Othon Chateau, solicitam a V. V. Excias. a criação de um prêmio – PRÊMIO DR. OTHON CHATEAU – no valôr de dois mil cruzeiros (Cr$ 2.000,00), a ser concedido anualmente, à melhor tese sobre Higiene e Medicina Preventiva. Todas as despêsas decorrentes da criação do referido prêmio correrão por conta dos requerentes” (FMCP, 1946b, p. 31). Os idealizadores e financiadores deste prêmio foram: José da Silveira, Epílogo de Campos, Moacir de Valmont, Eduardo Hermes, Ataualpa Fernadez, Alfredo Barroso Rebello, Vicente Magno de Miranda, Rui Romariz, Joaquim Araújo Filho, Guilherme Macedo, Gervásio de Brito Melo. É possível que nenhum deles tenha gastado um tostão sequer para o pagamento do “Prêmio Othon Chateau” visto que até 1951, último ano em que se obteve notícia dele, nenhum aluno ganhou tal honraria. Continua a não ter concorrentes o prêmio “Othon Chateau”, a ser concedido anualmente, á melhor tése sobre Higiene e Medicina Preventiva (FMCP, 1952, p. 26). Não é de hoje que a área de Medicina Preventiva é negligenciada por boa parte dos acadêmicos, que não ficam estimulados pelo assunto nem pagando... Já na década de 50, com o falecimento de outros professores dos primórdios da Faculdade, foram criados dois prêmios destinados aos melhores trabalhos científicos feitos por acadêmicos, por uma iniciativa do Departamento de Medicina Interna, seguindo uma sugestão do Prof. Affonso Rodrigues Filho. Estes foram: o prêmio Prof. Jayme Aben-Athar, conferido ao melhor trabalho individual, constituído por medalha de ouro e diploma16, e o prêmio Acilino de Leão, conferido ao melhor trabalho em grupo, constituído por diplomas. No entanto não foi encontrada nenhuO Prêmio Raul Leite e outras premiações 367 ma outra menção aos vencedores de tais prêmios, sendo possivelmente mais uma iniciativa que ficou restrita ao papel. Na biografia de Almir Gabriel, ex-aluno e ex-governador do Pará, escrita por Alfredo Oliveira17, existe menção a um outro prêmio chamado “Acilino de Leão”, oferecido pelo governo do Estado, sem nenhuma relação, além do nome, com o prêmio proposto pelo Departamento de Medicina Interna. Este outro “Acilino de Leão” foi criado pelo deputado Amintor Cavalcante, médico e deputado e ex-presidente do DAM. Na lei aprovada pela Assembléia Legislativa constava o seguinte: 368 Lei n. 1266 – de 21 de fevereiro de 1956. Cria o prêmio científico “Acilino de Leão” e dá outras providências. A Assembléia Legislativa do Estado estatui e eu sanciono a seguinte lei: Art. 1º - Fica criado pelo Govêrno do Estado o prêmio “Acilino de Leão”, para o doutorando que conseguir durante o curso médico a maior soma de notas. Art. 2º - O prêmio de que trata o artigo anterior será anual no valor de vinte mil cruzeiros (Cr$ 20.000,00). Art. 3º - A despesa prevista nesta lei correrá a conta dos recursos disponíveis do Estado, no ano de 1955, devendo ser incluída obrigatoriamente nos orçamentos financeiros do nosso Estado, a partir de 1956. Art. 4º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário. Palácio do Govêrno do Estado do Pará, 21 de fevereiro de 1956. Edward Cattete Pinheiro Governador do Estado José Jacynto Aben-Athar Secretário do Estado de Finanças (Jornal do Acadêmico de Medicina, março de 1956). Não se sabe quanto tempo durou este prêmio, nem por que acabou. Soma-se a mais uma iniciativa que não vingou. Se existe um fato repetitivo na história da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará é a descontinuidade das coisas. NOTAS 1 Oftalmologista paraense de destaque que chegou a ser ministro da agricultura durante o Governo Washington Luis. (N.A). 2 Agostinho Monteiro, um dos fundadores da Faculdade de Medicina e professor de Obstetrícia e Medicina Legal. Também um dos fundadores do Conselho Federal de Medicina, tendo exercido a presidência. (N.A). 3 “Disse-me o colega Milton Luna Lobato que o “Tônico” tinha um ótimo paladar, era uma espécie de vinho de Málaga. Quando menino, às escondidas e pelo gargalo, surrupiava boas talagadas de uma de suas irmãs que o tomava habitualmente”. (MEIRA, 1986a, p. 172). 4 Um dos fundadores da Faculdade de Medicina chegando a diretor da mesma, pioneiro na Urologia no Pará, especialidade na qual era professor catedrático. (N.A). 5 No relatório de 1935 o prêmio é referido com o valor de 10:000$000, o que Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 deve tratar-se de erro de impressão (FMCP, 1941, p. 42). 6 Dados da Medalha do Prof. Dr. José Monteiro Leite. 7 Dados do Diploma do Prof. Dr. Paulo Cordeiro de Azevedo. 8 “O premio escolar “Dr. Raul Leite” devia ser conquistado pelo graduando Mauricio Queima Coelho de Souza. Infelizmente, porém, como aconteceu em 1940, não nos foi enviado, talvez por medida de economia. É de ressaltar que o premio foi espontanemente oferecido à Faculdade pelos Laboratórios Raul Leite S.A., para ser conferido ao aluno que melhores notas obtivesse durante o curso.” (FMCP, 1945c, p. 26). 9 As referências para os premiados são: 1935, 1938 até 1951 são os respectivos relatórios apresentados a Congregação; 1936, 1957 até 1959 e 1961 são registros no livro de atas das colações de grau; 1937 - Folha do Norte 8 de dezembro de 1937, pág 5; 1952- informação do Dr. Camilo Viana; 1955 - informação do Dr. Eduardo Demétrio; 1956 - Biografia de Almir Gabriel escrita por Alfredo Oliveira; 1953, 1954 - informações dos respectivos agraciados. 10 Foi indicado para o prêmio, porém não recebeu; pelo menos no dia da colação. De acordo com o Relatório de Atividades da Faculdade referente ao ano de 1941, o prêmio fora sustado pelo Laboratório neste ano e reestabelecido no ano seguinte (FMCP, 1942b, p. 43). Em suas memórias Bittar recorda o desfecho do caso: “Eu havia sido o primeiro mas o prêmio não me foi entregue naquela noite. Oito anos depois, já morando no Rio de Janeiro, o laboratório mandou me entregar o prêmio, diploma e medalha. Reparava uma injustiça. O prêmio me foi entregue no consultório e foi feita uma fotografia que foi publicada na revista do laboratório” (PEREIRA, 2006, p. 39). 11 “Não tivemos este âno alunos matriculados na sexta série, em consequencia da criação do curso complementar, que privou a escola de alunos durante dois ânos, na primeira e segunda séries” (FMCP, 1943b, p. 4). 12 Indicado ao prêmio, não o recebeu, ao menos no dia da colação. 13 Ver capítulo “A colação de grau - cerimonial e formandos até 1950”. 14 Descrevendo a colação ele diz: “Relâmpagos de flashes - registros fotográficos do momento. Cochichos ao pé do ouvido. De quem será o prêmio “Raul Leite”? A face de meu pai irradia ansiedade. Todavia, nenhum prêmio é concedido. Não precisaria estar perto para saber o que papai, homem sincero e objetivo, terá resmungado: - Reacionários... Explicação posterior e desconcertante: o patrocinador do prêmio falira, fechara as portas.” (OLIVEIRA, 1986, p. 190). 15 Médico maranhense, formado na Bahia na mesma turma que Olympio da Silveira, secretário da Faculdade. Há uma curiosa relação entre Othon Chateau e Raul Leite, além de ambos terem sido nomes de prêmios na Faculdade. Quando os laboratórios “Raul Leite” inauguraram sua nova sede em Belém em 29 de novembro de 1946, havia no salão principal do edifício uma foto do Dr. Othon Chateau, como forma de homenagear a classe médica da cidade especialmente os professores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Olympio da Silveira discursaria neste dia em homenagem a Othon Chateau. (Folha do Norte, 30.11.1946, p. 3). (N.A). 16 Revista do Acadêmico de Medicina, ano XXIV, número 14, maio de 1957. O Prêmio Raul Leite e outras premiações 369 17 “Orgulhosa do filho, a professora Palmira o viu receber, além do ‘canudo’ que o declarava médico, os dois prêmios anunciados durante a solenidade realizada no salão nobre da Congregação: ‘Raul Leite’ e ‘Acilino de Leão’. O prêmio ‘Raul Leite’, entregue na ocasião, correspondia ao certificado de melhor aluno da turma. O prêmio ‘Acilino de Leão, em dinheiro, igualmente distinguia o aluno de maiores notas da turma, sendo oferecido pelo governo do Estado. Só foi recebido dias depois, na audiência marcada com Magalhães Barata...” (OLIVEIRA, 2002, p. 55). 370 Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 24 Houve uma vez um barão 371 372 Monograma do Barão de Anajás em cinza solferino sob coroa de barão. DREYFUS (1982, p.238). Nem todos os médicos que fizeram parte do grupo fundador da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, naquele inicio de 1919, tiveram a mesma sorte no que diz respeito à sua permanência na memória das gerações que se sucederam. Se de um lado Camilo Salgado é uma espécie de unanimidade, canonizado pela população, em um culto que aumenta a cada ano, tornando-se difícil, por vezes, separar o homem que existiu de fato, do santo popular surgido com o passar dos anos1, outros tantos não tiveram a mesma sorte. Personagens importantes como Lauro de Magalhães ou Acylino de Leão, do grupo de fundadores da Faculdade, ou pioneiros que entraram pouco após o início de seu funcionamento, como João Prisco dos Santos e Jayme Aben-Athar, continuam sendo lembrados de forma bastante incipiente, seja por seus ex-alunos, ou por estudiosos da história da medicina no Pará, (MEIRA, 1986b) recebendo modestas homenagens públicas como nomes de comendas, clínicas e laboratórios, o que não deixa de ser uma forma de poupar-lhes do esquecimento total. Num outro extremo temos aqueles que foram completamente engolidos pela voragem do tempo, estando inteiramente apagados da consciência coletiva ou reduzidos a pequenos verbetes em alguns ensaios esporádicos. Dentre estes muito injustiçados, talvez o maior de todos seja o primeiro diretor da Faculdade, Antonino Emiliano de Sousa Castro, o Barão de Anajás. Mesmo em obras específicas sobre o assunto, como o “Archivo Nobiliárquico Brasileiro” do Barão de Vasconcelos, ou livros de grande importância regional como os trabalhos de Ricardo Borges (1986), em relação ao Barão encontram-se apenas as datas de seu nascimento, do seu falecimento, que era médico e que vivia em Belém. O fato de o Barão de Anajás ter um filho que possuía o mesmo nome, o Dr. Sousa Castro, que chegou a ser Governador do Pará, e de ambos também serem médicos e fundadores da Faculdade, gerou grande confusão com o passar dos anos, ajudando mais ainda a eclipsar a memória do Barão, pois mesmo historiadores abalizados, por vezes escrevem como se pai e filho fossem a mesma pessoa (FIGUEIREDO, 2006); e em alguns relatos a foto do filho aparece como querendo se referir ao Barão (MEIRA, 1986b, s.p.). Antonino Emiliano de Sousa Castro, o Barão de Anajás, nasceu em 23 de abril de 1847, em Belém do Pará, sendo filho de Antônio Feliciano de Sousa e Maurícia Josepha de Castro da Gama.2 Ainda em Belém fez seus estudos de humanidades – o correspondente ao atual ensino médio -, partindo para o Rio de Janeiro, onde foi cursar medicina na Faculdade de Medicina e Pharmacia do Rio de Janeiro, recebendo o grau no dia 9 janeiro de 1872 (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5)3. Voltando a sua terra natal, tornou-se um dos mais abalizados “operadores-ginecologistas” de então, conseguindo vasta clientela e largo circulo de amizades, pas- Houve uma vez um Barão 373 374 Foto 67: O Barão de Anajás. Fonte: Estado do Pará, 03.08.1929. sando a fazer parte do corpo clínico de todos os hospitais de Belém, dedicando-se notadamente ao Hospital da Ordem Terceira de São Francisco, onde se tornou médico adjunto em 21 de outubro de 1873 (BAENA, 1878, p. 82), chegando a médico efetivo em 28 de junho do ano seguinte (BAENA, 1878, p. 84). Por relevantes serviços prestados, recebeu titulo honroso e teve seu retrato colocado no salão principal daquela instituição4 (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5). Era médico também do Instituto Gentil Bittencourt, função que assumiu ainda no primeiro governo de Lauro Sodré (Estado do Pará, 03.08.1929, p. 1). Abraçando a política, militou nas fileiras do antigo Partido Conservador, sob a chefia do cônego Siqueira Mendes, tornando-se figura política de destaque no Império, sendo eleito deputado provincial por duas vezes. Na primeira legislatura deixou de ocupar o cargo por ter partido para Europa em busca de aprimoramento profissional, permanecendo no Velho Continente por longo tempo. Na segunda legislatura não chegou a desempenhar seu mandato em virtude da proclamação da República (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5). Recebeu, em 6 de outubro de 1887, pela princesa Izabel, o título de comendador da Ordem da Rosa, em atenção aos seus “relevantes serviços prestados a província do Pará, a humanidade e a instrução pública”, referendando o decreto desta condecoração o chefe do ministério, o Barão de Cotegipe (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5). Em 20 de outubro de 1888 recebeu do Imperador Dom Pedro II o título de Barão de Anajás, sendo o respectivo título referendado pelo então ministro José Fernandes da Costa Pereira Junior (Estado do Pará, 03.08.1929, p. 1). Foi ainda nomeado pelo ministro Antônio Ferreira Viana, em 13 de abril de 1889, vice-presidente da província do Pará (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5). Fez parte em Belém da Liga Abolicionista tendo dado liberdade voluntária aos seus escravos antes mesmo da lei Áurea (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5). Também foi nomeado em 11 de fevereiro de 1889 membro de uma comissão composta por seis médicos, um engenheiro e um arquiteto que deveriam decidir qual melhor terreno para construção do novo Hospital da Santa Casa, se na praça da Sé, ou na rua Oliveira Belo onde se localiza até hoje (VIANNA, 1992, p. 324)5. Com o advento da República foi convidado por seu velho amigo e colega, o Dr. Paes de Carvalho, um dos fundadores do Clube Republicano do Pará e um dos primeiros governadores após o novo regime, para ocupar uma cadeira no Senado Federal, o que não aceitou, permanecendo fiel aos seus ideais monárquicos até o fim de sua vida (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 5). Após a morte da Imperatriz, em 28 de dezembro de 1889, o Barão de Anajás e outros monarquistas como Dr. Jaime Pombo Brício, José Brício Gama e Abreu, JoHouve uma vez um Barão 375 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. aquim Vitorino de Souza Cabral, Barão Mata Bacelar, Clementino Lisboa e Antônio Cardoso Danin, liderados pelo conselheiro Tito Franco, exacerbaram-se no pranto de pesar, promovendo aparatosas exéquias, enchendo os jornais de necrológios, enviando noticiário da imprensa e fotografias em álbum a Dom Pedro II no exílio. Tal fato irritou profundamente os republicanos, culminando com acirrados debates nos jornais. O mesmo grupo irritaria os republicanos pelo menos mais uma vez repetin127 1986, p.127 do as mesmas homenagens após a morte do Imperador (BORGES, 1993, 1986 p. 78). Por mais que provocasse os republicanos, seu prestígio como médico - coisa que nunca dependeu de sua simpatia pela monarquia - continuava em alta no novo regime. Pelo menos dois eventos ocorridos no fim daquele século reforçam a afirmativa: No dia 15 de maio de 1896 seu nome figurou entre os 23 médicos convocados por Paes de Carvalho que em conferência se reuniram na casa em que o maestro Carlos Gomes se hospedou em Belém numa tentativa de salvá-lo6. E em 1º de fevereiro de 1898 durante a instalação da Sociedade Médico-Pharmacêutica do Pará, foi empossado vice-presidente daquela que foi a primeira associação médica do estado. Na ocasião agradeceu sua escolha para o cargo e prometeu 376 ...hypothecar o seu concurso dedicado, somente pelo desejo de prestar serviço e não por vaidade de ocupar posições; que na sua idade não lhe pesava no ânimo a ambição de glórias, mesmo das que podem advir dos labores da profissão; desta profissão cujos triumphos não passam muita vez do recôndito das alcovas e no exercicio da qual se formam também heróes, obscuros embora, mais não menos uteis a humanidade (PARÁMÉDICO, 1901, p. 82). No início do século XX, mesmo afastado da política partidária, o Barão conseguiu se envolver em um incidente curioso durante a primeira visita de Oswaldo Cruz a Belém. Em 1905, a política do estado estava dividida entre “lemistas”, os partidários de Antônio Lemos, intendente de Belém no período, e “lauristas”, que apoiavam Lauro Sodré, a oposição. Conforme Amaral Costa: Estava sendo preparada pela classe médica uma expressiva manifestação de apreço, mas em consequência da falta de unanimidade na escolha do presidente da comissão, devido a intromissão da política local, em que os partidários de Lauro Sodré, desejavam para presidir aquela o Barão de Anajás, enquanto os adeptos de Antônino Lemos, tinham preferência pelo médico Lyra Castro (COSTA, 1972, p. 99). Este último uma figura de projeção política que já despontava no período e posteriormente viria a ser ministro da agricultura de Washington Luís (MEIRA, 1986b, p. 45). De fato, cada grupo tentava tirar proveito do evento em causa própria. De um lado queriam os “lemistas” aproveitar a passagem do sanitarista por Belém, para prestar-lhe estrondosa homenagem em desagravo ao episódio do levante liderado Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 por Lauro Sodré, em consequência à promulgação da lei que determinava a obrigatoriedade da vacinação anti-variólica ocorrido em 14 de novembro de 1904, no Rio de Janeiro (FRAIHA, 1972, p. 29). Já Antônio Lemos justificava a exigência de Lyra Castro, pois este era o diretor do Serviço Terrestre Sanitário do Estado (AMARAL, 2006, p. 199). Na outra mão, os “lauristas” queriam evitar qualquer ataque a Lauro Sodré no evento, considerando que a indicação de Lyra Castro era uma imposição de Antônio Lemos, não aceitando tamanha interferência, visto que já haviam convidado previamente o Barão de Anajás para presidência da festa. Alegavam ainda que o mesmo “tem ideias políticas conhecidas, é adversário intransigente das atuais instituições. A sua comparecência a manifestação nada tinha que ver por conseguinte, com o laurismo, e não seria mesmo em caráter político que presidiria esta manifestação, mas simplesmente como membro da classe a que pertence o Sr. Oswaldo Cruz, e só assim condesceria em aceitar, estamos certos, o convite espontâneo que lhe fora feito” (Folha do Norte, 11.11.1905). Ainda que o Barão não estivesse ligado diretamente às correntes políticas de então, seu filho, o Dr. Sousa Castro, que começava a se projetar na política, era definido por Ricardo Borges como um “laurista roxo” (BORGES, 1986, p. 366). Portanto havia uma conotação política na sua indicação, mesmo que os “lauristas” negassem descaradamente (AMARAL, 2006, p. 199). De qualquer modo, a discórdia na escolha do representante da classe médica esquentou a política local, com acalorados editoriais publicados tanto na Província do Pará, jornal de Antônio Lemos, como na Folha do Norte, órgão de tendências “lauristas”. Chegando animosidade a tal ponto que em determinado momento, o Dr. Jayme Brício, que escrevia na Folha do Norte, afirmou em um editorial que os “lemistas” “não passavam de vagabundos e batedores de carteiras” (AMARAL, 2006, p. 199). Ao tomar conhecimento destes fatos, Oswaldo Cruz, que era avesso a manifestações políticas e homenagens oportunistas, partiu antecipadamente de Belém, embarcando para Manaus silenciosamente à noite, deixando as duas correntes políticas se acusando mutuamente da sua partida precoce. Os tempos eram outros no final de 1918, quando os membros da Associação Científica do Pará, instituição que já mantinha a escola de Odontologia, procuraram Camilo Salgado com intuito de fundar uma Faculdade de Medicina no estado, oferecendo a este o cargo de diretor. Camilo aceitou a ideia, mas preferiu permanecer como vice-diretor, indicando para o cargo o Barão de Anajás, que já não era mais um jovem “operador-ginecologista”, e sim um médico septuagenário “especialista em moléstias e operações de olhos, garganta, nariz e bocca”, especialidade adquirida provavelmente após sua permanência no Velho Continente, e que atendia na rua 13 de maio, número 27, das 9 às 11 da manhã, e recebia chamadas a domicílio Houve uma vez um Barão 377 no mesmo período matinal, e das 3 às 5 da tarde, conforme anúncio publicado no jornal (Folha do Norte, 12.02.1919). A indicação do Barão, por Camilo Salgado, além de uma homenagem a um dos decanos da medicina paraense de então, poderia ter outro significado. Uma Faculdade surgia do nada, num estado em plena crise econômica após a queda da borracha, sem nenhum patrimônio material, ou mesmo local próprio, seria de se pensar duas vezes antes de embarcar numa empreitada dessas. Tudo que dispunham era alguns homens e muitas ideias, portanto seria mais do que necessário ligar um empreendimento tão arriscado a nomes que emprestassem credibilidade ao projeto. Da mesma forma que a Associação Científica buscou em Camilo Salgado “seu legítimo prestígio junto a classe médica” (PARÁ-MÉDICO, 1922, p. 360), este buscava os mesmos atributos no Barão, ou seja um nome tradicional e reconhecido que “devia imprimir naqueles jovens idealizadores, essa impressão de estímulo austero, com que a ciência absorve os espíritos privilegiados”. Isto é, “precisava existir fervente a disposição inicial do sacrifício, para o começo da jornada. Foi quando mais necessário se fazia a influência moral daquele ancião de espírito juvenil animando os companheiros moços” (A NOSSA Faculdade de Medicina, 08.01.1963). 378 O Barão seria então mais um nome de peso pra alavancar a iniciativa, atraindo médicos de todas as gerações, coisa que dificilmente ocorreria caso a recém criada instituição fosse encabeçada apenas por médicos com poucos anos de formados, ainda que cheios de boas intenções. É bom lembrar, também, que neste mesmo período, o Dr. Sousa Castro, filho do Barão e também um dos fundadores da Faculdade de Medicina, era deputado no Congresso Federal, colega e companheiro de Camilo Salgado no Partido Republicano Federal, vivia uma fase de ascendência política, que culminaria com sua eleição para Governador do Pará, cargo que ocuparia entre 1º de fevereiro de 1921 e 1º de fevereiro de 1925. Tal fato poderia também ter tido algum peso na sugestão do Barão como diretor. A verdade é que se poderia afirmar que aos 72 anos incompletos o Barão de Anajás havia sido “premiado” com um grande “abacaxi”. Era diretor de uma instituição que surgia em um Estado financeiramente instável, contando apenas com a fé de alguns e a descrença de muitos. Apesar das circunstâncias, o Barão não pode ser considerado um neófito em questões educacionais. Fazia já alguns anos que ele exercia o cargo de fiscal federal junto ao colégio “Paes de Carvalho”, tendo participado da equiparação deste ao colégio “Pedro II”, do Rio de Janeiro (PARÁ. Governador (1917-1921: Lauro Sodré), 1919, p. 120). Seu prestígio talvez tenha auxiliado o empréstimo de duas salas de aula no térreo daquele estabelecimento e de frente para rua João Diogo. Primeira morada da Faculdade de Medicina. De concreto mesmo, tendo como base os poucos documentos que sobreviveram, sabe-se que coube ao Barão, organizar as cadeiras e nomear os professores, tarefa Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. bastante ingrata, visto que passada a empolgação inicial, veio a incerteza quanto à remuneração, e mesmo a falta de vocação para o magistério, sendo grande o número de desistências e abandono por parte dos docentes. Este período inicial seria definido por Clodoaldo Beckmann como “dança das cátedras”7 tamanho foi o entra-e-sai de professores, muitos dos quais sequer chegaram a ministrar uma aula. Um exemplo entre tantos foi o do Dr. Pedro Miranda, renomado oftalmologista de então, nome hoje de larga avenida em Belém, nomeado professor de sua especialidade em 3 de abril de 1919, mas que nunca chegou a assumir a cadeira de fato (FMCP, 1919. Ata de 03.04.1919). Registre-se que além dos professores, os funcionários administrativos também foram perdendo o interesse pelo projeto, cabendo ao Barão substituí-los com habilidade como mostra este memorando enviado ao então tesoureiro da Faculdade. Ilmo Sr. Antônio Barbosa Rodrigues Em 16 de Fevereiro de 1922 Esta directoria attenta aos múltiplos problemas a manutenção e progresso desta Faculdade, tem notado toda a bôa vontade de Vossa Senhoria e todo esforço que vem fazendo em seu favor com sacrifício alias das innumeras preoccupações de sua vida commercial, preoccupações que o privam da assistência neste Instituto, principalmente agora que de um lado a Praça exige todo seu intelligente esforço nas coisas mercantis, emquanto que do outro lado carece a Faculdade do seu Thesoureiro, por causa do movimento de matriculas, exames e et cetera. Não é justo, pois, exigir de vossa senhoria mais do que sua bondade e affecto a esta casa lhe permittem fazer, o que infelizmente não basta; e por isto, esta Directoria resolva nomear outro funccionario para exercer o cargo de Thesoureiro, indo assim ao encontro das difficuldades, por Vossa Senhoria nunca expostas, como era de se esperar de sua proverbial gentileza. Cabe registrar aqui a maior gratidão à V. Sa., da parte da Faculdade de Medicina posto vosso empenho em prol de seu progresso, lamentando que as exigências de vossos muitos afazeres houvessem determinado o afastamento de cargo que tão gentilmente vinha exercendo. Aceite V. Sa. os meus protestos de mais elevada consideração. Saúde e Fraternidade Barão de Anajás (FMCP, 1922a). Dada à carência de material didático, o Barão buscou estabelecer contatos com centros mais adiantados visando solucionar problemas urgentes. Deste modo, enviou diversas correspondências, como para o médico Bruno Lobo, paraense radicado no Rio de Janeiro, professor catedrático de Microbiologia Anatomia Patológica xxxx da Faculdade Nacional de Medicina e Diretor do Museu Nacional, onde solicitou coleções de mineralogia e zoologia necessárias para as aulas de história natural, no que prontamente Houve uma vez um Barão 379 foi atendido recebendo entre 19 e 24 de setembro de 1919 doações do Museu Nacional compostas por 25 tipos de minérios, oriundos alguns do exterior, e diversos espécimes zoológicos entre moluscos, crustáceos, zoofítos, equinodermas e culicídeos (FMCP, 1919b). O Barão recorreria ainda a Bruno Lobo, pelo menos mais uma vez, no ano seguinte, em 4 de maio, solicitando “com a máxima brevidade, telegraphando dizendo-nos o custo, afim de ser imediatamente remetido o devido pagamento” preparados histológicos para as aulas práticas de histologia que se iniciavam. A “máxima brevidade” naquela época ocorreria em 9 de agosto do mesmo ano, quando a Faculdade recebia novamente em nome do Museu Nacional, duas coleções de lâminas, uma de histologia normal e uma de histologia patológica, preparadas pelo próprio Bruno Lobo (FMCP, 1919b). Ainda em 1920, o Diretor da Faculdade consegue do Governo do Estado, através do Diretor Geral da Instrução Pública Primária do Estado, o professor Paulo Maranhão, a doação de trinta e três carteiras, sendo cinco da escola da penitenciária e vinte e oito do grupo escolar “José Veríssimo” (FMCP, 1920). Prosseguindo com suas atividades à frente do novo curso de medicina, em 24 de fevereiro de 1921, o Barão organiza e publica o primeiro estatuto da Faculdade calcado nos moldes da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro.8 380 No dia 7 de março de 1921, o Barão envia correspondência a Camilo Salgado onde diz que: Tendo que retirar-me temporariamente d´este estado com destino ao Rio de Janeiro, tenho o prazer de transmittir durante meu impedimento a vossa excelência a direção d´este Estabelecimento de ensino superior, que assim ficará sobre a sabia orientação e alto descortino de vossa excelência que concorrerá para o progresso e engrandecimento d´esta Instituição (FMCP, 1921). Deste modo, Camilo assumiria pela primeira vez a direção da Faculdade, em uma espécie de ensaio para o que viria depois. Após seu retorno, por volta de junho do mesmo ano, o Barão continuaria na rotina entre nomeação e pedidos de afastamento de professores catedráticos, lentes substitutos, funcionários amanuenses, e secretários. Por intermédio de Antônio Porto de Oliveira, professor catedrático de psiquiatria, conseguiu no início de fevereiro de 1922, a doação de livros científicos e revistas médicas do Dr. J. A. de Magalhães, que fora vice-presidente da Sociedade Médico Cirúrgica do Pará no biênio de 1919-1920, e que “partindo de Belém, houve por bem mimosear e enriquecer nossa biblioteca”. O Barão responde que recebeu a “inestimável offerta [...] com os mais sinceros protestos de consideração e agradecimento” (FMCP, 1922b). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 As coisas pareciam transcorrer normalmente até que em 25 de março de 1922, Camilo Salgado recebeu a seguinte notificação do Barão informando que: Impossibilitado em virtude de encommodos de saúde dos misteres dos cargos que occupo n´essa Faculdade, passo as mãos de V. Exa. por tempo indeterminado o exercício do cargo de Director da mesma Faculdade que actualmente occupo. Saudações. (FMCP, 1922b). O Barão de Anajás assinava ali seu último documento como Diretor da Faculdade de Medicina do Pará. A questão de saúde aludida pelo Barão para largar o cargo não passou de um eufemismo, como pode ser visto em discurso pronunciado à congregação pelo já Diretor Camilo Salgado: ...o que occorreu no estabelecimento que passou a minha direcção em abril do ano passado, quando bem sabeis, vinham de ter logar as occorencias que deram ensejo ao afastamento do nosso venerado e acatado collega Barão de Anajás, que com tanto critério e sabedoria, orientava a Faculdade de Medicina do Pará, desde a sua fundação, de modo a não lhe escassearmos applausos, que se ajustam aos que bem se compenetram da responsabilidade dos seus deveres. Não esquecestes que fui investido das funcções de director justamente na época em que aquelle preclaro clinico paraense, reputando desacertadas e exaggeradas as reprovações em certas cadeiras do curso medico como anatomia descriptiva, microbiologia e physiologia, se demissionava do seu cargo, corrigindo o gesto que tomou a interferências nossas, com a licença em que permanece. A esse tempo a imprensa se occupou dos fatos em allusão, desenvolvendo Estado do Pará conceituado orgão de publicidade, séria campanha aos professores e auctores das reprovações em foco, porque as considerava como perseguição a determinados candidatos. Verifiquei então, porque ainda prosseguiam os exames da época, que os lentes em questão não exhorbitaram nas suas cathedras e que o corte de 60% dos candidatos em exame obedecia a um criterio muito alevantado e moralisador (FMCP, 1923c, p. 9). Buscando o jornal “Estado do Pará”, de 22 de março de 1922, a real motivação para saída do Barão fica completamente esclarecida na nota “Faculdade de Medicina – uma Scena Desagradável”. Ocorreu ante-hontem à tarde na Faculdade de Medicina, uma scena desagradável, entre o director Barão de Anajás, e alguns lentes e estudantes do 2º anno em consequencia das reprovações havidas nos ultimos exames praticos. O director mostrou-se contrariado com a severidade dos lentes e as reclamações dos estudantes, não deixando entretanto da dar razões a estes. Houve uma vez um Barão 381 Os exames realizaram-se naquelle dia, de manhã e á tarde, no hospital da Santa Casa. De manhã responderam á chamada em microbiologia 9 candidatos, passando 3, sendo um bacharel, e dois auxiliares da Profilaxia Rural. Foram examinadores os drs. Prisco dos Santos, Americo Campos e Dagoberto Sousa. Nos exames de histologia e anatomia, 2º anno, em que serviram como examinadores os drs. Teixeira Mendes, Prisco dos Santos e Evaristo Silva nenhum dos candidatos logrou approvação. A tarde fôram chamados mais dois candidatos, nessas ultimas cadeiras, passando um, simplesmente, em histologia. Sciente do ocorrido o Barão de Anajás manifestou francamente sua opinião que nenhum estudante devia ser reprovado, emquanto os examinadores se mantiveram firmes na suas deliberações, tomadas, segundo affirmaram, com absoluta isenção de animo e só baseadas nas provas exhibidas. Em face da attitude do director da Faculdade, os lentes julgando-se desconsiderados, procuraram o vice-director, dr. Camillo Salgado, a quem pediram providencias. (Estado do Pará, 22 de março de 1922). Como Camilo Salgado ficou a favor dos professores, o Barão sentiu sua autoridade desprestigiada e reduzida. Como resultado, no dia 27 de março, às onze horas da manhã, Camilo Salgado assumiu a direção da Faculdade (Estado do Pará, 28 de março de 1922). 382 Em 7 de abril de 1922 foi comunicado que na sessão da congregação do dia quatro, o Dr. Camilo Salgado, “Vice-Diretor em exercício de Diretor” apresentou um voto de louvor ao Barão de Anajás “em consideração aos serviços inestimáveis prestados por vossa excelência, a este futuroso estabelecimento de ensino superior”, que foi lançado em ata depois de aprovado por unanimidade (FMCP, 1922b). Numa forma de homenagem o documento ainda refere o Barão como diretor, mas este havia se desligado definitivamente da Faculdade. Um incidente curioso, que ocorreria pouco depois, confirma a hipótese de que o Barão de Anajás, naquela fase de sua vida, podia tomar decisões intempestivas e precipitadas quando era contrariado. Na tarde de 12 de abril de 1922 o Barão viajava em um bonde da linha Santa Izabel. O condutor Francisco de Assis, como era de rotina, foi cobrar as passagens. Ao chegar a vez do Barão, este disse que possuía “passe”, e conforme a lei vigente o condutor pediu que ele apresentasse seu “passe”. O Barão provavelmente sentiu-se ofendido por não ser reconhecido e respondeu asperamente que o condutor o veria na polícia. Minutos depois, quando o veículo chegou a estação central, Francisco de Assis foi preso “por ordem superior” sendo liberado somente na manhã seguinte. A imprensa, como não poderia ser diferente, criticou duramente o pai do governador que “por um capricho, mandou prender o conductor número 6” (UMA INIQÜIDADE. 14.04.1922). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 O afastamento da Faculdade não marcou de imediato o fim de suas atividades médicas, visto que em 1923 seu nome ainda figurava como médico do Instituto Lauro Sodré (ILS, 1923), porém com o passar dos anos as notícias a seu respeito vão ficando mais escassas e seu nome aparece cada vez mais ligado a fatos alusivos a seu filho mais famoso, que já senador vinha volta e meia até Belém para “...abraçar seu venerado progenitor, o Barão de Anajás, e repousar das fadigas parlamentares” (Revista A Semana, n. 516, 1928). Antonino Emiliano de Souza Castro, o Barão de Anajás, viveria ainda mais seis anos. Até que no dia 2 de agosto de 1929, por volta das 17h25, após cerca de dois meses de convalescença depois de “longos e atrozes padecimentos” (Estado do Pará, 03.08.1929, p. 1), que haviam se agravado nos três últimos dias, falecia em sua residência na travessa Dr. Moraes número 11, o homem que um dia foi definido por seus contemporâneos como “um dos membros mais acatados da classe médica do estado e cavalheiro largamente estimado e relacionado nesta capital” e “...um coração magnanimo, devotado ao próximo, a quem não recusava seus serviços profissionaes humanitariamente, procurando sempre consolar os que soffriam, mitigando-lhes as dores e alliviando os pesares” (Folha do Norte, 03.08.1929, p. 2). Viúvo de D. Merandolina Fernandes de Sousa Castro, a Baronesa do Anajás, vítima de meningite streptocócica em 10 de março de 1910 (Folha do Norte, 10.03.1910), deixava aos 82 anos os seguintes filhos: Dr. Antonino Emiliano de Sousa Castro, Arthur de Sousa Castro, Anna Sousa Castro de Campos, Maria Sousa Castro de Campos, e Joanna Fernandes de Sousa Castro, assim como os seguintes netos Dr. Fernando de Sousa Castro, Olga Sousa Castro Acatauassú Nunes, Conceição de Sousa Castro Cardoso e mais quatro bisnetos. Seu atestado de óbito preenchido pelo Dr. Acatauassú Nunes Filho dá como causa mortis “Artherio sclerose generalizado, colapso cardíaco9”. O colégio Paes de Carvalho em sinal de pesar pelo falecimento do Barão que fora fiscal federal durante muitos anos daquela instituição, suspendeu suas aulas naquele dia (Folha do Norte, 03.08.1929), a Beneficente Portuguesa deixou sua bandeira a meio mastro (Estado do Pará, 04.08.1929, p. 2). A Faculdade de Medicina, que o tinha então como diretor honorário (FMCP, 1924b), mandaria uma coroa de flores “Ao seu distincto fundador” (Estado do Pará, 04.08.1929, p. 2) e em seguida rapidamente esqueceria o homem que um dia emprestou seu prestígio quando aquela instituição mais precisava. Houve uma vez um Barão 383 Foto 68/69: Como era comum entre os titulares do Império Brasileiro, o Barão de Anajás possuía sua prataria em porcelana de Limoges personalizada com o monograma “BA” em cinza e solferino sob coroa de Barão. Apenas estas duas peças de seu acervo foram localizadas em coleções particulares no estado de São Paulo. Fonte: DREYFUS (1982, p. 238). 384 Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 NOTAS 1 Cf. COSTA, Éden Moraes da. Médico de ontem e de hoje: ciência, fé e santidade no culto a Camilo Salgado (1874-1938) em Belém do Pará. Dissertação de mestrado – UFPa, 2003. 2 Atestado de óbito. 3 Estado do Pará do mesmo dia cita a data de sua formatura como sendo 6 de outubro de 1877, trata-se provavelmente de um erro. 4 Acredita-se que o referido retrato não mais existe no hospital. 5 Curiosamente apenas um membro da comissão emitiu um parecer por escrito e uma nova comissão teve que ser formada. 6 O Maestro faleceria em Belém em 16 de setembro de 1896 (REGO, 2004, p. 462). 7 “...iniciou-se uma verdadeira dança das cátedras, com licenças, transferências, substituições e o que mais fosse, materializadas numa pletora de portarias e atos de nomeação para professores interinos, substitutos, regentes, efetivos, catedráticos, o que forçosamente haveria de desacreditar a Faculdade”. (BECKMANN, 2003, p. 250). 8 Estatutos da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. 9 Atestado de óbito. 385 Houve uma vez um Barão 386 25 Camilo Salgado O Berço do Mito 387 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. 388 Matéria da Folha do Norte de 28 abril de 1938 jornal. xxxxx “- Fui a muitos médicos, ninguém descobria o que tinha, cheguei até a ser desenganada por um deles, aí recorri ao Dr. Camilo e ele me curou”. A frase em epígrafe é facilmente ouvida em Belém em qualquer ocasião. Na verdade, não haveria nada de especial nela; em todos os lugares do mundo muitos pacientes com doenças crônicas e raras muitas vezes passam de médico em médico em uma longa e penosa peregrinação, até que um deles consegue estabelecer um diagnóstico preciso, seja por deter mais conhecimentos ou mesmo por pura sorte. O que confere a esta frase, aparentemente banal, um aspecto no mínimo curioso é que o Dr. Camilo em questão encontra-se desde 1938 enterrado no cemitério Santa Izabel, o maior de Belém. O Brasil está cheio de médicos visionários, que em condições adversas na velha República, ajudaram a criar Faculdades de Medicina pelo país. Em Pernambuco, por exemplo, há Octavio de Freitas, que lutou para a criação da Faculdade Medicina do Recife, aguardando pelo menos cinco longos anos entre a fundação e sua efetiva instalação (KELNER, 1985). Em São Paulo está aquele que talvez seja o exemplo mais famoso, Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho, criador da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), merecedor de enorme busto na entrada desta e nome da larga avenida em frente (LACAZ, 1985). Todos estes médicos criadores de escolas gozam ainda hoje de prestígio entre seus pares, mas nenhum deles adquiriu a honraria de “Santo Popular”, que coube exclusivamente a Camilo Salgado, ainda hoje “procurado” por gerações que sequer o conheceram profissionalmente (COSTA, É., 2003). Inicialmente o mito teve a vantagem de preservar a memória de Camilo Salgado em um país acostumado ao esquecimento. Por outro lado, o culto ao “santo” acabou por transformar o homem que realmente existiu em uma lenda tão grande que eclipsou os outros fundadores e consolidadores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Ressalte-se que o Pará já havia tido médicos de grande prestígio político e popular muito antes de Camilo. Ainda no tempo do Império pode ser citado o Dr. José da Gama Malcher, que teve estátua sua esculpida de corpo inteiro na Bélgica, paga com dinheiro obtido via contribuições da população e colocada no Largo das Mercês, atual Praça Visconde do Rio Branco. Entretando nenhum outro médico paraense “...conseguiu dar ao seu nome a aura, o carisma, a verdadeira mística, entre o povo...”, como Camilo Salgado (MEIRA, 1986b, p. 71). Camilo Henriques Salgado Junior1 nasceu em Belém em 22 de maio de 1874 ao meio dia, em uma quinta-feira santa, na casa de número 110 na antiga rua Cruz das Almas, atual Arcipreste Manoel Teodoro, local onde hoje existe o Hospital Guadalupe2. Era filho de Camilo Henrique Salgado3 e de Angélica de Alméria Tanellas Salgado. Teve dois irmãos, Angelina Salgado dos Santos e Carmelino Salgado4, cirurgião dentista, um dos fundadores e por duas vezes diretor da Faculdade de Odontologia5. Camilo Salgado o berço do mito 389 Camilo Salgado recebeu sua instrução primária em casa, com o pai. Posteriormente, após exame de admissão, matriculou-se no antigo Lyceu Paraense, atual colégio Paes de Carvalho (MORELLI, 1991, p. 24). Em 1891 viajou para Salvador matriculando-se na Faculdade de Medicina da Bahia, transferindo-se para o Rio de Janeiro no quarto ano. Concluiu o curso em 1896 na Faculdade de Medicina e Farmácia do Rio de Janeiro, posteriormente Faculdade Nacional de Medicina. Foi interno acadêmico no Hospital São João Batista em Niterói (PANTOJA, 1938, p. 6). Depois de formado regressou a Belém, partindo logo em seguida para Paris em viagem de estudos, para cursos de especialização, tendo freqüentado importantes centros cirúrgicos dentre os quais a Clínica do Prof. Charcot, chegando inclusive a viajar com este de trem de Paris até Versalhes (PANTOJA, 1938, p. 6). 390 De volta a Belém montou seu consultório atendendo às segundas, quartas e sextas, de 3 às 4 horas da tarde no “Gabinete Physioterapico”, localizado no Largo do Palácio, atual Praça Dom Pedro II, e às terças, quintas e sábados de uma às 3 da tarde na “Farmácia Pará” (Folha do Norte, 25.09.1923, p. 5), situada na Avenida Conselheiro, tornando-se sócio desta última. Como todo seu receituário era atendido ali de modo quase totalmente gratuito, os prejuízos não tardariam, e para que ela não fosse a falência, Camilo logo vendeu sua parte da sociedade (MORELLI, 1991, p. 24). Os jornais da época por ocasião de seu falecimento recordariam o fato de que “...as suas pharmacias foram as unicas no mundo que fecharam as portas por falta de lucros, nunca por falta de receituarios” (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1). Esta, aliás, é uma das características mais marcantes e recordadas pelos que conviveram com Camilo Salgado. “Tudo o quanto fazia, ou quase tudo, era de graça. Não cobrava porque o doente era pobre e não cobrava porque era rico, compadre e amigo” (MEIRA, 1986b, p. 71). Camilo atendia a todos sem distinção de classe social, chegando a casebres distantes onde seu automóvel não podia chegar. Os moradores do Jurunas, bairro periférico próximo de onde morava, o tinham como um amigo e o chamavam a qualquer hora que fosse preciso. Sua casa muitas vezes amanhecia cheia de pacientes à frente, que lá iam em busca de um pedido de qualquer natureza ou de uma consulta, no que eram sempre prontamente atendidos (Estado do Pará, 03.03.1938, p. 4). Além da receita era comum sair de seu bolso o valor do remédio e da dieta (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1). Esse lado humanitário aliado a uma boa qualificação profissional lhe rendeu rapidamente larga clientela e conseqüente fama como um dos melhores médicos de Belém. Um trágico incidente ocorrido em 1900 exemplifica isto. Em 11 de abril daquele ano chegava ao Pará a “Companhia Lírica Italiana”. Patrocinada pelo governo do Estado, contava com 107 participantes entre maestros, bailarinos, cantores, músicos e professores. Estrearam com a ópera “Aída” de Verdi, e em 45 dias já haviam apresentado 12 óperas diferentes com sucesso estrondoso. Logo a febre Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 amarela, então endêmica na cidade, começou a ceifar a vida dos membros da companhia praticamente dizimando-a, perdendo inclusive a cantora Maria Cavallini, um dos principais talentos líricos da Europa com apenas 27 anos (NUNES, 1989, p. 12). Os pacientes foram internados no recém inaugurado Hospital Domingos Freire6 e: “...de acordo com o regulamento deste, os doentes deveriam ser atendidos pelo corpo clínico do hospital, mas obedecendo a um princípio humanitário e ético, abriu excessão permitindo que fossem assistidos por médicos contratados pela companhia, os conceituados clínicos Torreão Rocho e Camilo Salgado” (COSTA, C., 1972, p. 71-72). 391 Foto 70: Camilo Salgado. Fonte: Museu da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará – quadro de formatura da turma de 1938. Considerado pela imprensa o melhor cirurgião do Pará (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1), algumas de suas intervenções marcaram época, como a de um paciente vindo de Manaus no qual praticou um enxerto na perna com um fragmento ósseo retirado de um cachorro. O resultado teria sido extraordinário, o caso foi fotografado e circulou o país (MEIRA, 1986, p. 72). Teria sido o primeiro cirurgião brasileiro a realizar no país, em 1924, o “processo de rejuvenescimento”, técnica desenvolvida pelo cirurgião russo Voronoff7 que lhe valeu brilhante carta do então senador Dyonisio Bentes, dirigida ao jornal “Imparcial” do Rio em defesa do seu nome acerca de “...commentarios insensatos que aquelle orgão da imprensa lhe havia feito a proposito dessa intervenção” (PANTOJA, 1938, p. 9). 392 Em uma época em que as intervenções cirúrgicas despertavam muita atenção a ponto das descrições operatórias sairem na imprensa leiga, Camilo não tinha como ficar de fora dos jornais. Deste modo sua fama foi rompendo fronteiras e em 11 de outubro de 1921 o jornal carioca “O Paiz”, diário de repercussão nacional, registrou o sucesso de duas operações por ele realizadas para retirada de volumosos cálculos na bexiga e no terço superior do ureter esquerdo, esta última em um paciente que já tinha tentado tratamento na Europa e no Rio de Janeiro, sem resultado. A notícia destaca a intervenção como brilhante e “...na curta duração de quarenta e cinco minutos, sendo que aos 25 o cálculo já se achava retirado” (SANTOS, 1974, p. 189). Em um período de grandes riscos anestésicos, o tempo operatório era fator da mais alta relevância. Mesmo colunas jornalísticas mais satíricas como “Tucháuas de minha taba” ressaltavam as habilidades, a inteligência seu lado humanitário consolidando a imagem de benemérito cidadão (ver foto 71). Abaixo da Caricatura de “Cotta” há o seguinte poema de Jacques Flores: Com este, “tanglomanglo” corta jaca, / digo que corta volta. Dá o fora.../ O enfermo fica são, e sem demora / se, com o saber, elle a doença ataca. / A enjôo manda dar chá de alfavaca. / Emtanto, se o doente não melhora./ fuma um cigarro e pensa a sós: -Agora / não mais receito. Vou agir a faca.../ Na operação de enxertos é de facto: / tira o bofe de um typo empaludado, e põe outro de boi, de cão ou gato... / Vive sempre glorioso e abençoado, pois rico em sciencia, aos pobres é barato, / prova que só no nome elle é salgado. (Estado do Pará, 15.08.1926, p. 1). Seu diário registrava cerca de 450 operações por ano, sendo muitos de seus pacientes oriundos de outros países sul-americanos ligados ao Pará pela bacia amazônica (PANTOJA, 1938, p. 9). Deste modo, aquele homem considerado ...tímido na vida pública, na profissional foi sempre audaz. Avançado no tempo, retirou esquírulas parietais na dura-mater, removeu cálculos ureterais, laparotomizou para intervir sobre o estômago, os intestinos e os anexos, invadiu a seara cirúrgica de ginecologia e da obstetrícia, pene- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 trou os meandros da pneumologia, realizou engênios de ortopedia e traumatologia, enfim poucos foram os sítios do corpo humano que seu exímio bisturi não perscrutou (SANTOS, 1974, p. 187). 393 Foto 71: Caricatura de Adrelino “Cotta”. Fonte: Estado do Pará, 15.08.1926, p. 1. Camilo fazia parte do corpo clínico dos principais hospitais de Belém, tendo participado do conselho administrativo da Santa Casa chegando a ser seu provedor (MEIRA, 1986b, p. 72). Foi chefe de clínica na Ordem 3ª de São Francisco (Estado do Pará, 03.03.1938, p. 4). e atuou também no Hospital dos Marítimos (PANTOJA, 1938, p. 9). No Hospital Dom Luiz I, da Imperial Sociedade Beneficente Portuguesa do Pará, não seria diferente. Lá ingressou em 1897, logo depois de formado; quatro anos depois era nomeado diretor do corpo clínico; em 1904 recebeu o título de “Sócio Benfeitor”, em 1916 “Sócio Honorário” e finalmente em 1924 “Sócio Benemérito”. Seu prestígio entre a colônia portuguesa era tão grande que em 1931 o novo regimento interno daquele hospital previa que o mandato dos diretores clínicos fosse de três anos, exceto para Camilo que exerceu o cargo até a morte (MEIRA, 1986b, p. 77). Bastante atuante no meio médico e associativo, está entre os fundadores da Sociedade Medico-Pharmaceutica do Pará, em 8 de novembro de 1897, (PARÁ-MÉCamilo Salgado o berço do mito DICO, 1900, p. 22) - posteriormente desaparecida - e fundaria, em 15 de agosto de 1914, a Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, instituição existente até hoje, da qual foi o primeiro presidente (MEIRA, 1986, p. 73). Em 4 de julho do mesmo ano figurou junto com seu irmão Carmelino entre os fundadores da “Escola Livre de Odontologia do Pará” (RIBEIRO, 2005, p. 12). Um homem com tamanho carisma e popularidade não ficaria afastado da vida política, tendo militado durante anos no Partido Republicano Federal, seguindo até o fim seu grande amigo Lauro Sodré, sem, no entanto deixar que sua orientação política interferisse em seu lado médico e humanitário. Em 1912, no tempo em que os ânimos políticos do Pará estavam muito acirrados e a população se dividia entre partidários de Lauro Sodré e defensores de Antônio Lemos, Camilo Salgado, “laurista” convicto, impediu, juntamente com o Dr. Antônio Marçal, o linchamento de Antônio Lemos pela furiosa multidão “laurista” em 30 de agosto (MORELLI, 1991, p. 29). Foi eleito em 1918 para o antigo Senado Estadual e reeleito em 1927, sendo indicado como vice e depois como presidente do Congresso Estadual (Folha do Norte, 06.03.1938). Nesta condição, chegou a assumir interinamente o Governo do Estado, dias antes do governador Eurico Valle assumir o mandato (Estado do Pará, 03.03.1938). 394 Após a Revolução de 1930 retirou-se temporariamente da política, retornando somente como vereador da Câmara Municipal de Belém em 1935, com expressiva votação, onde permaneceu até a extinção desta pelo Estado Novo. Recusou diversos convites para se candidatar a Deputado Federal, pois não desejava afastar-se de sua terra (Estado do Pará, 03.03.1938). Seu nome era tão popular, que seu amigo e professor de psiquiatria da Faculdade, Porto de Oliveira chegou a fundar uma agremiação partidária com seu nome, a “União Cívico-Politica Camilo Salgado” (Revista A Semana, n. 351, 1925). Com esta pequena resenha biográfica, sobram motivos para explicar o porquê da “Associação Cientifica do Pará” ter visto em Camilo Salgado a figura ideal para dirigir a Faculdade de Medicina que estavam por criar. Além de muito popular entre os pacientes das mais diversas classes sociais, Camilo era respeitado e admirado por seus colegas, e como se isso já não bastasse tinha um grande poder político, pertencendo ao partido que dominava a política local no período. Ele aceita o convite, mas declina a indicação para Diretor, preferindo permanecer como Vice, indicando em seu lugar o Barão de Anajás. Mais do que um gesto de humildade, ao indicar o Barão, Camilo agregaria ainda mais credibilidade a um projeto cuja execução para muitos era duvidosa. O Barão de Anajás era um dos decanos da medicina paraense, pertencia a uma outra geração de médicos que haviam construído sua imagem ainda no Império, como Silva Castro, José da Gama Malcher e Jaime Pombo Brício. Como diretor, o Barão Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 passaria a ideia de que médicos de todas as gerações estavam unidos na criação da Faculdade, fazendo com que a iniciativa não fosse vista como uma aventura de novatos. Sem esquecer é claro que o filho do Barão, além de médico, era político de projeção, que logo chegaria ao Governo do Pará8. Em 1921 o Barão viajou por alguns meses e Camilo assumiu interinamente a direção da Faculdade tomando uma medida fundamental: o convênio com a Santa Casa de Misericórdia estabelecendo um vínculo entre as instituições, o que perdura até hoje em certas disciplinas9. Com a saída definitiva do Barão de Anajás ocorrida em fins de março de 1922, Camilo Salgado tornava-se diretor da Faculdade, cargo que só deixaria por sua morte. Assumia ali uma instituição que ainda não estava equiparada às suas congêneres federais e nem sede própria possuía e cujas despesas previstas para aquele ano, tendo em vista a necessidade de compra de equipamentos de laboratório, seriam três vezes superiores a sua arrecadação (Estado do Pará, 08.05.1922). Uma fonte aparentemente inesgotável de aborrecimentos e dor de cabeça, mas isso não o abalou. Visando angariar recursos chegou a organizar festas no “Palace-Theatre”, que foi cedido pela empresa Teixeira Martins e Cia (Estado do Pará, 08.05.1922). Em janeiro de 1923 lançou uma ambiciosa campanha para doação de fundos visando a aquisição de uma sede própria para a Faculdade. Graças ao seu enorme prestígio a campanha foi um sucesso absoluto, praticamente toda a população de Belém aderiu, cada um doando o que podia em uma época que o estado atravessava uma crise econômica. Conseguiu a quantia de 25 contos de réis, mais 20 contos da hipoteca de sua própria casa10. Em dois de junho daquele ano a Faculdade de Medicina do Pará já ostentava sua sede própria, o Palacete Santa Luzia, situado no Largo homônimo, onde funcionava o grupo escolar Wenceslau Braz, estrategicamente em frente a Santa Casa.11 Só isso já bastaria para sua consagração na história daquela instituição, porém Camilo Salgado não parou por aí, sua amizade com Lauro Sodré rendeu alguns benefícios a Faculdade. Inicialmente tentou fazer com que Lauro Sodré conseguisse alguma ajuda financeira junto ao Congresso Nacional para a escola paraense. As tentativas iniciais, conforme conta o próprio Sodré, não foram nada animadoras: Rio, 25- Janeiro 1923 Amigo dr. Camillo Salgado Cumprimentos affectuosos; É com prazer que vejo o esforço com que se dedica á Escola de Medicina, cuja direcção lhe foi confiada. Só applausos e louvores merecem os que assim vão carregando a sua pedra para o edifício das nossas futuras grandezas moraes. Quando essa idea de crear uma Escola de Medicina surgiu ahi, era eu governo, e como tal fiz o que em minhas mãos esteve para ajudal-os no Camilo Salgado o berço do mito 395 ousado commettimento, que a meus olhos parecia uma temeridade, um acto de coragem e ao mesmo tempo de fé e confiança nas energias da nossa gente. Não desacertei de tudo, porque em boa parte os meus prognósticos, oriundos da crença posta no valor moral dos que se punham assim destemerosos em campo, foram confirmados. Ainda bem que assim é, por honra e para benefício de nossa generosa terra. Li como trata de conseguir um edificio para installar dignamente o instituto. Há de ser ouvido o seu appêllo. Nunca foi em vão que palavras como a sua chegaram aos ouvidos dos que fizeram sua a terra em que encontram generoso agasalho. Tive vezes diversas provas disso. Bem viu que não esqueci essa Escola. E de novamente voltei a pedir modesto auxilio de vinte contos ao Congresso Nacional. Uma vez ainda a Câmara dos Deputados não approvou o auxilio, que a Commissão de finanças do Senado reduzira a doze contos. E essa recusa era feita ao ser votado o orçamento em que figuraram auxílios vultuosos ás Escolas de Medicina em outros Estados. Espero que lograremos ser attendidos este anno. Já é tempo de conseguirmos que tambem para nossa terra se voltem os olhares dos que em tão pequena conta parecem ter o Norte, o eterno desamparado do Imperio e tão pouco acarinhado pela República. Abraços affectuosos. Amigo e correligionário (FMCP, 1923c, p. 21). 396 Posteriormente Lauro Sodré conseguiria obter uma pequena subvenção do Governo Federal, o que permitiu que a Faculdade melhorasse seus laboratórios e construísse o pavilhão onde está o Salão Nobre (Folha do Norte, 29.10.1934, p. 1). O mais importante, porém, foi que graças ao prestígio de Lauro Sodré junto ao Barão de Ramiz Galvão12, a Faculdade de Medicina do Pará foi equiparada às escolas oficiais em 4 de setembro de 1924 (Folha do Norte, 29.10.1934, p. 1). Assim, quando a primeira turma de médicos se formou seus diplomas já valiam em todo território nacional13. A equiparação não era um título definitivo, precisava ser periodicamente renovada mediante rigorosa fiscalização realizada pelo Conselho Superior de Ensino da República. Algo que poderia tornar-se um transtorno já estava resolvido ainda antes da equiparação ocorrer, pois o Inspetor Federal junto a Faculdade era o médico Lauro Sodré Filho (FMCP, 1923c, p. 4). Qualquer eventualidade que pudesse ameaçar a equiparação podia ser rediscutida quase que em família. É claro que o rigor no ensino, principalmente naqueles anos iniciais, também foi importante para equiparação transmitindo a ideia de idoneidade da jovem instituição. Camilo Salgado nunca precisou da Faculdade para obter popularidade. Ele era muito maior do que esta; era uma “instituição” dentro daquela escola, e seu trabalho como diretor lhe rendeu uma admiração ainda maior entre os acadêmicos e demais professores que o defenderiam do que fosse. Um fato ocorrido no inicio dos anos vinte, exemplifica a devoção quase cega que surgia em torno do diretor. Era comum naquela época que os médicos compusesMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 sem seus próprios medicamentos14, Camilo possuía seu “Xarope de Óxido de Ferro” para Anemia Ferropriva; o “Elixir Santa Cândida” a base de pedras de humecaá, para diabetes; o “Euforbinol” para combate a Erisipela, todos feitos em sua própria casa com ajuda de sua esposa. Entre estes medicamentos estava o “Elixir de Assacú” para lepra (MORELLI, 1991, p. 25). Revistas leigas da época começaram a divulgar artigos como “Um Scientista que se Notabilisa-As sensacionaes observações do erudito medico paraense dr. Camillo Salgado, sobre a cura da lepra” (Revista A Semana, n. 173, 30.07.1921) mencionando a cura total de um paciente de nove anos de idade às custas de Assacú-rana. O médico Heráclides Cezar de Souza Araújo, chefe do Serviço de Saneamento e Profilaxia Rural no Estado do Pará, responderia nos meios de comunicação de forma muito sutil que, seja de Assacú (Hura crepitans) ou Assacú-rana (Erythrina glauca) ambos extratos vegetais eram ineficazes no tratamento do mal de Hansen, sendo a casca do primeiro extremamente tóxica. Afirmava que os pacientes com hanseníase costumam aparentar melhora com os mais variados processos de tratamento (ARAUJO, 1922, p. 56). Bastou isso para que: Magoados com as referencias que o director do serviço de profilaxia Rural no Pará [...] fez aos serviços de hygiene de Belém, envolvendo, embora de maneira vaga, nos seus conceitos depreciadores a valorosa pessôa do dr. Salgado, os professores e alumnos da Faculdade de Medicina do Pará, confundidos nos mesmos sentimentos de justiça, promoveram expressiva manifestação de desaggravo áquele abalisado cirurgião, brilhantissima figura de nossa classe medica, que equivaleu a reaffirmar, pela sua espontaniedade, quanto valle nesta terra o nome do illustre paraense (Revista A Semana, 14.10.1922). Camilo havia se tornado um ser inatacável, errado era estar contra ele. Foi esta personalidade magnética que conseguiu manter os melhores médicos de Belém exercendo magistério à custa de salários inexpressivos. Certa vez em um dos muitos apertos financeiros, que eram uma constante na Faculdade, conseguiu que professores doassem dinheiro em pleno natal, para que aquela instituição pudesse saldar suas dívidas15. Uma das questões frequentemente levantadas sobre a participação de Camilo Salgado na Faculdade de Medicina é se ele teria ministrado aulas ou apenas ocupado os cargos de Diretor e Vice. Alguns estudos sobre sua vida negam que tenha lecionado (MORELLI, 1991, p. 27) e os ex-alunos mais antigos da Faculdade existentes, ambos formados em 1939 lembram de sua figura somente como Diretor. Sabe-se que nos primórdios foi nomeado para reger a cadeira de Clínica Cirúrgica (1ª cadeira)16 logo tornando-se catedrático desta (FMCP, 1923c, p. 19). Um relatório escrito pelo próprio Camilo comprova que este atuou como professor ao menos nos primeiros dias da Faculdade: Camilo Salgado o berço do mito 397 Procurei emprestar feição eminentemente pratica ao curso de clinica cirúrgica a meu cargo. Dei, no entanto, aulas theoricas e nellas abordei, procurando tornar tudo claro, assumptos ocorridos na clinica, falando das indicações geraes que se devem observar nas contusões, com ou sem ferida, e nas hérnias, frisando principalmente o caminho a seguir nos casos de estrangulamento. Por outro lado, sem alludir a outros pontos, abordei com insistencia a theoria e o tratamento da appendicite, salientando as difficuldades da interpretação dos syndromes dolorosos do coecum, e dos ferimentos por arma de fogo. No vasto campo que é a Santa Casa, dispondo de todos os recursos exigidos pela cirurgia moderna, facil foi aos alumnos do 4º anno o familiarisarem-se com as regras, que os encaminharam, muitas vezes ao diagnostico irreprehensivel. [...] Das 164 operações praticadas em doentes da nossa enfermaria especial, tive a satisfação na quase totalidade dellas de me ver auxiliado por alumnos, quer na anesthesia, em que todos se acham aptos, mesmo a rachidiana, quer nas próprias intervenções (FMCP, 1923c, p. 20). As atividades no bloco cirúrgico eram mesmo muito produtivas, o suficiente para que o doutorando Raymundo Ferro e Silva intitulasse sua “These de doutoramento” de “A cura radical da Hydrocele Vaginal, pelo processo Camillo Salgado” cuja dedicatória dirigida ao criador da técnica é transcrita a seguir: 398 Dedico esta pagina do meu pequeno trabalho ao querido mestre, amigo e eminente cirurgião paraense, bisturi de ouro do norte, - professor Dr. Camillo Salgado, - auctor do processo operatório para a cura radical da hydrocele vaginal, assumpto que escolhi para a dissertação da minha these. Das diversas operações que fui humilde auxiliar do Dr. Camillo Salgado, a esta me dediquei, motivo porque me sinto com coragem de levar esse processo ao conhecimento dos que não o conhecem, pois a modéstia doentia de seu auctor, deixa-o sempre olvidado (FERRO E SILVA, 1926, p. 20). Com o passar dos anos Camilo, que tinha muitas outras atividades paralelas às da Faculdade, foi canalizando sua atuação toda em prol da diretoria, sempre auxiliado por seu inseparável amigo Olimpio da Silveira, sem o qual muitos questionam se aquela instituição teria conseguido firmar-se (MORELLI, 1991, p. 27). De sua atuação como Diretor no olhar dos estudantes, muito bem se expressou o acadêmico Miguel Lupi Martins; Camillo Salgado não tinha a índole de castigar ou mesmo advertir. Suas palavras sempre educadas, valiam mais que as sanções disciplinares. Nas raras vezes em que descia ao térreo do prédio, em missão de reprimenda à turma que avançara o sinal da disciplina e das conveniências, vinha com a fisionomia séria, mais serena. E sempre trazia o coração aberto, largamente aberto, um sorriso sorrateiro para doutrinar, aconselhar, confiar... e ser obedecido. Nunca para punir! Todos nos acercávamos dele, fazendo alas respeitosas, para ouvir daquela alma impar o “Bom dia”, ou “Até amanhã, rapaziada!” (MORELLI, 1991, p. 28). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Era um homem de hábitos sedentários, apreciava, mas não praticava esportes, gostava de degustar bons vinhos portugueses, que lhe eram presenteados pela colônia lusa no Pará e, além disso, fumava muito chegando a três ou quatro carteiras de cigarro por dia. A principio fumava a marca “Aristocratas” trocando depois para “Acadêmicos”, os quais considerava excelentes chegando mesmo a fazer uma declaração gratuita por escrito a pedido dos fabricantes e por estes impressa como propaganda, afirmando que era um produto recomendável para amigos e clientes (MORELLI, 1991, p. 25). Isso em um tempo em que os males do tabaco estavam longe de uma definição. Quando Clóvis Meira o encontra pela primeira vez menciona que tinha cerca de 60 anos, porém aparentava muito mais, com uma fisionomia cansada (MEIRA, 1986b, p. 74). O ano de 1938 mal tinha iniciado e logo marcaria a história da Faculdade. O mês de fevereiro fora duro para Camilo. Em 23 daquele mês ele marcou uma conferência com o então Interventor Federal Deodoro de Mendonça, que havia cortado o auxilio do Estado para manutenção do Curso de Farmácia. Na carta há um pedido curioso, uma prévia do que estava por vir: Amigo Deodoro Preciso muito entender-me com V. a respeito da situação da Faculdade de Medicina, angustiosa e incerta quanto ao curso de pharmacia. Pedia-lhe que marcasse o dia e hora para esse entendimento e preferia que fosse em sua casa, pois me fatiga muito subir as escadas do palacio, o mais breve possivel. Abraços do amigo (FMCP, 1938a) A reunião ocorreu no dia 25 e foi um grande fiasco, de nada adiantaram seus argumentos. O Interventor alegaria a pouca frequencia de alunos naquele curso e a necessidade de cortar gastos; em breve, via decreto, iria extinguir definitivamente o auxílio (FMCP, 1939) Nesta mesma data em carta enviada a um amigo, Camilo confirma que as coisas andavam ruins não apenas dentro da Faculdade: “Não vou passando bem, muitos affazeres e mal das minhas artérias. A semana passada fui atacado de angina do peito. Vou melhor, mas resignado” (PANTOJA, 1938, p. 6). Em 28 de fevereiro de 1938 assinava o seguinte ofício, uma convocação trivial: Ilmo. Snr. Dr. Ausier Bentes Tenho o prazer de convocar o exmo collega, na qualidade se substituto, para reger a cadeira de Clínica Obstétrica, durante a ausencia do respectivo cathedratico, dr. Orlando Lima. Cordiaes saudações (FMCP, 1938a) Camilo Salgado o berço do mito 399 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. Era seu último ato como diretor da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, cargo que ocupou por 16 anos, tempo até hoje não superado pelos seus sucessores. O dia 2 de março maio começava como mais um dia de sua rotina. Mesmo sendo uma quarta-feira de cinzas, ele pela manhã realizou visitas domiciliares a seus pacientes e operou um doente no Hospital da Beneficente Portuguesa17, conversou com seu colega Porto de Oliveira, declarando-se bem disposto18. Almoçou em casa e em seguida voltou a Beneficente Portuguesa para dar assistência a um doente19 e esteve pouco depois das 13 horas em conferência médica com o Dr. Prisco dos Santos20. Em seguida regressou a sua residência na Rua Pariquis, número 517, ...onde chegou sentindo symptomas de uma syncope, a principio breves e depois mais agudos. Quando pessoa de sua família procurava chamar um medico, o dr. Camillo foi acometido de violento colapso, tendo morte fulminante antes que fosse tomada aquella providencia (Estado do Pará, 03.03.1938). Folha do Norte acrescenta mais alguns fatos: 400 Voltou ás 2 horas recolhendo-se em seus aposentos e deitando-se numa rede. Chamou sua senhora e manifestou não se sentir bem, pedindo-lhe que lhe desse uma injeção de morphina. Chamado imediatamente o dr. Porto de Oliveira, este, ao chegar constatou o fallecimento do dr. Salgado que succumbira repentinamente a uma crise de angina no peito (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1). O relógio marcava 14h30 (Estado do Pará, 03.03.1938). A notícia se espalhou rápido, e verdadeira romaria de pessoas de todas as classes sociais compareceu à sua residência para lhe prestar as últimas homenagens. O Interventor Federal interino Deodoro de Mendonça; o prefeito de Belém, Abelardo Condurú; o chefe de polícia Salvador Borborema; o Coronel Dias da Silva, o dr. Antonino de Souza Castro, dr. Lauro Sodré Filho foram algumas das autoridades que se fizeram presentes (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1). O Interventor Federal, José Malcher, declarou que fosse encerrado imediatamente o expediente determinando luto oficial por 3 dias em todas as repartições, concedendo honras de chefe de Estado aos funerais de Camilo Salgado, que seriam pagos às custas do Governo do Pará. A prefeitura estabeleceu ponto facultativo no dia do enterro (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1). A Faculdade de Medicina pretendia prestar uma última homenagem ao seu Diretor realizando o velório no Palacete Santa Luzia, mas a família preferiu que o corpo permanecesse em sua residência. Por disposição escrita de Camilo Salgado não foram aceitas coroas de flores (Folha do Norte, 03.03.1938, p. 1), certa vez ele diria a respeito deste tipo de homenagens: “Há o costume de ostentar ser amigo enviando Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. uma coroa de flores a um morto. Por principio eu abomino, e não aceitaria mesmo uma que fosse, se depois de morto eu pudesse protestar” (SANTOS, 1974, p. 186). O dia 3 de março maio amanheceu nublado, chovendo constantemente, mesmo assim foi enorme o número de pessoas que se aglomerou frente sua casa (A Folha Vespertina, 03.03.1938, p. 1). Os estabelecimentos comerciais do Jurunas e Batista Campos fecharam suas portas em sinal de luto (Estado do Pará, 04.03.1938, p. 1). O cortejo fúnebre saiu às 10 horas e 40 minutos, encabeçado pelo veículo mortuário da Santa Casa, ladeado por uma escolta da cavalaria. O ataúde era transportado por uma carreta dos Bombeiros Municipais puxada por elevado número de acadêmicos de medicina, e acompanhado por uma crescente multidão constrita e silenciosa de todas as classes sociais. Seguiu pela Praça Batista Campos, Travessa São Matheus, atual Padre Eutíquio, avenidas Conselheiro Furtado e Serzedello Corrêa, parando em frente ao cemitério da Soledade21, onde o batalhão da Polícia Militar deu três descargas de tiros, enquanto a banda dos bombeiros executou uma marcha fúnebre. Dali o féretro seguiu pela Avenida Nazaré, Independência, atual Magalhães Barata, travessa José Bonifácio até o Cemitério Santa Izabel onde outra multidão já o aguardava. Mais de 16 pessoas entre autoridades civis, militares, parentes e médicos tocaram nas alças da urna funerária da sua casa para a carreta, da carreta para a capela do cemitério Santa Izabel, e desta para a sepultura (A Folha Vespertina, 03.03.1938, p. 1). Às 12 horas e 13 minutos debaixo de uma chuva torrencial, sem que ninguém abandonasse o cemitério, baixou o caixão a sepultura, ao som dos clarins da Polícia Militar. Falaram à beira do túmulo o doutorando Francisco Luna, interno da Assistência Pública, e os médicos João Botelho e Henrique Esteves, este em nome da classe. Falou também pelos seus colegas condutores de bonde o condutor número 27 da Pará-Eletric. Fez as encomendações do ritual católico o padre Miguel Inácio da paróquia da Trindade. Fizeram-se presentes também representantes da Faculdade de Odontologia, do Conservatório Carlos Gomes, e do clube do Remo, estes capitaneados pelo médico Adriano Guimarães e o bacharelando Issacar Bendrihen (Estado do Pará, 04.03.1938, p. 1). A Folha Vespertina (03.03.1938, p. 3) resumiria: Não é possível inserir os nomes das pessoas que acompanharam os funeraes. O jornal não chegaria. Basta dizer que estiveram presentes todas as auctoridades do Estado, do Municipio, da União, do Arcebispado, da magistratura, etc, bem como representantes de associações de caridade, de classe, civis e commerciaes. Lá estava tambem coroando essa glorificação, o povo, que ninguem convidára e que para lá seguiu como se cumprisse um dever moral sahido do fundo de sua grande alma. Camilo Salgado o berço do mito 401 O Estado do Pará arriscou milhares de pessoas e comparou com as últimas homenagens prestadas a Carlos Gomes, o herói Veiga Cabral, e ao Monsenhor Cunha (Estado do Pará, 04.03.1938, p. 1). Participaram ainda do cortejo 216 automóveis e 10 bondes22. As homenagens se estenderiam para fora do Pará, havendo celebração de missas até no Rio de Janeiro, na igreja de São Francisco de Paula, organizadas pelos paraenses residentes na então Capital Federal (Folha do Norte, 30.03.1938, p. 2). Camilo Salgado deixava uma esposa, Dona Lina Antunes Salgado que lhe dera três filhos, Edgar, Maria Angélica e Arthur (Folha do Norte, 5 de maio de 1938, p. 9). As homenagens não cessariam logo. Diga-se de passagem que, ainda em vida, cerca de um mês antes do seu falecimento, o Governo do Estado criou no bairro do Jurunas um grupo escolar com o seu nome (Estado do Pará, 03.05.1938, p. 4). 402 A prefeitura de Belém também não tardaria em perpetuar sua memória mandando fundir em bronze, nas oficinas Pires da Costa, uma placa com sua efígie esculpida pelo artista maranhense Newton Sá (Folha do Norte, 28.04.1938, p. 1). A placa foi afixada na entrada do prédio da Faculdade em um domingo, no dia 22 de maio de 1938, às 9 da manhã, com direito a discurso do prefeito Abelardo Condurú e do novo diretor da Faculdade, Dr. Lauro de Magalhães em meio a diversas autoridades presentes, professores da Faculdade e parentes do homenageado. A cerimônia marcava a mudança de nome daquele logradouro, que deixava de ser “Largo de Santa Luzia”, passando a ser reconhecido oficialmente como “Praça Camillo Salgado” (Folha do Norte, 23.05.1938, p. 1). Saia uma santa e entrava um médico que a população havia canonizado23. Lauro de Magalhães em seu discurso captou bem o simbolismo daquele ato; Se o tempo, na sua marcha lenta, irremissível e destruidora, tentar desfazer do pensamento das gerações presente e vindouras a lembrança do querido mestre e amigo, estas placas, na sua eternidade de ferro e bronze, onde estão gravado seu nome e esculpido sua expressiva e attrahente effigie, farão certamente reviver e reflorir a recordação de seu grande vulto, de sua inconfundivel personalidade e de seu incomparável espírito (Estado do Pará, 24.05.1938). Um fato curioso chamou atenção dos jornais que cobriram o evento. Tanto do Estado do Pará (24.05.1938): “A ausencia dos moços que freqüentam aquella escola a um acto que lhes tocava de perto, causou geral consternação”, como da Folha do Norte: “Foi notada, com desolação geral, a ausencia de estudantes da Faculdade, que alli deviam estar compartilhando da homenagem ao seu mestre e amigo, que sempre foi de todos os alumnos” (Folha do Norte, 23.05.1938, p. 1). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 As razões deste boicote aparentemente sem motivo permanecem incertas. Desentendimentos com a secretaria da Faculdade, coisa que era comum? Tudo são especulações. A placa permanece até hoje. A própria Faculdade de Medicina, tão logo foi possível, também prestou-lhe uma homenagem inaugurando, em 2 de março de 1942, seu novo Pavilhão de Anatomia, o qual recebeu o nome de “Dr. Camilo Salgado” (FMCP, 1943b). Posteriormente com a mudança da disciplina de Anatomia para o Campus Universitário do Guamá, a homenagem se perdeu. Há ainda uma outra homenagem dentro do Casarão da Generalíssimo, que se não chama tanta atenção como a Placa de Bronze, ao menos não desapareceu do mapa como o Pavilhão de Anatomia. Em janeiro de 1959 a “Sociedade Doutorandos de 1930”24 estava excursionando por Belém. Seus membros realizaram algumas palestras de temas médicos no auditório da Faculdade e trouxeram do Jardim Botânico do Rio de Janeiro uma palmeira imperial, que foi plantada nos jardins do Palacete Santa Luzia. Na cerimônia, o médico paulista Arthur Ribeiro de Sabóia, um dos doutorandos de 30, fez um discurso relembrando Camilo Salgado denominado-o de o Miguel Couto paraense. Em seguida a viúva do homenageado Dona Lina Antunes Salgado auxiliada por Olimpio da Silveira, eterno secretario da Faculdade então já aposentado, fizeram o plantio da árvore símbolo daquela agremiação. Foi fixada uma pequena placa sobreposta a um pedestal de concreto armado com os dizeres: Que a memória do cirurgião prof. Camilo Salgado sirva de exemplo á posteridade: pelo seu saber, pela sua bondade e pelo seu coração. Sociedade Doutorandos de 1930, da Faculdade Nacional de Medicina. Belém - Janeiro de 1959 (Folha do Norte, 16.01.1959, p. 1). A palmeira se foi em 2001, a placa ainda que tímida, persiste ao lado de outra alusiva a Olimpio da Silveira25. Porém a maior homenagem àquele homem acontece até hoje: gerações após sua morte, uma multidão de pessoas freqüenta seu imponente túmulo em mármore negro ofertado pela colônia portuguesa (MORELLI, Belém, 1991, p. 32), depositando flores, rezando para agradecer “milagres” que ele teria realizado ou colocando pequenas placas que aludem graças que teriam sido alcançadas por sua intercessão. Para a maioria dos homens a sepultura marca o final, para Camilo Salgado foi o berço do mito. Camilo Salgado o berço do mito 403 404 Foto 72: Diploma de doutor em medicina de Camilo Salgado. Fonte: Acervo do Dr. Ubirajara Salgado. NOTAS 1 Nos textos mais antigos, anteriores à reforma ortográfica seu nome é grafado como “Camillo”. O “Henriques” por vezes aparece como “Henrique” e o “Junior” é citado somente em uma única fonte, mas será levado em conta por ter sido escrita por seu neto e seu bisneto, Ubirajara e Cláudio Salgado respectivamente. (PARÁ- MÉDICO, 2001, p. 50). 2 Folha do Norte, 28.04.1938, p. 6. e MORELLI, 1991, p. 24. 3 Eminente erudito e professor de pedagogia da antiga Escola Normal, um dos grandes chefes paraenses do Partido Liberal no Brasil Império, tendo feito seu curso normalista na Escola Sorbonne em Paris, financiado pelo Imperador Pedro II. (Folha do Norte, 28.04.1938, p. 6). Faleceria em 1921. (Revista A Semana, 1921). 4 Folha do Norte, 28.04.1938, p. 6. e MORELLI, 1991, p. 22-34. 5 RIBEIRO (2005, p. 14). 6 Localizado no terreno onde hoje está o Hospital Universitário João de Barros Barreto. Demolido em 1964, somente seu portão de ferro ainda permanece. (N.A). 7 O processo Voronoff consistia no enxerto de tecido de ovários de cabras ou primatas transplantados em mulheres pós-menopausadas. Prometia rejuvenescimento ou ao menos melhora dos sintomas do climatério. Tal técnica polêmica foi motivo de acalorados debates no mundo científico da época. (Folha do Norte, 11, 12, e 13 de Setembro de 1924). (N.A). 8 Ver capítulo “Houve uma vez um Barão”. 9 Ver capítulo “O Hospital Escola Primaz – A Santa Casa no contexto da Faculdade”. 10 Hipotecada junto a casa bancária Moreira Gomes, resgatada posteriormente por iniciativa do Interventor Federal Magalhães Barata. (MORELLI, 1991, p. 26). 11 Ver capítulo “Doutores Haja... - A Campanha para aquisição do prédio”. 12 Benjamin Franklin Ramiz Galvão médico, professor, filólogo, biógrafo e orador. Nascido em 1846, ocupou importantes cargos ligados ao ensino tanto no Império como na República, foi entre outras coisas tutor dos netos de Dom Pedro II. Nesta época tinha sido nomeado o primeiro reitor da recém criada Universidade do Brasil, atual UFRJ, cuja Faculdade Nacional de Medicina era considerada a instituição modelo com a qual a Faculdade de Medicina do Pará devia ser equiparada. (N.A). 13 Ver capítulo “Equiparação a Jato”. 14 Ver capítulo “O prêmio Raul Leite e outras Premiações”. 15 “Attendendo o que o prezado collega me expoz na conversa que tivemos sobre a Faculdade, ponho à disposição do amigo, em seu caráter de Director, a importância de 4$500.000. Certo da bôa acolhida e judiciosa aplicação d´esta minha pequena dádiva, cumprimento-o affectuosamente o collega e amigo”. Assinava Acylino de Leão em 24 de dezembro de 1933. Em 22 do mesmo mês Othon Chateau com uma bilhete muito semelhante havia doado a mesma quantia. (FMCP, 1933). 16 Livro de ata de posse, ata de 3 de abril de 1919, documento mais antigo encontrado sobre a Faculdade. 17 Estado do Pará, 3 de março de 1938. Camilo Salgado o berço do mito 405 18 Folha do Norte, 3 de março de 1938, p. 1. Idem. 20 Estado do Pará, 3 de março de 1938. 21 Cemitério já desativado naquela época, mas que era visto como uma espécie de panteão dos heróis paraenses, as exéquias de vultos importantes sempre passavam por lá. (N.A). 22 Folha Vespertina, 3 de março de 1938, p. 3 e Estado do Pará, de 4 de março quantifica 215 automóveis, pouco importa, o número não deixa de ser impressionante, ainda mais quando levamos em conta que naquele tempo os carros estavam longe de serem comuns. 23 Há provas de que ainda que extra oficialmente, o Largo de Santa Luzia já fosse reconhecido como Praça Camilo Salgado, uma nota da segunda página do jornal Estado do Pará de 10 de dezembro de 1926, diz o seguinte “Têm inicio amanhã o novenario e os populares festejos em honra de Santa Luzia, na Praça Dr. Camillo Salgado (antiga Santa Luzia)” e papeis timbrados do Centro Acadêmico de Medicina do Pará, primeira denominação do Diretório, datados de 1932, trazem como endereço a “Praça Dr. Camillo Salgado”. Posteriormente nestes cabeçalhos reaparece a denominação “Largo de Santa Luzia” até a mudança definitiva de 1938. (FMCP, 1932a). 24 Sociedade que congregava todos os médicos formados naquele ano na Faculdade Nacional de Medicina. (Folha do Norte, 16.01.1959, p. 1). 25 Ver capítulo “Um homem para dizer não”. 19 406 Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 26 Olympio um homem para dizer não 407 408 “...tirou seu ‘pince-nez’ e o collocou em cima de uma mesa...” O diretor da escola era muito bom, mas o grupo que o cercava não deixava ele dar muitas ordens porque era bom demais. Diziam que se fosse por conta dele “ninguém paga”, a escola ia para as cucuias. Tinha o secretário da escola Olimpio da Silveira, duro. Estava direito senão a escola ia embora (PARAENSE, 1989). É possível que haja algum exagero na afirmação de Wladimir Lobato Paraense, médico que estudou os primeiros anos de sua graduação em Belém. Mas uma instituição que não podia contar sempre com as esparsas verbas do governo, dependendo exclusivamente do pagamento de mensalidades e taxas pelos seus alunos, precisava de alguém que funcionasse como a contraparte de Camilo Salgado, trazendo equilíbrio financeiro à Faculdade. Este papel era desempenhado com maestria pelo secretário da Faculdade, Dr. Olimpio Cardoso da Silveira1. O “velho Olimpio”, como era conhecido pelos estudantes, nasceu em 10 de maio de 1879 no engenho Payayá em Vila Cristina, atual Cristinápolis, no estado de Sergipe (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65)2. Era filho de José Rodrigues da Silveira e Maria dos Anjos Cardoso da Silveira (MEIRA, S., 1979, p. 173). Alfabetizado por sua mãe (MEIRA, C., 1986, p. 103), aos dez anos de idade seguiu para a Bahia, onde fez os cursos primário e secundário, convivendo com futuros médicos como Clementino Fraga (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65). Concluído o ensino médio matriculou-se na Faculdade de Medicina da Bahia, diplomando-se inicialmente em farmácia e depois em medicina, em 16 de dezembro de 1905, obtendo o grau de doutor após defesa de tese intitulada “Da filaria sanguinis homini” (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65)3. Terminado o curso e antevendo um mercado saturado e competitivo em Salvador, optou por exercer a medicina em outro centro que apresentasse oportunidades mais promissoras. Alguns colegas de sua sala como Enjolras Vampré4 e Ovídio Pires de Campos5 optaram por São Paulo, onde se tornaram notáveis professores na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Olimpio seguiu o caminho do norte, escolhendo Belém, que então vivia o apogeu do ciclo da borracha (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65); assim também seu colega de sala e padrinho de seu primeiro filho, o maranhense Othon Chateau (REBELLO, 1968), que posteriormente tornar-se-ia professor catedrático de Higiene e Medicina Preventiva na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Chegou a Belém em 29 de julho de 1906 (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65), viajando no vapor “Alagoas”, o mesmo que levou Dom Pedro II ao exílio (Folha do Norte, 03.08.1968). Com apenas cem mil réis seus no bolso, mais um conto de réis emprestado de um cunhado, quantia que logo devolveu intacta, estabeleceu-se no “Hotel América”, localizada na esquina da rua João Alfredo com o Largo do Palácio passando a atender na “Farmácia do Povo”, situada no térreo daquele hotel (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65). Olympio - um homem para dizer não 409 410 Foto 73: Olympio da Silveira. Fonte: Foto do quadro de formatura da turma de 1938, Museu da Sociedade Médico-Cirurgica do Pará. Consta que seu primeiro cliente, no segundo dia após sua chegada, foi um imigrante (REBELLO, 1968) com febre amarela. Após o diagnóstico e tratamento bem sucedido aquela figura alta e magra e com um indefectível chapéu tornou-se conhecido entre os imigrantes que moravam nas cercanias do Largo da Pólvora, atual praça da República, o que lhe garantiu boa clientela (REBELLO, 1968)6. Foi por trinta dias médico do Esquadrão de Cavalaria da Brigada Militar do Estado deixando o cargo por recusar-se a cumprir determinação do governador Augusto Montenegro para não fornecer atestado de incapacidade física a um cabo que apresentava grave lesão cardíaca (Folha do Norte, 03.08.1968). Ingressou como médico da antiga companhia de inglesa de navegação “The Amazon River Steam Navigation Company”, viajando pelos rios da região (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65) durante quinze anos atingindo os mais remotos seringais, onde conheceu de perto não só as mazelas do homem amazônico como também sua futura esposa Violante Alvarez da Silveira, com quem se casou em 4 de dezembro de 1915 na capela do seringal de seu sogro no Alto Purus (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Em 1919, criada a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP), Olimpio não figurou entre os fundadores. Naqueles primeiros dias o cargo de secretário foi ocupado por Hermógenes Pinheiro, que também acumulava a função de professor de Anatomia Descritiva, 1ª parte. Talvez por esta acumulação de cargos, Hermógenes Pinheiro pediu sua exoneração do cargo de Secretário em 27 de abril de 1920 (FMCP, [19--]). Assumiria o cargo o Dr. Francisco da Silva Pinheiro, que teve vida efêmera como secretário, sendo exonerado em 19 de julho de 1920, voltando Hermógenes Pinheiro mais uma vez para esta função (FMCP, [19--]). Mesmo assinando muitos documentos Hermógenes Pinheiro não possuía grande disponibilidade para o cargo, visto que o primeiro estatuto da FMCP é assinado pelo secretário-auxiliar de então, Matheus Lydio Pereira de Souza (FMCP, [19--]). Em 17 de junho de 1921, nomeado para o Serviço de Profilaxia Rural e alegando falta de tempo disponível para exercer suas funções, Hermógenes Pinheiro pede novamente exoneração por tempo indeterminado, desta vez tanto do cargo de secretário como do de professor (FMCP, 1921). Retornaria posteriormente apenas como professor. Assume interinamente o cargo de secretário, em 18 de agosto de 1921, o Dr. João Evaristo Silva, dele se afastando apenas em 24 de janeiro de 1924 por ser lente catedrático de Histologia normal (FMCP, [19--]). A justificativa não explica completamente seu afastamento quando se leva em conta que fora nomeado para o cargo de professor de clínica neurológica desde a fundação da Faculdade, assumindo interinamente a cadeira de Histologia normal em 3 de fevereiro de 1921 (FMCP, [1950]), tornando-se catedrático desta em 26 de janeiro de 1923 (FMCP, [1950]). É provável que durante o período em que exerceu o cargo de secretário, João Evaristo Silva nunca tenha conseguido dedicar-se plenamente ao posto, haja vista que quem assina a maior parte dos documentos relativos à secretaria no período é o secretário-auxiliar, cargo que foi ocupado pelo Sr. Theodoro Maria de Souza Aranha em 2 de março de 1922. Funcionário este que havia sido bibliotecário da Faculdade e então acumulava o cargo de secretário amanuense. Neste entra e sai Olimpio da Silveira assume o cargo de secretário em 24 de janeiro de 1924 (FMCP, [19--])7, levado por seu amigo Renato Chaves (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65), então professor daquele estabelecimento8. A faculdade já possuía o Palacete Santa Luzia, que passava por adaptações, seguindo o curso ainda nas dependências do colégio Paes de Carvalho. Olimpio encontrou uma instituição que dava ainda passos bastante trôpegos (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65) com todo seu arquivo depositado improvisadamente no fundo de uma caixa de cervejas (Folha do Norte, 03.08.1968). As dificuldades eram muitas, mas nada que fizesse desistir aquele homem alto, magro, de anguloso Olympio - um homem para dizer não 411 nariz adunco, zigomas salientes, mãos e pés grandes, e timbre de voz personalíssimo (MEIRA, 1986b, p. 107). Pelo contrário, nas próximas três décadas faria da Faculdade “o centro de gravitação de sua vida” (MEIRA, 1986b, p. 106). Estudou a legislação do ensino, dominando-a com profundidade (REBELLO, 1968); organizou a secretaria racionalizando seus recursos, promovendo um equilíbrio entre receita e despesa, preparando as condições indispensáveis para o reconhecimento oficial da Faculdade, isto é, sua equiparação, de modo que os primeiros formandos tivessem seu diploma reconhecido no resto do país (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65). 412 Equiparada a Faculdade em 4 de setembro de 1924, o trabalho seguiria em frente, fazendo-se necessário a ampliação do espaço físico desta. Mesmo com a escassez de recursos Olimpio economizava “cada vintém” (A Província do Pará, 01.11.1968), conseguindo assim que se iniciassem as ampliações. Logo seria erguido um pavilhão destinado à Histologia e Parasitologia, seguido de um imponente Salão Nobre, para reunião da Congregação dos Professores. Pouco depois, seria a vez do Instituto de Anatomia; em seguida o salão da Diretoria, amplo e imponente com piso de madeiras paraenses, hoje inteiramente desaparecido, e a Biblioteca. Posteriormente o Pavilhão “Lauro de Magalhães”, dotado no andar superior de um auditório que durante muitos anos foi o único existente em Belém, e no térreo duas salas de aulas e os laboratórios de Fisiologia e de Química Fisiológica (A Província do Pará, 01.11.1968). Olimpio iniciou ainda as obras do que seria o Instituto de Higiene, prédio que acabaria recebendo o seu nome (MEIRA, 1986b, p. 107). De fato, os diretores que trabalharam com Olimpio da Silveira sempre reconheceram sua dedicação e empenho. Camilo Salgado assim diria em 1935: Repito que não mais me foi possível fazer em face das difficuldades economicas que se me antolhavam; não teria todavia, feito nem o pouco que fiz, se não fosse a cooperação de todos, notadamente as dos que me ajudaram mais de perto. Auxiliares dedicados ao mesmo problema, impulsionados pelo mesmo espírito de dedicação a esta Casa, como verbis gratia o snr. Dr. Secretário, antigo luctador nas luctas que hemos batalhado para o prestígio moral e material de nossa Faculdade...” (FMCP, 1936c, p. 6). Na gestão de Lauro de Magalhães, não seria diferente: É de justiça desde já associar a construção do Pavilhão Anatomico o nome do nosso ilustre e digno secretário dr. Olimpio da Silveira, que além de inestimáveis serviços que á Faculdade tem prestado, como funcionário honesto, incansavel e imprescindivel, tem se dedicado ás obras, dirigindo-as, fiscalisando-as e administrando-as com os carinhos e cuidados que dispensaria na construção do seu lar (FMCP, 1942b, p. 5). Entretanto nem tudo eram elogios. Como relata Clóvis Meira, a figura de Olimpio da Silveira era vista com pouca simpatia por muitos alunos: Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Sendo o Secretário da Faculdade, com espírito de liderança, era natural que os interesses dos estudantes, principalmente os financeiros, se chocassem com as necessidades de um estabelecimento de ensino que vivia dos alunos, sendo ele o pára-raios de todas as disputas. As decisões podiam ser da Congregação, do Conselho Técnico e Administrativo ou do Diretor, mas caso desagradassem à estudantada, a culpa era sempre do velho Olympio. Posso falar [...] porque quando estudante sempre participei ativamente dos movimentos universitários, algum tempo como Presidente do Diretório Acadêmico, o que obrigava a contatos permanente com a secretaria e os órgãos de direção da Faculdade, em acaloradas disputas (MEIRA, 1986b, p. 107). Somava-se a isso seu temperamento sério e suas atitudes comedidas, lutando sempre pelo que considerava certo para a escola, atingindo às vezes pontos excessivos (REBELLO, 1968). Sobre sua atitude combatente um de seus adversários na congregação certa vez teria dito que “Silveira tem a fibra de um jagunço” (MEIRA, 1979, p. 175). Seu jeito fortemente disciplinador, outro ponto de choque com os estudantes, pode ser observado na carta de fevereiro de 1932 endereçada a Camilo Salgado. Olympio da Silveira, secretario desta Faculdade, baseado no artigo 67, alíneas 2 e 8 do Regimento Interno, vem expor a VV. EE. O seguinte facto: No dia vinte e sete do corrente, á tarde, indo inspeccionar o serviço de asseio que se estava procedendo internamente em todo o edificio da Faculdade, no laboratorio de histologia deparou com o alumno Clidenor de Freitas Santos, ás voltas com diversos materiais e microscópio. Chamoulhe attenção que naquele laboratório ora em asseio, não era permittida a permanencia de alumnos, máxime achando-se no período das férias e não mais sendo elle alumno daquela disciplina. O referido alumno retirouse. Momentos depois, achando-se o reclamante na thesouraria a redigir notas para imprensa, foi pello mesmo alumno interpellado em alto tom nos seguintes termos: “Senhor Secretario, agora mesmo acabo de pagar minha matricula, e segunda-feira mostrarei ao senhor se trabalharei ou não no laboratorio de histologia; o senhor aqui não manda, tenho ordens do Director! Não crê que este alumno tivesse ordem superior para penetrar nos gabinetes, que estão sob a fiscalisação da secretaria, sem que esta tivesse sciencia previa. É do conhecimento de todos o procediemento incorrecto e até criminoso de certos alumnos que primam em destruir os moveis da Faculdade, como aconteceu agora mesmo com as bancas do salão da Congregação, que se acham riscadas á tinta, e a capa das cadeiras rotas, conforme mostrou o senhor Dr. Director. Do gabinete de Histologia já desapparecceram objectivas e um microscópio ficou inutilisado e depois desappareceu também; materiaes inutilisados atrás das portas, vidros com glycerina já têm sido encontrados; ossos do amphitheatro de Anatomia não mais existem. Deante do exposto, acha que os alumnos somente devem penetrar nos gabinetes nos dias de aulas e acompanhado do professor da respectiva cadeira. Procura o Secretario apenas cumprir o seu dever, zelando por tudo que a esta Faculdade pertence; mas, para isso precisa do apoio moral de VV. EE. Para não se vér exposto á indisciplina e as aggressões de alumnos. Olympio - um homem para dizer não 413 Convém ainda notar que este alumno foi um dos que foram beneficiados pecunitariamente por esta Faculdade no anno proximo passado, apesar de ser filho de outro Estado, quando, peço venia a VV. EE. para ponderar, os auxílios deveriam ser dados de preferencias aos alumnos pobres e aproveitáveis do nosso Estado, que os ha em grande numero (FMCP, 1932a). Na verdade Olimpio era o tipo de personagem que não levava desaforos para casa chegando mesmo por vezes “às vias de fato”. Um incidente ocorrido nas enfermarias da Santa Casa em 1926, cujas causas se perderam no tempo, ilustra bem esta faceta de sua personalidade. Segue a narração do enfermeiro Henrique Araújo testemunha ocular do ocorrido: 414 Fui, eu de facto, a pessoa que melhor testemunhou a scena verificada hontem neste hospital, que não teve a importância que lhe quiz emprestar. A não ser eu, no momento estava presente só uma irmã, de serviço na clinica cirúrgica, o póde presenciar, pois quando o dr. Mário Chermont intercedeu a tempestade já havia passado. O dr. Bianor Penalber, que estava no serviço de sua profissão, na enfermaria São Pedro, de clinica cirúrgica, vinha de terminar o mesmo quando, ao chegar num pequeno gabinete de espera, junto á sala de pequenas operações, foi abordado pelo dr. Olympio da Silveira, que eu pela primeira vez ali via. O dr. Bianor, attendendo a um pedido do dr. Silveira, para qualquer entendimento, sentou-se attensiosamente enquanto seu colega mantinha-se de pé, falando um tanto exaltado. O dr. Olympio tirou o seu “pince-nez” e o collocou em cima de uma mesa, o que me fez suppôr que ia aggredir o dr. Bianor, ficando eu de sobre aviso afim de evitar um scena desgradavel, e mesmo porque o dr. Bianor parecia despreoccupado, pois continuava sentado. Effectivamente, dentro de segundos, como eu previa, o dr. Olympio agarrou-se ao dr. Bianor e ambos iam luctar quando immediatamente os separei, ficando exclusivamente nisso o incidente, pois logo depois veio o dr. Mario Chermont que muito contribuiu para serenar os ânimos (Estado do Pará, A VERDADE sobre o incidente da Santa Casa, 16.09.1926, p. 1). Um dos pontos polêmicos a respeito da participação de Olimpio da Silveira na vida da Faculdade, que ainda há de render grandes debates, seria determinar qual seu papel na questão da Federalização da FMCP ocorrida em 3 de janeiro de 1950 (BRASIL, 1950). Como pode ser observado no capítulo referente ao Diretório Acadêmico de Medicina9, Olimpio era visto pelos estudantes como uma grande pedra no sapato da questão da Federalização. Um obstáculo a ser superado. Entretanto para seu filho, José da Silveira Netto, Olimpio “lutara heroicamente” pela causa, mas com um importante diferencial em relação aos alunos, pois defendia também a garantia dos direitos dos professores e do pessoal administrativo “do esbulho tão comum em ocasiões semelhantes” (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 A posição de Olimpio da Silveira na questão talvez seja melhor explicada se avaliada sua relação com o acadêmico Jean Bittar, então presidente do diretório e responsável pela apresentação do projeto da Federalizção intitulado “Federalização da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará - Necessidade Vital do Vale Amazonico” em um congresso no Rio de Janeiro promovido pela União Nacional de Estudantes10. Beckmann resumiria o fato da seguinte maneira: Jean Bittar era um brigador eterno com a diretoria. Ele e o velho Silveira não se davam bem. De parte a parte haviam aquelas pequenas intrigas. Houve então um congresso nacional de estudantes [...] no qual Jean Bittar apresentou a sua tese. [...] O trabalho foi apresentado, e naturalmente, os estudantes acolheram de braços abertos. Daí por diante, todo mundo aderiu. Inclusive os políticos, que cairam como galinhas famintas no milho (JORNAL DO CRM-Pa, 2005, p. 3). Os fatos acima descritos talvez sejam o início de uma explicação para a postura conservadora de Olimpio durante a Federalização. Era natural que ele temesse que após sua efetivação as intervenções do governo viessem a satisfazer mais a interesses de políticos do que do corpo docente, que desde a fundação se sacrificara pela escola. Sem contar que era provável que não aceitasse bem o fato de que Jean Bittar pudesse entrar para a história como o “pai da criança”. Polêmicas a parte, como já mencionado o grande mérito de Olimpio da Silveira foi equilibrar as finanças da Faculdade. Não que ela fosse uma instituição lucrativa, pelo contrário, mas não podia se dar ao luxo de ser filantrópica. Era Olimpio quem freiava eventuais abusos à benevolência de Camilo Salgado. Fossem estes excessivos pedidos de vagas gratuitas, descontos nas mensalidades ou prefeituras que teimavam em enviar alunos prometendo bancar seus estudos, para no meio do curso sem mais nem menos deixar de enviar o dinheiro. Era sempre ele quem iria se indispor fosse negando pedidos ou fazendo cobranças, conforme exemplificado abaixo: Belém, 20 de Janeiro de 1927 Ilmo. Snr. Intendente de Igarapé-assú De ordem do snr. Dr. Director desta Faculdade, accuso recebido o officio de V. S., numero 77, de 15 do vigente datado, comunicando-lhe haver o Conselho Municipal em sessao de 29 de Dezembro passado, resolvido que o auxilio para esta Faculdade fosse destinado á matricula do snr. *****.Cumpre-me comunicar a V. S. que a Directoria acceitará o referido candidato depois que essa Intendencia saldar com os cofres desta Faculdade compromissos anteriores, provienientes de auxilios votados pelo mesmo Conselho e até hoje não recebidos. Prevaleço-me da opportunidade para saudar a V. S. Saude e Fraternidade a) Dr. Olympio da Silveira Secretario (FMCP, 1927b) Olympio - um homem para dizer não 415 Mário Braga Henriques o primeiro reitor da Universidade Federal do Pará referirse-ia ao binômio Camilo-Olimpio da seguinte forma: Quando jovem, conheci Camilo Salgado e, dele, guardei a lembrança inapagável de grande cientista, cirurgião excepcional, bisturi infalível, boêmio adorável, político sedutor, nascido para a glória, para eternização na memória dos pôsteres e gerações sucessivas. Mas, a Camilo Salgado, com toda a sua bondade, com sua contagiante maneira de agir, de apóstolo abençoado pelo Senhor, não teria sido possível realizar esta grande obra, não teria consolidado esta instituição exemplar, não fora a assistência permanente, constante, perseverante, diuturna, de Olímpio da Silveira, o homem cristalizador de sonhos, materializador de devaneios, dramatizador de iniciativas. Enquanto Camilo Salgado agia com seu imenso prestígio político e consagração científica, Olímpio da Silveira construía, amalgamava, cimentava e, destarte, elevava-se o edifício, a instituição que enaltece e distingue a novel Universidade do Pará, como entidade modelar, um dos melhores entre os congêneres estabelecimentos de ensino superior existentes no País (FMCP, 1957)11. 416 Paralelamente à sua vida na Faculdade, Olimpio encontraria tempo para uma rápida passagem pela política, sendo eleito pelo Partido Republicano Conservador para vogal do Conselho Municipal em 1930, encerrando sua carreira com a extinção deste partido ocorrida no mesmo ano (Folha do Norte, 03.08.1968). Atendia também diária e matinalmente na enfermaria São Francisco na Santa Casa (MEIRA, 1986b, p. 107), ocupando ainda por algum tempo o cargo de diretor do Hospital dos Marítimos (SILVEIRA NETTO, 1980, p. 65). Olimpio da Silveira aposentou-se somente em 1953 (REBELLO, 1968), já com mais de 70 anos, “...não por invalidez física ou mental, mas por imposição da lei...” (Revista do Acadêmico de Medicina, 1952, p. 27) como afirmou certa vez. Entretanto: “Aposentado embora, diariamente aqui vem, percorre as dependências deste edifício, assistindo-lhe à ascensão vitoriosa dentro dos moldes que deixou traçados” (Folha do Norte, PROFESSOR “Honoris Causa” o dr. Olimpio da Silveira, 10.01.1954). No ano seguinte, no 35º aniversário de sua fundação, a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, por decisão unânime de sua Congregação (Folha do Norte, PROFESSOR “Honoris Causa” o dr. Olimpio da Silveira, 10.01.1954) baseada em uma proposta do professor Barroso Rebello (Folha do Norte, HOMENAGEM ao dr. Olimpio da Silveira, 12.01.1954) concedeu a Olimpio o título de “Professor Honoris Causa” (FMCP, 1949b)12 pelo seu trabalho e dedicação. Em 9 de agosto de 1968, falecia aquele homem do tipo “que não se fazem simpáticos para serem agradáveis” (MEIRA, 1979, p. 177), e que um dia foi definido como: ...enérgico e muitas vezes intempestivo e que acompanhara tijolo por tijolo, nas ardências do sol ou na umidade das manhãs friorentas, o cresci- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 mento de um sonho, acalentado sem interrupção, e para onde convergiam todas as suas forças de lutador e até ao sacrifício, os impulsos sentimentais do coração (REBELLO, 1968). Mas que: ...por vezes, quando se encoleriza, quando se irrita, seus traços fisionômicos se alteram, as palavras lhe saem fortes e metálicas, como o encontro de espadas, e o combatente aparece, destemido e indomável, na defesa do interesse deste estabelecimento (Folha do Norte, PROFESSOR “Honoris Causa” o dr. Olimpio da Silveira, 10.01.1954). Deixou dois filhos médicos, Olimpio da Silveira Filho, formado na turma de 1940, que logo se mudou para o Rio de Janeiro, vindo falecer precocemente em decorrência de um acidente de trânsito (MEIRA, 1986b, p. 108), e José Rodrigues da Silveira Netto, da turma de 1938, que ocuparia os mais diversos cargos no Palacete Santa Luzia, começando como tesoureiro, passando a professor catedrático de Higiene e Medicina Preventiva, depois diretor da Faculdade, chegando a ser o segundo reitor da Universidade Federal do Pará, criador do Campus Universitário do Guamá que hoje carrega seu nome. Um homem como Olimpio da Silveira, que ocupou durante tanto tempo um cargo tão importante, poderia ter escrito muito sobre os primórdios da primeira escola médica da Amazônia. Infelizmente isso nunca aconteceu. Sobram como consolo algumas linhas de dois discursos seus, um pronunciado durante um almoço em sua homenagem por ocasião de sua aposentadoria: Venho da época em que a Faculdade, fundada em 9 de janeiro de 1919 e instalada em 1º de maio do mesmo ano, começou a funcionar em duas salas cedidas, por empréstimo, nos baixos do Ginásio Paes de Carvalho, sem arquivo, nem diretriz segura e ridicularizada por alguns, que a chamavam de baía e que, mais tarde, amparados por políticos influentes, foram bater em suas portas, solicitando ingresso. Integrado ao grupo de batalhadores, e é de justiça salientar o entusiasmo moço de Carlos Arnóbio Franco e Renato Chaves, êste tão cêdo roubado ao nosso convívio, tendo a frente a figura singular e prestigiosa de Camilo Salgado, conseguimos adquirir o prédio, que é hoje vossa tebaida. Ali foi a grande luta, ali foi onde sofri os maiores embates que, é preciso dizer, nunca me entibiaram o ânimo, antes, porém, me encorajaram, porque lutava por uma causa justa – pelo progresso cultural e material de vossa Faculdade, pela moralidade do ensino, pela manutenção da disciplina e pelo cumprimento da lei que vos rege. Incompreendido por espíritos trêfegos, invejosos e interesseiros, que propugnavam apenas pelo seu EU, a tudo resisti, com os olhos fitos no futuro. E nos combates travados jamais fui vencido, porque sempre era apoiado pela maioria sensata da Congregação que desejava, como eu, o progresso, à ordem e o cumprimento da lei. [...] Olympio - um homem para dizer não 417 Agora nos sentimos todos compensados dos esfôrços despendidos! A Faculdade está federalizada! [...] Meus jovens colegas: Sêde sempre amigos da vossa Faculdade – vossa tebaida. Não a esqueceis nunca. Procurai elevá-la, como eu sempre fiz, com dedicação, zelo e carinho. Ela representa a nossa vida, o nosso passado e o nosso presente (Revista do Acadêmico de Medicina, 1952, p. 27). E outro quando recebeu o título de professor “Honoris Causa”: 418 Vimos dos tempos da fundação deste estabelecimento, quando seus passos ainda se mostravam ainda oscilantes, e o futuro pouco promissor. Tudo denotava desconfiança e incerteza e deste modo, impunha-se trabalhar e lutar com denodo para vencer obstáculos antepostos. E foi realmente o que fizemos – lutar sem tréguas. Nesta mesma sala, durante vários lustros tomamos parte em agitadas Congregações, em defesa das boas causas apoiado pela palavra de nosso ilustre e destemeroso colega Carlos Arnóbio Franco, bem como de Acilino de Leão, Jaime Aben-Athar, Rodrigues de Sousa, Lauro de Magalhães, Prisco dos Santos, Gastão Vieira, Dagoberto de Souza, Luiz Araújo e outros muitos que, igualmente, pugnavam pelo progresso, pela moralidade do ensino, manutenção da disciplina e rigoroso cumprimento da lei. Combatido por um grupo reacionário, de curta visão e oposição sistemática, e que açulava a mocidade inexperiente contra a Secretaria, a tudo resistimos confiantes no futuro. [...] Lutamos convem repetir sobre o dardo de cruéis injustiças, mas não perderamos o ânimo, certo de que propugnávamos por um ideal pelo progresso e renome da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Contudo, estamos certos, senhores professores, de que se não fora o apoio decisivo por vós prodigializado nos momentos mais difíceis de nossa atuação nesta casa, nada poderíamos conseguir e o grupo reacionário antipatriótico tudo teria levado de vencida, com prejuízo da Faculdade e quiçá das vantagens que desfrutamos. O que interessava apenas era o nosso aniquilamento. Mas, com vosso espírito esclarecido, com a vossa ponderação e bom senso a tudo resistimos, marchando sempre de vitória em vitória até a federalização (Folha do Norte, HOMENAGEM prestada ao Dr. O. da Silveira, 09.01.1954). Quanto à preservação de sua memória, teve um pouco mais de sorte do que o Barão de Anajás. Não que seja muito mais lembrado que este último, porém pelo menos duas tímidas placas garantem a perpetuação do seu nome no Largo de Santa Luzia, atual Praça Camilo Salgado. Uma localiza-se nas dependências do Instituto de Higiene, hoje Núcleo de Medicina Tropical, referindo que o antigo instituto levava seu nome13. A outra foi colocada junto a uma palmeira imperial nos jardins da velha Faculdade. A palmeira se foi há anos, mas a placa colocada em outubro de 1958 ainda persiste com os dizeres: Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Ao Professor Olimpio Cardoso da Silveira, exemplo de probidade e devotamento ao ensino médico. Homenagem do XI Congresso de Gastrenterologia. Belém - outubro de 1958. Curiosamente Olimpio nunca foi professor (MEIRA, 1986b, p. 107), recebeu o título “honoris causa” como justa homenagem, mas não há notícia que tenha dado uma aula14. A pequena placa ignora completamente sua atuação como secretário. Talvez fosse querer muito em uma instituição pouco acostumada a homenagear seus construtores. NOTAS 1 Seu nome aparece como Olympio antes da reforma ortográfica. 2 MEIRA cita como seu local de nascimento a cidade de Estância no mesmo estado. Preferimos levar em conta as informações escritas por seu filho SILVEIRA NETTO. 3 Leônidas Braga Dias em manuscritos afirma que sua tese seria “Das Relações de Elephantiases dos árabes com a Filária no sangue”. (N.A). 4 Sergipano, considerado o pai da neurologia no estado de São Paulo. (N.A). 5 Paulista de Tatuí, foi professor de clínica médica e diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). (N.A). 6 MEIRA cita como sendo um imigrante português, SILVEIRA NETTO e REBELLO referem ter sido um espanhol. (N.A). 7 É possível que Olimpio já estivesse exercendo o cargo antes desta data, pois no segundo estatuto da FMCP, datado de 6 de janeiro de 1924, ele já figura como secretário. Muitas fontes como obituários da Folha do Norte, A Província do Pará, um discurso de Silveira Netto publicado na revista Hiléia Médica e os trabalhos de Meira citam sua chegada à Faculdade como sendo em fins de 1922. A Folha do Norte de 10 de janeiro de 1954 refere 1921. Entretanto os documentos do período apontam sua entrada na FMCP em 1924. (N.A). 8 Segundo o livro de nomeação dos professores, Renato Chaves iniciou na FMCP como professor de Higiene e Medicina Legal, passando temporariamente pela Anatomia Descritiva, chegado em Anatomia Médico-Cirurgica Operações e Aparelhos, que posteriormente recebeu o nome de “Medicina Operatória”. Renato Chaves faleceu em 13 de dezembro de 1929, em sua residência, fulminado por um ataque cardíaco. O Instituto Médico Legal em Belém recebeu seu nome. 9 Ver capítulo “Apontamentos para uma história do DAM”. 10 Ver capítulo “A Federalização”. 11 Este discurso foi proferido pela primeira vez na colação de grau dos médicos de 1957, e posteriormente o mesmo trecho seria repetido em 31 de janeiro de 1959 na cerimônia de instalação da Universidade Federal do Pará, ocorrida no Teatro da Paz. (N.A). 12 A lista de professores “Honoris Causa” presente no relatório de 1948 é: Mauricío Gudin, Armínio Lalôr Mota, Jurandyr Lodi, e Olimpio Cardoso da Silveira (FMCP, 1948, s.p.). Olympio - um homem para dizer não 419 O fato curioso é que trata-se de um relatório de 1948, porém Olimpio receberia este título apenas em 1954, devendo tratar-se de uma folha anexada posteriormente a este relatório. 13 Na placa esta escrito: “O Instituto de Higiene, iniciado em 28-12-1949 sob a administração do Prof. Dr. Lauro Antunes de Magalhães e inaugurado em 16-12-1955, sob a administração do Prof. Dr. José Rodrigues da Silveira Netto, foi denominado por unânime decisão da congregação em sessão de 21 de janeiro de 1955- Instituto Olympio da Silveira- em homenagem ao grande consolidador da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará”. 14 “...mesmo sem lecionar, conhecia perfeitamente o aproveitamento dos alunos de todas as séries do Curso Médico.” (GARCIA FILHO, 08.01.1954). 420 Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 27 Retalhos da vida acadêmica 421 422 Detalhe de um dos pisos da FMCP. O que pode ser obtido, hoje, a respeito da vida acadêmica daqueles primeiros tempos da Faculdade de Medicina do Pará, antes mesmo da criação do Diretório é muito pouco. E se deve basicamente a dois alunos que foram muito importantes, cada um a sua maneira, a ponto de despertarem o interesse da imprensa. Um era Antônio Magno e Silva, um dos fundadores e diretor da “Escola Livre de Odontologia”; o outro era Bianor Penalber, então jornalista no periódico A Semana ambos pertencentes à primeira turma de formandos. Seria a A Semana, com sua característica de revista de amenidades, que publicaria as primeiras notas sobre a vida acadêmica na Faculdade, possivelmente escritas por Penalber, algumas bem jocosas, como a transcrita abaixo sobre uma possível gafe ocorrida em uma das primeiras necropsias realizadas na Faculdade. O dr. Arthur França, professor da Faculdade de Medicina do Pará, desejando confirmar um diagnóstico brilhante em doente de sua enfermaria, registrado o fallecimento reuniu os discípulos e lembrou a necropsia. Ansiosos pela confimação mestre e alumnos reuniram-se no respectivo necrotério. De repente, de um canto, enfarpellado numa capa, com os seus oculos levanta o dr. Mattehus Bonaparte Lydio Pereira de Sousa. Vae a mesa e colloca o ouvido no coração do defuncto, procurando-lhe tambem o pulso... Depois volta a seu logar. --Meus senhores, diz o dr. França, vamos ver o estado do pulmão deste homem. E mandou abrir o cadaver. O dr. Pereira não se conformou e gritou: --Assim tambem não; a sangue frio é uma barbaridade. E o chloroformio? --Chloroformio para que, atalhou o dr. França? --Para a anesttesia, insistiu o dr. Mattehus. Uma gargalhada uníssona poz termo ao incidente pittoresco. Bisbilhoteiro (Revista A Semana, n. 271, 11.08.1923, s.p.). Fica como curiosidade o fato de que Mattheus Lydio Pereira de Sousa aluno da Faculdade desde sua instalação1 também tendo ocupado o cargo de secretário-auxiliar (FMCP, 1919c), colaria grau somente na turma de 1929 (FMCP, 1936c). Antônio Magno e Silva, ainda que por outros motivos, também seria vítima das alfinetadas: Causou sensação nas rodas elegantes o gesto de desprendimento do dr. Magno e Silva mandando para o forno crematorio o seu chapéo cinzento, de grandes abas, que se familiarisara com sua cabeça ha cinco annos, ou desde quando iniciou o curso de medicina. Presentemente o dr. Magno anda melhorado: substituiu o saudoso chapéo cinzento por outro, que não lhe da mais aspecto solemne de seringueiro (Revista A Semana, n. 273, 14.07.1923, s.p.). Retalhos da vida acadêmica 423 Para Penalber, que fazia parte do grupo de colaboradores da revista, naturalmente sobravam elogios e um ou outro gracejo mais leve, como trovas na seção “Perfis Acadêmicos”. Vivo, elegante, sempre bem trajado, terribil “gavião” que ao longe avista, prosador, ex-poeta, jornalista, no calamo é, de ha muito, “diplomado” Hoje, é doutor de facto: (autorisado legalmente a mandar-nos á conquista de uma vida melhor...) o sexto-annista de topete e do peito do Salgado! Sua especialidade é o tratamento das meninas bonitas, de cabello aparado: - a ellas todo seu talento... E ha de extinguir- é o que ora se futura, hoje, que está de bórla e de capêllo dum certo coração o mal sem cura... (Revista A Semana, 09.08.1924, s.p.). 424 Foto 74: Alunos de diversos semestres da Faculdade reunidos em foto de 1922. Fonte: Pará-Médico, a. 3, v. 3, n. 10, set. 1922. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Fora uma ou outra nota, como as descritas, as manifestações acadêmicas desta fase inicial da Faculdade são mesmo dispersas, fato talvez explicado pelo pequeno número de alunos associado ao elevado número de transferências para Faculdades de outros estados. A primeira grande mobilização, na qual os estudantes tomariam parte, foi mesmo a campanha para aquisição do Palacete Santa Luzia2, projeto encabeçado por Camilo Salgado e que mobilizou as mais diversas camadas da sociedade paraense. Transferida a Faculdade para o Largo de Santa Luzia em 19243, a rotina dos estudantes mudaria; se por um lado ficavam mais próximos da Santa Casa desde o início do curso, perdiam de vez o contato com o centro da cidade pela saída definitiva do curso do colégio Paes de Carvalho. Naqueles idos, o bairro do Umarizal era considerado afastado do centro da cidade, o Largo dava para os fundos da Santa Casa, precisamente para o necrotério. Faziam ainda companhia para a Faculdade o mercado, que ainda hoje perpetua o nome do Largo, e somente ganharia seu aspecto atual em 10 de novembro de 1943 (VALENTE, 1993, p. 59), o bar de um comerciante português (GÓES, 2008) e no local onde hoje se encontra o Núcleo de Medicina Tropical havia a “Sabina Acadêmica”, casa de alvenaria onde uma senhora vendia garapa e lanches aos acadêmicos de medicina (GAMA, 2008).4 Asfalto no entorno da Faculdade nem pensar; o calçamento com paralelepípedos chegava apenas ao longo da Av. Generalíssimo Deodoro, na circunferência do Largo e na travessa Dom Pedro I, onde a urbanização ainda engatinhava, e até o Largo do Esquadrão, que somente em 1933 transformar-se-ia na praça Brasil (CRUZ, 1945, p. 96). A rua Bernal do Couto no inverno era um grande lamaçal que levava à Doca de Souza Franco, em um tempo em que as embarcações ainda por ali atracavam. A Av. Pedro Miranda nem existia, correspondia então a uma estrada conhecida como “caminho da Pedreira”, que levava para as partes mais baixas e alagadiças daquele bairro (VALENTE, 1993, v. 3, p. 25). Animação no Largo só ocorria mesmo por conta das festas juninas e principalmente em 13 de dezembro, dia de Santa Luzia, quando uma procissão percorria a Avenida Generalíssimo Deodoro, as ruas Diogo Móia, Alcindo Cacela, e Bernal do Couto retornando ao seu nicho no mercado (VALENTE, 1993, v. 2, p. 59), seguindo-se de quinze dias de arraial5. Sobre alguns aspectos daquele arraial a revista A Victoria de 29 de dezembro de 1927 assim se manifestava: Viva a Jogatina !!! A festa que esta tendo logar no Largo de Santa Luzia findou sob o patrocínio da Santa no domingo retrazado, mas vae continuar, agora ampara- Retalhos da vida acadêmica 425 do pelo São Bicho e Santa Jogatina, até o dia 6 de janeiro vindouro. Os novos padroeiros estão sendo venerados no Mercado e numa outra casa da Travessa e a entrada é franca e amparada pela policia, representada pelos milicianos assiduos frequentadores das duas baiúcas (A Victoria, 29.12.1927, p. 2). O acesso ao centro era mesmo pela Generalíssimo Deodoro até a Estrada de Nazaré. Apesar do aparente isolamento o transporte não era difícil, o Largo de Santa Luzia era o fim de uma das linhas de bondes, ponto estratégico para garantir a ida da população à Santa Casa de Misericórdia. Os bondes eram o principal meio de transporte dos estudantes, algumas vezes para desespero dos gerentes da “Pará Eletric” como pode ser conferido no oficio enviado ao então diretor da Faculdade, Camilo Salgado: Belem, 11 de Maio de 1927 Ilmo. Sr. Dr. Director da Faculdade de Medicina do Pará 426 Transmitto a V. S. a inclusa copia do officio que me dirigio o sr. Gerente Geral da “The Pará Eletric Railways and Lighting Company Limited”, relatando um incidente em que estiveram envolvidos 16 alumnos dessa Faculdade n’um bonde da linha circular, a fim de que essa Directoria tenha conhecimento da occorrencia e se digne a providenciar como melhor julgar conveniente de modo a evitar sua repetição. Servindo-me do ensejo apresento a V. S. protestos de estima e distincta consideração. Saudações. Francisco de Paula Pinheiro Chefe de Policia __________________________________________________________ CopiaThe Pará Eletric Railways and Lighting Company Limites. Nº. 2.691. Data, 9 de Maio de 1927. Exmo Snr. Trazemos ao conhecimento de V. Excia. o seguinte incidente: Ás 6 horas da tarde de 5 do corrente tomaram um bonde da linha circular 16 alumnos da Faculdade de Medicina, os quaes, fazendo grande algazarra, recusaram-se a pagar as passagens. Deante desta attitude dos alumnos, o revisor mandou parar o vehiculo e telephonou á Chefatura Central de Policia pedindo providencias, recebendo resposta, porem, que comunicasse para a Sub-prefeitura do Umarizal. Viajavam no carro praças da Brigada que allegavam não terem meios para manter a ordem com taes estudantes que fazem tal exhibição quase diariamente. Ficou para (do) o carro durante 21 minutos, assim prejudicando bastante o movimento do serviço de viação. Pedindo providencias no sentido de evitar uma reproducção, aproveitamos o ensejo para reiterar a V. Excia. os nossos protestos de elevada estima e real apreço. Saúde e fraternidade. A) H. C. Warner – Gerente Geral. (FMCP, 1927b). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Mesmo quando não tomavam os bondes os estudantes arranjavam outras maneiras de se divertir à custa destes. Outro ofício da chefatura de polícia datado de 4 de junho de 1936 menciona que: ...os estudantes de medicina vem levando effeito no Largo de Santa Luzia ou seja entre as ruas Bernal do Couto e Oliveira Belo certas brincadeiras de mau gosto, colocando pedras sobre os trilhos de bond, de forma a acarretar serios embaraços ao tráfego dos electricos (FMCP, 1936b). Os motorneiros paravam para retirar as pedras dos trilhos e acabavam tendo acaloradas discussões com os acadêmicos (FMCP, 1936b). Quando não usavam ou abusavam dos bondes, os acadêmicos costumavam voltar a pé pela Avenida Generalíssimo, muitas vezes acompanhando o Catedrático de Anatomia Humana, José Alves Dias Junior como recorda Clóvis Meira: Quando terminavam as aulas ou os estudos que se seguiam, em bloco com os estudantes, caminhava a pé até o largo de Nazaré. Era como continuação da aula, palestra entrecortada pelos mais variados assuntos. Depois voltava de bonde Circular. Nós dispersávamos ou íamos bebericar no Bar Estrela de Nazaré do seu Amaro, isso quando havia dinheiro, o que era raro. A influência de Dias Júnior era tanta, entre os estudantes de medicina, que a Turma “Evandro Chagas”, diplomada em 1943, desde o primeiro ano o escolhera para paraninfo e não mudou... (MEIRA, 1986b, p. 95). O diretor da Faculdade, Camilo Salgado, também ficava entre os favoritos dos estudantes. Tanto que estes, em 1928 chegaram até a mandar celebrar uma missa de ação de graças na Basílica de Nazaré pela recuperação de sua saúde após dois meses de enfermidade (Revista A Semana, 29.09.1928). Além de homenagens, naquela época já se notavam criticas bastante fortes a alguns professores. Por melhores que estes fossem e por mais que gozassem de prestigio entre a maior parte dos estudantes, pelas linhas transcritas abaixo se pode observar que sempre foi difícil conter a fúria de um acadêmico reprovado. A verdade porém e esta sr. redactor: fomos sacrificados para satisfação e gáudio do professor interino da cadeia de microbiologia - com o qual antes do exame tiveramos acalorada discusão. [...] Que mais esperar de uma banca composta de elementos com os srs. Prisco dos Santos, Aben-Athar e Remígio Filgueiras? Se o primeiro é um inquisidor pela sua miseria imnata, o segundo baqueia pelo seu estado pathologico, emquanto que o terceiro deixa-se vencer mais por ignorancia do que por maldade. Este ultimo, na verdade, embora fosse o presidente, ignora absolutamente o que seja microbiologia, bacteriologia ou cousa equivalente e acreditamos mesmo que nem saiba lidar com um microscopio, tal o estreitamento ou nenhum conhecimento que tem de todo o que se relaciona com o infinitamente pequeno. Essa faculdade, parece privativa do petit Retalhos da vida acadêmica 427 Pasteur indú, tão enfatuado e cheio de si que chega a desaparecer nos comesinhos conhecimentos de sua especialisação. Destaca-se o, melhor, quando no seu posto predileto de chauffeur, para o qual incontestavelmente tem mais pendor e está mais a calhar do que para o magistério, comquanto o seu nevropathismo já tenha contribuído para o augmento estatistico dos esmagamentos por automoveis. Este, é roxinho por uma carreira em desbalada e muito mais roxo ainda por sacrificar os que não confiam muito no seu preparo de cadernos assim como o Dr. Heraclides desconfiava da competência profissional de certo titulado. O Sr. Aben-Athar cuja pallidez tão profunda lhe empresta o aspecto de um cadáver ambulante, era a única figura que poderia ser justa se não peccasse pela sua origem Shylockeana. Se não lhe devíamos a obrigação de uma libra de carne do nosso o corpo, tinhamos commetido a imprudência de não consentir que fallasse conosco como quem falla com um creado seu. Que mais, pois esperar d`esse neo catholico, do presidente e do professor chauffeur, sinão uma decisão contra nós? Que a miséria lhes aproveite. E nós – aguardamos Março a fim de fazermos uma cadeira que nos falta e appellarmos para a justiça do illustardo cathedratico Dr. Acatauassú Nunes cuja educação moral nos assegura o que nos foi subtrahido (A Victoria, 29.12.1927, p. 11). 428 Fica patente que a irreverência não é algo da “modernidade”, mas um atributo natural da juventude seja qual for a época que ela pertença. Dr. Guaraciaba Quaresma da Gama, formado na turma de 1939 e posteriormente professor catedrático de Clínica Cirúrgica narra um fato que reforça este conceito e mostra que já naquele período os acadêmicos não poupavam nem seus colegas: Nas aulas práticas que se realizavam na Santa Casa, nós, os alunos, ficávamos ao redor da mesa de exames, enquanto o professor faria a exposição do caso de que era portador o doente examinado. Alguns colegas sentavam nas macas que se encontravam no local. Certo dia, por ocasião de uma aula prática, o colega Antônio Carneiro apanhou um chumaço de algodão, ensopou-o com éter sulfúrico e quando outro colega (não vou citar o nome) preparou-se para tomar impulso e sentar-se na maca, ele, o Antônio Carneiro, colocou a bola de algodão embaixo do traseiro do colega que sentou-se sobre ela, mas incontinenti, deu um pulo da maca arriando as calças o que não foi suficiente para alivia-lo e arrancando também a cueca ficou semipelado na presença do mestre, enquanto se abanava em desespero. O professor Lauro (de Magalhães) aborreceu-se dizendo-se desrespeitado mas terminou por relevar o incidente e até sorriu, continuando sua aula (GAMA, 2004, p. 8). Na década de 1930, os acadêmicos foram adquirindo cada vez mais o espírito corporativista que culminaria com a criação de agremiações como o “Centro Acadêmico de Medicina do Pará”, o atual DAM, a “Sociedade Acadêmica de Medicina do Pará” e, posteriormente, a “Sociedade de Internos dos Hospitais de Belém”. Ressalte-se que apesar disso muitas manifestações partiam ainda de grupos não ligados a nenhuma agremiação. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Um exemplo seriam os eventos realizados com a finalidade de angariar fundos para auxílio dos acadêmicos com dificuldade de pagar as taxas escolares: Festival de benefício Os rapazes que cursam o quarto ano da Faculdade de Medicina vão realizar quinta-feira no Palace Theatre, um festival em beneficio de alguns de seus colegas que se encontram em difficuldades para prosseguir no curso medico. Um gesto de tal natureza tem despertado applausos e merecida acolhida benevolente da parte do publico, segundo nos asseverou a comissão que veio a FOLHA constituída dos academicos Olavo Leoneto, Raymundo Paiva, Arnaldo Prado e Jose Thomaz Nabuco. O espetáculo que vae ser enscenado é constituído por uma peça intitulada “Casar para morrer” e de um acto de variedades (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 19.08.1930, p. 3). Numa época em que a cidade não contava com grandes opções de entretenimento até o Teatro da Paz, a maior casa de espetáculos de Belém, servia de palco para estes festivais: FESTIVAL EM BENEFICIO DO ACADEMICO POBRE Os academicos de Medicina Nelson Corrêa, Miguel Martins, Nery Guimarães, Pádua Filho e Deusdedith Moura com apoio de todos os seus colegas da Faculdade, organizaram um festival em benefício de alguns collegas que estão na imminencia de perder o anno. A commissão está solicitando da sociedade paraense, dos seus collgas de curso e da mocidade estudantina, do commercio um auxilio justo para a cruzada que se vae dedicar. Será uma noite no Theatro da Paz, em dia opportunamente marcado. Breve será divulgado o programma dessa festa na qual tomarão parte os academicos: Gentil Puget, Deusdedith Moura, com seu “Jazz”, Augusto Moreira, Nery Guimarães, Paulo Fender, Marcos Bahia, Paulo Darand, José Amorim, Renato Medeiros, Miguel Martins, e as gentis academicas Maria von Paungartten e Maria Izabel Coelho. (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 13.04.1932). A organização de tais eventos posteriormente seria assumida inteiramente pelo Diretório6. Outro evento “encampado” pelo DAM foi a realização de uma festa que ficaria conhecida como “Festa da Esmeralda”, a partir de uma ideia de alunos do quinto e sexto ano que realizariam um evento semelhante chamado “Festa da Esperança”. Neste caso o Diretório chegou inclusive a manifestar-se publicamente repudiando qualquer iniciativa de festa com cobrança de taxas que não partisse daquela agremiação7. O trote dos calouros também começou como uma iniciativa independente do DAM. As notícias mais antigas mostram que ele consistia em uma passeata dos estudantes de medicina pelas ruas de Belém, com direito a visitas aos principais jornais, uma forma de apresentar a sociedade paraense os novos acadêmicos de medicina: Retalhos da vida acadêmica 429 PASSEATA DOS ACADEMICOS DE MEDICINA Num desses arrancos que são próprio da vida acadêmica ou que definem os arroubos da mocidade, hontem, os estudantes da Faculdade de Medicina, festejando o dia do calouro, fizeram uma visita a FOLHA, vivando este jornal. Uma comissão constituída de veteranos subiu á nossa redacção, falando o academico Miguel Martins Filho que disse da satisfação dos estudantes em homenagear a FOLHA que, não poucas vezes, tem advogado a causa dos academicos paraenses. Depois de “ale-guapes” festivos a farandula academica continuou o seu passeio festivo, levando pelas ruas as alegrias proprias da mocidade. Os academicos – veteranos e calouros – eram acompanhados por grande massa de populares, sendo saudados em muita parte por senhoras e senhorinhas (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 02.03.1932). Outras referências mencionam ainda “o tradicional exame de admissão da calourada, promovido pelos veteranos alumnos” (Folha do Norte, Vida Acadêmica, 21.02.1934), sem maiores detalhes sobre o que consistia de fato este “exame”. Sabese que todos os veteranos eram convocados para assistir e as calouras eram examinadas à parte por veteranas. 430 Pouco a pouco o trote iria adquirindo as feições que o tornaram conhecido por gerações. Ao assumir a organização deste evento, o Diretório criaria até um departamento especial chamado “Grande Conselho de Trote” (A Folha Vespertina, 23.02.1942). A tradição era sair em uma passeata fantasiado e empunhando cartazes que criticavam um fato ou autoridade do momento. Um ofício curioso, com o timbre de “URGENTE”, encaminhado ao Diretor da Faculdade pelo Chefe de Polícia, em 8 de março de 1935, mostra que as críticas realmente incomodavam: Tendo chegado ao meu conhecimento que alumnos dessa Faculdade pretendem sahir á rua em passeata, num “trote” aos calouros e em critica ao governo, esta Chefia crê de bom aviso o prevenir V. Excia. de que a Policia não permittirá, em absoluto, que tal passeata se realize para que o tomará todas as providencias ao seu alcance. Quanto ao castigo applicado aos primeiranistas pelos seus collegas dos outros annos de curso, no interior do estabelecimento, esta Chefia está prompta a auxiliar V. Excia. no que for necessário, attendendo com presteza ás solicitações que V. Excia. houver por bem fazer-lhe (FMCP, 1935c). O então calouro Danilo Virgílio de Mendonça, que mais tarde seria professor de Fisiologia da Faculdade, recorda bem o seu trote no ano de 1948: A essa época tinham ocorrido dois desastres graves com aviões da FAB (Força Aérea Brasileira). Tomamos os fatos trágicos como uma crítica à Força Aérea Militar. Um calouro, o Mário Herculano Marinho da Silva, metido em roupas rasgadas com pseudo curativos na testa e no rosto, Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 pintado com mercúrio-cromo em várias partes, para imitar sangue, portando uma maleta furada e uma tabuleta com os dizeres “Viajei de um avião da nota musical fá, seguida de um B”. Mas o grosso das críticas eram dirigidas aos concursos de misses, tão em moda na sociedade local, e ao professor Lucival Lage Lobato, oficial da Aeronáutica que diziam ser um mestre nada eficiente boato arquitetado pelo veterano “Buda” um estudante “profissional”, sempre reprovado merecidamente pelo mestre Lucival. Posta a procissão em andamento percorremos alegremente a Av. Generalíssimo Deodoro, Av. Nazareth, Praça da República, Sto. Antonio e João Alfredo, sendo nossa previsão dissolvermos a passeata em frente ao Palácio do Governo, também incluído nas críticas. Eram sete ou oito calouros fantasiados de “miss” eu inclusive, fantasiado de “rainha das cobradoras” (de ônibus). Ao chegarmos quase no início da João Alfredo, pois trafegávamos em sentido contrário, fomos barrados por um grupo de civis armados de paus e fios elétricos, alguns soldados, cabos e sargentos e um oficial fardado. Foram se infiltrando no trote até chegarem ao Mário Herculano, que portava o cartaz alusivo a FAB. Aí o pau comeu, espalhando estudantes para todos os lados, apanhados que fomos de surpresa. Quando tomaram o cartaz do Mário ele ainda reclamou: - Peraí pessoal! Vocês estão estragando nosso trote! A esta altura já estava apanhando. [...] Desarmado distribuí chutes para todos os lados, tentando safar-me da pancadaria. Mas os militares e civis da Aeronáutica cometeram um erro estratégico; tinham penetrado fundo demais na massa estudantil que, refeita da surpresa inicial, transformara as ripas e cabos dos cartazes em armas de defesa, saindo para o merecido revide. Encurralados, os militares não tinham para onde recuar e passaram a apanhar muito mais do que haviam dado, até que os veteranos passaram a pedir calma aos calouros (MENDONÇA, 2002, p. 215). Os militares desta vez acabariam por fugir em meio a vaias, mas se não venceram pelo menos conseguiram retirar a “ofensa” a FAB (MENDONÇA, 2002, p. 216). Diga-se de passagem, confusões com militares eram comuns entre os acadêmicos. Um boletim da Chefatura de Polícia destinado à direção da Faculdade conta que, em 4 de abril de 1934, um cabo fuzileiro passava pelo largo de Santa Luzia quando perguntou para um acadêmico onde ficava a Faculdade de Medicina. Este respondeu que se o cabo não sabia ler, que aprendesse. Iniciou-se uma discussão, que logo virou luta corporal. Outros acadêmicos entraram em auxílio do colega, assim como outros militares apoiando o cabo, generalizando a desordem. O cabo chegou a exibir sua navalha, mas a luta foi apartada. Resultado final: ferimento contuso sobre o olho esquerdo do acadêmico e uma contusão no frontal do cabo, além de um pequeno ferimento no pavilhão auricular esquerdo de um dos amigos do militar (FMCP, 1934a). Retalhos da vida acadêmica 431 Em outro ofício, datado de outubro do mesmo ano um capitão do 26º B. C., atual 2º B.I.S, comunica que os acadêmicos de medicina estavam desrespeitando a farda do Exército Brasileiro, pois andavam vaiando os praças daquele batalhão; pedia para que o diretor tomasse providências, pois não poderia se responsabilizar pelas consequências daqueles atos... (FMCP, 1934a). 432 Foto 75: Calouro em dia de trote desfilando com cartaz de protesto em frente a Santa Casa. Fonte: Revista do Acadêmico de Medicina, dez. 1946, p. 43. Voltando ao trote dos calouros, este de certa forma não acabava após a “passeata”. Professores como José Alves Dias Junior faziam de sua primeira aula uma extensão do trote determinando que os calouros medissem a lateral inteira da sala com um palito de fósforo, entre outras brincadeiras: Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 - Não queira ludibriar o mestre, pois já sei quantos palitos medem esta parede, né siô? Interrogava com um sotaque, se imitável, impossível de reproduzi-lo fielmente no papel. E, com uma gesticulação toda própria onde as mãos eram preponderantes, ordenava: - Vá à cuba de formol e me traga um fígado, né siô?! Lá vinha o assombrado calouro com o fígado às mãos e a boca amarga pela expressão emocional de sua própria vesícula hepática. - Isto não é fígado, né siô! Isto é um pâncreas! Divertia-se o mestre com a expressão duvidosa do calouro. - Traduz o que está escrito naquela parede! Lá estava a frase latina “Nosce te Ipsum” trazida do grego inserida no portão do templo de Delfo, em Atenas (Conhece-te a ti mesmo). Na indecisão do “calouro burro” o mestre traduzia jocosamente: - É proibido fumar, né siô? (MENDONÇA, 2002, p. 222). 433 Fonte 76: Passeata do trote dos calouros de medicina no ano [19--]. Fonte: Coleção Dr. Carlos Amaral Costa, Museu da Sociedade Médico Cirúrgica do Pará. Retalhos da vida acadêmica Deixadas para trás as emoções e alegrias da entrada na Faculdade, os acadêmicos passariam a conviver com a dura realidade das elevadas despesas do curso. Como se já não bastassem as taxas escolares, os livros médicos também eram caros. Mesmo que o estudante não comprasse nenhum livro e vivesse na biblioteca, cuja utilização também era paga, ele deveria ter alguma compreensão de francês e espanhol, pois os tratados eram de um modo geral nestes idiomas. Tinha que ser assim ou nada entenderia do Brumpt de Parasitologia, do “Medicine Operatorie” de A. Broca, muito menos dos quatro volumes de anatomia de L. Testut e A. Letarjet, sem falar de outros como “Thibau” de Física Médica, o “Elements d´Obstetrique” de W. Wallich, e etc. Em português mesmo somente “Semiologia Médica” de Vieira Romeiro, “Medicina Legal” e “Hygiene” ambos de Afrânio Peixoto e “Farmacologia Geral” de Pedro Pinto (Folha do Norte, 13 de março de 1932). Os livros de autores europeus só começariam a ser substituídos pelos livros norte-americanos a partir da segunda guerra. O “status” dos acadêmicos de Medicina, bem como os de Direito e de Engenharia, era elevado. O que quer que fizessem e por onde quer que passassem eram recebidos com honras, tudo noticiado pela imprensa. Um exemplo disso eram as chamadas “caravanas acadêmicas”, nada mais do que viagens organizadas por estudantes. A Folha do Norte de 23 de março de 1932 dá um grande destaque a uma “Excursão dos Futuros Esculápios a Bragança”8: 434 A embaixada academica de medicina, que partira ás 6 horas da manhã de sabbado da estação de S. Braz indo até Bragança regressou antehontem a Belem. Em caminho para Ananindeua, o orador da comitiva, 2º annista Paulo Fender, em nome de todos os academicos, confiou ao professor dr. Francisco Freitas a presidência da caravana. Este agradeceu em palavras incentivadoras. Depois falou o academico de Direito E. Sousa Filho, congratulandose com todos e lançando a semente do Clube Academico, congregação sem distincção de todos os estudantes de cursos superiores. A viagem decorreu sob a maior cordialidade possível, executando o “jazz academico” varios numeros de seu repertorio. Almoçaram em Igarapé-Assu. As 5 ½ da tarde, chegaram a Bragança onde já estavam sendo esperados pelas auctoridades do município. Depois de optimamente hospedados pela proficiencia da direcção da embaixada, os academicos, que se distinguiam pelas boinas verdes e vermelhas, foram recepcionados na casa do prefeito de Bragança, sr. Raymundo Naziazeno Ferreira, que a todos comutou de gentilezas. Na manhã de domingo visitaram toda a cidade, acompanhados do sr. Naziazeno. Depois destas visitas dirigiram-se ao local do comício que annunciaram em boletins, ao largo da Matriz em prol dos Lázaros. Falaram os academicos Paulo Fender, Nery Guimarães, Sousa Filho e disse uns versos allusivos o poeta Rocha Moreira, nosso companheiro de trabalho. Foi feito então um bando precatório que percorreu o commercio juntando esmolas para os lazaros, sendo bem correspondida pelo povo a iniciativa. O sr. Naziazeno offereceu aos excursionistas um banho no igarapé Chumucuí, para onde foram todos de caminhão por uma bem construída estrada. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Depois de um banho, de um lauto almoço, prepararam-se os academicos com uma equipe formada á ultima hora , para enfrentar o forte conjuncto local da “Team Negra F. C.”, campeão de Bragança. A derrota era inevitável, mas o “score” era marcado antecipadamente pelos torcedores bragantinos: 5 x 0 a favor dos locaes. Mas não succedeu assim. Os academicos num esforço admiravel, conseguiram que o “score” fosse apenas de 2 x 1. Foi um bello jogo em que a vontade suppriu a technica. Á noite no grupo escolar foram realizadas as conferencias annunciadas. Augusto Moreira fez um histórico da Faculdade de Medicina, terminando por destruir certo boato que se estava propalando, em torno da desequiparação da Faculdade. Nery Guimarães falou sobre hygiene. Depois das conferencias, realizou-se o baile official ainda na residência do sr. Naziazeno. O “jazz acadêmico” conseguiu bello exito em sua finalidade. A volta fez-se ás 6 horas da manhã de segunda-feira quando de Bragança partiu o trem-horario. Almoçaram os academicos em Igarapé-Assu e chegaram a Belém ás 5 horas da tarde. A embaixada era composta de cincoenta estudantes, inclusive tres senhorinhas e os acadêmicos E. Sousa Filho pelo “Estado do Pará”, Paulo Eleutherio Filho, desta secção e Rocha Moreira, ambos pela Folha do Norte. (Folha do Norte, 23 de março de 1932). Existem notícias de “embaixadas acadêmicas” bem mais audaciosas, que foram muito mais longe ultrapassando as fronteiras do estado. Em setembro de 1935 partiu com destino a Porto Alegre para assistir aos festejos do centenário da Revolução Farroupilha a embaixada acadêmica “Camilo Salgado” a primeira enviada “...aos centros cultos do paiz” (FMCP, 1935a), que contava com dezenove estudantes de medicina e um de farmácia, tendo como presidente e orador respectivamente os então acadêmicos Alberto Moacyr Benayon e Hermínio Pêssoa. Tal embaixada possuía caráter oficial, recebendo dez contos de réis da Faculdade, sendo portadora de uma mensagem do diretor da FMCP, Camilo Salgado (FMCP, 1936c, p. 37)9. A embaixada visitou além de Porto Alegre, as cidades de Pelotas, Rio de Janeiro, Niterói, Salvador, Recife e Fortaleza mantendo contato com entidades acadêmicas, médicas e visitando hospitais e faculdades. Ao travarem contato com outras instituições de ensino médico os estudantes perceberam o quanto a sua escola era “modesta, a luctar com lamentável falta de recursos e quase abandonada do auxilio do governo da Republica”10. Ficaram muito entusiasmados com a receptividade e simpatia do povo gaúcho “por intermédio de todas as suas classes, estudantes, auctoridades, jornalistas, intellectuaes, elemento femenino etc” (FMCP, 1935a). Em 1938 seria a vez de uma embaixada com menos integrantes, e que ficou conhecida como “Abelardo Condurú” (FMCP, 1939c, p. 59), constituída pelos doutorandos Epílogo de Campos, Ocyr Dutra, Atahualpa Fernandes, Antonio Costa Rodrigues, J. Araújo Filho, Carlos Guimarães e Vicente Magno de Miranda. Desta vez Retalhos da vida acadêmica 435 o destino era o Rio de Janeiro, então capital federal, e outras capitais do país. No Rio, além da visita aos centros médicos locais , tentariam obter audiências junto às autoridades de ensino superior solicitando algumas vantagens para a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Já estava confirmada também uma parada de um dia em Pernambuco, onde os acadêmicos retribuiriam a visita dos alunos da Faculdade de Medicina do Recife, que haviam estado em Belém há alguns meses (Folha do Norte, 12.06.1938, p. 1). A última embaixada oficial registrada no período data de 1943, composta apenas por três estudantes: o doutorando Pedro de Brito Tupinambá e os acadêmicos Luis Gonzaga Pires e Edgar Bezerra Valente. Representou a Faculdade no II Congresso Médico-Academico Inter-Estadual ocorrido em Recife. Lá apresentaram vários trabalhos entre os quais “Anemia Verminótica – Problema médico-social da Amazônia”, que foi bastante elogiado (FMCP, 1945c, p. 30). Nem tudo eram viagens e alegrias. A década de 1930 marca um acontecimento trágico no meio acadêmico, apenas descrito por Clóvis Meira, ainda que vivo na memória de muitos alunos daqueles anos: 436 Quando entrei, em 1935, ainda ressoava o trágico incidente que envolvera os professores Acylino de Leão, Mattos Cascaes e Arthur França, ao reprovarem um aluno de sexto ano, levaram-no ao suicídio. Mesmo no último ano o aluno ainda era podado. Esse rigor é que deu a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará o renome que passou a desfrutar entre as suas congêneres, apesar de situada no extremo norte (MEIRA, 1986a, p. 17). Outro incidente desagradável daquele período, ainda que esteja mais para cômico do que para trágico, ficou registrado no livro de documentos recebidos pela Faculdade no ano de 1937. O Chefe de Policia do Estado pede em setembro daquele ano que Camilo Salgado tome providências a respeito de um acadêmico de medicina bastante alcoolizado que “...amedrontava com um dedo humano as meretrizes residentes á rua General Gurjão”. Camilo apuraria o caso e diplomaticamente como era seu costume responderia que o acadêmico havia levado “...para sua residencia o orgão referido no officio, e independente da vontade delle...” (FMCP, 1937a) um aluno secundarista havia feito a exibição pública conhecida. Finalizava que cabia a polícia punir os culpados, não havendo a Faculdade nenhuma responsabilidade naquele caso. Enquanto uns brincavam com peças anatômicas, outros faziam grandes sacrifícios em prol de “material didático”: Conseguíamos os cadáveres dos indigentes da Santa Casa e ficávamos horas a fio dissecando e preparando as peças anatômicas de que necessitávamos. Os ossos eram mais difíceis de se conseguir. O bedel do anfiteatro, que jocosamente chamávamos de “capanga” descarnava os ossos e nos vendia, mas o dinheiro era curto. Resolvemos pedir uma autorização do diretor do cemitério para termos acesso à vala comum. Consegui- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 mos uma escada e descemos pisando nos ossos e escolhendo os mais bem conservados. O lugar era úmido, cheio de insetos de toda a natureza, as paredes gélidas e gotejando água (MEIRA, 1986a, p. 27). Outro aspecto que marcaria a Faculdade nos anos de 1930 seriam as fortes tensões políticas daquele período histórico e que acabavam de alguma forma se refletindo no Casarão da Generalíssimo. Posições partidárias não só dificultavam a vida de alguns estudantes como às vezes forçavam sua transferência para outros estados. Ruben David Azulay11 um daqueles estudantes “convidados” a se transferir no ano de 1938 (FMCP, 1945c, Mapa 8), conta sua história: ...a faculdade era paga. Decidi procurar o major Barata, já eleito governador, e pedi uma bolsa de estudos. Me dedicava muito na faculdade e me destaquei na cadeira de Embriologia e Histologia, onde o professor costumava reprovar em massa. Durante nove meses, estudei de graça, mas o major Barata foi deposto. Cassaram minha bolsa de estudos e me cobraram os meses que estudei sem pagar. Como não tinha nem os 100 mil réis de uma mensalidade e nem o acumulado, a única saída seria largar a medicina. Mas decidi criar um curso paralelo de Histologia para todos os alunos reprovados da faculdade. Cobrava 100 mil réis por aluno e fiquei rico. Consegui pagar os atrasados e me manter na faculdade. [...] O único problema político que tive foi quando tentaram me expulsar da faculdade e fui preso. Mas não porque era conhecido do major. [...] Fui escolhido orador da União Democrática Estudantil. Era a época do integralismo, o fascismo brasileiro. Não consegui terminar meu discurso devido a pancadaria que saiu entre as correntes políticas. Na manhã seguinte, fui acordado pela polícia. Precisava dar declarações sobre o discurso que havia feito. Só não fiquei preso porque o procurador geral Casimiro Gomes da Silva havia escutado meu discurso e me defendeu. Ao mesmo tempo, sofri um inquérito na faculdade para ser expulso. Só não fui expulso porque o professor de Anatomia, Dias Júnior, alegou que a faculdade não poderia expulsar o seu melhor aluno. Como minha situação política e social não estava das melhores em Belém, decidi concluir minha faculdade no Rio de Janeiro. Peguei o Ita do Norte (INSTITUTO DE DERMATOLOGIA PROF. RUBEN DAVID AZULAY, 2008). Outro acadêmico que tomou um “Ita do Norte”, em 1937, Armando Lemos Monteiro da Silva, narra sua experiência: Em Belém do Pará, como na maioria das cidades, o meio estudantil sempre foi o mais visado pelos políticos. As agitações se sucediam contra o Governo imposto. Cursava o quarto ano da Faculdade de Medicina do Pará, quando a agitação começou novamente a invadir as escolas. Surgiu um sério desentendimento entre alguns alunos e professores, políticos, governistas. [...] Tornaram-se frequentes as perseguições de origem políticas no meio universitário. Retalhos da vida acadêmica 437 Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. [...] ...os estudantes organizaram uma passeata para homenagear o General Sotero de Menezes na sua residência na Cremação. Recebeu-nos na sacada de sua casa e quando falava para agradecer aquela manifestação carinhosa de nossa parte começou a fuzilaria promovida pelos capangas do governo. A estudantada só teve tempo de correr para o matagal vizinho de uma cervejaria lugar pantanoso para fugir dos tiros e da pancadaria inesperada. Outros atentados foram praticados. Certa vez a nossa Faculdade de Medicina quase foi invadida por capangas a mando de adversários políticos, misturados, infelizmente, com tropas federais, frequentemente usadas fora de suas atribuições quando era seu comandante o irmão do Governador, coronel Mário Barata. O simples fato de acompanhar o Mestre Dias Junior, pertencente a tradicional família de políticos do Pará, era o bastante para cair na ira dos inimigos (SILVA, A., 1977, p. 192). [...] Também, de outra feita surgiu na frente de nossa Escola um soldado caído, em péssimo estado de etilismo e telefonamos pedindo que o recolhessem. Não demorou trinta minutos compareceu ao local um pelotão enviado pelo irmão do Governador que no momento comandava o quartel com ordem para espancar os estudantes. A pancadaria foi grossa e revidamos então com paus e pedras que estavam ao nosso alcance. Dezenas de atentados contra os estudantes foram cometidos e estes não tinham a quem apelar, na época da ditadura (SILVA, A., 1977, p. 100). 438 Até mesmo as já citadas caravanas acadêmicas tornaram-se inseguras conforme segue a narrativa de Armando Lemos em uma excursão dos acadêmicos de medicina que por pouco não acabou em tragédia: Numa linda manhã de setembro os estudantes da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará receberam um convite do Prefeito de Bragança, Sr. Augusto Corrêa, para visitarem esta cidade. Foi com entusiasmo que cerca de trinta estudantes aderiram ao convite. Até o Prefeito de Belém, Prof. Alcindo Cacela colaborou financeiramente para o bom êxito dessa excursão. Estávamos em plena ditadura. [...] partimos da Estação de São Braz e, no mesmo dia à tardinha, chegávamos a gare de Bragança. Uma multidão, tendo a frente o Prefeito AugustoCorrêa Corria que a patrocinara já nos esperava. A banda de musica do Governo tocava os dobrados e alegrava o ambiente. A viagem decorreu no meio de intensa alegria e entusiasmo. Em todas as cidades intermediárias nos eram prestadas manifestações de apreço e carinho. A poeira da estrada, as fagulhas do trem e o intenso calor que fazia, tudo isso era recebido com muita esportividade pelos estudantes (SILVA, A., 1977, p. 96). Recebidos pelo prefeito de Bragança e instalados no Hotel, os estudantes receberam a programação estabelecida que incluía passeios, visitas e conferências sobre temas diversos como por exemplo “Dia da Árvore”. Neste dia o então acadêmico Epílogo de Campos faria em praça pública uma saudação ao povo bragantino. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 A praça principal foi bem iluminada e o pequeno coreto central preparado para os oradores. A multidão começou a chegar e às sete horas a banda começou a tocar. Logo em seguida subiram ao palanque todos os acadêmicos acompanhados do prefeito e demais autoridades locais. Epílogo de Campos tomou a palavra debaixo de aplausos e iniciou seu discurso. Decorreram poucos minutos quando apagaram todas as luzes da cidade e no meio da escuridão... Iniciou-se tremendo tiroteio partindo da praça. O povo tomado de surpresa começou a correr desabaladamente. Estávamos desarmados e perplexos. Só tivemos tempo de nos deitar no chão para melhor nos proteger das balas assassinas. Era a presença do Baratismo (SILVA, A., 1977, p. 98).12 Evacuada a praça a programação continuou no dia seguinte sem maiores transtornos, exceto por um novo tumulto na partida, desta vez causado pelos próprios estudantes: Cervejas continuavam sendo servidas e a pressão alcoólica subindo. Alguns estudantes começaram a cantar canções com paródias pejorativas. A banda de música não gostou. Insistiram. Ofensas pessoais. Veio o desacato. Iniciou-se uma luta entre os estudantes e os militares da banda. Houve imediata intervenção do sargento responsável que consegui acalmar os ânimos (SILVA, A., 1977, p. 99)13. Este ambiente hostil existente então no Pará, de acordo com Armando Lemos, teria determinado a transferência de muitos estudantes (SILVA, A., 1977, p. 138). Encerramos por aqui esta exposição de “causos”, uma pálida amostra do muito que ainda se tem a buscar das outras “histórias” da Faculdade, particularmente as acontecidas nos seus primeiros anos de funcionamento, quando ela ainda lutava bravamente contra todas as adversidades na tentativa de firmar-se como estabelecimento de ensino de qualidade. Existem ainda muitos episódios – pitorescos ou não – envolvendo os estudantes da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, ao longo de sua trajetória, seja fora das salas de aula ou dentro dos gabinetes e laboratórios do Palacete Santa Luzia. A divulgação de fatos na imprensa com a participação de acadêmicos e professores, ainda que possa soar como fofoca ou amenidade decerto contribuíram para fixar junto à sociedade paraense a “marca” da instituição. NOTAS 1 Ver seu nome entre os presentes na ata de Instalação, no capítulo “A instalação- Era preciso começar”. 2 Ver capítulo “Doutores Haja... - A campanha para aquisição do prédio”. 3 Idem. Retalhos da vida acadêmica 439 4 440 Curiosamente Doyle Maia em seu livro sobre a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro afirma que na realidade “Sabina” era um apelido que pertencia a uma dinastia de vendedoras de laranjas muito apreciadas pelos estudantes. Após o desaparecimento da Sabina original o nome foi adotado por outra vendedora que a substituíu. (MAIA, 1996, p. 76). Como muitos dos professores da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará se formaram na escola da Praia Vermelha o apelido provavelmente veio “importado”. 5 “Têm inicio amanhã o novenario e os populares festejos em honra de Santa Luzia, na praça Dr. Camillo Salgado (antiga Santa Luzia). O arraialzinho está recebendo profusa ornamentação e é fartamente illuminado. Uma banda de musica militar tocará no pavilhão levantado ao meio da Praça de Santa Luzia. As novenas serão cantadas em lindo altar, artisticamente decorado”. (Estado do Pará, 10.12.1926, p. 2). 6 Ver capítulo “Apontamentos para uma história do DAM 1930-1949”. 7 Idem. 8 Folha do Norte, 23 de março de 1932. 9 Os outros componentes da embaixada eram os acadêmicos de medicina: David Gabbay, Ruy Penna Pondé, Leônidas de Mello Deane, Milton Luna Lobato, Gladstone de Mello Deane, Milton Cordovil, Nelson Corrêa de Oliveira, Celso de Mattos Leão, Emílio Nasser, Felippe Nery Guimarães, Nilson Carvalho da Silva, Claudio de Mendonça Dias, Orlando da Costa Tavares Videira, Francisco da Cruz Luna, José Luiz Lemos da Silva, Guilherme Lins de Vasconcellos Chaves, Abelardo Santos e Francisco Siqueira Mendes Pereira este representando o curso de Farmácia. 10 Relatório da chegada. (FMCP, 1935a). 11 Dermatologista e professor emérito da UFRJ e UFF. Radicado no Rio de Janeiro. 12 Baratismo, no Pará, era o termo usando para definir a política do então Interventor Major Magalhães Barata. (N.A). 13 Estavam presentes nesta excursão: Armando Monteiro da Silva, Epílogo Gonçalves Campos, José da Silveira Netto, Clodomir Mendonça Maroja, Waldir Vieira Alves, Hugo Bastos, Gervásio Brito Melo, Nelson Ribeiro Filho, Ary Lage da Silva, Carlos Simões Pereira da Silva, Olavo da Mota Cardoso, Octávio Velloso Salgado e etc. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 28 A Federalização 441 442 Detalhe de azulejo de uma das paredes da FMCP. A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará foi federalizada através da lei nº 1.049, de 3 de janeiro de 1950. Mais que uma simples data ou numeração de uma lei, o ato significa o coroamento de um processo iniciado muitos anos antes, por iniciativa da própria Faculdade, provavelmente por volta de 1930, conforme mencionado em ata de reunião do Conselho Técnico Administrativo, em 23 de fevereiro de 1933, mas que só se concretizaria na prática após a intensa e brilhante participação do Diretório Acadêmico1. De acordo com o Relatório de Atividades do ano de 1949, o projeto de federalização da Faculdade de Medicina de Cirurgia do Pará, fora esboçado em 1937 pelo senador paraense Abelardo Conduru e posteriormente apresentado à Câmara Federal pelo deputado Deodoro de Mendonça (FMCP, 1950b, p. 5). Desta participação do senador Abelardo Conduru, não conseguimos maiores detalhes. Antes do “Projeto Deodoro”, como ficaria conhecida a proposição do deputado, já havia uma movimentação visando à almejada federalização. A questão do valor das taxas cobradas pela Faculdade, mote para ações dos estudantes, acentuar-se-ia a partir de 1943, com os alunos pregando boicote à matrícula, ao ponto da Direção da Faculdade ameaçar “cerrar as portas da Faculdade”, caso estes não se matriculassem até determinada data.2 De 1943 para frente, alternando períodos de acalmia com outros de maior conflito entre os dirigentes do DAM e a Direção da Faculdade por causa das taxas, as coisas seguiriam caminhando. Em fevereiro de 1944, a Revista do Acadêmico de Medicina, em artigo intitulado “Até quando...” manifestava-se sobre as dificuldades de cursar medicina devido ao custo elevado do curso, imputando o encarecimento às taxas cobradas pela Faculdade, “taxas que vem se avolumendo(sic) de âno para âno, devendo-se acrescer, a tudo isso, o preço elevadissimo que têm, em todo país, os livros de medicina”. Paralelamente, o artigo celebrava o resultado do apelo feito pelo Diretório ao Interventor Federal no Estado e que culminou com a criação e manutenção de seis vagas gratuitas sob a responsabilidade do Governo estadual, considerando ser “mais um passo na caminhada difícil de libertar o estudo médico do insolúvel problema monetário da Faculdade de Medicina”. Mencionava ainda o artigo, estar em vias de implantação a nova reforma do ensino superior, “que visa acabar com a exploração quasi que comercializada do ensino”, o qual “não deve e não pode ser um privilégio dos ricos”, “devendo se tornar cada vês mais acessível a todos” (Revista do Academico de Medicina, v. 3, n. 49, 1946, p. 58).3 O ano de 1946 seria o divisor de águas desse impasse que resultaria na federalização. O problema das taxas mereceria destaque na imprensa, com a Folha do Norte de 15 de fevereiro de 1946 noticiando que o DAM depois de tomar conhecimento A Federalização 443 da decisão da Congregação de majorar as taxas e mensalidades4 convocara uma assembléia geral onde fora decidido o seguinte: a) Enviar à Congregação da Faculdade um memorial expondo as inconveniências das taxas e mensalidades, pedindo a revogação do ato e oferecendo a colaboração decisiva do órgão máximo da classe discente para, no ano de 46, reivindicar com a diretoria, junto as autoridades federal e estaduais, o aumento das subvenções, afim(sic) de que as necessidades da Faculdade sejam satisfeitas sem o prejuízo dos alunos, os quais já se sentem “asfixiados” pelo preço do curso médico. b) Caso não seja atendido o referido memorial, o D.A.M. solicitará a intervenção do presidente da República, ministro da Educação e Saúde, diretor do Ensino Superior e diretor do Conselho Nacional de Educação, que terão interesse em baratear o ensino médico, tão necessário na Amazônia como parte de seu saneamento, mesmo que para isso seja preciso o governo federal encampar a nossa faculdade. c) Envidados todos os recursos dos discentes da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, pelo seu órgão de classe, o D.A.M. declarará greve geral (Folha do Norte, 15.02.1946, p. 4). Por sua importância transcrevemos o memorial encaminhado ao Interventor Federal do Estado pelo Diretório Acadêmico: 444 Exmo. Sr. Dr. Interventor Federal do Estado O Diretório Acadêmico de Medicina, expressão da vontade coletiva dos alunos desta Escola, confiante no espírito de justiça e no interesse demonstrado por V. Exa. em tudo que se refere ao importante problema do ensino, pede vênia para expor o seguinte: Este órgão de classe foi notificado há dias de que as taxas de laboratório e biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará haviam sido majoradas para cem cruzeiros (Cr$ 100,00), cada, e que a mensalidade dos alunos da 1ª serie tinha sido elevada para duzentos cruzeiros (Cr$ 200,00). Ora, já há muito que os jovens que tentam estudar medicina em nossa terra veem realizando ingêntes sacrifícios para satisfazer o aumento sempre crescente das taxas escolares. Quase anualmente, ou se criam novas taxas ou se aumentam as já existentes, criando-se para os alunos embaraços inumeraveis. Agora, essa nova majoração, elevando as já enormes quantias exigidas, vem tornar insuportavel a situação de alguns colegas, que terão de abandonar o curso por não poder efetuar tal pagamento. Esta entidade acadêmica procurou entrar em entendimento com a escola, enviando à Congregação da mesma um memorial, cuja cópia remetemos à apreciação de V. Excia., e tentando mesmo entrar em contacto com a Diretoria afim de procurar uma solução satisfatória, que harmonizasse os interesses de ambas as partes. Nada logrou, porém, em virtude unicamente da má vontade dos que se julgam proprietários desta Faculdade. Quanto à descabida alegação da Escola de que o grande número de alunos transferidos para o sul do país veio afetar enormemente as suas finanças, este Diretório tem a esclarecer a V. Excia., que cada um dos colegas a transferir-se deve efetuar um pagamento de dois mil cruzeiros Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 (Cr$ 2.000,00), afim de conseguir o seu intento. Esperando as sábias providencias de V. Excia., reitera os seus protestos de elevada estima e distinta consideração. Pelo D.A.M. Pedro Amazonas Pedroso Presidente (Revista do Acadêmico de Medicina, v. 5, n. 56, 1946). Do mesmo modo, o memorial encaminhado à Congregação: Nós, abaixo-assinados, representantes das diversas séries junto a esse Diretório, conhecedores da decisão tomada por V. V. Excias. em sessão realizada a 25 de janeiro p.p., de que resultou o aumento das taxas de laboratório e biblioteca e bem assim da contribuição mensal dos alunos do 1º ano desta Escola, pedimos vênia para solicitar a V. V. Excias. seja revogada a referida deliberação, pelos motivos infra-citados: a) os parcos ordenados percebidos por alguns alunos desta Faculdade ou por seus genitores são permitem fazer face às necessidades criadas pela carestia de vida, situação que se tornaria insuportável com esse aumento; b) temos sobejas razões para acreditar que essa majoração das taxas, embora crie ingentes dificuldades a alguns colegas, não poderá de modo algum melhorar os vencimentos dos dignos preceptores; c) não nos parece razoavel criar dentro da Escola distinção entre alunos, devendo uns efetuar pagamento superior aos demais, o que contraria uma aspiração deste Diretório, que é a igualdade de todos os colegas em qualquer ano ou condição em que se encontrem; d) esta entidade acadêmica compreende perfeitamente a situação difícil de nossa Faculdade, no que se refere às finanças, sendo nosso desejo trabalhar afim de que os ínclitos professores que aqui exercem o magistério tenham uma retribuição condigna com as elevadas funções que desempenham. Sabemos que as subvenções concedidas a esta Escola não são suficientes, sendo inferiores às concedidas a outras Faculdades do Brasil, razão por que este Diretório assume perante essa Congregação o compromisso de envidar, juntamente com a Diretoria, no decorrer do ano letivo de 46, todos os seus esforços afim de que essa contribuição dos governos federal e estadual seja elevada ao nível que se torna necessário, de modo a permitir à nossa Escola manter-se à altura das congêneres do país e continuar assim a preencher a lacuna do ensino médico na Amazônia. Outrossim, solicitamos a V.V. Excias. seja dado à Congregação conhecimento deste nosso justo apêlo. Certo de sermos atendidos, desde já nos confessamos gratos. aa) Pedro Amazonas Pedroso, Carlos Costa, Jean Bitar, Alcimar Chaves Brigido e Agostinho Sales Filho (Estado do Pará, 20.02.1946, p. 1). Foram enviados telegramas de comunicação da atitude do D.A.M., com pedido de solidariedade, à União Nacional dos Estudantes, União Acadêmica Paraense (U.A.P), Diretórios de Medicina das Faculdades da Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Belo Horizonte e Diretórios das Faculdades de Engenharia e Odontologia do Pará (Estado do Pará, 15.02.1946, p. 6).5 A Federalização 445 Em 19 de fevereiro a U.A.P. reuniu-se “para estudar, medir, imparcial e criteriosamente o ruidoso caso em que vêm de levantar os acadêmicos de Medicina”. Após a reunião estiveram na sede do jornal Estado do Pará solicitando o apoio deste, “para a justa e patriótica campanha em que vão se empenhar, lutando para evitar o negro crime de servir o ensino de fonte de lucros extraordinários”. Os representantes da U.A.P. disseram ainda ser clara e maliciosa a intenção da Diretoria da Faculdade em manter uma medida contraria aos interesses da coletividade, “que não quer sujeitar-se a arbitrariedade e servilismo”. Afirmavam que esgotados os recursos pacíficos a U.A.P. decretaria greve geral, não permitindo a matrícula de nenhum aluno em qualquer Faculdade. “Seremos uma só voz, um só peito, um só braço reivindicando um direito justo”; prometiam inclusive envolver os estudantes secundários. Ameaçavam também, desmascarar publicamente a direção da escola, com publicações diárias pela imprensa, “citando, relatando, estudando, concluindo fatos e argumentos insofismáveis”. 446 Um dos pontos citados era o fato de a Faculdade apregoar dificuldades financeiras, não obstante “as suntuosas obras que tem realizado, algumas necessárias, mas outras francamente sem razão”, dispondo ainda depositada em bancos da elevada quantia de Cr$ 97.000,000. Diziam, também, que as subvenções estaduais e federais haviam passado de 40 e 60 mil cruzeiros, respectivamente, para 60 e 100 mil, além de mais 12 mil da prefeitura de Belém. E perguntavam os estudantes, se antes com recursos inferiores a Escola podia manter-se e realizar edificações em seu prédio, como é que agora não, tendo em vista o aumento de suas verbas? (Estado do Pará, 20.02.1946, p. 1). O assunto ganharia as páginas dos jornais, praticamente todos os dias. Noticiando que o D.A.M. estava em reunião permanente, Estado do Pará, de 16 de fevereiro, informava que o assunto discutido no dia anterior fora o valor de dois mil cruzeiros para a taxa de transferência de “dezenas de alunos que não suportando o preço avultado do curso médico em Belém e também outras inúmeras e frequentes arbitrariedades vêm-se na contingência de emigrar para o sul” (Estado do Pará, 16.02.1946, p. 4). A mobilização dos estudantes para não efetuar suas matrículas e as decisões tomadas pela Direção da Escola, não acatando o apelo dos alunos gerariam um clima de conflito, com os estudantes propondo a deflagração de greve. A nota do Diretório publicada em Folha do Norte de 20 de fevereiro de 1946 dá conta desse estado de coisas: ESTUDANTES DE MEDICINA ENTRARÃO HOJE EM GREVE GERAL Despacho incongruente do sr. Diretor no apêlo dos alunos à Congregação e ao Conselho Técnico e Administrativo - Em Assembléia geral será pedida a eliminação do seio da classe para os alunos que se matricularem Como foi noticiado, o D.A.M. dirigiu à Congregação e ao Conselho Téc- Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 nico e Administrativo da Faculdade um memorial, no qual pedia, após justas ponderações, que fosse revogada a medida iníqua que majorou as já elevadas taxas da Faculdade. O sr. diretor, porém, a quem cabia, de acôrdo com o nº 5 do artigo 104, do Regimento Interno, convocar os responsáveis pela direção técnica e administrativa da escola, julgou-se no direito, direito indébito, de despachar o recurso do D.A.M. sem levar ao conhecimento daqueles a quem era dirigido. O pretexto foi o mais irrisório possível. No memorial dirigido à Congregação respondeu que não havia dois terços dos membros presentemente na capital, como se, antes de convocá-los, pudesse tomar tal resolução. No outro, enviado ao Conselho Técnico e Administrativo, fechou um circulo vicioso, indeferindo por não poder o C.T.A. decidir assunto resolvido pela Congregação, não obstante termos solicitado a este Conselho que levasse ao conhecimento daquela o nosso justo apêlo. Ainda desta vez, o sr. diretor andou fugindo ao direito, pois não tem atribuições para tomar pessoalmente qualquer deliberação pelo Conselho Técnico e Administrativo da escola. Era este que se devia declarar incompetente, se fosse o caso. Vemos assim a intenção maliciosa da Diretoria em tentar manter de pé a todo custo u’a medida contrária aos interesses de uma coletividade, que não quer sujeitar-se à injustiça e ao servilismo. Em vista dessa decisão arbitrária do sr. diretor em impedir chegue às mãos dos órgãos competentes os recursos interpostos pelos alunos este Diretório solicitou a ss.excias srs. presidente da República, ministro da Educação, diretor da Divisão do Ensino Superior e presidente do Conselho Nacional de Educação, providências urgentíssimas, afim de evitar que a greve perdure até o fim do ano (Folha do Norte, 20.02.1946, p. 4). No dia 22 de fevereiro, Estado do Pará publicaria uma nota encaminhada pelo Diretório: [...], os estudantes da Faculdade de Medicina vem pleiteando a revogação do [...] aumento das taxas escolares. Não é de hoje que esses aumentos sucessivos vêm sendo feitos, engendrados pelos espíritos maquiavélicos dos Silveiras e que muito se gabam de manobrar as diretorias e os próprios professores. O aumento atual é [...] ilegal. Em primeiro lugar majorou as taxas dos alunos do primeiro ano, colocando-os em desigualdade perante os demais, [...]. Em segundo lugar, a reunião da congregação a que o sr. secretário alude como tendo resolvido a majoração foi ilegal e não pode prevalecer. O Regimento Interno [...] determina que a congregação só pode reunir e deliberar contando com pelo menos dois terços de seus professores. [...] não estão em Belém professores catedráticos em número suficiente ao exigido [...] e desafiamos o sr. secretário e a própria diretoria da Escola a publicarem os nomes dos [...] presentes á reunião [...] e o teor da ata [...]. É nula ainda, [...], porque, o dr. Epílogo de Campos, fiscal federal da Faculdade foi eleito deputado federal e encontra-se presentemente no Rio de Janeiro e já lá se encontrava na data da reunião, [...], o que era necessário para sua validade. Desafiamos o sr. Silveira a provar em contrário. É nula [...] porque o Regimento Interno contém em seu texto uma tabela de taxas, aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação e somente o referido Conselho tem atribuições para modificá-la e, ainda A Federalização 447 448 mesmo que a Congregação pudesse fazer qualquer modificação no Regimento, esta para que pudesse ser posta em vigor teria que ser submetida á apreciação e aprovação do Conselho [...]. É contra a ilegalidade patente e irretorquível de tais atos que os estudantes se batem. Enviado um recurso dos mesmos á Congregação da Faculdade o sr. diretor, certamente guiado pelo sr. Olimpio da Silveira, mais uma vez agiu ilegalmente e indo além de suas atribuições indeferiu indevidamente um recurso que não lhe era dirigido e que somente a Congregação poderia deliberar. [...] os estudantes endereçaram novo e bem documentado recurso ao Conselho Técnico Administrativo e que mereceu novo indeferimento por parte do dr. diretor embora lhe escapassem atribuições. [...] o aumento em apreço em nada influirá no orçamento da Escola, auxiliada com cento e oitenta mil cruzeiros pelo Governo Federal, Estadual e Municipal e que a única justificativa apresentada pelo professor Henrique Esteves na reunião ilegal da Congregação foi de que o ensino médico estava barato. Com dados falsos fornecidos certamente pelo sr. secretário, ludibriado em sua bôa fé, chegou a afirmar que um litro de formol, que antigamente custava sete cruzeiros estava custando noventa e que as taxas da Faculdade de Belém eram as mais suaves do Brasil. [...] um litro de formol custa atualmente apenas nove cruzeiros. Diante do indeferimento “ilegal” exarado pelo dr. diretor aos requerimentos quer nos parecer que os dirigentes da Faculdade de Medicina estão na certeza de poder pensar pelos professores e que o Regimento de nada vale. Com o afastamento [...] do dr. Epílogo de Campos [...], urge a nomeação de novo fiscal federal para pôr termos aos atos ilegais que vêm sendo praticados. Justiça é tudo quanto desejam os acadêmicos da nossa Faculdade de Medicina e Cirurgia. Diretório Acadêmico de Medicina (Estado do Pará, 22.02.1946, p. 1). Na mesma data, pela manhã, aconteceria reunião extraordinária do VII Conselho Regional dos Estudantes para avaliar a situação do aumento das taxas, contando com a presença do Dr. Epílogo de Campos, ex-fiscal federal junto à Faculdade, na ocasião deputado federal (Estado do Pará, 23.02.1946, p. 4). Epílogo abriu os trabalhos falando do momento político e da importância dos estudantes no mesmo. Concluiu reconhecendo serem justas as reivindicações dos estudantes, porque “ainda há quem julgue que o ensino é privilégio de uma classe”. Em seguida, o presidente da U.A.P., Armando Mendes, após solicitar apoio ao Dr. Epílogo, pediu aos colegas que usassem de toda franqueza, sem receios, pois a resolução pré-estabelecida era levar até às últimas consequências, o que ficasse ali resolvido. Seguiu com a palavra o presidente do D.A.M., Pedro Amazonas Pedroso, resumindo os acontecimentos e os fatos que levaram o Diretório ao recurso extremo da greve e porque recorria à U.A.P. na busca de uma solução definitiva para o caso. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 O acadêmico Luiz Ozires da Silva, da Faculdade de Direito, disse que, esgotados os recursos pacíficos, só havia o recurso da greve, que teria que ser geral, estendendose a todos os acadêmicos, até que o presidente da República interviesse. Wilson Barroso, pela Medicina, propôs um último recurso, que seria a interferência do Dr. Epílogo de Campos. Epílogo aceita participar e fala que, por não ser mais fiscal federal, para melhor avaliar sua participação, pedia a suspensão dos trabalhos por 48h, o que seria aceito pela assembléia. O Dr. Roberto Chalu, advogado pelo D.A.M, ao manifestar-se mostra a impossibilidade do aumento das taxas lendo portaria do Ministério da Educação, de 6 de agosto de 1944, mais especificamente seus artigos 1º e 2º, respectivamente: Art. 1º os estabelecimentos de ensino de todo País não poderão elevar os preços cobrados a seus alunos, além dos limites em vigor a 17 de abril de 1944; Art. 2º o Departamento Nacional de Ensino examinará desde logo, o aumento de preço verificado em cada estabelecimento secundário e de ensino superior, entre 1943 e 1944, e representará ao Ministério da Educação contra a majoração porventura excessiva. E conclui dizendo que o único serviço que o Dr. Epílogo teria que fazer seria dar conhecimento da referida portaria; a Diretoria da Faculdade, que tinha conhecimento da lei, se não desistisse de seus intuitos estaria agindo com premeditada e insofismável má fé, pois tinha condições financeiras suficientes para sua manutenção. Em aparte, o presidente do Diretório, Pedro Amazonas, pede ao plenário a aprovação da publicação de uma nota rebatendo as infâmias assacadas contra o Diretório, pois estava impossibilitado de fazê-lo pela suspensão do Conselho pelas 48 horas proposto pelo Dr. Epílogo. O plenário também aprova que, resolvida a questão da medicina, favorável ou não, “seja o sr. Secretário da Faculdade desmentido nas afirmações que fez, por faltarem á verdade, ofendendo a briosa integridade do D.A.M”. O acadêmico Luiz Ozires propõe que fossem considerados acadêmicos os estudantes aprovados nos exames de admissão às Faculdades, para sua integração ao movimento, evitando a exploração das diretorias das Escolas, levando os calouros a se matricular por medo de serem prejudicados. Também que o Conselho tomasse a decisão firme e inabalável de que nenhum veterano se matriculasse, “caso essa matrícula fosse negada aos calouros”. Um acadêmico de medicina impedido de fazer exames de 2ª época, por já estar encerrada a matrícula, denuncia ter sabido que o secretário da Faculdade estava prometendo a alguns estudantes nas mesmas condições, de realizarem a 2ª chamada, desde que se matriculassem “furando a parede dos acadêmicos”. Avaliando o pânico natural dos calouros e também dos veteranos, para efeito legal em caso de uma greve geral e também por falha nas negociações do Dr. Epílogo de A Federalização 449 Campos, o acadêmico Carlos Lima propõe que fosse requerido em juízo um mandato de segurança, “colocando-se no banco a quantia correspondente à matricula para o presente exercício escolar nas várias faculdades”. Roberto Chalu diz que não seria propriamente um mandato, pois, em virtude do pouco tempo que havia até a data legal do fechamento da matrícula e da entidade a qual seria dirigida, o que deveria ser feito era “um protesto, que já deverá estar pronto na segunda-feira, dia 25, quando dará entrada na Repartição competente, se fracassar a mediação do Dr. Epílogo de Campos”. Após a redação da nota oficial, seriam aprovados votos de louvor ao Dr. Epílogo de Campos e ao jornal Estado do Pará. A notícia concluía dizendo ter o jornal procurado o Dr. Epílogo, à noite, para saber de seus movimentos, com este afirmando ter contatado com a Direção da Faculdade, encontrando dificuldades aos seus esforços. O texto prosseguia dizendo que “tornase crônica, pois, a intransigência da Direção Médica é quase inevitável a greve geral, consequentemente, dos universitários paraenses, solidários aos colegas de medicina”. 450 O Conselho de Estudantes reiniciaria sua reunião dia 23, à tarde. O Dr. Epílogo de Campos faria um resumo das suas atividades: tendo procurado não só o tesoureiro da Faculdade como também seu Diretor, o secretário e membros do corpo docente, falara das dificuldades encontradas. Disse que naquela manhã fora procurado pelo Dr. Acilino de Leão para assistir a reunião do Conselho Técnico, mesmo sem já não ser mais o fiscal federal. Na ocasião da reunião tomara conhecimento que a questão iria ser “posta nas mãos do dr. Otavio Meira, interventor federal no Estado”. O interventor, ao tomar conhecimento do problema através do noticiário e das dificuldades encontradas por Epílogo, escrevera a administração da Faculdade oferecendo-se como mediador, sendo esse o motivo da reunião do Conselho Técnico Administrativo (CTA, 1946, p. 175-179). Por esta razão, o Dr. Epílogo resolvera abster-se de qualquer manifestação, “ficando a Interventoria Federal encarregada do mesmo fim a que se propunha”. Pondo-se à disposição dos estudantes paraenses na capital da república, após sua explanação retirou-se da reunião. Em seguida, o presidente da U.A.P. disse ter tido conhecimento que alguns estudantes haviam efetuado sua matrícula na Faculdade de Medicina, “que a ser verdade, patentearia um caráter doentio e faltoso dos mais elementares princípios de união”. Pedro Pedroso rebate dizendo que eram apenas boatos visando quebrar a solidariedade entre os acadêmicos. Armando Mendes, presidente da U.A.P., disse ter absoluta certeza da matrícula do acadêmico Josias Macedo, pedindo um voto de censura ao mesmo. Prosseguindo, Armando Mendes disse ter sido a presidência da U.A.P. e particularmente do Diretório de Medicina, procurada pelo Interventor Federal. Por estar Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 em cima da hora, somente ele comparecera à residência do Dr. Otavio Meira no dia 23. Após ouvir um relato dos fatos, o Interventor ofereceu-se como mediador, tendo os estudantes, sem poder para deliberar naquele momento, prometido levar a resposta às 18h, juntamente com o presidente do D.A.M. A proposta foi aprovada pela plenária, com o presidente do D.A.M. divulgando correspondência enviada pelo Interventor: Governo do Estado do Pará Gabinete do Interventor Federal Belém, 23-2-46 Senhores membros do Diretório Acadêmico de Medicina, Cordiais saudações Neste momento, acabo de escrever ao professor Acilino de Leão, diretor da Faculdade de Medicina, uma carta na qual ofereço-me a servir como árbitro na pendência existente entre os jovens estudantes de Medicina e aquela Escola. Venho dar-lhes conhecimento dêsse oferecimento para que êsse Diretório declare se aceita a minha intervenção arbitral, pois só mediante a anuência irrestrita de ambas as partes poderei funcionar como juiz no caso. Quero deixar bem claro que a decisão que por mim for proferida deverá ser aceita por ambas as partes, que a isso deverão se obrigar. Aguardando sua deliberação, subscrevo-me, cordialmente. Otavio Meira6 A resposta dos estudantes de aceitar sem restrições a mediação foi levada ao Interventor, no Palácio, juntamente com um relatório sobre todas as etapas da questão das taxas (Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1). A primeira medida solicitada ao Interventor era a prorrogação do prazo para as matrículas. Em seguida o presidente do D.A.M. discutiu rebater “ás infundadas afirmações, que por um vespertino, vem fazendo o sr. Silveira, secretário da Faculdade, ferindo até a dignidade do Diretório daquele Estabelecimento”. Fica decidido aguardar o fim das negociações do interventor “para devida a resposta de desafronta”. Na mesma reunião foi aprovada uma nota oficial com voto de louvor aos professores da Faculdade e um protesto contra as acusações infundadas do sr. Secretário da Faculdade “cujo único objetivo é criar desharmonia entre os corpos docente e discente”. A resposta da Congregação seria tirada em reunião com a presença de 17 catedráticos. Por onze votos contra seis o órgão acatava a mediação do Interventor (Folha do Norte, 22.02.1946, p. 1). O teor do documento da Congregação é o seguinte: A Congregação da Faculdade de Medicina, tendo ouvido a leitura da carta do Exmo. Sr. Dr. Otavio Meira, dirigida ao Sr. Dr. Diretor desta Faculdade, resolve aceitar a mediação de S. Excia., comprometendo-se a acatar sua decisão sôbre a situação financeira desde que fique já assegurado o aumento da taxa de frequencia, para todos os alunos, para Cr$ 200,00 en- A Federalização 451 sais, a partir de 1947, bem como o aumento das taxas de laboratório e biblioteca, também partindo do ano vindouro (Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1). A carta entregue pessoalmente pelo Diretor, Dr. Acylino de Leão, reapresentava a proposta feita ao então interventor Magalhães Barata: “se o Estado der Cr$ 600.000,00 anuais à Faculdade, o ensino será gratuito; se der Cr$ 300.000,00, os alunos terão abatimento de 50% nas atuais mensalidades e taxas” (CTA, Ata de 23.02.1946). A Congregação só não aceitava interferência na parte disciplinar. No dia 26 de fevereiro, o mesmo jornal noticiava que a situação continuava sem solução, e que o secretário da Faculdade, alegando cumprir ordens da Congregação e do Conselho Técnico, “permanecia firme no aumento já anunciado, tentando dar um caráter político á reação que no seio da classe estudantina provocou aquela medida.” (Estado do Pará, 26.02.1946, p. 1) Afirmando não haver nenhuma medida legal que amparasse os estudantes e nenhum dispositivo em que se baseasse o aumento, o secretário “deixa entrever claramente que é um critério econômico, único e exclusivamente, que está dando motivo á luta universitária”. 452 A notícia destacava a expectativa para com a reunião do Conselho Técnico, marcada para aquele dia “para discutir a mediação do interventor”, com a esperança de que, “dado o espírito magnânimo de muitos que o integram, saibam compreender o apelo da classe médica acadêmica”. A edição do dia 27 traria pesadas críticas ao secretário da Faculdade, em função de suas declarações A Folha Vespertina, do dia 22 do mesmo mês. Em nota aprovada em sessão de 22, o D.A.M. rebate as declarações do secretário. Começava dizendo que este teria arbitrado sobre o prazo de matrícula, à revelia da legislação (Estado do Pará, 27.02.1946, p. 1). Também, quanto ao secretário não se achar “inimigo dos estudantes”, os estudantes diriam que isto seria julgado pelo público, pois “embora diante de tantas tentativas para agravar a situação de mais de uma centena de estudantes, estes não poderão considerar o sr. Silveira como seu amigo”. O secretário afirmara que, “o que os alunos pagam, não dá nem para as despesas do professorado”. Entretanto, o diretor, no relatório de 1944, declarava que a principal fonte de renda era a contribuição dos alunos; e quanto maior o número de alunos matriculados, maior a receita. Estas declarações deixavam os alunos indecisos sobre em quem acreditar. Em relação à subvenção federal de oitenta mil cruzeiros só poder ser aplicada em “construções novas, aquisição de material para o laboratório e livros para a biblioteca”, os alunos diziam que ela aumentara para cem mil cruzeiros. E agradecendo a informação sobre sua utilização sugeriam ao secretário que “em vez de outras despesas suntuárias (como derrubar uma bôa escada para construir outra, etc.) empregasse uma parte daquela quantia em beneficio do laboratório”, tornando desnecessário o aumento tão rápido da taxa de laboratório. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Quanto ao pessoal do diretório dever para a Faculdade – “quem mais me ataca é quem mais favor deve á Faculdade. Há dois anos não paga nada (palavras de Olimpio)” – repeliam dizendo nada dever e que as vagas gratuitas eram dadas pelo Estado, sendo obrigação deste zelar pela educação do povo. Citavam que o presidente do Diretório, abrira mão de sua vaga gratuita em favor de outro colega em pior situação. A matéria prosseguia com várias contestações às declarações do secretário, culminando com o revide à afirmação deste de que se não fosse a Faculdade, Pedro Pedroso seria um caixeiro de taberna, o que foi rebatida com: “a um médico com a mentalidade do sr. Silveira, antes ser um caixeiro de taberna”. Por fim, os estudantes lançam um desafio: se o secretario provar que o sr. Pedroso é comunista, ele renunciaria ao Diretório; se não provar, o secretário renunciaria. À reportagem do jornal, o secretário da Faculdade justificaria a legalidade do aumento das taxas, dizendo que a portaria apresentada pelo advogado Roberto Chalu não estava mais em vigor, sendo o aumento consequência das despesas que a Faculdade tivera que arcar para equiparar-se as congêneres do país: “isso não se faz sem dinheiro”, havendo várias obras a serem concluídas, como o laboratório de Microbiologia e o início de um para Tisiologia:“de alguma parte tem de vir o metal para esses empreendimentos e a manutenção dos já efetuados”. Disse ainda que as subvenções no total de Cr$ 195.666,30 e mais as taxas cobradas “formaram em 44, uma Receita de Cr$ 481.831,60 e em 45 de Cr$ 629.175,10”, sendo que nesses anos, as despesas foram “respectivamente, de Cr$ 578.955,70 e Cr$ 626.824,20”, e que “tudo, pois, é uma questão de dinheiro”. Também que, por intermédio do diretor, já havia sido procurado um entendimento com o governo do estado, no sentido de se “amenizarem as taxas escolares”, mas não fora possível um acordo. Segundo a reportagem, o secretário finalizava dizendo o seguinte: “deem-nos trezentos mil cruzeiros de subvenção anual e baixaremos a metade do atualmente cobrado o preço das taxas escolares; deem-nos seiscentos mil e o ensino em nossa Faculdade será completamente gratuito” (Estado do Pará, 27.02.1946, p. 1). Com base na exposição dos dois litigantes, o Interventor elaborou e enviou a ambas as partes um longo relatório para consubstanciar sua decisão, a qual, conforme exigência feita, deveria ser acatada “sem reclamações por nenhuma das partes”. Após detalhar o valor das taxas em vigor na Faculdade no ano de 1945 e como elas eram cobradas, citava a quantia disponível em banco, conforme o relatório de 1944, além do aumento das subvenções oficiais, incluindo o Serviço de Verificação de Óbitos. Relatava, também, os valores propostos pela Congregação mencionando que as despesas da Faculdade “tem sofrido decréscimo em suas relações para com os alunos”, pois o material das aulas práticas é permanente, sendo utilizadas, ainda, as projeções; e que a conservação dos cadáveres é feita em geladeira, menos dispendiosa que as cubas de formol. A Federalização 453 Em seguida, relatava as etapas empregadas pelos estudantes no sentido de resolver o impasse causado pelo aumento das taxas, bem como as ações do corpo dirigente da Faculdade. Por fim, dizendo não duvidar das razões apresentadas seja pelos dirigentes, seja pelos alunos, decidia: 1º - No ano corrente ficarão em vigor na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará as mesmas taxas e emolumentos que vigoraram em 1945, sem nenhum aumento. 2º - O Governo do Estado aumentará de mais Cr$ 24.000,00 a subvenção que presta áquela Faculdade, aumento este que indenizará este Estabelecimento do que deixa de receber dos estudantes pela não concessão do aumento. 3º - Nenhuma punição ou diminuição de direitos sofrerá qualquer estudante em consequência da resistência que opuzeram ao aumento das taxas. 4º - A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará promoverá pelos meios regulares uma revisão nas suas tarifas, procurando para isso um cordial entendimento com o corpo discente, de modo que no futuro tudo possa se conciliar sem atrito e divergências. Belém, 27 de fevereiro de 1946 (a) Otavio Meira – Interventor Federal (Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1) 454 A decisão de não punir os estudantes não seria bem aceita pelos dirigentes da Faculdade. Procurado pela reportagem do Estado do Pará, o secretário da Faculdade, Dr. Olimpio da Silveira, dizendo-se inconformado com o resultado da intermediação intervencional, afirmaria: A Congregação vai se reunir ‘para estudar’ (aspas é do repórter), a presente decisão. Não concordo com os itens 3 e 4. Sôbre a punição de alunos de Medicina que se empenharam na campanha, bem como sôbre os futuros aumentos – isto é cá conosco. Não toleraremos intervenções neste sentido. A Faculdade durante 26 anos de existência nunca teve pressão de nenhum governo. (Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1) Por outro lado, os estudantes mostravam-se “grandemente satisfeitos com a mediação do dr. Otavio Meira”. Elementos da U.A.P. e do Diretório de Medicina, disseram saber que o Interventor “compreenderia a sua situação e os motivos justos por que enfrentaram todos os riscos, expondo-se a um largo movimento de classe”. Depois de longos debates, os estudantes decidiram que iriam matricular-se. Entretanto, decidiram também que, caso seus requerimentos fossem recusados, “deverão os acadêmicos dirigirem-se ao Cartório do Registro de Documentos [...], onde o registrarão, colocando depois o dinheiro respectivo da matrícula no Banco do Brasil”. Outra decisão tomada foi a de que nada “impedirá de irem á greve se for tentada qualquer medida punitiva pela Direção da Faculdade contra elementos da Presidência do seu Diretório. (Estado do Pará, 28.02.1946, p. 1). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Para discutir a decisão do Interventor, particularmente os itens 3º e 4º, a Congregação reuniu-se no dia 1º de março. Numa sessão definida como “violenta” por 15 votos a dois (Profs. Dias Jr. e Acylino de Leão) seria refutada a proposta do interventor pelo não acatamento do item 3º.7 Deste modo, o inquérito mandado instaurar pelo C.T.A. para apurar as declarações dos estudantes Pedro Pedroso e Jean Bitar, consideradas “injuriosas à tradição da Faculdade” prosseguiria8. Estava declarada a guerra. Mesmo com a mediação do interventor federal, o clima era tenso em Santa Luzia. Com os alunos em greve a Faculdade não poderia funcionar. O assunto voltou à discussão na Congregação em 9 de março. Após “violentos debates”, “em escrutínio aberto”, com um resultado apertado (9 votos a 8), saiu vencedora a proposta do interventor Octavio Meira pela não punição dos acadêmicos9. Votaram a favor os professores: Acilino de Leão, Arnobio Franco, Prisco dos Santos, Porto de Oliveira, Aben-Athar, Dias Junior, Pena de Carvalho, Luiz Araújo e Hermógenes Pinheiro; votaram contra: Lauro Magalhães, Henrique Esteves, Gastão Vieira, Oscar Miranda, Rodrigues de Souza, Cruz Moreira, Pinheiro Sozinho e Rui Romariz (Folha do Norte, 10.03.1946, p. 1). Vale ressaltar que na reunião do C.T.A., de 28 de março de 1946, o Dr. Edgar Porto, inspetor federal junto à Faculdade, manifesta-se dizendo que a Faculdade para promover alguma alteração nos valores das taxas escolares tinha que “dirigir-se ao sr. Ministro da Educação, expondo os motivos”, e que o ministro, “depois de devidamente informado”, remeteria ao diretor do ensino superior” (CTA, 1946, p. 178-182). Em meio a toda a celeuma gerada pela questão do aumento dos valores das taxas, Folha do Norte reproduziria em sua edição de 7 de maio de 1946 trecho do discurso do paraninfo à turma de professoras normalistas. Nele, o advogado e professor Aldebaro Klautau, dizia que o ensino secundário já fora gratuito em virtude de uma lei de autoria dele; que o golpe de Estado de 10 de novembro de 1937 impediu que se transformasse em lei outro projeto de sua autoria instituindo a gratuidade no ensino superior; que essas medidas legislativas tinham tido o apoio do atual interventor, na época deputado estadual; que o Pará, antes mesmo de a gratuidade absoluta e plena da educação transformar-se em preceito constitucional no Brasil, deveria proclamá-la em sua legislação ordinária, decretando imediatamente a sua obrigatoriedade. E apresentava o seu projeto de decreto-lei, onde após vários considerandos sobre a responsabilidade do Poder Público para com a educação; sobre o custo de vida não dever influenciar os valores das taxas cobradas; sobre os valores cobrados representarem pouco na receita do Estado e muito na economia das classes pobres; sobre o regime de vagas gratuitas não resolver o problema, causando inclusive humilhação pela seleção; sobre a educação e a cultura influenciam na vitalidade econômica de um povo; decretava: Artigo. 1º - Fica instituída no Pará a gratuidade absoluta da educação em todos os estabelecimentos de ensino de qualquer grau, criados ou por A Federalização 455 criar, mantidos pelo Estado e, consequentemente, extintos todos os emolumentos e taxas que vinham sendo cobradas dos estudantes nos educandários de ensino normal, secundário e superior e no Instituto Carlos Gomes. Artigo 2º - Este decreto-lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário. O Secretário Geral do Estado assim o faça executar. Palácio do Governo do Estado do Pará, abril de 1946 (Folha do Norte, 07.05.1946, p.1) Outro fator “complicante” para as pretensões da Faculdade em aumentar o valor das taxas era a cobrança da taxa para transferência de alunos para outras escolas. Em reunião do C.T.A., de 4 de junho de 1946, foi lido ofício do inspetor federal dando conta das determinações emanadas pela Diretoria do Ensino Superior, as quais diziam que, “com exceção da taxa de transferência, as demais deveriam ser fixadas pela própria Faculdade” e que a taxa de transferência (Cr$ 1.900,00) havia sido considerada ilegal, devendo ser restituída aos alunos transferidos (CTA, 1946, p. 186-191)10. 456 Embora os dirigentes da Faculdade não concordassem com a decisão da Diretoria de Ensino Superior, teriam que obedecer às ordens, uma vez que a finalidade da reunião do C.T.A. de 22 de agosto de 1946 foi exclusivamente para que tomassem conhecimento das novas determinações da citada Diretoria, que advertia que “funestas consequencias advirão para esta Faculdade, caso não fosse imediatamente reconsiderada a decisão [...] relativa a não devolução das taxas de Cr$ 1.900,00 cobradas aos alunos transferidos”. Ainda assim, os membros do Conselho resolveram manter a sua decisão, por entenderem não haver infração à lei (C.T.A., 1946, p. 198-200). Infelizmente, por falta de documentação, não pudemos acompanhar o desfecho deste tópico. Em 16 de junho de 1946, atendendo o aprovado pelo C.T.A. em reunião de 4 de junho11, a Faculdade publica em Folha do Norte a nota oficial com os valores propostos para o ano seguinte: No ano de 1947, conforme resolveu a Congregação de 26 de fevereiro do ano em curso, vigorarão as seguintes taxas, pagas em quatro (4) prestações: 1ª de 10 a 25 de fevereiro ........... Cr$ 650,00 2ª de 1 a 10 de maio ..................... Cr$ 650,00 3ª de 1 a 10 de agosto .................. Cr$ 650,00 4ª de 1 a 10 de novembro .......... Cr$ 650,00 (Folha do Norte, 07.05.1946, p. 2) O movimento em prol gratuidade do ensino ganharia mais adeptos. Em 25 de junho de 1946, o médico e jornalista Bianor Penalber publica artigo em Folha do Norte louvando o interventor do Amazonas, sr. Julio Néri, por seu decreto pela gratuidade do ensino, “não só no curso primário como no secundário, normal e superior”. Criticando “certos interventores”, que após a revolução de 1930, “entraram a criar desordenadamente impostos e taxas”, com a instrução pública não escapando a esta “sede de ostentar artificialmente receitas à custa do sacrifício do Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 povo”, lembrava que o ensino normal e secundário na Velha República “sempre fôra acessível à juventude pobre”, agora passando a ser “privilégio dos melhores aquinhoados da fortuna”. Dizia que devido à situação econômico-financeira, “é impossível a muita gente ir além do curso primário”, e que em relação ao curso superior, “quase que só podem aspirar a ser médicos, engenheiros e bacharéis, nesse país, os filhos de papai rico”. Reforçava a necessidade dos administradores bem assistirem a população, com a instrução sendo “motivo de cuidados, zelo e preocupação constante”, não bastando abrir escolas, mas, também, “possibilitar acesso aos Ginásios, às Escolas Normais e às Faculdades”. Finalizava pedindo que os demais governantes imitassem o exemplo do interventor do Amazonas (GRATUIDADE do Ensino, 25.06.1946, p. 1, 2º cad). Em julho de 1946 aconteceria o 9º Congresso Nacional de Estudantes, no Rio de Janeiro. Uma das bandeiras dos estudantes amazonenses, em acordo com os paraenses, era a criação de uma universidade na Amazônia (Folha do Norte, 25.09.1946, p. 1). A delegação paraense conseguiria o apoio da UNE e veria aprovada sua tese de emenda constitucional propondo a gratuidade do ensino, bem como a federalização da Faculdade de Medicina, em sessão de 27 de julho de 194612. Referida proposição teve como relator Jean Chicre Bitar, na qualidade de presidente do Diretório Acadêmico de Medicina. Por sua importância história na trajetória da Faculdade, transcreve-mo-la na íntegra: Federalização da Faculdade de Medicina do Pará Necessidade Vital do Vale Amazônico A representação paraense e o Diretório Acadêmico de Medicina do Pará, em particular, solicitam a atenção deste nobre Congresso para a exposição abaixo a que se relacione a um dos problemas máximos dos setores educacional, sanitário e econômico da Amazônia. A ninguém deixa dúvida ser o Serviço de Saneamento o passo primeiro e decisivo para a realização da monumental obra de recuperação e aproveitamento do Vale Amazônico. A questão é de atualidade e mereceu a consideração e o carinho de todos os que compreenderam o seu sentido econômico-social no processo do Brasil. Evidentemente verbas de vulto têm sido investidas e o Serviço Especial de Saúde Pública, objeto de um acordo entre nosso Governo e o dos Estados Unidos não têm outra finalidade. Ainda agora acaba de ser proposto no Congresso Nacional serem aplicados cinco por cento da receita da União no trabalho de soerguimento da Amazônia. Este, porém, é apenas uma das faces na apreciação dos fatores. Quem quer que fale em saúde pública na Amazônia, inegavelmente reconhecerá a base sólida que representa a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Servindo a meio-Brasil, pois é a única existente de Pernambuco ao Acre, concentra o ensino médico de cinco Estados e quatro Territórios, no total de 4.345.302 Km2 e 5.500.000 habitantes, sustém-se das subvenções A Federalização 457 dos governos federal, estadual e municipal, ao lado das elevadíssimas taxas cobradas aos estudantes, na sua grande maioria desprovidos de recursos financeiros e muitos ainda com obrigação de família. Isso pode-se constatar examinando as fichas de concorrência e vagas gratuitas mantidas pelo Governo do Estado e distribuídas a critério do Diretório. Além do mais, de ano a ano, as taxas vêm sendo majoradas, do que resulta um número reduzido de matrículas, para grande prejuízo do Serviço Sanitário da Região. Até o corrente ano, em nossa Escola, está em vigor a seguinte tabela de preços: Taxa de matrícula .................................Cr$ 200,00 Mensalidades (9 meses a Cr$ 150,00).....1.350,00 Taxas de frequencia.......................................150,00 Taxa de laboratório..........................................50,00 Taxa de biblioteca............................................50,00 458 Por uma guia de transferência cobra a Faculdade de Medicina a quantia de dois mil cruzeiros, evidentemente ilegal, uma vez que a taxa autorizada pelo Ministério é de, apenas, cem cruzeiros. Para agravar e como pelos precedentes não constituiu surpresa, já foi anunciado aumento para 1947, quando o aluno terá de pagar bimensalmente seiscentos e cincoenta cruzeiros ou sejam trezentos e vinte e cinco mensais, ficando liquidada a taxa de promoção antes que se realize a prova parcial final, isto é a terceira. Disposição visceralmente e arbitrária, porque o seu fundamento sendo incerto, como é o acesso a uma série seguinte, não há porque antecipar-se o pagamento. O sistema será o seguinte: primeira prestação, a ser liquidada de 30 a 25 de fevereiro — Cr$ 650,00; segunda — de 1 a 10 de maio — Cr$ 650,00; terceira — 1 a 10 de agosto — Cr$ 650,00; quarta —1 a 10 de novembro — Cr$ 650,00. No fim do ano letivo, o estudante terá pago Cr$ 2.000,00, soma que, para a grande maioria, dado o seu nível econômico de subsistente, é realmente exorbitante. Isso para o estudante paraense. O que dizer dos colegas dos Estados vizinhos, que, além de taxas, têm ainda de encarar a agravação do seu padrão de vida longe da família e das facilidades de seu centro natal. Fossem as cifras mais modestas e teríamos provavelmente um grande incremento de matrículas, no curso médico. Não faltam as vocações médicas. A barreira está no custo da carreira. Conforme prevê o art. 5°, § 2° do Regimento Interno da Faculdade de Medicina, o número de vagas, em cada série, é fixado em cem (100). O de matrículas realizadas efetivamente fornece a média de 25,5 por série — quer dizer mais ou menos um quarto da previsão regimental. (Relatório de 1945, da Diretoria). A Faculdade diploma anualmente, a média de 20 alunos, de procedência diversa. Desses cerca de trinta por cento são de outros Estados e voltam à sua origem. Ora, o Pará, por exemplo, só na capital com seus duzentos e cincoenta mil habitantes, absorve completamente o coeficiente de médicos que lhe cabe em cada turma (14 ou 15), sem que, nessa fração, tenha preenchido o mínimo de suas necessidades. O Estado, nessas condições, encontra os maiores óbices para ajustar o seu quadro sanitário. Cincoenta municípios vivem em uma alarmante indigência médica, dada a insuficiência de elementos. Ê quase dispensável focalizar os prejuízos de toda Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 natureza advindos dessa lacuna. Em uma região onde a assistência social é esteio de sua prosperidade, a oscilação econômica é vertiginosa, sem o desvelo diuturno e permanente pela saúde do material humano. Não cansa repetir que as fontes explicativas dessa pobreza — é a formação demasiadamente dispendiosa de um médico. A Faculdade de Medicina do Pará, sugestivamente, com 26 anos de existência, serviu a região apenas com 318 médicos. Número irrisório, se atentarmos ser em grosso o de diplomados anualmente pela Universidade do Brasil, neste campo. Gradativamente e de maneira assustadora, ser médico no Pará torna-se prerrogativa de minoria restrita de abastados. “Estuda medicina quem póde”. O Secretário da Faculdade de Medicina revela que já se perdeu de vista a finalidade coletiva da instituição, esquecendo-se de que êle têm um alto significado humanitário e sagrado, verdadeiro patrimônio da comunhão pela utilidade e fins a preencher. Em entrevista concedida à “Folha Vespertina”, de 27 de fevereiro do corrente ano (recorte anexo), aquele senhor presta as seguintes declarações: “Estuda Medicina quem pode”. “Não se vive só da Medicina. O Brasil precisa de quem cultive os campos”. Referindo-se à mocidade: “Todos sabem que o porco prefere sempre o chiqueiro”, etc, Essa é a maneira de pensar daqueles que se julgam proprietários de um instituto de ensino superior, que surgiu da bôa vontade de um grupo de médicos bem intencionados, já falecidos na sua maioria. Fundada cm 1919, funcionou até 1924 em uma dependência do então Ginásio, hoje “Colégio Estadual Pais de Carvalho”. Daí passou ao atual edifício da Praça Camilo Salgado, outrora de “Santa Luzia”, adquirido com o produto de subscrição popular, lançada pelo saudoso mestre Camilo Salgado, uma das figuras de tradição mais simpático no seio da Escola pela sua humanidade e seu altruísmo profundo. Nascido sob esse signo generoso de amparo à carreira do estudante paraense que não poderia, por seus recursos parcos, freqüentar as Faculdades do Sul, ainda contando em seu ativo o beneficiamento da região com o provimento de um corpo clínico, a Escola vê-se hoje desnaturada nesses dois objetivos, mau grado a abnegação de alguns. Desde os primeiros dias de sua vida, subsiste da contribuição dos alunos, que, em 1945, atingiu Cr$ 318.200,00, de auxílio federal de Cr$ 80.000,00; estadual de Cr$ 40.000,00 e municipal de Cr$ 20.000,00. Na inversão dessa verba, na qual se encontram obras de natureza suntuária, como o majestoso salão Diretoria, ressente-se ainda a necessidade de laboratórios bem equiparados capazes de proporcionar aos discentes conhecimentos práticos fundamentais. Não há hesitação em se julgar da eficiência dos médicos diplomados pela Faculdade de Medicina do Pará, mas, releva frisar, que isto se deve à bôa vontade dos estudantes, ao par da dedicação dos professores, muito mal remunerados na base de setecentos cruzeiros mensais. Daí a se concluir por uma restruturação inelutável da nossa Faculdade, tornando-a acessível a um maior número de candidatos, o que não se obterá nas condições atuais. O Diretório Acadêmico de Medicina do Pará, encarando com real interesse a situação delicada de estudantes não apoiados em base financeira estável, tem dispensado somas relativamente consideráveis no pagamento de taxas inadiáveis na sua liquidação. Apesar disso, contamos ainda A Federalização 459 460 com estudantes que interrompem o seu curso por falta de numerário suficiente, com grande prejuízo para a região. É indiscutível que o problema amazônico é um problema médico. Assim: Considerando que a Faculdade de Medicina do Pará é de interesse público, mesmo porque não existe outro estabelecimento congênere na vasta extensão territorial que vem beneficiando; Considerando que é dever dos Poderes Públicos facilitar a instrução das massas com as medidas adequadas que a previdência do Estado ditar; Considerando que nas bases atuais o elevado preço do ensino médico no Pará veda terminantemente o ingresso de grande número de candidatos; Considerando o papel obrigatório que à Faculdade de Medicina do Pará cabe desempenhar no serviço de recuperação do Vale Amazônico, com a formação de turmas crescentes de médicos; Considerando que, no seio da Assembléia Constituinte Nacional, já se cogitou em dados concretos de inserir o auxílio à região amazônica como uma das atribuições constitucionais da União; Considerando ser de inteira justiça remunerar condignamente o corpo docente da Escola; Considerando não vir a medida que no final desta se pleiteia ferir interesses invertidos na Escola, pois que, nascida de subscrição popular, mantida pelos estudantes e subvenções governamentais, pertence antes à coletividade que lhe deu existência; Considerando ser imprescindível substituir a iniciativa privada pela iniciativa pública, mais poderosa e eficiente; A Delegação Paraense e o Diretório Acadêmico de Medicina apresentam ao IX Congresso Nacional de Estudantes a presente sugestão para que seja encaminhada aos Poderes Competentes e resumida na decretação da federalização da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, única medida capaz de solucionar o ensino médico no Pará e mais um gráu conquistado para a criação da Universidade do Norte. (Revista do Academico de Medicina, Belém, v. 6, 1946, p. 29-31). Enquanto se desenrolava o Congresso Nacional dos Estudantes, em julho do mesmo ano, o ministro da Educação e Saúde, professor Ernesto de Souza Campos, médico e professor da Faculdade de Medicina da USP, onde chegou a Diretor, esteve em Belém visitando a Faculdade de Medicina, a convite do deputado Epílogo de Campos. Depois de percorrer as instalações da Escola, reuniu-se com a Direção e representantes dos corpos docente e discente da mesma, além de representantes do Governo estadual e prefeitura. Na sala da congregação, após a saudação inicial pelo Diretor, Dr. Acylino de Leão, foi saudado pelo doutorando Ramiro Khoury, que “num discurso equilibrado, em nome dos discentes, expôs ao sr. ministro as necessidades e os anseios dos estudantes paraenses” (Folha Vespertina, 31.07.1946, p. 4). Em sua manifestação, o ministro discorreu sobre os problemas fundamentais do Brasil, sobretudo a tuberculose e a malária, que como os demais problemas de saúMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 de precisavam ser cuidados, juntamente com as condições de ensino, sendo grande a responsabilidade das escolas médicas. Após fazer um apanhado da evolução do ensino médico no Brasil, desde a fundação da primeira escola, na Bahia, em 1808, chegou à Faculdade de Medicina que ora visitava: O aparelhamento da Faculdade de Medicina do Pará já é considerável, mas é necessário envidar esforços para que o aluno possa participar do ensino prático. Devem apelar para que haja um auxílio do govêrno federal, ou do estadual, ou do municipal, destinado à aquisição de material, pois este é o meio do aluno adquirir conhecimentos que o habilitem a proteger as populações (Folha Vespertina, 31.07.1946, p. 4). A proposição dos estudantes paraenses teve grande repercussão, sendo distribuídas várias cópias aos representantes do Pará, na Constituinte (BARRETO, 1950, p. 3). Posteriormente seria encampada pelo Deputado Federal Deodoro de Mendonça, que em 23 de outubro de 1946 apresentaria em plenário seu projeto de federalização da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (Revista do Academico de Medicina, n. 6, 1946). Em sua justificativa, o parlamentar paraense dizia que a federalização era uma “velha aspiração não somente da classe acadêmica interessada diretamente, como do povo”, e que embora a Escola tivesse assinalado “notável progresso”, necessitava “melhor e maior aparelhamento técnico nas instalações” e “um corpo docente devidamente remunerado”, a fim de que pudesse “consagrar toda sua capacidade do ensino médico teórico e prático”. Afirmava que o governo federal tomando a si a Faculdade de Medicina, “realizará obra meritória e de maior alcance nacional”. Depois de tecer comentários sobre a situação sanitária da Amazônia, com altos índices de mortalidade, várias endemias, surtos epidêmicos devastadores, especialmente de malária, grande número de vitimados por verminoses, lepra e tuberculose, afirmava que “30% de nossa população vive retida nos leitos de doença, sem poder trabalhar, inerte, ou a caminho da morte”, e que “o plano de recuperação econômica da Amazônia [...] deve ser antes de tudo um plano sanitário”, pois “somente a saúde resolve o caso da civilização amazônica”. Mencionava o encaminhamento ao Presidente da República, através do Ministro da Educação, com exposição favorável deste, do relatório em que o Diretório da Faculdade solicitava a federalização desta, o que não pôde ser deferido, depois de 18 de setembro, “por lhe faltarem as atribuições que a Constituição fez reverter ao Poder Legislativo”. Dizia que: A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará é a (peça) primordial do aparelhamento de recuperação da Amazônia e é providencial que ela se encontre no ponto avançado de suas brilhantes conquistas, reclamando apenas recursos para ampliar o vasto programa que as necessidades humanas do setentrião brasileiro estão a exigir. A Federalização 461 Traça um histórico da Faculdade que, iniciada em 1919, criada num momento de “depressão econômica dos produtos nativos da floresta nortista”, com a Amazônia “entregue aos seus próprios elementos para sobreviver”, sendo este o imperativo que levara os grandes vultos do Pará a fundarem os cursos superiores de direito, medicina, [...], “uma vez que o Governo estadual, sem recursos financeiros, “não podia tomar a iniciativa pública que lhe competia”; que embora a Escola tivesse iniciado “improvisando professores com vencimentos nulos, usando prédios rústicos, vivendo de taxas precárias e auxílios insuficientes”, era “um dos mais acreditados institutos superiores do país, e seus diplomados por toda parte exibem um alto padrão científico”. Afirmando que o Pará possuía todos os cursos superiores exigidos para a fundação da sua universidade, dizia que seu projeto era “uma parte da necessária federalização de tôdos os cursos superiores da Amazônia”. 462 Relatava que os órgãos técnicos do Ministério da Educação, “mais de uma vez têm proposto a federalização do crédito da faculdade paraense”; que depois de 1930, o diretor do Ensino Superior, sugeriu ao governo “a instalação de faculdades de medicina no sul e no norte do país, de vez que no centro já existiam as duas tradicionais da Baía (sic) e Rio de Janeiro, sem falar das estaduais e particulares”; que federalizada em 1931 a Faculdade de Medicina de Porto Alegre, ficara a do Pará “relegada ao esquecimento e até hoje insuficiente para a alta finalidade do seu curso”. Falava das dificuldades financeiras para a manutenção da Escola; que os governos federal e estadual “nunca deram o que deviam dar a faculdade”, tendo sido cortado em 1929 um “modesto auxilio de 20 contos que Lauro Sodré propuzera no Senado”. Faz um balanço das finanças da Faculdade citando que o ativo incluía laboratórios, imóveis, aparelhos e instrumentos técnicos, e que a transferência para a União levaria este ativo, que embora não sendo vultuoso para a obra a que está servindo, “vale alguma coisa no acêrvo federal”. Tão logo o deputado apresentou seu projeto, comunicou o fato ao Diretório Acadêmico de Medicina através do seguinte telegrama Jean Bitar – Presidente do Diretório Acadêmico de Medicina – Belém- Pará Prazer comunicar apresentei tribuna Câmara transferência Faculdade Medicina para Ensino Superior União abrindo crédito valor 3817 mil cruzeiros pt Congratulações nobre classe breve concretização sua brilhante luta cultural pt Abraços – Deodoro de Mendonça. (Revista do Academico de Medicina, n. 6, 1946, p. 35)13 A apresentação do “projeto Deodoro” ensejou manifestações de apoio importantes. Em seu discurso, por ocasião de inauguração do novo pavilhão da Faculdade assim se manifestou o Diretor, Dr. Lauro de Magalhães: Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Até o ano de 1947, todos os auxílios obtidos dos governos Federal, Estadual e Municipal foram integralmente utilizados na realização deste severo e rígido programa, e só em 1948, com o aumento do auxílio Federal, com a verba da Valorização Amazônica, por imposição taxativa da lei de aplicação de verbas e auxílios, começamos a utilizar metade, para beneficiar professores e funcionários, e o resto em construções, melhoramentos e conservações, necessários e imprescindíveis para a realização do grande sonho e encerramento da nobre missão de seus fundadores; credenciar a Faculdade para alcançar o prêmio almejado e merecido: a Federalização (FMCP, 1950b, p. 44). Os professores catedráticos da Faculdade encaminharam ao presidente da República, ministro da Educação, presidente da Câmara dos Deputados, presidente da Comissão de Finanças e ao presidente da Comissão de Educação e Cultura, o seguinte telegrama: Apelamos sentimentos patrióticos Vossência apoiando projéto deputado Deodoro de Mendonça que federaliza Faculdade Medicina Pará, com quase trinta anos existência vem prestando inestimáveis serviços Amazônia. Professores catedráticos: Acilino Leão, Orlando Lima, Gastão Vieira, Apio Medrado, Prisco dos Santos, Jaime Aben-Athar, Arthur França, Mário Chermont, Porto Oliveira, Pena Carvalho, Lauro Magalhães, Dagoberto Souza, Luiz Araújo, Dias Junior, Oscar Miranda, Arnóbio Franco, Rodrigues Souza e Celso Malcher (Revista do Academico de Medicina, n. 6, 1946, p. 32).14 Também expressaria sua opinião o Dr. Orlando Lima, professor da Faculdade e, de certa forma, parte interessada na questão. Em 12 de novembro de 1946, através de Folha do Norte, o professor manifesta-se favoravelmente ao projeto dizendo dos “novos e promissores horizontes (que) acabam de rasgar-se com a notícia”, que vinha de encontro às necessidades científicas, pelo que não acreditava que alguém pudesse “regatear aplausos ao ato do operoso e ilustre representante paraense”. Com ênfase afirmava ainda que: “Não há, não pode haver, não é possível admitir a existência de ente algum, professor, aluno, funcionário, ou mesmo leigo de mediana cultura, que desconheça o alcance formidável dessa medida, sobre todas, benemérita.” Lembra da rápida federalização da Faculdade de Direito do Recife e da Escola Politécnica da Bahia, ocorridas em janeiro daquele ano, por conta do que o Diretório Acadêmico da nossa Faculdade enviara documento ao Governo e a vários de seus órgãos, solicitado medida semelhante para a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, capaz de uma vez por todas “de pôr termo às constantes dissidências entre os estudantes e a administração, filiadas, quase todas, a questões de dinheiro”. Fala das vantagens da federalização, onde a contribuição do aluno reduzir-se-ia a uma insignificância, “enquanto que o professor, gozando de todas as regalias dos funcionários federais, passará a receber um salário digno de sua função”. Diz das A Federalização 463 melhorias que deveriam acontecer nos laboratórios, que seriam dotados “de todos os requisitos necessários às indagações científicas, dando gosto ao trabalho”; que nos concursos, não se apresentariam candidato único, “porque de outros Estados virão outras competências”; que não mais se veria “professores a lecionar disciplinas diferentes das de sua secção”. Informa que o apelo dos estudantes paraenses, após ter encontrado “eco na alma de Deodoro de Mendonça”, já dava seus primeiros passos junto ao Presidente Dutra, “que imediatamente assentiu na adoção de tão importante medida”; que se não fora a viagem do ministro Souza Campos ao exterior, “nossa Faculdade já estaria federalizada”. Faz um apanhado da trajetória da Faculdade, que lutando pela vida há quase trinta anos, serena a galgar obstáculos sem conta, colocando a sua despesa em quadro cuja moldura tem o nome de receita, sem nada a dever a ninguém, a Faculdade de Medicina do Pará, embora a passos de cágado, vem sempre progredindo. Tendo visto a luz do dia em sala de empréstimo nos baixos do Ginásio, ela pôde, amparada pelo carinho de seus dirigentes, pela abnegação de seus professores, assim como pelos favores do govêrno, chegar ao ponto em que se encontra e apresentar a Nação um patrimônio de quatro milhões de cruzeiros. 464 Reforçando o aspecto econômico afirma que um “‘boy’ de qualquer banco recebia atualmente 800 cruzeiros mensais”, enquanto que os professores da Faculdade “percebem 680 cruzeiros por mês”. Finalizando o artigo, o prof. Orlando Lima dizia da sua desconfiança no “vultoso do donativo”, habituado que estava a ver “a nossa terra menosprezada pela mãe grande”, o que não lhe impedia de mandar ao autor do projeto os seus mais sinceros “prolfaças, e de parelha, os votos que faço a Deus para que o benemérito projeto breve se concretize na realidade” (Folha do Norte, 12.11.1946, p. 4). Orlando Lima voltaria ao assunto pelo mesmo jornal em de 19 de novembro. Com o mesmo título do artigo anterior – O Projeto Deodoro – e num aparente propósito de sensibilizar seus pares de docência, fala do “formidável alcance do projeto recentemente apresentado à Câmara” e diz que a federalização da Faculdade será o ponto máximo a que essa casa de ensino superior poderá ascender na escala das benemerências, de parabéns devendo estar, por sem dúvida, os que a fundaram, e, a vêm ninando a quase três décadas, com extremo de carinho, desde o berço, radiantes de poder entregá-la agora, já na idade adulta, louçã, garrida e próspera, ao único noivo que lhe convêm: - o governo federal. Ressalva a importância da questão econômico-financeira e suas consequências pela redução das despesas dos alunos e aumento do salário dos professores, resultando num “maior estimulo, maior incentivo aos seus trabalhos e lições”. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Acrescenta a importância da cátedra, que “será sempre a aspiração precípua de todo médico que não seja rotineiro, displicente ou desiludido” e se pergunta o que poderia animar alguém a conquistá-la “quando ele sabe que o seu salário não irá além de setecentos cruzeiros mensais?”, sem direito a aposentadoria, tendo que trabalhar “até morrer”. Dizia que com a federalização, o professor teria, com a compulsória, “o prêmio da sua dedicação, do seu labôr, exercido na minoração do sofrimento humano”. E apelava para que todos congregassem suas energias, “agindo junto aos grandes” para que o projeto “não fique para sempre sepulto no interior de uma gaveta, ou não esbarre diante da muralha da falta de dinheiro que eternamente se levanta diante das pretensões nortistas” (Folha do Norte, 19.11.1946, p. 8). Como ocorre na maioria dos casos, o projeto Deodoro teve uma lenta tramitação na Câmara. Somente em julho de 1948 seria transformado em projeto de lei (BRASIL, 1948), seguindo ao sabor das águas políticas até seu desfecho, após rápida tramitação no senado, onde contou com o apoio dos senadores pelo Pará: Augusto Meira, que foi o relator; Magalhães Barata, que pediria a dispensa dos interstícios para acelerar o andamento do projeto; e Álvaro Adolfo, “incansável em sua faina de levá-lo (o projeto) a bom termo” (BARRETO, 1950, p. 3). Entretanto, a trajetória do projeto não pode ser considerada tranqüila. Em 22 de novembro de 1949, Folha do Norte informava que a federalização estava ameaçada de veto pelo presidente da República. Mencionando a recente federalização da Faculdade de Direito do Amazonas, dizia que o presidente tinha intenção de vetar este projeto, só não o fazendo em homenagem ao governador do Amazonas, Leopoldo Neves, que havia chegado à capital federal. E que na mesma hora em que assinara a mencionada federalização, “assinava o ato aprovando o novo plano do Ministério da Educação, referente ao ensino superior”, o qual estabelecia várias exigências para a federalização das faculdades, ficando assim, a federalização da Faculdade de Medicina do Pará, ameaçada de veto (Folha do Norte, 22.11.1949, p. 4). Em 16 de dezembro de 1949, Folha do Norte noticiava algo mais concreto sobre as pretensões paraenses: informava que o projeto, após ter sido aprovado no senado, dependia apenas da sansão presidencial. Vale registrar que, embora de maneira discreta, a Direção da Faculdade também tentava dar sua ajuda. Em relatório contendo “um breve histórico da fundação da Faculdade” encaminhado ao Diretor do Serviço da Educação e Saúde, o Diretor da escola, Dr. Lauro de Magalhães, concluiria sua detalhada explanação da seguinte maneira: Todos estes grandes melhoramentos que elevam o seu patrimonio ao valor de cerca de dez milhões de cruzeiros, a moralidade e eficiencia de ensino aqui ministrado, concorreram para a apresentação de um projeto A Federalização 465 que se acha na Camara Federal, pleiteando sua federalisação e que teve o parecer favorável das comissões de Educação e Finanças. 15 Da mesma forma se pode depreender o interesse da direção da escola pela federalização através de outro ofício do Diretor encaminhado em 29 de dezembro de 1949 ao “Diretor”, sem identificação, mas presumivelmente ao mesmo Diretor do Serviço de Educação e Saúde, relacionado à criação da cadeira de Tisiologia. Em determinado ponto, o Dr. Lauro Magalhães dizia: 466 [...]resposta, recorro à sinceridade e boa vontade do meu prezado Diretor e amigo para esclarecer-me sobre o assunto, principalmente na parte financeira, sem dúvida a mais importante, visto que a didática e a administrativa já conhecemos. Aproveito a oportunidade que o amável amigo me ofereceu, para pedir informações reais e definitivas sobre a federalização da nossa faculdade, visto até o presente momento estar o assunto como no ar, duvidoso, obscuro e nebuloso. A única comunicação oficial que recebi foi do Exmº Sr. Ministro, por telegrama, informando que por seu próprio alvitre o Exº Sr. Presidente da República enviara uma mensagem ao Congresso pedindo a oficialização de algumas Faculdades, inclusive a nossa. Extra-oficialmente sei que o projeto primitivo de federalização foi aprovado nas duas Câmaras e acha-se presentemente me mãos do Exmº Sr. Presidente, dependendo da sanção de S. Excia. Telegrafei ao Exmº Sr. Ministro agradecendo o comunicado e solicitando informações da situação deste projeto perante a mensagem do Exmº Sr. Presidente e como até hoje não recebesse (FMCP, 1948b). Finalmente, o projeto Deodoro, com poucas modificações, seria sancionado pelo presidente da República e transformado na lei nº 1049, de 03 de Janeiro de 1950, publicada no Diário Oficial da União em 23 de janeiro de 1950, Seção 1, p. 1122, e cujo teor é o seguinte: Lei nº 1.049, de 3 de janeiro de 1950 Federaliza a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA: Faço saber que o CONGRESSO NACIONAL decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º - A Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará é transformada em estabelecimento federal de ensino superior, incorporados todos seus direitos, bens móveis e imóveis ao Patrimônio Nacional. Art. 2º - Para execução do disposto no artigo 1º, a administração federal adotará, desde logo, as seguintes providências: a) - pelo Ministério da Fazenda Serviço do Domínio da União o arrolamento e arrecadação de todos os bens imóveis; b) - pelo Ministério da Educação e Saúde, Diretoria do Ensino Superior, além dos direitos patrimoniais respectivos o arrolamento de todos os bens móveis. Art. 3º - Os cursos incorporados, que passarão a subordinar-se ao Ministério da Educação e Saúde, Diretoria do Ensino Superior, obedecerão ao regulamento dos congêneres federais, aprovado pelo Decreto Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 nº 20.865, de 20 de dezembro de 1931, até expedição de regulamentos próprios, dentro de noventa (90) dias, por decreto do Poder Executivo. Art. 4º - Aos atuais professores catedráticos e aos funcionários administrativos serão expedidos decretos de nomeação, assegurados, para todos os efeitos legais, o tempo de serviço e reajustados os vencimentos às carreiras do serviço público federal. Parágrafo único. Para êsse reajustamento, são criados, no Quadro Permanente do Ministério da Educação e Saúde, os seguintes cargos: 31 (trinta e um) professores M; 3 (três) oficiais administrativos J, K e L; 1 (um) arquivista G; 1 (um) bibliotecário J; 3 (três) escriturários E, F e G; 2 (dois) datilógrafos E; 1 (um) almoxarife I; e, no Quadro Extranumerários: 15 (quinze) serventes, referência V, e 31 (trinta e um) assistentes (um para cada cátedra), referência XVIII. Art. 5º - O professor catedrático, aposentando em consequência de invalidez, terá direito, como pensão a vencimentos integrais estabelecidos nesta Lei. Art. 6º - A presente Lei entrará em vigor na data da sua publicação. Art. 7º - Revogam-se as disposições em contrário. Rio de Janeiro, 3 de Janeiro de 1950; 129º da Independência e 62º da República. Eurico G. Dutra Clemente Mariani Guilherme da Silveira (BRASIL, 1950) Assim que a notícia chegou a Belém, alguns professores foram procurados para dar sua opinião sobre o assunto16. Embora satisfeitos pela concretização de um velho sonho, mostraram-se pouco orientados a respeito do assunto e sem perfeito conhecimento das bases estabelecidas na sanção, desconhecendo mesmo se a reforma seria feita em toda a extensão, passando o financiamento da Faculdade a ser feito pelo Ministério da Educação, ou se continuaria, pelo menos durante mais aquele ano, a funcionar com a dotação da Comissão de Valorização da Amazônia. Falando sobre a questão salarial dos professores e as taxas pagas pelos alunos, o Dr. Olimpio da Silveira, secretário da Faculdade, dizia achar difícil a passagem imediata para o âmbito do ministério, uma vez que o orçamento para 1950 já estava aprovado, juntamente com a verba correspondente pela Comissão de Valorização da Amazônia. Sobre as vantagens pela federalização, Olimpio mencionava a melhoria nos salários dos professores, que passariam de Cr$ 4.500,00 para Cr$ 8.400,00, enquanto que os alunos passariam a pagar taxas menores, semelhantes às cobradas pelo Rio de Janeiro, ou seja pouco mais de Cr$ 50,00 por cadeira em cada período letivo. O Dr. Olimpio também divulgaria o telegrama por ele recebido ainda no dia 3, enviado pelo senador Álvaro Adolfo e com a seguinte mensagem: Dr. Olimpio da Silveira – O sr. presidente da República acaba de sancionar a lei que federalizou a Faculdade de Medicina. Congratulo-me com o prezado amigo, como velho batalhador da vitória alcançada, pedindo esA Federalização 467 tender minhas congratulações aos corpos docente e discente. Quero logo salientar a atuação do dr. Juranddyr Lodi, diretor do ensino superior, na defesa dos foros da nossa Faculdade e sua cooperação para apressar a sanção da lei votada. Abraços. - (a) Álvaro Adolfo (Folha Vespertina, 04.01.1950, p. 3). Outros professores também deram suas opiniões. O Dr. Mario Chermont, decano da Faculdade, disse que a Federalização era o reconhecimento ao esforço de um punhado da abnegados e um prêmio pelos benefícios que a Escola tinha proporcionado, não apenas para o ensino superior como também pela formação de uma geração de médicos que tinham sabido elevar o conceito geral e o valor da ciência médica, destacando-se em exames e concursos pelo país. O Dr. Arthur França disse que a federalização satisfazia uma justíssima aspiração dos dedicados lentes da Escola e um prêmio à obra de Camilo Salgado. De início modesto, chegou ao ponto majestoso de um grande patrimônio. O Dr. Paulo Azevedo disse que materialmente era vantajoso para os professores e alunos, mas não saberia dizer se a faculdade continuaria a ter o desenvolvimento que sempre tivera, lembrando que ela começara em duas salas do Ginásio Paes de Carvalho e que agora possuía um grande patrimônio. 468 Satisfeito com o ato presidencial, o Dr. Luiz Araújo, desejava que a merecida federalização não determinasse a estagnação da vitoriosa trajetória da Escola e nem tampouco o último passo do seu progresso. Para o Dr. Cruz Moreira esta era mais uma etapa vencida no seio cultural paraense; uma vitória a que fazia jus a ciência médica do Pará, pois ninguém poderia negar os benefícios trazidos à coletividade pela Faculdade, onde uma coorte de professores abnegados contribuiu para a formação de profissionais competentes, já se espalhando por todos os cantos do Brasil. Um dos fundadores da Escola, o Dr. Arnóbio Franco, recebeu a notícia como um grande ato que o presidente poderia conceber para uma boa gestão presidencial. Lembrou os nomes de Renato Franco, Evaristo Silva, Magno e Silva e outros, como participantes da cruzada inicial havia 30 anos. Disse que materialmente a redução das taxas dos alunos era medida sensata e justíssima, permitindo a maior difusão dos ensinamentos de Hipócrates. Para o Dr. Prisco dos Santos, a federalização representava um ato de estrita justiça, pois a Faculdade pelo seu passado fazia jus a esse prêmio. Ele que era professor desde a fundação e acompanhara todas as fases de sua evolução, recebia a notícia com grande emoção e alegria. Igualmente satisfeito manifestou-se o Dr. Jaime Aben-Athar, exaltando o significado da medida. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Para o Dr. Oscar Miranda a federalização era um ato de justiça do presidente Dutra; um prêmio de honra a seus médicos fundadores e o reconhecimento do progresso em que sempre caminhou. Disse que este passo agigantado assinalava o advento da Universidade do extremo norte do Brasil. Os estudantes, do mesmo modo, foram ouvidos acerca da federalização. A Folha Vespertina, de 6 de janeiro de 1950, publicou a opinião de vários alunos. O então presidente do D.A.M., Almiro Monte assim se expressou: ...depois de 4 anos de árdua campanha, [...], eis concretizado o maior dos sonhos de nossa classe. Neste momento, [...], maior ainda é o nosso júbilo, por vermos materializada a luminosa ideia de um ex-colega, o então acadêmico e hoje dr. Jean Bitar, autor da tese: Federalização da Faculdade de Medicina do Pará, necessidade vital do vale amazônico e que hoje se constitui uma realidade. [...] ...movimento pro-federalização de nossa faculdade foi, desde os seus albores, promovido e ardorosamente defendido pelos estudantes. Atendendo as suas instancias, foi que o dr. Deodoro, a 23 de outubro de 1946, apresentou á Câmara Federal o ante-projeto de sua notável lei; dali por diante, os Diretórios Acadêmicos que sucederam ao de Jean Bitar, continuaram sua louvável iniciativa; em nossos arquivos possuímos dezenas de exemplares de correspondência especializada do assunto, trocada com as mais eminentes figuras do mundo nacional. Quatro anos se passaram, e cada presidente, recém-eleito recebia a seu tempo, a tremenda incumbência de “descascar” o “abacaxi” da Federalização... [...] ...a vitória e hoje não pertence apenas aos nossos dignos mestres; todos sabemos do seu labor e devotamento [...]; ela também nos pertence e muito, a todos nós que, durante quatro anos, vimos labutando incansavelmente [...]; pertence igualmente aos colegas que nos precederam e, conosco lutaram, lado a lado, ano após ano, para concretizar nosso sonho... [...] O acadêmico Amyntor Cavalcante disse que este era o “grande sonho da mocidade estudiosa da nossa terra”, e que os benefícios seriam “grandes e inestimáveis, pois atingem alunos, corpo docente e corpo administrativo”. Nagib Matni disse desejar que a federalização “faça com que o professor respeite o aluno, concorrendo assim para um ambiente de reciprocidade útil”. Everaldo Martins, secretário do DAM, disse que todos os alunos estavam satisfeitos e ansiosos por usufruir os efeitos de seus esforços, lembrando que a ideia partiu de um estudante e foi o objetivo principal de todos os Diretórios. Esperava que a contribuição dos alunos não fosse posta de lado, uma vez que “tantos querem chamar para si os louros da vitória”. Para Durvalino Braga, a federalização, “pelo objetivo social que visa, assinalará mais um gigantesco passo da juventude de nossa terra”, deixando a medicina de A Federalização 469 ser “atração dos privilegiados da fortuna, como tão prepotentemente se tem apregoado” e os pobres deixarão de ouvir “o tilintar excitante das moedas” (Folha Vespertina, 05.01.1950, p. 1). Tão logo foi sancionado o projeto de federalização seu autor cuidou de informar aos amigos e correligionários. Assim, A Folha Vespertina, 6 de janeiro de 1950, reproduz um telegrama enviado pelo Deputado Deodoro de Mendonça ao prof. Paulo Maranhão e a seu filho, João Maranhão, diretores do referido jornal nos seguintes termos: Rogo aos prezados compadres serem intermediários das minhas vivas congratulações com a mocidade paraense, à ilustrada classe médica e ao nosso generoso povo pela sanção do Presidente da República do projeto de minha autoria que federaliza a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, digna de figurar entre os mais creditados centros da cultura brasileira. Cordialmente, Deodoro de Mendonça. (Folha Vespertina, 06.01.1950, p. 1). 470 No mesmo dia, com o titulo de “Federalização da Faculdade de Medicina e os parlamentares paraenses”, o mesmo jornal informava que os professores da Faculdade iriam oferecer um banquete ao deputado Deodoro de Mendonça, autor do projeto, “ao senador Álvaro Adolfo e demais representantes do Pará na Câmara Alta”, “pelo empenho com que defenderam a causa da federalização”. Informava ainda que a irmã Dalmazia, da Santa Casa, estava encarregada de colher as assinaturas de professores que desejassem “coparticipar do ágape”, já contando com a adesão dos professores Orlando Lima, Aracy Barreto, Acilino de Leão, Arthur França, Jaime Aben-Athar, Arnóbio Franco, Porto de Oliveira, Oscar Miranda e Cruz Moreira. (Folha Vespertina, 06.01.1950, p. 1). Tendo à frente o Dr. Orlando Lima, o grande banquete — “no qual não se exige traje a rigor” (Folha Vespertina, 16.01.1950, p. 1) — em homenagem àquele que “com esforço inaudito, tornou possível a concretização desse grande sonho da classe médica do Pará e de todo o povo de nossa terra” realizou-se no dia 19 de janeiro de 1950, no salão de recepções do Hotel e Restaurante Mme. Garés. Além do deputado, foram homenageados os senadores Álvaro Adolfo (na ocasião representado pelo Dr. Acilino de Leão) e Augusto Meira, o Dr. Jean Bitar e “parlamentares presentes em Belém”. Compareceram ainda, além dos homenageados, os Drs. Orlando Lima, Acilino de Leão, Aracy Barreto, Arnóbio Franco, Arthur França, Prisco dos Santos, Jaime Aben-Athar, Oscar Miranda, Abdias Junior, Pena de Carvalho, Celso Malcher, Orlando Costa, Flavio de Brito Pontes, João Fecury e Otto Ailtner”. Não puderam comparecer os Drs. Cruz Moreira, (representado pelo Dr. Adriano Guimarães), Pinheiro Sozinho, (representado pelo Dr. Orlando Costa), Hermogenes Pinheiro e Pedreira de Albuquerque”. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Segundo o jornal, Servidos vinhos finos e variadas iguarias, o Dr. Orlando Lima ofereceu o banquete, em nome do corpo docente da Faculdade, em nome dos homenageados. Historiou as lutas que terminaram com a vitória da federalização e terminou por acentuar os significativos papéis representados sobretudo pelos Drs. Deodoro de Mendonça e Jean Bitar (Folha Vespertina, 20.01.1950, p. 1). Na ocasião, o ex-presidente do Diretório Acadêmico, relator da tese de federalização da Faculdade e já médico Jean Bitar17 fez o seguinte pronunciamento: Senhores, permiti que eu renuncie a favor dos estudantes da Faculdade de Medicina e Cirurgia a honrosa homenagem com que me distinguis, unindo-me, na vossa bondade a vultos propulsionadores da ideia que hoje comemoramos. Foi o Diretório Acadêmico de Medicina, representado por seu presidente, integrando a embaixada paraense ao IX Congresso Nacional dos Estudantes, sob a diretriz serena e eficiente de Armando Mendes, que apresentou àquele conclave a tese logo aprovada por unanimidade e transformada, por nossa iniciativa, em projeto de lei oferecido ao Congresso sob autoria do deputado Deodoro de Mendonça, a quem rendeis justa homenagem. Nessa época, ainda impressionava vivamente a luta desproporcional que sustentava o Diretório, o providencial e oportuno Diretório de Medicina, para sustar o aumento das taxas proclamado para o ano seguinte. Luta que não poderia ser censurada, pois constituía apenas premissa rudimentar das finalidades daquele órgão. Com a aproximação do IX Congresso de estudantes, arena normal das reivindicações estudantis da Nação, vimos o momento crucial para o debate da matéria tão relevante e a necessidade de uma instancia definitiva para coibir a permanente e asfixiante majoração das mensalidades. Impunha-se também considerar o problema de saneamento, recuperação e aproveitamento do Vale Amazônico, em cuja solução não poderia ficar extranha a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. A formação de profissionais é vital para a conquista sanitária da Amazônia. Como conseguir tal objetivo com as dificuldades obstrutoras do curso médico, permitindo que apenas uma elite abastada pudesse alcançar o diploma final? Daí a nossa tese com as razões que a instruíram: servir a Faculdade a vasta zona norte, do Acre ao Ceará; dever dos poderes públicos de prover a instrução adequada das massas; o barateamento do ensino como estímulo à grande concorrência; o papel eminente da Faculdade na recuperação do Vale Amazônico; a iniciativa da Constituinte em estabelecer a valorização da Amazônia em busca concretas e positivas; a necessidade de remunerar justa e condignamente o corpo docente. Enfim, a substituição da iniciativa privada pela tutela ampla do poder público. E hoje colhemos os frutos daquela ideia depois de toda trajetória sempre impulsionada pela boa vontade simpática das duas casas do legislativo federal. É necessário realçar, senhores a repercussão incomensurável desse ato na disseminação da cultura médica na Amazônia. De todas as faces essa A Federalização 471 conclusão é obrigatória: De um lado pelo afluxo de estudantes incentivados pela redução de suas contribuições, democratizada dessa maneira a profissão de médico que apenas sofrerá os limites vocacionistas dos interessados; de outro lado a dignificação do magistério médico provido de maiores recursos; e mais ainda, pelo símbolo de formação cultural que representa a nossa Escola. Senhores, se a minha voz neste momento é um eco dos grandes anseios dos estudantes do Pará, aos quais continuo preso por laços de grande afeto e solidariedade, consenti que termine o meu agradecimento almejando que o gesto do governo federal seja um aceno promissor para a criação da Universidade da Amazônia. (Folha Vespertina, 21.01.1950, p. 1). O deputado Deodoro de Mendonça, alvo das homenagens, também se manifestou em discurso. Depois de tecer comentários sobre a realidade sanitária da Amazônia e as condições de criação e manutenção da Faculdade de Medicina, “cuja existência, nas etapas mais difíceis, só foi transposta graças a tenacidade apostólica de Camilo Salgado”, disse do início modesto do curso, “engrandecido pela sabedoria dos docentes idealistas e pertinazes”, o que não impediu de produzir profissionais competentes, “espalhando pela Amazônia e por todo o Brasil médicos e operadores colocados entre os mais distintos”, fazendo com que até mesmo os que possuíam recursos, deixassem de buscar “as Faculdades do Novo Mundo, do Rio de Janeiro ou da Bahia”. 472 Prosseguindo, chegou ao ponto deflagrador do processo de federalização: “a insignificância da remuneração aos professores e funcionários e o exagero das taxas exigidas aos estudantes, sacrificando a uns e impedindo a muitos o ingresso, reduzindo a produtividade escolar”. Comenta as tentativas de transferir para a União os cursos médicos e da conduta governamental de somente manter os cursos da Bahia e do Rio de Janeiro. Fala também do relatório do Dr. Jurandir Lodi, Diretor do Ensino Superior, aventando a hipótese de federalizar uma faculdade de medicina no sul – a de Porto Alegre – e uma no norte – a de Belém. Comenta que primeira foi federalizada18 e a de Belém, esquecida. Lembra que ao invés de esmorecer, a Faculdade continuou sua trajetória, formando “novas e brilhantes turma de médicos, dirigidos às mais diversas especialidades”. Diz que a ideia da federalização foi defendida em vários congressos de estudantes, até que em 1946, “organizaram notável estudo”, sendo aprovada e recomendada pelo congresso. Que tendo à frente a “personalidade esclarecida e lutadora de Jean Bitar”, tiraram cópia de seu trabalho enviando-o ao presidente da República, ministros, parlamentares e entidades científicas de todo Brasil. Revela que, ao ler a proposta tomou-se de entusiasmo por ela “apaixonado que sempre fui pelos objetivos de seu tema”, tendo apresentado em 26 de outubro daquele ano o projeto, que foi sancionado pelo presidente em 3 de janeiro, “após uma Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 demorada e tenaz luta, que esgotou todos os recursos para ver triunfante a benemérita ideia da federalização”. Imagina o que será o curso, Favorecido de aparelhagem lecionado pela seleção de grandes professores, buscado por um maior número de alunos de todo o norte do Brasil; com seus modernos laboratórios, suas clínicas eficientes, biblioteca em dia, mestres e alunos estudando, as doenças do nosso vale pesquisadas e dominadas – um instituto científico, em resumo, que ativa e represente a Amazônia, sirva a seu povo e represente a cultura que aqui vamos alicerçando. Deu conta das dificuldades para aprovação do projeto, “às vezes parecendo pequeno a quanto se imagina fácil e criando a descrença na maior parte; que talvez achasse grande demais o feito para tão pequeno iniciador”, embora sempre acreditando, por ser justo e o Pará merecer. Agradece não só aos organizadores da homenagem, mas também aos senadores Magalhães Barata, Álvaro Adolfo e Augusto Meira, que jamais negaram seu apoio, e “sinceramente interessados em conduzir no Senado o projeto 374 até sua final aprovação”. Reconhece o muito que ainda há por fazer pela cultura amazônica e lança um apelo ao governo e à mocidade amazônica pela criação de uma Universidade no Pará, citando outros estados que já possuem a sua em funcionamento e afirmando ser Belém o “centro geográfico do norte e, sem dúvida, o seu fulcro econômico e cultural”, apesar de sermos o “grupo humano mais desprovido de recursos de todo Brasil”. Finaliza convocando a todos para a cruzada de criação da Universidade (Folha Vespertina, 25.01.1950, p. 1). Após o discurso do deputado Deodoro de Mendonça falou pelos parlamentares paraenses o deputado João Botelho, que em vibrante oração, mostrou ter sido antes de todos o deputado Deodoro de Mendonça o “grande lutador pela causa finalmente vitoriosa”. Em seguida falou o Dr. Acilino de Leão traçando um paralelo entre D. João VI e o presidente Dutra no muito que fizeram pelo ensino superior no Brasil, “evidenciando as finalidades psicológicas existentes entre os dois governantes”. Ao final levantou um brinde ao presidente da República, “feito ao som do Hino Nacional, executado pela orquestra do salão, com o que foi dado por encerrado o banquete” (Folha Vespertina, 21.01.1950, p. 1). Além das manifestações dos professores da Faculdade, o D.A.M. ofereceu ao deputado Deodoro de Mendonça, na noite do dia 2 de fevereiro de 1950, um coquetel no Avenida Hotel. A manifestação foi extensiva ao dr. Jean Bitar, “o primeiro dirigente do DAM que alvitrou a campanha da Federalização”. A Federalização 473 O presidente do DAM, Almiro Monte, exaltou o mérito do trabalho encetado pelo parlamentar, externando também a gratidão dos estudantes ao Dr. Jean Bitar. Em seu pronunciamento, o Dr. Jean Bitar disse da sua alegria em se encontrar no meio dos estudantes, pois embora afastado pela conclusão de seu curso, considerava-se um deles, principalmente por ter-se identificado com as lutas estudantis, suas aspirações e necessidades. E que jamais se sentiu longe dos amigos da Faculdade, pois tinha os mesmos ideais. Disse que aquela era a comemoração de um sonho, que por muito tempo empolgou a classe estudantil, “pelo que representava de bonança e justiça para o estudante de medicina da Amazônia”, e que todos os universitários do Pará estavam de parabéns, por formarem um bloco único de idealistas. Dizendo não ter a veleidade de dar conselhos, lembrou aos estudantes a “contraprestação rigorosa de vossa parte, no tirocínio e no currículo normais de vossos estudos”, lembrando ainda que “Redução de taxas, aparelhagem a altura das necessidades do curso, corpo docente bem remunerado, bibliotecas ampliadas – clima de prosperidade e conforto — tudo são fatores de progresso dentro da Faculdade”. (Folha Vespertina, 03.02.1950, p. 1). 474 Usando a palavra num improviso, o deputado Deodoro de Mendonça frisou que a grande luta da classe acadêmica do Pará não terminara; apenas começava a etapa mais árdua, “que terminaria pela concretização do maior sonho, que era a criação da Universidade do Pará”. Expondo as dificuldades antepostas quando defendia seu projeto, pedia ajuda para a criação da Universidade. A matéria cita ainda que “no decorrer dos discursos foram formuladas varias criticas à direção da Faculdade, que vem mantendo um ‘regime de prepotência e menosprezo aos direitos dos alunos’”. A federalização rendeu mais noticiário, homenagens, muitas dúvidas e discussões ao longo de 1950. Ceticismo, descrença, esperança, orgulho pela vitória foram os sentimentos que nortearam o período após o ato presidencial. Segundo A Folha Vespertina, de 23 de janeiro de 1950, alguns professores não compareceram ao banquete, pois “nem tudo era regozijo, mormente a homenagem prestada no Restaurante Gares”, tendo o assunto “federalização” sido motivo de debates na Congregação. Diante da situação, o jornal formulou a seguinte pergunta, pedindo para alguns professores responderem: Sendo a federalização da nossa Faculdade de Medicina um justo galardão para a Amazônia, cujo nível cultural com isso subirá extraordinariamente, por que v. s. como catedrático beneficiado não participou do banquete em que se rendia um preito de gratidão à bancada paraense federal, que tanto trabalhou para a consecução desse notável acontecimento? Alguns professores responderam com evasivas; o Dr. Silveira Netto, disse que não fora consultado e recusou-se a entrar em detalhes; o Dr. Luiz Araújo disse que preferia silenciar, por ser assunto bastante discutido na Congregação; o Dr. Ruy RoMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 mariz dizendo-se regozijado com as vantagens financeiras, tinha sérias restrições às questões administrativas, tendo sido, na Congregação, um dos contrários “ao banquete oficializado, a parlamentares”; que cada um pode homenagear quem quiser, mas não via vantagens em homenagear parlamentares, “pelo fato de terem cumprido o seu dever, de fazerem aquilo que a Nação a eles pagando, espera que façam”. Simbolicamente, a federalização delimita uma fase na vida da Faculdade de Medicina e “uma bela página de luta do Diretório Acadêmico de Medicina” (BECKMANN, 1985, p. 510). Com ela, aos poucos vão saindo de cena os antigos professores, fundadores da Escola, e assumindo os catedráticos formados na própria casa. Com propriedade, Antonio Lobão assim se manifesta: Na evolução natural dos acontecimentos educacionais, cresceu a Faculdade e trinta anos após sua fundação passou a integrar o sistema nacional de ensino, subordinado ao Ministério da Educação e Saúde, como se chamava na época. Os antigos professores, aos quais nunca é demais lembrar para a História, foram-se afastando por implemento da idade. Uma nova geração passou a constituir o corpo docente da Faculdade de Medicina, após cerca de meia centena de concursos para a cátedra ou para a docência livre (LOBÃO, 2006, p. 9). Deste modo, com a federalização e a reestruturação do seu corpo docente, além da conclusão, em 1949, do Pavilhão Lauro Magalhães e do início da construção do Instituto da Higiene, que viria a ser concluído em 1955, o último prédio a ser construído no “complexo de Santa Luzia”, a Faculdade estava pronta para mais uma batalha: a criação da Universidade do Pará, que aconteceria em 1957. NOTAS 1 Trecho da ata da reunião de 23 de fevereiro 1933: “Do expediente constam a redação final do oficio a ser dirigido ao sr. Ministro de Estado de Educação e Saúde Pública pedindo a federalização desta Faculdade, redação esta que foi aprovada”. (CTA, 1933). Em reunião do dia 9 de fevereiro do mesmo ano, um memorial a ser encaminhado ao Interventor Federal também pedia a interferência deste junto ao Governo Federal, “no sentido de tornar, este estabelecimento scientifico, officialisado”, posto que com isto, o Governo Federal praticaria um ato de justiça para o extremo norte,”uma vez que já foi concedido igual favor ao extremo sul”. Mais adiante, em reunião do CTA de 16 de março de 1933, o Dr. Ofir de Loiola propõe envio de telegrama ao Dr. Souza Araújo solicitando a intervenção deste junto ao Ministro da Educação e Saúde Pública, “para deferimento do requerimento desta Faculdade, relativo a sua federalização”. Digno de registro, também, é o ofício datado de 12 de junho de 1932 e enviado pela Direção da Faculdade ao Prof. Dr. Azevedo Ribeiro. No referido documento, Camilo Salgado comunicava a designação daquele professor “para pleitear no Rio de Janeiro, junto aos altos poderes da República, a federalização (grifo nosso) desta Faculdade”. (FMCP, Livro de A Federalização 475 476 ofícios expedidos [1930-1933]. Também sobre este assunto, não obtivemos maiores referências. 2 Ver capítulo “Apontamentos para uma história do DAM 1930-1949”. 3 Outra nota a página 58 diz o seguinte: “O Diretório Acadêmico de Medicina não póde, cumprindo um dever de gratidão, deixar de tornar público o seu reconhecimento à maneira acolhedora e amiga que lhe tem dispensado o Exmo. Sr. Coronel Joaquim de Magalhães Barata, Interventor Federal no Estado. [...] A criação de vagas gratuitas para alunos pobres em nossas Faculdades, é uma providência que objetiva ajudar a juventude a vencer a situação de precariedade econômica em nosso meio, parco de recursos.” (Revista do Acadêmico de Medicina, v. 3, n. 49, 1946, p. 58). 4 De acordo com a ata da reunião do C.T.A, de 23 de fevereiro de 1946, a resolução da Congregação, de 25 de janeiro, fez “um pequeno aumento nas taxas da biblioteca e laboratório – cem cruzeiros anuais e cincoenta cruzeiros nas taxas de prestações mensais, estas, porém, recaindo apenas nos candidatos que vão se ingressar no primeiro ano” e que “os interessados fôram avisados antes de se submeterem ao Concurso de habilitação”. (CTA, 1946, p. 175-179). 5 A mesma nota ainda mencionava que até aquela data nenhum aluno efetuara sua matricula, “apesar de aberta desde o dia 10, devendo encerrar-se o prazo respectivo no próximo dia 25”. 6 O teor da notícia completa: “como vemos é um documento histórico para a vida universitária do nosso estado” (Estado do Pará, 23.02.1946, p. 4). 7 A reportagem informa, ainda, que o secretário da Faculdade recusou-se a receber os requerimentos de matrícula, alegando que só o faria quando tivesse em mãos os Cr$ 24.000,00 prometidos pelo Interventor. (Estado do Pará, 02.03.1946, p. 4). 8 A Comissão de Inquérito era composta pelos professores Drs. Prisco dos Santos, Jayme Aben-Athar e Pinheiro Sozinho (Folha do Norte, 02.03.1946, p. 1). O motivo foi uma denúncia do prof. Ruy Romariz, que teria sido publicamente atacado pelas colunas da Folha Vespertina, de 20 de fevereiro de 1946, por Pedro Amazonas Pedroso, presidente do Diretório, com referência ao curso preparatório para alunos que pretendiam ingressar na Faculdade (CTA, 1946, p. 175-179). 9 A reportagem menciona ainda um “provável pedido de demissão do dr. Olimpio da Silveira do cargo de secretário, [...] em função da última decisão de seus pares”. (Estado do Pará, 10.03.1946, p. 1). 10 Na mesma ata temos a informação que a taxa de transferência que vinha sendo cobrada era no valor de Cr$ 100,00. 11 “propoe o sr. conselheiro Prisco dos Santos que a Faculdade publique uma nota oficial, para conhecimento dos interessados, das taxas que vão vigorar em 1947...” (CTA, 1946, p. 188). 12 “Foi aprovada, por unanimidade, a proposta do Diretório Acadêmico de Medicina do Pará sobre a federalização da Faculdade de Medicina”. Ainda de acordo com a notícia, os estudantes paraenses visitaram os deputados constituintes, com o deputado Carlos Nogueira comprometendo-se a encaminhálos aos presidente da república, quando exporiam os problemas educacionais do norte (Folha do Norte, 28.07.1946, p. 10). 13 Sem menção da data do telegrama. 14 Não há menção da data do telegrama. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 15 Do ofício encaminhado em 28 de outubro de 1948 pelo Diretor, Dr. Lauro de Magalhães, ao Diretor do Serviço de Educação e Saúde, contendo “um breve histórico da fundação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará”. (FMCP, 1948b). 16 Lauro Magalhães, Orlando Lima, Olimpio da Silveira e Araci Barreto. “Federalizada a Faculdade de Medicina (Folha Vespertina, 04.01.1950, p. 1). 17 Formado em 8 de dezembro de 1947. 18 Federalizada pelo Decreto 20.530, de 17.10.1931. (BRASIL, 1931)[2007]. 477 A Federalização 478 29 O que não tivemos a título de posfácio 479 480 Símbolo da FMCP. Escrever sobre uma história qualquer – pessoa, entidade, cidade, - a única coisa realmente desejável seria uma máquina do tempo. A partir daí, o resto viria a contento. Se possuíssemos tal artefato, escrever sobre a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará teria sido extremamente fácil, pois além dos boletins, jornais, documentos, fotografias, depoimentos, vivenciaríamos os fatos na hora. Assim, teríamos participado das reuniões iniciais visando a criação do curso. E saberíamos quais os verdadeiros interesses na referida criação, deixando de lado qualquer especulação socioeconômica – ou filosófica, até, agora já bem distanciados pelo tempo e numa época em que abrir um curso superior significa principalmente visar o lucro. Por exemplo: o que existe de registro sobre a Sociedade Propagadora das Ciências e sua “seguidora” a Associação Científica do Pará, mantedora do curso de odontologia e, depois, do de medicina, pois esse dado apesar de exaustivamente citado todas as vezes que se escreveu - com propriedade ou não sobre a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará e mesmo sobre a Odontologia - não vai adiante dessa informação vazia? E por que a Faculdade de Medicina logo se tornou independente desta associação? Coisa que não ocorreu com a Escola Livre de Odontologia. E qual teria sido o verdadeiro papel da Escola Livre de Odontologia do Pará e, particularmente, o de Antonio Magno e Silva na criação da Faculdade de Medicina, uma vez que existe o relato de que foi sob a Direção do referido professor, “por resolução da Congregação da Escola, em deliberação unânime, (que) se cria a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, nos idos de 1919” (RIBEIRO, 2005, p. 12)? O mesmo fato é citado por ocasião do falecimento do Dr. Magno e Silva, quando a Folha do Norte diz: “Foi ainda por sua iniciativa que se fundou a nossa Faculdade de Medicina, idea considerada por muitos como uma loucura, mas que para sua alma de grande batalhador era uma realidade insophismavel” (Folha do Norte, 28.01.1939). Nunca houve preocupação em esmiuçar as referidas entidades e mesmo as pessoas envolvidas ou nada existe sobre elas? Onde estão os livros da Congregação da Escola Livre de Odontologia do Pará? Aliás, por que Magno e Silva, que teria tido posição de destaque na “tramitação” da Escola somente chegou a professor auxiliar de Clínica Médica ele que seria componente da sua primeira turma? Retrocedendo um pouco mais no tempo, por que não vingou a lei editada por Paes de Carvalho, em 1899, que criava o curso de medicina juntamente com o de direito e de engenharia? Simplesmente as elites teriam achado que tal “avanço” não era necessário? Que era muita “modernidade” para o atrasado extremo norte, mero fornecedor de matérias-primas e de riquezas para o sustento da república que se iniciava? E por que Paes de Carvalho, idealista da referida lei, jamais é mencionado nas “histórias” sobre a Faculdade de Medicina, ele que era médico, também? O que não tivemos - a título de posfácio 481 Teríamos presenciado a elaboração da ata de instalação, no dia 9 de janeiro de 1919 - quem sabe até assinaríamos a referida. E não ficaríamos à procura de um documento que todos têm como perdido, mas que pode ainda existir, uma vez que há uma citação que diz: “do acto [de instalação] consta um documento que o Instituto Histórico do Pará tomou ao seu archivo”? (PARÁ-MÉDICO, set. 1922, p. 362). Como o referido documento não se encontra no IHGP, pode ser que esteja guardado em algum outro arquivo, à espera que alguém de sorte ou com visão de sua importância o traga a lume, aclarando mais essa página da nossa história, não tão antiga assim. Qual a repercussão da notícia veiculada na Folha do Norte de 15 de janeiro de 1919, dando conta da futura criação do curso1? O que pensaram os futuros estudantes, alguns já formados, como Magno e Silva, por exemplo, um dos criadores da Faculdade de Odontologia? Qual a credibilidade de uma nova escola de medicina fora do eixo Bahia-Rio de Janeiro e, por conseguinte, não oficial, implicando o não reconhecimento dos diplomas expedidos? Que “tradição” ofereceria aos seus futuros alunos, quando ainda era praxe buscar os diplomas nas escolas citadas e, ao regressar, divulgar ruidosamente pela imprensa seu feito? O que aliás, ainda acontece, de certo modo, com as devidas modificações e adaptações que o tempo exige. 482 Quais os critérios para a escolha do corpo docente? Apadrinhamentos? Importância social? Notório saber? Por que médicos que também ocupavam funções de destaque no meio social e científico do Estado não vieram a fazer parte do corpo docente? Não se interessaram? Não era vantajoso financeiramente? Não apostaram que o projeto vingasse? Ou simplesmente não foram convidados? Retornando aos primeiros tempos da criação do curso, quais as negociações para a instalação de mais um curso superior no Ginásio Paes de Carvalho? Relações pessoais, políticas, sentimentais, institucionais? Havia salas sobrando? Salas desocupadas ou ocupadas com outras finalidades que não o ensino? Quantas seriam necessárias para o início? Houve alguma compensação financeira para aquele estabelecimento de ensino e seus funcionários, que de qualquer maneira seriam envolvidos no funcionamento deste novo “apêndice” ao Ginásio? Como teria seria a convivência entre os ginasianos e os acadêmicos de medicina? De quem teria sido a ideia de solicitar carteiras para preenchimento das salas a fim de que as aulas pudessem ser ministradas? E a imprescindível parte administrativa, como e onde funcionava? Quando e de quem foi a ideia de criação de um símbolo, um logotipo para a Faculdade? Quem o desenhou e baseado em que? Por que não ficou nada registrado? Ou ficou e também não se conseguiu encontrar o fio de Ariadne? A título de curiosidade, o oficio mais antigo encontrado com o símbolo da Faculdade no cabeçalho data de 29 de março de 1928. Por que a escolha do Barão de Anajás como Diretor se consta que Camillo Salgado havia sido indicado? Por seu título de Barão, que talvez conferisse maior credibiliMemória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 dade à nova Escola, embora já vivêssemos o período republicano? Por ser ele um profissional bastante conceituado? Ou apenas por que ele era pai de um político de destaque, também médico e componente do corpo docente da Escola, e que seria governador mais adiante, o que poderia significar facilidades para ajuda oficial? E por que o Barão renunciaria em 1922, em mais um episódio nebuloso? Somente por discordar do rigor de alguns professores, conforme reza a versão oficial? Alguma pitada de ciúme em relação ao seu vice, por se sentir um tanto ofuscado por este ou por não ter tino administrativo para a condução do curso? Como descobriram que o dono do palacete Santa Luzia, Sr. Adolph Kolb, queria vender a casa, já que ela estava alugada para o Governo, lá funcionando uma escola? Foi oferecida ao Governo? Quem era Adolph Kolb? O que foi feito dos alunos que ali estudavam? Como era o prédio enquanto residência? Quando foi construído, já que consta ter sido o primeiro prédio em blocos da cidade? O que havia em seu entorno, ali no largo de Santa Luzia? Algum boteco bem na esquina, no lugar onde seria construído o mercado, local de reunião dos acadêmicos antes ou depois das aulas? O que mais havia além do palacete? E se não tivesse dado certo o plano de Camillo – foi dele a ideia? Se não, de quem? - de angariar fundos para a aquisição de uma sede para a Faculdade? Até quando o Ginásio Paes de Carvalho comportaria as turmas? Seria comprado um terreno para sua construção? Seria possível pensar a Faculdade de Medicina, naquele tempo, longe da Santa Casa? E hoje? Além do necrotério do Estado, como e onde se desenrolaram as aulas práticas? Onde mais seria possível aprender medicina? Os alunos podiam freqüentar os outros hospitais para aprendizado e treinamento? Os professores os levavam para acompanhar seus pacientes privados? Livros, biblioteca, microscópios, quais foram os “estrategistas” do miolo burocrático imprescindível para o funcionamento de qualquer coisa e, particularmente, de um curso médico, com todas as suas peculiaridades? Depois da aquisição da casa, quais as reformas iniciais necessárias para o funcionamento do curso em sua nova sede, uma vez que o prédio fora considerado insalubre, em 1919, para o funcionamento de uma escola? Como foi a rotina de funcionamento da Faculdade em 1º de Abril de 1924, quando iniciaram as atividades no palacete Santa Luzia? Houve alguma comemoração especial? Por que esta data não é lembrada nos anais da Faculdade? Quando os jardins da Faculdade teriam assumido seu aspecto atual, com o chafariz e a estátua de Asclépio? Sabemos que a estátua chegou ao Palacete Santa Luzia em 1940, como doação do professor Antonio Joaquim da Silva Rosado2. E de acordo com foto do relatório de 1943 (FMCP, 1945c) a estátua ficava no gabinete da diretoria. Quando migrou para os jardins, levando-se em conta que no Relatório de Atividades do ano de 1950, em uma foto do Biotério vê-se a citada estátua no lugar onde ainda hoje permanece? O que não tivemos - a título de posfácio 483 A primeira turma formada se sentia segura em praticar a medicina? Teria credibilidade junto aos seus futuros pacientes? Os prêmios Raul Leite que não estão registrados em ata, por quê? Proposital, em função do (possível) ganhador? E os prêmios dos anos posteriores à morte do seu criador, por que foi mantido o nome inicial? O laboratório continuou bancando as despesas? Os anos patrocinados pela “Chimica Bayer”, não houve questionamento quanto ao nome da premiação? Como se mantinha a faculdade, seus professores e funcionários, suas despesas de ordem geral, como água e luz, por exemplo, se o número de alunos era pequeno e nem sempre as subvenções eram pontuais? Onde estão os primeiros livros de ata de reunião da Congregação e do Conselho Técnico Administrativo, dando conta dos primeiros tempos, das primeiras divergências, das primeiras dissensões entre os professores, das “insubordinações” dos acadêmicos, indo de encontro aos todos poderosos dirigentes e professores? São tantos os questionamentos... São tantas as lacunas a serem preenchidas... De algum modo preenchemos várias e, sem falsa modéstia, podemos dizer que abrimos um leque bem amplo para a continuação das pesquisas. Se tivéssemos todas as respostas, um outro livro teria sido escrito. Mas aí já seria, também, uma outra história... 484 Foto 77: As origens do símbolo da Faculdade permanecem obscuras, sendo a versão mais antiga encontrada datada de 29 de março de 1928. Fonte: FMCP (1928a). Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 NOTAS 1 “Dentro em poucos dias será fundado nesta cidade um importante estabelecimento de ensino superior, que se denominará Faculdade de Medicina do Pará. Esta feliz idéa, nascida no seio dos mais illustres membros da nossa classe medica, teve logo, como era de prever, a mais enthusiastica e sympatica acolhida da parte de todos quantos se interessam pelo progresso intellectual e scientifico do nosso Estado, merecendo de toda gente os mais francos encomios. A Faculdade de Medicina, que está amparada pelos melhores e mais eminentes medicos de Belém, é o primeiro instituto do genro (sic) que se vae abrir no norte, da Bahia ao Pará. Dest’arte, vindo já satisfazer uma necessidade do meio, a Faculdade decerto contará com o applauso unanime da população deste Estado. A direcção do novo e utillissimo Instituto scientifica (sic) foi confiada ao venerando clinico dr. Barão de Anajáz, sendo vice-director o dr. Camillo Salgado e secretario o dr. H. Pinheiro. Para lente do estabelecimento foram convidados os mais eminentes medicos do nosso meio, que já têm acolhido com enthusiasmo a idéa. Já se tem realizado varias reuniões para deliberar a respeito, devendo o curso ser aberto brevemente”. (Folha do Norte, 15.01.1919 p. 1). 2 “Um infausto acontecimento enlutou a Faculdade no ano de 1940: o falecimento no dia 5 de Junho do dr. Antonio Joaquim da Silva Rosado, um de seus fundadores e professor catedrático, em disponibilidade, da cadeira de Clinica Ginecológica e expressão mais pura, mais perfeita e mais digna de médico e homem público e particular. [...] Como última prova de admiração e zelo pela nossa Faculdade, o ilustre morto legou a suas preciosa e seleta biblioteca médica e uma valiosa estátua de bronze, de Hipócrates.” (FMCP, 1941, p. 5-6). Nota: O relatório menciona estátua de Hipócrates, entretanto trata-se na verdade de uma estátua de Asclépio ou Esculápio. O que não tivemos - a título de posfácio 485 486 30 Lista de ilustrações 487 488 Detalhe de um dos pisos da FMCP. Foto 1 Dr. José Paes de Carvalho, governador do Pará de 1897 a 1901, o primeiro a pensar em um curso de medicina para o estado do chegando a editar uma lei criando Faculdades de Medicina, Engenharia e Direito no Estado do Pará. Tal lei jamais foi efetivada. Foto 2 Edifício do tradicional Colégio Paes de Carvalho, então “Gymnasio Paes de Carvalho” a primeira morada da Faculdade de Medicina em duas salas ali cedidas. Foto 3 Professores fundadores da Faculdade de Medicina do Pará, posam para a primeira foto da instituição. Foto 4 Barão de Anajás (sentado entre as senhoras) em meio aos primeiros alunos matriculados. Foto 5 Salas de aula do Colégio Paes de Carvalho no iníco do Século XX. Foto 6 Grupo Escolar Wenceslau Braz e alunos, futura sede da Faculdade. Foto 7 Sede logo após sua aquisição pela Faculdade de Medicina. Foto 8 Laboratório de Farmacologia. Foto 9 Gabinete de Fisiologia. 489 Foto 10 Laboratório de Química Fisiológica. Foto 11 Laboratório de Microbiologia. Foto 12 Laboratório de Química. Foto 13 Prédio onde ficava o salão nobre da Santa Casa, situado de frente para rua Oliveira Belo, posteriormente demolido. Foto 14 Enfermaria de Clínica Obstétrica. Maternidade da Santa Casa. Professor Dr. Orlando Lima (no centro) ladeado por alunos. Foto 15 Necrotério onde foram realizados os primeiros estudos anatômicos da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Edificação ainda existente ainda que bastante modificada. Foto 16 Enfermaria São Paulo. Clínica Cirúrgica de Homens. Professor Dr. Prisco dos Santos (sentado) ladeado por alunos. Lista de ilustrações Edited by Foxit Reader Copyright(C) by Foxit Corporation,2005-2010 For Evaluation Only. Foto 17 Enfermaria São João. Clínica de Doenças Tropicais. Professor Dr. Antonino Emiliano de Souza Castro (no centro de óculos e de bigode) ladeado por alunos. Foto 18 Enfermaria Santa Izabel. Clínica Médica de Mulheres. Terapêutica Clínica. Professor Dr. Luiz Araújo (sentado em primeiro plano) e alunos. Foto 19 Hospício dos Alienados, posteriormente Hospital Juliano Moreira, por volta de 1902. Foto 20 “Hospital Evandro Chagas, onde era lecionada a Clínica de Doenças Tropicais e Infectuosas”. Foto 21 Palacete Santa Luzia no ano da equiparação da Faculdade de Medicina. Foto 22 Grupo de alunos do terceiro ano que na presente época de exames tiveram acesso para o quarto. Foto 23 Professores em exercício reunidos em 1922 para edição comemorativa da revista Pará-Médico. Foto 24 Gabinete de Histologia. Professor Dr. Jayme Aben-Athar (no centro de gravata de borboleta) e alunos. Foto 25 Laboratório de Biologia parte interna, dirigido pelo Dr. Anatônio Acatauassú. 490 Corrigir legenda da foto 26. Foto 26 Laboratório de Biologia – Parte Externa – Prof. Dr. Antonio Acatauassú (sentado no centro). No mesmo prédio atualmente funciona o serviço de Dermatologia da UFPA na Santa Casa de Misericórdia. Foto 27 Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará em 1935 já com o pavilhão do Salão Nobre em anexo. Foto 28 Salão Nobre da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Foto 29 Laboratório de Parasitologia. Foto 30 Gabinete de Histologia. Foto 31 Laboratório de Histologia. Foto 32 Um projeto de como poderia ficar a fachada da Faculdade após sua remodelação. Foto 33 Fachada da Faculdade após a grande reforma de 1936 que lhe deu as feições atuais. Foto 34 Instituto de Anatomia “Camilo Salgado”. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 Foto 35 Sala para aulas de Anatomia Humana e Técnica Operatória, vendo-se a galeria encurvada em “U” e com capacidade para 50 alunos. Foto 36 Sala de Autopsias. Foto 37 Sala de Projeção. Fotos 38 Laboratório de Anatomia Patológica. Foto 39, 40, 41, 42 Aspectos da inauguração do Pavilhão de Anatomia “Dr. Camilo Salgado”. Foto 43 Câmara frigorífica com capacidade para seis cadáveres. Foto 44 Tanque para conservação, em formol, de peças cadavéricas. Foto 45 Biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Foto 46 Mesas de Estudo da Biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. Foto 47 Estanteria da Biblioteca da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará. 491 Foto 48 Gabinete da Diretoria. Observando-se no canto direito a estátua de Asclépio, posteriormente colocada nos jardins da Faculdade. Foto 49 Fachada do Auditório. Foto 50 Vista interna do Auditório. Foto 51 Mobiliário do Auditório. Foto 52 Vista lateral do Biotério. A esquerda a estátua de Asclépio já em sua localização atual. Foto 53 Biotério – Sala para criação de coelhos. Foto 54 Sala para animais inoculados. Ao fundo a sala para animais de médio porte. À frente escada de Acesso ao Pav. Superior. Vê-se a grade para a jaula dos macacos. Foto 55 Biotério – Sala de Esterilização. Foto 56 Sala de operações e anfiteatro para aulas práticas localizada no segundo andar do prédio. Lista de ilustrações Foto 57 Sala para animais de médio porte. Ao fundo a escada de Acesso ao Pav. Superior. Foto 58 Vista posterior do Biotério. Foto 59 Instituto de Higiene alguns anos após sua inauguração. Foto 60 Diploma da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará na década de 1930. Foto 61 Diploma da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará na década de 1940. Foto 62 Acadêmicos da turma de 1937 em frente à Faculdade. Observar detalhes da fachada antes das grandes reformas. Foto 63 Acadêmicos iniciam o asteamento da bandeira do Brasil em meio a “Pirâmide Oswaldo Cruz”, ao fundo observa-se o Mercado de Santa Luzia. Foto 64 Acadêmicos diante da “pirâmide” de borracha, ao fundo Mercado de Santa Luzia, a direita o quiosque “Buraco Gelado” tradicional parada para lanches do período, hoje demolido. 492 Foto 65 e 66 Medalha Raul Leite Foto 67 O Barão de Anajás. Foto 68 e 69 Louça com o anagrama do Barão de Anajás. Foto 70 Camilo Salgado. Foto 71 Caricatura de “Cotta”. Foto 72 Diploma de doutor em medicina de Camilo Salgado. Foto 73 Olympio da Silveira. Foto 74 Alunos de diversos semestres da Faculdade reunidos em foto de 1922. Foto 75 Calouro de 1946 em dia de trote desfilando com cartaz de protesto em frente a Santa Casa. Foto 76 Passeata do trote dos calouros de medicina no ano [19--]. Foto 77 Símbolo da Faculdade. Memória Histórica da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará 1919-1950 31 Referências 493 494 Detalhe de um dos pisos da FMCP. A FOLHA VESPERTINA, Belém, 03 jan. 1950. _____, Belém, 03 maio 1944. _____, Belém, 23 fev. 1942. _____, Belém, 31 de julho de 1946, p. 4 _____, Belém, 04 jan. 1950, p. 1 _____, Belém, 25 jan. 1950, p. 1 A INSPEÇÃO Paranhos ao Norte. Folha do Norte, 26 set. 1926. A NOSSA Faculdade de Medicina. Província do Pará, 8 jan. 1963. A PROVÍNCIA DO PARÁ, Belém, 01 nov. 1968. A SANTA Casa de Misericórdia do Pará. Pará-Médico, Belém, a. 8, v. 2, n. 10, p. 318, set. 1922. A ÚLTIMA reunião da congregação da Faculdade de Medicina. Folha do Norte, Belém, 25 out. 1934. A VERDADE sobre o incidente da Santa Casa. Estado do Pará, Belém, 16 set. 1926, p. 1. AINDA a ultima reunião da Congregação da Faculdade de Medicina. Folha do Norte, Belém, 27 out. 1934. ÁLBUM de Belém- Pará. Paris: Phillip Renouard, 1902. AMARAL, Alexandre Souza. Vamos à vacina? Doenças, saúde e práticas médico-sanitárias em Belém (1904 a 1911). 2006. 282 f. 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Sendo assim, após a conclusão deste trabalho, quando decidimos por um ponto final – pelo menos temporariamente – nas pesquisas; enquanto batalhávamos para que o livro fosse editado, por conta de outros objetos de estudo, veio-nos às mãos uma notícia publicada na primeira página de O Estado do Pará, em 18 de agosto de 1914. O assunto era a instalação da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará. A matéria, não assinada, versa entre outras coisas sobre a necessidade da criação de uma Faculdade Livre de Medicina e Cirurgia em Belém, em que se formassem farmacêuticos, dentistas, médicos e cirurgiões. Pelo ineditismo do texto, que é a única referência – até agora encontrada - sobre a criação de uma Faculdade de Medicina no Pará no período situado entre a lei de 1899, esquecida após o governo Paes de Carvalho, e a criação efetiva de nossa escola em 1919, transcrevêmo-lo parcialmente: De menos urgência talvez, mas de não menos necessidade, é a creação, entre nós, de uma Faculdade Livre de Medicina e Cirurgia, onde se formassem pharmaceuticos, dentistas, medicos e cirurgiões. Uma Faculdade de Medicina em Belem facilitaria os estudos da mocidade do Extremo Norte e do Meio Norte até Pernambuco. Muitas vocações neste vasto trecho do nosso paiz ficam impossibilitadas de fazer os seus estudos scientificos por não poderem se transportar para Bahia ou Rio e alli se manter. Além disso, uma Faculdade de Medicina nesta capital, que está em plena zona tropical, seria em pouco tempo, por força de circumstancias, um verdadeiro instituto de medicina tropical, especialidade que muito interessa o mundo scientifico por causa das tendencias colonizadoras das grandes potencias. É evidente que um instituto scientifico desta especialidade, funccionando no local apropriado, operando “in loco”, teria mais possibilidades de êxito que os que estão afastados do foro das moléstias que estudam, como o Instituto de Medicina Tropical de Liverpool. É nossa convicção que, dentro de alguns annos, depois de repetidas communicações levadas ao conhecimento dos grandes centros scientificos, a Faculdade de Medicina gosaria de grande auctoridade em materia de medicina tropical e, como o Instituto de Manguinhos, iria levar a bôa fama da sciencia brazileira, ao mundo inteiro. A idéa da creação de uma Faculdade de Medicina no Pará, alimentada e encaminhada pela Sociedade Médico-Cirurgica será fatalmente posta em execução mais anno menos anno, para alegria da terra paraense. Serviços como estes marcarão, estamos certos, a marcha progressista da Sociedade Medico-Cirurgica, há dias iniciada sob applausos animadores da sociedade paraense. O texto quase centenário não poderia ser mais atual. O restante da história já sabemos de cor... 515 516