Anderson Catapan
(Organizador)
Temas emergentes voltados
para as ciências sociais
Vol. 01
Brazilian Journals Editora
2022
2022 by Brazilian Journals Editora
Copyright © Brazilian Journals Editora
Copyright do Texto © 2022 Os Autores
Copyright da Edição © 2022 Brazilian Journals Editora
Editora Executiva: Barbara Luzia Sartor Bonfim Catapan
Diagramação: Aline B. Coelli
Edição de Arte: Aline B. Coelli
Revisão: Os Autores
O conteúdo dos livros e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade
são de responsabilidade exclusiva dos autores. Permitido o download da obra e o
compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores, mas sem a
possibilidade de alterá-la de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais.
Conselho Editorial:
Profª. Drª. Fátima Cibele Soares - Universidade Federal do Pampa, Brasil
Prof. Dr. Gilson Silva Filho - Centro Universitário São Camilo, Brasil
Prof. Msc. Júlio Nonato Silva Nascimento - Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Pará, Brasil
Profª. Msc. Adriana Karin Goelzer Leining - Universidade Federal do Paraná, Brasil
Prof. Msc. Ricardo Sérgio da Silva - Universidade Federal de Pernambuco, Brasil
Prof. Esp. Haroldo Wilson da Silva - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita
Filho, Brasil
Prof. Dr. Orlando Silvestre Fragata - Universidade Fernando Pessoa, Portugal
Prof. Dr. Orlando Ramos do Nascimento Júnior - Universidade Estadual de Alagoas,
Brasil
Profª. Drª. Angela Maria Pires Caniato - Universidade Estadual de Maringá, Brasil
Profª. Drª. Genira Carneiro de Araujo - Universidade do Estado da Bahia, Brasil
Prof. Dr. José Arilson de Souza - Universidade Federal de Rondônia, Brasil
Profª. Msc. Maria Elena Nascimento de Lima - Universidade do Estado do Pará, Brasil
Prof. Caio Henrique Ungarato Fiorese - Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil
Profª. Drª. Silvana Saionara Gollo - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
do Rio Grande do Sul, Brasil
Profª. Drª. Mariza Ferreira da Silva - Universidade Federal do Paraná, Brasil
Prof. Msc. Daniel Molina Botache - Universidad del Tolima, Colômbia
Prof. Dr. Armando Carlos de Pina Filho- Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil
Prof. Dr. Hudson do Vale de Oliveira- Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia de Roraima, Brasil
Profª. Msc. Juliana Barbosa de Faria - Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Brasil
Profª. Esp. Marília Emanuela Ferreira de Jesus - Universidade Federal da Bahia, Brasil
Prof. Msc. Jadson Justi - Universidade Federal do Amazonas, Brasil
Profª. Drª. Alexandra Ferronato Beatrici - Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Rio Grande do Sul, Brasil
Profª. Msc. Caroline Gomes Mâcedo - Universidade Federal do Pará, Brasil
Prof. Dr. Dilson Henrique Ramos Evangelista - Universidade Federal do Sul e Sudeste
do Pará, Brasil
Prof. Dr. Edmilson Cesar Bortoletto - Universidade Estadual de Maringá, Brasil
Prof. Msc. Raphael Magalhães Hoed - Instituto Federal do Norte de Minas Gerais, Brasil
Profª. Msc. Eulália Cristina Costa de Carvalho - Universidade Federal do Maranhão,
Brasil
Prof. Msc. Fabiano Roberto Santos de Lima - Centro Universitário Geraldo di Biase,
Brasil
Profª. Drª. Gabrielle de Souza Rocha - Universidade Federal Fluminense, Brasil
Prof. Dr. Helder Antônio da Silva, Instituto Federal de Educação do Sudeste de Minas
Gerais, Brasil
Profª. Esp. Lida Graciela Valenzuela de Brull - Universidad Nacional de Pilar, Paraguai
Profª. Drª. Jane Marlei Boeira - Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, Brasil
Profª. Drª. Carolina de Castro Nadaf Leal - Universidade Estácio de Sá, Brasil
Prof. Dr. Carlos Alberto Mendes Morais - Universidade do Vale do Rio do Sino, Brasil
Prof. Dr. Richard Silva Martins - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul
Rio Grandense, Brasil
Profª. Drª. Ana Lídia Tonani Tolfo - Centro Universitário de Rio Preto, Brasil
Prof. Dr. André Luís Ribeiro Lacerda - Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil
Prof. Dr. Wagner Corsino Enedino - Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil
Profª. Msc. Scheila Daiana Severo Hollveg - Universidade Franciscana, Brasil
Prof. Dr. José Alberto Yemal - Universidade Paulista, Brasil
Profª. Drª. Adriana Estela Sanjuan Montebello - Universidade Federal de São Carlos,
Brasil
Profª. Msc. Onofre Vargas Júnior - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
Goiano, Brasil
Profª. Drª. Rita de Cássia da Silva de Oliveira - Universidade do Estado do Pará, Brasil
Profª. Drª. Leticia Dias Lima Jedlicka - Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará,
Brasil
Profª. Drª. Joseina Moutinho Tavares - Instituto Federal da Bahia, Brasil
Prof. Dr. Paulo Henrique de Miranda Montenegro - Universidade Federal da Paraíba,
Brasil
Prof. Dr. Claudinei de Souza Guimarães - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil
Profª. Drª. Christiane Saraiva Ogrodowski - Universidade Federal do Rio Grande, Brasil
Profª. Drª. Celeide Pereira - Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Brasil
Profª. Msc. Alexandra da Rocha Gomes - Centro Universitário Unifacvest, Brasil
Profª. Drª. Djanavia Azevêdo da Luz - Universidade Federal do Maranhão, Brasil
Prof. Dr. Eduardo Dória Silva - Universidade Federal de Pernambuco, Brasil
Profª. Msc. Juliane de Almeida Lira - Faculdade de Itaituba, Brasil
Prof. Dr. Luiz Antonio Souza de Araujo - Universidade Federal Fluminense, Brasil
Prof. Dr. Rafael de Almeida Schiavon - Universidade Estadual de Maringá, Brasil
Profª. Drª. Rejane Marie Barbosa Davim - Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
Brasil
Prof. Msc. Salvador Viana Gomes Junior - Universidade Potiguar, Brasil
Prof. Dr. Caio Marcio Barros de Oliveira - Universidade Federal do Maranhão, Brasil
Prof. Dr. Cleiseano Emanuel da Silva Paniagua - Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia de Goiás, Brasil
Profª. Drª. Ercilia de Stefano - Universidade Federal Fluminense, Brasil
Prof. Msc. Marcelo Paranzini - Escola Superior de Empreendedorismo, Brasil
Prof. Msc. Juan José Angel Palomino Jhong - Universidad Nacional San Luis Gonzaga Ica, Perú
Prof. Dr. Edson da Silva - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri,
Brasil
Prof. Dr. João Tomaz da Silva Borges - Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de
Minas Gerais, Brasil
Profª Drª Consuelo Salvaterra Magalhães - Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro, Brasil
Prof. Dr. José Gpe. Melero Oláguez - Instituto Tecnológico Nacional de México, Cidade
do México
Prof. Dr. Adelcio Machado - Universidade Alto Vale do Rio do Peixe, Brasil
Profª Drª Claudia da Silva Costa - Centro Universitário Planalto do Distrito Federal, Brasil
Profª. Msc. Alicia Ravelo Garcia - Universidad Autónoma de Baja California, México
Prof. Dr. Artur José Pires Veiga - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Brasil
Profª Drª María Leticia Arena Ortiz - Universidad Nacional Autónoma de México, México
Profª Drª Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás - IFG, Brasil
Profª Drª Muriel Batista Oliveira - Faculdade de Ciências Contábeis de Nova Andradina,
Brasil
Prof. Dr. José Amilton Joaquim - Universidade Eduardo Mondlane, Brasil
Prof. Msc. Alceu de Oliveira Toledo Júnior - Universidade estadual de Ponta Grossa,
Brasil
Prof. Dr. Márcio Roberto Rocha Ribeiro - Universidade Federal de Catalão, Brasil
Prof. Dr. Alecson Milton Almeida dos Santos - Instituto Federal Farroupilha, Brasil
Profª. Msc. Sandra Canal - Faculdade da Região Serrana, Brasil
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
C357t Catapan, Anderson
Temas emergentes voltados para as ciências sociais /
Anderson Catapan. São José dos Pinhais: Editora
Brazilian Journals, 2022.
683 p.
Formato: PDF
Requisitos de sistema: Adobe Acrobat Reader
Modo de acesso: World Wide Web
Inclui: Bibliografia
ISBN: 978-65-81028-48-0.
1. Sociais. 2. Política. I. Catapan, Anderson II. Título
Brazilian Journals Editora
São José dos Pinhais – Paraná – Brasil
www.brazilianjournals.com.br
editora@brazilianjournals.com.br
APRESENTAÇÃO
A obra intitulada “Temas emergentes voltados para as ciências sociais vol.01”,
publicada pela Brazilian Journals Publicações de Periódicos e Editora, apresenta um
conjunto de trinta e cinco capítulos com diversas temáticas do conhecimento da área
de ciências sociais.
Dentre os artigos discorridos está um estudo que tem por proposta analisar as
estratégias de propaganda utilizadas pelo presidente Jair Messias Bolsonaro durante
a campanha eleitoral e governo. Assim como um artigo com intuito de discutir a
alteridade como fator determinante de reconstituição da identidade do adolescente em
conflito com a lei.
Outro assunto abordado é a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), com um
trabalho que tem entre seus objetivos a finalidade de realizar um levantamento
histórico acerca do processo legislativo que culminou na criação da LGPD, com
enfoque especial nas condições de produção, nos sujeitos participantes e nas
narrativas adotadas ao longo do processo legislativo.
Ainda um trabalho que visa explorar quais os principais indicadores
sustentáveis necessários para que as edificações estejam alinhadas ao conceito de
cidade resiliente promovendo a cultura e efetivação de construções de prédios
inteligentes, inserção de tecnologias modernas e eficientes.
Também é retratada uma discussão acerca da contribuição de Clemente
Romano na formação cristã do século I d. C., por volta de 92 a 96. Além disso um
estudo que debate como o papel do líder na gestão de conflitos afeta o comportamento
de uma empresa de tecnologia da informação, entre outros trabalhos.
Por fim, gostaríamos de agradecer os autores que colaboraram para a
construção desse livro, com tanto empenho e capricho. Esperamos que está obra
possa orientar pesquisadores, docentes, estudantes e gestores na compreensão e
debate dos temas relevantes para a área de ciências sociais.
Boa leitura!
Prof. Dr. Anderson Catapan
SUMÁRIO
CAPÍTULO 01 .......................................................................................................... 13
O DISCURSO DO INIMIGO: ANÁLISE DO DISCURSO POLÍTICO DO PRESIDENTE
DO BRASIL
Maria Vitória Rocha
Katia Maria Belisário
DOI:10.35587/brj.ed.0001578
CAPÍTULO 02 .......................................................................................................... 29
A MERCÊ PASSAGEIRA DE INSTANTES QUE NÃO DURAM: AS
REPRESENTAÇÕES DA MORTE NA POESIA DE RICARDO REIS
Murillo Hochuli Castex
Luiz Rogério Camargo
DOI:10.35587/brj.ed.0001579
CAPÍTULO 03 .......................................................................................................... 46
ANÁLISE CRÍTICA DA LINGUAGEM NEUTRA COMO INSTRUMENTO DE
RECONHECIMENTO DE DIREITOS DAS PESSOAS LGBTQIA+
Fabíola Sucasas Negrão Covas
Lucas Martins Bergamini
DOI:10.35587/brj.ed.0001580
CAPÍTULO 04 .......................................................................................................... 68
A ALTERIDADE NA RECONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO ADOLESCENTE EM
CONFLITO COM A LEI
Valdeir Cesário dos Santos
Cerise de Castro Campos
Maurides Macêdo
DOI:10.35587/brj.ed.0001581
CAPÍTULO 05 .......................................................................................................... 79
PARTICIPAÇÃO E PERCEPÇÃO DE ACADÊMICOS DE MEDICINA DA UNISA EM
LIGAS ACADÊMICAS
Talita Eliziário Bígoli
Rafael Arantes
Nathalia Bavaresco Gonçalves Cristóvão
André Bavaresco G Cristóvão
Paula Helena Gonçalves Cristóvão
Júlio Cesar Massonetto
Júlio César André
Helena Landim Gonçalves Cristóvão
DOI:10.35587/brj.ed.0001582
CAPÍTULO 06 ........................................................................................................ 108
ANÁLISE BIBLIOMÉTRICA DOS ARTIGOS DA BASE DE DADOS DA SCOPUS
SOBRE A PRODUÇÃO CIENTÍFICA BRASILEIRA DA COVID-19
Tiago Rodrigo Lutzer Tizotte
Nelson José Thesing
Fabiana Baptista Meurer Gomes
DOI:10.35587/brj.ed.0001583
CAPÍTULO 07 ........................................................................................................ 127
FERRAMENTAS DA GESTÃO DA QUALIDADE UTILIZADAS PELAS EMPRESAS
COMO ESTRATÉGIA DE SOBREVIVÊNCIA EM TEMPOS PANDÊMICOS
Virginia Tomaz Machado
Pavlova Christinne Cavalcanti Lima
Ícaro Ramalho Dionísio
Marcelo Oliveira Feitosa
Fernando Antônio Portela da Cunha
Luiz Carlos Machado de Souza Filho
DOI:10.35587/brj.ed.0001584
CAPÍTULO 08 ........................................................................................................ 149
TELEFONIA DE BAIXO CUSTO (TBC) BASEADA NO PROTOCOLO IP PARA A
UEMA E SECRETARIAS DO GOVERNO DO ESTADO (PROJETO VOIP UEMA)
Carlos Henrique Rodrigues de Oliveira
Luiz Ricardo Souza Ripardo
Magno Castro Moraes
Luis Carlos Costa Fonseca
DOI:10.35587/brj.ed.0001585
CAPÍTULO 09 ........................................................................................................ 160
THE INFLUENCE OF SOCIO-SPATIAL SEGREGATION ON URBAN MOBILITY
INDICATORS: THE CASE OF BELÉM – PA
Maisa Sales Gama Tobias
Verena Coelho Lobão Azevedo
Marco Aurélio Arbage Lobo
DOI:10.35587/brj.ed.0001586
CAPÍTULO 10 ........................................................................................................ 176
IMPACTO DA PSORÍASE EM ÁREAS ESPECIAIS NA QUALIDADE DE VIDA E A
PERSPECTIVA DE TRATAMENTOS MAIS PROMISSORES: REVISÃO NARRATIVA
Luísa Gouveia Alves Moraes
Kenderly Camila Baltokoski
Giovanna Moysés
Ruth Cordeiro do Rosário
Isabela Possari Librelotto
Amanda Vieira Serrano
Natália Pastorello
Ariadne Bonachela de Moura
Domingos Jordão Neto
DOI:10.35587/brj.ed.0001587
CAPÍTULO 11 ........................................................................................................ 195
O DIREITO À AUTODETERMINAÇÃO INFORMATIVA NA LEI GERAL DE
PROTEÇÃO DE DADOS: EMPODERAR PARA EFETIVAR
Pablo Rangell Mendes Rios Pereira
DOI:10.35587/brj.ed.0001588
CAPÍTULO 12 ........................................................................................................ 212
O REGISTRO DE IMÓVEIS E A INFORMAÇÃO AMBIENTAL
Antonio Fernando Schenkel do Amaral e Silva
Marcelo Buzaglo Dantas
Sheyla Campos Pinheiro
Zenildo Bodnar
DOI:10.35587/brj.ed.0001589
CAPÍTULO 13 ........................................................................................................ 233
EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004: UMA ANÁLISE SOB O PRISMA DA
PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS
Igor Gava Mareto Calil
Lara Abreu Assef
Luma Vilela Ramos Fonseca
DOI:10.35587/brj.ed.0001590
CAPÍTULO 14 ........................................................................................................ 253
INDICADORES SUSTENTÁVEIS PARA EDIFICAÇÕES EM PROL DA
CONSOLIDAÇÃO DO CONCEITO DE CIDADES RESILIENTES
Rosana Campos dos Santos
Maria Teresa Gomes Barbosa
Amanda Rodrigues da Silva Oliveira
Mariana de Athayde Salomão
DOI:10.35587/brj.ed.0001591
CAPÍTULO 15 ........................................................................................................ 273
ESTRANHOS NA PÁTRIA: UMA ANÁLISE PSICANALÍTICA DA VIOLÊNCIA
CONTRA REFUGIADOS
Wueslle Thibes dos Santos
Vera Lucia da Silva Alves
DOI:10.35587/brj.ed.0001592
CAPÍTULO 16 ........................................................................................................ 292
UMA REVERBERAÇÃO DO IDEÁRIO BRITÂNICO NO BRASIL: O GREEN-BELT DE
MARINGÁ E O GREEN-WEDGE DE CIANORTE
Layane Alves Nunes
Igor José Botelho Valques
Giovani Lemos Damasio
André Luis Pagnussat
DOI:10.35587/brj.ed.0001593
CAPÍTULO 17 ........................................................................................................ 313
HOUSING IN PORTUGAL (1992-2008) A MULTIDIMENSIONAL PERSPECTIVE ON
THE BEHAVIOUR OF ECONOMIC AGENTS
António Duarte Santos
Guilherme Castela
Iris Lopes
Nelson Silva
DOI:10.35587/brj.ed.0001594
CAPÍTULO 18 ........................................................................................................ 331
CLEMENTE ROMANO E A I CARTA AOS CORINTIOS: O TEMPO, O HOMEM E A
MISSÃO
Marcia Elieder Bolonhez Meneguetti
Roseli Gall do Amaral da Silva
Prof. Dr. José Joaquim Pereira Melo
DOI:10.35587/brj.ed.0001595
CAPÍTULO 19 ........................................................................................................ 354
COMPROMETIMENTO, LIDERANÇA E VALORES COMO FATORES DE
INFLUÊNCIA NA QUALIDADE DE VIDA EM UMA EMPRESA DE TECNOLOGIA DA
INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
Marcos Vinícius de Souza Toledo
Bruno de Souza Toledo
Karina Dutra de Carvalho Lemos
Mário Teixeira Reis Neto
DOI:10.35587/brj.ed.0001596
CAPÍTULO 20 ........................................................................................................ 377
COMO O PAPEL DO LÍDER NA GESTÃO DE CONFLITOS AFETA O
COMPORTAMENTO EM UMA EMPRESA DE TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
Bruno de Souza Toledo
Marcos Vinícius de Souza Toledo
Karina Dutra de Carvalho Lemos
Mário Teixeira Reis Neto
DOI:10.35587/brj.ed.0001597
CAPÍTULO 21 ........................................................................................................ 394
AO DISCURSO NEGACIONISTA/RELIGIOSO E CIENTÍFICO EM TEMPOS DE
PANDEMIA – COVID-19
Priscila Figueiredo Miranda Rabello
Joana d’Arc Araújo Silva
Heloisio Costa de Oliveira
Onildo de Souza Moraes
Monique Ludugério Garcia
Luciene Sipriano
DOI:10.35587/brj.ed.0001598
CAPÍTULO 22 ........................................................................................................ 409
ANÁLISE DAS PRÁTICAS DE INTRODUÇÃO ALIMENTAR DE MÃES RESIDENTES
EM BRASÍLIA - DISTRITO FEDERAL
Ana Isabelly Siqueira
Camila Araújo da Silva
Jessica Louranny Oliveira Rocha
Bruna Nascimento da Silva
Ramyne de Castro da Paz
Antônio José de Rezende
Renata Costa Fortes
DOI:10.35587/brj.ed.0001599
CAPÍTULO 23 ........................................................................................................ 425
NOOPOLÍTICA DO CONSUMO: ALGUMAS PISTAS EM DELEUZE, GUATTARI E
LAZZARATO
Frederico Augusto Tavares Junior
Patrícia Magalhães Bevilaqua
Carine Morrot de Oliveira Villasanti
Flávia Costa Rocha de Assis Fonseca
Andrea Maria Bruxellas Lucas Rodriguez
DOI:10.35587/brj.ed.0001600
CAPÍTULO 24 ........................................................................................................ 444
GRANDES EMPREENDIMENTOS HIDRELÉTRICOS NA AMAZÔNIA: ESTUDO DO
DINAMISMO ESPACIAL DA ORLA DA CIDADE DE FERREIRA GOMES, AMAPÁ,
BRASIL
Jacy Soares Corrêa Neto
Valmor Cerqueira Pazos
Lenildo Santos da Silva
José Marcelo Martins Medeiros
Marta Adriana Bustos Romero
DOI:10.35587/brj.ed.0001601
CAPÍTULO 25 ........................................................................................................ 464
O PROFISSIONAL E SUA ATUAÇÃO SOBRE A OPTICA DA INOVAÇÃO
Ana Cristina Brandão Ribeiro Silva
DOI:10.35587/brj.ed.0001602
CAPÍTULO 26 ........................................................................................................ 478
CIDADES SITIADAS: REPRESENTAÇÕES DO MEDO DA MORTE E DAS
ENFERMIDADES NA PANDEMIA DO COVID-19 E NAS CHARGES DO FINAL DO
SÉCULO XIX NO BRASIL
Élcia de Torres Bandeira
DOI:10.35587/brj.ed.0001603
CAPÍTULO 27 ........................................................................................................ 492
CONNECTED CITIES IN SOCIAL ISOLATION: IMPACT OF THE FOURTH
INDUSTRIAL REVOLUTION FACING PANDEMIC
Fábio Luis Fernandes Azarias
Lia Toledo Moreira Mota
Regina Márcia Longo
DOI:10.35587/brj.ed.0001604
CAPÍTULO 28 ........................................................................................................ 505
COMO AS MARCAS UTILIZAM O ESPORTE PARA GANHAR VISIBILIDADE
Caio Gabriel Peixoto Travassos
Carlos Leonardo Gomes Vidal
DOI:10.35587/brj.ed.0001605
CAPÍTULO 29 ........................................................................................................ 526
ESTRATÉGIA COMPLEMENTAR DE ATENDIMENTO À SAÚDE NA CIDADE
RIBEIRINHA DE MANICORÉ-AMAZONAS
Eliane Patrícia Cervelatti
Amanda Kaori Hamamoto
Caroline Mohr
Júlia Loli Barbosa
Mariana Toshie Brufatto Sumita
DOI:10.35587/brj.ed.0001606
CAPÍTULO 30 ........................................................................................................ 542
A PESQUISA-AÇÃO EM ANAIS DO SIMPEP (2007-2016): REVISÃO
BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA
Vera Mariza Henriques de Miranda Costa
Isaque Pereira de Almeida
DOI:10.35587/brj.ed.0001607
CAPÍTULO 31 ........................................................................................................ 562
FORMAÇÃO ÉTICO-ESTÉTICA EM PLATÃO, SCHILLER E FREIRE: A
KALOKAGATHIA, O IMPULSO LÚDICO E A BONITEZANA FORMAÇÃO DO
SUJEITO AUTÔNOMO
Ivys de Alcântara Silva
Sandro Melo Batalha Cardoso
Damião Bezerra Oliveira
DOI:10.35587/brj.ed.0001608
CAPÍTULO 32 ........................................................................................................ 582
DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS OBRIGATÓRIAS: APONTAMENTOS E
PROJEÇÕES PARA TOMADA DE DECISÃO ORGANIZACIONAL
Daniel Carneiro de Sousa
Gleydson Vieira da Hora
Kelly Cristina dos Reis Cavalcante
DOI:10.35587/brj.ed.0001609
CAPÍTULO 33 ........................................................................................................ 601
A BUSCA DO RE(CONHECER) DA NOSSA CULTURA E IDENTIDADE
Soenil Clarinda de Sales
João Clarindo da Silva
Silvia Aparecida Maschio
Maria Conceição de Campos Cunha Bortoncello
Elizaneth de Arruda Martins Eubank
Natalina Cristina da Costa Nunes
Nilson Ferreira da silva
Marileide do Carmo Amorim Arruda
Eliane Maria de Arruda Souza
Leticia Gisele Pinto de Moares Queiroz
DOI:10.35587/brj.ed.0001610
CAPÍTULO 34 ........................................................................................................ 609
TRÊS IMPORTANTES PALMEIRAS: DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS À
SUSTENTABILIDADE
Wilson da Costa Santos
Cristina Moll Hüther
Patricia Garcia Ferreira
Fernando Carvalho da Silva
Vitor Francisco Ferreira
DOI:10.35587/brj.ed.0001611
CAPÍTULO 35 ........................................................................................................ 661
NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL: RETROCESSO
OU OPORTUNIDADE?
Matheus Fortunato Barbosa Gomes
José Gomes Ferreira
Maria Wagna de Araújo Dantas
DOI:10.35587/brj.ed.0001633
SOBRE O ORGANIZADOR .................................................................................... 683
CAPÍTULO 01
O DISCURSO DO INIMIGO: ANÁLISE DO DISCURSO POLÍTICO DO PRESIDENTE DO
BRASIL
Maria Vitória Rocha
Formação: graduada em ciência Política - UNB
Instituição atual: Universidade de Brasília
E-mail marivi.rocha12@gmail.com
Katia Maria Belisário
Formação: doutorado em jornalismo e sociedade - UNB
Instituição de atuação: Universidade de Brasília -UNB
Endereço: SQSW 303, Bloco F Apto 305
E-mail: katia.belisario@gmail.com
RESUMO: O artigo propõe-se a analisar as estratégias de propaganda utilizadas pelo
presidente Jair Messias Bolsonaro durante a campanha eleitoral e governo. As
perguntas de pesquisa são: existem semelhanças/diferenças entre as estratégias de
propaganda de Bolsonaro e as dos líderes autoritários mundiais? Qual líder/discurso
assemelha-se ao do presidente? Analisamos as práticas discursivas do presidente,
com base no referencial de marketing, propaganda e da análise do discurso. A
metodologia usada foi a análise do discurso proferido na Organização das Nações
Unidas (ONU), em 24/09/2019. Os resultados mostram a semelhança entre o discurso
da ONU e o de líderes fascistas e o uso das mesmas técnicas criadas pelo Ministro
da Propaganda Nazista, Joseph Goebbels, tais como a retórica do inimigo único e a
simplificação de temas relevantes. A ‘‘lógica do inimigo’’ está nas falas do líder
brasileiro.
PALAVRAS-CHAVES: Marketing Político; Propaganda Política; Análise do Discurso;
Campanha e Governo.
ABSTRACT: The article aims to analyze the propaganda strategies used by President
Jair Messias Bolsonaro during his campaign and his government. The research
questions are: Are there similarities/differences between Bolsonaro's propaganda
strategies and those of world authoritarian leaders? Which leader/speech resembles
that of the president? We analyzed the president's discursive practices, based on the
framework of marketing, propaganda and the discourse analysis. The methodology
used was the discourse analysis of the president speech at the United Nations (UN)
on 09/24/2019. The results show the similarity between the UN speech and that of
fascist leaders and the use of the same techniques created by the Minister of Nazi
Propaganda, Joseph Goebbels, such as the rhetoric of the single enemy and the
simplification of relevant themes. The “logic of the enemy’’ is in the speeches of the
Brazilian leader.
KEYWORDS: Political Marketing; Political advertising; Speech analysis; Campaign
and Government.
* Trabalho apresentado no GP Políticas e Estratégias de Comunicação do 43º Congresso Brasileiro de
Ciências da Comunicação - Intercom 2020, em Salvador/BA, realizado de 01 a 10 de Dezembro de 2020.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
13
1. INTRODUÇÃO
Esta pesquisa objetiva compreender as estratégias de propaganda política
utilizadas na campanha eleitoral e no governo do Presidente da República do Brasil,
Jair Messias Bolsonaro. As perguntas que orientam o estudo são: existem
semelhanças/diferenças entre as estratégias de propaganda utilizadas pelo atual
presidente do Brasil e as usadas por líderes autoritários? Quais líderes e quais
discursos se evidenciam?
A metodologia usada consiste na análise do discurso feito pelo presidente
Bolsonaro na Organização das Nações Unidas (ONU), em 24/09/2019. Buscou-se
avaliar as semelhanças das falas do discurso com os de líderes autoritários,
especificamente com base nos 11 Princípios da Propaganda de Joseph Goebbels,
Ministro de Propaganda nazista.
A análise do discurso usada foi a da linha francesa que consiste, segundo
Duarte e Barros (2012), no método de desconstruir o texto para ter a percepção de
como foi construído. A análise de discurso francesa é necessária para que o emissor
consiga transmitir a mensagem desejada, e segundo os autores, a mensagem deve
ser compreensível por todos para que exista persuasão ou informação.
2. PROPAGANDA POLÍTICA: REVISÃO TEÓRICA
Segundo Pereira (2003), a propaganda política tem sua origem entre 1920 a
1940, com a evolução dos meios tecnológicos de comunicação, como imagens,
símbolos, e outros transmitidos pela mídia. Ela surgiu, em todo o mundo, a partir da
Primeira Guerra Mundial, e mudou as relações entre comunicação e política.
Almeida (2016) ressalta que a propaganda política consiste em técnicas ou
meios de marketing aplicado à divulgação de ideias, feitas por partidos políticos ou
pretendentes a se elegerem candidatos, ambicionando ser bem votados, obterem
indicação do candidato nas convenções partidárias e expor seus ideais. Já, a
propaganda eleitoral, de acordo com Rollo (2004), é um tipo de propaganda política
que busca conquistar votos, porém é autorizada apenas em um tempo determinado
de dias do ano da eleição. É por meio dela que os candidatos se apresentam a
sociedade, mostram seus partidos e coligações, e demonstram sua linha de
pensamento e propostas. Para Guimarães (2007), a propaganda eleitoral é usada
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
14
antecedendo as eleições, como mensagens discursadas sobre suas propostas, de
seus feitos em outros cargos, e qualidades, enviadas aos veículos de comunicação.
O jornal é, sem dúvida, o veículo de propaganda mais visível, e a evolução do
jornal se deu, principalmente, pela redução dos custos, aumento das vendas e
melhorias nos transportes para a distribuição dos jornais, além do apoio acelerado
das agências de informação. Marosin (2010) cita que ‘‘O livro e, depois o jornal, são
meios propulsores da propaganda de ideias.’’ (MAROSIN, 2010, p.32) Ele se
modernizou com custo baixo e imagem mais simples e mais informativa. Porém, por
visar lucro, a imprensa passou a ser controlada pelo Estado e por agências de
notícias.
Para Domenach (2001), a invenção do microfone aumentou o alcance da voz
humana em lugares maiores e abertos. Ele cita, o exemplo do rádio, que a voz alcança
proporções maiores, podendo ser escutada em todo o mundo quando em sintonia.
Segundo Marosin (2010), o rádio se desenvolveu como difusor da palavra, com
a vantagem de ser a forma de comunicação mais acessível dentre os demais veículos.
O rádio foi o principal meio de comunicação, usado até 1932, quando surgiu o cinema.
O autor observa que a imagem também trouxe benefícios para a reprodução e
propagação das mensagens. Além de gravuras e pinturas, a fotografia contribuiu para
uma reprodução rápida que capta muito bem a realidade. Outro meio de divulgação
muito usado foi o cinema, que tem a vantagem de mostrar a imagem em movimento,
lembrando a realidade. O cinema foi muito utilizado nos governos autoritários, de
acordo com Pereira (2003), teve grande importância na propaganda política, tornandose um meio de comunicação bastante influente. Na época da Primeira Guerra Mundial
(1914-1918), por exemplo, sua utilização como arma de persuasão da população que
assistia. Ademais, as democracias ocidentais usaram o cinema como propaganda,
embora passando uma mensagem persistente e agressiva, como ocorreu nos regimes
fascistas.
A televisão, surgiu na década de 1930 e trouxe consigo o som e a imagem aos
domicílios. No Brasil, a televisão só chegou na década de 1950, segundo Britos
(1999), os primeiros programas, televisivos no país, eram basicamente feitos ao vivo e
produzidos para cada região. O período entre 1964 a 1975, marcou a segunda fase
da televisão, a ‘‘populista’’, com o início das telenovelas e dos shows de auditório. Na
atualidade, segundo o autor, as redes de televisão tentam atingir a todos com uma
programação variada, englobando vários gêneros.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
15
Segundo Manuel Castells (2003), a história da internet tem origem em 1969, na
Arpanet. Trata-se de uma rede de computadores feita pela Advanced Research
Projects Agency (ARPA), formada pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos,
com o objetivo de alcançar soberania tecnológica militar em relação à União Soviética
quando lançam o Sputnik em 1957. Para Calazans e Lima (2013), a abertura da
internet para fins comerciais aconteceu em 1995. A partir daí, a internet deixou de ser
um fenômeno exclusivo e se popularizou.
As redes sociais vieram com objetivo de sociabilizar dados e criar laços sociais
online. Em 2004, com esse tipo de ambiente virtual baseado na criação de conteúdo
pessoal crescendo, surgiram Orkut, Flickr, Digg e Facebook, e posteriormente Twitter
e Instagram.
3. DUAS
LIDERANÇAS
AUTORITÁRIAS
MARCANTES:
PROPAGANDAS
POLÍTICAS
Castro (2007) observa que um grande exemplo de estrategista da propaganda
política foi Benito Mussolini, que ficou conhecido pelo modo fascista de governar a
Itália. Nas palavras de Saccomani, (apud CASTRO, 2007) o regime político fascista
tem como características principais o controle total da atuação política por um partido
exclusivo de representação, a adoração ao chefe da nação, o nacionalismo, a aversão
ao liberalismo, o almejo de ser imperial, o monopólio das massas pelas propagandas
eficazes e de outros veículos de informação, além de proibições de opiniões
opositoras.
Com a ascensão de Mussolini, o cinema foi muito usado como entretenimento
popular e meio de exaltar o ideal fascista, o nacionalismo, o anticomunismo, o
militarismo, colonialismo e o imperialismo, conforme Pereira (2003). A presença
pública desse líder, segundo o autor, caracterizava-se por uma boa entonação de voz
e expressões corporais que deixavam as pessoas atentas. Ele entendia a população,
prometia melhorias e, as pessoas sentiam-se na obrigação de apoiá-lo já que ele
demonstrava responsabilidade pelo país.
Outro exemplo a se destacar, de acordo com Castro (2007), é Adolf Hitler, com
o importante apoio de seu ministro da Propaganda nazista, Joseph Goebbels. Ele
desempenhou um papel central na criação de material antissemita e pró-nazista para
o partido. A propaganda era uma tentativa coordenada para influenciar a opinião
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
16
pública através da utilização de meios de comunicação, e foi habilmente utilizada pelo
Partido Nazista, nos anos que antecederam e durante a liderança de Hitler na
Alemanha (1933- 1945). A propaganda nazista utilizou apelos no rádio e no cinema
junto às massas como instrumento crucial para a conquista e manutenção do poder.
A implementação das suas políticas incluíram o exercício de guerra total e do
extermínio de milhões de judeus com o Holocausto. Durante a Segunda Guerra
Mundial, as técnicas de propaganda foram organizadas e aplicadas de modo a
persuadir e influenciar a opinião pública.
Teixeira (2002) explica que Goebbels, foi figura marcante e fez a propaganda
conquistar apoio e simpatia da massa. A partir de seu conhecimento, estabeleceu 11
normas conhecidas como ‘‘Princípios de Dominação’’, a serem seguidas, as
chamadas leis de propaganda política a saber:
1. Princípio da Simplificação e do Inimigo Único: simplificar e estabelecer que
um único objetivo por vez seja fixado a um grupo específico de pessoas ou
em oposição a somente um grupo de pessoas.
2. Princípio do Contágio: Divulgue a capacidade de contágio que este
inimigo tem. Colocar um antes perfeito e mostrar como o presente e o
futuro estão sendo contaminados por este inimigo.
3. Princípio da Transposição: transladar todos os males sociais a este
inimigo.
4. Princípio da Exageração (ampliação) e desfiguração: é exagerar as más
notícias até desfigurá-las transformando um delito em mil delitos criando
assim um clima de profunda insegurança e temor.
5. Princípio da Vulgarização: transforma tudo numa coisa torpe e de má
índole. As ações do inimigo são vulgares, ordinárias, fáceis de descobrir.
6. Princípio da Orquestração: fazer ressonar os boatos até se
transformarem em notícias sendo estas replicadas pela imprensa oficial.
7. Princípio da Renovação: Sempre há que bombardear com novas
notícias (sobre o inimigo escolhido) para que o receptor não tenha tempo
de pensar, pois está sufocado por elas.
8. Princípio do Verossímil: discutir a informação com diversas
interpretações de especialistas, mas todas contra do inimigo escolhido. O
objetivo deste debate é que o receptor, não perceba que o assunto
interpretado não é verdadeiro.
9. Princípio do Silêncio: ocultar toda a informação que não seja conveniente.
10. Princípio da Transferência: potencializar um fato presente com um fato
passado. Sempre que se noticia um fato se acresce com um fato que tenha
acontecido antes.
11. Princípio de Unanimidade: busca convergência em assuntos de
interesse geral apoderando-se do sentimento produzido por estes e
colocá-los em oposição do inimigo escolhido. (Os 11 princípios do ministro
da propaganda nazista, Joseph Goebbels. (DOMENACH, 2001, pp. 21-31)
4. JAIR MESSIAS BOLSONARO: IDEIAS E REDES SOCIAIS EM AÇÃO
Jair Messias Bolsonaro se destacou com ataques ao Partido dos Trabalhadores
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
17
(PT) e aos políticos envolvidos nos escândalos de corrupção, com o apoio de governos
civis e dos militares (FGV, 2009). Para Cioccari e Persichetti (2018) o presidente
conseguiu apoio político com o seu posicionamento de extrema-direita, sobretudo
após o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT), em 2016. Segundo as
autoras, as intenções de votos vieram basicamente de antipetistas com valores
tradicionais e viés religioso.
No período de campanha, 2018, Bolsonaro estava com índice alto de rejeição e
com índices baixos nas pesquisas de intenção de voto. No dia 6 de setembro, em Juiz
de Fora/MG, enquanto era carregado nos ombros por seguidores e apoiadores de
campanha, o candidato foi esfaqueado por Adélio Bispo de Oliveira. A tentativa de
assassinato contra
o candidato, de acordo com G1 Notícias (2019), colaborou para o desequilíbrio
do cenário político e aumentou a popularidade do presidenciável. Ele conseguiu ficar
mais exposto na mídia, tornando-se mais fortalecido e popular. Subiram as intenções
de votos e as críticas feitas a ele foram momentaneamente suspensas.
Cioccari e Persichetti (2018) argumenta que o discurso de Bolsonaro baseia-se
na criação de um ideal onde o criminoso é sempre o ‘‘outro’’, que desvirtua a
sociedade, e nunca o ‘‘cidadão de bem’’. E é próprio do ‘‘cidadão de bem’’ preservar
os valores tradicionais, a moral cristã e a polemização de conflitos. As autoras
percebem que além de defender as armas, ele foca no ódio.
Para a imprensa, ele representa o defensor de valores da família tradicional
brasileira, dos religiosos e cristãos e o inimigo da corrupção. Percebendo que boa
parte da sociedade discorda de seus posicionamentos, de acordo com Cioccari e
Persichetti, ele passa a usar um viés liberal na economia, afastando-se da imagem de
militar controlador do Estado.
O anticomunismo foi a principal bandeira do presidente, mas ‘‘funciona mais
como um pano de fundo, evocado quando conveniente, do que uma diretriz de ação
política.’’ (MIGUEL, 2016, p. 594) Outra vertente usada em sua campanha, segundo
o autor, foi o combate a ‘‘ideologia de gênero’’, que entrou em cena a partir da ideia
‘‘Escola Sem Partido’’ que revelava apenas o medo da ‘‘doutrinação marxista’’,
assombrando desde o período militar. Uma das principais promessas de campanha,
segundo a Agência Brasil (2019), foi a flexibilização da posse de armas de fogo, para
combater a pauta de insegurança na população.
Bolsonaro utilizou amplamente as mídias sociais em sua campanha e recebeu
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
18
um grande feedback de seus. Nas redes sociais (twitter principalmente), ele é
‘‘showman onde alterna promessas, compromissos, leviandades e acusações’’.
(CIOCCARI e PERSICHETTI, 2018, p.58). Na verdade, enquanto sua imagem
mostrada por mídias sociais é a de um homem conservador, cristão e de família, no
entanto desempenhou papel de um parlamentar preconceituoso e violento. Para as
autoras, ele representa cidadãos armamentista e conservadores. Já, Ferreira (2018)
observa que o candidato foi eleito pela imagem que ele mostrou, e não por suas
propostas de governo. Suas campanhas focaram no ataque ao adversário, seja direta
ou indiretamente.
O WhatsApp foi amplamente usado para disseminar Fake News, notícias
falsas. Como houve uma limitação do tempo de televisão na campanha, o candidato
focou em conseguir apoio voluntário de seus seguidores nas redes sociais. A
proporção e o imediatismo das redes fazem fortalecer a popularidade, ao fazer as
pessoas interagirem e divulgarem fake news, como estratégia política. Bolsonaro
usou propagandas de forma institucional, ideológicas, e ao se pronunciar o faz de
maneira política. Atraiu a atenção da mídia e das redes sociais com declarações
simples e polêmicas, cativou a classe média. Como o presidente norte-americano
Donald Trump, seu maior ídolo e exemplo, o marketing da campanha de Bolsonaro
focou na sua imagem pessoal e suas aparições nas mídias sociais. Segundo a BBC
News (2018), Trump tomou posse da presidência com a promessa de dar uma nova
imagem à política americana e colocar o poder nas mãos do povo. De modo populista,
ele tem se posicionado contrário a imigração ilegal e acordos comerciais feitos pelo
governo antecessor, o que o aproximou do público masculino, branco e dos
trabalhadores rurais. Algumas de suas declarações em entrevistas, no Twitter e
manifestações durante a campanha foram consideradas controversas, chamando
a atenção da mídia nacional e internacional sobre sua campanha. O mesmo ocorre
com Bolsonaro no Brasil.
O slogan da campanha "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos", e a
nomeação da coligação de seu partido foi uma das estratégias mais importantes de
Bolsonaro, que conquistou a maior parte dos eleitores religiosos. Sua campanha,
enfatizou sobretudo no patriotismo e na crença em Deus e valores cristãos. O ‘‘mito’’
se coloca como um homem honesto, religioso e de bem, que vai consertar o estrago
deixado pelo PT.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
19
5. PROCESSO METODOLÓGICO: ANÁLISE DO DISCURSO
Segundo Duarte e Barros (2012) a análise do discurso de linha francesa dá
importância no assujeitamento do enunciador, isto é, realça na identificação dos
discursos já estabelecidos, usados pelo sujeito, como ‘‘o religioso, o científico, o
filosófico, o mitológico, o poético, ou o jornalístico, o publicitário, o corporativo etc.’’
(DUARTE e BARROS, 2012, p.306). Para Orlandi (2009) a análise do discurso da
escola francesa procura os sentidos que o discurso assume, ou pode assumir, levando
em consideração o sujeito, seu contexto histórico, a ideologia e o contexto social no
qual esse sujeito está envolvido.
Na campanha presidencial, Bolsonaro aposta em um discurso religioso,
midiático e ideológico. A linguagem simples usada é associada a imagen de homem
cristão de família, preocupado com a segurança e o combate à corrupção nas redes
sociais, Na análise de seus discursos observa-se que ele troca fato por opiniões
ideológicas, além d de demistificar a imprensa e usar a estratégia da mídia
independente para ocultar toda informação que não seja conveniente. A sua oratória
é destinada áqueles que ele escolheu governar e sintetiza o ódio, a revolta com a
realidade e o lema patriótico.
Optou-se aqui, por analisar o discurso proferido pelo Presidente da República
do Brasil, na 74ª Assembleia Geral da Organizações das Nações Unidas (ONU). Esse
discurso foi feito na terça-feira, 24/09/2019. Os temas relatados na fala do presidente,
são relacionados às 11 Leis propostas pelo ministro da propaganda nazista, Joseph
Goebbels, com as falas do presidente.
A análise de semelhanças entre o discurso do líder brasileiro e as estratégias
de Hitler, com apoio de Goebbels, vai se restringir ao ponto de vista da comunicação
política. Destacam-se frases, posicionamentos ideológicos e posturas que comprovam
a hipótese. De modo estratégico ou apenas por impulso, Bolsonaro faz uso das
técnicas já usadas na propaganda política fascista e nazista a seu favor.
Selecionamos as falas mais emblemáticas do Presidente do Brasil em três
trechos, com ênfase: guerra ao socialismo, à Cuba e Venezuela, e; as mazelas do
Partido dos Trabalhadores e ideologia de esquerda e o Brasil. Vejamos a seguir três
trechos do discurso da ONU:
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
20
5.1 Trecho 1
Apresento aos senhores um novo Brasil, que ressurge depois de estar à beira
do socialismo. Um Brasil que está sendo reconstruídoa partir dos anseios e
dos ideais de seu povo. No meu governo, o Brasil vem trabalhando para
reconquistar a confiança do mundo,diminuindo o desemprego, a violência e o
risco para os negócios, por meio da desburocratização, da
desregulamentação e, em especial, pelo exemplo. Meu país esteve muito
próximo do socialismo, o que nos colocou numa situação de corrupção
generalizada, grave recessão econômica, altas taxas de criminalidade e de
ataques ininterruptos aos valores familiares e religiosos que formam nossas
tradições. (PODER 360, 2019)
Sujeito de fala: o Presidente, Jair Bolsonaro, primeira pessoa;
Sujeito Oculto: Partido dos Trabalhadores
Tempo do verbo: Presente: “A presento aos senhores um novo Brasil que ressurge
depois de estar à beira do socialismo”. Passado: “meu país esteve muito próximo do
socialismo, o que nos colocou numa situação de corrupção generalizada, grave
recessão, altas taxas de criminalidade e de ataques ininterruptos aos valores familiares
e religiosos que formam nossas tradições”
Inimigo: Socialismo; Partido dos Trabalhadores (desemprego; violência; greve;
recessão; ataque aos valores familiares); discurso ideológico.
Objetivo do Inimigo: Implantar o socialismo no Brasil; ir contra valores da família
religiosos.
Leis de Goebbels: Princípio da Simplificação e do Inimigo Único, Princípio do
Contágio, Princípio da Transposição.
Observa-se neste trecho que o inimigo principal do povo brasileiro, segundo o
presidente, é o SOCIALISMO, citado duas vezes. O Partido dos Trabalhadores não é
citado nominalmente, mas aparece de forma oculta, ele cita o PT como responsável
por situar o país à beira do socialismo. O texto é identificado com apenas uma voz, a
do Presidente da República. O discurso é monofônico, e direto aos ouvintes.
Como mostrado, o Partido dos Trabalhadores é o principal inimigo de
Bolsonaro, desde sua campanha, e assimilado por socialistas/comunistas do Brasil.
Um dos assuntos mais abordados pelo parlamentar, durante a sua candidatura, era o
ódio ao Partido dos Trabalhadores, associado à corrupção. Até mesmo na posse
presidencial, em 1º de janeiro de 2019, o discurso antipetista foi o foco. Também, sem
citar nomes, coloca o governo do PT (esquerda) como destruidor dos valores
religiosos e da família brasileira.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
21
Percebe-se nesses trechos o Princípio da Simplificação e do Inimigo Único,
quando estabelece o Partido dos Trabalhadores como difusor do socialismo e inimigo.
Como ressalta Castro (2007), por um tempo certo, concentre-se até acabar com o
inimigo. Essa é a única ideia e símbolo para que o objetivo de transformar o opositor
em inimigo seja conquistado.
Capta-se também o Princípio do Contágio entendido como divulgação do
contágio do inimigo. ‘‘Colocar um antes perfeito e mostrar como o presente e o futuro
estão sendo contaminados por este inimigo.’’ (CARTA MAIOR, 2015) Bolsonaro traz
os erros, as piores fases e até inventa posturas do Partido dos Trabalhadores. Ele
culpa o partido pela corrupção generalizada, pela grave recessão econômica, pelas
altas taxas de criminalidade e ataques ininterruptos aos valores familiares e religiosos.
Além disso, o Princípio da Transposição, ‘‘transladar todos os males sociais a
este inimigo.’’ (CARTA MAIOR, 2015). É perceptível no discurso a culpabilização do
PT/socialismo por todos os acontecimentos ruins. Finchelstein (2018), registra que
Hitler culpava os judeus de ser os opositores do país, ao lado dos Estados Unidos e
da Rússia, além disso orquestrava a população o mau que os judeus ‘‘planejavam’’.
5.2 Trecho 2
Em 2013, um acordo entre o governo petista e a ditadura cubana trouxe ao
Brasil 10 mil médicos sem nenhuma comprovação profissional. Foram
impedidos de trazer cônjuges e filhos, tiveram 75% de seus salários
confiscados pelo regime e foram impedidos de usufruir de direitos
fundamentais, como o de ir e vir. Um verdadeiro trabalho escravo,
acreditem…respaldado por entidades de direitos humanos do Brasil e da ONU.
Antes mesmo de eu assumir o governo, quase 90% deles deixaram o Brasil,
por ação unilateral do regime cubano. Os que decidiram ficar, se submeterão
à qualificação médica para exercer sua profissão. Deste modo, nosso país
deixou de contribuir com a ditadura cubana, não mais enviando para Havana
300 milhões de dólares todos os anos. (PODER 360, 2019)
Sujeito de fala: Presidente Jair Bolsonaro;
Tempo do Verbo: Passado - “Em 2013, um acordo entre o governo petista e a
ditadura cubana trouxe ao Brasil 10 mil médicos sem nenhuma comprovação
profissional”; Inimigo: Partido dos Trabalhadores; Socialismo; Ditadura cubana
(médicos cubanos)
Objetivo do Inimigo: Contribuir com a ditadura cubana; Discurso ideológico.
Leis de Goebbels: Princípio da Simplificação e do Inimigo Único, Princípio da
Vulgarização, Princípio do Contágio e Princípio da Transposição.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
22
Nota-se críticas à CUBA e ao programa Mais Médicos – que trouxe médicos de
Cuba para trabalhar no Brasil. Os médicos cubanos trabalharam durante o governo
da presidenta Dilma Rousseff, e foram afastados após a eleição de Bolsonaro.
Nesse trecho, o presidente está se referindo a "herança recebida de governos
petistas", mais uma vez, associando o governo petista ao socialismo e a Transposição
de males, lista de aspectos negativos que o Brasil sofreu pela Vulgarização do PT.
Usa-se um tom de voz conspiracionista, agressivo, e de forma segura, como se
estivesse comparando a sua superioridade com a inferioridade de Cuba. O Princípio
do Contágio é usado ao citar Cuba como ‘‘contagiada’’ pelo socialismo. Cuba,
representa para ele um país de regime socialista e inimigo e, por conseguinte
transmissora de males sociais. Mais uma vez, capta-se o uso do Princípio da
Simplificação e do Inimigo Único, o socialismo, e do Princípio da Transposição.
5.3 Trecho 3
Senhoras e Senhores,
O Brasil que represento é um país que está se reerguendo, revigorando
parcerias e reconquistando sua confiança política e economicamente.
Estamos preparados para assumir as responsabilidades que nos cabem no
sistema internacional. Durante as últimas décadas, nos deixamos seduzir,
sem perceber, por sistemas ideológicos de pensamento que não buscavam
a verdade, mas o poder absoluto. A ideologia se instalou no terreno da
cultura, da educação e da mídia, dominando meios de comunicação,
universidades e escolas.
A ideologia invadiu nossos lares para investir contra a célula mater de qualquer
sociedade saudável, a família. Tentam ainda destruir a inocência de nossas
crianças, pervertendo até mesmo sua identidade mais básica e elementar, a
biológica. O politicamente correto passou a dominar o debate público para
expulsar a racionalidade e substituí-la pela manipulação, pela repetição de
clichês e pelas palavras de ordem. A ideologia invadiu a própria alma humana
para dela expulsar Deus e a dignidade com que Ele nos revestiu. E, com
esses métodos, essa ideologia sempre deixou um rastro de morte, ignorância
e miséria por onde passou. Sou prova viva disso. Fui covardemente
esfaqueado por um militante de esquerda e só sobrevivi por um milagre de Deus.
Mais uma vez agradeço a Deus pela minha vida. (PODER 360, 2019)
Sujeito de fala: Presidente Jair Bolsonaro, primeira pessoa;
Tempos do Verbo: Presente/Passado
Presente: “O Brasil que represento é um país que está se reerguendo, revigorando
parcerias e reconquistando sua confiança política e econômica”
Passado: “Durante as últimas décadas, nos deixamos seduzir, sem perceber, por
sistemas ideológicos de pensamento que não buscavam a verdade, mas o poder
absoluto. A ideologia se instalou no terreno da cultura, da educação e da mídia,
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
23
dominando meios de comunicação, universidades e escolas.’’
Sujeito oculto: Partido dos Trabalhadores
Inimigo: Ideologia, Partido dos Trabalhadores, sistema ideológico, esquerda;
Objetivo do Inimigo: Implantar um sistema ideológico de pensamento.
Lei de Goebbels: Princípio da Vulgarização, Princípio da orquestração.
Ao final de seu discurso, com voz firme e confiante, Bolsonaro falou sobre
"sistemas ideológicos de pensamento que não buscavam a verdade, mas o poder
absoluto", exemplificou dizendo que foi uma vítima, quando foi esfaqueado por um
"militante de esquerda". Em seu discurso ele identifica claramente a IDEOLOGIA
como inimiga e como causa unificadora. Usa a oportunidade de discursar na ONU para
valorizar sua base de governo, ao falar de valores da família e promover sua guerra
cultural.
O Presidente usa o Princípio da Vulgarização: ‘‘transforma tudo numa coisa
torpe e de má índole. As ações do inimigo são vulgares, ordinárias, fáceis de
descobrir.’’ (CARTA MAIOR, 2015) A fala sobre a ideologia é de fácil compreensão,
até para os menos instruídos. Ele discursa em linguagem simples, de uma maneira
que todos entendam a mensagem, pois quanto mais pessoas forem cientes e
convencidas, menos esforço de persuasão. Quanto mais vulgar e simples for a
mensagem, mais fácil a compreensão e difícil chance de esquecimento.
A palavra ideologia, repetida à exaustão desde a campanha, e a ideia é tirar do
país da ‘‘submissão ideológica’’, das ‘‘amarras ideológicas’’, da ‘‘ideologia de gênero’’,
e regular a economia ‘‘sem viés ideológico’’. O termo ideologia é uma marca registrada
em seus discursos, e é usado para desmoralizar lideranças anteriores. Nota-se a
tentativa de desqualificar os concorrentes políticos com tendências ideológicas
associada à esquerda. Assim observa-se, o Princípio da Orquestração, fazendo
ressonar os males das ideologias de esquerda até transformá-las em notícias a seu
favor.
Em sua fala, Bolsonaro usou a voz sem dificuldade, mostrou-se confiante e
falou sem gaguejar, de forma clara, objetiva e corrente. O conteúdo do seu discurso foi
dirigido aos países membros da ONU, aos líderes da direita que concordam com a
sua visão de mundo, à população brasileira e com a sua visão de mundo. Os principais
inimigos são Partido dos Trabalhadores, Cuba, Venezuela, França e sobretudo a
mídia internacional, chamada de sensacionalista.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
24
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em 22 de setembro de 2020 o presidente Jair Bolsonaro fez o discurso de
abertura na Organização das Nações Unidas (ONU). Ele afirmou que o Brasil é alvo
de uma campanha de desinformação internacional e que não há de fato queimadas no
país, atacou a Venezuela e disse que o governo está combatendo a pandemia com
auxílio emergencial e muita eficiência. Há cerca de um ano atrás (22de setembro de
2019), o presidente fez um discurso mais inflamado na ONU, atacando
veementemente Cuba, Venezuela, o Partido dos Trabalhadores e o Socialismo. O
discurso de 2019 é o que analisamos neste estudo.
A análise das técnicas de comunicação e dos discursos dos líderes autoritários
como Mussolini e Hitler nos ajudam a perceber o poder exercido por eles sobre as
massas e e o uso estratégico da mídia. Ambos contaram com o apoio relevante do
cinema, do rádio, da televisão. O Ministro da Propaganda nazista, Joseph Goebbels,
elaborou, por exemplo, uma importante estratégia das onze leis de propaganda
política: lei da simplificação e do inimigo único, lei da ampliação e desfiguração, lei de
transfusão, lei da orquestração, lei da unanimidade e do contágio.
A propaganda é, sem dúvida, um instrumento estratégico fundamental de
persuasão para líderes autoritários. A disseminação repetitiva de informações
conquista a aprovação da sociedade para causas nacionalistas, geralmente
apresentadas como causas populares e de interesse da nação.
Nos trechos do discurso do atual presidente do Brasil na Organização das
Nações Unidas (ONU), proferido em 2019, constata-se o uso da propaganda pessoal,
desmerecendo adversários com ódio e muita intolerância. Isto pode ser observado a
partir de toda trajetória política nos discursos do presidente Bolsonaro, bem como na
história das lideranças autoritárias mundiais como Benito Mussolini e Adolf Hitler .
Em um contexto de desconfiança da populaçãoa com os partidos, sobretudo o
Partido dos Trabalhadores, e a intensa corrupção, Bolsonaro aproveitou o momento
político para conquistar seguidores nas redes sociais, com apelos emocionais,
discursos de ódio e vingança. Adotou as cores da bandeira do Brasil (verde e amarelo)
para reforçar o nacionalismo e patriotismo da direita. A internet e as redes sociais
foram importantes aliadas na estratégia do candidato. Ele conquistou sua base de
votos por meio das redes sociais, principalmente com imagens no Instagram, tweets
no Twitter, Whatsapp e lives no Facebook.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
25
Quanto às perguntas de pesquisa feitas: existem semelhançs/diferenças entre
as estratégias de marketing e propaganda do presidente do Brasil e as estratégias
usadas por líderes autoritários? Quais líderes/ discursos? Observou-se sim grandes
semelhanças entre as estratégias de Bolsonaro e a de líderes como Hitler. Há frases,
posicionamentos ideológicos e posturas que comprovam a hipótese. De modo
estratégico, ele utiliza, a seu favor, das mesmas técnicas da propaganda nazista, de
Joseph Goebbels.
Assim como Adolf Hitler, o governo do Brasil faz uso da repetição que se
sobrepõe à explicação. O inimigo único se corporifica em todos que discordam da
visão do líder. A chamada ‘‘lógica do inimigo’’ é a técnica dos discursos inflamados
contra o PT, a esquerda, o socialismo, os jornalistas e a Rede Globo, as feministas
e o grupo LGBTs.
Observou-se, ainda, uma grande semelhança entre o discurso de Jair
Bolsonaro e o de Donald Trump. Ambos se apresentam como ‘‘a nova política’,uma
opção diferente à velha política comunistas. Outra característica é a vinculação à
religião, à imagem de Deus e ao conservadorismo, além da idolatria aos militares e
aos valores patrióticos da nação.
Vale ressaltar, por fim, que este estudo traz contribuições importantes para a
análise das estratégias do discurso do governo Jair Messias Bolsonaro, mas não se
esgota em si. Há sem dúvida uma grande semelhança entre as estratégias usadas
por ele e a dos líderes autoritários do passado e da atualidade. No entanto, a limitação
de dados e espaço indica que há ainda muito a pesquisar para comprovar o que aqui
é afirmado.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
26
REFERÊNCIAS
AGÊNCIA BRASIL Flexibilização de posse de armas divide opiniões. 2019
Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2019-01/flexibilizacaode-posse-de-armas-divide-opinioes>. Acesso em 02. Fev. 2020.
ALMEIDA, Jorge. Os desafios da esquerda diante do marketing político: a
hipótese do marketing de contra-hegemonia. USP. Salvador: digit, 2016.
BRITOS, Valério Cruz. A televisão no Brasil, hoje: a multiplicidade da oferta.
Comunicação & Sociedade, n. 31, p. 9-34, 1999.
CALAZANS, J.; LIMA, C. Sociabilidades virtuais: do nascimento da Internet à
popularização dos sites de redes sociais online. 9º Encontro Nacional de
História da Mídia (UFOP). Ouro Preto, MG: 2013.
CIOCCARI, Deysi; PERSICHETTI, Simonetta. Armas, ódio, medo e espetáculo em
Jair Bolsonaro. Revista Alterjor, v. 18, n. 2, p. 201-214, 2018.
CIOCCARI, Deysi; PERSICHETTI, Simonetta. A política e o espetáculo em
Jair Bolsonaro, João Doria e Nelson Marchezan. Imagofagia, n. 18, p. 54-84,
2018.
CASTELLS, Manuel. A Galáxia Internet: reflexões sobre a Internet, negócios e
a sociedade. Zahar, 2003.Disponível em: <https://books.google.com.br/books?hl=ptBR&lr=&id=nCKFFmWOnNYC&oi=fnd&pg=PA5&dq=CASTELLS,+Manuel.+A+G
al%C3%A1xia+Internet:+reflex%C3%B5es+sobre+a+Internet,+neg%C3%B3cios+e+
a+sociedade&ots=_EyQVIza2O&sig=1kJoz_ZZ00COmAQesRRk1SPQZ2> Acesso
em 11. Out. 2020.
CASTRO, M. de S. Tradução, ética e subversão: desafios práticos e teóricos.
2007. Disponível em: <https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/10747/10747_7.PDF>.
Acesso em 02/03/2020, pp. 16-42.
DUARTE, Jorge; BARROS, Antônio (orgs). Métodos e técnicas de pesquisa em
comunicação: Análise do discurso, v. 2, 2012.
DOMENACH, Jean-Marie. La propaganda política. 2001. Disponível em:
< https://inforum.insite.com.br/arquivos/1046/apropagandapolitica.pdf> Acesso em
11. Out. 2020.
ECONOMIA, IMIGRAÇÃO, POPULARIDADE. O 1º ano de governo Trump em seis
gráficos. BBC News, 2018. Disponível em:
<https://www.bbc.com/portuguese/internacional-42730926> Acesso em 02. Fev.
2019.
FERREIRA, Ricardo Ribeiro. Rede de mentiras: a propagação de fake news na
pré-campanha presidencial brasileira. Faculdade de Letras da Universidade de
Coimbra (FLUC), Observatório (OBS*) Special Issue, (2018), 139-162.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
27
PODER 360. Leia a íntegra do discurso de Bolsonaro na ONU.2019. Disponível
em: https://www.poder360.com.br/governo/leia-a-integra-do-discurso-de-bolsonarona-onu/
MAROSIN, Jônatas. A influência da propaganda nazista no Marketing político
Atual. 2010.
MIGUEL, Luis Felipe. Da “doutrinação marxista” à" ideologia de gênero “Escola
Sem Partido e as leis da mordaça no parlamento brasileiro. Revista Direito e
Práxis, v. 7, n. 3, p. 590-621, 2016.
MONTEIRO, M; DE SOUSA, M; e DA SILVA, F. Biográfica de Jair Messias
Bolsonaro. CPDOC-FGV, Centro de Pesquisa e Documentação de História
Contemporânea do Brasil Praia de Botafogo, 190, Rio de Janeiro/RJ, 2009.
Disponível em: <http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/jairmessias bolsonaro>. Acesso em 25. Out. 2019
REVISTA CARTA CAPITAL.Os 11 princípios do ministro da propaganda
nazista, Joseph Goebbels., 2015. Disponível em:
<https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Midia/Os-11-principios-do-ministro-dapropaganda-nazista-Joseph-Goebbels/12/34137>. Acesso em 03/03/2020
ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de Discurso: princípios & procedimentos. 8.
ed. Campinas: Pontes, 2009. 100p.
PEREIRA, Wagner Pinheiro. Cinema e propaganda política no fascismo,
nazismo, salazarismo e franquismo. História: Questões & Debates, v. 38, n. 1,
2003.
O GLOBO. Relembre as propagandas eleitorais que marcaram a história., 2018.
Disponível em: <https://oglobo.globo.com/brasil/relembre-as-propagandas-eleitoraisquemarcaram-historia-23024873> Acesso em: 19. out. 2019.
ROLLO, Arthur Luis Mendonça. Propaganda eleitoral: Eleições no Direito
Brasileiro atualizado com a Lei, nº 12.034/09, 2004. Disponível em: <
http://albertorollo.com.br/wp-content/uploads/2016/03/PROPAGANDA-ELEITORAL2016-AMA.pdf> Acesso em 02. Out. 2020.
TEIXEIRA, F. Os fascismos. Século XX. Rio de Janeiro: Nova Fronteira: 2002.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 56040-56055 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
28
CAPÍTULO 02
A MERCÊ PASSAGEIRA DE INSTANTES QUE NÃO DURAM: AS REPRESENTAÇÕES DA
MORTE NA POESIA DE RICARDO REIS
Murillo Hochuli Castex
Graduado em Letras – Português/Inglês pela FAE Centro Universitário, bolsista do
Programa de Iniciação Científica (PAIC)
Mestre em Estudos de Linguagens pela Universidade Tecnológica Federal do
Paraná (UTFPR)
E-mail: mhcastex@hotmail.com
Luiz Rogério Camargo
Doutor em Estudos Literários pela Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Professor do curso de Letras – Português/Inglês da FAE Centro Universitário
E-mail: luiz.camargo@fae.edu
RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo analisar os símbolos de
representação da morte na poesia de Ricardo Reis, heterônimo neoclássico de
Fernando Pessoa, bem como instigar a reflexão sobre a maneira como tais
simbolismos influenciam na visão de mundo apresentada pelo poeta. Para tanto,
buscou-se identificar, ao longo de suas odes, metáforas relativas à ideia de finitude.
Nesse contexto, o material bibliográfico constitui-se de ensaios referentes à obra de
Ricardo Reis, abrangendo textos analíticos do próprio Pessoa e de outros críticos
literários. Por meio da pesquisa bibliográfica, buscou-se compreender o tema da morte
como uma constante para o heterônimo, uma vez que este apresenta-se como figura
de essencial importância para a poesia em língua portuguesa concebida a partir da
modernidade.
PALAVRAS-CHAVE: Ricardo Reis; Morte; Odes; Símbolos.
ABSTRACT: This paper aims to analyze the symbols representing death in the poetry
of Ricardo Reis, Fernando Pessoa's neoclassical heteronym, as well as to instigate
reflection on how such symbolisms influence the worldview presented by the poet. To
this end, we sought to identify, throughout his odes, metaphors related to the idea of
finitude. In this context, the bibliographic material consists of essays on the work of
Ricardo Reis, including analytical texts by Pessoa himself and other literary critics.
Through the bibliographical research, we seek to understand the theme of death as a
constant for the heteronym, since it presents itself as a figure of essential importance
to the poetry in Portuguese language conceived from modernity.
KEYWORDS: Ricardo Reis; Death; Odes; Symbols.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
29
1. INTRODUÇÃO
Poeta neoclássico, Ricardo Reis é uma expressão da modernidade em seu
sentido mais complexo, apresentando um apego muito particular à poesia e filosofias
originárias da antiguidade clássica, e, ao mesmo tempo, abordagens temáticas
pertinentes ao seu período histórico, mais especificamente, à primeira metade do
século XX. Em um contexto em que emergia o Modernismo em Portugal, Ricardo Reis
volta a sua concepção criativa para a tradição da poesia greco-romana, tomando-a
como base para a formulação de suas principais temáticas e para a estruturação
formal de seus poemas.
Inspirado pelo Mestre Alberto Caeiro e se diferenciando muito dos demais
heterônimos de Pessoa, Reis é descrito por seu criador, em carta ao crítico literário
Adolfo Casais Monteiro, como o heterônimo em quem colocou “toda a sua disciplina
mental, vestida da música que lhe é própria” (PESSOA, 1986, p. 199). Em suas odes
neoclássicas,
“requintadamente estilizadas” (SIMÕES, 1985, p. 310), Reis
caracteriza-se por apresentar um posicionamento plácido perante a vida, que procura
evitar o derramamento emotivo, por meio de uma postura olímpica e aristocrática
(GOMES, 1987, p. 27). Tais elementos, contudo, revelam-se incapazes de esconder
o universo de tensões que transparecem ao longo de sua obra.
Em relação a aspectos biográficos, Reis tem seu nascimento datado do ano de
1887, sendo educado em um colégio de jesuítas (PESSOA, 2006, p. 200). Ao longo
de sua formação, configura-se como um “latinista por educação alheia, e um semihelenista por educação própria” (PESSOA, 2006, p. 200) e, na fase adulta, expatria-se
para o Brasil voluntariamente, em função de sua orientação política monárquica
(PESSOA, 2006, p. 200). Por meio de sua erudição, o heterônimo concebe uma
poética voltada para a racionalidade, marcada tanto pelo virtuosismo estético quanto
pelo rigor formal (SIMÕES, 1985, p. 306). Assim, chega a afirmar, por exemplo, que
“deve haver, no mais pequeno poema de um poeta, qualquer coisa por onde se note
que existiu Homero” (REIS, 2016, p. 349), o que vem a diferenciá-lo muito de certas
correntes modernistas de seu tempo, motivadas, sobretudo, pelo rompimento com as
estruturas poéticas tradicionais.
Atraído por princípios filosóficos clássicos, isto é, helenísticos, Reis dialoga
constantemente com a vertente epicurista da filosofia, orientada para a busca dos
prazeres moderados, característica ao indivíduo que “ama os prazeres, a comodidade,
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
30
a vida agradável [...] em geral, com a ideia acessória de certa arte e de certa delicadeza
na eleição dos gozos” (GOMES apud LALANDE, 1987, p. 37). Ao mesmo tempo, o
heterônimo recebe grande influência da escola estoica, que propõe a total
negação dos valores mundanos, conforme a concepção de que a felicidade reside
na “tranquilidade ou na ausência de perturbações” (MARCONDES, 2006, p. 92).
Assim, pode-se afirmar que do estoicismo o heterônimo “recolhe a ideia central de
disciplina que irá dominar toda a sua arte poética” (SEABRA, 1974, p. 111),
valorizando aspectos como o autocontrole, a contenção e a austeridade, na medida
em que procura aceitar o curso dos acontecimentos (MARCONDES, 2006, p. 92).
Autoconsciente da “impotência do homem diante do fado” (GOMES, 1987, p.
28), Reis aponta para a renúncia como atitude a ser adotada, a fim de transcorrer a
vida, conforme suas próprias palavras: “sem desassossegos grandes” (REIS, 2016, p.
97). O ideal de evitar os excessos vem a aproximar a visão de mundo do heterônimo ao
postulado horaciano do aurea mediocritas, ou mediocridade dourada, o qual preza por
uma “vida mediana, de horizontes pequenos, sem ambições, mas também sem lutas,
identificada com uma idealização da vida campestre” (NICOLA, 1995, p. 47).
No entanto, agudamente consciente da passagem do tempo, Reis, em
diversos instantes, evoca a percepção da morte, refletida em simbologias
frequentemente inspiradas pela mitologia greco-romana. Desse modo, pode-se
afirmar que, apesar da placidez e da racionalidade almejadas a priori em seus versos,
o poeta sente a passagem dos instantes e se angustia, ainda que veladamente, diante
da impossibilidade de controlar o curso do tempo. A consciência da finitude revela-se,
assim, como o principal motivo de sofrimento do autor, conforme aponta Lourenço:
“o dado central da visão do novo heterônimo é sempre o mesmo: ser consciente é
ser infeliz” (LOURENÇO, 1981, p. 49). Diante das perspectivas apresentadas, o
objetivo deste estudo é desvendar os sentidos das simbologias relacionadas à
morte nas odes de Ricardo Reis, a fim de constatar de que modo este se utiliza
dos recursos literários para aludir à finitude. Além disso, procura-se contribuir para o
aprofundamento do presente estado de conhecimento relativo à obra de Ricardo
Reis, poeta de essencial importância para a compreensão da poesia em língua
portuguesa concebida a partir da modernidade.
Para atingir tais objetivos, o trabalho estrutura-se em tópicos constituídos a
partir das diferentes representações da ideia de morte empregadas ao longo das odes
ricardianas. Desse modo, aborda-se, primeiro, a simbologia mítica que a morte
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
31
adquire, abrangendo referências à mitologia da antiguidade clássica. A seguir, são
abordados os símbolos terrestres da morte, conotando evocações relativas à terra e
relacionadas aos seres e às coisas. Por fim, busca-se retratar os símbolos relativos à
noite e às sombras, como elementos essenciais para que o poeta referencie a finitude.
2. OS SÍMBOLOS MÍTICOS DA MORTE
Apegado à antiguidade clássica, Ricardo Reis frequentemente dialoga com
simbologias da mitologia greco-romana, utilizando para tanto suas respectivas
denominações romanas. Nesse sentido, figuras extraídas do cenário mitológico são
utilizadas para referenciar a morte, tema de central importância em sua obra. Observase, ao longo de diversas passagens, a alusão a figuras como as Parcas, ou Moiras,
“filhas da noite”, cuja ocupação consistia em tecer o fio do destino humano e que, com
suas tesouras, cortavam-no, quando muito bem entendiam (BULFINCH, 2002, p. 15).
Denominadas Clotos, Láquesis e Átropos
esta última diretamente responsável por
cortar o fio da vida (BRANDÃO, 2013, p. 243) – configuram-se, segundo a perspectiva
mitológica, como a “personificação do destino individual, da ‘parcela’ que toca a cada
um neste mundo” (BRANDÃO, 2013, p. 242) e são uma das mais clássicas
representações da finitude.
Desse modo, a representação das Moiras é evidenciada em momentos
oportunos, como nos versos em que o eu lírico questiona: “Que trono te querem dar/
Que Átropos to não tire” (REIS, 2016, p. 100). A partir dessa reflexão, Reis rejeita a
pretensão à opulência material, segundo o viés estoico, sugerindo que Átropos, aquela
que “não volta atrás, a inflexível” (BRANDÃO, 2013, p. 243), não permitirá que
nenhuma conquista mundana se estabeleça perenemente. Em outro fragmento, o
poeta apresenta a fragilidade que concerne todas as formas de existência, segundo a
perspectiva de que a tesoura da Moira invariavelmente determinará o momento
derradeiro: “Corta à flor como a ele/ De Átropos a tesoura” (REIS, 2016, p. 101). Assim,
por meio do pronome “ele”, Reis refere-se ao indivíduo que desfruta da vida
contentando-se apenas com os prazeres simples, reafirmando a ideia de que essa
seria a melhor forma de transcorrer a existência. Em um contexto que reúne ainda a
representação das sombras, novamente as Parcas são mencionadas, revelando a
angústia do poeta:
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
32
[...] Quando acabados pelas Parcas, formos,
Vultos solenes, de repente antigos,
E cada vez mais sombras,
Ao encontro fatal [...] (REIS, 2016, p. 102, grifo meu).
Nesse sentido, pode-se afirmar que, para Reis, as ideias de vida e de morte
apresentam-se inerentes, simbolicamente, à função de fiar (BRANDÃO, 2013, p. 243),
em consonância com a representação clássica. Sob tal enfoque, as Parcas são
responsáveis por determinar o início e o fim do indivíduo, agindo sobre ele de
maneira velada: “Do mesmo modo a vida é sempre a mesma/ Nós não vemos as
Parcas acabarem-nos” (REIS, 2016, p. 150), discorre o poeta.
Em virtude da busca por um estado de serenidade almejado, Reis chega a
afirmar que demonstrará contentamento ao antever o momento derradeiro da própria
existência: “Feliz, que quando a hora tributária/ Transpor seu átrio por que a Parca
corte/ O fio fiado até ao fim” (REIS, 2016, p. 117). No entanto, percebe-se que o
heterônimo não aceita a finitude com a placidez que professa, evidenciando, na
realidade, um eu lírico em permanente estado de angústia, para quem “cada momento
é morte” (PADRÃO, 1981, p. 128).
Diante da aflição que involuntariamente apresenta, Reis chega a enunciar que
os homens devem se fazer “Unidos pelos deuses” (REIS, 2016, p. 120), a fim de que
evitem maiores sofrimentos:
[...] Basta os males que o Fado às Parcas fez
Por seu intuito natural fazerem.
Nós homens nos façamos
Unidos pelos deuses (REIS, 2016, p. 120).
No trecho citado, evidencia-se o apego do heterônimo em relação aos deuses
olímpicos, que se configuram, em suas odes, como “uma ocupação múltipla do espaço
sagrado” (MARTINS, 2017, p. 122). Nestes, o autor procura inspirar sua conduta,
conforme a visão de que os deuses não possuem preocupações futuras ou passadas,
mas apenas existem enquanto entidade abstratas e, por isso, servem de modelo aos
homens (REIS, 2016, p. 245), transcendendo a própria percepção da morte.
Em consonância com os fragmentos analisados, outra figura mitológica de
fundamental importância é a do barqueiro Caronte, aquele que conduzia as sombras
dos mortos ao reino de Hades Deus do mundo inferior, responsável por reger as almas
dos mortos (MARCH, 2015, p. 116). Um exemplo dessa evocação se encontra no
momento em que Reis aconselha a Lídia, uma das musas a quem frequentemente se
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
33
dirige, uma postura de serenidade perante a vida: “E se antes do que eu levares o
óbolo ao barqueiro sombrio, / Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti” (REIS,
2016, p. 98, grifo meu). Ou seja, novamente o sofrimento diante do fim é a maior
angústia do eu lírico, que procura superá-lo mediante a completa negação dos
prazeres. A imagem também aparece em outro momento em que Reis reforça o seu
viés estoico:
Não tenhas nada nas mãos
Nem uma memória na alma
Que quando te puserem Nas
mãos o óbolo último, Ao
abrirem-te as mãos
Nada te cairá [...] (REIS, 2016, p. 100, grifo meu).
Aqui, o óbolo, a moeda, segundo a mitologia greco-romana, depositada sobre
a boca dos defuntos como pagamento ao barqueiro para a realização da travessia
(MARCH, 2015, p. 118), é utilizado como metáfora para a morte – justificando o
desapego tanto de aspectos materiais como sentimentais, a exemplo das referidas
memórias. Em contexto semelhante, a barca de Caronte, “sempre ligada à
indestrutível desgraça dos homens” (PADRÃO, 1981, p. 74), é aludida pelo
heterônimo como “O barco escuro no soturno rio” (REIS, 2016, p. 102), sendo o rio
escuro, segundo a representação mítica, aquele situado nos limites do Mundo Inferior,
a cujas margens chegavam as almas dos mortos (MARCH, 2015, p. 118). Em outra
ode, em que o poeta propõe um brinde ao Destino, novamente a figura do barqueiro
é resgatada para representar a finitude, contraposta pelo eu lírico a qualquer
possibilidade de bem-aventurança: “E brindamos uníssonos à sorte/ Que houver, até
que chegue/ A hora do barqueiro” (REIS, 2016, p. 127).
Ao longo das odes, outro elemento mitológico responsável por caracterizar a
morte é Averno, lago vulcânico que tem a forma de um círculo, com meia milha de
largura, e muito profundo (BULFINCH, 2002, p. 316), do qual vapores pestilentos se
levantam, de modo que não há vida em suas margens e nenhuma ave as sobrevoa
(BULFINCH, 2002, p. 316). Assim, este é considerado pela mitologia greco-romana
como o local em que é encontrada a gruta que dá acesso às regiões infernais
(BULFINCH, 2002, p. 316). Conforme as demais figuras mitológicas analisadas,
Averno é evocado como uma forma de referenciar o estado póstumo, diante do qual
a vida caracteriza-se como um breve estado de transição concedido pelos deuses:
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
34
[...] Bem sei que mesmo aqui
Se nos gasta esta carne
Que os deuses concederam
Ao estado antes de Averno (REIS, 2016, p. 106).
Por meio de outra alusão metafórica, Reis compara Averno à imagem de um
abrigo, em que estaria liberto das expectativas mundanas e, segundo sua perspectiva,
mais próximo à existência imortal dos deuses:
Feliz aquele a quem a vida grata
Concedeu que dos deuses se lembrasse
E visse como eles
Estas terrenas coisas onde mora
Um reflexo mortal da imortal vida
Feliz, que quando a hora tributária
Transpor seu átrio por que a Parca corte
O fio fiado até o fim,
Gozar poderá o alto prêmio
De errar no Averno grato abrigo
Da convivência [...] (REIS, 2016, p. 117, grifo meu).
Em sentido análogo, outra representação mitológica da morte é evidenciada
por meio da figura de Plutão, eufemismo utilizado para invocar o reino de Hades
(BRANDÃO, 2013, p. 330), lugar frio, situado fora do alcance da luz do sol (MARCH,
2015, p. 116). Tal referência evidencia-se em trecho em que Reis finaliza uma de suas
odes aludindo à morte segundo uma perspectiva tenebrosa, caracterizando-a como o
“regaço insaciável/ Da pátria de Plutão” (REIS, 2016, p. 99).
3. OS SÍMBOLOS TERRESTRES DA MORTE
Assim como os símbolos míticos, Reis utiliza em suas odes metáforas de
caráter terrestre para aludir à finitude, a partir da evocação de seres e elementos
naturais. Nesse sentido, recorre a representações de flores, ervas e da água esta, em
especial, expressa também sob o simbolismo de rios, lagos e do vinho. Percebe-se,
no entanto, que tais símbolos não são referidos pelo viés de celebração inerente, mas
como imagens representativas da efemeridade, conforme comentário de Padrão:
“[Reis] Pode procurar flores ou vinho, que camuflem a consciência da passagem do
tempo, mas nunca pode desligar de si a ideia de acabamento” (PADRÃO, 1981, p.
129).
Desse modo, quando propõe ao Mestre Caeiro que as flores devem ser
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
35
colhidas e os rios contemplados, não o faz senão a partir da consciência que possui
da “inutilidade da agitação cotidiana e a ausência de qualquer razão profunda de viver”
(PADRÃO, 1981, p. 76), anunciando o ato contemplativo como uma forma de evitar
maiores sofrimentos:
[...] Colhamos flores
Molhemos leves
As nossas mãos
Nos rios calmos
Para aprendermos
Calma também
Girassóis sempre
Fitando o sol
Da vida iremos
Tranquilos, tendo
Nem o remorso
De ter vivido (REIS, 2016, p. 94).
Nesse contexto, sob uma dimensão simbólica, as flores que o eu lírico
menciona trazem em si o caráter da “efêmera duração da vida, da beleza e dos
prazeres” (CHEVALIER, GHEERBRANT, 2017, p. 437), utilizadas para afirmar uma
postura estritamente contemplativa perante a realidade. Dando sequência à ode, Reis
sugere que a vida deve ser transcorrida de maneira plácida e utiliza, para tanto, a
metáfora dos girassóis, cuja constituição é comparada à frágil existência humana.
Assim, é possível observar o conflito gerado entre o estado de tranquilidade
professado ao longo do poema e o sentimento de remorso que o poeta pretende evitar,
revelando novamente o estado de angústia em relação à passagem do tempo. Em
outra ode, Reis utiliza a metáfora de uma coroa de rosas para aludir à finitude:
Coroai-me de rosas,
Coroai-me em verdade
De rosas –
Rosas que se apagam
Em fronte a apagar-se
Coroai-me de rosas
E de folhas breves
E basta (REIS, 2016, p. 95, grifo meu).
Aqui, a representação da coroa de rosas remete à efemeridade das aspirações
mundanas. O apelo “Coroai-me de rosas” é professado como o único desejo do eu
lírico, configurando-se como uma ironia às ambições que determinam grande parte da
existência. Em tal contexto, a evocação das rosas remete diretamente a um
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
36
simbolismo fúnebre, oriundo da antiguidade, segundo o qual costumava-se colocar
rosas sobre as tumbas dos defuntos (CHEVALIER, GHEERBRANT, 2016, p. 789).
Consciente da passagem do tempo e não ousando desejar mais do que a
“contemplação do espetáculo do mundo” (GOMES, 1987, p. 37), Reis chega a afirmar
também a ausência de ideais orientados para o patriotismo e para a prática da virtude:
“Prefiro rosas meu amor, à pátria/ E antes magnólias amo/ Que a glória e a virtude”
(REIS, 2016, p. 115). Projetando novamente a ideia da simplicidade a ser cultivada
nas ações cotidianas, o poeta aconselha: “Circunda-te de rosas, ama, bebe/ E cala. /
O mais é nada” (REIS, 2016, p. 126). Assim, aproxima a essência humana à das
rosas, conforme aponta Lourenço ao analisar a obra do heterônimo: “se como rosas
somos, como elas aceitemos o ocasional florir que aceito se volve eterno”
(LOURENÇO, 1981, p. 51).
Referindo-se novamente ao Destino, o poeta aconselha o interlocutor a
aproveitar o instante, segundo o ideal horaciano de carpe diem, associando as árvores
à imagem da sombra:
[...] Segue o teu destino
Rega as tuas plantas
Ama as tuas rosas
O resto é a sombra
De árvores alheias (REIS, 2016, p. 126).
Da mesma forma, ao longo de uma das odes destinadas a Lídia, Reis sugere
que as flores sejam colhidas, mas que sejam deixadas de lado logo em seguida, para
que não gerem apegos e, consequentemente, sofrimento:
[...] Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que seu perfume suavize o momento –
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada,
Pagãos inocentes da decadência (REIS, 2016, p. 98).
As flores, novamente, anunciam um contexto de fragilidade, percebidas
enquanto objetos de contemplação destinados a suavizar a passagem do tempo. Sob
tal perspectiva, o tempo para Reis é revela-se como sinônimo de morte e cada instante
pode ser qualificado como “uma morte fragmentária e sucessiva” (PADRÃO, 1981, p.
129), segundo sua frágil concepção: “Débil como uma haste de papoula/ Me suporta
o momento” (REIS, 2016, p. 141), afirma o poeta.
De maneira semelhante, o heterônimo compara as rosas aos sorrisos, ambos,
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
37
segundo sua concepção, elementos fugazes de prazer: “rosas breves os sorrisos
vagos, / E as rápidas carícias/ Dos instantes volúveis” (REIS, 2016, p. 99). Como uma
constante em sua obra, o autor previne o interlocutor para que não desenvolva apegos
em relação aos instantes que passam: “Colhe as flores, mas larga-as, / Das mãos mal
as olhaste” (REIS, 2016, p. 101), revelando um contexto poético em que “o gozo
convive com a serena aceitação da dor e do fado” (GOMES, 1987, p. 38).
Em sentido análogo ao das flores, em outra ode, a representação da erva é
também empregada pelo poeta:
Rasteja mole pelos campos ermos
O vento sossegado.
Mais parece tremer de um tremor próprio
Que do vento, o que é erva [...] (REIS, 2016, p. 141).
Novamente, Reis revela a sua inquietude perante a existência, utilizando a
imagem da erva como a de um elemento suscetível a intempéries, destinada a moldarse à ação constante das forças da natureza, que não pode controlar.
Em outra simbologia, a água adquire também uma conotação de finitude e
esgotamento para o heterônimo:
[...] Não pesa que amas, bebas ou sorrias:
Basta o reflexo do sol ido na água
De um charco, se te é grato [...] (REIS, 2016, p. 144)
Sob tal contexto, é possível inferir que, para Reis, “contemplar a água é
contemplar a si próprio no caminho para o fim” (PADRÃO, 1981, p. 76). Segundo esta
concepção, a representação da água remete aos conceitos de transitoriedade e de
esgotamento, conforme aponta Padrão: “à sua água está ligado o significado do correr
do homem, do correr dos dias, as conjecturas do destino funesto, da morte” (PADRÃO,
1981, p. 74).
A representação da água estende-se para a percepção do rio, interpretado
como uma “metáfora da vida enquanto fluxo” (GOMES, 1987, p. 34). Assim, o poeta
afirma: “passamos como o rio. / Mais vale saber passar silenciosamente/ E sem
desassossegos grandes” (REIS, 2016, p. 97). Sob tal perspectiva, os rios revelam
sempre a marca da transitoriedade (PADRÃO, 1981, p. 71), corroborando com a
aguda percepção da passagem do tempo que caracteriza o heterônimo. Em outro
contexto, Reis apresenta a imagem de um rio permeado pela escuridão, relacionandoBrazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
38
o à perspectiva mitológica da travessia para o reino dos mortos, conforme: “A
existência indecisa e afluente/ Fatal do rio escuro” (REIS, 2016, p. 104).
Em outra metáfora relativa à água, o poeta estabelece uma analogia entre olhos
e lagos, ambos destinados a secar segundo a passagem do tempo, deixando de
apresentar as funções vitais que lhes caracterizam. Assim, Reis discorre a respeito da
importância de contemplar a beleza, ainda que esta esteja fadada a extinguir-se:
[...] E a beleza, incriável por meu sestro,
Eu goze externa e dada, repetida
Em meus passivos olhos,
Lagos que a morte seca (REIS, 2016, p. 124, grifo meu)
Sob tal perspectiva, o caráter estanque dos lagos é contraposto à
transitoriedade dos rios, ainda que ambos representem a percepção da finitude.
Conforme observa Padrão, para Reis, “se cada rio reflete a morte, cada lago a
contém” (PADRÃO, 1981, p. 77).
Em outra simbologia, o vinho também é utilizado como elemento significativo de
representação da finitude, referenciado como um paliativo destinado a apagar “o gosto
às horas” (REIS, 2016, p. 101):
[...] Mas ele sabe fazer que a cor do vinho esconda isto
Que o seu sabor orgíaco
Apague o gosto às horas,
Como a uma voz chorando
O passar das bacantes [...] (REIS, 2016, p. 101).
De “sabor orgíaco”, o vinho é apontado pelo heterônimo como mais um dos
instantes que não duram, sendo o estado de embriaguez oriundo do seu consumo
definido como um mero atenuante ao sofrimento. Nesse contexto, pode-se observar
que Reis “Assume a pose de poeta báquico, coroado de pâmpanos ou de rosas, uma
taça de vinho na mão [...]. Mas tudo isso é puramente exterior” (BRÉCHON, 1998, p.
221).
A frágil taça, desse modo, pode ser comparada à própria existência do eu lírico:
“Com mão mortal elevo à mortal boca/ Em frágil taça o passageiro vinho” (REIS, 2016,
p. 129). Diante da bebida, que promove o embaraço dos sentidos, o poeta chega a
descrever um cenário ideal para a sua própria morte:
[...] Bocas roxas de vinho
Testas brancas sob rosas
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
39
Nus, brancos antebraços
Deixados sobre a mesa;
Tal seja, Lídia, o quadro
Em que fiquemos, mudos,
Eternamente inscritos
Na consciência dos deuses (REIS, 2016, p. 129).
Novamente direcionando-se a Lídia, Reis afirma a sua angústia, valendo-se
das representações do vinho e das rosas, ambas empregadas, conforme comentário
de Bréchon (1998, p. 225), como “imagens grandiosas para cantar a inutilidade de
tudo e o esquecimento, a miséria da condição do homem, sujeito ao destino e aos
deuses”.
4. OS SÍMBOLOS NOTURNOS DA MORTE
Outro elemento de fundamental importância para a compreensão das
representações da morte em Reis é a presença de palavras que remetem à noite e à
ausência de luz, ou às sombras. Assim, utilizando-se da representação da sombra,
“a própria imagem das coisas fugidias, irreais e mutantes” (CHEVALIER,
GHEERBRANT, 2016, p. 843), o poeta aconselha a Lídia a adoção de uma postura
contemplativa em relação à realidade, baseada na negação dos prazeres carnais, a
fim de que se evitem sofrimentos:
[...] Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças [...] (REIS, 2016, p. 98, grifo meu).
Em outro poema, a existência parece extinguir-se gradualmente segundo a
percepção do eu lírico, que anuncia o processo de diluição que envolve a si e a seu
próprio interlocutor, tornando-se ambos “cada vez mais sombras/ ao encontro fatal”
(REIS, 2016, p. 99). Novamente, a passagem do tempo suscita a angústia do
heterônimo, que questiona a seu leitor: “Que horas que te não tornem/ Da estatura da
sombra” (REIS, 2016, p. 100). Nesse sentido, cada instante age de maneira a diluir o
indivíduo, aproximando-o da morte e, por isso, o autor emprega de maneira recorrente
a metáfora da sombra. Conforme comentário de Padrão, “A sombra é um diluente
diluído a desfazer contornos de formas e a juntar-se [...] a um pensamento inútil que
‘se conduz até saber que nada vale ou pesa’” (PADRÃO, 1981, p. 108).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
40
Desse modo, qualquer tentativa de resistência à passagem do tempo é
considerada inútil e o heterônimo adota uma postura de aceitação total (MARTINS,
2017, p. 118) dos acontecimentos. Assim, os “infecundos, trabalhosos dias” (REIS,
2016, p. 102) que descreve conduzem, invariavelmente, ao perecimento,
representado pela escuridão; o lugar onde “não tens fogo que te aqueça” (REIS, 2016,
p. 102). Sob a ótica de Reis, em estado póstumo, os indivíduos ao menos já não
sentem o peso da existência:
Cuidas, ínvio, que cumpre, apertando
Teus infecundos, trabalhosos dias
Em feixes de hirta lenha.
Sem ilusão a vida.
A tua lenha é só o peso que levas
Para onde não tens fogo que te aqueça,
Nem sofrem peso aos ombros
As sombras que seremos (REIS, 2016, p. 102, grifo meu).
Referindo-se ao amor, Reis aponta a sua natureza perecível, comparando o
sentimento à representação da diluição que caracteriza a sombra: “A riqueza é um
metal, a glória é um eco/ E o amor uma sombra” (REIS, 2016, p. 110). Em outro
momento, aconselha novamente uma postura epicurista a seu interlocutor, utilizando a
representação da sombra para se referir ao curso dos acontecimentos, que não pode
controlar:
[...] Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas
Ama as tuas rosas
O resto é a sombra
De árvores alheias (REIS, 2016, p. 116).
Desse modo, nascer, segundo a perspectiva ricardiana, é estar condenado pelo
Fado a não cultivar esperanças: “[...] tu perene/ Sombra errarás absurda” (REIS, 2016,
p. 124), afirma o poeta em uma de suas odes.
De maneira análoga, a palavra “noite” alude em diversos poemas à morte,
remetendo diretamente aos primórdios da mitologia greco-romana, conforme a ideia
de que “para os gregos, a noite (Nyx) era a filha do Caos e a mãe do Céu (Urano) e da
Terra (Gaia). Ela engendrou também o sono e a morte” (CHEVALIER, GHEERBRANT,
2016, p. 639).
Nesse sentido, a noite desponta como um elemento aterrador, sugerindo o
“vazio e desconhecido à volta do poeta e dentro dele” (PADRÃO, 1981, p. 100).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
41
Profundamente desesperançado, Reis remete diretamente ao mito grego referente à
Noite em um de seus versos: “[...] me entrego, filho/ Ignorado do Caos e da Noite/ As
férias em que existo” (REIS, 2016, p. 141). Em outro momento, aconselha a Lídia:
[...] Assim façamos nossa vida um dia,
Inscientes, Lídia, voluntariamente
Que há noite antes e após
O pouco que duramos (REIS, 2016, p. 102).
Dirigindo-se, mais uma vez, a Lídia, o poeta sugere que sejam ignoradas
reflexões de ordem metafísica, a fim de que se aproveitem os instantes. Sob tal
enfoque, a brevidade da vida seria comparada a de um dia, ao passo que a morte
estaria representada segundo a escuridão e ausência de movimento (PADRÃO, 1981,
p. 98) que caracterizam a noite. De maneira semelhante, Reis a aconselha a musa
para que não cultive paixões exacerbadas: “À noite, que entra, não pertence, Lídia, /
O mesmo ardor que o dia nos pedia” (REIS, 2016, p. 103). Assim, segundo a visão
ricardiana, é necessário que os indivíduos abdiquem de ardores e paixões, a fim de
que “não se desviem das leis naturais que fundamentalmente regem a vida humana”
(CRESPO, 1988, p. 193).
Em outro momento, Reis refuta a ideia de enaltecer a noite em suas odes,
justamente por esta carregar de maneira inerente a perspectiva aterradora da finitude:
Não canto a noite porque no meu canto
O sol que canto acabará em noite
Não ignoro que esqueço
Canto por esquecê-lo.
Pudesse eu suspender, inda que em sonho,
O apolíneo curso, e conhecer-me
Inda que louco, gêmeo
De uma hora imperecível! (REIS, 2016, p. 122, grifos meus).
Nesse contexto, mesmo o sol, simbolicamente referido como “fonte da luz, do
calor, da vida” (CHERVALIER, GHEERBRANT, 2016, p. 836), sucumbe diante do
simbolismo da noite – isto é, da morte. O poeta, assim, chega a sonhar uma “hora
imperecível”, em um contexto em que a autoconsciência é apresentada como o único
atenuante ao sofrimento do qual padece, conforme observa Lourenço: “só da
autolucidez com que se contempla fia a improvável vitória sobre o deserto onde
agoniza” (LOURENÇO, 1981, p. 56).
No decorrer das odes, a estação do inverno é outro elemento utilizado para
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
42
representar a morte, como no seguinte trecho: “Não florescem no inverno os
arvoredos, / Nem pela primavera/ Têm brancos fios os campos” (REIS, 2016, p. 103).
O poeta, assim, compara o inverno à velhice humana, conforme a perspectiva de
encerramento de um ciclo.
Dirigindo-se a Lídia, Reis aponta novamente para as diferentes fases que
representam a existência:
Quando Lídia, vier o nosso outono
Com o inverno que há nele, reservemos
Um pensamento, não para a futura
Primavera, que é de outrem,
Nem para o estio, de quem somos mortos
Senão para o que fica do que passa –
O amarelo atual que as folhas vivem
E as torna diferentes (REIS, 2016, p. 135).
Nota-se, aqui, que o poeta estabelece uma analogia entre as estações do ano
com o “ritmo da vida, as etapas de um ciclo de desenvolvimento: nascimento,
formação, maturidade, declínio” (CHEVALIER, GHEERBRANT, 2016, p. 401). Assim,
o inverno configura-se como a estação mais fria do ano, que apresenta dias mais
curtos e noites mais longas, remetendo, por analogia, à finitude. Em outra passagem,
Reis afirma: “Haja inverno na terra, não na mente. / E, amor a amor, ou livro a livro,
amemos/ Nossa caveira breve” (REIS, 2016, p. 136), sugerindo que é fundamental ao
indivíduo cultivar a razão, mesmo em face do fim inevitável. Conforme aponta
Brechon, segundo a perspectiva ricardiana, “é justamente a ‘livre’ escolha do
inevitável que vai criar a dignidade do homem” (BRÉCHON, 1998, p. 226). Nesse
sentido, pode-se afirmar que a autoconsciência representa um atenuante em relação
à condição do heterônimo, ainda que este se revele profundamente angustiado diante
da passagem dos instantes.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Inspirado por ideais clássicos e pelas filosofias estoica e epicurista, Ricardo
Reis concebe uma poética que revela, ainda que veladamente, o sentido de angústia
e mesmo de terror em face à passagem do tempo. Nesse sentido, é possível
centralizar em sua obra a construção de uma “serenidade voluntariamente fictícia”
(LOURENÇO, 1981, p. 60), em que o eu lírico, sob a aparência da placidez que busca
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
43
em meio à tradição clássica, apresenta-se, em realidade, em permanente estado de
angústia – e por isso evoca tantas vezes a temática da morte, sob representações
distintas.
Segundo a poética objetiva refletida pelas odes ricardianas, pode-se observar
uma “clássica resposta à angústia da Morte, a de ver no que passa e porque passa o
sinal inverso da Eternidade” (LOURENÇO, 1981, p. 52). Assim, para Reis, cada
instante carrega em seu íntimo a perspectiva de finitude; mesmo os prazeres que tanto
procura evitar, ou as flores que procura contemplar, tornam-se metáforas dos instantes
volúveis, que anunciam ao indivíduo o seu próprio fim.
Desse modo, Reis volta-se frequentemente para a mitologia greco-romana, a
fim de recuperar a consciência do Fado e da fragilidade do indivíduo – tão bem
ilustradas em figuras como a das Parcas, do barqueiro Caronte e de Hades,
remetendo ao viés trágico da existência humana, que marca a tradição clássica.
Olhando para a realidade à sua volta, o poeta enxerga nas flores, nas plantas e na água
também os simbolismos da finitude e do esgotamento, ilustrando, particularmente, a
fugacidade dos prazeres – mesmo aqueles que exigem do indivíduo apenas o olhar
contemplativo, como o simples gesto de observar o curso de um rio.
De maneira análoga, a noite, as sombras e o inverno remetem à ideia de
finitude para Reis, que utiliza a metáfora da ausência de luz para representar aquilo
que não se pode conhecer – o vazio absoluto que representa a morte. Nesse sentido,
paradoxalmente, o vislumbre do desconhecido aflige ao máximo o heterônimo que se
define pelo cultivo da razão, que teme “o frio da sombra/ Em que não terei olhos”
(REIS, 2016, p.127) e insiste em cantar a mercê passageira de instantes que não
duram.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
44
REFERÊNCIAS
BRANDÃO, J. de Souza. Mitologia Grega. Rio de Janeiro: Vozes, 2013. v. 1.
BRÉCHON, R. Estranho estrangeiro: uma biografia de Fernando Pessoa. Rio de
Janeiro: Record, 1998.
BULFINCH, T. O livro de ouro da mitologia: histórias de deuses e heróis. Rio de
Janeiro: Ediouro, 2002.
CHEVALIER, J.; ALAIN, G. Dicionário de símbolos: mitos, sonhos, costumes,
gestos, formas, figuras, cores, números. Rio de Janeiro: José Olympio Ltda, 2017.
CRESPO, A. La vida plural de Fernando Pessoa. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
1988. GOMES, Á. C. Fernando Pessoa: as muitas águas de um rio. São Paulo:
EDUSP, 1987.
LOURENÇO, E. Fernando Pessoa revisitado: leitura estruturante do drama em gente.
Rio de Janeiro: Inova, 1981.
MARCH, J. Mitos clássicos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015.
MARCONDES, D. Iniciação à história da filosofia: dos pré-socráticos a
Wittgenstein. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2006.
MARTINS, F. C. Introdução ao estudo de Fernando Pessoa. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2017.
NICOLA, J. de. Fernando Pessoa: livro do professor. São Paulo: Scipione, 1995.
PADRÃO, M. da G. A metáfora em Fernando Pessoa. Porto: Limiar, 1981.
PESSOA, F. Escritos íntimos, cartas e páginas autobiográficas. Introdução,
organização e notas de António Quadros. Lisboa: Publ. Europa-América, 1986.
REIS, R. Obra completa de Ricardo Reis. Lisboa: Tinta da China, 2016.
. Obra poética de Fernando Pessoa: Fernando Pessoa. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 2016. v. 2.
SEABRA, J. A. Fernando Pessoa ou o poetodrama. São Paulo: Perspectiva, 1974,
SIMÕES, J. G. Vida e obra de Fernando Pessoa. Algés: Difel, 1985.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 61589-61605 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
45
CAPÍTULO 03
ANÁLISE CRÍTICA DA LINGUAGEM NEUTRA COMO
RECONHECIMENTO DE DIREITOS DAS PESSOAS LGBTQIA+
INSTRUMENTO
DE
Fabíola Sucasas Negrão Covas
Faculdades Integradas de Guarulhos. Mestranda em Direitos Humanos na
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
Membra do Ministério Público de São Paulo. Atualmente Membra Auxiliar do
Conselho Nacional do Ministério Público de São Paulo
Endereço: Rua Riachuelo, 115 - São Paulo - CEP 01007-904
E-mail: fabiolasucasas@gmail.com
Lucas Martins Bergamini
Graduação UNESP, Mestrando USP Ministério Público de São Paulo
Endereço: Rua Riachuelo, 115 - São Paulo - CEP 01007-904
E-mail: lucasbergamini@usp.br
RESUMO: O artigo contextualiza as dimensões críticas do uso da linguagem neutra e
o relaciona como possível instrumento antidiscriminatório e de visibilização e
reconhecimento da identidade do sujeito de direito LGBTQIA+.
PALAVRAS-CHAVE: Antidiscriminação; Dignidade; Direitos Humanos; Gênero;
Linguagem Neutra; Linguagem Inclusiva; LGBTQIA+.
ABSTRACT: The article contextualizes the critical dimensions of neutral language and
identify it as a possible anti-discrimination and a visibility/recognition instrument for
LGBT people.
KEYWORDS: Anti-discrimination; Dignity; Gender; Human Rights; Inclusive
Language; Neutral language; LGBT.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
46
1. INTRODUÇÃO
Em 10 de novembro de 2020, o colégio Liceu Franco-Brasileiro, localizado no
Bairro de Laranjeiras, cidade do Rio de Janeiro-RJ, divulgou uma circular tornando
público o suporte institucional à adoção de estratégias gramaticais de neutralização
de gênero em seus espaços formais e informais de aprendizagem1. Explicando que
“a neutralização de gênero gramatical consiste em um conjunto de operações
linguísticas voltadas tanto ao enfrentamento do machismo e do sexismo quanto à
inclusão de pessoas não identificadas com o sistema binário de gênero”, o colégio
manifestou “acolher ativamente demandas legítimas da sociedade, permitindo a
docentes e estudantes que manifestem livremente sua identidade de gênero e
contribuindo para uma representação mais digna e igualitária dos diferentes
gêneros”2.
A circular também explicou que, a “substituição da expressão “queridos alunos”
por “querides alunes”, por exemplo, passa a incluir múltiplas identidades sob a
marcação de gênero em “e”. Alternativas como “queridos alunos e queridas alunas”,
igualmente, mostram-se viáveis ao evitar a representação de todos os gêneros
exclusivamente pelo masculino”3. E deixou claro que a iniciativa “não configura,
absolutamente, a obrigatoriedade de adoção de estratégias de neutralização do
gênero pelo corpo discenteou docente”, mas convidou a comunidade escolar “a refletir
sobre a possibilidade de acolhimento dessa proposta nas práticas diárias, a fim de
promover uma cultura escolar baseada em princípios de tolerância, inclusão e paz”4.
Poucos dias depois, difundiu-se nas redes sociais uma notificação extrajudicial
dirigida ao colégio, assinada por cerca de 85 pais e representantes legais de
estudantes, visando que, no prazo de 24 horas, a escola se abstivesse de “praticar
qualquer ideologia de gênero em salas de aulas ou extra classe”, retomasse “o uso
da norma culta da língua portuguesa pelos professores” e, dentre outras medidas, que
se retratasse e explicasse qual o conteúdo de projeto pedagógico proposto do colégio,
“incidindo como crime de falsidade ideológica e crime contra o consumidor, além de
1
Disponível
em:
https://www.gazetadopovo.com.br/educacao/querides-alunes-colegio-adotalinguagem- neutra/. Acesso em 29 de novembro de 2020.
2
Ibidem.
3
Disponível
em:
https://www.gazetadopovo.com.br/educacao/querides-alunes-colegio-adotalinguagem- neutra/. Acesso em 29 de novembro de 2020.
4
Ibidem.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
47
reparar os danos morais e materiais aos contratantes, pela publicidade e propaganda
enganosa”. Os pais alegaram que a circular continha “viés de ideologia de gênero”,
confrontava “normas gramaticais culta da língua portuguesa”, “diretrizes educacionais
vigentes e aprovadas pelo MEC”, e “decisões do STF”5.
Neste mesmo ano de 2020, no entanto, o Supremo Tribunal Federal – ao
contrário do argumento dos pais e responsáveis legais dos estudantes do colégio e
coerente com decisões anteriores pelas quais a Corte reconheceu que o direito à
igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero e que a
identidade de gênero é manifestação da própria personalidade da pessoa humana6 -,
julgou uma série de ações considerando inconstitucionais leis municipais e estaduais
que proibiam a aplicação do termo gênero ou orientação sexual nas suas redes de
ensino, reputando-as contrárias à proteção do pluralismo de ideias e de concepções
pedagógicas e à promoção da tolerância, tal como previsto na Constituição Federal e
na Lei de Diretrizes e Bases da Educação7.
Neste sentido, fazendo um contraponto com o caso do colégio Liceu FrancoBrasileiro, cuja iniciativa, como se disse, culminou em uma nota de repúdio assinada
por quase uma centena de pais e responsáveis legais de estudantes, pretende-se
neste artigo analisar criticamente a linguagem neutra e sua possível utilização como
instrumento de reconhecimento de direitos da pessoa LGBTQIA+, perguntando-se:
(1)
A linguagem neutra é importante para reconhecimento de direitos das
pessoas LGBTQIA+?
(2)
Quais são os argumentos favoráveis e contrários à linguagem neutra?
Na primeira parte do artigo, abordaremos o recente reconhecimento da
população LGBTQIA+ como pessoas de direitos e, sob a alegoria “armário da
Linguagem”, traremos referências sobre o reconhecimento de identidade, os conceitos
e as diferenciações necessárias entre a linguagem neutra e linguagem inclusiva,
apontando os pontos de proximidade e de afastamento a respeito. Na segunda parte,
5
Conforme circulou em grupos de whatsapp e também nesta página do Facebook:
https://www.facebook.com/desordemeretrocessoatequando/posts/2098022366995828/. Acesso em 29
de novembro de 2020.
6
Cf. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.275/DF.
7
Cf. julgamento de procedência das Ações de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) n.
526/Paraná (Foz do Iguaçú), relatado pela Min. Cármen Lúcia, 467/Minas Gerais (Ipatinga), relatada
pelo Min. Gilmar Mendes, 460/Paraná (Cascavel), relatada pelo Min. Alexandre de Moraes, 457/Goiás
(Novo Gama), relatada pelo Min. Luiz Fux, 461/PR (Paranaguá), 465/TO (Palmas) e 600/PR (Londrina),
estas três últimas relatadas pelo Min. Barroso, e Ações Diretas de Inconstitucionalidade 5537/AL,
5580/AL e 6.038/AL.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
48
problematizaremos a linguagem neutra como instrumento de reconhecimento e/ou
como instrumento antidiscriminatório, bem como os argumentos contrários e
favoráveis.
2. OS ARMÁRIOS DA DIVERSIDADE: SILENCIAMENTO EM RAZÃO DA
AUSÊNCIA DA LINGUAGEM NEUTRA
O sonho que acho mais fascinante é o de uma sociedade andrógina e
sem gênero (embora não sem sexo), na qual a anatomia sexual de uma
pessoa seja irrelevante para o que ela é, para o que ela faz e para a definição
de com quem ela faz amor (RUBIN, 1993, p. 55).
Depois de Montesquieu questionar a institucionalização da tortura em seu
Espírito das Leis (1748), de Beccaria fazê-lo através dos Delitos e das Penas em
1764, e, dentre outros, de Voltaire denunciá-la em 1766, tratada como “a questão” a
partir do caso “Calas”, e, apesar das humilhações públicas, das marcações a ferro ou
mesmo do suplício da roda, até então, figurarem penas legítimas e aplicáveis a uma
série de situações – como pela heresia ou a sodomia, por exemplo -, atribuiu-se ao
movimento que sucedeu às denúncias uma nova ordem de valorização da linguagem
do sentimento.
Antes sagrado apenas dentro de uma ordem religiosamente definida, em que
os corpos individuais podiam ser mutilados ou torturados para o bem comum,
o corpo se tornou sagrado por si próprio numa ordem secular que se baseava
na autonomia e inviolabilidade dos indivíduos (HUNT, 2018, p. 82).
A linguagem, nesse caso, descortinou uma representação de imposição de
crueldade oficializada – e que servia a um “espetáculo público” destinado a “insuflar
o terror nos espectadores e dessa forma servir “como um instrumento de dissuasão”
(HUNT, 2018, p. 94), quebrando o silenciamento dos corpos em dor. Evidenciou algo
que existia, mas que não era alcançado pela linguagem. Nem tudo que existe é
alcançado pela linguagem; e nem tudo que a linguagem alcança existe.
MÄDER, em seus estudos sobre “sexismo gramatical”, pontuou que, embora
a linguagem “não seja uma representação especular da realidade, ela pode nos
oferecer pistas sobre como são construídos os diversos modelos que construímos
para interpretar as realidades nas quais vivemos”. Ou seja, pode nos mostrar o que
pensamos, mas também quem somos (MÄDER, 2019, p. 30).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
49
O armário, conforme SEDGWICK (1993, p. 04) muito bem define em poucas
palavras, é “a estrutura definidora da opressão gay no século XX”. Assumir-se
publicamente a própria orientação sexual homoafetiva, ainda que um ato de libertação
subjetiva, objetivamente considerado um ato de risco pelo compreendido confronto à
imposição heterocis normativa e às respostas dela decorrentes. SEDGWICK, nesse
passo, traz a reflexão capaz de revigorar em muitas pessoas um “sentimento de
potência e magnetismo”, outros armários se imporão em razão de uma ordem de
“presunção heterossexista”, a partir da qual “novos levantamentos, novos cálculos,
novos esquemas e demandas de sigilo ou exposição” serão exigidos (SEDGWICK,
1993, p. 04/08).
De Stonewall até hoje as violências enfrentadas pela população LGBTQIA+
foram inúmeras. Menciona-se, aqui, o fato de a homossexualidade ser considerada
doença até pouco tempo, com a retirada do termo homossexualismo do Catálogo
Internacional de Doenças, pela Organização Mundial de Saúde, somente em 17 de
maio de 19908; ou mesmo a invisibilidade da violência em estatísticas oficiais,
conforme aponta o Atlas da Violência 2019 organizado pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública9.
Neste texto, pretende-se buscar não necessariamente o que está descrito na
linguagem, mas o que ela, enquanto instrumento de expressão e reconhecimento,
esconde dentro dos armários da diversidade, tal qual analogamente também permeou
o clamo ao direito à retificação de registro de prenome perante os tribunais brasileiros.
2.1 Recente
reconhecimento da população lgbtqia+ como pessoas com direitos
específicos
Conforme esclarece BOBBIO (2004, p. 31) além dos processos de conversão
em direito positivo, de generalização e de internacionalização, os direitos das pessoas
passaram por um processo de especificação:
8
No Brasil, o Conselho Federal de Medicina já havia retirado da lista de transtornos em 1985, antes da
OMS.
9
Atlas da violência 2019 / Organizadores: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; Fórum Brasileiro
de Segurança Pública. Brasília: Rio de Janeiro: São Paulo: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada;
Fórum Brasileiro de Segurança Pública. ISBN 978-85-67450-14-8. .Disponível em:
https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/download/19/atlas-da-violencia-2019. Acesso em 03 de
dezembro de 2020.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
50
Essa especificação ocorreu com relação seja ao gênero, seja às várias fases
da vida, seja à diferença entre estado normal e estados excepcionais na
existência humana. Com relação ao gênero, foram cada vez mais
reconhecidas as diferenças específicas entre a mulher e o homem. Com
relação às várias fases da vida, foram se progressivamente diferenciando os
direitos da infância e da velhice, por um lado, e os do homem adulto, por
outro. Com relação aos estados normais e excepcionais, fez-se valer a
exigência de reconhecer direitos especiais aos doentes, aos deficientes, aos
doentes mentais, etc.
Com relação às pessoas LGBTQIA+, o processo de especificação está
acontecendo no presente momento histórico, uma vez que reconhecimento de direitos
a essa população só tem se dado recentemente.
Após a Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH), foram realizadas
diversas declarações de direitos humanos na busca pela concretização de direitos
previstos na DUDH. Em 1966 foi elaborado o Pacto Internacional de Direitos Civis
e Políticos e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. E
foram adotados, também, no Sistema ONU, diversos tratados para direitos
específicos.
Apesar deste percurso de desenvolvimento e especificação dos direitos
humanos, as pessoas LGBTQIA+ foram excluídas destes tratados internacionais. A
situação começou a ser alterada em 1994, após o julgamento do caso Toonen v.
Austrália10, em que a ONU, através de seu Comitê Internacional de Direitos Civis e
Políticos, reconheceu que leis que violam direitos LGBTQIA+ violam também direitos
humanos11.
Após quase uma década sem qualquer especificação, foram editados, também
no âmbito da ONU, os Princípios Yogyakarta, trazendo, finalmente, alguma
sistematização para a temática LGBTQIA+ no âmbito internacional. Tais princípios
surgiram dos esforços de especialistas, conjuntamente com diversas Organizações
não Governamentais, em 2005, como uma tentativa de mapeamento das experiências
de violação de direitos humanos sofridas por pessoas de orientações sexuais e
10
O caso foi levado ao Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas por Nicholas Toonen em 1991,
que questionava a criminalização do sexo entre homossexuais como uma violação ao direito à
privacidade, garantido pelo art. 17 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, culminando em
revogação das leis de sodomia da Austrália, acolhendo-se o argumento de que a orientação sexual era
protegida pelo Pacto.
11
United Nations: General assembly to address sexual orientation and gender identity - Statement
affirms promise of Universal Declaration of Human Rights". Amnesty International. 12 December 2008.
Disponivel em: https://www.amnesty.org/download/Documents/56000/ior410452008en.pdf. Acesso no
dia 04 de dezembro de 2020.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
51
identidades de gênero diversas, com o objetivo geral de averiguar a aplicação dos
tratados de direitos humanos a casos específicos, bem como de exigir a obrigação dos
Estados na implementação efetiva de cada um destes direitos12.
Em 2011, o Conselho de Direitos Humanos adotou a Resolução 17/19 –
primeira resolução das Nações Unidas sobre direitos humanos, orientação sexual e
identidade de gênero – e, posteriormente, em 2012, foi editado o documento “Nascidos
Livres e Iguais: Orientação Sexual e Identidade de Gênero no Regime Internacional
de Direitos Humanos”, que indicou cinco obrigações legais em relação à proteção dos
Direitos Humanos de Pessoas LGBT. São eles: I) proteger indivíduos de violência
homofóbica e transfóbica; II) prevenir tortura e tratamento cruel, desumano e
degradante de pessoas LGBT; III) descriminalizar a homossexualidade; IV) proibir
discriminação baseada em orientação sexual ou identidade de gênero; e V) respeitar
as liberdades de expressão, de associação e reunião pacífica.13
O Brasil tem se orientado pelo documento da ONU, principalmente nos bancos
do Supremo Tribunal Federal, que tem atentado e salvaguardado a garantia do direito
à não discriminação. Nesse passo, a lgbtfobia foi criminalizada (ADO 26 e MI 4733) e
o casamento igualitário reconhecido no âmbito judicial (ADI 4277 e ADPF 132).
2.2 O armário da linguagem: dando-se visibilidade ao reconhecimento de
identidade
A Organização das Nações Unidas optou pelo uso do termo LGBT para se
referir a este grupo populacional específico, tal qual consta do já citado documento
“Nascidos Livres e Iguais: Orientação Sexual e Identidade de Gênero no Regime
Internacional de Direitos Humanos”. No entanto, para este artigo, preferimos a
terminologia LGBTQIA+, de acordo com explicação que segue.
A cartilha “Diversidade Sexual e a Cidadania LGBT”14 editada pelo governo do
Estado de São Paulo contém definições indispensáveis e discute o que vem a ser
12
Disponível em: http://www.clam.org.br/uploads/conteudo/principios_de_yogyakarta.pdf. Acesso no
dia 04 de dezembro de 2020.
13
Disponível em:
https://www.ohchr.org/Documents/Publications/BornFreeAndEqualLowRes_Portuguese.pdf. Acesso
no dia 04 de dezembro de 2020.
14
Cartilha “Diversidade Sexual e a Cidadania LGBT”. Disponível em: https://justica.sp.gov.br/wpcontent/uploads/2017/07/Cartilha-3a-Edi%C3%A7%C3%A3o-Final.pdf. Acesso no dia 04 de dezembro de
2020.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
52
“sexo biológico”, “orientação sexual”, “gênero”, “identidade de gênero”, “papel de
gênero” e “expressão de gênero”.
Ao que tudo indica, a linguagem neutra se relaciona com os temas “gênero” e
“expressão de gênero”. E por isso serão aqui esclarecidos. De acordo com a
supramencionada cartilha, gênero é conceito utilizado para distinguir as dimensões
biológicas das sociais, pois “embora a biologia divida a espécie humana entre machos
e fêmeas, a maneira de ser homem e de ser mulher é expressa pela cultura”15. Ou
seja, “homens e mulheres são produtos da realidade social e não decorrência direta da
anatomia de seus corpos”. A expressão de gênero, a seu turno, significa “como a
pessoa manifesta publicamente a sua identidade de gênero, por meio do seu nome,
da vestimenta, do corte de cabelo, dos comportamentos, da voz e/ou características
corporais e da forma como interage com as demais pessoas.”16 Boa parte das
pessoas adotam expressões de gênero masculinas ou femininas, “mas encontramos
pessoas com a expressão andrógina, ou não binária, ou fluída”17.
Por esse motivo, no presente artigo, optamos por fazer uso da terminologia
LGBTQIA+ no lugar de LGBT usada nos documentos da ONU. A expressão
LGBTQIA+, malgrado longa, engloba, pelo menos, todas as pessoas da sigla que
podem, em algum momento da vida, apresentar uma forma de expressar gênero que
não seja, necessariamente, conformista.
Aliás, importa destacar que o “QIA+” da sigla refere-se a “queer”, “intersexo”,
“assexual” e outros. Essas são as que mais diretamente se relacionam com a proposta
da linguagem neutra, uma vez que não se enquadram, necessariamente, no binarismo
mulher/homem.
São, portanto, dois os motivos principais para a adoção da sigla LGBTQIA+: 1)
é terminologia que abarca a diversidade de gênero, ao contrário da LGBT que se
mostra insuficiente; 2) a linguagem (seja neutra ou com novas terminologias) é capaz
de expressar e indicar o reconhecimento de muitas realidades que são escondidas
pelo silenciamento a respeito do tema.
15
Idem.
Idem.
17
Idem.
16
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
53
2.3 O que é a linguagem neutra? o que é linguagem inclusiva?
...
“Ela” e “ele” vai virar “ILE’. “Dela” e “dele” vai virar “DILE”. “Aquela” e
“aquele” vai virar AQUILE. “Nela” e “nele” vai virar NILE.
“Essa” e “esse” vai virar “ISSE”. “Daquela” e “daquele” vai virar “DAQUILE”.
“Desta” e “deste” vai virar “DISTE”. “Sua” e “seu” vai virar “SUE”. “Nossa” e
“nosso” vai virar “NOSSE”. “Minha” e “meu” vai ficar “MINHE”.
Um exemplo: eles são amigos. Como vai ficar isso se for colocar no neutro?
“ILES SÃO AMIGUES”. Outros exemplos: João deu um beijo nela ou João
deu um beijo nele. Como fica no neutro? João deu um beijo “NILE”18
Rosa Laura, ativista não-binário, gravou um vídeo postado na plataforma
“Youtube” em que narra um texto explicativo sobre o sistema “Ile”, uma proposta de
alteração linguística atribuída como “linguagem neutra”. Outros sistemas também têm
sido disseminados, como “Elu” ou “Elo”, ou a utilização de “@” (arroba) e “x” (xis) na
linguagem escrita, substitutiva dos artigos de gênero. Fala-se, deste modo, em
“linguagem neutra”, “linguagem não-binária”, “linguagem inclusiva”, “linguagem de
gênero ou “neolinguagem”.
Na língua portuguesa há apenas dois gêneros gramaticais, o masculino e o
feminino. O “masculino genérico”, porém, é utilizado: “a) no emprego de nomes
masculinos para denotar seres humanos cujo gênero não é conhecido ou não é
relevante;
b) na concordância de gênero de predicados com sujeitos coordenados; c) na
concordância de predicados com pronomes que não distinguem entre os gêneros
masculino e feminino” (MÄDER, 2015, p. 18).
“Linguagem neutra”, por sua vez, cuida-se de um termo designado para
promover uma linguagem que não marca gênero algum; também conhecido por
“linguagem não-binária”, o termo designa uma linguagem que abarca pessoas cujas
identidades de gênero não são designadas pelos compostos binários homem ou
mulher, partindo-se do pressuposto que a diversidade de identidade compõe múltiplas
performatividades de gênero.
O desenvolvimento desta linguagem, embora sua origem seja atribuída a uma
reivindicação de minorias, não se apoia em uma bandeira individualista, muito pelo
contrário. A diversidade é uma realidade de todas as pessoas, pois se de um lado há
o direito de tornar-se visível e receber tratamento igualitário, por outro há o dever de
18
Trecho
do
texto
narrado pelo
militante
Rosa Laura. Disponível
https://www.youtube.com/watch?v=sXxxhDa0u3E. Acesso em 07 de dezembro de 2020.
em:
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
54
provocar a visibilidade e conceber tratamento igualitário.
Segundo o “Manifesto para uma comunicação radicalmente inclusiva”,
publicado em 2015, de autoria de Andrea Zanella e Pri Bertucci, e que culminou no
lançamento em 2020 do “Guia Todxs Nós de Linguagem Inclusiva” da HBO19, o uso
de “x” e “@” no lugar de “a” ou “o”, apesar de sua larga utilização, é encarado pelo viés
capacitista20 pois não tem marcação fonética, é impronunciável, considerado
reducionista e que exclui a comunicação com pessoas com dislexia e com deficiência,
como o caso das pessoas autistas e as com deficiência auditiva e visual.
Por isso, mas sem pretender esgotar os sistemas criados para a promoção
deste tipo de linguagem, preferimos indicar quatro deles, mais populares, que teriam
a tarefa do papel da neutralidade. A aplicação destes sistemas à “linguagem
neutra”21 é reconhecida pela designação “neolinguagem”, cuja proposta quer incluir
palavras que não são dispostas na língua-padrão.
A linguagem inclusiva, por sua vez, teria um espectro mais amplo, já que,
conforme o manual de Comunicação Inclusiva do Secretariado-Geral do Conselho da
União Europeia, editado em 2018, pode assumir as seguintes vertentes: (1) a da
linguagem sensível à questão de gênero, que visa evitar a aplicação de estereótipos
dos papeis de homens e mulheres; (2) a da linguagem utilizada para fazer referência
a pessoas com deficiência; (3) e de outras que sejam isentas de preconceitos.
Desta forma, embora os termos sejam usados como sinônimos, a “linguagem
inclusiva” é reconhecida como mais ampla, uma vez que abrange outras situações
que não se relacionam, necessariamente, com a questão do gênero (construção social
ou gramatical).
Cf. sítio da “Diversity BBox”, consultoria de diversidade. Disponível em
https://diversitybbox.com/pt/um-guia-para-promover-a-linguagem-inclusiva-em-portugues/. Acesso em
07 de dezembro de 2020.
20
As figuras de linguagem, as abreviações e o uso de emojis são outros exemplos comuns de uso de
linguagem considerada capacitista.
21
Possíveis sistemas de linguagem neutra: (1) o sistema ILU, que propõe a substituição de “Ele/ela”
por “Ilu”, “Dele/dela” por “Dilu”, “Meu/minha” por “Mi/Minhe”, “Seu/sua” por “su/sue”, “Aquele/aquela”
por “aquelu” e “o/a”, por “le”; (2) o sistema ELU, que propõe a substituição de “Ele/ela” por “Elu”,
“Dele/dela” por “Delu”, “Meu/minha” por “Mi/Minhe”, “Seu/sua” por “su/sue”, “Aquele/aquela” por
“aquelu” e “o/a”, por “le”; (3) o sistema EL, que propõe a substituição de “Ele/ela” por “El”, “Dele/dela”
por “Del”, “Meu/minha” por “Mi/Minhe”, “Seu/sua” por “su/sue”, “Aquele/aquela” por “aquel” e “o/a”, por
“le”; (4) e o sistema “ILE”, que propõe a substituição de “Ele/ela” por “Ile”, “Dele/dela” por “Dile”,
“Meu/minha” por “Mi/Minhe”, “Seu/sua” por “su/sue”, “Aquele/aquela” por “aquile” e “o/a”, por “e”.
19
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
55
3. A CHAVE DOS DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS LGBTQIA+: A
UTILIZAÇÃO DA LINGUAGEM PARA RECONHECIMENTO DA IDENTIDADE
“Não há identidade de gênero por trás das expressões do gênero; essa
identidade é performativamente constituída, pelas próprias “expressões” tidas
como seus resultados” (BUTLER, 2003, p. 56).
A linguagem usada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão custou
a vida de Olympe de Gouges na França do século XVIII. Ao questionar o uso da
palavra “homens” na Declaração como sinônimo de humanidade, Olympe quis mostrar
que o texto não contemplava as mulheres e que não seriam abarcadas no conceito de
igualdade. Por isso publicou, em 1791, a Declaração dos Direitos da Mulher,
documento que invertia a linguagem da declaração oficial de 1789. Olympe foi
condenada à guilhotina “como uma contrarrevolucionaria "impudente" e um ser
inatural (um "homem-mulher")” (HUNT, 2017, p. 172).
E extremamente pertinente aqui a reflexão de CARBONI e MAESTRI às
construções e aos processos que recaem sobre as palavras “homem” e “mulher”, e a
sua relação com os símbolos que permeiam a linguagem, atribuindo-se estereótipos
e marcadores aos referidos termos:
Nos dicionários, a palavra “homem”, no sentido de “ser humano do sexo
masculino”, costuma ser conotado com traços humanos fortemente valorizados
– coragem; determinação; vigor sexual; força física e moral, etc. O termo
raramente é associado à união com a mulher. Para tal, a língua dispõe de um
outro signo: “marido”.
Ao contrário, o termo “mulher” é fortemente polissêmico, servindo tanto para
referir-se ao ser biológico – no qual são centrais as características ligadas à
reprodução da espécie –, quanto à “companheira conjugal” ou “amante” do
homem, assumindo parte de sua significação no contexto de
relação/dependência ao seu termo oposto – o homem.
As conotações habituais e os campos semânticos aos quais o vocábulo
“mulher” é associado relacionam-se sobretudo com sexo, beleza física e
traços humanos pouco valorizados – fraqueza, leviandade, etc.
[HOUAISS:1975]. Nesse sentido, a língua encobre o fato de que a mulher foi
submetida pelo homem devido à capacidade produtiva e reprodutiva, e não a
uma pretensa inferioridade natural. [MEILLASSOUX: 1976, 47-60.]”
(CARBONI;
MAESTRI, 2003, p. 05).
Isso quer dizer que, assim como foi possível ressignificar o sentido da palavra
mulher, é também possível ressignificar ou criar palavras para reconhecer a existência
de pessoas que não se encaixam em um padrão binário de gênero. Neste sentido,
pode-se questionar se a linguagem seria a chave, dentro da epistemologia do armário.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
56
3.1 Linguagem neutra como instrumento de reconhecimento e/ou como instrumento
antidiscriminatório
Nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 5668/DF, o debate
proposto pelo advogado Paulo Iotti para o Supremo Tribunal Federal de modo
subsidiário, como efeito aditivo e, em caráter de fungibilidade das ações recursais, na
conversão da ação em Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, coloca em
xeque a omissão legislativa do Plano Nacional de Educação quanto ao enfrentamento
das discriminações por gênero, identidade de gênero e orientação sexual.
Como bem lembra o notável advogado na petição inicial da referida ação, a
“homotransfobia” é um neologismo que visa englobar em uma única palavra a
“homofobia” e a “transfobia”, para assim designar a discriminação contra a população
LGBT como um todo”. A linguagem define por si só.
Na toada do pensamento que o termo “homotransfobia” é um neologismo
utilizado – e não proibido - que serve à visibilidade, à nomeação e à significação ampla
do sentido da própria palavra “homofobia”, amparando inclusive o reconhecimento
de uma conduta que se adequa ao crime de racismo, isto quer dizer que,
coerentemente, a linguagem e os neologismos constituem, poderosamente,
instrumentos políticos antidiscriminatórios e que impulsionam a reafirmação da
dignidade de pessoas que não se enquadram no binarismo.
Alguns exemplos que retratam o uso da linguagem como instrumento
antidiscriminatório são o exercício que substitui a palavra “pessoal” no lugar de
“meninos” para designar “meninos e meninas”; e o uso do neologismo “menines”,
substantivo neutro que inclui pessoas do gênero masculino, feminino e pessoas que
não se identificam com nenhum destes gêneros.
São exemplos que retratam, simbolicamente, a intenção antidiscriminatória. O
que se pretende é deixar claro que não se quer discriminar mulheres e tampouco
minorias (LGBTQIA+). Ainda que a utilização das construções gramaticais novas ou
o uso de neologismos possam causar estranhamento, uma vez que é uma prática
capaz de afetar o uso da língua em seu cotidiano, não se afasta sua factibilidade e
legitimidade, sem a pretensão, por outro lado, que seja representativa de uma fórmula
mágica que provoque, repentinamente, a igualdade de gênero.
Do ponto de vista estritamente jurídico, a linguagem neutra/inclusiva é capaz
de cumprir o papel de não discriminar pessoas, bem como o de reconhecimento de
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
57
suas diversas identidades de gênero. Isto quer dizer que é possível juridicamente
defender o argumento do uso da linguagem neutra sem que ele fira a norma culta da
línguaportuguesa, inclusive a título institucional, de modo que não é defensável, senão
utilizá- la institucionalmente, proibir ou discriminar a sua utilização.
3.2 Argumentos favoráveis e contrários
Do ponto de vista jurídico, como já se viu acima, não há qualquer impedimento
à utilização de uma linguagem neutra, uma vez que seu papel se destina à visibilidade
de pessoas, ao reconhecimento de direitos e como forma de evitar a discriminação
em relação a determinados grupos.
Oportuno trazer ALMEIDA, professor da Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo, que enfoca a noção de “pessoa sagrada”, no âmbito da história dos
Direitos Humanos, a um interdito de não violência, fazendo referência ao professor e
sociólogo francês Jean-Claude Filloux:
“Considerar a pessoa como sagrada significa dizer que a pessoa deve
estar envolta em uma “aura de não violência” e transformada “na única
convicção moral que possa unir os homens de uma sociedade moderna”.
De modo que a sacralidade possibilita a interdição de todo tipo de violência
contra a pessoa e o respeito que é devido à pessoa no âmbito da
sociedade. (ALMEIDA, 2018, p. 36)
Atribui-se o sentido de sacralidade ao reconhecimento do valor da pessoa por
meio de uma narrativa. ALMEIDA explica no que consiste uma narrativa:
“Narrativa é toda e qualquer representação de eventos e consiste em
histórias e discurso narrativo; histórias (ou estórias) como sequência de
eventos (ação) e discurso narrativo como a representação de tais eventos.
Narrativas são uma forma de compreender a “razão de ser” dos
acontecimentos” (ALMEIDA, 2018, p. 17)
Ao caso Dreyfus, também segundo traz ALMEIDA, confere-se a origem da
expressão “sacralidade da pessoa”, atribuída por Durkheim, caso que escancarou a
posição do Estado enquanto ente violador dos direitos do homem e do cidadão.
Ensejou, daí, uma mobilização que culminou no reconhecimento da pessoa enquanto
sujeito, enquanto ser que deve e merece proteção, dotado de direitos universais.
Vale recordar a pergunta de RICOUER (2008, pág. 21): Quem é o sujeito de
direito? Quem é o sujeito digno de estima e respeito? Quem é aquele que fala? De
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
58
quem é a história aqui narrada? Não por outro motivo, registramos mais uma vez
RICOUER:
“O exame da noção de identidade narrativa dá ensejo a distinguir a
identidade do si da identidade das coisas; esta última se reduz em última
instância à estabilidade e até à imutabilidade de uma estrutura, ilustrada pela
fórmula genética de um organismo vivo; a identidade narrativa, em
contrapartida, admite a mudança; essa mutabilidade é a mutabilidade
das personagens das histórias que contamos; essas personagens são
urdidas simultaneamente à própria história. Essa noção de identidade
narrativa é da maior importância para a pesquisa da identidade dos povos e
das nações; pois ela contém o mesmo caráter dramático e narrativo que
frequentemente podemos confundir com a identidade de uma substância ou
de uma estrutura. No nível da história dos povos, assim como no dos
indivíduos, a contingência das peripécias contribui para o significado global
da história contada e para o significado de seus protagonistas. Esse
reconhecimento implica desfazer-se de um preconceito referente à
identidade reivindicada pelos povos sob a influência da arrogância, do
medo ou do ódio” – grifo nosso - (RICOEUR, 2008, p. 23/24).
Portanto, não se afasta deste cenário de pensamento, a ideia de que a
linguagem neutra, como expressão da realidade vivenciada pelas pessoas não
binárias, encontra guarida na noção de dignidade da pessoa humana, noção esta
decorrente do sentido de sacralidade como já exposto, e, por sua vez, na sua
proteção e resguardo por meio de posturas e proibições antidiscriminatórias tal
como garante a Constituição Federal de 1988.
É o que ampara o argumento de que possível utilização da neolinguagem,
senão uma realidade de mudança na estrutura da língua portuguesa – o que para
muitos seria motivo de espanto e repúdio -, não pode ser proibida.
No entanto, em uma pesquisa inicial acerca do tema foi possível encontrar
três principais argumentos contrários à utilização de uma linguagem neutra.
O primeiro deles, o fato de que o seu uso está relacionado com a “não
marcação do gênero masculino”. Conforme já mencionado na primeira parte do
artigo, a língua portuguesa adotou a fórmula do masculino gramatical para uso
genérico, enquanto o feminino seria destinado especificamente.
MÄDER (2015, p. 128), quando traz suas reflexões sobre os tempos em que o
masculino era considerado gênero “nobre”, relacionando explicitamente o machismo
patente no plano linguístico – fato que marcou a reivindicação de Olympe de Gouges
no caso da Declaração dos Direitos do Homem -, atribui aos tempos da modernidade
o argumento da justificativa do gênero “não-marcado” para determinar o uso do
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
59
gênero gramatical masculino na língua portuguesa.
A partir de referências sobre o conceito de marca e “o uso da questão do
masculino genérico como um recurso frequentemente usado para “explicar” o uso de
uma categoria por outra”, MÄDER traz as diferentes sustentações que ora apontam
para a conclusão de que o uso do masculino genérico é considerado ora uma prática
linguística sexista22, ora uma questão puramente estrutural23.
Ou seja, apesar de o gênero masculino ser usado como neutro na língua
portuguesa, esse uso tem sido progressivamente questionado, sob o argumento de
haver uma espécie de sexismo mascarado, pautado em uma raiz histórico-cultural e
estruturalmente machista.
O segundo argumento contrário é o da politização do uso da linguagem. De
acordo com o esclarecido pela Professora Daniela Palma em entrevista, a proposta
da linguagem neutra pode até se conformar em uma neutralidade do ponto de vista
gramatical, mas não do ponto de vista político.
Tanto que, pouco tempo depois de o Colégio Franco-Brasileiro no Rio de
Janeiro ter adotado a proposta de utilização de linguagem neutra, notícias correram de
que projeto de lei foi apresentado à Câmara dos Deputados com o objetivo de proibir
sua utilização.
Trata-se do Projeto de Lei n.º 5248/2020 que “estabelece o direito dos
estudantes de todo o Brasil ao aprendizado da língua portuguesa de acordo com a
norma culta e orientações legais de ensino, e dá outras providências.”24 E em seu art.
2º, existe previsão expressa da proibição de “linguagem neutra” e “dialeto não
Segundo o autor, uma das referências que sustentam a gramática sexista, está na ideia de que “o
gênero gramatical masculino teria um status cognitivo mais importante do que o gênero gramatical
feminino, o que se caracterizaria como uma espécie de efeito prototípico. Esse status mais básico do
masculino seria decorrente do uso desta categoria para denotar, metonimicamente, a categoria
humano, isto é, o uso de uma categoria (talvez de uma categoria de nível básico ‒ masculino) para uma
categoria superordenada ‒ humano (na qual a distinção masculino/feminino é posta em segundo plano
e não é relevante)...” (MÄDER, 2015, p. 128).
23
Conforme MÄDER, esta linha de argumentação se traduz em algumas destas justificativas: de que
“fenômeno denominado “masculino genérico” não se manifesta apenas na linguagem, mas na cognição
em geral; o status do masculino como gênero prototípico está correlacionado com a sua frequência de
uso; esse status de gênero prototípico é consequência de um caráter androcêntrico da língua, que se
manifesta também em outros contextos; e as relações de poder entre homens e mulheres (e, portanto,
entre a fala masculina e a feminina), além do poder das instâncias reguladoras da língua, fazem com
que o masculino genérico se institua como o “padrão” de linguagem para homens e mulheres” (págs.
145/146, 2015). A nosso ver, é compreensão que não destoa das representações de gênero fora da
linguagem, mas que através dela também se manifestam simbolicamente.
24
Disponível em:
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2265570. Acesso no dia
03 de dezembro de 2020.
22
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
60
binário”.25
E vale também trazer à baila a justificativa apresentada no projeto, que, sob o
argumento de que a linguagem neutra seria calcada em uma postura de cunho
ideológico, ela não teria o condão de legitimar a sua utilização26:
Mas o uso deste argumento provoca a seguinte indagação: se a utilização da
linguagem neutra é uma questão ideológica, a sua não utilização também não o seria?
Não à toa, a expressão “ideologia de gênero” tem sido alvo de críticas nos
meios acadêmicos e nos bancos judiciais. Cuida-se, inclusive, de um dos argumentos
constantes das petições iniciais das Ações de Descumprimento de Preceito
Fundamental – ADPFs propostas pelo Ministério Público Federal que pediam a
declaração de inconstitucionalidade de leis municipais proibitivas da abordagem de
gênero nas escolas, como já citado neste artigo.
A expressão tem sido atribuída como imprópria e incompatível com os
“estudos” ou “teoria de gênero”, constituindo-se tal argumento, na verdade, de uma
estratégia ideológica na medida em que visa disfarçar, afastar e tolher a temática de
gênero no campo dos direitos e do processo educativo27.
O Núcleo de Estudos de Gênero da Universidade Federal do Paraná, em
manifestação oficial, considerou que a palavra “ideologia” não tem definição
consensual e que carrega uma forte conotação negativa e falaciosa. Sustentou ainda
que as “discussões de gênero” dizem respeito ao estudo dos sistemas de dominação
e de exclusão, como são construídos e como se tornam permanentes a partir da
oposição e da desigualdade entre homens e mulheres, dos modelos de
masculinidade, feminilidade, sexualidade e da exclusão de toda a população
Art. 2º Fica vedado o uso da “linguagem neutra”, do “dialeto não binário” ou de qualquer outra que
descaracterize o uso da norma culta na grade curricular e no material didático de instituições de ensino
públicas ou privadas, em documentos oficiais dos entes federados, em editais de concursos públicos,
assim como em ações culturais, esportivas, sociais ou publicitárias que percebam verba pública de
qualquer natureza.
Disponível
em:
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1943896&filename=Tramit
aca o-PL+5248/2020. Acesso no dia 03 de dezembro de 2020.
26
Conforme expressamente mencionado no projeto de lei: Diante desse contexto, verifica-se que a
pretensão de uma linguagem não binária é, em verdade, retrato de uma posição sociopolítica, que,
nem de longe, representa uma demanda social, mas de minúsculos grupos militantes, que têm por
objetivo avançar suas agendas ideológicas, utilizando a comunidade escolar como massa de manobra.
Disponível
em:
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1943896&filename=Tramit
aca o-PL+5248/2020. Acesso no dia 03 de dezembro de 2020.
27
Cf.
inicial
da
ADPF
461/PR,
disponível
em:
http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.j
sf?seqobjetoincidente=5204906. Acesso em 07 de dezembro de 2020.
25
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
61
LGBTQIA+ (transgênero, queer, ou pessoas de gênero fluido e intersexuais)28.
De todo modo, na própria justificativa do Projeto de Lei n.º 5248/2020, existe
indicação de um artigo (de opinião) publicado no jornal espanhol “El Pais”, intitulado
“Alumnos,
alumnas
y
‘alumnes’29,
que
apresenta
o
principal
argumento
sociolinguístico contrário à utilização de um gênero neutro na linguagem, qual seja, o
de que, normalmente, não obtêm sucesso as imposições de alterações na linguagem.
Outro argumento desfavorável30 é o de que a utilização de uma linguagem inclusiva
não significa necessariamente o final da desigualdade entre os gêneros.
Neste sentido, vale a transcrição da passagem a seguir, tratando-se de reflexão
de Beatriz Sarlo, ex-professora de literatura argentina na Universidade de Buenos
Aires, que critica o uso de justificativas dos fins pelos meios (em tradução livre):
Surpreende a confiança com que hoje querem implantar o uso conjunto de
masculino e feminino como se essa transformação linguística garantiria uma
igualdade de gênero. Quando esta igualdade se expressar inteiramente, já
estará disposta nos dicionários. Mas o que mais surpreende é a curiosa
solução de utilizar a letra e final para indicar conjuntamente o masculino e o
feminino. Estudantes e a elite social e cultural, que frequentam os
prestigiosos colégios universitários de Buenos Aires hoje dizem: o les alunes,
les amigues, como se o e final outorgasse uma representação do masculino
e do feminino, a contrapelo do espanhol. A história das línguas ensina (a
quem a conheça um pouco) que as mudanças na fala e na escrita não se
impõem pelas academias ou pelos movimentos sociais, pouco importando o
quão justas sejam suas reivindicações31.
Ou seja, muito embora do ponto de vista linguístico seja viável a criação de um
pronome neutro, como existe em outros idiomas (a exemplo do alemão), os
argumentos contrários sobre a criação de neologismos (e sua imposição) não se
mostram uma medida prudente, já que 1) dificilmente teria aceitação; 2) não implicaria
necessariamente o fim da desigualdade de gênero.
28
Cf. manifesto publicado em seu sítio. Disponível em: https://www.ufpr.br/portalufpr/noticias/nucleode-estudos-de-genero-da-ufpr-produz-manifesto-sobre-exclusoes-das-discussoes-de-genero-ediversidade- sexual-nos-planos-de-educacao/. Acesso em 07 de dezembro de 2020.
29
Disponível em: https://elpais.com/cultura/2018/10/09/babelia/1539083839_285133.html. Acesso no
dia 04 de dezembro de 2020.
30
Pelo menos no que se refere à igualdade entre homens e mulheres.
31
No original: “Sorprende la confianza con que hoy se quiere implantar el uso conjunto de masculino y
femenino, como si esa transformación lingüística garantizara una igualdad de género. Cuando esa
igualdad se exprese enteramente, ya estará afincada en los diccionarios. Pero lo que más sorprende es
la curiosa solución de utilizar la letra e final para indicar conjuntamente al masculino y el femenino.
Estudiantes de la élite social y cultural, que asisten a los dos prestigiosos colegios universitarios de
Buenos Aires, hoy dicen: les alumnes, les amigues, como si la e final otorgara la representación del
masculino y el femenino,a contrapelo del español. La historia de las lenguas enseña (a quien la conozca
un poco) que los cambios en el habla y en la escritura no se imponen desde las academias ni desde la
dirección de un movimiento social, no importa cuán justas sean sus reivindicaciones.”
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
62
Todavia, diferentemente do que quer dizer o autor do projeto de lei, não há
qualquer argumento válido de que o uso da linguagem neutra deva ser proibido. Aliás,
não seria possível proibi-lo, pois a linguagem neutra é capaz de ser utilizada por meio
de substantivos epicenos. Seria possível proibir, por sua vez, o uso de palavras como
“chefe”, “cliente”, “colega”, “dentista”, “gerente”, “jovem”, “policial”?
O que é possível proibir, a nosso ver, seria a utilização de neologismos para a
representação desta linguagem neutra. E isso apenas nos documentos oficiais, pois
não nos esqueçamos de que a língua falada é a língua viva.
Nesse passo, imperioso registrar a reflexão da Profa. Ana Cecília Bizon32,
docente Departamento de Linguística Aplicada do Instituto de Estudos da Linguagem
da Universidade de Campinas, para quem não proibir o uso da linguagem inclusiva
seria uma solução viável, pois “ao marcar que não é proibido, você vai abrir caminhos
para que alguns utilizem”, de modo a circunscrever o lugar, criar uma tradição de uso
e viabilizar a própria discussão que permeia a questão.
A Profa. Daniela Paula, também docente da Unicamp, ainda que veja com
dificuldade a aceitação de propostas de mudanças ortográficas em uma das frentes
de implementação da linguagem inclusiva, entende que há outras formas textuais e
outras soluções de manuseio da linguagem que podem cumprir papel semelhante,
demarcando a sua posição política. De todo modo, trazendo referências dos
instrumentos de inclusão das pessoas com deficiência visual, também não concorda
com a proibição; reputa que o seu uso é uma forma de dar visibilidade à questão e
que tratar o tema como objeto de orientação geral seria uma forma de abrir caminho
para o respeito à diversidade
32
Tivemos a preocupação de abarcar pontos do tema no campo da linguística e realizamos uma
entrevista com as docentes do Departamento de Linguística Aplicada do Instituto de Estudos da
Linguagem da Universidade de Campinas - UNICAMP, as professoras Ana Cecília Cossi Bizon e
Daniela Palma. Ana Cecília Cossi Bizon é docente do Departamento de Linguística Aplicada do Instituto
de Estudos da Linguagem da Universidade de Campinas, membra da Cátedra Sérgio Vieira de Mello e
idealizadora do Banco de Tradutores e Intérpretes da Universidade de Campinas. Daniela Palma é
docente do Departamento de Linguística Aplicada do Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade
de Campinas, na linha de Linguagens, Transculturalidades e Tradução. Suas pesquisas referem-se às
áreas de estudos culturais e intermidialidades: o primeiro campo busca uma abordagem política nos
estudos da linguagem, através da interface das teorias pós-coloniais e da memória com os estudos sobre
discursos institucionais, mídia, artes, educação e literatura; o segundo, explora as várias formas de
interconexão entre texto e imagem para o estudo das culturas midiáticas contemporâneas. Ela tem
publicado textos sobre temas como narrativas em educação em direitos humanos, gêneros
(auto)biográficos multimodais, memória comunicativa e meios de comunicação, discursos institucionais
sobre gênero, escrita feminina, entre outros. É líder do grupo de pesquisa Nós-Outros: linguagem,
memória e direitos humanos.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
63
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo do presente artigo não era o de exaurir o tema, mas trazer alguns
esclarecimentos e pontuações acerca do assunto. Respondemos, assim, os seguintes
questionamentos principais: a) a linguagem neutra é importante para reconhecimento
de direitos das pessoas LGBTQIA+?; b) quais são os argumentos favoráveis e
contrários à linguagem neutra?
Apuramos que a utilização da linguagem neutra é importante para o
reconhecimento de direitos das pessoas LGBTQIA+, decorrente de sua dignidade
intrínseca, integrando o compêndio de demandas que se inserem no respectivo
processo de especificação de direitos, fenômeno recente na história dos direitos
humanos. No entanto, é importante mencionar que esta linguagem neutra não se
relaciona necessariamente com toda a comunidade, mas principalmente com as
pessoas que expressam seu gênero de modo “não conformista” com o papel de
gênero que lhe foi afirmado no nascimento.
O tema, porém, entrou na pauta brasileira em meio a uma série de o problemas
socioeconômicos e políticos, abalando o seu real propósito, uma vez relacionado com
o sentido deturpado que contém a expressão “ideologia de gênero”33, e que tem
ensejado a propositura de projetos de lei visando a sua proibição, como o Projeto de
Lei n.º 5248/2020.
Observamos também que o uso da linguagem neutra não é só a “consideração”
de uma conquista para a população LGBTQIA+. É, também, um importante
instrumento para provocar reflexão sobre o estado de ordem histórico-social de
discriminação de gênero contra as mulheres, fato lhe confere uma relevância ainda
mais latente já que afeta diretamente um grande contingente de pessoas e não apenas
um grupo minoritário (pessoas não binárias) dentro de uma minoria (LGBTQIA+).
De todo modo, apesar de não existir proibição nenhuma do ponto de vista
jurídico para a criação – e uso - de uma linguagem neutra, inclusive com neologismos,
o assunto não é nada pacífico do ponto de vista linguístico.
O argumento clássico da “não marcação do gênero masculino” que permeia a
língua portuguesa tem servido de justificativa para afastar o uso da linguagem neutra,
33
E aqui utiliza-se o termo entre aspas justamente porque do ponto de vista semântico não tem
nenhum significado preciso.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
64
pois cumpriria seu papel. Entretanto, não se desconhecem as críticas sobre ele, por
mascarar o sexismo estrutural existente na nossa sociedade e na nossa fala.
Outro argumento contrário ao uso ou à incorporação da linguagem neutra em
nossa língua, o da politização, se mostra bastante contundente. Todos os exemplos
de utilização de linguagem neutra trazidos no trabalho foram alvo de ataques intensos.
O vídeo do ativista Rosa Laura, recebeu apenas 772 (setecentos e setenta e duas)
curtidas e 10 (dez) mil “descurtidas”; e a notícia do Colégio Franco-Brasileiro foi
recebida com uma notificação judicial. Não se nega o fato de que são situações que
podem contribuir para afastar ainda mais o motivo de fundo do debate afeto ao
reconhecimento de direitos.
Por fim, não se desconhece também o argumento trazido por Beatriz Sarlo em
sentido contrário ao uso da linguagem neutra, na medida em que questiona a sua
efetividade, uma vez que a utilização não teria o condão e a força de provocar o fim
da discriminação contra pessoas não-binárias ou contra mulheres.
Uma conclusão que se pode chegar é a de que o reconhecimento de direitos
específicos para pessoas LGBTQIA+, apesar dos inúmeros avanços obtidos
recentemente, ainda é objeto de muita resistência e de ataques odiosos, resultado
que, embora não conforte os ideais da luta, refletem o pensamento de uma sociedade
ainda marcada por preconceito e discriminação.
Diante do exposto, recorda-se a origem do sentido da dignidade da pessoa
humana dentro do âmbito da sacralidade da pessoa e da importância histórica das
narrativas na construção do reconhecimento dos direitos universais e especiais. São
conceitos que se entrelaçam e que reforçam a ideia enquanto exercício do trajeto
que nasce no “siderar” mas que chega ao “considerar”, ou seja, resultado do exigir
consideração como tarefa política e jurídica para o exercício do reclamo do direito das
vidas (MACÉ, 2018)34.
34
MACÉ, Marielle. Siderar, Considerar Migrantes, Formas de Vida. Bazar do Tempo (edição
brasileira), 2018.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
65
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Guilherme Assis de. A proteção da pessoa humana no Direito
Internacional: conflitos armados, refugiados e discriminação racial. / Guilherme
Assis de Almeida. – São Paulo: Editora CLA Cultural, 2018.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução Carlos Nelson Coutinho;
apresentação de Celso Lafer. — Nova ed. — Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. — 7ª
reimpressão.
BUTLER, Judith P. Problemas de gênero: feminismo e subversão da
identidade/14ª ed. Judith Butler; tradução, Renato Aguiar. – 14ª; ed – Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2017.
CARBONI, Florence; MAESTRI, Mário. A linguagem escravizada. Língua, História
e Poder. REA, ano 2, n. 22, março 2003. ISSN 1519.6186. Disponível em:
https://www.academia.edu/11380352/A_Linguagem_Escravizada_L%C3%ADngua_
Hi st%C3%B3ria_e_Poder. Acesso em 24 de outubro de 2020.
CARNEIRO, Sueli Aparecida. A construção do outro como não-ser como
fundamento do ser. FEUSP, 2005. Tese de doutorado. Disponível em:
https://negrasoulblog.files.wordpress.com/2016/04/a-construc3a7c3a3o-do-outrocomo- nc3a3o-ser-como-fundamento-do-ser-sueli-carneiro-tese1.pdf. Acesso em 01
de maio de 2020.
Diversity BBox – consultoria de diversidade. Pronomes neutros ganham espaço
nas ruas, redes sociais e até em empresas. Disponível em:
https://diversitybbox.com/pt/pronomes-neutros-ganham-espaco-nas-ruas-redessociais- e-ate-em-empresas/. Acesso em 24 de outubro de 2020.
FERRAZ, Carolina Valença; e LEITE, Glauber Salomão (coord.). Direito à
Diversidade. – São Paulo – Atlas, 2015.
FRANCO, Paki Venegas; e CERVERA, Julia Pérez. Manual para o uso não sexista
da linguagem. O que bem se diz... bem se entende. Versão em português:
Beatriz Cannabrava. Edição em português foi realizada com o apoio da REPEM
– Rede de Educação Popular entre Mulheres da América Latina para ser
distribuído pela Internet para o Brasil e países africanos de língua portuguesa.
2006. Disponível em:
http://www.observatoriodegenero.gov.br/menu/publicacoes/outros-artigos-epublicacoes/manual-para-o-uso-nao-sexista-da-linguagem. Acesso em 24 de
outubro de 2020.
GORISCH, Patricia. O Reconhecimento dos Direitos Humanos LGBT: de
Stonewall à ONU. Curitiba, Editora e Livraria Appris, 2014,
GUIA de linguagem inclusiva. Todxs nós. HBO. 2020. Disponível em:
https://pji.portaldosjornalistas.com.br/wpcontent/uploads/2020/05/GuiaTodxsNos.pdf. Acesso em 24 de outubro de 2020.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
66
HUNT, Lynn. A invenção dos Direitos Humanos: Uma História. São Paulo:
Companhia das Letras, 2009.
MACÉ, Marielle. Siderar, Considerar Migrantes, Formas de Vida. Bazar do Tempo
(edição brasileira), 2018.
MÄDER, Guilherme Ribeiro Golaço. Masculino Genérico e Sexismo Gramatical.
Dissertação submetida ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da
Universidade Federal de Santa Catarina. 2015.
RICOEUR, Paul. O justo 1: a justiça como regra moral e como instituição / Paul
Ricoeur; tradução Ivone C. Benedetti. – São Paulo: WMF Martins Fontes, 2008.
RUBIN, Gayle. O tráfico de mulheres: Notas sobre a “Economia Política” do
Sexo. Recife: SOS Corpo;1993.
SEDGWICK, Eve Kosofsky. A epistemologia do armário. Texto traduzido e
publicado pelo cadernos pagu [Tradução: Plínio Dentzien; Revisão: Richard Miskolci
e Júlio Assis Simões]. Referência do texto original: Epistemology of the Closet. In:
ABELOVE, Henry et alli. The lesbian and gay studies reader. New York/London,
Routledge, 1993:45-61.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p. 54892-54913 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
67
CAPÍTULO 04
A ALTERIDADE NA RECONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO ADOLESCENTE EM
CONFLITO COM A LEI
Valdeir Cesário dos Santos
Mestre em Direitos Humanos
Instituição: Rede Municipal de Ensino de Goiânia
E-mail: valdeir.geo@hotmail.com.
Cerise de Castro Campos
Doutor em Ciências da Saúde
Instituição: Universidade de Brasília
Endereço: UnB - Brasília, DF, 70910-900
E-mail: dra.cerise@gmail.com
Maurides Macêdo
Pós-Doutora em Direitos Humanos
Instituição: Universidade Federal de Goiás
Endereço: Av. Esperança, s/n - Chácaras de Recreio Samambaia
E-mail: maurinha1312@hotmail.com
RESUMO: Esse artigo é resultado das análises e discussões da disciplina Alteridade,
Ética e Direitos Humanos e também do amadurecimento e reflexões do projeto de
pesquisa “Quando estar solto não significa liberdade: perfil e direito à educação dos
adolescentes em conflito com a lei em Anápolis-GO”, que foi realizado no Mestrado
Interdisciplinar em Direitos Humanos da Universidade Federal de Goiás. Tem como
objetivo discutir a alteridade como fator determinante de reconstituição da identidade
do adolescente em conflito com a lei. Problematizou-se, em que medida a alteridade
para com o adolescente em conflito com a lei é um potencializador da socioeducação?
Metodologicamente tem como base a pesquisa bibliográfica. Conclui-se que o autor
do ato infracional, mesmo estando entre adolescentes iguais a ele, perpassa por todo
um processo cujo cuidador e poder referencial que ele tem é o adulto. Portanto,
reconhecer o universo próprio do adolescente, com seus referenciais, parâmetros,
linguagem e valores é um vetor da ressocialização.
PALAVRAS-CHAVE: Alteridade; Socioeducação; Adolescente em conflito com a Lei.
68
1. INTRODUÇÃO
Esse artigo é resultado das análises e discussões da disciplina Alteridade, Ética
e Direitos Humanos e também do amadurecimento e reflexões do projeto de pesquisa
“Quando estar solto não significa liberdade: perfil e direito à educação dos
adolescentes em conflito com a lei em Anápolis-GO”, que foi realizado no Mestrado
Interdisciplinar em Direitos Humanos da Universidade Federal de Goiás. Tem como
objetivo discutir a alteridade como fator determinante de reconstituição da identidade
do adolescente em conflito com a lei. Problematizou-se, em que medida a alteridade
para com o adolescente em conflito com a lei é um potencializador da socioeducação? Metodologicamente tem como base a pesquisa bibliográfica.
Ao se falar em alteridade, é preciso ter claro que ela se faz sempre em relação
ao outro. Portanto, é importante evidenciar que a individualidade egoísta é
incompatível com qualquer demonstração de alteridade. Há de se falar numa ética da
alteridade quando, no exercício da convivência diária, nos deparamos com a
necessidade de estabelecer virtudes capazes de nos relacionar com o outro que, por
motivos diversos, sofre.
O objetivo desse estudo é discutir o reconhecimento do outro pelo outro, ou
seja, a alteridade humana como um fator determinante para a reconstituição da
identidade do adolescente em conflito com a lei, cujos direitos foram violados em
algum momento do seu desenvolvimento, oferecendo assim, subsídios acerca da
socioeducação do adolescente infrator, otimizando ações para sua reinserção na
sociedade.
Historicamente a criança e o adolescente foram, no tempo e no espaço,
excluídos de direitos normalmente adquiridos por outras parcelas da população.
Mesmo o seu direito de ser reconhecido enquanto pessoa foi, por longo tempo,
negado. (ARIÉS, 1981; NASCIMENTO et al, 2008) E mesmo quando reconhecidos,
não foi de forma linear em todos os países (GÉLIS, 1991).
No Brasil, com o advento de novas leis, a exemplo dos códigos de menores de
1927 e 1979, a criança e o adolescente passam a ter tratamento específico, mesmo
sendo reconhecido enquanto problema social. Quando todas as crianças e
adolescentes passam a ser reconhecidos na legislação brasileira enquanto pessoas
em desenvolvimento e cidadãos de direitos, descritos na Constituição Federal de 1988
69
e no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990, no lugar de uma rápida mudança
de tratamento que abrangesse todas as crianças e adolescentes, observa-se uma
lentidão no exercício e garantia dos direitos ou sua negligência por parte do Estado,
da Família ou da Sociedade, cuja proteção das crianças e adolescentes é dever.
(BRASIL, 1988, art. 227).
Entende-se que essa negligência se dá exatamente pela ausência de uma
alteridade histórica em relação à infância e por isso mesmo têm-se perpetuado ao
longo das relações sociais, embora muito se tenha evoluído desde o sec. XIX até as
conceituações que se tem atualmente sobre esses pequenos.
Para Nascimento et al (2008), até o séc XVII a ciência desconhecia a infância,
não havia lugar na sociedade para as crianças ou sequer uma expressão particular a
elas. A infância só surge então a partir das ideias de proteção, amparo e dependência.
Enquanto ser meramente biológico, a criança necessitava de disciplina.
Assim, a evolução de um sentimento da infância como parte do tecido social e
comunitário para o individualismo, contribui para compreender que ao longo dos
séculos a criança passou a ser vista em outros contextos que não o do seio familiar.
A partir dessa visão de uma infância peculiar e que se tornou existente, um novo olhar
foi lançado sobre esses pequenos, inserindo-a nos direitos sociais. Embora não seja
objeto desse artigo explanarmos sobre a evolução desse sentimento de infância, vale
ressaltar que ele teve contribuições de diversos estudiosos, destacadamente
Rousseau, Froebel, Montessori, Freinet e Dewey.
2. POR UMA ÉTICA DA ALTERIDADE
A importância da vida pública e coletiva até a modernidade supervalorizou a
procriação, de modo que alguns hábitos evidentes à época como dar o nome dos avós
aos netos e fazer rituais de fertilidade eram tidas como formas de garantir a
continuidade da família numa ideia cíclica (GELIS, 2009). O individualismo da pósmodernidade a que todos foram expostos permite refletir sobre quão difícil se torna
reconhecer no diferente um semelhante. Se em outros tempos a valorização da
vivência comunitária interna e externa era uma normalidade e até tido como uma
necessidade, hoje ela parece estranha. É possível se responsabilizar pelo outro que
me é estranho e me interpela pela sua estranheza?
Enriquez (2004, p.51) enfatiza que
70
Reconhecer no outro um semelhante significa, em primeiro lugar, que cada
um, como acredita Lévinas, recebe do rosto do outro um chamado e se sente
responsável por ele1. O outro lhe aparece como um fragmento da
humanidade inteira, e, consequentemente, se ele se sente e se quer parte da
espécie humana, não pode permanecer surdo (ou cego) à sua palavra, ao
seu desamparo, quem sabe, ou, de todo modo, à sua existência.
A infinita responsabilidade a que Lévinas (2008) se debruça, só é possível
através de uma ética da responsabilidade. Essa responsabilidade não é aquela que o
artigo 227 da Constituição Federal diz como sendo
[...] dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
É uma responsabilidade mais ética que legal, que vê num narcisismo
exacerbado associado a um individualismo egoísta a causa do não reconhecimento,
ou da recusa do rosto do outro, de sua alteridade.
Em seus estudos, Heiddeger (2002) afirma que “o Eu não é constituído
antes de sua implicação com os outros. E os outros não significam todo o resto dos
demais além de mim, os outros são entre os quais também se está”. Assim, o mundo
é sempre o mundo compartilhado com os outros, sem os quais não há vida, uma vez
que a vida é sempre vida compartilhada com os outros. O outro, no entanto, não é a
negação do eu, é um outro com rosto singular, cujo respeito imediato me é exigido
como fonte de uma ética da alteridade.
O compartilhamento da vida com os outros é um pensamento fundamental
para qualquer principio de alteridade, que inclusive funda a ideia de responsabilidade
de Lévinas (2008). Uma responsabilidade ética é o motor para o meu reconhecimento
a partir do outro e o reconhecimento do outro independente da reciprocidade.
A isso Segato (2006, p. 227) acrescenta que
[...] o outro na narrativa de Lévinas diferencia-se do outro no modelo
lacaniano, porque em Lévinas não instala o sujeito com sua violência
fundadora, mas o desloca, torna-o mais humilde e o infiltra com dúvidas:
convida-o a desconhecer-se e a abandonar suas certezas, entre elas a de
sua superioridade moral. Lévinas introduz, portanto, o valor ético daquilo que
nos desconfirma, ou seja, o valor ético da alteridade.
1
Vale aqui uma análise de Segato (2006): para Emmanuel Lévinas, o rosto é mais que uma mera face,
é o símbolo através do qual reconhecemos a revelação da humanidade do outro e vemos nele um
semelhante diferente. O rosto é questionador e reinvidicador. Assim, o eu ante a face do outro é
infinitamente responsável.
71
O eu ético para Lévinas é então este indivíduo dotado de responsabilidade para
com o outro, que acolhe o diferente, o intruso que se apresenta como alguém ou
sequer com a capacidade de se apresentar. Assim, o outro é diferente do próximo no
discurso cristão, visto que não é um conhecimento que parte de mim em relação ao
outro, mas de um olhar que ao partir do outro sobre nós permite que nos conheçamos
num entendimento de que o conhecimento do eu se dá a partir do outro.
Nesse sentido, o que se considera como sendo a ética numa perspectiva dos
direitos humanos é aquilo que
[...] em todas essas acepções, nos permite estranhar nosso próprio mundo,
qualquer que seja, e revisar a moral que nos orienta e a lei que nos limita. Por
isso, podemos dizer que constitui o principio motor da história dos direitos
humanos (SEGATO, 2006).
Uma ética da responsabilidade mútua permite que a alteridade esteja sempre
presente, é uma ética necessária, “em direção ao bem não alcançado” principio da
expansão dos direitos humanos e equalizadora. Uma ética da alteridade que nos
defina como humanos através de sua abertura e que reconstrua no outro sua
identidade perdida.
3. A ALTERIDADE COMO RECONSTITUIÇÃO IDENTITÁRIA DO ADOLESCENTE
EM CONFLITO COM A LEI
A partir da discussão anterior, é possível apreender que a identidade do
adolescente é constituída a partir do outro. Do mesmo modo, “a vontade do sujeito
não emana de forma espontânea do eu, não é um dado natural da sua essência,
senão que se constitui historicamente a partir da relação com o outro”. (RUIZ, sd,
p.211) A partir disso, o outro em si nem sempre é aquele ser benevolente no qual a
pessoa se apoia para construir sua identidade, mas pode ser uma sombra, um falso
duplo que suscita uma inquietude da qual o sujeito não sabe “como se livrar” [...]
(ENRIQUEZ, 2004). Nesse sentido, vale destacar uma análise sobre a imagem
especular de Lacan:
Se o eu se constitui a partir da imagem especular, é por uma apreensão global
(antecipação do domínio do corpo). Mas essa apreensão do corpo como
unidade, que faz surgir o júbilo fora do “estágio do espelho”, só é possível
porque a criança é, antes de tudo, constituída de unidade pelo olhar do outro
sobre ela [...] só podemos nos ver porque o outro nos vê e fala de nós. É,
72
portanto, por uma identificação com a imagem que os outros tem sobre nós
que podemos ter uma imagem de nós mesmos.[...] (WOLFF, 2004, p. 46-47)
Somos seres históricos, com rosto, corpo e fala2, que aprende a lidar com
as coisas a partir de um contexto e uma linguagem. Por isso, nossa conexão a
situações vivenciadas no passado com os eventos atuais permite que as respostas
que damos a esses últimos estejam associadas àqueles do pretérito. Numa
perspectiva identitária, o adolescente em conflito com a lei já não se reconhece mais
(se é que um dia o tenha feito) como o sujeito de direitos, como pessoa em peculiar
situação de desenvolvimento. Esse não reconhecimento se torna fruto de sua relação
com os outros. Mas o contrário também é verdade, uma vez que pela alteridade é
possível devolver a esse adolescente sua relação com o mundo infanto-juvenil, cujos
direitos que outrora deveriam ser garantidos o sejam efetivamente.
A ausência de alteridade referente ao adolescente que cometeu ato
infracional se manifesta na maioria das vezes a partir da mídia que possui papel
fundamental de formação de opinião. Expressões ainda do passado em que o
adolescente era considerado em situação irregular3 permanecem vivas na linguagem
da população em geral e da mídia, mesmo tendo o estatuto da criança e do
adolescente completado mais de duas décadas.
Se por um lado a alteridade é algo que respeita no outro seu rosto e,
sobretudo sua história, por outro não é tão simples um adulto julgar um adolescente
que
cometeu
ato
infracional
considerando
sua
situação
de
pessoa
em
desenvolvimento e todas as competências que formam a identidade daquele sujeito.
Mesmo já tendo passado por esse período da vida, só conhecendo a história social
da infância é possível se voltar para o autor do ato infracional de modo a compartilhar
de seu olhar e do seu signo, uma vez que o outro é incomparavelmente singular
(DOUZINAS, 2009).
Numa perspectiva histórica, Faleiros (2009) lembra que desde o Brasil
colônia a reprodução de exclusão de crianças pobres vem se perpetuando, de modo
2
Sobre a fala, pode-se consultar a análise que Caponi (2000, p.31) faz sobre Aristóteles, em que o
homem pode ser pensado como o zoon logon ekbon – o ser capaz de discurso. Para mais sobre a
linguagem e a legitimidade desta como reivindicadora de direitos conferir Lyotard (1993).
3
A situação irregular não caracterizava apenas a criança em situação de rua como em muitos registros,
embora essa veio a ser a característica mais usualmente disseminada a classificar o termo. A doutrina
da situação irregular compreendia desde a criança privada de condições essenciais à sua subsistência,
passando pelas que se encontravam vitimas de maus tratos até ao “autor de infração penal” (BRASIL,
1979).
73
que ao “menor” não restava muito senão vender sua mão de obra muito
precocemente. Para Ariés (1981), até o séc. XVI não havia um entendimento de
infância – culturalmente e não biologicamente falando - tal como o temos agora, com
demarcações bem definidas e proteção específica. Portanto, a infância era sinônimo
de inferioridade. Demonstrado por Ariés (1981) na iconografia analisada da época, só
a partir do séc. XVI é que a infância passa a ser registrada na comunidade familiar. É
nesse sentido que se pode dizer, portanto, que inexistia uma alteridade em relação à
criança, embora uma responsabilidade natural existisse enquanto ser biológico.
Da evolução do sentimento de infância, substituindo o infante (o que não
fala) para a criança agora enquanto pessoa e possuidora de direitos foi preciso o
reconhecimento dela por ela. A criança por ela, com suas vivências e peculiaridades,
com seu rosto, não mais com rosto adulto como na iconografia da idade média, mas
um rosto, que ao mesmo tempo em que pede proteção expressa o mais puro
protagonismo de sua própria história e do mundo enquanto ser social. Não é muito
dizer que os movimentos sociais que lutaram pelo reconhecimento dos direitos da
criança e do adolescente, foram capazes de uma alteridade desafiadora e atualmente
ainda ela é necessária, sobretudo com o adolescente em conflito com a lei, essa
parcela da população estigmatizada ora pela cor, ora pela condição socioeconômica
e ora pela própria faixa etária, resquícios ainda de uma alteridade ausente em séculos
passados.
É
nesse
sentido
que
pensar
numa
ética
da
alteridade,
uma
responsabilidade sempre presente como parte fundamental da reconstituição
identitária do autor do ato infracional é também pensar que cada um se sinta partícipe
desse processo e cada um é entendido como o eu ético de Lévinas em direção ao
outro, que é singular e capaz.
4.
A
ALTERIDADE
NA
CONTRIBUIÇÃO
DA
SOCIOEDUCAÇÃO
DO
ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI
Quando Rousseau (1979) afirma em sua obra Emílio ou Da Educação que
a educação é hábito e que essa mesma educação é que modifica os homens, o
filósofo suíço inaugura um grande pensamento no que se refere à educação dos
homens. Ora, o hábito pressupõe a experiência e essa experiência se dá ao longo de
toda a vida do homem, sobretudo na sua infância cuja propensão à aprendizagem se
74
dá de melhor forma. Nesse sentido, a alteridade em Rousseau é evidenciada ao tratar
a criança pela criança numa época em que não havia o reconhecimento das
especificidades desta.
Uma socioeducação do adolescente em conflito com a lei também deve
levar em consideração o período de desenvolvimento do adolescente. Ela objetiva a
reeducação dos hábitos, da educação que em algum momento foi falha, a falha de
alguma das educações4 ou de seus atores.
É preciso concordar com Gélis (2009, p. 328), quando salienta que o
[…] interesse ou a indiferença com relação à criança [e ao adolescente] não
são realmente a característica desse ou daquele período da história. As duas
atitudes coexistem no seio de uma mesma sociedade, uma prevalecendo
sobre a outra em determinado momento e por motivos culturais e sociais que
nem sempre é fácil distinguir.
O próprio termo infante já demonizava a criança. Ao falar da legitimidade da
fala enquanto reinvidicadora de direitos Lyotard (1993) expõe: Porque é este direito
(de interlocução) que me assegura que meu pedido será ouvido e que eu não serei
rejeitado na degradação da infantia. O autor fala da degradação não só de não poder
falar durante a infância, mas também de não ser ouvido, de não ter legitimidade. Assim
são até hoje construídas as políticas públicas para a infância e adolescência,
concebendo a infância como o período da não-fala, portanto sem legitimidade, sem o
direito de ser ouvida, sem qualquer exercício de alteridade em relação a ela,
reconhecida no seu direito de expressão voluntária. Nesse sentido, a constituição das
políticas públicas devem se efetivar a partir do ouvir e a outridade é condição básica
para isso.
Ao longo da história, a infância enquanto um problema social modificou seus
atores, se nas décadas de 1980 e 1990, por exemplo, o que era considerado problema
eram as crianças de rua denominadas de crianças em situação irregular, hoje ele se
concentra nos autores de ato infracional - os adolescentes em conflito com a lei, sendo
o papel da mídia fundamental para disseminar a ideia de problema social baseadas
em estatísticas que ditam o que deve ser feito com relação à violência e a
criminalidade.
4
Para Rousseau (1979), a educação se dá em três planos: a educação da natureza, responsável pelo
desenvolvimento biológico e portanto não depende de outros homens; a educação dos homens,
aprendida por meio dos indivíduos próximos e a educação das coisas, fruto da experiência com os
objetos.
75
O que se entende aqui é que numa relação de socioeducação que seja efetiva
ao adolescente em conflito com a lei, o exercício da alteridade por parte de todos os
envolvidos é fundamental. Não é possível que haja uma ignorância por quem é
responsável por educar, ou pseudoformas que acredite em uma educação efetiva sem
levar em consideração a outridade do adolescente.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao adolescente que não resta senão ser matéria de página policial de jornal,
ao adolescente que perdeu o sentido do brincar, do aprender desde o inicio, cuja
precocidade para as violências mais banais é uma regra, para eles uma alteridade
capaz de lhe enxergar no rosto sua história, a alteridade forte o suficiente para que
não lhe seja desviado nem o rosto nem o olhar, uma aceitação capaz de lhe devolver
sua história melhorada e resignificada.
No entanto, isso tudo não é tarefa fácil, sobretudo para quem lida diretamente
com o autor do ato infracional. É nesse sentido que é invocado novamente Rousseau
e a educação como hábito. É necessário uma formação específica para todos os que
lidam com o sistema socioeducativo, seja nas medidas socioeducativas em meio
fechado ou aquelas em meio aberto. Uma formação para a alteridade, respeitando
diferenças e tempos.
É possível, através de uma ética da alteridade tendo como princípio a
responsabilidade pelo outro, contribuir para a socioeducação do adolescente em
conflito com a lei, evidenciando seu protagonismo juvenil, restituindo sua identidade
caracterizada pelas vivências, pelo resgate infanto-juvenil e suas praticas associadas.
Estigmatizado pela mídia e sociedade, o adolescente não consegue se ressignificar e
se reconhecer a não ser pelo olhar do outro que lhe lança como o salvador. Essa
reconstrução identitária é que deve ser a busca de um cuidado especial no trato, no
direito daquela que outrora não tinha voz, de falar e ser ouvido na sua fala.
76
REFERÊNCIAS
ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro (RJ):
Editora Guanabara, 1981.
BRASIL. Lei n. 6.697 de 10 de outubro de 1979. Institui o Código de Menores.
Diário Oficial da União: Brasília, 1979
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
CAPONI, Sandra. Da compaixão à solidariedade: uma genealogia da assistência
médica. Rio de janeiro (RJ): FIOCRUZ, 2000.
DOUZINAS, Costas. Os direitos humanos do outro. In. DOUZINAS, Costas. O Fim
dos Direitos Humanos. São Leopoldo: UNISINOS, 2009.
ENRIQUEZ, Eugène. O outro, semelhante ou inimigo? In: NOVAES, Adauto.
Civilização e Barbárie. São Paulo (SP): Companhia das Letras, 2004. p. 45-60.
FALEIROS, Eva Teresinha Silveira. A criança e o adolescente: objetos sem valor no
Brasil Colônia e no Império. In: A arte de governar crianças: a história das políticas
sociais, da legislação e da assistência à infância no Brasil. 2. ed. São Paulo (SP):
Cortez, 2009.
GÉLIS, Jacques. A individualização da criança. In.: História da vida privada 3: da
Renascença ao Século das Luzes. Roger Chartier; Philippe Ariès (orgs.). Hildegard
Feist (trad.). São Paulo (SP): Companhia das Letras, 2009.
HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. 12. ed. Vozes; Universidade São Francisco:
Petrópolis, 2002. (v. I)
LEVINAS, Emmanuel. Totalidade e Infinito. Lisboa (PT): Edições 70, 2008.
LYOTARD, Jean-François. The Other’s Rights. In: SHUTE, Stephen; HURLEY,
Susan (Org.). On Human Rights: The Oxford Amnesty Lectures 1993. New York:
BasicBooks, 1993, p. 135-147
NASCIMENTO, Cláudia Terra do.; BRANCHER, Vantoir Roberto; OLIVEIRA,
Valeska Fortes de. A construção social do conceito de infância: algumas
interlocuções históricas e sociológicas. Contexto e Educação. Editora Unijuí, ano 23,
nº 79, jan./jun. 2008.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Emílio ou da Educação. Trad. Sérgio Milliet. 3. ed. Rio
de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995.
RUIZ, Castor, M. M. Bartolomé. Os direitos humanos como direitos do outro.
P.189-225.
77
SEGATO, Rita Laura. Antropologia e Direitos Humanos: alteridade e ética n
movimento de expansão dos direitos universais. MANA 12 (1): 2006, p. 207-236.
WOLFF, Francis. Quem é bárbaro? In: NOVAES, Adauto. Civilização e Barbárie.
São Paulo (SP): Companhia das Letras, 2004. P.19-43.
78
CAPÍTULO 05
PARTICIPAÇÃO E PERCEPÇÃO DE ACADÊMICOS DE MEDICINA DA UNISA EM LIGAS
ACADÊMICAS
Talita Eliziário Bígoli
Médica pela Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Instituição: Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Endereço: R. Prof. Enéas de Siqueira Neto, 340. Jardim das Imbuias, São Paulo/SP,
04829-300, Brasil
E-mail: talitabigoli@hotmail.com
Rafael Arantes
Graduando em Medicina pela Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Instituição: Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Endereço: R. Prof. Enéas de Siqueira Neto, 340. Jardim das Imbuias, São Paulo/SP,
04829-300, Brasil
E-mail: arantesmedicina52@gmail.com
Nathalia Bavaresco Gonçalves Cristóvão
Graduanda em Medicina pela Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Instituição: Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Endereço: R. Prof. Enéas de Siqueira Neto, 340. Jardim das Imbuias, São Paulo/SP,
04829-300, Brasil
E-mail: nathaliacristovao10@gmail.com
André Bavaresco G Cristóvão
Graduando em Medicina pela Universidade Santo Amaro (UNISA)
Instituição: Universidade de Medicina Santo Amaro (UNISA)
Endereço: R. Prof Enéas de Siqueira Neto, 340
E-mail: andre.cristovao017@gmail.com
Paula Helena Gonçalves Cristóvão
Médica pela Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Instituição: Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Endereço: R. Prof. Enéas de Siqueira Neto, 340. Jardim das Imbuias, São Paulo/SP,
04829-300, Brasil
E-mail: paulacristovao7@gmail.com
Júlio Cesar Massonetto
Doutor em Medicina (Obstetrícia), pela Universidade Federal de São Paulo
Instituição: Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Endereço: R. Prof. Enéas de Siqueira Neto, 340 - Jardim das Imbuias - São Paulo
E-mail: jmassonetto@prof.unisa.br
Júlio César André
Doutor em Morfologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - FMRP/USP
Instituição: Centro de Estudos e Desenvolvimento de Educação em Saúde - CEDES
Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto - FAMERP
Endereço: Av. Brigadeiro Faria Lima, 5416, Vila São Pedro, 15090-000 São José do
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
79
Rio Preto, São Paulo, Brazil.
E-mail: julio.andre@edu.famerp.br
Helena Landim Gonçalves Cristóvão
Mestre em Saúde Materno Infantil, pela Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Instituição: Universidade de Santo Amaro (UNISA)
Endereço: R. Prof. Enéas de Siqueira Neto, 340. Jardim das Imbuias, São Paulo/SP,
04829-300, Brasil
E-mail: hcristovao@prof.unisa.br
RESUMO: Os atuais currículos dos cursos de graduação na área da saúde estão em
constante reconstrução com o objetivo de garantir a qualificação profissional eficaz, e
uma alternativa para os acadêmicos que almejam o diferencial no mercado de trabalho
é a formação complementar por meio do currículo informal. Nesse contexto surgem
as ligas acadêmicas de medicina (LAM) em que os acadêmicos quando inseridos
nessas organizações buscam preencher lacunas do currículo formal. Caracterizar a
participação dos acadêmicos de medicina da Universidade Santo Amaro (UNISA) em
LAM’s, os fatores que influem para a escolha de uma LAM para participação bem como
a percepção acerca do impacto dessa relação com as mesmas no desenvolvimento
acadêmico pessoal foi o objetivo do presente. Pesquisa de natureza quantitativa, com
perspectiva qualitativa, por meio de análise transversal de números absolutos e
percentuais e medidas de tendência central. Amostragem não probabilística, por bola
de neve, onde acadêmicos de medicina da UNISA receberam um link com convite e
formulário eletrônico e o replicaram. 85 respondentes. 73,3% dos participantes de
LAM colocam o conteúdo abordado na mesma como o que mais chamou a atenção
para o seu ingresso. Das 29 LAM’s citadas apenas 3 não são de especialidades
médicas. 52% dos acadêmicos não está participando de uma LAM no momento.
77,6% concordam que a liga possibilita trabalhar e aperfeiçoar a arte de se relacionar,
desenvolvendo o relacionamento interpessoal entre várias especialidades médicas e
até mesmo entre outras áreas da saúde. Interesse quase exclusivo dos acadêmicos
por LAM’s de especialidades. Muitos acadêmicos não participam de LAM’s na UNISA
devido à sobrecarga do internato ou à problemas estruturais da organização das ligas
que dificultam o acesso. Patente a percepção de que as LAM’s possibilitam o
crescimento no âmbito pessoal, trabalhando as relações interpessoais e
interprofissionais.
PALAVRAS-CHAVE: Estudantes de Medicina; Liga acadêmica; Motivação; Vida
acadêmica.
ABSTRACT: The current curricula of undergraduate courses in the area of health are
constantly being rebuilt with the objective of guaranteeing effective professional
qualification and an alternative for academics who aim to differentiate themselves in
the job market is complementary training through the informal curriculum. In this
context, academic medical leagues (LAM) arise in which academics, when inserted in
these organizations, seek to fill gaps in the formal curriculum. The aim of this study
was to characterize the participation of medical students from the University of Santo
Amaro (UNISA) in LAMs, the factors that influence the choice of a LAM for participation,
as well as the perception of the impact of this relationship with them on personal
academic development. Quantitative research, with a qualitative perspective, through
transversal analysis of absolute and percentage numbers and measures of central
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
80
tendency. Non-probabilistic snowball sampling, where UNISA medical students
received a link with an invitation and an electronic form and replicated it. 85
respondents. 73.3% of LAM participants put the content covered in it as the one that
most called attention to their admission. Of the 29 LAM’s cited, only 3 are not medical
specialties. 52% of academics are not currently participating in a LAM. 77.6% agree
that the league makes it possible to work and improve the art of relating, developing
interpersonal relationships between various medical specialties and even among other
areas of health. Academics' almost exclusive interest in specialty LAM’s. Many
academics do not participate in LAM’s at UNISA due to the overhead of the boarding
school or structural problems in the organization of the leagues that make access
difficult. The perception that LAM’s make it possible to grow on a personal level,
working on interpersonal and interprofessional relationships.
KEYWORDS: Medical Students; Academic League; Motivation; Academic Life.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
81
1. INTRODUÇÃO
As Ligas Acadêmicas (LAs) são caracterizadas como organizações formadas
por núcleos estudantis sem fins lucrativos, que desenvolvem com seus membros
atividades didáticas, científicas, culturais e sociais, que acercam uma determinada
área da saúde. Essas atividades visam o crescimento e progresso dos estudantes. As
Ligas são administradas pelos próprios alunos o que exige uma articulação
interpessoal entre seu grupo formador e criando-se habilidades gerenciais, com a
orientação de um ou mais docentes1.
Essas LAs são formadas respeitando o princípio constitucional que rege o
Ensino Superior que é a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão,
conhecido como tripé universitário. Essas organizações podem ser compostas de
alunos de apenas um curso ou de cursos diversos, sempre respeitando o estatuto que
rege a sua formação2.
A história das LAs se inicia com a criação da Liga de combate a Sífilis na
Faculdade de Medicina pela Universidade de São Paulo. Porém foi somente nos anos
de 1964 a 1985, durante a ditadura militar, que as ligas obtiveram um alcance maior,
como forma de questionamento dos métodos de ensino universitários. Esse progresso
foi tão significativo que gerou até uma Associação de Ligas no Brasil2.
Esse corpo formado por estudantes tem assumido cada vez mais importância
na contribuição da ciência com suas atividades na formação de futuros profissionais
que atuarão nessas áreas. Seguindo o mesmo tripé das Universidades que preza a
integração das três vertentes, as LAs têm por finalidade a transmissão de conteúdo
teórico/prático de forma sistemática auxiliando no complemento do aprendizado
acadêmico e motivando os alunos a uma busca constante de novas informações.
Através do ensino constrói-se também um pensamento crítico e investigativo,
contribuindo, desta forma, para a disseminação dos conhecimentos aprendidos dentro
dos muros universitários e levando uma contribuição para a coletividade, promovendo
a integração entre universidade e comunidade por meio da extensão3.
No que tange às normativas dos cursos de graduação na área da saúde suas
diretrizes curriculares trazem a importância do estímulo à prática de estudos
independentes visando a autonomia intelectual e profissional, possuem como
premissa a autonomia do estudante para aperfeiçoamento contínuo diante das
diversas formas de aprendizado e destacam a importância da participação ativa do
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
82
discente no processo de construção e divulgação do conhecimento4.
Desta forma, as ligas acadêmicas, ainda que não contempladas nas diretrizes
curriculares de forma explícita, apresentam grande potencial no auxílio ao alcance do
que se é proposto nas diretrizes dos cursos das ciências da saúde. Contudo, ressaltase que as LAs não devem servir como depósito de expectativas quanto a
suplementação da deficiência no ensino formal proposto pelas Instituições de Ensino
Superior (IES)5.
Além disso, deve-se considerar a LA como espaço que possibilita a
implementação do ensino e pesquisa, viabiliza maior interação entre estudantes,
professores e comunidade e possibilita um panorama diversificado de práticas,
aproximando os estudantes e a população e desse modo, é possível entender que as
ligas representam um caminho para contribuição das Universidades com a sociedade6.
Detalhando-se o funcionamento e a organização interna das LAs, existem
cargos hierarquizados
e
diretorias
de
atividades
centrais
necessárias
ao
funcionamento desta organização, como: presidência, vice-presidência, secretaria,
tesouraria, diretorias de ensino, pesquisa, extensão, comunicação. Desta maneira,
pode-se dizer que as LAs ainda funcionam como espaço de desenvolvimento de
competências de gestão e liderança, pouco exercidas nos currículos tradicionais1.
Ferreira et al.7 ao fazerem um paralelo entre LAs e “Learning Communities”,
grupo de aprendizado encontrado nas Universidades canadenses e americanas,
frisam especificidades vistas nas LAs brasileiras que as tornam únicas como atividade
extracurricular, são elas: autonomia do estudante na condução das atividades,
organização baseada no tripé universitário (pesquisa/ensino/extensão), variabilidade
de participantes sob o aspecto de período no curso e origem de distintas Faculdades
e inserção destas organizações em congressos, conferências, eventos regionais e
nacionais da área em questão.
Sabendo de todas as funções e contribuições que as LAs desempenham no
currículo e formação médicos, existem críticas e ponderações a serem feitas acerca
do fenômeno frequente de participação nas mesmas. Pêgo-Fernandes et al.8
apontam como aspecto negativo das LAs o fato de alguns alunos tomarem essas
atividades como uma
chance para “especialização precoce”, dedicando-se
excessivamente a alguma área e relegando a segundo plano outras também
importantes para formação médica generalista. Desta maneira, as LAs propiciariam a
escolha do rumo profissional de maneira precoce, limitando a atuação e a busca
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
83
por conhecimento amplo e generalizado, o que contraria as Diretrizes Curriculares
Nacionais (DCN) para a formação médica consonante com as demandas atuais1.
Este fato levanta a necessidade de uma análise do fenômeno, a fim de
possibilitar o desenvolvimento de estratégias dentro do modelo de tais organizações
para reduzir uma possível restrição. Assim, este trabalho visa investigar a participação
dos acadêmicos de medicina de uma universidade privada paulista em ligas
acadêmicas de Medicina (LAM’s), os fatores que influem para a escolha de uma LAM
para participação bem como a percepção acerca do impacto dessa relação com as
mesmas no desenvolvimento acadêmico pessoal.
2. OBJETIVOS
2.1 Gerais
Realizar um levantamento em relação às motivações da participação em ligas
acadêmicas entre os estudantes de Medicina da UNISA e como elas podem
influenciar positivamente na construção da sua vida acadêmica
2.2 Específicos
✓ Identificar o nível de participação dos acadêmicos de medicina da UNISA em
ligas acadêmicas;
✓ Identificar quais são os fatores que influem para a escolha de uma liga acadêmica
para participação;
✓ Identificar se existe ou não impacto dessa relação com as ligas no
desenvolvimento acadêmico.
3. MÉTODO
Pesquisa exploratória, quantitativa, com perspectiva qualitativa, de corte
transversal, sob a forma de levantamento de dados. Os sujeitos da pesquisa foram
estudantes de medicina da UNISA. Amostragem não probabilística, por bola de neve,
onde os acadêmicos de medicina da UNISA receberam um link com convite e
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
84
formulário eletrônico (Google Forms©) com o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido
(TCLE) e
o
instrumento
de
coleta
de
dados
com
dados
sociodemográficos, de participação em ligas acadêmicas, fatores de escolha para a
LAM, percepção acerca do papel delas na construção da vida acadêmica, e o
replicaram.
Para levantar a percepção acerca do papel das LAMs na construção da vida
acadêmica dos participantes foram apresentadas 3 assertivas acerca do assunto e
para cada uma delas o respondente se valia de uma escala do tipo Likert para
expressar-se.
As assertivas eram:
1. As Ligas sendo uma atividade extracurricular, não representam apenas mais uma
maneira de preencher e aumentar o currículo, mas também uma forma de interação
entre os membros e uma forma de responder as dúvidas que se deparam no seu diaa-dia.
2. Há quem diga que é importante ressaltar a preocupação da Liga com o
aprendizado teórico, não visando apenas à prática.
3. As Ligas além de proporcionar conhecimento técnico, podem possibilitar também
trabalhar e aperfeiçoar a arte de se relacionar com diversas pessoas e em vários
níveis de igualdade, onde é evidente o relacionamento interpessoal entre várias
especialidades médicas e outras áreas da saúde.
A escala do tipo Likert, com 5 níveis, variou de discordo totalmente a concordo
totalmente.
Todos os dados foram cadastrados no Excel© e posteriormente, foram
importados para o software IBM-SPSS Statistics versão 27 (IBM Corporation, NY, USA)
para análise exploratória dos dados e análise comparativa entre grupos. A análise
exploratória dos dados incluiu as estatísticas descritivas mediana, valor mínimo e valor
máximo para variáveis ordinais e número e proporção para variáveis categóricas
nominais9. A comparação de variáveis ordinais entre dois grupos foi realizada pelo
Teste de Mann- Whitney; análise de correlação de Spearman foi realizada para verificar
a correlação entre duas variáveis ordinais10. Análise estatística foi realizada mediante
o software IBM-SPSS Statistics versão 27 (IBM Corporation, NY, USA). Todos os
testes foram bicaudais e valores de p < 0,05 foram considerados significantes.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
85
4. RESULTADOS
4.1 Caracterização da amostra
A amostra do estudo foi composta por 85 participantes.
4.1.1 Dados Sociodemográficos
As Tabelas 1 e 2 mostram a distribuição do participantes por gênero, faixa
etária e distribuição nos semestres de graduação.
Tabela 1 - Dados demográficos dos participantes incluídos no estudo, n = 85, UNISA, 2020
Característica
n = 85
Sexo, n (%)
Feminino
61 (71,8)
Masculino
24 (28,2)
Faixa etária, n (%)
Menor que 20 anos
7 (8,2)
Entre 20 e 25 anos
50 (58,9)
Entre 26 e 35 anos
25 (29,4)
Maior que 35 anos
3 (3,5)
Variáveis categóricas estão descritas em número
(porcentagem).
Fonte: O autor (2020).
Tabela 2 - Distribuição nos semestres dos participantes incluídos no estudo, n = 85, UNISA, 2020
Semestre
n
%
1
1,2
1º. Semestre
2
2,4
2º. Semestre
9
10,4
3º. Semestre
1
1,2
4º. Semestre
12
14,1
5º. Semestre
17
20
6º. Semestre
6
7,1
7º. Semestre
1
1,2
8º. Semestre
2
2,4
9º. Semestre
21
24,7
10º. Semestre
13
15,3
11º. Semestre
Variáveis categóricas estão descritas em
número (porcentagem).
Fonte: O autor (2020).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
86
4.2 Dados de participação em lams
Os dados de participação atual nas LAMs, pretensão de entrar para uma
LAM e qual a LAM pretendida estão sumarizados na Tabela 3.
Tabela 3 - Dados da participação em Ligas acadêmicas dos participantes incluídos no estudo, n
= 85, UNISA, 2020
Característica
Participa de alguma Liga acadêmica atualmente?
Não
Sim
Pretende entrar para alguma Liga acadêmica?
Não Sim
Qual(is)?
Liga Cirurgia Cardiovascular
Liga Saúde da Família e Comunidade
Liga Clínica Médica
Liga Grupo de Estudos do Aparelho Locomotor
Liga Saúde da Mulher
Liga Amar o Riso
Liga Cardiologia
Liga Medicina Baseada em Evidências
Liga Transplante de Órgãos
Liga Anestesiologia
Liga Angiologia e Cirurgia Vascular
Liga Endocrinologia e Metabologia
Liga Especialidades Pediátricas
Liga Hipertensão
Liga Imaginologia
Liga Medicina e Arte
Liga Oftalmologia
Liga Reprodução e Genética
Liga Atendimento Primário e Urgências e
Emergências
Liga Bioética, Ética Medica e Humanidades
Liga Cirurgia Pediátrica
Liga Cuidados Paliativos
Liga Dermatologia
Liga Farmacologia
Liga Medicina do Esporte
Liga Medicina Integrativa
Liga Oncologia
Liga Saúde Mental
Liga Trauma
Variáveis categóricas estão descritas em número (porcentagem).
n = 85
n (%)
45
(52,9)
40
(47,1)
n (%)
67
(78,8)
18
(21,2)
n (%)
5 (5,9)
5 (5,9)
4 (4,7)
4 (4,7)
4 (4,7)
3 (3,5)
3 (3,5)
3 (3,5)
3 (3,5)
2 (2,4)
2 (2,4)
2 (2,4)
2 (2,4)
2 (2,4)
2 (2,4)
2 (2,4)
2 (2,4)
2 (2,4)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
Fonte: O autor (2020).
O tempo de participação dos 40 respondentes que se encontravam participando
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
87
de LAM no momento da coleta de dados pode ser visto na tabela 4.
Tabela 4 - Tempo de participação em Ligas acadêmicas dos participantes incluídos em LAM, n =
40, UNISA, 2020
Há quanto tempo participa?
n
%
Iniciei este semestre
2 semestres
3 semestres
4 semestres
Não respondeu
14
8
9
7
2
35
20
22,5
17,5
5
Fonte: O autor (2020).
Quando inquiridos sobre uma participação anterior em LAM da qual não
participam mais, a indicação de qual seria, o tempo de participação na mesma, o
tempo decorrido desde o desligamento da mesma até o momento da coleta de dados
e qual o motivo pelo qual não participa mais da LAM em questão obtivemos os dados
mostrados, respectivamente, nas Tabelas 5, 6, 7 e 8.
Tabela 5 - Dados da participação anterior em LAMs dos participantes incluídos no estudo, n = 85,
UNISA, 2020
Característica
Participou de alguma liga acadêmica e não participa
mais? n (%)
Não
Sim
Qual(is)?
Liga Cirurgia Pediátrica
Liga Saúde da Mulher
Liga Trauma
Liga Saúde Mental
Liga Amar o Riso
Liga Anestesiologia
Liga Cirurgia Plástica
Liga Especialidades Pediátricas
Liga Grupo de Estudos do Aparelho Locomotor
Liga Imaginologia
Liga Medicina e Arte
Liga Bioética, Ética Médica e Humanidades
Liga Cardiologia
Liga Gastroenterologia
Liga Hipertensão
Liga Infectologia
Liga Otorrino
Liga Cuidados Paliativos
Liga Dermatologia
Liga Geriatria
Liga Medicina Baseada em Evidências
n = 85
30
(35,3)
55
(64,7)
n (%)
16
(18,8)
15
(17,6)
12
(14,1)
7 (8,2)
6 (7,1)
6 (7,1)
6 (7,1)
6 (7,1)
6 (7,1)
6 (7,1)
6 (7,1)
4 (4,7)
4 (4,7)
4 (4,7)
4 (4,7)
4 (4,7)
4 (4,7)
3 (3,5)
3 (3,5)
3 (3,5)
3 (3,5)
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
88
Liga Medicina do Esporte
Liga Medicina e Espiritualidade
Liga Medicina Integrativa
Liga Hematologia
Liga Neurologia
Liga Oncologia
Liga Angiologia e Cirurgia Vascular
Liga Cirurgia Cardiovascular
Liga Endocrinologia e Metabologia
Liga Medicina Intensiva
Liga Patologia
Liga Transplante de Órgãos
Liga Urologia
Variáveis categóricas estão descritas em número (porcentagem).
3 (3,5)
3 (3,5)
3 (3,5)
2 (2,4)
2 (2,4)
2 (2,4)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
1 (1,2)
Fonte: O autor (2020).
Tabela 6 - Tempo de participação anterior em LAMs de participantes do estudo, n = 71, UNISA, 2020
Por quanto tempo participou da LAM n
1 semestre
2 semestres
3 semestres
4 semestres
5 ou mais semestres
Não respondeu/Não se aplica
7
28
10
13
8
5
%
9,9
39,4
14,1
18,3
11,3
7
Fonte: O autor (2020).
Tabela 7 - Tempo de desligamento da participação anterior em LAMs de participantes do estudo, n
= 71, UNISA, 2020
Há quanto tempo não participa
mais da LAM?
n
Parei este semestre
13
2 semestres
9
3 semestres
11
4 semestres
7
Não respondeu/Não se aplica
31
Fonte: O autor (2020).
%
18,3
12,7
15,5
9,9
43,6
Tabela 8 - Motivo do desligamento da participação anterior em LAMs de participantes do estudo, n =
71, UNISA, 2020
Qual o motivo pelo qual deixou a Liga?
Não tinha mais tempo para participar da Liga
Encontrei outra Liga que me chamou mais a atenção
Não me identifiquei com a mesma
Considerei satisfatório meu conhecimento sobre a
temática da Liga
Ligas não são o que eu imaginava
Outro (s)
n
%
22
12
9
31,0
16,9
12,7
8
3
17
11,3
4,2
23,9
Fonte: O autor (2020).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
89
4.3 Dados de percepção dos respondentes acerca de lams
Os dados relacionados ao papel das LAMs na construção da vida acadêmica
dos participantes com base no grau de concordância ou não em relação às
assertivas apresentadas podem ser vistos nas Tabelas 9, 10 e 11.
Tabela 9 - Distribuição das respostas à assertiva 1 do instrumento entre os participantes do estudo, n
= 85, UNISA, 2020
As Ligas sendo uma atividade extracurricular, não representam apenas mais
uma maneira de preencher e aumentar o currículo, mas também uma forma
de interação entre os membros e uma forma de responder as dúvidas que
se deparam no seu dia- a-dia.
n
%
Discordo totalmente
Discordo em parte
Não discordo e nem concordo
Concordo em parte
Concordo totalmente
1
2
2
21
59
1,2
2,4
2,4
24,6
69,4
Fonte: O autor (2020).
Tabela 10 - Distribuição das respostas à assertiva 2 do instrumento entre os participantes do estudo, n
= 85, UNISA, 2020
Há quem diga que é importante ressaltar a preocupação da Liga com
o aprendizado teórico, não visando apenas à prática.
n
%
Discordo totalmente
3
3,5
Discordo em parte
3
3,5
Não discordo e nem concordo
Concordo em parte
Concordo totalmente
4
21
54
4,7
24,7
63,6
Fonte: O autor (2020).
Tabela 11 - Distribuição das respostas à assertiva 3 do instrumento entre os participantes do estudo, n
= 85, UNISA, 2020
As Ligas além de proporcionar conhecimento técnico, podem possibilitar
também trabalhar e aperfeiçoar a arte de se relacionar com diversas pessoas
e em vários níveis de igualdade, onde é evidente o relacionamento
interpessoal entre várias especialidades médicas e outras áreas da saúde
n
%
Discordo totalmente
Discordo em parte
Não discordo e nem concordo
Concordo em parte
Concordo totalmente
1
2
0
16
66
1,2
2,4
0
18,8
77,6
Fonte: O autor (2020).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
90
4.4. Dados de correlação entre dados sociodemográficos, dados de participação nas
lams e percepção acerca das mesmas
A análise de correlação foi utilizada para se estudar a relação entre as variáveis
que tenham natureza numérica ou ordinal. O coeficiente de correlação foi mensurado
por meio da escala de valores +1 a -1; sendo que quando o valor esteve próximo de
+1, assumiu-se a correlação linear positiva perfeita (ou seja, quanto maior o valor de
uma variável, maior também foi o valor da outra variável), e quando o valor do
coeficiente esteve próximo de -1, assumiu-se a correlação linear negativa perfeita (ou
seja, quanto maior o valor de uma variável, menor foi o valor da outra); os valores
próximos de zero indicaram a ausência de correlação. A força da correlação entre
duas variáveis foi interpretada da seguinte forma, segundo a literatura: r |≤0,25| =
ausência de correlação;
|0,26 – 0,50| = correlação fraca; |0,51 – 0,75| = correlação moderada e |>0,75| =
correlação forte. O resultado do “r” é aquele encontrado na amostra. Por outro lado, o
IC 95% (intervalo de confiança) mostra os valores de r extrapolados para a população,
com confiança de 95%.
As respostas à cada uma das assertivas foi correlacionada com os dados
sociodemográficos e os dados de participação nas LAMs e os resultados podem ser
vistos nas tabelas 12, 13 e 14.
Tabela 12 - Correlação entre a percepção do aluno* quanto à assertiva 1 do instrumento e idade,
semestre do curso e tempo de participação nas LAMs, n = 85, UNISA, 2020
Assertiva 1: As ligas sendo uma atividade extracurricular, não representam
apenas mais uma maneira de preencher e aumentar o currículo, mas também
uma forma de interação entre os membros e uma forma de responder as
dúvidas que se deparam no seu dia-a-dia.
rs
IC (95%)
Idade
-0,334 ; 0,098
0,123
Semestre
-0,426 ; -0,009
0,228
Tempo que participa da LAM
-0,399 ; 0,236
0,090
Tempo que participou da LAM anterior
0,045
-0,196 ; 0,282
rs = coeficiente de correlação de Spearman; IC, intervalo de confiança.
*A percepção do aluno foi relatada através de uma resposta em escala tipo
Likert, onde: 0 = discordo totalmente; 1 = discordo em parte; 2 = não discordo
e nem concordo; 3 = concordo em parte; 4 = concordo totalmente.
Fonte: O autor (2020).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
91
Tabela 13 - Correlação entre a percepção do aluno* quanto à assertiva 2 do instrumento e idade,
semestre do curso e tempo de participação nas LAMs, n = 85, UNISA, 2020
Assertiva 2: Há quem diga que é importante ressaltar a preocupação da
liga com o aprendizado teórico, não visando apenas à prática.
rs
IC (95%)
Idade
-0,278 ;
0,061
0,161
Semestre
-0,305 ;
0,092
0,129
Tempo que participa da LAM
-0,415 ;
0,109
0,218
Tempo que participou da LAM
-0,286 ;
anterior
0,050
0,192
rs = coeficiente de correlação de Spearman; IC, intervalo de confiança.
*A percepção do aluno foi relatada através de uma resposta em escala
tipo Likert, onde: 0 = discordo totalmente; 1 = discordo em parte; 2 = não
discordo e nem concordo; 3 = concordo em parte; 4 = concordo
totalmente.
Fonte: O autor (2020).
Tabela 14 - Correlação entre a percepção do aluno* quanto à assertiva 3 do instrumento e idade,
semestre do curso e tempo de participação nas LAMs, n = 85, UNISA, 2020
Assertiva 3: As ligas além de proporcionar conhecimento técnico,
podem possibilitar também trabalhar e aperfeiçoar a arte de se
relacionar com diversas pessoas e em vários níveis de igualdade, onde
é evidente o relacionamento interpessoal entre várias especialidades
médicas e outras áreas da saúde.
rs
IC (95%)
Idade
-0,241
-0,437 ; -0,023
Semestre
-0,295
-0,483 ; -0,080
Tempo que participa da LAM atual
0,096
-0,230 ; 0,404
Tempo que participou da LAM
-0,019
-0,258 ; 0,2217
anterior
rs = coeficiente de correlação de Spearman; IC, intervalo de confiança.
*A percepção do aluno foi relatada através de uma resposta em escala
tipo Likert, onde: 0 = discordo totalmente; 1 = discordo em parte; 2 =
não discordo e nem concordo; 3 = concordo em parte; 4 = concordo
totalmente.
Fonte: O autor (2020).
Foram utilizados ainda os gráficos de dispersão que descrevem a correlação
entre duas variáveis numéricas ou ordinais. Assim, foi possível visualizar, pelos
gráficos abaixo, que de fato não houve correlação entre as variáveis apresentadas
anteriormente, pois se observa uma nuvem de pontos em cada um deles. Caso
houvesse correlação, os pontos se distribuiriam pelo gráfico de maneira a formar uma
reta (ascendente – correlação positiva - ou descendente – correlação negativa ou
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
92
inversa).
4.5 Análise descritiva da percepção do aluno quanto às questões, de acordo com o
sexo e participação nas lams
Uma análise descritiva da distribuição das respostas de acordo com a
percepção do aluno, para cada assertiva, separadamente por sexo, bem como, pela
participação ou não em alguma LAM ou pretensão de entrar para alguma delas foi
realizada e os resultados podem ser vistos na Tabelas 15, 16 e 17.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
93
Tabela 15 - Distribuição das respostas à assertiva 1, em relação ao sexo e participação nas LAMs, n = 85, UNISA, 2020
Variáveis
Sexo
Masculino
Feminino
Total
Participa de alguma
liga acadêmica
atualmente?
Não
Sim
Total
Pretende entrar para
alguma liga acadêmica?
Não
Sim
Total
n
%
n
%
n
%
Assertiva 1: As ligas sendo uma atividade extracurricular, não representam apenas mais uma
maneira de preencher e aumentar o currículo, mas também uma forma de interação entre os
membros e uma forma de responder as dúvidas que se deparam no seu dia-a-dia.
Discordo
Não discordo Concordo
Discordo em
Concordo
Total
totalmente
e nem
em parte
parte
totalmente
concordo
0
2
0
8
14
24
0,00%
8,30%
0,00%
33,30%
58,30%
100,00%
1
0
2
13
45
61
1,60%
0,00%
3,30%
21,30%
73,80%
100,00%
1
2
2
21
59
85
1,20%
2,40%
2,40%
24,70%
69,40%
100,00%
n
1
2
2
11
29
45
%
n
%
n
%
2,20%
0
0,00%
1
1,20%
4,40%
0
0,00%
2
2,40%
4,40%
0
0,00%
2
2,40%
24,40%
10
25,00%
21
24,70%
64,40%
30
75,00%
59
69,40%
100,00%
40
100,00%
85
100,00%
n
%
n
%
n
%
1
1
1,50%
1,50%
0
1
0,00%
5,60%
1
2
1,20%
2,40%
Fonte: O autor (2020).
2
3,00%
0
0,00%
2
2,40%
16
23,90%
5
27,80%
21
24,70%
47
70,10%
12
66,70%
59
69,40%
67
100,00%
18
100,00%
85
100,00%
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
94
Tabela 16 - Distribuição das respostas à assertiva 2, em relação ao sexo e participação nas LAMs, n = 85, UNISA, 2020
Assertiva 2: Há quem diga que é importante ressaltar a preocupação da liga com o
aprendizado teórico, não visando apenas à prática
Discordo
totalment
e
Variáveis
Sexo
Participa de alguma
liga acadêmica
atualmente?
Pretende entrar para
alguma liga acadêmica?
Masculino
n
%
0
0,00%
Feminino
n
%
3
4,90%
Total
n
%
3
3,50%
Não
n
0
%
0,00%
Sim
n
%
3
7,50%
Total
n
%
3
3,50%
Não
n
%
3
4,50%
Sim
n
%
Total
n
%
Discord
o em
parte
Não discordo
e nem
concordo
Concordo
em parte
0
0,00
%
3
4,90
%
3
3,50
%
1
4,20
%
3
4,90
%
4
4,70
%
3
6,70
%
0
0,00
%
3
3,50
%
2
3,00
%
0
1
0,00%
5,60
%
3
3
3,50%
3,50
%
Fonte: O autor (2020).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
8
33,30
%
13
21,30
%
21
24,70
%
Concord
o
totalment
e
15
62,50
%
39
63,90
%
54
63,50
%
24
100,00
%
61
100,00
%
85
100,00
%
3
13
26
45
6,70
%
1
2,50
%
4
4,70
%
28,90
%
8
20,00
%
21
24,70
%
57,80
%
28
70,00
%
54
63,50
%
100,00
%
40
100,00
%
85
100,00
%
3
4,50
%
1
5,60
%
4
4,70
%
16
23,90
%
5
27,80
%
21
24,70
%
43
64,20
%
11
61,10
%
54
63,50
%
67
100,00
%
18
100,00
%
85
100,00
%
95
Total
Tabela 17 - Distribuição das respostas à assertiva 3, em relação ao sexo e participação nas LAMs, n = 85, UNISA, 2020
Variáveis
Sexo
Masculino
Feminino
Total
Participa de alguma liga
acadêmica atualmente?
Não
Sim
Total
Pretende entrar para
alguma liga acadêmica?
Não
Sim
Total
n
%
n
%
n
%
Assertiva 3: As ligas além de proporcionar conhecimento técnico, podem possibilitar também
trabalhar e aperfeiçoar a arte de se relacionar com diversas pessoas e em vários níveis de
igualdade, onde é evidente o relacionamento interpessoal entre várias especialidades médicas
e outras
áreas da saúde
Discordo
Discordo
Concordo
Concordo
Total
totalmente
totalmente
em
em
parte
parte
1
1
5
17
24
4,20%
4,20%
20,80%
70,80%
100,00%
0
1
11
49
61
0,00%
1,60%
18,00%
80,30%
100,00%
1
2
16
66
85
1,20%
2,40%
18,80%
77,60%
100,00%
n
%
n
%
n
%
1
2,20%
0
0,00%
1
1,20%
1
2,20%
1
2,50%
2
2,40%
n
%
n
%
n
%
1
2
1,50%
3,00%
0
0
0,00%
0,00%
1
2
1,20%
2,40%
Fonte: O autor (2020).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
9
20,00%
7
17,50%
16
18,80%
34
75,60%
32
80,00%
66
77,60%
45
100,00%
40
100,00%
85
100,00%
14
20,90%
2
11,10%
16
18,80%
50
74,60%
16
88,90%
66
77,60%
67
100,00%
18
100,00%
85
100,00%
96
4.6 Análise comparativa da percepção do aluno quanto às assertivas e sexo e
participação em lams
Foi realizada uma análise comparativa da percepção do aluno quanto às
assertivas, de acordo com sexo ou participação e pretensão de participação nas LAMs,
utilizando-se o teste não paramétrico de Mann-Whitney para as respostas tipo Likert
dos alunos, e apresentou-se o resultado em mediana destas respostas para cada
categoria a ser comparada, para cada questão, como demonstrado nas Tabelas 18,19
e 20.
Tabela 18 - Análise comparativa da percepção do aluno (respostas em escala tipo Likert de 0 a 4)
quanto às assertivas do instrumento e o sexo, n = 85, UNISA, 2020
Sexo
Masculino
n = 24
As ligas sendo uma atividade extracurricular, não
representam apenas mais uma maneira de
preencher e aumentar o currículo, mas também uma
forma de interação entre os membros e uma forma
de responder as dúvidas que se deparam no seu
dia-a-dia.
Há quem diga que é importante ressaltar a
preocupação da liga com o aprendizado teórico, não
visando apenas à prática.
As ligas além de proporcionar conhecimento técnico,
podem possibilitar também trabalhar e aperfeiçoar a
arte de se relacionar com diversas pessoas e em
vários níveis de igualdade, onde é evidente o
relacionamento interpessoal entre várias
especialidades médicas e outras áreas da saúde.
Feminino
n = 61
Valor p
4 (1-4)
4 (0-4)
0,164
4 (2-4)
4 (0-4)
0,801
4 (0-4)
4 (1-4)
0,290
As variáveis estão expressas em mediana (mínimo – máximo) das respostas em escala
tipo Likert a cada uma das questões, de acordo com o sexo.
Respostas em escala tipo Likert: 0 = discordo totalmente; 1 = discordo em parte; 2 = não
discordo e nem concordo; 3 = concordo em parte; 4 = concordo totalmente.
Fonte: O autor (2020).
Tabela 19 - Análise comparativa das assertivas do instrumento (respostas em escala tipo Likert)
e a participação em LAMs, n = 85, UNISA, 2020
Participa de alguma liga
acadêmica atualmente?
Não
Sim
n=
45
n=
40
Valor
p
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
97
As ligas sendo uma atividade extracurricular,
não representam apenas mais uma maneira
de preencher e aumentar o currículo, mas
também uma forma de interação entre os
membros e uma forma de responder as
dúvidas que se deparam no seu dia-a-dia.
Há quem diga que é importante ressaltar a
preocupação da liga com o aprendizado
teórico, não visando apenas à prática.
4 (0-4)
4 (3-4)
0,190
4 (1-4)
4 (0-4)
0,300
As ligas além de proporcionar conhecimento
técnico, podem possibilitar também trabalhar
e aperfeiçoar a arte de se relacionar com
4 (0-4)
4 (1-4)
0,601
diversas pessoas e em vários níveis de
igualdade, onde é evidente o relacionamento
interpessoal entre várias especialidades
médicas e outras áreas da saúde.
As variáveis estão expressas em mediana (mínimo – máximo) das respostas em
escala tipo Likert a cada uma das questões, de acordo com a participação atual
em alguma Liga.
Respostas em escala tipo Likert: 0 = discordo totalmente; 1 = discordo em parte;
2 = não discordo e nem concordo; 3 = concordo em parte; 4 = concordo
totalmente.
Fonte: O autor (2020).
Tabela 20 - Análise comparativa das questões do instrumento (respostas em escala tipo Likert) e a
intenção de participar em LAM, n = 85, UNISA, 2020
Pretende entrar para alguma
liga acadêmica?
Não
Sim
Valor p
n = 67
n = 18
As ligas sendo uma atividade extracurricular, não
representam apenas mais uma maneira de
preencher e aumentar o currículo, mas também
uma forma de interação entre os membros e
uma forma de responder as dúvidas que se
deparam no seu dia-a-dia.
Há quem diga que é importante ressaltar a
preocupação da liga com o aprendizado teórico,
não visando apenas à prática.
4 (0-4)
4 (1-4)
0,795
4 (0-4)
4 (1-4)
0,880
As ligas além de proporcionar conhecimento
técnico, pode possibilitar também trabalhar e
4 (0-4)
4 (3-4) 0,187
aperfeiçoar a arte de se relacionar com diversas
pessoas e em vários níveis de igualdade, onde é
evidente o relacionamento interpessoal entre
várias especialidades médicas e outras áreas da
saúde.
As variáveis estão expressas em mediana (mínimo – máximo) das respostas em escala
tipo Likert a cada uma das questões, de acordo com a participação atual em alguma Liga.
Respostas em escala tipo Likert: 0 = discordo totalmente; 1 = discordo em parte; 2 = não
discordo e nem concordo; 3 = concordo em parte; 4 = concordo totalmente.
Fonte: O autor (2020).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
98
5. DISCUSSÃO
As LAMs têm uma história de quase cem anos de sucesso na formação de
melhores médicos e, no final, na construção de uma sociedade melhor, uma vez que
esses profissionais de saúde podem oferecer melhor assistência à nossa população.11
Este país tem problemas sérios no que diz respeito aos serviços de saúde,
principalmente no sistema público. No entanto, os LAMs devem ser consideradas uma
forma inovadora de oferecer educação para os alunos e cuidados de saúde bem
estruturados para a população carente. Portanto, as escolas médicas devem apoiar
esse tipo de iniciativa fomentando essa via de acesso à cidadania no Brasil.11
Como historicamente as LAMs não são um programa formal das IES
brasileiras, para fornecer vínculo institucional às mesmas e para serem elegíveis para
bolsas e financiamento, elas tem sido registradas como programas de extensão
(também conhecidos como “extensão”), uma iniciativa formalmente reconhecida pelas
IES no Brasil.12
Tendo a identificação do nível de participação dos acadêmicos de medicina da
UNISA em ligas acadêmicas como um dos objetivos para o presente estudo, nosso
resultados evidenciaram uma predominância do gênero feminino entre os
participantes (71,8%) e com faixa etária entre 20 e 25 anos (58,9%).
Estes dados são concernentes ao fato de que é notável, desde a graduação, a
tendência da feminização da Medicina, e que, embora tenha havido um aumento da
média de idade no momento da conclusão do curso de Medicina, e que pode ter
ocorrido por fenômenos que incluem o aumento da média de idade no ingresso do
curso e/ou atraso no processo formativo, por repetência em disciplinas ou trancamento
de matrícula por determinado período durante a graduação13, essa é ainda a faixa
etária média da maioria dos estudantes e que os coloca como pertencentes à geração
millennial, que em breve será a força de trabalho predominante e hoje já representa
quase a totalidade dos médicos residentes14.
Na distribuição por semestres os respondentes se concentraram entre o 1º e 8º
semestres (60%). Importante relatar a participação, ainda que de um único
respondente (1,2%), do 1º semestre do curso. Os demais 40% dos respondentes se
encontravam no 10º e 11º semestres (24,7 e 15,3%, respectivamente) os 2 primeiros
semestres do internato. Estes dados mostram um início de participação no segundo
ano da estada na IES, uma persistência dessa participação no 5º e 6º semestres e
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
99
uma ampla participação no 10º e 11º semestres (40%). A participação de 40% de
respondentes do internato destoa uma pouco de dados anteriores que apontam uma
redução expressiva durante o internato15, apoiada pela evidência de que a maior
motivação apontada para a participação em LAMs seria a aproximação da prática
médica, considerando que o internato deve ser, fundamentalmente, a vivência da
prática médica, e os alunos desta fase não necessitariam buscar em atividades
extracurriculares o que têm em sua prática curricular diária, sendo as LAMs como
meio de incorporar o papel de médico16,17.
O início precoce na participação de LAMs já foi amplamente discutida por Peres
e Andrade18, que evidencia que a importância de participar dessas atividades se dá
desde o início do curso, com o assédio de calouros por veteranos para que cedo, em
sua fase de maior vulnerabilidade emocional, se engajem em alguma atividade, sem
reflexões críticas a respeito da necessidade real de participar. As razões desse
envolvimento seriam fatalmente influenciadas pelas pressões por integração social e
identificação com um novo grupo, bem como pela necessidade de assumir o papel
social de médico17 e permanecem bastante atuais.
A maioria dos respondentes (52,9%) não está participando atualmente de uma
LAM, mas 78,8% pretende entrar para uma LAM (no caso dos que ainda não
participam) ou para outra LAM, no caso dos que participam. 29 ligas, das 44 LAMs
cadastradas e em funcionamento na UNISA no ano de 2020, foram citadas dentre as
que estão nas pretensões dos respondentes e com os maiores índices de citação (5,9%
cada uma), porém não muito maior que as que se seguem na classificação (4,7% até
1,2%), aparecem a Liga Cirurgia Cardiovascular e a Liga Saúde da Família e
Comunidade. Uma de especialidade e outra generalista.
Para além do aspecto da “especialização precoce”8, corroborado pelo topo
do ranking das pretensões dos respondentes da Liga Cirurgia Cardiovascular, há
estudospublicados que apontam, também entre os principais motivos para o ingresso
de estudantes nas ligas, as necessidades de complementar conteúdos curriculares
devido a não visualização de forma concreta do tema proposto pela liga durante a
graduação, de integração e socialização com colegas e aproximação à prática
médica17,19,20,que poderia explicar a citação, também no topo do ranking, da Liga
Saúde da Família e Comunidade.
Predominância daqueles que iniciaram sua participação em LAM no semestre
da coleta de dados (35%), contudo há respondentes que relatam uma participação de
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
100
4 semestres (17,5%).
Considerando que a participação mínima em uma LAM é de 1 ano, ou 2
semestres, uma participação de 4 semestres significa participar uma única vez de 2
LAMs diferentes ou 2 vezes na mesma LAM. Sem desmerecer o eventual ganho nessa
atitude, convêm questionarmos: quão preparado está o estudante para tomar
decisões relativas ao uso de seu tempo? Que ansiedades e crenças lhe povoam o
imaginário, influenciando suas decisões? No caso das LAMs, que satisfações o
estudante nelas deposita para que comprometa seu tempo?17 64,7% dos
respondentes já participou de alguma LAM e não participa mais e na relação de LAMs
listadas como participação anterior estão 34 das 44 LAMs da UNISA e no topo dessa
lista 3 LAMs, sendo 2 de especialidades médicas (Cirurgia Pediátrica - 18,8% e
Trauma - 14,1%) e uma mais generalista (Saúde da Mulher - 17,6%). Tempo de
permanência na LAM que não mais participa variando de 1 (9,9%) a 5 ou mais
semestres (11,3%), com predomínio de 2 semestres (39,4%) e tempo desde o
desligamento de 1 (18,3% - maior índice) a 4 semestres (9,9% - menor índice). Acerca
da motivação para deixar a LAM o maior índice de respostas ficou com a falta de
tempo para participação em LAMs (31%).
Estudos
anteriores
observaram
que
o
envolvimento
em
atividades
extracurriculares, o que inclui as LAMs, para a maioria dos alunos, superava 8 horas
semanais20-22 e conquanto a maioria dos estudantes alegue falta de tempo para
atividades não curriculares em razão da carga horária formal, essa falta de tempo não
os impede de participar de atividades extracurriculares17.
Ao ocupar o tempo livre dos estudantes17, a participação em LAMs pode ainda
reforçar um aspecto negativo de participação nas mesmas, coincidente com o dado
acimaapresentado de falta de tempo para participação em LAMs como motivação para
deixar as mesmas, representado pela falta à atividades curriculares para participarem
das mesmas23, realidade compartilhada por muitas escolas médicas17, não só em
relação às LAMs mas também no que se refere aos cursos preparatórios para a
residência24.
A maioria dos respondentes concorda (69,4% Concordo totalmente + 24,6%
Concordo em parte) que as LAMs representam uma forma de interação entre os
membros e uma forma de responder as dúvidas que se deparam no seu dia-a-dia, que
é importante ressaltar a preocupação da Liga com o aprendizado teórico, não visando
apenas à prática (63,6% Concordo totalmente + 24,7% Concordo em parte) e que as
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
101
mesmas além de proporcionar conhecimento técnico, pode possibilitar também
trabalhar e aperfeiçoar a arte de se relacionar com diversas pessoas e em vários
níveis de igualdade, onde é evidente o relacionamento interpessoal entre várias
especialidades médicas e outras áreas da saúde (77,6% Concordo totalmente + 18,8%
Concordo em parte).
Valendo-se da etimologia, “liga” é a forma substantivada do verbo “ligar” e as
LAMs, enquanto movimentos acadêmicos, permitem ligar o currículo de forma a
diminuir a fragmentação do conhecimento e “ligar” os alunos na busca ativa do
aprender, além, é claro, de ligar as IES e as comunidades na constante troca de
conhecimentos, trazendo contribuições para ambos os lados.25
Por outro lado, as experiências vivenciadas quando da participação nessas
atividades podem contribuir no forjar de profissionais mais maduros, propositivos e
socialmente engajados – o que seria uma real contribuição das LAMs.17
Não é recente a percepção de que a participação em LAMs contribuem para o
exercício da cidadania, a humanização da medicina e possibilitam a aplicação prática
do profissional médico apto a trabalhar em equipe, lidando com diversos ramos
profissionais da área da saúde, com exemplos como o da Liga de Gestão em Saúde
da UERJ, composta por alunos de medicina, enfermagem, odontologia e nutrição25,26.
A ampliação do objeto da prática médica, implícita ou explicitamente, pode ser
mais uma razão para que estudantes procurem LAMs. Tem-se defendido que esta
ampliação é possível quando, por intermédio das mesmas, o estudante atua junto à
comunidade como agente de promoção de saúde e transformação social, e utiliza os
conhecimentos científicos em prol da população27,28. A ação social e o desempenho
da cidadania satisfariam expectativas dos estudantes quanto à concepção idealizada
da medicina, que, em muitos casos, motiva a escolha da profissão. O agir socialmente
através das LAMs incentiva estudantes a delas participarem.17,29,30
Não houve correlação entre a percepção dos alunos quanto à assertiva 1 e sua
idade, semestre e tempo de participação nas LAMs. Quanto ao semestre, o valor de
r foi -0,228, indicando correlação inversa fraca entre as duas variáveis; entretanto, ao
se observar o IC 95%, conclui-se que este valor, na população, pode ser tão baixo
quanto - 0,009 e, desta forma, optou-se por concluir que não há correlação.
Também não houve correlação entre a percepção dos alunos quanto à
assertiva 2 e sua idade, semestre e tempo de participação nas Ligas, pois os valores
do coeficiente estão muito baixos, sempre menores que |0,25|.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
102
Observou-se ainda que não houve correlação entre a percepção dos alunos
quanto à assertiva 3 e sua idade, semestre e tempo de participação nas LAMs. Apenas
quanto ao semestre, o valor de r foi -0,295 indicando possível correlação inversa fraca,
entretanto, ao se observar o IC 95%, concluiu-se que na população pode ser tão baixo
quanto -0,080, optando-se novamente pela ausência de correlação.
Os gráficos de dispersão confirmaram a não correlação entre as variáveis
acima, uma vez que em todos se observou uma nuvem de pontos.
Na análise descritiva da percepção do aluno quanto às questões, de acordo
com o sexo e participação nas LAMs, de maneira geral, observou-se uma semelhança
na proporção das respostas, entre as categorias, tanto de sexo masculino e feminino,
quanto daqueles que participam ou não participam atualmente de alguma LAM. Da
mesma forma, os alunos que tem e não tem pretensão de entrar para alguma Liga
tiveram respostas semelhantes às questões.
Na análise comparativa da percepção do aluno quanto às assertivas e sexo e
participação em LAMs observou-se, pelos valores de p, que não houve diferença nas
pontuações das respostas dos alunos, tanto em relação ao sexo, quanto à
participação ou pretensão de participação em alguma LAM.
Dessa forma as variáveis estudadas no presente (idade, semestre do curso e
tempo de participação nas LAMs) não se demonstram correlação com os resultados
apresentados para as assertivas apresentadas aos mesmos.
As LAMs têm produzido resultados muito interessantes, mas essas iniciativas
ainda dependem da vontade dos alunos de se organizarem, para atrair professores
que queiram se dedicar ao desafio e superar barreiras, como a burocracia para obter
financiamento. Todos esses obstáculos contribuem para um ambiente muito frágil à
perpetuação das ligas. Uma solução para o cenário atual seria mudar o papel passivo
que as IES têm desempenhado até agora e tomar medidas para incentivar a
disseminação das LAMs como atividades extracurriculares formalizadas.12,29
O presente estudo tem como principal limitação o fato de que os dados
analisados foram obtidos a partir de um questionário respondido apenas por
estudantes que voluntariamente se dispuseram a fazê-lo à partir do convite recebido,
o que pode caracterizar um certo viés de seleção da amostra.30.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
103
6. CONCLUSÃO
Interesse quase exclusivo dos acadêmicos por LAM’s de especialidades.
Muitos acadêmicos não participam de LAM’s na UNISA devido à sobrecarga do
internato ou à problemas estruturais da organização das ligas que dificultam o acesso.
Patente a percepção de que as LAM’s possibilitam o crescimento no âmbito pessoal,
trabalhando as relações interpessoais e interprofissionais.
Imperioso ressaltar que fazer parte de um LAM não é uma atividade curricular
obrigatória o que evidencia a automotivação dos alunos para buscar uma educação
melhor.
7. ÉTICA
Este estudo é parte do projeto mãe “STATUS DAS LIGAS ACADÊMICAS EM
ESCOLAS MÉDICAS BRASILEIRAS”, submetido à apreciação do Comitê de Ética em
Pesquisa (CEP) da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP), sob
Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) n. 02071018.0.1001.5415,
e aprovado em 20 de Maio de 2020, com parecer n. 4.038.287.
Em consonância com a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde foi
utilizado no presente projeto o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
104
REFERÊNCIAS
1. Pontes SM, Torreao LA. Influência da participação dos alunos em ligas acadêmicas
na escolha da especialidade para o Programa de Residência Médica Bahia 2017.
Revista de Medicina. 2019;98(3):160. https://doi.org/10.11606/issn.16799836.v98i3p160167
2. Silva DP, Raimundo ACL, Santos IMR, Gomes NMC, Melo PDCR, Santos DS.
Proposição, fundação, implantação e consolidação de uma liga acadêmica. Revista
de Enfermagem UFPE online. 2018;12(5):1486. Doi: https://doi.org/10.5205/19818963- v12i5a234589p1486-1490-2018
3. Silva WBH, Côrtes EMP, Marta CB, Francisco MTR, Silva PO, Santos RM, Ferreira
MA, Neves MP, Lima TA, Machado PRF. Reinvenção das ligas acadêmicas em
período de pandemia e interrupção das aulas presenciais. Glob Acad Nurs.
2020;1(3):e51. https://dx.doi.org/10.5935/2675-5602.20200051
4. da Silva SSF, Cavalcante CBTL, Anizio MS, Nunes BLR, Pinto ACS, de Paula DG.
Perfil e produções das ligas acadêmicas de ciências da saúde no Brasil: revisão
integrativa. Research, Society and Development, v. 9, n. 9, e 743997775, 2020 (CC
BY 4.0) | ISSN 2525-3409 | DOI: http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v9i9.7775
5. Hamamoto Filho PT. Ligas Acadêmicas: motivações e críticas a propósito de um
repensar necessário. Revista Brasileira de Educação Médica, 2011; 35(4), 535–543.
DOI: https://doi.org/10.1590/s0100-55022011000400013
6. de Carvalho e Araújo CR, Lopes RE, Dias, MAS, Ximenes Neto, FRG, Farias QLT,
Cavalcante, ASP. Contribuição das ligas acadêmicas para formação em
Enfermagem. Enferm. Foco 2019; 10 (6): 137-142 137. DOI:
https://doi.org/10.21675/2357- 707X.2019.v10.n6.2802
7. Ferreira DA, Aranha RN, de Souza MH. Academic leagues: a Brazilian way to teach
about cancer in medical universities. BMC Med Educ. 2015;15(236):1-7. DOI:
https://doi.org/10.1186/s12909-015-0524-x
8. Pêgo-Fernandes PM, Mariani AW. O ensino médico além da graduação: ligas
acadêmicas. Diagn Tratamento. 2011;16(11):50-1. Disponível em:
http://files.bvs.br/upload/S/1413-9979/2011/v16n2/a2048.pdf.
9. Conover WJ. Practical nonparametric statistics. New York: John Wiley & Sons,
1998.
10.
Siegel S, Castellan Jr. NJ. Estatística Não Paramétrica para Ciências do
Comportamento. Bookman, 2ª edição, São Paulo, 2006.
11. Torsani MB. The important role of academic leagues (extensions) in Brazilian
medical education. Rev Assoc Med Bras 2019; 65(2):98-98. DOI:
http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.65.2.98
12.
Garcia JBS, Barbosa Neto JO, Rodrigues TA. The role of academic leagues
as a strategy for pain education in Brazil. Journal of Pain Research 2019; 12:1891Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
105
1898. DOI: http://doi.org/10.2147/JPR.S205481
13. Scheffer M, Cassenote A, Guerra A, Guilloux AGA, Brandão APD, Miotto BA et
al., Demografia Médica no Brasil 2020. São Paulo, SP: FMUSP, CFM, 2020. 312 p.
ISBN: 978-65-00-12370-8
14. Tamoto P, Gati RS, Rondina JM, Brienze SLA, Lima ARA, André JC. Learning of
the millennial generation in medical schools. Rev. bioét. (Impr.). 2020; 28 (4): 68392. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1983-80422020284432
15. Peres CM, Andrade AS, Garcia SB. Atividades extracurriculares: multiplicidade
e diferenciação necessárias ao currículo. Rev Bras Educ Med. 2007;31(3):203-11.
16.
Nogueira-Martins MCF, Nogueira-Martins LA, Turato ER. Medical students’
perceptions of their learning about the doctor-patient relationship: a qualitative
study. Med Edu. 2006;40:322-8.
17. Hamamoto Filho PT. Student Leagues: Motivations and Criticisms Regarding a
Necessary Reconsideration. Rev Bras Educ Med. 2011;35(4):535-43.
18. Peres CM, Andrade AS. Atividades extracurriculares: representações e
vivências durante a formação médica. Anais. Ribeirão Preto: FFCLRP-USP, 2004.
https://repositorio.usp.br/item/001393855
19. Tavares AP, Ferreira RA, França EB, Fonseca Júnior CA, Lopes GC, Dantas
NGT et al. O “Currículo Paralelo” dos estudantes de Medicina da Universidade
Federal de Minas Gerais. Rev Bras Educ Med. 2007;31(3):254-65.
20. Taquette SR, Costa-Macedo LM, Alvarenga FBF. Currículo Paralelo: uma
realidade na formação dos estudantes de Medicina da UERJ. Rev Bras Educ Med.
2003; 27: 171- 76.
21. Vieira EM, Barbieri CLA, Vilela DB, Ianhez Júnior E, Tomé FS, Woida FM et al.
O que eles fazem depois da aula? As atividades extracurriculares dos alunos de
ciências médicas da FMRP-USP. Medicina (Ribeirão Preto). 2004;37:84-90
22. Peres CM. Atividades extracurriculares: percepções e vivências durante a
formação médica. Ribeirão Preto; 2006. Mestrado [Dissertação] – Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto. Universidade de São Paulo
23.
Monteiro LLF, Cunha MS, Oliveira WL, Bandeira NG, Menezes JV. Ligas
acadêmicas: o que há de positivo? Experiência de implantação da Liga Baiana de
Cirurgia Plástica. Rev Bras Cir Plást. 2008;23(3):158-161.
24. André JC, Melo JCR, Lima ARA, Brienze SLA, Werneck AL, Fucuta PS.
Preparatory Courses for Residency Examinations and the Avoidance of Practical
Settings: Where Is the Clerkship Student That Was Here? Rev Bras Educ Med.
2019;43(1):105-114. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/198152712015v43n1RB20170127ING
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
106
25. Ferreira DAV, Aranha RN & de Souza MHFO. Academic Leagues: a student
proposal for teaching, research and extension. Interagir: pensando a extensão, Rio
de Janeiro, n. 16, p. 47-51, jan./dez. 2011
26. Mello PPM, Batista LP, Cruz HT et al. Liga Acadêmica de Gestão em Saúde [CD
ROM]. In: Mostra de Extensão do UERJ Sem Muros, 21. 2010 set. 27- out. 1. Rio
de Janeiro, Brasil. Rio de Janeiro: UERJ, 2010. p. 279
27. Torres AR, Oliveira GM, Yamamoto FM, Lima MCP. Ligas acadêmicas e
formação médica: contribuições e desafios. Interface – Comunic. Saúde, Educ.
2008;12(27):713- 20
28. Bastos MG, Andrade CR, Salgado IAS, Paula MT, Brito DJA, Filho NS. Papel
das ligas estudantis de apoio à Nefrologia na prevenção da doença renal crônica. J
Bras Nefrol. 2007;29(1 supl 1):28-31.
29. Goergen DI, Hamamoto Filho PT. Academic leagues: Isolated experiences and
general phenomenon. Revista da AMRIGS, Porto Alegre, 64 (3): 365-372, jul.-set.
2020 365
30. Frissen A, Lieverse R, Drukker M, van Winkel R, Delespaul P, GROUP
Investigators. Childhood trauma and childhood urbanicity in relation to psychotic
disorder. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. (2015) 50:1481–8 doi:
10.1007/s00127-015-1049-7
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.83243-83269 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
107
CAPÍTULO 06
ANÁLISE BIBLIOMÉTRICA DOS ARTIGOS DA BASE DE DADOS DA SCOPUS SOBRE A
PRODUÇÃO CIENTÍFICA BRASILEIRA DA COVID-19
Tiago Rodrigo Lutzer Tizotte
Mestre em Desenvolvimento Regional pela UNIJUI
Participa do Grupo Interdisciplinar de Estudos em Gestão e Políticas Públicas,
Desenvolvimento, Comunicação e Cidadania – GPDeC.
E-mail: tiago.tizotte@hotmail.com
Nelson José Thesing
Doutor em Integração Regional
Professor do Departamento de Ciências Administrativas, Contábeis, Econômicas e
da Comunicação. Integra o Corpo Docente do Programa de Pós-graduação Stricto
Sensu em Desenvolvimento Regional e faz parte do Grupo Interdisciplinar de
Estudos em Gestão e Políticas Públicas, Desenvolvimento, Comunicação e
Cidadania – GPDeC
E-mail: nelson.thesing@unijui.edu.br
Fabiana Baptista Meurer Gomes
Mestranda em Desenvolvimento Regional pela UNIJUI
Participa do Grupo Interdisciplinar de Estudos em Gestão e Políticas Públicas,
Desenvolvimento, Comunicação e Cidadania – GPDeC
E-mail: fabiana.gomes@sou.unijui.edu.br
RESUMO: Este trabalho expôs como objetivo analisar as principais características
dos artigos da base de dados da Scopus sobre a produção cientifica brasileira da
COVID-19. Sendo empregada a bibliometria enquanto técnica estatística e
quantitativa de medida dos índices de produção e disseminação do conhecimento
científico, os tópicos de interesse, como título, resumo e corpo de texto foram
exportados da base de dados da Scopus e processados pelo software de análise
bibliométrica VOS viewer(R). Constata-se, o grande valor do assunto tratado em
virtude de sua importância mundial e, da vasta literatura existente. Ao final, são
difundidas sugestões para futuros estudos.
PALAVRAS-CHAVES: Covid-19; Bibliometria; Pandemia.
ABSTRACT: This work aimed to analyze the main characteristics of the articles in the
Scopus database on the Brazilian scientific production of COVID-19. Bibliometrics
being used as a statistical and quantitative technique for measuring the production and
dissemination of scientific knowledge indices, topics of interest such as title, abstract
and body of text were exported from the Scopus database and processed by the
bibliometric analysis software VOSviewer (R). It is verified the great value of the subject
dealt with due to its worldwide importance and the vast existing literature. At the end,
suggestions for future studies are disseminated.
KEYWORDS: Covid-19; Bibliometrics; Pandemic.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
108
1. INTRODUÇÃO
Em dezembro de 2019, foram divulgados os primeiros casos de uma
pneumonia de etiologia desconhecida até então na cidade de Wuhan na China. No dia
7 de janeiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) ratificou que se tratava
de um novo coronavírus, que em 11 de fevereiro de 2020 recebeu o nome de SARSCoV-2, e a doença foi cognominada de COVID-19. A COVID-19 é causada por
infecção com a cepa do vírus coronavírus 2 da síndrome respiratória aguda grave
(SARS-CoV-2).
Tedros Adhanom, Diretor-Geral da OMS “a época esclareceu: “CO” para
corona, “VI” para vírus, “D” para doença e 19 para quando o surto foi identificado pela
primeira vez (31 de dezembro de 2019)” (OMS, 2020). A doença é transmitida
principalmente pela via respiratória quando as pessoas inalam gotículas e partículas
que as pessoas infectadas liberam ao respirar, falar, tossir ou espirrar. Pessoas
infectadas são mais propensas a transmitir COVID-19 quanto mais tempo e mais perto
elas interagem com outras pessoas.
Em casos leves, a recomendação de entidades - como a OMS - é o uso de
fármacos como dipirona e paracetamol. Contudo segundo disposições da OMS (2020),
de 10% a 15% das vítimas da COVID-19 vão precisar de leito de terapia intensiva,
pois apresentarão sinais de insuficiência respiratória e outros agravamentos. Diante
disto, o tratamento envolve a obtenção de via aérea avançada. Sendo necessário o
uso de equipamento de proteção individual durante a intubação oro traqueal.
Pacientes internados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) também devem ser
isolados em leitos apropriados e submetidos a medidas de vigilância padrão. Ao
mesmo tempo, é fundamental frisar que até o presente momento não existe
tratamento precoce contra COVID-19.
Este cenário vem despertando os pesquisadores a estudar a COVID-19 e suas
diversas implicações, estes estudos visam em especial a identificação de vacinas,
tratamentos e as decorrências da doença na vida das pessoas. A relevância teórica
deste estudo se concentra na colaboração para com a discussão acerca da
disseminação de informações sobre a COVID-19 quanto aos demais estudos já
publicados sobre a temática. Desta forma, este trabalho trata-se de um artigo
teórico cujo procedimento metodológico constitui na de revisão bibliográfica e
bibliométrica, dos periódicos disponíveis na base de dados da Scopus, usando como
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
109
palavra-chave “COVID-19”.
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
A pesquisa realizada está conexa a COVID-19 e os seus reflexos na vida da
humanidade, sendo que dentro desse tema aborda-se inicialmente sobre a doença
por coronavírus 2019 (COVID-19), em seguida sobre a bibliometria, por fim apresentase estudos anteriores cuja temática seja a COVID-19 e tenha por metodologia a
utilização da bibliometria. Destaca-se o grande número de estudos recentes sobre a
temática utilizando-se de diversas abordagens e múltiplos autores que tratam sobre a
temática.
2.1 Covid-19
A doença por coronavírus 2019 (COVID-19) é uma doença contagiosa causada
pela síndrome respiratória aguda grave do coronavírus 2 (SARS-CoV-2). O primeiro
caso conhecido foi identificado em Wuhan, China, em dezembro de 2019. Desde
então, a doença se espalhou pelo mundo, levando a uma pandemia contínua. A
transmissão de COVID-19 ocorre quando as pessoas são expostas a gotículas
respiratórias contendo vírus e partículas transportadas pelo ar exaladas por uma
pessoa infectada.
Segundo a orientação técnica da OMS (2020) pessoas infectadas podem
transmitir o vírus a outra pessoa até dois dias antes de apresentarem os sintomas,
assim como as pessoas que não apresentam sintomas. As pessoas permanecem
infecciosas por até dez dias após o início dos sintomas em casos moderados e por até
vinte dias em casos graves. Vários métodos de teste foram desenvolvidos para
diagnosticar a doença. O método de diagnóstico padrão é por detecção do ácido
nucleico do vírus por reação em cadeia da polimerase de transcrição reversa em
tempo real (rRT-PCR), amplificação mediada por transcrição (TMA) ou por
amplificação isotérmica mediada por loop de transcrição reversa (RT-LAMP) de um
cotonete nasofaríngeo.
As medidas preventivas incluem distanciamento social, quarentena, ventilação
de espaços internos, cobertura de tosses e espirros, lavagem das mãos e manutenção
de mãos sujas longe do rosto. O uso de máscaras faciais ou coberturas tem sido
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
110
recomendado pela OMS em ambientes públicos para minimizar o risco de
transmissões.
Os sintomas de COVID-19 são diversos, variando de sintomas leves a graves.
Ossintomas comuns incluem dor de cabeça, perda do olfato e do paladar, congestão
nasal e coriza, tosse, dores musculares, dor de garganta, febre, diarreia e dificuldades
respiratórias. Pessoas com a mesma infecção podem ter sintomas diferentes,
e seus sintomas podem mudar com o tempo. Três grupos comuns de sintomas foram
identificados: um grupo de sintomas respiratórios com tosse, expectoração, falta de ar
e febre; um conjunto de sintomas musculoesqueléticos com dores musculares e
articulares, dor de cabeça e fadiga; um conjunto de sintomas digestivos com dor
abdominal, vômitos e diarreia. Em pessoas sem distúrbios anteriores de ouvido, nariz
e garganta, a perda do paladar combinada com a perda do olfato está associada ao
COVID-19.
Das pessoas que apresentam sintomas, 81% desenvolvem apenas sintomas
leves a moderados (até pneumonia leve), enquanto 14% desenvolvem sintomas
graves (dispneia, hipóxia ou mais de 50% de envolvimento pulmonar em exames de
imagem) e 5%
dos
pacientes
apresentam
sintomas
críticos (insuficiência
respiratória, choque ou disfunção de múltiplos órgãos). Segundo dados apurados pela
OMS pelo menos um terço das pessoas infectadas com o vírus não desenvolve
sintomas perceptíveis em nenhum momento. Esses portadores assintomáticos
tendem a não fazer o teste e podem espalhar a doença. Outras pessoas infectadas
desenvolverão sintomas posteriormente, chamados de "pré-sintomáticos", ou
apresentarão sintomas muito leves e também podem espalhar o vírus.
As medidas preventivas para reduzir as chances de infecção incluem vacinarse, ficar em casa, usar máscara em público, evitar lugares lotados, manter distância
de outras pessoas, ventilar espaços internos, administrar durações de exposição em
potencial, lavar as mãos com água e sabão frequentemente e por pelo menos vinte
segundos, praticando boa higiene respiratória e evitando tocar os olhos, nariz ou boca
com as mãos sujas.
Aqueles com diagnóstico de COVID-19 ou que acreditam que podem estar
infectados são aconselhados a ficar em casa, exceto para obter cuidados médicos,
ligar com antecedência antes de visitar um provedor de saúde, usar uma máscara
facial antes de entrar no consultório do provedor de saúde e quando estiver em
qualquer sala ou no veículo com outra pessoa, cubra tosses e espirros com um lenço
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
111
de papel, lave as mãos regularmente com água e sabão e evite compartilhar utensílios
domésticos pessoais.
A primeira vacina COVID-19 obteve aprovação regulatória em 2 de dezembro
pelo regulador de medicamentos do Reino Unido (MHRA). Ele foi avaliado para status
de autorização de uso de emergência (EUA) pelo FDA dos EUA e em vários outros
países. Inicialmente, as diretrizes dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA não
recomendam nenhum medicamento para prevenção de COVID-19, antes ou após a
exposição ao vírus SARS-CoV-2. Sem uma vacina, outras medidas profiláticas ou
tratamentos eficazes, uma parte fundamental do gerenciamento de COVID-19 é tentar
diminuir e retardar o pico da epidemia, conhecido como "achatamento da curva ". Isso
é feito diminuindo a taxa de infecção para diminuir o risco de os serviços de saúde
serem sobrecarregados, permitindo um melhor tratamento de casos ativos e
atrasando casos adicionais até que tratamentos eficazes ou uma vacina estejam
disponíveis.
Várias medidas são comumente usadas para quantificar a mortalidade, esses
números variam por região e ao longo do tempo e são influenciados pelo volume de
testes, qualidade do sistema de saúde, opções de tratamento, tempo desde o surto
inicial e características da população, como idade, sexo e saúde geral. A taxa de
mortalidade reflete o número de mortes dentro de um grupo demográfico específico
dividido pela população desse grupo demográfico.
Consequentemente, a taxa de mortalidade reflete a prevalência, bem como a
gravidade da doença em uma determinada população. As taxas de mortalidade estão
altamente correlacionadas à idade, com taxas relativamente baixas para os jovens e
taxas relativamente altas entre os idosos. Na verdade, um fator relevante das taxas
de mortalidade é a estrutura etária das populações dos países. Por exemplo, a taxa
de letalidade para COVID-19 é menor na Índia do que nos EUA, uma vez que a
população mais jovem da Índia representa uma porcentagem maior do que nos EUA.
A taxa de letalidade (CFR) reflete o número de mortes dividido pelo número de
casos diagnosticados em um determinado intervalo de tempo. Com base nas
estatísticas da Universidade Johns Hopkins, a proporção global de casos de morte é
de 2,2% (3.813.937 / 176.339.190) em 15 de junho de 2021. O número varia por
região. O CFR pode não refletir a verdadeira gravidade da doença, porque alguns
indivíduos infectados permanecem assintomáticos ou apresentam apenas sintomas
leves e, portanto, tais infecções podem não ser incluídas nos relatórios oficiais de
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
112
casos.
2.2 Bibliometria
As informações elaboradas por meio dos estudos bibliométricos mensuram a
contribuição do conhecimento científico proveniente das publicações em um
determinado campo. Os indicadores de produção são benéficos para o conhecimento
da comunidade científica sobre o sistema em que está inserida. A bibliometria
comporta a observação do estado da ciência por meio da produção científica
registrada em um determinado repositório de dados.
Baseia-se na contagem de artigos científicos, patentes e citações. Dependendo
da finalidade do estudo bibliométrico, os dados podem ser tanto o texto que compõe a
publicação como os elementos presentes em registros sobre publicações extraídos de
base de dados bibliográficos, como nome de autores, título, fonte, idioma, palavrachave, classificação e citações (RAO, 1986; ZHU et al., 1999). A bibliometria auxilia
na identificação de convergências do conhecimento em determinada área, autores e
instituições mais produtivos, e periódicos mais utilizados na publicação de estudos em
determinada disciplina.
Para Nicholas e Ritchie (1978, apud ARAÚJO, 2006), a diferença essencial
entre a tradicional bibliografia e a bibliometria é que esta utiliza mais métodos
quantitativos do que discursivos para uma avaliação objetiva da produção científica.
Ademais, destaca Figueiredo (1977) que a “bibliometria desde sua origem é marcada
por uma dupla preocupação: a análise da produção científica e a busca de benefícios
práticos imediatos para bibliotecas”.
Na presente pesquisa foram utilizados dados de produção científica brasileira
baseada em artigos publicados em periódicos indexados na base de dados da
Scopus. Scopus é uma base de dados científica, médica, técnica e social abrangente
que contém toda a literatura relevante, cujo Editor e Redator é Reed Elservier. Foi
escolhida como fonte de dados bibliográficos para avaliar a relação entre autores,
instituições, estados e áreas do conhecimento dos artigos selecionados.
Como critério de seleção dos dados foi utilizado a categoria com o termo: “Covid19”. Foram considerados artigos brasileiros aqueles que pelo menos um autor possua
filiação com instituições de ensino ou pesquisa brasileiras. Foram selecionados 3.198
artigos científicos, abordando o período de 2019 a 29 de junho de 2021.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
113
2.3 Estudos anteriores
No quadro a seguir constam estudos anteriores os quais utilizaram a
bibliometria como método quantitativo de análise e que possuem como temática relação
com o assunto tratado neste estudo, ou-seja o Covid-19 como tema central
apresentando-se o autor, ano, objetivo e respectivo resultado do estudo:
Quadro 1 – Estudos anteriores
Autor(es)
Ano
Estudo
MELO, Márcio
Uma análise
Cristiano de;
2020 Bibliométric
CABRAL, Elizabeth
das pesquisas
Regina de Melo;
Globais da
ROLIM, Ana Carine
COVID-19.
Arruda; OLIVEIRA,
Rinaldo Eduardo
Machado de;
TAKAHASHI,
Fábio; ARAUJO,
Alisson Costa de;
OLIVEIRA,
Gabriela Aparecida
de; GOMES,
Samantha Dantas
de Holanda;
MACÊDO, Rebecca
Tilie Dantas de.
Objetivo
Resultado
Conhecer a
Dos 1.841 trabalhos
produção científica analisados observou-se uma
global em termos de média diária de publicação
volume de dados, de 18,4 materiais. Quanto ao
tempo de publicação país de publicação, 28,4%
e país de origem, foi (n=523) foram publicados nos
realizada uma análise
Estados Unidos, 19,6%
bibliométrica com (n=360) na Inglaterra e 17,3%
base nas publicações (n=319) na China. A maior
disponíveis nas
concentração de publicações
principais bases de está na semana 12 (n=501)
dados de indexação
seguida da semana 13
de periódicos nos cem
(n=418). Houve um
primeiros dias de
crescimento elevado do
2020; com texto
número de trabalhos a partir
completo e usando o
da semana cinco (5) com
termo "COVID-19". queda na semana 12. O mês
de março concentrou 76,0%
das publicações (n=1400).
Produção
Descrever os
Amostra foi composta por
COSTA, Isabelle 2020 científica em
110 artigos científicos. Os
indicadores
Cristinne Pinto;
periódicos
bibliométricos da
autores principais
dos
SAMPAIO, Rômulo
online sobre o produção científica estudos tinham vinculações
Severo;
novo
com
83 instituições
disponível em
SOUZA,
coronavírus periódicos online que distribuídas em 30 países,
Fernando André
(COVID-19): abordam a Covid-19.
apresentando
Costa de; DIAS
pesquisa
prioritariamente a formação
Thainá
bibliométrica
em medicina. China foi o
Karoline Costa;
.
país que mais publicou,
COSTA
fornecendo grande número
Brunna Hellen
de dados de pesquisa.
Saraiva; CHAVES,
Pacientes infectados pela
Erika de Cássia
Covid-19 e a população em
Lopes.
geral compuseram
as
populações dos estudos e o
ambiente hospitalar foi o
local de desenvolvimento da
maior parte das pesquisas.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
114
O objetivo deste
Foram identificadas 5.570
2020 Mapeamento estudo foi mapear a publicações relacionadas ao
da produção
produção científica
tema. O ano com o maior
científica sobre sobre COVID- 19,
número de publicações foi o
COVID-19.
através de uma
ano de 2020, com 5.560
análise bibliométrica.
publicações. Quanto às
áreas de publicação do
artigo, as que mais se
destacaram foram: Medicina
e Bioquímica, Genética e
Biologia Molecular, com
4.161 e 594 artigos
publicados, respectivamente.
Entre os periódicos, o BMJ
Clinical Research Ed obteve
o maior número de
publicações sobre o tema
pesquisado. China e EUA
foram os países que mais
publicaram artigos e o
idioma mais utilizado foi o
inglês.
CARDOSO, Daniel
Caracterizar a
As publicações se
Análise e
Madeira; LIMA,
produção científica
concentraram entre nações
Miguel de Oliveira; 2020 caracterização
sobre a doença,
que enfrentam ou
da produção
GALVÃO, Luiza
relacionando-a ao enfrentaram situações críticas
científica sobre perfil de distribuição com relação à disseminação
Gomes; BORGES,
a COVID-Q9 e de casos e óbitos do vírus SARS-COV-2 (EUA,
Pauline Martins
sua
Leite.
pelo agravo nos
China, Reino Unido e Itália).
associação
âmbitos global e
Houve destaque para
com a
nacional. Trata- se de
conteúdos da medicina;
mortalidade e estudo bibliométrico a
modalidade artigo;
ocorrência de
Instituição Huazhong
partir do descritor
casos.
University of Science and
“COVID-19” na base
Technology; revista BMJ
Scopus.
Clinical Reseach ED; e autor
Wiwanitkit, V.
VASCONCELOS,
Iara Gomes;
NASCIMENTO
Danilo Alves do.
Fonte: Elaborado pelos autores, com base na pesquisa.
A metodologia empregada neste estudo para a análise dos dados coletados
são apresentados na seção a seguir.
3. METODOLOGIA
O presente estudo acercar-se de uma revisão bibliográfica e bibliométrica
baseada em um conjunto de artigos da base de dados da Scopus sobre a produção
cientifica brasileira da COVID-19. Beuren (2008) destaca que os métodos a serem
utilizados no trabalho científico referem-se à maneira pela qual são obtidos os dados
dos fatos sociais que contemplam a pesquisa relacionando as etapas necessárias
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
115
para a elaboração do estudo. Desta forma, o estudo é classificado de acordo com o
objetivo como descritiva, quanto aos procedimentos como bibliográfica, enquanto que
sua abordagem do problema é qualitativa.
Para a concretização deste estudo, utiliza-se a bibliometria cujo método para
organizar os resultados de pesquisas anteriores e oferece apoio para a tomada de
decisão e a melhoria das práticas de gestão, além de apontar lacunas nos estudos
sobre o consumismo que precisam ser preenchidas. Para realizar o estudo
bibliométrico, se estabeleceu as seguintes etapas: primeiramente ocorreu a definição
do tema; para posteriormente se executar o levantamento bibliográfico e por fim
ocorreu a interpretação dos resultados. O levantamento bibliográfico foi atingido por
meio do banco de dados da Scopus e processados pelo software de análise
bibliométrica VOSviewer(R). Os resultados e análise dos dados coletados são
apresentados na seção a seguir.
4. ANÁLISE DE DADOS
Esta seção do estudo é dedicada em quantificar a produção cientifica brasileira
sobre a COVID-19, desta forma a coleta dos artigos foi realizada através do portal de
periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(CAPES), extraído da base de dados da Scopus (Elsevier) no dia 29 de junho de 2021,
com a seleçãode 3.198 artigos publicados. Na tabela 1 temos a quantidade de estudos
brasileiros sobre a COVID-19 e participações percentuais por ano.
Tabela 1 – Quantidade de artigos sobre a COVID-19 por período - totais e participações percentuais
Ano/Período
2019
2020
2021 (até 29/06/2021)
Total de Publicações
Total de
artigos
4
1.57
7
1.61
7
3.19
8
Participação
percentual
sobre o total
0,13%
49,31%
50,56%
100%
Fonte: Elaborada pelos autores, com base na pesquisa.
Os artigos estão publicados em um total de 160 periódicos, destaque para o
“Cadernos de Saúde Pública” que concentra 74 publicações. A tabela 2 estão
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
116
elencadas os vinte periódicos com mais publicações e respectivo quantitativo de
artigos publicados, cujo conjunto de publicações totaliza 713 artigos e 22,30% das
3.198 publicações.
Tabela 2 – Quantidade de artigos sobre a COVID-19 por periódico - totais e participações percentuais
Periódico
Cadernos de Saúde Pública
Ciência e Saúde Coletiva
Plos One
Revista Brasileira de Enfermagem
Revista de Administração Pública
Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical
Jornal Internacional de Pesquisa Ambiental e Saúde
Pública
Relatórios Científicos
Arquivos Brasileiros de Cardiologia
Epidemiologia e Serviços de Saúde Revista do SUS do
Brasil
Texto e Contexto Enfermagem
Revista Brasileira de Doenças Infecciosas
Revista de Saúde Pública
Revista Jurídica
Fronteiras na Psicologia
Ciência do Ambiente Total
Revista da Associação Medica Brasileira
Revista Gaúcha de Enfermagem
Epidemiologia e Infecção
Estudos Avançados
[...] Demais Periódicos
Total de Publicações
Total de
artigos
publicados
7
4
7
0
6
8
6
5
4
9
4
6
4
2
2
9
2
8
2
4
2
4
2
3
2
3
23
22
22
21
21
20
19
2.48
5
3.19
8
Participação
percentual
sobre o total
2,31%
2,19%
2,13%
2,03%
1,53%
1,44
1,31
0,91
0,88
0,75
0,75
0,72
0,72
0,72
0,69
0,69
0,66
0,66
0,63
0,59
77,70
%
100%
Fonte: Elaborada pelos autores, com base na pesquisa.
No que diz respeito ao idioma dos artigos, por termos como base de pesquisa
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
117
os periódicos publicados na Scopus (Elsevier), torna-se natural que a maioria dos
estudos seja publicada em língua inglesa. A tabela 3 apresenta o detalhamento da
quantidade de artigos por idioma com seus totais e participações. Destaca-se que
dentre os artigos publicados encontram-se artigos publicados em mais de um idioma,
desta forma, o quantitativo total de artigos por idioma é de 3.559.
Tabela 3 - Quantidade de artigos sobre a COVID-19 por idioma - totais e participações percentuais
Idioma
Inglês
Português
Espanhol
Francês
Russo
Italiano
Quantitativo Total por
Idioma
Total de Publicações
Total de
artigos
publicados
2.93
6
556
61
3
2
1
3.55
9
3.19
8
Participação
percentual
sobre o total
91,81%
17,38%
1,91%
2,03%
0,09%
0,05
111,29
%
100%
Fonte: Elaborada pelos autores, com base na pesquisa.
O que se vê ao identificarmos o idioma em qual os artigos foram publicados
observamos que a imensa maioria está publicada em inglês, ou seja 91,81% ou 2.936
artigos. As publicações em língua portuguesa - 556 publicações -, espanhol com 61
publicações fecham a lista dos idiomas com mais publicações. As publicações em
língua francesa, russa e italiana possuem respectivamente três, duas e uma
publicações cada.
No que diz respeito ao ente financiador ou patrocinador (Tabela 4),
identificamos que 53,50% das publicações são provenientes de estudos produzidos
com financiamento de cinco entes. Destaque para o Ministério da Ciência, Tecnologia
e Inovação com 511 artigos e participação sobre o total de 15,98%, o Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico financiou 499 estudos e
participação de 15,60% do total de publicações, completam os cinco primeiros a
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), a
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo e a Fundação Carlos
Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
118
Tabela 4 - Quantidade de artigos sobre a COVID-19 por ente financiador ou patrocinador - totais e
participações percentuais
Financiador/Patrocinador
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do
Estado do RJ
Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA
Instituto Nacional de Saúde
Comissão Europeia
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas
Gerais
Wellcome Trust
Outras/Indefinido
Total de Participação
percentual
artigos
publicados sobre o total
511
15,98%
499
15,60%
Total de Publicações
400
12,51%
199
102
6,22%
3,19%
71
69
44
38
2,22%
2,16%
1,38%
1,19%
37
1.22
8
3.19
8
1,16%
38,39%
100%
Fonte: Elaborada pelos autores, com base na pesquisa.
Por fim, foi realizado o levantamento quanto a área de estudo da amostra
(Tabela 5), a análise dos artigos mostra que o tema possui relação com áreas
multidisciplinares, principalmente com as áreas de medicamento, a qual está
comtemplada em 57,54% dos artigos selecionados, demonstrando a grande
preocupação dos estudos em dar resposta a possibilidade de utilização de
medicamentos no tratamento da doença. As ciências sociais, por sua vez que é uma
ampla área de estudos a qual abranger a forma de desenvolvimento, funcionamento
e organização das sociedades, sendo portanto estudados os aspectos relacionados a
uma sociedade, dentre estes as suas origens e processos históricos, conflitos, e seus
aspectos de desenvolvimento, além de suas características culturais e hábitos. Tem
519 artigos e 16,23% na participação total de publicações.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
119
Tabela 5 - Quantidade de artigos sobre a COVID-19 por área de estudo - totais e participações
percentuais
Área de
estudo
Medicamento
Ciências Sociais
Bioquímica, Genética e Biologia
Molecular
Enfermagem
Imunologia e Microbiologia
Ciência Ambiental
Psicologia
Multidisciplinar
Ciências Agrárias e Biológicas
Ciência da Computação
Engenharia
Matemática
Neurociência
Artes e Humanidades
Profissões de Saúde
Química
Odontologia
Física e Astronomia
Farmacologia, Toxicologia e
Farmacêutica
Negócios, Gestão e Contabilidade
Economia, Econometria e Finanças
Energia
Ciências da Terra e Planetárias
Ciências da Decisão
Ciência de Materiais
Engenharia Química
Veterinária
Total de Publicações
Total de
artigos
publicados
1.840
519
291
Participação
percentual
sobre o total
57,54%
16,23%
240
210
201
142
121
113
100
95
93
91
83
71
67
66
65
63
7,50%
6,57%
6,29%
4,44%
3,78%
3,53%
3,13%
2,97%
2,91%
2,85%
2,60%
2,22%
2,10%
2,06%
2,03%
1,97%
55
45
38
30
27
20
17
16
3.198
1,72%
1,41%
1,19%
0,94%
0,84%
0,63%
0,53%
0,50%
100%
9,10%
Fonte: Elaborada pelos autores, com base na pesquisa.
Identificamos ainda que as áreas de estudos de bioquímica, genética e biologia
molecular - 291 -, enfermagem - 240 -, imunologia e microbiologia - 210 -, ciência
ambiental - 201 -, possuem grande relevância dentre as áreas de estudos abrangidos
pelos artigos sobre a COVID-19, dentre a amostra coletada através do portal de
periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –
CAPES, extraído da base de dados da Socopus (Elsevier).
Nos mapas bibliométricos foram incluídos todos os artigos da base de dados da
Scopus (Elsevier) e que continham em seu título, resumo ou nas palavras-chave a
expressão COVID-19, no dia 29 de junho de 2021, com a seleção de 3.198 artigos
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
120
publicados, com utilização dos termos que apareceram pelo menos 10 vezes em todos
eles. Quanto a definição da escolha do número de termos utilizadas para a criação
dos mapas o software de análise bibliométrica VOSviewer(R) selecionou 1090 termos.
Figura 1 - Temas relacionados ao consumismo – por cluster
Fonte: Elaborada pelos autores, com base na pesquisa com a utilização do software de análise
bibliométrica VOSviewer(R).
Para cada um destes termos, uma pontuação de relevância foi calculada, com
base nessa pontuação, os termos mais relevantes foram selecionados, sendo utilizada
a opção padrão do software ao se selecionar os termos mais relevantes em 60%, ou
seja 326. Nessa análise, o aumento de densidade representado pela maior intensidade
da cor nas figuras é diretamente proporcional à quantidade de repetição dos termos
no material extraído. Assim observa-se a formação de 4 clusters.
Um primeiro cluster com forte ligação os sintomas, mortalidade, risco,
pneumonia, inflamação e medicamento. Um segundo cluster se forma em torno do
primeiro caso, dinamismo atuação e interação. Já o terceiro cluster é formado a partir
das expressões: sentimento, renda, distanciamento, rede, mulher, homem,
participante e sexo. Por fim o quarto cluster possui em seu cerne as expressões:
contexto, lugar, pesquisa, crise, direito e alunos. As figuras 2 e 3 apresentam os
mapas com base nos dados bibliográficos, e são destinados a demonstrar os mapas
de co-autoria, co-ocorrência de palavra-chave, citação, acoplamento bibliográfico ou
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
121
co-citação.
Figura 2 – Mapa de co-citação e citações reciprocas – por cluster
Fonte: Elaborada pelos autores, com base na pesquisa com a utilização do software de análise
bibliométrica VOSviewer(R).
Assim a figura 2 apresenta o mapa dos autores, visualiza-se a formação de seis
clusters. Um primeiro cluster composto por 6 autores: Bozza F. A.; Bozza P. T.; Silva
M. T. T.; Siqueira M. M.; Soares C. N.; Souza T. M. L, tendo ligação a este temos um
segundo cluster formado pelos autores: Hochhegger B.; Marchiori E.; Rodrigues R. S.
e Zanetti G., o cluster central do mapa é composto por quatro autores: Hajjar L. A.; Jr.;
Lima- Costa M. F. e Pereira A., sendo estes os influenciandores das pesquisas
apontadas sobre a COVID-19 no Brasil, dentro da rede de co-citação e citações
reciprocas.
Concluindo a análise do mapa co-citação e citações reciprocas, visualiza-se
que do cluster central derivam dois clusters: Cluster formado pelo autores: de Souza
C. D. F.; Martins-Filhor P. R.; Quintans-Júnior L. J. e Santos V. S. e o Cluster formado
pelo autores: Costa S. F.; Durigon E. L.; Mendes-Correa M. C.; Pinho J. R. R.; Sabino
E. C. e Wendel S., que ainda possui ligação ao ultimo cluster composto pelos autores:
Dolhnikoff M.; Duarte-Neto A. N.; Mauad T. e Saldiva P. H. N. Por fim, após identificar
os principais elementos que circundam a produção cientifica brasileira sobre a COVID19 através da análise bibliométrica dos artigos da base de dados da Scopus, é
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
122
apresentado a seguir a conclusão do respectivo estudo.
5. CONCLUSÃO
A presente revisão bibliográfica e bibliométrica mostra a crescente evolução na
abrangência da pesquisa científica sobre a COVID-19. Entende-se que o objetivo
deste estudo foi atingido, dentro das fronteiras plausíveis relativas ao espaço físico
disponível da amostra, sendo assim, mapeado o estudo do consumismo
especificamente no que tange aos 3.198 artigos que apresentavam como tema a
COVID-19, e que fazem parte da base de dados da Scopus.
A pesquisa realizada está conexa a COVID-19 e os seus reflexos na vida das
pessoas, sendo que dentro desse tema aborda-se inicialmente sobre a doença por
coronavírus 2019 (COVID-19), em seguida discorreu-se sobre a bibliometria,
apresentou-se os estudos anteriores cuja temática seja a COVID-19 tenha por
metodologia a utilização da bibliometria. Destaca-se o grande número de estudos
recentes sobre a temática utilizando-se de diversas abordagens e múltiplos autores
que tratam sobre a temática. A análise dos artigos mostrou que a COVID-19 possui
relação com as mais diversas áreas de estudo, mas principalmente com as área de
medicamentos e das Ciências Sociais.
A observar as naturais limitações desta pesquisa. Uma delas é o extrato da
subamostra estudada: 3.198 artigos da base de dados da Scopus, sendo que esta
delimitação naturalmente excluiu as demais bases de dados e uma infinita quantidade
de publicações. O segundo obstáculo é basicamente, uma consequência inevitável da
rigidez que se impôs à metodologia de análise adotada, pois não se fez esforço algum
de interpretação para a extração de informações primárias. Utilizando-se para tanto da
coleta dos artigos através do portal de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior – CAPES, extraído da base de dados da Socopus
(Elsevier) e para a realização do levantamento bibliográfico foi atingido por meio do
pelo processamento dos artigos coletados pelo software de análise bibliométrica
VOSviewer(R).
Como os elementos analisados são aqueles oriundos estritamente daquilo que
se encontrava na base de dados da Socopus (Elsevier) e do processamento deste
pelo VOSviewer(R), a eventual carência destes elementos, ou até a sua precocidade,
pode ter gerado desvios nos resultados finais. Como sugestões para posteriores
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
123
estudos englobam a pesquisa de outros aspectos bibliométricos dos estudos desta
amostra, tais como os meios e as finalidades das pesquisas. Da mesma forma se
indica que outras pesquisas analisem as citações e cocitações e citações recíprocas
envolvendo os autores dos estudos de uma mesma linha de pesquisa, afim de se
avaliarem a longitudinalmente e as mudanças nas estruturas intelectuais e
consequentemente nas propriedades de um determinado campo de estudo.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
124
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Carlos A. Bibliometria: evolução histórica e questões atuais. Revista em
Questão. Rio de Janeiro. 2006. Disponível em:
https://seer.ufrgs.br/EmQuestao/article/view/16. Acesssado em 26 de junho de 2021.
BEUREN, Ilse Maria (org.). Como Elaborar Trabalhos Monográficos em
Contabilidade: teoria e prática. 3. ed. 2ª reimp. São Paulo: Atlas, 2008.
BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Secretários de Saúde.
Câmara de Educação Superior. Portaria Nº. 383 de 9 de abril de 2020. Dispõe
sobre a antecipação da colação de grau para os alunos dos cursos de Medicina,
Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia, como ação de combate à pandemia do novo
coronavírus – Covid-19. Diário Oficial da União, Brasília, 13 abr. Seção 1, p.24,
2020ª
BRASIL. Ministério da Saúde. Departamento de Informática do SUS (DATASUS).
Painel Coronavírus. 2020b. Disponível em: <https://covid.saude.gov.br/>. Acessado
em: 30 de julho de 2020.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Especializada à Saúde.
Protocolo de Manejo Clínico da Covid-19 na Atenção Especializada. Brasília
(DF); 2020c
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Especializada à Saúde.
Protocolo de Manejo Clínico para o Novo Coronavírus (2019-nCoV). Brasília
(DF); 2020d
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primária à Saúde. Protocolo
de Manejo Clínico do Coronavírus (COVID-19) na Atenção Primária à Saúde.
Brasília (DF); 2020e
CARDOSO, Daniel Madeira; LIMA, Miguel de Oliveira; GALVÃO, Luiza Gomes;
BORGES, Pauline Martins Leite. Análise e caracterização da produção científica
sobre a COVID-19 e sua associação com a mortalidade e ocorrência de casos.
Disponivel em:
http://www.fsj.edu.br/transformar/index.php/transformar/article/view/388. Acessado
em 26 de junho de 2021.
CERVO, Amado Luiz; BERVIAN, Pedro Alcino. Metodologia cientifica para uso
dos estudantes universitários. 3. Ed. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1983.
COSTA, Isabelle Cristinne Pinto; SAMPAIO, Rômulo Severo; SOUZA, Fernando
André Costa de; DIAS Thainá Karoline Costa; COSTA Brunna Hellen Saraiva;
CHAVES, Erika de Cássia Lopes. Produção científica em periódicos online sobre
o novo coronavírus (COVID-19): pesquisa bibliométrica Disponivel em:
https://www.scielo.br/j/tce/a/hJLtfNKkGCRLgVhLDddxwKJ/?lang=pt. Acessado em 26
de junho de 2021.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
125
COSTAS, R. Discussões gerais sobre as características mais relevantes de
infraestruturas de pesquisa para a cientometria. Bibliometria e Cientometria no
Brasil: infraestrutura para avaliação da pesquisa científica na Era do Big Data. p. 1942, 2017.
FIGUEIREDO, Nice. Tópicos modernos em Bibliometria. 1. ed. Brasília:
Associação dos Bibliotecários do Distrito Federal, 1977.
FONSECA, Edson Nery da (Org). Bibliometria: teoria e prática. São Paulo: Cultrix,
Ed. da USP, 1986.
GUEDES, Vânia; BORSCHIVER, Suzana. Bibliometria: uma ferramenta estatística
para a gestão da informação e do conhecimento, em sistemas de informação, de
comunicação e de avaliação científica e tecnológica. In: CINFORM – ENCONTRO
NACIONAL DE CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 6, 2005, Salvador. Anais... Salvador:
ICI/UFBA, 2005.
GUEDES, Vania Lisboa da Silveira. A bibliometria e a gestão da informação e do
conhecimento cientifico e tecnológico uma revisão da literatura. PontodeAcesso,
v. 6, n. 2, p. 74-109, 2012.
OMS. Organização Mundial de Saúde. Coronavirus disease (COVID-19)
pandemic. Disponivel em: https://www.who.int/emergencies/diseases/novelcoronavirus-2019. Acessado em 26 de junho de 2021.
MELO, Márcio Cristiano de; CABRAL, Elizabeth Regina de Melo; ROLIM, Ana Carine
Arruda; OLIVEIRA, Rinaldo Eduardo Machado de; TAKAHASHI, Fábio; ARAUJO,
Alisson Costa de; OLIVEIRA, Gabriela Aparecida de; GOMES, Samantha Dantas
de Holanda; MACÊDO, Rebecca Tilie Dantas de. Uma análise bibliométrica das
pesquisas globais da COVID-19. Disponivel em:
https://www.researchgate.net/publication/341554230_Uma_analise_bibliometrica_da
s_ pesquisas_globais_da_COVID-19. Acessado em 26 de junho de 2021.
RAUPP, Fabiano Maury., BEUREN, Ilse Maria. Metodologia da pesquisa aplicável
às ciências sociais. In: Ilse Maria Beuren. (Org.). Como elaborar trabalhos
monográficos em contabilidade: teoria e prática. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
VASCONCELOS, Iara Gomes; NASCIMENTO Danilo Alves do. Mapeamento da
produção científica sobre COVID-19. Disponivel em:
https://www.iajmh.com/iajmh/article/view/134/160. Acessado em 26 de junho de
2021.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.73457-73474 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
126
CAPÍTULO 07
FERRAMENTAS DA GESTÃO DA QUALIDADE UTILIZADAS PELAS EMPRESAS COMO
ESTRATÉGIA DE SOBREVIVÊNCIA EM TEMPOS PANDÊMICOS
Virginia Tomaz Machado
Mestra em Sistemas Agroindustriais – PPGSA
Professora da Faculdade Santa Maria – FSM
BR 230, Km 504, Bairro Cristo-Rei; Cajazeiras, PB
E-mail: vtmachado@hotmail.com
Pavlova Christinne Cavalcanti Lima
Doutora em Administração Professora da Faculdade Santa Maria – FSM
BR 230, Km 504, Bairro BR 230, Km 504, Bairro Cristo-Rei; Cajazeiras, PB
E-mail: pchristinne@hotmail.com
Ícaro Ramalho Dionísio
Mestre em Sistemas Agroindustriais - PPGSA
Professor da Faculdade Santa Maria – FSM
Rua João Bosco de Menezes Pereira, SN, Maria Singular de Brito; Bom Jesus, PB
E- mail: icaro@fsm.edu.br
Marcelo Oliveira Feitosa
Mestre em Administração
Coordenador e professor do curso de Administração da Faculdade Santa Maria –
FSM BR 230, Km 504, Bairro Cristo-Rei; CEP: 58900-000; Cajazeiras, PB
E-mail: marcelofeitosafsm@gamil.com
Fernando Antônio Portela da Cunha
Pós-doutor em Química
Professor do curso de Química da Universidade Federal de Campina Grande –
UFCG, campus Cajazeiras
Rua Sérgio Moreira de Figueiredo, S/N; Populares; Cajazeiras, PB
E-mail: fportela.ufcg@gmail.com
Luiz Carlos Machado de Souza Filho
Mestre em Direito Canônico
Reitor e professor do Seminário Diocesano da Paraíba
Rua: Bananeiras, 203; Manaíra; João Pessoa; PB
E-mail: peluizcarlos@hotmail.com
RESUMO: Imerso a um cenário de pandemia, provocada pelo COVID-19, as
empresas precisaram se adaptar a uma nova realidade mercadológica. Nesse
contexto, as mesmas precisam aprimorar a gestão dos processos digitais, como meio
de propagação para os serviços e produtos, porém sem perder a qualidade. Com este
cenário, percebe-se a importância de estudar com mais profundidade a gestão da
qualidade com ferramentas capazes de viabilizar a sobrevivência e crescimento das
organizações. Constituiu como objetivo desta pesquisa analisar as ferramentas da
qualidade utilizadas pelas empresas na cidade de Cajazeiras-PB, para alcançar as
metas pré-estabelecidas com eficiência, mesmo em um cenário conturbado de
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
127
isolamento social, dando aporte para futuros estudos da gestão contemporânea no
que se refere à qualidade e suas ferramentas em cenários adversos. A metodologia
utilizada foi de uma pesquisa exploratória, descritiva, um estudo de multicaso. De
abordagem quantitativa, os sujeitos da pesquisa foram constituídos de uma
amostragem de 100, comtemplando gestores e proprietários, número este suficiente
para o propósito das análises, no qual preencheram, por livre e espontânea vontade,
um questionário estruturado, aplicado de forma digital, utilizando a plataforma do
Google forms. A pesquisa foi realizada nos períodos de março a maio de 2020. Tendo
como resultado que são poucas as empresas que utilizam as ferramentas da
qualidade em seu processo de gestão, porém as empresas que utilizam a gestão da
qualidade com suas ferramentas obtiveram maior êxito, sendo fundamental para
planejar, controlar, apoiar, gerir e nortear decisões de forma mais assertiva, para a
manutenção e sobrevivência das empresas, de modo que seus objetivos foram
atingidos com sucesso, pois quanto maior o conhecimento dos gestores sobre as
ferramentas da gestão da qualidade, maior a chance da empresa chegar ao seu nível
de excelência desejado.
PALAVRAS-CHAVE: Empresas; Gestão da qualidade; Ferramentas da qualidade;
Pandemia, Covid-19.
ABSTRACT: Immersed in a pandemic scenario caused by COVID-19, companies
needed to adapt to a new market reality. In this context, they need to improve the
management of digital processes, as a means of propagation for services and products,
but without losing quality. With this scenario, we can see the importance of studying
quality management more deeply with tools capable of enabling the survival and
growth of organizations. The objective of this research was analyzing the quality tools
used by companies in the city of Cajazeiras-PB to achieve the pre-established goals
efficiently, even in a troubled scenario of social isolation, providing support for future
studies of contemporary management about quality and its tools in adverse scenarios.
The methodology used was an exploratory, descriptive research, a multi-case study.
From a quantitative approach, the research subjects were constituted of a sample of
100 managers and owners, a number sufficient for the purpose of the analyses, in which
they filled out by free will a structured questionnaire, applied digitally, using the Google
Forms Platform. The research was conducted from March to May 2020. Resulting in the
few companies that use quality tools in their management process, but companies that
use quality management with their toolshave been more successful, being fundamental
to plan, control, support, manage and guide decisions more assertively, for the
maintenance and survival of companies, so that their goals have been successfully
achieved. Because the greater the knowledge of managers about the tools of quality
management, the greater the chance of the company reaching its desired level of
excellence.
KEYWORDS: Enterprises; Quality Management; Quality Tools; Pandemic; Covid-19.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
128
1. INTRODUÇÃO
A empresa, independente do seu tamanho, constitui agente importante na
promoção do emprego, inovação, criação de rendimentos, no crescimento e
desenvolvimento econômico e social. (MACHADO et al. 2021).
O mundo está vivenciado uma crise econômica sem precedentes com as
empresas fragilizadas economicamente, assoladas pela pandemia provocada pela
doença da Covid- 19, levando muitas a fecharem suas portas com o lockdown, como
medida de proteção sanitária, medida está sobre o norteamento da Organização
Mundial da Saúde (OMS), pegando todas as empresas desprevenidas. Com isto nunca
foi tão importante a utilização de uma gestão de qualidade eficiente, com a utilização
de ferramentas adequadas, na tentativa de manter-se no mercado. (JUNIOR, et al.
2008).
Diante do exposto acima, faz-se necessária a utilização das ferramentas de
gestão tática da Qualidade, utilizadas pelas organizações na busca da melhor
estratégia para o desempenho institucional. A importância da aplicação dessas
ferramentas serve para orientar nos processos para uma tomada mais assertiva das
decisões, aumentando a produtividade, dando mais visibilidade à empresa com seus
produtos ou serviços.
Percebe-se que as ferramentas de gestão da qualidade envolvem o
desenvolvimento, a operacionalização, a avaliação e o processo de melhoria,
principalmente a execução do planejamento, com ações, táticas, padrões,
posicionamento e perspectivas que possam contribuir com as melhores decisões a
serem tomadas pelas empresas, principalmente em meio a uma crise mundial
provocada pela doença da Covid-19. Ou seja, o caminho necessário a ser seguido
pelo empresário para o planejamento, inovação e criação, programação, execução,
organização, direção, coordenação, controle e avaliação da empresa. (COSTA, 2013).
Para tanto, as organizações que não aplicam essas ferramentas têm
dificuldade em desenvolver estratégias de ação, pelo fato do gestor não conseguir
perceber com propriedade os indicadores, não ter aptidão em desenvolver uma gestão
integrada eficiente, diante da escassez de dados referente aos recursos, sejam eles
tecnológicos, naturais e/ou do capital humano, impossibilitando, assim, uma tomada
de decisão assertiva por parte da gerência, enfrentando dificuldades em se manter no
mercado. (BRASIL, 2011).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
129
A importância da aplicação das ferramentas de gestão nas organizações é
desencadear pesquisas que alcancem correlacionar a competitividade nas empresas
que utilizem as ferramentas, contrapondo-se as que atuam sem a utilização adequada
e/ou sem planejamento das mesmas. Para estas, o baixo nível de competitividade
está relacionado, entre outras causas, à ineficiência das práticas gerenciais de
ferramentas
que
possibilitem as
empresas
utilizá-las
adequadamente
no
gerenciamento de tecnologias necessárias à atividade fim, já para as que utilizam
mostrar os benefícios com o uso dessas ferramentas, possibilitando que as empresas
se tornem cada vez mais independentes e competitivas no mercado.
Como forma de aprofundar o assunto sobre a gestão da qualidade nas
empresas e a importância da utilização de suas ferramentas, chegou-se à seguinte
questão norteadora do trabalho de pesquisa: como as ferramentas da gestão da
qualidade contribuem para a sobrevivência das empresas da cidade de Cajazeiras –
PB, inseridas em uma crise acentuada que assola o mundo com a pandemia da Covid19?
De acordo com a análise situacional das empresas no Brasil, no qual o mercado
vivencia sinais reativos, com a crescente inflação, a Bolsa de Valores em constante
queda e o dólar nas alturas, percebe-se a importância de estudar com mais adentro a
gestão da qualidade com suas ferramentas, capazes de viabilizar a sobrevivência e
crescimento da organização neste mercado. Propondo que se faça necessário a
busca por excelência na qualidade de sua gestão. Para isto, as empresas devem
acompanhar seus processos de melhoria e se adaptarem aos novos padrões
tecnológicos inovadores do mercado. (MACHADO et al., 2021).
2. CRISE DA PANDEMIA CAUSADA PELO COVI-19
Segundo Machado et al. (2021), a pandemia causada pelo novo coronavírus
atingiu de forma holística todos os países, provocando uma crise econômica mundial.
Na contenção da pandemia foi implementada medidas de segurança, como o
lockdown, o isolamento social, a proibição da aglomeração populacional, o fechamento
das atividades não essenciais, tudo isto ocasionou o aumento do desemprego,
falência
de estabelecimentos
comerciais
e,
consequentemente,
uma
crise
socioeconômica no mundo.
Foi preciso a ação dos representantes legais, principalmente dos emergentes,
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
130
de forma coordenada e rápida com as demais esferas, no sentido de regularizar as
condições de segurança no comércio, indústria e serviços, para que a economia
continuasse a funcionar, de forma a tornar o ambiente laboral seguro, com condições
de proteção para a realização das funções, porém priorizando as vidas humanas.
(SANTOS, et al. 2000).
Os efeitos da recessão mundial afetam tanto aqueles que desenvolvem
atividades laborais quanto os que perderam seus empregos, o cenário brasileiro
encontra-se com alta taxa de desempregados. A ameaça da perda do emprego,
modos de existência e relações com parceiros de trabalho gera uma série de tensões.
As fontes do estresse são encontradas em grau elevado nos processos laborais
rotineiros, mas também na percepção gerada por salário decrescente diante do
aumento da inflação e pela instabilidade no emprego (SELIGMANN-SILVA, 2011).
No Brasil, desde março de 2020, o distanciamento social tem sido
constantemente solicitado pelos governantes, pelo fato da elevada taxa de contágio e
mortes no país. Segundo o site do Ministério da Saúde, no Brasil, no dia 03 de
novembro de 2020, existiam 5.394.128 casos confirmados da doença, 4.835.915
recuperados, 401.079 casos em acompanhamento e com 157.163 óbitos; em março
de 2021, este número está chegando a quase 500 mil óbitos. (BRASIL, 2020).
Ao longo da história, observou-se que, com o capitalismo em ampliação, com
uma economia complexa, as crises são mais frequentes, pois elas constituem um
desenvolvimento cíclico, dependente do próprio processo econômico. São alterações
periódicas e alternadas de comunicação e contração das atividades econômicas, e
podem ocorrer com diferentes intensidades e em todos os seguimentos. Com o
surgimento da Covid-19, aumentaram os gastos com o sistema de saúde, no aumento
do desemprego, na desaceleração econômica, que vem acentuando a crise de forma
mais agravante do que a crise financeira global de 2008, e a Grande Depressão
(THOMPSON, 2013).
Com isto, dada as circunstâncias descritas acima, os mercados de ações
chegaram a ter queda de, em média, 50%, mundialmente, os mercados de crédito
congelaram, com falências em massa, taxas de desemprego em ascensão acima de
10%, e o Produto Interno Bruto (PIB) contraiu-se a uma taxa anual de 10%, dentro de
um processo contínuo nos últimos três anos. Na atual crise do Covid-19, resultados
macroeconômicos e microeconômicos sociofinanceiros igualmente se materializaram
em apenas três semanas. (SENTANIN, BARBOSA, 2005).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
131
Ainda segundo o autor supracitado, outros argumentos para a crise se dar pelo
fato do componente da determinação agregada ao consumo, gasto de dinheiro,
exportações estar em declínio sem precedentes. O isolamento social, o desemprego, a
inflação e outros fatores têm sido
determinantes
para
esta
desaceleração
econômica, com uma queda acentuada no primeiro trimestre de 2020, repetindo-se
nos dois trimestres seguintes, fica claro que a crise do Covid-19 é completamente
diferente e bem mais intensa que as demais já vivenciadas.
Além disso, o período de crise que hoje afeta grande parte dos países foi
significante para crivar os negócios que realmente têm propostas de valor aos clientes,
através de uma gestão mais eficiente e assertiva em suas decisões. (SENTANIN,
BARBOZA, 2005).
3. ADMINISTRAÇÃO DA QUALIDADE: conceito
O termo qualidade é um tema debatido e difundido junto à sociedade, com as
empresas se adaptando a uma nova realidade de um mundo digital, no qual o uso da
tecnologia se faz necessário para a manutenção de suas atividades, e a qualidade
precisa está envolta a todos os processos, aparecendo ao lado de outros, como
produtividade, sobrevivência, globalização, tecnologia, redes sociais, competitividade,
integração, ecologia, entre outros.
Nesse sentido, qualidade é tanto aplicada como atributo de produtos e serviços,
que satisfazem a quem se destina (clientes), como é definida como um modo de
organização de empresas que objetivam produzir produtos e serviços com o atributo
qualidade. (WHO, 2020).
Com isto, autores de renome na área, como Crosby, Deming, Feigenbaum e
Juran definem o significado da qualidade de abordagem diferente.
Deming (1990) relata que qualidade não pode ser um espírito de riqueza, mas
aquilo que satisfaz o cliente com o que necessita e o que é desejado. Como as
expectativas dos clientes estão sempre mudando, a solução para conceituar
qualidade é definir constantemente as especificações.
Já para Juran (1991), a qualidade é o conjunto planejado de ações, repleta de
objetivos pelos quais atinge a adequação ao uso, não importa em que parte do
processo na organização essas atividades são efetivadas.
Para Crosby (1992), a qualidade é a conformidade com as normas das
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
132
especificações, quando você tenta fazer certo da primeira vez, deve ter o esforço de
todos. A qualidade se encontra uma arma preventiva, por sua vez, origina-se do
treinamento, exemplo, disciplina, liderança e persistência. O nível padrão do
desempenho da qualidade é o defeito zero, ou seja, falhas não são toleradas.
Para Feigenbaum (1994), a qualidade faz parte da gestão, um modo de vida
corporativo, uma forma de gerenciar envolvendo todos os colaboradores, pois o
resultado e controle de qualidade produz impacto positivo em toda empresa. A
qualidade deve ser guiada pela excelência e não pelos defeitos.
A qualidade é a razão de ser da empresa, um esforço amplamente
compensador por muitas razões: minimiza custos, racionaliza processos; reduz os
desperdícios; elimina o retrabalho e acaba com a burocracia e os controles em
excesso; dá o direcionamento certo, pois o compromisso com a qualidade alinha os
laços da organização com a clientela em permanente e sistemática troca de
informações, o que conduz a aperfeiçoamentos e inovações de sucesso garantido; a
sua prática amplia a percepção do gestor para novos negócios, novas oportunidades
e qualifica a empresa para novas ideias mercadológicas. Esses são resultados do
permanente enfoque no cliente e em todas as suas necessidades e aspirações.
(COSTA, 2013).
4. AS FERRAMENTAS DA GESTÃO DA QUALIDADE
Segundo Costa (2013), a implantação da qualidade, em qualquer segmento de
mercado, só é possível através da aplicação no desenvolvimento de métodos e
técnicas, que após uma avaliação possa demostrar a contribuição através dos
resultados que a qualidade insere na organização.
O primeiro conjunto de técnicas da Qualidade envolve as “ferramentas”, que
segundo Paladini (2003, p.66), “[...] são dispositivos, procedimentos gráficos,
numéricos ou analíticos, formulações práticas, esquemas de funcionamento,
mecanismos de operação, enfim métodos estruturados para viabilizar a implantação
da Qualidade”. Cada ferramenta refere-se a uma área do desenvolvimento do projeto
ou da execução do sistema de qualidade ou, ainda, na avaliação ou controle de seu
desempenho, isto é, dentro de um processo existem ferramentas específicas para
cada etapa, objetivando aquilo que é almejado pelo setor estratégico da empresa.
Prosseguindo, o autor supracitado afirma que existem muitas ferramentas em
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
133
uso para a implantação do sistema da Qualidade na empresa. Serão apresentadas a
seguir algumas das ferramentas mais utilizadas pelas organizações, com suas
funções e definições.
4.1 Diagrama causa-efeito
Segundo Filho, (2004), o Diagrama de Ishikawa é a análise das possíveis
causas de um problema, também conhecido como Diagrama de Causa e Efeito.
Portanto, entende-se que é uma ferramenta de grande utilidade, pois permite
conhecer os problemas cada vez mais a fundo, de fácil adequação dentro da
organização, permitindo a participação de todos os grupos da empresa.
Depois de ter a definição do problema, e com a lista de ideia de como solucionálo, as causas principais são separadas daquelas de segundo plano, isso pode ser
realizado através da utilização da análise dos “por que, o que, onde, quando, quem e
como”, isto é, 5W2H outra ferramenta da qualidade (PALADINI, 2003).
Para que seja construído o diagrama completo, com todas as anuências, fazse necessária a participação do maior número de pessoas envolvidas com o processo,
e que as causas relevantes não sejam omitidas. Para buscar quais as causas do
problema, é interessante que a técnica chamada de brainstorming seja utilizada
durante a reunião, conhecida também como “tempestade de ideias”.
4.2 Histogramas
Segundo Junior et al. (2008), os histogramas é um instrumento muito conhecido
na Estatística Clássica. Sua aplicação na gestão da Qualidade tem um número
considerável de utilidades.
Entende-se que o histograma é importante para identificar o comportamento
típico das características agrupadas por faixas, fornecendo informações com a
finalidade de obter uma fácil visualização da distribuição de conjuntos de dados, no
qual é evidenciada uma frequência e medições.
Para construir um histograma é simples, basta marcar, na reta horizontal, as
medidas; na reta vertical, serão escritas as frequências de ocorrências dos intervalos
ou das medidas. A construção da curva de dados aparecerá em cima dos retângulos
erguidos, a partir e entre os intervalos de medidas (PALADINI, 2003).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
134
Para tanto, é a partir da construção do histograma que se obtém informações
viáveis para reduzir a variabilidade dos processos empresariais.
4.3 Gráfico de pareto
Segundo Junior et al. (2008), o Diagrama de Pareto admite classificar os
elementos do processo seguindo pelo nível de importância na contribuição de cada
um deles para o processo completo, permitindo segmentar os elementos em
categorias, grupos ou classes.
Essa ferramenta auxilia o gestor a identificar o ambiente, no qual existe o maior
número de ocorrências de situações problemas, priorizando ações, tornando
possível a visibilidade de metas numéricas viáveis de serem almejadas. Os estudos
são estabelecidos a uma escala de valor numérico, formado de medidas em
unidades financeiras, percentuais, frequências de ocorrência, número de itens, entre
outros (PALADINI, 2003). Sendo assim, é através
informações
são
unidas, identificando
desta
ferramenta
os números de não
que
as
conformidade
encontrados em um determinado processo.
4.4 Fluxogramas
Os fluxogramas são representações gráficas das fases que constitui um
processo de forma a permitir, simultaneamente, uma visão global e, principalmente,
das características que compõem cada uma das etapas e como elas se relacionam
entre si. (PALADINI, 2003).
Os fluxogramas empregam símbolos padrões que identificam e mostram cada
operação básica ou secundária de um processo holístico.
Os Fluxogramas são uma ferramenta que têm como finalidade facilitar a
compreensão do processo, identificando os gargalos e oferecendo mecanismo de
ação extremamente útil para decisões típicas da gestão de qualidade.
4.5 5W2H
Ferramenta usada no mapeamento, organização e padronização de processos,
na elaboração estratégica de um plano de ação e desenvolvimento de procedimentos
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
135
associados a indicadores. (PALADINI,1997).
De acordo com Junior et al. (2008), 5W2H representa as iniciais de palavras
em inglês, com 5 (cinco) delas indicadas por “W” e 2 (duas) delas indicadas por “H”.
São why (por que), what (o que), where (onde), when (quando), who (quem), how
(como) e how much (quanto custa). Com a sua utilização, surgiu a necessidade de
uma variação com a inclusão de mais um “h”, e passou a chamar 5W3H, o terceiro “h”
refere-se a how many (quantos).
4.6 Balanced scorecard (BSC)
Segundo Kaplan e Norton (1997), o Balanced Scorecard é uma inovação na
estratégia das empresas, pois, através da sua atuação sob as quatro expectativas
(financeira, clientes, processos internos, crescimento e aprendizagem), consegue
mapear diversas áreas de uma organização, com o intuito de cumprir as metas
estabelecidas.
Entende-se que as quatro expectativas citadas acima, constituem os pilares do
sistema BSC, permitindo uma gestão mais eficiente, induzindo medir o desempenho
da organização, proporcionando o sucesso empresarial.
4.7 Diagrama de similaridade
O diagrama define níveis de similaridades entre informações relativas a um
dado processo ou produto. Além disso, é uma ferramenta que exige um grau maior
de criatividade do que da lógica, pois, de acordo com Paladini (1997, p. 85), procura
“agrupar informações que parecem pouco relacionadas em situações em que procura
determinar níveis de importância entre si”. Por trabalhar com informações que se
completam, as equipes responsáveis pelo desenvolvimento do diagrama terão que
ser divididas de acordo com a experiência prática, conhecimentos e áreas de atuação.
O que permite que um problema seja analisado por vários pontos de vista, fazendo
com que todas as dimensões que a questão apresenta sejam selecionadas
(PALADINI, 2003).
Esta ferramenta obtém maior resultado quando existe uma grande
diversificação de informações e fontes de coleta, pois isso facilita no momento da
elaboração do diagrama que tem como objetivo propor maneiras simplificadas e
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
136
eficientes de solucionar os problemas.
5. METODOLOGIA
O objetivo desse capítulo é apresentar uma exposição detalhada dos
procedimentos adotados no direcionamento do estudo, na coleta das informações, no
tratamento e análise dos dados. Dessa forma, permitiu uma melhor compreensão do
trabalho em questão.
Foi realizada a pesquisa sobre a caracterização da importância das
ferramentas gerenciais da qualidade, como fator crucial para a sobrevivência e
competitividade das empresas da cidade de Cajazeiras-Brasil, em meio a um cenário
de pandemia provocada pela Covid-19.
Uma pesquisa do tipo descritiva e um estudo de multicaso, classificado como
exploratório. Esse tipo de trabalho tem como característica métodos flexíveis e pouco
estruturados, assim foi possível analisar diversos aspectos ligados ao tema. (Vergara,
2008).
Conforme Gil (2002), a pesquisa descritiva apresenta características de
determinada população, amostra ou de determinado fenômeno. Pode também
estabelecer correlações e relações entre variáveis e apresentar sua natureza. Não
tem compromisso em explicar os fenômenos que descreve, embora sirva de base para
tal explicação.
Quanto à abordagem adotada, desenvolveu-se através do método quantitativo.
Sendo assim, os dados coletados serão submetidos às técnicas estatísticas,
trabalhando com quantidades, percentuais e análise do cenário quanto à utilização
das ferramentas de gestão da qualidade.
O método utilizado foi o de estudo de multicaso. Uma pesquisa survey, que é
descrito para a obtenção de dados, opiniões de um determinado grupo de pessoas,
representante de uma população-alvo, amostra, por meio da aplicação de um
instrumento de pesquisa. (Vergara, 2008).
A pesquisa foi realizada em 100 empreendimentos, situados no município de
Cajazeiras, que está localizada no ocidental do estado da Paraíba, Brasil, Região
Nordeste do país, localizada a 468 (quatrocentos e sessenta e oito) quilômetros da
capital do estado, João Pessoa. A população, segundo dados do IBGE (2017), era de
61.776 habitantes, sendo o sétimo município mais populoso da Paraíba.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
137
O município, diante do seu vertiginoso crescimento agropecuário, vivenciado
nos últimos 15 anos, sofre também um crescimento na economia devido à abertura
de um grande número de novos empreendimentos educacionais, hoje conta com três
Faculdades privadas e três públicas, com a emigração de estudantes que firmaram
moradia na cidade, e, consequentemente, o aumento da demanda gerou o interesse
de empresários por conquista de novos espaços no mercado.
A amostra desta pesquisa selecionou 100 empresas escolhidas pelo critério de
inclusão através do retorno do questionário, já que a amostra foi definida através da
devolutiva do questionário respondido, questionário este encaminhado via Google
forms, tendo como parceiro nesta distribuição o SEBRAE.
Na coleta de dados foi utilizado um questionário estruturado, composto de
questões objetivas, facilitando, assim, a participação dos sujeitos, que, diante de
sua atividade na gestão, estão normalmente muito atarefados, necessitando de uma
abordagem rápida e objetiva.
A pesquisa obedeceu a todas as recomendações éticas propostas para
projetos de pesquisa sociais, garantindo, assim, a confidencialidade dos dados
adquiridos, bem como, e, especialmente, a preservação da identidade dos sujeitos
pesquisados, isto descrito no próprio questionário apresentado.
A seguir estão as seções do questionário, com uma breve descrição:
Parte 1 – avaliar o perfil do gestor, seu grau de conhecimento e utilização das
ferramentas da gestão da qualidade;
Parte 2 – identificar nas práticas das ferramentas da Gestão da Qualidade nas
empresas pesquisadas os ganhos obtidos com a sua utilização, principalmente no
cenário atual de crise econômica provocada pela pandemia do Covid-19.
Após a compilação dos dados, foi realizada a tabulação dos mesmos com a
utilização do Excel. De acordo com Vergara (2008), a compilação dos dados consiste
em apresentar os dados, a fim de obter um retrato detalhado em termos de valores e
estatísticas que possam demonstrar a realidade observável e, através desta
observação, obteremos os dados necessários para que esses procedimentos
contribuam para o entendimento e compreensão das ferramentas da qualidade
aplicada nas empresas.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
138
6. REUSLTADOS E DISCURSSÕES
Os sujeitos da pesquisa são constituídos de uma amostragem de 100 gestores,
seja em cargo de proprietário ou gerente de empresas na cidade de Cajazeiras-PB,
que preencheram, por livre e espontânea vontade, um questionário estruturado, com o
objetivo de analisar a utilização das ferramentas de gestão de qualidade e se seus
resultados foram satisfatórios para uma melhor tomada de decisão em cenário
pandêmico do Covid-19.
Inicialmente, com relação ao gênero dos gestores pesquisado, observou-se
que a maioria, com 56%, são gestores do gênero feminino, haja vista que, apesar de
uma sociedade de modelo predominante patriarcal, os dados mostram que as
mulheres estão conquistando espaço, alcançando resultados expressivos, superando
as limitações do lar. Resultado este que diverge dos dados apresentados por Cury,
Anay e Caoli (2016) em matéria na G1, que pontua, a nível nacional, apenas 24% do
gênero feminino ocupando cargos de gerência.
Com relação à faixa etária, pontua-se que a maioria expressa, com 48%, na
faixa etária entre 31 a 40 anos. Outro ponto importante da pesquisa foi o nível de
escolaridade dos empresários, no qual demonstraram que 40% dos gestores
participantes pontuaram possuir apenas o ensino médio completo, em contrapartida,
28% tem o ensino superior completo, com a formação em destaque para o curso de
Administração, com 14% dos 28%. Kotler e Keller (2006) apontam que o nível de
escolaridade representa fator determinante para a definição do comportamento, visto
que cada nível de escolaridade representa preferências e gostos diversos.
A pesquisa mostrou que a maioria são empresas novas no mercado, 40% delas
têm tempo de vida entre três a cinco anos, e apenas 30% com mais de cinco anos de
vida, correlacionando com o nível de escolaridade pontuado, tem-se que apenas 28%
dos gestores têm curso superior e destes 14% em Administração de Empresas, isso
são dados importantes, até porque, conforme Sebrae (2010), as estatísticas apontam
que 80% das empresas no Brasil, entre três a cinco anos, acabam por encerrar suas
atividades, não conseguindo se manter no mercado. Desse modo, relacionar o tempo
de existência das empresas ao nível de escolaridade do gestor, torna-se um fator
crucial para a sobrevivência das empresas no mercado, pelo desenvolvimento das
competências que uma graduação agrega ao gestor frente a um negócio (SEBRAE,
2010).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
139
O setor de atuação que tem maior destaque na cidade de Cajazeiras-PB é o
comércio, ramo este imprescindível para o desenvolvimento econômico da região,
o comércio parece ser a opção mais “fácil” para o empreendedor, por conta da
subjetividade inerente ao departamento, porém requer habilidades para se adaptar em
um cenário de crise, imerso na inconstância, flexibilidade e incertezas, sendo
necessária a constância na busca pela tecnologia, conhecimento, criatividade, no
saber delimitar os melhores produtos, identificar excelentes oportunidades, antecipar
tendências e lidar com a concorrência e flexibilidade de forma versátil, além de ser bom
na hora da negociação. (NEVES, 2002).
Quando analisada a quantidade de colaboradores efetivos no empreendimento,
observa-se que a maior pontuação foi de 32% que responderam possuir entre 2 a 5
funcionários e 26% responderam que possuem entre 6 a 10 funcionários. Tem-se que,
de acordo com a classificação de empresas utilizadas pelo SEBRAE (2013), quanto
ao número de colaboradores tem que:
- A microempresa (ME): na indústria até 19 empregados, no comércio e serviço até 9;
- A pequena empresa (PE): na indústria, de 20 a 99 empregados, no comércio e
serviço, de 10 a 49.
- Isso demostra que as empresas da pesquisa são classificadas conforme o Serviço
Brasileiro de apoio às micro e pequenas empresas (2010), com empresas de pequeno
porte.
Gráfico 01 - Faixa estimada de faturamento anual da empresa
Até R$ 40 mil
Acima de R$ 40 mil até R$ 60 mil
10%
10%
30%
10%
10%
10%
20%
Acima de R$ 60 mil até R$ 90 mil
Acima de R$ 90 mil até R$ 120 mil
Acima de R$ 120 mil até R$ 200 mil
Acima de R$ 200 mil até R$ 500 mil
Acima de R$ 500 mil
Não Responderam
-
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
140
Analisando o gráfico 01, observa-se que 30% dos gestores responderam que
sua renda anual está acima de 500 mil reis, o que chama muito atenção por serem
empresas de pequeno porte, conforme o número de colaborador. Corroborando com
o SEBRAE (2002), enquadra-se na empresa de pequeno porte aquela com receita
bruta anual superior a R$ 240.000,00 e inferior a R$ 2.400.000,00.
Os pequenos empreendedores no Brasil representam um quarto do PIB
(Produto Interno bruto), no qual aproximadamente nove milhões de micro e pequenas
empresas contabilizam 27% do PIB e 52% dos empregos formais, dado relevante que
nos últimos dez anos os valores da produção gerada pelos pequenos negócios
tiveram um salto de R$144 bilhões para R$599 bilhões, SEBRAE (2011). Isto enfatiza
a importância dos pequenos negócios para a economia federativa.
Conhecendo os indivíduos da pesquisa e o perfil das empresas envolvidas, é
preciso conhecer e compreender os dados relativos à temática, avaliando o
desempenho dos gestores quanto à percepção na utilização das ferramentas da
qualidade para melhor tomada de decisão, e como as ferramentas ajudaram no
desenvolvimento em momento de crise.
Gráfico 02 - Grau de conhecimento quanto às ferramentas da qualidade
20%
30%
14%
Não conhece
Pouco
Médio
36%
-
Muito
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
Foi demonstrada com a pesquisa que 30% dos gestores desconhecem a
existência das ferramentas da qualidade, esta deficiência no saber acarreta riscos
para a empresa, já que as ferramentas são primordiais para melhoria dos objetivos
pré-estabelecidos, na promoção de uma assertividade melhor na tomada da decisão,
adquirindo o sucesso da organização.
Podemos comparar que essa falta de conhecimento está relacionado ao baixo
nível de escolaridade dos gestores, isto influencia na qualidade do gerenciamento do
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
141
negócio, pois o conhecimento sobre a gestão é um fator crucial no desenvolvimento
do empreendimento, principalmente em momentos de crise (NEVES, 2002).
A partir deste momento, será analisado apenas os 70% dos gestores
apresentados no gráfico 02, que pontuaram ter conhecimento das ferramentas da
qualidade.
Gráfico 03 - Das ferramentas utilizadas, qual (is) foi (ram) a(s) que teve (tiveram) melhor resultado.
Diagrama causa e efeito
30%
6%
6%
grafico de pareto
12%
fluxograma
8%
perda zero
30%
6%
Diagrama de similariedade
2%
programa 5s
balanced scorecard
-
não responderam
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
Conforme a apresentação do gráfico 03, observou-se que as ferramentas
utilizadas que tiveram maior eficiência dos resultados obtidos foi o Balanced Scorecard,
que liderou com uma porcentagem de 30%, esta vem atuando de maneira singular
nas organizações, já que a mesma tem papel importante na medição do desempenho
de suas atividades, sendo fundamental para uma análise dos processos em meio a
uma pandemia, dando ênfase na elevação do nível de qualidade, proporcionando o
sucesso empresarial. De acordo com Kaplan e Norton (2001), o Balanced Scorecard
foi inicialmente definido como um conjunto de indicadores que proporciona a direção
rápida e uma visão holística do negócio. A partir desse exposto, conclui-se que essa
ferramenta é a direção do empreendimento para o sucesso.
Levando em consideração que fluxograma, perda zero, diagrama de causa e
efeito e o diagrama de similaridade são ferramentas importantes na gestão, sendo
pontuadas pelos gestores, porém com pontuações menores.
O alarmante foi que, dos gestores que utilizam as ferramentas da qualidade,
30% não souberam responder quais das ferramentas utilizadas pela empresa
proporciona uma melhor visibilidade da mesma para a tomada de decisão mais
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
142
assertiva, isto demonstra que mesmo utilizando as ferramentas, muitos gestores não
conseguem analisar o retorno que sua utilização promove para a organização, pois as
ferramentas proporcionam retornos na análise e solução dos problemas, adquirindo
maior satisfação dos clientes, evitando os retrabalhos e os desperdícios (ISHIKAWA,
1997).
Tabela 01 - Opinião dos pesquisadores a respeito do ponto de vista da Gestão da Qualidade para um
melhor direcionamento da organização em cenário pandêmico
Classificação
Respostas
%
Gestores1
"Gestão da Qualidade contribuir para todas as áreas
da empresa de forma benéfica e neste momento de crise
tem ajudado muito para a tomada da decisão".
45%
Gestores2
Gestores3
Gestores4
"Gestão da Qualidade contribui para o desenvolvimento
continuo da organização para o mercado de
trabalho independendo o cenário vivenciado".
"Gestão da Qualidade está relacionada às
expectativas dos clientes".
"Sem resposta".
20%
30%
5%
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
De acordo com a participação dos gestores na compreensão sobre o ponto de
vista da gestão da qualidade, foi observado que todos apresentam um entendimento,
mesmo que seja mínimo, do conceito básico da palavra qualidade.
Conforme Feigenbaum (1994), a qualidade é um estilo de vida e liderança
corporativo, a maneira de gerenciar que envolve todos, pois o controle da qualidade
produz impacto em toda a empresa. A qualidade deve ser conduzida para excelência
e não pelas falhas com o entendimento e responsabilidade de todos dentro da
organização. Pontuando sobre os cursos de capacitação disponibilizados para
desenvolver conhecimento, gerando competências, foi identificado que 60% dos
pesquisados não disponibilizam cursos. Contrapondo-se a 40% dos pesquisados que
disponibilizam cursos, em sua maioria promovidos pelo SEBRAE, sobre diversos
temas na área de gestão, incluindo qualidade, envolvendo os colaboradores e
gestores, na perspectiva de desenvolver competências e habilidades, face ser o
SEBRAE um órgão que dar oportunidade e ajuda aos empresários a desenvolverem
seus negócios e talento.
Conforme Campos (2000), em era de economia global não é mais possível
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
143
assegurar a sobrevivência da empresa apenas exigindo que as pessoas façam o
melhor que puderem ou apenas cobrando resultados. Hoje são necessários métodos
de aprendizagem, treinamentos e capacitações que possam ser vivenciados por todos
dentro da organização, em direção aos objetivos de existência da empresa.
Gráfico 04 - As ferramentas de Gestão da Qualidade tornaram a empresa mais competitiva.
2%
20%
Discordo totalmente
6%
22%
Discordo parcialmente
Neutro
50%
Concordo parcialmente
Concordo totalmente
Não
responderam
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
Em um mundo globalizado, de futuro incerto, a busca pela sobrevivência vem
sendo estratégia das organizações, pois com o isolamento social provocou no meio
mercadológico a necessidade de adaptações a uma estrutura organizacional
inovadora, envolto à tecnológica. O gráfico 04 mostra que, para os gestores que
utilizam as ferramentas da qualidade, estão conscientes sobre a importância da
qualidade nos seus serviços e produtos, o que torna um diferencial da organização,
em sua totalidade foi percebida a eficiência da utilização das ferramentas no sistema
produtivo, gerando resultado positivo no mercado atuante, deixando a empresa mais
competitiva.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
144
Gráfico 05 - Ganhos obtidos com o uso das ferramentas de Gestão da Qualidade.
2%
Redução do custo
11%
18%
Aumento do nível de satifação
do cliente
8%
Conquista de novos mercados
Aumento de clientes
13%
Redução de
desperdicio
18%
Melhoria da
produtividade
Melhoria na qualidade
de produtos e serviços
5%
25%
Redução dos acidentes
de trabalho
Fonte: Dados da pesquisa, 2020.
De acordo com o esboço acima, é possível mensuras os benefícios da
utilização das ferramentas da qualidade nos processos da empresa, possibilitando a
sobrevivência em período tão crítico de isolamento social e crise econômica mundial,
podendo citar com maior pontuação no aumento no nível de satisfação dos clientes,
seguindo da melhoria na produtividade, aumento do número de clientes e aumento da
lucratividade, proporcionando a evolução na organização.
Campos (2000) afirma que a utilização das ferramentas da qualidade é um
modelo gerencial centrado no planejamento e controle do processo, tendo como meta
a satisfação das necessidades dos clientes, sejam eles internos ou externos.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para qualquer empresa alcançar sucesso, é importante que tenha uma gestão
de excelência, principalmente em momentos de crise, como a ocasionada pela
pandemia do Covid-19, que através do conhecimento para o planejamento, na
organização, na direção, no controle e na avaliação auxiliam o gerenciamento da
mesma, como também para a utilização de estratégias visando à qualidade dos seus
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
145
produtos e serviços, facilitando, assim, o desenvolvimento organizacional.
Constatou-se que, apesar da busca constante pela qualidade, muitas empresas
não utilizam as ferramentas de gestão da qualidade, por dois agravantes motivos:
primeiro, por não terem a percepção dos resultados que a prática das ferramentas
proporciona, atuando como uma alavanca para seu empreendimento; e, segundo, por
não terem o conhecimento da existência das mesmas, isto é, por falta de um preparo
administrativo técnico. Portanto, ao analisar o perfil dos gestores, observou-se que a
maioria tem o nível de escolaridade baixo, o que acarreta um grande risco para o
empreendimento, isto influencia diretamente na qualidade do gerenciamento, e
mostra o porquê muitas empresas finalizam suas atividades antes de completar cinco
anos de existência, já que o atual cenário competitivo exige respostas rápidas e
eficazes para suprir a necessidade de seu público, seja ele interno ou externo.
Desse modo, para as empresas da cidade de Cajazeiras-PB que utilizam as
ferramentas como suporte para a melhor compreensão na tomada de decisão mais
assertiva, conclui-se que o aprimoramento da gestão da qualidade traz inúmeros
benefícios para as empresas, como o aumento do nível de satisfação dos clientes, o
que leva ao ganho de novos clientes, enfatizando no aumento da lucratividade,
proporcionando evolução da organização através das decisões estratégicas mais
assertivas, na condução e aprofundamento nas tecnologias, promovendo visibilidade
e alcançando o cliente, deixando a empresa mais competitiva e proporcionando sua
sobrevivência, mesmo com o isolamento social provocado pela pandemia da Covid19.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
146
REFERÊNCIAS
Brasil. Ministério da Saúde. Portaria MS/GM n. 188, de 3 de fevereiro de 2020.
Declara Emergência em Saúde Pública de importância Nacional em decorrência da
Infecção Humana pelo novo Coronavírus (2019-nCoV) [Internet]. Diário Oficial da
União, Brasília (DF); 2020 fev 4 [citado 2020 Apr 27]; Seção Extra:1. Disponível em
http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/portaria/prt188-20-ms.htm
BRASIL, Pearson Education do. Gestão da Qualidade. São Paulo: Pearson, 2011.
CAMPOS, Vicente Falconi. TQC – Controle da qualidade total, 8. ed. Belo Horizonte:
DG, 2000.
COSTA, M. A. Gestão Estratégia da Manutenção: uma oportunidade para melhora o
resultado operacional. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Engenharia
de Produção). Juiz de Fora: UFJF, 2013.
CURY, Anay; CAOLI, Cristiane. PIB do Brasil cai 3,8% em 2015 e tem pior resultado
em 25 anos. G1, São Paulo/Rio de Janeiro, mar. 2016.
DEMING, W. E., Qualidade: a revolução da administração. Ed Marques
Saraiva,1990. FEIGENBAUM, A. V, Controle da qualidade total. São Paulo: Makron
Brooks,1994. GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4 ed. São
Paulo: Atlas, 2002.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Projeção da população do brasil e das
unidades da federação. (2017).
<https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/index.html?utm_source=por
tal&utm_medium=popclock&utm_campaign=novo_popclock>.
. Lei n. 9.841, de 05 de out. 1999. Institui o Estatuto da Microempresa e da
Empresa de Pequeno Porte, dispondo sobre o tratamento jurídico diferenciado,
simplificado e favorecido previsto nos arts. 170 e 179 da Constituição Federal. Diário
Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 06 out. 1999.
ISHIKAWA, K. Controle de qualidade total: a maneira japonesa. Rio de Janeiro:
Campus, 1997.
JUNIOR, I. M., CIERCO A. A., ROCHA, A. V., MOTA, E. B. LEUSIN, S. (2008).
Gestão da Qualidade. 9. Ed. Rio de janeiro: FGV.
JURAN, J.M. - A Qualidade desde o Projeto, São Paulo. Ed. Pioneira. 3 Edição.
1997. p 228.
KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P., A Estratégia em Ação - Balanced
Scorecard. Rio de Janeiro. Elsevier, 2001.
KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de marketing. 12. ed. São Paulo:
Pearson Prentice Hall, 2006.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
147
MACHADO, V.T.; et al. MICROEMPREENDEDOR INDIVIDUAL: uma análise dos
desafios enfrentados na pandemia do covid-19. Brazilian Journal of Development.
v.7, n.5, p. 49776-49793 May 2021. DOI:10.34117/bjdv7n5-396.
NEVES, Roberto de Castro. Crises empresariais com a opinião pública: como evitálas e administrá-las: casos e histórias. Rio de Janeiro: Mauad, 2002.
PALADINI, Edson P. - Controle de Qualidade: uma Abordagem Abrangente. São
Paulo. Atlas. 2003.
PALADINI, Edson P. A Gestão da Qualidade Total nas Organizações e a Escola
Clássica de Administração. Anais do ENEGEP 97 – Encontro Nacional de
Engenharia de Produção, (disponível em CD-ROM), Porto Alegre – RS, UFRGS,
PPGEP, 1997.
SANTOS, E. M. et al. Gestão em tempos de Pandemia: (RE)invenção das empresas
na percepção de estudantes do curso de administração. Brazilian Journal of
Development. v. 6, n. 7, p. 52797-52810- jul. 2020. DOI:10.34117/bjdv6n7-795.
SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa. Apresenta
informações sobre: Aspectos econômicos das Micro e Pequenas Empresas, 2010.
. Sobrevivência e Mortalidade das Empresas Paulistas de 1 a 5 anos,
Relatório final. SEBRAE e FIPE, São Paulo, 2001.
.10 Anos de Monitoramento da Sobrevivência e Mortalidade de
Empresas. Relatório final conclusivo sobre as empresas no estado de São Paulo.
São Paulo, 2008.
. Fatores condicionantes e taxa de mortalidade de empresas. Brasília:
SEBRAE, Agosto 2004.
SENTANIN, V. L. H.; BARBOZA, R. J. Conceitos de empreendedorismo. Revista
Científica Eletrônica de Administração (RCEA), Ano V, n. 9, dez. 2005.
VERGARA, Sylvia Constant. Projetos e relatórios de pesquisa em administração.3.
ed. São Paulo: Atlas, 2008.
World Health Organization - WHO. Coronavirus disease 2019 (COVID-19): situation
report – 30 [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2020 [cited 2020 Apr 27].
Available from: https://www.who.int/docs/ default-source/coronaviruse/situationreports/20200219- sitrep-30-covid-19.pdf?sfvrsn=3346b04f_2
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.80917-80937 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
148
CAPÍTULO 08
TELEFONIA DE BAIXO CUSTO (TBC) BASEADA NO PROTOCOLO IP PARA A UEMA
E SECRETARIAS DO GOVERNO DO ESTADO (PROJETO VOIP UEMA)
Carlos Henrique Rodrigues de Oliveira
Engenharia de Computação – Centro de Ciências Tecnológicas (CCT), Universidade
Estadual do Maranhão (UEMA)
E-mail: carloshenriqueoliveira@professor.uema.br
Luiz Ricardo Souza Ripardo
Engenharia de Computação – Centro de Ciências Tecnológicas (CCT), Universidade
Estadual do Maranhão (UEMA)
E-mail: ricardo_ripardo@hotmail.com
Magno Castro Moraes
Engenharia de Computação – Centro de Ciências Tecnológicas (CCT), Universidade
Estadual do Maranhão (UEMA)
E-mail: magnocasmor@gmail.com
Luis Carlos Costa Fonseca
Engenharia de Computação – Centro de Ciências Tecnológicas (CCT), Universidade
Estadual do Maranhão (UEMA)
E-mail: luisfonseca@professor.uema.br
RESUMO: O projeto VoIP UEMA é uma solução que permite o desenvolvimento de
projetos de comunicação baseados no protocolo IP. Este artigo apresenta uma
implantação de baixo custo chamada TBC (Telefonia IP de Baixo Custo). A viabilidade
técnica para implantação deste projeto foi verificada em uma prova de conceito. O
conceito foi comprovado mostrando que é possível criar ramais de usuários com
informações como nome, ID, cargo, curso, centro e campus obtendo informações de
todos os usuários cadastrados no servidor do sistema acadêmico e administrativo e
realizar chamadas de voz e vídeo por meio de Web Phone e aplicativo Android. O
aspecto de baixo custo foi justificado por uma análise financeira que mostrou que a
despesa anual com a conta telefônica caiu, representando uma economia de mais de
97%.
PALAVRAS-CHAVE: VoIP UEMA; VoIP University; SIP; Asterisk; Web Service.
ABSTRACT: The UEMA VoIP project is a solution that allows the development of
communication projects based on the IP protocol. This paper presents a low cost
deployment called TBC (Low Cost IP Telephony). The technical viability for the
implementation of this project was verified in a proof of concept. The concept was
proven showing that it is possible to create user extensions with information such as
name, ID, position, course, center and campus, obtaining information from all users
registered in the academic and administrative system server and making voice and
video calls through Web Phone and Android application. The low cost aspect was
justified by a financial analysis that showed that the annual expense with the phone bill
dropped, representing savings of more than 97%.
KEYWORDS: VoIP UEMA; VoIP University; SIP; Asterisk; Web Service.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
149
1. INTRODUÇÃO
Este artigo1 propõe uma solução de baixo custo chamada VoIP UEMA para
provimento de serviços de comunicação quadruple play para transporte de voz, dados
e vídeo com mobilidade [1, 2, 3, 4, 5] dentro e fora do país.
Essa solução de comunicação é baseada em serviços de telefonia sobre o
protocolo IP2 e consiste em servidores de web services (WS), do protocolo SIP3
(Session Initiation Protocol), do sistema acadêmico-administrativo em conjunto com
softphones para aplicativo e discador web e página web para divulgação.
O primeiro projeto da solução VoIP University é chamado VoIP UEMA, que
consiste nos servidores WS VoIP UEMA, SIP VoIP UEMA, SIGUEMA4 (derivado do
SIGAA5) acadêmico-administrativo, aplicativo (App) VoIP UEMA, discador web VoIP
UEMA e página web VoIP UEMA para divulgação.
O projeto VoIP UEMA foi desenvolvido por alunos e professores da Universidade
Estadual do Maranhão (UEMA) e implantado para comunicação de todos os alunos,
professores e técnicos-administrativos em todos6 os 19 campi e 22 centros
conectados pelo mesmo data center, sem a necessidade de roteamento7 de
chamadas SIP.
O servidor WS VoIP UEMA foi desenvolvido com base no código Java e cumpre
regras de encaminhamento de informações entre os servidores SIP VoIP UEMA e
SIGUEMA.
O servidor SIP VoIP UEMA foi baseado no Asterisk8, uma plataforma de código
livre e aberto para o desenvolvimento de redes de comunicação baseado no protocolo
IP.
O SIGUEMA é um sistema computacional para hospedar informações
acadêmicas e administrativas.
O aplicativo VoIP UEMA foi desenvolvido para permitir que os usuários do
1
Este trabalho é apoiado pela FAPEMA (Fundação de Amparo à Pesquisa e Desenvolvimento
Científico do Maranhão Brasil) e pelo grupo de pesquisa GETICOM (Grupo de Estudos em Tecnologias
da Informação e das Comunicações - http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/3696186303002506).
2
https://www.voip-info.org › rfc-2848
3
https://tools.ietf.org › html › rfc3261
4
https://sis.sig.uema.br/sigaa/verTelaLogin.do
5
https://sigaa.ufrn.br/sigaa/public/home.jsf
6
https://www.uema.br/uema-em-numeros/campi-e-centros/
7
https://www.ietf.org/rfc/rfc3487.txt
8
https://www.asterisk.org
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
150
sistema SIGUEMA possam realizar chamadas de voz, dados e vídeo utilizando
smartphones com sistema operacional Android baseados na biblioteca PJSIP9 de
código aberto, gratuita e escrita em linguagem C para comunicação multimídia. O
aplicativo VoIP UEMA para iPhone OS (iOS) e a comunicação por mensagens de texto
estão incluídos no roadmap do VoIP UEMA.
O discador web VoIP UEMA foi desenvolvido com base no código Java como
uma alternativa ao aplicativo VoIP UEMA para permitir que os usuários do sistema
possam realizar chamadas de voz a partir de um computador pessoal (PC) (notebook
ou desktop).
A página web VoIP UEMA foi desenvolvida com base no código Java para
divulgação, perguntas frequentes (FAQ - Frequently Asked Question) e suporte
técnico aos usuários do sistema.
Após a integração com o SIGUEMA, a Universidade disponibilizou na página
VoIP UEMA dentro do site oficial da UEMA, a lista de ramais dos usuários com o recurso
de busca. O usuário realiza seu login para obtenção do serviço VoIP UEMA com as
mesmas credenciais (CPF e senha) do servidor SIGUEMA e seu ramal é seu próprio
número de identificação (ID).
As próximas Seções estão organizadas da seguinte forma: a Seção 2
apresenta os trabalhos relacionados. A Seção 3 apresenta a metodologia do projeto
VoIP UEMA. Na Seção 4 são apresentados os resultados do projeto. A Seção 5
apresenta uma discussão sobre o projeto e finalmente na Seção 6 são apresentadas
as conclusões.
2. TRABALHOS RELACIONADOS
A solução de baixo custo do projeto TBC começa com uma prova de conceito
baseada nos softphones CounterPath X-Lite10 para sistema operacional Windows,
Mizudroid11, Zoiper12 e 3CX13 para sistema operacional Android e Brasilvox14 para
sistema operacional iOS bem como com equipamentos de infraestrutura de rede de
9
https://www.pjsip.org
https://www.counterpath.com/x-lite
11
https://www.mizu-voip.com/Software/Softphones/AndroidSoftphone.aspx
12
https://www.zoiper.com
13
https://www.3cx.com
14
https://apps.apple.com/us/app/id836169084
10
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
151
comunicação de dados baseados em Asterisk para Linux (FreePBX15 e Elastix16)
e Brekeke17 para Windows. Foi utilizado também um VoIP gateway Audio Codes18
para permitir comunicações de voz e vídeo de / para telefones analógicos legados
de/para softphones.
A comunicação entre smartphones de/para telefones analógicos e telefones IP
(Internet Protocol) passou a ser possível. O conceito foi comprovado, foram
desenvolvidos para o projeto TBC o aplicativo VoIP UEMA para sistema operacional
Android e um softphone próprio (discador Web para navegadores da Internet) e foi
desenvolvido todo o procedimento de controle via serviço web VoIP UEMA para
automatizar a administração dos usuários VoIP UEMA.
3. METODOLOGIA
Para possibilitar a implantação da solução VoIP UEMA, formam desenvolvidos
primeiramente o servidor WS e o App e customizado o servidor SIP. O funcionamento
do serviço VoIP UEMA é mostrado passo-a-passo na topologia de rede apresentada na
Figura 1.
Figura 1 – Topologia da rede VoIP UEMA
Fonte: os autores.
De acordo com a Figura 1, o primeiro passo para criação do banco de dados
de usuários VoIP UEMA é a obtenção de todos os usuários registrados no SIGUEMA.
A ideia inicial é criar um banco de dados com todas as informações dos usuários
15
https://www.freepbx.org
https://www.elastix.org
17
https://www.brekeke.com
18
https://www.audiocodes.com
16
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
152
(nome, ID, cargo, curso, centro e campus). Para obter essas informações, o servidor
WS VoIP UEMA deve executar uma consulta no servidor SIGUEMA.
O servidor WS foi desenvolvido com linguagem Java. Ele utiliza um servidor web
Apache Tomcat19 para hospedagem e um servidor web Apache20 como proxy. Sua tela
de apresentação é mostrada na Figura 2. Os recursos web estão disponíveis na
URL21.
VoIP UEMA é uma marca registrada22 no Instituto Nacional de Propriedade
Industrial (INPI).
Figura 2 – Servidor Web Service VoIP UEMA
Fonte: os autores.
O App VoIP UEMA, disponível na Play Store23 atualmente conta com mais de
1.000 (mil) downloads e foi desenvolvido para o sistema operacional Android da
Google para fazer chamadas de VoIP e vídeo com base na biblioteca PJSIP.
O aplicativo permite autenticação com as credenciais do SIGUEMA por meio
do WS VoIP UEMA e conexão com o servidor SIP VoIP UEMA, permitindo chamadas
VoIP com boa qualidade.
Os principais recursos PJSIP são:
•
Plug-in para suporte de chamadas de voz utilizando o codec Opus24;
•
Plug-in para suporte de chamadas de vídeo utilizando o codec H.26425;
•
Implementação de Packet Loss Concealment (PLC) para minimizar os efeitos da
19
http://tomcat.apache.org/
https://httpd.apache.org/
21
https://voip.ma.gov.br/wsvoipuema/
22
https://gru.inpi.gov.br/pePI/jsp/marcas/Pesquisa_num_processo.jsp
23
https://play.google.com/store/apps/details?id=br.uema.voipuema.mobile.app
24
https://tools.ietf.org/html/rfc6716
25
https://www.itu.int/rec/T-REC-H.264
20
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
153
perda de pacotes;
•
Segurança e criptografia com SRTP26 com base na biblioteca OpenSSH27.
•
Para o desenvolvimento do App VoIP UEMA foram utilizados linguagem de
programação Java e o Android Studio IDE (Integrated Development Environment).
•
O aplicativo alcançou os objetivos de autenticar com êxito os usuários nos
servidores WS e SIP VoIP UEMA utilizando as credenciais do SIGUEMA e realizar
chamadas de áudio e vídeo.
•
A tela de apresentação do aplicativo é mostrada na Figura 3. O botão vermelho
permite que qualquer pessoa que não faça parte da comunidade acadêmica ligue
direto sem login para alguns setores da Universidade como, por exemplo, vestibular
e secretarias de cursos trazendo benefícios sociais.
•
Dois importantes recursos de privacidade do aplicativo (e também do telefone
VoIP UEMA) permitem que os usuários do aplicativo desabilitem sua visibilidade
nas listas de ramais e bloqueiem qualquer usuário da lista de ramais.
Figura 3 – App VoIP UEMA
Fonte: os autores.
O discador web VoIP UEMA28 foi desenvolvido com base no Web RTC29 (Web
Real-Time Communication), um projeto livre e aberto que fornece aos navegadores e
aplicativos móveis recursos de comunicação em tempo real via APIs. O codec de
voz utilizado é o Opus. As videochamadas estão no roadmap do VoIP UEMA. Sua
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
154
tela de apresentação é mostrada na Figura 4.
Figura 4 – Discador web VoIP UEMA
Fonte: os autores.
A tela de apresentação da página web VoIP UEMA30 é mostrada na Figura 5.
A página contém uma apresentação do VoIP UEMA, a equipe do projeto, link para o
discador web, formulário para contatos, notícias da UEMA e perguntas frequentes.
Figura 5 – Página web VoIP UEMA
Fonte: os autores.
4. RESULTADOS
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
155
Foram realizados testes para conhecimento da qualidade da chamada de voz
baseado no MOS31 (Mean Opinion Score). O MOS mede a qualidade subjetiva da voz
para uma chamada. As notas do MOS variam de 1 para inaceitável e 5 para excelente.
As chamadas VOIP geralmente estão na faixa de 3,5 a 4,2. 39 pessoas foram
convidadas a participar do teste de MOS estabelecendo chamadas entre elas
utilizando o App VoIP UEMA e o discador VoIP UEMA (ambos com codec de voz Opus)
em redes Wi-Fi e com fio (ambas com taxas médias de dados acima de 10 Mbit/s),
bem como com redes 3G (com taxas médias de dados de 1,5 Mbit/s) e 4G (com taxas
médias de dados de 15 Mbit/s). A Figura 6 mostra os resultados dos testes
apresentados por grupos de n pessoas com uma média ponderada final de MOS em
torno de 3,5.
Figura 6 – Resultados do teste de MOS
n
4
0
1
0
8
3
20
2
1
MOS
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Fonte: os autores.
Os comentários dos participantes com MOS 3 a 5 foram: chamadas de voz
limpas e sem cortes. Os comentários com MOS 1 a 2,5 foram: chamadas de voz com
cortes. Esses resultados estão relacionados à qualidade de serviço prestado pela rede
de dados.
Também foi realizada uma análise financeira considerando a despesa média
anual, de contas telefônicas da antiga operadora Telemar com as despesas da UEMA
nos anos de 2013, 2014 e 2015, apresentada na Figura 7 totalizando uma despesa
total média de R$ 1.256.624,30 por ano. A conta telefônica mais cara, do ano 2015, é
apresentada na Figura 8.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
156
Figura 7 – Despesa média anual de contas telefônicas
Fonte: os autores.
Figura 8 – Despesas com contas telefônicas da UEMA em 2015
Fonte: os autores.
Dois anos após a implantação do projeto VoIP UEMA, a despesa anual com
contas telefônicas da UEMA caiu para R$ 36.000,00, representando uma economia
de mais de 97 %.
Até o momento o aplicativo VoIP UEMA conta com mais de 1.000 downloads e mais
de 400 ramais de serviços com telefones IP estão registrados na rede VoIP UEMA
para biblioteca, laboratórios e departamentos. Um PABX IP permitiu a integração da
rede VoIP UEMA com a rede legada de telefonia fixa e móvel.
5. DISCUSSÃO
A solução de baixo custo é justificada porque não houve gastos com materiais
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
157
ou equipamentos, apenas remuneração de professores e alunos com bolsas de
pesquisa. Não se pode afirmar que o custo para este projeto é zero porque requer
uma infraestrutura de rede de comunicação de dados que exige investimento prévio.
O projeto VoIP UEMA inova porque não existe uma proposta semelhante no
mundo de comunicação quadriple play que permita a integração com o banco de
dados de qualquer sistema institucional/corporativo para criar e gerenciar a lista de
ramais de usuários.
Existem quatro softwares com registros de programa de computador no INPI32
sob os seguintes números: a) WS VoIP UEMA nº BR 51 2017 001608-9; b) Aplicativo
VoIP UEMA nº BR 51 2017 001614-3; c) discador web VoIP UEMA nº BR 51 2018
000820-8 e d) página web VoIP UEMA nº BR 51 2017 001606-2.
6. CONCLUSÕES
A solução foi disponibilizada para mais de 20.000 alunos, 1.400 professores
e técnicos-administrativos. Atualmente a comunicação está sendo realizada mais por
meio da rede VoIP UEMA do que por meio das redes convencionais de telefonia fixa
e móvel. Alguns aspectos podem contribuir para redução das despesas com
contas telefônicas e o controle de gasto do dinheiro público: a) controle de
chamadas para impedir o tráfego entre usuários da rede VoIP UEMA utilizando as
redes de telefonia pública e b) limite de tempo da chamada para usuários fora da rede
VoIP UEMA.
A operação e manutenção da rede VoIP UEMA foi facilitada: a) qualquer usuário
acadêmico ou administrativo de qualquer centro ou campus pode ser localizado
pesquisando na lista de ramais (o WhatsApp33 requer conhecimento prévio do número
de telefone para ligar para alguém da comunidade) e com uma simples busca realizar
uma chamada com um toque sem discar número algum e b) devido à entrada e saída
de alunos e professores da instituição, a lista de ramais é atualizada automaticamente
por meio de serviço do próprio sistema acadêmico-administrativo SIGUEMA.
O segundo projeto da solução VoIP University já foi iniciado e é chamado de VoIP
Gov MA para fornecer uma rede de comunicação quadriple play para todos as
secretarias e agências governamentais do estado do Maranhão.
A solução VoIP University está disponível para mais interessados.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
158
REFERÊNCIAS
(1) Andrew S. Tanenbaum, David J. Wetherall, Computer Networks, Prentice Hall
Press, Upper Saddle River, NJ, 2010
(2) Bill Douskalis, IP telephony: the integration of robust VoIP services, Prentice
Hall PTR, Upper Saddle River, NJ, 2000
(3) Edwin W. C. Peh, Winston K. G. Seah, Y. H. Chew, Y. Ge, Experimental Study
of Voice over IP Services over Broadband Wireless Networks, Proceedings of
the 22nd International Conference on Advanced Information Networking and
Applications, p.834- 839, March 25-28, 2008. DOI: 10.1109/AINA.2008.65
(4) Whai-En Chen, Hui-Nien Hung, Yi-Bing Lin, Modeling VoIP Call Holding Times
for Telecommunications, IEEE Network: The Magazine of Global Internetworking,
v.21 n.6, p.22-28, November, 2007. DOI: 10.1109/MNET.2007.4395107
(5) Syed A. Ahson, Mohammad Ilyas, VoIP Handbook: Applications, Technologies,
Reliability, and Security, CRC Press, Inc., Boca Raton, FL, 2008. DOI:
10.1201/9781315218793
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.64198-64208 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
159
CAPÍTULO 09
THE INFLUENCE OF SOCIO-SPATIAL SEGREGATION ON URBAN MOBILITY
INDICATORS: THE CASE OF BELÉM – PA
Maisa Sales Gama Tobias
Doutora
Instituição de atuação atual: Universidade Federal do Pará, Instituto de Tecnologia
Endereço: Av. Perimetral s/n, Belém, Brasil, Cep 66075-110
E-mail: isatobias1@gmail.com
Verena Coelho Lobão Azevedo
Mestranda
Instituição de atuação atual: Universidade da Amazônia, Centro de Ciências Exatas
e Tecnologia
Endereço: Av. Alcindo Cacela, 287, Belém, Brasil, Cep 66060-902
E-mail: lobao.arquitetura@gmail.com
Marco Aurélio Arbage Lobo
Doutor
Instituição de atuação atual: Universidade da Amazônia, Centro de Ciências Exatas
e Tecnologia
Endereço: Av. Alcindo Cacela, 287, Belém, Brasil, Cep 66060-902
E-mail: lobo2502@gmail.com
ABSTRACT: The article discusses how the suburb socio-spatial segregation
influences the urban mobility of a population, using Belém-PA, Brazil as a case study.
The methodology started from the integration of socioeconomic and transport
microdata for areas containing selected household and their spatial location, that were
obtained from the 2010 Brazilian Census. In the spatial analysis of these microdata, the
variation in the average commute time for each resident was observed, given the
geographic location of the central business district (CBD) and other commercial and
industrial agglomerations. In the results, the generated maps, compared to the on-site
visit, allowed to identify the subareas with major and minor mobility and the priorities for
investment in transport infrastructure.
KEYWORDS: Segregation; Mobility; Indicators; Influence.
RESUMO: O artigo discute como a segregação socioespacial da periferia influencia a
mobilidade urbana de uma população, tendo como estudo de caso Belém-PA, Brasil.
A metodologia partiu da integração de microdados socioeconômicos e de transporte
para áreas contendo domicílios selecionados e sua localização espacial, obtidos a
partir do Censo Brasileiro de 2010. Na análise espacial desses microdados, observouse a variação do tempo médio de deslocamento de cada morador, dada a localização
geográfica do distrito central de negócios (CBD) e demais aglomerações comerciais e
industriais. Nos resultados, os mapas gerados, comparados com a visita in loco,
permitiram identificar as subáreas com maior e menor mobilidade e as prioridades de
investimento em infraestrutura de transportes.
PALAVRAS-CHAVE: Segregação; Mobilidade; Indicadores; Influência.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
160
1. INTRODUCTION
In the last decades, an intense and disorderly urban expansion has been
observed in large Brazilian cities, conditioned by population growth and the low cost of
living in places further away from the urban centers of commerce and services. In this
way, areas increasingly distant from the urban center began to house countless lowincome families, who found better economic housing conditions, but with deficient
transport infrastructure, making it difficult to move on foot or by bicycle, making the
dependence on motorized transport something inevitable. These families have more
difficulties than those in the same condition, who live in more consolidated areas of the
city, a fact proven in several studies, such as: health care (Azevedo, 2009), school
performance (Cunha et al., 2009; Cunha and Jiménez, 2009; Flores, 2006 and Torres
et al., 2005) and the insertion in the labor market (Cunha and Jakob, 2010).
For the low-income population in the distant suburb, with low accessibility,
investments by public authorities in public transport were not observed in the same
proportion as the population's need, as opposed to automobiles, in which the public
authorities, notably, in recent decades, offered facilities for importing and financing
vehicles, encouraging the high consumption of this mode of transportation (Paviani,
2013). In this way, in the distant suburb, the population, which mostly uses public
transport as means of transportation, needs to overcome the generalized travel cost,
notably, influenced by the fare, distance and travel time. The scenario is one of long
traffic jams, scarce and precarious bus fleets, in addition to the poor conditions of road
infrastructure in most of these suburban areas.
It should be noted that, in the Brazilian urbanization model, the main commercial
center of the city is not only the main area of commerce and services, but also of
employment, therefore, it attracts not only a big number of those who live in the
neighborhoods closer, such as those who live in distant suburbs, who face, daily,
various difficulties to reach their destination and return to their homes, to reach the
opportunities found in the city center (Deák, 2015). In this context, it is considered that
the distant suburban population suffers negative impacts when living far from where
the major employment opportunities are found, including time wasted in traffic, which
could be used for the qualification of these people, increasing access opportunities in
the labor market. It is important to note that there are also commercial and industrial
sub-centers in peripheral areas, but with much lower job offers than that in the central
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
161
business district and surrounding area (Costa et al., 2020).
For Domingues (1994), this suburban dependence related to the urban center
encourages what he calls commuting inhabitants, that is, people who live in the suburb,
but have their daily needs and opportunities in the urban center. This daily movement,
increasingly intense between the distant suburb and the urban center, is one of the
biggest reasons of the problems that urban mobility has today in big cities. Shortly, the
center, occupied by upper-income levels in society, concentrates most of public and
private urban services. It is important to understand that the urban mobility crisis has
caused a decrease in the life quality of the population living in distant suburbs, due to
the difficulties in accessing basic services that the city offers, such as hospitals,
schools, police stations, among others. And “there is also a cultural prejudice, with
regard to how these people start to see the world and what their objective awareness
of their socially and spatially segregated state is” (Negri, 2008: 138).
The suburb, occupied by the lower-income levels of society, is poorly attended
by both private and public services and, in most cases, has difficulty in accessing
the facilities in the center, through a public transport system, which characterizes a
situation of socio-spatial segregation, in which mobility is presumed to be a highly
relevant factor within this process (Villaça, 2004). Thus, this article sought to
contribute to this discussion, through two existing suburban situations in the city of
Belém do Pará, Brazil. Considering an integrated demographic database of areas
containing selected household and their spatial location, that were obtained from the
2010 Brazilian Census, use of ground and urban mobility, adopting a micro-analytical
spatial analysis of individuals living in the above-mentioned areas of selected
households, the study reflected the social situation of these individuals with travel time
to workplace as a variable. On the other hand, therefore, the central question that
guided this study, which focused on a practical situation of travel time in public
transport, was the following: How does the socio-spatial segregation of the distant
suburb affect urban mobility?
As a hypothesis, there is the fact that the major growth of socio-spatial segregatin
through distant suburbs is having a negative impact on urban mobility indicators and,
thus, the issues of socio-spatial segregation and the people’s freedom of movement
with quality and the effective reach to all the benefits that the city can provide to them,
should be the object of action guidelines and investments in urban infrastructure, to
achieve a fairer and more environmentally sustainable city.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
162
The article is structured with the theoretical reference, containing the main
categories of analysis: socio-spatial segregation and urban mobility; followed by the
methodological approach, with two fundamental steps: the formation of the database
and the implementation of the spatial microdata model; ending with the case study.
2. THEORETICAL REFERENCE
In general, urbanization in Brazil, and particularly in its metropolitan areas, has
assumed a standard defined by social, demographic, economic and environmental
segmentation, and differentiation. This pattern is also characterized by the low urban
life quality and high physical growth, suburb expansion and all the consequences that
this implies deficiencies in urban infrastructure and social facilities; production of
infrastructure urban voids; speculative ground retention, among others. Not only the
processes of production and ground appreciation for housing purposes, but also those
related to the location of economic activities have decisive impacts on the urban form,
influencing its expansion, its socio-spatial differentiation, and the mobility of the
population (Bourdieu, 2003).
The issue of socio-spatial segregation and urban mobility are inserted in a larger
political context in which the quality of life of a significant portion of the population is
being compromised by the growing of obstacles to urban motion (Gottdiener, 1993).
And, in the case of urban mobility and its intrinsic relationship with urban expansion,
several studies have shown the intensification of the processes of socio-spatial
segregation of the population (Matos, 1994; Rigotti and Rodrigues, 1994; Lago, 2000
and Rodríguez, 2007).
2.1 Urban socio-spatial segregation
Brazilian cities, like many others located in the developing world, are profoundly
unequal in spatial terms, which constitutes the manifestation in the territory of profound
social inequalities. The study of socio-spatial segregation in cities starts from an
analysis of urban evolution up to the present day, as segregation is not a static point
that emerged in a single moment, but a process of social fragmentation resulting from
the development of cities that occurred in many ways in every place in the world. It is
important to understand that class-based society historically precedes the origin of
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
163
urban space itself (Singer, 1973), that is, cities were already born socially segregated.
In the case of capitalist cities, in addition to social segregation, it is also spatial,
reflecting the complex of class-based structure society. Thus, socio-spatial segregation
was accentuated due to population growth within the urban space, which expanded to
suburban areas.
The process of socio-spatial segregation did not occur randomly, with standards
of residential segregation, for example, which developed over time and can be
observed in the models of Kohl, Burgess and Hoyt (Burgess, 1925; Hoyt, 1939 and
Maerivoet e de Mor, 2005). Kohl's nineteenth-century model expressed the spatial
distribution of social classes in European cities, where the central region (location of
important urban and financial institutions and commerce) was dominated by the upper
class and the distant suburb region was occupied by the lower class. Burgess' model
was based on northern American cities in the 1920s, where the lowest income class is
the one located in the downtown area of the city. This is because in this period the
evolution of automobile technology allowed more mobility for the upper-income
population, which moved away from the lower-income population in search of better
housing. Finally, Hoyt's 1939 model suggested a sectoral standard from the center,
rather than circles around the center, indicating that the higher status population settled
in areas with more amenities, which were located around the main access roads to the
urban center, thus, the rich continued to enjoy the benefits provided by the center and
remained distant from the poor population (Correa, 1989).
In Brazil, as well as in Latin America, it was Kohl's model that developed within
the urban space, which does not mean that there cannot be another model in the same
urban space, the very concept of socio-spatial segregation, refers to the different
income classes concentrated in different regions of the cities, with the upper class
concentrated in the central region and the lower class concentrated in distant suburban
areas, but without there being class exclusivity in each space (Kowarick, 2000). As an
example, the southern area, in Rio de Janeiro, despite the existing favelas, in general,
is the region with the highest concentration of rich people in the city. Thus, Villaça
concludes that what will define the class segregation is the concentration of one of it on
the other in a certain space. It is important to address that, in recent decades, sociospatial segregation has been accentuated due to the intense urban expansion that has
been taking place in large cities, which according to Batty et al. (2003), caused high
density in the urban center, which raised land prices in the region, leading the lowBrazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
164
income population to seek more and more distant places to settle down. Jargowsky
(2001) understood urban expansion as an exclusionary growth, in which the
segregation between rich and middle class from the poor is accentuated, contributing
to the social exclusion of this last group. Consequently, exclusion concentrates wealth
in the best sectors of the city, leaving the low-income
population isolated socially and geographically in the undesired sectors of the city.
For Santos and Ferreira (2016), the accentuation of socio-spatial segregation is
also caused by relationships between the urban space producing agents and the
development of motorized transport modes, with the capitalist system favoring the
upper income classes, while the low-income population is forced to isolate themselves
in regions of precarious access, in addition to being frequently relocated to increasingly
unwanted regions of cities. In this context, socio-spatial segregation is not just about
differences related to location, but also about the difference in opportunities, the quality
of public services and the infrastructure necessary to have a good quality of life.
2.2 Urban mobility and indicators
Law No. 12.587/2012 (Brazil, 2012), which established the guidelines of the
National Policy of Urban Mobility, in its Article 4th considers urban mobility as the
condition in which the displacement of people and cargo in the urban space takes
place. In the current organization of urban life in the capitalist city, composed by
center and suburb, people perform their activities in different places. Based on this
observation, space and time become determinants of transport demand, permeated
by the heterogeneity of the origins and destinations of urban displacements of the
population: the work groups determined by the economic space and the population
groups determined by the residential social space.
The spatial dimensions of mobility get a social significance when the movement
that drives people daily from the suburb to the center is analyzed. Alongside time and
cultural practices, work is at the forefront of human behavior, as it represents a time
spent due to transport. Transport has an important, often ignored, influence on
socioeconomic issues, which can be seen as the respiratory and circulatory system of
the urban economy; because it contributes to the distribution of labor, goods, and
services in the industrial and commercial centers of economic space. In consequence,
access to public transport, of course, has a great influence on the distances to work in
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
165
industrial and commercial centers and, therefore, on possibilities of work for people
living in suburban areas.
In a sociological analysis, it can be thought that workers displacements are more
penalized by time than by the family budget expense. Therefore, the economic
development of a country is measured by the speed and density of displacement of
people, goods, and services in its organization. This displacement presupposes that an
effort anda certain period between the departure and arrival times require a cost, called
transfer cost, which must be considered in productivity. The word production, in the
economic sense, involves any activity that generates utility and, consequently, creates
value. In urban public transport by bus, for example, a series of problems can be seen
that lead to the deterioration of service levels offered to users and that negatively
influence both the citizens’ quality of life and the levels of economic, social, and cultural
production.
Given the above, it can be assumed that the economic and social development
of a place is measured by the speed and density of displacement of people, goods, and
services, that is, by mobility, reflecting on people's quality of life. The question is how
to measure mobility, which has been processed through a set of indicators to evaluate
interventions in urban space. Studies to define urban mobility indicators are several
and diverse (Banister et al., 2000; Costa et al., 2004; Costa, 2008). In general, the
proposed indicators are based on three dimensions: physical-environmental,
economic and by grouping: population; of activities, or related to groupings by linear
extension or area.
3. METHOD
The methodology was developed in two steps. The first stage dealt with the
assembly of three maps or thematic cartograms, all of them using the QGIS program
(Cavallini, 2007):
a) Spatial distribution of household income by census sectors, to evaluate sociospatial segregation in the municipal territory;
b) Spatial distribution of basic road infrastructure and main public transport routes;
and
c) Spatial distribution of the percentage of people who spend an average of two or
more hours commuting, by weighting areas, which represents the indicator that
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
166
relates quality of life with urban mobility: the higher this percentage, the worse is
the situation.
This last indicator was obtained using microdata from the Demographic Census
2010, performed by the Brazilian Institute of Geography and Statistics (IBGE). The
microdata records the individual data contained in the sample questionnaire of all
residents in permanent private households who were sampled. For this reason, it
represents a very detailed portrait of reality. The microdata is available by the Brazilian
Institute of Geography and Statistics – IBGE (https://www.ibge.gov.br) in “txt” format.
For them to be tabulated and analyzed, the R statistical program was used.
Operationally, the data were grouped into the so-called weighting areas, which
are areas that aggregate enough residents for the sample data to be statistically
representative. These weighting areas constitute territorial units with some
socioeconomic similarity among their residents. Then, the weighting areas were
mapped using the QGIS program and, subsequently, the corresponding statistical data
was assigned to each one of them. Finally, through the same program, the weighting
areas were classified into four categories of the investigated indicator, intending to
perform the analysis of the spatial distribution of the results.
Given the results in a GIS environment, they could be compared with on-site
records of locational situations of urban infrastructure and transport. Areas with the
most critical results of the urban mobility indicator were selected and the conditions of
the road infrastructure and public transport were observed, thus validating the results
obtained, using the photographic record as the usual tool. The proposed methodology
can be implemented in any region to show the evaluation of urban mobility, relating it
to socio- spatial segregation. Another possibility is to evaluate future scenarios, given
the impact of new investments in terms of better connectivity or service by urban
transport systems.
4. CASE STUDY
The case study took place in Belém – Pará, which, as well as other large
population concentrations in Brazil, showed a strong expansion of the urban area in
recent decades. Part of this expansion has been taking place in a dispersed way, with
the emergence of low-density housing areas or isolated from the preexisting urban
area, configuring urban fragmentation, where many residents move daily to the CDB
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
167
and surrounding area.
4.1 Socio-spatial segregation in belém
The municipality territory of Belém is divided into two parts: a continental and an
insular one. It is in the continental area that most of the population and almost all
economic establishments are concentrated, and, for this reason, the analysis of this
article focuses on the continental and on one of the islands that compose the municipal
territory - Caratateua - spaces where the vast majority of daily trips household-toworkplace occurs. In 2010, nearly 1,400,000 people lived in the capital of Pará,
corresponding to 18.4% of the state's population.
The first standard of socio-spatial segregation can be observed within the First
Property League of Belém (a circle sector shape area with a radius of a league in
length in a straight line from the original city core- on the shores of the Guajará Bay by means of a Sesmarias Donation Letter donated by the Portuguese Crown, in 1627,
to the Municipality Council of Belém), between the highest areas where the largest
concentration of high-income families in the municipality is located and the poor families
living in former floodplain areas, currently urbanized, located in the surroundings, which,
as the name implies, are places with lower altitudes, close to sea level, where the
infrastructure presents a higher or lower level of precariousness, some of which suffer
with flooding during rainy season.
The second standard of socio-spatial segregation is the classic center-suburb,
where the distant suburb (areas far from the First League, as shown in Image 1a),
despite having a great diversity of residential areas, generally presents lower quality
infrastructure than that existing in the high areas of the First League. Most of the
population living in the suburb is low-income.
The third standard of socio-spatial segregation occurs inside distant suburb of
Belém, which houses of diverse socioeconomic groups, due to the emergence of gated
housing developments, where people with higher incomes live and are provided with
security and comfort. These housing developments share the space with people with
lower incomes, who live in the surroundings. This standard of socio-spatial segregation
is presented in Image 1a, that shows the distribution of average household income by
census tract, in the analyzed area.
This process of urban decentralization ended up bringing difficulties in the daily
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
168
trips, because despite people moving to the distant suburb, the urban center still
concentrates the greatest opportunities for employment, commerce, and services,
bringing serious mobility problems to the region, such as the long traffic jams on the
main access roads to the city center.
4.2 Socio-spatial segregation versus urban mobility
Image 1b shows a cartogram with the percentage spatial distribution of people
who spend an hour or more to get to work. Almost all the weighting areas belonging to
the class with the lowest percentage are located within the First Property League of
the municipality of Belém. This can be explained by the fact that it is in this area that
are most of the establishments of commerce and services in the city – therefore, the
largest spatial agglomeration offering occupations –, which also includes the main
commercial center, in consequence constituting the most important urban center.
On the other hand, all weighting areas located in the two classes with the highest
percentages – are in the distant suburb, despite the presence of some important
economic centralities, such as the subcenters of Icoaraci and Entroncamento and the
Industrial District of Icoaraci. It can be seen, then, in a structural context, that it is the
center-suburb segregation that influences the context of urban mobility, due to the
increase of commuting time, due to the concentration of economic establishments
within the First Property League. However, the socio-spatial segregation inside First
League, between high and low areas, is little influenced by travel time.
At a more local scope, inside of distant suburb, as on-site validation, there are
two selected areas, where critical mobility situations were observed (see Image 2): in
Caratateua Island (1) and in an intermediate area of the suburb, on the margins of a
large urban transport corridor, called Av. Augusto Montenegro (2). In these areas, the
presence of another factor that influences travel times was noticed: the quality of road
infrastructure and public transport routes. It can be seen, comparatively, in Images 3a
and 3b, the road network and the scarce public transport network. This factor is related
to socio-spatial segregation within the suburban space. The rarefied infrastructure and
the low range of spatial service of public transport network make the average
commuting time higher.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
169
Image 1: a) Average household income by census sector and b) Economic active people who spend
more than an hour commuting in weighting areas
Source: Authors, 2018; based on census of IBGE (2010).
Image 2: Selected weighting areas for on-site verification of the conditions of socio-spatial
segregation, infrastructure, and public transport service
Source: elaborated by Rendeiro, 2018, based on Google Maps.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
170
Image 3: a) Road Network and b) Public Transport Network in areas (1) and (2) respectively
Source: elaborated by Rendeiro, 2018, based on Google Maps.
Image 4: Images of areas (1) and (2), respectively
Source: Authors, 2018. Images of 27/04/2018.
The on-site verification of the conditions of socio-spatial segregation on the
areas (1) and (2) selected, allowed the visualization of the conditions of the road
network and transport. Image 4 attests to these conditions as compatible with the
situations verified in Images 1 and 3, validating the hypothesis that the socio-spatial
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
171
segregation of the distant suburb influences urban mobility, permeated by precarious
road infrastructure and poor conditions of public transport service. It should be noted
that the average travel time is also affected by walking to public transport access
points, increasing the entirely travel cost.
5. CONCLUSION
The hypothesis that socio-spatial segregation has an influence on urban mobility
indicators – in particular, on the average travel time from home to work – proved to be
plausible. Center-Suburb segregation is the main factor in this regard, due to the long
distances between homes located on the suburb and the large concentration of
economic establishments in the center. However, another socio-spatial segregation of
a more local context, which occurs in the suburb context, also interferes with the
indicator in question: in the results, the maps generated, compared with the on-site visit,
allowed to identify in selected areas the mobility being affected by the scarcity of road
infrastructure and the lack of public transport services, making the priorities for
investment in road infrastructure and transport crucial.
Increased travel times on public transport towards the suburb area, associated
with the predominance of low-income population involved and the dependence on the
center for its main activities, refers to the urgent need of public authorities, especially
in the municipal and state spheres, to initiate an effective economic decentralization
policy, with the stimulus for creation of new economic subcenters or the strengthening
of the existing ones. It is also of fundamental importance to improve the infrastructure
in places where it is most precarious, in addition to the necessary articulation between
local transport modes with an integrated trunk transport system, in the case of Belém,
a system is under construction: the Bus Rapid Transit - BRT.
In conclusion, the urban development model of Belém must be rethought,
expanding spaces for its economic activities, integrating them in a sustainable way, as
a form to reducing spatial inequalities, with a positive effect on reducing socio-spatial
segregation and improving the indicators of urban mobility.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
172
REFERENCES
Azevedo, S. J. S. (2009) Segregação e oportunidades de acesso aos serviços
básicos de saúde em Campinas: vulnerabilidades sociodemográficas no espaço
intraurbano, Tese (Doutorado), UNESC, Campinas, Brasil, 235 p.
Banister, D., Stead D., Steen, P., Akerman, J., Dreborg, K., Nijikamp, P. and
Tappeser R.S. (2000) Targets for Sustainability Mobility, European Transport Policy
and Sustainable Mobility, Spon Press, 119p.
Batty, M., Besussi, E. e Chin, N. (2003) Traffic urban growth and suburban sprawl,
Working papers, paper 70, Centre for Advanced Spatial Analysis, UCL, London.
Brasil, (2012, 4 de janeiro) Lei nº 12.587 de 3 de janeiro de 2012, Institui as diretrizes
da Política Nacional de Mobilidade Urbana e dá outras providências, Brasília: Diário
Oficial da União.
Bourdieu, P. (2003) Efeitos de lugar. In: Bourdieu, P. (org.). A miséria do mundo.
Petrópolis: Vozes.
Burgess E. W. (1925) The growth of the city, in Park, R.E., Burgess, E.W. and
McKenzie, R.D. (eds.), The City, University of Chicago Press, USA, pp. 47–62.
Cardoso, A. C. D., Lima, J.J.F, Sena, L.F.A, Santos, R.B.N e Cruz, S.H.R (2006) A
estrutura socioespacial da região metropolitana de Belém: de 1990 a 2000. Novos
Cadernos, NAEA, Vol. 10, No. 1, pp. 143-183, dez 2006.
Costa, M.S., A.N.R. e Ramos, R.A.R. (2004) Indicadores de Mobilidade Urbana
Sustentável para o Brasil e Portugal. Workshop, Plano Integrado: em busca de
desenvolvimento Sustentável para Cidades de Pequeno e Médio Portes.
Universidade do Minho, Braga, Portugal.
Costa, M. S. (2008) Um Índice de Mobilidade Urbana Sustentável. Tese (Doutorado),
Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos,
Brasil.
Costa, S. C. da S., Silva, T. S. da, e Silva, R. de O. (2020). Mobilidade e
desenvolvimento análise da construção da mobilidade urbana na cidade de Aracaju.
Brazilian Journal of Development, v.6, No. 9, pp. 69689-69707, sep. Doi:
https://doi.org/10.34117/bjdv6n9- 424.
Cunha, J. M. P. e Jakob, A. A. E. (2010) Segregação socioespacial e inserção no
mercado de trabalho na Região Metropolitana de Campinas, Revista Brasileira de
Estudos de População, São Paulo, Vol. 27, No. 1, pp. 115-139.
e Jiménez, M. A. (2009) The process of cumulative disadvantage:
concentration of poverty and the quality of public education in the Metropolitan
Region of Campinas. In Roberts, B. e Wilson, R. (eds.), Urban segregation and
governance in the Americas, New York: Palgrave-Macmillan, New York, pp. 169-185.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
173
Cunha e Jiménez, M. A. (2009) The process of cumulative disadvantage:
concentration of poverty and the quality of public education in the Metropolitan
Region of Campinas. In Roberts, B. e Wilson, R. (eds.), Urban segregation and
governance in the Americas, New York: Palgrave-Macmillan, New York, pp. 169-185.
Cavallini, P. (2007) Free GIS desktop and analyses: QuantumGIS, The easy way,
The Global Geospatial Magazine.
Deák, C. (2015) O processo de urbanização brasileiro, Falas e Façanhas, in Deák,
C. and Schiffer, S. (eds.), O processo de urbanização no Brasil, Edusp/Fupam, São
Paulo. Disponível em http://www.usp.br/fau/docentes/depprojeto/c_deak/
CD/3publ/99pub/index.html (consultado em 29 maio 2015).
Domingues, A. (1994) (Sub)úrbios e (sub)urbanos: o mal estar da periferia ou a
mistificação dos conceitos? Revista da Faculdade de Letras Geografia, Porto,
Vol. XX/XI, pp. 5-18.
Fernandes, J. C. M. L. (2012) Assentamentos Precários e Dispersão Urbana: o caso
da Região Metropolitana de Belém. Mestrado, Programa de Pós-graduação em
Desenvolvimento e Meio Urbano, Universidade da Amazônia, Belém, PA, Brasil.
Flores, C. (2006) Conseqüências da segregação residencial: teoria e métodos. In:
CUNHA, J. M. P. (org.). Novas Metrópoles Paulistas: população, vulnerabilidade e
segregação. Campinas: Nepo/Unicamp, pp. 197 – 230.
Gottdiener, M. (1993) A Produção Social do Espaço Urbano. Edusp, São Paulo,
Brasil. Hoyt H. (1939) The Structure and Growth of Residential Neighborhoods in
American Cities. Federal Housing Administration, Washington DC, USA.
Jargowsky, P. A. (2001) Sprawl, concentrations of poverty and urban inequality, in
Squires, G. (Ed), Urban Sprawl: causes, consequences and policy responses.
Wahshington D. C. Urban Intitute Press, Wahshington D. C., pp. 39-72
Kowarick L. (2000) Escritos Urbanos, Editoria 34, São Paulo, Brasil.
Lago, L. C. (2000) Estruturação urbana e mobilidade espacial: uma análise das
desigualdades socioespaciais na Metrópole do Rio de Janeiro, Tese (Doutorado),
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), Universidade de São Paulo, Brasil,
254p. Maerivoet, S. e De Moor, B. (2005) Transportation Planning and Traffic Flow
Models, Technical report, Katholieke Universiteit Leuven. Disponível em:
ftp.esat.kuleuven.be in the directory pub/sista/smaerivo/reports/paper-05-.p.
(Consultado em 27/04/18).
Matos, R. E. S. A (1994) Desconcentração populacional em Minas Gerais e as
mudanças na Região-Core, Anais do Encontro Nacional de Estudos Populacionais,
ABEP, Caxambu, Belo Horizonte.
Negri, S. M. (2008) Segregação Socioespacial: alguns conceitos e análise,
Coletânea Nosso Tempo, Rondonópolis, MT, Vol. VII, No. 8, pp. 129-153.
Paviani, A. (2013) O crescimento das metrópoles e problemáticas de lenta
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
174
solução, Desafios do Desenvolvimento, v. 10, p. 55.
Rigotti, J. I.; Rodrigues, R. N. (1994) Distribuição espacial da população na Região
Metropolitana de Belo Horizonte, Encontro Nacional de Estudos Populacionais,
ABEP, Caxambu, Belo Horizonte.
Rodriguez, J. (2007) Paradojas y contrapuntos de dinámica demográfica
metropolitana: algunas respuestas basadas en la explotación intensiva de
microdatos censales, in De Mattos, C. e Hidalgo, R. (eds.), Santiago de Chile:
movilidad espacial y reconfiguración metropolitana, Colección EURE Libros, Serie
GEOlibros, Santiago de Chile, Chile, No. 8, pp. 19-52.
Santos, D. P. e Ferreira, I. M. (2016) A segregação espacial e residencial na cidade
contemporânea, in Neves, A. F., De Paula, M. H., Anjos, P. H. R., Bernardo, J. L. e
Pires, M. G. G., Estudos interdisciplinares em Ciências Ambientais, Território e
Movimentos Sociais. Blucher, São Paulo, Brasil. p. 175-189.
Singer P. (1973) A Guisa de Introdução: urbanização e classes sociais. Economia
Política da Urbanização, Brasiliense, São Paulo, pp. 11-28.
Torres, H. G, Ferreira, M.P. e Gomes, S. (2005) Educação e segregação social:
explorando o efeito das relações de vizinhança, in Marques, E. e (orgs.), São Paulo:
segregação, pobreza e desigualdade, Editora do Senac, São Paulo, SP, pp. 123-14.
Villaça, F. (2004) Uma contribuição para a história do planejamento urbano no
Brasil, in Deák, C. and Schiffer, S. (eds.), O processo de urbanização do Brasil,
Editora da USP, São Paulo, SP, pp.169-243.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92981-92996 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
175
CAPÍTULO 10
IMPACTO DA PSORÍASE EM ÁREAS ESPECIAIS NA QUALIDADE DE VIDA E A
PERSPECTIVA DE TRATAMENTOS MAIS PROMISSORES: REVISÃO NARRATIVA
Luísa Gouveia Alves Moraes
Acadêmica do curso de Medicina, Centro Universitário das Américas (FAM)
Rua Augusta 1508, Bairro Consolação – São Paulo, SP, CEP: 01304-001
E-mail: luisagouveiaa_@hotmail.com
Kenderly Camila Baltokoski
Acadêmica do curso de Medicina, Centro Universitário das Américas (FAM)
Rua Augusta 1508, Bairro Consolação – São Paulo, SP, CEP: 01304-001
E-mail: kenderly.vda@gmail.com
Giovanna Moysés
Acadêmica do curso de Medicina, Centro Universitário das Américas (FAM)
Rua Augusta 1508, Bairro Consolação – São Paulo, SP, CEP: 01304-001
E-mail: moysesgiovanna@gmail.com
Ruth Cordeiro do Rosário
Acadêmica do curso de Medicina, Centro Universitário das Américas (FAM)
Rua Augusta 1508, Bairro Consolação – São Paulo, SP, CEP: 01304-001
E-mail: ruthcord2478@gmail.com
Isabela Possari Librelotto
Acadêmica do curso de Medicina, Centro Universitário das Américas (FAM)
Rua Augusta 1508, Bairro Consolação – São Paulo, SP, CEP: 01304-001
E-mail: isabelapossari_@hotmail.com
Amanda Vieira Serrano
Acadêmica do curso de Medicina, Centro Universitário das Américas (FAM)
Rua Augusta 1508, Bairro Consolação – São Paulo, SP, CEP: 01304-001
E-mail: mandinhavs2@gmail.com
Natália Pastorello
Acadêmica do curso de Medicina, Centro Universitário das Américas (FAM)
Rua Augusta 1508, Bairro Consolação – São Paulo, SP, CEP: 01304-001
E-mail: nataliapastorello@outlook.com
Ariadne Bonachela de Moura
Acadêmica do curso de Medicina, Centro Universitário das Américas (FAM)
Rua Augusta 1508, Bairro Consolação – São Paulo, SP, CEP: 01304-001
E-mail: aridemoura@gmail.com
Domingos Jordão Neto
Médico, Mestrado na Universidade de São Caetano do Sul (USCS), Coordenador e
chefe do serviço de Dermatologia do Hospital Heliópolis-SP, Docente do curso de
Medicina da Universidade de São Caetano do Sul (USCS)
Rua Cônego Xavier, 276, Bairro Sacomã – São Paulo, SP, CEP: 04231-030
E-mail: dr.domingosjordao@gmail.com
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
176
RESUMO: Introdução: A psoríase representa uma doença autoimune, sistêmica e
crônica, relacionada ao aparecimento de pápulas e placas eritemato-escamosas
presentes em diferentes áreas do corpo, como cabeça, órgãos genitais e pernas. Além
das lesões psoriásicas, há um significativo prejuízo na qualidade de vida,
principalmente quando se trata de psoríase em áreas especiais, abrangendo não
apenas a questão física como também financeira e psicossocial. Esse prejuízo se dá
de tal forma que é capaz de alterar as perspectivas do paciente a longo prazo,
aumentando o risco de desenvolver doenças cardiovasculares e distúrbios
psicológicos. Objetivo: Desenvolver e aprofundar o conhecimento da psoríase em
áreas especiais, destacando o impacto da qualidade de vida dos pacientes e a
dificuldade da resposta terapêutica nessas áreas. Desenvolvimento: Pacientes com
psoríase em áreas especiais frequentemente adquirem impactos físicos, problemas
sociais e emocionais significativos. Em conjunto, a psoríase inversa (axilas, virilhas,
embaixo das mamas e ao redor dos genitais), a psoríase do couro cabeludo, a
psoríase palmoplantar e a psoríase ungueal resultam em direta redução da qualidade
de vida. Considerações Finais: Psoríase em locais de difícil tratamento
frequentemente trazem aos pacientes grande impacto na qualidade de vida, com
consequente disfunção e efeitos psicológicos. O uso da terapia sistêmica com
imunobiológicos costuma ser indicado, ao considerar a frequente ineficácia e
desconforto relacionada ao uso de tratamento tópico e fototerapia. Finalizando, é
imprescindível que na abordagem ao paciente, sejam mensuradas abertamente as
reais expectativas sobre a terapêutica e os planos para o futuro, para desta forma
evitar o surgimento de respostas inalcançáveis e falha na adesão ao tratamento.
PALAVRAS-CHAVE: Psoríase; Áreas especiais; Qualidade de vida.
ABSTRACT: Introduction: Psoriasis is an autoimmune disease, systemic and chronic,
related to the appearance of erythematous-squamous papules and plaques present in
different areas of the body, such as the head, genitals and legs. In addition to psoriatic
lesions, there is a significant loss in quality of life, especially when it comes to psoriasis
in special areas, covering not only the physical but also the financial and psychosocial
issues. This damage occurs in such a way that it is capable of changing the patient's
perspectives in the long term, increasing the risk of developing cardiovascular
diseases and psychological disorders. Objective: To develop and deepen the
knowledge of psoriasis in special areas, highlighting the impact on patients' quality of
life and the difficulty of therapeutic response in these areas. Development: Patients
with psoriasis in special areas often acquire significant physical impacts, social and
emotional problems. Together, reverse psoriasis (armpits, groin, under the breasts and
around the genitals), scalp psoriasis, palmoplantar psoriasis, and nail psoriasis result
in a direct reduction in quality of life. Final Considerations: Psoriasis in difficult-to-treat
places often has a great impact on patients' quality of life, with consequent dysfunction
and psychological effects. The use of systemic therapy with immunobiologicals is
usually indicated, considering the frequent inefficacy and discomfort related to the use
of topical treatment and phototherapy. Finally, it is essential that when approaching the
patient, the real expectations about the therapy and plans for the future are openly
measured, in order to avoid the emergence of unattainable responses and failure to
adhere to the treatment.
KEYWORDS: Psoriasis; Special areas; Quality of life.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
177
1. INTRODUÇÃO
Psoríase vulgar é uma doença autoimune, sistêmica e crônica que está
relacionada ao aparecimento de pápulas e placas eritemato-escamosas em todo o
corpo, podendo estar presentes em áreas como cabeça, órgãos genitais e pernas.1 O
aparecimento pode ocorrer tanto durante a infância quanto na idade adulta.1 A
psoríase pediátrica é uma doença de extrema importância à prática clínica, tendo em
vista sua prevalência relevante, além de seu impacto psicossocial tanto ao paciente
quanto a seus cuidadores e as comorbidades associadas. A distribuição desta doença
em crianças inclui o envolvimento da face, couro cabeludo e pele intertriginosa. Já em
bebês a manifestação da psoríase das fraldas (também conhecida como “psoríase
dos guardanapos”) é a mais comum.2 A psoríase genital foi considerada a pior no
quesito de estigma das áreas afetadas pela psoríase, podendo ter prejuízo na saúde
sexual. Quanto a psoríase inversa, distúrbio de áreas intertriginosas da pele que pode
facilmente se mascarar como um câncer; se houver falha no tratamento, má adesão
ou resistência aos medicamentos, o diagnóstico pode se tornar suspeito ou até mesmo
incorreto caso não tenha sido bem analisado.3 Há também, a artrite psoriásica (APs)
que é uma doença inflamatória crônica de múltiplos órgãos, geralmente soronegativa
para o fator reumatoide, com prevalência em torno de 1% na população geral. É uma
doença multifacetada, podendo apresentar envolvimento músculo esquelético (artrite
periférica, dactilite, entesite, inflamação da coluna), doenças da pele e das unhas ou
manifestações extra-articulares, como uveíte e doença inflamatória intestinal.4
Na epidemiologia da psoríase é estimado que a mesma afeta de 2 a 4% da
população mundial.5 Tal comorbidade aparece em uma grande variedade de fenótipos
que resultam principalmente em uma alta carga de doenças.5 A prevalência da psoríase
genital isoladamente, foi avaliada entre 2 e 5% de todos os pacientes, no entanto, o
tipo de placa generalizada ou psoríase intertriginosa também afeta uma área genital,
sendo cerca de 29 a 40% dos casos de psoríase.5
Essa afecção, além das lesões na pele, se relaciona com o risco aumentado
de desenvolver doenças cardiovasculares, distúrbios psicológicos, como depressão,
ideação suicida e ansiedade, e até mesmo de mortalidade do indivíduo, quando
comparados a população sem as lesões.1 Embora sua causa seja desconhecida, o
desenvolvimento da psoríase pode estar relacionado a uma complexa interação de
fatores genéticos, imunológicos e ambientais. Acredita-se que a psoríase se
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
178
desenvolve quando os linfócitos T promovem um estado pró-inflamatório pela
liberação de citocinas e outros mediadores, como interleucina 17, 8 e 6, interferon-γ
(INF-γ), fator de necrose tumoral- alfa (TNF-alfa) e fator de crescimento endotelial
vascular. Além disso, a interleucina 23 (IL-23) foi identificada como uma das principais
citocinas envolvidas na resposta mediada por células T. A IL-23 compartilha a
subunidade p40 com IL-12, mas é composta de uma subunidade p19 única. Assim,
essas duas citocinas mantêm distintas funções biológicas, agora com a IL-23 tendo
papel proeminente na patogênese da psoríase.6
Sua apresentação clínica mais comum está relacionada a placas bem
demarcadas, eritematosas e escamosas, sendo acompanhadas muitas vezes de dor
e prurido.6
É sabido que há significativo prejuízo na qualidade de vida relacionada à saúde
(QVRS) no paciente com psoríase, abrangendo não apenas a questão física como
também financeira e psicossocial. Esse prejuízo se dá de tal forma que é capaz de
alterar as perspectivas à longo prazo do paciente, comprometendo em especial as
expectativas de vida do mesmo, uma vez que a psoríase é uma patologia imprevisível
e de comportamento único para cada indivíduo levando o paciente a dúvidas e
incertezas quanto ao futuro.7 Além destes fatores, o prejuízo a qualidade de vida é
ainda maior quando se trata do sexo feminino e início precoce das placas de psoríase,
sendo este um fator importante para autoestima e piora do bem-estar do indivíduo.8
O impacto da APs parece ser muito amplo, cobrindo todos os aspectos da vida
do paciente, ou seja, físicos e emocionais, distúrbios do sono, fadiga extrema,
comprometimento social, entre outros; assim, a avaliação da QV em APs torna-se
fundamental. A melhor compreensão dos problemas de qualidade de vida pode
melhorar o atendimento e a comunicação médico-paciente. Várias pontuações estão
disponíveis para avaliar esses aspectos da APs. De acordo com a Organização
Mundial da Saúde (OMS), qualidade de vida (QV) representa a percepção do indivíduo
de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive
e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações. A OMS
desenvolveu uma linguagem padrão e sistêmica de classificação para funcionalidade
e deficiência: a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde
(CIF). Na CIF, funcionalidade e deficiência são multidimensionais. Esses termos
denotam os aspectos positivos ou neutros, que seria o funcionamento, ou aspectos
negativos, a deficiência, da interação entre a(s) condição(ões) de saúde de uma
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
179
pessoa e seus fatores subjetivos, tanto ambientais como pessoais. O Grupo de
Pesquisa e Avaliação de Psoríase e Artrite Psoriática (GRAPPA) e Grupo Outcome
Measures in Rheumatology (OMERACT) incluiu o domínio QV relacionada à saúde
no conjunto de domínios básicos da APs, evidenciando a importância da avaliação da
QV em pacientes com artrite. O Core Domain Set inclui os domínios obrigatórios para
serem abordados em ensaios clínicos de APs e estudos observacionais longitudinais.4
O artigo relata também o desenvolvimento do Diário de Sinais e Sintomas da
Psoríase (PSSD), questionário de alta relevância clínica para o relato de sinais e
sintomas da psoríase moderada a grave dos pacientes. Nele, a perspectiva do
paciente psoriásico mostra-se importante ao considerar a grande variedade de sinais
e sintomas que este pode apresentar, permitindo melhor avaliação destes e
consequentemente melhor prognóstico à doença.9
Partindo desta explanação, veremos a seguir como a psoríase mostra-se
relevante, já que se trata de uma doença crônica, incurável e que afeta de forma
negativa a qualidade de vida dos pacientes.
5
Como objetivo geral, esta revisão da
literatura buscou desenvolver e aprofundar o conhecimento da psoríase em áreas
especiais, destacando o impacto da qualidade de vida dos pacientes e a dificuldade
da resposta terapêutica nessas áreas.
2. DESENVOLVIMENTO
A psoríase representa o resultado de um conjunto de fatores ambientais e
genéticos. Um fator de risco comum é o histórico familiar da doença, sendo que o risco
genético predisponente mais comum é o antígeno leucocitário humano (HLA) tipo Cw6
(PSOR1) e o menos frequente é a mutação patogênica no CARD14, conhecido
também como PSOR2. Os fatores ambientais, como traumas cutâneos, infecções e
estresse físico ou psicológico também podem ocasionar ou até mesmo estimular a
doença.11
Sobre a patogenia da doença, a psoríase é uma inflamação cutânea mediada
pelo sistema imunológico inato e adaptativo. Ocorre a inflamação das células
dendríticas pelo fator de necrose tumoral (TNF-Alfa), interleucinas (IL-6 e IL-1) e
interferon-gama, que estimulam o sistema imune adaptativo. Esse sistema expressa
citocinas sinérgicas que estimulam a liberação de mediadores inflamatórios nos
queratinócitos, resultando nas placas eritematosas e escamosas da psoríase.11
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
180
As placas originadas pela psoríase podem ser apresentadas de diversas
formas e distribuições. Em crianças, as principais são: gutata, pustular e eritrodérmica.
A apresentação clássica dessas placas é em formato redondo, eritematoso, bem
demarcado e coberto com uma escala prateada e/ou branca (micácea). Em crianças,
essas placas possuem margens menos distintas e/ou uma escala mais fina. Em
indivíduos com pele altamente pigmentada, o eritema pode aparecer violáceo ou
hiperpigmentado. 11 Sobre a sua distribuição, pode ocorrer com poucas placas em um
único local ou de forma mais generalizada (muitas placas em diversos locais), mas a
distribuição é frequentemente simétrica. Em psoríase com placas crônicas, os locais
mais comuns são cotovelos e joelhos, porém podem acometer outros locais, como as
áreas especiais (couro cabeludo, região palmoplantar, região ungueal e região
anogenital).11
Em relação às principais comorbidades associadas à psoríase, destacam-se:
obesidade, risco cardiovascular, artrite e perturbação psiquiátrica. A artrite psoriásica
também representa uma comorbidade comum da psoríase, sendo necessário rastrear
vermelhidão ou inchaço nas articulações.11 Normalmente o diagnóstico ocorre em
caráter clínico e, de modo geral, não se faz necessária a biópsia de pele. O histórico
familiar, sintomas articulares e a distrofia das unhas servem como apoio dessa
investigação clínica. Além disso, outras doenças podem surgir como diagnóstico
diferencial, como a dermatite atópica, pitiríase rósea, pitiríase liquenóide crônica e
pitiríase rubra pilar.11
Pacientes com psoríase em locais de difícil tratamento frequentemente
adquirem impactos físicos e emocionais significativos que interferem na qualidade de
vida, além de enfrentarem dificuldades com a adesão à terapia tópica, podendo assim
justificar-se a classificação de lesões psoriásicas nesses locais como grave, mesmo
que apresentem extensão limitada.10
2.1 Psoríase em área inversa
A psoríase inversa é considerada uma variante anatômica da psoríase vulgar,
por isso, não se atribuiu um código distinto na classificação internacional de doenças.
A prevalência mundial de psoríase varia de 1% a 3%, e estudos obtidos recentemente
mostram que 3% a 12% dos pacientes com psoríase manifestam a psoríase do tipo
inversa.3
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
181
A psoríase inversa também pode ser denominada como psoríase flexural ou
psoríase intertriginosa, podendo ser fétida e/ou pruriginosa. Se presentes, lesões
psoriasiformes em outras partes do corpo, história familiar de psoríase e
características anormais da unha tique-taque levam a um diagnóstico de psoríase.3
O abalo psicossocial da psoríase muitas vezes causa mais angústia do que
suas repercussões físicas, e a percepção de estigma tem grande influência no
funcionamento social e na autoimagem. O pico do início da psoríase varia de 15 a 30
anos de idade, quando as questões relativas à saúde sexual são mais prováveis que
tenham um efeito negativo na criação, e a manutenção das relações interpessoais.12
Fatores como gênero – mulheres têm mais comprometimento da qualidade de
vida do que os homens – e idade precoce causam maiores prejuízo na qualidade de
vida e saúde sexual desses pacientes. Foram reveladas deficiências relevantes na
qualidade de vida sexual, aumento da sensação de estigma e taxas superiores de
depressão entre pacientes com psoríase genital.13
A psoríase genital costuma cursar com rubor intenso acompanhado de outras
queixas, como: coceira genital (sintoma mais comum, relatado por mais de 82%
dos pacientes), prurido (relatado por 40% dos pacientes), sensação de picadas e
queimação (em 40% dos casos) e dor (sintoma de maior incômodo, relatada por 20%
dos pacientes).1 A psoríase genital apresenta grandes impactos na função sexual do
paciente, uma vez que se sentem desconfortáveis com sua aparência e nudez
diminuindo a frequência, o desejo e até evitando relações sexuais. A dor também está
presente durante ou após o ato, intensificando os sintomas apresentados, sendo este
um impacto que acomete principalmente mulheres.1
As lesões genitais apresentam grandes repercussões na qualidade de vida do
paciente, mesmo quando comparado aos casos de psoríase sem lesões genitais. O
impacto se apresenta com infortúnios nos relacionamentos amorosos e sociais,
problemas emocionais e interferência nas atividades diárias, levando o paciente a
depressão e ideação suicida.1
O envolvimento facial e anogenital em crianças é maior do que em adultos,
com psoríase facial presente como única manifestação psoriática em 4-5% dos
pacientes; já a psoríase anogenital é a apresentação clínica mais comum em crianças
menores de 2 anos. No início da doença, os locais mais acometidos são o couro
cabeludo, tronco e extremidades. O couro cabeludo costuma ser mais acometido em
meninas, enquanto as unhas costumam ser mais acometidas em meninos. A psoríase
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
182
em bebês frequentemente envolve o acometimento da área de fralda, apresentando
placas cor de salmão ou eritema confluente, possivelmente relacionados ao fenômeno
de Koebner. A diferenciação entre a psoríase de fralda e outras irritações de pele por
fraldas pode ser difícil, já que a descamação psoriática pode não ser visível pela alta
hidratação na área ocluída em questão; nesses casos, o envolvimento de área
umbilical ou disseminação das placas pode ajudar no diagnóstico. 2
A psoríase inversa pode ser facilmente confundida com dermatoses
infecciosas, particularmente bacterianas ou fúngicas. O intertrigo é a inflamação de
dobras cutâneas causadas pela fricção pele a pele que se apresenta como placas
eritematosas maceradas. Já em áreas bacterianas e fúngicas são comuns porque a
pele úmida e desnuda, oferece um ambiente ideal para crescimento de
microrganismos. A Cândida é o organismo fúngico mais comum associado ao
intertrigo, uma candidíase intertiginosa também apresenta manchas eritematosas
demarcadas com pápulas satélites e pústulas, ou pústulas na periferia; a presença de
pápulas ou pústulas satélites periféricas podem ajudar a diferenciar candidíase
intertriginosa da psoríase inversa. A dermatite seborreica é outra doença cutânea que
pode se assemelhar facilmente a psoríase inversa ou candidíase; a biópsia de pele
pode ajudar a diferenciá-las, sendo que na primeira mostra uma aparência
"espongiforme".3
Há um baixo índice de satisfação com o uso de regimes tópicos de tratamento;
embora o uso de agentes de sistemas tradicionais pareçam melhorar a doença genital,
o uso de terapias biológicas conhecidas tem benefício limitado no tratamento do
quadro. O uso de corticosteróides de alta potência são limitados, devido ao
desenvolvimento de atrofia e estrias da pele, enquanto inibidores da calcineurina
podem melhorar os órgãos genitais acometidos, porém, podem causar irritação.12
2.2 Psoríase do couro cabeludo
A psoríase do couro cabeludo apresenta grande impacto na qualidade de vida
de pacientes e significativa prevalência em pacientes psoriáticos, sendo o primeiro
local acometido em até 25% dos pacientes com psoríase e presente em até 79% dos
pacientes que apresentam psoríase vulgar crônica. Frequentemente, apresenta-se
com prurido. Seu tratamento é muitas vezes prolongado e possui algumas
desvantagens como irritação facial, dificuldade na administração de drogas, coloração
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
183
capilar e consequências cosméticas que dificultam sua eficácia e adesão.14
O tratamento da psoríase do couro cabeludo foi dividido por Peter Van de
Kerkhof em 4 fases: primeira fase, com uso de ácido salicílico ou preparações de ureia
para descalcificação; segunda fase, com uso de corticosteroides tópicos, análogos de
vitamina D, alcatrão, ditranol, antifúngicos, terapia com luz ultravioleta B ou
tratamentos sistêmicos, sendo esta a fase de limpeza; terceira fase, utilizando um
análogo de vitamina D poupador de esteróides durante a semana e um corticosteróide
tópico superpotente aos finais de semana, sendo a fase de estabilização; e a quarta
fase, com o uso de um análogo de vitamina D isoladamente ou associado ao uso de
um shampoo de alcatrão. 14
A curto prazo, é recomendado o uso de corticosteroides tópicos como
tratamento de primeira linha. Espuma de propionato de clobetasol 0,05% e espuma de
betametaso na valerato 0,12% são alternativas às preparações tópicas tradicionais,
já que o veículo de espuma é absorvido mais rapidamente, reduz a descamação,
apresenta maior biodisponibilidade, pode ser usado apenas uma vez ao dia e não está
associado à supressão do eixo hipotalâmico hipofisário adrenal, sendo igualmente
eficaz. Shampoos de clobetasol 0,05% também podem ser utilizados, apresentando
melhor adesão quando comparados aos tratamentos tópicos convencionais. 14
Para o tratamento a longo prazo da psoríase de couro cabeludo, pode ser
usado o creme de antralina 0,1-3% uma vez ao dia, com sua concentração variando de
acordo com a resposta e tolerância do paciente ao longo do tratamento. Seu uso deve
ser evitado em couro cabeludo agudamente inflamado, e pode temporariamente
manchar unhas, cabelos brancos ou grisalhos, pele e tecidos, além de comumente
causar vermelhidão ou irritação do couro cabeludo. 14
Tratamentos de segunda linha como fototerapia (com unidades convencionais
ou pentes de UV e Excimer Laser), medicamentos sistêmicos e biológicos são
utilizados apenas em casos de doença recalcitrante, ou seja, quando o uso de todas
as opções disponíveis para tratamento tópico falham, não havendo estudos
controlados sobre seu uso. 14
Um grande desafio à efetividade do tratamento para psoríase de couro
cabeludo está associado à entrada de drogas no sítio desejado: as placas psoriásicas
possuem padrão de escamas grossas, reduzindo a penetração da droga e precisando
ser removidas. O ácido salicílico 5–10% é utilizado como ceratolítico em combinação
com outras terapias tópicas. Para hidratação do couro cabeludo, uréia 10% e ácido
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
184
lático 10% têm sido usados. Já em casos resistentes, derivados tópicos de imidazol
podem ser utilizados, visando conter o crescimento excessivo de pityrosporum. 14
Foram analisados também os usos de terapia anti-fator de necrose tumoral alfa,
como infliximabe, etanercept, adalimumabe e ustekinumabe. Tanto o uso de
infliximabe quanto de etanercept foram considerados extremamente recomendáveis
e eficazes no tratamento da psoríase de couro cabeludo. O adalimumabe parece ser
benéfico no tratamento de psoríase do couro cabeludo, com evidências moderadas
de eficácia. O uso de ustekinumabe pode ter um papel no tratamento da psoríase de
couro cabeludo, não sendo recomendado, mas também não desaconselhado. Em
relação aos efeitos adversos do tratamento anti-TNF alfa, pode-se destacar alopecia
não cicatricial, já que em biópsias apresenta alterações epidérmicas psoriasiformes e
infiltrados de células plasmáticas e eosinófilos na derme, diferenciando-a da alopecia
areata e alopecia psoriásica, respectivamente. 10
2.3 Psoríase palmoplantar (PPP)
A psoríase palmoplantar causa grande impacto na qualidade de vida e afeta as
atividades diárias dos indivíduos acometidos com essa condição. Os pacientes
possuem prejuízo pela doença de pele, diminuição da capacidade motora,
autocuidado e dependência de medicações de uso tópico. A psoríase palmoplantar é
uma doença única, apesar de ter 2 fenótipos envolvidos, placa palmoplantar e pústula
palmoplantar que, por mais que tenha semelhança clínica, esse último tipo apresenta
evidências de que, geneticamente, pode ser um tipo diferente de psoríase.15
A psoríase palmoplantar possui como sintomas fissuras, hiperceratose e, em
alguns casos, pústulas, com sobreposição de ambos os tipos morfológicos,
apresentando, portanto, significativa morbidade ao paciente. Em adição, é um dos
locais em que o curso clínico é mais recalcitrante e de menor índice de eficácia à
terapia tópica, ilustrando a escassez de estudos específicos. Seus objetivos
terapêuticos podem muitas vezes priorizar a redução da dor e melhora da
funcionalidade à sua depuração completa. 14
O ácido acetilsalicílico é utilizado como queratolítico associado a agentes
tópicos, como corticosteróides, na psoríase palmoplantar. Ele bloqueia a penetração
de UVB, não devendo ser associado à fototerapia. 14
O uso de esteróides tópicos potentes e superpotentes têm sido adotados para
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
185
tratamento da PPP por períodos de até 6-8 semanas. O uso de formulações em
espuma de valerato de betametasona 0,12% e de propionato de clobetasol a 0,05 %
resulta em melhor conformidade do paciente em relação às formas tradicionais,
apresentando benefícios como facilidade de aplicação, secagem rápida, falta de
fragrância e resíduo mínimo. 14
O alcatrão de carvão é utilizado na psoríase palmoplantar, possuindo
propriedades antibacterianas,
antifúngicas,
efeitos
antipruriginosos
e
anti-
inflamatórios, além de alta biodisponibilidade e baixo custo. Seu uso em forma de
pomada de alcatrão de carvão bruto 1 a 5% com vaselina, amido e óxido de zinco é
comum. 14
O calcipotriol demonstrou eficácia na psoríase palmoplantar, podendo ter seus
benefícios
potencializados
em
um
regime
alternado
entre
calcipotriol
e
corticosteróides tópicos potentes. 14
A combinação de corticosteróides tópicos à análogos de vitamina D pode ser
eficaz ao tratamento da PPP, apresentando melhores resultados e menos efeitos
colaterais em comparação aos seus usos de forma isolada. O tratamento sequencial
com o uso tópico inicial de corticosteróide seguido pelo uso de análogo de vitamina D
a longo prazo, têm demonstrado melhora rápida das lesões e segurança de utilização
de tal tratamento a longo prazo. 14
Agentes oclusivos também podem ser utilizados para o tratamento da psoríase
palmoplantar: entre eles, podemos citar o uso oclusivo de esteróides tópicos, curativos
hidrocolóides e adesivo de hidrogel. O uso de curativos hidrocolóides podem culminar
em irritação, foliculite, suor excessivo e coebenerização, além de ser um tratamento
de alto custo.14
O uso de ciclosporina é indicado a pacientes adultos, imunocompetentes, com
PPP grave, incapacitante e recalcitrante. Seu tratamento contínuo foi aprovado pelo
período de 1 ano pela FDA-US, mas não há consenso sobre sua duração de uso. Em
casos de psoríase palmoplantar incapacitante, pode ser indicado o uso de
metotrexato. Para psoríase palmoplantar refratária, o uso de radioterapia pode ser
indicado, possuindo dose ideal de irradiação desconhecida.14
O uso de terapias Anti-TNF alfa como infliximabe, etanercepte, adalimumabe e
ustekinumabe para psoríase palmoplantar têm sido utilizadas. O uso de infliximabe,
etanercepte e adalimumabe foram considerados recomendáveis e eficazes no
tratamento. Já o uso ustekinumabe em pacientes com psoríase palmoplantar
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
186
apresenta eficácia moderada.10
2.4 Psoríase ungueal
Em pacientes com psoríase, o envolvimento ungueal possui significativa
prevalência, estando presente em 50-80% dos casos e com incidência de 90% ao
longo da vida. Um estudo epidemiológico realizado nas Astúrias, Espanha, evidenciou
em pacientes com psoríase ungueal a presença de psoríase mais grave, maiores
escores PASI (Índice de Área e Severidade de Psoríase) e maior IMC (Índice de
Massa Corporal) associadas. 10
Pacientes com psoríase acometendo as unhas podem possuir dificuldade na
execução de tarefas finas, dor, alteração de sensação de tato, deficiência cosmética
e comprometimento no meio de trabalho, resultando em direta redução de sua
qualidade de vida, assim como problemas sociais e emocionais. 14
O Nail Psoriasis Severity Index (NAPSI) é um protocolo importante de avaliação
da psoríase ungueal. Neste, a unha é analisada com base nos sinais de envolvimento
da matriz ungueal e leito ungueal, variando de 0-8 para uma unha e de 0 a 160 ao
analisar as 20 unhas (mãos e pés).14
Michael Jiaravuthisan sugeriu um algoritmo terapêutico para psoríase ungueal,
dividindo as lesões psoriáticas em dois grupos: em algumas unhas e em muitas unhas.
Para o grupo das lesões psoriáticas em algumas unhas, ainda foram criados dois
subgrupos, sendo eles: com envolvimento da matriz ungueal e com envolvimento do
leito ungueal. Assim, a terapia tópica definida para as lesões da matriz ungueal foram:
os esteróides intralesionais, tazaroteno e esteróides tópicos potentes; e para as lesões
do leito ungueal foram: calcipotriol e esteróides, tazaroteno e ciclosporina. Já para as
lesões psoriáticas em muitas unhas adota-se a terapia sistêmica com o uso de
Infliximab e Retinóides. 14
A eficácia da terapia para psoríase ungueal é diretamente comprometida pela
baixa permeabilidade das unhas, limitando a chegada de medicamentos à esta. O
rompimento da lâmina ungueal, assim como o uso de abrasivos químicos e físicos e o
uso da iontoforese podem ser utilizados para aumentar a penetração de fármacos na
unha. 14
O uso de esteróides tópicos potentes e superpotentes apresentou melhoras no
leito ungueal e nas características da matriz ungueal. No entanto, a terapia possui
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
187
efeitos colaterais como telangiectasias e atrofia tanto da área paroniquial como, mais
raramente, da falange correspondente. 14
Esteróides intralesionais podem ser utilizados, obtendo boa resposta (até 7090%) em pacientes com lesões psoriáticas na matriz e no leito ungueal. Já para casos
de onicólise, tal tratamento possui 20-55% de resposta. Seu uso pode causar linhas
de Beau, hipopigmentação da prega ungueal proximal, atrofia e hematoma
subungueal. 14
O uso de gel de tazaroteno 0,1% apresentou melhoras na onicólise,
hiperceratose e manchas cor de salmão nas unhas, principalmente quando utilizado
sob oclusão. Seus efeitos adversos incluem descamação ou queimação da área
paroníquica e irritação cutânea moderada.14
A pomada de calcipotriol (50 μg / g) aplicada nas lesões psoriáticas ungueais
apresentou resultados positivos quanto à hiperceratose subungueal, onicólise e
descoloração.14
O uso de tacalcitol (calcipotriol) sob oclusão durante a semana, combinado com
o uso de clobetasol-17-propionato 8% (esteróide) em esmalte aos finais de semana
apresentou bons resultados, com redução da dor ungueal e uma queda do NAPSI alvo
modificado de 78% em comparação aos níveis basais. 14
O uso de solução oral de ciclosporina dissolvida em óleo de milho a 70% de
modo tópico demonstrou melhora da hiperceratose subungueal e onicólise. Efeitos
adversos não foram relatados. 14
Em casos de unhas muito grossas, raios-x suaves podem ser utilizados em
doses fracionadas para placas psoriáticas ungueais. 14
A psoríase ungueal apresenta melhor resposta à terapia sistêmica, em relação
ao tratamento tópico, principalmente em casos graves (Índice de Gravidade de
Psoríase Ungueal/ NAPSI>10).10
O uso de terapias anti-fator de necrose tumoral alfa foi analisado a partir da
revisão de estudos com Infliximab, Etanercept e Adalimumab para psoríase ungueal.
Todos estes foram considerados uma boa alternativa de tratamento para psoríase
ungueal, de caráter extremamente recomendável e eficaz; no entanto, foi proposto o
uso de infliximab especificamente em pacientes com placas psoriáticas associadas a
presença de artrite psoriática ou comprometimento ungueal severo. O uso de
Ustekinumab também é considerado alternativa extremamente recomendável e eficaz
ao tratamento de psoríase ungueal. 10
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
188
2.5 Avaliação da qualidade de vida de pacientes com psoríase em áreas especiais
Medir a qualidade de vida relacionada à saúde em psoríase em áreas especiais
pode ser realizada com instrumentos que refletem a perspectiva do paciente sobre o
impacto da doença, o chamado Paciente Relatou Resultados (PROs). Na artrite
psoriática existem vários PROs usados para medir a qualidade de vida: genéricos e
específicos da doença, cada um com vantagens e desvantagens. 4
Entre os questionários genéricos, ou seja, questionários desenvolvidos para
psoríase em áreas especiais, há alguns pontos fortes: experiência de uso, ampla
validação em outras doenças e a possibilidade de comparação entre doenças. O
questionário Medical Outcomes Study (SF-36) é um exemplo de questionário genérico
que mede a qualidade de vida através de 2 componentes principais: saúde física e
mental e 8 subdomínios: funcionamento físico, limitações de função devido aos
problemas físicos, dor corporal, saúde geral, vitalidade, funcionamento social,
limitações devido a problemas emocionais e problemas mentais. 4
Já o questionário Diferença Clínica Minimamente Relevante (MCID) tem
algumas desvantagens, como a proteção por direitos autorais, que pode limitar seu
uso, algoritmo de pontuação difícil, tornando-o inviável fora das configurações de
ensaios clínicos. Além desses, outro questionário de qualidade de vida que pode ser
utilizado é o Domínio EuroQol 5 (EQ-5D), um instrumento genérico que fornece uma
medida sobre o estado geral de saúde. Consiste em duas partes: questionário e escala
visual analógica, analisando a autoavaliação de saúde. O Índice de Qualidade de Vida
Dermatológica (DLQI) também representa um questionário genérico. Possui 10 itens
para avaliar o efeito da psoríase nas atividades diárias e nível de deficiência. Nesse
DLQI, as questões são agrupadas em 6 subcategorias: sintomas e sentimentos,
atividades diárias, lazer, trabalho / escola, relações pessoais e tratamento. 4
O questionário PsAID é multidimensional e avalia o impacto da psoríase em
áreas especiais na perspectiva do paciente. Existem duas versões do PsAID: 12 itens
(PsAID12), recomendado para a prática clínica que abrange domínios como dor,
problemas de pele, fadiga, atividades de trabalho e/ou lazer, capacidade funcional,
desconforto, distúrbios do sono, ansiedade/medo e incerteza, constrangimento e/ou
vergonha, participação social e depressão; e a de 9 itens (PsAID9) que é
recomendada para clínicas de pesquisa, mais curta e não contém os três últimos itens
citados anteriormente. 4
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
189
Outro questionário específico utilizado é o PsAQoL, que avalia a qualidade de
vida definida como a extensão em que as necessidades são atendidas pela
perspectiva do paciente. O PsAQoL possui alguns pontos fortes, como ser derivado
diretamente de entrevistas qualitativas e ter boas propriedades psicométricas,
tornando-o adequado parauso em configurações de pesquisa e clínica. No entanto, tem
sido pouco utilizado até hoje, devido ao fato de estar sujeito a direitos autorais e pela
elevada taxa de licença para uso.4
Já o questionário VITACORA-19 parece ter boas propriedades psicométricas,
embora sejam necessários mais testes. Outros possíveis PROs específicos de APs
incluem: Medição de Impacto de Artrite (AIMS), Perfil de Impacto da Artrite Psoriática
(PAIP), PSOdisk, Questionário de Artrite Inflamatória Combinada – QoL (CIAQ-QoL)
e o Inverso Carga da Doença de Psoríase (IBOD); que são questionários pouco
usados até hoje. 4
Para o desenvolvimento do Diário de Sinais e Sintomas da Psoríase, foram
realizadas revisões literárias para compreensão tanto da psoríase como de métodos
já existentes de resultados relatados pelo paciente, assim como 3 rodadas de
entrevistas cognitivas com pacientes que apresentavam psoríase moderada a grave.9
O Diário de Sinais e Sintomas da Psoríase avalia a gravidade dos principais
sinais e sintomas associados às placas psoriáticas: são estes, 5 sintomas (coceira,
queimação, dor, ardência e rigidez da pele) e 6 sinais clínicos observáveis (secura da
pele, rachadura, descamação, derramamento ou descamação em placas, vermelhidão
e sangramento). São classificados qualitativamente de 0 (ausente) – 10 (pior
imaginável). Os relatos podem ser feitos embasados tanto no período de 24 horas
(PSSD-24hrs) quanto nos últimos 7 dias (PSSD-7d).9
Ao comparar o Diário de Sinais e Sintomas da Psoríase ao Índice de Qualidade
de Vida em Dermatologia (DLQI), o primeiro demonstra-se mais vantajoso na
avaliação e acompanhamento de lesões psoriáticas em pacientes: enquanto o DLQI
agrupa sintomas e impactos em apenas uma pontuação, o PSSD permite que o
paciente relate os itens individualmente, assim como seus respectivos níveis de
gravidade tanto para sinais quanto para sintomas. O PSSD também possui
aplicabilidade específicas às lesões de psoríase, já o DLQI pode ser utilizado em uma
variedade de condições dermatológicas. Em casos de sinais e sintomas variáveis
diariamente, o PSSD-24hrs possui melhor aplicabilidade comparado ao DLQI, o qual
é embasado em relatos semanais.9
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
190
2.6 Agentes biológicos e a melhora da qualidade de vida de pacientes com
psoríase
A qualidade de vida abrange o bem-estar físico, psicológico, sexual, social e
ocupacional. Assim, para avaliar com precisão o impacto total da psoríase, é
importante avaliar cada um desses fatores. As ferramentas de avaliação da qualidade
de vida relacionada à saúde que são frequentemente utilizadas na pesquisa clínica da
psoríase incluem os instrumentos citados anteriorermente, como: Qualidade de
Vida em Dermatologia (DLQI), Questionário de
Qualidade
de
Vida (EQ-5D),
Questionário Genérico de Qualidade de Vida (SF-36) e Inventário de Sintomas de
Psoríase (PSI). 6
Um estudo avaliou o impacto de quatro classes de agentes biológicos na
qualidade de vida relacionada à saúde em pacientes com psoríase: inibidores do TNFalfa, agentes anti-IL-12/23, agentes anti-IL-23 e agentes anti-IL-17. 6
Os inibidores do TNF-alfa levam a depuração cutânea da psoríase, sendo
primeira linha para pacientes com psoríase moderada a grave. Existem atualmente
alguns agentes anti-TNF-alfa aprovados pelo Federal Drug Administração (FDA) para
o tratamento da psoríase em placas: adalimumabe, etanercept, infliximabe e
certolizumabe pegol. Apesar de haver uma quantidade limitada de dados clínicos a
respeito da eficácia clínica desses agentes em relação à qualidade de vida dos
pacientes, os agentes biológicos inibidores de TNF-alfa parecem estar associados a
efeitos positivos, clinicamente significativos.
6
Novas classes de agentes biológicos surgiram com a descoberta do papel do
eixo imunológico IL-23/IL-17 na patogênese da psoríase. Avaliações clínicas
direcionadas desses imunobiológicos demonstraram uma eficácia clínica sem
precedentes, com um número considerável de pacientes obtendo respostas PASI75/90/100. Essa resposta excepcional ao tratamento confirma o papel central das
citocinas IL-23 e IL-17 na fisiopatologia da psoríase. Além disso, oferece aos
pacientes com doença moderada a grave, antes não tratados, um potencial para
melhorias significativas em sua qualidade de vida. Os atuais imunobiológicos anti-IL17/IL-12/IL-23
aprovados
pela
FDA
incluem:
Brodalumabe,
Ixekizumab
e
Secucinumabe, Ustekinumab, Guselkumab e Tildrakizumab.6
Ficou
demonstrado
que
os
agentes
imunobiológicos
antipsoriáticos
direcionados ao fator de necrose tumoral-alfa (TNF-α), às vias imunes da interleucinaBrazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
191
12/23 e da interleucina-17, apresentaram resultados clínicos positivos em relação à
depuração da pele e melhora do bem-estar geral. No entanto, o impacto dos agentes
biológicos da psoríase na melhora da qualidade de vida parece estar relacionado
diretamente com as melhorias nos parâmetros físicos, principalmente com o grau de
depuração da pele. 6
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente revisão, buscando responder se a psoríase em áreas especiais
impacta negativamente na qualidade de vida e se há dificuldade de resposta
terapêutica nessas áreas, demonstrou que esta doença afeta de forma significativa
a saúde e o bem-estar dos pacientes.
Ainda, com a dificuldade de comunicação e a inibição do paciente diante das
repercussões da doença, a mensuração do impacto da condição pelo profissional de
saúde deve ser feita de forma proativa. Sendo assim, torna-se fundamental a
avaliação dos resultados com classificações qualitativas aprofundadas, buscando
uma comunicação médico-paciente mais eficaz, com os cuidados de saúde
centrados no paciente e, consequente, melhor prognóstico da doença.
Nota-se com essas informações que psoríase em locais de difícil tratamento,
embora localizadas, frequentemente trazem aos pacientes grande impacto na
qualidade de vida, com consequente disfunção e efeitos psicológicos. O uso da
terapia sistêmica com anti-TNF-alfa ou anti-imunoglobulinas costumam ser
indicados, ao considerar a frequente ineficácia e desconforto relacionada ao uso de
tratamento tópico e fototerapia. Finalizando, é imprescindível que na abordagem ao
paciente, sejam mensuradas abertamente as reais expectativas sobre a terapêutica
e os planos para o futuro, para desta forma evitar o surgimento de respostas
inalcançáveis e falha na adesão ao tratamento.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
192
REFERÊNCIAS
YANG EJ, et al. The impact of genital psoriasis on quality of life: a systematic review.
Psoriasis: Targets and Therapy, 2018; 8: 41.
EICHENFIELD LF, et al. Pediatric psoriasis: evolving perspectives. Pediatric
dermatology, 2018; 35(2): 170-181.
WILMER EN, HATCH RL. Resistant “candidal intertrigo”: could inverse psoriasis be
the true culprit? The Journal of the American Board of Family Medicine, 2013; 26(2):
211-214.
GUDU T, GOSSEC L. Qualidade de vida na artrite psoriática. Revisão especializada
de imunologia clínica, 2018; 14(5): 405-417.
CHUNG J, et al. Palmoplantar psoriasis is associated with greater impairment of
health- related quality of life compared with moderate to severe plaque psoriasis.
Journal of the American Academy of Dermatology, 2014; 71(4): 623-632.
FRIEDER J, et al. The impact of biologic agents on health-related quality of life
outcomes in patients with psoriasis. Expert review of clinical immunology, 2018; 14(1):
1-19.
RENCZ F, et al. Moderate to severe psoriasis patients' subjective future expectations
regarding health‐related quality of life and longevity. Journal of the European
Academy of Dermatology and Venereology, 2015; 29(7): 1398-1405.
DA SILVA N, et al. Disease burden and treatment needs of patients with psoriasis in
sexually-sensitive and visible body areas: results from a large-scale survey in routine
care. European Journal of Dermatology, 2020; 30(3): 267-278.
FELDMAN SR, et al. Development of a patient-reported outcome questionnaire for
use in adults with moderate-to-severe plaque psoriasis: the psoriasis symptoms and
signs diary. Journal of Dermatology & Dermatologic Surgery, 2016; 20(1): 19-26.
SÁNCHEZ RM, et al. Directrices del grupo español de psoriasis (GEP) basadas en la
evidencia para el uso de medicamentos biológicos en pacientes con psoriasis en
localizaciones de difícil tratamiento (uñas, cuero cabelludo, palmas y plantas). Actas
Dermo-Sifiliográficas, 2014; 105(10): 923-934.
PALLER AS, et al. Psoriasis in children: epidemiology, clinical manifestations,
and diagnosis. UpToDate. Updated June 2018. Available at:
https://www.uptodate.com/contents/psoriasis-in-children-epidemiology-clinicalmanifestations-and-diagnosis (acesso em 2 de abril de 2021).
RYAN C, et al. Genital psoriasis is associated with significant impairment in quality of
life and sexual functioning. Journal of the American Academy of Dermatology, 2015;
72(6): 978-983.
DA SILVA N, et al. Sex-related impairment and patient needs/benefits in anogenital
psoriasis: Difficult-to-communicate topics and their impact on patient-centred care.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
193
Plos one, 2020; 15(7): 1-13.
HANDA S. Newer trends in the management of psoriasis at difficult to treat locations:
Scalp, palmoplantar disease and nails. Indian journal of dermatology, venereology
and leprology, 2010; 76(6): 634.
PETTEY AA, et al. Patients with palmoplantar psoriasis have more physical disability
and discomfort than patients with other forms of psoriasis: implications for clinical
practice. Journal of the American Academy of Dermatology, 2003; 49(2): 271-275.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92332-92350 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
194
CAPÍTULO 11
O DIREITO À AUTODETERMINAÇÃO INFORMATIVA NA LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE
DADOS: EMPODERAR PARA EFETIVAR
Pablo Rangell Mendes Rios Pereira
Mestrando em Direito e Políticas Públicas Centro Universitário de Brasília – UniCEUB
SEPN 707/907, Campus Universitário, Asa Norte, Brasília/DF
E-mail: pablorangell@gmail.com
RESUMO: A Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, denominada Lei Geral de
Proteção de Dados Pessoais (LGPD), é fruto do encontro de duas proposições
legislativas: o Projeto de Lei nº 4.060, de 13 de junho de 2012, de autoria do Deputado
Federal Milton Monti (PR/SP), e o Projeto de Lei nº 5.276, de 13 de maio de 2016, de
autoria do Poder Executivo Federal. Este artigo tem dois objetivos: i) realizar
levantamento histórico acerca do processo legislativo que culminou na criação da
LGPD, com enfoque especial nas condições de produção, nos sujeitos participantes
e nas narrativas adotadas ao longo do processo legislativo que levou ao mais
importante marco legal da proteção de dados pessoais no Brasil; e ii) explorar a ideia
de “autodeterminação informativa”, a partir da literatura jurídica nacional, com vistas a
identificar seu conceito, finalidade e os principais desafios à sua efetivação. A
pesquisa, de cunho exploratório, se valeu de documentos constantes do endereço
eletrônico da Câmara dos Deputados e de revisão da literatura jurídica nacional,
especializada na temática da proteção de dados no Brasil. Sugere-se que a
concretização do direito à autodeterminação informativa requer um olhar atento para
a vulnerabilidade do titular de dados pessoais, de modo que, para a efetivação desse
direito, revela-se imprescindível o necessário empoderamento do titular de dados
pessoais.
PALAVRAS-CHAVE: Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, LGPD, Lei nº
13.709/2018; Autodeterminação informativa.
ABSTRACT: Law No. 13.709, of August 14, 2018, called General Personal Data
Protection Law (LGPD), is the result of the meeting of two legislative proposals: Bill
No. 4,060, of June 13, 2012, authored by Federal Deputy Milton Monti (PR/SP), and Bill
No. 5,276, of May 13, 2016, authored by the Federal Executive Branch. This article has
two objectives: i) to carry out a historical survey about the legislative process that
culminated in the creation of the LGPD, with a special focus on the conditions of
production, on the participating subjects and on the narratives adopted throughout the
legislative process that led to the most important legal framework of the protection of
personal data in Brazil; and ii) explore the idea of “informative self-determination”,
based on the national legal literature, with a view to identifying its concept, purpose
and the main challenges to its realization. The research, of an exploratory nature,
made use of documents contained in the electronic address of the Chamber of
Deputies and a review of the national legal literature, specialized in the theme of data
protection in Brazil. It is suggested that the realization of the right to informative selfdetermination requires a careful look at the vulnerability of the holder of personal data,
so that, for the realization of this right, the necessary empowerment of the holder of
personal data is essential.
KEYWORD: General Personal Data Protection Law, LGPD, Law No. 13.709/2018,
informative self-determination.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
195
1. INTRODUÇÃO
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) é fruto do encontro de
duas proposições legislativas: o Projeto de Lei nº 4.060, de 13 de junho de 2012 (PL
4060/2012), de autoria do Deputado Federal Milton Monti (PR/SP), e o Projeto de Lei
nº 5.276, de 13 de maio de 2016 (PL 5276/2016), de autoria do Poder Executivo
Federal.
Na primeira parte do artigo é apresentado levantamento histórico – a partir de
pesquisa exploratória de documentos constantes do endereço eletrônico da Câmara
dos Deputados – acerca do processo legislativo que culminou na criação da Lei nº
13.709, de 14 de agosto de 2018, denominada Lei Geral de Proteção de Dados
Pessoais (LGPD), com enfoque especial nas condições de produção, nos sujeitos
participantes e nas narrativas adotadas ao longo do processo legislativo que levou ao
mais importante marco legal da proteção de dados pessoais no Brasil.
A segunda parte explora a ideia de “autodeterminação informativa” – a partir de
revisão bibliográfica da literatura jurídica nacional, especializada na temática da
proteção de dados pessoais – com vistas a identificar seu conceito, finalidade e os
principais desafios à sua efetivação.
Ao final, faz-se uma abordagem acerca dos importantes desafios que se
colocam frente à necessidade de efetivação do direito à autodeterminação informativa,
previsto como fundamento da disciplina do tratamento de dados pessoais no Brasil.
2. A AUTODETERMINAÇÃO INFORMATIVA NA LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE
DADOS PESSOAIS
A Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, denominada “Lei Geral de Proteção
de Dados Pessoais (LGPD)” é fruto – essencialmente1 – do encontro de duas
proposições legislativas: o Projeto de Lei nº 4.060, de 13 de junho de 2012 (PL
4060/2012), de autoria do Deputado Federal Milton Monti (PR/SP), e o Projeto de Lei
nº 5.276, de 13 de maio de 2016 (PL 5276/2016), de autoria do Poder Executivo.
Para melhor compreensão, serão analisados, inicialmente, os principais
eventos relacionados ao processo legislativo de cada uma dessas proposições.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
196
2.1 O PL 4060/2012 e sua justificativa
O Projeto de Lei nº 4.060, de 13 de junho de 2012 (PL 4060/2012), de autoria
do Deputado Federal Milton Monti (PR/SP), tinha por objeto dispor “sobre o tratamento
de dados pessoais”, entre outras providências.
O objetivo da lei, conforme o art. 1º, seria “garantir e proteger, no âmbito do
tratamento de dados pessoais, a dignidade e os direitos fundamentais da pessoa
natural, particularmente em relação a sua liberdade, privacidade, intimidade, honra e
imagem”.
Segundo consta da Justificativa da proposição legislativa, a finalidade seria “dar
ordenamento jurídico e institucional ao tratamento de dados pessoais, bem como a
proteção dos direitos individuais das pessoas, conforme a Constituição da República
Federativa do Brasil”. Ainda, nos termos da Justificativa, o estabelecimento de normas
legais para disciplinar o tratamento de dados permitiria “dar proteção à individualidade
e a privacidade das pessoas, sem impedir a livre iniciativa comercial e de
comunicação”.
Por trás dessas ideias, chama a atenção um trecho da Justificativa do PL
4060/2012, em que o Deputado Milton Monte exalta a importância do V Congresso
Brasileiro da Indústria da Comunicação, fórum de onde teria surgido a minuta que,
posteriormente, seria apresentada à Câmara dos Deputados:
Por esses motivos e sensibilizado pela realização do V Congresso Brasileiro
da Indústria da Comunicação, evento promovido pela ABAP – Associação
Brasileira das Agências de Publicidade e pelo FORCOM – Fórum Permanente
de Comunicação, no qual tive a honra e a oportunidade de participar, e de
forma especial como Presidente da Comissão 5 que tratou do tema da
comunicação “one-to-one” Personalização X Privacidade, e que decidi
apresentar o presente Projeto de Lei. Debatemos com muitos especialistas
dessa área, destacando aqui a participação do blogueiro Marcelo Tás, do ator
Odilon Wagner, do Presidente da ABEMD Efraim Kapulski, do Advogado Vitor
Morais de Andrade, do Diretor da Editora Abril Fernando Costa, além de mais
de uma centena de participantes, sendo elaborado ao final e aprovado um
relatório pelos participantes de Comissão, bem como a aprovação por todas as
38 entidades que compuseram o V Congresso em uma votação plenária,
destacando ainda que o texto final foi aprovado por unanimidade.
Ainda, segundo consta do referido documento, o parlamentar conclui:
Não há dúvida nenhuma que o Estado deve cuidar das questões gerais,
mas é também evidente que a sociedade é refrataria ao excesso de tutela
por parte do Estado e que deseja exercer na plenitude seus direitos
constitucionais inclusive o de receber se quiser comunicações pelos meios
disponíveis no momento.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
197
O V Congresso Brasileiro da Indústria da Comunicação, realizado em maio
de 2012, foi promovido pela Associação Brasileira das Agências de Publicidade
(ABAP) e pelo Fórum Permanente da Indústria da Comunicação (FORCOM).
O Congresso contou com a participação de 38 entidades integrantes do
FORCOM, a exemplo da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA), da
Associação Brasileira de Agências de Publicidade (ADAP), da Associação Brasileira
de Mídia Digital Out of Home (ABDOH), da Associação Brasileira de Empresas de
Pesquisa (ABEP), da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão
(ABERT), da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (ABIGRAF Nacional), da
Associação Brasileira de Marketing & Negócios (ABMN), da Associação Brasileira
de Marketing Rural & Agronegócio (ABMR&A), da Associação Brasileira de
Propaganda (ABP), da Associação Brasileira de Radiodifusores (ABRA), da
Associação Brasileira das Agências de Comunicação (Abracom), entre outras.
A lista é extensa, mas deixa evidente que o projeto de lei de proteção de
dados pessoais que se buscava para o país tinha seu nascedouro no âmbito das
entidades representativas da indústria da comunicação, e não nas entidades
protetoras dos direitos individuais ou do consumidor, como se poderia presumir.
2.3 A autodeterminação informativa no PL 4060/2012
Em sua redação original, apresentada em 13/6/2012, assim era tratado o
direito à autodeterminação informativa:
CAPÍTULO II
Dos Requisitos para Tratamento de Dados
Pessoais [...]
Art. 15. O Titular tem direito a autodeterminação das informações e
dados pessoais prestados ou coletados, por qualquer meio.
Parágrafo Único. O tratamento de dados e o envio de comunicações
comerciais ou sociais é permitido, salvo se o titular solicitar o bloqueio do
tratamento dos seus dados ou tiver manifestado diretamente ao responsável
pelo envio a opção de não recebê-la.
Topograficamente, o artigo estava inserido no Capítulo II da norma, que
versava sobre os “requisitos” para tratamento de dados pessoais. O temo “requisito”
diz respeito a “condição imposta” ou “condição reclamada”. Em seu sentido jurídico,
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
198
portanto, é a “condição legal, exigida ou imposta para que tudo se faça de acordo
com a regra jurídica” (SILVA, 2006, p. 1.211).
No parágrafo único do dispositivo, faz-se menção às “comunicações
comerciais”, o que revela as condições de produção (o V Congresso Brasileiro da
Indústria da Comunicação) e os sujeitos participantes do discurso normativo
inicialmente previsto (as entidades representativas dos meios de comunicação de
massa e indústria da comunicação).
2.4 O PL 5276/2016 e sua justificativa
O Projeto de Lei nº 5.276, de 13 de maio de 2016 (PL 5276/2016), de autoria
do Poder Executivo, por sua vez, tinha por objeto dispor “sobre o tratamento de
dados pessoais para a garantia do livre desenvolvimento da personalidade e da
dignidade da pessoa natural”. Na ementa do PL 5276/2016, diferentemente do PL
4060/2012, havia manifestação explícita de que a proposta visaria garantir o livre
desenvolvimento da personalidade e da dignidade da pessoa natural.
Pode-se argumentar que a ementa não tem valor normativo. Contudo, há um
valor simbólico que não pode ser desprezado: a declaração explícita de proteção ao
livre desenvolvimento e à dignidade da pessoa humana.
Igualmente, pode-se argumentar que o art. 1º do PL 4060/2012 previa como
objetivo “a dignidade e os direitos fundamentais da pessoa natural, particularmente
em relação a sua liberdade, privacidade, intimidade, honra e imagem”, o que, ao fim
e ao cabo, redundaria na mesma ideia. Ocorre que, outra vez, o art. 1º do PL
5276/2016 reforçou o objetivo de “proteger os direitos fundamentais de liberdade e
de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural”.
Há que se reconhecer, portanto, que o PL 5276/2016 sinalizou explicitamente
o intento de proteger o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural, o
que não foi feito no PL 4060/2012. Tal sinalização é importante porque permite
trilhar caminhos de resposta para dúvidas que se mostram fundamentais, no que diz
respeito à “autodeterminação informativa”: há como exercer a autodeterminação
informativa sem se ter liberdade de desenvolvimento da personalidade? O livre
desenvolvimento da personalidade é pressuposto para se exercer, de forma
consciente, a autodeterminação informativa?
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
199
Segundo constava da Justificativa do PL 5276/2016, a proposta, ao invés de
se limitar à manifestação de “dar proteção à individualidade e a privacidade das
pessoas, sem impedir a livre iniciativa comercial e de comunicação”, como previsto
no PL 4060/2012, tinha como finalidade “assegurar ao cidadão o controle e a
titularidade sobre suas informações pessoais, com fundamento na inviolabilidade da
intimidade e da vida privada, na liberdade de expressão, comunicação e opinião, na
autodeterminação informativa, no desenvolvimento econômico e tecnológico, bem
como na livre iniciativa, livre concorrência e defesa do consumidor”.
A proposta veiculada no PL 5276/2016 preocupava-se com o fato de que “o
avanço da tecnologia da informação amplia enormemente o potencial de coleta,
processamento e utilização de dados pessoais, o que representa, por um lado, uma
oportunidade de geração de novos conhecimentos e serviços mas, por outro, pode
acarretar graves riscos aos direitos da personalidade do cidadão, ao acesso a
serviços e bens, além de uma grande insegurança jurídica para o ambiente de
negócios de tecnologia da informação existente no país”.
Ao contrário de uma fundamentação preponderantemente voltada para o
mercado (o mercado dos meios de comunicação de massa), como era o caso do PL
4060/2012, a proposta do Poder Executivo, veiculada a partir do PL 5276/2016,
visava um espaço de harmonia possível entre as forças do mercado e a proteção
aos direitos individuais do cidadão.
Além disso, ao invés de ter sua origem em um público restrito, tais como as
entidades de representação da indústria da comunicação, o PL 5276/2016 foi
resultado “de um amplo debate público promovido pelo Ministério da Justiça, que
teve duração de quase seis meses, recebendo mais de 50 mil visitas e obtendo mais
de 1.100 contribuições”.
2.5 A autodeterminação informativa no PL 5276/2016
Na sua redação original, apresentada em 13/5/2016, o PL 5276/2016, de
autoria do Poder Executivo, assim dispunha sobre a autodeterminação informativa:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
[...]
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
200
Art. 2º A disciplina da proteção de dados pessoais tem como fundamento
o respeito à privacidade e:
I - a autodeterminação informativa;
Topograficamente, ao contrário do PL 4060/2012, de autoria do Deputado
Federal Milton Monti (PR/SP), a proposta do Poder Executivo situou a
autodeterminação informativa como “fundamento” para a disciplina da proteção de
dados. Segundo De Plácio e Silva, considera-se “fundamento”, em relação às
coisas, “a própria razão de ser delas”; e em relação às ações, o que as legitimam
(SILVA, 2006, p. 643).
Também aqui é possível observar as condições de produção (debates
públicos e audiências públicas, inclusive na Internet) e os sujeitos participantes do
discurso normativo inicialmente previsto (pluralidade de atores e contribuições dos
mais diversos setores da sociedade).
2.6 A tramitação conjunta dos pls 4060/2012 e 5276/2016: ampliação do espaço
de debate
O PL 4060/2012, de autoria do Deputado Milton Monti (PR/SP), já tramitava
pela Câmara dos Deputados desde 13 de junho de 2012. Apesar de a proposta ter
como objeto tema de grande amplitude, que envolvia – direta ou indiretamente –
direitos individuais, consumeristas, entre outros, foi inicialmente tramitada para a
Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos
Deputados (CCTCI), uma das Comissões Permanentes da Casa, designando-se
como relator do projeto na referida Comissão o Deputado Federal Sergio Zveiter
(PSD-RJ), em 11/03/2015.
Segundo o Regimento Interno da Câmara dos Deputados (RICD), as
Comissões Permanentes ou Temporárias atuam, basicamente, na apreciação de
proposições legislativas, apreciando-as e deliberando sobre sua aprovação ou
rejeição. É que prevê o art. 22 do RICD:
CAPÍTULO IV DAS
COMISSÕES
Seção I Disposições
Gerais
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
201
Art. 22. As Comissões da Câmara são:
I - Permanentes, as de caráter técnico-legislativo ou especializado
integrantes da estrutura institucional da Casa, co-partícipes e agentes do
processo legiferante, que têm por finalidade apreciar os assuntos ou
proposições submetidos ao seu exame e sobre eles deliberar, assim como
exercer o
acompanhamento dos planos e programas governamentais e a
fiscalização orçamentária da União, no âmbito dos respectivos campos
temáticos e áreas de atuação;
II - Temporárias, as criadas para apreciar determinado assunto, que se
extinguem ao término da legislatura, ou antes dele, quando alcançado o
fim a que se destinam ou expirado seu prazo de duração.
As Comissões Permanentes são distribuídas por áreas temáticas, enquanto
as Comissões Temporárias são criadas para apreciarem um assunto específico. No
caso da CCTCI, Comissão Permanente para a qual foi distribuído o PL 4060/2012,
suas competências são as previstas no art. 32, III, do RICD:
Art. 32. São as seguintes as Comissões Permanentes e respectivos
campos temáticos ou áreas de atividade:
[...]
III - Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática:
a) desenvolvimento científico e tecnológico; política nacional de ciência e
tecnologia e organização institucional do setor; acordos de cooperação
com outros países e organismos internacionais;
b) sistema estatístico, cartográfico e demográfico nacional;
c) os meios de comunicação social e a liberdade de imprensa;
d) a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão;
e) assuntos relativos a comunicações, telecomunicações, informática,
telemática e robótica em geral;
f) indústrias de computação e seus aspectos estratégicos;
g) serviços postais, telegráficos, telefônicos, de telex, de radiodifusão e
de transmissão de dados;
h) outorga e renovação da exploração de serviços de radiodifusão sonora
e de sons e imagens;
i) política nacional de informática e automação e de telecomunicações;
j) regime jurídico das telecomunicações e informática;
Pelas competências regimentais da CCTCI, nota-se que o PL 4060/2012 dava
muito mais enfoque à indústria da comunicação, em seus variados aspectos, do que
à garantia da privacidade ou dos direitos individuais do cidadão. A proposição era,
materialmente, muito mais ampla e merecia ser discutida em fórum igualmente plural.
Com vistas a ampliar o debate acerca da proposição legislativa, o Deputado
Federal Sérgio Zveiter (PSD/RJ) apresentou requerimento para que entidades e
especialistas no tema fossem convidados para discutir a proposta.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
202
Nesse sentido, Zveiter, por requerimento apresentado em 06/05/2015,
propunha à CCTCI, portanto, convidar para debater o projeto aqueles que já haviam
participado de todo o processo de construção do projeto de lei, isto é, os
representantes da indústria da mídia, tais como a Associação Brasileira de Agências
de Publicidade (ABAP), a Associação Brasileira de Marketing Direto (ABEMD) e a
Associação Brasileira das Empresas de Rádio e Televisão (ABERT).
Somente quatro meses depois, em 17/09/2015, Zveiter apresentaria novo
requerimento, propondo à CCTCI que fossem convidados para debater a proposta
representantes da Secretária Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça
(Senacon/MJ), do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e o professor Pablo
Ortellado, Professor da Universidade de São Paulo (USP). O requerimento mantinha
a proposta de convite à Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão
(Abert).
Após diversas tramitações processuais, em 12/11/2015, substituiu-se o relator
do projeto na CCTCI, função esta que passou a ser desempenhada pelo Deputado
Federal Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ).
Em 04/05/2016, o projeto receberia parecer – pela aprovação – do relator
Sóstenes Cavalcante para apreciação e votação no âmbito da CCTCI. Em seu voto, o
destaque para o fato de que “o Brasil demanda uma legislação sobre a matéria, em
face do crescimento desse tipo de atividade e da comercialização ilegal desse tipo de
informação” e a menção ao fato que veio a público, em 2013, relatando que “as
principais empresas de Internet sediadas nos Estados Unidos da América, entre elas
o Google e o Facebook, violam a privacidade de seus usuários, franqueando o acesso
a esses dados à NSA, a agência de segurança americana”.
No dia 11/05/2016, em reunião deliberativa ordinária da CCTCI, o projeto foi
retirado de pauta a pedido do Deputado Federal Bilac Pinto. Dois dias depois, em
13/05/2016, o Poder Executivo apresentaria sua proposta de projeto de lei para dispor
sobre o tratamento de dados pessoais. Nascia, naquele momento, o PL 5276/2016.
Depois de sucessivas retiradas de pauta (18/05/2016, a requerimento do
Deputado Federal Vitor Lippi; 1º/06/2016, a requerimento do Deputado Federal Sibá
Machado; 13/07/2016, por iniciativa do próprio relator da CCTCI), o Deputado Federal
Alexandre Leite (DEM-SP) apresentou requerimento no Plenário da Câmara dos
Deputados para que o PL 5276/2016, de autoria do Poder Executivo, fosse apensado
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
203
ao PL 4060/2012, de autoria do Deputado Milton Monti (PR/SP).
Em 18/07/2016, o requerimento foi aprovado pela Mesa Diretora da Câmara
dos Deputados e os processos passam a tramitar conjuntamente. No dia 24/08/2016,
a Presidência da Câmara dos Deputados cria Comissão Especial, com fundamento no
art. 34, II, do RICD, para apreciar o PL 4060/12, em conjunto com o PL 5276/2016, de
autoria do Poder Executivo. Nos termos do art. 34, II, do RICD:
Subseção I
Das Comissões Especiais
Art. 34. As Comissões Especiais serão constituídas para dar parecer
sobre: [...]
II - proposições que versarem matéria de competência de mais de três
Comissões que devam pronunciar-se quanto ao mérito, por iniciativa do
Presidente da Câmara, ou a requerimento de Líder ou de Presidente de
Comissão interessada.
§ 1º Pelo menos metade dos membros titulares da Comissão Especial
referida no inciso II será constituída por membros titulares das Comissões
Permanentes que deveriam ser chamadas a opinar sobre a proposição em
causa.
§ 2º Caberá à Comissão Especial o exame de admissibilidade e do mérito
da proposição principal e das emendas que lhe forem apresentadas,
observado o disposto no art. 49 e no § 1º do art. 24.
A criação da Comissão Especial denunciaria uma falha grave, já identificada no
nascedouro do PL 4060/2012, qual seja, a tramitação da proposição na CCTCI, a
despeito do amplo escopo da proposição legislativa. De fato, a apreciação do projeto
sob a lente da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática
tenderia a favorecer as entidades representativas da indústria da mídia e limitaria o
espaço de debate de um projeto tão importante para a vida de todos os brasileiros.
Como resultado da ampliação da arena de debate, a Comissão Especial
recebeu 18 requerimentos para realização de audiência pública e um para realização
de missão oficial dos seus membros ao Valle do Silício, nos Estados Unidos. Na
Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, pelo contrário,
apenas três requerimentos voltados à ampliação do debate foram protocolizados.
A título de registro, na CCTCI, apenas o Deputado Federal Sibá Machado, em
requerimento datado de 17/05/2016, sugeria que a Comissão também convidasse
para debate outras autoridades envolvidas com a temática, e não apenas as
representativas da mídia de massa, tais como Pedro Markun, do Laboratório Hacker,
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
204
da Câmara dos Deputados, Demi Getschko, Conselheiro do Comitê Gestor da Internet
no Brasil (CGI.br), Ronaldo Lemos, do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS),
Paulo Rená, Diretor do Instituto Beta para Internet e Democracia (IBIDEM) e, também,
professor de Direito no Centro Universitário de Brasília e Mestre em Direito pela UnB,
representante do Coletivo Intervozes, do InternetLab e do Instituto Brasileiro de Defesa
do Consumidor (IDEC).
Portanto, com a criação da Comissão Especial, diversas entidades e
autoridades dos mais diversos setores da sociedade puderam ser convidadas para dar
sua opinião sobre o projeto de lei que se propunha a ser o principal marco regulatório
da proteção de dados pessoais do país. Ao final, a Lei nº 13.709, de 14 de agosto de
2018, Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), restou assim redigida, no
tocante à autodeterminação informativa:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
[...]
Art. 2º A disciplina da proteção de dados pessoais tem como
fundamentos: [...]
II - a autodeterminação informativa;
Prevaleceu a proposição legislativa de autoria do Poder Executivo e, com ela,
a ideia de que a autodeterminação é um fundamento da disciplina da proteção de
dados pessoais no Brasil. Se a legislação alcançará a sua eficácia social, isso ainda
é uma incógnita.
3. A AUTODETERMINAÇÃO INFORMATIVA À LUZ DA LITERATURA JURÍDICA
NACIONAL
Como dito, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) é fruto da apreciação de
três Projetos de Lei da Câmara dos Deputados: o Projeto de Lei nº 4.060, de 13 de
junho de 2012 (PL 4060/2012), de autoria do Deputado Milton Monti (PR/SP) e seus
dois apensos, o Projeto de Lei nº 5.276, de 13 de maio de 2016 (PL 5276/2016), de
autoria do Poder Executivo, e o Projeto de Lei nº 6.291, de 11 de outubro de 2016 (PL
6291/2016), de autoria do Deputado Federal João Derly (REDE/RS)2.
A autodeterminação informativa foi tratada em ambas as propostas, desde a
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
205
sua versão original. A despeito disso, a autodeterminação informativa ganhou
conotação e importâncias distintas nas proposições legislativas.
A autodeterminação informativa foi tratada como um requisito para o tratamento
de dados pessoais no PL 4060/2012, de autoria do Deputado Milton Monti (PR/SP),
ao passo que, no PL 5276/2016, de autoria do Poder Executivo, a autodeterminação
informativa foi tida como fundamento para a disciplina da proteção de dados
pessoais.
Prevaleceu a proposição do Poder Executivo, ou seja, a de que a
autodeterminação informativa é um fundamento para a própria disciplina da proteção
de dados 3.
Em termos gerais, a autodeterminação informativa tem sido compreendida a
partir da premissa de que o indivíduo pode controlar a obtenção, a titularidade, o
tratamento e a transmissão de dados relativos à sua pessoa. Mas o que diz a literatura
jurídica nacional a respeito do tema?
Para Rony Vainzof, a autodeterminação informativa consiste no controle
pessoal do titular do dado sobre o trânsito relativo às suas informações. Trata-se,
portanto, de uma “extensão de liberdades do indivíduo” (VAINZOF, 2019, p. 27).
Segundo Vainzof, essas liberdades conjugariam duas concepções de privacidade de
dados. Uma seria negativa e estática; a outra seria moderna e dinâmica, que
acompanharia todo o “ciclo da vida dos dados nos mais variados meios em que possa
circular” (VAINZOF, 2019, p. 27).
Ana Paula Gambogi Carvalho, por sua vez, destaca que a autodeterminação
informativa é o direito que assegura a todo titular de dados tomar conhecimento sobre
o arquivamento e a utilização de informações a ele pertencentes por terceiros, assim
como controlar, questionar, corrigir, impedir, retirar ou retificar dados (CARVALHO,
2003).
Danilo Doneda, um dos maiores estudiosos do tema no Brasil, por sua vez,
esclarece que “a autodeterminação informativa surgiu basicamente como uma
extensão das liberdades presentes nas leis de segunda geração, e são várias as
mudanças específicas neste sentido que podem ser identificadas na estrutura destas
novas leis” (DONEDA, 2010, p. 42). O autor ressalta, ainda, que:
O tratamento dos dados pessoais era visto como um processo, que não se
encerrava na simples permissão ou não da pessoa à utilização de seus
dados pessoais, porém procurava inclui-la em fases sucessivas do
processo de tratamento e utilização de sua própria informação por
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
206
terceiros, além de compreender algumas garantias, como o dever de
informação (DONEDA, 2010, p. 42).
Portanto, reconhecendo a assimetria de informações e o desequilíbrio de
armas entre titular e agente de tratamento de dados, Doneda ressalta que as leis:
procuraram fortalecer a posição da pessoa em relação às entidades que
coletam e processam seus dados, reconhecendo um desequilíbrio nesta
relação que não era resolvido por medidas que simplesmente reconheciam
o direito à autodeterminação informativa (DONEDA, 2010, p. 42).
A autodeterminação informativa, portanto, não corresponde à ideia
reducionista de autonomia da vontade do titular do dado, como outrora já se
acreditou. Como acentua Bruno Ricardo Bioni, outro expoente do tema no Brasil,
“historicamente, a proteção dos dados pessoais tem sido compreendida como o
direito
de
o
indivíduo
autodeterminar
as
suas
informações
pessoais:
autodeterminação informacional” (BIONI, 2019, n.p). Contudo, o autor critica essa
forma de construção do sentido da autodeterminação informativa, dado que, na
construção do conceito:
recorre-se, por isso, à técnica legislativa de eleger o consentimento do
titular dos dados pessoais como seu pilar normativo. Por meio do
consentimento, o cidadão emitiria autorizações sobre o fluxo dos seus
dados pessoais, controlando-os (BIONI, 2019, n.p).
Porém, Bioni adverte que:
não raras vezes a terminologia ‘autodeterminação informacional’ implica a
interpretação equivocada de que o consentimento do titular dos dados
pessoais teria primazia e prevalência na proteção dos dados pessoais, a
fim de que, justamente, o sujeito autodeterminasse as suas informações
pessoais (BIONI, 2019, n.p).
Ao se definir o consentimento do titular como base normativa fundamental para
a proteção de dados, dando-lhe papel primordial à proteção de dados pessoais, limitase, ou mesmo, ignora-se a assimetria entre o titular e o agente de tratamento de dados.
Prioriza- se o aspecto formal, que ignora a desigualdade material entre os atores
envolvidos no jogo do tratamento de dados, em detrimento do aspecto material. Ao
priorizar a lógica formal, ignora-se que a capacidade do titular em consentir de maneira
plenamente informada é um ideal, jamais uma realidade, sobretudo em um país tão
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
207
desigual, em termos sociais e econômicos, como o Brasil.
Nessa mesma linha de ideias, Rony Vainzof, ao comentar o art. 2º, II, da LGPD,
que trata da autodeterminação informativa, adverte que “pensar que o cidadão possa
ter o controle sobre seus próprios dados parece, atualmente, uma utopia” (VAINZOF,
2019, p. 27). Como ressalta Vainzof, a autodeterminação informativa, enquanto
fundamento da LGPD:
vai muito além do nível de esfera íntima do cidadão, pois atinge também
emanações notoriamente de natureza pública dos titulares, como opinião
política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico
ou político, incluindo o tratamento de dados pessoais cujo acesso é público,
que deverá considerar a finalidade, a boa-fé e o interesse público que
justificaram sua disponibilização (VAINZOF, 2019, p. 27-28).
Por isso, Bioni sustenta a necessidade de empoderamento do titular de dados,
como forma de efetivar a autodeterminação informativa. Nas palavras do autor:
deve haver uma releitura ambivalente do paradigma da autodeterminação
informacional – procedimental e substantiva – que embora mantenha o
papel de protagonismo do consentimento, empresta-lhe um novo roteiro
normativo: a percepção de que o titular dos dados pessoais amarga uma
(hiper)vulnerabilidade, o que demanda, respectivamente, o seu
empoderamento para emancipá-lo e a sua intervenção para assisti-lo
(BIONI, 2019, n.p).
Em termos práticos, Bioni menciona uma série de fragilidades informacionais
por parte de titulares de dados, constatadas a partir de estudos empíricos das
Universidades de Stanford e Carnegie Mellon, desenvolvidos a partir de modelos
mentais dos usuários a respeito do funcionamento da publicidade comportamental no
ambiente on-line:
os usuários não têm um conhecimento técnico para autodeterminar os seus
dados pessoais no plano da sua coleta. Apenas 23% dos usuários usam o
modo de navegação privada – aquele que bloqueia a coleta dos dados
pessoais –, enquanto 50% dos usuários não usam tal ferramenta e 27%
não têm certeza. Além disso, somente 17% deletam cookies, 23% não têm
certeza, e, por fim, 60% não deletam essa ferramenta de coleta de dados
pessoais (BIONI, 2019, n.p).
No mesmo sentido, merece destaque o estudo de Flávio Franco sobre o
impacto do marco civil da internet nas atividades de e-commerce. O autor aponta o
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
208
contínuo aumento de vendas on-line no e-commerce brasileiro (“26% em 2011,
20% em 2012, 28% em 2013 e 24% em 2014”) (FRANCO, 2017, p. 492), o que
evidencia o desafio de se assegurar ao consumidor, e por que não dizer, ao titular
de dados, a devida proteção dos seus dados pessoais, tendo em vista a assimetria
informacional entre titular e agentes de tratamento de dados do mercado virtual
(FRANCO, 2017, p. 492).
Do mesmo modo, Laura Schertel Mendes, ao abordar a tutela da privacidade
do consumidor na internet, chama a atenção para a necessária segurança e
confiabilidade dos ambientes virtuais, visto que o usuário de plataformas digitais
precisará:
confiar na funcionalidade do sistema e no fato de que as suas informações
serão tratadas de forma confidencial e segura para que possa utilizar
livremente o sistema e exercer os seus direitos fundamentais por meio dele
(MENDES, 2015, p. 474).
Nesse sentido, deve ser lida com uma certa dose de ceticismo a justificativa
constante do PL 4060/2012, de autoria do Deputado Federal Milton Monti (PR/SP),
no sentido de que “não há dúvida nenhuma que o Estado deve cuidar das questões
gerais, mas é também evidente que a sociedade é refrataria ao excesso de tutela por
parte do Estado e que deseja exercer na plenitude seus direitos constitucionais
inclusive o de receber se quiser comunicações pelos meios disponíveis no momento”.
Mais adequado seria, portanto, que a justificativa enfatizasse o papel do Estado
enquanto instrumento de apoio ao empoderamento do titular dos dados – na feliz
expressão de Bioni (BIONI, 2019, n.p) – ao invés de sustentar a ideia de que há uma
extrema tutela estatal, o que não parece ser o caso, ao menos no campo da proteção
de dados pessoais no Brasil.
Assim, a LGPD é um importante instrumento para fazer frente aos desafios que
se colocam frente à necessidade de efetivação do direito à autodeterminação
informativa, dado que, na linha do que orienta a literatura jurídica nacional, não se pode
perder de vista a “(hiper)vulnerabilidade” do titular de dados pessoais no Brasil (BIONI,
2019, n.p).
3. CONCLUSÃO
A Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, Lei Geral de Proteção de Dados
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
209
Pessoais (LGPD), é um grande marco para a proteção de dados pessoais no Brasil. É
fruto do encontro de duas proposições legislativas: o Projeto de Lei nº 4.060, de 13 de
junho de 2012 (PL 4060/2012), de autoria do Deputado Federal Milton Monti (PR/SP),
e o Projeto de Lei nº 5.276, de 13 de maio de 2016 (PL 5276/2016), de autoria do
Poder Executivo.
Sua proposta inicial, isto é, o PL 4060/2012, carecia de legitimidade e
representatividade, porque atendia aos anseios da indústria da comunicação. A
correção de rumos veio com a apresentação do PL 5276/2016, de autoria do Poder
Executivo, momento a partir do qual se ampliou de forma significativa do debate em
torno do tema da proteção de dados pessoais.
A autodeterminação informativa, inicialmente alocada como um “requisito” na
proposta inicial (PL 4060/2012), ganhou status de “fundamento” no PL 5276/2016, e
assim permaneceu até o texto final da LGPD. A autodeterminação informativa é o
direito que assegura a todo titular de dados tomar conhecimento sobre o arquivamento
e a utilização de informações a ele pertencentes por terceiros, assim como controlar,
questionar, corrigir, impedir, retirar ou retificar dados (CARVALHO, 2003).
Contudo, a efetivação desse direito impõe importantes desafios para o futuro,
entre eles, o desafio da superação da “(hiper)vulnerabilidade” do titular de dados
pessoais no Brasil (BIONI, 2019, n.p). Há correções a serem feitas? Falhamos no
conteúdo da lei?
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais produzirá a eficácia social desejada?
A autodeterminação informativa será um direito plenamente efetivado? Todas essas
questões ainda carecem de maiores investigações, pois a LGPD foi publicada há
pouco mais de três anos.
O passado sugere que, se falhamos em algo, não parece ter sido no
procedimento. A norma foi construída a partir de um amplo debate, que envolveu
diversos setores da sociedade e uma gama de estudiosos do tema. O presente, por
sua vez, evidencia que a literatura jurídica nacional se encontra vigilante em relação
aos desafios que se põem à efetivação do direito à autodeterminação informativa. É
preciso dar mais liberdade e intervir menos, mas é preciso, sobretudo, (super)
empoderar o titular de dados pessoais.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
210
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei n. 13.709 de 14 de agosto de 2018. Lei Geral de Proteção de Dados
Pessoais. Brasília, DF. ago. 2021.
BIONI, B. Proteção de dados pessoais: a função e os limites do consentimento. Rio
de Janeiro: Forense, 2019. Versão digital.
CARVALHO, A. P. G. O consumidor e o direito à autodeterminação informacional:
considerações sobre os bancos de dados eletrônicos. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003.
DONEDA, D. A proteção de dados pessoais nas relações de consumo: para além da
informação creditícia. Brasília: SDE/DPDC, 2010.
FRANCO, F. O impacto do marco civil da internet nas atividades de e-commerce. In:
FREITAS, Rafael Véras de; RIBEIRO, Leonardo Coelho; FEIGELSON, Bruno
(Coord.). Regulação e novas tecnologias. Belo Horizonte: Fórum, 2017.
MENDES, L. S. A Tutela da Privacidade do Consumidor na Internet: uma análise à
luz do Marco Civil da Internet e do Código de Defesa do Consumidor. In: LUCCA,
Newton de; FILHO, Adalberto Simão; LIMA, Cíntia Rosa Pereira de. Direito & Internet
III. Marco Civil da Interne. São Paulo: Quartier Latin, 2015.
SILVA, D. P. E. Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
VAINZOF, R. Lei 13.709, de 14 de agosto de 2018. In: BLUM, Renato Opice;
MALDONADO, Viviane Nóbrega. LGPD: Lei Geral De Proteção De Dados
Comentada. 2. ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2019.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.92075-92091 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
211
CAPÍTULO 12
O REGISTRO DE IMÓVEIS E A INFORMAÇÃO AMBIENTAL
Antonio Fernando Schenkel do Amaral e Silva
Mestre e Doutor em Ciência Jurídica pela Fundação Universidade do Vale do Itajaí
(UNIVALI) Juiz Federal
Rua Uruguai, 458 – Centro, Itajaí – SC - Brasil
E-mail: amaraltoninho@hotmail.com
Marcelo Buzaglo Dantas
Pós-Doutor em Direito Ambiental, Transnacionalidade e Sustentabilidade pela
UNIVALI
Docente Permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciência Jurídica
(Mestrado e Doutorado) da UNIVALI
Rua Uruguai, 458 – Centro, Itajaí – SC - Brasil
E-mail: marcelo@buzaglodantas.adv.br
Sheyla Campos Pinheiro
Graduanda em Direito Universidade Ceuma
Av. Sarney Filho, 19A - V. Embratel, São Luís - MA - Brasil
E-mail: sheylapinheiro99@gmail.com
Zenildo Bodnar
Pós Doutor em Direito Ambiental pela Universidade Federal de Santa Catarina e pela
Universidad de Alicante – Espanha
Professor nos programas de Doutorado e Mestrado em Ciência Jurídica da
Universidade do Vale do Itajaí
Rua Uruguai, 458 – Centro, Itajaí – SC - Brasil
E-mail: zenildo.bodnar1@gmail.com
RESUMO: A Constituição Federal assegurou a todos o direito ao meio ambiente
equilibrado, delegando ao Registro de Imóveis a missão de concentrar todas as
informações relativas ao bem de raiz. Há um trinômio envolvendo meio ambiente,
propriedade imobiliária e Registro de Imóveis, na medida em que as informações, os
direitos e as restrições ambientais devem ser inscritas na matrícula, operando-se a
publicidade ambiental, a segurança jurídica econômica e a preservação do meio
ambiente. Desta forma, o presente trabalho, utilizando-se da pesquisa bibliográfica
como metodologia, tem por objetivo estudar as relações entre o Registro de Imóveis
e a Lei de Informação Ambiental (Lei 10.650/2003) verificando se há alguma interação
normatizada entre eles, especialmente quanto ao ingresso dos dados ambientais nas
serventias imobiliárias. Ao estudar os artigos da Lei, procura-se verificar as medidas
necessárias para que a eficácia da norma seja potencializada através de uma
adequada combinação com o Direito Registral, de molde a obter repercussões e
interações diretas e práticas no âmbito do Registro de Imóveis em favor do meio
ambiente.
PALAVRAS-CHAVE: Registro de Imóveis; Lei 10.650/2003; Meio Ambiente;
Informação.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
212
ABSTRACT: The Federal Constitution guaranteed everyone the right to a balanced
environment, delegating to the Property Registry the task of concentrating all
information related to the root asset. There is a trinomial involving the environment, real
estate and Property Registry, insofar as environmental information, rights and
restrictions must be registered in the property's registration, operating environmental
advertising, economic legal security and preservation of the environment. Thus, the
present work, using bibliographic research as a methodology, aims to study the
relationship between the Property Registry and the Environmental Information Law
(Law 10.650 / 2003), checking if there is any standardized interaction between them,
especially regarding the entry of environmental data into the real estate registry
services. When studying the various articles of the Law, one seeks to verify the
necessary measures so that the effectiveness of the standard is enhanced through an
appropriate combination with the Registration Law, in order to obtain repercussions
and direct and practical interactions within the scope of the Property Registry in
environmentally friendly.
KEYWORDS: Property Registration; Law 10.650/2003; Environment; Information.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
213
1. INTRODUÇÃO
O artigo tem por objetivo científico estudar a Lei de Informação Ambiental e suas
interações com o registro imobiliário. Insere-se na temática combinada entre o Direito
Ambiental1 e o Direito Registral2, buscando elementos teóricos que possam legitimar
a inscrição das informações da Lei 10.650/2003 nas matrículas do Registro de Imóveis3
em prol do meio ambiente.4
Pretende-se verificar os dispositivos legais e suas relações com o registro
imobiliário, mormente se indagarmos: existe uma interação entre a Lei 10.650/2003 e
o Registro de Imóveis para a inscrição das informações ambientais nas matrículas?
Destarte, é oportuno averiguar a questão e, ainda, pensar em como melhorar o
intercâmbio de informações entre os órgãos administrativos com o sistema5 de
registro imobiliário. Importante, também, propor medidas práticas em prol da
informação ambiental, da transparência e da sustentabilidade.6
Sob a perspectiva da publicidade e da segurança jurídica, pretende-se
demonstrar a importância da interligação entre as normas da Lei 10.650/2003 e as de
Direito Registral, potencializando a informação de caráter ambiental com sua inscrição
1
Direito Ambiental: “O Direito Ambiental é, portanto, a norma que, baseada no fato ambiental e no valor
ético ambiental, estabelece os mecanismos normativos capazes de disciplinar as atividades humanas
em relação ao meio ambiente.” ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 14 ed. São Paulo: Atlas,
2012, p. 6.
2
Direito Registral: é o conjunto de princípios e de normas que têm por objetivo disciplinar os registros
públicos, regulamentando a forma e o procedimento para a realização de tais atos solenes, bem assim
os efeitos e as consequências jurídicas que deles promanam.
3
Registro de Imóveis: é a instituição encarregada, por delegação constitucional, de guardar e conservar
na matrícula as informações relativas a determinado bem imóvel, fornecendo a qualquer interessado
certidão a respeito dos dados alusivos à propriedade imobiliária, conferindo autenticidade, segurança,
validade e publicidade a atos e fatos jurídicos. SARMENTO, Eduardo Sócrates Castanheira. A dúvida
na nova lei de registros públicos: doutrina, prática, jurisprudência, legislação. Rio de Janeiro: Editora
Rio, 1977, p. 3.
4
Meio ambiente: “[...] o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e
biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. Consoante o artigo 3º da Lei
6.938/1981.
5
Sistema: “Todo conjunto ordenado de técnicas, normas e conceitos que venha a constituir-se num
Modelo” MELO, Osvaldo Ferreira. de. Dicionário de Política Jurídica. Florianópolis: OAB-SC, 2000, p.
88.
6
“Sin embargo, la Sostenibilidad es una noción positiva y altamente proactiva que supone la
introducción de los cambios necesarios para que la sociedad planetaria, constituida por la Humanidad,
sea capaz de perpetuarse indefinidamente en el tiempo.” REAL FERRER, Gabriel. Sostenibilidad,
transnacionalidad y transformaciones del Derecho. In: SOUZA, Maria Cláudia da Silva Antunes de;
GARCIA, Denise Schmitt Siqueira (Orgs.). Direito ambiental, transnacionalidade e sustentabilidade.
Dados eletrônicos. Itajaí: UNIVALI, 2013, p. 13. Tradução livre: “Porém, Sustentabilidade é uma noção
positiva e altamente pró-ativa que supõe a introdução das mudanças necessárias para que a sociedade
planetária, constituída pela Humanidade, seja capaz de se perpetuar indefinidamente no tempo”.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
214
na matrícula imobiliária.7
A transparência8 e a acessibilidade proporcionadas pelo registro imobiliário
a todos, independentemente de justificação9 e mediante simples requerimento ao
registrador, é uma das medidas de maior eficácia para a defesa da natureza na
atualidade.
Daí ser oportuno questionar quais dados, relativos ao meio ambiente10, que
devem ser inscritos na matrícula das propriedades. Sem dúvida, são inúmeras as
hipóteses, especialmente quando cominadas ao proprietário limitações e/ou
obrigações de fazer ou não fazer, cujo conhecimento por terceiros somente é viável
pela via da inscrição na matrícula e pela publicidade registral.
É interessante, portanto, que sejam apresentadas propostas de atualização da
Lei 10.650/2003, de tal forma que todos os dados estejam acessíveis não só nos
órgãos ambientais, mas, sobretudo, no Registro de Imóveis e na internet, poupando o
cidadão de dirigir-se, fisicamente, até qualquer um deles.
2. REGISTRO DE IMÓVEIS E MEIO AMBIENTE: SUSTENTABILIDADE
As serventias imobiliárias destinam-se ao assentamento de títulos públicos e
Como leciona MÁÑEZ o “Registro de Imóveis tem por finalidade principal dar segurança ao tráfico
jurídico imobiliário, no intuito de garantir a existência e conteúdo dos direitos de propriedade que se
constituam e inscrevam sobre as propriedades registrais, de modo que, quem adquira tais direitos
confiando em sua descrição registral e o inscreva a seu favor, será protegido pelo ordenamento jurídico
diante de possíveis reclamações”. MÁÑEZ, José Luis Salazar. Meio ambiente e Registro de Imóveis,
uma interação mútua: o direito de acesso à informação ambiental e em apoio à sustentabilidade. In:
Registro de Imóveis e meio ambiente. JACOMINO, Sérgio; MELO, Marcelo Augusto Santana; CRIADO,
Francisco de Asís Palacios (Coordenadores). São Paulo: Saraiva, 2010, pág. 175/176.
8
Transparência do Estado se revela quando ele torna pública a informação que detém, de forma
acessível, clara e simples, despida de tecnicismos ou outras linguagens obscuras para a maioria da
população.
9
Lei 6.015/1973: “Art. 17. Qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial
ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido”
10
“1.1.1 Defining the environment - [...] The Environmental Protection Act (EPA) 1990 provides a useful
starting point. Under s 1(2) “The ‘environment’ consists of all, or any of the following media, namely, the
air, water and land; and the medium of air includes the air within buildings and the air within other natural
or man-made structures above or below ground”. “1.1.1 Definindo o ambiente
- [...] A Lei de Proteção Ambiental (EPA) 1990 fornece um ponto de partida útil. Sob s 1(2) - “O‘ ambiente
’consiste em todos ou qualquer um dos seguintes meios, nomeadamente, o ar, a água e a terra; e o
meio do ar inclui o ar dentro de edifícios e o ar dentro de outras estruturas naturais ou feitas pelo homem
acima ou abaixo do solo" (tradução livre). WOLF, Susan; WHITE, Anna. Principles of environmental
law. Second Edition. London: Cavendish Publishing Limited, 1997, p.1.
7
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
215
privados e, com a publicidade advinda do registro11, outorgam-se aos títulos a
oponibilidade a terceiros. O sistema de Registros Públicos é destinado a garantir a
publicidade, a autenticidade, a segurança e a eficácia dos atos jurídicos, na forma das
Leis 6.015/1973 e 8.935/1994 ou “Lei dos Notários e Registradores”.12
O acesso às informações constantes do registro é amplo e livre, consoante o
artigo 17 da Lei 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos), pelo que qualquer “pessoa
pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo
ou interesse do pedido”. Sendo certo que todas as informações pertinentes a um
imóvel devem estar concentradas numa matrícula individualizada.
MÁÑEZ, defende que os registros imobiliários exerçam “atividades de
informação e de segurança jurídica em matéria ambiental”, convertendo-se em
instrumentos de “proteção da legalidade meio ambiental”, mediante:
- A utilização do cartório como centro de difusão de informação meio
ambiental relativo ao território do distrito registral de que se cuide,
aproveitando que se trata de órgãos públicos, descentralizados e com
grande implantação territorial, completamente informatizados, e
relacionados com os departamentos de registro dos demais países da União
Europeia.13
Com efeito, a serventia do Registro de Imóveis, para gerar a proteção jurídica
e econômica da propriedade, deve fornecer à coletividade quaisquer informações
relativas à situação do bem, incluindo, as de caráter ambiental. Nesse sentido, o
problema da eficácia das leis é preocupante:
Según el profesor Rafael Valenzuela, una norma es eficaz cuando las
respuestas conductuales reclamadas por su contenido preceptivo han sido
las apropiadas para encarar la situación que motivó, precisamente, su
imposición.
Lei 6.015/73: “Art. 16. Os oficiais e os encarregados das repartições em que se façam os registros são
obrigados: 1º a lavrar certidão do que lhes for requerido; 2º a fornecer às partes as informações
solicitadas”.
12
“Notários e registradores são profissionais cujos atos, atribuídos por lei, são remunerados por
pessoas naturais ou jurídicas (as partes) e não pelo Estado. Por isso se diz que são titulares de
serventias não oficializadas, querendo, assim, afirmar que se trata de serviços não estatizados”.
CENEVIVA, Walter. Lei dos notários e dos registradores comentada. 3. ed. rev., ampl. e atual. São
Paulo: Saraiva, 2000, p. 21.
13
MÁÑEZ, José Luis Salazar. Meio ambiente e Registro de Imóveis, uma interação mútua: o direito ao
acesso à informação ambiental e em apoio à sustentabilidade. Em: JACOMINO, Sérgio; MELO,
Marcelo Augusto Santana de; CRIADO, Francisco de Assis Palacios (coord). Registro de Imóveis e
meio ambiente. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 186-187.
11
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
216
Se habla de eficacia cuando la norma cumple con la finalidad para la cual
fue dictada, y de eficiencia cuando ella es acatada por la sociedad, alude al
grado de obedecimiento efectivo, espontáneo o provocado, del deber ser
impuesto por la norma vigente.14
É claro que o cumprimento espontâneo é um ideal coletivo, porém difícil de ser
atingido, bem por isto, normas restritivas devem vir acompanhadas de instrumentos
para lhes dar eficácia. A Carta Magna trouxe o princípio do direito ao meio ambiente
equilibrado e o constitucionalizou no artigo 225:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.
Esse direito se traduz na conservação da natureza e suas funções,
garantindo-se a existência, evolução e desenvolvimento dos seres vivos do planeta,
podendo ser tal estado de coisas condensado na palavra sustentabilidade:15
Another principle undergirding much of international environmental law is
that of sustainable development. This concept refers to limiting
development to actions that sustain, rather than deplete or destroy,
resources such as forests, fisheries, and the like, Sustainable development
might be likened to using the income, rather than depleting the capital, of
natural resources. It recognizes that these resources are finite.16
Assim, o artigo 225 da CF, dada a sua amplitude, generalidade e importância,
“Segundo o professor Rafael Valenzuela, uma regra é eficaz quando as respostas comportamentais
reivindicadas por seu conteúdo prescritivo foram as adequadas para enfrentar a situação que
justamente motivou sua imposição”. - “Fala-se de eficácia quando a norma cumpre o fim para o qual
foi emitida, e de eficiência quando é seguida pela sociedade, referindo-se ao grau de cumprimento
efetivo, espontâneo ou provocado, do dever imposto pela norma em vigor” (tradução livre). BITTERLICH,
Pedro Fernández. Manual de derecho ambiental chileno. 2. ed. Santiago: Editorial Jurídica de Chile,
2004, p. 64.
15
Sobre a temática: “Trata-se do princípio constitucional que determina, com eficácia direta e imediata,
a responsabilidade do Estado e da sociedade pela concretização solidária do desenvolvimento material
e imaterial, socialmente inclusivo, durável e equânime, ambientalmente limpo, inovador, ético e
eficiente, no intuito de assegurar, preferencialmente de modo preventivo e precavido, no presente e no
futuro, o direito ao bem-estar” FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 3. ed. Belo
Horizonte: Fórum, 2016, p. 43.
16
WEINBERG, Philip; REILLY, Kevin A. Understanding environmental law. Danvers: LexisNexis,
2008, p. 425. “Outro princípio subjacente a grande parte do direito ambiental internacional é o do
desenvolvimento sustentável. Este conceito se refere a limitar o desenvolvimento a ações que
sustentam, ao invés de esgotar ou destruir, recursos como florestas, pescas e outros. O
desenvolvimento sustentável pode ser comparado a usar a renda, ao invés de esgotar o capital, dos
recursos naturais. Ele reconhece que esses recursos são finitos” (tradução livre).
14
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
217
expande-se e tem plena aplicação a quaisquer campos do Direito pátrio, porquanto “a
sustentabilidade, em sua acepção mais ampla, passará a ser, se já não o é, o principal
item do debate político jurídico e, portanto, possivelmente o novo paradigma indutor
do direito".17
Ao tutelar o equilíbrio quer-se preservar a estabilidade dos processos naturais,
de modo a evitar que a ruptura dessa estabilidade nos leve ao colapso ambiental. É
certo que o crescimento sustentável precisa contar com novos instrumentos de ação
concreta, como sói ser o Direito Registral, observado a ausência de efetividade na
salvaguarda do meio ambiente nacional e o irrefreável fortalecimento das práticas
empresariais e consumeristas em território brasileiro:
No mundo atual cada vez mais globalizado, o estilo de vida, o
comportamento e os modelos de consumo dos países desenvolvidos estão
se estendendo para os países em desenvolvimento. Consumo esse nada
sustentável quando se observa as cadeias de produção, os hábitos das
pessoas, chancelados por legislações vulneráveis e pouco eficazes.18
O Estado tem o dever de exigir compulsoriamente o zelo ambiental, bem
como, o dever de partilhar as informações com a coletividade através da
comunicação às serventias imobiliárias de dados de interesse do meio ambiente. É
imprescindível que os diversos membros do corpo estatal se comuniquem
eficazmente.
De outro norte, as restrições ambientais ocorrem porque necessitamos de
limites à atividade econômica, dada a sua inclinação para maximizar os lucros:
While business teaches us effective forms of human organization,
environmental science reveals that those forms do not necessarily preserve
the natural resources that are the basis of our well-being. While business
teaches how to gain financial wealth, ecological understanding demonstrates
that wealth to be illusory unless it is based on teh principles and cyclical
17
BODNAR, Zenildo; CRUZ, Paulo Márcio. A Commolização do Direito Positivo, o Ativismo Judicial
e a Crise do Estado. Revista Novos Estudos Jurídicos, [S.I.], v.21, n.3, p. 1332 a 1351, nov.2016.
ISSN 2175 0491. Disponível em: https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/nej/article/view/9700/5451.
Acesso em: 22 set.2021. doi:https://doi.org/10.14210/nej.v21n3.p1332-1351.
18
BRITTO, Marcel; GOMES, Heitor Menezes.; VALICENTE, Raiana Rassi. Reflexões sobre a
sustentabilidade e sua institucionalização no Brasil. Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7,
n.9,
p.
89512-89527,
sep.
2021.
ISSN:
2525-8761.
Disponível
em:
https://www.brazilianjournals.com/index.php/BRJD/article/view/35921. Acesso em: 18 set. 2021.
doi:https://doi.org/10.34117/bjdv7n9-218.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
218
processes of nature. The dialoque reconciling these dichotomies will be the
fundametal basis for economic transformation.19
O artigo 5º da Constituição assegura, como princípio fundamental, o direito de
propriedade, constitucionalizando o princípio
da função socioambiental da
propriedade: Fundamentalmente, pode-se dizer que a propriedade tem um conteúdo
variável de acordo com a função social ditada pela natureza do bem, conforme limites
fixados em lei, garantido, entretanto, um conteúdo mínimo essencial (CF, art. 5º, XXII).
É que, de fato, a garantia do direito individual não dá ao titular a faculdade de exercer
seus poderes ilimitadamente, mas submete-os aos direitos alheios, de igual natureza,
e ao interesse coletivo, que deve prevalecer em face do direito individual.
O conceito de função social da propriedade não se confunde com o sistema de
limitações à propriedade, pois a função social diz respeito à própria estrutura do direito
de propriedade, enquanto que as limitações têm como objeto o exercício do direito,
expressando-se na esfera do poder de polícia, [...].20
Portanto, a propriedade deve estar voltada ao bem estar de todos e ao equilíbrio
ambiental, sendo inconstitucional qualquer legislação que contrarie este comando, o
que justifica a imposição de restrições à propriedade.
3. A MATRÍCULA IMOBILIÁRIA
Para o Direito Registral, a matrícula é o centro de toda a atividade cartorária, é
o instrumento técnico-legislativo utilizado para atingir as finalidades do registro
imobiliário. É ela que enseja o nascimento jurídico do imóvel, individualizando-o.
Outrossim, as serventias de Registro de Imóveis há muito tempo se
converteram em agentes tributários responsáveis pela prestação de informações ao
Fisco e de longa data exercem um poder de fiscalização para o cumprimento das
posturas urbanísticas e o georreferenciamento dos imóveis rurais, sendo que
19
HAWKEN, Paul. The ecology of commerce: a declaration of sustainability. New York: Harpen
Business, 2010, p. 12. “Enquanto os negócios nos ensinam formas eficazes de organização humana, a
ciência ambiental revela que essas formas não preservam necessariamente os recursos naturais que
são a base de nosso bem-estar. Enquanto os negócios ensinam como obter riqueza financeira, a
compreensão ecológica demonstra que a riqueza é ilusória, a menos que seja baseada nos princípios e
processos cíclicos da natureza. O diálogo que concilia essas dicotomias será a base fundamental para
a transformação econômica” (tradução livre).
20
CHALHUB, Melhim Namem. Propriedade imobiliária: função social e outros aspectos. Rio de
Janeiro: Renovar, 2000, p. 11-12.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
219
futuramente deverão se converter em ofícios públicos ambientais.
ARIAS, comentando o assunto na experiência espanhola dos registros, aduz:
A oportunidade de transladar essa eficaz experiência para o âmbito da
legislação ambiental deve ser ineludivelmente aproveitada. Os registros da
propriedade não colaboram somente na função de ‘polícia territorial’, no
âmbito estrito da informação sobre medidas punitivas impostas por não
cumprimento de deveres legais de conservação ambiental, ou de garantia
pela imposição de sanções econômicas ou do estabelecimento e
indenizações: a colaboração deve, e pode, abarcar todo o amplo leque de
atuações que impliquem a restauração do equilíbrio ecológico alterado,
conceito este que veremos ser muito mais amplo do que exclusivamente
punitivas.21
É importante, pois, verificar as diversas hipóteses previstas na legislação e na
práxis jurídica que recomendam a atuação dos registros públicos imobiliários.
3. ASPECTOS
GERAIS
DA
TUTELA
AMBIENTALNO
REGISTRO
IMOBILIÁRIO
As disposições legais imobiliárias têm por objeto o território, no que se irmanam
às normas ambientais. A terra, o ar e a água estão contidos dentro de um espaço
delimitado ou delimitável, que é compreendido em uma circunscrição imobiliária.
Assim, com o espaço devidamente identificado e titulado, é possível que as
autoridades e a coletividade tenham plena ciência de onde, como e quando algo está
acontecendo em relação ao meio ambiente.
Quanto mais cedo for feito o registro dos fatos e atos jurídicos, melhor para
todos e, em especial, para o meio ambiente. A publicidade no início dos
procedimentos administrativos proporciona uma prevenção geral, pública e notória:
Não esqueçamos de que a função preventiva, aquela que impede a
realização de um prejuízo ecológico, deve ter primazia sobre essa função
de restauração, ou saneadora, do dano já realizado; mas ressaltamos a
eficácia dissuasória que a publicidade-informação tem sobre futuro
descumprimento: ao contaminante já conhecido será mais difícil voltar a
lesar o meio ambiente; terá dificuldades para o seu acesso ao crédito e para
obter um bom valor para seu imóvel; sofrerá descrédito social. Finalmente,
21
ARIAS, Luis Alfredo Suáres. O registro da propriedade como meio de garantia das sanções no meio ambiente. Em: DIP, Ricardo Henry
Marques; JACOMINO, Sérgio (orgs). Registro imobiliário: temas atuais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. – (Coleção
doutrinas essenciais: direito registral; v. 2), p. 614.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
220
a possibilidade de que os descumprimentos de obrigações ecológicas
sejam conhecidos pela sociedade, com caráter permanente e acessível,
fará diminuir a sua ocorrência e quantidade em um prazo relativamente
curto.22
De toda sorte, a inscrição na matrícula é um elemento a mais de garantia do
cumprimento da obrigação firmada no expediente administrativo, que pode resultar
na imposição de medidas mitigadoras ou na constatação da inexistência do ilícito.
5. O PRINCÍPIO DA INFORMAÇÃO OU DA PUBLICIDADE
A informação e a publicidade constituem o núcleo do princípio, sendo
fundamental para a defesa da natureza, pois impõe ao Estado a obrigação de
informar à sociedade, independentemente de solicitação, sobre as condições do
meio ambiente, publicando todas as informações que interessam aos cidadãos.
A informação ambiental não tem o fim exclusivo de formar a opinião
pública.Valioso formar a consciência ambiental, mas com canais próprios,
administrativos e judiciais, para manifestar-se. O grande destinatário da
informação – o povo, em todos os seus segmentos, incluindo o científico
não governamental – tem o que dizer e opinar.23
Uma sociedade bem informada tem condições de participar ativamente das
decisões estatais, bem como questioná-las e buscar eficiência da máquina pública
na prevenção e solução dos problemas que a afetam.
Essa ideia é partilhada por MATEO:
Es evidente que sólo si se conocen los procesos abiertos de toma de
decisiones y las actuaciones en curso de las Administraciones Públicas,
podrán hacerse oír los ciudadanos interesados, lo que es más factible en
los niveles más inmediatos de gestión, por lo que el V Programa constata
que las administraciones locales y regionales “pueden contribuir a que la
opinión pública participe más en la protección del Medio Ambiente y a
aumentar su confianza”.244
22
ARIAS, Luis Alfredo Suárez. O registro da propriedade como meio de garantia das sanções no meio
ambiente. Em: DIP, Ricardo Henry Marques; JACOMINO, Sérgio (orgs). Registro imobiliário: temas
atuais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. – (Coleção doutrinas essenciais: direito
registral; v. 2), p. 614.
23
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 25. ed., rev., ampl., e atual. São
Paulo: Malheiros, 2017, p. 127.
24
“É evidente que só se forem conhecidos os processos decisórios abertos e as ações em curso das
Administrações Públicas é que os cidadãos interessados poderão fazer-se ouvir, o que é mais viável
nos níveis de gestão mais imediatos, para que o Programa V observa que as administrações locais e
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
221
Na Declaração do Rio de Janeiro/1992, a questão foi posta no Princípio 10:
A melhor maneira de tratar as questões ambientais é assegurar a
participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No
nível nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações
relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas,
inclusive informações acerca de materiais e atividades perigosas em suas
comunidades, bem como a oportunidade de participar dos processos
decisórios. Os Estados irão facilitar e estimular a conscientização e a
participação popular, colocando as informações à disposição de todos.
Será proporcionado o acesso efetivo a mecanismos judiciais e
administrativos, inclusive no que se refere à compensação e reparação de
danos.
Convém saber o estado do ar, das águas, do solo, das terras, da paisagem e
dos sítios naturais, bem como as condições de diversidade biológica, os ruídos, as
atividades empresariais que causem poluição, as medidas preventivas e reparadoras,
os planos ambientais, as informações sobre a saúde do homem etc.
A informação tem caráter educacional e objetivo: pretende, fundamentalmente,
colocar o cidadão em condições de participar do processo de tomada de decisões,
tais como as políticas públicas ambientais.
A democracia nasce e vive na possibilidade de informar-se. O
desinformado é um mutilado cívico. Haverá uma falha no sistema
democrático se uns cidadãos puderem dispor de mais informações que
outros sobre um assunto, que todos têm o mesmo interesse de conhecer,
debater e deliberar.25
A legislação expressamente vem proclamando o princípio da publicidade:
-
A Lei 11.428/2006, que regula o Bioma Mata Atlântica:
Art. 6º A proteção e a utilização do Bioma Mata
geral o desenvolvimento sustentável e, por
salvaguarda da biodiversidade, da saúde
paisagísticos, estéticos e turísticos, do regime
social.
Atlântica têm por objetivo
objetivos específicos, a
humana, dos valores
hídrico e da estabilidade
regionais ‘podem ajudar a opinião pública a participar mais na proteção do ambiente e a aumentar a
sua confiança’" (tradução livre). MATEO, Ramón Martín. Manual de Derecho Ambiental. 2. ed. Madrid:
Editorial Trivium, 1998, p. 57-58.
25
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à informação e meio ambiente. São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 50.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
222
Parágrafo único. Na proteção e na utilização do Bioma Mata Atlântica,
serão observados os princípios da função socioambiental da propriedade,
da eqüidade intergeracional, da prevenção, da precaução, do usuáriopagador, da transparência das informações e atos, da gestão democrática,
da celeridade procedimental, da gratuidade dos serviços administrativos
prestados ao pequeno produtor rural e às populações tradicionais e do
respeito ao direito de propriedade.
- A Lei 12.305/2010, da Política Nacional de Resíduos Sólidos:
Art. 6º São princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos:
X - o direito da sociedade à informação e ao controle social. (Destaques
nossos).
Destarte, o princípio da informação relaciona-se intimamente com outros
princípios ambientais, especialmente os da publicidade e da participação
comunitária. A doutrina espanhola solidifica a importância da informação ambiental:
El acceso a la información medioambiental, además de desempeñar un
papel esencial en la concienciación y educación ambiental de la sociedad,
constituye un instrumento indispensable para hacer efectivos los otros dos
pilares del Convenio de Aarhus, pues si los ciudadanos no disponen de la
información ambiental relevante en cada momento, difícilmente podrán
intervenir de forma efectiva, con “conocimiento de causa”, en los asuntos
públicos que atañen a este bien jurídico colectivo.26
En passant, não há dúvidas que a publicidade é uma das vigas-mestras da
teoria e da prática registral brasileira. Assim, nada mais natural que essas
informações ambientais sejam compartilhadas com o Registro de Imóveis,
potencializando a difusão desses dados ambientais.
A Lei 10.650/2003 cuida especificamente do assunto na esfera ambiental,
dispondo sobre o “acesso público aos dados e informações ambientais existentes
nos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente –
“O acesso à informação ambiental, além de desempenhar um papel essencial na consciência
ambiental e na educação da sociedade, constitui um instrumento indispensável para a efetivação dos
outros dois pilares da Convenção de Aarhus, pois se os cidadãos não dispõem das informações
ambientais relevantes em todos os momentos, é-lhes difícil intervir eficazmente, com ‘conhecimento
dos fatos’, nos negócios públicos que dizem respeito a este direito jurídico coletivo” (tradução livre).
CUTANDA, Blanca Lozano; TURRILLAS, Juan-Cruz Alli. Administración y legislación ambiental.
Actualizado y adaptado al EEES. Madrid: Editorial Dykynson, 2013, p. 186.
26
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
223
Sisnama, instituído pela Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981”, consoante seu artigo
1º, o que será visto na sequência do trabalho.27
6. A INFORMAÇÃO E A PUBLICIDADE AMBIENTAL PELO REGISTRO DE
IMÓVEIS
Atualmente a informação ambiental encontra-se dispersa, desorganizada e
desconcentrada em muitos e distantes órgãos administrativos. Por isso, o primeiro
passo é acabar com a distância física entre a pessoa e a informação; o segundo,
eliminar quaisquer exigências formais ou subjetivas para o acesso aos informes.
Assim, acredita-se que a Lei 10.650, de 16 de abril de 2003, que trata do acesso
público aos dados e informações existentes nos órgãos e entidades integrantes do
Sistema Nacional do Meio Ambiente, mereça uma atualização.
Nesse sentido é a observação de MACHADO:
A Lei 10.650/2003 tem seus méritos, mas não se pode deixar de afirmar que
se tornou insuficiente, diante da velocidade e da intensidade dos fatos
poluidores dos ecossistemas. Precisamos de uma reforma dessa legislação
ou, mesmo, de uma antecipação voluntária dos órgãos do SISNAMA,
propiciando que a Administração Pública Ambiental ininterruptamente bata à
porta das cidadãs e dos cidadãos informando-os, via Internet, do estado do
meio ambiente. Sem isso a informação se tornará uma partitura chorosa e
resignada, a ser executada diante de degradações irreversíveis.28
O direito à informação ambiental é pressuposto para que a sociedade possa
influenciar as políticas de governo. Possibilita, de fato, que os governados exerçam
uma cidadania crítica e construtiva, também quanto ao progresso econômico:
At the same time, access to information may be viewed as an instrument of
democratic governance [...], opennes and transparency being a prerequisit of
executive and corporate accountability to civil society. Hence precautionary
procedures and safeguards here also refer to precaution against
encroachments on civil liberties, be they in the form of governmentasl attempts
at withholding information as a source of political power or in the form of
industry attempts at monopolizing information as a source of economic gain.29
27
Em Santa Catarina, a Resolução CONSEMA 98, de 05.7.2917 estabelece no Capítulo XIV a
regulamentação da publicidade e da participação popular, não se referindo ao Registro de Imóveis.
Fonte: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=345935> Acesso em 13 de fev. 2020.
28
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à informação e meio ambiente. São Paulo: Malheiros
Editores, 2006, p. 209. O autor aborda, especificamente, a Lei 10.650/2003 às páginas 204-213.
29
“Ao mesmo tempo, o acesso à informação pode ser visto como um instrumento de governança
democrática, [...], sendo a abertura e a transparência um pré-requisito da prestação de contas do
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
224
Da Lei, destaca-se o artigo 2º. Ele obriga os órgãos e entidades integrantes do
SISNAMA a permitir o acesso público aos documentos, expedientes e processos
administrativos que tratem de matéria ambiental e a fornecer as informações
ambientais que estejam sob sua guarda, em meio escrito, visual, sonoro ou eletrônico,
sem necessidade de justificativa, especialmente as relativas a: I - qualidade do meio
ambiente; II - políticas, planos e programas potencialmente causadores de impacto
ambiental; III - resultados de monitoramento e auditoria nos sistemas de controle de
poluição e de atividades potencialmente poluidoras30, bem como de planos e ações
de recuperação de áreas degradadas; IV - acidentes, situações de risco ou de
emergência ambientais; V - emissões de efluentes líquidos e gasosos, e produção de
resíduos sólidos; VI – substâncias tóxicas e perigosas; VII - diversidade biológica e;
VIII - organismos geneticamente modificados.
Em termos de atualizar a Lei, é necessário incluir a obrigação para que os
órgãos integrantes do SISNAMA tenham uma home page na internet para melhor
difusão das informações, evitando o deslocamento do cidadão até a entidade.
Segundo a agência Intermidias31, home page “é página de entrada quando o
usuário digita o endereço eletrônico de um site”. Além disso, na hipótese de o usuário
não entrar no website pela página inicial, ele acabará por passar na home page para
procurar informações sobre o seu site. Por isso: “Esta página precisa ser muito bem
planejada, pois – em alguns casos – cabe a ela encantar o usuário e atraí-lo a navegar
pelas páginas internas do seu site”:
É preciso perceber que o valor da home page enquanto “índice” ou “capa” de
um site não está sendo questionado – pois ele é, de fato, irrevogável. Para
executivo e das empresas à sociedade civil. Portanto, os procedimentos de precaução e salvaguardas
aqui também se referem à precaução contra invasões das liberdades civis, seja na forma de tentativas
governamentais de reter informações como fonte de poder político ou na forma de tentativas da
indústria de monopolizar informações como fonte de ganho econômico” (tradução livre). SAND, Peter
H. Information disclosure. In:
. WIENER, Jonathan B; ROGERS, Michel D; HAMMITT, James K;
SAND, Peter H. (Ed.). The realtiy of precaution: comparing risk regulaltion in the United States and
Europe. Washington: PRF Press, 2011, p. 324.
30
Importante o destaque feito por THOMÉ: “É necessária a utilização de nova forma de interpretar os
dados científicos, para que a sociedade perceba, efetivamente, os efeitos dos impactos negativos sobre
o meio ambiente, a saúde humana e suas próprias vidas. A divulgação de dados científicos
desvinculada de seus efeitos para o homem apresenta-se como medida inócua e que não incentiva a
tomada de decisões no sentido da preservação do meio ambiente. [...]”.THOMÉ, Romeu. O princípio
da vedação de retrocesso socioambiental no contexto da sociedade de risco. Salvador: Editora
Jus Podivm, 2014.
31
Agência de marketing digital. Fonte: https://www.intermidias.com.br/seo-otimizacao-de-sites/o-que-ehome-page-landing-pages/> Acesso em: 17 de fev. 2020.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
225
que uma home page seja eficiente, devem-se concentrar esforços no
planejamento da arquitetura de informação e estudos de usabilidade, a fim de
que a navegação do usuário seja fluida o suficiente para que ele encontre o
que buscava facilmente. A crítica aqui está na supervalorização da home
page em detrimento das landing pages, páginas que se tornam ainda mais
importantes na medida em que é nelas onde se encontra o conteúdo – o que
o usuário, de fato, busca.
A home page também poderá utilizar a landing page, conhecida como página
de aterrissagem ou página de destino. A landing page “é uma página estrategicamente
criada para uma campanha ou projeto e tem como objetivo atender ao máximo as
expectativas de quem a visita”, segundo a Intermidias. Ela deve carregar conteúdos
diferenciados e completos, voltados para um objetivo único: “Campanhas de links
patrocinados, quando bem executadas, apontam para uma landing page. Isso porque,
o conteúdo contido nessas páginas são totalmente estudados e planejados para
seduzir, persuadir e informar o público-alvo”.32
Adotando-se, legalmente, a obrigação de criar-se a home page e a landing
page nas entidades do Sistema Nacional do Meio Ambiente, haveria a fórmula para
fornecer informação ambiental através de um acesso atrativo, fácil e intuitivo.
Como a Administração Pública está ungida ao princípio da legalidade, é
necessária uma alteração legislativa. Assim, sugere-se que a redação do artigo 2º,
caput, seja atualizada para os seguintes termos:
Art. 2º Os órgãos e entidades da Administração Pública, direta, indireta e
fundacional, integrantes do Sisnama, ficam obrigados a permitir o acesso
público aos documentos, expedientes e processos administrativos que
tratem de matéria ambiental e a fornecer todas as informações ambientais
que estejam sob sua guarda, pela internet em home page e landing page,
em meio escrito, visual, sonoro ou eletrônico, especialmente as relativas a:
[...].
Igualmente, merece ser atualizado o § 1º do artigo 2º da Lei, possibilitando que
o requerimento escrito possa ser feito pela home page da entidade, mediante um link33
específico:
32
Fonte: https://www.intermidias.com.br/seo-otimizacao-de-sites/o-que-e-home-page-landing-pages/>
Acesso em: 17 de fev. 2020.
33
“inf elemento de hipermídia formado por um trecho de texto em destaque ou por um elemento gráfico
que, ao ser acionado (ger. mediante um clique de mouse), provoca a exibição de novo hiperdocumento”.
Fonte: https://www.google.com/search?client=firefox- b-e&q=o+que+%C3%A9+link%3F > Acesso em:
17 fev. 2020.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
226
§ 1º Qualquer indivíduo, independentemente da comprovação de interesse
específico, terá acesso às informações de que trata esta Lei, mediante
requerimento escrito ou por e-mail ou requerimento na página daentidade na
internet, no qual assumirá a obrigação de não utilizar as informações colhidas
para fins comerciais, sob as penas da lei civil, penal, de direito autoral e de
propriedade industrial, assim como de citar as fontes, caso, por qualquer meio,
venha a divulgar os aludidos dados.
Outro artigo que deve ser melhorado, mediante a utilização da informática e
de uma interação direta com o Registro de Imóveis, é o caput do artigo 4º:
Art. 4º Deverão ser publicados em Diário Oficial e ficar disponíveis, no
respectivo órgão, em local de fácil acesso ao público, listagens e relações
contendo os dados referentes aos seguintes assuntos: [...].
A nova redação inclui na home page da entidade as publicações de todas as
informações previstas no rol do artigo 4º, especialmente quando possível a
identificação do titular do domínio do imóvel no registro imobiliário, caso em que a
informação seria compartilhada com a respectiva serventia do Registro de Imóveis.
Assim, propõe-se a seguinte redação:
Art. 4º Deverão ser publicados em Diário Oficial e comunicados aos
respectivos cartórios de Registro de Imóveis, para averbação nas matrículas,
além de ficar disponíveis, no respectivo órgão e na sua página na rede mundial
de computadores, em local de fácil acesso ao público, listagens e relações
contendo os dados referentes aos seguintes assuntos:
[...]
Sugere-se a inclusão de um parágrafo, a fim de que a entidade ambiental
comunique, de maneira obrigatória e célere, ao Registro de Imóveis as ocorrências
previstas nos incisos III, IV e V, respectivamente: os autos de infrações e respectivas
penalidades impostas pelos órgãos ambientais; a lavratura de termos de compromisso
de ajustamento de conduta e; reincidências em infrações ambientais.
Basta, tão somente, que no início do processo administrativo, a autoridade
indique o número da matrícula do imóvel onde se deu a infração ambiental, emitindo
certidão para ser inscrita no registro imobiliário.
Destarte, vêm mais dois parágrafos:
§ 1º. Nos casos dos incisos III, IV e V, a autoridade deverá oficiar ao Registro
de Imóveis para averbação das informações, mediante certidão do órgão.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
227
§ 2º. As relações contendo os dados referidos neste artigo deverão estar
disponíveis para o público trinta dias após a publicação dos atos a que se
referem.
Finalmente, uma pequena inclusão no artigo 5º da Lei, uma vez que não tem
mais sentido um pedido por e-mail e uma resposta “nos autos” ou “por meio de
carta”. Nesse diapasão, basta incluir a seguinte hipótese:
Art. 5º O indeferimento de pedido de informações ou consulta a processos
administrativos deverá ser motivado, sujeitando-se a recurso hierárquico,
no prazo de quinze dias, contado da ciência da decisão, dada diretamente
nos autos ou por meio de e-mail ou carta com aviso de recebimento, ou em
caso de devolução pelo Correio, por publicação em Diário Oficial.
Cabe frisar que há competência legislativa comum em matéria ambiental, nada
impedindo que Estados e Municípios editem legislação obrigando o órgão ambiental
local a comunicar as informações ao Registro de Imóveis por e-mail e por canais
oficiais pela internet, conforme amparo constitucional verificado no artigo 5º:
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu
interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas
no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo
sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
O relacionamento entre as entidades do Sistema Nacional do Meio Ambiente e
as serventias do Registro de Imóveis também pode ser objeto de resolução do
Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), notada sua legitimidade para criar
mecanismos de efetiva publicidade sobre quaisquer informações ambientais.
É oportuno realçar que a verdadeira publicidade ocorre quando o Poder Público
transmite a informação independentemente de solicitação, dando transparência a
esses dados por diversos meios e formas, em especial, pelos registros públicos.
Outrossim, o fim último da publicidade ambiental é a defesa da natureza e, nesse
objetivo, não se pode ser tímido34, devendo aproveitar todo o ferramental que o Estado
brasileiro fornece, em especial, à utilização do Registro de Imóveis.
“We may not know every detail of doing the right thing, but the direction of the required actions is
clear: to ensure the habitability of the biosphere while maintaining human dignity”. SMIL, Vaclav.
Growth. Cambridge: The MIT Press, 2019, p. 512. “Podemos não saber todos os detalhes de como
fazer a coisa certa, mas a direção das ações necessárias é clara: garantir a habitabilidade da biosfera,
mantendo a dignidade humana” (tradução livre).
34
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
228
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Registro de Imóveis é considerado como o repositório de todas as
informações sobre determinada propriedade, gerando segurança e confiabilidade ao
sistema. Uma pessoa pode requerer, sem prestar qualquer justificativa, informações
que estejam no Registro de Imóveis a respeito da situação de um bem lá inscrito.
Destarte, pelo menos em tese, uma vez expedida a certidão imobiliária, ter-seia toda a informação relevante do imóvel, particularmente, a ciência a respeito de
quaisquer dados ambientais que pairam sobre a propriedade.
A Lei 10.650/2003, que dispõe sobre o acesso público aos dados e informações
existentes no Sistema Nacional do Meio Ambiente, pretende estabelecer uma ampla
publicidade em prol da população. Todavia, em razão dessa divulgação se dar pelo
Diário Oficial e em mural no órgão público, evidentemente, não tem adesão popular
alguma, restringindo-se a uma mera ficção social e jurídica.
É lamentável que a Lei 10.650/2003 não preveja a utilização do registro
imobiliário como auxiliar da publicidade ambiental. Igualmente, precisa de uma
atualização para potencializar a informação ambiental por meio do Registro de Imóvel,
que está muito mais próximo do cidadão do que o órgão ambiental.
Esses problemas na Lei de Informação levam à escassez de transparência e
a respeito de dados essenciais à sociedade. Essa falha leva à ineficácia das políticas
públicas de proteção do meio ambiente, por falta de publicidade: informação,
transparência e publicidade são os tripés da moderna defesa ambiental.
O artigo 4º da Lei deve ser urgentemente alterado. Propõe-se uma nova
redação, para incluir a comunicação direta ao Registro de Imóveis das informações
previstas no rol daquele dispositivo. Dessa forma, haveria plena publicidade, sem a
exigência do cidadão ter que se deslocar até o órgão ambiental para ler um mural.
Nesse passo, é importante frisar que há competência legislativa comum,
prevista no artigo 23 da CF, nada impedindo que Estados e Municípios editem
legislação obrigando o órgão ambiental local a comunicar-se com o Registro de
Imóveis, uma vez que tal mister está previsto pelo artigo 5º, inciso XXXIII.
A norma deve ter caráter geral, ou seja, ordenar que quaisquer informações
ambientais provenientes de procedimentos administrativos, vinculadas a obrigações
de prevenção e reparação, sejam compartilhadas com o sistema registral, mediante
comunicação formal do órgão com a serventia imobiliária.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
229
Não há dúvida que a falta de obrigação legal das autoridades administrativas
de informar ao Registro de Imóveis qualquer ação que importe consequências
ambientais para determinada área diminui a eficácia desses mecanismos de
atuação estatal, que trabalham isolados, deixando de somar esforços.
Não obstante, o relacionamento entre as entidades do Sistema Nacional do
Meio Ambiente e as serventias do Registro de Imóveis também pode ser objeto de
resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente, uma vez que como órgão
consultivo e deliberativo, tem toda a legitimidade para criar mecanismos de efetiva
publicidade de quaisquer informações ambientais relevantes.
Como se sabe, as obrigações ambientais têm natureza propter rem e, por
isso, acompanham a vida do imóvel até que sejam devidamente cumpridas pelo
obrigado, razão que determina a sua inscrição no registro imobiliário, para fins de
efetividade prática e social.
Nessa senda, há o Registro de Imóveis e seus atributos a serviço do meio
ambiente, maximizando a eficácia da legislação ambiental em todos os campos,
aproveitando-se da sua abrangência nacional e somando esforços com todo o Poder
Público e a sociedade, em prol da sustentabilidade.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
230
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2012.
ARIAS, Luis Alfredo Suáres. O registro da propriedade como meio de garantia das
sanções no meio ambiente. Em: DIP, Ricardo Henry Marques; JACOMINO, Sérgio
(orgs). Registro imobiliário: temas atuais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2011. – (Coleção doutrinas essenciais: direito registral; v. 2), p. 613- 619.
BITTERLICH, Pedro Fernández. Manual de Derecho Ambiental Chileno. 2. ed.
Santiago: Editorial Jurídica de Chile, 2004.
CENEVIVA, Walter. Lei dos notários e dos registradores comentada. 3. ed. rev.,
ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2000.
CHALHUB, Melhim Namem. Propriedade imobiliária: função social e outros
aspectos. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
CUTANDA, Blanca Lozano; TURRILLAS, Juan-Cruz Alli. Administración y legislación
ambiental. Actualizado y adaptado al EEES. Madrid: Editorial Dykynson, 2013.
FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 3. ed. Belo Horizonte:
Fórum, 2016.
HAWKEN, Paul. The ecology of commerce: a declaration of sustainability. New
York: Harpen Business, 2010.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 25. ed., rev., ampl., e
atual. São Paulo: Malheiros, 2017.
. Direito à informação e meio ambiente. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.
MÁÑEZ, José Luiz Salazar. Meio ambiente e Registro de Imóveis, uma interação
mútua: o direito ao acesso à informação ambiental e em apoio à sustentabilidade.
Em: JACOMINO, Sérgio; MELO, Marcelo Augusto Santana de; CRIADO,
Francisco de Assis Palacios (coord). Registro de Imóveis e meio ambiente. São
Paulo: Saraiva, 2010, p. 163-189.
MATEO, Ramón Martín. Manual de Derecho Ambiental. 2. ed. Madrid: Editorial
Trivium, 1998.
MELO, Osvaldo Ferreira de. Dicionário de política jurídica. Florianópolis: OAB-SC,
2000.
REAL FERRER, Gabriel. Sostenibilidad, transnacionalidad y transformaciones del
Derecho. In: SOUZA, Maria Cláudia da Silva Antunes de; GARCIA, Denise Schmitt
Siqueira (Orgs.). Direito ambiental, transnacionalidade e sustentabilidade. Dados
eletrônicos. Itajaí: UNIVALI, 2013.
SAND, Peter H. Information disclosure. In:
. WIENER, Jonathan B; ROGERS,
Michel D; HAMMITT, James K; SAND, Peter H. (Ed.). The realtiy of precaution:
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
231
comparing risk regulaltion in the United States and Europe. Washington: PRF Press,
2011.
SARMENTO, Eduardo Sócrates Castanheira. A dúvida na nova lei de registros
públicos: doutrina, prática, jurisprudência, legislação. Rio de Janeiro: Editora Rio,
1977.
SMIL, Vaclav. Growth. Cambridge: The MIT Press, 2019.
THOMÉ, Romeu. O princípio da vedação de retrocesso socioambiental no contexto
da sociedade de risco. Salvador: Editora Jus Podivm, 2014.
WEINBERG, Philip; REILLY, Kevin A. Understanding environmental law. Danvers:
LexisNexis, 2008.
BODNAR, Zenildo; CRUZ, Paulo Márcio. A Commolização do Direito Positivo, o
Ativismo Judicial e a Crise do Estado. Revista Novos Estudos Jurídicos, [S.I.], v.21,
n.3, p. 1332 a 1351, nov.2016. ISSN 2175 0491. Disponível em:
https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/nej/article/view/9700/5451. Acesso em: 22
set.2021. doi:https://doi.org/10.14210/nej.v21n3.p1332-1351.
BRITTO, Marcel; GOMES, Heitor Menezes.; VALICENTE, Raiana Rassi. Reflexões
sobre a sustentabilidade e sua institucionalização no Brasil. Brazilian Journal of
Development, Curitiba, v.7, n.9, p. 89512-89527, sep. 2021. ISSN: 2525-8761.
Disponível em: https://www.brazilianjournals.com/index.php/BRJD/article/view/35921.
Acesso em: 18 set. 2021. doi:https://doi.org/10.34117/bjdv7n9-218.
WOLF, Susan; WHITE, Anna. Principles of Environmental Law. Second Edition.
London: Cavendish Publishing Limited, 1997.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.103490-103508 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
232
CAPÍTULO 13
EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004: UMA ANÁLISE SOB O PRISMA DA PROTEÇÃO
AOS DIREITOS HUMANOS
Igor Gava Mareto Calil
Graduando em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
Curriculum Lattes: 8802836350537240
Endereço: Av. Dante Michelini, 1601, Ed. Mata da Praia Park, Mata da Praia, Vitória,
Espírito Santo
E-mail: igorgcalil@gmail.com
Lara Abreu Assef
Graduanda em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
Curriculum Lattes: 9434732756871769
Endereço: R. Cel. Schwab Filho, 310, Ed. Personal Residence, Bento Ferreira,
Vitória, Espírito Santo
E-mail: laraabreuassef@gmail.com
Luma Vilela Ramos Fonseca
Advogada. Graduada em Direito. Pós graduada em Direito Constitucional Aplicado e
em Direito Público. Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Processo da
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e bolsista de mestrado pela
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
Lattes: 9480778211703946.
Endereço: Avenida Fortaleza, 1311, Ed Seville, Itapuã, Vila Velha, Espírito Santo.
E-mail: lumavramos@gmail.com
RESUMO: O presente trabalho tem por escopo tecer uma análise acerca dos efeitos
surtidos pelo advento de uma regulamentação legislativa específica para disciplinar o
processo de incorporação dos Tratados Internacionais, mormente, os Tratados
Internacionais de Direitos Humanos, ao ordenamento jurídico da República Federativa
do Brasil. Destarte, põe-se em xeque o status normativo que lhes é atribuído após uma
burocrática penetração no direito interno positivo, no que tange à hipótese de
submissão das normas jurídicas de direito internacional público ao rito tradicional de
ratificação parlamentar. À luz do exposto intento, exorta-se, em pormenores, a
significância da promulgação da Emenda Constitucional de nº 45/2004 na tentativa de
uniformizar os critérios a serem observados no momento da atribuição de primazia
hierárquica entre os sistemas jurídicos supracitados. Questiona-se, por fim, a
magnitude da contribuição do referido dispositivo na ampliação da proteção aos
direitos fundamentais da pessoa humana, tendência contemporânea que
indubitavelmente permeia o cenário jurídico mundial.
PALAVRAS-CHAVE: Tratados Internacionais; Direito
Dignidade Humana; Emenda Constitucional nº 45/2004.
Internacional
Público;
ABSTRACT: The purpose of this labor is analyzing the effects caused by the
elaboration of a specific legislation to discipline the process of incorporation of
International Treaties, mainly, the International Human Rights Treaties, into the legal
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
233
system of the Federative Republic of Brazil. Thus, their constitutional status, given after
their bureaucratic penetration in positive internal law, is put at stake, regarding the
possibility of public international law being submitted to the traditional procedure of
parliamentary ratification. Following the exposed intent, the significance of the
promulgation of Constitutional Amendment nº 45/2004 will be exhorted furthermore in
an attempt to standardize the criteria to be observed in the attribution of hierarchical
primacy among the legal systems mentioned above. Finally, is questioned the
magnitude of its contribution in the enhancing of the protection to the fundamental
human rights, contemporary tendency that pervades the global scenario, undoubtedly.
KEYWORDS: International Treaties; International Public Law; Human dignity;
Constitutional Amendment nº 45/2004.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
234
1. INTRODUÇÃO
A formulação de tratados relativos à proteção internacional dos direitos
humanos fez-se imperativa diante da recente e bárbara eclosão de ideologias
racistas e segregacionistas vivenciadas em meados do século XX. As correntes
modernas totalitárias, a exemplo do Nazismo, constituíram-se de um discurso
incomplacente, que suprimiu, por meio de diferentes brutalidades – v.g. o Holocausto
– direitos fundamentais de milhares de homens e de mulheres. Nessa perspectiva,
deu-se por crucial o estabelecimento de organismos internacionais, com vistas a
tutelar a incolumidade da pessoa humana e garantir a amistosidade entre as
nações. O principal expoente do movimento foi a criação da Organização das
Nações Unidas (ONU), em 1945, consolidando um marco perene na história da
humanidade.
Ademais, o cenário mundial no pós-guerra exibiu a decadência de
significativas potências, o que fragilizou a possibilidade de manutenção do poderio
sobre suas respectivas áreas de influência ao redor do globo. A eclosão de
movimentos emancipatórios diante dessa fragilização política derivou o surgimento
de inúmeras nações independentes e o consequente crescimento de uma rede de
relações globais. Nessa perspectiva, o direito internacional torna-se protagonista na
contemporaneidade, na medida em que se demonstra como pressuposto essencial
para a disciplina dessas novas relações e para a garantia do bem-estar entre as
nações.
Outrossim, destaca-se que tal sistema jurídico adentra nas relações
internacionais com vistas a dirimir as tensões decorrentes da dicotomia políticoideológica imposta pela Guerra Fria. Dessa forma, diante dessa conjuntura, o
movimento de globalização no epílogo do século XX fragiliza a soberania estatal,
mas não a cessa, de modo que se perpetua a necessidade do preponderante
diálogo entre o direito internacional e o direito pátrio de tais nações.
À luz do exposto, urge uma análise pormenorizada das teorias que se
dispuseram a decifrar os hiatos da relação entre direito pátrio e direito internacional.
Serão, em primeiro momento, abordadas as correntes ideológicas do Monismo e
Dualismo jurídicos, que sustentam, respectivamente, a existência de uma unidade
absoluta do sistema jurídico e o reconhecimento de uma dicotomia entre os
ordenamentos em questão, autônomos entre si e, portanto, obrigatoriamente
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
235
consonantes.
Em abordagem sequencial, expor-se-á a vasta divergência doutrinária e
jurisprudencial sobre o status normativo das normas internacionais de direitos
humanos incorporadas ao direito pátrio. Trata-se de uma polêmica que adquire
notoriedade diante dos diversos entendimentos do Supremo Tribunal Federal ao
longo dos anos, suscitando a busca do presente artigo por uma apreciação crítica
perante tal metamorfose consuetudinária, de modo a ressaltar a heterogeneidade
de
perspectivas
no
que
tange
ao
nível
hierárquico
dessas
normas:
supraconstitucionalidade, constitucionalidade, supralegalidade ou caráter ordinário.
Por fim, em face dessa problemática conjuntura, será desenvolvida uma
averiguação aprofundada da Emenda Constitucional nº 45/2004, que buscou dirimir
as lacunas acerca dessa temática ao estabelecer que:
Tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem
aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três
quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às
emendas constitucionais (BRASIL, 2004).
Destarte, inquere-se a magnitude da serventia do referido dispositivo ao zelo
da dignidade humana, haja vista tal aparente solução conceitual ter resultado na
fragilização da unidade das normas de direitos fundamentais sob o prisma do
ordenamento jurídico brasileiro, isto é, ter oportunizado uma estratificação entre
normas de mesma natureza, incumbindo ao poder legislativo o discernimento sobre
o status que lhes é conferido.
Com vistas à realização de seus propósitos, este artigo utiliza de metodologia
qualitativa, partindo de pesquisa de cunho bibliográfico e documental, que provê
embasamento teórico e jurídico para a tese defendida, a saber, a adoção de um
sistema discricionário no que tange à validação dos tratados internacionais de
direitos humanos no ordenamento pátrio brasileiro.
2. PROCESSO DE INCORPORAÇÃO DOS TRATADOS INTERNACIONAIS
Em primeiro plano, preliminarmente ao estudo detalhado da burocracia de
incorporação dos tratados, faz-se necessário conceituar as duas vertentes
ideológicas que se propõem a decifrar os hiatos da relação entre direito pátrio e
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
236
direito internacional.
A primeira corrente, denominada Monismo Jurídico, reconhece a existência
de um único ordenamento jurídico, de modo que o direito nacional e o internacional
estariam sob um mesmo prisma. Em pormenores:
Criado por Hans Kelsen no ano de 1926 em oposição à existência de duas
ordens jurídicas, sustenta a existência de apenas uma delas, que não se
distingue em interna ou externa. Até porque a necessidade de
regulamentação seria a mesma nas duas esferas. (PEREIRA, 2006, p.48)
Vale, ainda, pontuar que a ideologia monista pode subcategorizar-se, à
medida que atribui primazia a um dos sistemas em detrimento do outro. Nesse
sentido, o monismo com primado do direito interno, também conhecido como
“monismo tradicional”, teve seu florescimento na figura de Georg Jellinek, sob
influência do hegelianismo. Defende- se a soberania irrestrita dos Estados
Nacionais, cujos ordenamentos seriam invariavelmente proeminentes ao direito
internacional, sendo esse último nada mais do que um direito interno aplicado pelas
nações para disciplinar o âmbito das relações internacionais. É, pois, anulada sua
existência (TREVISAN, 2016).
Nas palavras de Rezek (2008, p. 78), faz-se “inconcebível que uma norma
jurídica se imponha ao Estado soberano à revelia”, novamente exortando a
submissão do que lhe é estrangeiro perante à Administração pátria.
Já a vertente do monismo com primazia do direito internacional, foi
desenvolvida inicialmente pela Escola de Viena e parte da formulação original de
Hans Kelsen. No vértice da pirâmide hierárquica proposta pelo doutrinador na Teoria
Pura do Direito, estaria a Grundnorm, ou norma hipotético-fundamental. Seria
ela a fonte única de fundamento e derivação, a partir da qual se subseguiriam as
normas inferiores (KELSEN, 2009). Era, pois, de notável constatação a inviabilidade
da existência de conflito, material ou formal, entre normas de ordenamento interno e
internacional.
Todavia, a teoria monista radical kelseniana sofre uma importante
atualização, fazendo com que já não seja descartada a possibilidade de antinomias
entre os sistemas normativos. Conforme muito bem colocado pelo jurista Mello
(2000, p. 112):
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
237
O conflito entre o Direito Interno e o Direito Internacional não quebra a
unidade do sistema jurídico, como um conflito entre a lei e a Constituição
não quebra a unidade do direito estatal. O importante é a predominância do
DI [direito internacional].
Sob o prisma do monismo moderado, então, deve-se relativizar a soberania
dos Estados em prol do império das normas internacionais. É, ademais, passível de
“processo” de responsabilidade internacional a nação que venha a descumprir
cláusula convencional, independentemente da promulgação de lei interna
superveniente que a modifique, conforme o artigo 27 da Convenção de Viena1
(GNOATO, 2013).
Por fim, traz-se à luz da discussão uma doutrina diametralmente oposta às
anteriores, que tem suas bases fincadas em 1889 pelo jurista germânico Triepel. Seu
ponto de partida é a tese de absoluta independência e autonomia entre a
normatividade interna e externa (BEDIN; SCWEDE, 2017). A teoria, que fora
denominada dualista, portanto, pauta-se no ideal de que os tratados internacionais,
sendo firmados por força da vontade comum dos Estados, debruçar-se-iam sobre
objetos e relações jurídicas alheios ao ordenamento pátrio, inviabilizando uma
aplicação interna sem uma devida recepção (SILVA, 2017).
Destarte, reitera-se a eminência do procedimento, ainda que deveras
burocrático, de incorporação dos tratados internacionais ao ordenamento interno
positivo do país. Tal relevância emana do caráter aberto e, consequentemente,
passível de incompatibilidades do sistema jurídico brasileiro. Nesse entendimento, a
ocorrência de antinomias é dirimida pela observância rígida do rito de anexação, de
modo a garantir um diálogo harmônico e consonante entre ambas as fontes de
direito.
Ademais, é apenas assegurada a plena eficácia da norma internacional uma
vez submetida ao processo de validação supracitado, adentrando de fato o direito
pátrio. Nas palavras de Flávia Piovesan (2011, p.103):
A assinatura do tratado, por si só, traduz um aceite precário e provisório,
não irradiando efeitos jurídicos vinculantes. Trata-se da mera aquiescência
do Estado em relação à forma e ao conteúdo final do tratado. A assinatura
do tratado, via de regra, indica tão somente que o tratado é autêntico e
definitivo.
Nesse entendimento, resta nítido que a obrigatoriedade dos tratados
internacionais se impõe aos sujeitos de direito internacional exclusivamente
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
238
mediante a ratificação de seu corpo normativo pelos órgãos estatais pátrios.
Somente assim, caso imbuídos de boa- fé, poderão ser dignos da máxima pacta sunt
servanda, brocardo latim que significa “o pacto deve ser cumprido”2 (MORE, 1998).
Vale ressaltar que, em caso de tratados internacionais que venham a versar
sobre os direitos humanos, o referido procedimento de incorporação, é responsável
por conferir às normas o atributo da validade em seu âmbito exclusivamente formal,
haja vista que a redação do § 2º do artigo 5º da Constituição da República
Federativa do Brasil (CRFB) de 1988 confere espontaneamente a validade material
de tais regulamentações legislativas, in verbis, “os direitos e garantias expressos
nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por
ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do
Brasil seja parte”. (ARRUDA, 2014)
O entendimento sinóptico que se extrai da totalidade do disposto acima é a
adoção da vertente dualista moderada3 pela nação brasileira, haja vista o
reconhecimento da imprescindibilidade de um rito formal de penetração das normas
de jus cogens4 para que gozem de sua imperatividade em grau máximo, fato que
reforça um ideal de distinção e autonomia entre os ordenamentos, muito embora
não se descarte a possibilidade de diálogo e interpenetração de suas
normatividades (MEDEIROS, 2015).
Em síntese, o dualismo mitigado se manifesta na juridicidade brasileira pela
estrita necessidade de incorporação formal das normas internacionais para que
criem direitos e deveres aos sujeitos particulares, “ainda que antes disso tenha o
estado em relação aos seus cocontratantes assumido suas obrigações no plano
internacional, por ratificação e depósito do instrumento próprio” (ACCIOLY, 2012, p.
239)
Observa-se, pois, que os tratados internacionais, independentemente de sua
natureza, devem ser formalmente validados para que adquiram plena força
vinculante no ordenamento interno brasileiro, sob o regime de competências
prescrito no Título IV da Lei Maior de 88, seguindo as etapas que serão a seguir
discriminadas.
2.1 Celebração
A priori, faz-se relevante destacar que a celebração dos tratados
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
239
internacionais de direitos humanos pode advir de duas hipóteses. A primeira referese a um acordo firmado entre dois ou mais Chefes de Estado, enquanto a segunda
trata das resoluções provenientes dos órgãos e entidades internacionais de proteção
aos direitos fundamentais. Nos termos do inciso VIII do artigo 84 da CRFB, compete
exclusivamente ao Presidente da República celebrar convenções, tratados e atos
internacionais, sendo posteriormente submetidos à avaliação parlamentar. Ademais,
conforme parágrafo único do artigo supracitado, há a possibilidade de delegação: o
“Presidente da República poderá delegar as atribuições mencionadas nos incisos
VI, XII e XXV (...)”, dessa forma a competência continua exclusiva do presidente
ainda que possível a delegação.
2.2 Aprovação
Tendo o Brasil adotado a teoria dualista moderada, faz-se necessária a
aprovação dos Tratados Internacionais pelo Congresso e a promulgação do
Presidente. Assim, após o processo de celebração, processa-se a aprovação, um
ato interno que recorre às negociações preliminares, envolvendo a arquitetura do
tratado bem como sua averiguação. Dessa forma, explicitou Roberto Luiz Silva
(2002, p. 58):
No caso de tratado multilateral, ocorre nos congressos e conferências
internacionais, onde é discutido o objeto do acordo internacional. Esta fase
se encerra com a elaboração do texto final do tratado, que deverá ser
aprovado, segundo o artigo 9º da Convenção de Viena, por no mínimo 2/3
dos presentes, nos casos das conferências internacionais.
No caso do Brasil, antes que ocorra a assinatura no tratado, o texto é
submetido à avaliação da Consultoria Jurídica do Itamaraty (CJI), a qual averigua o
aspecto jurídico, e a Divisão de Atos Internacionais (DAI), que analisa o aspecto
processual. Além disso, o tratado deverá passar pelo crivo da constitucionalidade
para então estar apto a receber o aval das partes, pelo ato da assinatura (CIELO,
2013).
No entendimento de Valerio de Oliveira Mazzuoli, dessa forma, a assinatura é
um passo importante da celebração do tratado revelando o consentimento das partes
em aderir
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
240
o acordado e, ainda que fiquem proibidas quaisquer alterações no texto do acordo,
há a possibilidade de serem apresentadas objeções ao texto do instrumento caso
necessário. Desse modo, as partes ao assinarem apenas demonstram aceitar a
forma e o conteúdo do que foi negociado.
A próxima fase se constitui pelo processo de avaliação do parlamento
que, segundo a Constituição da República Federativa do Brasil em seu inciso I, do
artigo 49: “(...) é da competência exclusiva do Congresso Nacional resolver
definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem
encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional (...)”. Em caso de
aprovação, esse concretiza seu ato por meio da expedição de um decreto legislativo,
seguindo para o processo de ratificação de responsabilidade presidencial (CIELO,
2013).
2.4 Ratificação
Após a fase de aprovação do Congresso, o tratado segue para um processo
de caráter internacional, a ratificação. Somente poderá realizá-lo o Presidente da
República, com fins de expressar definitivamente a sua vontade em se
responsabilizar com os termos do instrumento perante a comunidade internacional.
Nada obstante, a possibilidade de o Estado vir, no futuro, a denunciá-lo (HUSEK,
2003). Outrossim, a partir dessa etapa, o acordo internacional condiciona a
exigibilidade de outras nações e admite vigência internacional, desde que satisfeitos
todos os requisitos (MELLO, 2017).
2.5 Promulgação
Depois de ser ratificado, o tratado, mediante decreto, será promulgado e
publicado oficialmente. Com a promulgação, tal ato normativo passará a ser aplicado
a todos de maneira obrigatória, ainda que subsista vasta divergência doutrinaria e
jurisprudencial acerca do status hierárquico dessa norma (ARRUDA, 2014).
Faz-se oportuno, ao trazer a etapa final do procedimento à luz da discussão,
reproduzir as sábias palavras de Mazzuoli (2006, p. 63):
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
241
A promulgação tem por finalidade, pois, atestar que o ato internacional já
existe e que foram cumpridas todas as formalidades internas para sua
celebração. Indica, ademais, que o compromisso internacionalmente firmado
já é juridicamente exigível, obrigando a todos sua observância. Mas, para que
a norma jurídica se considere efetivamente promulgada, é indispensável sua
publicação, dando conhecimento à população de sua existência.
Ademais, o Direito Internacional tem ocupado importante papel no cenário
geopolítico mundial e, da mesma forma, na esfera política brasileira. À vista disso, tais
procedimentos tornam-se essenciais no processo de incorporação dos Tratados
Internacionais de Direitos Humanos de maneira a consolidar e reconhecer seu
conteúdo e sua posição hierárquica dentro do ordenamento jurídico nacional.
3. ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE
O TEMA
A temática da incorporação de Tratados Internacionais, mormente, os Tratados
Internacionais de Direitos Humanos, ao sistema jurídico brasileiro suscitou o debate
sobre o status hierárquico dessas normas no ordenamento pátrio. Isso porque, diante
do advento da Emenda Constitucional 45/2004, “apenas os tratados que versam sobre
Direitos Humanos, aprovados por um procedimento especial têm status de Emenda
Constitucional” (DOMENICO, 2019, p. 2907), o que enseja um caloroso debate
calcado na vasta divergência doutrinária e jurisprudencial
Dessa forma, a diversidade de entendimentos advindos do Supremo Tribunal
Federal corporifica e exemplifica a polêmica e as latentes discordâncias no que tange
a essa matéria. Sob essa ótica, há de se analisar a heterogeneidade evolutiva de
posicionamentos da Corte Suprema acerca do caráter formal e material dessas
normas, de modo que se enxergam, nas palavras de Frederico Koehler:
Quatro possíveis níveis hierárquicos que se pode atribuir aos tratados e
convenções internacionais: 1) hierarquia supraconstitucional; 2) hierarquia
constitucional; 3) hierarquia infraconstitucional, mas supralegal; 4) paridade
hierárquica entre tratado e lei federal. (KOEHLER, 2007, p. 1557).
A priori, ressalta-se que a perspectiva supraconstitucional mencionada acima,
responsável por atribuir superioridade às normas em tela frente à Constituição da
República, apesar de dissertada por famigerados hermeneutas, como Agustín Gordillo
em sua obra Derechos humanos, doctrina, casos y materiales: parte general, não foi
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
242
uma concepção latente nas deliberações do Supremo Tribunal Federal, de modo a não
se fazer necessária e oportuna sua apreciação pormenorizada no trabalho em
questão.
Na República Velha, durante o governo de Getúlio Vargas, constata-se o inicial
entendimento kelseniano5 do Supremo Tribunal Federal, embasado na Lei de nº.
2.416, de 28 de junho de 1911, sobre a preponderância no sistema jurídico brasileiro
da vertente do monismo com primazia do direito internacional, de modo a reconhecer
a prevalência de normas internacionais frente as demais vigentes no ordenamento
pátrio (SANTOS, 2013). Dessa forma, diversos julgados da Corte Suprema, como o
pedido de extradição nº 07/1913 e as Apelações Cíveis de nº 7.872/RS e 9.587/DF,
consolidaram tal predomínio de dispositivos internacionais diante de casos de
antinomias.
Outrossim, ressalta-se que esse entendimento, o qual até 1945 apresentavase como unânime no STF, tem sua fragilização no ano de 1977, perante o
emblemático julgamento do Recurso Extraordinário de nº 80.004 (MAZZUOLI, 2001).
Essa inovadora resolução passa a representar, portanto, uma revolução no que
tange a perspectiva analítica da incorporação das normas em tela ao ordenamento
pátrio, de modo a deliberar sobre o caráter ordinário desses dispositivos internacionais
quando incorporados ao âmbito nacional. Nas palavras de Fábio Medeiros:
Nesse julgado, que tratava da Convenção de Genebra (Lei Uniforme sobre
Letras de Câmbio e Notas Promissórias), ficou decidido que os conflitos
entre uma disposição normativa de direito interno e uma decorrente do
direito internacional seriam resolvidos pela regra geral destinada a solver
antinomias normativas de mesma hierarquia. (MEDEIROS, 2015, p. 292).
Nessa perspectiva paritária, reconheceu-se a equânime hierarquia normativa
entre dispositivos pátrios ordinários e convenções internacionais, de modo a tornar-se
latente o critério cronológico, lex posterior derogat priori, como fator primordialmente
decisivo quando há antinomias entre essas. Com efeito, ressalta Medeiros (2015, p.
292) que “após 1977 e antes da EC nº 45 [Emenda Constitucional n.º 45/2004] , a
posição é de que todos os tratados - de direitos humanos ou não - fossem recebidos
como lei ordinária”.
Posteriormente, verifica-se que essa nova interpretação se faz reiterada na
Cúpula Maior diante do hodierno julgamento do HC 72.131-RJ, de alta repercussão,
relativo a suposta possibilidade de prisão por dívida do depositário infiel. Nesse caso,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
243
deliberou-se a equiparação do devedor-fiduciante ao depositário infiel, de modo a
reconhecer a constitucionalidade da prisão civil por dívida em questão. Com efeito,
ressalta-se a divergência dessa decisão para com o art. 7º, VII do Pacto de São José
da Costa Rica, do qual o Brasil é parte. Diante dessa aparente contradição, convém a
exposição de um trecho extraído do voto do Ministro Celso de Mello na ocasião do
julgamento supracitado:
A circunstância do Brasil haver aderido ao Pacto de São José da Costa Rica
— cuja posição, no plano da hierarquia das fontes jurídicas, situa-se no
mesmo nível de eficácia e autoridade das leis ordinárias internas — não
impede que o Congresso Nacional, em tema de prisão civil por dívida, aprove
legislação comum instituidora desse meio excepcional de coerção processual
(...). Os tratados internacionais não podem transgredir a normatividade
emergente da Constituição, pois, além de não disporem de autoridade para
restringir a eficácia jurídica das cláusulas constitucionais, não possuem força
para conter ou para delimitar a esfera de abrangência normativa dos preceitos
inscritos no texto da Lei Fundamental (STF, 1995). (grifo nosso)
Entretanto, em maio de 2000, no julgamento do RHC de nº. 79.785-RJ “que
envolvia o alcance interpretativo do princípio do duplo grau de jurisdição, previsto pela
Convenção Americana de Direitos Humanos” (PIOVESAN, 2011, p.126), o Ministro do
STF Sepúlveda Pertence adotou em seu voto o entendimento do caráter
infraconstitucional, porém supralegal, dos dispositivos internacionais de direitos
humanos. Essa perspectiva foi minoritária, de modo que se preponderou a ótica
vigente de paridade ordinária. Porém, há de se destacar, com ênfase, a
representatividade desse entendimento para com o início do processo de
diferenciação e de estabelecimento de natureza especial desses dispositivos frente
aos demais. Sob essa ótica, o magistrado proferiu em um trecho de seu discurso, o
seguinte:
Creio na outorga de força supralegal às convenções de direitos humanos, de
modo a dar aplicação direta às suas normas — até, se necessário, contra a
lei ordinária — sempre que, sem ferir a Constituição, a complementem,
especificando ou ampliando os direitos e garantias dela constantes (STF,
2000).
Nessa conjuntura dialética, com vistas a encerrar as controvérsias
jurisprudenciais e doutrinárias suscitadas pelo § 2º do art. 5º, o qual confere natureza
materialmente constitucional a essas convenções (LAFER, 2005), promulgou-se a
Emenda Constitucional (EC) nº 45/2004, a qual, em seu § 3º, art. 5º, estabelece que:
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
244
Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem
aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três
quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às
emendas à Constituição (BRASIL, 2004).
Dessa forma, esse último entendimento do ordenamento jurídico brasileiro
coaduna à compreensão de que todas as normas internacionais de direitos humanos
seriam materialmente constitucionais, porém, apenas aquelas incorporadas após a
EC nº 45/2004 e que seguiram o quórum, disfrutam da extensão desse status para
o âmbito formal (PIOVESAN, 2009, p.71-78).
Contudo, por fim, prevalece atualmente o entendimento do Ministro Gilmar
Mendes acerca dessa temática, de modo que, vide o RE nº 466.343.1/SP, passouse a reconhecer o caráter supralegal dos dispositivos internacionais despidos de
quórum e/ou aprovação de acordo com positivado na EC nº 45/2004. Assim,
reiterando a questão da impossibilidade de prisão do depositário infiel, proferiu o
Ministro Gilmar Mendes em um trecho de seu voto:
Não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois o caráter
especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes
reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da
Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo
supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo
Brasil, dessa forma, torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele
conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação (STF, 2009).
(grifo nosso)
Com efeito, é preciso destacar que, apesar da prevalência atual do
entendimento do Ministro Gilmar Mendes sobre a temática em análise, é latente a
permanente divergência no seio da Suprema Corte. Sob essa ótica, alude-se, como
fator exemplificativo, o voto do Ministro Celso de Mello nesse mesmo julgamento
supracitado, o qual considerou que “os tratados de direitos humanos, em si mesmos
considerados, possuiriam força de norma constitucional, diante da previsão do art. 5º,
§1º e 2º da Constituição Federal, (...) de modo a consolidar a jurisprudência dos
tribunais internacionais de direitos humanos” (FEILKE, 2013, p.6).
Nesse diapasão, há de se considerar notória a evolução das posições do
Supremo Tribunal Federal acerca da incorporação desses dispositivos legais
internacionais ao ordenamento jurídico brasileiro, de modo a ser incontestável sua
contribuição, a partir do reconhecimento do caráter especial das normas em tela, para
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
245
a temática dos direitos humanos no Brasil. Essa confluência de fatores, todavia,
coaduna à necessidade de que se analise crítica e metodicamente as benesses e
supostas incoerências que floresceram no ordenamento jurídico pátrio como frutos da
EC nº 45/2004, o que virá a ser dissertado no tópico a seguir.
4. DISCUSSÃO: A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004
Vieram as Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, em 30 de
dezembro de 2004, a promulgar a Emenda Constitucional (EC) de número 45, fazendo
vigorar com redação alternativa os artigos 5º, 36, 52, 92, 93, 95, 98, 99, 102, 103,
104, 105, 107, 109, 111, 112, 114, 115, 125, 126, 127, 128, 129, 134 e 168 da
Constituição Federal, bem como lhe acrescentando os artigos 103-A, 103B, 111-A e
130-A.
Para os fins do proposto artigo, cabe uma análise fragmentada do dispositivo
de reforma, trazendo ao lume o novo corpo textual do artigo 5º, que, ao ser-lhe
inserido o parágrafo 3º, disciplina a atribuição de caráter constitucional aos tratados
e convenções internacionais de direitos humanos que obtenham aprovação
parlamentar, em dois turnos – passando por ambas as casas do Congresso Nacional
–, com quorum de três quintos dos votos.
Visou-se, com tal edição legislativa, assegurar em máxima magnitude os
direitos fundamentais da pessoa humana, partindo da atribuição do status
hierárquico mais elevado aos tratados internacionais de direitos humanos como meio
para atingir a plena salvaguarda dos aspectos personalíssimos dos homens.
Não é diferente o olhar de Juan Antonio Travieso (1990), que defende
invariavelmente o que advém da assinatura dos tratados modernos sobre direitos
humanos. Estes, ao invés do tradicional caráter multilateral de tratados
confeccionados em função do benefício mútuo dos Estados contratantes, gozariam
de natureza sui generis, tendo por objeto e fim último a proteção dos direitos
fundamentais dos seres humanos, a despeito de sua nacionalidade. Ao aprová-los, os
Estados se submetem a uma ordem legal e assumem obrigações frente aos cidadãos
que se encontram abaixo de sua jurisdição.
Sob essa ótica, o parágrafo aludido acima introduziu a possibilidade formal e
material da constitucionalização dos tratados internacionais de direitos humanos, a
partir de sua incorporação como emenda constitucional, quando, e somente quando,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
246
houver aprovação em dois turnos, por maioria qualificada dos membros.
Com efeito, adverte-se a incoerência que se perfaz no ordenamento jurídico,
no que tange aos tratados incorporados a tempo anterior ao advento da EC nº
45/2004:
Há o entendimento segundo o qual, em face do § 3º do art. 5º, todos os
tratados de direitos humanos já ratificados seriam recepcionados como lei
federal, pois não teriam obtido o quorum qualificado de três quintos,
demandado pelo aludido parágrafo. (PIOVESAN, 2011, p. 19)
Nesse prisma, é imperioso ressaltar que seria alheio à razoabilidade que os
tratados de direitos humanos já ratificados mantivessem o caráter de lei federal,
enquanto aos demais, cuja data de penetração seja posterior a 2004, fosse atribuído
status constitucional, exclusivamente em virtude de seu quórum de aprovação. Seria,
desse modo, desrespeitada a teoria geral da recepção, configurando um quadro de
“agudo anacronismo” da normatividade jurídica do Brasil (PIOVESAN, 2011).
Ainda na mesma perspectiva, nota-se que a suposta uniformidade propiciada
por essa Emenda se mostra de cunho ilusório, na medida em que suscitou não uma
homogeneização doutrinária, mas o florescimento do debate acerca da diferença
hierárquica entre normas de mesma natureza. Diferença essa vedada pelos princípios
de horizontalidade e igualdade jurídica dos Estados – os sujeitos de direito
internacional – restando, assim, nítida a percepção da lesão que se lhe configura.
Por outro lado, o Excelentíssimo Ministro Celso de Mello6, defendeu que a
suposta incongruência possa ser desmantelada por uma hermenêutica fundada em
premissas axiológicas, realçando o valor ético-jurídico da primazia dos direitos
humanos e assim, possibilitando uma atualização jurisprudencial da Suprema Corte
em favor do caráter constitucional subordinante dos tratados internacionais de direitos
humanos.
Muito embora o partidarismo de juristas, dentre os quais o Min. Celso de Mello,
a favor de um avanço esplendoroso trazido pela Emenda nº 45/2004, evidente é que
tal legislação não se encontra imune à pecha de retrocesso. Torna-se indubitável que,
ao invés de complementar a normatividade dos parágrafos que lhe são anteriores, o §
3º veio a “ceifar sua eficácia”, impondo uma natureza deveras formalista ao
procedimento de incorporação dos tratados, tornando, pois, menos efetivos os
dispositivos de salvaguarda da dignidade humana (SANTOS, 2013).
Corrobora-se, dessa forma, a Teoria dos direitos fundamentais de Mello
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
247
(apud PIOVESAN, 2011), no ideal de que o primado do aspecto material de um bem
jurídico a ser tutelado – a saber os direitos e a dignidade da pessoa humana – deve
ser condicionante de sua forma no plano jurídico normativo. Em palavras outras, ao
prezar-se pela lógica de que a hierarquia de valores deva ditar a hierarquia de
normas, descredita-se o intento da Emenda em incumbir à arbitrária vontade dos
parlamentares o posicionamento, na normatividade do ordenamento pátrio, dos
tratados internalizados.
Como salienta Carlos Frederico Santos (2013), pode se concluir de uma
abordagem analítica do referido parágrafo 3º que sua natureza é de norma permissiva
facultativa, a partir do momento em que permite, ao gosto da discricionariedade do
poder legislativo, a não adoção do quórum de votação qualificado pertinente, quando
da incorporação dos tratados internacionais sobre direitos humanos. Faculta-se,
assim, aos membros das Casas do Congresso a atribuição de estatura formalmente
constitucional à norma de jus cogens a ser internalizada no ordenamento jurídico
pátrio.
Em abordagem última, ressalta-se a severa crítica que tece Canotilho (apud
GNOATO, 2013) à Emenda Constitucional em xeque, “mal redigida e mal formulada”,
haja vista que configura uma incontestável involução na abertura constitucional às
garantias de direitos consagrada pela redação original de 1988. No tangente aos
tratados aprovados anteriormente a 2004:
Cria um imbróglio tão a gosto de nossos publicistas estatocêntricos,
insensíveis às necessidades de proteção do ser humano. [...] Este retrocesso
provinciano põe em risco a interrelação ou indivisibilidade dos direitos
protegidos em nosso país (previstos nos tratados que o vinculam),
ameaçando-os de fragmentação ou atomização, em favor dos excessos de
um formalismo e hermetismo jurídicos eivados de obscurantismo.
(CANOTILHO, 2007, p. 209).
Portanto, o que não se enxerga pelos “triunfalistas” da EC, é o vínculo ipso iure
que advém da celebração do tratado, não obstando os “malabarismos pseudojurídicos” – isto é, a facultativa aprovação parlamentar por quórum qualificado – para
oferecer ao Estado subterfúgio que o exima de sua responsabilidade internacional.
5. CONCLUSÃO
O presente artigo, em síntese, debruçou-se em vasto arcabouço documental e
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
248
doutrinário para denunciar as falhas e contradições enredadas na promulgação da
Emenda Constitucional nº 45/2004, no inicial escopo de suprir as lacunas
interpretativas do parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição da República Federativa
do Brasil.
Subseguiu-se à análise da heterogeneidade evolutiva de posicionamentos da
Corte Suprema – STF – acerca do caráter formal e material das normas provenientes
de tratados internacionais a constatação de que o advento da referida EC não foi capaz
de cumprir seus propósitos a contento.
Restou indubitável que o novo parágrafo 3º do mesmo artigo deixou-se permear
por um invólucro vazio de juridicidade, na medida em que uma concepção
exacerbadamente formalista e artificial do procedimento de incorporação dos tratados
internacionais de direitos humanos fez sucumbir à égide da discricionariedade dos
membros das Casas do Congresso Nacional o intento-mor de todo o Direito, quer
interno, quer internacional: a salvaguarda em última instância da dignidade da pessoa
humana, bem como todos os seus aspectos mais fundamentais.
Desse modo, é urgente uma alternativa à indeterminabilidade suscitada pela
promulgação do referido documento quanto ao status hierárquico da normatividade
de jus cogens que adentra o ordenamento pátrio. Requer-se, pois, uma atualização
hermenêutica da jurisprudência do Pretório Excelso, no intuito de uniformizar e
consolidar os critérios de atribuição de constitucionalidade às normas de proteção
internacional aos direitos humanos.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
249
REFERÊNCIAS
ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público. 20 ed. São Paulo:
Saraiva, 2012.
ARRUDA, Weslley Rodrigues. Tratados internacionais: processo de incorporação ao
ordenamento jurídico interno. Conteudo Juridico, Brasilia-DF, 19 dez. 2014.
Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.51529&seo=1>.
Acesso em: 30 jun. 2019.
BEDIN, Gilmar Antônio; SCHWEDE, Matheus Antes. O conflito entre normas
externas e internas e a incorporação dos tratados internacionais no ordenamento
jurídico brasileiro. In: XXV Seminário de Iniciação Científica, 2017, Salão do
Conhecimento. UNIJUÍ, 2017.
CIELO, Patrícia Fortes Lopes Donzele; DOTTO, Adriano Cielo. Tratados
internacionais: processo de formação e relação com o direito interno. Revista Jus
Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3644, 23 jun. 2013. Disponível
em: <https://jus.com.br/artigos/24732>. Acesso em: 27 jun. 2019.
CONVENÇÃO de Viena sobre o Direito dos Tratados – VIENA Convention on the
Law of Treaties. Viena, 23 mai.1969.
COSTA, Ismael Saraiva da; MELO, Ana Cecília Pereira. Conflito entre tratado
internacional e norma de direito interno. In: Seminário de Iniciação Científica, 2016,
Anais do ICESP. Brasília, 2016.
DOLINGER, Jacob. A Nova Constituição e Direito Internacional – Propostas e
Sugestões. RIO DE JANEIRO: FREITAS BASTOS, 1987.
DOMENICO, Jackson Di. O controle de convencionalidade e a candidatura avulsa à
luz da Constituição do Brasil. In: Brazilian Journal of Development, v. 5, n. 4, Curitiba,
2019.
FEILKE, Pedro Ribeiro Agustoni. A Posição dos Tratados Internacionais sobre
Direitos Humanos no Ordenamento Jurídico Brasileiro. In: DIREITO E
HUMANIDADES: revista eletrônica. São Caetano do Sul, SP: Universidade
Municipal de São Caetano do Sul, n. 25, 2013.
GORDILLO, Agustín A. Derechos humanos, doctrina, casos y materiales: parte
general. Buenos Aires: Fundación de Derecho Administrativo, 2ed., 1997.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 8ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 2009.
KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino. Hierarquia dos tratados internacionais em
face do ordenamento jurídico interno: um estudo sobre a jurisprudência do STF. Jus
Navigandi (Teresina), v. a. 11, 2007.
LAFER, C. A Internacionalização dos Direitos Humanos: Constituição, Racismo e
Relações Internacionais. 1. Ed. Barueri-SP: Manole, 2005.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
250
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direito Internacional: Tratados e Direitos Humanos
Fundamentais na Ordem Jurídica Brasileira. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2001.
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de direito internacional público. 2ed. rev.,
atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007.
MEDEIROS, F. A. Monismo e dualismo no direito internacional e a jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal sobre a incorporação dos tratados de direitos humanos ao
ordenamento jurídico nacional. Direito internacional dos direitos humanos III. 1ed.,
2015.
MELLO, Bernardo de. Tratados Internacionais de Direitos Humanos no Direito
Brasileiro:
recepção
e
hierarquia
normativa.
Disponível
em:
<https://direitodiario.com.br/tratados-internacionais-direitos-humanos-recepcaohierarquia/>. Acesso em: 27 jun. 2019.
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. Vol. 1 –
12ª ed. rev. e aum. – Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
MORE, Rodrigo Fernandes. Fontes do Direito Internacional. Jus Navigandi
(Teresina), 1998.
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e direito constitucional internacional. 10. ed.
São Paulo: Saraiva, 2009
PIOVESAN, Flávia. Tratados internacionais de direitos humanos: jurisprudência do
STF. In: Sidney guerra e Lilian Balmant Emerique (org.). (Org.). Perspectivas
Constitucionais Contemporâneas. 1ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, v. 1, 2011.
REZEK, Francisco. Direito internacional público: Curso Elementar. 11. ed. rev. e
atual. São Paulo: Saraiva, 2008.
SANTOS, Carlos Frederico. Tratados Internacionais Sobre Direitos Humanos: uma
reflexão sobre a inconstitucionalidade do § 3º do art. 5º da CF. Boletim Científico da
Escola Superior do Ministério Publico da União, v. 41, 2013.
SILVA, Maria Clara Marussi. As teorias do monismo e dualismo jurídico e a
opção brasileira para a internalização das normas de tratados de direitos humanos
no brasil. In: Anais do Encontro Internacional de Produção Científica, 2017.
Campinas, GALOÁ, 2018. Disponível em:
<https://proceedings.science/epcc/papers/as-teorias-do-monismo- e-dualismojuridico-e-a-opcao-brasileira-para-a-internalizacao-das-normas-de-tratados- dedireitos->. Acesso em: 27 jun. 2019.
SILVA, Roberto Luiz. Direito internacional público. 2.ed., rev. atual. e ampl. Belo
Horizonte: Del Rey, 2002.
Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº. 72.131-1/RJ, de 23 nov. 1995.
Relator: min. Marco Aurélio. Relator para o acórdão: min. Moreira Alves. Diário da
Justiça, DF. Disponível em:
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
251
<http://stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoRTJ/anexo/170_3.pdf> . Acesso em: 26 jun.
2019.
Supremo Tribunal Federal. Recurso em habeas corpus no 79785 ED de Rio de
Janeiro. Relator: Min. Sepúlveda Pertence. Diário da Justiça, DF, 10 abr. 2003.
Disponível em:
<https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14825228/recurso-em-habeas-corpus-rhc79785-rj-stf>. Acesso em: 27 jun. 2019.
Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 466.343 de São Paulo.
Relator: Min. Cezar Peluso, Brasília, DF, 03 dez. 2008, Diário da Justiça, Brasília,
DF, 5 de jun. 2009. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/imprensa/pdf/re466343.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2019.
Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 87.585-8/TO, Relator Ministro Marco
Aurélio, Diário da Justiça, DF, de 25 de junho de 2009. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/dl/HC87585_VISTA.pdf>. Acesso em: 19 jul. 2019
TAVARES, Aderruan. A promulgação dos tratados de direitos humanos após a
Emenda Constitucional nº 45/2004. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862,
Teresina, ano 19, n. 3911, 17 mar. 2014. Disponível em:
<https://jus.com.br/artigos/26958>. Acesso em: 27 jun. 2019.
TRAVIESO, Juan Antonio. Derechos humanos y derecho internacional. Buenos
Aires: Heliasta, 1990.
TREVISAN, Rosaldo. A Internacionalizacao da Disciplina do Imposto de Importação:
Contornos para uma Regulação Internacional da Incidência. Tese (Doutorado em
Direito do Estado) – Setor de Ciências Jurídicas, Universidade Federal do Paraná.
Curitiba, 2016.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.9, p.93451-93469 sep. 2021 ISSN: 2525-8761
252
CAPÍTULO 14
INDICADORES SUSTENTÁVEIS PARA EDIFICAÇÕES EM PROL DA CONSOLIDAÇÃO
DO CONCEITO DE CIDADES RESILIENTES
Rosana Campos dos Santos
Mestranda em Ambiente Construído – UFJF
Universidade Federal de Juiz de Fora - Faculdade de Engenharia
Rua José Lourenço Kelmer, s/n. Campus Universitário – Martelos 36036-330. Juiz
de Fora – MG- Brasil
E-mail: campos.rosana@engenharia.ufjf.br
Maria Teresa Gomes Barbosa
Professora D. Sc., Departamento de Construção Civil – UFJF Programa de Pós
Graduação em Ambiente Construído – PROAC
Universidade Federal de Juiz de Fora - Faculdade de Engenharia,
Rua José Lourenço Kelmer, s/n. Campus Universitário – Martelos 36036-330. Juiz
de Fora – MG- Brasil
E-mail: teresa.barbosa@engenharia.ufjf.br
Amanda Rodrigues da Silva Oliveira
Mestranda em Ambiente Construído – UFJF
Universidade Federal de Juiz de Fora - Faculdade de Engenharia,
Rua José Lourenço Kelmer, s/n. Campus Universitário – Martelos 36036-330. Juiz
de Fora – MG- Brasil
E-mail: amanda.rodrigues@engenharia.ufjf.br
Mariana de Athayde Salomão
Mestranda em Ambiente Construído – UFJF
Universidade Federal de Juiz de Fora - Faculdade de Engenharia
R. José Lourenço Kelmer, s/n. Campus Universitário, Martelos 36036-330. Juiz de
Fora – MG. Brasil
E-mail: mariana.salomao@engenharia.ufjf.br
RESUMO: Atualmente muito se relata sobre a importância das cidades resilientes que
são resumidamente aquelas que são capazes de se restituir e adaptar-se rapidamente
com a incidência de eventos adversos, sejam problemas sociais e/ou desastres
naturais. A adaptação de edificações deve se apresentar cada vez mais sustentáveis
com utilização por exemplo de retrofit para o reaproveitamento e otimização de
recursos que já existem. O presente trabalho objetiva apresentar e explorar quais os
principais indicadores sustentáveis necessários para que as edificações estejam
alinhadas ao conceito de cidade resiliente promovendo a cultura e efetivação de
construções de prédios inteligentes, inserção de tecnologias modernas e eficientes.
A metodologia utilizada se baseou em revisão bibliográfica, seguido de análise da
importância de cidades resilientes e sustentáveis, posteriormente realizou-se um
estudo qualitativo com os principais indicadores sustentáveis e como as edificações
devem se adaptar para que suas construções estejam alinhadas com o conceito de
cidades resilientes. Como resultados, ponderou-se e identificou-se os principais
indicadores sustentáveis essenciais para as edificações inteligentes enfatizando a
importância de retrofits, aumento de áreas verdes, inserção de materiais ecoeficientes
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
253
e integração de técnicas de construção com a utilização de energias renováveis. O
conjunto destas práticas utilizadas nas edificações é imprescindível para que se
alcance os indicadores sustentáveis e o alinhamento das cidades de acordo com os
parâmetros da ONU, promovendo assim a contribuição para um planeta cada vez
mais sustentável e com melhor utilização de seus recursos, promovendo assim
qualidade de vida.
PALAVRAS-CHAVE: Indicadores Sustentáveis; Construção Sustentável; Inovação;
Retrofit; Cidades Resilientes.
ABSTRACT: Currently much is said about the importance of resilient cities that are
briefly those that are able to restore and adapt quickly to the incidence of adverse
events, whether social problems and/or natural disasters. The adaptation of buildings
should be increasingly sustainable with the use of retrofit, for example, to reuse and
optimize existing resources. This paper aims to present and explore the main
sustainable indicators needed for buildings to be aligned with the concept of a resilient
city, promoting a culture of intelligent building construction and the insertion of modern
and efficient technologies. The methodology used was based on a literature review,
followed by an analysis of the importance of resilient and sustainable cities, and then
a qualitative study of the main sustainable indicators and how buildings should adapt
so that their constructions are aligned with the concept of resilient cities. As a result,
the main sustainable indicators essential for intelligent buildings were pondered and
identified, emphasizing the importance of retrofits, increase of green areas, insertion
of eco-efficient materials, and integration of construction techniques with the use of
renewable energy. The set of these practices used in the buildings is essential to
achieve the sustainable indicators and the alignment of cities according to the UN
parameters, thus promoting the contribution to an increasingly sustainable planet and
with better use of its resources, thus promoting quality of life.
KEYWORDS: Sustainable Indicators; Sustainable Construction; Innovation, Retrofit;
Resilient Cities.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
254
1. INTRODUÇÃO
De acordo com a Organização das Nações Unidas -ONU (2020), a maior parte
da população mundial vive em centros urbanos, aproximadamente 3,5 bilhões de
pessoas residem em cidades, e estima-se que até o ano de 2050 o número aumente
para 5 bilhões.
Diante destes dados, é imprescindível atentar-se para a importância de se
executar construções sustentáveis, aderentes para a consolidação de edificações
integradas dentro do conceito de cidades resilientes. Construções com materiais
inovadores, adaptados para cidades tecnológicas, materiais que não degradem o
meio ambiente, inovações sustentáveis para que as cidades cada vez mais caminhem
para uma realidade de smart cities ou cidades inteligentes.
No setor de construção civil é necessário que os edifícios cada vez mais
contribuam para uma realidade e futuro sustentável do mundo, para que se otimize o
desempenho sustentável de edificações e infraestrutura promovendo qualidade de
vida para todos.
Conforme Waclawovsky e Alves (2010), as construções sustentáveis devem
compilar pontos importantes para seu alcance: benefícios econômicos, benefícios
sociais e benefícios ambientais, promovendo viabilidades, adequação ambiental,
justiça social e aceitação cultural, com a integração de qualidade em todos os
processos.
O Retrofit que muito se utiliza hoje em dia para edificações sustentáveis, é
ampliado no Brasil devido à preocupação com a defesa de áreas tombadas que aliamse ao desenvolvimento dos centros urbanos, originando uma demanda considerável
para essas edificações com a redução de custo comparado com uma nova construção
e no que tange às edificações históricas origina condições para criação de novas
funções promovendo a facilitação do uso de retrofit.
O artigo objetiva explorar e identificar quais os principais indicadores
sustentáveis que são imprescindíveis para que as construções estejam conforme o
conceito e requisitos para se tornar cidades resilientes, com a inserção de construções
inteligentes, tecnologias modernas e ecoeficientes, aderindo ao grande projeto mundial
de cada vez mais as cidades estarem preparadas para melhor gestão de riscos e
inovações tecnológicas.
Como resultados, será apresentado e identificado os mais importantes
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
255
indicadores sustentáveis imprescindíveis para as edificações inteligentes enfatizando
a importância de retrofits, aumento de áreas verdes, inserção de materiais
ecoeficientes e integração de técnicas de construção com a utilização de energias
renováveis. Posteriormente será abordado a importância intrínseca da urbanização
sustentável e seus principais valores.
A pesquisa desenvolvida foi de tipologia qualitativa e exploratória, devido à
revisão literária inicial consultando órgãos, notícias, livros, artigos, anais de
publicações para correta conceituação e apresentação da importância de construções
sustentáveis para o crescimento de urbanização sustentável alinhadas em prol do
conceito de cidades resilientes.
2. CONSTRUÇÕES SUSTENTÁVEIS
Para Sattler (2017), define-se que para a população ser sustentável é
necessário se integrar dentro da capacidade que o planeta possui de suporte, e que
as edificações sejam executadas dentro desta capacidade de suporte.
De acordo com Silva, Hilário et al (2017), a construção sustentável deve
realizar intervenções sobre o meio ambiente sem esgotar com os recursos naturais
existentes, realizando sua preservação para futuras gerações, utilizando de sistema
de reuso de água por exemplo, contribuindo para a redução do seu consumo, realizar
coletas seletivas de lixo fazendo sua reciclagem, utilizar tecnologias que criem
ambientes com regulação acústica e regulação de temperatura adequada.
Smart Cities são um conjunto de sistemas e pessoas que interagem e utilizam
energia, materiais, diversos serviços e financiamento para se catalisar um ótimo
desenvolvimento econômico e uma melhor qualidade de vida para todos (ALBINO et
al., 2015).
Define-se Retrofit como “a remodelação ou atualização do edifício ou de
sistemas, através da incorporação de novas tecnologias e conceitos, normalmente
visando valorização do imóvel, mudança de uso, aumento da vida útil, eficiência
operacional e energética.” (ABNT NBR 155575-1, 2013, p.3).
De acordo com Queiroga, De Fátima Martins (2015), destaca-se vários
avanços para aplicação da sustentabilidade na construção civil como:
•
International Council for Research and Innovation Building and
Construction (CIB) que finalizou a Agenda 21;
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
256
•
United States Green Building Council (USGBC) que originou o selo de
certificação Leadership in Energy and Environmental Design (LEED);
•
Livro Green Vitruvius: Principles and Practices of Sustainable
Architectural Design, produzido pelo Conselho Europeu de Arquitetura;
•
Agenda Setorial para Construção Sustentável para países em
desenvolvimento, criada em 2000;
•
Beddington Zero Energy Development (BedZED), na Inglaterra: obra
finalizada em 2001;
•
Em 2002, o CIB o finaliza a Agenda 21 para construção sustentável
para países em desenvolvimento;
•
França lançou em 2002 seu programa de certificação de construções,
e o Japão lançou o seu, Comprehensive Assessment System for Building
Environmental Efficiency (Casbee);
•
National Australian Built Environment Rating System (Nabers), na
Austrália em 2004;
•
Em 2006, o arquiteto Norman Foster projeta a Cidade Carbono Zero ou
Masdar City;
•
No Brasil, em 2007, foi criado o Green Building Council Brasil (GBC
Brasil) como referência na avaliação e certificação de construções sustentáveis
do LEED. Nesse mesmo ano, foi criado o Conselho Brasileiro de Construção
Sustentável (CBCS) e lançado o selo ecológico para produtos e tecnologias
sustentáveis IDHEA-Falcão Bauer.
•
Em 2008, é lançado o selo brasileiro de certificação ambiental AQUA
(MOTTA; AGUILAR, 2009).
•
A ISO 14000, que foi desenvolvida pela International Organization for
Standardization (ISO) propõe que a certificação e identificação dos produtos e
serviços sejam padronizadas mundialmente. A ISO também formulou outras
normas voltadas à sustentabilidade, como a ISO 21930 (2007), Sustentabilidade
na Construção Civil – Declaração Ambiental de Produtos para Construção, e a
ISO 15392 (2008), Sustentabilidade na Construção Civil − Princípios Gerais
(IBRAHIM, 2014).
O AQUA (Alta Qualidade Ambiental do Empreendimento) foi adaptado do
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
257
modelo HQE (Haute Qualité Environnementale), que se baseia nos referenciais de
desempenho elaborados pelo CSTB (Centre Scientifique et Technique du Bâtiment)
em 1947 na França. Em 2007, sofreu adaptação para a versão brasileira. Foi
implantado pela Fundação Vanzolini. Com ele é possível se atestar se um
empreendimento encontra-se de acordo com as exigências por meio de auditorias
independentes. No processo, as normas brasileiras vigentes são utilizadas, caso não
exista norma brasileira específica, podem ser utilizadas normas internacionais
(VALENTE, 2009).
A Certificação LEED (Leadership in Enueun6yy798777477mergy and
Environmental Design) é um sistema de certificação reconhecido no mundo. Foi
desenvolvido pelo USGBC em 1991 nos Estados Unidos. Constitui um sistema
voluntário que pode ser aplicado a qualquer tipo de construção e em qualquer fase
da vida do empreendimento, inclusive durante o retrofit. Essa certificação baseia-se
em alguns critérios de avaliação e é um sistema de pontuação cumulativa para
diversos itens de projeto ou obra (VALENTE, 2009).
2.1 Construções sustentáveis e cidades resilientes
Conforme o ranking anual dos países com maior área certificada LEED, o
Brasil se manteve em 2018 no top 5 dos países com o maior volume de construções
sustentáveis em âmbito mundial. A lista integra os mercados que são reconhecidos
pela Green Business Certification Inc. (GBCI), que criou o selo LEED há 25
anos. Com 531 certificações LEED até o final de 2018, o Brasil está atrás dos
Estados Unidos, que lideram com 33.632 construções sustentáveis, seguido de
China, Canadá e Índia.
De acordo com a Norma ABNT NBR ISO 37120:2017 que enfatiza o
desenvolvimento
sustentável
de
todas
as
comunidades
com
indicadores
relacionados aos serviços urbanos e com a qualidade de vida de seus habitantes,
dividindo esses indicadores como:
•
Indicadores essenciais: direcionam o desempenho da gestão de
serviços urbanos e a qualidade de vida;
•
Indicadores de apoio: demonstram o desempenho da prestação de
serviços urbanos e qualidade de vida;
•
Indicadores de perfil: Fornecem estatísticas básicas e informações
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
258
2.2 Importância da utilização do retrofit para cidades inteligentes e sustentáveis
O Retrofit que se iniciou na Europa, e se destaca atualmente por representar
50% de utilização nas obras atuais contribuindo efetivamente para as construções
sustentáveis, que permite a revitalização de imóveis, representado na Figura 1
abaixo, sem a necessidade de realizar uma nova construção.
Figura 1 – Revitalização de Fachada com Retrofit
Fonte: (T2 Arquitetura, 2020).
2.3 Indicadores de sustentabilidade na construção civil
A Indústria de construção civil é impulsionadora de desenvolvimento
econômico, que representa 8% do PIB no Brasil, mas ainda é um dos setores que mais
absorve recursos naturais e faz geração de resíduos sólidos, necessitando de uma
gestão eficiente que beneficie a geração atual e futura. Para isso se torna necessário
que as construções atinjam cada vez mais os indicadores de sustentabilidade.
Os indicadores de sustentabilidade começaram a aparecer em 1980, na
Europa. Mas somente a partir da Agenda 21 que foram incluídos oficialmente na pauta
das nações. A Organização das Nações Unidas (ONU), iniciou o desenvolvimento de
indicadores de sustentabilidade a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o
Ambiente Humano (UNCED), realizada em Estocolmo, em 1972. Após vinte anos
no Rio de Janeiro foi criada a Comissão das Nações Unidas para o Desenvolvimento
Sustentável (CSD). Entre os anos de 1995 e 2000, o órgão dividiu um programa de
trabalho em três partes para o estabelecimento de indicadores de desenvolvimento
sustentável, originado o Indicators of Sustainable Development: guidelines and
methodologies. A Agenda 21 foi um dos mais importantes resultados da Rio-92,
englobando orientações relativas ao desenvolvimento e à implementação de
indicadores de sustentabilidade. Atualmente cada país desenvolve a sua própria
Agenda 21 (SIENGE, 2020).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
259
Já a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD),
foi fundada em 1961, e começou a publicar indicadores ambientais em 1989. Possui
sede em Paris, na França, e sua principal missão é a proposição de políticas para
soluções compartilhadas de dificuldades econômicas, sociais e ambientais,
objetivando o crescimento verde (SIENGE, 2020).
No Brasil , o Ministério do Meio Ambiente (MMA), em união com entidades
parceiras, construiu os Indicadores Ambientais Nacionais, atualizando os indicadores
de sustentabilidade
que
já
existiam,
e se
relacionam
aos
Objetivos
do
Desenvolvimento Sustentável (ODS), que é composto de 17 objetivos e 169 metas
que deverão guiar as políticas nacionais e as atividades de cooperação internacional
até o ano de 2030 .Em 2002 ,também no Brasil, o Instituto de Geografia e Estatística
(IBGE) originou seus primeiros indicadores de desenvolvimento sustentável que foram
atualizados com a publicação Indicadores de Desenvolvimento Sustentável em 2015
(SIENGE, 2020).
O Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade no Habitat (PBQP-H),
outro importante programa, foi criado pelo Governo Federal com o objetivo de
melhoria das construções e modernização do setor de produção com a abordagem
dos seguintes indicadores: Indicador de geração de resíduos ao longo da obra;
Indicador de geração de resíduos ao final da obra; Indicador de consumo de água ao
longo da obra; Indicador de consumo de água ao final da obra; Indicador de consumo
de energia ao longo da obra; Indicador de consumo de energia ao final da obra.
A Série ISO 14000 é um conjunto de normas desenvolvido pela International
Organization for Standardization (ISO), que objetiva a minimização do impacto
ambiental das empresas pela implantação do Sistema de Gestão Ambiental. Dentre
as diversas normas, a ISSO 1431, do ano de 2004 apresenta os indicadores: Indicador
de Condição Ambiental (ICA) e o Indicador de Desempenho Ambiental (IDA), que são
considerados na Avaliação do Desempenho Ambiental (ADA).
A Certificação LEED é concedida pela Green Building Council Brasil (GBC
Brasil), membro do World Green Building Council, que regula a criação de Conselhos
Nacionais para o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis na construção civil.
Pode ser aplicada em qualquer etapa de um projeto. Os níveis são: Certified, Silver,
Gold e Platinum, que são definidos através dos pontos acumulados.
O Processo AQUA-HQE é uma certificação internacional que desenvolveu-se
por meio da francesa Démarche HQE e é aplicado no Brasil pela Fundação Vanzolini.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
260
Para obtenção deve-se implantar um Sistema de Gestão do Empreendimento (SGE)
além de atender quatorze categorias de qualidade ambiental.
O Selo Casa Azul CAIXA, certificação criada em 2009 para promoção do uso
racional de recursos naturais nos projetos financiados. Constitui seis categorias:
qualidade urbana, projeto de conforto, eficiência energética, conservação de recursos
naturais, gestão da água e práticas sociais. Possui selo Bronze, Prata e Ouro.
O Selo Procel Edificações concedido pela Eletrobrás, identifica os prédios com
maior índice de eficiência energética, podendo ser obtido em qualquer etapa do
projeto. Para obtenção do Selo Procel Edificações, é preciso primeiro obter a Etiqueta
PBE Edifica.
Segue abaixo a Tabela 1 onde se realiza a comparação entre os indicadores
ambientais tradicionais e os indicadores ambientais sustentáveis, que demonstra
como é importante os indicadores sustentáveis para edificações sustentáveis.
Tabela 1 – Indicadores Ambientais
Indicadores Tradicionais
Indicadores Sustentáveis
•
Níveis ambientais de poluição do ar,
•
Habilidade do ecossistema de
água, geralmente medido em ppm ou
assimilar e processar poluentes
poluentes específicos
•
Quantidade de material reciclado
•
Toneladas de resíduos sólidos
por pessoa, em relação ao total de
produzidos
resíduos sólidos produzidos
•
Energia renovável em relação a
não renovável
•
Energia per capita utilizada
•
Quantidade total de energia usada
Fonte: Autora (Adaptado de Unicamp 2021).
2.4 Norma abnt
A Norma ABNT NBR ISO 37120:2017 – Desenvolvimento sustentável de
comunidades - Indicadores para serviços urbanos e qualidade de vida, traz o conceito
de cidade como: comunidade urbana sob uma delimitação administrativa em
específico, normalmente relacionada como uma cidade, município ou governo local.
O princípio geral da norma e a sustentabilidade e a resiliência é considerada
um conceito orientador no desenvolvimento sustentável das cidades, devendo os
indicadores serem compilados de acordo com base anuais. A norma é contemplada
por 100 indicadores de sustentabilidade urbana para gestão nas áreas de: economia,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
261
educação, energia, finanças, ambiente, saúde, lazer, serviços de emergência,
resíduos, segurança, transportes, água, telecomunicações, planejamento urbano entre
outros (ABNT NBR ISO 37120: 2017).
2.5 Objetivos de desenvolvimento sustentável da onu
Conforme a ONU, a população residente em áreas urbanas até o ano de 2050,
será correspondente a 66% da população do mundo e a estimativa é que até 2030, 41
existirão 41 megalópoles com população acima de 10 milhões de habitantes. Abaixo
a Figura 2 representa os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU,
destacando o objetivo 11 –Cidades e Comunidades Sustentáveis.
Figura 2 – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU
Fonte: (ONU, 2021).
2.6 Smart cities no brasil
Necessita-se frequentemente a consolidação de pólos urbanos que sejam
exemplo e referencial para conexões tecnológicas, inovações, colaboração constante,
transparência e assistência para os indivíduos e para o meio ambiente, definidas
como cidades inteligentes. Considerando dados do Connected Smart Cities, destacase Campinas, São Paulo e Curitiba como as três cidades inteligentes localizadas no
Brasil (SUMMIT, 2021). O Connected Smart Cities, constitui o órgão com
responsabilidade de plataforma, unificado as empresas, entidades e administração
pública, objetiva o pensamento e progressão para as smart cities. De acordo com o
relatório desenvolvido recentemente do órgão mencionado, Campinas (SP), São
Paulo (SP) e Curitiba (PR), constituem as vencedoras. Para confecção dessa lista
realiza-se o mapeamento de publicações do mundo sobre smart cities com
conectividade eficiente e sustentabilidade, além de artigos acerca do tema (SUMMIT,
2021).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
262
3. URBANIZAÇÃO SUSTENTÁVEL
O World Cities Report 2020, ressalta que o valor intrinsecamente da
urbanização com sustentabilidade pode e deve ser utilizado com o intuito de qualidade
de vida para todos. O relatório fornece ainda, evidências e análise política do valor de
urbanização de uma visão econômica, social e ambiental, inclusive o valor
inquantificável, além de explorar o papel da inovação e tecnologia, governos locais,
direção de investimentos e a inserção da Nova Agenda Urbana para promover o valor
da urbanização sustentável. Destaca-se ainda que beneficiará todos os governos
capacitando-os para criação de programas e estratégias que aumentam o valor da
urbanização com sustentabilidade (UN- HABITAT, 2021).
3.1 Valor da urbanização sustentável
Conforme a UN-HABITAT (2021), quando existe planejamento nos centros
urbanos, estes criam valor que representa a totalidade do aspecto da economia, da
sociedade, do meio ambiente e condições não tangíveis (Instituição, governo,
percepção da política, cultura, civilidade), cujo resultados potencializam melhorias de
qualidade de vida dos moradores de forma significativa e tangível. Ressalta-se assim,
que o valor da urbanização deve integrar a totalidade de grupos residentes nos meios
urbanos, sendo a urbanização a fortaleza para o desenvolvimento.
3.2 Valor econômico
O valor econômico da sustentabilidade da urbanização inclui inclusão próspera
e oportunidades para todos, destacando-se os pontos: os centros urbanos são
propulsores de crescimento da economia; a urbanização com sustentabilidade gera
prosperidade inclusiva; a economia informal se fortaleceu em diversos municípios nos
países em desenvolvimento; direitos de propriedade, regulamentação de terras,
acessibilidade de transportados para pessoas com deficiência; o plano urbano e de
territórios com apoio de governos estruturados aumentarão o valor econômico da
urbanização; os governos locais e nacionais necessitam realizar o fortalecimento de
sistemas no meio urbano com capacidades de produção; (UN-HABITAT, 2021).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
263
3.3 Valor ambiental: construção da urbanização com resiliência
Mediante a UN-HABITAT (2021), relata-se que a sustentabilidade da
urbanização é uma corrente de transformação para apropriação do valor ambiental. O
planejamento adequado da urbanização favorece o valor ambiental por intermédio de
inovações de energia, padrões de assentamentos sustentáveis, alterações de
comportamento dos indivíduos acerca de preservação ambiental. Vale ressaltar
alguns pontos essenciais como: algumas políticas de ação verde e sustentabilidade
no meio urbano apesar de aspectos positivos, estão gerando impactos não
intencionais como deslocamento de pessoas com renda mínima e deve-se explorar
motivos estruturais da devastação do meio ambiente, ter iniciativas de ecologia urbana
aumentam o valor geral da urbanização e alavancam tecnologias para ações
ambientais.
3.4 Valor social da sustentabilidade
As oportunidades que as cidades oferecem emprestam um valor social para a
urbanização, que realiza-se juntamente com o valor intangível da urbanização que
inclui cultura e origens. Nesse sentido, o direito à cidade sustenta o valor social (UNHABITAT, 2021).
3.5 Tecnologia relacionada ao valor da urbanização sustentável
A tecnologia está presente no mundo, fazendo com que as economias e
sociedades se remodelem. A inovação e a tecnologia representam papéis
multidimensionais no meio urbano, onde as cidades inteligentes devem ser planejadas
para os indivíduos, devendo os governantes o desenvolvimento de administrações
públicas eficazes para o ramo tecnológico, evitando exclusão digital, estabelecendo
estruturações com transparência para coleta e compartilhamento de dados (UNHABITAT, 2021).
3.6 Governantes das localidades e o valor da urbanização sustentável
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
264
Conforme a UN-HABITAT (2021), os governos dos municípios são os principais
impulsores da urbanização sustentável e os governos subnacionais são essenciais
para a sustentabilidade mundial da agenda de desenvolvimento. Estes contribuem
para a progressão da urbanização sustentável, com o intuito de promover a mudança
climática, ações de mitigação, resiliência do meio urbano e ações de inclusão da
sociedade e crescimento econômico (UN-HABITAT, 2021).
3.7 Investimentos para valor da urbanização sustentável
A governança deve constituir um componente - chave para novos governos do
meio urbano, deve existir planejamento através de transformação sustentável, deve
haver produtividade e comunicação de dados desagregados para monitorar e avaliar
os impactos urbanos, a existência de investimentos correto urbanos são
imprescindíveis para o aumento do valor da urbanização sustentável. O alcance do
dimensionamento urbano dos ODS está em torno de US $ 38 trilhões para os anos de
2020 a 2030, existem recursos financeiros mundiais para atendimento das
necessidades de investimento, porém esses não são direcionados para áreas de
maior importância, mediante estimativas da UN- Habitat demonstram que a
capacidade de investimento de US $ 98 trilhões é maior que a totalização de
necessidades de investimento (UN-HABITAT, 2021).
Conforme a UN-HABITAT (2021), as receitas do governo é a mais importante
fonte de financiamento para crescimento urbano, ressalta-se que a receita média em
países pobres encontra-se abaixo de 15% do PIB, nos países em desenvolvimento
são 2,3% do PIB e quando comparado aos países desenvolvidos onde é 6,4 % do PIB,
somente 4% dos 500 maiores municípios dos países em desenvolvimento são
considerados aptos para crédito pelos mercados internacionais financeiros.
3.8 A nova agenda urbana e o valor da urbanização sustentável
A roteirização da urbanização com sustentabilidade na Nova Agenda Urbana
é essencial para uma estrutura completa para desbloqueio de valor inerente a
cidades com planejamento adequado, administração eficaz e financiadas (UNHABITAT, 2021).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
265
3.9 Perspectivas de urbanização
No ano de 2015, quando aderiu-se o Agenda 2030 54% (4 bilhões de pessoas)
residia em meio urbano conforme a Figura 3 abaixo, no final do período de 20 anos,
alcançando totalmente a Nova Agenda Urbana em 2036, estima-se que 62% (5,4
bilhões de pessoas) habite em meio urbano. Ainda pondera-se que 96% do
desenvolvimento urbano acontecerá em regiões pouco desenvolvidas como Leste
Asiático, Sul da Ásia e África (Índia, China e Nigéria) representando 35% da total de
população de áreas urbanas no período de 2018 à 2050, Índia deve acrescentar 416
milhões de habitantes, China 255 milhões e Nigéria 189 milhões de habitantes (UNHABITAT, 2021).
Figura 3 – Urban Population and Level of Urbanization (2000 à 2035)
Fonte: (UN-HABITAT, 2021).
Um dos maiores desafios do crescimento da urbanização é a ocupação
irregular em favelas e sem condições adequadas para vida das pessoas que não
encontram outra alternativa devido à ausência de oportunidades, mais de 1 bilhão de
indivíduos vivem em favelas, sendo mais da metade destes no leste, centro e sul da
Ásia (UN-HABITAT, 2021).
4. EDIFÍCIOS VERDES
Atualmente percebe-se um crescimento para edifícios verdes na totalidade de
regiões do mundo de acordo com a Figura 4 abaixo, e o fortalecimento de 20% dos
edifícios nos seguintes 5 anos, inseridos em investimento relativamente administrável
pode ser imprescindível para utilização eficiente de recursos. Um estudo desenvolvido
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
266
por McKinsey Institute, demonstra que apesar de tecnologias para edificações verdes
possam custar mais que as edificações convencionais, as taxas de retorno internas
oscilam de 18% - 30% que é traduzida em uma taxa de equilíbrio de 3- 5 anos, de
acordo com as regiões e tecnologias inseridas. Nos EUA, o Instituto Nacional de
Ciências da Construção constatou uma Relação Custo-Benefício Médio Nacional
(BCR) de 4:1 para uma diversidade de medidas comuns de retrofit de edifícios, um BCR
de 4:1 para quantificação de serviços públicos e infraestrutura de transporte e BCR de
US$ 6 para cada US$ 1 em subsídios investidos na mitigação de riscos (UN-HABITAT
2021).
Figura 4 – Investment Opportunity Across Regions for Green Buildings
Fonte: (UN-HABITAT, 2021).
A sustentabilidade engloba todo o processo de produção desde a entrada com
utilização de recursos energéticos, utilização de água e insumos importantes, até na
saída quando se entrega a construção finalizada e também seus impactos causados
no meio ambiente. As construções sustentáveis como edifícios verdes devem
ponderar o ciclo de vida na totalidade objetivando que se impeça que materiais não
reutilizáveis convertam- se em agentes de poluição ambiental (WRASSE et al., 2018).
Ademais, vale ressaltar que o UN-HABITAT possui estimativa de necessidade
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
267
de investimento em infraestrutura, inclusive construções sustentáveis, e nos ODS da
ONU, de US $38 trilhões para os anos de 2020-2030, um total de US $98 trilhões. Os
bancos comerciais têm capacidade de US $33 trilhões, bancos de investimento
administram US $24 trilhões, seguradoras e previdência privada administram
aproximadamente US $22 trilhões. Já os 82 maiores fundos soberanos do mundo
administram em conjunto mais de US $6,7 trilhões e permanecem com ampla
subutilização para se realizar o crescimento sustentável (UN-HABITAT, 2021).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O crescimento desestruturado das cidades e a ausência de moradias constitui
alguns dos fatores que reforçam a ocupação desregrada de locais propensos a
inundações e demais desastres ambientais. A urbanização é um desafio mundial, em
30 anos dois terços da população do mundo residirá em áreas urbanas. O crescimento
urbano com descontrole, ausência de planejamento e desigualdade constitui desafios
mundiais, apesar da urbanização constituir um impulso para o desenvolvimento, pois
as cidades contribuem para 80% do PIB mundial, podendo ser uma melhoria de vida
para população desfavorecida.
Uma das maiores dificuldades existentes nos centro urbanos é a ausência de
planejamento de infraestrutura que as cidades deveriam disponibilizar para que a
demanda dos seus habitantes como, saúde e bem estar sejam efetivadas. Para
construir cidades com desenvolvimento sustentável é necessário o envolvimento de
todas as partes interessadas como as empresas, a sociedade, os governantes para
que se alcance cada vez mais cidades mais sustentáveis, inteligentes e resilientes.
Na construção civil os indicadores de sustentabilidade baseiam-se na utilização
do solo da energia e dos recursos hídricos, das emissões atmosféricas, do lançamento
de efluentes e no uso de matéria prima. O Retrofit por exemplo, contribui para
construções sustentáveis pois utiliza-se de reforma e restauração, contribuindo para
valorização do imóvel, podendo ser utilizado também para mobiliário urbano, parques
e demais lugares públicos, evitando-se a necessidade de novas construções,
diminuindo o descarte de resíduos no meio ambiente.
Com a crescente preocupação da sociedade perante à crise ambiental, é
imprescindível que o mercado da construção civil inclua por definitivo os indicadores
de sustentabilidade em seus projetos, contribuindo para que as cidades aderem ao
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
268
conceito de cidades resilientes. Alcançando os indicadores de sustentabilidade pode
ser alcançado selo de sustentabilidade, para que ocorra a certificação das empresas,
que agregam valor aos diversos projetos de construção civil.
A urbanização é crescente para a próxima década, estima-se que aumente de
56,2% atualmente para 60,4% até 2030, 96% de crescimento acontecerá em regiões
com menor desenvolvimento do Leste da Ásia, Sul Asiático e África, com 3 países
(Índia, China e Nigéria) representando 35% de crescimento da totalidade da
população urbana mundial de 2018 a 2050, sendo imprescindível que cada vez mais
a construções sejam sustentáveis para que as cidades se tornem cada vez mais
resilientes (UN HABITAT, 2021).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
269
REFERÊNCIAS
AGENDA 2030. ODS 11. Dados e estatísticas. 2021. Disponível em:
<http://www.agenda2030.org.br/ods/11/>. Acesso em 20/09/2021.
ALBINO, Vito; BERARDI, Umberto; DANGELICO, Rosa Maria. Smart cities:
Definitions, dimensions, performance, and initiatives. Journal of urban technology,
v. 22, n. 1, p. 3-21, 2015.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Edificações
Habitacionais- Desempenho: NBR 15575. Rio de Janeiro, 2013.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR ISO 37120
– Desenvolvimento sustentável em comunidades – indicadores para serviços
urbanos e qualidade de vida. Rio de Janeiro: ABNT, 2017.
CIDADES RESILIENTES E SUSTENTÁVEIS/ Cuiabá, MT:Sebrae-2019.
CIDADES RESILIENTES. SEDEC Cidades Resilientes. Cursos. 2021. Disponível
em: <https://eird.org/curso-brasil/docs/modulo7/4.SEDEC-Cidades-Resilientes.pdf.>.
Acesso em 01/08/2021.
CIMENTO ITAMBÉ. O Brasil segue no top 5 da construção sustentável mundial.
Dados e estatísticas. 2021. Disponível em<
https://www.cimentoitambe.com.br/massa- cinzenta/brasil-segue-no-top-5-daconstrucao-sustentavel-mundial/>. Acesso em 10/08/2021.
CONDOMÍNIOS VERDES. Brasil ocupa o 5º lugar no ranking mundial de
construções sustentáveis. Dados e estatísticas. 2021. Disponível em:
<https://www.condominiosverdes.com.br/brasil-ocupa-o-5o-lugar-no-rankingmundial-de- construcoes-sustentaveis/>. Acesso em 10/08/2021.
DA SILVA, Diogo Hilário et al. Construção sustentável na engenharia civil.
Caderno de Graduação-Ciências Exatas e Tecnológicas-UNIT-ALAGOAS, v. 4, n.
2, p. 89, 2017.
GROSSO, Marianna. As obras de retrofit sob a visão da sustentabilidade /
Marianna Grosso - Rio de Janeiro: UFRJ / Escola Politécnica, 2015.
LEITE, C.; TELLO, R. Indicadores de sustentabilidade no desenvolvimento
imobiliário urbano: relatório de pesquisa. São Paulo. SP: Fundação Dom
Cabral/Secovi, 2010.
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE (MMA). Responsabilidade socioambiental
Agenda 21. Órgão. 2021. Disponível em:
<https://www.mma.gov.br/responsabilidade- socioambiental/agenda-21>. Acesso em
13/08/2021.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
270
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU) NEWS. População mundial.
Dados e estatísticas. 2021.Disponível em: <https://news.un.org/pt/tags/populacaomundial>. Acesso em 15/08/2021.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Objetivos de desenvolvimento
sustentável, ODS da ONU tudo o que você precisa saber. Notícias.2021.
Disponível em:
<https://www.creditodelogisticareversa.com.br/post/t-objetivos-de-desenvolvimentosustentavel-ods-da-onu-tudo-o-que-voce-precisa-saber>. Acesso em 15/08/2021.
PRECISÃO. Retrofit. Dados. 2021. Disponível em:
<http://www.precisao.eng.br/fmnresp/retrofit.htm#gsc.tab=0>. Acesso em
05/08/2021.
QUEIROGA, Adayanna Teberges Dantas; DE FÁTIMA MARTINS, Maria. Indicadores
para a construção sustentável: estudo em um condomínio vertical em Cabedelo,
Paraíba. Revista de Administração da UFSM, v. 8, p. 114-130, 2015.
UNITED NATIONS HUMAN SETTLEMENTS PROGRAMME- UN HABITAT. The
Value of Sustainable Urbanization. World Cities Report. 2020. Disponível
em: <https://unhabitat.org/sites/default/files/2020/10/wcr_2020_report.pdf>. Acesso
em 26/08/2021.
SATTLER, Miguel Aloysio. Habitações de baixo custo mais sustentáveis: A casa
alvorada e o centro experimental de tecnologias habitacionais sustentáveis.
ANTAC, 2007.
SUMMIT MOBILIDADE. Ir e vir no mundo, quais são as 3 cidades mais
inteligentes do Brasil. Relatórios. 2021. Disponível em:
<https://summitmobilidade.estadao.com.br/ir-e-vir- no-mundo/quais-sao-as-3cidades-mais-inteligentes-do-brasil/> Acesso em 19/08/2021.
SIENGE. Indicadores de Sustentabilidade. Dados e estatísticas. 2021. Disponível
em:<https://www.sienge.com.br/blog/indicadores-de-sustentabilidade/>. Acesso em
18/08/2021.
T2 ARQUITETURA. Retrofit, conheça esse tipo de reforma que vem ganhando
espaço. Notícias. 2021.Disponível em: <https://www.t2arquitetura.com.br/retrofitconheca-esse- tipo-de-reforma-que-vem-ganhando-espaco/>. Acesso em
12/08/2021. UNICAMP. Indicadores Ambientais. 2021. Disponível
em:<https://www.unicamp.br/fea/ortega/temas530/anacarla.htm>. Acesso em
10/09/2021.
UNITED NATIONS (UN). SDGS. Organização. 2021. Disponível em:
<https://brasil.un.org/pt-br/sdgs>. Acesso em 10 /09/2021.
VALENTE, J. P. Certificações na construção civil: comparativo entre LEED e
HQE. Rio de Janeiro: 2009.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
271
WRASSE, Patrícia Andreia; PFITSCHER, Elisete Dahmer; SANTA, Stephane Louise
Boca. Avaliação da sustentabilidade: estudo em edificações sustentáveis em um
campus de um Instituto Federal de Ensino Paranaense. Brazilian Journal of
Development, v. 4, n. 5, p. 2127-2149, 2018.
WACLAWOVSKY, EDSA; ALVES, Salete M. As construções sustentáveis e o
desenvolvimento sustentável do Habitat Humano. XXX Encontro Nacional de
Engenharia de Produção. São Carlos/SP, 2010.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.10, p.98823-98840 oct. 2021 ISSN: 2525-8761
272
CAPÍTULO 15
ESTRANHOS NA PÁTRIA: UMA ANÁLISE PSICANALÍTICA DA VIOLÊNCIA CONTRA
REFUGIADOS
Wueslle Thibes dos Santos
Bacharelado em Psicologia - Uniandrade
Instituição de atuação atual: Nenhuma
Endereço: R. General de Brigada Carlos Castor de Menezes, 71, Butiatuvinha Curitiba - PR
E-mail: wueslle@gmail.com
Vera Lucia da Silva Alves
Doutora em filosofia PUCPR
Instituição de atuação atual: FESP – PR Fundação de Ensino Superior do Paraná
Endereço: Rua Viviany Cristina Wanto, 50 sobrado 6 – Curitiba/PR
E-mail: veraalves33@hotmail.com
RESUMO: A temática dos refugiados vem aparecendo com frequência nos noticiários
nos últimos anos, mobilizando diversos debates ao redor do globo. Isso porque o fluxo
de imigração aumentou de forma exponencial nos últimos 10 anos, tendo como
principais países a Síria, Afeganistão e o Sudão do Sul. Apesar disso, muitos outros
países produzem novos refugiados todos os dias. Isso acontece por diversos motivos,
entre eles: conflitos internos, guerras sectárias e a fome. Tal imigração equivale a um
sintoma social; sintoma, este, que desestabiliza uma ordem prévia das coisas e,
consequentemente, provoca oposições. Assim, surgem os discursos violentos contra
os refugiados, que os consideram, muitas vezes, como terroristas ou invasores. A
contribuição da psicanálise para essa questão pode vir de diversos flancos teóricos,
porém, para esse artigo foram selecionados alguns conceitos para contribuir para o
desenvolvimento da discussão: o refugiado estaria numa posição de estranho familiar,
aquele que invade uma montagem de muros – estes visam segurança e o
impedimento daquilo que está fora entre (a indeterminação e o mal- estar). A violência
aparece como uma reação ao estranho, ela tem múltiplas formas, funciona como algo
sistêmico e invisível, e, serve para justamente recuperar alguma suposta homeostase
de um estado imperturbado antes da guerra. Ou, ainda, surge como uma violência
simbólica, isso se refere à palavra como aquilo que reduz a coisa a um simples traço
e lhe atribui perspectivas externas a ela mesma, sendo, então, a própria linguagem
uma violência. Para tal análise foram utilizados diversos autores da psicanálise, tais
como Sigmund Freud, Jacques Lacan, Slavoj Zizek e Christian Dunker.
PALAVRAS-CHAVE: Refúgio; Refugiado; Unheimlich; Violência; Inconsciente .
ABSTRACT: Refugee issues have often appeared in the news in recent years,
mobilizing various debates around the globe. This is because the flow of immigration
has increased exponentially over the past 10 years, with Syria, Afghanistan and
southern Sudan as its main countries. Despite this, many other countries produce new
refugees every day. This happens for a variety of reasons, including internal conflict,
sectarian wars and famine. With this symptom that destabilizes a prior order of things,
opposition also appears. This gives rise to violent speeches against refugees, often
regarding them as terrorists or invaders. The contribution of psychoanalysis to this
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
273
question may come from several theoretical fields, but for this article some concepts
were selected to contribute to the development of the discussion. The refugee would
be in this position of familiar stranger, who invades a wall assembly that aims at security
and to prevent what is out there (indetermination and malaise) from entering. Violence
then appears in various ways, as something systemic and invisible and which serves
to justly recover some kind of homeostasis from an undisturbed state before the war,
or as a symbolic violence, being referred to as what reduces the thing to a simple trace,
and attributes external perspectives to itself, and then language itself is a violence. For
this analysis were used several authors of psychoanalysis, such as Sigmund Freud,
Jacques Lacan, Slavoj Zizek and Christian Dunker.
KEYWORDS: Refugee; Other; Strange; Unheimlich; Violence; Unconscious .
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
274
1. INTRODUÇÃO
O ser humano migra desde que se levantou e passou a caminhar sob duas
pernas. A pluralidade de culturas e idiomas que possuímos até então, só foi possível
porque grupos de Homo Sapiens decidiram migrar (ZIMMER, 2017). As primeiras
migrações saíram do norte da África, na região da Etiópia, para outras regiões
do globo, há aproximadamente 270 mil anos atrás. Desde então, vários movimentos
migratórios aconteceram, permitindo a formação das sociedades ocidentais, orientais
e mediterrâneas, como as conhecemos hoje (ZIMMER, 2017).
Migra-se por vários motivos, dentre eles: em busca de um lugar desconhecido
para preencher a esperança de uma vida melhor; por questões organizacionais; ou,
ainda, por questões políticas. A presente pesquisa irá se ater ao último motivo referido.
Aquele que faz uma migração forçada por questões políticas é denominado
refugiado ou asilado. Tal migração também pode acontecer por diversos motivos:
conflitos internos na região, perseguições políticas, retaliações e sanções do próprio
estado, guerras sectárias, afundamento de estados, expedições militares, e outros
(BAUMAN, 2017). Essa migração forçada é responsável por criar centenas de milhões
de refugiados.1
A experiência de refugiar-se em um outro lugar que não é o seu, pode ser, por
si só, uma experiência traumática. Pois, o novo lugar é regido por um “Outro”2, isto é,
outra cultura, outro lugar simbólico, que lhe é estrangeiro e estranho. Obviamente o
“Outro”, lugar estranho, irá impor ao sujeito novas normas e regras – as quais ele
aceita ou busca outro espaço supostamente menos tirânico (DUARTE, 2016).
Assim, o refugiado pode sofrer ao ocupar o lugar do estrangeiro na nova
sociedade e, sobretudo, pela sua simples presença estrangeira, pode ferir uma
unidade narcísica já constituída, uma sociedade com cultura e normas próprias
instituídas, encerrada em seus muros e fronteiras, como será analisado no corpo
trabalho.
1
Os dados serão apresentados na sequência.
Termo utilizado por Jacques Lacan para designar um lugar simbólico — o significante, a lei, a
linguagem, o inconsciente, ou, ainda, Deus — que determina o sujeito, ora de maneira externa a ele,
ora de maneira intra-subjetiva em sua relação com o desejo. Pode ser simplesmente escrito com
maiúscula, opondo-se então a um outro com letra minúscula, definido como outro imaginário ou lugar
da alteridade especular. Mas pode também receber a grafia grande Outro ou grande A, opondo-se
então quer ao pequeno outro, quer ao pequeno a, definido como objeto (pequeno) a. (Roudinesco,
1998, p. 558)
2
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
275
As possíveis interpretações e consequências às “ameaças” deste estranho, que
está fora da coesa cultura, que não compõe o grupo já estabelecido, que traz másnovas de lugares longínquos e daquilo que nada se sabe e não se quer saber
(BAUMAN, 2017), podem ser respondidas com violência, por exemplo, com atos
homicidas, como o caso na cidade de Christchurch3.
Tais ações e reações dos membros de uma sociedade diante de um estranho,
de um refugiado pode ser configurado como um sintoma. Apesar dessa ruptura
sintomática no tecido social (que expressa tanto a intolerância ao diferente quanto a
dificuldade de aculturamento) ser significativa e crescente, observa-se escasso
acompanhamento e produção acadêmica da psicologia. Há pouca pesquisa diante
desse crescimento exponencial das ondas migratórias ao redor do mundo e das suas
consequências psicológicas, haja vista que em busca na base de dados LILACS
utilizando as palavras chave: psicologia AND refugiados, foram encontrados apenas
16 artigos produzidos na américa latina entre 1990 e 2019.
Isso indica a necessidade de se produzir mais pesquisas acerca dessa
problemática. É necessário colocar em discussão a questão da relação subjetiva e do
sofrimento psíquico do refugiado com a perda de sua nação e de sua cultura original
e do novo vínculo com o Outro simbólico, bem como, colocar em discussão a reação
daquela nação que acolhe (evitando) o estrangeiro. O presente artigo fará uma
correlação da questão dos refugiados com a estruturação inconsciente, segundo uma
perspectiva psicanalítica.
2. MÉTODO
Trata-se de uma pesquisa de revisão de literatura narrativa, de natureza
qualitativa, de caráter exploratório e explicativo sobre como o refugiado é colocado no
lugar do estranho, do diferente e sua relação com a violência.
Em busca na base de dados SciElo com as palavras-chave “refugee”, observouse que houve um aumento expressivo nas produções acadêmicas sobre a temática
do refugiado nos últimos 10 anos, sendo encontrados 146 resultados, destes 39 foram
publicados em 2016 – o ano de maior produção com este tema. Entre os anos 2000 e
3
Este caso é do australiano Brenton Tarrant, adepto de um discurso anti-imigrantes e de extrema
direita, assassino de 49 pessoas nas mesquitas de Linwood e Al Noor no dia 15 de março de 2019
(BBC, 2019).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
276
2009 encontrou-se apenas 34. Ao utilizar as palavras-chaves “migrant” e “violence”
encontrou- se 37 artigos, totalizando assim 183 artigos que relacionam os conceitos
de refugiados, imigração e violência.
Os critérios: Tempo de publicação (foram descartados os artigos produzidos
antes dos anos 2000); idioma (descartados artigos de outras línguas que não inglês e
português); e,
relevância
do
tema.
Após
as
exclusões,
foram
utilizados
aproximadamente 30 artigos. Além dos artigos, foram utilizados livros, sem critérios
temporais, tais como as obras completas de Sigmund Freud, Seminários de Jacques
Lacan, textos de Slavoj Zizek, Noam Chomsky, Bauman e Christian Dunker, de acordo
com a relação e com os objetivos da pesquisa. Foram utilizadas também dissertações
e teses do sistema CAPES.
3. ACERCA DO REFÚGIO E DO REFUGIADO
A palavra refúgio tem sua etimologia originada no latim “refugium”: lugar que
se busca para coibir o perigo. Pode ser associada também ao grego “asylon”: lugar
incorruptível e que não pode ser violado (Priberam, s.d.). Assim, a etimologia
apresenta um espaço de suspensão da violação, mas evidencia uma relação
essencial e paradoxal entre exílio, refugiado e violência. Tal relação será analisada na
sequência.
Sobre o termo “refugiado”, relativo ao estatuto dos refugiados, foi oficialmente
definido na convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) de 1951.
Segundo o artigo 1°, refugiado é a pessoa que:
“[...] temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo
social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não
pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que,
se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência
habitual em consequência de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido
temor, não quer voltar a ele.” (ONU, 1951, p. 2)
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR)
adicionou à definição: “[...] Também são consideradas refugiadas aquelas pessoas
que foram obrigadas a deixar seus países devido a conflitos armados, violência
generalizada e graves violações dos direitos humanos.” (ACNUR, 2019, p. 2)
Isso porque entende-se que a não assistência daquele estado de direito à
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
277
cidadania dos indivíduos que compõe aquele corpo social/político fere diretamente a
declaração universal dos direitos humanos e, portanto, é qualificador da lei
internacional para determinação de status de refugiado, de acordo com as
convenções de 1951 e 1967, alusivo ao estatuto dos refugiados (ONU, 1951; 1967).
A questão dos refugiados tem aparecido cada vez mais nos jornais nos últimos
anos, sendo pauta de diversos debates pela União Europeia (UE) e dividindo opiniões
entre os chefes de estado e de governo (DW, 2018). Contudo, apesar das
discordâncias, o fato em comum é que existe uma problemática quanto aos refugiados
que tem se enrijecido com o avançar da última década, em especial dos últimos 5
anos (UNHCR, 2017).
De acordo com o “UNHCR”, United Nations High Comissioner for Refugees
(ACNUR) – órgão criado em 1950 com objetivo de dar apoio aos refugiados de todos
os lugares – 660 milhões de pessoas realizaram migrações forçadas no período de
17 anos. Entre os refugiados estão pessoas que buscam asilo, pessoas deslocadas
internamente (PDI), refugiados que retornaram, PDIs que retornaram, expatriados,
dentre outros. Essa cifra fica ainda mais alarmante quando se vislumbra que 71.44
milhões de migrações ocorreram apenas no ano de 2017 – número equivalente a
quase 1% da população mundial, que na época era de 7,6 bilhões (UNHCR, 2017).
4. O SIMBÓLICO DO REFÚGIO E DO REFUGIADO
O filósofo Vladimir Safatle em sua coluna “Refugiados que devem ser
educados” da Folha de SP (2016) evidenciou que, sob a óptica da psicanálise, o
primeiro indivíduo a pedir asilo num lugar diferente da sua origem foi Édipo4. Ele foi
expulso de Tebas, ainda bebê, pelo seu próprio pai e foi acolhido por Teseu na cidade
de Colono. Mas, retornou a Tebas na vida adulta (Safatle, 2016). Essa ilustração
psicanalítica do refúgio e do refugiado coloca em pauta o caminho trágico do herói
fadado a um destino que lhe atravessa sem que possa controlá-lo. Saindo e
retornando da nação que o elevou ao status de refugiado à herói, pois, quando
eliminou a esfinge recebeu a condição de regente da nação e, ao mesmo tempo,
recebeu seu destino trágico.
Tanto o herói da mitologia grega quanto o refugiado atual são atravessados por
4
Personagem da peça trágica de Sófocles, utilizado por Freud para esclarecer seu conceito
psicanalítico do ‘Complexo de Édipo'.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
278
dois significantes: nação e pátria. A etimologia desses dois significantes referem-se
às temáticas de lugar de origem atravessada pelo pertencimento geracional. Nação (do
latim: natus) como nascimento; pátria (do latim: pater) como pai – A perda da pátria,
bem como, a perda do pai simbólico5.
O psicanalista francês Jacques Lacan (1938) explica que a perda do referencial
do pai, perpassa necessariamente pelo significante do “nome-do-pai6”, esse que
amarra todos os outros na cadeia de significantes do sujeito. O declínio do pai
representa um declínio de um pai simbólico, o pai da horda, capaz de ditar um destino
e organizar o sujeito em relação às suas cadeias significantes. “[...] o pai simbólico
que representa o Outro como sede da lei. Para que haja algo que faça com que a lei
seja fundada no pai, é preciso haver o assassinato do pai, o pai morto, isto é, o símbolo
do pai.” (LACAN ,1957, p. 152)
Essa perda coloca em evidência a falta, mas, permite ao indivíduo se haver
com o próprio desejo na medida que se afasta do “nome-do-pai”, o qual aparece
através da incidência do inominável, unbehagen, do mal-estar e do real (DUARTE,
2016).
O mal-estar que desponta no sujeito que busca refúgio, portanto aquele que já
perdeu o pai e a pátria, pode surgir através do desamparo, denominado por S. Freud
(1926) de “angst”, angústia ou ansiedade. O pai da psicanálise definiu “angst” como
defesa do ego em relação à perda do primeiro objeto de desejo. Já Lacan, define a
angústia como um sinalizador de desamparo diante da perda do lugar de amado
perante o Outro (DUARTE, 2016). Ambas versões esclarecem a questão do refúgio e
do refugiado: a perda da nação amada e a perda da proteção do “Outro” simbólico.
5. A DIÁSPORA E SEU IMAGINÁRIO
Em 2017 a pesquisadora estadunidense Ramona Kreis realizou uma análise
no
microblog
twitter
dos
discursos
anti-refúgio
através
da
hashtag
“#refugeesnotwelcome” (refugiados não são bem-vindos). Foram selecionadas cem
Para Lacan (1953) trata-se da perda do grande Outro – registro simbólico e princípio organizador de
alteridade radical, sendo referido como um dos 3 registros fundamentais da estruturação psíquica (real,
simbólico e imaginário).
6
O Nome-do-pai é o significante fundamental porque permite a significação para proceder
normalmente. Esse significamente fundamental confere tanto a identidade do sujeito (nomeia e o
posiciona na ordem simbólica) e significa a proibição edípica, o “não” do tabu do incesto. (LACAN,
1998).
5
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
279
mensagens de diversos lugares da Europa e foi identificado que, majoritariamente, o
núcleo do discurso de todas as mensagens está relacionado a um sentimento de ter
sua pátria invadida (KREIS, 2017). Em grande parte das mensagens aparece também
uma secção: de um lado está a construção de uma nova identidade europeia e de
outro a construção imaginária de refugiados como “criminosos”, “clandestinos” e
“invasores”. (KREIS, 2017).
Para além das mídias sociais, há uma correlação entre o discurso antiimigração e as mídias convencionais, como demonstrado por Jäckle e König (2018);
eles delimitaram três possíveis variáveis que relacionam refugiados à violência : 1)
Violência ou crimes cometidos por refugiados; 2) Operações policiais contra
fundamentalistas islâmicos; 3) Ataques e alarmes terroristas na Alemanha ou nos
países vizinhos.7 Assim posto, as três variáveis ficaram permeadas pelo discurso
midiático que, dada as proporções das notícias e a forma como é construída a
narrativa, influenciou diretamente a opinião pública, potencializando desse modo o
discurso de ódio e a violência anti-imigração (Jäckle & König, 2018).
Além desses discursos rotulando refugiados como invasores e/ou como
terroristas, outra crença comum é a de que os refugiados irão roubar empregos e
benefícios sociais que seriam de direito dos “cidadãos” originários de determinado
país ou região. Isso foi demonstrado por uma pesquisa do Pew Research Center
(2016), a qual apontou uma grande anuência popular europeia a essa crença: 82% da
população húngara e 75% da polonesa corroboram tal crença. Países como Holanda,
Alemanha, Itália, Grécia, Suíça, Reino Unido, França e Espanha também
demonstraram concordância à crença, com 50% em média.
A seguir serão apresentados dois conceitos de âmbito psicanalíticos: o
“infamiliar” de Freud e a “lógica do condomínio” de Dunker, que permitirão elucidar a
posição que o sujeito em refúgio ocupa no imaginário social.
6. O INFAMILIAR
Do alemão ‘das unheimliche’, o infamiliar diz primeiramente de uma experiência
estética do horror, um incômodo ou desconforto diante de algo que conhecemos e
desconhecemos ao mesmo tempo. Em algumas edições da obra freudiana o conceito
7
A pesquisa foi realizada através de notícias do jornal alemão Spiegel Online, um dos maiores veículos
da mídia tradicional germânica.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
280
era traduzido como a “inquietante estranheza” e “o estranho familiar”, ou seja, o
estranho que nos habita e que nada queremos saber (FREUD, 1919).
Freud se apropria de uma definição dada por Schelling (1968 apud 2019)
proferida em uma de suas aulas em Berlim, a qual define o "unheimlich" como aquilo
que veio à luz, que surgiu, porém, deveria ter permanecido em segredo, na escuridão.
Contudo, como demonstrado por Freud (1919), seu oposto “heimliche”, que em sua
essência estaria relacionado a um sentimento de familiaridade e intimidade, traz
também as ideias de “secreto e desconhecido”, aglutinando assim os opostos.
Seguindo tal raciocínio, (un)heimliche indica a negação do familiar, sendo o (un) a
partícula que explicita o recalcamento de algo que já foi conhecido e não o é mais.
Dunker (2019) define algumas oposições contidas em (un)heimliche: “Casa
(intimidade ou privacidade) / Floresta ou Rua (estrangeiro ou público), confiança
(manter próximo) / desconfiança (manter distante), oculto (pertence a alguns) / revelado
(pertence a todos), vivo, animado, humano / morto, inanimado (coisa), inumano”
(DUNKER, 2019, p.137). Porém, esse estado de oposição não é bem delimitado,
havendo entremeios que se cruzam o tempo todo, causando então o sentimento de
indeterminação e estranhamento explicitado por Freud (1919).
Em seu texto “Sobre o sentido antitético das palavras”, Freud (1910) expõe
através dos estudos do linguista Karl Abel, a relação dialética na formação do idioma,
utilizando como exemplo a língua egípcia. Segundo ele, além de existirem palavras
que continham seus opostos nela mesma (como se a palavra “forte” significasse
concomitante forte e fraco, por exemplo) existiam também palavras que necessitavam
de duas partículas para representar uma, como “fortefraco”. Isso acontecia por uma
motivação estritamente dialética, uma vez que “forte” precisava do “fraco” para indicar
que é forte, ou, “luz” precisava de “escuridão” para indicar que é luz. Essa relação
antitética forma um campo de significação que pode ser traduzida em uma mecânica
do funcionamento inconsciente, como argumenta Freud (1919), ao analisar a
deformação do conteúdo nos sonhos que, segundo ele, muitas vezes contém em si
seus opostos.
Essa convergência pode ser exportada para o (un)heimliche, visto que a
palavra ‘infamiliar’ é composta pelas partículas (heim) casa e (licht) luz. Assim,
‘infamiliar’ representa duas coisas que nos são familiares: a casa e a luz, já expostas
anteriormente. No sentido antitético, a luz contém a escuridão e a casa contém o
externo, por isso heimlich é simultaneamente o familiar e o infamiliar (DUNKER, 2019).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
281
É nesse ponto que se coloca, então, o estranho como retorno daquilo que outrora fora
conhecido. Ainda sobre o estranho, Freud acrescenta:
“[...] propriamente, algo que tem um efeito de infamiliar frequente é facilmente
alcançado quando as fronteiras entre fantasia e realidade são apagadas, quando algo
real, considerado como fantástico, surge diante de nós, quando um símbolo assume
a plena realização e o significado do simbolizado e coisas semelhantes” (FREUD,
1919, p. 71)
Ao encerramento das fronteiras entre a realidade e a fantasia, conforme a
citação freudiano, o fato é dado como dúbio e paradoxal, surge então um campo de
indeterminação e, nesse campo, há a emergência do Real como aquilo que escapa
ao simbólico e não cessa de não se inscrever (LACAN, 1953).
O refugiado apareceria aqui como portador do dúbio ou como esse infamiliar,
na medida que é colocado imaginariamente como o estranho, como o invasor,
como o criminoso, como aquele que supostamente vai violentar as relações
estabelecidas e estabilizadas da cultura local, assim descrito acima, na pesquisa de
Ramona Kreis (2017).
A partir desta pequena conceitualização psicanalítica, vemos o refugiado
colocado na posição de arauto do mal-estar, que desestabiliza a “pseudo homeostase”
organizada pelo recalque para impedir a iminência do real. O exilado assim como o
infamiliar, enquanto conceito, contém em si os sentidos antitéticos de dentro/fora, de
casa/rua, de humano/inumano. Ao passo que os refugiados atravessam as fronteiras
demarcadas geograficamente (representantes da fronteira entre a fantasia e o real)
invadem os limites do muro simbólico do familiar, destituem a razão de ser e violam a
segurança do conhecido. Nesse interregno aparece o sintoma em forma de violência
com o objetivo de eliminar aquele que imaginariamente ameaça, com o objetivo de
eliminar o enstrangeiro, o outro da diferença radical, o outro estranho, mas, ao mesmo
tempo, familiar. Portanto, o refugiado representa o dúbio e paradoxal – ‘unheimliche’.
Na sequência será analisado brevemente o conceito de “lógica do condomínio”
apresentado por Dunker (2016), a fim de determinar o espaço “para cá da fronteira”,
bem como, definir mais o que é o dentro/fora, explicitado pelo ‘unheimliche’.
7. A PSICANÁLISE “ENTRE-MUROS”
Em sua obra “Mal-estar, sofrimento e sintoma”, Dunker (2015) estabelece uma
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
282
metáfora baseando-se na frase de Lacan “entre o homem e o mundo, há um muro”
(1972, p. 90). Essa metáfora é marcada pela construção de grandes condomínios
como Alphaville, concebendo uma correlação entre os muros, a indeterminação e a
incidência do mal-estar. Cercear-se entre paredes, delimitando o que é dentro e fora,
criando fronteiras e zonas de interdição é encontrar um lugar onde o mal-estar foi
nomeado.
A construção do condomínio se orienta pela busca de um lugar perdido, um
espaço de realização onde é possível estar entre pares, atravessados por uma
normativa que serve aos sujeitos que ali estão, mantendo a ordem e impedindo o caos.
Uma espécie de autarquia desconectada do que há do lado de fora. Dois argumentos
preponderantes na retórica de condomínios são: segurança e acesso a serviços
(DUNKER, 2015).
Dunker (2015) estabelece três tempos para a montagem de uma fantasia
organizada através dessa representação, a qual ele chama de “lógica do condomínio”.
O primeiro tempo é do mal-estar real (separação dentro-fora, ordem-anomia, através
da construção do muro e portanto, correlato da castração); o segundo, o recalcamento
(nomeação) do mal-estar; o terceiro, a elaboração imaginária do outro (figura do
síndico como aquele que coordena o sofrimento num espaço de ordem e de produção,
aquele que converte um desprazer tangível no que ele possa administrar). Por fim,
Dunker adiciona aos três tempos um quarto, a formação de sintomas – que articulam
o nó e norteiam o nexo do eixo real-simbólico-imaginário8 (RSI).
Além disso, a ideia de muro apresenta uma relação direta com a de segurança.
Ao se cercar impede-se que o que há lá fora entre, como um forte – o muro se orienta
como defesa. Essa é uma ideia presente também na psicanálise, a defesa como uma
das formas de tornar essa indeterminação do mal-estar em determinação, dar nome e
existência a algo a que se deve defender, como explicitado pelo autor na seguinte
passagem:
“O condomínio expressa uma espécie de nova montagem entre supereu e
fantasia, uma nova política de manejo da alteridade e do antagonismo social, em cujo
epicentro podemos colocar o mal-estar na a-violência. Os novos sintomas ganham,
assim, uma espécie de princípio de redescrição, a partir do qual são dispostos tanto
como efeitos articulados de uma nova forma de declínio da função social da imago
8
Eixo organizado pelo nó borromeano, estrutura baseada no brasão da família Borromeu onde 3 arcos
são enlaçados de forma que um não pode ser solto sem desorganizar toda a estrutura.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
283
paterna quanto de uma irrupção do Real.” (DUNKER, 2015, p.106)
Deste modo, o infamiliar, como figura do estrangeiro, revela-se nessa metáfora
como aquele que vem de fora e tenta adentrar nesse espaço de determinação do malestar, onde ele se encontra nomeado e onde há um síndico que reorganiza o desprazer
tornando- o gestável. E como dito por Freud (1919), ao desaparecer os limites entre a
fantasia e a realidade algo tido como fantástico surge e esse algo traz consigo aquilo
que muito se nega: a falta.
O quarto tempo da formação da fantasia na lógica do condomínio é a violência
como sintoma que amarra o nó9 (DUNKER, 2016). Assim, o infamiliar seria aquele
que promove o “desnodamento”, desorganizando a montagem da suposta segurança
e expondo os indivíduos que outrora viviam encastelados em seus condomínios ao
deserto do real.
8. ACERCA DO VIOLAR
Violência, palavra de origem latina, tem sua etimologia nas palavras violentia e
violare: vocábulos para impetuosidade e violação respectivamente (Conceito, 2011).
Desde os primórdios da humanidade a violência é um meio para alcançar finalidades,
um resultado de um conjunto de aspectos sociais e, até mesmo, um sintoma de
práticas culturais que remontam um passado longínquo.
Segundo definição da Organização Mundial da Saúde (OMS), violência é: “o
uso de força física ou poder, em ameaça ou na prática, contra si próprio, outra pessoa
ou contra um grupo ou comunidade que resulte ou possa resultar em sofrimento, morte,
dano psicológico, desenvolvimento prejudicado ou privação”. (World Health
Organization, 2002, p. 5)
A escolha do verbete “poder” que segue “força física” remete a um aspecto
político da violência. Onde o poder existe, pode ter significado de impor a própria
vontade sob o outro, em qualquer instância que se estabeleça uma relação vertical,
como descrito por Max Weber em sua obra “Economia e Sociedade”. Weber apresenta
uma interessante relação da violência como constructo etimológico de impetuoso e de
violador com o poder, portanto, na esfera social (WEBER, 1991). Desta arte, entendese que a violência é social, uma vez que depende intrinsecamente do outro e
9
Nó borromeano.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
284
estabelece uma relação de dominação imediata como resultado.
A legitimidade da violação como meio de dominação só foi possível através do
fenômeno da linguagem, dando consciência à estrutura semiótica da violência, bem
como, dando razão de ser ao que pratica a violação. Desse modo, a linguagem molda
a violência como fenômeno, constrói um sistema no qual a totalidade dessa dinâmica
é muito maior que a soma de todas as partes e confere, assim, uma relação
diametralmente oposta e vertical entre dominador e dominado, violador e violado.
Essas relações de poder aparecem em diversos momentos no percurso
histórico, ecoando através de vozes oprimidas por sua classe, raça, gênero, etnia ou
credo, e por isso, a violência é essencialmente política (COSTA, 2018). As diferenças
estruturais que sustentam discursos de dominação servem como único meio possível
de alcançar o desenvolvimento, sendo “conditio sine qua non" da competitividade,
todavia, servem também como manutenção constante da violência.
9. A PSICANÁLISE DA VIOLÊNCIA
Em uma perspectiva psicanalítica, a violência está associada a afetos tais como
a hostilidade e o ódio, ambos relacionados aos conceitos apresentados na obra
freudiana de “Eros e Tanatos”. A dicotomia entre as pulsões que afirmam e destituem
a vida. A violência como ato, como repetição indica um lugar de gozo10 do sujeito na
posição relativa ao discurso sadomasoquista, uma vez que a violência ao outro é uma
violência contra si (FERRARI, 2006).
Lacan separou aquilo que chamou de violência propriamente dita e
agressividade. A violência propriamente dita é algo que não pode ser recalcado, pois
a violência em si é o curto-circuito da palavra, a passagem ao ato, e, portanto, a
incidência do real (LACAN, 1991). Já a agressividade estaria relacionada ao "estádio
do espelho11”, a posição do pequeno outro imaginário como uma imagem especular e
uma agressividade direcionada a ele. Essa relação especular que se constrói na
formação do eu, onde o indivíduo rivaliza com a sua própria imagem e forma-se o que
Lacan chamou de paranoia estrutural do homem. O sujeito, cindido pelo semelhante,
sente-se agressor e agredido, autoagressão e autoagredido, o superego resulta como
10
Do francês Jouissance.
Parte do desenvolvimento infantil onde a criança se identifica com a sua própria imagem no espelho
e passa a se reconhecer como alguém separada do mundo e com um nome.
11
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
285
expressão dessa cisão do sujeito contra si mesmo (FERRARI, 2006).
A violência aparece na obra psicanalítica também como parte fundamental do
mito fundador, uma antropologia do sujeito inconsciente castrado12, apresentado por
Freud em seu texto "Totem e Tabu” (1913). Nesse mito, Freud apresenta a violência
como fundadora e parte essencial do processo civilizatório, uma vez que permite a
vida em sociedade, estabelecendo, juntamente da lei, o mal-estar pela vivência
incompleta do desejo. Em uma perspectiva hobbesiana, bellum omnium omnes, a
guerra de todos contra todos, é parte da disputa dos filhos pela posição de pai-dahorda13. Assim como o “Leviatã” de Hobbes, que foi erigido no lugar desse Pai que é
morto, um totem, que o representa, é significado de toda a lei e ordem que instaura o
tabu do incesto. Para além dessa análise, é possível expandir o conceito de violência
para a vida mental, a qual funda a constituição do psiquismo na sua relação com o
meio.
10. VIOLÊNCIA SIMBÓLICA
A entrada na linguagem possibilita a entrada da violência (PERINE, 1987). É a
partir desse pressuposto que Zizek organiza a sua ideia de uma violência da
linguagem. Essa violência, que se diferencia da anteriormente chamada de violência
propriamente dita, é o laço social que protege o sujeito do Real, do mal-estar
primordial ou, ainda, da morte do Pai-da-horda. Aqui retoma-se o que Lacan diz, pois
há uma interdependência dessa relação do outro com a violência. Para tal análise
Zizek (2014) resgata o caso da caricatura de Maomé realizada pelo jornal
dinamarquês Jyllands-Posten em 2005, que gerou revolta das comunidades
muçulmanas, para se referir a violência simbólica. O alvo dessa revolta, nesse caso,
não foi a caricatura por si só, mas, sim, a todo um ideal de um ocidente imperialista,
ateu e hedonista, correlata de maneira diametralmente oposta. A caricatura
orientalista que se faz no ocidente com símbolos que estruturam a violência e
organizam a linguagem, posiciona esses sujeitos em relação a si e aos outros e,
sobretudo, condensa todo ódio em uma imagem (característica fundamental da
linguagem) (ZIZEK, 2014).
12
Isso é, atravessado pela lei do Pai.
Nome dado por Freud ao pai da horda primordial que é assassinado pelos filhos e tem um totem
erigido em sua posição simbólica.
13
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
286
A violência se faz aqui no próprio processo de simbolização. A linguagem
desenreda a coisa e na medida que o faz, a diminui, a reduz à uma perspectiva e,
forçosamente, a insere em um contexto e campo de significação que não lhe é natural
(ZIZEK, 2014). Isso é justamente o que Lacan chama de significante-mestre, ao
realizar esse processo de redução sutura-se o campo simbólico. Nesse sentido, a
comunicação não se faz de forma igual, homeostática e horizontal, mas, sim, de forma
assimétrica. Haja vista que cada espaço de discurso objetivo (real) é fundado
basicamente por um imperativo desse significante-mestre irracional. Eis a montagem
da violência simbólica (ZIZEK, 2014).
11. CONCLUSÃO
Finaliza-se não como conclusão propriamente dita, mas com o desejo de
proporcionar maior abertura para o discurso da violência contra refugiados, que, antes
de tudo, é o discurso da relação do inconsciente com o estranho. Portanto, finaliza-se
com o desejo de proporcionar abertura para falar do “unheimliche”, esse que faz parte
da nossa estrutura psíquica — o estranho que nos habita.
A violência perpetrada contra refugiados é um sintoma de uma série inextricável
de variáveis sociais, políticas e econômicas, e todas elas apontam para o mesmo lado:
o mal-estar como vivência incompleta do desejo e a morte do pai-da-horda.
No campo da violência simbólica, ela opera reduzindo os seres humanos vindos
de outro lugar; essa violência subjuga toda experiência e subjetividade do estrangeiro,
essa violência os condenando a serem apenas"refugiados”. E, ainda, lhes atribui
perspectivas externas à própria coisa, como: “refugiados são bandidos, querem roubar
nossos empregos”. Essa característica da linguagem é a sutura do campo simbólico
que organiza o nó, a qual Lacan se refere.
A violência se apresenta com múltiplas facetas, podendo desta forma, ser
analisadaatravés de diversos aportes teóricos. Quando Lacan diz que a violência
contra o outro é uma violência contra si (FERRARI, 2006), no conjunto da análise
realizada nesse artigo, é possível pensá-la como uma violência provinda de uma
relação especular com esse estranho que nos habita. A violência (subjetiva)
perpetrada contra o outro, representa uma quebra na homeostase do corpo social,
apresentado por Lacan como violência propriamente dita. É, então, um curto-circuito
na palavra, onde aparece o que não pode ser dito, o inexprimível, aquilo que não pode
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
287
ser simbolizado, como o real, ou, de outro modo, aquilo que veio à luz e deveria ter
permanecido na escuridão, recalcado, como o ‘unheimliche’.
Essa pesquisa permitiu elucidar uma pequena relação contingencial da
linguagem com fenômenos sociais tais como a violência e o mal-estar com o
crescimento exponencial em ondas migratórias. E, parafraseando Lacan em seu
célebre discurso no Hospital Saint-Anne (1972): entre o refugiado e o condomínio há
o muro! haja vista que é esse discurso que atravessa os sujeitos.
Não por acaso que Hobbes decidiu-se pelo nome “Leviatã” – criatura mitológica
que assombrava o imaginário dos marinheiros e, mesmo sem existir, controlava-os
através da coerção.
Toda a estrutura simbólica voltada para impedir a entrada de refugiados revela
uma sociedade essencialmente neurótica, que ainda não está pronta para se haver
com a sua falta, por isso, como já dito: o muro se apresenta como defesa.
Assim posto, a relevância dessa discussão para a psicologia reside justamente
aí, na possibilidade de refletir sobre o que é o estranho e sobre o lugar do outro no
psiquismo humano, e através disso, produzir novos significados.
“Assim, fica cada vez mais claro que a solução não é “derrubem os muros
e deixem todos entrar”, nos termos da exigência fácil e vazia dos liberais “radicais” de
coração mole. A única verdadeira solução é derrubarmos o verdadeiro muro – não o
do Departamento da Imigração, mas o social e econômico: transformar a sociedade
de maneira que as pessoas deixem de tentar desesperadamente fugir de seu próprio
mundo.” (ZIZEK, 2014, p.73)
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
288
REFERÊNCIAS
ACNUR. (2019). Protegendo refugiados no brasil e no mundo. Brasilia: ACNUR
Bauman, Z. (2017). Estranhos à nossa porta. Rio de Janeiro: Zahar.
BBC. (2019). O que se sabe sobre o atirador que se filmou em ataque na Nova
Zelândia. Fonte: BBC Brasil: www.bbc.com/portuguese/amp/international-47586983
Chomsky, N. (2009). Estados Fracassados: O abuso do poder e o ataque à
democracia. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
Conceito. (25 de Fevereiro de 2011). Conceito de violência. Fonte: Conceito:
conceito.de/violência
Costa, H. S. (2018). Poder e violência no pensamento de Michel Foucault. Sapere
Aude, 153-170.
Duarte, M. B. (2016). O sofrimento psíquico do sujeito em condição de
estrangeiro. Acervo Digital UFPR.
Dunker, C. I. L. (2015). Mal-estar sofrimento e sintoma: Uma psicopatologia do
brasil entre muros. São Paulo: Boitempo.
Dunker, C. I. L. (2019). O infamiliar. Em Obras incompletas de Sigmund Freud.
São Paulo: Autentica.
DW. (2018). Como a questão dos refugiados divide a UE. Fonte: DW:
https://www.dw.com/pt-br/como-a-quest%C3%A3o-dos-refugiados-divide-a-ue/a44429705 Ferrari, I. F. (2006). Agressividade e Violência. Psicologia Clinica, 49-62.
Freud, S. (1974). Além do princípio do prazer. Em Obras completas, vol. XVIII. Rio
de Janeiro: Imago.
Freud, S. (1976). O eu e o Id, uma neurose demoníaca do século XVII e outros
trabalhos. Rio de Janeiro: Imago.
Freud, S. (1919/2019). O infamiliar. Em Obras incompletas de Sigmund Freud.
São Paulo: Autentica.
Freud, S. (1919/2019). O sentido antitético das palavras. Em Obras incompletas
de Sigmund Freud. São Paulo: Autentica.
Girard, R. (1990). Violência e o Sagrado. São Paulo: Paz e Terra.
HRW. (2015). Burundi: Crackdown on Protesters. Fonte: Human Rights Watch:
https://www.hrw.org/news/2015/04/27/burundi-crackdown-protesters Human Rights
Watch.
HRW. (2019). The Alarming Rise of Anti-Semitism in Europe. Fonte: Human
Rights Watch: https://www.hrw.org/news/2019/06/04/alarming-rise-anti-semitismBraz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
289
europe Independent. (2015). Hungarian PM Viktor Orbán says 'all the terrorists are
basically migrants' in response to
Paris
attacks.
Fonte:
Independent:
https://www.independent.co.uk/news/world/europe/hungarian-pm-viktor-orb-n-saysall- the-terrorists-are-basically-migrants-in-response-to-paris-a6746356.html
Independent. (2017). French elections: Marine Le Pen vows to suspend immigration
to 'protect France'. Fonte: https://www.independent.co.uk/news/world/europe/frenchelections-latest-marine-le-pen-immigration-suspend-protect-france-borders-frontnational-fn-a7689326.html Independent. (2018). Refugees are ‘Muslim invaders’
not running for their lives, says Hungarian PM Viktor Orban. Fonte: Independent:
https://www.independent.co.uk/news/world/europe/refugees-muslim-invadershungary- viktor-orban-racism-islamophobia-eu-a8149251.html
Jackle, S., & Konig, P. D. (2018). Threatening Events and Anti-Refugee Violence: An
Empirical Analysis in the Wake of the Refugee. European Sociological Review, pp. 116.
Kreis, R. (2017). #refugeesnotwelcome: Anti-refugee discourse on Twitter. Discourse
and Communication, pp. 498–514.
Lacan, J. (1938/1985). Os complexos familiares na formação do indivíduo, ensaio de
análise de uma função em Psicologia. Rio de Janeiro: Zahar
Lacan, J. (1953/1985) O seminário, livro 1: os escritos técnicos de Freud. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar
Lacan, J. (1957/1991). Os circuitos do desejo. O seminário, livro 5: As formações do
inconsciente. Rio de Janeiro: Zahar.Lacan, J. (1956/1995) O Seminário: livro 4 – A
Relação de objeto. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Lacan, J. (1998). Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise. In Escritos.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Meruje, M., & Rosa, J. M. (2013). Sacrifício, rivalidade mimética e "bode expiatório"
em R. Girard. Griot, 151-174.
Miller, J.-A. (1991). La agresividad en psicoanálisis de Jacques Lacan. Em J.-A. e.
Miller, Agresividad y pulsion de muerte (pp. 7-22). Medelin: Fundacion Freudiana de
Medelin. Neves, T. I., Santos, A. S., & Mariz, I. A. (2017). A violência e o seu real:
Zizek e a psicanálise. Subjetividades, 45-54.
Pew Research Center. (2016). Europeans Fear Wave of Refugees Will Mean More
Terrorism, Fewer Jobs. Fonte: Global attitudes and trends:
https://www.pewresearch.org/global/2016/07/11/europeans-fear-wave-of-refugeeswill- mean-more-terrorism-fewer-jobs/
ONU. (1951). Convenção relativa ao estatuto dos refugiados. Fonte:
https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Convencao_relativa_ao
_Estatuto_dos_Refugiados.pdf
ONU. (1967). Protocolo de 1967 relativo ao estatuto dos refugiados. Fonte:
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
290
https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BD_Legal/Instrumentos_Inte
r nacionais/Protocolo_de_1967.pdf
Perine, M. (1987). Filosofia e violência: Sentido e intenção da filosofia de Eric Weil.
São Paulo: Loyola.
Priberam. (s.d.). Priberam Dicionário. Fonte: https://dicionario.priberam.org/
Público. (2015). Parlamento húngaro aprova construção do muro para travar
imigrantes. Fonte: Publico: www.publico.pt/2017/07/08/mundo/noticia/parlamentohúngaro-aprova- construção-do-muro-para-travar-imigrantes-1701393
Safatle, V. (2015). O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do
indivíduo. São Paulo: Cosac Naify.
Safatle, V. (2016). Refugiados que devem ser educados. Folha de SP.
Teixeira, L. C. (2002). Função paterna, fratria e violência: sobre a constituição do
socius na psicanálise freudiana. Psico-USF, 195-200.
Weber, M. (1991). Economia e Sociedade. Brasilia: UNB.
World Health Organization. (2002). World report on violence and health. Geneva:
World Health Organization.
Zimmer, C. (2017). In Neanderthal DNA, Signs of a Mysterious Human Migration.
New York Times.
Zizek, S. (2014). Violência. São Paulo: Boitempo.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.6, p.61380-61397 jun. 2021 ISSN: 2525-8761
291
CAPÍTULO 16
UMA REVERBERAÇÃO DO IDEÁRIO BRITÂNICO NO BRASIL: O GREEN-BELT DE
MARINGÁ E O GREEN-WEDGE DE CIANORTE
Layane Alves Nunes
Doutora, docente na Universidade Estadual de Maringá (UEM)
Endereço: Rua Inhaúma, 731, apto 601, zona 03, Maringá, Paraná, CEP: 87050-170
E-mail: layanenunes.arq@gmail.com
Igor José Botelho Valques
Doutor, docente na Universidade Estadual de Maringá (UEM)
Endereço: Rua Rio Ganges n70, Jardim Novo Oásis, CEP: 87043-596
E-mail: ijbvalques@uem.br
Giovani Lemos Damasio
Graduado pela Universidade Estadual de Maringá (UEM)
Endereço: Rua Pelicano, 155, jardim olimpico, Cep 87070-340
E-mail: gd4masio@gmail.com
André Luis Pagnussat
Graduado pela Universidade Estadual de Maringá (UEM)
Endereço: Rua Alagoas, 1284, apto 120, Centro, Londrina, CEP: 86020-430
E-mail: andrezitopagnussat@gmail.com
RESUMO: Esta pesquisa investigou o desenho e a implantação de Green-Belts nas
cidades de Maringá e Cianorte, onde observar-se a reverberação do planejamento
britânico e do ideário de Cidade-Jardim no Norte do Estado do Paraná, em meados
do século XX, aplicado por meio do Plano de Colonização executado pela Companhia
de Terras Norte do Paraná. Sob a análise dos planos urbanísticos desenvolvidos por
Jorge de Macedo Vieira para estas cidades e do processo inicial de implantação das
mesmas, verificou-se que em Maringá houve a tentativa de implantação de um
cinturão verde no formato de um anel de pequenas propriedades rurais, enquanto em
Cianorte a ideia foi implantada com a preservação de um cinturão de mata nativa que
circunda adentra o espaço urbano, identificado como um Green-Wedge.
PALAVRAS-CHAVE: Green-Belt; Cidade-Jardim; Maringá; Cianorte; Planejamento
Urbano.
ABSTRACT: This research investigated the design and the implementation of
greenbelts in the cities of Maringá and Cianorte, where the reverberation of British
planning and the ideals of the Garden City took place in the middle of the mid-twentieth
century through the Colonization Plan for the north of the State of Paraná, executed
by the Companhia de Terras Norte of Paraná. From the analysis of the urban plans
designed by Jorge de Macedo Vieira for these two cities and its early process of
implementation, it appears that in Maringá there was an attempt to realize a greenbelt
in the form of a ring of small agricultural farms, whereas in Cianorte the idea was
implanted through the preservation of a belt of native vegetation that encircles and
enters the urban space, identified as a green wedge.
KEYWORDS: Greenbelt; Garden City; Maringá; Cianorte; Urban planning.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
292
1. INTRODUÇÃO
Esta investigação responde questões referentes à identificação da aplicação
do elemento Green-Belt – cinturão verde - na colonização planejada do norte do
estado do Paraná, ocorrida entre 1930 e 1960, em especial a discussão se pauta nas
cidades de Maringá (1945) e Cianorte (1955). O estudo se fundamenta em dois vieses:
o primeiro um panorama do desenvolvimento (evolução e adaptação) do ideário do
Green-Belt, e por uma análise comprobatória da aplicação deste elemento no
processo de ocupação da região e nas cidades citadas, tidas como estudos de caso.
Compreendido como uma ferramenta de planejamento urbano, o Green-Belt –
parcela de terra não urbanizável que margeia um núcleo urbano – foi aplicado em
diversas cidades pelo mundo, durante a evolução das teorias do urbanismo, atuando
como elemento-chave em propostas de reorganização e contenção de um território.
As aplicações, em especial as britânicas, produziram um legado de planejamento
tanto urbano como regional, tido como referência a partir da década de 1930 no
processo de colonização de parte da região norte do Estado do Paraná, Brasil,
empreendido por uma empresa privada de capital britânico (em sua fase inicial). O
também denominado cinturão verde no Paraná é tema desta pesquisa uma vez que
verificamos referências a este termo nos documentos que descreveram, ilustraram e
registraram a colonização do território dirigida pela Companhia de Terras Norte do
Paraná (CTNP). Durante a análise da representação gráfica dos diversos mapas,
produzidos pela empresa sobre a região, identificamos o elemento em questão
aplicado com diferentes abordagens, assim pudermos concluir que houve
contraposições comerciais e intencionais no decorrer do processo de planejamento e
ocupação do território (NUNES, 2016).
Os casos de Maringá e Cianorte são consideramos, por nós, exemplos
emblemáticos, devido à escala e relevância das cidades dentro da rede urbana
implantada no território mencionado. Estas cidades também retratam a fase de
transferência do capital britânico da Companhia para o grupo nacional em 1944 e,
ainda apresentam diferentes formas de aplicações do ideário britânico. A base desta
pesquisa está posta sobre a análise documental de mapas da empresa colonizadora
e sobre publicações que tratam do tema da colonização do território em questão e dos
princípios do Green-Belt.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
293
2. A ORIGEM DO GREEN-BELT
No final do século XVIII, em plena Revolução Industrial, a questão habitacional
era o problema enfrentado pelas grandes cidades. O excessivo contingente
populacional, vindo da zona rural atraído pela oportunidade de emprego na indústria,
fez com que os grandes centros urbanos se transformassem em áreas de densa
ocupação do solo, com péssimas condições sanitárias e baixos indicadores sociais.
Nesse contexto, a expansão urbana foi tida como um problema, pois a medida que a
área urbanizada crescia, em grandes dimensões e sem controle, ia perdendo a
definição de seus limites e forma, e avançava sobre áreas agricultáveis (HALL, 2010).
Frente a essa questão, alguns ideários urbanísticos surgem com o intuito de planejar
a expansão dos assentamentos urbanos, como a Cidade-Linear de Soria y Mata, que
propunha estimular o crescimento contínuo de uma cidade que se desenvolveria ao
longo e as margens de um eixo de transporte de massa (ferroviário); e a Cidade-jardim
de Ebenezer Howard, que visava a descentralização da metrópole a partir da criação
de uma rede de cidades independentes, de população e dimensões limitadas,
separadas fisicamente por um Green-Belt e conectadas entre si pelo transporte de
massa (também ferroviário) (CALABI, 2012). Ambos os conceitos discutem
alternativas morfológicas de expandir a urbe, porém apenas o modelo de CidadeJardim propôs limitar o tecido urbano.
Registros históricos apontam como exemplo pioneiro do uso de Green-Belts o
plano para a cidade de Adelaide, na Austrália, planejada pelo Coronel William Light,
em 1837. Porém, foi a partir das ideias de Howard que este elemento ganhou
destaque, pois ele foi o primeiro a propor seu uso como ferramenta de planejamento
urbano e regional. No livro “Garden Cities of Tomorrow” (1902), Howard idealiza a
criação de uma cidade como uma comunidade cooperativa autônoma, de tamanho
limitado para 32.000 habitantes e área de 6.000 acres (2.400 hectares). Sua forma
seria organizada de modo concêntrico, com espaços livres, parques e bulevares
radiais; a área urbana teria 1000 acres (400 hectares) e o Green-Belt, reservado para
a agricultura e reservas naturais, 5000 acres (2.000 hectares), ou seja, a proporção
indicada era de cinco vezes a área urbanizada. O espaço verde teria a função de
conter a área urbanizável, evitando a conurbação com os núcleos adjacentes, dentro
desta área poderiam ser implantados espaços públicos e equipamentos. Quando o
número de habitantes fosse atingido, uma nova cidade seria criada. Assim, Howard
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
294
imaginou uma rede radial de Cidades-Jardim dispostas como satélites de uma cidade
central de 58.000 pessoas, ligadas por rodovias e ferrovias. Essa concepção refletiuse como um novo modelo adaptado de urbanização na Grã-Bretanha, aproximando
da cidade a qualidade de vida proporcionada pelo ambiente natural e campestre
(figura 1) (CALABI, 2012).
Figura 1 – Rede radial de Cidades-Jardim (esquerda) e diagrama dos núcleos urbanos
demonstrando a delimitação da área urbana e da área rural (direita).
Fonte: HOWARD, 1902; HALL, 2010; adaptado pelos autores.
Duas Cidades-Jardim foram implantadas seguindo os preceitos estabelecidos
por Howard: Letchworth, projeto de Raymond Unwin e Barry Parker, fundada em 1904;
e Welwyn, de Louis de Soissons, fundada em 1920. As cidades possuem tamanho
limitado por um Green-Belts, onde os espaços de moradia, trabalho e lazer são
entremeados por uma vasta área verde (jardins, parques e praças), num traçado
urbano orgânico e interligadas à Londres, por linhas de transporte ferroviário de massa
(HALL, 2010). Os dois exemplos, apesar de não seguirem todas as diretrizes de
Howard, possuem o Green- Belt como uma interface entre o campo e a cidade,
impedindo o avanço da expansão urbana sobre a área rural e assegurando a produção
agrícola, para que desse suporte à vida urbana, como também demonstra o Greater
London Plan (figura 2).
O modelo original de Cidade-Jardim não foi replicado, devido aos empecilhos
de sua administração de modo cooperativo (HALL, 2002), já o elemento Green-Belt
foi adotado como estratégia de planejamento urbano em outras ocasiões. O caso de
maior sucesso e repercussão internacional foi o Greater London Plan, proposto por
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
295
Sir Patrick Abercrombie, em 1944, após diversos estudos e planos desenvolvidos
desde o fim da Primeira Guerra Mundial. O plano tinha em sua morfologia um GreenBelt, de escala regional, como partido para a reorganização espacial da metrópole.
Este se estrutura a partir de esquemas conceituais elaborados por Raymond Unwin
em 1929 e 1933 (Figura 3), que sintetizaram as propostas anteriores de parkways e
cinturões mais modestos inicialmente, e propôs um modelo de descentralização de
Londres a partir da criação de novas cidades, inseridas em um cinturão de grandes
dimensões (THOMAS, 1963).
Figura 2 – Anéis verdes e agrícolas de contenção (áreas listradas) propostos no Greater London Plan
Fonte: THOMAS, 1963; adaptado pelos autores.
Figura 3 – Evolução da ideia de implantação de áreas verdes para conter a mancha urbana de
Londres.
Fonte: THOMAS, 1963; adaptado pelos autores.
Em complementação ao sistema Green-Belt, Sir Abercrombie descreveu seu
plano de 1943-1944 como um sistema de parques para Londres, onde todas as formas
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
296
que compõe os espaços abertos são entendidas como um todo e conectadas por um
“sistema de parques”, com vias existentes e novas “formando os elos entre os parques
maiores” (Turner, 1992: 367). Com a concepção desse sistema de parques torna-se
possível para o morador se deslocar da sua casa pela cidade por “um fluxo fácil de
espaço aberto de jardim para parque, de parque para via pública, de passagem para
a cunha verde e da cunha verde para o cinturão verde” (Turner, 1992: 367, 368). Além
do formato perimetral, o elemento pode irradiar suas áreas verdes, de modo linear,
para o interior do tecido urbano, tomando a morfologia apontada de cunha verde,
denominada de Green Wedge. Esta é uma forma de aplicar espaços verdes
incrustados nos tecidos urbanos (figura 4), que segue preconizando a ligação entre o
campo e acidade. A diferença é que a área verde periférica se amplia na forma de
caminhos verdes, que conduzem o crescimento da urbe, adaptados as características
naturais do terreno, como vales, bosques riachos e pedreiras, inseridos na malha
urbana, se ramificando das áreas centrais para a periferia (HARLOW, 2014).
Figura 4 – Espaços verdes incrustados no tecido urbano em Londres
Fonte: FORSHAW e ABERCROMBIE, 1944 apud LUCCHESE, 2012.
Por fim, o plano de Abercrombie organizou o território londrino em quatro anéis
concêntricos: a zona mais interna e existente continha a área urbana de alta
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
297
densidade (185-250 hab./ha); o segundo anel, os distritos residenciais de média
densidade (125 hab./ha); no terceiro anel seria implantado o grande Green-Belt, como
uma zona amortecedora entre a expansão espraiada de Londres (congelando-a) e o
quarto anel; o anel mais externo, local reservado exclusivamente à produção agrícola
e implantação das New Towns - novas cidades industriais independentes. Oito
cidades foram implantadas, e nos primeiros vinte anos aproximadamente 320.000
londrinos mudaram-se para esses novos núcleos urbanos (THOMAS, 1963). Depois
desse plano, a implantação de cinturões verdes se espalhou pela Grã-Bretanha, em
consequência disso atualmente 13% do território do país é ocupado por Green-Belts
(1.634.700 hectares). Assim, como nas cidades de Cambridge e Oxford1.
O Greater London Plan foi tomado como exemplo de planejamento britânico e
foi referência para propostas de reestruturação regional espalhadas pelo mundo,
onde aliou o conceito inglês aos contextos urbanos locais, como exemplo há o caso
do Green-Belt de Ottawa, planejado entre 1945 e 1950 (AMATI, 2008). Na
contemporaneidade, Hack (2012) insere o elemento Green-Belt nas discussões
voltadas à sustentabilidade, uma vez que a partir dele podem ser criados espaços que
visam a proteção, manutenção ou criação de reservas florestais que margeiam o
perímetro urbano, como é observado nas metrópoles de Toronto (2005) e São Paulo
(1994). O autor defende a aplicação da ideia como um limite para a urbanização, com
a intenção de promover o adensamento dos centros urbanos, em especial os norteamericanos, evitando o modelo de crescimento urbano espraiado comum no país, e
assim proporcionar a compactação das cidades. Neste sentido, os cinturões verdes
ganharam novo papel no território, aliando o planejamento urbano e regional ao
ambiental.
No Brasil, a matriz inglesa citada teve sua reverberação. No norte do estado do
Paraná identificamos a aplicação deste conceito na configuração do território onde, a
partir de um Plano Geral de Colonização, a Companhia de Terras Norte do Paraná
(CTNP) idealizou a implantação de uma rede linear de cidades interligadas por um
eixo de transporte ferroviário e rodeadas por cinturões verdes.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
298
3. O PLANO GERAL DE COLONIZAÇÃO DA CTNP: REFERÊNCIAS INGLESAS
NO TERRITÓRIO BRASILEIRO
Em 1925 a empresa britânica Parana Plantations, por meio da subsidiária
brasileira Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP), adquiriu do governo estadual
pouco mais de 1.320 hectares de terras (ditas) devolutas localizadas no Paraná, sul
do Brasil, para colonização e comércio de terras. A empreitada de viés comercial
foi estruturada e apoiada em um Plano Geral de Colonização, que previu diretrizes
para o parcelamento da gleba em lotes rurais, direcionados à produção de café e a
criação de uma rede de cidades (CMNP, 1975). Neste plano verificamos forte
influência inglesa de planejamento urbano, incluindo o uso do cinturão verde (NUNES
et al., 2018). Ainda, o Plano Geral organizou o território com base na estrutura
topográfica da região e na distribuição da população no território, a aplicação de
cinturões relaciona-se à ambas (NUNES, 2016). A topografia foi o guia do arranjo
físico-territorial, direcionando as estruturas e demarcações antrópicas, desde a
localização do sistema de circulação, o posicionamento dos núcleos urbanos e a
configuração dos lotes rurais. A estrada de ferro compreendida como eixo estruturador
do território, foi locada na linha de festo (cumeada principal) da gleba e as estradas
de rodagens nas cumeadas secundárias, estas também demarcavam o acesso às
propriedades rurais (pela parte mais alta) e os cursos d’água, localizados nas cotas
mais baixas, determinava o comprimento dos lotes. Assim, as propriedades teriam
acesso rápido ao escoamento da produção e à água. Os núcleos urbanos seriam
implantados nos platôs do terreno, distantes entre 10 e 15 quilômetros uns dos outros;
e funcionariam como centros autônomos de apoio à população da região (CMNP,
1975).
O modelo morfológico do Green-Belt apresentou-se inserido na descrição da
formação esquemática do parcelamento rural, que previa o gradual aumento da
dimensão dos lotes agricultáveis e o decaimento da densidade populacional,
conforme o distanciamento da cidade. Esse arranjo de esmaecimento da
concentração populacional definiu os núcleos urbanos como ponto de partida para a
organização territorial, esquematizado numa analogia ao desenvolvido no Greater
London Plan. Ao redor das cidades estariam os cinturões verdes, configurados como
uma “faixa de terra parcelada em chácaras”, propriedades de 2,42 a 12,1 hectares; na
sequência estariam dispostas as propriedades de média dimensão; e raros seriam os
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
299
grandes lotes, as fazendas, que estariam distantes das áreas urbanizadas (CMNP,
1975, p. 79). A dimensão desses "anéis" variava de acordo com o relevo (NUNES,
2016).
Sobre sua função, os documentos da CTNP descrevem que os cinturões
verdes seriam destinados à produção de alimentos (hortifrutigranjeiros) para abastecer
as cidades (CMNP, 1975), que remete à uma das funções descritas por Howard.
Yonegura (2010) reconhece que também há a premissa do pensamento ecológico na
delimitação dos cinturões, cuja finalidade era de proteger as nascentes localizadas
nas proximidades dos núcleos urbanos. Segundo Nunes (2016), os cinturões não
tinham a função de limitar o crescimento das urbes, pois interessava à Companhia a
expansão subsequente das malhas e não seu contingenciamento. O esquema do
parcelamento é representado graficamente em uma Planta Parcial do território da
empresa, onde observamos no recorte, as cidades de Londrina e Nova Dantzig
(Cambé) (figura 5), com a área destinada ao cinturão de chácaras contornando
morfologicamente as malhas urbanas, ao mesmo tempo que incorporam as nascentes
adjacentes aos planos urbanos.
Figura 5 – Planos de Londrina e Cambé e seus Green-Belts, respectivamente.
Fonte: YONEGURA, 2010.
A direção britânica da empresa perdurou de 1929 a 1944. Nesse período, não
houve grande distinção entre a lógica apresentada no Plano Geral de Colonização e
a implantação. Após 1944, a Companhia passou a ser dirigida por um grupo brasileiro,
que alterou algumas diretrizes da colonização. O empreendimento focado inicialmente
no parcelamento rural, direcionou seus investimentos para a produção de cidades,
inclusive alterou a nominação da empresa para Companhia Melhoramentos Norte
do Paraná (CMNP), que perdura até os dias atuais. Assim, a hierarquia entre os
núcleos urbanos foi estabelecida, dentro desta quatro “metrópoles” foram idealizadas
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
300
como as maiores cidades implantadas, distanciadas em aproximadamente 100
quilômetros entre si, planejadas para receber mais de 100.000 habitantes. Nessa fase,
três foram implantadas: Maringá, Cianorte e Umuarama, e Londrina, já existente. Pela
primeira vez, no contexto imobiliário, o plano das cidades não foi projetado pelo
próprio escritório técnico da colonizadora, o urbanista Jorge de Macedo Vieira foi
contratado para planejar Maringá (1945) e Cianorte (1955); Umuarama (1956) foi
planejada pelo engenheiro e topógrafo da Companhia Wladimir Babkov (NUNES,
2016).
4. OS PLANOS DE MARINGÁ E CIANORTE: APROXIMAÇÕES
Maringá e Cianorte são cidades que se destacam na rede urbana norte
paranaense pelas dimensões de seus planos e, principalmente, pela identidade
urbanística impressa no traçado urbano. Quando convidado pela Companhia para
planejar as cidades Vieira já havia desenvolvido diversos projetos com referências e
aplicação do ideário inglês de Cidade-Jardim. Autores associam a aplicação desse
conhecimento devido ao fato de ele ter sido estagiário na Companhia City, junto a
Barry Parker, em São Paulo. Fato que também propiciou sua participação no projeto
de Bairros Jardins, entre outras cidades balneários, no estado de São Paulo (SILVA;
BERLINI, 2016). Para a Companhia Vieira elaborou desenhos urbanos mais
complexos e completos se comparado aos planejados pelo escritório técnico da
empresa até então, marcando na nova fase os interesses comerciais e publicitários
da empresa (NUNES, 2016).
O plano para Maringá (figura 6) foi concebido em meados da década de 1940 e
o de Cianorte em meados da década de 1950, ambos com forma urbana e traçado
que possuem aspectos oriundos do City Beautiful e do Garden City Movement,
incluindo fortes referências ao desenho proposto para Letchworth e Welwyn. Os
traçados propostos pelo urbanista apresentam aspectos comuns, como: eixos
monumentais e largas avenidas; adaptação das estruturas urbanas ao meio natural
(traçado viário adaptado à topografia, reticulado e/ou orgânico); reservas de áreas
verdes protegendo os fundos de vale; espaços livres com a função de sociabilização
em pontos distribuídos no interior dos bairros; a hierarquização dos espaços urbanos
e a divisão da cidade em zonas, onde enfatiza-se a zona central que se difere das
zonas residenciais; e locais para a aplicação da arborização e ajardinamento que são
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
301
elementos importantes da composição da paisagem das cidades e sustentaram parte
da estratégia comercial da Companhia (REGO, 2001).
Figura 6 – Desenho do Plano Inicial para Maringá de Jorge de Macedo Vieira em meados 1940
Fonte: Acervo Museu da Bacia do Paraná.
O plano para Maringá contabilizava 1.583,65 hectares, prevendo uma
densidade média de 38 habitantes por hectare. A cidade foi planejada para acolher
50.000 habitantes inicialmente, e havia a estimativa de em 50 anos abrigar até
200.000 pessoas dentro dos limites do plano (MENEGUETTI, 2007). Para Cianorte
uma área de 1.864,60 hectares foi destinada ao perímetro urbano, sendo que 1.497,35
hectares era de área urbanizada. Diferentemente de Maringá, Cianorte não teve seu
plano executado por completo, durante a implantação a área urbana foi reduzida para
964,892 hectares (NUNES et. al, 2018).
A presença de grandes bolsões de mata nativa inseridas no tecido urbano é
uma característica marcante dos planos. Para Cianorte, conforme observamos na
figura 7, as abundantes áreas florestadas foram delimitadas contornando parte da
área planejada, indicando a formação de uma anel verde, composto de áreas
florestada, que se estende por “caminhos” lineares para o interior da malha
urbanizada, protegendo os fundos de vale, configurando-se como cunhas verdes ou
Green-Wedges, e seccionando parte da malha urbana, no setor norte. Já no plano
para Maringá, a representação gráfica de Vieira não apresentou nenhum elemento que
configure a formação de um cinturão de chácaras nos limites da área planejada, as
áreas arborizados desenhadas estão isoladas no interior da malha, configurando-se
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
302
como parques que protegem as nascentes, conforme podemos observar na figura 6
(NUNES et al., 2018).
Figura 7 – Anteprojeto do plano urbanístico para a cidade de Cianorte, Jorge de Macedo Vieira, 1955
Fonte: CMPN, 1955; apud NUNES, 2016.
De acordo com Nunes (2016) não há documentos que comprovem a existência
de planos para ordenar o crescimento de Maringá, nem elementos no seu plano
urbano que demostrem a preocupação de controle ou manutenção da dimensão
planejada. Já em Cianorte o contorno de mata virgem é compreendido como um limite
morfológico à malha planejada, por isso entendemos que houve uma intenção da
Companhia, desde o plano, de manter a dimensão urbana proposta ou não executar
toda a malha, como ocorreu (NUNES et al., 2018).
5. OS GREEN-BELTS DE MARINGÁ E GREEN-WEDGE DE CIANORTE:
CONTRAPOSIÇÕES
A semelhança entre os Green-Belts idealizados pela Companhia para o norte
paranaense e a ideia primária proposta por Howard na Inglaterra é evidente, mas
quando trata-se do que de fato foi materializado, esta compreensão se altera. Em
Maringá, conforme Nunes (2016), apesar de não estar representado no plano de
Vieira houve o planejamento, de iniciativa da CNTP, de implantar uma área de
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
303
chácaras margeando e circulando os limites urbanos, esta está representada em um
dos mapas do parcelameno rural (figura 8). Já no plano para Cianorte é na peça
gráfica de Vieira (figura 7) que se observa claramente na morfologia do desenho
urbano a presença de um elemento, composto de mata nativa, circundando grande
parte do perímetro urbano e este adentra ao tecido urbano, protegendo os fundos de
vale e provendo uma ruptura com parte da malha urbanizada, se aproximando do
formato e do ideiao de Green-wedges. Nos dois casos, a área nos limites do plano –
seja de mata ou de chácaras - tinha o mesmo objetivo declarado: proteger as
nascentes no entorno da urbe e as inseridas no interior dos tecidos urbanos
(YONEGURA, 2010). Em ambos os casos, o cinturão não circundou totalmente a área
planejada, porém o rodeou na maior parte.
5.1 O green-belt de maringá: a ideia não materializada do cinturão de chácaras
Em Maringá, a Planta Parcial de Parcelamento Rural da Companhia (figura 8)
comprova a demarcação da intenção de se implantar o cinturão, composto por
"chácaras", envolvendo o plano de Vieira. Esse mapa é compreendido como uma
complementação ao plano (figura 6), pois define os limites da área planejada, suas
conexões (meios de circulação) com o meio rural, seguindo as diretrizes do Plano Geral
de Colonização. Nota- se que a maior parte do parcelamento rural localizado nas
margens do plano era composto de pequenas propriedades, com exceção do setor
norte, onde há a representação de lotes rurais de tamanho médio e grande, há
também a definição do local de implantação do primeiro aeroporto da cidade, à leste,
também rodeado por pequenos lotes rurais. É importante destacar que enquanto o
setor sul, de topografia mais íngreme, foi dividido em pequenos lotes; o setor norte,
de superfície plana, apresenta apenas a demarcação da área reservada ao cinturão
de chácaras, sem indicar a forma deste parcelamento rural. A porcetagem da área
demarcada para o cinturão de chácaras representava aproximadamente uma relação
de ¼ da superfície planejada.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
304
Figura 8 – Parte da planta territorial da CTNP, recorte com Maringá e o seu o Green-Belt de chácaras
Fonte: CTNP, s/d; apud NUNES, 2016.
5.2 O green-wedge de cianorte: a ramificação do cinturão para o interior do tecido
urbano
Em Cianorte, ao invés de chácaras delimitando o entorno da malha urbana
como indicava o Plano Geral de Colonização, são representadas por Vieira, no plano,
grandes áreas recobertas por vegetação nativa, as quais margeiam os cursos d’água
presentes no interior da malha urbana e se ramificam para os limites da área
planejada, localizadas sobretudo nos setores norte e sul. Esses fragmentos não
circundam a cidade, mas adentram na malha planejada, formando cunhas verdes ou
Green-Wedges, protegendo os fundos de vale e promovendo a ruptura presente no
tecido no setor norte (figura 7). A princípio não há indicativos de que essa área
verde seria um elemento limitante do crescimento urbano, uma vez que Vieira
desenha porções de malha urbana além da áreas verdes - as quais não foram
implantadas posteriormente – e assim como em Maringá desenha prolongamentos
viários com o espaço rural.
Ao considerarmos o Plano de Vieira para Cianorte e cruzarmos as informações
expostas por Dias (1998), verificamos que a relação da malha planejada com os
espaços verdes é de aproximadamente 0,385 hectares, ou seja, a malha urbana é 3,67
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
305
vezes maior. Essa proporção não se manteve na prática, pois a área planejada
implantada foi reduzida. Atualmente, as medições realizadas por imagens de satélite
revelam que a malha urbanizada da cidade possui uma área de 1,8 vezes maior que
as áreas verdes existentes, ou seja, metade do planejado é o que foi preservado
(NUNES et al., 2018).
5.3 A expansão urbana e a desconfiguração do planejado
Em ambas as cidades, as áreas contidas no “cinturão” eram de posse da
Companhia, e por isso teriam a função e o destino que a empresa e seus dirigentes
desejassem, podendo inclusive ser reserva de área para a especulação imobiliária ou
ainda atuar como um elemento de contenção das dimensões urbanas. Nas duas
intenções mencionadas, os espaços verdes planejados assumiram diferentes papéis
concomitante ao início do processo de implantação das cidades.
Em Cianorte, a área verde foi e é preservada até os dias de hoje como mata
nativa, seguindo em parte o planejado por Vieira. A manutenção destas áreas
vegetadas está ligada à política de controle do território promovida pela Companhia,
que em Cianorte contribuiu para a manutenção das dimensões da urbe, dentro
dos limites do plano (SOUZA, 2015; DIAS, 1998). Dalberto (2009) aponta que o baixo
ritmo de crescimento da urbe, no período inicial após a implantação do plano, contribiu
para o baixo índide de crescimento da cidade, resultando na conservanção das
características formais da cidade por décadas. A autora ressalta que a redução da
implantação da área planejada decorreu do fato de que a época de execução da
cidade coincidiu com a última década de expansão cafeeira, cujo declínio econômico
ocorreu a partir de 1960. Em consequência disso, além da redução da área construída,
a cidade não registrou grande ritmo de crescimento nos anos seguintes, retomando
seu processo de expansão na década de 1980 (entre 1986 e 1989 a cidade expandiu
cerca de 5,6 ha). A década de 1990 apresentou um déficit de lotes urbanos ocasionado
pelo incremento populacional, isso alavancou a implantação de novos loteamentos,
resultando na ocupação de áreas fora dos limites do plano, mas não
descaracterizando as áreas verdes.
Em Maringá esse contexto foi diferente, as áreas reservadas para as chácaras
- imediatamente localizadas no entorno do plano - não foram implantadas, em sua
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
306
maioria, rapidamente se tornaram áreas ocupadas pela expansão urbana. Isso se
definiu quando a Companhia as loteou e as infraestruturou com redes urbanas, ao
mesmo tempo que implantava a área planejada por Vieira. Com a prerrogativa
publicitária de urbanizar as áreas próximas ao aeroporto e junto da linha férrea, além
disso o que não foi divulgado é que esses loteamentos, localizados fora do plano no
setor norte, seguiam em direção aos grandes lotes de propriedade dos funcionários
diretores da empresa, locados imediatamente anexos à demarcação das chácaras,
desta forma não foi por acaso que grande parte do cinturão de chácaras de Maringá
se materializou como área urbanizada, sendo estas as primeiras áreas alvo da
especulaçao imobiliária. A partir de então novas expansões foram concretizadas, pela
própria Companhia e por seus funcionários, posteriormente por terceiros em áreas
desconecatadas dos limites do plano. No setor sul, parte da área de chácaras foi
implantada, existindo remanescentes na borda da Zona 08 até hoje (setor sudeste).
Em 1963, a cidade tinha 78% do plano implantado e a grande maioria das áreas
idealizadas como chácaras estavam parceladas como áreas urbanas (NUNES, 2016).
Em Maringá, a Companhia e seus principais funcionários foram os agentes
responsáveis pela maior porcentagem de expansão da cidade nas décadas de 1950 e
1960. Acredita-se que estas expansões promovidas pela Companhia abriram “as
portas” para novos empreendimentos, irradiados a partir do plano, alterando a forma
urbana proposta para a urbe e provocando um crescimento inicialmente contínuo. As
décadas de 1960 e de 1970 foram marcadas pelo grande fluxo populacional da zona
rural para a urbana e, decorrente disso, foi o momento da maior expansão urbana
registrada até hoje, promovendo um crescimento contínuo concentrado no setor norte.
(NUNES, 2016).
A partir do exposto acima, entendemos que enquanto em Cianorte a
Companhia prezou pelo monopólio da comercialização dos lotes urbanos, em Maringá
a empresa agiu em sintonia com os interesses do setor imobiliário, representado por
seus funcionários, que obtiveram vantagens na aquisição das terras rurais e loteá-las
e comercializá-las ao mesmo tempo que a empresa, uma vez que ali havia demanda.
5.4 Um panorama atual
Maringá contabiliza hoje mais de 410.000 habitantes, distribuídos em uma área
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
307
urbanizada de 12.826 hectares, que representa mais de trinta vezes a área planejada
por Vieira. Seu cinturão, por consequência da rápida expansão, foi o primeiro alvo da
urbanização e, dessa forma, a maior parte dele, sobretudo no setor norte, nunca se
tornou área rural de fato. Entendemos que o cinturão proposto em nenhum momento
delimitou ou caracterizou as bordas da malha planejada. Isso afirma o que Nunes
(2016) concluiu: a área delimitada como chácaras em Maringá foi alvo da especulação
imobiliária comandada pela CTNP. Dos poucos remanescentes do cinturão, pode-se
observar alguns lotes de chácaras no setor sul, preservados devido à topografia
íngreme.
Cianorte atualmente possui cerca de 80.000 habitantes, e segue com as
carcaterísticas formais de suas áreas verdes planejadas até hoje. A partir do ano de
2000, a área foi protegida por meio da Lei Municipal n° 2067, que estabeleceu a
criação do Parque Municipal Cinturão Verde, propiciando a criação da principal área
de lazer e recreação da cidade. Apesar das tentativas de preservação, o cinturão
sofreu perdas territoriais decorrente do avanço da expansão urbana, que seguiu
principalmente no sentido noroeste (DALBERTO, 2009). A expansão ocorrida ocupou
áreas fora da área de mata preservada, e produziu uma forma urbana marcada por
limites transpostos, ou seja, uma ruptura entre porções do tecido urbano. Com isso, a
área verde não mais delimita a cidade como outrora, mas o Grren-Wedge segue
demarcado na forma urbana, pois corredores verdes situam-se parcialmente dentro
da mancha urbana, atuando como um obstáculo ao crescimento urbano contínuo,
fenômeno visto sobretudo na região norte da cidade. Dessa forma, pode-se afirmar
que a manutenção do green-wedge contribuiu para a contenção do crescimento de
Cianorte por décadas, além de propiciar a reserva de áreas verdes (NUNES et al.,
2018).
Sabe-se que o Green-belt e o Green-Wedge são heranças inglesas nas áreas
do planejamento urbano, presentes no plano citado de Abercrombie, atualmente
defende-se o Green-Wedge como a evolução do Green-belt, pois, o mesmo é
considerado mais permeável, fato que facilita a ordenação do crescimento das
cidades. Lembramos que o elemento verde desenhado na forma de “Cunha Verde” é
entendido como espaços livres verdes lineares que atravessam o tecido urbano desde
as áreas centrais até as periféricas. Sua aplicação no planejamento contemporâneo
é de potencial contribuição para o pensamento que discute cidades mais sustentáveis
e resilientes (OLIVEIRA, 2017).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
308
O que vemos no norte paranaense é que em ambas as cidades desta
investigação os dois elementos estavam presentes, mas não ordenaram o crescimento
das urbes, e hoje não existe a possibilidade de retomar a marcação dos limites iniciais
planejados sem haver intervenções drásticas no tecido urbano consolidado.
6. CONSIDERAÇÕES
As duas cidades, apesar de terem sido planejadas pelo mesmo urbanista,
compartilharem as mesmas características de desenho urbano e fazerem parte de um
mesmo processo de colonização, não apresentam o mesmo resultado para seus
cinturões verdes, seja na concepção ou no destino que cada um teve. O que se
comprova são duas situações análogas. As ações de controle da Companhia sobre o
território se baseavam na demanda por novos loteamentos, fator que impediu que em
Maringá qualquer iniciativa de consolidação do seu cinturão fosse realizada, o que
houve foi a rápida desconfiguração da proposta, como um boicote do plano efetivado
pela própria empresa. Assim, não é por acaso que autores relatam a não existência
de um cinturão de chácaras na cidade, e o desconhecimento do tema pelos seus
habitantes, demonstrando que esse elemento tornou- se uma mera fração da história
da cidade.
Em Cianorte, ocorreu o oposto, tanto na forma proposta quanto no destino
destas áreas. Pois, além de implantado o cinturão se mantém por décadas
preservado, devido a baixa dinâmica imobiliária do empreendimento na época,
resultando na manutenção da forma das bordas do plano, não avançando sob a área
reservada ao cinturão. O fato de o cinturão de Cianorte ser composto por mata nativa
pode ter sido um fator determinante para sua preservação posterior, uma vez que, de
todos os cinturões implantados no território da Companhia, esse é o único não
composto por chácaras e o único que se mantêm até hoje, como reserva florestal sob
a forma de parque urbano. Os demais, na sua grande maioria, tiveram o mesmo
destino do de Maringá, se tornaram área urbanizada, restando poucos vestígios de
sua presença, descaracterizando o planejamento regional proposto nos dias de hoje.
Nesse sentido, enfatiza-se que o conhecimento histórico do planejamento
urbano é peça fundamental para o entendimento do processo de expansão urbana e
fator preponderante para a contínua busca de melhores alternativas formais para
orientar o crescimento do território citadino. Nesta pesquisa visamos contribuir com
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
309
discussões e possibilidades de harmonia entre desenvolvimento urbano e
planejamento sustentável, mostrando que é importante refletir em como as cidades
irão lidar com os remanescentes ambientais, e quais podem ser as implicações de
suas decisões na forma urbana gerada no futuro. Assim, mostramos também que é
premente e de extrema relevância fomentar novas pesquisas e auxiliar o arcabouço
teórico para as decisões dos gestores urbanos no momento atual em que se discute
a necessidades das cidades se reinventarem.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
310
REFERÊNCIAS
AMATI, Marco. Urban greenbelts in the twenty-first century. Aldershot, Ashgate,
2008. CALABI, Donatella. História do Urbanismo Europeu. Tradução de Marisa Barda
e Anita di Marco. São Paulo, Perspectivas, 2012.
COMPANHIA MELHORAMENTOS NORTE DO PARANÁ. Colonização e
Desenvolvimento do Norte do Paraná. São Paulo, (s.n.), 1975.
DALBERTO, Anelise Guadagnin. O Desenho da Cidade e a Identidade Urbana: O
Caso da Expansão de Cianorte – PR. Orientador: Renato Leão Rego. Dissertação
de mestrado. Maringá, Universidade Estadual de Maringá, 2009.
DEPARTMENT FOR COMMUNITIES AND LOCAL GOVERNMENT. Green Belt
Statistics in England Disponível em:
<https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/64268
4/Green_Belt_Statistics_England_2 016-17.pdf>. Acesso em junho de 2021.
DIAS, Edson dos Santos. Atuação do agente fundiário na produção do espaço
urbano – Companhia Melhoramentos Norte do Paraná: uma presença constante na
cidade de Cianorte. Orientador: Margareth de Castro Afeche Pimenta. Dissertação
de mestrado. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina, 1998.
HACK, Gary. Shaping urban form. Planning ideas that matter: livability, territoriality,
governance, and reflective practice. Cambridge, MIT Press, p. 34-63, 2012.
HALL, Peter; TEWDWR-JONES, Mark. Urban and regional planning. 5a edição.
Londres, Routledge, 2010.
HARLOW. Harlow Local Development Plan: Green Wedge Review. IN: Harlow
Council, Workin together for Harlow, abril de 2014. Disponível em
<https://www.harlow.gov.uk/sites/default/files/documents/HEBPS2A%20%20Green%2 0Wedge%20Review%202014.pdf>, acessado em 30 de junho de
2021.
HOWARD, Ebenezer. Garden Cities of Tomorrow. Londres, Sonnenschein, 1902.
LUCCHESE, Maria Cecilia. O planejamento urbano de Londres (1943 – 1947)
Revista Risco - IAU-USP– V.15 – São Carlos, 2012.
MENEGUETTI, Karin Schwabe. De cidade-jardim a cidade sustentável:
potencialidades para uma estrutura ecológica urbana em Maringá-PR. Orientador:
Paulo Renato Mesquita Pellegrino. Tese de Doutorado. São Paulo, FAU-USP, 2007.
NUNES, Layane Alves. Para além do Plano de Jorge de Macedo Vieira: a expansão
urbana de Maringá de 1945 a 1963. Orientadora: Sarah Feldman. Tese de Doutorado.
São Carlos, Universidade de São Paulo, 2016.
NUNES, Layane Alves; PAGNUSSAT, André Luiz; DAMASIO, Giovani Lemos. O
Elemento Green-Belt na Formação do Território Urbano Norte Paranaense: os
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
311
casos de Maringá e Cianorte. Relatório Final de Pesquisa de Iniciação Científica.
Maringá, Universidade Estadual de Maringá, 2018.
OLIVEIRA, Fabiano Lemes de. Green Wedge Urbanism: History, Theory and
Contemporary Practice. Londres: Bloomsbury Publishing, 2017.
REGO, Renato Leão. O desenho urbano de Maringá e a idéia de cidade-jardim. Acta
Scientiarum. Technology, v. 23, p. 1569-1577, 2001.
REGO, Renato Leão. As cidades plantadas: os britânicos e a construção da
paisagem do norte do Paraná. Londrina, Humanidades, 2009.
SILVA, Fernanda Correia; BERLINI, Cintia Stela Negrão. O acervo pessoal do
urbanista Jorge de Macedo Vieira: a importância da preservação do patrimônio
documental. Geografia e Pesquisa, v. 9, n. 2, 2016.
SOUZA, Nadir Leandro de. O Parque Cinturão Verde de Cianorte: de fragmentação
florestal à área protegida no espaço urbano. Orientador: Bruno Luis Domingos de
Angelis. Tese de Doutorado. Maringá, Universidade Estadual de Maringá, 2015.
THOMAS, David. London's greenbelt: The evolution of an idea. The Geographical
Journal, v. 129, n. 1, p. 14-24, 1963.
TURNER, T. Open space planning in London: From standards per 1000 to greens
strategy. Londres: The Town Planning Review, vol. 63, n. 04, 365-386. Disponível em
< https://www.jstor.org/stable/27798219>, acessado em 30 de junho de 2021.
YONEGURA, Robinson Keith. O esquema de ocupação da Companhia de Terras
Norte do Paraná e as práticas de planejamento ambiental. Orientador: Renato Leão
Rego. Dissertação de mestrado. Maringá, Universidade Estadual de Maringá, 2010.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.74801-74819 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
312
CAPÍTULO 17
HOUSING IN PORTUGAL (1992-2008) A MULTIDIMENSIONAL PERSPECTIVE ON
THE BEHAVIOUR OF ECONOMIC AGENTS
António Duarte Santos
Ph.D
Universidade Autónoma de Lisboa
ajsantos@autonoma.pt
Guilherme Castela
Ph.D
Faculdade de Economia da Universidade do Algarve
gcastela@ualg.pt
Iris Lopes
Ph.D
Faculdade de Economia da Universidade do Algarve
igoncal@ualg.pt
Nelson Silva
Ph.D
Faculdade de Economia da Universidade do Algarve
ntsilva@ualg.pt
ABSTRACT: Since the nation joined the European Union, the process that regulates
housing policy in Portugal has been subject to specificities that are proper of the
Portuguese situation. In a State which has a considerable housing deficit, it was the
quantifier elements that judged the various governments regarding this matter. Almost
all of the housing production depended on mortgage loans in which soft loans played
an important part, together with tax benefits. The negative effects produced by lease
blocking were increasingly felt throughout the analyzed period of time. The changes in
context due to the decrease of tax rates and the legislative alterations on soft loans,
conditioned the agents behavior and, necessarily, the rhythm of Portugal’s housing
market. Using the STATIS (Structuration of Tableaux A Trois Indices de la Statistique)
methodology and through the analysis of the housing policy instruments, it was possible
to identify the trajectories and changes in performance of the State, Owners and
Families during the period between 1992 and 2008, as well as the most significant
variables for understanding the problematic of housing in Portugal.
KEYWORDS: Housing; Policy Instruments; STATIS.
RESUMO: Desde a adesão do país à União Europeia, o processo que regula a política
de habitação em Portugal tem estado sujeito a especificidades próprias da situação
portuguesa. Em um Estado com um déficit habitacional considerável, foram os
elementos quantificadores que julgaram os diversos governos quanto a esta questão.
Quase toda a produção habitacional dependia de empréstimos hipotecários, nos quais
os empréstimos em condições favoráveis desempenhavam um papel importante,
juntamente com os benefícios fiscais. Os efeitos negativos produzidos pelo bloqueio
do arrendamento foram cada vez mais sentidos ao longo do período de tempo
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
313
analisado. As alterações de contexto decorrentes da diminuição das taxas de imposto
e das alterações legislativas sobre o crédito bonificado, condicionaram o
comportamento dos agentes e, necessariamente, o ritmo do mercado imobiliário
português. Utilizando a metodologia STATIS (Estruturação de Tableaux A Trois
Indices de la Statistique) e por meio da análise dos instrumentos de política
habitacional, foi possível identificar as trajetórias e mudanças de atuação do Estado,
Proprietários e Famílias durante o período de 1992 a 2008, bem como as variáveis
mais significativas para a compreensão da problemática da habitação em Portugal.
PALAVRAS-CHAVE: Habitação; Instrumentos de política; STATIS.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
314
1. INTRODUCTION AND OBJECTIVES
After Portugal joined the European Union came into existence until the
beginning of the mortgage crisis of high risk in 2008, a growing concern about the issue
of housing. This concern was centered in the framework of the process of public policy,
whose changes, adaptations and specific characteristics prior to the behaviour of the
demand for housing, given the residential deficit. It became therefore essential to
recognize the institutional intervention of economic operators in this particular market
in particular, the state, the owners and families.
In the period 1992-2008, the State played an active role in the housing sector,
legislating promotion to purchase and own housing construction. Indeed, from the early
years of the nineties, and by 2008, further compounded these guidelines housing policy
concerns social, having been created rehousing programs in urban areas, supporting
the leasing incentives particularly for young people and stimulating himself to restoring
degraded properties. The purchase of homes by families, the lease on the open market
and that for young people, catapulted the state as stimulating element of housing and
urban regeneration, theoretically through a redistribution of income from households
based on equity.
However, the problem of housing cannot be reduced only from the perspective
of supply and demand. In fact, the specific characteristics of this and led to the creation
of inefficiencies in the market, in particular by the inadequacy of market argument as
resolution mechanism housing of lower income families. The strengthening of housing
programs of the most insolvent populations took effect in resolving the housing needs,
but it was not enough. In the Portuguese case, the construction of housing was mainly
directed to the sale, given the low expression of the rental market, while providing a
housing solution only to solvent families. Consequently, the housing credit supply grew
significantly and interest rates have a significant downward trend, resulting in greater
accessibility of Portuguese families to credit.
On the other hand, the expansion of housing credit in the nineties and the
beginning of the new century was a rational response of economic agents to favourable
changes in financing conditions. In fact, the dynamics of the rental market was another
objective of housing policies of this period.
We understand relevant building the objectives of this work according to a socioeconomic support and technical support. In fact, the socio-economic component refers
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
315
to connections between the formulation of public policies on housing and its
implementation, which are measured by results. Regarding the technical side, we will
use the STATIS method (Structuration of Tableaux A Trois Indices de la Statistique),
first introduced by Escoufier (1973) and L'Hermier des Plantes (1976) and later
developed by Lavit (1988).
Thus, we highlight six objectives:
(1) - Identify the position of the three economic agents, in relation to the variables under
study;
(2) - To analyze the relationship between the state, owners and households;
(3) - To characterize the behavior of the variables analyzed in the perspective of the
three agents;
(4) - Verify the state contribution, owners and households for the definition of housing
policies;
(5) - Check the relationship between the variables and their contribution in
identifying the similarities / dissimilarities between the state, owners and households;
(6) - To recognize the agents of economic which cause divergences and/or
convergences in the housing sector.
2. THE METHODOLOGICAL PROCEDURE
The measuring of a variable over a set of individuals, which from a statistical
viewpoint corresponds to the simplest situation, allows us to build a vector of
observations with one entry or way: individuals. If, besides this, we consider a set with
more than one variable, the information can be structured as a data matrix and we
obtain two ways: individuals and variables. If, for each previous matrix we carry out a
repetition of measurements, on different occasions, we will be before a threedimension setting, or in other words, three ways: individuals, variables and occasions.
With a view to the explanation of data, for the one entry or way, we normally modelise
the distribution of data. For the two entries or ways, explicative models or models of
co-variance are built and, for the three ways we build models that are designated as
three-way models. The main aim is to analyze multiple data tables where the
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
316
observations are, for example, objects or individuals on which various measurements
(variables) were carried out on various occasions. The term ‘occasion’ can refer to
different moments in time or to different situations of measurements, in other words, to
distinguish experimental situations. In these models the set of data is usually
associated to a graphic representation, for a better recognition and illustration of the
essential trends of the phenomena under study.
The data accommodated in a tridimensional configuration is presented in figure
1.
Figure 1 – Cube of three-way data
Source: own elaboration.
Over the last decades, the methods of Multivariate Data Analysis (MVA) have
proven their efficacy. In the 1970s and 1980s, Escoufier (1973), Bouroche (1975),
L'Hermier des Plantes (1976), Robert & Escoufier (1976), Jaffrenou (1978), Foucart
(1981) and Escofier & Pagès (1985), amongst others, began developing their studies
on methods for analysis of multidimensional tables, giving rise to one of the
fundamental strands in this type of MVA techniques – the French school of analysis.
In this sense the elected method for this research is STATIS (Structuration de
Tableaux À Trois Índices de la Statistique) that was first introduced by Escoufier (1973)
and L'Hermier des Plantes (1976) in Probability and Statistics Laboratory of the
University of Montpellier II, and later developed by Lavit (1988). This method is not
restricted to the analysis of a data frame such as the Principal Component Analysis
(PCA), but allows the simultaneous operation of multiple frames of quantitative data. It
is an exploratory method for analyzing multivariate data which aims to compare
configurations of the same individuals, in different conditions in order to find a common
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
317
structure, stable and representative of all tables. It comprises the following four
fundamental steps:
1. Interstructure analysis, which accounts for a comprehensive comparison of data
tables;
2. Compromise analysis, which describes the common structure of several data tables;
3. Analysis of the Intrastructure, which allows highlighting of the individuals responsible
for similarities (or differences) between tables;
4. Finally, the trajectories that describe the evolutionary behavior of each individual or
variable are traced from the Compromise of the image.
In short, the STATIS method allows us not only to capture the trajectories of
individuals and variables over time or conditions, but also to identify the variables and
individuals that contribute to stability.
The general principle of classification used for clustering in this research is
based on the construction of a framework of similarities between the arrays of
approximations. The method used was Ward (Ward, 1963) which considers the
Euclidean distance. In the Ward method, the total variance is equal to the sum of the
internal variance of class and inter-class variance. It is therefore necessary to find a
uniformity within each class (thus minimizing the variation of inter- class variance), and
a heterogeneity between classes. Lastly the group of subjects is performed in order to
maximize the similarity within the groups and differences between groups.
To identify the significant active variables for each cluster we used the test to
the differences of the averages of the samples where the null hypothesis means that
there is no difference between the mean of a sample and the population mean, and no
difference between the means of two samples.
The data used in this research is of secondary databases provided by INE
(National Statistical Institute of Portugal), IGAPHE (Institute of Management and
Alienation of the Patrimony Housing of State), INH (National Housing Institute), Bank
of Portugal, IHRU (Institute for Housing and Urban Rehabilitation), IMOESTATÍSTICA
(real estate private index), Finance Ministry of Portugal and AECOPS (Association of
Construction, Public Works and Services) are presented in Table 1.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
318
Table 1 – Observations, Variables and Entities
i=OBSERVATION S:
Portugal for years (1992-2008)
k=ENTITIES
j=VARIABLES
(F1) General Credit Scheme (€ million): monetary value of the credit
agreements for housing without direct financial state support;
(F2) Subsidised Credit (€ million): Monetary amount of interest on
credit contracts for housing under the subsidized credit scheme with
state support for the acquisition, construction and works in permanent
housing;
(F3) Credit Subsidised for the young (€ million): idem, since
the buyers had until age 30;
(F4) (F1 + F2 + F3) / GDP: relative weight of the sum of these
variables in GDP.
(P1) REHABITA (€ thousands): value resulting from the conclusion
of agreements between the IGAPHE (IHRU) and the municipalities,
the two bodies responsible for the financial coverage of the works
of urban renewal to be undertaken; these collaboration agreements
were also endorsed by INH (IHRU) or other credit institutions;
(P2) RECRIPH (€ thousands): financial contribution for carrying out
maintenance and improvement works on units by joint owners of old
buildings, via administration of condominiums;
(P3) Real Estate Confidential Index: Index that measures since
1988, the oldest series on the evolution of the value of residential real
estate;
HOUSEHOLDS
OWNERS
STATE
(P4) (P1 + P2) / GDP: Group of the relative weight of these active
variables in GDP.
(E1) Subsidized General Interests (€ million): amount payable by
the resulting state of the differential between the interest rate indexed
to EURIBOR (the reference rate of the interbank market) and the
contracted rate on loans;
(E2) Controlled Cost Housing by cooperatives, municipalities
and private companies (€ million): it is the State financial support
in order to allow the rental or home ownership to low household
resources, promoted by Cooperatives, by local councils and private
companies;
(E3) Incentive to rent for the young (€ million): Financial support
specific state for the tenants young (30 years old);
(E4) Special Re-housing Plan (established in 1993) (million €): corepayable via IGAPHE (IHRU), up to 50% of the cost of construction
of the projects, and the municipalities could also use, for the
remaining cost, long-term subsidized funding or the INH (IHRU) or
any credit institution;
(E5) RECRIA (€ million): the amount of bonuses, via INH (IHRU), the
municipalities, landlords and tenants of fires, since should proceed
conservation works or improvement;
(E6) (E1 + E2 + E3 + E4 + E5) / GDP: on the combined weight of
these variables in GDP at current currency values, which quantifies
the economic activity by sector of activity, considering only the
consumer goods and services finals.
Source: own elaboration.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
319
3. RESULTS
The comparison of the groups of variables in the space of the first two principal
components for STATIS interstructure is displayed in Figure 2. From this analysis we
can explore the stability of the set of observations.
Figure 2 – The interstructure: A global comparison of the sets of data on the three economic agents
Source: own elaboration.
The distances between the entities reflect similarities / differences in the stability
of 3 economic agents over the period 1992-2008
The coordinates of this factorial structure, with a quality of representation 80%,
are associated with the first dimension which retains 92% of the total information.
In the STATIS results, the configuration of the interstructure denotes stability, for
all three entities are associated to the first dimension, and this method, by its nature,
is well interpretable over the first dimension.
In the STATIS method, the computation of the compromise matrix, where each
row represents a observation of (Portugal per year), and each column is a component.
The compromise matrix is a scalar product matrix, and therefore its eigende
composition amounts to a PCA. In Figure 3 the Euclidian image coordinates in
compromise space is presented along axes 1-2. From this analysis we can explore the
structure of the set of observations from the STATIS point of view.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
320
Figure 3 – The compromise: A description of the structure common to the various tables of data with an
Euclidean representation of the years on plane 1-2
Source: own elaboration.
Identifies the level of commitment between the years. Detects the temporal
position in question, reflected by the Active Variables of the 3 agents. The identification
of the three clusters defined by Ward’s method is represented in Figure 4.
Figure 4 – Identification of three Clusters in the common structure by Hierarchical segmentation
using the squared Euclidean distance and Ward Criteria
Source: own elaboration.
The application of a singular value decomposition (SVD) and subsequent
principal component analysis (PCA) now reveals a factorial space that captures, in two
dimensions, 92.31% of the compromise matrix, being 64.55% of the information held
in the first dimension.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
321
In Figure 4 can be noticed the most important periods that marked the 19922008 period as for the credit schemes used in Portugal.
Thus, the second dimension can be interpreted by the opposition between the
years before and after entry into force of Decree-Law No. 349/98 of 11 November,
decree amending and starts to regulate the new subsidized credit agreements (Figure
4).
Thus, it becomes possible to characterize, at first, the three clusters detected.
Cluster 1 is to be marked by the period of the former subsidized credit scheme, Cluster
2, as the period of the new subsidized credit scheme and the Cluster 3, a period in
which ceases to exist hiring of subsidized loans (Figure 4).
In order to distinguish the three clusters, depending on variables considered
significant, and, for a 95% confidence interval, was performed a test of the difference
of averages of three independent samples. It were obtained in this way, the following
significances values associated with the test (Table 3).
Table 3 – Test to the difference of averages for independent samples (Clusters)
Source: own elaboration.
It was found the presence of six significant active variables (zP1, zP2, zP4, zE2,
zE4 and zE6) differentiating the clusters. In Table 4 are observed movements of these
six variables per cluster, over the period 1992-2008.
Table 4 – Differentiation between clusters according to the significant active variables
Source: own elaboration.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
322
The variables Subsidized General Interest Rate, Incentive to youth renting,
RECRIA, General Credit Regime, Subsidized Credit and Subsidized Credit for the
young had different movements for each cluster as exposed in Table 4. This gives us
an insight of the relative homogeneity of policy for the years encompassed in each
cluster and heterogeneity of policy between clusters.
This phase of intrastructure spatially represent the structure of each original
matrix data in the compromise space. Each trajectory represents one year the period
1992-2008 for the three economic agents, thus delineating approaches or deviations
regarding individual’s compromise.
These deviations and approaches are better understood using the correlation
of active variables and supplementary variables that most significantly are associated
with each of the compromise axes.
Figure 5 shows the significant correlations between the original variables and
dimensions of the compromise space concerning each economic agent.
Figure 5 – The intrastructure: Circles of Correlations
Source: own elaboration.
It is possible to identify the variables that contributed to instability for each
economic entity.
The variables F1 and F4 for Households, E3 for State and P3 for Owners,
diverged and in this sense did not support the formation of the compromise.
Thus the reproduction of trajectories in Euclidean image of compromise is
based on the representation in this image of the three clouds of individuals (Figure
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
323
6). We believe, therefore, to be able to indicate the year in which the structure is
more or less consistent in the relations between the three economic agents.
Figure 6 – The intrastructure: identification of three examples for the 1992, 2000 and 2008 trajectories.
Source: own elaboration.
For 1992 the households contribute the most to the average of the behavior.
There is a strong positive correlation between the state and owners. Owners and
especially the state contributes, opposed to households, to the formation of
compromise.
On 2000 it is shown that it is the owners who contribute most to the behavior of
the average. There is a strong positive correlation between state and households.
Households and the state contribute as opposed to owners for the formation of
compromise.
In the year 2008 it is observed that are the owners who contribute most to the
average behavior. There is a negative correlation between Households, State and
Owners. There has been a greater contrast between owners and households, keeping
the state on an equal relationship with both for the formation of commitment.
4. DISCUSSION
The analysis of the results showed that there is a change in relative position
of economic agents which notes:
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
324
1. The Association of State and property opposed to families in the years 1992-1994,
1998 and 2004-2007;
2. The Association of State and Families as opposed to owners in the years 19951996, 1999-2001 and 2003;
3. In 1997, 2002 and 2008, years of change, the three economic agents are negatively
correlated (in opposition);
4. At no time was association (positive correlation) between families and owners.
According to the characterization of clusters performed in Table 4 and taking into
account the additional information of the evolution of the interest rate, it is possible to
establish behavior al typologies that are displayed in Figure 7.
Figure 7 – Behavioral Typologies
Source: own elaboration.
Thus, the years that are positioned in the first cluster are the result of:
1.
A STATE trying to balance the high interest context in decline with the
need to own housing for FAMILIES or through the Subsidised credit schemes and
Credit Subsidised Young little restrictive with regard to hiring, either by encouraging the
young Rent. On the other hand promotes the rehabilitation of buildings leased by
RECRIA program directed to the OWNERS;
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
325
2.
FAMILIES forced into debt, given the still high interest rate for own
house purchase and the absence of a genuine rental market; it's from,
3.
OWNERS that given the rents freeze history, maintain a very high level
of suspicion, either for rehabilitation investment, whether to increase the lease offer.
Similarly, the years that are positioned in the second cluster are the result of:
4.
A debt STATE, via the subsidized loans previously contracted and still
in force, trying to balance the new lower interest context and oscillation, or by restricting
access to the hiring of new credits Subsidised and Subsidised Young or by reducing
Encouraging Young People's rent, directed to the households. On the other hand, it
reduces the incentive to rehabilitation of leased property through targeted RECRIA
program for OWNERS;
5.
HOUSEHOLDS rationally, given the low level of interest rates and the
added difficulty of framing the credits subsidized and maintenance of the lack of a real
rental market, resort to borrowing via General Credit scheme for purchase of homes;
it's from,
6.
OWNERS that, given the shrinkage of state incentives or credits in
Subsidised and Subsidised Young wants investment in rehabilitation, maintain a high
level of suspicion, either for rehabilitation investment, whether to increase the lease
offer.
Finally, the years that are positioned in the third cluster are the result of:
7.
A STATE trying to rationally balance the low and stable interest
context, with less need for private housing for HOUSEHOLDS, either by elimination of
contracting new loans in subsidized schemes, either by encouraging the rent Young.
On the other hand promotes the rehabilitation of buildings leased by RECRIA program
directed to the OWNERS;
8.
HOUSEHOLDS forced into debt to purchase private housing via Credit
General, given the withdrawal of support by the State to purchase a pair of an increase
in the incentive to rent Young; it's from,
9.
PROPRIETARY that given the rents freeze history, maintain a very high
level of suspicion, either for rehabilitation investment, whether to increase the supply
of accommodation, despite the increase in support from the state via RECRIA in
promoting property leased rehabilitation.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
326
5. CONCLUSIONS
Relative to owners:
1. In the old, the new and the Credit Regime absence Subsidised period, the OWNERS
maintained a low level of adherence to the market, both for investment in rehabilitation,
and for increasing the supply of homes for rent.
Relative to state:
2. In the Old Credit Scheme Subsidised, and in the presence of decreasing interest
rates, STATE sought to balance the needs of two economic agents. For
HOUSEHOLDS through interest subsidy for purchase of homes and through the
encouragement of young lease. For OWNERS, promoting the rehabilitation of leased
properties through a targeted program for this purpose.
3. New Credit Scheme Subsidised and a swing in interest rate environment, debt
STATE via the previously contracted subsidized loans, restricted access to new credits
subsidized and reduced the incentive for young leasing, targeted for HOUSEHOLDS.
On the other hand, it decreased the incentive to rehabilitation of properties leased to
the OWNERS.
4. In the absence of Subsidised Credit Contracting and in an environment of stable
interest rates, STATE tried to rebalance the demand for private housing HOUSEHOLDS
of either the extinction of new loans in subsidized schemes, either by encouraging
young lease. On the other hand, promoted the rehabilitation of properties leased to the
OWNERS.
Relative to households:
1. In the Old Credit Scheme Subsidised, the HOUSEHOLDS were induced
indebtedness, given the decrease in interest rates for the purchase of homes and the
lack of a true rental market.
2. New Credit Scheme Subsidised, given the low level of interest rates, the added
difficulty of framing the credits subsidized, as well as maintaining the absence of a
genuine lease market, HOUSEHOLDS, rationally, resorted to borrowing through
regime General Credit.
3. In Credit Hiring None Subsidised, and given the increase in encouraging young lease,
the HOUSEHOLDS were forced into debt via General Credit scheme.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
327
Our empirical study, to detect a common structure, although instability between
OWNERS, STATE, and HOUSEHOLDS, showed that public housing policies are not
separable in the analysis and understanding of the relationships among the three
clusters, in Portugal, in the period 1992-2008.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
328
REFERENCES
Bouroche, J. M. (1975) – Analyse des Données Ternaires: La Double Analyse en
Composantes Principales. Thèse de troisième cycle, Université de Paris.
Escofier, B. & Pagès, J. (1985) – Mise en Oeuvre de l’AFM pour les Tableaux
Numériques, Qualitatifs ou Mixtes. Publication Interne de l’IRISA, 429.
Escoufier, F. (1973) – Le Traitement des Variables Vectorielle, Biometrics
International Biometric Society), 29 (4), p. 751-760.
Foucart, T. (1981) – Suites de Tableaux et de Sous-Tableaux. Revue de
Statistique Appliquée, 29(2), 31-42.
INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA (2009) – Estatísticas da Construção e
Habitação. Jaffrenou, P.A. (1978) – Sur L'analyse des Familles Finies de Variables
Vectorielles, Thèse de troisième cycle, Université de Lyon
Lavit, C. (1988) – Presentation de Methode STATIS Permettant L’abalyse Coinjointe
de Plusiers Tableaux de Donn’Ees Quantitatives. Cachiers de la Recherche
Dévelopment, 18, pp. 49-60.
L'Hermier des Plantes (1976) - Structuration des Tableaux à Trois Indices de la
Statistique. Thèse de troisième cycle, Université de Montpellier.
LOPES, José Silva (1999) – A Economia Portuguesa desde 1960. 5ª Ed. Gradiva:
Lisboa.
MALPASS, Peter, MURIE, Alan (1999) – Housing Policy and Pratice, 5th Edition,
MacMillan Press, Londres.
MOON, Choon-Geol; STOTSKY, Janet G. (1993) – The Effect of Rent Control on
Housing Quality Change: A Longitudinal Analysis. In The Journal of Political
Economy, December, Vol. 101 nº 6, p. 1114-1148, Wilson Social Sciences Abstracts.
MUCHA, Marta M. Campos (2002) – (Des) Construir a Descentralização:
Descoincidência entre Descentralização de Competências e de Recursos, em
Matéria de Habitação, e seus Reflexos nos Modos de Vida da população;
Dissertação de Mestrado em Sociologia, Faculdade de Economia da Universidade
de Coimbra.
NEWMAN, Sandra J.; BASGAL, Ophelia; NIGHTINGALE, Demetra Smith (2000) –
Welfare Reform: Should Housing Have a Role? In Journal of Housing and Community
Development. Vol. 57; Issue 1; Jan/Feb, p. 15-24. National Association of Housing
and Redevelopment Officials. Washington.
ROBERT, P.; ESCOUFIER, Y. (1976) - A Unifying Tool for Linear Multivariate
Statistical Methods: The RV-Coeficient. Applied Statistics, 25, pp. 257-265.
SEIXAS, João; MAS, Abel Albet i (2010) – Urban governance in the South of Europe:
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
329
cultural identities and global dilemmas, in Análise Social, Vol. XLV (197), 4º Trimestre,
pp. 771-787.
SHEPSLE, Kenneth; WEINGAST, Barry R. (1984) – Political Solutions to Market
Problems. In The American Political Science Review, Vol. 78, June, nº 2, pp. 417434.
SILVA, Carlos Nunes; HOGGART, Keith (1997) – Parcerias Publico-Privado nas
Politicas de Habitação em Portugal e no Reino Unido, III Congresso da Geografia
Portuguesa, Porto, Setembro.
SILVA, Maria Alexandra B. Ferraz da (2001) – Políticas de Habitação: seu
desenvolvimento em Portugal. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Economia da
Universidade de Coimbra.
Ward, J. H., Jr. (1963) – Hierarchical Grouping to Optimize an Objective Function,
Journal of the American Statistical Association, 58, 236–244.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.115880-115880 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
330
CAPÍTULO 18
CLEMENTE ROMANO E A I CARTA AOS CORINTIOS: O TEMPO, O HOMEM E A MISSÃO
Marcia Elieder Bolonhez Meneguetti
Mestranda em Educação na Universidade Estadual de Maringá
Rua Fernandes Vieira, 743, zona 02 - Maringá, Paraná, CEP: 87010340
E-mail: marciabolonhezm@hotmail.com
Roseli Gall do Amaral da Silva
Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Maringá
Universidade Tecnológica Federal do Paraná - Apucarana
Rua Doze de Outubro, 31, Centro - Astorga, Paraná, CEP: 86730-000
E-mail: amararoseli@gmail.com
Prof. Dr. José Joaquim Pereira Melo
Pós-Doutorado em História da Educação pela Universidade Estadual Paulista Júlio
de Mesquita Filho
Universidade Estadual de Maringá
Rua José Joaquim Pereira, 72, Centro, Itambé, Pr. CEP: 87175-000
E-mail: pereirameloneto@hotmail.com
RESUMO: O presente estudo tem como objetivo discutir a contribuição de Clemente
Romano na formação cristã do século I d. C., por volta de 92 a 96. Por meio de uma
epístola redigida depois que o autor, Clemente Romano, então bispo de Roma,
recebeu notícias de dissidências na comunidade de Corinto. Como fonte primária
privilegiamos a I Carta de Clemente Romano aos Coríntios, traduzida do grego por M.
Luiz Marques, com introdução de Isidro B. Lamelas (2001), além de outras referências
bibliográficas tais como: Eusébio de Cesareia (2005), Jaeger (1989), Lightfoot (1869),
Cowper (1967), Daniel-Rops (2014), Moreschini e Novelli (1996), Altaner e Stuiber
(1988) e Koester (2005). A discussão do tema foi realizada a partir de Clemente
Romano seu contexto social e suas origens, e os objetivos da I Carta aos Coríntios,
demonstrando os motivos pelos quais foi escrita. A investigação centrou-se em
desvelar Clemente Romano como um dos principais colaboradores para a formação
das bases educacionais do homem cristão tendo em vista atender as exigências do
cristianismo e de sua sobrevivência social naquele período.
PALAVRAS-CHAVE: Clemente Romano; Cristianismo Primitivo; Contexto social.
ABSTRACT: This study aims to discuss the contribution of Clement Romano in the
Christian formation of the 1st century d. c., circa 92-96. By means of an epistle written
after the author, Clement Romano, then bishop of Rome, received news of dissent in
the community of Corinth. As a primary source we favored the I Letter of Clement
Romano to the Corinthians, translated from the Greek by M. Luiz Marques, with an
introduction by Isidro B. Lamelas (2001), as well as other bibliographical references
such as: Eusébio de Cesareia (2005), Jaeger (1989), Lightfoot (1869), Cowper (1967),
Daniel-Rops (2014), Moreschini and Novelli (1996), Altaner and Stuiber (1988) and
Koester (2005). The discussion of the subject was carried out from Clement Romano,
its social context and its origins, and the objectives of the I Letter to the Corinthians,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
331
demonstrating the reasons why it was written. The investigation focused on unveiling
Clemente Romano as one of the main collaborators for the formation of the educational
bases of the Christian man with a view to meeting the demands of Christianity and its
social survival in that period.
KEYWORDS: Clement of Rome; Early Christianity; Its origins.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
332
1. INTRODUÇÃO
Clemente Romano foi um bispo da Igreja cristã no primeiro século d. C. e fez
parte do início da propagação do cristianismo, religião que se firmou e arrebanhou
muitos adeptos em dois mil anos. O estudo de sua carta escrita no final do primeiro
século e encaminhada para outra comunidade cristã permite uma visão sobre os
primeiros ensinamentos que foram primordiais para a instrução dos adeptos da nova
crença. Investigar o momento histórico deste estudioso, um dos pilares da história da
educação cristã, permiti averiguar como foram essas primeiras diretrizes instrucionais
e pedagógicas, relacionando-as no contexto do Império Romano do primeiro século
d. C.
O cristianismo é um dos fenômenos mais originais da história porque propôs
uma visão particular de mundo e de homem, cuja influência chega aos nossos dias.
Imbuídos por uma promessa religiosa, materializada na pessoa de Cristo, os cristãos
elaboraram uma proposta de salvação e uma compreensão que afirmava serem os
homens filhos de Deus. Com base nessa proposta, os cristãos enfrentaram (e também
dialogaram) outras visões determinantes de mundo, especialmente doutrinas gregas
e o estoicismo romano.
Desta maneira é essencial investigar como era esse contexto social em que
vivia Clemente Romano e os adeptos da nova crença. Roma desde suas origens (séc.
VIII a.C.), ocorridas na península itálica, até à decadência por volta do século V da Era
Cristã, deixou um legado de influências literárias, jurídicas, arquitetônicas e morais,
que se fazem sentir mesmo passados mais de 2700 anos da fundação da cidade de
Roma, entre as colinas do Velho Lácio. Entre a aristocracia e monarquia, entre
República e Império, Roma se consolidou como uma das civilizações mais importantes
da história. Parte dessa trajetória alcança maior significado quando consideramos o
aspecto religioso, sobretudo, em função do cristianismo, o que levanta muitas
interrogações, entre as quais: como os cristãos se estabeleceram no Império? Porque
o cristianismo, apesar de perseguições, foi recepcionado pelos romanos?
2. A I CARTA DE CLEMENTE ROMANO AOS CORÍNTIOS
O cristianismo foi um fenômeno urbano assim como o Império romano era
composto por cidades importantes, a exemplo da capital Roma, Pompeia e Herculano.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
333
Também as cidades sugerem o fato de os romanos serem, essencialmente, uma
civilização a partir do qual integrava as práticas agrícolas, as bélicas e a intensa vida
urbana, rica pela arquitetura e vida cultural. Mas não era apenas isso. Outro aspecto
singular se destaca: no século I d. C, as conquistas do Império Romano deram
condições para realizar uma extensa dominação territorial que se estendeu por muitas
regiões e séculos. A capital desse Império, Roma, era uma cidade que indicava o ciclo
de expansão territorial e, como tal, representava o centro do mundo antigo. Foi crucial
para o início do Cristianismo, mesmo que tenha sido, às vezes, ofuscada por outros
centros cristãos influentes no Oriente cristão, a exemplo de Antioquia, Éfeso, Corinto
e Jerusalém. Roma era a cidade em que viveu Clemente Romano.
O Cristianismo foi uma crença diferente dos cultos às divindades que havia na
época, especialmente em Roma. Seus seguidores acreditavam em um só Deus, como
os judeus, mas, ao contrário destes, os cristãos partiam da crença em Jesus Cristo.
Informações sobre o magistério estão contidas na tradição apostólica e quase nada
há de dados biográficos. Entretanto, essa crença, fundamentada em Jesus Cristo,
partia do princípio de haver uma concepção de homem assentada na promessa de
uma vida eterna. Para isso, cumpria realizar uma conversão pessoal e a renovação
moral para a instauração do que acreditavam ser o reino de Deus. Ele pressupunha a
criação de um novo povo, um novo Israel, ideia que sugere a instauração de uma
comunidade diferente dos romanos, em razão da moral (escatológica) que pregavam
(KOESTER, 2005).
Na efetivação dessa proposta, Martin (2019) afirma que o cristianismo enfrentou
muitos desafios para se estabelecer como religião. Primeiro porque, embora fosse
herdeira, se firmou na condição de ser distinta do judaísmo e segundo porque,
presente no Império Romano, os cristãos se movimentaram no sentido de afrontar
os cultos romanos. Ao seguirem uma nova fé e não adotarem a religião tradicional e
ancestral, os cristãos formaram uma nova religião, o que pode ter provocado as
perseguições que sofreram do poder romano, como a de Nero (37– 68) em 64 ou 67
e a de Domiciano (51 – 96), por volta da última década do século I d. C. Tais
perseguições, no mundo antigo, duraram até Constantino e somente acabaram
quando a religião foi declarada oficial no Império Romano por Teodósio (347-395), em
380 d. C.
Na contribuição para a efetivação do cristianismo no primeiro século, há de se
destacar as ações de Paulo de Tarso (5 -67 d.C):
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
334
Elemento decisivo, neste sentido, foi o fato de o cristianismo ter começado
a ultrapassar as fronteiras do mundo semita e entrar em territórios dos povos
que chamavam de pagãos. Esse contato com a cultura clássica, além de
marcar profundamente a nova religião, provocou mudanças substantivas no
pensar e no comportamento dos povos clássicos. Nesse primeiro momento,
Paulo de Tarso teve papel determinante na sistematização do conteúdo e
na sua regulamentação, o que favoreceu a sua expansão (SILVA, 2010,
p.11).
Ele estabeleceu importantes comunidades cristãs (SILVA, 2010) para as quais
foram endereçados cartas, a exemplo das redigidas a Corinto por Paulo de Tarso e,
posteriormente por Clemente Romano. Corinto, assim como as cidades da região, era
a personificação da cultura e seu espaço urbano oferecia um estilo de vida que
combinava o desenvolvimento da atividade pública e amenidades urbanas, a exemplo
do teatro, das termas, entre outras coisas. Seu estilo romanesco, apesar de estar na
Grécia, reproduzia as estruturas e o modo de vida dos romanos, já que por eles foi
destruída (II a. C) e reconstruída (44 a. C) por Júlio Cesar (NASCIMENTO;
SELVATICI, 2017).
O fato a considerar, entretanto, é a importância da cidade para os cristãos. Da
mesma forma que o cristianismo foi inserido em Roma, em Corinto não foi diferente,
pois Paulo de Tarso fundou uma comunidade quando ficou nesta cidade em atividade
missionária por dezoito meses (At 18, 11), de 50 a 52. De acordo com relatos dessa
atividade nas cartas de Paulo aos Coríntios, ele se estabeleceu em Corinto, capital da
província de Acaia, a fim de conclamar os cristãos que lá viviam para uma maior
unidade ao mesmo tempo em que procurou agregar mais pessoas que o auxiliaram a
instaurar comunidades tanto na capital de Acaia, Corinto, quanto em outras cidades
vizinhas (KOESTER, 2005).
De acordo com Altaner e Stuiber (1988), a presença de Paulo de Tarso nessa
comunidade foi motivada pelas contendas naquela comunidade (SILVA, 2010). Alguns
membros mais jovens da comunidade se haviam rebelado contra a autoridade dos
presbíteros, expulsando-os de seus ofícios. Mas, tarde quando a Igreja de Roma teve
conhecimento do sucedido, Clemente Romano dirigiu uma Carta a Corinto na tentativa
de resolver o problema. Nesse sentido, o fato de enviar cartas para uma comunidade
a fim de resolver seus problemas, evidencia que a construção e estabelecimento do
cristianismo foram conflituosos, pois tiveram que tratar não apenas de divergências
teológicas como também disputas internas pelo controle das comunidades. É provável
também que os conflitos aludidos, principalmente nos textos paulinos, estivessem
ligados à diversidade dos que frequentavam as comunidades.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
335
Clemente Romano também escreveu uma carta aos Coríntios, provavelmente
em 92 d. C, em razão desta comunidade se encontrar em situação ainda se encontrar
em dissensões internas. A causa disto parece ter sido motivada pela disputa entre
jovens e anciãos sobre o ordenamento religioso e político daquela comunidade. Nessa
carta, ele comenta sobre outras epístolas escritas por Paulo de Tarso e ainda
mencionou sobre a morte dele e de Pedro, ocorridas, segundo Clemente Romano, por
ciúmes e inveja. Essa situação corrobora com o conhecimento que Clemente Romano
tinha dos seus antecessores e os compreendia como exemplos a serem seguidos.
Quanto ao comportamento dos cristãos em Corinto, na visão de Clemente
Romano, este acreditava que havia falhas que causaram as brigas e que poderiam
levar a comunidade à queda antes de estar estabelecida. Clemente Romano citou
“uma rebelião alheia e estranha aos eleitos de Deus, indecorosa e sacrílega, que
algumas pessoas temerárias e audazes, estimularam a um tal grau de falta de senso”
(I CLEM., I, 1) presente na comunidade, que considerou pior que as facções de Paulo,
Cefas e Apolo, citados por Paulo de Tarso na Carta aos Coríntios. Em face disso,
Clemente Romano alegou que estes eram pregadores escolhidos para os cargos,
enquanto os de Corínto ainda estavam no início de uma associação religiosa e não
poderiam
ter
condutas
controversas (NASCIMENTO; SELVATICI, 2019). A
preocupação dele era com a unidade da religião na comunidade coríntia, por isso apela
para modelos exemplares contidos no Antigo Testamento e nos exemplos pagãos. A
recorrência à unidade levava os representantes da igreja a primar pelo ordenamento
dos seus adeptos e dos coordenadores em seus cargos. Na medida em que as
lideranças cometiam erros, eram transferidos de local para que não afetassem o
prosseguimento das transmissões de mensagens e ritos cristãos.
Assim, ao nos defrontarmos com o contexto em que vivia Clemente Romano
em Roma e o início da nova religião cristã nas comunidades que foram fundando, a
exemplo de Corinto, podemos constatar que foi um período de muitas mudanças para
os cristãos que viviam na sociedade romana. As condições de mudanças da
sociedade romana e dos cristãos podem ser compreendidas quando o historiador, em
particular o da educação, escrutina as fontes daquele momento em busca dos
elementos que permitem compreender os modos pelos quais o cristianismo atuou.
Além disso, não somente a maneira como agiram para construir a religião que
acreditavam, mas, sobretudo, a compreensão de homem que defenderam e
reproduziram no magistério dos fiéis e nos textos que redigiram e que é de nosso
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
336
conhecimento. Além do mais, eles contribuem para o entendimento de um momento
histórico singular porque revelam as práticas utilizadas pelos cristãos e o empenho
deles na formação instrucional do novo homem que se apresentava naquele
momento. Por outro lado, aquela era a maneira pela qual a comunicação acontecia,
de modo a transmitir informações relevantes que possibilitaram construir o perfil de
sociedade e de homem segundo a doutrina cristã. A tradição posterior reconheceu os
primeiros escritos cristãos, não como tratados de filosofia, mas como instrumentos
doutrinários com o objetivo de construir a fé cristã e esse conjunto de autores e
escritos são, hoje, chamados de Padres Apostólicos.
3. OS PADRES APOSTÓLICOS E A MISSÃO CRISTÃ
Segundo Quasten (1968) são chamados Padres Apostólicos aquele grupo de
escritores cristãos que compreende o período entre os séculos I e II, cujos
ensinamentos podem ser considerados como ecos da predicação dos Apóstolos, dos
quais muitos desses Padres conheceram pessoalmente. É o que chamamos de igreja
primitiva, um conceito inexistente naquele período. O fato mais importante a
considerar, entretanto, é o de que os escritos desses Padres têm caráter pastoral, no
entendimento de Quasten (1968). Seu conteúdo e estilo estão profundamente
imbuídos pelo Novo Testamento, portanto, são contemporâneos a eles e, como tais,
são ricos em elementos que possibilitam problematizar e entender a construção do
cristianismo no primeiro século. É o caso de Clemente Romano, que viveu no século
I d. C. Eusébio de Cesareia, em sua História Eclesiástica (III, 10, 15) o situou como o
terceiro bispo da Igreja Cristã, após Lino e Anacleto. É autor do primeiro documento
escrito no mesmo período ou após os Evangelhos e às Cartas de Paulo de Tarso.
Eusébio de Cesareia (Hist. Ecl. III, 10, 16) faz menção a ela, mas sem oferecer maiores
detalhes de seu conteúdo, apenas atesta sua autenticidade.
Conforme Hamman (1995), esses primeiros escritos cristãos pertencem mais a
um conjunto literário, pois são cartas de autores com várias finalidades, o que
caracterizou um vínculo entre uma comunidade e outra, entre pastor e fiéis. Escreviam
desde informações cotidianas à exortações com a finalidade de instruir ou animar as
comunidades. Essas primeiras cartas foram redigidas por bispos e por chefes de
comunidades de origem principalmente paulina. Esses primeiros escritores, que são
estudados pela Patrologia1, são denominados de Padres Apostólicos, que recebeu
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
337
esta designação em função de terem sido dirigentes da igreja e por inspiração nos
personagens do Antigo Testamento. Em relação a esse conceito de pai, temos que na
significação comum, pai é conhecido como genitor e mantenedor da família, a quem
importa a guarda, a direção e os encaminhamentos na vida e na fé. No âmbito romano,
o pater famílias era o sacerdote do culto doméstico (DROBNER, 2003). Ao que
parece, essa é uma tradição que remonta à ideia da relação entre a figura paterna e
o aspecto religioso, como demonstrou Fustel de Coulanges (2004), quando estudou
essa tradição e apontou a condição do pai como aquele que representa a
descendência.
Entretanto, o aspecto mais relevante é o de considerar o fato de o nome padre
significar, por assimilação, a um padre/pai em sentido figurado, a um “padre espiritual”.
Este é entendido como aquele que educa, ensina e proclama o Evangelho, da mesma
maneira que orienta e dirige a comunidade. Mas até o século IV d. C., o título de padre
é destinado apenas aos bispos e depois foi aplicado aos presbíteros, sacerdotes e
diáconos. Os padres eram considerados os depositários das promessas e garantias
que foram pactuadas com Deus, portanto, assumem a condição de mediadores entre
os fiéis e as verdades consideradas divinas. Apesar disso, no entendimento de Ropero
(2004), havia um conflito de consciência em virtude de uma advertência bíblica que
afirmava:
“Não chameis padre a nada na terra, porque um é vosso Padre, aquele que está
no céu” (Mt 23:9). Em relação a esse tratamento verifica-se que os cristãos teriam que
considerar como pai apenas Deus no céu e o próprio pai na terra e mais ninguém.
Mas, mesmo com essa advertência bíblica, a tradição assumiu a qualificação de Pai
e/ou Padre para os dirigentes da Igreja. Eles são, portanto, aqueles que estão no seio
da Igreja e são disseminadores da mensagem cristã. Assumiram para si a missão de
ensinar/formar os fiéis que estavam sob sua responsabilidade.
Na compreensão de Insuelas (1943), para que esses escritores fossem
considerados Padres da Igreja, foram estabelecidos quatro requisitos: o primeiro é o
da ortodoxia doutrinal; o segundo, a santidade de vida; o outro a aprovação da Igreja;
e, por fim, a antiguidade. Entretanto, não são todos que atendem a esses requisitos, o
que não impede que alguns deles, fora dessa perspectiva, sejam considerados
eclesiásticos, pela contribuição que prestaram à Igreja, a exemplo de Tertuliano (160
d. C – 220 d. C.), que rompeu com a Igreja Católica e passou a ser montanista2, mas
ainda foi e é considerado um dos mais originais escritores eclesiásticos (ALTANER;
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
338
STUIBER, 1988).
Outra maneira comum de se referir aos escritores cristãos dos primeiros tempos
é de chamá-los de apostólicos. Assim são considerados porque tiveram contato direto
com os Apóstolos, embora nem todos sejam considerados discípulos diretos. Desse
modo, Padres Apostólicos foram escritores e ou escritos que datam do fim do século
I ou da primeira metade do século II, que continuaram o ensino dos Apóstolos de
Jesus e da literatura sagrada dos livros do Novo Testamento (INSUELAS, 2004).
Como alguns destes padres apostólicos temos Inácio de Antioquia (? – 110 d. C.),
Policarpo de Esmirna (? – 156 d. C.), Pápias de Hierápolis (viveu na primeira metade
do século II), dentre outros.
O conjunto dos textos desse momento, possibilitam, na medida do possível,
compreender como foi a vida das primeiras comunidades cristãs, bem como os modos
pelos quais aconteceu a propagação do ensino da doutrina que as caracterizam.
Igualmente, a maneira como os cristãos, na ausência dos Apóstolos, foram
responsáveis por comunicar como se comportaram os cristãos quando não havia mais
os testemunhos oculares de Jesus Cristo. Os Padres Apostólicos deixaram uma
literatura que demonstra a estima atribuída por eles aos escritos do Novo Testamento.
Escritos canônicos ou não eles são tidos como normativos nas comunidades cristãs,
por isso, importantes recursos para entender a construção do início do cristianismo
(ROPERO, 2004)
A contribuição dada por Lamelas (2001) a respeito desses Padres, referese ao
fato de que indica o surgimento da expressão Padres Apostólicos, ao esclarecer que
essa denominação foi utilizada pela primeira vez, por J. B. Cotelier, que sob o
qualificativo de Patres aevi apostolici, reuniu em dois volumes publicados em 1672,
vários escritos sem autores e alguns escritores, dos quais não sabemos a biografia e,
com o tempo, foram acrescentadas outras coletâneas.
Dentre muitos desses escritos, alguns exemplos são bem conhecidos por
estudiosos do cristianismo primitivo. Esses textos oferecem informações importantes
sobre o surgimento, a doutrina e mesmo as contradições internas do cristianismo,
entre os quais temos a Didaqué, Ignácio de Antioquia, a Carta de Barnabé, a Carta de
Papias, entres outros:
A Didaquê é um manual de regulamentos comunitários. A Carta aos Coríntios
de Clemente Romano (IClem) é uma intervenção da igreja de Roma na crise
de outra comunidade, apoiando a estruturação hierárquica no princípio da
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
339
sucessão apostólica. As cartas de Ignácio de Antioquia testemunham a
solidariedade entre as igrejas e a responsabilidade de um bispo frente a
cisma e a heresia. A Carta de Barnabé é um tratado sobre a interpretação
cristã do Antigo Testamento dirigido a cristãos atraídos pelo judaísmo. O
Pastor de Hermas é um livro apocalíptico com uma mensagem de penitência
para a igreja. A Carta de Policarpo e a carta de Papias, são marcos da
teologia asiática e com um interessante testemunho sobre os evangelhos
(TREVIJANO, 1994, p. 5).
Dessa maneira, o mérito desses textos reside no fato deles serem
propagadores da nova crença que se expandia, sobretudo no interior do Império
Romano. O público-alvo das exortações eram as lideranças das comunidades, a partir
das quais as instruções eram- lhes oferecidas. O cristianismo, por sua vez, parece
defender uma posição mais ampla pois pretendia atrair a todos, e seus adeptos eram
pertencentes tanto à parte desfavorecida da população, que seria a mais necessitada
de acolhimento, bem como atuou para converter os setores mais privilegiados da
sociedade romana, como já mencionado por Paulo de Tarso em suas cartas. O fato é
que fica latente a premência em escrever para todas as pessoas, de maneira a
conseguir mais adeptos à nova fé. A possibilidade mais comum em atingir uma
generosa parcela da população seria escrever de forma compreensível e adequada
aos seus fiéis, por isso, as cartas privilegiam modos exortativos e instrutivos.
Muitos desses escritos privilegiaram a língua grega, o Koiné, a vertente mais
comum na época, como foi a opção de Clemente Romano, que escreveu em grego,
pois era a mais utilizada nas regiões dominadas pelo Império Romano do que o latim,
língua oficial romana, como afirmou Daniel-Rops (2014, p. 118): “[...] em todo o império
romano, as pessoas só se entenderão se possuírem o conhecimento de uma única
língua, o grego”. O Latim, que somente dominará no Ocidente a partir do século III d.
C., era a língua utilizada pelos exércitos e pela administração. Alguns autores
romanos tentaram defender essa influência grega e manterem a identidade do povo
romano, como Catão (234 a. C – 149 a. C), que considerava um perigo para a
sociedade romana a marcha vitoriosa da cultura grega e Cícero (106-46 a. C.) que
também era a favor do latim, como língua oficial no Império Romano (ROSTOVTZEFF,
1986).
A língua grega foi a que prevaleceu nos Evangelhos, com exceção do
evangelho de Mateus, que recorreu ao aramaico, provavelmente pelo bom trânsito
desta língua entre judeus e árabes, e porque era a língua utilizada por Jesus Cristo.
Assim se justifica o uso da língua grega pelos propagadores das chamadas
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
340
promessas de Cristo, uma vez que era a língua helênica, na época, mais falada que o
hebraico, o aramaico ou o latim (SPINELLI, 2015), o que facilitou a disseminação e
propagação da nova crença. Clemente Romano é conhecido como um desses padres
apostólicos pré- nicenos, que escreveram antes do Concílio de Nicéia3 (325 d. C). A
mensagem que esses padres nos concedem, especialmente Clemente Romano é o
interesse particular na Igreja, pois concentram toda a atenção para a vida interna da
Igreja e não tanto no mundo externo. A Igreja cristã era a nova realidade que surgia
para o mundo antigo e era tida por incomum, desconhecida. Em face às circunstâncias
apresentadas, Clemente Romano destaca a unidade da Igreja e o amor recíproco para
com todos, condição que os fieis deveriam praticar. As Cartas geralmente têm um
conteúdo doutrinário que reforçam os preceitos basilares da mensagem cristã:
“Clemente é um verdadeiro testemunho da fé da Igreja, não é um teólogo, mas sim
um intérprete da fé” (CASTELLARO, 2015, p. 213).
De Clemente Romano existem outras Cartas que a ele são atribuídas, entre as
quais as denominadas: II Carta Clementina e as Pseudoclementinas. A Epístola
apelidada de II Carta Clementina não é considerada de Clemente Romano, pois na
realidade é tida como a mais antiga homilia conservada até hoje. Datada do segundo
século, por volta de 150 d. C., ela foi endereçada para uma comunidade ortodoxa, na
qual algumas tradições gnósticas fizeram presentes (TREVIJANO, 1994).
A esse respeito, Drobner (2003) oferece descrições dessa II carta informando
que ela é um discurso de exortação, pronunciado depois de uma leitura durante a
liturgia.
Para ele, a carta alinha 20 parágrafos, não claramente articulados, diversos
exemplos e argumentos, que exortam a seguir os mandamentos de Cristo:
em compensação pela ação redentora de Cristo, com os olhos dirigidos para
o futuro, comparando a vida a uma competição, por causa da limitada
possibilidade de penitência, por amor aos bons frutos da obediência, etc
(DROBNER, 2003, 65).
As outras cartas que foram atribuídas a Clemente Romano são as
Pseudoclementinas e a Ad Virgines, reunidas em uma única obra e, conforme a
tradição, foram redigidas apenas no século III d.C. Elas, de acordo com Altaner;
Stuiber (1988, p.57), “são narrativas romanescas sobre os apóstolos, onde Clemente
relata acontecimentos por ele presenciados como companheiro de São Pedro,
pertencem, portanto, às narrativas apócrifas a respeito dos apóstolos”. Sobre esses
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
341
documentos, podemos ter uma pequena amostra do seu conteúdo por meio de outro
autor, que as descreveu como uma série de homilias, de conteúdo judeu-cristã e antipaulino.
Também se atribuíram a Clemente umas Cartas ad Virgenes e a chamada
literatura pseudoclementina: uma série de homilias, correspondência fictícia
e novela de aventuras (Recognitiones). Obra completa e que tem sido muito
estudada. Dado seu pronunciado judeu-cristianismo e antipaulino, tem
servido de base tanto para conhecer uma corrente judeocristiana marginal e
tardia bem como de reconstruções audazes sobre o papel do movimento
ebionita4 na origem do cristianismo (TREVIJANO, 1994, p.15).
Apesar dessas informações sugerirem outros escritos, o mais provável e aceito
pela historiografia contemporânea, é reconhecer apenas a I Carta de Clemente
Romano aos Coríntios como autêntica (DANIEL-ROPS, 2014). Nela, seu autor
demonstra a preocupação formativa com o homem cristão para
atender às
necessidades de seu tempo. Reprovava atitudes que considerava indevidas e salienta
o padrão comportamental aceitável ao cristão. Em seu magistério pastoral, como
prosseguidor e fomentador do legado dos apóstolos, Clemente Romano procurou dar
orientações doutrinais e comportamentais à igreja primitiva e as virtudes elencadas e
defendidas como prioridade para os novos cristãos.
4. CLEMENTE ROMANO E SUAS ORIGENS
São precárias as informações biográficas de Clemente Romano. Eusébio de
Cesareia (2005), historiador, se limita a afirmar que ele possivelmente tenha sido
colaborador de Paulo de Tarso, na carta aos Filipenses (Fl, 4,3), porque neste
versículo menciona um tal Clemente como seu companheiro. Também fixa o início do
pontificado entre o reinado de Domiciano (51 d.C.- 96 d. C.) e o de Trajano (98 d.C.117 d.C.), isto é, entre 92 d.C. a 101 d.C. Irineu de Lião (Adv. Haer. III, 3,3), no texto
Adversus Haerese (Contra Heresias), informa que ele viu os próprios apóstolos e
manteve relação com eles. Afirma, ainda, que “ele guardava viva em seus ouvidos a
pregação deles e diante dos olhos a tradição”. Também afirma que seu pontificado foi
marcado por conflitos na igreja de Corinto, havendo ali divergências graves entre os
irmãos daquela comunidade. Irineu de Lião (Adv. Haer. III, 3,3) reforça o fato de que
foi enviada uma carta – provavelmente a de Clemente – para reafirmar a unidade da
igreja e a fé num único Deus, assim como estimular a conhecer a tradição apostólica
da igreja porque alguns pregavam outro Deus superior.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
342
De fato, tais informações sugerem que a construção da igreja não ocorreu de
maneira pacífica, mas que enfrentou adversidades, seja por motivos doutrinais seja
porque estavam inseridos numa sociedade que não era cristã, a romana. A esse
respeito, Werner Jaeger (2014) alerta para o fato de que um grupo – sem especificar
qual – em Corinto havia recusado a reconhecer a autoridade de seu bispo e a igreja
estava em desacordo. Em face dessa situação, Clemente Romano, Bispo de Roma,
dirige-se aos coríntios como representante da igreja que desfrutava da maior
autoridade. Essa condição, demonstra o prestígio de que gozava e a autoridade que
dispunha de modo que Jaeger (2014) afirmou que ele tinha a seu favor a arte da
retórica de modo a provar, por meio de muitos exemplos, os efeitos trágicos da disputa
de facções e da desobediência. Mas quem era esse homem?
As circunstâncias de seu nascimento e origens familiares são obscuras. Nem
Eusébio de Cesareia e nem Irineu de Lião mencionam alguma coisa sobre esse
assunto. São Jerônimo (15, 2018), no seu De viris Illustribus (Os varões Eclesiásticos
Ilustres) se limita a informar sobre os escritos dele e menciona a morte, por martírio5,
no terceiro ano de Trajano (ano 100 d. C.). O que se sabe foi que viveu em Roma,
com um nome latino e tendo o grego como língua materna. Ele poderia ser um liberto
de um cidadão romano, uma vez que os libertos poderiam ter o prefixo ou praenomen
ou cognomen de seus antigos senhores, não havendo lei que os impedissem
(JEFFERS,1995). Ou Clemente teria sido um dos escritores mais venerados da
antiguidade cristã? Modernamente se tentou identificá-lo com um primo do imperador
Domiciano, mas essa informação é pouco provável (RUIZ BUENO, 2002).
Em relação a essa identificação de Clemente Romano com a pessoa do
Imperador Domiciano (51 d. C – 96 d. C.), o fato é que na época esse imperador
comandava o Império Romano. A dinastia de Domiciano que era a dos flavianos, se
iniciou com Vespasiano (9 d. C. - 79 d. C), que foi sucedido por seu filho Tito (39 a. C
– 81 d. C.). Domiciano era o segundo filho de Vespasiano que assumiu o governo do
Império Romano, no final do século I d. C. Flávio Clemente, cônsul e primo de
Domiciano, e sua esposa Flávia Domitila, eram membros da gens flavia6 e se
converteram à nova crença, a religião cristã, juntamente com seus dois filhos. Estes
meninos eram herdeiros do imperador Domiciano, cujo mandato foi de 81 d. C a 96
d.C. Em razão desta conversão, essa família foi condenada à morte por Domiciano
(ROPS, 2014).
Assim, não se sabe ao certo se Clemente Romano pertencia aos flavianos ou
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
343
foi um liberto dessa família imperial, em virtude de ter o mesmo nome deste primo do
Imperador Domiciano. A esse respeito, Lightfoot (1869) partiu do princípio de que
Clemente Romano seria um membro da família imperial e sugeriu que o autor da I
Carta de Clemente Romano aos Coríntios foi um antigo escravo de Flávio Clemente,
tendo como base a semelhança de nomes. Entretanto, faltam evidências seguras
dessa hipótese, pois a mera coincidência de nomes não é prova consistente entre
Clemente Romano e outro romano qualquer. O que se pode alegar é que Domitila,
esposa de Flávio Clemente,foi simpatizante cristã, já que há evidências da arqueologia
de que a igreja doméstica de Clemente Romano, situada em Roma, está localizada
numa propriedade que pertenceu aos Flavianos (JEFFERS, 1995, p. 53).
Roque Frangiotti (1995) oferece alguns elementos importantes que contribuem
para definir suas origens, o modo como agiu e as influências que recebeu. Para ele,
Clemente Romano invoca os exemplos do AT e os vai desfilando em passagens mais
importantes, próprias para reconduzir os coríntios à paz, à concórdia, à humildade e
à obediência. De fato, Clemente Romano pareceu depender estreitamente do
judaísmo helenístico. Destacaram-se, ainda, em sua Carta, empréstimos e citações
de Eurípedes e de Sófocles (poetas trágicos gregos). Por outro lado, a ausência
de toda alusão aos problemas judaicos e nenhuma discussão sobre o legalismo
judaico (sábado, circuncisão), são os principais argumentos contra sua origem judaica.
Em contrapartida, há quem defenda com mais veemência o fato dele ter origem
judaica. É o caso de Withrow (2005) que afirma encontrar em sua carta características
de um judeu helenizado. Ele ressalta que o bispo Lightfoot (1869) elencou muitos
paralelos sugestivos entre a oração do final da Carta e a oração judaica denominada
Shemoneth 'Esreh’, as "dezoito bênçãos". O fato de apresentar semelhanças desta
oração judaica em sua carta pode induzir a pensarmos que Clemente Romano tenha
crescido nos ensinamentos do judaísmo.
A interpretação de Cowper (1867) destaca alguns aspectos singulares a
respeito do testemunho de Clemente Romano. Para ele, o pensador cristão sempre
menciona as Escrituras no sentido de apelar para ela como condição decisiva em
todas as questões discutidas. Os Textos Sagrados são considerados como autoridade
final na qual não há mais outra apelação. Além disso, Cowper (1867) destaca o fato
de que os Evangelhos e epístolas são apelados com reverência e submissão por um
homem que mantinha relações de amizade com seus escritores; e as Igrejas de Roma
e Corinto reconhecem e se submetem a essa reivindicação em seu nome. Ao
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
344
ressaltarmos a importância da Escritura para Clemente Romano, consubstancia-se
uma influência recebida durante a sua formação moral e instrucional, pois,
provavelmente, aprendeu todas as histórias e ensinamentos do Antigo Testamento,
como se verifica em toda a carta. Clemente Romano conhecia as histórias bíblicas, bem
como normas e preceitos que emanam como princípios inspirados por Deus. A
Escritura é a autoridade final para os judeus e assim ele também a considerava.
Os estudos realizados por Jaeger (2014) procuraram destacar outro aspecto
do pensamento de Clemente Romano. Segundo ele, esse bispo da igreja sempre fazia
derivar suas normas de comportamento humano e social das normas divinas do
universo, que eram chamadas de natureza. Além do mais, recorreu à tradição da
paideia clássica para justificar uma concepção orgânica de sociedade, que ele
assume do pensamento político grego que, em seus escritos, assumiu um significado
quase místico quando ele a interpreta, à maneira cristã, como a unidade no corpo de
Cristo. Na interpretação de Jaeger (2014) ele recorreu, igualmente, às tragédias
gregas, entre as quais a de Eurípides ou Sófocles. Se no Ajax (158), de Sófocles,
Clemente Romano reconheceu o princípio de que os grandes não podem existir sem
os pequenos, e os pequenos sem os grandes, no autor de Aiolos (21) buscou o
pressuposto de que isso acontece porque há uma mistura própria de todas as coisas,
o que, na compreensão de Jaeger, torna o seu uso possível.
Suas descobertas são importantes para nossa tentativa de determinar a
presença de uma tradição viva da paideia grega na comunidade cristã de fala
grega em Roma. Era de fala grega porque foi formada por judeus helenizados
desde o começo até o fim do século I, e talvez por mais tempo que isso. Assim,
podiam oferecer aos coríntios sua crítica cristã na linguagem de sua educação
clássica. Isso não era somente uma questão de estilo, mas levava implícita a
generalidade teórica do método intelectual aplicável a qualquer problema, que
é a marca distintiva da paideia grega (JAEGER, 2014, p. 30).
O propósito de Clemente Romano parece ser o de considerar o antigo conceito
(grego) com um novo espírito propriamente cristão, com a finalidade de organizar a
nova crença como formação e instrução dos novos adeptos. Clemente Romano
cresceu nesse ambiente e se apropriou de sua cultura para ser convincente em seus
ensinamentos. Nesse caso, a língua grega e a forma filosófica de pensar eram
recorrentes em sociedade helenizadas onde o cristianismo se estabeleceu e, portanto,
não poderiam justificar suas crenças de outra forma, que não a de se comunicar na
mesma linguagem. Em sua preocupação com a formação do homem cristão,
conforme expressa em sua I Carta aos Coríntios, fez dela o primeiro a comentar sobre
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
345
uma paideia cristã, segundo já destacado por Pereira Melo (2012), em seu artigo sobre
Clemente Romano, a partir do qual ressalta a flagrante inspiração do conceito de
paideia:
Em termos de concepção educacional, também fica clara a identificação de
São Clemente Romano com a cultura clássica, especialmente quando ele
menciona a necessidade da efetivação de uma paideia cristã – Christó
paideia. Neste caso, é flagrante a inspiração do conceito grego de Paideia.
Desse modo, o conceito apareceu pela primeira vez, entre os cristãos, nessa
carta de São Clemente Romano (Pereira Melo, 2001). Ao afirmar a
necessidade de que “[...] participem nossos filhos de educação em Cristo”
(Carta a los coríntios, XXI,8), ele pôs em tela a “Cristó paideia” (PEREIRA
MELO, 2012, p.193).
Como em qualquer estudo historiográfico, considera-se que foi instruído nos
ensinamentos judaicos, bem como era conhecedor da formação dada aos pagãos, ou
seja, a filosofia greco-romana. Em relação a este conhecimento filosófico precisamos
entender que a filosofia greco-romana foi utilizada pelos propagadores da nova crença
segundo seus propósitos. Se apropriaram dela para alicerçar o discurso direcionado
aos gregos a fim de que fosse palpável a relação de instrução educacional inspirada na
paideia clássica, para aprimorar e convencer adeptos à paideia cristã, conforme seus
propósitos. Servia, igualmente, para corroborar a fé cristã, oferecendo a ela um
sentido novo, de caráter religioso:
O cristianismo é uma religião, empregando por vezes termos filosóficos para
exprimir sua fé, os escritores sacros cediam a uma necessidade humana,
mas substituíam o sentido filosófico antigo desses termos por um sentido
religioso novo. É esse sentido que lhes devemos atribuir, quando os
encontramos nos livros cristãos (GILSON, 2013, XV introdução).
Gilson (2013) reforça que é esse o sentido que devemos atribuir à presença da
filosofia nos escritos e autores cristãos: devemos ser cautelosos porque, de um lado,
há autores que negam a filosofia pagã e, de outro, aqueles que se alimentam dela para
outros fins. Esse mesmo cuidado deve ser dispensado ao se estudar os textos de
Clemente Romano, visto a postura que assumiu em relação à cultura clássica. Usoua, apenas, para justificar uma paideia cristã, sem, entretanto, se posicionar na
condição de defensor de filosofias incompatíveis com a doutrina cristã. Clemente
Romano se apropriou da filosofia clássica a seu favor para edificar a unidade religiosa
entre os adeptos da nova crença, pois era o conhecimento no qual foi instruído.
Desta forma, muitas são as discussões despertadas pela leitura de Clemente
Romano e suas origens instrucionais, mas, o que se deve ressaltar é esta Carta que
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
346
deixou e os ensinamentos que emanam dela. A partir daí, buscamos a compreensão
das instruções religiosas e/ou morais que foram inspiração para muitos cristãos na
história da Igreja e comunidades, entre as quais Antioquia, Cesareia, Samaria,
Filadelfia (Rabá), Trôade, Filipos, Corinto, Éfeso, Esmirna, Sardes, (KOESTER, 2005).
Dessas, cumpre destacar a de Corinto, pois foi para ela que ele destinou sua Carta a
fim de que passasse recomendações, em face dos problemas internos. Por fim, para
além de investigar suas origens, apesar das limitações ocasionadas pela carência de
fontes primárias, cumpre destacar o modo como ele permaneceu na tradição cristã e
na história.
5. CLEMENTE ROMANO VISTO PELA TRADIÇÃO CRISTÃ E HISTÓRICA
Em relação à tradição cristã, temos como referência a trajetória do cristianismo
e os escritores cristãos que foram responsáveis pela sua propagação. Esses
escritores foram reunindo uma literatura que perpetuava as prerrogativas destinadas
à formação de seus adeptos e divulgava a mensagem de Jesus Cristo. Fazendo parte
desta literatura pós- apostólica contamos com Clemente Romano. E de acordo com
essa tradição eclesial, Clemente Romano foi o terceiro bispo de Roma, uma vez que
há informações de que os primeiros bispos exerceram seus cargos na seguinte ordem:
Linus, Anacletus e Clemente Romano. Mas a respeito dessa ordem temos muitas
discussões que elencam essas disposições de outra forma, conforme ratificações e
pesquisas realizadas.
Existem documentos da Igreja que informam a disposição papal na qual
Clemente Romano é citado, como podemos extrair da contribuição de Pereira Melo
(2012), que destaca alguns documentos que elencam a ordem papal:
[...] as Constituições Apostólicas (VII, 46), de 375-380, de autoria anônima; o
Catálogo Liberiano7, de 345; e as cartas de Santo Agostinho (Epístola 53,2);
segundo as quais, a linha sucessória estaria disposta da seguinte forma:
Pedro, Lino e Clemente (PEREIRA MELO, 2012, p.186).
Clemente Romano está nessa lista como um dos primeiros bispos. Assim,
partindo dessas informações, a Igreja de Roma elabora a ordem dos papas desde o
século I d.C., e a mantém como prova da importância histórica dessa crença. Desde
Pedro (5 d. C.– 67 d. C.) se formou uma lista que contém, hoje, 263 papas (DUFFY,
1998). Esse histórico e a ação da igreja garantem a legitimidade dessa cronologia
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
347
papal, uma vez que ela é confirmada por vários estudiosos e documentos.
De acordo com Lamelas (2001), historicamente, um dos primeiros autores a
escrever sobre Clemente Romano foi Hegesipo (110 d. C – 180 d. C.) que era do
Oriente, conhecedor do siríaco e provavelmente de descendência judaica. Hegesipo foi
para Roma, passando por Corinto durante o pontificado do bispo Aniceto (154-166 d.
C.), com o objetivo de estudar nas comunidades cristãs sobre a tradição da doutrina
apostólica. Escreveu várias obras que se perderam, mas sabemos delas pelo
historiador Eusébio de Cesareia (270 a. C. – 339 d; C.) (ALTANER; STUIBER, 1988).
Hegesipo escreveu sobre Clemente Romano e Eusébio de Cesareia (2005) reproduziu
o seu conteúdo e reforçou esse contato:
E a igreja dos coríntios permaneceu na reta doutrina até que Primo foi bispo
de Corinto. Quando navegava para Roma, convivi com os coríntios e com eles
passei muitos dias, durante os quais me reconfortei com sua reta doutrina
(História Eclesiástica, Livro IV, XXII, 2).
Outra fonte considerável sobre o terceiro bispo da igreja, é Irineu de Lyon (130
d.C. - 202 d.C), respeitável historiador da Igreja. Ele considerava Clemente Romano
como o terceiro sucessor de Pedro, depois de Lino (67-76) e Anacleto (76-91) (IRINEU
DE LYON, III, 3,3). Irineu, o bispo de Lião, conhecido principalmente pela sua refutação
do gnosticismo, descreveu no seu livro Contra as Heresias, (III, 3,3) não apenas o
lugar de Clemente na sucessão como também o fato dele enviar correspondências à
Corinto, com a finalidade de pacificar os conflitos ali existentes.
[...] os apóstolos, então, tendo fundado e construído a Igreja, passaram o
comando do episcopado a Lino [...] Seu sucessor foi Anacleto, e, após este,
no terceiro lugar desde os apóstolos, Clemente foi sagrado bispo. Esse, por
ter visto os abençoados apóstolos, assim como suas tradições. [...] No tempo
de Clemente, havendo uma dissensão na comunidade de Corinto, a Igreja de
Roma despachou uma carta poderosa aos irmãos daquela igreja, exortandoos a paz, a renovação da fé deles e declarando a tradição que essa
comunidade recebera recentemente dos apóstolos [...] Clemente foi
substituído por Evaristo, [...] a tradição eclesiástica dos apóstolos e a
disseminação da Verdade têm chegado a nós. E isso nos serve como prova
abundante de que existe uma e vivificante fé, que tem sido preservada pela
Igreja desde os apóstolos até hoje (Adversus haereses, III,3).
A respeito da relação de Clemente Romano com os apóstolos Paulo de Tarso
e Pedro (5 d. C. -67 d. C.), um dos primeiros relatos desse assunto foi feito por
Orígenes (185 d.C. - 253 d.C.), escritor de obras importantes como a “Exortação ao
Martírio” e “Sobre a oração”. Orígenes relaciona Clemente Romano como colaborador
dos apóstolos, ressaltando que na fundação da comunidade de Filipos, Paulo de Tarso
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
348
escreve uma carta que diz: “Junto com Clemente e meus outros colaboradores, cujos
nomes estão no livro da vida” (Fl 4,3)” (RUIZ BUENO, 2002, p. 101).
Também Eusébio de Cesareia e São Jerônimo, que seguem as palavras de
Orígenes, citam a mesma passagem bíblica: Filipenses, capítulo 4 e versículo 3, para
corroborar a presença de Clemente Romano junto aos apóstolos, na propagação da
nova crença nas comunidades que foram fundadas no início da pregação cristã (RUIZ
BUENO, 2002).
Sendo-nos impossível enumerar pelo nome todos os que na primeira geração
de apóstolos foram pastores e inclusive evangelistas nas igrejas de todo o
mundo, é natural que mencionemos por seus nomes e por escrito apenas
aqueles dos quais se conserva a tradição até hoje graças a suas memórias
da doutrina apostólica. [...] 1. Não cabe dúvida, portanto, de que tais são
Inácio, em suas cartas cuja lista fornecemos, e Clemente na carta por todos
admitida, que escreveu em nome da Igreja de Roma à de Corinto (História
Eclesiástica, Livro III, 37, 4; 38, I, 1).
Como complemento dessas informações, o nome de Clemente Romano era
conhecido como um símbolo e sinônimo de pontífice ou bispo romano e Hermas em
o Pastor de Hermas, que escreve em Roma sob o pontificado de seu irmão Pio (141155d. C.), conta-nos a mensagem que lhe foi dada pela Igreja, em uma de suas
obras “As Visões”, em que ele descreve cinco visões (O Pastor de Hermas, “El
Visiones”). Na segunda visão lhe aparece a figura de uma venerável anciã (um anjo
lhe fala em sonho que é a Igreja) que lhe diz: “Copiarás então dois livrinhos ou
cadernos, e você vai mandarum a Clemente e outro para Grapta. Clemente vai mandálo para as cidades de fora, já que ele é o responsável por esta posição ...”
(TREVIJANO, 1994, p. 41). Hermas afirma que Clemente Romano tinha liderança
como bispo na sucessão eclesiástica.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos referenciais acima mencionados, se pode compreender a
importância de Clemente Romano como bispo de Roma para a história cristã. Ela não
pode ser mensurada, visto a relevância de seus ensinamentos, disseminados nas
comunidades cristãs por vários séculos. Dessa forma, é importante considerar que
suas orientações são o produto de um momento histórico, específico do cristianismo
primitivo. Elas refletem a formação, a preocupação e as apreensões do autor e sua
época. A reflexão sobre a redação de Clemente Romano nos instiga a estudar o
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
349
modus operandi de uma crença em que seus adeptos subsistiram à opressão
intentada pelos romanos, se movendo de forma ordenada, instruindo seus convertidos
e seguidores. Tendo em vista que a maioria de seus adeptos não tinham acesso a uma
instrução sistematizada, as cartas eram uma forma de educá-los para uma vivência
em uma sociedade que não acolhia a todos. Em face disso, é necessário pôr em
discussão o conteúdo de seus escritos para, a partir deles, compreender as
dificuldades que teve em moldar os comportamentos, formando os fieis segundo a
crença que acreditava e defendia. Compreendendo o seu momento social, e as
necessidades educacionais para uma formação cristã, Clemente Romano fez de sua
Carta aos Corintos um manual de boas práticas na propagação da fé cristã.
Cumpre afirmar que Clemente Romano procurou agir com a finalidade de
afastar as crises por que passava a comunidade destinatária da carta que redigiu.
Movidas pelas disputas internas, a situação de Corinto motivou o bispo a intervir
chamando a atenção para os valores cristãos que, segundo acreditava, poderia
resolver uma situação que não era compatível com os princípios que defendia e da
religião que procurou expandir, segundo a doutrina de seu fundador e dos
representantes apostólicos. Em seu clamor para a manutenção da unidade e da paz,
ele chamou a atenção para o respeito às autoridades religiosas constituídas, além de
sugerir um conjunto de valores que comporiam a formação dos cristãos no primeiro
século e até hoje.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
350
REFERÊNCIAS
ALTANER, Berthold. Patrologia: vida, obras e doutrina dos Padres da Igreja/
Alfred Stuiber; tradução Monjas Beneditinas – 2ª edição – São Paulo: Paulinas,
1988. BÍBLIA de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2002.
CARTA de são Clemente Romano aos Coríntios. Introdução de Roque Frangiotti
In:
. Coleção Patrística. 2. ed. São Paulo: Paulus, 1995. v. 1. Página 23-72.
CASTELLARO, María Inés. Clemente Romano, sembrador de fraternidad en la
Carta a los Corintios. VERITAS, Nº 34 (Marzo 2016) 211-228. Recibido:
30/Septiembre/2015 - Aceptado: 10/Noviembre/2015. Centro de Estudios Filosóficos
y Teológicos (Córdoba-Argentina) maria_inescastellaro@hotmail.com
CESARÉIA, E. de. História eclesiástica. São Paulo: Fonte Editoria, 2005.
CLEMENT I, P. The First epistle of Clement of Rome to the Corinthians. With an
introduction and notes. In: COWPER, B. H. The First Bishop of Rome taugh.t
London: Religious Tract Society, 1867. p. 325-342.
CLEMENTE ROMANO. Carta aos Coríntios. Introdução de Isidro P. Lamelas,
Tradução de Luís Marques Alcalá: Lisboa, 2000.
COWPER, Benjamin Harris et al. The Epistle of Clement of Rome to the
Corinthians with an introduction and notes: the translation by B. Harris Cowper.
London: The Religious Tract Society, 1867. Disponível em:
https://play.google.com/books/reader?id=BrRWAAAAcAAJ&pg=GBS.PA2
DUFFY, Eamon. Santos & Pecadores: História dos Papas. Tradução: Luiz Antonio
Araujo. Cosac & Naify Edições Ltda. São Paulo, 1998.
FERRAR, W. J. Clemente de Roma. Teologia, Campinas, SP, v. 17, n. 101, p.
275282, 1928. Doi: 10.1177 / 0040571X2801710102.
GIBBON, Edward. Os Cristãos e a Queda de Roma. Tradução de José Paulo Paes
e Donaldson M. Garschagen. 1ª ed. – São Paulo: Penguin Classics Companhia das
Letras, 2012.
GIDALTE, Lara Ximenes. Corinto: uma análise sociolcultural para a fundamentação
do estudo sobre as relações de gênero existentes nas comunidades cristãs do
século I E. C. Artigo aprovado em 2015 pela Revista Eletrônica de Antiguidade –
NEArco, Ano VIII, Número II da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Disponível em: http://www.neauerj.com/Nearco/arquivos/numero16/4.pdf
GRIMAL, P. A civilização romana. Lisboa: Edições 70, 2020. HAMMAN, A. G. Para
ler os padres da igreja. São Paulo: Paulus, 1995. IRINEU DE LIÃO. Contra as
heresias. São Paulo: Paulus, 2014.
INSUELAS, João Baptista Lourenço. História da Patrologia: História da Literatura
Antiga da Igreja. Escola Tipográfica das Oficinas de São José. Braga- Portugal,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
351
1943.
JAEGER, W. Cristianismo primitivo e Paidéia grega. Tradução de Daniel Costa.
Santo André: Academia Cristã, 2014.
JAEGER, W. Paideia: a formação do homem grego. Tradução Arthur M. Parreira.
Revisão do texto grego por Gilson Cesar Cardoso de Souza. 2. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1989.
JEFFERS, J. S. Conflito em Roma: ordem social e hierarquia no cristianismo
primitivo. Tradução de Adail V. Sobral; Maria Stela Goncalves e Laureano Pelegrin.
São Paulo: Edições Loyola, 1995.
KOESTER, Helmut. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Paulus, 2005. 2:
história e literatura do Cristianismo Primitivo.
MARTIN, T. R. Roma antiga: de Rômulo a Justiniano. Tradução de Thomas R.
Martin Porto Alegre: L&PM, 2019.
NASCIMENTO, Amanda C. M do; SELVATICI, Mônica. O Início da
Hierarquização no Cristianismo Primitivo na I Carta de Clemente Romano aos
Coríntios (séc. I d. C.) Revista Relegens Thréskeia, V. 8, pp.132 a 152 – 2019 –
UFPR.
PEREIRA MELO, J. J. P. São Clemente Romano e sua Carta aos Coríntios:
aspectos da educação cristã. Revista Brasileira de História das Religiões, ANPUH,
Porto Alegre, ano V, n. 13, maio 2012. Disponível em:
http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/RbhrAnpuh/article/view/30258 Acesso
em: 12 jan. 2020.
POPE, C. I. Clement of Rome: the two epistles to the Corinthians. a revised text with
introduction and notes by J.B. Lightfoot. Cambridge: Trinity College, 1869. Disponível
em: https://play.google.com/books/reader?id=PH9AAAAAIAAJ&pg=GBS.PA4.
Acesso em: 12 jan. 2020.
POPE, C. I. What the First Bishops of Rome taught: the Epistle of Clement of
Rome to the Corinthians. With an introduction and notes. The translation by B. Harris
Cowper. Disponível em:
https://play.google.com/books/reader?id=BrRWAAAAcAAJ&hl=pt&pg=GBS.P A3.
Acesso em: 12 jan. 2020.
SOCIEDADE Bíblica do Brasil. Revista e corrigida, edição de 1995 da Sociedade
Bíblica do Brasil. 2. impr. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de
Deus, 2019. Disponível em:
https://docer.pl/show/?q=Revista+e+Corrigida%2C+edi%C3%A7%C3%A3o+
de+1995+da+Sociedade+B%C3%ADblica+do+Brasil.+2.+Impr.+Rio+de+Jan
eiro%3A+Casa+Publicadora+das+Assembleias+de+Deus%2C+2019. Acesso em: 12
jul. 2020.
QUASTEN, Johannes. Patrologia I. Hasta el concilio de Nicea, Madrid, BAC, 1968.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
352
ROPERO, Alfonso. Lo Mejor de Los Padres apostólicos. Traduzido e adaptado ao
Espanhol por Alfonso Ropero. Editorial Clie: Barcelona, Espanha. 2004.
ROSTOVTZEFF, Michael Ivanovitch. História de Roma. Tradução de Waltensir
Dutra. – 5ª ed. – Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.
RUIZ BUENO, Daniel. Padres Apostólicos Y apologistas griegos (S.II). Madrid:
BAC, 2002.
SPINELLI, Miguel. Herança Grega dos Filósofos Medievais. São Paulo: Hucitec,
2013.
SILVA. Roseli Gall do Amaral. A formação do homem ideal em Paulo de Tarso: o
amor como elemento formativo. Dissertação de Roseli Gall do Amaral Silva
apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade
Estadual de Maringá. Maringá, PR: UEM, 2010. Disponível em:
http://www.ppe.uem.br/SITE%20PPE%202010/dissertacoes/2010_roseli_gall. pdf
Acesso em 27 jul. 2021
TREVIJANO ETCHEVERRIA, Ramon. Patrologia. Biblioteca de Autores Cristianos.
Madrid: 1994
WITHROW Brandon G. Rising from the Ashes: Rediscovering the St.
Clement of Rome’s Doctrine Perseverance. Testamentum Imperium An
International Theological Journal. Volume I - 2005 - 2007
WITHROW, Brandon G. Ressuscitando das Cinzas: Redescobrindo a Doutrina da
Perseverança de São Clemente de Roma. Testamentum Imperium – Volume I –
2005 - 2007, Rising from the Ashes: Rediscovering the St. Clement of Rome’s
Doctrine of Perseverance (17p) Dr. Brandon G. Withrow—Samford University,
Birmingham, AL, USA www.PreciousHeart.net/ti
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118405-118405 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
353
CAPÍTULO 19
COMPROMETIMENTO, LIDERANÇA E VALORES COMO FATORES DE
INFLUÊNCIA NA QUALIDADE DE VIDA EM UMA EMPRESA DE TECNOLOGIA DA
INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
Marcos Vinícius de Souza Toledo
Mestrado em Sistemas de Informação e Gestão do Conhecimento
Instituição de Atuação Atual: Universidade FUMEC
Endereço: Rua Cobre, nº 200, Bairro: Cruzeiro – Belo Horizonte – CEP: 30310-190
E-mail: mv.toledo@yahoo.com.br
Bruno de Souza Toledo
Doutorado em Sistemas de Informação e Gestão do Conhecimento
Instituição de Atuação Atual: Universidade FUMEC
Endereço: Rua Cobre, nº 200, Bairro: Cruzeiro – Belo Horizonte – CEP: 30310-190
E-mail: bruno.toledo@ifmg.edu.br
Karina Dutra de Carvalho Lemos
Mestrado em Modelagem Matemática e Estatística
Instituição de Atuação Atual: Universidade FUMEC
Endereço: Rua Cobre, nº 200, Bairro: Cruzeiro – Belo Horizonte – CEP: 30310-190
E-mail: karina.dutra@ifmg.edu.br
Mário Teixeira Reis Neto
Doutorado em Administração
Instituição de Atuação Atual: Universidade FUMEC
Endereço: Rua Cobre, nº 200, Bairro: Cruzeiro – Belo Horizonte – CEP: 30310-190
E-mail: reisnetomario@fumec.br
RESUMO: O mundo corporativo tem a consciência da importância da qualidade de
vida no trabalho e de criar condições favoráveis para o bem-estar e motivação dos
seus funcionários, para isto ele vem utilizando dos comportamentos organizacionais
para conseguir alcançar tais finalidades, como: comprometimento, liderança e valores.
Este artigo tem por objetivo discutir as proposições teóricas na prática em um
ambiente organizacional, à luz da literatura sobre tipos de comportamentos
organizacionais e qualidade de vida nas empresas de tecnologia da informação. Para
tal, foi utilizada como metodologia a revisão de literatura com as seguintes temáticas:
comprometimento, liderança, valores e qualidade de vida nas empresas de TI. E como
esses tipos de comportamentos organizacionais influenciam na qualidade de vida dos
indivíduos em um ambiente corporativo. Finalmente, são apresentadas cinco práticas
que podem melhorar a qualidade de vida no trabalho nas organizações, a saber: 1) as
empresas oferecem um bom ambiente organizacional aos seus funcionários; 2) a
motivação dos funcionários deve partir da sua chefia imediata; 3) cabe ao líder buscar
a criação de ambiente propício na empresa; 4) considera-se um bom líder alguém que
motiva e coordena à equipe aplicando de maneira eficaz, sua habilidade individual e
grupal e 5) a empresa espera desde o nível operacional até a alta gerência, atitudes
e comportamentos das pessoas que trabalham nela. Pode-se chegar a seguinte
conclusão, as práticasse bem aplicadas, podem auxiliar as empresas a melhorarem a
qualidade de vida no ambiente organizacional.
354
PALAVRAS-CHAVE: Qualidade de vida no trabalho; Comportamentos
organizacionais; Ambiente organizacional; Motivação dos funcionários.
ABSTRACT: The corporate world is aware of the importance of the quality of life at
work and of creating favorable conditions for the well-being and motivation of its
employees, for which it has been using organizational behaviors to achieve such
purposes as: commitment, leadership and values. This paper aims to discuss
theoretical propositions in practice in an organizational environment, in light of the
literature on types of organizational behavior and quality of life in information
technology companies. For this, the literature review was used as methodology, with
the following themes: commitment, leadership, values and quality of life in IT
companies. And how these types of organizational behaviors influence the quality of
life of individuals in a corporate environment. Finally, five practices that can improve
the quality of work life in organizations are presented, namely: 1) companies offer a
good organizational environment to their employees; 2) the motivation of the
employees must start from their immediate leadership; 3) it is up to the leader to seek
the creation of a favorable environment in the company; 4) a good leader is someone
who motivates and coordinates the team by effectively applying their individual and
group skills and 5) the company expects from the operational level to the top
management, attitudes and behaviors of the people who work on it. The following
conclusion can be drawn: practices, if well applied, can help companies to improve the
quality of life in the organizational environment.
KEYWORDS: Quality of life at work; Organizational Behaviors; Organizational
environment; Motivation of employees.
355
1. INTRODUÇÃO
Com a evolução das tecnologias e a globalização das informações têm trazidos
impactos no quadro social e econômico da população, a rapidez dos avanços
tecnológicos e a maciça competição fora e dentro das empresas, fez com que o
trabalho tomasse maior parte do tempo e da vida dos seres humanos, neste contexto,
o tema Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) tem ganhado espaço nas discussões
em ambientes organizacionais (Bastos, 2015).
A Qualidade de Vida no Trabalho tem sido uma preocupação constante dos
indivíduos que trabalham nas empresas de TI (Tecnologia da Informação), pois
diversos fatores podem influenciar a qualidade de vida no mundo moderno,
constituindo seu ambiente social, físico e psíquico, e podem ser identificados, como:
a família, o lazer, a educação, o próprio indivíduo e, por último, o trabalho (Siqueira,
2015).
O Comportamento Organizacional influencia todo o clima da corporação e é
fundamental entender a sua dinâmica dentro de uma organização. O trabalho dos
líderes tem a possibilidade de prever e evitar problemas individuais ou coletivos entre
os funcionários, bem como estruturar métodos de liderança e estratégias de gestão
efetiva por meio do comprometimento e valores dos indivíduos perante a empresa,
pois estas estratégias trazem o alcance de metas e resultados desejados. O
comportamento organizacional aliado à qualidade de vida nas empresas traz
resultados competitivos e lucros para as organizações.
Para isto, é necessário fazer o estudo e a avaliação do comportamento dentro
das organizações, a fim de trazer maior entendimento sobre as lacunas empresariais,
no sentindo comportamental e cultural, para o desenvolvimento contínuo e acertado
de soluções com o objetivo de atrair e reter talentos, promover engajamento,
produtividade e harmonia entre os gerentes, os funcionários e os clientes. Com o
intuito de este contexto ser realizado dentro da empresa, a qualidade de vida no
trabalho é essencial em ambientes corporativos, pois ela corresponde o grau de
satisfação das necessidades pessoais que o funcionário consegue enquanto exerce
sua função.
Nesse contexto, justifica-se este estudo teóricona medida em quea maior parte
das pessoas fica muito tempo no ambiente de trabalho e o gestor deve levar em
consideração o impacto que as horas excessivas exercem não apenas na saúde
356
física, mas também na saúde mental dos funcionários. Esse impacto tem relação
direta com os resultados das empresas de Tecnologia da Informação, ou seja, a
qualidade de vida no trabalho está diretamente relacionada ao comportamento
organizacional de uma empresa. O comportamento nestas empresas é de
fundamental importância no desenvolvimento do comportamento humano dentro de
um ambiente empresarial, que busca tratar a equipe, os indivíduos e toda a estrutura
da organização, sob a óticado comportamento dentro das empresas, para que haja
atitudes e motivações, assim os programas de qualidade de vida dentro das
organizações têm o objetivo de reter talentos, aumentar a produtividade e o
desempenho da empresa perante o mercado.
O presente artigo objetiva discutir as proposições teóricas na prática em uma
empresa de TI, à luz da literatura sobre tipos de comportamento organizacional e
qualidade de vida nas organizações.
Como estratégia metodológica, utilizou-se no estudo a revisão da literaturacom
as seguintes temáticas: comprometimento, liderança, valores e qualidade de vida nas
organizações. E como estes tipos de comportamentos organizacionais influenciam na
qualidade de vida dos indivíduos em um ambiente corporativo.
2. COMPROMETIMENTO ORGANIZACIONAL
O comprometimento organizacional pode ser considerado fator importante para
indivíduos e organizações, influenciando as vivências no trabalho e a produtividade.
O termo comprometimento é usado quando alguma pessoa se refere a relações que
se estabelecem com outras pessoas, entre uma pessoa e um grupo ou uma pessoa e
uma organização (Bastos & Maia, 2011).
Já para Menezes (2019) conceitua o comprometimento organizacional como
um tipo de vínculo social estabelecido entre o trabalhador e a organização, composto
de um componente afetivo e de identificação que predispõe um conjunto de intenções
comportamentais de proatividade, participação e defesa da organização.
Uma das principais preocupações das organizações é de conseguir selecionar
e manter os funcionários envolvidos na busca de soluções para os problemas
relacionados no cotidiano da empresa, neste contexto, o comprometimento torna-se
um fator primordial para o engajamento e o envolvimento do funcionário em uma
organização.
357
Porém, se não for dada a devida atenção às necessidades destes profissionais
e as suas condições de trabalho, isto pode contribuir para um baixo comprometimento
organizacional, trazendo prejuízos para o trabalhador e para o alcance dos objetivos
organizacionais (Kilimnik et al., 2013).
O comprometimento tem haver com a identificação da relação do funcionário
com os objetivos e os valores da organização e associada a um nível de satisfação
de fazer parte da mesma, e estar disposto a realizar-se tudo pela empresa. Neste
contexto, projeta-se um sentimento de lealdade relacionado com a visão, missão e
valores organizacionais e participação quase irrestrita nos processos decisórios de
uma empresa.
À medida que os estudos sobre comprometimento nas empresas foram
ganhando espaços, algumas contribuições relevantes foram evidenciadas, como por
exemplo, que um indivíduo comprometido com uma organização cria um vínculo que
o leva a fazer sacrifícios em prol da mesma (Silva et al., 2018) e que, quando
comprometidos, eles tendem há permanecer mais tempo na organização (Rocha &
Honório, 2015).
Manter o funcionário comprometido é um dos fatores responsáveis por atribuir
qualidade e eficiência dentro de uma empresa, diminuindo custos com desperdícios
de materiais de bens de consumo e reduzindo a rotatividade de pessoal nos postos
de trabalho e diminuindo as ausências rotineiras em seu departamento.
A maior parte das definições sobre comprometimento organizacional tem em
comum o estado psicológico do indivíduo na sua relação com a empresa, o que pode
diminuir suas chances de abandoná-la. O comprometimento pode ser entendido como
a identificação pessoal e o envolvimento emocional com uma organização. Essa
identificação baseia-se fortemente em três fatores: a crença e a aceitação dos valores
de uma determinada organização; o funcionário manter vínculo com a empresa e o
esforço do funcionário de manter eficiente dentro da organização.
Nesse sentindo, o modelo de Meyer e Allen (1991) reúne as principais correntes
para definir o termo comprometimento:
a)
Afetiva: envolve o apego e a identificação do funcionário com os
valores da organização;
b)
Instrumental ou calculativa: envolve a ligação do funcionário com
a organização em respostas às suas necessidades e expectativas no trabalho;
358
c)
Normativa: envolve o funcionário em permanecer na organização
relacionado a padrões morais.
Os pontos em comum destas três dimensões citadas no modelo anteriormente
são a visão do comprometimento como um estado psicológico que caracteriza o
relacionamento do funcionário com a empresa e as implicações de continuar ou não
como um membro da organização (Rocha & Paiva, 2016).
Diante deste cenário, o comprometimento significa mais que respeitar os
princípios e as regras dentro da organização, envolve um relacionamento afetivo com
a organização, em que cada funcionário contribui com seus conhecimentos com a
empresa, para que a mesma possa crescer e expandir seus negócios e
consequentemente aumentar o seu faturamento.
O comprometimento organizacional afetivo é um preditor importante para o
desempenho do empregado e para a diminuição na intenção de rotatividade (Silva,
Capellozza, & Costa, 2014).
De acordo com as principais análises das correntes teóricas sobre os conceitos
de comprometimento foram detectadas três abordagens: apego afetivo à organização,
percepção de custos associados ao abandono da organização e obrigação de
permanecer na organização.
O comprometimento organizacional pode ser percebido na forma como o
trabalhador se relaciona com a empresa, se adere às práticas organizacionais e se
está empenhando em participar e trabalhar para o alcance das metas e objetivos das
empresas. O funcionário motivado irá se engajar em participar do crescimento e na
melhora do desempenho da empresa. Algumas práticas da organização e dos
recursos humanos podem auxiliar no comprometimento dos funcionários, como:
recompensas baseadas em desempenho, incentivo ao desenvolvimento pessoal e
compartilhamento das informações da empresa.
O comprometimento das pessoas pode ter relação com o tempo, uma vez que
elas levam suas vivências e emoções para o ambiente a qual estão inseridas. No
ambiente de trabalho, por exemplo, podem interferir em resultados, relacionamentos,
valores, lideranças e grupos de trabalhos. Sendo assim, alguns destes fatores serão
abordados adiante e suas relações com as organizações.
359
3. LIDERANÇA E SEUS EFEITOS NA ORGANIZAÇÃO
A liderança é uma atividade, que envolve mobilizar pessoas, e que pode ser
vista como um trabalho adaptativo, com mudanças em valores, crenças e
comportamentos (Heifetz, 1994). O líder é aquele que usa do seu poder de influência
junto aos seus seguidores, sendo capaz de estimular os seus liderados a depositarem
um esforço extra para atingir o objetivo proposto pela empresa que é estimular os
funcionários a trabalharem em equipe.
O trabalho em equipe é essencial para obtenção de bons resultados em
qualquer organização, pois o trabalho em equipe harmonioso resulta em maior rapidez
e eficiência no ambiente corporativo, e para que um grupo de pessoas se organize de
maneira consistente visando à solução de um problema, é essencial a figura de um
líder dentro de uma empresa.
Alguns líderes são capazes de despertar, em seu grupo, sentimentos
construtivos, de força, de comprometimento; enquanto outros podem fazer enaltecer
os mais agressivos gestos de terror e destruição. Entretanto, para ser líder, embora
seja necessária uma flexibilização diante das diferentes situações e pessoas com as
quais vai se relacionar, só exercerá liderança se seus seguidores estiverem em
consonância com as ideias do líder.
Northouse (2013) define liderança como: “um processo em que um indivíduo
influencia um grupo de indivíduos para alcançar um objetivo comum” (p. 5). Ao
considerar a liderança como um processo, este autor busca expandir o conceito, não
associando a prática a um líder formalmente designado, visto que um líder pode
exercer influência sobre as pessoas devidas às suas características e forma de
atuação (Gramkow, 2016).
Estudos de liderança abordam uma variedade de tópicos, incluindo traços de
personalidade, energia, visão, valores, carisma, fatores situacionais, seguidores,
equipes, função, níveis de competências, comportamentos, espiritualidade e
inteligência (Nicholson, 2013).
O estilo de liderança denota a conduta e as atitudes demonstradas por líderes
de como eles influenciam os outros e interagem com as partes interessadas. Muitas
vezes, os líderes demonstram um padrão consistente de comportamentos que
caracterizam o seu estilo de liderança. O estilo de liderança dá o tom no ambiente
360
corporativo e pode moldar a atitude e o desempenho da força de trabalho (Dubrin,
2015).
Compreende-se que, ser um líder é ter uma visão da relação do homem com
seu ambiente de trabalho, é saber ensinar e também aprender, fazer uso das suas
emoções para conduzir pessoas. A liderança é específica em relação a cada momento
dentro de uma organização e precisa ser exercida, no entanto, o profissional para
exercer a função de líder não precisa mudar de personalidade, mas tem que mudar
seu modo de agir de acordo com cada situação que acontecer dentro do ambiente de
trabalho.
Por isto, o líder requer algumas atitudes e comportamentos dentro de uma
organização, tais como:
a)
Superar expectativas: os líderes buscam sempre alcançar metas
acima das estabelecidas pela empresa, pois seu conhecimento e perspicácia
faz que o desempenho da empresa atinja um patamar acima do préestabelecido;
b)
Sintonizar com as novidades do mercado: os líderes sempre estão
em sintonia com as exigências e criação de novos produtos para o mercado
consumidor devido a sua inteligência emocional;
c)
Enxergar o potencial das pessoas: os líderes sempre estão
atentos com sua equipe e o que acontece com ela, pois o treinamento e o
desenvolvimento dos funcionários são essenciais na evolução do desempenho
da equipe no trabalho.
A liderança e a tomada de decisão na empresa devem ser exercidas
objetivando minimizar o surgimento de conflitos, aumentar a produtividade e os bons
resultados. Nesse sentido, o papel do líder como motivador passa a influenciar sua
interação com os liderados na tentativa de a organização obter bons resultados e
diminuir os conflitos entre os funcionários (Tillmann & Grzybovski, 2005).
O líder deve apreciar as características individuais, analisar o desempenho da
equipe de maneira justa, ser um guia de tarefas a serem desempenhadas e motivar a
equipe a alcançar as metas estipuladas pela organização (Mello, 2014). A liderança é
uma competência que, com bons propósitos e determinação, se desenvolve dentro do
ambiente organizacional, pois um bom líder incentiva o crescimento e o bem estar do
grupo.
361
Se a liderança for exercida com autoridade e individualismo, pode levar ao
desânimo, à indiferença e até mesmo o temor dos funcionários. Isto levaria a
diminuição do desempenho da equipe no trabalho. Com a falta de motivação, os
indivíduos se tornam pouco produtivos e consequentemente acarreta perda de
lucratividade na organização.
Por isto, a liderança deve influenciar na construção de uma cultura
organizacional baseada em valores éticos, gerando um clima organizacional baseado
na confiança e na participação. Dentre estas características podem-se citar: estímulo
e promoção de um ambiente crítico; participativo; propício à construção de novos
conhecimentos; construção de um ambiente de confiança; o líder atuando como
facilitador nas relações entre os funcionários, estimulando-os no compartilhamento do
conhecimento nas organizações e promoção de um ambiente, baseado nas relações
de confiança, que valorize e estimule o desenvolvimento dos trabalhadores dentro de
uma organização (Torres, 2005).
Esse cenário favorece a construção de valores, visto que a ética e a
autenticidade nas relações entre as pessoas colaboram para o bom convívio e
desempenho organizacional.
4. VALORES DENTRO DE UMA ORGANIZAÇÃO
Os valores organizacionais fazem parte do comportamento organizacional de
uma empresa, porque estabelecem a base na compreensão de atitudes e de crenças
que proporcionam a identidade de uma organização. Tamayo (2006) diz que os
valores organizacionais: “são construídos sobre princípios ou crenças relativas às
metas e aos comportamentos organizacionais desejáveis, que orientam a vida da
empresa e estão a serviço de interesses individuais, coletivos ou mistos” (p. 179).
Os valores organizacionais segundo Porto (2012) são definidos como: “são
representações mentais compartilhados pelos membros da organização, que
convivem dentro do mesmo ambiente, em um espaço de tempo duradouro,
consistindo em princípios que orientem práticas e normas organizacionais” (p. 242).
Os valores podem ser caracterizados como princípios que direcionam a vida
dos indivíduos, para compreenderem o pensamento e as ações dos seres humanos.
Além destas características, os valores possuem caráter integrativos, capazes de
decodificar as influências dos fatores sociais, políticos, religiosos ou econômicos e
362
delinear as identidades, os comportamentos e as atitudes de indivíduos ou grupos
(Ros, 2016). Assim, os valores podem ser influenciados pela classe social, pela
escolaridade, informação recebida e interpretada, pelo convívio entre as pessoas,
além das relações de poder (Borlido, 2011).
Desse modo, os valores podem ser associados ao grau de importância
atribuído pelo sujeito, podendo sofrer variações de acordo com o julgamento de cada
pessoa (Schwartz, 2005). Pode-se inferir pela citação do autor que, os valores
individuais são o principal fator da personalidade humana e a base do
autoconhecimento, podendo apresentar-se como crença, uma vez que os valores
guiam o comportamento do indivíduo e conscientiza a pessoa do que deve ser
realizado ou não em um determinado ambiente.
No ambiente organizacional, os valores pessoais podem influenciar as tomadas
de decisões à medida que os valores organizacionais sejam compatíveis ou
semelhantes aos valores dos trabalhadores (Mourão et al., 2003).Os valores
organizacionais envolvem princípios ou crenças que estão relacionados às metas e
aos comportamentos organizacionais, que sustentam não apenas às políticas, mas as
práticas de gestão da organização, as quais possam não os concretizar de fato no
cotidiano do trabalho (Gehman, Treviño, & Garud, 2013).
De acordo com Oliveira e Tamayo (2014) os valores organizacionais podem ser
classificados em oito tipos de valores:
a)
Realização: valorização da competência para o alcance do
sucesso da organização e dos empregados;
b)
Conformidade: valorização do respeito às regras e modelos de
comportamento no ambiente de trabalho;
c)
Domínio: valorização do poder, controle sobre pessoas, recursos
e mercado;
d)
Bem-Estar: valorização da satisfação dos empregados mediante
a qualidade de vida do trabalho;
e)
Tradição: valorização dos costumes e práticas consagradas;
f)
Prestígio: valorização da organização na sociedade, mediante a
qualidade dos produtos;
g)
Autonomia: valorização de desafios, a busca de aperfeiçoamento
constante e a definição de objetivos profissionais dos empregados;
363
h)
Preocupação com a coletividade: valorização do relacionamento
com pessoas que são próximas à comunidade.
Para melhor conhecer estes valores organizacionais, é preciso entender o
cotidiano dos empregados, pois são por meio deles que os valores organizacionais
são externalizados, direta ou indiretamente, podendo ser considerados como
observadores internos, envolvidos diretamente no processo coletivo, para identificar
as prioridades de valores na organização (Paiva, 2013).
Liang (2012) corrobora com esta ideia acrescentando que há uma relação entre
os valores organizacionais e os valores pessoais, uma vez que ambos orientam e
direcionam a vida de grupos e indivíduos. Desse modo, os valores dos indivíduos
poder ser compreendidos pelo que eles julgam importante, o que vai pautar sua
conduta dentro das organizações onde trabalham, e mais particularmente, no trabalho
que realizam (Teixeira et al., 2013).
Os valores em uma organização devem ser bem definidos e vivenciando-os no
cotidiano, o clima e a cultura organizacional serão muito favoráveis aos bons
resultados e aos bons relacionamentos. Toda empresa deve perceber que, cultivando
bons valores, será possível alcançar internamente processos mais bem estruturados
e mais robustos e externamente melhores diferenciação do mercado perante aos
clientes.
O mercado, atualmente, exige negócios que estão ancorados em valores como:
transparência, qualidade, valorização das pessoas, espírito de equipe, respeito ao
cliente e a importância na qualidade de vida de seus funcionários. A qualidade de vida
é trabalhar com satisfação, sem medir esforços para atingir o crescimento
organizacional, é fazer com que os indivíduos sintam-se verdadeiros parceiros da
empresa e formem equipes visando alcançar os objetivos organizacionais, que são a
harmonia do trabalho em equipe, geração de lucros para a empresa e motivação dos
seus colaboradores internos e externos.
5. QUALIDADE DE VIDA NA ORGANIZAÇÃO
O termo Qualidade de Vida (QV) é multidisciplinar e recente, em processo de
afirmação de fronteiras e conceitos; por isso, definições sobre o termo são comuns,
mas nem sempre concordantes (Almeida, Gutierrez, & Marques, 2012). Para a
Organização Mundial de Saúde (OMS), qualidade de vida pode ser definida como
364
percepção dos indivíduos de que suas necessidades estão sendo satisfeitas ou,
ainda, que lhes estão sendo negadas oportunidades de alcançar a felicidade e a
autorrealização, com independência de seu estado de saúde físico ou das condições
sociais e econômicas, não envolvendo somente a saúde física e mental (OMS, 2008).
Conceitua-se ainda qualidade de vida como olhar do sujeito para sua posição
no contexto da cultura, sistemas de valores nos quais vive em relação aos seus
objetivos, expectativas, padrões e preocupação, até a dimensão dos comportamentos
organizacionais (Almeida & Gutierrez, 2010).
No ambiente de trabalho e nas organizações, o conceito de qualidade de vida
é uma compreensão abrangente e comprometida das condições de vida no ambiente
laboral, incluindo aspectos de bem-estar, garantia da saúde, segurança física, mental,
social e capacitação para realizar tarefas com segurança e bom uso do trabalho do
indivíduo (Padilha, 2014).
A construção da qualidade de vida nas organizações ocorre a partir do
momento que a empresa e as pessoas como um todo, promovendo o bem-estar e a
segurança dos trabalhadores, a fim de assegurar uma maior produtividade, qualidade
no trabalho e maior satisfação na vida familiar e pessoal (Aquino & Fernandes, 2013).
A qualidade de vida no trabalho, não depende apenas da oferta de serviços
assistenciais públicos ou empresariais, nem mesmo programas de gestão que
ofereçam ginástica laboral, massagens, salas de descanso e outros recursos de
relaxamento antes e depois da jornada de trabalho. Depende, exclusivamente, no
planejamento do trabalho e sua execução no tempo pré-determinado, que também
leve em conta as necessidades de adaptação dos trabalhadores no seu ambiente de
trabalho.
A qualidade de vida em uma organização está ligada à motivação dos
funcionários, para isso é preciso criar um ambiente de trabalho, onde as pessoas
possam se sentir bem com o seu chefe, com eles mesmos e entre os colegas de
trabalho, e estar confiantes na satisfação das próprias necessidades, ao mesmo
tempo em que cooperam com o grupo. Não se pode dizer em qualidade de produtos
e serviços se aqueles que vão produzi-los não tem qualidade de vida no trabalho
(Fernandes, 2006).
É necessária a conscientização da importância dos indivíduos se adaptarem no
ambiente organizacional, isto é dever das lideranças para que haja a aprovação de
investimentos, mudança de cultura organizacional e integração dos departamentos
365
dentro de uma empresa, pois um dos maiores desafios dos recursos humanos em um
ambiente organizacional é atrair e reter bons profissionais para atuarem nas tarefas
cotidianas da empresa.
Algumas empresas promovem ações para a promoção da qualidade de vida,
tais como: criação de espaços para descanso, grupos de corrida e caminhada,
campanhas de incentivo para uma alimentação saudável e cuidados com a saúde.
Muitos benefícios com estas ações já foram comprovados, entre eles maior
produtividade, menos estresse no ambiente de trabalho, diminuição de faltas
decorrentes de problemas com saúde, melhor integração entre equipes e empresae,
principalmente maior valorização à organização por parte dos seus funcionários e de
seus colaboradores.
Para Chiavenato (2010) a qualidade de vida nas organizações é um construto
complexo que envolve alguns fatores, tais como: a satisfação com o trabalho
executado; as possibilidades de crescimento futuro na organização; o reconhecimento
da alta gerência pelos resultados alcançados por determinado funcionário ou pela
equipe de trabalho; o relacionamento humano dentro da equipe e da organização; a
liberdade de atuar e responsabilidade de tomar decisões e as possibilidades de um
funcionário ou uma equipe de estar engajado e de participar ativamente na tomada de
decisões nas empresas.
França (2016) enfoca a participação no processo decisório e a possibilidade de
discutir soluções em conjunto são fatores fortemente relacionados e descritos como
decisivos na qualidade de vida no trabalho. Arellano (2008) reforça a ideia que a
preocupação com a qualidade de vida no trabalho já está presente em grande parte
das organizações que em busca do diferencial competitivo, fazem constantes
alinhamentos das questões organizacionais e da dimensão humana, gerando a
necessidade de se construir uma forma de administrar o bem-estar.
De acordo com Paz, Neiva e Dessen (2012) o bem-estar nas organizações
depende da prática dos direitos e deveres entre o empregado e a empresa. O
empregado tem como dever realizar suas atividades objetivando alcançar as metas
organizacionais que garantam a sobrevivência e o crescimento da empresa, enquanto
a organização fica responsável por garantir um ambiente favorável ao alcance de tais
metas, sem comprometer a saúde do trabalhador e garantir o seu bem-estar pessoal
dentro da organização. Estas metas podem, por exemplo, ser a criação de meios de
comunicação entre a corporação e o público-alvo desta empresa e investimento em
366
uma estratégia de marketing eficaz por um determinado período de tempo para
alavancar as vendas de determinados produtos.
Hádiversos fatores que estão ligados ao conceito e promoção de qualidade de
vida em um ambiente de trabalho, como os tipos de comportamentos organizacionais:
liderança, comprometimento e valores de uma organização. Estes tipos de
comportamentos, se bem trabalhados e orientados, auxiliam os indivíduos em busca
da satisfação profissional e um ambiente de trabalho harmonioso, isto acarreta
aumento de produtividade e melhor desempenho por parte dos funcionários em uma
empresa de TI.
6. PROPOSIÇÕES TEÓRICAS APLICADAS NA PRÁTICA
Conforme apresentado anteriormente na revisão bibliográfica, verifica-se a
importância do comportamento organizacional como fator influenciador para a
qualidade de vida do indivíduo dentro de uma empresa de tecnologia da informação.
A preocupação das organizações com a qualidade de vida dos funcionários
vem aumentando cada vez mais ao longo dos anos, haja vista que as empresas
percebem que primeiramente precisam satisfazer às necessidades dos empregados,
para assim, conseguirem atender às expectativas dos seus clientes e as empresas
alcançarem seus objetivos, que é serem competitivas no mercado.
Os profissionais são pressionados a proporcionar os resultados ou metas
estabelecidas pelas organizações, causando muitas vezes frustração pelo baixo
desempenho conseguido pela equipe no trabalho. Silva e Ferreira (2013) afirmam que
a relação harmoniosa dos funcionários com as organizações traz benefícios no
desenvolvimento e na agilidade na execução das tarefas em um ambiente
organizacional. Alguns benefícios como salários justos, desenvolvimento de
competências e a participação nas tomadas de decisões são fatores que influenciam
positivamente na qualidade de vida do trabalho.
Diante das exposições ao longo do artigo, acredita-seque algumas boas
práticas possam ser aplicadas em uma empresa de TI, a fim de melhorar a qualidade
de vida dos funcionários com foco no comportamento organizacional, tais como:
comprometimento, liderança e valores.
Conforme observado na revisão de literatura, o atual cenário nas empresas de
tecnologias confirma a influência positiva do comportamento organizacional na
367
qualidade de vida do trabalho, pois os estudos demostraram quanto mais
comprometido e satisfeito o funcionário dentro de uma organização, melhor será o seu
bem-estar no ambiente empresarial e consequentemente às tomadas de decisões vão
ser realizadas de maneiras corretas e conscientes. Assim, espera-se que a Prática 1,
a seguir, possa ser entendida como uma regra de lições aprendidas no contexto
organizacional:
Prática 1: Inicialmente, as empresas de TI devem oferecer um bom ambiente
organizacional aos seus funcionários e por consequência os indivíduos e as equipes
de trabalho serão mais bem comprometidos com suas tarefas cotidianas e
atingirãometas estabelecidas pela organização. Diante deste contexto, a organização
ganha em produtividade.
Diante das diversas visões dos autores por meio da revisão de literatura, o
funcionário deve estar em sintonia com os interesses da empresa, pois existe uma
relação de dependência entre eles. Um funcionário não comprometido com o trabalho
prejudica a própria imagem e atrapalha o alcance das metas organizacionais. A falta
de comprometimento dos funcionários tem afetado muitas organizações e dificultado
o crescimento de alguns negócios. A Prática 2 tenta minimizar este cenário do servidor
descomprometido com o trabalho:
Prática 2: A motivação dos funcionários deve partir de sua chefia imediata.
Reconhecer o esforço dos indivíduos nos afazeres profissionais é muito proveitoso e
traz aprendizado para a empresa de TI. Neste contexto, as empresas devem estimular
a qualidade de vida no ambiente de trabalho, pois isto aumentará o envolvimento e o
empenho dos trabalhadores, seja pela identificação com a missão e os valores da
empresa, seja por uma promoção no trabalho.
Em algumas empresas de TI é comum algumas pessoas trabalharem em salas
isoladas, na literatura pode-se perceber que em algumas organizações o clima
organizacional é o pior possível, pois alguns funcionários sofrem assédios morais e
isto faz com que eles desestimulem nas execuções das tarefas cotidianas. Alguns
líderes são autoritários e isto faz com que o ambiente de trabalho fique improdutivo e
o sentimento de insatisfação predomina nos setores da organização. A Prática 3
sugere melhoras no ambiente de trabalho:
Prática 3: Cabe ao líder buscar a criação de um ambiente propício, onde os
funcionários se sintam motivados a trabalhar em um local harmônico e motivador
dentro do seu grupo de trabalho. O líder deve fornecer meios para que as pessoas se
368
sintam engajadas à equipe e que os indivíduos atinjam melhores qualidade de vida
dentro da empresa de TI.
As organizações são compostas por pessoas, com emoções e motivos
racionais diferentes, sujeitos ao ambiente que influenciam a motivação, os
relacionamentos e a liderança, entre outras dinâmicas que motivam a conduta do ser
humano e da equipe no trabalho. O gestor precisa motivar e saber conduzir pessoas,
pois administrar uma equipe com qualidade diferencia as empresas de TI competitivas
de seus concorrentes. A Prática 4 mostra como a liderança pode afetar na qualidade
de vida dos trabalhadores em uma empresa:
Prática 4: Considera-se um bom líder alguém que motiva e coordena a equipe
aplicando de maneira eficaz, suas habilidades individuais e grupais, seus
conhecimentos e suas experiências de como alcançar as metas na organização. O
gestor ideal é aquele que treina com eficiência os funcionários, recompensa-os de
forma justa e motiva a equipe. Inclusive, um bom líder melhora a qualidade de vida no
trabalho dentro de uma empresa de tecnologia.
A literatura revela que os valores organizacionais como a realização valoriza a
competência dos funcionários para o alcance do sucesso da organização aliada com
o bem-estar dos indivíduos mediante a qualidade de vida no trabalho. Os valores
organizacionais são externalizados no cotidiano através dos indivíduos que darão a
determinada organização sua identidade. A Prática 5 foca os valores dentro de uma
empresa de TI aliada com a qualidade de vida no trabalho:
Prática 5: A empresa de tecnologia espera desde o nível operacional até a alta
gerência, atitudes e comportamentos das pessoas que trabalham nela. Os valores
organizacionais permeiam a cultura organizacional, influenciando no relacionamento
da chefia com os funcionários, as relações entre os trabalhadores e ainda seu
comprometimento com a identidade da empresa perante o mercado. Os valores
dentro de uma organização podem ser trabalhados para compreender, explicar e
interpretar as motivações das pessoas no ambiente de trabalho. Com relações às
motivações, aspectos como a qualidade de vida no trabalho, visa o aumento de
resultado de uma empresa de TI e a satisfação para o trabalhador.
De acordo com a revisão teórica, deduz-se que com as cinco práticas citadas
anteriormente comprovam-se que os comportamentos organizacionais, como:
comprometimento, liderança e valores influenciam a qualidade de vida em uma
empresa de tecnologia da informação. A literatura também comprova que o contrário
369
também é verdadeiro, que a qualidade de vida pode influenciar nos três tipos de
comportamentos organizacionais citados anteriormente.
Portanto, podem-se ampliar as ideias dos autores, sugerindo para a
continuidade desta pequisa, às aplicações das práticas em um ambiente
organizacional, pois desta maneira pode-se retratar os envolvidos nas organizações
citados neste artigo, e assim, obter-se resultados mais condizentes com a realidade.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo mostrou que a relação entre comportamento organizacional
e a qualidade de vida nas empresas de TI trazem benefícios duradouros para essas
empresas. As explicações para esta afirmação é pelo fato que, quando as empresas
proporcionam um ambiente de trabalho agradável para os funcionários, há maior
comprometimento destes com as tarefas cotidianas e faz com que as pessoas
cumpram com responsabilidade todos os seus afazares e isto gera bons resultados
para a organização, como a agilidade na execução das tarefas.
Em relação à liderança, um bom líder consegue bons resultados, por meio do
desempenho da sua equipe, incentivando o crescimento e preservando a harmonia e
o bem estar do grupo. Já os valores organizacionais são as crenças e as atitudes que
darão a determinada organização sua identidade, isto pressupõem que os
funcionários deverão cumprir metas dentro da empresa, a fim de obterem resultados
positivos no ambiente de trabalho (Podsakoff, 2014).
Estes tipos de comportamentos organizacionais aliados à qualidade de vida
das organizações oferecidas pelos líderes trazem algumas vantagens para as
empresas de TI, como: integração interna e social proporcionada pela companhia,
oportunidades oferecidas aos funcionários para desenvolver suas capacidades e
retenção de talentos nas empresas (Dekas, 2013).
Discutiram-se, também, por meio da revisão de literatura, pesquisas
relacionadascomo a qualidade de vida no trabalho impacta positivamente ou
negativamente um ambiente organizacional relacionado com tecnologias da
informação. Por exemplo, uma liderança autoritária pode causar na equipe baixa
estima e motivação e consequentemente a diminuição da produtividade, sendo
necessário um controle de qualidade nos resultados, por outro lado, um líder que
estimula sua equipe nas tomadas de decisões, permite maior autonomia e demonstra
370
confiança na capacidade dessa equipe de resolver problemas. O panorama positivo
em um ambiente organizacional traz bem-estar para quem está trabalhando na
empresa de TI, melhorando assim sua qualidade de vida na organização.
Foram, ainda, identificadas as seguintes práticas que podem contribuir para
melhorar os resultados da influência do comportamento organizacional na qualidade
de vida dos indivíduos numa empresa de TI: 1) as empresas oferecem um bom
ambiente organizacional aos seus funcionários; 2) a motivação dos funcionários deve
partir da sua chefia imediata; 3) cabe ao líder buscar a criação de ambiente propício
na empresa de TI; 4) considera-se um bom líder alguém que motiva e coordena à
equipe aplicando de maneira eficaz, sua habilidade individual e grupal e 5) a empresa
de TI espera desde o nível operacional até a alta gerência, atitudes e comportamentos
das pessoas que trabalham nela.
Os argumentos analisados neste artigo, não deixam dúvida de que é importante
uma boa liderança por parte dos gestores, um comprometimento profissional dos
funcionários perante a empresa e definição de valores organizacionais na
organização. Estes três tipos de comportamentos organizacionais aliados com a
qualidade de vida no trabalho são primordiais para a eficiência e a busca de resultados
satisfatórios na organização, que busca desempenho competitivo no mercado.
Entre as limitações do estudo, destaca-se que foi uma pesquisa de revisão
bibliográfica e compreende-se que o estudo aplicado em uma empresa de TI pode
trazer resultados positivos para a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos, que
trabalham
em
um
ambiente
organizacional
pautado
em
comportamentos
organizacionais.
Considerando-se os resultados alcançados com as proposições teóricas
aplicadas na prática e as limitações da pesquisa, alguns trabalhos futuros
relacionados ao tema podem ser realizados: aplicar as práticas sugeridas neste
estudo em um ambiente organizacional para melhoria da qualidade de vida do
trabalho dos funcionários e estudar as relações dos três construtos do comportamento
organizacional relatados na pesquisa (comprometimento, liderança e valores) e
aplicá-los em uma organização que tem uma qualidade de vida de trabalho não
favorável e desestimulante aos funcionários e ao final do estudo com as análises dos
resultados alcançados, comparar se houve melhoria ou não da qualidade de vida do
trabalho em uma organização perante aos seus colaboradores.
371
E, finalmente, o estudo deste artigo procurou estudar alguns tipos de
comportamentos organizacionais e suas influências na qualidade de vida em uma
empresa de TI. Percebe-se nesta pesquisa, que houve melhoria na qualidade de vida
do trabalho dos colaboradores, pois as organizações tem consciência que buscar
novas ideias e ações para a melhoria da qualidade de vida nas empresas de
tecnologias, traz mais rentabilidade e aumento de competitividade da empresa
perante o mercado.
372
REFERÊNCIAS
Almeida, M.A.B., & Gutierrez, G.L. (2010). Qualidade de vida: discussões
contemporâneas. In: Vilarta, R., Gutierrez, G.L., & Monteiro, M.I. Qualidade de vida:
evolução dos conceitos e práticas no século XXI. Campinas: IPES editorial.
Almeida, M.A.B., Gutierrez, G.L., & Marques, R. (2012). Qualidade de vida:
definição, conceitos e interfaces com outras áreas de pesquisa. São Paulo: Escola
de Artes, Ciências e Humanidades-EACH/USP.
Aquino, A.S, & Fernandes, A.C.P. (2013). [Quality of life and work]. J Health Sci Inst
[Internet]. 31(1), 420-438. Recuperado em 25 Abril, 2019, de
http://www.unip.br/comunicacao/publicacoes/ics/edicoes/2013/01_janmar/V31_n1_2
013_p53a58.pdf.
Arellano, E.B. (2008). Avaliação dos programas de qualidade de vida no trabalho:
análise crítica das práticas das organizações premiadas no Brasil. São Paulo. Tese
(doutorado) – Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo.
Bastos, A. V. B. (2015). Comprometimento Organizacional. In: Bastos, A. V. B.
Medidas do comportamento organizacional: ferramentas de diagnóstico e de gestão.
Porto Alegre: Artmed, pp. 49-95.
Bastos, A. V. B., & Maia, L. G. (2011). Comprometimento calculativo e retaliação:
visão integrada dos conceitos em uma organização pública. Rev. Adm. UFSM, Santa
Maria, 4(3), 390-405.
Borlido, F. C. (2011). Valores organizacionais e do trabalho na percepção de jovens
recém-inseridos no mercado de trabalho: o caso dos alunos do Espro. Dissertação
(Mestrado em Administração) – Faculdade Novos Horizontes, Belo Horizonte.
Chiavenato, I. (2010). Comportamento Organizacional: A Dinâmica do Sucesso das
Organizações (2a ed.). Rio de Janeiro: Elsevier.
Dekas, K. H. (2013). Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and
qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The
Academy of Management Perspectives, 27 (3), 219-237.
Dubrin, A. J. (2015). Leadership: Research findings, practice, and skills. Nelson
Education.
Fernandes, E. C. (2006). Qualidade de vida no trabalho: como medir para melhorar.
Salvador: Casa da Qualidade.
França, A. C. L. (2016). Indicadores empresariais de qualidade de vida no trabalho:
um estudo comparativo entre satisfação dos empregados e esforço empresarial nas
empresas com certificação ISO 9000. São Paulo, Tese (Doutorado) – Faculdade de
Economia e Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo.
373
Gehman, J., Treviño, L. K., & Garud, R. (2013). Values work: a process study of the
emergence and performance of organizational values practices. Academy of
Management Journal, 56 (1), 84-112.
Gramkow, F. B. (2016). Liderança complexa em uma equipe de desenvolvimento de
software. Tese (Doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento) – Programa
de Pós Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento, Universidade
Federal de SantaCatarina, Florianópolis.
Heifetz, R. A. (1994). Leadership without easy answers. London, England: BelknapHarvard.Cap.3, The roots of authority.
Kilimnik, Z. M. et al. (2013). Análise do estresse, fatores de pressão do trabalho e
comprometimento com a carreira: Um estudo com médicos de uma unidade de
pronto atendimento de Belo Horizonte, Minas Gerais. Salvador: Revista Gestão &
Planejamento-G&P, 12(3), 668-693.
Liang, Y. W. (2012). The relationships among work values, burnout, and
organizational citizenship behaviors. International Journal of Contemporary
Hospitality Management, 24 (2), 251-268.
Melo, E. A. M. Liderança gerencial. (2014). In: Siqueira, M. M. M. (org.). Novas
Medidas do Comportamento Organizacional. Porto Alegre: Artmed, pp. 132-146.
Menezes, Igor G. (2019). Comprometimento organizacional: construindo um conceito
que integre atitudes e intenções comportamentais. Tese (doutorado) – Universidade
Federal da Bahia, Salvador.
Meyer, J.P., & Allen, N.J. (1991). A three-component conceptualization of
organizational commitment. Human Resource Management Review, Greenwich,
1(1), 61-89.
Mourão, L. et al. (2003). Valores, suporte psicossocial e impacto do treinamento no
trabalho. In: ENCONTRO DA ANPAD, 33. Atibaia. Anais... Rio de Janeiro: ANPAD.
Nicholson, N. (2013). The invention of leadership. Business Strategy Review, 24(2),
14-29.
Northouse, P. G. (2013). Leadership: theory and practice. (6th. ed.). Thousand Oaks,
CA: Sage Publications.
Oliveira, A., & Tamayo, A. (2014). Inventário de perfis de valores organizacionais.
Revista de Administração, 39 (2), 129-140.
OMS. (2008). Promoción de la salud. Glossario. Genebra: OMS.
Padilha, V. (2014). [Quality of work life in a setting of precarious-ness: a delusional
panacea]. Trab Educ Saúde [Internet]. 7(3), 549-563. Recuperado em 23 Abril, 2019,
de http://www.scielo.br/pdf/tes/v7n3/09.pdf.
374
Paiva, K. C. M. (2013). Valores organizacionais e do trabalho: um estudo com jovens
trabalhadores brasileiros. Tourism & Management Studies, 9 (2), 100-106.
Paz, M. G. T., Neiva, E. R., & Dessen, M. C. (2012). Bem-estar e felicidade nas
organizações: Um só fenômeno? In: Ferreira, M. C.&Mendonça, H. (Orgs.). Saúde e
bem-estar no trabalho: Dimensões individuais e culturais (pp. 105-130). São Paulo:
Casa do Psicólogo.
Podsakoff, N. (2014). Consequences of unit-level organizational citizenship
behaviors: a review and recommendations for future research. Journal of
Organizational Behavior, 35 (1), 87-119.
Porto, J. B. (2012). Análise fatorial confirmatória da escala de valores relativos ao
trabalho. In: ENCONTRO DA ANPAD, 30. Salvador. Anais... Salvador: ANPAD.
Rocha, E.S., & Honório, L.C. (2015). Comprometimento com o trabalho: O caso dos
chefes de seções de infraestrutura da UFMG. Revista Ciências Administrativas,
21(1), 237-261.
Rocha, M.S., & Paiva, K.C.M. (2016). Relações fronteiriças entre as dimensões do
comprometimento organizacional: contribuições de um estudo com jovens
trabalhadores. In: Anais... EnANPAD, Costa do Sauípe.
Ros, M. (2016). Psicologia social dos valores: uma perspectiva histórica. In: Ros, M.;
Gouveia, V. V. (Org.). Psicologia social dos valores humanos. São Paulo: Senac, pp.
23-53.
Silva, L.P., Castro, M.A.R., Dos-Santos, M.G. & Neto, P.J.L. (2018).
Comprometimento no trabalho e sua relação com a cultura organizacional mediada
pela satisfação. Revista Brasileira de Gestão de Negócios, 20(3), 401-420.
Silva, R.S., Capelloza, A., & Costa, L.V. (2014). O impacto do suporte organizacional
e docomprometimento afetivo sobre a rotatividade. Revista de Administração IMED,
4(3), 314-329.
Silva, C. A., & Ferreira, M. C. (2013). Dimensões e indicadores de qualidade de vida
no trabalho. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 29 (3), 331-339.
Siqueira, M. M. M. (2015). Bem-estar no trabalho e percepção de sucesso na
carreira como antecedentes de intenção de rotatividade. Revista de Administração
Mackenzie, São Paulo, 16 (6), 71-93.
Schwartz, S. H. (2005). Valores humanos básicos: seu contexto e estrutura
intercultural. In: TAMAYO, A.; PORTO, J. B. (Org.). Valores e comportamento nas
organizações. Petrópolis, RJ: Vozes, pp. 21-55.
Tamayo, A. (2006). Valores organizacionais. In: Tamayo, A., Borges-Andrade, J. &
Codo, W. (Eds.). Trabalho, organizações e cultura, 175-193. São Paulo: Cooperativa
de Autores Associados.
375
Teixeira, J. C., Nascimento, M. C. R., & Antonialli, L. M. (2013). Perfil de estudos em
administração que utilizaram triangulação metodológica: uma análise dos anais do
EnANPAD de 2007 a 2011. Revista de Administração, 48 (4), 800-812.
Tillmann, C., & Grzybovski, D. (2005). Sucessão de dirigentes na empresa familiar:
estratégias observadas na família empresária. Organizações & Sociedade, 12 (32),
45-61.
Torres, C. V. (2005). Liderança e valores culturais: dois conceitos interrelacionados? Em: Tamayo, A.; Porto, J. B. Valores e comportamentos nas
organizações, pp. 187-200.
376
CAPÍTULO 20
COMO O PAPEL DO LÍDER NA GESTÃO DE CONFLITOS AFETA O
COMPORTAMENTO EM UMA EMPRESA DE TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
Bruno de Souza Toledo
Doutorado em Sistemas de Informação e Gestão do Conhecimento
Instituição de Atuação Atual: Universidade FUMEC
Endereço: Rua Cobre, nº 200, Bairro: Cruzeiro – Belo Horizonte – CEP: 30310-190
E-mail: bruno.toledo@ifmg.edu.br
Marcos Vinícius de Souza Toledo
Mestrado em Sistemas de Informação e Gestão do Conhecimento
Instituição de Atuação Atual: Universidade FUMEC
Endereço: Rua Cobre, nº 200, Bairro: Cruzeiro – Belo Horizonte – CEP: 30310-190
E-mail: mv.toledo@yahoo.com.br
Karina Dutra de Carvalho Lemos
Mestrado em Modelagem Matemática e Estatística
Instituição de Atuação Atual: Universidade FUMEC
Endereço: Rua Cobre, nº 200, Bairro: Cruzeiro – Belo Horizonte – CEP: 30310-190
E-mail: karina.dutra@ifmg.edu.br
Mário Teixeira Reis Neto
Doutorado em Administração
Instituição de Atuação Atual: Universidade FUMEC
Endereço: Rua Cobre, nº 200, Bairro: Cruzeiro – Belo Horizonte – CEP: 30310-190
E-mail: reisnetomario@fumec.br
RESUMO: É fundamental que para se desenvolver e conquistar espaço no mundo
corporativo uma organização deve valorizar a participação de seus funcionários no
processo de crescimento, pois é a partir deles que devem surgir ideias, sugestões,
melhorias e críticas para um trabalho de qualidade. Compete ao líder incentivar sua
equipe a vestir-se da organização e lutar pelo seu sucesso. O objetivo deste artigo foi
analisar o papel do líder na gestão de conflitos e como os valores e a diversidade
afetam o comportamento organizacional em uma empresa de TI, e assim verificar a
interferência na produtividade. Para isso, utlizou-se uma revisão de literatura. Foram
sugeridas algumas práticas para ajudar os gestores no gerenciamento dos conflitos
dentro da sua equipe e assim, ser possível que uma empresa com tal situação possa
melhorar sua produtividade. O líder é um motivador, que conduz e inspira os
colaboradores a trabalhar em prol da organização, fazendo com que eles se sintam
integrados. Para isso, é necessário obter uma atenção maior aos envolvidos em uma
empresa de tecnologia, as características individuais de cada um e como utilizar a
diversidade e os conflitos a favor da empresa.
PALAVRAS-CHAVE:
Diversidade.
Liderança;
Comportamento
Organizacional;
Conflitos;
ABSTRACT: It is essential that in order to develop and conquer space in the corporate
world, an organization must value the participation of its employees in the growth
377
process, as it is from them that ideas, suggestions, improvements and criticisms for
quality work must arise. It is up to the leader to encourage his team to dress up the
organization and fight for its success. The purpose of this paper was to analyze the
role of the leader in conflict management and how values and diversity affect
organizational behavior in an IT company, and thus check for interference in
productivity. For this, a literature review was used. Some practices have been
suggested to help managers in managing conflicts within their team and thus, it is
possible that a company with such a situation can improve its productivity. The leader
is a motivator, who leads and inspires employees to work for the organization, making
them feel integrated. For this, it is necessary to obtain greater attention to those
involved in a technology company, the individual characteristics of each one and how
to use diversity and conflicts in favor of the company.
KEYWORDS: Leadership; Organizational behavior; Conflicts; Diversity.
378
1. INTRODUÇÃO
As
organizações
têm
entendido
a
importância
do
comportamento
organizacional como fator competitivo.Para produzir o diferencial nas organizações,
vê-se que osaber técnico não é responsável singular, sendo possível que o funcionário
de forma geral ter bastante conhecimento sobre o que faz e habilidade para
empreender, mas muitas vezes não ter atitude para conceber, o que depende da
decisão do mesmo.
Visto que as empresas de Tecnologia da Informação (TI) têm neste entrecho
um importante papel, cada uma tem seu grupo de crenças, valores e princípios que
formam sua cultura organizacional. Esta é evidenciada a partir do comportamento das
pessoas dentro da organização e assim, a tarefa das empresas diante desta realidade,
geralmente do setor de Recursos Humanos (RH) ou Gestão de Pessoas, é de medirse o mais próximo possível, o comportamento dos colaboradores da empresa, em
atuação pelo seu trabalho, de acordo com sua cultura organizacional ao
comportamento esperado pela organização.
Toda organização depende de pessoas, e percebe-se que muitas empresas de
TI têm deixado de ver seus funcionários como apenas mais um recurso e estão
começando a se preocupar com o desenvolvimento de habilidades.
As organizações estão formadas por indivíduos com uma diversidade de
pensamentos e maneira de agir cada vez maior. E esta ocasiona o aparecimento dos
conflitos organizacionais. Desta forma, em um ambiente cheio de diferenças
intelectuais, crenças, valores, dentre outros, e para lidar com os conflitos dentro das
organizações faze-se necessário a gestão destes (Robbins, Judge, & Sobral, 2010).
Para compreender a importância do líder nos atuais modelos de gestão, faz-se
necessário um estudo do que se deve buscar para que os objetivos organizacionais
sejam atingidos, assim valorizar o principal ativo de uma empresa que é o seu pessoal,
e deve-se levar em consideração ainda, o principal ativo de cada pessoa, que é a sua
competência profissional (Santos, 2008).
Perebe-se que a liderança é tema de inúmeras pesquisas há alguns anos, visto
que refere-se ao conhecimento e capacidade de gerenciar grupos de pessoas,
alterando-as em equipes eficientes e assim, melhores resultados à empresas de
tecnologias.
379
Para tanto, foi realizada uma revisão de literatura a fim de contribuir com os
gestores no gerenciamento dos conflitos dentro da sua equipe. Esse tipo de pesquisa
se caracteriza por suprimir dúvidas a partir de pesquisas em documentos. Isso implica
no esclarecimento das pressuposições teóricas que fundamentam a pesquisa e das
contribuições proporcionadas por estudos já realizados com uma discussão crítica
(Gil, 2010).
O presente estudo teve como objetivo analisar o papel do líder na gestão de
conflitos e como os valores e a diversidade afetam o comportamento organizacional
em uma empresa de TI, e assim verificara interferência na produtividade.
2. O COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL
O comportamento organizacional pode ser visto como o conjunto de
comportamentos e atitudes praticadas pelas pessoas que compõem a empresa, tanto
funcionários quanto seus diretores, e o impacto que tais condutas e costumes têm
sobre o andamento e desenvolvimento da organização (Andrade, 2018).
O comportamento organizacional envolve inúmeros fundamentos, em que o
estudo destes está relacionado a fatores de grande influência nos resultados
alcançados pelas empresas de TI como: valores, conflitos, mudanças organizacionais,
diversidade, liderança, entre outros que afetam os indivíduos e as equipes
organizacionais.
2.1 Valores organizacionais
Os valores organizacionais adquiriram extrema relevância para as empresas
de TI, sendo elementos motivadores que direcionam as ações das pessoas nas
organizações. Valores organizacionais são crenças e atitudes que dão uma
personalidade à empresa, definindo uma "ética" para a atuação das pessoas e da
organização como um todo (Demo, Fernande, & Fogaça, 2017).
Nos últimos anos, o interesse por estudos de valores organizacionais cresceu,
uma das explicações para este acontecimento é o seu papel fundamental para o
entendimento da cultura (Carvalho, Oliveira, & Silva, 2013).
380
Nesse sentido, Veiga (2010) argumenta que os valores organizacionais não
são os valores pessoais dos integrantes da organização. Os valores pessoais são
aprendidos e desenvolvidos durante o convívio familiar, escolar e nas interações
sociais ao longo da existência do indivíduo, enquanto os valores organizacionais são
geralmente introduzidos pelo dono ou criador da empresa ou por indivíduos que
exercem forte influência no ambiente organizacional. Os valores têm origem na
interação social e são construídos com base nas necessidades de trabalho e para
orientar as relações existentes na organização, eles atuam como elementos que
definem, especificam e tornam uma organização singular, diferente de todas as outras
existentes.
Segundo os estudos de Silva e Oliveira (2017) os valores organizacionais
traçam um cenário em que os empregados percebem consideravelmente o empenho
das organizações em estabelecer limites, regras e modelos de comportamento, mas
nem tanto em favorecer o bem-estar do empregado.
De maneira semelhante, os empregados referem satisfação com as relações
interpessoais proporcionadas, mas pouca satisfação com saúde física. Isso acarreta
um questionamento sobre a atenção dirigida pelas empresas de tecnologias às
necessidades do empregado, enquanto ser complexo e enquanto recurso essencial
para o funcionamento organizacional. Porém, atenta-se que muitos conflitos podem
derrubar esses valores, conforme descrito a seguir.
2.2 Conflitos e as mudanças organizacionais
Berg (2012, p. 18), afirma que: “O conflito nos tempos atuais é inevitável e
sempre evidente. Entretanto, compreendê-lo, e saber lidar com ele, é fundamental
para o seu sucesso pessoal e profissional”. Ainda segundo o autor, aplicando à
realidade, conflito é um estado antagônico de ideias, pessoas ou interesses e não
passa, basicamente, da existência de opiniões e de situações divergentes ou
incompatíveis.
Conforme Marras (2009), o conflito é uma disputa de interesses pessoais
versus interesses organizacionais, e somente a comunicação edisseminação das
informações podem fazer com que as consequências sejam amenizadas.
381
Burbridge e Burbridge (2012) defendem que conflitos são naturais e em muitos
casos necessários. São o motor que impulsiona as mudanças. No entanto, muitos
conflitos são desnecessários e destroem valores, causando prejuízo para as
empresas e pessoas que nelas trabalham. O principal desafio dos gestores é
identificar os conflitos produtivos e contra produtivos e gerenciá-los.
Segundo Cordeiro e Cunha (2018) o conflito pode ocorrer no contexto de
relacionamentos entre duas ou mais partes, podendo ser entre pessoas, grupos ou
organizações, assim como pode ocorrer entre mais de duas partes ao mesmo tempo.
Nota-se que maior parte dos autores concordam sobre a inevitabilidade do conflito,
pois é da natureza humana, e como as pessoas integram as organizações, estas terão
de aprender a lidar com essa realidade.
É procedente observar as diferenças individuais que afeta valores, percepções
e ponderações morais distintas, e que nem todos têm acesso às mesmas informações
e nem dispõem da mesmo conhecimento para que melhor se compreenda a gestão
do conflito.
Desde há muitos anos que a comunidade científica, sobretudo da área do
comportamento organizacional, tem sublinhado a importância de se colocar o estudo
do conflito no centro do debate da investigação sobre a gestão, em termos gerais, e
sobre o comportamento organizacional e a gestão de recursos humanos, em termos
específicos, já que o mesmo, quando gerido de forma positiva e construtiva, pode
contribuir decisivamente para o desempenho dos indivíduos, dos grupos e das
organizações (Hussein, Al-Mamary, & Hassan, 2017).
As principais causas de conflito organizacional, para Berg (2012), são:
mudanças que ocorrem principalmente por pressão do mercado, forçando a
organização a adaptar-se às novas realidades. Essas alterações são geralmente de
caráter tecnológico, estrutural ou comportamental, buscando com isso melhorar a
eficácia na busca por resultados, aumentar ou manter lucros, enxugar custos, atualizar
a organizações em todos os aspectos, crescer ou manter-se no mercado.
O autor também afirma que mudanças organizacionais podem trazer
demissões, reestruturações e espalhar medo e resistência, por isso representam uma
fértil fonte de conflitos. Recursos limitados podem trazer a escassez de recursos,
devido a enxugamentos promovidos pelas organizações para tornarem-se
competitivas, são motivo de muitos atritos, pois podem limitar o desempenho de
colaboradores e departamentos. As limitações vão desde dinheiro até às pessoas, o
382
que gera muitas vezes grandes jornadas de trabalho objetivando o alcance de metas
em detrimento à interação entre gestores e subordinados, podendo ocasionar
cansaço, estresse e descontentamento geral.
Por fim, tem-se o choque entre metas e objetivos que são impasses entre
departamentos ou diretorias e são comuns atualmente nas empresas de TI, em função
principalmente das metas e objetivos que se chocam, por falta de comunicação e
sintonia entre as áreas. A causa desse fator é geralmente o planejamento deficiente,
que compartimenta e prioriza muitas das vezes ações emergenciais e isoladas de
setores distintos, sem se dedicara integração de objetivos e metas da organização
como um todo (Berg, 2012).
Gerenciar conflitos no século XXI compreende habilidade competitiva que pode
agregar um diferencial à organização, sobretudo em tempos nos quais se evidencia
que as corporações dependem de pessoas e de suas inter-relações (Costa, 2013).
Os conflitos abragem um importante papel na organização e esse assunto tem
motivos que levam um indivíduo a adversar ao outro e vice-versa, por questões que
envolvem a relação empresas versus pessoas, bem como, de pessoas versus
pessoas.
Pode-se constatar que as organizações são ambientes de relação de pessoas,
que, por isso mesmo, sofrem a influência cultural, que são expectativas sociais mais
amplas trazidas pelos insumos humanos, que desempenham papéis no subsistema
técnico da empresa. Que é no interior dessas organizações, que se concentram os
fatores que põem os homens em contado direto uns com os outros, nas diferentes
formas de competição, conflito e cooperação (Costa, 2013).
Diante do exposto, acredita-se que admitindo-se a manifestação dos conflitos,
bem como sua importância,observa-se que este é percebido como desacordo que se
instala pelas divergências de ideias, quando a choque de papéis e de princípios, entre
os envolvidos no grupo organizacional. Sua natureza, não se restringe a um único
tipo, bem como, não é única a forma de tratá-lo.
Entende-se então, que nem sempre o conflito é prejudicial, com aspectos
positivos, e negativos, construtivos ou destrutivos, em consequência do estado de
observação e intensidade, de tempo, das circunstâncias e da maneira como ele é
encarado e administrado.
383
Muitas empresas de tecnologias têm procurado adotar práticas de gestão da
diversidade para diminuir os conflitos, de acordo com a próxima seção.
2.3 Diversidade no comportamento organizacional
O tema diversidadeé muito relevante para os estudos organizacionais. As
organizações constituem um retrato do Brasil, país continental cujas diferenças entre
cidades, estados e regiões são bastante acentuadas. Muitas empresas de TI têm
procurado adotar práticas de gestão da diversidade, no sentido de formar e
administrar equipes heterogêneas, ou seja, equipes diversificadas em termos tanto
biográficos, como gênero e idade, quanto subjetivoscomo personalidade, educação e
valores. A necessidade de administrar a diversidade organizacional foi um
desdobramento da diversificação crescente da força de trabalho (Barreiro et al., 2015).
Para Robbins, Judge & Sobral (2010) “a diversidade em nível superficial diz
respeito aos elementos biográficos, como idade, raça, gênero e etnia”. Não refletem
pensamentos e sentimentos e, por esse motivo, podem induzir à criação de
estereótipos. Em resumo, este tipo de diversidade não apresenta grande possibilidade
de se relacionar diretamente ao desempenho profissional.
Não é possível garantir que essas práticas de diversidade corporativa são
verdadeiramente uma ideologia, que busca a diminuição da desigualdade através da
inclusão social, ou se faz parte de um conjunto de estratégias para obter melhores
desempenhos. Trazer a responsabilidade social para dentro da empresa, além de ser
interessante no quesito sociológico, pode gerar um aumento na performance
organizacional. A diversidade é também o caminho para que as empresas se tornem
mais inovadoras (já que sua premissa é trazer múltiplas visões acerca de um assunto),
capazes de produzir bens úteis e tornar os seus trabalhadores incluídos, realizados e
motivados (Santos, Santana, & Arruda, 2018).
É possível perceber que ainda há muito trabalho a ser feito para tornar o
ambiente e estrutura de funcionários mais diversificados, pois percebe-se ainda a
mão-de-obra desqualificada ainda representa maior parte dos empreados brasileiros,
sendo estes homens e jovens. Essa preocupação com o capital humano e sua
estratégia de composição precisa continuar sendo discutida e estudada no âmbito
acadêmico, devido a sua grande relevância e complexidade.
384
Ao se falar em diversidade na organização, acaba-se por passar uma
impressão de que a empresa está “abrindo espaço” para um grupo que se enquadra
no conceito de “minoria”. Sendo assim, é possível observar que em uma organização,
muitas vezes o discurso da diversidade acaba sendo apenas para passar uma boa
impressão aos stakeholders. Os extensos manuais, cartas publicadas em sites
oficiais, tópicos sobre a diversidade em seus valores organizacionais, não passam,
em sua grande maioria, de apenas um discurso, divergindo do cotidiano da
organização (Santos, Santana, & Arruda, 2018).
A diversidade está presente em todos os âmbitos, sejam eles organizacionais
ou não, e, mesmo dentro de uma organização onde o principal objetivo é o lucro, as
ações voltadas à gestão da diversidade deve reconhecer que cada elemento é único
e insubstituível, sendo as pessoas o foco mais importante dentro da organização. A
diversidade é também o caminho para que as empresas de TI se tornem mais
inovadoras, capazes de produzir bens úteis e tornar os seus trabalhadores incluídos,
realizados e motivados (Santos, Santana, & Arruda, 2018).
Com isso, o papel do gestor é de suma importância nesse contexto, pois ele
deve entender a diversidade em sua essência sendo uma das axiomas da sociedade,
e que sem isto acaba sendo impossível ter êxito social.
Os resultados financeiros sempre é a busca de uma empresa, porém não
podem ser estratégias restritas a essas metas, com exigências políticas de
diversidade na organização, pois o compromisso ético deve ser reconhecido pela
empresa de tecnologia. Antes de ser funcionário, o colaborador é um cidadão e deve
ter sempre seus direitos sociais garantidos, incluindo o de ser respeitado nas suas
diversas características pessoais.
Essa diversidade, juntamente com os valores e conflitos afetam os processos
organizacionais e para isso vê-se o papel do líder fundamental na gestão, conforme
são analisados a seguir.
2.4 Liderança
Percebe-se que dentro dentro das empresas de TI, háentendimentos e
compreensões discordantes sobre questões ou práticas e procedimentos, seja
profissional ou pessoal. Assim, o papel do líder faz-se necessário para a gestão de
385
conflitos e com isso conseguir equacionar os problemas para melhorar a relação entre
os funcionários ou para a empresa.
Qualquer organização sempre se encontra diante de problemas sérios de
decisão. Geralmente o líder poderia analisar o problema e escolher a melhor
alternativa de decisão de modo inteiramente informal. Porém, essas adversidades são
muito mais amplos e complexos, envolvendo riscos e incertezas. Necessitam da
opinião e participação de muitas pessoas, em diversos níveis funcionais. O processo
de decisão em uma empresa ou organização deve ser estruturado e resolvido de
modo formal, detalhado, consistente e transparente (Lima, 2012).
Cada pessoa por si só sempre está tomando alguma decisão dentro da
empresa e fatores como a intuição, racionalidade e a percepção influenciam no
processo decisório. Todavia, é imprescindível que o administrador, dentre inúmeras
alternativas, escolha a melhor para o processo decisório da empresa (Bertoncini et al.,
2013).
Segundo Chiavenato (2012), liderança é uma influência interpessoal exercida
em determinada situação e conduzida por meio da comunicação entre os indivíduos,
a fim de alcançar determinado objetivo. Por isso é fundamental que o administrador
conheça a natureza do homem e saiba conduzir as pessoas. Este processo é liderar.
Portanto, a liderança se faz necessária em todos os tipos de organizações.
Os “comportamentos de liderança” típicos, como dirigir, planejar, controlar e
supervisionar, também são mantidos, vez por outra, por indivíduos que não ocupam
posição de líder. O líder e o tipo de liderança que ele exerce também são fundamentais
já que as atitudes que ele terá, influenciará no clima organizacional da empresa. A
boa liderança faz com que a organização flua de maneira positiva e mantenha a
produtividade bem como também as relações de trabalho (Marinho, 2016).
Chiavenato (2014) relata que a capacidade de influenciar, persuadir e motivar
os liderados está relacionada a outra característica do líder, o poder. Este é
classificado em cinco diferentes tipos:
1.
Poder coercitivo: o liderado teme em não atender o líder por medo de
alguma punição ou penalidade;
2.
Poder de recompensa: o liderado espera alguma recompensa, incentivo,
elogio ou reconhecimento por parte do líder;
3.
Poder legitimado: deriva do cargo ou hierarquia. Aquele que possui um
cargo mais elevado, é percebido como alguém que tem mais poder;
386
4.
Poder de competência: é aquele baseado no conhecimento técnico. Os
liderados percebem e reconhecem que o líder possui conhecimentos e conceitos que
excedem os seus funcionários;
5.
Poder de referência: é aquele baseado na atuação e apelo. O líder é
admirado por sua personalidade e carisma.
Portanto, os líderes descortinam o conflito de forma positiva e analisam a
oportunidade para motivar as partes envolvidas, conectar o grupo, elevar o
conhecimento, a criatividade e estimular o crescimento. Contudo, os conflitos também
podem gerar efeitos negativos e depende da responsabilidade de quem assume,
quais as estratégias e instrumentos utilizadas para gerenciá-los.
2.5 Liderança na gestão de conflitos
Obeservar e prever os problemas possíveis no ambiente organizacional são
consideradas as melhores formas de conseguir fazer uma gestão de conflitos mais
eficiente. Isso significa que é primordial o líder trabalhar de maneira efetiva os
conflitos gerados e, para isso, é relevante que entenda quais são as causas do
problema.
Um dos grandes erros cometidos pelos gestores é ignorar a existência do
conflito como forma de fugir da responsabilidade de sua resolução. Isso se deve
principalmente à falta de habilidade interpessoal ou receio de agradar um grupo de
colaboradores e desagradar outro. Parece mais fácil a famosa ideia de “deixar que
eles se entendam por si”. É um pensamento bastante arriscado, que pode colocar a
perder o desempenho da equipe. Um conflito bem administrado pode se transformar
em um fator motivador de grandes mudanças e ter um efeito altamente positivo. Em
outras palavras, o conflito pode contribuir para o amadurecimento da organização, se
o gestor souber utilizar a situação a seu favor (Assis, & Straub, 2018).
Para Knapik (2012), o papel dos gestores na administração de conflitos
consiste em transformá-lo em oportunidades de aprendizagem organizacional e de
mobilização para novos métodos de trabalho, bem como em minimizar a probabilidade
de eclosão de novos conflitos, que podem ser gerados por: Dificuldades de
relacionamento oriundas da relação entre colegas de trabalho, de liderança ou
gerenciamento ineficaz; Dificuldades por falta de recursos que dão suporte, como
ambiente físico, falta de equipamentos, dentre outros; Fatores ambientais
387
(mercadológicos, legais, dentre outros) e sociais (divergências de religião); Excesso
de trabalho, já que o ideal é que as pessoas procurem o equilíbrio, conciliando
trabalho, lazer e afetos.
Conforme Lalau (2017), uma gestão competente precisa conhecer muito bem
as gerações com as quais trabalha, para, assim identificar as principais características
de cada uma, visando extrair o melhor dos funcionários. É preciso um olhar estratégico
sobre diferenças e enxergar como elas se agregam, não existe geração melhor ou
pior, as contribuições de cada uma são diferentes.
Cavalcanti (2006) refere que perante a perspetiva política, a gestão é vista
como um processo direcionado para o controle do conflito, no qual o gestor interage
com a equipe, tentando gerir os aspetos que provocam concorrências internas. “Para
conseguir resultados, o gestor precisa ser um conhecedor do seu ambiente de
atuação e das estruturas organizacionais” (p.18).
Robbins (2009) pondera que não há uma forma de administração de conflito
que seja sempre a melhor, cabendo ao gestor, dentre as formas de administração de
conflitos já citadas, escolher a mais apropriada para cada uma das situações.
Exemplo disso, é que a colaboração pode ser utilizada para encontrar uma
solução quando as partes envolvidas no conflito têm interesses significativos para
serem comprometidos, quando do seu intuito primordial for a aprendizagem, para
assim, obter empenho ou ainda para trabalhar sentimentos que podem interferir no
relacionamento entre os integrantes da equipe.
3. PROPOSIÇÕES
Conforme apresentado anteriormente, verifica-se a importância do papel do
líder na gestão de conflitos, a relação aos valores organizacionais, na qual se observa
como a diversidade afeta o comportamento na organização e a interferência nos
resultados em uma empresa de tecnologia.
Embora,o enfrentamento do conflito seja incômodo, percebe-se que isto não
faz aumentar o conflito em si. Ao contrário do que muitos pensam, não falar sobre o
problema é que tem o efeito de acentuar as dificuldades, conforme os autores
explicitam em seus estudos neste artigo.
Lidar com essas implicações não é uma tarefa fácil, além de ser muito exigente,
uma vez que envolve aspectos intangíveis, o contexto organizacional e diversas
388
outras peculiaridades, mas qualquer que seja adificuldade, o conflito precisa ser
interpelado pelo gestor, servindo-lhe no momento decidir pelas intercorrências de
defrontação.
Diante do exposto neste artigo, acredita-se que se podeaplicar algumas
práticas para auxiliar os gestores no gerenciamento dos conflitos dentro da sua
equipe.
Conforme foi possível observar na literatura, o atual cenário empresarial
comporta uma diversidade de perfis profissionais, na interação desses indivíduos
surgem as diferenças e os conflitos organizacionais e nesse contexto as empresas
precisam de orientação na condução e verificação da base dos conflitos e dos
envolvidos. Assim, cabe esperar que a Prática 1, a seguir, gere bons resultados neste
contexto:
Prática 1: Inicialmente, se faz necessário identificar onde se encontra o
problema e as partes envolvidas, antes de tomar atitudes. Consultar e ouvir todos os
envolvidos, para assim entender a causa do conflito.
Diante do exposto de diversos autores, é importante o papel de moderador
diante das situações ocorridas dentro da empresa de tecnologia. Por estarem numa
colocação acima, alguns líderes acreditam que tem o conhecimento sobre tudo, e que
não necessitam ouvir ninguém. Os autores afirmam que saber ouvir gera
relacionamentos, pois pessoas querem ser percebidas, e assim se o líder souber ouvilas, ele produz um relacionamento considerável e de segurança, gerando a confiança
entre as partes, permitindo que as pessoas sempre o procurem, e assim possibilitar a
sua influência.
Com isso, almeja-se que a Prática 2, apresente boas perspectivas:
Prática 2: Seja o Facilitador. Tenha o papel de não ser o solucionador de
problemas. Instigue que os próprios envolvidos acordem a melhor forma de resolver
o problema. Caso precise, colabore a engendrar a solução e acertar-se os acordos.
Pensando em minimizar os problemas dentro das empresas de TI com relação
aos líderes, a literatura sugere que os colaboradoresevitem conflitos por ter se
posicionado contrariamente ao que a empresa, os colegas e o gestor pensam sobre
determinados assuntos. Para tal, indicam a imparcialidade e assim, impedir que os
profissionais desviem o foco de seu trabalho e projetos com questões que eles não
têm poder para resolver no momento. Para isso, é preciso mostrar respeito às opiniões
389
alheias e habilidade social. Assim, acredita-se que a Prática 3, venha gerar bons
resultados:
Prática 3: Seja Neutro.Imparcialidade é crucial, para não ser tendencioso e ter
equívocos. Enxergar-se na situação de cada um dos envolvidos pode facilitar o
entendimento e análise dos acontecimentos.
Atualmente autores e especialistas afirmam que o feedback é uma das
melhores soluções para que as empresas se mantenham no caminho para o êxito. Os
colaboradores da empresa são estimulados ao aprendizado constantepor meio do
feedback, e assim, serem reconhecidos pelo bom desempenho, além de obter
resultados favoráveis. Com isso, espera-se que a Prática 4, apresente boas
perspectivas
Prática 4: Incentive a cultura de feedback. Crie um ambiente organizacional que
valorize o diálogo e resolva as dificuldades desde o início, para eveitar assim que elas
surjam.
Assim, é possível seguindo as práticas supracitadas que uma empresa de
tecnologia da informação com tais situações possa melhorar sua produtividade.
Pode-se ampliar as ideias sugerindo para a continuidade deste estudo a
utilização de pesquisa de campo, pois dessa maneira pode-se abordar os envolvidos
nas empresas de TI citadas neste artigo, e assim, obter-se resultados mais condizente
com a realidade, pois até o momento uma resposta precisa e definitiva a essa questão
não parece possível.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo foi desenvolvido com o intuito de compreender o papel da liderança
na gestão de conflitos, visando minimizar a diversidade e maximizar a produtividade
em uma empresa de tecnologia da informação.
Inicialmente, conheceu-se as teorias do comportamento organizacional,
valores organizacionais, conflitos, diversidade, a liderança e o seu papel na gestão
dos conflitos, além de analisar se há impacto na produtividade e assim, sendo criado
algumas práticas para ajudar os gestores no gerenciamento dos conflitos.
O conflito pertence as quaisquer equipes bem como as organizações e é
relevante o impacto do líder como gestor emocional dos membros de uma equipe, por
meio de sua conduta, visto que a omissão colabora para estimularo conflito à medida
390
que as pessoas não tem o controle de suas atitudes e poderem tomar decisões por si
próprias. Sob este aspecto, a competência do líder torna-se fundamental na gestão
deste processo.
Para pessoas que exercem liderança em qualquer área, este trabalho mostra a
importância da habilidade de gerenciar conflitos, sendo esta uma competência
interpessoal essencial para gestores e sugere necessidade de maior atenção para o
tema. Os autores afirmam que nem sempre os conflitos são negativos, pois funcionam
como motivações para mudanças.
A empresas de TI devem investir em seus líderes capacitando-os para
gerenciar os conflitos e assim, evitar a perda nos resultados. Além disso, ter um
profissional preparado e que seja especialista neste assunto, e assim, a empresa terá
mais chances de obter sucesso nas mediações de conflitos e consequentemente nos
resultados.
Conclui-se, portanto, que é necessário obter uma atenção maior aos envolvidos
em uma empresa de tecnologia da informação, saber de que modo estão interagindo,
se as características individuais de cada um estão sendo respeitadas e como utilizar
a diversidade e os conflitos, sendo intermediado pelo líder a favor da empresa.
391
REFERÊNCIAS
Andrade, A. Comportamento Organizacional. (2018). Disponível em:
<https://administradores.com.br/artigos/comportamento-organizacional>. Acesso: 19
abr. 2019.
Assis, A. F., Straub, A. (2016). Gestão de conflitos: a oportunidade de aprendizagem
através da exploração de divergências. Revista FAE, Curitiba, 19 (2), pp. 220-231.
Barreiro, J. L. C. D. B. et al. (2015). Diversidade nas Organizações: Uma Análise de
Resultados. XI Congresso Nacional de Excelência em Gestão. Disponível em: <
http://www.inovarse.org/sites/default/files/T_15_353_11.pdf>. Acesso em: 11 abr.
2019.
Berg, E. A. (2012). Administração de conflitos: abordagens práticas para o dia-a-dia.
Curitiba: Juruá.
Bertoncini, C. et al. (2013). Processo Decisório: a tomada de decisão. Disponível
em:
http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/QjxDDqGcS5r3dHL_20
13-5-3-12-8-34.pdf. Acesso em: 15 abr. 2019.
Burbridge, R. M.; Burbridge, A. (2012). Gestão de conflitos: desafios do mundo
corporativo. São Paulo: Saraiva.
Carvalho, V. D.; Oliveira, T. A.; Silva, D. C. (2013). Valores organizacionais em
instituições públicas brasileiras: percepções dos servidores em diferentes posições
hierárquicas e tipos de entidade de administração indireta. Revista de Administração
Mackenzie, São Paulo, 14 (5), pp. 74-103.
Cavalcanti, A. (2006). O Gestor e o seu papel na Gestão de Conflitos. Um estudo de
caso em empresa de Varejo de Vestuário masculino. Dissertação de Mestrado,
Faculdade de Ciências Econômicas, Belo Horizonte.
Chiavenato, I. (2012). Princípios da administração: o essencial em teoria geral da
administração. 2. ed. Barueri, São Paulo: Manole.
Chiavenato, I. Administração nos novos tempos: os novos horizontes em
administração. 3. ed. Barueri, São Paulo: Manole, 2014.
Cordeiro, J., Cunha, P. (2018). Gestão de conflitos, comportamentos de
comprometimento e de cidadania organizacional em contexto educativo: contributos
para a formulação de um modelo conceptual. European Journal of Applied Business
Management, 4(3), 2018, pp. 46-66.
Costa, J. O. et al. (2013). Gestão de conflitos: estratégias adotadas em unidade
básica de saúde. Revista de Administração em Saúde. 15 (61), pp. 134-140.
Demo, G.; Fernandes, T.; Fogaça, N. (2017). A influência dos valores
organizacionais na percepção de políticas e práticas de gestão de pessoas. Revista
Eletrônica de Administração, Porto Alegre, 86 (1), pp. 89-117.
392
Gil, A. C. (2010). Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas.
Hussein, A., Al-Mamary, Y. & Hassan, Y. (2017). Conflict management styles and
organizational commitment: the conceptual framework development. International
Journal of Research in Management, Science & Technology, 5(1), pp. 86-97.
Knapik, J. Gestão de pessoas e talentos. Curitiba: IBPEX, 2012.
Lalau, B. (2017). Sem mais conflitos. Revista Melhor. São Paulo, n. 353, ABRH,
mai/2017.
Lima, J. A. Liderança e tomada de decisão na organização. (2012). Disponível em:
<http://www.uniedu.sed.sc.gov.br/wpcontent/uploads/2014/01/Josimara-Alves-deLima.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2019.
Marinho, B. L. (2016). Comportamento Organizacional: Um estudo sobre a
diversidade e conflitos.
Marras, J. P. (2009). Administração de Recursos Humanos: do operacional ao
estratégico. São Paulo: Saraiva.
Robbins, S. P. Fundamentos do comportamento organizacional. 8. ed. São Paulo:
Prentice Hall, 2009.
Robbins, S. P.; Judge, T. A.; Sobral, F. (2010). Comportamento Organizacional. 14.
ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall.
Santos, J. V. M., Santana, A. C, & Arruda, G. D. (2018). Diversidade nas
organizações: inclusão social ou estratégia competitiva? Disponível em:
<http://www.psicologia.com.pt/artigos/textos/A1170.pdf>. Acesso em: 10 abr. 2019.
Santos, R. A. (2008). O líder e o processo de gestão de conflitos. Revista São Luis
Orione. 1 (2).
Silva, U. L.; Oliveira, A. F. (2017). Qualidade de Vida e Valores nas Organizações:
Impactos na Confiança do Empregado, Revista Psicologia: Ciência e Profissão,
Brasília, 37 (1), pp. 7-17, 2017.
Veiga, H. M. S. (2010). Comportamento Pró-ativo: relações com valores
organizacionais, estímulos e barreiras à criatividade nas organizações e normas
sociais. Tese (Doutorado) – Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília,
Brasília.
393
CAPÍTULO 21
AO DISCURSO NEGACIONISTA/RELIGIOSO E CIENTÍFICO EM TEMPOS DE
PANDEMIA – COVID-19
Priscila Figueiredo Miranda Rabello
Mestranda do Curso de Ciências das Religiões da Faculdade Unida de Vitória
(FUV/ES)
Graduada em Pedagogia (UFES). Especialista em Educação Especial
E-mail: prifimira@gmail.com
Joana d’Arc Araújo Silva
Mestranda do Curso de Ciências das Religiões da Faculdade Unida de Vitória
(FUV/ES)
Graduada em Pedagogia (ICMG)
E-mail: sirana66@yahoo.com.br
Heloisio Costa de Oliveira
Mestrando do Curso de Ciências das Religiões da Faculdade Unida de Vitória
(FUV/ES)
Graduado em Arte (UFF), Especialista em Filosofia – Teologia e Coordenação
Pedagógica
E-mail: heloisiomusico@gmail.com
Onildo de Souza Moraes
Mestrando do Curso de Ciência das Religiões da Faculdade Unida de Vitória
(FUV/ES)
E-mail: onildomoraes@yahoo.com.br
Monique Ludugério Garcia
Mestranda do Curso de Ciências das Religiões da Faculdade Unida de Vitória
(FUV/ES)
Graduada em Administração de Empresas (UFF)
E-mail: moniqueludgarcia@gmail.com
Luciene Sipriano
Mestranda do Curso de Ciências das Religiões da Faculdade Unida de Vitória
(FUV/ES)
Graduada em Letras Português / Inglês (Faculdade Saberes)
E-mail: lso2013cipriani@gmail.com
RESUMO: A pandemia trouxe para o mundo consequências desastrosas e de difícil
reparação. Demonstrou-se que além da crise gerada na área da saúde, também,
instalaram-se disputas de ordem política, as quais dividem opiniões. Dessa forma, este
artigo tem o propósito de mostrar no contexto da pandemia do Covid-19 as disputas
travadas entre dois discursos: o negacionista e o científico e suas consequências.
Para isso, pretende-se utilizar a pesquisa bibliográfica e exploratória. Nesse momento
em que as disputas trazem incertezas, torna-se relevante refletir sobre tais
implicações. A partir dessa contextualização, levantamos as seguintes questões:
Quais as disputas advindas desses dois discursos opositores? Como são
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
394
representados os evangélicos em meio a essa disputa discursiva? O resultado mostrou
que as disputas são de cunho político e motivam ainda mais as incertezas. Parte dos
evangélicos são representados ao lado de Jair Bolsonaro como negacionistas que
acumulam também um poder político, são incompreendidos e criticados por esse
posicionamento.
PALAVRAS-CHAVE: Pandemia; Negacionismo; Cientificismo; Religião evangélica.
ABSTRACT: The pandemic has brought disastrous consequences to the world that
are difficult to repair. it was demonstrated that, in addition to the crisis generated in the
health area, political disputes had also arisen, which divided opinions. Thus, this article
aims to show, in the context of the Covid-19 pandemic, the disputes between two
discourses: the denial and the scientific and their implications. For this, it is intended
to use the bibliographical and exploratory research. At this moment when disputes
bring uncertainty, it becomes relevant to reflect on such implications. From this context,
we raise the following questions: What are the disputes arising from these two
opposing discourses? How are evangelicals represented in the midst of this discursive
dispute? The result showed that the disputes are of a political nature and further
motivate uncertainties. Part of evangelicals are represented alongside Jair Bolsonaro
as deniers who also accumulate political power, are misunderstood and criticized for
this position.
KEYWORDS: Pandemic; Negationism; Scientism; Evangelical religion.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
395
1. INTRODUÇÃO
Em pleno século XXI, no ano de 2020, o mundo foi surpreendido pelo novo
coronavírus, o Covid-19. A princípio não se deu muita importância a esse fato, mas
em pouco tempo a humanidade percebeu que os efeitos causados sobre a saúde das
pessoas, além de pouco conhecidos, são letais. Isso se tornou um desafio para os
cientistas os quais buscam uma vacina imunizante. Porém, como essa solução será a
longo prazo, para se evitar a morte de milhares de vidas foi preciso adotar medidas
imediatas, tais como: distanciamento social, isolamento, fechamento de escolas,
estabelecimentos comerciais e templos religiosos e a quarentena isolando, as
pessoas ao redor do mundo e alterando, repentinamente, a rotina da população.
A partir desses acontecimentos e suas consequências, cabe uma adesão às
reflexões de Santos (2020) o qual afirmou que a pandemia serviu para revelar sérios
problemas existentes no Brasil como as desigualdades, as diferenças e os
despreparos.
Esse contexto aponta para um presente caótico e um futuro de incertezas
impactado pelo panorama atual.
Nesse momento de pandemia, sabemos que muitos discursos se entrelaçam e
uma das formas mais comuns de conhecê-los é pelo meio digital. A tecnologia da
informação acabou acirrando esse processo discursivo onde a Web se tornou o palco
das principais disputas. Nesse sentido, busca-se cada vez mais a tecnologização do
discurso como meio de aperfeiçoá-lo a fim de que possa ser utilizado como forma de
convencimento (MAINGUENEAU, 2015).
Sendo assim, pretendemos analisar dois discursos que disputam o poder. O
primeiro diz respeito ao discurso negacionista cujos representantes são o expresidente dos Estados Unidos e o atual presidente do Brasil, assim como, as
lideranças econômicas e religiosas pentecostais. O segundo é o discurso científico o
qual tem por adeptos médicos sanitaristas, apoiados por instituições como a OMS
(Organização Mundial da Saúde), a Fiocruz e os governadores dos Estados brasileiros
(ROMANO e et al., 2020).
A partir dessa contextualização, levantamos as seguintes questões: Quais as
disputas advindas desses dois discursos opositores? Como são representados os
evangélicos em meio a essa disputa discursiva? Nosso objetivo é analisar os
argumentos entre esses dois discursos e como a sociedade representa e envolve os
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
396
evangélicos nela. Para isso, utilizaremos a pesquisa de cunho bibliográfica e
exploratória. Uma vez que nesse cenário de disputas discursivas, incertas, se torna
relevante conhecer as implicações deles para a sociedade.
Ao longo da história da humanidade aconteceram outras pandemias. Para a
OMS o conceito que designa uma doença como pandêmica, é a sua capacidade de se
alastrar por diversas regiões do Planeta. Senhoras, identifica como fator facilitador nas
primeiras pandemias, a “dinâmica demográfica” consequência da expansão da
humanidade em suas três ondas.1
O autor destaca também certa padronização e periodização temporal nas
pandemias de maior relevância na história, que “embora sem precisão estatística,
partindo do século VI com a conhecida “Praga de Justiniano”, passando pelo século
XIV com a “Peste Negra”, até se chegar ao século XX com a “Gripe Espanhola”,
guardam entre si certo espaçamento.2 Desta forma é preciso aprender com as
pandemias anteriores nas ações das eventuais pandemias que possam se apresentar.
Assim, devido à incidência do novo coronavírus a OMS, prudentemente,
declarou pela 6ª vez o estado de emergência internacional. Esta medida já havia sido
tomada em epidemias anteriores como Ebola (2018 e 2016), zika vírus (2016),
poliomielite (2014) e gripe suína, H1N1 (2009).3
Inclusive a última pandemia que ceifou o mundo, denominada de Gripe
Espanhola, foi bem mais cruel no número de vítimas em relação à Covid-19. “Em
1918, a população mundial era de 1,8 bilhão e a pandemia matou provavelmente, 50
a 100 milhões de pessoas”4.
2. DISCURSO E PODER
Para entender o que é discurso e poder é necessário lembrar que segundo
Foucault “[...] saber e poder eram exatamente correspondentes, correlativos,
superpostos, não podia haver saber sem poder. E não podia haver poder político sem
1
SENHORAS, Elói Martins. CORONAVÍRUS E O PAPEL DAS PANDEMIAS NA HISTÓRIA HUMANA.
Boletim da Conjuntura. Ano II | Volume 1 | Nº 1| Boa Vista | 2020, p.29.
2
SENHORAS, Elói Martins. CORONAVÍRUS E O PAPEL DAS PANDEMIAS NA HISTÓRIA HUMANA.
Boletim da Conjuntura. Ano II | Volume 1 | Nº 1| Boa Vista | 2020 p.30.
3
SENHORAS, Elói Martins. CORONAVÍRUS E O PAPEL DAS PANDEMIAS NA HISTÓRIA HUMANA.
Boletim da Conjuntura. Ano II | Volume 1 | Nº 1| Boa Vista | 2020, p.31.
4
BARRY, John M. A grande gripe: a história da gripe espanhola, a pandemia mais mortal de todos os
tempos. Tradução de Alexandre Raposo, Carmelita Dias, Cássia Zanon, Lívia Almeida. Maria de Fátima
Oliva Do Coutto e Paula Diniz. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2020. p. 503.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
397
a detenção de um certo saber especifico.” (FOUCAULT, 1978, p.39). Em várias
passagens pela história da humanidade, os entendimentos que se tinha de saber e de
poder estiveram juntos.
Desta forma, pressupõe-se que é possível analisar o discurso da pandemia e
as disputas advindas desse acontecimento estudado por Romano e et al (2020) a
partir de dois pontos citados por Maingueneau (2015). No primeiro, na análise do
discurso, não descende de uma única corrente, por isso, quando se trata de analisar
um assunto podem ocorrer posicionamentos diversos acerca dele.
Maingueneau (1995), argumenta que o discurso somente se torna
verdadeiramente objeto de um saber se ele for assumido por diversas disciplinas que
possuem cada uma um interesse específico. Pressupõe que, neste bojo, está
presente várias disciplinas que dialogam com a análise do discurso, são elas: as
teorias da argumentação, análise crítica do discurso, a sociolinguística e a análise da
conversação. Não se tem espaço para um discurso isolado, neutro. Ele tem que estar
contextualizado. Nesse sentido, a análise do discurso é considerada uma área
movediça, ou seja, cujo processo discursivo é incerto e cheio de surpresas.
O segundo é a “tecnologização” do discurso. Ao contrário do que diziam nos
anos 60 que a análise do discurso seria um método transitório e para pouco tempo
(MAINGUENEAU, 2016), atualmente, percebe-se cada vez mais a importância dessa
disciplina, e o termo “tecnologização” assinala as muitas correntes que têm o discurso
por objeto bem como as diversas entidades sociais que necessitam das análises a
respeito dos mais diversos temas em voga na sociedade.
Por outro lado, tais estudos levam a compreender, também, sobre a
necessidade de controlar os processos discursivos buscando dar uma solução em
meio ao caos. Dessa forma, os discursos que as autoridades querem apresentar é
aquele que vai acalmar os ânimos da sociedade, tranquilizando e trazendo a harmonia
necessária para sua continuidade.
Romano e et al (2020) chamam a atenção para o fato de que a pandemia
provocada pelo Covid-19 pode ser vista como um “acontecimento” que ao mesmo
tempo em que desestabiliza traz oportunidades de disputas políticas, religiosas e
científicas. Cada uma buscando dar uma solução ou uma resposta sobre o problema
para a sociedade.
Porém, como as várias correntes ou pontos de vista acerca desses assuntos
obedecem a uma ordem de pensamento social diferente, torna-se uma disputa que
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
398
muitas vezes divide as opiniões e acaba apontando, cada vez mais, para maiores
incertezas. Como Maingueneau (2015) afirmou a análise do discurso é um terreno
movediço.
3. DISCURSO NEGACIONISTA
O discurso anticientífico não é novo, mas faz parte de uma conjuntura sóciohistórica. Podemos dizer, contudo, que na atualidade ele encontrou fatores propícios
para sua proliferação. De acordo com Fetter (2020) tais fatores estão relacionados à
economia, à política e à tecnologia. Esta última tem a responsabilidade central, uma vez
que propicia às pessoas adquirirem informações como ferramenta eficaz de
desenvolvimento humano, mas também pode servir de veículo de disseminação de
notícias inverídicas. Em consequência disso, a falta de censo crítico acaba fazendo
com que a população concorde com quaisquer ideias.
Analisando o cenário político que se formou desde a pré-candidatura do
Presidente Bolsonaro até as consequências no decorrer da pandemia do novo
coronavírus - Covid-19 não causam espanto se pensarmos que foi marcado pelo
negacionismo. Nesse sentido, Caponi (2020) cita vários fatos que nos fazem
compreender essa afirmação. Segundo o autor
Esse negacionismo que foi adotado pelo atual governo já na campanha
eleitoral, com seu desprezo pelas universidades, pela pesquisa científica,
pelos direitos das populações vulneráveis, pelas comunidades indígenas,
LGBT, populações de rua, mulheres em situação de violência etc., agravase em tempos de epidemia, quando existe maior necessidade de um
Estado presente que garanta o exercício dos direitos (CAPONI, 2020, p.
211).
Embora estejamos falando, especificamente, da figura do presidente do
Brasil, a motivação maior de suas ações recaia sobre o ex-presidente dos Estados
Unidos que era uma espécie de garantidor delas. A estes se juntaram lideranças
econômicas e religiosas pentecostais (ROMANO e et al, 2020).
Os adeptos desse discurso tratam a situação como um acontecimento que
se deve atribuir pouca relevância. Oriundo do discurso das mídias as expressões “é
uma gripezinha”, “o Brasil não pode parar”, “histeria”, “hidroxicloroquina salva”,
“Finalzinho da Pandemia”, “Lamento as 200 mil mortes, mas a vida continua”5
consegue significar o que acreditam (ARRUDA, 2021).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
399
Nesse sentido, buscam dar ênfase a argumentos que distorcem as
orientações. Sendo possível exemplificar com discursos de cientistas econômicos,
tais como: deve-se priorizar a economia porque se o Brasil parar a situação tende a
piorar; ou o da organização Mundial de Saúde (OMS): deve-se adotar o isolamento
social horizontal, tomando os cuidados necessários. Desta forma, acreditam que o
lockdown pode causar mais óbitos se comparado ao coronavírus. Além do mais,
incentivam a utilização de terapias medicamentosas como a Cloroquina, mesmo
sem comprovação científica, o que pode causar efeitos colaterais danosos à saúde.
Aliado à política negacionista e ao uso de medicamentos ineficazes à cura da
pandemia estão as fake news acerca da Covid-19. Este fato prejudicou as relações
sociais e econômicas do Brasil, criando um fosso entre os que acreditam na ciência
e na vacina e aqueles fanáticos que acreditam ser o vírus algo produzido pela China
ou um castigo divino, como acreditavam os homens e mulheres no medievo,
referente à peste negra.
Recentemente, na maior pandemia de nossa história, várias ações
negligenciadas, igualmente, foram criadas acerca da Gripe Espanhola. “As mentiras
das autoridades e da imprensa nunca permitiram que o terror se tornasse real [...]
O medo, não a doença, ameaçou a ruptura da sociedade”6.
Ao contrário do que se possa pensar, o atual Presidente da República do
Brasil representa uma liderança que exerce influência sobre muitos grupos políticos
e sociais. Nesse sentido, Caponi (2020) aponta em seu trabalho como ele mobilizou
campanhas pró-Bolsonaro que lutaram a favor de seus ideais. Por exemplo, nos
locais onde ele tem simpatizantes políticos, suas declarações dificultaram o
isolamento social, o lockdown e até mesmo incentivou o uso indiscriminado da
Cloroquina.
A autora assinalou que no dia 14 de maio de 2020 a declaração de Bolsonaro
de que o Brasil está em guerra adquiriu um duplo sentido: guerra contra o vírus ou
contra os governadores? A resposta é contra os governadores, adeptos do discurso
científico e que, apesar do número de contaminados e mortos divulgados no site do
próprio governo federal7. optaram por seguir um caminho contrário.
Nesse cenário de embates ideológicos, também, há de se ressaltar o trabalho
dos jornalistas que, sob forte tensão, precisam ao mesmo tempo divulgar, tanto, os
apelos da ciência quanto o posicionamento do presidente Jair Bolsonaro.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
400
4. DISCURSO CIENTÍFICO
O discurso científico é incisivo pela maneira como trata suas descobertas e
como aprova ou desaprova socialmente determinados casos. Há por trás de tudo
métodos rigorosos que vão de encontro ao puro senso comum.
Demonstrando essa perspectiva, Maingueneau (2020) ao examinar o contexto
depandemia, especialmente, em relação à Covid-19 traçou reflexões para mostrar que
não somente os cientistas sabem sobre esse assunto, mas a população em geral
passou a ter acesso às informações científicas divulgadas pela mídia. Outro aspecto
é o que se pode apreender sobre a pandemia ocorrida no século XIX. Na época, esse
termo era mais conhecido como peste ou catástrofe.
Atualmente, para a ciência o termo “Coronavírus” constitui uma construção
conceitual, pois o vírus é uma categoria biológica e Corona uma subcategoria. Nesse
sentido, a construção científica do termo “Coronavírus” força a pensar que o vírus
perdeu a categoria de peste e está em um invólucro ou uma caixa que pode ser
controlada pelo ser humano. Essa visão científica da pandemia exclui qualquer outra
forma de pensar, inclusive a religiosa, colocando a ciência como aquela que tem o
poder de controlar a situação e dar tranquilidade à população. Um terceiro aspecto que
vale ressaltar é a figura do perito que é aquele responsável por dar as informações
sobre a pandemia.
O discurso levado a mídia por esse perito precisa demonstrar credibilidade
nesse momento de incertezas. Em relação a tais discursos, notamos que eles foram
sintetizados pelos gráficos e esquemas, isto é, a pandemia tornou-se números que são
interpretados pelos peritos e jornalistas. Contudo, o problema não é simples de ser
resolvido se pensarmos na informação de qual perito podemos considerar: se ligado
ao governo ou ao comitê científico.
O discurso científico o qual tem por adeptos médicos sanitaristas, apoiados por
instituições como a Organização Mundial da Saúde e a Fiocruz, além dos
governadores de vários Estados brasileiros, tais como São Paulo, Rio de Janeiro,
Maranhão e os demais do Nordeste; e dos governos de países, tais como Rússia,
China, Argentina, França, Alemanha, Nova Zelândia, dentre outros.
Para os partidários desse discurso deve-se preservar a saúde e a
sustentabilidade da vida, defendem o isolamento social horizontal e o lockdown, a fim
de garantir o bem estar da população e a sustentabilidade da economia futuramente.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
401
Presente no discurso da mídia a expressão fique em casa reflete esse pensamento
(ROMANO e et al., (2020).
Pensar nesse lugar de disputas discursivas, nos leva a pensar em como será
o pós- pandemia ou o “novo normal” como dizem. Por meio de Romano e et al (2020)
podemos entender que para um cientista o futuro é o resultado de uma equação
entre o passado e o presente.
Assim, há especulações de muitos especialistas, por exemplo, no livro Sopa
de Wuhan de Slavoj Žižek o capitalismo foi ferido de morte e surgirá uma nova
ordem comunista baseada na cooperação; para Byung-Chul Han, o vírus
completará o atentado terrorista, o capitalismo se fortalecerá graças às tecnologias
e surgirão governos totalitários; segundo Ignacio Ramonet, haverá um choque entre
a velha normalidade e a nova normalidade, aprofundando as desigualdades sociais;
Michel Wieviorka diz que faltarão atores sociais para levar as ideias adiante; Walden
Bello diz que os sentimentos pessimistas serão o cerne utilizado pela extrema direita
e esquerda para promover transformações.
Observando tais ideias diversas, perceber-se um futuro de incertezas em que
pelas suas previsões “tecnologizadas” os especialistas tentam forçar um discurso
profético mostrando que tem o poder de controlar os momentos incertos. Porém, o
que se percebe mesmo são discursos vazios no terreno discursivo das incertezas.
5. REFLEXÕES SOBRE O COMPORTAMENTO DOS EVANGÉLICOS NA
PANDEMIA
No site do Instituto Datafolha, no dia 03 de abril/2021, podemos ter acesso à
pesquisa de opinião sobre a pandemia do COVID-19. De acordo com a exposição dos
dados, os evangélicos estão avaliando com mais critérios as ações do governo de Jair
Bolsonaro e relativizando a pandemia, considerando a posição de que o isolamento
social é aceito pela maioria dos grupos religiosos.
Entretanto, alguns dados merecem nossa atenção: 37% da população geral
defendem que a volta ao trabalho, entre os evangélicos esse número é de 44%; 33%
da população em geral atribuem “bom” e “ótimo” a maneira como o Presidente da
República tem conduzido a crise, contudo, entre os evangélicos esse número chega
a 41%. Esses dados demonstram que o presidente, adepto do discurso negacionista,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
402
exerce uma forte liderança entre os evangélicos e uma preocupação para os adeptos
do discurso científicos. Se considerarmos esses dados mais o fato de que os
evangélicos crescem em número e em capacidade de lobby, que representam 31%
dos brasileiros e ocupam 107 das 513 cadeiras da Câmara Federal, são fatores que
devem ser considerados na análise desse cenário político (DATAFOLHA, 2020).
Compreender o comportamento político desse grupo é, portanto, fundamental para
percebermos com nitidez o desenrolar dos fatos no cenário político nacional e não
podem ser explicadas de maneira simplista. Dessa forma, em relação a esses dados
que influenciam as notícias na mídia, podemos observar que elas assinalam por um
lado que os fiéis são manipulados por suas lideranças, mas por outro, estão alinhados
a político do governo de Jair Bolsonaro.
A mídia mostra ainda que as lideranças religiosas como os pentecostais
locais investem na crença e na fé como meio sobrenatural de curar os acometidos
pela Covid- 19. Tais lideranças são apoiadas pelo presidente, os quais juntos
convocaram jejuns religiosos com o objetivo de erradicar o vírus que é caracterizado
por clichês como: “Tática de Satanás”, “pandemia maligna”, “histeria”, “sinal de
Deus”.
Além disso, os evangélicos tem uma visão profética e escatológica sobre o
advento da pandemia, tais como: “É previsto pela palavra de Deus”, “aponta para a
segunda vinda de Cristo”, “É um sinal do fim dos tempos”. No entanto, essa visão
em certa medida contribui para reforçar o discurso anticientífico (GONÇALVES,
2021). Os religiosos querem que seja resguardado o direito de cultuar nos templos,
assim como soluções controversas, como a imunização por meio de óleo ungido ou
pela cloroquina de Jesus (ROMANO e et al, 2020).
Como se pode perceber, em tempos de pandemia muitos são os perigos do
discurso negacionista religioso e científico. O principal efeito, porém, é a geração de
um nível de desinformação que agrava os índices de infectados e, por conseguinte,
eleva consideravelmente o volume de mortos. Mas aqui é preciso fazer algumas
indagações, tais como: Por qual razão, no Brasil e no mundo, nos últimos anos, tem
crescido a onda negacionista do conhecimento científico? Quem ganha com isso?
E o que exatamente essas pessoas ganham com a difusão do discurso
negacionista?
No âmago da abertura política e da liberdade de expressão surgidas nos anos
80 do século passado, muitos setores vêm revelando certo desconforto,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
403
inconformados com as mudanças que, aos poucos, conferiram mais direitos sociais
à população. Assim, buscam, de diversas formas, criar situações para legitimar
intervenções autoritárias e conservadoras. De forma contraditória, tais setores
fazem uso dos espaços democraticamente construídos, para negar, entre outras
coisas, a própria democracia.
Nos parâmetros pretendidos pelos setores mais conservadores da sociedade,
as ciências tendem a ser reduzidas apenas ao conhecimento que possa embasar,
minimamente, o fundamentalismo religioso que novamente se avizinha. Os valores
comuns dos conservadores estão relacionados à importância atribuída à religião, à
valorização das instituições intermediárias entre o Estado e os indivíduos (família,
corporação etc.) e, por conseguinte, uma crítica à centralização estatal e ao
individualismo moderno (FERNANDES E FERREIRA, 2021, p. 196). Percebe-se que
o contexto social – vislumbrado pelos negacionistas – favorece apenas à
institucionalização do caos social. Atualmente, o que os negacionistas buscam é a total
desconstrução da base do conhecimento científico. Um exemplo é o surgimento de
teses “esdrúxulas”, como é o caso da “teoria terraplanista” – que é, talvez, o maior
exemplo de negaciocismo. Na Idade Média, a cultura, dominada pela Igreja, pouco
conseguia exercer sua função crítica, de modo a provocar questionamentos no
pensamento coletivo.
Hoje, porém, o dano seria maior, visto que a cultura vigente – até mesmo pela
força das novas formas de comunicação, as quais alcançam imenso contingente –
possui imensurável capacidade de estimular a reflexão acerca dos problemas sociais.
Assim sendo, o cerceamento das ciências estaria, dessa vez, calando vozes bem mais
potentes do que eram as vozes da ciência na Idade Média.
Ora, debater acerca de nova tese é algo positivo. É salutar, para a sociedade,
que as novas ideias sejam submetidas às mais complexas contradições. Porque é
assim que as ciências avançam – tese, antítese, síntese. No entanto, o que os
negacionistas pretendem não é a evolução do pensamento. Bem ao inverso, buscam
destruir as poucas certezas, que constituem a base do conhecimento científico –
construído ao longo de milênios.
Querem colocar em dúvida e, assim, enfraquecer o conhecimento científico já
consolidado. Ao provocarem o debate acerca do saber consolidado, querem causar a
derrocada das ciências, igualando-as a qualquer saber informal – em que os
argumentos mais sem sentido ganham adeptos fervorosos. E assim, com as certezas
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
404
científicas sendo trazidas ao mesmo nível da banalidade e do empirismo, as grandes
massas pouca ou nenhuma chance terão de construírem um mundo mais justo – pelo
simples fato de que sequer saberão o que é “justo” e o que é “mundo”.
Então, o negacionismo religioso e científico é basicamente um movimento cujo
principal objetivo é o enfraquecimento do saber científico já consolidado, o que serve,
entre outras coisas, para enfraquecer a defesa da escola pública – especialmente as
universidades –, bem como para tornar as massas populares mais facilmente
manipuláveis, já que agora passam a seguir discursos totalmente esvaziados de
conteúdo científico sólido. Até 2019, o negacionismo habitava tão-somente os
ambientes virtuais e os debates acadêmicos.
Na pandemia, contudo, o negacionismo se fez concreto, confundindo as
massas populares no que diz respeito às formas ideais de se combaterem o covid-19,
o que, por conseguinte, contribuiu significativamente para a elevação do número de
mortes – no Brasil e no mundo.
6. CONCLUSÃO
Que possamos entender o espírito deste tempo histórico e cuidar melhor de
toda a criação. O tempo pandêmico – Covid-19, nos alerta: É necessário
romper com o ciclo depredatório do capitalismo. Assim não é possível
continuar! Necessitamos de uma nova organização social que respeite o
comunitário, o coletivo, a natureza. (Ulrich, 2021, p. 40).
Na análise dos discursos negacionista e científico durante a pandemia mostrou
que em meio a uma situação de calamidade pública os governantes e outras
lideranças se aproveitaram para criar polêmicas, deixando a população à mercê da
sorte. No que se refere à pandemia enquanto as autoridades parecem um tanto
desnorteadas e sem saber com agir, contudo, o vírus com sua natureza mortal age
conforme essa natureza, infectando e mantando a população.
Outra constatação é de que muitas lideranças capitalistas se aproveitam para
transmitir a culpa ao vírus pelos problemas sociais, como a miséria, a segurança, falta
de hospitais, etc. Contudo, sabemos que tais problemas são uma somatória de falta
de investimentos em políticas públicas.
Não é possível identificar um discurso dominante, mas uma divisão entre os
discursos do Governo Federal e do comitê de ciências, os quais cada um procura dar
explicações baseadas em suas visões com o objetivo de trazer estabilidade.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
405
Entretanto, essas disputas políticas causam mais a instabilidade em todos os setores
sociais.
Nessa disputa discursiva, os evangélicos figuram como negacionistas. O fato
de a mídia mostrar este grupo alinhado com as ideias do Presidente da República
deixa transparecer que as lideranças evangélicas acumulam também um poder
político e temporal. Além do mais, por não serem compreendidos pela fé e suas
práticas religiosas isso acaba por motivar ainda mais as críticas da população.
Como resultado de um país com princípios religiosos tradicionais e com uma
grande desigualdade econômica/cultural, observamos que o “caos” é sempre
intensificado, pois quando não se conhece o histórico político do país ou as
consequências reais da má administração econômica, as palavras administradas
sob o ângulo religioso bastam.
Afinal “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” é o slogan utilizado pelo
presidente e seus apoiadores, mas vale ressaltar que devemos lembrar que
“Devemos fazer a nossa parte, para que Deus cumpra sua promessa em nossa
vida”- Josué 1.9: “Nãote mandei eu? Esforça-te e tem bom ânimo; não pasmes, nem
te espantes, porque o SENHOR, teu Deus, é contigo, por onde quer que andares”.
É necessário que o Presidente busque organizar o país com visão ampla e a
longo prazo, considerando as diversas esferas (econômica, cultural, educacional,
meio ambiente, etc.) assim, considere suas interconexões e avalie os resultados
com foco no crescimento do país. E a religião!? Cabe aos ministros religiosos
ceifarem suas ovelhas, afinal cada gestor deve ter foco em sua área!
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
406
REFERÊNCIAS
ARRUDA, Robson Lima de. O negacionismo como artefato da pós-verdade:
Bolsonaro, a pandemia e a educação. BOLETIM DE CONJUNTURA (BOCA) - ano
III, vol. 5, n. 15, Boa Vista, 2021. Disponível em: Acesso em:
https://doi.org/10.5281/zenodo.4587656. Acesso em: 27 de setembro de 2021.
CAPONI, Sandra. Covid-19 no Brasil: entre o negacionismo e a razão
neoliberal.
ESTUDOS
AVANÇADOS
34
(99),
2020.
Disponível
em:
https://www.scielo.br/pdf/ea/v34n99/1806-9592-ea-34-99-209.pdf. Acesso em: 27 de
setembro de 2021
DATAFOLHA. Opinião sobre a pandemia Coronavírus: Avaliação dos
governantes. Disponível
em:
<http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2020/04/03/314a4d134693a86f6fd981754a0
57 5ceag.pdf >. Acessado em: 27 setembro 2021.
FERNANDES, Lorena Ismael; FERREIRA, Camila Alves. O movimento Escola
Sem Partido: ascensão e discurso. Revista Humanidades em Diálogo, São Paulo,
v. 10, n. 2, p. 194-209, 2021.
FETTER, G. L. Discurso anticientífico e Covid-19: tensões entre política e
jornalismo. Macabéa – Revista Eletrônica do Netlli | v.9., n.1., Out.-Dez. 2020, p.
562- 584. Disponível em:
http://periodicos.urca.br/ojs/index.php/MacREN/article/view/2672/1962. Acesso em:
27 de setembro de 2021.
FOUCAULT, M. A verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: PUC, 1978.
(Cadernos da PUC/RJ. Série letras e artes).
GONÇALVES, R. B. Discurso laico e discurso religioso em tempos de
Coronavírus. Ciencias Sociales y Religión/Ciências Sociais e Religião, Campinas,
v.23, e021001, 2021. Disponível em:
https://econtents.bc.unicamp.br/inpec/index.php/csr/article/view/13742/10165
Acesso em: 22 de setembro de 2021.
MAINGUENEAU, Dominique. O que pesquisam os analistas do discurso? Revista
da ABRALIN, v.14,
n.2,
p.
31-40, jul./dez.
2015.
Disponível em:
https://revistas.ufpr.br/abralin/article/view/42547. Acesso em: 25 de setembro de
2020.
MAINGUENEAU, D. Quem fala da pandemia? Notas sobre ethos e porta-voz.
Canal do LEEDIM –
UFSCAR do
Facebook, 2020. Disponível em:
https://www.facebook.com/leedim.ufscar/videos/quem-fala-na-pandemia-notassobre- ethos-e-porta-voz/1028161050913072/. Acesso em: 27 setembro de 2021
MAINGUENEAU, D. Présentation. Langages. Paris: Larousse, v.117, p. 5-11, 1995.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
407
ROMANO, J. O. e et al. A disputa de discursos sobre a pandemia. Le
Monde – Diplomatique Brasil. Edição 155, 1 de junho de 2020. Disponível em:
https://diplomatique.org.br/a-disputa-de-discursos-sobre-a-pandemia/. Acesso em:
27 setembro de 2021.
Povo, Gazeta do. “Números da Covid-19 hoje no Brasil e no Mundo”, Brasil, 05
de out. 2021. Google [online].
SANTOS, Boaventura de Santos. A Cruel Pedagogia do Vírus. Coimbra: Ed.
Almedina: 2020.
SENHORAS, Elói Martins. CORONAVÍRUS E O PAPEL DAS PANDEMIAS NA
HISTÓRIA HUMANA. Boletim da Conjuntura. Ano II | Volume 1 | Nº 1| Boa Vista |
2020. p.29-32.
ULRICH, Claudete Beise. É Tempo de Afastar-se dos Abraços. E-book Pandemia
de Covid-19: experiências, espiritualidades e esperanças / Claudete Beise Ulrich;
Vinicius Silva de Oliveira (orgs.). São Paulo: Recriar; Vitória: Unida, 2021. pg. 35-41.
Disponível em https://marketingeditorare.wixsite.com/ebook-unida-recriar Acesso em:
05 de out. 2021.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.111831-111844 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
408
CAPÍTULO 22
ANÁLISE DAS PRÁTICAS DE INTRODUÇÃO ALIMENTAR DE MÃES RESIDENTES EM
BRASÍLIA - DISTRITO FEDERAL
Ana Isabelly Siqueira
Graduada em Nutrição pela Universidade Paulista
Instituição: Universidade Paulista – Campus Brasília
Endereço: SGAS - Asa Sul, Brasília - DF
E-mail: anaisasiqueira17@hotmail.com
Camila Araújo da Silva
Graduada em Nutrição pela Universidade Paulista
Instituição: Universidade Paulista – Campus Brasília
Endereço: SGAS - Asa Sul, Brasília - DF
E-mail: camilasilva.010@gmail.com
Jessica Louranny Oliveira Rocha
Graduada em Nutrição pela Universidade Paulista
Instituição: Universidade Paulista – Campus Brasília
Endereço: SGAS - Asa Sul, Brasília - DF
E-mail: nutrijessicalouranny@gmail.com
Bruna Nascimento da Silva
Doutoranda em Saúde Integral, Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira
Instituição: Universidade Paulista – Campus Brasília
Endereço: SGAS - Asa Sul, Brasília - DF
E-mail: bruna.silva@docente.unip.br
Ramyne de Castro da Paz
Mestre em Ciências para a Saúde pela Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências
da Saúde, Fepecs/SES-DF
Endereço: Unip - Sgas - Asa Sul, Brasília – DF
E-mail: ramyne.paz@docente.unip.br
Antônio José de Rezende
Doutor em Agronomia pela Universidade de Brasília (UND – DF).
Endereço: Unip - Sgas - Asa Sul, Brasília – DF
E-mail: antonio.rezende1@docente.unip.br
Renata Costa Fortes
Pós-Doutoranda em Psicologia pela Universidad de Flores, Argentina
Endereço: Unip - Sgas, s/nº - Conjunto B - Asa Sul, Brasília – DF
E-mail: renata.fortes@docente.unip.br
RESUMO: Objetivo do estudo é caracterizar as práticas de introdução alimentar de
mães residentes em Brasília, Distrito Federal, Brasil. Trata-se de um estudo
transversal, realizado em 2020 em uma creche privada de Brasília, Distrito Federal,
Brasil. Foram aplicados dois questionários por meio de um formulário virtual, um
referente a dados sociodemográficos das mães e o outro sobre introdução da
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
409
alimentação da criança. Na análise estatística foi realizada frequência para as
variáveis categóricas. Para as variáveis contínuas foram obtidas médias e desvios
padrão. Participaram desse estudo 44 mães. A média da idade materna foi de 33 ± 6
anos e 75% delas não eram profissionais da saúde. Com relação a alimentação nos
primeiros seis meses de vida das crianças, 70% das mães ofertaram o leite materno
nas primeiras horas de vida e 55% mantiveram a oferta do leite materno exclusivo até
o sexto mês de vida e 61,4% dos lactentes iniciaram a introdução alimentar no sexto
mês de vida. A respeito da introdução alimentar, 80% das crianças realizaram como
primeira refeição a papa de fruta com a consistência amassadas (93%), quase 100%
das crianças receberam carne vermelha (91%), verduras e legumes (95%), arroz e
feijão (91%). Entretanto, foi comum oferta de sucos, açúcar e mel também. Concluise que a introdução da alimentar se mostrou adequada em grande parte da amostra
com boas fontes alimentares. Entretanto, foi observado também o uso precoce de suco
e sal, o que pode comprometer a saúde da criança.
PALAVRAS-CHAVE: Nutrição do Lactente, Alimentação Complementar, Nutrição
Infantil.
ABSTRACT: The objective is characterize the feeding introduction practices of
mothers residing in Brasília, Distrito Federal, Brazil. This is a cross-sectional study,
carried out in 2020 in a private nursery school in Brasília, Distrito Federal, Brazil. Two
questionnaires were applied through a virtual form, one referring to the
sociodemographic data of the mothers and the other about the introduction of child
nutrition. In the statistical analysis, frequency analysis was performed for categorical
variables. For continuous variables, means and standard deviations were obtained. 44
mothers participated in this study. Mean maternal age was 33 years ± 6 years and 75%
of them were not health professionals. Regarding feeding in the first six months of life
of children, 70% of mothers offered breast milk in the first hours of life and 55%
maintained exclusive breast milk supply until the sixth month of life and 61.4% of
infants started the introduction of food in the sixth month of life. Regarding the
introduction of food, 80% of the children had a mashed fruit porridge (93%) as their first
meal, almost 100% of the children received red meat (91%), vegetables (95%), rice
and beans (91%). However, it was common to offer juices, sugar and honey as well. In
conclusion, the feeding introduction practices proved to be adequate for most of the
sample with good food sources. However, the early use of juice and salt was also
observed, which can compromise the child's health.
KEYWORDS: Infant Nutrition, Complementary Feeding, Child Nutrition.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
410
1. INTRODUÇÃO
Nos primeiros anos de vida de uma criança, é primordial para seu
desenvolvimento e crescimento que a nutrição ocorra de maneira adequada. Por isso,
a Organização Mundial de Saúde (OMS) em conjunto com o Ministério da Saúde
(MS) recomenda que a criança permaneça em aleitamento materno exclusivo (AME)
até completar os seis meses de vida, sendo a partir dessa fase que a introdução de
alimentos complementares seja iniciada de forma correta, não deixando de manter o
leite materno até a criança completar dois anos de vida (RIQUELME et al., 2021,
JUSTINO et al., 2021, BRASIL, 2017; CARVALHO; OLIVEIRA; SANTOS, 2015;
FRAGOSO; FORTES, 2011, DIAS; FREIRE; FRANCESCHINI, 2010, WHO, 2000).
A alimentação complementar tem a função de complementar os nutrientes e a
energia necessários para proporcionar crescimento e desenvolvimento saudáveis à
criança. Quando realizada de forma correta, a alimentação complementar irá, além de
satisfazer as necessidades nutricionais da criança, auxiliá-la no desenvolvimento dos
aspectos motores, psicológicos e cognitivos e prevenir o surgimento de doenças
(MOREIRA et al, 2021).
A mãe tem um papel fundamental na vida da criança, e ela é capaz de fazer
um elo entre a alimentação e a criança. As condutas inadequadas realizadas são
consequências do desconhecimento sobre o assunto, do despreparo dos profissionais
na orientação às mães e da falta de informação adequada (ARAUJO et al, 2004). Os
alimentos tais como frutas, verduras, legumes, cereais, carnes, ovos, gorduras e
raízes devem estar presentes no início da introdução alimentar (IA), além de serem
os recomendados para se manter um hábito alimentar saudável (VITOLO et al, 2014).
Em 2019, o “Guia Alimentar para crianças menores de dois anos de idade” teve
o acréscimo de informações como a redução do consumo de açúcares e alimentos
ultraprocessados pelas crianças. É de conhecimento que o consumo de alimentos
industrializados, até mesmo por incentivo da mídia, aumenta a cada dia, podendo
levar a ocorrência de problemas de saúde, como diabetes, obesidade e até mesmo
problemas cardíacos. Por essa razão, o guia teve uma modificação em sua versão,
trazendo agora os 12 passos para uma alimentação saudável, sendo apresentado de
forma mais acessível em sua linguagem, com diminuição de conteúdo teórico (DIAS;
FREIRE; FRANCESCHINI, 2010).
Levando-se em consideração que a alimentação complementar tem a
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
411
finalidade de indicar gostos e preferências que vão seguir com a criança em todas
as suas fases da vida, o presente estudo tem como objetivo caracterizar as práticas
das mães referentes à introdução da alimentação complementar em uma creche
privada de Brasília, Distrito Federal, Brasil.
2. MÉTODOS
Este estudo respeitou os preceitos éticos, sendo aprovado pelo Comitê de
Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Paulista, Campus
Indianópolis - SP, sob parecer número 4.183.255 e Certificado de Apresentação de
Apreciação Ética (CAAE) número 33605120.2.0000.5512.
Trata-se de um estudo transversal descritivo realizado com mães adultas. A
amostra foi não probabilística por conveniência, realizada em 2020, com coleta de
dados por formulário online, mediante os seguintes critérios de inclusão: mães ou
cuidadores com idade maior que 18 anos, nas quais os filhos frequentavam a
creche, com crianças entre 4 meses e 1 ano de idade. Os critérios de exclusão
foram: mães de crianças com síndromes ou malformações congênitas que
impossibilitassem a amamentação e mães que por alguma condição clínica
estivessem contraindicadas de amamentar.
Para a coleta de dados foram aplicados dois questionários via Google
Forms®, sendo o primeiro referente a dados da mãe (idade, ocupação, quantidade
de filhos e se realizou acompanhamento nutricional durante a gestação). E o
segundo questionário com informações relacionadas às práticas realizadas pelas
mães durante a IA (a partir de qual mês deu início a introdução alimentar, uso de
fórmulas infantis, quais foram os primeiros alimentos ofertados para o bebê, qual a
consistência das refeições após os 6 meses de vida, a oferta da água, ovo, frutos
do mar, oleaginosas, carne vermelha, frutas e legumes, arroz e feijão, a oferta de
açúcar e mel).
Para a análise estatística, os dados foram lançados no programa Microsoft®
Office Excel e analisados pelo software Stata 12.1 SE (StataCorp, 4905 Lakeway
Drive, College Station, Texas 77845 USA). A caracterização da amostra foi realizada
construindo-se tabelas de frequência para as variáveis categóricas. Para as
variáveis contínuas foram obtidas médias e desvios padrão.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
412
3. RESULTADOS
Participaram desse estudo 44 mães residentes em Brasília-DF, com média de
idade (anos) de 33±6; 25% (n=11) eram profissionais da área da saúde com nível
superior, 64% (n=28) tinham apenas um filho e metade delas (n=22) realizaram
acompanhamento nutricional (Tabela 1).
Tabela 1 – Características sociais e clínicas de mães de crianças de uma creche privada de Brasília,
Distrito Federal, Brasil, 2020 (n=44)
Características
n
Ocupação
Profissional da área da saúde
11
(nutricionista, médico, psicólogo)
33
Outras áreas
Quantidade de filhos
28
Somente 1
16
De 2 a 3 filhos
Acompanhamento nutricional durante a gestação
22
Sim
22
Não
Fp(%)
25%
75%
64%
36%
50%
50%
Nota: n = número de mães. Fp% = frequência percentual.
Com base nas características da alimentação nos primeiros seis meses de vida,
52% das mães não ofertaram fórmulas infantis, 55% ofertaram o leite materno até o
6º mês de vida, 61% iniciaram a introdução alimentar no 6º mês de vida (Tabela 2).
Tabela 2 – Características da alimentação nos primeiros seis meses de vida de crianças de uma creche
privada de Brasília, Distrito Federal, Brasil, 2020 (n=44)
Características da alimentação
Uso de fórmula infantil no hospital
Sim
Não
Aleitamento materno exclusivo até o sexto
mês de vida
Sim
Não
Início da Introdução Alimentar
No 6° mês de vida
Entre o 4 ° e 5° mês de vida
A partir do 3° mês de vida
n
Fp(%)
21
23
48%
52%
24
20
55%
45%
27
14
2
61%
32%
5%
Nota: n = número de mães. Fp% = frequência percentual.
Com relação às características da IA das crianças, 80% (n=35) receberam
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
413
como primeira refeição papa de frutas, sendo 93% (n=41) amassadas com o garfo
(Tabela 3).
Tabela 3 – Características da introdução alimentar de crianças de uma creche privada de Brasília,
Distrito Federal, Brasil, 2020 (n=44)
Características
Primeira papa ofertada
Papa de fruta
Papa salgada
Consistência das refeições após 6
meses de vida
Amassada no garfo
Batida no liquidificador
n
%
35
9
80%
20%
41
3
93%
7%
Nota: n = número de mães. Fp% = frequência percentual.
Em relação aos alimentos ofertados na IA, 64% (n=28) das crianças receberam
ovo, 16% (n=7) frutos do mar, 80% (n=35) peixe e 34% (n=15) oleaginosas. Observouse consumo de carne vermelha em 91% (n=40), verduras e legumes 95% (n=42),
arroz e feijão 91% (n=40). A oferta de suco foi observada em 59% (n=26). Houve
adição de açúcar na IA em 55% (n=24) e 43% (n=19) receberam mel antes dos dois
anos de vida. Observou-se, também, que 18% (n=08) da oferta de bolachas
recheadas, biscoitos e salgadinhos e 23% (n=10) das mães ofereceram chás para os
bebês (Tabela 4).
Tabela 4 – Alimentos ofertados na introdução alimentar de crianças de uma creche privada de
Brasília, Distrito Federal, Brasil, 2020 (n=44)
Alimento
Ovo
Frutos do mar
Peixe
Oleaginosas (castanhas e nozes)
Carne vermelha
Verduras e legumes
Arroz/feijão
Suco
Açúcar
Mel
Bolachas recheadas, biscoitos e
salgadinhos
Chás
Sim
n (%)
28 (64%)
07 (16%)
35 (80%)
15 (34%)
40 (91%)
42 (95%)
40 (91%)
26 (59%)
24 (55%)
19 (43%)
08 (18%)
Não
n (%)
16 (36%)
37 (84%)
09 (20%)
29 (66%)
04 (9%)
02 (5%)
04 (9%)
18 (41%)
20 (45%)
25 (57%)
36 (82%)
10 (23%)
34 (77%)
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
414
4. DISCUSSÃO
No presente estudo, mais da metade dos lactentes iniciaram a IA no sexto mês
de vida e menos de 5% iniciaram a IA no terceiro mês de vida. A introdução precoce
dealimentos à dieta da criança, antes dos seis primeiros meses de vida, pode culminar
com consequências significativas para a saúde dela, com interferência nos
processos digestivos e absortivos dos nutrientes (SILVA et al, 2021, FRAGOSO;
FORTES, 2011). Em um estudo na Serra Gaúcha, foi verificado um percentual de
42,7% de lactentes iniciaram a IA antes de completar seis meses e 3,4% iniciaram
antes de completar três meses de vida. Uma pesquisa desenvolvida no Ceará, com
mães de bebês de até um ano, observou-se que 90% da amostra sabia que a IA
deveria ser iniciada no sexto mês de vida do bebê. Acredita-se que questões
culturais podem ter impacto no desmame precoce ou pode estar relacionado ao
retorno da mãe ao trabalho fora do lar, já que a licença maternidade no Brasil é de
quatro meses (MOREIRA et al., 2021; BRASIL, 2015).
Outros fatores que podem estar relacionados ao desmame precoce incluem a
falta de preparo dos profissionais de saúde na orientação e no manejo adequado
perante as dificuldades encontradas pelas mães e a fragilidade das políticas públicas
de saúde na promoção do aleitamento materno (SILVA et al, 2021). Fragoso e Fortes
(2011) evidenciaram que cerca de 76,5% das nutrizes atendidas em um hospital
público do Distrito Federal tiveram dificuldades para amamentar nos primeiros dias
após o parto, o que reforça a falta de suporte adequado do serviço de saúde. Logo, o
desmame precoce pode ser influenciado por uma diversidade de fatores, como
biológicos, históricos, culturais, econômicos, sociais e psíquicos (JUSTINO et al,
2021).
A OMS recomenda a introdução dos alimentos complementares a partir dos
seis meses de idade. É por volta dessa fase, que o bebê já consegue ter um bom
desenvolvimento motor e apresenta maturidade fisiológica, já sendo possível notar os
sinais essenciais para a deglutição, a sustentação da cabeça e do tronco, o movimento
de levar algo até a boca e o paladar já desenvolvido (BRASIL, 2019).
Com relação ao tipo de preparação inicial na IA, a papa de fruta foi a mais
prevalente. Resultados similares foram encontrados em um estudo feito com mães
também brasileiras do sul do país em que foi possível identificar que 62% dos
lactentes iniciaram a IA com papas de frutas, seguindo para as papas salgadas e os
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
415
sucos. Em contrapartida, um estudo em São Bernardo do Campo, observou que o
início da IA foi arcado pelo consumo de papa de legumes, seguindo com frutas (SILVA;
VENÂNCIO; MARCHIONI, 2010, WILLRICH, 2017).
Não existem regras sobre a escolha de papa de fruta ou papa salgada no início
da introdução alimentar. Mas, na prática clínica, observa-se que a oferta da papa de
fruta é inicial, devido ao seu sabor ser adocicado e ter mais aceitação entre os bebês.
Os primeiros anos de vida é um período importantíssimo para a aplicação de práticas
adequadas de alimentação, pois é nesta etapa de vida que as habilidades são
adquiridas para a formação de um padrão alimentar na vida adulta. Sendo assim, é
importantíssimo que o início da alimentação complementar seja realizado com
alimentos saudáveis e que vão contribuir para o desenvolvimento da criança
(MONTEIRO, 2016).
Encontrou-se alta prevalência de mães que ofertaram as primeiras papinhas na
consistência pastosa. No estudo realizado por Baldissera, Issler e Giugliani (2016),
em Porto Alegre, o resultado foi semelhante ao presente estudo. Das mães que
foram entrevistadas, 79,7% ofertavam as primeiras papinhas na consistência pastosa.
Carneiro et al (2015), em Recife, também encontraram resultados similares, em que
65,5% das mães entrevistadas também ofertaram as primeiras papinhas na
consistência pastosa.
Em uma pesquisa feita em duas universidades do Foz de Iguaçu, entrevistando
mães universitárias, o percentual encontrado de mães que liquidificavam as papinhas
foi superior a 30%. Em uma análise realizada no estado do Ceará, 48% da amostra
acreditava que a consistência correta era liquida, elas justificaram essa conduta,
devido ao fato do bebê não possuir dentes e não conseguir deglutir alimentos
amassados e sim os liquidificados (MOREIRA et al, 2021, BRASIL et al., 2017).
O recomendado é iniciar apresentando ao bebê uma consistência mais espessa,
pastosa, como um purê e a mudança deve ocorrer de forma gradativa, passando da
consistência pastosa para a sólida, até chegar na consistência da alimentação da
família. Os alimentos devem ser ofertados em colher e serem preparados sem
liquidificador, processador ou peneira. O objetivo é estimular a mastigação e
proporcionar o conhecimento dos sabores e consistência dos alimentos, o que não é
possível quando liquidificado (DALLAZEN et al., 2018).
O estudo atual, teve um percentual de 82% de mães que não ofereceram
bolachas recheadas, biscoitos e salgadinhos. Em um estudo desenvolvido na região
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
416
do Sul do Brasil, foi verificado que 64,5% das mães nunca tinham ofertado alimentos,
como bolachas, salgadinhos entre outros que contém açúcar em sua preparação para
seus filhos (BERCINI et al, 2007).
O oposto foi evidenciado em uma pesquisa realizada em Maringá, 65,1% das
crianças menores de um ano tiveram acesso aos alimentos como bolachas e
salgadinhos. Assim como, um estudo realizado no município de Registro, em São
Paulo, foi encontrado um percentual de 63,7% de crianças que receberam alimentos
como bolachas, biscoitos ou salgadinhos no primeiro ano de vida (LOPES et al., 2020,
TOMÁSIA, 2013).
Nota-se que a prevalência do consumo de açúcar em muitos estudos aqui
citados é alta. Tal hábito pode ser prejudicial, a criança que é exposta ao açúcar desde
cedo tem dificuldades na aceitação de alimentos, com sabores não adocicados. Além
disso, crianças que consomem açúcar em excesso podem apresentar alterações no
sono e na saciedade. Outro aspecto é que alimentos industrializados, ricos em açúcar
podem favorecer o desenvolvimento de doenças, principalmente obesidade infantil,
diabetes e outras doenças crônicas não transmissíveis na vida adulta (ARAÚJO;
COSTA, 2018).
Neste estudo, 80% das mães ofertaram peixe aos seus filhos na introdução
alimentar. Diferentemente dos resultados encontrados por Takushi et al. (2006) na
cidade de São Paulo, em que 85,4% das mães não ofertaram peixe na introdução
alimentar. De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (2018), o peixe deve
fazer parte da alimentação do bebê na IA. O peixe tem inúmeros benefícios para a
saúde, principalmente na oferta de ácidos graxos ômega-3 e ferro. Além disso, ajuda
no desenvolvimento do sistema nervoso central, previne doenças como a hipertensão,
obesidade dislipidemia. A preocupação maior dos pais, na oferta do peixe ao bebê, é o
risco de alergias, porém, essa proteína deve ser introduzida gradualmente, sempre
observando a criança.
Neste estudo, foi identificado que a maioria das mães não ofereceram chás para
os bebês. Entretanto, Takushi et al. (2006) na sua pesquisa desenvolvida em São
Paulo encontraram um percentual de 71,3% de mães que ofertaram alimentos como
chás, por volta dos cinco meses de idade. De acordo com as recomendações da OMS,
o bebê deve receber o leite materno de forma exclusiva até os seis meses de vida
(FRAGOSO; FORTES, 2011). Esse é o primeiro dos 12 passos para a alimentação
saudável durante a primeira infância, recomendados pelo Ministério da Saúde (MS),
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
417
Organização Pan- Americana de Saúde (OPAS) e pela Sociedade Brasileira de
Pediatria (SBP). O guia orienta aos pais, que até os seis meses de idade, não seja
oferecido água, chá, suco, ou qualquer outro alimento (BRASIL, 2019, FREIRE;
FRANCESCHINI, 2010).
A respeito da oferta de sucos, açúcar e mel, quase metade das mães já
ofereceram esses alimentos para bebês com menos de dois anos de idade. Em um
estudo feito na região noroeste de Goiânia foi verificado um percentual mais alto,
57,2% das mães ofertaram suco para as crianças ao sexto mês de vida. E, segundo
dados da Pesquisa Nacional de Saúde, 32,3% das crianças menores de dois anos
ingerem sucos açucarados (BRASIL, 2015, SCHINCAGLIA et al., 2013).
Um estudo realizado na região de Montes Claros, em Minas Gerais, 15,5% das
mães ofertaram suco para bebês com três meses de vida e 31,1% para aqueles com
12 meses de vida. Resultados mais alarmantes foram encontrados em um estudo
realizado na cidade de Maringá, em que 77% das mães que já haviam ofertado suco
para bebês menores de seis meses de vida (SCHINCAGLIA et al, 2013, BRASIL,
2009, BERCINI et al., 2007).
Recomenda-se a ingestão de suco somente a partir de 01 a 02 anos de idade,
lembrando que a partir de um ano, a limitação é de 100mL por dia. Cabe ressaltar
a importância de as crianças terem acesso às frutas in natura, que são dotadas de
vitaminas, minerais, fibras e não são prejudiciais à saúde (HEYMAN, 2017).
Com relação a utilização de fórmula infantil, no primeiro ano de vida, quase
metade da amostra do presente estudo fez uso. Um estudo realizado em município
do Recôncavo da Bahia, chamado Santo Antônio de Jesus, foi observado que 47%
das mães ofertaram aos seus filhos a fórmula infantil. Já, 25% das mães ofertaram
preparações tendo como base de farináceos e fórmula infantil. E, 27% já haviam
ofertado as duas preparações aos seus filhos (MACHADO, 2016).
Neste estudo, verificou-se que 64% das mães já haviam ofertado ovo para os
seus filhos e 36% não ofertaram. Acredita-se que as mães que não ofertaram ovo na
IA temiam alergias alimentares. Em um estudo realizado no município do Norte do
estado do Rio Grande do Sul, foi encontrado um percentual de 11,1% de crianças que
consumiam o ovo inteiro, 11,1% de crianças consumiam somente a clara e 7,4%
apenas a gema do ovo (GARCIA; GRANADO; CARDOSO, 2011). A recomendação
para a oferta do ovo é a partir do sexto mês de vida. Por ser um possível alimento
alergênico é necessário a oferta a cada 3 a 5 dias, observando a reação do organismo
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
418
da criança após o consumo do ovo (ARAÚJO, COSTA, 2018).
Notou-se que neste estudo, 91% das mães ofertaram arroz e feijão na IA. Em
um estudo realizado no município do Norte do estado do Rio Grande do Sul, os dados
se mostraram similares, 88,9% das crianças consumiram o feijão na alimentação. Em
contrapartida, uma pesquisa realizada em uma instituição privada, localizada em
Águas Claras-Brasília/DF, verificou uma prevalência de 28% de mães que já haviam
ofertado arroz e feijão para as crianças (ARAÚJO; COSTA, 2018; OLIVEIRA;
RIGOTTI; BOCCOLINI, 2017).
As leguminosas são consideradas alimentos com alto valor nutricional,
contendo em sua composição vitaminas e minerais, sendo de maior destaque ferro,
zinco e magnésio. São alimentos de extrema importância nessa etapa da introdução
alimentar (BRASIL, 2009). O percentual de oferta de verduras e legumes na
população do estudo foi elevado. Oliveira, Rigotti e Boccolini (2017) verificaram que
70,9% das crianças já haviam consumido verduras e legumes (DIAS, 2013).
Com relação a oferta de carnes, os resultados foram satisfatórios. Os dados
levantados na Pesquisa Nacional Demográfica demonstraram que 17,3% das crianças
receberam carnes diariamente na introdução alimentar. Já, 40% das crianças
receberam carnes somente 2 a 3 vezes na semana, o que não condiz com as
recomendações preconizadas pelo Guia Alimentar para crianças menores de dois
anos de idade, em que indica 01 porção diária deste alimento aos seis meses de vida
(BRASIL, 2014, BRASIL, 2009).
Em uma pesquisa realizada no bairro Vila Planalto, localizado em Brasília-DF,
foi verificado que aos seis meses de idade, 80% das crianças tinham recebido carne
na alimentação. Em contrapartida, em um estudo realizado por Budree et al (2017),
em crianças sul-africanas, foi observado um percentual de 77% de crianças que só
consumiram carne com doze meses de idade (BUDREE et al, 2017, DIAS, 2013).
Nos primeiros dois anos de vida de uma criança é possível o desenvolvimento
de alergia alimentar a frutos do mar, trigo, leite, amendoim, peixe e nozes. Muitos já
possuem uma predisposição genética para o desenvolvimento da alergia, enquanto
alguns fatores ambientais, também podem ser considerados favoráveis ao surgimento
de alergia (SILVA, 2020).
Um dos problemas que mais afeta a saúde de 1% a 3% de crianças em países
ocidentais é a alergia ao amendoim. Evidências recentes levaram a modificações nas
diretrizes anteriores, dando ênfase na oferta de amendoim na introdução alimentar, e
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
419
não no consumo deste após os três anos de idade. A evidência foi encontrada em um
ensaio clínico sobre o consumo de amendoim e o risco de alergia, o Learning Early
About Peanut - LEAP Trial, o qual foi verificada uma redução de 11% a 25% de
crianças com chances de desenvolvimento de alergia ao amendoim, se ele fosse
oferecido entre os quatro meses de idade até os onze (DU TOIT et al, 2013).
Pode-se notar, pontos positivos em relação às práticas alimentares adotadas
pelas mães com relação à IA no presente estudo. Cabe evidenciar que a creche onde
os dados foram coletados possui nutricionista, que desenvolve atividades de
educação alimentar e nutricional direcionadas tanto para as crianças quanto para os
familiares. Contudo, é muito nítido que a falta de informações em muitas famílias gera
diversos erros ou insegurança, o que pode comprometer substancialmente a saúde
da criança em curto e longo prazos.
Logo, a implementação de ações tanto de proteção quanto de promoção
ao aleitamento materno é crucial e depende de esforços conjuntos que envolvem as
políticas de saúde e a comunidade acadêmica, no intuito de conscientizar e
democratizar a informação, com uma perspectiva de abordagem holística e
humanizada (RIQUELME et al., 2021).
5. CONCLUSÃO
Conclui-se que a exposição de alimentos como suco, bolachas recheadas,
biscoitos e salgadinhos foi precoce na maioria das crianças de uma creche privada de
Brasília-DF, o que pode afetar a saúde geral e o estado nutricional de forma aguda ou
crônica, tornando-se imprescindível a orientação às mães e/ou aos familiares sobre
os riscos do consumo de determinados alimentos.
Sendo assim, os profissionais de saúde, principalmente os nutricionistas,
possuem um papel essencial na conscientização das famílias, na oferta de uma
alimentação saudável às crianças no primeiro ano de vida, desencorajando-os da
prática do uso de alimentos processados e ultraprocessados por meio da educação
alimentar e nutricional.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
420
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, M. F. et al. Custo e economia da prática do aleitamento materno para a
família. Revista Brasileira Saúde Materno Infantil, v.4, n.2, p.135-141, 2004.
ARAÚJO, S. S. X.; COSTA, A. B. Obesidade em crianças de 5 a 10 anos como
consequência da introdução alimentar inadequada. 2018. 34 f. Monografia
(Graduação) - Faculdade de Ciências da Educação e Saúde, Centro Universitário de
Brasília, Brasília, 2018.
BALDISSERA, R..; ISSLER, R. M. S.; GIUGLIANI, E. R. J. Efetividade da Estratégia
Nacional para Alimentação Complementar Saudável na melhoria da alimentação
complementar de lactentes em um município do Sul do Brasil. Cadernos de Saúde
Pública, v.32, p.e00101315, 2016.
BERCINI, L. O.; MASUKAWA, M. L. T.; MARTINS, M. R.; LABEGALINI, M. P. C.;
ALVES, N. B. Alimentação da criança no primeiro ano de vida, em Maringá, PR.
Ciência, Cuidado e Saúde, v. 6, p. 404-410, 2008.
BRASIL, G. C. Conhecimento das mães sobre a alimentação de lactentes a partir dos
seis meses de idade. REME – Revista Mineira de Enfermagem. v.21. p. 97-98, 2017.
BRASIL, G. C.; LEON, P.; MARTINS, C. G. R.; RIBEIRO, L. M.; SCHARDOSIM, J.
M.; GUILHEM, D. B.Conhecimento das mães sobre a alimentação de lactentes a partir
dos seis meses de idade. Revista Mineira de Enfermagem, v.21, p.1-7, 2017.
BRASIL. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à saúde. Caderno de atenção
básica nº23: Saúde da criança aleitamento materno e alimentação
complementar. 2.ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2015.
BRASIL. Ministério da Saúde. Doze passos para uma alimentação saudável: guia
alimentar para crianças menores de dois anos. Ministério da Saúde, 2019.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de
Atenção Básica. Saúde da criança: nutrição infantil: aleitamento materno e
alimentação complementar. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde,
Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Editora do Ministério da Saúde, 2009.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de
Atenção Básica. Guia alimentar para a população brasileira / Ministério da Saúde,
Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – 2. ed., 1. reimpr.
– Brasília: Ministério da Saúde, 2014.
BRASIL. Ministério da Saúde; CEBRAP –Centro Brasileiro de Análise e Planejamento.
Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher: PNDS 2006.
Dimensões do comportamento reprodutivo e da saúde da criança. Brasília, 2009.
BRASIL. Pesquisa Nacional de Saúde 2013: percepção do estado de saúde, estilos
de vida e doenças crônicas: Brasil, Grandes Regiões e Unidade da Federação. IBGE,
2015.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
421
BRASIL. Saúde da criança: Nutrição infantil, aleitamento materno e
alimentação complementar, 2019.
BUDREE, S. et al. Infant feeding practices in a South African birth cohort—A
longitudinal study. Maternal & Child Nutrition, v. 13, n. 3, p. e12371, 2017.
CARNEIRO, G. C. S.; MORAIS, L. M. C, COSTA, L. F. A.; MOURA, T. H. M.;
JAVORSKI, M., LEAL, L. P. Crescimento de lactentes atendidos na consulta de
enfermagem em puericultura. Revista Gaúcha Enfermagem, v.36, p.35-42, 2015.
CARVALHO, A. P.; OLIVEIRA, V. B.; SANTOS, L. C.. Hábitos alimentares e práticas
de educação nutricional: atenção a crianças de escola de Belo Horizonte-MG. Jornal
de Pediatria.v.32,n.1. p.20-27, 2015.
DALLAZEN, C. ET AL. Introdução de alimentos não recomendados no primeiro ano de
vida e fatores associados em crianças de baixo nível socioeconômico. Caderno
Saúde Pública, v.34, n.2, p.e00202816, 2018.
DIAS, M. C. A.; FREIRE, L. M. S.; FRANCESCHINI, S. C. C. Recomendações para
alimentação complementar de crianças menores de dois anos. Revista Nutrição. v.
23, n. 3, p. 475– 486, 2010.
DIAS; A. R. Alimentação complementar de crianças menores de dois anos
residentes na Vila Planalto, Brasília – DF. 2013. 38 f. Monografia (Bacharelado em
Nutrição) — Universidade de Brasília, Brasília, 2013.
DU TOIT, G.; ROBERTS, G.; SAYRE, P.H. et al. Identifying infants at high risk of
peanut allergy: the Learning Early About Peanut Allergy (LEAP) screening study.
Journal of Allergy and Clinical Immunology, n.131, p.131-135, 2013.
FRAGOSO, A.P.R., FORTES, R.C. Fatores associate’s à prática do aleitamento
materno entre nutrizes de um hospital público do Distrito Federal. J. Health Sci. Inst;
v.29, n.2, p.114-118, 2011.
GARCIA, M. T.; GRANADO, F. S.; CARDOSO, M. A. Alimentação complementar e
estado nutricional de crianças menores de dois anos atendidas no Programa Saúde
da Família em Acrelândia, Acre, Amazônia Ocidental Brasileira. Caderno de Saúde
Pública, v. 27, n. 2, p. 305- 316, 2011.
HEYMAN, M. B.; ABRAMS, S. A.; SECTION ON GASTROENTEROLOGY;
HEPATOLOGY, AND NUTRITION; COMMITTEE ON NUTRITION. Fruit Juice in
Infants, Children, and Adolescents: Current Recommendations. Pediatrics, v.139, n.6,
p. e20170967, 2017.
JUSTINO, M.J.F.A. et al. Desmame precoce em puérperas na percepção dos
profissionais de enfermagem. Brazilian Journal of Development, v.7, n.3, p. 3333033337. 2021.
LOPES, W.C.; PINHO, L.D.; CALDEIRA, A.P.; LESSA, A.D.C. Consumo de alimentos
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
422
processados por crianças menores de 24 meses de idade e fatores associados.
Revista Paulista de Pediatria, v.38, p.e2018277, 2020.
MACHADO, L.R. Avaliação de preparações lácteas oferecidas a lactentes em um
município do Recôncavo da Bahia. 2016. 34f. Dissertação (Bacharel em Nutrição) Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Bahia; 2016.
MONTEIRO, G. S. G. et al. Avaliação das informações nutricionais referentes às
crianças de até dois anos disponíveis em sites populares. Revista Paulista Pediatria,
v. 34, v. 3, p. 287-292, 2016.
MOREIRA, J.C.et al. Introdução da alimentação complementar no primeiro ano de
vida: investigação sobre o conhecimento materno. Brazilian Journal of Health
Review. v.4, n.3, p. 13886-13902,2021.
OLIVEIRA, M. I. C.; RIGOTTI, R. R.; BOCCOLINI, C. S. Fatores associados à falta de
diversidade alimentar no segundo semestre de vida. Caderno Saúde Coletiva, v. 25,
n. 1, p. 65-72, 2017.
RIQUELME, C.S.G. et al. Utilização de mídia social como meio de educação sobre o
aleitamento materno para a promoção de bem-estar de gestantes e puérperas.
Brazilian Journal of Development, v.7, n.6, p. 62349-62357, 2021.
SCHINCAGLIA, R.M.; OLIVEIRA, A.C., SOUSA, L.M.; MARTINS, K.A. Feeding
practices and factors associated with early introduction of complementary feeding of
children aged under six months in the northwest region of Goiânia, Brazil.
Epidemiologia e Serviços de Saúde, v. 24, n. 3, p. 465-474, 2015.
SILVA, L. M. P.; VENÂNCIO, S. I.; MARCHIONI, D. M. L. Práticas de alimentação
complementar no primeiro ano de vida e fatores associados. Revista de Nutrição,
v.23, n.6, p. 983-992, 2010.
SILVA, M.D. et al. O papel do enfermeiro frente ao impacto do aleitamento materno
na saúde infantil: relato de experiência. Brazilian Journal of Development, v.7, n.6,
p. 54796-54804. 2021.
SILVA, R.T. et al. Alergias alimentares na infância: sistema imunológico e fatores
envolvidos. Brazilian Journal of Development, v.6, n.9, p. 66324-66342,2020.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA – Departamento de Nutrologia. Manual
de Alimentação: orientações para alimentação do lactente ao adolescente, na
escola, na gestante, na prevenção de doenças e segurança alimentar Sociedade
Brasileira de Pediatria. Departamento Científico de Nutrologia. 4ªed, 2018.
TAKUSHI et al. Perspectiva de alimentação infantil obtida com gestantes atendidas
em centros de saúde na cidade de São Paulo. Revista Brasileira Saúde Materno
Infantil, v.6, n.1, p.115-125, 2006.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
423
TOMÁSIA, G. A. Perfil da amamentação e alimentação complementar no
município de Registro-SP. Dissertação de mestrado. SãoPaulo: Faculdade de
Saúde Pública-USP; 2013.
VITOLO, M.R. et al. Impacto da atualização de profissionais de saúde sobre as
práticas de amamentação e alimentação complementar. Caderno Saúde Pública,
v.30, n.8, p.1695-1707, 2014.
WILLRICH, N.M. Introdução da alimentação complementar em lactentes de uma
cidade da Serra Gaúcha. Repositório da Universidade de Caxias do Sul.2017.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. Complementary feeding: Family foods for
breastfed children. Geneva: World Health Organization. WHO/NHD/00.1: WHO/FCH
/CAH/00.6, 2000.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.8, p.85105-85120 aug. 2021 ISSN: 2525-8761
424
CAPÍTULO 23
NOOPOLÍTICA DO CONSUMO: ALGUMAS PISTAS EM DELEUZE, GUATTARI E
LAZZARATO
Frederico Augusto Tavares Junior
Pós-doutorado UFRJ
Professor Associado ECO- PPG/Eicos- UFRJ
Av. Pasteur, 250 - Praia Vermelha - RJ
E-mail: frederico.tavares@eco.ufrj.br
Patrícia Magalhães Bevilaqua
Doutoranda em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social EICOS Instituto de Psicologia - UFRJ
Rua Saint Roman, 271/203 - Copacabana - Rio de Janeiro
E-mail: titabevilaqua@gmail.com
Carine Morrot de Oliveira Villasanti
Mestre em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social EICOS - Instituto de
Psicologia - UFRJ
Rua Décio Vilares, 323/304 – Copacabana – Rio de Janeiro
Flávia Costa Rocha de Assis Fonseca
Doutoranda em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social EICOS Instituto de Psicologia - UFRJ
Av. Venceslau Brás, 30/201 – Botafogo – Rio de Janeiro
E-mail: flavocha@gmail.com
Andrea Maria Bruxellas Lucas Rodriguez
Mestranda em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social EICOS - Instituto
de Psicologia - UFRJ
Av. Epitácio Pessoa, 2330/301 – Rio de Janeiro
E-mail: andreabruxellas@gmail.com
RESUMO: Articulando ideias de Gilles Deleuze1, Félix Guattari2 e Maurizio Lazzarato3,
este ensaio teórico procura contribuir com os debates acerca dos mecanismos de
controle inerentes ao capitalismo contemporâneo, que ultrapassam o mero
confinamento e a disciplina dos corpos e avançam para a gestão da vida por meio da
biopolítica, até, finalmente, direcionar a produção de subjetividades pela noopolítica,
que opera sobre a regulação da memória, a ingerência sobre o pensamento e a
(im)potência criativa. Essas transformações dos mecanismos de controle, associadas
ao deslocamento do consumo para o centro da dinâmica capitalista, como modo de
produção e criação de subjetividades, demandam analisar mais profundamente a
noopolítica, associada ao consumo. Assim, ao relacionar tanto formulações
macropolíticas, como o Capitalismo Mundial Integrado de Guattari e o Capitalismo
Rizomático de Deleuze, com a dimensão dos desejos e das subjetividades, a
construção teórica propõe a compreensão de uma noção de noopolítica do consumo
pelo diálogo entre a Filosofia e a Psicossociologia, relacionando as concepções e
narrativas destes campos de estudo, estimando o papel do consumo na constituição
do capitalismo atual, a partir da formação da imagem do pensamento contemporâneo,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
425
individual e coletiva, direcionada ao fantasma da falta, à insatisfação contínua e, ao
consumo incessante e à produção de subjetividades.
PALAVRAS-CHAVE: Psicossociologia; Noopolítica do consumo; Pensamento;
Controle; Capitalismo Mundial Integrado.
ABSTRACT: Articulating ideas from Gilles Deleuze, Félix Guattari and Maurizio
Lazzarato, this theoretical essay seeks to contribute to debates about the control
mechanisms inherent to contemporary capitalism, which go beyond mere confinement
and the discipline of bodies and advance towards the management of life through
biopolitics, even finally, directing the production of subjectivities through noopolitics,
which operates on the regulation of memory, interference with thought and creative
(im)potency. These transformations in control mechanisms, associated with the
displacement of consumption to the center of capitalist dynamics, as a mode of
production and creation of subjectivities, demand a deeper analysis of the noopolitics
associated with consumption. Thus, by relating both macro-political formulations, such
as Guattari's Integrated World Capitalism and Deleuze's Rhyzomatic Capitalism, with
the dimension of desires and subjectivities, the theoretical construction proposes the
understanding of a notion of consumption noopolitics through the dialogue between
Philosophy and Psychosociology, relating the conceptions and narratives of these
fields of study, estimating the role of consumption in the constitution of current
capitalism, from the formation of the image of contemporary, individual and collective
thought, directed at the ghost of lack, continuous dissatisfaction and, incessant
consumption and the production of subjectivities.
KEYWORDS: Psychosociology; Noopolitics of Consumption; Thought; Control;
Integrated World Capitalism.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
426
1. INTRODUÇÃO: A NOOPOLÍTICA COMO ESTRATÉGIA DE CONTROLE
As transformações da sociedade capitalista contemporânea, principalmente
com o estabelecimento da globalização industrial, cultural e demais domínios sociais
e produtivos, desviam os modos de produção do centro do processo de geração de
capital e posicionam o consumo como cerne desse sistema, aprofundando, assim, a
cultura do consumo e a metamorfose do ser, do corpo ou do cidadão em mero
consumidor, em ser-consumidor. A produção de subjetividade torna-se, então, uma
dinâmica essencial ao lucro capitalista e, as formas de controle sobre o pensamento,
as mãos firmes que conduzem títeres às encenações consumistas de desejos
contínuos e insaciáveis. O objetivo deste ensaio, portanto, é contribuir com a
compreensão dos mecanismos de controle da sociedade capitalista contemporânea
sobre as subjetividades, aprofundando a compreensão sobre a noopolítica
(LAZZARATO, 2006), que diz respeito às interferências sobre a própria concepção da
imagem do pensamento, e desenvolvendo, especialmente, a noção de noopolítica do
consumo, ou seja, a imagem do pensamento voltada ao consumo e influenciada,
principalmente, pelos dispositivos da publicidade e do marketing, que potencializam
“esse movimento da criação de imaginários” (TAVARES, 2020).
Para tanto, as mutações vividas pelo capitalismo e suas estratégias de
operação serão caracterizadas e elaboradas teoricamente, desde a transição do
modelo disciplinar, da vigilância e do poder exercido concretamente sobre os corpos
(FOUCAULT, 1979) até uma abordagem na qual os mecanismos não são mais
configurados pela gestão dos corpos, mas envolvem aspectos mais refinados de
controle sobre a população, característicos da biopolítica (DELEUZE, 1992). Essa
sofisticação dos mecanismos de controle e de poder leva à concepção de noopolítica,
por Maurizio Lazzarato (2006), para o qual o controle passa, portanto, a operar sobre
as mentes, desde a própria criação da imagem do pensamento, tornando-o submisso
às mutações engendradas pelo capitalismo sobre as subjetividades, que, segundo
Guattari (1987), ultrapassa o registro das ideologias, sujeitando o próprio coração dos
indivíduos, sua maneira de perceber o mundo, às abstrações do consumo. Assim
sendo, qualquer ideia de transformação e emancipação macropolítica ou macrossocial
está necessariamente associada à questão da resistência e da oposição às
reproduções do controle subjetivo e social. Esse problema colocado por Lazzaratto e
Guattari envolve profundamente o campo da psicossociologia, uma vez que “os limites
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
427
entre o psíquico e o social se confundem, se fundem e nos confundem” (NASCIUTTI,
1996), ao evidenciar as influências recíprocas e bilaterais entre indivíduo e sociedade,
que resultam em criações, encantamentos e resistências, mas também em dilemas e
adversidades psicossocioambientais, como aquelas provocadas pelo consumo
excessivo,
indispensável
à
lógica
e
manutenção
da
produção
capitalista
contemporânea.
Este ensaio procura, então, integrar a formulação da noopolítica de Lazzaratto,
como ferramenta de controle biopolítico, fundamentado por Foucault, e suas
implicações sobre a constituição das subjetividades, pensamentos e memórias, em
diálogo com a ideia de pensamento e de singularidades de Deleuze e Guattari. E, com
as análises sobre o consumo na contemporaneidade, enquanto alicerce da produção
de um Capitalismo Mundial Integrado, refletir sobre a imagem do pensamento,
orientada pelo fantasma da falta e para a necessidade permanente e desmesurada de
consumo e seus desdobramentos nas subjetividades. Por conseguinte, trazer a noção
da noopolítica voltada para o consumo: a noopolítica do consumo.
2. AS METAMORFOSES DO CAPITALISMO: DA DISCIPLINA DO BIOPODER À
SEGURANÇA DA BIOPOLÍTICA; DA SEGURANÇA DA BIOPOLÍTICA AO
CONTROLE DA NOOPOLÍTICA
Para se compreender melhor a ideia de noopolítica do consumo é preciso
perceber a forma de desenvolvimento e mutação do capitalismo desde os seus
primórdios com o exercício da vigilância e da disciplina como forma de controle social.
A Sociedade Disciplinar toma o lugar da forma de soberania, com o enfraquecimento
do poder monárquico na Europa, e é construída por meio do poder e da influência
advindos da sociedade burguesa para a implementação e o fortalecimento das ideias
liberais e do capitalismo industrial. Essa configuração, originária do início da
Revolução Industrial, foi delineada como uma estrutura de panóptico, um grande
sistema de observação das ações individuais, que instaura o controle através da
vigilância, como forma de adquirir o domínio sobre as disposições individuais do
comportamento humano pela ameaça de punição. Michel Foucault (1979) resgata a
imagem da natureza opressora do panóptico a fim de explicitar esses mecanismos de
imposição de poder, inerentes à prática da disciplina, para o controle social. A
observação e restrição contínuas dos indivíduos confinados a espaços, como, por
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
428
exemplo, instituições escolares, prisionais e hospitalares, é empregada pelos regimes
liberais burgueses para a manutenção do poder. O panóptico, e seu subjacente
sistema de fiscalização coercitivo, opera através da submissão e adequação do
indivíduo às regras, até a subordinação de corpos dóceis (FOUCAULT, 1979) à
conformação da vida humana em força produtiva. Foucault (1979) formula o conceito
de biopoder para explicitar o artifício que passa a gerir a vida e determinar o controle,
a vigilância, a regulação, a uniformização de condutas e a domesticação dos corpos,
com a intenção de nivelar os indivíduos e suprimir a diferença e a percepção dos
fluidos criativos das singularidades.
Com as transformações das estratégias de operação do capitalismo mundial,
Foucault observa a transição do modelo disciplinar para uma outra abordagem, mais
insidiosa, na qual os mecanismos não são mais configurados pelo corpo e pelo
confinamento, mas envolvem aspectos mais amplos e sutis de controle da população.
Se a essência da dominação do biopoder se encontra na disciplina do corpo, a
perspectiva da sociedade de controle, pela biopolítica, evidencia a regulação da vida
por meio de padrões maniqueístas, que definem o que é considerado normal e
afirmativo ou anormal e negativo.
Na biopolítica, a estratégia adotada permeia normas ligadas aos processos e
estratégias de regulação da vida com a adoção de dispositivos de saúde pública,
seguridade social ou mesmo de controle das taxas de criminalidade (HUR, 2013).
Taxas de natalidade e fluxos migratórios também funcionam como dispositivos de
controle, uma vez que podem ser regulados e monitorados, fortalecendo a vigilância
e submetendo as potências vitais a sua gestão. É o próprio poder sobre a vida
(FOUCAULT, 1979). Para Pelbart,
a vida torna-se um objeto de poder, não só na medida em que o poder tenta
se encarregar da vida na sua totalidade, penetrando-a de cabo a rabo e em
todas as suas esferas, desde a sua dimensão cognitiva, psíquica, física,
biológica e até genética, mas, sobretudo, quando esse procedimento é
reformado por cada um dos seus membros. O que está em jogo nesse regime
de poder, de qualquer modo, é a produção e reprodução da vida nela mesma
(PELBART, 2003, p.82).
Neste sentido, um novo saber normalizador se alinha ao capitalismo, que faz
com que a vida se torne alvo da política, configurada em um “corpo-máquinaprodutivo”, em que tais corpos são examinados e investigados: é a associação dos
aparelhos de confinamento com a vigilância e o governo das condutas (AGAMBEN
apud HUR, 2013). Deleuze nota a transformação da Sociedade Disciplinar para a
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
429
Sociedade de Controle, a partir da observação da criação de modulações ou
moldagens autodeformantes, as quais variam continuamente e capturam o indivíduo e
as massas com apelos aos desejos, que configuram as subjetividades a partir de
(des)necessidades de consumo que acabam por tornar-se ilusoriamente vitais e
constituintes do sujeito:
A fábrica cedeu lugar para a empresa. A família, a escola, o exército, a fábrica
não são mais espaços analógicos distintos que convergem para um
proprietário, Estado ou potência privada, mas agora são figuras cifradas,
deformáveis e transformáveis, de uma empresa que só tem gerentes. Até a
arte abandonou os espaços fechados para entrar nos circuitos abertos do
banco. As conquistas de mercado se fazem por tomada de controle e não
mais por formação de disciplina, por fixação de cotações mais do que por
redução de custos, por transformação de produto mais do que por
especialização da produção (DELEUZE, 1992, p. 223-224).
Se na Sociedade Disciplinar o capitalismo estava dirigido à produção, na
Sociedade de Controle biopolítico o foco se volta para o consumo, que se torna o fator
principal de controle social entre os próprios indivíduos, não mais necessariamente
confinados. O poder deixa de ser exercido tão somente na forma de um panóptico,
como na Sociedade Disciplinar, e passa a controlar o corpo isubjetivamente. Todos
controlam- se mutuamente e ainda exercem uma autovigilância.
A base da Sociedade de Controle (DELEUZE, 1992), por conseguinte, também
é associada ao modelo capitalista e à gestão dos corpos empreendida pela biopolítica,
mas ultrapassa as conformações e normas da vida ou a mera produção comercial de
produtos e serviços, introduzindo novos domínios, que investem sobre o controle das
subjetividades, por meio do incentivo ao consumo, como forma de criação de estilo,
autorrepresentação e objetivo de vida. Não obstante, mesmo operando em uma
sociedade de controle das subjetividades, o capitalismo ainda mantém “como
constante a extrema miséria de três quartos da humanidade, pobres demais para a
dívida e numerosas demais para o confinamento” (DELEUZE, 1992, p. 224). Sendo
assim, essa mesma Sociedade de Controle conserva paralelamente características
dos regimes de soberania e de disciplina, principalmente em países subalternos,
também determinando, intensamente e cotidianamente, quem exerce o direito de
matar, quem se pode deixar morrer ou mesmo quem se deixa viver, por meio da
“instrumentalização generalizada da existência humana e da destruição material de
corpos humanos e populações” (MBEMBE, 2016, p.125).
A mais recente transformação da engrenagem capitalista se relaciona com o
conceito de noologia apresentado por Deleuze e Guattari:
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
430
a noologia [...] é precisamente o estudo das imagens do pensamento e de
sua historicidade. De certa maneira, poderia dizer-se que isto não tem
muita importância, e que a gravidade do pensamento sempre foi risível.
Porém, ela só pede isso: que não seja levada a sério, visto que, dessa
maneira, seu atrelamento pode tanto melhor pensar por nós, e continuar
engendrando novos funcionários; e quanto menos as pessoas levarem a sério
o pensamento, tanto mais pensarão conforme o que quer um Estado”
(DELEUZE, GUATTARI, 1980, p. 46).
Lazzarato (2006), com base nesses autores, apresenta uma articulação da
Sociedade de Controle e da Noologia por meio da criação de novas relações de poder,
associadas a políticas de controle da memória e da atenção, denominada noopolítica.
Para o autor, a noopolítica utiliza um conjunto de técnicas que atuam na modulação
do pensamento para controlar a memória e sua potência virtual. Dessa forma,
modulando o pensamento, todos os aspectos da vida ocorrem por meio de uma
regulação, relacionada ou subjugada ao mundo e à imagem do pensamento
capitalista (HUR, 2013), impregnando subjetividades e pensamentos.
Com essa visão, pode-se pressupor que a noopolítica é a base para as práticas
de consumo que hoje são realizadas, porque representa “a máxima da reprodução do
capital” (HUR, 2013, p. 213), incentivando uma imagem do pensamento e lógica
individualista, competitiva, acumulativa, sem empatia ou alteridade, sem a
reciprocidade comunitária, se afastando “assim dos tradicionais códigos sociais
instituídos” (HUR, 2013, p. 213) e produzindo, como consequência, transtornos e
desequilíbrios tanto sociais, como a despolitização e a desigualdade, quanto pessoais,
em níveis psíquicos. Os corpos, na sociedade de controle, são atravessados por
múltiplas forças perturbadoras próprias à noopolítica do consumo, que acenam com
referências ou padrões de excelência, relacionadas às órbitas de mercado, as quais
se confundem com a própria totalidade da vida, provocando, segundo a filósofa e
psicanalista Suely Rolnik,
vazios de sentido insuportáveis... porque são vividos como esvaziamento da
própria subjetividade e não de uma de suas figuras... e não como efeito de
uma proliferação de forças que excedem os atuais contornos da subjetividade
e a impelem a tornar-se outra (ROLNIK, 1997, p. 20).
O capitalismo contemporâneo e a noopolítica do consumo, como um dispositivo
de controle, objetiva capturar a potência de criação ou imaginação de uma “infinidade
de mundos possíveis” que o precedem e o ultrapassam (DELEUZE, 1992, p. 188).
Neste sentido, os sistemas de poder, empresas, governos, capital financeiro, criam
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
431
mundos para o consumidor e para o trabalhador por meio de subjetividades, baseadas
na produção e em interesses econômicos, que normatizam as formas de sentir e de
viver (HUR, 2013; TAVARES, 2014). Dessa forma, os pensamentos dos indivíduos
passam a funcionar pela lógica neoliberal, “afastando suas preocupações da política,
gerando coletivos despolitizados e vorazes por dinheiro” (HUR, 2013, p. 211). E um
dos efeitos mais contundentes é justamente a modulação dos modos de vida, segundo
o paradigma da empresa, que não apenas elabora o objeto, a mercadoria ou o
consumidor, mas o próprio mundo onde existem (HUR, 2013; TAVARES, 2014).
Destarte, “para a teoria neoliberal, são precisamente (...) as transferências de
rendimentos de uma parte da população (...) para corrigir as desigualdades e os
excessos da concorrência que transforma os indivíduos (...) em consumidores
passivos” (LAZZARATO, 2011, p. 31). Portanto, o controle está mais introjetado na
subjetividade, sendo contínuo, simultâneo e descentralizado (TAVARES; IRVING,
2009). Com essa perspectiva, como a psicossociologia pode contribuir com a
discussão?
3. UM OLHAR PSICOSSOCIOLÓGICO DO CAPITALISMO RIZOMÁTICO E SEUS
NOVOS DOMÍNIOS DE MERCADO
De acordo com Guattari, qualquer ideia de transformação macropolítica ou
macrossocial está necessariamente associada à questão da produção de
subjetividade. Nesse sentido, um olhar psicossocial tem muito a contribuir para a
discussão, uma vez que a Psicossociologia abrange um campo rico que concede a
possibilidade de compreender como indivíduos e sociedade se influenciam
mutuamente, no que tange aos dilemas psicossocioambientais contemporâneos e às
dinâmicas culturais na constituição de subjetividades.
A Psicossociologia, portanto, se baseia nas relações que o indivíduo tem com
o social, o modo como são estruturadas e as consequências dessa interação no
indivíduo (NASCIUTTI, 1996). Sendo assim, a psicossociologia do consumo surge
com o intuito de observar a inserção do indivíduo na sociedade, suas interrelações,
imaginários sociais e a reflexão dos processos de subjetivação na produção do
consumo a partir de fenômenos, relações e interações entre o individual e o
macrossocial. Em vista disso, seu objeto de estudo é complexo e foca a interação
entre imaginários e simbolismos do coletivo com os sujeitos. Para Tavares,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
432
o domínio próprio da psicossociologia aparece na interação dos processos
sociais e psíquicos ao nível das condutas concretas, assim como na interação
das pessoas e dos grupos no quadro da vida cotidiana (TAVARES, 2004,
p.125).
Este enfoque permite problematizar ainda mais um campo já complexo, que
envolve os processos de subjetivação na temática do consumo, permitindo o diálogo
entre diferentes ciências das áreas sociais, aprofundando o estudo sobre o
consumidor e sua subjetividade mutável no âmbito do capitalismo, que na sociedade
contemporânea, se constitui de forma rizomática. A vida, nas suas mais variadas
esferas,
vem
Compreender
sendo modificada
pela
ótica
significativamente
psicossocial
tais
pelo
mudanças
modelo
capitalista.
vivenciadas
na
contemporaneidade é fundamental, visto que, de indivíduos a grupos sociais,
inúmeras rupturas e transformações vêm ocorrendo ao longo de um curto espaço de
tempo na história (FEDERICI, 2017).
No contexto de um mundo globalizado, desigual e em mutação permanente, no
qual as empresas e os meios de comunicação utilizam dispositivos de controle social
e agenciamentos de enunciação capazes de criar demanda, mercado e desejos,
produzindo incessantemente novas ordens de consumo (TAVARES; SILVA et al.,
2017), promover o resgate e a capacidade para a formulação de ideias e pesquisas,
voltadas para a redução de desigualdades e para a ampliação de potencialidades,
apresenta desafios, mas também oportunidades de refletir sobre alternativas ou
brechas sobre estratégias criadas por esse modelo de sociedade, que captura
interesses individuais e coletivos por meio de uma cultura mercadológica, que utiliza
estratégias direcionadas ao consumo (TAVARES, 2014). O autor afirma que a
noopolítica também pode ser uma oportunidade para os indivíduos agenciarem
protagonismos em redes sociais e demais conexões para produzir mudanças, ideiasvírus, capazes de transformar e alcançar novas redes, criando estratégias e narrativas
de transformação (TAVARES, 2020).
Contudo, estas ideias-vírus devem ser capazes de ultrapassar a própria lógica
da cultura dominante, a qual estão inseridas. Segundo Guattari e Rolnik (1999, p. 23),
por exemplo, a distinção entre cultura popular e cultura erudita é um falso problema,
pois o que há é apenas “uma cultura capitalística” que permeia todos os campos. Ideias,
portanto, que refutem o capitalismo em rede, que produz subjetividades e modos de
ser voltados às novas formas de expansão dos mercados (TAVARES; IRVING, 2009).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
433
O fortalecimento do neoliberalismo e do capital financeiro, o consequente
enfraquecimento político dos Estados-nação, as privatizações, a desregulamentação
do mercado de trabalho e da seguridade social – que facilita a flexibilização e a
precarização da própria vida – funcionam como elementos centrais para os grandes
negócios transnacionais, mas também para afetar indivíduos de forma determinante,
tornando-os cada vez mais vulneráveis (CARRARA, 1996; BAUMAN, 1999) e sob o
controle da narrativa e das (des)necessidades promovidas pelo mercado e pelo
capital.
As subjetividades são produzidas por todos os lados em agenciamentos
insuspeitos, materializando-se no cotidiano, nas relações sociais, familiares, afetivas,
institucionais, entre outras. O modelo capitalista de produção ampara-se
especialmente na competição e no controle como organizadores: 1) dos modos de
pensar, de perceber, de sentir, de relacionar-se e 2) dos equipamentos coletivos que
se entrelaçam neste processo produtivo, ao longo da sua trajetória. Os modos, os
meios e as velocidades desses fluxos não se inscrevem apenas na economia de
mercado: são imanentes ao processo de constituição do mundo, em todas as suas
dimensões – da planetária à da subjetividade. A subjetividade permanece
massivamente controlada pelos dispositivos de poder e de saber, que colocam as
inovações técnicas, científicas e artísticas a serviço das figuras mais retrógradas da
socialidade (SILVA, 1998).
Em pleno século XXI, as questões e desafios que afetam as subjetividades, que
acabam enrijecidas ou moldadas à luz do sistema capitalista em diversas esferas da
vida
(TAVARES, 2014) repercutem nos corpos tanto com a mortificação
“sobrevivencialista”, em condições extremas de violência, como em guerras, em
campos de concentração ou em territórios pobres, quanto na banalidade cotidiana
das pressões de consumo de shopping centers ou propagandas as mais diversas
(PELBART, 2007). Diante disso, o filósofo Peter Pál Pelbart afirma que seria preciso
reclamar ao corpo aquilo que lhe é mais próprio, no encontro com a exterioridade, sua
condição de corpo afetado pelas forças do mundo e capaz de ser afetado por elas. Seria
preciso retomar o corpo na sua afectibilidade, no seu poder de ser afetado e de afetar”
(PELBART, 2007, p.62).
O consumo, em função da sua expansão e desterritorialização, começa a se
apresentar de forma mais ardilosa e fluida, criando, o que Guattari (1990) denomina
Capitalismo Mundial Integrado – CMI, o qual “coloniza o conjunto do planeta”, mesmo
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
434
países outrora comunistas “porque tende a fazer com que nenhuma atividade
humana, nenhum setor de produção fique fora do seu controle” (GUATTARI, 1985, p.
211). O CMI representa a transição do modelo capitalista da “toupeira”, que cria seus
túneis subterrâneos de forma relativamente simples, para a alegoria da “serpente”,
que possui alta mobilidade, é flexível, ondulante e atravessa todos os espaços. Por
mecanismos de controle, muitas vezes invisíveis, o mercado se estabelece, apesar da
exclusão de diversas camadas da população “desnecessárias” à ordem instituída.
Elas podem ser desviadas, empurradas ou eliminadas (GUATTARI, 1991; DELEUZE,
1992).
O CMI uniformiza a vida e regula comportamentos pelo mercado,
empobrecendo as diferentes dimensões do corpo e tornando o capital e o consumo
os únicos horizontes louváveis da existência. Enquanto as relações de poder pela
produção explicitam a exploração de uns sobre os outros, bem como a luta de classes,
as relações de mercado privilegiam o produto e a permanente (in)satisfação do
consumidor (PELBART, 2003).
O Capitalismo Mundial Integrado ocorre em modalidades que variam de acordo
com o país ou com a camada social, por meio de duas formas autoritárias e
opressoras. A primeira acontece pela repressão direta no plano econômico e social,
qual seja, pelo controle da produção de bens e das relações sociais, através de meios
de coerção material externos, e de sugestão de conteúdos de significação. A segunda
decorre – talvez de forma mais intensa – pela instauração da própria produção de
subjetividade: uma imensa máquina que fabrica uma subjetividade mecanizada e
industrial, em escala mundial, tornando-se o alicerce da formação da força de trabalho
e do controle social coletivo (GUATTARI; ROLNIK, 1999).
A Sociedade de Controle, a lógica da biopolítica e da noopolítica - e,
consequentemente, da noopolítica do consumo -, se inserem na dimensão cognitiva,
psíquica, física, biológica e até mesmo genética. É a representação da vida como
objeto de poder, perpassada por uma sociedade que se configura como algo não
unificado, seguro ou bem delimitado. Ela é constantemente deslocada por forças
produzidas por si mesma.
Esse atravessamento é a marca de toda uma diferença que produz uma
variedade de posições de sujeito. Ou seja, passa-se a viver em um mundo de eterno
recomeço, de indefinições, globalizado, imediato e de enfraquecimento das instituições
e de referências sociais. É um eterno período transitório e indefinido. A sociedade
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
435
contemporânea parece viver um mundo sem origem ou destino, passado ou futuro,
onde se enfatiza a importância de conquistas de caráter transitório, efêmero e fugaz,
e não da procura dos meios para os fins (HUR, 2013; PONTES; TAVARES, 2017).
Neste sentido, essa nova lógica neoliberal não pretende reduzir ou extinguir
desigualdades pelo simples motivo de que ela opera em cima dessas mesmas
diferenças para governar. “Ela procura somente estabelecer (...) um equilíbrio
suportável para a sociedade entre normalidades diferentes; entre normalidade da
pobreza, da precariedade, e a normalidade da riqueza” (LAZZARATO, 2011, p. 51).
Portanto, este modelo - que produz conexões rizomáticas e que envolve
diferentes atores sociais, como empresas, ONG’s, Governos e consumidores, cerceia
as “capacidades e resistências de indivíduos e grupos em produzirem (ativamente)
sua história, ou seja, buscar mudanças não só no contexto em que se inserem, mas
também neles mesmos” (CASSADORE, 2013, p. 171) e contribui para tornar
capitalizável aquilo que é imaterial e mais valioso: as relações íntimas e sociais e a
própria imagem do pensamento, tanto individual quanto coletiva, à mercê de um senso
comum constituído e regulamentado pelo mercado.
4. NOOPOLÍTICA DO CONSUMO: A PSICOSSOCIOLOGIA DA MEMÓRIA, DOS
DESEJOS E DO PENSAMENTO DO CORPO
O senso comum na maior parte das vezes tem a capacidade de limitar as
percepções e as potências criativas, como, por exemplo, ao se mirar uma parede
pintada com tinta branca e se afirmar que a cor da parede é branca. Todavia, no
momento em que se olha, a parede pode estar colorida de rosa pelo reflexo de um pôr
do sol ou de verde pela projeção da luz em uma planta ou ainda acinzentada por uma
sombra no ambiente. Mas, a despeito de toda e qualquer luminescência ou falta dela,
a resposta sob a ingerência do senso comum continua sendo a cor branca. Essa
afirmação obstinada evidencia a lógica e a memória de pensamentos cristalizados, que
determinam que, se a tinta é branca, logo a cor da parede também é sempre e
imutavelmente branca. Uma alegoria simples sobre uma imagem do pensamento
condicionada sobre um mundo em constante devir. Ou seja, um olhar que se abstém
de uma miríade de cores e tons cotidianos, a cada minuto, não somente sobre a visão
de uma parede, por certo, mas acerca de memórias, desejos, sociedade, o outro, a
vida.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
436
O senso comum em um espaço do mundo dominado pelo CMI evidencia modos
de pensar sem criatividade e abertura para as transformações. Uma imagem do
pensamento “dogmática ou ortodoxa, imagem moral” (DELEUZE, 2018, p.131), e ética
capitalística, que chega ao indivíduo, pela linguagem, pela família e pelos
equipamentos que nos rodeiam.
Explorando esse modo de pensar limitado a reproduções e a memórias
reguladas e moldadas, as quais anestesiam as percepções do corpo em sua
capacidade criativa, a noopolítica, segundo Lazzarato (2006), atua justamente e
principalmente na modulação e controle dessas memórias e, junto à biopolítica e à
disciplina, constitui os dispositivos de controle social do capitalismo contemporâneo,
que se processa e se firma, principalmente, a partir do consumo. A noopolítica, como
conjunto das técnicas de controle, se exerce sobre os cérebros, atuando sobre a
atenção, para controlar a memória e sua potência virtual. A modulação da memória é
então a função mais importante da noopolítica. A noopolítica do consumo, por
conseguinte, como dispositivo, se engendra nos espaços das moldagens deformantes
e autodeformantes dos desejos e da memória, fabricados e regulados pelas
subjetividades capitalistas.
Segundo os filósofos Félix Guattari e Suely Rolnik, a produção de subjetividade
torna-se até mesmo uma dinâmica mais importante para o fortalecimento do
capitalismo do que qualquer outro tipo de produção, “mais essencial até do que
petróleo e energias” (1986, p.26). O lucro capitalista é, nesse sentido,
fundamentalmente, produção de poder subjetivo e seu campo é o de todos os
processos de produção social e material, convertendo, assim, o indivíduo a mero
consumidor dessa produção e desse sistema de representação e de sensibilidade, o
qual articula sistemas semióticos que transpassam, ou
melhor, urdem as
subjetividades, de duas formas complementares: a sujeição econômica ao capital e a
sujeição subjetiva à cultura, que se manifestam em todos os níveis da produção e do
consumo (PELBART, 2003).
O poder de dominação do sistema capitalista pretere (ainda que não abandone)
a forma verticalizada e repressiva, inerente às sociedades disciplinares, e se expande,
na sociedade de controle, em múltiplas direções espaciais e dimensionais sobre a
vida, apelando aos desejos e delineando subjetividades a partir de (des)necessidades
de consumo, que acabam por tornar-se ilusoriamente vitais e constituintes do sujeito.
Os agenciamentos de enunciação, “que são operados por intermédio de diversos
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
437
atores sociais, tais como governo, empresas, fornecedores e mass-media” (ALMEIDA
et al., 2020, p.53445), através do marketing, o principal instrumento de controle social
de curto prazo e rápida motilidade, utilizado de modo contínuo e ilimitado (DELEUZE,
1992), intermediam o controle subjetivo para o consumo, principalmente após o
fenômeno da globalização, com a ampliação vertiginosa do intercâmbio de
informações, respondendo assim “às novas exigências da acumulação do Capital”
(ALLIEZ; LAZZARATO, 2021, p. 418).
Desse modo, a noopolítica do consumo adapta à lógica do mercado modos de
ser apelativos aos desejos, implicando, a produção de identidades fluidas e efêmeras
ou de “kits de perfis-padrão” (ROLNIK, 1997, p. 19), os quais se criam e se recriam de
acordo com os horizontes e exigências do mercado, e com igual velocidade,
independente do contexto geográfico ou cultural, transmutando o corpo, ou a própria
existência, a mero objeto de consumo e propaganda.
Os kits de perfil padrão ou kits de subjetividades são, portanto, formas de
modulação e controle capitalista, que coagem a pessoa no campo dos desejos,
sucessivamente insatisfeitos, a embrenhar-se em um processo incessante de
consumo, não somente de mercadorias, mas de subjetividades mutáveis, temporárias
e superficiais. Da mesma forma, a ingerência sistemática dos mecanismos do capital
sobre a vida mantém os corpos sob controle pela determinação da gestão biopolítica,
que estimula vigorosamente processos existenciais e relações sociais de baixa
densidade, superficiais e sugestionáveis. Circunscritos a uma dimensão residual das
suas plenitudes, na sociedade de consumo, os corpos não são mais exclusivamente
ou prioritariamente confinados a espaços disciplinares, todavia são aprisionados pelas
próprias subjetividades, pelos desejos de aquisição sob controle das moldagens
capitalistas e endividados pelos custos das encenações e dos figurinos de suas
próprias existências.
A noopolítica do consumo cria e reproduz uma imagem do pensamento e uma
memória sobre os desejos, relacionadas à carência, à falta fantasmal que produz uma
idealização e demanda o consumo desse anseio inatingível. Para Deleuze, este modo
de desejar não advém de uma necessidade concreta, mas, pelo contrário, “as
necessidades derivam do desejo e são contra produzidas no real que o desejo produz”
(DELEUZE, 2010, p.43). Um real impregnado de uma memória e de um pensamento
demasiado amordaçados pelos dispositivos de controle, que impedem ou cerceiam o
desejo de criação ou de produção de novas e outras realidades. Deleuze afirma que
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
438
“não é o desejo que exprime uma falta molar no sujeito; é a organização molar, ou seja,
a estrutura social, que destitui o desejo do seu ser objetivo” (DELEUZE, 2010, p.44).
E a objetividade do desejo é justamente aquilo que pode criar uma potência produtora,
proporcionalmente tão mais intensa quanto menos necessidade se tem de consumir,
capaz de exorcizar o fantasma da falta. Em conformidade com os postulados do
capital e de modos de vida voltados para o consumo e produção, a noopolítica do
consumo constitui subjetividades mais competitivas, menos solidárias, construídas
por conteúdos e memórias de peças publicitárias e da cultura de massa em geral, as
quais incitam
a concorrência, a desigualdade social e individual, a lógica de empresa e a
despolitização do potencial insurgente, pois isola e opõe os indivíduos numa
lógica competitiva, despotencializando a composição política coletiva. Esta
configuração política e social porta um problema político, de diminuição da
potência de ação do esvaziamento do potencial desejante e de crítica dos
sujeitos, tornando assim mais eficaz o governo das condutas. Portanto,
mediante a modulação das técnicas noopolíticas há a constituição de um
pensamento e uma subjetividade capitalista (HUR, 2013, p. 213- 214).
O que a sociedade capitalista e a noopolítica do consumo produzem, portanto,
é o sentido do desejo como algo material ou sensível que falta e faltará sempre para
a percepção de completude e satisfação do corpo e a representação massificada
desta falta implica também a supressão da potência de produção ou de criação.
Portanto, o corpo torna-se uma apropriação do capitalismo, uma máquina que não
cria, não olha ou pressente múltiplas possibilidades, mas caminha com a carência e
com o desejo, organizado “pelas classes dominantes sobre as incertezas e
inseguranças fabricadas” (DELEUZE, 2010, p.45), ainda que na abundância de
produção. “A produção do desejo é vinculada ao fantasma (nada além do fantasma)”
(DELEUZE, 2010, p.45), o fantasma da falta, ou ao menos da sua ameaça sempre
iminente.
Deleuze propõe pensar a partir do saber do corpo como tentativa de escapar a
essa sujeição aos fantasmas da falta e às necessidades “vitais” de consumo,
fabricados pela sociedade de controle e pelos mecanismos da noopolítica do
consumo. Inspirado pelo modelo de corpo de Espinosa, Deleuze propõe o conceito de
pensamento, que está estreitamente relacionado ao sentido de liberdade, que se
articula com a ideia da necessidade do ser de dominar a “causa ativa” de suas próprias
ações e, para esse fim, não deve confundi-la com as forças externas e com os efeitos
(reações) assimilados pela consciência, os quais constrangem a sua liberdade. O ser
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
439
deve captar a potência do corpo para além das condições dadas pelo conhecimento
racional e sensível, e a captar a força do espírito, para além das condições dadas pela
consciência. Deve-se procurar adquirir um conhecimento das potências do corpo para
descobrir paralelamente as potências do espírito que escapam à consciência
(DELEUZE, 2002).
Em suma, o que o modelo do corpo, na interpretação de Deleuze sobre
Espinosa, oferece de mais interessante e potente como resistência às subjetividades
dominadas pela noopolítica do consumo, ou pelo senso comum, ou ainda pela imagem
do pensamento e memória capitalista, é uma desvalorização da consciência em
relação ao pensamento. Isto é, uma descoberta do inconsciente, do inconsciente do
pensamento, que permite ver a vida para além das falsas aparências, evidenciando
um pensamento intuitivo, um corpo aberto aos fluxos e às singularidades, que
possibilita o desenho de uma ação que se situa na ordem das causas “de composição
e decomposição, as quais afetam infinitamente toda a natureza. Nós, como seres
conscientes, recolhemos apenas os efeitos dessas composições e decomposições”
(DELEUZE,2002, p.25). Portanto, a consciência é o lugar de uma ilusão, que aprisiona
o ser humano e o desqualifica a uma vida superior e criativa, capaz de produzir novos
modos de estar no mundo; e, o pensamento, o espaço em que as forças ativas da
liberdade criativa podem controlar as forças reativas da dominação cultural, do
controle absoluto do capitalismo e suas representações formuladas, principalmente,
na atualidade, pela noção de noopolítica do consumo.
5. CONSIDERAÇÕES (NÃO) FINAIS
Na perspectiva da psicossociologia sobre os conceitos apresentados por
Deleuze, Guattari e Lazzarato, compreende-se a noção de noopolítica do consumo
como um viés preponderante da noopolítica na contemporaneidade, enquanto
dispositivo de controle, elaborado pelo sistema capitalista, que afeta o corpo tanto
subjetivamente quanto socialmente. Visto que o consumo e a produção de
subjetividades voltadas para o consumo são essenciais para a dinâmica desse
sistema, a modulação do pensamento e da memória normatiza as formas de sentir e
de viver e, consequentemente, captura a potência de criação ou de imaginação de
outros mundos, livres do sentido pungente da falta e da necessidade permanente, da
competitividade e do gerenciamento empresarial da vida e de criação de uma nova
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
440
história individual e coletiva.
Com a transição do modelo disciplinar e do biopoder para uma abordagem de
controle e neoliberal, que se utiliza de estratégias, para além do confinamento,
configurando a biopolítica, o capitalismo passa a operar, de forma mais sofisticada
ainda, sobre as mentes, memórias e sobre a criação da própria imagem do
pensamento com a noopolítica, principalmente em relação ao consumo. Ou seja, a
noopolítica do consumo visa atravessar e influenciar o momento primordial da criação
de uma ideia, percepção ou mesmo de um sonho, que já se elabora como imagem
plena de reproduções e engessamentos de um sistema hegemônico e dominador, que
tem na publicidade e no marketing seu componente fundamental, tal qual instrumentos
de forja das formas adequadas à cultura do consumo e, portanto, à própria máquina
capitalista. Os enunciados produzidos e difundidos pela publicidade, embrenhados
em todas as esferas de produção da cultura de massas, asseguram a pavimentação
de caminhos sem escape para as subjetividades, tanto em processos de criação
molares de sistemas econômicos, sociais, culturais, tecnológicos etc, quanto em
movimentos pessoais de percepção, de criação, de sensibilidade e de afeto.
Dessa forma, pela perspectiva da sociedade do controle, as subjetividades são
constantemente (re)elaboradas pelas estratégias criadas pelos sistema de poder
dominante, para a captura da potência criativa e para a modelagem de indivíduosconsumidores, movidos pela insaciabilidade e pela falta fantasmal. Este ensaio
contribui, assim, com uma reflexão sobre a força engendrada pelo capitalismo a partir
da noopolítica, concentrada na instituição de uma imagem do pensamento
globalizada, relacionada ao consumo.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
441
REFERÊNCIAS
AGAMBEN, Giorgio; HARVEY, David et al (2020). Sopa de Wuhan – Pensamiento
Contemporáneo em Tiempos de Pandemias. Buenos Aires: ASPO Pablo Amadeo,
188.p ALLIEZ, Éric; LAZZARATO, Maurizio. Guerras e Capital. São Paulo. Ubu
Editora, 2021.
ALMEIDA, Eliane M; TAVARES, Frederico et al (2020). Pensando o Marketing
Ambiental por meio de Cartografias Psicossociais: ecosofia, rizoma e agenciamentos
de enunciação. Curitiba: Brazilian Journal of Development, v. 6 – n. 7, p. 53446 –
53458.
CARRARA, Sérgio (1996). Tributo a Vênus: a luta contra a Sífilis no Brasil, da
passagem do século aos anos 40. Rio de Janeiro: Fiocruz.
CASADORE, Marcos M. (2013) Psicossociologia e intervenção psicossociológica:
alguns aspectos da pesquisa e da prática. In: EMIDIO, Thassia Souza e
HASHIMOTO, Francisco. (Org.). Psicologia e seus campos de atuação: demandas
contemporâneas. 1ed. São Paulo: Cultura Acadêmica (Unesp), v. 1, p. 163-182.
DELEUZE, Gilles. (1992) O que é a filosofia? Rio de Janeiro: Editora 34.
. Post-scriptum sobre as sociedades de controle. In:
Conversações. Editora 34, 1992.
.
. (2002) Espinoza: Filosofia Prática. São Paulo: Escuta, 144p.
. (2018) Diferença e Repetição. São Paulo: Paz e Terra, 420 p
. (2010) O anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo: Ed.
34, 560 p. (Coleção TRANS)
. GUATTARI, F. (1995) Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia.
Tradução de Ana Lúcia Oliveira e Lúcia Cláudia Leão. São Paulo: Ed. 34, Vol. 2.
FEDERICI, Silvia (2017). Calibã e a bruxa. Mulheres, corpo e acumulação
primitiva. Trad. de Coletivo Sycorax. São Paulo: Elefante.
FOUCAULT, Michel. (1979). Microfísica do Poder. Organização e tradução de
Roberto Machado. Rio de Janeiro: Edições Graal.
GUATTARI, Félix (1097). Revolução Molecular: Pulsações Políticas do Desejo.
São Paulo Brasiliense.
(1995). Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Tradução de
Ana Lúcia Oliveira e Lúcia Cláudia Leão. São Paulo: Ed. 34, Vol. 2, p. 211.
; ROLNIK, S. (1999) Micropolítica: Cartografias do Desejo.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
442
HUR, Domenico U. (2013) Da biopolítica à noopolítica: contribuições de Deleuze.
Lugar Comum (UFRJ), v. 40, p. 201-215, 2013.
LAZZARATO, Maurizio. (2006). A Política no Império - As revoluções do capitalismo.
Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 217 p.
(2011). O Governo das Desigualdades: Crítica da
insegurança neoliberal. São Paulo. EdUFSCar.
MBEMBE, Achille (2016). Necropolítica: biopoder, soberania, estado de exceção,
política da morte. São Paulo, SP: n-1 edições, p.125.
NASCIUTTI, Jacyara CR. (1996). Reflexões sobre o espaço da psicossociologia.
Documenta Eicos, n.7.
PELBART, Peter P. (2003) Vida capital: ensaios de biopolítica. São Paulo:
Iluminuras.
PONTES, F. e TAVARES, F. (2015) Kits de subjetividade e antropofagia: algumas
considerações sobre o consumo e a publicidade na sociedade de controle. XVII
Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste, Natal.
ROLNIK, Suely (1998). Subjetividade Antropofágica. Disponível em:
http://www4.pucsp.br/nucleodesubjetividade/Textos/SUELY/Subjantropof.pdf.
SILVA, Nilza (1998). Subjetividade. In: STREY, Marlene N. et al. Psicologia Social
Contemporânea. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.
TAVARES, Frederico. (2020). Ecopoder, Capitalismo Rizomático e a noopolítica do
consumo [arquivo em vídeo]. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=8iblDt_esYk e
https://www.youtube.com/watch?v=W9WDgJ7X568
; IRVING, Marta de Azevedo (2009). Natureza S/A? O
consumo verde na lógica do Ecopoder. 1. ed. RIMA, v. 1. 272p
; SILVA, Analice A. (2017). The “Green Consumption” and the
Rhizomatic Capital Strategy: Ads and Reports in the Brazilian Media. Advances in
Applied Sociology vol.07 nº.02. Disponível em:
https://www.scirp.org/html/1-2290353_74086.htm?pagespeed=noscript
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.118797-118814 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
443
CAPÍTULO 24
GRANDES EMPREENDIMENTOS HIDRELÉTRICOS NA AMAZÔNIA: ESTUDO DO
DINAMISMO ESPACIAL DA ORLA DA CIDADE DE FERREIRA GOMES, AMAPÁ,
BRASIL
Jacy Soares Corrêa Neto
Doutorando no PPG em Arquitetura, Tecnologia e Cidade da Unicamp – SP
Instituição: Professor de Arquitetura e Urbanismo na Faculdade Estácio-Amapá
Endereço: Rod. Josimar Chaves Pinto, Jardim Equatorial. 68900-002 – Macapá/AP
E-mail: neto.scorrea@gmail.com / ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8467-9561
Valmor Cerqueira Pazos
Mestrando em Desenvolvimento Profissional e Educação – UnB
Instituição: Pesquisador. Grupo: A Sustentabilidade em Arquitetura e Urbanismo
Endereço: FAU-UnB – Caixa Postal 04431 – CEP: 70.842-970 – Brasília/DF
E-mail: pazos@unb.br / ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8268-6514
Lenildo Santos da Silva
Doutor em Geotecnia pela Universidade de Brasília - UnB
Instituição: Departamento de Engenharia Civil e Ambiental
Endereço: ENC-UnB – Caixa Postal 04431 – CEP: 70842-970 – Brasília-DF
Email: lenildo@unb.br / ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5099-6123
José Marcelo Martins Medeiros
Doutor em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de Brasília – UnB
Instituição: Professor Adjunto da Universidade Federal do Tocantins
Endereço: CAU – UFT 109 N Av. NS-15 CEP: 77.001-090 – Palmas/TO
E-mail: medeirosjose@gmail.com / ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2554-8289
Marta Adriana Bustos Romero
Doutora em Arquitetura pela Universitat Politecnica de Catalunya – UPC
Instituição: Professora Titular da Universidade de Brasília
Endereço: FAU-UnB – Caixa Postal 04431 – CEP: 70.842-970 – Brasília/DF
E-mail: romero@unb.br / ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4222-8463
RESUMO: Os espaços transfronteiriços da Amazônia vêm sendo alvo de grandes
empreendimentos hidrelétricos como é o caso da bacia do Rio Araguari, em Ferreira
Gomes, no estado do Amapá. Esses empreendimentos trazem consigo alterações
negativas e positivas na dinâmica dos espaços livres públicos. Nesta pesquisa, foram
realizados Mapas Temáticos, com o auxílio de tecnologia SIG, apoiado em modelos
de apropriação da paisagem. O objetivo foi a avaliação comparativa das condições
infraestruturais dos espaços públicos urbanos, confeccionando-se “mapas de
sensibilidade dos espaços livres”. A análise foi realizada por meio de indicadores
decompostos em variáveis e pontuados conforme o grau de degradação que causam
à paisagem. O produto servirá de apoio na proposição e implantação de novos
projetos de espaços públicos nas margens do Rio Araguari.
PALAVRAS-CHAVE: Amazônia; Rio Araguari; SIG; Espaços públicos.
444
ABSTRACT: The transboundary spaces of the Amazon have been the target of large
hydroelectric projects, such as the Araguari River basin, in Ferreira Gomes, in the state
of Amapá. These enterprises bring with them negative and positive changes in the
dynamics of public open spaces. In this research, Thematic Maps were made, with the
help of GIS technology, supported by landscape appropriation models. The objective
was the comparative assessment of the infrastructural conditions of urban public
spaces, creating “sensitivity maps of open spaces”. The analysis was performed using
indicators broken down into variables and scored according to the degree of
degradation they cause to the landscape. The product will support the proposal and
implementation of new projects for public spaces on the banks of the Araguari River.
KEYWORDS: Amazon; Araguari River; GIS; Public spaces.
445
1. INTRODUÇÃO
A Amazônia é rica em beleza, recursos naturais e biodiversidade, é comumente
definida pela “bacia hidrográfica do Amazonas ou pela floresta equatorial
imensamente grande” (REIS, 2001, p. 202), como também, pelo desenvolvimento de
suas
sociedades
e
culturas,
evidenciadas
através
de
suas
atividades
socioeconômicas que a distinguem de outros espaços e lugares, seja por seus rios,
pelas florestas fechadas, seja por sua população. Essa visão genérica do rincão
amazônico esconde que tal espaço não é uno. A Amazônia possui suas
especificidades e agrega sub-regiões, tais como, zonas de vegetação, de campos, de
cerrados, e, além de tudo, a presença de cidades (REIS, 2001). Portanto, a Amazônia,
longe de uma visão bucólica, simplista e romântica, exibe-se pela complexidade de
suas redes urbanas (TRINDADE JR, 2011; CORRÊA, 1987).
A busca por uma matriz energética estabilizada e desenvolvimentista na
Amazônia perfaz ações que sustentam o setor econômico-industrial por meio das
implantações de empreendimentos energéticos, dentre eles os de natureza
hidrelétrica (BRITO, 2008). O bioma amazônico é caracterizado também por seus
vastos cursos d’água, constituídos “pelo maior sistema hidrográfico do mundo, com
aproximadamente 6.400.000 km², sendo a maior reserva de água doce do planeta”
(BERMANN et al., 2010, p. 1), além de desempenhar papel substancial no que tange
aos referidos empreendimentos, que, ao serem implantados, modificam de modo
expressivo a dinâmica espacial.
Conforme Côrrea (2018), o sistema elétrico do país prioriza o cumprimento de
metas produtivas para a geração de energia elétrica, condicionando a exploração do
potencial hidroenergético amazônico ao atendimento de demandas provenientes de
outras regiões do Brasil. Os novos empreendimentos hidrelétricos colaboraram para
o aumento dos níveis de geração de energia, excedendo a demanda do Amapá,
porém a plena contribuição para com os aspectos locais de ordenamento territorial
ainda não é satisfatória.
A dinâmica espacial da orla da cidade de Ferreira Gomes vem sendo
continuamente alterada em razão da implantação de usinas hidrelétricas ao longo do
Rio Araguari. Desse modo, as transformações decorrentes desse processo podem ser
evidenciadas principalmente pelo crescimento demográfico, expansão urbana,
deslocamentos de comunidades e pela interferência no meio biótico. Nessa
446
perspectiva, a análise dessas transformações pode ser vista tanto por um ângulo
positivo, como o crescimento do turismo e do comércio na cidade, quanto por um
ângulo negativo, a julgar os impactos ambientais e a falta de intervenções na orla da
cidade, que sofre com a diminuição da vazão do rio.
Se por um lado a crise energética pode vir a ter um profundo efeito negativo
nos esforços de alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), por
outro, podemos aproveitar a oportunidade dessa crise para fortalecer o compromisso
dos países para implementar a Agenda 2030 e os 17 Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável para alcançar um futuro mais inclusivo e sustentável.
As áreas verdes urbanas manifestam-se como elementos essenciais na
definição da paisagem urbana, funcionando como amenidade ambiental no tecido
urbano e como âncora estruturadora da urbanização difusa, mas que têm sido
negligenciadas pelos processos de planejamento (GONÇALVES, 2010). Mas sempre
é bom lembrar que para que a vegetação possa exercer uma função microclimática,
em termos de plano térmico e higrométrico, no meio urbano, é preciso atender a
algumas condições, por exemplo, a necessidade que a área verde constitua um efeito
de massa dentro da escala da cidade e que essa massa vegetal represente 30% da
superfície urbanizada (ROMERO, 2011). Na tentativa de reverter esse processo, a
ONU, em sua conferência Habitat III (2016), propôs que houvesse um novo olhar para
os espaços verdes e públicos nas cidades. Conforme Amanajás e Klug (2018),
A expectativa de que o desenho e a gestão de espaços públicos socialmente
inclusivos e seguros contribuam para a redução das desigualdades urbanas
e da criminalidade é tão expressiva, que uma das metas do Objetivo de
Desenvolvimento Sustentável (ODS) 11 “Construir cidades e assentamentos
humanos inclusivos, seguros, resistentes e sustentáveis” da ONU é “até
2030, garantir acesso universal a espaços verdes e públicos seguros,
inclusivos e acessíveis, especialmente para mulheres e crianças, pessoas
idosas e pessoas com deficiência” (AMANAJÁS e KLUG, 2018, p. 33).
O ODS 11 está alinhado com a nova agenda urbana, acordada em outubro de
2016, durante a III Conferência das Nações Unidas sobre Moradia e Desenvolvimento
Urbano Sustentável. Entre uma de suas metas, pretende-se garantir o acesso de
todos a habitação segura, adequada e a preço acessível, bem como aos serviços
básicos e urbanização de favelas. Todos os habitantes devem ter acesso a um lugar
para viver com dignidade e aos meios de subsistência, conforme os artigos 5º e 6º da
nossa Constituição Federal (CF/1988). Inclui-se, assim, a moradia entre as
necessidades vitais básicas que devem ser atendidas pelo salário-mínimo. A perda
447
de renda das famílias devido a desastres ambientais levará à vulnerabilidade vários
segmentos da sociedade, abaixo da linha da pobreza, sobretudo no contexto da
Amazônia.
2. PROBLEMA AMAZÔNICO: GRANDES EMPREENDIMENTOS HIDRELÉTRICOS
Em se tratando de termos hidrográficos, os quais incorporam umas das
problemáticas tratadas, “a Bacia Hidrográfica Amazônica é composta por todos os
afluentes e rios formadores do Rio Amazonas. Ela drena sete países e corresponde a
quase 40% da América do Sul, com uma área de 6,6 milhões de quilômetros
quadrados” (CARNEIRO FILHO e SOUZA, 2009, p. 10). Sua bacia hidrográfica
representa um volume hidrológico que varia, aproximadamente, de 60 a 140 metros
cúbicos por segundo, o que pode variar e diferenciar-se conforme a época do ano e
localidades (REIS, 2001). Além disso, esse mesmo volume serve de base para as
tramas da urbanização das cidades amazônicas, em suas pluralidades e
singularidades (CASTRO, 2009).
A Amazônia é alvo da implantação de condicionantes espaciais que propiciam
a criação e instalação de mecanismos externos, alheios às vivências locais, que
promovem a (des)construção espacial (PORTO, 2007). Sendo assim, os recursos
disponíveis, somados com a intervenção estatal, possibilitam a exploração dos
recursos naturais, o que resulta na implantação de diversos empreendimentos, dentre
eles os de natureza hidrelétrica. Tais ações são para Becker (2005, p. 71) resultados
de redes “desenvolvidas nos países ricos, nos centros do poder, onde o avanço
tecnológico é maior e a circulação planetária permite que se selecionem territórios
para investimentos, seleção que depende também das potencialidades dos próprios
territórios”.
O aproveitamento desse potencial hidrelétrico dos rios amazônicos ressalta o
posicionamento de Becker (2005, p. 78) quanto ao valor econômico e de mercadoria
dos recursos hídricos, quando afirma que a “água é considerada o ouro azul do século
XXI”. A experiência da Amazônia como ponto de convergência dessa corrida
energética iniciou-se com a construção de usinas hidroelétricas nos países que fazem
fronteira com o Brasil, como a usina de porte de Brokopondo, no Suriname, em 1964;
Petit-Saut, em 1994, na Guiana Francesa; enquanto do lado brasileiro, a usina de
448
Coaracy Nunes, em 1953, no Amapá, foi o marco da introdução desses elementos no
espaço amazônico (BERMANN et al., 2010).
Face à implantação dos projetos hidrelétricos, ocorreu a instalação de grandes
projetos e sistemas de engenharia, o que promoveu a ocupação massiva de um novo
território pela população urbana. A urbanização e as redes urbanas amazônicas,
segundo Corrêa (1987), são produtos da evolução dos núcleos urbanos oriundos de
fortins, aldeias missionárias e das rotas comerciais de “drogas do sertão”, do
extrativismo da borracha e da implantação de sistemas de engenharia, constituídas
pelas infraestruturas (SANTOS, 2006). Ainda nesse discurso, as redes urbanas
amazônicas possuem diferenciação no que tange aos tempos espaciais, existem
núcleos urbanos considerados como “velhos” e “novos”, os quais evidenciam-se por
meio das cidades que surgiram através de núcleos ribeirinhos e de fortificações, assim
como de cidades que acompanharam o desenvolvimento dos grandes projetos e eixos
rodoviários (CORRÊA, 1987).
De forma mais recente, o curso dessas discussões tem sido ampliado por meio
da inserção de novas hidrelétricas e pelo planejamento infraestrutural realizado pela
Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (IIRSA), que reúne os doze
países da América do Sul. Carneiro Filho e Souza (2009) enfatizam que esse
gigantesco programa, orçado atualmente em US$ 21 bilhões, tem por objetivo a
integração e a construção de hidrelétricas, ferrovias, oleodutos, gasodutos,
telecomunicações, bem como de rodovias.
Belém e Cabral (2019) ressaltam os impactos ambientais causados pelas
hidrelétricas, sobretudo os processos de decomposição dos vegetais liberados no
ambiente aquáticos dos reservatórios, que libera gás sulfídrico e grande quantidade
de carbono e fósforo, que podem alterar a qualidade da água. Esses autores
evidenciam a mortandade de peixes à jusante do reservatório da UHE Ferreira
Gomes, no Amapá, concluindo que houve uma mudança negativa na paisagem ao
longo de 30 anos na bacia hidrográfica do reservatório.
O curso do rio Araguari passou a ser conhecido internacionalmente pelo
fenômeno da pororoca, uma onda provocada pelo encontro das grandes marés do rio
com o oceano atlântico, que alcançava até 5m de altura (CÔRREA, 2020). Desde o
ano de 2015, o fenômeno não é mais observado. Além dos efeitos negativos para o
turismo, o fim da pororoca, segundo Belém e Cabral (2019), incrementa a seca de
outras partes da bacia do rio Araguari e acarreta a diminuição da ictiofauna na região.
449
As possibilidades levantadas para o fim da pororoca são a soma de vários fatores: a
construção de três hidrelétricas ao longo do rio Araguari, a abertura de canais para
levar água às fazendas e a degradação causada pelo pisoteio de búfalos.
3. A FORMAÇÃO ESPACIAL DO MUNICÍPIO DE FERREIRA GOMES/AP
O Amapá é um estado brasileiro criado em 1988 e pertence à Região Norte. No
que tange às fronteiras internacionais, o Amapá faz fronteira com dois países, a
Guiana Francesa e o Suriname. Seu território localiza-se na margem esquerda do rio
Amazonas e sua capital, Macapá, está sediada na linha do Equador. A economia do
referido estado destaca-se pela exploração de minérios e seus desdobramentos
relativos à exploração de outros recursos naturais.
Figura 1 – Mapa de localização da área em estudo
Fonte: adaptado de IBGE e Plano Diretor Participativo do Município de Ferreira Gomes, 2013.
O cenário da economia e do território amapaense sofreu nítidas mudanças com
a inserção de uma empresa denominada Indústria de Comércio e Minérios (ICOMI),
constituindo-se o primeiro empreendimento de grande porte na Amazônia, nos anos
de 1950, permitindo a exploração de minérios de ferro e manganês (PORTO, 2007).
450
A fim de promover a criação de subsídios para o escoamento da produção e
manutenção energéticas do setor industrial, grandes projetos e hidrelétricas foram
construídos. Como exemplos dessa política de Estado, criou-se a hidrelétrica de
Coaracy Nunes (PORTO, 2007), tornando o município de Ferreira Gomes palco
dessas transformações. As consequências desse processo ocasionaram o
desenvolvimento de várias cidades, assim como o crescimento populacional; dos anos
de 1991 e 1996, a população estadual passou de 289.397 para 439.781 habitantes
(SEICOM, 2000).
Segundo Brito (2008), a implantação da infraestrutura da hidrelétrica de
Coaracy Nunes modificou drasticamente o meio ambiente tanto pela construção do
reservatório, quanto pelos impactos na formação de núcleos urbanos, na provisão de
energia para o setor industrial. Assim sendo, foi no município de Ferreira Gomes que
as transformações no setor energético se iniciaram em toda a Amazônia. Soma-se a
isso a implantação de dois empreendimentos hidrelétricos no município com a
finalidade de utilização do potencial hidrológico do rio Araguari, a hidrelétrica de
Ferreira Gomes – em operação desde 2015 –, localizada nas proximidades da sede
do município, e a usina de Cachoeira Caldeirão (ANEEL, 2012) – em operação desde
2017, formando um tríplice uso do regime hidrológico do rio Araguari e
(des)construindo novos usos ao espaço do município.
Figura 2 – Aproveitamentos hidrelétricos no rio Araguari
Fonte: adaptado de Ecotumucumaque, 2013.
451
Quantos aos aspectos espaciais do município, ele apresenta uma população
de 5.802 habitantes e um grau de urbanização 72,09% (PLANO DIRETOR
PARTICIPATIVO DO MUNICÍPIO DE FERREIRA GOMES, 2013). A economia
caracteriza-se pelas atividades no setor primário, tais como agropecuária, não
existindo fomentos à implantação de indústrias. Conforme Silva et al. (2020), com a
construção dos grandes empreendimentos hidrelétricos, houve uma expansão urbana
acelerada da cidade de Ferreira Gomes, provocada pelo elevado crescimento
demográfico, em curto prazo. Para esses autores, o poder público falha na regulação
desse fenômeno antrópico, com poucas medidas de planejamento e ordenamento
territorial e estratégias urbanísticas pouco eficazes, comprometendo a qualidade de
vida e o bem-estar social da população local.
Os principais acessos à cidade se dão por meio fluvial e pela BR-156 “rodovia
de integração que corta o Amapá de Sul a Norte e passa por dez dos seus dezesseis
municípios” (PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO DO MUNICÍPIO DE FERREIRA
GOMES, 2013) e sua pavimentação, que constituem elementos concernentes à
estratégia do planejamento do IIRSA, já que esta encontra-se diretamente ligada à
articulação do eixo rodoviário entre o Brasil e a Guiana Francesa. A questão fronteiriça
influencia não somente o contato direto, numa perspectiva político-administrativa,
como também as dinâmicas espaciais dos municípios lindeiros.
No que tange aos aspectos hidrográficos, o município de Ferreira Gomes
insere-se na região da Bacia do Araguari, que possui 42 mil km² de área total e detém
uma vazão média de 1.200m3/s. Logo, apresenta um notório potencial hidroenergético
(PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO DO MUNICÍPIO DE FERREIRA GOMES, 2013).
O rio Araguari é o rio que margeia a cidade de Ferreira Gomes e é considerado o
principal e maior rio do Amapá, possuindo aproximadamente 617 km de comprimento.
Nessa conjuntura, tem-se a construção da hidrelétrica de Ferreira Gomes, em
operação desde 2015, que se localiza nas proximidades da principal cidade do
município de Ferreira Gomes, esse fato nos leva à problemática da avaliação da
dinâmica dos espaços livres da cidade de Ferreira Gomes, levando-se em
consideração a relação do encontro entre “cidade-rio-empreendimento hidrelétrico”.
Portanto, o objetivo desta pesquisa é a avaliação da orla enquanto espaço livre público
de encontros e quanto a seu aspecto ecológico, com destaque para a dimensão em
diversos projetos de diferenciadas tendências (econômico, políticas ou urbanísticas),
temporalidades e urbanidades, estabelecendo termos de comparação entre
452
dinâmicas e urbanísticas diferenciadas, olhando os usos dos espaços que evocam a
coexistência física e social dos pedestres nos lugares públicos (CERTEAU, 1994).
4. ANÁLISE DOS ESPAÇOS LIVRES PÚBLICOS DE FERREIRA GOMES/AP
A cidade de Ferreira Gomes conta com poucos espaços livres públicos que
propiciam uma grande concentração de pessoas. A referida cidade detém uma orla
de aproximadamente 1,5 quilômetro de extensão às margens do rio Araguari. Esse
fator faz com que esse elemento espacial se torne um dos principais atributos que
promovem o convívio da população, assim como o lazer aos habitantes e turistas.
Também existe uma praça localizada na parte alta da cidade, no bairro da Montanha,
que se mostra pouco atrativa a seus usuários por falta de infraestrutura adequada.
Figura 3 – Localização dos espaços livres públicos na cidade de Ferreira Gomes destacados na cor
vermelha
Fonte: adaptado de Plano Diretor Participativo do Município de Ferreira Gomes, 2013.
Os estudos aqui apresentados abordam a orla da cidade como principal espaço
público livre, em razão de possuir maior complexidade, dada a sua proximidade com
o rio, e de constituir-se como uma das áreas mais degradadas ecologicamente do
ambiente urbano. Destacam-se o verde urbano e a necessidade de seu
453
conhecimento, uma vez que os benefícios da vegetação em relação ao microclima
podem ser indiretos, através da evapotranspiração, que mitiga as superfícies e o ar
adjacente devido à troca de calor, e diretos, através do sombreamento, que reduz a
conversão de energia radiante em calor sensível e diminui a temperatura de superfície
(ROMERO, 2011). A absorção da radiação solar pelas folhas das plantas é um dos
benefícios das áreas verdes sobre as áreas não plantadas. Deve-se levar em conta
que a radiação de onda longa das folhas é mais lenta que a das superfícies dos
arredores, por isso, as pessoas nas áreas verdes estão mais sujeitas à menor pressão
do calor radiante. O esquema apresentado abaixo mostra as principais conformações
das parcelas da orla que subsidiam as análises descritas na metodologia desta
pesquisa e permite compreender por meio de registros fotográficos da visita in loco as
feições gerais da orla.
Figura 5 – Feições gerais da orla da cidade de Ferreira Gomes/AP
Fonte: acervo dos autores.
As parcelas foram numeradas de A1 a A20 com o objetivo de evidenciar as
estruturas parciais da área em estudo. Na parcela A1, existe uma praça que conta
com mobiliários (bancos, lixeiras, um quiosque) e gramados, porém com pouca
arborização. Da parcela A2 até A4, há uma predominância de bares e restaurantes de
uso misto (restaurante/residência) que fornecem serviços aos turistas e usuários da
área. Já as parcelas de A5 a A10 são caracterizadas pela presença de calçadas que
delimitam a orla, em que estão alocados quiosques, playgrounds, campo de voleibol
454
e esculturas, além da arborização de médio/grande porte pontual. Na parcela A11,
está alocado um posto de combustível, na margem da orla, e um pequeno trapiche de
embarcações. Nos trechos de A12 a A14 estão sediados os equipamentos públicos
como a prefeitura, centros culturais, algumas secretarias e a promotoria da justiça. Os
intervalos de A15 a A17 são definidos pela presença de residências que impedem o
acesso à orla. Já as parcelas de A18 a A20 definem-se pela presença de vegetação
arbustiva, pequenas embarcações e casas de pescadores.
5. RESULTADOS
A ecologia vem lentamente sendo incorporada a diversas disciplinas, sendo
assim, em muitos aspectos, o planejamento urbano e o planejamento ambiental
associam-se de maneira profunda. Desse modo, tanto a compreensão ecológica
quanto os espaços livres públicos tornaram-se temas frequentes nos projetos das
cidades. Algumas experiências demonstram essas interações no novo papel de
construir as cidades, no qual a reestruturação dos processos naturais são
imprescindíveis e o papel da dinâmica espacial dos espaços livres públicos cada vez
mais ganha espaço. O método escolhido para a realização da análise ambiental da
orla de Ferreira Gomes foi apoiado em conceitos da ecologia da paisagem (FORMAN
e GODRON, 1986) e nos métodos consagrados de modelos de apropriação da
paisagem (MCHARG, 1969).
A pesquisa busca o aprofundamento de uma consideração recente, que é a
avaliação da “performance” ecológica do urbanismo. Procura-se a avaliação dos
diferentes usos do solo utilizado na orla segundo sua integração ecossistêmica com o
bioma natural. No trabalho, desenvolveu-se uma pesquisa de campo na porção mais
antropizada da orla do rio, salientando-se as variáveis que ajudam a compreender a
integração ecossistêmica com o meio ambiente. Escolheram-se como indicadores do
processo de impacto das atividades antrópicas sobre o meio natural três grupos
sensíveis de elementos físicos da paisagem, notadamente, (1) o estado da
vegetação – diz respeito à vegetação que caracteriza as áreas verdes da orla em
seus diversos estratos (herbáceo, arbustivo e arbóreo); (2) o estado do solo – diz
respeito ao suporte físico ou plano horizontal que deveria dar suporte à vida, com
verificação de presença de solo exposto, impermeabilização, existência de processos
de erosão, escavações, muros de arrimo que alteram a conformação das margens
455
etc.; e (3) a acessibilidade ou barreiras aos ciclos de vida – diz respeito
principalmente aos elementos construídos pelo ser humano que dificultam a dispersão
de espécies impedindo total ou parcialmente a troca gênica, verificada, assim, a
presença de muros, cercas, pequenos elementos construídos, construções irregulares
etc.
A análise se restringiu à situação em que se encontra a orla do rio
atualmente, com o objetivo de se obter um diagnóstico da área em estudo. Tendo em
vista a necessidade de se conhecer com detalhes os aspectos que envolvem o tema,
foi necessário definir o universo de pesquisa, o qual se constitui de uma faixa de 30m
ao longo de toda a orla do rio e que corresponde à faixa orla urbana. As unidades
básicas de análise da paisagem são parcelas de 75x30m, o que correspondeu a 20
parcelas ao total. Os indicadores foram decompostos em variáveis, e pontuados
conforme o grau de degradação que causam à paisagem, variando de +4 a –4 pontos.
A maior pontuação demonstra maior capacidade de suporte ecológico e a menor
pontuação representará a dificuldade na manutenção de ecossistemas.
(1) Indicador - Vegetação:
- Natural (4 pontos): maior pontuação é alocada nas parcelas com a maior
quantidade e variedade de espécies nativas, pois estas possibilitam a troca gênica
com maior facilidade;
- Vegetada (2 pontos): parcelas vegetadas, porém com a presença exclusiva
de espécies exóticas, recebem uma pontuação intermediária, pois a biomassa criada
ainda pode gerar certa complexidade ao ecossistema;
- Baixa degradação (zero ponto): essa pontuação é eleita às áreas com baixa
diversidade e quantidade de espécies, que são consideradas degradadas devida à
baixa capacidade de suporte ecológico;
- Média degradação (-2 pontos): parcelas vegetadas com a presença rarefeita
de vegetação; e
- Alta degradação (-4 pontos): parcelas com nenhuma quantidade e variedade
de espécies nativas, impossibilitam a troca gênica.
(2) Indicador - Solo:
- Estável (4 pontos): essa pontuação é posta para parcelas com o solo capaz
de criar um verdadeiro suporte ao ecossistema, sem presença de processos erosivos
ou áreas impermeabilizadas;
456
- Em baixo risco de erosão (2 pontos): parcelas com processo inicial de
degradação do solo, com influência negativa na qualidade do ecossistema, com
presença de pequenos processos erosivos;
- Em risco intermediário de erosão (zero ponto): parcelas em processo notável
de degradação do solo, com influência negativa perceptível na qualidade do
ecossistema,
com
presença
de
consideráveis
processos
erosivos
e
impermeabilizações, recebem uma pontuação intermediária;
- Em alto risco de erosão (-2 pontos): parcelas em alto processo de degradação
do solo, com alta influência negativa na qualidade do ecossistema, por meio da
presença de grandes processos erosivos, adições de solo e impermeabilizações em
grande escala; e
- Em processo de erosão (-4 pontos): áreas em acelerado processo de
degradação, com solo exposto e erodido, incapazes de suportar vida.
(3) Indicador - Acessibilidade x Barreiras:
- Acessibilidade (4 pontos): a pontuação máxima é verificada em parcelas que,
devido a sua proximidade com as áreas naturais e que pela ausência de barreiras
físicas, poderiam funcionar como verdadeiros corredores ecológicos para as espécies
nativas e circulação de pessoas;
- Barreira Média (2 pontos): a pontuação intermediária positiva é empregada
em parcelas que, apesar de possuírem barreiras à circulação das espécies (cercas
verdes, por exemplo), poderiam, com pequenas intervenções, modificar o estado em
que se encontram para uma situação de melhor suporte ecológico;
- Barreira Forte (zero ponto): parcelas que possuem um isolamento
considerável em relação a sua vizinhança (muros de cimento, grande parte da área
ocupada por construções) e grande distanciamento das áreas naturais não são
pontuadas;
- Barreira mais que forte (-2 pontos): parcelas que apresentam barreiras à
circulação das espécies poderiam com grandes intervenções modificar o estado em
que se encontram para uma situação de melhor suporte ecológico;
- Não acessível (-4 pontos): verificado em parcelas que, devido a sua
proximidade com as áreas naturais e pela presença total de barreiras físicas, impedem
o funcionamento de corredores ecológicos para as espécies nativas e circulação de
pessoas.
Os resultados obtidos através da análise dos três indicadores formarão mapas
457
temáticos (vegetação, solo e acessibilidade x barreiras) que serão sobrepostos
conforme a técnica de “overlayers” (sobreposição de camadas), consagrada por
McHarg (1969), em seus estudos ambientais. Depois da realização e análise dos
mapas temáticos, será composto o mapa de suporte ecológico da orla de Ferreira
Gomes, através de uma matriz de agregação dos dados. Cada unidade da paisagem
analisada nos mapas temáticos possuirá uma pontuação diferente. Essa matriz
agregará as diferentes pontuações em uma escala de cores em que cada pontuação
representará um tom diferente. Na fase de agregação dos dados e na manipulação
dos mapas será utilizado o Sistemas de Informações Geográficos ArcGis e softwares
de manipulação de imagens.
6. MAPAS TEMÁTICOS E DIAGNÓSTICO
Após a visita de campo e a obtenção dos dados segundo a proposição da
metodologia aqui discutida, foram elaborados mapas por meio de tecnologia SIG,
mediante o uso do software ArcGis, que evidenciam informações acerca da
vegetação, solo e acessibilidade/barreiras presentes na faixa linear de trinta metros
de orla urbana da cidade de Ferreira Gomes.
Os primeiros mapas a serem apresentados são relacionados a aspectos da
vegetação e do solo. O mapa temático da vegetação mostra que o trecho central da
orla da cidade apresenta mais problemas quanto à presença de vegetação nativa, em
contrapartida, as extremidades são mais preservadas. A importância da grama como
material de revestimento é observada no período da chuva nos climas tropicais como
é o caso da cidade de Ferreira Gomes, que, mesmo estando exposta aos raios
solares, apresenta superfície gramada com valores baixos de temperatura, que se
aproximam dos valores das áreas sombreadas. Com relação ao mapa resultante das
variáveis tangenciais ao solo, este se mostra mais diversificado em relação aos
valores obtidos, embora os valores exibam que grande parte da orla se encontra em
algum processo de erosão.
458
Figura 7 – Mapas temáticos da vegetação e do solo da orla da cidade de Ferreira Gomes
Fonte: acervo dos autores.
Os seguintes mapas são produtos das informações extraídas dos aspectos de
acessibilidade e barreiras, assim como, da somatória dos aspectos da vegetação e
solo, o que foi denominado de mapa de suporte ecológico. Em termos de
acessibilidade, a orla da cidade de Ferreira Gomes na maioria de sua extensão
apresenta barreiras ou algum tipo de impedimento que restringe ou dificulta o acesso
dos usuários ao rio Araguari. Os pontos mais críticos são verificados em residências
particulares que impedem completamente o uso da orla como espaço público.
Figura 8 – Mapas temáticos da acessibilidade e de suporte ecológico da orla da cidade de Ferreira
Gomes/AP
Fonte: acervo dos autores.
Com relação ao mapa de suporte ecológico, que agrega informações dos três
459
mapas temáticos, conclui-se que as extremidades da orla, justamente as que
possuem menores influências antrópicas, estão mais preservadas, provando que as
ocupações urbanas atuais têm uma influência negativa na qualidade ambiental dos
espaços livres. Esse mapa ajuda a visualizar quais as áreas das orlas que são
prioritárias para novos projetos urbanos, sendo uma ferramenta útil para a gestão
urbana.
7. CONCLUSÃO
O município de Ferreira Gomes é um dos eixos em que se implantam sistemas
de engenharia na Amazônia brasileira, por conseguinte, uma gama de transformações
desenvolve-se, alterando as condições socioambientais. As transformações espaciais
atuais no município de Ferreira Gomes são produtos dessa relação, baseada na
apropriação
dos
recursos
naturais
pelos
grandes
empreendimentos
dos
aproveitamentos energéticos proveniente do rio Araguari. Tal fato implica na dinâmica
espacial e, consequentemente, gera impactos no planejamento urbano da cidade,
bem como no planejamento regional, através de fenômenos como o adensamento
populacional – dada a oferta de empregos e serviços –, o que ocasiona fluxos
migratórios, crescimento urbano tanto na cidade de Ferreira Gomes, nas vilas
urbanas, quanto em Porto Grande, município vizinho.
A criação do Plano Diretor de Ferreira Gomes (2013), resultante das ações para
implementação dos empreendimentos hidrelétricos, corrobora na inserção do
município de Ferreira Gomes na complexidade do espaço transfronteiriço. Dessa
forma, faz-se necessário refletir sobre as potencialidades e fragilidades e enfrentar
desafios decorrentes das intencionalidades de agentes sociais atuantes no espaço
em questão, a fim de que se promova a estruturação urbana e a qualidade de vida no
município em meio ao desenvolvimento econômico.
Já o mapa de suporte ecológico da orla de Ferreira Gomes identificará valores
ambientais e urbanísticos, gerando diferentes alternativas para a efetiva implantação
de corredores ecológicos e ações planejadas em termos de projetos de intervenção
urbano-paisagística, que ligarão os locais degradados com áreas onde a natureza
ainda não foi destruída.
Conforme os resultados obtidos na análise da orla de Ferreira Gomes, grande
parte das parcelas apresentou alguma forma de interferência humana. Observou-se
460
que as parcelas com maior capacidade de suporte ecológico estão localizadas nas
extremidades da orla urbana próximas a áreas como parques e áreas de preservação,
provando que a privatização da orla pelos lotes residenciais é extremamente
prejudicial à sustentabilidade dos ecossistemas nativos. Uma das alternativas que
poderia ajudar na preservação da orla seria a utilização, por parte dos órgãos públicos
competentes, de novas tecnologias e métodos que facilitem a integração de dados
recentes, como as imagens de mapas temáticos apresentados neste artigo, como uma
ferramenta de gestão ambiental.
461
REFERÊNCIAS
AMANAJÁS, R.; KLUG, L. B. A nova agenda urbana e o Brasil: insumos para
sua construção e desafios a sua implantação. Brasília: IPEA, 2018.
ANEEL. Características Técnicas e Informações Básicas para a Exploração Da
UHE Cachoeira Do Caldeirão. ANEXO VIII AO EDITAL DE LEILÃO Nº. 06/2012Processo nº. 48500.001651/2012-54, 2000.
BECKER, B. K. Geopolítica da Amazônia. Conferência do Mês do Instituto de
Estudos Avançados da USP. Proferida pela autora em 27 de abr. 2004. Instituto
de Estudos Avançados, Universidade de São Paulo, São Paulo, 71-86, 2005.
BELÉM, F. L.; CABRAL, J. B. P. Dinâmica da paisagem na bacia hidrográfica da
Usina Hidrelétrica de Ferreira Gomes –Amapá, Brasil. Caderno de Geografia,
v.29, n.56, 2019.
BERMANN, C.; WITTMANN, D.; HERNANDEZ, F.; RODRIGUES, L. Usinas
Hidrelétricas na Amazônia - O futuro sob as aguas. In: Apresentação de
Trabalho/Seminário no Instituto de Energia e Meio Ambiente. Universidade de São
Paulo, 2010.
BRITO, A. Certificação ISO 14001 e Educação Ambiental: estudo de caso do
Sistema de Gestão Ambiental da Usina Hidrelétrica Coaracy Nunes- AP.
Dissertação de Mestrado em Direito Ambiental e Políticas Públicas. UNIFAP,
Macapá, 2008.
CARNEIRO FILHO, A.; SOUZA, O. Atlas de Pressões e Ameaças às Terras
Indígenas na Amazônia Brasileira, Instituto Socioambiental, São Paulo, 2009.
CASTRO, E. Urbanização, pluralidade e singularidade fazem cidades
amazônicas. In: Cidades da Floresta, Edna Castro, organizadora, Editora
Anablume, São Paulo, 2009.
CERTEAU, M. A invenção do cotidiano: artes de fazer. Petrópolis, Vozes, 1994.
CORRÊA, K. M. A. formação do complexo hidrelétrico no Rio Araguari:
impactos no ordenamento territorial de Ferreira Gomes, Amapá. Dissertação
(mestrado). PPG MDR, UNIFAP, 2018.
CORRÊA, R. L. A periodização da rede urbana da Amazônia. In: Revista
Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, v.49 (3), 39-68, 1987.
ECOTUMUCUMAQUE. PBA - Plano Básico Ambiental do Aproveitamento
Hidrelétrico Cachoeira Caldeirão, Volume I, Apresentação – Programas
Institucionais – Programa de Controle Ambiental das obras e construções.
Ecotumucumaque, Macapá, Estado do Amapá, 2013.
462
GONÇALVES, N. F. H. Espaços verdes no planeamento urbano sustentável.
Dissertação (Mestrado em Ordenamento do Território e Planeamento Ambiental) –
Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2010.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Nova agenda urbana:
Declaração de Quito sobre as cidades e assentamentos urbanos para todos.
Secretariado da HABITAT III, 2017.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico, 2010.
MCHARG, I. Design with Nature, John Wiley & Sons, New York, 1969.
OLIVEIRA, J. A. A cultura nas (das)pequenas cidades da Amazônia Brasileira.
In: VIII Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciência Sociais. Centro de Estudos
Sociais, Faculdade de Economia, Universidade de Coimbra, Portugal, 2004.
PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO DO MUNICÍPIO DE FERREIRA GOMES.
Diagnóstico das Condicionantes, Deficiências e Potencialidades Municipais
Propostas e Ações, Ferreira Gomes Energia, Estado do Amapá, 2013.
PORTO, J. L. R. Amapá: Principais transformações econômicas e
institucionais-1943 -2000. 2ª ed. Edição do Autor, Macapá, Amapá, 2007.
PORTO, J. L. R.; SILVA, G. V. De Periferia à Espaço Estratégico: A Construção
da Condição Fronteiriça Amapaense. In: Anais da XXXVI Reunión de Estudios
Regionales, Portugal, Badajoz-Elvas, 2-14, 2010.
REIS, A. C. F. A Amazônia e a Integridade do Brasil. Senado Federal, Brasília,
Conselho Editorial, 2001.
ROMERO, M. A. B. Arquitetura do Lugar. Uma visão Bioclimática da
Sustentabilidade em Brasília, Nova Técnica Editorial, São Paulo, 2011.
SANTOS, M. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. 4. ed.
2. Reimpressão. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006.
SEICOM/Secretaria de Estado da Indústria, Comércio e Mineração. Amapá:
construindo uma economia sustentável. Governo do Estado do Amapá, Amapá,
2000.
SILVA, E. S.; FERREIRA, J. F. C.; TOSTES, J. A. A implantação de
Empreendimentos Hidrelétricos no MÉDIO ARAGUARI e a Nova Configuração
Urbana de Ferreira Gomes-AP, na Amazônia Brasileira. Geosul, Florianópolis, v.
35, n. 75, p. 376-396, mai./ago. 2020.
TRINDADE JUNIOR, S. C. Cidades médias na Amazônia Oriental: das novas
centralidades à fragmentação do território. In: Anais do XIV Encontro Nacional
da Anpur, Rio de Janeiro, Brasil, 2011.
463
CAPÍTULO 25
O PROFISSIONAL E SUA ATUAÇÃO SOBRE A OPTICA DA INOVAÇÃO
Ana Cristina Brandão Ribeiro Silva
Professora de IES
E-mail: anacbrs@yahoo.com.br
RESUMO: Analisar a atuação do secretário executivo sob a óptica da inovação a guisa
da gestão do conhecimento se constitui no objetivo deste estudo. Buscou-se
contextualizar historicamente a gestão do conhecimento com vistas à inovação e
identificar as vantagens para o desenvolvimento dos profissionais. Dentre os autores
mais citados e que servem de fundamentação para esta temática figuraram: Beal
(2004), Nonaka e Takeuchi (1997), Probst; Raub, Romhardt (2002), Staub (2001),
Quadros e Vilha (2007), Silva (2013), Silva e Miranda (2013). Realizou-se pesquisa
qualitativa, a coleta foi por meio de revisão bibliográfica e a análise descritiva. Os
resultados apontaram para indicação de mudanças nas estratégias da organização,
caracterizando a inovação como impulsionador do diferencial do secretário no papel
de cogestor. A conclusão principal foi à valorização das atribuições desse profissional
ao gerar inovação propiciando vantagem estratégica.
PALAVRAS-CHAVE: Inovação; Conhecimento; Secretário Executivo.
ABSTRACT: The objective of this study was to analyze the role of the executive
secretary from the perspective of innovation through knowledge management. We
sought to contextualize historically the management of knowledge with a view to
innovation and to identify the advantages for the development of professionals. Among
the most cited authors who serve as a foundation for this theme were: Beal (2004),
Nonaka and Takeuchi (1997), Probst; Raub, Romhardt (2002), Staub (2001), Quadros
and Vilha (2007), Silva (2013), Silva and Miranda (2013). Qualitative research was
conducted, the collection was by means of literature review and descriptive analysis.
The results indicated changes in the organization's strategies, characterizing
innovation as a driver of the secretary's differential in the role of co-manager. The main
conclusion was the valorization of the attributions of this professional when generating
innovation providing strategic advantage.
KEYWORDS: Innovation; Knowledge; Executive Secretary.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
464
1. INTRODUÇÃO
A inovação passou a ser um elemento diferenciador para a organização, a
qual varia dependendo da forma que é aplicada, pois não basta desenvolver os
trabalhos de modo eficiente e com qualidade, é preciso que as metodologias sejam
aperfeiçoas e renovadas com características diferentes em comparação as utilizadas.
A concepção dessa terminologia é diversificada a depender de cada estratégia
organizacional. Assim, ela é considerada uma alternativa para propiciar modificações
nas organizações, seja com o intuito de corresponder e responder às mudanças
internas e externas, ou como ação prévia aos concorrentes do segmento empresarial.
(DAMANPOUR, 1991).
Entretanto, ao abordar este tema deve-se contextualizar inicialmente a
informação e o conhecimento, pois, para Miranda (2008) a gestão da informação e do
conhecimento são diferentes em sua essência, mas pertencem à mesma família da
gestão de dados. Assim, pode-se afirmar que a inovação faz parte deste contexto
organizacional, sendo um conhecimento, que por sua vez é poder, significando moeda
de valor para o alcance dos resultados organizacionais.
Neste panorama, concebe-se que o capital intelectual é o envolvimento dos
profissionais na organização. A partir deste entendimento evidencia-se a participação
e atuação do secretário executivo no processo de inovacao ao estar no nível tático e
em constante compartilhamento com o nível estratégico. Diante disso, promove-se a
oportunidade para profissional apresentar seu diferencial ao saber gerenciar e
tranformar a informacão em conhecimento. Deduzindo-se ser um colaborador
indispensável à organização por promover vantagem estratégica no mercado. E
segundo Robbins (2005, p, 112) “A maioria das pessoas possui um potencial criativo
que pode ser usado quando elas se confrontam com a necessidade de solucionar um
problema”. Nesta perspectiva, observa-se que para ocorrer a inovação torna-se
necessário o diferencial das pessoas.
Por outro lado, compreende-se a sedimentação do secretário executivo como
um cogestor das ações e estratégias que balizarão à tomada de decisão, sendo
evidenciada sua experiência, pois ele “detém os conhecimentos mais valiosos sobre
como atingir melhores resultados, como diagnosticar problemas e otimizar processos
internos [...].” (SAITO, 2012).
Por isso, a gestão da informação torna-se um elemento importante neste
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
465
contexto, principalmente aos recursos e seu custo de fazer negócios. Todavia, a
concepção que a tecnologia e os sistemas de informação podem sofrer uma
administração e uma aplicação errada de forma a produzirem tanto o fracasso
tecnológico como o da empresa, cabe destacar que são situações essenciais para os
gestores
buscarem
estratégias
catalizadoras para
solucionar
determinados
problemas, e ganhar com seus resultados. Diante disso, ressalta-se sua contribuição
para o sucesso e a eficácia no nível de execução bem como para a produtividade do
indivíduo.
Porém, as organizações precisam fornecer meios para o secretário
proporcionar a vantagem competitiva, transformando dados em informações e
transformá-los em conhecimento, por meio de uma reflexão e análise aprofundada
das respectivas informações, de tal forma que possa organizá-las.
O entendimento de que a gestão do conhecimento contribui fundamentalmente
com serviços eficientes, produtivos, aprimorando-os continuamente para a sociedade
é geral. Diante dessa visão compreende-se que o secretário executivo é o principal
colaborador para converter as informações em conhecimento produtivo, favorecendo
e aprimorando os processos. De acordo com Beal (2004, p.125), qualquer
organização, seja terceiro setor, pública e ou privada, têm condições plenas de
alcançar essa eficácia e eficiência com “(...) projetos multidisciplinares, encontros
virtuais e presenciais, grupos de pesquisa, comunidade prática, mapeamento de
competências e habilidades etc.”
Nessa perspectiva, a empresa deverá determinar objetivos claros e metas
delineadas buscando o alcance dos resultados organizacionais, partindo-se do
princípio de que as diretrizes devem estar bem definidas e as estratégias bem
desenhadas. Essas estratégias bem estruturadas dificultam qualquer reprodução.
Sendo assim, se os recursos são os conhecimentos presentes nos indivíduos se
tornam muito mais estratégicos e valiosos.
Apropriando-se da ideia de Goulart, pode-se inferir que existem secretários
executivos
disponibilizando
conhecimento
tácito,
mapeando
conhecimentos,
identificando-os, categorizando em quais níveis se encontram e como podem ser
utilizados. Com isso, pode-se afirmar sua colaboração com o tratamento dado pelo
pessoal do sistema de informação. Essa etapa exploratória, de análise e pesquisa é
essencial, pois, torna-se necessário método que oriente como fazer uso desse recurso
estratégico de forma efetiva. “As estratégias dependem, para sua realização eficaz,
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
466
desse grupo de conhecimentos e capacidades que a empresa deve ter ou desenvolver
para transformar objetivos estratégicos em ações.” (2008, p.25)
Nessa perspectiva é relevante analisar a atuação do profissional sob a óptica
da inovação a guisa da gestão do conhecimento, por estar diretamente direcionada à
administração das atividades dos profissionais com vistas a garantir a eficiência e
eficácia dos elementos disponibilizados pela organização. Além disso, compreender as
vantagens que a propicia aos profissionais em sua área de atuação, possíveis
benefícios, entre outros aspectos. Diante disso, os dois objetivos específicos que
norteiam esta
pesquisa:
a)
contextualizar
historicamente
a gestão
do
conhecimento com vistas à inovação b) identificar as vantagens da inovação
para o desenvolvimento dos profissionais.
Assim, motivada pela proposta de ministrar o Mini Curso – "O profissional e
sua atuação sob a óptica da inovação", no VIII Encontro Nacional Acadêmico de
Secretariado Executivo (ENASEC), compreende-se que esta pesquisa se justifica por
alguns motivos. Primeiro, porque auxilia o entendimento sobre a importância e o
contexto do referido tema para os acadêmicos, profissionais e docentes. Segundo,
porque contribui com a discussão do referido assunto, considerado como elemento
propulsor para destacar o diferencial profissional. Por fim, se justifica por trazer à
reflexão aspectos sobre a pesquisa na área de secretariado executivo, contribuindo
para a discussão da temática do ENASEC, sobre o “DNA do Secretariado:
competências, inovação e gestão”.
Este artigo se subdivide em mais quatro seções, além desta introdução. Na
segunda seção são apresentados conceitos sobre a gestão do conhecimento e
informação contextualizando a inovação, bem como suas vantagens. Na seção três
são abordados os procedimentos metodológicos adotados. Na quarta seção
apresentam-se os resultados e a discussão que são tratados na mesma ordem dos
objetivos específicos. Por fim, a quinta e última seção apresenta as considerações
finais, indicando as sugestões para continuidade da pesquisa.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Contextualizações da gestão do conhecimento – inovação
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
467
Contextualizar a inovação não é uma das tarefas mais fáceis, pois, é
bastante variada ao considerar sua aplicação. Desta forma compreende-se ser um
elemento propiciador do aumento do faturamento, disponibiliza novos negócios e
mercados, estende as margens de lucro, entre outros. Dentre as várias inovações,
cabe destacar as relativas aos produtos, processos, novos modelos de negócios,
métodos organizacionais. A inovação tratada neste artigo é aquela que causa impacto
significativo na organização, tais como: receita da empresa, participação de
mercado, imagem institucional, pois normalmente, só o aperfeiçoamento contínuo
não cria vantagens competitivas de médio e longo prazo. Na realidade só assegura
a competitividade em relação ao custo.
Conforme Guimarães (2011, p.462) o novo panorama que apresenta
conhecimento e inovação como "(...) fatores centrais para o crescimento e o
desenvolvimento econômico sustentáveis, desta forma pode-se inferir que a
sociedade precisa da parceria de toda sociedade produtiva, ensino e tecnologia". Já
STAUB (2001), apresenta que a atual economia funciona com a geração e
incorporação de inovações, observando que o conhecimento tecnológico poderá
preparar a empresa para competir com a buscar permanente de inovações podendo
recriar as condições para se mantiver competitiva ao longo do tempo demonstrando,
que a competitividade é dinâmica. Assim, requer a manutenção de investimento em
desenvolvimento tecnológico. Acrescenta ainda, que a empresa é o seu agente
introdutório, pois “lança novos produtos no mercado e utiliza novos processos de
produção ou novos processos organizacionais, porém o desenvolvimento tecnológico
não é fruto da ação individualizada das empresas” (p.1).
A inovação e o desenvolvimento tecnológico são produtos da coletividade. Com
a interação demonstrada por STAUB (2001) permite-se inferir sobre o papel do
profissional neste coletivo que produz o desenvolvimento tecnológico. Além disso,
compreende-se inovar como um elemento imprescindível de competição entre setores
da sociedade, pois, atualmente ter conhecimento tecnológico é possuir passaporte
não só para manutenção, mais para a dominação econômica e política. Quadro e Vilha
(2007) citam que cada gestor tem sua necessidade e demanda com isso a inovação
depende de vários fatores. Significa dizer que cada profissional atua conforme sua
visão de negócio e processo.
Cabe destacar que existem vários tipos de inovação que não serão
aprofundadas nesta pesquisa, mais serão objeto de estudo em futuras pesquisas
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
468
realizadas nesta área, por esta pesquisadora. Os tipos são os mais variados, de
produto, de processo, modelo de negócios, organizacional, entre outras. Portanto, é
importante frisar que perpassa em vários segmentos da organização, desde a
concepção até a produção, conforme demonstrado no quadro abaixo.
Quadro demonstrativo 1 – Tipos e Concepções de Inovações
Tipo
Concepção
Envolve mudanças significativas nas
potencialidades de produtos e serviços.
Produto
Incluem- se bens e serviços totalmente
novos e aperfeiçoamentos importantes
para produtos existentes.
Representa mudanças significativas
Processo
nos métodos de produção e de
distribuição
Refere-se à implementação de novos
métodos organizacionais, tais como
Organizacional mudanças em práticas de negócios, na
organização do local de trabalho ou
nas relações externas da empresa.
Envolve a implementação de novos
métodos de marketing, incluindo
mudanças no design do produto e na
Marketing
embalagem, na promoção do produto
e sua colocação e em métodos de
estabelecimento de preços de bens e de
serviços.
Secretário Executivo
Colabora na visão que o
mercado exige dos bens
e serviços.
Relaciona as mudanças
necessárias nos métodos
utilizados pela empresa.
Facilita com a
sensibilização dos
setores da importância
de implementação dos
métodos organizacionais.
Colabora na
implementação dos novos
métodos de marketing.
Fonte: Nanica (2015) adaptado do Manual de Oslo (2005).
Conforme as concepções apresentadas, esta pesquisa compreende como
objeto de estudo a inovação como apresentada na introdução, pois não pretende
comparar ou discutir todas as concepções, mas somente relaciona-las com o papel
do secretário executivo nesta referida seção.
Ao pesquisar estudos sobre a relação entre produção do conhecimento e
inovação observam-se evidências que, para aplicar o conhecimento científico, não
basta à disponibilização do conhecimento explícito, pois ele deve ser acompanhado
da prática, o que, demanda ajustes e soluções complexas de ser implantadas, além
da imprevisibilidade. Por essa razão, em sua maioria a organização precisa apoiar e
comprar a ideia, não apenas no aspecto financeiro, mas também nos acordos,
convênios, integração, parcerias formais e não formais capazes de promover a
interação entre os envolvidos no respectivo processo.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
469
2.2 Vantagens da inovação para o profissional
As vantagens da inovação para o profissional de secretariado na sua área de
atuação tem sido motivo de pesquisa por sua relação direta com o nível estratégico
da organização. É importante ressaltar que Silva e Miranda (2013, p.45) afirmam que
o profissional "[...] não assume posição de comando para simplesmente exercitar a
função de ‘dar ordens’ que devem ser obedecidas a qualquer custo. Ele precisa
pensar no equilíbrio do ambiente organizacional bem como acompanhar e buscar a
harmonia dos seus colaboradores". Neste sentido, o papel do secretário executivo
vai além, com direcionamento e procurando os meios adequados para alcançar os
objetivos organizacionais.
No Quadro 2 – adaptado do artigo de Silva e Miranda (2013), pode-se observar
que o secretariado colabora diretamente com os objetivos da organização, no
direcionamento, nas mudanças tanto internas como externas, de tal forma que
impacta nas ações estratégicas. Por outro lado, esse compartilhamento de
informações carrega consigo alterações e transformações que podem resultar em
inovação que promoverá uma guinada positiva, na imagem da empresa bem como em
ganhos financeiros.
Desta forma, elevará o patamar da empresa com obtenção de credibilidade e
lucros extraordinários. Assim sendo, a inovação gerada por esse profissional o
beneficiará indiretamente, ao proporcionar-lhe identidade própria, o tornando
referência pelo reconhecimento no âmbito do quadro de pessoal dos expertises da
organizacional.
Quadro Demonstrativo 2 – Função Estratégica do Profissional de Secretariado Executivo
Função
Profissional de Secretariado Executivo
Colabora com os objetivos da Auxilia no suporte à tomada de decisão estratégica e
organização
tática da organização
Promove a integração dos diversos agentes internos e
externos à organização, por meio da intermediação de
Confere Senso de Unidade
informações.
Utiliza sua capacidade de influência, em seu nível de
Propicia direção
atuação para indicar possibilidades de atuação e de ação.
Promove a partilha de conhecimentos sobre alterações e
Facilita as mudanças Internas transformações na organização, atuando como fonte de
e Externas
disseminação de informações que promovem a
transformação organizacional.
Fonte: Silva e Miranda (2013) adaptado de Goulart (2008).
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
470
No Quadro 3 – Pode-se observar a importância do papel do profissional de
Secretariado Executivo diante dos recursos tecnológicos da gestão do conhecimento
e informação ao contribuir com o compartilhamento de informações e torna-se gerador
de mudanças no contexto prático e teórico do conhecimento.
Quadro Demonstrativo 3 – Bancos de Dados e Bases de Conhecimento X Papel do Profissional
de Secretaria do Executivo
Recurso
Conceito
Coleção de registros e arquivos
logicamente relacionados. Um banco
de dados incorpora muitos registros
Bancos
de
anteriormente
armazenados em
dados
arquivos separados para que uma
fonte comum de registros de dados
sirva muitas aplicações.
Guardam conhecimento em uma
Bases
de multiplicidade de formas como fatos,
conhecimento regras e inferência sobre vários
assuntos.
Papel do Profissional de
Secretariado Executivo
Agrega valor com informações
valiosas que estejam encobertas
pela falta de padronização de
termos,
pelo
nível
de
detalhamento inadequado ou por
outras
deficiências
na
apresentação.
Partilha e atua como catalizador
na
transformação
do
conhecimento tácito em explicito
e vice-versa.
Fonte: Silva e Miranda (2013) adaptado de Beal (2004).
Diversos são os fatores que determinam o sucesso ou fracasso de uma
organização, com isso, pode-se inferir que um dos fracassos é não saber utilizar o
capital intelectual para disseminar, compartilhar e promover conhecimentos. Quando
se trata de inovação, Silva (2013) aponta que a atuação do profissional tem impacto
pelas mudanças e transformações mercadológicas, demonstrando ser um fator de
vantagem e incentivo para o profissional desenvolver novas competências.
Complementando, Silva (2013) comenta que a forma de aplicação dos conhecimentos
fará o diferencial para maximizar os resultados, e consequentemente a empresa tende
a obter ganhos financeiros, econômicos e possivelmente sociais. Assim, considerando
a respectiva concepção infere- se que a gestão do conhecimento sob a óptica da
inovação deve ser compreendida para que o profissional consiga conhecer as
melhores práticas e instrumentos eficazes para desenvolvê-la com resultados plenos.
Outro aspecto abordado por Staub (2001) é de que a detenção de
conhecimento científico é condição necessária, mas não suficiente para inovação.
Diante dessa colocação pode-se compreender que não é implantada somente pelo
aspecto científico. No que tange os custos, Moreno (S/D) observa que a empresa
precisa saber implementar, comercializar conhecimento e inovar para obter o
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
471
reconhecimento como fornecedora de excelentes produtos e processos. Considera
ainda, que é fundamental para as organizações se mantiverem competitivas. Neste
pensamento sinaliza-se que realmente contribui para o aumento nos rendimentos,
credibilidade e permanência da empresa no mercado.
Já Quadros e Vilha (2007), apontam que o gerenciamento desse processo deve
contemplar a mobilização e integração das áreas internas da empresa com as áreas
externas. Nesses casos, o grupo menor é menos eficiente. Assim, a eficiência maior
ou menor de um grupo depende se a análise é sobre a sua organização ou sobre a
maior possibilidade de alcance do objetivo grupal.
Por fim, considerando as colocações supracitadas compreende-se que além do
aspecto científico é preciso inserir em todo esse processo as equipes de todas as
áreas da organização. Percebe-se vários aspectos que podem determinar a
manutenção e, consequentemente, o crescimento e sucesso da disseminação do
conhecimento transformando-o em inovação. Dessa maneira, salienta-se que o
sucesso depende de como
essas estratégias são gerenciadas pelas partes
envolvidas.
Finalizadas as exposições sobre o referencial teórico, a seguir na próxima
seção abordam-se os procedimentos metodológicos desta pesquisa.
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Nessa seção, são apresentados os procedimentos metodológicos adotados
para alcançar os objetivos propostos para esta pesquisa. Nela são expostos a
caracterização da pesquisa, o delineamento da pesquisa e sua sistemática.
O procedimento metodológico envolveu a pesquisa bibliográfica como fonte
teórica para o estudo buscando atender aos objetivos delineados no presente artigo.
Utilizou-se ainda, os resultados da pesquisa de Silva e Miranda (2013), sobre as
atividades do exercício da profissão de secretariado executivo.
A presente pesquisa limitou a descrever e refletir sem pretensão de generalizar
as justificativas e argumentos apresentados. Por outro lado buscou-se observar sobre
a atuação do profissional sob óptica da inovação no contexto da gestão do
conhecimento.
Optou-se
por
elaborar
um
constructo
metodológico
calcado,
predominantemente em pesquisa de caráter qualitativo. As ideias centrais que
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
472
conduzem à opção por essa forma de pesquisa são fundamentadas em autores como
GIL, (2009) para o qual o recurso qualitativo se apresenta como forma adequada para
a compreensão dos fenômenos sociais, justo porque se fundamenta na análise de
diferentes perspectivas e na reflexão do pesquisador a respeito de sua investigação
como parte do processo de produção de conhecimento, e Prodanov e Freitas (2013)
que defende não requerer a utilização de métodos e técnicas estatísticas, pois o
ambiente natural é uma fonte propicia para a coleta de dados e o pesquisador. Assim
sendo, a coleta de dados para a pesquisa ocorreu por meio da revisão bibliográfica e
no artigo de Silva e Miranda (2013).
No que tange a análise e interpretação de dados, utilizou-se análise descritiva
que, segundo Gil (2009, p. 42) “têm como objetivo primordial a descrição das
características
de
determinadas
populações
ou
fenômenos
ou,
então,
o
estabelecimento de relações entre variáveis”. Cabe ressaltar, que a análise dos
resultados se deu a guisa da literatura sobre a gestão do conhecimento pelo
secretariado.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Em relação aos resultados utilizou-se o Quadro 4 adaptado do artigo de Silva
e Miranda (2013), no qual observa-se a atuação do Secretariado Executivo no
desenvolvimento de produtos e serviços competitivos, tais como: sensibilização,
assessoria, padronização, negociação, utilização das melhores práticas. Enfim, várias
competências que facilitam a disseminação da gestão do conhecimento na
organização.
Portanto há uma visível relação entre as competências secretariais e a
utilização da transformação do conhecimento com o apoio oferecido pela organização,
que tornam a inovação uma prática recomendável na criação e gestão dos negócios
que surgem a partir de grandes ideias e muita dedicação.
Além disso, Tidd, Bessant e Pavitt (1997) apud Nanica (2015), apresentam
componentes que determinam o ambiente inovador, e de forma forma qualitativa podese inferir que são consoantes com algumas competências profissionais do secretário
executivo, tais como: visão e liderança, papéis-chaves, equipe, envolvimento,
comunicação, entre outros.
A partir do exposto, é possível afirmar que o diferencial competitivo do
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
473
profissional será oportunizado diante do ambiente propício. Resumidamente, o
profissional tem ação direta e indireta sobre os processos internos e externos de sua
organização. Exemplificando, ele pode colaborar de diversas formas, por meio
das competências adquiridas em sua formação, porém em determinadas situações
pode apenas opinar. De qualquer forma, ele pode colaborar no estímulo e
sensibilização dos demais colegas a aceitarem o uso das novas metodologias e
processos de trabalho com vistas à inovação. Nesse ponto, demonstra-se a grande
contribuição do presente estudo, qual seja apresentar as organizações, mercado de
trabalho e ao secretário executivo formas de conceber e mantiver uma empresa mais
inovadora.
Contudo, devem ser considerados todos os aspectos anteriormente descritos,
para garantir que o sucesso seja alcançado, no atual mercado em que a velocidade
das mudanças define os rumos da economia e do mercado.
Quadro Demonstrativo 4 - Fatores importantes no desenvolvimento de produtos e serviços
competitivos e atuação do profissional de secretariado executivo
Fatores de Sucesso
Envolvimento do usuário
Apoio à administração
executiva
Clara declaração de
requisitos
Planejamento adequado
Expectativa realista
Atuação do Profissional de
Secretariado Executivo
Ausência de entrada de Sensibilizar e envolver os usuários no
usuários
processo.
Fatores de Fracasso
Assessorar e apoiar o nível
estratégico e tático
Padronizar os procedimentos
Requisitos e
relativos à criação e encaminhamento
especificações
de documentos Colaborar no plano
incompletas
de desenvolvimento do projeto
Colaborar na negociação de
Alteração dos requisitos
mudanças de requisitos seguindo as
e especificações
etapas necessárias
Estimular o uso eficiente e eficaz da
Incompetência
Tecnologia Utilizar as melhores
Tecnológica
práticas e realizar Workshops
Falta de apoio executivo
Fonte: Silva e Miranda (2013, p.) adaptado de Leal (2006) e Beal (2004).
De acordo com o exposto, é possível retratar que a inovação por meio da
gestão do conhecimento e da informação contribui para que mudanças e impactos na
área sejam percebidos, tanto para a pesquisa, quanto para a categoria profissional e
para a sociedade como um todo.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
474
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Cabe enfatizar que se obteve os resultados esperados com os objetivos
delineados e a pesquisa, além de apresentar as contribuições do estudo para o
secretariado. O objetivo central que norteou esta pesquisa foi analisar a atuação do
profissional sob a óptica da inovação a guisa da gestão do conhecimento.
Em relação ao objetivo principal, pode-se perceber o alcance com a análise
realizada por meio do primeiro objetivo específico ao contextualizar a gestão
do conhecimento com vistas à inovação, ao apresentar que a inovação é um
elemento diferenciador e promove mudanças efetivas na organização com aumento
de lucros, posição no mercado, entre outros. Quanto ao segundo objetivo específico
cabe citar que foi possível identificar as vantagens para o desenvolvimento dos
profissionais.
Considerando os trabalhos realizados por esta pesquisadora e outros
pesquisadores sobre a gestão do conhecimento, bem como a literatura específica da
área, pode-se inferir que esses puderam ser amplamente relacionados com a gestão
do conhecimento e informação uma vez que a mesma pressupõe que esta intimamente
ligada à respectiva área.
Ademais, cabe destacar a importância deste assunto para as pesquisas futuras,
pois propoe-se a continuidade devendo-se fazer uma mensuração sobre o quantitativo
de profissionais promovidos e quais as vantanges que tiveram ao lançar inovações
em suas empresas.
Compreende-se que o assunto não se esgota e considera-se que gerenciar
a informacão tranformado-a em conhecimento modifica consideravelmente o papel do
profissional em uma organização. Além disso, observa-se a afirmação de Silva e
Miranda (2013), sobre o aumento das atribuições desse profissional com a gestão do
conhecimento.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
475
REFERÊNCIAS
BEAL, Adriana. Gestão Estratégica da Informação. Como Transformar a informação
e a Tecnologia da Informação em Fatores de Crescimento e de Alto Desempenho nas
Organizações. São Paulo. Atlas, 2004.
DAMANPOUR, Fariborz. Organizational innovation: a meta-analysis of effects of
determinants and moderators. Academy of Management Journal, v. 34, n. 3, p. 555590, 1991.
GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2009.
GUIMARÃES, Sonia K. GUIMARÃES, Sonia K. Produção do Conhecimento Científico
e Inovação: desafios do novo padrão de desenvolvimento. Caderno CRH, Vol. 24. N.
63.
Salvador.
Set/Dez.
2011.
ISSN
0103-4979.
Disponível
em
<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S01039792011000300001&script=sci_arttext&tlng=es, acesso em> 17 de abril de 2016.
MORENO, Aparecido de Paula. Inovações nas Organizações Empresariais.IETEC.
Instituto de Educação Tecnológica. TecHoje, uma revista de opinião. Belo Horizonte.
Disponível
em
<http://www.techoje.com.br/site/techoje/categoria/detalhe_artigo/428.Acesso em>17
de abril de 2016.
NONAKA, Ikujiro. TAKEUCHI, Hirotaka. Criação do Conhecimento na empresa: como
as empresas japonesas geram a dinâmica da inovação. 12. ed. Rio de Janeiro:
Elsevier, 1997.
PROBST, Gilber; RAUB, Steffen.; ROMHARDT, Kai. Gestão do Conhecimento: os
elementos construtivos do sucesso. Porto Alegre. Bookman. 2002.
PRODANOV, C. C.; FREITAS, E. C. Metodologia do trabalho científico: métodos e
técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico. 2 ed. Novo Hamburgo: Feevale, 2013.
NANICA, Carlos Rossano. Sistemática para aprimorar ambientes organizacionais
direcionados a inovações. 2015. 164 f. Dissertação (Mestrado em Design) Programa
de Pós-Graduação em Design, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto
Alegre. 2015. Disponível em: >file:///E:/Sistem%C3%A1tica-para-aprimorarambientes-organizacionais-direcionados-a-inova%C3%A7%C3%B5es%20(2).pdf.
Acesso em> 16 de abril de 2016.
QUADROS, Ruy; VILHA, Ana Patrícia Morais. Tecnologia de informação no
gerenciamento do processo de inovação. Revista 05.2007. Disponível em
<http://www.extecamp.unicamp.br/gestaodainovacao/biblioteca/tecnologias_de_info
rmacao.pdf. Acesso em> 16 de abril de 2016.
ROBBINS, Stephen P. Comportamento organizacional. São Paulo: Peason Prentice
Hall, 2005.
SAITO, A. Importância da gestão do conhecimento. VocêRH, 24 fev. 2012. Disponível
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
476
em:
<http://revistavocerh.abril.com.br/materia/a-importancia-da-gestao-doconhecimento> Acesso em: 6 jun. 2013.
SILVA, Ana Cristina Brandão Ribeiro. Atuação do Secretariado Executivo na Gestão
da Informação e do Conhecimento.p. 141-147. D`ELIA, Bete, AMORIM, Magali, SITA,
Maurício. Excelência no Secretariado: a importância da profissão os processos
decisórios. São Paulo: Ser mais, 2013.
SILVA, Ana Cristina Brandão Ribeiro; MIRANDA, Roberto Campos da Rocha. Gestão
da Informação e do Conhecimento e a Atuação do Secretariado Executivo. In: Anais
do III Encontro Nacional Acadêmico de Secretariado Executivo e IV Encontro de
Secretariado Executivo da Paraíba. UFPB. 42-52. Editora Ideia. ISSN: 2179-1457.
Disponivel em [CD-ROOM].
STAUB, Eugêneo. Desafios estratégicos em ciência, tecnologia e inovação.
Parcerias
Estratégicas.
Vol.
6,
N.13
(2001).
Disponível
em
<http://seer.cgee.org.br/index.php/parcerias_estrategicas/article/viewArticle/205,
acesso em> 17 de abril de 2016.
Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p. 66948-66961, jul. 2021 ISSN: 2525-8761.
477
CAPÍTULO 26
CIDADES SITIADAS: REPRESENTAÇÕES DO MEDO DA MORTE E DAS
ENFERMIDADES NA PANDEMIA DO COVID-19 E NAS CHARGES DO FINAL DO
SÉCULO XIX NO BRASIL
Élcia de Torres Bandeira
Mestra
UFRPE
Endereço: Rua Amaro Coutinho, 392, Rosarinho, Recife - Pernambuco, Brasil
E-mail: elciabandeira@gmail.com
RESUMO: As epidemias assolaram o Brasil em diversos períodos da história como o
final do século XIX e repercutiram largamente na Revista Ilustrada, coordenada pelo
chargista ítalo-brasileiro Ângelo Agostini. O medo das enfermidades e da morte nos
acompanha ao longo da história e gera práticas e representações associadas ao
contexto histórico da época. Hoje, a pandemia do covid-19 ceifa milhares de vida no
Brasil e no mundo, e a forma como nos apropriamos da trágica realidade nos leva a
produzir representações que resvalam, em muitos casos, para o negacionismo
científico e contribuem para que muitas vidas ainda sejam perdidas pelos discursos e
práticas esvaziados de fundamentação científica. Sitiadas, as cidades enfrentam o
microscópico inimigo com distanciamento social e medidas sanitárias de higiene
básica, enquanto a vacinação não consegue imunizar a maioria da população
brasileira. O amor e a empatia tornam-se lenimentos no vazio deixado pela ausência
de vacinas suficientes ou remédio específico contra o coronavírus até o presente
momento, em 20 de março de 2021. Janelas antes fechadas são abertas para
propiciar a visão do outro. Destacaremos neste artigo a relação entre sentimentos e
suas expressões representativas relativas ao medo da morte e das enfermidades nas
linguagens escrita e iconográfica e procuraremos articulá-los aos fatos históricos que
serviram de palco para a sua construção. Analisar as práticas e representações
associadas à saúde pública e desenvolver um estudo comparativo entre as epidemias
do final do século XIX e a pandemia do covid-19 torna-se relevante para encontrarmos
soluções realistas que nos conduzam com segurança para a liberdade, a saúde e o
usufruto da vida em comunidade.
PALAVRAS-CHAVE: Covid-19; Charges; Representações.
478
1. INTRODUÇÃO
A tecitura da História remete-nos às balizas que sempre nortearam a sua
escrita: o tempo e o espaço. Sem o contexto em que os fatos históricos ocorrem, sua
significação perde-se no emaranhado das possibilidades infinitas da transição entre
passado e presente, sem acrescentar sua contribuição efetiva para a compreensão
do mundo em que vivemos. É necessário sempre situar as práticas e representações
no tempo histórico e no espaço geográfico em que foram erigidas. Chartier nos aponta
a necessidade de considerar as apropriações que fazemos da realidade e como elas
estabelecem elos entre as práticas e as representações que construímos a partir delas
ao elaborarmos nossos discursos. Sobre a definição de História Cultural ele afirma:
Por um lado, é preciso pensá-la como a análise do trabalho de representação,
isto é, das classificações e das exclusões que constituem, na sua diferença
radical, as configurações sociais e conceptuais próprias de um tempo ou de
um espaço. (CHARTIER, 2002, p. 27)
A elaboração discursiva está sempre permeada de simbolismos. Nossos
medos, anseios, sonhos, desejos, expectativas de vida expressamos em diversas
linguagens que interagem com o cotidiano e se revestem de códigos de acesso que
se conectam entre si. A subjetividade cria interpretações próprias que revelam os
espelhos com que refletimos nós mesmos e o mundo que nos rodeia. Destacaremos
neste artigo a relação entre sentimentos e suas expressões representativas relativas
ao medo da morte e das enfermidades nas linguagens escrita e iconográfica e
procuraremos articulá-los aos fatos históricos que serviram de palco para a sua
construção.
Considerando as balizas do medievo europeu Jacques Le Goff apresenta a
cidade:
A cidade da Idade Média é um espaço fechado. A muralha a define. (...) Lugar
de cobiça, a cidade aspira à segurança. (...) Mas os doentes, como os
leprosos que não podem mais trabalhar, causam medo, e essas estruturas
de abrigo não demoram a tornar-se estruturas de aprisionamento, de
exclusão. (LE GOFF, 1988, p. 71)
As muralhas foram erguidas no medievo europeu em busca de proteção.
Período marcado por guerras, especialmente pelas invasões bárbaras, elas pareciam
constituir refúgios contra o perigo ameaçador que atingia a Europa Ocidental. Contudo
elas não estenderam esta proteção a todos os habitantes nem de forma igualitária. A
exclusão social demarca suas fronteiras e elas refletem as desigualdades que também
479
atingem as esferas entre a doença e a saúde, entre a vida e a morte. As cidadelas
eram erigidas com fossos, muralhas e paredes espessas para assegurarem que a
população em seu interior estaria mais resguardada dos perigos externos que as
ameaçavam. Mas as doenças geravam o medo do desconhecido que poderia
encaminhar para a morte e promoviam a exclusão social dos enfermos. A doença
dentro da cidadela poderia significar a morte de muitas pessoas intramuros e
extramuros.
Em 2020, vimos as fronteiras serem fechadas diante de uma outra ameaça: a
pandemia do novo coronavírus, também chamadaCovid-19, que se alastrou pelo
mundo, tomando como ponto de partida a China continental no final doano de 2019.A
grande muralha da China foi ineficaz para conter o inimigo. A rapidez com que o vírus
se propagou continua assombrando a população mundial e nos leva a buscar formas
alternativas de convívio social, especialmente nas cidades, onde residem milhares de
pessoas em espaços compactados pela demanda social. Se de um lado a busca por
segurança em condomínios fechados demarca a ocupação do espaço urbano no
século XXI, esta segurança torna-se frágil diante do inimigo invisível, microscópico,
que não poupa ricos nem pobres e invade áreas públicas e privadas ceifando milhares
de vidas.
Diante do perigo ainda pouco conhecido, a Organização Mundial de Saúde e
os profissionais de saúde clamam pelo distanciamento social como forma de conter o
avanço inexorável da pandemia. Esta tem sido a medida mais defendida de contenção
da enfermidade associada a medidas profiláticas como a higiene básica, como a
lavagem das mãos, e a utilização de máscaras. Máscaras antes utilizadas
formalmente nos meios de pesquisa e atendimento na área de saúde, ou
simbolicamente associada aos festejos carnavalescos ou ainda à necessidade do
anonimato para os agentes de segurança ou marginais, agora ganham as ruas nas
cidades como imposição dos poderes públicos estaduais e municipais e dos
profissionais de saúde no Brasil que lutam para combater o vírus e suas trágicas
consequências para a população. Governos estaduais e municipais têm tomado várias
medidas restritivas para a circulação populacional, visando à redução da propagação
da enfermidade que atinge índices alarmantes em 2021, durante a segunda onda
pandêmica no Brasil. Também chamado “lockdown”, o fechamento do comércio,
geralmente excetuando os serviços essenciais tais como farmácias, supermercados
e bancos, passa a ser imposto por governos estaduais e municipais em alguns
480
municípios por alguns períodos durante a pandemia, que incluiu ainda o uso
obrigatório de máscaras em espaços públicos dentre outras medidas restritivas como
o rodízio de veículos e a proibição de acesso a espaços públicos como bares, praias,
parques e restaurantes, enquanto o negacionismo científico do governo federal, que
deveria coordenar as ações de combate à pandemia no Brasil, leva ao avanço do mal
que continua a ceifar milhares de vidas em todo o mundo.
Somamos no dia 10 de março de 2021, no Brasil, 270.917mortos por Covid-19
e, em 24h, 2.349 óbitos pela doença, com um total de 11.205.972 casos confirmados
desde o início da pandemia no país, informações divulgadas pelo Consórcio de
Veículos de Imprensa através do Jornal Nacional da Rede Globo de televisão.
Números estes apenas indicativos da alta letalidade da infecção respiratória, sendo
apenas indicativos subnotificados, uma vez que a reduzida disponibilidade de testes
para a Covid-19 levou a sua aplicação apenas em doentes em estado grave,
profissionais de saúde e de segurançano início da pandemia, não se tendo como
avaliar a real gravidade do problema. A maioria da população continua sem o acesso
ao diagnóstico e, muitas vezes, sem acesso a um atendimento no serviço de saúde,
que em vários estados brasileiros já entrou em colapso, sem condições de oferecer
leitos, especialmente de UTI com respiradores, indispensáveis para salvar vidas no
caso de agravamento da doença e, em alguns municípios, sem oxigênio suficiente
para atender à demanda social, como aconteceu em Manaus e no interior de
Pernambuco. Muitos enfermos convalescem ou vêm a óbito em suas próprias
residências.
Embora a maioria dos infectados consiga se restabelecer, não podemos
descurar o assustador número de infectados e de óbitos por Covid-19 já alcançado no
Brasil, que atingiu o record de 2.798 no número de mortos em 24h e um total de
282.400 óbitos desde o início da pandemia até o dia 16 de Março de 2021.O Brasil
superou os Estados Unidos da América e tornou-se o epicentro da pandemia,
especialmente após a descoberta de nova variante do vírus em Manaus, considerada
mais contagiosa que a maioria das mutações genéticas do vírus até agora
identificadas, assemelhando-se às cepas do Reino Unido, da África do Sul e da Índia.
É imprescindível observar como a enfermidade tem transformado a vida de
milhares de pessoas. Imagens de cidades quase desertas como Paris, Madrid, Roma,
a cidade do Vaticano, Nova Iorque dentre tantas outras grandes capitais parecem vir
do imaginário ou de simples manipulação digital em computador, quando em tempos
481
normais vivem aglomeradas de pessoas circulando com os mais diversos objetivos. A
cidade se ressignificou.
Por outro lado, ao contrário do que se tem dito a respeito do “fragmentário”
da cidade, penso que isso que se toma como fragmentário, em uma certa
formação discursiva que dispõe sentidos sobre a cidade, é, na realidade,
olhar, interpretação do mundo, da cidade em movimento: o sentido,
repetimos, é também a janela de que se olha. E aí temos tanto o virtual como
o real. (ORLANDI, 2004, p. 29)
O movimento do olhar recria novas percepções da cidade sitiada e imobilizada;
o reduzido movimento de pedestres e de veículos se associa à frenética rede de
circulação invisível da cidade que se opera no plano virtual-real, mediada pela internet,
pelos smartphones, pelo computador, em uma agilidade impressionante na permuta
de vivências. Os sentidos da cidade estão em trânsito. Possibilidades remotas
ocupam cada vez mais o tempo e o espaço dos fragmentos reais de vida nas cidades
aterrorizadas pela pandemia.
A solidão, com a reclusão forçada nos espaços domésticos, aumentou a
depressão e gerou a necessidade de tratar deste problema com a aproximação digital.
A tecnologia vence distâncias e aproxima indivíduos e grupos fazendo emergir a
solidariedade como novo elo e um dos pilares em que a população se apoia em busca
de sustentação.
Parece-me que hoje, diante da ascensão da miséria que os poderes públicos
não conseguem conter, aparece um revigoramento da solidariedade. (DUBY,
1998, p. 36)
A solidariedade aparece como elemento constitutivo de uma nova prática social
e está associada à sobrevivência coletiva em tempos de pandemia doCovid-19. A
morte parece-nos excessivamente próxima para nos colocar diante do dilema:
enfrentá-la, buscando soluções alternativas como ações comunitárias afirmativas de
socorro e sustentação para os enfermos isolados em suas residências, ou para os
desempregados e componentes da categoria social constituída pelos autônomos que
perderam a única fonte de renda que possuíam com os decretos estaduais e
municipais de isolamento social-seja na forma de auxilio alimentar ou de
equipamentos de proteção individual como máscaras e material de limpeza para
garantir a contenção da velocidade
aterradora com que se propaga o vírus,
especialmente nos chamados grupos de risco que englobam a faixa etária dos que
estão com ou acima dos 60 anos de idade, os que têm comorbidades como
hipertensos graves, diabéticos, imunossuprimidos, cardiopatas e pessoas com
482
prévias doenças respiratórias, ou se acomodar diante da sorte de não ser infectado e
deixar a morte seguir seu curso sem nada fazer para tentar detê-la, sem se importar
com a vida alheia. Hoje, os poderes públicos locais se associam à população civil
organizada em ONGs formadas por grupos de voluntários, pelo empresariado, pelas
comunidades e associações específicas locais no intuito de promoverem o bem-estar
social.
Esses sujeitos coletivos são os que perpetuam a memória histórica de
processos civilizatórios emancipadores, que constroem a indignação diante
da reatualização de problemas antigos e da reconfiguração das misérias
humanas e que sonham com a possibilidade de contribuir para a produção
de uma sociedade mais justa e feliz. (SCHERER-WARREN, 1999, p.11)
O despertar da sociedade atual para a necessidade de preservação da vida
tem nos contemplado com cenas emocionantes de convívio social reinventado.
Profissionais de saúde são frequentemente aplaudidos e aplaudidas em cidades
inteiras do interior dos edifícios, das sacadas dos apartamentos, como também eles e
elas aplaudem a recuperação dos enfermos que vencem a morte e retornam à vida
familiar cotidiana, levando em sua bagagem a gratidão pela vitória conquistada e o
reconhecimento pelo esforço dos profissionais de saúde na obtenção da cura. Nos
corredores dos hospitais, alas são formadas por estes e estas profissionais da vida
que comemoram as altas médicas dos e das pacientes convalescentes que passam
recebendo aplausos e felicitações como se tivessem ressurgido para uma nova vida.
Os pacientes internados ficam impedidos de um convívio maior com familiares e
amigos e contam com Deus e com a dedicação das equipes responsáveis pelo seu
tratamento. Cria-se, então, um elo afetivo que extrapola os limites profissionais: não é
mais um número apenas que fugiu da morte; é uma vida singular que se preserva e
que desenvolve um pertencimento maior com o mundo que o rodeia. O amor e a
empatia tornam-se lenimentos no vazio deixado pela ausência de vacinas suficientes
ou remédio específico contra o coronavírus até o presente momento, em 13 de junho
de 2021.
O medo da morte é substituído pela substancialidade da vida, pela valorização
de prioridades como afetividades e convivências em situações de risco limítrofes.
Janelas antes fechadas são abertas para propiciar a visão do outro. A música aparece
então como veículo catalizador de emoções que vencem as barreiras físicas
estabelecidas pelo distanciamento social e levam felicidade de uma sacada a outra
na Itália e em outros países, rompendo o silêncio devastador e levando um alento de
483
vida, como um sopro que faz ressurgir o potencial social do ser humano. As Lives
substituem grandes eventos, evitando as aglomerações favoráveis ao contágio e
entram em nossas casas para trazer um fôlego novo com música e mensagens
construtivas de protocolos de saúde, narrativas de vivências e mortes que convivem
lado a lado no útero da sociedade.
As epidemias assolaram o Brasil em diversos períodos como o final do século
XIX e repercutiram largamente na Revista Ilustrada, coordenada pelo chargista ítalobrasileiro Ângelo Agostini, que circulou no Brasil no período de 1876 a 1898. O medo
das enfermidades e da morte nos acompanha ao longo da história e gera práticas e
representações associadas ao contexto histórico da época (Fig 1).
Hoje, a pandemia do Covid-19 ceifa milhares de vida no Brasil e no mundo, e a
forma como nos apropriamos da trágica realidade nos
leva a produzir representações que resvalam, em muitos
casos, para o negacionismo científico e contribuem para
que muitas vidas ainda sejam perdidas pelos discursos e
práticas esvaziados de fundamentação científica.
Em reportagem de Pedro Henrique Gomes, “ao
responder nesta segunda-feira (20) à pergunta de um
jornalista sobre o número de mortes por coronavírus no
país o presidente Jair Bolsonaro afirmou que não é
“coveiro” (GOMES, 2020). Fazendo referência namesma
Figura 1.AGOSTINE, Angelo.
Revista Ilustrada, 1881, p. 1 –
“Venha,
querida
epidemia!
Preparei-te a cidade o melhor
possível para que possas ter
uma esplêndida colheita de
vidas”.
reportagem à resposta dada pelo presidente Jair
Bolsonaro no dia 29 de março de 2020 à um jornalista na
frente do Palácio da Alvorada em Brasília que comentava
sobre o número de mortos no país pela pandemia do
Covid-19: no dia 29/03 após voltar de um passeio à
Brasília Bolsonaro repetiu o argumento de que “essa é uma realidade, o vírus tá aí.
Vamos ter que enfrentá-lo, mas enfrentar como homem. Não como moleque. Vamos
enfrentar o vírus com a realidade. É a vida. Todos iremos morrer um dia”.
Na Revista Ilustrada de 1878, Ângelo Agostini apresenta na Fig.2 a
representação das epidemias que ameaçavam a cidade do Rio de Janeiro, na época
capital do país, como três esqueletos armados com suas foices para ceifarem a vida
de pobres mortais: a Febre Amarela, coroada ao centro, reinando sobre a Febre
484
Tifoide e a Febre Perniciosa também coroadas. Hoje, a coroa está sobre o coronavírus
que prevalece sobre a Febre Amarela, a
Dengue, a Chikungunya e a Zica.
Na Fig.3, além dos já citados
esqueletos representativos da Febre
Amarela, da Febre Perniciosa e da Febre
Tifóide, aparece também, em uma canoa
guiada por um esqueleto que serve como
barqueiro que segue em direção à cidade
de São Sebastião do Rio de Janeiro, a Febre Biliosa que causava pânico entre
apopulação.
Figura 2 – AGOSTINI, Angelo. Revista Ilustrada, 1881, nº 238, p. 4. "S. M. a febre amarela e toda a
sua Cortejá tinham deixado a ilha para fazer a sua viagem quotidiana a cidade de S. Sebastião, pois
que nada acontece o aos seus vereadores."
Na Fig4, uma mulher cheia de pústulas com uma foice aparece ameaçando a
cidade do Rio de Janeiro representada por outra mulher bem vestida, branca e com
uma coroa na cabeça que pede socorro aos pés dos representantes da Junta de
Higiene. Um apelo lançado aos representantes da Junta responsável pelo combate às
epidemias como último recurso de uma população aterrorizada pela Varíola.Cabe
lembrar que em 1878 estávamos vivendo na forma de governo monárquica e a cidade
do Rio de Janeiro era a capital do país, por isto na sua representação como figura
feminina ela aparece coroada. É interessante ressaltar que, apesar da imensa
população afrodescendente residente na cidade, ela aparece ainda como mulher
branca. Os estigmas do racismo e do preconceito também derivado da escravidão se
faziam presentes. Só quem tinha acesso ao letramento iria ler e entender as
485
caricaturas, charges e textos publicados nos periódicos e isto levantava o velho
sistema de exclusão social mais incidente sobre os(as) pretos(as) e pardos(as). Além
da escravidão, a pobreza, a miséria e a falta de escolaridade que atingiam a grande
massa da população brasileira naqueles tempos levavam à exclusão social.
Figura 3 – AGOSTINI, Angelo. Revista Ilustrada, 1878, nº 131, p. 5. “O Governo e a Juntade Higiene
procuram salvar a cidade da cruel epidemia."
As teorias sociais aparecem com mais força no século XIX, época do
Darwinismo Social e de uma efervescente discussão científica, buscando respostas
às vezes atreladas a preconceitos, discursos e práticas discriminatórias.
Em geral, até a segunda metade do século XIX, os miasmas gozariam de
ampla aceitação de todas as ideias que atribuiriam a origem das epidemias –
febres terçãs, febre amarela, cólera, etc. Tão estranhos elementos, se
definiriam usualmente como substâncias imperceptíveis dissolvidas na
atmosfera, originadas da decomposição de cadáveres, elementos orgânicos,
ou inclusive por emanações de doentes. (ALMEIDA, 2018, p. 121-122)
As explicações médicas para o aparecimento e expansão das epidemias de
febre amarela na Corte em dois momentos diferentes – na década de 1850,
quando a doença apareceu pela primeira vez, e no início dos anos de 1870,
quando ela retornou após ausência relativamente prolongada durante os
anos 1860 – demonstram a contínua interdependência entre pensamento
médico e ideologias políticas e raciais. [...] Em outras palavras, ao lidar com
o problema da febre amarela num momento histórico particular, as
autoridades de saúde pública dos governos do Segundo Reinado, inventaram
alguns dos fundamentos essenciais do chamado “ideal de
embranquecimento” – ou seja a configuração de uma ideologia racial pautada
na expectativa de eliminação da herança africana presente na sociedade
brasileira. Tal eliminação se produziria através da vinda de imigrantes, do
incentivo à miscigenação num contexto demográfico alterado pela chegada
massiva de brancos europeus, pela inércia e também pela operação de
malconfessadas políticas específicas de saúde pública (CHALHOUB, 1996,
p.63)
É fato notório que a denúncia feita na charge de Ângelo Agostini no século XIX
na Fig 5, na qual aparecem figuras representando os ricos com suas propriedades
486
esbanjando água e outras representando os pobres, que dependiam dos chafarizes
que não atendiam à demanda da população de baixa renda para se abastecerem (Fig.
6) aponta para um problema atual: como atender aos protocolos de higiene sem água,
que se torna elemento primordial para evitar a propagação de vírus como o corona?A
ausência de políticas públicas que garantam a equidade de direitos conduz às
disparidades sociais que se agravam com o aumento demográfico e com o
enraizamento dos estigmas que herdamos como o racismo e a exclusão social.
Figura 4 – AGOSTINI, Angelo. Revista Ilustrada. 1878, nº 101, p. 4. "Ha grande falta d'agua, e no
entantoella é esperdiçada pelos ricos que a tem de sobra em detrimento dos pobres que não tem
nenhuma.”
Figura 5 – AGOSTINI, Angelo. Revista Ilustrada, 1878, nº 101, p. 4. " Actual aspecto de um chafariz.
Uma gota d'agua de 5 em 5 minutos."
Por outro lado, a deficiência de ações afirmativas do governo federal para
controlar a pandemia, seguindo os protocolos de saúde já estabelecidos pela área
científica, nos leva a ver o caos se instalando mesmo na primeira onda da pandemia
do coronavírus, como ocorreu em Manaus, no que se refere à quantidade elevada de
corpos para serem enterrados nos cemitérios já lotados. Covasforam abertas em larga
escala muito próximas umas às outras, enquanto filas de caminhões frigoríficos se
487
formavam com os corpos das vítimas da pandemia esperando sepultamento. Na Fig.
7, vê-se a imagem de um esqueleto reclamando que contraiu bexigas com outros
vizinhos enterrados ao seu lado, dada a proximidade das covas no cemitério na charge
do século XIX.
Figura 6 – AGOSTINI, Angelo. Revista Ilustrada, 1878, p. 4. “As pessoas que tiverem fallecido de
moléstias contagiosas, serão enterradas em logar especial. Esta medida, deve-se talvez às queixas
de alguns defuntos que apanharam bexigas ultimamente de alguns outros, victimas da actual
epidemia.”
No dia 18 de março de 2020, em Bérgamo na Itália, vimos um comboio de
caminhões do exército retirando centenas de corpos para serem enterrados fora da
cidade. No Rio de Janeiro, em 1878, como apresenta em sua sátira social a Revista
Ilustrada (Fig. 8), a inovação pensada para lidar com a elevada quantidade de corpos
a serem enterrados vítimas das epidemias foi propor a criação de um crematório nas
proximidades da cidade e transportá-los através de trem, chamado de carro mortuário,
até o local do enterro. Isto nos leva a recuperar a velha discussão higienista do século
XIX de construir cemitérios laicos, sem o controle das irmandades, para se evitar a
propagação de enfermidades com a prática de enterros intramuros nas igrejas e nos
seus adros. Para transportar os corpos até o local da cremação no Rio de Janeiro,
pensou-se em usar trens mortuários adequando a cidade aos padrões modernos que
prezavam então. As estradas de ferro simbolizaram a modernização do Brasil no XIX,
produto da Revolução Industrial. Devido à demanda provocada pela Covid-19 no
século XXI, caminhões frigoríficos, produto da modernização atual, aguardavam
lotados de cadáveres pelos enterros nos cemitérios abarrotados.
488
Figura 7 – AGOSTINI, Angelo. Revista Ilustrada, 1878, nº 134, p. 4. " Ahi serão assadas as pessoas
que, depois de longos soffrimentos na terra durante a vida, nada mais queremcom ella depois da
morte. E assim ficarão reduzidos a cinzas, o que é muito mais aceado, comodo e elegante.”
Figura 8 – AGOSTINI, Angelo. Revista Ilustrada, 1878, nº 134, p. 4. "Os cadaveres serão conduzidos
pela estrada de ferro do Rio do Ouro em carros mortuários. Ida e volta 10 leguas só."
Este estudo comparativo entre as representações do medo das enfermidades
e da morte na Covid-19 e nas charges de Angelo Agostini no final do século XIX
permite-nos avaliar por fragmentos vivências cotidianas em tempos de pandemia e de
epidemias que ceifaram inexoravelmente milhares de vidas e deixaram suas sequelas
físicas e psicológicas na população brasileira.
489
Aprendemos a lidar com nossos medos e a enfrentar as enfermidades e a
própria morte com um espírito maior de solidariedade, mas ainda nos defrontamos
com as barreiras impostas pela ignorância e pelo descaso com a saúde da população
que atingem ainda alguns governantes e parte da população que teima em não dar
ouvidos à ciência e à necessidade de responsabilidade e respeito na convivência
social. Muitas vidas poderiam ter sido preservadas com o respeito aos protocolos de
saúde. A demanda por políticas públicas que amparem as camadas menos
favorecidas da população com abastecimento hídrico, indispensável ao combate às
enfermidades, fornecimento de energia elétrica, produto da segunda Revolução
Industrial no século XIX, educação e saúde, que devem ser prioridades em qualquer
governo, tornam-se preocupações urgentes para que possamos trilhar o caminho do
bem-estar social juntos e juntas, garantindo assim a construção de uma sociedade
pautada pelo respeito aos direitos humanos e pela acessibilidade coletiva à felicidade.
Hoje, 19 de junho de 2021, atingimos um patamar aterrador de 500.022 óbitos
(GLOBO, 2021) desde o início da pandemia no Brasil em 2020. Já perdemos mais de
meio milhão de vidas no Brasil. A vacinação está sendo ampliada e novas vacinas
aparecem no cenário brasileiro para nos dar novo fôlego para continuarmos na luta
pela sobrevivência e pela vivência de melhores dias.
490
REFERÊNCIAS
AGOSTINI, Angelo. Revista Ilustrada. Rio de Janeiro, 1878 e 1881. Disponível em
http://www.hemerotecadigital.bn.br/acervodigital/revista-ilustrada/332747. Acesso em
12 de junho de 2021.
ALMEIDA, Argus Vasconcelos de. A epidemiologia histórico-ontológica da febre
amarela em Pernambuco. Recife: Editora Universitária da UFRPE, 2018.
CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte Imperial. São
Paulo: Companhia das Letras, 1996.
CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Tradução
de Maria Manuela Galhardo. 2ª ed. Algés, Portugal: DIFEL, 2002.
DUBY, Georges. Ano 1000, ano 2000, na pista de nossos medos. Tradução
Eugênio Michel da silva; Maria Regina Lucena Borges-Osório. Revisão do texto em
Português Ester Mambrini. São Paulo: Fundação Editora UNESP, 1998.
GOMES, Pedro Henrique. Presidente do Brasil Jair Bolsonaro em 20 de abril de 2020.
Disponível em http://www.G1.globo.com. Acesso em 25/04/2021.
LE GOFF, Jacques. Por amor às cidades: conversações com Jean Le Brun.São
Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1988.
ORLANDI, Eni P. Cidade dos sentidos. Campinas, SP: Pontes, 2004.
SCHERER-WARREN, Ilse. Cidadania sem fronteiras: ações coletivas na era da
globalização. São Paulo: HUCITEC, 1999.
GLOBO, Brasil chega à marca de 500 mil mortes por Covid. Disponível em:
https://g1.globo.com. Acesso em 19 de junho de 2021.
491
CAPÍTULO 27
CONNECTED CITIES IN SOCIAL ISOLATION: IMPACT OF THE FOURTH INDUSTRIAL
REVOLUTION FACING PANDEMIC
Fábio Luis Fernandes Azarias
Master’s Student in Urban Infrastructure Systems, PUC-Campinas, Brazil
fabio.lfa@puccampinas.edu.br
Lia Toledo Moreira Mota
Professor PhD, PUC-Campinas, Brazil lia
mota@puc-campinas.edu.br
Regina Márcia Longo
Professor PhD, PUC-Campinas, Brazil
regina.longo@puc-campinas.edu.br
ABSTRACT: The evolutionary process of the Fourth Industrial Revolution has faced
the Coronavirus Pandemic and its challenges in combating the disease. Thus, this
article aimed to reflect and indicate how disruptive technological advances allow
society to readjust and adapt. In that regard, a revision was carried out which enabled
an in-depth analysis of current references on the topic. It was observed that, even in
times of social isolation, the community made important publications on the subject. It
was also noted the emergence of new knowledge that brings new concepts and points
out challenges to be faced and transformations to be carried out. These concepts can
be used by public managers, urban planners, engineers and society as a whole to build
smart and sustainable future cities.
KEYWORDS: Hyperconnected City; Cyber Infrastructure; Pandemic.
RESUMO: O processo evolutivo da Quarta Revolução Industrial enfrentou a pandemia
do Coronavírus e seus desafios no combate à doença. Assim, este artigo teve como
objetivo refletir e indicar como avanços tecnológicos disruptivos permitem que a
sociedade se reajuste e se adapte. Nesse sentido, foi realizada uma revisão que
permitiu uma análise aprofundada das referências atuais sobre o tema. Observou-se
que, mesmo em tempos de isolamento social, a comunidade fazia publicações
importantes sobre o assunto. Percebeu-se também o surgimento de novos
conhecimentos que trazem novos conceitos e apontam desafios a serem
enfrentados e transformações a serem realizadas. Esses conceitos podem ser
usados por gestores públicos, planejadores urbanos, engenheiros e a sociedade como
um todo para construir cidades futuras inteligentes e sustentáveis.
PALAVRAS-CHAVE: Cidade Hiperconectada; Infraestrutura Cibernética; Pandemia.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 492
1. INTRODUCTION
Data communication, as used in the 21st century, was predicted by Nikola Tesla
who, according to the article “An Early History of the Internet” (KLEINROCK, 2010),
stated in 1908: “a technology will allow a businessman in New York to dictate
instructions, and have them instantly appear in type at his office in London or
elsewhere.” After 61 years of this prediction, in 1969, during the Cold War period (19471991) and in the midst of military intelligence disputes between the United States of
America (USA) and the Soviet Union (USSR), Leonard Kleinrock led the transmission
of the host-to-host data from the University of California at Los Angeles (UCLA) to
Stanford Research Institute (SRI) was regarded as the first email in history
(KLEINROCK, 2010). This event became a revolutionary milestone even though the
original word of the email typed and sent letter by letter was not fully completed.
Over time this notorious means of communication of sending electronic letters,
as well as the entire Internet, has become an extremely common reality being
accessible from a laptop or cell phone. This widespread availability of the internet is
one of the factors that indicates humanity is currently in the Fourth Industrial Revolution,
also called Industry 4.0. As a result, great and innovative transformations will take
place, creating unemployment and extinction of jobs due to a natural technological
update, what can be termed as “digital Darwinism”. With the vast use and readiness of
access to the Data Network Infrastructure placed in the palm of your hands, the entire
world went from a status “Connected” to “Hyperconnected” (BRYNJOLFSSON;
MCAFEE, 2014).
The current revolution will also be felt in every concept of living, working and
relating (EVANS, 2020; MELO, 2020) as millions of people are able to access online
data of vast human knowledge and, emblematically, are able to access the Global
Brain, an idea introduced by Peter Russell in the book “The Global Brain: The
Awakening Earth in a New Century” (1983). The Fourth Industrial Revolution is not only
based on Intelligent and Integrated Systems (SCHWAB, 2017), but it has a
comprehensive scope of advances in the microscopic sphere: from genetic
sequencing (PARK, 2010) to nanotechnology and quantum computing. It will be the
convergences and synergies of Digital Technologies (Systems) with the Physical
(Things) and Biological (Beings) spheres that will make Industry 4.0 indistinguishable,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 493
giving rise to the term Cyber- Physical System. New technologies previously
considered as miracles will become part of society's use, such as restoring sight to the
blind, wirelessly guided wheelchair through thought and 3D printing of human organs.
On the other hand, with the world population close to 7.67 billion inhabitants
(The World Bank, 2019) there is a strong impact on the organic maintenance of the
planet due to human interaction with urban infrastructure works, deforestation and
degradation of natural resources which threatens the sustainability of the current
civilization (ZULIETTI et al, 2014). It is essential that society moves towards a “Post
Carbon Economy”, manufacturing and consuming green products. One of the
facilitating factors for the healthy development of humanity will be precisely the reach
and interconnection of the inhabitants of planet Earth, generating technical knowledge
to solve emerging challenges, as in the case of a Pandemic, firmly based on the maxim
"Think Global, Act Local".
Regardless of the boundaries of territorial divisions stipulated by man, cities are
connected to each other both physically, socially and digitally. The mutual connections
and interferences range from natural resources, such as water and atmospheric
(BROOMANDI et al., 2021; NODA et al., 2021), as well as cultural, commercial and
large infrastructures which include Electric, Mobility and Cybernetics (MOHEBBI,
2020).
Empirical evidence that a site is connected as an integral part of a whole is in
fact experienced from the emergence of the virus identified as Severe Acute
Respiratory Syndrome Coronavirus Type 2 (SARS-Cov-2), popularly known as New
Coronavirus or Covid- 19 (joining the terms Corona, due to the shape of the virus
similar to the tips of a Crown, with Virus, Disease and the year 2019, which was the
year of its identification). This virus, with a diameter of the order of 50nm to 200nm,
invisible to the naked eye and with fast and lethal dissemination, spread throughout
the world in 2020, showing the global connection that exists today.
Until the vast majority of the population is vaccinated, one of the methods used
to control the advancement of Covid-19 is social isolation. This massive and rapid
vaccination process proves that the Industrial Revolution is going through
indispensable and propelling advances in the area of biomedicine and genetic
engineering with the need for collective engagement of society to contain the
Pandemic, the motto of this scientific article.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 494
2. OBJECTIVES
This article aims to present the state of the art about technological advances
from the Fourth Industrial Revolution, in order to understand and identify the impact of
Industry 4.0 on the sustainable growth of cities and on the fight against the Covid-19
Pandemic, as well as highlighting the need for human interaction through Information
and Communication Technology (ICT) in full social isolation.
3. ANALYSIS METHOD
Since the subject under analysis is a recent and current issue, initially a
contextualization was sought through the press and media, promoting a premise of
study and targeting of concepts and keywords such as "Pandemic" and "Connected
Cities" in order to delimit the search of research in several scientific articles published
from remote access to the journal portal of the Coordination for the Improvement of
Higher Education Personnel (CAPES).
As a term in vogue in academic reading emerged and the need to refine and
scrutinize the concept under investigation was felt, then the inquiry in the CAPES
database was fed back by the term put into question. A unique list of new expressions
were highlighted from the bibliometric review, which describe technological innovations.
The results and discussions arising from this extensive literature review were
organized in chapter 4, in secondary sections, according to the following topics
covered:
•
Consolidation of the Fourth Industrial Revolution;
•
Use of technologies driven by Social Isolation;
•
Planning of Future Cities in Post Pandemic.
4. RESULTS AND DISCUSSIONS
4.1 Consolidation of the fourth industrial revolution
As the very semantics of the word reveals, the Revolution brings with it the
meaning of radical, abrupt and definitive change. Historically, the trigger of Industrial
Revolutions as a disruptive movement is marked by the invention and adherence of
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 495
technological innovations revolutionizing the human capacity for interaction in social
and economic organizations. German engineer Klaus Schwab, founder and executive
chairman of the World Economic Forum, emphasizes in “The Fourth Industrial
Revolution” (2017) that a distinguished Fourth Industrial Revolution is in effect brought
about by evident changes in terms of speed, magnitude and impact, as characterized
in Table 1. According to the engineer, the current Industrial Revolution began at the
beginning of this 21st century and was based on the Digital Revolution – for didactic
purposes, Graph 1 signals in 2001 the transition between Revolutions, which will be
up to the future to precisely indicate the date.
Table 1 - Ind. tripod. 4.0
Sphere
Speed
Scale
Impact
Characteristic
Accelerated rhythm of transformation. Interconnected world.
Paradigm shifts with the combination of digital technologies in
human and socio-economic factors.
It encompasses systems from micro to macro, from the individual
to society, from the employee to the company, from the state to
the country.
Font: Created by the author, reference SCHWAB (2017).
The former director and chief researcher of the MIT Digital Business Center,
respectively Erik Brynjolfs son and Andrew McAfee, published the academic book “The
Second Machine Age” (2014) in which they describe as the first moment in which
humanity came to be guided by a major technological innovation: thanks to James
Watt and his colleagues who developed and improved the steam engine that allowed
limitations of human and animal strength to be overcome. However, in the Second
Machine Age (Graph 1), the computational processing and digital advancements
surpass human brain power when it comes to the perception of understanding and
shaping environments. This new age of machines will be dramatic for mental progress
and development. The impact of the Second Machine Age was highlighted in
(BRYNJOLFSSON; MCAFEE, 2014):
For years we have studied the impact of digital technologies like computers,
software, and communications networks, and we thought we had a decent
understanding of their capabilities and limitations. But over the past few years, they
started surprising us. Computers started diagnosing diseases, listening and speaking
to us, and writing high- quality prose, while robots started scurrying around warehouses
and driving cars with minimal or no guidance. Digital technologies had been laughably
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 496
bad at a lot of these things for a long time—then they suddenly got very good. How did
this happen? And what were the implications of this progress, which was astonishing
and yet came to be considered a matter of course? (BRYNJOLFSSON; MCAFEE,
2014, pg. 12)
4.2 Use of technologies driven by social isolation
The first Covid-19 case recorded in Brazil was a 61-year-old man who returned
from a trip from Italy. The suspicion of infection by the new virus was confirmed by the
Hospital Israelita Albert Einstein, in São Paulo, in February 2020. As a result, Governor
João Doria decreed a quarantine throughout the State of São Paulo on restrictive
measures to inhibit the crowding of people and avoid the spread of the disease.
According to criteria established in the São Paulo Plan, each region of the State
received definitions of what are the essential services, which are non-essential for the
population and how the services s hould work in a strategy for a conscious and
protected economic recovery (Decree No. 64,881, dated 03/22/2020).
Thus, there were sudden and challenging changes in citizens' habits. Workers in
activities considered non-essential continued remotely or were paralyzed; in addition,
the urgent need to restrict physical contact between people has also accelerated the
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 497
adaptation and use of different technologies, migrating to digital contact. De Carvalho
et al. (2020) comment that the speed of closing stores, offices and schools was as viral
and unprecedented as the pandemic itself, showing that what was seen as a
technological future has turned into a rapid adaptive primordially based on the need
for its massive adoption and economic opening.
There has been a notable rise in the use of transmission and data technologies
both professionally for online meetings and for entertainment with access to music,
movies and live videos through social networks, mainly through streaming and/or on
demand communication - with content available to the user without the need to
download the file and access on demand. The digital and virtual world has become the
key to human connection and interaction in times of isolation and social restriction.
Many of the advances in Industry 4.0, shown in Table 2, are constantly being
improved and were directly or indirectly oriented to circumvent or solve problems
caused by the current pandemic. Therefore, the current Industrial Revolution (4.0)
currently has, due to the Pandemic, the primary objective of saving human lives.
Table 2 - Contribution of Ind. 4.0 to the Pandemic and Social Isolation
Technology
Application
Vaccine mRNA Immunization
Drones
E-commerce
E-Learing
Smart Work
Smart Factory
5G e 6G
Monetary
Digitization
Utilization
New vaccine technologies
Confrontation existing potential for transport and
delivery of personal purchases and deliveries of
Delivery
hospital supplies
Sales and transitions performed via electronic devices
Commerce
without personal contact
Study
On-line learning in virtual enviroment
Work
Remote working outside of the office
Storage and shipment of goods by automated
Intralogistics
processes
5G (up to 10Gbps) and 6G (up to 100Gbps) mobile
Telecommunicati data transmission networks with very low response
ons
latency allowing physicians to operate remotely to a
patient
Digitization of bank transactions by cell phone
Finance
applications and Internet Banking; Virtual currencies
(Cryptocurrencies) and digital banks (Fintechs)
Source: Created by the authors.
4.3 Planning of future cities during post-pandemic
The availability of electronic solutions and services reveals the disruptive
concept of the Fourth Industrial Revolution: detachment from the confinement of the
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 498
physical space of the industry and overcoming the dependence on the office as a
central unit. Just as digital culture has revealed the indispensability of technology even
for small businesses, it has also proved to be essential for every employee.
The incorporation and sale of rooms in Corporate Buildings for in-person work
with integration concepts and multi-purpose opened spaces for the worker's own
residence to serve as a work table and remote meetings, allowing for the
decentralization of offices and flexibility of schedules, establishing a new range of
possibilities for the reuse of inactive commercial offices. It is worth remembering that
many Corporate Towers, due to their magnitude, appear like small cities due to the
applied infrastructure and concentration of bystanders.
Compulsory working from home required a full-time coexistence of members of
the same house. This, according to Domenico de Masi (2020), an Italian sociologist,
seems for some a pleasant and reassuring way to live together, but for others it is
invasive and oppressive. Those who manage to turn leisure into creativity, harmonizing
reading, studying and playing with the work itself, are smart working – a remote work
modality that provides the worker with an advantage on saving in travel time and money
as well as freeing up expenses with workplace maintenance for companies and
promotes increased productivity.
In homes, spaces were optimized, highlighting desks in bedrooms, dining room
tables and indoor offices, both for remote work and for academic studies at schools
and universities. Environments with an open space concept tend to be redesigned to
allow privacy for residents, ensure focus and concentration, and avoid inconvenience
during video calls. Table 3 below shows the readjustment of spaces.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 499
Table 3 - Space Planning during and after the Pandemic
Space
Aspect
Residence
Home office
Office
Hybrid work
Business
Sales Method
School
Teaching and
Learning
Cyberinfrastructure
City
Transportation
Infrastructure
Public Parks
Adaption
Office environment with closed doors; reversible
environments; segregated environments (as opposed
to open environments)
Rotation of positions; Sharing of meeting rooms
between companies with scheduled times
Strengthening of E-commerce; Mass-process
manufacturing of packaging and customized products;
Extinction of payment in physical currency. Payment by
NFC approximation. QR Code menu
Full insertion in the digital world by changing didactics,
presentation of syllabus, tests, activities and reference
collection.
Infrastructure for Smart and Connected Cities:
integrated cyber infrastructure in water sanitation,
transit, public transportation, electrical distribution and
e Gov systems. Availability of data on the Internet of
the Infrastructure systems in real time and open to the
community by SCADA system and infographics.
Management with identification of the flow pattern of
cars and pedestrians with alterations of the signals of
automated traffic lights by Machine Learning;
Information of the location of each bus of the public
fleet with estimated time of arrival at stops; Vehicle
Detection Sensors. Facial recognition cameras; Vehicle
Sharing.
Experience disconnection and contact with Nature.
Individual outdoor exercises.
Source: Created by the authors.
5. CONCLUSIONS
Highlighting the debate on the non-regressive life changes that digital
technology employs, especially in critical moments like the Covid-19 pandemic,
Industry 4.0 provides the world with total connection and interaction via the internet
and complete transformation of all sectors. This pandemic highlights the transition
zone between the Third and the consolidation of the Fourth Industrial Revolution,
bringing to reality the technologies that were only previously seen in science fiction
movies.
The outbreak of this disease affects the physical, mental and financial health of
all humans, but this disease fights against an opponent who knows and watches it
closely. Therefore, the current moment calls for communication between civil society,
scientific academia and government leaders for the immediate future. For future cities,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 500
all spaces will be redesigned based on learning to adapt to current conditions in order
to minimize new risks of infections.
5.1 Future jobs
Suggestions for future jobs, are featured:
•
E-Commerce and Monetary Digitization: elimination of personal contact
between seller and buyer and the abandonment of physical currency;
•
Urban Infrastructure Planning for Industry 4.0;
•
Potential of 5G and 6G wireless communication technology;
•
Production of goods in Factory 4.0;
•
Cybersecurity in human evolution.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 501
REFERENCES
ALTARES, Guillermo. Os humanos estão ameaçados de extinção. El País.
Arqueologia. Available in: https://brasil.elpais.com/ciencia/2021-04-02/os-humanosestao- ameacados-de-extincao.html> Accessed on April 1st 2021.
BROOMANDI, Parya; GENG Xueyu; GUO Weisi; PAGANI Alessio; TOPPING David;
KIM Jong Ryeol. Dynamic Complex Network Analysis of PM2.5 Concentrations in the
UK, Using Hierarchical Directed Graphs (V1.0.0). Sustainability. 13(2), 2201, 2021.
Disponível em: < https://doi.org/10.3390/su13042201> Accessed on April 3rd 2021.
BRYNJOLFSSON, Erik; MCAFEE, Andrew. The Second Machine Age: Work,
Progress, and Prosperity in a Time of Brilliant Technologies. New York: W. W.
Norton, 2014.
CUNHA, Maria Alexandra; COELHO, Taiane Ritta; PRZEYBILOVICZ, Erico; Get into
the club: positioning a developing country in the international e-gov research. The
Electronic Journal of Information Systems in Developing Countries. Vol 79,
2017. Available in: <https://doi.org/10.1002/j.1681-4835.2017.tb00580.x>. Accessed
on April 24th 2021
DE CARVALHO, Augusto César Leite; BLIACHERIENE, Ana Carla; ARAÚJO,
Luciano Vieira. Quando um vírus nos desafia: pandemia, novas tecnologias e
teletrabalho – desafios do século XXI. Revista Controle. Tribunal de Contas do
Estado do Ceará, Ceará, Brasil, 2020, Vol. 18, no. 2, pp. 21 – 41. Available in:
<https://revistacontrole.tce.ce.gov.br/index.php/RCDA/index> Accessed March 26th,
2021.
EVANS, A. Permanent Transience: The Identity Crisis Within Representations Of
New Urban Housing. WIT Transactions on The Built Environment. Vol. 193, pg 314, 2020. Available in: <https://www.witpress.com/elibrary/wit-transactions-on-thebuilt-environment/193/37555> Accessed on April 3rd 2021.
FOLHA DE SÃO PAULO. Coronavírus anuncia revolução no modo de vida
que conhecemos. Available in:
<https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2020/03/coronavirus-anuncia-revolucaono-modo-de-vida-que-conhecemos.shtml>. Accessed on April 24th 2021.
FRANCISCO. Carta Encíclica Laudato Si’ sobre o cuidado da casa comum. São
Paulo, Paulus Editora, 2015.
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO. SP contra o Novo Coronovírus.
Available in: <https://www.saopaulo.sp.gov.br/coronavirus/quarentena/>. Accessed
on April 24th 2021.
KLEINROCK, Leonard. An early history of the internet [History of Communications].
IEEE Communications Magazine. Vol. 48, no. 8, p. 26-36, 2010. Available
in: <https://ieeexplore.ieee.org/abstract/document/5534584> Accessed on April 29th
2021.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 502
MEGAHED, Naglaa A.; GHONEIM, Ehab M. Antivirus-built environment: Lessons
learned from Covid-19 pandemic. Sustainable Cities and Society. Vol 61, 2020.
Available in:
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2210670720305710?via%3Dihub>
Accessed on April 3rd 2021.
MELO, Gabriel. Inteligência artificial, gestão empresarial e o futuro do trabalho no
Brasil. Mundo Livre. Universidade Federal Fluminense (UFF), Rio de Janeiro, Brazil,
vol. 6, no. 2, 2020. Available in:
<https://doaj.org/article/a31c2255aed64f7ea8aebaac6781bcda?frbrVersion=2>
Accessed on March 25th. 2021.
MINISTÉRIO DA SAÚDE, Governo do Brasil. Sobre a Doença. Available in:
<https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-doenca>. Accessed on April 24th 2021.
MOHEBBI, Shima; ZHANG, Qiong; WELLS, E. Christian; ZHAO, Tingting; NGUYEN,
Hung; LI, Mingyang; ABDEL-MOTTALEB, Noha; UDDIN, Shihab; LU, Qing;
WAKHUNGU, Mathews J.; WU, Zhiqiang; ZHANG Yu; TULADHAR, Anwesh; OU,
Xinming. Cyber-physical-social interdependencies and organizational resilience: A
review of water, transportation, and cyber infrastructure systems and processes.
Sustainable Cities and Society. Volume 62, 2020. Available in:
<https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S2210670720305485?via%3Di
h ub> Accessed on April 3rd 2021.
NODA, Lumy; NÓBREGA, Ana Beatriz E. Q.; DA SILVA JÚNIOR João B. M.
SCHMIDLIN Flávio; LABAKI Lucila. COVID‐19: Has social isolation reduced the
emission of pollutants in the megacity of São Paulo - Brazil? Environment,
Development and Sustainability. 2021. Available in:
<https://doi.org/10.1007/s10668- 020-01166-2> Accessed on May 16th 2021.
PARK, Bongsoo; PARK, Jongsun; CHEONG, Kyeong-Chae; CHOI, Jaeyoung;
JUNG, Kyongyong; KIM, Donghan; LEE, Yong-Hwan; WARD, Todd J.; O’DONNELL
Kerry; GEISER, David M.; KANG, Seogchan. Cyberinfrastructure for Fusarium: three
integrated platforms supporting strain identification, phylogenetics, comparative
genomics and knowledge sharing. Nucleic Acids Research, University of Oxford,
Inglaterra, Volume 39, D640–D646, 2011. Available in:
<https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3013728/> Accessed on April
3rd 2021.
PORATH, Mauricio de Campos; TRAVASSOS JÚNIOR, Xisto Lucas; TILP, Jonas. A
universidade para a indústria do futuro. Extensio: Revista Eletrônica de Extensão.
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Santa Catarina, Brasil, 2019, vol.
16, no. 33, pp. 145 – 154. Available in:
<https://periodicos.ufsc.br/index.php/extensio/article/view/18070221.2019v16n33p145> Accessed on March 25th 2021.
RUSSEL, Peter. The Global Brain: speculation on the Evolution leap to planetary
conscious ness. Los Angeles, EUA, J.P. Tarcher, 1983.
SCHWAB, Klaus. The Fourth Industrial Revolution. New York, EUA, Currency,
2017.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 503
THE ECONOMIST. How Covid-19 is boosting innovation. Available in:
<https://www.youtube.com/watch?v=zPyOnZpeFnQ&t=27s>. Accessed on April
24th 2021.
ZULIETTI, Luis Fernando. No limiar da quarta revolução industrial: iniciativas para
sustentabilidade por empresas líderes do setor automotivo rumo a nova economia.
Faces: Revista de Administração, Universidade Fumec, Minas Gerais, Brasil, Vol.
12, no. 3, 2014. Available in: <http://www.fumec.br/revistas/index.php/facesp>
Accessed on March 26th 2021.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p. 105164-105175 nov. 2021 ISSN: 2525-8761 504
CAPÍTULO 28
COMO AS MARCAS UTILIZAM O ESPORTE PARA GANHAR VISIBILIDADE
Caio Gabriel Peixoto Travassos
Graduação
Instituição: Esplanada Comunicação Estratégica (Design Júnior)
Endereço: SQS 415 Bloco E Apartamento 104
E-mail: gabrielptravassos@hotmail.com
Carlos Leonardo Gomes Vidal
Licenciatura e Bacharelado em Educação Física/Licenciatura em Pedagogia
Graduação em Marketing Digital/Mestrado em Tecnologias Emergentes em
Educação MBA em Marketing e Propaganda
Instituição de atuação atual: Centro Universitário IESB
Endereço: Alameda das Acácias, Qd 107, Residencial Rio Negro
E-mail: professor.leonardovidal.iesb@gmail.com
RESUMO: Este projeto acadêmico tem como foco o Marketing Esportivo e os seus
benefícios, os capítulos citados para compor este artigo, irá retratar o motivo que as
marcas estão utilizando o esporte para ganhar mais visibilidade no mercado mundial.
O objetivo deste trabalho é analisar o motivo das marcas (patrocinadores) estarem
interessadas em eventos esportivos e porque querem ganhar tanta visibilidade entre
os seus espectadores. Com este objetivo, o projeto irá retratar o quanto à imagem de
uma marca (patrocinadores) vêm crescendo mundialmente e o quanto elas podem ter
um resultado significante patrocinando equipes no esporte. O interesse de estudo é
explorar sobre o Marketing Esportivo, sobre Eventos Esportivos e como as marcas
(patrocinadores) utilizam deste meio para conseguir ganhar mais visibilidade entre os
espectadores. Para começar o projeto foi realizada uma pesquisa bibliográfica para
captar o maior número de informações possível, uma pesquisa documental no qual foi
lido livros que falassem sobre Marketing Esportivo e sobre Eventos Esportivos, um
estudo de caso para o pesquisador analisar e conseguir desenvolver sobre os temas
e discursões com colegas no intuito de investigar sobre o tema.Na Copa do Mundo no
Brasil foram disputadas 60 partidas em 12 arenas diferentes, com um público total de
3.165.627 de torcedores, média de 52.760 pessoas por partida. No ano de 2018, a
final do Super Bowl teve no total, uma média de 103.4 milhões de pessoas assistindo,
com pico de 106 milhões. Com estes resultados analisado, percebe-se a força que o
evento esportivo tem perante seus espectadores. Com base no que foi pesquisado, o
esporte desperta o interesse de milhares de pessoas em todo o mundo e tendo isso em
vista, as marcas sempre estarão dispostas a fazer alguma ativação em determinados
eventos esportivos, pois estes eventos reúnem milhares de pessoas propensas a
interagir, acompanhar, experimentar e principalmente comprar dos seus produtos.
Essas ativações trazem inúmeras chances de negócios para a sua marca pois
ampliam o alcance de sua empresa.
PALAVRAS-CHAVE: Marketing Esportivo; Marca; Visibilidade e Eventos Esportivos.
ABSTRACT: This academic project focuses on Sports Marketing and its benefits, the
chapters cited to compose this paper, will portray why brands are using sports to gain
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
505
more visibility in the world market. The objective of this paper is to analyze why brands
(sponsors) are interested in sporting events and why they want to gain so much
visibility among their spectators. To this end, the project will portray how much a brand's
(sponsors) image has grown worldwide and how significant a result they can have by
sponsoring teams in sports. The interest of the study is to explore about Sports
Marketing, about Sports Events and how brands (sponsors) use this medium to gain
more visibility among spectators. To begin the project we conducted a literature search
to capture as much information as possible, a documentary research in which we read
books that spoke about Sports Marketing and about Sporting Events, a case study for
the researcher to analyze and develop on the themes and discussions with colleagues
in order to investigate the theme. In the World Cup in Brazil, 60 matches were played
in 12 different arenas, with a total attendance of 3,165,627 fans, an average of 52,760
people per match. In the year 2018, the Super Bowl final had a total average of 103.4
million people watching, with a peak of 106 million. With these results analyzed, one
realizes the strength that the sporting event has before its viewers. Based on what was
researched, sports arouse the interest of thousands of people around the world and
with this in mind, brands will always be willing to do some activation in certain sporting
events, because these events bring together thousands of people likely to interact,
follow, experience and especially buy their products. These activations bring countless
business opportunities for your brand because they expand your company's reach.
KEYWORDS: Sports Marketing; Brand; Visibility and Sports Events.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
506
1. INTRODUÇÃO
Desde quando o Marketing foi criado, ele foi dividido em três períodos o
Marketing 1.0, Marketing 2.0 e o Marketing 3.0. A seguir, discute-se a diferença e os
benefícios de cada um desses períodos.
No início do Marketing 1.0, o importante era oferecer os produtos a todos que
quisessem compra-los. Ele se caracteriza pelas empresas estarem voltando para a
produção e massificação dos produtos. O objetivo das companhias era padronizar
seus produtos, otimizar seus processos para poder oferecer um preço acessível ao
público.
O Marketing 2.0 surgiu na era da informação (1970). Com isso, o consumidor
consegue comparar preços, produtos, marcas e qualquer fator que lhes ajude a melhor
satisfazer suas necessidades e desejos. É conhecido como a era do Marketing focada
no consumidor.
Por fim, o Marketing 3.0 surge a medida que o ambiente de negócios muda
novamente, com recessão, novas preocupações com o meio ambiente, influência das
mídias sociais, provocam mudanças maciças nas práticas do uso de Marketing. Essa
era do Marketing nos trás três conceitos muito importantes: Cocriação, comunização
e personalidade da marca.
O Marketing é essencial no mundo moderno, pois auxilia seus profissionais a
criarem um conjunto de técnicas para a melhora das vendas e gera experiência entre
o cliente e a sua empresa. Com o avanço da tecnologia, o Marketing vem se
reinventando e se adequando aos meios de comunicação digital, com isso o tempo
de produção e distribuição de seus produtos, são menores. Utiliza a tecnologia para
poder canalizar os resultados futuros.
Marketing é uma palavra procedente da língua inglesa, mesmo assim também
é conhecida mundialmente. Marketing é um conjunto de técnicas e métodos
destinados à venda com foco em geração de experiência e valor entre cliente e
empresa. O Marketing estuda as causas e os mecanismos em relações de troca
(bens, serviços ou ideias) e pretende que o resultado seja uma transação (venda)
satisfatória para todas as partes envolvidas no processo. Segundo KOTLER (1993 p.
600),” Marketing é o processo social e gerencial através do qual indivíduos e grupos
obtêm aquilo de que necessitam e desejam por meio da criação e troca de produtos e
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
507
valores”. O trabalho de um profissional de Marketing começa muito antes da
fabricação de um produto e continua muito depois de sua venda. O Marketing tem
uma área de atuação muito ampla no mercado, com os conceitos específicos
direcionado para cada atividade relacionada, temos como exemplos os seguintes tipos
de Marketing: Marketing cultural, Marketing político, Marketing de eventos, Marketing
social, Marketing digital, Marketing Direto e Marketing Indireto e também temos o
Marketing Esportivo, entre outros.
Com isso, o Marketing Esportivo mostra os seus principais objetivos, quanto
o esporte vem crescendo no mercado Nacional e Mundial e como ele está se
tornando importante para os seus patrocinadores.
“Quando as pessoas assistem, ouvem ou praticam um esporte, essa atividade
é chamada de consumo esportivo. O esporte pode ser consumido direta – ao
se assistir pessoalmente a um jogo ou ao participar de um esporte – ou
indiretamente – ao se assistir a um jogo pela televisão, ouvi-lo no rádio ou a
ler a seu respeito em um jornal ou revista” (JOHNSON, 2008, P. 18).
O consumo esportivo é uma das formas de entretenimento que vem sendo
amplamente difundido na sociedade moderna. Ele envolve todos os aspectos da vida
humana e possui um apelo mundial (MORGAN; SUMMERS, 2008). O esporte vem se
tornando habito na vida das pessoas tanto por hobbies quanto por uma vida mais
saudável. Com o propósito, o Marketing Esportivo busca aumentar o reconhecimento
público, reforçar a imagem corporativa, estabelecer identificação com segmentos
específicos do mercado, combater ou antecipar as ações de concorrência, envolver a
empresa com a comunidade, além de conferir credibilidade ao produto com a
associação à qualidade e emoção do evento (BERTOLDO, 2004).
Com o passar dos anos, a tecnologia vem se inventando e crescendo
absurdamente, com isso várias empresas estão se lançando ao mercado com a ajuda
das redes sociais ou até mesmo colocando o seu nome estampado em um local no
qual ela ganhe mais confiança de seus consumidores. Com este número excessivo
de marcas no mercado Mundial, o consumidor está fazendo as suas escolhas através
daquelas marcas que estão investindo maciçamente na comunicação. A marca ganha
força, quando ela consegue conversar direto com o seu público alvo.
Uma marca boa consegue fazer com que o seu consumidor se sinta atraído por
seus produtos ou serviços. Segundo KOTLER (1998), a marca é um nome, termo,
sinal, símbolo ou combinação dos mesmos, que tem o propósito de identificar bens ou
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
508
serviços de um vendedor ou grupo de vendedores e de diferenciá-los dos
concorrentes.
Este projeto irá retratar, o quanto à imagem de uma marca (patrocinadores)
vêm crescendo mundialmente e o quanto elas podem ter um resultado significante
patrocinando equipes no esporte.
Várias marcas estão se aproveitando que o esporte é uma das grandes paixões
mundiais. O esporte atraí bastante público, e sempre haverá muitas pessoas
procurando sobre algo nas mídias impressas, e nas mídias digitais. O grande intuito
dessas empresas em colocar a sua marca no esporte, é pelo o fato de poder ganhar
mais visibilidade entre os telespectadores.
Nos dias atuais, as empresas buscam com que a sua marca consiga atingir o
maior número de pessoas possíveis usando do seu produto.
O objetivo geral do projeto é analisar o motivo das marcas (patrocinadores)
estarem interessadas em eventos esportivos e porque querem ganhar tanta
visibilidade entre os seus espectadores. Também é de grande importância
desenvolver os objetivos específicos deste projeto, como: verificar quais as marcas
que mais patrocinam o esporte e o que elas pretendem ganhar com essa visibilidade;
compreender o potencial que os eventos esportivos têm perante a população; analisar
o programa sócio torcedor.
A importância deste projeto, para o autor pretende obter conhecimento sobre
o tema escolhido, elaborar um ótimo trabalho de conclusão de curso, e
posteriormente realizar uma Pós-Graduação na área escolhida, com a ideia de realizar
palestras por todo o Brasil para aquelas pessoas que possuírem o interesse em saber
sobre o tema abordado.
O interesse de estudo deste projeto é explorar sobre o Marketing Esportivo e
como as marcas (patrocinadores) estão fazendo para poder ganhar mais visibilidade
entre os espectadores.
Mostrar os métodos que os Patrocinadores estão utilizando para poder entreter
o seu público alvo. Este projeto irá conter diversas pesquisas diferentes para poder
chegar a uma conclusão.
O público no qual este projeto irá atingir, são todos aqueles que se interessam
por esporte ou que estão ligados em eventos esportivos de grande porte.
Este trabalho terá como base nos livros de Kotler, livros que falem sobre
Marketing Esportivo, Patrocínio, Eventos Esportivos e em pesquisas realizadas na
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
509
Internet.
2. QUAIS AS MARCAS QUE MAIS PATROCINAM O ESPORTE E O QUE ELAS
PRETENDEM GANHAR COM ESSA VISIBILIDADE
Definir alguns padrões utilizados dentro do Marketing Esportivo e esclarecer
suas finalidades, especificamente, verificar o interesse das marcas em geral ao
patrocinar um clube de futebol, associar as vantagens e desvantagens da ligação
entre uma marca e um time, entender como este patrocínio influencia a mente do
consumidor/torcedor.
As principais marcas sempre estarão ligadas a grandes eventos esportivos.
Pois elas têm como finalidade que sua mensagem seja captada pelo maior número
de espectadores possíveis, e que eles se sintam atraídos pela sua marca. Como nestes
eventos esportivos possui um grande número de telespectadores, a intenção das
marcas é fazer com que eles virem uns potenciais clientes no futuro. Comentar um
pouco sobre as principais competições que são disputadas no Mundo.
“A relação das marcas mais conhecidas com o universo esportivo é bastante
valorizada pela população. As empresas patrocinadoras são vistas como
companhias de qualidade, que justamente adquirem alta visibilidade”
(Rezende, 2013, P. 88).
A Copa do Mundo foi criada pelo francês Jules Rimet, em 1928, logo após
ter assumido o comando da maior instituição de futebol mundial: FIFA (Federation
International Football Association). O primeiro campeonato foi realizado no Uruguai
em 1930 que contava com a participação de 16 seleções, sem a disputa de
eliminatórias, como é realizado nos dias de hoje. Em 1950, a seleção do Brasil foi a
final contra a seleção do Uruguai, o jogo foi realizado no Maracanã (Rio de Janeiro) e
teve a presença de aproximadamente 200 mil pessoas no estádio. A Copa é realizada
de quatro em quatro anos, e hoje todas as seleções disputam uma eliminatória para
saber quais delas poderão participar de tal evento, que é televisionado para
centenas de pessoas pelo mundo. A empresa que mantém contrato com a Copa do
Mundo é a BUDWEISER. Mas foi com o UFC que a empresa mais apareceu com
grandes campanhas. A SAMSUNG patrocina no Brasil, a entidade máxima do futebol,
que é a Confederação Brasileira de Futebol (CBF). A principal competição europeia
de clubes foi lançada um mês após o primeiro congresso da UEFA, que teve lugar
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
510
em Wien na Austria, a 2 de março de 1955. Contudo, a então denominada Liga dos
Campeões Europeus não surgiu de uma iniciativa da UEFA, que estava mais
preocupada em criar uma competição europeia para seleções. A Taça dos Clubes
Campeões Europeus foi uma ideia do então diretor do diário desportivo francês
L'Équipe, Gabriel Hanot. A sua sugestão, em dezembro de 1954, tendo em vista a
criação de uma competição europeia interclubes, foi recebida com entusiasmo pela
então recém fundada UEFA. A competição idealizada pelo L'Equipe, iniciada em
setembro de 1955, não obrigava a que os participantes fossem campeões
nacionais, funcionava sim por convites aos clubes que geravam maior interesse.
Apenas 16 clubes confirmaram presença no torneio. A Taça dos Campeões
Europeus era apenas disputada em eliminatórias até que o formato e o nome foram
alterados em 1992/93, ano da criação da UEFA Champions League (Liga dos
Campeões). Nesse ano, a competição começou com três eliminatórias, passando os
vencedores a uma fase de grupos, com dois grupos de quatro equipes, que se
enfrentaram em jogos de ida e volta. Os vencedores dos grupos disputaram a final.
Na temporada seguinte, foi utilizado um formato semelhante, com a adição de uma
semifinal entre os dois primeiros de cada grupo. A popularidade e o sucesso da
fase de grupos permitiram à competição crescer, com jogos em toda Europa nas
noites de terça e quarta-feira. Ao longo dos anos mais fases eliminatórias e fases de
grupo foram adicionadas a competição e, aquilo que hoje se tem com o nome Liga
dos Campeões, nada tem de concreto pois, as equipes participantes não são
obrigatoriamente campeãs nacionais. A maior patrocinadora deste campeonato, é a
HEINEKEN que é praticamente “Dona” do maior campeonato de futebol mundial, que
tem como o maior Campeão do torneio a equipe do Real Madrid, que é parceiro da
companhia aérea EMIRATES.
A Taça Libertadores (no começo era chamada de Copa de Campeões da
América), também já foi chamada de Copa Toyota Libertadores, por causa do
patrocínio do torneio pela Fábrica de Automóveis Toyota, em 2008 começou a ser
chamada de Copa Santander Libertadores. Os nomes oficiais: Copa Campeões da
América de 1960 a 1964, e Copa Libertadores da América de 1965 a 1997. Com a
chegada de patrocinadores o torneio levou os seguintes nomes: Copa Toyota
Libertadores de 1998 a 2007, Copa Santander Libertadores de 2008 a 2012, e Copa
Bridgestone Libertadores desde 2013.
O objetivo era de criar um torneio que reunisse os clubes campeões de cada
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
511
país da América do Sul. A Libertadores da América é a mais tradicional e
importante competição de clubes de toda a América do Sul. A competição foi criada
em 1960. No começo só participava os campeões de sete países, depois de alguns
anos passou para os campeões de 20 países, a partir do ano 2000, o total de equipes
subiu para 32 times. Em 2003 decidiu-se aumentar o número de times participantes
da competição para 36, em 2006, a Copa Libertadores atingiu a marca de 38 equipes
participantes. Em 2008 ganhou o nome de Copa Santander Libertadores (nome do
Banco Santander), um dos maiores Grupos Financeiros da Espanha.
Desde 2013 a BRIDGESTONE é patrocinadora do maior e mais competitivo
campeonato que envolve as equipes da América do Sul, que é a Libertadores da
América e tem o seu nome ligado ao torneio Copa Bridgestone Libertadores.
Figura 1 - Nomes oficiais da Copa Libertadores
Fonte: www.campeoesdofutebol.com.br
O Super Bowl é o jogo correspondente à final da NFL – National Football League,
sendo aí determinado o campeão do principal campeonato de futebol americano
profissional dos Estados Unidos. O jogo foi criado como parte do acordo de fusão
celebrado em 1966 entre a NFL e sua então liga rival, a American Football League
(AFL) e que determinou a fusão, a partir de 1970, das 2 ligas naquela que é hoje a
NFL. Nos termos desse acordo, foi decidido que as equipas campeãs das duas ligas
jogariam uma final que determinaria o campeão da temporada. No dia da final do
Super Bowl, é para muitos, considerado um feriado nacional nos Estados Unidos,
sendo chamado de “Super Bowl Sunday”. É o segundo dia de maior consumo de
alimentos nos EUA, só perder para o Dia de Ação de Graças. Além disso, a final tem
sido frequentemente o programa de televisão americano mais visto no ano. O Super
Bowl XLV, jogado em 2011 entre os Green Bay Packers e os Pittsburgh Steelers, foi
mesmo o programa da televisão norte- americana mais visto na história, com uma
audiência média de 111 milhões de espectadores e assumindo o lugar do Super Bowl
do ano anterior, o qual tinha, por sua vez, assumido o 1º lugar no ranking de
audiências. O Super Bowl também está entre os eventos desportivos mais vistos em
todo o mundo, principalmente devido às audiências norte-americanas, é o segundo
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
512
evento desportivo mais visto anualmente em todo o mundo, perde apenas para à final
da Liga dos Campeões da UEFA. Por causa das suas elevadíssimas audiências, os
minutos de publicidade exibidos durante a transmissão do Super Bowl são os mais
caros do ano. Devido ao seu alto custo, as empresas desenvolvem também as mais
caras e espetaculares propagandas especialmente para este evento. Como resultado,
observar e discutir os comerciais da transmissão tornou-se um aspecto importante do
evento. A PEPSI uma empresa de refrigerantes espalhou investimento nos esportes
americanos. Na NFL, conseguiu a propriedade do show do Super Bowl, evento que é
assistido por milhares de pessoas.
O patrocínio é uma das formas de Marketing que melhora a experiência do
consumidor com o produto. É crescente o número de empresas que associam sua
marca em eventos esportivos.
Eles também estão patrocinando os grandes Clubes Europeus pois sempre
estão disputando campeonatos importantes pelo mundo, eles também patrocinam os
atletas que para muitos torcedores são tidos como Ídolos, eles usam isso como uma
forma de mostrar que a sua marca também cuida da carreira de determinado atleta e
que também está presente no dia a dia desses atletas.
Uma forma dos patrocinadores ganharem os seus telespectadores, é levando
uma experiência até o consumidor. Uma boa jogada é quando a marca começa a
patrocinar um clube, pois ela mexe diretamente com o seu consumidor no qual é
um ótimo meio de divulgação da marca. Com isso, as marcas terão a oportunidade
de ter um aumento significante nas vendas de seus produtos e também no
relacionamento com os seus clientes. Porque estar em contato direto com o seu público
alvo significa muito mais oportunidades de negócios futuros para essas marcas em
geral.
As marcas pretendem ganhar maior visibilidade a cada dia que passa, pois
assim, elas conseguirão um aumento no lucro de suas empresas, ficarão mais popular
no mundo dos esportes, ganharão reconhecimento pelos produtos que vendem e
também vão fazer com que a população se interesse cada vez mais pelos produtos
oferecidos, além de fazer com que as pessoas se fidelizem a elas.
3. POTENCIAL QUE OS EVENTOS ESPORTIVOS TÊM PERANTE A POPULAÇÃO
Milhares de pessoas gostam de assistir e até se envolver com algum tipo de
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
513
evento esportivo, por essa razão que organizar um evento pode ser tão dinâmico e
vibrante: qualquer tipo de esporte têm o poder de mexer com a emoção e a paixão de
uma população.
“O esporte é um fenômeno complexo que inclui produtos, serviços e diversos
fatores intangíveis, como emoção, orgulho, lealdade, competitividade e
determinação. Por essa razão, não é suficiente considerar apenas a
satisfação do consumidor em relação a determinado esporte ou a importância
desse esporte para ele. É necessário um profundo estudo de comportamento
dos consumidores do esporte em todas as suas modalidades: praticantes,
torcedores, simpatizantes e consumidores” (JOHNSON, 2008, P.74).
Para organizar um bom evento esportivo, é necessário ter um bom
planejamento. Antes de colocar a ideia em prática, é fundamental realizar uma boa
pesquisa para entender a dimensão do seu evento. Após realizar essa pesquisa,
precisa escolher um local adequado para a realização do evento, no qual suporte os
atletas e os telespectadores que compraram para estar naquele evento, não esquecer
que todos os eventos precisam de um número certo de segurança para garantir que
no evento ocorra tudo bem. Conseguir patrocinadores para o evento é sempre bom,
lembrando que estes patrocinadores precisam ter identificação com o evento
esportivo. Corra atrás de várias empresas, propondo diferentes tipos de patrocínio.
Contatar bons fornecedores é primordial, pois são eles que vão fornecer o material
para o evento. Por último, faça uma divulgação correta, que assim irá de encontro com
o seu público alvo.
“Evento é um acontecimento previamente planejado, com o objetivo claramente
definido. Sua realização obedece a um planejamento e costuma ter como um dos seus
objetivos
a
interação
entre
seus
participantes,
público,
personalidades
e
entidades”. (Rodrigues, 2013. Página 19)
O público que pretende ir ao evento, espera fazer a compra dos ingressos de
uma forma simples e sem perturbação. No dia do evento, ela quer encontrar um local
organizado, sem muitas filas e com uma boa comunicação entre as pessoas que ali
estão trabalhando. O público espera ter uma identificação com a marca que está
patrocinando o evento, pois isso faz com que ele vá até o evento.
“Um evento em si é algo que pode ser definido como a ida de centenas,
milhares ou até milhões de pessoas a um determinado local, para atingir um objetivo,
satisfazer expectativas de emoção, alegria e vibração” (Nogueira, 2010, p.14).
A Copa do Mundo da FIFA no Brasil ocorreu entre o dia 12 de junho até o dia
o dia 13 de julho. A Copa no Brasil foi considerada a segunda maior média de público
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
514
nas histórias de todas as Copas, perde apenas para o Mundial de 1994 que foi
disputado nos Estado Unidos, que registrou uma média de 68.991 torcedores por
partida. Foram disputadas 60 partidas em 12 arenas diferentes, com um público total
de 3.165.627 de torcedores. Média por partida era de 52.760 pessoas. O estádio que
teve o maior público de toda a Copa do Mundo, foi o estádio do Maracanã.
“O esporte deixou sua marca em muitas economias mundo afora: é o que
demonstram os dados sobre geração de empregos e receitas. Mais que mero
fator da economia contemporânea, o esporte faz parte da cultura e do estilo
de vida de um país” (JOHNSON, 2008, P.72).
Figura 2 - Números oficiais em cada um dos estádios da Copa
Fonte: www.copa2014.gov.br.
Na temporada 2016/2017 houve um aumento de público comparada a
temporada do ano passado. Apenas na fase de grupos do torneio mais importante da
Europa começou com uma média de 43.898 pagantes. No torneio de clubes da
Europa, a liderança é do Barcelona. O time catalão levou em média 85.663 pagantes
ao Camp Nou. Na sequência, aparecem Tottenham (77.519), Real Madrid (75.547),
Bayern de Munique (70.000), Borussia Dortmund (63.698), Arsenal (59.869) e Celtic
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
515
(57.781). A final da Uefa Champions League contabilizou uma média de 35.201
pagantes e um total de 1.267.222 espectadores. Nessa temporada 2016/2017, o Real
Madrid consagrou-se Campeão, além de ter Cristiano Ronaldo como artilheiro.
Figura 3 – Média de Público pagante na temporada 2016/2017
Fonte: blogs.correiobraziliense.com.br/
No jogo do Tottenham x Monaco, no qual a equipe do Monaco saiu vitoriosa
teve o maior público de uma partida na Champions League, que foi de 85.011
pagantes. O segundo maior público dessa edição foi a goleada que o Barcelona
aplicou em cima do Celtic, com 73.290 pagantes que virão o Barcelona fazer 7x0 na
equipe Escocesa. O Real Madrid teve um público de 70 mil espectadores na vitória de
virada sobre o Sporting. Já o Bayern de Munique goleou o novato Rostov perante 70
mil espectadores.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
516
Figura 4 – Ranking por partidas
Fonte: www.esporte.ig.com.br
Na Libertadores do ano de 2017 teve um total de 746.662 ingressos vendidos
para as 28 partidas que foram disputadas no Brasil. O time que mais levou
torcedores aos estádios foi o Flamengo, com o total de, 161.996 ingressos vendidos
com o mando do time. Nesta temporada da Libertadores o Grêmio consagrou-se
campeão e teve apenas a 5ª melhor média de público entre as equipes brasileiras.
Nesta figura, pode-se analisar a média de pagantes das oito equipes brasileiras
que disputou a competição, a ocupação média por estádio que foram realizados os
jogos, a renda bruta que cada equipe obteve na competição e o valor que estava
sendo cobrado por cada jogo nos estádios.
Figura 5 – Ranking de equipes
Fonte: app.globoesporte.globo.com/
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
517
O Super Bowl se tornou o evento mais esperado por todos os amantes de
esporte e entretenimento, ele está em primeiro lugar entre os dez eventos mais
aguardados durante o ano. A NBC divulgou os números finais da audiência da final de
2018. No total, a partida teve média de 103.4 milhões de pessoas assistindo, com pico
de 106 milhões. Essa média representa uma queda de 7% em relação a temporada de
2017.
Durante o The Pepsi Super Bowl LII Halftime Show (2018) quando Justin
Timberlake figurou no gramado do U.S. Bank Stadium, mais de 106.6 milhões de
espectadores estavam ligados. Sobre o show, vale destacar que Timberlake não
conseguiu bater o alcance de Lady Gaga em 2017. O cantor ficou 9% abaixo da
cantora. O intervalo mais popular da história do Super Bowl ocorreu em 2015 (XLIX),
quando Katy Perry obteve uma audiência total 120.7 milhões. Desta maneira, o
recorde segue sendo do Super Bowl XLIX, quando 114.4 milhões de pessoas
viram o New England Patriots conquistar o título da NFL.
“Esse caráter midiático do esporte desperta o interesse de empresas
patrocinadoras e grandes grupos de comunicação, que investem cada vez mais
recursos em eventos esportivos” (MATTAR, 2013, p. 2)
Como foi abordado no capítulo, os grandes eventos esportivos sempre estarão
reunindo milhares de espectadores para acompanhar tal evento, isso não diferencia os
que estão presentes ou os que assistem pela televisão. No Brasil, o esporte é algo que
é levado muito a sério, pois está presente na cultural a várias gerações e os eventos
esportivos são de extrema importância para o desenvolvimento da sociedade.
“O esporte está presente nas culturas, mas também é um fenômeno cultural
por seus próprios méritos e desempenha um papel importante na definição
da identidade nacional e na satisfação de muitas necessidades, individuais e
sociais. Isso significa que o esporte não apenas funciona como parte de uma
cultura, mas também contribui para moldá-la” (JOHNSON, 2008, P.69).
No geral, os esportes se tornam o algo a mais para as pessoas. Algo que não
se pode mensurar, simplesmente pelo prazer de praticar ou participar de algum jeito
de esportes. Dentro dessa visão, o mercado de marcas aproveita bastante esses
eventos para tornar a identidade da empresa mais vista pelo público. O potencial é
altíssimo se enaltecermos as vantagens para todas as partes.
Para patrocinar um evento esportivo, a empresa pública ou privada tem a
finalidade de atingir um público grande e um mercado específico, recebendo em troca,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
518
uma série de vantagens em incremento de vendas, melhorar a imagem da sua marca
e ganhar a simpatia do público presente. O aumento de patrocínio no esporte, está
diretamente ligado aos retornos que o esporte lhe proporciona.
“É por meio do patrocínio esportivo que a marca concretiza seus atributos e
envolve com muito apelo o coração e os hábitos dos seus públicos-alvo. Ou
seja, associarmos uma marca ao esporte estaremos percorrendo o melhor
caminho para falar a mente e à alma de milhões de pessoas” (Rodrigues,
2013. Página 59).
Os aspectos que mais tem retorno nos patrocínios esportivos são: Aumentar o
reconhecimento da empresa, melhorar a imagem da empresa, demonstrar
responsabilidade social, incrementar o reconhecimento de determinados produtos,
melhorar imagem de determinado produto, aumentas vendas em curto e longo prazo
e alimentar orgulho e motivação dos funcionários. Com a ajuda do esporte, diversos
patrocinadores têm visto suas marcas alavancarem no mercado nacional. Isso causa
um grande impacto nas vendas de seus produtos, além de conquistar um grande
número de futuros clientes.
Em um evento esportivo é onde as marcas preferem fazer grandes ativações
para conseguir atrair um determinado público. Elas pretendem de alguma forma
causar algum tipo de impacto para as pessoas que estão presentes no local. Por
exemplo: em um estádio de futebol como o Maracanã onde cabe aproximadamente
79 mil pessoas, a marca faz diferentes estratégias para conseguir passar a sua
mensagem para o máximo de pessoas que estão dentro do evento. Essas ativações
também servem para que a marca cause uma boa impressão para as pessoas que
estão no evento. Se o público se sentir impactado com a mensagem passada pela
marca, ele se tornará mais um novo consumidor dos produtos daquela marca sem
contar que essa ativação irá causar uma boa impressão e ficará marcado na mente
dos espectadores por um longo tempo.
Com isso, os eventos esportivos é um ótimo lugar para as marcas fazerem suas
ativações, pois atingirá milhares de pessoas e com isso conseguirá ter um retorno
enorme na venda de seus produtos.
“O consumo de um esporte e dos produtos a ele relacionados não apenas
atende às necessidades de lazer e recreação, mas também representa um tipo de
consumo simbólico do consumidor” (JOHNSON, 2008, P.74).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
519
4. ANALISAR O PROGRAMA SÓCIO TORCEDOR
Em tempos atuais, a disputa por receita no esporte ganha mais importância a
cada dia que passa. Uma das principais fontes de dinheiro para os clubes de futebol
na atualidade são os seus programas de sócio torcedor. Além de fidelizar os
torcedores e garantirem uma arrecadação mais segura, depende do momento que
cada equipe vive em determinado campeonato. Diferente das fontes mais tradicionais
de arrecadação (Direitos de TV e Merchandising), que dependem diretamente de
celebridades renomadas.
Os recebimentos com os programas têm forte ligação com a renda proveniente
de ingressos e de dias de jogo, que diminuíram em importância nas últimas décadas
com o crescimento das transmissões e fortalecimento das marcas dos grandes clubes.
Outro fator importante é que a formatação desses programas permite um foco
exclusivo no investimento realizado no futebol, característica essencial para
torcedores interessados em contribuir para o fortalecimento dos elencos permitindo
uma separação entre os valores destinados ao futebol e aos clubes sociais, algo
necessário no Brasil, que conta com um cenário aonde a maior parte das
agremiações surgiram como clubes poliesportivos e patrimoniais, contando com
diversos esportes e estruturas além do futebol.
Os valores arrecadados com os programas de sócio torcedor variam. Alguns
fatos contribuem para isso: primeiro, cada um possui planos com valores e formatos
diferenciados, que variam de menos de R$ 10 a mais de R$ 1.000 de
mensalidade. Os benefícios, vantagens e facilidades também diferem.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
520
Figura 6 – Receita Sócio Torcedor
Fonte: www.palmeirasacademy.wordpress.com
Como pode analisar, a figura acima mostra o número de Sócio Torcedores
adquirido por cada clube nos anos de 2015 e 2016. Também mostra a receita (R$)
que cada clube atingiu neste mesmo período. Com isso dá para observar quanto cada
clube adquiriu de torcedores e o quanto determinado clube perdeu de torcedores neste
período.
Figura 7 – Receita Sócio Torcedor
Fonte: palmeirasacademy.wordpress.com/
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
521
5. METODOLOGIA
O estudo que deu origem ao Como as Marcas Utilizam o Esporte para Ganhar
Visibilidade foi realizado pelo aluno Caio Gabriel Peixoto Travassos, entre agosto de
2017 e maio de 2018, em três fases:
Para começar o projeto, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, com o objetivo
de reunir o maior número de informações e dados que servirão como base para o
desenvolvimento do projeto.
Foi realizado uma pesquisa documental, onde foi feita uma seleção bibliográfica
para escolher os melhores livros que falem sobre Esporte e Eventos Esportivos, sites
que contam a história do Marketing.
Um estudo de caso, onde apresenta um problema e o pesquisador tem que
analisar e desenvolver um argumento para solucionar.
Discursões com colegas, com o duplo objetivo de investigar de forma ampla o
esporte e como as marcas podem se aproveitar disso.
6. CONCLUSÃO
Este projeto acadêmico possibilitou uma análise de como os donos das
empresas (patrocinadores) estão utilizando o Marketing Esportivo como um dos meios
de sua marca ganhar mais visibilidade no mercado mundial e fazer com que ela seja
vista por milhares de pessoas em um evento esportivo. Avaliar o impacto que um
evento esportivo causa na população.
Com base nos objetivos específicos que foram propostas para compor este
projeto, pode-se analisar que foram escolhidas cinco competições que são
extremamente competitivas no esporte. Com base nos infográficos que contem em
cada um dos objetivos, nota-se que essas competições não deixam de ser um grande
evento para que as empresas mostrem as suas marcas para o público.
Com isso compreende que quando uma marca resolve patrocinar um evento
esportivo, ela realmente tem o interesse de estar sendo exposta para um grande
número de pessoas.
Antes de começar, será realizada uma pesquisa bibliográfica, com o objetivo
de reunir o maior número de informações e dados que servirão como base para dar
início a este projeto.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
522
Na pesquisa documental foi feita uma seleção bibliográfica, no qual foram
escolhidos alguns livros sobre Marketing Esportivo e sobre Eventos Esportivos, sites
que contam histórias sobre Marketing e até artigos para compor o projeto.
No estudo de caso, apresenta um problema “saber o motivo que as marcas
(patrocinadores) querem patrocinar os eventos esportivos” o aluno/ pesquisador tem
como objetivo de identificar o problema, analisar e desenvolver um argumento para
solucionar este problema.
As empresas devem fechar seus patrocínios para qualquer tipo de evento
esportivo, pois quando ela faz isso, ela estará atingindo diferentes públicos e
ganhando cada vez mais admiradores por seus produtos.
O Marketing vem utilizando o esporte como uma plataforma de comunicação
nos dias de hoje.
Como foi abordado nos capítulos deste projeto, o esporte desperta o interesse
de milhares de pessoas em todo o mundo e tendo isso em vista, as marcas sempre
estarão dispostas a fazer alguma ativação nos eventos esportivos, pois reúne milhares
de pessoas propensas a interagir, acompanhar, experimentar e principalmente
comprar dos seus produtos, essas ativações trazem inúmeras chances de negócios
para a sua marca pois ampliam o alcance de sua empresa.
A visibilidade que o esporte proporciona e a mídia espontânea que pode ser
gerado através de uma disputa é uma oportunidade valiosa que as empresas têm em
mãos.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
523
REFERÊNCIAS
JOHNSON, Melissa; Summers, Jane. R; Marketing Esportivo, 1ª Edição, Editora
Cengage CTP 6 de setembro de 2006.
MATTAR, Fauze Najib; Mattar, Michel Fauze, Gestão de Negócios Esportivos,
Editora Elsevier, julho de 2013;
NOGUEIRA, Claudio, Zero à Direita Marketing & Mídia no Esporte, Editora iVentura,
2010.
REZENDE. M, Dossiê Esporte, Editora Gráfica Burti Ltda, setembro de 2005.
RODRIGUES, Davi, Organização de Eventos Esportivos, 5ª Edição, Editora Phorte
21 de outubro de 2013.
Disponível em: <https://www.significados.com.br/marketing/ > Acesso em: 17
novembro 2017.
Disponível em: <https://marketingdeconteudo.com/tipos-de-marketing/ > Acesso em:
17 novembro 2017.
Disponível em: <http://maquinadoesporte.uol.com.br/artigo/top-10-marcas-que-maisse-valorizaram-com-o-esporte-na-ultima-decada_28656.html> Acesso em: 17
novembro 2017.
Disponível em: <https://marcelosazevedo.wordpress.com/tag/beneficios-depatrocinio/> Acesso em: 10 março 2018.
Disponível em: <http://blog.sympla.com.br/como-organizar-um-evento-esportivo/>
Acesso em: 23 abril 2018.
Disponível em: <http://blog.sympla.com.br/5-razoes-para-pessoas-irem-ao-seuevento-esportivo/> Acesso em: 23 abril 2018.
Disponível em: <http://www.copa2014.gov.br/pt-br/noticia/publico-da-copa-no-brasilsupera-os-3165-milhoes-de-torcedores > Acesso em: 23 abril 2018.
Disponível em: <https://www.webartigos.com/artigos/marcas/61907> Acesso em:
25 abril 2018. Disponível em
<http://www.educacaofisica.seed.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteud
o=2 05> Acesso em: 25 abril 2018.
Disponível em: <http://www.campeoesdofutebol.com.br/hist_liga_campeoes.html>
Acesso em: 25 abril 2018.
Disponível em: <http://www.campeoesdofutebol.com.br/libertadores_historia.html >
Acesso em: 25 abril 2018.
Disponível em: <http://www.futebolamericano.eu/superbowl/a-historia-do-superBraz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
524
bowl#.WtTlci7wYdU> Acesso em: 27 abril 2018.
Disponível em: <http://esporte.ig.com.br/futebol/2016-09-16/uefa-championsaumento-publico.html> Acesso em: 27 abril 2018.
Disponível em: <http://blogs.correiobraziliense.com.br/dribledecorpo/5688-2/>
Acesso em: 27 abril 2018.
Disponível em <http://guiademarketing.com.br/eras-do-marketing-1-0-2-0-e-3-0/>
Acesso em: 28 abril 2018.
Disponível em: <https://pt.linkedin.com/pulse/entenda-diferen%C3%A7a-entre-omarketing-10-20-e-30-bruno-cioffi-braga Acesso em: 28 abril 2018.
Disponível em: <http://esporte.ig.com.br/futebol/2016-09-16/uefa-championsaumento-publico.html> Acesso em: 28 abril 2018.
Disponível em: <http://app.globoesporte.globo.com/futebol/publico-nobrasil/2016/taca- libertadores/> Acesso em: 28 abril 2018.
Disponível em: <http://www.mktesportivo.com/2018/02/5718/ > Acesso em: 28 abril
2018.
Disponível em: <https://universidadedofutebol.com.br/a-importancia-do-patrocinioesportivo-para-as-empresas/> Acesso em: 05 maio de 2018.
Disponível em: <https://palmeirasacademy.wordpress.com/2017/05/21/sociotorcedor-qual-clube-tem-o-maior-e-melhor-programa-entre-os-times-brasileiros/ >
Acesso em: 02 maio 2018.
Disponível em: <http://ataquemarketing.com/marketing/marketing-esportivo-tudoprecisa-saber/ > Acesso em: 07 junho 2018.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.7, p.70383-70401 jul. 2021 ISSN: 2525-8761
525
CAPÍTULO 29
ESTRATÉGIA COMPLEMENTAR DE ATENDIMENTO À SAÚDE NA CIDADE RIBEIRINHA
DE MANICORÉ-AMAZONAS
Eliane Patrícia Cervelatti
Docente - Curso de Medicina
Bióloga Doutora em Ciências (Genética) pela USP
Rua Kameo Ussui, no 312, Pinheiros, Araçatuba-SP
E-mail: ecervelatti@hotmail.com
Amanda Kaori Hamamoto
Graduanda - Curso de Medicina
Estudante do UniSALESIANO - Centro Universitário Católico Salesiano Auxilum
Rua Barão do Triunfo, no 921, Paraíso, Araçatuba-SP
E-mail: amanda-kaori@hotmail.com
Caroline Mohr
Graduanda - Curso de Medicina
Estudante do UniSALESIANO - Centro Universitário Católico Salesiano Auxilum
Rua José Lourenço, no 300, apto 101 torre B, Concórdia, Araçatuba-SP
E-mail: carolinemohr@hotmail.com
Júlia Loli Barbosa
Graduanda- Curso de Medicina
Estudante do UniSALESIANO - Centro Universitário Católico Salesiano Auxilum
Rua Dr. Luiz Carlos Bertechini, no 2275, Torre Olivia apto 94, Paineiras, Birigui-SP
E-mail: julialolibarbosa@outlook.com
Mariana Toshie Brufatto Sumita
Graduanda- Curso de Medicina
Estudante do UniSALESIANO - Centro Universitário Católico Salesiano Auxilum
Rua Ana Luisa da Conceição, no 509, Centro, Mirandópolis-SP
E-mail: marianasumita98@gmail.com
RESUMO: Introdução: O acesso aos serviços de saúde públicos passa por problemas
na sua universalidade, principalmente nas comunidades afastadas, com isso a
população busca por meios alternativos a resolução dessas carências. A “Farmácia
Verde”, localizada em Manicoré – Amazonas (AM) disponibiliza tratamentos de
enfermidades com recursos naturais, como chás, ervas e florais. Objetivo: analisar a
atuação da Farmácia Verde como medida complementar de saúde pública na
população ribeirinha de Manicoré – AM considerando-se a efetividade do tratamento
proposto para as respectivas queixas da população. Metodologia: aplicação de dois
questionários aplicados pelos funcionários da Farmácia Verde (o primeiro identificou
o que motivou a procura pelos serviços e tratamento proposto e o segundo, a
satisfação quanto aos resultados). Resultados: Observou-se que as queixas da
população são sanadas em sua maioria segundo percepção subjetiva dos pacientes
(88,6%) com pequenas taxas de efeitos colaterais (12,9%) contemplando desde “azia
e queimação” até mioma. Constatou-se que há uma grande taxa de retorno (75,7%)
da população demonstrando confiança no serviço prestado em eventos anteriores.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
526
Conclui-se que os serviços complementares à saúde são importantes para a
população tanto em sua individualização quanto a sua resolutividade, agregando a
medicina tradicional de forma síncrona.
PALAVRAS-CHAVE: Acesso aos Serviços de Saúde; Medicina Popular; Saúde
Pública.
ABSTRACT: Introduction: Even though it includes great part of the Brazilian
population, the access to public health services faces a severe issue in its universality,
mainly in communities apart from urbanized centers and outskirts, Therefore, some
needs are not accommodated, pushing the population to reach for alternative means
for the resolution of this lack. “Farmácia verde” (that could be translated as “Green
Pharmacy”), located in the city of Manicoré – Amazonas (AM) offers disease treatments
made with natural resources, such as herbs, teas and florals. Objective: to analyze the
performance of Farmácia Verde as a public health complementary measure in riparian
population in Manicoré – AM, considering the effectiveness of the proposed treatment
to the respective population complaints. Methodology: the data were collected in two
questionnaires (the first one aims to identify what motivated the search for the services
and treatment proposed, and the second one analyzes the satisfaction regards the
obtained results). Results: It was observed that the complaints of the population are
mostly remedied according to the subjective perception of patients (88.6%) with small
rates of side effects (12.9%) ranging from "heartburn and upset stomach" to fibroid. It
was found that there is a high rate of return (75.7%) of the population demonstrating
confidence in the service provided in previous events. It is concluded that
complementary health services are important for the population both in their
individualization and in their resoluteness, adding traditional medicine in a
synchronous way.
KEYWORDS: Access to health services; Folk medicine; Public health.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
527
1. INTRODUÇÃO
Saúde pública é compreendida como o esforço organizado da sociedade,
principalmente através de instituições de cunho público para aprimorar, promover e
restabelecer a saúde das populações através de execuções que alcancem o coletivo
(ALMEIDA, 2013).
Apesar de abranger boa parte da população brasileira, o acesso aos serviços
de saúde públicos enfrenta um sério problema na sua universalidade, principalmente
nas comunidades afastadas das regiões urbanizadas, periferias e outras populações
em estado de vulnerabilidade (IBGE, 2009).
Na verdade, essa parcela da população brasileira não tem acesso as ações e
serviços de saúde necessários para a resolução de seus problemas. Tal fato está
associado a heterogeneidade das regiões brasileiras, corrupção no processo de
repasse de verbas, construção de formas de responsabilização de governantes e
cidadãos e falta de acessibilidade. Há também uma contraditória distribuição de
recursos em nosso país, onde regiões menos favorecidas têm menos serviços de
saúde. Além disso, há também ações que não são planejadas corretamente por parte
de setores governamentais, fazendo com que essas fiquem fragmentadas, gerando
um desperdício de recurso público (LUCCHESE, 2004).
Essas dificuldades de encontrar equilíbrio entre a gestão dos âmbitos políticoadministrativas do Estado refletem diretamente na população, que busca meios
alternativos de sanar suas necessidades, sem perder o saber técnico-científico. Um
exemplo bem sucedido é observado em Manicoré, cidade ribeirinha no interior do
Amazonas, norte do Brasil, com 54.708 habitantes, à margem direita do Rio Madeira,
distante 390 km de Manaus (Capital do estado), cuja principal fonte de renda da
população é predominante através de produções agrícolas, como banana e melancia
(PREFEITURA DE MANICORÉ. Prefeitura de Manicoré, 2017). Ali foi inaugurada a
“Farmácia Verde” em outubro de 2012, graças ao trabalho árduo por parte da Igreja
Católica e voluntários. Seu objetivo é contribuir com a Saúde Pública do município
através de múltiplas abordagens, dentre elas: educação em saúde, educação
sanitária, amplificação dos meios naturais de tratamento das doenças ou outras
condições, promoção de saúde e captação de recursos naturais (FAVERO, 2018).
No atendimento, além da escuta da queixa do paciente, é realizada uma
avaliação bioenergética, um método que busca entender a maneira pela qual a
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
528
vitalidade está relacionada com o corpo e seus processos energéticos (MINISTÉRIO
DA SAÚDE, 2018). Esse procedimento é novamente aplicado ao paciente em um seu
retorno 15 dias após o primeiro atendimento, com isso a Farmácia Verde consegue
estabelecer se houve melhora após instituição do tratamento proposto.
Vale ressaltar que a Farmácia Verde não é um “método” substitutivo de um
hospital, mas sim uma maneira de complementar os pilares da saúde: espiritual, físico
e mental, haja vista que é necessário o equilíbrio dos três para harmonia que tanto se
busca. Além disso, destaca-se a forma pela qual a Farmácia Verde realiza seus
trabalhos em conjunto com órgãos de saúde da cidade de Manicoré, como Unidades
Básicas de Saúde (UBS), hospitais, prefeitura e a própria Secretaria de Saúde do
município. Reuniões são realizadas entre essas entidades e a Farmácia Verde para
que haja um alinhamento de pensamentos e intervenções, bem como para que
possam trabalhar de forma sinérgica dentro da cidade (PREFEITURA DE
MANICORÉ. Prefeitura de Manicoré, 2021).
Diante desse contexto, o presente artigo teve como objetivo analisar a atuação
da Farmácia Verde como medida complementar de saúde pública na população
ribeirinha de Manicoré-AM, considerando-se a efetividade do tratamento proposto
para as respectivas queixas segundo a satisfação dos usuários quanto aos resultados
obtidos após o tratamento da Farmácia Verde.
2. MÉTODOS
Trata-se de uma pesquisa de campo com finalidade aplicada, de natureza
observacional, quantitativa descritiva, exploratória e com delineamento longitudinal
(FRANCO; DANTAS, 2019). O projeto foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética
em
Pesquisa
(CEP)
através
do
parecer
número
4.479.852
e
CAAE:
40284920.5.0000.5379. O material usado para a coleta dos dados (dois questionários
semiestruturados, bem como o Termo de Consentimento Livre Esclarecido - TCLE),
foi enviado para Manicoré-AM através do correio.
Os questionários foram aplicados pelos funcionários e voluntários da Farmácia
Verde (seguindo as instruções dadas pelos pesquisadores). Após a assinatura do
TCLE foi aplicado o questionário 1 que obteve as seguintes informações: 1) dados
socioeconômicos dos participantes; 2) motivo da procura pelo serviço da Farmácia
Verde e 3) tratamento proposto (Figura 1). Após 15 dias, no retorno para uma nova
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
529
consulta, foi aplicado o questionário 2, que analisou, por exemplo, a satisfação quanto
aos resultados obtidos (Figura 2).
Figura 1 – Questionário 1 (inicial) aplicado na admissão do paciente na Farmácia Verde
Fonte: elaborado pelos próprios autores. Araçatuba-SP, Brasil, 2021.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
530
Figura 2 – Questionário 2 aplicado aos pacientes da Farmácia Verde após 15 dias da admissão.
Fonte: elaborado pelos próprios autores. Araçatuba-SP, Brasil, 2021.
Os critérios de inclusão foram: ter mais que dezoito anos de idade, ambos os
sexos, aceitar participar voluntariamente da pesquisa, assinar o TCLE, procurar o
serviço
da
Farmácia
Verde
durante
o
desenvolvimento
da
pesquisa,
comprometimento com o tratamento proposto pela Farmácia Verde e retornar em
quinze dias para reavaliação e preenchimento do segundo questionário. Os critérios
de exclusão foram: ter menos que dezoito anos de idade em ambos os sexos, recusar
assinar o TCLE, o não retorno para avaliação em quinze dias, a não aderência ao
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
531
tratamento proposto pela Farmácia Verde, analfabetos e indivíduos incapazes de
responder por si mesmo (capacidade mental ou autonomia reduzida).
O tempo total de coleta de dados foi de aproximadamente 90 dias. Após o
término do prazo estabelecido os questionários retornaram, através do correio, para
a cidade de Araçatuba – São Paulo onde foram avaliados. Os dados foram tabulados
no Excell 365TM e analisados pelo software Jamovi 1.6.
3. RESULTADOS
Ao todo, 70 usuários dos serviços prestados pela Farmácia Verde participaram
da presente pesquisa, totalizando 140 questionários (contabilizando os questionários
1 e 2). Através da análise dos dados do questionário 1 foi possível observar o perfil
epidemiológico e socioeconômico dos usuários da Farmácia Verde, no qual a maioria
era do sexo feminino (80%), solteiros (55,7%), com renda mensal de 1-2 saláriosmínimos (67,2%) e idade média de 41,8 anos. Observou-se também que a maioria
alega não possuir hábito e vícios (75,7%), tais como tabagismo e etilismo, bem
como praticar alguma atividade física durante a semana (60%). Além disso, a
maior parte dos usuários do serviço relatou não ser a primeira vez que utilizaram os
serviços prestados pela Farmácia Verde (75,7%) (Tabela1).
Tabela 1 – Perfil epidemiológico e socioeconômico dos usuários da Farmácia Verde
Usuários da Farmácia Verde
n
%
Idade
18 - 34 anos
1
35 - 50 anos
2
51 - 65 anos
Sexo
7
Feminino
6
Masculino
Outro
Estado civil
4
Solteiro
9
Casado
Viúva (o)
1
2
3
1
5
1
0
3
2
3
30
45
25
80
20
0
55, 7
30
4,3
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
532
5
2
Outro
Não informado
Escolaridade
EFI
EFC
0
EMC
EMI
4
ESC
Renda (R$)
1
1-2 salários mínimos
3-4 salários mínimos
5-6 salários mínimos
Acima de 6 salários
Desempregado
Não informado
Outro
Hábitos e vícios
7
Etilismo
Tabagismo
Drogas ilícitas
3
Não possui
Ex-etilista
Atividade física
3
Sim
2
Não
1ª vez na Farmácia Verde?
8
Sim
7
Não
Procurou outro serviço
antes?
3
Sim
5
Não
4
2
1
2
3
3
4
7
2
0
1
7
6
1
3
0
5
1
UBS
6
Clínico
Serviço especializado
7
2,9
14, 3
34, 3
4,3
3
4
67, 2
10
2,9
0
1,4
10
8,5
18,6
4,3
0
75, 7
60
2
40
1
24,3
5
5, 7
4
4, 3
2
3
1,4
1
1
3
,
1,4
1
Não informado
Qual serviço?
7,1
2,9
3
4
,
35,5
37,8
6,7
8
17,8
Hospital
1
Outro
2,2
Fonte: Elaborado pelos próprios autores. Araçatuba–SP, Brasil, 2021.
EFI: Ensino fundamental incompleto; EFC: ensino fundamental completo; EMC: ensino médio completo;
EMI: ensino médio incompleto; ESC: ensino superior completo.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
533
Além disso, a análise dos dados revelou que a maioria dos participantes
procurou o serviço prestado pela Farmácia Verde por “cefaleia” (15,95%) e por “azia e
queimação” (12,76%). Outras queixas também foram “dor de barriga” com 9,57% e
dor nas costas com 8,51%. As queixas em sua totalidade encontram-se na tabela
abaixo (tabela 2).
Tabela 2 - Sintomas mais frequentes apresentados pelos usuários da Farmácia Verde.
Sintomas
Cefaleia
Azia, queimação
Dor de barriga
Dor nas costas
Ansiedade
Dispneia
Insônia
Menopausa
Dores reumatoides
Infecção urinária
Metrorragia
Alergia
Catarata
Cisto ovariano
Depressão
Diabetes
Dor de estômago
Dor na articulação
Dor no peito
Dor no quadril
Dor nos braços
Edema de membros de inferiores
Esteatose hepática
Ferida no colo do útero
Infecção
Lúpus
Mioma
Nervosismo
Parestesia no corpo
Pico hipertensivo
Próstata
Tireoide
Útero
Não informado
Frequência
%
15,95
15
12,76
12
9,57
9
8,51
8
6,38
6
4,25
4
4,25
4
3,19
3
2,12
2
2,12
2
2,12
2
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
1,06
1
5,31
5
Fonte: Elaborado pelos próprios autores. Araçatuba–SP, Brasil, 2021.
Com relação à efetividade do tratamento oferecido, observou-se uma
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
534
maciça resolução dos sintomas apresentados na consulta inicial em 88,6% dos
usuários, com melhora relatada pelos próprios e avaliação da Farmácia Verde. Além
disso, observa-se que 95,7% dos pacientes seguiram todas as recomendações dadas
pela Farmácia Verde. No entanto, é importante ressaltar que mesmo se baseando em
um tratamento 100% natural, em alguns casos (12,9%) houve efeitos colaterais como
constipação, palpitação, dor no estômago, diarreia, tontura e vômitos (Tabela 3).
Tabela 3 - Resultados baseados na opinião dos pacientes após intervenção terapêutica da Farmácia
Verde.
n
Usuários da Farmácia
Verde
%
Melhora após o tratamento
Sim
Não
Parcialmente
Não informado
Efeito colateral durante o tratamento
Sim
2
Não
Não informado
Seguiu as instruções do tratamento
8
Sim
Não
Parcialmente
Avaliação pessoal da Farmácia Verde
7
8
9
7
10
6
0
7
1
9
5
3
6
0
3
1
4
7
5
88,6
0
10
1,4
12,9
82,9
4,3
95,7
0
4,3
1,4
5,7
10
8
82,9
Fonte: Elaborado pelos próprios autores. Araçatuba–SP, Brasil, 2021.
Uma das variáveis analisadas no presente trabalho foi o tratamento utilizado
pela Farmácia Verde para as enfermidades dos seus usuários. A análise dessas
informações mostrou que embora algumas pessoas tenham apresentado a mesma
queixa, o tratamento difere entre si, conferindo assim um tratamento individualizado
não apenas baseado na enfermidade, mas sim na pessoa em sua totalidade. A tabela
4 a seguir demonstra essa individualização ao comparar os diversos tratamentos
realizados para as principais queixas apresentadas isoladamente pelos usuários
(quando não acompanhado de quaisquer outras queixas).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
535
Tabela 4 - Comparação entre os tratamentos dos principais sintomas isolados dos usuários da
Farmácia Verde.
Sintomas
Indivíduo
1
2
3
4
Azia e
queimação
5
6
7
8
1
2
Tratamentos
1) Chá: camomila, gervão, alfazema, bidens pilosa - 1 xícara 2 vezes
ao dia por 7 dias.
2) Florais: agrimony, rock rose, vervain, aspen, impatiens - 4 gotas 3
vezes ao dia.
3) Composto para estômago - 40 gotas 3 vezes ao dia.
4) Composto para gordura no fígado - 45 gotas 2 vezes ao dia.
1) Chá: unha de gato, malva calêndula, tansagem, losna, sete sangrias,
flor da mamão macho – tomar por 15 dias.
2) Essência de própolis 7 gotas em um pouco de água – 2 vezes ao
dia.
3) Pomada anti-inflamatória.
1) Chá: canela de velho, erva baleeira, hipérico, cavalinha, alfavaca,
macela e gervão - tomar 500ml por dia durante 10 dias. Melão são
Caetano, chapéu de couro, mastruz, folha de amora.
2) Repositor hormonal fervido: 2 vezes ao dia – tomar puro.
1) Chá: camomila, gervão, espinheira-santa, chapeu de couro, unha de
gato, tansagem, mão de Deus. Tomar 1 litro de chá ao dia por 15 dias.
1) Chá: losna, gervão, espinheira-santa, mururé, canarana, mulungu,
unha de gato. Tomar 1 litro de chá ao dia por 15 dias.
2) Bálsamo digestivo: jucá, puxuri, sálvia, hortelã, alfazema, boldo,
casca preciosa, casca de laranja. Tomar 30 gotas antes das refeições.
1) Chá: melão são caetano, bidens pilosa, tansagen, salsaparrilha,
alfafa, gervão, cipó, mulungu.
1) Chá: terramicina, espinheira santa, corama, carqueja, dente de leão,
equinácea, barbatimão, alcaçuz, folha de mamão. Tomar 1 litro por dia
por 15 dias.
2) Florais: nux vomica CH 13. Tomar 5 gotas 3 vezes ao dia.
1) Chá: espinheira santa, gervão, barbatimão, carqueja, folha de mamão
macho, jaraquicoa, cavalinha. Tomar 1 litro de chá por dia por 15 dias
2) Tintura: espinheira santa, gervão, corama, boldo. Tomar 25 gotas
antes das refeições
3) Florais: Star of bethlehem, honeysuckle, gorse, aspen . Tomar 8 gotas
3 vezes ao dia.
1) Chá: catuaba, melão são caetano, vassourinha de botão, cavalinha,
carqueja, ginseng (ou erva cidreira).
2) Vinagre de maçã.
1) Folha de maracujá, marapuama, melão são caetano, alcaçuz,
sassafrás, jaraquicará, hipérico: tomar 1 litro de chá ao dia por 15
dias.
2) Cantharis CH 7: tomar 5 gotas 3 vezes ao dia.
3) Florais: Elm, Impatiens, mimulus, Cherry Plum - tomar 8 gotas 3
vezes ao dia.
Cefaleia
3
1) Chá: Dente de leão, tansagem, quebra pedra, taiuá, sete-sangrias,
alfavaca, salsaparrilha por 10 dias.
4
1) Chá: jucá, equinácea, hipérico, unha de gato, terramicina, gervão,
barbatimão. Tomar 1 litro de chá ao dia por 15 dias.
2) Nux vomeca CH
13: Tomar 5 gotas 3 vezes ao dia.
3) Florais: willow, holly, mustard, aspen, cherry plum. Tomar 8 gotas 8
vezes ao dia.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
536
5
1) Chá: unha de gato, crajiru, cavalinha, mururé, camomila, gervão, uxi.
Tomar 1 litro de chá ao dia por 15 dias.
2) Composto de 7 ervas: folha de algodoeiro roxo, crajuru, jucá, casca de
copaiba, uxi, sucuba, caju açu e vinho. Tomar 1 colher de sopa 3 vezes
ao dia.
6
1) Chá: Moringa, tansagen, jucá, sete sangrias, mulungu, dente de leão,
japecanga. Tomar 1 litro de chá ao dia por 15 dias.
2) Usar argila nos olhos por 10 minutos.
7
1) Chá: crajiru, ipê-roxo, moringa, pata de vaca, bidens pilosa, gervão,
chapéu de couro, pitanga. Tomar 500ml de chá por dia por 15 dias
2) Composto: espinheira-santa, gervão, corama, boldo. Tomar 30 gotas
3 vezes ao dia.
3) Floral: white chestnut, impatiens, vervain, chicory, vine, aspen,
hornbeam. Tomar 8 gotas 3 vezes ao dia.
1) Chá: camomila, unha de gato, espinheira santa, gervão, bidens pilosa,
tansagen, açoita cavalo. Tomar 1 litro de chá por dia por 15 dias
2) Xarope: flor de bananeira, gengibre, limão, casca de uxi, mel ou
8
açúcar. Tomar 1 colher de sopa 3 vezes ao dia
3) Florais: heather, gorsi, rock rose, aspen, cherry plum. Tomar 8 gotas
3 vezes ao dia.
Fonte: Elaborado pelos próprios autores. Araçatuba–SP, Brasil, 2021.
4. DISCUSSÃO
Sabe-se que há milhares de anos o homem busca de artifícios para melhorar
sua qualidade de vida buscando muitas das vezes na natureza esse suporte
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006). Por exemplo, na Grécia antiga, Teofrasto (372-285
a.C) chegou a catalogar aproximadamente 500 espécies vegetais. Já Hipócrates (460361 a.C), considerado o pai da medicina, deixou a obra “Corpus Hippocraticum”, onde
há catalogada diversas espécies vegetais e seus respectivos usos (ASSOCIAÇÃO
PAULISTA DE NATUROLOGIA, 2007). No Brasil, é dos índios a tradição do uso de
plantas tanto em rituais sagrados quanto em rituais de cura. Sabe-se que com a
colonização, os conhecimentos se fundiram, permitindo o desenvolvimento de
técnicas que são vistas hoje (BRAGA, 2011).
O uso de plantas medicinais faz parte da prática do que é chamado de
“medicina popular”, que consiste em um conjunto de saberes que são detidos por
usuários e/ou praticantes imersos a aquele meio onde se tem esse costume. O
conhecimento desses saberes é passado, habitualmente, pela tradição oral. Tendo em
vista que é um tratamento complementar e síncrono a medicina tradicional, geralmente
de baixo custo, usualmente é empregado em populações com rendas mais baixas,
corroborando com os achados no presente artigo, o que torna o serviço muito
importante para essa população mais carente (BRUNING et al., 2012).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
537
A procura pelos serviços da Farmácia Verde foi majoritariamente do sexo
feminino (80%) e idade média de 41,8 anos. Ambos os dados encontrados são fatores
preditores de maior busca por assistência a saúde (LEVORATO, 2013). Além disso,
há estudos que mostram a menor procura a serviços de saúde pelos homens, seja por
questões sociais, associação do “cuidar” como sendo algo do âmbito feminino, medo
de descobrir uma doença grave, vergonha de exposição do corpo, entre outros motivos
(GOMES et al., 2007).
As limitações de acesso à zona urbana, atreladas à realidade econômica
desfavorável, parecem impactar de uma maneira positiva na saúde física dos usuários
da Farmácia verde quanto a prática de atividades físicas, visto que os pacientes
utilizam principalmente bicicletas e caminhadas para se locomoverem (FAVERO,
2018). Além disso, é evidente que com o alto índice de pessoas com baixo nível
socioeconômico, por vezes é necessário ir até a cidade mais próxima de barco não
motorizado, já que grande parte das pessoas não apresentam condições de possuir
um barco motorizado (GAMA et al., 2018).
Nessa amostra populacional analisada, notou-se que o sintoma mais frequente
é o de “cefaleia” (15,95%), seguido por “azia e queimação” (12,76%) e “dor de barriga”
(9,57%%). As condições precárias de saneamento e o consumo de água imprópria
diretamente dos rios e lagos podem contribuir para a piora dos sintomas relacionados
ao trato gastrointestinal (GAMA et al., 2018).
Considerando a individualidade de cada pessoa, associando-se as queixas das
mesmas, observou-se que o tratamento proposto pela Farmácia Verde é de natureza
individual, respeitando as limitações, crenças, situações econômicas e socioculturais
de seus usuários (CONASS, 2015), visto que a mesma queixa (exemplo: cefaleia)
apresenta tratamentos divergentes entre os pacientes. Isso tudo porque ao se passar
um tratamento ao paciente, deve-se considerar aspectos tais como: posologia, modo
de armazenamento, farmacodinâmica, farmacocinética, associações, interações
medicamentosas, efeitos colaterais, entre outros (SANTI, 2016).
Um ponto importante de orientação em relação ao tratamento para o paciente
é sobre os efeitos colaterais daquilo que lhe fora prescrito, pois mesmo se tratando de
algo natural, pode apresentar efeitos adversos, o que foi evidenciado em alguns
pacientes no presente trabalho (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).
Estima-se que aproximadamente 40% dos medicamentos atualmente
disponíveis foram desenvolvidos direta ou indiretamente a partir de fontes naturais,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
538
assim subdivididos: 25% de plantas, 12% de micro-organismos e 3% de animais
(CALIXTO, 2001). A capacidade do uso das plantas para fins medicinais encontra-se
longe de estar extenuada já que embora o nosso país possua a maior diversidade
vegetal do mundo, com cerca de 60.000 espécies vegetais superiores catalogadas
(PRANCE, 1977), apenas 8% foram estudadas para pesquisas de compostos
bioativos e 1.100 espécies foram avaliadas em suas propriedades medicinais
(GUERRA et al., 2001). Os usuários da farmácia verde em sua grande maioria (88,6%)
relataram melhora dos sintomas, evidenciando-se, portanto, a necessidade de novos
estudos que busquem explorar a grande variedade de plantas que poderiam estar
sendo utilizadas como matéria prima para novas medicações, beneficiando assim um
maior número de pacientes.
A grande maioria dos pacientes encontrou-se satisfeito com as medidas
propostas pela Farmácia Verde, de forma que 82,9% atribuiu a nota dez ao serviço e
75,7% dos usuários declararam não ser a primeira vez que compareceram à Farmácia
Verde, o que denota confiança no serviço prestado.
Entende-se, portanto, a importância de que serviços como estes, prestado pela
Farmácia Verde, sejam estudados de forma mais intensa pela comunidade científica.
Um dado que corrobora isso é que em 2009 fora sancionado um decreto presidencial
a fim de operacionalizar o Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos
no Brasil (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).
5. CONCLUSÃO
Diante da situação socioeconômica em que o país está imerso, ressalta-se a
importância de medidas complementares à saúde pública como é realizado na
Farmácia Verde, em Manicoré, tendo em vista a dificuldade de acesso da população
aos serviços especializados. O presente trabalho conclui que a Farmácia Verde é
resolutiva na maioria das queixas apresentadas pelos usuários, possuindo pouca taxa
de efeitos colaterais e maciça satisfação dos pacientes, já que a mesma aborda de
forma individualizada, levando em conta não apenas os fatores fisiopatológicos da
doença, mas também os aspectos biopsicossociais de cada pessoa. Isto reforça a
importância de que serviços como esse, prestado pela Farmácia Verde, sejam
estudados de forma mais intensa pela comunidade científica para maior benefício da
população.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
539
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, N. D. A saúde no Brasil, impasses e desafios enfrentados pelo
Sistema Único de Saúde-SUS. Recife: Revista Psicologia e Saúde, 2013.
ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE NATUROLOGIA. Fitoterapia. Associação Paulista de
Naturologia, 2007. Disponível em: <http://apanat.org.br/fitoterapia/>. Acesso em: 11
ago. 2021.
BRAGA, Carla de Morais. Histórico da utilização de plantas medicinais. 2011.
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. SECRETARIA DE CIÊNCIA, Tecnologia e
Insumos Estratégicos. Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos
Estratégicos. A fitoterapia no SUS e o Programa de Pesquisas de Plantas
Medicinais da Central de Medicamentos. Ministério da Saúde, 2006.
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. SECRETARIA DE ATENÇÃO À SAÚDE.
Departamento de Atenção Básica. Práticas integrativas e complementares:
plantas medicinais e fitoterapia na Atenção Básica/Ministério da Saúde.
Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. – Brasília:
Ministério da Saúde, 2012
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Departamento de Atenção Básica. Conhecendo
as Práticas Integrativas e Complementares em Saúde: Bioenergética.
Coordenação Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde. – 1.
ed. – Brasília: Ministério da Saúde, 2018.
BRUNING, Maria Cecilia Ribeiro; MOSEGUI, Gabriela Bittencourt Gonzalez;
VIANNA, Cid Manso de Melo. A utilização da fitoterapia e de plantas medicinais em
unidades básicas de saúde nos municípios de Cascavel e Foz do Iguaçu-Paraná: a
visão dos profissionais de saúde. Ciência & saúde coletiva, v. 17, 2012.
CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE. Atenção Individualizada.
Brasília, DF, 2015
FAVERO, L.; ORNELLAS, A. L.; CERVELATTI, E. P. Conhecimento popular e
ciência: uma parceria de sucesso no interior da Amazônia, o uso de plantas
medicinais. Araçatuba: Missão Salesiana de Mato Grosso, 2018.
FRANCO, M. V. A.; DANTAS, O. M. A. N. A.; Pesquisa exploratória: aplicando
instrumentos de geração de dados- observação, questionário e entrevista.
Curitiba: Anais do XIII Congresso Nacional de Educação, 2017.
GAMA, Abel Santiago Muri; FERNANDES, Tiótrefis Gomes; PARENTE, Rosana
Cristina Pereira; et al. Inquérito de saúde em comunidades ribeirinhas do Amazonas,
Brasil. Cadernos de Saúde Pública, v. 34, 2018.
GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, IBGE. Disponível em:
<https://cidades.ibge.gov.br/brasil/am/manicore/panoram>. Acesso em: 20 ago.
2020.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
540
GOMES, Romeu; NASCIMENTO, Elaine Ferreira do; ARAÚJO, Fábio Carvalho de.
Por que os homens buscam menos os serviços de saúde do que as mulheres? As
explicações de homens com baixa escolaridade e homens com ensino superior.
Cadernos de Saúde Pública, v. 23, 2007.
LEVORATO, Cleice Daiana; MELLO, Luane Marques de; SILVA, Anderson Soares
da; et al. Fatores associados à procura por serviços de saúde numa perspectiva
relacional de gênero. Ciência & saúde coletiva, v. 19, 2014.
LUCCHESE, P. T. R. et al. Informação para tomadores de decisão em saúde
pública. Tema: políticas públicas em saúde. São Paulo: BIREME/OPAS/OMS,
2004.
NASCIMENTO JÚNIOR, JM; PAGANELLI, MO; TAVARES, NUL; et al. Uso
Racional de medicamentos: fundamentação em condutas terapêuticas e nos
macroprocessos da Assistência farmacêutica. Brasília: OPAS/OMS, 2016.
ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DE SAÚDE. Medição do desempenho das
funções essenciais de saúde pública: guia para aplicação do instrumento de
desempenho das funções essenciais de saúde pública. Rio de Janeiro, RJ,
2005.
PREFEITURA DE MANICORÉ, Prefeitura municipal, 2017. Disponível em:
<https://manicore.am.gov.br/o-municipio/sobre-o-municipio/>. Acesso em: 12 set.
2020.
PREFEITURA DE MANICORÉ, Prefeitura municipal, 2021. Disponível em:
<https://manicore.am.gov.br/governo-municipal-firma-nova-parceria-para-ampliacaoda-instituicao-farmacia-verde-em-manicore/>. Acesso em: 06 nov. 2021.
PREFEITURA DE MANICORÉ, Prefeitura municipal, 2021. Disponível em:
<https://manicore.am.gov.br/ex-deputado-luiz-castro-faz-visita-na-farmacia-verde/>.
Acesso em: 06 nov. 2021.
SOUZA, L. E. P. F. et al. Os desafios atuais da luta pelo direito universal à
saúde no Brasil. São Paulo, SP, 2019
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p.120408-120423 dec. 2021 ISSN: 2525-8761
541
CAPÍTULO 30
A PESQUISA-AÇÃO EM ANAIS
BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA
DO
SIMPEP
(2007-2016):
REVISÃO
Vera Mariza Henriques de Miranda Costa
Doutora em Economia e Livre Docente em Economia Brasileira pela Universidade
Estadual Paulista (UNESP)
Bolsista da Fundação Nacional de Desenvolvimento do Ensino Superior Particular
(FUNADESP)
Pesquisadora-Docente do Mestrado Profissional em Engenharia de Produção da
Universidade de Araraquara (UNIARA)
E-mail: verammcosta@uol.com.br
Isaque Pereira de Almeida
Mestre em Engenharia de Produção pelo Mestrado Profissional em Engenharia de
Produção da Universidade de Araraquara (UNIARA)
Coordenador de Operações e Logística - Votorantim Cimentos. Unidade de Manaus
E-mail: isaquealmeida@yahoo.com.br
RESUMO: A discussão sobre rigor metodológico na condução das investigações em
Engenharia de Produção tem sido objeto de atenção, expressa em livros e periódicos.
Nesse contexto, este artigo tem por objetivo identificar, caracterizar e avaliar a
utilização da pesquisa-ação em artigos publicados nos Anais do Simpósio de
Engenharia de Produção - SIMPEP, período 2007-2016, por meio de Revisão
Bibliográfica Sistemática (RBS). Duas questões nortearam a investigação: “qual a
incidência da pesquisa-ação, nos artigos dos Anais do SIMPEP (2007- 2016)?” e “as
investigações que utilizaram a pesquisa-ação foram conduzidas com rigor
metodológico e suporte teórico adequado?” Na primeira etapa do trabalho foi feita a
busca de artigos nos anais, usando a palavra-chave pesquisa-ação, no título, no
resumo e na relação de palavras-chave, sendo identificados 93 artigos. Após a
eliminação de artigos duplicados, foi feita a aplicação de critérios de descarte e foram
excluídos os artigos: a) apenas teóricos e b) que empregaram o termo pesquisa-ação
sem a caracterização desse tipo de pesquisa e a previsão de sistemática para sua
aplicação. Restaram 16 artigos que utilizaram a pesquisa-ação, fundamentada em
base teórica adequada, para investigar diferentes temas, sob focos diversos,
contribuindo para o conhecimento nas diversas áreas da Engenharia de Produção.
Nos artigos analisados foram observadas insuficiências metodológicas tanto na
revisão da literatura quanto no planejamento e na realização da investigação empírica.
PALAVRAS-CHAVES: Pesquisa-Ação; Revisão Bibliográfica Sistemática; Anais
SIMPEP.
ABSTRACT: The discussion about methodological rigor in the conduction of
investigations in Production Engineering has been object of attention, expressed in
books and journals. In this context, this paper aims to identify, characterize and
evaluate the use of action research in papers published in the Proceedings of SIMPEP
(2007-2016), through Systematic Literature Review (SLR). Two questions guided the
research: “what is the incidence of action research in the articles of the Proceedings of
SIMPEP (2007- 2016)?” and “have the investigations that used action research been
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
542
conducted with methodological rigor and adequate theoretical support?” In the first
stage of the study, a search was carried out in the Annals, using the keyword researchaction, in the title, in the abstract and in the list of keywords, and 93 articles were
identified. After eliminating duplicate articles, the discard criteria were applied and the
following articles were excluded: a) only the theoreticals and b) that used the term
action research without the characterization of this type of research and the systematic
forecast for its application. Remained 16 papers that used action research, based on
an adequate theoretical basis, to investigate different themes, under different focuses,
contributing to the knowledge in production engineering. In the articles analyzed,
methodological insufficiencies were observed both in the review of the literature and in
the planning and execution of empirical research.
KEYWORD: Action research; Systematic Literature Review; Proceedings of SIMPEP.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
543
1. INTRODUÇÃO
A avaliação dos métodos de pesquisa adotados na área de Engenharia de
Produção e a identificação desse enquadramento em resultados de investigações,
publicados no Brasil, têm sido objeto de reflexão de diversos autores.
As publicações de Nakano e Fleury (1996), de Berto e Nakano (1998, 1999,
2000 e 2014), de Cauchick Miguel et al. (2009) e de Nakano (2010) constituem
referência na identificação e avaliação dos tipos de pesquisa em Engenharia de
Produção. A partir de tipologia proposta por Filippini (I997), Berto e Nakano (1999 e
2000) propuseram sete tipos de pesquisa - modelagem, simulação, survey, estudo de
caso, estudo de campo, experimento e teórico conceitual - por eles utilizados para
identificar as investigações apresentadas em artigos publicados em Anais do
ENEGEP – Encontro Nacional de Engenharia de Produção, nos anos de 1996, 1997
e 1998. Posteriormente, Nakano (2010) deu continuidade à investigação desenvolvida
por Berto e Nakano nos Anais do ENEGEP, analisando os artigos do período 1999 a
2004 e englobando a avaliação anterior, referente ao período 1996 a 1998. Berto e
Nakano, em publicação de 2014, revisitaram os trabalhos de 1999 e 2000.
Nas investigações realizadas, Berto e Nakano constataram a prevalência das
pesquisas classificadas como teórico conceituais, com incidência máxima de 48,4%
e mínima de 30,1%, em relação aos demais tipos, considerados todos os anos do
período de 1996 a 2004. Identificaram os estudos de caso, com um máximo de 32,7%
e mínimo de 13,9% e os estudos de campo, com 19,8% de presença máxima e 8,8%
de mínima. Com menor participação, em relação aos tipos anteriores e considerando
maior e menor participação, nos diversos anos do período estão: modelagem – 16,5%
e 3,3%; simulação – 9,7% e 2,7%; survey – 5,3% e 2,0%; e experimento – 2,3% e 0,7%
(BERTO; NAKANO, 1999 e 2000). Berto e Nakano (1999 e 2000) não destacaram, em
suas investigações, a incidência da pesquisa-ação, provavelmente, em razão da
presença pouco significativa desse tipo de pesquisa no período que, assim sendo,
deve ter sido computada na categoria estudo de campo.
Em outros textos têm sido apresentadas conceituação, análise e avaliação
crítica dos tipos de pesquisa utilizados nas investigações desenvolvidas na área de
Engenharia de Produção. Além dos textos de Berto e Nakano (1998, 1999, 2000 e
2014) e de Nakano (2010), podem ser destacados os artigos de: Nakano e Fleury
(1996); Cauchick Miguel (2005, 2007, 2010a, 2010b, 2010c); Cauchick Miguel et al.,
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
544
(2009); Fleury (2010); Turrioni e Mello (2010 e 2012); Mello et al. (2012); Costa (2013).
Muitos desses autores expressaram preocupação com o cumprimento do rigor
metodológico na adoção de tipos ou estratégias de pesquisa por parte da Engenharia
de Produção, tanto no que diz respeito à revisão da literatura quanto ao planejamento
e à realização da investigação empírica.
Costa (2013) aponta o enquadramento metodológico incorreto, como “estudo
de caso” como estratégia de pesquisa, em artigos publicados nos Anais do SIMPEP
(2007- 20120), inclusive nos classificados pelo evento como “melhores artigos”.
Nakano (2010) manifesta sua apreensão pelo frequente uso inadequado do
método de pesquisa na Engenharia de Produção e reforça a necessidade de tomada
de posição mais rigorosa a esse respeito, a fim de que se obtenha maior inserção da
pesquisa em engenharia de produção no circuito internacional.
Mello et al. (2012) relatam que uma das principais críticas feitas à adoção da
pesquisa-ação é que sua utilização por vezes é feita como se estivesse sendo
desenvolvido projeto de consultoria, relatando acontecimentos sem preocupação com
a teoria.
Menelau et al. (2015), a partir de avaliação de 44 periódicos nacionais de
Administração e de publicações em 38 encontros ou simpósios da Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (ANPAD), referentes aos
anos de 2000 a 2010, identificaram a utilização do conceito de pesquisa-ação, mas
avaliaram que os relatos de sua aplicação foram deficientes: não foram
suficientemente definidos e apresentados.
Chisté (2016) chama a atenção para a relevância da pesquisa-ação nos
mestrados profissionais e a tendência à adoção dessa modalidade, dado o perfil do
mestre que se pretende formar e o tipo de pesquisa que deverá dar suporte à
dissertação desenvolvida, com direcionamento aplicado. A autora, após analisar
dissertações apresentadas em um programa de mestrado profissional em ensino de
ciências e de matemática, observou que, das cinco dissertações produzidas no
programa em dois anos, que explicitaram a pesquisa- ação como metodologia adotada,
apenas uma cumpriu os pressupostos fundamentais da pesquisa-ação e estabeleceu
relações teóricas mais aprofundadas com esse tipo de pesquisa.
Toledo, Giatti e Jacobi (2014), a partir de revisão bibliográfica sobre aplicação
da pesquisa-ação em teses e dissertações defendidas nas três Universidades
Estaduais Paulistas – USP, INICAMP e UNESP – no período 1990 a 2010, identificaram
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
545
a crescente aplicação da metodologia da pesquisa-ação em pesquisas acadêmicas,
tanto em nível de mestrado, como de doutorado. De 1990 a 2000 foi constatada a
realização de 45 pesquisas, tendo esse número crescido para 228 de 2001 a 2010,
indicando o aumento desse tipo de pesquisa.
Assim sendo, justifica-se o desenvolvimento de investigações e avaliações
referentes à condução metodológica das pesquisas em engenharia de produção, de
modo geral e considerando determinado tipo de pesquisa. A preocupação dos autores
com o rigor metodológico, que se expressa tanto na revisão teórico conceitual quanto
na previsão e execução do trabalho empírico, motivou a investigação de um tipo de
pesquisa que não esteve no foco da avaliação de Berto e Nakano (1998, 1999 e 2000)
e de Nakano (2010): a pesquisa-ação.
Nesse contexto, constitui objetivo do presente artigo identificar, caracterizar e
avaliar a utilização da metodologia da pesquisa-ação em artigos publicados nos Anais
do SIMPEP, no período 2007-2016, por meio de Revisão Bibliográfica Sistemática
(RBS).
2. PESQUISA-AÇÃO:
ÂMBITO
DA
UTILIZAÇÃO,
CONCEITO E
CARACTERÍSTICAS
Tripp (2005) relata diversos tipos de pesquisa-ação com aplicação em
diferentes campos, dentre os quais estão ensino, administração, saúde, mudança
organizacional, geração de tecnologia, mudança política.
A utilização da Pesquisa-Ação pode ser identificada em periódicos de diversas
áreas, por ordem de maior presença, nas áreas de Educação e de Saúde, de
Administração e de Engenharia de Produção (SCIELO, 2017).
Yin (2015), Turrioni e Mello (2010) e Martins (2010) arrolam a pesquisa-ação
como tipo, método ou estratégia de pesquisa utilizada pela engenharia de produção.
Segundo Martins (2010, p. 53) “Os métodos de pesquisa mais apropriados na área de
engenharia de produção para conduzir uma pesquisa qualitativa são o estudo de caso
e a pesquisa ação”.
Segundo Yin (2015) a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa planejada e
realizada em estreita associação com a resolução de um problema, para cujo
diagnóstico, planejamento de resolução e implementação de soluções são
desenvolvidas ações, coletivamente, estando nelas envolvidos, de modo cooperativo
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
546
e participativo, pesquisadores e demais componentes da coletividade em questão.
Nos termos de Thiollent (1994 e 1997):
A pesquisa-ação consiste essencialmente em acoplar pesquisa e ação
em um processo no qual os atores implicados participam, junto com os
pesquisadores, para chegarem interativamente a elucidar a realidade
em que estão inseridos, identificando problemas coletivos, buscando e
experimentando soluções em situação real. Simultaneamente, há
produção e uso de conhecimento (THIOLLENT, 1997, p. 14).
Segundo Kelch et al. (2020), a pesquisa-ação traz resultados valiosos para
os pesquisados, dado que, além de contribuir para a correção de algum problema,
suscita a reflexão sobre condições daquele ambiente, anteriormente não realizada.
Após o estudo concluído, os participantes saberão como podem se
contextualizar dentro de seu próprio sistema e, também, qual o reflexo
de uma ação nos processos anteriores e posteriores. Essa interação
pode gerar resultados não previstos pelo pesquisador, uma vez que
podem ocorrer alterações no projeto se alguma sugestão e/ou crítica
vinda dos pesquisados for considerada. (KELCH et al., 2020, p. 81615).
Cabe, portanto, destacar as seguintes características da pesquisa-ação: trata-se
de pesquisa com base empírica, conduzida em tempo real, concebida e realizada em
associação com a resolução de um problema coletivo, frente ao qual pesquisadores
e participantes estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. A pesquisaação envolve dois objetivos: solucionar um problema e contribuir para a ciência; nela
o pesquisador não é mero observador; prevê interação entre os envolvidos e requer
entendimento da estrutura étnica (valores e normas), bem como amplo conhecimento
do ambiente organizacional, das condições, estrutura e dinâmica das operações;
objetiva entendimento holístico; é fundamentalmente relacionada à mudança; e pode
incluir todos os tipos de coleta de dados, com utilização de técnicas quantitativas e
qualitativas (THIOLLENT, 1994 e 1997).
Simultaneamente o conhecimento é produzido e a realidade modificada:
resolve-se um problema e gera-se conhecimento. Desenvolve-se através da
observação participante, mas não se reduz a ela. Nesse processo de conhecimento, a
metodologia, em consonância com os critérios de cientificidade, desempenha,
segundo Thiollent (1994), um papel de “bússola” na condução das atividades dos
pesquisadores, orientando os passos da pesquisa, a tomada de decisões, a definição
e a utilização de técnicas e instrumentos de pesquisa, o delineamento e a consecução
dos objetivos e a elaboração de relatórios.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
547
2.1 Principais procedimentos na condução da pesquisa-ação com rigor metodológico
A estruturação da pesquisa-ação deve estar explicitada e programada,
abrangendo suas diversas fases. Cada ciclo do processo da pesquisa-ação se
desenvolve em cinco fases: planejamento, coleta de dados, análise dos dados e
planejamento das ações, implementação de ações, avaliação de resultados e
geração de relatório.
Turrioni e Mello (2010) e Mello et al. (2012), a partir de Westbrook (1995),
Coughlan e Coughlan (2002) e Thiollent (1994) são autores que se destacam na
caracterização da pesquisa-ação e na apresentação de propostas para sua
estruturação e condução.
As Figuras 1 e 2, a seguir, apresentam, nos termos de Turrioni e Mello (2010),
a estruturação para a condução da pesquisa-ação, enfatizando a circularidade que
marca as descobertas, a aplicação e a incorporação do conhecimento.
Figura 1 - Estruturação para condução da Pesquisa-ação
Planejar a
Pesquisa-ação
Avaliar
Resultado e
gerar
relatório
Coletar
dados
Monitoramento
Implementar
ações
Analisar dados
e planejar
ações
Fonte: Turrioni e Mello (2010, p. 150).
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
548
Planejar pesquisa-ação
Figura 2 - Estruturação para condução da Pesquisa-ação
Avaliar resultados e
gerar relatório
Avaliar resultados
Prover estrutura para replicação
Desenhar implicações teóricas e práticas
Redigir relatório
Fonte: Turrioni e Mello (2010, p. 151).
3. METODOLOGIA DA PESQUISA
Esta seção foi desenvolvida em 3 subseções: 1. Enquadramento metodológico
da pesquisa; 2. Caracterização da Revisão Bibliográfica Sistemática (RBS); 3. Etapas
da pesquisa.
3.1 Enquadramento metodológico da pesquisa
O enquadramento metodológico da pesquisa que dá suporte ao presente artigo
está explicitado no Quadro1.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
549
Quadro 1 – Enquadramento metodológico da pesquisa que dá suporte ao presente artigo
Referencial Classificação
Objetivos
Teórico
conceitual com
utilização da
Caracterização/Descrição
Visa descrever as características de determinado
fenômeno. No caso em questão, a presença e a
caracterização da Pesquisa-ação em Anais do
SIMPEP.
Marcada pela interpretação nos fenômenos. O
pesquisador é o instrumento-chave. Não requer o
uso de métodos e técnicas estatísticas.
Os pesquisadores definem os recortes e dão
tratamento qualiquantitativo aos dados.
Caracteriza-se por seu interesse prático. No caso
em questão, pretende-se contribuir para a
utilização da pesquisa-ação na Engenharia de
Produção com rigor científico.
Levantamentos e discussões conceituais a partir
da literatura e revisões bibliográficas. RBS: busca
abrangente e exaustiva por estudos primários.
Revisão
Bibliográfica
Sistemática
(RBS)
Desenvolve-se a partir de uma questão e da
formulação de critérios de qualificação claros e
reproduzíveis para a seleção e avaliação crítica
dos estudos e síntese dos resultados.
Descritiva
Abordagem Qualitativa
Tratamento Quali
quantitativo
Natureza
Tipo de
Pesquisa
Aplicada
Bibliografia
Turrioni e
Mello (2012)
Turrioni e
Mello (2012)
Turrioni e
Mello (2012)
Berto e
Nakano
(1999, 2000,
2014)
Pai et al.
(2004) e
Rother (2007)
Fonte: Elaborado pelos autores a partir da bibliografia citada.
3.2 Revisão bibliográfica sistemática (rbs): caracterização
Todo trabalho científico deve estar fundamentado em Revisão Bibliográfica,
desenvolvida através do que se conceitua Revisão Bibliográfica Tradicional ou
Revisão Narrativa (ROTHER, 2007), que se diferencia da RBS utilizada no presente
artigo. A primeira conduz e avalia a coleta do material de forma subjetiva e informal,
selecionando a literatura a partir dos pressupostos iniciais da pesquisa. A segunda se
caracteriza bela busca abrangente e exaustiva, a partir da proposta de uma questão,
que abre maior leque de possibilidades. A primeira não descreve a busca, a seleção e
a avaliação do material estudado, enquanto a RBS prevê critérios de qualificação
claros e reproduzíveis para a seleção de estudos, bem como a avaliação crítica dos
estudos e a síntese dos resultados de acordo com um método explícito e
predeterminado (PAI et al., 2004).
Michels et al. (2020), apoiados em Creswell (2007), destacam que, dentre os
propósitos cumpridos pela revisão da literatura, estão: a socialização de resultados
obtidos em outros estudos, a abertura de oportunidade para o estabelecimento de
diálogo com a literatura produzida, a colocação em evidência da relevância do tema e
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
550
ainda a geração de motivações para trabalhos futuros.
3.3 Etapas da pesquisa
Para a escolha da base de dados e a definição das etapas da pesquisa foram
consultados artigos que adotaram a Revisão Bibliográfica Sistemática – RBS, alguns
deles que utilizaram como Base de dados Anais do SIMPEP e do ENEGEP
(LACERDA; ENSSLIN; ENSSLIN, 2012; SAMPAIO; BORTOLLOSSI, 2010; GUARDIA
et al., 2013; SILVA; COSTA, 2016).
A pesquisa foi planejada e, posteriormente desenvolvida, em cinco etapas:
Na primeira etapa foram realizadas leituras sobre metodologia e tipos de
pesquisa, no sentido de ampliar conhecimentos e aprofundar suportes teóricos e
empíricos relativos à pesquisa-ação: âmbito de aplicação, conceitos, características e
procedimentos na condução da pesquisa ação com rigor metodológico.
Na segunda etapa foi escolhida a Base de Dados – Anais do SIMPEP (20072016). A escolha dessa Base de Dados foi feita tendo em vista: a) sua amplitude em
termos do grande número de pesquisadores envolvidos, tanto orientadores
experientes como pós graduandos em processo de formação, procedentes de
diversas IES (Instituições de Ensino Superior), situadas em diversas regiões do país;
b) o fato de que, muitas vezes, os resultados das investigações são divulgados
inicialmente em eventos e, assim, conforme ressaltam Guardia et al. (2013, p. 3), os
congressos podem ser considerados “... um “termômetro” dos temas e métodos
científicos que estão sendo aplicados pelos pesquisadores, captando dados
recentes”; c) em razão de o SIMPEP não ser um evento itinerante, ocorrendo sempre
no Campus da UNESP, Universidade Estadual Paulista, em Bauru-SP; o fato de não
ser itinerante, evita que, a cada ano, os artigos apresentados sejam influenciados por
fatores de proximidade ou distância de outros principais centros de formação em
Engenharia de Produção em nível de Pós-Graduação, o que leva a supor a não
alteração do número e da qualidade dos artigos apresentados a cada ano, favorecendo
comparação de caráter longitudinal (COSTA, 2013); e d) pela facilidade de acesso às
informações, disponíveis nos referidos Anais.
Na terceira etapa, a partir da “palavra-chave” “pesquisa-ação” foram buscados
artigos
publicados
no
período
de
2007
a
2016
no
sítio
<http://www.simpep.feb.unesp.br/anais.php> que abriga os Anais do SIMPEP. A
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
551
busca nos Anais foi feita solicitando localização por título, por resumo e por palavrachave, em conformidade com as informações dadas pelos próprios Anais. Nessa
etapa foram identificados, após eliminadas as duplicações, 93 artigos, justificando e
validando, pela frequência da palavra-chave e número de artigos identificados, a
escolha da base para a avaliação da presença da “pesquisa-ação” nos artigos
publicados. Esses 93 artigos foram organizados segundo a incidência deles pelos 10
anos do período 2007-2016 e pelas 11 áreas de conhecimento da Engenharia de
Produção contempladas pelo SIMPEP: 1. Gestão da produção; 2. Gestão da
Qualidade; 3. Gestão Econômica; 4. Ergonomia e Segurança do Trabalho; 5. Gestão
do Produto; 6. Pesquisa Operacional; 7. Gestão Estratégica e Organizacional; 8.
Gestão do conhecimento Organizacional; 9. Gestão Ambiental; 10. Educação em
Engenharia de Produção; 11. Engenharia de Produção, Sustentabilidade e
Responsabilidade Social.
A quarta etapa foi desenvolvida tendo por foco as seguintes questões: “Qual a
incidência da pesquisa ação, nos artigos dos Anais do SIMPEP (2007-2016)?” e “As
investigações que utilizaram a pesquisa ação foram conduzidas com rigor
metodológico e suporte teórico adequado?” Nessa etapa foram aplicados dois critérios
de corte sobre os 93 artigos localizados na terceira etapa, levando ao descarte dos
artigos: a) 8, apenas com foco teórico, sem resultados de pesquisas de campo; b) 69,
que apenas empregaram o termo pesquisa ação, sem o desenvolvimento de seção ou
sub-seção metodológica ou com a caracterização insuficiente da pesquisa ação, sem
a indicação de sistemática para sua aplicação. Os critérios mínimos para permanência
dos artigos desenvolvidos foram: a) a explicitação do conceito, das características e
da(s) base(s) teórica(s) da pesquisa-ação;
b) a indicação da sistemática e/ou do planejamento da investigação
proposta/desenvolvida.
Na quinta etapa, após o descarte dos artigos somente teóricos e dos que
apresentaram considerações metodológicas insuficientes para condução das etapas
da pesquisa, restaram 16 artigos que foram identificados e listados por ano de
publicação, sub-área do SIMPEP em que foram enquadrados, foco e autor(es)
utilizado(s) como suportes teóricos.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
552
4. RESULTADOS DA AVALIAÇÃO DE ARTIGOS SOBRE PESQUISA-AÇÃO
NOS ANAIS DO SIMPEP (2007-2016)
Os resultados estão apresentados em conformidade com as etapas de
pesquisa previstas.
4.1 Artigos que utilizam pesquisa-ação nos anais do simpep (2007- 2016):
distribuição por áreas da engenharia de produção
Os 93 artigos localizados por título, por resumo e por palavra-chave estão
apresentados na Tabela 1, distribuídos pelas 11 áreas da Engenharia de Produção do
SIMPEP.
Tabela 1 – Artigos que utilizaram Pesquisa-ação nos Anais do SIMPEP (2007-2016) por
Áreas da Engenharia de Produção.
AREAS DA ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
2
3
4
5
6
7
8
9 10
1
2
2
3
2
1
1
1
2
1
1
1
1
2
2
6
1
2
2
5
2
2
1
1
1
1
2
1
2
1
1
2
1
1
1
1
17
2
4
9
1
14
9
1
3
ANO
1
11 TOTAL
2007
3
2008
1
9
2009
2
8
2010
2
8
2011
4
13
2012
2
11
2013
3
7
2014
4
9
2015
12
16
2016
3
9
TOTAL 33
0
93
%
ÁREA 35% 18% 2% 4% 10% 1% 15% 10% 1% 3% 0% 100%
Fonte: Elaborada pelos autores.
A principal área, abrangendo 32% dos artigos publicados no período foi a 1.
Gestão da Produção, seguida da 2. Gestão da Qualidade (20%); as duas juntas
reunindo 52% dos artigos. Em 3º lugar está a 7. Gestão Estratégica e Organizacional
(14%), em 4º a 8. Gestão do Conhecimento Organizacional (13%) e em 5º a 5. Gestão
do Produto (11%). É baixa a participação das áreas 4 e 10, respectivamente,
Ergonomia e Segurança do Trabalho e Educação em Engenharia de Produção, cada
uma com 3% de participação. A área 6, Pesquisa Operacional reúne apenas 1 artigo.
A área 11, Engenharia de Produção, Sustentabilidade e Responsabilidade Social não
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
553
abrange nenhum artigo.
4.2 Apresentação dos artigos selecionados
Os artigos selecionados, distribuídos pelos anos do período e segundo as subáreas do SIMPEP, os focos das pesquisas e o suporte teórico utilizado para a
condução da pesquisa ação estão apresentados no Quadro 2.
Quadro 2 – Artigos dos Anais do SIMPEP (2007-2016) que utilizam pesquisa-ação [Ano da
publicação, título, autor(es), foco e principal(is) suporte(s) teóricos)
ANO
SIMPEP
(Nº de
artigos)
TÍTULO DO ARTIGO/AUTOR(ES)/
MATHIAS, A.P.; SILVA, C.E.S.;
LEITE, V.F. A gestão de projetos
Anais
na mudança de localização de
SIMPEP
uma pequena empresa
XIV 2007
empreendedora devido à
(1)
expansão da demanda.
CARVALHO, B.V.; MURAD, R.B.;
LIMA, R.S. Aplicação do Método
Ágil Scrum na gestão de
desenvolvimento de produtos de
software por uma pequena
Anais
empresa durante o
SIMPEP XV desenvolvimento de software para
2008 (2)
Arranjos Produtivos Locais
BETANHO, C.; EID, F.;
FERNANDES, J.E Estratégias de
Marketing no MST: pesquisa-ação
com educandos do ITERRA (RS)
RIBEIRO, A. C.; ALVES, A. A.
Aspectos fundamentais da cadeia
de produção da pesca artesanal
em São João da Barra – RJ
WECKESLE, V. M.; RECH, I.;
MALANOVICZ,
A. V. Gestão da
Anais
qualidade
em
processos
de TI:
SIMPEP XVI
adequação
da
Information
2009 (3)
Technology Infrastructure Library
(ITIL) em um Help-Desk
KLEIN, A.L.; HUGO, G. B.;
AYALA, N. F.; PASA, G. S.
Sistemática para implantação do
trabalho padronizado em
empresas de produção em
SUB-ÁREA DO SIMPEP
FOCO(S)
SUPORTE(S)
TEÓRICO(S)
7.4 – Empreendedorismo
Pequena empresa; Gestão Thiollent
Empreendedorismo;
(1994)
Planejamento.
5.3 - Metodologia de
Projeto do Produto
Produtos de Software;
Pequena empresa.
5.5 - Marketing do
Produto
Intervenção DidáticoPedagógica Alimentos.
7.7 - Redes de Empresas
e Gestão da Cadeia
Produtiva
Pesca Artesanal; Cadeias
Produtivas;
Desenvolvimento local.
Thiollent
(2005)
Coughlan;
Coughlan
(2002)
Thiollent
(1997)
Thiollent
(2002)
2.5 - Qualidade em
Thiollent
Serviços
(2003)
Gestão de Processos de TI
1.1 - Gestão de Sistemas
de Produção
Indústrias de produtos de
grande porte e produção
Thiollent
(1997)
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
554
Anais
SIMPEP
XVII 2010
(4)
Anais
SIMPEP
XVIII 2011
(2)
pequena escala e produtos com
elevado grau de customização
em pequena escala.
MARZAGAO, D. S. L.;
CARVALHO, M. M. Competências
dinâmicas no âmbito da qualidade:
uma pesquisa-ação sobre a
motivação e desenvolvimento
BRAGA, N. S.; GODOY, H. A.;
SILVA, C. E. S. Análise de riscos
em projeto de certificação ISO9001
em empresa de base tecnológica
SCHARAN, M. J.; SANTOS, L. C.;
GOHR, C. F. Reestruturação do
fluxo do processo de montagem
de embalagens de madeira
utilizadas para o acondicionamento
de motores elétricos
OSTANEL, C. E.; SILVA, R. S. G.;
GASPAROTTO, A.; CAZARINI, E.
W.; GUERRINI, F. M. A
sistematização do conhecimento
em uma instituição de ensino
superior utilizando a metodologia
Enterprise Knowledge
Management – EKD
2.5 - Qualidade em
Serviços
Empresa de Serviços;
Recursos, habilidades,
Competências.
Thiollent
(1997)
Coughlan;
Coughlan
(2002)
8.4 - Gestão de Projetos
Área médica; empresa de
base tecnológica.
Coughlan;
Coughlan
(2002)
FRANCO, M. M. N.; SILVA, C. E.
S. Análise da solução de
problemas pelo método A3:
pesquisa-ação em uma empresa
de estruturas metálicas
SANTOS, L. C. ; GOHR, C. F.;
NOGUEIRA, M. F. F. Análise e
melhoria de processos de serviços
em uma empresa de varejo de
bijuterias e acessórios
RIBEIRO, P. M. F.; ESPOSTO, K.
Anais
F. Aplicação da metodologia A3
SIMPEP XIX como instrumento de melhoria
contínua em uma empresa da
2012 (1)
indústria de linha branca
Anais
SIMPEP
XXI 2014
(1)
MAGALHÃES, A. X.; SILVA, E. C.
C.; HERMOSILLA, J. L. G.;
VALENTE, C. M. O. Melhoria no
processo produtivo em uma
empresa fabricante de redutores,
utilizando o Método para Análise e
Solução de Problemas (MASP)
1.7 - Gestão de Processos Eden;
Produtivos
Huxham
Processos de montagem;
(1996)
embalagens de madeira.
8.5 - Gestão do
Conhecimento em
Sistemas Produtivos
Serviço de Assistência
Acadêmica. Ensino
Superior.
Thiollent
(2006, 2007).
Franco
(2005)
2.5 - Qualidade em
Serviços Pequena
Coughlan;
empresa do segmento de
Coughlan
Telecomunicações para
(2002)
atendimento de produtos e
serviços.
2.5 - Qualidade em
Serviços
Empresa de pequeno porte;
montagem e
comercialização de
bijuterias
1.7 - Gestão de
Processos
Produtivos
Empresa de médio porte
fabricante de produtos da
linha branca.
2.4 - Confiabilidade de
Processos e Produtos
Um setor de usinagem de
uma empresa de grande
porte fabricante de
redutores.
Eden;
Huxham
(1996)
Coughlan;
Coughlan
(2002)
Coughlan;
Coughlan
(2002)
Thiollent
(2009)
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
555
Anais
SIMPEP
XXII 2015
(1)
Anais
SIMPEP
XXIII 2016
(1)
RODRIGUES, C. V.; TOLEDO, J.
C. Gestão de operações no
serviço público de perícia criminal:
um projeto de pesquisa-ação em
uma unidade regional de polícia
técnico-científica.
CAMPANHOLI, B. / SILVA, E. C.
C. / HERMOSILLA, J. L. G.
Pesquisa-ação envolvendo o
processo de mudanças para
implantação de um sistema de
planejamento e controle da
produção em uma empresa de
pequeno porte do setor de moto
peças.
1.8 - Gestão de
Operações e Serviços
Gestão de operações de
serviços públicos; perícia
criminal; operações de
serviços.
Turrioni;
Mello (2010)
Thiollent
(2009)
1.2 - Planejamento e
Controle da Produção
Tripp (2005)
Mello et
Planejamento e controle da al.(2012)
Thiollent
produção; Empresa de
(1997)
pequeno porte; Setor de
motopeças.
Fonte: Elaborado pelos autores.
Apenas 19% dos artigos identificados por palavras-chave foram selecionados.
Conforme Quadro 2, dos 16 artigos selecionados, 5 se inserem na Área 1. –
Gestão da produção; 5 na 2. - Gestão da Qualidade; 2 na 5. - Gestão do Produto; 2
na 7. Gestão Estratégica e Organizacional; 2 na 8. - Gestão do Conhecimento
Organizacional. Nenhum artigo foi selecionado vinculado às demais 6 Áreas:
Em termos de teóricos ou estudiosos da pesquisa-ação, o autor mais utilizado
foi Thiollent, em 11 artigos, seguido de Coughlan e Coughlan, em 6; Eden e Huxham
em 2; e Tripp; Turrioni e Mello; e Mello et al., em apenas 1 artigo.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A incidência da pesquisa-ação nos Anais do SIMPEP (SIMPÓSIO DE
ENGENHARIA DE PRODUÇÃO), no período de 2006 a 2016, foco deste artigo,
apresentou-se pouco significativa, considerando os critérios de seleção que nortearam
a Revisão Bibliográfica Sistemática realizada. De fato, poucos autores e textos
utilizaram o rigor metodológico esperado para guiar suas pesquisas. Assim, mostrouse procedente a preocupação de vários autores: Nakano e Fleury (1996); Berto e
Nakano (1998); Cauchick Miguel (2005, 2007, 2010a, 2010b, 2010c); Cauchick Miguel
et al., (2009); Fleury (2010); Turrioni e Mello (2010 e 2012); Mello et al. (2012); Costa
(2013), com o cumprimento do rigor metodológico na adoção dos tipos ou estratégias
de pesquisa por parte da Engenharia de Produção, tanto no que diz respeito à revisão
da literatura quanto ao planejamento e à realização da investigação empírica.. A maior
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
556
parte dos artigos não se preocupou em declarar a metodologia utilizada e mesmo
quando alguns artigos apontaram se tratar de uma pesquisa-ação não utilizam o rigor
metodológico para guiar a pesquisa.
Alguns artigos desenvolveram a pesquisa no formato de projeto de consultoria
ou mesmo como uma pesquisa aplicada e afirmaram se tratar de uma pesquisa-ação.
Outros casos
trataram
claramente
de
outra
estratégia
de
pesquisa
e,
equivocadamente, a consideraram uma pesquisa-ação. Sendo assim, é necessário
que a pesquisa-ação seja mais difundida aos interessados nesta estratégia de
pesquisa tendo por foco seguir corretamente os modelos propostos e garantindo o
rigor metodológico nas investigações.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
557
REFERÊNCIAS
ANAIS do Simpósio de Engenharia de Produção – SIMPEP (2007-2016). ISSN 18097189. Disponível em: http://www.simpep.feb.unesp.br/anais.php. Acesso em
30/01/2020. BERTO, R. M. V. S.; NAKANO, D. N. Metodologia de pesquisa e a
Engenharia de Produção. ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE
PRODUÇÃO, 18. In Anais ENEGEP, 1998, p. 1-7.
BERTO, R. M. V. S.; NAKANO, D. N. A produção científica nos Anais do Encontro
Nacional de Engenharia de Produção: um levantamento de métodos e tipos de
pesquisa. ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 19, 1999 in
Anais... ENEGEP p. 1-13.
BERTO, R. M. V. S.; NAKANO, D. N. A Produção Científica nos Anais do Encontro
Nacional de Engenharia de Produção: um levantamento de métodos e tipos de
pesquisa. Produção, vol.9, nº 2, p.65-76, 2000.
BERTO, R. M. V. S.; NAKANO, D. N. Revisitando a produção científica nos Anais do
Encontro Nacional de Engenharia de Produção. Production, v. 24, n. 1, p. 225-232,
jan./mar. 2014.
CAUCHICK MIGUEL, P. A. Recomendações na Adoção de Estudo de Caso como
Abordagem Metodológica. In SIMPÓSIO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 12,
Anais... SIMPEP – Bauru, SP, Brasil, 7 a 9 de novembro de 2005. 12 p.
CAUCHICK MIGUEL, P. A. Estudo de caso na Engenharia de Produção: estruturação
e recomendações para sua condução. Produção (versão impressa), v.17 n.1, p. 216229, São Paulo jan./abr.2007.
CAUCHICK MIGUEL, P. A. Adoção do Estudo de Caso na Engenharia de Produção.
In CAUCHICK MIGUEL, P. A. (Coord.) Metodologia de Pesquisa em Engenharia de
Produção e Gestão de Operações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010a, p.129-143.
CAUCHICK MIGUEL, P. A. Introdução. In CAUCHICK MIGUEL, P. A. (Coord.)
Metodologia de Pesquisa em Engenharia de Produção e Gestão de Operações. Rio
de Janeiro: Elsevier, 2010 b, p.1-4.
CAUCHICK MIGUEL, P. A. Considerações Finais. In CAUCHICK MIGUEL, P. A.
(Coord.) Metodologia de Pesquisa em Engenharia de Produção e Gestão de
Operações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010 c, p.195-197.
CAUCHICK MIGUEL, P. A.; MARTINS, R.; LAROZINSKI NETO, A.; et al. Desafios
para a metodologia de pesquisa em engenharia de produção. In: Tópicos emergentes
e desafios metodológicos em engenharia de produção: casos, experiências e
proposições. Rio de Janeiro: ABEPRO, 2009.
CHISTÉ, P. S. Pesquisa-Ação em mestrados profissionais: análise de pesquisas de
um programa de pós-graduação em ensino de ciências e de matemática. Ciênc. educ.
(Bauru), Bauru, v. 22, n. 3, p. 789-808, Sept. 2016. Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
558
73132016000300789&lng=en&nrm=iso>. Acesso 30 abril 2017.
http://dx.doi.org/10.1590/1516-731320160030015.
COSTA, V. M. H. M. Abordagens metodológicas e estratégias de pesquisa em
Engenharia de Produção em Anais do SIMPEP: a incidência do Estudo de Caso. In
SIMPEP – SIMPOSIO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 20, 2013, Bauru-SP.
Anais... CD. Bauru-SP, 2013. p. 1-14.
COUGHLAN, P.; COUGHLAN, D. Action research for operations management.
International Journal of Operations & Production Management, v. 22, n 2, p. 220-240,
2002.
CRESWELL, J. W. Projeto de Pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto.
Trad. Luciana de Oliveira da Rocha. 2 ed., Porto Alegre: Artmed, 2007.
FILIPPINI, R. Operations management research: some reflections on evolution,
models and empirical studies in OM. International Journal of Operations and
Production Management, v.17, n.7, p. 655-70, 1997.
FLEURY, A. Planejamento do Projeto de Pesquisa e Definição do Modelo Teórico. In
CAUCHICK MIGUEL, P. A. (Org) Metodologia de Pesquisa em Engenharia de
Produção e Gestão de Operações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010, p. 31-44.
GUARDIA, M.; QUEIROZ, G.A.; COBRA, R.L.R.B.; OLIVEIRA, J.A.; AMARAL,
D.C. A adoção da Revisão Bibliográfica Sistemática na Engenharia de Produção:
uma análise nos Anais do ENEGEP. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA
DE PRODUCAO, 23. Salvador, BA, 2013. 17 p. Anais. 2013.
KELCH, R.S.; GALHARDI, A.C.; COLONA, S.F.; LUCIO, W.S. Pesquisa-ação:
Comparações com consultoria e aplicação na engenharia de produção /. Action
research: Comparisons with consulting and application in production engineering.
Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 10, p.81608-81617, oct. 2020. ISSN 2525-8761
LACERDA, R. T. O.; ENSSLIN, L.; ENSSLIN, S. R. Uma análise bibliométrica da
literatura sobre estratégia e avaliação de desempenho. Gest. Prod., vol.19, no.1.
São Carlos, 2012.
MARTINS, R. A. Abordagens Quantitativa e Qualitativa. In CAUCHICK MIGUEL, P.
A. (Org.) Metodologia de Pesquisa em Engenharia de Produção e Gestão de
Operações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010, p. 45-61.
MELLO, C. H. P.; TURRIONI, J. B.; XAVIER, A. F.; CAMPOS, D. F. Pesquisa-ação
na engenharia de produção: proposta de estruturação para sua condução. Produção,
v. 22, n. 1, p. 1-13, jan./fev. 2012. Doi: 10.1590/S0103-65132011005000056.
MENELAU, S.; SANTOS, P. M. F.; CASTRO, B. G. A.; NASCIMENTO, T. G.. Realizar
pesquisa sem ação ou pesquisa-ação na área de Administração? Uma reflexão
metodológica. Revista de Administração (São Paulo), mar. 2015, v. 50 n. 1, p. 4055. DOI: 10.5700/rausp1183.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
559
MICHELS, E.; WITT, F.; MOREIRA, F.K.; LEITE, L.; BORGES, M. K. Aprendizagem
híbrida e o ensino de administração: tendência ou estratégia? / Blended learning and
management educ ation: trend or strategy? Braz. J. of Develop., Curitiba, v.6, n.12,
p.95507-95523, dec. 2020. ISSN 2525-8761.
NAKANO, D. N. Métodos de Pesquisa adotados na Engenharia de Produção e
Gestão de Operações. In CAUCHICK MIGUEL, P. A. (Org.) Metodologia de
Pesquisa em Engenharia de Produção e Gestão de Operações. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010, p. 63-72.
NAKANO, D. N.; FLEURY, A. C. C. Métodos de pesquisa em Engenharia de
Produção. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 16.
Piracicaba, 1996. Anais... Piracicaba: UNIMEP / ABEPRO, 1996. (CD-ROM)
PAI, M.; MCCULLOCH, M.; GORMAN, J.D.; PAI, N.; ENANORIA, W.; KENNEDY,
G.; THARYAN, P.; COLFORD JUNIOR, J.; M. Systematic reviews and metaanalyses: an illustrated, step-by-step guide. The National Medical Journal of India, v.
17, n. 2, p.86- 95, 2004.
ROTHER, E. T. Revisão sistemática versus revisão narrativa. Editorial. Acta Paul
Enferm, 2007; vol.20, n. 2, vi. 2007. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ape/v20n2/a01v20n2.pdf> Acesso em: 27 abr. 2020.
SAMPAIO, M.; BORTOLLOSSI, L. N. A produção acadêmica publicada na revista
Gestão & Produção de 1999 a 2010: tendências e direções para pesquisas futuras.
Gest. Prod., vol.19, no.1 São Carlos, 2012.
SCIELO – Scientific Eletronic Library Online. Disponível em:
<http://search.scielo.org/>. Último acesso em 24/04/2017.
SILVA, C.A.F.; COSTA, V. M. H. M. Arranjos Produtivos Locais (APLs) nos Anais do
SIMPEP (2007-2015): Uma Revisão Bibliográfica Sistemática. In: XXIII Simpósio de
Engenharia de Produção - SIMPEP, 2016, Bauru-SP. In Anais... Bauru-SP: UNESP,
2016.
SIMPEP (Simpósio de Eng de Prod) Anais. Disponível em:
http://www.simpep.feb.unesp.br/anais.php. Último acesso em 08/03/2020)
THIOLLENT, M. Metodologia da Pesquisa-ação. São Paulo: Cortez. 6 ed., 1994
THIOLLENT, M. Pesquisa-Ação nas Organizações. São Paulo: Atlas, 1997.
TOLEDO, R. F.; GIATTI, L. L.; JACOBI, P. R.. A pesquisa-ação em estudos
interdisciplinares: análise de critérios que só a prática pode revelar. Interface Comunicação, Saúde, Educação, dez 2014, Volume 18 Nº 51 Páginas 633 – 646.
DOI: 10.1590/1807-57622014.0026
TRIPP, D. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Educação e Pesquisa, São
Paulo, v. 31, n. 3, p. 443-466, set./dez. 2005
TURRIONI, J. B.; MELLO, C. H. P. Pesquisa-ação na Engenharia de Produção in
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
560
CAUCHICK MIGUEL, P. A. (Org) Metodologia de Pesquisa em Engenharia de
Produção e Gestão de Operações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010, p. 145-163.
TURRIONI, J.B.; MELLO, C.H.P. Metodologia de Pesquisa em Engenharia de
Produção: Estratégias, métodos e técnicas para condução de pesquisas
quantitativas e qualitativas. Itajubá: UNIFEI, 2012.
WESTBROOK, R. Action research: a new paradigm for research in production and
operations management. International Journal of Operations & Production
Management, v. 15, n 12, p. 6-20, 1955.
YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Trad. D. Grassi. 5 ed.
Porto Alegre: Bookman, 2015.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.11, p.108426-108443 nov. 2021 ISSN: 2525-8761
561
CAPÍTULO 31
FORMAÇÃO ÉTICO-ESTÉTICA EM PLATÃO, SCHILLER E FREIRE: A
KALOKAGATHIA, O IMPULSO LÚDICO E A BONITEZANA FORMAÇÃO DO
SUJEITO AUTÔNOMO
Ivys de Alcântara Silva
Mestre em Educação (UFPA)
SEDUC-PA - PPGED/UFPA
Rod. Augusto Montenegro Km 10, S/N. 66.820-000. Belém – PA, Brasil
E-mail: ivys.alcantara@gmail.com
Sandro Melo Batalha Cardoso
Mestre em Filosofia (UFPA)
SEDUC-PA - CESUPA
Rod. Augusto Montenegro Km 10, S/N. 66.820-000. Belém – PA, Brasil
E-mail: sandrocardoso@yahoo.com.br
Damião Bezerra Oliveira
Pós-doutor em Filosofia (UFPA)
PPGED-PPGFIL/UFPA
R. Augusto Corrêa, 01 -Faculdade de Filosofia. 66075110 - Belém –PA –Brasil
E-mail: damiao@ufpa.br
RESUMO: Neste breve ensaio, aproximamos autores de diferentes períodos
históricos e pertencentes a ambientes socioculturais diversos: Platão, Schiller e Paulo
Freire. Pretende-se não apenas comparar teorias aparentemente conflitantes, mas
também seguir uma trilha que nos leve à redescoberta da importância da dimensão
estética na formação dos sujeitos e no nosso fazer pedagógico. Busca-se estabelecer
como fios condutores relevantes para entrever correlações entre os três pensadores,
as categorias: ética, estética e formação. O problema de pesquisa expressa-se pelas
interrogações: como os três autores aludidos pensam o lugar da estética na formação
humana? Que aproximações conceituais podem ser ressaltadas entre os três
pensadores? Que contribuições podem ser destacadas dessa discussão para se
pensar a relação entre estética e ética na formação do sujeito emancipado? Concluiuse, desta breve análise, que o modo de ser (ethos) baseado na conjunção entre ética
e estética nos possibilitaria desenvolver em nossa formação aspectos voltados à
sensibilidade e a alteridade nos permitindo perceber o outro, reforçando em nos o
sentimento de alteridade.
PALAVRAS-CHAVE: Filosofia da educação; Estética; Ética; Formação.
ABSTRACT: In this briefes say, we bring together authors from different historical
periods and belong ingto different sociocultural environments: Plato, Schiller and Paulo
Freire. It seeks not only to compare apparently conflicting theories, butalsoto follow a
path that leads us to the rediscovery ofthe importance of the aesthetic dimension in
the formation of subjects and in our pedagogical practice. It istried to establish as
relevant threads to perceive correlations between the three thinkers, the categories:
ethics, aesthetics and culture. The research problemis expressed by the questions:
how do the three a forementioned authors think about the place of a esthetics in human
Culture? What conceptual approximation scanbe highlighted between the three
562
thinkers? What contribution scan be highlighted from this discussion to think about the
relation ship between aesthetics and ethics in the Culture of the emancipated subject?
It was concluded, from this brief analysis, that the way of being (ethos) base dont he
conjunction between ethics and aesthetics would allow usto develop aspects related
to sensibility and alterity in our training, allowingustoperceivetheother, reinforcing in
usthe feeling of alterity.
KEYWORDS: Philosophyof education; Aesthetics; Ethics; Culture.
563
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Diferentes dimensões compõem o ente humano em sua antropologia filosófica.
A dimensão estética, esfera fundamental da experiência humana, apresenta-se
amalgamada à sensibilidade e à arte desde os estágios mais pregressos de nossa
trajetória filogenética. Tal dimensão, mais que meramente lúdica e simbólica, faz parte
da formação do homem nos diferentes momentos do processo histórico e cultural de
produção da sua existência e em nossos traços ontogenéticos. Nesse movimento de
proto-auto-constituição, o ser humano superou o estado de subsistência e passou ao
patamar de existência mais livre e consciente de si, colocando, desse modo, a razão
como o corolário do seu progresso científico-tecnológico, em detrimento da dimensão
estética e da beleza, que acabaram por assumir uma condição secundária na sua
formação.
Muito embora não se tenha neles uma, mas diversas perspectivas filosóficas,
Platão, Schiller e Paulo Freire criticam como prejudiciais à formação, um certo espírito
utilitário. Esse pode ser flagrado no pensamento da maioria dos sofistas, na Grécia;
no capitalismo emergente na Alemanha do século XVIII, Schiller vê na utilidade o
“ídolo da época”, ameaçando a arte e a formação. No neoliberalismo dominante a
partir da segunda metade do século XX, Freire critica o que chamou de “ética do
mercado”, porque ela ameaça a formação e a vocação ontológica do ser-mais do
homem (Freire, 1997; Platão, 2000; Schiller, 2002). Pode-se dizer que todos recusam
que a lógica da produção (poiésis) possa servir de paradigma orientador da existência
político-educacional.
Na busca da compreensão da dimensão estética da formação do homem inseparável da bondade e da verdade -, encontramos a primeira teoria filosófica mais
sistematizada sobre o fazer artístico, nas análises feitas por Platão a respeito da
Paideia grega à luz do seu ideal político-educacional. Pela importância paradigmática
da filosofia de Platão, o tomaremos como ponto de partida da investigação. Veremos
sua crítica ao fazer poético e artístico, a partir das obras A República e sua última,
inacabada e mais extensa obra, Leis.
Em sequência, veremos um contraponto à filosofia da educação de Platão, na
abordagem do poeta e filósofo Friedrich Von Schiller, que vai defender a arte e a
dimensão estética da educação, levando em conta não apenas a dimensão racional
do ser humano, mas também a dimensão sentimental e sensível. Para as
564
contribuições de Schiller, centraremos nossas análises em sua obra Educação
Estética do Homem numa série de cartas.
Por fim, articulando as análises anteriores, teremos a colaboração do
exponencial pensador brasileiro Paulo Freire. O relacionaremos, sobretudo com
Schiller, por suas semelhanças, explicitadas pelas ideias contidas em Pedagogia da
Autonomia: Saberes necessários à prática educativa, em que Freire dá relevo
principalmente aos conceitos de “Boniteza” e “pensar certo”, mencionados
obstinadamente ao longo de toda esta obra.
Diante desses três autores e dos seus respectivos contextos históricos,
socioculturais e políticos-educacionais, poder-se-ia imaginar que aqui se percorreria
um caminho puramente teórico ou, ainda, que far-se-ia um retalho historiográfico de
vários autores. Contudo, a despeito das aparências, creio que a justificativa mais forte
desta investigação está no exemplo de reflexão filosófica que estes pensadores nos
legaram; exemplos universais que nada têm de anacrônicos, porque nos servem como
bússolas, não apenas em nossas expedições sacrificantes da docência, mas também,
em nosso processo de constante construção como seres humanos.
Portanto, a finalidade deste trabalho não reside apenas na exposição e
comparação de teorias aparentemente conflitantes, mas sim na tentativa de seguir
essa trilha que nos leva à redescoberta da importância da dimensão estética da
formação, em estreita conexão com o domínio ético-político, e com repercussão no
fazer pedagógico que não dispensa, de modo algum, a sólido debate teórico. Para
além do espaço formal de educação, pensa-se, também no processo de emancipação
dos sujeitos como atores sociais ou artistas do mundo que são instigados
continuamente a se autoformarem.
2. ARTE E EDUCAÇÃO: PLATÃO E A REFORMA DA PAIDEIA GREGA
Ao nos depararmos com obras capitais de Platão, como A República ou sua
última obra Leis, somos incialmente conduzidos a ingenuamente considerá-las
apenas como textos de gênero político. Não obstante, ao adentrarmos um pouco mais
tais obras, percebemos que não se trata somente de propostas de organização de
uma Cidade, mas, mais que isso, tem-se uma proposta de reformulação dos núcleos
que formam a Polis: seus cidadãos. Trata-se, portanto, de uma reformulação dos
ideais de formação (Paideia) do homem grego, uma reformulação dos ideais da Velha
565
Grécia contidos, mormente, nas obras de poetas como Homero e Hesíodo. Ernst
Cassirer em sua obra O mito do Estado, resguardando-se na autoridade de Rousseau,
confirma tal inter-relação entre política e educação na obra de Platão:
A esse respeito, Rousseau tinha uma concepção mais verdadeira acerca de
A República, de Platão, que o positivismo do século XIX quando afirmou que
essa obra não era um sistema político, como se podia pensar pelo seu título,
mas o primeiro tratado de educação jamais visto (CASSIRER, 1976, p. 78).
Assim, partindo deste prisma de que obras como A república e Leis, que
aparentemente são de gênero apenas político, são, na verdade, tratados
educacionais, veremos doravante a relação entre arte e educação na filosofia
platônica e que cuidado deveremos ter ao relacioná-las.
Assim sendo, pergunta Platão, a respeito de como deveremos iniciar a
educação dos jovens que, por conseguinte, levará à fundação da Cidade: “Que
educação lhe daremos? Será difícil achar outra melhor do que a que a que já foi
encontrada no decurso do tempo, a saber Ginástica para o corpo e Música para a
alma” (PLATÃO, Rep,366e). Convém lembrar que “música” ou musikhê, refere-se ao
sentido grego do termo, isto é, a arte das musas. Portanto, música aqui não se refere
apenas ao ritmo e à harmonia, mas principalmente e quase que exclusivamente, ao
texto, à palavra falada ou logos (Jaeger, 2001, p.768). A poesia e a música para os
gregos tinham, desde sempre, sido consideradas como base da constituição do
espírito, abarcando estas a educação tanto moral como religiosa, e arraigando-as,
desde a infância, na mentalidade grega.
Na Paideia grega, Hesíodo e Homero são absolutamente tidos em alta conta
por manterem, em seus poemas, praticamente todo o arcabouço da educação
helênica. Aliás, essa respeitabilidade não concerne apenas à educação, mas também
ao retrato que traça da civilização, cultura, tradição e literatura grega. Não obstante,
Platão percebe um problema no estatuto educacional grego: Como explicar à tradição
educacional grega que grande parte de suas narrativas, ainda que fossem
verdadeiras, seriam inadequadas à função educacional? Como explicar, por exemplo,
a inadequação educacional da exposição mítica dos atos que Chrono infligiu a seus
filhos, devorando-os (PLATÃO, Rep, 378a)?
Em função de tal objeção, Platão toma para si a responsabilidade de uma
drástica investida contra a equivocada formação do homem grego. Afirma Jaeger, que
Platão não se limita a censurar ocasionalmente a influência negativa da poesia sobre
566
o pensamento do povo, mas assume na República o papel de um renovador de todo
o sistema da paidéia grega. A poesia e a música sempre tinham sido consideradas as
bases da formação do espírito e englobavam a educação religiosa e moral (JAEGER,
2001, p. 771).
A antiga paideia grega e sua inclinação artístico-poética começam a ruir, aos
olhos de Platão, por sua atual incapacidade de bem conduzir este sistema
educacional, que foi engendrada pelo cultivo de condutas degeneradas, retratadas
nas máximas poéticas dos pequenos e grandes contadores de fábulas.
Como, destarte, deve fundar-se a Pólis ideal e, por conseguinte, sua
constituição educacional? Assevera o filósofo que, por todos os fatos adversos que os
acusam, não podem, sob hipótese alguma, ser os poetas os fundadores da cidade
(PLATÃO, Rep, 379a ss.), já que, também sobre suas poesias, pesa o negativo fardo
de uma corrupção moral tanto de sua forma quanto de seu conteúdo que concorrerá
para uma má conduta e formação dos espíritos mais jovens (BARKER, 1978).
Deste modo, temos a partir de já um íntimo atamento entre arte e moralidade,
tal como nos afirma Sir Ernest Barker a este respeito:
Se Platão estiver certo, é sumamente importante que a arte transmita uma
sugestão moral, e que nunca empreste sua atração a algo que os jovens não
devam aprender a amar. A arte deve dar sempre uma lição de coragem ao
espírito, e levar aos ouvidos da razão sinais do bem supremo, que ela
conhecerá um dia em sua plenitude (BARKER, 1978, p. 188).
A arte, mesmo neste recorte de Barker, é retratada como instrumento
educacional deveras atrativo, no entanto muito perigoso por sua grande capacidade
de distrair a alma, sobretudo as mais jovens. Por intermédio desta imitação artística
pode-se alcançar, não um conhecimento científico, mas uma parte da opinião correta.
Assim, pondera Platão “importa, antes de mais nada, que as primeiras criações
mitológicas por eles [os jovens] ouvidas sejam compostas com vistas à moralidade”
(PLATÃO, Rep, 378e).
Mesmo tendo sido taxativo quanto à recusa das artes e da poética no último
livro d’ARepública, Platão reconsidera novamente o atrelamento entre a arte e a
educação, ponderando que a arte deva estar voltada ao bem e às virtudes, porque
modalidades artísticas como a poesia e a música, por ser imitação dos sentimentos,
nos conduzem facilmente à imoralidade caso não seja restringida ou bem orientada
(PLATÃO, Leis, 655d-656a), correndo-se o risco, no caso contrário, de se estar
567
instruindo os jovens tanto mais para o mal que para o bem. Quanto a isto, indaga
seriamente o filósofo:
Nos lugares em que há, ou pode haver, boas leis com relação à educação
musical e divertimentos correlatos, devemos imaginar que será permitido às
pessoas com disposição poética introduzir em suas composições o que
quiserem, em matéria de ritmo, melodia ou letra, para ensiná-lo aos filhos dos
cidadãos bem governados e aos adolescentes em suas coréias, dependendo
simplesmente da sorte influir neles para o bem e para o mal? (Leis, 656cgrifos nossos).
Assim, não é atitude razoável do governante permitir o livre acesso à Paideia
aos que possuem uma disposição poética ou aceitar as suas aleatórias composições,
porque nesse caso põe-se em risco a educação dos mais jovens. Como estes últimos
ainda não possuem razão acurada para julgar o que lhes seria benéfico ou malévolo
à sua própria educação, cumpre, então, ao legislador deliberar leis que fiscalizem a
atuação dos criadores destas mimesis (imitações) poéticas, tal como afirma
categoricamente o gênio platônico, quanto a essa questão do ajuste delas: “o
legislador sensato convencerá o poeta a usar sua bela e recomendável linguagem, ou
no caso de não ser obedecido, o obrigará a apresentar nos ritmos e harmonias de
suas canções varões temperantes, destemidos e de todo em todo virtuosos” (Leis,
660a).
Mesmo que de modo um tanto receoso, a produção artística imitativa é
considerada, por Platão, em Leis, como um potente auxiliar pedagógico, por ser este
estilo muito ao gosto dos mais jovens, sobretudo no que se refere à música, como nos
explica Hildeberto Bitar: “É no poder encantatório da música que repousam suas
possibilidades mais imediatas, poder que é inerente à sua natureza e que resulta
basicamente da união de ritmo, harmonia e melodia” (Bitar, 1980, p.10). Entretanto, é
por via desta mesma potência que a música mais facilmente entorpece a mente e
deturpa o ensino, carecendo de maior vigilância e severidade sobre si, caso venha a
querer realmente prestar-se à boa condução dos jovens aprendizes.
Mesmo concordando parcialmente que a música deve ser julgada pelo deleite
que nos causa, Platão afiança que ela não deve ser estimada por qualquer tipo de
prazer, senão por aqueles que conduzem à educação e à virtude (Leis, 659a). Por
esse motivo é que os juízes mais indicados a decidir quais produções poéticas devam
ser recusadas ou aceitas, são os mais velhos, os que, de acordo com Platão, possuem
juízo e gosto mais apurado (Leis, 658e), cabendo a eles conhecer todas as
composições textuais poéticas e artísticas, afirmando-as como belas ou não à alma,
568
como bem observamos na seguinte passagem: “os velhos precisarão conhecer todos
[os discursos] para ficarem em condições de escolher o que há de mais belo ou que
mais se aproxime deste estado, sem o que jamais conseguirão levar os jovens para a
virtude, com a magia de seus cantos” (Leis, 670e-671a).
3. EDUCAÇÃO ESTÉTICA: A FORMAÇÃO DO SER HUMANO EM SENTIDO
PLENO
Admitindo-se que a arte, ou mais especificamente a arte poética, ainda que sob
suspeita, seja uma simples ferramenta aos fins educacionais, tal como queria o
filósofo Platão; o que diria um poeta a esse respeito? Nesse contexto, insere-se a
figura de Friedrich Von Schiller, falando não apenas como um filósofo, mas como um
livre pensador que toma a causa para si, apelando não só a princípios e premissas,
mas também, a sentimentos.
Logo, diante do exposto acerca da teoria de Platão, poderíamos pensar que,
desde já há uma completa dicotomia entre as duas teorias, posto que Platão ao tentar
reformular a Paideia grega, cristaliza a poética e cerceia toda e qualquer atividade
artística, impondo condições à esta livre produção.
Contudo, mesmo que a reflexão feita por Schiller se afaste em larga medida da
concepção platônica de arte, o poeta inicia sua carta VI fazendo amplo elogio ao
modelo grego de formação do homem (Paidéia), modelo que, mesmo reformulado na
proposta platônica, não deixou de manter alguns dos aspectos mais marcantes. Em
seu elogio, o pensador alemão afirma o seguinte:
Numa observação mais atenta ao caráter do tempo, entretanto, admirar-nosemos do contraste que existe entre a forma atual da humanidade e a passada,
especialmente a grega. A glória da formação e do refinamento, que fazemos
valer, com direito, contra qualquer outra mera natureza, não nos pode servir
contra a natureza grega, que desposou todos os encantos das artes e toda a
dignidade da sabedoria, sem tornar-se, como a nossa, vítimas de nós
mesmos. Não é apenas por uma simplicidade, estranha a nosso tempo, que
os gregos nos humilham; são também nossos rivais, e frequentemente
nossos modelos, naqueles mesmos privilégios com que habitualmente nos
consolamos. Vemo-los ricos, a um só tempo, de forma e de plenitude,
filosofando e formando, delicados e enérgicos unindo a juventude da fantasia
à virilidade da razão em magnífica humanidade (SCHILLER, 2002, p. 35).
Assim, sua visão a respeito dos gregos mostra não só traços românticos, como,
também, revela sutilmente a necessidade de um equilíbrio entre as potências
assinaladas no final do excerto. Isto é, ao povo grego, pelo menos à sua maioria, era
569
inerente uma harmonia, sua natureza possuía a simplicidade do meio termo,
distinguindo-se, segundo Schiller, de qualquer outra natureza e afastando-se,
mormente, da atual natureza moderna vigente em sua época que, pelo frequente
desequilíbrio dessas funções, nos torna autodestrutivos e vítimas de nós mesmo.
Ainda louvando a florescência grega, Schiller ressalta o fato de que neste
período dourado da cultura grega, a variedade dos saberes, não apontavam, ainda,
caminhos fragmentados dos saberes humanos, de modo que razão e sensibilidade
concorriam juntas para o esclarecimento, sem a soberba de uma em detrimento de
outra, tal como nos esclarece o poeta-filósofo:
Naqueles dias do belo despertar das forças espirituais, os sentidos e o
espírito não tinham ainda domínios rigorosamente separados; a discórdia não
havia incitado ainda a divisão belicosa e a demarcação das fronteiras. A
poesia não cortejara a espirituosidade, nem a especulação se rebaixara pelo
sofisma. Podiam se necessário, trocar os seus misteres, pois as duas, cada
qual a seu modo, honravam a verdade. Por mais alto que a razão se elevasse,
trazia sempre consigo, amorosa, a matéria, e por fina e rente que a cortasse,
nunca a mutilava. (SCHILLER, 2002, p. 36).
A demarcação desses territórios cerceou as várias instâncias da vida humana,
fragmentando essas instâncias e quebrando a unidade de atuação do homem em
variadas áreas. No período moderno, a exigência de uma excessiva especialização,
concepção permeada grandemente pela ciência, acabou com a unidade entre arte e
erudição. Instâncias que conviviam pacificamente na formação do homem grego, se
dilaceraram, introduzindo, gradativamente, a noção moderna de ser humano, na qual
o indivíduo se encontra bipartido entre razão e sensação/sentimento.
Segue-se daqui, portanto, uma das primeiras críticas ao fazer artístico no
período moderno, uma visão crítica vanguardista acerca da modernidade e suas
mazelas do ponto de vista estético, tal como afirma Ricardo Barbosa em seu artigo A
educação do homem e a educação estética do homem:
Como notou Habermas, o Schiller das Cartas sobre a educação estética do
homem foi o primeiro a fazer da crítica da Modernidade uma crítica estética.
Schiller escreveu esta obra sob o impacto do terror revolucionário, execrado
por ele desde o primeiro momento (HUSSAK &VIEIRA, 2011, p. 28).
Logo, se a partir deste momento Schiller identifica uma cisão na natureza
humana, o que é necessário para a junção dessas instâncias, há muito separadas? A
resposta a este problema parece simples e, mesmo, já mencionada aqui algumas
vezes: o retorno à valorização da educação estética.
Não obstante, aqui se instala uma das grandes problemáticas da proposta
schilleriana, posto que, tal retorno é uma tarefa assaz intricada, pelo fato de que a
570
supremacia de educação racional se encontra arraigada aos mais sensíveis
filamentos da nervura social. Assim, a pergunta fundamental que devemos nos fazer
é a de como funciona este resgate da sensibilidade por meio da estética?
Sabemos já que, para a reconquista da sensibilidade estética, o excesso da
lógica e da razão torna-se um empecilho para o desenvolvimento da fantasia e das
forças criativas do homem, pois, concorda Schiller,
o predomínio da faculdade analítica rouba necessariamente a força e o fogo
à fantasia, assim como a esfera mais limitada de objetos diminui-lhe a
riqueza. Por isso o pensador abstrato tem, frequentemente, um coração frio,
pois desmembra as impressões que só como um todo comovem a alma
(SCHILLER, 2002, p. 39).
Convém, então, diante do conselho de Schiller, resgatar a unidade dos gregos,
há muito desvanecida, lutando contra a compartimentação e fragmentação das
potências humanas que, como se pode perceber, funcionam mais harmonicamente
em conexão. Exemplo disso são os primeiros pensadores gregos que compilavam
seus discursos filosóficos e científicos em forma de poesia, tal como Parmênides,
revelando esta unidade das potencialidades humanas.
Os gregos, de alguma forma, compreenderam intuitivamente os mecanismos
da inter-relação plena dos vários saberes. Contudo, segundo Schiller, “os gregos
haviam alcançado tal grau, e caso quisessem prosseguir no sentido de uma formação
mais alta deveriam, como nós, abrir mão da totalidade de seu ser e buscar a verdade
por rotas separadas” (SCHILLER, 2002, p. 40). Por conseguinte, esse exercício
unilateral das forças leva o homem a concentrar suas energias compreensivas e
criativas em um único elemento. O que leva à seguinte questão elaborada por Schiller:
“dissolvido em entendimento puro e pura intuição será o espírito capaz de trocar as
severas algemas da lógica pelo livre andamento da força poética, de aprender a
individualidade das coisas com um sentido fiel e casto?” (SCHILLER, 2002, p. 40).
Logo, esta reunificação é a primeira tarefa da educação estética, posto que,
evocando uma metáfora do próprio pensador, “somente o jogo livre e regular dos
membros desenvolve a beleza” (SCHILLER, 2002, pp.40-41), o que nos leva a aduzir
que esta tarefa, imposta a cada um de nós, será um trabalho disciplinar de anos a fio,
com o intuito de tornar o exercício da sensibilidade, um hábito constante.
Este esforço de trazer à tona a educação estética, voltando-se aos elementos
do cultivo da sensibilidade humana, é, em verdade, um esforço de remover-se da
possibilidade de decair ou entregar-se às duas piores consequências geradas pelo
571
desequilíbrio entre a instância racional e a instância estética, a saber: o retorno ao
estado de selvagem ou à recorrência da barbárie. Fato evidenciado no brilhante
excerto da carta IV:
O homem, entretanto, pode ser oposto a si mesmo de duas maneiras: como
selvagem, quando seus sentimentos imperam sobre seus princípios, ou como
bárbaro, quando seus princípios destroem seus sentimentos. O selvagem
despreza a arte e reconhece a natureza como sua soberana irrestrita; o
bárbaro escarnece e desonra a natureza, mas continua sendo escravo de seu
escravo, por um modo frequentemente mais desprezível, que o do selvagem.
O homem cultivado faz da natureza uma amiga e honra sua liberdade, na
medida em que apenas põe rédeas a seu arbítrio (SCHILLER, 2002, p. 29).
Assim, podemos imaginar que o homem civilizado, não-selvagem, portanto, por
sua condição de instrução, não poderá incorrer em erros banais. Contudo, mesmo
dotado de cultura, ou de um mero verniz cultural, pode recair na barbárie, o que é
mais grave, por ser a barbárie um flagelo da própria cultura, ou fruto da distorção dela.
Citando uma passagem platônica, Schiller ressalta o risco oferecido à educação
estética por um filisteu da cultura: “Não recordo mais que filósofo, antigo ou moderno,
fez a observação de que o mais nobre é que é o mais abominável em sua destruição;
observação que revela sua verdade também na moral” (Schiller, 2002, p. 32). Este
filósofo, como dissemos, é Platão por meio de Sócrates:
Sabemos muito bem, [...] que todas as sementes ou germens, tanto de planta
como de animal, que não encontram alimentação apropriada ou a estação e
lugar adequados, quanto mais vigorosos, mais se ressentirão da falta dessas
condições, pois o mal é mais adverso ao que é bom do que ao que não é. [...]
no meu modo de pensar, [...], é certo dizer-se que as naturezas mais nobres
ficam pior com uma alimentação inadequada do que as medíocres. [...] por
isso, [...], podemos afirmar que com uma educação viciosa as almas mais
bem dotadas, se tornam particularmente ruins. Acreditas que os grandes
crimes e a maldade consumada provenham de uma alma medíocre e não de
uma natureza exuberante, porém, corrompida pela educação, ou que uma
natureza fraca seja capaz de produzir em qualquer tempo algo grandioso,
para o bem ou para o mal? (PLATÃO, República, 491d).
Destarte, a análise de Schiller começa a dirigir-se para a tentativa de mostrar
que o âmbito estético, mas do que uma simples ferramenta, caracteriza a condição
sinequa non para a formação plena do indivíduo, posto que o ser humano só se torna
pleno, mediante o impulso lúdico que a esfera estética lhe fornece (SCHILLER, 2002,
p. 80). Este impulso lúdico é, justamente, o jogo equilibrado entre razão e
sensibilidade, jogo que não pode ocorrer com as cristalizações e sobrepujança da
razão (SCHILLER, 2002, p. 83). Destarte, um ser humano integral, segundo Schiller,
só atinge tal completude, de fato, quando tem a alma livre, o que, por conseguinte, só
ocorre quando o este homem estende a mão a essa disposição lúdica.
572
4. ÉTICA E ESTÉTICA: A BONITEZA NA EDUCAÇÃOSEGUNDO PAULO FREIRE
Schiller, em seu percurso filosófico, pretende mostrar que a dimensão estética
tem sido não apenas esquecida na sociedade moderna, mas, o pior, tem sido
considerada mero adorno ou uma instância secundária e desnecessária em favor de
um racionalismo enervado no leito do pensamento de sua época, tendência que vigora
grandemente ainda hoje.
A dimensão estética, assim como, de modo geral, as artes, são cada vez mais
identificadas, desde a época de Schiller, como mero entretenimento ou simples
distrações
dos
sentidos,
fato
que
persiste
igualmente
na
atualidade.
Consequentemente, a crítica de Schiller se volta para a consideração da insuficiência
da razão como única forma de perceber, interpretar e compreender o mundo, tendo
em vistas a verdade “precisa” que a razão nos pode fornecer acerca do mundo
circunstante.
Coadunada a esta perspectiva de conciliação moral e estética para a formação
plena do homem, temos, também, o pensamento de Paulo Freire. De modo análogo
a Platão e Schiller, Freire (1997) supõe a necessidade de associar ética e estética e,
sobretudo, de resgatar a dimensão estética para a formação de um indivíduo pleno,
como se pode constatar de modo privilegiado em sua Pedagogia da Autonomia.
Assim, vemos em trecho da obra de Schiller semelhanças profundas com
Freire, quando, ao mencionar a ideia de emancipação humana, o pensador alemão
afirma que uma alma emancipada deve emancipar não apenas a si mesma, mas
igualmente, nessa torrente ético-estética, tudo e todos que estiverem ao seu derredor:
Onde quer que o encontremos, este tratamento espirituoso e esteticamente
livre da realidade comum é o sinal de uma alma nobre. Deve ser dita nobre a
mente que tenha o dom de tornar infinitos, pelo modo de tratamento, mesmo
o objeto mais mesquinho e a mais limitada empresa. É nobre toda a forma
que imprime o selo da autonomia àquilo que, por natureza, apenas serve (é
mero meio). Um espírito nobre não se basta como ser livre, precisa pôr em
liberdade todo o mais à sua volta, mesmo o inerte (SCHILLER, 2002, p. 116).
Assim, o indivíduo autônomo, emancipado pelo concurso da dimensão éticoestética é exortado por sua própria natureza e inclinação a aperfeiçoar a realidade,
transformá-la virtuosamente. Tal passagem evidencia a transformação salutar que um
indivíduo autônomo pode realizar em sua realidade, tendo o compromisso não só
consigo, mas com o outro, comprometendo-se com a transformação do mundo.
573
Levando adiante a cotejo dos pensadores, encontramos claras analogias na
citação a seguir em relação aos significados dos trechos supramencionados de obra
de Schiller. Paulo Freire, quando fala do ser democrático, na figura da professora, no
ambiente da realidade escolar, ressalta:
A professora democrática, coerente, competente, que testemunha seu gosto
de vida, sua esperança no mundo melhor, que atesta sua capacidade de luta,
seu respeito às diferenças, sabe cada vez mais o valor que tem para a
modificação da realidade, a maneira consistente com que vive sua presença
no mundo, de que sua experiência na escola é apenas um momento, mas um
momento importante que precisa ser autenticamente vivido (FREIRE, 1997,
p. 127).
Deste modo, transportando o excerto para um contexto mais geral da realidade
humana, o ser democrático, autônomo, ciente de suas potencialidades, deve
colaborar para a transformação da realidade, contribuindo não apenas com a
transformação das coisas, mas dos seres, de modo geral, particularmente do seu
alunado. Em um contexto mais amplamente antropológico que é condizente com o
pensamento freireano, pode-se falar de transformação do próximo, por meio do cultivo
das virtudes e da beleza (FREIRE, 1997).
Para se referir ao cultivo do belo ou a esta “dimensão estética”, Paulo Freire
cunha um termo próprio, a “boniteza”. Menciona, já em um dos tópicos do primeiro
capítulo da obra aqui analisada, a indissociabilidade entre dimensão ética e estética
da existência humana. Com efeito, já neste primeiro capítulo, o autor assume que uma
das exigências fundamentais do ato de ensinar está no caráter estético da educação.
Veremos, doravante, como funciona essa exigência estética da educação na
concepção freireana, isto é, como ela se efetiva, ressaltando alguns excertos que
mencionem a dimensão estética como sendo a mencionada “boniteza”.
Ao afirmar a importância da dimensão estética para o ato de ensinar e para a
educação, de modo geral, Paulo Freire passa a associá-la à dimensão ética da
educação, tonando ambas indissociáveis e complementares. À guisa de um
procedimento metodológico de diferenciação da estética no seu sentido mais lato,
Freire vai se referir à dimensão estética da educação, em todo o percurso desta obra,
como “boniteza”. Com esse termo peculiar, Freire (1997) já começa, doravante, a
diferenciar a concepção estética no sentido meramente artístico, da estética no
sentido mais afetivo e sentimental, na acepção de sentir (Aisthesis).
Boniteza tem um sentido afetivo, pois ao tratar de saberes e competências
necessários à docência, Freire enfatiza como indispensável o querer bem os
574
educandos, senti-los. E isto, segundo ele, deve significar para o professor: “que a
afetividade não me assusta, que não tenho medo de expressá-la” (FREIRE, 1997, p.
159).
Com efeito, podemos dizer que o sentido estético ou da boniteza do ato de
ensinar, diz respeito à capacidade de sentir, e isso se relaciona não só com a
capacidade e exercício de sentir o educando, mas também com a capacidade de se
expressar diante do movimento dadivar da vida e senti-la em seus vários aspectos.
Em função disso, é que Edina Castro de Oliveira, afirma no breve prefácio à obra de
Freire:
impossível não ressaltar a beleza produzida e traduzida nesta obra. A
sensibilidade com que Freire problematiza e toca o educador aponta para a
dimensão estética de sua prática que, por isso mesmo pode ser movida pelo
desejo e vivida com alegria, sem abrir mão do sonho, do rigor, da seriedade
e da simplicidade inerente ao saber-da-competência (FREIRE, 1997, p. 13).
Afirmamos justamente esta dimensão estética como uma das exigências
necessárias a ensinar, presente de modo latente e constante nesta obra. Contudo, há
de se notar, novamente, que tal perspectiva lançada por Freire remete-nos para além
da sensibilidade fornecida pelas artes ou pela apreciação do belo representativo. Não
se trata somente de cultivar com o formando uma atitude de contemplação das
representações do belo, em pinturas, esculturas ou quaisquer outras formas de
expressão artística. O educador dirigia-se também à beleza de viver, mesmo de sofrer
e vencer, ou sofrer e perder para depois se reerguer, em suma: a beleza de fazer
história, como melhor vemos no próprio excerto do autor:
Estar no mundo sem história, sem por ela ser feito, sem cultura, sem “tratar”
sua própria presença no mundo, sem sonhar sem cantar, sem musicar, sem
pintar, sem cuidar da terra, das águas, sem usar as mãos, sem esculpir, sem
filosofar, sem pontos de vista sobre o mundo, sem fazer ciência, ou teologia,
sem assombro em face do mistério, sem aprender, sem ensinar, sem ideias
de formação, sem politizar não é possível (FREIRE, 1997, p. 64).
Então, tal dimensão, inerente à vivência humana, não pode ser ignorada,
devendo ser reconhecida como uma competência fundamental do nosso movimento
no tempo e na história. Neste movimento fundamental da existência acima
mencionado, surge, subjacente, mais uma característica da dimensão estética ou da
“boniteza” da qual Freire se refere. Tal característica, sutilmente revelada, é a
necessidade e, sobretudo, o dever de nos movimentarmos em nosso tempo histórico
ou, como menciona o autor, de “brigarmos” pela nossa existência, porque: “A boniteza
de ser gente, se acha entre outras coisas nessa possibilidade e nesse dever de brigar”
575
(FREIRE, 1997, p. 67). Esse “brigar” mencionado por Freire, são nossas lutas diárias
no percurso de nossa história: lutar contra a discriminação, lutar pelo que acreditamos,
lutar para conseguirmos algo, lutar pelo direito de não fazer ou poder fazer algo, lutar.
Todavia, esta briga não deve ser levada ao sentido negativo, pois que toda
essa luta leva em conta princípios éticos que, como já afirmamos, devem ser
indissociáveis do caráter da boniteza da existência humana, somando-se a isso o fato
de que tal perspectiva tem como escopo a busca pela alegria e pela esperança
humana.
No que tange a prática docente, a boniteza se volta à uma postura de alteridade
e sensibilidade afetiva do professor para com os seus alunos. Logo, esta boniteza,
segundo Freire, não cabe nem se coaduna com uma atitude de frieza e excessiva
austeridade, tampouco com uma atitude de arrogância, por isso afirma que
A boniteza da prática docente se compõe do anseio vivo de competência do
docente e dos discentes e de seu sonho ético. Não há nesta boniteza lugar
para a negação da decência, nem de forma grosseira nem farisaica. Não há
lugar para puritanismo. Só há lugar para pureza (FREIRE, 1997, p.106).
Ressaltando novamente neste excerto o compromisso intrínseco da dimensão
estética com a dimensão ética. Assim, fica-nos evidente que, do mesmo modo, a
vaidade não se coaduna também com a postura estética de Paulo Freire, a despeito
de erroneamente se associar a beleza à vaidade. Por tal associação equivocada e
perversa, o pensador brasileiro adverte: “Boniteza que se esvai de minha prática se,
cheio de mim mesmo, arrogante e desdenhoso dos alunos, não canso de me admirar”
(FREIRE, 1997, p. 116), associação perversa já denunciada desde a Velha Grécia
com o mito de Narciso.
Por fim, a dimensão estética é inegável e não pode nem deve ser suprimida
sem o prejuízo de ambos, professor e alunos (ou mais, amplamente, eu e o outro),
estando a “boniteza” ligada profundamente à busca de virtudes essenciais, à uma
educação para a autonomia do ser, a virtudes como esperança, humildade, bom
senso, afetividade, dentre outras virtudes, mas, mormente, está ligada à busca da
alegria que, para Freire, é o fundamento da beleza, tal como vemos neste excelente
excerto que encerra este singelo apanhado:
A atividade docente de que a discente não se separa é uma experiência
alegre por natureza. É falso também tomar como inconciliáveis, seriedade
docente e alegria, como se a alegria fosse inimiga da rigoridade. Pelo
contrário, quanto mais metodicamente rigoroso me torno na minha busca e
na minha docência, tanto mais alegre me sinto e esperançoso também. A
alegria não chega apenas no encontro do achado mas faz parte do processo
576
da busca. E ensinar e aprender não podem dar-se fora da procura, fora da
boniteza e da alegria. O desrespeito à educação, aos educandos, aos
educadores e às educadoras corrói ou deteriora em nós, de um lado, a
sensibilidade ou a abertura ao bem querer da própria prática educativa de
outro, a alegria necessária ao que fazer docente. É digna de nota a
capacidade que tem a experiência pedagógica para despertar, estimular e
desenvolver em nós o gosto de querer bem e o gosto da alegria sem a qual
a prática educativa perde o sentido (FREIRE, 1997,p.160-161).
Reelaborando diferentes concepções, Freire estabelece, a um só tempo, um a
indissociabilidade entre ética e estética, como preconizava Platão e, como Schiller,
expande as fronteiras da concepção de estética, para além do mero sentir e da arte,
atingindo a estética como forma de sentir o outro e sentir tudo o mais que nos circunda,
imprimindo, em cada coisa que nos cerca, o selo da graça, da dignidade e da
autonomia, mesmo ao inerte. Freire sente no fazer educacional dialógico, essa
estética da alteridade que percebe o outro, associando de modo orgânico o bom, o
belo e o verdadeiro da kalokagathia pressentida na paideia grega
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta breve afluência filosófica por entre pensadores que aparentemente
poderiam nos caracterizar como definitivamente contraditórios, tem como ponto de
partida a necessidade da compreensão não apenas da arte, mas da dimensão estética
como um fenômeno intimamente atado ao compromisso ético. Sem tal aliança entre
a estética e ética fracassaremos, não apenas como professores ou educadores, mas
como seres humanos que, necessariamente, precisam da vida gregária.
Com Platão vimos que a arte, sobretudo aquelas que têm mais afinidade com
o inteligível como a música o teatro e a poesia, deveriam estar voltados, minimamente,
à moralidade, não permitindo a banalização da arte e da fruição estética do ponto de
vista apenas do aprazível e do entretenimento, tal como naturalmente ocorre hoje em
nossa sociedade. Com relação a isso sabemos do duro escárnio que Platão sofreu ao
longo da história da filosofia e das duras críticas que recebe ainda hoje, ante sua
posição restritiva e taxativa acerca da arte. Contudo, ainda assim, fazemo-nos uma
pergunta hipotética, pergunta inevitável quando se escolhe tomar um caminho
diferente do indicado por um sábio: e se Platão tivesse sido minimamente seguido?
Tal questão, como não poderia ser diferente, suscita inúmeras outras que não
cabem nas extensões deste limitado artigo, questões como “e se realmente
577
tivéssemos, no decurso destes séculos, conduzido a arte com vistas a moralidade? ”,
“teria sido possível com tal atitude corrigir o curso da arte que, na modernidade, se
isentou de juízos morais e rumou em direção à um processo de franca decadência? ”,
“teria sido menos problemático pensar nos limites da arte ou do humor sem cairmos
em moralismos neoconservadores?”.
Uma vez mais, ratificamos que a questão fundamental, lançada aqui como
princípio de um problema, não diz respeito propriamente à forma, mas ao conteúdo
da arte, ao poder encantatório mencionado por Platão e o risco da aliciação desta
potência indômita. Com isso, não condenamos alguma forma de arte popular como
expressão natural de uma cultura, do mesmo modo como o gênio platônico não
condenou a obra homérica, utilizando do mesmo recurso poético para compor seus
Diálogos, mas o que aflige é a pungência dos conteúdos encontrados nas várias
formas artísticas, que propagam preconceitos de diversas ordens e banalizam motes
como sexualidade, com vistas tão somente ao entretenimento.
Mesmo que com ressalvas e seguindo a trilha deixada pela estética kantiana,
os conselhos de Platão reverberaram em Schiller, exortando-o a escrever não como
um poeta, por meio de metáforas, tampouco como um esteta ou um legislador ou um
matemático com o esquadro nas mãos, mas sim como um livre-pensador guiado não
apenas pela razão, mas, também, pelo sentimento. Sua breve menção nos mostra a
necessidade de resgatarmos nossa dimensão estética, considerada não apenas do
ponto de vista da arte ou do artista, mas, mormente, do ponto de vista do indivíduo
que sente, do ser humano sensível ao outro, percebendo suas necessidades,
limitações, dificuldades, virtudes e peculiaridades. Schiller não se refere à estética
apenas do ponto de vista da percepção sensorial do mundo, não se trata da mera
percepção de que o outro existe e está lá ocupando lugar no mundo, mas da
percepção de que só tenho condições de me tornar emancipado e pleno em minha
existência, se tornar emancipado e autônomo também o outro. Assim, a sensibilidade
estética não é aqui mero acessório de erudição cultural, tampouco uma habilidade,
mas um imperativo para a emancipação da alma em prol de torná-la nobre.
E aqui esta perspectiva de Schiller converge para uma aproximação com o
pensamento de Paulo Freire, pois que na obra de Freire não é possível uma distinção
entre estética e ética e vice-versa, não é possível, pois a estética, a aesthesis, o sentir,
é parte indissociável da existência humana. Pode-se até tentar ignorar tais dimensões
da existência humana, todavia, elas sempre estarão lá e só atingiremos a autonomia
578
e a emancipação da alma se nos dermos conta e aprimorarmos essas dimensões,
aprimorando, nesse movimento, as coisas e os seres ao nosso redor. Logo, nessa
perspectiva freireana, que não é apenas educacional, mas que, por sua universalidade
pode ser aplicada de modo mais amplo à existência humana, temos a opção de
“pensar errado” e continuar a “fazer errado”, ou “pensar certo” e lançar mão da
articulação das várias virtudes necessárias para a aplicação das várias dimensões do
ser humano.
O “pensar certo”, assim como a “boniteza”, configura no pensamento de freire
um conceito complexo que se articula com outros. É mister mencioná-lo aqui,
justamente por sua articulação indissociável com o conceito que conduz à sua
estética, que é o conceito de “boniteza”, conceitos contrários ao “pensar e fazer
errado”. Deste modo, afirma Freire, a sensibilidade estética (boniteza) necessita de
recursos que só podem ser ministrados pelo “pensar certo”, pois que “pensar e fazer
errado, pelo visto, não tem mesmo nada que ver com a humildade que o pensar certo
exige. Não tem nada que ver com o bom senso que regula nossos exageros e evita
nossa caminhada até o ridículo e a insensatez” (FREIRE, 1997, p. 40).
Esta articulação entre pensar/fazer certo e a boniteza, já nesse excerto acima
citado, revela a necessidade de nos tornarmos mais sensíveis e humildes, não sendo,
portanto, uma metafísica ou uma filosofia de cunho teorético, mas um imperativo
prático de nossa existência, tal como se apresenta a proposta de Schiller, onde
sensibilidade, humildade e outras virtudes são condições sinequa non para o meu
desenvolvimento como ser integral, lembrando, ainda, que só atingirei a plenitude se
neste processo eu elevo comigo tudo e todos ao meu derredor, sendo este ato de
libertação, um ato comunicante (SCHILLER, 2002, p.116). Do mesmo modo, pensar
certo e pensar inserido no estatuto da boniteza, não é pensar isoladamente,
desenvolver-se só, mas sim o inverso disso, “pensar certo não é que-fazer de quem
se isola, de quem se ‘aconchega’ a si mesmo na solidão, mas um ato comunicante”
(FREIRE, 1997, p. 41).
Com efeito, preconizando maneiras de como fugir de “pensar errado” e, ainda,
apresentando caraterísticas de como “pensar certo” em articulação com a dimensão
estética, Freire afirma que:
Só, na verdade, quem pensa certo, mesmo que, às vezes, pense errado, é
quem pode ensinar a pensar certo. E uma das condições necessárias a
pensar certo é não estarmos demasiado certos de nossas certezas. Por isso
é que o pensar certo, ao lado sempre da pureza e necessariamente distante
do puritanismo, rigorosamente ético e gerador de boniteza, me parece
579
inconciliável com a desvergonha da arrogância de quem se acha cheia ou
cheio de si mesmo. (FREIRE, 1996, pp. 30-31).
Neste excelente último excerto fica evidente que pensar certo requer uma gama
de características específicas e que, ao ser referir a esses termos (pensar certo e
boniteza) Freire se aproxima das concepções ético-estéticas de Platão e Schiller,
procurando sintetizar sob a mesma chancela características fundamentais não apenas
para educador e formador, mas para o ser integral e pleno preparado para lidar tanto
com a condução da autonomia de si, quanto com a autonomia de outrem.
Características que vão desde nossa maneira de ler e pesquisar os assuntos a serem
estudados, passando pela ruptura com dogmatismos, valorização da pureza em
detrimento do puritanismo, indo até o cultivo da ética e de seu inseparável par que é
a dimensão estética, cognominada também como “boniteza”, conceito que nos leva
ao inevitável cultivo da sensibilidade e da afetividade, no intuito de demover quaisquer
tendências do ser à arrogância e a imoralidade gerada pela vã vaidade. Assim, mesmo
que todo o cabedal cultural que envolve a formação dos seres esteja cristalizado em
formas que nos conduzem à imoralidade, à falta de princípios éticos, à carência de
sensibilidade e à falta alteridade, nossa tarefa, doravante, é cultivar a semente éticoestética em nós mesmo, de modo a preservá-la, repassando-as aos que nos cercam
não como um ditame, mas como um ethos, isto é, como um modo de ser genuíno,
inspirando através de nossas ações, as virtudes que queremos cultivar em outrem,
sobretudo naqueles que nos têm como parâmetro.
580
REFERÊNCIAS
BARKER, Ernest. Teoria política grega – Platão e seus predecessores. Trad. SérgioF.
G. Bath. Brasília: Ed. da Universidade de Brasília, 1978
BITAR, Hildeberto. Introdução àLeis. In: Leis. Trad. Carlos Alberto Nunes.
Belém:Editora da UFPA. 1980
CASSIRER, Ernst. O mito do Estado. Trad. Álvaro. Rio de Janeiro: Zahar Editores,
1976.
DETIENNE, Marcel. Os mestres da verdade na Grécia Arcaica. Rio de Janeiro:
JorgeZahar Editor, 1988
Freire, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.
São Paulo: Paz e Terra,1997.
HUSSAK, P.; VIEIRA, V. (Orgs.). Educação Estética: de Schiller a Marcuse. Rio de
Janeiro: NAU-EDUR, 2011.
Jaeger, Werner Wilhelm (2001). Paidéia: a formação do homem grego. Trad. Artur
M.
Parreira. SP: Martins Fontes.
PLATÃO. Leis. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belém: Editora da UFPA, 1980
PLATÃO. Os pensadores (Diálogos). (4a ed.). SP: Nova Cultural, 1987.
PLATÃO. A República. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belém: EDUFPA, 2000.
SCHILLER, Friedrich. A educação estética do homem: numa série de cartas. São
Paulo: Iluminuras, 2002.
SUZUKI, M. O belo como imperativo. In SCHILLER, F. A educação estética do
homem numa série de cartas. São Paulo: Iluminuras, 2002.
581
CAPÍTULO 32
DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS OBRIGATÓRIAS: APONTAMENTOS E PROJEÇÕES
PARA TOMADA DE DECISÃO ORGANIZACIONAL
Daniel Carneiro de Sousa
Bacharel em Sistemas da Informação
Instituição: Universidade Estatual do Goiás - UEG
Endereço: Av. Sra. de Santana, 598 - St. Santa Luzia, Posse - GO
E-mail: danielss660@gmail.com
Gleydson Vieira da Hora
Bacharel em Sistemas da Informação
Instituição: Universidade Estatual do Goiás - UEG
Endereço: Av. Sra. de Santana, 598 - St. Santa Luzia, Posse - GO
E-mail: gleydsonmelo0101@gmail.com
Kelly Cristina dos Reis Cavalcante
Especialista em Gestão Pública Municipal
Instituição: Universidade de Brasília - UnB
Endereço: Campus Universitário Darcy Ribeiro, Brasília-DF
E-mail: prof.kellyueg@gmail.com
RESUMO: A contabilidade é uma ciência qualificada a estudar tudo o que diz respeito
ao patrimôniO de uma empresa, seja de natureza financeira, econômica ou física.
Com isso, é possível acompanhar com melhor precisão a situação da instituição em
vários aspectos como: expansão, lucros, prejuízos, contas, bens, direitos, obrigações,
entre outros. A contabilidade evoluiu e atualmente contribui para todo tipo de empresa,
independentemente do seu porte. Com ela é possível produzir relatórios que
demonstram a vitalidade financeira de uma organização, sendo esses denominados
de demonstrações contábeis, úteis para os diversos usuários da ciência contábil.
Dentre várias demonstrações, há duas específicas que são obrigatórias, sendo: o
Balanço Patrimonial e o Demonstrativo do Resultado do Exercício (DRE). OBJETIVO:
Essa pesquisa busca entender e especificar as contribuições da contabilidade e seus
demonstrativos obrigatórios para as organizações. METODOLOGIA: A pesquisa será
um estudo descritivo, com abordagem quantitativa. Foi selecionada uma empresa para
obtenção dos referidos demonstrativos contábeis mencionados anteriormente, para
que tenhamos ciência dos dados concretos da organização. Serão realizadas análises
com a finalidade de comparar demonstrações atuais com as passadas para alcançar
resultados que apontem, dentre outros, crescimento, queda, lucro ou prejuízo.
RESULTADOS: Com a análise e comparação dos demonstrativos, foi possível
verificar a real situação financeira e patrimonial da empresa. A princípio, o balanço
patrimonial demonstrou que a organização obteve aumento no ativo e
consequentemente no passivo e patrimônio líquido. Aliado a isso, o demonstrativo do
resultado registrou um superavit significativo no período apurado. CONCLUSÕES:
Portanto, a contabilidade é essencial para o desenvolvimento das empresas. Os
demonstrativos analisados se consolidam como importantes fontes de informações
para os gestores e ferramentas essenciais para as tomadas de decisões e verificação
da situação financeira e patrimonial, contribuindo assim para o crescimento das
organizações.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 582
PALAVRAS-CHAVE: Balanço Patrimonial; Demonstrativo do Resultado do Exercício;
Tomada de Decisão.
ABSTRACT: Accountancy is a qualified science to study everything that concerns a
company's assets, whether financial, economic or physical. In this way, it is possible
to monitor with better precision the institution situation in several aspects such as:
expansion, profits, damage, accounts, assets, rights, obligations, among others.
Accounting has evolved and currently contributes to all types of companies, regardless
of their size. It is possible to produce reports that demonstrate the organization's
financial vitality, these being called accounting statements, useful for the users of
accounting science. Between several statements, there are two specific that are
mandatory: the Balance Sheet and the Income Statement for the Year. OBJECTIVE:
This research seeks to understand and specify the contributions of accounting and its
mandatory statements for organizations. METHODOLOGY: The research will be a
descriptive study with a quantitative approach. A company was selected to obtain the
aforementioned accounting statements, so that we are aware of the organization's
concrete data. Analyzes will be carried out in order to compare current statements with
past ones to achieve results that point out, among others, growth, decline, profit or loss.
RESULTS: From the analysis and comparison of the statements, it was possible to
verify the real company financial and equity situation. At first, the balance sheet
showed that the organization had an increase in assets and, consequently, in liabilities
and equity. Allied to this, the income statement recorded a significant surplus in the
period determined. CONCLUSIONS: Therefore, accounting is essential for business
development. The statements analyzed are consolidated as important information
sources for managers and essential tools for decision-making and verification of the
financial and equity situation, thus contributing to the growth of organizations.
KEYWORDS: Balance Sheet; Income Statement for the Year; Decision Making.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 583
1. INTRODUÇÃO
A contabilidade é a ciência responsável por estudar tudo o que diz respeito ao
patrimônio de uma organização, sejam elas de natureza financeira, econômica ou
físicas. Com as técnicas e habilidades dessa ciência, é possível registrar, demonstrar
e organizar atividades que são referentes ao patrimônio, permitindo que se possa
analisar e acompanhar de maneira mais eficiente os dados relacionados a empresa.
Bächtold (2011, pág. 162) comenta que a “Contabilidade é uma ciência social
que através da execução de serviços técnicos, ou seja, controla, organiza, estuda e
avalia o patrimônio de uma entidade (física ou jurídica) permanentemente”, em outras
palavras, a contabilidade é composta de diversos procedimentos organizados que
visam avaliar e controlar o patrimônio de uma entidade de forma constante.
Contextualizando acerca dos objetivos da contabilidade, Bächtold, ainda fala
que:
Um dos objetivos da Contabilidade é gerar informações para a tomada de
decisões, conhecida como Contabilidade Gerencial. Por isso, é fundamental
a existência de ferramentas que possibilitem conhecer a real situação e
atender a esta missão. Compete à Contabilidade registrar os atos e fatos
administrativos e produzir informações que possibilitem ao planejar e controlar
suas ações, para traçar os objetivos da entidade. (BÄCHTOLD, 2011, pág.
162).
Percebe-se que a partir da contabilidade e de seus segmentos, é possível
constituir fontes de dados que poderão auxiliar nas tomadas de decisões empresariais
bem como demonstrar inúmeros benefícios para as organizações.
Tem-se como principais funções: registrar os fatos administrativos (memória);
demonstrar e controlar as mutações patrimoniais (controle); servir como elemento de
prova em juízo ou tribunal; fornecer elementos para que os acionistas ou sócios
possam examinar as contas da diretoria e aprová-las ou não; demonstrar ao fisco o
cumprimento da legislação tributária; fornecer dados para a tomada de decisões, etc
(Ibid, p. 170).
Os relatórios ou os demonstrativos gerados pela contabilidade são essenciais
para certos usuários. Dentre eles: investidores, fornecedores, bancos e funcionários.
É de suma importância que esses clientes tenham acesso a tais informações, pois é
por meio delas que os mesmos terão a ciência de como está o desempenho
empresarial e a administração
organizacional das empresas as quais estão
envolvidos. Para Iudícibus et al. (2006, p. 48):
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 584
A contabilidade é objetivamente, um sistema de informação e avaliação
destinado a prover seus usuários com demonstrações e análises de natureza
econômica, financeira, física e de produtividade, com relação à entidade objeto
de contabilização. (IUDÍCIBUS et al. 2006, p.48)
Dessa forma, tal ciência é um importante instrumento para a vitalidade de
qualquer organização. Madeira (2012), diz que: “Através da Contabilidade a empresa
sabe o valor de seus ativos, passivos, receitas, custos e despesas, a rentabilidade
e lucratividade do negócio, produtividade da mão de obra e através disso, pode realizar
um bom planejamento tributário”. Isso significa que por meio da contabilidade é
possível controlar e planejar melhorias para a manutenção do funcionamento da
empresa bem como subsidiar elementos estratégicos, que auxiliaram os gestores a
tomarem decisões mais eficientes e eficazes.
Mediante o exposto, o presente estudo tem como objetivo entender e
especificar as contribuições da contabilidade e seus demonstrativos obrigatórios para
as organizações. Além desta introdução, o artigo apresenta a seção de referencial
teórico, a qual busca fornecer com base em autores que versam especificamente
sobre o assunto, esclarecer sobre as demonstrações contábeis, balanço patrimonial
e demonstrações do resultado do exercício.
Após o referencial é apresentado o método de pesquisa. Este objetivo visa
demonstrar, por meio do levantamento de demonstrativos obrigatórios de uma
empresa, as contribuições que a contabilidade e suas ferramentas podem trazer para
as organizações, proporcionando a compreensão de como as suas aplicabilidades
podem auxiliar na tomada de decisão e no sucesso empresarial.
2. REVISÃO TEÓRICA
Conforme explanado, o objetivo desta pesquisa busca entender e especificar
as contribuições da contabilidade e seus demonstrativos obrigatórios para as
organizações. Desse modo, o referencial destaca elementos teóricos que forneçam,
com base em autores que versam especificamente sobre o assunto, esclarecer sobre
as demonstrações contábeis, balanço patrimonial e demonstrações do resultado do
exercício.
2.1 Demonstrações contábeis
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 585
A contabilidade possui uma série de ferramentas que auxiliam os seus usuários,
e uma delas são as demonstrações contábeis. Essas demonstrações são documentos
elaborados, pelo setor competente da empresa para representar a contabilidade da
organização, ou seja, são relatórios que trazem um compilado de dados necessários
para compreensão do desempenho do negócio.
Sendo que as mesmas, abordam o fluxo contábil e financeiro ocorrido em
determinado período de tempo, geralmente em um período de exercício de 12 meses
e são de suma importância para que os administradores conheçam o real estado da
empresa e possam tomar medidas que visem mudanças ou a realização de
adequações, caso, é claro, hajam essas necessidades. Lemes (2018, pág. 3) aponta
que:
As informações contidas nos demonstrativos contábeis, trabalhadas de acordo
com algumas técnicas de análise, podem tornar-se valiosos instrumentos de avaliação
da situação econômico-financeira de uma empresa, de acordo com os interesses dos
diversos usuários dessas informações. (LEMES, 2018, pág.3)
Dessa forma, essas informações são extremamente úteis para todos os usuários
e não somente para os tomadores de decisões. Dentre eles, os fornecedores, clientes,
instituições financeiras, acionistas, governos, empregados e até mesmo a
concorrência que utiliza das informações de desempenho de outras empresas.
Os demonstrativos contábeis possuem obrigatoriedade para empresas de
sociedade por ações, ou seja, organizações cujo capital social é dividido em ações de
cada investidor. Esse tipo de natureza jurídica, também é conhecida como Sociedade
Anônima (SA). A legislação brasileira, mais precisamente, a Lei 6.404/76, legitimiza a
divulgação dos seguintes demonstrativos para empresas de capital aberto: Balanço
Patrimonial; Demonstração do Resultado do Exercício (DRE); Demonstração dos
Resultados Abrangentes; Demonstração de Fluxo de Caixa (DFC); Demonstração das
Mutações do Patrimônio Líquido; Demonstração do Valor Adicionado e Notas
Explicativas.
Nos demais tipos de empresas, como Micro Empresas (ME), Empresas de
Pequeno Porte (EPP) e as Pequenas e Médias Empresas (PME’s), a obrigatoriedade
e a facultatividade desse conjunto de demonstrativos podem ser diferenciada,
possibilitando que alguns itens sejam substituídos mediante a apresentação da
Demonstração de Lucros ou Prejuízos Acumulados (DLPA) ou da Demonstração das
Mutações do Patrimônio Líquido.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 586
2.2 Balanço patrimonial
O Balanço Patrimonial é o demonstrativo contábil que diz respeito ao conjunto
de bens, direitos e obrigações de uma organização. Para Gelbcke (2018, pág. 66) “O
balanço tem por finalidade apresentar a posição financeira e patrimonial da empresa
em determinada data, representando, portanto, uma posição estática”. Com isso, é
possível serem feitas análises quantitativas e qualitativas a respeito da situação da
empresa a partir desses relatórios gerados.
A contabilidade do balanço é dividida em dois eixos, onde a primeira parte
recebe os ativos da empresa e a segunda fica a cargo dos passivos e patrimônio
líquido. O ativo diz respeito aos bens e direitos que uma empresa possui, por exemplo,
o dinheiro em caixa, terrenos, ações em outras empresas, entre outros. Sendo
perceptível que são contas mais fáceis e rápidas de serem convertidas em dinheiro.
Por outro lado, o passivo compreende as obrigações exigíveis a entidade como,
contas a pagar, impostos, tributos, pagamentos com fornecedores e saldos
devedores. Na sequência, temos o patrimônio líquido que é a diferença entre os
valores totais dos ativos e dos passivos de uma empresa.
Esses eixos devem ser organizados e ordenados para serem calculados e
analisado da melhor forma possível. Gelbcke (2018, pág. 67) explica como deve ser
feito:
No Ativo, são apresentadas em primeiro lugar as contas mais rapidamente
conversíveis em disponibilidades, iniciando com o disponível (caixa e bancos),
contas a receber, estoques, e assim sucessivamente;
No Passivo, classificam-se em primeiro lugar as contas cuja exigibilidade
ocorre antes. (GELBCKE, 2018, pág. 67)
Dito isso, entende-se que os ativos (bens e direitos) são organizados de acordo
com a sua liquidez, ou seja, o grau de liquidez que é a facilidade com que o ativo tem
de ser convertido em dinheiro. Para o autor, a Lei 6.404/76 cita no artigo 178 que o
balanço patrimonial deve ser segregado, no tocante do ativo e passivo.
Em suma, o ativo circulante, refere-se ao alto nível de liquidez, que significa
que se convertidos em dinheiro pode ser de forma rápida. Já os ativos não circulantes
dizem respeito a menores graus de liquidez, que demandam mais tempo para serem
transformados em dinheiro, ou seja, são realizados a longo prazo.
Quanto aos passivos (obrigações exigíveis), deve-se atentar ao vencimento
das contas a pagar. Caso o vencimento das contas forem a curto prazo, elas farão
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 587
parte do passivo circulante, quando for o contrário, farão parte do passivo não
circulante.
Já as obrigações não exigíveis formam o patrimônio líquido, como exemplo,
capital social, reservas de capital, ajustes de avaliação patrimonial, entre outros.
Nesse sentido, é necessário que haja um equilíbrio entre os eixos que dividem o
balanço patrimonial para que seja consolidado um bom desempenho no período ao
qual será realizado.
2.3 Demonstrações do resultado do exercício
Diz respeito ao resultado líquido da empresa e basicamente demonstra se ela
está gerando lucros ou prejuízos. Sendo a mesma uma demonstração obrigatória e
uma das mais importantes que deve ser apresentada. Santos et al (2011, p. 55), o
conceitua como, o conjunto de acontecimentos, oriundos de decisões administrativas,
que envolvem a entidade, isto é, a administração, gerência, ato de gerir a empresa.
Os mesmos autores descrevem que para a legislação societária a
Demonstração do Resultado destina-se a, evidenciar a formação do resultado do
exercício, mediante confronto das receitas, custos e despesas incorridos no exercício.
Essas demonstrações devem ser apresentadas na posição vertical e discriminar seus
componentes de forma ordenada. (SANTOS, et al., 2011, p. 55).
Contudo, o Sebrae (2019), conceitua o tema da seguinte forma:
Demonstração do Resultado do Exercício, também conhecida como DRE, é
um documento contábil de demonstração cujo objetivo é detalhar a formação
do resultado líquido de um exercício pela confrontação das receitas, custos e
despesas de uma empresa, apuradas segundo o princípio contábil do regime
de competência (receitas e despesas devem ser incluídas na operação do
resultado do período em que ocorrem).
Em outras palavras, uma DRE apresenta o resumo financeiro dos resultados
operacionais e não operacionais de uma empresa. (SEBRAE, 2019)
Além disso, a legislação responsável por essa regularização é rígida ao
determinar que a divulgação desse demonstrativo deve ser anual, no período de
janeiro e dezembro. Muito embora, para fins administrativos as organizações
costumam elaborar mensalmente e trimestralmente para fins fiscais. Gelbcke (2018)
diz que:
A Lei 6.404/76 define o conteúdo da Demonstração do Resultado do Exercício,
que deve ser apresentada na forma dedutiva, com os detalhes necessários
das receitas, despesas, ganhos e perdas e definindo claramente o lucro ou
prejuízo líquido do exercício [...]. (GELBCKE, 2018, pág. 70)
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 588
A partir disso, é possível analisar a evolução das receitas, despesas e demais
itens, auxiliando grandemente a gestão do negócio, tendo em vista que possui
capacidade de auxiliar no planejamento estratégico e na tomada de decisões.
Seja como for, a Lei 6.404/76 prevê em seu art. 187 (BRASIL, Lei n° 6.404/76,
de 15 de dezembro de 1976, 1976), que esse demonstrativo contenha os seguintes
itens, devendo os especificar:
•
A receita bruta das vendas e serviços, as deduções das vendas, os
abatimentos e os impostos;
•
A receita líquida das vendas e serviços, o custo das mercadorias e
serviços vendidos e o lucro bruto;
•
As despesas com as vendas, as despesas financeiras, deduzidas das
receitas, as despesas gerais e administrativas, e outras despesas operacionais;
•
O lucro ou prejuízo operacional, as outras receitas e as outras despesas;
•
O resultado do exercício antes do Imposto sobre a Renda e a provisão para o
imposto;
•
As participações de debêntures, empregados, administradores e partes
beneficiárias, mesmo na forma de instrumentos financeiros, e de instituições ou
fundos de assistência ou previdência de empregados, que não se caracterizem como
despesa;
•
O lucro ou prejuízo líquido do exercício e o seu montante por ação do capital
social.
Portanto, esse demonstrativo consolida-se como importante ferramenta na
tomada de decisão pois demonstra a situação financeira da empresa. É através desse
relatório que é possível ver a capacidade ou não da empresa em gerar lucro.
Apontando até mesmo sua importância para obtenção de empréstimos e de
arrecadação de dinheiro. Sem esse relatório, seria extremamente difícil mensurar a
qualidade e eficácia da gestão que comanda a organização.
Vale salientar que, segundo Silva (2008, p. 28), a contabilidade preocupa-se
em fornecer não apenas informações de natureza econômica, financeira e
patrimonial, mas visa atender as necessidades de seus usuários no processo de
tomada de decisões, ou seja, essa ciência auxilia em diversos aspectos a
administração de empresas, tornando-se base para a manutenção e bom
desempenho do negócio.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 589
3. METODOLOGIA
A pesquisa é a investigação de fenômenos que visam responder indagações
propostas a fim de caracterizar a realidade ou descobrir soluções para problemas.
Para Gil (2008, pág. 8) pode-se definir o método como caminho para se chegar a
determinado fim. E método científico como sendo o conjunto de procedimentos
intelectuais e técnicos adotados para se atingir o conhecimento. Isto é, a atividade
sistemática de aplicar procedimentos bem definidos para atingir o conhecimento.
Esse estudo tem como objetivo entender e especificar, por meio do
levantamento de demonstrativos obrigatórios de uma empresa, as contribuições que
a contabilidade e essas ferramentas podem trazer para as organizações.
Proporcionando a compreensão de como as suas aplicabilidades podem auxiliar no
sucesso empresarial.
Tal pesquisa caracteriza-se então como um estudo descritivo. Para Gil (2008,
pág. 28) este tipo tem como objetivo primordial a descrição das características de
determinada população ou fenômeno, ou o estabelecimento de relações entre
variáveis. Com isso, além de descrever os dados, é possível interpretá-los com base
em sua realidade e relacioná- los com possíveis consequências.
Diante disto, a abordagem quantitativa foi escolhida por expressar em números
a realidade de determinado ambiente. A natureza quantitativa permite estabelecer
uma relação de causa-efeito entre os fenômenos e possibilita descrever com
facilidade determinadas hipóteses ou problemas. Além de contribuir com um maior
grau de profundidade para interpretações de particularidades (PRODANOV e
FREITAS, 2013). No que se refere ao ambiente para levantamento de dados, foi
selecionada uma empresa privada sem fins lucrativos do estado de Goiás,
pertencente a uma entidade do Sistema S, responsável por promover a capacitação
gerencial e o fomento do empreendedorismo às micro e pequenas empresas no
estado. Além disso, a entidade tem como papel fundamental proporcionar com seus
serviços a sustentabilidade dos pequenos negócios e consequentemente contribuir
para o desenvolvimento econômico e social.
Por meio de consultas ao site do portal da transparência da organização, foram
obtidos os demonstrativos obrigatórios (Balanço Patrimonial e DRE - Demonstrativo
do Resultado do Exercício) da empresa citada, onde foram realizadas análises com a
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 590
finalidade de comparar demonstrações atuais com as passadas. Definindo-se como
período, resultados consolidados de 2019 e 2020.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
A princípio é importante ressaltar que por sua natureza sem fins lucrativos e
sua fonte orçamentária depender de recursos advindos de um sistema composto de
contribuições sociais, podem ocorrer de haver anos com maiores valores
orçamentários e outros não. Isso não significa que a organização não está tendo
sucesso em suas atividades. Pelo contrário, manter-se financeiramente bem, mesmo
quando o orçamento é menor que em anos anteriores, é sinal de que a contabilidade
está sendo bem aplicada e permite que a empresa se mantenha no mercado e
cumprindo com seus objetivos.
Posto isso, como abordado anteriormente, o balanço patrimonial é o
demonstrativo que aborda de maneira clara a situação financeira da empresa. Dessa
forma, esse relatório permitiu que obtivéssemos com precisão a situação financeira
da instituição nos períodos analisados. Observa-se na figura 1, o balanço referente
aos anos de 2019 e 2020, elaborado sob período de competência de 12 meses.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 591
Figura 1 - Balanço Patrimonial de 2019 e 2020.
Fonte: https://transparencia.sebrae.com.br/contabel
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 592
O ativo circulante, cujo elemento pode ser convertido em dinheiro mais
rapidamente, em seu item de caixa e equivalentes de caixa percebe-se que de 2019
para o ano seguinte obteve um aumento de cerca de 15,6% crescendo de R$ 786 mil
para R$ 909 mil reais. Esse item citado se refere ao valor em espécie que a empresa
possui no final do período analisado.
Da mesma maneira, as aplicações financeiras tiveram um crescimento
significativo de 41,8% em um período de 12 meses. Essas aplicações são realizadas
em títulos públicos federais e possuem liquidez imediata, ou seja, o vencimento é
inferior a 90 dias. Nesse caso, os recursos podem ser utilizados para à manutenção
operacional e administrativa, isto é, caso a empresa possua compromissos a curto
prazo esses recursos podem honra-los. Entretanto, é importante ressaltar que esse
item do ativo circulante se refere aos investimentos do Sistema S como um todo e a
organização estudada possui participação inferior a 5% desse fundo.
Os valores a receber, são recursos oriundos da prestação de serviços de
cursos, treinamentos, consultorias e demais atividades da organização. Nesse item,
registrou-se uma diminuição de 14,4% em relação ao ano de 2019. Esses resultados
já incluem a provisão de não recebimento financeiro por parte dos clientes. Isto quer
dizer que a contabilidade estima um valor com base no histórico de perdas no
recebimento de clientes e subtrai do total de créditos a receber.
O ativo não circulante é o grupo composto pelos bens e patrimônios, cuja
característica principal é que são destinados ao funcionamento da empresa. E não
são facilmente convertidos em dinheiro de imediato. De 2019 para 2020 a empresa
observou esse ativo diminuir de R$ 18.624 milhões para R$ 17.509 milhões, que
corresponde em termos percentuais a cerca de 5,9%. A redução desses valores pode
ser explicada pelos leilões de patrimônios. A organização costuma utilizar dessa
modalidade para vender bens que se tornaram inservíveis para os seus negócios e
atividades.
Em contrapartida, o passivo da organização são as suas obrigações perante
aos clientes, fornecedores e governo, sendo integrantes desse grupo as despesas,
dívidas, tributos e demais. Os encargos que devem ser cumpridos a curto período
fazem parte do passivo circulante. E nesse total, houve uma redução de cerca de
15,3%, resultando em R$ 10.219 milhões em 2020. Já o passivo não circulante,
relativo a obrigações a longo prazo, aumentou de R$ 11.671 milhões para R$ 14.496
milhões. Nesse item, é importanteapontar que as obrigações a longo prazo se referem
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 593
a obrigações a serem cumpridas da empresa com a entidade do Sistema S. Como
também as provisões que são resultantes de causas ajuizadas em desfavor da
empresa.
De forma geral, é possível observar que o passivo da empresa teve um
aumento percentual de 4,1%. Mesmo não sendo um aumento expressivo esse pode
ser um indicativo que chame a atenção dos gestores. Com isso, análises podem ser
feitas a fim de buscar os pontos que mais contribuíram para esse crescimento e assim
poder traçar estratégias para reduzir essa proporção.
Na figura 2, constata-se que a empresa obteve em 2019 o ativo de R$ 88.625
milhões e consequentemente a mesma razão no total do passivo e do patrimônio
líquido. No ano seguinte, no final do exercício de 2020 foi registrado um crescimento
de R$ 23.255 milhões, o que resultou em um ativo de R$ 111.880 milhões, bem como
o passivo e patrimônio líquido.
Figura 2 - Ativo, passivo e patrimônio líquido da empresa em 2019 e 2020.
Fonte: https://transparencia.sebrae.com.br/contabel.
Para os gestores, esse relatório é uma importante ferramenta de comparação
com o que foi definido inicialmente no plano de ação da instituição. Nesse caso
analisado, foi registrado um crescimento de 26,2% de um balanço patrimonial para o
outro. Observa-se no demonstrativo exposto na figura 1 que há um equilíbrio
financeiro, ou seja, a organização conseguiu manter um desempenho eficiente nesse
período.
Portanto, de forma geral o balanço patrimonial possibilitou obter informações
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 594
abrangentes sobre o patrimônio da empresa, seus ativos, direitos e obrigações. Para
os interessados, esse é o primeiro relatório a ser analisado, pois busca demonstrar
de forma quantitativa e qualitativa a evolução das finanças, sendo possível concluir a
situação do patrimônio se cresceu ou regrediu.
O demonstrativo do resultado contrapõe as receitas e as despesas objetivando
saber se a empresa obteve lucro ou prejuízo em determinado período. Na figura 3,
apresenta-se os resultados atingidos no final do exercício dos anos de 2019 e 2020:
Figura 3 - Demonstrativo do Resultado do Exercício 2019 e 2020.
Fonte: https://transparencia.sebrae.com.br/contabel.
No ano de 2020 o mundo presenciou o ápice das consequências causadas pela
COVID-19, a sociedade precisou se adaptar repentinamente e de maneira drástica
para tentar conter o avanço da doença. As empresas precisaram se organizar e traçar
novas diretrizes para continuar comercializando ou prestando seus serviços aos
clientes, devido aos problemas causados muitos empreendimentos precisaram
finalizar suas atividades ou sofreram com queda de receitas.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 595
O estado de calamidade pública exigiu que a organização tomasse medidas
emergenciais de isolamento. Foi necessário a implantação do modelo de trabalho
home-office para todos os colaboradores. Além das atividades presenciais serem
adequadas exclusivamente para o ambiente online e diversas outras mudanças.
Diante desses fatos, os resultados foram afetados com reduções significativas que
serão abordadas na análise do demonstrativo do resultado do exercício (DRE).
A respeito das receitas sem contraprestação, segundo o Conselho Federal de
Contabilidade, são transações as quais a empresa recebe ativos ou serviços, ou tem
passivos extintos sem entregar nada em troca ou entregando valores irrisórios, em
contrapartida. Nesse sentido, a figura 4 evidencia a redução desse tipo de receita.
Figura 4 - Receitas sem contraprestação de 2019 e 2020.
Fonte: elaborado pelo autor por meio dos dados do DRE (2019/2020).
Fazem parte dessa receita a Contribuição Social Ordinária e a Contribuição
Social do Nacional, cujos recursos são transferidos às unidades conforme a
arrecadação da entidade integrante do Sistema S. A empresa constatou uma redução
nessa receita em cerca de 16,2% em 2020 devido à queda dos repasses das
contribuições.
Nesse grupo, apenas as receitas operacionais obtiveram aumento, tendo em
vista a alienação de bens do imobilizado. A venda de ativos imobilizados foi necessária
devido a depreciação ocasionada naturalmente pela perda de valor ou pelo uso. No
balanço patrimonial observou-se a diminuição do ativo e no presente demonstrativo
do resultadodo exercício figura-se como um crédito nas receitas sem contraprestação.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 596
Por outro lado, receitas com contraprestação são caracterizadas pela obtenção
de ativos ou serviços mediante a entrega direta de valor aproximadamente igual (em
forma de dinheiro, bens, serviços ou ativos) em troca com outra organização. A
instituição promove ações às micro e pequenas empresas, candidatos a empresários
e empreendedores. Nessa perspectiva, as contrapartidas financeiras oriundas da
prestação de serviços de treinamentos, consultorias e cursos integram as receitas de
empresas beneficiadas, e, novamente observa uma variação negativa de -50,8% em
relação a 2019. Na figura 5 é possível examinar com os totais obtidos no final do
exercício de 2019 e 2020.
Figura 5 - Receitas com contraprestação de 2019 e 2020.
Fonte: elaborado pelo autor por meio dos dados do DRE (2019/2020).
De forma geral, as receitas com contraprestação tiveram um decréscimo de
19,2%, isso sendo consequência das restrições impostas pelo estado de calamidade,
onde a empresa precisou suspender momentaneamente suas atividades presenciais.
E uma importante fonte de recursos é a locação de espaços em feiras foi impactada
diretamente, devido a essas necessidades de interrupção de eventos.
Suas ações foram direcionadas ao máximo para o ambiente digital, o que
eventualmente auxiliou a empresa a avançar o processo de digitalização e fez com
que os seus objetivos continuassem, minimizando as consequências da situação
emergencial. Assim como as receitas sofreram baixas, as despesas seguiram a
mesma tendência com percentuais relevantes.
A respeito das despesas, os principais pontos para a operacionalização das
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 597
suas atividades e que foram visivelmente afetados foram os gastos com pessoal,
encargos e benefícios sociais que tiveram uma variação de -20,4% comparado a
2019, decorrente principalmente da redução do quadro de colaboradores. A
contratação de serviços feito pela empresa diminuiu em razão da demanda,
acarretando em -38,3% sobre os custos com serviços profissionais e contratados.
Aliado a isso, os custos e despesas de operação declinaram em -61,1%. Portanto, de
2019 para 2020 a diminuição percentual foi de 32,4%.
Figura 6 - Despesas totais nos anos de 2019 e 2020.
Fonte: elaborado pelo autor por meio dos dados do DRE (2019/2020).
Em face do exposto, a gestão do empreendimento, por meio do demonstrativo
do resultado, registrou um superavit de R$ 24.825 milhões, um acréscimo de 68,2%
em relação ao ano de 2019. Entretanto, tendo em vista a sua natureza jurídica ser
sem fins lucrativos, a empresa não distribui qualquer tipo benefício financeiro para
seus envolvidos. Todo recurso remanescente de um período é aplicado único e
exclusivamente para a manutenção das suas atividades.
De qualquer modo, o balanço patrimonial e o demonstrativo do resultado do
exercício possibilitaram alcançarmos a real situação da empresa no momento
analisado. Demonstraram que apesar do momento atípico que o país/estado se
encontra onde houveram queda de receitas, também foram registrados números
positivos, que resultou na estabilidade e no bom desempenho das atividades e das
finanças da organização.
Submetendo-se ao que foi definido no plano de ação, os gestores têm em
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 598
posse importantes ferramentas de informações, pois é possível comparar os
relatórios com as definições e analisar se as metas estão sendo atingidas, caso
contrário medidas corretivas podem ser tomadas a fim de sanar cenários não ideais
em que a empresa possa se encontrar.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tomada de decisão é essencial para a gestão de um negócio, seus resultados
implicam no desempenho da organização no mercado. Esse processo é apoiado por
múltiplas vertentes, dentre elas o conhecimento, experiência e ferramentas como
sistemas de informações. Uma decisão bem planejada e construída com dados
precisos, tem grandes chances de levar a empresa a obter melhores resultados e
alcançar aquilo que a sua visão/missão propõe.
As decisões são embasadas considerando todas as esferas da empresa, e a
área contábil possui grande relevância. Muitas escolhas implicam em efeitos nas
finanças, por essa razão faz-se necessária que a decisão a ser tomada considere a
situação financeira. A contabilidade com seus relatórios se consolida como importante
fonte de informação para o apoio das tomadas de decisões.
Na organização analisada, a contabilidade e aplicabilidade dos demonstrativos
proporcionaram a transparência das finanças no final dos exercícios finalizados. Com
o balanço patrimonial foi possível visualizar quantitativamente os ativos, passivos e o
patrimônio, sendo possível atingir de maneira precisa e ampla a sua real situação
financeira. Bem como há a possibilidade de extração de informações qualitativas para
revisão do plano de ação da organização por parte dos gestores.
Na sequência, o demonstrativo do resultado do exercício permitiu conhecer as
principais fontes de recursos e despesas. Cujo resultado final apontou que a empresa
obteve superavit no período de 12 meses. Considerando isso, além de ser um registro
exigível para as obrigações contábeis e fiscais, esse relatório pode ser utilizado como
ferramenta guia para o controle financeiro.
Portanto, o balanço patrimonial e o demonstrativo do resultado do exercício
auxiliam de maneira significativa no processo de tomada de decisão. Se consolidam
como essenciais na avaliação dos resultados e no direcionamento de uma organização
conforme as diretrizes propostas no seu planejamento. O que pode gerar o bom
desempenho e o sucesso da empresa.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 599
REFERÊNCIAS
CHIAVENATO, Idalberto. Administração nos Novos Tempos. Rio de Janeiro:
Editora Campus, 1999.
BÄCHTOLD, Ciro. Contabilidade Básica. Curitiba-PR: Instituto Federal do
Paraná. 2011.
GELBCKE, Ernesto Rubens [et al.]. Manual de contabilidade societária: aplicável
a todas as sociedades: de acordo com as normas internacionais e do CPC. 3.
ed. – São Paulo: Atlas, 2018.
GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. – São Paulo:
Atlas, 2008.
LEMES, Giovanni Bugni. Análise das Demonstrações Contábeis. Clube de
Autores: 2018.
PRODANOV, Cleber Cristiano; FREITAS, Ernani Cesar de. Metodologia do
Trabalho Científico: Métodos e Técnicas da Pesquisa e do Trabalho
Acadêmico. 2. ed. – Novo Hamburgo: Feevale, 2013.
SANTOS, José Luiz dos. et al. Contabilidade Geral. 3 ed. Atual, pela Lei n°
11.941/09 e pelas normas do CPC. São Paulo: Atlas, 2011.
SILVA, Clésio de Castro e. A importância da contabilidade gerencial para o
processo de tomada de decisão. Brasília: UniCEUB, 2008.
BASTOS, Renata. Contabilidade Básica? Método das Partidas Dobradas. Débito
e Crédito. Disponível: <https://www.meucontadoronline.com.br/blog/contabilidadebasica-metodo-das-partidas-dobradas-debito-e-credito/> Acesso em: 29 Dez. 2020.
FERNANDES, Regina. O que é Demonstração do Resultado de Exercício da sua
empresa (DRE)? - Capital Social. Disponível em:
<https://capitalsocial.cnt.br/demonstracao-do-resultado-de-exercicio/> Acesso em:
10 Jan. 2021.
MADEIRA, Rodrigo. A importância da contabilidade para a empresa. Disponível
em: < https://administradores.com.br/artigos/a-importancia-da-contabilidade-para-aempresa> Acesso em: 29 Dez. 2020.
BRASIL. Lei nº 6.404 de 15 de dezembro 1976. Dispõe sobre as Sociedades por
Ações. Presidência da República Federativa do Brasil. Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404compilada.htm> Acesso em: 8 de
jan. de 2021
NBC TSP – do Setor Público. Disponível em: <https://cfc.org.br/tecnica/normasbrasileiras-de-contabilidade/nbc-tsp-do-setor-publico/> Acesso em: 9 de out. de
2021.
Braz. Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 112907-112924 dec. 2021 ISSN: 2525-8761. 600
CAPÍTULO 33
A BUSCA DO RE(CONHECER) DA NOSSA CULTURA E IDENTIDADE
Soenil Clarinda de Sales
Mestre em Ensino pelo (IFMT) Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia de Mato Grosso, Doutoranda em Educação pelo Programa de Pós
Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso - PPGE/UFMT
E-mail: soehsales@gmail.com
João Clarindo da Silva
Formação: Licenciatura Plena em Filosofia e História/Faculdades Associadas do
Ipiranga São Paulo SP, Especialização: Interdisciplinaridade, Mestrando em:
Comunicação e Mediações Culturais/UFMT
Email: jclarindo.silva@gmail.com
Silvia Aparecida Maschio
Formação: Licenciatura Plena Ciências e Matemática/Unic. Especialização:
Administração Pública/Gestão Escolar, Faculdades Integradas de Várzea Grande
E-mail: silvia.ap.maschio@gmail.com
Maria Conceição de Campos Cunha Bortoncello
Formação: Ciências Físicas e Biológicas – Univag.
Especialização: Especialização em Educação do Campo: saberes Pantaneiro e
socioeconomia solidária – IFMT
E-mail: mcbortoncello34@gmail.com
Elizaneth de Arruda Martins Eubank
Formação: Licenciatura e Bacharelado em História UFMT, Especialização: Metodologia
do Ensino da Linguagem
E-mail: elizaneth.eubank@gmail.com
Natalina Cristina da Costa Nunes
Formação: Ciencias/Matemática - UNIC, Especialização: Iterdisciplinaridade na
Educação Básica ICE
E-mail: Tinaanasjr@hotmail.com
Nilson Ferreira da silva
Formação: Ciências/Matemática Unic. Especialização: Iterdisciplinaridade na
Educação Básica ICE
E-mail: nilson-mel@hotmail.com
Marileide do Carmo Amorim Arruda
Possui Mestrado em Educação pelo Programa de Pós Graduação em Educação UNEMAT
E-mail: marileide_amorim@yahoo.com.b
Eliane Maria de Arruda Souza
Formação: Licenciatura plena em Pedagogia e em Matemática Especialização: Currículo
e metodologia do ensino fundamental
E-mail: elianesouza.mt@hotmail.com
Leticia Gisele Pinto de Moares Queiroz
601
Mestre em Ensino, pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato
Grosso.
Na atualidade ouve-se falar muito nas mais variadas formas de cultura e a
busca de uma identidade que possa tornar um ponto referencial no intuito de fazer
certa identificação fazendo uma definição a esta temática que é vivenciada das mais
diferentes formas, e que em geral é desqualificada quando se trata da cultura da
grande massa. Ao se referir à busca da própria identidade, o ser humano tem-se
deparado com uma gama de conceitos culturais ao longo da sua existência.
Diante desta constante busca, o ser humano passa por uma espécie de busca
de identidade que o leva a uma profunda reflexão em relação ao estar interagindo com
o OUTRO, o EU e o NÓS em todos os aspectos da sociedade, ou seja, na família,
igreja, grupo e sociedade, onde cada um busca posicionar, criando assim seu espaço
de pertencimento e de defesa de suas ideias, podendo ser identificado como a busca
da própria personalidade enquanto EU e o mundo que o cerca, se expondo
socialmente em busca de ser aceito e ao mesmo tempo, de se posicionar e defender
suas ideias, seus pertences e ao mesmo tempo, se conhecendo melhor, valorizando
seus projetos, bem como fortalecendo sua posição identificadora na sociedade em
que está inserido. Ao tomar conhecimento de seus valores sociais, o ser humano
passa a ampliar sua rede de conectividade e com isso se abre para adquirir novos
conhecimentos a partir da sua própria historicidade de vida, suas capacidades de
atuação enquanto alguém que projeta suas ideias e atualizam uma vez que vivenciam
no dia a dia da sociedade uma diversidade cultural que abarca diferentes pessoas,
costumes e tradições, situações e vivencias que envolvem as mais diversas formas
de cultura.
Mediante as análises de alguns autores abordados, a cultura de um povo é
formada por vários elementos como crenças, ideias, mitos, valores, danças, festas
populares, alimentação, modo de vestir entre outros fatores. Trata-se de uma
característica importante de uma comunidade, pois a cultura é transmitida de geração
em geração e demonstra aspectos locais de uma população da qual as comunidades
tradicionais não estão imunes.
Stuart Hall (2006), afirma que não são apenas identidades individuais que
passam, na modernidade tardia, por um processo de transformação, o mesmo ocorre
com as identidades culturais, igualmente deslocadas pela globalização. Ao tratarmos
dos saberes culturais, percebe-se a necessidade de entender o contexto em que
602
envolvem as ações humanas, do OUTRO e do NÓS, que são frutos do meio e do
trabalho do homem. Diante destas informações e reflexões, pode-se dizer que, a
cultura é produzida no dia a dia da vida humana.
O Brasil, por conter uma grande dimensão territorial e uma população
numerosa e miscigenada com grande quantidade de descendentes de vários povos,
tais como: europeus, africanos, asiáticos e índios entre tantos outros povos, apresenta
uma vasta dimensão cultural.
Diante de exposto no que diz respeito a dimensão cultural à partir de um olhar
que parte da perspectiva macro, relativa as mais variadas formas culturais vivida pela
humanidade no seu mais amplo sentido, estes estudos mais direcionado me fez
aproximar reflexão ao Projeto em analise, pois diante do grande leque cultural, podese entender que a CULTURA não é propriedade de um grupo seleto, mas, sim, de
toda a humanidade que a cultuam, prezam as mais antigas tradições culturais, vivendo
a diversidade da cultura erudita como também das culturas vividas no senso comum
da ancestralidade sendo relembrada no campo social folclórica, tradicional e científica
vivenciadas nos últimos séculos, até a perspectiva micro, realidade de vida nas
comunidades remanescentes de quilombo, mediante suas práticas cotidianas e
tradicionais.
Ao se tratar de comunidades tradicionais, ela se constitui de singular modelo
de sociedade e de relação social na qual a cultura influencia as novas gerações,
mantém sua cultura, identidade e tradições, onde cada indivíduo luta por efetivação
de políticas educacionais e sociais que possam permitir o acesso e permanência e,
suas localidades, defendendo seus pertences e ao mesmo tempo em que valorize e
descobre o real sentido de suas lutas na coletividade, trazendo para si
questionamentos em relação à forma pela qual a cultura é visualizada e produzida no
grupo dos remanescentes.
Diante das reflexões culturais, Dennys Cuche nos leva a dar um “mergulho” no
que se refere aos estudos da cultura, onde cada coletividade, no interior de uma
situação dada, pode ter a tentação de defender sua especificidade, fazendo um
esforço através de diversos artifícios para convencer (e se convencer) que seu modelo
cultural é original e lhe pertence. O caráter da situação determinará se o jogo de
distinção levará a valorizar e acentuar tal conjunto de diferenças culturais mais do que
outro. Isso leva cada indivíduo a se conhecer, bem como propõem fazer
questionamentos à cerca daquilo que procura manter vivo em suas vivencias, mesmo
603
que remotamente distante da ancestralidade. Para além dessas informações, a
vivência em comunidade, consiste em um lugar cujo processo de organização, desde
os aspectos socioculturais, educativo e econômico parte de um protagonismo, cuja
trajetória de vida é marcada por dificuldades. É uma história de homens e mulheres
trabalhadores,
história
de
pessoas
ordinárias
que
merece
ser
relatada,
problematizada como dito Michel de Certean (1998). Ou ainda nos dizeres de Michel
Perrot (2007), dos excluídos da história.
Diante do exposto, em pleno século XXI, a sociedade brasileira ainda luta pela
garantia dos direitos e dentre os quais pelo direito à liberdade de poder ir e vir com
sentimentos de ser respeitado, independentemente de qual quer amarrar que se
traduza em preconceitos ou abusos por fazer parte desta ou daquela cultura, seja ela
oral, seja tradicional, razão pela qual se faz necessário conhecer, analisar e identificar
a grande diversidade cultural, do qual compõem o cenário da sociedade brasileira e
sai relevante importância para reflexão no âmbito acadêmico. A percepção de Hall
(1997) é a de
“toda a ação social e cultural, que todas as práticas sociais expressam e
comunicam um significado e, neste sentido, são práticas de significados; ou seja, toda
prática social tem uma dimensão cultural, da mesma forma que as práticas políticas e
econômicas, também possuem uma dimensão cultural.
Hall (1997) destaca que a cultura sempre foi importante nas ciências humanas
e sociais, pois os estudos das linguagens da literatura, das artes, entre os estudos
das linguagens, da literatura, das artes, entre outros, sempre fundamentaram o tema,
embora não fosse trivial o entendimento de que esses estudos compusessem um
conjunto diferenciado de significados, ou seja, uma cultura, na concepção deste autor.
Este novo mundo ultra conectado, representa um dos grandes desafios da
filosofia contemporânea. Essa natureza planetária do mundo virtual indica que a
cibercultura não está condicionada pelos mesmos fatores que a cultura “tradicional”
como a geografia, religiões, tradições e contextos locais.
“Cultura ou Civilizações, tomada em seu sentido etnológico amplo, é todo
aquele complexo que inclui conhecimentos, crença, arte, moral, lei, costumes e todas
as demais capacidades e hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro a
sociedade”. A condição da cultura, entre as diversas sociedades da espécie humana,
na medida em que é possível de ser investigada nos princípios, é um, tema apropriado
604
para o estudo do pensamento e das ações humanas (TYLOR, apud THOMPSON,
2009, p. 171).
Diante deste mecanismo de interações, há de se observar que tanto o
ciberespaço quanto a cibercultura não foram previstos nem mesmo pelos mais
imaginativos escritores da ficção cientifica. Sua origem se deu da fusão de iniciantes
isoladas de instituições e pessoas visionárias.
Diante a esta afirmação, isso deixa evidente de que todo aprendizado se dá do
reconhecimento de preservar, cuidar, manter viva a cultura imbricada no seio da
comunidade, tendo capacidade de reconhecer e fortalecer em suas vivencias
comunitárias.
“Essa identificação da cultura com a história leva e conta a maneira como o
tempo se realiza. Na natureza, o tempo é repetição (o dia sempre sucede a noite, as
estações do sempre da mesma maneira, os animais sempre se reproduzem da
mesma maneira, os astros realizam sempre os mesmos momentos, etc.). Ao contraio,
o tempo da cultura é o da transformação (isto é, das mudanças nos costumes, nas
leis, nas emoções, nos pensamentos, nas técnicas, no estuário, na alimentação, na
linguagem, nas instituições sociais e políticas, etc.)”. (CHAUÍ, 2017, p. 273).
Conforme Eduardo Assis (2007) refere a conformação teórica da literatura
“afrobrasileira” ou “afrodescendente”, onde a busca pela identidade tem provocado
uma profunda exigência para que possa construir algo mais concreto e substancial.
Sobretudo ao se referir ao afrodescendente, onde se vê certo distanciamento entre a
história real com certos desencontros, vazios em sua existência, onde muitas vezes
se encontram silenciadas ou mesmo esquecidas nas margens sociais. A sociedade é
a grande promotora de ações que se possam sustentar ideias que produzam efeitos
positivos, mesmo que haja resistências por parte de indivíduos que deixam cair em
situações que negam sua historiografia enquanto sujeitos oriundos da grande
composição atual. Ao se referir o período colonial, período este que nem sempre
procurou ver a sociedade de modo geral, com ser pensante, que buscassem conhecer
seus direitos enquanto sujeito que possuem uma história de vida, uma cultura que se
pudessem ser valorizadas, pois os afrodescendentes eram vistos apenas como de
obra com capacidades para realizar tarefas pesadas e não sendo vistos como agente
transformador e formador de opiniões.
Ao se referis aos afrodescendentes, fica notório que estes tiveram sua grande
parcela de contribuição em todos os campos de atuação, mas que nem sempre eram
605
reconhecidas como produtores de cultura houve-se uma grande negação a sua
participação; pois estes por sua vez, estiveram sempre presentes nas mais diferentes
produções artísticas culturais do seu meio, dos quais pode ser elencado, o samba, o
carnaval, o futebol, a música, o teatro, novelas, enfim, em todos os setores
apresentando assim uma chama cultural, mesmo que em muitos casos, essas
produções literárias sofressem ao longo do tempo, impedimentos que pudessem
negar sua divulgação, em se tratando da etnicidade africana.
Além disso, há muitos debates em relação aos afrodescendentes, onde em
muitas vezes é possível deparar com a negação de critérios étnicos ou de identidades
que não deve sobrepor ao critério de nacionalidade, na qual deveria atentar para
aquilo que é comum a todos pois a “literatura é uma só” e afinal, é de todos. Sabe-se
que a historicidades dos afrodescendentes lhes são negados desde o período
colonial, as amarras e impedimentos sociais são tantas e das mais variadas formas,
onde os afrobrasileiros e afrodescendentes deparam com a imensa dificuldade de
posicionam o EU em relação ao OUTRO devido a uma serie de obstáculo impostos
por sujeitos/indivíduos que se posicionam na sociedade como detentores de poderes,
subjugando aos demais como se não possuíssem sequer a dignidade de
reconhecimento humano diante daquilo que se conhecer ou pretende conhecer.
Mediante os vários fatores, cabe aqui lembrar que os afro-brasileiros ou
afrodescendentes são povos que sempre estão em busca de melhor conhecer sua
história e fazer-se conhecer-se de modo que estes sejam reconhecidos como povos
que produzem culturas, interagem com toda sociedade, construindo na apenas
memorias, mas também sua historias, formando saberes e participando da construção
social em todos os sentidos, na sua origem, na sua comunidade onde possam ser
reconhecidos e defensores da sua cultura e da sua identidade. Ao se referir
comunidades, cabe aqui ressaltar que a Constituição Federal Brasileira – CFB de
1988, em seu artigo 68, regulamentando pelo Decreto nº 4.887, de novembro de 2003
que regulamentou e delimitou limites territoriais dessas comunidades estabelecendo
procedimentos administrativos para identificação, reconhecimento, delimitação,
demarcação e titulação de propriedade definitiva das terras ocupadas por
remanescentes de afrodescendentes que se encontram pelo país.
Diante de tantas informações literárias n que consiste analise de cultura, cabe
ressaltar que todos os autores conhecidos neste período de investigação social e
cultural trazem uma gama de informação intrínseco ao projeto que pretendo estudar,
606
ressaltando inúmeras fontes inspiradoras e ao mesmo tempo em que provoca um
desejo de aprimorar conhecimentos em relação à cultura, onde a sociedade atual, a
cada dia que possa, tem vivido uma demanda muito grande de informação que tem,
cada vez mais aproximado conhecimentos, onde os jovens tem experimentado uma
gama de “resoluções mecanizadas”, levando a conceber novos horizontes bem como
reconhecer enquanto sujeito histórico e de mudanças perante o espaço que se vive,
conhecendo, reconhecendo e posicionando o seu EU em relação com o OUTRO e o
NÓS em busca de fortalecer seus ideais, sua identidade e sua cultura.
REFERÊNCIAS
607
BRASIL, constituição Federal de 1988. Brasília, presidência da República, Casa
Civil, 1988. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/civil_03constituicao.htm , 03
de jan. de 2018.
CHAUÍ, Madalena. Iniciação a Filosofia. Volume único. Ensino médio. 3 ed. São
Paulo: Ática -2017
DUARTE, Eduardo Assis. Literatura e Afrodescendência. Literafro - O portal da
literatura Afro-Brasileira, Belo Horizonte. 12 de set de 2017. Disponível em:
http://www.letras.ufmg.br/literafro/artigos/artigos-teorico-conceituais/150-eduardodehttp://www.letras.ufmg.br/literafro/artigos/artigos-teorico-conceituais/150-eduardo-deassis-duarte-literatura-e-afrodescendenciaassis-duarte-literatura-e-afrodescendencia
CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Tradução: Viviane
Ribeiro. Bauru. Edusc. 1999. 256p.
HALL, 5. A centralidade da cultura: notas sobre a revolução cultural do nosso
tempo. Educação e realidade, Porto Alegre, nº 2, V. 22, p. 5, 1997.
PERROT, M. Minha História de Mulheres. Tradução Ângela Maria da Silva Correa.
São Paulo: contexto, 2007.
THOMPSON, J.B. ideologia e cultura moderna: Teoria social crítica na era dos
meios de comunicação de massa. Petrópolis: Vozes, 2009.
608
CAPÍTULO 34
TRÊS IMPORTANTES
SUSTENTABILIDADE
PALMEIRAS:
DAS
CONTRIBUIÇÕES
SOCIAIS
À
Wilson da Costa Santos
Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Farmácia, Programa de PósGraduação em Ciências Aplicadas a Produtos para a Saúde
Endereço: Rua Dr. Mario Vianna, 523, CEP 24241-000, Niterói, RJ, Brasil
E-mail: wsantos@id.uff.br*Autor para correspondência
Cristina Moll Hüther
Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Farmácia, Departamento de
Tecnologia Farmacêutica, Programa de Pós-Graduação em Ciências Aplicadas a
Produtos para a Saúde
Endereço: Rua Dr. Mario Vianna, 523, CEP 24241-000, Niterói, RJ, Brasil
E-mail: cristinahuther@gmail.com
Patricia Garcia Ferreira
Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Farmácia, Departamento de
Tecnologia Farmacêutica, Programa de Pós-Graduação em Ciências Aplicadas a
Produtos para a Saúde
Endereço: Rua Dr. Mario Vianna, 523, CEP 24241-000, Niterói, RJ, Brasil.
E-mail: patricia.pharma@yahoo.com.br
Fernando Carvalho da Silva
Universidade Federal Fluminense, Instituto de Química, Departamento de Química
Orgânica, Programa de Pós-Graduação em Química
Endereço: Rua Mario Santos Braga, 30, CEP 24020-141, Niterói-RJ, Brasil
E-mail: fcsilva@id.uff.br
Vitor Francisco Ferreira
Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Farmácia, Departamento de
Tecnologia Farmacêutica, Programa de Pós-Graduação em Ciências Aplicadas a
Produtos para a Saúde
Endereço: Rua Dr. Mario Vianna, 523, CEP 24241-000, Niterói, RJ, Brasil
E-mail: vitorferreira@id.uff.br
RESUMO: Esse capítulo pretende explorar os principais aspectos de três palmeiras
do reino Plantae e família Arecaceae: Cocos nucifera, Elaeis guineensis e Copernicia
prunifera que têm altos valores comerciais. Essas palmeiras são valorizadas no
mundo e muitas vezes referidas como - árvores da vida - pois contribuem diretamente
para a comodidade e renda de milhões de pequenos agricultores, proporcionando
alimentação, benefícios à saúde, produtos estruturais e beleza estética à paisagem.
Especial atenção para as possibilidades de uso dos seus constituintes, que podem
ser usados como em diversas aplicações industriais, construções, artesanato, setores
farmacêuticos/cosméticos e para a alimentação de humanos e animais. Esses
subprodutos e coprodutos obtidos a partir do extrativismo das folhas, palhas, raízes,
caules e frutos destas palmas têm sido pilar e sustento de gerações de trabalhadores.
Há também diversos produtos naturais como celulose, ceras e óleos. As aplicações
609
de tais produtos variam desde a sua utilização em diversas indústrias, construção civil,
até a sua utilização na indústria de alimentícia, cosméticos e farmacêuticos. Quanto
às possibilidades de uso na alimentação animal, já existem relatos de uso dos
diferentes produtos da cera de palma, onde apenas as folhas apresentaram sinais de
intoxicação quando administradas em bovinos e caprinos. Os demais produtos
derivados da cera de palma (cera, palha e fruto) não apresentaram tais efeitos,
variando entre respostas positivas e negativas quanto à melhora dos diversos
parâmetros avaliados. Dessa forma, foi concluído que o uso dos produtos derivados
da cera de palma na alimentação animal, e suas perspectivas de uso se mostram
promissoras. No passado questões sociais dessas palmeiras eram suas principais
contribuições, mas atualmente ainda continuam gerando muitos empregos,
distribuídos ao longo de uma grande cadeia produtiva, porém atualmente suas
contribuições vão além disso, pois geram produtos de baixo impacto ambiental e são
economicamente sustentáveis.
PALAVRAS-CHAVE: Coqueiro; Cocos nucifera; Dendezeiro; Elaeis guineenses;
carnaubeira Copernicia prunifera; Contribuição social; Sustentabilidade.
“Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.”
Canção do exílio, Gonçalves Dias, 1847.
610
1. INTRODUÇÃO
O Brasil detém de uma grande diversidade de espécies botânicas, e seus
usos pela população, vão desde fins medicinais (FARIAS et al., 2021), como para o
fornecimento de matéria-prima para geração de produtos ou subprodutos que são
condições dependente da espécie botânica.
Em todos os continentes as palmeiras, da família Arecaceae, sempre se
destacaram entra as espécies botânicas de maior distribuição botânica, tendo sido de
vital importância para a sobrevivência dos humanos e animais, pois além de serem
alimentos rico em nutrientes, também encontram usos na construção de casas e
diversos usos medicinais. Portanto, ao longo de milênios tiveram enorme importância
econômica e sociocultural. São espécies amigáveis com grande utilidade dos frutos,
caules e folhas. No mundo estão catalogados 252 gêneros e aproximadamente de
2.600 espécies na família das Arecaceae. O Brasil tem 38 gêneros e cerca de 270
espécies, sendo muitas de grandes interesses comerciais e importantes para a
valorização e a preservação da biodiversidade brasileira (LORENZI et al., 2010;
SOARES et al., 2014).
A palavra palmeira tem um significado que representa ascensão, vitória,
regeneração e imortalidade. E nesse aspecto, é uma dos cultivares que apresenta
grande importância para a bioeconomia. Essa ciência estuda os sistemas biológicos
e recursos naturais aliados a utilização de novas tecnologias com propósitos de criar
produtos e serviços mais sustentáveis. A BIOECONOMIA está presente na produção
de vacinas, enzimas industriais, novas variedades vegetais, biocombustíveis,
cosméticos, entre outros. A exploração comercial das palmeiras é uma grande
oportunidade para o país, se os interesses do Estado brasileiro estiverem com as
empresas e a sociedade civil, pautando-se pelo respeito à sustentabilidade e a
conservação dos recursos naturais (SILVA et al., 2021) Recentemente, Lopes et al.
(2015), relataram as principais características de 12 espécies de palmeiras e as
tecnologias para o cultivo e o extrativismo com técnicas modernas. Além das
importantes contribuições comerciais das palmeiras, elas também podem ser
utilizadas na recuperação de áreas ambientalmente degradadas. As que mais se
destacam são a Buriti, Juçara e o Açaí, cujos frutos são alimento que atraem pássaros,
além de outros animais, ou seja, contribuem para manter várias outras espécies em
611
uma floresta e restabelecer a biodiversidade dos ecossistemas. Na Tabela 1 estão
destacadas algumas dessas espécies que apresentam demanda de mercado e
apresentam potencial comercial, pela produção de óleos ou demais produtos, além do
potencial para ornamentação paisagística de parques, jardins, varandas e canteiros.
Tabela 1 – Exemplos de palmeiras com interesses comerciais
Açaí
Buriti
Coqueiro
Babaçu
Carnaúba
Dendê
Juçara
Jerivá
Pupunha
Euterpe oleracea Mart.
Mauritia flexuosa L.f.
Cocos nucifera L.
Attalea speciosa Mart.
Copernicia prunifera (Mill.) H.E. Moore
Elaeis guineenses Jacq.
Euterpe edulis Mart.
Syagrus romanzoffiana (Cham) Glassman
Bactris gasipaes Kunth
Tucumã
Astrocaryum aculeatum Meyer
2. CONTRIBUIÇÕES DAS PALMEIRASÀ SUSTENTABILIDADE E AS FUNÇÕES
SOCIAIS
A fauna e a flora têm sido o pilar da sobrevivência da humanidade desde os
tempos do caçadores-coletores que usavam seus frutos como fontes de alimentos
abundantes até o início da Revolução Agrícola. Essa agricultura surgiu em diversas
partes do mundo, modo totalmente independente, com as plantas mais facilmente
cultivadas (trigo, ervilha, milho, batata, palmeiras etc.). Se no passado as palmeiras
eram importantes para a sobrevivência do homem e de muitos animais, hoje o cultivo
dessas espécies tem grande função social e adicionalmente seus produtos envolvem
ciência, além de tecnologia sustentável. Neste aspecto, a conservação e exploração
dessa diversidade de palmeiras é importante, pois também contribuem positivamente
para reverter as mudanças climáticas.
Qual a razão da sustentabilidade e o desenvolvimento sustentável serem
temas atuais e urgentes? A resposta é simples, mas sua resolução é complexa. O
planeta que outrora era robusto se tornou doente, pois a prioridade dos humanos
passou para segurança econômica, segurança militar e guerras, prioridades muito
acima aos danos ambientais, ruptura do tecido social, tratamento injusto, miséria,
fome e migração forçada. A política dos países, corporações, mercado global, lucro
612
infinito, ideologias perversas e os descasos dos cidadãos continuam a minar a
sobrevivência dos humanos aniquilando o meio em que vivem (O’RIORDAN, 2004).
A sustentabilidade exige a continuidade da vida das espécies e dos
ecossistemas, que os sustentam, ou seja, uma ampliação de nossas percepções de
tempo. Muito do esgarçamento do tecido ambiental começou a ser acelerada com
Revolução Industrial que transformou uma economia artesanal para uma nova
economia, dominada pelas indústrias, com consequente substituição do trabalho
humano (energia muscular) pelas máquinas. Ao mesmo tempo a aceleração do uso
do capital natural com as máquinas movidas a vapor, também começaram a emitir
gases do efeito estufa. Alguns autores acreditam que adentramos numa nova era
geológica, chamada de “antropoceno” onde os humanos passaram a ter em suas
mãos o futuro de um planeta mais quente e com maior risco de catástrofes, uma
cobertura de gelo reduzida, níveis do mar mais altos e um clima fora de controle
(CRUTZEN, 2002).
As palmeiras são consideradas importante espécies, pois contribuíram para
manter os recursos naturais silvestres ao longo dos anos. Porém, para manter isso, é
necessário prevenir impactos ambientais negativos causados pelas atividades de
coleta, respeitar os direitos e costumes locais para o plantio, além de proporcionar
benefícios para as comunidades locais e um tratamento justo com os coletores. Todos
as espécies de palmeiras que foram selecionados nesse capítulo, a saber, coqueiro
ou coqueiro da Bahia (Cocos nucifera), dendezeiro (Elaeis guineenses) e carnaubeira
(Copernicia prunifera), têm longo histórico de contribuição social e cultural no Brasil.
Porém, atualmente apesar do coqueiro produzir matérias renováveis e biodegradáveis
com muitas utilidades, ele também se se tornou alvo de grandes empreendimentos e
corporações, em que muitas situações a coleta já não se mantêm mais sustentável e
consequentemente afetando a sustentabilidade das florestas. Certamente, isso é
devido ao fato de o coqueiro da Bahia não ser uma espécie brasileira, pois sua origem
é do Sudeste da Ásia. Ele foi introduzido no Brasil em 1553 e se aclimatou de forma
muito eficiente e, portanto, teve ao longo de quase 500 anos vasta utilização em
diversos alimentos e pratos culinários, aplicação artesanal, medicinal e cosmética
(SIQUEIRA et al., 2002).
613
3. COQUEIRO (Cocos nucifera)
O coqueiro (C.nucifera L.), que produz o coco (fruto), é referido na literatura
como “árvore da vida”, por seus múltiplos usos, sendo uma das palmeiras mais
valorizadas no mundo (OHLER, 1984; BENASSI et al., 2013; FERREIRA et al., 2018;
ADKINS et al., 2020; SALUM et al., 2020), pois essa espécie contribui diretamente
para a comodidade e renda para mais de 20 milhões de pequenos agricultores e seus
dependentes, proporcionando alimentos, benefícios à saúde, produtos estruturais e
beleza estética à paisagem (ADKINS et al., 2020). Assim, contribui e desempenha um
papel importante no desenvolvimento econômico, social e na vida cultural de pessoas
em muitos países ao redor do mundo (ALOUW et al., 2020).
Os humanos já exploravam as diferentes estruturas desta palmeira há
milênios, antes mesmo de ser referida como “árvore da vida”, pois já apresentava
diversos usos, como o tronco e as folhas usados principalmente como material de
construção, o fruto para hidratação, porém com o passar dos anos, o que ficou mais
valioso no mercado foi o fruto, que é fonte de componentes comestíveis, como água
de coco, óleo de coco e leite de coco, além de fibra natural (casca) e carvão ativado
(IGNÁCIO e MIGUEL, 2021).
O coqueiro, é uma palmeira, também conhecido popularmente no Brasil como
coqueiro-da-bahia, coqueiro da Bahia, coco-da-bahia, coco-da-baía, coqueiro-dapraia ou simplesmente coco, pertencente à família Arecaceae (antiga Palmaceae),
que produz frutos grandes, de forma ovoide, com coloração esverdeada a amarela,
de casca lisa, com cerca de 25 cm de comprimento e 15cm de diâmetro, com cerca
de 1,2 kg de peso, individualmente e que demora a amadurecer, quando então tornase castanho (AZEVEDO, 2014; HORTO BOTÂNICO, 2022a).
O coco, no entanto, é ofruto do coqueiro, do tipo drupa, simples monocárpico
(proveniente de gineceu unicarpelar, resultante de um ovário apenas), que possui
consistência carnosa em relação ao seu pericarpo (espesso e suculento), classificado
quanto à sua deiscência de indeiscente (não abre quando maduro) e quanto ao
pericarpo (parede do fruto), é lignificado (endocarpo), que constitui o caroço nas
drupas (VIDAL e VIDAL, 2003). Assim, o seu fruto é enorme, coberto por uma grossa
camada de fibra ou “casca”, sendo que essa casca dura envolve uma camada de
endosperma sólido (polpa de até 2 cm), comestível e rica em óleo, e uma cavidade
central que contém o endosperma líquido ou “água de coco”, destacando que todas
614
as partes da planta têm usos alimentícios e não alimentícios, incluindo o caule e as
folhas, usados na construção e no artesanato (BAUDOUIN, 2020).
O coqueiro tem muitos diferentes usos, envolvendo todas as partes da planta,
desde a raiz (uso medicinal) até a broto terminal (uma deliciosa salada) (BATUGAL
2005; BAUDOUIN, 2020), que servem para a economia humana, tanto para a sua
contribuição para as cadeias alimentar e não alimentar tem um impacto significativo
no bem-estar socioeconômico de grandes populações rurais no mundo tropical, que
dependem dele (SALUM et al., 2020), pois se extrai ou aproveita quase tudo, desde o
fruto até seu uso como paisagismo, devido principalmente pelas suas características
morfológicas como, tronco simples, ereto ou levemente curvado, irregularmente
anelado, com folhas de até 3m de comprimento, pêndulas, largas, com folíolos de
coloração verde-amarelada, rígidas e suas flores brancas reunidas em cachos de até
1m de comprimento (HORTO BOTÂNICO, 2022a).
A produção da espécie depende sobretudo da polinização, que ocorre
principalmente por anemofilia, contudo insetos visitam suas inflorescências em
abundância, pois de acordo com a as características das inflorescências do coqueiro,
há uma disposição das folhas e dos cachos, em espiral (em uma espádice), o que
facilita a locomoção de numerosos insetos e pode favorecer a polinização cruzada
(MUNIZ et al., 2020).
O caule do coqueiro, é do tipo estipe, que tem tecido com uma orientação
não uniforme dos feixes fibrovasculares e distribuição de densidade também,
provavelmente influenciando as propriedades mecânicas do coqueiro e a capacidade
de resistir a condições climáticas extremas, como a sua eficiência mecânica para
resistir as forças externas como gravidade (biomassa), vento e água da chuva, e isso
é dependente da relação característica entre sua forma (morfologia), estrutura do
material (anatomia) e a função, visto que essa relação para coqueiros (planta
monocotiledônea) difere significativamente da madeira dura ou macia (plantas
dicotiledôneas) e até mesmo de outras espécies de palmeiras (GONZÁLEZ et al.,
2014).
O Sudeste Asiático é considerado o centro de origem do coqueiro (C. nucifera
L.), visto que, nesta região, a espécie apresenta ampla diversidade morfológica
(AZEVEDO, 2014), sendo também o local inicial de domesticação (LOIOLA, 2014). A
sua dispersão natural, ocorreu por correntes marítimas, conseguindo se estabelecer
em regiões costeiras, principalmente regiões tropicais, mas sua dispersão também foi
615
pela ação antrópica, de modo inicial, principalmente pelos navegadores (AZEVEDO,
2014). Para que a disseminação natural do coqueiro ocorra com sucesso é necessário
que haja um equilíbrio entre o número de frutos e o tamanho do fruto. Por um lado, o
maior número de frutos aumenta as chances do coqueiro alcançar diversos locais e
de se estabelecer, mas por outro lado, os frutos maiores aumentam a capacidade do
coco flutuar nas correntes marítimas e permanecer viáveis, até atingir um local
(LOIOLA, 2014).
O número de variedades de C. nucifera não é definitivamente conhecida, mas
é geralmente aceito que todas as variedades de coco atuais derivam desta espécie,
sendo que a seleção natural e artificial levou à criação de três grupos varietais
principais: alto ou typica; anão ou nana; e híbridos (IGNÁCIO, MIGUEL, 2021 e
PERERA et al., 2020). Assim, existem dois tipos principais de coco: o coco alto e
robusto, de crescimento rápido e principalmente polinização cruzada, enquanto o coco
anão, que cresce lentamente e se autopoliniza (BAUDOUIN, 2020). Variedades altas
podem crescer até 15 – 24 m de altura e que entre seis e dez anos após a germinação,
produzem frutos de tamanho médio à grande, que contêm alta qualidade, comumente
usados na produção de óleo de coco (IGNÁCIO e MIGUEL, 2021). Além disso, essa
espécie apresenta dentro dessas variedades (alta e anã), três sub-variedades: verde,
vermelha e amarela (ALVES e MÜLLER, 1995).
De acordo com a classificação do germoplasma do coco no Sri Lanka, há três
variedades, a saber, typica (alto), nana (anão) e uma nova variedade aurantiaca, que
incluiu cocos de altura intermediária entre os tipos alto e o anão (PERERA et al., 2020)
e as principais característica gerais que definem os diferentes fenótipos de coco estão
expressas na Tabela 2.
Tabela 2 – Características gerais que definem os tipos alto, anão e intermediário de coco*
Característica
Alto
Anão
Estatura
Alto e resistente
Baixo
Folhas grandes e
compridas
Grande
Folhas pequenas e
curtas
Pequeno
Verde, laranja,
amarelo ou
castanho
Forma da copa
Tamanho do fruto
Cor do fruto
Verde a castanho
avermelhado
Intermediário
Intermediário entre
alto eanão
Tamanho
intermediário
Pequeno
Principalmente
amarelo
acastanhado
*Adaptado de Perera et al. (2020).
616
Em comparação com as variedades altas, as variedades anãs são mais
baixas em altura (5 – 18 m), produzem frutos menores e iniciam a produção de frutos
três a cinco anos após plantio (IGNÁCIO e MIGUEL, 2021).
Frutos de variedades anãs são amplamente utilizadas como fonte de água de
coco fresca no mundo (IGNÁCIO e MIGUEL, 2021), porém, as classificações mundiais
de coco não incluem alguns dos diferentes fenótipos presentes em certos países, que
e apresentam estatura semi-alta ou semi-anã, havendo uma necessidade grande de
desenvolver uma classificação padronizada em todo o mundo (PERERA et al., 2020).
O coqueiro, como descrito anteriormente é uma palmeira que está presente
em vários países, mas algo importante de se destacar, é que habita áreas costeiras e
terrestres próximas na maioria dos trópicos (SALUM et al., 2020), sendo assim,
cultivado em regiões tropicais em todo o mundo (IGNÁCIO e MIGUEL, 2021) em mais
de 12 milhões de hectares, distribuídos em mais de 90 países tropicais e subtropicais
(ADKINS et al., 2020), onde há melhores condições de cultivo, como: solos arenosos,
intensa radiação solar, umidade e boa precipitação (FERREIRA et al., 2018), mas
apenas cerca de 50 países até o momento o utilizam comercialmente para geração
de renda, além dos conhecidos tradicionais e usos domésticos (SALUM et al., 2020).
3.1 Principais produtos obtidos do coqueiro C. nucifera, seus usos e composição
Quase todas as partes da palma podem ser utilizados, desde alimentos
saudáveis, bebidas, medicamentos, cosméticos, casas, móveis, artesanato e
bioenergia (ALOUW et al., 2020). Em nosso país, o coqueiro é explorado,
basicamente, para uso do fruto verde (água-de-coco) e seco (uso culinário e
agroindústria de alimentos). Nas agroindústrias sua utilização ocorre na fabricação de
leite de coco, coco ralado, na conservação de água-de-coco, entre outros (LOIOLA,
2014), como pode ser observado na Figura 1.
617
Figura 1. Uma visão geral dos produtos alimentícios produzidos a partir do fruto do coco usando o
processo de secagem. Adaptado de Dayrit e Nguyen, 2020.
Os produtos obtidos do coqueiro são inúmeros, pois todas suas partes, como
raiz, caule, folha, inflorescência e fruto são empregados para fins artesanais,
alimentícios, nutricionais, agroindustriais, medicinais e biotecnológicos, entre outros
(CARVALHO et al., 2006), proporcionando um crescimento internacional na produção
e comercialização de coco, onde os produtos obtidos do coqueiro vêm permitindo
gerar divisas, essencialmente, pela produção de coco, óleo e coco desidratado, além
de novos e outros subprodutos (MARTINS e JESUS JÚNIOR, 2014), porém, um de
seus principais produtos é a água-de-coco.
A água-de-coco verde é uma bebida refrescante, agradável ebastante
consumida, não somente por suas qualidades sensoriais, mas também pelas suas
funções nutricionais e terapêuticas, por apresentaruma composição rica em açúcares
e sais (ROSA e ABREU, 2000) e em alguns países onde a deficiência nutricional na
população é alta, a água-de-coco é utilizada como substituta de produtos proteicos
(CARVALHO et al., 2006).
Na água (albúmen líquido), são encontrados carboidratos, gordura e
proteínas, possuindo também diversos minerais como: sódio, potássio, cálcio,
magnésio, ferro, cobre, fósforo, enxofre e cloro (ALVES e MÜLLER, 1995). A águade-coco apresenta composição de aminoácidos semelhante ao do leite, porém com
maior porcentagem de arginina, alanina, cistina e serina na água-de-coco, e em
menores proporções de outros aminoácidos (CARVALHO et al., 2006).
618
A caracterização físico-química da água-de-coco está destacada na Tabela
3, da variedade anão verde, quando apresenta 7 meses de idade, pois conforme
destacado por Rosa e Abreu (2000), o líquido começa a se formar em torno do 2º mês
após a abertura natural da inflorescência, atingindo valor máximo por volta do 5º ao
7º mês, sendo este o período recomendado para a colheita. Em geral, esta é a época
em que a água-de-coco também se encontra com máximoteor de açúcares e mais
saborosa. A partir daí, há redução nestes valores, até o completo amadurecimento do
fruto, no 12º mês (ROSA e ABREU, 2000).
Tabela 3 – Caracterização físico-química da água-de-cocodo fruto com 7 meses de idade, da
variedade anão verde*
Item
Sacarose
Glicose
Frutose
P
Ca
Na
Mg
Mn
Fe
Valor
280 (mg/100mL)
2378 (mg/100mL)
2400 (mg/100mL)
7,40 (mg/100g)
17,10 (mg/100g)
7,05 (mg/100g)
4,77 (mg/100g)
0,52 (mg/100g)
0,04 (mg/100g)
Item
K
Acidez
pH
Sólidos totais
Brix
Vitamina C
Glicídeos totais
Proteína
Valor calórico
Valor
156,86 (mg/100g)
1,11 (%v/p)
4,91
5,84 (g/100g)
5,00
1,2 (mg/100mL)
3,46 (g/100g)
370 (mg/100g)
27,51 (Cal/100g)
*Adaptado de Rosa e Abreu (2000).
O desenvolvimento de técnicas de industrialização, que conseguiram manter
as características nutricionais e o sabor da água-de-coco, foi de grande importância
para o melhor aproveitamento deste produto, garantindo mercado juntamente com
outros produtos já estabelecidos como leite de coco, coco ralado e a copra (polpa do
coco madura e seca), produtos comerciais e muito utilizados no Brasil (MARTINS e
JESUS JÚNIOR, 2014).
A polpa, que é parte sólida interna do fruto do coco, também chamada
popularmente de a carne do coco (albúmen sólido), é rica em gordura, carboidratos e
moderada quantidade de proteínas, porém apresenta alto valor nutritivo, pois em cada
100 g de albúmen sólido são encontradas 151 U.I. de tiamina, 1 mg de ácido ascórbico
(vitamina C), traços de vitamina A, 0,2 mg de vitamina E e traços de vitamina B
(ALVES e MÜLLER, 1995).
A maioria dos países que cultivam essa palmeira, utilizam para produção
defrutos, com os objetivos de explorarem comercialmente a copra para produção de
619
óleo e coco seco desidratado, mas no Brasil, o coqueiro é cultivado com a finalidade
de produzir frutos destinados à agroindústria para produção principal de coco ralado
e leite coco, além da água de coco (MARTINS e JESUS JÚNIOR, 2014).
Da amêndoa ou polpa albuminosa do cocomaduro obtém-se, o coco ralado e
o leite de coco, produtos que são usados nas indústrias alimentícias, mas também
pode se realizar a extração do óleo; e para obtenção desses produtos, recomenda-se
que seja a partir de frutos colhidos entre 13 a 14 meses após a polinização,
observando se o fruto possui umidade baixa, recomenda-se a não utilização produção
de leite e coco ralado e sim para produção de óleo (CARVALHO, 2007). Assim, da
polpa do coco maduro, crua ou seca (copra), pode ser utilizada para a produção de
leite de coco, coco ralado, óleo de coco, manteiga de coco, farinha de cocoe derivados
destes (SILVA et al., 2022).
Ainda no que tange aos principais produtos produzidos ou extraídos do coco,
o leite de coco é muito importante para vários países, tanto para produção de pratos
culinários típicos, como também, grande parte da população dos países tropicais,
como da Ásia, América do Sul e África, utilizam o coco como parte da dieta e como
meio de subsistência, devido principalmente ao seu uso nas refeições, que são
preparadas com leite ou óleo de coco (SANTOS et al., 2019).
O leite de coco constitui-se um sistema disperso, formado de gorduras,
proteínas, açúcares, sais minerais e água, sendo os lipídios e a água os componentes
predominantes (CARVALHO, 2007). A sua produção é realizada a partir das polpas
frescas de cocos maduros devidamente selecionadas, as quais são submetidas à
retirada da testa (película marrom que recobre o endosperma e pode conferir
amargor), lavagem, trituração e prensagem, sendo que após a prensagem há
obtenção do leite de coco (líquido) e de uma massa (bagaço) que poderá ser
aproveitada para produção de coco ralado ou farinha de coco (SILVA et al., 2022).
Em relação ao óleo de coco, esse pode ser utilizado para várias finalidades,
desde a culinária, até para fins terapêuticos, como por exemplo calmante
(CARVALHO, 2007) e para sua extração, diferentes técnicas podem ser aplicadas
para obtenção do óleo, as quais são modificadas em relação ao tratamento da polpa,
forma de extração (química ou física – mecânica, térmica) e tratamento do óleo após
a extração, sendo que o produto final contém os seguintes ácidos graxos majoritários,
ácido láurico (45-53%), mirístico (16-21%), palmítico (7-10%), caprílico (5-10%) e
cáprico (5-8%) (SILVA et al., 2022).
620
Essas características do óleo, proporcionaram o aumento do consumo de
óleo de coco e produtos relacionados, sendo que algumas razões para o aumento da
popularidade do óleo de coco são a sua defesa na promoção de benefícios à saúde,
principalmente relacionados às doenças cardiovasculares, dentre outras (SANTOS et
al., 2019).
O óleo de coco, foi por mais de um século, a principal oleaginosa do mercado
internacional, antes de ser substituído pelo dendê (Elaeis guineensis Jacq.)
(BAUDOUIN, 2020). Esse óleo é extraído do endosperma do coco maduro, visto que
este acumula elevado teor lipídico (SILVA et al., 2022), sendo assim, deve ser incluído
apenas dentro de 10% da ingestão calórica total e considerado semelhante a qualquer
fonte de ácido graxo saturado em seus efeitos adversos sobre lipídios e doenças
cardiovasculares (SANTOS et al., 2019). Segundo esses mesmos autores, é
importante salientar que, com base em uma revisão realizada por eles, nenhum dado
é valioso para apoiar as alegações sobre o valor do óleo de coco como queimador de
gordura, bem como também, que não foi demonstrado que influencie a termogênese
ou à saciedade.
Além do óleo de coco, e dos demais produtos acima abordados, a produção
ou extração desses produtos, gera resíduos industriais ou também gera subprodutos
do beneficiamento, como como é o caso da geração de resíduos das cascas de coco
não reaproveitadas (MACHADO et al., 2020), sendo as cascas descartadas
principalmente como resíduos, no entanto, essas porções da planta servem como
recurso potencial para fibras naturais (ADENIYI et al., 2019).
O fato de possíveis utilizações e o aproveitamento dos resíduos da casca do
fruto,
promoveu
e
promove
o
desenvolvimento
de
inúmeras
pesquisas,
desenvolvendo possíveis usos, como a substituição parcial do cimento Portland em
argamassas com a utilização das cinzas da casca do coco verde (GUIMARÃES et al.,
2017).
Na indústria convencional do coco maduro, este resíduo é largamente usado
como combustível para caldeiras, beneficiamento de fibras, manufatura de cordoalha,
tapetes, estofamentos e capachos, porém, no caso do fruto imaturo (verde), que tem
alta umidade (cerca de 85%) e também as características da fibra do coco imaturo
inviabilizam algumas aplicações usualmente empregadas com a casca do coco
maduro (ROSA e ABREU, 2000), contudo, o aproveitamento da casca do coco, tanto
621
verde, quanto madura, devem se tornar uma atividade viável, sendo mais uma
alternativa de lucro para os sítios de produção (SILVA et al., 2022).
O aproveitamento da casca de coco tem várias potencialidades, dentre elas,
como substrato orgânico ou cobertura morta para cultivos agrícolas, fabricação de
carvão ativado ou incorporação na formulação de elastômeros, aumentando a sua
resistência mecânica (ROSA e ABREU, 2000).
Os compósitos poliméricos reforçados com fibras naturais desempenham
papéis importantes na produção de materiais ecologicamente corretos devido ao seu
alto módulo, resistência meticulosa e redução da pegada de carbono no meio
ambiente (ADENIYI et al., 2019). Porém, fibras vegetais possuem uma baixa interação
com a matriz polimérica, em virtude de seu caráter hidrofílico quando comparado à
matriz polimérica, hidrofóbica (WEARN et al., 2019).
Para isso, a modificação da superfície da fibra (tratamento da fibra) é vista como
melhorar o desempenho desses compósitos, pois melhora a adesão interfacial
fibra/matriz, aumentando assim o acima propriedades mencionadas, e o método de
tratamento mais popular é a alcalinização por NaOH, pois os compósitos de coco não
tratados são mais suscetíveis a alta absorção de água (ADENIYI et al., 2019).
Assim, além da água de coco e outros produtos abordados anteriormente, há
também outros produtos derivados, como o vinho de coco, vinagre de coco, gordura
de coco e manteiga de coco, dentre outros, onde esses produtos têm sido destacados
na literatura pelos seus efeitos benéficos e sendo cada vez mais reconhecidos
mundialmente pelos usuários, tornando-se o coco, um dos alimentos funcionais mais
atraentes nos últimos anos (ADKINS et al., 2020).
3.2 Aspectos Sócio-econômicos
A planta é considerada uma das espécies perenes de maior relevância do
mundo, porque detém a capacidade de gerar emprego e, consequentemente, arenda
em vários países, seja mediante o consumo de seus frutos in natura oupela
industrialização, bem como de outros órgãos desta planta (raiz, estipe, inflorescência,
folhas e palmito), originando mais de 100 produtos e subprodutosde significativo valor
econômico
(AZEVEDO,
2014).
Além
disso,
contribui
para
o
paisagismo,
principalmente utilizado em projetos paisagísticos com aspecto tropical (GONÇALVES
622
e SEGOVIA, 2020), ou projetos que necessitem de caules inclinado ou encurvado
(SALVIATÍ, 1993).
Apesar das inúmeras aplicações e usos do coqueiro, o fruto e os produtos
derivados do fruto, ainda seguem sendo um dos principais produtos, sendo
responsável pelo maior interesse econômico dessa espécie, e a água de coco, ou
também chamada de isotônico natural, é uma importante fonte de renda, que pode
ser em escala formal, pelas grandes indústrias de beneficiamento do coco, ou pelo
mercado informal de venda, muito comum no litoral do país e até mesmo nos centros
urbanos (MACHADO et al., 2020), sendo que o mercado de produtos de coco é
segmentado com base no tipo, aplicação, forma e região (RESEARCH e MARKETS,
2022).
A comercialização da copra do coco também evoluiu muito nos últimos anos,
tendo esse aumento se destacado em mais de 70% nas últimas décadas e os países
que mais dominam esse mercado são principalmente asiáticos (MARTINS e JESUS
JÚNIOR, 2014).
Atualmente o coco é cultivado em aproximadamente 12 milhões hectares de
terra em todo o mundo (COGENT 2017; ALOUW et al., 2020), produzindo entre 60 e
70 bilhões de frutas por ano (ALOUW et al., 2020). No Brasil, a produção de Coco-dabaía no Brasil, segundo dados do IBGE (2020), foi de 1.639.226 mil frutos, sendo o
estado com maior produção, o estado do Pará, com valor dessa produção de
1.149.030 mil reais. Essa produção advém de 25.170 mil pés (unidades), segundo
dados IBGE (2017).
O mercado global de produtos derivados do coco da Bahia foi avaliado em
US$ 11,5 bilhões em 2018 e deve chegar a US$ 31,1 bilhões até 2026, com uma taxa
de crescimento anual composta (CAGR) de 13,6% entre 2019-2026 (RESEARCH e
MARKETS, 2022).
A crescente demanda, tanto pelos produtos tradicionais, quanto pelos novos
produtos derivados do coco (alimentos, bebidas e cosméticos), aumentam a demanda
por frutos, e isso vem impulsionando o mercado globalmente, no entanto, o atual nível
de produção tem lutado para acompanhar essa demanda de mercado (ALOUW et al.,
2020), contudo, aumento na produção é resultante, principalmente, da expansão das
fronteiras agrícolas, sobretudo, do incremento da comercialização do coco verde para
atender o crescente mercado da água-de-coco, uma vez que a produção de frutos
ainda é baixa, isto é, 20 a 30 frutos/planta/ano, porém, o potencial do coqueiro pode
623
ser de até cinco (coqueiro híbrido) a sete (coqueiro anão) vezes essa produção,
dependendo da cultivar empregada e da tecnologia aplicada (LOIOLA, 2014),
necessitando de maiores estímulos de pesquisas a serem realizados nessa área.
3.3 Cultivo do coqueiro C.nucifera
A cocoicultura tem despertado interesse de produtores pelo curto período de
produção, a possibilidade de colheita no decorrer do ano, pela comercialização do
produto e ser outra fonte de renda para a unidade produtiva (BAPTISTELLA e
COELHO, 2021).
Infelizmente, a maioria das áreas de cultivo de coco já foi florestada e, em
algumas regiões como as ilhas do Pacífico, ainda é a principal causa do
desmatamento, como por exemplo, o desenvolvimento de grandes "propriedades de
coco" tornaram-se uma atividade dominante de uso da terra, principalmente durante
o século 20, pelos europeus, e florestas e pousios antigos foram transformados em
plantações de coco (KUMAR e KUNHAMU, 2022).
A evolução tecnológica e o avanço de técnicas de cultivo adequadas aos
novos preceitos da sociedade vêm possibilitando a inserção de pequenos produtores
às melhores condições de vida em diversas regiões do mundo (LOIOLA, 2014) e
concomitantemente vêm possibilitando, principalmente em agroecossistemas frágeis,
a inserção de pequenos produtores em melhores condições de vida, nas diversas
regiões do mundo (FERREIRA et al., 2018).
As áreas de cultivo, em sua maioria, são conduzidas por pequenos
produtores, em pequenas propriedades dotadas de solos arenosos além disso,
ressalta-se que cerca de 90% da produção de coco do mundo advém de pequenos
agricultores, com áreas de até 5 hectares, sendo que esta produção é praticamente
consumida internamente nos países produtores (LOIOLA, 2014).
O cultivo do coqueiro no Brasil é tradicionalmente e predominantemente
realizado no litoral doNordeste, região onde se concentra as principais agroindústrias
de coco (LOIOLA, 2014), mas nos últimos trinta anos as áreas desse cultivo vêm tendo
uma atenção especial em outras regiões do Brasil, principalmente no Sudeste, Centro
Oeste e Norte do país (MARTINS e JESUS JÚNIOR, 2014).
A comercialização e produção do coco-da-baía (C. nucifera Linn), por
exemplo, vem ganhando espaço na região acreana, nos últimos anos, ainda mais com
624
o incentivo do governo do estado do Acre, que vem auxiliando os produtores rurais do
Vale do Juruá a partir de 2015, e com isso o estado também entrou no mapa de
produção de coco no Brasil (MACHADO et al., 2020).
A área plantada de coqueiro no país se distribui entre as variedades de
coqueiro-gigante e coqueiro-anão e híbridos (resultado do cruzamento do coqueiroanão com o coqueiro-gigante, com dupla finalidade comercial, destinado tanto para
consumo in natura quanto para uso agroindustrial (MARTINS e JESUS JÚNIOR,
2014). O híbrido intervarietal (anão x gigante) é o tipo principal de cultivar utilizada
mundialmente, nos programas de fomento à cultura do coqueiro (LOIOLA, 2014).
O coco anão vive, em média 20 anos, ou seja, bem menos tempo do que o
centenário coqueiro comum, sendo que para cultivares comerciais esse período de
duas décadas possibilita o desenvolvimento de novas variedades com vantagens
agronômicas e econômicas (BAPTISTELLA e COELHO, 2021).
Embora os coqueiros anões produzam mais cedo que os gigantes e tenham
boa produção, a polpa tem tendência a ser mais macia e flexível, de qualidade inferior
a dos coqueiros gigantes, sendo empregados exclusivamente para água-de-coco
(ROSA e ABREU, 2000).
Em relação ao cultivo, muitos países vêm usando os mesmos híbridos de
coco, há mais de 20 anos (BANDUPRIYA et al., 2020), além disso, há uma alta
proporção de palmeiras senis (acima de 80 anos) no campo e isso contribui para a
baixa produtividade (ALOUW et al., 2020), necessitando uma com revitalização dos
coqueirais. A baixa produtividade também pode ser explicada pela falta de água, pois
muitos cultivos não utilizam sistemas de irrigação, o que contribui para a queda da
produção (BAPTISTELLA e COELHO, 2021).
Infelizmente, além dos fatores acima abordados, o cultivo de coco também
está ameaçado, pois as plantações de coco vêm enfrentando diversos outros
desafios, como pragas e doenças emergentes, além dos efeitos nocivos das
mudanças climáticas (SÁENZ-CARBONELL et al., 2020).
Dentre as pragas que atacam a cultura do coco (C. nucifera), no Brasil, se
destaca o ácaro da necrose, Aceria guerreronis, pois esta praga danifica os frutos nos
primeiros estágios de desenvolvimento, podendo acarretar perdas parciais ou totais
na produção de frutos (ALENCAR et al., 2021), no entanto, isso depende do estado,
país e do clima de cada região produtiva, podendo ter outras (ALOUW et al., 2020).
625
Portanto, esforços precisam ser realizados em todo o mundo para replantar
plantações envelhecidas com cocos selecionados por sua alta produtividade e
resistência/tolerância a pragas e doenças, o que requer um requer um sistema
inovador de propagação, de maneira a não perder a diversidade genética (SÁENZCARBONELL et al., 2020; PERERA et al., 2020), bem como o uso de práticas
agronômicas atualizadas, como a consorciação com outras culturas, pois a cultura do
coqueiro favorece a consorciação com culturas anuais e perenes emtodas as fases
de seu cultivo e o manejo com animais na fase adulta de exploração, minimizando
assim os custos para a implantação dos coqueirais, além derepresentar mais uma
fonte de renda para o produtor, favorecendo a fixação do homem nocampo (LOIOLA,
2014). Ademais, combinações de culturas que incluem uma variedade de espécies,
particularmente culturas arbóreas, têm o potencial de aumentar o sequestro de
carbono e, ao mesmo tempo, fornece diversos serviços culturais e de abastecimento
(KUMAR e KUNHAMU, 2022).
3.4 Sustentabilidade da “Árvore da Vida”
A demanda de coco no Brasil e no mundo impulsiona a cadeia produtiva e a
constante evolução técnica e tecnológica de maneira a propiciar a expansão de área
de cultivo e, principalmente, ao incremento da produtividade aliados aos novos
preceitos da sociedade no que diz respeito ao caráter social, econômico e ambiental
da exploração da cultura (MARTINS e JESUS JÚNIOR, 2014).
Na busca de estratégia para a sustentabilidade dos sistemas de produção de
coco e a manutenção da diversidade dos recursos genéticos é cada vez mais
necessário aliar a tecnologia com o uso de práticas agronômicas e biotecnológicas
modernas de manejo cultural, além da diminuição do uso de insumos e buscar a
integração de diferentes formas de vida no cultivo (KUMAR e KUNHAMU, 2022,
ADKINS et al., 2020; IGNÁCIO e MIGUEL, 2021).
Globalmente, os recursos genéticos do coco estão ameaçados devido a uma
taxa relativamente alta deerosão genética causada por vários fatores, incluindo
urbanização e industrialização, desenvolvimento de infraestrutura, mudança do cultivo
de coco para dinheiro de alto valorculturas, desastres naturais e estresses bióticos, e
pragas e doenças, além disso, oreplantio em larga escala de cocos de um número
relativamente pequeno de plantas de alto rendimentocultivares melhoradas,
626
especialmente em áreas de coqueiros naturais onde a genética diversidade é alta,
resulta na diminuição da diversidade genética do germoplasma de coco (PERERA et
al., 2020).
Análises filogenéticas são importantes, inclusive para caracterizar a
diversidade genética do germoplasma do coco e a caracterização do germoplasma é
importante também para programas de melhoramento do coco (MURSYIDIN e
AHYAR, 2022).
Há algumas décadas, a identificação, coleta e conservação dos recursos
genéticos do coco eram reconhecidos como um objetivo importante em países
produtores de coco e mais tarde se expandiu para ser um fenômeno deinteresse
internacional, principalmente porque o futuro do melhoramento de coco seriacom base
na disponibilidade de germoplasma diversificado, sendo inclusive fundado em 1992
InternationalCoconutGeneticResources Network (COGENT) (PERERA et al., 2020),
que visa promover a colaboração para a conservação e uso de recursos genéticos de
coco e que atualmente é composto por 39 países membros que, todos juntos,
representam mais de 90% da produção mundial de coco (BOURDEIX et al., 2020).
No ano de 1997, a COGENT iniciou um programa de coleta e conservação
de recursos genéticos do coco, que foi financiado pelo Banco Asiático de
Desenvolvimento (PERERA et al., 2020).
Ao longo do últimas duas décadas, laboratórios em diferentes países
progrediram e estabeleceram protocolos de propagação clonal de coco utilizando
diferentes tipos de explantes e esses métodos incluem não apenas plúmulas retiradas
de embriões zigóticos, mas também tecidos de inflorescências imaturas para poder
clonar palmeiras verdadeiras (SÁENZ-CARBONELL et al., 2020).
Aplicações, incluindo o uso do método para a coleta de germoplasma, a
conservação (criopreservação) e a disseminação do germoplasma de elite, e o início
da propagação clonal (via embriogênese somática) também são importantes (BIDDLE
et al., 2020). Assim, aplicações para conservação e movimentação segura de
germoplasma, propagação clonal, valorização de produtos alimentícios e promoção
de meios de vida sustentáveis (ADKINS et al., 2020) são importantes para a realização
de cultivos adequados, pois o melhoramento genético para características desejáveis
é identificado como vital para melhorar a produtividade de coco em todo o mundo e
as ferramentas biotecnológicas (Figura 2) são muito importantes para superar as
deficiências das abordagens tradicionais (BANDUPRIYA et al., 2020).
627
Figura 2. Novas tecnologias estão desvendando os segredos do coqueiro. A combinação da
genômica, transcriptômica, proteômica e metabolômica com a bioinformática está gerando uma nova
compreensão do coco, que revolucionará seu cultivo e usos no futuro. Adaptado de Ignacio e Miguel
(2021).
Com a introdução dos marcadores moleculares no final do século XX houve
um avanço substancial na genética de plantas, como adesenvolvimento de
marcadores moleculares específicos, inclusive para o coco, para serem usados na
reprodução, melhoramento genético e, finalmente, aconservação do coco (SALUM et
al., 2020). Recentemente, um esboço da sequência do genoma do coco foi publicado,
enquanto os estudos sobre a transformação do coco também estão em progresso
(BANDUPRIYA et al., 2020).
Pesquisas devem ser realizadas, por meio de uma colaboração mundial, para
continuar melhorando os protocolos e tornando-os mais eficientes e acessíveis, desde
conhecimentos básicos, desenvolvimento de plântulas e conservação de linhagens
embriogênicas, sendo que além disso, é necessário fortalecer pesquisa sobre
melhoramento de coco para características relacionadas não apenas à produtividade
e manejo de pragas/doenças, mas também tolerâncias à seca e ao calor para lidar
com mudanças nas condições climáticas (SÁENZ-CARBONELL et al., 2020).
Outra questão importante é a classificação padronizada em todo mundo dos
coqueirais, pois é importante para que abranja uma extensa avaliação e
caracterização de diferentes tipos/formas de coco cultivados em todo o mundo,
628
contribuindo para bancos de genes e com isso promovendo o melhor aproveitamento
germoplasma de coco em programas de melhoramento (PERERA et al., 2020), pois
novas técnicas genômicas em breve contribuirão para encurtar e otimizar a coleta,
reprodução e programas de clonagem (BOURDEIX et al., 2020), que vão revolucionar
seu cultivo e usos no futuro (IGNÁCIO e MIGUEL, 2021)
4. DENDEZEIRO (Elaeis guineenses)
O dendezeiro, Elaeis guineensis, é uma espécie pertencente à família
Arecaceae oriunda do Continente Africano. O gênero Elaeis (do grego “Elaion”, que
significa óleo), possui duas espécies de palmeiras muito conhecidas (Elaeis
guineenses e Elaeis oleífera) pelo seu principal produto, o óleo. Essas palmeiras-deóleo são plantas pertencentes a família Arecaceae. Ambas as espécies são utilizadas
na agricultura comercial para produção de óleo de palma, sendo que E. guineensis é
a principal fonte de óleo de palma comestível no mundo, enquanto E. oleifera é mais
cultivado para a produção local do óleo de palma.
O dendê africano, Elaeis guineensis Jacq. é nativo da África Ocidental,
enquanto a palmeira Caiaué, Elaeis oleifera (Kunth) Cortés, é nativa de regiões
tropicais, América Central e América do Sul. O dendê africano também apresenta
outros nomes populares, como: palma-de-guiné, dendê, palmeira dendê, dendem,
palmeira-dendem, coqueiro-de-dendê (JARDINE e BARROS, 2022; HORTO
BOTÂNICO, 2022b).
Elaeis guineensis Jacq. é uma monocotiledônea perene, que em idade adulta
apresenta uma coroa com 30 a 45 folhasverdes de 5 a 9 m de comprimento, no alto
de um caule do tipo estipe cilíndrico único (Figura 3) e além disso, se caracteriza
reprodutivamente, como uma planta monoica, produzindo inflorescências femininas e
masculinas na mesma planta, as quais se alternam em um ciclo de duração variável
que depende de fatores genéticos, condições ambientais e idade do vegetal, em que
essas características favorecem a polinização cruzada e além do mais, o vegetal tem,
preponderantemente, polinização entomófila (CHAGAS et al., 2019), sendo que a
produção é constituída de cachos de frutos tipo drupa (RODRIGUES et al., 2002).
629
Figura 3 – Coqueiro-de-dendê (Elaeis guineensis Jacq.).
Fonte da imagem: Horto Botânico (2022b).
O número de frutos por cacho pode chegar a 3.000, mas o númeromédio situase por volta de 1.500, representando 60% a 70% do pesodo cacho. O fruto é uma
drupa séssil de forma bastante variável. Medede 2 cm a 5 cm de comprimento e pesa
de 3 g a 30 g. É composto poramêndoa, endocarpo ou casca, mesocarpo ou polpa e
epicarpo ouepiderme (CUNHA et al., 2007).
O fruto da palma produz dois tipos distintos de óleos: óleo de palma bruto, a
partir do mesocarpo e óleo da amêndoa (palmiste), a partir do interior do caroço. O
óleo de palma bruto também é chamado de óleo de palma vermelha devido à sua
elevada concentração de carotenoides (KELLENS et al., 2007). O óleo ou o azeite de
dendê, é o produto derivado do mesocarpo carnoso do fruto do dendezeiro (FAO,
2022).
Trata-se de uma palmeira que é cultivada, portanto, em zonas equatoriais, tais
como a África, o sudeste asiático e América Central e do Sul. A Indonésia e a Malásia
são os principais produtores de óleo de palma, seguidos da Tailândia, Colômbia e
Nigéria. De fato, o óleo de palma é o óleo vegetal mais comercializado no mundo e
90% de seu uso é para consumo alimentar e 10% do consumo está relacionado à
indústria, como produção de cosméticos ou combustíveis.
O dendezeiro ou palma de óleo africana (Elaeis guineenses, Jacq), se destaca
entre as espécies oleaginosas devido ao fato de apresentar a maior produtividade, 4
630
a 6 t de óleo/ha/ano e pela grande versatilidade de seu uso nas indústrias: alimentícia,
farmacêutica, cosmética, higiene e limpeza, oleoquímica e agroenergética (CRUZ,
2016).Segundo informações registradas no Museu Nacional da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), extraem-se do fruto da palma o óleo de dendê, e das folhas;
e com os cachos dos frutos podem ser produzidos materiais para construção e
acabamento de lareiras, sendo que com o tronco pode ser utilizado para a fabricação
de móveis (HORTO BOTÂNICO, 2022b).
Os produtores associados à Denpasa, localizados no Nordeste Paraense,
foram pioneiros no País no plantio comercial de dendezeiros híbridos interespecíficos
(HIE) resultantes do cruzamento do dendezeiro africano (Elaies guineensis) com o
dendezeiro nativo da Amazônia (Elaies oleifera) (caiauê) (MENEZES et al., 2017).
A produção de óleo de palma no Brasil em 2021 atingiu 64 mil toneladas
métricas, um aumento de mais de três vezes em comparação com as 20 mil toneladas
métricas em 2008. O volume de produção de óleo de palma no país aumenta
constantemente desde 2008, enquanto o seu consumo também registrou um salto de
mais de 70% no mesmo período. Em 2021, o consumo industrial de óleo de palma no
Brasil ascendeu a 347 mil toneladas métricas, contra as 312 mil toneladas métricas
consumidas um ano antes. Desde 2017, o consumo industrial de óleo de palma no
país cresce, uma tendência também observada na sua produção (STATISTA, 2022).
Por exemplo, em 2012 o óleo de palma foi responsável por 32% da produção global
de gorduras e óleos. O óleo de palma ultrapassou o óleo de soja como o óleo vegetal
mais importante do mundo (OIL WORLD, 2022).
Considerando o consumo alimentar, o óleo de palma é utilizado para cozinhar,
fritar, e como fonte de vitaminas. De fato, Tyagie Vasishtha (1996) o descreveram
como uma rica fonte de vitamina E (600-1000 ppm); coenzima Q10 (ubiquinona) (1825 mg/kg) e esterois (325-365 mg/kg). Ademais, O óleo de palma tem um perfil único
de composição em ácidos graxos e triacilglicerol, sendo o único óleo vegetal com
quase 50%-50% de composição de ácidos graxos saturados e insaturados, o que o
torna adequado para numerosos alimentos, cosméticos, lubrificantes, velas, pastas
de dentes e biodiesel. O fraccionamento do óleo de palma produz principalmente
palmoleína, líquida, e palmoestearina, a fracção sólida. Estes dados de composição
do óleo de palma chamam atenção especialmente no considerável interesse científico
em dietas alimentares com conteúdo em substâncias antioxidantes em face da saúde
e de doenças.
631
Especialmente, nas últimas décadas o interesse na busca por substâncias que
apresentem a propriedade antioxidante vem crescendo bastante. As evidências
sugerem que os antioxidantes ingeridos oralmente através da dieta desempenham um
papel importante na diminuição do desenvolvimento de doenças crônicas em todo o
mundo,
tais
como
doenças
cardiovasculares,
neoplasias,
e
doenças
neurodegenerativas (NALSEN et al., 2006). Logo, fontes alimentares ricas em
substâncias como as vitaminas E e C, licopeno, β-caroteno e polifenóis, por exemplo,
ademais de outras, podem assumir um papel importante na prevenção de diversas
doenças crônicas. Neste contexto, dada a sua composição química e suas
características físico-químicas, o óleo palma está sendo amplamente pesquisado com
interesse em suas possíveis atividades antioxidantes e sua eventual relação com a
prevenção de enfermidades quando empregado em dietas alimentares.
Interessante, por exemplo, os estudos de Mozzon et al. (2013), que relataram
resultados sobre a composição e estrutura da fracção glicerídica de óleo de palma
bruto obtido de híbridos interespécies Elaeis oleifera x Elaeis guineenses. Naquele
trabalho, os autores compararam os resultados obtidos com relação à composição
dos híbridos em ácidos graxos e gliceróis com o extrato bruto do óleo de palma nativo
da África, e demonstraram diferenças significativas entre os óleos de palma em
estudo. O óleo híbrido apresentou um alto percentual de ácido oleico e um menor
conteúdo em ácidos graxos saturados. Os autores sugeriram que os extratos híbridos
modificaram substancialmente a biossíntese dos ácidos graxos em quantidade
superior que o da sua constituição natural em triacilgliceróis. A relevância de seus
resultados foi interpretada no contexto do óleo de palma, extraído principalmente de
E. guineensis, ter sido criticado durante as últimasdécadas, por ser uma rica fonte de
ácidos graxos saturados, especificamente ácido palmítico, e seu uso em alimentos e
produtos alimentícios ter sido desencorajado. Destarte a demonstração que uma
substituição parcial da dieta de ácido palmítico saturado com ácido oleico
monoinsaturado pode ser alcançada consumindo óleo de palma híbrido em vez de
óleo de palma africano, foi considerado pelos autores um achado relevante.
Em outra relevante pesquisa no tema, Lucci et al. (2016), examinaram o efeito
da suplementação com óleo de palma híbrido Elaeis oleifera x E. guineenses nos
lipídios do plasma humano relacionados com fatores de risco para doenças
cardiovasculares, com o objetivo de verificar os potenciais benefícios para a saúde do
consumo de óleo de palma híbrido. No estudo clínico, os autores usaram uma
632
abordagem experimental na qual administraram aos participantes randomizados do
estudo, 25 mL de óleo de palma híbrido ou, como controle, 25 mL de óleo de oliva
extravirgem – reconhecido como potencial anti-aterogênico e óleo cardioprotector diariamente por três meses. Os autores avaliaram a concentração plasmática de
lípidos e o seu potencial como óleo alimentar funcional para a prevenção de doenças
cardiovasculares. Após avaliação dos resultados, os autores concluíram no estudo
que os efeitos de uma dose diária de 25 mL de óleo de palma híbrido nos lipídeos
plasmáticos são comparáveis ao consumo diário de óleo de oliva extravirgem
recomendado pelo Foodand Drug Administration (USA). Ademais, os resultados
também demonstraram que após três meses de consumo de óleo de palma híbrido, a
dose administrada teve um impacto parcialmente favorável sobre fatores de risco para
doença cardiovascular: os níveis plasmáticos de triglicerídeos diminuíram 6,3%,
enquanto a concentração de LDL-Colesterol diminuiu em mais de 13%. Os resultados
da pesquisa permitiram aos autores concluírem que os efeitos da administração do
óleo de palma híbrido podem ser atribuídos à sua elevada percentagem de oleico
ácido, bem como ao seu elevado conteúdo em tocotrienois, que provavelmente
podem levar a mais benefícios nos níveis de colesterol LDL e efeitos antioxidantes,
fornecendo portanto suporte ao conceito de que o óleo híbrido de palma de Elaeis
oleifera + E. guineenses pode ser visto como o "equivalente tropical do óleo de oliva”.
Considerando este panorama, uma outra investigação, de Ojeda et al. (2016),
buscou explorar os potenciais impactos e atividade antioxidante do consumo diário de
óleo de palma híbrido (25 mL/dia por 3 meses) em adultos de 55-77 anos de idade
particularmente vulneráveis a doenças cardiovasculares. Os resultados obtidos foram
comparados com os resultados do grupo controle, que recebeu uma quantidade
equivalente de óleo de oliva extravirgem. Os autores puderam observar através dos
resultados obtidos na pesquisa que a suplementação com 25 mL de óleo de palma
híbrido por 3 meses melhorou a capacidade de captação de radicais livres dos sujeitos
da pesquisa. As evidências experimentais demonstraram uma melhoria notável nos
níveis séricos de compostos fenólicos totais juntamente com um aumento
considerável da capacidade antioxidante. Além disso, o óleo de palma híbrido mostrou
ter efeitos semelhantes ao óleo de oliva extravirgem, que é considerado o “padrão
ouro” entre todos os óleos comestíveis devido às suas propriedades nutracêuticas e
funcionais.
633
À parte de seu uso alimentar, é importante salientar que diversos usos
terapêuticos do óleo de palma já foram descritos. Na África ocidental, várias partes da
árvore E. guineensis são amplamente utilizadas na medicina tradicional. As folhas são
usadas para promover a cicatrização de feridas, onde as folhas são espremidas, e o
suco obtido é colocado nas feridas para promover a cicatrização. A seiva da planta
também é usada como laxante, e o vinho de palma parcialmente fermentado é
administrado às mães que amamentam para melhorar a lactação. O sabão preparado
com cinzas da casca do fruto é usado para tratar infecções de pele. Um decocto da
raiz é preparado para aliviar dores de cabeça. Raízes pulverizadas são adicionadas
às bebidas para tratar gonorreia, menorragia e bronquite. O uso popular na forma de
remédio à base de óleo de palma inclui o tratamento para câncer, dor de cabeça e
reumatismo, bem como uso como afrodisíaco, diurético e linimento (SREENIVASAN
et al., 2010; ABDULLAH et al., 2013).
Em uma revisão recente, TOW et al. (2021) reconhecem o promissor potencial
antioxidante do óleo da palma E. guineenses em vários experimentos; no entanto,
como ainda faltam estudos de seus outros efeitos farmacológicos conforme o uso
popular, pesquisas futuras devem ser conduzidas usando estudos de concentraçãoefeito, sistemas de solventes e unidades de medida, para permitir uma melhor
compreensão e interpretação e resultados. Não obstante, as características
dependentes da dose das propriedades farmacológicas do óleo de palma já foram
descritas em vários estudos. Portanto, uma investigação é recomendada para a
identificação de sua faixa de concentração ótima. Há também efeitos sinérgicos dos
fenólicos que compõem o óleo de palma relatados na literatura, e esta lacuna pode
ser ainda mais explorada como estratégia de identificação e conhecimento de como
este efeito sinérgico pode ocorrer. Embora o óleo de palma tenha sido cientificamente
relatado como exibindo amplas propriedades farmacológicas, os metabólitos
secundários que foram responsáveis por esses reputados efeitos terapêuticos ainda
não são totalmente conhecidos. Ademais, é possível que flavonoides presentes nas
folhas de E. guineensis, como catequinas, luteolina, vitexina, isovitexina, orientina e
isoorientina, que podem ser responsáveis pelos efeitos farmacológicos como a
atividade antioxidante. Com efeito, pesquisas futuras que empreguem grande escala
de material vegetal para tentar isolar uma quantidade suficiente de constituintes
químicos e marcadores podem ampliar o entendimento de suas atividades
farmacológicas e mecanismos de ação. Logo, diversos de seus efeitos e sua
634
empregabilidade terapêutica já descritos, podem ser esclarecidos através de
pesquisas futura no campo da química medicinal.
Destarte, analisados em conjunto, os dados relatados demonstram a
importante contribuição social, econômica, sanitária e ambiental da palma de dendê,
e sobretudo apontam para a extrema necessidade de manejo sustentável dessa que
desponta como um preponderante e fundamental ser vivo de capital importância para
o desenvolvimento de natureza terrestre.
5. CARNAUBEIRA (Copernicia prunifera)
A carnaubeira (Copernicia prunifera) é uma espécie que se destacou
inicialmente pela sua beleza, nos primórdios das navegações ao Brasil e que com o
passar dos anos manteve sua importância devido ao seu destaque nos produtos
produzidos a partir de sua matéria-prima. Essa palmeira chamou a atenção de poetas,
naturalistas e viajantes que vieram ao Brasil e que até hoje se destaca, não só sobre
a sua beleza, mas por apresentar múltiplos usos e de grande importância econômica
e social para várias famílias extrativistas. Assim, a multiplicidade do seu uso e a
extração de sua matéria-prima de forma sustentável, contribuíram para manutenção
e importância dessa espécie por mais de dois séculos, indicando a necessidade da
continuidade da preservação dessa espécie, bem como promover e incentivar cada
vez mais as boas práticas para a sustentabilidade dessa cadeia produtiva.
A espécie Copernicia prunifera (Miller) H.E. Moore, da família Arecaceae,
popularmente conhecida como carnaubeira, é um exemplo. Trata-se de uma palmeira
nativa do Brasil adaptada ao clima seco da Caatinga, solos arenosos e alagadiços,
várzeas e margens dos rios de regiões de clima quente (CARVALHO e GOMES,
2008). Embora ela cresça em outros países de clima tropical é no Brasil que se
mantém um cultivo para fins econômicos e, portanto, o único país produtor da cera de
carnaúba em escala comercial. A produção da cera está concentrada na Região
Nordeste, tendo o Estado do Piauí como principal produtor, seguido do Ceará,
Maranhão e Rio Grande do Norte. A população nordestina considera carnaubeira
como “Árvore da Vida” devido não só a cera produzida, mas também uma infinidade
de usos econômicos (CARVALHO e GOMES, 2008; SOUSA et al., 2015).
A Arecaceae é uma das famílias mais características dentre as
angiospermas, sendo um importante formador de paisagens em desertos na África,
635
mangues na Ásia, e veredas, babaçuais e carnaubais na América do Sul (GIULIETTI
et al., 2009). O nome do gênero Copernicia é em homenagem ao astrônomo italiano
Nicolau Copérnico (1473-1543) que desenvolveu a teoria heliocêntrica e que a forma
da terra era redonda, assim como a copa da palmeira que também tem forma
arredondada. Por estar sempre com tom verde, levemente azulado das folhas, em
virtude da cobertura de cera, independente da época do ano é sinônimo de resistência
(SILVA, 2017). A palmeira pode alcançar até 15 metros de altura e seu caule reto e
cilíndrico e espinhento tem um diâmetro que varia de 10 a 20 centímetros (GIULIETTI
et al., 2009) e o nome carnaúba vem de caraná-iba, que veio de caraná, do tupi
karaná, madeira cheia de escamas, áspera e arranhento por conta da camada de
espinhos que cobre a parte inferior do caule.
A carnaubeira é uma espécie que se destacou inicialmente pela sua beleza,
nos primórdios das navegações ao Brasil, mas com o passar dos anos manteve sua
importância, não só pela beleza, mas devido ao seu destaque nos produtos
produzidos a partir de sua matéria-prima. Assim, buscou-se discutir alguns elementos
ligados à importância dessa espécie e a sua manutenção por mais de dois séculos na
geração de emprego e renda.
5.1 Os Naturalistas e a Carnaubeira
A importância e a beleza dessa palmeira chamaram a atenção de poetas,
naturalistas e viajantes que vieram ao Brasil (PEDRAS, 2000). O Manuel Arruda da
Câmara (1752-1810) foi um médico naturalista e o primeiro brasileiro a relatar a
carnaubeira ao percorrer as capitanias do Norte para registrar a natureza e as formas
de produzir e utilizar os recursos naturais (MELLO e CÂMARA,1982; CHAVES
JUNIOR, 2019). Relatou ao governador de Pernambuco: “mas neste tempo não
estava eu tão persuadido, como hoje, da grande utilidade, que êste produto pode dar
no uso civil e só o propus como objeto curioso de química” (CASCUDO, 1964). Em
homenagem ao botânico Manuel Arruda Câmara foi criado o Parque Zoobotânico
oriundo da antiga mata do Róger no Estado da Paraíba e tombado pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico do (Iphaep) (PMJP, 2015).
Friedrich Wilhelm Heinrich Alexander von Humboldt (1769-1859) em sua
jornada nas planícies Rio Orinoco, na Venezuela, vendo a palmeira murichi
(muriti, miriti, biriti ou buriti) e o uso que faziam a população, chamou-a de “uma árvore
636
da vida” pela multiplicidade do seu uso entre os indígenas e mestiços. Jean Ferdinand
Denis disse em 1837 que “A carnabuba é uma daquelas arvores da vida, como diz o
senhor Humboldt ao falar do murichi, uma daquelas palmeiras a que se pode anexar
toda a existência de uma aldeia, principalmente em um país árido. Graças à solidez
de sua madeira e ao arranjo de sua folhagem, pode-se construir uma cabana comum
apenas com carnaúbas, sendo necessário o uso de outros materiais além de um
pouco de terra para formar as paredes. Os folhetos, dispostos em leque, são usados
para fazer uma série de pequenos itens, como esteiras, chapéus, cestos, cestos; e,
além disso, grandes bovinos podem se alimentar deles. Durante os períodos de seca
extrema, os animais também recebem o coração da árvore quando ela é jovem e
podem se contentar com ele na ausência de outro alimento” (DENIS, 1837). Foi dessa
passagem do livro de Ferdinand Denis que se espalhou-se a fama de que Humboldt
denominara a carnaúba como "árvore da vida". Em realidade Humboldt nunca chegou
a ver uma carnaúba em dias de sua vida (CASCUDO, 1964).
O farmacêutico e naturalista alemão Theodor Peckolt (1822-1912)
(PECKOLT, 2005) em sua obra que relata as plantas medicinais úteis do Brasil fez a
observação sobra a carnaubeira: “Este vegetal resiste tanto as grandes inundações
como às mais rigorosas secas. Na Província do Ceará, que é quase sempre flagelada
pela seca, desaparecendo os campos verdejantes e até as matas espessas, as
florestas de carnaubeiras são as únicas que se conservam em seu belo estado”
(DENIS, 1837; CASCUDO, 1964). A seguir na mesma obra comentou “As folhas da
palmeira, além de fornecerem cera, servem para cobrir casas, para o fabrico de
cestos, leques, chapéus, esteiras, vassouras, papel, etc” (PECKOLT e PECKOLT,
2016).
O naturalista M. A de Macedo foi o primeiro a escrever com mais detalhes
sobre a carnaúba. Em seu livro logo no início faz uma observação que demonstra o
quanto essa palmeira impressionava que com ela se encontrasse e percebesse a sua
importância para a população local: “Carnaúba é, de todas as plantas úteis, aquela
que é chamada a prestar mais serviços ao homem. No entanto, essa árvore ainda é
pouco conhecida fora das regiões onde se origina. Proponho-me, portanto, dar uma
breve ideia de algumas das vantagens que já derivamos desta notável palmeira”
(MACEDO, 1867). M. A. de Macedo afirma que a cera que Humbolt obteve era
diferente a da carnaúba é que palmeira observada por Humboldt em Orinoco cresce
em montanhas bem acima do nível do mar e em regiões cobertas de neve. “Pelo
637
contrário, a vegetação do Brasil é pequena e se desenvolve muito lentamente em
países onde não existem montanhas altas”.
O botânico português Manuel Pio Corrêa (1844-1934) e naturalista do Jardim
Botânico do Rio de Janeiro escreveu uma vasta obra em seis volumes chamada de
“Dicionário das Plantas Úteis do Brasil e das Exóticas Cultivadas”. Nessa obra ele
traça muitos detalhes sobre plantas úteis do Brasil e, não poderia faltar a carnaubeira,
onde ressalta a importância da palmeira em diversas áreas, como tratamento de
doenças, e destaca o valor econômico da cera de carnaúba para exportação. Em
destaque o trecho: “Entre as numerosíssimas espécies indígenas desta nobre família,
a magestosa e elegante CANAHUBEIRA occupa um dos primeiros lugares pela
variedade dos produtos que fornece no homem, entre estes a <cera de carnahuba>
que, antes do petróleo, alumiou o Brasil inteiro durante dezenas de anos e que depois
passou a servir ás artes e ás sciencias, ao mesmo tempo que, annualmente, incorpora
aeconomia nacional alguns milhares de contos de reis correspondentes ao valor da
sua exportação” (CORRÊA, 1931).A história registra que foram os naturalistas
Marcgravee Piso que primeiro deram notícia desta palmeira e o Dr. Arruda Camara
ocupou-se posteriormente (1797-1809).
Com base no que foi descrito acima, se percebe que dá carnaubeira tudo se
aproveita (SILVA et al., 2019), por exemplo: tronco, frutos, folhas, palmito, raízes e as
sementes, que vão de usos para alimentação, artesanato, cosméticos e produtos
farmacêuticos, sendo que o pó cerífero é o produto de maior importância econômica,
por ser utilizado na indústria automobilística, na fabricação de cosméticos, óleos
essenciais e na agricultura (proteção e adubação do solo) (MAPA, 2014). Assim, da
parte externa das folhas, cortadas e secas, é extraída em abundância uma cera sob
forma de pó em cerca de 100 g por uma árvore em um ano.
O pó é usado como matéria-prima básica e purificada por fusão, filtração
simples ou centrifugação. Os frutos roxos da carnaubeira são bem aproveitados para
alimentar animais de criação, mas os frutos verdes quando fervidos em água se
tornam moles e pode ser misturado com leite quente servem de alimento (PECKOLT
e PECKOLT, 2016). A polpa serve para a produção de farinha e extração de um líquido
leitoso. A semente também pode ser usada torrada e moída em substituição ao pó de
café. As folhas servem para fazer telhados de casas e as fibras viram sacos, cestos,
redes (ISPN, 2021).
As raízes têm uso medicinal como diurético (PECKOLT e
PECKOLT, 2016).
638
5.2 Cera da Carnaúba
A cera de carnaúba (INS 903) é uma cera de origem vegetal obtida da
palmeira e como toda cera epicuticular a principal função é melhorar a adaptação da
planta às condições climáticas e nesse caso para adaptação as regiões secas do
Nordeste, pois esse material ceroso evita a perda excessiva de água, mantendo o
balanço hídrico da planta.
O seu principal atrativo para é sua dureza e ponto de fusão (78-85oC). É a
cera entre a cera natural comercial devido a sua composição de ésteres alifáticos e
diésteres de ácido cinâmico. Esta é a cera vegetal mais importante do ponto de vista
econômico e com possíveis aplicações, é a mais dura e tem o maior ponto de fusão
de qualquer cera natural comercial, tem baixa solubilidade e é predominantemente
composta de ésteres alifáticos e diésteres de ácido cinâmico. Seus componentes são
relativamente inertes e estáveis, características físico-químicas importantes para
diversas aplicações.
Devido a estabilidade e ser inerte (não tóxica) a cera de carnaúba tem sido
amplamente utilizada em alimentos e produtos farmacêuticos, com autorização de
órgãos de vigilância sanitárias, como a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância
Sanitária), FDA (Foodand Drug Administration), FAO (Foodand Agriculture
Organization of the United Nações) e pelas agências reguladoras da União Europeia
(European Food Safety Authority). A ANVISA permite seu uso como agente de
glaceamento de frutas (ex. limão (CARON et al., 2015); maçã (CHIUMARELLI e
HUBINGER, 2012); ameixa (KIM et al., 2013); maracujá (MOTA et al., 2006); manga
(DANG et al., 2008), e legumes e embalagens de alimentos. Em termos de
formulações alimentícias agente de volume, regulador de acidez, transportador e
antiaglomerante no tratamento de superfície.
A cera pode estar presente em outras formulações de uso geral, como de
pasta de óleo, revestimento brilhante, revestimento de papel (KHWALDIA et al., 2006),
e como componente de tintas de impressão térmica, discos de vinil, vernizes, lacres,
ceras polidoras, ceras para assoalho, atuando ainda como agente impermeabilizante,
em embalagens, isolante em materiais elétricos, microencapsulação de sabores para
alimentos (flavorizantes), na preparação de filmes comestíveis e super hidrofóbicos e
em embalagens biodegradáveis e como matéria-prima para fabricação de velas
(FREITAS et al., 2019). Em produtos para o cabelo, a cera de carnaúba confere
639
estabilidade e em emulsões W/O, é usado como estabilizador e modificador de
viscosidade.
Em outras formulações a composição da cera de carnaúba entra
parcialmente na emulsão, pois a cera pura é muito dura e impossível de utilização na
forma pura (Figura 4). Para a indústria automobilística a cera de carnaúba é ideal para
revestimento da superfície, pois repele a água, tem alta durabilidade (3-8 semanas),
proteger a pintura e entrega alto poder de brilho.
Figura 4. Usos e composição da cera de carnaúba. Fonte imagem: Vinagre (2021).
Essa cera também é usada como desmoldante ou agente para moldagem
(ANVISA, 2021), de pães em geral, biscoitos e com ou sem recheio, com ou sem
revestimento, confeitaria, bolos, doces e massas, pronto para consumo ou préembalado, massas de bolos, pastéis e confeitaria. Atualmente, pesquisadores de toda
parte do mundo buscam novas aplicações para esta cera e novos produtos com novas
tecnologias para melhorar as existentes, e por isso, muitas das pesquisas se
concentram no uso desta cera na conservação e processamento de alimentos
(FREITAS et al., 2019), como é o emprego da cera de carnaúba (revestimento
comestível) na conservação de alimentos, resultando em menor perda de massa e
maior brilho à superfície dos frutos, por exemplo (ATAÍDE et al., 2017).
640
O encapsulamento de diversos produtos químicos, incluindo cera de
carnaúba sob a forma de micropartículas, é um processo para construir uma barreira
de proteção entre os produtos alimentícios, medicamentos e cosméticos (MILANOVIC
et al., 2011). A tecnologia de microencapsulação de rações tem se tornado uma opção
interessante, pois permite maior sincronização da taxa de degradação desse
composto no rúmen, fornecendo um substrato para transportar os aminoácidos
diretamente para o intestino (NEDOVICA et al., 2011). Assim, por sua alta capacidade
de proteção e retenção, alta disponibilidade no mercado e não toxicidade para
animais, a cera de carnaúba se destaca como material encapsulante de ureia. Na
medicina, é usado em revestimentos de cápsulas, cera dentária e produtos para o
tratamento da pele e dos cabelos; além disso, a cera de carnaúba como agente
microencapsulante apresenta excelentes resultados quanto à proteção da metionina
(CARVALHO NETO et al., 2019), pois o revestimento de cera de carnaúba à base de
plantas, mostra melhor desumedecimento do que outras ceras (GUPTA et al., 2021).
As características químicas da cera de carnaúba indicam que ser trata de
uma mistura complexa de produtos com proporções variadas (COTTOM et al., 2000).
Ela contém principalmente ésteres graxos com ácidos graxos de cadeia variando entre
C18-C30 (80-85%), álcoois graxos livres com cadeias de 30-34 átomos de carbono
(10-15%), ácidos graxos livres (3-6%) e hidrocarbonetos (1-3%).
Uma característica interessante dessa cera é a presença diois graxos
esterificados (10-20%), ácidos graxos hidroxilados (6%), ácido cinâmico (10%) e
outros minoritários (triterpenos, esteres de triterpenos, esteroides, etc.) (ALMEIDA et
al., 2017).
A cera amarela tipo 1 tem constituintes que variam, mas dentro por uma
variedade de técnicas convencionais mostraram que a composição é: hidrocarboneto
0,3-1%, ésteres alifáticos 38-40%, álcoois mono-hídricos 10-12%, ésteres ωhidroxialifáticos 12-14%, p-metoxicinamia diésteres alifáticos 5-7%, diésteres phidroxicinâmicos alifáticos 20-23%, um tipo de triterpeno não combinado diol 0,4% e
ácidos não combinados e outros constituintes desconhecidos 5-7% (VANDENBURG
e WILDER, 1970).
A capacidade antioxidante da cera é devido ao ácido fenólico na forma livre,
pode ser hidroxilado ou metoxilado. E importante destacar que na mistura da cera de
carnaúba o conteúdo de hidrocarbonetos é significativamente baixo quando
comparado com outras ceras naturais.
641
5.3 Cera de Carnaúba e suas Atividade Biológicas
Outro aspecto que deve ser ressaltado da cera de carnaúba são suas
atividades biológicas. Ela tem uma composição química variada, mas nessa
composição existem muitas substâncias aromáticas e triterpenos que são capazes de
conferir atividades antioxidantes (FREITAS et al., 2016), antiptotozoárias (ALMEIDA
et al., 2016), antifúngicas (ANDRADE et al., 2018), dentre outras. Por exemplo,
Oliveira et al., (2020), verificaram que ésteres do ácido p-hidroxicinâmico extraídos do
pó da cera de carnaúba causaram efeitos hipoglicémicos em ratos com diabetes
experimentalmente induzida. Já Almeida et al., (2016) estudaram efeitos antiprotozoários de extratos e de triterpenoides extraídos da cera de carnaúba e
concluíram que estes compostos podem ser futuramente utilizados como protótipos
para novos fármacos com possível empregabilidade terapêutica na Doença de
Chagas e/ou na Leishmaniose.
Ademais, a cera de carnabaúba foi recentemente testada como excipiente
em minicomprimidos contendo substâncias altamente solúveis, como o captopril e a
metformina, com o objetivo de garantir uma liberação sustentada dos fármacos (NART
et al., 2017). Os Autores concluíram que a cera de carnaúba é uma excelente
alternativa para formulações de liberação sustentada de fármacos altamente
hidrossolúveis. Seus principais efeitos foram: redução do contato entre partículas dos
fármacos e o meio de dissolução, redução da taxa de liberação dos fármacos e atraso
na desintegração dos comprimidos. Tais efeitos favorecerem, em última análise a
biodisponibilidade de fármacos solúveis.
Então, a fabricação de alimentos, produtos farmacêuticos e cosméticos vão
se beneficiar das propriedades biológicas dessas substâncias e, portanto, não é de se
estranhar que os nordestinos já conheciam essas propriedades curativas. Que
substâncias aromáticas são essas que apresentam essas atividades biológicas? São
ésteres cinâmicos de três classes: 4-hidróxicinâmico, ácido 4-metoxicinâmico e
diésteres do ácido cinâmico (Figura 4) com álcoois mono e poli-hídricos e ácidos ωhidroxicarboxílicos (FREITAS et al., 2016).
Os compostos fenólicose polifenólicos tem capacidade antioxidante que
diminui o dano celular indutor do estresse oxidativo que por sua vez está associado a
patologias graves, como doenças cardiovasculares, neurodegenerativas, cânceres,
642
diabetes, hipertensão, pré-eclâmpsia, aterosclerose, insuficiência renal aguda,
doenças de Alzheimer e Parkinson (TORO e RODRIGO, 2009).
A capacidade antioxidante dos compostos fenólicos (Figura 5) estão
associadas ao seu alto potencial redox. Os derivados do ácido cinâmico (ácidos transfenil-3-propenóico) são ácidos orgânicos que ocorrem naturalmente em muitas nas
plantas que além da baixa toxicidade, eles têm amplo espectro de atividades
biológicas (SHAHIDI e CHANDRASEKARA, 2010). Os derivados de ácido cinâmico
mais comuns em plantas são os ácidos cinâmico, p-cumárico, caféico e clorogênico
(SOVA, 2012).
Figura 5 – Substâncias fenólicas presentes na cera de carnaúba
De acordo com a empresa Grand View Research especializada em pesquisa
de mercado de produto em escala mundial, o tamanho do mercado global de cera de
carnaúba foi de US $ 246,0 milhões em 2015 e deve crescer significativamente nos
próximos oito anos devido ao uso crescente em produtos de confeitaria. Espera-se
que o aumento dessa demanda se deva para uso em produtos de confeitaria como
geleias, gomas de mascar, agentes glaciantes para alimentos e produtos cosméticos,
principalmente na Ásia-Pacífico (GVR, 2021).
643
5.4 Extrativismo Sustentável da Carnaúba
A carnaúba se destaca por todos os seus produtos, que formam uma
importante cadeia produtiva renovável, e é fonte geradora de emprego e renda para
comunidades que residem no semi-árido nordestino, região que pode ser explorada
economicamente durante o período seco. Devido a sua ocorrência ser tipicamente
uma palmeira do nordeste brasileiro, da caatinga, ela é encontrada principalmente nos
estados do Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte e em menor densidade no
Tocantins, Goiás, no Norte de Minas Gerais e vale do São Francisco, sendo destacado
na literatura inclusive ser é uma atividade extrativista, muito importante nos estados
do Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte (MAPA, 2014).
Sua principal riqueza está na cera que recobre as folhas, principalmente as
mais jovens, tornando-a internacionalmente conhecida como "carnaubawax", mas
estão sempre em busca de diferentes formas de usos da planta pelas comunidades
extrativistas, como a utilização das palhas para a produção de artesanato e também
para adubação do solo (DEMARTELAERE et al., 2021), pois após a extração da cera,
o resíduo da palha (bagana de carnaúba), gerado, pode atuar no favorecimento
nutricional, ainda contribuir na melhoria do substrato no que diz respeito à manutenção
de umidade para as raízes, podendo prolongar o tempo de disponibilidade de
nutrientes a ser absorvido pelas raízes (GONÇALVES et al., 2020). Também cada vez
mais há buscapor produtos naturais ecologicamente corretos, em toda a sua cadeia
produtiva, por parte dos consumidores (SOUSA et al., 2015).
A quase totalidade dos carnaubais é nativa, e devem receber o manejo
adequado para que as áreas não sejam degradadas, sendo o manejo da exploração
é de fundamental importância para a manutenção e estabilidade produtiva dos
carnaubais (FERREIRA et al., 2013). Este ecossistema possui fauna e flora formadas
por vasta biodiversidade de vegetação composta por espécies lenhosas, herbáceas,
cactos e bromélias envolvendo cerca 932 espécies de plantas, sendo que algumas
espécies só ocorrem na Caatinga (PONTE et al., 2020).
Os carnaubais vêm sendo explorados de forma indiscriminada desde o
séculoXVII, para obtenção de lenhas para as fornalhas, construção de casas e currais;
produtose subprodutos industriais e para o artesanato, colocando a espécie em risco
de extinção (DEMARTELAERE et al., 2021).
644
Alguns estados brasileiros possuem legislação estadual que garante a
proteção da espécie e regulamenta o seu uso, como é o caso do Piauí, onde a
constituição estadual determina que os carnaubais são considerados áreas de
preservação permanente, enquanto no Ceará o Decreto nº 27.413/2004 estabelece
que o corte da árvore precisa de uma autorização do órgão estadual (MAPA, 2014) e
inclusive carnaubeira é considerada símbolo do Ceará.
Com isso, percebe-se que para que essa espécie se mantivesse com a
importância que possui até os dias atuais, foi necessário o envolvimento da
comunidade que depende do extrativismo dessa espécie, na preservação e
entendimento da cadeia produtiva e de valor. Com esse intuito, foi fundada a
Associação da Caatinga, que está amplamente envolvida na divulgação de atividade
e eventos relacionados a melhor desempenho dessa atividade extrativista, buscando
cada vez mais a sustentabilidade dessa cadeia produtiva e enfatizando soluções e
boas práticas no ciclo produtivo, principalmente em relação a produção da cera.
Existem duas formas de extração de cera de carnaúba, a artesanal que se
classifica em três tipos: amarela ou cera olho, arenosa e gorda, e a industrial que
também possui três tipos: Um, Três e Quatro, sendo que a produção industrial de cera
impacta o meio ambiente com uso intenso de água, utilização da lenha e diesel como
fonte energética, consumo de produtos químicos e emissão de poluentes, entretanto,
atende importantes elementos de ecoeficiência como a reutilização de materiais e
consumo de materiais renováveis, sendo que o artesanal produz a chamada cera de
origem; o industrial produz a cera refinada (CARVALHO e GOMES, 2008).
Para a produção da cera, essa pode ser estimada pelo agricultor, pois é
importante levantar as quantidades de folhas produzidas nos anos anteriores,
verificando a média de palha por área a ser coletada, como por exemplo, uma
carnaúba produz em média de 35 a 40 palhas e para coletar 1000 palhas e obter 8 kg
de pó cerífero é necessário coletar25 carnaubeiras, no mínimo (MAPA, 2014).
A Associação Caatinga em parceria com o Sindicato das Indústrias
Refinadoras de Cera de Carnaúba no Estado do Ceará (SINDCARNAÚBA) e apoio
da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva da Carnaúba da Agência de
Desenvolvimento do Estado do Ceará (ADECE) desenvolveram o Projeto Carnaúba
Sustentável, que é uma iniciativa da que visa a distribuição de tecnologia sustentável,
educação ambiental e investimento social na cadeia produtiva da carnaúba
(SINDCARNAÚBA, 2021; ACAATINGA, 2021). Com o desenvolvimento desse projeto,
645
muitos avanços já foram conquistados, como modernização, regularização e
profissionalização da atividade extrativista da cadeia da carnaúba.
Foi também desenvolvido o manual de boas práticas no cultivo da carnaúba,
onde constam instruções aos produtores dessa matéria-prima, ou aos que desejam
entrar nessa cadeia produtiva, que vão desde itens iniciais, até a preparação do
material, como por exemplo: preparo das áreas; o combate a unha-do-diabo;
arrendamentos de áreas; contratação de pessoal e direitos trabalhistas; fase de
extração vareiro; cortador; agrupamentos dos feixes; comboieiro; lastreiro; trabalho
máquina de corte; acesso ao crédito e rastreabilidade, dentre outros assuntos
importantes para quem faz parte dessa atividade (SINDCARNAÚBA, 2021).
Os cuidados com o manejo da carnabueira também incluem controlar a unhado-diabo, Cryptostegia madagascariensis, que é uma planta invasora e que prejudica
a saúde dos carnaubais e, por isso, o combatê-la deve ser uma atividade prioritária e
contínua, por parte dos agricultores (SFIEC, 2021). O extrativismo da carnaúba está
ligado à preservação dessa espécie nativa, pois os carnaubais abandonados são
frequentemente vítimas da espécie invasora unha-do-diabo, que sufoca e mata a
palmeira cerífera (ACAATINGA, 2021).
Um carnaúbal saudável, além de oferecer uma beleza cénica, oferece uma
diversidade de serviços ecossistêmicos gratuitos que contribuem para nossa
qualidade de vida, como fornecimento de alimentos para os animais, recursos úteis
aos seres humanos como a própria cera de carbaúba, a regulação do clima, qualidade
da água e do ar e a proteção dos solos e dos rios (MAPA, 2014). Porém existem
ameaças capazes de prejudicar o equilíbrio natural do carnaúbal que podem afetar
esses serviços, como a trepadeira invasora e falta de planejamento da exploração
sustentável. Existe ainda a necessidade de novos esforços com relação à proteção
do conhecimento popular, que está sendo perdido (CARDOSO et al., 2021). Além
disso, são escassos os estudos a respeito da variabilidade genética da espécie
(SILVA et al., 2018), contribuindo assim para estratégias de manejo e conservação
das populações naturais (SOUSA et al., 2015).
Como a maioria das espécies utilizadas para extrair a matéria-prima são
nativas, há a necessidade de se realizar o plantio de novos indivíduos, pois é simples
e pode ser feito em consórcio com feijão, milho e mandioca, bem como em sistemas
agroflorestais (SFIEC, 2021).
646
O desenvolvimento do projeto Carnaúba Sustentável tem também aderência
aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), agenda global (Agenda 2030)
estabelecida pela Organização das Nações Unidas para promover o desenvolvimento
sustentável globalmente (SINDCARNAÚBA, 2021). Mas para que continue tendo a
importância que a carnaúba possui, é necessário a manutenção e preservação do
carnaubal, pois são muitas famílias que obtém sua renda a partir da carnaubeira. Com
isso, há sempre a busca pela implantação das tecnologias que visem melhorar a
qualidade de vida das famílias, contribuindo para a segurança hídrica e alimentar e
reduzindo a vulnerabilidade social, bem como tentando resolver desafios e propor
soluções para o setor (SOUSA et al., 2015), almejando cada vez mais realizar boas
práticas na cadeia produtiva da carnaúba, e para isso, políticas públicas são cada vez
mais necessárias.
Dessa forma, a carnaúba, como no passado e no presente, poderá, no futuro
ser de grande importância para o homem, que vive na sua região produtora, desde
que seja explorada com racionalidade, para a preservação do meio ambiente (SFIEC,
2021).
6. CONCLUSÕES
Com o crescimento da população mundial, simultaneamente crescem as
necessidades humanas na mesma proporção, como por exemplo a produção de
energia,
alimentos,
medicamentos
e
água
potável.
Este
capítulo
tratou
fundamentalmente das contribuições sociaisde três importantes palmeiras que
participaram do desenvolvimento sustentável em diversas regiões do Brasil, em
especial as regiões Norte e Nordeste. Durante milênios essas palmeiras foram
consideradas Árvores da Vida, haja vista que estiveram presentes durante a evolução
humana conferindo alimentos, remédios e abrigos. Não podemos esquecer que hoje
elas representam importantes comodities para a bioeconomia mundial, pois esse tipo
economia é centrado nas biomassas e o meio ambiente. Porém, a bioeconomia das
palmeiras não deve ser apenas uma pura exploração desses recursos naturais para
atender as necessidades do homem. Ela também deve focar nas questões sociais,
como fome, miséria, saúde, empregos, vida digna, desigualdades, moradia, etc. É
importante utilizar esses recursos conscientemente sem transformaros ambientes em
áreas estéreis que inviabilizem as condições de sua existênciada fauna e da flora no
647
planeta. Os povos tradicionais das florestas já sabiam como era importante explorar
as Árvores da Vida sem destruir as florestas, mas esses conhecimentos foram se
perdendo dando lugar a um tipo de exploração que a tudo devasta e visa apenas o
lucro das corporações.
Várias pesquisas e dados sobre o uso dessas palmeiras estão descritos na
literatura, onde seus produtos primários e rejeitos são industrializados atestando suas
importâncias no cenário econômico. No entanto, muitas outras pesquisas botânicas e
biotecnológicas precisam ser desenvolvidas que demonstrem o quanto é importante
para a sustentabilidade o cultivo e a produção dessas cadeias produtivas de
biomasas. A cadeia produtiva para essas três palmeiras necessita cada vez mais da
expansão de novas tecnologias, que promovam a vinculação entre ciência, produção
e manutenção dos recursos naturais, por intermédio da conexão entre a pesquisa e a
extensão rural. A exploração sustentável dessas palmeiras promove maior agregação
de valores às cadeias produtivas, contribuindo para a ecologia social, evolução do
setor, aumento de renda dos trabalhadores, diminuição da pobreza e qualidade de
vida dos produtores.
AGRADECIMENTOS
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq (CNPq
bolsa 1A 301873/2019-4) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de
Janeiro – FAPERJ. (E-26/010.101106/2018, Pensa Rio E-26/010/00168/2015, CNE
E-26/202.800/2017 eTemático SEI-260003/001178/2020)
648
REFERÊNCIAS
ABDULLAH, S.; CHONG, K.; NG, S. Phytochemical Constituents From Leaves of
Elaies Guineensis and Their Antioxidants and Antimicrobial Activities.Journal of
Pharmaceutical Sciences, v. 5, p.137–140, 2013.
ACAATINGA – Associação Caatinga. Carnaúba Sustentável. Disponível em:
https://www.acaatinga.org.br/carnauba-sustentavel/. Acessado em: 27 agosto 2021.
ADENIYI, A. G., ONIFADE, D. V., IGHALO, J. O., & ADEOYE, A. S. A review of coir
fiber reinforced polymer composites. Composites Part B: Engineering, 107305, 2019.
https://doi:10.1016/j.compositesb.2019.107305
ADKINS, S. FOALE, M.; BOURDEIX, R.; NGUYEN, Q.; BIDDLE, J. Coconut
Biotechnology: Towards the Sustainability of the ‘Tree of Life’. Springer
NatureSwitzerland, 2020, 288p. https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9
ALENCAR, J.A.; ALENCAR, P.C.G.; HAJI, F.N.P.; BARBOSA, F.R. Efeito do
controle cultural e químico sobre o ácaro da necrose do coqueiro, em coco-anão
irrigado. Revista Brasileira de Fruticultura, v. 23, n. 3, p. 577-579, 2001.
https://doi.org/10.1590/S0100-29452001000300026
ALMEIDA, B.C.; ARAÚJO, B.Q.; BARROS, E.D.S.; FREITAS, S.D.L.; MACIEL,
D.S.A.; FERREIRA, A.J.S.; GUADAGNIN, R.C.; JÚNIOR, G.M.V.; LAGO, J.H.G.;
CHAVES, M.H. Dammarane triterpenoides from carnauba, Copernicia prunifera
(p.Miller) H.E. Moore (Arecaceae) wax. Journal of the Brazilian Chemical Society,
v.28, 1371-1376, 2017. https://doi.org/10.21577/0103-5053.20160308
ALMEIDA, B.C.; ARAÚJO, B.Q.; CARVALHO, A.; FREITAS, S.D.L.; MACIEL, D.S.A.;
FERREIRA, A.J.S.; TEMPONE, A.G.; MARTINS, L.F.; ALEXANDRE, T.R.; CHAVES,
M.H.; LAGO, J.H. Antiprotozoal activity of extracts and isolated triterpenoids of
‘carnauba’ (Copernicia prunifera) wax from Brazil. Pharmaceutical Biology, v.54,
p.3280-3284, 2016. https://doi.org/10.1080/13880209.2016.1224257
ALOUW, J.C.; HOSANG, M. L. A.; NGUYEN, Q. Biotechnology Contributing to
Integrated Pest Management: The Example of Two Major Coconut Pests, Oryctes
rhinoceros and Brontispa longissimi. S. Adkins et al. (eds.), Coconut Biotechnology:
Towards the Sustainability of the ‘Tree of Life’, Springer Nature Switzerland, 2020.
https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9_8
ALVES, R.M.; MÜLLER, A.A. Aspectos básicos do cultivo do coqueiro (Cocos
nucifera L.). EMBRAPA, Belém-Pará, 1995. Disponível em:
https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/374719/1/Aspectosba
sicos.pdf. Acessado em: 12 maio 2022.
ANDRADE, L.B.S.; JULIÃO, M.S.S.; CRUZ, R.C.V.; RODRIGUES, T.H.S.;
FONTENELLE, R.O.S.; SILVA, A.L.C. Antioxidant and antifungal activity of carnauba
wax powder extracts. Industrial Crops and Products, v.125, p.220-227, 2018.
https://doi.org/10.1016/j.indcrop.2018.09.004
649
ANVISA - Resolução ANVISA nº 27 de 26/05/2009. Disponível em:
https://www.diariodasleis.com.br/legislacao/federal/211122-cera-de-carnaubaextensuo-do-uso-aprova-a-extensuo-do-uso-de-cera-de-carnauba-comocoadjuvante-de-tecnologia-com-a-funuuo-de-lubrificante-agente-de-moldagem-oudesmoldagem-p.html. Acessado em: 30 maio 2021.
ATAÍDE, E.M.; DORES, T.E.; SANTOS, A.G.B.; SOUZA, J.M.A.; SANTOS, P.F.R.
Cera de carnaúba e própolis na conservação pós-colheita de frutos de juazeiro em
condição refrigerada. Agrarian Academy, Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.4,
n.8; p. 2017.
AZEVEDO, C.D.O. Diversidade genética de populações de coqueiro (Cocos
nucifera L.) via marcadores SSR”; Dissertação, 2014. Universidade Estadual do
Norte Fluminense Darcy Ribeiro. Disponível em:
https://uenf.br/posgraduacao/gmp/wp-content/uploads/sites/6/2014/05/Tese-MSCarlos-Diego-O-Azevedo.pdf. Acessado em: 12 maio 2022.
BANDUPRIYA, H.D.D.; PERERA, C.; PEREIRA, M.G.; BOURDEIX, R. Towards
Innovative Coconut Breeding Programs. Adkins et al. (eds.), Coconut
Biotechnology: Towards the Sustainability of the ‘Tree of Life’, Springer Nature
Switzerland, 2020. https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9_12
BAPTISTELLA, C. S. L.; COELHO, P. J. Cocoicultura no Estado de São Paulo, 2015
a 2020. Análises e Indicadores do Agronegócio, v. 16, n. 11, p. 1-6, nov. 2021.
Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/AIA/AIA-46-2021.pdf. Acessado em:
20 maio 2022.
BATUGAL, P. Coconut genetic resources. Bioversity International and
International Plant Genetic Resources Institute - Regional Office for Asia, the
Pacific and Oceania (IPGRI-AP). Serdang (Malaysia). International Coconut Genetic
Resources Network (COGENT)); Ramanatha Rao, V.; Oliver, J. (eds.); International
Plant Genetic Resources Inst., Rome (Italy), 2005, 779p. Disponível em:
https://agris.fao.org/agris-search/search.do?recordID=QJ2007000021. Acessadoem:
15 maio 2022.
BAUDOUIN, L. Genome Studies for Effective Management and Utilization of
Coconut Genetic Resources. In: S. Adkins et al. (eds.), Coconut Biotechnology:
Towards the Sustainability of the ‘Tree of Life’, Springer Nature Switzerland, 2020.
https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9_7
BENASSI, A.C.; FANTON, C.J.; SANTANA, E.N. O cultivo do coqueiro-anãoverde: tecnologias de produção. Vitória, ES: Incaper, 2013, 120 p.
BIDDLE, J.; NGUYEN, Z.; MU, Z.H.; FOALE, M.; ADKINS, S. Germplasm
Reestablishment and Seedling Production: Embryo Culture. In: Adkins et al.
(eds.), Coconut Biotechnology: Towards the Sustainability of the ‘Tree of Life’,
Springer Nature Switzerland, 2020. https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9_10
BOURDEIX, R.; D’EECKENBRUGGE, G.C.; KONAN, J.L.; NOVARIANTO, H.;
PERERA, C.; WOLF, V.L.F. Collecting Coconut Germplasm for Disease
650
Resistance and Other Traits. In: S. Adkins et al. (eds.), Coconut Biotechnology:
Towards the Sustainability of the ‘Tree of Life’, Springer Nature Switzerland, 2020.
https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9_5
CARDOSO, E. A. R.; SANAVRIA, A.; VITA, G.F.; SOUZA, E.D.; SILVA, J.F.M.;
GUIMARÃES, L. J. A. F. Plantas medicinais como prática educativa para Técnicos
em Agropecuária de Instituto Federal Brasileiro. Brazilian Journal of Development,
v.7, n.8, p.77194-77217. https://doi.org/10.34117/bjdv7n8-099
CARON, V. C.; JACOMINO, A. P.; SARANTÓPOULOS, C. I. G. L.; MIGUEL, A. C. A.
Carnauba wax and modified atmosphere in refrigerated preservation of ‘Tahiti’ acid
limes. Packaging Technology and Science, 28, 647-656. 2015.
https://doi.org/10.1002/pts.2133.
CARVALHO NETO, J.P.; BEZERRA, L.R.; SILVA, A.L.; MOURA, J. F. P.; PEREIRA
FILHO, J.M.; SILVA FILHO, E. C.; GUEDES, A.F.; ARAÚJO, M.J.; EDVAN, R.L.;
OLIVEIRA, R.L. Methionine microencapsulated with a carnauba (Copernicia
prunifera) wax matrix for protection from degradation in the rumen. Livestock
Science, 228, 53-60, 2019. https://doi.org/10.1016/j.livsci.2019.07.024.
CARVALHO, F.P.A.; GOMES, A. J. M. Eco-eficiência na produção de cera de
Carnaúba no município de Campo Maior, Piauí, 2004. Revista de Economia e
Sociologia Rural, v. 46, p. 421-453, 2008. https://doi.org/10.1590/S010320032008000200006
CARVALHO, J.M.; MAIA, G.A.; SOUSA, P.H.M.S.; MAIA, G.A. Água-de-coco:
Propriedades nutricionais, funcionais e processamento. Semina: Ciências Agrárias,
v.27, n.3, p.437-452, 2006.
CARVALHO, R.F. Industrialização Do Coco – Beneficiamento (Produção De Coco
Ralado e Leite de coco). Rede de Tecnologia da Bahia – RETEC/BA. 2007.
Disponível em: http://www.respostatecnica.org.br/dossietecnico/downloadsDT/MTA0. Acessado em: 19.05.2022.
CASCUDO, L.C. A Carnaúba. Revista Brasileira de Geografia, v.26, p.162-163,
1964. Disponível em:
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/115/rbg_1964_v26_n2.pdf.
Acessado em: 30 abril 2021.
CHAGAS, K.P.T.; CARVALHO, B.L.B.; GUERRA, C.A.G.; SILVA, R. A.R.; VIEIRA,
F.A. Fenologia do dendezeiro e correlações com variáveis climáticas. Ciência
Florestal, v. 29, n. 4, p. 1701-1711, 2019. https://doi.org/10.5902/1980509822640.
CHAVES JUNIOR, J.I. “As partes do Norte”: empire and local identities in reports of
the nature of Pernambuco and Paraíba (1790-1817). Revista do Programa de PósGraduação em História 26, e2019007, 2019. https://doi.org/10.22456/1983201X.83564
CHIUMARELLI, M., HUBINGER, M. D. Stability, solubility, mechanical and barrier
properties of cassava starch – Carnauba wax edible coatings to preserve fresh-cut
651
apples. Food Hydrocolloids, v. 28, p.59-67, 2012.
https://doi.org/10.1016/j.foodhyd.2011.12.006.
COGENT. A global strategy for the conservation and use of coconut genetic
resources 2018–2028. BioversityInternational, Montpellier, France, 2017.
CORRÊA, M.P. Dicionário das Plantas Úteis do Brasil e das Exóticas
Cultivadas. Ed. Ministério da Agricultura Instituto Brasileiro de Desenvolvimento
Florestal, v. II, 51-54, 1931.
COTTOM, W. P.; WAXES, K-O. Encyclopedia of Chemical Technology. John
Wiley & Sons, Inc. 2000.
https://doi.org/10.1002/0471238961.2301240503152020.a01
CRUTZEN, P. J. Geology of Mankind, Nature, v. 415, n.3, p. 23, 2002.
https://doi.org/10.1038/415023a
CRUZ, B.A. Características vegetativas e produção de cachos de híbridos
interespecíficos entre o caiaué e o dendezeiro. Dissertação. Instituto Nacional de
Pesquisas da Amazônia, Manaus, 2016. 54f.
CUNHA, R.N.V.; LOPES, R.; DANTAS, J.C.R.; ROCHA, R.N.C. Procedimentos
para Produção de Sementes Comerciais de Dendezeiro na Embrapa Amazônia
Ocidental. Embrapa Amazônia Ocidental, Manaus, AM, 2007, 14 p.
DANG, K. T. H.; SINGH, Z.; SWINNY, E.E. Edible coatings influence fruit ripening,
quality, and aroma biosynthesis in mango fruit. Journal of Agricultural and Food
Chemistry, v.56, p.1361-1370, 2008. https://doi.org/10.1021/jf072208a
DAYRIT, F. M.; NGUYEN, Q. Improving the Value of the Coconut with
Biotechnology. In: Adkins et al. (eds.), Coconut Biotechnology: Towards the
Sustainability of the ‘Tree of Life’, Springer Nature Switzerland, 2020.
https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9_3
DEMARTELAERE, A.; PRESTON, H.; NASCIMENTO, M.; GOMES, K.; SILVA, M.;
SOUZA, J.; MEDEIROS, D.; ABRAÃO, P.; PAIVA, L.; FERREIRA, M.; LAZZARINI,
L.; CORDEIRO, K.; SILVA, L.; SENHOR, R. Utilidades e a importância econômica da
Coperniciaprunifera para o Rio Grande do Norte: uma espécie em extinção.
Brazilian Journal of Development, v.7, n.1, p.5065-5088, 2021.
https://doi.org/10.34117/bjdv7n1-344.
DENIS, J.F. Brésil. Paris: Firmin Didot FréresEditeurs, 1837, p. 276. Disponível em:
https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/4/browse?type=author&value=Denis%2C+
Jean+Ferdinand%2C+1788-1890. Acessadoem: 29 abril 2021.
FAO - Food and Agricutulture Organization of United Nation. Palm oil. Disponível
em: https://www.fao.org/faoterm/viewentry/en/?entryId=172679. Acessado em: 10
de maio de 2022.
652
FARIAS, P. A. M.; SILVA, I. A.; QUEIROZ, A. L. F. G.; SILVA, J.G.; MELO, E. R.
DINIZ; BARROS J.M.M.; LAURENTINO, C. S.; COIMBRA, C. G. O. Propriedades
terapêuticas de plantas do gênero Syagrus: uma revisão integrativa. Brazilian
Journal of Development, v.7, n.8, p. 76999-77010, 2021.
https://doi.org/10.34117/bjdv7n8-087.
FERREIRA, C.S.; NUNES, J.A.R; GOMES, L.R.F. Manejo de corte das folhas de
Coperniciaprunifera (Miller) H. E. Moore no Piauí. Revista Caatinga, v. 26, p. 25-30,
2013.
FERREIRA, J.M.S.; Warwick, D.R.N.; SIQUEIRA, L.A. A cultura do coqueiro no
Brasil.3 ed. Brasília, DF. Embrapa, 2018, 508p.
FREITAS, C. A. S.; VIEIRA, I. G. P.; SOUSA, P. H. M.; MUNIZ, C. R.; GONZAGA, M.
L. D. C.; GUEDES, M. I. F. Carnauba wax p-methoxycinnamic diesters:
Characterisation, antioxidant activity and simulated gastrointestinal digestion followed
by in vitro bioaccessibility. Food Chemistry, v.196, p.1293-1300, 2016.
https://doi.org/10.1016/j.foodchem.2015.10.101
FREITAS, C. A. S; DE SOUSA, P. H. M.; SOARES, D. J.; DA SILVA, J. Y. G.;
BENJAMIN, S. R., GUEDES, M. I. F. Carnauba wax uses in food - a review. Food
Chemistry, v.291, p.38-48, 2019. https://doi.org/10.1016/j.foodchem.2019.03.133
GIULIETTI, A.M.; RAPINI, A.; ANDRADE, M.J.G.; QUEIROZ, L.P.; SILVA, J.M.C.
Plantas Raras do Brasil, Org. Ed. Universidade Estadual de Feira de Santana Belo
Horizonte, MG, 2009, p.74.
GONÇALVES, M. C.A.; SEGOVIA, J.F.O. Evolução em paisagismo e floricultura
tropical. In: Floricultura tropical : técnicas e inovações para negócios sustentáveis
na Amazônia.SEGOVIA, J.F.O. ed., Brasília, DF: Embrapa, 2020, 211. Disponível
em: https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/1129381/1/CPAFAP-2020-cap-7-Evolucao-em-paisagismo.pdf. Acessado em: 20 maio 2022.
GONÇALVES, M.; LÍCIA, A.; SILVA, A.; SILVA, L.; SILVA, K.; JÚNIOR, F.; GRUGIKI,
M.; SILVA, M. Desenvolvimento em campo de espécies da Caatinga com o uso de
resíduo de carnaúba. Brazilian Journal of Development, v. 6, n. 1, p.1188-1200,
2020. https://doi.org/10.34117/bjdv6n1-083.
GONZÁLEZ, O.M., GILBERT, B.P., BAILLÈRES, H., & GUAN, H. Compressive
strength and stiffness of senile coconut palms stem green tissue. Materials Science,
2014. Disponível em: https://www.semanticscholar.org/paper/Compressive-strengthand-stiffness-of-senile-palms-Gonz%C3%A1lezGilbert/7652a8482b198cb5b3515f4c8b96e2027f25d1d5#citing-papers. Acessado
em: 16 maio 2022.
GUIMARÃES, C. C.; MATOS, S. R. C. Utilização da cinza da casca do coco verde
como substituição parcial do cimento Portland em argamassas. REEC - Revista
Eletrônica de Engenharia Civil, v. 13, n. 1, 2017.
https://doi.org/10.5216/reec.v13i1.41675.
653
GUPTA, S.; IVVALA, J.; GREWAL, H.S. Development of natural wax based durable
superhydrophobic coatings. Industrial Crops and Products, v.171, p. 113871,
2021. https://doi.org/10.1016/j.indcrop.2021.113871.
GVR – Grand View Research. Carnauba Wax Market Analysis by Product (Type
1, Type 3, Type 4) by Application (Cosmetics, Food, Automotive,
Pharmaceutical) and Segment Forecasts to 2024. Disponível em:
https://www.grandviewresearch.com/industry-analysis/carnauba-wax-market.
Acessado em: 03 maio 2021.
HORTO BOTÂNICO. Cocos nucifera. Disponível em:
https://www.museunacional.ufrj.br/hortobotanico/Palmeiras/cocosnucifera.html.
Acessado em: 02 maio 2022a.
HORTO BOTÂNICO. Elaeis guineenses. Disponível em:
https://www.museunacional.ufrj.br/hortobotanico/Palmeiras/elaeisguineensis.html.
Acessado em: 10 de maio de 2022b.
IBGE 2017. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Produção de Cocoda-baía. https://www.ibge.gov.br/explica/producao-agropecuaria/coco-da-baia/br.
Acessado em: 12 maio 2022.
IBGE 2020. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Produção de Cocoda-baía. https://www.ibge.gov.br/explica/producao-agropecuaria/coco-da-baia/br.
Acessado em: 12 maio 2022.
IGNACIO, I.-F.; MIGUEL, T.-S. Researchopportunitiesonthecoconut (Cocos nucifera
L.) using new technologies. South AfricanJournalofBotany, 141, 414–420,
2021. https://doi:10.1016/j.sajb.2021.05.030
ISPN - Instituto Sociedade, População e Natureza. Carnaúba.Cerratinga. Disponível
em: http://www.cerratinga.org.br/carnauba/. Acessado em: 30 abril 2021.
JARDINE, J.G.; BARROS, T.D. Dendê. Disponível em:
https://www.agencia.cnptia.embrapa.br/gestor/agroenergia/arvore/CONT000fbl23vm
z02wx5eo0sawqe3valo63n.html. Acessadoem: 30 maio 2022.
KELLENS, M.; GIBON, V.; HENDRIX, M.; GREYT, W.D. Palm oil fractionation.
European Journal of Lipid Science and Technology, v. 109, p.336–349, 2007.
https://doi.org/10.1002/ejlt.200600309.
KHWALDIA, K., LINDER, M., BANON, S., DESOBRY, S. Effects of mica, carnauba
wax, glycerol, and sodium caseinate concentrations on water vapor barrier and
mechanical properties of coated paper. Journal of Food Science, v.70, p.E192E197, 2006. https://doi.org/10.1111/j.1365-2621.2005.tb07135.x
KIM, I.-H.; LEE, H.; KIM, J. E.; SONG, K. B.; LEE, Y. S.; CHUNG, D. S.; MIN, S. C.
Plum coatings of lemongrass oil-incorporating carnauba wax-based nanoemulsion.
Journal of Food Science, v. 78, p. E1551-E1559,
2013.https://doi.org/10.1111/1750-3841.12244
654
KUMAR, B. M.; KUNHAMU, T.K. Nature-based solutions in agriculture: A review of
the coconut (Cocos nucifera L.)-based farming systems in Kerala, “the Land of
Coconut Trees”. Nature-BasedSolutions, v. 2, 100012, 2022.
https://doi.org/10.1016/j.nbsj.2022.100012.
LOIOLA, C.M. Diversidade genética em coqueiro-gigante (Cocos nucifera L.)
por meio de marcadores microssatélites e características morfoagronômicas.
2014. 100f. Tese (Doutorado em Agronomia: Fitotecnia/Melhoramento Genético) –
Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA). Disponível em:
https://ppgfito.ufersa.edu.br/wp-content/uploads/sites/45/2015/02/Tese-2014CARINA-MENDES-LOIOLA.pdf.Acessado em: 12 maio 2022.
LOPES, R.; OLIVEIRA, M. S. P.; CAVALLARI, M. M.; BARBIERI, R. L.;
CONCEIÇÃO, L. D. H. C. S. Palmeiras Nativas do Brasil. Brasília, DF: Embrapa
Amazônia Ocidental, 2015, 432p.
LORENZI, H.; NOBLICK, L.R.; KAHN, F.; FERREIRA, E. Flora brasileira:
Arecaceae (Palmeiras). Instituto Plantarum, Nova Odessa, 2010, 382p.
LUCCI, P.; BORRERO, M.; RUIZ, A.; PACETTI, D.; FREGA, N.; DIEZ, O.; OJEDA,
M.; GAGLIARDI, R.; PARRA, L.; ANGEL, M. Palm Oil and Cardiovascular Disease: A
Randomized Trial of the Effects of Hybrid Palm Oil Supplementation on Human
Plasma Lipid Patterns. Food and Function, 7, p.347-354, 2016.
https://doi.org/10.1039/C5FO01083G
MACEDO, M.A. Notice sur le palmier carnauba. Ed. H. Plon, Paris,1867.
Disponível em:
https://archive.org/details/noticesurlepalm00macegoog/page/n19/mode/2up?q=carna
%C3%BAba. Acessado em: 02 maio 2021.
MACHADO, L.J.; SARTORI, R.A.; MARQUES, D.D.; NASCIMENTO, A.E.S.;
FURTADO, J.M. Utilização da biomassa do coco verde (Cocos nucifera l.) para
obtenção de Subprodutos. BrazilianJournalofDevelopment, v. 6, n. 1, p.38083826, 2020.
MAPA - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. (Carnaúba, Copernicia
prunifera) /Série: Cadernos de Boas Práticas para o Extrativismo Sustentável
Orgânico. Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e Cooperativismo. –
Brasília: MAPA/ACS, 2014. 43p.
MARTINS, C.R.; JESUS JÚNIOR, L.A. Produção e comercializaçõao de coco no
Brasil frente ao comércio internacional: panorama 2014. Embrapa Tabuleiros
Costeiros, Aracaju, 2014, 51p.
MELLO, J.A.G.; CÂMARA, M.A. Obras reunidas. Organizado e com estudo
introdutório por José Antônio Gonsalves de Mello. Recife: Fundação de Cultura
Cidade do Recife, p. 11-74,1982.
655
MENEZES, A.J.E.A.; HOMMA, A.K.O.; GOMES JÚNIOR, R.A.; FUJIYAMA, B.S.;
SANTOS, J.C. Práticas Tecnológicas Adotadas pelos Produtores de Dendezeiro
Híbrido Interespecifico no Nordeste Paraense. Embrapa Amazônia Oriental
Belém, PA, 2017, p.40.
MILANOVIC, J.; LEVIC, S.; MANOJLOVIC, V.; NEDOVIC, V.; BUGARSKI, B.
Carnaubawaxmicroparticlesproducedbymeltdispersiontechnique. Chemical Papers,
v.65, p.213-220, 2011. https://doi.org/10.2478/s11696-011-0001-x
MOTA, W. F.; SALOMAO, L. C. C.; NERES, C. R. L.; MIZOBUTSI, G. P.; MELO
NEVES, L. L. Use of carnauba wax and plastic film on postharvest conservation of
the yellow passion fruit. Revista Brasileira de Fruticultura, v. 28, p.190-193, 2006.
https://doi.org/10.1590/S0100-29452006000200008
MOZZON, M.; PACETTI, D.; LUCCI, P.; BALZANO, M.; FREGA, N.G. Crude palm oil
from interspecific hybrid Elaeis oleifera x Elaeisguineensis: Fatty acid
regiodistribution and molecular species of glycerides. FoodChemistry, v.141, p.
245–252, 2013.
MUNIZ, V.I. M.S.; BRAGA, P.E.T.; ALVES, E.A. Frequência de coletores florais do
Coqueiro (Cocos nucifera L.) no litoral do município de Acaraú (Ceará – Brasil).
Revista Brasileira de Meio Ambiente, v.8, n.2. 002-010, 2020.
MURSYIDIN, D. H.; AHYAR, G. M. Z. Diversidade genética de germoplasma de coco
nativo de Kalimantan do Sul, Indonésia: um estudo
molecular. PesquisaAgropecuária Tropical, Goiânia, v. 52, p. e71016, 2022.
NALSEN, C.; BASU, S.; WOLK, A.; VESSBY, B. The importance of dietary
antioxidants on plasma antioxidant capacity and lipid peroxidation in vivo in middleaged men. Scandinavian Journal of Food and Nutrition, v.50, n.2. p. 64-70, 2006.
https://doi.org/10.1080/11026480600717202
NART, V.; BERINGHS, A. O.; FRANÇA, M. T.; DE ESPÍNDOLA, B.; PEZZINI, B. R.;
STULZER, H. K. Carnauba wax as a promising excipient in melt granulation targeting
the preparation of mini-tablets for sustained release of highly soluble drugs.
Materials Science and Engineering: C, v.70, p.250-257, 2017.
https://doi.org/10.1016/j.msec.2016.07.070
NEDOVICA, V.; KALUSEVICA, A.; MANOJLOVICB, V.; LEVICA, S.; BUGARSKIB, B.
An overview of encapsulation technologies for food applications. Procedia Food
Science, v.1, p.1806-1815, 2011. https://doi.org/10.1016/j.profoo.2011.09.265
O’RIORDAN, T. Environmental science, sustainability and politics. Transactions of
the Institute of British Geographers, v. 29, n. 2, p. 234–247,
2004. https://doi.org/10.1111/j.0020-2754.2004.00127.x
OHLER, J.G. Coconut, tree of life. Roma: FAO,1984. 446p.
656
OIL WORLD - Independent Global Market Analyses & Forecasts Since 1958 - Oil
world Annual 2013.Disponível em: http://www.oilworld.biz/app.php. Acessado em:
26 de maio de 2022.
OJEDA, M.; BORRERO, M.; SEQUEDA, G.; DIEZ, O.; CASTRO, V.; GARCÍA, A.;
RUIZ, A.; PACETTI, D.; FREGA, N.; GAGLIARDI, R.; LUCCI, P. Hybridpalmoil
(Elaeisoleifera x Elaeisguineensis) supplementation improves plasma
antioxidantcapacity in humans. European Journal of Lipid Science and
Technology, v.118, n.2, 1600070, , 0000–0000, 2016.
https://doi.org/10.1002/ejlt.201600070.
PECKOLT, T. A produção científica de um pioneiro da fitoquímica no Brasil História.
Ciências, Saúde-Manguinhos, v.12, p.515-533, 2005.
https://doi.org/10.1590/S0104-59702005000200018
PECKOLT, T.; PECKOLT, G. História das plantas medicinais e úteis do Brasil.
Organização, Belo Horizonte, MG: Fino Traço, 2016, p. 228. Disponível em:
http://www.ceplamt.org.br/wp-content/uploads/2017/08/miolo_plantas-medicinais.pdf.
Acessado em: 02 maio 2021.
PEDRAS, L. R.V. A paisagem em Alexander von Humboldt: o modo descritivo dos
quadros da natureza. Revista USP, São Paulo, 46, p.97-114, 2000.
https://doi.org/10.11606/issn.2316-9036.v0i46p97-114
PERERA, C.; DHARSHANI, B.D.H.; THOMAS, R.J. Diversity Studies Using
Molecular Markers. In: Adkins et al. (eds.), Coconut Biotechnology: Towards the
Sustainability of the ‘Tree of Life’. Springer NatureSwitzerland, 2020.
https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9_6
PMJP – Prefeitura Municipal de João Pessoa. Histórico do Parque. Disponível em:
http://www.joaopessoa.pb.gov.br/zoobica/historia-da-bica/historico-do-parque/.
Acessado em: 15 de maio 2015.
PONTE, I. A.; MUTHUVEL, M.; SARAVANABHAVAN, S.; BENJAMIN, S.R. The
PhytochemicalCompositionof Medicinal Plants: BrazilianSemi-AridRegion
(Caatinga). Em Phytochemicals in Human Health. chapter, Ed. Venketeshwer Rao,
Dennis Mans, Leticia Rao, Intechopen, 2020, chapter 4, 73-87.
https://doi.org/10.5772/intechopen.90252
RESEARCH e MARKETS. Coconut Products Market by Type Application and
Form: Global Opportunity Analysis and Industry Forecast, 2019-2026. Disponível
em: https://www.researchandmarkets.com/reports/4989541/coconut-productsmarket-by-type-applicationand#:~:text=The%20global%20coconut%20products%20market,13.6%25%20during
%20the%20forecast%20period. Acessado em: 06 maio 2022.
RODRIGUES, M.R.L.; AMBLARD, P.; SILVA, E.B.; MACÊDO, J.L.V.; CUNHA,
R.N.V.; TAVARES, A.M. Avaliação do estado nutricional do dendezeiro: análise
foliar. Embrapa Amazônia Ocidental, Manaus, Circular Técnica, 11, 2002, 9 p.
657
ROSA, M. de F.; ABREU, F. A. P. de. Água-de-coco: métodos de conservação.
Fortaleza: Embrapa - CNPAT / SEBRAE/CE, 2000. 40 p.
SÁENZ-CARBONELL, L.; NGUYEN, Q.; LÓPEZ-VILLALOBOS, A.; OROPEZASALÍN, C. CoconutMicropropagation for WorldwideReplantingNeeds. In: Adkins
et al. (eds.), Coconut Biotechnology: Towards the Sustainability of the ‘Tree of Life’,
Springer Nature Switzerland, 2020. https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9_11
SALUM, U.; FOALE, M.; BIDDLE, J.; BAZRAFSHAN, A.; ADKINS, S. Towards the
Sustainability of the “Tree of Life”: An Introduction. In: Adkins et al. (eds.),
Coconut Biotechnology: Towards the Sustainability of the ‘Tree of Life’, Springer
Nature Switzerland, 2020. https://doi.org/10.1007/978-3-030-44988-9_1
SALVIATÍ, E.J. Tipos vegetais aplicados ao paisagismo. Paisagem e Ambiente, v.5,
p. 9-45, 1993. https://doi.org/10.11606/issn.2359-5361.v0i5p9-45.
SANTOS, H. O.; HOWELL, S.; EARNEST, C. P.; TEIXEIRA, F. J. Coconut oil intake
and its effects on the cardiometabolic profile – A structured literature review.
Progress in Cardiovascular Diseases,
2019.https://doi.org/10.1016/j.pcad.2019.11.001
SFIEC – Sistema FIEC - Câmara Setorial da Carnaúba. A carnaúba: preservação e
sustentabilidade. / Câmara Setorial da Carnaúba. - Fortaleza: Câmara Setorial da
Carnaúba, 2009. p. 40. Disponível em:
http://www.sfiec.org.br/portalv2/sites/sindicarnauba/files/Brochura_Carna%C3%BAba
2.pdf. Acessado em: 28 agosto 2021.
SHAHIDI, F.; CHANDRASEKARA, A. Hydroxycinnamates and their in vitro and in
vivo antioxidant activies. PhytochemistryReviews, v. 9, p. 147-70, 2010.
https://doi.org/10.1007/s11101-009-9142-8
SILVA, A.J.B; SEVALHO, E.S.; MIRANDA, I.P.A. Potencial das palmeiras nativas da
Amazônia Brasileira para a bioeconomia: análise em rede da produção científica e
tecnológica. Ciência Florestal, v. 31, p. 2, 2021.
https://doi.org/10.5902/1980509843595.
SILVA, A.M.; GUEDES, M.I.F.; RONDINA, D. Produtos da cadeia produtiva da
carnaubeira e seus efeitos na alimentação animal. Ciência Animal, v.29, n.2, p.6579, 2019.
SILVA, J. F. O. “A árvore da vida”: ciência, natureza e tempo nos estudos sobre a
carnaúba no Ceará oitocentista. Dissertação de Mestrado, Programa Pósgraduação em História da História, Universidade Federal do Ceará, 2017, 198p.
SILVA, L. G.C.; MOREIRA, J.F.L; HOLANDA, H.B.B.; ROCHA, E.L.B; DIAS, P.C.
Evaluation of carnauba progenies and estimates of genetic parameters in the juvenile
phase. Revista Caatinga, v. 31, n. 04, p. 917-925, 2018.
https://doi.org/10.1590/1983-21252018v31n414rc.
658
SILVA, T.T.; MULDER, A.P.; SANTANA, C. (Cocos nucifera L.) e produtos
alimentícios derivados: Uma revisão sobre aspectos de produção, tecnológicos e
nutricionais. https://doi.org/10.37885/200800949. Disponível em:
https://downloads.editoracientifica.org/articles/200800949.pdf. Acessado em: 19
maio 2022.
SINDCARNAÚBA – Sindicato das Indústrias Refinadoras de Cera de Carnaúba no
Estado do Ceará. Carnaúba sustentável. Disponível em:
http://sindcarnauba.org.br/carnauba-sustentavel/. Acessado em: 26 agosto 2021.
SIQUEIRA, L.A.; ARAGÃO, W.M.; TUPINAMBÁ, E.A. A Introdução do coqueiro no
Brasil, importância histórica e agronômica. Embrapa Tabuleiros Costeiros.
Aracaju, Sergipe, 2002, 24 p.
SOARES, K.P.; LONGHI, S.J.; WITECK NETO, L.; ASSIS, L.C. Palmeiras
(Arecaceae) no Rio Grande do Sul, Brasil. Rodriguésia, v.65, n.1, p.113-139, 2014.
https://doi.org/10.1590/S2175-78602014000100009.
SOUSA, R.F.; SILVA, R.A.R.; ROCHA, G.F.; SANTANA, A.S.; VIEIRA, F.A.
Etnoecologia e etnobotânica da palmeira carnaúba no semiárido brasileiro. CERNE
v. 21, n. 4, p. 587-594, 2015. https://doi.org/10.1590/01047760201521041764.
SOVA, M. Antioxidant and antimicrobial activities of cinnamic acid derivatives. Mini
Reviews in Medicinal Chemistry, v.12, p.749-767, 2012.
https://doi.org/10.1016/j.etap.2017.09.015
SREENIVASAN, S.; RAJOO, N.; RATHINAM, X.; LACHIMANAN, Y.L.; RAJOO, A.
Wound healing potential of Elaeisguineensis Jacq leaves in an infected albino rat
model. Molecules, v.15, p.3186–3199, 2010.
STATISTA - Statista Inc. Consumption of vegetable oils worldwide from 2013/14
to 2021/2022, by oil type. Disponível em:
https://www.statista.com/statistics/263937/vegetable-oils-global-consumption/.
Acessadoem: 26 de maio de 2022.
TORO, J.; RODRIGO, R. Oxidative Stress: Basic Overview, em Oxidative stress
and antioxidants: Their role in human disease Ed. Ramon Rodrigo, by Nova Science
Publishers, Inc, NY,Chapter I. p. 1, 2009.
TOW, W.-K.; GOH, A.P.-T.; SUNDRALINGAM, U.; PALANISAMY, U.D.;
SIVASOTHY, Y. Flavonoid Composition and Pharmacological Properties of
Elaeisguineensis Jacq. Leaf Extracts: A Systematic Review. Pharmaceuticals, v. 14,
p. 961, 2021. https://doi.org/10.3390/ph14100961.
TYAGI, V.K.; VASISHTHA, A.K. Changes in the characteristics and composition of
oils during deep-fat frying. Journal of the American Oil Chemists’ Society, v. 73,
n.4, p.499–506, 1996. https://doi.org/10.1007/BF02523926
659
VANDENBURG, L.E.; WILDER, E.A. The structural constituents of carnauba wax.
Journal of the American Oil Chemists Society, v. 47, p.514-518, 1970.
https://doi.org/10.1007/BF02639240
VIDAL, W.N & VIDAL, M.R.R. Botânica Organografia – Quadros sinóticos
ilustrados de fanerógamas. 4.ed. Viçosa: Universidade Federal de Viçosa. Ed. UFV.
2003. 124p.
VINAGRE, F. Fundação CECIERJ. Disponível em:
https://canal.cecierj.edu.br/recurso/1019. Acessado em: 29 agosto 2021.
WEARN, Y.N.; MONTAGNA, L. S.; PASSADOR, F.R. Compósitos de fibra de
coco/LDPE: efeito do tratamento superficial das fibras de coco em compósitos
verdes. Revista Matéria, v.25, n.1, 2020.
660
CAPÍTULO 35
NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL: RETROCESSO
OU OPORTUNIDADE?
Matheus Fortunato Barbosa Gomes
Mestrando em Estudos Urbanos e Regionais
Instituição: Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Endereço: Departamento de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte; Rua das Humanidades - Lagoa Nova, Natal, 59078-970. Natal/RN
E-mail: matheus.fortunato.700@ufrn.edu.br
José Gomes Ferreira
Doutor em Sociologia
Instituição: Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Endereço: Departamento de Políticas Públicas da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte; Rua das Humanidades - Lagoa Nova, Natal, 59078-970. Natal/RN
E-mail: josegomesufrn@gmail.com
Maria Wagna de Araújo Dantas
Doutoranda em Estudos Urbanos e Regionais
Instituição: Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Endereço: Av. dos Caiapós, 121 Cond. Vita, Torre Veneza, apto 1206, Pitimbu,
59067-400 – Natal/RN
E-mail: wagnad.dantas.498@ufrn.edu.br
RESUMO: No Brasil, com a aprovação recente da Lei 14.026, de 15 de julho de 2020,
foi alterado o marco legislativo do saneamento básico, sendo um processo
extremamente controverso e com avanço durante a pandemia da COVID-19. Em
debate, está a entrada de empresas privadas na gestão do setor e a possível
privatização dos serviços de água no país, assim como o fim da prestação de serviços
de água e esgoto por parte das companhias estaduais, comprometendo o subsídio
cruzado para os pequenos municípios que não conseguem pagar os custos da
operação dos sistemas. O artigo analisa o processo de elaboração até a aprovação
da Lei, identificando os argumentos contra e a favor, assim como que possíveis
implicações terá para o futuro e qual o papel dos entes da da federação na
concretização da política. Dividimos este trabalho em três partes. Na primeira parte,
tratamos do processo de remunicipalização que tem ocorrido em muitos países ao
redor do mundo em paralelo com o reconhecimento do acesso à água e ao
saneamento básico como um direito universal. Na segunda parte, é discutida, de
forma breve, a evolução histórica do saneamento básico no Brasil após a Constituição
de 1988, passando pelo marco regulatório do serviço: a Lei 11.445/2007. Na terceira
e última parte, apresenta-se os processos que levaram à aprovação da Lei
14.026/2020, apontando seus principais atores, tanto os considerados a favor, como
seus opositores, bem como o desenvolvimento do primeiro e mais recente leilão da
Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE-RJ), ocorrido no
primeiro semestre de 2021, considerado como a “Jóia da Coroa” do Ministro da
Economia Paulo Guedes. Para efeito, recolhemos documentos dos trabalhos do
Congresso Nacional e do Senado, assim como notícias da comunicação social e
testemunhos de peritos sobre o tema.
661
PALAVRAS-CHAVE: Acesso à água e saneamento; Direitos humanos; Privatização;
desigualdades sociais; Brasil.
1. INTRODUÇÃO
Durante várias décadas do séc. XX, a privatização dos serviços de água foi um
paradigma dominante, procurando fazer face ao que se considerava ser ineficácia da
administração pública para fornecer os serviços, permanecendo, ainda assim, com a
tutela do recurso. Durante a década de 2000, várias cidades, em todos os continentes,
iniciaram o que se chama de remunicipalização, movimento que considerava que o
setor privado não estava a cumprir com aquilo que prometia. Este processo tem vindo
a somar municípios, o interesse de investigadores, movimentos ambientalistas e de
defesa da água, políticos e sindicalistas.
A importância atribuída ao tema tem aumentado pelo fato de crescer,
igualmente, o debate sobre o direito humano à água e esgotamento sanitário,
tornando-se ainda mais importante num país como o Brasil, com enormes
desigualdades sociais e com atraso consecutivo na implementação da Política
Nacional de Saneamento Básico e do princípio da Universalização destes serviços
como direitos sociais, o que irá também ao encontro dos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável, das Nações Unidas, em particular do ODS 6 Assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos.
A reversão no sentido da remunicipalização dos serviços tem se consolidado
como novo paradigma. Estudos internacionais abaixo citados e mobilização da
sociedade civil, indicam que o mito da melhor prestação do serviço pelos privados não
se confirma e que, no movimento pela remunicipalização, as cidades acabam se
reinventando e prestando melhores serviços (KISHIMOTO et al., 2017). Em causa na
disputa contra a privatização estão questões como a degradação do serviço, a
transformação da água em mercadoria, o não fornecimento de modo universal e a
preço acessíveis, além da perda de emprego público, daí a maior mobilização dos
sindicatos
neste
processo.
Igualmente
importantes,
estão
os
riscos
de
desinvestimento em um dos eixos do saneamento básico que é o esgotamento
sanitário, pelo simples fato de não ser rentável do ponto de vista econômico, assim
como o desinvestimento em áreas cuja distância ou relevo coloquem dificuldades na
662
prestação dos serviços, encarecendo-o. Chama-nos a atenção para um dos slogans
dos contestatários da privatização é de que a água é um bem comum e não uma
mercadoria (SILVA, 2018a e 2018b; GARCÍA; AGUDO, 2018; RODRIGUES, 2019).
No Brasil, apesar da criação de instrumentos legais, como a Lei 11.445/2007,
que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, as ações por parte
da União não atingiram o território brasileiro de forma homogênea, tendo em vista as
características locais dos municípios, como o nível de suas capacidades técnicas,
vontade política das gestões municipais e captação de recursos para geração destes
instrumentos voltados para o Saneamento Básico.
No meio deste contexto, apesar da tendência internacional ser a de reverter os
processos de privatização, o governo avançou numa primeira fase, com abertura para
os serviços de água e exploração dos mananciais à iniciativa privada, através da
aprovação da Lei 14.026/2020. A polêmica integra diversos aspectos. Uma delas, sem
dúvida, foi dada ao Senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), relator do Projeto de Lei,
apelidado pelo Deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) como o “Senador Coca-cola”,
devido suas ligações à iniciativa privada com interesse no setor da água. Outro fator
polêmico, foi o fato de que o que tinha sido negociado previamente não foi aprovado
pelo Presidente da República, que vetou 12 artigos, considerados vitais pelos
opositores da proposta. Os vetos colocam igualmente em causa a continuidade da
prestação de serviços de água e esgoto por parte das companhias estaduais, podendo
abrir um vazio na gestão dos serviços (MONITOR MECANTIL, 2020).
O processo tem merecido a oposição de membros da academia brasileira,
assim como de especialistas do setor de saneamento, de movimentos sociais, de
sindicatos e partidos da oposição, os quais: rejeitam que a privatização traga
investimentos; que a privatização lança o mito da universalização mas que esta é
incompatível com o modelo capitalista, que busca lucro; que a melhoria do serviço não
tem condições para acontecer e que as áreas periféricas vão ser as mais afetadas;
que se a água está a venda, a medida que a mesma se transforma em mercadoria,
os consumidores mais vulneráveis ficam sem condições de pagar por ela; que haverá
pouco investimento para o esgotamento sanitário por não ser rentável (SILVA, 2018a
e 2018b; ROGERS, 2020; PINHEIRO, 2020).
Em causa também está o fato do processo ter ido à votação durante a
Pandemia da Covid-19, reduzindo a possibilidade de uma ampla discussão e
participação social, mas é também uma expressão da verticalização administrativa e
663
a agenda atual do país. A Pandemia acabou por dar maior visibilidade à necessidade
de se cumprir o direito humano à água e esgotamento sanitário, ao facilitar a
contaminação das populações mais carenciadas (BORJA e MORAES, 2020).
Este é o ponto de partida deste artigo que, a seguir, aprofundaremos. O nosso
objetivo é mostrar como o país está indo em contraciclo, tanto no referente à tendência
crescente de devolução dos serviços de água e esgoto aos municípios ou empresas
estaduais como das políticas no sentido da universalização do acesso à água. Este
trabalho segue o princípio do acesso à água e esgotamento sanitário como direito
humano, estabelecido pela Resolução 64/A/RES/64/292, das Nações Unidas, que
orienta aos Estados no dever de diminuírem, progressivamente, as desigualdades no
acesso aos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, seja nas
zonas urbanas e rurais, formais ou informais, ricas ou pobres e esse direito deve ser,
inclusive, incluído nas constituições dos países.
Nesse sentido, procedemos à revisão da literatura sobre o tema, a partir dos
documentos levados a votação no Congresso e Senado, reconstruímos os
argumentos e momentos que levaram à publicação da citada lei, e a partir da
comunicação social trazemos mais argumentos e atores sociais que participaram no
debate. Na última parte desta pesquisa, detalhamos o processo de venda em leilão
da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE-RJ),
chamada, pelos apoiadores do governo Bolsonaro, como a “joia Joia da coroa” do
Ministro Paulo Guedes.
2. ESTADO DA ARTE – REMUNICIPALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS EM VÁRIOS
PAÍSES
A água é um recurso natural cujos fluxos e consumos têm presença constante
no cotidiano. Tratando-se de um recurso vital, que é escasso, ameaçado e distribuído
de forma desigual, é indispensável que seja garantida a gestão e tutela pública do
recurso. Sendo inquestionável a sua importância econômica como recurso produtivo,
igualmente essencial à vida e ao ambiente. Ao mesmo tempo em que articula valores
sociais e identitários fundamentais para as populações, a água tem sido usada como
um instrumento de poder, com enorme visibilidade midiática produtivista que desvirtua
esses valores (GARCÍA e AGUDO, 2018).
664
De uma imagem tradicional dos serviços públicos como pouco eficazes e
gastadores, a gestão da água para abastecimento humano passou gradualmente para
empresas privadas. Porém, tem relevância a remunicipalização e contestação da
privatização dos serviços. Um dos aspectos mais controversos diz respeito à
possibilidade deste recurso se transformar numa mercadoria transacionável no
mercado, colocando em causa o acesso universal à água e o seu papel como agente
cultural de socialização. A passagem da gestão do Estado para o setor privado tem
sido, em vários países, alvo de críticas que apontam para a degradação da qualidade
do recurso, aumento de preço e aumento de situações de conflito suscitados pela
desigual distribuição do recurso. A perda da qualidade da água para consumo
humano, o aumento de tarifário e de situações de vulnerabilidade social
(VALDOVINOS, 2012; PIGEON, 2012) estão entre argumentos recorrentes dos
opositores.
A disputa se relaciona com o reconhecimento, em 2010, pela Assembleia Geral
das Nações Unidas, do direito à água potável própria, de qualidade e a instalações
sanitárias que é um direito do homem, indispensável para o pleno gozo do direito à
vida, o que determina que todos têm direito à água e a serviços de saneamento,
financeiramente acessíveis, aceitáveis e de qualidade para todos, sem qualquer tipo
de
discriminação,
obrigando
Estados,
progressivamente,
a
eliminarem
as
desigualdades de acesso, tanto à água como ao esgoto (BRITO, 2020).
Sobre este último aspecto, o último relatório de Léo Heller (que deixou o cargo
de Relator Especial das Nações Unidas sobre os direitos humanos à água potável e
ao esgotamento sanitário, agora ocupado por Pedro Arrojo Agudo), afirma que “o
cumprimento dos direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário não pode ser
alcançado em um curto espaço de tempo e geralmente depende da disponibilidade e
do uso de recursos” (ONU, 2020, p.3). Ou seja, esse é um desafio maior caso o país
avance para a privatização, na medida em que o tempo curto da rentabilização
empresarial pode ser incompatível com a necessidade de serem tomadas medidas
destinadas à realização progressiva desses direitos pelos estados, não se
concretizando de um dia para o outro.
Autores como José Esteban Castro (2013, 2016 e 2019) e Arrojo Agudo (2010
e 2013) são da opinião que a mercantilização ignora que a água tem em si própria
uma diversidade de valores culturais de uso e é um agente de socialização que
incorpora mecanismos de regulação e o desenvolvimento de relações sociais. Edson
665
Silva (2018a), Arlindo Rodrigues (2019) e Victoria Aragón García e Pedro Arrojo
Agudo (2018), reforçam o que foi dito: a água é um bem comum e não uma
mercadoria, rejeitando a ideia de que a água é um insumo do processo produtivo, o
que faz dela um bem capaz de gerar riqueza, pelo contrário, é um direito humano
(YAMAMOTO; PEREIRA; ALCÂNTARA, 2020).
Para Victoria Aragón García e Pedro Arrojo Agudo (2018) o problema acaba
sendo mais abrangente, pois a privatização acaba repercutindo no acesso a outros
recursos e no direito de propriedade, fazendo parte do processo de mercantilização
da natureza. Em sua opinião, um dos motivos que levou ao uso abusivo da água e
sobre-exploração dos ecossistemas hídricos foram as estratégias baseadas no
sistema de subvenção pública de grandes projetos hidráulicos. Políticas perversas
que invocam o pretenso interesse geral dos projetos, apesar de, na prática,
beneficiarem um grupo reduzido de utilizadores privilegiados, que acabam por
beneficiar desde o projeto à construção, o que, por sua vez, tem levado a casos de
corrupção em diversos países.
Considerando que se trata de grupos de poder econômico e político, com uma
forte máquina midiática que permite fomentar e preservar o poderoso apoio social de
que têm desfrutado tradicionalmente. Os contestatários da privatização argumentam
igualmente que a água é um bem público, de interesse público, e que o fato de ser um
recurso indispensável para a vida deve ser administrada pelo setor público. Porém,
não se trata apenas de remunicipalizar, os desafios são maiores, exigindo maiores
responsabilidades da administração pública e responsabilidade partilhadas com a
sociedade civil e utilizadores (YAMAMOTO, PEREIRA e ALCÂNTARA, 2020).
Diversos estudos têm mostrado que a pressão contra a privatização tem dado
resultados positivos, assistindo-se desde 2000 à remunicipalização dos serviços de
água e esgotamento sanitário como uma tendência. Em 2015, por pressão de
movimentos cívicos, 180 cidades em todo o mundo remunicipalizaram os serviços, se
destacando 136 cidades em países com maiores rendimentos (LOBINA; KISHIMOTO;
PETITJEAN, 2015). Satoko Kishimoto e Olivier Petitjean (2017), apresentam no
documento “La recuperación de los servicios públicos. Cómo ciudades y ciudadanía
están escribiendo el futuro de los servicios públicos”, a situação referente ao ano 2017.
Já Yamamoto, Pereira e Alcântara (2020) atualizam a discussão para o ano de 2020.
Estas e outras publicações mostram que se trata de uma tendência relativamente
recente, sendo determinante e pode redesenhar o setor de água e esgotamento
666
sanitário à escala mundial, marcando uma tendência de apropriação social da água,
conseguindo a mobilização social recuperar a água para o domínio público, não
necessariamente para o poder municipal, ainda assim melhorando, nomeadamente,
a eficiência dos serviços, praticando preços mais baixos, garantindo o direito humano
à água e ao saneamento.
O tema ganhou maior relevância quando na Europa, a partir de 2012, vários
movimentos, entre eles sindicatos, se mobilizaram quanto à possível privatização da
água pelos estados-membros. Entre os argumentos, ressurgiu a questão acabada de
citar sobre a água como um bem público e não uma mercadoria. Na sequência, em
dezembro de 2013, foi submetida ao Parlamento Europeu a Iniciativa de Cidadania
Europeia “Right2Water”, após ter recebido o apoio de mais de 1,9 milhão de cidadãos.
Os subscritores pediram às instituições europeias e aos Estados-Membros que
cumprissem a legislação que assegura o direito humano à água e ao saneamento e
que assegura a universalização destes serviços. E que o abastecimento de água e a
gestão dos recursos hídricos não fossem sujeitos às regras do mercado interno e que
os serviços fossem excluídos da liberalização.
Por exemplo, no caso português, municípios como Lisboa e Porto mostraramse contrários à privatização, considerando que estão a defender o que consideram ser
património municipal, que levou décadas a construir, e a defenderem a relação de
confiança já estabelecida com os consumidores. Outro caso, é o do município de
Alcázar de San Juan, na Espanha, que, depois de 8 anos de privatização, voltará a
ter o seu serviço de gestão da água gerido pelo setor público. Foi criada uma
Plataforma contra a privatização da água de Alcázar que recebeu mais 11.000
assinaturas e, mesmo com a Pandemia da Covid-19, a população do município saiu
às ruas, levando, posteriormente, à decisão do Supremo Tribunal de anular o contrato
de adjudicação dos serviços. Para um dos líderes do movimento, a privatização do
serviço de água no município representava uma ação “de costas para o povo, com
engano e mentiras” (GARCÍA, 2021).
Por último, o tema foi também analisado por Léo Heller no 12º Relatório do
Relator Especial das Nações Unidas sobre os direitos humanos à água potável e ao
esgotamento sanitário, afirmando que “a privatização dos serviços de água e
esgotamento sanitário levanta preocupações relacionadas à sustentabilidade, uma
vez que muitas vezes as empresas privadas se abstêm de investir na expansão,
667
melhoria ou manutenção da infraestrutura, especialmente quando seus contratos
estão para terminar em breve” (ONU, 2020, p.23 e 24).
3. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL
O Saneamento Básico no Brasil é institucionalizado no âmbito do pacto
federativo. Antes da criação de um marco legal pós-redemocratização, o setor já havia
sido citado, diretamente, em três trechos da Constituição Federal de 1988: 1. No
parágrafo XX do Artigo 21, no que se refere ao que Compete à União: “XX - Instituir
diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e
transportes urbanos”; 2. No Parágrafo IX do Artigo 29 que se refere à competência
comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: “IX - Promover
programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de
saneamento básico”; e 3. No Parágrafo IV do Artigo 200 que se refere à competência
do Sistema Único de Saúde: “IV - Participar da formulação da política e da execução
das ações de saneamento básico”.
A Constituição também trouxe, para o saneamento e outros setores, a
descentralização e solidificação da titularidade, dos serviços públicos locais, aos
municípios (BORELLI, 2010), através do Artigo 30, inciso V, no que compete aos
municípios: “organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou
permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo,
que tem caráter essencial” (BRASIL, 1988).
Partindo além da Carta Magna, muito antes da Lei 14.026/2020 ser instituída,
o Estado brasileiro já havia flertado com um possível processo de privatização no final
da década de 90 e início dos anos 2000, com os PLS 266/96 e o PL 4147/01, projetos
que defendiam o princípio de que a transferência da titularidade dos serviços dos
municípios para os Estados garantiriam, aos investidores, a segurança jurídica
necessária para compra de companhias estaduais de água e esgoto.
Segundo Sousa e Costa (2011), após a derrota do primeiro projeto, o PLS
266/96, o governo federal assumiu um compromisso com o Fundo Monetário
Internacional (FMI), em 1999, buscando atender o compromisso de privatização do
setor, sendo assim encaminhado em fevereiro de 2001, para o Congresso Nacional,
em caráter de urgência, com prazo máximo de votação de 45 dias, o Projeto de Lei
4147/01. Do lado governista, o argumento baseava-se no suposto fato de que a água,
668
sendo um bem econômico, com gestão implementada de modo empresarial e
sustentável economicamente e tendo o mercado como seu provedor, haveria geração
de mecanismos de modernização e eficiência que viriam a beneficiar a sociedade
brasileira. Já no lado da oposição e da Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental
(FNSA), defendia-se que o saneamento básico possuía natureza social, devendo ser
provido pelo poder público, sendo o mais adequado para minimizar este déficit de
acesso e que teria maior garantia de seu acesso universal, proporcionando à vida e
controle social (SOUSA e COSTA, 2011).
O Projeto de Lei 4.147/2001 acabou sendo vetado e a existência de um marco
legal do saneamento básico no Brasil foi postergado por mais seis anos. Baseada no
PL 5.296/06, aprovada e recomendada pelo Conselho das Cidades para o Congresso
Nacional, instaurou-se a Lei nº 11.445, de 5 de Janeiro de 2007, estabelecendo
diretrizes nacionais para o Saneamento Básico, definindo-o como um “conjunto de
serviços públicos, infraestruturas e instalações operacionais de [...] abastecimento de
água potável, [...] esgotamento sanitário, [...] limpeza urbana e manejo de resíduos
sólidos e [...] drenagem e manejo das águas pluviais urbana” (Brasil, 2007, p.1). Uma
conquista importante da Lei é o direito da participação social em todas as etapas,
inclusive no processo de diagnóstico das deficiências sanitárias de seu município,
atingindo sua comunidade e residência, afinal, o saneamento trata-se de um assunto
de saúde pública, logo, a participação é papel de qualquer cidadão e contribui para
melhor efetividade política.
Em 2009, divulgou-se a Resolução Recomendada n° 75 que estabelece
orientações relativas à Política de Saneamento Básico e ao conteúdo mínimo dos
Planos de Saneamento Básico. O Documento define os Planos Municipais de
Saneamento Básico (PMSB) como instrumentos fundamentais para implementação
da política. Em 2010, instaurou-se o Decreto no 7.217, que versa sobre os quatro
eixos do saneamento básico: abastecimento de água, esgotamento sanitário,
drenagem e manejo das águas pluviais, bem como sobre a limpeza urbana e o manejo
de resíduos sólidos. No documento, retomou-se os princípios fundamentais para os
serviços públicos de saneamento básico.
A União compreendeu que precisava ser elaborada uma Política pública para
nortear a gestão dos Resíduos Sólidos no Brasil, e em 2010, foram instauradas a Lei
12.305 e o Decreto 7.404, referentes a institucionalização e regulamentação da
Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Está previsto na PNRS a integralidade
669
com a Política Nacional do Meio Ambiente, a articulação com a Política Nacional de
Educação Ambiental (PNEA), as normas gerais para contratação de consórcios
públicos; e a Política Federal de Saneamento Básico, representadas pelas Leis
9.795/99, 11.107/05 e 11.445/07, respectivamente. Essa política pública de acordo
com Silveira (2019) vem trazer segurança jurídica, através de normas disciplinadoras
para a área de resíduos sólidos, com proteção ao meio ambiente e responsabilidades
compartilhadas.
Em 2012, a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) publicou o “Termo de
Referência para elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico” que teve,
como objetivo principal, auxiliar na elaboração dos PMSBs e aos procedimentos
relativos ao convênio de cooperação técnica e financeira para a referida ação, para
os municípios de até 50.000 habitantes. Esse Termo de Referência, bebe de fontes
documentais importantes, como a Lei no 11.445/07 e do seu Decreto de
Regulamentação no 7.217/10; da Lei no 12.305/10 e do seu Decreto de
Regulamentação no 7.404, de 23 de dezembro de 2010.
Em 2013, através da Resolução 144/2013, a Secretaria Nacional de
Saneamento Ambiental, do Ministério das Cidades, com participação dos Conselhos
Nacionais de Saúde (CNS), Meio Ambiente (Conama), Recursos Hídricos (CNRH) e
das Cidades (Con Cidades), publicou-se o tão aguardado Plano Nacional de
Saneamento Básico (PLANSAB). Com metodologia sistemática para ações voltadas
ao Saneamento, o instrumento estabeleceu objetivos e metas nacionais e
regionalizadas, de curto, médio e longo prazos, representadas pelos anos 2018, 2023
e 2033, respectivamente 5, 10 e 20 anos, para a universalização dos serviços de
saneamento básico e, para isso, apresenta proposição de programas, projetos e
ações para alcance destas metas.
Mesmo com a criação de instrumentos jurídicos para o setor, a realidade
sanitária brasileira continuou frágil. Os municípios não conseguiram elaborar seus
Planos e instituir suas Políticas Municipais de Saneamento Básico. Não seria surpresa
dizer que a imagem positiva da Política de Saneamento Básico foi se enfraquecendo
ao longo dos anos, levando a discussões quanto a insuficiência do Estado brasileiro
no papel de liderança e investimento no setor. Marcado por incertezas, desafios e
controvérsias, os processos que levaram ao novo marco legal do saneamento básico
no Brasil serão discutidos no próximo tópico.
670
4. DESAFIOS E CONTROVÉRSIAS DO NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO
BÁSICO NO BRASIL
Apesar dos avanços da política, o Brasil apresenta ainda grandes carências na
prestação de serviços de abastecimento de água e muito mais na coleta e tratamento
de esgoto, notoriamente, com grandes disparidades regionais, estaduais e municipais,
apresentando uma tradição que tem deixado a prestação desses serviços a
companhias estaduais, mas com outros modelos presentes, tanto das PPPs parcerias público privadas como dos chamados SAAEs Serviços Autónomos de Água
e Esgoto, semelhantes ao que eram os SMAS – Serviços Municipalizados de água e
Saneamento em Portugal.
Dos pouco mais 210 milhões de brasileiros, 16,38% não têm acesso à água da
rede pública, com um agravante, de que a água fornecida não ser de qualidade para
beber; sendo que 46,85% dos brasileiros abastecidos com água não têm acesso a
coleta de esgoto e 53,35% não têm o esgoto tratado (BRASIL, 2019).
O ano de 2018 foi marcado pela primeira tentativa de mudança no marco
regulatório do Saneamento Básico instituído em 2007: a Medida Provisória 844/2018
que visava alterar 42 artigos das Leis 9.984/00, 10.768/03 e 11.445/07, conhecida,
por seus opositores, como a “MP da Sede e da Conta Alta”. A MP acabou perdendo a
validade em novembro do mesmo ano. Porém, no ano seguinte, veio o Projeto de Lei
4.162/2019 que, posteriormente, tornou-se a Lei 14.026/2020.
O projeto foi considerado, para seus apoiadores, como um meio de atingir
aumento de investimentos para o setor, na possibilidade da entrada de recursos do
setor privado, mas, para seus opositores, representava uma marcha à privatização da
água no Brasil. O processo todo foi marcado por polêmicas e controvérsias,
começando pelo fato de que o pico das discussões do PL ocorreu durante a pandemia
da Covid-19, o que serviu de desculpabilização para a não existência de um processo
de consulta pública tanto com as empresas que detêm a concessão dos serviços
públicos de saneamento básico, como organizações da sociedade civil que atuam na
área. O Projeto de Lei 4.162/2019 passou pelo Senado Federal, em caráter de
urgência, considerado como prioridade para o Presidente Jair Bolsonaro.
Na alteração do marco legal, o relator foi o senador “Coca-cola”, assim
chamado senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), relator da proposta, apelidado pelo
Deputado Glauber Braga (PSOL-RJ), devido às suas ligações à iniciativa privada com
671
interesse no setor da água, especificamente, por fazer parte do “Grupo Jereissati” que
comanda a Calila Participações, sendo a única acionista brasileira da Solar, estando
entre as 20 maiores fabricantes de Coca-Cola no mundo. O Senador Cid Gomes
(PDT-CE) considerava que a proposta tinha caráter utópico, pois, segundo ele, na
prática, as empresas privadas só terão interesse em investir nas grandes cidades,
onde há garantia de lucro (MONITOR MERCANTIL, 2020).
O processo é controverso e ainda será necessário aguardar os efeitos da
implementação para saber, de forma mais ampla, seus efeitos. Apesar dos embates
entre apoiadores e opositores, a Lei 14.026/2020 foi instituída. Porém, um fato que
gerou crise foram os 12 artigos da Lei, vetados pelo presidente Jair Bolsonaro,
considerados vitais pelos opositores da proposta. O mais polêmico de todos foi do
Artigo 16, fruto de acordo do Congresso e governadores, que permitia a renovação de
contratos de programa sem licitação até 31 de março de 2022, com prazo máximo de
vigência de 30 anos. O governo federal argumentou que o artigo limitava a livre
iniciativa e a livre concorrência, estando em “descompasso com os objetivos do novo
marco legal” (AGÊNCIA SENADO, 2020).
Na sequência, 16 governadores enviaram uma carta para o Presidente Jair
Bolsonaro, pedindo para que o artigo fosse mantido e Partidos contrários (PCdoB,
PSOL, PSB e PT) entraram com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade com
Medida Cautelar para travar o veto, mas, em nenhum dos casos, houve sucesso.
Porém, o veto presidencial não incomodou só a oposição, o senador Tasso Jereissati
afirmou que esperava no máximo três vetos, já o senador Otto Alencar (PSD-BA)
mostrou preocupação ao considerar que os vetos põem em risco a segurança jurídica
dos contratos em vigência (ONDAS, 2020).
Entre os grandes efeitos do novo marco destaca-se: a eliminação da
exclusividade das companhias públicas, tornando obrigatório a abertura de licitação,
onde os contratos que entrarem em vigor entrarão na categoria de concessão, no caso
de empresas privadas que assumirem a prestação de serviços. Para a área de
resíduos sólidos, a Lei prorroga o prazo do fim dos lixões para 31 de dezembro de
2020, com exceção de municípios que possuam Plano Municipal de Gestão Integrada
de Resíduos Sólidos (PMGIRS) ou Plano Intermunicipal de Resíduos Sólidos (PIRS)
que variam de agosto de 2021 a agosto de 2024. Voltado à universalização do acesso
à água potável e esgotamento sanitário, a Lei 14.026/2020 prevê, até o fim de 2033,
cobertura de 99% de água potável e 90% de coleta e tratamento de esgoto e, para
672
que isso ocorra, o governo Bolsonaro espera de R$ 500 a R$ 700 bilhões em
investimentos ao longo dos próximos anos (VALOR, 2020).
Entre os pontos focados, destacamos, a justiça socioambiental como justiça
distributiva em defesa da vulnerabilidade das populações pobres e as diferenças entre
serviço público e atividade econômica e os riscos de danos aos princípios da
universalização e da modicidade tarifária. Também os sindicatos têm manifestado a
sua oposição. Considerando alguns dos seus representantes que “excluir as
empresas e as associações de estados e municípios não é a solução para a
universalização de água e esgotos a preços compatíveis com as diferentes condições
regionais e sociais da população brasileira” e que a nova lei não é nada mais que “um
negócio lucrativo”, sem qualquer interesse em resolver o problema dos esgotos das
periferias (POLLACHI, 2020).
No tocante à regulação dos serviços de saneamento básico o novo marco legal
atribui a Agência Nacional de Águas (ANA), as competências para instituir normas de
referências para esse fim, estabelecendo padrões de qualidade e de eficiência na
prestação desses serviços, bem como, versar sobre a regulação tarifária, padronizar
contratos e instituir metas para a universalização dos serviços de saneamento básico,
dentre outras competências, passando a ser chamada de Agência Nacional de Águas
e Saneamento Básico. (Ribeiro e Cukiert, 2020).
Entre outros segmentos da sociedade brasileira que se pronunciaram
contrários, destacam-se a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental
(ABES) e a Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento
(ASSEMAE). A ABES (ROGERS, 2020) manifestou em comunicado “enorme
estranheza o veto ao Artigo 16 do projeto de lei aprovado na Câmara e no Senado”,
salientando que os pontos integrantes “foram exaustivamente discutidos por anos, e
foram determinantes para que o projeto de lei pudesse avançar no legislativo, fruto de
um acordo político em torno do tema, que incluiu os governadores de Estado”.
Compreendendo que não está em causa apenas o processo de construção de
consensos, mas a enorme insegurança jurídica, que poderá ocasionar a judicialização
de todo o processo, provocando a paralisia do setor, o que se torna mais grave ainda
num contexto de crise sanitária. A ASSEMAE (2020) pronunciou-se através de um
artigo do Diretor de Assuntos Jurídicos (Pinheiro, 2020), questionando o momento e
a forma como a nova legislação foi aprovada, que acabando por mitigar a participação,
dado o contexto de pandemia, considerando igualmente que o país tem outras
673
prioridades que não a privatização do setor. Pinheiro (2020) critica o fato de o país
“conceder à iniciativa privada o filé do saneamento básico, sendo que a carne de
pescoço continuará nas costas do Estado (gênero) já pesado e endividado”, o que vai
na contramão de várias cidades do mundo que reestatizaram os serviços.
Apesar dos avanços rápidos no processo este é ainda uma incógnita. Foi
grande a euforia com a licitação, em 30 de setembro de 2020, dos serviços de
abastecimento de água e de esgotamento sanitário da Região Metropolitana de
Maceió, estado de Alagoas, com a venda da CASAL à empresa BRK Ambiental, do
grupo canadense Brookfield. Porém, outras empresas podem ver os seus leilões sem
interessados pelo fato de não se revelarem rentáveis. Os dados ainda são escassos,
mas tem sido revelado um aumento dos pedidos de esclarecimento por parte das
empresas interessadas na privatização, havendo dificuldade de resposta e divulgação
pública do desenvolvimento do processo. O que se sabe é que várias companhias
estatais tiveram editais de licitação marcados para o último trimestre de 2020, primeiro
e segundo semestre de 2021.
O primeiro grande efeito pós-aprovação do novo marco do saneamento foi o
leilão para a venda da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro
(CEDAE), realizado no final de abril de 2021 e que tem sido apresentada como a jóia
da coroa por ser a primeira de uma série de possíveis privatizações de empresas
públicas estaduais de água e esgoto no Brasil. No total, a concessão da CEDAE
abarca 70% da população do estado, algo próximo de 11 milhões de habitantes. As
empresas que se candidataram ao leilão assumiram a responsabilidade de ampliar a
taxa de cobertura de água e esgoto de 87% para 99% e 68% para 90%,
respectivamente, com investimento de 30 bilhões de reais nos próximos 35 anos de
contrato de concessão (BEZERRA; PEREIRA, 2021).
O edital do leilão sofreu diversos questionamentos e pedidos para que fosse
reavaliado antes de iniciar o processo. A Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ, 2021,
p. 21) emitiu uma Nota Técnica, recomendando a ampliação do prazo de consulta
pública para que houvesse participação da população e instituições acadêmicas e de
pesquisa do Rio de Janeiro e, caso isso não ocorresse, o estado passará os próximos
35 anos de concessão ao setor privado com “indefinições institucionais, jurídicas,
técnicas, econômicas e financeiras, com potenciais de impactos socioambientais, em
especial à saúde pública e aos direitos humanos”. Volschan Jr. e Figueiredo (2021),
membros do Departamento de Recursos Hídricos e Meio Ambiente da Universidade
674
Federal do Rio de Janeiro, também apontaram questionamentos do ponto de vista da
Engenharia Sanitária e Ambiental.
O Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) aprovou uma auditoria para analisar
os pontos de: adesão de novos municípios; qualificação técnica exigida para a
licitação; exclusão de áreas irregulares; a viabilidade de preço, em especial, a
incerteza regulatória quanto às regras para cobrança de tarifa de esgoto, e do volume
da água a ser fornecida pela CEDAE; a necessidade de vinculação em edital dos
valores mínimos de investimentos; e o prazo para atingir as metas de saneamento e
realização de obras em cada município (VALOR, 2021). A Assembleia Legislativa do
Estado do Rio de Janeiro (ALERJ) chegou a aprovar o Projeto de Lei Complementar
57/2021 que suspendia o leilão e, no dia 19 de abril, 142 instituições, entre elas,
representantes da Defensoria Pública do estado, Instituto Rio Metrópole, Fiocruz,
UFRJ, Observatório dos Direitos à Água e ao Saneamento (ONDAS) e sindicatos do
CEDAE e outras instituições, enviaram uma carta à ALERJ, solicitando a realização
de uma audiência pública em caráter de urgência para tratar do assunto. Apesar das
tentativas, o governador Cláudio Castro manteve a continuidade do Leilão.
Como resultado, o leilão obteve faturamento de R$ 18,2 bilhões, não sendo
capaz de reembolsar à União o empréstimo feito no BNP Paribas, que venceu no final
de 2020, sendo quitado pelo governo federal. Recentemente, a Advocacia-Geral da
União (AGU) entrou com um recurso para derrubar a liminar do STF que impede a
cobrança da dívida de R$ 4,3 bilhões, porém ainda aguarda julgamento (TOMAZELLI,
2021).
Além deste fato, dos quatro blocos da CEDAE que estavam à venda neste
leilão, o bloco 3 recebeu apenas uma proposta que, posteriormente, foi retirada, sendo
esta a região que mais necessita de investimento e dá menos lucro, formada pelos
bairros de Bangu, Campo Grande e Santa Cruz e os municípios vizinhos de Itaguaí e
Seropédica (MIRANDA, 2021). Para o Sindicato dos Trabalhadores nas empresas de
Saneamento Básico e Meio Ambiente do Rio de Janeiro e Região (Sintsama-RJ) e o
ex-presidente da CEDAE Wagner Victer, o modelo de gestão trará aumento das tarifas
de água e esgoto, aumentando o preço do metro cúbico de água de R$ 1,70 a R$
2,30, para que seja possível garantir a saúde financeira da empresa. Victer afirma que
esta alta das tarifas ocorrerá pelo fato de que as concessionárias privadas perderão a
imunidade tributária federal disponível se não fizerem isso (THUSWOHL, 2021).
675
Já Edson Gonçalves, professor e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas
(FGV), diferente do que consideram os opositores, o leilão foi um sucesso por ter
conseguido atrair empresas experientes em investimento em saneamento, além de
que os editais das concessões trouxeram metas possíveis de serem executadas. Para
Gonçalves, este processo vai ser importante para CEDAE, pois a empresa terá que
se adaptar às mudanças, considerando que os editais exigem que a prestação de
serviços seja de qualidade (MAGALHÃES, 2021). O Ministro da Economia Paulo
Guedes e o Presidente Jair Bolsonaro pediram confiança dos investidores e
garantiram que haverá mudanças positivas para o setor de água e esgoto no Brasil.
Guedes considerou que o leilão representa “o maior projeto de saneamento, ambiental
e de saúde pública do país”, apesar de ter ignorado, em seu discurso, que a área que
mais necessita de investimento, o bloco 3, ficou sem comprador (GOVERNO
FEDERAL, 2021).
Atualmente, a União atua em três frentes principais. A primeira refere-se às
gestões regionais de água e esgotamento sanitário, as quais em algumas regiões no
país estão em fase inicial. A segunda concerne nos próximos leilões que, segundo o
BNDES, estão previstos nos estados do Amapá, Porto Alegre e Rio Grande do Sul,
com estimativa de investimento 3, 2,17 e 3 bilhões de reais, respectivamente, no
segundo semestre de 2021. Para 2022, os estados de Alagoas e Ceará já se
mostraram interessados, enquanto Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco e Rondônia
encontram-se em fase de estudo e/ou negociações (PEREIRA, 2021).
A terceira tem a ver com os próximos investimentos no setor que, segundo o
secretário especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da
Economia, Diogo Mac Cord, possuirão três fases. A primeira fase é a que ocorre na
atual conjuntura, com abertura de novos leilões, gestões regionalizadas e
chamamentos para investimento do setor privado no saneamento básico. A segunda
fase será em 2022, prazo final para companhias estatais comprovarem sua
capacidade de investimento para garantir a universalização de acesso aos serviços.
Por fim, a terceira fase, segundo Mac Cord, ocorrerá em 2028, quando as empresas
estatais perderem suas concessões, havendo uma abertura, praticamente, total para
a desestatização (ONDAS, 2021).
676
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No processo de implementação do novo marco regulatório do saneamento
básico no Brasil, pode-se dizer que existem dois grupos principais: os que são contra
e os que são a favor da proposta.
Àqueles que são a favor, afirmam que haverá atração de investimentos para o
serviço, concretização da universalização dos serviços de água e esgoto e defendem
o fato de que o setor privado seria, supostamente, mais eficiente. Já os que se
colocam contra a Lei, afirmam que haverá aumento do preço dos serviços; que o lucro
das companhias privadas estará acima da qualidade dos serviços; o fim do subsídio
cruzado, necessário para garantir a prestação dos serviços de águas e esgoto para
os municípios deficitários; Desfavorecimento das comunidades mais vulneráveis e
afastadas dos centros urbanos; e Desestruturação das companhias estaduais e,
eventualmente, dos serviços municipais.
Independentemente destes dois grupos em questão, o processo tem trazido
conflitos e incertezas. Além disso, tem ido de encontro ao processo de
remunicipalização destes serviços de saneamento básico ao redor do mundo.
Observa-se um risco de aumento das desigualdades no Brasil quanto ao acesso ao
serviço, o risco de privatização de aquíferos subterrâneos e aumento das tarifas dos
serviços. Além disso, observa-se a possibilidade do fim do subsídio cruzado, onde
municípios deficitários podem sofrer por falta de abastecimento.
A maior contribuição que o novo marco legal do saneamento tem o dever de
trazer para a população brasileira é a universalização dos serviços. Isto se traduz em
distribuir água em quantidade e qualidade para todos e coletar e tratar o esgoto,
contribuindo para uma melhor qualidade de vida, a um preço justo. Fato que ainda
aguardamos para ver e, para que isso seja de fato concretizado, as áreas mais
vulneráveis precisam receber assistência e investimento no setor, o que não
aconteceu no caso da joia da coroa do Ministro da Economia Paulo Guedes.
677
REFERÊNCIAS
AGÊNCIA SENADO. Publicados 12 vetos ao Marco Legal do Saneamento. Agência
Senado, p. 1-2, 16 jul. 2020.
AGUDO, P. A. Typology and roots of conflicts over water in the world. In:
Jaume Declòs (coord.). Water, a right, not a commodity. Civil Society proposals for a
public model of water services. Engineering without Borders. Calatunha, 2010, pp.936.
AGUDO, P. A. Lo público y lo privado en la gestión del agua. In: VIII Congresso
Ibérico de Gestão e Planeamento da Água. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian,
5-7 de Dezembro de 2013. Fundação Nova Cultura da Água. Saragoça.
BEZERRA , M. D.; PEREIRA, G. T. Saneamento: o Rio de Janeiro decola e a Bahia
deve pegar carona. Portal Saneamento Básico, p. 1-1, 2 jun. 2020.
BORELLI, Raul Felipe. Aspectos jurídicos da gestão compartilhada dos serviços
públicos de saneamento básico. 2010. 266 p. Dissertação (Mestrado em Direito) Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil.
1988.
BRASIL. Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007. Estabelece as diretrizes nacionais
para o saneamento básico; cria o Comitê Interministerial de Saneamento Básico;
altera as Leis nos 6.766, de 19 de dezembro de 1979, 8.666, de 21 de junho de
1993, e 8.987, de 13 de fevereiro de 1995; e revoga a Lei nº 6.528, de 11 de maio de
1978. (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020). 5 jan. 2007.
BRASIL. Resolução Recomendada nº 75, de 2 de julho de 2009. Estabelece
orientações relativas à Política de Saneamento Básico e ao conteúdo mínimo dos
Planos de Saneamento Básico. 2 jul. 2009.
BRASIL. Decreto nº 7217, de 21 de junho de 2010. Regulamenta a Lei no 11.445,
de 5 de janeiro de 2007, que estabelece diretrizes nacionais para o saneamento
básico, e dá outras providências. 21 jun. 2010.
BRASIL. Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de
Resíduos Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras
providências. Brasília. 3 de agosto de 2010.
BRASIL. Decreto nº 7404, de 23 de dezembro de 2010. Regulamenta a Lei no
12.305, de 2 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos,
cria o Comitê Interministerial da Política Nacional de Resíduos Sólidos e o Comitê
Orientador para a Implantação dos Sistemas de Logística Reversa, e dá outras
providências. 23 dez. 2010.
BRASIL. FUNASA – Fundação Nacional de Saúde. Termo de Referência para
Elaboração de Planos Municipais de Saneamento Básico. Procedimentos
678
relativos ao convênio de cooperação técnica e financeira da Fundação Nacional de
Saúde – Funasa/MS. Brasília, 68p, 2012.
BRASIL. Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental. Plano Nacional de
Saneamento Básico - PLANSAB -. Brasília, 2013. 172 p.
BRASIL. SNIS. Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento: 24º
Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgotos – 2019. Brasília: Ministério do
Desenvolvimento Regional. Secretaria Nacional de Saneamento.
BRASIL. Lei nº 14.026, de 15 de julho de 2020. Atualiza o marco legal do
saneamento básico. 15 jul. 2020.
BRITO, A. L. As tarifas sociais de abastecimento de água e esgotamento sanitário
no Brasil: seus impactos nas metas de universalização na garantia dos direitos
humanos à água e ao esgotamento sanitário. Observatório Nacional dos Direitos
à Água e ao Saneamento – ONDAS. 2020.
BORJA, P. C.; MORAES, L. R. S. Direito humano à água e ao esgotamento
sanitário: breve cenário internacional e nacional, princípios, obrigações e critérios de
positivação. Nota Técnica para o Projeto SanBas da Universidade Federal de Minas
Gerais/Fundação Nacional de Saúde. Observatório Nacional dos Direitos à Água
e ao Saneamento - ONDAS. 2020. BRASIL.
CASTRO, J. E. “Water is not (yet) a commodity: Commodification and
rationalization revisited”. 2013. Volume 2, Issue 1.
CASTRO, J. E. Água e Democracia na América Latina. Campina Grande:
EDUEPB. 2016.
CASTRO, J. E.; Kohan, G.; Poma, A.; Ruggerio, C. (Eds.). Territorialidades del
água Conocimiento y acción para construir el futuro que queremos. Buenos
Aires: Fundación CICCUS e Waterlat-Gobacit. 2019.
FRANCO, V. A. S. Concepciones neoconstitucionales sobre el agua en
Latinoamérica. Alegatos-Revista Jurídica de la Universidad Autónoma
Metropolitana, 2018, v 99. P.287-308.
GARCÍA, V. A.; AGUDO, P. A. . La ideología del agua en España: desmontando el
discurso. Revibec: revista iberoamericana de economía ecológica, 2018, v 28,
37-51.
GARCÍA, T. Alcázar de San Juan recupera la gestión pública del agua tras ocho
años de lucha ciudadana y el respaldo del Supremo: El Pleno de la ciudad
manchega ha respaldado por una amplia mayoría liquidar el contrato con Aqualia,
poniendo fin a la privatización llevada a cabo por el Partido Popular. Periódico CLM,
31 maio 2021.
GOVERNO FEDERAL (Brasil). Ministério da Economia. Leilão dos serviços de água
e esgoto da Cedae atenderá 12 milhões de pessoas no estado do Rio: Concessão
679
dos serviços terá investimentos de R$ 27 bilhões em 35 anos de contrato e gerará
40 mil empregos diretos. Governo do Brasil, 30 abr. 2021.
FIOCRUZ. Análise dos potenciais impactos à saúde e aos direitos humanos
diante do edital de concessão da prestação regionalizada dos serviços
públicos de fornecimento de água e esgotamento sanitário e dos serviços
complementares dos municípios do estado do Rio de Janeiro para o setor
privado. 40 p, 3 ago. 2020.
KISHIMOTO, S.; PETITJEAN, O. (Ed.). La recuperación de los servicios
públicos. Cómo ciudades y ciudadanía están escribiendo el futuro de los
servicios públicos. Ámsterdam e París: Transnational Institute (TNI) e outros. 2017.
LOBINA, E.; KISHIMOTO, S.; PETITJEAN, O. Veio para ficar: A remunicipalização
da água como uma tendência global. STAL/Água de Todos/PSIRU/Multinacionals
Observatory/TNI. 2015.
MAGALHÃES, L. E. Para especialistas, Rio ganhou com concessões da Cedae.
Extra, 1 maio 2021.
MIRANDA, E. Em leilão, empresas rejeitam bloco da Cedae que requer investimento
e dá menos lucro: Região não arrematada abarca os bairros de Bangu, Campo
Grande e Santa Cruz e tem território comandado por milícias. Brasil de Fato, 7 jun.
2021.
MONITOR MERCANTIL. ‘Senador Coca-Cola’ e a privatização da água. Monitor
Mercantil, p. 1-2, 8 maio 2019.
ONDAS. Veto ao artigo 16 pode entrar na pauta do Congresso na próxima semana.
Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento – ONDAS. 14 de
agosto de 2014.
ONDAS, Sancionado o novo marco do saneamento: ameaça ao fim do subsídio
cruzado. Ondas, 17 jun. 2020.
ONDAS. Governo aposta no fim das estatais do saneamento até 2028: é o
descompromisso com a universalização dos serviços. ONDAS, 15 jan. 2021.
ONU. Assembleia Geral das Nações Unidas. Conselho de Direitos Humanos (2020).
Realização progressiva dos direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário.
Relatório do Relator Especial sobre os direitos humanos à água potável e ao
esgotamento sanitário. A/HRC/45/10.
PC do B; PSOL; PSB; PT (2020). ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade Lei
14026.
PEREIRA, R. Após Cedae, BNDES tem na fila mais cinco leilões de saneamento: No
total, são R$ 17 bilhões de investimentos para universalizar e modernizar os
serviços de água e esgoto para 10,4 milhões de pessoas. CNN BRASIL, p. 45-55, 1
maio 2021.
680
PIGEON, M. et al (ed). Remunicipalisation: Putting Water Back into Public
Hands. Amsterdam. Transnational Institute. 2012.
PINHEIRO, D. V. Alteração do marco regulatório do saneamento. Assemae –
Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento. 2020.
POLLACHI, A. Nova lei: o saneamento é somente um negócio lucrativo. Sindicato
dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP). 2020.
RIBEIRO, W. A; CUKIERT, T. ANA propõe agenda que irá determinar regulação no
saneamento. Migalhas. 10/11/2020.
RODRIGUES, A. Gestão hídrica: governança dos bens comuns. São Paulo: Editora
Origem. 2019.
ROGERS, A. P. Posicionamento da ABES sobre a sanção presidencial e a
promulgação da Lei Federal n.º 14.026. ABES, 17 jul. 2020. Disponível em:
http://abes-dn.org.br/?p=36531. Acesso em: 10 ago. 2020.
SOUSA, A. C. A. de; COSTA, N. do R. Ação coletiva e veto em política pública: o
caso do saneamento no Brasil (1998-2002). Ciência & Saúde Coletiva, Rio de
Janeiro, ago. 2011. DOI https://doi.org/10.1590/S1413-81232011000900022.
SILVA, E. Água é direito e não mercadoria. In Marcello Husek Carrion, Marcos
Todt, Simoni Fernandes Medeiros e Thiago Ingrassia Pereira (org.) Em defesa do
bem comum. Porto Alegre: Tomo Editorial, 2018a, p.135-146.
SILVA, E. A. A água e o esgotamento sanitário como direitos humanos
fundamentais. In Daniela Stefano e Maria Luisa Mendonça. Direitos Humanos no
Brasil. Relatório da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos. São Paulo: Outras
Expressões. 2018b. p.233-241.
SILVEIRA, R. M. da C. Os caminhos da inclusão social à luz da política nacional
de resíduos sólidos: um olhar sobre a categoria dos catadores de materiais
reutilizáveis e recicláveis. 2019. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal/RN.
VALDOVINOS, J. The remunicipalization of Parisian water services: new
challenges for local authorities and policy implications. Water International. 2012.
Vol. 37, Nº 2, pp. 107-120.
VALOR. Assemae repudia assinatura de Medida Provisória para o saneamento
brasileiro. Valor Investe, 25 jun. 2020.
VALOR, TCE vê "pontos sensíveis" no edital de concessão da Cedae: Tribunal de
Contas do Rio aprovou a realização de auditoria para acompanhar o processo de
licitação para a concessão dos serviços prestados pela empresa. Valor Econômico,
27 fev. 2021.
VOLSCHAN JR. I.; FIGUEIREDO, I. C. Contribuição ao conteúdo do Edital de
Concessão dos Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário do
Estado do Rio de Janeiro. DRHIMA-UFRJ, 9 jul. 2020.
681
YAMAMOTO, É. A. F. S.; PEREIRA, J. R.; ALCÂNTARA, V. D. C.
Remunicipalização e coprodução do bem público: perspectivas de gestão dos
serviços de água e saneamento. 2020. Cadernos Gestão Pública e Cidadania,
25(81).
THUSWOHL, M. Após a euforia do leilão da Cedae, um choque de realidade:
Sindicatos, gestores e parlamentares avisam que futuro da empresa passa longe
dos alardeados 45 mil empregos e R$ 30 bi em investimentos. Rede Brasil Atual, 9
maio 2021.
TOMAZELLI, I. Rio fica com R$ 18,2 bi do leilão da Cedae e resiste a quitar dívida
com a União. ESTADÃO, 7 jun. 2021.
682
SOBRE O ORGANIZADOR
Edilson Antonio Catapan: Doutor e Mestre em Engenharia da Produção pela
Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC (2005 e 2001), Especialista em
Gestão de Concessionárias de Energia Elétrica pela Universidade Federal do Paraná
- UFPR (1997), Especialista em Engenharia Econômica pela Faculdade de
Administração e Economia - FAE (1987) e Graduado em Administração pela
Universidade Positivo (1984). Foi Executivo de Finanças por 33 anos (1980 a 2013)
da Companhia Paranaense de Energia - COPEL/PR. Atuou como Coordenador do
Curso de Administração da Faculdade da Indústria da Federação das Indústrias do
Paraná - FIEP e Coordenador de Cursos de Pós-Graduação da FIEP. Foi Professor
da UTFPR (CEFET/PR) de 1986 a 1998 e da PUCPR entre 1999 a 2008. Membro do
Conselho Editorial da Revista Espaço e Energia, avaliador de Artigos do Encontro
Nacional de Engenharia de Produção - ENEGEP e do Congresso Nacional de
Excelência em Gestão - CNEG. Também atua como Editor Chefe das seguintes
Revistas Acadêmicas: Brazilian Journal of Development, Brazilian Applied Science
Review e Brazilian Journal of Health Review.
683
684
Agência Brasileira ISBN
ISBN: 978-65-81028-48-0.
685