Arte acessível através de mural tátil para deficientes está em Santos

Pintura no Instituto Braille de Santos possui detalhes em relevo e cores fortes

Por: Juliana Bernardino  -  01/08/23  -  08:52
Pinturas, além de serem em relevo, também contam com cores fortes e figuras em tamanho grande para aqueles com dificuldade em enxergar
Pinturas, além de serem em relevo, também contam com cores fortes e figuras em tamanho grande para aqueles com dificuldade em enxergar   Foto: Alexsander Ferraz/AT

Todos devem ter acesso à cultura e à arte. Com essa premissa, o Instituto Braille de Santos (Rua Júlio Conceição, 246, Encruzilhada) recebeu na última semana um mural de pintura texturizada, que visa a inclusão de pessoas com deficiência visual (PcD) na arte: o Mural Tátil, que possui detalhes em relevo.


Iniciado em março deste ano, ele é colorido e tem imagens simples e claras, que possam ser sentidas e interpretadas facilmente, e ocupa toda a fachada do instituto. A experiência multissensorial teve sua inauguração na última semana.


O artista plástico Yuri Scavinski tomou como referência para a obra o Museu do Prado, em Madri (Espanha), onde aconteceu a primeira exposição para pessoas cegas com reproduzidas de obras famosas com técnica que mesclava pintura e escultura, permitindo que as imagens sejam percebidas por meio de um relevo.


A produtora cultural Marcela Mattos explica que ela e Scavinski – que também é seu companheiro – moram próximo ao Instituto Braille. Eles perceberam um forte fluxo de pessoas com deficiência visual na região, onde também está inserido o Lar das Moças Cegas.


“É um espaço onde a gente acompanha a existência. E o muro já tinha uma pintura anterior, que um outro artista tinha feito, já bem deteriorada. Como o Yuri é artista plástico, a gente sempre olhava aquele muro e ele comentava que ‘precisava pintar esse muro aí. Precisava dar uma vida melhor para esse lugar’”, comenta Marcela.


Desse questionamento, nasceu a ideia de desenvolver um projeto que tem como foco, levar acessibilidade artística para pessoas com deficiência visual. “Pinturas que fossem com formas simples, grandes, cores fortes, para que não só pessoas cegas, mas que pessoas com alguma deficiência visual, que enxergam menos, pudessem enxergar esse desenho”.


Pós-graduada em criação visual e multimídia, Marcela comenta que o impacto da arte na sociedade é um tema complexo. “Acredito muito na arte como uma função questionadora da ordem, de trazer para a reflexão. Apesar de ser um mural de pintura, não trabalha só a pintura, mas busca essa acessibilidade de incluir pessoas que não enxergam. Acho que a partir daí ela provoca uma reflexão, obriga até as pessoas que enxergam a refletir sobre esse lugar das pessoas que não são contempladas com uma arte visual”.


Yuri Scavinski pintou ícones santistas como as muretas e a ciclovia
Yuri Scavinski pintou ícones santistas como as muretas e a ciclovia   Foto: Alexsander Ferraz/AT

Inclusão
Natural de Santos, o artista plástico Yuri Scavinski cita que desenhos e pinturas sempre foram presentes em sua vida. Criado em Cubatão, aos 7 anos venceu um concurso de desenho da escola municipal Usina Henry Borden. “Minha relação com a arte sempre foi intensa desde a infância até hoje, mas ela está no seu momento de mais curiosidade, mais cautela, por um resultado de uma vida inteira dedicada a isso”.


Para o santista, a arte é terapia e uma forma de despertar a criança interior, que é ‘fonte de imaginação’, e que essa é a gratificação de seu trabalho. “Aquela fonte que fornece essa sensação que as pessoas têm de estar envoltas, de estar sendo acolhidas por uma coisa. É a sensação que está na pureza de uma arte muito difícil de você tirar, nos dias de hoje, em um dia a dia corrido, climas de competição, trânsito, barulhada. É difícil você atingir esse ponto. O trabalho foi gratificante nisso”.


Yuri ressalta a importância de dar voz às causas de inclusão. “Não dá pra fechar os olhos para as coisas que estão acontecendo no mundo. E para que aconteça uma melhora nisso, é preciso mais editais, mais investimento e desburocratização desse processo. Tem que ser um processo mais simples, para que a coisa venha acontecer na prática e com mais intensidade”.


Scavinski é formado em design gráfico, e já realizou pinturas ao vivo durante apresentações musicais no Sesc de Santos e outros eventos independentes. É vencedor do Prêmio Célio Nori 2022, com a exposição Vidas Negras que Tocam.


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