Pernambuco perde o talento do ilustrador e cartunista Ral

O meio artístico e cultural pernambucano se entristeceu com a partida do cartunista, chargista e ilustrador Romildo Araújo Lima, mais conhecido como RAL. Ele lutava contra a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), uma doença degenerativa, e faleceu na noite do último domingo (28), aos 71 anos. O artista deixou sua marca atuando nos principais jornais de Pernambuco e se tornando uma referência para muitos dos quadrinistas e ilustradores do estado.

Trajetória

Nascido em Arcoverde, o artista morava no Recife desde 1966. Atuou como ilustrador e chargista na Folha de Pernambuco e no Jornal do Commercio, e teve passagem como editor de arte no Diario de Pernambuco e colaborações com a revista O Pasquim. RAL estudou jornalismo na Unicap, no Recife, e ilustração na Escola Panamericana de Artes, em São Paulo. Foi responsável pelo setor de arte da Prefeitura de Olinda ao longo de 25 anos e do Sindicato de Previdenciários de Pernambuco por 18 anos, com atuação ativa na imprensa sindical.

Comoção no jornalismo e na Cultura

O Sindicato de Jornalistas de Pernambuco divulgou uma nota de pesar pelo falecimento do artista. “RAL lutou como um guerreiro. Graças à solidariedade de muita gente, que lhe ajudou através de uma loja virtual criada em 2022 para vender camisetas e canecas com artes feitas por ele, ele conseguiu arrecadar recursos para seu tratamento. Infelizmente, a doença venceu o talento, a competência e a força de vontade de viver do grande RAL. Siga em paz e na luz! Neste momento de dor e consternação, manifestamos nossas profundas condolências aos seus familiares, amigos e colegas de profissão, desejando-lhes força para superar essa irreparável perda."

“Ral desenhou uma linda história de vida, com talento e leveza, sempre com uma leitura de mundo extremamente aguçada, fazendo a gente refletir enquanto ria com suas tiradas geniais. Ral é exemplo de alguém agregador, que sabia juntar pessoas e virtudes. Simplicidade e sofisticação. Inconformismo e generosidade. Criticidade e bom humor. Esse é Ral. Dele ficam obras, lembranças, lições e um legado que deveremos sempre reverenciar. Porque um mestre assim permanece”, destacou o secretário de Cultura do Recife, Ricardo Mello. 

Arte, política e ativismo

Ao lado de Bione e José Teles, RAL foi um dos fundadores do jornal de humor satírico O Papa-Figo, em agosto de 1984, em plena disputa entre Paulo Maluf e Tancredo Neves na eleição indireta para presidente. No seu currículo também estão anos de colaboração com o jornal O Pasquim, que reunia ideias e pensamentos de esquerda. Por sua atuação, foi homenageado pelo Festival de Internacional de Humor e  Quadrinhos de PE - FIHQ, em 2007.

“No tempo em que eu era só leitor de jornal, cartunistas estavam em alta. Em época de censura braba, ainda se podia protestar contra a ditadura com cartuns e charges. A grande maioria dos desenhistas famosos nessa área do humor publicava em O Pasquim. Daqui do Recife somente um jogava nesse time, Romildo de Araújo Lima, que fez das iniciais seu nome de guerra. RAL. Além de charges, cartuns, ele desenhava quadrinhos, as tirinhas do Boi Misterioso, com personagens do Bumba-meu-boi, foi o mais conhecido”, lembra o jornalista José Teles. “O mundo ficou mais sem graça, mas Ral, pelo menos, parou de sofrer”, escreveu.

Inspiração para novas gerações

João Lin, editor de arte da Folha de Pernambuco, atribui ao cartunista o início de sua carreira em veículos de comunicação. “Foi RAL que me contratou para trabalhar no Diario, meu primeiro emprego como ilustrador. Trabalhamos muitos anos juntos. Eu era muito novo e inseguro, e RAL foi o cara que me deu todo o apoio e deu essa possibilidade de, mesmo sem ter experiência, poder trabalhar na área. A partir disso, fui aprendendo com ele. Muito do meu desenho tem influência de RAL, que tinha um desenho sintético e simples”, conta. 

“A gente trabalhava na arte do Diario e tinha aqueles momentos de tensão, naquela época muito mais, com o jornal impresso. E quando RAL entrava na sala da arte, o clima mudava. Ele realmente era um cara que tinha esse espírito leve. Ele chegava nos lugares e com ele vinha essa sensação de leveza. Isso era unânime. Era um cara sempre assim, quando o mundo estava caindo, RAL estava em uma tranquilidade. Resolvia bem as coisas, sem se estressar”, relembra Lin.

"A gente podia contar com o humor de Ral sempre, mas na hora de cobrar ele sempre cobrava, sabia levar muito à sério o trabalho, era muito exigente com o resultado, mas sempre ensinando com muita paciência", descreve o cartunista Samuca.

Despedida

Ral foi sepultado na tarde de ontem (29), no Cemitério Parque das Flores, no Sancho, Zona Oeste do Recife.

Com informações de Juliana Gomes

Postar um comentário

0 Comentários