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Etarismo é o desrespeito à capacidade de uma pessoa em função da idade. Vamos virar essa chave?

Etarismo é o desrespeito à capacidade de uma pessoa em função da idade. Vamos virar essa chave?

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“Ah, ele era para estar era aposentado”

“Você ainda tem idade para ….?” (estudar, nadar, dançar, viajar, trabalhar…)

“A senhora está muito conservada para sua idade”

“Aquele lugar parece um museu: só tem velho”

Todas essas frases acima escancaram o etarismo, termo que está diretamente relacionado ao desrespeito à capacidade de uma pessoa em função da idade. Na conduta, o agressor julga que a pessoa, em função da idade, não é capaz de tomar decisões, de exercer determinadas profissões ou realizar tarefas cotidianas, como voltar a estudar.

Nos últimos dias, um vídeo viralizou na internet mostrando três estudantes de uma universidade particular de Bauru, interior de São Paulo,  debochando de uma mulher que também estuda na instituição pelo fato de ela ter “40 anos”. A estudante, que na verdade está prestes a completar 45 anos este mês, está no primeiro ano de biomedicina. O fato chamou a atenção em todo o país e levantou uma discussão sobre discriminação e o preconceito relacionados a idade, sobretudo de mulheres.

Ainda que atinja alguns perfis mais do que outros, os dados de um relatório elaborado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que uma a cada duas pessoas no mundo já sofreu situações preconceituosas desse tipo. Algumas atrizes e jornalistas já relataram em entrevista como perdem oportunidades profissionais ou como são alvos de críticas quando assumem cabelos brancos, caso da apresentadora de TV Astrid Fontenelle, que gravou um vídeo nas redes essa semana debatendo o tema.

A defensora pública Sandra Dond é do primeiro concurso para prover cargos de advogados de ofício no Ceará, que aconteceu em 1978, antes mesmo do título Defensoria Pública ser reconhecido. Hoje, aos 72 anos de idade, atua ativamente na 2ª Câmara Criminal.

Ela lembra que, durante o começo da trajetória profissional, aos trinta anos, chegou a passar por uma situação de julgamento por parte dos colegas mais novos. “Em 1983, ingressei na carreira e passou muito tempo sem haver outro concurso. Logo, nos primeiros concursos após o meu, ingressaram pessoas muito jovens. Eles começaram a chamar a turma do primeiro concurso de ‘jurássica’. Quando a gente chegava, eles diziam ‘lá vem as jurássicas’. Ficavam cobrando nossa aposentadoria, acredito que, porque se a gente aposentasse, criaria mais vagas na carreira. Mas, depois que convivemos com essas pessoas mais jovens, esse mal estar passou. Eles passaram, ao contrário, a ter mais carinho e respeito para com a gente”, relata.

O etarismo não é algo que não deva ser considerado uma brincadeira, porque há um componente no agressor que perpetua o preconceito, já que ela se sente ameaçada pela experiência ou que vê no envelhecimento um momento debilitante ou incapacitante. Além disso, a discriminação por idade é a porta para casos de violência física e psicológica.

Com uma população cada vez mais velha e investindo em qualidade de vida, diversos países em todo mundo tem lidado com a produtividade, o vigor e a alegria da Terceira Idade em muitos espaços e profissões. Diversos estudos mostram ainda que mais de 35% da população que trabalha é uma população 50+ e essa população agrega ao mercado de trabalho. Na lista de competências estão comprometimento, inteligência emocional e experiência, atributos que trazem não só a conservação do conhecimento, mas a busca por soluções inovadoras.

A defensora Sandra Dond concorda. Ela confessa que não vê o tempo passar e ainda encontra a mesma força e disposição para exercer sua profissão assim como há 30 anos atrás. “Eu não sinto que tenho 72 anos de idade. Ainda tenho muita garra, muita força de trabalho. Sou daquelas defensoras que vestem a camisa, que briga pelo assistido. Essa semana, inclusive, descobri que em nossa Câmara houve a reforma de uma sentença, onde dois assistidos foram absolvidos e postos em liberdade depois de quatro anos presos. Só que um deles foi solto e outro não. Eu passei dois dias para descobrir onde estava esse rapaz. Só fiquei tranquila no momento em que a unidade prisional deu o cumprimento ao alvará de soltura”, revela.

A supervisora do setor psicossocial da Defensoria, a psicóloga Andreya Arruda destaca sobre a importância da qualidade de vida. “Eu tenho pensado muito na aversão que as pessoas têm sobre o envelhecer, com valorização constante às intervenções estéticas, porque o envelhecimento do corpo assusta muito. Na realidade, só temos duas opções: ou vivemos e envelhecemos ou morremos jovens”, lembra. “Então, nós não precisamos nos preocupar com o envelhecimento e sim com a qualidade de vida. Antes se associava o envelhecimento à sabedoria e ao aprendizado e temos que retomar essa cultura, passar a olhar para nossos idosos, sabendo que eles estarão ativos, com saúde, abrindo novas possibilidades de trabalho e de realização pessoal. Sempre é possível realizar um sonho antigo ou trocar de profissão, em qualquer idade”, pontua Andreya.