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Conhecendo os quadrinhos parte 15: Breve história do quadrinho nacional

Hoje, 30 de janeiro, é dia do quadrinho nacional, então bora conhecer um pouco mais sobre a origem e evolução das HQs no Brasil!

Por: Iuri Biagioni Rodrigues



O Dia do Quadrinho Nacional é comemorado no dia 30 de janeiro. Esta comemoração foi estabelecida, em 1984, pela Associação dos Quadrinhistas e Caricaturistas do Estado de São Paulo (AQC-ESP) que era formada por nomes importantes dos quadrinhos como João Gualberto Costa (mais conhecido como Gual), Jayme Leão, Henfil, entre outros.


A data foi escolhida, pois foi neste dia, em 1869, ou seja, 155 anos atrás, que o italiano radicado no Brasil, Angelo Agostini lançou aquela que é considerada a primeira história em quadrinhos do país: "As Aventuras de Nhô-Quim ou Impressões de uma Viagem à Corte”. A história foi publicada no jornal "Vida Fluminense". 


As Histórias de Nhô-Quim mostravam a vida de um caipira que foi morar no Rio Janeiro e que ficou chocado com o modo de vida das pessoas desta cidade e abordava diferenças da vida no campo para a vida no ambiente urbano. Você pode baixar e ler "As Aventuras de Nhô-Quim ou Impressões de uma Viagem à Corte” no site do Senado Federal clicando aqui  . (A edição em PDF no site do senado também traz as histórias de Zé Caipora, outra obra de Agostini).



Agora, vamos conhecer um pouco mais sobre a evolução da nona arte no Brasil.


Após esse pioneirismo de Agostini no final do século XIX, vemos que é no começo do século XX que os quadrinhos ganham o público através de suplementos de jornais e revistas.


Assim, a primeira revista voltada para HQs do Brasil foi publicada pela O Malho, do jornalista Luiz Bartolomeu de Souza e Silva, em 1905, era O Tico-Tico: o jornal das crianças. Angelo Agostini participou dessa criação e teve sua primeira experiência produzindo histórias para o público infantil.


O Tico-Tico era publicado toda quarta-feira e, inicialmente, possuía uma média de 11 páginas compostas de HQs completas, contos, fábulas, anúncios, etc. Com o passar dos anos, o número de páginas passou por variações e número de quadrinhos publicados foi diminuindo. O pesquisador Moacy Cirne destaca que esta revista era consumida principalmente por pessoas de classe média da época.


Os quadrinhos que saíam pelo O Tico-Tico eram principalmente de humor, porém havia HQs voltadas para o ensino também. Aliás, a revista ressaltava a importância das HQs como instrumento de aprendizagem. Também é válido mencionar que os editores da revista buscavam valorizar a produção nacional de histórias em quadrinhos, então davam espaço para quadrinistas brasileiros. No ano de 1911, O Malho lanço o Almanaque do Tico-Tico, uma publicação de periodicidade anual que continha mais de 100 páginas e que circulou até 1958.


Esta primeira revista também trazia quadrinhos estrangeiros de países como Estados Unidos, França e Inglaterra. Talvez, o caso mais conhecido seja o de Buster Brown e seu cachorro tigre criados pelo estadunidense Richard Outcault. Aqui, os personagens tiveram os nomes adaptados para Chiquinho e Jagunço. A partir de 1914, os personagens foram adaptados ao contexto brasileiro pelo quadrinista Luís Gomes Loureiro. Mesmo após a morte de Outcault, o personagem continuou a ser publicado com as novas características e teve vários quadrinistas à frente dessa produção.


Nas histórias do Chiquinho abrasileirado, surge Benjamin, um dos primeiros personagens nacionais negros, que auxiliou no sucesso destas obras e que acompanhava o protagonista em suas aventuras. O público brasileiro só descobriu que Chiquinho era cópia de um personagem dos EUA no ano de 1955, no aniversário de 50 anos de O Tico-Tico.


Na produção 100% nacional d'O Tico-Tico podemos destacar: Reco-Reco, Balão e Azeitona do cearense Luiz Sá que trazia as histórias de confusões dos três adolescentes do título. A estreia foi em 1931 e esse quadrinho inovou por ter um personagem negro entre os protagonistas. Essas histórias foram publicadas até o início dos anos 1960. Trabalhos do carioca J. Carlos também se destacaram, especialmente, lamparina. O personagem Tinoco, o caçador de feras criado por Théo também marcou os leitores a partir de 1936. O Tico-Tico foi publicado até 1961 e você pode conferir as edições digitalizadas no site da Hemeroteca Digital Brasileira .



Outro importante material no Brasil foi o suplemento Gazetinha surgido em 1929 (que passou a ser Gazeta Infantil em 1948) como parte do jornal paulista Gazeta de Adolfo Campos de Araújo. A Gazetinha era voltada para as crianças e continha textos ilustrados no formato de charge e personagens nacionais e estrangeiros. Ficou em circulação até meados da década de 1950 e segundo Waldomiro Vergueiro e Roberto Elísio dos Santos no artigo A Gazetinha e os suplementos de histórias em quadrinhos no Brasil: "Pode-se considerar a Gazeta Infantil, do jornal paulista A Gazeta, como o ponto inicial e o mais importante dos suplementos de quadrinhos no Brasil".


Dentre as histórias desse suplemento podemos mencionar: Piolin (1929) de Gomez Dias e Nino Borges, Bolinha e Bolonha (1930 - estes personagens passaram para O Tico-Tico em 1938) Jojoca e Rabicó (1930) e Nhô Quim (1948 - sem relação com o personagem de Angelo Agostini) todos de Nino Borges.



Outras HQs de destaque são: Aventuras do Paulino e da Albina e Tutu, Titi e Totó que foram publicadas a partir de 1933 feitas pelo quadrinista Belmonte, cujo o nome real era Benedito Bastos Barreto. Ele também criou os cartuns do personagem Juca Pato para o Jornal Folha da Manhã, atual Folha de São Paulo, no começo dos anos 1920. A Gazetinha também trouxe trabalhos de Messias de Melo como Tutu (1933), Pão-Duro (1934) e, em parceria com o roteirista Armando Brussolo, lançou várias histórias em quadrinhas serializadas de 1936 a 1939 como Capitão Blood, Sherlock Holmes, O Homem Electrico, Conquista das Esmeraldas, entre outras.


Ainda na Gazetinha, a história A Garra Cinzenta de Francisco Armond (roteiro) e Renato de Azevedo Silva (arte) fez muito sucesso e tem grande relevância para a história do quadrinho nacional. A trama era uma mistura do gênero policial com ficção científica e terror e saiu em julho de 1937.


Com o título de Gazeta Juvenil, a publicação era comandada por Jerônimo Monteiro que era roteirista e editor. Nesta fase, havia quadrinhos italianos e nacionais no suplemento.


O periódico feminino Cirandinha que foi publicado entre 1951 e 1958 também contava com histórias em quadrinhos. A equipe de produção era composta por mulheres que atuavam em diferentes funções. Dentre elas, Giselda Melo era a quadrinista.


Agora, deixando os suplementos de lado, vamos focar rapidamente em pessoas pioneiras do quadrinho nacional, pois como destaca Natania Nogueira, os artistas brasileiros tiveram grande importância na construção da identidade dos quadrinhos enquanto cultura material no Brasil. A historiadora também lembra que no século XX surgiram quadrinistas de talento, mas que hoje são desconhecidos do grande público. Assim, sem mais delongas, vamos ver quem são essas pessoas! (além dos que já foram citados acima).


Primeiramente, destaco Patrícia Galvão, mais conhecida como Pagu, que você provavelmente conhece da segunda geração do modernismo atuando como romancista e teatróloga. Ela também destacou-se na áreas do desenho e das histórias em quadrinhos. Deste modo, em 1931, ela produziu um dos primeiros quadrinhos feito por uma mulher no país: as tiras de Malakabeça, Fanika e Kabelluda. Temos conhecimento de apenas 8 tiras.



Entre as temáticas desses trabalhos de Pagu encontravam-se: política, feminismo e modernismo. Nas palavras de Natania Nogueira no artigo  Pagu: política e pioneirismo nas histórias em quadrinhos nos anos de 1930: "Em seus quadrinhos, ela denuncia a violência contra as mulheres de seu tempo. Elas são censuradas, agredidas e submetidas a humilhações quando se comportam fora dos padrões impostos pela sociedade. Kabelluda representa a própria Pagu, que não se submete. Sua tia Fanika é, ao contrário, moralista. Ela não aceita Kabelluda e representa o machismo incutido nas próprias mulheres."


Francisco Acquarone (1898-1954) é outro nome de relevância. Em 1937, ele fez a primeira adaptação para quadrinhos de um conhecido romance. Trata-se de O Guarani de José de Alencar. Outras adaptações feitas por ele nos anos 1930 são Minas de Prata (de José de Alencar), Vida de Circo, com Bandeira Duarte como parceiro, Os Primeiros Homens na Lua (de H.G. Wells) e Atribuições deu um Chinês na China (de Júlio Verne).


Mas não só de adaptações viveu Acquarone. Em 1938, ele lançou João Tymbira em redor do Brasil, que tinha como personagem principal um herói brasileiro esportista e aventureiro. As tramas tinham diversas regiões do país como cenário.


Um personagem de sucesso dos anos 1940 foi O Amigo da Onça, criado pelo artista pernambucano Péricles de Andrade Maranhão e teve suas histórias publicadas pela Revista Cruzeiro.


Outro nome que não pode ficar de fora é o de Jayme Martins Cortez (1926-1987). Ele nasceu em Portugal, mas mudou-se para o Brasil e teve uma vasta produção por aqui. Em nosso país ele começou atuando como chargista. Entre suas HQs temos: Caça ao tubarão (1947), fez sua versão de O Guarani, charges e HQs na Gazeta Juvenil, Zodiako (1976). Cortez também foi um dos fundadores da Editora Continental/Outubro que fazia questão de publicar somente artistas brasileiros.


Alguns nomes que passaram pela Continental (que depois mudou o nome para Outubro e Taika) foram: Rodolfo Zalla, Eugênio Colonnese, Júlio Shimamoto, Flávio Colin, Nico Rosso, entre outros.


Flavio Colin (1930-2002) destacou-se por obras com temas de terror, folclore, cultura popular, eróticos, indígenas e história do Brasil. Júlio Shimamoto (1939-) inovou nas técnicas desenho, criou personagens como Balthar, Fidêncio, o Gaúcho, professor Zoltan, entre outros. Ele também trabalhou com diversos gêneros e está entre os maiores nomes do quadrinho nacional.


Outra mulher que podemos citar é Helena Fonseca que atuou nos anos 1960. Ela escreveu roteiros para a revista do Capitão 7, um dos heróis mais antigos dos quadrinhos brasileiros que surgiu no começo da década de 1950. Helena era bem versátil e produziu HQs de gêneros que as mulheres não tinham muito espaço.


Ela foi uma das principais roteiristas de Targo (versão brasileira do Tarzan) criado por Heli Otávio de Moura Lacerda. No gênero de terror, Helena Fonseca, em parceria com Nico Rosso, criou Naiara, a Filha do Drácula. (Ela já escrevia Drácula). Outros trabalhos são: Almanaque Clássicos de Terror, Almanaque do Drácula e Seleções de Terror. Aliás, a partir da década de 1970, o terror ficou bem popular e foi o gênero onde as mulheres se destacaram. Maria Aparecida Godoy, muito provavelmente a primeira mulher negra a atuar profissionalmente na área da 9ªarte, é outro bom exemplo com histórias de terror que exploravam crendices populares e folclore.


Helena também trabalhou no gênero nordestern (ou gênero cangaço). Ela roteirizou Juvêncio, o justiceiro do Sertão que foi criado pelo jornalista Reinaldo Santos.



Outro gênero de bastante sucesso entre 1950 e 1970 foi o histórico. Assim, havia várias histórias em quadrinhos inspiradas em eventos da História do Brasil. Aqui, o grande nome foi Ivan Watsh Rodrigues. Suas obras mais conhecida são: História do Brasil em Quadrinhos lançada entre 1959 e 1962 e Casa Grande e Senzala (adaptando o livro do sociólogo Gilberto Freire) feita com o roteirista Estevão Pinto.


Os anos 1950/1960 marcaram a estreia de dois gigantes do quadrinho brasileiro: Ziraldo e Mauricio de Sousa. Ziraldo começou em 1954 no jornal Folha da Manhã. Em 1959, ele cria a primeira revista em quadrinhos brasileira feita por um só quadrinista: Turma do Pererê e alcança grande sucesso. Vale destacar que esta também foi a primeira HQ a cores a ser totalmente produzida no Brasil! Mauricio de Sousa, em 1959, cria Bidu e Franjinha. Depois, ao longo dos anos 1960, surgem os famosos e queridos Cebolinha, Horácio, Cascão, Chico Bento, Mônica, Astronauta, Magali, etc. Sua carreira decolou a partir disso.


Para finalizar, é importante lembrar que entre 1964 e 1985, o Brasil vivenciou a Ditadura Civil-Militar, um período de autoritarismo extremo, perseguição, violência política e censura. Nessa época os quadrinhos colaboraram para combater e criticar (direta ou indiretamente) os abusos do governo militar. Entre os quadrinistas que atuaram nesse aspecto temos Ziraldo, Henfil, Laerte, Angeli, Glauco, Ciça e Luiz Gê que faziam diversas críticas sociais em seus trabalhos e Carlos Zéfiro, Cláudio Seto, Paulo Fukue e Fernando Ikoma (seus quadrinhos pornográficos/eróticos desafiam a moral imposta pelos militares).


Ufa! Chegamos ao fim da nossa breve jornada pela história da Nona Arte no Brasil!


A formação do mercado editorial brasileiro e a atuação de Adolfo Aizen ficarão para outra parte desta série. Se quiser conhecer um pouco mais sobre a geração mais atual do quadrinho nacional, leia o especial do Dia do Quadrinho Nacional do ano passado e escute o quinto episódio do nosso Podcast Odisseia do Frango Frito no Spotify! Até a próxima!


Texto produzido com base em Uma Breve História das Histórias em Quadrinhos de Natania Aparecida da Silva Nogueira (material da especialização em quadrinhos da Faculdades EST) e nos artigos citados.













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