Pinturas de Yanaki Herrera retratam grávidas e mulheres andinas

Pinturas de Yanaki Herrera

Dynelle Coelho/divulgação

A artista peruana Yanaki Herrera mostra trabalhos na exposição “Warmi wasi: lutas subjetivas e coletivas”, em cartaz na galeria do BDMG Cultural. Quatro séries discutem a maternidade e sua relação com a ancestralidade andina. Da gravidez ao parto, do puerpério ao primeiro ano do filho, Herrera retrata suas próprias inquietações como mãe solo em território estrangeiro.

Desenhos, pinturas, lambes e videoperformances são o resultado de experimentações realizadas pela artista entre 2018 e 2022. A expressão quéchua warmi wasi significa “casa da mulher”.

Idealizada em 2020, a série “Fora do lar” traz pinturas que remetem à fase inicial da jornada de Yanaki como mãe. “A gravidez coincidiu com o momento da pandemia, então é um retrato da maternidade imigrante, da maternidade solo no meio de uma crise sanitária mundial”, explica a artista.

Com o fechamento das fronteiras, Herrera se viu sozinha na capital mineira. Nascida em Cusco, ela se mudou para o Brasil há oito anos. Embora acolhida por amigos desde a chegada, a imigrante se viu cercada de solidão pela primeira vez.

Grávida, ela fez de “Fora do lar” a representação do momento em que o corpo imigrante também se torna casa. “O corpo da própria mulher e o casulo da criança, mãe e filho”, afirma.
 
Yanaki Herrera aponta pintura com o dedo para o filho ver

Yanaki Herrera com o filho, que nasceu no Brasil

Dynelle Coelho/divulgação
 

A segunda série se inspira nas experimentações de Yanaki no interior de sua própria casa. Formada em artes visuais pela Universidade Federal de Minas Gerais, a peruana era habituada ao espaço de ateliês, por exemplo. Restrita às “fronteiras do lar”, ela criou “Crianças de cartón”, coleção de recortes e pinturas em papel kraft iniciada em 2021 e finalizada em 2022.

Suportes de papelão trazem representações de crianças em processo de crescimento. “Foi a maneira que encontrei de retratar o laço com meu filho, as brincadeiras e nossas trocas, como nos conhecemos e nos entendemos nos momentos lúdicos do dia a dia. Além disso, são as minhas brincadeiras com o papelão, material muito acessível, que trouxe ainda mais diversidade para minha arte”, explica.
 
Desenho mostra menino usando máscara

Máscaras vêm da tradição andina

Dynelle Coelho/divulgação
 

Máscaras andinas

Além das pinturas, a série exibe a coleção de “máscaras encantadas”, que resgatam tradições culturais milenares da Cordilheira dos Andes. “Trago a presença do encanto, que aparece nas máscaras. Elas são inspiradas nas histórias do Peru e da Bolívia, representadas de maneira lúdica nas obras”, diz a artista.

Yanaki conta que desejava compartilhar com o filho as tradições que a cercavam em sua infância.
 
“Parti das cosmovisões andinas e seus preceitos para as pinturas no rosto do meu filho, que está sempre mascarado. Queria representar os seres encantados que acompanham as crianças. Eles são símbolo de proteção e, além disso, da mistura do humano e o animal, relacionando passado com a contemporaneidade”, explica.

A terceira fase, “Wawawasi”, significa casa de criança, em quéchua. “Escolho nomeá-la assim para homenagear a minha família e resgatar a língua materna de Ocobamba, a cidade onde meus familiares moram, no interior do Peru”, comenta.

Aqui, Yanaki Herrera registra quatro fases da maternidade vivenciadas por ela, buscando unificar sua história com a de seus antepassados. Criada em 2022, a série busca representar “a maternidade não romantizada”, diz.

“Desejei transgredir o lugar sacro ao qual a mulher, a feminilidade e a maternidade estão atreladas”, afirma. “Eu me aproprio desse espaço para contar a minha história a partir da minha própria narrativa.”

Mães lutadoras

A última série “Madres que lucham” remete a lutas lideradas por mães na América Latina. Desejo, tabus, repressões e liberdade são abordados nos lambes (cartazes) que cobrem inteiramente duas paredes da galeria. 

“Me inspiro muito nas mulheres zapatistas do México e nas mulheres do MST”, afirma a artista. “São pinturas e desenhos digitais que fogem da representação santificada da grávida. Trago as lutas subjetivas da vida de cada uma, o que nos unifica como coletividade”, diz. É viver a vida além da maternidade, explica.

“Tocar nesse assunto mexe muito comigo, principalmente quando há trocas com outras mulheres mães, amigas, da família e na minha arte também. Entendi a importância de ter pessoas e lugares que nos acolhem no momento em que falamos sobre nossos próprios desejos”, diz Yanaki Herrera.

YANAKI HERRERA

Várias linguagens. Exposição “Warmi Wasi: lutas subjetivas e coletivas”. Galeria do BDMG Cultural (Rua Bernardo Guimarães, 1.600, Lourdes). Funciona diariamente, das 10h às 18h. Em cartaz até 9 de julho. Entrada franca.
 
* Estagiária sob supervisão da editora-assistente Ângela Faria