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Cobertura da visita de Neil Gaiman ao Brasil

Cobertura da visita de Neil Gaiman ao Brasil

25.05.2001, às 00H00.
Atualizada em 13.11.2016, ÀS 04H18

O escritor britânico Neil Gaiman esteve no Brasil a convite da Editora Conrad para lançar Sandman - Os caçadores de Sonhos e a coletânea de contos, O livro dos Sonhos, editada por ele. Foram cinco dias intensos. Cheios de compromissos. Gaiman participou de bate-papos na internet, entrevistas para TV e deu muuuuuitos autógrafos. Os omeleteiros de plantão conseguiram descobrir alguns planos que o pai de Morpheus e Morte está tramando.

E mais: Jotapê Martins, Érico Borgo e Marcelo Forlani, chefs de cuisinne do Omelete, conversaram com Gaiman e aproveitaram para presenteá-lo em nome de todos os usuários e colaboradores do Omelete. O pai de Sandman recebeu um livro com imagens belíssimas sobre o Brasil e a escultura em cerâmica Andarilho da artista plástica Enery Pietro. Gaiman agradeceu a todos os usuários do Omelete pelo presente e ficou bastante empolgado com o livro, que mostrou a ele o quanto de Brasil ainda há para se conhecer.


Gaiman desembrulha a escultura

Confira o dossiê da segunda viagem de Gaiman ao país.

Em passagem pela Bienal do Livro do Rio de Janeiro, Gaiman deu uma entrevista coletiva que foi muito mais como um bate-papo entre amigos. Para quem pensa que Mr. Gaiman é uma estrela, muito se engana. Ele se mostrou muito educado e gentil com os jornalistas presentes, mesmo depois de nove horas de vôo. Pediu desculpas pelo atraso de mais de uma hora e retirou os óculos escuros, revelando um olhar profundo e ao mesmo tempo amigável e gentil. Está sempre vestindo o tradicional preto e, para isso, tem uma explicação bastante simples: Não tem muito gosto para escolher o que combina com o quê, portanto, prefere usar algo que seja uniforme. Confira o que esse excepcional escritor falou sobre Sandman, novos projetos, cinema e muito mais.

Em São Paulo, dois dias depois, Gaiman foi à America Online para um bate-papo com os internautas. Logo após o chat, ele concedeu uma entrevista exclusiva ao omeleteiro Marcelo Forlani. Usando a mesma roupa negra, ele falou sobre seus novos projetos, a parceria com Dave McKean a alegria de rever os fãs brasileiros e o trânsito de São Paulo, segundo ele, nosso único problema... mal sabe ele :(

Nós juntamos tudo o que ele falou de mais legal (ou seja, TUDO!) e colocamos aqui para você ver. Divirta-se!

Caçadores de Sonhos

A história da publicação de Caçadores de Sonhos começou quando Jenny Lee, editora de Sandman, foi a uma exposição de Yoshitaka Amano e se apaixonou pelo trabalho do ilustrador japonês. No décimo aniversário de Sandman, Amano foi convidado para fazer um pôster, que Gaiman viu e se encantou.

Ao encarar o trabalho de Amano, Gaiman teve a sensação de que aquilo era exatamente o que queria para uma nova abordagem do personagem. Outro fator que contribuiu na decisão de escrever o livro é que nunca havia escrito nada sobre um Sandman japonês. O trabalho com Amano seria como inventar um conto de fadas oriental, o que se logo se transformou em uma adorável idéia.

Originalmente, o livro seria uma história em quadrinhos, mas como Amano disse que não faria uma HQ, Gaiman propôs então que se fizesse um livro ilustrado, idéia que agradou o ilustrador.

No projeto original, o álbum era bem mais fino que a versão publicada. Porém Amano, habituado aos editores japoneses, envia sempre o dobro de peças que lhe é requisitado. Como todas acabaram encantando tanto Gaiman quanto os editores da DC, a solução foi aumentar o tamanho da publicação.

O sucesso foi tamanho que o autor de Sandman quer trabalhar com o ilustrador japonês de novo. Mas desta vez, gostaria de realizar uma história de Batman. Segundo o escritor, o homem-morcego é um personagem extremamente maleável, pois está na estrada há mais de 50 anos. O projeto é viável pois, doze anos atrás, ele assinou um contrato com a DC Comics para escrever uma história do cavaleiro das trevas que seria ilustrada por Simon Bisley, nunca realizada.

A vontade de escrever uma HQ para Batman existe desde a época em que começou a roteirizar. Gaiman acredita que existem provavelmente algo em torno de 3000 histórias ruins do homem-morcego e apenas umas 300 boas.

Quadrinhos na internet

Gaiman acredita que os quadrinhos na internet funcionarão somente quando as pessoas deixarem de receber a mensagem na tela de que a página está sendo carregada.

Toda a graça do quadrinho é o imediatismo. É a coisa de alguém conseguir um quadrinho para você poder sentar e ler, afirmou. Segundo o autor, ninguém tem tempo de ficar duas horas apenas esperando o download de uma página.

Sobre magia e sonhos

Algumas pessoas se perguntam se Gaiman é um mago...

Sobre isso, o britânico diz apenas acreditar naquilo em que precisa para que a história funcione. Se ele precisar acreditar em magia e fantasmas, ele assim o fará. Se ele precisar imaginar um mundo sem magia, assim será. Para ele, um dos motivos gloriosos em ser um escritor é que ele acredita naquilo em que precisa.

Quando começou a escrever Sandman, o ator procurou ler os livros que os cientistas que estudavam sonhos haviam escrito. Gaiman leu uma obra de um psiquiatra que dizia que as pessoas sonham em preto e branco e que quando acordam, lembram-se do sonho colorido. Outro dizia que os sonhos são coloridos mas, que não há som e que quando as pessoas acordam, elas se lembram dos sons. Eram tantas teorias que desistiu dos livros sobre o assunto.

Ele se surpreende com o fato de as pessoas sonharem com algo que ainda vai lhes acontecer. Como um desenhista que ilustrou um sonho, uma batida de ônibus, que aconteceu alguns meses depois. Não acredita que as coisas que sonha têm significado mas, se lembra de ter sonhado com um discurso antes dele acontecer. Um dos sonhos que ele recorda é de uma pintura de Picasso em que havia macarrões assassinos e que o macarrão gostaria de matá-lo! :-)

Para escrever Sandman, resolveu então abandonar a pesquisa científica e seguir seus instintos.

Filmes e uma situação embaraçosa

Gaiman afirma não ter nada a ver com o filme The Sandman (Nota do Editor: filme de 1996 que se aproveitou do sucesso do personagem). Ele conta que tudo começou em 1991, quando empresários de Hollywood vinham até ele oferecendo rios de dinheiro para que ele declarasse que o filme era bom e que seu nome aparecesse nos créditos. Recusou e disse: Vão em frente! Apenas tentem não estragar demais!

No caso de um filme sobre o Senhor dos Sonhos, Gaiman sente que não interessaria aos produtores o projeto que ele gostaria de fazer. Segundo o escritor, filmes devem simplesmente acontecer. Como o filme da Morte, que está escrevendo e pode até dirigir. Death - A High Cost of Living, título provisório, já tem um primeiro rascunho pronto e que deixou o autor muito satisfeito. Ele disse que sabia o que tinha nas mãos e que estava muito ansioso para começar a fazer a segunda versão.

Gaiman considera que a história da irmã mais velha dos Perpétuos dará um ótimo filme. Para ele, o divertido é pegar algo pequeno e transformar em algo grandioso. Outra razão que lhe dá prazer na produção é que se trata de um filme com baixo orçamento, apenas dez milhões de dólares (padrões hollywoodianos, vale lembrar).

Gaiman evita dizer qual atriz gostaria que estivesse no filme porque o mundo ficou muito pequeno, graças à Internet. Suas declarações logo apareceriam em sites pelo mundo afora. Com isso, ele ligaria para os agentes das atrizes que havia mencionado e receberia respostas do tipo: Eu sei que você a quer! Agora, cobraremos o dobro. Portanto, os fãs terão que esperar mais um pouco para descobrir quem é a escolha dos produtores.

Quando perguntado sobre a adaptação da Trilogia do Anel para o cinema, Gaiman revelou uma história embaraçosa de sua puberdade. A biblioteca da sua escola tinha uns dois volumes do Senhor dos Anéis, de J.R.R.Tolkien. Então, o jovem Gaiman roubou uma delas para que pudesse ler e reler os livros quantas vezes quisesse.

Obviamente, ele espera que o filme seja muito bom!

Sandman faz diferença

Gaiman não concorda quando dizerm que Sandman foi uma revolução no mundo dos quadrinhos, apenas uma chacoalhada. Porém, ele acha que algumas coisas mudaram desde então.

Antes de Sandman era impossível o personagem principal não estar na capa e esta foi a maior briga que ele teve com a DC Comics.

Outra grande batalha com a editora foi sobre a idéia de fazer uma história com começo, meio e fim. Sandman inovou e abriu caminho para que outros autores pudessem fazer o mesmo. A DC sabia também que não adiantava brigar pela continuidade de Sandman porque só Gaiman poderia fazê-lo. Se outra pessoa escrevesse o título, não venderia.

Quando perguntam a Gaiman porque ele não está trabalhando com quadrinhos, ele lembra que durante dez anos de sua vida se dedicou exclusivamente às HQs. Nesta época, teve que deixar de lado muitos projetos em que gostaria de trabalhar. E é nisso que ele está se focalizando agora. Por isso, vai se dedicar ao lançamento do livro American Gods e em outros projetos que não lhe tomem 100% do tempo livre.

Seu trabalho continua vivo, mesmo 14 anos após a primeira edição ter sido publicada. Gaiman lembra que as edições encadernadas de Sandman continuam vendendo, tanto quanto antes. E que grande parte das pessoas que compram são leitores novatos, então ele acha que continua contribuindo para o crescimento do mercado.

Apesar do fim da série, ele quer agora escrever sobre Os Pérpetuos. Seria um livro como Os caçadores de sonhos. A presença do Sandman-branco não foi confirmada pelo autor. Mas ele adiantou que seu novo projeto deve contar com desenhistas do mundo inteiro que não fossem norte-americanos. É onde eu quero estar. Trabalhando com arte... com artistas! declarou. Gaiman afirmou também não ter preferências por ilustradores no projeto, no entanto, gostaria de fazer algo com Moebius.

Outro desenhista com o qual ele teria grande prazer em trabalhar é Milo Manara. Entretanto não sabe se Manara aceitaria e se a DC Comics publicaria uma história desenhada por ele. Desejo seria a personagem perfeita para Manara e vice-versa.

Televisão e American Gods

Após desenvolver Neverwhere, uma mini-série para a televisão britânica, o escritor expressou vontade de criar um roteiro para a Arquivo X. Só não o fez porque Chris Carter, autor da série, ainda não o chamou.

Diz ter sentido enorme prazer quando Joe Straczynski, o criador de Babylon 5, o convidou para fazer um episódio da série. Nasceu assim Dia dos Mortos - episódio em que retrata o dia das bruxas alienígena, exibido nos Estados Unidos em 3 de novembro de 1998.

Entretanto, em nenhum desses projetos Gaiman sentiu que tivesse escrito algo do mesmo nível de Sandman. Até agora.

American Gods (livro que será lançado em junho no Estados Unidos) é o primeiro trabalho com o qual Gaiman se sente plenamente satisfeito desde a saga do senhor dos sonhos. Ele considera American Gods seu primeiro romance, embora seja o quarto com o seu nome impresso (os outros são 1. Belas Maldições - que escreveu junto com Terry Pratchett; 2. Neverwhere - baseado na série de TV que fez para a BBC; 3.Stardust - escrito em episódios para Charles Vess ilustrar).

A alegria do escritor por ter realizado a obra reside no fato de que o livro jamais funcionaria como uma HQ, o que prova que conseguiu crescer como escritor. Para fazer este livro, Gaiman trabalhou incessantemente por dois anos. Chegou a se isolar na Flórida, numa época que só parava de escrever para comer e dormir.

Para divulgar o lançamento, Gaiman vai fazer uma turnê por todos os Estados Unidos com sessões de autógrafos e leitura. Era de arrepiar ver os olhos verdes de Neil Gaiman brilharem quando falava de sua nova cria.

Influências

Gaiman tem em Will Eisner umas das maiores influências de seu trabalho.

Durante sua infância e adolescência, Gaiman lia qualquer gibi que lhe caísse nas mãos. Aos 16 anos parou com a leitura de HQs, mas não parou com Eisner. No dia em que resolveu que iria trabalhar como escritor de quadrinhos, comprou Quadrinhos e Arte Sequencial, que é um dos únicos três livros que recomenda.

Os outros são Understanding Comics, de Scott McCloud, e Graphic Storytelling, também de Eisner. Gaiman considera Will Eisner um gênio por ter criado muito do que há de melhor nos quadrinhos e acredita ser uma honra poder viver na mesma época do escritor.

Dupla Gaiman X Mckean

Dando continuidade a uma das parcerias mais tradicionais e duradoras dos quadrinhos americanos, Gaiman tem três projetos com Dave McKean em andamento. Um livro infantil, chamado The Wolves in the Walls e uma outra publicação entitulada Coraline, que conta a história de uma garotinha que volta para casa e descobre seus pais com longos dedos brancos e botões no lugar de olhos. O terceiro projeto, cuja idéia foi apresentada a ele apenas cinco dias antes da coletiva, é um filme com baixíssimo orçamento mas com completa liberdade criativa, sem as pressões dos grandes estúdios. Nem precisamos dizer que ele está animadíssimo com a idéia de trabalhar neste projeto ao lado de McKean, né&qt;& ;-)

Sobre a parceria, Gaiman disse que Dave McKean é o artista mais interessante com quem já trabalhou. O motivo é muito simples: McKean sempre o surpreende! Eu sei o que esperar de um artista quando estou escrevendo para ele, com o Dave é diferente. Eu não tenho a menor idéia do que ele vai aprontar. E é isso que deixa o trabalho com Dave tão saboroso e excitante, declarou. Ele também adorou o trabalho de Craig Russell em Ramadan (Sandman número 50). Considera um dos melhores da série. Mas é beleza que já se esperava do artista.

Saboroso e excitante de verdade foi conhecer Gaiman. Conversar com ele. Ver que ele é tão humano quanto nós. Porém, com uma pitada exagerado de genialidade. Normal ele não é. Podem ter certeza!!!!

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