Análise

Serguei foi exemplo de liberdade entendida como exotismo

Músico carioca que morreu aos 85 anos gravou música com letra de Ney Matogrosso

Por Raphael Vidigal
Publicado em 07 de junho de 2019 | 19:24
 
 
 
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Não deixa de ser irônica a constatação de que, apresentado como cantor e compositor, poucas pessoas conhecessem, de fato, a obra ou alguma música do carioca Serguei (1933-2019). O envolvimento amoroso com Janis Joplin, a propalada fama de pansexual, o uso de substâncias alucinógenas de todo tipo e a autopromoção como uma lenda viva do rock sempre estiveram à frente das demais questões. Mas não foi por acaso que a personalidade exuberante de Serguei sopesou a carreira artística.

Não que Serguei não tenha procurado o sucesso comercial. “As Alucinações de Serguei” acena para os ídolos da Jovem Guarda, Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa. “Rolava Bethânia” já aparece como uma tresloucada homenagem a variados personagens controversos da música brasileira, passando por Lobão, Cazuza e Angela Ro Ro. “Pegue Zé” é um forró lançado quando o polêmico Carlos Imperial distribuiu na imprensa a notícia mentirosa de que os Beatles tinham gravado “Asa Branca”.

Sem grandes dotes vocais, o músico apostou na chamada arte performática, e gravou apenas dois discos em toda a trajetória, combinados com compactos dispersos nas décadas de 60, 70, 80, 90 e 2000. A despeito disso, o intérprete conseguiu alguns feitos, como, por exemplo, gravar uma música cuja letra foi escrita, a pedido seu, por Ney Matogrosso, algo único. “Lindo Anjo” foi usada como trilha do documentário “Serguei: O Último Psicodélico”, na cena onde o protagonista pratica sexo oral em outro homem.

Uma das melhores versões de Serguei veio com o samba meio rock “Devagar Também É Pressa”. Acreditando nos princípios do movimento hippie, o artista se refugiou na cidade de Saquarema, interior do Rio de Janeiro, onde criou um “Museu do Rock” particular. A miséria financeira que Serguei enfrentou no final da vida talvez tenha sido apenas uma das consequências da maneira com que ele lidava com a liberdade, que, com o tempo, passou a ser cada vez mais entendida como exotismo. Algo revelador.

Ouça música gravada por Serguei:

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