Coluna

Igor Normando quebra barreira do fisiologismo nas Usinas da Paz e se pinta como super-herói da Disney

Equipamento criado pelo intelectual Ricardo Balestreri sob encomenda do então candidato Helder Barbalho perde consistência e vira quartel-general do deputado licenciado.

23/10/2023 11:28 / Por Olavo Dutra | Colaboradores

Igor Normando quebra barreira do fisiologismo nas Usinas da Paz e se pinta como super-herói da Disney

 

s Usinas da Paz foram idealizadas ainda na pré-campanha do candidato Helder Barbalho, em 2018. Preocupado com o voto volátil de centro-esquerda, Helder decidiu aprofundar políticas sociais, de olho no voto das periferias dos grandes aglomerados urbanos do Pará e no crescente descontentamento com o governo Jatene, visto pelo público, especialmente do interior, como focado na capital e ausente do restante do Estado. O conceito de "presença" de Helder em oposição à "ausência" do adversário seria uma decorrência óbvia dessa análise.


Primo do governador que quer porque quer ser candidato a prefeito de Belém usa equipamento público ao seu bel prazer, ousando em um ponto como nenhum outro secretário de governo/Fotos: Divulgação-Redes Sociais.

Mas, como traduzir em uma grande política pública a ideia de inclusão e vender a proposta de que a violência poderia ser reduzida não apenas com o uso da força, mas também com políticas sociais e presença nas áreas mais críticas?

 

Helder pediu ajuda aos universitários, mais precisamente a um professor e intelectual dedicado a políticas sociais em territórios marcados pela violência. Ricardo Brisolla Balestreri (foto, detalhe), educador, licenciado em História, especialista em Psicopedagogia Clínica e em Terapia de Família, foi diretor do Departamento de Pesquisa, Análise da Informação e Desenvolvimento de Pessoal em Segurança Pública da Senasp durante os dois primeiros governos Lula. Era o homem certo para o lugar certo. Com ele, Helder viajou para conhecer experiências práticas que servissem de modelos para o que pretendia fazer caso eleito, como a de Medellín, na Colômbia.

 

Modo integração

 

Balestreri se debruçou sobre os dados do Pará e interferiu diretamente no programa de governo que seria apresentado, explicando como a sociedade se constitui como sistema de interação entre indivíduos, produzindo formas sociais a partir da participação cidadã, e como a política pública pode ativar atores sociais a partir dos territórios. Assim surgiram as UsiPaz como modelo de incidência não invasiva do Estado nas áreas mais críticas para a segurança, consideradas a partir dos dados do IBGE, engendrando ações que estimulariam o que o consultor de então chamava de "cidadania ativa" e que se concretizaria como prática social feita e usufruída por atores locais.

 

Ricardo Balestreri se consolidou como opção óbvia para a gestão e administração das UsiPaz, assumindo, após a vitória de Helder, a Secretaria Estratégica de Articulação da Cidadania, q criada para ser "à prova de fisiologismo político e partidarização" das futuras usinas.

 

Depois do vendaval

 

As obras dos complexos foram executadas em parceria com as empresas Vale e Hydro, que arcaram integralmente com os custos. Neles são oferecidos mais de 80 serviços gratuitos, disponibilizados pelos órgãos e entidades parceiras do Estado uma estrutura que, não fosse blindada, se tornaria um balcão para compra de votos, desvirtuando o projeto original. 



 

Era uma vez

 

Balestreri e o próprio governador mantiveram os espaços das UsiPaz como equipamentos públicos íntegros, que cumpriram sua função social plenamente, até que veio o vendaval de 2022.

 

A reeleição folgada de Helder Barbalho no primeiro turno poderia ter gerado uma independência completa do governador em relação à baixa política. Mas o efeito foi diametralmente oposto: cargos distribuídos sem qualquer critério de razoabilidade a políticos deram lugar às escolhas técnicas, ponderadas, da primeira gestão. 

 

De mal a pior

 

Ricardo Balestreri, que mudou sua vida para se instalar no Pará, dormiu secretário e acordou no pesadelo de uma demissão inexplicável e, obviamente, injusta. Mas tudo ainda poderia piorar. E o desastre aconteceu. Em um arranjo visto como um ‘cavalo de pau’ arriscado e inseguro, o deputado estadual Igor Normando, primo do governador, se licenciou do mandato e assumiu a Seac criada por Balestreri. Normando manteve o controle financeiro da Fundação Cultural do Pará e agregou agora o que Balestreri via como uma escola de cidadania e ele vê como uma mina de ouro para arregimentar votos sem meter a mão no próprio bolso.

 

Controle absoluto

 

Como esperado, ao contrário do que existiu na origem do projeto, as UsiPaz foram tomadas pela baixa política. Igor Normando, cuja ousadia e pragmatismo fariam Gerson Peres corar, tomou de assalto as estruturas, que passaram a ser ordenadas segundo as prioridades dele, e não mais da gestão.

 

Nada mais acontece ali sem que ele pessoalmente aprove e garanta que estará presente para faturar politicamente, desde a entrega do diploma do corte e costura até a vacinação de animais, atividades que já aconteciam antes, mas sem o palanque eleitoral montado ou o carimbo patrimonialista que se impôs agora. Normando aparelhou a estrutura, partilhando seu uso nada republicano com vereadores e deputados amigos, que iludem o público, fazendo-o crer que as ações ali realizadas acontecem graças a algum tipo de esforço desse ou daquele parlamentar e não como parte de uma política pública continuada.

 

O usufruto abertamente eleitoral da máquina pública acontece nas barbas do Ministério Público, sem embaraços, com a desfaçatez de quem acredita na impunidade.

 

Bem me quer...

 

Apeado do Podemos, partido que apresentava como seu, Igor Normando se apresenta como candidato a prefeito de Belém. Sem partido já dialogou, em nome do primo poderoso, com a ala petista de Beto Faro, foi rejeitado pelo PSB de Cássio Andrade e recebido como um jovem tucano, com pompas e circunstâncias, na Convenção do PSDB em Belém. O secretário sabe que no MDB teria dificuldades, não só porque outros nomes da legenda despontam com maior destaque - em que pese o esforço de comunicação de Normando, que inclui centenas de outdoors de aniversário e milhares de bots nas redes sociais.

 

A barricada no MDB é mais alta, porque o peso do deputado José Priante nas escolhas que o partido fará na capital não deve ser desconsiderado, assim como a movimentação nada sútil do deputado estadual Zeca Pirão.

 

Bichinho da Disney

 

O post-cartaz publicado pelo dublê de secretário e candidato em suas redes sociais nesse final de semana mostra-o como um super-herói de desenho animado da Disney-Pixar, cercado de crianças e animais, tendo ao fundo o equipamento público criado e realizado para ser à prova do fisiologismo e que agora se tornou, sem qualquer rubor, seu quartel-general.


Nenhum secretário ousou utilizar os equipamentos do Estado em usufruto pessoal desse modo. Nem ousaria. Mas, pelo visto, o primo pode.

Igor Normando quebra barreira do fisiologismo nas Usinas da Paz; e se pinta como super-herói da Disney