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Capa

Folha de rosto

Gian Danton
(Ivan Carlo Andrade de Oliveira)

JORNALISMO em QUADRINHOS

Marca de Fantasia
Parahyba, 2022 - 2a edição

Capa s Expediente s Sumário s Autor


Expediente

JORNALISMO em QUADRINHOS
Gian Danton
(Ivan Carlo Andrade de Oliveira)

Série Quiosque, 62. 2022. 2a edição. 76p.

MARCA DE FANTASIA
Rua João Bosco dos Santos, 50, apto. 903A
João Pessoa (Parahyba), PB. Brasil. 58046-033
marcadefantasia@gmail.com
https://www.marcadefantasia.com

A editora Marca de Fantasia é uma atividade da Associação Marca de Fantasia,


CNPJ 09193756/0001-79 e do NAMID - Núcleo de Artes e Mídias Digitais,
projeto de extensão do Departamento de Mídias Digitais da UFPB

Editor/designer: Henrique Magalhães


Imagem da capa: Antonio Eder

Conselho editorial
Adriana Amaral - Unisinos, RS Marcos Nicolau - UFPB
Adriano de León - UFPB Marina Magalhães - UFAM
Alberto Pessoa - UFPB Nílton Milanez - UESB
Edgar Franco - UFG Paulo Ramos - UNIFESP
Edgard Guimarães - ITA/SP Roberto Elísio dos Santos - USCS/SP
Gazy Andraus - FAV-UFG Waldomiro Vergueiro - USP
Heraldo Aparecido Silva - UFPI
José Domingos - UEPB
Marcelo Bolshaw - UFRN

Financiamento Edital PAPESQ PROPESPG 01/2021

Imagens usadas exclusivamente para estudo de acordo com o artigo 46


da lei 9610, sendo garantida a propriedade das mesmas a seus criadores
ou detentores de direitos autorais.

__________________
ISBN 978-65-86031-60-7

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Sumário

Sumário

Prefácio 5

Capítulo 1
Jornalismo em quadrinhos: uma definição 8

Capítulo 2
O jornalismo e os quadrinhos – histórico 14
Jornais e quadrinhos – uma relação estreita 14
Precursores 21
O underground 22
Os primeiros exemplos de JHQ 27
Joe Sacco 32
Persépolis e Fax de Saravejo 38
O complô 39
Big book 41
Outros exemplos 48

Capítulo 3
A série Psicopatas 52
Referências 68
Sobre o autor 72

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Prefácio

Prefácio
Rafael Senra

A inda que os primórdios do jornalismo possam remeter a al-


guns exemplos históricos consideravelmente antigos (como
a Acta Diurna que o imperador Julio César criou para divulgar
notícias e fazer publicidade pessoal em meados de 69 A.C.), ape-
nas nos séculos XVII e XVIII encontraremos periódicos que real-
mente podem ser enquadrados como exemplares legítimos des-
sa atividade. No século XIX, principalmente devido à invenção
do telégrafo, temos uma consolidação do jornal impresso como
um veículo privilegiado de transmissão de informações. É nessa
mesma época que temos o surgimento do gênero das histórias
em quadrinhos, este nascido justamente nas páginas dos jornais
que circulavam em diversos países. Contudo, assim como no caso
do jornalismo, podemos citar peças históricas que já apresenta-
vam características dos quadrinhos, começando pelas pinturas
rupestres do período Paleolítico Superior, passando pela arte
egípcia, ou, já na Idade Média, por peças como a Tapeçaria de
Bayeux (1070-1080).
Se há algo que podemos refletir a partir desses exemplares de
pré-jornalismo e pré-quadrinhos é o quanto tais atividades lidam
com experiências fundamentais para a cultura e a organização
social da humanidade. Tratam-se de fenômenos possíveis de se
mapear historicamente, mas para os quais não havia nome pró-
prio ou tampouco uma definição em termos de gênero. Na verda-
de, são diversas conquistas modernas (como a invenção da pren-
sa por Johannes Gutenberg) ou a possibilidade de reprodução
técnica em larga escala da Revolução Industrial que forneceram

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o alicerce para que nascessem o jornalismo e os quadrinhos da
maneira pela qual os conhecemos.
Ainda que as relações entre essas duas áreas pareçam tão im-
bricadas, foi apenas em meados do século XX que tivemos obras
efetivamente dispostas a criar um verdadeiro subgênero com ca-
racterísticas híbridas dos dois campos em questão. A relevância
do jornalismo em quadrinhos pode ser notada quando constata-
mos que algumas das obras vinculadas a essa área ganharam sig-
nificativos prêmios nas diversas bifurcações que a tangenciam:
tanto do jornalismo (como Maus, de Art Spiegelman, premiada
com o prêmio Pulitzer) quanto dos quadrinhos (o Harvey Awards
que Joe Sacco venceu por Palestina) ou mesmo prêmios do cam-
po literário (no caso, a mesma Palestina venceu também o Ame-
rican Book Awards).
Todos esses fatos dão a dimensão dos tópicos discutidos no
presente livro Jornalismo em Quadrinhos. Sobretudo se con-
sideramos que seu autor Ivan Carlo Andrade de Oliveira (Gian
Danton) tem sua carreira profissional amparada tanto no jorna-
lismo (é Professor Adjunto no Departamento de Jornalismo da
Universidade Federal do Amapá) quanto nos quadrinhos (já teve
obras publicadas por editoras brasileiras e estrangeiras, e venceu
prêmios importantes dos quadrinhos nacionais como o HQMix e
o Angelo Agostini).
Em Jornalismo em Quadrinhos, Gian não apenas traça um
histórico dessa área, mas analisa suas principais obras publica-
das no Brasil e no mundo. Além do conteúdo servir como uma
generosa introdução ao tema, Gian ainda traz os bastidores de
diversas produções de jornalismo em quadrinhos feitas por ele
mesmo. Nesse caso, a importância de sua obra pode ser mensu-
rada justamente por não ser apenas teórica ou bibliográfica, mas
também por trazer um panorama prático poucas vezes visto em

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livros que pretendem introduzir um tópico em especial, como é
o caso aqui.
Uma vez que temos poucas publicações sobre jornalismo em
quadrinhos no Brasil, a publicação de Jornalismo em Quadri-
nhos promete ser uma referência importante para qualquer pes-
quisador e interessado no tema, não só por buscar sanar essa
lacuna bibliográfica em nosso país, mas principalmente pela
qualidade de seu conteúdo.

Rafael Senra é Professor Adjunto no Departamento de Letras da Universi-


dade Federal do Amapá, e professor no PPG-LET/UNIFAP. Como autor de
quadrinhos, já publicou as HQs Balada Sideral (Bartlebee, 2014) e Cobra
Sofia (Marca de Fantasia, 2021).

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Capítulo 1

Capítulo 1

Jornalismo em quadrinhos: uma definição

A ntes de falarmos do Jornalismo em Quadrinhos (JHQ) con-


vém definir o termo. Nem tudo que envolve jornalismo e qua-
drinhos é JHQ. Primeiramente é importante definir a diferença
entre Jornalismo em Quadrinhos e Jornalismo de quadrinhos,
uma diferenciação feita por Augusto Paim (apud SILVA, 2020).
Segundo esse autor, o primeiro termo evoca a união das narrati-
vas jornalística e quadrinística. Refere-se, portanto, a obras ba-
seadas no processo jornalístico de apuração para apresentação
de informações no formato quadrinístico. Já o Jornalismo de
Quadrinhos é aquele especializado em discutir a linguagem e a
produção de quadrinhos, mas usando um formato de jornalismo
convencional.
Paulo Ramos define quatro possibilidades da relação entre
jornalismo e quadrinhos, assim resumidas por Vinícius Pedreira
Barbosa da Silva (2020, p. 55-56):

1) Jornalismo em quadrinhos – são ocorrências nas quais


os gêneros do jornalismo (reportagem, entrevista, notí-
cias, perfil etc.) são produzidas na forma de história em
quadrinhos; 2) jornalismo com quadrinhos – apropriação
da linguagem dos quadrinhos para produzir material in-
formativo; 3) quadrinhos com jornalismo – narrativas que
utilizam as características dos profissionais de imprensa
para dar sequência às histórias (exemplos de Homem-A-
ranha, Super-Homem, Tintin, entre outros). Ou seja, são
narrativas nas quais os personagens principais são jorna-

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listas ou fotojornalistas; e 4) jornalismo sobre quadrinhos
– aquele especializado sobre resenhas e notícias das pro-
duções de quadrinhos.

Como se vê, o que Augusto Paim chama de Jornalismo de


quadrinhos, Paulo Ramos chama de jornalismo sobre quadri-
nhos. Mas, independente da expressão usada, essa distinção é
essencial. Uma matéria sobre o novo lançamento da Marvel não
é jornalismo em quadrinhos. Já uma matéria sobre a vitória do
Talibã no Afeganistão usando a linguagem dos quadrinhos é Jor-
nalismo em Quadrinhos.
Outra distinção importante (já entrevista na definição de Pau-
lo Ramos) é que nem toda iniciativa que usa elementos de quadri-
nhos para a produção de matérias é Jornalismo em Quadrinhos.
Exemplo disso é a matéria “Sexo, drogas e brigas: a morte de
MC Kevin”, de Luisa Vale com ilustrações de André Melo publi-
cada no jornal Extra.
A reportagem trata dos últimos momentos de vida de MC Ke-
vin, que morreu em maio de 2021 após cair do quinto andar de
um hotel no Rio de Janeiro.
Há, como em uma matéria jornalística convencional, um lead,
que resume as principais informações referentes ao fato. Esse
lead aparece na forma de texto.
Logo em seguida, começa a narrativa dos últimos momentos
do cantor, na forma de texto:

O funkeiro passou por uma festa, bebeu, consumiu drogas,


brigou em público com a mulher, relaxou na praia e termi-
nou numa sessão de sexo com uma modelo, em troca de
R$ 2 mil. Desde a morte, cinco personagens envolvidos no
caso prestaram depoimentos à polícia. As versões apresen-
tadas pelas pessoas que estavam com o funkeiro são ques-
tionadas por sua mulher, a advogada criminalista Deolane

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Bezerra. Ela também publicou áudios sobre as contradi-
ções entre o que disse a modelo Bianca Domingues, que
estava com Kevin antes de sua morte, à polícia e a amigos.
A polícia aguarda o laudo da perícia para determinar se ele
sofreu um acidente.

Após esse texto, vemos uma imagem com texto:

Figura 1. Legenda jornalística que simula texto de quadrinhos

O texto “MC Kevin se apresenta em baile ilegal no Rio, na


noite de sábado Foto: André Mello/Editoria de Arte” se encaixa
muito mais na definição de legenda jornalística do que de texto
de quadrinhos.
Embora essa matéria tenha sido anunciada como Jornalismo
em quadrinhos e tenha elementos de quadrinhos (como a sequên-
cia de desenhos), é muito perceptível que as imagens aí represen-

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tam apenas o papel de ilustrações do texto, que pode facilmente
ser lido separadamente sem nenhum prejuízo de compreensão. A
imagem é, portanto, descartável, meramente ilustrativa.
Em uma história em quadrinhos, texto e imagem formam um
todo, transmitindo cada um deles um nível de informações. Em
outras palavras, texto e imagens não são redundantes, mas com-
plementares.
Assim, a redundância ocorre quando o texto é “inferior” ao
desenho, não trazendo nenhuma informação a mais e sendo, por-
tanto, desnecessário. O mesmo pode ser dito da imagem. Se a
ilustração não traz nenhuma informação ao texto, ela é desneces-
sária e, portanto, redundante.
Segundo Danton (2015, p. 15) “As histórias em quadrinhos são
uma mídia em que imagem e texto formam um todo inseparável
e é isso que faz com que os quadrinhos sejam diferentes da litera-
tura. Normalmente, se você tirar o texto, a HQ perde sentido. Se
tirar a imagem, ela igualmente perde sentido”.
“Sexo, drogas e brigas: a morte de MC Kevin” é, portanto, uma
reportagem ilustrada, e não Jornalismo em Quadrinhos.
Como já ficou claro anteriormente, a definição de Jornalismo
em quadrinhos trata do uso da linguagem dos quadrinhos para
difusão de conteúdo jornalístico. Ou matéria jornalística com
tratamento de quadrinhos. Mas o exemplo da matéria sobre MC
Kevin mostra que é necessário acrescentar algo à definição. Não
basta que a matéria use elementos de quadrinhos. Texto e ima-
gem devem trazer aspectos informacionais diversos, não sendo
redundantes. As instâncias textuais e icônicas devem ser com-
plementares.
Outro equívoco é considerar o JHQ como um gênero do jor-
nalismo. Esse equívoco surge do sucesso do trabalho de Joe Sac-
co com seus livros-reportagens. Isso fez com que alguns autores
considerassem que o Jornalismo em quadrinhos sempre será

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uma reportagem e sempre terá as características expostas em ál-
buns como Palestina. Ou seja, relato pessoal, entrevista de fontes
testemunhais, entre outros.
Augusto Paim (2020, p. 67) cita o exemplo de Nyberg, que,
nos objetivos de seu artigo, escreve: “(...) vamos examinar como
o jornalismo em quadrinhos torna visível o processo de reportar
em primeira pessoa”.
Ainda segundo Paim, o entendimento do Jornalismo em Qua-
drinhos como um gênero

(...) também obriga a forçar uma equiparação entre forma-


tos tão diferentes entre si, como uma entrevista em qua-
drinhos, uma reportagem em quadrinhos ou uma resenha
em quadrinhos, sendo que cada um desses formatos exi-
giria ferramentas de análise específicas. Indo mais além,
essa noção de “gênero” nivela toda a produção na área do
quadrinho jornalístico a partir de características de repor-
tagens em quadrinhos, ocasionando questões sem sentido,
como a se é possível fazer jornalismo em quadrinhos em
jornais diários, ou interrogações facilmente respondíveis,
como se pode existir jornalismo de entretenimento em
quadrinhos (PAIM, 2020, p. 67-68).

O autor defende que o Jornalismo em Quadrinhos é uma área


do Jornalismo dentro da qual todos os gêneros do jornalismo po-
dem existir, cada um com suas características. Assim, podemos
ter uma reportagem em quadrinhos, uma notícia em quadrinhos,
uma resenha em quadrinhos, uma entrevista em quadrinhos, um
editorial em quadrinhos, uma crônica em quadrinhos, uma nota
em quadrinhos. As possibilidades do jornalismo em quadrinhos
são tão extensas quanto as do próprio jornalismo.
Em sua definição do que seria Jornalismo em quadrinhos, Au-
gusto Paim desfaz diversos equívocos sobre o mesmo:

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1. Jornalismo em quadrinhos é uma área do jornalismo.
2. O termo descreve o uso da linguagem dos quadrinhos
para o exercício das atividades jornalísticas, da mesma
forma que os termos “radiojornalismo”, “telejornalismo”
e “webjornalismo” são utilizados para descrever campos
do jornalismo, nos quais respectivamente o rádio, a televi-
são e a internet servem de suporte. 3. O termo “jornalismo
em quadrinhos” abrange toda a produção de conteúdo jor-
nalístico apresentado em quadrinhos, e as características
dessa produção estão atreladas aos gêneros jornalísticos
já conhecidos. 4. A necessidade de conduzir entrevistas
pessoais ou de o jornalista estar presente no local dos
acontecimentos depende do respectivo gênero jornalístico
(PAIM, 2020, p. 73).

Assim, o Jornalismo em Quadrinhos é uma área do jornalis-


mo, dentro da qual podem entrar os mais diversos gêneros, de
modo que ele não pode ser limitado pelas regras homogeneizan-
tes deste ou daquele gênero ou deste ou daquele trabalho.
Num esforço de definirmos o que seria o Jornalismo em Qua-
drinhos, poderíamos dizer que é uma área do jornalismo carac-
terizada pelo uso da linguagem quadrinística na transmissão de
informações jornalísticas de modo que texto e imagem são com-
plementares e informativos.

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Capítulo 2 - O jornalismo

Capítulo 2

O jornalismo e os quadrinhos – histórico

Jornais e quadrinhos – uma relação estreita

A relação entre quadrinhos e jornais é tão antiga que se torna


difícil estabelecer quando teve início.
Segundo Antônio Aristides Corrêa Dutra (2020),

Os quadrinhos e o jornal têm uma relação muito mais pro-


funda do que pode parecer à primeira vista. Essa relação
não é unicamente histórica, ela chega também ao nível es-
trutural. Um autor de quadrinhos pega a sua história, divide
em partes e dispõe cada uma dessas partes em um quadro
com sua imagem e textos necessários. Esses quadros são
justapostos, são ajuntados lado a lado nas páginas. Algumas
vezes, o autor colocará um único ou uns poucos quadros por
página, outras vezes, vários quadros menores. O leitor, por
sua vez, ao ler esses quadros, vai reconstituindo, pouco a
pouco, a história narrada. Ora, não é assim também que se
faz um jornal? Os jornalistas dividem os acontecimentos em
partes, que são trabalhadas em matérias, com o texto e as
imagens necessárias. Depois, juntam essas partes em pági-
nas, compondo esse objeto que chamamos jornal.

Dutra aponta como antecessores do jornalismo em quadri-


nhos obras como a Tapeçaria de Bayeux (século XI) a Coluna de
Trajano (século II) e a Coluna de Vendôme (1810), que narra a
vitória dos franceses na batalha de Austerlitz.

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Mas de fato, a relação entre quadrinhos e jornalismo surge
no século XIX, num contexto de acentuado desenvolvimento in-
dustrial, melhoria das técnicas de impressão e o surgimento de
um grande contingente urbano de pessoas alfabetizadas, seden-
tas por entretenimento e informação. Esse ambiente propicia as
condições para o surgimento do mercado editorial de massa.
Segundo Srbek,

Paralelamente ao crescimento da população, ampliavam-


-se as políticas de educação e o consequente aumento do
número de leitores em potencial, o que possibilitava aos
editores aumentar e diversificar as tiragens, barateando
os produtos, o que atraía novos leitores. Essas condições
favoráveis levaram a uma maior concorrência entre os edi-
tores europeus, que motivou o surgimento de veículos es-
pecializados (como os periódicos ilustrados La Caricature,
La Charavari e Punch) (...) (SRBEK, 2014, p. 22).

Já em 1820, Rodolphe Topffer publica aquela que seria con-


sidera por muitos pesquisadores como a primeira história em
quadrinhos, Les amours de Monsieur Vieux-bois. Em 1842 esses
quadrinhos são publicados em um jornal de Nova York, o Bro-
ther Jonathan.
No Brasil, tivemos a atuação do jornalista ítalo-brasileiro An-
gelo Agostini, que em 1869 publicou a história em quadrinhos
Nhô-Quim no periódico Vida Fluminense. Em 1883, o mesmo
Agostini publicou na Revista Ilustrada a série Zé Caipora. Por
ambos os trabalhos, ele é considerado pioneiro dos quadrinhos
nacionais.
Mas, segundo Vinicius Pedreira Barbosa da Silva (2020, p.
39-40), Agostini foi também um pioneiro do Jornalismo em
Quadrinhos:

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(...) infelizmente seu trabalho ainda não tem o alcance de
outros autores em pesquisas internacionais, mas é notável
certa relação de seu trabalho quando se discute o jorna-
lismo e os quadrinhos. Em especial citamos os desenhos
feitos por ele para o jornal paulista O cambrião.

Silva (2020) cita como exemplo uma reportagem publicada


em 17 de setembro de 1865 sobre um acidente de trem aconteci-
do onze dias antes.
A sequência de desenhos não tinha uma reportagem de apoio.
As informações eram transmitidas unicamente através dos dese-
nhos e das legendas. A primeira imagem mostrava o acidente do
trem. A segunda descrevia como o trem havia parado na vala da
várzea. Na terceira, o leitor via os frades do Seminário prestando
os primeiros socorros aos feridos. O interessante aí é que texto e
imagem eram complementares.
Em outros países a relação entre jornalismo e imagem era
muito mais antiga.
Silva (2020) destaca que o uso de fotografias, em especial na
cobertura de conflitos, só se tornou comum a partir da década de
1930, quando surgiram câmeras leves, como a Leica com filmes
de 35 milímetros e capacidade de fotografar 36 vezes sem neces-
sidade de recarregar.
Antes, usava-se prioritariamente os desenhos.
Na Inglaterra, por exemplo, o jornalismo ilustrado aparecia
esporadicamente em jornais, mas é com o The Ilustrated London
New, fundado em 1842, que acontecem as primeiras tentativas
sistematizadas de ilustrar notícias. O sucesso foi tão grande que
o periódico começou a enviar artistas para cobrir acontecimen-
tos ao redor do mundo, criando a categoria de aristas-repórteres.
Havia artistas exploradores (especializados em viagens), artis-

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tas-naturalistas (especializados em natureza) e artistas satíricos,
que apresentavam a sociedade sob um viés humorístico.
O ilustrador francês Constantin Guys especializou-se em fazer
a cobertura visual de guerras, tendo retratado a guerra da Cri-
méia (1853-1856).
Uma das suas características que depois poderá ser observada
em exemplos de trabalhos de Jornalismo em Quadrinhos moder-
nos pode ter surgido aqui: inserção visual de si mesmo nas cenas,
como forma de testemunho e relato da própria presença no even-
to (SILVA, 2020).
O sucesso do The Ilustrated London New fez surgir diversas
publicações semelhantes em diversos outros países, a exemplo
do francês L´Illustration, do espanhol La Ilustration ou do nor-
te-americano Frank Leslie´s Illustrated. Este último usava ilus-
tradores não só para narrar guerras, mas também para a recons-
tituição de crimes “em uma narrativa pré-lógica de quadrinhos
com linguagem mais moderna” (SILVA, 2020, p. 37).
Outro exemplo é o Harper´s New Monhphly, lançado em
1850, com tiragem de 7.500 exemplares e 144 páginas de dimen-
são semelhante ao formato A4 e duas colunas. “Embora se cen-
trasse na vida política e se direcionasse para as elites, no início
de 1851 esse periódico já tirava 50 mil exemplares, vendidos em
todo o país. Dará origem à revista ilustrada semanal Harper´s
Illustrated Weekly” (SOUZA, 2020, p. 141).
Mas essa relação entre quadrinhos e jornalismo não se limita-
va a publicações especializadas. Nos EUA essa relação vai se dar
principalmente através dos penny press. Eram jornais populares
com tiragens astronômicas e preço baixo (o penny era uma moe-
da de baixo valor usada na compra dos periódicos).
O primeiro jornal que pode ser de fato considerado um penny
press foi o The New York Morning Herald, fundado em 1835. Em

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1836, o Herald já tirava 20 mil exemplares. Em 1860 atingia 70
mil exemplares, captando vultosos investimentos publicitários.
Mas o maior marco dessa primeira fase dos penny press foi
o The New York Tribune, fundado por Horace Greely em 1841.
A publicação era sensacionalista, voltada ao interesse humano
e politicamente envolvida – sendo seu fundador um líder parti-
dário. O jornal se empenhou em campanhas contra o desempre-
go, pela igualdade salarial para trabalho igual, independente de
sexo, a abolição da escravatura, o fim do trabalho infantil e das
prisões por dívidas, entre outros temas sociais.
Nas últimas duas décadas do século XIX surgiu um novo tipo
de penny press que iria revolucionar o mercado editorial e rela-
ção entre quadrinhos e jornalismo. O grande nome dessa nova
tendência seria o jornalista Joseph Pulitzer. “Imigrante de ori-
gem húngara, Pulitzer teve o mérito de perceber que a sociedade
norte-americana, na qual se integravam diariamente novos imi-
grantes, necessitava de um novo tipo de imprensa que misturasse
as características da primeira geração da imprensa popular com
novas ideias” (SOUSA, 2020, p. 144).
Filho de um comerciante judeu e uma mãe católica, Pulitzer
emigrou para os EUA quando o pai morreu e os negócios da famí-
lia faliram. Lutou na guerra civil norte-americana e depois atuou
como carregador, bagageiro e garçom enquanto estudava inglês
na biblioteca. Foi justamente neste local que ele viu dois homens
jogando xadrez e resolveu opinar sobre o jogo. Os dois ficaram
tão impressionados com sua inteligência que lhe ofereceram em-
prego no jornal no qual eram editores, o Westliche Post, publica-
ção destinada à comunidade de língua alemã do Missouri.
Pulitzer tinha apenas 21 anos.
Aos 25 anos já havia economizado dinheiro o suficiente para
comprar o jornal, que transformou em laboratório para suas ideias
a respeito das inovações necessárias ao jornalismo. Em 1878 com-

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prou outro jornal, o Dispatch e fundiu com o Post, criando o Post
Dispatch. O sucesso foi tão grande que o animou a comprar um
jornal nova-iorquino em falência, o News York World. Quando foi
comprado, em 1883, o jornal tirava 15 mil exemplares diários. Um
ano depois a tiragem já pulara para 100 mil exemplares. Em 1892
a tiragem já chegava a 375 mil exemplares e no final do século che-
garia a um milhão de exemplares vendidos.
O segredo de Pulitzer estava no preço baixo (dois cêntimos),
na linguagem acessível, que facilitava a leitura por parte dos imi-
grantes, o design inovador com muitas imagens, uso de manche-
tes, letras com corpo grande, títulos emocionais e chamativos.
De olho no público imigrante, como ele mesmo, Pulitzer en-
comendou ao cartunista R. F. Outcault a criação de uma série
que refletisse essas pessoas. Outcault criou um garoto chinês que
falava em inglês primário através de mensagens em seu camiso-
lão. Como o amarelo era a cor que dava menos problemas gráfi-
cos, essa foi a cor escolhida para o personagem, que se chamou
Yellow Kid (Menino Amarelo). Publicado inicialmente em 1896,
o sucesso foi tão grande que a série se tornou um dos principais
atrativos do jornal.
Mas logo Pulitzer teria um concorrente à altura.
O rival chamava-se William Randolph Hearst. Ao contrário de
Pulitzer, que tinha origem humilde, Hearst nascera em berço de
ouro. Seu pai era senador pelo estado da Califórnia. Aos 24 anos
comprou o São Francisco Examiner e o modificou, seguindo o
modelo popular implantado por Pulitzer no World, com linha
editorial sensacionalista, títulos chamativos, design apelativo,
diversidade tipográfica e uso de cor.
Em 1895 Hearst comprou o The New York Journal e, numa
estratégia agressiva, contratou quase todos os principais colabo-
radores do World, incluindo R. F. Outcault, que passou sua cria-
ção Yellow Kid para o jornal concorrente.

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Hearst levava o sensacionalismo ao ponto de criar notícias,
levando os críticos a chamar o Journal de “jornalismo amare-
lo” justamente em referência ao personagem publicado por ele,
Yellow Kid. Logo a expressão se estenderia a todos os jornais
sensacionalistas norte-americanos.
A partir daí, as histórias em quadrinhos se tornariam atrações
fixas nos jornais norte-americanos. “Vendo o interesse dos lei-
tores por essas narrativas deflagrarem o aumento da venda de
jornais, seus proprietários passaram a investir no gênero e em
pouco tempo já havia uma série de personagens preenchendo as
coloridas páginas dominicais” (NICOLAU, 2007, p. 12).
As histórias em quadrinhos logo ultrapassariam as páginas
dominicais para se espraiarem pelas tiras diárias. O pioneiro do
gênero foi Mutt e Jeff, de Bud Fisher, surgido em 1907. Logo viria
Pafúncio e Marocas, criado por George McManus em 1913 e Os
sobrinhos do Capitão, criados por Rudolph Dirks.
Marcos Nicolau (2007, p. 22-23) acredita que as tiras têm
uma relação tão íntima com os jornais, que se tornaram um gê-
nero jornalístico:

(...) ao considerarmos de modo contextualizado o surgimen-


to da tirinha, sua trajetória de cem anos no âmbito dos jor-
nais e seu rico conteúdo de expressão do cotidiano, vamos
encontrar peculiaridades próprias de um gênero opinativo e
representativo da realidade tratada por diversos outros gêne-
ros jornalísticos, como o artigo, a crônica, a coluna de autor.
Mesmo que a tirinha não seja encarada com a importância
que se dá a esses outros gêneros, ela traz em seu texto mui-
to da literariedade encontrada na crônica e da denúncia ou
crítica apresentada pelo artigo (NICOLAU, 2007, p. 22-23).

O surgimento dos syndicates é outro capítulo da relação entre


jornais e histórias em quadrinhos. Essas empresas, que funcionam

Capa s Expediente s Sumário s Autor 20


Precursores

de maneira similar às agências de notícias, distribuíam tiras e pá-


ginas dominicais para publicações em todo o mundo, fazendo com
que as HQs se tornassem uma das principais atrações dos jornais.
Na verdade, a relação entre jornalismo e quadrinhos se tornou
tão forte, tão intrínseca, que surpreende o fato de ter demorado
tanto para termos exemplos do que viria a ser chamado Jornalis-
mo em Quadrinhos.

Precursores

Silva (2020) destaca o trabalho de Bernard Krigstein e Harvey


Kurtzman, ambos vindos da editora EC Comics, como precurso-
res do Jornalismo em quadrinhos já na década de 1950.
Na história de oito páginas Master Race, Krigstein (ilustração)
e Al Feldestein (roteiro) narram o reencontro de sobrevivente de
campo de concentração com ex-combatente nazista em estação
de metrô. No célebre ensaio A Examination of Master Race, Art
Spielgman, David Kasakove e John Benson apontam a contribuição
que a obra traz ao subverter a narrativa padrão dos quadrinhos:

No lugar da estética visual exagerada, com linhas de ação,


por exemplo, foram utilizadas “ferramentas mais objeti-
vas e o uso de claro e escuro de maneiras mais abstratas,
assim como a utilização de ângulos mais agudos e linhas
retas, afastando um pouco da influência de uma estética
cinematográfica de efeitos de luz e close-ups (aproximação
dos personagens), como nas produções que seguiam o mo-
delo de narrativa de Milton Caniff. Para Santiago Garcia, o
trabalho foi uma forma de “recuperar os valores inerentes
à narrativa de quadrinhos”, experimentando com a forma
de maneira que não acontecia desde Winsor McCay e Ge-
orge Herriman (SILVA, 2021, p. 139).

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O underground

Outro antecessor do Jornalismo em Quadrinhos foi Harvey


Kurtzman. Sua principal criação foi a revista MAD, grande in-
fluência da geração underground que viria pouco depois e de au-
tores como Robert Crumb, Gilbert Sheldon e outros. Embora o
enfoque principal da revista inicialmente fosse a sátira de qua-
drinhos, a MAD muitas vezes satirizou inclusive acontecimentos
políticos, fazendo comentários sobre a realidade que muito se
aproximam dos gêneros opinativos do jornalismo.
Além disso, em histórias de guerra produzidas para a revista
Two-Fisted Tales e Frontline Combat, Kurtzman era obcecado
por detalhes, a ponto de contratar auxiliares para fazerem pes-
quisas histórias em bibliotecas como forma de aumentar a veros-
similhança das HQs.

O underground

Embora a relação entre jornais e quadrinhos seja tão antiga


quanto os quadrinhos, as condições para o surgimento do Jorna-
lismo em Quadrinhos só vão se estabelecer de fato na década de
1960, com o surgimento dos quadrinhos underground.
Esses quadrinhos surgem numa época de intensas mudanças
sociais puxadas pelo movimento da contracultura.
De acordo com Aristides Corrêa Dutra (2021), “os quadrinhos
underground desempenharam, então, um duplo papel: de um
lado, permitiram ampliar o leque de ferramentas a serviço dos
processos revolucionários(...)” e “(...) de outro, operaram uma
inversão maliciosa de valores ao trazer histórias sujas, cruéis e
realistas para uma linguagem onde antes reinavam alegres bichi-
nhos falantes e exemplares e corajosos heróis”.
A grande inovação do underground foi focar no mundo real. As
histórias não eram sobre animaizinhos antropomorfizados ou su-
per-seres com roupas colantes, mas pessoas comuns vivendo mui-

Capa s Expediente s Sumário s Autor 22


tas vezes situações comuns. O underground também se destaca
por apresentar relatos pessoais, algo que seria apropriado por al-
gumas das produções mais famosas do jornalismo em quadrinhos.
Dois dos nomes mais importantes do jornalismo em quadrinhos,
Art Spieglman e Joe Sacco, vieram do movimento underground.
No rastro do underground, surgem os quadrinhos autobiográ-
ficos, na década de 1970. Em 1972 são publicados dois dos tra-
balhos mais relevantes e que iriam influenciar gerações de qua-
drinistas: Gen – pés descalços, de Keiji Malasawa e Bink Brown
meet The Holy virgin Mary, de Justin Green.

Figura 2. Bink Brown foi um dos primeiros


quadrinhos autobiográficos

Na época, a maioria dos quadrinhos alternativos tinha poucas


páginas, mas Green passou quatro anos desenhando minuncio-
samente as 44 páginas de seu trabalho, um épico para a época:
“A história acompanha a infância e adolescência do jovem Binky,
sempre às voltas com suas fantasias sexuais, culpa católica e

Capa s Expediente s Sumário s Autor 23


transtorno obsessivo compulsivo, numa narrativa rica em de-
talhes e com uma narrativa temporal rígida” (SOUZA JÚNIOR,
2020, p. 164).
O nome Binky Brown fazia uma referência direta a um clássi-
co dos quadrinhos, Buster Brown, criação de Richard F. Outcault
(o mesmo de Yellow Kid).
A influência de Binky Brown sobre trabalhos posteriores foi
enorme. “Sem Binky Brown, Maus não existiria, e ambos inspi-
raram vários cartunistas a lidarem com suas experiências de for-
mação e os efeitos decorrentes”, afirma Paul Gravett (apud SOU-
ZA JÚNIOR, 2020, p. 165).
Outros autores importantes para eclosão do gênero autobio-
grafia foram Robert Crumb, Harvey Pekar, Chester Brown e Ali-
son Bechdel.
Harver Parker publicava suas histórias na revista indepen-
dente American Splendor, editada por ele e tratava de temas do
cotidiano, episódios banais, como o hábito de colecionar discos
de vinil, um sonho angustiante, uma convocação para ser jurado
e até uma fila de supermercado.
Robert Crumb já mostrava a si mesmo nas histórias desde o
início da carreira. Em The confession of Robert Crumb, publica-
da na revista The people comics, o autor mostra a si mesmo no
útero, nascendo e tendo relações com a própria mãe. Mas mesmo
essas “participações especiais” nas histórias eram mais ficcionais
do que autobiográficas. A primeira iniciativa no sentido de superar
a autoficcionalidade é a história “Minha primeira experiência com
LSD”, publicada em 1973 na revista El perfecto comics. Segundo
Souza Júnior (2021, p. 64), “Nesta história, Crumb narra de for-
ma verossímil sua primeira experiência com LSD, destacando logo
acima do título a veracidade dos fatos narrados (...) Essa narrativa
se afasta da autoficcionalidade por abordar percepções reais e re-
latar acontecimentos cuja veracidade pode ser comprovada”.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 24


Boa parte desses quadrinhos autobiográficos ou de autoficciona-
lidade foram reunidos nos álbuns Minha vida e Minhas mulheres.
ABS Moraes (2020) argumenta que há tanto de Crumb na
obra do quadrinista que é quase impossível separar o artista da
obra: “Falar dos quadrinhos de R. Crumb sem falar dele mesmo,
em trabalhos pessoais como Minhas Mulheres, por exemplo, é
praticamente impossível. Seria como tentar falar dos filmes de
Woody Allen sem falar de sua vida, ou tratar da protoliteratura
de Charles Bukowsky sem dar a mínima para a sua biografia”.

Figura 3. Minha primeira experiência com LSD foi o primeiro quadrinho de


Crumb a superar a autoficcionalidade

Capa s Expediente s Sumário s Autor 25


Outro marco importante é a criação das graphic novels. O
termo foi popularizado por Will Eisner ao aparecer na capa do
álbum Um contrato com Deus, de 1978. O álbum, formado por
várias histórias, é baseado nas experiências do autor com os cor-
tiços judeus de Nova York, o que fugia das características ficcio-
nais dos quadrinhos. O objetivo de Eisner ao usar a expressão
era trazer “respeitabilidade ao meio ao trazer histórias de cunho
social e ‘assuntos sérios’” (SILVA, 2020, p. 47).
A ideia por trás das graphic novels seria a publicação de his-
tórias mais adultas, com um maior tempo de produção e maior
apuro visual e literário. Uma novidade num mercado dominado
por revistas finas e mensais.
Boa parte dos trabalhos de Jornalismo em Quadrinhos seriam
publicados como graphic novels ou reunidos em graphic novels.

Figura 4. Ao usar o termo graphic novel, Eisner pretendia fugir


do termo comics, usado nos EUA para se referir aos quadrinhos

Embora reunisse histórias ficcionais, Um contrato com Deus


apresentava a visão de Eisner sobre os guetos judaicos em Nova

Capa s Expediente s Sumário s Autor 26


Os primeiros exemplos de JHQ

York, um local onde ele cresceu. Ou seja, embora ficção, o álbum


já revelava elementos do Jornalismo em Quadrinhos. Eisner pos-
teriormente realizaria um trabalho que indubitavelmente pode
ser considerado jornalístico: O complô.

Os primeiros exemplos de JHQ

Provavelmente, o primeiro exemplo do que viria a ser chama-


do de Jornalismo em Quadrinhos foi o álbum Brought to light,
lançado em 1989. A obra, chamada de graphic docudrama, tinha
dois capítulos.
A origem desse álbum remonta a 1979, quando foi fundado
o Cristic Institute com o objetivo de denunciar o terrorismo de
direita. Em 1980, por exemplo, o Instituto moveu um processo
contra a Ku Klux Khan pelo assassinato de quatro manifestantes
de esquerda em 1979.
Em 1984, a Nicarágua vivia o auge da guerra civil entre o go-
verno revolucionário sandinista e Os Contras, apoiados direta-
mente pela CIA a mando do presidente Ronald Reagan. O Insti-
tuto Cristic organizou uma entrevista de imprensa com um oficial
Contra desiludido chamado Edén Pastora. Em sua fala, Pastora
iria estabelecer a relação entre os Contras, a CIA e traficantes de
drogas. A entrevista aconteceu no acampamento de La Penca, na
fronteira com a Costa Rica.
Um suposto fotojornalista chamado Per Anker Hansen partici-
pou da coletiva. Mas seu equipamento fotográfico estava, na ver-
dade cheio de explosivos. Hansen saiu do acampamento e detonou
os explosivos remotamente. Três jornalistas e quatro guerrilheiros
morreram na explosão. Vinte e uma pessoas ficaram feridas. Pas-
tora, o principal alvo do atentado, no entanto, sobreviveu.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 27


Dois sobreviventes, Tony Avirgan e sua esposa Martha Honey
iniciaram por conta própria uma investigação e descobriram que
todas as pistas levavam à CIA como responsável.
O Instituto Cristic achou que seria uma boa ideia apresentar o
resultado dessa investigação, que incriminava diretamente a CIA
no atentado, na forma de quadrinhos. Para escrever o roteiro foi
escolhida a ativista política e roteirista de quadrinhos indepen-
dentes Joyce Brabner. Para desenhar foi escolhido Thomas Ye-
ates. Logo Alan Moore e Bill Sienkiewicz iriam aderir ao projeto.

Figura 5. Flashpoint explica a relação


da CIA com o atentado La Penca

O resultado foi a graphic novel Brought to light, dividida em


duas partes: Flahspoint – the LaPenca bombing (sob responsa-
bilidade da dupla Joyce Brabner e Thomas Yeates) e Shadowplay
– the secret team (da dupla Alan Moore e Bill Sienkiewicz).
Flashpoint era uma história em quadrinhos convencional.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 28


Por outro lado, a segunda história, Shadowplay – the se-
cret team, com texto de Alan Moore e desenhos de Bill
Sienkiewicz, é uma fantasia em tom de fábula que comple-
menta a primeira. Em um bar decadente, uma águia ame-
ricana antropomorfizada oferece seus ‘serviços patrióticos’
de extrema direita enquanto relata alguns ‘casos de suces-
so’ de suas ações na América Latina. Os dados foram ex-
traídos da Declaração de Evidência elaborada pelo Christic
Institute. O desenho é expressionista e cheio de ousadias
gráficas, um belo exemplo do trabalho de um artista então
no auge da fama (DUTRA, 2022, p. 11).

Figura 6. Shadowplay fala das intervenções


da CIA em países da América Latina

Capa s Expediente s Sumário s Autor 29


Outro trabalho anterior às reportagens de Joe Sacco que já
poderia ser considerado Jornalismo em Quadrinhos é Maus, de
Art Spielgman, lançado entre 1986 e 1992.

Maus, de Art Spiegelman, é uma entrevista no formato de


HQ, estendendo-se por mais de 300 páginas. O entrevista-
dor é Spiegelman e o entrevistado Vladek, seu pai, que re-
lata ao filho sua juventude em guetos de judeus na Polônia
e seu confinamento em Auschwitz. Embora os persona-
gens sejam graficamente animalizados (judeus são ratos,
nazistas são gatos, poloneses são porcos, americanos são
cachorros – já o judeu que se passasse por gentio utilizaria
máscaras correspondentes à respectiva nacionalidade), as
situações descritas são reais. Há em Maus muito de me-
talinguagem e making of, pois os bastidores da entrevista
são mostrados durante a história, prática também adotada
pelos adeptos do new journalism Gay Talese e Hunter S.
Thompson (OLIVEIRA, 2021).

A graphic novel Maus foi vencedora do prêmio Prêmio Pu-


litzer Especial em Literatura no ano de 1992. Foi a primeira e
única história em quadrinhos a ganhar o prêmio, que é tradicio-
nalmente voltado a trabalhos jornalísticos.
Os críticos simplesmente não conseguiam se entender sobre
qual gênero se encaixava a história. Maus foi rotulada como bio-
grafia, ficção, autobiografia e memórias. O New York Times, ao
tentar elogiar a obra, definiu que Maus não era uma história em
quadrinhos, para revolta de Spielgman.
Mais recentemente, Maus tem sido considerado um exemplo
de Jornalismo em Quadrinhos.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 30


Figura 7. Maus surge de entrevistas
feitas por Art Spielgman com seu pai

Dutra (2020) defende que a classificação como jornalismo é


plenamente cabível:

Maus – a história de um sobrevivente (1986-1992), com


texto e desenhos de Art Spiegelman, não é uma reporta-
gem investigativa tradicional como Palestina ou Brought
to light, mas a classificação como jornalismo é plenamen-
te cabível. Sua narrativa, de teor autobiográfico, se dá em
dois tempos. No atual, Spiegelman nos conta a difícil con-
vivência com seu pai Vladek, um judeu mesquinho e pouco
emotivo. No tempo passado, a narrativa mostra a dura luta
de Vladek para sobreviver em um campo de concentração
nazista. O desenho segue a linha despojada dos quadri-
nhos underground, em sintonia com o texto autobiográfi-
co, recurso que seria depois seguido por Sacco.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 31


Joe Sacco

Joe Sacco

Joe Sacco nasceu na ilha de Malta, ao sul da Sicília. Ainda crian-


ça, mudou-se com a família para a Austrália. Em 1972 a família foi
para os EUA. Em 1978 ele ingressou na faculdade de Jornalismo,
mas nunca abandonou o sonho de se tornar quadrinista.
No início dos anos 1980 ele submeteu alguns de seus traba-
lhos para a revista Raw, de Art Spielgman, mas foi rejeitado.
Em 1985 ele e o amigo Tom Richards fundam a revista de
humor Portland Permanent Press, que acaba falindo em pouco
tempo, mas tem uma grande influência na vida de Sacco. Um dos
anunciantes da revista era a editora Fantagraphics, que oferece
para Sacco um emprego no Comics Journal, publicação mensal
voltada para o mundo dos quadrinhos. A mesma Fantagraphics
o estimula a editar a revista Yahoo, que se tornaria um laborató-
rio no qual o quadrinista faria as suas primeiras experiências no
Jornalismo em Quadrinhos. “Na Yahoo eu parti de peças curtas
e satíricas que supostamente eram para ser engraçadas para pe-
ças mais autobiográficas, biografia misturada com política (...)”
(SACCO apud SILVA, 2020, p. 155).
Duas histórias publicadas nessa revista já tinham caracterís-
ticas de jornalismo em quadrinhos: “Quando bombas boas acon-
tecem a pessoas más” e “Mais mulheres, mais crianças, mais rá-
pido”. Ambas as histórias são focadas em bombardeios efetuados
sobre a população civil.
“Quando bombas boas acontecem a pessoas más” é centrada
em três momentos históricos: o bombardeio britânico à Alema-
nha entre 1940 e 1945, o bombardeio americano ao Japão, entre
1944 e 1945 e o bombardeio americano à Líbia em 1986.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 32


A HQ mostra como o bombardeio de população civil passou
de um ato reprovável no início da guerra para uma estratégia de
terrorismo no final.
Em 1940, por exemplo, uma instrução do Ministério da Ae-
ronáutica da Inglaterra dizia: “O ataque deve ser realizado com
razoável cuidado para evitar perda de vidas civis nas proximi-
dades do alvo”. Em 1937, uma nota do Departamento de Estado
norte-americano afirmava: “Qualquer bombardeio geral a uma
área extensa onde resida uma grande população engajada em ati-
vidades pacíficas, é injustificada e contrária aos princípios da lei
e da humanidade”.
Já em 1942, o Ministério da Aeronáutica da Inglaterra afirma-
va: “As operações devem agora estar focadas na moral da popu-
lação civil do inimigo e em particular nos operários das fábricas”.
Por outro lado, os militares americanos comemoravam o fato de
que as casas no Japão serem feitas de madeira e papel, o que
tornavam suas cidades o maior alvo aéreo que o mundo já viu.
A história é toda construída com essas citações entremeadas de
imagens da guerra. No final, Joe Sacco coloca uma bibliografia,
referenciando as fontes das citações.
“Mais mulheres, mais crianças, mais rápido” é baseado num
relato da mãe de Joe Sacco. Quando criança, ela vivia na ilha de
Malta, um local entre a Itália e a África pertencente à Inglaterra,
que foi duramente atacado por bombardeiros italianos na Segun-
da Guerra Mundial. A história acompanha o dia-a-dia da garota,
desde os primeiros dias e o medo de ataques com gases letais até
um ponto em que os bombardeios eram tão normais que mui-
tas crianças ainda continuavam indo para a escola. No momento
mais dramático, a garota é alvo de uma rajada de tiros de um
avião italiano e por pouco não é atingida.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 33


Essa HQ é mais próxima do que Sacco faria posteriormente.
Ao invés de apenas textos laterais e desenhos centrais, temos a
quadrinização de situações, com forte teor humano.
As duas histórias foram posteriormente reunidas no álbum
Derrotista (publicado no Brasil pela editora Conrad).
Mas a grande mudança na carreira de Joe Sacco, que faria seu
trabalho guinar totalmente para o Jornalismo em Quadrinhos,
foi uma viagem para a Palestina no final de 1991 e início de 1992.
Quando voltou, trazia consigo a ideia de transformar o mate-
rial em uma reportagem em quadrinhos. O resultado foi Palesti-
na – uma nação ocupada, publicado em fascículos 1993 e depois
reunido em álbum.
Em Palestina, Sacco apresenta já as características que tor-
nariam seu trabalho famoso: ele presente no palco dos aconteci-
mentos, os depoimentos das testemunhas, o traço caricatural, a
diagramação distorcida, muitas vezes com balões se sobrepondo.
À certa altura, por exemplo, um dos informantes lhe mostra um
garoto e diz: “Este aqui: pai na cadeia. Quanto tempo na cadeia?
Quatro anos!”. Depois aponta para um idoso: “Este aqui: filho
morto por soldados!”.
Sacco também visita os setores judeus e chega a fazer amizade
com israelenses.
O trabalho lhe valeu o Harvey Awards e o Book Award e a
partir daí Sacco se dedicaria apenas ao novo gênero batizado por
ele, o Jornalismo em Quadrinhos ou reportagem em quadrinhos
(Comics Journalism no original).
Seu trabalho seguinte seria Área de segurança Gorazde:
guerra na Bósnia oriental, publicado entre 1992 e 1995 e ganha-
dor do prêmio Eisner em 2000.
A guerra da Bósnia teve início com a desintegração das repú-
blicas comunistas no pós-queda do muro de Berlim.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 34


Figura 8: Joe Sacco sempre mostra a si mesmo
no palco dos acontecimentos

Na Bósnia, o partido nacionalista sérvio organizou grupos


paramilitares para expulsar os não sérvios e se unir à Sérvia. O
governo bósnio tinha sido obrigado a entregar suas armas para
o Exército Popular da Iugoslávia. Quando os sérvios começaram
a atacar Saravejo, só quem podia defender a cidade eram grupos
paramilitares, verdadeiras gangues lideradas por bandidos e até
por um cantor pop.
Essas gangues defendiam a cidade, mas também tocavam o
terror. Podiam entrar na casa de alguém e confiscá-la. Matavam
cidadãos de descendência sérvia. Sequestravam civis para ca-
varem trincheiras, uma atividade extremamente perigosa num

Capa s Expediente s Sumário s Autor 35


local repleto de franco-atiradores. Chegou num ponto em que o
próprio governo Bósnio, que finalmente conseguira montar um
exército, teve que dar um basta.
O trabalho seguinte voltaria a focar na guerra da Bósnia, mas
traria uma interessante mudança do ponto de vista narrativo.
Em Uma história de Saravejo, de 2005, o foco é Neven, um ve-
terano que atuou em uma das milícias que defenderam a capital
contra os sérvios.
O álbum todo é costurado em torno da figura de Neven. Ele
mente para Sacco, o explora, inventa histórias, arranja informan-
tes que no final não sabem nada sobre a guerra, mas querem di-
nheiro. Mesmo assim, acaba sendo útil por mostrar o quanto a
guerra foi dúbia e o tipo de pessoa que se envolveu nela.
Neven mostra também como, após o conflito, Saravejo ficou
repleta de ex-combatentes, pessoas que haviam se acostumado a
matar e não sabiam fazer outra coisa. O apartamento de Neven,
totalmente caótico e repleto de lixo espalhado por todos os can-
tos é a perfeita definição visual de Saravejo no pós-guerra.
No mesmo ano Sacco publica outro livro sobre o conflito ára-
be-israelense: Palestina – na faixa de Gaza.
Outros trabalhos do autor foram Days of destruction, days of
revolt (sobre áreas empobrecidas dos EUA), The Great War (so-
bre a I Guerra Mundial), Reportagens (com matérias de menor
extensão), entre outros.
Vinicius Pedreira Barbosa da Silva destaca como um dos as-
pectos que diferenciam Joe Sacco do jornalismo normalmente
feito por publicações jornalísticas é o tempo usado para recolhi-
mento de dados:

Por geralmente ter a possibilidade de não precisar seguir


deadlines rígidos em suas obras, Sacco traz crítica implí-
cita da cobertura jornalística e sua superficialidade por

Capa s Expediente s Sumário s Autor 36


causa do tempo de produção, o que traz paralelos com o
que hoje de se chama de slow journalism. Palestina, por
exemplo, demorou dois meses de pesquisa e três anos para
a série ser completada (depois de compilada), enquanto
Notas sobre Gaza levou sete anos para ser concluída –
quatro deles desenhando (SILVA, 2020, p. 157).

Ana Camila Negri (2020) acrescenta outra diferença do jorna-


lismo informativo cotidiano: “(...) a reportagem prima por uma
visão pluridimensional do fato. Nesse aspecto Joe Sacco se sai
muito bem. Em sua obra não há ‘mocinho’ e ‘bandido’, todos po-
dem ser vítimas e algozes dependendo do momento”.
Segundo Antônio Aristides Corrêa Dutra (2021), os livros de
Joe Sacco funcionam de forma extraordinária ao unir os qua-
drinhos e o jornalismo: “As velhas categorias não podiam mais
contê-lo e um novo nome teve que ser cunhado para definir seu
trabalho: ‘jornalismo em quadrinhos’ (comics journalism)”.
Outro aspecto relevante na obra é o aprofundamento e a con-
textualização dos fatos.

Em sua obra Palestina, por exemplo, Sacco tem a preocu-


pação de explicar como todo o conflito começou, situando
o leitor sobre o que aconteceu bem antes, quando a grande
nação colonialista ocidental, no caso a Inglaterra, forçou a
criação do Estado de Israel na Palestina “esquecendo-se”
da numerosa população que já vivia por lá e da diferença
cultural e religiosa entre tais povos. Na obra Gorazde, o
autor ainda se utiliza de mapas para situar melhor seu lei-
tor, fazendo um trabalho mais eficaz do que muitos livros
didáticos escolares (NEGRI, 2020).

Além disso, Sacco une a entrevista à observação. Ele entre-


vista famílias expulsas de suas casas pelos assentamentos isra-
elenses, gente que esteve em campos de prisioneiros, pessoas que

Capa s Expediente s Sumário s Autor 37


Persépolis e Fax de Saravejo

tiveram parentes mortos ou torturados. Segundo Negri (2020),


“Sacco observa tudo e todos à sua volta, incluindo tumultos de
rua, quando manifestantes e soldados se enfrentam entre nuvens
de gás lacrimogêneo, pedras e balas de borracha”.

Persépolis e Fax de Saravejo

Outras obras de destaque no jornalismo em quadrinhos são


Persépolis, de Marjane Satrapi e Fax de Saravejo, de Joe Kubert.
Persépolis narra as mudanças provocadas na sociedade ira-
niana a partir da ditadura religiosa dos aiatolás. “Satrapi res-
gata uma história pessoal de longo tempo. Enfatiza suas raízes,
os costumes iranianos e a dificuldade de manifestação cultural
ocorrida durante a Revolução Xiita. Marjane Satrapi é jornalista
e utilizou-se dos quadrinhos para escrever uma reportagem au-
tobiográfica” (SCHEIBE, 2020).
Ao contrário de Satrapi e Sacco, que estão mais ligados aos
quadrinhos alternativos, Joe Kubert é um respeitável membro
da indústria de quadrinhos norte-americana. Famoso por seus
trabalhos com super-heróis, ele nunca havia se aventurado no
Jornalismo em Quadrinhos até que seu agente em Saravejo co-
meçou a lhe enviar faxes sobre a situação da guerra e sobre como
tentava manter ele e a família vivos. A máquina de fax era a única
forma de contar ao mundo acontecimentos como o massacre de
civis. Kubert usou os fax como base para uma história em qua-
drinhos, Fax de Saravejo, publicada em 1996 e ganhadora de di-
versos prêmios. “O que impressiona especialmente em Fax from
Sarajevo é ver um grande domínio da técnica narrativa tradicio-
nal sendo usado para documentar um fato real” (DUTRA, 2020).

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O complô

O complô

Em 2005, Will Eisner lançou um trabalho com características


claras de jornalismo em quadrinhos. Fruto de uma longa pesqui-
sa bibliográfica, O complô – a história secreta dos Protocolos dos
sábios de Sião apresenta os bastidores da criação de uma fraude
histórica, ainda na época da Rússia czarista e a forma como os
nazistas se apropriaram dessa fraude em sua campanha contra
os judeus.
O livro Os Protocolos foi produzido pela Okhrana, a polícia
secreta russa para convencer o Tzar Nicolau II de que o progra-
ma de modernização da Rússia era na verdade uma conspiração
judaica para tomada do poder.

Figura 9. Eisner mostra como os nazistas se apropriaram


de uma falsificação para perseguir judeus

Capa s Expediente s Sumário s Autor 39


A produção do texto ficou por conta do falsificador Mathieu
Golovinski, que copiou trechos inteiros do panfleto O diálogo
no inferno entre Maquiavel e Montesquieu, escrito por Mauri-
ce Joly para criticar o imperador Napoleão III em 1864. O livro
acusava os judeus de manipular os reformistas sociais, a impren-
sa, o sistema educacional e os movimentos trabalhistas. Insistia
que os judeus queriam destruir a civilização cristã como forma de
chegarem ao poder.

O resultado disso foram inúmeros progons organizados


por grupos reacionários como as Centúrias Negras nos
quais morreram milhares de judeus. O panfleto voltou a se
tornar popular em 1917, quando os anticomunistas “bran-
cos” o usaram como propaganda, alegando que a revolução
era resultado de uma conspiração judaico-bolchevique.
Com a derrota dos brancos, Alfred Rosemberg, chamado
por Norman Cohn de fiador do genocídio, importou o li-
vreto para a Alemanha e o usou na campanha nazista. Na
Europa dos anos 1920 e 1930 os Protocolos só eram menos
populares que a Bíblia e acabaram sendo a base da propa-
ganda nazista, sendo citados inclusive por Hitler no livro
Minha luta (DANTON, 2019, p. 74).

A história termina com a prova definitiva de que os Protocolos


são falsos. O renomado historiador Mikhail Lepekhine provou,
graças aos arquivos mantidos pela antiga União Soviética, que os
protocolos foram escritos pelo falsificador Mathieu Golovinski.
Mas a sequência final mostra o desanimo do autor. Eisner está no
meio de uma manifestação e pergunta por que as pessoas estão
portando cópias dos Protocolos. As respostas seguem o mesmo
padrão: “Eles mostram que os judeus querem mandar na gente!”;
“Tem um judeu em cada posto importante do governo no mun-

Capa s Expediente s Sumário s Autor 40


Big book

do ocidental, sacou?”; “Os judeus estão por trás de tudo de ruim


que acontece hoje!”; “É, os planos deles estão todos escritos nos
protocolos, sacou?”.
Eisner se revolta: “Esperem um minuto! E se já foi provado
que o livro é uma farsa? É a invenção de um falsário que traba-
lhava para o velho serviço secreto russo em 1898, para difamar
judeus. Os protocolos nunca existiram... nunca!”.
As respostas são surpreendentes e revelam o nível de disso-
nância cognitiva dos seguidores dos Protocolos: “Talvez os judeus
só tenham usado o livro para fazer seus planos!”; “Mesmo se for
falso, as pessoas devem ler o livro porque explica os judeus!”.
Segundo Umberto Eco (2006, p. 7), “(...) não são os Protocolos
que geram o anti-semitismo; é a profunda necessidade das pesso-
as de isolar um Inimigo que as leva a acreditar nos Protocolos”.

Big book

Além desses exemplos mais famosos, há diversos exemplos


de Jornalismo em Quadrinhos espalhados pelos mais diversos
meios de comunicação.
A DC Comics, por exemplo, lançou a série de antologias Big
Book entre 1994 e 2000. Eram histórias curtas, muitas delas com
farta pesquisa bibliográfica, explorando diversos aspectos do as-
sunto do volume.
Entre os títulos estavam Lendas Urbanas, Conspirações e
Hoaxes (histórias falsas).
A maioria dos volumes tinha histórias escritas por um único
autor (principalmente Doug Moench e John Wagner) e desenha-
das por diversos artistas.
Muitos artistas famosos participaram da série. Foi o primeiro
trabalho americano de Frank Quitely. Veteranos da indústria dos
comics, como Joe Orlando, George Evans e Marie Severin, Russ

Capa s Expediente s Sumário s Autor 41


Heath e Gray Morrow também estavam presentes. Até mesmo
Joe Sacco participou ilustrando uma história.
Desse material, provavelmente a única história publicada no
Brasil foi Psichedelle Cia, de Doug Moench e Alex Wald. A HQ
de sete páginas saiu na revista General Visão zero e fala sobre o
envolvimento da CIA em experiências com psicodélicos.

Figura 10. Os livros da série Big Book eram temáticos


e muitas história tinham características jornalísticas,
como essa, sobre a CIA e as experiências com LSD

Capa s Expediente s Sumário s Autor 42


Narrada por um apresentador hippie, a HQ conta como os
militares norte-americanos descobriram as experiências nazistas
com psicodélicos e controle da mente e criaram um departamen-
to na CIA para pesquisar a possibilidade do uso de LSD como
forma de controle social.
“A operação Midnight-climax incluía prostitutas drogando as
bebidas de seus clientes. Os bordéis na verdade eram ‘aparelhos’
da CIA, que filmava tudo através de espelhos falsos (...) Depois de
ter sido drogado com LSD num ‘inferninho’ da CIA, um homem
pulou através de uma janela. A CIA chamou de ‘suicídio’ até 1975,
quando finalmente se desculpou”, diz o texto.
Dough Moench levanta a hipótese de que Lee Harvey Oswald,
supostamente o assassino do presidente Kennedy, teria feito par-
te das experiências de controle da mente com LSD, já que ser-
via numa base americana que foi alvo de experiências com LSD.
Outra hipótese levantada pelo autor é de que o LSD foi usado
para transformar o movimento político contra a guerra do Vietnã
numa geração apática e “viajadona”.
Tirando os comentários (que poderiam se encaixar no jorna-
lismo de opinião), a maioria da história é focada em fatos cujas
fontes são publicadas no final do volume.
Os Big Books editados pela DC Comics inspiraram uma pu-
blicação nacional, editada por Leonardo Santana e lançada em
2008, Prismarte Conspirações.
Como no original americano, a revista trazia diversas histórias
curtas. Algumas eram apenas simples conjecturas sobre o tema,
como “Seu Raimundo e a urna eletrônica”, de Leonardo Santana
e Will. Outras revelavam a pesquisa em fontes bibliográficas no
estilo dos Big Books.
Embora seja focado nas teorias da conspiração sobre o 11 de se-
tembro e tenha um tom humorístico, “Bin Laden, Brasil e os cha-
rutos cubanos” cita vários fatos reais colhidos em notícias à época.

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Figura 11. Bin Laden, Brasil e os charutos cubanos costurava diversas
informações aleatórias sobre o atentado de 11 de setembro

Escrita por mim (com o pseudônimo de Gian Danton) e ilus-


trada pelo desenhista curitibano Antonio Eder, a HQ é apresen-
tada por um papagaio, que diz: “Os ataques terroristas de 11 de
setembro. O assunto é um prato cheio para teorias conspirató-
rias, algumas delas envolvendo o Brasil. (...) Numa situação em
que informações oficiais são omissas, mentirosas (...) e forjadas
para servir a interesses escusos (...) Em uma situação como essa,
até as teorias mais surreais acabam fazendo algum sentido”.
Por trás do humor e das teorias da conspiração, informações
reais aparecem: Bin Laden de fato visitou Foz do Iguaçu em bus-

Capa s Expediente s Sumário s Autor 44


ca de financiamento; Os EUA acusaram o Iraque de ter armas
de destruição em massa; o brasileiro morto na Inglaterra con-
fundido com um terrorista foi acusado falsamente de estupro; o
governo americano tentou contratar uma empresa da família Bin
Laden para fazer a segurança dos portos americanos; a família
Bin Laden foi retirada dos EUA num avião do governo antes de
serem interrogados pela CIA.
Outra história da dupla é “PC Farias”, sobre o tesoureiro de
campanha do presidente Fernando Collor. Na história, as infor-
mações factuais são repassadas essencialmente através dos tex-
tos das legendas, enquanto os diálogos e as ilustrações dão o tom
de humor da história, chamando a atenção do leitor e deixando
a leitura fluída.
As fontes aí eram todas documentais. A pesquisa foi feita em
jornais e revistas da época, além do livro Todos os sócios do pre-
sidente, de Gustavo Krieger, Luiz Antônio Novaes e Tales Faria.

Figura 12. A HQ PC Farias une humor e informação

A introdução de humor na história pode dar a impressão de


que torna a HQ menos jornalística. Entretanto, Kuncizk (2001)
lembra que diversão não é o oposto da informação. Ao contrario,
na cabeça do receptor, o oposto de entretenimento não é infor-
mação, mas aquilo que não lhe agrada.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 45


Demonstração de que essa separação entre jornalismo e di-
versão tem caído é o conceito de infotenimento. Segundo Dejavi-
te (2006, p. 71),

Tal termo surgiu durante a década de 1980, mas só ga-


nhou força no final dos anos 1990, quando passou a ser
empregado por profissionais e acadêmicos da área comu-
nicacional, como sinônimo daquele jornalismo que traz
informação, prestação de serviço e ao mesmo tempo ofe-
rece divertimento ao receptor.

Segundo a autora, a distinção entre jornalismo e entreteni-


mento nunca foi nítida e a sobreposição é quase inevitável nos
dias atuais. “No jornalismo de INFOtenimento uma mesma ma-
téria pode muito bem informar entretendo ou, então, entreter
por meio da informação” (DEJAVITE, 2006, p. 72).
Na HQ esse aspecto de união entre diversão e informação já
aparece no primeiro quadro. O texto diz: “PC Farias foi a figura
mais importante do governo Collor. Embora não tivesse nenhum
cargo oficial, ele mandava mais do que ministros ou secretários.
Responsável pelo esquema de corrupção que desviou 1 milhão de
dólares, ele era o queridinho do presidente”. A imagem mostra
PC Farias e Collor abraçados no meio de uma chuva de dinheiro.
PC faz sinal de chifre sobre a cabeça do presidente, sinal da inti-
midade entre os dois.
Mas as imagens são usadas não só para trazer humor, mas
também para introduzir informações. Na página 5, por exemplo,
é mostrada a primeira versão da polícia, segundo a qual Suzana
teria matado PC e depois se suicidado. Essa versão foi contestada
por alguns legistas pelo fato da posição do tiro ser difícil para al-
guém que estava atirando em si mesma. O desenho mostra isso.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 46


Figura 13. Mesmo humorísticas, as imagens repassavam
informações importantes sobre o caso PC Farias

Talvez a página que melhor trabalhe o humor seja a última,


que mostra as várias possibilidades a respeito do crime, que nun-
ca foi de fato solucionado. Numa primeira versão, PC teria sido
morto a mando de Collor, como queima de arquivo.
Como outra pessoa cometendo o assassinato não daria ao lei-
tor a percepção de que o crime tinha sido cometido a mando do
ex-presidente, optou-se por colocar o próprio Collor atirando. O
ex-presidente diz: “Não te amo mais”, numa alusão à primeira
versão da polícia, mostrada na HQ com Suzana atirando e dizen-
do essas mesmas palavras.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 47


Outros exemplos

O quadro seguinte mostra alguém misterioso, de óculos es-


curos, atirando e dizendo: “La garantia soy jo”, numa alusão a
um famoso comercial da época em que um paraguaio dizia essas
mesmas palavras. Nessa versão, os assassinos seriam traficantes
de drogas panamenhos com os quais PC tinha relações.
No quadro seguinte, alguém exatamente igual a PC farias atira
enquanto diz: “Ó chente, maninho, eu não ti amo mais”, numa
referencia à versão de que PC teria sido morto pelo irmão.
No quadro seguinte aparece um segurança atirando e dizen-
do: “Patrão, nós nunca te amamos!”. Nessa versão o crime teria
sido cometido pelos seguranças, interessados em ficar com a for-
tuna do ex-tesoureiro.

Outros exemplos

Além de publicações voltadas para o Jornalismo em Quadri-


nhos, há diversos outros exemplos recorrentes no próprio jorna-
lismo diário.
Exemplo disso foi a história em quadrinhos Luakam, assinada
por Pablito, usada como chamada de Facebook para a matéria
sobre a mulher índia que se tornou um sucesso com a venda de
bonecas indígenas pela internet. Com um traço muito simples,
mas igualmente representativo, a HQ conta, em apenas sete qua-
dros, a história de Luakan, que trabalhava em uma fazenda em
troca de pouso e comida. Quando foi a uma feira, viu uma boneca
pela primeira vez, mas a patroa se recusou a comprá-la. Anos de-
pois, ela fez uma boneca para a neta que ia nascer, o que lhe deu
a ideia de vender pela internet. A HQ funciona como se fosse uma
chamada do jornalismo televisivo, inclusive com os apresenta-
dores aparecendo no último quadro. Como a HQ foi publicada
na rede social Facebook, os quadrinhos foram divididos, sendo
visualizados um a um, o que facilitava a leitura.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 48


Figura 14. A HQ Luakam funciona como chamada da matéria televisiva

Há vários outros exemplos. Robson Vilalba fez diversas histó-


rias em quadrinhos sobre fatos futebolísticos para o jornal A Gaze-
ta do Povo, de Curitiba. Na edição de 25 e 26 de fevereiro de 2017,
ele publicou uma história sobre quando uma partida entre o Co-
ritiba e o Atlético Paranaense (o conhecido Atletiba) foi cancelada
por divergências a respeito de quem faria a transmissão do clássi-
co. Com desenhos que privilegiam os contrastes, a HQ usa apenas
balões legenda e descreve passo a passo todos os acontecimentos
daquele dia em que jogadores dos dois times rivais se uniram no
campo enquanto os torcedores travavam uma batalha.
Em 11 de setembro de 2021, 20 anos depois dos atentados a
Nova York, o jornal O Estado de S. Paulo fez uma matéria sobre
o atentado terrorista que mudou o mundo e inovou apresentando
a reportagem na forma de uma história em quadrinhos que ga-
nhou destaque na capa.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 49


Figura 15. As histórias de Robson Vilalba eram feitas
para ocupar uma página inteira do jornal

Capa s Expediente s Sumário s Autor 50


Figura 16. A HQ sobre os atentados de 11 de setembro
foi destaque na capa do jornal O Estado de S. Paulo

Com roteiro de Rodrigo Turrer e desenhos de Marcos Muller,


a história é narrada do ponto de vista de uma testemunha dos
atentados que parece ser uma jornalista, já que não só narra os
fatos, mas também reflete sobre eles e sobre como os atentados
mudaram a face do mundo. A HQ mostra como os EUA come-
çaram uma guerra sem fim contra o terrorismo e o impacto que
isso teve sobre o mundo, inclusive com a criação de grupos ainda
mais radicais. A HQ avança até a saída atabalhoada dos EUA do
Afeganistão, o que fez com que o grupo Taliban tomasse o poder.
O estilo de desenho privilegia o contraste, provavelmente para
facilitar a compreensão das imagens.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 51


Capítulo 3 - A série Psicopatas

Capítulo 3

A série Psicopatas

A série Psicopatas surgiu no ano de 2017. Neste ano a revista


calafrio, da editora Ink&Blood publicou, no seu número 58 a
história “Monstros” retratando o serial killer Jeffrey Dahmer.
A HQ era escrita por mim (sob pseudônimo de Gian Danton)
e ilustrada por Edson Kohatsu.
O foco ainda não era de jornalismo em quadrinhos. A propos-
ta era usar um caso real para provocar medo através da sensação
de insegurança, como demonstrado no texto final: “O garoto afá-
vel que todos gostavam foi condenado a quase mil anos de pri-
são. Mas não pense que está seguro. Há muitos outros como ele.
Pessoas acima de qualquer suspeita. Nunca se sabe onde estão.
Talvez na casa ao lado. Ou dormindo com você”.
A ideia aí era fazer uma história solo, mas o resultado – e a
reação dos leitores – me animou a sugerir ao editor Daniel Sarks
uma série focada no tema psicopatas com biografias de assassi-
nos seriais.
Já na Calafrio 59 aparece a segunda história da série, com seu
formato definitivo, como um pôster central da revista. Intitulada “O
homem mais diabólico que já andou sobre a terra”, essa HQ, dese-
nhada por Fábio Vermelho, contava a trajetória de Charles Manson.
Desde então a série se tornou um quadro fixo na revista, rece-
bendo diversos elogios de leitores.
Já foram publicados os perfis dos seguintes assassinos seriais:
Jeffrey Dahmer (com desenhos de Edson Kohatsu - publicado em
Calafrio 58); Charles Manson (com desenhos de Fábio Vermelho

Capa s Expediente s Sumário s Autor 52


– publicado em Calafrio 59); John Wayne Gacy (com desenhos
de Guto Dias – publicado em Calafrio 60); Big Ed (com desenhos
de Juliano Kaapora – publicado em Calafrio 61); Ed Gein (com
desenhos de Décio Ramirez – publicado em Calafrio 62); Paul
Bernardo e Karla Homolka (com desenhos de Marco Cortez –
publicado em Calafrio 64); Jack, o estripador (com desenhos de
Ivan Lima – publicado em Calafrio 66); Elizabeth Bathory (com
desenhos de Aurea Chu – publicado em Calafrio 67); Ted Bun-
dy (com desenhos de Chris Cuffi – publicado em Calafrio 68);
Assassino do Zodíaco (com desenhos de Eduardo Cardenas –
publicado em Calafrio 69); Pedro Lopez (com desenhos de João
Ferreira – publicado em Calafrio 71) e Tiago Henrique Gomes
da Rocha, o maníaco de Goiânia (com desenhos de Cláudio Du-
tra – publicado em Calafrio 72); Ivan Milat (com desenhos de
Bira Dantas – publicado em Calafrio 73). Também foi publica-
da a história “Como reconhecer um psicopata”, com desenhos de
Antônio Eder, publicada em Calafrio 74.
Segundo Daniel Sarks, editor da revista, fazer uma série sobre
assassinos seriais foi uma sugestão maravilhosa:

Lembro que a ideia de transformar em pôster central veio


automática na minha cabeça, e do Gian veio a proposta de
que cada HQ tivesse um desenhista diferente. Com muitos
capítulos já publicados, alguns em produção e muitos que
ainda virão, a série se tornou um dos pontos de referência
para leitores, não houve até agora uma objeção à série, e
os artistas participantes da editora aguardam sua vez de
poderem contribuir com um novo psicopata (Daniel Sarks
– depoimento ao autor).

Neste capítulo iremos analisar o processo de produção das HQs


da série a partir da concepção do Jornalismo em Quadrinhos.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 53


Uma matéria jornalística sempre começa pela apuração das
informações, a consulta às fontes. O Dicionário de comunicação
define fonte como “qualquer pessoa usada por um repórter na
sua busca por informação” (RABAÇA; BARBOSA, 1978, p. 212).
Essa definição, assim como a popularidade do trabalho de Joe
Sacco, pode dar a entender que uma história em quadrinhos só é
jornalística se houver a entrevista de fontes testemunhais.
No entanto, há toda uma variedade de fontes, destacadas pe-
los mais diversos autores.
Lage (apud SCHMITZ, 2021) descreve a natureza das fontes
como sendo mais ou menos confiáveis, pessoais, institucionais
ou documentais.
Chaparro (apud SCHMITZ, 2021) classifica as fontes como:
“organizadas” (organizações que produzem conteúdos noticiá-
veis com grande competência e utilizam a notícia como forma
de ação); “informais”, que falam apenas por si; “aliadas”, infor-
mantes que mantêm uma relação de confiança com os jornalis-
tas; “de aferição” (especializadas em certos temas e cenários);
“de referência”, entendidas como pessoas sábias ou instituições
detentoras de um conhecimento; “documentais”, referente a do-
cumentos de origem confiável e identificada; e “bibliográficas”,
que abrange livros, teses e artigos sobre o assunto.
Em alguns casos, como o jornalismo histórico, as únicas fon-
tes disponíveis são especialistas no assunto, livros e documentos.
A bibliografia envolve livros, artigos, teses e outras produções
científicas, tecnológicas e culturais.
Segundo Schmitz, (2021), as fontes bibliográficas fundamen-
tam o conteúdo jornalístico: “Também servem de fonte as mí-
dias, como jornais, revistas, audiovisuais e, com a consolidação
das tecnologias de informação e comunicação, proliferam as re-
des sociais (Twitter, Orkut, Facebook, MySpace etc.), portais, si-

Capa s Expediente s Sumário s Autor 54


tes, blogs, que também produzem conteúdos e servem de fontes
de consulta, embora passíveis de distorções”.
Por tratar de fatos antigos e muitas vezes ocorridos fora do Bra-
sil, seria impossível a consulta a fontes testemunhais para elabora-
ção das histórias da série Psicopatas. A única exceção diz respeito
ao Maníaco de Goiânia. Eu estava na cidade na época em que ele
agia e acompanhei pela mídia não só os assassinatos, mas sua pri-
são. Mas, mesmo nesse caso, as principais fontes foram documen-
tais: as matérias de jornais publicada na época sobre o assunto.
Dessa forma, o processo de produção do roteiro de uma HQ da
série Psicopatas começa com a consulta a fontes documentais/
bibliográficas. Todo tipo de material sobre o assunto é consulta-
do: livros, revistas, sites, notícias. Para alguns fatos específicos,
quando há divergência entre as fontes, outras fontes são procura-
das e confrontadas. Como a série ocupa apenas uma página, não
são destacadas as divergências entre as fontes, sendo escolhida a
versão que aparenta ser mais fidedigna (numa JHQ mais ampla
o ideal seria mostrar as várias versões).
Esse processo de pesquisa gera um texto-resumo com os prin-
cipais acontecimentos ligados àquele assassino serial. Boa parte
do texto desse resumo é reaproveitado nas legendas da história.
Veja um trecho do resumo feito sobre o psicopata Andrei Chi-
katilo, que assassinou diversos meninos e meninas nas décadas
de 70, 80 e 90 nos arredores da localidade de Rostov:

Em 22 de dezembro de 1978, Lena Zekotnova, de 9 anos,


foi abordada no ponto de ônibus quando um senhor muito
bem vestido se aproximou dela e prometeu-lhe chicletes
importados se ela o acompanhasse até sua casa.
Do outro lado da rua, uma mulher esperava um taxi e
observou a cena da linda menina de casaco vermelho se-

Capa s Expediente s Sumário s Autor 55


guir alegremente o homem de aproximadamente 40 anos,
usando óculos de grau e um capote preto.
O homem levou a menina até um barracão, onde tirou sua
roupa. Para evitar que a menina continuasse gritando, ele a
estrangulou até que ela desmaiasse. Então tentou estuprá-
-la, mas como não conseguiu, enfureceu-se e esfaqueou-a
diversas vezes. Ele jogou o corpo no rio Grushovka, mas
não percebeu que o sangue da garota manchara a frente de
seu barraco. Ele também esquecera a luz acesa.

A fase seguinte é a produção do roteiro, a partir do resumo.


Essa fase inclui a escolha do foco narrativo, a divisão das ações em
quadros, o corte de informações menos relevantes, a redução de
frases que serão aproveitadas do resumo, a escolha de quais infor-
mações aparecerão na história como texto e quais como imagem.
Também nessa fase é feita a pesquisa de imagens de apoio.
Veja como ficou o roteiro referente a essa parte do resumo:

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Figura 17. Produção do roteiro a partir do resumo

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No caso acima, o foco narrativo é o mesmo do resumo (a his-
tória começa pela morte da menina Lena Zekotnova). Mas há vá-
rias diferenças entre o resumo e o roteiro. As informações sobre
a roupa e as características físicas de Chikatilo, que no resumo
apareciam como texto, são colocadas como descrição para o de-
senhista ou como imagem de apoio.
Também é feita uma considerável redução no texto. O trecho
“Em 22 de dezembro de 1978, Lena Zekotnova, de 9 anos, foi
abordada no ponto de ônibus quando um senhor muito bem ves-
tido se aproximou dela e prometeu-lhe chicletes importados se
ela o acompanhasse até sua casa” transforma-se, no roteiro, em:
“22 de dezembro de 1978. Lena Zekotnova é abordada no ponto
de ônibus por um senhor que prometeu-lhe chicletes importados
se ela o acompanhasse até sua casa”. Só para termos de compa-
ração, o texto no resumo tinha 209 toques e o texto do roteiro
referente ao mesmo fato tem 156 toques.
Também a informação da mulher que vê o psicopata abordan-
do a menina é transformada em descrição para o desenhista, ali-
viando a parte textual. A informação sobre a mulher aparece no
texto apenas após o assassinato, quanto esta liga para a polícia:
“Uma senhora que havia visto a menina sendo abordada procurou
a polícia e fez um retrato falado, que foi espalhado pela cidade”.
A elaboração do roteiro deve seguir alguns princípios.
O primeiro deles é evitar ao máximo a redundância entre as
imagens e o texto.
Segundo Oliveira (2010, p. 26), “O conceito de redundância é
absolutamente oposto ao de informação. Enquanto a informação
significa variedade, novidade, a redundância significa falta de va-
riedade ou simplesmente repetição”.
A redundância nos quadrinhos acontece quando texto e ima-
gem concorrem entre si, transmitindo a mesma informação. É o
que ocorria, por exemplo, em alguns quadrinhos clássicos, como

Capa s Expediente s Sumário s Autor 58


Flash Gordon, em que a imagem mostrava o herói socando o vi-
lão e o texto dizia algo como “Flash dá um soco em Ming”.
Exemplo desse processo de evitar a redundância de forma que
texto e imagem transmitam informações diferentes é a história re-
ferente ao assassino do Zodíaco. No resumo feito a partir da con-
sulta das fontes bibliográficas, apareciam detalhes de um dos as-
sassinatos. Zodíaco mata o casal e escreve na porta do carro uma
mensagem. O texto-resumo indicava também o tipo de carro.
As informações sobre a inscrição na porta do carro foram para
a descrição ao desenhista e os detalhes sobre o carro foram resol-
vidos com uma foto de referência.

Figura 18. Uso de foto de referência para a construção do roteiro

Abaixo como ficou a mesma sequência desenhada por Edu-


ardo Cardenas. Observa-se que a quantidade de texto no quadro
ficou equilibrada, e complementa a imagem.

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Figura 19. Detalhe da HQ Zodíaco

Na história sobre Jack, o estripador, temos um processo seme-


lhante. Na parte referente ao assassinato de Catherine Eddowes,
o texto-resumo trazia a informação de que o assassino escrevera
no muro uma mensagem contra os judeus. Essa informação tex-
tual transformou-se em informação imagética no roteiro:

Quadro 3 – Jack trabalhando em Catherine. Faça o dese-


nho de forma que apareça ele tirando um órgão, mas não
apareça seu rosto, a cena sendo vista de trás. No muro está
escrito: “Os judeus não são homens que serão culpados
por nada”.
Texto: No dia 30 de setembro, o assassino matou duas
prostitutas. As vítimas foram Elizabeth Stride e Catherine
Eddowes. Aparentemente, o assassino foi interrompido e
não conseguiu mutilar Elizabeth. Mas compensou com Ca-
therine. Ela foi degolada, seu abdômen foi aberto. Seu rim
esquerdo e parte do útero foram removidos.

O desenhista Ivan Lima, seguindo o roteiro, deu destaque para


as inscrições no muro. O resultado evitou que essa informação
fosse repassada textualmente, enxugando o texto e, ao mesmo
tempo, chamando a atenção para o fato.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 60


Figura 20. Na HQ Jack, o estripador, a informação
sobre a inscrição no muro foi repassada de forma visual

Outo princípio básico da elaboração do roteiro é: cada painel


deve ter apenas uma ação.
Veja abaixo trecho do roteiro da HQ sobre o assassino Big Ed:

Q2 – Ed pequeno, enterrando o gato da família. Imagino


essa cena vista de cima para baixo, como se ele estivesse
curvado, empurrando o gato para dentro do buraco e nós
estivéssemos pouco acima do seu ombro.
Texto: Ed foi uma criança problemática, especialmente
depois da separação dos pais. Certa vez ele enterrou vivo o
gato da família e depois o desenterrou, removeu sua cabe-
ça e a manteve em seu quarto, como um troféu.
Q3 – Podemos brincar aqui. Fazer uma imagem como se fos-
se uma foto de família, com Ed sorrindo no centro e os avós
um de cada lado. Mas há um tiro na nuca de cada um deles.
Texto: Aos 15 anos ele foi enviado para morar com os avós
em uma fazenda. Algum tempo depois ele atirou nos dois.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 61


Quando o prenderam, ele disse que só queria saber “como
era atirar na vovó.

Como se pode os quadros 2 e 3 trazem cada um deles um fato,


uma ação.
O quadro 2, por exemplo, se refere a várias ações: Big enterra
o gato da família, o desenterra, corta sua cabeça, coloca a cabeça
como enfeite no quarto. Desenhar tudo isso num único quadro
seria impossível, de modo que escolhi apenas uma ação para apa-
recer como imagem (ele enterrando o gato) e o restante da sequ-
ência de ações foi expressa através do texto.
No quadro 3 temos, de novo, vários fatos ou ações: Big Ed
chega para morar com os avós, ele atirando nos avós, ele sendo
preso. A escolha foi por uma ação que não consta na lista acima
e é puramente fictícia, mas é muito simbólica e expressa perfei-
tamente a situação: o garoto ao lado dos avós mortos, como se
estivessem posando para uma fotografia.
Edmund Kemper era famoso pelo narcisismo, pelo orgulho
que sentia pelos crimes cometidos. Assim, mostrá-lo como se es-
tivesse posando para uma foto ao lado dos avós mortos, embora
não seja real, é verossímil, já que expressa a personalidade do
personagem.
Veja como ficou a página desenhada por Juliano Kaapora:

Capa s Expediente s Sumário s Autor 62


Figura 21. Na HQ sobre Big Ed um exemplo
de como quadro deve mostrar apenas uma ação

Finalmente, o terceiro princípio é pensar a história e o texto


como um todo e não como elementos isolados compostos por vá-
rios quadrinhos. No caso da série Psicopatas, isso inclui pensar
também a página como um todo, inclusive pensando nos signifi-
cados adjacentes.
Na história sobre Charles Manson, por exemplo, a diagrama-
ção da página foi pensada para que o jovem Charles Manson, no
início da história, de certa forma “olhasse” para o Charles Man-
son velho, no final e os dois parecessem olhar para o leitor. A
ideia era mostrar alguém capaz de hipnotizar o leitor da mesma
forma que Manson manipulou seus seguidores para cometerem
assassinatos.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 63


Figura 22. A diagramação foi pensada para que os Mason
jovem e velho olhassem um para o outro e para o leitor

Da mesma forma que numa matéria jornalística impressa,


numa história em quadrinhos também existe um lead (ou lide),
um quadro que resume os acontecimentos ou destaca aspectos
mais importantes da história.
O dicionário de comunicação define da seguinte forma o lide:
“Abertura de uma notícia, reportagem etc., onde se apresenta su-
cintamente o assunto ou se destaca o fato essencial, o clímax da
história. Resumo inicial, constituído pelos elementos fundamen-
tais do relato a ser desenvolvido no corpo do texto jornalístico”
(RABAÇA; BARBOSA, 1978, p. 278-279.)

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Na história sobre Charles Manson, por exemplo, o roteiro do
primeiro quadro destaca, de forma muito resumida os aspectos
mais importantes da história do biografado:

Q1 – Este quadro será uma espécie de mosaico, com várias


imagens, tendo o rosto de Charles Manson ao centro, com o
olhar satânico que o tornou famoso. Ao redor dele coloque
imagens dos Beatles e títulos de músicas dos Beatles: Yer
Blues, Revolution #9, Blackbird, Piggies, Helter Skelter.
Texto: Beatles, guerra raciais, uma seita satânica e assas-
sinato em massa. Conheça a história de Charles Manson, o
homem mais diabólico que já andou sobre a terra.

Veja o quadro, desenhado por Fábio Vermelho:

Figura 23. A ideia da imagem era mostrar


uma figura capaz de “hipnotizar” o leitor

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É interessante notar que, como dito anteriormente, imagem e
texto se complementam. Nesse caso, o rosto de Manson, a legenda
e os nomes das músicas, colocados graficamente de modo a pare-
cerem parte da imagem, tudo isso se completa para formar o lead.
A HQ sobre Ted Bundy segue modelo semelhante, com um
lead que sintetiza as principais informações sobre o biografa-
do: “Um homem jovem, bonito, inteligente, simpático e com um
grande futuro pela frente. Ted Bundy era o esposo que toda mu-
lher gostaria de ter. Exceto por um detalhe: ele matava mulheres
nas horas vagas”.
A imagem do quadro mostrava simplesmente o psicopata bem
trajado e com aparência simpática (em consonância com o fato
de Ted Bundy ser chamado de “o galã serial killer”) como se pode
ver na imagem desenhada por Chris Ciuff:

Figura 24. O texto inicial da história


sobre Ted Bundy funciona como lead

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Um exemplo diferente de lead foi a HQ sobre Jack, o estripa-
dor. Ao invés de focar no personagem, o texto privilegia o con-
texto, a ambientação: “Londres, final do século XIX. Nos cantos
mais escuros da cidade, em meio ao fog e à pobreza extrema sur-
ge um assassino que se tornaria um dos mais famosos de todos
os tempos. Prezados leitores, conheçam a história de... JACK, O
ESTRIPADOR”.
A ideia original era que a página de HQ simulasse um jornal
popular do século XIX, chamado à época de penny press, o que
explica a expressão “prezados leitores”, em desuso no jornalis-
mo moderno. Assim, o título JACK, O ESTRIPADOR aparece-
ria como a manchete da página. A ideia era refletir, na própria
diagramação, sobre o papel da imprensa sensacionalista na di-
mensão do fenômeno. O desenhista Ivan Lima, no entanto, não
seguiu o roteiro.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 67


Referências

Referências

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Conrad, 2004, p. 7.
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dade e simulacro nos quadrinhos: a fantástica história de Fran-
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GRASSO, Michael. “I’m Sellin’ Folks A Dream”: Alan Moore and
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-Graduação em Comunicação Social da Universidade Federal de
Minas Gerais. Belo Horizonte, 2010.
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judaica: uma releitura necessária. Disponível em: https://
quadrinheiros.com/2019/01/17/will-eisner-e-o-mito-da-
conspiracao-judaica-uma-releitura-necessaria. Acesso em: 16
set. 2021.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 71


Autor

Ivan Carlo Andrade de Oliveira


(também conhecido por Gian Danton)
é roteirista de quadrinhos desde 1989,
quando publicou sua primeira história
na revista Calafrio. Em todos esses anos, ele já trabalhou para
quase todas as editoras nacionais de quadrinhos e fez parceria
com vários desenhistas, entre eles Joe Bennet, que atualmente
desenha histórias para a Marvel Comics. Suas histórias já foram
publicadas até nos EUA, pela editora Phantagraphics.
Tem lançado diversos livros, muitos deles pela Virtual books.
Pela editora Marca de Fantasia lançou Ciência e Quadrinhos e
Watchmen e a teoria do caos, em 2005; em 2010, Caligari: do
cinema aos quadrinhos. Lançou ainda Grafipar, a editora que
saiu do eixo (Kalaco, 2012) e Como escrever quadrinhos (Marca
de Fantasia, 2015), ambos finalistas do prêmio HQ Mix.
Um dos seus trabalhos mais conhecidos é a revista Manticore,
ganhadora dos prêmios HQ Mix 1999 (melhor revista de terror e
desenhista revelação), Associação  Brasileira de Arte Fantástica
(melhor revista em quadrinhos), HQ Mix 2000 (melhor revista
de terror) e Angelo Agostini (melhor roteirista).
Escreveu textos para edição War – histórias de guerra, com
arte de Eugênio Colonesse, publicada pela Opera Graphica. É ro-
teirista da revista MAD. Foi um dos autores escolhidos para o
álbum MSP+50, lançado em homenagem a Maurício de Sousa. 
Gian Danton tem colaborado com várias publicações e sites e
mantém um blog, o Professor Ivan Carlo (http://ivancarlo.blogs-
pot.com). É professor da Universidade Federal do Amapá.

Capa s Expediente s Sumário s Autor 72


Mais obras de Gian Danton

Marca de Fantasia

O roteiro nas Histórias em


Quadrinhos
Gian Danton
2016, 2ed. 104p.
Manual para elaboração de roteiro para Como escrever quadrinhos
quadrinhos. Gian Danton
Edição digital 2015, 108p.
Segundo livro do autor sobre roteiros
para quadrinhos. Veja também "O rotei-
ro nas histórias em quadrinhos".

Acessíveis em
https://www.marcadefantasia.com/livros/livros.html

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Ciência e Quadrinhos
Gian Danton
2005, 60p. 12x18cm.
As descobertas científicas nas HQ, sua Watchmen e a teoria do caos
evolução e antecipações. Gian Danton
Análise da obra de Alan Moore.
2014, 3ed. 128p.
Edição digital

Capa s Expediente s Sumário s Autor 74


Caligari: do cinema aos
quadrinhos
Gian Danton
2020, 44p.
Análise sobre a adaptação aos
quadrinhos.
Edição digital

Hiper-realidade e simulacro: a incrível


história de Francisco Iwerten
Gian Danton
2019, 316p.
Edição digital

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