Em fevereiro de 1987 saía a primeira edição de Guerra das Idéias como edição extra do fanzine Quadrix, editado por Worney Almeida de Souza em São Paulo. Essa edição quase artesanal logo se transformou num acontecimento no meio dos quadrinhos independentes brasileiros. Esse magnífico álbum de Flávio Calazans é formado por uma série de pequenas histórias em quadrinhos de duas páginas que se encadeiam formando uma grande história muito bem estruturada, a história do processo civilizatório desde os primeiros agrupamentos humanos até a revolução telemática.
Calazans firmava-se, com Guerra das Idéias, como um dos mais criativos quadrinistas de sua geração, com uma obra baseada em pesquisas acadêmicas, com o experimentalismo no campo visual e a proposta inovadora do que viria a ser conhecido como “quadrinhos poéticos”, ou “poético-filosóficos”, como também são chamados. Guerra das Idéias parte desse princípio, da quebra da formatação dos quadrinhos comerciais, da exploração dos limites da criatividade e da crítica política por intermédio da reflexão pessoal.
Malgrado o álbum abordar um universo amplo e complexo, Calazans apresenta com maestria um verdadeiro tratado sobre a história da humanidade, suas lutas, contradições, mesquinhez e tiranias. Seu olhar é extremamente personalizado, mas ricamente fundamentado nos pequenos detalhes, minúcias de arquitetura, ambientação, vestuário, fauna e flora. O rigor na elaboração dos quadrinhos os aproxima da realidade histórica, ainda que subvertida pela interpretação crítica do autor.
O espírito contestador de Calazans flui perfeitamente em Guerra das Idéias, que se baseia na dualidade do cérebro: lado esquerdo x lado direito, conformismo x fantasia, lógica x liberdade criativa. As ideias revolucionárias contra os sistemas estabelecidos vêm à tona no discurso de negros, judeus, anarquistas, filósofos, que se confronta com preconceitos raciais, religiosos e políticos.