Mostra de SP | Animação brasileira "Bizarros Peixes das Fossas Abissais" esbanja criatividade
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  • Foto do escritorGuilherme Cândido

Mostra de SP | Animação brasileira "Bizarros Peixes das Fossas Abissais" esbanja criatividade


Longa-metragem de estreia de Marcelo Fabri Marão, ou simplesmente Marão, Bizarros Peixes das Fossas Abissais é a culminância de uma filmografia que já incluía 14 curtas e participações em mais de três centenas de animações. A trama de seu novo filme se passa em Nilópolis, município da região metropolitana do Rio de Janeiro e também sua terra-natal.




À primeira vista, Bizarros Peixes parece beber da fonte de A Era do Gelo ao apresentar a protagonista (dublada por Natália Lage) numa intensa missão de recuperar misteriosos cacos. Em paralelo, acompanhamos a rotina de uma carismática tartaruga (voz de Rodrigo Santoro) trabalhando numa espécie de armarinho. Entrecortando os dois núcleos, surge um desajeitado senhor de óculos, cujas intervenções aparentemente desconexas causam confusão num primeiro momento, mas não demora até que tudo faça sentido. Ou “quase tudo”.


Pois a maior virtude da produção está justamente na criatividade sempre irreverente do roteiro, também assinado por Marão. Afinal, estamos diante de um improvável trio formado por uma nuvem com incontinência urinária (ou pluviométrica), uma tartaruga com TOC é uma jovem com poderes, no mínimo, peculiares. Se Jack Nicholson interpretou uma versão mais radical e sem filtros de um portador de Transtorno Obsessivo Compulsivo no excepcional Melhor É Impossível, Rodrigo Santoro dá voz a uma visão mais civilizada, mas não menos divertida como a tartaruga. Dublada pelo sempre genial Guilherme Briggs, a nuvem, uma Cumulus Nimbus, encanta por sua timidez (ela não chove na frente dos outros), mas não mais que a protagonista, cuja seriedade inabalável adotada por Natália Lage favorece o humor do roteiro.


Com o super poder de transformar qualquer parte do corpo em um animal ao especificar em voz alta, ela provoca altas gargalhadas ao dizer, por exemplo, “minha bunda é um gorila!” pouco antes de detonar um grupo de rinocerontes espaciais que expelem suco de graviola sem açúcar (isso mesmo). Ou a versão completa de sua frase de efeito: “A minha bunda não está feliz e isso é ruim pra vocês, porque a minha bunda é um gorila”. E como não admirar um roteiro que faz graça de forma inteligente utilizando a Língua Portuguesa ao colocar a protagonista para corrigir um vilão? ("Encarar de frente é redundância. Encarar significa olhar de frente"). E não para por aí, pois o repertório afiado de Marão também traz brincadeiras divertidas com a cidade maravilhosa (“isso está em construção há mais de cem anos, parece o metrô do Rio!”), incluindo uma referência que só os cariocas pegarão (“é como uma confeitaria Colombo, só que mais barata”).

Além disso, o realizador explora ao máximo as possibilidades oferecidas por seus personagens. Assim, a cada vez que a personagem central usa seus poderes, um efeito colateral é provocado. E como a cidadã se esbalda ao longo da narrativa, somos presenteados com eventos inusitados como a adoção do suflê de cenoura como prato nacional, o sumiço da letra “J” ou a transformação das mulheres nas obras de Klimt e Mucha em bodes. A inventividade de Marão permite até o que parece ser uma piada interna com um dos animadores ao criar um artefato chamado “Os Olhos de Fernando Miller”.

Tecnicamente, o longa também merece elogios. Quando as tais intervenções do misterioso senhor de óculos são justificadas, seu design monocromático ganha uma conotação completamente diferente, por exemplo. A animação é fluida e traz dinamismo à história, com sequências de ação bem concebidas que aliam estética e performance (ao contrário do recente Atiraram no Pianista, que falhou no segundo quesito). A direção de arte ainda inclui alguns easter eggs que serão captados com facilidade pelos espectadores cariocas (note a fonte da estação de trem).


Pecando somente ao se estender numa sequência envolvendo as criaturas do título, que soa deslocada e compromete o ritmo, Bizarros Peixes das Fossas Abissais representa uma ótima estreia de Marão nos longas-metragens, oferecendo uma experiência divertida e criativa que imediatamente faz o espectador ansiar por ver a próxima obra do realizador Nilopolitano.


NOTA 8

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