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unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA<br />
“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”<br />
Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências e Letras<br />
Campus <strong>de</strong> Araraquara - SP<br />
<strong>Ricardo</strong> <strong>Luiz</strong> <strong>Sapia</strong> <strong>de</strong> <strong>Campos</strong><br />
Qualificação Profissional e Sindicatos. Entre Estado, Capital e<br />
Trabalho: um estudo <strong>de</strong> casos no meio rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto.<br />
ARARAQUARA/SP<br />
2007
<strong>Ricardo</strong> <strong>Luiz</strong> <strong>Sapia</strong> <strong>de</strong> <strong>Campos</strong><br />
Qualificação Profissional e Sindicatos. Entre Estado, Capital e<br />
Trabalho: um estudo <strong>de</strong> casos no meio rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto.<br />
ARARAQUARA/SP<br />
2007<br />
Tese <strong>de</strong> Doutorado, apresentada ao Programa<br />
<strong>de</strong> Pós Graduação em Sociologia, da<br />
Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências e Letras –<br />
<strong>Unesp</strong>/Araraquara, como requisito para<br />
obtenção do título <strong>de</strong> Doutor em Sociologia.<br />
Classe e movimentos sociais<br />
Orientadora: Leila <strong>de</strong> Menezes Stein<br />
Co-orientador: Giuseppe Mario Cocco<br />
Bolsa: FAPESP
Ficha Catalográfica : <strong>de</strong>ve ser impressa no verso da folha <strong>de</strong> rosto.<br />
Devem ser enviados a biblioteca capa, folha <strong>de</strong> rosto, resumo com palavras-chave,<br />
sumário e número total <strong>de</strong> folhas do trabalho para a elaboração da ficha, através do email:<br />
bib@fclar.unesp.br
<strong>Ricardo</strong> <strong>Luiz</strong> <strong>Sapia</strong> <strong>de</strong> <strong>Campos</strong><br />
Qualificação Profissional e Sindicatos. Entre Estado, Capital e<br />
Trabalho: um estudo <strong>de</strong> casos no meio rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto.<br />
Data <strong>de</strong> aprovação: 29/03/2007<br />
Tese <strong>de</strong> Doutorado, apresentado ao<br />
Programa <strong>de</strong> Pós – Graduação da Faculda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> Ciências e Letras – <strong>Unesp</strong>/Araraquara,<br />
como requisito para obtenção do título <strong>de</strong><br />
Doutor em Sociologia.<br />
Sociologia Rural<br />
FAPESP<br />
MEMBROS COMPONENTES DA BANCA EXAMINADORA:<br />
Presi<strong>de</strong>nte e Orientador: Dra. Leila <strong>de</strong> Menezes Stein<br />
UNESP/FCL/Ar.<br />
Membro Titular: Dr. Milton Lahuerta<br />
UNESP/FCL/Ar.<br />
Membro Titular: Dra. Maria Teresa Micelli Kerbauy<br />
UNESP/FCL/Ar<br />
Membro Titular: Dr. Jacob Carlos Lima<br />
UFSCAR – Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> São Carlos<br />
Membro Titular: Dra. Giselia Franco Potengy<br />
UFPE - Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Pernambuco<br />
Universida<strong>de</strong> Estadual Paulista<br />
Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências e Letras<br />
UNESP – Campus <strong>de</strong> Araraquara
Á<br />
Ciccia, Seme, Shakespeare e Legião,
Muitos seriam, limito-me aos imprescindíveis:<br />
AGRADECIMENTOS<br />
Á FAPESP – Fundação <strong>de</strong> Amparo a Pesquisa do Estado <strong>de</strong> São Paulo que financiou<br />
esta pesquisa.<br />
As instituições, fe<strong>de</strong>rações sindicais, confe<strong>de</strong>ração, sindicatos, Institutos <strong>de</strong> pesquisa,<br />
Secretaria <strong>de</strong> Emprego e Relações <strong>de</strong> Trabalho, ao SENAR e SERT, SEBRAE, FAT,<br />
DIEESE, UNITRABALHO, ao IIEP, Comissão Municipal <strong>de</strong> Emprego <strong>de</strong> Araraquara,<br />
por meio do pessoal que pacientemente, “tolerou”, as inquietações do pesquisador.<br />
Aos funcionários da UNESP e em especial aqueles do Programa <strong>de</strong> Pós – Graduação<br />
em Sociologia.<br />
Á Banca que pacientemente leu o trabalho.<br />
Ao Prof. Adalberto Cardoso do IUPERJ, com que trabalhei por pouco tempo.<br />
Ao Beppo, “co-orientador”, principalmente pela afinida<strong>de</strong> teórica.<br />
Ao Prof. Sandro Mezzadra, que tutorou meu estágio junto á Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Bologna.<br />
Reservo um agra<strong>de</strong>cimento especial á Leila Stein, minha <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito orientadora e<br />
amiga, principalmente pela amiza<strong>de</strong>, paciência e <strong>de</strong>dicação com que conduziu este<br />
trabalho <strong>de</strong> tese.
[...] Cada qual tem o próprio <strong>de</strong>mônio <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> si, que durante a noite mor<strong>de</strong> e <strong>de</strong>strói, e isso não é<br />
nem bom, nem ruim, é a vida. Se não o possuíssemos não se viveria. Sendo assim, aquilo que você<br />
maldiz <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> você, é a sua vida. Este diabo é o material (na verda<strong>de</strong> um material maravilhoso)<br />
que você recebeu e com o qual <strong>de</strong>ve, <strong>de</strong>ste modo, fazer alguma coisa.<br />
(Kafka em carta a Minze Eisner -1920)<br />
Quel ch´i fa mia incö, i la fa dman.<br />
(Dito popular mantovano: da constância e da indolência)<br />
Do Rigor da Ciência<br />
[...] Naquele Império, a Arte da Cartografia atingiu uma tal Perfeição que o Mapa duma só<br />
Província ocupava toda uma Cida<strong>de</strong>, e o Mapa do Império, toda uma Província. Com o tempo,<br />
esses Mapas Desmedidos não satisfizeram e os Colégios <strong>de</strong> Cartógrafos levantaram um Mapa do<br />
Império que tinha o Tamanho do Império e coincidia ponto por ponto com ele. Menos Apegada ao<br />
Estudo da Cartografia, as Gerações Seguintes enten<strong>de</strong>ram que este extenso Mapa era Inútil e não<br />
sem Impieda<strong>de</strong> o entregaram às Inclemências do sol e dos Invernos. Nos Desertos do Oeste<br />
subsistem <strong>de</strong>spedaçadas Ruínas do Mapa, habitadas por Animais e por Mendigos. Em todo o País<br />
não resta outra relíquia das Disciplinas Geográficas.<br />
(Suárez Miranda: viagens <strong>de</strong> Varões Pru<strong>de</strong>ntes, livro quarto, cap. XIV, 1658.Em J.L. Borges: História<br />
Universal da Infâmia)
RESUMO: Analisamos experiências <strong>de</strong> qualificação profissional realizadas pelos<br />
sindicatos dos trabalhadores e sindicatos rurais (patronais) da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto.<br />
Estruturamos nossa investigação abrindo o <strong>de</strong>bate com o clássico tripé: estado, capital e<br />
trabalho, quando então passamos a questionar a construção institucional <strong>de</strong>stas três<br />
dimensões. A re<strong>de</strong>finição <strong>de</strong>stes, aberta com o processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva é<br />
observada, tanto no que tange aos novos perfis profissionais, tendências e oscilações <strong>de</strong><br />
um “mercado <strong>de</strong> trabalho”, quanto ativida<strong>de</strong>s profissionais e <strong>de</strong> renda que não integram<br />
a construção institucional regulada sobre as relações <strong>de</strong> trabalho. Discutimos<br />
experiências <strong>de</strong> qualificação profissional rural, em diversos recortes sindicais, e outros,<br />
<strong>de</strong>ntro do meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto. Para tanto estabelecemos “zonas <strong>de</strong><br />
interesse” no tocante aos cursos <strong>de</strong> qualificação, apontando tal diversida<strong>de</strong> e<br />
multiplicida<strong>de</strong>, entendidas como ativida<strong>de</strong>s em que se compreen<strong>de</strong> o trabalho produtivo,<br />
ou “trabalho vivo”. Tomando como foco empírico por um lado o assalariamento<br />
agrícola, <strong>de</strong> outro, núcleos <strong>de</strong> pequena produção estabelecendo campos distintos no<br />
tocante a estas zonas <strong>de</strong> interesse. No caso do assalariamento priorizamos aqueles tipos<br />
<strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> baixa renda e qualificação que i<strong>de</strong>ntificamos principalmente entre os<br />
trabalhadores da colheita e trato da cana-<strong>de</strong>-açúcar. Discutimos o tema como ocorrência<br />
contemporânea, a partir principalmente do final da década <strong>de</strong> noventa e início <strong>de</strong>sta,<br />
estabelecendo discussão, primeiro com o Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador (FAT),<br />
também com os dois programas fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong>ste período: O PLANFOR e posteriormente<br />
o PNQ.<br />
Palavras-chave: estado, capital, trabalho, sindicatos, qualificação profissional,<br />
resistência produtiva.<br />
Abstract: I have analyzed the experiences of professional qualification carried out by<br />
rural employers and employees unions in the Ribeirão Preto area (State of São Paulo). I<br />
have initially structured the research in the classical three pillars (state, capital and<br />
labor) and then questioned the institutional construction of such three dimensions. The<br />
re<strong>de</strong>finition of these three dimensions is analyzed taking into consi<strong>de</strong>ration new<br />
professional profiles, ten<strong>de</strong>ncies and variations of a “labor market” as well as new<br />
professional activities that do not take part of the regulated institutional construction of<br />
labor relation. I have presented different experiences of professional qualification with<br />
different union profiles within the Ribeirão Preto area. To achieve that, I have set<br />
“zones of interest” regarding the qualification activities, <strong>de</strong>scribing the diversity and<br />
multiplicity un<strong>de</strong>rstood as activities that comprise productive work (or “living labor”).<br />
As an empiric focus, I have taken on the one hand the salaried work and on the other<br />
small scale production nuclei. In the case of salaried rural labor, I have prioritized the<br />
low income and low qualification jobs among the workers of the tract and harvest of<br />
sugarcane. I have discussed such theme as a contemporary occurrence, especially as<br />
from the 1990’s and 2000’s. Therefore, I have established points of discussion with the<br />
major government social schemes for the period: FAT, PLANFOR and PNQ.<br />
Keywords: state, capital, work, labor unions, professional qualification, productive<br />
resistence.
APL - Arranjos Produtivos Locais<br />
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS<br />
BNDS - Banco Nacional Desenvolvimento Social<br />
BNDES - Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social<br />
CGT - Confe<strong>de</strong>ração Geral dos Trabalhadores<br />
CLT - Consolidação das Leis do Trabalho<br />
CNA – Confe<strong>de</strong>ração Nacional na Agricultura<br />
CNF – Confe<strong>de</strong>ração Nacional das Instituições Financeiras<br />
CNC - Confe<strong>de</strong>ração Nacional do Comércio<br />
CNI - Confe<strong>de</strong>ração Nacional da Indústria<br />
CNOC - Confe<strong>de</strong>ração Nacional dos Operários Católicos<br />
CO - Círculos Operários<br />
Co<strong>de</strong>fat - Conselho Deliberativo do Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador<br />
CME – Comissão Municipal <strong>de</strong> Emprego<br />
CONCUT – Congresso Nacional da Central Única dos Trabalhadores<br />
CONTAG – Confe<strong>de</strong>ração Nacional dos Trabalhadores na Agricultura<br />
CUT - Central Única dos Trabalhadores<br />
DIEESE - Departamento Intersindical <strong>de</strong> Estatística e Estudos Sócio-Econômicos<br />
DIRARP - Divisão Regional Agrícola <strong>de</strong> Ribeirão Preto<br />
DI s – Distritos Industriais<br />
ETR - Estatuto do Trabalhador Rural<br />
FAF - Fe<strong>de</strong>ração da Agricultura Familiar<br />
FASE – Fe<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> Órgãos para Assistencial Social e Educacional<br />
FAPESP - Fundação <strong>de</strong> Amparo à Pesquisa do Estado <strong>de</strong> São Paulo
FAT - Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador<br />
FERAESP - Fe<strong>de</strong>ração dos Empregados Rurais Assalariados do Estado <strong>de</strong> São Paulo<br />
FETAESP - Fe<strong>de</strong>ração dos Trabalhadores na Agricultura do Estado <strong>de</strong> São Paulo<br />
FIESP - Fe<strong>de</strong>ração das Indústrias do Estado <strong>de</strong> São Paulo<br />
FLACSO – Faculda<strong>de</strong> Latino-americana <strong>de</strong> Ciências Sociais<br />
FS - Força Sindical<br />
IBGE - Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e Estatística<br />
IEA – Instituto <strong>de</strong> Economia Agrícola<br />
IIEP - Intercâmbios, Informações, Estudos e Pesquisa<br />
INFOCIDADES - Informações Cida<strong>de</strong>s<br />
IPEA - Instituto <strong>de</strong> Pesquisa Econômica Aplicada<br />
IUPERJ - Instituto Universitário <strong>de</strong> Pesquisa do Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />
MAA – Ministério da Agricultura e do Abastecimento<br />
MDA - Ministério do Desenvolvimento Agrário<br />
MPAS – Ministério da Previdência e Assistência Social<br />
MR-8 - Movimento Revolucionário oito <strong>de</strong> outubro<br />
MST – Movimento Sem Terra<br />
Mtb - Ministério do Trabalho<br />
OIT - Organização Internacional do Trabalho<br />
ONGs - Organizações não Governamentais<br />
ONU – Organização das Nações Unidas<br />
PCB - Partido Comunista Brasileiro<br />
PC do B - Partido Comunista do Brasil<br />
PIS – Programa <strong>de</strong> Integração Social<br />
PASEP – Plano <strong>de</strong> Assistência aos Servidores Públicos
PLANFOR - Plano Nacional <strong>de</strong> Educação Profissional<br />
PNQ – Programa Nacional <strong>de</strong> Qualificação<br />
PROGER – Programa <strong>de</strong> Geração <strong>de</strong> Emprego e Renda<br />
PRONAF - Programa Nacional <strong>de</strong> Fortalecimento da Agricultura Familiar<br />
PT - Partido dos Trabalhadores<br />
SABESP – Serviço <strong>de</strong> Abastecimento do Estado <strong>de</strong> São Paulo<br />
SAI - Sistema Agroindustrial Integrado<br />
SEAD – Sistema Estadual <strong>de</strong> Análise <strong>de</strong> Dados<br />
SEBRAE - Serviço Brasileiro <strong>de</strong> Apóio às Micro e Pequenas Empresas<br />
SDS – Social Democracia Sindical<br />
SENAC - Serviço Nacional <strong>de</strong> Aprendizagem Comercial<br />
SENAI - Serviço Nacional <strong>de</strong> Aprendizagem Industrial<br />
SENAR - Serviço Nacional <strong>de</strong> Aprendizagem Rural<br />
SENAT - Serviço Social <strong>de</strong> Aprendizagem <strong>de</strong> Transporte<br />
SERT – Secretária do Emprego e Relações <strong>de</strong> trabalho<br />
SESC - Serviço Social do Comércio<br />
SESCOOP - Serviço Social das Cooperativas <strong>de</strong> Prestação <strong>de</strong> Serviços<br />
SESI - Serviço Social da Indústria<br />
SEST - Serviço Social em Transporte<br />
SR – Sindicato Rural<br />
STR - Sindicato dos Trabalhadores Rurais<br />
TCU – Tribunal <strong>de</strong> Contas da União<br />
ULTAB - União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas<br />
UNESP - Universida<strong>de</strong> Estadual Paulista<br />
UNITRABALHO – Fundação Interuniversitária <strong>de</strong> estudos e Pesquisas sobre o trabalho
SUMÁRIO<br />
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................01<br />
2 Sindicatos e Qualificação Profissional.............................................................07<br />
2.1 A região <strong>de</strong> Ribeirão Preto................................................................................08<br />
2.2 Entre crise e reestruturação sindical...............................................................12<br />
2.3 Sindicato e Qualificação Profissional no Brasil..............................................17<br />
2.4 Estrutura sindical rural na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto....................................22<br />
2.5 Os sindicatos como órgãos privilegiados na execução das políticas <strong>de</strong><br />
qualificação profissional................................................................................................27<br />
2.6 Corporativismo ou neocorporativismo sindical..............................................31<br />
3 Qualificação Profissional nos anos 90..............................................................37<br />
3.1 Retomando o tema da qualificação profissional.............................................39<br />
3.2 Alguns órgãos que atuam na formação e qualificação profissional no<br />
Brasil...............................................................................................................................43<br />
3.3 O sistema FAT/PLANFOR...............................................................................50<br />
3.4 A disputa por representação no meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto:<br />
entre sindicatos da FETAESP e da FERAESP...........................................................56<br />
3.5 Qualificação Profissional, entre FERAESP, FETAESP.................................61<br />
3.6 Dois recortes acerca da qualificação profissional: proximida<strong>de</strong><br />
involuntária....................................................................................................................64<br />
3.7 Entre FAT, PRONAF e MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário...76<br />
3.8 A qualificação Profissional junto aos sindicatos rurais patronais................81<br />
3.9 Modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> Formação Profissional..........................................83<br />
3.10 Experiências <strong>de</strong> Qualificação Profissional patronal.......................................91<br />
4) Trabalho e Trabalhadores................................................................................93
4.1 A crise da organização do trabalho..................................................................96<br />
4.2 O foco da qualificação profissional: entre i<strong>de</strong>ntificação e divergências <strong>de</strong><br />
interesses.......................................................................................................................106<br />
4.3 O Foco da qualificação do PLANFOR e PNQ, fe<strong>de</strong>rações e centrais<br />
sindicais........................................................................................................................ 120<br />
4.4 Qualificação profissional como resistência produtiva..................................127<br />
4.5 Nichos ou Brechas do sistema.........................................................................133<br />
4.6 A emergência <strong>de</strong> pequenos núcleos produtivos.............................................141<br />
4.7 Savoir Faire Rural: espaço privilegiado para a qualificação profissional.147<br />
5 Conclusão..........................................................................................................152<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...........................................................162<br />
BIBLIOGRAFIAS CONSULTADAS............................................................169<br />
FONTES PRIMÁRIAS ORAIS: ENTREVISTAS.......................................179
1 Introdução<br />
Nosso trabalho <strong>de</strong> tese se refere temporalmente à década <strong>de</strong> noventa, buscando<br />
aproximar o máximo possível dos dias atuais, ou pelo menos das tendências apontadas pela<br />
última década do século passado e os primeiros anos <strong>de</strong>ste século.<br />
Nosso objeto <strong>de</strong> pesquisa trata da qualificação profissional rural na região <strong>de</strong> Ribeirão<br />
Preto. Discutimos como o tema vem sendo proposto pelas principais correntes sindicais da<br />
região. A partir da i<strong>de</strong>ntificação do problema <strong>de</strong> pesquisa, discutimos alternativas que partem<br />
das próprias ocorrências econômicas, produtivas, ou associativas do interior <strong>de</strong>stes sindicatos.<br />
Saindo em alguns momentos do recorte meramente sindical, apontamos tendências e<br />
alternativas possíveis ou efetivas no tocante às políticas <strong>de</strong> qualificação profissional e mais<br />
propriamente <strong>de</strong> uma qualificação profissional rural. Ainda que a construção do nosso objeto<br />
possa perfeitamente ser percebida no título do trabalho, lembramos que a qualificação<br />
profissional realizada no interior dos sindicatos rurais é o nosso foco, e, quando saímos <strong>de</strong>ste<br />
prisma é para po<strong>de</strong>r estabelecer a discussão com o nosso próprio objeto. Apesar <strong>de</strong> focarmos<br />
as experiências sindicais, gravitamos em campos <strong>de</strong> intervenção em que os sindicatos não<br />
estão presentes. Não temos como objeto <strong>de</strong> estudo os sindicatos; também não estabelecemos<br />
discussões substanciais com uma literatura mais voltada para uma sociologia dos sindicatos<br />
senão na medida em que o nosso objeto exige. Buscamos outra via: estabelecer a discussão<br />
sobre o nosso tema tendo em vista as tendências locais e globais sob o foco da qualificação<br />
profissional e <strong>de</strong> reorganização produtiva e do trabalho.<br />
Partimos dos anos noventa, discutindo nosso objeto <strong>de</strong> pesquisa sem estabelecer uma<br />
data rígida e precisa quanto ao tema. Parece importante apontar o motivo da escolha e os<br />
fatores que julgamos centrais ao <strong>de</strong>stacar este período. O primeiro <strong>de</strong>stes fatores<br />
consi<strong>de</strong>ramos como sendo a Carta Constitucional <strong>de</strong> 1988. O espírito e as motivações da<br />
constituinte, como se sabe, estavam completamente contaminados pelo i<strong>de</strong>ário<br />
<strong>de</strong>mocratizante. Tendo sido rapidamente precedida pela abertura política e pelo movimento<br />
pelas eleições diretas – “Diretas Já”, a carta <strong>de</strong> 1988 tinha como proposta à abertura<br />
<strong>de</strong>mocrática. Dado o próprio histórico da legislação trabalhista e do movimento operário no<br />
país, apontamos <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já que a constituição <strong>de</strong> 88 foi um marco das mudanças que se<br />
seguiram. Um marco no sentido que refletia as mudanças que vinham ocorrendo no mundo,<br />
ou seja, estas mudanças, muitas das quais ainda in<strong>de</strong>finidas já se expressavam na Constituição<br />
1
Brasileira. Por outro lado, o texto fe<strong>de</strong>ral também impulsionou as mudanças que vieram<br />
posteriormente.<br />
Outro fator marcante refere-se à criação, pela via legislativa do que já estava previsto<br />
na Constituição <strong>de</strong> 88. Trata-se do Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador (FAT), bem como do<br />
Conselho Deliberativo do Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador (Co<strong>de</strong>fat) e a formação dos<br />
conselhos tripartites e paritários.<br />
Também central foi a abertura econômica iniciada nos primeiros anos da década <strong>de</strong> 90.<br />
Tal abertura não apenas coinci<strong>de</strong> com os movimentos <strong>de</strong> reajuste pelo qual passavam os<br />
países centrais 1 , com particular atenção para a Europa e os EUA, tanto quanto a própria<br />
abertura econômica permite que os problemas por que passavam os ditos países centrais<br />
tivessem um impacto mais direto na realida<strong>de</strong> nacional.<br />
No Brasil, as primeiras ações <strong>de</strong> Estado que expressam uma dinâmica <strong>de</strong> <strong>de</strong>sencaixe<br />
neste sentido, po<strong>de</strong>m ser verificadas no início dos anos noventa com a abertura econômica.<br />
Des<strong>de</strong> então, e cada vez <strong>de</strong> maneira mais acentuada, cresce o entendimento, segundo o qual,<br />
seria preciso <strong>de</strong>smontar o aparato institucional edificado na era Vargas 2 , inserindo o país num<br />
outro mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Por mais que persistam diferenças quanto a este ponto,<br />
existe um <strong>de</strong>bate aberto no meio político-institucional, em que alguns, ou até as tendências<br />
hoje dominantes, enten<strong>de</strong>m que o gran<strong>de</strong> problema do país está no, digamos assim, “atraso<br />
estatal”. Significa apontar que o <strong>de</strong>safio colocado para o Estado é inserir o país na<br />
concorrência do capitalismo mundial, ou internacional, que por sua vez já <strong>de</strong>monstra<br />
suficientemente o <strong>de</strong>smonte do aparato do velho Estado <strong>de</strong> Bem-Estar 3 .<br />
1 Sobre o que enten<strong>de</strong>mos como países centrais, consi<strong>de</strong>ramos os gran<strong>de</strong>s blocos econômicos oci<strong>de</strong>ntais mais do<br />
que cada país individualmente. Marcio Pochmann (2001) aponta três categorias: países do centro do capitalismo,<br />
países semiperiféricos e países periféricos, e faz uma distribuição <strong>de</strong> países entre estas três categorias. Ao que<br />
pensamos, por um lado esta relação é alterada fácil e rapidamente fazendo com que um país passe <strong>de</strong> uma para<br />
outra categoria sem que com isso seja alterado significativamente o cenário que preten<strong>de</strong>mos discutir. Por outro<br />
lado, o que <strong>de</strong> fato interessa na nossa discussão é <strong>de</strong>ixar claro que se mantida esta separação entre países do<br />
centro e da periferia, o Brasil não está entre os países do centro do capitalismo, ou <strong>de</strong> capitalismo avançado.<br />
Sendo assim, tomamos como países centrais o bloco europeu, ainda que com especial atenção para os países do<br />
centro da Europa, bem como os Estados Unidos da América.<br />
2 Era Vargas i<strong>de</strong>ntificada como período <strong>de</strong> construção do Estado Nacional. Neste momento, tentamos uma<br />
correlação com o Estado <strong>de</strong> Bem-Estar nos mol<strong>de</strong>s europeus e norte-americanos. Evi<strong>de</strong>ntemente, conforme a<br />
literatura dominante <strong>de</strong>monstrou, a Era Vargas não po<strong>de</strong> ser tomada como Estado <strong>de</strong> Bem-Estar à brasileira,<br />
porém, é o período <strong>de</strong> construção do Estado Brasileiro que possibilita a regulação das relações <strong>de</strong> trabalho, uma<br />
legislação trabalhista, um sistema fiscal e distributivo regulado.<br />
3 Ao falarmos em mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> Estado, e assumindo a crise do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong> Bem-Estar, tomamos o<br />
varguismo no Brasil como correspon<strong>de</strong>nte, ainda que capenga, do mo<strong>de</strong>lo tal qual verificado no centro da<br />
Europa e nos EUA. Se consi<strong>de</strong>rados tais mo<strong>de</strong>los em sua totalida<strong>de</strong>, ou seja, com todas as suas características, é<br />
possível que o varguismo tenha mais semelhança com o Estado Fascista do que com o Estado <strong>de</strong> Bem-Estar.<br />
Tomamos a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> comparação entre O Estado Varguista e o Estado <strong>de</strong> Bem-Estar no tocante ao ponto que<br />
nos interessa: regulação do trabalho, instituições <strong>de</strong> classes como os sindicatos atreladas ao Estado, distribuição<br />
2
Entendia-se que o atraso e as profundas <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s, assim como a falta <strong>de</strong><br />
investimentos no país advêm do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado que temos, ou seja, da herança da Era<br />
Vargas. Era preciso <strong>de</strong>smontar este Estado para que as forças estruturais da globalização<br />
operassem na composição <strong>de</strong> novos padrões <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Este argumento, se levado<br />
às últimas conseqüências é pertinente não na forma em que tais políticas são postas em<br />
prática, mas sim na admissão <strong>de</strong> que o contexto produtivo e <strong>de</strong> mercado exige a reforma das<br />
instituições.<br />
É na década <strong>de</strong> noventa, e mais particularmente a partir <strong>de</strong> 1994, que a abertura<br />
econômica se dá <strong>de</strong> forma sistemática, ainda que esta tenha sido iniciada anos antes. Contra a<br />
idéia <strong>de</strong> que o capitalismo necessitava <strong>de</strong> uma periferia permanente e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, passa-se a<br />
pensar a estrutura do sistema abrindo-se para o fluxo do capitalismo global. Paradoxalmente,<br />
o mesmo Estado que <strong>de</strong>veria promover esta inserção, <strong>de</strong>ve ser reformado. É emblemática, a<br />
frase dita no início do primeiro governo <strong>de</strong> Fernando Henrique Cardoso: “É preciso acabar<br />
com a era Vargas 4 ”.<br />
É <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sta realida<strong>de</strong> difusa e <strong>de</strong> intensas transformações que situamos nosso objeto<br />
<strong>de</strong> pesquisa. A reorganização econômica e produtiva pela qual passavam os países <strong>de</strong><br />
capitalismo avançado provocou, digamos, um solavanco no mundo do trabalho. Tais<br />
mudanças foram sentidas pelos sindicatos, e como se sabe, o tema da qualificação profissional<br />
ganha cada vez mais contornos e <strong>de</strong>finições que pareciam impensáveis algumas décadas atrás.<br />
A intensificação das políticas <strong>de</strong> formação profissional no Brasil foi <strong>de</strong> tal calibre que numa<br />
única década se superou as iniciativas das décadas anteriores. Da mesma forma que houve tal<br />
intensificação, a mudança <strong>de</strong> rotas foi bem mais rápida do que po<strong>de</strong>ríamos imaginar tempos<br />
atrás.<br />
A década <strong>de</strong> noventa foi a década da qualificação profissional no Brasil. O período<br />
completo entre criação e vigência do Programa Nacional <strong>de</strong> Qualificação Profissional<br />
(PLANFOR), <strong>de</strong> 1995 a 2002. Em 2003, entra em vigor o Plano Nacional <strong>de</strong> Qualificação<br />
(PNQ), em substituição ao PLANFOR.<br />
<strong>de</strong> renda, que se comparado neste ponto a pecha sobre Vargas <strong>de</strong> pai dos pobres e mãe dos ricos, se i<strong>de</strong>ntifica a<br />
teoria <strong>de</strong> Keynes sobre cooperação entre capital e trabalho e distribuição <strong>de</strong> riquezas.<br />
4 A frase gerou polêmica tanto no meio político quanto acadêmico. A colocação central <strong>de</strong>ste discurso apontava<br />
que era preciso rever o papel do Estado, promovendo ao mesmo tempo a reforma <strong>de</strong>ste. Acabar com a Era<br />
Vargas, significava acabar com o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong>senvolvimentista, e, portanto, com as instituições políticas<br />
criadas a partir <strong>de</strong>ste. Desmontar o aparato institucional varguista foi colocado como <strong>de</strong>safio político e<br />
administrativo dos dois governos <strong>de</strong> Fernando Henrique. E é claro que neste aparato está incluída a tão<br />
propagada Reforma Trabalhista, com especial atenção para o texto da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),<br />
que até hoje não se concretizou. “Acabar com a Era Vargas” significava mudar o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong><br />
Estado na economia, abrindo para o fluxo do capitalismo global.<br />
3
O PLANFOR certamente po<strong>de</strong> ser tido como o gran<strong>de</strong> marco institucional <strong>de</strong><br />
programa <strong>de</strong> políticas públicas sobre qualificação profissional no Brasil. Ainda que o tema da<br />
qualificação profissional não seja novo, a intensificação <strong>de</strong>stas políticas, a maneira <strong>de</strong><br />
conceber a qualificação profissional, bem como os sistemas <strong>de</strong> parceria e financiamentos são<br />
criações típicas dos anos noventa.<br />
Mas se o tema da qualificação profissional remota no tempo também, ou quiçá<br />
principalmente, ecoa <strong>de</strong>ntro do movimento sindical e, mais especificamente, <strong>de</strong>ntro dos<br />
sindicatos dos trabalhadores conforme apontam Souza, Santana e Deluiz (1999). Ocorre que<br />
nas décadas anteriores, ou mesmo ainda na década <strong>de</strong> oitenta, o terreno <strong>de</strong> atuação sindical no<br />
Brasil era amplo, ainda que nos países <strong>de</strong> capitalismo avançado a crise do movimento já se<br />
fizesse presente. Só para ter uma idéia <strong>de</strong>ste processo, as principais centrais sindicais<br />
presentes e atuantes hoje no país foram concebidas e criadas entre os anos oitenta e noventa.<br />
Ocorre que, em um primeiro momento <strong>de</strong> surgimento <strong>de</strong>stas organizações, havia um terreno<br />
propício para a atuação sindical ligada às lutas históricas do movimento tal qual foi concebido<br />
<strong>de</strong>ntro do contexto europeu. As lutas por melhores condições <strong>de</strong> trabalho, por conquistas<br />
salariais, ou a pauta da greve como movimento reivindicatório <strong>de</strong> contestação impactava os<br />
ganhos <strong>de</strong> capital. Exemplo emblemático foram as greves e mobilizações que sacudiram o<br />
Estado <strong>de</strong> São Paulo se estendo para outras regiões do país. Movimento que começou na<br />
maior concentração industrial do país que era o chamado A B C Paulista.<br />
Estes movimentos sacudiram e re<strong>de</strong>finiram a estrutura dos sindicatos, bem como suas<br />
linhas <strong>de</strong> atuação. Contaminados por este processo <strong>de</strong> reforma e reorganização, ainda em<br />
formação, e também ainda restritos às pautas clássicas do movimento, os sindicatos não<br />
<strong>de</strong>ram muita atenção para questões atinentes à educação ou formação profissional. Ainda que<br />
o tema estivesse no âmago dos sindicatos nos anos oitenta no Brasil, era uma espécie <strong>de</strong> “um<br />
tema a mais”, que sempre cedia espaço para outros consi<strong>de</strong>rados <strong>de</strong> maior relevância como as<br />
lutas econômicas mais urgentes e emergenciais.<br />
No contexto dos países <strong>de</strong> capitalismo avançado, o tema da qualificação profissional<br />
<strong>de</strong>ntro do movimento sindical já se configurava como central. No início da década <strong>de</strong> 90 no<br />
Brasil, as centrais sindicais, a exemplo da Central Única dos Trabalhadores (CUT), após<br />
reiteradas discussões, divulgam inúmeros textos ressaltando a importância e a necessida<strong>de</strong> da<br />
formação profissional. (SANTANA; SOUZA; DELUIZ, 1999).<br />
Mas foi a partir da década <strong>de</strong> noventa que paulatinamente o tema da qualificação<br />
profissional passou a ganhar terreno. Quer seja num mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> sindicalismo <strong>de</strong> “resultados”,<br />
como comumente é chamada a Força Sindical (FS), que enfatizava a qualificação profissional<br />
4
como estratégia <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> no mercado <strong>de</strong> trabalho, ou mesmo a CUT, que criticando<br />
esta vertente, propunha uma qualificação abrangente tendo em vista o maior controle dos<br />
trabalhadores, a qualificação profissional passa a ganhar espaço <strong>de</strong>ntro do movimento<br />
sindical.<br />
A partir <strong>de</strong> meados dos anos 90, as centrais sindicais passam a adotar medidas<br />
concretas <strong>de</strong> intervenção no tocante à qualificação profissional. Tais medidas coinci<strong>de</strong>m com<br />
os espaços <strong>de</strong> participação institucional que são abertos a partir da Constituição <strong>de</strong> 88. É<br />
preciso notar que as indústrias nacionais tinham gran<strong>de</strong> interesse no tema, dado que este<br />
ressaltava as exigências <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> internacional.<br />
Mas é também nos anos noventa que assistimos ao rápido e crescente arrefecimento do<br />
movimento sindical. Conforme aponta Rodrigues (1999), existia uma crise estrutural global<br />
do movimento sindical, apesar <strong>de</strong>sta apresentar características e intensida<strong>de</strong> distintas <strong>de</strong>ntro<br />
<strong>de</strong> cada realida<strong>de</strong> nacional. Crise inserida <strong>de</strong>ntro do processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva em<br />
curso, revelando a crescente <strong>de</strong>sindustrialização, crescimento do setor <strong>de</strong> serviços, mudança<br />
na organização da produção e padrão <strong>de</strong> consumo, etc.<br />
No Brasil, apesar <strong>de</strong> não ter ocorrido um processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>ssindicalização significativo, a<br />
crise global do movimento sindical culmina primeiro com algumas políticas mais localizadas<br />
<strong>de</strong> qualificação profissional, e ainda, com um fórum relevante <strong>de</strong> participação institucional<br />
dos sindicatos que foi a criação do FAT em 1990.<br />
Este fervilhar do movimento sindical entre as décadas <strong>de</strong> oitenta e noventa, coinci<strong>de</strong><br />
com a abertura comercial e econômica iniciadas no governo Collor. A abertura traz em si<br />
efeitos como a re<strong>de</strong>finição da relação do papel do Estado com a economia, a terceirização, a<br />
privatização do setor produtivo, a mudança na política cambial visando exportação e atração<br />
<strong>de</strong> capital estrangeiro para o país, etc.<br />
Inserido em tais mudanças o Brasil passa por um turbilhão buscando acertar suas<br />
políticas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>ntro do novo paradigma técnico-produtivo. Tanto o processo<br />
<strong>de</strong> inovação tecnológica e a<strong>de</strong>quação promovida pelas empresas privadas do contexto<br />
internacional, quanto o rearranjo e reorganização do trabalho, passam a serem sentidos no<br />
país.<br />
Neste momento é que o tema da qualificação profissional ganha <strong>de</strong>staque especial.<br />
Afora outros fatores, muitos dos quais se julgava que seriam corrigidos pelo próprio mercado,<br />
a qualificação profissional passa a figurar como algo central para corrigir as distorções da<br />
precarização das ocupações geradas pelo impacto das inovações tecnológicas. No contexto do<br />
primeiro governo <strong>de</strong> Fernando Henrique Cardoso, ela era apresentada como “solução” para o<br />
5
<strong>de</strong>semprego. Conforme aponta Pochmann (2001), a qualificação profissional tinha acento<br />
privilegiado, como medida <strong>de</strong> combate ao <strong>de</strong>semprego mediante á a<strong>de</strong>quação do trabalho às<br />
novas exigências das empresas; a requalificação na melhora <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> dos postos <strong>de</strong><br />
trabalho já existentes. Ambas como medidas sociais e ao mesmo tempo <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação.<br />
Neste contexto, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), orienta a adoção da<br />
gestão tripartite dos fundos públicos para a formação profissional pelas várias instâncias <strong>de</strong><br />
po<strong>de</strong>r. No Brasil, seguindo esta orientação <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1996, com o surgimento do PLANFOR,<br />
financiado com recursos do FAT, po<strong>de</strong> ser constatada a preocupação crescente com as<br />
políticas <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> recursos humanos entendidos como estratégia <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> e<br />
<strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong>, e principalmente como medida <strong>de</strong> combate ao <strong>de</strong>semprego. Sindicatos,<br />
ONGS e outras organizações da socieda<strong>de</strong> civil são os principais executores <strong>de</strong>stes cursos <strong>de</strong><br />
formação que, apesar <strong>de</strong> serem distribuídos via fe<strong>de</strong>ração, são estabelecidos num terreno<br />
público entre os agentes e segmentos <strong>de</strong> interesse capital, trabalho e Estado. A Constituição<br />
Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988, aten<strong>de</strong>ndo às resoluções da OIT, prevê a participação institucional dos<br />
sindicatos e dos patrões, abertos à discussão e negociação <strong>de</strong>ntro do aparelho <strong>de</strong> Estado.<br />
Entendia-se assim que as relações <strong>de</strong> trabalho, e os conflitos <strong>de</strong> interesses, <strong>de</strong>veriam ser<br />
discutidos como questões <strong>de</strong> interesse público relacionados com o campo da cidadania.<br />
Questões pertinentes à melhora das condições <strong>de</strong> vida e trabalho <strong>de</strong>veriam ser preocupações<br />
da socieda<strong>de</strong> como um todo, e, portanto, <strong>de</strong>veriam ser tratadas em um ambiente público, cuja<br />
<strong>de</strong>finição e limites são criados e promovidos pelo Estado.<br />
A qualificação profissional dos anos noventa se move <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste quadrante <strong>de</strong><br />
mudanças na conservação e no rompimento com seu histórico, e com as antigas instituições<br />
estatais.<br />
O marco histórico e institucional <strong>de</strong>stas ocorrências no meio rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto é<br />
parecido com o meio urbano e industrial, apesar das suas particularida<strong>de</strong>s e especificida<strong>de</strong>s.<br />
As diferenças <strong>de</strong>sta contextualização são apontadas no trabalho, no tocante a formação do<br />
movimento sindical rural, contextualizado com as ocorrências urbanas industriais do país e <strong>de</strong><br />
certa forma do mundo. O meio rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto está conectado tanto às mudanças<br />
globais da economia quanto às empresas <strong>de</strong> ponta das regiões mais industrializadas do país.<br />
As particularida<strong>de</strong>s do meio rural dizem respeito mais ao histórico do movimento<br />
sindical, bem como às questões mais circunscritas as especificida<strong>de</strong>s produtivas rurais, como<br />
relações <strong>de</strong> produção, conhecimento, cooperação, etc. No tocante à legislação e à<br />
regulamentação os trâmites são os mesmos, ainda que evi<strong>de</strong>ntemente existam muitos<br />
6
programas específicos para o meio rural tanto no plano fe<strong>de</strong>ral, quanto no plano das centrais<br />
sindicais e fe<strong>de</strong>rações sindicais.<br />
Dessa forma, a qualificação profissional rural por nós estudada <strong>de</strong>nota fatores como<br />
interseção simbiótica entre as dimensões rural e urbana; reorganização do tema e investimento<br />
entre uma qualificação profissional voltada para postos <strong>de</strong> trabalho já existentes, e uma<br />
qualificação profissional que sendo em si produtiva é proposta junto com a criação <strong>de</strong> postos<br />
<strong>de</strong> trabalho e investimentos em formação <strong>de</strong> parque produtivo; recontextualização da<br />
representação, políticas <strong>de</strong> parcerias e campo <strong>de</strong> disputa sindical; tendência à aproximação<br />
dos conteúdos programáticos dos cursos compreendidos entre distintos recortes sindicais com<br />
propostas e histórico <strong>de</strong> formação diferentes e algumas vezes conflitantes entre si;<br />
<strong>de</strong>slocamento quanto a execução dos programas, passando cada vez mais dos organismos<br />
fe<strong>de</strong>rais e estaduais para órgãos <strong>de</strong> gestão e execução em nível local ou municipal.<br />
Fatores estes que são compreendidos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> dois períodos: o primeiro período<br />
refere-se à fase <strong>de</strong> experimentação, e que, portanto, i<strong>de</strong>ntificamos como da falta <strong>de</strong> foco sobre<br />
tais políticas <strong>de</strong> formação; o segundo busca corrigir as falhas e equívocos do primeiro período<br />
discutindo e propondo o tema e as políticas públicas <strong>de</strong> qualificação no interior das<br />
transformações produtivas um pouco melhor <strong>de</strong>finidas.<br />
As tendências sobre tais políticas <strong>de</strong> qualificação profissional apontam para o<br />
<strong>de</strong>slocamento do tema que passa a ser tratado cada vez menos como treinamento rápido. Isso<br />
não quer dizer que os sindicatos saiam <strong>de</strong> cena, pelo contrário. Ainda que muitas vezes cedam<br />
espaço para outras instituições como o SEBRAE. O que parece mudar é o foco <strong>de</strong> atuação dos<br />
sindicatos, que mesmo com suas dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> origem buscam se inserir <strong>de</strong>ntro duma nova<br />
dinâmica produtiva. Também, cada vez mais as políticas <strong>de</strong> qualificação se <strong>de</strong>slocam das<br />
pautas do assalariamento, mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> representação clássico ligado à própria origem do<br />
movimento sindical, passando a atuar mais nas transformações atinentes à própria<br />
organização do trabalho.<br />
2 Sindicatos e Qualificação Profissional<br />
Buscamos contextualizar o <strong>de</strong>bate acerca do movimento sindical <strong>de</strong> forma global, com<br />
a formação tanto dos sindicatos quanto <strong>de</strong> um ambiente sindical no meio rural da região <strong>de</strong><br />
Ribeirão Preto. Focamos dois pontos: o primeiro refere-se à contextualização histórica da<br />
região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, seus aspectos e vocação produtiva, bem como a condição<br />
privilegiada <strong>de</strong> importante região agrícola do país; o segundo ponto tem por objetivo apontar<br />
7
o histórico da formação dos sindicatos na região. O foco está circunscrito a relação entre os<br />
cursos <strong>de</strong> qualificação profissional e a crise, ou reorganização dos sindicatos. Discutimos as<br />
particularida<strong>de</strong>s das políticas <strong>de</strong> qualificação profissional dos anos 90, frente a reestruturação<br />
pela qual passam os sindicatos.<br />
A qualificação profissional da maneira que observamos no nosso trabalho é a<br />
expressão do surgimento <strong>de</strong> novos atores sociais. Se historicamente a condição <strong>de</strong> trabalhador<br />
assalariado expressava esta relação pela via da regulação e reconhecimento dos direitos<br />
trabalhistas; a qualificação profissional dos anos noventa expressa a entrada em cena <strong>de</strong> um<br />
gran<strong>de</strong> contingente <strong>de</strong> trabalhadores amparados ou não pela legislação trabalhista, mas que<br />
são reconhecidos como trabalhadores e agentes produtivos, para os quais tais programas estão<br />
voltados.<br />
Retomamos a discussão da relação entre sindicato e Estado no intuito <strong>de</strong> verificar os<br />
cursos <strong>de</strong> formação profissional apontando para uma possível recontextualização do<br />
corporativismo sindical. Para tanto, <strong>de</strong>stacamos a construção <strong>de</strong> um ambiente público da<br />
qualificação profissional a partir do Estado.<br />
2.1 A região <strong>de</strong> Ribeirão Preto<br />
A região <strong>de</strong> Ribeirão Preto é consi<strong>de</strong>rada importante capital agrícola do interior<br />
paulista. Com uma população <strong>de</strong> 535,7 mil habitantes (SEAD, 2006) está localizada na região<br />
nor<strong>de</strong>ste do Estado, próxima <strong>de</strong> outros gran<strong>de</strong>s centros do interior paulista, com os quais já<br />
compôs a dimensão <strong>de</strong> uma região rural como Araraquara, Franca, São Carlos, Barretos,<br />
Bebedouro, etc. Caracteriza-se pela capitalização do setor agrário, ou agroexportador, com<br />
forte potencial <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização principalmente na agroindústria sucroalcooleira. A forte<br />
presença <strong>de</strong>sta característica agrícola incentiva outros setores como o <strong>de</strong> máquinas agrícolas e<br />
equipamentos, indústrias voltadas para o ramo alimentício, ração, fertilizantes, entre outras.<br />
A região correspon<strong>de</strong> a respectivamente 14% da área cultivada no Estado, 0,5% no<br />
país (SEAD, 2006). É a principal produtora mundial <strong>de</strong> cana-<strong>de</strong>-açúcar, e assim do açúcar<br />
para consumo doméstico, e principalmente do álcool combustível. Atualmente o Estado <strong>de</strong><br />
São Paulo é responsável sozinho por 62% da cana-<strong>de</strong>-açúcar produzida no país. Dentre outros<br />
produtos importantes, ainda que proporcionalmente inferiores em relação à cana, encontram-<br />
8
se a soja, o amendoim, a agropecuária, com <strong>de</strong>staque para a citricultura 5 , em especial do suco<br />
<strong>de</strong> laranja. (ZAFALON, 2007)<br />
A região é historicamente agrícola, tendo se <strong>de</strong>senvolvido com o ciclo do café no final<br />
do século XIX. O café foi o foco <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento da região que sempre possuiu o que<br />
existe <strong>de</strong> mais mo<strong>de</strong>rno e <strong>de</strong>senvolvido no meio rural. Sendo o principal produto <strong>de</strong><br />
exportação até o final da década <strong>de</strong> 20, o café encontrou na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto terra<br />
fértil e clima apropriado, além da facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte por meio da instalação da re<strong>de</strong><br />
ferroviária. Com a queda da Bolsa em 1929, a região foi rapidamente substituída por outros<br />
produtos agrícolas, sendo que na década <strong>de</strong> 1940 o setor canavieiro começa a <strong>de</strong>spontar como<br />
um dos principais do Estado. (STOLCKE, 1986)<br />
O café é rapidamente substituído pela cana-<strong>de</strong>-açúcar, que aparece não como produto,<br />
mas como matéria-prima para a produção <strong>de</strong> açúcar e álcool 6 . Portanto, entre as décadas <strong>de</strong><br />
sessenta e setenta, o açúcar e o álcool começam a surgir como viabilida<strong>de</strong> econômica <strong>de</strong><br />
mercado, sendo que a região <strong>de</strong>sponta como uma das principais produtoras do Estado e do<br />
país.<br />
Dadas as condições climáticas e <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> do solo aliadas à tradição agrícola, já na<br />
década <strong>de</strong> 1960, prevaleceu na região o mo<strong>de</strong>lo tipicamente agroindustrial. Após a criação do<br />
Pró-Álcool em 1975, os investimentos no setor sucroalcooleiro passaram a figurar como um<br />
dos principais do país. De 1975 até 1985, a área ocupada com cana-<strong>de</strong>-açúcar triplicou na<br />
região.<br />
Dentre os fatores que possibilitaram a expansão da cultura da cana-<strong>de</strong>-açúcar,<br />
po<strong>de</strong>mos citar principalmente o aumento do consumo no mercado interno e externo <strong>de</strong><br />
produtos como o açúcar e o álcool; as políticas <strong>de</strong> crédito rural; as políticas estabelecidas pelo<br />
Instituto do Açúcar e do Álcool; a criação do Proálcool; a regulamentação do preço da cana<br />
estabelecido pelo Estatuto da Lavoura Canavieira; além da legislação trabalhista.<br />
(SCOPINHO; VALARELLI, 1995)<br />
Com a abertura do mercado norte americano após a Revolução Cubana a exportação<br />
<strong>de</strong> açúcar cresce vertiginosamente. Assim, a cana <strong>de</strong> açúcar é rentável apenas se produzida em<br />
5 Juntamente com a cana, a laranja foi na década <strong>de</strong> oitenta o mais importante produto agrícola da região. Fator<br />
impulsionado pelo mercado exportador, e principalmente pelas geadas no Estado Unidos, mais particularmente<br />
no Estado da Flórida. Des<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 90, com o equilíbrio da produção e do mercado exportador á cultura da<br />
laranja vêm per<strong>de</strong>ndo espaço, principalmente para a cana-<strong>de</strong>-açúcar.<br />
6 A chamada Revolução <strong>de</strong> 30 representou a vitória da cida<strong>de</strong> sobre o campo. Os setores agrários, tanto<br />
produtivo quanto comercial, voltados para o mercado importador e exportador passam a per<strong>de</strong>r hegemonia para<br />
as classes urbanas emergentes. Passam a ser criadas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então condições políticas, econômicas e sociais que<br />
favoreceriam o capital industrial, particularmente a partir da década <strong>de</strong> 50.<br />
9
larga escala, o que proporcionou a instalação <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s empresas agrícolas, expulsando os<br />
pequenos produtores do campo e impulsionando o plantio em larga escala <strong>de</strong> outros produtos<br />
agrícolas. O Estado por sua vez adotou a lógica do capital, através do Sistema Nacional <strong>de</strong><br />
Crédito Rural criado em 1965 aprimorou as políticas <strong>de</strong> crédito, subsídios, incentivos fiscais<br />
etc. Na década <strong>de</strong> 80, sob influência da nova or<strong>de</strong>m neoliberal, o Estado passa a adotar novos<br />
mecanismos <strong>de</strong> intervenção que favorecem a expansão e consolidação dos gran<strong>de</strong>s capitais<br />
agroindustriais. (SILVA, 1976)<br />
Altos investimentos e <strong>de</strong>senvolvimento tecnológico, aliados a política <strong>de</strong> mercado,<br />
inviabilizaram a pequena produção, o que por si só expulsou um gran<strong>de</strong> contingente <strong>de</strong><br />
trabalhadores sem opção <strong>de</strong> inserção profissional. Por outro lado estima-se que foram<br />
fechados cerca <strong>de</strong> 100 mil postos <strong>de</strong> trabalho nos últimos <strong>de</strong>z anos, tendo como uma das<br />
causas à mecanização do corte da cana. Atualmente, são extintos em média cerca <strong>de</strong> dois mil<br />
postos <strong>de</strong> trabalho por ano, ligados a produção do açúcar e álcool. (SILVA, 1999)<br />
Em 1975, temos a criação e implantação do Proálcool que impulsiona ainda mais o<br />
processo <strong>de</strong> “mo<strong>de</strong>rnização no campo”. A região <strong>de</strong> Ribeirão Preto passa <strong>de</strong> 182.500 alqueires<br />
plantados <strong>de</strong> cana em 1968, para 624.700 alqueires em 1989. Um aumento <strong>de</strong> quase 3,5 vezes<br />
neste período. (SILVA, 1999). Só na década <strong>de</strong> 70, aponta a autora, a região <strong>de</strong> Ribeirão Preto<br />
recebera um contingente migratório <strong>de</strong> trabalhadores volantes da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> 120.030 pessoas.<br />
Em 1980 a região <strong>de</strong> Ribeirão Preto respondia pelo primeiro lugar em produção <strong>de</strong><br />
soja (62%), laranja (41%), cana <strong>de</strong> açúcar (40%), e milho (25%) do Estado <strong>de</strong> São Paulo. Era<br />
responsável já naquele período por 20% do café, 23% do amendoim, 18% do arroz, 13,1% do<br />
rebanho bovino, e 13,3% das aves produzidas no Estado. Já em 1986, a Divisão Regional<br />
Agrícola <strong>de</strong> Ribeirão Preto – DIRARP - era responsável por 30% do álcool e 20% do açúcar<br />
produzidos no país, além <strong>de</strong> ser responsável por 70% da exportação <strong>de</strong> suco <strong>de</strong> laranja. O que<br />
equivale a 3.400.000 hectares <strong>de</strong> área agricultável, com um Produto Interno Bruto da or<strong>de</strong>m<br />
<strong>de</strong> 17 bilhões <strong>de</strong> dólares. (SCOPINHO, 1995, p. 13)<br />
No caso da cana-<strong>de</strong>-açúcar estima-se que estejam envolvidos no plantio e colheita, só<br />
no Estado <strong>de</strong> São Paulo entre 250 á 350 mil trabalhadores, além <strong>de</strong> outros 100 mil na<br />
industrialização do produto final. De toda mão <strong>de</strong> obra puramente rural estima-se só na região<br />
<strong>de</strong> Ribeirão Preto algo em torno <strong>de</strong> 84% da <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra agrícola do Estado <strong>de</strong><br />
São Paulo. (PT, 1999, p. 6).<br />
A mecanização da lavoura, e mais especificamente da lavoura canavieira, foi<br />
impactante para uma região <strong>de</strong>marcada pelo assalariamento agrícola e mais particularmente<br />
10
pelos chamados “cortadores <strong>de</strong> cana”. Dentro <strong>de</strong>ste cenário, uma das saídas encontradas pelos<br />
trabalhadores, num primeiro momento, foi à migração para os gran<strong>de</strong>s centros urbanos. Este<br />
processo <strong>de</strong> concentração e exploração fundiária, aliado ao que existe <strong>de</strong> mais mo<strong>de</strong>rno e<br />
<strong>de</strong>senvolvido na agricultura, impulsionou ainda mais os índices <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais e<br />
concentração <strong>de</strong> rendas, (BACCARIN, 1985). Um processo <strong>de</strong> “mo<strong>de</strong>rnização” que<br />
reproduzia e intensificava as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s, (SILVA, 1982).<br />
Segundo o censo <strong>de</strong>mográfico <strong>de</strong> 1991 (IBGE, 2006), a região apresentava uma renda<br />
média que indicava fortes fatores <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> se comparada com outras regiões do<br />
Estado. De 1990 até agora, estima-se um crescimento <strong>de</strong> 244% no número <strong>de</strong> pessoas sem<br />
condições <strong>de</strong> moradia só na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ribeirão Preto. Segundo dados da própria prefeitura <strong>de</strong><br />
Ribeirão Preto, passou <strong>de</strong> 7 mil para 23 mil o número <strong>de</strong> pessoas que moram em “barracos”.<br />
(FOLHA DE SÃO PAULO, 2000, p. 01).<br />
Na divisão regional agrícola <strong>de</strong> Ribeirão Preto, em que predominam as gran<strong>de</strong>s<br />
empresas agrícolas, os pequenos núcleos <strong>de</strong> produção representam uma parcela pequena 7<br />
segundo Scopinho, (1995, p. 24 - 25). Sendo assim, a região indica gran<strong>de</strong> uso <strong>de</strong> tecnologias<br />
poupadoras <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra, particularmente no tocante ao setor sucroalcooleiro.<br />
Como a cana é um negócio rentável apenas se cultivada em gran<strong>de</strong> escala,<br />
esses aumentos vertiginosos na produção foram possíveis graças à expulsão<br />
das culturas <strong>de</strong> gêneros alimentícios que vinham sendo empreendidas por<br />
pequenos e médios proprietários. A exploração mercantil da terra realizada<br />
pelos gran<strong>de</strong>s proprietários substituiu o trabalhador resi<strong>de</strong>nte (colonos,<br />
camaradas, parceiros, etc.) pela máquina (que reduziu sensivelmente o<br />
número <strong>de</strong> braços necessários para a realização <strong>de</strong> tarefas) e, quando era<br />
impossível o uso <strong>de</strong>stas, pelo trabalho assalariado volante. O pequeno<br />
proprietário não conseguiu integrar-se à dinâmica econômica da gran<strong>de</strong><br />
empresa rural que, ao instalar-se na região, <strong>de</strong>sarmonizando o modo <strong>de</strong><br />
organização e funcionamento das proprieda<strong>de</strong>s, impôs-lhe a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
ven<strong>de</strong>r sua terra e migrar para as cida<strong>de</strong>s.<br />
Conforme aponta Ianni (1973), a gênese do proletariado rural <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da<br />
transformação do lavrador em trabalhador livre assalariado, apartado dos meios <strong>de</strong> produção,<br />
7 É preciso tomar certo cuidado com esta colocação. O que acontece na região <strong>de</strong> forma marcante é a<br />
concentração produtiva, ou seja, a eliminação cada vez maior dos pequenos negócios rurais, lembrando ainda<br />
que nas culturas anteriores, principalmente com o café, havia necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> utilização <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra, sendo<br />
que em muitos casos esta se dava sob regime <strong>de</strong> arrendamento, colonato, meação etc. Ou seja, sem que houvesse<br />
proprieda<strong>de</strong> da terra por parte do trabalhador. Portanto, é preciso consi<strong>de</strong>rar que ainda hoje, a gran<strong>de</strong> maioria das<br />
terras plantadas em cana na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto pertence ou a pessoas físicas, ou então parceiros e<br />
arrendatários.<br />
11
sendo que neste caso nos referimos particularmente a posse e uso da terra 8 . O assalariamento<br />
agrícola, ou mesmo o assalariamento voltado para os gran<strong>de</strong>s complexos agroindustriais<br />
tornou-se das principais ativida<strong>de</strong>s. Lembrando que os trabalhadores assalariados <strong>de</strong>stes<br />
complexos produtivos passam a habitar os centros urbanos, ou nos pequenos municípios da<br />
região. Tanto no setor sucroalcooleiro como na citricultura, o grosso do trabalho <strong>de</strong> pouca<br />
qualificação é aquele realizado por colhedores <strong>de</strong> laranja e também pelos cortadores e<br />
plantadores <strong>de</strong> cana-<strong>de</strong>-açúcar. O trato <strong>de</strong>stas culturas cada vez mais é realizado por<br />
máquinas, e quando <strong>de</strong>manda intervenção <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra, é para um tipo <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong><br />
baixa qualificação e remuneração. A questão central com a qual têm que lidar os sindicatos é<br />
disponibilizar políticas <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> qualificação profissional capazes <strong>de</strong> intervir e reverter o<br />
quadro <strong>de</strong> crescente <strong>de</strong>semprego e baixa qualificação <strong>de</strong>ntre, principalmente os trabalhadores<br />
da parte agrícola da produção.<br />
2.2 Entre Crise e Reestruturação Sindical<br />
O processo <strong>de</strong> reorganização da produção que impactou o país na década <strong>de</strong> 90 abalou<br />
as bases dos sindicatos. Uma nova forma <strong>de</strong> produzir aliada à flexibilização <strong>de</strong> direitos e <strong>de</strong><br />
organização do trabalho corroeu a estrutura da organização sindical. Os novos setores<br />
produtivos como o <strong>de</strong> serviços, o crescimento da informalida<strong>de</strong> e a organização da produção<br />
em re<strong>de</strong>s não são favoráveis à sindicalização.<br />
Na introdução do livro <strong>de</strong> Leôncio Martins Rodrigues (1999), Iran Rodrigues (1999, p:<br />
0) aponta:<br />
“O processo <strong>de</strong> reorganização da produção que se <strong>de</strong>senvolveu nas últimas<br />
duas décadas colocou em cheque o sindicato, atingindo <strong>de</strong> forma<br />
generalizada a organização coletiva dos trabalhadores e mudando<br />
significativamente a correlação <strong>de</strong> forças entre capital e trabalho. As<br />
mudanças no perfil do mercado <strong>de</strong> trabalho, o aumento do <strong>de</strong>semprego e a<br />
<strong>de</strong>sregulamentação das relações <strong>de</strong> trabalho são fatores que levaram a<br />
diminuição das eficácias da ação sindical nos países centrais e que se<br />
expressam entre outros aspectos, numa queda acentuada das taxas <strong>de</strong><br />
sindicalização. Esse processo mais geral <strong>de</strong> mudanças no mundo do trabalho<br />
coloca um paradoxo fundamental para a ação trabalhista: como tornar<br />
8 Falamos aqui do período histórico <strong>de</strong> transformação do lavrador em proletário rural na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto<br />
consi<strong>de</strong>rando a terra como principal meio <strong>de</strong> produção, ou meios materiais <strong>de</strong> produção. Este fator é central, pois<br />
se por um lado remete a posse e uso da terra, é preciso consi<strong>de</strong>rá-lo <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um conjunto maior <strong>de</strong> fatores,<br />
como acesso aos bens <strong>de</strong> produção, as novas tecnologias, e ao perfil consumidor do mercado interno e <strong>de</strong><br />
exportação.<br />
12
compatível um movimento que é fragmentário e disperso e, <strong>de</strong>sse modo<br />
individualizante, com aquele princípio que, em certo sentido, são a essência<br />
da ativida<strong>de</strong> sindical, isto é, solidarieda<strong>de</strong> e ativida<strong>de</strong>s coletivas.”<br />
As conclusões da pesquisa <strong>de</strong> Leôncio Martins Rodrigues apontam para um inevitável<br />
<strong>de</strong>clínio dos sindicatos, consi<strong>de</strong>rando que apenas em países que o processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização<br />
chegou atrasado como nos casos do Brasil, Coréia do Sul e África, ou então em experiências<br />
<strong>de</strong>mocráticas coorporativas tópicas e bastante consolidadas como nas experiências dos países<br />
nórdicos, é que as taxas <strong>de</strong> sindicalização foram mantidas ou então cresceram. Na medida em<br />
que os países se inserem na economia mundial, os problemas são levados para o contexto da<br />
globalização. São conservadas diferenças <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo do contexto e da realida<strong>de</strong> política e<br />
sócio-econômica <strong>de</strong> cada país. Via <strong>de</strong> regra, a <strong>de</strong>ssidincalização é um fenômeno mundial,<br />
tanto como fato quanto tendência segundo o autor.<br />
Segundo o Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e Estatística, existia no Brasil no ano <strong>de</strong><br />
2002, um total <strong>de</strong> 11.354 sindicatos dos quais 4.303 estavam filiados a alguma central<br />
sindical. O número <strong>de</strong> sindicatos existentes e atuantes, ou mesmo o aumento <strong>de</strong>stes como<br />
instituição po<strong>de</strong>m revelar que tenha havido aumento inclusive das políticas e ações dos<br />
sindicatos, ainda que redirecionando suas linhas <strong>de</strong> atuação. As propostas e políticas do<br />
governo seguem as orientações da OIT, propiciando liberda<strong>de</strong> sindical contra a unicida<strong>de</strong> ou<br />
monopólio característico do histórico sindical brasileiro. Esta seria uma medida visando a<br />
liberda<strong>de</strong> sindical que <strong>de</strong>satrelaria o sindicato do Estado. Medida para reduzir os chamados<br />
sindicatos <strong>de</strong> fachada ou <strong>de</strong> carimbo 9 . Dado o histórico da relação dos sindicatos com o<br />
Estado no Brasil esta é uma, <strong>de</strong>ntre muitas outras maneiras que o próprio Estado encontra<br />
para conter a crise e propiciar certa retomada <strong>de</strong> representação por parte dos sindicatos. O<br />
mo<strong>de</strong>lo sindical brasileiro sofre <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong> “mal <strong>de</strong> berço”, conforme aponta Cardoso<br />
(2002). Existe uma série <strong>de</strong> mecanismos burocráticos oriundos do próprio histórico sindical<br />
que obstam aos sindicatos <strong>de</strong> se <strong>de</strong>svincularem do Estado. Conforme aponta Leôncio Martins<br />
Rodrigues (2002, p. B 11), tem diminuído a importância e representativida<strong>de</strong> dos sindicatos<br />
para a vida dos trabalhadores:<br />
9 Como se sabe, estes termos são usados <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito tempo, mesmo na literatura corrente sobre o tema, mas<br />
certamente tem origem no próprio meio sindical. Se trata daqueles sindicatos que existem apenas no papel –<br />
formalmente, e que se mobilizam (geralmente apenas os membros da direção) em momentos específicos. “De<br />
fachada” porque não mantém uma política sindical atuante e clara – serve apenas <strong>de</strong> representação formal. “De<br />
carimbo” porque com este simples ato tem legalida<strong>de</strong>, apesar <strong>de</strong> não ter legitimida<strong>de</strong>.<br />
13
Do ponto <strong>de</strong> vista da <strong>de</strong>fesa dos trabalhadores, ele não cumpre seu papel, só<br />
beneficia um pequeno grupo <strong>de</strong> associados [...] Acho que <strong>de</strong>veria acabar a<br />
contribuição sindical e o monopólio <strong>de</strong> representação. Essas duas medidas já<br />
provocariam uma tempesta<strong>de</strong> no movimento sindical. A contribuição<br />
sustenta um bando <strong>de</strong> sindicatos que são fantasmas, e a unida<strong>de</strong> não permite<br />
a concorrência [...] A constituição manteve todos os aspectos que são<br />
vantajosos para os dirigentes, como as fontes <strong>de</strong> renda e o monopólio da<br />
representação, mas eliminou o controle do Ministério do Trabalho,<br />
fortalecendo os elementos corporativos [...] Os sindicatos são uma instituição<br />
con<strong>de</strong>nada ao <strong>de</strong>clínio. Os setores nos quais o emprego cresce, como os <strong>de</strong><br />
serviço, não são favoráveis a sindicalização. O po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> fogo das empresas<br />
também aumentou com o <strong>de</strong>semprego. Os sindicatos per<strong>de</strong>ram assim po<strong>de</strong>r<br />
<strong>de</strong> barganha e capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mobilização.<br />
Existem fatores gerais e estruturais que permeiam a nova organização do trabalho e<br />
que obstam a ação sindical. Isso, consi<strong>de</strong>rando os sindicatos com instituições históricas <strong>de</strong><br />
representação á partir do local <strong>de</strong> trabalho. Contudo, este problema é sentido <strong>de</strong> maneira<br />
distinta e com intensida<strong>de</strong> diferente <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> cada realida<strong>de</strong> nacional, conforme aponta<br />
Rodrigues (1999), que consi<strong>de</strong>ra relevante e central, a relação entre Estado e sindicatos. A<br />
qualificação profissional presente na agenda sindical passou pelo mesmo processo <strong>de</strong> crise e<br />
in<strong>de</strong>finição. O <strong>de</strong>semprego passa a ser fator central trazido pela abertura. Também, e em<br />
primeiro plano o chamado “<strong>de</strong>semprego tecnológico”, mas não só. Mediante os impactos<br />
sócio-econômicos <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ados pelas altas taxas <strong>de</strong> juros, o Estado intervém buscando<br />
solucionar, ou então amenizar os problemas <strong>de</strong>sta crise. As políticas <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional surgem e se intensificam neste momento. (POCHMANN, 2001). O programa<br />
FAT/PLANFOR é proposto como medida <strong>de</strong> Estado que propagava que a principal causa do<br />
<strong>de</strong>semprego <strong>de</strong>via-se à falta <strong>de</strong> trabalhadores qualificados para ocupar os novos postos <strong>de</strong><br />
trabalho que estavam surgindo. Ou seja, a atenção maior estava voltada para este que<br />
chamamos <strong>de</strong>semprego tecnológico, para o qual a qualificação profissional aparecia como a<br />
principal política <strong>de</strong> enfrentamento. As políticas <strong>de</strong> qualificação profissional discutidas no<br />
nosso trabalho são medidas típicas dos anos 90, em que o Estado visa corrigir os efeitos e<br />
conseqüências da crise e dos problemas estruturais advindos com a abertura econômica. Vale<br />
notar, conforme aponta Pochmann (2001) que este processo que impactou o país <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o final<br />
da década <strong>de</strong> oitenta, a<strong>de</strong>ntrando com maior veemência nos noventa, já havia acontecido no<br />
mundo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos setenta.<br />
Os novos requisitos profissionais indispensáveis ao ingresso e á permanência<br />
no mercado <strong>de</strong> trabalho em transformação seriam passíveis <strong>de</strong> atendimento<br />
somente por meio <strong>de</strong> um maior nível educacional dos trabalhadores. Ao<br />
mesmo tempo, a formação e o constante treinamento profissional se<br />
14
transformariam em uma das poucas alternativas passíveis da ação <strong>de</strong> Estado<br />
para conter o avanço do <strong>de</strong>semprego e da precarização no uso da força <strong>de</strong><br />
trabalho. (POCHMANN, 2001, p. 41-42)<br />
O Estado, tanto no contexto mundial, ou no Brasil, cada vez mais re<strong>de</strong>fine sua relação<br />
<strong>de</strong> intervenção na economia, restando-lhe o ônus, inclusive reclamado pelo capital, <strong>de</strong><br />
qualificar os trabalhadores para os novos postos <strong>de</strong> trabalho que estariam surgindo e que<br />
<strong>de</strong>mandavam maior qualificação. Era inclusive uma ação tida como “social” que <strong>de</strong>via partir<br />
dos organismos públicos e assim do Estado.<br />
Os sindicatos enquanto organismos <strong>de</strong> representação dos trabalhadores sentiram os<br />
efeitos <strong>de</strong>sta crise. As bases sindicalizadas começam a ser afetadas em conseqüência das<br />
mudanças econômicas que se seguiram nesta década. A fragmentação do sistema produtivo,<br />
impondo uma nova organização da produção e conseqüentemente um novo perfil profissional,<br />
quebraria com as históricas linhas <strong>de</strong> atuação do movimento sindical. O po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> mobilização<br />
foi drasticamente afetado, sendo que os sindicatos passam da organização orgânica e política,<br />
para uma outra mais institucional e restrita ao âmbito das políticas públicas. Constata-se<br />
também, um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> ação mais direto, privilegiando os campos econômico e social. No<br />
campo mais econômico ações voltadas para formação <strong>de</strong> cooperativas é um exemplo. No<br />
social ficaram as políticas <strong>de</strong> formação e qualificação empreendidas, primeiro como políticas<br />
públicas <strong>de</strong> Estado propostas á partir do chamado sistema FAT/PLANFOR.<br />
Existe um elemento importante que <strong>de</strong>ve ser colocado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já, para que sobre ele<br />
possamos discorrer mais adiante. Trata-se do fato dos sindicatos, da maneira que os<br />
concebemos serem organismos típicos da socieda<strong>de</strong> industrial, conforme pon<strong>de</strong>ra Offe (1985,<br />
p. 20):<br />
O interesse do pleno emprego por parte dos sindicatos é uma função do seu<br />
papel enquanto coalizões <strong>de</strong> ven<strong>de</strong>dores da força <strong>de</strong> trabalho. Neste papel,<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m três amplas categorias <strong>de</strong> interesses que naturalmente po<strong>de</strong>m<br />
entrar em conflito entre si: 1. O interesse na manutenção ou no crescimento<br />
do salário real; 2. O interesse pelas boas condições <strong>de</strong> trabalho; 3. O<br />
interesse em um alto nível <strong>de</strong> emprego. Entretanto tais coalizões dispõem<br />
apenas <strong>de</strong> meios estratégicos extremamente limitados para atingirem o<br />
objetivo do crescimento do emprego, principalmente se consi<strong>de</strong>rarmos a<br />
compatibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses meios com a sobrevivência da própria organização<br />
sindical.<br />
Os sindicatos sendo órgãos <strong>de</strong> representação <strong>de</strong> classe, que tem como principal função,<br />
dada a sua origem a coalizão <strong>de</strong> ven<strong>de</strong>dores da força <strong>de</strong> trabalho, certamente sempre agiram<br />
15
neste sentido como forma <strong>de</strong> preservar a própria existência. Os programas <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional voltados para a relação <strong>de</strong> venda <strong>de</strong> força <strong>de</strong> trabalho sempre foram ação<br />
privilegiada dos sindicatos. Mas quando a socieda<strong>de</strong> do pleno emprego entra em crise, os<br />
sindicatos são diretamente afetados.<br />
O interesse do pleno emprego é dos principais objetivos do Estado, como forma <strong>de</strong><br />
promover a inclusão e a regulação sobre o trabalho. (NEGRI e HARDT, 2004). Estas são as<br />
bases <strong>de</strong> sustentação do Estado <strong>de</strong> Bem Estar (OFFE, 1985), e também do Estado Nacional no<br />
Brasil. Era normal que diante da crise aberta no Brasil o Estado interviesse, mas era ainda<br />
mais normal a intervenção pela via dos mecanismos constituídos <strong>de</strong> inclusão salarial.<br />
Portanto, os objetivos últimos do Estado por meio das políticas <strong>de</strong> formação e qualificação<br />
profissional era reverter o quadro <strong>de</strong> marginalida<strong>de</strong> e exclusão social. Em suma, qualificação<br />
profissional como políticas sociais compensatórias.<br />
A crise <strong>de</strong> representação sindical aponta para duas questões. A primeira <strong>de</strong>las busca<br />
refletir se a crise é <strong>de</strong> representação ou <strong>de</strong> uma forma <strong>de</strong> representação. Este ponto remete à<br />
discussão sobre a possibilida<strong>de</strong> dos sindicatos se reorganizarem a partir <strong>de</strong> uma ampla e<br />
estrutural reforma. Outra tendência é consi<strong>de</strong>rar que os sindicatos como mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> ação<br />
coletiva, estruturados no período <strong>de</strong> hegemonia industrial, estariam inevitavelmente<br />
con<strong>de</strong>nados ao <strong>de</strong>clínio 10 . Muitas vezes, este <strong>de</strong>bate acaba levando para discussões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />
i<strong>de</strong>ológica, ou então apontando para concepções que cada autor ou corrente têm sobre as<br />
bases e estruturas sindicais. Ao analisar as taxas <strong>de</strong> <strong>de</strong>ssindicalização, tendo em vista a queda<br />
<strong>de</strong> representativida<strong>de</strong> dos sindicatos, Pochmann (2003) avalia que há espaço para atuação<br />
sindical e que estes continuam importantes e po<strong>de</strong>m recuperar seu papel <strong>de</strong><br />
representativida<strong>de</strong>, mas para isso é preciso uma reforma ampla e profunda. Já Rodrigues<br />
(2003), sobre o mesmo ponto, e em <strong>de</strong>bate com o primeiro autor, coloca que se esta ampla e<br />
estrutural reforma acontecer, o que é necessário e imprescindível para a manutenção dos<br />
sindicatos, estes <strong>de</strong>ixariam <strong>de</strong> ser sindicatos e passariam a ser outra coisa.<br />
10 Este ponto parece <strong>de</strong> suma importância, pois quando falamos em crise do movimento sindical, ou crise <strong>de</strong><br />
representação á partir <strong>de</strong>ste mo<strong>de</strong>lo, po<strong>de</strong> gerar o falso entendimento <strong>de</strong> que os sindicatos ficaram atrelados a um<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> representação con<strong>de</strong>nada ao <strong>de</strong>clínio, ou então que tais organismos sindicais agonizam sem<br />
possibilida<strong>de</strong>s e intervenção. A crise do movimento sindical <strong>de</strong>ve ser tomada <strong>de</strong>ntro da organização ou<br />
reorganização do trabalho e do sistema produtivo. Apontamos aqui a crise <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo ou forma <strong>de</strong><br />
representação voltada prioritária ou até exclusivamente para as relações atinentes a um “local <strong>de</strong> trabalho” e para<br />
as pautas típicas do assalariamento. Isso não impe<strong>de</strong>, portanto, que os sindicatos se reorganizem em outras linhas<br />
<strong>de</strong> atuação, como se sabe, aconteceu em vários países do contexto europeu, principalmente com a crise do<br />
Estado <strong>de</strong> Bem Estar. Aliás, a observação que fazemos acerca dos programas <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional no Brasil, segue esta linha. Tais programas são entendidos como novas forma ou possibilida<strong>de</strong>s<br />
abertas, primeiro pela reorganização produtiva, <strong>de</strong>pois pelo Estado, para a retomada ou seqüência da<br />
representação sindical.<br />
16
Para o nosso <strong>de</strong>bate, o ponto que interessa é apontar esta crise dos sindicatos, ou então<br />
<strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> ação sindical, que sai da perspectiva orgânica das lutas voltadas para as<br />
pautas <strong>de</strong> assalariamento, entrando numa ação direcionada para as políticas públicas. As<br />
políticas <strong>de</strong> qualificação e requalificação profissional são medidas típicas <strong>de</strong>ste segundo caso<br />
<strong>de</strong> ações <strong>de</strong> políticas sindicais.<br />
2.3 Sindicato e Qualificação Profissional no Brasil<br />
A regulação do trabalho no Brasil é o capítulo central do histórico <strong>de</strong> construção das<br />
instituições e em particular dos sindicatos 11 . O chamado estatuto corporativo foi a saída<br />
encontrada pelo governo Vargas para conter interesses e viabilizar um projeto<br />
<strong>de</strong>senvolvimentista <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização e industrialização 12 . Pelo estatuto corporativo, Vargas<br />
não apenas constrói o perfil institucional sindical, como também retira do mercado e passa<br />
para o interior do Estado os conflitos sobre as relações <strong>de</strong> trabalho. Este Estado Nacional<br />
Desenvolvimentista é que <strong>de</strong>via representar os anseios da nação, mantendo em seu interior as<br />
divergências <strong>de</strong> interesses com particular atenção para os conflitos entre capital e trabalho.<br />
Conforme aponta Evaristo <strong>de</strong> Moraes (1978), a autonomia sindical era restrita e<br />
limitada pelo Estado. Des<strong>de</strong> 1931, cabia ao Estado o reconhecimento dos sindicatos, embora a<br />
interferência fosse indireta ela já existia na <strong>de</strong>finição dos estatutos, nas eleições, controle<br />
administrativo, burocrático, financeiro e i<strong>de</strong>ológico. O Estado quando não fez diretamente<br />
pela via legal, cooptava, aos poucos, li<strong>de</strong>ranças e quadros burocráticos dos sindicatos. Tratase,<br />
segundo o autor, da chamada política populista <strong>de</strong> incorporação estratégica. Quando em<br />
1943 é criada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), os sindicatos já estavam<br />
consolidados <strong>de</strong>ntro do Estado. São comuns olhares benevolentes sobre a CLT atribuindo sua<br />
criação à generosida<strong>de</strong> da benesse <strong>de</strong> Estado, mais do que aos conflitos que se moviam <strong>de</strong>ntro<br />
do Estado, ou mesmo com alguma autonomia fora <strong>de</strong>le.<br />
11 A estrutura sindical brasileira foi formada na década <strong>de</strong> 30 e sistematizada pela Consolidação das Leis do<br />
Trabalho (CLT), promulgada em 1943 pelo governo <strong>de</strong> Getúlio Vargas. A CLT sistematizou a política<br />
trabalhista <strong>de</strong> Vargas, regendo o funcionamento interno dos sindicatos. Assim, regendo as relações entre Estado<br />
e instituições <strong>de</strong> classe a partir do interior do local <strong>de</strong> trabalho.<br />
12 Aqui falamos mais propriamente do chamado “segundo período Vargas”, ou do Estado Novo. Alguns<br />
enten<strong>de</strong>m que Vargas neste período completou uma política trabalhista já iniciada em 1931 com a criação do<br />
Ministério do Trabalho. De qualquer forma o que vale salientar é que o Estado Novo regulamentou as relações<br />
entre empregados e patrões <strong>de</strong>ntro, ou no interior do Estado. Foi o período da criação do imposto sindical e em<br />
1943 da criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O ponto que interessa salientar é que o chamado<br />
Nacional Desenvolvimentismo se refere a este período. Industrialização, redução <strong>de</strong> importações, aumento da<br />
produção nacional, e em soma, política econômica voltada para o mercado interno <strong>de</strong> forma protecionista. O<br />
ponto era <strong>de</strong>senvolvimento industrial brasileiro a partir da construção <strong>de</strong> infra-estrutura nacional. Para isso era<br />
preciso ter “controle” sobre as relações <strong>de</strong> trabalho.<br />
17
Esta chamada política populista <strong>de</strong> incorporação estratégica tinha como meta controlar<br />
os conflitos <strong>de</strong> trabalho via sindicatos cooptados para <strong>de</strong>ntro do Estado. Os sindicatos<br />
<strong>de</strong>veriam funcionar como órgãos <strong>de</strong> colaboração do Estado na busca <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong><br />
“equilibrada” capaz <strong>de</strong> promover a paz social. Tais políticas <strong>de</strong> incorporação estratégica<br />
po<strong>de</strong>m ser encontradas via estatuto legal como o enquadramento por categoria profissional,<br />
setorização <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma base territorial, imposto sindical obrigatório, unicida<strong>de</strong> sindical,<br />
estrutura verticalizada possibilitando a criação <strong>de</strong> fe<strong>de</strong>rações, confe<strong>de</strong>rações, etc., no<br />
reconhecimento dos conflitos <strong>de</strong> trabalho nos limites do estatuto da CLT e ainda, no<br />
reconhecimento da personalida<strong>de</strong> jurídica dos sindicatos pelo Estado via Ministério do<br />
Trabalho.<br />
Todo e qualquer conflito que não estivesse amparado na e pela legislação pertinente<br />
ficava a mercê da classe patronal. Longe <strong>de</strong> ser dádiva estatal, a legislação trabalhista foi fruto<br />
<strong>de</strong> um amplo processo <strong>de</strong> luta e embates. Muitos <strong>de</strong>stes embates políticos <strong>de</strong> forma estratégica<br />
se moveram via sindicatos <strong>de</strong>ntro do Estado, outros com relativa autonomia conforme aponta<br />
Weffort (1973).<br />
A criação <strong>de</strong>sta estrutura dual <strong>de</strong> garantias <strong>de</strong> cidadania entre formalida<strong>de</strong> e<br />
marginalida<strong>de</strong> impossibilitou que o Estado esten<strong>de</strong>sse os direitos <strong>de</strong> cidadania, e também que<br />
permitisse que novas <strong>de</strong>mandas sociais fossem incorporadas e representadas pelo Estado. Este<br />
fenômeno Santos (1979, p. 75) chamou <strong>de</strong> cidadania regulada:<br />
[...] por cidadania regulada entendo o conceito <strong>de</strong> cidadania cujas raízes<br />
encontram-se, não em um código <strong>de</strong> valores políticos, mas em um sistema<br />
<strong>de</strong> estratificação ocupacional, e que, a<strong>de</strong>mais, tal sistema <strong>de</strong> estratificação<br />
ocupacional é <strong>de</strong>finido por norma legal. Em outras palavras, são cidadãos<br />
todos aqueles membros da comunida<strong>de</strong> que se encontram localizados em<br />
qualquer uma das ocupações reconhecidas e <strong>de</strong>finidas em lei.<br />
Uma incorporação social da condição <strong>de</strong> cidadão <strong>de</strong>finida pelo Estado e reconhecida<br />
pelo Estado via Ministério do Trabalho. Foi este cenário <strong>de</strong> regulação do trabalho, e dos<br />
direitos <strong>de</strong> cidadania, aliado ao fator globalização <strong>de</strong> <strong>de</strong>smonte internacional <strong>de</strong>ste aparato,<br />
que a qualificação profissional encontrou no início dos anos noventa.<br />
O tema da qualificação profissional está intimamente ligado ao histórico do<br />
movimento sindical. No Brasil, em 1908, por exemplo, o II Congresso Operário do Estado <strong>de</strong><br />
São Paulo apresentou uma proposta <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> uma universida<strong>de</strong> operária (DIEESE,<br />
1998). Até meados da década <strong>de</strong> 30 com a criação do Estado Novo, foram inúmeras<br />
experiências <strong>de</strong> qualificação profissional, geralmente cursos <strong>de</strong> curta duração executados<br />
18
pelos sindicatos das categorias, conforme apontam Souza, Santana e Deluiz (1999). A partir<br />
principalmente da construção do Estado Nacional, ou Estado Novo, o tema ganhou nova<br />
roupagem que se espraiava entre experiências na área <strong>de</strong> educação e alfabetização por um<br />
lado, e por outro, experiências técnico-profissionalizantes, visando a<strong>de</strong>quar o país nas novas<br />
exigências profissionais trazidas com o surto <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Este ponto é importante<br />
para nossa discussão uma vez tratando-se do período <strong>de</strong> construção do Estado Nacional, ainda<br />
que na forma <strong>de</strong> um “fordismo tropical 13 ”. O país passa a incorporar e a introduzir conquistas<br />
técnicas científicas <strong>de</strong> ponta que vinham sendo experimentadas e criadas no mundo. No<br />
tocante a qualificação profissional, Pochmann (2001, p. 136) aponta:<br />
A implementação da aprendizagem profissional setorial, no governo<br />
Vargas, buscou oferecer alguma qualificação profissional paralelamente às<br />
necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> contratação dos empresários nas ativida<strong>de</strong>s urbanas mais<br />
dinâmicas. Não há consensos sobre a eficácia dos programas <strong>de</strong> formação<br />
<strong>de</strong>senvolvidos, todavia, parece não haver dúvidas quanto ao compromisso<br />
com o a<strong>de</strong>stramento <strong>de</strong> trabalhadores não-qualificados em tarefas simples,<br />
sobretudo na incorporação da metodologia taylorista <strong>de</strong> organização do<br />
trabalho no Brasil.<br />
Este mo<strong>de</strong>lo foi implantado no Brasil com a construção do Estado Nacional no<br />
período Vargas. Ainda que passássemos por distintos momentos históricos, nunca nos<br />
livraríamos completamente <strong>de</strong>le, mesmo por que no contexto mundial ele ainda galgaria <strong>de</strong><br />
sucesso durante algumas décadas.<br />
Entre as décadas <strong>de</strong> sessenta e setenta, o <strong>de</strong>bate se alarga, mantendo as propostas <strong>de</strong><br />
formação para novos postos <strong>de</strong> trabalho dada a introdução <strong>de</strong> novas tecnologias, mas abrindose<br />
para as ações em torno da educação popular que inclusive foi tida como foco <strong>de</strong> resistência<br />
no período da repressão.<br />
Se a década <strong>de</strong> oitenta no Brasil foi marcada pela crise, também neste período foi<br />
retomado o processo <strong>de</strong> re<strong>de</strong>mocratização do país. Dentro <strong>de</strong>ste processo <strong>de</strong> re<strong>de</strong>mocratização<br />
em que a socieda<strong>de</strong> civil emerge como sujeito político surge um sindicalismo mais orgânico e<br />
politizado que se contrapõe ao movimento sindical tradicional.<br />
13 Á adaptação do fordismo, enquanto regime sociopolítico e econômico com padrão <strong>de</strong> organização do trabalho<br />
fabril, á realida<strong>de</strong> brasileira, ou mesmo o toyotismo enquanto organização científica do trabalho, fragmentação e<br />
cronometragem <strong>de</strong> tarefas, separação entre concepção e execução, disciplina e controle sobre o trabalho,<br />
expropriação do saber e da autonomia, <strong>de</strong>squalificação e <strong>de</strong>gradação do trabalho. Sobre este ponto ver: LEITE,<br />
E. Módulo Sociologia do trabalho Reestruturação produtiva no Brasil: mudanças no mercado <strong>de</strong> trabalho e<br />
impactos sobre a qualificação profissional, VOGEL e YANNOULLAS (Org.), UNESP/FLACSO, 2000. (p. 127<br />
– 142)<br />
19
Foi neste período <strong>de</strong> lutas e <strong>de</strong> retomada do processo <strong>de</strong> re<strong>de</strong>mocratização que a<br />
socieda<strong>de</strong> civil ocupou a cena política nacional, crescendo o número <strong>de</strong> sindicatos. A tabela<br />
abaixo mostra estes números referindo-se ao período <strong>de</strong> fundação dos sindicatos no Brasil<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1930 a 2001.<br />
20
Tabela 17 - Sindicatos, urbanos e rurais, por período <strong>de</strong> fundação, segundo as Gran<strong>de</strong>s Regiões<br />
e tipo <strong>de</strong> sindicato - Brasil - 1930-2001<br />
Gran<strong>de</strong>s Regiões<br />
e<br />
tipo <strong>de</strong> sindicato Total<br />
Até<br />
1930<br />
1931<br />
a<br />
1940<br />
1941<br />
a<br />
1950<br />
1951<br />
a<br />
1960<br />
Sindicatos<br />
Período <strong>de</strong> fundação<br />
1961<br />
a<br />
1970<br />
1971<br />
a<br />
1980<br />
1981<br />
a<br />
1990<br />
1991<br />
a<br />
2000<br />
2001<br />
Sem<br />
<strong>de</strong>cla-<br />
ração (1)<br />
Brasil 15 961 97 547 814 811 2 533 2 260 4 376 4 212 195 116<br />
Urbanos 10 263 91 537 785 697 628 774 3 366 3 155 144 86<br />
Empregadores 2 758 5 145 374 189 165 245 759 802 34 40<br />
Empregados 6 070 49 314 324 417 340 312 2 233 1 949 97 35<br />
Trabalhadores autônomos 585 4 15 22 35 61 70 132 230 11 5<br />
Agentes autônomos 62 2 4 7 3 7 3 13 23 - -<br />
Profissionais liberais 483 6 26 42 22 19 108 165 88 1 6<br />
Trabalhadores avulsos 305 25 33 16 31 36 36 64 63 1 -<br />
Rurais 5 698 6 10 29 114 1 905 1 486 1 010 1 057 51 30<br />
Empregadores 1 787 6 9 28 106 845 279 235 250 11 18<br />
Trabalhadores 3 911 - 1 1 8 1 060 1 207 775 807 40 12<br />
Norte 1 208 6 27 32 47 64 146 378 471 31 6<br />
Urbanos 781 6 27 32 38 28 41 262 319 23 5<br />
Empregadores 237 - 5 17 9 5 12 59 114 14 2<br />
Empregados 405 3 18 8 18 17 15 165 153 5 3<br />
Trabalhadores autônomos 75 - 2 3 5 4 6 21 30 4 -<br />
Agentes autônomos 6 - - - - - - - 6 - -<br />
Profissionais liberais 31 - 1 2 1 - 3 13 11 - -<br />
Trabalhadores avulsos 27 3 1 2 5 2 5 4 5 - -<br />
Rurais 427 - - - 9 36 105 116 152 8 1<br />
Empregadores 131 - - - 9 21 16 27 53 4 1<br />
Trabalhadores 296 - - - - 15 89 89 99 4 -<br />
Nor<strong>de</strong>ste 4 072 23 123 212 173 689 818 878 1 056 57 43<br />
Urbanos 2 055 23 123 208 136 123 141 566 660 41 34<br />
Empregadores 540 1 20 97 54 25 43 124 160 4 12<br />
Empregados 1 132 10 76 80 53 64 49 349 401 34 16<br />
Trabalhadores autônomos 159 2 3 6 7 14 16 36 71 2 2<br />
Agentes autônomos 14 1 1 5 - - - 5 2 - -<br />
Profissionais liberais 108 1 9 10 6 7 18 33 19 1 4<br />
Trabalhadores avulsos 102 8 14 10 16 13 15 19 7 - -<br />
Rurais 2 017 - - 4 37 566 677 312 396 16 9<br />
Empregadores 339 - - 4 30 140 69 32 55 2 7<br />
Trabalhadores 1 678 - - - 7 426 608 280 341 14 2<br />
Su<strong>de</strong>ste 5 213 46 290 392 351 786 631 1 388 1 236 55 38<br />
Urbanos 3 757 44 286 372 299 249 226 1 190 1 023 41 27<br />
Empregadores 1 003 3 105 183 69 64 66 257 234 6 16<br />
Empregados 2 334 26 153 158 205 142 102 828 682 31 7<br />
Trabalhadores autônomos 173 1 6 9 14 31 18 28 60 3 3<br />
Agentes autônomos 17 1 3 2 2 3 - 2 4 - -<br />
Profissionais liberais 164 5 9 18 9 5 37 52 28 - 1<br />
Trabalhadores avulsos 66 8 10 2 - 4 3 23 15 1 -<br />
Rurais 1 456 2 4 20 52 537 405 198 213 14 11<br />
Empregadores 689 2 3 19 51 377 110 58 62 - 7<br />
Trabalhadores 767 - 1 1 1 160 295 140 151 14 4<br />
Sul 3 970 22 99 155 220 844 444 1 192 942 33 19<br />
Urbanos 2 679 18 93 153 208 183 241 980 762 26 15<br />
Empregadores 730 1 14 66 52 58 82 246 197 5 9<br />
Empregados 1 620 10 61 73 130 92 96 654 480 19 5<br />
Trabalhadores autônomos 112 1 3 2 9 9 21 30 35 2 -<br />
Agentes autônomos 20 - - - 1 3 2 4 10 - -<br />
Profissionais liberais 118 - 7 10 6 4 37 36 17 - 1<br />
Trabalhadores avulsos 79 6 8 2 10 17 3 10 23 - -<br />
Rurais 1 291 4 6 2 12 661 203 212 180 7 4<br />
Empregadores 404 4 6 2 12 223 59 61 34 1 2<br />
Trabalhadores 887 - - - - 438 144 151 146 6 2<br />
Centro-Oeste 1 498 - 8 23 20 150 221 540 507 19 10<br />
Urbanos 991 - 8 20 16 45 125 368 391 13 5<br />
Empregadores 248 - 1 11 5 13 42 73 97 5 1<br />
Empregados 579 - 6 5 11 25 50 237 233 8 4<br />
Trabalhadores autônomos 66 - 1 2 - 3 9 17 34 - -<br />
Agentes autônomos 5 - - - - 1 1 2 1 - -<br />
Profissionais liberais 62 - - 2 - 3 13 31 13 - -<br />
Trabalhadores avulsos 31 - - - - - 10 8 13 - -<br />
Rurais 507 - - 3 4 105 96 172 116 6 5<br />
Empregadores 224 - - 3 4 84 25 57 46 4 1<br />
Trabalhadores 283 - - - - 21 71 115 70 2 4<br />
Fonte: IBGE, Diretoria <strong>de</strong> Pesquisa, Departamento <strong>de</strong> População e Indicadores Sociais, Pesquisa Sindical 2001.<br />
21
É importante notar como houve uma explosão do número <strong>de</strong> sindicatos no Brasil,<br />
especialmente no que se refere aos sindicatos rurais entre os períodos <strong>de</strong> 1971 até 1980, e<br />
também <strong>de</strong> 1981 a 1990, com mais incidência <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> sindicatos no primeiro período.<br />
No caso do meio rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto, soma-se o aumento <strong>de</strong> áreas plantadas em<br />
cana, seguida pelo setor citricultor, portanto ressaltando a relevância no assalariamento<br />
agrícola. Este processo foi <strong>de</strong>cisivo na emergência <strong>de</strong> vários movimentos que culminaram<br />
com a fundação <strong>de</strong> sindicatos (STEIN, 1998). Portanto, os sindicatos são expressões <strong>de</strong>stas<br />
lutas abertas com o processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização do país, ainda que mesmo reformados<br />
guar<strong>de</strong>m relação e vinculação com seu “mal <strong>de</strong> berço”, que é o estatuto corporativo,<br />
(CARDOSO, 1999). Assim, dada a estreita vinculação do histórico e das políticas <strong>de</strong><br />
qualificação profissional com o movimento sindical, tais políticas, e mais precisamente esta<br />
que surge nos anos 90, também são expressão <strong>de</strong>ste processo <strong>de</strong> abertura e <strong>de</strong>mocratização do<br />
país.<br />
2.4 Estrutura Sindical Rural na Região <strong>de</strong> Ribeirão Preto<br />
Segundo Stolcke (1986), o Estatuto do Trabalhador Rural (ETR) foi uma concessão<br />
mo<strong>de</strong>rada que alterou as condições jurídico-sociais dos trabalhadores na agricultura. O ETR<br />
passa a regulamentar as relações <strong>de</strong> trabalho no campo como forma mo<strong>de</strong>rada, <strong>de</strong> conce<strong>de</strong>r<br />
direito. Buscava regulamentar as relações <strong>de</strong> trabalho no meio rural, num momento em que<br />
crescia a relação <strong>de</strong> assalariamento agrícola. Nos anos 60, conforme aponta Scopinho (1995),<br />
a agricultura, e particularmente o setor sucroalcooleiro da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, já<br />
<strong>de</strong>spontava como principal foco econômico do país. O Estatuto da Lei, uma vez aplicado,<br />
beneficiaria os trabalhadores. Isso acontece num momento, 1963, em que os movimentos<br />
sociais e greves estavam eclodindo pelo Brasil. Com o golpe <strong>de</strong> 64, houve paralisia <strong>de</strong>stes<br />
movimentos. Em certa medida, o Estatuto serviria como parcial substituto dos movimentos<br />
sociais no campo, uma vez que os trabalhadores rurais passavam a exigir seus direitos,<br />
(STEIN, 1998).<br />
O histórico do <strong>de</strong>senvolvimento econômico brasileiro é marcado pela concentração <strong>de</strong><br />
capitais. Conforme aponta Silva (1999), esta afirmação cabe também para o <strong>de</strong>senvolvimento<br />
agrícola do país e principalmente para a região <strong>de</strong> Ribeirão Preto. Todas as políticas<br />
22
“<strong>de</strong>senvolvimentistas” e “mo<strong>de</strong>rnizadoras”, com especial atenção para o período Vargas 14 e o<br />
governo dos militares, propiciaram uma política <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s proprieda<strong>de</strong>s e investimentos. Um<br />
processo que Silva (1982) chamaria <strong>de</strong> “Mo<strong>de</strong>rnização Dolorosa”, dado que ao mesmo tempo<br />
em que o meio agrícola da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto <strong>de</strong>spontava como a principal região<br />
agrícola do país, introduzindo tecnologia <strong>de</strong> ponta na produção, por outro lado excluía ou<br />
então pauperizava um gran<strong>de</strong> contingente <strong>de</strong> trabalhadores. As bases técnicas e as novas<br />
relações <strong>de</strong> produção com base no capital intensivo se revertem em alta produtivida<strong>de</strong>. Assim<br />
enten<strong>de</strong>mos que antes mesmo das regulamentações legais do ETR, o complexo agroindustrial<br />
já vinha ameaçando as relações <strong>de</strong> trabalho no campo, conforme acontece no meio urbano em<br />
que, segundo Cardoso (1999), tem-se um direito trabalhista que antece<strong>de</strong> a própria<br />
industrialização. O que <strong>de</strong> certa forma acabaria por ocasionar alguns <strong>de</strong>sarranjos, bem como a<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> novas regulamentações.<br />
Neste caso da agricultura, não se trata da regulamentação a partir <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong><br />
consolidada, pois foi neste mesmo período do surgimento do ETR que as relações <strong>de</strong> trabalho<br />
no campo vinham sendo alteradas. O colonato, a meação, a parceria, bem como a pequena<br />
produção vinham sendo ameaçadas pelo <strong>de</strong>senvolvimento do capitalismo no campo. O ETR<br />
passa a regulamentar as relações <strong>de</strong> trabalho apontando para o crescente assalariamento.<br />
No caso dos trabalhadores rurais, o Estado, passa a regulamentar, ou ainda, a antever<br />
as relações <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r vigentes na matriz do po<strong>de</strong>r social. O mesmo Estado que buscava conter<br />
os interesses dos trabalhadores <strong>de</strong>veria promover e mediar o <strong>de</strong>senvolvimento econômico. O<br />
período mais marcante a este respeito foi o governo dos militares, quando o Estado subsidia e<br />
promove o <strong>de</strong>senvolvimento do capital agroindustrial (SCOPINHO, 1995).<br />
A Lei n.º: 5889 <strong>de</strong> 1973 substituiu os ETR. Os dantes consi<strong>de</strong>rados pelo ETR<br />
“trabalhadores rurais", categoria que compreen<strong>de</strong> <strong>de</strong> forma mais genérica todos aqueles<br />
trabalhadores da terra, <strong>de</strong>ntre os quais meeiros, arrendatários, pequenos proprietários e<br />
também assalariados, com a nova lei passam a ser referidos como "empregados rurais". Ou<br />
seja, já no texto da lei se previa relação <strong>de</strong> “assalariamento”, que vinha crescendo no país,<br />
mas também na região, pois o termo empregado, que consta do texto legal, pressupõe a<br />
existência dos patrões.<br />
A Lei n.º 5889 <strong>de</strong> 1973 em seu artigo primeiro, prevê a regulamentação e direito das<br />
proprieda<strong>de</strong>s agrícolas. No artigo 14, o Estado impulsiona e encoraja a criação e<br />
14 Por período Vargas, e particularmente ao ponto que nos toca <strong>de</strong>ntro das discussões que levantamos nos<br />
referimos particularmente a dois períodos: Estado Novo, como construção do chamado “Estado Nacional” e o<br />
chamado “Período Democrático”, mais pertinente <strong>de</strong>ntro das iniciativas do “Nacional Desenvolvimentismo”.<br />
23
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> empresas rurais, cujo objetivo é a intensificação da produção<br />
agroindustrial.<br />
A estrutura sindical varguista, conforme observa Coletti (1998), foi transposta para o<br />
meio rural inicialmente pelo Estatuto do Trabalhador Rural na década <strong>de</strong> sessenta. Na<br />
formação dos sindicatos rurais no Brasil, o processo <strong>de</strong> implantação e reconhecimento dos<br />
sindicatos passa pela instância estatal, mas é também fruto <strong>de</strong> lutas e enfrentamentos.<br />
Conforme observa Stein (1998), o movimento católico através da Confe<strong>de</strong>ração Nacional dos<br />
Operários Católicos (CNOC), i<strong>de</strong>ntificado como “movimento circulista”, explodiu<br />
impulsionando o reconhecimento dos sindicatos rurais pelo Ministério do Trabalho. Tanto que<br />
a principal fe<strong>de</strong>ração sindical presente e que se conserva até hoje atuante na região foi<br />
fundada em 1962. Conforme aponta Stein (1998), os STR – Sindicatos Trabalhadores Rurais<br />
(STR) <strong>de</strong> Lins, Assis, Guariba, Juquiá, Matão e Porto Feliz requereram a fundação da<br />
fe<strong>de</strong>ração que seria reconhecida em agosto <strong>de</strong> 63 por portaria do Ministério do Trabalho. A<br />
outra fe<strong>de</strong>ração presente e atuante na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, a Fe<strong>de</strong>ração Rural dos<br />
Assalariados do Estado <strong>de</strong> São Paulo (FERAESP), surge apenas em 1989, a partir <strong>de</strong> uma<br />
dissidência da primeira.<br />
O movimento sindical rural da região, a exemplo do restante do país, passou por<br />
momentos difíceis <strong>de</strong> reformulação <strong>de</strong> suas estruturas. Se por um lado as mudanças<br />
socioeconômicas foram <strong>de</strong>cisivas, é inegável que as experiências políticas experimentadas<br />
durante décadas tiveram significativa importância. O trabalho <strong>de</strong> base da Igreja Católica 15 ,<br />
partidos políticos e <strong>de</strong> círculos operários tem fundamental importância na formação da<br />
consciência dos trabalhadores rurais. Os sérios abalos nas bases sindicais sacudiram os<br />
trabalhadores rurais <strong>de</strong>limitando ainda mais um marco divisor entre o mo<strong>de</strong>lo do "velho<br />
sindicalismo 16 " e as propostas <strong>de</strong>fendidas pela oposição sindical 17 . Os dirigentes ligados ao<br />
movimento <strong>de</strong> oposição se formavam <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um caldo cultural, proporcionado<br />
principalmente pelo processo <strong>de</strong> re<strong>de</strong>mocratização interrompido com o golpe <strong>de</strong> 64. Os<br />
opositores combatiam fundamentalmente o caráter assistencialista e apaziguador das práticas<br />
sindicais, propondo um sindicato mais combativo e comprometido com a base, conforme<br />
aponta Stein (1998).<br />
15 Sobre sindicalização rural, ver: STEIN, L, M. Igreja católica e programas <strong>de</strong> sindicalização rural no<br />
Brasil (1954 a 1964). Revista TEMAS, Araraquara, UNESP, Vol. 4, ano 5, 1998.<br />
16 Enten<strong>de</strong>-se por "velho sindicalismo", a estrutura sindical corporativa e assistencialista, criada por Vargas em<br />
1931, e transportada para o meio rural, principalmente após a criação do Estatuto do Trabalhador Rural em 1962.<br />
17 Enten<strong>de</strong>-se por "oposição sindical", o surgimento no meio rural <strong>de</strong> li<strong>de</strong>ranças organizadas que lutavam para<br />
substituir o "velho mo<strong>de</strong>lo" sindical corporativo herdado da era Vargas.<br />
24
Apesar <strong>de</strong> todos os movimentos ocorridos no meio rural, o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> estrutura<br />
sindical só foi revisto pelo texto Constitucional <strong>de</strong> 1988. Conforme requeriam todos os<br />
movimentos e lutas no campo, a reformulação do texto legal tinha como alvo <strong>de</strong> ataque a<br />
estrutura sindical corporativa herdada do varguismo. A quebra da tutela estatal se expressa<br />
por meio do artigo 8, caput, e incisos: I e II da Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1888. Contudo, o texto<br />
é ambíguo e tem gerado correntes <strong>de</strong> interpretações diversas. A Constituição proibiu a<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autorização pelo Estado para a criação <strong>de</strong> sindicatos, além <strong>de</strong> vedar a<br />
interferência do Estado nas questões sindicais. E ainda assim, estabelece a possibilida<strong>de</strong> da<br />
pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sindicatos para uma mesma categoria. Todavia, o inciso II do referido artigo<br />
prevendo a unicida<strong>de</strong> compulsória condiciona obrigatoriamente os empregados e patrões a<br />
a<strong>de</strong>rirem ao sindicato legalmente reconhecido, e também, <strong>de</strong>termina instância para dirimir<br />
conflitos sobre a possível existência <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> um sindicato em uma mesma localida<strong>de</strong>.<br />
Na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, todo este processo se dava principalmente no interior da<br />
única Fe<strong>de</strong>ração existente. A Fe<strong>de</strong>ração dos Trabalhadores na Agricultura do Estado <strong>de</strong> São<br />
Paulo (FETAESP), fundada em 1962 e reconhecida pelo Ministério do Trabalho em 17 <strong>de</strong><br />
agosto <strong>de</strong> 1963, caracterizava-se <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu surgimento pela continuida<strong>de</strong> do mo<strong>de</strong>lo<br />
político-sindical ligado aos Círculos Operários. Corrente ligada a Igreja Católica, <strong>de</strong> corte<br />
conservador e anticomunista, que se opunha ao mo<strong>de</strong>lo sindical proposto pela União <strong>de</strong><br />
Lavradores e Trabalhadores Agrícolas (ULTAB 18 ), em que se encontrava à esquerda, a<br />
exemplo do Partido Comunista Brasileiro (PCB), o Partido Comunista do Brasil (PC do B) e o<br />
Movimento Revolucionário 8 <strong>de</strong> outubro (MR-8). Portanto, esta disputa <strong>de</strong> hegemonia no<br />
Movimento Sindical Rural não é um fenômeno recente. (STEIN, 1998)<br />
Em 1989, fruto da corrente Oposição Sindical surge a FERAESP. Em princípio, a<br />
justificativa central para o surgimento <strong>de</strong> outra fe<strong>de</strong>ração era o fato da FETAESP representar<br />
não apenas assalariados rurais, mais também, camponeses e pequenos proprietários. Entendiase<br />
que os interesses dos pequenos proprietários eram diferentes daqueles <strong>de</strong>fendidos pelos<br />
assalariados rurais e que as circunstâncias exigiam um novo mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> representação<br />
institucional. É bem verda<strong>de</strong> que com a intensificação da concentração fundiária que<br />
expulsava <strong>de</strong>finitivamente os trabalhadores da terra, a gran<strong>de</strong> luta dos assalariados rurais era<br />
pela conquista da terra. Assim, o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> representação da FETAESP não atendia aquilo<br />
que os assalariados tinham como primordial. Os pequenos proprietários estavam preocupados<br />
com a política agrícola e não com a reforma agrária. Portanto, os interesses eram acima <strong>de</strong><br />
18 ULTAB - Associação classista <strong>de</strong> assalariados rurais e camponeses. Atuou principalmente <strong>de</strong> 54 a 62,<br />
organizada pelo PCB, figurava como contraponto aos Círculos Operários <strong>de</strong> corte conservador e anticomunista.<br />
25
tudo antagônicos, uma vez que do seu surgimento, a FERAESP <strong>de</strong>stacava que a luta principal<br />
é contra aqueles que exploram a força <strong>de</strong> trabalho, e <strong>de</strong>ntre estes, não se po<strong>de</strong> distinguir<br />
pequenos e gran<strong>de</strong>s proprietários. A FERAESP <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então pauta suas lutas em duas frentes:<br />
a luta pela reforma agrária; e as lutas e reivindicações a partir do assalariamento, como<br />
greves, dissídios coletivos, melhoria <strong>de</strong> salários e condições <strong>de</strong> trabalho etc.<br />
O racha que proporcionou o surgimento da FERAESP não foi fruto da percepção<br />
rápida e espontânea do movimento <strong>de</strong> oposição, mas da atuação militante em curso que<br />
propunha um novo mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> sindicalismo combativo e comprometido com sua base. Assim,<br />
a atuação da oposição sindical com a proposta <strong>de</strong> um novo sindicalismo 19 tinha como alvo <strong>de</strong><br />
crítica o mo<strong>de</strong>lo assistencialista e coorporativo representado pela FETAESP. (SCOPINHO;<br />
VALARELLI, 1995)<br />
As seguidas greves que sacudiram o meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto na década<br />
<strong>de</strong> 80 são marcos históricos que <strong>de</strong>limitam a intensificação das divergências quanto ao<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> representação sindical. O fator experiência praticado pelos trabalhadores, nos<br />
parece <strong>de</strong>cisivo na constante formação da consciência e ação. (THOMPSON, 1989) Dentre as<br />
greves que eclodiram no meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, <strong>de</strong>stacamos aquela <strong>de</strong><br />
Guariba 20 como exemplo <strong>de</strong> intensificação das lutas no meio rural. Se por um lado fatores<br />
objetivos, como a intensificação da exploração, foram <strong>de</strong>cisivos, por outro, o acúmulo<br />
experimentado em greves, paralisações e campanhas salariais tiveram gran<strong>de</strong> importância.<br />
Na década <strong>de</strong> 1990 o processo <strong>de</strong> mecanização da lavoura canavieira é intensificado,<br />
com isso gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> trabalhadores per<strong>de</strong> seus postos <strong>de</strong> trabalho ou então sentem o<br />
aumento da exploração e diminuição dos salários. Hélio Neves presi<strong>de</strong>nte da FERAESP, em<br />
entrevista (NOVAES E ALVES, 2003, p. 53) aponta:<br />
Se a gente convertesse o salário <strong>de</strong> 87 em dólar, comparasse esse valor com<br />
o salário mínimo e <strong>de</strong>pois projetasse este valor para hoje (2003), a gente ia<br />
ver que o piso salarial da cana <strong>de</strong>veria estar na faixa <strong>de</strong> R$600,00. Contudo<br />
está na faixa <strong>de</strong> R$300,00, possivelmente chegando na faixa <strong>de</strong><br />
R$350,00/R$360,00 nesta safra <strong>de</strong> 2003. Então, nos precisamos <strong>de</strong> 100% <strong>de</strong><br />
reajuste para alcançar 87. O que é grave é que em 87 tinha um número duas<br />
19 Enten<strong>de</strong>-se por "novo sindicalismo" as propostas <strong>de</strong>fendidas pela oposição sindical, <strong>de</strong> um movimento<br />
combativo e comprometido com a base. "Novo Sindicalismo" é um termo usado para contrastar com o "velho<br />
sindicalismo" corporativo e assistencialista.<br />
20 A greve <strong>de</strong> Guariba aconteceu em maio <strong>de</strong> 1984, quando os cortadores <strong>de</strong> cana paralisaram suas ativida<strong>de</strong>s por<br />
motivo <strong>de</strong> imposição dos usineiros da região pelo corte <strong>de</strong> sete ruas. Esta prática resultou no maior esgotamento<br />
físico e em significativas perdas salariais. A greve não se restringiu ao setor canavieiro, vindo a atingir também<br />
os colhedores <strong>de</strong> laranja, que passaram a reivindicar o aumento do valor da caixa colhida. A greve <strong>de</strong> Guariba<br />
correu completamente por fora do aparelho sindical, sendo um levante espontâneo dos trabalhadores. Constitui<br />
assim, um marco histórico <strong>de</strong>cisivo para as lutas sociais no meio rural.<br />
26
vezes maior <strong>de</strong> trabalhadores na safra. Então ocorreu diminuição <strong>de</strong><br />
trabalhadores, diminuição <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho e diminuição <strong>de</strong> ganhos<br />
daqueles que continuam trabalhando.<br />
Pontua ainda a dificulda<strong>de</strong> dos sindicatos se firmarem diante <strong>de</strong>ste quadro<br />
extremamente <strong>de</strong>sfavorável para a ação coletiva. Por outro aponta que não existe saída para<br />
este impasse da relação trabalho e capital no campo, senão pela via da Reforma Agrária, que<br />
segundo ele, vem sendo praticada mediante a maior conscientização dos trabalhadores.<br />
Conscientização esta atribuída ao fator experiência 21 acumulada nas últimas décadas <strong>de</strong><br />
enfrentamento e lutas no meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto.<br />
Diante <strong>de</strong>ste quadro no que diz respeito mais direta e pontualmente a disputa por<br />
representação sindical no meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, tinha-se a diluição <strong>de</strong><br />
propostas entre o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> sindicalismo corporativo, ou “velho sindicalismo”, i<strong>de</strong>ntificado<br />
com a FETAESP, e o <strong>de</strong> oposição sindical que tinha na FERAESP a proposta <strong>de</strong> um “novo<br />
sindicalismo”. Dada a recontextualização <strong>de</strong>ste quadro <strong>de</strong>ntro do atual processo <strong>de</strong><br />
reestruturação produtiva, quando as propostas <strong>de</strong> ação e representação a partir das pautas <strong>de</strong><br />
assalariamento entram em crise, o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> sindicalismo, ou para ser mais preciso e direto, o<br />
“novo sindicalismo” da FERAESP passa a ser questionado, não galgando mais <strong>de</strong> assento<br />
privilegiado como fora no momento <strong>de</strong> seu surgimento.<br />
2.5 Os Sindicatos como Órgãos Privilegiados na Execução das Políticas <strong>de</strong><br />
Qualificação Profissional<br />
As políticas <strong>de</strong> qualificação profissional dos anos 90, e principalmente a implantação<br />
dos programas que norteariam tais políticas surgem exatamente quando os sindicatos estavam<br />
começando a sentir os efeitos da crise aberta pelo processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva. Ainda<br />
que no Brasil este processo tenha recorte bastante particular, foi exatamente nesta década que<br />
as relações <strong>de</strong> trabalho no meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, sofrem profundas<br />
transformação. Dado o histórico trabalhista brasileiro, os sindicatos aparecem como órgão<br />
privilegiado na representação <strong>de</strong> interesses referentes às relações <strong>de</strong> trabalho. Era, portanto,<br />
21 Dentre algumas entrevistas que realizamos, ainda que este não fosse o foco, sempre surgiam <strong>de</strong>poimentos<br />
sobre a Greve <strong>de</strong> Guariba. Um ponto ficou latente em nossa memória, mesmo por que ele aparece em vários<br />
<strong>de</strong>poimentos. Segundo estes <strong>de</strong>poimentos colhidos, uma das práticas dos usineiros da região, logo após a greve<br />
terminada e os trabalhadores terem voltado ao trabalho, era <strong>de</strong>ixar uma máquina – colheita<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> cana –<br />
funcionando em algum local estratégico em que os trabalhadores pu<strong>de</strong>ssem ver. Segundo alguns tratava-se <strong>de</strong><br />
uma espécie <strong>de</strong> ameaça táxita para os trabalhadores, como que dizendo: caso se organizem e reivindiquem, a<br />
máquina substituirá vocês. Alguns afirmam ainda que a intensificação da mecanização do corte no meio<br />
canavieiro se <strong>de</strong>u principalmente a partir do absenteísmo da Greve <strong>de</strong> Guariba.<br />
27
quase automático, quando as políticas <strong>de</strong> Estado propagavam que a qualificação profissional<br />
seria a principal solução para o <strong>de</strong>semprego, passar para os sindicatos a execução <strong>de</strong> tais<br />
políticas. Também, a construção <strong>de</strong> órgãos e conselhos tripartites iniciadas a partir da carta<br />
constitucional <strong>de</strong> 88, que previa a participação <strong>de</strong> representantes do Estado, trabalhadores e<br />
capital. Portanto, tínhamos uma política <strong>de</strong> combate ao <strong>de</strong>semprego que <strong>de</strong>veria ser tocada<br />
pelo movimento sindical. Tese reforçada pela representação <strong>de</strong>stes três segmentos <strong>de</strong><br />
interesses, chamado por Asiz Simão (1966) como “Clássico Tripé”, entendido como Estado,<br />
capital e trabalho. Dada a relação entre sindicatos e Estado no Brasil, os interesses dos<br />
trabalhadores, bem como do capital, são canalizados para o interior do Estado. Cabia ao<br />
Estado intervir neste processo.<br />
O Estado, afirmação que vale tanto para o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong> Bem-Estar quanto<br />
para o varguismo no Brasil, se caracteriza fundamentalmente pela presença <strong>de</strong> um ente, uma<br />
abstração que se apresenta na figura <strong>de</strong> um terceiro, mas que se coloca acima dos dois pólos,<br />
capital e trabalho, envolvidos nesta relação 22 . Estes dois pólos são entendidos como partes<br />
conflitantes, dirimidas por um po<strong>de</strong>r que está acima dos interesses <strong>de</strong> cada uma <strong>de</strong>las. A busca<br />
pela conciliação <strong>de</strong> interesses pressupõe necessariamente cooperação, ou competição velada,<br />
permitida até os limites da institucionalida<strong>de</strong> construída. O Estado <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>cidir e fazer valer<br />
esta cooperação, visando o bem-estar comum. Para isso, em tese, <strong>de</strong>ve compor da melhor<br />
maneira possível o interesse <strong>de</strong>stes dois pólos, tendo em vista que concebe a socieda<strong>de</strong> como<br />
formada pela relação entre eles.<br />
O Estado, para se constituir como tal, necessita <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> controle sobre a esfera<br />
produtiva e do trabalho. O Estado é neste caso, pressuposto <strong>de</strong> um ente “acima” <strong>de</strong> interesses<br />
específicos, capital e trabalho, e que, dados os interesses antagônicos e <strong>de</strong> certa forma<br />
irreconciliáveis, se faz necessária a presença, inclusive justificando a sua existência, <strong>de</strong> um<br />
Estado 23 que funciona primeiro como árbitro e <strong>de</strong>pois como executor. (SIMÃO, 1966)<br />
Sendo assim, é clara a posição do Estado como agente mediador <strong>de</strong> interesses. Mas é<br />
preciso atentar para o fato <strong>de</strong> que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sta relação <strong>de</strong> “mediação” <strong>de</strong> interesses, sempre<br />
22 Sobre estas colocações chamamos atenção para o papel e a relação do Estado com a economia e com a<br />
economia política. Neste sentido a relação entre Estado e economia, ou em alguns casos <strong>de</strong>mocracia capitalista.<br />
Portanto, significa apontar que o Estado, <strong>de</strong> forma abstrata (pois não tem correspon<strong>de</strong>nte real com a base e<br />
movimento dos pólos capital e trabalho), assume o papel <strong>de</strong> ente acima dos interesses <strong>de</strong>stes dois pólos. Neste<br />
sentido, interesses <strong>de</strong> estado, são sempre interesses maiores.<br />
23 Tanto para o conceito <strong>de</strong> Estado, quanto para ampla divergência discursiva acerca <strong>de</strong> tal conceito nos<br />
utilizamos <strong>de</strong> três obras fundamentais: NEGRI, A. O Po<strong>de</strong>r Constituinte: ensaio sobre as alternativas da<br />
mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. Rio <strong>de</strong> Janeiro: DP&A, 2002. GIDDENS, A. O Estado-Nação e a Violência: segundo volume <strong>de</strong><br />
uma crítica contemporânea ao Materialismo Histórico. São Paulo: EDUSP, 2001; e: BOBBIO, N. Estado,<br />
governo, socieda<strong>de</strong>: por uma teoria geral da política, Rio <strong>de</strong> Janeiro: Paz e Terra, 1987.<br />
28
existe disputa e negociação. O mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado varguista é citado como exemplo clássico <strong>de</strong><br />
contenção <strong>de</strong>sses interesses. O varguismo, neste âmbito, <strong>de</strong>ve ser entendido como Estado<br />
forte e centralizador que fazia concessões e dirimia interesses <strong>de</strong>ixando pouco espaço para<br />
disputa e negociação. É por isso que, comumente, ouvimos dizer que o governo Vargas andou<br />
na corda bamba. Tinha <strong>de</strong> fazer concessões e administrar no limite, e era este mesmo limite<br />
que caracterizava o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado. E se admitimos esta relação que serve também para o<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong> Bem-Estar <strong>de</strong> maneira geral, teremos que admitir o elemento <strong>de</strong><br />
cooperação entre Estado, capital e trabalho. (NEGRI; HARDT, 2004) A relação instituída,<br />
institucionalizada e salvaguardada pelo Estado era sempre <strong>de</strong> cooperação, ainda que conforme<br />
afirmamos, caminhasse no limite. Esta cooperação, é preciso anotar, era mais formal do que<br />
real. Ainda que tenhamos neste mesmo período distintos recortes sindicais, um sindicato com<br />
propostas <strong>de</strong> ruptura, por exemplo, só podia existir institucionalmente nas propostas e<br />
intenções, agindo <strong>de</strong> maneira estratégica 24 . Por mais que haja historicamente uma gran<strong>de</strong><br />
diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recortes e propostas sindicais como postula este autor, a passagem dos<br />
sindicatos dispersos ou mesmo marginais para o sindicato integrado ao Estado, altera e <strong>de</strong>fine<br />
profundamente a relação entre trabalho e Estado. Relação que inclusive faz do sindicato braço<br />
do Estado, levando toda a burocratização do próprio Estado para <strong>de</strong>ntro do aparelho sindical,<br />
(SIMÃO, 1966).<br />
Com a “explosão” das políticas <strong>de</strong> formação profissional a partir da década <strong>de</strong> 90 e<br />
mais propriamente com a entrada em vigência do PLANFOR em 1996, <strong>de</strong>finia-se um amplo<br />
espaço <strong>de</strong> negociação e disputa. Os conselhos paritários e tripartites previstos na carta<br />
constitucional <strong>de</strong> 88 foram cada vez mais incentivados no âmbito das políticas públicas <strong>de</strong><br />
formação profissional, trabalho e renda.<br />
O Estado se coloca tanto como mediador quanto parte na negociação entre interesses<br />
históricos “antagônicos”, capital e trabalho. Questões relativas à qualificação profissional, os<br />
rumos a tomar, gerenciamento <strong>de</strong> verbas e concepção <strong>de</strong>veriam ser pensados em conjunto, na<br />
forma <strong>de</strong> um “gran<strong>de</strong> pacto” <strong>de</strong> interesse social sobre a ótica do clássico tripé: Estado, capital<br />
e trabalho.<br />
Ocorre que pela perspectiva da socieda<strong>de</strong> salarial, ou mesmo do gran<strong>de</strong> pacto social, a<br />
condição <strong>de</strong> direitos <strong>de</strong> cidadania e acesso a estes está condicionada á participação ativa, <strong>de</strong><br />
inclusão no, digamos, mundo do trabalho. Ainda que todo este aparato <strong>de</strong> Estado, quer na<br />
24 Para um quadro geral e completo da formação das instituições representativas <strong>de</strong> classes a partir do Estado, ou<br />
da <strong>de</strong>mocracia representativa, a “opção das classes” pela cooperação <strong>de</strong>ntro do sistema, ver PRZEWORSKI, A.<br />
Capitalismo e social-<strong>de</strong>mocracia, São Paulo: Companhia das Letras, 1989.<br />
29
forma do Estado <strong>de</strong> Bem Estar mo<strong>de</strong>lar conforme aponta Offe (1985), ou mesmo do<br />
varguismo no Brasil, (VOGEL; YANOULLAS, 2000) viesse sendo <strong>de</strong>smontado, era normal,<br />
para não dizer “natural”, que as ações <strong>de</strong> combate a marginalida<strong>de</strong>, pobreza e exclusão social,<br />
partissem e privilegiassem as medidas clássicas <strong>de</strong> intervenção. Tais medidas visavam a<br />
“inclusão social” via mercado <strong>de</strong> trabalho, ou seja, a inclusão participativa e cidadã partindo<br />
da construção <strong>de</strong> um sistema público <strong>de</strong> qualificação profissional que tinha como meta incluir<br />
socialmente via mercado <strong>de</strong> trabalho.<br />
Conforme aponta Pochmann (2001) no ano <strong>de</strong> 1999, o Brasil ocupava o décimo<br />
terceiro lugar no mundo em volume <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego, sendo que em 1986 ocupava o décimo<br />
terceiro lugar. Quando sentimos os impactos das altas taxas <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego, existe uma<br />
corrida por parte do Estado para solucionar ou então minimizar os efeitos <strong>de</strong>sta crise.<br />
Dentre as políticas <strong>de</strong> qualificação profissional, o Estado, que havia proposto um<br />
programa a partir do qual <strong>de</strong>veria ser formada a estrutura pública <strong>de</strong> qualificação profissional<br />
no Brasil, propagava que <strong>de</strong>ntre as principais causas do <strong>de</strong>semprego tem-se a falta <strong>de</strong><br />
trabalhadores qualificados para ocupar os novos postos <strong>de</strong> trabalho que estavam surgindo. É<br />
neste sentido que as propostas e políticas <strong>de</strong> qualificação profissional são medidas que<br />
integram o cabedal <strong>de</strong> alternativas típicas dos anos 90 no Brasil.<br />
Quem <strong>de</strong>veria executar tais políticas eram justamente os sindicatos, órgãos<br />
institucionais legais <strong>de</strong> representação das relações <strong>de</strong> trabalho, e que neste momento passavam<br />
por uma profunda crise. É <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste quadro que “explo<strong>de</strong>m” as propostas e políticas <strong>de</strong><br />
formação, qualificação e requalificação profissional. O novo contexto produtivo leva à maior<br />
centralização por parte do Estado no tocante às ações voltadas para a qualificação<br />
profissional. Conforme aponta Pochmann (2001, p. 132), a qualificação passa a ser pensada<br />
como política que tem o Estado como ator estratégico:<br />
“Assim, a educação profissional assumiria importância redobrada, como um<br />
projeto nacional, que teria o Estado como ator estratégico na garantia <strong>de</strong><br />
condições a<strong>de</strong>quadas para a maior qualificação dos trabalhadores. O resgate<br />
da qualificação profissional po<strong>de</strong>ria aten<strong>de</strong>r tanto às novas exigências do<br />
processo produtivo, quanto às exigências <strong>de</strong> reprodução social, por meio da<br />
incorporação do trabalhador nos frutos do <strong>de</strong>senvolvimento econômico.”<br />
Pochmann (2001) observa que, já no final da década passada, o montante do PIB –<br />
Produto Interno Bruto <strong>de</strong>stinado à qualificação profissional girava em torno <strong>de</strong> 0,6%. A<br />
qualificação profissional do setor industrial movimentava sozinha em torno <strong>de</strong> 0,1% do PIB.<br />
30
Exatamente o setor que apresenta maiores crises e em que a relação <strong>de</strong> assalariamento é mais<br />
presente.<br />
2.6 Corporativismo ou Neocorporativismo Sindical<br />
Uma maneira <strong>de</strong> fugir da crise do Estado é reinventando mecanismos <strong>de</strong> controle que<br />
intervenham nas bases <strong>de</strong> sustentação do próprio Estado. (NEGRI e HARDT, 2004). São<br />
mecanismos políticos <strong>de</strong> controle, ou re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> controles que absorvem e reconhecem a<br />
participação da socieda<strong>de</strong> civil, conforme aponta Gid<strong>de</strong>ns (2001). A busca pela reforma do<br />
estatuto corporativo foi uma das primeiras ações <strong>de</strong> Estado buscando <strong>de</strong>sestabilizar o<br />
equilíbrio do mercado <strong>de</strong> trabalho, que era a base <strong>de</strong> sustentação do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong> Bem<br />
Estar. Desestabilizar a negociação coletiva <strong>de</strong> trabalho, remetendo esta para o mercado.<br />
(NEGRI e HARDT, 2004). Momento em que o Estado <strong>de</strong>veria mudar seu papel <strong>de</strong><br />
intervenção, reinventando as bases para sua existência a partir da reforma.<br />
No Brasil, do ponto <strong>de</strong> vista institucional pouco <strong>de</strong> concreto aconteceu, lembrando que<br />
<strong>de</strong>bates recentes entre governo e centrais sindicais sobre o fim da obrigatorieda<strong>de</strong> do imposto<br />
sindical levou a certa estagnação <strong>de</strong>sta discussão. Cabe, portanto, analisar <strong>de</strong> que forma o<br />
Estado reforma buscando manter algum controle, ou os pilares que sustentam esta relação<br />
corporativa, via cursos <strong>de</strong> qualificação profissional.<br />
Tomamos como base para esta discussão dois períodos distintos em que estivemos<br />
envolvidos nas pesquisas <strong>de</strong> campo. O primeiro período refere-se ao final da década passada e<br />
início <strong>de</strong>sta, quanto então era vigente o PLANFOR. O segundo período 25 tem início um pouco<br />
antes da substituição do PLANFOR pelo PNQ, vindo a se constituir com a vigência <strong>de</strong>ste.<br />
Neste que chamamos <strong>de</strong> primeiro período, os sindicatos que visitamos tinham suas<br />
agendas voltadas prioritariamente para estes cursos <strong>de</strong> qualificação e requalificação<br />
profissional. Dentre as políticas sindicais, a qualificação profissional era a que mobilizava<br />
atenção da burocracia sindical. Dentre estes sindicatos, haviam pautas restritas ao âmbito das<br />
relações <strong>de</strong> trabalho, mas estas quase sempre eram resolvidas via justiça do trabalho e<br />
dissídios coletivos. O movimento diário <strong>de</strong>stes sindicatos estava voltado para serviços como<br />
25 Já no ano <strong>de</strong> 2000/01, as experiências do PLANFOR sofrem avaliação por parte do Estado, quando então se<br />
percebe que do ponto <strong>de</strong> vista da relação qualificação/trabalho os resultados não eram satisfatórios, ou então não<br />
se podia estabelecer uma relação direta entre cursos <strong>de</strong> formação, emprego e trabalho. Neste mesmo período,<br />
ocorreram várias <strong>de</strong>núncias <strong>de</strong> corrupção na gestão e direcionamento das verbas do FAT. Portanto, o número <strong>de</strong><br />
cursos disponibilizados pelos sindicatos rurais não eram mais tão freqüentes como foram nos últimos anos da<br />
década passada.<br />
31
Su<strong>de</strong>ste<br />
médicos, <strong>de</strong>ntistas, cabeleireiros e principalmente cursos <strong>de</strong> qualificação profissional.<br />
Falamos aqui dos sindicatos ligados a FETAESP, uma vez que aqueles ligados a FERAESP<br />
olhavam <strong>de</strong> forma bastante crítica para este tipo <strong>de</strong> qualificação praticada pelos sindicatos da<br />
FETAESP, e com recursos do FAT.<br />
A tabela abaixo refere-se ao ano <strong>de</strong> 2001, portanto, no final da vigência do<br />
PLANFOR. Neste caso, utilizamos apenas os dados referentes à região su<strong>de</strong>ste do país; entre<br />
sindicatos urbanos e rurais nos cursos <strong>de</strong> educação, qualificação e requalificação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-<br />
obra.<br />
Tabela 67 - Sindicatos, urbanos e rurais, por tipo, segundo as Gran<strong>de</strong>s Regiões e cursos <strong>de</strong> educação,<br />
qualificação e requalificação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra - Brasil - 2001<br />
Gran<strong>de</strong>s Regiões,<br />
e<br />
cursos <strong>de</strong> educação, qualificação<br />
e requalificação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra<br />
Total<br />
Empre-<br />
gadores<br />
Empregados <br />
Trabalhadoresautônomos<br />
Sindicatos<br />
Urbanos Rurais<br />
Agentes<br />
autô-<br />
nomos<br />
Profissionais<br />
liberais<br />
Trabalha-<br />
dores<br />
avulsos<br />
Empre-<br />
gadores<br />
32<br />
(conclusão)<br />
Trabalha-<br />
dores<br />
5<br />
213 1 003 2 334 173 17 164 66 689 767<br />
Curso <strong>de</strong> educação regular 335 60 161 3 - 9 4 79 19<br />
Curso pré-vestibular 30 1 27 - - 2 - - -<br />
Curso <strong>de</strong> idiomas 317 33 253 3 1 15 2 3 7<br />
Curso básico <strong>de</strong> informática 730 94 471 5 3 21 2 40 94<br />
Curso intermediário ou avançado <strong>de</strong> informática 231 42 163 - - 14 1 2 9<br />
Curso para manutenção e configuração <strong>de</strong> micro 156 26 109 - - 8 - 5 8<br />
Cursos ligados à agricultura e à pecuária 198 12 40 - - 1 1 115 29<br />
Cursos ligados à área industrial e <strong>de</strong> extração<br />
<strong>de</strong> minerais 72 8 42 - - 1 - 16 5<br />
Cursos <strong>de</strong> apoio à ativida<strong>de</strong> administrativa,<br />
econômico-financeira e <strong>de</strong> produção 52 13 32 2 - 4 1 - -<br />
Cursos ligados à outras ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> serviços 94 16 42 10 1 5 3 11 6<br />
Cursos profissionalizantes sem especificação 89 19 32 - 1 5 1 31 -<br />
Outros cursos (1) 117 26 63 3 1 9 1 12 2<br />
Fonte: IBGE, Diretoria <strong>de</strong> Pesquisas, Departamento <strong>de</strong> População e Indicadores Sociais, Pesquisa Sindical<br />
2006.<br />
(1) Cursos ligados às ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, comércio e construção civil; curso superior; e cursos nas áreas<br />
tributárias e <strong>de</strong> gestão.<br />
Um ponto que corrobora com a hipótese da falta <strong>de</strong> foco <strong>de</strong>stes cursos <strong>de</strong> formação<br />
sindical, que acabaram sendo criados no atropelamento do processo <strong>de</strong> reestruturação<br />
produtiva que impactava o Brasil nos anos noventa, se refere à modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursos
disponibilizados. Os dados da tabela não distinguem sindicatos urbanos <strong>de</strong> sindicatos rurais, o<br />
que sugere também que o fenômeno <strong>de</strong> “cursos rápidos <strong>de</strong> aplicativos básicos em<br />
microinformática” que observamos no meio rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto acontecia <strong>de</strong> forma<br />
bastante disseminada <strong>de</strong>ntro dos sindicatos <strong>de</strong> maneira geral. É preciso notar também que os<br />
itens 4, 5 e 6, todos se referem aos cursos <strong>de</strong> aplicativos em microinformática, sugerindo<br />
apenas certa diferença no nível <strong>de</strong> aprendizado, ou foco. Em termos relativos, os cursos <strong>de</strong><br />
aplicativos em microinformática se sobressaem dos <strong>de</strong>mais. Se ainda consi<strong>de</strong>rarmos estes<br />
itens em conjunto como “aplicativos <strong>de</strong> cursos em micro informática”, teremos os seguintes<br />
números: <strong>de</strong> um total <strong>de</strong> 5213 cursos, 1117 são <strong>de</strong> aplicativos em microinformática, os 4096<br />
restantes se divi<strong>de</strong>m em outras oito modalida<strong>de</strong>s. Estes cursos geralmente tinham carga<br />
horária que variava <strong>de</strong> 30 a 40 horas, com direito ao certificado <strong>de</strong> conclusão.<br />
O Presi<strong>de</strong>nte do sindicato dos trabalhadores <strong>de</strong> Jaboticabal, (LINEU, 2000), filiado a<br />
FETAESP aponta a relação entre o órgão que presi<strong>de</strong> e a respectiva fe<strong>de</strong>ração no tocante a<br />
execução dos cursos e direcionamento das verbas:<br />
[...] vêm fechado <strong>de</strong> lá e você é que tem quer ver a escola, aquela escola que<br />
tem nome, idoneida<strong>de</strong> moral para passar esses cursos. Nos também não<br />
vamos lá pegando apenas porque o cara enten<strong>de</strong> um pouquinho <strong>de</strong><br />
informática. Não po<strong>de</strong>mos pegar essa pessoa porque esse pessoal que passa<br />
pelo sistema <strong>de</strong> curso <strong>de</strong> qualificação e requalificação, ele tem que ter um<br />
certificado, e quem vai dar esse certificado tem que ser pessoas que têm<br />
uma escola <strong>de</strong> informática senão você passa uma coisa até infrutífera. Então<br />
o pacote vem fechado <strong>de</strong> lá, mas a escolha do monitor nos que fazemos a<br />
escolha da escola e tudo. [...] Nos é que procuramos o pessoal para executar<br />
esses cursos aqui na base, eles só mandam dinheiro. E o que vem lá <strong>de</strong> São<br />
Paulo, apenas o pessoal fiscaliza [...] Você realiza curso com fiscalização do<br />
pessoal do governo [...] nos fizemos dois curso, estamos no terceiro e nos já<br />
temos promessa do quarto curso porque, nos fizemos corretamente, com a<br />
fiscalização da Secretária do Trabalho [...] todas as vezes que nos<br />
mandamos um projeto para curso, a primeira coisa os caras já telefona para<br />
nos que chegou lá o projeto nosso [...]<br />
O crescimento do acesso aos bens <strong>de</strong> consumo, como computador, sugeria habilida<strong>de</strong>s<br />
profissionais necessárias em quase todos os empregos ou postos <strong>de</strong> trabalho. A informática,<br />
portanto, o domínio básico dos aplicativos, passa a ser um fenômeno presente e assim<br />
necessário, não apenas para o exercício <strong>de</strong> todo e qualquer trabalho, mas para a vida <strong>de</strong><br />
maneira geral. A condição <strong>de</strong> cidadania, ou até mesmo <strong>de</strong> consumidor, exige para sua plena<br />
realização e acesso, conhecimentos básicos operativos <strong>de</strong> microinformática.<br />
O discurso dos sindicalistas era que estas novas tecnologias <strong>de</strong> informática haviam<br />
“chegado para ficar”. Quem as dominasse estaria mais bem qualificado para enfrentar o<br />
33
“mercado <strong>de</strong> trabalho”. É preciso notar que está afirmação é tanto banal quanto verda<strong>de</strong>ira.<br />
Mas é preciso notar também que a partir <strong>de</strong>ste momento, se estaria inaugurando uma nova<br />
concepção acerca da qualificação profissional: a falta <strong>de</strong> foco. Ou seja, não se trata <strong>de</strong><br />
treinamento para postos <strong>de</strong> trabalho existentes, mas também não se trata <strong>de</strong> investimento em<br />
potencial criativo como o conhecimento.<br />
Como se sabe, alguma importância estes cursos <strong>de</strong> fato têm no aprendizado geral e<br />
específico dos alunos. Ocorre que este tipo <strong>de</strong> aprendizado pouco colabora para com que estes<br />
alunos se tornem mais concorrentes em um “mercado <strong>de</strong> trabalho” constituído. Mas o ponto a<br />
ser discutido aqui é que este foi um período que os sindicatos estiveram prioritariamente<br />
voltando seu foco <strong>de</strong> atuação para estas “políticas <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> qualificação profissional.” Não<br />
houve remanejamento <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s, todas as prestações <strong>de</strong> serviços sindicais, como da<br />
assistência jurídica, foram mantidas. Acontece que tais serviços estavam já bastante<br />
estruturados burocraticamente <strong>de</strong>mandando poucos esforços neste sentido.<br />
Os sindicatos como sabemos sempre foram ambientes <strong>de</strong> movimentação em torno <strong>de</strong><br />
pautas por lutas salariais. Tais lutas salariais têm expressão privilegiada na Justiça do<br />
Trabalho, mas também nas greves, reuniões, pautas <strong>de</strong> discussão e outras mobilizações. Por<br />
mais que haja regulamentação suficiente para todas estas ativida<strong>de</strong>s, a gran<strong>de</strong> expressão <strong>de</strong><br />
regulamentação <strong>de</strong> conflitos e solução <strong>de</strong>stes é a Justiça do Trabalho. É no âmbito da Justiça<br />
do Trabalho, portanto, do Estado, que os conflitos entre capital e trabalho são solucionados.<br />
Mas é justamente a solução <strong>de</strong> conflitos por esta via que tem crescido nos últimos anos no<br />
Brasil, apontando para a sua própria crise, conforme coloca Cardoso (2002, p. 520):<br />
“O aumento sem prece<strong>de</strong>nte nas <strong>de</strong>mandas judiciais trabalhistas expressa<br />
tanto a <strong>de</strong>slegitimação do direito do trabalho pelos capitalistas quanto à<br />
tentativa dos trabalhadores <strong>de</strong> fazerem valer as regras da or<strong>de</strong>m. É a or<strong>de</strong>m<br />
legal como um todo que está em crise, e seu sintoma mais conspícuo é o<br />
crescimento das <strong>de</strong>mandas judiciais. A judicialização é a resposta dos<br />
trabalhadores a essa crise.”<br />
Os patrões <strong>de</strong>slegitimam porque querem <strong>de</strong>sregulamentar diminuindo o ônus sobre os<br />
custos do trabalho. Os trabalhadores por sua vez usam do recurso judicial na medida em que<br />
este está disponível, ou cada vez mais acessível. Diante da crise do movimento sindical, a<br />
“judicialização” dos conflitos trabalhistas é disponibilizada e incentivada pelo Estado<br />
conforme pon<strong>de</strong>ra o autor. Ou ainda, diante da crise da regulamentação do trabalho dado o<br />
processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva, a saída encontrada é fazer valer as regras da or<strong>de</strong>m<br />
(legais) como única alternativa possível pela via da regulação.<br />
34
Portanto, há uma espécie <strong>de</strong> substituição das antigas intervenções sindicais voltadas<br />
para as pautas <strong>de</strong> assalariamento, e <strong>de</strong> cunho reivindicativo, tendo como principal expressão<br />
as greves e paralisações, por saídas, agora dirimidas e controladas pelo Estado via Justiça do<br />
Trabalho. São evi<strong>de</strong>ntemente conflitos pertinentes à relação capital e trabalho.<br />
Fenômeno parecido com este da “judicialização”, apontado por Cardoso (2002),<br />
verificamos na nossa pesquisa no tocante aos cursos <strong>de</strong> formação profissional vigentes no<br />
período do PLANFOR. Os cursos <strong>de</strong> qualificação profissional estudados entre final da década<br />
<strong>de</strong> noventa e início <strong>de</strong>sta década apresentavam esta característica <strong>de</strong> motivação e<br />
disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso. Tanto no caso da judicialização das relações <strong>de</strong> trabalho, conforme<br />
aponta Cardoso (2002), quanto na busca pelos programas <strong>de</strong> qualificação profissional por<br />
parte dos trabalhadores, trata-se, do uso do recurso disponível mediante o arrefecimento e<br />
impossibilida<strong>de</strong> diante da crise. No primeiro caso das pautas reivindicativas e impactantes<br />
típicas do assalariamento, no segundo, <strong>de</strong> outras vias capazes <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r satisfatoriamente a<br />
crise da socieda<strong>de</strong> do pleno emprego.<br />
Vale apontar também que dada a característica fortemente voltada para o<br />
assalariamento rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, a maioria dos cursos que encontramos na<br />
pesquisa foram <strong>de</strong> aplicativos em microinformática; cursos disponibilizados pelos sindicatos<br />
dos trabalhadores rurais, abertos para toda a população circunscrita geralmente em âmbito<br />
municipal. O Estado, ou órgãos <strong>de</strong> comunicação do Estado via propagandas, principalmente<br />
entre meados da década <strong>de</strong> noventa e início <strong>de</strong>sta, priorizavam a relação direta entre<br />
qualificação e mercado <strong>de</strong> trabalho, porém, chamando par si o ônus da qualificação como<br />
medida <strong>de</strong> intervenção social.<br />
Portanto, a mesma relação que faz Cardoso (2002) sobre o aumento das <strong>de</strong>mandas<br />
judiciais, fazemos com relação a estes cursos <strong>de</strong> aplicativos básicos com carga horária <strong>de</strong><br />
quarenta horas, disponibilizados pelos sindicatos. Observamos que tais políticas eram<br />
seguidas <strong>de</strong> forte propaganda que buscava revelar sua importância e também motivar o<br />
público a buscar esta alternativa como medida <strong>de</strong> combate ao <strong>de</strong>semprego. Era, portanto, uma<br />
política que estava disponível e era incentivada pelos sindicatos. Tanto em um quanto em<br />
outro caso, ou seja, da judicialização, quanto das políticas <strong>de</strong> qualificação, havia um elemento<br />
comum que era a facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso <strong>de</strong> maneira geral. Nas cida<strong>de</strong>s que visitamos em nossas<br />
pesquisas <strong>de</strong> campo, como Jaboticabal, Guariba, Matão, Araraquara entre outras, todas<br />
mantiveram por longo período cursos <strong>de</strong> qualificação e requalificação profissional em<br />
aplicativos básicos em microinformática para a população em geral, ou para quem tivesse<br />
interesse em passar por estes cursos.<br />
35
No caso dos conflitos trabalhistas dirimidos via Justiça do trabalho, o Estado atua<br />
como mediador, facilitando e disponibilizando recursos legais para resolução <strong>de</strong> conflitos. Os<br />
sindicatos funcionam também neste caso como órgãos legais <strong>de</strong> representação <strong>de</strong> interesses <strong>de</strong><br />
classes. A estrutura sindical facilmente se adaptou para a execução <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional do sistema FAT/PLANFOR. Os sindicatos ligados a FETAESP, fe<strong>de</strong>ração que<br />
melhor representa esta via <strong>de</strong> transposição do mo<strong>de</strong>lo sindical corporativo do meio industrial<br />
para o meio rural, foram os que mais facilmente se adaptaram e executaram estes cursos.<br />
Soma-se o fato <strong>de</strong> que o processo <strong>de</strong> crescente sindicalização ocorrido pouco antes<br />
inclui um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> trabalhadores. Fenômeno que Rodrigues (1999) analisa,<br />
atribuindo ao fato do Brasil ser um país em que o processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização chegou<br />
atrasado com relação aos países do centro do capitalismo. Estes dois fenômenos, tanto o da<br />
crescente judicialização das relações <strong>de</strong> trabalho, observado por Cardoso (2000), quanto este<br />
da qualificação profissional que observamos na passagem das décadas, são entendidos como<br />
envelhecimento da legislação, e também, como medidas que buscam reforçar o papel <strong>de</strong><br />
intervenção do Estado via sindicatos.<br />
Ao que parece não se trata <strong>de</strong> uma nova estrutura corporativa, mas sim da mesma. O<br />
que muda é o tipo <strong>de</strong> política exercida para consegui-la. Estas políticas <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong><br />
qualificação profissional chegam, ou até “coinci<strong>de</strong>m”, com a crise <strong>de</strong> representação dos<br />
sindicatos. Os sindicatos, por meio dos mecanismos legais apontados anteriormente,<br />
continuam atrelados ao Estado, contudo são necessárias novas formas <strong>de</strong> exercer esta relação<br />
corporativa. Cardoso (2002) aponta que a distribuição dos custos e ajustes <strong>de</strong> um novo parque<br />
produtivo transfere para os trabalhadores os ônus antes reservados aos patrões, buscando fazêlo<br />
<strong>de</strong> forma institucional. A qualificação profissional é um ônus do qual os patrões buscam se<br />
<strong>de</strong>sonerar. Isso acontece, ressaltamos, dada a estrutura <strong>de</strong> representação corporativa. Dado o<br />
papel institucional do Estado em dirimir questões pertinentes aos interesses do capital e do<br />
trabalho em seu interior. Portanto, é a ação do Estado, ou qualquer movimento no sentido <strong>de</strong><br />
aten<strong>de</strong>r a estes interesses que sempre acaba intervindo no sentido <strong>de</strong> reforçar o estatuto legal.<br />
O aumento <strong>de</strong>stas políticas <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> formação profissional aparece como uma<br />
espécie <strong>de</strong> alternativa para a representação sindical. Os sindicatos estavam atônitos diante da<br />
crise aberta no mundo produtivo e com poucas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ação para além dos conflitos<br />
dirimidos no âmbito da Justiça do Trabalho. A ação sindical estava bastante restrita ao<br />
arcabouço burocrático construído. Consi<strong>de</strong>rando o “mal <strong>de</strong> berço” do histórico e estrutura<br />
sindical no Brasil, conforme aponta Cardoso (2002, p. 497), esta relação entre Estado e<br />
36
sindicatos encontra nas políticas <strong>de</strong> qualificação profissional uma alternativa <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong><br />
ou então, <strong>de</strong> “reforma na continuida<strong>de</strong>”.<br />
“Refiro-me ao qualificativo “corporativismo”, <strong>de</strong>corrente da percepção do<br />
mo<strong>de</strong>lo brasileiro <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> trabalho como a reprodução, sem gran<strong>de</strong>s<br />
mudanças no tempo, <strong>de</strong> seu “mal berço”, isto é, a inspiração fascista que<br />
presidiu sua elaboração durante o primeiro período Vargas.”<br />
Ainda que o autor aponte para uma espécie <strong>de</strong> “corporativismo capenga a lá<br />
brasileira”, admite os fortes elementos corporativos ainda vigentes como “mal <strong>de</strong> berço”, da<br />
Era Vargas. Ou seja, postula que o corporativismo no Brasil foi fraco na medida em que a<br />
i<strong>de</strong>ologia corporativa impregnou as instituições, mas o uso cotidiano do trabalho era regulado<br />
por instrumentos <strong>de</strong> direito privado. Ocorre que era a or<strong>de</strong>m jurídica corporativa do Estado<br />
que <strong>de</strong>finia e reconhecia os sindicatos como representantes <strong>de</strong> classe. Também, os direitos e<br />
políticas sindicais sempre foram tidos como públicos.<br />
As políticas <strong>de</strong> qualificação profissional estabelecidas no âmbito do FAT/PLANFOR<br />
serviram para a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> regulação do trabalho que tinha como<br />
conseqüência reforçar, ou então, reabilitar a atuação sindical. Ao que parece, trata-se <strong>de</strong> um<br />
problema <strong>de</strong> origem da própria estrutura do mo<strong>de</strong>lo sindical brasileiro. Dada a relação<br />
institucional entre sindicatos e Estado é normal que esta estrutura busque se reformar<br />
internamente. Neste sentido, que a qualificação profissional aparece como política pública,<br />
política <strong>de</strong> Estado, que é ao mesmo tempo política sindical.<br />
Por mais que admitamos um quadro <strong>de</strong> corporativismo fraco conforme aponta Cardoso<br />
(2002), amparado num mo<strong>de</strong>lo legislado e não contratual, permanecem as bases <strong>de</strong><br />
sustentação <strong>de</strong>ste mo<strong>de</strong>lo que são reabilitadas por políticas como estas <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional. O que muda é a maneira, a forma <strong>de</strong> sustentação <strong>de</strong>ste corporativismo, que se<br />
apresentaria como uma espécie <strong>de</strong> “neocorporativismo”. Cardoso (1999) admite que o espírito<br />
norteador da reforma, particularmente da Constituinte <strong>de</strong> 88, não conseguiu quebrar com o<br />
velho corporativismo. Ou então, mesmo tentando romper com este, acabou reformando.<br />
3 Qualificação Profissional nos anos 90<br />
Retomemos o tema da qualificação profissional sobre um prisma histórico para<br />
<strong>de</strong>stacar a particularida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> política nos anos 90. Também, <strong>de</strong>staca-se a linha e<br />
37
foco sobre o qual construímos nosso objeto <strong>de</strong> pesquisa e a maneira com que este se insere<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma perspectiva sindical.<br />
Destacamos os principais órgãos atuantes <strong>de</strong>ntro da nossa região <strong>de</strong> estudo,<br />
enfatizando a relação <strong>de</strong>stes com uma qualificação profissional executada por sindicatos. Os<br />
dois principais focos são os casos do Serviço Nacional <strong>de</strong> Aprendizagem Rural (SENAR) e o<br />
Serviço Brasileiro <strong>de</strong> Apóio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e a relação <strong>de</strong>stes com<br />
os três segmentos <strong>de</strong> qualificação profissional rural estudados entre os sindicatos: sindicatos<br />
FERAESP, FETAESP e sindicatos patronais rurais.<br />
O chamado sistema FAT/PLANFOR é apresentado como a principal linha <strong>de</strong> atuação<br />
no tocante as políticas <strong>de</strong> qualificação profissional dos anos 90.<br />
Focamos neste capítulo a disputa por representação entre os três segmentos sindicais,<br />
bem como a maneira que esta disputa interage com os cursos <strong>de</strong> qualificação profissional<br />
estudados. Demonstramos como esta disputa resi<strong>de</strong> em um campo mais corporativo e<br />
institucional; tributários <strong>de</strong> diferentes formas <strong>de</strong> conceber tanto o tema da representação<br />
quanto da qualificação profissional. Por outro lado, os cursos <strong>de</strong> formação profissional, bem<br />
como as parcerias, principalmente com o SENAR e o SEBRAE, apontam para uma tendência<br />
<strong>de</strong> convergência na maneira <strong>de</strong> conceber tais políticas, bem como suas importâncias e<br />
necessida<strong>de</strong>s.<br />
O resultado é que as disputas persistem e se reformam, mas cada vez mais <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser<br />
uma disputa <strong>de</strong> concepção e i<strong>de</strong>ologia sobre a representação e a qualificação profissional,<br />
ce<strong>de</strong>ndo lugar para uma disputa para ver quem executa, ou executa melhor tais programas <strong>de</strong><br />
qualificação. Ainda que <strong>de</strong> fato houvesse um profundo redirecionamento nas políticas,<br />
concepção, modalida<strong>de</strong> e conteúdo dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional, tais mudanças<br />
ocorreram <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> dois períodos. O primeiro é tido como <strong>de</strong> fase experimental e não tem um<br />
momento preciso <strong>de</strong> início e término. A referência temporal são os últimos cinco anos da<br />
década passada, tendo seu auge entre 1997 e 2001; O segundo período vai do início da<br />
presente década, passando por profundas transformações e redirecionamento com a troca <strong>de</strong><br />
programas, do PLANFOR para o PNQ, se aproximando ao máximo dos dias atuais.<br />
A ênfase sobre o tema e a prática da qualificação profissional recai sobre os sindicatos<br />
ligados a FETAESP e os sindicatos patronais rurais, dado que são as duas linhas <strong>de</strong><br />
sindicalismo historicamente integradas ao mo<strong>de</strong>lo sindical brasileiro. A FERAESP <strong>de</strong>stoa<br />
neste ponto não apenas por conceber a qualificação profissional <strong>de</strong> forma mais crítica com<br />
relação às outras duas. O que corrobora com o fato da FERAESP até hoje não estar integrada<br />
tanto quanto as outras duas, <strong>de</strong>ve-se, em primeiro lugar, por esta ter um eixo mais articulado<br />
38
<strong>de</strong> representação e ação com a central CUT da qual é filiada. Esta por sua vez, como se sabe<br />
mantém uma postura crítica e propositiva com relação ao “sindicalismo oficial”. Também,<br />
dado que a FERAESP historicamente mantém uma estratégia <strong>de</strong> ação que visa a partir do<br />
assalariamento, ou da luta reivindicatória organizada partindo <strong>de</strong>ste, superar esta relação.<br />
Apresentamos rapidamente um tipo <strong>de</strong> qualificação profissional que se move fora<br />
<strong>de</strong>ste espaço público <strong>de</strong>limitado pelo Estado e que recai no viés <strong>de</strong> mercado, seguindo as<br />
orientações e interesses dos patrões.<br />
3.1 Retomando o Tema da Qualificação Profissional<br />
As políticas <strong>de</strong> qualificação profissional no Brasil passaram por distintos recortes <strong>de</strong><br />
acordo com o momento histórico. Uma característica marcante foi a forte presença do Estado<br />
que, <strong>de</strong> alguma maneira, sempre se fez presente. Vale anotar aqui alguns movimentos sobre<br />
tais políticas e <strong>de</strong> que forma o tema <strong>de</strong>sembocou na década <strong>de</strong> 90.<br />
Des<strong>de</strong> os primórdios do Brasil Império que as iniciativas sobre a qualificação<br />
profissional se diluíam entre uma prática “suja” do trabalho <strong>de</strong>stinada a escravos, ou por outro<br />
lado, um ensino <strong>de</strong> elite que era reservado para poucos. No período dito republicano, as<br />
primeiras instituições públicas <strong>de</strong> ensino a serem fundadas no país visavam qualificar para<br />
funções <strong>de</strong> administração do Estado, ou então para o comércio nascente. O Liceu <strong>de</strong> Artes e<br />
Ofícios, criado já na segunda meta<strong>de</strong> do século XIX parece refletir bem esta idéia <strong>de</strong> um<br />
ensino <strong>de</strong> elites. (MANFREDI, 2002)<br />
A República foi marcada por três fatores que recolocam a questão: a extinção do<br />
trabalho escravo, a expansão cafeeira e os projetos <strong>de</strong> imigração. Tais ocorrências são fatores<br />
embrionários e ao mesmo tempo estruturais que acabam impulsionando a qualificação<br />
profissional, tal qual viria a ser tratada um pouco mais tar<strong>de</strong> no período industrial. A<br />
separação entre um ensino <strong>de</strong> elite e outro voltado para o efetivo exercício do trabalho<br />
predominou durante o período histórico da chamada Primeira República. A “reprodução”<br />
<strong>de</strong>ste quadro entre um ensino <strong>de</strong> elite e outro voltado para a execução do trabalho perdurou e<br />
influenciou o que mais tar<strong>de</strong> teríamos como <strong>de</strong>finição entre espaço público e privado acerca<br />
da qualificação profissional. Ainda que a própria concepção política <strong>de</strong> República que<br />
tivemos aglutinasse entre seus principais i<strong>de</strong>alizadores ferrenhos liberais, positivistas e<br />
monarquistas, todos, segundo Cunha (2000- b), eram unânimes e acor<strong>de</strong>s com a Igreja<br />
Católica, <strong>de</strong> que o “ensino <strong>de</strong> oficio” <strong>de</strong>veria servir acima <strong>de</strong> tudo como mecanismo <strong>de</strong><br />
controle e disciplina dos setores populares.<br />
39
A industrialização concentrada nos centros urbanos como São Paulo, e a introdução <strong>de</strong><br />
mão-<strong>de</strong>-obra imigrante foram fatores <strong>de</strong>cisivos na recontextualização das políticas e da<br />
própria concepção <strong>de</strong> trabalho.<br />
A reprodução do sistema <strong>de</strong> ensino passa por este período sendo contaminada por esta<br />
relação entre um ensino <strong>de</strong> elite e outro <strong>de</strong>stinado às classes populares <strong>de</strong> forma relativamente<br />
autônoma. Dessa maneira, conforme pon<strong>de</strong>ram Bourdieu e Passeron (1992), a reprodução<br />
ocorre na mudança, ou seja, não se limita a uma condição fechada, “as coisas têm que mudar<br />
para continuarem como estão”, segundo estes autores. As camadas populares galgam espaço<br />
na medida em que vão se tornando relevantes como mão-<strong>de</strong>-obra assalariada. Na construção<br />
do Estado Nacional com Vargas e, mais particularmente no tocante ao arcabouço legal sobre o<br />
trabalho, estas camadas populares vão sendo absorvidas. Este fenômeno <strong>de</strong> absorção <strong>de</strong><br />
classes é analisado <strong>de</strong>ntro do contexto europeu por Gid<strong>de</strong>ns (2001), ao tratar do Estado <strong>de</strong><br />
Bem Estar. Segundo o autor este seria inevitavelmente o rumo <strong>de</strong> construção do mo<strong>de</strong>rno<br />
Estado - Nação. Significa, portanto, que a própria estrutura jurídica e administrativa do Estado<br />
é gerida e controlada burocraticamente por um quadro administrativo que não está estruturado<br />
prioritariamente pela velha relação <strong>de</strong> classes. Capital e trabalho se diluíram <strong>de</strong>ntro da<br />
estrutura <strong>de</strong> Estado. A criação <strong>de</strong> diversos conselhos tripartites visando representar interesses<br />
distintos <strong>de</strong>ntro do Estado, fenômeno que ocorreu tanto <strong>de</strong>ntro do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong> Bem<br />
Estar europeu, quando com o varguismo no Brasil, corrobora a tese <strong>de</strong> Gid<strong>de</strong>ns (2001).<br />
A indústria, e o comércio voltado para bens <strong>de</strong> produção industrial reproduzem,<br />
(PASSERON; BOURDIEU, 1992) esta relação entre execução do trabalho e formação <strong>de</strong><br />
quadros dirigentes (geralmente formação universitária). A absorção dos conflitos e interesses<br />
antagônicos entre capital e trabalho por parte do Estado no Brasil acontece, portanto, junto<br />
com o processo <strong>de</strong> industialização. Temos, portanto, uma situação em que os quadros <strong>de</strong><br />
comando e alta qualificação estavam reservados a poucas pessoas. Já os cursos técnicos <strong>de</strong><br />
rápida formação eram voltados para os executores <strong>de</strong> tarefas rotineiras, repetitivas e <strong>de</strong> baixa<br />
qualificação. Este processo <strong>de</strong> absorção das camadas populares e <strong>de</strong> reprodução entre um<br />
ensino <strong>de</strong> elite e outro voltado para o exercício do trabalho rotineiro, enfadonho e <strong>de</strong> baixa<br />
qualificação, conforme vimos anteriormente, da maneira que o conhecemos, sob a forma <strong>de</strong><br />
um “fordismo tropical”, tem início com a construção do Estado Nacional.<br />
Ainda que os sobressaltos trazidos com este processo tenham sido muitos, este quadro<br />
<strong>de</strong> “reprodução” podia ser claramente percebido no início da década <strong>de</strong> setenta:<br />
40
Até o início da década <strong>de</strong> 70 o mundo do trabalho exigia uma formação pré<strong>de</strong>finida<br />
e segmentada em todos os níveis <strong>de</strong> qualificação. Um grupo<br />
relativamente pequeno <strong>de</strong> profissionais qualificados, com certificado <strong>de</strong><br />
especialização diploma técnico ou nível universitário, convivia no mesmo<br />
processo <strong>de</strong> trabalho com mão-<strong>de</strong>-obra pouco, ou nada, qualificada. Esse<br />
panorama valia para a indústria, comércio, serviços e, até certo ponto, para<br />
a agricultura. (DIEESE, 1998, p. 17)<br />
Neste quadro <strong>de</strong> divisão precisa entre educação formal e educação para o trabalho, o<br />
ensino formal reproduzia esta segmentação com os chamados “níveis <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong>”. Tais<br />
níveis <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong> serviam <strong>de</strong> fato para <strong>de</strong>terminar a inserção no mundo do trabalho,<br />
todavia reproduzia-se um quadro em que <strong>de</strong> um lado tínhamos um número menor <strong>de</strong><br />
trabalhadores altamente qualificados e “certificados”, geralmente em postos <strong>de</strong> comando; e <strong>de</strong><br />
outro, trabalhadores <strong>de</strong> diferentes setores cumprindo tarefas rotineiras, mecânicas, pré-<br />
<strong>de</strong>finidas e que, geralmente, eram treinados para as ativida<strong>de</strong>s que exerciam nos seus próprios<br />
postos <strong>de</strong> trabalho. Eram estes trabalhadores pouco qualificados que engrossavam as fileiras<br />
dos sindicatos, principalmente os sindicatos urbanos ou industriais.<br />
Este quadro <strong>de</strong> separação entre educação e trabalho marcou fortemente o histórico da<br />
formação profissional no Brasil, reproduzindo uma situação em que o “trabalho sujo”, ou<br />
“trabalho pesado”, sempre esteve reservado à emergência das camadas populares como<br />
sujeitos e atores das relações <strong>de</strong> trabalho. Os postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> gerência, comando ou<br />
mesmo aqueles mais diretamente ligados às tomadas <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões continuam sendo exercidos<br />
por um número reduzido <strong>de</strong> pessoas. Tanto que estes fatores <strong>de</strong> clara distinção acabam<br />
possibilitando uma nítida separação <strong>de</strong>ste quadro entre recortes e linhas <strong>de</strong> atuação sobre as<br />
políticas <strong>de</strong> qualificação profissional no Brasil.<br />
Segundo Manfredi (2002), po<strong>de</strong>mos separar três gran<strong>de</strong>s troncos acerca da<br />
qualificação profissional no Brasil, pelo prisma <strong>de</strong> um recorte mais histórico. No campo das<br />
associações religiosas, temos as famosas “escolas salesianas” e o “movimento circulista”. No<br />
âmbito da socieda<strong>de</strong> civil, as experiências do Lyon Club e do Rotary, mais tar<strong>de</strong> das<br />
Organizações não Governamentais (ONGs). Já por parte do Estado tem-se a implantação do<br />
Liceu <strong>de</strong> Artes e Ofícios, Universida<strong>de</strong>s e das próprias Escolas Públicas. Ainda assim,<br />
consi<strong>de</strong>ramos esta separação que faz Manfredi (2002) um pouco difusa, uma vez que parece<br />
difícil compor qualquer separação nítida entre principalmente socieda<strong>de</strong> civil e Estado. De<br />
qualquer forma vale para fins conceituais. Houve, por exemplo, a criação do Sistema “S” logo<br />
após o fim do Estado Novo, e todo um arcabouço sobre a formação profissional voltada para<br />
as camadas populares emergentes. Estes dois tipos <strong>de</strong> qualificação ou formação são<br />
41
eproduzidas pelo Estado, uma vez que este traz para seu interior os interesses distintos entre<br />
capital e trabalho.<br />
São estes recortes duais (capital e trabalho) do Estado, que interessa para nossa<br />
pesquisa. Uma vez que <strong>de</strong>finindo um espaço público para a qualificação profissional via<br />
relações <strong>de</strong> trabalho (trabalho e capital) terá nos sindicatos os principais atores <strong>de</strong> execução <strong>de</strong><br />
cursos <strong>de</strong> formação profissional. Partindo <strong>de</strong>sta distinção feita por Manfredi (2002), que<br />
coloca no âmbito da socieda<strong>de</strong> civil as experiências sindicais, religiosas, leigas e dos<br />
movimentos populares, situamos nosso tema <strong>de</strong> estudo sobre qualificação profissional <strong>de</strong>ntro<br />
do recorte sindical. Todavia, as experiências sindicais sobre qualificação profissional são<br />
experiências públicas <strong>de</strong> articulação do Estado. Por mais que Manfredi (2002), esteja se<br />
referindo a origem <strong>de</strong>stes movimentos, permanece o entendimento do recorte sindical como<br />
sendo da socieda<strong>de</strong> civil. Sobre este ponto é preciso alguns esclarecimentos que terão<br />
<strong>de</strong>sdobramentos mais adiante.<br />
A relação, tema clássico da sociologia, entre socieda<strong>de</strong> civil e Estado é <strong>de</strong> certa forma,<br />
nos limites do nosso objeto <strong>de</strong> investigação, retomada neste trabalho. Conceitualmente, ou da<br />
maneira que enten<strong>de</strong>mos este ponto, socieda<strong>de</strong> civil não é tomada aqui fora do Estado.<br />
Socieda<strong>de</strong> civil e Estado não são como na vertente clássica hegeliana, dimensões separadas.<br />
Enten<strong>de</strong>mos esta relação mais próxima da vertente gramsciniana, segundo a qual a socieda<strong>de</strong><br />
civil exerce sua hegemonia nos aparelhos <strong>de</strong> Estado. Ou então, conforme apontam Negri e<br />
Hardt (2004, p. 118): “[...] o Estado é mantido, mas subordinado à pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interesses<br />
que interagem na socieda<strong>de</strong> civil [...].” Portanto, os sindicatos como organização <strong>de</strong> classes, e<br />
que atua mediante reconhecimento do Estado não po<strong>de</strong>m, bem como a qualificação<br />
profissional por eles exercida, ser concebidos como ações da socieda<strong>de</strong> civil que se contrapõe<br />
ao Estado.<br />
Os sindicatos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a origem, ou mesmo nos anos noventa no Brasil, <strong>de</strong>marcam a<br />
entrada em cena <strong>de</strong> atores sociais que passam a <strong>de</strong>ter a condição <strong>de</strong> acesso a partir da<br />
construção do arcabouço legal sobre o trabalho. Tais atores sociais, como antes as camadas<br />
populares, são incorporados pela regulação e regulamentação <strong>de</strong> Estado.<br />
Conforme aponta Manfredi (2002) ao tratar do primeiro surto <strong>de</strong> industrialização do<br />
país, com a emergência das camadas populares, a classe dirigente passou a olhar para o tema<br />
da qualificação e formação profissional como um antídoto, um mecanismo <strong>de</strong> contenção e<br />
controle, e, paradoxalmente, ao mesmo tempo, como mecanismo <strong>de</strong> emancipação econômica,<br />
social e política. Já o movimento operário em formação, fundamentalmente urbano e restrito<br />
42
aos gran<strong>de</strong>s centros como São Paulo e Rio <strong>de</strong> Janeiro, passa a conceber a qualificação<br />
profissional e a educação como mecanismo <strong>de</strong> conscientização e libertação.<br />
Ainda que em suas particularida<strong>de</strong>s e recortes o tema da qualificação profissional no<br />
âmbito sindical tenha, historicamente, sido proposto sob vários ângulos, o que importa reter<br />
aqui é este fator <strong>de</strong> emergência <strong>de</strong> um novo tipo <strong>de</strong> trabalhador e exercício do trabalho,<br />
reproduzido a partir das camadas populares. Os principais atores produtivos no período<br />
industrial. Como agentes produtivos, portanto, sujeitos e cidadãos, passam a figurar como<br />
público para o qual as políticas <strong>de</strong> qualificação profissional são voltadas.<br />
Dos sindicatos que promoviam a qualificação profissional entre o final da década <strong>de</strong><br />
oitenta e início da <strong>de</strong> noventa, 70% <strong>de</strong> tais iniciativas provinham dos sindicatos <strong>de</strong><br />
trabalhadores urbanos (MANFREDI, 2002). Segundo a autora, o gran<strong>de</strong> salto significativo<br />
que impulsiona mudanças nas políticas <strong>de</strong> formação profissional via sindicatos ocorre a partir<br />
do emblemático ano <strong>de</strong> 1996, em virtu<strong>de</strong> da liberação dos recursos do FAT, via<br />
PLANFOR/Ministério do Trabalho (MTB), quando então as centrais sindicais passaram a<br />
promover estes programas <strong>de</strong> qualificação em âmbito nacional, estabelecendo pouca distinção<br />
ou <strong>de</strong>marcação <strong>de</strong> focos que privilegiassem os ambientes rural ou urbano. Além disso, os<br />
sindicatos aparecem como a institucionalização das lutas operárias que se seguiram, e o<br />
Estado, como agente central e mediador que estabelece um ambiente e um discurso público<br />
sobre o tema da qualificação profissional <strong>de</strong>ntro do seu interior.<br />
Vale salientar que ainda que tenhamos a construção e persistência <strong>de</strong> distintos recortes<br />
sindicais, o movimento operário foi rapidamente absorvido pelo movimento sindical<br />
conforme aponta Simão (1966). Nossa pesquisa está situada neste último caso, ou seja, na<br />
qualificação profissional, o tema, tal qual vem sendo discutido <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um prisma sindical,<br />
ou então, a partir <strong>de</strong>ste. Porém, sem a distinção clássica entre socieda<strong>de</strong> civil e Estado.<br />
3.2 Alguns órgãos que atuam na formação e qualificação profissional no Brasil<br />
Escolas técnicas, centros <strong>de</strong> educação tecnológica e treinamentos especializados são<br />
exemplos da prática <strong>de</strong> formação profissional no Brasil das últimas décadas. São associações<br />
que surgem ou associadas, ou her<strong>de</strong>iras do antigo padrão <strong>de</strong> industrialização. Mesmo<br />
consi<strong>de</strong>rando a importância presente e a relevância passada, são entida<strong>de</strong>s que, cada qual a<br />
seu modo, não ficaram imunes às profundas transformações ocorridas no mundo do trabalho.<br />
Depen<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> cada caso, foram re<strong>de</strong>finidas no tocante às políticas <strong>de</strong> formação e a gestão <strong>de</strong><br />
43
financiamentos. Passamos a apresentar algumas <strong>de</strong>stas experiências, especialmente aquelas<br />
que <strong>de</strong> certa forma se relacionam com nosso objeto <strong>de</strong> estudo.<br />
O sistema “S” tradicionalmente trabalha com o tema da qualificação profissional nos<br />
vários setores em que atua. Trata-se <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> educação profissional proveniente <strong>de</strong><br />
órgãos paraestatais, organizados e gerenciados por sindicatos, confe<strong>de</strong>rações, fe<strong>de</strong>rações e<br />
pela indústria. Teve início com o Serviço Nacional <strong>de</strong> Aprendizagem Industrial (SENAI) e o<br />
Serviço Social da Indústria (SESI), nos anos 40. Ambos foram criados por Decreto Lei<br />
visando a expansão da indústria nacional no contexto do Nacional Desenvolvimentismo<br />
Varguista. (CUNHA, 2000 - c). Portanto, surgem com a perspectiva <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r à <strong>de</strong>manda da<br />
indústria nascente. As outras organizações que integram a re<strong>de</strong> do sistema “S”, cada qual têm<br />
características diferentes, vinculando-se cada uma ao setor <strong>de</strong> atuação. Além das duas<br />
apontadas, há também o Serviço Nacional <strong>de</strong> Aprendizagem <strong>de</strong> Transportes (SENAT) e o<br />
Serviço Social em Transporte (SEST), ambos no setor <strong>de</strong> transporte; SENAC – Serviço<br />
Nacional <strong>de</strong> Aprendizagem Comercial (SENAC) e Serviço Social do Comércio (SESC), estas<br />
no setor <strong>de</strong> comércio e serviços; O Serviço Social das Cooperativas <strong>de</strong> Prestação <strong>de</strong> Serviços<br />
(SESCOOP). Manfredi (2002). SENAI e SENAC foram referências na formação profissional<br />
tanto no Brasil quanto na América Latina. No Brasil, durante algum tempo, possuir<br />
certificação do SENAI, significava garantia <strong>de</strong> emprego.<br />
Todos estes órgãos do chamado sistema “S”, surgem buscando qualificar, ou treinar<br />
estes trabalhadores, ou “novos” sujeitos produtivos que emergem com o processo <strong>de</strong><br />
industrialização.<br />
Ainda que a ação <strong>de</strong>stes institutos atualmente seja mais difusa e pouco precisa, tal o<br />
caso <strong>de</strong> trabalhadores operadores <strong>de</strong> máquinas ou gerentes e administradores do complexo<br />
agroindustrial, que po<strong>de</strong>m ser e são, qualificados tanto pelo SENAI quanto pelo SENAC,<br />
nossa atenção concentra-se nos casos do SEBRAE e do SENAR. Isso dado que servem <strong>de</strong><br />
parâmetro para a discussão que faremos adiante no tocante a emergência <strong>de</strong> uma nova forma<br />
produtiva que tem ganhado espaço no meio rural; Também, por que são <strong>de</strong>stoantes com<br />
relação aos <strong>de</strong>mais órgãos do sistema “S”, no tocante ao perfil do público atendido. Ou, como<br />
aponta Manfredi, (2002) o sistema “S” não se constitui numa organização homogênea, apesar<br />
da estrutura <strong>de</strong> gestão e financiamento que é comum a todo sistema.<br />
O objetivo do SENAR é promover a formação profissional rural, além da promoção<br />
social dos produtores e trabalhadores rurais. Visa a geração <strong>de</strong> renda e competitivida<strong>de</strong> no<br />
mercado <strong>de</strong> trabalho. Tem como foco <strong>de</strong> atuação as políticas <strong>de</strong> qualificação e requalificação<br />
44
profissional, tendo em vista trabalho, renda, lucrativida<strong>de</strong> e eficiência. Tem como proposta<br />
atuar promovendo trocas e intercâmbios <strong>de</strong> experiências profissionais, sociais e culturais.<br />
Dentre estes órgãos do sistema “S”, o SENAR é o único que implantou gestão<br />
tripartite em seus conselhos regionais. Igual aos <strong>de</strong>mais, os recursos são públicos,<br />
provenientes <strong>de</strong> contribuições compulsórias que inci<strong>de</strong>m sobre as folhas <strong>de</strong> pagamento.<br />
Ainda que todo o sistema “S” promova a qualificação profissional, <strong>de</strong>stacamos o<br />
SENAR para nossa pesquisa por estar voltado ao meio rural e por ter como foco a<br />
qualificação profissional empreen<strong>de</strong>dora. Além disso, enquanto os outros institutos do sistema<br />
“S” promovem cursos em locais próprios e o fazem <strong>de</strong> forma direta estabelecendo poucas<br />
políticas <strong>de</strong> parcerias, o SENAR se utiliza sindicatos, se<strong>de</strong>s <strong>de</strong> fe<strong>de</strong>rações tanto para a<br />
execução dos cursos quanto para formação <strong>de</strong> parcerias. Muitos <strong>de</strong>stes cursos <strong>de</strong> formação<br />
profissional do SENAR são executados em fazendas, plantações, se<strong>de</strong>s <strong>de</strong> clubes sociais e<br />
igrejas, localida<strong>de</strong>s rurais, vilas <strong>de</strong> assentamento <strong>de</strong> Reforma Agrária, centros comunitários,<br />
bem como as se<strong>de</strong>s dos sindicatos e fe<strong>de</strong>rações.<br />
O SEBRAE, filho mais jovem do sistema “S”, apesar <strong>de</strong> atuar em sintonia com o setor<br />
público, principalmente em parcerias e público atendido, é uma entida<strong>de</strong> sem fins lucrativos,<br />
além <strong>de</strong> autônomo e administrado pela iniciativa privada. Portanto, não está vinculado à<br />
estrutura pública e funciona como instituição <strong>de</strong> fomento <strong>de</strong> programas e projetos para micro<br />
e pequenas empresas. Foi criado por Lei Fe<strong>de</strong>ral em 1990 e regulamentado no mesmo ano<br />
(MANFREDI, 2002).<br />
O SEBRAE na verda<strong>de</strong> não promove cursos <strong>de</strong> qualificação profissional da maneira<br />
como estes são concebidos pela tradição sindical. A proposta do SEBRAE, partindo da<br />
perspectiva <strong>de</strong> apóio e fomento às pequenas empresas, na verda<strong>de</strong> discute e promove a<br />
qualificação profissional a partir <strong>de</strong> uma perspectiva empreen<strong>de</strong>dora. A concepção <strong>de</strong><br />
qualificação profissional do SEBRAE está necessariamente vinculada ao fomento <strong>de</strong> micro e<br />
pequenos empreendimentos.<br />
O SEBRAE se ocupa da qualificação e do apóio técnico profissional na medida em<br />
que estes estejam vinculados ao projeto empreen<strong>de</strong>dor voltado para micro e pequenos<br />
negócios. Um ponto interessante sobre o SEBRAE é que foi criado visando o setor urbano, ou<br />
urbano/industrial. Com o rompimento <strong>de</strong> barreiras rígidas entre as dimensões rural e urbano,<br />
dado o processo <strong>de</strong> reorganização produtiva, esta separação per<strong>de</strong> cada vez mais o sentido.<br />
São muitos e variados os casos em que o SEBRAE está presente em locais e negócios que,<br />
pela antiga separação que se fazia entre estas duas dimensões, certamente estariam no meio<br />
rural. Casos que pu<strong>de</strong>ram rapidamente ser verificados na região <strong>de</strong> estudo como micro e<br />
45
pequenos empreendimentos em embutidos <strong>de</strong> alho, geléias, sabonetes e cosméticos,<br />
fabricação <strong>de</strong> aguar<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> cana, <strong>de</strong>ntre muitos outros. Ou então, em regiões ou municípios<br />
consi<strong>de</strong>rados como rurais, como é o caso da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Tabatinga que sofreu transformações<br />
positivas na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida, arrecadação municipal, emprego e renda, a partir dos<br />
chamados Arranjos Produtivos Locais (APLs), que tiveram como principais parceiros na<br />
implantação e <strong>de</strong>senvolvimento o SEBRAE.<br />
Ainda que em função das crescentes <strong>de</strong>mandas o SEBRAE tenha implantado em seu<br />
interior o SAI – Sistema Agroindustrial Integrado, os empreendimentos e a qualificação dada<br />
pelo SEBRAE, na maioria dos casos, não fazem distinção entre sistema agroindustrial e<br />
sistema industrial. Todo o suporte técnico profissional estabelece outros parâmetros para<br />
atuação, mais voltados para perspectivas empreen<strong>de</strong>doras do que para estabelecer separação<br />
entre setores produtivos. De qualquer forma, em se tratando do meio rural ou agroindustrial o<br />
chamado sistema SAI do SEBRAE, implantado no Estado <strong>de</strong> São Paulo em 1998, tem<br />
crescido consi<strong>de</strong>ravelmente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua implantação. (SEBRAE, 2006). Um crescimento<br />
também qualitativo, <strong>de</strong>finindo e <strong>de</strong>scobrindo vocações locais e potencial produtivo,<br />
geralmente representado pelas APL como é o caso <strong>de</strong> Tabatinga.<br />
O apoio técnico e profissional do SEBRAE visa colocar o produto no mercado com<br />
“valor agregado”, diferencial <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, em muitos casos exportação, promoção ou<br />
participação em fóruns <strong>de</strong> discussão, feiras etc. O SEBRAE busca investir no sucesso do<br />
empreendimento a partir do qual coloca, segundo cada necessida<strong>de</strong> e interesse, as políticas <strong>de</strong><br />
qualificação profissional voltadas a estes negócios. Trata-se <strong>de</strong> um qualificado investimento<br />
em conhecimento para a produção. Temos como exemplos <strong>de</strong> cursos disponibilizados pelo<br />
SEBRAE em 2006:<br />
Jornada <strong>de</strong> capacitação – administração <strong>de</strong> conflitos: estratégias para uma<br />
negociação <strong>de</strong> sucesso; jornada <strong>de</strong> capacitação – auto <strong>de</strong>senvolvimento:<br />
como se tornar um lí<strong>de</strong>r eficaz; jornada <strong>de</strong> capacitação – como <strong>de</strong>finir o<br />
preço <strong>de</strong> venda na indústria – como <strong>de</strong>finir o preço <strong>de</strong> venda no serviço;<br />
jornada <strong>de</strong> capacitação – compras na empresa: da organização aos<br />
resultados; jornada <strong>de</strong> capacitação – fluxo <strong>de</strong> caixa: como administrar;<br />
jornada <strong>de</strong> capacitação – planejamento estratégico para micro e pequenas<br />
empresas; jornada <strong>de</strong> capacitação – qualida<strong>de</strong> máxima no atendimento ao<br />
cliente; jornada <strong>de</strong> capacitação – saber empreen<strong>de</strong>r; jornada <strong>de</strong> capacitação<br />
– vendas da empresa: as melhores táticas para sua equipe; jornada <strong>de</strong><br />
capacitação – vendas no balcão: sua empresa <strong>de</strong> portas abertas para o lucro;<br />
programa alavancagem tecnológica – FASE II)<br />
46
Como se po<strong>de</strong> ver no caso do SEBRAE, são cursos <strong>de</strong> capacitação profissional<br />
voltados para o empreen<strong>de</strong>dorismo, fazendo poucas, ou nenhumas distinção entre rural e<br />
industrial. Também, o tema da qualificação cada vez é mais <strong>de</strong>slocado para o da capacitação.<br />
A capacitação sugere potencial produtivo e <strong>de</strong> mercado, ao contrário da qualificação que dado<br />
o uso no Brasil geralmente sugere formação técnica para o mercado <strong>de</strong> trabalho, ou postos <strong>de</strong><br />
trabalho existentes.<br />
Sobre esta questão vale observar a tendência crescente da formação <strong>de</strong> parcerias na<br />
execução <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> qualificação profissional. O sistema SERT/SENAR já está, digamos,<br />
consolidado no tocante a estas parcerias. Des<strong>de</strong> a sua criação em 1976, aproveitando-se do<br />
arcabouço jurídico formal no meio rural que o SENAR atua como órgão promotor da<br />
qualificação profissional rural. Com o reconhecimento da FETAESP em 1962, que se seguiu<br />
o reconhecimento e filiação <strong>de</strong> sindicatos, que a qualificação é exercida por esta via. Durante<br />
muito tempo este foi o principal recorte <strong>de</strong> uma qualificação profissional no meio rural, do<br />
SENAR via fe<strong>de</strong>ração ou mesmo confe<strong>de</strong>ração. (CUNHA, 2000)<br />
Já no caso do SEBRAE, lembrando que este é criado apenas em 1990, passa a<br />
acontecer algo inédito que são as formulações <strong>de</strong> parcerias na execução <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong><br />
formação profissional com sindicatos dos trabalhadores <strong>de</strong> maneira geral, ou mesmo com a<br />
Fe<strong>de</strong>ração da Agricultura Familiar do Estado <strong>de</strong> São Paulo (FAF), que é filiada a CUT.<br />
Apontamos como inédito uma vez que com os sindicatos patronais rurais estas parcerias já<br />
existiam há algum tempo, conforme pu<strong>de</strong>mos levantar na pesquisa. Dada a natureza<br />
empreen<strong>de</strong>dora 26 do SEBRAE aliado ao fato <strong>de</strong> se i<strong>de</strong>ntificar com o setor urbano/industrial,<br />
normalmente os sindicatos dos trabalhadores não olhavam com bons olhos para tais políticas.<br />
Já o sistema SERT/SENAR, pela própria natureza da organização sempre e<br />
particularmente no período <strong>de</strong> vigência do FAT/PLANFOR, formulou e estabeleceu políticas<br />
<strong>de</strong> parcerias para formulação e execução dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional. Entretanto,<br />
neste caso, é preciso apontar uma distinção, ainda que um pouco adiantada. Tais parcerias<br />
eram formuladas na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, além dos Sindicatos Patronais Rurais, também<br />
com os sindicatos dos trabalhadores rurais ligados à FETAESP, que por sua vez é ligada à FS.<br />
Os sindicatos dos trabalhadores rurais ligados à FERAESP, esta ligada à CUT , sempre se<br />
recusaram em formar parcerias tanto com o sistema SERT/SENAR quanto com o SEBRAE.<br />
26 Conforme se sabe, qualquer perspectiva ou ação <strong>de</strong> iniciativa produtiva, criação <strong>de</strong> empresa, o “tornar-se<br />
patrão”, nunca foi visto com bons olhos pela tradição do movimento operário, e mais particularmente para um<br />
recorte <strong>de</strong> esquerda mais clássica. Este fator está intimamente ligado à hegemonia do período industrial, e<br />
também à construção institucional do Estado que busca representar interesses (capital e trabalho) como entes<br />
irreconciliáveis.<br />
47
Quando o sistema FAT/PLANFOR foi implantado em 1996, logo em seguida os<br />
sindicatos ligados à FS - Força Sindical passam a estabelecer convênios, recebendo recursos<br />
do FAT para execução dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional. Ou seja, a via do Estado para o<br />
seu “braço sindical” continua reproduzindo neste caso o que ocorria antes com o SENAR. O<br />
SENAR, vale lembrar, apesar do processo <strong>de</strong> reestruturação interna e <strong>de</strong> diretrizes pelas quais<br />
passou, foi criado em 1976, coincidindo, portanto, com o <strong>de</strong>senvolvimento agroindustrial,<br />
principalmente <strong>de</strong> São Paulo e assim da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto.<br />
Portanto, a FERAESP, tanto quanto a CUT <strong>de</strong> maneira geral, surge como alternativa<br />
crítica do sistema representado pelo SENAR e FERAESP. O recorte ocorrido no meio rural<br />
foi o mesmo do meio urbano, apenas removendo e estabelecendo esta discussão <strong>de</strong> cada<br />
central para a sua respectiva fe<strong>de</strong>ração. No meio rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto, o sindicalismo<br />
corporativo e <strong>de</strong> resultados era representado pela FETAESP, sendo que a oposição sindical<br />
era a FERAESP.<br />
A FERAESP mantinha uma postura crítica com relação aos cursos <strong>de</strong> formação<br />
profissional executados pela FETAESP com verbas do FAT, aliás, mantém até hoje, pois<br />
formalmente segue a linha das diretrizes do 5° Congresso Nacional da Central Única dos<br />
Trabalhadores (CONCUT) <strong>de</strong> 1995 (CUT, 1999), estabelecendo marcos <strong>de</strong> distinção sobre a<br />
qualificação profissional visada pela FS expressa no documento chamado “Um Projeto para o<br />
Brasil” <strong>de</strong> 1993. Este marco <strong>de</strong>limitador é bem colocado por Santana, Souza e Deluiz, (1999,<br />
p. 27 – 28):<br />
Percebe-se que as concepções <strong>de</strong> educação, seus pressupostos<br />
epistemológicos, as propostas curriculares, os conteúdos educativos, a<br />
forma <strong>de</strong> gestão e financiamento dos programas <strong>de</strong> Formação Profissional<br />
se diferenciam na perspectiva da FS, CGT e da CUT. Enquanto para as duas<br />
primeiras, o objetivo da Formação Profissional seria, basicamente, o <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolver plenamente a capacida<strong>de</strong> do trabalhador com vistas aos<br />
<strong>de</strong>safios que os esperam no processo <strong>de</strong> produção, para a última este<br />
objetivo não po<strong>de</strong> ser reduzido ao mero a<strong>de</strong>stramento da mão-<strong>de</strong>-obra para<br />
o mercado, mas <strong>de</strong>ve contribuir para a formação <strong>de</strong> trabalhadores<br />
tecnicamente competentes e politicamente comprometidos com a luta pela<br />
transformação da socieda<strong>de</strong>. Nesse sentido, para a CUT, a educação<br />
orientada para o trabalho seria, ao mesmo tempo Educação Profissional e<br />
Educação Política.<br />
Uma orientação pedagógica difícil <strong>de</strong> ser implementada pela via do mercado, ou do<br />
mercado <strong>de</strong> trabalho constituído. O que tradicionalmente levou a central a fazer distinção<br />
entre uma qualificação profissional emancipadora e <strong>de</strong>slocada das intervenções técnicas<br />
imediatas; e outra <strong>de</strong>stinada ao mercado <strong>de</strong> trabalho.<br />
48
A percepção dos sindicatos ligados a FERAESP e da própria fe<strong>de</strong>ração começa a<br />
mudar na medida em que, apesar <strong>de</strong> problemáticos, se percebe que estes cursos eram uma<br />
prática política <strong>de</strong> intervenção. Não há documentos que alterem, ou então <strong>de</strong>sdigam as<br />
resoluções críticas do 5º CONCUT. Contudo, após dois anos <strong>de</strong> implantação, ainda que sem<br />
data <strong>de</strong>finida, a FERAESP também passa a receber verbas do FAT para promover cursos <strong>de</strong><br />
qualificação profissional, conforme aponta um técnico <strong>de</strong> avaliação <strong>de</strong>stes cursos:<br />
Nenhum <strong>de</strong>les questiona mais, nem os mais radicais como a CUT, por<br />
exemplo, questionam, pelo contrário, <strong>de</strong>vem estar hoje lamentando <strong>de</strong> terem<br />
entrado <strong>de</strong>pois nesse programa e per<strong>de</strong>ram aí dois anos <strong>de</strong> muitos recursos<br />
para fazer o jogo que os outros estão fazendo e que consequentemente estão<br />
à frente: recebem mais recursos porque já têm uma estrutura consolidada <strong>de</strong><br />
cursos que a CUT está criando agora. Então, você vê que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ssa<br />
aceitação da lógica do capital, todas as partes envolvidas foram cooptadas,<br />
fazem parte sem nenhuma dificulda<strong>de</strong>, mas nada que os iniba <strong>de</strong> participar<br />
<strong>de</strong>ssa história: “Vamos lá, é esse o jogo? Então, vamos jogar o jogo.” Acho<br />
que a contestação á lógica do capital é uma ban<strong>de</strong>ira que um bom tempo foi<br />
enrolada e guardada pelos órgãos representativos dos trabalhadores e a<br />
lógica do capital prevaleceu <strong>de</strong> modo absoluto nos sistemas. Não há dúvida.<br />
E acho que é muito fácil con<strong>de</strong>nar essa postura, mas é muito difícil chegar e<br />
realizar efetivamente lutas revolucionárias, hoje foi totalmente mudado com<br />
uma proposta, como um pilar para o neoliberalismo. Foi preciso <strong>de</strong> um<br />
exército <strong>de</strong> reservas, uma massa <strong>de</strong>sempregada e os sindicatos foram<br />
obrigados a se posicionar na <strong>de</strong>fensiva mudando todo o discurso, parado <strong>de</strong><br />
brigar até por melhoria <strong>de</strong> salários <strong>de</strong>sviando todo enfoque da luta para<br />
preservação <strong>de</strong> empregos. Então quem luta hoje pela preservação <strong>de</strong> um<br />
emprego, pensar em <strong>de</strong>rrubar o sistema há uma distância extraordinária.<br />
(CUT, 2000)<br />
Mesmo mantendo postura crítica na sua concepção e estabelecendo marcos <strong>de</strong><br />
distinção, que inclusive fazem parte do histórico da CUT e FERAESP as distinguindo da FS e<br />
FETAESP, as primeiras são “empurradas” para as políticas dos cursos. Ainda que em um<br />
primeiro momento as parcerias das primeiras fossem poucas, tentando afastar órgãos como o<br />
SENAR <strong>de</strong>ste campo, a FERAESP, com relativa autonomia nos mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> cursos passa a<br />
receber verbas do FAT para execução <strong>de</strong>stes programas.<br />
O SENAR, portanto, é mais comprometido tanto com a digamos concepção do sistema<br />
“S”, quanto com uma estrutura <strong>de</strong> parcerias que vinha sendo feita pelo arcabouço legal<br />
existente. Já o SEBRAE, criado em 1990, surge nos marcos das transformações do sistema<br />
produtivo que vinham acontecendo no mundo.<br />
Um ponto que consi<strong>de</strong>ramos inédito sobre a relação entre estas instituições é que as<br />
políticas <strong>de</strong> parcerias têm se intensificado para muito além das possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> décadas<br />
49
atrás. Ainda que sejam casos isolados, verificamos em 2006, parcerias <strong>de</strong> sindicatos ligados a<br />
FERAESP tanto com o sistema SERT/SENAR quanto com o SEBRAE.<br />
3.3 O Sistema FAT/PLANFOR<br />
Nos anos 90, o tema da qualificação profissional sofre profundas transformações,<br />
<strong>de</strong>ntre as quais <strong>de</strong>stacamos o surgimento <strong>de</strong> novas formas <strong>de</strong> elaboração, execução e<br />
financiamento dos cursos <strong>de</strong> formação. Ainda que eventualmente possam ser encontrados<br />
vários resquícios do período anterior, a qualificação profissional, tal qual a enten<strong>de</strong>mos nos<br />
anos 90, é fruto <strong>de</strong> múltiplas experiências trabalhistas e sindicais, com <strong>de</strong>staque à participação<br />
das camadas populares. Um dos meios, ou mecanismos, que expressa esta relação são as<br />
experiências <strong>de</strong> fóruns multipartites como a Comissão Nacional <strong>de</strong> Formação Profissional do<br />
Subgrupo <strong>de</strong> Assuntos Trabalhistas do Mercosul. (DIEESE, 1998).<br />
Dentre tais mudanças, <strong>de</strong>stacamos a expansão <strong>de</strong> agências <strong>de</strong> formação, a<br />
incorporação <strong>de</strong> novos temas, a diversificação do público a que se <strong>de</strong>stina, e financiamento<br />
com recursos públicos e privados (DIEESE, 1998). Esta nova estrutura <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional, diferente dos períodos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento industrial e dos cursos técnicos<br />
profissionalizantes, apresenta pouca articulação com a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino regular.<br />
Neste novo cenário <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> um ambiente público <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional, um fator central da década <strong>de</strong> noventa foi a implementação, a partir <strong>de</strong> 1996, do<br />
PLANFOR, que se seguiu à criação do FAT.<br />
O FAT foi criado pela lei n.º 7.998/90, tratando-se <strong>de</strong> um fundo contábil <strong>de</strong> natureza<br />
financeira, sendo constituído por vários recursos <strong>de</strong> natureza diversa, <strong>de</strong>ntre as quais:<br />
Arrecadação do Programa <strong>de</strong> Integração Social (PIS), Plano <strong>de</strong> Assistência aos Servidores<br />
Públicos (PASEP), remuneração <strong>de</strong> empréstimos e <strong>de</strong>pósitos especiais Banco Nacional <strong>de</strong><br />
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), saldos do pagamento do seguro<strong>de</strong>semprego,<br />
abono salarial e contribuição sindical (MANFREDI, 2002).<br />
O FAT já estava previsto na Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988 no artigo 239, tendo sido na<br />
verda<strong>de</strong> regulamentado pela lei <strong>de</strong> 1990, que também dispõe sobre a vinculação do FAT ao<br />
MTb. Visa custear os mecanismos compensatórios gerados para combater o <strong>de</strong>semprego, ou<br />
então para as políticas <strong>de</strong> assistência e proteção financeira no momento <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego. Ou<br />
seja, tem como propósito custear tanto os programas que visam a reinserção na dinâmica<br />
produtiva do trabalho e renda, quanto assegurar direitos sociais básicos em momento <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>semprego. Financia e sustenta a implementação <strong>de</strong> vários e distintos programas que visam<br />
50
assegurar direitos sociais que foram prejudicados pela perda do emprego ou fonte <strong>de</strong> renda,<br />
fomentando a reversão <strong>de</strong>ste quadro. Abre-se, portanto, um gran<strong>de</strong> leque <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
programas e projetos a serem implementados <strong>de</strong>ntro dos marcos <strong>de</strong>finidores do sistema<br />
FAT/PLANFOR.<br />
Vários e distintos órgãos passam a receber verbas para financiamento <strong>de</strong> projetos<br />
compensatórios, tendo em vista o combate ao <strong>de</strong>semprego e a reinserção produtiva.<br />
Programas diversos gerados e executados por diferentes organismos como associações civis,<br />
câmaras setoriais e os sindicatos visavam geração <strong>de</strong> emprego e renda, intermediação e<br />
pesquisa, bem como análise sobre o mercado <strong>de</strong> trabalho e a implementação <strong>de</strong> Programas <strong>de</strong><br />
Políticas Públicas <strong>de</strong> Trabalho e Renda, que é on<strong>de</strong> se situam os cursos <strong>de</strong> qualificação e<br />
requalificação profissional.<br />
As políticas públicas <strong>de</strong> trabalho e renda buscam facilitar a inserção produtiva e<br />
profissional dos trabalhadores, garantindo a renda familiar e a melhoria da qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida.<br />
A concepção do programa e gestão <strong>de</strong> seus recursos prevê a participação <strong>de</strong> distintos<br />
segmentos sociais com particular atenção para os três gran<strong>de</strong>s segmentos: Estado, capital e<br />
trabalho. Esta abertura <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s em relação a diretrizes, metas e foco <strong>de</strong> atuação já<br />
estavam na concepção do FAT e na origem <strong>de</strong> seus recursos.<br />
A porcentagem <strong>de</strong> 40% dos recursos arrecadados anualmente pelo FAT vai para o<br />
BNDES. Ou ainda, dito <strong>de</strong> outra maneira, 40% das verbas do FAT são constituídas,<br />
provenientes, da remuneração <strong>de</strong> empréstimos do BNDES. O mesmo fundo financia<br />
simultaneamente as políticas apontadas acima, programas e projetos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />
econômico e investimentos produtivos. Ou seja, tanto na concepção do programa, quanto na<br />
prática conforme mais tar<strong>de</strong> se verificou tal fonte <strong>de</strong> recursos, financiava <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cursos <strong>de</strong><br />
qualificação profissional executados por sindicatos e voltados para a pauta do assalariamento,<br />
quanto investimentos econômicos e produtivos, como a criação e manutenção <strong>de</strong> empresas.<br />
A gestão dos recursos e dos programas financiados com recursos do FAT ficou <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
o início por conta do Conselho Deliberativo do FAT – CODEFAT, criado pela mesma lei <strong>de</strong><br />
âmbito fe<strong>de</strong>ral da criação do FAT. O CODEFAT, com inúmeras funções quanto aos recursos<br />
e ao controle social sobre o FAT, previa <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua origem a participação igualitária do<br />
“governo” (Estado), “empregadores” (capital) e “trabalhadores” (trabalho). É, portanto, um<br />
órgão <strong>de</strong> representação tripartite e paritária “exemplar” no que diz respeito às políticas <strong>de</strong><br />
qualificação profissional dos anos 90.<br />
O Estado tem assento no CODEFAT via MTB , MPAS – Ministério da Previdência e<br />
Assistência Social (MPAS), o BNDES e o Ministério da Agricultura e do Abastecimento<br />
51
(MAA). Os representantes patronais com assento no Conselho provêm da Confe<strong>de</strong>ração<br />
Nacional do Comércio (CNC), Confe<strong>de</strong>ração Nacional das Instituições Financeiras (CNF),<br />
Confe<strong>de</strong>ração Nacional da Indústria (CNI), Confe<strong>de</strong>ração Nacional da Agricultura (CNA).<br />
Por parte dos trabalhadores, a representação provém da CGT – Confe<strong>de</strong>ração Geral dos<br />
Trabalhadores (CGT), CUT, FS e Social Democracia Sindical (SDS). (VOGEL;<br />
YANNOULAS, 2000).<br />
Em 1994, por iniciativa do próprio CODEFAT (VOGEL; YANNOULAS, 2000) é<br />
criado o Programa <strong>de</strong> Geração <strong>de</strong> Emprego e Renda (PROGER) que viria a ser reconhecido<br />
mais tar<strong>de</strong> por lei fe<strong>de</strong>ral. A criação do PROGER visava aten<strong>de</strong>r a um público que não estava<br />
sendo <strong>de</strong>vidamente atendido pelos programas existentes. O público alvo eram os<br />
<strong>de</strong>sempregados, pequenos empreen<strong>de</strong>dores, o setor informal, bem como pequenos<br />
proprietários rurais. Visava atingir ações do tipo criação e manutenção <strong>de</strong> pequenas e<br />
microempresas, cooperativas e formas associativas <strong>de</strong> produção; agricultura familiar e<br />
iniciativas produtivas a partir da economia informal.<br />
Já o PLANFOR foi criado em 1995 e passou a ser implementado no ano seguinte. O<br />
FAT, no âmbito do PLANFOR, tem priorida<strong>de</strong> para aprovação e dotação <strong>de</strong> recursos. O<br />
PLANFOR traça algumas diretrizes básicas <strong>de</strong> implementação e atuação entre os anos <strong>de</strong><br />
1996 até 1998. O programa do PLANFOR é justificado pelo governo como sendo uma<br />
política <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento sustentável que visa além <strong>de</strong> formar profissionalmente, promover<br />
competência e consciência cidadã. Comparando os dados <strong>de</strong> 1998, verifica-se que os<br />
sindicatos e fe<strong>de</strong>rações aparecem em primeiro lugar na participação dos programas, 67%, se<br />
comparado com as instituições privadas e organizações não governamentais. Ocorre, que em<br />
1998, por exemplo, a Fe<strong>de</strong>ração das Indústrias do Estado <strong>de</strong> São Paulo (FIESP) foi a que mais<br />
recebeu recursos do FAT para programas <strong>de</strong> qualificação e requalificação profissional. Algo<br />
em torno <strong>de</strong> 14,6 milhões, que foram aplicados no programa do Telecurso 2000, da Fundação<br />
Roberto Marinho e em congressos sobre formação profissional, contemplou principalmente<br />
pessoas empregadas, (NASCIMENTO, 2000). No ano <strong>de</strong> 1999, o PLANFOR utilizou 627<br />
milhões para qualificar 2,6 milhões <strong>de</strong> pessoas, (ver quadro abaixo) lembrando ainda que o<br />
Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador que compõe cerca <strong>de</strong> 40% do patrimônio do BNDES<br />
correspondia neste ano a um montante <strong>de</strong> R$47,7 bilhões <strong>de</strong> patrimônio, (ABDALA;<br />
ROCHA, 2000).<br />
Para termos uma idéia sobre os recursos arrecadados pelo FAT e os investimentos<br />
apenas no âmbito do PLANFOR, Manfredi (2002, p. 173) aponta:<br />
52
No âmbito do Planfor, vimos que os recursos são provenientes do FAT e<br />
que, no período <strong>de</strong> seis anos, <strong>de</strong> 1995 a 2001, foram investidos em torno <strong>de</strong><br />
2,3 bilhões <strong>de</strong> reais (...) o orçamento do FAT em 1997, foi <strong>de</strong> 8,783 bilhões<br />
<strong>de</strong> reais, e o total aplicado na educação profissional foi <strong>de</strong> 348 milhões <strong>de</strong><br />
reais. No orçamento do fundo, a participação da Educação Profissional<br />
correspon<strong>de</strong>u a 3,9% do total.<br />
Nos seis primeiros anos <strong>de</strong> vigência, entre 1990 e 1996, o FAT atingiu um patrimônio<br />
<strong>de</strong> 27 bilhões <strong>de</strong> reais, segundo a mesma pesquisadora. Mas é conforme pontuamos o ano<br />
emblemático <strong>de</strong> 1996, com a entrada em vigor do PLANFOR, que as políticas públicas <strong>de</strong><br />
qualificação profissional, e em particular as articuladas via centrais sindicais, ganham<br />
contornos especiais e passam por um gran<strong>de</strong> aumento quantitativo. O quadro abaixo aponta<br />
com referência aos anos o número <strong>de</strong> beneficiados e o montante <strong>de</strong> recursos correspon<strong>de</strong>ntes.<br />
É preciso atentar para o fato <strong>de</strong> que além <strong>de</strong> não haver distinção entre os enquadramentos:<br />
rural e urbano, se trata <strong>de</strong> programas efetivamente realizados contabilizados segundo o valor<br />
<strong>de</strong> referência custo x aluno, sob média estatística. O quadro extraído do Mtb faz referência á<br />
todo o pessoal qualificado e não apenas os que se enquadram nos marcos do sistema<br />
FAT/PLANFOR.<br />
Ano Beneficiados Recursos<br />
1994 83,000 42.900.000,00<br />
1995 153,000 70.600.000,00<br />
1996 1.198,000 506.800.000,00<br />
1997 2.001,000 744.800.000,00<br />
1998 2.321.000 862.500.000,00<br />
1999 2.663.000 627.900.000,00<br />
2000 3.140.000 647.500.000,00<br />
2001 3.727.000 696.800.000,00<br />
2002 721.000 157.900.000,00<br />
2003 120.300 43.800.000,00<br />
Dados extraídos do MTB – Ministério do Trabalho (2006)<br />
Como po<strong>de</strong>mos observar entre os anos <strong>de</strong> 1997 a 2001, houve um aumento crescente<br />
do número <strong>de</strong> pessoas beneficiadas. Este aumento não correspon<strong>de</strong> ao montante <strong>de</strong> recursos<br />
disponibilizados para cada referência. A diminuição <strong>de</strong> recursos, proporcional ao número <strong>de</strong><br />
pessoas atendidas sugere barateamento <strong>de</strong> custos, ou diminuição da qualida<strong>de</strong> dos mesmos.<br />
Um crescente processo <strong>de</strong> massificação <strong>de</strong> cursos, conforme convêm para o atendimento dos<br />
sindicatos.<br />
Este novo mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> formação profissional em que situamos nossas discussões tem<br />
base organizacional e financeira bastante diferente das experiências anteriores. Uma <strong>de</strong>las é o<br />
53
fato <strong>de</strong> funcionar autonomamente sem liame e vinculação com a escola, universida<strong>de</strong> e até<br />
mesmo formações setoriais. As políticas <strong>de</strong> qualificação implantadas pelo sistema<br />
FAT/PLANFOR visavam uma qualificação sólida, mas principalmente uma qualificação<br />
rápida, dado o problema do <strong>de</strong>semprego que aumentava e se estruturava no país. Segundo<br />
Pochmann (2001), existia pouca comunicação entre as experiências sindicais, setoriais e das<br />
escolas e universida<strong>de</strong>s no tocante à qualificação profissional. Os sindicatos estavam atentos á<br />
requalificação, mas principalmente voltados para a qualificação buscando aten<strong>de</strong>r as<br />
<strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> um mercado <strong>de</strong> trabalho que estava passando por profunda transformação.<br />
O espírito norteador do FAT/CODEFAT, <strong>de</strong>pois reforçado pelo PLANFOR, é formar<br />
“mesa <strong>de</strong> negociação”, uma possibilida<strong>de</strong> aberta pela carta constitucional <strong>de</strong> 88 que tem em<br />
seu âmago este princípio <strong>de</strong>mocratizante. É preciso observar este ponto, dado que é ele que<br />
<strong>de</strong>fine e estabelece o marco <strong>de</strong> formação pública e institucional no tocante às políticas <strong>de</strong><br />
qualificação profissional no Brasil e em especial nos anos 90. Ao que enten<strong>de</strong>mos, <strong>de</strong>fine-se<br />
um ambiente público <strong>de</strong> qualificação profissional em que todos os interesses das partes<br />
envolvidas <strong>de</strong>vem ser colocados e solucionadas neste plano. Em trabalho publicado pelo<br />
Departamento Intersindical <strong>de</strong> Estatística e Estudos Sindicais (DIEESE), (1998, 1998, p. 54),<br />
esta <strong>de</strong>finição aparece como conteúdo crítico, caso as soluções sejam tomadas unilateralmente<br />
por segmentos <strong>de</strong> interesse:<br />
As empresas ainda tomam para si o direito exclusivo <strong>de</strong> capacitar o<br />
trabalhador em seu espaço, ou <strong>de</strong> apresentar a sua <strong>de</strong>manda diretamente ao<br />
Estado. Para muitas empresas, a capacitação do trabalhador não se traduz<br />
em um problema, na medida em que continua aten<strong>de</strong>ndo suas necessida<strong>de</strong>s<br />
como sempre o fizeram, ou seja, treinando, <strong>de</strong> forma unilateral o<br />
trabalhador no local <strong>de</strong> trabalho. Para outras, o nível <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong> passa a<br />
ser um requisito <strong>de</strong> seleção, que se traduz em uma barreira entre os postos<br />
<strong>de</strong> trabalho que são oferecidos para a massa <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempregados com baixa<br />
escolarida<strong>de</strong> em busca <strong>de</strong> uma ocupação. [...] Há muito a fazer e lutar para<br />
que essa situação se transforme. Afinal, o direito <strong>de</strong> conhecer e saber<br />
também passa por <strong>de</strong>cidir o que, e como, apren<strong>de</strong>r. A negociação bipartite<br />
ainda é o melhor meio <strong>de</strong> formular, conceber e <strong>de</strong>senvolver, políticas <strong>de</strong><br />
formação profissional no âmbito da empresa, ou mesmo do setor <strong>de</strong><br />
produção.<br />
Tais colocações se referem á negociação entre capital e trabalho no tocante a<br />
qualificação profissional. Como se sabe as empresas movidas por interesses unilaterais<br />
treinam por conta própria os trabalhadores, arcando com os custos e conteúdos <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong><br />
formação. Outras vezes <strong>de</strong>mandam ao Estado suas necessida<strong>de</strong>s. Para que haja equilíbrio <strong>de</strong><br />
interesses entre capital e trabalho, o tema <strong>de</strong>ve ser mediado pelo Estado. A criação dos<br />
54
conselhos tripartites e das mesas <strong>de</strong> negociação reflete este espírito “<strong>de</strong>mocratizante” da Carta<br />
Constitucional <strong>de</strong> 1988. Mesmo por que o Estado não coloca as políticas públicas <strong>de</strong><br />
formação e qualificação como política <strong>de</strong> interesse específico, por mais que sejam. O papel do<br />
Estado é criar mecanismos <strong>de</strong> intervenção aten<strong>de</strong>ndo a interesses distintos. (capital e<br />
trabalho).<br />
Portanto, a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> um espaço <strong>de</strong> negociação das relações <strong>de</strong> trabalho estabelece<br />
o marco que <strong>de</strong>fine o que se enten<strong>de</strong> por uma política pública <strong>de</strong> qualificação profissional.<br />
Contra as <strong>de</strong>cisões unilaterais, a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> um espaço público <strong>de</strong> qualificação profissional é<br />
estabelecida <strong>de</strong>ntro do Estado. Os conflitos <strong>de</strong> interesses e as políticas visando emprego,<br />
trabalho e renda não <strong>de</strong>vem ser solucionada unilateralmente no âmbito do mercado.<br />
Mas o Estado, paulatinamente, diante do processo <strong>de</strong> abertura, re<strong>de</strong>fine seu papel na<br />
intervenção da economia e nas relações <strong>de</strong> trabalho. Busca afrouxar os pilares que sustentam<br />
o velho estatuto corporativo visando aos poucos <strong>de</strong>ixar o papel <strong>de</strong> mediador ou controlador,<br />
ao mesmo tempo em que assume o <strong>de</strong> parceiro. Ao que enten<strong>de</strong>mos, a formação <strong>de</strong> conselhos<br />
tripartites e paritários nos mol<strong>de</strong>s do CODEFAT reflete esta relação que preten<strong>de</strong> se colocar<br />
como agente, em “pé <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong>”, com relação aos outros dois pólos: capital e trabalho.<br />
Santana, Souza e Deluiz (1999, p. 37) apontam este fator como tendência do processo<br />
<strong>de</strong> abertura econômica e reforma política das décadas <strong>de</strong> 80/90 no Brasil, que buscava seguir<br />
o que vinha acontecendo no contexto mundo:<br />
[...]o Estado teria inflado suas atribuições. Esta será a base da argumentação<br />
que formula a idéia <strong>de</strong> que o Estado <strong>de</strong>ve restringir ao máximo sua<br />
intervenção na economia e nos setores sociais, diminuindo sua carga. O<br />
Estado <strong>de</strong> Bem-Estar Social, ou Estado Providência, <strong>de</strong>veria ce<strong>de</strong>r lugar a<br />
um novo formato <strong>de</strong> Estado, o chamado Estado mínimo.<br />
Foi no processo <strong>de</strong> re<strong>de</strong>finição do papel do Estado que surgiu o FAT/CODEFAT, ou<br />
mesmo o PLANFOR. Um processo <strong>de</strong> re<strong>de</strong>finição no mínimo ambíguo, pois o mesmo Estado<br />
que <strong>de</strong>veria intervir promovendo o <strong>de</strong>senvolvimento, <strong>de</strong>veria também <strong>de</strong>ixar operar<br />
livremente, via mercado, as forças e potências da globalização econômica. Os programas <strong>de</strong><br />
qualificação profissional visavam geração <strong>de</strong> emprego e renda tendo como marcos <strong>de</strong>finidores<br />
o Estado. Neste sentido, um processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização a partir do Estado.<br />
55
3.4 A disputa por representação no meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto: entre<br />
sindicatos da FETAESP e da FERAESP<br />
Ainda que existam outros recortes sindicais na região, <strong>de</strong>stacamos estas duas vertentes<br />
por serem as maiores e mais significativas, expressando claramente a disputa por<br />
representação no meio rural da região. Com relação aos sindicatos patronais, os trataremos<br />
separadamente por se constituírem num importante prisma <strong>de</strong> discussão sobre o tema da<br />
qualificação profissional.<br />
Já as ações da CONTAG na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto são menores e mais localizadas.<br />
Nosso estudo indica que a FERAESP, <strong>de</strong> certa maneira faz, às vezes da CONTAG na região;<br />
e ainda que uma seja confe<strong>de</strong>ração e a outra fe<strong>de</strong>ração, ambas são ligadas a CUT. No caso dos<br />
assentamentos <strong>de</strong> reforma agrária acontece o mesmo. Ainda que existam ações da CONTAG,<br />
são mais significativas e em maior número as ações da FERAESP, FETAESP, sindicatos<br />
patronais ou mesmo da FAF.<br />
Nossa pesquisa priorizou três vertentes <strong>de</strong>ste processo <strong>de</strong> qualificação profissional<br />
rural presentes na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto. A qualificação, ou os cursos <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional executados pelos sindicatos ligados a FETAESP, FERAESP e Sindicatos Rurais<br />
(SR-patronais). Este fato <strong>de</strong>ve-se à gran<strong>de</strong> incidência <strong>de</strong>stes recortes sindicais. Portanto, nos<br />
ocuparemos em discutir a articulação, disputa e propostas no tocante ao tema, tendo em vista<br />
estes três segmentos.<br />
Para discutir a qualificação profissional realizada pelos sindicatos ligados às duas<br />
gran<strong>de</strong>s fe<strong>de</strong>rações presentes na região, é preciso entrar numa discussão mais circunscrita a<br />
formação e disputa entre ambas, uma vez que as duas figuram como fe<strong>de</strong>rações dos<br />
trabalhadores rurais, estabelecendo, portanto, um amplo terreno <strong>de</strong> disputa por representação.<br />
A FETAESP, como se sabe, é a referência do sindicalismo corporativo transplantado<br />
do meio urbano para o meio rural no início da década <strong>de</strong> sessenta. (COLETTI, 1998). Mantém<br />
até hoje a alcunha <strong>de</strong> velho sindicalismo 27 , em contraposição à FERAESP, i<strong>de</strong>ntificada <strong>de</strong>ntro<br />
do movimento que se convencionou chamar <strong>de</strong> novo sindicalismo, surgido com o movimento<br />
<strong>de</strong> “oposição sindical 28 ”.<br />
A FERAESP surge do interior da FETAESP. O movimento que culminou na fundação<br />
da primeira partiu das críticas formuladas à segunda. Inclusive muitos membros, sindicalistas,<br />
27 Enten<strong>de</strong>-se por "velho sindicalismo", a estrutura sindical corporativa e assistencialista, criada por Vargas em<br />
1931, e transportada para o meio rural principalmente após a criação do Estatuto do Trabalhador Rural em 1962.<br />
28 Enten<strong>de</strong>-se por "Oposição Sindical", o surgimento no meio rural, <strong>de</strong> li<strong>de</strong>ranças organizadas que lutavam<br />
contra o velho mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> sindicalismo corporativo herdado da era Vargas.<br />
56
presi<strong>de</strong>nte da fe<strong>de</strong>ração e ativistas sindicais que compunham a FETAESP acabaram sendo<br />
membros da FERAESP. O movimento <strong>de</strong> disputa por representação entre estas duas correntes<br />
po<strong>de</strong> ser lido na emergência do que também ocorreu no meio urbano industrial, mais<br />
i<strong>de</strong>ntificado neste caso entre FS e CUT , (SILVA, 1995).<br />
O surto <strong>de</strong> industrialização brasileiro ocorreu tardiamente com relação aos países <strong>de</strong><br />
capitalismo avançado. Com Vargas, e <strong>de</strong> forma mais proeminente a partir do Estado Novo<br />
tivemos o processo <strong>de</strong> construção do Estado Nacional, e assim, <strong>de</strong> inclusão das camadas<br />
populares. Esta relação entre incluídos e excluídos a partir do contrato <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong>ixava<br />
muita gente, principalmente no meio rural, á margem do sistema. A FS, ainda que se ocupasse<br />
da qualificação técnica profissional, este processo nada tem a ver com a qualificação tal qual a<br />
verificamos na última década do século passado. A CUT é a expressão tanto do movimento <strong>de</strong><br />
oposição sindical, que passa a existir institucionalmente, quanto da emergência das camadas<br />
populares no cenário nacional. Ainda que evi<strong>de</strong>ntemente esta inclusão e reconhecimento se<br />
<strong>de</strong>ssem também <strong>de</strong>ntro da FS. Neste sentido a primeira ação da CUT voltada para a questão<br />
da qualificação profissional apenas ocorreria e, 1995 a partir das resoluções aprovadas no III<br />
Congresso Nacional dos Metalúrgicos. Tratava-se do chamado Projeto Integrar, que na<br />
verda<strong>de</strong> abriria as portas para a CUT se inserir <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sta que po<strong>de</strong>mos chamar <strong>de</strong><br />
“estrutura da formação profissional no Brasil”. Sem entrar nos meandros <strong>de</strong>ste programa, vale<br />
apontar que ele surge exatamente da constatação do crescimento das taxas <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego, e<br />
do questionamento por parte dos sindicalistas ligados á CUT que, formados pelo mo<strong>de</strong>lo da<br />
“crítica emancipatória”, postulavam: <strong>de</strong> que vale a formação sem emprego? Este parece ser<br />
um ponto importante, pois trata-se da primeira ruptura que acaba tendo fortes <strong>de</strong>sdobramentos<br />
futuros no tocante a aproximação entre estes dois mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> sindicalismo (CUT e FS) no<br />
tocante a prática da qualificação profissional.<br />
Formação profissional, certamente não foi uma preocupação do movimento<br />
sindical brasileiro. Formação <strong>de</strong> quadros, sim; qualificação <strong>de</strong> militantes,<br />
sem dúvida. Por isso mesmo, e até bem pouco tempo, nem <strong>de</strong> longe a<br />
temática da qualificação parecia fazer parte do repertório sindical.<br />
(GUIMARÂES; COMIN; LEITE, 2001, p. 442)<br />
Os autores pontuam que pouco <strong>de</strong> ação concreta havia no tocante ao tema. O<br />
movimento <strong>de</strong> oposição sindical que culminou na criação da CUT, estava preocupado com<br />
formação <strong>de</strong> quadros políticos e militantes. Mais tar<strong>de</strong> a percepção da CUT é que era preciso<br />
entrar neste novo espaço aberto pelos programas públicos <strong>de</strong> formação.<br />
57
O Projeto Integrar foi num primeiro momento, ou mesmo da perspectiva <strong>de</strong> sua<br />
implantação, apontado como <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> sucesso. Des<strong>de</strong> a sua implantação em 1996 no Estado<br />
<strong>de</strong> São Paulo até meados <strong>de</strong> 1998, ao todo, ou seja, em todos os Estados on<strong>de</strong> o projeto foi<br />
implantado, 205 mil pessoas haviam passado por estes cursos. O programa passou <strong>de</strong> 780<br />
alunos por programa em 1997 para 1 580 em 1999. Todos atendidos em cursos e laboratórios<br />
pedagógicos, oficinas, cursos <strong>de</strong> geração <strong>de</strong> trabalho e informática (GUIMARÃES; COMIN;<br />
LEITE, 2001). O projeto previa além da formação técnica, seminários <strong>de</strong> formação política, e<br />
alternativas solidárias como forma <strong>de</strong> retorno dos trabalhadores ao mercado <strong>de</strong> trabalho. Mas<br />
visando também, e até principalmente, a formação <strong>de</strong> quadros militantes e o processo <strong>de</strong><br />
conscientização. Nesse sentido aparece como uma alternativa pioneira da CUT sobre o tema,<br />
mas que ainda não tinha a característica <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são aos programas oficiais <strong>de</strong> qualificação<br />
conforme verificado mais adiante.<br />
Retomemos aqui apenas um ponto <strong>de</strong>sta discussão, mesmo por que ele é apresentado<br />
em outro momento. Dentre as postulações críticas do novo sindicalismo contra o mo<strong>de</strong>lo<br />
corporativo herdado do período Vargas, movimento que primeiro eclo<strong>de</strong> no meio urbano e<br />
industrial, tendo como principal expressão as greves e paralisações que ocorreram em zonas<br />
industrializadas do país, um <strong>de</strong>les particulariza o racha ocorrido entre estas duas fe<strong>de</strong>rações,<br />
trata-se da questão da representação. A FETAESP representava, como ainda hoje representa,<br />
os trabalhadores rurais <strong>de</strong> forma geral e sem distinção. Sempre se dispôs como representante<br />
legítima tanto dos assalariados rurais quanto dos trabalhadores, que são i<strong>de</strong>ntificados em<br />
pequenas proprieda<strong>de</strong>s e núcleos <strong>de</strong> produção, quer como proprietários, arrendatários ou<br />
outras formas <strong>de</strong> trabalho. Alves (1991, p. 262) aponta alguns motivos <strong>de</strong>ste recorte <strong>de</strong><br />
dissidência entre as duas fe<strong>de</strong>rações e que ocorreu no meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto:<br />
O primeiro é o avanço do processo <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização da agricultura,<br />
fundamentalmente dos setores sucroalcooleiro e citrícula na região <strong>de</strong><br />
Ribeirão Preto; O segundo é o <strong>de</strong>corrente do grau <strong>de</strong> organização e luta dos<br />
trabalhadores assalariados rurais, por melhores condições <strong>de</strong> vida e trabalho<br />
e pelo controle do processo <strong>de</strong> trabalho; O terceiro fator é o<br />
questionamento, na região, da forma <strong>de</strong> encaminhamento e atuação política<br />
da Fetaesp (Fe<strong>de</strong>ração dos trabalhadores da Agricultura do Estado <strong>de</strong> São<br />
Paulo), que no <strong>de</strong>correr das lutas se afasta das formas <strong>de</strong> encaminhamento<br />
propostas pelos trabalhadores assalariados rurais.<br />
Imbuídos pelo i<strong>de</strong>ário do novo sindicalismo e trazendo novas pautas para o<br />
movimento sindical rural como a retomada pela luta por Reforma Agrária e políticas<br />
Agrícolas, militantes sindicais que estavam no interior da FETAESP concluem também que o<br />
58
interesse dos assalariados rurais é distinto <strong>de</strong> todas as outras formas <strong>de</strong> trabalho no meio rural.<br />
A FERAESP, portanto, surge com a proposta <strong>de</strong> representar os assalariados rurais, e para tal<br />
representação volta-se para as pautas típicas do assalariamento como luta por salário, dissídios<br />
trabalhistas, melhores condições <strong>de</strong> trabalho, etc. (ALVES, 1991) Mas a luta da FERAESP<br />
tem como objetivo último, circunscrito nos trabalhos e movimentos da própria fe<strong>de</strong>ração, a<br />
luta pela terra, pela reforma agrária. Neste sentido, a luta por melhores condições <strong>de</strong> trabalho<br />
e renda a partir das pautas do assalariamento se constitui num meio para se chagar ao fim<br />
último que é a conquista dos meios <strong>de</strong> produção: a terra e as políticas <strong>de</strong> Reforma Agrária.<br />
A articulação <strong>de</strong>stes temas entre o assalariamento e outras lutas mais abrangentes<br />
como a Reforma Agrária e políticas agrícolas a<strong>de</strong>ntro da FERAESP, remetem tal discussão<br />
para a central – CUT. O primeiro ponto <strong>de</strong> entendimento da fe<strong>de</strong>ração, aliás, também este<br />
comum com os movimentos sindicais urbanos ligados à mesma central, era que a luta voltada<br />
às pautas <strong>de</strong> assalariamento levariam à conscientização por parte dos trabalhadores. Neste<br />
momento, parece necessário dar os créditos a Fe<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> Órgãos para Assistência Social e<br />
Educacional 29 (FASE) que na década <strong>de</strong> 80 teve uma atuação militante abrangente no meio<br />
rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto, atuando <strong>de</strong> forma integrada com membros da FERAESP <strong>de</strong>pois da<br />
formação <strong>de</strong>sta. Um dos focos <strong>de</strong> atuação da FASE era investir na tomada <strong>de</strong> consciência, ou<br />
conscientização dos trabalhadores a partir do aumento da exploração do trabalho com o<br />
crescente assalariamento rural na região, (SILVA, 1995). O primeiro período da FERAESP,<br />
entre o final da década <strong>de</strong> 80 e início dos 90, se i<strong>de</strong>ntifica com a concepção e ação da FASE<br />
no meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto. Uma vez investindo na representação <strong>de</strong> interesses<br />
dos assalariados rurais, se chegaria ao entendimento (conscientização) <strong>de</strong> que não haveria<br />
saída, se mantida a relação <strong>de</strong> assalariamento verificada no meio rural. Portanto, o fim último<br />
também visava a Reforma Agrária <strong>de</strong>ntre outras políticas, mas esta articulação foi vis-à-vis<br />
<strong>de</strong>scentralizada para sua respectiva Central. Conforme aponta Silva (1995, p. 95):<br />
A Feraesp é filiada à CUT (Central Única dos Trabalhadores), expressão<br />
maior <strong>de</strong>ste novo sindicalismo na socieda<strong>de</strong> brasileira. Seus fundamentos <strong>de</strong><br />
atuação buscam: a) <strong>de</strong>senvolver uma prática sindical colada na<br />
representação dos interesses imediatos e gerais dos assalariados rurais, que<br />
se manifesta na direção das principais lutas <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>adas pela categoria<br />
29 A FASE – Fe<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> Órgãos para a Assistência Social e Educacional é uma ONG sem fins lucrativos que<br />
atuou e ainda hoje atua em várias regiões do país. Tem como foco, <strong>de</strong>senvolver projetos educacionais para<br />
populações miseráveis e marginalizadas, visando o resgate da cidadania e o pleno exercício da <strong>de</strong>mocracia. Na<br />
região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, e mais particularmente no meio rural, foi bastante atuante na década <strong>de</strong> 80 e início da<br />
década <strong>de</strong> 90. Dentre seus marcos <strong>de</strong> atuação institucional elegeu pelo país segmentos profissionais como<br />
estratégia <strong>de</strong> intervenção político educativa. Dentre estes, o setor canavieiro, ou dos cortadores <strong>de</strong> cana da região<br />
<strong>de</strong> Ribeirão Preto.<br />
59
nos últimos anos; b) na proposição e implementação da organização por<br />
local <strong>de</strong> trabalho, principal priorida<strong>de</strong> do novo sindicalismo brasileiro; c) na<br />
articulação <strong>de</strong> diferentes categorias <strong>de</strong> trabalhadores existentes nos CAIs,<br />
consi<strong>de</strong>rando que, ao estreitar sua relação com os trabalhadores<br />
consi<strong>de</strong>rados urbanos, contribui <strong>de</strong>cisivamente para o avanço e<br />
consolidação do projeto classista <strong>de</strong> estruturação sindical da CUT.<br />
Aliás, trata-se <strong>de</strong> uma crítica <strong>de</strong> fundo, até hoje bastante recorrente <strong>de</strong>ntro da<br />
FERAESP, que o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> representação da FETAESP favorece a concentração fundiária e<br />
a monocultura, uma vez que ela sempre, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua concepção, esteve atrelada ao Estado.<br />
Estado este que sempre esteve voltado a uma política agrária concentradora <strong>de</strong> terra, na<br />
agricultura extensiva e monocultora. Estado que, portanto, subsidiou o crescimento<br />
<strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nado dos gran<strong>de</strong>s complexos produtivos, expulsando os trabalhadores da terra e<br />
promovendo o assalariamento rural; E também, que ela aten<strong>de</strong> <strong>de</strong> fato, mais os interesses dos<br />
que exploram o trabalho, uma vez que representa grupo <strong>de</strong> produtores proprietários.<br />
No caso da FERAESP, é preciso consi<strong>de</strong>rar que ela tem um eixo articulado <strong>de</strong> atuação<br />
que se movimenta <strong>de</strong>ntro da CUT. Este eixo articulado <strong>de</strong> que falamos se espraia <strong>de</strong>ntro da<br />
central, ou seja, não apenas na concepção, mas nos distintos órgãos e <strong>de</strong>partamentos que<br />
compõe a CUT. Atualmente, o principal órgão articulado com a FERAESP <strong>de</strong>ntro da CUT é a<br />
FAF.<br />
A FAF, no tocante à qualificação profissional, pressupõe um trabalho integrado que<br />
não separa trabalho e renda da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> parque produtivo. Tem como<br />
priorida<strong>de</strong> a captação <strong>de</strong> potencialida<strong>de</strong>s locais e a <strong>de</strong>manda por qualificação atenta às<br />
necessida<strong>de</strong>s e vocações, segundo o perfil e os interesses do público a ser atendido.<br />
Se ambas FERAESP e FAF são fe<strong>de</strong>rações que estando <strong>de</strong>ntro da CUT não tem<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> disputa <strong>de</strong> representação, elas <strong>de</strong> fato se integram via Central Sindical. A<br />
FERAESP se ocupa das pautas <strong>de</strong> “luta salarial”, apontando para a solução possível que é a<br />
luta pela terra e as políticas <strong>de</strong> reforma agrária. Ainda que a FERAESP intervenha<br />
diretamente também nos núcleos <strong>de</strong> proprietários (assentamentos rurais), uma vez que esta<br />
articulação é recente. Geralmente, uma vez constituídos os assentamentos <strong>de</strong> reforma agrária<br />
é que entra a FAF. O eixo articulado é este, enquanto a FERAESP está mais presa na luta pela<br />
conquista da terra via pautas <strong>de</strong> assalariamento, a FAF entra num momento posterior que<br />
compreen<strong>de</strong> tanto a luta por políticas <strong>de</strong> reforma agrária quanto todas as pautas atinentes ao<br />
campo da produção.<br />
Ainda que exista este eixo articulado via central é evi<strong>de</strong>nte que a FAF não atua apenas<br />
nos núcleos <strong>de</strong> reforma agrária, mas também entre pequenos e médios produtores <strong>de</strong> maneira<br />
60
geral. Conforme se po<strong>de</strong> ver, acaba existindo inevitavelmente disputa <strong>de</strong> representação tanto<br />
com a FETAESP, quanto com os sindicatos patronais, conforme veremos mais adiante.<br />
A FERAESP por sua vez tem participação direta nos movimentos voltados aos<br />
assentamentos <strong>de</strong> Reforma Agrária, <strong>de</strong>ntre estes, os cursos <strong>de</strong> qualificação profissional.<br />
Contudo, ela articula tais intervenções com outros órgãos da central da qual é filiada, com<br />
especial atenção para a FAF, conforme se pontuou. Certamente este é um, e não o único,<br />
conforme já <strong>de</strong>monstramos, fator que explica a pouca intervenção da FERAESP no tocante às<br />
políticas <strong>de</strong> qualificação profissional, se comparado aos sindicatos ligados à FETAESP.<br />
3.5 Qualificação Profissional, entre FERAESP e FETAESP<br />
Quando na segunda meta<strong>de</strong> da década <strong>de</strong> noventa os sindicatos passam a receber<br />
verbas do FAT para execução <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> formação profissional, cada uma <strong>de</strong>stas fe<strong>de</strong>rações<br />
mantém posturas distintas.<br />
Uma primeira diferença marcante po<strong>de</strong> facialmente ser <strong>de</strong>duzida das colocações<br />
anteriores. A FERAESP estava preocupada exclusivamente com as pautas do assalariamento<br />
rural e <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sta perspectiva, pensava numa qualificação emancipadora que se contrapunha<br />
à preparação e qualificação para ocupação <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho 30 . Já a FETAESP, além <strong>de</strong><br />
não fazer esta distinção entre empregados e trabalhadores rurais, sempre esteve mais<br />
preocupada com um sindicalismo <strong>de</strong> resultados.<br />
A CUT, da qual a FERAESP é filiada, durante os anos noventa, tese reforçada pela<br />
sétima plenária, estava preocupada com uma “qualificação emancipadora”. Avaliava-se que a<br />
organização e as relações <strong>de</strong> trabalho, o investimento neste tipo <strong>de</strong> trabalho “alienado”, não<br />
levaria à almejada emancipação dos trabalhadores. Seria preciso uma educação que<br />
ressaltasse a condição <strong>de</strong> exploração dos trabalhadores e apontasse caminhos possíveis.<br />
Frigotto (1991), por exemplo, mantém esta postura que corrobora com a CUT. Aponta o autor<br />
que continuam existindo contradições no sistema capitalista <strong>de</strong> produção. Portanto, os novos<br />
requisitos profissionais <strong>de</strong> qualificação <strong>de</strong>vem ser pensados não na lógica da adaptabilida<strong>de</strong> e<br />
funcionalida<strong>de</strong>, mas na lógica da ruptura. Adaptabilida<strong>de</strong> e ruptura, quando colocados sob o<br />
30 O entendimento que a FERAESP tem sobre as políticas <strong>de</strong> qualificação profissional advém do mesmo núcleo<br />
motriz da CUT, central a qual é filiada. O documento mais importante da CUT sobre o tema, e que vigora até<br />
hoje apesar <strong>de</strong> na prática as coisa terem mudado bastante, po<strong>de</strong> ser encontrado na 7. Plenária Nacional da<br />
Central, em que esta insiste numa qualificação “diferenciada” e “emancipadora”, em contrapartida com uma<br />
qualificação voltada para o mercado <strong>de</strong> trabalho.<br />
61
prisma <strong>de</strong> dicotomias entre os quais se <strong>de</strong>ve fazer opção gera radicalização <strong>de</strong> posições. Tal<br />
radicalização colocada sob o prisma institucional significa fazer escolhas.<br />
Pensamos que foi a organização <strong>de</strong>ste pensamento antagônico entre ruptura e<br />
adaptabilida<strong>de</strong> que fez com que a CUT, e <strong>de</strong>sta forma a FERAESP, se mantivessem críticas e<br />
pouco receptivas num primeiro momento à qualificação do sistema FAT/PLANFOR. Por um<br />
lado pensavam que o assalariamento e a luta, a partir <strong>de</strong>ste, levaria à emancipação, e esta só<br />
seria conseguida via conscientização. Para fortalecer este elemento <strong>de</strong> conscientização, era<br />
preciso investir em cursos <strong>de</strong> formação profissional que apontassem para o vetor <strong>de</strong><br />
exploração do trabalho. Cursos voltados para o mercado, ou para aten<strong>de</strong>r aos interesses <strong>de</strong><br />
postos <strong>de</strong> trabalho, apenas aumentariam a exploração sobre o trabalho, sem apontar para<br />
saídas possíveis. Conforme colocado anteriormente, o Projeto Integrar implantado em São<br />
Paulo em 1996 foi a primeira abertura para mudança <strong>de</strong>ste quadro, ainda que não <strong>de</strong>finitiva,<br />
pois este previa estratégias <strong>de</strong> conscientização que iam além da mera formação técnica e<br />
profissional.<br />
A FERAESP, assim como a CUT, sempre esteve preocupada com outras frentes <strong>de</strong><br />
luta como capacitação da militância sindical, fortalecimento do laço <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> entre<br />
trabalhadores, ban<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> luta contra as privatizações, etc., por enten<strong>de</strong>rem que estes fatores<br />
influenciam diretamente a relação trabalho versus qualificação, conforme aponta Hélio Neves,<br />
(1998):<br />
[...] Nós não preten<strong>de</strong>mos qualificar trabalhadores para serem explorados<br />
por patrão em profissão alguma, então essa pregação do governo brasileiro<br />
<strong>de</strong> que a saída para os trabalhadores brasileiros é a qualificação, isso é<br />
formar gente para trabalhar para as multinacionais. Se o patrão quer ter<br />
mão-<strong>de</strong>-obra ele que pague por isso, ele que sustente escolas próprias <strong>de</strong><br />
qualificação profissional. [...]então a FERAESP não tem participado dos<br />
programas <strong>de</strong> qualificação profissional via governo, via FAT. Agente até<br />
teve oportunida<strong>de</strong> mas não temos participado disso. [...] temos conseguido<br />
até uns recursos oficiais para um programa <strong>de</strong> alfabetização <strong>de</strong> jovens e <strong>de</strong><br />
adultos. [...] No plano da qualificação profissional nós trabalhamos com a<br />
autonomia dos trabalhadores. Então os cursos e o trabalho <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional que a FERAESP faz, é dirigido diretamente aos assentamentos<br />
e aos trabalhadores, na perspectiva <strong>de</strong> sair da relação <strong>de</strong> emprego. Então nos<br />
temos um curso <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> café, curso <strong>de</strong> administração rural, curso<br />
dos mais... E temos curso inclusive em ví<strong>de</strong>o, que a gente promove. Agora<br />
isso está fora dos planos <strong>de</strong> qualificação profissional governamental. E o<br />
governo diga-se <strong>de</strong> passagem, prefere financiar o SENAR, financiar as<br />
entida<strong>de</strong>s patronais, á formar mão <strong>de</strong> obra mais barata pros patrões, do que<br />
formar trabalhadores na perspectiva da autonomia.<br />
62
A postura crítica e <strong>de</strong> <strong>de</strong>sacordo com o aparato público <strong>de</strong> qualificação profissional fez<br />
com que a FRAESP, á exemplo da CUT, mantivesse distância <strong>de</strong>stes programas num primeiro<br />
momento. Qualificação profissional se resumia ao atendimento imediato e direto <strong>de</strong> interesses<br />
pontuais <strong>de</strong> assentados em políticas <strong>de</strong> Reforma Agrária, ou então continuava na formação <strong>de</strong><br />
quadros militantes via conscientização.<br />
Ao contrário, a FETAESP não entrava nesta discussão, ou entrando, mantinha uma<br />
posição diferente, apontando que as exigências por melhores qualificações, fariam com que o<br />
trabalho ficasse inacessível para muitas pessoas que não se preparassem para tais exigências.<br />
Como coloca no mesmo período e sobre o mesmo ponto o Presi<strong>de</strong>nte da FETAESP Mauro<br />
Silva (2000):<br />
O programa é bom, o que falta às vezes é um pouco <strong>de</strong> serieda<strong>de</strong>. O<br />
programa é bom, todo programa que o governo baixa é bom. Falta um<br />
pouco <strong>de</strong> serieda<strong>de</strong>. Precisa ser mais, digamos assim, as pessoas <strong>de</strong>vem ter<br />
um pouco mais <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>, enten<strong>de</strong>u? Agora não é as pessoas que<br />
vão usufruir, que vão administrar esse curso não. É o governo que têm que<br />
ter um pouco mais <strong>de</strong> respeito. A visão da Fe<strong>de</strong>ração nossa hoje, como<br />
Fe<strong>de</strong>ração: o governo têm saber on<strong>de</strong> é que ele têm que entregar esse<br />
dinheiro, se ele está empregando no lugar certo. Se esse dinheiro está dando<br />
retorno[...], então aplica o dinheiro aon<strong>de</strong> vai gerar.<br />
O Presi<strong>de</strong>nte da FETAESP pontua a “simpatia critica”, ou a anuência da fe<strong>de</strong>ração<br />
com relação ao programa público <strong>de</strong> qualificação profissional, afirmando a linha <strong>de</strong> atuação<br />
que parte da central da qual é filiada, que por sua vez apresenta postura crítica com relação ao<br />
sistema CUT/FERAESP:<br />
[...] esses cursos só vêm através da Força Sindical. A CUT pega o dinheiro<br />
também, mas eles aplicam em monitores; a CUT quer formar monitores. A<br />
CUT não preocupa em formar trabalhador, qualificar e requalificar. [...] Por<br />
que nos vamos requalificar monitor? Eu não vejo razão para isso e a CUT<br />
faz [...]. Eu acho que a i<strong>de</strong>ologia <strong>de</strong>les é muito forte para o sistema atual O<br />
sistema atual requer você discutir os problemas, resolver os problemas, têm<br />
que trabalhar <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> resultado. [...] Aon<strong>de</strong> você radicaliza<br />
você ganha a opinião pública na cabeça, contra os teus i<strong>de</strong>ais. [...] Hoje é<br />
um momento <strong>de</strong> você conseguir alguma coisa para o trabalhador sem expor<br />
o trabalhador; você sabe que o <strong>de</strong>semprego está <strong>de</strong>vassando esse país nosso,<br />
agora se você começar a radicalizar as coisas, o <strong>de</strong>semprego torna muito<br />
maior. É o nego vai mecanizar o setor da cana. [...] Na medida em que<br />
houve radicalização, pressão, cobrança por parte do trabalhador, o que as<br />
usinas fizeram: a Usina São Martinho tinha 7500 trabalhadores, hoje está<br />
com 2000. Então não adianta, hoje o braçal vai per<strong>de</strong>r para o sistema<br />
robotizado. [...] nos não temo competência para ir contra o sistema<br />
mecanizado nesse país não. Ou você se a<strong>de</strong>qua ao sistema ou você vai<br />
ficando para traz.[...]<br />
63
A FETAESP apesar <strong>de</strong> manter alguns pontos críticos com relação a distribuição dos<br />
recursos, sustenta seu ponto <strong>de</strong> acordo com estes programas como forma <strong>de</strong> conquista para os<br />
trabalhadores. Ao mesmo tempo critica a linha <strong>de</strong> atuação da CUT que investe em formação<br />
<strong>de</strong> monitores. A concepção da FETAESP vem da central FS, da qual é filiada. Conforme<br />
apontam Santana, Souza e Deluiz (1999, p. 107):<br />
É neste sentido que a Central assinala, <strong>de</strong> forma geral, a importância da<br />
qualificação para os trabalhadores, garantindo possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> inserção<br />
satisfatória no quadro das mudanças. Na visão da FS, as novas formas <strong>de</strong><br />
organização do trabalho se baseariam em métodos que têm como<br />
pressuposto um trabalhador com sólida educação geral e profissionalizante.<br />
Isto levaria em sua implantação, ao correlato processo <strong>de</strong> elevação salarial<br />
para os trabalhadores incluídos nestes marcos.<br />
É assim que o sistema FAT/PLANFOR cai na exata medida das políticas sindicais<br />
adotadas pela Força Sindical e, <strong>de</strong>sta forma, as fe<strong>de</strong>rações a ela ligadas como a FETAESP. No<br />
documento “Perspectivas e Alternativas para uma Nova Ação Sindical em uma Nova Or<strong>de</strong>m<br />
Política, Econômica e Social” (FS, 1998), a Força Sindical, apresentando pontuações críticas<br />
e indicando a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> romper com seu próprio passado corporativo, aponta para a<br />
urgente necessida<strong>de</strong> da qualificação profissional. O mesmo documento possui indagações<br />
interessantes frente ao processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva pelo qual passávamos. Questões<br />
como manter postos <strong>de</strong> trabalho ou a CLT, por exemplo. .<br />
Ambas, FETAESP e FERAESP, radicalizando suas posições, acabaram sendo<br />
“forçadas” pelo processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva a a<strong>de</strong>rirem às novas <strong>de</strong>mandas do<br />
mundo produtivo. O entendimento sob contradição do sistema capitalista levado a cabo pela<br />
FERAESP, tanto quanto a a<strong>de</strong>quação ao “mercado <strong>de</strong> trabalho” privilegiado pela FETAESP,<br />
foi solapada pela dinâmica do processo produtivo. Em outras palavras as i<strong>de</strong>ologias foram<br />
<strong>de</strong>voradas pela realida<strong>de</strong>. Esta foi a condição colocada para se manterem representativas,<br />
ainda que com posições divergentes que resi<strong>de</strong>m mais no campo formal e i<strong>de</strong>ológico. Na<br />
prática, houve certo “caminhar para o centro” por parte das duas fe<strong>de</strong>rações.<br />
3.6 Dois recortes acerca da qualificação profissional: proximida<strong>de</strong> involuntária<br />
É preciso estabelecer dois momentos distintos no que diz respeito à discussão dos<br />
cursos <strong>de</strong> qualificação e requalificação profissional executado pelos sindicatos patronais,<br />
FERAESP, e FETAESP. Algumas mudanças po<strong>de</strong>m ser atribuídas à alteração <strong>de</strong> programas<br />
64
fe<strong>de</strong>rais, do PLANFOR para o PNQ. O principal <strong>de</strong>stes atributos na nossa discussão é o fato<br />
do PNQ enfatizar as iniciativas locais, consi<strong>de</strong>rando os municípios como parceiros nos<br />
programas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento, emprego e qualificação profissional. Fator apontado pelo<br />
presi<strong>de</strong>nte da UNITRABALHO, Francisco Mazzeu, (2000), como sendo a principal inovação<br />
do PNQ em relação ao PLANFOR. Num documento que trata da qualificação profissional<br />
rural a CUT (CUT, 1999, p. 79) aponta:<br />
O município passa a ser um espaço estratégico <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> políticas. A<br />
municipalização da saú<strong>de</strong>, da educação, da política agrícola, entre outras,<br />
tem dado uma razoável autonomia aos municípios. A tradicional<br />
administração pública municipal, baseada no assistencialismo e no<br />
clientelismo, vem sendo aos poucos questionada e substituída pela<br />
incorporação <strong>de</strong> políticas municipais voltada para o <strong>de</strong>senvolvimento<br />
econômico.<br />
Cada vez mais existe uma forte tendência à municipalização das políticas, <strong>de</strong>ntre as<br />
quais se inserem programas voltados ao <strong>de</strong>senvolvimento econômico local e à qualificação <strong>de</strong><br />
mão-<strong>de</strong>-obra. Trata-se, portanto, <strong>de</strong> um marco <strong>de</strong>cisivo no tocante a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> espaços <strong>de</strong><br />
intervenção política.<br />
Um marco <strong>de</strong>sta experiência <strong>de</strong>mocratizante iniciada com a Constituição <strong>de</strong> 1988, e<br />
também da forte tendência a municipalização e formação dos conselhos tripartites po<strong>de</strong> ser<br />
verificado com a criação das chamadas Comissões Municipais <strong>de</strong> Emprego (CME).<br />
Contudo, conforme aponta o próprio membro da Comissão Municipal <strong>de</strong> Emprego <strong>de</strong><br />
Araraquara, nem sempre se <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> pela qualida<strong>de</strong>:<br />
[...] então eles entregam o esboço do projeto, o esboço do projeto, que é o<br />
próprio mo<strong>de</strong>lo que a secretaria tem, só que isso gera custo e dinheiro, hora<br />
aula, porque você tem no curso, uma planilha <strong>de</strong> custo, além da hora aula,<br />
você tem um instrutor, o recolhimento dos encargos sociais <strong>de</strong>le. Você tem<br />
a divulgação do curso, você tem o lanche. [...] você tem o vale transporte,<br />
você tem o seguro. Barato, mas tem. Você tem o custo da apostila, você tem<br />
tudo isso, você tem o custo geral do curso, e aí você vai apresentar esse<br />
projeto para a outra entida<strong>de</strong> pega o mesmo curso e faz outro esboço do<br />
projeto [...] Como é que a Secretaria vai fazer isso aí? Simplesmente<br />
baseada no preço, que nem sempre e bom negócio! Então você tem o<br />
SENAI que apresentou um curso para dar aulas <strong>de</strong> informática a 10 reais a<br />
hora Uma outra entida<strong>de</strong> apresentou a 6, outra a 5! O que aconteceu? Vai<br />
dar aquela <strong>de</strong> 5! Aí é que eu digo: será que aquela <strong>de</strong> 5 tem condições?<br />
Aqui, foi preciso estabelecer um outro marco divisório no que diz respeito a um<br />
primeiro e um segundo período <strong>de</strong>stes cursos <strong>de</strong> qualificação profissional. O período a que<br />
65
nos referimos tem início com a vigência do sistema FAT/PLANFOR, quando estes cursos <strong>de</strong><br />
formação profissional passam a serem executados, entrando nesta década e se aproximando ao<br />
máximo dos dias atuais.<br />
O primeiro <strong>de</strong>stes períodos vai da implantação do sistema, tendo seu auge entre 1998<br />
até 2001. O segundo período vai <strong>de</strong> 2001 até os dias atuais, sofrendo uma sacudi<strong>de</strong>la com a<br />
troca <strong>de</strong> programas. Os principais fatores que caracterizam o primeiro período, portanto, o<br />
diferenciam do segundo são: a) Prevalência da FETAESP na execução <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong><br />
qualificação profissional, em <strong>de</strong>trimento da FERAESP; b) Prevalência <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong><br />
aplicativos em microinformática, em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outros módulos; c) Poucas políticas <strong>de</strong><br />
parceria na execução dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional; d) Maior proximida<strong>de</strong> entre<br />
concepção e execução entre módulos <strong>de</strong> cursos e diretrizes <strong>de</strong> atuação sindical. Passaremos a<br />
tratar cada um <strong>de</strong>stes fatores na or<strong>de</strong>m em que estão colocados, apontando as principais<br />
características que diferenciam estes dois períodos.<br />
A postura política adotada historicamente e mais propriamente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 90<br />
pelas duas centrais sindicais e suas respectivas fe<strong>de</strong>rações, ao que pensamos comprometeram<br />
a atuação futura e atual em relação ao tema das políticas públicas <strong>de</strong> qualificação profissional.<br />
Enquanto a FETAESP passou pelo processo <strong>de</strong> experimentação, reorganizando suas políticas<br />
<strong>de</strong> formação profissional, a FERAESP, pelos motivos apontados acima, diríamos “chegou<br />
mais tar<strong>de</strong>”. Um fator <strong>de</strong>cisivo que contribuiu para esta diferença <strong>de</strong>ve ser encontrado no<br />
histórico <strong>de</strong> formação <strong>de</strong>stas duas centrais e na concepção que ambas sempre mantiveram em<br />
relação às políticas <strong>de</strong> ação sindical.<br />
Da comparação entre o discurso dos presi<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>stas duas fe<strong>de</strong>rações, em entrevistas<br />
realizadas no final da década <strong>de</strong> noventa e início da presente década, esta posição é clara.<br />
Enquanto o presi<strong>de</strong>nte da FETAESP Mauro Alves da Silva, (2000) afirmava reiteradas vezes<br />
que a qualificação é necessária, que ela induz ao emprego e que apenas é possível pensar em<br />
emancipação tendo garantido o emprego e a renda; o presi<strong>de</strong>nte da FERAESP, Hélio Neves,<br />
(1998) reitera que a qualificação proposta pelo sistema FAT/PLANFOR serve apenas para<br />
preparar trabalhadores <strong>de</strong> baixa qualificação para serem explorados pelo mercado capitalista.<br />
Neste sentido, a FETAESP interveio no processo, inclusive com os equívocos que<br />
foram corrigidos tanto pelo mercado quanto pelas políticas públicas para qualificação<br />
profissional. Já a FERAESP, diríamos, “pegou o bon<strong>de</strong> andando”, uma vez que se viu<br />
“forçada” a a<strong>de</strong>rir a estas políticas quando elas já estavam em andamento, ou até passavam<br />
por processo <strong>de</strong> avaliação e reciclagem.<br />
66
No início da presente década, a FERAESP passa a formar parcerias para a qualificação<br />
profissional, coisa que a FETAESP já realizava fazia algum tempo. O interessante é que o<br />
discurso e a postura crítica com relação a estas políticas eram, e <strong>de</strong> certa forma são, mantidos.<br />
Nosso entendimento neste caso é que as <strong>de</strong>mandas por qualificação, e mais ainda, por uma<br />
qualificação difusa, como incerto e inacabado, é o processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva, e que<br />
age em várias frentes <strong>de</strong>limitando e <strong>de</strong>finindo caminhos, impulsionou este processo<br />
prevalecendo sobre as concepções sindicais sobre o tema. A <strong>de</strong>limitação <strong>de</strong> um novo perfil<br />
profissional, também este incerto, e a formação <strong>de</strong> novos mercados produtivos e<br />
consumidores solapou i<strong>de</strong>ologias. Outro fator que merece <strong>de</strong>staque sobre este ponto é que a<br />
crise do movimento sindical é um fenômeno estrutural global, conforme aponta Rodrigues<br />
(1999), que apesar <strong>de</strong> tardiamente com relação aos países centrais, atinge o Brasil e mais tar<strong>de</strong><br />
o meio rural brasileiro. Os sindicatos buscam estratégias <strong>de</strong> sobrevivência e manutenção<br />
institucional. Para isso <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m fundamentalmente <strong>de</strong> suas bases <strong>de</strong> representação. Na<br />
medida em que as pautas sindicais clássicas, como luta por melhorias salariais e por melhores<br />
condições <strong>de</strong> trabalho, greves e políticas reivindicatórias e contestatórias entram em crise, as<br />
políticas <strong>de</strong> qualificação profissional “caem como bálsamo” tanto para os sindicatos ligados à<br />
FETAESP, quanto para os ligados à FERAESP.<br />
Se <strong>de</strong> fato é verda<strong>de</strong> que na prática as diferenças entre FETAESP e FERAESP ten<strong>de</strong>m<br />
cada vez mais a diminuir no tocante às políticas <strong>de</strong> qualificação profissional, cabe indagar em<br />
que campo as diferenças subsistem, uma vez que os dois recortes sindicais permanecem no<br />
terreno da disputa <strong>de</strong> representação. Ao que pensamos, esta resposta <strong>de</strong>ve ser encontrada tanto<br />
no conteúdo dos cursos <strong>de</strong> formação profissional, quanto na forma que eles são aplicados,<br />
além da representação institucional <strong>de</strong> cada uma <strong>de</strong>stas fe<strong>de</strong>rações.<br />
Atentos às necessida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>mandas por trabalho e renda, cada vez mais os sindicatos<br />
são impulsionados pelo processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva que aponta para diretrizes<br />
comuns. Cada vez mais as necessida<strong>de</strong>s e potencialida<strong>de</strong>s produtivas situam a crise <strong>de</strong> um<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento calcado no pleno emprego <strong>de</strong> massa. Ao mesmo tempo,<br />
re<strong>de</strong>finem um novo contexto produtivo. Se esta afirmação é verda<strong>de</strong>ira, significa que os<br />
sindicatos são “forçados” cada vez mais a reverem suas pautas <strong>de</strong> atuação com vistas à nova<br />
realida<strong>de</strong> produtiva. No momento em que isso acontece, ou então <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste movimento,<br />
muitas posições políticas e até “i<strong>de</strong>ológicas” com atenção ao próprio histórico <strong>de</strong> formação<br />
<strong>de</strong>stes sindicatos são colocadas em segundo plano. É preciso, até mesmo como condição <strong>de</strong><br />
sobrevivência institucional, a<strong>de</strong>ntrar nesta zona <strong>de</strong> interesse comum em que se movimenta a<br />
qualificação profissional. Por isso, estabelecemos estes dois períodos sobre tais políticas <strong>de</strong><br />
67
qualificação profissional, dado que isso facilita a compreensão tanto do processo <strong>de</strong><br />
re<strong>de</strong>finição produtiva pelo qual passava o país, quanto na tomada <strong>de</strong> posições dos distintos<br />
recortes sindicais sobre o tema.<br />
Este primeiro período foi <strong>de</strong>marcado por pouca participação dos sindicatos ligados à<br />
FERAESP, e em contraposição, participação massiva dos sindicatos ligados à FETAESP nos<br />
cursos <strong>de</strong> formação profissional executados via FAT/PLANFOR.<br />
O Plano “Gestão na Qualificação Profissional no meio rural” da CUT (CUT, 1999, p.<br />
76), e que orienta as ações da FERAESP, aponta:<br />
A qualificação profissional tem um objetivo imediato <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r a uma<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualificação dos trabalhadores para o mercado <strong>de</strong> trabalho.<br />
Porém, como toda forma <strong>de</strong> educação e <strong>de</strong> cultura, a qualificação<br />
profissional está relacionada a uma <strong>de</strong>terminada visão <strong>de</strong> mundo. Neste<br />
sentido, a qualificação profissional para o setor rural, além <strong>de</strong> estar<br />
a<strong>de</strong>quada às atuais exigências do mercado <strong>de</strong> trabalho, ou seja,<br />
acompanhando as transformações estabelecidas pelas atuais dinâmicas<br />
econômicas e sociais, <strong>de</strong>ve também ser um instrumento para tornar os<br />
trabalhadores capazes <strong>de</strong> intervir no futuro. Esta é uma visão que parte do<br />
princípio <strong>de</strong> que os trabalhadores não po<strong>de</strong>m ser limitados a se a<strong>de</strong>quar às<br />
transformações, mas <strong>de</strong>vem, sobretudo ser sujeitos das transformações.<br />
Os cursos propiciados pelo sistema FAT/PLANFOR atendiam <strong>de</strong> pronto às exigências<br />
<strong>de</strong> interesse <strong>de</strong> mercado, aponta o presi<strong>de</strong>nte da FERAESP, Hélio Neves, (1998), sem atentar<br />
para o fator mais importante que é a intervenção dos trabalhadores nos processos <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões,<br />
e que teriam impactos <strong>de</strong>ntro das transformações que vinham ocorrendo no mundo do<br />
trabalho. Ocorre que bem cedo se percebeu que estes cursos não preparavam sequer para o<br />
mercado <strong>de</strong> trabalho, uma vez que não havia mercado <strong>de</strong> trabalho para absorver o contingente<br />
<strong>de</strong> trabalhadores excluídos pelo chamado <strong>de</strong>semprego tecnológico (SINGER, 1996); tão<br />
pouco este tipo <strong>de</strong> qualificação interessava aos novos postos que estavam surgindo. Melhor<br />
seria colocar estes cursos, geralmente <strong>de</strong> aplicativos básicos em microinformática como um<br />
tipo <strong>de</strong> reciclagem necessário ao próprio gozo da cidadania ou da condição <strong>de</strong> consumidor.<br />
A falta <strong>de</strong> foco dos módulos e conteúdos dos cursos <strong>de</strong> formação profissional, ao que<br />
enten<strong>de</strong>mos, <strong>de</strong>ve-se por um lado à in<strong>de</strong>finição advinda com o processo <strong>de</strong> reestruturação<br />
produtiva que impactou o país. Por outro, esta in<strong>de</strong>finição ocorre quando o país começa se<br />
abrir para uma perspectiva <strong>de</strong> economia globalizada. Este ponto é central para enten<strong>de</strong>rmos a<br />
predominância <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> aplicativos básicos em microinformática, mais particularmente<br />
entre os sindicatos ligados à FETAESP. Com a abertura econômica e <strong>de</strong> mercado, as<br />
conquistas tecnológicas com particular atenção para a microinformática, são rapidamente<br />
68
difundidas no país. Todos os sistemas operacionais das gran<strong>de</strong>s empresas passam por um<br />
processo <strong>de</strong> reestruturação, substituindo as antigas formas <strong>de</strong> gestão e processamento <strong>de</strong><br />
dados e informações. Prevalece, portanto, a codificação da microinformática, ocasião em que<br />
passa a ocorrer a reestruturação também do quadro <strong>de</strong> funcionários.<br />
Na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, e mais particularmente no meio rural, os “bons<br />
empregos” são aqueles reservados aos operadores <strong>de</strong>stes sistemas <strong>de</strong>ntro do complexo<br />
agroindustrial, enquanto os “maus empregos” eram reservados aos trabalhadores braçais,<br />
geralmente o corte da cana. Cada vez mais o ônus da qualificação é passado aos próprios<br />
trabalhadores. Neste sentido, que um usineiro entrevistado aponta que a condição <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sempregado, ou então a existência <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> baixa qualificação existem dado<br />
que o trabalhador não teria interesse em melhorar sua própria condição:<br />
[...] Ele não almeja, ele não tem aspirações, ele não se preocupa em fazer<br />
um curso <strong>de</strong> profissionalização, uma alfabetização melhor, apesar <strong>de</strong> que<br />
tudo isso existe em termos <strong>de</strong> facilida<strong>de</strong>... Ele não se interessa, mas ele fala<br />
para o filho <strong>de</strong>le fazer. Então enquanto existir este pessoal que não tem<br />
interesse ou por que acha difícil conseguir pela própria formação <strong>de</strong>le, vai<br />
continuar existindo a colheita manual <strong>de</strong> cana. [...]. (NARCISO ZANIN,<br />
2000)<br />
Trabalho exaustivo, <strong>de</strong>gradante, <strong>de</strong> baixos ganhos e muita exploração como o da<br />
colheita manual da cana, existem, dado que os trabalhadores não se preocupam em melhorar<br />
suas qualificações, segundo as palavras do patrão. Dentre os módulos <strong>de</strong> cursos executados<br />
pela FEATAESP até o início da última década, a gran<strong>de</strong> maioria eram cursos <strong>de</strong> aplicativos<br />
básicos em microinformática. Levantamos alguns outros módulos <strong>de</strong> cursos executados por<br />
estes mesmos sindicatos, porém, eram poucos e quase sempre atendiam a uma <strong>de</strong>manda<br />
direcionada. Foram casos como cursos <strong>de</strong> panificação, bordado, embutidos, cosméticos,<br />
<strong>de</strong>ntre alguns outros.<br />
Conforme aponta o presi<strong>de</strong>nte da UNITRABALHO, Francisco Mazzeu, (2000), o<br />
computador é uma ferramenta <strong>de</strong> trabalho que <strong>de</strong>ve ser manipulada na condição <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong><br />
meio e não como fim. Cursos <strong>de</strong> aplicativos em microinformática são uma espécie <strong>de</strong> acesso e<br />
difusão <strong>de</strong> novas tecnologias e não qualificação profissional. Tais cursos, portanto, não<br />
viabilizam uma qualificação para o mercado <strong>de</strong> trabalho e nem mesmo são eficientes do ponto<br />
<strong>de</strong> vista <strong>de</strong> uma qualificação mais ampla e geral. Também, aplicativos básicos em<br />
microinformática significam apenas manuseios básicos <strong>de</strong> ferramentas <strong>de</strong> trabalho. Não há<br />
mercado <strong>de</strong> trabalho constituído capaz <strong>de</strong> absorver gran<strong>de</strong> contingente <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra<br />
69
qualificada como operadores <strong>de</strong> computador ou microinformática. A própria natureza, ou<br />
melhor, a falta <strong>de</strong> foco <strong>de</strong>stes cursos dificultou a relação <strong>de</strong> avaliação dos programas entre<br />
aprendizado e emprego, e este era um ponto polêmico que já havia sido percebido no final da<br />
década <strong>de</strong> noventa conforme aponta Espósito (1999). O PLANFOR não conseguiu uma<br />
metodologia precisa e eficiente, (CUNHA, 2000- c) capaz <strong>de</strong> relacionar qualificação com<br />
inserção produtiva ou profissional.<br />
Do conteúdo <strong>de</strong>stes cursos, prevalece o aprendizado prático <strong>de</strong> como operar a<br />
máquina. Ou então a manipulação <strong>de</strong> aplicativos <strong>de</strong> programas simples e que hoje estão<br />
bastante integrados <strong>de</strong>vido a difusão <strong>de</strong> uso. A aprendizagem teórica não vai além do<br />
conhecimento da simples operacionalida<strong>de</strong>. Noções mínimas <strong>de</strong> como ligar e <strong>de</strong>sligar a<br />
máquina, manipulação do teclado, etc. Os professores, apesar <strong>de</strong> disponíveis, ensinavam<br />
simplesmente a operar a máquina e sistemas simples com pouca, ou nenhuma complexida<strong>de</strong> e<br />
interação <strong>de</strong> uso. Tais cursos, conforme apontamos eram verificados massivamente até<br />
meados <strong>de</strong> 2001. A própria difusão <strong>de</strong> uso do computador, o acesso á máquina, fez com que<br />
tais conteúdos se tornassem acessíveis e o aprendizado e reciclagem rápida viessem no curso<br />
da própria operacionalida<strong>de</strong>.<br />
A FETAESP aponta as dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong>sta relação entre módulos <strong>de</strong> cursos e postos <strong>de</strong><br />
trabalho, ou mesmo emprego e renda. Em entrevista realizada com o presi<strong>de</strong>nte da FETAESP,<br />
membro do FAT e do SENAR (2006), eles manifestam o problema. Uma medida que <strong>de</strong> certa<br />
forma conteria a relação clientelista seria a maior participação dos trabalhadores na escolha<br />
dos módulos <strong>de</strong> curso a serem executados. Para tanto, <strong>de</strong>veriam ser observados os nexos<br />
locais <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> qualificação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra. Em vários momentos tentamos i<strong>de</strong>ntificar<br />
a participação dos trabalhadores ou pelo menos algum esforço da instituição sindical em<br />
captar o interesse da categoria por <strong>de</strong>terminado curso. Apesar dos dirigentes sindicais e<br />
presi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> fe<strong>de</strong>rações afirmarem existir a participação dos trabalhadores na escolha dos<br />
cursos, em nenhum momento pu<strong>de</strong>mos i<strong>de</strong>ntificar tal feito. Os sindicatos ligados a FETAESP,<br />
procuram direcionar massivamente cursos <strong>de</strong> aplicativos básicos em microinformática, ainda<br />
que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> cada região alguns nexos <strong>de</strong> <strong>de</strong>mandas pu<strong>de</strong>ssem ser i<strong>de</strong>ntificados. Dada a<br />
estrutura socioeconômica da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, cursos <strong>de</strong> aplicativos em<br />
microinformática sugeriam a ocupação <strong>de</strong> novos postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong>ntro dos gran<strong>de</strong>s<br />
complexos produtivos. Neste sentido, uma qualificação profissional que pretendia-se voltada<br />
para um “mercado <strong>de</strong> trabalho”. Acreditavam os alunos, que após passarem por estes cursos<br />
<strong>de</strong> qualificação, estariam mais aptos e concorrentes no mercado <strong>de</strong> trabalho, conforme aponta<br />
Singer (1999, p. 119 - 120):<br />
70
[...] é preciso que fique bem claro que a maior qualificação dos<br />
trabalhadores, iminentemente reclamada pelos empregadores, não é solução<br />
para o <strong>de</strong>semprego. O aumento da qualificação não induz os capitais a<br />
ampliar a <strong>de</strong>manda por força <strong>de</strong> trabalho, pois esta <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> basicamente do<br />
crescimento dos mercados em que as empresas ven<strong>de</strong>m seus produtos. Se<br />
todos os trabalhadores <strong>de</strong>sempregados incrementassem seu nível <strong>de</strong><br />
qualificação, o único resultado seria uma concorrência mais intensa entre<br />
eles, com provável queda dos salários pagos.<br />
Pu<strong>de</strong>mos constatar na nossa pesquisa que entre os anos <strong>de</strong> 1998 – 2000 alguns<br />
sindicatos ligados à FETAESP como o <strong>de</strong> Guariba, Jaboticabal, Sertãozinho, Araraquara<br />
<strong>de</strong>ntre outros, promoveram cursos <strong>de</strong> reciclagem profissional inclusive com recursos próprios.<br />
Outras vezes, eram recursos da própria fe<strong>de</strong>ração, no caso a FETAESP, geralmente, buscando<br />
aten<strong>de</strong>r à <strong>de</strong>manda do público. Como no caso <strong>de</strong> Guariba, Wilson Silva (2000) aponta:<br />
[...] Nem Fe<strong>de</strong>ração, nenhuma Central, nem secretária do governo participa<br />
<strong>de</strong>sse curso. É por isso que temos tido oferta <strong>de</strong> cursos da fe<strong>de</strong>ração. Por<br />
exemplo, recentemente nos <strong>de</strong>mos um outro curso aqui em dois dias. Foi<br />
um curso <strong>de</strong> [...] aplicativos em microinformática. Então <strong>de</strong>mos um outro<br />
curso que não tinha nada a ver com esse curso que nos estamos fazendo.<br />
Inclusive esse curso foi dado como para a maioria que tinha dos<br />
participantes foi o pessoal do assentamento aqui do lado do rio. Por isso nos<br />
não achamos viável trazer o curso <strong>de</strong> computação para Guariba, para que<br />
não acabe estragando esse trabalho que nos estamos fazendo. Porque o<br />
trabalho nosso, ele não tem parada, é no dia-dia: De Terça à Sábado, é das<br />
sete às <strong>de</strong>z da noite.<br />
Consi<strong>de</strong>rando insuficientes os módulos repassados via fe<strong>de</strong>ração pelo programa<br />
FAT/PLANFOR, estes sindicatos reproduziam o conteúdo dos cursos, se utilizando das<br />
mesmas estruturas físicas e serviços técnicos profissionais como professores e computadores,<br />
porém custeavam estes cursos com recursos do próprio sindicato. Esta constatação, ao que<br />
enten<strong>de</strong>mos, reforça a idéia, segundo a qual, estes cursos geraram uma “política <strong>de</strong> ilusão”<br />
entre os trabalhadores e que tais políticas <strong>de</strong> qualificação profissional serviram para a<br />
retomada <strong>de</strong> representação sindical, num momento em que os sindicatos passavam por<br />
profunda crise <strong>de</strong> representação. Também, o sindicalista chega a pontuar que não quer, ou<br />
gostaria que fosse implantada escola <strong>de</strong> informática em Guariba, para não afetar o trabalho<br />
que o “seu” sindicato vinha fazendo com êxito.<br />
No campo da disputa por representação, conforme vimos, o caso entre FETAESP e<br />
FERAESP é estabelecido entre propostas e concepções diferentes <strong>de</strong> sindicalismo. No tocante<br />
71
à qualificação profissional, este quadro <strong>de</strong> disputa entre formas diferentes <strong>de</strong> conceber o tema<br />
e tais políticas foi transferido das políticas sindicais para o campo público das políticas <strong>de</strong><br />
formação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra. Portanto, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste que chamamos <strong>de</strong> primeiro período, a<br />
relação era mais clara nas propostas e disputa por representação. Já no segundo período,<br />
quando vários recortes sindicais passam a disputar as mesmas políticas e módulos <strong>de</strong> cursos,<br />
esta relação ganha novos contornos.<br />
As parcerias eram poucas naquele que chamamos <strong>de</strong> primeiro momento. Os cursos<br />
eram disponibilizados pelos sindicatos havendo certa disputa no intento <strong>de</strong> quem aplicava<br />
mais e melhor os cursos. Havia alguns apoios e pequenas ajudas que não po<strong>de</strong>m ser<br />
concebidos como sendo parcerias propriamente ditas. O módulo <strong>de</strong> curso recebido por este ou<br />
aquele sindicato era passado para os alunos como sendo uma realização do sindicato. Dada a<br />
importância dispensada a estes cursos, pu<strong>de</strong>mos verificar pequenos apoios como cessão <strong>de</strong><br />
espaço físico e em alguns casos transporte ou até mesmo alimentação. Geralmente era a<br />
prefeitura municipal quem fornecia algum tipo <strong>de</strong> ajuda, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo da relação entre prefeito<br />
<strong>de</strong> plantão e dirigentes sindicais locais. Parece-nos que a política <strong>de</strong> qualificação e<br />
requalificação adotada pelos sindicatos se constituem no mote <strong>de</strong> sua atuação e assim sendo a<br />
socieda<strong>de</strong> ou a base sindical <strong>de</strong>ve receber estes cursos como sendo uma realização meritória<br />
do esforço <strong>de</strong>spendido pelo aparelho sindical.<br />
No segundo momento, estas parcerias passam a ser estabelecidas com mais freqüência.<br />
Atribuímos este fato, por um lado às Comissões Municipais <strong>de</strong> Emprego (CME) que foram se<br />
consolidando; mas também ao fato <strong>de</strong> que o processo <strong>de</strong> reorganização produtiva que solapou<br />
i<strong>de</strong>ologias impulsionou a política e o conteúdo <strong>de</strong>stes cursos para uma espécie <strong>de</strong> terreno<br />
comum.<br />
Vale lembrar que a Comissão Municipal <strong>de</strong> Emprego é <strong>de</strong>liberativa, ela avalia quais os<br />
melhores cursos a serem realizados naquele município, apresentando um parecer a Secretaria<br />
<strong>de</strong> Emprego e Relações <strong>de</strong> Trabalho (SERT). Os sindicatos daquela cida<strong>de</strong> que tenham a<br />
intenção em receber o módulo <strong>de</strong> curso, apresentam programa para sua execução, que será<br />
avaliado após <strong>de</strong>cidirem por um ou outro sindicato ou qualquer outra organização social.<br />
Importante citar também que aqueles municípios que não têm constituído a Comissão<br />
Municipal <strong>de</strong> Emprego po<strong>de</strong>m invocar a Comissão Estadual <strong>de</strong> Emprego para <strong>de</strong>liberarem<br />
sobre a questão.<br />
Um membro da Comissão Municipal <strong>de</strong> Emprego <strong>de</strong> Araraquara, Sérgio Porto, (2000)<br />
aponta que nem sempre se <strong>de</strong>cidia pela qualida<strong>de</strong> e pelo mérito. Muitas vezes era uma relação<br />
<strong>de</strong>finida <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um ambiente clientelista que escolhia qual o sindicato melhor qualificado<br />
72
para receber o módulo <strong>de</strong> curso, mesmo porque os critérios apesar <strong>de</strong> <strong>de</strong>finidos eram<br />
avaliados internamente pela comissão. Ainda que possa haver corrupção nesta relação, fator<br />
evi<strong>de</strong>ntemente não <strong>de</strong>scartado, não é isso que nos interessa aqui. A questão que nos interessa,<br />
e que foi reiterada pelos membros da Comissão Municipal <strong>de</strong> Emprego é que os módulos <strong>de</strong><br />
cursos escolhidos podiam ser disponibilizados por vários e distintos recortes sindicais,<br />
momento em que se estabelecia uma forte disputa. Cada vez mais o conteúdo dos cursos po<strong>de</strong><br />
indiferentemente ser disponibilizado por sindicatos ligados à FERAESP, FETAESP, ou<br />
mesmo por sindicato patronal rural. Ainda, muitos <strong>de</strong>stes módulos <strong>de</strong> cursos po<strong>de</strong>m ser<br />
aplicados tanto por sindicatos rurais quanto urbanos. Exemplos típicos são cursos <strong>de</strong><br />
eletricista, operação <strong>de</strong> máquinas, mecânica, <strong>de</strong>ntre muitos outros. Parcerias da FETAESP e<br />
dos sindicatos patronais rurais com o SENAI e SENAC, órgãos históricos na formação<br />
profissional urbana industrial, pu<strong>de</strong>ram ser observados <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década passada. Todo o<br />
complexo agroindustrial necessita <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> qualificação, tanto quanto o setor mais<br />
urbano/industrial. Portanto, estas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cursos po<strong>de</strong>m ser ministradas por qualquer<br />
uma das vertentes <strong>de</strong> sindicalismo rural presentes na região.<br />
É preciso atentar para este fator <strong>de</strong> proximida<strong>de</strong> entre diversas linhas <strong>de</strong> sindicalismo<br />
com o histórico e as propostas <strong>de</strong> representação distintas, uma vez que se constituem numa<br />
importante chave <strong>de</strong> leitura para enten<strong>de</strong>r a relação dos cursos <strong>de</strong> qualificação com os<br />
sindicatos; Também, a tendência cada vez mais acentuada à cooperação no ambiente<br />
produtivo, aproximando, ou no mínimo turvando, as relações entre capital e trabalho.<br />
Se existe uma confluência nas políticas <strong>de</strong> qualificação e requalificação profissional,<br />
ao ponto dos distintos recortes sindicais proporem cursos que com relação ao conteúdo muito<br />
pouco tem <strong>de</strong> diferente, é evi<strong>de</strong>nte que existe um terreno <strong>de</strong> disputa e negociação. Este amplo<br />
terreno <strong>de</strong> que falamos na prática consiste em princípio, na admissão <strong>de</strong> que distintos módulos<br />
<strong>de</strong> cursos po<strong>de</strong>m ser aplicados e disponibilizados por qualquer um <strong>de</strong>stes recortes sindicais,<br />
que em tese, e até historicamente, sempre tiveram posições divergentes e contrárias sobre a<br />
qualificação profissional. Estes cursos entram num terreno <strong>de</strong> disputa que aponta para uma<br />
forte tendência <strong>de</strong> formulação <strong>de</strong> parcerias entre sindicatos. As parcerias não verificadas,<br />
pelos motivos <strong>de</strong> disputa histórica <strong>de</strong> representação, e até institucional, estão situadas entre os<br />
sindicatos ligados a FERAESP e FETAESP. Lembrando mais uma vez que do ponto <strong>de</strong> vista<br />
do conteúdo e módulos <strong>de</strong> cursos entre estes sindicatos, poucas diferenças subsistem.<br />
Provavelmente, existam ainda no tocante às priorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> um ou outro módulo. De qualquer<br />
forma, os sindicatos ligados à FERAESP, críticos que são ao mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> qualificação para o<br />
“mercado”, uma vez que têm como priorida<strong>de</strong> a pauta do assalariamento, ficam com poucas<br />
73
margens <strong>de</strong> manobra. Ou qualificam trabalhadores para aten<strong>de</strong>r aos postos <strong>de</strong> trabalho em<br />
relação <strong>de</strong> assalariamento, ou então investem na conscientização <strong>de</strong>stes trabalhadores. Em<br />
relação à qualificação mais voltada para os assentamentos <strong>de</strong> Reforma Agrária e núcleos <strong>de</strong><br />
pequena produção, geralmente outros órgãos vinculados à FERAESP via Central, com<br />
especial atenção para a FAF, é que acabam se ocupando <strong>de</strong>stes cursos, ainda que a FERAESP<br />
esteja direta ou indiretamente envolvida nestas políticas.<br />
No tocante às políticas <strong>de</strong> formação profissional, po<strong>de</strong> parecer que entre estes<br />
sindicatos não existem mais diferenças práticas. Em princípio é verda<strong>de</strong>, mas acontece que<br />
estes distintos recortes sindicais por um lado levam esta questão para o campo da disputa por<br />
representação. Esta disputa não ocorre da mesma forma que verificamos no primeiro período.<br />
No primeiro período a disputa era <strong>de</strong> concepção sobre vertentes diferentes em enten<strong>de</strong>r o tema<br />
da qualificação profissional. Portanto, as diferenças entre conteúdos programáticos, alvo,<br />
objetivos, sobre o próprio tema da qualificação profissional. No segundo período, existe<br />
maior i<strong>de</strong>ntificação sobre estes pontos, restando a questão <strong>de</strong> quem, ou qual, dos recortes vai<br />
executar estes programas, e assim, obviamente, angariar méritos que se revertem em<br />
representativida<strong>de</strong>. Cada vez mais os sindicatos passam a disputar módulos <strong>de</strong> cursos a serem<br />
disponibilizados numa mesma região em que os distintos recortes estão presentes.<br />
Mas existe outro ponto para o qual chamamos a atenção e que talvez venha a re<strong>de</strong>finir<br />
estes sindicatos, quiçá apontando para uma nova institucionalida<strong>de</strong>. Trata-se <strong>de</strong> um fator <strong>de</strong><br />
caráter bastante qualitativo. Cada vez mais o diferencial entre estes sindicatos está na<br />
articulação do tema, no caso a qualificação profissional, com outros fatores que compõem,<br />
por um lado, o campo da cidadania, e por outro, na própria maneira e compromisso com que<br />
tais cursos são disponibilizados.<br />
A crítica, por exemplo, que a FAF, ou mesmo a FERAESP faz com relação à<br />
qualificação profissional praticada pela FETAESP, ou mesmo aos módulos disponibilizados<br />
via SENAR há muito <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser com relação ao conteúdo <strong>de</strong>stes cursos. A crítica busca<br />
apontar o equívoco em disponibilizar módulos <strong>de</strong> cursos indiscriminadamente, sem prévio<br />
estudo das necessida<strong>de</strong>s e potencialida<strong>de</strong>s locais. Sem o que chamam <strong>de</strong> captar as vocações<br />
ou “vocacionalida<strong>de</strong>s” locais. Sem antes ouvir as <strong>de</strong>mandas do público a ser atendido,<br />
percebendo quais seriam os cursos que <strong>de</strong> fato apresentariam bons resultados práticos, atentos<br />
a fatores como cidadania, <strong>de</strong>senvolvimento produtivo, trabalho e renda.<br />
A crítica que a FAF faz à FETAESP e aos cursos disponibilizados via SENAR, é que<br />
estes disponibilizam cursos <strong>de</strong> forma indiscriminada. Não fazem captação <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>s,<br />
74
potencialida<strong>de</strong>s e vocacionalida<strong>de</strong>s locais. É o que criticando chamam <strong>de</strong> “cursos pontuais”. É<br />
o caso, por exemplo, <strong>de</strong> disponibilizar cursos <strong>de</strong> embutidos <strong>de</strong> leite, que são bastante comuns<br />
entre estes módulos, sem que, contudo, o público atendido possua a vaca ou as condições e<br />
perspectivas <strong>de</strong> investir no setor.<br />
Dada a diversida<strong>de</strong> que compõe o Estado <strong>de</strong> São Paulo, sem entrar em nível nacional,<br />
é preciso atentar para cada realida<strong>de</strong> sócio-econômica, suas características, potencialida<strong>de</strong>s e<br />
vocação. A FAF pontua estas questões, bem como o escoamento da produção, a maneira <strong>de</strong> se<br />
inserir e concorrer no mercado e ainda, a questão do “agregar valor ao produto 31 ”.<br />
É interessante notar que a velha discussão, aliás, nem é tão velha assim, sobre uma<br />
formação ou qualificação profissional voltada para a emancipação dos trabalhadores, e outra<br />
para o a<strong>de</strong>stramento <strong>de</strong> trabalhadores para o capital, levada à cabo pela CUT durante anos,<br />
não entra nesta disputa. Por outro lado, ou seja, do ponto <strong>de</strong> vista da Força Sindical e assim da<br />
FETAESP, o conteúdo programático dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional sofreram gran<strong>de</strong><br />
transformação. Um dos fatores que impulsionaram esta transformação <strong>de</strong>ve ser encontrado no<br />
redirecionamento das verbas do FAT e na substituição do PLANFOR pelo PNQ. Mas <strong>de</strong>vem<br />
ser encontrados também em outros dois pontos.<br />
O primeiro <strong>de</strong>stes é que o processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva, trazendo in<strong>de</strong>finição<br />
no tocante ao perfil profissional e às áreas profissionais a serem investidas, remete esta<br />
questão para o mercado, ou então para o <strong>de</strong>senvolvimento e <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> parque produtivo. O<br />
mercado, por sua vez, aponta para a necessida<strong>de</strong> em <strong>de</strong>finir qualificação profissional <strong>de</strong><br />
acordo com o surgimento das potencialida<strong>de</strong>s produtivas. Por isso, cada vez mais os módulos<br />
<strong>de</strong> cursos entre distintos recortes sindicais ten<strong>de</strong>m a se aproximar.<br />
Mais existe ainda um outro ponto que aparece junto nesta relação. A tendência à<br />
formulação <strong>de</strong> parcerias tem aumentado. Os sindicatos ligados à FETAESP têm parcerias para<br />
execução <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> formação profissional, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> cada caso ou sindicato, com o<br />
SEBRAE, SENAR e até mesmo com os sindicatos patronais. A FERAESP que manteve <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
a sua formação uma postura crítica e <strong>de</strong> distanciamento, atualmente já tem parcerias tanto<br />
com o SENAR, quanto com o SEBRAE.<br />
A FETAESP sempre manteve aberto o canal com o SERT/SENAR. Portanto, não<br />
cabem gran<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>rações sobre este ponto, ou seja, o sistema SENAR/SERT sempre<br />
aten<strong>de</strong>u à FERAESP disponibilizando cursos <strong>de</strong> qualificação profissional. Já a FERAESP,<br />
31 Agregar valor ao produto, segundo concepção corrente nos sindicatos e fe<strong>de</strong>rações, significa investir na parte<br />
industrial, e eventualmente comercial <strong>de</strong> produtos primários originários do meio rural. Significa, portanto,<br />
investir nas mais diversas fases da produção que aproxime o máximo possível o produtor do consumidor,<br />
buscando eliminar a figura do “atravessador”.<br />
75
tanto pelo histórico <strong>de</strong> formação, quanto por concepção mesmo, sempre se recusou a fazer<br />
parte <strong>de</strong>stas parcerias. Atualmente, ou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2005, a FERAESP passa a integrar a disputa com<br />
a FETAESP, firmando convênio com o SENAR e disponibilizando estes cursos que já vêm<br />
prontos em módulos fechados 32 .<br />
Portanto, o campo <strong>de</strong> disputa em relação aos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional, ten<strong>de</strong><br />
a ser mantidos entre os dois recortes sindicais. Todavia, são diferenças que do ponto <strong>de</strong> vista<br />
prático diminuíram. Os módulos <strong>de</strong> cursos disponibilizados atualmente, ainda que a<br />
FETAESP continue investindo mais que a FERAESP neste campo, po<strong>de</strong>m ser<br />
disponibilizados por qualquer um <strong>de</strong>stes recortes.<br />
Na prática e conteúdo, nada obstaria que estes módulos <strong>de</strong> cursos fossem realizados<br />
em parceria. Se isso não ocorre é por disputa <strong>de</strong> representação, cada sindicato busca<br />
apresentar os cursos como sendo um feito seu o que por si só gera legitimida<strong>de</strong> a instituição.<br />
Por outro lado, restam diferenças históricas, <strong>de</strong> cunho i<strong>de</strong>ológico e institucional que acabam<br />
impossibilitando a ação conjunta, ou políticas <strong>de</strong> parceria. E ainda, as fe<strong>de</strong>rações e sindicatos<br />
recebem financiamento <strong>de</strong> acordo com suas próprias políticas e esforços neste sentido.<br />
Portanto, no primeiro período, a proximida<strong>de</strong> entre concepção e recorte sindical e os<br />
cursos <strong>de</strong> qualificação profissional era maior se comparada com o segundo período. É preciso<br />
atentar ainda para o fato <strong>de</strong> que no primeiro período, tido como uma espécie <strong>de</strong><br />
experimentação, a corrida por estes cursos <strong>de</strong> qualificação profissional, quer por parte dos<br />
sindicatos, quanto dos usuários, era maior se comparada com o segundo período. A negativa<br />
da FERAESP num primeiro momento era acor<strong>de</strong> à sua postura e concepção sobre políticas <strong>de</strong><br />
formação profissional, bem como a FETAESP mergulhou nestas políticas por convicção e<br />
compromisso com sua linha <strong>de</strong> atuação. O fato novo sobre este ponto é que cada vez mais,<br />
tanto uma quanto a outra fe<strong>de</strong>ração ten<strong>de</strong>m a se afastar das posturas mais rígidas que vinham<br />
trazendo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua formação.<br />
3.7 Entre FAT, PRONAF e MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário.<br />
No final da década <strong>de</strong> 90, mais intensamente entre os anos <strong>de</strong> noventa e oito até dois<br />
mil e um, os sindicatos ligados à FETAESP receberam módulos <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional via sistema FAT/PLANFOR. Estes módulos eram organizados e disponibilizados<br />
32 É preciso notar que pelo fato <strong>de</strong>stes cursos já virem em módulos fechados, a contratação <strong>de</strong> serviços como<br />
material e professores, é feita pelos órgãos do SERT/SENAR. Segundo informações <strong>de</strong> alguns sindicalistas,<br />
geralmente os valores pagos aos profissionais são mais altos do que a média <strong>de</strong> mercado.<br />
76
via fe<strong>de</strong>ração. Era a fe<strong>de</strong>ração que <strong>de</strong>finia a distribuição <strong>de</strong>stes cursos, bem como contratava<br />
profissionais para executá-los. Apesar dos módulos virem prontos da fe<strong>de</strong>ração, a execução<br />
<strong>de</strong>stes cursos geralmente, mas nem sempre, era feita por profissionais da própria localida<strong>de</strong>.<br />
Eram os sindicatos que acertavam contratos, valores e condições <strong>de</strong> execução. Outras vezes,<br />
era a fe<strong>de</strong>ração que mantinha contrato fechado com equipes técnicas, nestes casos geralmente<br />
escolas <strong>de</strong> informática. O argumento a favor da contratação <strong>de</strong> serviços da própria localida<strong>de</strong><br />
ou próximo era que esta prática diminuía custos como transporte e alimentação.<br />
Com relação a localização <strong>de</strong> po<strong>de</strong>res, lembramos, conforme aponta Abramovay<br />
(2000), que este fenômeno no âmbito <strong>de</strong> pequenos municípios revela fatores positivos e<br />
negativos ao <strong>de</strong>senvolvimento. Determinada re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações po<strong>de</strong> tanto favorecer o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento e a transparência das ações políticas como maior possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
fiscalização, conhecimento amplo da comunida<strong>de</strong> e da formação <strong>de</strong>sta etc.; como po<strong>de</strong><br />
também, e isso <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> mais da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações e <strong>de</strong> inter<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong>sta, uma vez que<br />
tais características são atribuídas <strong>de</strong> maneira geral a todos os pequenos municípios, facilitar e<br />
proporcionar favoritismos e corrupção.<br />
A falta <strong>de</strong> foco no tocante a tais políticas caracterizou este primeiro período <strong>de</strong><br />
experimentação e implantação da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> formação profissional. Uma falta <strong>de</strong><br />
foco que vai <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a aplicação dos recursos, a relação custo benefício, os módulos escolhidos,<br />
até a eficiência e os sistemas <strong>de</strong> avaliação <strong>de</strong> resultados. A pesquisa que realizamos naquele<br />
período (CAMPOS, 2001), revela pouca diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> módulos <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional, apesar das políticas <strong>de</strong>stes sindicatos estarem voltadas à qualificação<br />
profissional. Cursos <strong>de</strong> aplicativos básicos em microinformática com carga horária <strong>de</strong> 35 a 40<br />
horas eram comuns e quase constantes no interior da maioria <strong>de</strong>stes sindicatos.<br />
Havia uma espécie <strong>de</strong> “febre” da qualificação profissional, digamos assim, em que os<br />
sindicatos haviam entrado. Também, o <strong>de</strong>semprego crescente movimentava as pessoas a<br />
procurarem se qualificar na tentativa <strong>de</strong> se integrarem ou reintegrarem em postos <strong>de</strong> trabalho.<br />
Tanto Estado quanto sindicatos, propagavam a idéia segundo a qual o <strong>de</strong>semprego crescia<br />
<strong>de</strong>vido a falta <strong>de</strong> trabalhadores qualificados para ocuparem os novos postos <strong>de</strong> trabalho que<br />
estariam surgindo. Este processo acontecia no interior da crise <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento econômico que estava apoiado na perspectiva do emprego <strong>de</strong> massa ou<br />
socieda<strong>de</strong> do pleno emprego. (POCHMANN, 2001) O Estado, por meio <strong>de</strong> políticas públicas,<br />
apesar <strong>de</strong> galvanizar esforços, não havia digerido, ou seja, não tinha claro e <strong>de</strong>finido este<br />
processo aberto no mundo produtivo e que impactava o país.<br />
77
De qualquer maneira, quem mais se beneficiou <strong>de</strong>stas políticas <strong>de</strong> formação<br />
profissional naquele momento, foram os sindicatos. Diante da crise estrutural e global do<br />
movimento sindical que já era sentida no Brasil, a política dos cursos <strong>de</strong> formação<br />
profissional cai como um bálsamo para estes sindicatos. Diante da crise das antigas pautas<br />
salariais, os sindicatos reforçavam, ou tentavam reforçar suas bases <strong>de</strong> representação por meio<br />
<strong>de</strong>stas políticas <strong>de</strong> cursos. Os cursos <strong>de</strong> formação profissional para os trabalhadores (alunos)<br />
apareciam como possibilida<strong>de</strong>s. Na falta <strong>de</strong> alternativas, ou <strong>de</strong> outras alternativas mais<br />
eficazes e momentâneas, e ainda que reconhecendo as limitações <strong>de</strong>stas que estavam sendo<br />
disponibilizadas, havia uma gran<strong>de</strong> busca por estes cursos.<br />
Um fator que parece importante apontar é que o gerenciamento das verbas do FAT<br />
acarretou polêmica entre os últimos anos da década passada e início dos anos dois mil.<br />
Polêmicas, inclusive bastante propagadas pela gran<strong>de</strong> imprensa que apontavam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mau<br />
uso <strong>de</strong>stes recursos, bem como focos <strong>de</strong> corrupção endêmica. (ABDALA; ROCHA, 2000). Os<br />
recursos do FAT e seu gerenciamento sob vigência do PLANFOR <strong>de</strong>monstraram uma urgente<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intervenção no sentido tanto <strong>de</strong> fiscalizar quanto <strong>de</strong> <strong>de</strong>scentralizar estes<br />
recursos. O maior controle público e operacional do FAT foi sugerido após o Tribunal <strong>de</strong><br />
Contas da União (TCU) e a Secretaria Geral <strong>de</strong> Controle da Corregedoria Geral da União<br />
empreen<strong>de</strong>r profunda investigação que indicava irregularida<strong>de</strong>s no gerenciamento <strong>de</strong>stes<br />
recursos.<br />
Com a mudança <strong>de</strong> governo em 2002, e a substituição do PLANFOR pelo PNQ, o<br />
FAT <strong>de</strong>ixa aos poucos <strong>de</strong> ser o centro das atenções no tocante à qualificação profissional. Na<br />
verda<strong>de</strong>, o FAT continua existindo e sendo o principal financiador das políticas <strong>de</strong> formação<br />
profissional do país, mas aos poucos <strong>de</strong>ixa a posição quase unânime que teve na década<br />
passada. Este fato <strong>de</strong>ve-se também ás investigações nos <strong>de</strong>stinos <strong>de</strong>stes recursos. Mas o que,<br />
para seguir com nossos argumentos mais nos interessa aqui é que houve re<strong>de</strong>finição no que<br />
diz respeito ao uso e gerenciamento <strong>de</strong>stes recursos. O próprio PNQ na concepção do novo<br />
programa aponta os problemas do PLANFOR, indicando o arrefecimento dos recursos<br />
<strong>de</strong>stinados à qualificação profissional:<br />
Em 2002, os recursos orçamentários para a Qualificação Profissional<br />
<strong>de</strong>cresceram para 302 milhões, que, entretanto, foram reduzidos com o<br />
contingenciamento para apenas R$ 153 milhões (representando algo em<br />
torno <strong>de</strong> 30% dos valores do ano anterior). Para 2003, o Orçamento da<br />
União, <strong>de</strong>finido ainda no Governo anterior, <strong>de</strong>stinou apenas R$ 186<br />
milhões. (PNQ, 2003)<br />
78
O argumento seguido pelo PNQ era mudar o foco da qualificação, do gerenciamento e<br />
uso dos recursos. Neste sentido seria preciso um melhor aproveitamento <strong>de</strong>stes recursos. O<br />
arrefecimento <strong>de</strong>stes, <strong>de</strong>stinados exclusivamente à qualificação profissional <strong>de</strong>ve-se à<br />
avaliação dos resultados <strong>de</strong>stes programas que constatava que do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> seus<br />
objetivos, estes cursos não apresentavam resultados satisfatórios ou então que era quase<br />
impossível equacionar a relação entre qualificação profissional e conquista <strong>de</strong> emprego. Não<br />
houve impacto favorável entre cursos <strong>de</strong> formação profissional e aumento <strong>de</strong> pessoas<br />
ocupadas durante o período vigente <strong>de</strong>stes cursos, ou então, não foi possível fazer relação<br />
entre estes fatores. (ESPÓSITO, 1999)<br />
Aos poucos, o FAT retoma posição privilegiada no cenário nacional, inclusive<br />
aumentando os recursos, créditos e linhas <strong>de</strong> financiamento. Contudo, prioriza linhas <strong>de</strong><br />
atuação, compreen<strong>de</strong>ndo a qualificação profissional <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>stas matrizes ou linhas.<br />
O Conselho Deliberativo do Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador (Co<strong>de</strong>fat)<br />
aumentou para R$ 19,5 bilhões os recursos <strong>de</strong>stinados aos programas e<br />
linhas <strong>de</strong> créditos especiais em 2006. No início do ano, a estimativa extraoficial<br />
era <strong>de</strong> liberação <strong>de</strong> R$ 9 bilhões. [...] também aprovará importantes<br />
ajustes operacionais. Além <strong>de</strong> R$ 4,9 bilhões para programas <strong>de</strong> infraestrutura<br />
do BNDES, serão <strong>de</strong>stinados mais R$ 4,4 bilhões para micro e<br />
pequenas empresas e cooperativas <strong>de</strong> profissionais liberais, além <strong>de</strong> R$ 2,4<br />
bilhões para a agricultura familiar e R$ 1,9 bilhão para a geração <strong>de</strong><br />
emprego. [...] a medida <strong>de</strong>ve aumentar o volume dos reembolsos e ajustar o<br />
fluxo <strong>de</strong> caixa do fundo à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sembolsos, além <strong>de</strong> dar mais<br />
liberda<strong>de</strong> ao Conselho para <strong>de</strong>stinar os recursos a programas ou linhas ‘mais<br />
ajustadas às suas diretrizes’ [...]. (VALOR on-line, 28/04/2006, p. 01)<br />
Com o PNQ, passa a ocorrer um redirecionamento das linhas <strong>de</strong> atuação e<br />
financiamento <strong>de</strong> programas com recursos do FAT. A qualificação profissional cada vez mais<br />
passa a ser tratada sobre a perspectiva <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento e criação <strong>de</strong> novos negócios.<br />
Ainda que os “cursos pontuais” sejam mantidos, os programas, linhas e diretrizes <strong>de</strong> atuação<br />
buscam priorizar o <strong>de</strong>senvolvimento integrado que, investindo na criação e consolidação <strong>de</strong><br />
empresa, cooperativas, linhas <strong>de</strong> crédito para a agricultura familiar <strong>de</strong>ntre outras, investem, ao<br />
mesmo tempo, em qualificação profissional. Ou então, com a constituição e difusão <strong>de</strong>stes<br />
novos negócios surge uma miría<strong>de</strong> <strong>de</strong> profissões para as quais os cursos <strong>de</strong>vem se voltar.<br />
Linhas e diretrizes <strong>de</strong> atuação mais localizadas e específicas e que contemporizem<br />
com o plano fe<strong>de</strong>ral é uma das metas perseguidas pelo PNQ. É o caso do Programa Nacional<br />
<strong>de</strong> Desenvolvimento da Agricultura Família (PRONAF), por exemplo, existente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />
governo passado. O PRONAF, segundo Abramovay e Veiga (1999) é <strong>de</strong> suma importância,<br />
79
uma vez que além das políticas públicas disponibilizadas para o meio rural, impulsionou a<br />
criação dos chamados Conselhos Rurais, implantados a partir <strong>de</strong> 1997. Para o autor, o<br />
PRONAF correspon<strong>de</strong> a uma virada significativa nas políticas públicas voltadas para o meio<br />
rural. O mais importante é que a formação <strong>de</strong> tais conselhos conte com a participação efetiva<br />
dos agentes locais interessados no seu <strong>de</strong>senvolvimento e políticas. Lima (2005), para além<br />
das críticas que faz ao PRONAF, consi<strong>de</strong>ra que no Estado <strong>de</strong> São Paulo houve <strong>de</strong> fato tal<br />
participação na formação dos conselhos.<br />
O que é importante notar é que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> meados da década <strong>de</strong> noventa, ou seja, no<br />
mesmo período que apontamos os cursos <strong>de</strong> formação profissional via sindicatos como<br />
experimentação, têm ganhado <strong>de</strong>staque outras linhas <strong>de</strong> atuação no tocante a criação <strong>de</strong><br />
trabalho, emprego e renda. O Programa Nacional <strong>de</strong> Apóio á Agricultura familiar (PROGER),<br />
em se tratando do meio rural é um dos principais. Também este, como o Programa <strong>de</strong> Geração<br />
<strong>de</strong> Emprego e Renda (PROGER), que é voltado para o meio urbano, é financiados com<br />
recursos do FAT. São programas que funcionam basicamente por linhas <strong>de</strong> créditos<br />
subsidiados, mas que interessantemente não se esgotam nestes. A própria proposta e<br />
concepção <strong>de</strong>stes programas <strong>de</strong> fomento <strong>de</strong> negócios <strong>de</strong> pequeno porte, visam dar um suporte<br />
financeiro que atua <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma linha mais livre e geral <strong>de</strong> investimento, mas também se<br />
ocupam do suporte técnico e profissional. Este suporte técnico e profissional seria<br />
disponibilizado também, via organismos como o SEBRAE.<br />
Em princípio, esses programas não se esgotam apenas no crédito,<br />
compreen<strong>de</strong>ndo também ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> capacitação, seja dos proprietários,<br />
seja dos funcionários, bem como a vinculação do apóio financeiro á geração<br />
<strong>de</strong> empregos. (GUIMARÃES; COMIN; LEITE, 2001, p. 439).<br />
A articulação entre trabalho, qualificação e <strong>de</strong>senvolvimento produtivo faz com que<br />
estes programas acabem galgando <strong>de</strong> maior sucesso. O PRONAF já havia apontado esta linha<br />
<strong>de</strong> atuação algum tempo antes.<br />
Os principais critérios-objetivos na escolha dos municípios a serem atendidos pelo<br />
PRONAF foi atingir os mais pobres, mais agrícolas e <strong>de</strong> menor população, (ABRAMOVAY,<br />
2001). Talvez possamos encontrar neste ponto um dos equívocos do PRONAF que acabou se<br />
voltando mais para um programa <strong>de</strong> assistência social do que <strong>de</strong>senvolvimento rural. Como se<br />
sabe, a pequena agricultura no Brasil, e mais propriamente a agricultura familiar,<br />
tradicionalmente, sempre foi tida à “rasteira” das gran<strong>de</strong>s políticas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />
agrário. A política agrária brasileira é tradicionalmente voltada para o agronegócio com<br />
80
gran<strong>de</strong>s investimentos. Ao que parece, o PRONAF, apesar das suas conquistas e sucessos,<br />
esteve <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua concepção imbuída do i<strong>de</strong>ário da pequena produção ou da agricultura<br />
familiar como sendo marginal ao gran<strong>de</strong> processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento agrário.<br />
É neste cenário que com a troca <strong>de</strong> governo ganha <strong>de</strong>staque o Ministério <strong>de</strong><br />
Desenvolvimento Agrário (MDA). Este passa a ser dos principais promotores das políticas <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento no meio rural, atuando <strong>de</strong> acordo com o PNQ e buscando vias <strong>de</strong> atuação<br />
integradas com programas locais. O MDA tem autonomia relativa nos temas <strong>de</strong> sua<br />
competência, como na alocação <strong>de</strong> verbas e formulação <strong>de</strong> políticas públicas. Por isso, boa<br />
parte da qualificação profissional rural, integrando <strong>de</strong>senvolvimento produtivo e qualificação,<br />
passa a ser financiada e gerida via MDA.<br />
3.8 A qualificação Profissional junto aos sindicatos patronais rurais<br />
Os sindicatos patronais também receberam recursos do FAT para promoção <strong>de</strong> cursos<br />
<strong>de</strong> qualificação e requalificação profissional. Os dois principais órgãos com os quais estes<br />
sindicatos faziam e fazem parceria são SEBRAE e SENAR. Entre FETAESP e FERAESP, a<br />
disputa por representação esta que, no que diz respeito à qualificação profissional, é menos<br />
acirrada até o final da década passada, ten<strong>de</strong>ndo a aumentar nesta década. Esta disputa<br />
aparece <strong>de</strong> maneira diferente com relação aos sindicatos patronais.<br />
A FETAESP, por exemplo, tem 209 sindicatos filiados no Estado <strong>de</strong> São Paulo,<br />
abrangendo todas as regiões e representando tanto assalariados rurais como trabalhadores<br />
(meeiros, arrendatários, parceiros e pequenos proprietários), conforme aponta Mauro Alves da<br />
Silva (2000), presi<strong>de</strong>nte da fe<strong>de</strong>ração. Prevê um limite <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> para serem filiados aos<br />
sindicatos ligados à fe<strong>de</strong>ração que não ultrapasse 16,6 alqueires. Portanto, estabelece um<br />
amplo campo <strong>de</strong> disputa no tocante à qualificação profissional com os sindicatos patronais.<br />
Estes exigem estatutariamente um limite um pouco maior <strong>de</strong> terras para filiação sindical.<br />
Limite este pouco ortodoxo. Em entrevista, o presi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> um <strong>de</strong>stes sindicatos, Marcelo<br />
Bombarda, (2000), aponta que sempre, tanto o sindicato que ele representa quanto gran<strong>de</strong><br />
parte <strong>de</strong>les, flexibilizam este limite aceitando filiação e representação a partir <strong>de</strong> uma<br />
porcentagem menor <strong>de</strong> terras. A diferença mais marcante, portanto, entre os sindicatos ligados<br />
à FETAESP e os sindicatos patronais em relação à qualificação profissional, é que os<br />
primeiros representam assalariados rurais, já os sindicatos patronais evi<strong>de</strong>ntemente não. Esta<br />
diferença, ao que enten<strong>de</strong>mos, é que levou os sindicatos ligados à FETAESP a promoverem<br />
massivamente cursos <strong>de</strong> aplicativos em microinformática, sendo que os sindicatos patronais,<br />
81
apesar <strong>de</strong> disponibilizarem também tais cursos não o fizeram <strong>de</strong> forma disseminada e<br />
massiva.<br />
Esta relação fica difusa, uma vez que também neste caso, o que muda é o foco <strong>de</strong><br />
priorida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursos, uma vez que estes cursos po<strong>de</strong>m ser aplicados por qualquer um <strong>de</strong>stes<br />
recortes sindicais. Em se tratando do perfil a ser atendido, trabalhadores assalariados rurais<br />
po<strong>de</strong>m, como <strong>de</strong> fato são, atendidos em cursos <strong>de</strong> qualificação profissional dados pelos<br />
sindicatos patronais.<br />
É o caso, por exemplo, quando os sindicatos patronais disponibilizam cursos como <strong>de</strong><br />
tratorista, operador <strong>de</strong> máquinas, microinformática, aplicativos <strong>de</strong> agrotóxicos, <strong>de</strong>ntre outros.<br />
Buscando, até mesmo como lógica <strong>de</strong> representação, aten<strong>de</strong>r ao segmento patronal, cursos<br />
como estes servem aos interesses dos gran<strong>de</strong>s complexos produtivos. Mas são tidos como<br />
cursos <strong>de</strong> interesse também dos trabalhadores. Portanto, dois casos pu<strong>de</strong>ram ser <strong>de</strong>tectados.<br />
Em alguns casos, os usineiros indicam, ou até facilitam, dispensando os trabalhadores<br />
minutos antes, ou disponibilizando transporte, para que seus funcionários façam estes cursos.<br />
Outras vezes, trabalhadores assalariados vão por conta própria á procura <strong>de</strong>stes cursos.<br />
Geralmente, quando os cursos são <strong>de</strong> interesse imediato dos gran<strong>de</strong>s complexos produtivos é<br />
que os patrões facilitam o acesso.<br />
Ocorre que gran<strong>de</strong> parte ou até a maioria dos cursos disponibilizados por estes<br />
sindicatos patronais é <strong>de</strong> aplicativos em pequenos empreendimentos rurais. Curso, ou<br />
modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cursos que passaram cada vez mais a serem i<strong>de</strong>ntificados com os conteúdos e<br />
cursos disponibilizados pela FETAESP, neste que chamamos <strong>de</strong> segundo momento. Uma,<br />
dado que a FETAESP e sindicatos patronais ao receberem cursos via SENAR estabelecem um<br />
campo <strong>de</strong> disputa no tocante às mesmas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cursos; outra que quando se trata do<br />
SEBRAE, este trabalha apenas nesta perspectiva empreen<strong>de</strong>dora <strong>de</strong> pequenos e médios<br />
negócios agrícolas.<br />
Mas existe ainda um outro ponto central sobre este tema. Os sindicatos patronais<br />
representam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> pequenos e médios produtores até os gran<strong>de</strong>s complexos produtivos<br />
agroindustriais. Os gran<strong>de</strong>s produtores geralmente arcam com recursos e metodologia própria<br />
com a qualificação profissional <strong>de</strong> que necessita. Fazem isso <strong>de</strong> forma pontual, ainda que<br />
muitas vezes, conforme vimos modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cursos interessam diretamente à agroindústria.<br />
São os pequenos e médios produtores, que, muitas vezes “agonizados” com a falta <strong>de</strong><br />
políticas específicas para o setor e na impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> arcar com recursos próprios o<br />
direcionamento <strong>de</strong> tais políticas, acabam sendo os principais usuários das políticas em geral e<br />
82
em específico dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional promovido pelos sindicatos patronais.<br />
Abre-se assim, neste campo <strong>de</strong> disputa, um amplo terreno <strong>de</strong> atuação para estes sindicatos.<br />
No caso <strong>de</strong> cursos voltados à pequena produção, percebe-se que apesar <strong>de</strong> muitas<br />
vezes os produtores terem dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> colocar seus produtos no mercado, no mínimo estes<br />
cursos se revertem na prática em melhores condições <strong>de</strong> vida e consumo. Depoimentos <strong>de</strong><br />
alguns alunos apontam para este fator bem como para a melhora da renda doméstica que<br />
muitas vezes é complementada com a venda <strong>de</strong> produtos como queijos, carne suína,<br />
cosméticos e embutidos em geral. O SEBRAE, através do seu programa Sistema<br />
Agroindustrial Integrado (SAI) capta este potencial que, segundo alguns técnicos, têm início<br />
com este fator <strong>de</strong> melhora do consumo ou da renda doméstica. Os fatores que se seguem<br />
como o chamado, tanto pelos técnicos do SEBRAE quanto do SENAR, <strong>de</strong> “porteira para<br />
fora 33 ”, muitas vezes começam com o amadurecimento <strong>de</strong> idéias empreen<strong>de</strong>doras.<br />
3.9 Modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> Formação Profissional<br />
A seguir, observamos algumas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> formação profissional<br />
executados pelos sindicatos rurais da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, que enfatizam uma relação em<br />
que o conhecimento aparece como sendo a principal força produtiva, e, portanto, como a força<br />
motriz dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional. São cursos executados nos últimos dois anos<br />
pela FETAESP em todo o Estado <strong>de</strong> São Paulo e a maioria <strong>de</strong>les em parceria com o SENAR.<br />
Lembramos que outro segmento sindical atendido pelo SENAR são os sindicatos<br />
patronais rurais, portanto, estas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cursos indicam a qualificação profissional<br />
realizada também por este recorte.<br />
O quadro abaixo se refere a todos os cursos realizados pelo Departamento <strong>de</strong><br />
Educação da FETAESP durante o ano <strong>de</strong> 2006, lembrando que estes são em parceria com o<br />
SENAR.<br />
33 Trata-se do suporte técnico e conhecimento dado para os produtores para colocar da melhor forma possível<br />
seus produtos no mercado. Uma intervenção <strong>de</strong> qualificação que acontece <strong>de</strong>pois do produto pronto, no chamado<br />
“escoamento da produção” e que implica não apenas na venda mas na embalagem, higiene, potencial <strong>de</strong><br />
consumo, público a ser atingido, etc.<br />
83
PROMOÇÃO SOCIAL<br />
Administrar a vida e o trabalho Dança e música <strong>de</strong> São Gonçalo<br />
Aproveitamento <strong>de</strong> alimentos Dança e música do balaio<br />
Artesanato em argila - Bijuterias Dança e música do barro<br />
Artesanato em argila - Utilitários Danças e músicas folclóricas regionais<br />
Artesanato em bambu Direitos e <strong>de</strong>veres do cidadão<br />
Artesanato em cipó Fabricação <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> higiene e limpeza<br />
Artesanato em couro - Alto relevo Facilitando a aprendizagem<br />
Artesanato em couro - Lida Folia <strong>de</strong> reis<br />
Artesanato<br />
<strong>de</strong>corativos<br />
em couro - Utilitários e<br />
Formação <strong>de</strong> coral<br />
Artesanato em fibras <strong>de</strong> bananeira Gincana recreativa e cultural<br />
Artesanato em<br />
- Decorativos<br />
fibras <strong>de</strong> bananeira<br />
Jogos <strong>de</strong> equipe<br />
Artesanato<br />
- Trançados<br />
em fibras <strong>de</strong> bananeira<br />
Li<strong>de</strong>rança <strong>de</strong> equipes<br />
Artesanato<br />
- Arranjos<br />
em fibras vegetais<br />
Motivação <strong>de</strong> equipes<br />
Artesanato em<br />
- Fabricação <strong>de</strong> papel<br />
fibras vegetais<br />
O homem rural<br />
Artesanato<br />
Trançados<br />
em folha <strong>de</strong> coqueiro -<br />
O Jovem e o meio rural<br />
Artesanato em ma<strong>de</strong>ira Passeio ciclístico<br />
Artesanato<br />
Decorativos<br />
em palha <strong>de</strong> milho -<br />
Preservação do meio ambiente<br />
Artesanato em palha <strong>de</strong> milho - Flores Processamento artesanal <strong>de</strong> carne bovina<br />
Artesanato em palha <strong>de</strong> milho - Trançados Processamento artesanal <strong>de</strong> carne suína<br />
Artesanato em sementes Processamento artesanal <strong>de</strong> frutas<br />
Artesanato em taboa Processamento artesanal <strong>de</strong> leite<br />
Caminhada campestre Processamento artesanal <strong>de</strong> leite<br />
Cavalgada rural Processamento artesanal <strong>de</strong> pães<br />
Comunicação no meio rural Processamento artesanal <strong>de</strong> pães<br />
Congada Processamento artesanal <strong>de</strong> vegetais<br />
Contos e lendas regionais Relacionamento interpessoal<br />
Culinária regional Resgate das tradições culturais do meio rural<br />
Dança <strong>de</strong> fitas Técnicas e formas <strong>de</strong> organização comunitária<br />
Atemóia - Manejo e tratos culturais Milho - Colheita e comercialização<br />
Abacate - Colheita e comercialização Limão - Colheita e comercialização<br />
Abacate - Instalação da lavoura Limão - Instalação da lavoura<br />
Abacate - Manejo e tratos culturais Limão - Manejo e tratos culturais<br />
Dança e música catira Trabalho e <strong>de</strong>senvolvimento do homem<br />
Avicultura <strong>de</strong> postura - Manejo <strong>de</strong> postura Minhocultura - Produção <strong>de</strong> húmus<br />
Avicultura básica Milho - Cultivo hidropônico<br />
Avicultura <strong>de</strong> corte Milho - Instalação da lavoura<br />
Avicultura <strong>de</strong> postura - Manejo <strong>de</strong> cria e<br />
Milho - Manejo e tratos culturais<br />
recria<br />
Abacaxi - Instalação da lavoura Mandioca - Instalação da lavoura<br />
Abacaxi - Manejo e tratos culturais Mandioca - Instalação da lavoura<br />
Administração rural Mandioca - Manejo e tratos culturais<br />
Algodão - Colheita e comercialização Mandioca - Manejo e tratos culturais<br />
84
Algodão - Instalação da lavoura Manga - Colheita e comercialização<br />
Algodão - Manejo e tratos culturais Manga - Instalação da lavoura<br />
Apicultura Manutenção <strong>de</strong> colheita<strong>de</strong>iras automotrizes<br />
Apicultura Manutenção <strong>de</strong> tratores agrícolas<br />
Aplicação <strong>de</strong> agrotóxicos c/ pulverizador<br />
Maracujá - Colheita e comercialização<br />
costal manual<br />
Aplicação <strong>de</strong> agrotóxicos com pulverizador<br />
Maracujá - Instalação da lavoura<br />
<strong>de</strong> barras<br />
Aplicação <strong>de</strong><br />
turboatomizador<br />
agrotóxicos com<br />
Maracujá - Instalação da lavoura<br />
Atemóia - Instalação da lavoura Maracujá - Manejo e tratos culturais<br />
Banana - Colheita e comercialização Noções <strong>de</strong> globalização<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Aplicação <strong>de</strong><br />
Noções <strong>de</strong> planejamento<br />
medicamentos e vacinas<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Casqueamento Nome da flor - Colheita e comercialização<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Confinamento Nome da flor - Instalação da lavoura<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Fenação Nome da flor - Manejo e tratos culturais<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Formação e<br />
manejo <strong>de</strong> capineiras<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Formação e<br />
manejo <strong>de</strong> pastagens<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Inseminação<br />
artificial<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Manejo <strong>de</strong> cria e<br />
recria<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Manejo <strong>de</strong> gado<br />
adulto<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Silagem<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> leite - Aplicação <strong>de</strong><br />
medicamentos e vacinas<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> leite - Casqueamento<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> leite - Confinamento<br />
Nome da planta ornamental - Colheita e<br />
comercialização<br />
Nome da planta ornamental - Instalação da<br />
lavoura<br />
Nome da planta ornamental - Manejo e tratos<br />
culturais<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Frutos e Sementes - Colheita e<br />
comercialização<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Frutos e Sementes - Instalação<br />
da lavoura<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Frutos e Sementes - Manejo e<br />
tratos culturais<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Raízes, Bulbos e Tubérculos –<br />
Colheita e comercialização<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Raízes, Bulbos e Tubérculos –<br />
Instalação da lavoura<br />
FONTE: FETAESP – Fe<strong>de</strong>ração dos Trabalhadores na Agricultura do Estado <strong>de</strong> São Paulo, 2006.<br />
Abaixo, apresentamos três segmentos <strong>de</strong> cursos realizados pela FETAESP, lembrando<br />
que todos eles se referem ao ano <strong>de</strong> 2005.<br />
O primeiro grupo <strong>de</strong> cursos busca fazer uma intermediação entre ativida<strong>de</strong>s rurais ou<br />
agrícolas, pouco constituídas, com outras já <strong>de</strong>vidamente inseridas <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um mercado <strong>de</strong><br />
trabalho. O melhor exemplo para este caso é contrapor ativida<strong>de</strong>s disponibilizadas nestes<br />
cursos como, por exemplo, <strong>de</strong> um lado “Processamento Artesanal do Leite”, que é uma<br />
ativida<strong>de</strong> que encontra pouca ou nenhuma guarida no mercado <strong>de</strong> trabalho assalariado, com<br />
outro como “Operação e Manutenção <strong>de</strong> Tratores Agrícolas”, que é voltado mais para aten<strong>de</strong>r<br />
às necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s complexos produtivos.<br />
85
O segundo grupo <strong>de</strong> cursos está mais preocupado em aten<strong>de</strong>r aos chamados “nichos <strong>de</strong><br />
mercado”. São ativida<strong>de</strong>s ainda marginais, diríamos que não constituídas, mas que<br />
apresentam potencial para formação <strong>de</strong> negócios.<br />
O terceiro e último grupo se refere às ativida<strong>de</strong>s que guardam uma relação mais direta<br />
com o que estes sindicatos enten<strong>de</strong>m por “Formação Profissional”. Todas elas, sem exceção,<br />
segundo aponta Jair Kaczinski (2005) do SENAR, são constituídas a partir <strong>de</strong> negócios já<br />
existentes e que <strong>de</strong>mandam qualificação, digamos mais específicas.<br />
Cursos <strong>de</strong> Qualificação Profissional realizados pela FETAESP em 2005.<br />
CURSOS<br />
Bovin. De Leite - Formaç e Manejo <strong>de</strong> Pastagens<br />
Processamento Artesanal do Leite<br />
Eletricista<br />
Olericultura Orgânica - Custo <strong>de</strong> Produção<br />
Olericultura Orgânica - Custo <strong>de</strong> Produção<br />
Olericultura Orgânica – Comercialização<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> Leite – Casqueamento<br />
Olericultura Orgânica - Custo <strong>de</strong> Produção<br />
Olericultura Orgânica – Comercialização<br />
Processamento Artesanal <strong>de</strong> Aves<br />
Olericultura Orgânica - Colheita e Beneficiamento<br />
Operação e Manutenção <strong>de</strong> Tratores Agrícolas<br />
Artesanato em Bambu – Utilitários<br />
Operação e Manutenção <strong>de</strong> Tratores Agrícolas<br />
Encontro <strong>de</strong> Produtores<br />
Processamento Artesanal <strong>de</strong> Carne Suína<br />
Processamento Artesanal <strong>de</strong> Frutas<br />
Operação <strong>de</strong> Motoserra<br />
Operação e Manutenção <strong>de</strong> Tratores Agrícolas<br />
Laranja – Pragueiro<br />
Operação e Manutenção <strong>de</strong> Tratores Agrícolas<br />
Olericultura Orgânica – Comercialização<br />
Sangria em Seringueira<br />
Seminário<br />
Operação e Manutenção <strong>de</strong> Tratores Agrícolas<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> Leite - Inseminação Artificial<br />
Olericultura Orgânica - Custo <strong>de</strong> Produção<br />
Olericultura Orgânica – Comercialização<br />
Olericultura Orgânica - Custo <strong>de</strong> Produção<br />
Olericultura Orgânica – Comercialização<br />
Fonte: FETAESP – Fe<strong>de</strong>ração dos Trabalhadores na Agricultura do Estado <strong>de</strong> São Paulo, 2006.<br />
Este primeiro grupo <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> formação profissional disponibilizado pelos<br />
sindicatos ligados à FETAESP se referem a todo o “meio rural” do Estado <strong>de</strong> São Paulo. São<br />
cursos normalmente chamados no meio sindical <strong>de</strong> cursos “pontuais”. Os cursos pontuais<br />
estão preocupados em passar um módulo <strong>de</strong> aprendizado <strong>de</strong> curso voltado a um tipo <strong>de</strong><br />
ativida<strong>de</strong> específica no meio rural. A crítica que muitas vezes os recortes <strong>de</strong> sindicatos ligados<br />
86
à FERAESP, ou mesmo à FAF, ambas ligadas à CUT, fazem á FETAESP, é que estes não<br />
estariam preocupados com outros aspectos da ca<strong>de</strong>ia produtiva, como escoamento, mercado,<br />
vocações e vocacionalida<strong>de</strong>s locais. Dizem que a FETAESP não se preocupa ou se preocupa<br />
pouco com a aplicabilida<strong>de</strong> prática dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional por eles<br />
disponibilizados.<br />
Não existe crítica com relação ao conteúdo dos cursos. Os recortes sindicais que<br />
historicamente disputaram representação, tendo como dos focos da disputa o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />
qualificação profissional aplicada apresentam mais consenso que dissenso com relação ao<br />
conteúdo dos cursos. A discordância se dá mais na forma <strong>de</strong> aplicação, relevando fatores que<br />
<strong>de</strong>stacam o potencial empreen<strong>de</strong>dor. A FAF, por exemplo, insiste que é preciso dar suporte<br />
para além da aplicabilida<strong>de</strong> e execução dos cursos, apontando para outros fatores da ca<strong>de</strong>ia<br />
produtiva como conhecimento, vocacionalida<strong>de</strong>s e potências produtivas locais, <strong>de</strong>ntre outros.<br />
Outro ponto é que a maioria <strong>de</strong>stes cursos exige para sua efetiva realização e<br />
aproveitamento o fator empreen<strong>de</strong>r. Alguns cursos, dada as características econômicas e <strong>de</strong><br />
mercado <strong>de</strong> trabalho da região, po<strong>de</strong>m <strong>de</strong> fato vir a se constituir em aprendizados que se<br />
dispõem ao assalariamento, mas são a minoria <strong>de</strong>les. Alguns trabalhos no setor<br />
sucroalcooleiro e citrícola acabam absorvendo alguns trabalhadores qualificados em<br />
“operação e manutenção <strong>de</strong> tratores agrícolas”, “operação <strong>de</strong> motoserra”, no caso da extração<br />
<strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira, mas não vai para muito além disso. Aprendizado e módulos <strong>de</strong> curso como<br />
oleicultura, casqueamento ou processamento artesanal do leite, são na verda<strong>de</strong>, aproveitados<br />
numa perspectiva empreen<strong>de</strong>dora.<br />
Existe outra gama <strong>de</strong> cursos que a FETAESP disponibiliza que são consi<strong>de</strong>rados,<br />
digamos assim, da forma que nos fala um sindicalista envolvido com estas políticas <strong>de</strong><br />
formação profissional, “menos voltados para o mercado”. (GOMES, 2006). São mais<br />
voltados, segundo este, para os comumente chamados nichos <strong>de</strong> mercado. Portanto, segue<br />
abaixo uma gama <strong>de</strong>stes cursos, também disponibilizados pela FETAESP no ano <strong>de</strong> 2005.<br />
87
Cursos realizados pela FETAESP em 2005<br />
Administrar a vida e o trabalho<br />
Aproveitamento <strong>de</strong> alimentos<br />
Artesanato em argila - Bijuterias<br />
Artesanato em argila - Utilitários<br />
Artesanato em bambu<br />
Artesanato em cipó<br />
Artesanato em couro - Alto relevo<br />
Artesanato em couro – Lida<br />
Dança e música <strong>de</strong> São Gonçalo<br />
Dança e música do balaio<br />
Dança e música do barro<br />
Danças e músicas folclóricas regionais<br />
Direitos e <strong>de</strong>veres do cidadão<br />
Fabricação <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> higiene e limpeza<br />
Facilitando a aprendizagem<br />
Folia <strong>de</strong> reis<br />
Formação <strong>de</strong> coral<br />
Gincana recreativa e cultural<br />
Jogos <strong>de</strong> equipe<br />
Li<strong>de</strong>rança <strong>de</strong> equipes<br />
Motivação <strong>de</strong> equipes<br />
O homem rural<br />
Artesanato em couro - Utilitários e <strong>de</strong>corativos<br />
Artesanato em fibras <strong>de</strong> bananeira<br />
Artesanato em fibras <strong>de</strong> bananeira - Decorativos<br />
Artesanato em fibras <strong>de</strong> bananeira - Trançados<br />
Artesanato em fibras vegetais - Arranjos<br />
Artesanato em fibras vegetais - Fabricação <strong>de</strong> papel<br />
Formação <strong>de</strong> coral<br />
Gincana recreativa e cultural<br />
Jogos <strong>de</strong> equipe<br />
Li<strong>de</strong>rança <strong>de</strong> equipes<br />
Motivação <strong>de</strong> equipes<br />
O homem rural<br />
Artesanato em folha <strong>de</strong> coqueiro - Trançados<br />
Artesanato em ma<strong>de</strong>ira<br />
Artesanato em palha <strong>de</strong> milho - Decorativos<br />
Artesanato em palha <strong>de</strong> milho - Flores<br />
Artesanato em palha <strong>de</strong> milho - Trançados<br />
Artesanato em sementes<br />
88
Artesanato em taboa<br />
Caminhada campestre<br />
Cavalgada rural<br />
Comunicação no meio rural<br />
Congada<br />
Contos e lendas regionais<br />
Culinária regional<br />
Dança <strong>de</strong> fitas<br />
O Jovem e o meio rural<br />
Passeio ciclístico<br />
Preservação do meio ambiente<br />
Processamento artesanal <strong>de</strong> carne bovina<br />
Processamento artesanal <strong>de</strong> carne suína<br />
Processamento artesanal <strong>de</strong> frutas<br />
Processamento artesanal <strong>de</strong> leite<br />
Processamento artesanal <strong>de</strong> leite<br />
Processamento artesanal <strong>de</strong> pães<br />
Processamento artesanal <strong>de</strong> pães<br />
Processamento artesanal <strong>de</strong> vegetais<br />
Relacionamento interpessoal<br />
Resgate das tradições culturais do meio rural<br />
Técnicas e formas <strong>de</strong> organização comunitária<br />
Fonte: FETAESP – Fe<strong>de</strong>ração dos Trabalhadores na Agricultura do Estado <strong>de</strong> São Paulo, 2006.<br />
Esta segunda vertente <strong>de</strong> cursos disponibilizados pela FETAESP se preocupa em<br />
aten<strong>de</strong>r aos nichos <strong>de</strong> mercado, mas também são voltados para uma perspectiva <strong>de</strong> lazer,<br />
turismo rural ou mesmo algo como consciência cívica. São tidos como exemplos <strong>de</strong> negócios<br />
pouco <strong>de</strong>finidos, lucrativos e constituídos, mas que contribuem com a economia doméstica no<br />
tocante ao consumo próprio, complementação da renda ou mesmo com fatores <strong>de</strong> integração<br />
social.<br />
É importante notar que são módulos <strong>de</strong> cursos mais soltos que não fazem a separação<br />
entre lazer e trabalho, são constituintes <strong>de</strong> um “modo <strong>de</strong> vida rural”, tais os casos <strong>de</strong> técnicas e<br />
formas <strong>de</strong> organização comunitária, resgate das tradições culturais no meio rural, <strong>de</strong>ntre a<br />
maioria <strong>de</strong>les.<br />
Mas é no terceiro e último caso que observamos um ponto interessante. Estes seriam<br />
os cursos mais propriamente chamados <strong>de</strong> “formação profissional”.<br />
89
Cursos realizados pela FETAESP em 2005<br />
FORMAÇÃO PROFISSIONAL<br />
Atemóia - Manejo e tratos culturais Milho - Colheita e comercialização<br />
Abacate - Colheita e comercialização Limão - Colheita e comercialização<br />
Abacate – Instalação da lavoura Limão - Instalação da lavoura<br />
Abacate - Manejo e tratos culturais Limão - Manejo e tratos culturais<br />
Dança e música catira Trabalho e <strong>de</strong>senvolvimento do homem<br />
Avicultura <strong>de</strong> postura - Manejo <strong>de</strong><br />
postura<br />
Minhocultura - Produção <strong>de</strong> húmus<br />
Avicultura básica Milho - Cultivo hidropônico<br />
Avicultura <strong>de</strong> corte Milho - Instalação da lavoura<br />
Avicultura <strong>de</strong> postura - Manejo <strong>de</strong> cria e<br />
Milho - Manejo e tratos culturais<br />
recria<br />
Abacaxi – Instalação da lavoura Mandioca - Instalação da lavoura<br />
Abacaxi - Manejo e tratos culturais Mandioca - Instalação da lavoura<br />
Administração rural Mandioca - Manejo e tratos culturais<br />
Algodão - Colheita e comercialização Mandioca - Manejo e tratos culturais<br />
Algodão – Instalação da lavoura Manga - Colheita e comercialização<br />
Algodão - Manejo e tratos culturais Manga - Instalação da lavoura<br />
Apicultura Manutenção <strong>de</strong> colheita<strong>de</strong>iras automotrizes<br />
Apicultura Manutenção <strong>de</strong> tratores agrícolas<br />
Aplicação <strong>de</strong> agrotóxicos c/<br />
pulverizador costal manual<br />
Maracujá - Colheita e comercialização<br />
Aplicação <strong>de</strong> agrotóxicos com<br />
pulverizador <strong>de</strong> barras<br />
Maracujá - Instalação da lavoura<br />
Aplicação <strong>de</strong> agrotóxicos com<br />
turboatomizador<br />
Maracujá - Instalação da lavoura<br />
Atemóia – Instalação da lavoura Maracujá - Manejo e tratos culturais<br />
Banana - Colheita e comercialização Noções <strong>de</strong> globalização<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Aplicação <strong>de</strong><br />
medicamentos e vacinas<br />
Noções <strong>de</strong> planejamento<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Casqueamento Nome da flor - Colheita e comercialização<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Confinamento Nome da flor - Instalação da lavoura<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Fenação Nome da flor - Manejo e tratos culturais<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Formação e Nome da planta ornamental - Colheita e<br />
manejo <strong>de</strong> capineiras<br />
comercialização<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Formação e Nome da planta ornamental - Instalação da<br />
manejo <strong>de</strong> pastagens<br />
lavoura<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Inseminação<br />
artificial<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Manejo <strong>de</strong> cria<br />
e recria<br />
Nome da planta ornamental - Manejo e tratos<br />
culturais<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Frutos e Sementes – Colheita e<br />
comercialização<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Manejo <strong>de</strong> Olerícolas <strong>de</strong> Frutos e Sementes – Instalação<br />
90
gado adulto da lavoura<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> corte - Silagem<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Frutos e Sementes - Manejo e<br />
tratos culturais<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> leite - Aplicação <strong>de</strong><br />
medicamentos e vacinas<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> leite - Casqueamento<br />
Bovinocultura <strong>de</strong> leite - Confinamento<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Raízes, Bulbos e Tubérculos -<br />
Colheita e comercialização<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Raízes, Bulbos e Tubérculos -<br />
Instalação da lavoura<br />
Olerícolas <strong>de</strong> Raízes, Bulbos e Tubérculos -<br />
Manejo e tratos culturais<br />
Fonte: FETAESP – Fe<strong>de</strong>ração dos Trabalhadores na Agricultura do Estado <strong>de</strong> São Paulo, 2006.<br />
Sobre este último grupo <strong>de</strong> cursos aparecem algumas características interessantes. A<br />
primeira <strong>de</strong>las é que <strong>de</strong> fato muitos <strong>de</strong>les po<strong>de</strong>m servir ao gran<strong>de</strong> mercado constituído dos<br />
gran<strong>de</strong>s latifúndios agrários, mas mesmo assim, além <strong>de</strong> não serem todos, cada vez mais esta<br />
separação fica confusa. Tomemos alguns exemplos.<br />
Antes <strong>de</strong> tudo é preciso consi<strong>de</strong>rar que estes cursos se referem ao meio rural do Estado<br />
<strong>de</strong> São Paulo e não apenas à região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, portanto é preciso consi<strong>de</strong>rar alguns<br />
focos <strong>de</strong> produção em larga escala como banana, a agropecuária, algodão, milho, <strong>de</strong>ntre<br />
outras, que são fortes em outras regiões do Estado. A maioria <strong>de</strong>stes cursos, bem como o<br />
conteúdo disponibilizado por eles, permite noções gerais do processo <strong>de</strong> produção e<br />
escoamento. Normalmente, não são cursos <strong>de</strong> treinamento rápido voltados a reprodução <strong>de</strong><br />
ativida<strong>de</strong>s específicas no exercício do trabalho.<br />
A FETAESP, mais do que a FERAESP, tem se preocupado com estas políticas <strong>de</strong><br />
cursos <strong>de</strong> formação profissional. Esta afirmação é valida para o período <strong>de</strong> início da vigência<br />
do sistema FAT/PLANFOR até os dias <strong>de</strong> hoje. O que ocorre é que no final da década <strong>de</strong><br />
noventa, a FERAESP passa a se interessar mais pelas políticas <strong>de</strong> qualificação profissional,<br />
momento que a FETAESP apesar dos erros e equívocos já havia galgado certa experiência<br />
através dos equívocos e experimentações.<br />
3.10 Experiências <strong>de</strong> Qualificação Profissional patronal<br />
Uma prática constante <strong>de</strong>ntro dos complexos produtivos agroindustriais, conforme<br />
observamos na pesquisa, é a execução <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> qualificação profissional por parte dos<br />
patrões. São geralmente cursos que visam preparar, ou mais do que isso, manter preparados os<br />
trabalhadores <strong>de</strong> acordo com as novas <strong>de</strong>mandas profissionais e introdução tecnológica.<br />
91
Existem também cursos passados em caráter ininterrupto como o <strong>de</strong> prevenção <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />
trabalho. É preciso notar que esta é uma prática que sempre ocorreu <strong>de</strong>ntro dos complexos<br />
produtivos agroindustriais, sendo executadas com maior intensida<strong>de</strong> e freqüência a partir da<br />
intensificação da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> requalificação profissional nos últimos anos. Scopinho<br />
(1995, p. 83) aponta:<br />
Os processos <strong>de</strong> treinamento e reciclagem são contínuos e os conteúdos<br />
guardam caráter tanto técnico, quanto i<strong>de</strong>ológicos e disciplinares. Na esfera<br />
técnica, preparam o trabalhador para <strong>de</strong>sempenhar certas tarefas com<br />
eficiência e rapi<strong>de</strong>z: na esfera i<strong>de</strong>ológica, política, dissemina a concepção<br />
<strong>de</strong> mundo mais a<strong>de</strong>quada para o bom <strong>de</strong>senvolvimento da produção.<br />
Do ponto <strong>de</strong> vista da relação dos alunos com seus empregos, estas experiências parecem<br />
apontar um grau <strong>de</strong> relação mais conciso. Os cursos são direcionados precisamente para a<br />
execução <strong>de</strong> tarefas que interessam aos seus patrocinadores. Os alunos são exclusivamente<br />
trabalhadores que estão empregados e que, com o processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva, têm a<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se "reciclarem" constantemente. Nestas experiências patronais, o curso é<br />
direcionado para objetivos claros e precisos. Portanto, mais <strong>de</strong> requalificação profissional.<br />
São módulos <strong>de</strong> cursos rápidos e <strong>de</strong> curta duração com objetivos muitos bem <strong>de</strong>limitados e <strong>de</strong><br />
caráter quase ininterrupto. Cursos que po<strong>de</strong>riam ser chamados <strong>de</strong> treinamento, reciclagem, ou<br />
então “a<strong>de</strong>stramento”, como normalmente são chamados pela tradição sindical italiana.<br />
No tocante à eficácia dos cursos realizados no interior da empresas, eles apresentam<br />
bons resultados, quase sempre atingindo os objetivos almejados. São cursos realizados por<br />
patrões–usineiros, mas também por empresas <strong>de</strong> máquinas e implementos agrícolas que<br />
qualificam mão-<strong>de</strong>-obra, uma vez que prestam este serviço para seus clientes. A Jhon Deer,<br />
multinacional na área é exemplo, uma vez que constatamos que além da venda <strong>de</strong> máquinas e<br />
equipamentos, a empresa se ocupa da prestação <strong>de</strong> serviços, manutenção e operação <strong>de</strong>stas<br />
máquinas.<br />
São cursos rápidos que reciclam trabalhadores conforme a necessida<strong>de</strong> e geralmente<br />
no processo <strong>de</strong> requalificação mediante a introdução <strong>de</strong> novas tecnologias. São iniciativas<br />
empresariais que buscam aten<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s imediatas e específicas da empresa.<br />
Segundo <strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> usineiro, as políticas públicas <strong>de</strong> qualificação profissional<br />
geralmente envolvem interesses diversos e até antagônicos, nem sempre aten<strong>de</strong>ndo às<br />
necessida<strong>de</strong>s específicas e imediatas das empresas. Os patrões, com poucos investimentos,<br />
conforme pu<strong>de</strong>mos constatar, qualificam empregados executores <strong>de</strong> tarefas voltadas aos<br />
interesses precisos. Inevitavelmente, com a intervenção sindical e o envolvimento <strong>de</strong> outros<br />
92
órgãos representando os trabalhadores e até o Estado, este processo não se daria assim <strong>de</strong><br />
forma tão exata.<br />
Para os patrões, a qualificação profissional <strong>de</strong>ve ser um investimento ininterrupto. O<br />
funcionamento da empresa <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhadores qualificados, aptos a operarem as novas<br />
tecnologias que estão surgindo. Ocorre que, dada a tendência <strong>de</strong> re<strong>de</strong>finição da relação entre<br />
capital e trabalho, quando isso acontece mantendo estes pólos institucionalmente separados, a<br />
exploração acaba sendo cada vez maior.<br />
O discurso i<strong>de</strong>ológico sobre a cooperação po<strong>de</strong> ser extraído do <strong>de</strong>poimento dum patrão<br />
que aponta que o operário é “tão valorizado” para a empresa, que merece operar uma máquina<br />
<strong>de</strong> valor superior ao carro <strong>de</strong> passeio do próprio patrão. Durante todo o tempo <strong>de</strong> trabalho, e<br />
mais precisamente a i<strong>de</strong>ologia que é passada nos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional<br />
executados pelas usinas, é que patrões e empregados são uma “gran<strong>de</strong> família”, portanto,<br />
<strong>de</strong>vem trabalhar unidos em prol do bem comum.<br />
Os usineiros fazem uso <strong>de</strong>sta “i<strong>de</strong>ologia” da cooperação que é propagada nos<br />
cursos <strong>de</strong> qualificação profissional. O <strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> um técnico (CLAUDINEI, 2001),<br />
que executa estes cursos para as empresas, afirma que as perdas salariais são compensadas<br />
através da “dominação cultural”, dominação da “subjetivida<strong>de</strong> do trabalhador”. O<br />
empregado passa a se sentir importante não apenas diante do patrão, mas principalmente<br />
perante os seus iguais. Sente-se numa condição distinta ao interiorizar a idéia <strong>de</strong> que está<br />
operando uma máquina <strong>de</strong> alto custo a qual nem todos os trabalhadores têm acesso.<br />
4 Trabalho e Trabalhadores<br />
Neste capítulo traçamos um pouco do perfil dos trabalhadores para os quais se<br />
<strong>de</strong>stinam estes cursos <strong>de</strong> qualificação e requalificação profissional. Ao que pensamos tais<br />
políticas <strong>de</strong> cursos, suas propostas e efetiva realização, bem como a eficiência na relação<br />
publico atendido e programas <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> tanto do fluxo <strong>de</strong> organização produtiva quanto <strong>de</strong>sta<br />
relação.<br />
As relações <strong>de</strong> trabalho no meio rural <strong>de</strong> Ribeirão Preto apresentam características<br />
distintas. Sendo assim, consi<strong>de</strong>ramos a distinção <strong>de</strong> dois tipos <strong>de</strong> trabalho e, portanto, <strong>de</strong><br />
qualificação profissional no meio rural. Um primeiro tipo <strong>de</strong> trabalho é o dos chamados<br />
assalariados rurais. Estes, consi<strong>de</strong>rados tanto pelos sindicatos da categoria quanto pelas<br />
próprias empresas agrícolas são os trabalhadores assalariados que compõem o setor<br />
93
propriamente agrícola 34 da produção. Temos uma segunda linha <strong>de</strong> trabalhadores rurais que<br />
são pequenos e médios produtores in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes com organização familiar <strong>de</strong> produção ou<br />
não; além <strong>de</strong> assentados em políticas <strong>de</strong> Reforma Agrária, e ainda arrendatários e parceiros.<br />
Estes são muito comuns na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, dada a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cana-<strong>de</strong>-açúcar<br />
para os complexos agroindustriais 35 .<br />
Discutimos aqui o chamado <strong>de</strong>semprego tecnológico, apontando para o aumento da<br />
exploração nos postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> baixa qualificação no meio rural. Destacamos o<br />
pagamento por cotas <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> como sendo a principal via <strong>de</strong> exploração do trabalho e<br />
<strong>de</strong> diminuição dos ganhos reais. Momento que apontamos que a qualificação profissional não<br />
<strong>de</strong>ve estar diretamente relacionada á conquista e manutenção <strong>de</strong> “postos <strong>de</strong> trabalho”. Nossa<br />
meta aqui é discutir as <strong>de</strong>corrências dos processos <strong>de</strong> qualificação profissional no quadro <strong>de</strong><br />
mudanças na alocação <strong>de</strong> trabalho. Para tanto, <strong>de</strong>limitamos o perfil <strong>de</strong> dois tipos <strong>de</strong><br />
assalariamento agrícola. Um primeiro, dos chamados trabalhadores resi<strong>de</strong>ntes que é<br />
comumente mais i<strong>de</strong>ntificado entre trabalhos como dos tratoristas, dos administradores e dos<br />
operadores <strong>de</strong> máquinas em geral; o segundo, dos trabalhadores temporários migrantes ou<br />
volantes, i<strong>de</strong>ntificados entre os trabalhadores da cana, mais particularmente do corte da<br />
cana 36 .<br />
É evi<strong>de</strong>nte que esta divisão que fazemos, ainda que oriunda <strong>de</strong> resultados <strong>de</strong> pesquisa<br />
comporte nuanças. Todavia a configuração <strong>de</strong>ste quadro que encontramos nas nossas<br />
pesquisas <strong>de</strong> campo, acreditamos, permite uma interessante leitura <strong>de</strong>stes que chamamos <strong>de</strong><br />
dois perfis <strong>de</strong> trabalhadores, que terá <strong>de</strong>sdobramentos sobre o tema da qualificação<br />
profissional, conforme se verá adiante.<br />
34 Esta separação ainda é feita tanto pelos sindicatos quanto pelas usinas e empresas agrícolas. A chamada “parte<br />
agrícola” da produção diz respeito ao plantio, trato, colheita e transporte do produto, sendo que a parte industrial<br />
é consi<strong>de</strong>rada quando o produto entra na fase <strong>de</strong> produção. Esta divisão reforça a separação que ainda se faz<br />
entre produção agrícola e produção industrial, também facilita a representação sindical por categoria. Assim,<br />
tomando como exemplo o caso da cana, quem trabalha na fase <strong>de</strong> produção da cana-<strong>de</strong>-açúcar está na fase<br />
agrícola, quem trabalha na produção do álcool e do açúcar, na fase industrial. Alguns casos são <strong>de</strong>stoantes como<br />
o caso dos sindicatos dos transportes que disputam representação com sindicatos dos trabalhadores rurais.<br />
35 As usinas necessitam <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s extensões <strong>de</strong> terra para plantio, não encontrando terras disponíveis para<br />
compra firmam contratos <strong>de</strong> parceria e arrendamento com pequenos, médios e mesmo gran<strong>de</strong>s proprietários<br />
rurais. No caso do arrendamento, o preço é pago pelo uso da terra, já na parceria, o proprietário da terra firma<br />
contrato <strong>de</strong> fornecimento da chamada “cana crua” para as usinas.<br />
36 Como se sabe o <strong>de</strong>srespeito a legislação trabalhista é algo bastante freqüente entre os chamados “trabalhadores<br />
da cana”, ainda que no Estado <strong>de</strong> São Paulo esta prática seja menos freqüente se em comparação com outros<br />
Estados do país. Em nossos estudos não perseguimos esta via, dado que a crítica que fazemos a este tipo <strong>de</strong><br />
trabalho <strong>de</strong> baixa qualificação remete o mesmo á condições <strong>de</strong> trabalho análoga a dos escravos negros no Brasil.<br />
Estima-se que um trabalhador do corte <strong>de</strong> cana, em continuo e rotineiro esforço físico, <strong>de</strong>baixo <strong>de</strong> um sol<br />
escaldante caminhe em média <strong>de</strong>z quilômetros por dia cortando cana, conforme <strong>de</strong>poimentos colhidos em nossos<br />
estudos; também, que a vida útil <strong>de</strong> um trabalhador do corte, em fluxo contínuo e sem interrupção, gire em torno<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>z a doze anos.<br />
94
Tendo em vista estes dois grupos <strong>de</strong> trabalhadores, estabelecemos o que <strong>de</strong>nominamos<br />
<strong>de</strong> “zonas <strong>de</strong> interesses”. Por zonas <strong>de</strong> interesses se enten<strong>de</strong> um leque <strong>de</strong> interesses atribuíveis<br />
aos trabalhadores volantes em função <strong>de</strong> suas vivências nos locais e em seus postos <strong>de</strong><br />
trabalho e na vida social <strong>de</strong> maneira geral, o que, hipoteticamente, acarreta uma diversida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> interesses gerais e específicos no tocante à qualificação profissional. Tem-se por esta via,<br />
duas modalida<strong>de</strong>s particulares <strong>de</strong> interesses, o que ocasionaria uma relação entre duas zonas<br />
<strong>de</strong> interesses. Recoloca-se o clássico <strong>de</strong>bate sociológico sobre formação <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>.<br />
Próximo, portanto, do conceito <strong>de</strong> “zonas <strong>de</strong> interesse”, das observações <strong>de</strong> Thompson (1989)<br />
ao analisar a formação da classe operária inglesa. Falamos mais propriamente da observação<br />
<strong>de</strong>ste autor, segundo a qual, tanto “consciência”, quanto “resistência”, são frutos <strong>de</strong><br />
experimentação continua e ininterrupta, criações sempre abertas e inacabadas adquiridas na<br />
vida <strong>de</strong> maneira geral. Neste sentido local <strong>de</strong> trabalho e fora local <strong>de</strong> trabalho se relaciona sem<br />
se sobreporem.<br />
Localizamos em nosso estudo uma espécie <strong>de</strong> “resistência produtiva” e argumentamos<br />
que seria justamente a relação entre os grupos estabelecidos entre “zonas <strong>de</strong> interesses” que a<br />
possibilitaria. Se o conceito po<strong>de</strong> <strong>de</strong>limitar interesses com vistas aos postos <strong>de</strong> trabalho e<br />
mobilida<strong>de</strong> social <strong>de</strong> maneira geral, a resistência produtiva enquanto negação <strong>de</strong> formas <strong>de</strong><br />
produção ao mesmo tempo em que recria produções alternativas, é possibilitada pela<br />
qualificação profissional. A qualificação profissional aparece como potencialisadora da<br />
resistência produtiva, ainda que evi<strong>de</strong>ntemente não seja a única.<br />
Os “nichos” ou “brechas” são possibilida<strong>de</strong>s abertas no interior do próprio sistema que<br />
apontam para novas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> reorganização produtivas, geralmente flexíveis e que<br />
abrem espaço para pequenas unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção. Estas apontam para a emergência <strong>de</strong><br />
pequenos e médios negócios concentrados localmente. O perfil profissional reorganiza a<br />
relação capital e trabalho, tendo como principal característica uma qualificação profissional<br />
que po<strong>de</strong> ser em si produtiva.<br />
Portanto, a discussão <strong>de</strong>ste último capítulo do nosso trabalho busca relacionar os<br />
programas, cursos e propostas acerca do tema da qualificação profissional com o público, ou<br />
os trabalhadores para os quais tais programas se <strong>de</strong>stinam. Trata-se <strong>de</strong> certa maneira, em<br />
lidarmos com o tema da qualificação profissional <strong>de</strong> duas formas: uma como proposta <strong>de</strong><br />
políticas públicas, e neste caso estaria mais diretamente relacionada ao nosso objeto <strong>de</strong><br />
pesquisa; outra, abrindo para a discussão mais substancial sobre o tema para além da<br />
regulação. Pensamos ser necessária esta distinção, uma vez que o objeto <strong>de</strong> estudo e o<br />
material empírico se remete ao trabalho regulado, porém, as saídas apontadas, como, por<br />
95
exemplo, a <strong>de</strong>limitação <strong>de</strong> “zonas <strong>de</strong> interesses” apontam para espaços produtivos, trabalho,<br />
ou mesmo o tema da qualificação, como ambientes ou pontos abertos, e, portanto,<br />
constituintes. (NEGRI, 2002)<br />
4.1 A crise da organização do trabalho<br />
Alguns aspectos gerais como <strong>de</strong>sindustrialização, crescimento do trabalho informal e<br />
do setor <strong>de</strong> serviços, flexibilização <strong>de</strong> diretos e das relações <strong>de</strong> trabalho, terceirização, <strong>de</strong>ntre<br />
outras, permitem pensar a crise aberta no mundo do trabalho. Variáveis são os cenários em<br />
que as gran<strong>de</strong>s empresas po<strong>de</strong>m ser substituídas por outras <strong>de</strong> porte menor e com capacida<strong>de</strong><br />
produtiva equivalente ou maior. (SANTANA; SOUZA; DELUIZ, 1999). Se por um lado<br />
temos a substituição <strong>de</strong> trabalho humano por máquinas, que ao <strong>de</strong>struir postos <strong>de</strong> trabalho cria<br />
outros, ainda que em menor número, exigindo uma qualificação diferenciada, por outro se<br />
registra aumentos significativos <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> baixa qualificação.<br />
Como se sabe, o processo <strong>de</strong> mecanização e automação é inevitável, se constituindo<br />
numa “ameaça” aos postos <strong>de</strong> trabalho do tipo emprego <strong>de</strong> massa 37 . Na medida em que postos<br />
<strong>de</strong> trabalho são fechados, outros são criados em menor número, o que não possibilita pensar,<br />
conforme aponta Singer (1996), numa perspectiva <strong>de</strong> pleno emprego. Os novos postos <strong>de</strong><br />
trabalho que surgem a partir do fechamento <strong>de</strong> outros exigem qualificação diferenciada, mais<br />
complexa e que no mais das vezes estão voltadas para habilida<strong>de</strong>s que integram a ação<br />
humana a novas tecnologias. O que apontamos aqui é que a reestruturação do quadro<br />
produtivo acarreta tanto fechamento <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho quanto reorganização daqueles<br />
postos <strong>de</strong> trabalho existentes. Como sabemos um fenômeno nada novo. O importante é<br />
chamar a atenção não apenas para este processo, mas também para a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong><br />
trabalho. Têm-se uma relação, como se sabe, em que em alguns setores produtivos, e falamos<br />
mais propriamente das empresas agrícolas, o trabalho manual é substituído pelo <strong>de</strong> operação<br />
<strong>de</strong> máquinas, cabe questionar as condições <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> trabalho que mesmo diante das<br />
conquistas tecnológicas permanece manual.<br />
No caso do assalariamento, o maior problema verificado é a diminuição <strong>de</strong> ganhos<br />
reais e aumento da exploração do trabalho. Acreditamos necessária esta distinção, uma vez<br />
que não teríamos argumentos para sustentar a diminuição do assalariamento como um todo.<br />
37 Por emprego <strong>de</strong> massa, enten<strong>de</strong>mos aqueles que empregam um número gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> pessoas para execução <strong>de</strong><br />
tarefas rotineiras e repetitivas que exigem pouca qualificação e muita resistência física. Do ponto <strong>de</strong> vista prático<br />
da pesquisa, enten<strong>de</strong>mos como emprego <strong>de</strong> massa aquele exercido pelos trabalhadores do corte da cana, ou<br />
catadores <strong>de</strong> laranja, por exemplo.<br />
96
Nosso ponto aqui é que o assalariamento rural (pensamos particularmente no caso da cana)<br />
está cada vez mais precário, com diminuição <strong>de</strong> ganhos e aumento da exploração. Isto<br />
acontece diante da <strong>de</strong>sregulamentação das relações <strong>de</strong> trabalho viabilizada pela rotativida<strong>de</strong><br />
das necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho em subcontratação. Outro fator que <strong>de</strong>ve ser pon<strong>de</strong>rado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já<br />
é sobre a mecanização e automação que cada vez necessita <strong>de</strong> menor número <strong>de</strong> pessoas<br />
ocupadas, e esta mais qualificada, para exercer as mesmas funções.<br />
De qualquer forma é preciso que fique claro que este processo não é linear. Se por um<br />
lado a mecanização da agricultura tem liberado mão-<strong>de</strong>-obra, por outro, isso não significa que<br />
o assalariamento tenha diminuído. Ponto este que discutiremos mais adiante ao tratarmos do<br />
fenômeno da migração.<br />
Ocorre que uma qualificação profissional voltada para este tipo <strong>de</strong> trabalho, visando<br />
aprendizado rápido e repetitivo, não soa como viável, tendo em vista tanto a qualida<strong>de</strong> 38 <strong>de</strong>ste<br />
tipo <strong>de</strong> trabalho, quanto a sua continuida<strong>de</strong> 39 . (GROTTIAN, 1999). Sobre este ponto, nada<br />
mais provi<strong>de</strong>nte que lembrar dos clássicos escritos <strong>de</strong> Braverman (1981), que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos<br />
setenta apontava que o trabalho assalariado no sistema capitalista era <strong>de</strong>gradante e <strong>de</strong>gradado,<br />
e que ocorria uma tendência inexorável <strong>de</strong> <strong>de</strong>squalificação do trabalho. O trabalho agrícola,<br />
ou do assalariamento agrícola, neste ponto comparado por Pochmann (2001) com o trabalho<br />
do chão <strong>de</strong> fábrica 40 , é o que apresenta muita exploração, baixos ganhos, e pouca<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualificação. Do ponto <strong>de</strong> vista da organização e gestão da força <strong>de</strong> trabalho<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sta nova organização produtiva, segundo Negri (2001), manter a relação salarial, ou<br />
a “venda <strong>de</strong> força <strong>de</strong> trabalho”, ten<strong>de</strong> sempre a aumentar a exploração sobre o trabalho. Um<br />
fator que reforça esta afirmação é o crescimento, em todo Brasil, <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong><br />
baixa qualificação com baixos ganhos e diminuição ou concentração <strong>de</strong> outras ativida<strong>de</strong>s que<br />
exigem maior qualificação, pagando melhores salários, conforme aponta Canzian (2006).<br />
38 Este ponto merece atenção, uma vez que indiretamente voltaremos a ele. No caso do assalariamento rural<br />
observado atualmente <strong>de</strong>ntro dos gran<strong>de</strong>s complexos produtivos da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, consi<strong>de</strong>rados<br />
<strong>de</strong>gradantes e <strong>de</strong> estrema periculosida<strong>de</strong> a ponto <strong>de</strong> ter sido <strong>de</strong>tectada uma nova doença que tem sido chamada<br />
<strong>de</strong> “morte súbita”. A morte súbita ocorre, geralmente entre os trabalhadores do corte <strong>de</strong> cana e que por motivo <strong>de</strong><br />
exaustão no trabalho tem morte instantânea. A ONU – Organização das Nações Unidas já <strong>de</strong>clarou este tipo <strong>de</strong><br />
trabalho como análogo ao trabalho escravo. No caso do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> organização produtivo japonês, este tipo <strong>de</strong><br />
morte por exaustão no trabalho já está institucionalizada – o karoshi – e conta com uma in<strong>de</strong>nização a ser paga à<br />
família da vítima.<br />
39 No caso do corte manual da cana, já se trabalha com a perspectiva <strong>de</strong> extinção. Muitos fatores contribuem para<br />
isso e acordados com os sindicatos. Dentre eles, a poluição ambiental proveniente da queima da cana crua.<br />
Conforme voz corrente na região, o corte da cana crua é muitíssimo mais difícil para o trabalhador, os quais já<br />
expressaram esta opinião em reuniões <strong>de</strong> pauta para dissídios e acordos coletivos.<br />
40 Falamos em divisão parcelar do trabalho, na rotina repetitiva e enfadonha, no treinamento para execução <strong>de</strong><br />
tarefas repetitivas comportando nenhuma criativida<strong>de</strong> e suportabilida<strong>de</strong> física e mental. Neste sentido, o trabalho<br />
do corte <strong>de</strong> cana, mais do que todos os <strong>de</strong>mais verificados na agricultura, po<strong>de</strong> ser comparado ao trabalho do<br />
chão <strong>de</strong> fábrica.<br />
97
O <strong>de</strong>senvolvimento tecnológico substitui postos <strong>de</strong> trabalho, sendo que a resistência a<br />
este processo implica em maior exploração e arrocho salarial. Aos trabalhadores que<br />
permanecem nestes postos <strong>de</strong> trabalho são exigidas cada vez mais resistência e<br />
suportabilida<strong>de</strong> física. O foco central <strong>de</strong> assalariamento rural na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, que<br />
é o dos “cortadores <strong>de</strong> cana”, que tiveram seus ganhos diminuídos em até 60% <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o final<br />
da década <strong>de</strong> setenta até hoje, sendo que as exigências <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> passaram <strong>de</strong> uma<br />
média diária <strong>de</strong> seis toneladas para uma média atual que varia entre <strong>de</strong>z e doze toneladas;<br />
(NOVAES; ALVES, 2003). Ou seja, quase dobra o volume <strong>de</strong> cana cortada por trabalhador.<br />
Neste tipo <strong>de</strong> trabalho não há possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> intervenção quanto a modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
cursos <strong>de</strong> qualificação profissional para manter os trabalhadores nestes postos <strong>de</strong> trabalho.<br />
Uma saída mais imediata e que absorve apenas parte <strong>de</strong>stes trabalhadores é uma qualificação<br />
<strong>de</strong> reversão <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> trabalho, buscando aten<strong>de</strong>r às novas exigências dos postos <strong>de</strong><br />
trabalho que surgem com o fechamento <strong>de</strong>stes. Mas vale lembrar, conforme aponta Singer<br />
(1996), que este processo nem absorve todos os trabalhadores que per<strong>de</strong>ram seus postos <strong>de</strong><br />
trabalho, e nem <strong>de</strong> longe se po<strong>de</strong> falar em solução para o <strong>de</strong>semprego. Ainda, no caso <strong>de</strong> uma<br />
qualificação profissional <strong>de</strong> reversão, os investimentos em cursos seriam mais longos e<br />
duradouros, dada a distância entre aprendizado geral e específico para os postos <strong>de</strong> trabalho<br />
que se extinguem e para os outros que estão surgindo.<br />
O quadro abaixo faz referência à mão-<strong>de</strong>-obra ocupada no meio rural do Estado <strong>de</strong> São<br />
Paulo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1970 até 1996. Mesmo não especificando o tipo <strong>de</strong> ocupação, e as variáveis<br />
apresentadas sendo por sexo, verifica-se diminuição acentuada da mão-<strong>de</strong>-obra ocupada,<br />
ainda que esta se refira em termos absolutos não discriminando o tipo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>. Neste<br />
mesmo período, conforme sabemos, aumentaram os investimentos no campo e o volume <strong>de</strong><br />
terras cultivadas, com ênfase para as terras plantadas em cana para aten<strong>de</strong>r às <strong>de</strong>mandas do<br />
complexo sucroalcooleiro.<br />
98
Pessoal Ocupado na Agricultura do Estado <strong>de</strong> São Paulo<br />
Fonte IBGE – Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e Estatística, 1996.<br />
Esta queda acentuada <strong>de</strong> ocupação no meio rural paulista é acompanhada do crescente<br />
aumento da produção e <strong>de</strong> áreas cultivas neste mesmo período, conforme se verá mais<br />
adiante. Ainda que consi<strong>de</strong>remos os equívocos nos padrões <strong>de</strong> mensuração em qualificar<br />
trabalhos rurais e urbanos, é preciso admitir a relevância dos gran<strong>de</strong>s empreendimentos <strong>de</strong>ntro<br />
do Estado <strong>de</strong> São Paulo, que ocupam fundamentalmente mão-<strong>de</strong>-obra assalariada.<br />
Para tentar qualificar estes dados, atentemos para o quadro seguinte que aponta a<br />
população trabalhadora em ativida<strong>de</strong>s agrícolas no Estado <strong>de</strong> São Paulo entre resi<strong>de</strong>ntes e não<br />
resi<strong>de</strong>ntes.<br />
99
Estimativa da População Trabalhadora em Ativida<strong>de</strong>s Agrícolas, Resi<strong>de</strong>nte e Não-Resi<strong>de</strong>nte nas UPAs,<br />
Estado <strong>de</strong> São Paulo, Junho e Novembro <strong>de</strong> 2004 e Junho e Novembro <strong>de</strong> 2005<br />
Categoria<br />
Resi<strong>de</strong>nte<br />
Junho <strong>de</strong> 2004 Novembro <strong>de</strong> 2004 Junho <strong>de</strong> 2005 Novembro <strong>de</strong> 2005<br />
Número % Número % Número % Número %<br />
Proprietário 1 227.332 47,7 194.059 44,9 243.356 51,2 196.830 44,6<br />
Administrador - - 17.832 4,1 - - 19.476 4,4<br />
Arrendatário 1 17.652 3,7 7.179 1,7 15.004 3,1 13.388 3,0<br />
Parceiro 1 37.907 8,0 37.037 8,6 32.316 6,8 19.149 4,4<br />
Assalariado 2 193.845 40,6 166.892 38,6 184.903 38,9 178.834 40,5<br />
Outros - - 9.363 2,1 - - 13.482 3,1<br />
Subtotal 476.736 100,0 432.362 100,0 475.578 100,0 441.158 100,0<br />
Não-Resi<strong>de</strong>nte<br />
Proprietário 1 148.784 25,9 150.735 24,1 127.494 21,4 159.949 26,2<br />
Arrendatário 1 36.497 6,4 44.906 7,2 34.774 5,8 30.449 5,0<br />
Parceiro 1 19.593 3,4 22.273 3,6 14.554 2,4 15.896 2,6<br />
Assalariado 3 187.219 32,7 202.436 32,3 176.088 29,6 158.496 25,9<br />
Volante 181.307 31,6 205.825 32,8 242.859 40,8 246.031 40,3<br />
Subtotal 573.399 100,0 626.175 100,0 595.769 100,0 610.821 100,0<br />
Total 1.050.135 - 1.058.537 - 1.071.347 - 1.051.979 -<br />
1 Engloba os familiares que auxiliam no trabalho.<br />
2 Engloba administrador (exceto em novembro), mensalista, diarista, tratorista, etc.<br />
3 Engloba administrador, mensalista, diarista, tratorista, etc.<br />
Fonte: Instituto <strong>de</strong> Economia Agrícola e Coor<strong>de</strong>nadoria <strong>de</strong> Assistência Técnica<br />
Entre os trabalhadores arrendatários e parceiros, quer resi<strong>de</strong>ntes ou não, houve uma<br />
diminuição acentuada no período a que o quadro se refere. Entre os assalariados resi<strong>de</strong>ntes,<br />
houve pouca redução, quando pegamos os dois extremos <strong>de</strong> início e fim do período, 40,6 %<br />
que passa para 40,5% da mão-<strong>de</strong>-obra ocupada. Neste mesmo período, houve diminuição dos<br />
proprietários resi<strong>de</strong>ntes, <strong>de</strong> 47,7% para 44,6% da mão-<strong>de</strong>-obra ocupada: Já a porcentagem <strong>de</strong><br />
mão-<strong>de</strong>-obra não resi<strong>de</strong>nte cresceu <strong>de</strong> 25,9 % para 26,2% entre junho <strong>de</strong> 2004 e novembro <strong>de</strong><br />
2005. Mesmo fazendo a compensação entre mão-<strong>de</strong>-obra resi<strong>de</strong>nte e não resi<strong>de</strong>nte em termos<br />
absolutos no período, temos a diminuição <strong>de</strong> 2,8% <strong>de</strong>sta categoria, ainda que o quadro indique<br />
certa retomada dos trabalhadores proprietários não resi<strong>de</strong>ntes da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> 0,3%.<br />
A maior revelação ao que parece está entre os assalariados e “volantes” não resi<strong>de</strong>ntes.<br />
Entre junho <strong>de</strong> 2004 e novembro <strong>de</strong> 2005, a categoria <strong>de</strong>scrita no quadro como dos<br />
assalariados enfatizando que neles se incluem administradores, mensalistas, diaristas e<br />
100
tratoristas caiu 6,8%. Passando <strong>de</strong> 32,7% para 25,9% indicando queda acentuada. No caso dos<br />
volantes, entre junho <strong>de</strong> 2004 e novembro <strong>de</strong> 2005, houve um aumento <strong>de</strong> 8,7% da mão-<strong>de</strong>-<br />
obra ocupada, num período <strong>de</strong> apenas <strong>de</strong>zessete meses. Os números sobre esta categoria <strong>de</strong><br />
trabalhadores revelam também que existe uma forte tendência <strong>de</strong> crescimento absoluto <strong>de</strong>ste<br />
tipo <strong>de</strong> trabalho no período <strong>de</strong>scrito. Portanto, apesar <strong>de</strong> nos chamados períodos <strong>de</strong> safra, o<br />
número <strong>de</strong> trabalhadores volantes aumentar, o crescimento não po<strong>de</strong> ser atribuído apenas a<br />
este período.<br />
Estes dados revelam que no tocante à ocupação ou mão-<strong>de</strong>-obra rural está havendo<br />
uma reestruturação acentuada. Estes dados confirmam as colocações <strong>de</strong> Pochmann (2001, p.<br />
39) já do início da década ao analisar os dados do MTB:<br />
101<br />
Não <strong>de</strong>ve causar espanto, portanto, o fato <strong>de</strong> o país ter uma baixa geração<br />
<strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho qualificados. Entre 1990 e 1998, os postos <strong>de</strong> trabalho<br />
qualificados foram reduzidos em 12,3% no Brasil, enquanto as ocupações<br />
não qualificadas cresceram 14,2%, segundo informações do Ministério do<br />
Trabalho.<br />
Os quadros enfatizam a transferência e mobilida<strong>de</strong> da mão-<strong>de</strong>-obra no campo. Existe<br />
um aumento crescente, conforme aponta Pochmann, <strong>de</strong> ocupações <strong>de</strong> baixa qualificação e<br />
salários. Estes dados indicam ainda um fator central para nossa pesquisa. A diminuição do<br />
assalariamento típico e o crescimento <strong>de</strong> trabalhos por produtivida<strong>de</strong>. Dentre os trabalhadores<br />
volantes, migrantes ou temporários, a maioria ganha por produtivida<strong>de</strong>, por isso, o ônus da<br />
qualificação, qualquer que seja ela, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não remetendo a interesses diretos e específicos<br />
<strong>de</strong> setores da produção, momento que os patrões qualificam seu quadro <strong>de</strong> pessoal, são<br />
passados para os trabalhadores, que <strong>de</strong>vem arcar por sua própria conta e risco. Ganhando por<br />
produtivida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>vem investir na própria qualificação para melhorarem seus salários e renda.<br />
É neste sentido que observa Cardoso (1999), quando aponta que esta é uma investida do<br />
capital sobre o trabalho que, diante dos custos em manter estes trabalhadores, se <strong>de</strong>svencilham<br />
do ônus da qualificação remetendo este ônus para os trabalhadores, ou então para a<br />
concorrência <strong>de</strong> mercado. Um processo <strong>de</strong> rodízio <strong>de</strong> trabalhadores que tem como objetivo<br />
<strong>de</strong>svencilhar-se dos gastos com a formação, e como conseqüência tem-se o achatamento da<br />
renda, conforme apontam Mattos e Rolli (2001). Ocorre que a qualificação que necessitam<br />
para tanto (aumento <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong>), se refere ao fator <strong>de</strong> suportabilida<strong>de</strong> física. Basta dizer<br />
que o aprendizado <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> trabalho é rápido e simples, o difícil mesmo é suportar um<br />
tipo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> que, conforme apontamentos da Organização das Nações Unidas (ONU), é<br />
análogo ao trabalho escravo, levando muitos trabalhadores a morte por exaustão. Não há
qualificação possível para este tipo <strong>de</strong> trabalho que atenda aos requisitos <strong>de</strong> dignida<strong>de</strong> e<br />
cidadania, apontados como meta pelo próprio PLANFOR e mais adiante pelo PNQ.<br />
Evi<strong>de</strong>ntemente que não há qualificação possível se esta for tomada unicamente na tentativa <strong>de</strong><br />
qualificação ou requalificação para a manutenção <strong>de</strong>stes postos <strong>de</strong> trabalho, ou seja, uma<br />
qualificação mais imediata e específica.<br />
Os dados sugerem também um outro ponto sobre o qual tanto os cursos <strong>de</strong><br />
qualificação profissional quanto as políticas para emprego e renda <strong>de</strong>vem voltar suas<br />
atenções. Se por um lado não há viabilida<strong>de</strong> do ponto <strong>de</strong> vista das políticas públicas <strong>de</strong><br />
qualificação profissional, que insistem em qualificar trabalhadores que ocupam postos <strong>de</strong><br />
trabalho que “concorrem” com o <strong>de</strong>senvolvimento tecnológico e científico, por outro, atentar,<br />
ou investir via programas <strong>de</strong> qualificação, para os postos <strong>de</strong> trabalho que são criados a partir<br />
do fechamento <strong>de</strong>stes po<strong>de</strong> em alguns casos amenizar, mas não solucionar o problema.<br />
Nos novos postos <strong>de</strong> trabalho que estão surgindo, as <strong>de</strong>mandas por qualificação<br />
profissional são bastante distintas se comparadas com o mo<strong>de</strong>lo rígido, repetitivo e com<br />
conteúdos específicos e localizados. Já os novos postos e trabalho que estão surgindo, têm-se<br />
a pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> experiências e a multidisciplinarieda<strong>de</strong>, conforme aponta Crompton (1996),<br />
ao fazer tal observação como tendência global. A questão é que estes postos <strong>de</strong> trabalho que<br />
estão surgindo não absorvem os trabalhadores liberados pelo fechamento <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> menor<br />
qualificação. Este foi o equívoco do PLANFOR contaminado tanto pela avalanche da<br />
reestruturação produtiva, que causou impacto ao país no início dos anos noventa, quanto pela<br />
emergência em dar respostas imediatas para o problema do <strong>de</strong>semprego. Qualificar<br />
trabalhadores para postos <strong>de</strong> trabalho existentes é uma alternativa e até uma necessida<strong>de</strong> do<br />
ponto <strong>de</strong> vista das políticas públicas e sindicais. Mas é preciso atentar para o fato, conforme<br />
aponta Singer (1999), <strong>de</strong> que não se trata <strong>de</strong> política pública <strong>de</strong> combate ao <strong>de</strong>semprego, tratase<br />
<strong>de</strong> mera reorganização para aten<strong>de</strong>r às <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> um mercado <strong>de</strong> trabalho.<br />
Este processo <strong>de</strong> substituição homem/máquina que acontece a partir da intensificação<br />
da produção e do crescente processo <strong>de</strong> mecanização do setor agrícola, começa a ocorrer <strong>de</strong><br />
forma impactante na região quando são implementadas as colheita<strong>de</strong>iras <strong>de</strong> cana e também<br />
com a mecanização e automação nas outras fases da produção, como plantio e trato. A<br />
estimativa média, conforme aponta Francisco Alves (2003), é que uma colheita<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> cana<br />
substitua cento e vinte trabalhadores, a saber, os chamados “trabalhadores do corte”. A<br />
diminuição dos ganhos <strong>de</strong>stes trabalhadores assalariados, concorrendo com o processo <strong>de</strong><br />
mecanização e automação é <strong>de</strong> aproximadamente 60% uma vez que o que está em jogo num<br />
primeiro momento são apenas custo e eficiência <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong>. Em outras palavras, o<br />
102
assalariamento rural é mantido, quando ele é mais vantajoso que arcar com os custos da<br />
automação e mecanização. A implementação <strong>de</strong> máquinas, como se sabe, acaba<br />
intensificando a produção e barateando custos. (POCHMANN, 2001).<br />
No caso do setor citriculor, o processo é o mesmo, a diferença fundamental é que se<br />
por um lado a expansão <strong>de</strong>ste não seguiu o mesmo ritmo que a sucroalcooleira, também os<br />
custos da mecanização são mais altos, conforme aponta Ruy Meyer (2001), representante da<br />
multinacional Jhon Deer: “Mecanizar a colheita da laranja significa investir em custos altos”.<br />
Custos que são equacionados a partir da mão-<strong>de</strong>-obra disponível, conforme vimos<br />
anteriormente. No caso da cana, conforme aponta Narciso Zanin (2001), é uma questão <strong>de</strong><br />
tempo:<br />
103<br />
Em primeiro lugar você não po<strong>de</strong> ter esta mentalida<strong>de</strong>. Teve colheita<br />
manual durante setenta anos; a lavoura, a área agrícola não está totalmente<br />
preparada para isto. Não é chegar a máquina e por no campo, você tem que<br />
preparar o solo, a área para que a máquina tenha <strong>de</strong>sempenho econômico<br />
[...] há investimento alto [...] muitos problemas tem que ser resolvidos [...] o<br />
conceito tecnológico que possa se adaptar, falta <strong>de</strong> equipamento mais<br />
apropriado, e falta uma lei mais a<strong>de</strong>quada, sem dizer que você <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da<br />
varieda<strong>de</strong> da cana que é uma questão genética [...]<br />
Este processo <strong>de</strong> substituição homem/máquina, sempre imprime esta relação em que<br />
mediante o fechamento <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> baixa qualificação, outros tantos <strong>de</strong> maior<br />
complexida<strong>de</strong> são criados. Diante <strong>de</strong>ste quadro é que faz sentido pensar na qualificação<br />
profissional <strong>de</strong> forma mais ampla, como algumas vezes o tema é proposto. Mesmo pensando<br />
diretamente pela ótica e perspectiva <strong>de</strong> “postos <strong>de</strong> trabalho”, os mecanismos <strong>de</strong> controle e<br />
contenção, ou a organização do trabalho, não são mobilizados exclusivamente num “ambiente<br />
<strong>de</strong> trabalho”. Existe toda uma situação <strong>de</strong> reprodução social, conforme Bourdieu e Passeron<br />
(1992), que incorpora elementos da vida como um todo. A multidisciplinarieda<strong>de</strong>, a<br />
capacida<strong>de</strong> exigida dos trabalhadores em tomar <strong>de</strong>cisões aleatórias e inesperadas, a gestão e<br />
organização do trabalho aliada à perspectiva do controle, conforme aponta Pochmann (2001),<br />
faz com que a exploração sobre o trabalho aumente. Como nas observações <strong>de</strong> Franco Berardi<br />
(2003), que aponta as novas formas <strong>de</strong> organização do trabalho sob o título provocativo <strong>de</strong> “A<br />
Fábrica da Infelicida<strong>de</strong>”. A busca em mobilizar vários e diferentes mecanismos <strong>de</strong> contenção<br />
e organização do trabalho aproxima cada vez mais a fábrica da socieda<strong>de</strong>. É neste sentido que<br />
apontam Negri e Hardt, (2004, p. 22):
104<br />
Em outras palavras, o aparente <strong>de</strong>clínio da fábrica como lugar da produção<br />
não significa o <strong>de</strong>clínio do regime e da disciplina <strong>de</strong> fábrica, mas sim, que<br />
essa disciplina não se limita mais a um espaço específico <strong>de</strong>ntro da<br />
socieda<strong>de</strong>, e se insinua em todas as formas <strong>de</strong> produção social, difundindose<br />
como um vírus. A socieda<strong>de</strong> como um todo é agora permeada pelo<br />
regime da fábrica, ou seja, pelas regras específicas das relações <strong>de</strong> produção<br />
capitalista.<br />
Com relação ao trabalho agrícola que encontramos entre os trabalhadores do corte da<br />
cana os conteúdos são repetitivos, rígidos, exigindo mais resistência e menos qualificação,<br />
remetendo-se a uma rápida fase da produção, conforme aponta Silva (1999, p. 201), ao<br />
<strong>de</strong>screver este tipo <strong>de</strong> trabalho:<br />
O ato <strong>de</strong> cortar cana resume-se a seqüência <strong>de</strong> gestos, curvatura do corpo,<br />
manejo do podão, <strong>de</strong>streza, rapi<strong>de</strong>z, dispêndio <strong>de</strong> força. É necessário cortar<br />
um certo quantum <strong>de</strong> cana, diariamente, que é <strong>de</strong>terminado pela usina.<br />
A<strong>de</strong>mais, exige-se um corte <strong>de</strong> boa qualida<strong>de</strong>: alguns centímetros acima do<br />
chão para facilitar uma excelente rebrotação, o aparar das pontas, montes<br />
or<strong>de</strong>nados para facilitar o carregamento feito por máquinas. Tudo se passa<br />
<strong>de</strong> uma forma combinada. Corta-se, formando-se vários montes. No final da<br />
rua, voltam-se e aparam as pontas. Reinicia-se o processo nas outras cinco<br />
ruas, até acabar o talhão. O trabalho do cortador <strong>de</strong> cana combina-se àquele<br />
do seu prece<strong>de</strong>nte, <strong>de</strong>senvolvido pela equipe do fogo e aos dos seus<br />
sucessores: bituqueiros, sinalizadores, aparadores, carregadores,<br />
transportadores.<br />
Mas com a mobilização <strong>de</strong> fatores múltiplos tanto no local <strong>de</strong> trabalho quanto fora<br />
<strong>de</strong>le, a fábrica, ou no caso local da produção, passa a ser um elo, mas não é mais o “local”<br />
privilegiado da produção. A produção <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ter espacialida<strong>de</strong> e temporalida<strong>de</strong> precisa e<br />
<strong>de</strong>finida. A exploração sobre o trabalho aumenta quando ela passa da fábrica para a<br />
socieda<strong>de</strong>, mas ocorre que a resistência também passa a operar neste nível. A questão,<br />
portanto, é que se num primeiro momento existe uma espécie <strong>de</strong> “colonização” que vai da<br />
fábrica para a socieda<strong>de</strong>, num momento posterior estas dimensões ten<strong>de</strong>m a se equiparar,<br />
fazendo com que a fábrica permaneça como elo da produção, mas não como local privilegiado<br />
<strong>de</strong>sta. Nesta abertura do local da produção ocorre que o conhecimento, e aqui estamos falando<br />
mais propriamente da formação <strong>de</strong> consciência dos trabalhadores, os meios necessários à<br />
produção, <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ser exclusivida<strong>de</strong> do capital. (COCCO, 1999 - b). Ou seja, o<br />
conhecimento necessário à produção se confun<strong>de</strong> com os fatores e elementos da resistência.<br />
A mobilização <strong>de</strong> saberes remete-se a capacida<strong>de</strong> produtiva dos agentes. Numa<br />
perspectiva <strong>de</strong> inserção econômica neste novo cenário produtivo, o que importa, tanto da
perspectiva <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho, quanto <strong>de</strong> formação <strong>de</strong>stes, resume-se em: “qual o produto<br />
que se tem para ven<strong>de</strong>r”. Este produto, diferente da socieda<strong>de</strong> industrial, com o processo <strong>de</strong><br />
substituição homem/máquina, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser meramente “suportabilida<strong>de</strong>” e capacida<strong>de</strong><br />
reprodutiva <strong>de</strong> conhecimentos pré-codificados e alheios ao agente executor. O conhecimento<br />
em si é produto <strong>de</strong> mercado, momento em que ele, ou o tema se confun<strong>de</strong> com o da<br />
qualificação.<br />
Dentro <strong>de</strong>sse novo contexto, o trabalho em si, sob nova forma, passa a se constituir<br />
como a principal força produtiva. Um trabalho dotado <strong>de</strong> conhecimento, conhecimento<br />
necessário à produção – força produtiva. É neste aspecto que o tema da qualificação<br />
profissional ganha relevância. De certa forma, este conhecimento agora <strong>de</strong>veras modificado,<br />
pois imbuído <strong>de</strong> aspectos produzidos e transformados que conseguiram romper com o<br />
controle na forma <strong>de</strong> resistência, passa a ser apropriado pelos trabalhadores. Evi<strong>de</strong>ntemente<br />
que não se trata <strong>de</strong> uma, digamos assim, apropriação consciente. Trata-se da admissão,<br />
segundo a qual, o trabalho, e a própria organização <strong>de</strong>ste, tendo rompido com a espacialização<br />
da fábrica 41 , e disseminando-se na socieda<strong>de</strong>, sai da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> controle. (COCCO,<br />
1999)<br />
O ônus da qualificação profissional é passado para os trabalhadores, também, dado<br />
que são donos <strong>de</strong> um “saber-fazer”. Ocorre que o saber-fazer do assalariamento i<strong>de</strong>ntificado<br />
entre os cortadores <strong>de</strong> cana se remete a suportabilida<strong>de</strong> física sem se aliar a qualquer<br />
conhecimento mais qualificado. Mas esta abertura a que nos referimos “libera” outros tipos <strong>de</strong><br />
saber-fazer que passam a ser <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> dos trabalhadores.<br />
Esta apropriação da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir figura no tocante à qualificação<br />
profissional como educação geral, educação básica, etc., mas também como políticas<br />
imediatas e direcionadas visando produção, trabalho e renda. Por isso uma qualificação<br />
profissional que é <strong>de</strong> fato conectada e comprometida com as transformações que vêm<br />
ocorrendo no mundo, ao contrário da qualificação que visa o reemprego via melhorias na<br />
preparação, se constitui em si, como força produtiva, ou, meio <strong>de</strong> produção. Ou seja, uma<br />
qualificação profissional diferente das posturas dicotômicas calcadas num pensamento binário<br />
como faziam CUT e FS. A qualificação profissional <strong>de</strong>ve ser pensada em si e no seu ato<br />
imediato como inserção produtiva e ao mesmo tempo como capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />
<strong>de</strong> potencialida<strong>de</strong>s humanas. É neste sentido que pensamos as “zonas <strong>de</strong> interesse”, tanto<br />
41 Falamos em “fábrica” quando nos remetemos tanto aos trabalhadores da parte industrial da produção, os<br />
chamados pelos patrões: “trabalhadores internos”, mas também, quando nos referimos aos trabalhadores da<br />
“parte agrícola”, ou mais propriamente aqueles do corte, trato e plantio da cana-<strong>de</strong>-açúcar. Fazemos isso, uma<br />
vez que o que está em discussão é a organização e exercício do trabalho.<br />
105
quanto numa qualificação geral, que atenda aos requisitos <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> conhecimento,<br />
criativida<strong>de</strong> e até <strong>de</strong> cidadania, e uma qualificação profissional mais restrita, voltada para a<br />
satisfação mais ou menos imediata <strong>de</strong> interesses e necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> inserção produtiva.<br />
4.2 O foco da qualificação profissional: entre i<strong>de</strong>ntificação e divergências <strong>de</strong><br />
interesses.<br />
Entre os trabalhadores assalariados rurais, por meio das entrevistas realizadas,<br />
pu<strong>de</strong>mos observar uma característica marcante. Dos trabalhadores operadores <strong>de</strong> máquinas,<br />
tratores e transporte em geral, administradores e gerentes, em sua maioria, são pessoas com<br />
fortes vínculos locais, e que na maioria das vezes são filhos e netos <strong>de</strong> ex-produtores rurais. Já<br />
entre os chamados “trabalhadores da cana”, que são geralmente os que colhem a cana,<br />
também chamados <strong>de</strong> “cortadores <strong>de</strong> cana” ou “bóias-fria 42 ”, esta relação se inverte. Este<br />
segundo segmento em que estão incluídos os trabalhadores do corte da cana, mas que abrange<br />
também colhedores <strong>de</strong> laranja <strong>de</strong>ntre outros, <strong>de</strong>finimos como “trabalhadores braçais.” Por<br />
trabalhadores braçais, enten<strong>de</strong>mos os que apresentam pouca ou nenhuma interação com<br />
máquinas e codificações. Aqueles para os quais as conquistas do <strong>de</strong>senvolvimento<br />
tecnológico pouco influem no exercício <strong>de</strong> suas funções. Os que “nos braços”, resi<strong>de</strong> a<br />
principal força produtiva. Um tipo <strong>de</strong> trabalho que exige, portanto, resistência e esforço físico,<br />
também habilida<strong>de</strong>, mas nenhum aprendizado qualificado.<br />
Esta classificação entre dois grupos <strong>de</strong> trabalhadores, ainda que ligeira, dada a<br />
necessida<strong>de</strong> em <strong>de</strong>finir melhor as diferenças e particularida<strong>de</strong>s que compõem cada um <strong>de</strong>les,<br />
permite estabelecer marcos distintos <strong>de</strong> interesse no tocante à qualificação profissional. O<br />
tema da qualificação profissional aqui <strong>de</strong>ve ser tomado apenas tendo em vista às necessida<strong>de</strong>s<br />
econômicas imediatas <strong>de</strong>stes dois grupos, <strong>de</strong>ixando para mais adiante questões mais<br />
abrangentes como escolarida<strong>de</strong>, inserção cidadã, etc.<br />
42 “bóia-fria” é o termo usado para <strong>de</strong>signar o trabalhador assalariado rural, mais propriamente os trabalhadores<br />
da parte agrícola. O termo surge apontando para o fato mais objetivo <strong>de</strong>stes trabalhadores não residirem no local<br />
<strong>de</strong> trabalho, e por tanto têm que levar comida – “marmita” que são consumidas frias nos horários das refeições.<br />
Todavia, o termo enseja significados fortes e marcantes. Ser bóia-fria significa ser pobre, <strong>de</strong>spossuído, morador<br />
<strong>de</strong> periferia com pouca escolarida<strong>de</strong> e recursos. Significa ser alvo das políticas <strong>de</strong> assistência social. Significa<br />
também ser consumidor <strong>de</strong> produtos baratos, possuir pouca higiene pessoal e ser alvo <strong>de</strong> problemas e intrigas. O<br />
termo é bastante marcado caracterizando a condição <strong>de</strong> “inferiorida<strong>de</strong>” do grupo, e buscando distingui-lo.<br />
Apesar do termo, ao que parece estar caindo em <strong>de</strong>suso, talvez até pela diminuição <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> trabalho, ele<br />
ainda é usado para distinguir este grupo social. Numa das nossas idas a campo na periferia <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> do<br />
entorno <strong>de</strong> Ribeirão Preto, uma senhora que trabalhava no corte da cana apontava: “a pior coisa do mundo, é ser<br />
chamada <strong>de</strong> bóia-fria”.<br />
106
No caso dos trabalhadores rurais do corte e trato da cana, pensar numa qualificação<br />
profissional voltada ao exercício do seu trabalho, significaria potencializar os ganhos <strong>de</strong><br />
produtivida<strong>de</strong>, haja vista que a remuneração <strong>de</strong>stes trabalhadores é por produtivida<strong>de</strong>. Esta<br />
afirmação é cabível também para o segundo segmento <strong>de</strong> trabalhadores, com a diferença que<br />
estes recebem salários fixos, e, portanto, não necessitam na relação <strong>de</strong> venda <strong>de</strong> força <strong>de</strong><br />
trabalho, serem explorados até o limite da própria suportabilida<strong>de</strong>. A qualificação profissional<br />
neste segundo caso tem em vista à introdução <strong>de</strong> novas tecnologias que redimensionam as<br />
ativida<strong>de</strong>s profissionais, exigindo um perfil profissional diferente e com novas e distintas<br />
habilida<strong>de</strong>s, o que via <strong>de</strong> regra não acontece com o primeiro segmento. Neste segundo caso,<br />
mais uma requalificação, visando mantê-los, ou mais ainda redimensioná-los para novos<br />
postos <strong>de</strong> trabalho. No primeiro, o objetivo é o aumento <strong>de</strong> ganhos <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> 43 .<br />
Este ponto é discutido adiante, mas é preciso dizer <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já que o fator apontado nos<br />
<strong>de</strong>poimentos <strong>de</strong> sindicalistas, proprietários rurais e especialistas em máquinas e implementos<br />
agrícolas é que os custos da mecanização da laranja são muito mais altos em comparação com<br />
a cana. A compensação neste caso é muito menor. Baseamo-nos no caso da produção <strong>de</strong> cana<strong>de</strong>-açúcar<br />
por ser o mais marcante e significativo. Também, dado que é entre estes<br />
trabalhadores, ou até “tipo <strong>de</strong> trabalho” que po<strong>de</strong>mos encontrar as principais características <strong>de</strong><br />
reorganização produtiva e do trabalho que vêm acontecendo no mundo. Grosso modo, a<br />
mesma regra po<strong>de</strong> ser aplicada a outras culturas, com especial atenção para a laranja. Uma<br />
diferença marcante no tocante a esta é que a incidência <strong>de</strong> trabalhadores migrantes volantes é<br />
menor do que no caso da cana. No caso <strong>de</strong> outras culturas como soja, arroz, milho, etc., ainda<br />
que com estes trabalhadores tivéssemos menor contato, são culturas que ocupam basicamente<br />
operadores <strong>de</strong> máquinas sendo que quase a totalida<strong>de</strong> da produção é mecanizada. 44<br />
Antes <strong>de</strong> seguirmos sobre o segundo grupo <strong>de</strong> trabalhadores apontado acima é preciso<br />
levantar uma questão que assim chamamos <strong>de</strong> “clássica da sociologia”. Questão que po<strong>de</strong><br />
43 Cursos como: “manejo da cana”, “cana limpa”, “segurança no trabalho”, etc. Neste último caso, os patrões<br />
afirmavam que os cursos surtiam resultados uma vez que o trabalhador que sofresse aci<strong>de</strong>nte no local <strong>de</strong> trabalho<br />
ou adquirisse doença “dava prejuízo para usina”. Em todos os outros casos <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional, quer disponibilizado por sindicatos patronais ou dos trabalhadores, quer pelos próprios patrões<br />
como muitas vezes pu<strong>de</strong>mos observar o foco era o aumento da produtivida<strong>de</strong>. Não havia nenhuma habilida<strong>de</strong><br />
nova no conteúdo <strong>de</strong>stes cursos.<br />
44 No caso <strong>de</strong> plantações <strong>de</strong> soja, milho, amendoim, arroz, <strong>de</strong>ntre alguns outros produtos todas as fases da<br />
produção são mecanizadas. Plantio, trato, e colheita são feitos por máquinas com apenas um, ou em alguns casos<br />
dois operadores. Trata-se <strong>de</strong> culturas em que implementação da mecanização é mais fácil. Mesmo assim é<br />
preciso consi<strong>de</strong>rar dois pontos: O primeiro é que estamos falando das gran<strong>de</strong>s, ou quando muito médias<br />
proprieda<strong>de</strong>s, uma vez que as pequenas não são mecanizadas, mas na região representam uma fatia menor da<br />
produção; O outro é que são produtos agrícolas comercializados como tal, diferente da cana e da laranja que<br />
serve <strong>de</strong> matéria prima para a fabricação e produtos industrializados, no caso açúcar, álcool e suco concentrado<br />
<strong>de</strong> laranja respectivamente.<br />
107
parecer banal, uma vez que a resposta po<strong>de</strong> parecer evi<strong>de</strong>nte. Ainda assim, ela <strong>de</strong>ve ser<br />
apresentada uma vez que os <strong>de</strong>sdobramentos conforme se verá adiante não são tão simples<br />
nem tão pouco evi<strong>de</strong>ntes.<br />
Os fatores que permitem a separação entre dois grupos <strong>de</strong> assalariados rurais, que por<br />
questão <strong>de</strong> entendimento po<strong>de</strong>m ser tidos como <strong>de</strong> maior e menor qualificação, são por nós<br />
i<strong>de</strong>ntificados com a separação que fazemos entre trabalhadores originários, oriundos ou<br />
trabalhadores resi<strong>de</strong>ntes e trabalhadores temporários migrantes. Enten<strong>de</strong>mos por<br />
trabalhadores originários ou oriundos, fixos ou resi<strong>de</strong>ntes os que possuem residência fixa, mas<br />
principalmente aqueles que durante várias gerações vêm se reproduzindo <strong>de</strong>ntro da região ou<br />
Estado. São pessoas que possuem uma vida social integrada com o local. As relações<br />
familiares, parentesco, história <strong>de</strong> vida etc., se i<strong>de</strong>ntificam com a região.<br />
Os trabalhadores temporários migrantes, geralmente do corte da cana, são os que<br />
apresentam, segundo avaliação dos próprios sindicalistas que entrevistamos, menor grau <strong>de</strong><br />
qualificação; já aqueles com maior qualificação e até escolarida<strong>de</strong> 45 são os trabalhadores<br />
assalariados que geralmente estão no setor <strong>de</strong> transporte, gerência ou operação <strong>de</strong> máquinas,<br />
etc.<br />
Já o segundo grupo, dos trabalhadores temporários migrantes, a relação é bastante<br />
distinta. São trabalhadores que não possuem vínculos ou laços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> local. São<br />
trabalhadores migrantes provenientes dos estados mais pobres do país com especial atenção<br />
para as regiões norte e nor<strong>de</strong>ste. Geralmente vêm em busca <strong>de</strong> trabalho e voltam para as<br />
regiões <strong>de</strong> origem quando termina a safra, ou quando muito se reproduzem, ficam em bairros<br />
pobres das periferias das cida<strong>de</strong>s 46 .<br />
A diferença marcante entre estes dois grupos <strong>de</strong> trabalhadores é que enquanto os<br />
migrantes temporários vêm em busca <strong>de</strong> melhores condições <strong>de</strong> vida por meio <strong>de</strong> melhores<br />
ganhos econômicos 47 ; o segundo grupo passou pelo que po<strong>de</strong>mos chamar processo <strong>de</strong><br />
45 É preciso notar que não fizemos pesquisa precisa sobre este ponto. As entrevistas realizadas aleatoriamente<br />
segundo as necessida<strong>de</strong>s da própria pesquisa revelaram esta tendência <strong>de</strong> maior escolarida<strong>de</strong> formal entre os<br />
trabalhadores locais e menor escolarida<strong>de</strong> entre os trabalhadores migrantes temporários.<br />
46 - Na periferia da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Guariba pu<strong>de</strong>mos observar um modo <strong>de</strong> vida segregado e particular que caracteriza<br />
a “localização” dos trabalhadores temporários migrantes. Muitos já estão na segunda geração, sendo que vivem e<br />
se reproduzem como uma espécie <strong>de</strong> transposição <strong>de</strong> seus locais <strong>de</strong> origem. Os laços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> são<br />
estabelecidos intra grupos, lembrando que muitos dos produtos comercializados ali cotidianamente, tanto em<br />
estabelecimentos locais como nas feiras semanais, apenas po<strong>de</strong>riam ser encontrados em casa especializadas.<br />
47 Sobre o potencial <strong>de</strong> resistência do ato <strong>de</strong> imigrar, apesar <strong>de</strong> não ser tema do nosso trabalho sugerimos a<br />
leitura <strong>de</strong> um livro belíssimo do professor <strong>de</strong> Ciência Política da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Bologna, Sandro Mezzadra,<br />
chamado Il diritto di Fuga: migrazioni, cittadinanza, globalizzazione. Ombre Corte, Verona, 2001. Analisando a<br />
condição histórica do ato <strong>de</strong> migrar ou imigrar com especial atenção para o fenômeno tal qual ele vêm ocorrendo<br />
no contexto europeu, o autor chama a atenção para o fato <strong>de</strong> que a migração em si se constitui num ato <strong>de</strong><br />
resistência. Esta resistência po<strong>de</strong> ser encontrada nos dois principais fatores que a compõe: A recusa <strong>de</strong> sua<br />
108
“proletarização”, sendo que ao estabelecerem fortes vínculos sociais locais em diferentes<br />
grupos e associações facilitou e facilita uma relação <strong>de</strong> reprodução diferenciada no tocante à<br />
qualificação.<br />
Outra característica que pu<strong>de</strong>mos observar com relação a estes dois grupos <strong>de</strong><br />
trabalhadores é que enquanto os trabalhadores originários possuíam fortes laços <strong>de</strong><br />
sociabilida<strong>de</strong> local entre clubes, time <strong>de</strong> futebol, amigos, relações <strong>de</strong> parentesco, sindicatos,<br />
freqüência em bares, etc.; o segundo grupo apresentava menor incidência associativa, ou<br />
quase sempre a sociabilida<strong>de</strong> era estabelecida <strong>de</strong>ntro do próprio grupo <strong>de</strong> trabalhadores<br />
migrantes. Evi<strong>de</strong>ntemente neste segundo caso, os laços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> são mais fracos e<br />
perenes, pois são estabelecidos apenas entre o grupo <strong>de</strong> forma segregada do contato com<br />
outros grupos sociais constituídos. Este processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sestabilização social é interessante para<br />
o capital, assim como significa uma variável possível para o trabalhador melhorar as<br />
estratégias <strong>de</strong> venda <strong>de</strong> força <strong>de</strong> trabalho.<br />
109<br />
A única variável através da qual o ven<strong>de</strong>dor da força <strong>de</strong> trabalho<br />
possivelmente po<strong>de</strong> melhorar sua posição estratégica no mercado é a<br />
dimensão espacial. Consequentemente as reações adaptativas<br />
historicamente mais importantes da força <strong>de</strong> trabalho na ausência <strong>de</strong><br />
assistência pública, ocorrerão na dimensão espacial através <strong>de</strong> movimentos<br />
como a emigração, a urbanização e as viagens diárias até o local <strong>de</strong> trabalho<br />
muito distante <strong>de</strong> casa. Mas é obvio que, mesmo em processos <strong>de</strong> adaptação<br />
espacial, que representam a única dimensão na qual o lado da oferta no<br />
mercado <strong>de</strong> trabalho po<strong>de</strong> empregar estratégias autônomas contra o lado da<br />
<strong>de</strong>manda, o trabalhador é obrigado a se sacrificar. Isso se torna claro, não só<br />
na <strong>de</strong>struição <strong>de</strong> relações familiares e sociais locais, mas também nos riscos<br />
específicos <strong>de</strong> empobrecimento ou <strong>de</strong> marginalização, como acontece no<br />
<strong>de</strong>senvolvimento urbano tanto <strong>de</strong> países do Terceiro Mundo, quanto nos<br />
Estados Unidos, e cada vez mais na Europa. (OFFE, 1985, p. 31)<br />
Este fator <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocalização geográfica apontada por Offe, é uma saída, uma via <strong>de</strong><br />
possibilida<strong>de</strong> para o trabalhador se inserir no mercado <strong>de</strong> trabalho, a migração ou imigração.<br />
Este processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sterritorialização implica na <strong>de</strong>struição <strong>de</strong> relações sociais e quase sempre<br />
no empobrecimento e marginalização.<br />
Dentre as entrevistas que realizamos com alunos dos cursos <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional executados pelos sindicatos, (Teresa, Reginaldo, Andréia, Marcelo e Diego,<br />
2000), a maioria pertence ao grupo dos trabalhadores originários. Interessante notar que quase<br />
sempre havia um pertencimento dos alunos com este grupo <strong>de</strong> trabalhadores (quase sempre<br />
condição, quando o migrante diz “não” para a condição que o acometi; E que para o segundo fator que pressupõe<br />
o primeiro, sendo a construção <strong>de</strong> alternativa que é o ato <strong>de</strong> migrar em si.
familiar: filhos, sobrinhos, primos, etc.,). Poucas vezes pu<strong>de</strong>mos encontrar trabalhadores<br />
migrantes entre os alunos dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional.<br />
Notamos nestes casos que o fator <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> dos trabalhadores não exclui ou<br />
separa a relação integrada entre local <strong>de</strong> trabalho e extra local <strong>de</strong> trabalho. Os dois ambientes<br />
interagem e se relacionam exercendo influência e penetração, ficando difícil <strong>de</strong>terminar qual é<br />
o ambiente mais importante. Sobre este ponto, lembramos das já clássicas colocações <strong>de</strong><br />
Thompson (1989),em A Formação da Classe Operária Inglesa. O autor aponta que não foi a<br />
fábrica, enquanto local <strong>de</strong> trabalho, que permitiu a formação <strong>de</strong> uma consciência <strong>de</strong> classe,<br />
resistência e ação entre os trabalhadores. A segregação espacial <strong>de</strong> um local <strong>de</strong> trabalho, ou, o<br />
pertencimento mais objetivo, ainda que vigiado e contido, permitia que estes mesmos<br />
trabalhadores se encontrassem em diferentes ocasiões fora do local <strong>de</strong> trabalho, ou seja, em<br />
ambientes tidos como <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> (a taberna, os bares, clubes, associações, caça, pesca e<br />
festas comunitárias). Para o autor, é preciso voltar os olhos para estas atitu<strong>de</strong>s “marginais”,<br />
fora do establishment:<br />
110<br />
Precisamos <strong>de</strong> mais estudos sobre as atitu<strong>de</strong>s sociais <strong>de</strong> criminosos,<br />
soldados e marinheiros, e sobre a vida <strong>de</strong> taberna; e <strong>de</strong>veríamos olhar as<br />
evidências, não com os olhos moralizadores (nem sempre os “pobres <strong>de</strong><br />
cristo” eram agradáveis), mas com olhos para os valores brechtianos – o<br />
fatalismo, a ironia em face das homilías do Establishment, a tenacida<strong>de</strong> da<br />
auto preservação. E <strong>de</strong>vemos também lembrar o “submundo” do cantor <strong>de</strong><br />
baladas e das feiras que transmitiu tradições para o século 19 (até o musichall,<br />
a cultura <strong>de</strong> circo <strong>de</strong> Dickens ou os contadores <strong>de</strong> história e<br />
animadores <strong>de</strong> Hardy); pois <strong>de</strong>ssa forma os “sem linguagem articulada”<br />
conservaram certos valores – espontaneida<strong>de</strong>, capacida<strong>de</strong> para a diversão e<br />
lealda<strong>de</strong> mútua -, apesar das pressões inibidoras <strong>de</strong> magistrados, usineiros e<br />
metodistas. (THOMPSON, 1989, p. 61 - 62)<br />
A formação <strong>de</strong> um quadro que integra e relaciona a vida profissional não po<strong>de</strong> ser<br />
separada da vida social como um todo. Neste caso, Thompson (1989) aponta o fator da<br />
formação histórica <strong>de</strong> uma classe em sua totalida<strong>de</strong>. Na resistência, na organização, na<br />
produção <strong>de</strong> alternativas <strong>de</strong> vida, quer profissional, se referindo mais ao local <strong>de</strong> trabalho,<br />
quer social como um todo, que integrando o primeiro caso abre para outros momentos da<br />
vida. Trata-se <strong>de</strong> voltar os olhos para a marginalida<strong>de</strong> na sua totalida<strong>de</strong>. Para as relações<br />
sociais e produtivas “fora” regulação ou establishment.<br />
Pu<strong>de</strong>mos observar no tocante à sociabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stes grupos que os trabalhadores<br />
migrantes estabelecem fracos laços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> com outros grupos locais mais<br />
estruturados e estáveis na comunida<strong>de</strong>. Em Errantes do Fim do Século (1999), Silva aponta
este fator. Os trabalhadores migrantes são explorados como grupos segregados da socieda<strong>de</strong><br />
ou comunida<strong>de</strong> local, não apenas nas relações <strong>de</strong> trabalho, pois são comuns “turmas·”<br />
homogêneas <strong>de</strong> trabalhadores por regiões ou Estados do país. No roubo da medição da cana,<br />
nos baixos salários, no trabalho exaustivo e <strong>de</strong>gradante. São explorados também quando<br />
entregues à sorte <strong>de</strong> habitações insalubres, em casos que são “forçados” a comprarem<br />
alimentos em armazéns locais que cobram mais caro que a média <strong>de</strong> mercado, ou mesmo na<br />
segregação espacial forçada <strong>de</strong> habitações isoladas, perdidas em meio aos canaviais e velhas<br />
fazendas.<br />
Estes que chamamos <strong>de</strong> trabalhadores originários não passam pelas condições<br />
<strong>de</strong>gradantes <strong>de</strong> vida geralmente encontrada entre os trabalhadores migrantes, conforme aponta<br />
Silva (1999) ao traçar o quadro completo da exploração <strong>de</strong>ste grupo. Possui uma qualificação<br />
diferenciada tanto no tocante às relações <strong>de</strong> trabalho quanto nas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> vida local<br />
mais integrada como um todo. Aparte o fato <strong>de</strong> habitarem em seus locais <strong>de</strong> origem, e que,<br />
diga-se <strong>de</strong> passagem, é o Estado mais rico da fe<strong>de</strong>ração, os trabalhadores originários possuem<br />
tanto condições <strong>de</strong> trabalho, ganhos reais e qualificação elevada com relação ao primeiro<br />
grupo. Mas possuem tais características diferenciadoras com relação ao primeiro grupo por<br />
possuírem um histórico <strong>de</strong> reprodução social distinto. Digamos que um histórico <strong>de</strong><br />
reprodução social mais integrado localmente que o primeiro grupo, sugerindo assim<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> capital social. (PUTNANN, 2005).<br />
Mas este histórico <strong>de</strong> reprodução social não se restringe às relações <strong>de</strong> um local <strong>de</strong><br />
trabalho. O “local <strong>de</strong> trabalho” é correlato, mas não é <strong>de</strong>terminante da ação e escolha dos<br />
trabalhadores <strong>de</strong> maneira geral. Como nas observações <strong>de</strong> Offe (1989), dos anos setenta,<br />
quando o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> acumulação capitalista centrado na produção fabril localizada já estava<br />
<strong>de</strong>smoronando <strong>de</strong>ntro do contexto europeu, que o autor apontava o local <strong>de</strong> trabalho como<br />
concorrente com outras esferas da vida.<br />
111<br />
A pesquisa sociológica da vida cotidiana e do “mundo vivido” também<br />
representa um rompimento com a idéia <strong>de</strong> que a esfera do trabalho tem um<br />
po<strong>de</strong>r relativamente privilegiado para <strong>de</strong>terminar a consciência e a ação<br />
social. Até certo ponto, inclusive, é realizada a realida<strong>de</strong> oposta, segundo a<br />
qual as experiências e os conflitos engendrados pelo trabalho são vistos<br />
como conseqüências <strong>de</strong> interpretações adquiridas fora do trabalho. (OFFE,<br />
1989, p. 172)<br />
Mesmo persistindo, diferenças entre grupos <strong>de</strong> trabalhadores assalariados migrantes e<br />
grupos <strong>de</strong> trabalhadores não migrantes, na <strong>de</strong>terminação da ação e consciência são comuns à
i<strong>de</strong>ntificação dos fatores extralocal <strong>de</strong> trabalho. A relação e interpenetração das experiências e<br />
<strong>de</strong>terminações <strong>de</strong> um local <strong>de</strong> trabalho e extralocal <strong>de</strong> trabalho não <strong>de</strong>vem ser consi<strong>de</strong>radas<br />
como espaços distintos para a pesquisa. Não parece viável pensar esta relação entre<br />
dualida<strong>de</strong>s da mesma maneira que não são viáveis políticas <strong>de</strong> qualificação voltadas para um<br />
“ambiente <strong>de</strong> trabalho”. Pensamos fatores que integram à discussão sobre qualificação<br />
profissional, e que se movem para além das <strong>de</strong>terminações tanto mais econômicas da<br />
qualificação profissional, quanto circunscrita a um local <strong>de</strong> trabalho. Questões como educação<br />
geral e cidadã, que inclusive são pautas históricas do movimento sindical 48 .<br />
Mas existe uma questão fundamental sobre este ponto e que <strong>de</strong>ve ser colocada, apesar<br />
<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>senvolvida mais adiante. Não existe ambiente <strong>de</strong> “liberda<strong>de</strong>” fora do local <strong>de</strong><br />
trabalho. Se o trabalho <strong>de</strong>ixa ou ten<strong>de</strong> cada vez mais a <strong>de</strong>ixar seu ponto <strong>de</strong> localização<br />
espacial, as características e componentes <strong>de</strong>sta relação também seguem este curso:<br />
resistência, ação, formação <strong>de</strong> consciência, são atributos que se <strong>de</strong>slocam para o mundo da<br />
vida como aponta Gorz (2003). É neste sentido que se coloca uma espécie <strong>de</strong> aceleração<br />
neurótica que tem reflexos no trabalho, no lazer, no consumo, na intimida<strong>de</strong>, nas relações<br />
afetivas, etc., que são colocados por Berardi (2003).<br />
A quebra <strong>de</strong>sta divisão que separava local <strong>de</strong> trabalho e mundo da vida remete o tema<br />
da qualificação profissional para um outro foco <strong>de</strong> atenção. A chamada qualificação geral não<br />
é mero terreno preparatório para a qualificação específica. Esta separação ten<strong>de</strong> apenas a<br />
reproduzir esta relação binária que sempre o que fez foi facilitar a reprodução <strong>de</strong>ste quadro<br />
hierárquico e <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s entre os que pensam o trabalho e <strong>de</strong>tém os meios para sua<br />
execução, e aqueles que o executam.<br />
Enfatizamos neste momento o conceito <strong>de</strong> “capital social” 49 aplicado aos territórios<br />
rurais proposto por Abramovay (2000), para pensar a qualificação profissional rural. Segundo<br />
o autor que discute o mesmo conceito proposto pelos estudos <strong>de</strong> Putnann (2005), o conceito<br />
<strong>de</strong> capital social <strong>de</strong>ve integrar-se a uma série <strong>de</strong> características <strong>de</strong> organização social sem o<br />
privilégio <strong>de</strong> relações circunscritas <strong>de</strong>ntro e fora <strong>de</strong> um local <strong>de</strong> trabalho.<br />
48 Sobre este tema do histórico da qualificação profissional no Brasil e do recorte sindical sobre o tema, ver:<br />
MANFREDI, S. M. Educação Profissional no Brasil, São Paulo: Cortez, 2002.<br />
49 Como se sabe o conceito <strong>de</strong> “capital social” é bastante abrangente, comportando discussões e dividindo<br />
opiniões. Portanto, parece importante frisar que aqui nos valemos <strong>de</strong>ste conceito apenas numa das “aberturas”,<br />
que acreditamos, ele possibilita. Esta abertura se refere ao fato <strong>de</strong> que o conceito permite pensar os elementos<br />
centrais <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento (econômico e social) e sociabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado território sem as peias da<br />
dualida<strong>de</strong> trabalho e não trabalho, ou local <strong>de</strong> trabalho e extra local <strong>de</strong> trabalho. Aliás, não sendo esta uma<br />
discussão que integra a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> capital social, ao mesmo tempo, permite compreen<strong>de</strong>-la e relevá-la<br />
utilizando tal conceito.<br />
112
É preciso estabelecer algumas características marcantes que compõem o conceito <strong>de</strong><br />
capital social: “[...] características da organização social, como confiança, normas e sistemas,<br />
que contribuam para aumentar a eficiência da socieda<strong>de</strong>, facilitando as ações coor<strong>de</strong>nadas”.<br />
(PUTNANN, 2005, p. 177), citando Coleman (1990, p. 302-307), estabelece o conceito<br />
segundo o qual:<br />
113<br />
Assim como outras formas <strong>de</strong> capital, o capital social é produtivo,<br />
possibilitando a realização <strong>de</strong> certos objetivos que seriam inalcançáveis se<br />
ele não existisse [...] Por exemplo, um grupo cujos membros <strong>de</strong>monstrem<br />
confiabilida<strong>de</strong> e que <strong>de</strong>positem ampla confiança uns nos outros é capaz <strong>de</strong><br />
realizar muito mais do que outro grupo que careça <strong>de</strong> confiabilida<strong>de</strong> e<br />
confiança [...] numa comunida<strong>de</strong> rural [...] on<strong>de</strong> um agricultor ajuda o outro<br />
a enfardar o seu feno e on<strong>de</strong> os implementos agrícolas são reciprocamente<br />
emprestados, o capital social permite a cada agricultor realizar o seu<br />
trabalho com menos capital físico sob a forma <strong>de</strong> utensílios e equipamentos.<br />
O conceito <strong>de</strong> capital social pressupõe a relação social entre pessoas e entre grupo <strong>de</strong><br />
pessoas. Também pressupõe participação cívica, outro conceito trabalhado por Putnann<br />
(2005), que não diferencia relações entre local e extra local <strong>de</strong> trabalho. Pressupõe a confiança<br />
entre atores sociais, que é dos principais atributos do capital social, como as dádivas <strong>de</strong><br />
reciprocida<strong>de</strong>. Bastante trabalhada pela literatura italiana específica que a coloca como uma<br />
espécie <strong>de</strong> força produtiva do novo mercado e relações <strong>de</strong> trabalho e produção (RULLANI,<br />
1998). É força produtiva em si, não fazendo distinção entre conhecimento entendido como<br />
força, ou capacida<strong>de</strong> produtiva, e capital material, conforme aponta Gorz (2003).<br />
O que parece importante reter <strong>de</strong>ste conceito para a discussão que fazemos aqui, é que<br />
ele possibilita pensar ambientes <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> dotados <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> características dos<br />
agentes sociais, conforme pon<strong>de</strong>ramos acima. Além <strong>de</strong> permitir pensar a construção do<br />
território como elemento vivo e dotado <strong>de</strong> subjetivida<strong>de</strong>, sem, contudo se restringir às<br />
<strong>de</strong>terminações físicas ou geográficas. Possibilita pensar o <strong>de</strong>senvolvimento social, e no<br />
sentido do conceito também econômico, sem ficar preso, ou mesmo relevar como central a<br />
discussão sobre emprego formal e local <strong>de</strong> trabalho.<br />
O conceito <strong>de</strong> capital social é, portanto, central para pensarmos o tema da qualificação<br />
profissional, na medida em que pontuamos a sociabilida<strong>de</strong> dos agentes, entre migrantes e não<br />
migrantes. Permite intervenções que têm em vista tanto suas possibilida<strong>de</strong>s e alcances, quanto<br />
os interesses dos grupos a serem atendidos. Ambientes produtivos integrados que possuam<br />
características que proporcionem e facilitem a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações sociais. É assim que o conceito
<strong>de</strong> capital social é mobilizado aqui não em sua totalida<strong>de</strong>, haja vista a abrangência,<br />
complexida<strong>de</strong>, uso corrente e literatura sobre o tema. Mobilizamos este conceito, exatamente,<br />
dado que sendo suficientemente conhecido e aplicado, funciona como uma espécie <strong>de</strong><br />
antídoto contra a separação que comumente se faz entre ensino formal preparatório e<br />
qualificação profissional como treinamento. A re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações sociais entre os agentes,<br />
cristalizada num <strong>de</strong>terminado território, tanto possibilita o <strong>de</strong>senvolvimento econômico,<br />
quanto os atributos <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> e formação cidadã.<br />
Mas as relações <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>, como sabemos, ocorrem <strong>de</strong>ntro dum contexto <strong>de</strong><br />
diferenças e <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s. Dentro <strong>de</strong>ste contexto <strong>de</strong> diferenças e <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s po<strong>de</strong>mos<br />
i<strong>de</strong>ntificar divergência <strong>de</strong> interesses no que toca á aspectos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m mais coletivas. Cabe,<br />
portanto, i<strong>de</strong>ntificar entre grupo <strong>de</strong> trabalhadores, os aspectos reais e imediatos sobre os quais<br />
se estruturam as diversida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> interesses.<br />
Dentro do primeiro grupo, o que existe <strong>de</strong> comum entre os trabalhadores é o fato <strong>de</strong><br />
ambos não serem <strong>de</strong>tentores dos meios materiais <strong>de</strong> produção. Tanto os trabalhadores<br />
migrantes temporários, quanto os assalariados locais, não possuem os meios materiais <strong>de</strong><br />
produção. Ambos, cada qual com as suas características, sua remuneração por produtivida<strong>de</strong>,<br />
ou por salários fixos, não possuem os meios materiais para a efetiva realização <strong>de</strong> seus<br />
trabalhos, ou seja, <strong>de</strong> suas qualificações.<br />
Mas, apontamos agora um segundo segmento <strong>de</strong> trabalhadores, que se diferenciam dos<br />
primeiros, quer migrante ou originário, pelo fato <strong>de</strong> possuírem, ou, serem <strong>de</strong>tentores dos<br />
meios materiais <strong>de</strong> produção, com especial atenção para a posse da terra. Neste grupo,<br />
entrariam pequenos e médios proprietários rurais 50 <strong>de</strong> maneira geral, tratando-se assim <strong>de</strong><br />
experiências <strong>de</strong> “empreen<strong>de</strong>dorismo rural 51 ”. Neste caso, os fatores <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> ou<br />
i<strong>de</strong>ntificação com relação aos grupos <strong>de</strong> trabalhadores verificados anteriormente ocorre numa<br />
outra zona <strong>de</strong> interesse. Se a referência forem os postos <strong>de</strong> trabalho existentes, este fator é<br />
50 Não parece necessário para o teor das nossas discussões entrar num terreno <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate sobre a caracterização e<br />
conceituação do que vêm a ser micro, pequenos e médios empreendimentos, ou empreendimentos rurais.<br />
Tomamos estes como: “agricultura familiar”, assentados em políticas <strong>de</strong> Reforma Agrária, ou mesmo pequenos e<br />
médios empreendimentos em geral que fazendo uso <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra assalariada, se diferenciam tanto pelo<br />
produto, quanto pela gestão e organização do trabalho. De qualquer maneira, conforme aponta Veiga (2005) há<br />
uma espécie <strong>de</strong> consenso internacional, <strong>de</strong> que microempresas são as que possuem até nove pessoas ocupadas<br />
ininterruptamente, e pequenas entre <strong>de</strong>z e quarenta e nove pessoas; médias empresas entre cinqüenta até<br />
duzentas e quarenta e nove pessoas ocupadas. Ao que parece, este não é um bom parâmetro para pensar a<br />
realida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste segmento produtivo, quer no Brasil ou no mundo, haja vista que a tendência crescente em poupar<br />
mão-<strong>de</strong>-obra permite pensar em gran<strong>de</strong>s empresas com poucas pessoas ocupadas. De qualquer maneira apenas<br />
apontamos o mote da discussão.<br />
51 Como se sabe, po<strong>de</strong>-se perfeitamente enten<strong>de</strong>r por “empreen<strong>de</strong>dor rural”, ou “empreen<strong>de</strong>dorismo rural”, tanto<br />
pequenos e médios quanto gran<strong>de</strong>s proprietários rurais. Contudo, pela própria natureza do tema que tratamos,<br />
tanto quanto pelas separações sobre as especificida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada caso, na <strong>de</strong>finição <strong>de</strong>ste grupo, ou segmento <strong>de</strong><br />
trabalhadores, nos referimos unicamente aos pequenos e médios proprietários como empreen<strong>de</strong>dores rurais.<br />
114
encontrado apenas fora do local <strong>de</strong> trabalho, ou então num ambiente que não faz esta<br />
distinção. Fatores fora das relações <strong>de</strong> trabalho, <strong>de</strong> interesse comum, são mais fáceis <strong>de</strong> serem<br />
encontrados. A educação geral ou educação formal é o melhor exemplo. Para pensarmos no<br />
conceito <strong>de</strong> capital social proposto por Abramovay (2000), parece que esta separação entre<br />
local <strong>de</strong> trabalho e ambiente fora local <strong>de</strong> trabalho apenas atrapalha. O capital social é<br />
produtivo em sentido amplo. Produz melhores condições <strong>de</strong> vida em socieda<strong>de</strong>, mas produz<br />
também um ambiente institucional propício para o trabalho, renda, inserção produtiva, etc. A<br />
capacida<strong>de</strong> em mobilizar recursos para construir um ambiente institucional propício,<br />
fortalecendo laços <strong>de</strong> relações sociais, não privilegia o local <strong>de</strong> trabalho.<br />
Conforme apontam Putnann (2005) e Abramovay (2000), o fortalecimento <strong>de</strong>stes<br />
laços <strong>de</strong> institucionalida<strong>de</strong> que propiciam o movimento cooperado do capital social é capaz <strong>de</strong><br />
substituir os meios materiais <strong>de</strong> produção, ou então é capaz <strong>de</strong> <strong>de</strong>spen<strong>de</strong>r menos <strong>de</strong>stes meios<br />
como uma espécie <strong>de</strong> compensação. Neste caso, fatores <strong>de</strong> cunho altamente subjetivos como a<br />
confiança, o conhecimento, a cooperação, a ação e a consciência cívica aparecem como força<br />
produtiva. Esta força produtiva a qual nos referimos como capital social não é exclusivida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> quem <strong>de</strong>tém os meios materiais <strong>de</strong> produção. Trabalhadores em geral são agentes <strong>de</strong>ste<br />
processo sendo que a busca tanto da <strong>de</strong>finição quanto das políticas públicas <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional <strong>de</strong>vem passar pela capacida<strong>de</strong> produtiva <strong>de</strong> cunho subjetivo, o conhecimento<br />
<strong>de</strong>ntre os outros fatores apontados acima.<br />
Temos neste caso a i<strong>de</strong>ntificação da qualificação profissional como conhecimento.<br />
Conhecimento necessário para o exercício do trabalho. Mas já é possível agora pensar numa<br />
qualificação profissional que extrapola os limites meramente imediatos e econômicos. Ainda<br />
que, conforme havíamos colocado anteriormente, a qualificação neste momento <strong>de</strong>va ser<br />
pensada mais como habilida<strong>de</strong>s imediatas para o exercício do trabalho, po<strong>de</strong>mos sem muito<br />
esforço i<strong>de</strong>ntificar conhecimento com qualificação profissional.<br />
Voltemos agora para um ponto <strong>de</strong>ixado acima, a diferença fundamental que<br />
caracteriza o segundo grupo <strong>de</strong> trabalhadores rurais, os que empreen<strong>de</strong>m, ou que possuem<br />
meios <strong>de</strong> produção, com relação ao primeiro grupo “apenas” nas relações <strong>de</strong> trabalho. Se no<br />
primeiro grupo temos os assalariados rurais, tanto migrantes quanto originários, no segundo<br />
grupo observaremos os pequenos e médios produtores, quer sejam proprietários, ocupantes,<br />
arrendatários e parceiros.<br />
O quadro abaixo sobre a condição dos produtores rurais em todo o Estado mostra<br />
como este grupo é expressivo. Ainda que haja redução <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> trabalho e<br />
115
empreendimento rural, ela não segue o mesmo ritmo <strong>de</strong> concentração monocultora pela qual<br />
passou o Estado <strong>de</strong> São Paulo, e em especial a região <strong>de</strong> Ribeirão Preto nas últimas décadas.<br />
Condição do Produtor Rural no Estado <strong>de</strong> São Paulo<br />
Fonte IBGE – Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e Estatística, 1996.<br />
O quadro acima revela proporcionalmente uma diminuição mais acentuada com<br />
relação ao sistema <strong>de</strong> arrendamento, parceria e ocupação da terra entre o início dos anos<br />
setenta e final da década <strong>de</strong> noventa. Ainda que tenha havido diminuição dos trabalhadores<br />
proprietários, esta vertente é menos acentuada se comparada com a outra variável da condição<br />
dos produtores. Vale frisar que o quadro não faz distinção entre: gran<strong>de</strong>s, médios, pequenos e<br />
micros produtores rurais.<br />
O campo comum <strong>de</strong> interesses entre os dois grupos <strong>de</strong> assalariados rurais quer<br />
migrantes mais circunscritos ao trabalho agrícola do corte, trato e plantio da cana, quer os<br />
chamados trabalhadores originários aos quais atribuímos maior qualificação <strong>de</strong>ve ser<br />
116
encontrado num ambiente “fora” local <strong>de</strong> trabalho. O campo comum <strong>de</strong> interesse também<br />
entre assalariados <strong>de</strong> maneira geral e proprietários, ou empreen<strong>de</strong>dores, também po<strong>de</strong> ser<br />
encontrado apenas em ativida<strong>de</strong>s ou políticas que não estejam circunscritas ou não somente,<br />
ao local <strong>de</strong> trabalho. Estabelecemos um campo comum <strong>de</strong> interesse entre os dois grupos <strong>de</strong><br />
assalariados e proprietários que não esta circunscrito a um local <strong>de</strong> trabalho. Voltamos agora a<br />
estabelecer uma condição <strong>de</strong> diferença mais objetiva e econômica entre eles. Esta diferença é<br />
encontrada entre uma qualificação voltada aos postos <strong>de</strong> trabalho existentes em que estão<br />
situados os assalariados rurais, e uma qualificação voltada ao empreen<strong>de</strong>dorismo. Já o<br />
segundo grupo <strong>de</strong> trabalhadores que possui mais ou menos os meios 52 <strong>de</strong> produção, <strong>de</strong>ve<br />
pensar numa qualificação profissional que integre trabalho e capital. A qualificação<br />
profissional voltada a este segundo segmento <strong>de</strong> trabalhadores rurais não visa a preparação<br />
profissional para venda <strong>de</strong> força <strong>de</strong> trabalho, conforme acontece com o primeiro grupo, e sim<br />
uma qualificação profissional voltada à produção ou formação e <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> parque<br />
produtivo. I<strong>de</strong>ntificada esta diferença, po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar que no tocante à qualificação<br />
profissional existe uma diferença marcante, inclusive com relação aos interresses <strong>de</strong> cada um<br />
<strong>de</strong>stes grupos.<br />
Estabelece-se assim, zonas mais ou menos distintas <strong>de</strong> interesses no que dizem<br />
respeito ao tema da qualificação profissional rural que, do ponto <strong>de</strong> vista restrito ao local <strong>de</strong><br />
trabalho, parecem irreconciliáveis. Todavia, aberta <strong>de</strong>ntro dum ambiente social 53 que não faz<br />
esta separação entre local e mundo da vida, os interesses, sem distinção se i<strong>de</strong>ntificam. É o<br />
caso apontado, por exemplo, a partir do conceito <strong>de</strong> capital social. O gran<strong>de</strong> dilema, portanto,<br />
das políticas públicas <strong>de</strong> qualificação profissional está em lidar com estas zonas <strong>de</strong> interesse:<br />
a emergência e a dinâmica produtiva em conexão com as políticas públicas, ou até um<br />
ambiente institucional. Pensamos ambiente institucional como sendo diferente <strong>de</strong> arcabouço<br />
institucional. Este último diz respeito às normas, leis e regulamentações constituídas sobre as<br />
relações e até aos contratos <strong>de</strong> trabalho. (NEGRI, 2001) Já ambiente institucional é mais<br />
abrangente, compreen<strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações integradas, muitas, ou até a maioria e as<br />
52 Possuem mais ou menos”, pois apesar <strong>de</strong> possuírem a terra, e neste caso mais em termos <strong>de</strong> posse – uso do que<br />
unicamente relação <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> privada da terra, á terra não po<strong>de</strong> ser pensada como único meio <strong>de</strong> produção,<br />
nem mesmo como único meio material <strong>de</strong> produção. Mesmo sem entrar aqui no ponto sobre os “meios<br />
imateriais” <strong>de</strong> produção, como meio materiais po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>rados máquinas, implementos, estrutura física<br />
etc., sem os quais não é possível se inserir <strong>de</strong>ntro duma perspectiva produtiva.<br />
53 Pensamos “ambiente social” no contexto que propicia o conceito <strong>de</strong> capital social. Neste sentido é a<br />
cristalização <strong>de</strong> normas <strong>de</strong> reciprocida<strong>de</strong>, interação cooperativa (em que se pressupõe a disputa <strong>de</strong> interesses)<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado contexto, que, portanto, ten<strong>de</strong> a extrapolar os limites meramente físicos e geográficos,<br />
sem prescindir <strong>de</strong>stes. Neste sentido, respon<strong>de</strong> à institucionalização constituída, sem, contudo, se limitar a ela.<br />
117
principais, <strong>de</strong> caráter subjetivo como confiança, conhecimento, cooperação, reciprocida<strong>de</strong>,<br />
etc. (ABRAMOVAY, 2000).<br />
Para a construção <strong>de</strong> um ambiente institucional em que a qualificação profissional<br />
interaja com e nas diferenças <strong>de</strong> interesses, importa saber como po<strong>de</strong>m ser estabelecidos elos<br />
<strong>de</strong> comunicação e reciprocida<strong>de</strong>. A dificulda<strong>de</strong> em pensar esta relação é mais institucional<br />
(construída) do que possa parecer. Conforme apontam Galvão, Urani e Cocco (1999), a<br />
construção do Estado Nacional passou uma espécie <strong>de</strong> “régua” entre os que estavam fora, e os<br />
que integravam o mundo do trabalho. Para os <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro, todas as garantias sociais <strong>de</strong><br />
cidadania, para os que permanecem fora, nenhum reconhecimento. Que pese ainda a cultura<br />
sobre o trabalho criada a partir <strong>de</strong>sta regulação, trabalho e trabalhador era uma condição <strong>de</strong><br />
reconhecimento do Estado. Mas o mundo produtivo sempre se moveu também fora, ou para<br />
além <strong>de</strong>sta regulação.<br />
118<br />
No caso brasileiro, temos que a segmentação <strong>de</strong> nosso mercado <strong>de</strong> trabalho<br />
reforça a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte da massa excluída da formalida<strong>de</strong> em<br />
construir cultura política. O esforço getulista na promoção <strong>de</strong> um mercado<br />
formal <strong>de</strong> trabalho, on<strong>de</strong> alguns seriam incluídos e disporiam <strong>de</strong> direitos<br />
garantidos, <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> fora uma parcela significativa da população, que passou<br />
a <strong>de</strong>sempenhar suas ativida<strong>de</strong>s econômicas à margem da oficialida<strong>de</strong> ou da<br />
formalida<strong>de</strong>. Este enorme contingente populacional ocupa os níveis mais<br />
baixos na hierarquia do mercado <strong>de</strong> trabalho, dispondo <strong>de</strong> menos<br />
qualificação, renda menor e nem um direito formal garantido pelo Estado. O<br />
grupo formalizado, ou aqueles com carteira <strong>de</strong> trabalho construiu uma<br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> no imaginário popular nacional tão forte que a referência a este<br />
grupo passou a ser mais importante entre todas as <strong>de</strong>mais. (GALVÃO;<br />
URANI; COCCO, 1999, p. 28)<br />
No momento que este arcabouço institucional sobre o trabalho entra em crise, ele<br />
sugere que o Estado já não é mais capaz <strong>de</strong> se organizar através da regulação do trabalho.<br />
Uma porque o trabalho produtivo se moveu para fora da regulação <strong>de</strong> Estado; outra, porque a<br />
constituição jurídica <strong>de</strong> Estado sobre o trabalho envelheceu, não sendo mais capaz <strong>de</strong><br />
respon<strong>de</strong>r sobre a maior parte da potência produtiva. Ou como aponta Negri e Hardt, (2004, p.<br />
24 - 52):<br />
[...] a organização do Estado e da sua lei está, em gran<strong>de</strong> parte ligada à<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construir uma or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> reprodução social baseada no<br />
trabalho, e a forma do Estado e da sua lei é transformada <strong>de</strong> acordo com as<br />
modificações da natureza do trabalho [...] O Estado <strong>de</strong> bem-estar social <strong>de</strong>ve<br />
conter a produção <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um processo estável <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento social<br />
e econômico. O <strong>de</strong>senvolvimento do Estado <strong>de</strong> bem-estar social ao longo do
119<br />
século XX como Estado Social comportou, sobretudo, um processo <strong>de</strong><br />
constitucionalização do trabalho, o que significa a mediação e a regulação<br />
<strong>de</strong> suas forças produtivas e antagonistas <strong>de</strong>ntro da constituição jurídica <strong>de</strong><br />
Estado, baseada, por sua vez, nessas mesmas forças <strong>de</strong> trabalho.<br />
Insistir, portanto, numa qualificação profissional amparada nesta distinção entre fora e<br />
<strong>de</strong>ntro, apenas reforça esta construção institucional que necessariamente previa que trabalho<br />
produtivo era trabalho regulado. Neste caso, estaríamos hoje excluindo a maior parcela da<br />
população dos direitos sociais, <strong>de</strong>ntre os quais o da qualificação profissional financiada e<br />
gerida com recursos públicos; Se optássemos por <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar a parcela da socieda<strong>de</strong> que<br />
ainda integra a regulação dos contratos 54 formais <strong>de</strong> trabalho, também cairíamos em equivoco.<br />
É preciso lidar com estas duas realida<strong>de</strong>s tendo em vista as diferenças, sem excluí-las, ou<br />
mesmo sem colocá-las como antagônicas. Pensar <strong>de</strong>sta forma significa estabelecer duas zonas<br />
<strong>de</strong> interesses distintos, encontrando elos <strong>de</strong> comunicação entre eles, sem o antagonismo <strong>de</strong><br />
escolhas entre elas. Este elo <strong>de</strong> comunicação entre interesses que aparecem como distintos, a<br />
partir <strong>de</strong> agora passam a se aproximar. Caminham quiçá para uma nova institucionalida<strong>de</strong>,<br />
preocupação apontada pelo professor Pastore (2000) quando fala em “pontaria” da<br />
qualificação profissional entre uma qualificação geral e outra específica.<br />
O que é melhor para os trabalhadores – conhecimentos gerais ou<br />
específicos? Embora o primeiro tipo garanta mais alternativas <strong>de</strong> trabalho,<br />
as instituições <strong>de</strong> treinamento e retreinamento (e os próprios trabalhadores)<br />
ten<strong>de</strong>m a escolher os treinamentos específicos. Nesse caso, a questão <strong>de</strong><br />
pontaria se avoluma. Será que há vagas abertas para esse tipo <strong>de</strong><br />
trabalhador? Se for admitido, terá ele chance <strong>de</strong> permanecer no emprego? E,<br />
se não for admitido, o que fará com conhecimentos tão específicos? Os<br />
trabalhadores que recebem conhecimentos gerais (básicos) <strong>de</strong>senvolvem<br />
lógica <strong>de</strong> raciocínio; adquirem habilida<strong>de</strong>s para apreen<strong>de</strong>r outras coisas;<br />
trabalham bem em grupo; têm potencialida<strong>de</strong> para empregar-se (...) Mas,<br />
por causa das pressões da necessida<strong>de</strong> imediata, os trabalhadores optam por<br />
treinamentos e retreinamentos específicos. E, para muitos, esse<br />
conhecimento fica rapidamente obsoleto.<br />
Trabalhar com o problema e as mudanças no mundo produtivo parece mais acertado<br />
que estabelecer pólos <strong>de</strong> antagonismos que na maioria das vezes, para não dizer sempre,<br />
ten<strong>de</strong>m apenas a estruturar institucionalmente <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s que existindo na realida<strong>de</strong> são<br />
54 Que pese todas as irregularida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>srespeitos ao arcabouço legal sobre a regulação do trabalho no meio<br />
agrícola, e mais particularmente aquele voltado para os chamados “trabalhadores da cana”, este tipo <strong>de</strong> trabalho<br />
é amparado e assegurado pela estrutura social e jurídica. Neste sentido o Estado providência ou Estado <strong>de</strong> Bem<br />
estar, existe e é presente para este tipo <strong>de</strong> trabalhador.
sufocadas no prisma da construção <strong>de</strong> hegemonias, consi<strong>de</strong>radas necessárias para a<br />
construção <strong>de</strong> um ambiente institucional <strong>de</strong> políticas públicas.<br />
4.3 O Foco da qualificação no PLANFOR e PNQ, fe<strong>de</strong>rações e centrais sindicais.<br />
O PLANFOR tinha como público alvo prioritário, empregados e <strong>de</strong>sempregados, mas<br />
tinha também os autônomos e empreen<strong>de</strong>dores. As políticas <strong>de</strong> formação profissional<br />
amparadas no programa acabaram priorizando os dois primeiros segmentos <strong>de</strong> trabalhadores<br />
(pessoas <strong>de</strong>socupadas e pessoas ocupadas em risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>socupação), uma vez que o quadro<br />
institucional, conforme vimos, favorecia esta relação. Ou em outras palavras pensava-se<br />
resolver ou amenizar o problema a partir <strong>de</strong>ste quadro <strong>de</strong> institucionalida<strong>de</strong>. O mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />
estrutura sindical que é tema <strong>de</strong> outro capítulo, não apenas na concepção, mas na prática,<br />
fazendo distinção precisa entre capital e trabalho, acabava reproduzindo <strong>de</strong>ntro dos conselhos<br />
tripartites, este arcabouço institucional. A reprodução <strong>de</strong>sta política, como já frisamos,<br />
priorizou a relação emprego e <strong>de</strong>semprego em vez <strong>de</strong> trabalho e renda.<br />
Os trabalhadores <strong>de</strong>veriam ser qualificados para aten<strong>de</strong>r às novas <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> mão<strong>de</strong>-obra,<br />
apesar <strong>de</strong> que este não era o único foco do programa. Provavelmente o equivoco não<br />
do PLANFOR, mas das políticas <strong>de</strong> qualificação que se ampararam nele foi acreditar, ou<br />
propagar, que seria possível qualificar estes trabalhadores <strong>de</strong> “baixa qualificação” para os<br />
postos <strong>de</strong> trabalho que estavam surgindo, e que estes por sua vez seriam capazes <strong>de</strong> absorver<br />
<strong>de</strong>sempregados ou então garantir empregabilida<strong>de</strong> para os trabalhadores em risco <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>socupação. O quadro mostra em linhas gerais o alvo e objetivos do PLANFOR:<br />
120
PLANFOR: público alvo prioritário<br />
Grupos Composição<br />
1. pessoas <strong>de</strong>socupadas<br />
2. pessoas ocupadas, em<br />
risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>socupação<br />
permanente ou conjuntural<br />
3.empreen<strong>de</strong>dores (que já<br />
.Desempregadas com seguro <strong>de</strong>semprego;<br />
.Desempregadas sem seguro <strong>de</strong>semprego;<br />
.Cadastradas no SINE e Agências <strong>de</strong> Trabalho <strong>de</strong> sindicatos;<br />
.Jovens buscando 1º trabalho;<br />
Empregados/as em setores que estão passando por mo<strong>de</strong>rnização ou<br />
reestruturação, enxugando quadros e/ou exigindo novos perfis profissionais. Ex.:<br />
bancos, portos, indústrias, administração pública;<br />
Trabalhadores/as em ativida<strong>de</strong>s sujeitas à instabilida<strong>de</strong> por fatores como clima,<br />
restrição legal, ciclo econômico. Ex.: pescadores/as em períodos <strong>de</strong> <strong>de</strong>feso;<br />
agricultores/as em ativida<strong>de</strong>s sujeitas a flagelos do clima (seca, geada, inundação)<br />
e a conjunturas do mercado internacional (crises financeiras, medidas <strong>de</strong><br />
protecionismo);<br />
Trabalhadores/as domésticos/as;<br />
têm ou querem iniciar micro e Agricultores/as familiares<br />
pequenos negócios)<br />
4. pessoas autônomas<br />
Associadas<br />
cooperadas<br />
auto geridas<br />
Beneficiários/as do crédito popular (Proger, Pronaf);<br />
Beneficiários/as do Brasil Empreen<strong>de</strong>dor<br />
Assentados/as rurais<br />
sócios/as ou donos/as <strong>de</strong> pequenos negócios urbanos<br />
Trabalhando por conta própria;<br />
Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego, 2006<br />
Participantes <strong>de</strong> associações, cooperativas, grupos <strong>de</strong> produtoresque assumem a<br />
gestão <strong>de</strong> empresas, para garantir sua continuida<strong>de</strong> e os empregos<br />
Este tipo <strong>de</strong> política não funcionou porque errou o alvo, falhou na pontaria, conforme<br />
aponta Pastore (2000), ao analisar o dilema trazido não pelo PLANFOR, mas pelos programas<br />
estabelecidos a partir <strong>de</strong>le:<br />
121<br />
O ajuste entre <strong>de</strong>manda imediata, <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> longo prazo e o conteúdo<br />
curricular dos programas <strong>de</strong> treinamento e retreinamento é extremamente<br />
complexo. Na verda<strong>de</strong>, a dicotomia entre treinamentos gerais e específicos<br />
está per<strong>de</strong>ndo o sentido prático, pois o mercado necessita <strong>de</strong> trabalhadores<br />
que tenham, simultaneamente, uma sólida formação básica e bons<br />
conhecimentos <strong>de</strong> tecnologia específicas. [...] Retreinar, reciclar e<br />
reconverter mão-<strong>de</strong>-obra são ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> alto risco. A apuração da<br />
pontaria é o gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>safio para essas ativida<strong>de</strong>s. E, lamentavelmente, não<br />
há receitas prontas para acertar no alvo.<br />
No que se relaciona à qualificação específica, evi<strong>de</strong>ntemente que as coisas ficam mais<br />
complicadas uma vez que é necessário voltar a atenção aos empregos existentes, buscando
solucionar o problema <strong>de</strong> maneira pontual e a curto prazo. Defen<strong>de</strong>-se uma posição na qual as<br />
políticas públicas e sindicais <strong>de</strong> qualificação profissional não <strong>de</strong>ve se pren<strong>de</strong>r a um tipo <strong>de</strong><br />
trabalho como o do corte <strong>de</strong> cana, por exemplo, dada a exploração e não possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
qualificação <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>. Por outro lado, qualificar trabalhadores expulsos <strong>de</strong>stes<br />
postos <strong>de</strong> trabalho tendo em vista os novos postos criados a partir <strong>de</strong>stes, não po<strong>de</strong> ser<br />
apontado como solução para o <strong>de</strong>semprego.<br />
Dentre as entrevistas que realizamos com alunos dos cursos <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional executados por sindicatos dos trabalhadores rurais, professores e, em alguns<br />
casos, com trabalhadores do corte da cana, o público era bastante heterogêneo. (ALEX; JR.;<br />
TIAGO, 2000). Jovens, aposentados, filho e netos <strong>de</strong> pequenos proprietários ou assalariados<br />
rurais ou não, <strong>de</strong>sempregados, etc. (ELISA, sic. 2000). Não havia um perfil <strong>de</strong>finido <strong>de</strong><br />
alunos, ainda que <strong>de</strong> alguma maneira pu<strong>de</strong>ssem ser enquadrados <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> algum dos<br />
segmentos do “público alvo”, tanto do PLANFOR quanto do PNQ.<br />
O perfil profissional encontrado principalmente entre os trabalhadores volantes não<br />
comporta políticas <strong>de</strong> qualificação possível, quer específica ou geral no tocante à manutenção<br />
<strong>de</strong> seus postos <strong>de</strong> trabalho. Não comporta nenhuma possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong><br />
“saberes” ou conhecimentos que possam ser passados via cursos <strong>de</strong> qualificação profissional<br />
para o tipo <strong>de</strong> trabalhos que exercem. Também não comporta possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> qualificação<br />
específica voltadas aos novos postos <strong>de</strong> trabalho que estão surgindo, uma vez que na maioria<br />
das vezes não possuem o conhecimento geral necessário para interagir com estes conteúdos.<br />
Este é o perfil do trabalhador que está ocupando os postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> baixa remuneração e<br />
qualificação no meio rural.<br />
Temos, portanto, uma situação em que existem saídas possíveis, que <strong>de</strong>ve apresentar<br />
ações conjugadas e interrelacionadas em duas vertentes: Uma qualificação geral e que não<br />
restrinja campos <strong>de</strong> interesses. Esta apenas po<strong>de</strong> ser encontrada na falta <strong>de</strong> especificida<strong>de</strong> e <strong>de</strong><br />
foco nas ações e investimentos na escolarida<strong>de</strong>, educação, condições <strong>de</strong> acesso aos direitos e<br />
serviços públicos <strong>de</strong> educação e outras políticas que a visem ou proporcione. Outra, ao<br />
contrário da primeira, focando a satisfação mais imediata e pontual <strong>de</strong> interesses, que seja<br />
capaz <strong>de</strong> conjugar em curto prazo a relação teoria e prática. Ou seja, numa qualificação que<br />
possa aten<strong>de</strong>r <strong>de</strong> imediato aos interesses <strong>de</strong> um “mercado <strong>de</strong> trabalho” e <strong>de</strong> um “mercado<br />
produtivo”. Uma qualificação em suma, que reverta <strong>de</strong> imediato o aprendizado em<br />
intervenção prática na forma <strong>de</strong> emprego, trabalho, renda e produção. Mas esta última se po<strong>de</strong><br />
dizer, não po<strong>de</strong>rá ser encontrada nos postos <strong>de</strong> trabalho existentes na relação <strong>de</strong><br />
122
assalariamento rural, ou melhor, em alguns sim, mas que não absorveram a gran<strong>de</strong> maioria da<br />
mão-<strong>de</strong>-obra.<br />
Des<strong>de</strong> então, o complicador resi<strong>de</strong> no fato da qualificação profissional específica,<br />
digamos, não po<strong>de</strong>r ser tão precisamente específica. Por outro lado, da qualificação<br />
profissional geral não po<strong>de</strong>r ser geral a ponto <strong>de</strong> não antever o alvo do trabalho, emprego,<br />
renda como direitos <strong>de</strong> cidadania. Ou então é preciso estar atento para a construção <strong>de</strong> novas<br />
institucionalida<strong>de</strong>s em que a qualificação profissional entre geral e específica possa se mover.<br />
Vale atentar para a forma que o PNQ e as duas principais centrais sindicais tratam<br />
<strong>de</strong>sta questão. Lembrando que no caso dos sindicatos a prática, positivamente, tem se<br />
<strong>de</strong>scolado bastante da teoria.<br />
O movimento sindical, e em se tratando do meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto,<br />
mais a tradição que vem pela CUT – FERAESP, historicamente separaram a qualificação<br />
profissional em duas frentes. Uma voltada às questões pontuais e <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>s imediatas<br />
<strong>de</strong> sobrevivência inseridas <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um “mercado <strong>de</strong> trabalho”, e outra que diz respeito à<br />
“emancipação humana”. Uma, portanto, voltada à questões mais pontuais e direcionadas,<br />
outra geral. No mais das vezes, o mal está em não estabelecer conexão entre estas duas<br />
concepções, pois por um lado se permite a qualificação que atenda apenas e pontualmente às<br />
necessida<strong>de</strong>s do mercado, ou postos <strong>de</strong> trabalho; por outro prega, uma qualificação voltada a<br />
um tipo <strong>de</strong> emancipação que se constitui num i<strong>de</strong>ário <strong>de</strong>slocado da realida<strong>de</strong>. As diferenças <strong>de</strong><br />
concepção sobre a formação profissional são colocadas por Santana, Souza e Deluiz (1999, p.<br />
162 - 163):<br />
123<br />
Coesa a visão <strong>de</strong> uma educação voltada para a transformação da realida<strong>de</strong>, a<br />
CUT <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que os trabalhadores <strong>de</strong>vem ser preparados técnica e<br />
politicamente para a intervenção nos rumos da reestruturação produtiva; [...]<br />
A FS chega a afirmar que a precarieda<strong>de</strong> das possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho se<br />
<strong>de</strong>ve ao não preparo do trabalhador segundo os novos requisitos postos pelo<br />
processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva. [...] à CUT, vincula à cidadania não<br />
apenas às condições <strong>de</strong> acesso do trabalhador a educação, seja ela geral ou<br />
específica, mas a um tipo <strong>de</strong> educação <strong>de</strong> caráter crítico que, em vez <strong>de</strong><br />
oferecer respostas técnicas ás exigências do mundo produtivo, subsidie a<br />
luta daquela classe pelo controle do processo e do mercado <strong>de</strong> trabalho. [...]<br />
Na concepção da FS, a cidadania é posta como <strong>de</strong>corrente da igualda<strong>de</strong> da<br />
oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso à formação e à informação por trabalhadores<br />
<strong>de</strong>sempregados ou não. [...]<br />
A concepção da FS, portanto da FETAESP, sobre a relação trabalho e cidadania<br />
encontrou melhor i<strong>de</strong>ntificação no PLANFOR. A visão da CUT sempre foi mais crítica,
chamando atenção para o fato <strong>de</strong> que a qualificação que se estava propondo visava mais<br />
aten<strong>de</strong>r aos interesses do mercado <strong>de</strong> trabalho e não ao dos trabalhadores.<br />
Disso resulta, ou pelo menos resultou, visto que atualmente esta relação ganha novos<br />
contornos, que no caso da FETAESP acabavam permitindo toda sorte <strong>de</strong> qualificação voltada<br />
a preencher postos <strong>de</strong> trabalho, uma vez que este seria o requisito básico indispensável para a<br />
conquista e reconhecimento da cidadania. No caso da FERAESP, investia-se numa<br />
qualificação que não tinha nenhuma, ou tinha pouca intervenção prática, ainda que o conteúdo<br />
<strong>de</strong> formação geral fosse sólido e abrangente. No caso da FERAESP ou eram cursos<br />
específicos direcionados aos assentados em políticas <strong>de</strong> Reforma Agrária, e neste caso tinhase<br />
manejo da planta <strong>de</strong> café, pastagem, forragem, cultura orgânica, <strong>de</strong>ntre outros, ou então,<br />
como na maioria dos casos, eram cursos amplos que investiam no fator conscientização como:<br />
globalização, relações <strong>de</strong> trabalho, etc., voltados para a formação <strong>de</strong> militantes. O problema é<br />
que sempre houve pouca conexão tanto entre estes módulos <strong>de</strong> cursos, quanto com relação ao<br />
público atendido. Dada a própria estrutura <strong>de</strong> representação da FERAESP, conforme já foi<br />
pontuado, cursos mais específicos e pontuais eram reservados á pequenos produtores, todos,<br />
ou a maioria <strong>de</strong>les, assentados em políticas <strong>de</strong> Reforma Agrária; Os cursos amplos e pouco<br />
direcionados serviam assim á própria “falta <strong>de</strong> foco”, ou seja, na ausência <strong>de</strong> saída para o<br />
problema da reversão profissional, este cursos eram <strong>de</strong>stinados na maioria dos casos aos<br />
assalariados rurais, visando a “conscientização” <strong>de</strong>stes.<br />
Talvez o mal da FETAESP e <strong>de</strong>sta forma da própria FS tenha sido investir sem<br />
escrúpulos no primeiro caso. Numa qualificação voltada às <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> mercado, sem<br />
atentar para o segundo, que sempre foi priorida<strong>de</strong> da FERAESP via CUT. Já no caso da<br />
FERAESP, foi priorizar a formação geral <strong>de</strong> conteúdo crítico, sem dar a <strong>de</strong>vida atenção para<br />
pontos mais direcionados e específicos da qualificação profissional. Conforme já se pontuou,<br />
em boa medida, tais fatores se <strong>de</strong>vem a própria estrutura <strong>de</strong> representação <strong>de</strong> cada um <strong>de</strong>stes<br />
recortes sindicais.<br />
Já o PNQ (2003 – 2007), do ponto <strong>de</strong> vista conceitual, acerta ao reconhecer a<br />
diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> grupos a serem atendidos por estas políticas. Foi também isto que permitiu que<br />
estabelecêssemos as chamadas “zonas <strong>de</strong> interesse”. O ponto <strong>de</strong>sta discussão está na admissão<br />
da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um novo “pacto social”, conforme o próprio Programa Fe<strong>de</strong>ral mais <strong>de</strong> uma<br />
vez faz referência. Este, evi<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong>ve passar pela re<strong>de</strong>finição <strong>de</strong> parque produtivo,<br />
<strong>de</strong>senvolvimento, emprego, trabalho e renda. Ocorre que para que isso possa fluir é preciso<br />
admitir os novos espaços produtivos que se formam e que nem sempre são amparados e<br />
reconhecidos pela velha institucionalida<strong>de</strong>. Mesmo sem entrar na qualificação do que seria<br />
124
esta informalida<strong>de</strong>, vale ressaltar que o setor informal, quando observado <strong>de</strong> perto, assusta.<br />
Dentro do que se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar como setor produtivo, a informalida<strong>de</strong> se aproxima dos<br />
40% (IBGE, 2006). Para cada 32 milhões <strong>de</strong> trabalhadores no mercado formal <strong>de</strong> trabalho,<br />
existe um correspon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> informais na casa dos 48 milhões que não são assistidos por<br />
nenhuma regulação e garantias formais <strong>de</strong> contrato <strong>de</strong> trabalho. Ainda que seja natural o<br />
esforço do Estado na busca em trazer estes negócios para o campo da regulação formal, é<br />
preciso permitir o acesso, espaço para que novas forças produtivas sejam reconhecidas como<br />
tal. O PNQ significa um avanço neste sentido.<br />
O PNQ, ao reconhecer o campo geral e também restrito da qualificação profissional,<br />
reconhece as diferenças apontando para a re<strong>de</strong>finição <strong>de</strong> novos espaços <strong>de</strong> institucionalida<strong>de</strong>.<br />
A crítica à pouca base <strong>de</strong> articulação do PLANFOR consta do próprio PNQ, (PNQ, 2003, p.<br />
19):<br />
125<br />
[...] evi<strong>de</strong>ncia importantes lacunas, incoerências, limitações, tais como:<br />
pouca integração entre a Política Pública <strong>de</strong> Qualificação Profissional e as<br />
<strong>de</strong>mais Políticas Públicas Trabalho e Renda [...] <strong>de</strong>sarticulação <strong>de</strong>sta em<br />
relação às Políticas Públicas <strong>de</strong> Educação [...] Fragilida<strong>de</strong> das Comissões<br />
Estaduais e Municipais <strong>de</strong> Trabalho [...] baixo grau <strong>de</strong> institucionalida<strong>de</strong> da<br />
re<strong>de</strong> nacional <strong>de</strong> qualificação profissional [...] ênfase do PLANFOR nos<br />
cursos <strong>de</strong> curta duração, voltados ao tratamento fundamentalmente das<br />
“habilida<strong>de</strong>s específicas” [...] fragilida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>ficiências no sistema <strong>de</strong><br />
planejamento, monitoramento e avaliação do PLANFOR.”<br />
A partir das críticas que o próprio texto formula ao PLANFOR, po<strong>de</strong>mos extrair as<br />
diretrizes <strong>de</strong> correção <strong>de</strong>sta rota. Portanto, o PNQ tem como meta não substituir o PLANFOR,<br />
mas o espírito que norteia o novo programa é o <strong>de</strong> correção <strong>de</strong> rotas. Neste, inclui o que<br />
aponta como falhas do antigo programa propondo alternativas que <strong>de</strong>vem ser corrigidas na<br />
base da experimentação. Experimentação expressa na possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> correção <strong>de</strong> rotas no<br />
curso da própria execução do programa. Sobre este ponto, vale pon<strong>de</strong>rar que a base <strong>de</strong><br />
correção <strong>de</strong> rotas que o PNQ estabelece com relação ao PLANFOR se aproveita mais das<br />
avaliações dos programas e cursos do que do texto do plano. Visando a correção <strong>de</strong> rotas com<br />
relação às políticas <strong>de</strong> qualificação estabelecidas pelo PLANFOR, e com relação às políticas<br />
do próprio programa, o PNQ estabelece metas anuais com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> serem<br />
rediscutidas constantemente. Esta previsão possibilita que as políticas <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional sejam constantemente revistas com base nas transformações <strong>de</strong> toda or<strong>de</strong>m, com<br />
especial atenção para aquelas pertinentes à economia e ao mundo produtivo.
Tem-se uma situação em que são urgentes e necessários tanto a difusão das políticas<br />
públicas <strong>de</strong> qualificação quanto o reconhecimento e inclusão <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> contingente <strong>de</strong><br />
trabalhadores que não são atendidos por elas. Por outro lado, seria necessário estabelecer<br />
conexão entre zonas <strong>de</strong> interesses. Tais zonas se remetem diretamente a ponto <strong>de</strong> uma<br />
qualificação geral e outra específica, que por sua vez são construídas sobre o prisma <strong>de</strong> dois<br />
componentes básicos discutidos no início <strong>de</strong>ste capítulo. Trata-se da intermediação, ou do<br />
reconhecimento <strong>de</strong>sta por parte <strong>de</strong> uma estrutura publica <strong>de</strong> qualificação entre o que ainda<br />
têm-se como separado: trabalho e “não trabalho”.<br />
Temos assim a seguinte situação: a qualificação geral i<strong>de</strong>ntificada na zona <strong>de</strong> interesses<br />
comuns entre grupos possibilita escolhas. A qualificação geral possibilita compreensão e<br />
facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso aos melhores empregos. Para chegar a este ponto, não é preciso gran<strong>de</strong><br />
esforço <strong>de</strong> compreensão. Os novos trabalhos que surgem no meio rural que aqui i<strong>de</strong>ntificamos<br />
como operadores <strong>de</strong> máquinas <strong>de</strong> maneira geral, mas que também po<strong>de</strong>m ser administradores<br />
rurais ou mesmo <strong>de</strong> gerenciamento <strong>de</strong> pequenas proprieda<strong>de</strong>s, ou ainda <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />
proprieda<strong>de</strong>s, necessitam <strong>de</strong> conhecimentos aberto e <strong>de</strong> condições <strong>de</strong> acesso a este. Isso tanto<br />
do ponto <strong>de</strong> vista da inserção imediata, quanto da fruição e capacida<strong>de</strong> inventiva.<br />
Os operadores <strong>de</strong> máquinas que entrevistamos possuem algum nível <strong>de</strong> acesso ao<br />
conhecimento ou mesmo <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong>, que permite com que leiam códigos <strong>de</strong> comando,<br />
façam contas e no mais das vezes tomem <strong>de</strong>cisões que implicam neste conhecimento. É<br />
preciso notar que aqui falamos <strong>de</strong> grau <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong>, mas, mais do que isso, falamos na<br />
capacida<strong>de</strong> necessária <strong>de</strong> interação com a linguagem codificada. Fatores que são encontrados<br />
mais facilmente entre os trabalhadores locais do que entre os trabalhadores volantes. Tanto no<br />
assalariamento agrícola e nas gran<strong>de</strong>s produções monocultoras, quanto no gerenciamento e<br />
intervenção geral das pequenas proprieda<strong>de</strong>s é preciso acesso ao conhecimento: linguagem,<br />
códigos, acesso ao computador, leitura <strong>de</strong> comandos e tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> acordo com este<br />
conhecimento, muitas vezes estudos <strong>de</strong> tendências <strong>de</strong> mercado, etc.<br />
Em todos estes casos é preciso acesso ao conhecimento, sendo que o primeiro <strong>de</strong>les é<br />
dado pela educação formal. Neste sentido, para a gran<strong>de</strong> maioria dos trabalhadores migrantes,<br />
a qualificação voltada a estes trabalhos mais específicos também não serve. Mesmo existindo<br />
trabalhadores do corte com algum grau <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong> e condições <strong>de</strong> acesso ao<br />
conhecimento, conforme pu<strong>de</strong>mos observar, são casos reduzidos e isolados. Já entre os<br />
operadores <strong>de</strong> máquinas, principalmente aqueles que operam as novas colheita<strong>de</strong>iras,<br />
planta<strong>de</strong>iras, que gerenciam o trato das lavouras, os aplicativos <strong>de</strong> agrotóxicos, etc., o grau <strong>de</strong><br />
126
escolarida<strong>de</strong> e acesso ao conhecimento é bastante superior se comparado com os<br />
trabalhadores “braçais”.<br />
Ao que enten<strong>de</strong>mos, este <strong>de</strong>snível que na maioria das vezes impossibilita o próprio<br />
acesso ao conhecimento, em boa medida explica o fator <strong>de</strong> resistência entre os trabalhadores.<br />
Uma resistência geral, e não apenas no local <strong>de</strong> trabalho, que acaba diferenciando o<br />
trabalhador resi<strong>de</strong>nte do trabalhador volante ou migrante, conforme veremos adiante. Por<br />
outro lado, a qualificação profissional focada e conjugada como política pública <strong>de</strong> reversão<br />
<strong>de</strong>ste quadro aparece como eixo central e prioritário. Os trabalhadores que i<strong>de</strong>ntificamos<br />
como resi<strong>de</strong>ntes aos quais atribuímos maior escolarida<strong>de</strong> e qualificação se “negam” a fazer<br />
aquele tipo <strong>de</strong> trabalho reservado aos trabalhadores migrantes temporários e volantes. Este<br />
segmento <strong>de</strong> trabalhadores quase sempre é capaz <strong>de</strong> mobilizar conhecimento necessário para<br />
se integrarem ao mercado <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> maneira mais qualificada.<br />
4.4 Qualificação profissional como resistência produtiva<br />
A separação entre local <strong>de</strong> trabalho e fora do local <strong>de</strong> trabalho, uma vez reproduzida<br />
ten<strong>de</strong> a também reproduzir, como falam Bourdieu e Passeron (1992) sobre a reprodução<br />
social, a falta <strong>de</strong> foco sobre o tema da qualificação profissional e a condição <strong>de</strong> excluídos e<br />
incluídos nos programas <strong>de</strong> qualificação profissional, mundo produtivo e mercado <strong>de</strong><br />
trabalho. Apontamos anteriormente que este quadro <strong>de</strong> reprodução institucional ocorre<br />
quando se estabelece e se institucionalizam dicotomias que não existem como tais na<br />
realida<strong>de</strong>. Também, que é necessário lidar com as diferenças <strong>de</strong> maneira geral, com particular<br />
atenção a diferença <strong>de</strong> interesses.<br />
Cabe consi<strong>de</strong>rar agora como foi ou como é que este trabalhador assalariado rural da<br />
parte agrícola <strong>de</strong>ixa, ou po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar, esta condição sendo inserido numa perspectiva<br />
empreen<strong>de</strong>dora, ou então passando a interagir com as novas conquistas tecnológicas. Este é,<br />
senão o foco, o eixo central das políticas públicas <strong>de</strong> qualificação profissional. A questão que<br />
colocamos aqui recupera um ponto propositalmente <strong>de</strong>ixado logo acima, quando<br />
diferenciamos dois tipos <strong>de</strong> trabalhadores e <strong>de</strong> qualificação profissional no meio rural da<br />
região <strong>de</strong> Ribeirão Preto. Também, quando traçamos pontos <strong>de</strong> diferença entre o grupo dos<br />
assalariados rurais locais ou originários e dos trabalhadores migrantes temporários. Vale<br />
atentar para um aporte teórico que se refere à regulação formal ou contrato <strong>de</strong> trabalho.<br />
Aporte este que <strong>de</strong>stacamos como um clássico ponto nodal da sociologia do trabalho.<br />
127
Claus Offe (1989) aponta que o contrato <strong>de</strong> trabalho, apesar <strong>de</strong> figurar como qualquer<br />
outro contrato <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> mercadorias é único e inconfundível. Para Offe, a<br />
particularida<strong>de</strong> do contrato <strong>de</strong> trabalho resi<strong>de</strong> no fato da impossibilida<strong>de</strong> da precisão efetiva<br />
do cumprimento por uma das partes envolvidas. O trabalhador “possui” algo único e<br />
inconfundível que apesar <strong>de</strong> colocado no mercado como outra mercadoria qualquer, nunca<br />
po<strong>de</strong> ser efetivamente cumprido nos termos formais <strong>de</strong> um contrato <strong>de</strong> compra e venda. O que<br />
o trabalhador possui <strong>de</strong>ntro da relação formal <strong>de</strong> troca é força <strong>de</strong> trabalho, esta por sua vez é<br />
dotada <strong>de</strong> subjetivida<strong>de</strong>, característica única que a diferencia <strong>de</strong> qualquer outra mercadoria.<br />
Este é o ponto <strong>de</strong> abertura para pensar a resistência, pois o trabalho como mercadoria<br />
contém aquilo que nenhuma outra mercadoria possui: subjetivida<strong>de</strong>. Karl Polanyi (2000)<br />
também coloca nestes termos ao lembrar que o trabalho é uma mercadoria fictícia como outra<br />
qualquer, porém diferente <strong>de</strong> todas as <strong>de</strong>mais ao vir atada a um indivíduo dotado <strong>de</strong><br />
subjetivida<strong>de</strong> que entra numa relação <strong>de</strong> troca. Ocorre que para esta mesma troca se<br />
aperfeiçoar, este mesmo indivíduo tem que cooperar com quem comprou a força <strong>de</strong> trabalho.<br />
Tem que cooperar em sentido amplo, pois se trata da cooperação na produção.<br />
Quando Offe (1989), ou mesmo Polaniy (2000), colocam esta questão sobre a abertura<br />
<strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s a partir do contrato <strong>de</strong> trabalho, tacitamente estão admitindo a “perfeição”<br />
(precisão) das relações <strong>de</strong> mercado. Uma relação que aparece como perfeita do ponto <strong>de</strong> vista<br />
formal, ou até real em se tratando <strong>de</strong> mercadorias objetivas. Apontam que as relações <strong>de</strong><br />
mercado pressupõem contrapartidas exatas entre as partes envolvidas. Ocorre que em se<br />
tratando do componente subjetivida<strong>de</strong>, esta contrapartida nunca po<strong>de</strong> ser dada com precisão<br />
por uma das partes envolvidas: o trabalho.<br />
É esta característica singular que chamamos <strong>de</strong> subjetivida<strong>de</strong> que permite pensar a<br />
construção coletiva <strong>de</strong> alternativas produtivas, ou da resistência. Assim é importante frisar,<br />
que não é na crítica do mercado em geral, mas na admissão da impossibilida<strong>de</strong> da força <strong>de</strong><br />
trabalho como mercadoria se aperfeiçoar com a troca. E é evi<strong>de</strong>nte que aqui falamos do<br />
período <strong>de</strong> hegemonia industrial quando capital e trabalho são tidos como pólos antagônicos<br />
irreconciliáveis. Uma relação <strong>de</strong> trabalho, que conforme normas contratuais e <strong>de</strong> mercado<br />
<strong>de</strong>ve se esgotar no momento da troca, mas que permanece exigindo a cooperação, conforme<br />
postula Polaniy (2000), e que é por excelência uma cooperação que nunca po<strong>de</strong> ser prevista<br />
na sua totalida<strong>de</strong> absoluta conforme acontece em outros tipos <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> compra e venda.<br />
Esta mesma subjetivida<strong>de</strong> que figura como subjugada nos limites <strong>de</strong> mensuração <strong>de</strong> um<br />
contrato formal permite que Gid<strong>de</strong>ns (2001) construa sua Teoria da Estruturação. Nesta,<br />
Gid<strong>de</strong>ns aponta que é o <strong>de</strong>srespeito sutil e reiterado às normas contratuais (<strong>de</strong> trabalho,<br />
128
organização <strong>de</strong> Estado, etc.) que permite a mudança da socieda<strong>de</strong>. O autor afirma a<br />
impossibilida<strong>de</strong> do exato cumprimento dos códigos e normas formais e contratuais. Para<br />
tanto, dá o exemplo da linguagem entre a falada e a escrita. Conclui que não se po<strong>de</strong> respeitar<br />
os códigos formais da linguagem da mesma forma que é impossível cumprir com exatidão as<br />
normas do contrato <strong>de</strong> trabalho.<br />
Um dos caminhos pelo qual se po<strong>de</strong> enveredar para pensarmos a resistência no meio<br />
rural e a formação <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e ação entre os trabalhadores é aquele atinente às formas<br />
típicas do trabalho regulado. Caminho perseguido pela via das greves, negociações, dissídios<br />
coletivos, lutas por melhores condições salariais, <strong>de</strong> trabalho, etc. Não é preciso gran<strong>de</strong><br />
mobilização <strong>de</strong> argumentos, mesmo porque eles já foram apresentados anteriormente, para<br />
saber que as condições <strong>de</strong> trabalho pioraram e o emprego e os salários diminuíram. Este tipo<br />
<strong>de</strong> ação tem uma importância histórica e restrita. Histórica dado que tais eventos tiveram<br />
importância quando impactavam os ganhos <strong>de</strong> capital. Quando o assalariamento agrícola era<br />
imprescindível no meio rural. Quando o trato e colheita eram feitos completamente <strong>de</strong> forma<br />
manual, mobilizando um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> trabalhadores, uma greve <strong>de</strong> “cruzar os braços”<br />
em tempos <strong>de</strong> safra, por exemplo, podia significar perdas irreparáveis aos patrões. Havia,<br />
portanto, um amplo e frutífero terreno para este tipo <strong>de</strong> ação. Lutar por melhores condições <strong>de</strong><br />
salário e trabalho significava <strong>de</strong> fato mobilização, a partir das relações <strong>de</strong> um “local <strong>de</strong><br />
trabalho”, ou melhor, a partir <strong>de</strong> interesses mais localizados. Na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto,<br />
nada melhor para explicar este processo que a famosa greve <strong>de</strong> Guariba 55 .<br />
Atualmente, haveremos <strong>de</strong> admitir que não existe espaço privilegiado para este tipo <strong>de</strong><br />
ação simplesmente por não serem mais tão impactantes nos ganhos <strong>de</strong> capital 56 . Mesmo assim<br />
55 A “Greve <strong>de</strong> Guariba” foi dos movimentos mais conhecidos e impactantes no meio rural paulista á partir do<br />
assalariamento rural, e mais propriamente entre os trabalhadores assalariada cana. O movimento explo<strong>de</strong> em<br />
maio <strong>de</strong> 1984 sendo que a primeira reivindicação era contra a suspensão do fornecimento <strong>de</strong> água pela SABESP<br />
– Serviço <strong>de</strong> Abastecimento do Estado <strong>de</strong> São Paulo. Como Guariba concentrava o maior número <strong>de</strong><br />
trabalhadores assalariados rurais do Estado, o movimento explo<strong>de</strong> entre eles. A justificativa <strong>de</strong>stes moradores<br />
era que a água era cara e eles ganhavam pouco. Automaticamente o movimento se volta para as relações <strong>de</strong><br />
trabalho, especificamente no tocante as questões salariais. Neste momento, quando se torna questão pertinente ás<br />
relações <strong>de</strong> trabalho o Sindicato dos Trabalhadores Rurais local encampa o movimento que já havia se formado.<br />
Neste ínterim o movimento ganha força se expandindo para outras cida<strong>de</strong>s vizinhas como Barrinha, Sertãozinho<br />
etc., chegando a “contaminar” outras regiões do Estado. Dada a força do movimento os sindicatos organizados<br />
passam as reivindicações pertinentes as condições <strong>de</strong> trabalho como o chamado “corte <strong>de</strong> oito ruas” em que os<br />
trabalhadores tinham que seguir cortando por igual um número excessivo <strong>de</strong> ruas <strong>de</strong> cana, aumentando as<br />
dificulda<strong>de</strong>s e diminuindo rendimentos. O movimento organizado durou meses e chegou a ameaçar a or<strong>de</strong>m<br />
pública com <strong>de</strong>predações e <strong>de</strong>struição <strong>de</strong> prédios públicos. Autores <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m que foi á partir <strong>de</strong>ste movimento<br />
que a mecanização do corte <strong>de</strong> cana ganha impulso na região.<br />
56 Mesmo tendo sido pontuado em outros momentos, voltamos a insistir que as conquistas trabalhistas (direitos e<br />
regulamentação sobre o exercício do trabalho) são conquistas dos trabalhadores, ainda que reconhecidos nos<br />
limites estabelecidos pelo Estado. Todavia, tais conquistas não <strong>de</strong>vem ser tidas como fins últimos <strong>de</strong><br />
possibilida<strong>de</strong>s, mas como conquistas não cumulativas e pertinentes a um dado momento histórico. É neste<br />
sentido que as criticas e propostas sobre qualificação <strong>de</strong> reversão en<strong>de</strong>reçada á alguns tipos <strong>de</strong> trabalho, com<br />
129
elas existem e são importantes, ocorre que são concorrentes com outras formas <strong>de</strong> ação.<br />
Gran<strong>de</strong> parte das terras plantadas em cana, se não estão mecanizadas são passíveis <strong>de</strong><br />
mecanização. No caso da cana, dois fatores são apontados para a manutenção da mão-<strong>de</strong>-obra<br />
assalariada. O primeiro <strong>de</strong>les é que existe mão-<strong>de</strong>-obra barata disponível no mercado com<br />
especial atenção aos trabalhadores migrantes; o segundo, é que têm algumas faixas <strong>de</strong> terra<br />
em que as máquinas não po<strong>de</strong>m operar. Estas faixas <strong>de</strong> terra conforme afirmamos são<br />
reduzidas, e mesmo assim muitas em sistema <strong>de</strong> arrendamento e parceria estão sendo<br />
<strong>de</strong>volvidas para os proprietários. Soma-se a isso o fato da legislação específica ter se<br />
preocupado com a preservação ambiental, ocasião que muitas faixas <strong>de</strong> terra <strong>de</strong> difícil acesso,<br />
ou apresentando altos custos <strong>de</strong> produção, são reservadas para políticas <strong>de</strong> reflorestamento.<br />
Ao traçarmos zonas <strong>de</strong> interesses iguais e distintas entre dois grupos <strong>de</strong> trabalhadores<br />
rurais, apontamos entre um <strong>de</strong>stes grupos uma separação pontual no tocante à qualificação e<br />
condição <strong>de</strong> vida dos trabalhadores originários daqueles trabalhadores temporários migrantes.<br />
Apontamos ainda que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sta zona <strong>de</strong> interesses entre os dois grupos, haveria uma<br />
i<strong>de</strong>ntificação que os unia <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste mesmo campo <strong>de</strong> interesse e outra que os separava. A<br />
qualificação que une os dois segmentos <strong>de</strong>ste grupo é a mesma que os une ao grupo seguinte<br />
dos trabalhadores proprietários rurais ou na posse da terra. A diferença marcante que afasta os<br />
dois grupos é <strong>de</strong> cunho bastante pontual e institucional: “postos <strong>de</strong> trabalho”. A qualificação<br />
profissional que une os dois grupos é, portanto, a qualificação geral que não pressupõe uma<br />
qualificação voltada exclusivamente às exigências <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho. O problema então é<br />
colocado da seguinte maneira: se não po<strong>de</strong>mos insistir na dualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma qualificação geral<br />
e outra específica, dado que isso apenas reproduz um quadro institucional fechado entre<br />
trabalho e local <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> um lado e <strong>de</strong>semprego e exclusão do mundo produtivo <strong>de</strong><br />
outro, temos que pensar em construção <strong>de</strong> ambientes <strong>de</strong> institucionalida<strong>de</strong>s. A qualificação<br />
profissional <strong>de</strong>ve, portanto, propiciar, facilitar o capital social necessário para a construção<br />
<strong>de</strong>stes ambientes <strong>de</strong> institucionalida<strong>de</strong>.<br />
Aqui falamos em absenteísmo, termo usual que comporta um entendimento<br />
abrangente. Evi<strong>de</strong>ntemente que não estamos falando num “cruzar os braços” como o<br />
absenteísmo do período industrial. Este é o ponto <strong>de</strong> importância da qualificação profissional,<br />
pois é através <strong>de</strong>la que este absenteísmo, portanto, resistência, opera, ou po<strong>de</strong> operar. Os<br />
especial atenção para aquele do corte e trato da cana-<strong>de</strong>-açúcar, <strong>de</strong>ve se pautar no conceito <strong>de</strong> cidadania, ou seja,<br />
na verificação <strong>de</strong> que este tipo <strong>de</strong> trabalho não é digno. Em outras palavras, toda e qualquer ação <strong>de</strong><br />
cumprimento as normas legais estabelecidas, ou mesmo as reivindicações atinentes ao exercício <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong><br />
trabalho não são suficientes para fazer <strong>de</strong>ste trabalho uma ativida<strong>de</strong> digna, e menos ainda passível <strong>de</strong> políticas<br />
públicas <strong>de</strong> qualificação para estas ativida<strong>de</strong>s.<br />
130
trabalhadores melhores qualificados resistem, se negando a executar trabalhos <strong>de</strong> baixa<br />
qualificação, apenas quando encontram alternativas produtivas e <strong>de</strong> trabalho. A condição <strong>de</strong><br />
trabalhadores melhores qualificados, quer do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> uma educação formal e geral,<br />
portanto, <strong>de</strong> uma qualificação mais aberta na zona <strong>de</strong> interesse comum, quer a possibilida<strong>de</strong><br />
que esta propicia no acesso à qualificação mais pontual e restrita, leva este contingente <strong>de</strong><br />
trabalhadores a uma qualificação que é em si produtiva e resistente. É produtiva e resistente<br />
ao mesmo tempo porque cria alternativas para não precisarem exercer funções como aquelas<br />
reservadas aos trabalhadores braçais. É neste sentido que os postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> menor<br />
qualificação são reservados aos trabalhadores migrantes. Veja o que aponta De Masi (1999, p.<br />
84):<br />
131<br />
A <strong>de</strong>manda pelo trabalho aumenta porque cresce o número dos seres<br />
humanos, aumenta o tempo <strong>de</strong> vida, ingressam no mercado <strong>de</strong> trabalho<br />
novas forças ativas que antes não participavam (mulheres, aposentados,<br />
inválidos, etc.); além disso, a facilida<strong>de</strong> dos <strong>de</strong>slocamentos físicos faz com<br />
que chegue aos mercados mais ricos multidões <strong>de</strong> trabalhadores oriundos <strong>de</strong><br />
mercados mais pobres. Por outro lado, a disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalho diminui<br />
seja porque as novas tecnologias absorvem ofícios antes <strong>de</strong>sempenhados<br />
por trabalhadores e por funcionários, seja porque o progresso das ciências<br />
da organização permite maximilizar sempre mais a combinação dos fatores<br />
produtivos.<br />
O que acontece sobre este fenômeno, particularmente no ponto que nos interessa aqui,<br />
é o fator da migração <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra. Este fenômeno po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado historicamente.<br />
Po<strong>de</strong> ser observado em todo o mundo, com a diferença que cada vez ele é mais presente dada<br />
a facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mobilização que é cada vez maior. Ocorre que as dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> toda or<strong>de</strong>m,<br />
até situações <strong>de</strong> miséria levam à migração. Estes trabalhadores migrantes se “sujeitam” a<br />
executar um tipo <strong>de</strong> trabalho que, geralmente, os trabalhadores resi<strong>de</strong>ntes não fazem. Não<br />
fazem uma vez que melhores qualificados e integrados socialmente, ou ocupam os novos<br />
postos <strong>de</strong> trabalho que estão surgindo com o fechamento <strong>de</strong> outros, ou então encontram<br />
escape montando pequenos negócios. Tivemos muitos <strong>de</strong>poimentos <strong>de</strong>ste tipo em que<br />
trabalhadores assalariados resi<strong>de</strong>ntes se estabelecem com “carrinhos <strong>de</strong> lanches”, “lojas <strong>de</strong><br />
roupa”, “empresas <strong>de</strong> moto-táxi”, “bar”, “padarias” <strong>de</strong>ntre outras. E ainda, quase sempre<br />
divi<strong>de</strong>m a economia doméstica no âmbito da família: irmãos, pais, esposa, sogros, etc.<br />
Temos então uma situação na qual o absenteísmo ou a negação em executar um tipo<br />
<strong>de</strong> trabalho é dado, ou possibilitado, também, ou principalmente, pela qualificação<br />
profissional. Num primeiro plano é dada pela formação que chamamos <strong>de</strong> geral (escolarida<strong>de</strong>,
educação básica, acesso), mas é dada também pela qualificação específica uma vez que<br />
nalguns casos ela garante o acesso aos postos <strong>de</strong> trabalho mais bem qualificados<br />
possibilitando a escolha. A resistência tal qual apresentamos aqui é “negação construtiva”.<br />
Não pressupõe um antes e um <strong>de</strong>pois, (NEGRI; HARDT, 2004). Para a negação, é preciso<br />
alternativas imediatas, sendo que com alternativas <strong>de</strong> trabalho e renda a negação é, diríamos<br />
que, automática. Por isso a chamamos <strong>de</strong> “resistência produtiva”, a criação <strong>de</strong> alternativas é<br />
um ato constitutivo da própria negação.<br />
Ainda que não tenhamos espaço aqui para entrar neste ponto sobre a migração, tema<br />
amplo e bastante discutido pela literatura específica, cabe consi<strong>de</strong>rar que no caso do trabalho<br />
migrante, ou do migrante propriamente dito, o ato <strong>de</strong> migrar se constitui em si numa forma <strong>de</strong><br />
resistência, ou ainda, <strong>de</strong> “resistência produtiva”. Conforme aponta De Masi (1999), este<br />
processo mundo ocorre sempre dos trabalhadores se <strong>de</strong>slocando <strong>de</strong> locais mais pobres para<br />
outros mais ricos e <strong>de</strong>senvolvidos. Dentro <strong>de</strong>ste processo existe o ato <strong>de</strong> resistência da<br />
maneira que i<strong>de</strong>ntificamos no caso anterior. A diferença consiste nas possibilida<strong>de</strong>s e<br />
condições <strong>de</strong> acesso. Em outras palavras, nas possibilida<strong>de</strong>s reais disponíveis. Conforme os<br />
<strong>de</strong>poimentos colhidos por Novaes e Alves ( 2003, p. 62), que po<strong>de</strong>m ser sintetizados e<br />
resumidos sem prejuízo <strong>de</strong> conteúdo na fala <strong>de</strong> uma migrante, trabalhadora do corte <strong>de</strong> cana,<br />
falando da sua <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> migrar do Estado do Maranhão para a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Guariba no interior<br />
<strong>de</strong> São Paulo:“Eu vim prá cá em busca <strong>de</strong> uma vida melhor”.<br />
O migrante, ou imigrante, tal qual o segmento anterior, constrói negando, ou nega<br />
construindo. A <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> migrar 57 pressupõe a negação <strong>de</strong> uma condição presente. Ao<br />
mesmo tempo constrói alternativa no próprio ato <strong>de</strong> migrar. Ele nega a condição que está e sai<br />
em busca <strong>de</strong> vida melhor. Ainda que encontre exploração em outras paradas, tal o caso típico<br />
dos trabalhadores migrantes do corte <strong>de</strong> cana da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, conseguem<br />
melhores rendas e acesso ao consumo. Senão eles têm a “liberda<strong>de</strong>” <strong>de</strong> voltar. Isso para não<br />
dizer que <strong>de</strong>ntro da realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estranhamento na qual chegou quase sempre é tido como<br />
“forasteiro” e “cidadão” <strong>de</strong> segunda categoria. O migrante se organiza como po<strong>de</strong>, em bairros<br />
periféricos, com manifestações culturais, etc. É este mesmo “direito <strong>de</strong> fuga”, <strong>de</strong> migrar,<br />
característica <strong>de</strong> “escolha” individual e coletiva, e que é intensificada com o capitalismo,<br />
57 Insistimos no termo “<strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> migrar” que junto com a colocação que fazemos logo abaixo <strong>de</strong> “liberda<strong>de</strong>”,<br />
ou “liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha”, explicam bastante esta atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro do capitalismo. Historicamente, nas socieda<strong>de</strong>s<br />
não capitalistas, ou até nos dias <strong>de</strong> hoje em países “não capitalistas”, esta liberda<strong>de</strong> é sempre reduzida ou<br />
restringida. Os mercados <strong>de</strong> trabalho necessitam <strong>de</strong>sta mobilida<strong>de</strong>, da mesma forma que ela em si, enquanto<br />
liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha aparece como forma privilegiada <strong>de</strong> resistência.<br />
132
conforme aponta Sandro Mezzadra (2001), que possibilita tanto a recusa e a resistência<br />
produtiva, quanto a satisfação <strong>de</strong> mercados <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> baixa qualificação.<br />
A qualificação geral que se move fora do ambiente 58 <strong>de</strong> trabalho tanto quanto a<br />
específica voltada para o ambiente <strong>de</strong> trabalho são espaços privilegiados <strong>de</strong> manifestação e<br />
construção <strong>de</strong> políticas públicas para emprego, renda, trabalho e em suma, direitos <strong>de</strong><br />
cidadania. São também formas que propiciam a ação coletiva e a resistência, o absenteísmo e<br />
a ação subjetiva sutil com relação aos contratos <strong>de</strong> trabalho, conforme apontam Polanyi<br />
(2000) e Offe (1989), permitindo a construção <strong>de</strong> novas institucionalida<strong>de</strong>s como nos termos<br />
<strong>de</strong> Gid<strong>de</strong>ns (2001). A subjetivida<strong>de</strong>, e neste particular o conhecimento tem acento<br />
privilegiado, permite o movimento que pontuam estes autores, como o <strong>de</strong>srespeito sutil,<br />
cooperado e reiterado ao contrato formal <strong>de</strong> trabalho. Permite também a abertura para um<br />
ambiente mais amplo do que um “local da produção”. A qualificação <strong>de</strong>ve se mover nestes<br />
dois níveis que cada vez mais aparecem como sendo o mesmo.<br />
4.5 Nichos ou Brechas do sistema<br />
Aqui nos <strong>de</strong>teremos em fatores do processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva que permite<br />
pensar nas “brechas” abertas pelo sistema produtivo. Tais brechas ou fendas permitem discutir<br />
a viabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alternativas, apontando elementos que contribuem com o entendimento e o<br />
<strong>de</strong>bate acerca das políticas <strong>de</strong> formação profissional. As consi<strong>de</strong>rações acerca <strong>de</strong>stes fatores<br />
são necessárias para a pesquisa dado que cada vez mais são discutidas alternativas sobre as<br />
políticas <strong>de</strong> qualificação profissional, que passam ou até se remetem diretamente à<br />
viabilização <strong>de</strong> investimentos em formação <strong>de</strong> parque produtivo.<br />
Enten<strong>de</strong>mos por formação <strong>de</strong> parque produtivo uma tendência cada vez mais<br />
crescente, que do ponto <strong>de</strong> vista da pesquisa observamos a partir do conteúdo dos cursos <strong>de</strong><br />
qualificação profissional. Discutir o tema da qualificação profissional junto com a perspectiva<br />
<strong>de</strong> formação <strong>de</strong> parque produtivo significa tanto reconhecer quanto aproximar as vertentes<br />
capital e trabalho. Implica, portanto, <strong>de</strong>svincular a qualificação profissional direcionada<br />
unicamente aos postos <strong>de</strong> trabalho existentes.<br />
58 É preciso notar o esforço que fazemos durante a elaboração dos argumentos tentando <strong>de</strong>sfazer esta relação<br />
“fora” e “<strong>de</strong>ntro” do ambiente <strong>de</strong> trabalho. Todavia acabamos sempre fazendo esta separação. Isso ocorre por<br />
dois motivos. Em primeiro lugar por uma questão coloquial, ou seja, nos ocupamos <strong>de</strong>sta dualida<strong>de</strong> para<br />
combatê-la, <strong>de</strong>sta forma temos sempre que nos remeter a ela; Por outro, e ai seguindo o curso dos argumentos, o<br />
arcabouço institucional legal sobre o trabalho, por mais que isso tenha mudado bastante, ainda carece <strong>de</strong>stas<br />
medidas. Neste sentido o Estado, na distribuição <strong>de</strong> políticas públicas em que se inclui a <strong>de</strong> qualificação<br />
profissional, necessita estabelecer um ambiente produtivo do trabalho, o que necessariamente implica em<br />
reconhecer um ambiente do “não trabalho”.<br />
133
No meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, observamos este processo particularmente<br />
no tocante à produção da cana-<strong>de</strong>-açúcar, conforme já apontamos por ser a principal cultura<br />
agrícola da região. Mesmo assim, ainda que mais uma vez tomemos como exemplo o caso da<br />
cana, haja vista que ele foi alvo preferencial <strong>de</strong> nossos estudos, o ponto que discutimos aqui é<br />
aplicável a outras culturas como da laranja, ou mesmo soja, amendoim, arroz, milho, algodão,<br />
etc. Mais uma vez insistimos que a cana é o melhor exemplo do que vem acontecendo na<br />
região, não apenas pela importância e incidência com relação as outras culturas, mas<br />
principalmente por comportar todo o processo <strong>de</strong> transformação que vem acontecendo no<br />
mundo do trabalho. O setor citricultor po<strong>de</strong> ser comparável ao sucroalcooleiro neste ponto,<br />
ainda que a relevância seja menor. Já outras culturas ligadas aos gran<strong>de</strong>s investimentos<br />
agrícolas não têm as mesmas características, dado que não apresentam forte incidência no<br />
assalariamento rural, já que quase todo o processo <strong>de</strong> produção é mecanizado e automatizado.<br />
Os complexos produtivos da agroindústria sucroalcooleira seguem em rápida expansão<br />
e, com a abertura dos mercados internacionais, não é possível antever crises a pequeno e<br />
médio prazo. Portanto, não trabalhamos com a hipótese do sucesso <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo ou sistema<br />
<strong>de</strong> produção vindo em <strong>de</strong>corrência da crise do velho mo<strong>de</strong>lo. Neste sentido nos aproximamos<br />
bastante tanto <strong>de</strong> trabalhos, digamos mais difundidos e já clássicos como as postulações <strong>de</strong><br />
Piore e Sabel (1984), quanto <strong>de</strong> outros que vêm sendo realizados com sucesso como nos casos<br />
pontuais <strong>de</strong> Dimaggio e Louch (1998), e em se tratando <strong>de</strong> uma sociologia rural ou voltada<br />
para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> territórios rurais, que tem como importante expressão, os estudos e<br />
pesquisas <strong>de</strong> <strong>Ricardo</strong> Abramovay (2000) no Brasil. Trata-se em suma <strong>de</strong> estudos voltados<br />
para o que se convencionou chamar <strong>de</strong> sociologia econômica. Ou seja, que parte da<br />
constatação do <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> um tecido econômico formado inter<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente com<br />
o <strong>de</strong>senvolvimento social. Dito <strong>de</strong> outra maneira, ultrapassando sem negar as correntes<br />
clássicas da economia que viam o mercado apenas como ente racional <strong>de</strong> satisfação <strong>de</strong><br />
interesses. Para esta corrente na qual incluímos estes autores citados e que bebem <strong>de</strong> um<br />
aporte teórico mais clássico tanto em Weber, particularmente em Economia e Socieda<strong>de</strong>,<br />
quanto em Simmel que <strong>de</strong>monstrou que a construção dos valores econômicos passa sempre<br />
pela mediação social, conforme aponta Negri (2001).<br />
Exploramos quais são os fatores internos a este gran<strong>de</strong> complexo produtivo que<br />
permitem ou corroboram para o surgimento <strong>de</strong> uma nova organização produtiva e do trabalho.<br />
Em princípio, tais fatores <strong>de</strong>vem ser procurados <strong>de</strong>ntro das transformações recentes pelas<br />
quais vêm passando o setor agroexportador da região sem negar, ou procurando i<strong>de</strong>ntificar a<br />
crise <strong>de</strong> outro mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> produção. Passaremos então a <strong>de</strong>stacar tais fatores.<br />
134
O primeiro <strong>de</strong>les é apontado pelo professor e pesquisador Francisco Alves (2003), e da<br />
relação que este faz entre “crescimento intensivo” do complexo agroindustrial sucroalcooleiro<br />
e “crescimento extensivo 59 ”. Aponta que cada vez mais o primeiro vem substituindo o<br />
segundo.<br />
Num primeiro momento <strong>de</strong> rápida expansão dos complexos, as usinas compravam, ou<br />
arrendavam, toda e qualquer terra disponível para plantio <strong>de</strong> cana. Ainda que evi<strong>de</strong>ntemente<br />
houvesse variação e diferença no preço da terra, ou arrendamento, toda e qualquer área<br />
disponível era rapidamente incorporada pelas usinas da região. A capacida<strong>de</strong> produtiva das<br />
usinas, ou o que os usineiros–proprietários bem como empregados do setor chamam <strong>de</strong><br />
“capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> moagem 60 ”, quase sempre excedia na produção das áreas plantadas em cana.<br />
Estaríamos hoje, segundo o pesquisador Francisco Alves (2003) que vem estudando as<br />
relações produtivas e processos <strong>de</strong> trabalho no setor canavieiro há mais <strong>de</strong> vinte anos,<br />
passando por um momento <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong>ste fator <strong>de</strong> crescimento extensivo para o que<br />
chama <strong>de</strong> crescimento intensivo. Dentro do que se enten<strong>de</strong> por crescimento intensivo, relevase<br />
fatores qualitativos mais ligados à possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intensificação e aumento da produção<br />
relativa a mesma área plantada em cana. Significa, em outras palavras, produzir mais sacarose<br />
por hectare investindo em <strong>de</strong>senvolvimentos científicos da qualida<strong>de</strong> e varieda<strong>de</strong> da cana, por<br />
exemplo. Ocorre que este fator não po<strong>de</strong> ser tomado <strong>de</strong> forma isolada na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> uma<br />
possível diminuição <strong>de</strong> área plantada, frente ao aumento da produção. O aumento da área<br />
plantada em cana no Brasil é um fator inquestionável. Isso não significa necessariamente<br />
aumento exponencial, e intensivo concentrado no Estado <strong>de</strong> São Paulo. O que está em<br />
discussão é que o pioneirismo <strong>de</strong>ste Estado com relação a cana-<strong>de</strong>-açúcar, o mesmo<br />
verificado com o café, po<strong>de</strong> propiciar a reversão <strong>de</strong>ste quadro produtivo <strong>de</strong>ntro do Estado, ao<br />
mesmo tempo que impulsiona o plantio em outras regiões do país, conforme já está<br />
acontecendo 61 . Passemos a analisá-lo, tendo em vista o segundo fator chamado <strong>de</strong> “efeito<br />
transferibilida<strong>de</strong>”.<br />
59 Por crescimento extensivo enten<strong>de</strong> o aumento exponencial das áreas plantadas em cana-<strong>de</strong>-açúcar.<br />
60 A “capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> moagem” foi um termo que ouvimos em todas as entrevistas que realizamos com<br />
proprietários ou trabalhadores das gran<strong>de</strong>s usinas. Ainda que o termo sugira apenas a prensa da cana para<br />
extração do suco, na verda<strong>de</strong>, quando se referem a ele estão dizendo da totalida<strong>de</strong> do que chamam <strong>de</strong> processo<br />
<strong>de</strong> industrialização do álcool e do açúcar. Quase sempre dizem que a capacida<strong>de</strong> produtiva da parte industrial do<br />
complexo é maior que a produção agrícola, ou, da matéria prima cana-<strong>de</strong>-açúcar.<br />
61 Como se sabe o Estado <strong>de</strong> São Paulo tem poucas, ou melhor, reduzidas, possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> expansão <strong>de</strong> áreas<br />
plantadas em cana-<strong>de</strong>-açúcar para aten<strong>de</strong>r as <strong>de</strong>mandas, principalmente do álcool combustível como divisas <strong>de</strong><br />
mercado exportador. Por outro lado, ao mesmo tempo em que este Estado concentra a maior parte da mão-<strong>de</strong>obra<br />
qualificada e <strong>de</strong>senvolvimento técnico científico do país, existem muitas áreas e extensão territorial propicia<br />
ao plantio em outras regiões do país, com especial atenção para o centro oeste. É neste sentido que <strong>de</strong>ve ser<br />
pensado o efeito transferibilida<strong>de</strong>.<br />
135
O segundo fator po<strong>de</strong> ser extraído da entrevista realizada com um dos gran<strong>de</strong>s<br />
proprietários–usineiros da região, Narciso Zanin (2001), <strong>de</strong>ntro do que ele enten<strong>de</strong> por “efeito<br />
transferibilida<strong>de</strong>”. Este “efeito transferibilida<strong>de</strong>” vem sendo apontado por outros empresários<br />
do setor sucroalcooleiro com os quais tivemos contato na pesquisa. Trata-se da transferência<br />
cada vez mais acentuada das áreas plantadas em cana para outras regiões do Estado ou do<br />
país.<br />
Com a expansão do setor e abertura <strong>de</strong> mercados internacionais, os investimentos têm<br />
crescido e para isso são necessários dois elementos básicos: barateamento dos custos da<br />
produção e investimento em qualida<strong>de</strong> do produto. Mesmo consi<strong>de</strong>rando a intensificação da<br />
produção <strong>de</strong> sacarose por área plantada, ainda assim, a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produção das usinas<br />
aliada ao crescimento do setor, necessita cada vez mais <strong>de</strong> terra para o plantio da cana. A<br />
maior parte das terras da região está plantada com cana, inclusive áreas pouco produtivas e<br />
com <strong>de</strong>clive, pequenas proprieda<strong>de</strong>s, até os limites <strong>de</strong> matas nativas e mananciais. O preço da<br />
terra na região aumentou significativamente, tendo chegado conforme o caso a cinqüenta mil<br />
reais o alqueire, conforme <strong>de</strong>poimentos <strong>de</strong> Jamil Mattioli, (2005). Como se sabe, o valor da<br />
terra em boa medida é <strong>de</strong>terminado pelo complexo agroindustrial, ou seja, <strong>de</strong> acordo com o<br />
interesse e disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> terras. Ocorre que as usinas não têm, ou têm pouca,<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> expansão <strong>de</strong> áreas plantadas na região 62 . Assim, o efeito transferibilida<strong>de</strong> 63<br />
apontado por Narciso Zanin (2001) alguns anos atrás, hoje já é uma realida<strong>de</strong>. Segundo<br />
informações obtidas recentemente, são <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> usinas <strong>de</strong> álcool e açúcar sendo<br />
implantadas, ou já em funcionamento no Estado <strong>de</strong> São Paulo, e a maioria <strong>de</strong>las concentradas<br />
na região Centro Oeste do Estado. Nesta região, temos o custo do alqueire em torno <strong>de</strong> <strong>de</strong>z,<br />
quinze mil reais contra os cinqüenta mil reais que chegou a ser o preço do alqueire na região<br />
<strong>de</strong> Ribeirão Preto. Segundo Narciso Zanin (2001), a terra é melhor para o plantio, pois além<br />
<strong>de</strong> serem “terras novas 64 ” apresentam menos <strong>de</strong>clive, o que facilita a mecanização do setor;<br />
Ainda, conforme aponta o mesmo usineiro, a mão-<strong>de</strong>-obra é mais farta e barata 65 . Atualmente,<br />
62 Em alguns casos chegamos a i<strong>de</strong>ntificar usinas que transportavam cana para moagem <strong>de</strong>ntro dum raio <strong>de</strong> até<br />
cem quilômetros, o que evi<strong>de</strong>ntemente aumenta o custo da produção.<br />
63 Evi<strong>de</strong>ntemente que o chamado “efeito transferibilida<strong>de</strong>” <strong>de</strong>ve levar em conta outros fatores como, por<br />
exemplo, o aumento do consumo e exportação. Aqui trabalhamos com este entendimento apenas buscando<br />
relacionar custo benefício comparativamente com relação a uma região e outra.<br />
64 Terras pouco exploradas, geralmente <strong>de</strong> pastagem, o que segundo os usineiros são melhores no tocante a<br />
produtivida<strong>de</strong> e a qualida<strong>de</strong> da cana. (relação tonelada <strong>de</strong> cana por alqueire plantado, e relação tonelada cana por<br />
produção e qualida<strong>de</strong> da sacarose).<br />
65 No tocante aos custos da mão-<strong>de</strong>-obra, o que os <strong>de</strong>poimentos colhidos pelas entrevistas revelaram é que<br />
existiria mais mão-<strong>de</strong>-obra “ociosa” dada a pouca concorrência com outras usinas. Também, que esta mão-<strong>de</strong>obra<br />
dita ociosa apresentaria pouca, ou menor qualificação se comparada com a região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, uma<br />
vez que a maior oferta <strong>de</strong> trabalhos nesta região gera concorrência e qualifica mão-<strong>de</strong>-obra. Esta baixa<br />
136
a critica feita aos que apontam para este efeito “transferibilida<strong>de</strong>”, advogam que a aceitação<br />
do açúcar e do álcool no mercado internacional mediante a crescente abertura <strong>de</strong> exportações,<br />
não possibilitariam tal substituição. Ou seja, que a <strong>de</strong>manda do mercado interno exigiria <strong>de</strong><br />
maneira voraz toda e qualquer área disponível. Neste caso estaríamos mais próximos <strong>de</strong> um<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> expansão do setor do que <strong>de</strong> transferência. O usineiro Narciso Zanin (2001) aponta<br />
que a expansão seria o primeiro efeito. Todavia, a disposição e disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> áreas em<br />
outras regiões do país fariam com que os investimentos <strong>de</strong> ponta do setor fossem<br />
<strong>de</strong>finitivamente transferidos para outras regiões.<br />
Ainda que este processo seja, digamos, “tímido” e pouco <strong>de</strong>finido, Francisco Alves<br />
(2003) aponta que algumas terras principalmente <strong>de</strong> pequenas proprieda<strong>de</strong>s já estão sendo<br />
<strong>de</strong>volvidas pelas usinas para seus proprietários. Sobre este ponto, é preciso consi<strong>de</strong>rar que<br />
partes das terras plantadas em cana na região não pertencem às usinas. São terras plantadas ou<br />
em sistema <strong>de</strong> arrendamento ou parceria. Como se sabe, o sistema <strong>de</strong> arrendamento é mais<br />
simples, paga-se geralmente anualmente pelo uso da terra. Ocorre que segundo informações<br />
obtidas junto aos pequenos e médios proprietários, este sistema é mais vantajoso para as<br />
usinas, mesmo assim é preferido por alguns proprietários que não querem correr os riscos<br />
típicos da produção: estiagem, queimadas, riscos da produção hectare/tonelada, etc.<br />
Já o sistema <strong>de</strong> parceria tem sido uma saída encontrada nos últimos anos tanto pelas<br />
usinas quanto pelos proprietários das terras. O sistema <strong>de</strong> parceria na cana é antigo, e<br />
inclusive protegido por legislação que prevê que <strong>de</strong>terminada porcentagem da cana moída<br />
pelas usinas seja <strong>de</strong> terceiros. Ocorre que com a intensificação da produção, cada vez fica<br />
mais difícil e inviável para pequenos e médios produtores plantar, tratar e colher a cana por<br />
conta própria, apenas fornecendo para as usinas que pagam por tonelada. Por sua vez, as<br />
usinas têm à disposição toda a estrutura como máquinas, técnicos, agrônomos e trabalhadores<br />
para fazer este serviço. O que ocorre neste caso é que na verda<strong>de</strong>, a maioria das terras em<br />
sistema <strong>de</strong> parceria não são cultivadas e tratadas pelos proprietários, e sim pelas usinas. Na<br />
gran<strong>de</strong> maioria dos casos, conforme <strong>de</strong>poimentos <strong>de</strong> pequenos e médios produtores, os<br />
proprietários apenas acompanham o trabalho da usina. A usina planta, trata, colhe, transporta<br />
até o complexo para moagem e paga o preço “tonelada cana 66 ”, <strong>de</strong>scontando os custos <strong>de</strong><br />
produção.<br />
qualificação possibilita os usineiros pagarem menos qualificando os trabalhadores para o que lhes interesse<br />
<strong>de</strong>ntro do próprio curso da produção.<br />
66 Nestes <strong>de</strong>poimentos pu<strong>de</strong>mos i<strong>de</strong>ntificar também que o sistema <strong>de</strong> pagamento (mês, semestral, anual etc.)<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> cada usina, é negociado com os proprietários, sempre <strong>de</strong> acordo com o preço da tonelada ditado<br />
pelo mercado.<br />
137
A diferença substancial é que apesar da renda ser maior, o proprietário corre todo o<br />
risco <strong>de</strong> produção junto com a usina. Também vale anotar que muitos <strong>de</strong>stes proprietários<br />
figuram como fornecedores <strong>de</strong> cana para as usinas e não em sistema <strong>de</strong> parceria conforme<br />
figuram contratualmente. Segundo Francisco Alves (2003), é uma maneira <strong>de</strong> burlar a<br />
legislação que prevê uma porcentagem <strong>de</strong> cana moída proveniente <strong>de</strong> terceiros. Por isso,<br />
<strong>de</strong>ntro do quadro apresentado no item anterior, po<strong>de</strong>-se observar uma diminuição mais<br />
acentuada no arrendamento e parceria, e menos acentuada no tocante à condição <strong>de</strong><br />
proprietário. As entrevistas colhidas na pesquisa sugerem, portanto, que boa parte dos que<br />
figuram como produtores, se utilizam do sistema <strong>de</strong> parceria da maneira <strong>de</strong>scrita acima.<br />
Diante <strong>de</strong>ste quadro, é interessante apontar para a <strong>de</strong>volução <strong>de</strong> terras, geralmente<br />
pequenas proprieda<strong>de</strong>s. Com a transferência do setor, e ainda, com o crescimento intensivo<br />
apontado acima, as usinas ficam mais seletivas na escolha da terra, além <strong>de</strong> abaixar o valor do<br />
alqueire ou hectare. Evi<strong>de</strong>ntemente que as primeiras terras “<strong>de</strong>volvidas” são sempre as áreas<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>clive, on<strong>de</strong> as máquinas não po<strong>de</strong>m operar, lembrando que para estes casos é<br />
imprescindível o trabalho braçal. Um quarto fator apontado por Francisco Alves (2003),<br />
salienta sobre a inviabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pequenas proprieda<strong>de</strong>s para o plantio da cana em larga<br />
escala. Diz respeito à própria extensão da área. A mecanização requer gran<strong>de</strong>s áreas para que<br />
as máquinas possam operar. O paradigma da gran<strong>de</strong> produção em escala requer maiores<br />
“talhões” para que as máquinas possam operar livremente sem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />
manobras. Os limites físicos da proprieda<strong>de</strong> só possibilitam talhões curtos em que as<br />
máquinas têm que fazer muitas manobras, aumentando custos e tempo <strong>de</strong> produção. As<br />
pequenas proprieda<strong>de</strong>s geralmente são irregulares segundo o pesquisador, com áreas<br />
retangulares ou em forma <strong>de</strong> losango, que dificulta ainda mais. Lembrando que Narciso Zanin<br />
aponta em torno <strong>de</strong> 68% <strong>de</strong> terras mecanizáveis na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto e 32 % <strong>de</strong> terras<br />
não mecanizáveis, ou que dada a topografia do terreno exigem o corte manual.<br />
Os dados referentes à área plantada na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto corroboram com a<br />
afirmação <strong>de</strong> Francisco Alves (2003), ainda que a diminuição <strong>de</strong>sta não implique<br />
necessariamente no processo <strong>de</strong>scrito acima. O fator central é que os dados se referem às<br />
chamadas “principais lavouras” e justamente <strong>de</strong>ntre estas é que houve diminuição <strong>de</strong> áreas<br />
plantadas.<br />
138
Tabela 1- Evolução da área das principais lavouras no Estado <strong>de</strong> São Paulo, segundo as regiões agrícolas 3 . Triênios 1969- 1971 a 2002-2004,<br />
em hectares<br />
REGIÃO 1969-1971 1979-1981 1989-1991 1999-2001 2002-2004<br />
Araçatuba 305.539 270.119 304.320 349.604 434.942<br />
Bauru 325.420 353.800 392.601 397.622 436.167<br />
Campinas 688.277 889.129 934.549 921.643 959.403<br />
Marília 622.566 826.662 746.979 747.473 808.556<br />
Presi<strong>de</strong>nte Pru<strong>de</strong>nte 699.316 424.713 378.714 258.240 381.980<br />
Ribeirão Preto 1.131.247 1.642.059 1.928.505 2.153.052 2.131.096<br />
São José do Rio Preto 997.871 752.110 802.194 669.557 747.119<br />
São Paulo 114.769 99.511 76.679 70.516 66.468<br />
Sorocaba 597.161 772.556 645.827 618.943 708.389<br />
Vale do Paraíba 72.733 58.046 57.621 41.126 37.551<br />
ESTADO 5.554.899 6.088.705 6.267.992 6.227.776 6.711.670<br />
(1) Correspon<strong>de</strong>m às 10 Divisões Regionais Agrícolas (DIRAs) do período 1973-1984 (PETTI et al. 2001).<br />
Fonte: Instituto <strong>de</strong> Economia Agrícola (IEA)<br />
No que se refere à área cultivada, houve crescimento substancial <strong>de</strong> 5,6 milhões <strong>de</strong><br />
hectares entre 1969-1971 para 6,7 milhões <strong>de</strong> hectares entre 2002-2004. No caso da região <strong>de</strong><br />
Ribeirão Preto, a área plantada na região cresceu 10 milhões <strong>de</strong> hectares: <strong>de</strong> 1,1 milhões <strong>de</strong><br />
hectares entre 1969-1971 para 2,1 milhões <strong>de</strong> hectares entre 2002-2004. Ocupando quase todo<br />
espaço rural da região em que predominam as gran<strong>de</strong>s ca<strong>de</strong>ias produtivas sucroalcooleira e <strong>de</strong><br />
citricultura. Todavia, no último período que começa a haver alguma diminuição da área<br />
plantada, passando <strong>de</strong> 2.153,052 hectares entre os anos <strong>de</strong> 1999 a 2001, para 2.131, 096<br />
hectares entre os anos <strong>de</strong> 2002 á 2004. Portanto, a diminuição da área plantada no último<br />
período é <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> vinte mil hectares (IPEA, 2006).<br />
Tais fatores <strong>de</strong>vem ser tomados como “brechas”, “aberturas”, fendas do sistema que<br />
permitem pensar a emergência <strong>de</strong> uma nova organização produtiva e do trabalho. No tocante a<br />
estes fatores <strong>de</strong> rearranjo, citamos um quinto fator que, corroborando com os argumentos,<br />
aponta para a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> novos espaços <strong>de</strong> produção e <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>. Sobre este ponto,<br />
139
vale notar o Decreto n° 50.889, <strong>de</strong> 16 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 2006, que regula a manutenção,<br />
recomposição, condução e regeneração natural na compensação <strong>de</strong> áreas em imóveis rurais.<br />
140<br />
Estima-se que 3,7 milhões <strong>de</strong> hectares produtivos <strong>de</strong>vem ser revertidos para<br />
Reserva Legal, com perdas <strong>de</strong> renda bruta agropecuária estimada em R$ 5,6<br />
bilhões, levando a reflexos <strong>de</strong> queda <strong>de</strong> receitas no conjunto das ca<strong>de</strong>ias <strong>de</strong><br />
produção da agricultura da or<strong>de</strong>m R$ 67,0 bilhões. Além disso, os custos <strong>de</strong><br />
recomposição a serem arcados pelos agropecuaristas somam R$ 14,8<br />
bilhões, ao lado da potencial eliminação <strong>de</strong> 136,1 mil empregos. [...] pelo<br />
Decreto n° 50.889/2006, tome-se a mais pujante região agropecuária<br />
estadual representada por Ribeirão Preto. Mais <strong>de</strong> uma bacia hidrográfica e<br />
inúmeros ecossistemas estão abrangidos no território regional ribeirãopretano.<br />
[...] haveria recuo expressivo da área <strong>de</strong> lavouras para aten<strong>de</strong>r aos<br />
limites estabelecidos para compensação. (IPEA, 2006)<br />
Os efeitos trazidos pelo Decreto <strong>de</strong> 2006, uma vez em prática, certamente surtiram<br />
efeitos imediatos na ocupação da terra, área plantada e emprego na região. Também este<br />
ponto corrobora com o chamado efeito transferibilida<strong>de</strong> citado acima, uma vez que nas outras<br />
regiões do Estado e do país, as terras são mais baratas e não se paga os custos da “reversão”.<br />
Soma-se a este fator <strong>de</strong> rearranjo produtivo, o aumento <strong>de</strong> políticas publicas para o<br />
meio rural e a produção agrícola, que buscam dar acesso à terra como forma <strong>de</strong> reinserção<br />
produtiva conforme apontamos a partir do PNQ. Nestes casos, bastante i<strong>de</strong>ntificados nas<br />
políticas <strong>de</strong> crédito e microcrédito, a qualificação profissional é pensada tendo em vista o<br />
acesso à terra, e mais ainda o acesso ao conhecimento necessário para tornar-se um<br />
empreen<strong>de</strong>dor agrícola. São muitos e diferentes os organismos que têm esta política <strong>de</strong><br />
inserção produtiva. Lembremos aqui apenas <strong>de</strong> alguns <strong>de</strong>les como pela via dos movimentos<br />
sociais o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ou pela via institucional <strong>de</strong><br />
políticas públicas o Ministério <strong>de</strong> Desenvolvimento Agrário 67 (MDS), ou mesmo as políticas<br />
já implementadas pelo Programa Nacional <strong>de</strong> Fortalecimento da Agricultura Familiar<br />
(PRONAF). Para Veiga e Abramovay (1999), <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira investidura, o PRONAF<br />
conseguiu estabelecer e ampliar um ambiente institucional 68 <strong>de</strong> políticas sociais e <strong>de</strong> crédito<br />
67 O MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário têm políticas específicas para o acesso a terra e as<br />
melhorias dos negócios e empreendimentos rurais no Brasil. Tais políticas recuperam a pauta sindical <strong>de</strong> cunho,<br />
digamos, mais reivindicatório que é o acesso á terra e as políticas <strong>de</strong> Reforma Agrária, mas vai além, ao propor<br />
políticas públicas específicas através do acesso ao crédito rural. O crédito rural que tem como alvo pequenas<br />
proprieda<strong>de</strong>s rurais e trabalhadores rurais sem terra tem política específica para aquisição da terra e melhorias<br />
como construção e implantação <strong>de</strong> galpões, silos, casa etc.<br />
68 Ambiente institucional é trabalhado pelo autor tendo em vista o conceito <strong>de</strong> capital social. Ambiente<br />
institucional e capital social são fatores inter<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes. Um ambiente institucional consolidado e propício
no meio rural brasileiro. Pela via sindical, também existe esta preocupação na forma <strong>de</strong><br />
formulação <strong>de</strong> convênios e propostas <strong>de</strong> políticas públicas, como é o caso da FAF ligada à<br />
CUT. Isso para não alargar <strong>de</strong>mais os exemplos dos sindicatos que têm a preocupação da<br />
conquista da terra como saída para o problema do campo, como é o caso da FERAESP –<br />
Fe<strong>de</strong>ração dos Empregados Rurais Assalariados do Estado <strong>de</strong> São Paulo.<br />
Ao que apontamos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste quadro <strong>de</strong> reorganização produtiva e do surgimento<br />
tanto <strong>de</strong> novas experiências quanto <strong>de</strong> políticas voltadas para elas, surgem novos marcos <strong>de</strong><br />
institucionalida<strong>de</strong> que a elas se remetem. O SEBRAE é um caso típico <strong>de</strong> representação e<br />
promoção <strong>de</strong> políticas públicas nos marcos <strong>de</strong>sta nova institucionalida<strong>de</strong>, uma vez que atua<br />
contextualizado e conectado com as transformações que vêm ocorrendo no tocante ao<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> tecido produtivo 69 .<br />
4.6 A emergência <strong>de</strong> pequenos núcleos produtivos<br />
Tomemos os apontamentos <strong>de</strong> Soares (2005, p. 0) sobre a importância em “números”<br />
<strong>de</strong>stes pequenos núcleos produtivos no Brasil, que crescem e se <strong>de</strong>senvolvem<br />
concomitantemente aos gran<strong>de</strong>s negócios:<br />
141<br />
[...] a economia informal abriga 10,336 milhões <strong>de</strong> firmas (9,1% a mais do<br />
que em 1997), ou 98% do total <strong>de</strong> empresas com até cinco pessoas<br />
ocupadas. (10,525 milhões) As firmas informais por sua vez, ocupam<br />
13,861 milhões <strong>de</strong> pessoas – 7,7% a mais do que em 1997. A alta foi<br />
proporcionalmente maior do que a expansão no período do total <strong>de</strong> pessoas<br />
ocupadas nas cida<strong>de</strong>s: 4%<br />
Os dados foram extraídos da pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia<br />
e Estatística (IBGE), em parceria com o SEBRAE.<br />
favorece tanto a criação quanto a difusão <strong>de</strong> capital social; Por sua vez, o capital social cria, é o adubo, que<br />
possibilita emergir este ambiente institucional.<br />
69 Ainda que não tenhamos aqui espaço suficiente para discutir as experiências e as iniciativas do SEBRAE, vale<br />
apontar algumas características centrais, ainda que não todas, nas quais nos apoiamos para afirmar tratar-se, com<br />
seus méritos e equívocos, <strong>de</strong> instituição criada nos marcos <strong>de</strong>sta que apontamos como “nova institucionalida<strong>de</strong>”.<br />
Em primeiro lugar o SEBRAE, pela própria via da representação, não separa a socieda<strong>de</strong> entre empregados e<br />
empregadores; Também, não propõe e nem disponibiliza cursos <strong>de</strong> capacitação segundo interesses <strong>de</strong>tectados<br />
pelo instituto. Antes disso aten<strong>de</strong> as <strong>de</strong>mandas e necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acordo com a formação do tecido produtivo, as<br />
oscilações do mercado, e a necessida<strong>de</strong> e formação <strong>de</strong> interesses por parte dos trabalhadores-proprietários. Seus<br />
módulos não separam capital material <strong>de</strong> capital imaterial (conhecimento produtivo). Estes são fatos nos quais<br />
nos apoiamos para atribuir ao SEBRAE a alcunha <strong>de</strong> instituto que funciona nos marcos <strong>de</strong>sta que chamamos <strong>de</strong><br />
“nova institucionalida<strong>de</strong>”. Os méritos, equívocos e vicissitu<strong>de</strong>s do SEBRAE, portanto, não alteram a valida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>ste argumento.
Note que as duas últimas gran<strong>de</strong>s pesquisas realizadas se referem à primeira ao ano <strong>de</strong><br />
1997 e a segunda em 2003. Por mais que haja gran<strong>de</strong>s dificulda<strong>de</strong>s em precisar estas<br />
ativida<strong>de</strong>s bem como suas características, são os próprios institutos <strong>de</strong> pesquisa que admitem<br />
esta informalida<strong>de</strong> chamando a atenção para a urgente necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trazer estas empresas<br />
para formalida<strong>de</strong>.<br />
A mesma pesquisa aponta que a renda média <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> trabalhador caiu, usando<br />
comparativamente os anos <strong>de</strong> 1997 e 2003. Também, que o trabalho “por conta própria”,<br />
autônomos sem nenhuma formalida<strong>de</strong>, representam 69% <strong>de</strong>ste montante. Noventa e cinco por<br />
cento <strong>de</strong>stes negócios apontados acima têm apenas um proprietário e a maioria <strong>de</strong>les são<br />
patrões, ainda que uma porcentagem seja <strong>de</strong> empregados. Oitenta e oito por cento <strong>de</strong>stas<br />
firmas não existem legalmente, lembrando que a estimativa do SEBRAE é que exista o dobro<br />
<strong>de</strong> negócios informais comparados com aqueles que funcionam <strong>de</strong> forma regulamentada<br />
(SOARES, 2005).<br />
Os dados sugerem o crescimento <strong>de</strong> pequenas empresas apontando que muitas <strong>de</strong>las<br />
permanecem na informalida<strong>de</strong>. São estas pequenas empresas que apresentamos como<br />
possibilida<strong>de</strong>s produtivas e como laboratório para enten<strong>de</strong>r a aproximação, ou recomposição<br />
(NEGRI; HARDT, 2004) entre capital e trabalho. Uma forma produtiva e <strong>de</strong> gerenciamento<br />
da produção que pressupõe trabalho, portanto qualificação para o trabalho, junto com os<br />
meios, portanto meios <strong>de</strong> produção, necessários para a execução <strong>de</strong>ste trabalho. Esta vertente<br />
é tratada aqui como empreen<strong>de</strong>dorismo. Ainda que o entendimento sobre empreen<strong>de</strong>dorismo<br />
seja pouco preciso, comportando diferentes leituras, como é comum à mutilação <strong>de</strong> conceitos,<br />
trabalhamos segundo o entendimento <strong>de</strong> Veiga (2005). Por empreen<strong>de</strong>dorismo 70 , enten<strong>de</strong>-se a<br />
capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mobilizar recursos, materiais, no caso a terra e ferramentas em geral, e<br />
imateriais como o conhecimento para a produção. Esta produção se refere à qualificação<br />
profissional. Ou seja, ao contrário do velho paradigma produtivo que pensava a qualificação<br />
70 Como se sabe, o conceito <strong>de</strong> empreen<strong>de</strong>dorismo comporta nuanças e diversas interpretações. Neste sentido,<br />
ou, <strong>de</strong> maneira mais laica possível, é perfeitamente cabível atribuir a condição <strong>de</strong> empreen<strong>de</strong>dor, tanto aos<br />
pequenos e micro negócios, quanto aos gran<strong>de</strong>s investidores agroindustriais. Na verda<strong>de</strong> esta questão pouco<br />
importa para os nossos argumentos, ainda que nos referimos sempre ao caso dos pequenos produtores. O termo,<br />
ou o conceito são usados no nosso trabalho para <strong>de</strong>monstrar as novas possibilida<strong>de</strong>s abertas <strong>de</strong>ntro do processo<br />
<strong>de</strong> reestruturação produtiva e econômica. Ou seja, no sentido <strong>de</strong> apontar que <strong>de</strong>ntro da economia <strong>de</strong> mercado é<br />
perfeitamente possível inserir-se e ser concorrente no mercado por meio <strong>de</strong> tais iniciativas. Se a força dos nossos<br />
argumentos e colocações aponta que não estamos em momento algum entrando numa discussão sobre<br />
substituição <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los produtivos, é evi<strong>de</strong>nte que este mercado não é concorrente com os gran<strong>de</strong>s aglomerados<br />
produtivos. Portanto, o conceito <strong>de</strong> empreen<strong>de</strong>dorismo nos remete diretamente a mais <strong>de</strong> um, mas a<br />
especialmente a um dos pontos <strong>de</strong> interesse dos nossos argumentos, que é sobre o tema da recomposição entre<br />
capital e trabalho. Dentro <strong>de</strong>ste processo <strong>de</strong> reestruturação a que nos referimos, é perfeitamente possível, pensar<br />
em iniciativas produtivas e <strong>de</strong> qualificação que visem agentes que são ao mesmo tempo donos do capital<br />
necessário para a produção, tanto quanto executores do trabalho.<br />
142
para postos <strong>de</strong> trabalho já existentes, este pensa a qualificação profissional junto com a<br />
mobilização dos recursos para execução do trabalho. Neste sentido o conceito <strong>de</strong> capital<br />
social discutido anteriormente, não apenas serve como é fundamental para pensar o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> perspectivas empreen<strong>de</strong>doras, uma vez que mobiliza uma forte re<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
relações sociais entre os agentes.<br />
Um apóio teórico central para pensar a emergência <strong>de</strong> novas experiências produtivas e<br />
<strong>de</strong> gestão da mão-<strong>de</strong>-obra são os já clássicos escritos <strong>de</strong> Piore e Sabel (1984). Estes autores<br />
fazem referência às possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> expansão <strong>de</strong>stas novas empresas contextualizadas<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um novo mercado, apontando para a expansão do trabalho ou ocupações. Mas os<br />
autores em The Second Industrial Divi<strong>de</strong>, (1984), observam ainda a existência duma forte<br />
tendência das empresas, ou pequenas e médias empresas aglomeradas, aproveitando <strong>de</strong> todos<br />
os benefícios e requisitos das gran<strong>de</strong>s empresas se expandirem chegando até a “ameaçar” o<br />
sucesso dos gran<strong>de</strong>s aglomerados produtivos que apresentam pouca cooperação e alto grau <strong>de</strong><br />
disputa ou concorrência.<br />
O fenômeno do surgimento <strong>de</strong> pequenas e médias empresas em expansão e<br />
concorrentes no mercado mundial aparece junto com um outro fator que é o da concentração<br />
da produção nos territórios. As políticas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento tratam <strong>de</strong>stes pequenos<br />
aglomerados produtivos na forma <strong>de</strong> “<strong>de</strong>senvolvimento local”. As políticas <strong>de</strong> parceria para<br />
<strong>de</strong>senvolvimento ten<strong>de</strong>m também a se regionalizar, sendo geralmente firmadas em âmbito<br />
municipal ou regional. Dentre exemplos, um com o qual tivemos contato foi o da parceria<br />
para <strong>de</strong>senvolvimento local do consórcio <strong>de</strong> cooperação entre Brasil e Itália, firmado pela<br />
prefeitura <strong>de</strong> Araraquara. Estudos revelaram que a região <strong>de</strong> Araraquara, que apresenta as<br />
mesmas características do meio agrícola da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, tem forte potencial<br />
propulsor para pequenos negócios tanto urbanos quanto rurais. Possui características<br />
socioeconômicas e forte potencial para o <strong>de</strong>senvolvimento local <strong>de</strong> pequenos negócios. O<br />
projeto piloto <strong>de</strong>senvolvido em acordo <strong>de</strong> cooperação entre os dois países revela o setor<br />
agroindústria como tópico em potencial <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento da região. O projeto que visa o<br />
fomento <strong>de</strong> pequenos empreendimentos rurais e urbanos <strong>de</strong>staca a singularida<strong>de</strong> da região no<br />
tocante à existência <strong>de</strong> pequenos empreendimentos urbanos, e pequenas e médias<br />
proprieda<strong>de</strong>s rurais (INFOCIDADES, 2006). Tais parcerias buscam estreitar vínculos entre<br />
países ou regiões que as experiências ou políticas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento local são consolidadas,<br />
com regiões que são <strong>de</strong>tectadas condições e vocação para implementação <strong>de</strong> projetos <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento.<br />
143
Para citar exemplos consolidados que têm sido referências, lembramos os casos da<br />
Alemanha nas regiões da Baviera e do Ba<strong>de</strong>n Whüttemberg, Na França o Sentier; Nos EUA<br />
do Silicon Valley e no caso italiano com <strong>de</strong>staque para duas regiões, Vêneto e Emilia<br />
Romagna, estes últimos discutidos sobre a óptica do mo<strong>de</strong>lo “distrital”, ou dos distritos<br />
industriais italianos 71 .<br />
Tais exemplos tidos como consolidados são discutidos, o SEBRAE faz isso para<br />
enten<strong>de</strong>r o fenômeno ocorrido na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Tabatinga. Não mais que cem quilômetros<br />
distantes do centro <strong>de</strong> Ribeirão Preto, Tabatinga integra um exemplo bem sucedido <strong>de</strong><br />
aproveitamento <strong>de</strong>sta brecha aberta pelo sistema produtivo. Trata-se <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
aproximadamente treze mil habitantes e que apresenta as mesmas características <strong>de</strong><br />
concentração <strong>de</strong> usinas, ainda que o setor mais forte seja o citricultor. A cida<strong>de</strong> já é citada<br />
internacionalmente como mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento local bem sucedido não apenas no país,<br />
mas na América Latina. Há não mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos era uma cida<strong>de</strong> como outra qualquer do<br />
entorno. Desenvolveu um forte potencial produtivo em torno da fabricação <strong>de</strong> “bichinhos <strong>de</strong><br />
pelúcia”. Portanto, são conhecidos como “clusters, ou distritos dos bichinhos <strong>de</strong> pelúcia”. Já<br />
são mais <strong>de</strong> cem pequenas, médias e microempresas na cida<strong>de</strong>, todas surgidas nos últimos <strong>de</strong>z<br />
anos e com mercado internacional em expansão. A qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida e o índice <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento do município tiveram saltos assustadores neste período. (SEBRAE, 2006)<br />
Cada vez mais existe uma forte tendência dos movimentos e organizações produtivas<br />
apresentarem características cristalizadas em pequenos aglomerados e núcleos <strong>de</strong> produção<br />
voltados à municipalização ou regionalização. Os municípios por sua vez, enquanto po<strong>de</strong>r<br />
local, são, segundo Abramovay (2001), locais <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r privilegiados da gestão <strong>de</strong> recursos.<br />
A gestão, arrecadação e direcionamento <strong>de</strong> recursos em nível municipal favorece o<br />
controle, dada a homogeneida<strong>de</strong> social, econômica, e tratando-se <strong>de</strong> núcleos <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento local, produtiva, típicas dos pequenos municípios. Os interesses dos<br />
pequenos e médios negócios na busca pelo sucesso econômico e por se manterem no mercado<br />
é o motor que favorece a organização e a ação coletiva. Estes pequenos negócios, por sua vez,<br />
71 Ainda que o fenômeno dos distritos industriais italianos seja bastante conhecido e corrente na literatura<br />
especifica vale pon<strong>de</strong>rar que se trata <strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong> organização produtiva <strong>de</strong>ntro da perspectiva <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento local que “explodiu” na Itália do pós-guerra, com especial atenção para o norte <strong>de</strong> país, e em<br />
regiões que não passaram por processo acentuado <strong>de</strong> industrialização (gran<strong>de</strong> indústria). O que os teóricos sobre<br />
os distritos buscam argumentar é que á resposta á crise produtiva pela qual passava a Itália veio <strong>de</strong> regiões<br />
pouco, ou com baixa taxa <strong>de</strong> industrialização. Para melhor <strong>de</strong>finir os distritos industriais (DI s) concordamos<br />
com Becattini (1998), segundo o qual os DI s po<strong>de</strong>m ser entendidos como sendo um gran<strong>de</strong> complexo produtivo,<br />
em que a coor<strong>de</strong>nação e o controle do seu funcionamento in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> regras pré-estabelecidas, projetos, e<br />
mecanismos hierárquicos. São construídos e submetidos num mesmo momento ao jogo do mercado e a validação<br />
e legitimação por parte da socieda<strong>de</strong>. Um conjunto <strong>de</strong> pequenas e médias empresas que aproveita o ambiente<br />
institucional e do fluxo em re<strong>de</strong> criado pelos aglomerados locais.<br />
144
encontram um fator <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> local muito maior nos municípios que em quaisquer outras<br />
esferas <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r. A homogeneida<strong>de</strong> e o controle da vida pública favorecem a ação coletiva em<br />
torno <strong>de</strong> interesses comuns.<br />
145<br />
Por mais que se procure dotar a atribuição <strong>de</strong> recursos aos municípios <strong>de</strong><br />
um caráter objetivo e <strong>de</strong> uma administração burocrática profissionalizada, é<br />
permanente a tentação <strong>de</strong> se fazer das verbas fe<strong>de</strong>rais um instrumento <strong>de</strong><br />
acumulação política que, com freqüência, estimula o clientelismo. Neste<br />
sentido, critérios estatísticos objetivos contribuem ao menos para atenuar<br />
esta característica ligada aos processos <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> recursos para os<br />
municípios. Além disso, é no plano municipal que os cidadãos têm as<br />
melhores oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> controle sobre a vida pública, tanto em função<br />
do interconhecimento existente nos pequenos municípios, quanto da<br />
existência das instâncias representativas do prefeito e da Câmara dos<br />
vereadores. A vida dos pequenos municípios caracteriza-se por uma espécie<br />
<strong>de</strong> transparência social que po<strong>de</strong>ria, em tese, favorecer a ação coletiva.<br />
(ABRAMOVAY, 2001, p. 09)<br />
Ainda que existam fatores que dificultem, e em alguns casos até impeçam que dado<br />
município ou região produtiva seja capaz <strong>de</strong> promover o <strong>de</strong>senvolvimento apenas com<br />
agentes e criativida<strong>de</strong>s internas, eles favorecem os movimentos <strong>de</strong> organização e ação<br />
coletiva, uma vez que ten<strong>de</strong>m a estabelecer laços e vínculos <strong>de</strong> confiança no âmbito local,<br />
olhando com <strong>de</strong>sconfiança para os fatores <strong>de</strong> intervenção externa. Por mais que o<br />
comunitarismo e ação <strong>de</strong> agentes locais sejam insuficientes, e em alguns casos até aparecem<br />
como um entrave à criativida<strong>de</strong> e a construção <strong>de</strong> alternativas, as características <strong>de</strong><br />
homogeneida<strong>de</strong> local favorecem as organizações em torno <strong>de</strong> interesses comuns.<br />
Neste cenário tanto <strong>de</strong> crise quanto <strong>de</strong> reorganização produtiva, é que ganha espaço<br />
tais temas e experiências novas no Brasil como “distritos industriais”, “economia em re<strong>de</strong>”,<br />
“clusters”, <strong>de</strong>ntre muitos outros. Temas embasados em experiências tópicas e difusas <strong>de</strong><br />
algumas regiões do mundo e mais particularmente <strong>de</strong> países <strong>de</strong> capitalismo avançado. Um<br />
ponto comum sobre estas experiências é que todos eles são discutidos sobre a óptica do<br />
“<strong>de</strong>senvolvimento local”. A importância que tais ocorrências <strong>de</strong> organização produtiva têm<br />
para nosso tema <strong>de</strong> investigação é que este rearranjo produtivo recoloca o tema da<br />
qualificação profissional, que passa a ser pensado com vistas a tais mudanças. O PNQ não<br />
apenas faz referência constante como integra <strong>de</strong>ntro do tema da qualificação profissional tais<br />
transformações como “<strong>de</strong>senvolvimento sustentável”, “<strong>de</strong>senvolvimento local” e<br />
“regionalização”. Estabelece o que parece ser a principal inovação com relação ao
PLANFOR, que é consi<strong>de</strong>rar os municípios como atores privilegiados nas parcerias para as<br />
políticas <strong>de</strong> qualificação profissional redimensionadas pelo PLANFOR.<br />
Ao traçar as estratégias <strong>de</strong> implementação dos planos territoriais <strong>de</strong> qualificação<br />
estabelece espaços <strong>de</strong> localização para formulação <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> qualificação que, apesar<br />
<strong>de</strong> reconhecer e privilegiar os po<strong>de</strong>res locais constituídos, tendo o município como exemplo,<br />
abre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> “formação <strong>de</strong> espaços produtivos”, atentos às vocacionalida<strong>de</strong>s locais.<br />
Este ponto é importante, dado que permite que ações como <strong>de</strong>senvolvimento e qualificação<br />
profissional sejam programados, tendo em vista os interesses <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma<br />
região. Região que po<strong>de</strong> ser “formada”. Esta formação, mesmo passando pelos po<strong>de</strong>res<br />
municipais constituídos, estabelece ou po<strong>de</strong> estabelecer uma nova regionalização voltada mais<br />
a fatores <strong>de</strong> vocacionalida<strong>de</strong>s e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s produtivas locais:<br />
146<br />
O PNQ apresenta como inovação a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> os Planos Territoriais<br />
<strong>de</strong> Qualificação serem <strong>de</strong>senvolvidos por municípios <strong>de</strong> mesorregiões,<br />
microregiões e municípios <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> um milhão <strong>de</strong> habitantes. Serão<br />
implementados em caráter experimenta, por meio <strong>de</strong> planos-piloto com<br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> municipal ou mesorregional, com gestão compartilhada entre<br />
representações <strong>de</strong> municípios (através <strong>de</strong> consórcios municipais),<br />
in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> pertencerem a um mesmo estado, mas cujas<br />
diretrizes <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento sejam comuns. (PNQ, 2003, p. 37)<br />
Este reconhecimento do PNQ abre um amplo e frutífero terreno <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s<br />
conectadas com os processos <strong>de</strong> regionalização produtiva que vêm ocorrendo no mundo. Tal<br />
regionalização sugere a construção territorial intervindo em <strong>de</strong>senvolvimento, que respeitando<br />
e até se utilizando dos po<strong>de</strong>res constituídos, abre espaço para novas construções e re<strong>de</strong>s<br />
institucionais tributárias <strong>de</strong> uma nova organização produtiva.<br />
O PNQ abre uma gran<strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong> para a qualificação profissional ser pensada em<br />
âmbito local. Um local que se utiliza sem, contudo, ficar prezo à dimensão geográfica. A<br />
i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> um local e o fator <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> são construídos tendo por base uma re<strong>de</strong>, um<br />
ambiente institucional amparado amplamente no capital social. Conforme coloca Abramovay<br />
(2000):<br />
[...] por um lado a que vem enfatizando a dimensão territorial do<br />
<strong>de</strong>senvolvimento. Não se trata <strong>de</strong> apontar vantagens ou obstáculos<br />
geográficos <strong>de</strong> localização e sim <strong>de</strong> estudar a montagem das “re<strong>de</strong>s”, das “<br />
convenções”, em suma, das instituições que permitem ações cooperativas –<br />
que incluem, evi<strong>de</strong>ntemente, a conquista <strong>de</strong> bens públicos como educação,<br />
saú<strong>de</strong>, informação – capazes <strong>de</strong> enriquecer o tecido social <strong>de</strong> uma certa<br />
localida<strong>de</strong>. (ABRAMOVAY, 2000, p. 02)
A emergência <strong>de</strong>stes negócios, concentrando conhecimento e capacida<strong>de</strong> produtiva em re<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> pequenas e médias empresas, aponta <strong>de</strong> fato para uma nova institucionalida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>finição<br />
<strong>de</strong> novos espaços produtivos. Todavia, no tocante ao <strong>de</strong>bate sobre substituição <strong>de</strong> sistemas<br />
produtivos ou modo <strong>de</strong> produção, falamos em “brechas” ou “fendas” do sistema. Tendo como<br />
base tanto a literatura internacional, Bagnasco (1988), Becattini (1998) e Rullani, (1998),<br />
quanto as experiências produtivas cada vez mais localizadas quer no Brasil, como aponta Eli<br />
da Veiga (2005), ou em se tratando <strong>de</strong> emergências produtivas <strong>de</strong> países centrais, conforme<br />
aponta Cocco, Urani e Galvão (1999). Verificamos nestes casos a predominância <strong>de</strong><br />
argumentos construídos a partir <strong>de</strong> pesquisas que <strong>de</strong>tectam a superação <strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong><br />
organização do trabalho e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Conclusões obviamente embasadas em<br />
elementos díspares, os quais não cabe discutir aqui. Muitos autores falam <strong>de</strong> fato numa<br />
substituição <strong>de</strong> sistemas produtivos, como Coriat (1993), ou numa perspectiva “neofordista”,<br />
como Watanabe (1993), aqui preferimos levantar apenas o elemento <strong>de</strong> coexistência entre<br />
estes distintos mo<strong>de</strong>los produtivos, mesmo porque é assim que vemos a realida<strong>de</strong> brasileira e<br />
mais especificamente o meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto.<br />
4.7 Savoir Faire Rural: espaço privilegiado para a qualificação profissional<br />
Mas existe um fator central que é característico <strong>de</strong>stes pequenos e médios<br />
empreendimentos que surgem e se localizam. A qualificação e as habilida<strong>de</strong>s exigidas pelos<br />
novos postos <strong>de</strong> trabalho compreendidos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>stes pequenos núcleos produtivos requerem<br />
um aprendizado que não faz distinção, ou então faça pouca distinção, entre execução do<br />
trabalho e <strong>de</strong>senvolvimento e gerenciamento <strong>de</strong>stes negócios. Trata-se <strong>de</strong> um empreen<strong>de</strong>r que<br />
aproxima a relação entre o saber e o fazer.<br />
Savoir faire é facilmente traduzido para o português como saber-fazer. Ocorre que<br />
<strong>de</strong>ntro da tradição francesa, o termo tem um significado carregado <strong>de</strong> conhecimento e<br />
habilida<strong>de</strong>s remoídos e qualificados pelo tempo, persistência e <strong>de</strong>dicação. É este saber-fazer,<br />
na verda<strong>de</strong> o savoir faire, que apontamos neste trabalho como sendo a principal força<br />
produtiva que passa a ser valorizada pelo mercado. A qualificação profissional que interessa<br />
ao novo contexto produtivo não abdica, antes necessita, ou até se confun<strong>de</strong> com este saberfazer.<br />
147
O saber-fazer rural não é tomado como fator isolado ou contraponto do evolucionismo<br />
tecnológico. Ele é em si o conhecimento que busca se integrar com a codificação do<br />
<strong>de</strong>senvolvimento tecnológico.<br />
(2003, p. 32):<br />
Uma boa <strong>de</strong>finição para este saber-fazer po<strong>de</strong> ser extraída das colocações <strong>de</strong> Gorz<br />
148<br />
O saber é, antes <strong>de</strong> tudo, uma capacida<strong>de</strong> prática, uma competência que não<br />
implica necessariamente conhecimentos formalizáveis, codificáveis. A maior<br />
parte dos saberes corporais escapa a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma formalização. Eles<br />
não são ensinados; apren<strong>de</strong>m-se no e pela prática, pelo costume, ou seja<br />
quando alguém se exercita fazendo aquilo que se trata <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r a fazer. [...]<br />
Quem quer apren<strong>de</strong>r uma língua, por exemplo, apren<strong>de</strong>ndo suas regras<br />
gramaticais, não saberá falar essa língua, ao passo que aquele que em<br />
princípio treina falá-la po<strong>de</strong>rá apren<strong>de</strong>r mais facilmente as regras gramaticais<br />
perguntando-se sobre o funcionamento <strong>de</strong>ssa língua que ele sabe, sem<br />
contudo conhecê-la.<br />
O “meio rural” é o local privilegiado <strong>de</strong>ste saber-fazer. Como nas palavras <strong>de</strong> Negri e<br />
Hardt (2005), todo agricultor é um químico. O conhecimento <strong>de</strong> cada tipo <strong>de</strong> solo para cada<br />
tipo <strong>de</strong> planta, a seleção da semente. Ele é também um biólogo que escolhe as melhores<br />
sementes e aperfeiçoa as varieda<strong>de</strong>s vegetais. É um artesão que transforma a fruta em vinho e<br />
o queijo em leite. É um metereologista que espreita o céu e arrisca previsões <strong>de</strong> chuva e<br />
estiagem.<br />
O agricultor é um cientista bastante diferente daquele produzido pela socieda<strong>de</strong><br />
industrial com suas precisões e fórmulas técnicas e matemáticas. O agricultor trabalha no<br />
ritmo do tempo, da terra e dos períodos e ciclos. Dia <strong>de</strong> plantar, o trato da colheita, não é um<br />
ato espontâneo ou mecânico. Trata-se <strong>de</strong> conhecimentos tradicionais e experimentados<br />
milenarmente. Também <strong>de</strong> conhecimento renovado. Como observam Hardt e Negri (2004, p.<br />
152) : “Este tipo <strong>de</strong> ciência aberta, típico da agricultura que se move <strong>de</strong> acordo com as<br />
mudanças imprevisíveis da natureza remete antes aos tipos <strong>de</strong> conhecimento que são centrais<br />
para o trabalho imaterial do que às ciências mecanicistas da fábrica”.<br />
O trabalho agrícola como se sabe sempre seguiu os ciclos da natureza, as vonta<strong>de</strong>s do<br />
solo, portanto nunca respeitou a <strong>de</strong>terminação precisa do relógio. A maturação da uva e a<br />
elaboração do vinho não são <strong>de</strong>terminadas, absolutamente, por previsões precisas. O meio<br />
rural ou camponês “guardou” o gran<strong>de</strong> componente <strong>de</strong> engenharia e saber-fazer que propiciou<br />
o surgimento <strong>de</strong> vários laboratórios produtivos.<br />
No caso da divisão sexual do trabalho, este fenômeno também é marcante. Apesar <strong>de</strong><br />
existir separação entre o trabalho do homem e da mulher, no meio rural esta relação sempre
foi mais complexa e difusa. Também neste caso a relação com a natureza, no tempo <strong>de</strong> colher,<br />
trato, estiagem, inverno, chuva. Ainda quando reservado ao ambiente doméstico, o trabalho<br />
feminino sempre foi dotado <strong>de</strong> um saber-fazer que a fábrica procurou eliminar. Na lida diária<br />
da casa, com crianças, velhos e pessoas enfermas, a mulher sempre conservou e reproduziu<br />
características <strong>de</strong> afeto e sentido, que, conforme Hardt e Negri (2005), estariam na base da<br />
principal força produtiva.<br />
Mas como vimos, este savoir faire rural não está amparado numa possível crise da<br />
socieda<strong>de</strong> industrial. Mesmo porque o setor agroindustrial com concentração <strong>de</strong> capitais e<br />
latifúndios monocultores vai muito bem e em expansão, não permitindo pensar em crise a<br />
pequeno e médio prazo. Mesmo assim, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste complexo difuso <strong>de</strong> aglomeração<br />
agroindustrial <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s empresas agrícolas têm surgido pequenos negócios que se sustentam<br />
mais com diferencial <strong>de</strong> produção e qualida<strong>de</strong> do que concorrentes com as gran<strong>de</strong>s empresas.<br />
Um exemplo com o qual tivemos contato em nossa pesquisa sobre produtos com<br />
diferencial <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> foi o caso <strong>de</strong> pequenos engenhos para produção <strong>de</strong> aguar<strong>de</strong>nte<br />
artesanal. Muitos dos gran<strong>de</strong>s complexos sucroalcooleiros com o incentivo para produção <strong>de</strong><br />
álcool combustível e do açúcar, e com a abertura <strong>de</strong> mercados internacionais <strong>de</strong>ixaram <strong>de</strong><br />
fabricar aguar<strong>de</strong>nte. Esta por sua vez passa a ser produzida por pequenos engenhos, muitos<br />
dos quais sobre organização familiar e a maioria <strong>de</strong>les na mais completa informalida<strong>de</strong>.<br />
Visitamos alguns <strong>de</strong>stes pequenos engenhos, sendo que num <strong>de</strong>les pu<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>tectar um forte<br />
potencial propulsor <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento que com poucos hectares <strong>de</strong> terra plantada em cana e<br />
com não mais <strong>de</strong> quatro funcionários, havia aberto mercado <strong>de</strong> exportação com a Inglaterra.<br />
No caso <strong>de</strong>ste engenho, por exemplo, todo o suporte técnico e profissional para<br />
gerenciamento do negócio foi dado pelo, pelo SEBRAE via SR.<br />
Mas este novo mercado produtivo e <strong>de</strong> trabalho não se sustenta na simples perspectiva<br />
<strong>de</strong> recuperação <strong>de</strong> velhas formas produtivas. Necessita da quebra <strong>de</strong> barreiras e na construção<br />
<strong>de</strong> um ambiente institucional propício. Dentro <strong>de</strong>sta nova realida<strong>de</strong> em que as barreiras <strong>de</strong> um<br />
mundo rural e outro urbano são quebradas, surge uma série <strong>de</strong> novas ativida<strong>de</strong>s que po<strong>de</strong>m<br />
ser agrupadas <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> qualquer uma <strong>de</strong>stas antigas separações. Algumas ativida<strong>de</strong>s por um<br />
lado reforçam as particularida<strong>de</strong> e tradições rurais ou até camponesas, lembrando que estas<br />
são mais comuns entre a agricultura familiar. Sobre este sistema <strong>de</strong> gerenciamento e<br />
produção, vale apontar que no Brasil são cerca <strong>de</strong> 4,5 milhões <strong>de</strong> estabelecimentos <strong>de</strong>ste tipo,<br />
on<strong>de</strong> se tem 80% <strong>de</strong> estabelecimentos agrícolas, dos quais 50% estão no nor<strong>de</strong>ste do país.<br />
Apesar <strong>de</strong>ste porcentual, o segmento <strong>de</strong>tém 20% das terras, o que implica em média a 30% da<br />
produção nacional. Se consi<strong>de</strong>rarmos apenas os produtos básicos <strong>de</strong> consumo diário como<br />
149
arroz, feijão, milho, hortaliça e carne, este porcentual atinge a cifra dos 60%. (MINISTÉRIO<br />
DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO, 2005).<br />
Por outro lado, o campo ou meio rural, conforme aponta Abramovay (2004), não é,<br />
nem nunca foi local <strong>de</strong> mera produção <strong>de</strong> alimentos. Dentro do novo contexto produtivo, este<br />
potencial <strong>de</strong>sprezado pela socieda<strong>de</strong> industrial aparece. Para Bagnasco (1988, p. 38), ao tratar<br />
do caso do nor<strong>de</strong>ste italiano, apontando o mesmo como tendência global, pontua que a força<br />
motriz da nova organização produtiva é encontrada principalmente neste, digamos, rural<br />
transformado:<br />
150<br />
Em inúmeros casos, em somente uma ou duas gerações surgiram <strong>de</strong>ssas<br />
famílias rurais, artesãos e pequenos empresários. Assim, a ação combinada<br />
<strong>de</strong>ssas duas condições permite melhor enten<strong>de</strong>r a razão pela qual o meio<br />
mais favorável a expansão da pequena empresa, foi o que um economista<br />
<strong>de</strong>signou “campo urbanizado.<br />
O meio rural produz “modo <strong>de</strong> vida”. Acontece uma espécie <strong>de</strong> reestruturação do<br />
próprio espaço que passa a ser valorizada pelo mercado gerando ativida<strong>de</strong>s como jardineiros,<br />
chacareiros, limpadores <strong>de</strong> poços, a<strong>de</strong>stradores <strong>de</strong> animais, vigias etc. São, por exemplo,<br />
chácaras e sítios <strong>de</strong> recreio para temporada, abrindo espaço para novas <strong>de</strong>mandas. Existe uma<br />
tendência crescente pelo “retorno às origens”, ao campo, à socieda<strong>de</strong> rural. Retorno este que<br />
evi<strong>de</strong>ntemente não po<strong>de</strong> ser tomado em sentido literal. Muitas das características e modos <strong>de</strong><br />
vida perdidos com a socieda<strong>de</strong> industrial são hoje recuperados e existe cada vez mais mercado<br />
para ser explorado neste sentido, uma vez que têm consumidores para estes novos produtos.<br />
São também produtos, alimentos, roupas, objetos e adornos <strong>de</strong> maneira geral, mas não é<br />
apenas isso, é um modo <strong>de</strong> vida que se busca. Fatores como áreas <strong>de</strong> lazer, paisagens, o<br />
chamado “ver<strong>de</strong>”, o silêncio, o contato e a interação com a natureza. Conforme aponta Baima<br />
(2002, p. 02):<br />
Esses dois movimentos populacionais, aliados a mecanização do trabalho<br />
agrícola, estão levando ao crescimento das ocupações não agrícolas no<br />
meio rural sem que, no entanto, haja uma política <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>obra<br />
nas regiões afetadas. São novas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ocupação para a<br />
população, como caseiro, jardineiro, trabalho doméstico e no setor <strong>de</strong><br />
serviços, que estão surgindo para aten<strong>de</strong>r a esse movimento <strong>de</strong> saída das<br />
cida<strong>de</strong>s.<br />
No mais das vezes, esta relação se dá <strong>de</strong> forma que os proprietários possuem um<br />
trabalho urbano e geralmente não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m da terra como fonte <strong>de</strong> renda. Por outro lado, são
significativos os casos em que famílias acabam permanecendo <strong>de</strong>finitivamente na terra. Na<br />
maioria das vezes são pequenas proprieda<strong>de</strong>s, lotes <strong>de</strong> terra com estrutura bastante distinta do<br />
meio rural <strong>de</strong> décadas passadas. Na maioria dos casos, o que não possuem com relação aos<br />
centros urbanos, é o que <strong>de</strong> fato não querem possuir como comércio e asfaltamento urbano,<br />
por exemplo.<br />
Então, este saber-fazer <strong>de</strong>ixa seu casulo, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser ou habilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>scartada ou<br />
habilida<strong>de</strong> recuperada e passa a interagir com as novas dinâmicas produtivas. Neste momento,<br />
ele passa a ser alvo preferencial da qualificação profissional, ten<strong>de</strong>ndo, conforme o caso, a se<br />
confundir com ela. Não abdica, portanto, do conhecimento e do acesso amplo ao<br />
conhecimento, antes necessita <strong>de</strong>ste, sem a distinção da construção institucional das<br />
dimensões rural e urbana. Negri e Hardt (2005, p. 155) apontam:<br />
151<br />
Começa a surgir, por exemplo, uma forma pós fordista <strong>de</strong> produção agrícola<br />
que se caracteriza por este tipo <strong>de</strong> mudança tecnológica. A mo<strong>de</strong>rnização<br />
agrícola escorou-se fortemente em tecnologias mecânicas, do trator<br />
soviético aos sistemas californianos <strong>de</strong> irrigação, mas a pós mo<strong>de</strong>rnização<br />
agrícola <strong>de</strong>senvolve inovações biológicas e bioquímicas, paralelamente a<br />
sistemas especializados <strong>de</strong> produção, como as estufas, a iluminação<br />
artificial e a agricultura sem solo. Essas novas técnicas e tecnologias<br />
ten<strong>de</strong>m a afastar a produção agrícola da produção em larga escala,<br />
facultando operações mais especializadas em pequena escala.<br />
As novas formas <strong>de</strong> produção camponesa ou agrícola não estão isoladas<br />
economicamente, pois em boa medida não estão isoladas do acesso amplo ao conhecimento,<br />
aos mercados, produção, etc. Se este saber-fazer é atribuído mais a uma cultura e tradição<br />
popular, sendo reproduzida na prática, e hoje integrando os interesses produtivos e <strong>de</strong><br />
mercado, ele <strong>de</strong>ve ser alvo <strong>de</strong> preocupação em se tratando <strong>de</strong> qualificação profissional. Neste<br />
sentido, é que a resposta à crise <strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong> organização e gestão do trabalho surge<br />
recuperando elementos que foram <strong>de</strong>scartados pela socieda<strong>de</strong> industrial, conforme apontam<br />
Santana, Souza e Deluiz (1999, p. 41):<br />
A resposta á crise, ou melhor, como querem os teóricos da especialização<br />
flexível, a antecipação ao estrangulamento, não surgia <strong>de</strong> elementos<br />
totalmente inusitados. Antes, viria <strong>de</strong> uma certa recuperação <strong>de</strong> elementos<br />
ou formas produtivas que sucumbiram diante do sistema fordista sem se<br />
extinguirem. Aquilo que po<strong>de</strong>-se chamar <strong>de</strong> sistema <strong>de</strong> manufatura<br />
concorrera com as idéias chaves que se articulariam mais tar<strong>de</strong> no fordismo,<br />
sendo <strong>de</strong>rrotado enquanto linha mestra do sistema produtivo, continuando a<br />
existir ao longo do tempo em experiências isoladas. A <strong>de</strong>rrota teria se dado,<br />
<strong>de</strong>vido, sobretudo, á intervenção <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m política, sustentada pela visão do<br />
evolucionismo tecnológico.
A recuperação <strong>de</strong> formas produtivas que pareciam extintas surge como resposta à<br />
crise 72 . Tais formas recuperam um saber <strong>de</strong>sprezado pelo evolucionismo tecnológico e que<br />
passam a integrar a nova dinâmica do conhecimento necessário à produção. Mas este saber-<br />
fazer já integra o conteúdo dos cursos <strong>de</strong> qualificação profissional. A perspectiva aberta pelo<br />
PNQ e a ação dos sindicatos buscando resultados e eficiências interage com esta nova forma<br />
<strong>de</strong> saber. No momento que este saber-fazer – conhecimento popular - integra o conteúdo dos<br />
cursos, ele passa a ser qualificação profissional. Uma qualificação profissional que atenta às<br />
transformações que vêm ocorrendo no mundo do trabalho, recupera saberes que dantes se<br />
julgava, teriam sucumbido. São formas produtivas que transformadas passam a integrar o<br />
circuito <strong>de</strong> valorização do capital. Esta transformação passa sempre pelo processo <strong>de</strong><br />
conhecimento e mesmo <strong>de</strong> precisão e da codificação e difusão do conhecimento que em boa<br />
medida foram conquistas <strong>de</strong>ste mesmo evolucionismo tecnológico.<br />
5 Conclusões<br />
As políticas, e mais particularmente as políticas sindicais <strong>de</strong> qualificação e<br />
requalificação profissional passaram por profundas transformações compreendidas <strong>de</strong>ntro do<br />
período investigado. Tais transformações, ou mais propriamente a rapi<strong>de</strong>z com que elas<br />
acontecem, são analisadas no nosso trabalho a partir <strong>de</strong> dois pontos, digamos, mais gerais.<br />
O primeiro <strong>de</strong>les diz respeito às políticas <strong>de</strong> qualificação profissional propriamente<br />
ditas, como elas são disponibilizadas e propostas. Como elas aparecem, diríamos, <strong>de</strong> forma<br />
“fechada”, os módulos <strong>de</strong> cursos, e também a avaliação <strong>de</strong> resultados <strong>de</strong> tais programas; O<br />
segundo ponto diz respeito às transformações abertas pelo processo <strong>de</strong> reestruturação<br />
produtiva, ou mundo do trabalho. Na verda<strong>de</strong> a relação entre estes dois prismas se constitui na<br />
organização central do nosso trabalho <strong>de</strong> investigação e pesquisa.<br />
Buscamos relacionar estas duas dimensões, sem, contudo, relativizá-las. Grosso<br />
modo, estas duas dimensões não são correspon<strong>de</strong>ntes, ainda que necessariamente<br />
relacionadas. As políticas públicas <strong>de</strong> qualificação profissional são referente ao aparato<br />
institucional público, estatal, e no nosso caso particularmente sindical. Mesmo consi<strong>de</strong>rando<br />
todas as transformações sobre esta questão, conforme apontamos no nosso trabalho: Reforma<br />
72 Frise-se que não advogamos aqui um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> pequena produção como solução para o problema do trabalho<br />
e nem mesmo como antídoto contra a concentração <strong>de</strong> acesso (terra, bens, etc.). Os fatores e tendências se<br />
constituem em verificação, portanto, em fatos. Gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong>stes pequenos empreendimentos tem curta<br />
duração. Decretam falência e são passíveis <strong>de</strong> toda má sorte atinente a uma legislação e regulação que não<br />
favorece a sua existência.<br />
152
Constitucional, criação dos conselhos e órgãos tripartites etc. A reforma, ou a tentativa por<br />
reformar tais instituições visando aten<strong>de</strong>r as transformações que vêm ocorrendo no mundo no<br />
tocante a reorganização da produção, ou mesmo buscando maior <strong>de</strong>mocratização, conforme o<br />
espírito da Constituição <strong>de</strong> 88 reorganizaram institucionalmente a representação <strong>de</strong> interesses<br />
distintos, ou tidos institucionalmente como absolutamente antagônicos. O Estado <strong>de</strong> maneira<br />
geral continua sendo espaço em que tais antagonismos ou divergências <strong>de</strong> interesses <strong>de</strong>vem<br />
ser resolvidos ou solucionados. Temos então uma “solução institucional” que aparece na<br />
forma <strong>de</strong> políticas públicas <strong>de</strong> qualificação e requalificação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra.<br />
Foi nesta linha que analisamos o processo <strong>de</strong> sindicalização no Brasil, e<br />
particularmente <strong>de</strong> sindicalização rural. Uma relação entre o Estado que busca se adiantar<br />
frente às transformações que vêm ocorrendo na dinâmica produtiva, visando sempre<br />
regulamentar <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> limites preestabelecidos. Trata-se em essência da própria matriz do<br />
po<strong>de</strong>r constituinte (NEGRI, 2002). Os movimentos sociais no meio rural, a luta dos<br />
trabalhadores por melhores condições <strong>de</strong> trabalho e renda, é a força propulsora das mudanças,<br />
e assim também, do reconhecimento <strong>de</strong> direitos, <strong>de</strong>ntre os quais á sindicalização. Ocorre que<br />
os limites <strong>de</strong>ste reconhecimento, diríamos a forma, é dado pelo po<strong>de</strong>r político, que inclusive<br />
busca se adiantar mediante regulamentações que, em partes, ou <strong>de</strong> maneira <strong>de</strong>formada e<br />
transformada, se alimenta <strong>de</strong>ste processo. Sem entrar numa discussão mais substancial sobre o<br />
conceito <strong>de</strong> Estado, apontamos que era normal que isso acontecesse no Brasil, uma vez que o<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> construção do Estado Nacional, da legislação sobre o trabalho e da relação<br />
institucional <strong>de</strong>ste com o capital, “velada” nos limites do próprio Estado, impulsionavam para<br />
esta relação. Os sindicatos, como órgãos <strong>de</strong> representação <strong>de</strong> classes são, portanto, o braço <strong>de</strong><br />
expressão do Estado, que intervêm, buscando dirimir conflitos e interesses relativos a relação<br />
capital e trabalho. Quando o Estado ativa este processo, inevitavelmente ele traz para o campo<br />
da regulação, do reconhecimento, ou seja, para seu interior, trabalhadores que mesmo<br />
figurando nos limites preestabelecidos (horas <strong>de</strong> trabalho, ativida<strong>de</strong>s, salário, direitos e<br />
<strong>de</strong>veres reconhecidos e salvaguardados), sempre ultrapassam estes mesmos limites.<br />
A verificação <strong>de</strong>stes limites que foram ultrapassados apontamos quando, no final dos<br />
anos 90 passam a serem implementadas as políticas públicas <strong>de</strong> qualificação profissional,<br />
objeto do nosso trabalho <strong>de</strong> investigação. Mediante a crise dos sindicatos, crise que lemos<br />
como atinente à ação e pautas <strong>de</strong> intervenção que se constituem na própria gênese <strong>de</strong>stes<br />
movimentos, as crescentes <strong>de</strong>sregulamentações, <strong>de</strong>ntre todos os fatores já sabidos e citados,<br />
os sindicatos não encontram saída senão intervindo num ambiente aberto <strong>de</strong> trabalho. Os<br />
sindicatos não são capazes <strong>de</strong> qualificar trabalhadores para postos <strong>de</strong> trabalhos existentes,<br />
153
conforme ocorria em períodos <strong>de</strong> “pleno emprego”. Os sindicatos continuam<br />
institucionalmente representativos, uma que continuam sendo órgãos legítimos <strong>de</strong><br />
representação <strong>de</strong> classes, outra que mudam na medida do possível, seu foco <strong>de</strong> atuação. Os<br />
cursos <strong>de</strong> qualificação profissional, particularmente <strong>de</strong> aplicativos básicos em<br />
microinformática que verificamos naquele que chamamos <strong>de</strong> primeiro período, não são<br />
<strong>de</strong>stinados á ativida<strong>de</strong>s e empregos preestabelecidos; Também, entre os alunos, a gran<strong>de</strong><br />
maioria não é <strong>de</strong> “trabalhadores empregados”.<br />
Partimos assim da construção <strong>de</strong> um aparato público <strong>de</strong> programas e cursos <strong>de</strong><br />
qualificação profissional que são construídos a partir dos planos e programas fe<strong>de</strong>rais, com<br />
especial atenção para o PLANFOR e PNQ, financiados particularmente pelo FAT. Este<br />
“ambiente”, ou aparato público <strong>de</strong> qualificação profissional acontece no momento em que o<br />
Estado busca re<strong>de</strong>finir seu papel no contexto das mudanças que vinham acontecendo no<br />
mundo produtivo. Existe, portanto, uma espécie <strong>de</strong> solavanco no que diz respeito a todo<br />
aparato institucional como sindicatos, legislação trabalhista etc. E é no interior <strong>de</strong>stas<br />
transformações que a relação sindicato e Estado tenta “mudar na continuida<strong>de</strong>”. A<br />
continuida<strong>de</strong> é o papel do Estado via regulação, buscando se “alimentar” sempre, do “trabalho<br />
vivo”. A mudança consiste em captar estas novas relações <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong>ntro da dinâmica<br />
produtiva, para assim, as alterando, propor políticas públicas.<br />
A trajetória <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os recursos, passando por propostas, disputa <strong>de</strong> interesses,<br />
distribuição <strong>de</strong> verbas, formulação <strong>de</strong> módulos <strong>de</strong> cursos etc., são políticas “públicas”, que<br />
tratamos como aparato institucional da qualificação profissional. O ponto consiste em discutir<br />
como tais políticas são absorvidas e aproveitadas pelos agentes, ou alunos no caso. Para tanto<br />
é preciso consi<strong>de</strong>rar o interesse <strong>de</strong>stes agentes no tocante aos cursos e conteúdos <strong>de</strong><br />
aprendizado. Tais interesses, evi<strong>de</strong>ntemente, são alimentados pelo aproveitamento e as<br />
possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> transformação e uso <strong>de</strong>stes conteúdos. Neste ponto já estamos tanto mais<br />
próximos da, por assim dizer, matriz da sociologia, quanto, <strong>de</strong> um ponto bastante caro ás<br />
nossas investigações e pesquisa, que é a questão da subjetivida<strong>de</strong>.<br />
Trabalhamos com tais interesses, sob duas perspectivas. Uma <strong>de</strong>las é a conquista do<br />
emprego, e neste caso estaríamos, ainda que não necessariamente, voltados para a relação <strong>de</strong><br />
assalariamento; O segundo, <strong>de</strong> forma mais laica, acaba levando para o conceito <strong>de</strong> cidadania,<br />
uma vez que consi<strong>de</strong>ra e prioriza o trabalho ao invés do emprego, momento em que fatores,<br />
como principalmente a qualida<strong>de</strong> do trabalho entra em discussão.<br />
Ainda que não tenhamos a intenção <strong>de</strong> camuflar nossas simpatias por este ou aquele<br />
ponto <strong>de</strong> vista ou linha teórica, em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outros, buscamos trabalhar com “zonas <strong>de</strong><br />
154
interesses”. Tais “zonas <strong>de</strong> interesses” nos levam a admitir a pluralida<strong>de</strong> difusa no tocante ao<br />
paradigma produtivo, ou do trabalho. Em outras palavras, nos leva a admitir a existência <strong>de</strong><br />
tipos diferentes <strong>de</strong> trabalho e organização produtiva. Afirmação que procuramos dirigir<br />
diretamente ao nosso objeto, ainda que generalizações maiores sejam cabíveis. Seguindo esta<br />
orientação, não opomos mo<strong>de</strong>los produtivos, como também não saímos em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> um tipo<br />
<strong>de</strong> organização do trabalho em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outro. Neste sentido buscamos nos voltar para o<br />
empírico.<br />
Pensar sobre este empírico foi o <strong>de</strong>safio proposto. Contudo não basta a sua<br />
constatação. Como também não basta propor a superação <strong>de</strong>ste por mero otimismo <strong>de</strong><br />
vonta<strong>de</strong>. Acreditamos que apenas seria possível o <strong>de</strong>senvolvimento dos nossos estudos<br />
admitindo e trabalhando com estes pontos entre uma dimensão constituída: as políticas<br />
publicas <strong>de</strong> qualificação profissional; E uma dimensão constituinte: o espaço aberto pelo<br />
mundo produtivo e <strong>de</strong> constante reorganização do trabalho (NEGRI, 2002). O primeiro po<strong>de</strong><br />
ser apreendido, o segundo não, dada á dinâmica aberta (movimento), e sempre contemporânea<br />
<strong>de</strong> suas transformações.<br />
A “resistência produtiva” é pensada neste ponto como ato constituinte. A resistência<br />
assim produz tanto alternativas materiais e imediatas, ainda que limitadas por possibilida<strong>de</strong>s e<br />
contexto histórico, quanto produz subjetivida<strong>de</strong>. A subjetivida<strong>de</strong> neste ponto é i<strong>de</strong>ntificada<br />
com o fator “experiência”, ou “experimentação” (THOMPSON, 1989), é, portanto a<br />
experiência vivida que forma e transforma á consciência. Assim, os pequenos núcleos <strong>de</strong><br />
produção i<strong>de</strong>ntificados com o fator do empreen<strong>de</strong>dorismo em que apontamos a retomada da<br />
capacida<strong>de</strong> produtiva por parte dos trabalhadores não aparecem em nosso trabalho como<br />
mo<strong>de</strong>lo, ou saída para o impasse do <strong>de</strong>semprego, ou da qualificação. Estas experiências são<br />
discutidas como “formas” <strong>de</strong> resistência que no ato da negação (do assalariamento,<br />
subcontratação, exercício do trabalho, etc.) criam alternativas imediatas, viáveis e possíveis.<br />
Sobre este ponto, o ato <strong>de</strong> migrar i<strong>de</strong>ntificado principalmente entre os trabalhadores<br />
assalariados <strong>de</strong> baixa qualificação (sem separar a materialização <strong>de</strong>ste ato do seu componente<br />
subjetivo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão) é também resistência produtiva. É neste sentido que pensamos o<br />
mercado como constitutivo ou como construção social. Tanto novas <strong>de</strong>mandas por produtos,<br />
qualificação etc., quanto a satisfação <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalhos <strong>de</strong> baixa qualificação <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da<br />
construção social e da ação dos agentes.<br />
A discussão sobre as políticas <strong>de</strong> qualificação profissional nos sindicatos rurais tem<br />
como <strong>de</strong>safio serem analisadas a partir <strong>de</strong> suas relações com a dinâmica aberta pela nova<br />
organização produtiva. Ou ainda, pelas tendências contemporâneas e ofertas <strong>de</strong> trabalho e<br />
155
enda. Por isso enten<strong>de</strong>mos tal dinâmica como absoluta, passando por alterações constantes e<br />
ininterruptas. Sendo assim ela não po<strong>de</strong> ser apreendida completamente, tanto quanto guarda<br />
gran<strong>de</strong> dose <strong>de</strong> imprevisibilida<strong>de</strong>. Isso não significa dizer que o po<strong>de</strong>r constituído, em que<br />
enten<strong>de</strong>mos as políticas <strong>de</strong> formação e qualificação, tanto quanto os programas e projetos<br />
mais amplos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento não tenham influências na <strong>de</strong>finição constituinte (NEGRI,<br />
2002). A relação entre estas duas dinâmicas que no nosso trabalho po<strong>de</strong> ser lida por um lado<br />
como as políticas sindicais <strong>de</strong> qualificação e por outro como possibilida<strong>de</strong>s produtivas, <strong>de</strong><br />
trabalho e renda são apontadas como o <strong>de</strong>safio central da nossa pesquisa.<br />
No tocante as transformações na organização do trabalho, segue a mesma orientação.<br />
A importância e o significado <strong>de</strong>sta constatação buscam romper com alguns cânones, bem<br />
como contribuir com o espaço aberto a partir do rompimento <strong>de</strong>stas barreiras. Dito <strong>de</strong> outra<br />
maneira não é difícil i<strong>de</strong>ntificarmos estudos atribuídos á uma sociologia do trabalho que ficam<br />
presos a um espaço <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação e análise da construção institucional do problema <strong>de</strong><br />
investigação. Estudar relações <strong>de</strong> trabalho no mundo contemporâneo significa tomar certa<br />
distância, sem abandonar, as construções e regulações institucionais sobre o trabalho. A<br />
apreensão institucional do trabalho (regulação geral sobre o trabalho) po<strong>de</strong> apontar, ou<br />
explicar apenas um elo da ca<strong>de</strong>ia produtiva e das relações <strong>de</strong> trabalho. Ou, apenas uma ponta<br />
daquilo que Marx chamava <strong>de</strong> “trabalho vivo”. Neste sentido o trabalho em sentido mais laico<br />
possível (GORZ, 1998), como atributo fundante e <strong>de</strong> transformação da socieda<strong>de</strong> revela uma<br />
“produção” <strong>de</strong>slocalizada e difundida pelo tecido social. Um trabalho que ao mesmo tempo é<br />
cada vez mais, para bem ou para mal, <strong>de</strong>stituído <strong>de</strong> regulação e, portanto, <strong>de</strong> direitos sociais.<br />
Uma vez ocorrendo tais mudanças, é normal que a própria sociologia sofra<br />
transformações. Neste momento toda a rica e vasta produção <strong>de</strong> conhecimento do período<br />
industrial <strong>de</strong>vem servir como referência para ultrapassar os problemas estudados naquele<br />
momento. Dois pontos que consi<strong>de</strong>ramos clássicos são retomados na tese, ambos tidos como<br />
centrais, e que atribuímos ao “pioneirismo” <strong>de</strong> Thompson (1989). Um <strong>de</strong>les se refere à análise<br />
organizativa daqueles que estão fora Establishment, ou seja, <strong>de</strong> toda organização não regulada<br />
e regulamentada e que se move, digamos assim, por “fora”; Também, sobre a diferença entre<br />
os estatísticos e os i<strong>de</strong>ólogos, ou seja, a busca em aproveitar estas experiências na forma <strong>de</strong><br />
qualificar as estatísticas ou quantificar posições.<br />
Este mesmo fenômeno acontece mais especificamente no nosso caso, com a<br />
sociologia rural, uma vez que também este passou por profundas transformações.<br />
“Apren<strong>de</strong>mos” a conceber o meio rural como local do atraso com relação á cida<strong>de</strong> e a<br />
produção <strong>de</strong> conhecimentos e bens industriais. Este entendimento hoje não vigora mais. A<br />
156
egião <strong>de</strong> Ribeirão Preto, ou o meio agroindustrial da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto é suficiente<br />
como argumento contra a tese <strong>de</strong> colonização do meio rural pelo industrial. Todos os bens e<br />
serviços disponibilizados no setor chamado <strong>de</strong> agroindustrial da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, e<br />
voltados para este tipo <strong>de</strong> produção, estão em completa conexão com o <strong>de</strong>senvolvimento<br />
técnico científico <strong>de</strong> ponta, geralmente atribuídos as conquistas do <strong>de</strong>senvolvimento<br />
industrial. Se antes verificávamos estudos voltados para o meio rural ou agroindustrial que<br />
priorizavam o “rural” como local <strong>de</strong> atraso, o trabalhador rural como simples espoliado e<br />
expulso do seu meio, estes estudos hoje não gozam <strong>de</strong> acento privilegiado para explicar o<br />
fenômeno que hoje vem acontecendo neste que chamamos <strong>de</strong> “meio rural”. Em verda<strong>de</strong> são<br />
as antigas matizes <strong>de</strong>finidoras da separação entre rural e urbano que, por assim dizer, caíram<br />
por terra. Se isso aconteceu é por que são mundos, estes tidos como separados, que se<br />
“contaminaram”. Da mesma forma que a “sociologia <strong>de</strong> fábrica”, ou do “local <strong>de</strong> trabalho”,<br />
não goza mais <strong>de</strong> acento privilegiado. Se as antigas matizes não dão conta <strong>de</strong> explicar a<br />
realida<strong>de</strong> social precisamos não apenas realizar a pesquisa, mas construir novos referenciais<br />
<strong>de</strong> análise. (NEGRI, 1998)<br />
Não cabe aqui discutir o quanto às características clássicas <strong>de</strong>finidoras do meio rural<br />
mudaram. Todavia, para o teor da nossa discussão <strong>de</strong> tese é fundamental apontar que o meio<br />
rural não <strong>de</strong>sapareceu conforme algumas visões proféticas e apologéticas em vigor até pouco<br />
tempo. Por outro lado, o meio rural mudou, sofreu profundas transformações que o colocaram<br />
como vetor <strong>de</strong> civilização e <strong>de</strong>senvolvimento. Um meio rural que aproveitando das conquistas<br />
científicas e tecnológicas comumente atribuídas á socieda<strong>de</strong> industrial, passa a ter acesso ao<br />
conhecimento e aos bens <strong>de</strong> serviço disponíveis. Evi<strong>de</strong>ntemente que existe um outro problema<br />
a ser enfrentado no que diz respeito a <strong>de</strong>mocratização e a socialização <strong>de</strong> tais conquistas. O<br />
acesso em sentido amplo – as políticas públicas <strong>de</strong> financiamento, <strong>de</strong>senvolvimento, ou<br />
mesmo acesso ao mercado, são reservados aos gran<strong>de</strong>s investimentos <strong>de</strong> capitais no campo.<br />
Os fatores que <strong>de</strong>finem esta relação são muitos, cabendo aqui citar apenas que o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento econômico brasileiro favoreceu, impulsionou e priorizou a concentração<br />
fundiária e os gran<strong>de</strong>s aglomerados produtivos.<br />
Nossa pesquisa aponta que existe uma forte tendência <strong>de</strong> transformação aberta nesta<br />
que chamamos <strong>de</strong> dinâmica produtiva. Todavia trata-se <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong> que <strong>de</strong>vem ser<br />
estudadas a partir da relação mercado x socieda<strong>de</strong>. Conforme estudo <strong>de</strong> Dimaggio e Louch,<br />
(2005) o mercado não é uma entida<strong>de</strong> autônoma e <strong>de</strong>scolada da socieda<strong>de</strong>, antes disso,<br />
mercado e socieda<strong>de</strong> são dimensões tão relacionadas e influenciáveis que não po<strong>de</strong>m ser<br />
157
pensadas separadamente. Portanto não se trata <strong>de</strong> conceber o mercado como ele é tentando<br />
intervir na socieda<strong>de</strong> e sim admitir a construção social do mercado, (BAGNASCO, 1988.).<br />
O mercado é uma construção social, ainda que evi<strong>de</strong>ntemente, como toda construção<br />
social, esta também se limita ás possibilida<strong>de</strong>s e apreensões históricas temporais, conforme<br />
pon<strong>de</strong>ra Gid<strong>de</strong>ns (2001), lembrando <strong>de</strong> uma das teses centrais <strong>de</strong> Marx. Uma vez admitido<br />
este entendimento em nosso trabalho <strong>de</strong> tese, perseguimos em algum momento as<br />
características <strong>de</strong>ste novo mercado, <strong>de</strong>sta nova produção. Evi<strong>de</strong>ntemente que cabe aqui uma<br />
ampla discussão sociológica amparada sobre este problema enquanto verificação empírica. O<br />
processo <strong>de</strong> reorganização produtiva que sacudiu o mundo já na década <strong>de</strong> setenta e o Brasil<br />
mais pontualmente nos anos noventa, levou muitos autores, <strong>de</strong>ntre os quais cito apenas alguns<br />
(GORZ, 2003); (NEGRI, 2001); (OFFE, 1989); (HABERMANS, 1984); (SENNETT, 2001);<br />
(KURZ, 1986) a levantarem o problema indicando saídas diversas. Tais referências teóricas<br />
nos levam a admitir no nosso trabalho <strong>de</strong> tese, que estaríamos diante <strong>de</strong> uma nova<br />
“materialida<strong>de</strong> do mundo”. Ao que pensamos não cabe sobre este ponto moralismos<br />
conservadores ou juízos <strong>de</strong> valores, conforme apontam Bourdieu, Chanboredon e Passeron<br />
(2000). A i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong>ste fenômeno é tomada como terreno comum <strong>de</strong> pesquisa.<br />
Os programas e cursos <strong>de</strong> qualificação profissional iniciados em meados da década <strong>de</strong><br />
noventa no Brasil têm um recorte bastante industrialista na acepção do termo. Cursos na<br />
maioria das vezes voltados para o treinamento rápido e para postos <strong>de</strong> trabalho que<br />
“acreditava-se” já existentes. Taís “políticas <strong>de</strong> cursos” não <strong>de</strong>ram respostas satisfatórias á<br />
crise do <strong>de</strong>semprego, motivo e justificativa central do marco inaugural <strong>de</strong>stes programas.<br />
Mas, se tais políticas não surtiram os resultados esperados não se <strong>de</strong>ve á boas ou más<br />
intenções, e nem mesmo por motivo <strong>de</strong> corrupção institucional, <strong>de</strong>ve-se mais á tentativa <strong>de</strong><br />
solucionar o problema do <strong>de</strong>senvolvimento e do <strong>de</strong>semprego por meio <strong>de</strong> um aparato<br />
institucional envelhecido e, mais propriamente pela regulação do trabalho pelo Estado.<br />
O eixo articulado da pesquisa é a relação entre as dimensões dos programas <strong>de</strong><br />
qualificação com as transformações produtivas como totalida<strong>de</strong>. A relação entre estes dois<br />
elementos é o fio condutor da tese e da leitura sobre o nosso objeto <strong>de</strong> pesquisa. As mudanças<br />
e transformações na organização produtiva são, portanto, construções sociais, mas não<br />
necessariamente instituições e políticas públicas. As constitucionalida<strong>de</strong>s institucionais das<br />
políticas <strong>de</strong> qualificação são ou po<strong>de</strong>m vir a ser, parte das mudanças e transformações abertas<br />
no mundo produtivo.<br />
Os sindicatos são tomados como instituições típicas do velho mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> regulação<br />
sobre o trabalho. Esta discussão é aberta na tese, principalmente a partir da posição <strong>de</strong><br />
158
Rodrigues (1999) quando este aponta que os sindicatos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sta relação per<strong>de</strong>ram a<br />
condição <strong>de</strong> instituições privilegiadas <strong>de</strong> representação <strong>de</strong> classe.<br />
Esta discussão sobre os sindicatos aponta para uma questão central: Os sindicatos são<br />
instituições criadas á partir <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo temporal <strong>de</strong> organização do trabalho, (COCCO,<br />
2000). A estrutura organizacional e até mesmo os limites e parâmetros da instituição, são<br />
construídos tendo em vista á organização produtiva <strong>de</strong> um momento histórico. Os sindicatos<br />
são instituições voltadas para o trabalho regulado no tempo e no espaço. Se a dinâmica do<br />
mundo produtivo aponta para o crescimento da <strong>de</strong>sregulamentação tanto quanto para o<br />
exercício do trabalho cada vez mais <strong>de</strong>slocalizado, enfrentar esta nova realida<strong>de</strong> é o <strong>de</strong>safio<br />
colocado á instituição sindical. Neste sentido os sindicatos fizeram as suas parte no tocante<br />
aos programas <strong>de</strong> formação profissional. Não foram muitos além, uma vez que os próprios<br />
limites institucionais não permitem! Os sindicatos, institucionalmente representam interesses<br />
consi<strong>de</strong>rados antagônicos e irreconciliáveis na relação entre capital e trabalho. Portanto a<br />
construção institucional dos sindicatos <strong>de</strong>ve representar interesses ou do capital ou do<br />
trabalho. Um tipo <strong>de</strong> trabalho que se organizava como produto <strong>de</strong> venda <strong>de</strong> quem não <strong>de</strong>tinha<br />
o capital.<br />
Conforme discutimos, o “mundo do trabalho”, afirmação que vale para o meio rural da<br />
região <strong>de</strong> Ribeirão Preto tanto quanto para os chamados países do centro, não se constitui<br />
somente <strong>de</strong> empregados e empregadores. Consi<strong>de</strong>rar apenas este tipo <strong>de</strong> relação é um gran<strong>de</strong><br />
engodo. Basta dizer que enquanto formulamos estas conclusões nos <strong>de</strong>paramos com uma série<br />
<strong>de</strong> políticas voltadas para o <strong>de</strong>senvolvimento e a capacitação profissional rural na região <strong>de</strong><br />
Ribeirão Preto, e mais particularmente em Araraquara, todas envolvendo os sindicatos<br />
patronais rurais, e muito poucas que tivessem a participação dos sindicatos dos trabalhadores.<br />
Isso por que os sindicatos dos trabalhadores ficaram presos ás pautas do assalariamento,<br />
enquanto o próprio texto constitutivo dos sindicatos patronais permite que estes representem<br />
pequenos e médios proprietários rurais. A maioria dos programas <strong>de</strong> formação e capacitação<br />
vigentes no meio rural da região estão cada vez mais voltadas para o empreen<strong>de</strong>dorismo dos<br />
pequenos núcleos <strong>de</strong> produção. As propostas, com especial <strong>de</strong>staque para o Programa SAI do<br />
SEBRAE, estão preocupadas em transformar o pequeno produtor em pequenos e micro<br />
empresários rurais. Se isso acontece, com propostas e programas que tem crescido a cada ano,<br />
com especial atenção para aqueles propostos como <strong>de</strong>senvolvimento local ou aglomerados<br />
produtivos, é por que existe um forte potencial <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> tecido produtivo, portanto,<br />
trabalho e renda neste sentido.<br />
159
Não se po<strong>de</strong> colocar estes pequenos e médios produtores que agonizam com a falta <strong>de</strong><br />
políticas específicas para o setor como meros <strong>de</strong>tentores <strong>de</strong> capital, semelhantes aos gran<strong>de</strong>s<br />
complexos produtivos agroindustriais. Existe uma diferença fundamental sobre este ponto, ou<br />
sobre estes dois segmentos. Os gran<strong>de</strong>s complexos produtivos pouco necessitam das políticas<br />
sindicais. A concentração <strong>de</strong> capitais nos gran<strong>de</strong>s complexos produtivos reproduz, ainda que<br />
<strong>de</strong> maneira reformada a velha relação entre capital e trabalho. Neste caso prevalece o<br />
assalariamento como força <strong>de</strong> trabalho separada dos <strong>de</strong>tentores do capital. Já nos pequenos<br />
núcleos <strong>de</strong> produção a realida<strong>de</strong> é bem distinta. Os <strong>de</strong>tentores do capital (das pequenas e<br />
médias empresas ou proprieda<strong>de</strong>s rurais) não se limitam a gerencia e expansão do capital. São<br />
também executores do trabalho. Mais do que isso são executores <strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong> trabalho<br />
distinto daquele verificado <strong>de</strong>ntro das gran<strong>de</strong>s corporações agoindustriais. Se no caso <strong>de</strong>stas<br />
prevalece o assalariamento e ou a reprodução <strong>de</strong> tarefas rotineiras, no primeiro caso temos um<br />
tipo <strong>de</strong> trabalho mais voltado para o conhecimento como saber-fazer.<br />
Trata-se do conhecimento produtivo que, apesar <strong>de</strong> envolver o gerenciamento e a<br />
gestão da empresa, envolve principalmente, ou também, o conhecimento e operação <strong>de</strong> todas<br />
as fases da produção. A partir do crescimento <strong>de</strong>stas experiências é que falamos em<br />
recomposição entre capital e trabalho. Tema como se sabe polêmico, mas nada novo.<br />
(NEGRI, 2001)<br />
Admitindo a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pensar o trabalho como capital, ou seja, a capacida<strong>de</strong><br />
produtiva como capital imaterial (LAZZARATO; NEGRI, 2001), ou como principal força<br />
produtiva, nos vemos diante <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> inusitada. Tal realida<strong>de</strong> nos remete aos<br />
conteúdos <strong>de</strong> cursos e programas <strong>de</strong> formação e capacitação profissional não como<br />
“a<strong>de</strong>stramento”,como normalmente se diz na tradição italiana, mas como capacitação. Esta<br />
capacitação envolve uma série <strong>de</strong> conhecimentos que não po<strong>de</strong>m ser apenas reproduzidos em<br />
módulos <strong>de</strong> cursos, necessitando <strong>de</strong> experimentação e constante cooperação produtiva.<br />
Sobre este ponto não preten<strong>de</strong>mos ir muito além da afirmação segundo a qual o<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> qualificação profissional “regulada” e voltada para postos <strong>de</strong> trabalhos pré<br />
<strong>de</strong>finidos com conteúdos pré-concebidos e treinamento rápido, entrou em crise. São dois<br />
mo<strong>de</strong>los distintos <strong>de</strong> qualificação. Um que subsiste ao velho mo<strong>de</strong>lo produto, aten<strong>de</strong>ndo aos<br />
interesses institucionais do assalariamento, e outro que busca construir conhecimento como<br />
qualificação.<br />
É o próprio Ministério do Trabalho (2006) quem <strong>de</strong> outra forma coloca este impasse,<br />
ainda que o faça <strong>de</strong> maneira bastante sutil. Pon<strong>de</strong>ra que qualificação profissional <strong>de</strong>ve ser<br />
pensada junto com <strong>de</strong>senvolvimento econômico. O que nossa tese acaba propondo é que o<br />
160
<strong>de</strong>senvolvimento econômico ou a formação <strong>de</strong> parque produtivo <strong>de</strong>vem ser pensados juntos<br />
com o tema da qualificação profissional. Mas este “junto”, não significa duas linhas <strong>de</strong><br />
investimento em políticas públicas, como talvez proponha o Ministério do Trabalho. Se assim<br />
for continuamos pensando a qualificação profissional, os programas e políticas públicas sobre<br />
o tema como compensação que os ajustes do mercado não compõem. Ou seja, a qualificação<br />
para preencher postos <strong>de</strong> trabalho surgidos com o processo <strong>de</strong> reestruturação produtiva.<br />
As propostas e os resultados pretendidos com este estudo buscam inserir a qualificação<br />
profissional como interesse <strong>de</strong> mercado, como <strong>de</strong>senvolvimento em si. Se admitimos que o<br />
mercado é uma construção social, ainda com todo o peso <strong>de</strong> negativida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> que<br />
ele, em muitos casos sugere, <strong>de</strong>vemos admitir que o mercado não é meramente sustentado<br />
pela racionalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> troca entre os agentes.<br />
No caso <strong>de</strong> concebermos o mercado em relação com a socieda<strong>de</strong> para além <strong>de</strong> mera<br />
estrutura, saímos da perspectiva da qualificação como política compensatória, abrindo espaço<br />
para pensar o tema como “investimento”. Investimento em capacitação ou qualificação como<br />
conhecimento que é absorvida e valorizada pelo mercado nas relações <strong>de</strong> troca. Mesmo<br />
sabendo que a venda <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> conhecimento na forma <strong>de</strong> assalariamento leva as gran<strong>de</strong>s<br />
empresas aos mais bárbaros níveis <strong>de</strong> exploração. Exploração da vida. (BERARDI, 2003).<br />
Os gran<strong>de</strong>s aglomerados produtivos do meio rural da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto não<br />
apresentam ares <strong>de</strong> crise. Pelo contrário, estão abrindo mercados <strong>de</strong> exportação e se<br />
expandindo. Neste sentido não cabe falar em crise ou substituição <strong>de</strong> sistemas produtivos. A<br />
nossa orientação <strong>de</strong> estudo discutiu as diversas vertentes produtivas no tocante a qualificação<br />
profissional procurando não entrar em avaliações <strong>de</strong>sta monta. De qualquer maneira é<br />
interessante, e até sugere estudos mais aprofundados sobre este processo dos pequenos e<br />
médios empreendimentos surgirem fortes on<strong>de</strong> muitas vezes prevalecem como investimento<br />
<strong>de</strong> ponta os gran<strong>de</strong>s aglomerados. Muitos autores, <strong>de</strong>ntre os quais alguns da tradição italiana<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m que estas duas realida<strong>de</strong>s são inter<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, se necessitam <strong>de</strong>ntro da perspectiva<br />
<strong>de</strong> mercado. Mas esta já é uma outra história.<br />
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microinformática para o Sindicato dos Trabalhadores Rurais <strong>de</strong> Jaboticabal. Jaboticabal,<br />
2000.<br />
Wilson Rodrigues da Silva: Presi<strong>de</strong>nte do Sindicato dos Trabalhadores Rurais <strong>de</strong> Guariba.<br />
Guariba, 2000.<br />
Mauro Alves da Silva: Presi<strong>de</strong>nte da FETAESP – Fe<strong>de</strong>ração dos Trabalhadores na<br />
Agricultura do Estado <strong>de</strong> São Paulo. São Paulo, 2000.<br />
Cristiano (?): Membro do FAT – Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador. São Paulo, 2000.<br />
179
Francisco Mazzeu: Professor da área <strong>de</strong> educação da UNESP/Araraquara e Presi<strong>de</strong>nte da<br />
UNITRABALHO. Araraquara, 2000.<br />
Damião Munhoz: Diretor técnico <strong>de</strong> serviços do Posto <strong>de</strong> Atendimento do Trabalhador PAT<br />
<strong>de</strong> Araraquara e membro da Comissão Municipal <strong>de</strong> Emprego <strong>de</strong> Araraquara. Araraquara,<br />
2000.<br />
Sérgio Porto: Membro patronal da Comissão Municipal <strong>de</strong> Emprego <strong>de</strong> Araraquara.<br />
Araraquara, 2000.<br />
Claudinei (?): Estudante do curso <strong>de</strong> agronomia e técnico para cursos <strong>de</strong> formação<br />
profissional rural da UFScar – Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> São Carlos – campus <strong>de</strong> Araras.<br />
Araraquara, 2001.<br />
Ruy Meyer: Diretor Representante da empresa <strong>de</strong> implementos agrícolas John Deer. Ribeirão<br />
Preto, 2001.<br />
Antonio Carlos Mazzeu: Técnico na aplicação dos cursos <strong>de</strong> formação profissional pela<br />
UNITRABALHO. Araraquara, 2001.<br />
Narciso Zanin – Proprietário/Presi<strong>de</strong>nte/Diretor representante da usina “Zanin” <strong>de</strong> álcool e<br />
açúcar <strong>de</strong> Araraquara, Araraquara – SP, 2001.<br />
Wan<strong>de</strong>rley Guilherme dos Santos: Prof. Dr. Do IUPERJ – Instituto Universitário <strong>de</strong><br />
Pesquisa do Rio <strong>de</strong> Janeiro. Rio <strong>de</strong> Janeiro, 2003.<br />
Francisco Alves: Pesquisador e professor do Departamento <strong>de</strong> Engenharia <strong>de</strong> Produção da<br />
UFScar – Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> São Carlos. São Carlos, 2003.<br />
Sebastião Neto: Presi<strong>de</strong>nte do IIEP – Intercâmbio, Informações, Estudos e Pesquisa. São<br />
Paulo, 2004.<br />
Suzana Sochaczewski: Socióloga do DIEESE: Departamento Intersindical <strong>de</strong> Estatística e<br />
Estudos Sócio Econômicos. São Paulo, 2004.<br />
Jair Kaczinski: Assessor para Formação Profissional do sistema SERT – Secretaria <strong>de</strong><br />
Emprego e Relações <strong>de</strong> Trabalho; SENAR – Serviço Nacional <strong>de</strong> Aprendizagem Rural e<br />
FAESP – Fe<strong>de</strong>ração da Agricultura do Estado <strong>de</strong> São Paulo. São Paulo, 2005.<br />
Juliana (?): Pesquisadora UNITRABALHO. São Paulo, 2005.<br />
Acácio dos Santos: Trabalhador migrante do corte <strong>de</strong> cana da região <strong>de</strong> Ribeirão Preto.<br />
Fernando Prestes, 2005.<br />
Jamil Matiolli: Funcionário “controle <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>” da Usina Colombo. Santa Adélia – SP,<br />
2005.<br />
Célia - Assessora <strong>de</strong> Imprensa do SEBRAE - SP – Serviço Brasileiro <strong>de</strong> Apóio as Micro e<br />
Pequenas Empresas. São Paulo, 2005.<br />
180
Nivaldo <strong>de</strong> Siqueira Gomes: Secretário Geral e <strong>de</strong> Comunicação da FAF - Fe<strong>de</strong>ração da<br />
Agricultura Familiar do Estado <strong>de</strong> São Paulo, ligada a CUT – Central Única dos<br />
trabalhadores. São Paulo, 2006.<br />
181