O mais famoso dos heróis da Rádio Nacional era ... - Casa da Palavra
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O <strong>mais</strong> <strong>famoso</strong> <strong>dos</strong> <strong>heróis</strong> <strong>da</strong> <strong>Rádio</strong><br />
<strong>Nacional</strong> <strong>era</strong>, sem dúvi<strong>da</strong>, Jerônimo, um<br />
caubói que lutava pelos fracos e oprimi<strong>dos</strong><br />
nos sertões brasileiros.<br />
Jerônimo <strong>era</strong> filho de Maria Homem<br />
(interpreta<strong>da</strong> por Tina Vita), uma mulher<br />
de pulso forte, que lhe ensinou a diferença<br />
entre o bem e o mal. O marido de Maria<br />
Homem, pai de Jerônimo, <strong>era</strong> um honesto<br />
estancieiro, cujas terras foram invadi<strong>da</strong>s e<br />
toma<strong>da</strong>s por um latifundiário ganancioso<br />
e sem escrúpulos, o coronel Saturnino<br />
Bragança. O conflito transformou-se<br />
numa guerra, e o pai de Jerônimo acabou<br />
sendo covardemente assassinado.<br />
– 99 –<br />
A mulher não se abateu e acabou assumindo<br />
corajosamente a luta do marido,<br />
ganhando então o apelido de Maria Homem.<br />
Um esclarecimento: o apelido não<br />
<strong>era</strong> uma vela<strong>da</strong> e mal<strong>dos</strong>a insinuação a<br />
respeito <strong>da</strong> feminili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> mãe do nosso<br />
herói. Éramos, na época, uma socie<strong>da</strong>de<br />
predominante machista – e gente valente<br />
só podia mesmo ser homem, mesmo que<br />
fosse uma mulher. Mulher, digo, na acepção<br />
ortodoxa <strong>da</strong> palavra, entend<strong>era</strong>m?<br />
O idealizador e re<strong>da</strong>tor de Jerônimo, o<br />
herói do sertão chamava-se Moisés Weltman,<br />
um carioca nascido em 1932 que,<br />
desde jovem, se dedicou a escrever nove-
las e programas para o rádio. Em 1953,<br />
em face do sucesso <strong>da</strong> novela A <strong>da</strong>ma de<br />
negro, apresenta<strong>da</strong> pela <strong>Rádio</strong> <strong>Nacional</strong>,<br />
Weltman recebeu o Prêmio Revelação<br />
do Ano, o que lhe deu a oportuni<strong>da</strong>de<br />
de mostrar o projeto a um possível patrocinador<br />
– The Sidney Ross Company,<br />
que já patrocinava As aventuras do Anjo.<br />
A proposta foi logo aceita, de criação de<br />
um herói brasileiro.<br />
Bem ver<strong>da</strong>de que Jerônimo <strong>era</strong> uma<br />
a<strong>da</strong>ptação <strong>dos</strong> faroestes americanos, mas<br />
isso só melhorou o seu ibope junto ao público<br />
jovem, que curtia, na época, os filmes<br />
de John Wayne e Audie Murphy.<br />
De início, o herói imaginado por Moisés<br />
Weltman seria gaúcho – O Cavaleiro<br />
<strong>dos</strong> Pampas – e teria o nome de Bento Faria.<br />
Com medo de que o programa ficasse<br />
muito regionalizado, Weltman preferiu situar<br />
o espaço de ação do herói <strong>mais</strong> para o<br />
norte, tomando cui<strong>da</strong>do, é claro, para que<br />
ele não se transformasse num cangaceiro<br />
defensor <strong>da</strong> lei e <strong>da</strong> ordem.<br />
– 100 –<br />
Quem escolheu o nome que consagraria<br />
o nosso herói foi o próprio Weltman,<br />
após examinar uma lista com <strong>mais</strong> de<br />
trinta opções.<br />
O nome Jerônimo, sem dúvi<strong>da</strong>, foi um<br />
achado: <strong>era</strong> másculo, mas não <strong>era</strong> vulgar,<br />
e evocava o líder apache que, durante<br />
anos, infernizou a Cavalaria do Exército<br />
<strong>dos</strong> Esta<strong>dos</strong> Uni<strong>dos</strong>, infringindo-lhe segui<strong>da</strong>s<br />
e humilhantes derrotas. Felizmente<br />
o nome Bento Faria – que evocaria,<br />
sem dúvi<strong>da</strong>, o vampiro brasileiro, Bento<br />
Carneiro, personagem do Chico Anísio<br />
– acabou não prevalecendo.<br />
As aventuras de Jerônimo, vivido na<br />
<strong>Rádio</strong> <strong>Nacional</strong> pelo radioator Milton<br />
Rangel, eletrizavam a garota<strong>da</strong>, sua principal<br />
audiência. Sempre acompanhado<br />
do Moleque Saci (interpretado pelo radioator<br />
Cauê Filho) e por sua eterna noiva<br />
Aninha (a radioatriz Dulce Martins),<br />
o nosso herói tinha alguns inimigos de<br />
carteirinha, como o Caveira, um criminoso<br />
especializado na arte do disfarce, e
o Cobra, um sujeito de maus bofes, assassino<br />
confesso e assaltante de bancos.<br />
As peripécias de Jerônimo, que varava o<br />
sertão montado no seu cavalo Príncipe (em<br />
tempo: o cavalo do Moleque Saci chamava-se<br />
Goiaba<strong>da</strong>), se passavam sempre em ci<strong>da</strong>des fictícias<br />
de nomes sugestivos: Serro Bravo, Águas<br />
Claras, Paulópolis, Morro Queimado, Ribeira<br />
Alta e Mata Virgem.<br />
Jerônimo permaneceu no ar por exatos 14<br />
anos e trocou socos e tiros com seus algozes ao<br />
longo de 3.276 capítulos! Jerônimo, o herói <strong>dos</strong><br />
sertões ia ao ar às 18h35, de segun<strong>da</strong> a sexta-feira,<br />
logo após As aventuras do Anjo, “num oferecimento<br />
de Melhoral, contra dores e resfria<strong>dos</strong>”.<br />
E por falar no Anjo: tal como o detetive milionário,<br />
Jerônimo também ganhou a sua revista<br />
em quadrinhos. O número 1 de Jerônimo, o<br />
herói do sertão chegou às bancas em julho de<br />
1957 e o sucesso foi tão espetacular que, em<br />
menos de 48 horas, a Rio Gráfica Editora teve<br />
de por na rua uma segun<strong>da</strong> edição <strong>da</strong> revista,<br />
com o dobro de exemplares.<br />
Edmundo Rodrigues, um <strong>dos</strong> traços <strong>mais</strong> geniais<br />
do quadrinismo brasileiro, desenhou o seriado<br />
durante cinco anos ininterruptos, ou seja,<br />
62 revistas (uma por mês), cinco almanaques,<br />
dois exemplares <strong>da</strong>s Peripécias do moleque Saci e<br />
dois outros com As aventuras de Aninha.<br />
A bibliografia de Jerônimo, contudo, não<br />
parou por aí: na déca<strong>da</strong> de 1960, na Tupi, e<br />
nos anos 1980, na SBT, o seriado chegou finalmente<br />
à televisão, mas a audiência estava<br />
longe <strong>da</strong> do rádio. O filme Jerônimo, de David<br />
Rangel, lançado em 1994, foi um fracasso<br />
?<br />
?<br />
Você sabia?<br />
Que a primeira edição <strong>da</strong> Revista do <strong>Rádio</strong> saiu em fevereiro de 1948, custava<br />
3 cruzeiros, tinha quarenta páginas e trazia Carmem Miran<strong>da</strong> na capa?<br />
Que, antes de cantar, Jorge Veiga ganhava a vi<strong>da</strong> pintando parede?<br />
Você sabia?<br />
Que a cantora Lin<strong>da</strong> Batista manteve o título de Rainha do <strong>Rádio</strong> por 11<br />
anos, de 1937 a 1947? Que o apelido Sapoti foi <strong>da</strong>do à cantora Ângela<br />
Maria pelo presidente Getúlio Vargas?<br />
– 101 –
– 102 –
de público e de crítica. A ver<strong>da</strong>de é que a<br />
magia do nosso herói estava no rádio e<br />
nos quadrinhos. A televisão e o cinema<br />
não <strong>era</strong>m o seu terreno.<br />
To<strong>da</strong>s as revistas em quadrinhos de<br />
Jerônimo, incluindo os almanaques, são,<br />
hoje, rari<strong>da</strong>des disputa<strong>da</strong>s a ferro e fogo<br />
por colecionadores e sau<strong>dos</strong>istas. O mesmo<br />
acontece com o LP Jerônimo, o herói<br />
do sertão, selo Colúmbia Discos, no qual<br />
se pode ouvir a bela toa<strong>da</strong> de Getúlio Macedo<br />
e Lourival Faissal, que to<strong>dos</strong> sabíamos<br />
– vá lá, ain<strong>da</strong> sabemos – cantar:<br />
Quem passar pelo sertão<br />
Vai ouvir alguém falar<br />
No herói desta canção<br />
Que eu venho aqui cantar<br />
Se é pro bem vai encontrar<br />
Um Jerônimo protetor<br />
Se é pro mal vai enfrentar<br />
Um Jerônimo lutador.<br />
O INSPETOR MARQUES<br />
O herói do Teatro de Mistério <strong>era</strong> o<br />
Inspetor Marques, interpretado por Rodolfo<br />
Mayer, do Departamento de Polícia<br />
Judiciária, uni<strong>da</strong>de que não existia nem<br />
na polícia nem no judiciário quando o<br />
seriado foi lançado. O Inspetor Marques<br />
tinha um auxiliar, o Detetive Zito, vivido<br />
por Ger<strong>da</strong>l <strong>dos</strong> Santos.<br />
O Teatro de Mistério <strong>era</strong> escrito por<br />
Hélio do Sov<strong>era</strong>l e dirigido ain<strong>da</strong> por Rodolfo<br />
Mayer. Segundo o autor, o Departamento<br />
de Polícia Judiciária tinha sido<br />
criado para corrigir os erros <strong>dos</strong> inquéritos<br />
policiais.<br />
?<br />
– 103 –<br />
As histórias continham sempre muitos<br />
mistérios (<strong>da</strong>í o nome), niti<strong>da</strong>mente infl<br />
uencia<strong>da</strong>s pelos policiais norte-americanos,<br />
na linha de Dashiell Hammett e Raymond<br />
Chandler. Mas o Inspetor Mário Marques<br />
não <strong>era</strong> um personagem fácil de catalogar.<br />
Ele não usava a dedução rebusca<strong>da</strong> de um<br />
Sherlock Holmes, nem a psicologia infalível<br />
de um Hércule Poirot, nem o refi namento<br />
esnobe de um Philo Vance, nem a burocracia<br />
estreita de um Comissário Maigret. Inspetor<br />
Marques usava um pouco de ca<strong>da</strong> coisa, <strong>da</strong>í<br />
o seu encanto e a sua geniali<strong>da</strong>de.<br />
As histórias do Inspetor Marques e do seu<br />
fi el escudeiro, o Detetive Zito, foram documenta<strong>da</strong>s<br />
em livros de bolso, publica<strong>dos</strong>, no<br />
início <strong>dos</strong> anos 1960, pela Editora Vecchi.<br />
Quando Rodolfo Mayer e Ger<strong>da</strong>l <strong>dos</strong><br />
Santos foram demiti<strong>dos</strong> <strong>da</strong> <strong>Rádio</strong> <strong>Nacional</strong><br />
por força do Ato Institucional nº 1, Hélio<br />
do Sov<strong>era</strong>l não manteve os nomes <strong>dos</strong><br />
personagens <strong>dos</strong> atores puni<strong>dos</strong>. Era uma<br />
forma de protestar contra a violência que<br />
havia sido cometi<strong>da</strong> contra os colegas.<br />
O CAVALEIRO DA NOITE<br />
Era um herói importado, tipo Zorro.<br />
O intérprete <strong>era</strong> Roberto Faissal, galã de<br />
muito sucesso na <strong>Rádio</strong> <strong>Nacional</strong>. A namora<strong>da</strong><br />
do Cavaleiro <strong>da</strong> Noite <strong>era</strong> interpreta<strong>da</strong><br />
pela grande atriz Isis de Oliveira.<br />
O Cavaleiro <strong>da</strong> Noite lutava contra os<br />
poderosos, que teimavam em explorar os<br />
pobres. O programa ia ao ar às 18 horas.<br />
Depois dele, vinha o Anjo e, em segui<strong>da</strong>,<br />
Jerônimo. To<strong>dos</strong> <strong>era</strong>m patrocina<strong>dos</strong> pela<br />
Sidney Ross Company.<br />
Você sabia?<br />
Que no fi nal <strong>dos</strong> anos 1950, Cauby Peixoto excursionou pelos Esta<strong>dos</strong><br />
Uni<strong>dos</strong>, usando o nome de Ron Coby, e gravou “Maracangalha”, de<br />
Caymmi, com o título “I go”?