O resto não é silêncio - Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes ...
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GRUPO DE TRABALHO 6<br />
TEORIA E PENSAMENTO SOCIAL NO BRASIL<br />
O RESTO NÃO É SILÊNCIO:<br />
A POLÊMICA DE ÉRICO VERÍSSIMO COM PE.<br />
LEONARDO FRITZEN. SJ E A BIPOLARIZAÇÃO<br />
DO “CAMPO” INTELECTUAL NA PORTO ALEGRE<br />
DOS ANOS 1940.<br />
Lorena Madruga Monteiro<br />
1
O RESTO NÃO É SILÊNCIO:<br />
A POLÊMICA DE ÉRICO VERÍSSIMO COM PE. LEONARDO FRITZEN. SJ E A<br />
BIPOLARIZAÇÃO DO “CAMPO” INTELECTUAL NA PORTO ALEGRE DOS ANOS<br />
Resumo<br />
1940.<br />
Lorena Madruga Monteiro 1<br />
Com base nos escritos <strong>de</strong> Jean-François Sirinelli e Christophe Charle este trabalho revisa a<br />
polêmica do escritor Érico Veríssimo com o Pe. Fritzen SJ a partir da análise dos grupos envolvidos<br />
e do conteúdo dos manifestos. Tal polêmica refere-se à queixa - crime <strong>de</strong>flagrada pelo escritor<br />
contra o padre jesuíta, após este ter publicado um artigo o qual repreen<strong>de</strong> o conteúdo da obra <strong>de</strong><br />
Érico Veríssimo “O <strong>resto</strong> <strong>é</strong> <strong>silêncio</strong>”. Al<strong>é</strong>m disso, tal fato trouxe a cena pública intelectualida<strong>de</strong><br />
gaúcha em solidarieda<strong>de</strong> a um ou outro dos envolvidos nesta questão. Desse modo, argumenta-se<br />
nesse artigo, a partir da analise das bases sociais e intelectuais <strong>de</strong> ambos os grupos, que este fato<br />
evi<strong>de</strong>nciou a estrutura da esfera intelectual no período, <strong>de</strong> um lado monopolizado pelos católicos<br />
das Congregações Marianas e por outro o grupo da editora Globo, mais heterogêneo socialmente e<br />
i<strong>de</strong>ologicamente.<br />
Introdução<br />
Este trabalho revisita a polêmica do escritor Érico Veríssimo com o Pe. Leonardo Fritzen SJ<br />
- redator da revista Echo do Ginásio Anchieta <strong>de</strong> Porto Alegre – na d<strong>é</strong>cada <strong>de</strong> 1940, a partir da<br />
análise dos grupos envolvidos e do conteúdo dos manifestos <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>. Tal polêmica refere-<br />
se à queixa - crime <strong>de</strong>flagrada por Érico Veríssimo contra Pe. Fritzen S.J após este ter publicado<br />
um artigo na revista Echo o qual repreen<strong>de</strong> a obra <strong>de</strong> Érico Veríssimo “O <strong>resto</strong> <strong>é</strong> <strong>silêncio</strong>”,<br />
especialmente pelo seu conteúdo moral, e <strong>não</strong> autoriza a leitura <strong>de</strong>sta pela mocida<strong>de</strong> dos<br />
educandários católicos.<br />
As origens da polêmica remetem ao artigo do Pe. Fritzen S.J escrito em homenagem a<br />
Getulinho, filho do presi<strong>de</strong>nte Getúlio Vargas, antigo aluno do col<strong>é</strong>gio Anchieta, que havia<br />
falecido. No entanto, o artigo que era para ser um texto <strong>de</strong> consagração e homenagem ao antigo<br />
aluno, passou a ser uma crítica ao escritor Érico Veríssimo, principalmente ao seu livro “o <strong>resto</strong> <strong>é</strong><br />
silencio”, consi<strong>de</strong>rado, pelo padre, um veneno para a cultura gaúcha. Frente a esta situação Érico<br />
Veríssimo moveu uma queixa-crime ao padre jesuíta. A polêmica terminou com o po<strong>de</strong>r judiciário<br />
absolvendo Pe. Fritzen S.J 2 do crime <strong>de</strong> injúria consi<strong>de</strong>rando a queixa-crime prescrita 3 .<br />
1<br />
Mestre em Ciência Política pela UFRGS. Atualmente doutoranda em Ciência Política pelo PPGCP/ UFRGS. E-mail:<br />
Lorena Madruga Monteiro.<br />
2<br />
Trajetória do Padre Leonardo Fritzen S.J: Nasceu em Tupandi, em 1885. Em 1899, ingressou no Seminário dos<br />
Jesuítas em Sebastião do Caí, instituição transferida em 1900 para Pareci Novo, Em 1905 tornou-se noviço jesuíta em<br />
Barros, Portugal, aon<strong>de</strong> realizou seus votos <strong>de</strong> pobreza, castida<strong>de</strong> e obediência em 1907. Entre 1907 e 1911 cursou<br />
Filosofia em Valkemburg, Holanda. Em 1911 voltou ao Brasil e ficou-se no Ginásio Conceição, <strong>de</strong> São Leopoldo, on<strong>de</strong><br />
lecionou at<strong>é</strong> 1912. De 1913 a 1917 trabalhou no col<strong>é</strong>gio Anchieta <strong>de</strong> Porto Alegre. Or<strong>de</strong>nou-se sacerdote em 1920. De<br />
2
Al<strong>é</strong>m da polêmica em si, tal fato trouxe a cena pública, na d<strong>é</strong>cada <strong>de</strong> 1940, a<br />
intelectualida<strong>de</strong> gaúcha - escritores e/ou professores universitários – em solidarieda<strong>de</strong> a um ou<br />
outro dos envolvidos nesta questão judicial. Desse modo, argumenta-se nesse artigo, a partir da<br />
analise das bases sociais e dos recursos intelectuais <strong>de</strong> ambos os grupos, que este fato evi<strong>de</strong>nciou o<br />
estado da esfera intelectual no período, <strong>de</strong> um lado monopolizado pelos católicos conservadores das<br />
Congregações Marianas coor<strong>de</strong>nadas pelos Jesuítas do Ginásio Anchieta, e por outro o grupo da<br />
Editora Globo mais heterogêneo socialmente e i<strong>de</strong>ologicamente. Contou-se, para tanto, com fontes<br />
biográficas dos signatários <strong>de</strong> ambos manifestos e artigos <strong>de</strong> jornais <strong>de</strong>dicados a tal polêmica<br />
publicados à <strong>é</strong>poca.<br />
Intelectuais e engajamento público: perspectivas teóricas<br />
Atualmente as análises <strong>de</strong> História Intelectual ou História dos Intelectuais distanciaram-se<br />
da tradicional História das id<strong>é</strong>ias e apresentam novas perspectivas, tanto nas <strong>Ciências</strong> Sociais,<br />
quanto na História. De um lado, aparece como uma Sociologia ou Cartografia dos intelectuais<br />
influenciada pelos estudos sociológicos <strong>de</strong> Pierre Bourdieu e <strong>de</strong> seu grupo sobre o campo intelectual<br />
francês. Um dos exemplos <strong>de</strong> estudos nessa vertente <strong>é</strong> a obra <strong>de</strong> Christophe Charle (1990) a qual<br />
reconstitui o contexto cultural o qual emergiu a figura do intelectual francês no affaire Dreyfus<br />
atrav<strong>é</strong>s da análise das mudanças que ocorreram no campo intelectual com a expansão do ensino<br />
superior que possibilitou o surgimento <strong>de</strong> novos grupos com valores, origens sociais e formação<br />
universitária, distintos daqueles já estabelecidos. Por outro, no campo historiográfico, manteve-se a<br />
perspectiva internalista <strong>de</strong> interpretação das obras, dos discursos intelectuais, mas com novos<br />
enfoques. Apresenta-se como uma História política dos intelectuais a qual consi<strong>de</strong>ra como objeto<br />
<strong>de</strong> análise, al<strong>é</strong>m dos itinerários intelectuais, os manifestos, petições, discursos que mobilizaram os<br />
intelectuais para a atuação pública, a exemplo do trabalho <strong>de</strong> Jean-François Sirinelli (1990) sobre os<br />
<strong>de</strong>bates e paixões intelectuais em torno do Affaire Dreyfus.<br />
Com base nos escritos <strong>de</strong> Jean-François Sirinelli e Christophe Charles acerca do campo<br />
intelectual francês, e levando-se em conta os problemas relacionados à apreensão <strong>de</strong>sses mo<strong>de</strong>los<br />
analíticos aos contextos perif<strong>é</strong>ricos como o brasileiro o qual as esferas sociais carecem <strong>de</strong><br />
autonomia tanto na formação dos intelectuais, quanto na esfera <strong>de</strong> produção cultural, este artigo tem<br />
por objetivo, ainda que <strong>de</strong> modo embrionário, <strong>de</strong>svendar que estrutura o “campo intelectual” <strong>de</strong><br />
1923 a 1930 retornou ao Col<strong>é</strong>gio Anchieta, aon<strong>de</strong> dirigiu a revista Eco. A partir <strong>de</strong> 1931 dirigiu Seminários <strong>de</strong> diversas<br />
Dioceses, e at<strong>é</strong> 1936 exerceu o reitorado no Seminário São Jos<strong>é</strong> <strong>de</strong> Santa Maria. De 1942 a 1943 voltou a lecionar no<br />
col<strong>é</strong>gio Anchieta. Depois <strong>de</strong> 1944 foi transferido para Salvador do Sul e para a direção do Seminário <strong>de</strong> Cerro Largo.<br />
Faleceu em 1965. Conforme: LEITE, Luíz Oswaldo. A polêmica entre Érico Veríssimo e um padre jesuíta. In:<br />
MORETTO, Fulvia (org). Érico e seu tempo. Ediplat, Porto Alegre, 2005.<br />
3 Para mais <strong>de</strong>talhes, inclusive do conteúdo do livro repreendido pelo padre, ver: TRINDADE, Fernando. A polêmica<br />
entre Érico Veríssimo e o Pe. Leonardo Fritzen, SJ. IN: Revista do IFCH, Porto Alegre, n. 11/12, 1984.<br />
3
Porto Alegre apresentava nos anos 1940 atrav<strong>é</strong>s da análise da inserção cultural e profissional dos<br />
signatários dos manifestos <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> e com base nos <strong>de</strong>sdobramentos <strong>de</strong> tal polêmica analisar<br />
que questões realmente estavam em jogo nesse <strong>de</strong>bate atrav<strong>é</strong>s da análise dos conteúdos divulgados<br />
na imprensa em favor ou contra as partes envolvidas.<br />
Admite-se que este mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> análise apresenta muitas limitações para o caso em questão.<br />
Uma <strong>de</strong>las refere-se a <strong>de</strong>finir o que seria um intelectual na Porto Alegre dos anos 1940, ou melhor,<br />
quem po<strong>de</strong>ria ser consi<strong>de</strong>rado um intelectual?. Jean-François Sirinelli (1986, 1990) em suas análises<br />
trabalha com duas noções complementares <strong>de</strong> intelectuais. A primeira – sociológica e cultural-<br />
abrange os criadores, os mediadores e os receptores da cultura (por exemplo, os jornalistas, os<br />
escritores, os professores, os estudantes, etc) articulados com uma <strong>é</strong>poca e um lugar específico. A<br />
segunda <strong>de</strong>finição <strong>é</strong> baseada na noção <strong>de</strong> engajamento – direto ou indireto- na vida da cida<strong>de</strong>. O<br />
engajamento direto refere-se àquele individuo que <strong>é</strong> um ator do jogo político, já o indireto<br />
caracteriza àqueles indivíduos que são conscientes <strong>de</strong> sua <strong>é</strong>poca, que divulgam, mesmo <strong>de</strong> forma<br />
passiva, sua visão <strong>de</strong> mundo. Nesse sentido, ambos os modos <strong>de</strong> engajamento constituem uma<br />
forma <strong>de</strong> intervenção política na vida da cida<strong>de</strong>.<br />
Christofer Charle, por sua vez, enfrentou essa questão nos seus estudos atrav<strong>é</strong>s da teoria dos<br />
campos sociais <strong>de</strong> Pierre Bourdieu. Em seus trabalhos sobre os intelectuais do affaire Dreyfus,<br />
Charle (1977, 1990) privilegiou uma categoria específica do campo intelectual: os escritores e a<br />
lógica subjacente dos seus engajamentos nos outros campos sociais, em especial no político. Nesse<br />
sentido, a estrutura do campo intelectual foi tomada como o elemento fundamental para<br />
compreen<strong>de</strong>r o engajamento público <strong>de</strong>sses escritores. A partir disso, Charle (1990) <strong>de</strong>monstra que<br />
a crise do campo literário francês á <strong>é</strong>poca do Affaire Dreyfus re<strong>de</strong>finiu as relações entre o campo<br />
literário e o campo do po<strong>de</strong>r. Assim sendo, em linhas gerais, Charle (1990) <strong>de</strong>monstra que as<br />
divisões literárias e as posições que tais escritores possuíam na esfera intelectual, assim como a<br />
bipolarização do campo literário (dreyfusianos e anti-dreyfusianos) refletiram-se no campo político.<br />
No seu trabalho comparativo sobre os intelectuais na França e na Alemanha Christophe<br />
Charle (1995) reitera a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir tal categoria em estruturas sociais distintas e<br />
específicas. Nesta direção aponta como essencial para <strong>de</strong>svendar o conjunto das estruturas do<br />
campo intelectual e o significado da noção <strong>de</strong> intelectual numa dada <strong>é</strong>poca e num contexto<br />
específico a utilização <strong>de</strong> biografias coletivas sistematizadas. Jean – François Sirinelli (1986) segue<br />
essa direção ao <strong>de</strong>monstrar que o conceito <strong>de</strong> intelectual varia conforme o tempo, assim como seu<br />
engajamento. Desse modo, para apreen<strong>de</strong>r as várias periodizações possíveis do engajamento dos<br />
intelectuais, assim como o contexto histórico <strong>de</strong> entrada dos intelectuais na política, <strong>de</strong>ve-se lançar-<br />
se a análise dos itinerários intelectuais. A partir dos itinerários <strong>é</strong> possível apreen<strong>de</strong>r as i<strong>de</strong>ologias<br />
dominantes e espírito <strong>de</strong> dada <strong>é</strong>poca, assim como as influencias que receberam. Tal reconstituição<br />
4
das trajetórias intelectuais, conforme Sirinelli (1995) po<strong>de</strong>m ser obtidas <strong>de</strong> duas formas: 1) Pelo<br />
estudo da biografia; 2) ou pelo estudo <strong>de</strong> um grupo específico.<br />
Ambos os autores reiteram que a análise <strong>de</strong> grupos intelectuais <strong>de</strong>ve incorporar <strong>não</strong> apenas<br />
aqueles que possuem mais notorieda<strong>de</strong>, os grupos dominantes, mas tamb<strong>é</strong>m os estratos<br />
intermediários e os dominados do campo. Sirinelli (1995) ainda <strong>de</strong>staca a importância <strong>de</strong> estudar<br />
aqueles que exerceram influencia cultural e política na formação dos grupos intelectuais que se<br />
engajaram na vida pública posteriormente 4 . Portanto, a análise dos trajetos dos grupos ou<br />
individuais permite apreen<strong>de</strong>r os tipos <strong>de</strong> engajamento relacionados à estrutura do campo<br />
intelectual. No entanto, apenas a análise dos trajetos, embora <strong>de</strong>screvam a estrutura intelectual, <strong>não</strong><br />
apreen<strong>de</strong>m as linhas, as clivagens e a<strong>de</strong>sões existentes na comunida<strong>de</strong> intelectual e o espectro <strong>de</strong><br />
suas <strong>de</strong>mandas.<br />
Nesse sentido Sirinelli (1995, 2003) <strong>de</strong>staca a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> apreensão das estruturas <strong>de</strong><br />
sociabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dado meio cultural. Elas se <strong>de</strong>finem enquanto um grupamento permanente ou<br />
temporário da comunida<strong>de</strong> intelectual, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do seu estágio <strong>de</strong> institucionalização. Tais<br />
estruturas - sejam revistas, manifestos, petições - revelam um domínio intermediário entre a vida<br />
privada e pública dos intelectuais, e foram construídas por simpatia e/ou amiza<strong>de</strong> entre os membros<br />
ou por oposição a outros grupos. Al<strong>é</strong>m disso, a análise do conteúdo revela as questões subjacentes<br />
ao engajamento intelectual. Como discorre abaixo:<br />
“Entre as estruturas mais elementares, duas, <strong>de</strong> natureza diferente, parecem<br />
essenciais. As revistas conferem uma estrutura do campo intelectual por meio <strong>de</strong><br />
forças antagônicas <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são – pelas amiza<strong>de</strong>s que as subten<strong>de</strong>m, as fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong>s<br />
que arrebanham e a influência que exercem – e <strong>de</strong> exclusão – pelas posições<br />
tomadas, os <strong>de</strong>bates suscitados e as cisões advindas. Ao mesmo tempo que um<br />
observatório <strong>de</strong> primeiro plano da sociabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> microcosmos intelectuais, elas<br />
são aliás um lugar precioso para a análise do movimento das id<strong>é</strong>ias.Em suma, uma<br />
revista <strong>é</strong> antes <strong>de</strong> tudo um lugar <strong>de</strong> fermentação intelectual e <strong>de</strong> relação afetiva, ao<br />
mesmo tempo viveiro e espaço <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>, e po<strong>de</strong> ser, entre outras<br />
abordagens, estudada nessa dupla dimensão. Os manifestos e abaixo-assinados que<br />
permitem aos manifestantes contarem-se num protesto, se revestem tamb<strong>é</strong>m <strong>de</strong>ste<br />
duplo aspecto. De um lado o historiador <strong>não</strong> po<strong>de</strong> evitar estas perguntas essenciais:<br />
como se formam os grupos <strong>de</strong> apoio e os abaixo assinados? De outro, para a análise<br />
das correntes i<strong>de</strong>ológicas marcantes, dos gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>bates e dos pequenos casos,<br />
conduzida nos tempos diferente das i<strong>de</strong>ologias em posição dominante, polêmicas<br />
<strong>de</strong> dimensão nacional e epifenômenos que vêm apenas enrugar a superfície da<br />
história política, o abaixo-assinado <strong>é</strong> um bom sismógrafo para revelar e medir as<br />
ondas, os abalos e os estremecimentos que percorreram a consciência nacional”<br />
(SIRINELLI, 2003: 249)<br />
Nesta direção, tomando por base as questões suscitadas por esses dois autores, este artigo,<br />
ainda que <strong>de</strong> forma preliminar, expõe, atrav<strong>é</strong>s dos trajetos coletivos dos signatários das moções a<br />
4 Ver SIRINELLI, Jean- François. Alain et les siens. Sociabilit<strong>é</strong> du milieu intelecteul et responsabilit<strong>é</strong> du clerc. Revue<br />
Française <strong>de</strong> Science politique, Ann<strong>é</strong>e 1988, volume 38, num<strong>é</strong>ro 2.<br />
5
favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo e Pe. Leonardo Fritzen, algumas característica da estrutura do “campo<br />
intelectual” dos anos 1940, as quais revelam especificida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>sse contexto perif<strong>é</strong>rico, como a<br />
baixa institucionalização dos espaços sociais, e analisa atrav<strong>é</strong>s dos conteúdos difundidos o que<br />
estava em jogo em tal embate público. Portanto, esse artigo, embora <strong>não</strong> analise uma revista em<br />
particular, toma, num primeiro momento, as assinaturas das moções <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> como uma<br />
fonte preliminar, mas essencial, para <strong>de</strong>stacar as características <strong>de</strong>sse meio intelectual, e num<br />
segundo momento, atrav<strong>é</strong>s <strong>de</strong> artigos divulgados na imprensa local, caracteriza os <strong>de</strong>bates<br />
específicos e gerais que estiveram presentes em tal polêmica.<br />
A estrutura perif<strong>é</strong>rica do “campo intelectual” e os “intelectuais” envolvidos<br />
Ambos manifestos foram publicados a pedidos no Diário <strong>de</strong> Notícias assim que a questão<br />
judicial foi divulgada. O número <strong>de</strong> assinaturas no manifesto em favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo foi <strong>de</strong><br />
650 5 . Já a moção em solidarieda<strong>de</strong> ao Pe. Leonardo Fritzen contou com 345 assinaturas 6 . Frente a<br />
esse amplo universo <strong>de</strong> indivíduos e levando em conta que a maioria das trajetórias <strong>não</strong> está<br />
documentada ou então as informações sobre cada uma são dispersas, optou-se por utilizar uma<br />
única fonte <strong>de</strong> referência que <strong>é</strong> o livro <strong>de</strong> biografias intitulado “Os Escritores do Rio-Gran<strong>de</strong> do<br />
Sul” <strong>de</strong> Ari Martins. Destaca-se, nesse sentido, que esta obra, dada inexistência <strong>de</strong> um campo<br />
literário específico, consi<strong>de</strong>ra como escritores os professores universitários (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> aqueles que<br />
escreveram em publicações <strong>de</strong> natureza cultural, at<strong>é</strong> aqueles com produções específicas e cientificas<br />
<strong>de</strong> suas área acadêmica), os jornalistas (tanto os ligados a periódicos <strong>de</strong> circulação representativa,<br />
quanto àqueles que escreveram em jornais locais e/ ou publicações eventuais), os escritores <strong>de</strong><br />
gêneros literários variados e graus distintos <strong>de</strong> notorieda<strong>de</strong> (teatrólogos, contistas, ensaístas,<br />
cronistas, prosadores, memorialista, romancistas, poetas, etc), políticos, juristas, etc. No entanto,<br />
embora esse quadro seja amplo, só localizamos 93 biografias, 45 daqueles que foram signatários da<br />
moção em favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo e 48 daqueles da do Pe. Leonardo Fritzen. Al<strong>é</strong>m disso, ainda<br />
que as informações contidas nessas biografias sejam padronizadas (formação escolar e universitária,<br />
trajeto profissional e/ ou político, pertencimento a instituições culturais, produção intelectual),<br />
muitos casos tais dados apresentam-se incompletos. Mesmo assim optou-se por utilizá-los.<br />
Uma das variáveis mais importantes na análise <strong>de</strong> elites culturais <strong>é</strong> a formação escolar.<br />
Nesse sentido a pertença a um col<strong>é</strong>gio <strong>de</strong> prestigio, ligado à formação das elites políticas e sociais<br />
traduz-se num indicador revelador, mas <strong>não</strong> <strong>de</strong>finidor, <strong>de</strong> origem social. No Rio Gran<strong>de</strong> do Sul esse<br />
papel coube, <strong>de</strong> modo mais intenso, aos jesuítas alemães e seus educandários católicos (Ginásio<br />
5 Manifesto <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> ao escritor Érico Veríssimo. A PEDIDO. Diário <strong>de</strong> notícias. 2 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1943.<br />
6 Uma página <strong>de</strong> crítica literária e os que com ela se solidarizaram. A PEDIDO. Diário <strong>de</strong> Notícias. 30 <strong>de</strong> Abril <strong>de</strong><br />
1943.<br />
6
Nossa Senhora da Conceição e Ginásio Anchieta). Em menor grau, mas tamb<strong>é</strong>m importantes,<br />
<strong>de</strong>stacamos, <strong>de</strong>ntre os col<strong>é</strong>gios católicos, aqueles da or<strong>de</strong>m Marista e dos Lassalistas. Já entre os<br />
ginásios públicos, nesse período, <strong>de</strong>stacam-se, <strong>não</strong> como educandários das elites, com uma clientela<br />
mais diversificada, o Ginásio Júlio <strong>de</strong> Castilhos e o Col<strong>é</strong>gio Militar.<br />
O grupo a favor do Padre Fritzen em sua maioria teve sua trajetória ligada aos educandários<br />
dos jesuítas especialmente no Ginásio Anchieta (alguns estudaram no Ginásio Conceição que<br />
existiu at<strong>é</strong> a fundação do Anchieta). É claro que isso tem relação com o fato do Pe. Fritzen ser,<br />
naquela <strong>é</strong>poca, professor <strong>de</strong>ste educandário, mas envolve outras questões. A maioria <strong>de</strong>ste grupo<br />
manteve-se ligado aos empreendimentos dos jesuítas durante toda sua vida atrav<strong>é</strong>s das<br />
Congregações Marianas. Esse grupo participou ativamente das ativida<strong>de</strong>s das Congregações<br />
Marianas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o Ginásio at<strong>é</strong> <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> formados, atrav<strong>é</strong>s daquela dos ginasianos, da <strong>de</strong><br />
acadêmicos e da <strong>de</strong> formados. Desse modo, embora haja diferenças geracionais entre esse grupo,<br />
estavam conectados por uma sociabilização católica comum e agiam em conjunto no projeto <strong>de</strong><br />
restauração católica. Conforme quadro abaixo:<br />
Quadro I: Formação escolar e religiosa dos signatários dos manifestos<br />
Ginásio Signatários Moção a favor <strong>de</strong> Érico<br />
Veríssimo ( SEV)(N=25)<br />
Signatários Leonardo Fritzen (SLF)(N=40)<br />
Nª Senhora da Conceição/ Congregação Augusto <strong>de</strong> Carvalho (2) Adroaldo Mesquita da Costa (1)<br />
Mariana<br />
Antônio Pinto Bottini (1)<br />
Mário Bernd (1)<br />
Nª Senhora da Conceição Dario <strong>de</strong> Bittencourt (1)<br />
Anchieta/ Congregação Mariana Ruy Cirne Lima (1)<br />
Raul Moreira (1)<br />
Rinaldo Pereira Câmara (1)<br />
Mário Goulart Reis (1)<br />
Carlos <strong>de</strong> Britto Velho (1)<br />
D<strong>é</strong>cio Martins Costa (1)<br />
Francisco Machado Carrion (1)<br />
Egberto Guido Becker (1)<br />
Aldo Obino (1)<br />
Felipe Machado Carrion (1)<br />
Ernani Maria Fiori (1)<br />
Armando Dias <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Ama<strong>de</strong>o <strong>de</strong> Oliveira Freitas (1)<br />
Gustavo Pereira Filho<br />
Mário Bernd (2)<br />
Antônio Peirouton Louzada (1)<br />
Heitor Cirne Lima (1)<br />
Camilo Martins Costa (1)<br />
Galeno Vellinho <strong>de</strong> Lacerda (1)<br />
Ruy Rodrigues Brasileiro <strong>de</strong> Azambuja (1)<br />
Armindo Cemin Beux (1)<br />
Anchieta Clovis Pestana (1)<br />
Ciro Martins (1)<br />
Nilo Ruschel (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Luiz <strong>de</strong> Almeida Martins Costa Júnior (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Bochado da Rocha (1)<br />
Valter Becker (1)<br />
Humberto Lubisco (1)<br />
Osmar Pilla (1)<br />
Mário Calvet Fagun<strong>de</strong>s (1)<br />
Dario <strong>de</strong> Bittencourt (2)<br />
Leônidas Soares Machado (1)<br />
7
Outros Educandários Católicos Estela Budiansky (1) Fábio <strong>de</strong> Barros (1)<br />
Outros educandários Católicos/ Congregação<br />
Mariana<br />
Ginásio Julio <strong>de</strong> Castilhos Celestino Prunes(1)<br />
Armando Fay <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Dante <strong>de</strong> Laytano (1)<br />
Luís Palhares <strong>de</strong> Melo (1)<br />
Adalmiro Ban<strong>de</strong>ira Moura (2)<br />
Col<strong>é</strong>gio Militar Francisco Tavares Farias Guimarães (1)<br />
Gabriel <strong>de</strong> Miranda Obino (1)<br />
Homero <strong>de</strong> Castro Jobim (1)<br />
Júlio Ruas (1)<br />
Mário Quintana (1)<br />
Adalmiro Ban<strong>de</strong>ira Moura (1)<br />
Formação fora do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul Clovis Pestana (2)<br />
Ângelo Guido (1)<br />
Augusto <strong>de</strong> Carvalho (1)<br />
Ernani Dias Correa (1)<br />
Outros Dion<strong>é</strong>lio Machado (1)<br />
Licurgo Cardoso (1)<br />
Gastão Hasslocher Mazeron (1)<br />
Adail Leo<strong>de</strong>gário <strong>de</strong> Moraes (1)<br />
Júlio Ruas (2)<br />
Ovídio Moojen Chaves (1)<br />
Pedro Rubens <strong>de</strong> Freitas Wayne (1)<br />
Lila Gue<strong>de</strong>s Ripoll (1)<br />
Érico Maciel (1)<br />
Olinto San Martin (1)<br />
Lau<strong>de</strong>lino Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
Eliseu Paglioli (1)<br />
Mário Goulart Reis (1)<br />
Armindo Cemin Beux (2)<br />
Fábio <strong>de</strong> Barros (2)<br />
Rinaldo Pereira Câmara (2)<br />
Jos<strong>é</strong> Brochado da Rocha (2)<br />
Mário Calvet Fagun<strong>de</strong>s (2)<br />
Mansueto Bernardi (1)<br />
Isolino Leal (1)<br />
Mário Brasil (1)<br />
Leonardo Macedônia (1)<br />
Fonte: MARTINS, Ari (1978), MEMÓRIAS DA CONGREGAÇÃO DOS ACADÊMICOS, “Mater Salvatoris”, Typ Selbach & Cia., Porto Alegre,<br />
1926, 1932, 1933, 1935.<br />
Portanto, esse grupo se <strong>de</strong>fine, <strong>não</strong> apenas por ter estudado no Ginásio Anchieta, uma vez<br />
que indivíduos signatários da moção a favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo e a elite <strong>de</strong> forma geral estudaram<br />
nesse educandário, mas pelas ativida<strong>de</strong>s inter<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes das Congregações Marianas. Já o grupo a<br />
favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo apresenta uma formação escolar variada, muitos em educandários do<br />
interior do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, como o escritor e m<strong>é</strong>dico Dyon<strong>é</strong>lio Machado, que advinha <strong>de</strong> uma<br />
família <strong>de</strong> origem pobre, que, para estudar em Quarai dava aula para os alunos atrasados e em<br />
contrapartida <strong>não</strong> pagava matricula. Após realizou seus estudos preparatórios com o prof. Emílio<br />
Meyer, como muitos outros signatários da moção a favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo.<br />
Em relação à formação universitária dos signatários dos manifestos o grupo a favor <strong>de</strong> Érico<br />
Veríssimo, embora a maioria do grupo realize seus estudos universitários nas tradicionais escolas <strong>de</strong><br />
Medicina, Direito e Engenharia, alguns membros, mais novos, realizaram-se seus estudos em<br />
unida<strong>de</strong>s acadêmicas incipientes à <strong>é</strong>poca, como a faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> ciências econômicas, a <strong>de</strong> Filosofia e<br />
a <strong>de</strong> jornalismo. Por sua vez o grupo da moção ao Padre Fritzen buscou as carreiras típicas dos<br />
grupos <strong>de</strong> elites, especialmente a Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito, como <strong>de</strong>monstra o quadro abaixo:<br />
8
Quadro II: Formação universitária dos signatários dos manifestos<br />
Curso SEV (N= 23) SLF (N=38)<br />
Direito Clóvis Pestana (2)<br />
Manoelito <strong>de</strong> Ornellas (1)<br />
Armando Fay <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Dante <strong>de</strong> Laytano (1)<br />
Manoel Braga Gastal (1)<br />
Nei Messias (1)<br />
Nilo Ruschel (1)<br />
Gabriel <strong>de</strong> Miranda Obino (1)<br />
João <strong>de</strong> Aragão Bergmann (1)<br />
Fernando da Silva Borba (1)<br />
Adail Leo<strong>de</strong>gário <strong>de</strong> Moraes (1)<br />
Adalmiro Ban<strong>de</strong>ira Moura (1)<br />
Medicina Celestino Prunes (1)<br />
Dion<strong>é</strong>lio Machado (1)<br />
Ciro Martins (1)<br />
Rui Vieira da Rocha (1)<br />
Estela Budiansky (1)<br />
Engenharia Clóvis Pestana(1)<br />
Edvaldo Paiva (1)<br />
Ernani Dias Correa (1)<br />
Agronomia Gevaldino Ferreira (1)<br />
Veterinária Outubrino Correa (1)<br />
Filosofia Nei Messias (2)<br />
Adroaldo Mesquita da Costa (1)<br />
Ruy Cirne Lima (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Luiz <strong>de</strong> Almeida Martins Costa Júnior (1)<br />
Valter Becker (1)<br />
Francisco Machado Carrion (1)<br />
Egberto Guido Becker (1)<br />
Aldo Obino (1)<br />
Felipe Machado Carrion (1)<br />
Ernani Maria Fiori (1)<br />
Leonardo Macedônia (1)<br />
Armando Dias <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Dario <strong>de</strong> Bittencourt (1)<br />
Ama<strong>de</strong>o <strong>de</strong> Oliveira Freitas (1)<br />
Lau<strong>de</strong>lino Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
Paulo Rache (1)<br />
Camilo Martins Costa (1)<br />
Galeno Vellinho <strong>de</strong> Lacerda (1)<br />
Ruy Rodrigues Brasileiro <strong>de</strong> Azambuja (1)<br />
Leopoldo Hoffmann (1)<br />
Antônio Pinto Bottini (1)<br />
Fábio <strong>de</strong> Barros (1)<br />
Raul Moreira (1)<br />
Luis Francisco Guerra Blessmann (1)<br />
Eliseu Paglioli (1)<br />
Carlos <strong>de</strong> Britto Velho (1)<br />
D<strong>é</strong>cio Martins Costa (1)<br />
Humberto Lubisco (1)<br />
Osmar Pilla (1)<br />
Alfeu Bica <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
Gustavo Pereira Filho<br />
Mário Bernd (1)<br />
Antônio Peirouton Louzada (1)<br />
Heitor Cirne Lima (1)<br />
Leônidas Soares Machado (1)<br />
Mário Goulart Reis (1)<br />
Mário Brasil (1)<br />
Armindo Cemin Beux (1)<br />
Economia Olinto SanMartin (1) Lau<strong>de</strong>lino Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
Jornalismo Luís Palhares <strong>de</strong> Melo (1)<br />
Fonte: MARTINS, Ari (1978)<br />
Entre os itinerários dos membros analisados <strong>de</strong>staca-se que a maioria dos membros do grupo<br />
em torno do Pe. Fritzen realizou estudos universitários, enquanto o grupo em torno <strong>de</strong> Érico<br />
Veríssimo um pouco menos da meta<strong>de</strong> dos membros analisados concluiu um curso superior. Isso<br />
tem relação, al<strong>é</strong>m da questão <strong>de</strong> possuírem origens sociais mais variadas, assim como pelo caráter<br />
elitista do ensino superior que se constituía privil<strong>é</strong>gio <strong>de</strong> poucos na <strong>é</strong>poca, com o fato que em sua<br />
maioria já exerciam ativida<strong>de</strong>s no jornalismo, embora a carreira <strong>não</strong> fosse institucionalizada, seja<br />
em jornais e periódicos <strong>de</strong> tiragem pequena, <strong>de</strong> caráter local, ou nos jornais <strong>de</strong> Porto Alegre como o<br />
Diário <strong>de</strong> Notícias, a Fe<strong>de</strong>ração, o Correio do Povo, a Folha da Tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> Porto Alegre, al<strong>é</strong>m da<br />
Revista do Globo, conforme quadro abaixo:<br />
9
Quadro III: Inserção profissional dos signatários dos manifestos<br />
Ativida<strong>de</strong> (s) Profissional (ais) Signatários Moção a favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo<br />
(SEV)<br />
Professores Universitários Celestino Prunes (1)<br />
Manoelito <strong>de</strong> Ornellas (1)<br />
Angelo Guido (1)<br />
Dion<strong>é</strong>lio Machado (1)<br />
Armando Fay <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Edvaldo Paiva (2)<br />
Oto Alci<strong>de</strong>s Ohlweiller (1)<br />
Outubrino Correa (1)<br />
Nei Messias (1)<br />
Nilo Ruschel (3)<br />
Estela Budiansky (1)<br />
Ernani Dias Correa (1)<br />
Professores ensino m<strong>é</strong>dio e/ ou<br />
profissionalizante<br />
Olinto San Martin (1)<br />
Érico Maciel (1)<br />
Jorge Bahlis (1)<br />
Gevaldino Ferreira (1)<br />
Homero <strong>de</strong> Castro Jobim (1)<br />
S.D. <strong>de</strong> Ramayana (Salim Daou)(1)<br />
Estela Budiansky (2)<br />
Lila Gue<strong>de</strong>s Ripoll (1)<br />
Jornalistas Celestino Prunes (2)<br />
Manoelito <strong>de</strong> Ornellas (2)<br />
Ângelo Guido (2)<br />
Dion<strong>é</strong>lio Machado (3)<br />
Olinto San Martin (2)<br />
Armando Fay <strong>de</strong> Azevedo (2)<br />
Érico Maciel (3)<br />
Antônio Barata (1)<br />
Jorge Bahlis (2)<br />
Manoel Braga Gastal (1)<br />
Nei Messias (2)<br />
Gevaldino Ferreira (2)<br />
Francisco Talaia O’Donnell (2)<br />
Nilo Ruschel (1)<br />
Licurgo Cardoso (2)<br />
Josino Campos (Isaac Axelrud) (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Ferreira Amaro Júnior (1)<br />
João <strong>de</strong> Aragão Bergmann (1)<br />
Bolívar Carneiro da Fontoura (1)<br />
Fernando da Silva Borba (2)<br />
Gastão Hasslocher Mazeron (1)<br />
Luís Palhares <strong>de</strong> Melo (2)<br />
Carlos Macedo Reverbel (1)<br />
S.D. <strong>de</strong> Ramayana (Salim Daou)(1)<br />
Adail Leo<strong>de</strong>gário <strong>de</strong> Moraes (1)<br />
Signatários moção Pe. Leonardo Fritzen<br />
(SLF)<br />
10<br />
Adroaldo Mesquita da Costa (1)<br />
Antônio Pinto Bottini (1)<br />
Fábio <strong>de</strong> Barros (1)<br />
Ruy Cirne Lima (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Luiz <strong>de</strong> Almeida Martins Costa Júnior<br />
(1)<br />
Raul Moreira (1)<br />
Luis Francisco Guerra Blessmann (1)<br />
Eliseu Paglioli (1)<br />
Carlos <strong>de</strong> Britto Velho (1)<br />
D<strong>é</strong>cio Martins Costa (1)<br />
Humberto Lubisco (1)<br />
Osmar Pilla (1)<br />
Francisco Machado Carrion (1)<br />
Alfeu Bica <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
Mário Brasil (1)<br />
Egberto Guido Becker (1)<br />
Felipe Machado Carrion (1)<br />
Ernani Maria Fiori (1)<br />
Leonardo Macedônia (1)<br />
Armando Dias <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Dario <strong>de</strong> Bittencourt (1)<br />
Ama<strong>de</strong>o <strong>de</strong> Oliveira Freitas (1)<br />
Henrique Desjardins (1)<br />
Romeu Mucillo (1)<br />
Mário Bernd (1)<br />
Lau<strong>de</strong>lino Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
Heitor Cirne Lima (1)<br />
Camilo Martins Costa (1)<br />
Galeno Vellinho <strong>de</strong> Lacerda (1)<br />
Ruy Rodrigues Brasileiro <strong>de</strong> Azambuja (1)<br />
Bruno Kieffer (1)<br />
Armando Pereira Câmara (1)<br />
Aldo Obino (1)<br />
Armando Dias <strong>de</strong> Azevedo (2)<br />
Leopoldo Hoffmann (1)<br />
Armando Pereira Câmara (2)<br />
Fábio <strong>de</strong> Barros (3)<br />
Isolino Leal (1)<br />
Mário Calvet Fagun<strong>de</strong>s (1)<br />
Aldo Obino (2)<br />
Dario <strong>de</strong> Bittencourt (1)<br />
Ruy Rodrigues Brasileiro <strong>de</strong> Azambuja (2)
Aur<strong>é</strong>lio Limeira Tejo (1)<br />
Júlio Ruas (1)<br />
Ovídio Moojen Chaves (1)<br />
Pedro Rubens <strong>de</strong> Freitas Wayne (1)<br />
Mário Quintana (1)<br />
Gilda Marinho (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Faltzenback Amadio (1)<br />
Escritores Manoelito <strong>de</strong> Ornellas (3))<br />
Dion<strong>é</strong>lio Machado (2)<br />
Editores Mansueto Bernardi (2)<br />
Servidores públicos Clóvis Pestana (1)<br />
Augusto <strong>de</strong> Carvalho (1)<br />
Edvaldo Paiva (1)<br />
Dante <strong>de</strong> Laytano (1)<br />
Nei Messias (3)<br />
Nilo Ruschel (2)<br />
Licurgo Cardoso (1)<br />
Gabriel <strong>de</strong> Miranda Obino (2)<br />
Rui Vieira da Rocha (1)<br />
Ac<strong>é</strong>lio Antunes Daudt (1)<br />
Bolívar Carneiro da Fontoura (2)<br />
Fernando da Silva Borba (1)<br />
Gastão Hasslocher Mazeron (2)<br />
Luís Palhares <strong>de</strong> Melo (1)<br />
Adail Leo<strong>de</strong>gário <strong>de</strong> Moraes (2)<br />
Alfredo Gomes Jacques (1)<br />
Aur<strong>é</strong>lio Limeira Tejo (2)<br />
Ernani Dias Correa (2)<br />
Profissionais Liberais Ciro Martins (1)<br />
Érico Maciel (2)<br />
Francisco Talaia O’Donnell (1)<br />
Gabriel <strong>de</strong> Miranda Obino (3)<br />
João <strong>de</strong> Aragão Bergmann (2)<br />
Adalmiro Ban<strong>de</strong>ira Moura (1)<br />
Fonte: MARTINS, Ari (1978)<br />
Adroaldo Mesquita da Costa (2)<br />
Fábio <strong>de</strong> Barros (2)<br />
Mário Goulart Reis (1)<br />
Mansueto Bernardi (1)<br />
Isolino Leal (2)<br />
Egberto Guido Becker (2)<br />
Paulo Rache (1)<br />
Leônidas Soares Machado (1)<br />
Galeno Vellinho <strong>de</strong> Lacerda (2)<br />
Armindo Cemin Beux (1)<br />
11<br />
Jos<strong>é</strong> Luiz <strong>de</strong> Almeida Martins Costa Júnior<br />
(2)<br />
Carlos <strong>de</strong> Britto Velho (1)<br />
Valter Becker (1)<br />
Egberto Guido Becker (3)<br />
Aldo Obino (3)<br />
Ernani Maria Fiori (2)<br />
Armando Dias <strong>de</strong> Azevedo (3)<br />
Antônio Peirouton Louzada (1)<br />
Armando Pereira Câmara (3)<br />
Se o grupo a favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo se <strong>de</strong>stacava nas ativida<strong>de</strong>s jornalísticas, os<br />
signatários da moção em solidarieda<strong>de</strong> ao Pe. Fritzen ocupavam o espaço universitário. A maioria<br />
<strong>de</strong>sse grupo <strong>de</strong>dicou-se a carreira do magist<strong>é</strong>rio, especialmente no ensino superior, al<strong>é</strong>m <strong>de</strong> suas<br />
carreiras liberais como m<strong>é</strong>dicos e advogados. Esse direcionamento a esfera universitária têm<br />
relação com as <strong>de</strong>manda aberta para indivíduos com títulos universitários e certa notorieda<strong>de</strong> para<br />
lecionar nas novas unida<strong>de</strong>s acadêmicas criadas (Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofia e Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Ciências</strong><br />
Econômicas) que juntamente com as escolas superiores existentes (Direito, Medicina, Engenharia e<br />
Agronomia) constituíram a Universida<strong>de</strong> do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul a partir <strong>de</strong> 1934, assim como na<br />
Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica fundada na d<strong>é</strong>cada <strong>de</strong> 1940. Al<strong>é</strong>m disso, a entrada no ensino<br />
universitário fez parte <strong>de</strong> uma estrat<strong>é</strong>gia do grupo católico que já tinham posições <strong>de</strong> li<strong>de</strong>rança na<br />
Universida<strong>de</strong>, como o lí<strong>de</strong>r católico Armando Câmara, docente da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito e reitor da<br />
Universida<strong>de</strong> na d<strong>é</strong>cada <strong>de</strong> 1940, <strong>de</strong>, por um lado distanciar o domínio universitário <strong>de</strong> orientações<br />
distintas das suas, e por outro garantir o monopólio da formação das futuras gerações <strong>de</strong> professores<br />
para a re<strong>de</strong> católica <strong>de</strong> ensino especialmente na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofia.
O ensino universitário e o funcionalismo público tamb<strong>é</strong>m se constituíram ativida<strong>de</strong>s<br />
profissionais do grupo a favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo, mas em sua maioria <strong>de</strong>dicaram-se ao jornalismo.<br />
De um lado o jornalismo “exerceu atração sobre muitos escritores que <strong>de</strong>senvolviam ativida<strong>de</strong>s<br />
literárias e artísticas, uma vez que a ausência <strong>de</strong> um mercado editorial forte favorecia a aproximação<br />
entre jornalismo e escritores, tornando a imprensa o principal espaço <strong>de</strong> difusão <strong>de</strong> obras literárias<br />
(PETRARCA, 2007: 68). Esse foi o caso, por exemplo, <strong>de</strong> escritores como Manoelito <strong>de</strong> Ornellas,<br />
que concomitantemente com sua produção literária <strong>de</strong>senvolveu carreira no jornalismo como<br />
redator do jornal A Fe<strong>de</strong>ração e do Jornal da Manhã. Para outros o jornalismo <strong>de</strong>svinculava-se da<br />
literatura e começava a constituir-se enquanto um ramo profissional, cujo objetivo <strong>é</strong> reportar a<br />
realida<strong>de</strong> política e social, a exemplo da trajetória do m<strong>é</strong>dico Celestino Prunes como repórter. Como<br />
<strong>de</strong>monstramos abaixo:<br />
Quadro IV: Inserção no campo jornalístico<br />
Ativida<strong>de</strong> SEV SLF<br />
Redatores Celestino Prunes (1)<br />
Manoelito <strong>de</strong> Ornellas (1)<br />
Ângelo Guido (1)<br />
Dion<strong>é</strong>lio Machado (1)<br />
Olinto San Martin (1)<br />
Armando Fay <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Gevaldino Ferreira (2)<br />
Francisco Talaia O’Donnell (1)<br />
Nilo Ruschel (2)<br />
Gabriel <strong>de</strong> Miranda Obino (1)<br />
Josino Campos (Isaac Axelrud) (1)<br />
João <strong>de</strong> Aragão Bergmann (1)<br />
Fernando da Silva Borba (1)<br />
Gastão Hasslocher Mazeron (1)<br />
Luís Palhares <strong>de</strong> Melo (1)<br />
Carlos Macedo Reverbel (1)<br />
S.D. <strong>de</strong> Ramayana (Salim Daou)(1)<br />
Adail Leo<strong>de</strong>gário <strong>de</strong> Moraes (1)<br />
Aur<strong>é</strong>lio Limeira Tejo (1)<br />
Júlio Ruas (1)<br />
Mário Quintana (1)<br />
Ovídio Moojen Chaves (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Faltzenback Amadio (1<br />
Dirigentes Nei Messias (1)<br />
Gevaldino Ferreira (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Ferreira Amaro Júnior (1)<br />
Isolino Leal (1)<br />
Mário Calvet Fagun<strong>de</strong>s (1)<br />
Aldo Obino (1)<br />
Dario <strong>de</strong> Bittencourt (1)<br />
Ruy Rodrigues Brasileiro <strong>de</strong> Azambuja (1)<br />
Ruy Cirne Lima (1)<br />
Mansueto Bernard (2)<br />
Ama<strong>de</strong>o <strong>de</strong> Oliveira Freitas (1)<br />
Ruy Rodrigues Brasileiro <strong>de</strong> Azambuja (2)<br />
Editores Mansueto Bernardi (1)<br />
Articulista periódico Armando Fay <strong>de</strong> Azevedo (2)<br />
Ac<strong>é</strong>lio Antunes Daudt (1)<br />
Articulista eventual Adroaldo Mesquita da Costa (1)<br />
Ruy Cirne Lima (1)<br />
Rinaldo Pereira Câmara (1)<br />
Mário Goulart Reis (1)<br />
Francisco Machado Carrion (1)<br />
Ernani Maria Fiori (1)<br />
Armando Dias <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Lau<strong>de</strong>lino Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
Armando Pereira Câmara (1)<br />
12
Repórteres Celestino Prunes (2))<br />
Gastão Hasslocher Mazeron (2)<br />
Radialistas Manoel Braga Gastal (1)<br />
Nilo Ruschel (1)<br />
Josino Campos (Isaac Axelrud) (2)<br />
João <strong>de</strong> Aragão Bergmann (2)<br />
Bolívar Carneiro da Fontoura (1)<br />
Ovídio Moojen Chaves (1)<br />
Isso <strong>não</strong> significa que o grupo a favor <strong>de</strong> Leonardo Fritzen <strong>não</strong> <strong>de</strong>senvolvera ativida<strong>de</strong>s na<br />
imprensa escrita, uma vez que escreveram constantemente em jornais <strong>de</strong> circulação, algumas vezes<br />
comprando espaços, outras a pedidos, e at<strong>é</strong> mesmo contando com uma coluna semanal como o caso<br />
<strong>de</strong> Aldo Obino, que foi redator do Jornal Correio do Povo. No entanto, a atuação <strong>de</strong>sse grupo foi<br />
representativa num ramo específico <strong>de</strong> imprensa: a católica. Por exemplo, o jurista e professor <strong>de</strong><br />
Direito Rui Cirne Lima fundou o Jornal do Dia, o tamb<strong>é</strong>m professor <strong>de</strong> Direito Ama<strong>de</strong>o <strong>de</strong> Oliveira<br />
Freitas dirigiu o jornal católico A Nação, cuja redação ficava ao encargo <strong>de</strong> Rui Rodrigo Brasileiro<br />
<strong>de</strong> Azambuja. Al<strong>é</strong>m disso, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a d<strong>é</strong>cada <strong>de</strong> 1930 o movimento católico era divulgado na revista<br />
Ida<strong>de</strong> Nova criada por boa parte <strong>de</strong>sse grupo no Centro Católico <strong>de</strong> Acadêmicos da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Direito.<br />
Se as ativida<strong>de</strong>s jornalísticas e as instituições <strong>de</strong> imprensa <strong>não</strong> constituíram o lócus<br />
privilegiado <strong>de</strong> atuação do grupo a favor do Pe. Fritzen, eles construíram sua notorieda<strong>de</strong> intelectual<br />
atrav<strong>é</strong>s das suas ativida<strong>de</strong>s universitárias. Nesta esfera, o grupo do Pe. Fritzen, em comparação aos<br />
poucos itinerários ligados ao ensino universitário do grupo a favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo, dominaram<br />
as áreas acadêmicas mais tradicionais, como o Direito e a Medicina e em menor grau, naquele<br />
momento, a Filosofia. Conforme quadro abaixo:<br />
Quadro V: Inserção no ensino universitário: Unida<strong>de</strong>s acadêmicas<br />
Faculda<strong>de</strong> SEV (N =11) SLF (N = 33)<br />
Direito Nei Messias (1) Adroaldo Mesquita da Costa (1)<br />
Ruy Cirne Lima (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Luiz <strong>de</strong> Almeida Martins Costa<br />
Júnior (1)<br />
Egberto Guido Becker (1)<br />
Leonardo Macedônia (1)<br />
Dario <strong>de</strong> Bittencourt (1)<br />
Ama<strong>de</strong>o <strong>de</strong> Oliveira Freitas (1)<br />
Camilo Martins Costa (1)<br />
Galeno Vellinho <strong>de</strong> Lacerda (1)<br />
Armando Pereira Câmara (1)<br />
Medicina Celestino Prunes (1)<br />
Dion<strong>é</strong>lio Machado (1)<br />
Estela Budiansky (1)<br />
Antônio Pinto Bottini (1)<br />
Fábio <strong>de</strong> Barros (1)<br />
Raul Moreira (1)<br />
Luis Francisco Guerra Blessmann (1)<br />
Eliseu Paglioli (1)<br />
Carlos <strong>de</strong> Britto Velho (1)<br />
D<strong>é</strong>cio Martins Costa (1)<br />
Osmar Pilla (1)<br />
Alfeu Bica <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
13
Mário Bernd (1)<br />
Heitor Cirne Lima (1)<br />
Engenharia Oto Alci<strong>de</strong>s Ohlweiller (1) Mário Brasil (1)<br />
Filosofia Manoelito <strong>de</strong> Ornellas (1)<br />
Oto Alci<strong>de</strong>s Ohlweiller (2)<br />
Dante <strong>de</strong> Laytano (1)<br />
Nilo Ruschel (1)<br />
Agronomia e Veterinária Outubrino Correa (1)<br />
Arquitetura e artes Edvaldo Paiva (1)<br />
Ernani Dias Correa (1)<br />
Francisco Machado Carrion (1)<br />
Felipe Machado Carrion (2)<br />
Ernani Maria Fiori (1)<br />
Armando Dias <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Romeu Mucillo (1)<br />
Lau<strong>de</strong>lino Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
Armando Pereira Câmara (2)<br />
<strong>Ciências</strong> Econômicas Francisco Machado Carrion (2)<br />
Felipe Machado Carrion (1)<br />
Lau<strong>de</strong>lino Me<strong>de</strong>iros (2)<br />
<strong>Artes</strong> Bruno Kieffer (1)<br />
Outras Mário Goulart Reis (1)<br />
Humberto Lubisco (1)<br />
Henrique Desjardins (1)<br />
Ruy Rodrigues Brasileiro <strong>de</strong><br />
Azambuja (1)<br />
Fonte: MARTINS, Ari (1978)<br />
Outra variável importante para verificar a posição dos membros dos grupos no meio<br />
intelectual <strong>é</strong> o seu pertencimento a instituições <strong>de</strong> consagração cultural. Nesse sentido,<br />
selecionamos duas instituições que a princípio po<strong>de</strong>riam <strong>de</strong>marcar diferenças <strong>de</strong> perfis intelectuais<br />
entre esses grupos, trata-se do Instituto Histórico Geográfico do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul e da Aca<strong>de</strong>mia<br />
Rio- gran<strong>de</strong>nse <strong>de</strong> <strong>Letras</strong>. Enquanto a primeira, fundada no período imperial, <strong>de</strong>marcaria o campo<br />
do passado, do ensaísmo, a segunda, fundada nos primórdios do período republicano, balizaria a<br />
esfera da produção literária.<br />
O Instituto Histórico Geográfico agregou membros <strong>de</strong> ambos os grupos. Destaca-se nesse<br />
sentido a presença <strong>de</strong> membros da moção a favor do Pe. Fritzen com posições <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque no<br />
Instituto, especialmente aqueles <strong>de</strong>dicados à produção sobre o passado imperial do Estado e do<br />
Brasil (Armando Dias <strong>de</strong> Azevedo, Rinaldo Pereira Câmara, Lau<strong>de</strong>lino Teixeira Me<strong>de</strong>iros). Já do<br />
grupo em favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo <strong>de</strong>staca-se a atuação <strong>de</strong> Manoelito <strong>de</strong> Ornellas e Ângelo Guido,<br />
<strong>de</strong>ntre outros.<br />
A Aca<strong>de</strong>mia Rio – Gran<strong>de</strong>nse <strong>de</strong> <strong>Letras</strong>, embora em sua origem, em 1901, tenha tido um<br />
grupo <strong>de</strong> literatos representativos à <strong>é</strong>poca, seu <strong>de</strong>senvolvimento foi marcado por <strong>de</strong>scontinuida<strong>de</strong>s.<br />
Fundada em 1901, em 1910 tornou-se Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> <strong>Letras</strong> do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, e na d<strong>é</strong>cada <strong>de</strong><br />
1920 os escritores mo<strong>de</strong>rnistas contrários à existência <strong>de</strong> aca<strong>de</strong>mias <strong>de</strong> letras criaram o Instituto<br />
14
Rio-Gran<strong>de</strong>nse <strong>de</strong> <strong>Letras</strong> que em 1934 tornou-se Aca<strong>de</strong>mia Rio-gran<strong>de</strong>nse <strong>de</strong> <strong>Letras</strong>. Apenas em<br />
1944 as duas aca<strong>de</strong>mias se fun<strong>de</strong>m e em 1963 retomam o nome original <strong>de</strong> 1901. De todo modo,<br />
esta instituição <strong>não</strong> <strong>de</strong>marcou o campo literário, uma vez que encontramos poucos itinerários<br />
representativos <strong>de</strong> ambos os grupos envolvidos em seu <strong>de</strong>senvolvimento. Como abaixo:<br />
Quadro VI: Pertencimento a Instituições <strong>de</strong> consagração cultural<br />
Instituições SEV SLF<br />
Instituto Histórico e<br />
Geográfico do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul (IHGRGS)<br />
Manoelito <strong>de</strong> Ornellas (1)<br />
Ângelo Guido (1)<br />
Olinto San Martin (3)<br />
Dante <strong>de</strong> Laytano (3)<br />
Jorge Bahlis (3)<br />
Gastão Hasslocher<br />
Mazeron (1)<br />
Carlos Macedo Reverbel<br />
(1)<br />
Aca<strong>de</strong>mia Sul Riogran<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Letras</strong> Augusto <strong>de</strong> Carvalho (1)<br />
Olinto San Martin (1)<br />
Jorge Bahlis (2)<br />
Fernando da Silva Borba<br />
(1)<br />
Gastão Hasslocher<br />
Mazeron (2)<br />
Adroaldo Mesquita da Costa (1)<br />
Rinaldo Pereira Câmara (2)<br />
Mansueto Bernardi (1)<br />
Mário Calvet Fagun<strong>de</strong>s (1)<br />
Aldo Obino (1)<br />
Leonardo Macedônia (1)<br />
Armando Dias <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Lau<strong>de</strong>lino Me<strong>de</strong>iros (1)<br />
Mário Calvet Fagun<strong>de</strong>s (1)<br />
Mário Bernd (2)<br />
Instituto Rio-gran<strong>de</strong>nse <strong>de</strong> <strong>Letras</strong> Jorge Bahlis (1) Fábio <strong>de</strong> Barros (1)<br />
Dario <strong>de</strong> Bittencourt (1)<br />
Ama<strong>de</strong>o <strong>de</strong> Oliveira Freitas (1)<br />
Aca<strong>de</strong>mia Rio- Gran<strong>de</strong>nse <strong>de</strong> <strong>Letras</strong> Olinto San Martin (2)<br />
Gevaldino Ferreira (1)<br />
Fonte: MARTINS, Ari (1978)<br />
Dario <strong>de</strong> Bittencourt (2)<br />
Mário Bernd (1)<br />
É preciso <strong>de</strong>stacar a militância dos signatários da moção em favor á Érico Veríssimo em<br />
instituições da imprensa. Participaram e muitas vezes fundaram associações, a exemplo da<br />
Associação Rio- Gran<strong>de</strong>nse <strong>de</strong> Imprensa e da Associação dos cronistas (esportivos) <strong>de</strong> Porto<br />
Alegre. Alguns poucos participaram <strong>de</strong> órgãos oficiais <strong>de</strong> governo, como o Departamento <strong>de</strong><br />
Imprensa e Propaganda (DIP) do Estado Novo e a Imprensa Oficial do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul. Já o<br />
grupo a favor do Pe. Fritzen <strong>de</strong>stacou-se no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>s e/ ou institutos<br />
profissionais, especialmente na área do Direito, a exemplo do Instituto dos advogados do RGS e do<br />
Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Direito Social.<br />
Portanto, a <strong>de</strong>speito do caráter perif<strong>é</strong>rico e <strong>não</strong> institucionalizado <strong>de</strong>ssas instancias sociais,<br />
essa breve <strong>de</strong>scrição pautou certas diferenças entre os grupos. De um lado, um grupo católico (com<br />
algumas exceções), formado em um educandário <strong>de</strong> prestigio e com a mesma sociabilização<br />
católica que dominaram o espaço universitário, e <strong>de</strong> outro um grupo heterogêneo em termos <strong>de</strong><br />
formação escolar e origens sociais, cuja atuação, com exceções, pautou-se, al<strong>é</strong>m <strong>de</strong> suas ativida<strong>de</strong>s<br />
profissionais, pelas suas atuações na imprensa e na literatura. No entanto, tais características <strong>não</strong><br />
15
<strong>de</strong>monstram como tal polêmica refletiu-se no campo do po<strong>de</strong>r e se isto realmente ocorreu. Um dos<br />
meios <strong>de</strong> verificação <strong>é</strong> a análise das trajetórias políticas dos signatários. Afinal, tal polêmica teve<br />
relação com a entrada posterior na política dos signatários ou essa relação <strong>é</strong> infundada. O quadro<br />
abaixo sugere algumas pistas:<br />
Quadro VII: Entrada na política dos signatários<br />
Em relação a Polêmica SEV SLF<br />
Antes Armando Fay <strong>de</strong> Azevedo (1)<br />
Gabriel <strong>de</strong> Miranda Obino (1)<br />
Depois<br />
Fonte: MARTINS, Ari (1978).<br />
Clóvis Pestana (1)<br />
Dion<strong>é</strong>lio Machado (1)<br />
Manoel Braga Gastal (1)<br />
Adail Leo<strong>de</strong>gário <strong>de</strong> Moraes (1)<br />
Adalmiro Ban<strong>de</strong>ira Moura (1)<br />
Adroaldo Mesquita da Costa (1)<br />
Antônio Pinto Bottini (1)<br />
Luis Francisco Guerra Blessmann<br />
(1)<br />
D<strong>é</strong>cio Martins Costa (1)<br />
Jos<strong>é</strong> Brochado da Rocha (1)<br />
Paulo Rache (1)<br />
Adroaldo Mesquita da Costa (2)<br />
Eliseu Paglioli (1)<br />
Carlos <strong>de</strong> Britto Velho (1)<br />
D<strong>é</strong>cio Martins Costa (2)<br />
Jos<strong>é</strong> Brochado da Rocha (2)<br />
Francisco Machado Carrion (1)<br />
Paulo Rache (1)<br />
Armando Pereira Câmara (1)<br />
Os poucos casos sugerem que a polêmica <strong>não</strong> se refletiu na esfera política. É claro que se<br />
<strong>de</strong>ve levar em conta o contexto no qual se <strong>de</strong>senvolveu: o final do Estado Novo <strong>de</strong> Getúlio Vargas.<br />
Al<strong>é</strong>m disso, a entrada na política do grupo ligado ao Pe. Fritzen teve uma relação direta com os<br />
processos constituintes (<strong>de</strong> 1934 e 1946) e <strong>não</strong> com fatos advindos da esfera intelectual. No entanto,<br />
por outro lado, como <strong>de</strong>monstraremos abaixo, o contexto político da <strong>é</strong>poca – mundial, nacional, e<br />
local - refletiu-se nos <strong>de</strong>sdobramentos da polêmica divulgadas na imprensa <strong>de</strong> Porto Alegre.<br />
Os manifestos <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>: Liberda<strong>de</strong> x autoritarismo?<br />
A manifestação a favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo começou com um “a pedido” no Diário <strong>de</strong><br />
Noticias com a reprodução do artigo do Pe. Fritzen e das assinaturas dos intelectuais solidários ao<br />
padre. Logo após, surgiu o manifesto em solidarieda<strong>de</strong> ao escritor Érico Veríssimo. Este se<br />
concentrou no conteúdo político da polêmica. Para tanto, associavam as posições <strong>de</strong> Érico<br />
Veríssimo no contexto da Segunda Guerra Mundial ao i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>mocracia liberal, aos i<strong>de</strong>ais<br />
do presi<strong>de</strong>nte americano Roosevelt, <strong>de</strong>stacando, nesse sentido, que Érico Veríssimo <strong>de</strong>fendia o<br />
liberalismo frente ao autoritarismo do Estado Novo e das nações do eixo. Como <strong>de</strong>monstra o artigo<br />
<strong>de</strong> Homero <strong>de</strong> Castro Jobim, publicado no jornal Diretrizes:<br />
“ As <strong>de</strong>clarações <strong>de</strong> Wen<strong>de</strong>ll Wilkie e <strong>de</strong> Henri Wallace, e a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> opinião, a<br />
liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> culto, a libertação do medo e a libertação da mis<strong>é</strong>ria, as quatro<br />
liberda<strong>de</strong>s fundamentais estabelecidas pelo presi<strong>de</strong>nte Roosevelt enchiam <strong>de</strong><br />
16
esperanças a imensa maioria dos homens e mulheres <strong>de</strong> porto alegre. Não podiam<br />
agradar, porem a parte restante <strong>de</strong>ssa imensa maioria. Não podiam naturalmente<br />
agradar os que querem conservar a socieda<strong>de</strong> como um organismo morto, estático,<br />
imutável atrav<strong>é</strong>s dos s<strong>é</strong>culos, aqueles que julgam que o homem, espiritualmente,<br />
<strong>de</strong>ve viver sempre no s<strong>é</strong>culo XII. Não podiam agradar, enfim, aos que querem<br />
impedir que as conquistas do pensamento cientifico passem a fazer parte do<br />
pensamento coletivo das massas populares e que querem manter in<strong>de</strong>finidamente<br />
seus privil<strong>é</strong>gios econômicos e espirituais; àqueles que temem a <strong>de</strong>mocracia, porque<br />
ela <strong>é</strong> o sistema político mais favorável ao progresso; àqueles que esperam uma boa<br />
oportunida<strong>de</strong> para agrupar-se em torno <strong>de</strong> um Fuehrer qualquer, que lhes <strong>de</strong>fenda<br />
as viagens <strong>de</strong> recreio, as caríssimas amantes, os automóveis luxuosos, os ócios<br />
intermináveis...” 7<br />
Em relação ao grupo em a favor <strong>de</strong> Pe. Fritzen, o ataque dos signatários a favor <strong>de</strong> Érico<br />
Veríssimo foi contra a maneira “inquisicional” que o criticavam, aproximando-os das atitu<strong>de</strong>s do<br />
regime nazista. Como ilustra o texto da moção <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>:<br />
“Agora, que Érico Veríssimo acaba <strong>de</strong> enobrecer a literatura brasileira,<br />
consagrando-se fora das fronteiras do país, e a propósito <strong>de</strong> seu último romance,<br />
uma onda <strong>de</strong> sectária <strong>de</strong> intolerância, <strong>de</strong>svirtuando o real sentido <strong>de</strong> princípios<br />
morais e religiosos assás respeitáveis, levantou-se contra o escritor patrício,<br />
solidarizando-se com o autor <strong>de</strong> uma sugestão que apregoa a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
efetivar algo muito semelhante ás fogueiras <strong>de</strong> livros marcados pelo in<strong>de</strong>x do<br />
ditador <strong>de</strong> Berlim; revivescência, por sua vez, das fogueiras medievais <strong>de</strong> homens,<br />
sete anos atrás. É um contra-senso que uma tal coisa esteja acontecendo<br />
precisamente no país que foi, na Am<strong>é</strong>rica do Sul, o pioneiro da participação<br />
armada na luta contra o nazismo” 8<br />
A associação <strong>de</strong> Érico Veríssimo aos i<strong>de</strong>ais do presi<strong>de</strong>nte americano Roosevelt, a<br />
<strong>de</strong>mocracia americana, tem relação com o fato <strong>de</strong> ele ter estado, em 1941, nos EUA a convite do<br />
Departamento <strong>de</strong> Estado do presi<strong>de</strong>nte Roosevelt ministrando conferências e ter retornado logo<br />
após a polêmica para a Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Berkeley, na Califórnia. Al<strong>é</strong>m disso, embora Érico<br />
Veríssimo nunca tenha se <strong>de</strong>finido i<strong>de</strong>ologicamente ou exercido alguma função em alguma<br />
instituição política, sempre se posicionou como a favor dos regimes <strong>de</strong>mocráticos, especialmente o<br />
americano.<br />
Já o grupo em torno do Pe. Fritzen <strong>é</strong> retratado como simpáticos a regimes como o Nazismo,<br />
o Fascismo e ao Estado Novo <strong>de</strong> Getulio Vargas. No entanto, o manifesto apresentado pelo grupo<br />
<strong>não</strong> fez nenhuma menção ao contexto político da <strong>é</strong>poca uma vez que apenas se posicionaram na<br />
função <strong>de</strong> docentes que <strong>de</strong>fendiam a formação dos alunos, e por isso, era legitimo o ato do Pe.<br />
Leonardo Fritzen <strong>de</strong> censurar o conteúdo da obra <strong>de</strong> Érico Veríssimo, uma vez que “<strong>não</strong> bastava<br />
ensinar os alunos a religião católica, era importante que eles julgassem a obra <strong>de</strong> um <strong>não</strong> católico<br />
sob o prisma da Igreja” (TRINDADE, 1984: pág. 56). Como abaixo:<br />
7 Jobim, Homero <strong>de</strong> Castro. Érico Veríssimo atacado pelos inimigos da Liberda<strong>de</strong>. Diretrizes, 6 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1943.<br />
8 Manifesto <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> ao escritor Érico Veríssimo. A PEDIDO. Diário <strong>de</strong> notícias. 2 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1943<br />
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“Aos sacerdotes, a lei eclesiástica prescreve que advirtam os fi<strong>é</strong>is acerca do dano e<br />
perigo advenientes dos livros maus - Opportune moneant fi<strong>de</strong>les <strong>de</strong> periculo et<br />
damno lectionis librorum pravorum. Aos professores, acaso será lícito manteremse<br />
indiferentes à intima formação do caráter dos alunos? Ningu<strong>é</strong>m negará, estamos<br />
tranqüilos, o direito e o <strong>de</strong>ver que assistem aos professores, <strong>de</strong> orientar sadiamente<br />
em tal mat<strong>é</strong>ria os jovens confiados à sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> educadores” 9<br />
De toda forma, esta relação, implícita ou <strong>não</strong>, entre esse grupo católico e os regimes<br />
autoritários está ligado, por um lado à posição da Igreja Católica em relação a esses governos, e por<br />
outro, no nível regional, a oscilação <strong>de</strong> posições <strong>de</strong> Dom João Becker, arcebispo <strong>de</strong> Porto Alegre.<br />
Nesse sentido, para Fernando Trinda<strong>de</strong> (1934) houve mais uma omissão da Igreja Católica diante<br />
<strong>de</strong>sses regimes totalitários uma vez os católicos estavam mais engajados no seu anticomunismo e<br />
em relação ao Estado Novo, mesmo o Brasil estando em guerra contra o eixo, contra os regimes<br />
totalitários, eles ainda prestigiavam a Ditadura <strong>de</strong> Vargas. Já a posição brasileira <strong>de</strong> guerra ao eixo<br />
refletiu-se nas posições <strong>de</strong> Dom João Becker, e da Arquidiocese do RGS, como comenta Arthur<br />
Isaía (1998: 199):<br />
“A <strong>de</strong>claração brasileira <strong>de</strong> guerra ao eixo, no segundo semestre <strong>de</strong> 1942, refletirse-á<br />
na postura arquidiocesana, que persistirá na con<strong>de</strong>nação explícita ao nazismo e<br />
ao nacionalismo nipônico, mas silenciando completamente em relação ao fascismo<br />
italiano. O arcebispo fugia <strong>de</strong> um reconhecimento público da conivência italiana à<br />
agressão alemã ao Brasil e da realida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> guerra em relação<br />
tamb<strong>é</strong>m à Itália, contida no documento da chancelaria brasileira datada <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong><br />
agosto <strong>de</strong> 1942. Ao contrário da retratação oficial <strong>de</strong> Dom João Becker sobre sua<br />
opinião a respeito do nacional –socialismo alemão, seu posicionamento favorável a<br />
experiência fascista italiana <strong>não</strong> sofreria retoques explícitos. Con<strong>de</strong>nava-se a<br />
política do eixo, mas particularizava-se apenas as con<strong>de</strong>nações aos regimes<br />
anticristãos da Alemanha e do Japão.”<br />
Tais posicionamentos <strong>de</strong> Dom João Becker refletiram-se nas tomadas <strong>de</strong> posição do grupo<br />
em torno do Pe. Fritzen. Inclusive, muitos <strong>de</strong>sses <strong>de</strong>bates – seja a favor do Nazismo ou do<br />
Fascismo-foram divulgados no jornal a Nação cujos articulistas fizeram parte <strong>de</strong>sse grupo.<br />
Portanto, os manifestos <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> a um ou outro das partes envolvidas revelam “as tomadas<br />
<strong>de</strong> posição e os confrontos relativos ao fascismo, ao Estado Novo, e à nova conjuntura pós-guerra.”<br />
(CORADINI: 2003: 16).<br />
Consi<strong>de</strong>rações finais<br />
A análise <strong>de</strong>scrita nesse artigo pontuou algumas características essenciais <strong>de</strong>sses grupos<br />
intelectuais e do <strong>de</strong>bate público à <strong>é</strong>poca. De modo preliminar a caracterização dos grupos revela<br />
certas bipolarizações no “campo intelectual” da Porto Alegre dos anos 1940, seja em termo <strong>de</strong><br />
capitais escolares, ou em relação aos espaços sociais <strong>de</strong> atuação. Por um lado um grupo católico,<br />
9 Uma página <strong>de</strong> crítica literária e os que com ela se solidarizaram. A PEDIDOS. Diário <strong>de</strong> Notícias. 30 <strong>de</strong> Abril <strong>de</strong><br />
1943.<br />
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com a mesma sociabilização escolar e religiosa cujos trajetos confluem no magist<strong>é</strong>rio universitário,<br />
e por outro um grupo heterogêneo em termos <strong>de</strong> formação escolar e universitária cujos itinerários<br />
ligam-se em sua maioria as ativida<strong>de</strong>s literárias da editora Globo e aos empreendimentos da<br />
imprensa rio-gran<strong>de</strong>nse. Destaca-se, nesse sentido, que as características sociais <strong>de</strong> alguns membros<br />
do grupo em torno <strong>de</strong> Érico Veríssimo, e do próprio Érico, assemelham-se àquelas do grupo <strong>de</strong><br />
escritores brasileiros da d<strong>é</strong>cada <strong>de</strong> 1930 os quais “pertencendo quase sempre a famílias <strong>de</strong><br />
proprietários rurais que se arruinaram, <strong>não</strong> tem outra possibilida<strong>de</strong> se<strong>não</strong> <strong>de</strong> sobreviverem às custas<br />
<strong>de</strong> empregos no serviço público, na imprensa, e <strong>de</strong>mais ofícios que se prestam às divagações do<br />
espírito” (MICELI; 1979: 93).<br />
Em relação ao conteúdo dos manifestos ultrapassaram a questão literária e moral que<br />
originalmente impulsionaram a polêmica e abarcou o contexto político da segunda Guerra Mundial.<br />
Nesta direção, o grupo dos signatários do manifesto em favor <strong>de</strong> Érico Veríssimo se apresenta como<br />
ao lado dos aliados, especialmente da <strong>de</strong>mocracia americana, e o grupo em torno do Pe. Fritzen <strong>é</strong><br />
<strong>de</strong>scrito como simpáticos aos regimes totalitários e autoritários do eixo. No entanto, acreditamos<br />
que essa representação carece <strong>de</strong> elementos menos circunstanciais, uma vez que esse grupo em<br />
torno do Pe. Fritzen constituiu-se como um apostolado leigo formado pelos jesuítas em seu projeto<br />
<strong>de</strong> restauração católica, e <strong>de</strong>sse modo, suas práticas têm relação com as posições que a Igreja<br />
Católica assumiu nesse contexto 10 .<br />
De todo modo, essa breve análise da esfera intelectual no período em pauta situou algumas<br />
características <strong>de</strong>sse contexto perif<strong>é</strong>rico que revelam certa configuração intelectual que <strong>de</strong>ve ser<br />
apreendida tanto em relação à estruturação dos grupos (meios <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong>, os itinerários<br />
intelectuais e os tipos <strong>de</strong> engajamentos na vida pública), quanto em relação ao conteúdo dos <strong>de</strong>bates<br />
públicos. Acredita-se, portanto, que análises com esse intuito trarão mais elementos para a<br />
compreensão da formação dos meios e círculos intelectuais que pautaram o <strong>de</strong>bate público durante<br />
o s<strong>é</strong>culo XX.<br />
10 Essas questões sobre esse grupo vêm sendo <strong>de</strong>senvolvidas na minha pesquisa <strong>de</strong> doutorado provisoriamente intitulada<br />
Religião, cultura e política: O apostolado leigo dos Jesuítas no RGS.<br />
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