• Darcio Oliveira, Ariane Abdallah e Michelle Ferreira
  • Darcio Oliveira, Ariane Abdallah e Michelle Ferreira
Atualizado em
Reprodução (Foto: Reprodução)

Em alguns minutos, as câmeras e os refletores estarão ligados. Em alguns minutos, ele entrará num estúdio para comandar, ao vivo, o programa de auditório de maior audiência da TV brasileira. Nesses poucos minutos, espera pacientemente no camarim, concentrado, repassando o roteiro escrito de próprio punho num papelzinho ordinário que carregará como um rosário durante todo o show. Trinta segundos, avisa o diretor. Três, dois... “E aí, galera! Chegando mais um Domingão na sua televisão”... Aí está Fausto Corrêa da Silva, o Faustão, 62 anos de idade, 45 de profissão, 23 de Rede Globo, tão presente nos domingos quanto a macarronada ou o futebol. Há quem se divirta com ele, há quem não o suporte, mas é difícil encontrar quem não tenha, ao menos, dado uma espiada no programa de Fausto – nem que seja com a desculpa de que estava na casa da tia avó, que adora a Dança dos Famosos. No mês de junho, seus bordões inconfundíveis foram ouvidos, em média, por 18,1 milhões de pessoas, sintonizadas no Domingão do Faustão. A audiência e a capacidade de falar para todas as classes sociais fizeram dele não apenas um comunicador de sucesso, mas um exímio vendedor. De celulares a carros chineses, de sabão em pó a geladeiras, Fausto tem o dom de transformar produtos anódinos em campeões de popularidade. É assim que engorda o lucro dos patrocinadores, os cofres da TV Globo – e, claro, o próprio patrimônio.

À primeira vista, pode-se pensar que o carisma de Faustão deve-se apenas ao fato de ocupar há tantos anos um espaço nobre da maior emissora do país. Não fossem suas qualidades, porém, ele teria sido expelido da programação há muito tempo – e talvez seu horário não fosse tão nobre assim. Mais justo é encarar a janela da TV como uma oportunidade. O que Fausto extrai dela é fruto de sua capacidade de comunicação. Nas próximas páginas, apresentamos os meios e modos como Faustão se vira nos 30. E como tantas vezes transforma os 30 em 300. Comecemos com um trava-língua que Fausto Silva ensinou a população brasileira a soletrar: Procter & Gamble, a P&G.

Estados Unidos, setembro de 2010. Fausto Silva desembarca em Cincinnati, acompanhado de Tarek Farahat, o presidente da Procter & Gamble. “Quando o convidei para ser embaixador de nossa marca, ele me disse: ‘quero conhecer o dono, falar com os funcionários, ver a empresa por dentro’”, afirma Farahat. Fausto visitou o museu P&G, o centro de pesquisa, a linha de produção, conversou com os funcionários e disse aos americanos o que já havia dito a Farahat: que embora gastasse muito em publicidade, a empresa, a seu ver, precisaria dar mais atenção ao Brasil. A P&G é a maior anunciante do mundo. No ano passado, investiu US$ 9,3 bilhões em propaganda. Ainda assim, apenas um de cada cem brasileiros conhecia a marca até aquela conversa em Cincinnati.

A cúpula da P&G já havia identificado o problema. Produtos como Oral B, Pantene, Gillette, Pampers eram conhecidos por aqui, mas os consumidores não ligavam o nome à pessoa, ou seja, não os vinculavam à Procter & Gamble (que, vamos combinar, não é exatamente um nome fácil de ser guardado pelos brasileiros). O papel de Farahat é justamente tirar a Procter do anonimato. A ideia é que a marca mãe sirva de elo para que as submarcas famosas emprestem sua credibilidade às desconhecidas. O presidente abriu o cofre – R$ 770 milhões em 2010 e quase R$ 1 bilhão em publicidade no ano passado, um recorde para a filial – e partiu para uma estratégia agressiva de comunicação. Pôs a marca no Big Brother, na Ana Maria Braga, no Luciano Huck, no programa de Rodrigo Faro, em diversos comerciais em que apareciam os produtos e um imenso logo da P&G na tela. Funcionou. Um pouco. No começo de 2010, dois em cada cem brasileiros reconheciam a marca.

Reprodução (Foto: Reprodução)

Com Faustão em cena, o reconhecimento saltou. E saltou bem. Em 2010, após a primeira promoção do avião de prêmios do Faustão (ideia do apresentador), dez em cada cem brasileiros já identificavam a marca P&G, segundo pesquisa do Instituto Ipsos. Agora, após a segunda temporada, o índice chegou a 74%. O poderoso slogan “P&G: Provou, Gostou”, na boca de Fausto, caiu nas graças da galera. “Hoje, sete em cada dez brasileiros conhecem a marca. É lógico que o Fausto não foi o único responsável por isso, mas que ele foi importantíssmo nessa nova fase da P&G, isso é indiscutível”, diz Farahat. Segundo a P&G, mais de 140 milhões de consumidores foram impactados na primeira e na segunda edição da promoção. “Fausto foi nossa alternativa para fugir do merchandising clássico. Ele é extremamente criativo. Em Cincinnati, gravou, de improviso, um vídeo sobre as qualidades e a história da P&G.” Virou peça de campanha.

Faustão trabalha assim, sem roteiro. Sérgio Amado, presidente do Grupo Ogilvy, agência que já levou JAC Motors, Magazine Luiza e Claro ao Fausto, resume dessa forma o jeitão do apresentador: “Quem sou eu para pedir que algum de nossos criativos construa um texto para o Fausto. Com ele é o seguinte: você faz uma reunião, dá o briefing e ele cria, constrói o discurso, monta para o cliente. Para o grande público, Fausto é o dono da JAC, o dono do Magazine Luiza, o dono da Claro”. E parece ser o dono da P&G. Certa vez, Faustão telefonou para Farahat avisando-o que iria conclamar a galera a entrar no site da P&G para ganhar amostras da escova de dente Oral B. Enquanto o programa rolava, a empresa registrou 400 mil visitas na página, até que o sistema travou. “É o que chamamos nos Estados Unidos de Real Time Authentic Marketing. Fausto é o rei disso”, diz Farahat.

Faustão escreve o próprio roteiro e faz do improviso uma poderosa arma de vendas. Na JAC, vivia surpreendendo os publicitários com bordões criados no set de filmagem 

E quanto vale o rei do mar­keting em tempo real? Farahat não revela as bases do contrato. Diz apenas que é um relacionamento de longo prazo. No mercado publicitário circula a informação de que a P&G teria desembolsado R$ 25 milhões anuais para ter sua imagem associada à de Fausto. Ele tem mais quatro anos de contrato com a empresa.

Faustão é hoje a celebridade mais bem paga da TV brasileira. O apresentador recebe R$ 1,5 milhão de salário fixo da Globo, participa do faturamento bruto do programa e ganha uma espécie de royalty dos merchands. Acredita-se que ele embolse algo em torno de R$ 5 milhões todos os meses só com o Domingão – sem contar os contratos individuais com as empresas que o têm como embaixador da marca. Um break de 30 segundos no Domingão sai por volta de R$ 215 mil. Um comercial chamado (em que o apresentador chama o anúncio), R$ 557,5 mil. Um testemunhal custa R$ 619,4 mil. “Mas isso é a teoria. Na prática, uma ação de merchandising no Faustão sai por R$ 1 milhão em média, mais os 15% de direitos conexos (um cachê), que sempre vai para a equipe que participou da ação – ele incluído”, afirma um publicitário. Para a Globo, o apresentador vale cada centavo de salário e patrocínio. Ele traz muito dinheiro para a emissora. Natural que ganhe bônus pela performance.

É brincadeira, bicho! (Foto: Ilustrações: Alexandre Affonso)

(Ilustrações: Alexandre Affonso)

Entrevistá-lo não é tarefa simples. Durante dois meses, tentamos chegar ao apresentador pelas vias tradicionais, falando com os produtores e com a secretária, Cláudia. Ele não respondia. Mas não perdia a simpatia. Mandava abraços públicos para “o Darcio e para a galera da Época NEGÓCIOS”... durante as videocassetadas. O jeito foi pegá-lo na saída de um restaurante em São Paulo, tarefa complicadíssima já que o apresentador troca de restaurante como quem troca de camisa – sempre exageradamente coloridas, já que falamos delas. Demos sorte numa churrascaria chique na Zona Sul de São Paulo. Foi um papo rápido com o garoto-propaganda mais cobiçado do país. “Não sou garoto-propaganda. Garoto-propaganda é aquele que grava o texto do comercial, fala rigorosamente o que está escrito e encerra ali o seu compromisso. Eu me envolvo com a empresa. O fato de eu me envolver significa que fico conhecendo cada vez mais as características do produto, a história da companhia e, por outro lado, acabo ajudando na criação e na execução da campanha publicitária”, disse Faustão. “Eu recebo duas dezenas de consultas por mês, mas sempre tento escolher produtos que tenham a ver comigo.”

Um ex-diretor de TV ironizou essa história de Fausto escolher produtos que tenham a ver com ele. “O cara adora máquinas como Aston Martin e Jaguar. Será que o chinês JAC tem mesmo a ver com ele? É brincadeira, bicho”, diz ele, repetindo, em tom de blague, um dos bordões do apresentador. Faustão diz que tem a ver, sim, pelo simples motivo de gostar de carros, sejam eles de R$ 37,9 mil ou de R$ 1 milhão. Sorte de Sergio Habib, o dono da JAC Motors do Brasil. “Ele foi e está sendo extremamente importante para nosso sucesso”, diz Habib. “Os consumidores entram em nossa concessionária e pedem para ver o carro do Faustão.” Habib conta que a ideia de usar o bordão “JAC, o completão” (o JAC vem de fábrica com acessórios que outras montadoras oferecem apenas como opcionais) foi de Fausto, no improviso. Assim como o “Quem tem gosta, quem entende recomenda”, criado depois de uma revista automotiva eleger o JAC como a compra do ano. A marca ainda tem um longo caminho pela frente no mercado brasileiro. “Mas sem o Fausto seria mais caro e mais difícil para a JAC”, diz Amado.

Foi ele quem sugeriu a contratação do apresentador do Domingão. Habib estava mais inclinado a fechar com um astro internacional, como George Clooney ou Jackie Chan. Acabou cedendo aos apelos de Amado, ainda que o passe de Faustão fosse maior que a soma dos cachês dos dois (em 2009, o cachê de Clooney era de US$ 2 milhões e o de Chan, próximo disso. Estima-se que o brasileiro tenha cobrado algo em torno de US$ 6 milhões para emprestar seu nome à JAC). Como de hábito, Faustão pediu para conhecer a sede, os funcionários, visitar o departamento de engenharia, as obras das concessionárias. E quis se aproximar de Habib fora do ambiente corporativo, saber da sua vida, de seus valores. Tornaram-se amigos. Não há uma semana em que os dois não saiam para almoçar ou jantar.

Em quase todos os casos, Fausto acaba criando uma relação de amizade com os empresários que o contratam. “É inevitável, eu me envolvo de verdade com a empresa e prezo muito esse tipo de relacionamento”, diz o apresentador. Foi ele quem incentivou Luiza Trajano a seguir o seu exemplo e fazer uma cirurgia de redução de estômago. Ligava toda semana para a empresária e provocava: “Vai fazer ou não? Faz logo”. Luiza acabou se submetendo à cirurgia, e Fausto lhe presenteou com uma cesta cheia de produtos “pastosos”, como cream-cheese, seguindo a exigência médica do período pós-cirúrgico. “Quem vê na televisão aquele homão, cortando a fala dos outros, não imagina o carinho que ele tem com as pessoas”, afirma a dona do Magazine. Luiz Fernando Musa, CEO da Ogilvy & Mather, amigo recente de Fausto, também dá o seu testemunho: “Fausto diz que eu me visto de forma desleixada. Aí me traz um caminhão de roupas de presente. O cara virou meu personal stylist, fazer o quê?”.

Olha a fera aí! (Foto: TV GLOBO/Zé Paulo Cardeal)

Olha a fera aí! (Foto: TV GLOBO/Zé Paulo Cardeal)

Antes de assinar com o dono da JAC o apresentador pediu para testar um J3 durante uma semana. E acompanhou, por meio de telefonemas diários a Luiz Musa, o desempenho do carro na viagem teste que a equipe da Ogilvy fez do Chile até o Brasil – experiência que acabou virando um documentário. Ali, Fausto se convenceu de que poderia representar a JAC. O primeiro comercial da marca foi filmado no pavilhão da Bienal, no Ibirapuera, em São Paulo. Fausto vinha do Rio e chegou ao set de filmagem por volta das 8 e meia da noite. Gravou até as três da manhã. Habib o acompanhou na jornada. “Ele gravava, via o resultado e, se não gostasse desta ou daquela cena, pedia para repetir, até que ficasse bom. Fazia isso sempre com a mesma energia. Quando acabamos, convidei-o para comer alguma coisa e ele me disse que precisava dormir um pouco porque dali a seis horas teria uma reunião com o Magazine Luiza.”

Fausto Silva chega ao estúdio da Globo às 13h. Quem conta é o funcionário que cuidava da recepção, no domingo em que estivemos no programa. “Ele sempre chega cedo e vai embora assim que termina o show”, diz. Faustão é conhecido por porteiros e seguranças da filial paulistana da emissora como o cara que oferece as caixinhas mais gordas. Mas distribui notas com discrição. Não sorri à toa e passa sempre rapidamente pelos corredores, sem dar brecha para abordagem. A atitude pode ser reflexo de timidez, apontada por amigos como Luiza Trajano e o cantor Agnaldo Rayol. Pode ser também o tal do profissionalismo, arrisca o recepcionista. Dia desses, ele conta, o Fausto ficou uma fera com o Luan Santana. Era um sábado e o programa seria excepcionalmente gravado (e não transmitido ao vivo), em função da agenda do cantor. O garoto, no auge da popularidade, seria uma das atrações do Domingão. Chegou mais de uma hora atrasado. Fausto enlouqueceu. “Quando o Luan chegou, ele deu uma bronca na frente de todo mundo. Apontava o dedo e falava sobre a importância do compromisso. O Luan abaixou a cabeça e ficou quietinho, como quem leva um pito do pai”, afirma o funcionário.

R$979 milhões foi quanto a P&G gastou em publicidade em 2011. Além de Fausto, contratou Luciano Huck, Rodrigo Faro e Ana
Maria Braga  

Tanto naquele dia quanto no da nossa visita, o programa aconteceu em São Paulo – desde 2006, a transmissão se alterna: em um domingo é feita do Projac, no Rio de Janeiro, em outro no estúdio E, da Rede Globo paulistana. A emissora mantém um jatinho executivo para o apresentador cruzar a ponte aérea e libera um helicóptero para levá-lo aos estúdios. Cerca de uma hora antes de o programa começar, o público é convidado a ocupar as cadeiras do auditório. Mas o show mesmo tem início às 18h, quando Fausto Silva entra em cena, microfone em punho, um festival de bordões. Mesmo de perto, o apresentador parece estar na telinha. Não se aproxima e não interage com a plateia nos intervalos. Nem ao final do programa.

O máximo de interação com o público acontece quando as câmeras estão ligadas. São as piadas tradicionais do apresentador, que brinca também com o contrarregra e com o famoso Caçulinha. Naquele dia, Fausto tirou sarro dos convidados que aplaudiram quando ele apresentou a história de uma mãe que não via os filhos havia 40 anos. “Ô loco, eu falo uma tragédia dessas e vocês aplaudem? Depois eu é que sou xarope.” Todos riram. Ele mesmo continuou sério. Fausto é chamado pelos amigos de “generoso”, “simples”, “humano”. Mas “simpático” é uma palavra que ninguém usa para descrevê-lo. Alguns atores globais, que fazem parte do elenco de novelas atuais e, vira e mexe, são convidados para quadros como Arquivo Confidencial ou Dança dos Famosos, dizem não ter proximidade com o apresentador. Mas muitos já foram convidados para sua famosa pizzada, evento que acontece várias vezes por mês no salão de sua casa, em São Paulo, há mais de uma década.

Fausto no palco:  23 anos de TV Globo e 18 milhões de telespectadores, em média, nos domingos de junho (Foto: TV GLOBO/Zé Paulo Cardeal)

Fausto no palco: 23 anos de TV Globo e 18 milhões de telespectadores, em média, nos domingos de junho (Foto: TV GLOBO/Zé Paulo Cardeal)

MARGHERITA E CALABRESA
As pizzadas do Faustão reúnem cerca de 50 convidados, entre médicos, empresários, jogadores de futebol, artistas e familiares. Durante nove anos – de 1999 a 2008 – quem comandava o forno a lenha era Ismael Silva, que ficou conhecido como “pizzaiolo do Faustão”. Ismael trabalhava na pizzaria paulistana Monte Verde havia 16 anos, quando um colega garçom o convidou para conhecer a casa de Fausto. A partir de então, a vida deste cearense tomou outro rumo. “Eu ganhava R$ 1,2 mil na pizzaria, mas larguei para trabalhar só com o Fausto. Ele se encarregava de todos os ingredientes, pagava apenas pela mão de obra e ainda dava caixinha. A última que recebi foi de R$ 800. Nessa época, ele me chamava até três vezes na semana”, diz.

Do forno, ele observava que o apresentador comia um ou, no máximo, dois pedaços de pizza por noite – mesmo antes de passar pela cirurgia de redução de estômago. Os sabores, em geral, eram margherita e calabresa. Quanto à bebida, só via o patrão tomar água de coco. Há oito meses, Ismael não é mais responsável pelos eventos, mas reforça a gratidão a Fausto. “Ganhei fama porque ele sempre deixou eu me apresentar como pizzaiolo do Faustão.” Hoje, Ismael é dono de um bufê. Entre funcionários diretos e indiretos, tem uma equipe de 80 pessoas e faz em média 45 eventos por mês. Uma festa como a que ele promovia na casa de Fausto sai por R$ 2,58 mil.

R$1 milhão é o preço de um merchandising no Domingão, segundo informações do mercado publicitário. A Globo não divulga sua tabela
de preços   

Logo que começou a fazer parcerias comerciais com Faustão, Luiza Trajano e sua família viraram frequentadores das famosas pizzadas. Mas, num primeiro momento, o contato foi estritamente profissional. O departamento de marketing do Magazine Luiza, empresa que nasceu e fez fama no interior de São Paulo, procurava uma porta de entrada para a capital paulista. “Pensamos: qual programa se adequa ao perfil do nosso público? Aí veio a ideia de tentar o Fausto”, diz ela. A primeira tentativa, em 2005, revelou-se frustrada. Naquele tempo a empresa ainda não tinha condições financeiras de pagar o cachê do apresentador global. A saída foi investir em Gugu Liberato, que comandava o Domingo Legal, no SBT. Segundo Frederico Trajano, filho de Luiza e diretor de vendas e marketing do Magazine, Fausto custava cinco vezes mais do que o garoto-propaganda Gugu.

Em 2006, aproveitando o crescimento da marca, a equipe de Luiza finalmente conseguiu entrar para o “clube do Faustão”. Duas campanhas foram especialmente bem-sucedidas: a comemoração de meio século de existência do Magazine com a promoção 50 anos, 50 casas (os consumidores eram premiados com casas) e o Caminhão do Faustão (que dava aos contemplados um “caminhão” de eletroeletrônicos). “Fechar com ele foi um tiro certeiro. Nossos estudos de reconhecimento de marca demonstram isso”, diz Frederico. Eis o efeito Fausto:

:: Uma pesquisa com 2.960 consumidores em nove importantes mercados brasileiros revelou que as pessoas que assistiam ao programa tinham um conhecimento espontâneo da marca 38% acima daquelas que não viam o Domingão. Cabe lembrar que a empresa tem outras ações publicitárias.

:: Em 2011, 76% das pessoas sintonizadas no Domingão associavam Fausto à marca Magazine Luiza, índice 2,3 vezes superior à segunda marca citada (JAC Motors) e 5,3 vezes mais que a 3ª marca citada (Claro). A pesquisa foi feita com 1.362 consumidores.

:: Uma pesquisa feita em 2009 com 250 consumidores revelou importantes atributos das campanhas: “confiável” / “voltada para a família” / “verdadeira”. Faustão foi considerado um eficiente porta-voz para a marca.

Quem não tem Fausto vai de Gugu. Foi o que fez o Magazine Luiza em 2005. Naquele tempo, a rede ainda não tinha condições de contratar o apresentador da Globo 

Do lado de lá do balcão, um dos “efeitos Fausto Silva” foi a mudança da precificação dos produtos. “Quando viu valores como R$ 1,99, R$ 3,49 em alguns de nossos itens, ele falou que era enganação. Então mudamos tudo para números redondos, como R$ 2 e R$ 3,50”, diz Luiza. Ele também fez isso com a JAC. Ao saber da intenção de Habib de fixar o preço do J3 em R$ 37,99 mil, ele disse: “Pra que esses 90? R$ 37,9 mil é melhor”. Habib concordou.

Fausto é o único profissional que por seis anos seguidos fez propaganda da marca Magazine Luiza. Afinal, cumpriu com mérito a missão de abrir as portas para a rede em novas regiões. Luiza não se cansa de dizer que com ele foi bem mais fácil chegar à Grande São Paulo e ao Nordeste. Uma grande vantagem, segundo Frederico, foi ter ampliado o número de lojas mantendo os mesmos gastos com publicidade desde 2006. O Magazine continua investindo em mídia um décimo do que investe a principal concorrente, a Casas Bahia. Em 2011, foram R$ 100 milhões, ante R$ 1, 2 bilhão da rival.

Luiza continua com promoções no programa de Fausto, mas ele não é mais o “embaixador” de sua empresa. Faustão, segundo Frederico, quis diminuir a alta exposição a que uma campanha de varejo o submetia. Pessoas próximas afirmam que ele teria pedido mais de R$ 15 milhões para assinar o novo contrato e Luiza declinou – não estaria disposta a mexer em seu orçamento publicitário. Sem confirmar cifras, ela diz que “a decisão não foi tomada só por causa de dinheiro. Foram outros motivos, e continuamos amigos”.


Silvio Santos (Foto: Divulgação)

Em 1989, Silvio Santos se disse surpreso por
um apresentador como Fausto Silva ser contratado 
pela Globo. E Fausto lhe tomou o domingo


PERDIDOS NA NOITE
Faustão trabalha muito. Parece respirar marketing. Mas não é só a dedicação que explica o fenômeno. Cida Coelho, fonoaudióloga de famosos, como o jogador Neymar, lembra que o poder de comunicação é formado principalmente por atributos não verbais. “Do total daquilo que usamos para nos comunicar apenas 7% depende das palavras (verbal). Os outros 93% dividem-se em psicodinâmica vocal (tom, intensidade, ressonância, velocidade, articulação, pausas, ênfases) e linguagem corporal.” Segundo ela, os bons comunicadores desenvolvem bastante essa parte não verbal. É o que ocorre com Fausto (leia quadro). “Ele se destaca pela intensidade da voz, articulação vocal e expressões faciais.” Reinaldo Polito, professor de oratória, segue na mesma linha. Diz que Fausto tem um conjunto harmonioso de inflexão de voz e expressão corporal e sabe dizer as coisas de modo simples e objetivo – além de ter uma invejável presença de espírito.

Simples, objetivo, espirituoso. Fausto trouxe do rádio essas qualidades. Começou a carreira aos 15 anos na rádio Centenário de Araras e, logo depois, viraria locutor na rádio Cultura de Campinas. Chegou a fazer faculdade de direito em São Paulo, na PUC, mas abandonou o curso no quarto ano (imagine Faustão de terno e gravata, num tribunal. Ô loco...) Faculdade às favas, ele voltou ao rádio: primeiro na Record, depois na Jovem Pan, como repórter esportivo. Também trabalhou no jornal O Estado de S. Paulo, cobrindo futebol. O grande salto veio com o programa Balancê na rádio Excelsior de São Paulo, antes pilotado por Osmar Santos.

US$2 milhões era o cachê de George Clooney, cogitado para ser garoto-propaganda da JAC. Estima-se que Fausto tenha custado o triplo disto 

“O Fausto sempre foi muito divertido. Quando a gente estava na equipe de esportes de Osmar Santos, o maxilar doía de tanto rir”, diz Lucimara Parisi, ex-secretária da rádio Globo que foi produtora dos programas de Fausto durante 30 anos. No Balancê, ele recebia artistas de teatro e televisão, políticos e humoristas, como Nelson Tatá Alexandre e Carlos Roberto Escova. O jeito escrachado de Fausto começava a tomar forma e a audiência subia exponencialmente. Em pouco tempo a gravação do Balancê saía do estúdio para um teatro, no formato de programa de auditório. Dali para a televisão foi um pulo.

Nascia então o Perdidos na Noite, programa que ia ao ar nas madrugadas de sábado – primeiro pela TV Gazeta, depois na Record, até chegar à Bandeirantes. Ali, sem qualquer produção, no palco de um teatro no centro de São Paulo, Fausto recebia bandas de rock que tocavam ao vivo (o bordão “quem sabe faz ao vivo” vem daí), artistas e políticos que podiam falar o que bem entendessem. Não havia roteiro. Nem pudor. Era Fausto em estado bruto. “Não tá gostando, meu? Muda de canal, tá passando um filmão na Globo”, dizia, debochado. Anos depois, ele mudou de canal.


Ronaldo (Foto: Divulgação)

As pizzadas na casa dele reúnem artistas, jogadores
de futebol e empresários. Foi num desses encontros
que ele sugeriu a Ronaldo a ideia de montar a 9ine   


Filho de uma família de classe média alta – o pai, Amaury, era economista e a mãe, Cordélia, professora –, Fausto conta que teve uma infância e juventude confortáveis. Cresceu cercado de irmãs – são quatro – e rodeado por livros, influência direta da mãe. Leitura é um hábito que o apresentador conserva até hoje. “Fausto lê de tudo. Os principais jornais do país, revistas, romances, biografias e acompanha a internet. Ele é incrivelmente antenado”, afirma Ivan Zurita, presidente do Conselho Consultivo da Nestlé e amigo do apresentador. Ambos cresceram em Araras, estudaram no mesmo colégio (dona Cordélia foi professora de Zurita), e jogaram bola no mesmo time. Fausto, sempre gordinho, ia pro gol. “Ela era muito conversador e muito bem articulado. Dizíamos que era o orador da turma. Deu no que deu”, diz Zurita, a quem Fausto ainda chama de Fábio, seu nome do meio, pelo qual é conhecido em Araras. Os filhos de Fausto – Lara (14 anos), do primeiro casamento, com a modelo Magda Colares, e João Guilherme (8) e Rodrigo (4), da atual mulher, Luciana – são amigos da neta de Zurita. “Fábio” e Fausto sempre se encontram para relembrar os bons tempos de Araras.

Ele tentou a carreira de advogado, mas abandonou a faculdade para se dedicar ao jornalismo esportivo. Alguém consegue imaginar Faustão num tribunal?

Faustão pilotou duas campanhas para Zurita: 80 anos de Nestlé, 80 casas para Você e Junta Brasil – uma tabelinha entre Fausto e Gugu. Um fazia o link para o outro ao vivo, algo inédito na TV brasileira, para premiar os consumidores. O número de cartas recebidas durante a promoção (de abril a dezembro de 2003) foi bem expressivo: 50,5 milhões. Cada envelope continha oito embalagens de produtos Nestlé. Houve também uma quantidade recorde de contatos de consumidores com a central de atendimento da empresa: média de 10 mil por dia, dez vezes mais que o normal. Zurita conta que o Junta Brasil nasceu da necessidade de ampliar o alcance da Nestlé. A empresa tinha uma imagem elitista e precisava conquistar as classes C, D e E – sem abandonar a A e a B. “Quem poderia nos ajudar a transmitir essa mensagem ao público? Alguém como o Faustão, que se adapta a qualquer palco”, diz Zurita. “Hoje, temos 99% de penetração nos domicílios brasileiros. Isso é fruto de uma presença forte nos pontos de venda e de uma estratégia bem articulada de marketing e propaganda.”

Ainda hoje, mesmo sem ter nenhum contrato em andamento, os dois costumam falar de negócios. “Ele faz sugestões para campanhas e produtos e eu também dou pitacos. Outro dia liguei para ele dizendo que a campanha de determinada empresa estava muito decoradinha, que não combinava com ele [Zurita se recusa a nomear a empresa]. Ele concordou. Nem preciso dizer que o contrato não durou muito. Foi uma das poucas ações publicitárias que não deram certo com o Fausto.”

Fausto começou a se destacar no Balancê, da rádio Excelsior, e logo criaria o Perdidos na Noite, um programa alternativo adorado pelos jovens. Dali para a Globo foi um pulo 

O amigo de infância de Zurita não coleciona apenas vitórias. Entre 1998 e 2002, Fausto registrou sua pior fase na era Globo. Levava uma surra do rival Gugu e houve momentos em que a audiência chegou a 11 pontos no Ibope, pouco para um programa que fica três horas no ar num dia e horário em que, geralmente, as pessoas estão em casa. Foi então que Fausto cometeu seu pior erro: apelou para o grotesco na tentativa desesperada de levantar a audiência. Incluiu no programa o Sushi erótico – quadro em que os atores degustavam comida japonesa sobre o corpo de modelos nuas – e explorou a imagem de Rafael Pereira dos Santos, o Latininho, então um garoto de 15 anos com problemas mentais e portador de uma deficiência de crescimento. Na época, Fausto admitiu a mancada. “Eu deixava as coisas correrem soltas. Agora, mergulho na produção para evitar que isso ocorra novamente.” Com quadros mais moderados, voltados à família, a audiência subiu, estabilizando-se na casa dos 18 pontos nos últimos anos. No final de 2011, a luz amarela piscou novamente, sinalizando nova queda: 17,1 pontos no Ibope, ainda assim maior que a soma da audiência dos dois principais rivais. Fausto diz que o mercado todo sentiu. Além de brigar com a concorrência, todo mundo teve de enfrentar TV paga, DVD, internet e outras formas de lazer que chegaram às classes C e D. Desta vez a Globo agiu rápido, contratando o ex-diretor de núcleo de artistas da Band, Hélio Vargas (conhecido como “Senhor do Auditório”), para comandar o programa em 2012. A média do ano está em 18,25 pontos, com 36% de participação de audiência nacional – de cada 100 domicílios com TV ligada no Brasil 36 estavam sintonizados no Domingão.

Às vezes, Fausto também exagera na dose de irreverência. No mês passado ele e a TV Globo foram condenados a pagar R$ 40 mil de indenização à consultora de moda Ana Lúcia Zambon, por ofensa no Domingão do Faustão. Durante o programa, Fausto entrevistava a atriz Carolina Dieckmann sobre padrões estéticos. Foi quando exibiu a imagem da modelo Gisele Bündchen ao lado de uma imagem de Ana Lúcia. Comparando as duas, disse que a consultora era a Gisele Bucho. O advogado Luiz Aranha Neto, que representa Fausto e a Globo, afirmou que irá recorrer da decisão em relação ao valor. Mas não discutiu o mérito. “Se errou, Fausto vai reparar o erro”, diz um amigo.


Shutterstock (Foto: Shutterstock)


Faustão costuma telefonar para os amigos publicitários quando não gosta de alguma campanha, mesmo que não tenha a ver com ele  


Fausto Silva começou a carreira no rádio... (Foto:  O Globo; Cedoc TV Bandeirantes; TV Globo/Zé Paulo Cardeal)

Fausto Silva começou a carreira no rádio, como locutor e depois como repórter esportivo. Nos anos 80, teve a sorte de pegar um dos períodos mais férteis do futebol brasileiro. “Dava gosto entrevistar craques como Sócrates”, ele diz. Ao lado, com Mário Covas, no programa Perdidos na Noite, da Band, gravado em um teatro de São Paulo. Era o nascimento de Fausto Silva na TV. Antes de sua estreia na Globo, uma palhinha no programa da Xuxa. E hoje, no comando do Domingão, o programa de auditório de maior audiência do país   (Foto: O Globo; Cedoc TV Bandeirantes; TV Globo/Zé Paulo Cardeal)

BUQUÊ E GRAMPO DE OURO
Fausto afirma ter uma relação tranquila com o dinheiro. Costuma dizer que veio de uma família relativamente bem posicionada e por isso já chegou à TV vacinado contra a praga do deslumbramento financeiro. Ele gosta de gastar com sapatos, camisas, relógios e automóveis. E com viagens à Itália, ao menos uma vez por ano, onde geralmente renova seu guarda-roupa. “Ele sempre gostou de lá, principalmente dos restaurantes. Mas agora que é um ex-gordinho e está comendo bem menos, se concentra mais nas lojas da Itália”, afirma Vicente Raiola, dono de uma fabricante de alimentos e padrinho de casamento do apresentador (o “rei da azeitona”, segundo Fausto). Esse é o lado mais visível de seus gastos.

Ele dá apartamento, carro e até dinheiro para amigos em dificuldade. “Não tem de ajudar só pobre. Tem de ajudar quem tem, para que o cara fique melhor”, diz  

Mas existe um outro. Quando chega o Natal, Fausto Silva é tido como um “anjo da guarda” do Retiro dos Artistas, instituição carioca que abriga artistas idosos com dificuldades financeiras. Faz 13 anos que é assim, período em que Cida Cabral está à frente da administração da casa. Ela conta que Fausto e o cantor Roberto Carlos são os responsáveis pelas doações mais significativas. Em 2011, Fausto depositou R$ 60 mil na conta do Retiro. A mão aberta também alcança os amigos. Ficou famosa no meio artístico a ajuda que ele deu a Clodovil Hernandes. Em 2008, ao saber que Clodovil enfrentava uma fase financeira difícil, Faustão lhe enviou um buquê de flores e R$ 40 mil em notas graúdas, presas por um grampo de ouro. No cartão, escrito à mão, lia-se: “Não é dinheiro. É um presente de um amigo”. Também preparou uma festa em sua casa para Dercy Gonçalves comemorar 100 anos e repetiu a dose no aniversário de 101 da atriz. O amigo Agnaldo Rayol cantou para os convidados nas duas ocasiões. “Ele dá festas, dá carro, apartamento, ajuda financeiramente. Quando eu estava na produção do Domingão, ele dizia: ‘vamos ajudar aquele lá. Não tem de ajudar só pobre, tem de ajudar quem tem também, para que o cara fique melhor’”, diz Lucimara Parisi. É o arquivo confidencial de Fausto Silva. 


Reprodução (Foto: Reprodução)

Itália Mia... O apresentador sempre gostou da Itália. É lá que ele renova o guarda-roupa e compra as camisas coloridas que “saltam” na telinha todos os domingos 


Colaborou André Vieira

Ao lado da mulher... (Foto: Arquivo; O Globo)

Ao lado da mulher, Luciana (à esq. dele), de Lucimara Parisi, ex-produtora do Domingão, e do maestro Caçulinha. Com a atriz e humorista Dercy Gonçalves, para quem preparou uma megafesta de aniversário de 100 anos em sua casa – com direito a show particular de Agnaldo Rayol. Abaixo, um abraço nos amigos Zezé Di Camargo, Vanessa e Luciano. E no sambódromo, com a ex-mulher Magda Colares, com quem teve a primeira filha, Lara (hoje com14 anos). Do casamento com Luciana, Fausto tem mais dois filhos: João Guilherme (4) e Rodrigo (8) (Foto: Arquivo; O Globo)  


Arquivo confidencial 
Eles começaram como clientes e viraram amigos. Fausto diz que é inevitável essa relação, pois se envolve de verdade com a empresa e com quem o contrata. Olha o que a clientela anda falando do apresentador: