Política Crise na Segurança

Atlas da Violência 2018: Brasil tem taxa de homicídio 30 vezes maior do que Europa

Segundo relatório, mais de meio milhão de pessoas foram assassinadas no país na última década

Grupo organiza ato em memória às 19 vítimas da chacina de Osasco e Barueri enfileirando sacos plásticos em formato de corpos na frente do Masp, na Avenida Paulista
Foto: ONG Rio de Paz / Divulgação
Grupo organiza ato em memória às 19 vítimas da chacina de Osasco e Barueri enfileirando sacos plásticos em formato de corpos na frente do Masp, na Avenida Paulista Foto: ONG Rio de Paz / Divulgação

RIO — Em 2016, pela primeira vez na história, o número de homicídios no Brasil superou a casa dos 60 mil em um ano. De acordo com o Atlas da Violência de 2018 , produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o número de 62.517 assassinatos cometidos no país em 2016 coloca o Brasil em um patamar 30 vezes maior do que o da Europa. Só na última década, 553 mil brasileiros perderam a vida por morte violenta. Ou seja, um total de 153 mortes por dia.

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Os homicídios, segundo o Ipea, equivalem à queda de um Boieng 737 lotado diariamente. Representam quase 10% do total das mortes no país e atingem principalmente os homens jovens: 56,5% de óbitos dos brasileiros entre 15 e 19 anos foram mortes violentas.

DOCUMENTÁRIO: A guerra do Brasil

O número de mortes violentas é também um retrato da desigualdade racial no país, onde 71,5% das pessoas assassinadas são negras ou pardas.

O impacto das armas de fogo também chega a níveis elevados no país, que tem medições sobre mortes causadas por disparos desde 1980. Se naquela época a proporção dos homicídios causados por armas de fogo girava na casa dos 40%, desde 2003 o número se mantém em 71,6%.

O mapa dos homicídios
Variação entre 2006 e 2016, por UF
RR
+44,2
AP
+48,5
AM
+71,9
RN
PA
CE
MA
+74,4
+256,9
+121,0
+86,3
PB
PI
PE
+48,8
+58,5
AC
-10,2
+93,2
TO
AL
RO
+2,0
+119,0
+5,1
SE
BA
+121,1
MT
+97,8
+13,8
DF
-7,8
GO
+72,2
MG
ES
MS
+2,7
-37,2
-15,8
SP
Evolução da taxa 2006-2016
RJ
-46,7
-23,4
Estados com aumento
no período
PR
-8,1
Estados com
redução
SC
+27,4
Variação
Brasil
+ 14%
RS
+58,0
Fonte: Atlas da Violência 2018/Ipea e FBSP
O mapa dos homicídios
Variação entre 2006 e 2016, por UF
256,9%
121,1%
121,0%
119,0%
97,8%
93,2%
86,3%
74,4%
72,2%
71,9%
58,5%
58,0%
48,8%
48,5%
44,2%
27,4%
14,0%
13,8%
5,1%
2,7%
2,0%
-7,8%
-8,1%
-10,2%
-15,8%
-23,4%
-37,2%
-46,7%
Fonte: Atlas da Violência 2018/Ipea e FBSP

REALIDADES DISTINTAS

Apesar dos números alarmantes em nível nacional, a disparidade entre as Unidades da Federação chama mais atenção ainda. Basta comparar a redução da taxa de homicídios na última década em estados como São Paulo (-46,7%), Espírito Santo (-37,2%) e Rio de Janeiro (-23,4%) com o crescimento de outros como Rio Grande do Norte (256,9%), Acre (93,2%), Rio Grande do Sul (58,8%) e Maranhão (121,0%).

As diferenças se dão também em níveis regionais. Em 2016, a taxa de homicídios por 100 mil habitantes chegou a quase 45 nos estados do Nordeste e Norte. No Sudeste, por outro lado, o valor ficava na casa dos 20, um pouco abaixo dos 25 alcançados pelos estados do Sul.

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As reduções, porém, não significam que a situação em todos os estados seja de declínio constante. Basta analisar o caso do Rio de Janeiro, que entre 2015 e 2016 viu crescer em 18,8% a taxa dos homicídios. Ou do Ceará, que, apesar de ter aumentado em 86,3% nos últimos 10 anos, conseguiu uma diminuição percentual 13,1% na taxa de homicidos durante o último ano analisado.

JUVENTUDE PERDIDA

Dentre os afetados pela crescente no número de homicídios no Brasil, um grupo de destaca: o dos jovens. Representando 53,7% das vítimas totais no país (ou seja, 33.590 óbitos), eles ainda são majoritariamente homens. Mais especificamente, 94,6% deles são homens.

O caso é histórico, com os jovens entre 15 e 29 anos sendo a principal fatia da população afetada pelos assassinatos violentos, o que não significa que o número não tem sofrido aumentos no período analisado pelo Atlas da Violência.

Na década entre 2006 e 2016, o Brasil assistiu a um aumento de 23,3% nos assassinatos de seus jovens. Homicídio é a causa de 49,1% das mortes de jovens entre 15 e 19 anos, e 46% das mortes entre 20 a 24 anos. Esse índice é bem diferente do grupo de brasileiros entre 45 e 49 anos, por exemplo, que é de 5,5%.

Proporção de óbitos causados por homicídios
Números de 2016
49,1%
46%
36,1%
26,4%
17,1%
13,2%
10,1%
9,7%
5,5%
3%
1,7%
1%
0,5%
Média
25-29
anos
40-44
anos
45-49
anos
50-54
anos
55-59
anos
60-64
anos
65-69
anos
10-14
anos
15-19
anos
20-24
anos
30-34
anos
35-39
anos
Fonte: MS/SVS/CGIAE - Sistema de Informações sobre Mortalidade - SIM. *Considerando as agressões e intervenções legais. Não foram levados em conta os óbitos em que o sexo da vítima era ignorado. Elaboração Diest/Ipea e FBSP.
Proporção de óbitos causados por homicídios
Números de 2016
49,1%
46%
36,1%
26,4%
17,1%
13,2%
10,1%
9,7%
5,5%
3%
1,7%
1%
0,5%
Fonte: MS/SVS/CGIAE - Sistema de Informações sobre Mortalidade - SIM. *Considerando as agressões e intervenções legais. Não foram levados em conta os óbitos em que o sexo da vítima era ignorado. Elaboração Diest/Ipea e FBSP.

MAIS MORTES POR TIROS

De 1980 até 2016, quase um milhão de brasileiros perdeu a vida por conta de armas de fogo. As 910 mil pessoas mortas por perfuração causada por disparos são, segundo o Atlas da Violência, vítimas de uma questão "central" do país.

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Com um total de 71,1% de homicídios cometidos com uso de armas de fogo (taxa que cresceu por décadas até 2003, ano da criação do estatuto do desarmamento), o Brasil deixou de ocupar um patamar próximo ao dos vizinhos Chile (37,3%) e Uruguai (46,5%) e hoje se aproxima à El Salvador (76,9%) e Honduras (83,4%). Na Europa, a média é 19,3%.

VEJA: Qual é o número de mortes no seu município?

A relação entre o número de armas de fogo e as mortes violentas, segundo o relatório, é clara. Para ele, sem a atual legislação que impõe restrições às armas, "a taxa de homicídios seria ainda maior que a observada". Isso porque as cidades que mais tiveram aumentos nos homicídios totais também foram que sofreram com maior crescimento de óbitos causados por disparos.

Mortes por arma de fogo no Brasil
De 2006 a 2016
Variação de 2006 a 2016
27,4%
44.475
42.755
41.817
40.369
40.077
36.624
36.792
35.676
34.921
34.147
36.737
2006
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2007
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM. O número de homicídios na UF de residência foi obtido pela soma das seguintes CIDs 10: X93-X95, ou seja: óbitos causados por agressão por disparo de arma de fogo. Elaboração Diest/Ipea e FBSP.
Mortes por arma de fogo no Brasil
De 2006 a 2016
Variação de
2006 a 2016
44.475
27,4%
42.755
40.077
34.921
36.737
34.147
2006
07
2016
08
09
10
11
12
13
14
15
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM. O número de homicídios na UF de residência foi obtido pela soma das seguintes CIDs 10: X93-X95, ou seja: óbitos causados por agressão por disparo de arma de fogo. Elaboração Diest/Ipea e FBSP.