Rio Bairros

Histórias do velho Mário Filho

Torcedores relembram jogos inesquecíveis no Maracanã, nos tempos em que o estádio recebia mais de cem mil

Abarrotado. Era comum ver o Maracanã lotado, como nesse jogo do Brasil contra o Paraguai em 1985, que recebeu mais de 140 mil pessoas
Foto: Arquivo O Globo / Anibal Philot/ 23-06-1985
Abarrotado. Era comum ver o Maracanã lotado, como nesse jogo do Brasil contra o Paraguai em 1985, que recebeu mais de 140 mil pessoas Foto: Arquivo O Globo / Anibal Philot/ 23-06-1985

RIO - Depois de quase três anos de obras, a fim de se adequar ao padrão Fifa e poder sediar jogos da Copa do Mundo de 2014, o sessentão Estádio Mário Filho está aberto para a torcida carioca. O novo templo do futebol ficou mais confortável, seguro e moderno. Mas muitos torcedores ainda não se acostumaram com o atual modelo e morrem de saudades dos tempos em que o Maracanã recebia mais de cem mil espectadores. Eles lembram os momentos de grande emoção que viveram quando o então maior estádio do mundo era uma segunda casa.

Um ex-frequentador assíduo, o professor de História Luiz Antônio Simas, de 45 anos, morador da Rua Lúcio de Mendonça, está desanimado.

— O Maracanã deixou de ser único, para ser mais um. Está igual a qualquer arena europeia. Ele era amplo, imenso e foi totalmente recauchutado. Sua identidade foi jogada no lixo, por mais que a fachada e as rampas de acesso originais tenham permanecido — lamenta.

Botafoguense, ele relembra seu jogo inesquecível:

— O fim do jejum de títulos, em 1989, contra o Flamengo marcou muito. Eu estava na geral.

Um outro fã que gosta de lembrar os tempos áureos do Maracanã é Bruno Ferreira, de 35 anos, morador da Rua dos Artistas. Tricolor e ex-geraldino de carteirinha, teme que o Maracanã se torne um espaço apenas para a elite e, consequentemente, mais frio e distantes dos times.

— Com a privatização, os preços ficaram muito caros, afastando quem tem menos condição financeira. Isso não pode acontecer. O Maraca sempre foi de todas as classes sociais — critica.

Ele confessa que um dos dias mais tristes da sua vida foi quando fecharam a geral, em 2005:

— Eu vou contar aos meus netos que fui ao último jogo da história da geral do estádio. Foi Fluminense 2 x 1 São Paulo. A vitória não importou muito. Todo mundo só pensava que nunca mais teríamos o setor. Foi duro.

O vascaíno Luan Pires, de 28 anos, morador do Grajaú, gostava mesmo era de frequentar a arquibancada, de preferência lotada.

— Além da visão privilegiada, o que marcava era o calor da massa. Lá, a gente sentia o estádio balançar, literalmente — afirma.

Ele comenta uma partida que sempre guardará na memória:

— Vasco 3 x 0 Fluminense, em 1999. Mais de 140 mil pessoas. Foi o jogo mais lotado a que fui e o meu último com a arquibancada de cimento — conta o torcedor.

O rubro-negro Ronaldo Helal, professor de Comunicação Social da Uerj, de 58 anos, aprovou a instalação de cadeiras na geral para os Jogos Pan-americanos de 2007, mas reclama da última obra:

— Entendo o fim da geral, que realmente era muito perigosa e desconfortável. Mas não me identifico com esse novo Maracanã. Tiraram a arquibancada superior, que era sua alma, e a bela marquise.

Ele não se esquece do “jogo da vingança”, em 1981, quando estava na cadeira especial:

— O Flamengo devolveu ao Botafogo o 6 a 0 de 1972. Foi como um título. O Maraca explodiu!

Estudante de jornalismo produz documentário sobre o estádio

Apaixonado por futebol e pela mística que envolvia o antigo Estádio Mário Filho, Bruno Velasco, de 33 anos, estudante de Comunicação Social na Veiga de Almeida, no campus da Rua Ibituruna, decidiu fazer como projeto final de curso um documentário sobre o estádio, intitulado “Maracanã e suas histórias”.

O projeto está dividido em duas partes. Na primeira, já finalizada, Velasco fala sobre os personagens que fizeram história no estádio, entre operários, torcedores e ex-jogadores. Figuras como Túlio Maravilha, Delei e Beto deram seus depoimentos. São 45 minutos de filme.

— Minha proposta é mostrar a relação de intimidade dessas pessoas com o estádio. Além de curiosidades vividas por eles — afirma.

Na segunda parte, ainda em produção, serão abordados os 63 anos de história:

— Vou falar de como ele se tornou um estádio tão mítico — explica Velasco.

Botafoguense, ele lembra sua primeira vez no estádio e a emoção que sentiu:

— Foi um Botafogo x São Paulo, pelo Torneio Rio-São Paulo de 1998. Na hora do gol, pessoas que nunca tinha se visto se abraçavam. Só no Maraca mesmo isso acontecia. Aquilo me marcou muito. Espero que essa comunhão permaneça.