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Brasil Brasília

Decreto sobre drogas prevê foco em abstinência e maior repressão ao tráfico, diz secretário

Política Nacional de Drogas do governo Bolsonaro estimula ampliação de financiamentos para comunidades terapêuticas
Presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia que marcou os 100 primeiros dias de seu governo Foto: EVARISTO SA / AFP
Presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia que marcou os 100 primeiros dias de seu governo Foto: EVARISTO SA / AFP

BRASÍLIA — A Política Nacional de Drogas do governo de Jair Bolsonaro , expressa num decreto que integra um conjunto de ações referentes aos primeiros cem dias de gestão , está ancorada em quatro pontos centrais: posição clara contra a legalização de drogas; tratamento focado em abstinência, com estímulo às chamadas comunidades terapêuticas; novo entendimento sobre o que é considerado tráfico, sem levar em conta somente a quantidade que se porta, mas também as circunstâncias do flagrante policial; e ações de prevenção nas escolas. A informação foi repassada ao GLOBO pelo secretário nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas do Ministério da Cidadania, Quirino Cordeiro Júnior.

Quirino participou das discussões para elaboração do decreto, representando o Ministério da Cidadania. O documento também contou com a participação dos Ministérios da Saúde; da Justiça e Segurança Pública; e da Mulher, Família e Direitos Humanos.

A nova Política Nacional de Drogas foi anunciada num evento no Palácio do Planalto no começo da manhã desta quinta-feira, com a participação de Bolsonaro. O conteúdo do decreto só foi divulgado à noite. O texto fala em "reconhecer o vínculo familiar, a espiritualidade, os esportes, entre outros, como fatores de proteção ao uso, ao uso indevido e à dependência do tabaco, do álcool e de outras drogas, observada a laicidade do Estado".

Os quatro pontos centrais apontados por Quirino são o cerne do decreto. O documento orienta como, a partir de agora, devem ser tocadas as políticas públicas voltadas à questão das drogas.

— Existe no decreto um posicionamento claro contra a legalização das drogas. O governo respeita a posição majoritária da população de ser contra a legalização, com um horizonte de políticas a serem adotadas — disse o secretário ao GLOBO.

O decreto não discute descriminalização, mas expressa a posição contrária a qualquer tipo de legalização. Sobre o tratamento dispensado a usuários de drogas, sai a redução de danos e entram abstinência e recuperação, segundo Quirino. Para isso, o governo vai financiar ainda mais comunidades terapêuticas, que são espaços que misturam assistência a usuários e religião. Essas comunidades são tocadas pelas mais diferentes vertentes religiosas — católicos, espíritas e evangélicos são donos de comunidades.

Segundo Quirino, 2,9 mil vagas em comunidades terapêuticas foram financiadas pelo governo federal até o ano passado. Agora, no governo Bolsonaro, serão 11 mil vagas financiadas em quase 500 comunidades. A orientação para priorizar abstinência e recuperação no tratamento vale também para a rede pública de saúde, mais especificamente para os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), que atendem usuários de drogas.

O decreto, ainda conforme o secretário do Ministério da Cidadania, traz uma nova orientação relacionada à repressão. Segundo Quirino, o tráfico não deve ser determinado pela quantidade de maconha, por exemplo, em poder de uma pessoa abordada por um policial militar. Este policial deve levar em conta a circunstância do flagrante. Um exemplo dado por Quirino: se a quantidade evidencia um porte para consumo, deve-se analisar outros fatores, como presença em uma boca-de-fumo ou dinheiro no bolso, o que configuraria tráfico, na visão do secretário.

Quirino disse que a publicação do decreto neste momento é importante para marcar a posição do governo Bolsonaro, uma vez que o Supremo Tribunal Federal (STF) vai retomar em junho o julgamento de um processo que trata da liberação do porte de maconha para uso pessoal. Até agora, três dos 11 ministros votaram por liberar esse porte para uso pessoal.

— Dentro deste contexto, é importante que o governo coloque sua posição — afirmou o secretário.