A Revolução dos Bichos, de George Orwell: resumo e análise do livro


Laura Aidar
Revisão por Laura Aidar
Arte-educadora, fotógrafa e artista visual

Animal Farm (em português A Revolução dos Bichos) é uma fábula distópica do escritor inglês George Orwell. A história faz uma crítica ao stalinismo através de personagens animais que representam tipos sociais.

O livro foi escrito e publicado durante a Segunda Guerra Mundial e tem forte caráter questionador.

O trabalho é considerado uma obra-prima e foi adaptado para o audiovisual duas vezes. A revista Time elegeu Animal Farm como uma das cem melhores obras de língua inglesa publicadas entre 1923 e 2005.

Resumo de A Revolução dos Bichos

A história contada por Orwell se passa na Granja do Solar, uma fazenda na Inglaterra que tinha como proprietário o senhor Jones. Galinhas, pombas, porcos, cachorros, cavalos, cabras, burros, ovelhas e vacas são os personagens centrais dessa narrativa. Os animais na ficção do escritor inglês possuem características humanas, fazem questionamentos densos, filosóficos, políticos e identitários.

Eles organizam-se e tentam criar uma sociedade utópica após tecerem duras críticas ao homem, nesse caso representado pela figura do senhor Jones:

O Homem é a única criatura que consome sem produzir. Não dá leite, não põe ovos, é fraco demais para puxar o arado, não corre o suficiente para alcançar uma lebre.

Mesmo assim, é o senhor de todos os animais. Põe-nos a trabalhar, dá-nos de volta o mínimo para evitar a inanição e fica com o restante. Nosso trabalho amanha o solo, nosso estrume o fertiliza e, no entanto, nenhum de nós possui mais do que a própria pele.

As vacas, que aqui vejo à minha frente, quantos litros de leite terão produzido este ano? E que aconteceu a esse leite, que deveria estar alimentando robustos bezerrinhos? Desceu pela garganta dos nossos inimigos.

E as galinhas, quanto ovos puseram este ano, e quantos se transformaram em pintinhos? Os restantes foram para o mercado, fazer dinheiro para Jones e seus homens.

A fala acima foi dita pelo velho Major, um porco idoso e com profundo senso de justiça. O Major tinha como sonho tornar os animais da granja seres ricos e livres. Segundo ele, todos os homens eram inimigos e todos os animais eram camaradas e iguais.

O Major iniciou um movimento na granja que pretendia reunir os animais e incitar uma rebelião. No entanto, morreu três dias depois de dar os primeiros passos em direção a uma sociedade igualitária.

Assumiram o posto de comando após a morte do Major os porcos Bola de Neve, Garganta e Napoleão. Os três organizaram os ensinamentos do Major em um sistema de pensamento chamado Animalismo.

O Animalismo é a teoria política fictícia que se assemelharia ao que teria sido o Stalinismo. O Major deu início à revolução embora não tivesse chegado à vê-la. O princípio básico do Animalismo se resumia à uma única frase: "Quatro pernas bom, duas pernas ruim."

Os animais ganharam um hino intitulado Bichos da Inglaterra, que sublinhava a esperança e o desejo de igualdade entre todos.

Foram instituídos na nova sociedade os sete mandamentos:

l. Qualquer coisa que ande sobre duas pernas é inimigo.
2. Qualquer coisa que ande sobre quatro pernas, ou tenha asas, é amigo.
3. Nenhum animal usará roupas.
4. Nenhum animal dormirá em cama.
5. Nenhum animal beberá álcool.
6. Nenhum animal matará outro animal.
7. Todos os animais são iguais.

Os bichos passaram a ser chamados de camaradas e todos os assuntos de interesse coletivo eram levados a votação em Assembleia. Numa das primeiras reuniões foi discutido, por exemplo, se os ratos eram ou não amigos dos animais. Em conjunto também votaram a idade de aposentadoria para cada classe de animal e decidiram instituir aula de alfabetização para todos.

Foi durante encontros escondidos que se planejou uma rebelião. Um dia, o senhor Jones bebeu demais e esqueceu de dar comida aos animais. Foi o estopim e o princípio de uma nova era. Os bichos, diante da fome e da injustiça, juntaram-se e fizeram uma grande revolução, expulsando os humanos da fazenda.

As mudanças foram rápidas e substanciais: a casa onde o senhor Jones e a sua mulher viviam virou um museu, o nome da propriedade foi alterado de Granja do Solar para Granja dos Bichos.

A vida na propriedade rural corria bem após a revolução, mas apesar de todos trabalharem, Mimosa e o gato se esquivavam dos afazeres, aparecendo apenas na hora das refeições.

Os porcos também não trabalhavam propriamente, apenas dirigiam e supervisionavam o trabalho dos outros. Eles afirmavam que, como eram donos de conhecimentos maiores e foram os precursores da revolução, era natural que assumissem a liderança.

Bola de neve, Garganta e Napoleão gradualmente conseguiram privilégios na comunidade. O leite foi desaparecendo e acabou sendo encontrado na comida dos porcos, já as maçãs eram recolhidas na surdina e levadas para os porcos. Pequenos privilégios eram praticados por aqueles que se consideravam trabalhadores intelectuais.

Um belo dia, o senhor Jones voltou para retomar a fazenda. Armado e acompanhado, regressou à granja com uma espingarda. Os animais, porém, conseguiram expulsar o antigo dono da propriedade.

Bola de Neve, tentando otimizar a produção e o fornecimento de energia elétrica, propôs a construção de um moinho. O projeto avançou, mas gerou desentendimentos na cúpula do grupo. Por fim, durante uma reunião no celeiro, Bola de Neve acabou expulso por Napoleão.

Os porcos mudaram-se para a casa onde vivia Jones, que inicialmente seria um museu. Napoleão, ambicioso, decidiu fazer negócios com outras granjas, obrigando os animais a aumentarem a produção.

A situação piorou consideravelmente: os outros bichos tinham cada vez menos comida e cada vez mais trabalho. O líder chegou a proibir que os animais cantassem a música que tanto gostavam (Bichos da Terra) alegando que a canção só teria servido para os tempos da revolução.

Napoleão passou a negociar os produtos da granja com os homens, entre eles Frederick, que deu um golpe na fazenda. A desavença transformou-se num conflito com direito a invasão da propriedade e morte de muitos animais.

Com o tempo, a granja cresceu pois os animais foram dando crias. Os bichos transformaram o espaço em uma república e Napoleão, o único candidato ao cargo, foi eleito.

Devido às relações comerciais com os homens, estreitou os laços com quem tanto odiava e colocou em prática métodos que facilitavam a produção, o controle de gastos com a ração e com os horários de trabalho.

O porco foi ganhando características humanas, tornando-se tão corrupto quanto o antigo proprietário da granja. O final da história evidencia a simbiose entre o porco e o ser que ele antes detestava: o homem.

Personagens principais de A revolução dos bichos

Senhor Jones

Era o dono da fazenda. Explorava os animais para ter maior lucro e não fornecia melhores condições de vida. Especula-se que foi inspirado em Nicolau II, o último imperador da Rússia, que era alcoólatra (assim como o senhor Jones) e detestava o povo.

Velho Major

Porco barbudo, tido em alta conta entre os animais, com maturidade dado a experiência dos seus 12 anos. Era cheio de ideias e foi o primeiro a tentar reunir o grupo em uma sociedade autônoma e igualitária. O personagem teria sido inspirado em Karl Marx, um idealista que mobilizava as massas e faleceu sem ver os frutos da revolução que procurava instaurar.

Bola de neve, Garganta e Napoleão

Eram porcos que o senhor Jones criava. Com a morte do Major eles assumem a liderança da comunidade após a revolução.

As brigas retratadas entre Bola de neve, com perfil expansionista, e Napoleão, claramente ditador, remetem às brigas entre Trotsky e Stálin, dois idealistas de esquerda que divergiam na maneira que deviam implementar o regime.

O porco Napoleão representa uma série de ditadores, como Stálin (União Soviética), Augusto Pinochet (no Chile), Mao Tse Tung (na China), Salazar (em Portugal), etc. Costuma-se associar mais frequentemente a figura do porco Napoleão à Stalin porque ele havia traído os princípios da revolução.

O porco Garganta seria a representação da propaganda feita pelo governo, sempre dita de modo eloquente com o objetivo de manter a ordem.

Sansão e Quitéria

Dois cavalos de tração. Sansão era um trabalhador incansável, um exemplo a ser seguido. Fiel ao mundo do trabalho e ao compromisso social, era considerado o trabalhador modelo da fazenda.

Mimosa

Uma égua branca que tinha como fraco a vaidade e a gula, ela é a representação da burguesia. Ela gostava muito de andar com fitas e de comer torrões de açúcar. Mimosa representa de certa forma o egoísmo e o individualismo por colocar as suas vontades na frente das necessidades dos outros animais.

Benjamim

O burro, animal mais idoso da fazenda, e o mais moderado, representa os sábios ponderados que aprenderam com a experiência dos anos.

Moisés

Um corvo domesticado alcoviteiro que vivia com a família Jones. Na obra ele é a representação da igreja.

Análise de A Revolução dos Bichos

Segundo o autor, A revolução dos bichos faz referência a fatos que se seguiram à Revolução Russa (1917) e a era estalinista na União Soviética.

O desejo de Orwell era denunciar a ditadura instaurada depois que Stalin subiu ao poder. Na história vemos através do porco Napoleão como um cargo de liderança pode fazer com que um suposto representante do povo use do seu posto para obter benefícios pessoais.

Assistimos como Napoleão se corrompe paulatinamente: o porco começa a furtar leite, a ter acesso exclusivo as maçãs e acaba por se mudar para a casa dos Jones, que deveria ser mantida como um museu por decisão coletiva.

Assim, o escritor inglês critica o culto à personalidade e a censura. Napoleão, quando percebe a sua influência na comunidade, proíbe os animais de cantarem a música que os deixava felizes. Além de serem censurados, nem os animais e nem o leitor ficam sabendo o exato motivo da proibição.

O livro parece ser uma mensagem vigorosa contra o totalitarismo e a opressão, a narrativa lembra como algumas pessoas podem ser corrompíveis e como o autoritarismo é cruel para a vida em sociedade.

A manipulação de informações e a chantagem, duas preocupações de Orwell, também aparecem na ficção: na tentativa de manter os animais unidos em torno de uma vida igualitária, os porcos lembram sempre os seus camaradas como era terrível a realidade na época do senhor Jones.

Com uma linguagem fácil e bem humorada, a narrativa procura ser acessível. Assim, foi um sucesso de vendas na época da publicação e em reedições posteriores.

A revolução dos bichos permanece atual, trazendo questões que não perdem a validade, como o jogo de poder, a censura e a manipulação das massas.

Análise das principais frases

Todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais do que os outros.

A conclusão é que o desejo de comunhão e liberdade é corroído pela ambição e pelo poder.

Se no princípio as regras eram claras (como por exemplo, "nenhum animal dormirá em cama"), elas se transformaram, permitindo brechas duvidosas.

As regras universais passaram a ser particularizadas dependendo de quem se tratava, corrompendo o sistema que prometia igualdade para todos.

Retire-se da cena o Homem e a causa principal da fome e da sobrecarga de trabalho desaparecerá para sempre.

A frase acima é dita no princípio do livro, quando o Major ainda tentava convencer os animais da necessidade de se libertarem do domínio do Senhor Jones.

Em seu discurso ele tenta alertar os companheiros, mostrando como são explorados e como Senhor Jones os explora.

O Major identifica o homem como a causa de todo mal e pretende instaurar uma sociedade diferente, com novos valores.

Contexto histórico

Escrito na Segunda Guerra Mundial (entre novembro de 1943 a fevereiro de 1944) e publicado em 17 de agosto de 1945, na Inglaterra, o livro tem claras referências políticas.

Ao longo das páginas vemos uma evidente crítica à ditadura stalinista feita num período em que os soviéticos ainda eram aliados do Ocidente.

Vale lembrar que Stalin era relativamente querido pelo povo britânico (e também pelo governo), situação que deixava o escritor George Orwell em profundo desconforto.

Não por acaso o livro foi recusado por uma série de editoras, muitas casas editoriais temiam possíveis represálias com a publicação.

Uma curiosidade: Orwell chegou a atuar como combatente na Guerra Civil Espanhola, foi lá que conheceu de perto o exército soviético de Stalin.

O autor também trabalhou na BBC até pedir demissão para escrever um livro que denunciasse aquilo que acreditava ser o real caráter do regime stalinista.

Sobre o livro

O livro foi rejeitado por diversas editoras até ser publicado por uma pequena casa editorial em 1945.

Ao criar A revolução dos bichos, o escritor fez uma mistura de gêneros: por um lado é possível encontrar traços das fábulas morais, aquelas cujo mais famoso representante era Esopo, e a da sátira política.

Primeira edição de Animal Farm.
Primeira edição de Animal Farm.

Adaptações cinematográficas

Filme de 1954

A primeira adaptação para o cinema foi realizada em 1954 sob a forma de desenho animado, numa coprodução britânico-americana. Os diretores do longa metragem foram John Halas e Joy Batchelor.

Esse filme foi intitulado Animal Farm, sendo a segunda animação longa-metragem produzida no país (a primeira, Handling Ships, data de 1945). A produção foi indicada ao Bafta de melhor animação em 1956.

Filme de 1999

A segunda adaptação para o cinema foi dirigida por John Stephenson e lançada em outubro de 1999. Essa nova montagem foi bem diferente da primeira, especialmente porque já trazia animais reais ao invés de animados.

Leia na íntegra

A revolução dos bichos encontra-se disponível para download gratuito em formato pdf.

Descubra George Orwell

Eric Arthur Blair, nascido em Montihari (uma pequena cidade em Bengala) escolheu o pseudônimo George Orwell para trabalhar como jornalista, ensaísta e romancista.

Nascido em 25 de junho de 1903, Orwell era filho de um funcionário colonial inglês agente do Departamento Britânico de Ópio.

Antes de ser escritor, atuou na Polícia Imperial da Índia. Não durou muito tempo no cargo porque rapidamente percebeu que queria se dedicar exclusivamente às palavras.

Asim, se mudou para a capital da França onde teve uma vida boêmia e repleta de prazeres. Em 1936 a alegria acabou quando embarcou para a Espanha para lutar contra o franquismo (ditadura de Francisco Franco).

Em 1933, publicou o seu primeiro livro, intitulado Na pior em Paris e Londres. Em 1945, lançou A revolução dos bichos.

Retrato de George Orwell.
Retrato de George Orwell.

Na vida pessoal o escritor foi casado com Eileen, com quem adotou um menino chamado Richard Horatio Blair.

Orwell ficou viúvo muito cedo, com apenas quarenta e um anos. Deprimido com a perda, mudou-se para uma casa afastada da cidade, situada na ilha escocesa de Jura.

Cinco anos mais tarde, acometido pela tuberculose, o escritor não resistiu e faleceu, deixando uma importante obra literária.

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Laura Aidar
Revisão por Laura Aidar
Arte-educadora, artista visual e fotógrafa. Licenciada em Educação Artística pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e formada em Fotografia pela Escola Panamericana de Arte e Design.
Rebeca Fuks
Edição por Rebeca Fuks
Formada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2010), mestre em Literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2013) e doutora em Estudos de Cultura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e pela Universidade Católica Portuguesa de Lisboa (2018).