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Entrevista: e-commerce aquecido não muda valuation de aquisições, diz CFO da Locaweb

17 ago 2020, 17:45 - atualizado em 17 ago 2020, 17:47
Locaweb sede
Filão de ouro: ajudar PMEs a vender online é o principal foco da Locaweb atualmente (Imagem: Divulgação/ Locaweb)

Mesmo antes de estrear na Bolsa no início de fevereiro, a Locaweb (LWSA3) já chamava a atenção do mercado. Primeiro, porque os investidores aceitaram comprar suas ações por R$ 17,25, no teto da faixa indicativa, na oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês).

A cifra correspondia a um múltiplo Preço/Lucro estimado para 2020 de 30 vezes e implicava num valor de mercado de R$ 2,6 bilhões. Por aquele valor, o IPO movimentou mais de R$ 1 bilhão, dos quais, R$ 575 milhões na oferta primária – o dinheiro que, efetivamente, entrou no caixa da empresa.

As sobrancelhas permaneceram levantadas, após as ações saltarem 20% no primeiro dia de pregão. Não faltou quem se perguntasse se o mercado havia enlouquecido. Mas, seis meses depois, o atual patamar em que os papéis são negociados faz aquelas dúvidas soarem como descabidas. Na última sexta-feira (14), fechou cotada em R$ 53,10 – um salto de 208% sobre o preço de colocação do IPO.

O que os investidores querem saber, agora, é se as ações já renderam tudo o que poderiam e, portanto, seu valor atingiu um platô, ou se há espaço para novas altas. No que depender da cúpula da Locaweb, é muito cedo para deixar as ações sossegarem.

Há duas grandes fontes de geração de valor no radar da companhia: atrair novos clientes, sobretudo para sua divisão de e-commerce, e aumentar o tíquete médio de quem já utiliza seus serviços e produtos. Para tanto, a empresa não esconde de ninguém que realizará aquisições estratégicas. Neste momento, sete candidatas à venda mantêm memorandos de entendimento.

“A Locaweb não fez um IPO para aprender a fazer aquisições; a gente já faz M&A há muito tempo”, diz Rafael Chamas, diretor financeiro da companhia, em entrevista ao Money Times. Veja os principais trechos da conversa.

Money Times – Quais são os principais destaques do segundo trimestre da Locaweb?
Rafael Chamas – Gostaria de destacar o e-commerce. Ele representou 27,9% de nossa receita líquida, mas contribuiu com 45% do ebitda consolidado, e ainda mais no fluxo de caixa. O e-commerce nos ajudou a entregar crescimento, rentabilidade e caixa. Agregamos novos assinantes, o que aumenta nossa receita recorrente. A Tray [marca da Locaweb] é a maior plataforma do Brasil, em clientes e GMV [volume bruto de vendas, em inglês]. Mas, não basta apenas ser uma plataforma. Temos todo um ecossistema que a envolve, com ferramentas de pagamento online, integração com marketplaces, gestão de estoques, ERP, marketing, logística. Hoje, temos quatro vezes mais lojas virtuais em nossa plataforma, do que no fim do ano passado. Isso significa muito cliente e muita receita futura.

Aliados: “aprendemos a atrair e manter empreendedores”, diz Rafael Chamas, CFO da Locaweb (Imagem: Divulgação/ Locaweb)

MT – Como a Locaweb consegue aumentar a receita por cliente?
RC – Na média, a receita obtida com cada cliente é multiplicada por sete, num intervalo de três anos. Isso reflete o seu próprio sucesso. Quanto mais bem-sucedido ele for, maior é a tarifa que paga, porque vai mudando de patamar, vai fazendo um upgrade, vai integrando mais serviços e produtos da Locaweb. Mas, mesmo que a tarifa suba, o cliente ganha na escala. Na comparação com seu faturamento, as tarifas começam a ser um custo cada vez menor, percentualmente.

MT – As micro, pequenas e médias empresas formam a maior parte de seus clientes. Isso não representa um risco para a Locaweb, já que elas são as que têm menos caixa para enfrentar a pandemia e a crise econômica?
RC – Sim, nosso foco é, majoritariamente, as PMEs. Queremos ser uma “one stop shop” para as PMEs brasileiras. A Locaweb oferece serviços essenciais para essas empresas, como lojas virtuais e e-mails. Por isso, costumamos dizer que o cliente só nos deixa, quando ele próprio desiste de empreender. Além disso, o Brasil ainda está muito atrás na digitalização. Antes da Covid-19, só 5% ou 6% do varejo era digital. Em países desenvolvidos, essa fatia é muito maior. A quantidade de novos entrantes no varejo online é cavalar. Nós acompanhamos as “safras” de novos clientes e, desde janeiro, não constatamos nenhuma depreciação de suas métricas, em relação aos clientes mais antigos.

MT – A pandemia criou uma bolha de marketplaces e e-commerce? Quanto desse crescimento vai permanecer?
RC – Acho ótimo ter tantos marketplaces sendo criados no Brasil, porque isso cria um mercado endereçável para a gente. Nossa plataforma de e-commerce oferece 170 integrações para as PMEs. Cada loja virtual pode se integrar a sistemas de vendas, logística, gestão de atendimento, e-mail marketing, pagamentos e marketplaces, entre outros. Continuamos atraindo clientes. Em julho, a adição de novas lojas foi 347% maior que a média do quarto trimestre de 2019. Além disso, os varejistas não querem, nunca mais, correr o risco de depender de apenas um canal de vendas, como as lojas físicas. Isso permanecerá depois da pandemia. O comportamento dos consumidores também mudou, está mais online. O consumidor não será o mesmo, após a Covid-19.

MT – A Locaweb possui, neste momento, sete memorandos de entendimento com empresas que podem ser adquiridas. Qual é a importância dessas aquisições?
RC – Primeiro, precisamos lembrar que, ao contrário de outras empresas, a Locaweb não fez um IPO para começar a fazer M&A. Nós já compramos empresas há muito tempo. Aprendemos que, no setor de tecnologia, o principal ativo é gente. Além do que sempre buscamos nas empresas, que é receita recorrente, possibilidades de cross-selling e produtos já desenvolvidos, nos preocupamos também com os talentos que virão com as aquisições. A maioria dos fundadores das seis empresas que já compramos ainda está conosco. Aprendemos como atrair e manter esses empreendedores, mesmo depois de receberem todo o valor da transação. Eles sabem que, aqui, podem continuar empreendendo, sem o peso de se preocupar com outros assuntos, como a rotina de gestão de uma empresa.

MT – O aquecimento do e-commerce elevou o valuation das candidatas à aquisição?
RC – Não. Nossos contratos seguem o modelo de earnout. Assim, pagamos um valor justo pelo negócio e, se o empreendedor nos entregar crescimento, recebe outro tanto. É, também, uma forma de proteger a Locaweb e seus investidores. Se o crescimento não vier, não teremos pagado um valor acima do que seria justo.

MT – Quais são os setores de interesse para aquisição?
RC – E-commerce e SaaS [software as a service].

MT – A Locaweb tem cerca de 16 mil investidores pessoas físicas e 300 investidores institucionais. Qual é a mensagem da empresa para eles?
RC – Investir em equity só é possível, com credibilidade. Somos uma empresa fundada há 20 anos. Passamos por todas as etapas do desenvolvimento tecnológico do Brasil. Temos um histórico, entregamos resultados sólidos, priorizamos a governança. Eu costumo dizer que nosso controlador está na empresa há 20 anos e continua acreditando na nossa visão de longo prazo. Se ele continua vendo o potencial da empresa, quem sou eu para duvidar?

Diretor de Redação do Money Times
Ingressou no Money Times em 2019, tendo atuado como repórter e editor. Formado em Jornalismo pela ECA/USP em 2000, é mestre em Ciência Política pela FLCH/USP e possui MBA em Derivativos e Informações Econômicas pela FIA/BM&F Bovespa. Iniciou na grande imprensa em 2000, como repórter no InvestNews da Gazeta Mercantil. Desde então, escreveu sobre economia, política, negócios e finanças para a Agência Estado, Exame.com, IstoÉ Dinheiro e O Financista, entre outros.
marcio.juliboni@moneytimes.com.br
Ingressou no Money Times em 2019, tendo atuado como repórter e editor. Formado em Jornalismo pela ECA/USP em 2000, é mestre em Ciência Política pela FLCH/USP e possui MBA em Derivativos e Informações Econômicas pela FIA/BM&F Bovespa. Iniciou na grande imprensa em 2000, como repórter no InvestNews da Gazeta Mercantil. Desde então, escreveu sobre economia, política, negócios e finanças para a Agência Estado, Exame.com, IstoÉ Dinheiro e O Financista, entre outros.